TUDE, João Martins.; Conceitos Gerais de Políticas Públicas

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Conceitos gerais de Políticas Públicas João Martins Tude As Políticas Públicas e o seu estudo O estudo do papel e das ações do Estado não é novidade na história humana. Desde os filósofos e pensadores da Antiguidade que a humanida- de debruça-se na reflexão sobre o que o Estado “faz ou deixa de fazer”, sobre como são tomadas as decisões políticas e sobre quais as obrigações e direi- tos dos governantes e governados. Mas, no decorrer dos séculos, essas pers- pectivas foram se modificando em decorrência do próprio desenvolvimento político das sociedades e das formas de governo que iam se consolidando ao longo do tempo. Nos séculos XVIII e XIX, por exemplo, as principais funções do Estado res- tringiam-se à manutenção da segurança pública interna e da preservação da propriedade privada e à defesa das fronteiras em caso de ataque externo ad- vindo de outros Estados. No século seguinte, com o adensamento e expan- são cada vez mais crescente da democracia, as responsabilidades e funções do Estado também se diversificaram e expandiram. O século XX é marcado pelo surgimento de uma nova e importante função do Estado, a promo- ção do bem-estar social. Essa nova demanda social, o bem-estar, requer do Estado uma atuação diferenciada e mais diretamente ligada aos problemas cotidianos da sociedade. É nesse contexto que surgem as Políticas Públicas, com o objetivo de dar respostas a demandas específicas da sociedade. En- quanto disciplina acadêmica e área do conhecimento, as Políticas Públicas têm sua origem nos Estados Unidos em meados do século XX. Políticas Públicas, tradicionalmente, compreendem o conjunto das deci- sões e ações propostas geralmente por um ente estatal, em uma determina- da área (saúde, educação, transportes, reforma agrária etc.), de maneira dis- cricionária ou pela combinação de esforços com determinada comunidade ou setores da sociedade civil. Contudo, destaca-se que o conceito de Políticas Públicas tem evoluído ao longo do tempo, sobretudo na Ciência Política. Inicialmente, consideravam-se

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  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    Joo Martins Tude

    As Polticas Pblicas e o seu estudoO estudo do papel e das aes do Estado no novidade na histria

    humana. Desde os filsofos e pensadores da Antiguidade que a humanida-de debrua-se na reflexo sobre o que o Estado faz ou deixa de fazer, sobre como so tomadas as decises polticas e sobre quais as obrigaes e direi-tos dos governantes e governados. Mas, no decorrer dos sculos, essas pers-pectivas foram se modificando em decorrncia do prprio desenvolvimento poltico das sociedades e das formas de governo que iam se consolidando ao longo do tempo.

    Nos sculos XVIII e XIX, por exemplo, as principais funes do Estado res-tringiam-se manuteno da segurana pblica interna e da preservao da propriedade privada e defesa das fronteiras em caso de ataque externo ad-vindo de outros Estados. No sculo seguinte, com o adensamento e expan-so cada vez mais crescente da democracia, as responsabilidades e funes do Estado tambm se diversificaram e expandiram. O sculo XX marcado pelo surgimento de uma nova e importante funo do Estado, a promo-o do bem-estar social. Essa nova demanda social, o bem-estar, requer do Estado uma atuao diferenciada e mais diretamente ligada aos problemas cotidianos da sociedade. nesse contexto que surgem as Polticas Pblicas, com o objetivo de dar respostas a demandas especficas da sociedade. En-quanto disciplina acadmica e rea do conhecimento, as Polticas Pblicas tm sua origem nos Estados Unidos em meados do sculo XX.

    Polticas Pblicas, tradicionalmente, compreendem o conjunto das deci-ses e aes propostas geralmente por um ente estatal, em uma determina-da rea (sade, educao, transportes, reforma agrria etc.), de maneira dis-cricionria ou pela combinao de esforos com determinada comunidade ou setores da sociedade civil.

    Contudo, destaca-se que o conceito de Polticas Pblicas tem evoludo ao longo do tempo, sobretudo na Cincia Poltica. Inicialmente, consideravam-se

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    as Polticas Pblicas quase exclusivamente como outputs do sistema poltico, ou seja, as aes executadas por um ente estatal a partir de demandas capta-das, negociadas e transformadas da sociedade; sendo que a cincia poltica se preocupava em estudar somente os inputs, que eram essas demandas da sociedade responsveis pela formao desses outputs.

    Entretanto, com a evoluo desta cincia, as Polticas Pblicas comearam a ser concebidas como unidade de anlise, sendo estudado o seu processo como um todo (inputs + outputs). Dessa forma, os estudos nessa temtica passaram a se ocupar em entender desde a origem at a formao final das Polticas Pbli-cas, abordando todos os atores envolvidos para o seu desenvolvimento.

    De Faria (2003) faz uma interessante anlise da evoluo do conceito de Polticas Pblicas que evidencia a complexificao do processo por conta da participao de novos atores frente ao mesmo. Ela argumenta que in-meros trabalhos cientficos tm apontado para diversas formulaes desse conceito. Segundo ela, os processos cada vez mais complexos, bem como a participao de novos atores nesses processos teriam deixado os modelos tradicionais de anlise incapazes de interpretar essa nova realidade. A seguir destacado um trecho importante em que se encontra esse pensamento:

    Nas duas ltimas dcadas, porm, os estudos acerca da interao entre os atores estatais e privados no processo de produo das Polticas Pblicas tm sofrido significativas formulaes. Uma grande variedade de pesquisas empricas e de ensaios de natureza terico-conceitual tem demonstrado a incapacidade dos modelos tradicionais de interpretao dos mecanismos de intermediao de interesses, como o pluralismo, o corporativismo, o marxismo, em suas vrias derivaes, de dar conta da diversificao e da complexificao desses processos, muitas vezes marcados por interaes no hierrquicas e por um baixo grau de formalizao no intercmbio de recursos e informaes, bem como pela participao de novos atores, como, por exemplo, organizaes no governamentais de atuao transnacional e redes de especialistas. (DE FARIA, 2003, p. 21)

    Na atualidade, diante da diversidade de conceitos de Polticas Pblicas, destaca-se o de Teixeira (2002). Ele desenvolve um conceito que aborda ele-mentos de uma definio clssica (alocao de recursos pblicos e desenvol-vimento de aes a partir de regras definidas pelo Estado e sociedade), mas atenta tambm para a omisso em determinadas aes que fazem parte das Polticas Pblicas. Dessa maneira, para Teixeira (2002, p. 3) Polticas Pblicas

    [...] so diretrizes, princpios norteadores de ao do Poder Pblico; regras e procedimentos para as relaes entre Poder Pblico e sociedade, mediaes entre atores da sociedade e do Estado. So, nesse caso, polticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos

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    (leis, programas, linhas de financiamentos) que orientam aes que normalmente envolvem aplicaes de recursos pblicos. Nem sempre, porm, h compatibilidade entre as intervenes e declaraes de vontade e as aes desenvolvidas. Devem ser consideradas tambm as no aes, as omisses, como formas de manifestao de polticas, pois representam opes e orientaes dos que ocupam cargos.

    Os estudos de Polticas Pblicas esto difundidos em diversos pases e so de grande valia para o planejamento das aes dos governos, seja em nvel mu-nicipal, estadual ou federal, das empresas e at mesmo dos cidados comuns.

    Neste captulo buscaremos entender quais as principais razes motivado-ras de se estudar as Polticas Pblicas e os diferentes tipos de atores sociais e instituies que se ocupam de sua anlise. Posteriormente passaremos ao es-foro de conceituao e discusso semntica do termo poltica e suas diver-sas dimenses interpretativas, e especificamente do termo Polticas Pblicas. Veremos, ainda, as diferenas entre os diversos atores envolvidos nos proces-sos de formulao, implementao e avaliao de Polticas Pblicas. Analisa-remos os principais tipos de polticas adotadas pelo governo classificando-as de acordo com suas consequncias tanto no processo de formulao como no processo de implementao e, por fim, verificaremos as interpretaes das diversas correntes tericas que se ocupam desse campo de estudos.

    Por que estudar Polticas Pblicas?Diversas so as razes que impulsionam os diferentes atores sociais a se

    debruarem sobre os estudos de Polticas Pblicas, mas dentre elas desta-camos trs razes principais: razes cientficas (universidades, grupos de pesquisa, acadmicos etc.), razes profissionais (organizaes sindicais, em-presas e corporaes comerciais e industriais, tcnicos e especialistas em diversos segmentos sociais etc.) e razes polticas (lideranas comunitrias, lideranas polticas, organizaes no governamentais etc.).

    Razes cientficasAs razes cientficas para o estudo das Polticas Pblicas devem-se im-

    portncia adquirida por essa matria principalmente nas democracias oci-dentais modernas. A possibilidade de prever os impactos da ao do Estado

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    sobre a sociedade movimenta cientistas, notadamente do campo das cincias humanas (cientistas polticos, socilogos, administradores, antroplogos, eco-nomistas etc.) que tm por objetivo criar modelos que possam auxiliar tanto o Estado quanto a sociedade no processo de formulao, implementao e avaliao de Polticas Pblicas, alm de fornecer instrumental explicativo dos fenmenos sociais que envolvem esse campo.

    Assim entendemos que,

    o pressuposto analtico que regeu a constituio e a consolidao dos estudos sobre Polticas Pblicas o de que, em democracias estveis, aquilo que o governo faz ou deixa de fazer passvel de ser (a) formulado cientificamente e (b) analisado por pesquisadores independentes. A trajetria da disciplina, que nasce como subrea da cincia poltica, abre o terceiro grande caminho trilhado pela cincia poltica norte-americana no que se refere ao estudo do mundo pblico. (SOUZA, 2006, p. 22)

    Uma anlise cientfica das Polticas Pblicas passa pela verificao de pelo menos duas variveis explicativas: uma varivel dependente e uma varivel independente.

    Varivel dependente: refere-se a quais foras sociais e quais caracters- ticas do sistema poltico influenciam o contedo das polticas.

    Varivel independente: refere-se aos impactos das Polticas Pblicas sobre a sociedade e sobre o sistema poltico.

    Razes profissionaisAs razes profissionais para o estudo das Polticas Pblicas geralmente

    relacionam-se com a utilizao dos conhecimentos adquiridos para resolu-o de problemas prticos. O estudo das Polticas Pblicas muito impor-tante para tomada de decises e planejamento das empresas e corporaes comerciais e industriais, pois estas se utilizam dos estudos de Polticas Pbli-cas para prever os impactos das aes do Estado sobre a sociedade e assim planejar suas aes no curto e mdio prazo principalmente.

    Alm das questes relacionadas economia, os estudos de Polticas Pblicas do base para a ao de profissionais responsveis por prover solues imedia-tas para problemas sociais: tcnicos em segurana pblica, tcnicos em planeja-mento sanitrio, tcnicos em planejamento urbano, tcnicos em sade pblica, tcnicos em educao etc.

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    Razes polticasA principal razo poltica para o estudo das Polticas Pblicas est em

    elevar o grau de conscientizao da sociedade em torno das interferncias do Estado na vida social e, dessa maneira, aumentar a qualidade das Polti-cas Pblicas. Atravs da explanao detalhada das polticas adotadas pelo Estado, o estudo das Polticas Pblicas proporciona o instrumental neces-srio para acender a discusso poltica e, dessa forma, tornar mais eficaz o resultado das Polticas Pblicas, alm de aproximar atravs da informao a sociedade das aes do Estado.

    Conceitos centrais no estudo das Polticas Pblicas

    A anlise de Polticas Pblicas passa necessariamente pelo entendimento dos diversos conceitos imbricados nessa matria multidisciplinar e multifa-cetada das cincias humanas. De acordo com Frey (2000), o termo poltica em lngua inglesa possui trs dimenses de significao: uma dimenso ins-titucional (polity), uma dimenso processual (politics) e uma dimenso mate-rial (policy/policies).

    A dimenso institucional ( polity): como o prprio termo j diz, essa dimenso do conceito de poltica na lngua inglesa se refere ao or-denamento institucional do sistema poltico, s disposies jurdicas a que est sujeito e estrutura institucional do sistema poltico-admi-nistrativo.

    A dimenso processual ( politics): refere-se ao processo poltico como comumente entendemos, s relaes conflituosas entres os diversos atores polticos, partidos e agentes do governo, diz respeito aos obje-tivos a serem alcanados, aos contedos e s decises de distribuio de poderes.

    A dimenso material ( policy): faz referncia ao que entendemos como polticas (no plural), ou mais especificamente Polticas Pblicas. So os contedos concretos da ao poltica, isto , o resultado material dos chamados programas polticos ou planos de governo, so as resolu-es do Estado para os problemas tcnicos e mais imediatos da socie-dade em sua concepo mais material.

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    Apesar da importncia terica desses conceitos para a compreenso mais clara do que so as Polticas Pblicas, na prtica eles no podem ser disso-ciados. Temos sempre de levar em conta que todas essas dimenses esto inter-relacionadas e emergem de modo mais ou menos acentuado na ao poltica sempre entrelaadas e influenciando-se mutuamente.

    O que veremos agora a conceituao geral de cada uma dessas dimen-ses alm de outros conceitos essenciais para compreenso das Polticas P-blicas, sejam eles: politics, polity e policy/policies, policy network, policy arena e policy cycle.

    PoliticsA politics pode ser entendida como a dimenso processual da poltica. o

    mbito dos caminhos (e descaminhos) pelos quais uma deciso poltica tem de passar, representa as instncias decisrias do processo poltico, nesse mbito onde os diversos atores envolvidos no processo decisrio possuem maiores possibilidades de interveno, tanto os policy makers (formuladores de polti-cas) quanto os demais atores sociais interessados nas decises polticas.

    PolityA polity seria a dimenso institucional da poltica. O conjunto de procedi-

    mentos, nos mais diversos nveis, formais e informais, que expressam relaes de poder e que tm por objetivo a resoluo dos conflitos no seio do Estado (entre diversas instncias do poder) para melhor alocao dos recursos pblicos.

    Podemos entender instituies polticas como,

    [...] padres regularizados de interao, conhecidos, praticados e em geral reconhecidos e aceitos pelos atores sociais, se bem que no necessariamente por eles aprovados.[...] So produtos de processos polticos de negociao antecedentes, refletem as relaes de poder existentes e podem ter efeitos decisivos para o processo poltico e seus resultados. (PRITTWITZ apud FREY, 2000, p. 232)

    Policy/policies no conceito de policy/policies que iremos encontrar a definio mais

    equivalente ao que entendemos como Polticas Pblicas, ou mesmo polti-cas no plural. As policies so outputs (sadas), resultantes da atividade polti-ca, da dimenso procedimental da poltica (politics): faz referncia aos con-tedos mais objetivos da poltica, ou seja, materializao das propostas

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    inseridas nos programas polticos, relaciona-se com os problemas tcnicos e com o contedo material das decises polticas.

    Policy networkA policy network pode ser entendida como o processo de inter-relaes

    entre os diversos atores envolvidos na formulao/implementao de Polti-cas Pblicas, so as redes que interligam esses atores e por onde a discusso poltica transita. De acordo com Miller, 1994, p. 379 (apud FREY, 2000, p. 221),

    Conforme uma definio de Heclo, entende-se por um policy network as interaes das diferentes instituies e grupos tanto do executivo, do legislativo como da sociedade na gnese e na implementao de uma determinada policy [Heclo, 1978, p. 102]. Segundo Miller, trata-se no caso de policy networks de redes de relaes sociais que se repetem periodicamente, mas que se mostram menos formais e delineadas do que relaes sociais institucionalizadas, nas quais prevista uma distribuio concreta de papis organizacionais. Todavia, essas redes sociais evidenciam-se suficientemente regulares, para que possa surgir confiana entre seus integrantes e se estabelecer opinies e valores comuns. [MILLER, 1994, p. 379 apud FREY, 2000, p. 221]

    Policy arenaA policy arena refere-se aos processos de conflitos e consensos entre os

    atores nas diversas arenas polticas. Envolve uma srie de negociaes e bar-ganhas que tm por objetivo maximizar os ganhos polticos nos processos de formulao/implementao de Polticas Pblicas. Essas arenas de discus-so podem ser subdividas de acordo com as suas consequncias: polticas distributivas, polticas redistributivas, polticas regulatrias e polticas cons-titutivas. Frey (2000, p. 223) argumenta que,

    A concepo da policy arena foi originalmente introduzida no debate cientfico por Lowi (1972). Ela parte do pressuposto de que as reaes e expectativas das pessoas afetadas por medidas polticas tm um efeito antecipativo para o processo poltico de deciso e de implementao. Os custos e ganhos que as pessoas esperam de tais medidas tornam-se decisivos para a configurao do processo poltico. O modelo da policy arena refere-se, portanto, aos processos de conflito e de consenso dentro das diversas reas de poltica, as quais podem ser distinguidas de acordo com seu carter distributivo, redistributivo, regulatrio ou constitutivo.

    Policy cycleA policy cycle corresponde s fases ou ciclos pelos quais as Polticas Pbli-

    cas transitam antes de se concretizarem materialmente na sociedade. Esses ciclos correspondem a uma ordem sequencial que guia o processo poltico-

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    -administrativo e possuem fases que vo desde a formulao, passando pela implementao at a avaliao das consequncias das polticas adotadas. Frey (2000) prope uma subdiviso mais sofisticada dessas fases que estaria representada pelas seguintes etapas:

    Fase da percepo e definio de problemas a grande questo envolvida nesse elemento concerne ao fato de como entre uma infini-dade de demandas polticas, uma demanda especfica converte-se em um problema pblico que acaba por gerar um policy cycle.

    Fase da agenda setting nessa fase decidido se determinado tema far parte da agenda poltica ou ser excludo ou adiado para um pe-rodo posterior.

    Fase de elaborao de programas e de deciso nesse cenrio que se decide qual das alternativas de ao a mais apropriada para resoluo da problemtica social em questo.

    Fase da implementao de polticas seria a fase imediatamente posterior da elaborao de programas e de deciso, corresponderia concretizao da alternativa escolhida entre as diversas disponveis transformando-a em ao poltica concreta.

    Fase da avaliao de polticas e correo da ao nessa fase quando ocorre a avaliao das polticas adotadas. Nela possvel refle-tir a relao custo X benefcio empreendida na poltica pblica e tentar contornar possveis falhas de formulao ou execuo.

    Atores de Polticas PblicasDiversos so os atores sociais interessados na discusso das Polticas

    Pblicas, seja na formulao, na implementao ou na avaliao. Esses atores, cada um a sua maneira, procuram influenciar esse processo dentro do jogo poltico e podem ser divididos em atores estatais e atores privados. Passare-mos agora distino desses atores e sua forma de atuao na discusso das Polticas Pblicas.

    Atores estataisO que entendemos por atores estatais so aqueles atores diretamente

    ligados Administrao Pblica, que esto envolvidos na burocracia estatal

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    ou ocupando cargos legislativos e executivos, sendo os polticos os princi-pais representantes dos atores estatais.

    Os polticos so eleitos com base em suas propostas de polticas apresentadas para a populao durante o perodo eleitoral e buscam tentar realiz-las. As Polticas Pblicas so definidas no Poder Legislativo, o que insere os parlamentares (vereadores e deputados) nesse processo.

    Entretanto, as propostas das Polticas Pblicas partem do Poder Executivo, e esse Poder que efetivamente as coloca em prtica. Cabe aos servidores pblicos (a burocracia) oferecer as informaes necessrias ao processo de tomada de deciso dos polticos, bem como operacionalizar as Polticas Pblicas definidas. Em princpio, a burocracia politicamente neutra, mas frequentemente age de acordo com interesses pessoais, ajudando ou dificultando as aes governamentais.

    Assim, o funcionalismo pblico compe um elemento essencial para o bom desempenho das diretrizes adotadas pelo governo. (SEBRAE/MG, 2008, p. 8-9)

    Atores privadosOs atores privados so aqueles que, diferentemente dos atores estatais,

    no esto diretamente ligados Administrao Pblica, mas procuram par-ticipar das decises do Estado principalmente atravs do que comumente conhecido como lobby poltico. Como exemplo desses atores temos:

    organizaes no governamentais (ONGs);

    as mdias em geral;

    movimentos sociais;

    sindicatos;

    corporaes empresariais;

    associaes da sociedade civil;

    grupos polticos;

    entidades representativas etc.

    Entre os atores privados de relevncia, com grande capacidade de influir em Polticas Pblicas, esto includos os empresrios, que detm os meios de produo, controlam parcelas de mercado e a oferta de empregos. Atravs dos sindicatos, os trabalhadores podem, de forma organizada, articular e expressar seu poder e fora polticos, tanto no setor privado quanto pblico. (IIDAC, 2003, p. 2)

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    Tipos de Polticas PblicasDepois de verificados os diversos conceitos envolvidos no estudo das

    Polticas Pblicas e as razes e justificativas para seu estudo, passaremos agora anlise dos principais tipos de Polticas Pblicas. certo que os mo-delos que iremos apresentar no representam o conjunto total dos tipos de Polticas Pblicas existentes, nem que cada poltica encaixe-se somente em um modelo, mas eles so importantes, pois buscam simplificar e esclarecer o nosso entendimento em torno do tema, nos ajudam a identificar aspectos relevantes das problemticas polticas e a direcionar nosso olhar para com-preender melhor o campo das Polticas Pblicas.

    Inseridos no que definimos anteriormente como policy arena, podemos dividir em quatro os principais tipos de Polticas Pblicas: polticas distributi-vas, polticas redistributivas, polticas regulatrias e polticas constitutivas.

    Polticas Pblicas distributivasAs chamadas polticas distributivas no consideram a limitao dos recur-

    sos pblicos e buscam privilegiar no a sociedade como um todo, mas uma parcela da populao. Um risco iminente advindo das polticas distributivas a ocorrncia do que conhecemos como clientelismo.

    As polticas distributivas so caracterizadas por um baixo grau de conflito dos processos polticos, visto que polticas de carter distributivo s parecem distribuir vantagens e no acarretam custos pelo menos diretamente percebveis para outros grupos. Essas policy arenas so caracterizadas por consenso e indiferena amigvel [Windhoff-Hritier, 1987, p. 48]. Em geral, polticas distributivas beneficiam um grande nmero de destinatrios, todavia em escala relativamente pequena; potenciais opositores costumam ser includos na distribuio de servios e benefcios. (FREY, 2000, p. 223)

    Polticas Pblicas redistributivasDiferente das polticas distributivas, as polticas redistributivas procuram

    atingir grandes contingentes sociais, mas consequentemente acarretam quase que equitativamente perdas e ganhos que muitas vezes representam um jogo que resulta em soma zero, tornando assim as polticas adotadas ineficazes.

    As polticas redistributivas, ao contrrio [das polticas distributivas], so orientadas para o conflito. O objetivo o desvio e o deslocamento consciente de recursos financeiros, direitos ou outros valores entre camadas sociais e grupos da sociedade [Windhof f-Hritier, 1987, p. 49]. O processo poltico que visa a uma redistribuio costuma ser polarizado e repleto de conflitos. (FREY, 2000, p. 224)

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    Polticas Pblicas regulatriasDentre os principais tipos de Polticas Pblicas, as polticas regulatrias so

    as mais facilmente reconhecidas e envolvem prioritariamente os policy makers, a administrao pblica e a burocracia estatal, alm dos grupos de interesse.

    As polticas regulatrias trabalham com ordens e proibies, decretos e portarias. Os efeitos referentes aos custos e benefcios no so determinveis de antemo; dependem da configurao concreta das polticas. Custos e benefcios podem ser distribudos de forma igual e equilibrada entre os grupos e setores da sociedade, do mesmo modo como as polticas tambm podem atender a interesses particulares e restritos. Os processos de conflito, de consenso e de coalizo podem se modificar conforme a configurao especfica das polticas. (FREY, 2000, p. 224)

    Polticas Pblicas constitutivasAs Polticas Pblicas constitutivas incorporariam em si os outros trs tipos

    de polticas e seriam responsveis pelos procedimentos necessrios para que as outras polticas entrem em vigor.

    As polticas constitutivas (constituent policy) [Lowi, 1972] ou polticas estruturadoras Beck fala de polticas modificadoras de regras [Beck, 1993, p. 17] determinam as regras do jogo e com isso a estrutura dos processos e conflitos polticos, isto , as condies gerais sob as quais vm sendo negociadas as polticas distributivas, redistributivas e regulatrias. (FREY, 2000, p. 224)

    Abordagens tericas sobre as Polticas Pblicas

    No campo das cincias especializadas nos estudos de Polticas Pblicas, notadamente a Cincia Poltica e a Administrao, muitos so os modelos tericos utilizados na anlise das Polticas Pblicas. Destacaremos a seguir os principais modelos tericos utilizados e as questes que guiam sua an-lise em torno da resoluo das problemticas que envolvem os estudos de Polticas Pblicas.

    Institucionalismo (neoinstitucionalismo)A Escola Institucionalista da Cincia Poltica tem origem nos Estados

    Unidos em meados do sculo XX, tendo como principais representantes Joseph Schumpeter, Robert Alan Dahl, Giovanni Sartori, entre outros. O prin-cipal pressuposto institucionalista evidencia que o desenho organizacional

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    das instituies primordial no desdobramento do jogo poltico, relegando participao dos cidados um carter secundrio.

    Aprofundando um pouco mais as contribuies do chamado [institucionalismo] neo- -institucionalismo para a rea de Polticas Pblicas, sabemos que, de acordo com os vrios ramos desta teoria, instituies so regras formais e informais que moldam o comportamento dos atores. Como as instituies influenciam os resultados das Polticas Pblicas e qual a importncia das variveis institucionais para explicar resultados de Polticas Pblicas? A resposta est na presuno de que as instituies tornam o curso de certas polticas mais fceis do que outras. Ademais, as instituies e suas regras redefinem as alternativas polticas e mudam a posio relativa dos atores. (SOUZA, 2006, p. 40)

    Existem, no mnimo, trs grandes diferenas entre as instituies do Estado (ou governo) e as organizaes privadas no que tange s Polticas Pblicas, so elas:

    o estado que d legitimidade s Polticas Pblicas, so apenas as polticas governamentais que esto submetidas s obrigatoriedades legais;

    o objetivo das polticas governamentais est em atender a sociedade como um todo, em carter universal;

    somente o Estado possui a prerrogativa da coero.

    Como j afirmamos anteriormente, o desenho organizacional das institui-es pode influenciar de modo decisivo o encaminhamento de um processo poltico e a implementao das Polticas Pblicas. Esse desenho pode, em alguns casos, acelerar e desobstruir a execuo de algumas polticas, mas pode tambm, em alguns casos, emperrar totalmente a execuo de um projeto.

    Apesar dessa capacidade de mudar os rumos de um processo poltico, as alteraes no desenho institucional das instituies devem ser feitas com cautela, pois muitas vezes essas mudanas so ineficazes, ou at mesmo prejudiciais, quando no acompanhadas de mudanas na conjuntura social, econmica e poltica.

    Grupos de interesseA teoria dos grupos de interesse estabelece que grupos com atitudes

    prximas ou semelhantes tendem a se unir e reivindicar interesses comuns sobre outros grupos constitutivos da sociedade. Essa perspectiva compreen-de a poltica como a disputa entre os diversos grupos sociais pela influncia

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    nas aes do Estado, nas Polticas Pblicas. O sistema poltico seria o res-ponsvel por equilibrar essas disputas e gerenciar os conflitos inter-grupais atravs de quatro disposies bsicas:

    estabelecer sob que regras esses grupos disputariam sua influncia sob o processo poltico;

    balancear os interesses divergentes e estabelecer os compromissos entre as partes;

    fazer valer os compromissos e materializ-los em Polticas Pblicas;

    garantir a efetividade desses compromissos e sua permanncia para sociedade.

    As Polticas Pblicas representariam o equilbrio mnimo alcanado na disputa dos grupos de interesse pelo poder poltico. Os policy makers (for-muladores de polticas) ficariam ento responsveis em dar uma resposta s demandas dos diversos grupos sociais que os pressionam atravs de bar-ganha, negociao e concesses frente s peties de grupos de influncia concorrentes.

    Teoria das elitesSendo uma das teorias mais influentes na Cincia Poltica moderna a

    teoria das elites possui tambm uma interpretao das Polticas Pblicas e de como elas se conformam.

    A teoria das elites surgiu no final do sculo XIX tendo como fundador o filsofo e pensador poltico italiano, Gaetano Mosca (1858-1941). Em seu livro Elementi di Scienza Poltica (1896), Mosca estabeleceu os pressupostos do elitismo ao salientar que em toda sociedade, seja ela arcaica, antiga ou moderna, existe sempre uma minoria que detentora do poder em detrimento de uma maioria que dele est privado. Os poderes econmicos, ideolgicos e polticos so igualmente importantes, mas em seus escritos Mosca deu nfase fora poltica das elites. O restrito grupo de pessoas que a detm tambm pode ser denominado de classe dirigente. (CANCIAN, 2009, p. 1)

    De acordo com a perspectiva elitista, as elites possuram historicamente maior poder de influncia sobre o processo de formulao/implementao das Polticas Pblicas que as massas, isso em decorrncia de sua efetiva capa-cidade de organizao e seu alto grau de consenso, dificilmente encontrado nas massas. Como consequncia disso podemos delinear alguns pontos que caracterizariam as Polticas Pblicas influenciadas pelas elites polticas.

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    as elites tendem a impor seus valores nas inovaes e mudanas das Polticas Pblicas que passam a perder seu carter de alcance universal;

    a perspectiva de inflexo (revoluo) nas Polticas Pblicas substitu- da por uma perspectiva incremental e reformista;

    as reformas efetuadas atravs das Polticas Pblicas podem servir somen- te para manuteno do status quo da elite dominante no momento;

    na perspectiva elitista, a responsabilidade pela promoo do bem-es- tar das elites e no das massas, no que necessariamente somente as primeiras venham se beneficiar dos resultados das Polticas Pblicas;

    o processo de participao poltica democrtica na formulao/imple- mentao das Polticas Pblicas adquiriria um carter meramente sim-blico j que essa prerrogativa estaria restrita somente a uma minoria.

    RacionalismoOutra corrente terica de grande relevncia nas cincias em geral e nas

    cincias humanas especificamente, o racionalismo possui grande influncia na formulao das Polticas Pblicas. Dizer que uma poltica racional signi-fica afirmar que todos os valores essenciais para consecuo dessa poltica foram amplamente difundidos e conhecidos e que, caso um desses valores tenha de ser sacrificado imediatamente, deve ser compensado por outro capaz de proporcionar o mesmo resultado.

    No campo prtico da formulao/implementao das Polticas Pblicas, essa racionalidade absoluta praticamente impossvel de ser alcanada devido complexidade dos problemas sociais e da grande diversidade de fa-tores imprevisveis contidos nesses problemas. Para resoluo de tais ques-tes, Simon (1957) introduziu no campo de estudos das Polticas Pblicas o conceito de racionalidade limitada dos policy makers (decisores pblicos) argumentando que,

    [...] a limitao da racionalidade poderia ser minimizada pelo conhecimento racional. Para Simon, a racionalidade dos decisores pblicos sempre limitada por problemas tais como informao incompleta ou imperfeita, tempo para a tomada de deciso, autointeresse dos decisores etc., mas a racionalidade, segundo Simon, pode ser maximizada at um ponto satisfatrio pela criao de estruturas (conjunto de regras e incentivos) que enquadre o comportamento dos atores e modele esse comportamento na direo de resultados desejados, impedindo, inclusive, a busca de maximizao de interesses prprios. (SOUZA, 2006, p. 23)

  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    25

    Uma poltica racional estar sempre pautada na relao custo (valor dos inputs) X benefcio (valor dos outputs), ou seja, sempre priorizando a eficin-cia. Quanto maior for o clculo racional inserido numa poltica, maior ser sua eficincia prtica.

    No processo de formulao/implementao de Polticas Pblicas racio-nais, os policy makers necessitam seguir alguns pressupostos bsicos:

    necessrio possuir o conhecimento de todas as preferncias dos di- versos grupos demandantes da sociedade e seus pesos relativos;

    necessrio ter claramente quais as alternativas possveis e viveis para consecuo de determinada poltica;

    preciso ter um diagnstico antecipado das consequncias de cada poltica alternativa que pode ser adotada;

    indispensvel estabelecer a relao custo X benefcio (valores atendi- dos e valores sacrificados) para cada poltica alternativa;

    dentre as alternativas apresentadas, deve-se escolher a que for mais eficiente, ou seja, a que minimize os custos e maximize os ganhos para sociedade.

    IncrementalismoNo campo das Polticas Pblicas, o incrementalismo a teoria concorren-

    te da teoria racionalista, visto que, a primeira considera as Polticas Pblicas um continuum das polticas adotadas no passado efetuando-se apenas pe-quenas modificaes. O incrementalismo considera a perspectiva raciona-lista irrealista e humanamente invivel, entendendo que seus pressupostos bsicos requereriam uma capacidade de clculo, conhecimento e previso de fatos sociais que estariam alm do escopo intelectual e tcnico humano.

    Segundo Anthony Downs, os economistas analisam, planejam e decidem racionalmente. Dessa forma, creem poder prever as decises, j que sero sempre tomadas aquelas consideradas mais razoveis para se alcanar as metas previstas. Portanto, o homem racional sempre age de acordo com os seguintes critrios: (i) consegue tomar uma deciso quando confrontado com vrias alternativas; (ii) classifica todas as alternativas em ordem de preferncia; (iii) seu ranking de preferncias transitivo, ou seja, pode ser mudado; (iv) a escolha recai sempre sobre a primeira preferncia; (v) a deciso sempre a mesma quando so dadas as mesmas preferncias.

    Downs ainda afirma que as decises nem sempre sero racionais porque os homens sempre visam algum fim e os benefcios devem sempre superar os custos. Assim, tambm

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    Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    se pode dizer que os polticos visam, primeiramente, a reeleio (seu maior benefcio), logo, suas decises sero sempre de acordo com seus fins e nem sempre racionais. O Homo economicus possui uma lgica diferente do Homo politicus. Alm disso, o comportamento racional requer uma ordem social previsvel. Nesse sentido, fica claro o quanto o comportamento racional se torna algo impossvel nas relaes polticas, pois, a imprevisibilidade da ordem social um elemento, comprovadamente, presente na engenharia poltica. Se, geralmente, o resultado o aumento das incertezas, torna-se muito difcil a racionalidade das decises. (FERREIRA, 2003, p. 1)

    Com isso podemos sintetizar as crticas do incrementalismo ao modelo de Polticas Pblicas pautadas na perspectiva racionalista nos seguintes pontos:

    no h disponibilidade de tempo, verbas pblicas, capacidade intelec- tual etc. que possibilitem a investigao de todas as alternativas poss-veis na formulao/implementao das Polticas Pblicas;

    no h como prever todas as consequncias possveis das novas pol- ticas adotadas;

    no seria interessante desperdiar investimentos j efetuados em fun- o de polticas passadas, mesmo que estas no estejam atendendo com total eficincia as demandas a que foram destinadas;

    a disputa poltica inviabiliza a implementao de uma poltica estrita- mente racional;

    h uma predisposio humana em buscar a satisfao de suas deman- das individuais e no a maximizao dos ganhos sociais;

    impossvel estabelecer um consenso dos objetivos sociais.

    Teoria dos jogosA teoria dos jogos utilizada no campo das Polticas Pblicas pode ser con-

    ceituada como o estudo das decises racionais dos atores polticos quando postos em situaes nas quais, interagindo com outros atores, tm que fazer opes e o resultado dessas escolhas depende das escolhas feitas por cada um dos atores envolvidos.

    A teoria dos jogos tem a finalidade de prever os movimentos dos outros jogadores, sejam eles concorrentes ou aliados, atravs dessa teoria os jogadores se posicionam da melhor forma para obter o resultado desejado.

    O objetivo da teoria dos jogos entender a lgica na hora da deciso e ajudar a responder se possvel haver colaborao entre os jogadores, em quais circunstncias o mais racional no colaborar e quais estratgias devem ser adotadas para garantir a colaborao entre os jogadores. (ALMEIDA, 2006, p. 1)

  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

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    A teoria dos jogos no possui a capacidade de descrever como os atores realmente fazem suas escolhas, mas como eles fariam se fossem totalmente racionais. uma espcie de aplicao da teoria racionalista aplicada a situa-es competitivas.

    Um exemplo muito conhecido de aplicao da teoria dos jogos o dilema do prisioneiro, que funciona da seguinte forma:

    Dois suspeitos, A e B, so presos pela polcia. A polcia tem provas insuficientes para os condenar, mas, separando os prisioneiros, oferece a ambos o mesmo acordo: se um dos prisioneiros, confessando, testemunhar contra o outro e esse outro permanecer em silncio, o que confessou sai livre enquanto o cmplice silencioso cumpre 10 anos de sentena. Se ambos ficarem em silncio, a polcia s pode conden-los a 6 meses de cadeia cada um. Se ambos trarem o comparsa, cada um leva 5 anos de cadeia. Cada prisioneiro faz a sua deciso sem saber que deciso o outro vai tomar, e nenhum tem certeza da deciso do outro. (WIKIPDIA, 2009)

    A grande questo resultante de que forma os prisioneiros iro reagir a esse dilema?

    Do ponto de vista individual, o dilema do prisioneiro pode ser sintetizado na relao proposta na tabela abaixo:

    Prisioneiro B nega Prisioneiro B delata

    Prisioneiro A nega

    Ambos so condenados a 6 meses.

    A condenado a 10 anos; B sai livre.

    Prisioneiro A delata

    A sai livre; B condenado a 10 anos.

    Ambos so condenados a 5 anos.

    Teoria dos sistemasA teoria dos sistemas utilizada como ferramenta para resoluo das pro-

    blemticas das Polticas Pblicas preconiza que os diversos sistemas sociais esto em constante interao e, por isso, no devem ser considerados isola-damente, mas sim nas suas relaes de interdependncia mesmo que sejam estes extremamente heterogneos.

    A partir dessa perspectiva podemos entender que para resoluo dos problemas sociais deve haver uma interao entre os policy makers e a so-ciedade civil, num processo de troca de conhecimentos e experincias para consecuo dos objetivos das Polticas Pblicas formuladas. Nesse processo

    (WIK

    IPD

    IA, 2

    009)

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    Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    a teoria dos sistemas prope algumas questes essenciais que caracteriza-riam uma Poltica Pblica sistmica.

    Quais dimenses significativas do sistema social que acarretam em de- mandas sobre o sistema poltico?

    Quais caractersticas significativas do sistema poltico geram a possibi- lidade de transformao das demandas sociais em Polticas Pblicas?

    De que maneira os inputs da sociedade afetam as caractersticas espe-cficas do sistema poltico?

    De que modo essas caractersticas especficas do sistema poltico in- fluem no contedo das Polticas Pblicas adotadas?

    Como as demandas e presses sociais influenciam no contedo das Polticas Pblicas?

    De que maneira a Poltica Pblica influencia, atravs de feedback, o am-biente social e as caractersticas especficas do sistema poltico?

    Neste captulo vimos que o estudo de Polticas Pblicas segue uma linha evolutiva ao longo do tempo, sempre em sintonia com o desenvolvimento do sistema poltico e social e do que considerado no momento respon-sabilidades do Estado. Vimos, tambm, as razes que motivam o estudo em torno das Polticas Pblicas, tanto as cientficas, profissionais, quanto as razes polticas. Realizamos um esforo em conceituar o termo poltica para assim definir o termo Polticas Pblicas e observamos as diversas dimen-ses contidas nesses termos: uma dimenso institucional, uma dimenso processual e uma dimenso material. Analisamos as distines existentes entre os modos de atuao dos diversos atores envolvidos nos processos de formulao, implementao e avaliao de Polticas Pblicas, atores pbli-cos e atores privados. Vimos, tambm, a classificao dos diversos tipos de Polticas Pblicas de acordo com suas consequncias: polticas distributivas, polticas redistributivas, polticas regulatrias e polticas constitutivas, e ve-rificamos que apesar dessa distino elas no podem ser entendidas na pr-tica separadamente, mas sim em um movimento de influncia mtua. E, por fim, analisamos as diferentes abordagens tericas que se debruam sobre o estudo das Polticas Pblicas e de que maneira elas podem nos ajudar a compreender melhor as aes do Estado sobre a sociedade.

  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

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    Ampliando seus conhecimentos

    Reflexes leigas para a formulao de uma agenda de pesquisa em Polticas Pblicas

    (REIS, 2003)

    No contexto do tema geral desse evento Cincia Poltica e Justia Social parece-me oportuno lembrar algumas questes que permeiam toda a pr-tica da cincia social e, em particular, da cincia poltica. Quero, contudo, pensar isso no caso especfico da subrea de Polticas Pblicas. O tema importante demais para ser reservado exclusivamente aos especialistas. Considero as questes a serem discutidas to centrais que sinto-me von-tade para refletir sobre alguns pontos, ainda que, pessoalmente, eu no seja uma pesquisadora dessa rea e sim uma consumidora de seus resultados de pesquisa.

    Como ponto de partida, quero chamar ateno para o fato de que Po-lticas Pblicas uma das especializaes que responde mais diretamente ao imperativo da relevncia na prtica das cincias sociais. Seja analisando a formulao, a implementao ou os resultados de policies, os especialistas podem ver de maneira bastante clara e imediata como suas anlises inter-pelam situaes concretas, examinam tecnicamente problemas empricos especficos e podem servir para legitimar ou deslegitimar as escolhas po-lticas efetivas. precisamente esse aspecto da relevncia prtica que mais me atrai nessa rea. Ou seja, o fato de que, em princpio, ela no se furta ao imperativo da utilidade social e que, mesmo quando adota uma postura cr-tica, ela o faz apostando na possibilidade de cursos de ao alternativos. Em outras palavras, trata-se de uma rea propositiva, pelo menos em tese. [...]

    Nesse sentido, o primeiro ponto que eu lembraria para uma agenda de pesquisas em Polticas Pblicas que os projetos tenham uma sustentao terica. Isso parece demasiado bvio para requerer ateno. Contudo, na prtica vemos que com muita frequncia descuramos desse princpio. Talvez o problema seja mais agudo na prtica do ensino do que na da pesquisa em Polticas Pblicas, mas em ambos os casos vale a pena enfatizar que ns nos beneficiamos e muito ao adotar uma postura atenta aos parmetros teri-cos que modelam nossas anlises, por mais empricas que sejam.

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    Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    O problema inverso deve nos preocupar igualmente. Pesquisas e cursos que so rotulados como anlises de Polticas Pblicas, na realidade, apenas se referem a policies, sem trat-las de forma especfica e sistemtica. Em muitos casos, a indignao moral tomada como justificativa terica. Para algum, como eu, que tem uma viso de fora da rea, quais seriam os temas canden-tes? Que temticas privilegiar nessa agenda? Sem dvida, a gama de temas e problemas a serem investigados imensa e so vrios os critrios ordenado-res que poderiam ser invocados para se elaborar as prioridades de pesquisa. O que que esperaramos ver enfatizado pelos especialistas? De fato, parece- -me que a comunidade acadmica tem respondido bem aos desafios do mo-mento e a prova disso pode ser vista no prprio programa desse evento. [...] Acho proveitoso partir da constatao de que as relaes entre recursos de autoridade e recursos de mercado, por um lado, e entre critrios de autorida-de e critrios de solidariedade, por outro, passaram por modificaes profun-das no perodo histrico recente.

    No caso do primeiro polo, o surpreendente revival do liberalismo a que assistimos levou a uma sbita eroso da legitimidade do Estado como agente econmico no Segundo e no Terceiro mundo. O que mais me impressiona aqui a rapidez com que crenas firmemente estabelecidas no mbito da aca-demia e no mbito dos governos foram suplantadas quase da noite para o dia. Subitamente, por exemplo, os livros sobre desenvolvimento e planejamento caducaram, deixando anmicos os especialistas no assunto.

    No caso dos pases ex-socialistas, as tendncias mais recentes sugerem que tanto o governo quanto o mercado comeam a dar sinais de se reequili-brarem, mas busca-se avidamente um arcabouo terico e ideolgico capaz de sistematizar novos arranjos. J no caso da Amrica Latina, se a situao econmica e social menos animadora, no deixa de ser claro que o eclipse do Estado desenvolvimentista deixou um enorme vazio ideolgico que intro-duz aqui e ali novas incertezas polticas. Nesse novo contexto, a anlise e a discusso de Polticas Pblicas pode ser vtima de um tecnicismo exagerado, e isso o que muitas vezes se critica nas anlises dos economistas.

    O problema inverso tambm bastante disseminado, ou seja, a negao dos constrangimentos tcnicos em favor de uma adeso a-crtica a ideais dou-trinrios no mais das vezes arcaicos e anacrnicos. Pois bem, a ns cientistas polticos, socilogos e antroplogos caberia o empenho de analisar policies como prticas polticas, prticas essas onde a interao entre interesses, va-

  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

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    lores e normas merece tanta considerao quanto os critrios tcnicos e as restries oramentrias.

    Lembraria tambm que a eroso do iderio planificador (socialista ou capi-talista) deu ensejo a uma situao nova onde a formulao de policies consti-tui causa e efeito das mudanas poltico-institucionais em curso. Poucas con-junturas so to propcias a evidenciar a dinmica interativa entre instituies e motivaes individuais. Um programa de pesquisa amplo que se dedicas-se a explorar essa questo, comparando tanto as diversas formas institucio-nais quanto as motivaes variveis de atores estratgicos que atuam nelas, ou com elas, seria extremamente relevante no s em termos tericos, mas tambm prticos.

    Quero enfatizar aqui tanto o foco simultneo na instituio e no ator, como o recurso comparao. O primeiro aspecto permite-nos captar o jogo entre constrangimento e liberdade, entre limitaes paramtricas e voluntarismo. Mas o segundo, a comparao sistemtica, que nos faculta as condies para checarmos o alcance de nossas explicaes e interpretaes. Nunca demais insistir que a comparao nossa melhor proxi a uma situao ex-perimental. Esses seriam, portanto, na minha opinio, os elementos prelimi-nares de uma agenda de pesquisa em Polticas Pblicas. preciso assumir o compromisso de articular as perspectivas individualista e institucional. Isso me parece o desafio crucial, desafio que tanto terico como prtico. Vol-temos linha central de meu argumento, a ideia segundo a qual as relaes entre autoridade, mercado e solidariedade passam por mudanas profundas no momento atual. No que diz respeito interao entre autoridade e solida-riedade, as transformaes no so menos relevantes. Assim, por exemplo, as transformaes recentes nas relaes entre o Estado e a nao so igualmen-te dignas de nota: identidades coletivas so redefinidas por toda parte, cru-zando fronteiras e desafiando autoridades nacionais. Mas, na medida em que a Poltica Pblica continua sendo definida no contexto dos Estados nacionais, quero me deter apenas em outra dimenso desse relacionamento entre au-toridade e solidariedade, o que concerne s organizaes voluntrias ONGs, instituies filantrpicas etc. Tambm aqui observamos um movimento not-vel em escala mundial que cria um novo tipo de ator relevante para a prtica da Poltica Pblica, o chamado Terceiro Setor, reino da solidariedade.

    Em sntese, necessrio reexaminarmos as relaes do Estado com o mer-cado, por um lado, e com a sociedade civil, por outro. No primeiro caso, pare-

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    Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    ce-me que rea de Polticas Pblicas compete, por exemplo, analisar como que o Estado age e/ou poderia agir para assegurar a proviso de bens pblicos que no so mais produzidos e/ou distribudos pelo setor pblico. Nesse sen-tido, a anlise das agncias de regulao um dos objetos de estudo cruciais. Como so concebidas essas novas instituies? Quais suas atribuies? Como vm desempenhando seu papel de articuladoras entre a autoridade pblica e o mercado provisor de bens pblicos? De que maneira suas atribuies e prerrogativas constituem obstculos ou recursos para a eficcia de Polticas Pblicas especficas? Enfim, h toda uma srie de questes da maior relevn-cia para a anlise de Polticas Pblicas que, para serem respondidas, precisam que o formato institucional e a prtica dessas agncias sejam esclarecidos.

    Com relao ao binmio autoridade/solidariedade, seria de extrema rele-vncia pesquisar os novos padres de funcionamento da poltica social, que conta mais e mais com o voluntariado. Noes como democracia participa-tiva, capital social, incluso social, governana e tantas outras que incor-poramos ao nosso lxico nas dcadas recentes tm, certamente, inspirado estudos de grande interesse e importncia. Mas, oportuno lembrar que a componente virtuosa associada a cada um desses conceitos no nos dispensa do exame crtico, sem o qual a prtica da anlise poltica perde sua dimenso cientfico-reflexiva para tornar-se prtica poltica.

    Cabe examinar, por exemplo, as consequncias do recurso cada vez mais utilizado atuao da sociedade civil em contextos onde a extrema desigual-dade torna difcil postular uma sociedade civil no singular. Se os custos de organizao e de participao so to desiguais dentro de um pas, faz sen-tido falar de uma sociedade coincidente com o Estado nacional? No s a globalizao que coloca desafios ao Estado nacional. Interage estreitamente com ela um paralelismo entre setores sociais que experimentam condies e oportunidades de vida to desiguais. Nesse contexto, o prprio engajamento da sociedade civil pode implicar novas formas de oligarquizao de recursos.

    Ou seja, onde os custos e as oportunidades de participao dos cidados so to desiguais, os que j esto includos podem vir a aumentar suas vanta-gens relativas em relao aos excludos. A lgica do capital social pode com-portar tanta formao de monoplios quanto a do mercado. O que estou su-gerindo que a agenda de pesquisa em Polticas Pblicas deveria incluir entre suas preocupaes o exame crtico da interao entre o ator pblico e o vo-luntariado na execuo de policies. No se trata de demonizar esse ator, mas

  • Conceitos gerais de Polticas Pblicas

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    simplesmente de adotar uma postura crtica e analtica ante um ator ainda pouco estudado pela rea.

    Tambm gostaria de ressaltar a importncia de se inserir no quadro geral de orientaes a modelar uma agenda de pesquisa em Polticas Pblicas a ques-to das tenses e possveis contradies entre os princpios orientadores da ao. Universalismo e ao focalizada, afirmao da igualdade e afirmao das diferenas so termos que povoam os discursos de tericos e prticos sobre a afirmao da cidadania. No entanto, a discusso a respeito disso poucas vezes se volta para a anlise sistemtica de resultados a curto ou a longo prazo de polticas sociais que privilegiem um ou outro dos termos dessas disjuntivas. Aqui, poder-se-ia abrir um amplo leque de estudos extremamente importan-tes, tanto no interior da rea de Polticas Pblicas como no mbito da cincia poltica como um todo. Isto , essa discusso diz respeito ao prprio escopo da cidadania hoje, tema que se situa no cerne da teoria social e poltica.

    Atividades de aplicao1. De acordo com a evoluo dos estudos de Polticas Pblicas, correto

    afirmar que:

    a) No sculo XX e incio do sculo XXI as principais funes do Estado restringem-se manuteno da segurana pblica interna e pre-servao da propriedade privada alm da defesa das fronteiras em caso de ataque externo advindo de outros Estados. Isso explica o elevado interesse nos estudos de Polticas Pblicas.

    b) Enquanto disciplina acadmica e rea do conhecimento as Pol-ticas Pblicas tm sua origem na Europa Ocidental em finais do sculo XX. A globalizao e o desenvolvimento da ideologia neo-liberal foram cruciais para que os estudos de Polticas Pblicas se sedimentassem.

    c) Atualmente, os estudos de Polticas Pblicas esto difundidos em diversos pases e so de grande valia para o planejamento das aes dos governos, seja em nvel municipal, estadual ou federal, das empresas e at mesmo dos cidados comuns.

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    Conceitos gerais de Polticas Pblicas

    d) O estudo do papel e das aes do Estado recente na histria hu-mana e data de fins da Idade Mdia. Foi somente no contexto do declnio do regime feudal que os pensadores, filsofos e cientistas passaram a investigar e refletir sobre o que o Estado faz ou deixa de fazer.

    2. Quais as principais dimenses conceituais inseridas na definio de poltica, qual delas a que mais se aproxima do que conhecemos comumente como Polticas Pblicas e quais as implicaes dessa se-parao metodolgica?

    3. Quais as principais diferenas entre a abordagem racionalista e a abor-dagem incrementalista das Polticas Pblicas?