Tratamento da Vinhaça: Biodigestão Anaeróbica

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1 “Workshop Tecnológico sobre VINHAÇA” Projeto Programa de Pesquisa em Políticas Públicas Painel 5: Tratamento da Vinhaça: Biodigestão Anaeróbia Palestrante: Clarita Schvartz Peres IPT - Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas http://www.ipt.br e-mail: [email protected] Debatedor: Elke Meireles - Usina São Martinho Relator: Jorge Lucas Junior – FCAV/UNESP Jaboticabal, 10/10/2007

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“Workshop Tecnológico sobre VINHAÇA”

Projeto Programa de Pesquisa em Políticas Públicas

Painel 5:

Tratamento da Vinhaça: Biodigestão

Anaeróbia

Palestrante : Clarita Schvartz Peres

IPT - Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas http://www.ipt.br e-mail: [email protected] Debatedor:

Elke Meireles - Usina São Martinho

Relator:

Jorge Lucas Junior – FCAV/UNESP

Jaboticabal, 10/10/2007

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Projeto Programa de Pesquisa em Políticas Públicas

WORKSHOP TECNOLÓGICO SOBRE VINHAÇA

COORDENAÇÃO: Márcia Justino Rossini Mutton – FCAV/UNESP

Raffaella Rossetto – Apta Miguel Angelo Mutton – FCAV/UNESP

Painel 5 - “Tratamento da Vinhaça: Biodigestão Ana eróbia”

Palestrante : Clarita Schvartz IPT – Centro de Tecnologias ambientais e Energéticas Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas Fone: 11 3767 4750 www.ipt.br [email protected] Colaboração: Marcelus Valentim – FEAGRI/UNICAMP [email protected] Debatedor: Elke Meireles - Usina São Martinho Mediador e Relator: Jorge Lucas Junior – FCAV/UNESP QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS – TERMO DE REFERÊNCIA 1. Qual a influência da atual utilização da vinhaça no solo? O que esperar para seu uso contínuo? Que cuidados devem ser observados nas áreas de expansão da cultura? 2. Qual a influência na utilização da vinhaça na pr odutividade de colmos/biomassa da cana-de-açúcar? Que efeitos apre senta na qualidade tecnológica da matéria prima e no processamento ind ustrial para produção de etanol? 3. Qual a influência da vinhaça no meio ambiente (s olo, água e ar)? 4. As medidas atualmente empregadas no manejo e mon itoramento da vinhaça são adequadas e suficientes? 5. Faltam pesquisas básicas e/ou estudos de viabili dade técnica/econômica/ambiental para caracterizar os im pactos e/ou direcionar os modos de utilização da vinhaça? 6. Quais são os usos potenciais da vinhaça e os gar galos tecnológicos para sua adoção?

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BIODIGESTÃO DE VINHAÇA – UMA NECESSIDADE FUTURA

INTRODUÇÃO Não é pretensão deste texto abordar os temas de usos e aplicações de vinhaça e será

focado somente no assunto digestão anaeróbia, conforme solicitação da coordenação do

presente workshop. Acrescenta-se que tal assunto não está claramente colocado no

contexto das questões a serem respondidas, sendo a abordagem adotada mais

contextualizada pelas questões 5 e 6.

A biodigestão de qualquer efluente ou resíduo deve ser vista como um processo que tem

como objetivo o saneamento ambiental e a produção de energia.

No termo de referência é citado:

“A biodigestão anaeróbia da vinhaça é uma alternativa pouco utilizada e estudada. É um

processo que propicia a diminuição da carga de DBO da vinhaça, utilizando-se reatores

anaeróbios. Este processo é largamente empregado e estudado objetivando o tratamento de

efluentes urbanos domésticos, além de efluentes de origem animal. Apresenta como

vantagens: baixo consumo de energia, a pequena produção de lodo (descarte), a grande

eficiência na diminuição da carga orgânica, baixo potencial poluidor, sendo que o biogás

produzido poderá ser empregado no processo de produção de energia (FREIRE &

CORTEZ, 2000).”

Pouco utilizada, sim, entretanto é bastante estudada. Pode-se ilustrar tal afirmação por

vasta literatura sobre o assunto tanto escrita, como através da web onde se verifica o estado

atual da tecnologia de tratamento de efluentes, com o emprego de biodigestores de elevada

eficiência, para tratar efluentes produzidos em altas vazões, com elevadas concentrações

de carga orgânica, com reduzido tempo de detenção hidráulica.

No Brasil há várias plantas de biodigestão em operação, mas nenhuma desse tipo operando

com vinhaça. O motivo é o seu alto custo de investimento e de operação, comparando-se

com os de fertirrigação. Portanto, a questão não é tecnológica.

No estado de São Paulo há uma planta de digestão anaeróbia de vinhaça, operando, na

Usina São Martinho, há vários anos com vinhaça, em processo termofílico – 55 º C.

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Atualmente, a vinhaça produzida é destinada à fertirrigação e, no estado de São Paulo, deve

atender à norma Técnica CETESB P4.231/2006, que disciplina sua aplicação, mantendo

concentrações de K em limites pré-estipulados em função do tipo de solo e de cana e define

que os tanques de armazenagem e os drenos para a vinhaça devem ser impermeabilizados

para impedir contaminação de solo e águas.

O PROCESSO DE BIODIGESTÃO

O processo de biodigestão é realizado por uma comunidade microbiana, da qual participam

vários grupos metabólicos de bactérias.

O esquema, a seguir, ilustra tal interação.

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Vários fatores têm influência nas populações bacterianas, a saber: temperatura, pH,

composição orgânica do substrato (no caso, vinhaça), composição inorgânica, taxa de

alimentação etc. Desta forma, fatores de importante controle no processo de biodigestão

são: pH, alcalinidade, ácidos orgânicos voláteis, temperatura, teores de C, N e P, regulados

por condições operacionais de carga orgânica, (concentração da alimentação), vazão de

alimentação do reator, tempo de detenção hidráulica e outros.

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No caso de reatores do tipo UASB, o controle de velocidade ascencional de líquido é

também importante para que ocorra a granulação do lodo anaeróbio. Isto deve ser

considerado já no projeto do reator.

Outros aspectos a serem avaliados são relativos à presença de compostos tóxicos aos

microrganismos que atuam no processo. Para a vinhaça, um ponto de controle importante é

o teor de sulfato presente na sua composição.

A eficiência do processo é avaliada pela produção de biogás, teor de metano, redução de

DQO e/ou DBO.

Ainda permanecem algumas incertezas para o uso energético do biogás tais como os

efeitos corrosivos nos equipamentos auxiliares e motogeradores e a estabilidade da

biodigestão frente às flutuações na quantidade e qualidade da vinhaça processada. Estes

problemas potenciais, que podem causar impactos negativos para o futuro comercial da

tecnologia, só poderão ser realmente avaliados e resolvidos com a operação de algumas

unidades.

Deve-se lembrar que a vinhaça, após biodigerida, continua sendo um bom fertilizante para a

cultura de cana, tendo ainda uma parcela de matéria orgânica e mantendo os teores de

potássio.

A VINHAÇA DO FUTURO

O que se pretende discutir, em primeiro lugar, é impacto ambiental da vinhaça nos próximos

anos, face às metas que vêm sendo estabelecidas para a produção de etanol.

Segundo Délcio Rodrigues e Lúcia Ortiz, no trabalho “Em direção à sustentabilidade da

produção de etanol de cana de açúcar no Brasil (outubro, 2006): “As expectativas do

Governo Brasileiro, expressas na Política Nacional de Agroenergia 2006-2011 (2005),

lançam projeções de crescimento do consumo interno de 1,5 bilhões de litro ao ano, o que

representa uma demanda estimada de 25 bilhões de litros para 2013, e uma oferta total de

etanol próxima a 30 bilhões de litros para 2015, agregando-se aí o volume previsto para

exportação. A consolidação das expectativas de consumo e exportação de etanol e açúcar

deve representar, uma demanda adicional por 220 milhões de toneladas de cana e a

incorporação de 3 milhões de hectares de novas áreas.”

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Nessas projeções estão previstas alterações tecnológicas no cultivo da cana/variedades e

no processo de produção de álcool, direcionando para uma maior produtividade de álcool

tanto no campo como na fermentação.

Com uma maior produtividade, poderá haver excedente de vinhaça armazenada, que

poderá gerar problemas ambientais, se não controlada.

Em segundo lugar, deve-se considerar o desenvolvimento da tecnologia de produção de

etanol a partir de materiais celulósicos, no caso da cana, visando seu aproveitamento

integral, do bagaço excedente e, posteriormente também da palha.

Novas questões ambientais e energéticas surgirão com as usinas / destilarias que irão

processar a fermentação do caldo de cana juntamente (?) com o hidrolisado de celulose

(bagaço, palha).

O fluxograma, a seguir, ilustra, de forma simplificada, o processo de produção de etanol do

caldo da cana juntamente com o hidrolisado de celulose, para melhor explicar.

Fluxograma da produção de álcool de caldo e hidrolisado de bagaço

PRÉ-TRATAMENTO

SEPARAÇÃO

BAGAÇO

SÓLIDO= BAGAÇO PRÉ-

TRATADO

HIDRÓLISE ENZIMÁTICA

SEPARAÇÃO

CALDO HIDROLISADO

RESÍDUO SÓLIDO

INSUMOS

INSUMOS

CANA

CALDO

LÍQUIDO

CALDO FERMENTAÇÃO

DESTILAÇÃO ETANOL VINHAÇA

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A vinhaça produzida neste processo poderá apresentar características diferentes da atual, a

considerar os seguintes pontos:

� Poderá ser muito mais diluída, se não se adicionar mel ou melaço ao caldo, para se

ter uma concentração adequada de açúcares para um bom rendimento de etanol.

� Poderá ter pentoses oriundas da hemicelulose, dependendo do tipo de pré-

tratamento, que não são fermentadas pela levedura atualmente empregada.

� Poderá ter na sua composição os componentes do preparado enzimático (celulases,

citratos etc.).

� Se o processo de hidrólise estiver associado à produção de enzimas, conterá todos

os componentes desse mosto, podendo, se não separados, incluir até os microrganismos

produtores de enzimas.

� Embora a tecnologia de digestão anaeróbia de vinhaça esteja otimizada, haverá

necessidade da realização de determinações analíticas para conhecer a composição da

nova vinhaça, bem como ensaios para determinar atividade metanogênica específica, e

ensaios de bancada/piloto para avaliar toxicidade de algum composto e a eficiência de

processo em termos de redução de carga orgânica e de produção de energia, na forma de

metano.

Poder-se-ia perguntar se a fertirrigação não continuaria a ser a saída para a destinação da

nova vinhaça. Será também necessária a caracterização química da nova vinhaça para

poder responder. Além disso, se a concentração de açúcares redutores totais na

fermentação alcoólica for a mesma que a atualmente empregada, o volume de vinhaça

dobrará e a cultura de cana não absorverá essa quantidade de material.

Ressalta-se ainda, que embora se afirme que o efluente da biodigestão de vinhaça possa

ser aplicado na cultura de cana, não se tem conhecimento de resultados dessa aplicação.

Também deve ser considerado que a destilaria terá necessidade de insumo energético

adicional, que pode ser oriundo do biogás, uma vez que parte do bagaço será desviado para

a produção de etanol.