Tudo Do Ensino Medio Literatura Portuguesa....

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Coordenador

Deocleciano Torrieri Guimarães

1a Edição

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Proibida qualquer reprodução, seja mecânica ou eletrônica,total ou parcial, sem prévia permissão por escrito do editor.

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Expediente

Editor Italo AmadioEditora Assistente Katia F. Amadio

Assistente Editorial Edna Emiko NomuraCoordenador Deocleciano Torrieri Guimarães

Revisão Elaine Ferrari de AlmeidaProjeto Gráfico Jairo Souza

Diagramação Art Feita Design GráficoCapa Antonio Carlos Ventura

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Língua portuguesa: teoria e prática / coordenador DeoclecianoTorrieri Guimarães. – São Paulo : Rideel, 2006.

ISBN 85-339-0813-X

1. Português (Ensino médio) I. Guimarães, DeoclecianoTorrieri.

06-0009 CDD-469.07

Índice para catálogo sistemático:1. Português : Ensino médio 469.07

© Copyright - Todos os direitos reservados à

Av. Casa Verde, 455 – Casa VerdeCep 02519-000 – São Paulo – SP

e-mail: [email protected]

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APRESENTAÇÃO

Sendo a Língua um organismo vivo, em permanente mutaçãoe recriação na voz do povo, preocupou-se esta Editora em mostrá-la, o mais possível, em seu estágio atual, já com os acréscimosintroduzidos e aceitos, sem descurar, porém, do vocabulário básico.

Assim, oferece-se ao estudante, e a todos que o consultem,um instrumento prático, objetivo, moderno de trabalho, emconsonância com os padrões exigidos, e obrigatoriamenteexigentes, para o uso de nosso idioma.

A definição dos verbetes segue a orientação dos melhoresdicionaristas, antigos e contemporâneos, de molde a informar deimediato ao consulente; em alguns casos, com definições maisextensas, procura-se motivá-lo a novas pesquisas em outras áreasde estudos, de acordo com a tendência atual de absorção deconhecimentos, matéria-prima essencial do mundo globalizado.

Visou-se, ainda, à função estrita de um Dicionário – a consulta– quanto ao apoio que deve oferecer ao estudante, noentendimento do vocabulário de uso popular (gírias, brasileirismos,regionalismos, antigos ou recentes) quando com ele se deparaao compulsar livros indicados para leitura obrigatória.

Assim, ao lado das imprescindíveis referências gramaticais eprosódicas, preocupou-se também esta Editora em colocar adivisão silábica dos verbetes, bem como oferecer, nos exíguoslimites fixados, o máximo de informações, visando não só ànecessidade da consulta momentânea, mas também aoenriquecimento do universo vocabular do estudante. Muitostermos correntes em Informática foram acrescentados, assimcomo de outros ramos de conhecimentos técnicos em processode renovação.

Ao seguir os padrões mais indicados para obras deste jaez,esta Editora espera ter contribuído com as autoridades do Ensinono sentido de facilitar o acesso ao nosso idioma e de valorizá-loquanto à correção de seu uso.

Afinal, o idioma é, e assim deve ser respeitado, um dos sím-bolos nacionais.

O Editor

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“A arte é (...) uma transformação simbólica do mundo.Quer dizer: o artista cria um outro — mais bonito oumais intenso ou mais significativo ou mais ordenado —por cima da realidade imediata.”

Ferreira Gular

Literatura é recriação da realidade.

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A literatura é uma dentre as várias formas de expressão artís-tica. Como as outras artes (pintura, arquitetura, música, dança,escultura*), sua característica principal é a recriação da realida-de por meio de um processo de elaboração estética.

Em outras palavras, o artista, por meio de seu modo pessoalde ver o mundo (resultado de suas experiências, conhecimentos,idéias, convicções) –, molda uma outra realidade carregada designificação própria, que produz sobre o público um efeito práti-co: modifica sua conduta e concepção do mundo, delimita seto-res de gosto, forma grupos, veicula padrões estéticos e morais. Asociedade assim atingida pela obra de arte, num movimentodialético, devolve essas influências para o artista, formando-se,então, um vasto sistema solidário de influências recíprocas.

Esquematizando, podemos dizer que, sociologicamente, aarte pode ser definida como um sistema simbólico de comunica-ção inter-humana e, portanto, pressupõe a existência de:

a) quem comunica: o artista que, mais que simplesmentetransmitir conceitos e noções, vai exprimir as realidadesnele profundamente radicadas;

b) um comunicado: a obra que representa simbolicamente omundo, a realidade;

c) um comunicando: o público a quem a obra se dirige;

d) o efeito: a ação da obra sobre a sociedade, efeito que sevolta novamente para o artista.

Por duas vezes, anteriormente, usamos o adjetivo simbólico.O que ele quer dizer? Que a arte trabalha com signos polivalentes:mais que transmitir noções, conceitos, mais que simplesmentereproduzir o real, eles produzem um outro real, criam novos sig-nificados inesperados, estranhos, pessoais. É por isso que cada

* muitos consideram o cinema como a sétima arte

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pessoa (dependendo do seu grau de informação estética, baga-gem cultural e sensibilidade) vai sentir/“ler” de um modo único,singular, um poema de Manuel Bandeira, uma tela de Portinari,uma sonata de Beethoven, um jardim de Burle Marx, uma escul-tura de Rodin, uma apresentação do balé de Maurice Béjart (e,por que não?, um filme de Fellini).

LiteraturaComo a literatura opera essa recriação? Por meio de um veí-

culo próprio, específico: a palavra**. Como o poeta cria um mun-do supra-real (que reflete a realidade, mas não é ela), costuma-se chamar sua produção de ficção (ato ou efeito de fingir, simu-lação, coisa imaginária). O poeta modernista português FernandoPessoa, neste fragmento de texto, sintetizou de forma perfeitaesse trabalho do escritor e seu efeito sobre o público:

O poeta é um fingidor.Finge tão completamenteQue chega a fingir que é dorA dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,Na dor lida sentem bem,Não as duas que ele teve,Mas só a que eles não têm.(...)

Texto Literário x Texto Não-literárioAté o século XIX, considerava-se literatura qualquer produ-

ção escrita, daí persistirem até hoje denominações como litera-

** o veículo de expressão da música é o som; da pintura, a cor e a forma; dacoreografia, o movimento; da escultura, o volume; e da arquitetura, o espaço.

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tura médica, literatura jurídica, etc. Sabemos, no entanto, que otexto médico ou o jurídico, por exemplo, não são literatura, por-que exploram somente a função utilitária do signo, o plano doconteúdo (o o quê), o valor denotativo das palavras. A lingua-gem, nesses textos, transmite unicamente informações.

A literatura, ao contrário, superpõe ao plano do conteúdo oplano da expressão (o modo de dizer, o como): reforça-se o con-teúdo na expressão, isto é, o escritor não só procura reproduziro mundo, mas recriá-lo nas palavras. Assim, explora-se a fun-ção estética do signo, que procura associações novas entre aspalavras, que procura a conotação.

É útil fazermos a comparação entre dois textos, para enten-der melhor esses processos.

Texto A:

.....................................................

“A partir do séc. XVIII, a Europa passou porgrandes transformações que lhe alteraram pro-fundamente as feições. Os regimes absolutis-tas foram pouco a pouco superados e a febredo liberalismo não se satisfez em inspirar no-vas formas de governo. Chegou à economia,em que a palavra de ordem também era liber-dade, ou seja, livre iniciativa. O capitalismo, quedera seus primeiros e inseguros passos no finalda Idade Média, desenvolveu-se, amparadopelo Estado Moderno.”

LIMA, Sandra Lúcia Lopes.História & Comunicação.

A linguagem serviu, nesse texto, somente para veicular infor-mações, portanto apenas o plano do conteúdo foi trabalhado.Ele é denotativo e a função de linguagem predominante é areferencial. Em resumo: texto objetivo, direto, imparcial, que nos

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oferece somente uma possibilidade de leitura, por isso monossig-nificativo. Como o objetivo da autora não era trabalhar a lingua-gem para que o leitor se detivesse no seu modo de expressar-se,a linguagem foi usada somente na sua função utilitária: reproduziro real, veicular informações. Não é um texto literário.

Texto B:

.....................................................

O delegado proibiu bombas, foguetes, busca-pésChamalotes checoslovacos enchem o chão de chamas rubras.Chagas de enxofre chinesas chiam, choram, cheiram,numa chuva de chispas,chispas de todos os tons,listas de todas as cores e no fim sempre um Tchi — bum!

LIMA, Jorge de. “Noite de São João”.Em Obra Completa. Rio de

Janeiro: Aguilar,1958, v.1, p.240.

Percebemos nesse texto um outro uso da linguagem: mais doque reproduzir a realidade, ele procura recriá-la em palavras,superpondo ao plano do conteúdo o da expressão (o modo de or-ganização dos signos). Na sua seleção de palavras o poeta privile-giou as que sugerissem, pela sonoridade, o som da queima de fo-gos de artifício para recriar a atmosfera da festa junina. Isso, conju-gado à disposição gráfica, nos permite classificá-lo como poético.

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Embora tenhamos escolhido um poema para exemplificaçãodo texto literário, isso não quer dizer que este deva aparecerobrigatoriamente sob a forma de verso. Não é a forma técnica(prosa ou verso) que classifica o texto como literário, mas o modocomo se organiza a mensagem.

Esquematizando, teremos as seguintes características:

Essa postura diante da realidade resulta num texto rico de sen-timento e emoção que pode apresentar-se sob a forma de verso(isto é o mais comum, o poema lírico) ou sob a forma de prosa (aprosa poética).

Texto não-literário Texto literário

• relevância do plano do • superposição do plano daconteúdo expressão ao do conteúdo

• monossignificativo • plurissignificativo• reproduz o real • recria o real (ficção)• denotativo • conotativo• linguagem em função utilitária • linguagem em função estética

Prosa e PoesiaQuando dizemos texto em prosa ou texto em verso, estamos

nos referindo a dois aspectos técnicos, externos, concretos dotexto: a sua disposição gráfica.No entanto, quando nossa distin-ção se faz entre prosa e poesia, estamos fazendo alusão a doisaspectos do conteúdo, da essência do texto, a duas maneirasde apreensão da realidade.

A poesia nasce do amálgama da realidade interna (o eu dopoeta) com a realidade externa:

RI RE

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RI RE

Também nessa “leitura” da realidade, o texto pode apresen-tar-se sob a forma de prosa (isto é o mais comum, a narrativa doconto, do romance, da novela, da crônica) ou sob a forma deverso (o poema épico, por exemplo).

Gêneros LiteráriosSe quanto à forma, a literatura pode manifestar-se em pro-

sa ou verso, quanto ao conteúdo e à estrutura, as obras podemser classificadas em gêneros literários. Na Grécia clássica, ofilósofo Aristóteles ( 384-322 a.C.) adotou uma tripartição paraos gêneros : lírico, épico e dramático. No entanto, como a epo-péia (exposição narrativa) praticamente desapareceu desde oséculo XVIII, modernamente tem-se desmembrado do gêneroépico o narrativo.

Gênero LíricoA palavra lírico origina-se de lira, instrumento musical de cor-

da com que os gregos acompanhavam os cantos. Nesse gêneropredomina a função emotiva da linguagem: expressão do mun-do subjetivo do poeta. Os temas líricos mais freqüentes são oamor, a saudade, a solidão e a morte. Como nesse gênero ostemas são eternos e universais, eles não envelhecem, daí terum soneto escrito por Camões no século XVI sido retomado porRenato Russo no século XX e parecer tão atual quanto o foi nomomento da sua criação. A poesia, em geral, pertence a essegênero. Algumas formas que se destacam são:

O texto prosaico identifica-se pelo fato de ser uma exposi-ção mais impessoal e objetiva da realidade:

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a) soneto: composição poética de catorze versos distribuí-dos em 2 quar-tetos e dois ter-cetos. Apresen-tam versos de-cassílabos oualexandrinos erima.

b) hino: poema para glorificar a pátria ou louvar divindades;

c) ode: poema entusiástico, de exaltação;

d) elegia: poema em tom;

Dez demônios, dez máquinas de guerra...

Imediatamente ouviu-se uma descarga de arcabuzes; dezhomens destemidos tendo à sua frente Aires Gomes sal-taram por sua vez com a arma em punho, e começaram atalhar de alto a baixo a grandes golpes de espada.Não pareciam homens, e sim dez demônios, dez máquinas

de guerra vomitando a morte de todos os lados; enquanto asua mão direita imprimia à lâmina da espada mil voltas, queeram outros tantos golpes terríveis, a esquerda jogava a ada-ga com destreza e segurança admiráveis.O escudeiro e seus homens tinham feito um semicírculo

em roda de Álvaro e de Peri e apresentavam uma barreirade ferro e fogo às ondas de inimigos que bramiam, recu-avam, e lançavam-se de novo quebrando-se de encontroa esse dique.

ALENCAR, José de.O guarani.

Soneto significa “pequeno som”. Foiusado pela primeira vez por Jacob deLentini, Escola Siciliana (séc. XIII), di-fundido por Petrarca no século XIV.

Característica fundamental:

• Narração de ações heróicas edos grandes feitos do homem

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e) epitalâmio: poema feito em homenagem ao casamentode alguém; composição poética de 14 versos, foi a formafixa que mais resistiu ao tempo;

f) idílio: poema bucólico, de exaltação à natureza;

g) égloga: poema bucólico com diálogos;

h) sátira: poema que pretende censurar ou ridicularizar osdefeitos ou vícios, para corrigi-los.

Alma minha gentil, que te partisteTão cedo desta vida, descontente,Repousa lá no Céu eternamenteE viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,Memória desta vida se consente,Não te esqueças daquele amor ardenteQue já nos olhos meus tão puro viste.E se vires que pode merecer-teAlguma coisa a dor que me ficouDa mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,Que tão cedo de cá me leve a ver-te,Quão cedo de meus olhos te levou.

CAMÕES, Luis Vaz de.Poesia Lírica, Soneto no 48.

Características fundamentais do gênero lírico:• Musicalidade• Expressão dos sentimentos pessoais

O “Cântico do Calvário”, do poetabrasileiro Fagundes Varela, é a maisfamosa elegia brasileira, inspirada namorte prematura de seu filho.

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Gênero ÉpicoCaracteriza-se como uma poesia impessoal, objetiva, em que

o narrador conta, em forma de verso, um feito heróico de umpovo ou nação.

As duas primeiras grandes epopéias da literatura ocidentalsão a Ilíada e a Odisséia de Homero ( século IX a.C.). Influencia-do por ele, o poeta latino Virgílio (71-19 a.C.) escreveu a Eneida.Decalcadas nesses modelos clássicos, no Renascimento surgi-ram outras epopéias: Paraíso perdido, do inglês Milton (1533-1608);Orlando Furioso, do italiano Ariosto(1474-1533); Os Lusíadas, deLuís de Camões (1525-1580).

Caramuru, de Santa Rita Durão; O Uraguai, de Basílio daGama; e Vila Rica, de Cláudio Manuel da Costa, foram epopéiasbrasileiras escritas no século XVIII.

Gênero NarrativoDesmembramento moderno do épico, este gênero dele dife-

re por não apresentar a grandiosidade das narrativas épicas epor não trabalhar um mundo povoado de heróis e deuses. Suassemelhanças com o gênero épico são a presença de persona-gens, enredo, tempo/espaço e narrador. A esse gênero perten-cem as seguintes modalidades de texto em prosa:

a) conto: narrativa curta, com um número mínimo de perso-nagens e ação limitada a um único núcleo;

b) romance: narrativa longa e complexa, com muitos núcleosde ação, cenários variados e longa temporalidade;

c) novela: narrativa mais curta que o romance, com diálogosbreves e sucessão de conflitos vistos com superficialidade;

d) crônica: narrativa curta e leve, que toma o cotidiano comoponto de partida para suas reflexões.

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Gênero DramáticoPertencem a esse gênero os textos em prosa ou poesia pró-

prios para serem representados. Enquanto forem obra literáriaescrita, os textos dramáticos são somente verbais. Uma vezrepresentados, a linguagem não-verbal (cenário, iluminação,entonação de voz, figurinos...) combina-se com a linguagemverbal, produzindo um texto híbrido em que autor-público-elen-co desempenham papel fundamental.

Daí derivam as telenovelas, ou seja, nove-las transmitidas pela televisão. Note queas telenovelas mantêm uma sucessão deconflitos e assim conseguem manter a

atenção do telespectador por vários meses. Tantosos conflitos quanto os personagens são abordadosde maneira superficial.

A palavra dramático vem de drama, que em gre-go significa ação. Nesse tipo de gênero não hánarrador, os atores representam os personagensque ora dialogam, ora monologam. Nesse caso, afala do narrador é substituída pela rubrica.

O gênero dramático apresenta as seguintes modalidades:

a) tragédia: representação de um fato trágico que despertatemor e piedade;

b) comédia: representação de um fato inspirado na vida, deriso fácil e que pretende criticar a sociedade e o compor-tamento humano;

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c) tragicomédia: representação que mistura elementos trá-gicos e cômicos, com desfecho feliz;

d) drama: modernização da tragicomédia;

e) farsa: pequena peça teatral, surgida por volta do séculoXIV, que provocao riso explorandosituações engra-çadas, grotescase ridículas da vidacotidiana;

f) auto: breve peça profana ou religiosa. Seu conteúdo é sim-bólico e os atores representam entidades abstratas: opecado, a luxúria, a bondade etc.

Boca de Ouro

Nélson Rodrigues

Boca de Ouro, banqueiro do bicho, em Madureira, é relativa-mente moço e transmite uma sensação de plenitude vital.Homem astuto, sensual e cruel. (...) Ao iniciar-se a peça,Boca de Ouro ainda não tem o seu nome legendário. Agora éque, com audácia e imaginação, começa a exterminar os seusadversários. Está sentado na cadeira do dentista.)

BOCA DE OURO – Pronto?DENTISTA – Pode sair.BOCA DE OURO – Que tal doutor?DENTISTA – Meu amigo, está de parabéns!BOCA DE OURO – (abrindo o seu riso de cafajeste) – Acha?DENTISTA – Rapaz, te digo com sinceridade: nunca vi, emtoda a minha vida – trabalho nisso há vinte anos –, e nuncavi, palavra de honra, uma boca tão perfeita!BOCA DE OURO – Batata?

O termo “farsa” baseia-se no lemalatino Ridendo castigatmores, cujosignificado é “Rindo, castigam-seos costumes”.

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DENTISTA – Dentes de artista de cinema! Quer dizer, umaperfeição!(Sente-se em Boca de Ouro uma satisfação de criança grande)BOCA DE OURO – Sabe que quando eu vejo falar em dorde dentes, fico besta? Nunca tive esse troço!DENTISTA – Lógico.BOCA DE OURO – Pois é, doutor. Agora vou me sentar, outravez, porque eu queria um servicinho seu, caprichado, doutor!DENTISTA – Na boca?BOCA DE OURO – Na boca.DENTISTA – Meu amigo, é um crime mexer na sua boca!BOCA DE OURO – Mas o senhor vai mexer, vai tirar tudo,Todo, doutor!DENTISTA (no seu assombro) – Tirar os dentes?BOCA DE OURO – Meus dentes. Os 32 – são 32? – pois é:os 32 dentes!DENTISTA – E o senhor quer que eu tire?BOCA DE OURO – Eu pago, doutor! Meu chapa, eu pago!DENTISTA – Nunca!BOCA DE OURO (sempre rindo) – O senhor vai tirar, sim,vai tirar, doutor! Vai arrancar tudo!

Característica fundamental:

• Narração de ações heróicas edos grandes feitos do homem

O Auto da Compadecida, livro deAriano Suassuna, foi adaptado

para o cinema em 1999 e alcançougrande sucesso.

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Observe o quadro-síntese dos gêneros literários que, ainda hoje, é difí-cil esgotar, já que a mistura de gênero é cada vez mais acentuada.

LÍRICO ÉPICO DRAMÁTICA

FUNÇÃO Emotiva Referencial ConativaDA LINGUAGEMPREDOMINANTE

MODO DE Enunciação do Enunciação do Enunciação dasENUNCIAÇÃO emissor emissor e/ou personagens

das personagens

PERSPECTIVA O presente do O passado Ações presentesTEMPORAL artista presentificado

VERBOS E Presente – Passado – Presente e futuro –PESSOAS 1a pessoa 3a pessoa 1a e 2a pessoas

CONTEÚDO Expressão de Relato de ações Representação desentimentos heróicas ações nas quais

se chocamforças oponentes

EFEITO Emoção Admiração PiedadeSimpatia Surpresa RevoltaExaltação Orgulho Terror

FORMAS Soneto, ode, Epopéia e Diferentes tiposPRINCIPAIS balada, elegia, diferentes tipos de peças de

canção, prosa, de romances teatro, monólogoslírica dramáticos

Movimentos LiteráriosComo já vimos, o que caracteriza um texto literário é o seu

modo particular de organizar a linguagem, por meio da qual oartista representa a realidade. É comum na história da literatura,e da arte em geral, encontrarmos determinados traços estéticos

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e estilísticos que se repetem em autores de uma mesma época,como se fosse moda utilizar determinados recursos para expres-sar-se. Exemplo disso, entre tantos possíveis, são as cantigasde amor que obedeciam a um esquema rígido em que se desta-cavam a vassalagem amorosa, a presença da palavra senhor, aidealização da mulher (sempre inatingível). Ao agrupamento deobras que, num determinado espaço de tempo, se utilizamde recursos literários e temas semelhantes dá-se o nome de mo-vimento ou estilo literário.

Por convenção, a data de início de um movimento literárioé, quase sempre, a publicação de uma obra inovadora. Mas,como a literatura acompanha de perto as mudanças socio-econômicas, político-administrativas e culturais, podem ha-ver marcos de outra natureza, como fatos históricos (criaçãodo cargo de cronista-mor do Reino), eventos culturais (Sema-na de Arte Moderna), polêmicas (Questão Coimbrã) etc. Oimportante, no entanto, não é decorar essas datas de início etérmino de um dado movimento (mesmo porque elas nãoindicam que até tal ano se escrevia de uma maneira e, a partirdo ano seguinte, de outra), mas perceber quais formasde expressão predominaram num certo momento históricoe por quê.

Em Portugal, acompanhando as grandes transformações vi-vidas pela Europa, há três grandes eras literárias: Era Medieval,Era Clássica, Era Romântica ou Moderna, subdivididas em mo-vimentos ou estilos literários.

A Era Medieval, que se estende de 1189 (1198) a 1527, abran-ge o Trovadorismo e o Humanismo. A Era Clássica, de 1527 a1825, divide-se em três movimentos: Classicismo, Barroco eArcadismo ou Neoclassicismo. A Era Romântica ou Moderna,de 1825 até nossos dias, apresenta quatro períodos: Romantis-mo, Realismo, Simbolismo e Modernismo.

Esquematizando, temos:

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Era RomânticaEra Medieval Era Clássica

ou Moderna

1189 (1198) 1434 1527 1580 1756 1825 1865 1890-1915

TrovadorismoH

uman

ism

o

Cla

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ism

o

Bar

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nism

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Questões de Vestibular

1 (UF-ES) “Mas que significam as palavras? Que significam, na verdade,as palavras? Que significa a palavra verdade, a palavra mentira ou apalavra amor?”

LYRA, Bernadette. A panelinha de breuA afirmativa INCORRETA em relação ao conceito de literatura é:a) Literatura é a linguagem carregada de significado.b) No texto literário, as palavras possuem predominantemente senti-

do denotativo.c) Em literatura, cada palavra tem mil faces secretas sob a face

neutra.d) O texto literário é plurissignificativo, passível de várias inter-

pretações.e) A linguagem literária é predominantemente conotativa e metafórica.

2 (FUVEST-SP) Qual a diferença mais significativa entre a poesia lírica ea épica: o tipo de verso empregado ou o conteúdo? Justifique suaresposta.

3 (FUVEST-SP) Em que diferem essencialmente o teatro e o romancequanto à forma de composição, uma vez que o mesmo assunto podeser utilizado por ambos?

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4 (UF-SC) Leia os textos a seguir, assinale as alternativas corretas e,depois, some os valores atribuídos:

a) “Eu faço versos como quem choraDe desalento... de desencanto...Fecha o meu livro, se por agoraNão tens motivo nenhum de pranto.”(Manuel Bandeira)

b) “Recebi os trocados a que tinha direito e fiquei procurando um novoemprego, noutro ramo.”(Bento Silvério)

c) “Um primeiro sobressalto de pânico apertou-lhe a garganta...– Padre Estevão! – falou, alto, pensando que talvez houvesse al-guém ali, em alguma parte.”(Antônio Callado)(01) Os versos do fragmento apresentam característica líricas.(02) O fragmento b está escrito em prosa, que tem, como unidade

de composição básica, o parágrafo.(04) O fragmento c está impregnado de características dramáticas.(08) A estrofe é a unidade de composição básica da prosa.(16) A prosa presta-se para a confissão amorosa, pessoal... e a

poesia, para a criação de personagens e a estruturação delongas narrativas.Soma

5 (UF-ES) “Parece-me bastante possível sustentar que a função da litera-tura como força geratriz digna de prêmio consiste precisamente emincitar a humanidade a continuar a viver; em aliviar as tensões da mente,em nutri-la, e nutri-la, digo-o claramente, com a nutrição de impulsos.”POUND, Erza. A arte da poesia: ensaios escolhidos.O autor acima refere-se à seguinte função da literatura:a) Cognitiva d) Catárticab) Lúdica e) Socialc) Sinfônica

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6 (UF-ES) É CORRETO afirmar que o discurso literário caracteriza-se pora) recorrer à clicherização, quebrando a rigidez dos usos lin-

güísticos.b) tender ao hermetismo absoluto para tornar-se mais expressivo.c) romper as relações sintáticas, sem estabelecer novas relações

semânticas entre as palavras.d) visar à representação do simbólico e do imaginário por meio de

múltiplas modalidades discursivas.e) instaurar novos procedimentos técnicos, evitando a imprevisibilidade

das rupturas estéticas.

7 (UFRGS-RS) O soneto é uma das formas poéticas mais tradicionaise difundidas nas literaturas ocidentais e expressa, quase sempre,conteúdo:a) dramáticob) satíricoc) líricod) épicoe) cronístico

8 (UF-SC) Assinale as opções CORRETAS e some os valores corres-pondentes:(1) O gênero dramático mostra a representação de ações que se de-

senrolam diante dos espectadores, gerando conflitos e produzin-do tensões, como nesta passagem de Macunaíma, de Mário deAndrade.“Nas conversas das mulheres no pino do dia o assunto era sem-pre as peraltagens de herói. As mulheres se riam muito simpati-zadas, falando que ‘espinho que pinica, de pequeno já traz pron-ta’, e numa pagelança Rei Nagô fez um discurso e avisou que oherói era inteligente”.

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(2) Ao subjetivizar o mundo exterior para melhor exprimir as emo-ções do mundo interior, Cassiano Ricardo compôs, nesta “Sere-nata Sintética”, um poema lírico:

ruatorta

luamorta

tuaporta

(4) O seguinte trecho de poema de Maura de Senna Pereira eviden-cia algumas características simbolistas, como: alienação do real efuga para um mundo ilusório, senso do mistério, gosto pelo notur-no e retorno ao passado:Quero ajudar a construir o mundo futuro– o mundo sem opressão e sem miséria –luminoso, rasgado e justo.Quero permanecer alertae colocar a minha pedrano lugar exato e na hora certa.

(8) O poeta parnasiano, ao preocupar-se, acentuadamente, com acomposição formal, com a técnica do poema, compara sua tare-fa com a do ourives e do escultor, que também aprimoram a for-ma. É o que se percebe nesta estrofe do parnasiano Luis Delfino:Há, gentil criatura, um poeta que cinzelaA frase como um velho ourives florentino,Que torce o ouro, e mistura a prata, e que martela,De um golpe, o vaso iriante, adamascado e fino.

(16) Uma da características da poesia moderna é a valorização docotidiano, registrando um “momento poético”, como o fez Ma-nuel Bandeira em “A Realidade e a Imagem”:O arranha-céu sobe ao ar puro lavado pela chuvaE desce refletido na poça de lama do pátio.Entre a realidade e a imagem, no chão secoque as separaQuatro pombas passeiam.

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(32) Entre as tendências renovadoras da poesia moderna, figura o mo-vimento da “poesia concreta”, que, abolindo o verso e a estruturasintática, explora as palavras no seu poder sugestivo e na suadisposição visual, valorizando o espaço gráfico, como ocorre nopoema “Ser”, de Alcides Buss, que segue:

SerRESRESRES RESRESRES RESRESRESRESRESRESRES RESRESRES RESRESRESRESRESRESRES RESRESRES RESRESRESRESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRESRESRES RESRESRES RESRESRESRESRESRESRES RESRESRES RESRESRESRESRESRESRES RESRESRES RESRESRESRES

RES RES RESRESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RESRES RES RES RES

RESRESRES RESRESRES RES RESRESRESRES RESRESRES RES RESRESRESRES RESRESRES RES RES

Soma

9 (UF-BA) “Quando se atribui ao poeta a missão [...] de nomear as coi-sas não se está dizendo, na verdade, senão que ele, ao falar delas,revela-lhes a atualidade, a condição histórica: tira-as da sombra, dolimbo, para mostrá-las, reais, concretas, aos homens.”Assinale a proposição ou proposições que equivalem ao conceito depoeta/poesia expresso no fragmento acima e, depois, some os valores:

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(01) “O poeta/com a sua lanterna/mágica está sempre/no começo dascoisas./ É como a água, eterna-/mente matutina.”

(02) “Não faças versos sobre acontecimentos./Não há criação nemmorte perante a poesia./ Diante dela, a vida é um sol estático,/não aquece nem ilumina.”

(04) “Dos braços do poeta/Pende a ópera do mundo/(Tempo, cirur-gião do mundo).”

(08) “Poesia – deter a vida com palavras?/Não – libertá-la,/fazê-la voze fogo em nossa voz. Pó-/esia – falar/o dia.”

(16) “Quero fazer uma grande poesia./Quando meu pai chegar tra-gam-me logo os jornais da tarde/Se eu dormir pelo amor de Deus,me acordem/Não quero perder nada na vida.”

(32) “Andei pelo mundo no meio dos homens!/uns compravam jóias,uns compravam pão/Não houve mercado nem mercadoria/queseduzisse a minha vaga mão.”

10 (UF-PR) A crônica, tradicionalmente considerada um gênero menor, nasúltimas décadas passou a ocupar um lugar expressivo no panoramaliterário brasileiro. Concorreram para essa valorização cronistas como:(01) Fernando Sabino.(02) Paulo Mendes Campos(04) Jorge de Lima(08) José Lins do Rego(16) Rubem Braga(32) João Cabral de Melo NetoColoque aqui a soma dos numerais correspondentes às opções corretas:

Soma

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Trovadores.

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TROVADORISMO(1189/1198-1434)

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TROVADORISMO: séculos XII, XIII, XIV e XV

CONTEXTO HISTÓRICO: Idade Média

• Feudalismo: nobreza, clero e servos

• Cruzadas

• Teocentrismo

• formação do Estado português

CARACTERÍSTICAS: amor cortêsvassalagem amorosa

PRODUÇÃO: cantigas lírico-amorosas de amorde amigo

cantigas satíricas de escárniode maldizer

novelas de cavalaria

PRINCIPAIS AUTORES: Paio Soares de TaveirósD. DinisMartim CodaxJoão Garcia de GuilhadeFernando EsguioPero da Ponte

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Já vimos que a literatura não só é reflexo da história e dacultura, ou seja, do espaço/tempo em que é produzida, comotambém influencia esse momento. É preciso, pois, antes de par-tir para o estudo do Trovadorismo, situá-lo histórica e cultural-mente e lembrar que esse estilo de época expressou-se numalíngua razoavelmente diferente da atual: o galego-português.

Língua PortuguesaQuando os romanos invadiram a Península Ibérica, em 190

a.C., impuseram o latim vulgar, o latim, falado pelos soldados,às regiões conquistadas, cujos habitantes já dispunham de lín-guas próprias. Estas últimas foram, no entanto, suplantadas pelolatim, não sem deixar nele suas marcas. Modificado por essesfalares regionais, o latim deu origem a vários dialetos chamadosromanços ou romances, que, por sua vez, sofreram influências(sobretudo na composição do léxico) das invasões bárbaras, noséculo V, e árabes, no século VIII.

O galego-português foi um desses romanços. Era falado emtoda a faixa ocidental da Península, na região atual da Galiza ede Portugal, entre os séculos XII e XIV. Essa é a língua em que foiescrita toda a produção literária do Trovadorismo.

Com as lutas da Reconquista ( batalhas para recuperar oterritório, sobretudo do sul da Península, sob domínio dos ára-bes ), notam-se influências dos falares do sul e progressivas di-ferenças entre o galego e o português, surgindo, então, o portu-guês moderno.

É interessante observar que, apesar dea guerra dos Estados Unidos contra oIraque ter motivações econômicas e políti-

cas, havia também, ainda que em menor escala, oenfoque religioso.

TROVADORISMO (1189/1198-1434)

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O Estado PortuguêsA esse evoluir da língua correspondeu a formação do reino

português. Em fins do século XI, cavaleiros cristãos vinham dosmais diferentes lugares da Europa para expulsar os árabes daPenínsula Ibérica. O reino de Leão (mais tarde absorvido pelo deCastela ) recebeu ajuda de dois nobres da Borgonha: Raimundoe Henrique. D. Afonso VI, que governava o reino de Leão, tinhaduas filhas —Urraca e Teresa—, que casou com esses nobresdando-lhes como dote dois feudos. Raimundo casou-se comUrraca e recebeu o governo da Galiza; Henrique, ao casar-secom Teresa, passou a governar o Condado Portucalense.

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Mapa Península Ibérica

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Em 1139, o filho de Henrique e Teresa, D. Afonso Henriques,proclamou a independência do condado, elevando-o à condi-ção de reino, o reino de Portugal, que cresceu em direção ao sul,separando-se geográfica e lingüísticamente da Galiza, mais tar-de anexada pelo reino de Castela.

Em toda a Europa, esse período foi marcado pelo feudalis-mo, pelas Cruzadas, que se empenhavam em expulsar os mourosinstalados na Península Ibérica, e pelo poder espiritual da Igreja.

Sistema político-econômico da Idade Média, o feudalismo sus-tentava-se sobre uma hierarquia rígida entre suseranos – proprietá-rios de grandes extensões de terra – e vassalos – aqueles que rece-biam não só os feudos dos suseranos, mas também proteção dosenhor a quem deviam prestar irrestrita obediência, além de pagar-lhe taxas e contribuições. Nessa sociedade tipicamente rural, emque o comércio era feito na base de trocas, as principais atividadeseram a pesca e a agricultura, esta cultivada pelos servos, os pilaresdessa sociedade agrária, que viviam miseravelmente e cujo únicoconsolo era almejar a vida eterna prometida pela Igreja.

A base da força militar dos senhores feudais estava na cava-laria à qual pertenciam os nobres. O cavaleiro devia servir a Deus,à Igreja e ao seu suserano; devia, também, proteger as donzelase os fracos. Esses cavaleiros engajaram-se num dos mais im-portantes movimentos da Idade Média: as Cruzadas.

Tratava-se de expedições armadas, alimentadas por espíritoreligioso, cujo objetivo era recuperar os lugares santos na Palesti-na, que estavam sob domínio dos muçulmanos. A religião, por-tanto, conduziu a Europa ao movimento cruzadista, atestando quea Igreja foi a instituição mais importante do período medieval.

Ainda hoje, podemos acompanharpelos noticiários a disputa entre

israelenses e palestinos por lugares consi-derados santos.

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A religiosidade marcou profundamente a cultura medieval.Eram comuns as procissões e romarias, sobretudo a Santiago deCompostela, na Galiza. O teocentrismo (Deus visto como centrodo universo, regendo o destino das pessoas) perpassa todo o pen-samento da Idade Média. Isso só foi possível porque, numa épo-ca histórica tão caótica, o povo procurou na religião ajuda para asdificuldades neste mundo e salvação depois da morte. Nos mos-teiros, centros cultu-rais desse período,não só se conserva-ram textos e obrasde arte greco-roma-nos, como tambémfoi desenvolvido otrabalho dos copis-tas. Num momentoem que a imprensaainda não haviasido inventada, osmonges foram osresponsáveis pelareprodução escritadas obras, adorna-das por enfeitescoloridos chama-dos i luminuras eminiaturas.

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ção

Iluminuras.

Um livro interessante, que re-trata a vida dos copistas

nos mosteiros, é O Nome da Rosa,de Umberto Eco.

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Manifestações ArtísticasDois estilos marcaram a Idade Média.

A arte românica foi uma arte de peregrinos, viajantes e cru-zados. Os castelos, mosteiros e igrejas — caracterizados pelouso do arco redondo, grossas paredes de pedra, janelas peque-nas e predomínio de linhas horizontais — foram construídos commão-de-obra gratuita. Nessa arte predominou a arquitetura, emfunção da qual existiam a pintura e a escultura.

A partir do século XII, começou a desenvolver-se um novoestilo, marcado pela construção de catedrais: o gótico. Elas con-trastam com as românicas pela leveza expressa sobretudo porsuas imensas janelas, seus vitrais coloridos e suas torres que seelevam para os céus como mãosem prece. A pintura ea escultura ganhammaior autonomiae há uma cres-cente humaniza-ção das figuras.As catedrais gó-ticas, produto dosurgimento dascidades, eramconstruídas porartesãos e tra-balhadores as-salariados reuni-dos em corpo-rações.

Em qualquerum dos dois es-tilos, as cate-drais eram livros Igreja da arte românica – Notre Dame La Grande.

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escritos em pedra. Tanto os vitrais quanto as imagens do pór-tico ensinavam ao homem a história do mundo desde a suacriação, dogmas da religião, exemplos dos santos e hierarquiadas virtudes.

Portugal já estavaerigido em Estado, dis-punha de rei, de terri-tório, de povo, de ex-pressão lingüística(embora ainda mes-clada com o galego).Só lhe faltava um do-cumento artístico es-crito para atestar sua

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Duomo,em Milão.

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Vitrais da catedral de Chartres.

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existência cultural. Assim, em 1189, segundo alguns; em 1198,segundo Carolina Michaelis, o trovador Paio Soares de Taveirósproduziu o primeiro texto escrito da literatura portuguesa: a can-tiga A Ribeirinha, inspirada em Maria Pais Ribeiro, a favorita dorei D. Sancho Primeiro.

.....................................................

A RIBEIRINHA OUCANTIGA DE GUARVAIA

No mundo non me sei parelha, No mundo ninguém se assemelha a mim,mentre me for como me vai, enquanto minha vida continuar assim,ca já moiro por vós – e ai! porque morro por vós, e ai!mia senhor branca e vermelha, minha senhora de pele alva e faces

roqueredes que vos retraia quereis que vos descrevaquando vos eu vi en saia! quando vos vi sem manto!Mau dia me levantei, Maldito dia! me levantei,que vos enton non vi fea! que não vos vi feia!

E, mia senhor, dês aquel dia’ai! E, minha senhora, desde aquele dia,ai!

me foi a mi mui mal, Tudo me foi muito mal,e vós, filha de don Paai e vós, filha de don PaiMoniz, e ben vos semelha Moniz, e bem vos pareced’haver eu por vós guarvaia, de ter eu por vós guarvaia, (roupa

luxpois eu, mia senhor, d’alfaia pois eu, minha senhora, como mimonunca de vós houve nen hei de vós nunca recebivalia d’ua correa. algo, mesmo que sem valor.

(Paio Soares de Taveirós. In S. Spina.Presença da Literatura Portuguesa –

Era Medieval. 3ª- ed. São Paulo, Difel, 1969)

PARÁFRASE

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Conheça alguns termos técnicos empregados na poética doperíodo trovadoresco. Naquela época, a estrofe recebia o nomede cobra, cobla ou talho. O verso recebia o nome de palavra e,quando não havia rima, chamava-se palavra- perluda, bemexemplificado pelo segundo verso da segunda cobra. Veja:

“me foi a mi mui mal”

Designava-se vocábulo atafita o que hoje conhecemos comoencadeamento ou “enjambement” entre dois versos, exempli-ficados pelo terceiro e quarto verso da primeira cobra:

“queredes que vos retraia quando vos eu vi en saia!”Repare-se que a cantiga, formada de duas oitavas, não pos-

sui refrão ou estribilho: por isso, chama-se cantiga de maestria.

A Cantiga da Ribeirinha está registrada em o Cancioneiro daAjuda sob o número 38 e sua classificação é equivocada já queapresenta simultaneamente elementos lírico-amorosos e satíricos.

A qualidade emocional do texto e a habilidade do poeta su-gerem que devia haver uma atividade literária intensa anterior aessa cantiga, só que oral e, portanto, dela não se tem registro.No período que se estende do século XII ao XIV, cultivaram-se apoesia, a novela de cavalaria, os cronicões e os livros de linha-gem, nessa ordem decrescente de importância.

Poesia Medieval PortuguesaOs textos poéticos dessa época eram acompanhados por

música e dança (por isso eram chamados de cantigas) e produ-ziram o aparecimento de muitos artistas assim denominados:

a) trovador: poeta, quase sempre um nobre, que compunhaletra e música das canções, sem preocupação financeira.

b) jogral, segrel, menestrel: de condição social inferior, can-tavam as poesias dos trovadores, de castelo em castelo,entretendo a nobreza.

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c) soldadeira ou jogralesa: moça que cantava e tocava cas-tanholas ou pandeiro enquanto dançava.

A poesia trovadoresca divide-se em:

cantigas de amigopoesia lírico-amorosa

cantigas de amor

cantigas de escárniopoesia satírica

cantigas de maldizer

Poesia Lírico-Amorosa

1. Cantiga de AmorUm dos três grandes centros culturais da Idade Média, ao

lado da Itália e da Espanha, foi a França e, nela, a Provença,que exportou trovadores para toda a Europa. A cantiga de amorrevela influência provençal, mas os trovadores portugueses nãose limitaram à imitação, imprimindo grande sinceridade e liris-mo a suas composições. Assim se exprimiu D. Dinis, rei e tro-vador português:

“Quer’eu en maneira de proençalfazer agora um cantar d’amor(...)”

As principais características da cantiga de amor são:

a) ambiente palaciano;

b) eu-lírico masculino: é sempre o trovador que fala a suasenhor, sem jamais revelar-lhe o nome;

c) amor cortês: o sistema feudal criou uma maneira feudalde pensar que se refletiu também na literatura; por isso, amulher é a senhor a quem o trovador presta vassalagemamorosa: deve servi-la com fidelidade e reverenciá-la;

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O crítico português Alexandre Pinheiro Torres assim semanifestou sobre a sociedade medieval e o amor:

“Em sociedade tão fechada, de estrutura medieval, o amor– o grande e eterno tema – vai ser uma manifestação devassalagem feudal, já que as formas de vida e pensamentotambém são feudais. O que significa que o feudalismo engen-dra uma maneira de pensar feudal, como hoje o capitalismoengendra uma maneira de pensar capitalista”.

d) idealização da mulher: a mulher é vista como um ser inatingí-vel (ou é casada ou pertence a uma classe social superior àdo trovador); por não ser correspondido, o poeta experimen-ta a coita d’amor (o sofrimento amoroso), João Guilhade diz:

“Estes olhos nunca perderansenhor, gran coita,mentr’eu vivo for(...)”

Esse sofrimento do trovador, que se contenta só com ver aamada, é tão intenso que a única saída do poeta é a morte, comocanta Bernal de Bonaval:

A dona que eu am’e tenho por senhoramostrade-me-a* Deus, se vos en prazer for**, * mostrai-a a mim

se non dade-me-a morte. ** se tiverdes prazer

A que tenh’eu por lume* destes olhos meus * luz

e por que choram sempre amostrade-me-a Deus,se non dade-me-a morte.

Essa que Vós fizestes melhor parecerde quantas sei*, ai Deus, fazede-me-a veer, * a mais formosa de

se non dade-me-a morte. quantas existem

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Ai Deus, que me-a fizestes mais ca* mim amar, * que a

mostrade-me-a u* possa com ela falar, * onde

se non dade-me-a morte.(Bernal de Bonaval. In J. J. Nunes.

Cantigas d´amor. Coimbra:Imprensa da Universidade, 1932)

2. Cantiga de AmigoAs cantigas de amigo têm origem na própria Península Ibéri-

ca. São, portanto, de origem popular. Suas principais caracterís-ticas são:

a) ambiente rural: a mulher é sempre uma camponesa;

b) eu-lírico feminino: apesar de serem escritas por homens,as cantigas exprimem um sentimento feminino. É a mu-lher que sofre por estar separada do amigo (amante ounamorado). D. Sancho I escreveu:

“Ai eu coitada,como vivo en gran cuidadopor meu amigoque ei alongado!(...)”

c) presença de outros personagens com os quais a mulherdialoga (mãe, amigas, flores, ondas, etc.), como atestaFernando Esguio:

“Vaiamos, irmã, vaiamos dormirnas ribas do lago, u eu andar vi a las aves meu amigo.(...)”

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A cantiga transcrita a seguir é do rei D. Dinis (1261-1325),protetor dos poetas, amante da cultura (fundador da primeirauniversidade do país, a de Lisboa, em 1290) e o poeta que maisescreveu cantigas: 138 composições, sendo 76 de amor, 52 deamigo e 10 de maldizer.

Essa cantiga está registrada no Cancioneiro da Vaticana, sobo nº- 97 e no Cancioneiro da Biblioteca Nacional, sob o nº- 459:

CANTIGA

Hun tal home sei eu, ai ben talhada,que por vós ten a sa morte chegada;vede quem é e seed’en nenbrada;eu, mia dona.

Hun tal home sei eu que preto sentede si morte chegada certamente;vede quem é e venha-vos em mente;eu, mia dona.

Hun tal home sei eu, aquest’oide:que por vós morr’ e vo-lo en partide,vede quem é e non xe vos obride;eu, mia dona.(*)

(J.J. Nunes. Cantigas d’Amor, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1932, pp.93-94.)

Essa cantiga é denominada cantiga de refrão, visto repetir-se o mesmo verso “eu, mia dona” no final de cada cobra. Obser-ve que os versos da primeira cobra recorrem, com alteraçõesformais, mas não de sentido, nas cobras seguintes; a esse re-curso denomina-se “paralelismo”.

*bem talhada =formosa; seed’en nenbrada = lembrai-vos disso; preto = perto;venha-vos en mente = tende em mente; aquest’oide = ouvi isto; vo-lo en partide =

afastai-o disso ( en = da morte); non xe vos obride = não vos olvideis.

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O refrão e o paralelismo são recursos típicos da poesia popular.

d) concepção mais humana do amor;

e) trabalho formal mais apurado em relação às cantigas deamor: é comum a presença de paralelismo (construção

Cenário perfeito para uma barcarola.

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ção

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Dependendo do cenário, as cantigas de amigo podem divi-dir-se em:

• albas: o tema relaciona-se com o amanhecer;

• bailias: o cenário é uma festa em que se dança;

• barcarolas: referem-se a rio, lago ou mar e falam do temorde que o amigo, que partiu em expedições marítimas, nãovolte mais;

• pastorelas: o cenário é o campo;

• romarias: falam sobre romarias ou peregrinações a santuá-rios. Quanto à forma, essas cantigas dividem-se em:

• cantigas de mestria: sem estribilho ou refrão;

• cantigas de refrão: que têm estribilho ou refrão;

• cantigas paralelísticas: que apresentam paralelismo.

que se repete com pequenas variações a cada estrofe),de refrão ou estribilho (versos que se repetem ao final decada estrofe).

Vários compositores da MPB escrevemcantigas de amigo: Paulo Vanzolini(Ronda), Chico Buarque (Atrás da Porta,

Tatuagem), Gonzaguinha, Gilberto Gil entre outros.Veja um fragmento de Caetano Veloso:“Ah! Esse cara temme consumidoa mim e a tudo que eu quiscom seus olhinhos infantiscom os olhos de um bandido (...)”

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Observe, nesta barcarola de Martim Codax, em que a mulherconversa com as ondas, a presença de paralelismo e estribilho:

Ondas do mar de Vigo,se vistes meu amigo!

e ai Deus, se verrá cedo*! *ele voltará logo

Ondas do mar levado*, * agitado

se vistes meu amado!e ai Deus, se verrá cedo!

Se vistes meu amigoo por que eu sospiro!

e ai Deus, se verrá cedo!

Se vistes meu amadopor que hei gran cuidado!

e ai Deus, se verrá cedo!(Martim Codax. In J. J. Nunes. Op. Cit.)

Conheça uma outra cantiga de amigo.

Airas Nunes – Essa cantiga é uma bailada de Airas Nunes, tro-vador galego da segunda metade do século XIII, coevo de AfonsoX, o Sábio, e de D. Sancho IV, dos mais importantes de toda a líricamedieval. Consideramos essa cantiga sua obra-prima. A cantiga éconhecida por dois registros, no Cancioneiro da Vaticana, sob o nº-462, e no Cancioneiro da Biblioteca Nacional, sob o nº- 818:

CANTIGA

Bailemos nós já todas três, ai amigas,so aquestas avelaneiras frolidas,e quen for velida, como nós, velidas,se amig’amar,so aquestas avelaneiras frolidasverrá bailar.

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Bailemos nós já todas três, ai irmanas,so aqueste ramo destas avelanas,e quem for louçana, como nós, louçanas,se amig’amar,so aqueste ramo destas avelanasverrá bailar.

Por Deus, ai amigas, mentr’al non fazemos,so aqueste ramo frolido bailemose quen ben parecer, como nós parecemos,se amig’amar,so aqueste ramo so lo que nós bailemosverrá bailar. *

(J. J. Nunes, Cantigas d’Amigo, 3 vols., Coimbra:Imprensa da Universidade, 1926-1928, vol. II, p. 235.)

*so = sob; aquestas = estas; velida = formosa; verrá = virá; louçana = formosa;mentr’al = mentre al = enquanto outra coisa; quen ben parecer = quem for bela

Observe que a cantiga, de conteúdo esvoaçante e alegre,relata o sentimento de três bailadeiras, pessoas do povo quesão sensíveis, mas incultas.

“Bailemos nós já todas três, amigas”, ocupando cada amigauma cobra.

Cada jovem atua em uma cobra e suas vozes se unem emcouro nos versos menores que, assim, funcionam como verda-deiros estribilhos.

Transcrevemos a seguir um dos raros exemplos de alba den-tro da lírica trovadoresca. O autor é Nuno Fernandes Torneal.

Nuno Fernandes Torneol – trovador da primeira metade doséculo XIII. Dos mais autênticos e inspirados poetas do tempo,escreveu 13 cantigas de amor, uma de escárnio e 8 de amigo,das quais se considera obra-prima a Alba ou alvorada que sesegue, registrada no Cancioneiro da Vaticana, sob o nº- 242, e noCancioneiro da Biblioteca Nacional, sob nº- 604:

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CANTIGA

Levad’, amigo, que dormides as manhãas frias;todalas aves do mundo d’amor dizian:leda m’and’eu!

Levad’, amigo, que dormide’-las frias manhãas;todalas aves do mundo d’amor cantavan:leda m’and’eu!

Todalas aves do mundo d’amor dizian;do meu amor e do voss’en ment’avian:leda m’and’eu!

Todalas aves do mundo d’amor cantavas;do meu amor e dos voss’ i enmentavam:leda m’and’eu!

Do meu amor e do voss’en ment’avian;vós lhi tolhestes os ramos en que siian:leda m’and’eu!

Do meu amor e do voss’i enmentavan;vós lhi tolhestes os ramos en que pousavam:leda m’and’eu!

Vós lhi tolhestes os ramos en que siiane lhi secastes as fontes em que bevian:leda m’and’eu!

Vós lhi tolhestes os ramos en que pousavame lhi secastes as fontes u se banhavan:leda m’and’eu!*

(J. J. Nunes, Cantigas d’Amigo, vol. II, pp. 71-72.)

*levad = levantai; leda = contente; i = aí, nos cantos; em ment’avian =traziam na mente ( = referiam se a); enmentavan = equivalente a em ment’aviam;

siian = pousavam.

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Poesia SatíricaAs cantigas satíricas dividem-se entre as de escárnio e as de

maldizer. Elas são importantes porque não se prenderam a con-venções literárias, aproximando-se da vida e dos costumes, sen-do, por isso, importante documento da sociedade medieval por-tuguesa. Elas também contribuíram para o aprimoramento dalíngua literária, uma vez que exploraram jogos de palavras eambigüidades.

Essas cantigas referiam-se à vida dos jograis, relatandovícios, escândalos, excessos de toda ordem e rivalidadeprofissional. Criticavam o burguês afidalgado, o nobre sovi-na, o clero e a fraqueza dos nobres portugueses contra osárabes. Cantadas nas tabernas, essas eram cantigas da vidaboêmia.

Hoje, o gênero satírico apresenta-se desdobrado em fábulase comédias.

Essa cantiga é um monólogo da moça ao amanhecer, des-perta pelo canto da passarada. O contentamento da moça pare-ce-nos ser resultado das lembranças do afeto já vivido e, quemsabe, acabado, mais que da continuidade da relação de amar nodia que se inicia.

1) Cantigas de EscárnioSão sátiras veladas que não citam o nome da pessoa ridi-

cularizada. Esta cantiga de João Garcia de Guilhade, trovadordo século XIII que compôs 21 cantigas de amigo, 15 de maldizere duas tenções, é um dos exemplos mais conhecidos dessetipo de cantiga:

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Ai, dona fea! fostes-vos queixarque vos nunca louv’en meu trobar* * trovar

mais ora* quero fazer um cantaren que vos loarei toda via* * vida

e vedes como vos quero loar:dona fea, velha e sandia*! * louca

Ai dona fea! se Deus me perdon!e pois havedes tan gran coraçonque vos eu loe en esta razon,vos quero já toda via;e vedes qual será a loaçon*: * louvação

dona fea, velha e sandia!Dona fea, nunca vos eu loeien meu trobar, pero muito trobei;mais ora já un bon cantar fareien que vos loarei toda via;e direi-vos como vos loarei:dona fea, velha e sandia!

(João Garcia de Guilhade. In S. Spina. Op. Cit.)

2) Cantigas de MaldizerEssas cantigas utilizam o insulto direto e grosseiro, dando nome

ao ofendido. Observe o que fez Pero da Ponte na página seguinte:

“Quen a sa* filha quiser dar * sua

mester*, que sábia* guarir*, * profissão * saiba * enriquecer

a Maria Doming’á-d’ir* * deve ir

deve ir que a saberá ben mostrar*, * ensinar, mostrar

e direi-vos que lhi fará:ante dun mês* lh’amostrará * antes de um mês

como sábia mui ben ambrar*. (...)” * requebrar ou ter relações sexuais

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Satiriza-se, na cantiga, uma certa Maria Dominga que ensi-nava as moças a requebrar para atrair homens. As cantigaslírico-amorosas e as satíricas chegaram até nós por meio detrês Cancioneiros, compilações manuscritas da produção trova-doresca:

* Cancioneiro da Ajuda: com 467 poesias, sem indicação deautor. Encontra-se na Biblioteca do Palácio da Ajuda, emLisboa;

* Cancioneiro da Vaticana: composto de 1205 cantigas de160 autores, está na Biblioteca do Vaticano;

* Cancioneiro Colocci-Brancuti (ou Cancioneiro da Bi-blioteca Nacional de Lisboa): contém mais de 1500cantigas.

Conheça uma outra cantiga que tão bem exemplifica a poe-sia trovadoresca. Trata-se do trovador galego da segunda me-tade do século XIII, Pêro Garcia Burgalês . Escreveu numero-sas cantigas de amor, de amigo e de escárnio e maldizer. Acantiga seguinte, que tão bem representa seu talento, consti-tui, sem dúvida, um dos momentos mais altos a que subiu asátira trovadoresca. Registram-na o Cancioneiro da Vaticana,sob o nº- 998, e o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, sob onº- 1331:

CANTIGA

Rui Queimado morreu com amoren seus cantares, par Sancta Maria,por úa dona que gran bem queria,e, por se meter por mais trobador,porque lh’ela non quis [o] bem fazer,fez-s’el en seus cantares morrer,mas ressurgiu depois ao tercer dia!

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Esto fez el por dia por úa as senhorque quer gran bem, e mais vos em diria:porque cuida que faz i mestria,e nos cantares que fez a saborde morrer i e desi d’ar viver;esto faz el que x’o pode fazer,mas outr’omen per ren non [n] o faria.

E non há já de sa morte pavor,senon as morte mais la temeria,mas sabe ben, per sa sabedoria,que viverá, dês quando morto for,e faz-[s’]en seu cantar morte prender,desi as viver: vede que poderque lhi Deus deu, mais que non cuidaria.

E, se mi deus a mim desse poder,qual oi’ el há, pois morrer, de viver,jamais morte nunca temeria.

(J. J. Nunes, Crestomatia Arcaica, 3ª- ed., Lisboa:Clássica, 1943, p. 400.)

*par = por; en = disso; porque cuidda que faz i maestria = porque pensa que possuitalento; sabor = gosto; i = aí; desi = depois; ar = re ( ar viver = reviver), de novo,outra vez; dês = desde; oi = hoje; pois morrer, de viver = viver depois de morrer.

Desaparecimento do Trovadorismoe a Prosa Medieval

A lenta passagem de uma estrutura feudal a uma economiamercantil, a criação das primeiras universidades, a valorização davida cortês, a permanência do espírito guerreiro da Reconquista ea influência da Igreja selaram a decadência do Trovadorismo eprepararam o aparecimento da prosa em Portugal, nos séculosXIII e XIV. A produção desse período pode ser dividida em:

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a) hagiografias: relatos sobre a vida dos santos;

b) livros de linhagens ou nobiliários: relatos genealógicos dasfamílias nobres;

c) cronicões: relatos romanceados de acontecimentos his-tóricos e sociais;

d) novelas de cavalaria: relatos de combates entre heróis einfiéis ou vilões.

As novelas de cavala-ria surgiram das cançõesde gesta, antigos poemasde assuntos guerreiros, eformaram ciclos de acor-do com o tema central.Veja: a) ciclo clássico: en-volve os heróis da mitolo-gia greco-romana; b) ciclo carolíngio: focaliza as aventuras deCarlos Magno e seus guerreiros; c) ciclo bretão ou arturiano: tratadas façanhas do rei Artur e os cavaleiros da Távola Redonda. Estefoi o ciclo que mais influenciou a Literatura Portuguesa. Duas no-velas marcaram esse período: A Demanda do Santo Graal e Amadisde Gaula. Em A Demanda do Santo Graal, são relatadas as aven-turas do rei Artur e seus cavaleiros, que saem à procura (deman-da) do santo cálice (graal) em que José de Arimatéia recolheu osangue de Cristo derramado quando estava na cruz. Nessa nove-la está evidente o ideal do cavaleiro cristão medieval, enfatizando-se sua valentia e castidade. Em Amadis de Gaula, há também aencarnação do perfeito cavaleiro, combativo e generoso, que amatimidamente sua senhora. Amadis é pajem de Oriana, a quem ser-ve fielmente: por ela arrisca-se a toda espécie de combate. Acu-sado de infidelidade por Oriana, Amadis torna-se ermitão. Masnovas aventuras ocorrem e ele precisa salvar Oriana, com quemfica a sós numa floresta. Aí a donzela deixa-se possuir. Mais tarde,depois de outras tantas aventuras, eles se casam.

A primeira acepção para o ver-bete prosa que aparece no Dicio-nário Aurélio, século XXI, diz: “ma-neira natural de falar ou escrever,sem forma retórica ou métrica, poroposição ao verso”.

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A DEMANDA DO SANTO GRAAL

O episódio seguinte corresponde aos capítulos 250-253,intitula-se “A Barca Misteriosa – O Torneo Forte e Maravilhoso”:

Quando Boorz se partiu da abadia, úa voz lhe disse que fos-se ao mar, ca Perseval o atendia i. El se partiu ende, assi como oconto o há já devisado. E quando chegou aa riba do mar, afremosa nave, coberta de um eixamete branco aportou, e Boorzdesceu e encomendou-se a Nostro Senhor, e entrou dentro eleixou seu cavalo fora. E tanto que entrou dentro, viu que a navese partiu tam toste da riba, como se voasse. E catou pela nave enom viu rem, que a noite era muito escura; e acostou-se aoboordo e rogou a Nostro Senhor que o guiasse a tal lugar u sua

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rodu

ção

Os cavaleiros serviam ao Cristianismo, e à mulher amada e ao seu reino.

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alma podesse salvar. E, pois fez sa oraçom, deitou-se a dormir.E manhã, quando se espertou, viu na nave uú cavaleiro armadode loriga e de brafoneiras. E, pois o catou, conhecê-o e tolheulogo seu elmo e foi-o logo abraçar e fazer com ele maravilhosaledice. E Persíval foi maravilhado, quando o viu vir contra si, canom podia entender quando entrara na nave. E pero, quando oconheceu, foi tam ledo, que nom poderia chus. E ergueu-se eabraçou-o e recebe-o como devia. E começou o uum ao outro acontar de sas aventuras, que lhes aveerom dês que entraram nademanda. Assi se acharom os amigos na barca que Deus lhesguisara, e atendiam i quais aventuras lhes el quisesse enviar. EPersíval disse que lhe nom falecia de sa promessa, fora Galaaz.

Mais ora leixa o conto falar deles e torna a Galaaz, ca muitohá gram que se calou dele.

Conta a estória que, pois que o boõ cavaleiro se partiu dePersíval e que o livrara dos XX cavaleiros que o perseguiram póladonzela, entrou no grã caminho da e andou pois muitas jorna-das, aas vezes aça, aas vezes alá, assi como a ventura o levava.E pois andou gram peça pelo reino de Logres em muitos logaresu lhe diziam que havia aventuras de acabar, tornou-se contra omar, assi como sa vontade lhe deu.

Um dia lhe aveo que a ventura o levou per ante uú castelo, uhavia uú torneo forte e maravilhoso; e havia i gram gente da uãparte e da outra, e dos da Mesa Redonda havia i muitos, uús queajudavam os de dentro, e outros os de fora, e nom se conhe-ciam, pólas armas que haviam cambadas. Mais aquela hora queveio i Galaaz, eram os de dentro tam desbaratados, que nomatendiam se morte nom. E Tristam, que a ventura adussera aaqueltorneo e que ajudava os de dentro, sofrera já i tanto que tinha jámui grandes IIII chagas, ca todolos de fora estavam sobre elepólo prenderem, porque viram que era melhor cavaleiro que nehuúdos outros; e nom havia i tal dos outros que lhe tanto mal fezessecomo Galvam e Estor, que eram da outra parte, e nom no conhe-ciam, e pero el se defendia tam vivamente, que todos os que o

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viam eram maravilhados. Galaaz estava já muito preto da porta,e viu ante si uú cavaleiro mal-ghagado, que saíra do torneo e iafazendo tam gram doo, que nom vistes maior. E Galaaz se che-gou a ele e perguntou-o porque fazia tam gram doo:

— Por quê? disse el: polo milhor cavaleiro do mundo, quevejo morrer per grãmaa-ventura, ca todo o mundo é contra el,assi como veedes, e ainda nom quer leixar o torneo.

— E qual é ? disse GalaazE el lho mostrou.— Par Deus, disse Galaaz, verdadeiramente el é mui boõ ca-

valeiro. Assi Deus vos salve, dizede-me como há nome.— Senhor, disse el, há nome dom Tristam.— No nome de Deus, disse Galaaz, eu o conhosco mui bem.

Ora me terriam por mau, se o nom fosse ajudar.Entom se leixou correr a eles e meteu Gilflet em terra; dês i,

Estor; dês i, Sagranor; dês i, Lucan. E depois que lhe quebrou alança, meteu mão aa espada, como aquel que se sabia bem delaajudar, e meteu-se u era a maior pressa, e começou a derribarcavaleiros e cavalos, e fazer tam gram maravilha de armas, quequantos o viam se maravilhavam em. E Galvam disse a Estor eaos outros seus companheiros que já cavalgarom:

— Por esta cabeça, esta é Galaaz, boo cavaleiro. Ora fol quemno mais atender, ca a seu golpe nom pode durar arma.

E el isto dizendo, aveo que chegou Galaaz a ele, assi comoa ventura o trazia, e deu-lhe ua cuitalada, que lhe talhou oelmo e o almofre e o coiro e a carne atee o texto, mais aveo-lhe bem que nom foi chaga mortal. E Galvam, que bem cuidoua seer morto, leixou-se cair em terra. E Galaaz, que nom po-der ter seu golpe, alcaçou o cavalo pelo arçom de ante, assique o talhou per meo das espáduas, e o cavalo caiu morto a-cabo seu senhor.

Quando Estor viu este golpe, maravilhou-se e afastou-se afo-ra, cabem entendeu que seria mal-sem e folia demais entender.Sagramor disse entom:

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— Per boa fé, ora posso bem dizer que este é o melhor cavaleiroque eu nunca vi. Nunca me creades de rem, se este é o melhor cava-leiro, aquel que há de dar cima aas aventuras do regno de Londres.

— Sem falha, esse é, disse Estor.

E eles em esto falando, Galaaz viu que os de fora começa-ram a fugir, e os do castelo iam empós eles, prendendo em elesa seu plazer. E quando Galaaz viu que os de fora eram já assidesbaratados, que nom podia já recobrar, partiu-se ende tamescundidamente, que guu no entendeu, fora Tristam. Aquel ver-dadeiramente o seguiu de longe, que aquel dia viu em el tamgran bondade de cavalaria, que disse que jamais nom serialedo taa que nom soubesse que era. Assi se foram ambosescondidamente, que os da assumada nom poderam saber quefora deles. E Galvam, que foi tam coitado do golpe, que nomcuidou a escapar vivo, disse a Estor:

— Par Deus, dom Estor, ora vejo eu que é verdade o que medisse Lançalot ante vós todos, em dia de Penticoste, que, seprovocasse de tirar a espada do padrom, que me acharia eumal, ante que o ano passasse, e que seria per aquela espadamesma. E, sem falha, esta é aquela espada com que el feriu. Eesto vejo que assi me aveo como me foi adeviado.

— E sodes mal-ferido? disse Estor.

— Non som tam mal-ferido, disse el, que nom possa guarecer.Mais o pavor me fez peor que al.

— Mais que podemos fazer? disse el. Semelha-me que jáficaremos, disse Estor.

— Non ficaredes vós, disse el, mais eu ficarei taa que sejaguarido.

E eles em esto falando, chegarom-se os do castelo a eles. Equando souberom que era Galvam, muitos houve i a que pesou.E filharam-no e levaram-no ao castelo e desarmorom-no, emeterom-no em uã câmara escura e longe de gente, e fezerom-

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lhe catar sua chaga a uú mui boõ mestre, que mui bem sabia detal mestria, que os fez seguros, que o daria são a pouco tempo.Assi ficou Galvam no castelo, e Estor, que o nom quis leixar ataaque saasse. Os outros se foram, e quando se partiram do caste-lo, começaram a falar de Galaaz e disserom:

— Que faremos? Aquel boõ cavaleiro nom é longe; vamosempós el, ataa que o achemos; e se Deus quer que o achemos,tenhamos-lhe companhia mentre podermos, ca, sem falha, ma-ravilhas haveremos Del.

A esto i se acordaram, e per u iam, iam demandando porGalaaz. Mais porque o nam acharam esta vez, se cala ora endeo conto e torna a Galvam.*

(A Demanda do Santo Graal, repr. Facs. e transcr. Crit. De Augusto Magne,Rio de Janeiro, INL, 1955, vol. I, pp. 375, 377, 379 e 381)

* ca=pois; atendia=esperava;ende=daí; eixamente=antigo veludo oriental, felpudo;leixou=deixou; toste=rápida, depressa; catou=olhou; rem=nada; u=onde; loriga=saiote

de malha com lâminas de aço ou escamas de ferro; brafoneiras=peça que cobria a partesuperior dos braços dos cavaleiros; ledice=alegria; contra=na direção de; pero=mas;

chus=mais/que nom poderia chus=a mais não poder/; aveerom=aconteceram;dês=desde; guisara=preparara; gram peça= há muito tempo; froesta= floresta; se mortenom = senão a morte, apenas a morte; adussera = levara; preto = perto; dês i = depois;em = disso; fol = louco; cuitalada = cutilada; almorfe = elmo; texto = cabeça; a-cabo =

junto de; dar cima = realizar; empós = atrás de; taa = até; assumada = ajuntada; padrom= padrão, pedra de mármore; seria = sararia; sem falha = sem dúvida; guarecer = curar;

al = outra coisa; mestre = médico; saasse = sarasse.

Este episódio divide-se em duas partes distintas, conformeo próprio título sugere. Na primeira, protagonizada por Boorz ePerseval, dois dos principais cavaleiros de Camaalot, observa-se, de um lado, a presença de ingredientes místicos que fazemda Demanda uma novela “ao divino”, isto é, cristã e transcen-dental; de outro, a magia, o maravilhoso pagão, representadopela barca que partiu “como se voasse”, que lembra a facetafantástica e supersticiosa da Idade Média.

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A segunda parte, encetada no segundo parágrafo, contémo recheio mais freqüente nesse tipo de narrativa épica: a “jus-ta”, quando a troca de armas se realiza homem a homem, e o“torneio”, quando coletiva. Aqui, Tristão enfrenta sozinho, em tor-neio, vários adversários, pois “nom se conheciam, pólas armasque haviam cambadas”. Vale dizer: como o reconhecimento en-tre os cavaleiros se fazia por meio das inscrições que adorna-vam o escudo, estando este “cambado”, é natural que lutassementre si julgando-se cavaleiros inimigos ou desconhecidos. Talpormenor constitui lugar-comum na novela de cavalaria medie-val. Observe-se também que Galaaz se coloca ao lado de Tristão,embora não o reconheça: bastava que o outro estivesseinferiorizado para que sentisse obrigação de ajudá-lo, mesmoque contra seus amigos, Estor e Galvam. Essa adesão fraternal,que contrabalança o ímpeto guerreiro motivado por desconhe-cimento; guarda um símbolo de extração cristã: o herói correem socorro de Tristão porque este, batalhando contra numero-sos cavaleiros, representa o Bem a se bater com o Mal. É queGalaaz, tanto quanto os demais companheiros de jornada, nãosó procurava aperfeiçoar-se física e moralmente na defesa dedonzelas e cavalheiros desprotegidos ou injustiçados, como fa-zia disso sua própria razão de viver. Assim, por trás da interfe-rência altruísta de Galaaz, percebe-se que o cavaleiro simboli-zava Cristo em sua peregrinação entre os homens, a fim depacificá-los e defender os pobres contra os ricos, os fracos contraos fortes etc. E por seu intermédio se patenteia o intuito do au-tor da Demanda: exortar os leitores à prática das virtudes cristãse pregar a salvação do mundo pelo exemplo de Cristo e seusapóstolos, encarnados em Galaaz e irmãos de armas. Do pontode vista estrutural, observe-se a expressão “ora leixa o conto”,ou “conta a estória”, ou “ora ende se cala o conto”, em que aspalavras “estória” e “conto” encerram o mesmo significado que“narrativa”, e funcionam apenas como elementos de ligação en-tre as partes ou episódios da novela.

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Questões de Vestibular

1 (UF-PA) “Ai flores, ai flores do verde pinose sabedes novas do meu amigo?Ai, Deus, e u é?”

O autor da poesia acima é:a) Gil Vicente c) Bocage e) Antônio Nobreb) Camões d) D. Dinis

2 (UF-PA) Amor, desamor e ciúme; freqüente inspiração na vida popu-lar, bem como a exploração do eu feminino indicam cantigas de:a) amigo c) amor e) maldizerb) amor e amigo d) escárnio

3 (UF-PA) Soneto de Contrição“Eu te amo, Maria, te amo tantoQue o meu peito me dói como em doençaE quanto mais me seja a dor intensaMais cresce na minha alma teu encanto

Como a criança que vagueia o cantoAnte o mistério da amplidão suspensaMeu coração é um vago de acalantoBerçando versos de saudade imensa.

Não é maior o coração que a almaNem melhor a presença que a saudadeSó te amar é divino, e sentir calma...

E é uma calma tão feita de humildadeQue tão mais te soubesse pertencidaMenos seria eterno em tua vida”

Este poema de Vinicius de Moraes situa a mulher num plano superior,deificado, e reserva ao sujeito poético masculino um papel submisso.Exatamente assim, no contexto poético medieval, surgia a mulher nascantigas de:

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a) escárnio c) amigo e amor e) amorb) maldizer d) amigo

4) (Mackenzie-SP) “Ai dona fea! foste-vos queixarporque vos nunca louv’en meu trobarmais ora quero fazer um cantarem que vos loarei toda viae vedes como vos quero loar:dona fea, velha e sandia!”

Assinale a informação correta a respeito do trecho de João Garcia deGuilhade:a) é cantiga satíricab) foi o primeiro documento escrito em língua portuguesa (1189)c) trata-se de cantiga de amigod) foi escrita durante o Humanismo (1418-1527)e) faz parte do Auto da Feira

5) (FUVEST-SP) Com relação às seguintes estéticas literárias: Barroco,Arcadismo, Trovadorismo, Simbolismo e Romantismo:a) coloque-as em ordem cronológica;b) indique uma que ocorreu em Portugal e não no Brasil.

6) (FUVEST-SP) “Ai, flores, ai flores do verde ramose sabedes novas do meu amado?Ai, Deus, e u é?(sabedes, ‘sabeis’; u, ‘onde’)

Escreva as palavras que completam os claros.“Os versos acima pertencem a uma cantiga de (a), característica do(b). 0 português, estética literária dos séculos XII, XIII e XIV.”

7) (FUVEST-SP) Coube ao século XIX a descoberta surpreendente danossa primeira época lírica. Em 1904, com a edição crítica e comenta-da do Cancioneiro da Ajuda, por Carolina Michaëlis de Vasconcelos,tivemos a primeira grande visão de conjunto do valiosíssimo espóliodescoberto. (Costa Pimpão)

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a) Qual é essa “primeira época lírica” portuguesa?b) Que tipos de composições poéticas se cultivavam nessa época?

8) (UNESP) Leia e observe com atenção a composição seguinte:“Ay flores, ay flores do verde pinho,se sabedes novas do meu amigo!

ay Deus, e hu é?Ay flores, ay flores do verde ramo,se sabedes novas do meu amado!

ay Deus, e hu é?Se sabedes novas do meu amigoaquel que mentiu do que pôs comigo!

ay Deus, e hu é?Se sabedes novas do meu amado,aquel que mentiu do que nh’ á iurado!

ay Deus, e hu é?A composição anterior, parcialmente transcrita, pertence à lírica medie-val da Península Ibérica. Ela tem autor conhecido, arte poética própria ecaracterísticas definidas do lirismo trovadoresco, podendo-se ainda des-cobrir o nome pelo qual composições idênticas são conhecidas.Em uma das alternativas indicadas acham-se todos os elementos quecorrespondem àquelas informações.a) O autor é Paio Soares de Taveirós. Destacam-se o paralelismo das

estrofes, a alternância vocálica e o refrão. O poeta pergunta peloseu amigo.

b) O autor é Nuno Fernandes Torneol. Destaca-se o refrão como inter-pelação à natureza. Trata-se de uma cantiga de amigo.

c) O autor é el-rei D. Dinis. Destacam-se o paralelismo das estrofes, aalternância vocálica e o refrão. O poeta canta na voz de uma mulhere pergunta pelo amado, porque é uma cantiga de amigo.

d) O autor é Fernando Pessoa. Destaca-se alternância vocálica. Trata-se da teoria do fingimento, que já existia no lirismo medieval.

e) O autor é Martim Codax. Destaca-se o ambiente campestre. O poetaespera que os pinheiros respondam à sua pergunta.

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9) (UNESP) SEDIA LA FREMOSA SEU SIRGO TORCENDOEstêvão Coelho

Sedia la fremosa seu sirgo torcendoAs voz manselinha fremoso dizendoCantigas d’amigo.

Sedia la fremosa seu sirgo lavrando.As voz manselinha fremoso cantandoCantigas d’amigo

– Par Deus de Cruz, dona, sey que avedesAmor muy coytado que tan bem dizedesCantigas damigo.

Par Deus de Cruz, dona, sey que andadesD’amor muy coytada que tan bem contadesCantigas d’amigo.

– Avuytor comestes, que adevinhades(Cantiga nº- 321 – Canc. da Vaticana)

ESTAVA A FORMOSA SEU FIO TORCENDO(paráfrase de Cleonice Berardinelli)

Estava a formosa seu fio torcendo,Sua voz harmoniosa, suave dizendoCantigas de amigo.

Estava a formosa sentada, bordando,Sua voz harmoniosa, suave cantandoCantigas de amigos.– Por Jesus, senhora, vejo que sofreisDe amor infeliz, pois tão bem dizeisCantigas de amigo.

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Por Jesus, senhora, eu vejo que andaisCom penas de amor, pois tão bem cantaisCantigas de amigo.

– Abutre comestes, pois que adivinhais.in BERARDINELLI, Cleonice. Cantigas de Trovadores

Medievais em português moderno. Rio de Janeiro, 1953, pp. 33-39.

O paralelismo é um dos recursos estilísticos mais comuns na poesialírico amorosa trovadoresca. Consiste na ênfase de uma idéia central,às vezes repetindo expressões idênticas, palavra por palavra, emséries de estrófes paralelas. A partir destas observações, releia o textode Estêvão Coelho e responda:a) O poema se estrutura em quantas séries de estrófes paralelas? Iden-

tifique-as.b) Que idéias centrais são enfatizadas em cada série paralelística?

10) (UNESP) Considerando-se que o último verso da cantiga caracterizaum diálogo entre personagens; considerando-se que a palavra abutregrafava-se avuytor, em português arcaico; e considerando-se que, deacordo com a tradição popular da época, era possível fazer previsõese descobrir o que está oculto, comendo carne de abutre, medianteestas três considerações:a) Identifique o personagem que se expressa em discurso direto, no

último verso do poema;b) Interprete o significado do último verso, no contexto do poema.

11) (Mackenzie-SP) Maior poeta trovadoresco da escola provençal:a) Paio Soares de Taveirós c) D. Dinisb) D. Sancho d) Garcia de Resende

12) (Mackenzie-SP) Uma das afirmações é certa:a) as cantigas de amigo eram compostas por mulheres.b) cancioneiros eram intérpretes das cantigas.c) o intérprete era sempre o próprio compositor da cantiga.d) na cantiga de escárnio a crítica é encoberta.

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HUMANISMO(1434-1527)

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ção

As primeiras décadas de 1400 assistem a uma revolução feita com esquadro ecompasso, que tem por objetivo conquistar o espaço onde vive o homem, que volta aser o centro do universo.

Leonardo da Vinci simbolizou a perfeição de todo o cosmos na harmonia docorpo humano inscrito nas figuras perfeitas do círculo e do quadrado.

As medidas do corpo humano, de Leonardo da Vinci.

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HUMANISMO: séculos XV e XVI

CONTEXTO HISTÓRICO: crise do feudalismosurgimento da burguesiateocentrismo e antropocentrismoinício do estudo das obras

greco-latinasRevolução de Avis

CARACTERÍSTICAS: reconhecimento dos valoreshumanos

denúncia das classes dominantes

PRODUÇÃO LITERÁRIA: historiografia — crônicas deFernão Lopes

prosa doutrinária — preocupaçãoem educar os nobres para oconvívio social e para a guerra

poesia palaciana — CancioneiroGeral de Garcia de Resende

teatro popular — Gil Vicente

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O Humanismo representa, literariamente, uma transição entreo Trovadorismo e o Classicismo. Inicia-se em 1434, com a no-meação de Fernão Lopes para o cargo de cronista-mor da Torredo Tombo e encerra-se em 1527, com a volta do poeta Sá deMiranda da Itália, onde tomara contato com a nova estética clás-sica. Nesse período da literatura cultivaram-se a historiografia –cujo maior representante é Fernão Lopes –, a prosa didática, apoesia palaciana – compilada no Cancioneiro Geral – e o teatropopular de Gil Vicente.

Contexto HistóricoGuerras, rebeliões, problemas econômicos e religiosos e a

peste negra, que reduziu drasticamente a população da Europa(só em Portugal exterminou quase um terço da população) –acarretando a falta de mão-de-obra nos campos – foram os res-ponsáveis pela crise do Feudalismo.

Restabelecido o comércio na Europa ocidental, a moeda rea-pareceu como instrumento de troca. A riqueza – que até entãoestava nas mãos da aristocracia e da Igreja – desviou-se para osbolsos dos mercadores habitantes dos burgos, os burgueses. Oreaparecimento das cidades (burgos) e do comércio ocorreu nummundo feudalizado com o qual a nova classe – a burguesia – nãodemorou a entrar em conflito. A economia feudal de subsistênciafoi substituída por atividades comerciais. Como conseqüência, oprocesso de urbanização acelerou-se e o campo foi abandonado.

A burguesia mercantil sentiu-se forte para disputar com a no-breza a direção política, pois seu dinheiro financiava projetos desoberanos que centralizavam o poder. Em Portugal, essa burgue-sia esteve presente na Revolução de Avis (1383-1385), que con-duziu D. João I, o Mestre de Avis, ao trono, e foi sua riqueza quepropiciou as grandes navegações e conquistas que se iniciaramcom a tomada de Ceuta em 1415.

HUMANISMO (1434-1527)

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Embora a Igreja nunca tenha perdido seu poder, a visãoteocêntrica cedeu pouco a pouco lugar para a antropocêntrica –o homem como centro do universo. Esse deslocamento foi fruto,em parte, das Grandes Navegações, que mostraram ser o mun-do maior do que cada feudo e que o homem podia ser senhor doseu destino.

Manifestações CulturaisToda a produção artística do Humanismo, iniciado na Itália

no século XIV, reflete a passagem do teocentrismo para oantropocentrismo. A pin-tura e a escultura enfa-tizam uma visão mais rea-lista do mundo e adquiremautonomia, isto é, passama ser manifestações inde-pendentes das obras arqui-tetônicas. As formas hu-manizam-se. A pintura nãotem mais como tema úni-co as cenas religiosas; ago-ra são também retratadosaspectos da vida leiga.

LiteraturaEssa tendência à humanização refletiu-se também na pro-

dução literária da época: surgem textos mais aprimorados deautores que conhecem o latim clássico. Nesse período desen-volvem-se a prosa, a poesia e o teatro popular.

Rep

rodu

ção

Um banqueiro e sua esposa, Quentin Metsys.

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Fernão Lopes é o primeiro historiador português a despre-zar o relato oral e, com objetividade, imparcialidade e rigor, ba-sear-se em várias fontes docu-mentais que compara com espí-rito crítico. Suas crônicas tambémapresentam qualidades literárias:prosa dinâmica, linguagem sim-ples, estilo rico e movimentado.São de sua autoria:

a) Crônica de El-ReiD. Pedro I

b) Crônica de El-ReiD. Fernando

c) Crônica de El-ReiD. João I (1ª e 2ª partes)

Prosa

1) A HistoriografiaNomeado em 1434 guarda-mor da Torre do Tombo, Fernão

Lopes é considerado o pai da História Portuguesa. Em suas crô-nicas ele contou a vida de seus reis, a Revolução de Avis (susten-tada pela burguesia aliada às camadas populares), a expansãoultramarina. Apesar de ser chamado “o historiador da Revolu-ção de Avis”, para ele a história era constituída não só pelasfaçanhas de reis, nobres e cavaleiros, mas também pelos movi-mentos populares (ele chamava o povo de “arraia-miúda” ou “bar-rigas ao sol”) e pelas forças econômicas.

Podemos considerar Fernão Lopes umpioneiro por considerar os movimentospopulares nas narrativas históricas.

Crônica de El-Rei D. João I, deFernão Lopes.

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ção

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CRÔNICA DE D. JOÃO I

D. João I, filho bastardo de D. Pedro I, que o elevou a Mes-tre de Avis com apenas sete anos, ascendeu ao trono por meioduma revolução popular, em 1383-5. Antes disso, reimava oseu meio-irmão, D. Fernando: casado com Leonor Teles, espa-nhola de nascimento, em pouco tempo a perigosa influênciade Castela se fez notar, sobretudo por causa dos amores ilíci-tos entre a rainha e um seu compatriota, o Conde João Fernan-

Conheça agora a Crônica de El-Rei D. João.

Neste pequeno trecho da Crônica de El-Rei D. Pedro I, temosa descrição tanto de suas qualidades quanto de seus defeitos:

“Este Rei D. Pedro era muito gago e foi sempregrande caçador e monteiro1, em sendo infante edepois que foi rei, trazendo grande casa2 decaçadores e moços de monte, e de aves, e decães, de todas as maneiras que para tais jogoseram pertencentes3.Ele era muito viandeiro4, sem ser comedor maisque outro homem; que suas salas5 eram depraça6 em todos os lugares por onde andava,fartas de vianda, em grande abastança.”

Outros cronistas, Gomes Eanes de Zurara e Rui de Pina,sucederam Fernão Lopes no cargo de guarda-mor; no entan-to, inferiores a ele, não tiveram sua visão de conjunto da his-tória portuguesa.

1 caçador de monte / 2 quantidade / 3 próprios /4 apreciador de carnes / 5 banquetes / 6 abertos a todos

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des de Andeiro. Inconformado com a situação, o povo insurge-se contra o trono, comandado pelo Mestre de Avis. Este, vito-riosa a sublevação, é aclamado rei (6-4-1385) e dá início à di-nastia de Avis e a um reinado de profícuas realizações, acimade tudo culturais. O trecho selecionado corresponde a um dosmomentos mais dramáticos da revolta, quando o Mestre Avisassassina o amante de Leonor Teles:

Em outro dia pela manhã partiu o Mestre daquela aldeia udormira, e começou a andar seu caminho, sem trigança algumadesacostumada; e no caminho dizem que descobriu o Mestreesta cousa a alguns seus, convém saber: ao Comendador deJerumenha, e a Fernando Álvares, e a Lourenço Martins de Leiria,e a Vasco Lourenço que depois foi Meirinho, e a Lopo Vasquesque depois foi Comendador mor, e a Rui Pereira que o foi rece-ber. E disse a um deles.

— I-vos diante quanto puderdes e dizei a Álvaro Paes que sefaça prestes, ca eu vou por fazer aquilo que ele sabe.

O escudeiro andou à pressa o recado e tornou-se pêra oMestre onde vinha. E ele trazia uma cota vestida e até venteconsigo com cotas e braçais e espadas cintas como homenscaminheiros; e chegou ao Paço à hora de terça ou pouco mais,sem deter porém em outra parte. E quando descavalgou e co-meçaram de subir acima, disseram uns aos outros mui manso:

— Sede todos prestes, ca o Mestre quer matar o Conde JoãoFernandes.

A Rainha estava em sua câmara e Donas algumas assenta-das no estrado, e o Conde de Barcelos seu irmão, e o CondeDom Álvaro Peres, e Fernando Afonso de Samora, e Vasco Peresde Camões e outros, estavam em um banco; e o Conde JoãoFernandes que dantes estava em cabeceira deles, estava en-tão ante ela e começava de lhe falar passamente. E em lhesendo assi falando, bateram à porta, e o Porteiro como entrouo Mestre, quis cerrar a porta por não entrar nenhum dos seus,

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e disse que o perguntaria à Rainha, não por deles haver nenhu-ma suspeita, mas porque a Rainha estava com dó, e não eracostume de nenhum entrar, salvo esses senhores, sem lho pri-meiro fazer saber. E o Mestre respondeu ao Porteiro:

— Que hás tu assi dizer?

E em esto entrou de guisa, que entraram os seus todos comele; e ele moveu passamente contra onde estava a Rainha; e elase levantou, e todolos outros que eram presentes.

E depois que o Mestre fez reverência à Rainha e mesura atodos, e eles a ele recebimento, disse a Rainha que se assentas-sem, e falou ao Mestre dizendo:

— E pois, irmão que é isto a que tornastes de vosso caminho?

— Tornei, Senhora, disse ele, porque me pareceu que nãoia desembargado como cumpria. Vós me ordenastes que ti-vesse cargo da comarca de Entre Tejo e Odiana, se por ven-tura el-Rei de Castela quisesse vir ao reino e quebrar ostrautos entre vós ele; e porque aquela frontaria é grossa degentes e grandes senhores, assi como do Mestre de Santia-go, e do Mestre de Alcântara e doutros e bons fidalgos; eaqueles que vós assinastes pera a guardarem comigo, meparecem poucos; por ende tornei pera me dardes maisvassalos, pera vos eu poder servir segundo cumpre a minhahonra e vosso serviço.

A Rainha disse que era mui bem, e mandou logo chamarJoão Gonçalves seu Escrivão da Puridade, que visse o livrodos vassalos daquela comarca, e que lhe desse quantos equais o Mestre requeresse, e que fosse logo desembargadode todo. João Gonçalves foi chamado à pressa e foi-se as-sentar com seus escrivães a prover os livros pera desembargaro Mestre.

Em esto começaram de o convidar os Condes cada um persi; e isso mesmo o Conde João Fernandes se aficava mais que

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comesse com ele que os outros. O Mestre não quis tomar convi-te de nenhum, escusando-se per suas palavras, dizendo que játinha prestes de comer que mandara fazer ao seu Vedor; porémdizem que disse mui escusamente ao Conde de Barcelos que onão sentiu nenhum:

— Conde, i-vos daqui, ca eu quero matar o Conde JoãoFernandes.

E que ele respondeu que se não iria, mas estaria i com elepera o ajudar.

— Não sejais, disse o Mestre, mas rogo-vos todavia que vosvades daqui, e me aguardeis pera o jantar; ca eu Deus querendotanto que isto for feito, logo irei comer convosco.

A ventura por melhor azar a morte do Conde João Fernandes,começou de lhe fazer recear a vida do mestre; per tal guisa quelhe pôs em vontade, que mandasse a todolos seus que se fos-sem armar e se viessem pera ele; e de qualquer jeito que foi,partirom-se os seus todos do Paço, assim fidalgos que o acom-panhavam como os outros, e foram-se armar pera se virem perele; e esta foi a razão por que ele ficou só de todos eles, e ne-nhum estava i quando morreu.

A Rainha isso mesmo pôs femença nos do Mestre; e vendo-os assim todos armados, não lhe prougue em seu coração, edisse falando contra todos:

— Santa Maria val! Como os Ingleses hão mui bom costume,que quando são no tempo da paz, não trazem armas, nem cu-ram de andar armados, mas boas roupas e luvas nas mãos comodonzelas; e quando são na guerra, então costumam as armas eusam delas como todo o mundo sabe.

— Senhora, disse o Mestre, é mui grande verdade. Mas issofazem eles porque hão mui amiúde guerras, e poucas vezes paz,e podem-no mui bem fazer; mas a nós é pólo contrário, cahavemos mui amiúde paz e poucas vezes guerra; e se no tempo

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da paz não usarmos as armas, quando viesse a guerra não aspoderíamos suportar.

E falando em isto e em outras cousas, chegavam-se as horasdo comer, e despediu-se o Conde de Barcelos, e desi os outros,ca os mais deles dava a vontade aquilo que se depois fez.

Ficando assim o Conde João Fernandes, gastava-lhe o co-ração, e tornou a dizer ao Mestre:

— Senhor, vós todavia comereis comigo.

— Não comerei, disse o Mestre, ca tenho feito de comer.

— Sim, comereis; disse ele, e enquanto vós falais, irei eu man-dar fazer prestes.

— Não vades, disse o Mestre, ca vos hei de falar uma cousa antes que me vá, e logo me quero ir, que já é horas de comer.

Então se despediu da Rainha, e tomou o Conde pela mãoe saíram ambos da câmara a uma grande casa que era diante,e os do Mestre todos com ele, e Rui Pereira e Lourenço Martinsmais acerca. E chegando-se o Mestre com o Conde acercade uma fresta, sentiram os seus que o Mestre lhe começavade falar passo, e estiveram todos quedos. E as palavras fo-ram entre eles tão poucas e tão baixo ditas, que nenhum porentão entendeu quejendas eras; porém afirmam que foramdesta guisa.

— Conde, eu me maravilho muito de vós serdes homem a queeu bem queria, e trabalhardes vós de minha desonra e morte.

— Eu, senhor! disse ele, quem vos tal cousa disse, mentiu-vos mui grande mentira.

O Mestre que mais vontade tinha de o matar que de estarcom ele em razões, tirou logo um cutelo comprido, e enviou-lheum golpe à cabeça; porém não foi a ferida tamanha que delamorrera, se mais não houvera. Os outros que estavam de arredor,quando viram isto, lançaram logo as espadas fora pera lhe dar, eele movendo pera se colher à câmara da Rainha com aquela

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2) A Prosa DidáticaA prosa didática ou dou-

trinária tinha por objetivoeducar a nobreza para oconvívio social e a guerra. Orei D. Duarte escreveu Ensi-nança de bem cavalgar todasela e Leal Conselheiro;D. João I, O Livro da Monta-ria; e Pero Menino, o Livro daFalcoaria.

ferida, e Rui Pereira que era mais acerca, meteu um estoque dearmas per ele de que logo caiu em terra morto.

Os outros quiseram-lhe dar mais feridas, e o Mestre disseque estivessem quedos, e nenhum foi ousado de lhe mais dar;e mandou logo Fernando Álvares e Lourenço Martins que fos-sem cerrar as portas que não entrasse nenhum e dissessem aoseu Pajem que fosse à pressa pela vila brandando que mata-vam o Mestre, e eles fizeram-no assim.

E era o Mestre quando matou o Conde, em idade de vinte ecinco anos e andava em vinte e seis; e foi morto seis dias dedezembro, era já escrita de quatrocentos e vinte e um.*

(Crônica de D. João I, ed. Pref. Por Antônio Sérgio,2 vols., Porto, Civilização, 1945, Vol. I, cap. IX, pp. 19-22.)

A ilustração mostra como prender um falcão.

*u = onde; trigança = pressa; que se faça prestes = que se prepare;ca = porque; passamente = vagarosamente; de guisa = de modo;trautos = tratos, tratados; assinastes = designastes; ende = isso;

aficava = teimava; mandasse dizer; femença = atenção;contra todos = para todos; prougue = agradou;

val = valha (como na expressão “Valha-me Deus”); desi = depois;vontade = pressentimento; todavia = sempre, completamente;

acerca = próximo de; quejandas = quais; quedos = quietos;era já escrita de quatrocentos e vinte e um = 1383.

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Conheça um pouco sobre D. Duarte e sua prosa doutrinária:

D. Duarte – Filho de D. João I, nasceu em 1391 e faleceu em1438. Subiu ao trono em 1433. A ele se devem os atos que pro-piciaram a Fernão Lopes criar sua notável obra historiográfica.Escreveu o Leal Conselheiro e o Livro da Ensinança de Bem Ca-valgar Toda Sela.

LEAL CONSELHEIRO

Redigida entre 1437 e 1438, esta obra somente foi dada apúblico em 1842. Dividida em cento e três capítulos, consistenuma espécie de tratado moral para a edificação da aristocra-cia, girando em torno de temas fundamentais, como o entendi-mento, a memória, a vontade, o siso, a soberba, a vanglória, ainveja, a sanha, a avareza, a gula, a caridade, o amor, a prudên-cia, etc. A doutrina moral de D. Duarte se resume em fazer aapologia das virtudes e a admoestação dos pecados. Dentre osvários tópicos de que se compõe a obra, escolheu-se o referen-te à saudade, que integra o capítulo XXV:

E a saudade não descende de cada uma destas partes, masé um sentido do coração que vem da sensualidade, e não darazão, e faz sentir às vezes os sentidos da tristeza e do nojo. Eoutros vêm daquelas cousas que a homem praz que sejam, ealguns com tal lembrança que traz prazer e não pena. E em ca-sos certos se mistura com tão grande nojo, que faz ficar em tris-teza. E pêra entender isto, não cumpre ler per outros livros, capoucos acharão que dele falem, mas cada um vendo o que es-crevo, consííre seu coração no que já per feitos desvairados temsentido, e pudera ver e julgar se falo certo.

Pera maior declaração ponho disto exemplos. Se algumapessoa por meu serviço e mandado de mim se parte, e delasinto saudade, certo é que de tal partida não hei sanha, nojo,

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pesar, desprazer nem aborrecimento, ca praz-me de ser, e pe-sar-me-ia se não fosse. E por se partir algumas vezes vem talsaudade, que faz chorar e suspirar, como se fosse de nojo. Eporém me parece este nome da saudade tão próprio, que oLatim nem outra linguagem que eu saiba não é pera tal sentidosemelhante. De se haver algumas vezes com prazer, e outrascom nojo ou tristeza, isto se faz, segundo me parece, por quantasaudade propriamente he sentido que o coração filha por seachar partido da presença de alguma pessoa, ou pessoas quemuito per afeição ama, ou o espera cedo de ser. E isso medesdos tempos e lugares em que per deleitação muito folgou. Digoafeito e deleitação, porque são sentimentos que ao coraçãopertencem, donde verdadeiramente nasce a saudade mais queda razão nem do siso. E quando nos vem alguma lembrançadalgum tempo em que muito folgamos, não geral, mas que tra-ga rijo sentido, e por conhecermos o estado em que somos sertantos melhor, não desejamos tornar a ele por leixar o que pos-suímos, tal lembramento nos faz prazer. E a míngua do desejoper juízo determinado da razão nos tira tanto aquele sentido,que faz a saudade, que mais sentimos a folgança por nos lem-brar o que passamos, que a pena da míngua de tempo ou pes-soa. E aquesta saudade é sentida com prazer mais que comnojo nem tristeza.

Quando aquela lembrança faz sentir grande desejo, outorga-do per toda maior parte da razão, de tornar a tal estado ou con-versação, com esta saudade vem nojo ou tristeza mais que pra-zer. E porque sobre esta lembrança que traz saudade muitosencorrem em pecado, tristeza e desordenança da vontade, lem-brando-lhes por vista de homens e mulheres casadas, cantidas,cheiros, ou per saltamento doutras falas e cuidados algumaspessoas com que houveram algumas folganças quais não deviam,ou puderam compridamente haver como desejavam, e o leixavamde fazer, e por ello lhes vem desejo de tornar a tal estado e con-versação, não havendo reprendimento do mal que fizeram, mas

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hão desprazer do que não cumpriram, estes proveitososavisamentos pensei declarar de boa maneira que devemos terem tal caso.*(Leal Conselheiro, ed. Crit. e anot. por Joseph M. Piel. Lisboa: Bertrand, 1942, pp. 94-96)

* sensualidade = sensibilidade, sensação; nojo = sofrimento; homem = a gente;casos certos = certos casos; ca = pois; consiire = considere; feitos desvairados =

circunstâncias diversas; ca praz-me de ser = pois me agrada de haver-me separado;porém = por isso; espera cedo de ser = espera de cedo separar-se; medes= mesmo

( ou seja: a saudade viria do afastamento dos lugares e tempos em que a pessoa foifeliz); siso = juízo; não geral, mas que traga rijo sentido = não vaga, mas

determinada; míngua = diminuição; desordenança = perturbação; saltamento =associação; ello = isso; reprendimento = arrependimento, remorso; proveitosos

avisamentos = D Duarte tece, a seguir, considerações acerca de como vencer o apeloda saudade mórbida por meio do exercício da vontade.

A Poesia PalacianaSe, por mais ou menos um século, com a decadência do feu-

dalismo a poesia enfrentou uma séria crise, quase desaparecen-do, a partir de 1450 hou-ve novas condiçõespara seu florescimento:uma vida cultural maisintensa na corte, estímu-lo aos poetas e procurade novas formas depassatempo.

Dois fatos marcaram a poesia desse período:

a) a poesia separa-se do canto e da dança. Por isso o poetadeve encontrar novos recursos para conseguir musi-calidade por meio da própria linguagem. Em conseqüên-cia, as poesias apresentam maior elaboração formal e lin-guagem mais rica que as cantigas trovadorescas;

b) a partir de 1487, com a introdução da imprensa em Portugal,os poemas são impressos, podendo ser lidos (e não maissomente ouvidos) por um maior número de pessoas.

O mote, em geral, é obrigatório napoesia palaciana e constitui-se numaestrofe de quatro ou cinco versos quefornece o tema e funciona como umestímulo verbal, de sentido cortês, mo-ral ou satírico.

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CANTIGA SUA PARTINDO-SE

Senhora, partem tão tristes

meus olhos por vós, meu bem,

que nunca tão tristes vistes

outros nenhuns por ninguém.

Grande parte dessa produção literária foi compilada epublicada em 1516 sob o nome de Cancioneiro Geral, porGarcia de Resende. Na temática, predomina o lirismo senti-mental com influência do humanista italiano Petrarca(1304-1374); na forma, aparecem o verso de sete sílabas (redondilhamaior) e o de cinco (redondilha menor). A mulher, que foraidealizada no Trovadorismo, transforma-se num ser mais con-creto, mais humano. Observe este texto de João Ruiz de Cas-telo Branco:

Tão tristes, tão saudosos,

tão doentes da partida,

tão cansados, tão chorosos,

da morte mais desejosos

cem mil vezes que da vida.

Partem tão tristes os tristes,

tão fora d’esperar bem,

que nunca tão tristes vistes

outros nenhuns por ninguém.(João Ruiz de Castelo Branco. In Alexandre Pinheiro (org.)

Antologia da Poesia Portuguesa. Porto: Lello e Irmão, 1977)

As redondilhas estãopresentes em textos de to-das as épocas posterioresao Humanismo. No Brasil,são grandes representantesGonçalves Dias, Oswald deAndrade e Chico Buarquede Holanda.

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Senhoras, se algum senhorVos quiser bem ou servirQuem tomar tal servidorEu lhe quero descobrirO galardão do amor.Por Sua Mercê saberO que deve de fazer,Vej’o que fez esta dama,Que de si vos dará fama,Se estas trovas quereis ler.

Fala de D. Inês

Qual será o coraçãoTão cru e sem piedadeQue lhe não cause paixãoUma tam grã crueldade?Triste de mim, inocente,Que por ter muito ferventeLealdade, fé, amor,O príncipe, meu senhor,Me mataram cruelmente!

Quanto à forma, o verso utilizado é a redondilha maior,que lhe confere o ritmo murmurante sublinhado pelas rimase pela repetição. Pelo vocativo “senhora”, percebe-se a in-fluência da cantiga de amor, mas a mulher já não é inatingí-vel, observe o outro vocativo, “meu bem”. A relação amoro-sa está no nível das realidades concretas: individualizada,emocional. Pela exploração do tema da partida do ser ama-do, percebe-se a influência da cantiga de amigo. Mas o eu-lírico é masculino.

É importante salientar que, tanto a prosa histórica de FernãoLopes, que exalta o sentimento de coletividade e de nacionalis-mo, quanto o amor cantado na poesia palaciana prenunciam oaparecimento da grande epopéia portuguesa, Os Lusíadas, deCamões, que neles encontrou farto material.

Conheça um belíssimo trabalho de Garcia de Resende emhomenagem à morte de D. Inês de Castro:

TROVAS À MORTE DED. INÊS DE CASTRO

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A minha desaventuraNão contente de acabar-me,Por me dar maior tristuraMe foi pôr em tanta alturaPara d’alto derribar-me;Que, se me matara alguémAntes de ter tanto bem,Em tais chamas não ardera,Pai, filhos, não conhecera,nem me chorara ninguém.

Eu era moça, menina,Por nome dona Inêsde Castro, e de tal doutrinae virtude, que era dinade meu mal ser ao revés.Vivia sem me lembrarQue paixão podia darNem dá-la ninguém a mim:Foi-me o príncipe olhar,por seu nojo e minha fim!

Começou-me a desejar,Trabalhou por me servir,Fortuna foi ordenarDous corações conformarE ~ua vontade vir.Conheceu-me, conheci-o,Quis-me bem e eu a ele,Perdeu-me, também perdi-o,Nunca até à morte foi frioO bem que, triste, pus nele.

Dei-lhe minha liberdade,Não senti perda de fama;

Pus nele minha verdade,Quis fazer sua vontade,Sendo mui fremosa dama.Por me estas obras pagarNunca jamais quis casar;Pelo qual, aconselhadoFoi el-Rei que era forçado,Pólo seu, de me matar.

Estava mui acatada,Como princesa servida,Em meus paços mui honrada,De tudo mui abastada,De meu senhor mui querida.Estando mui de vagar,Bem fora de tal cuidar,Em Coimbra d’assossego,Pelos campos de MondegoCavaleiros vi somar.

Como as cousas que hão de serLogo dão no coração,Comecei entristecerE comigo só dizer:“Estes homens d’onde irão?”e tanto que perguntei,soube logo que era el-Rei:quando o vi tão apressado,meu coração trespassadofoi, que nunca mais falei.

E quando vi que descia,Saí à porta da sala;Devinhando o que queria,Com grã choro e cortesia

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Lhe fiz ~ua triste fala.Meus filhos pus derredorDe mim, com grã humildade;Mui cortada de temor,Lhe disse: “havei, Senhor,Desta triste piedade!

Não possa mais a paixãoQue o que devias fazer;Meteis nisso bem a mão,Que é de fraco coraçãoSem porquê matar mulher;Quanto mais a mim, que dãoCulpa não sendo razão,Por ser mãe dos inocentes,Que ante vós estão presentes,Os quais vossos netos são.

E têm tão pouca idadeque, se não forem criadosde mim, só com saudadee sua grã orfandade,morreram desamparados.Olhe bem quanta cruezaFará nisto Vossa Alteza,E também, Senhor, olhai,Pois do príncipe sois pai,Não lhe deis tanta tristeza!

Lembre-vos o grande amorQue me vosso filho tem,E que sentirá grã dorMorrer-lhe tal servidor,Por lhe querer grande bem.Que, se algum erro fizera,

Fora bem que padeceraE que estes filhos ficaramÓrfãos tristes, e buscaramQuem deles paixão houvera;

Mas, pois eu nunca erreiE sempre mereci mais,Deveis, poderoso rei,Não quebrantar vossa leiQue, se moiro, quebrantais.Usai mais de piedadeQue de rigor nem vontade;Havei dó, Senhor, de mim,Não me deis tão triste fimPois que nunca fiz maldade!”

El-Rei, vendo como estava,Houve de mim compaixãoE viu o que não olhava:Que eu a ele não erravaNem fizera traição.E vendo quão de verdadeTive amor e lealdadeAo príncipe, cuja sam,Pôde mais a piedadeQue a determinação.

Que, se m’ele defenderaQue a seu filho não amasse,E lh’eu não obedecera,Então com razão puderaDar-me a morte que ordenasse;Mas, vendo que nenh ~u’hora,– dês que nasci até’gora –nunca nisso me falou,

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quando se disto lembrou,foi-se póla porta afora,

Com seu rosto lacrimoso,co propósito mudado,muito triste, mui cuidosocomo rei mui piedoso,mui cristão e esforçado.Um daqueles que traziaConsigo na companhia,Cavaleiro desalmado,Detrás dele mui irado,Estas palavras dizia:

— “Senhor, vossa piedadeÉ dina de reprender,Pois que, sem necessidade,mudaram vossa vontadeLágrimas d’ ~ua mulher.E quereis que abarregado,Com filhos, como casado,Este, Senhor, vosso filho?De vós mais me maravilhoQue dele que é namorado!

Se a logo não matais,Não serei nunca temidoNem farão o que mandais,Pois tão cedo vos mudaisDo conselho que era havido.Olhai quão justa querelaTendes, pois por amor delaVosso filho que estarSem casar, e nos quer darMuita guerra com Castela.

Com sua morte escussareisMuitas mortes, muitos danosVós, Senhor, descansareis,E a vós e a nós dareisPaz para duzentos anos:O príncipe casará,Filhos de bênção terá,Será fora de pecado;Que agora seja anojadoAmanhã lh’esquecerá!”

E, ouvindo seu dizer,El-Rei ficou muito torvado,Por se em tais extremos verE que havia de fazerOu um ou outro, forçado.Desejava dar-me vida,Por não lhe ter merecidaA morte nem nenhum mal:Sentia pena mortalPor ter feito tal partida.

E vendo que se lhe davaA ele toda esta culpa,E que tanto o apertava,Disse àquele que bradava:— “Minha tenção me desculpase o vós quereis fazer,fazei-o sem mo dizer,que eu nisso não mando nada,nem vejo essa coitadapor que deva de morrer.”

Fim

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* fama = notícia, exemplo; fervente = ardente; doutrina = educação; era dina / demeu ser o revés = era digna / de merecer sorte contrária; cru = cruel; crueza =

crueldade; pólo seu = pela necessidade de preservar a sucessão do poder na pessoade D. Pedro; de vagar = calma; somar = assomar; comigo só dizer = dizer a mim

próprio; vontade = arrebatamento; e viu o que não olhava = percebeu o que nãohavia entendido antes; cuja sam = de quem sou, a quem pertenço; determinação =

ordem, resolução (isto é, de assassinar Inês); ele me defendera / ca seu filho namamasse = ele me proibira / de amar seu filho; dês = desde; necessidade = motivo

justo; abarregado = amasiado; este = esteja; me maravilho = me espanto; querela =queixa; filhos de bênção = filhos legítimos; qu’agora seja anojado = ainda que agora

possa sofrer; um ou outro = perdoar ou não; tal partido – ter partido para Coimbra.

Dous cavaleiros irosos,Que tais palavras lh’ouviram,Mui crus e não piedosos,Perversos, desamorosos,Contra mim rijo se viram; comas espadas na mão,Me atravessam o coração,A confissão me tolheram.Este é o galardãoQue meus amores me deram.*

O tema Inês de Castro,estendendo-se do séculoXV até nossos dias, é enfo-cado por vários escritores:Rui de Pina, Garcia de Re-sende, Antonio Ferreira,Júlio de Castilho e muitosoutros.

O TeatroAté o Humanismo não se tinham produzido

textos especialmente elaborados para a repre-sentação teatral. Na Idade Média só houve en-cenações religiosas para as festas de Pás-coa e Natal. Foi Gil Vicente (1502?-1537?)que, em 1502, com o Monólogo do Va-queiro (ou Auto da Visitação), escrito emcastelhano, fundou o teatro português.Nesse auto, declamado nos aposentosda rainha, ele saúda o nascimento dofuturo rei D. João III, filho de D. Manuel ede D. Maria.

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Gil Vicente

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Sua produção, basicamente caracterizada pela sátira, constade 44 peças (17 em português, 11 em castelhano e 16 bilíngües).Através de uma galeria de tipos – o fidalgo decadente, o escudei-ro fanfarrão, o velho apaixonado, o usurário, o judeu, a alcoviteira,a mulher adúltera, a velha beata, o lavrador que abandona o cam-po em busca de riqueza na cidade, magistrados, bispos, reis – GilVicente passa em revista e satiriza a sociedade do seu tempo. Elesó poupa um tipo: o lavrador que dá o sustento a todos, mas é avítima mais explorada de toda a estrutura social.

Pode-se classificar suas peças em três fases:

a) de 1502 a 1508 – início de sua produção, sob influênciado castelhano Juan del Encina, fase composta de peçasde conteúdo religioso: Auto da Visitação, Auto PastorilCastelhano, Auto de São Martinho, Auto dos Reis Magos.

b) de 1508 a 1516 – peças de sátira social. São dessa fasealgumas de suas obras-primas:

Quem tem Farelos? – escudeiro pobre quer namorar umamoça, mas é enxotado pela mãe dela.

Auto da Índia – mulher engana o marido enquanto ele estáfora.

O velho da Horta – velho ridículo apaixona-se repentina-mente por uma jovem.

c) de 1516 a 1536 – fase de maturidade intelectual, além dacrítica social, aparecem atitudes moralizantes medievais.São dessa fase:

• Farsa de Inês Pereira – desenvolvimento do dito popular“Mais quero asno que me carregue, que cavalo que mederrube” – mulher que quer casar, depois de rejeitar ofilho de um camponês, casa-se e sofre nas mãos de umescudeiro ciumento (o cavalo fogoso que a derrubou).Viúva, aceita de volta o primeiro pretendente, um tolo.Agora experiente, a moça começa a flertar com um ermitão

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Ilustração de Auto da Barcado Inferno, de Gil Vicente

Este trecho do Auto da Barca doInferno dá uma idéia da riqueza do tea-tro de Gil Vicente: a alma de um fidalgochega ao porto onde ocorre o juízo final,que determina em qual barca a alma deve seguir. Observe a crítica ànobreza, a perfeição formal (todos os versos são redondilhas maio-res), o frescor da sátira ao fidalgo que pensa merecer o céu não porsuas ações, mas porque deixou alguém rezando por ele na Terra.

e é o marido que a leva,sem saber, ao amante.Para chegar ao destino,eles devem atravessarum rio. A fim de que elanão se molhe, o maridoa leva às costas (o asnoque a carregou).

• Auto da Lusitânia –uma fantasia alegóricaque começa contan-do as preocupaçõesde uma família judiae, na segunda parte,narra o casamentode Portugal com a prince-sa Lusitânia.

• Trilogia das Barcas (Autoda Barca do Inferno, Autoda Barca do Purgatório,Auto da Barca da Glória)– as almas dos mortos es-tão à espera das embar-cações que as levarão aodestino final.

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Diabo: Ó precioso Dom Anrique!Cá vindes vós? Que cousa é esta?

Fidalgo: Esta barca onde vai ora,qu’assim está apercebida1?

Diabo: Vai pera2 a Ilha perdida3,e há de partir logo essora4.

Fidalgo: Pera lá vai a senhora5?

Diabo: Senhor, a vosso serviço.

Fidalgo: Parece-me isso cortiço6.

Diabo: Porque a vedes lá de fora.

Fidalgo: Porém a que terra passais?

Diabo: Pera o Inferno, senhor.

Fidalgo: Terra é bem sem sabor.

Diabo: Que! E também cá zombais?7

Fidalgo: E passageiros achaispera tal habitação?

Diabo: Vejo-vos eu em feiçãoPera ir ao nosso cais.

Fidalgo: Parece-te a ti assi8.

Diabo: Em que esperas ter guarida9?

Fidalgo: Que deixo na outra vidaQuem reze sempre por mi10.

Diabo: Quem reze sempre por ti?Hi hi hi hi hi hi hi.E tu viveste a teu prazer,Cuidando cá guarecer11,porque rezam lá por ti?Embarcai, hou, embarcai,

1 aparelhada2 para3 eufemismo paradesignar o inferno4 esta hora

5 o Fidalgo, por cortesia,trata a barca de senhora

6 muito leve, poucoaparelhado para viajar

7 o Fidalgo faziazombarias mesmodepois de morto

8 assim

9 proteção, refúgio

10 mim

11 salvar-se

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qu’haveis d’ir à derradeira12.Mandai meter a cadeira13,qu’assi passou vosso pai.14

Fidalgo: Que, que, que! E assi lhe vai?

Diabo: Vai ou vem, embarcai prestes15:Segundo lá16 escolhestes,assi cá vos contentai.Pois que já a morte passastes,Haveis de passar o rio.

Fidalgo: Não há aqui outro navio?

Diabo: Não, senhor, qu’este fretastes,17

E já quando espirastes,Me tínheis dado sinal18.

Fidalgo: Que sinal foi esse tal?

Diabo: Do que vós vos contentastes.19

Fidalgo: A est’outra barca20 me vou.Ou da barca! Pera onde is?Ah barqueiros, não m’ouvis?Respondei-me. Hou lá, hou!Por Deos, aviado21 estou:cant’a isto é já pior.Que gericocins22, salvanor23!Cuidam cá que sou eu grou24!

Anjo: Que mandais?

Fidalgo: Que me digais,pois parti tão sem aviso,25

se a barca do Paraísoé esta em que navegais.

12 de qualquer maneira13 define a posição socialda personagem14 o pai do Fidalgotambém tinha merecido oinferno

15 com presteza, rapidez16 o Diabo refere-se àTerra

17 o Fidalgo tinha feito,em vida, tudo paramerecer o inferno18 pagamentoadiantando. O demôniorefere-se aos pecados doFidalgo

19 os pecados que tantoderam prazer ao Fidalgo20 o Fidalgo refere-se àbarca do Paraíso

21 apressado

22 jerico (asno) + rocim(cavalo pequeno e fraco)23 com licença24 indivíduo pertencenteàs camadas sociais maisbaixas

25 morri subitamente

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Anjo: Esta é; que lhe buscais?

Fidalgo: Que me leixeis26 embarcar:sou fidalgo de solar27,é bem que me recolhais.

Anjo: Não se embarca tiranianeste batel divinal.

Fidalgo: Não sei por que haveis por malqu’entre minha senhoria.

Anjo: Pera vossa fantesia28

mui pequena é esta barca.

Fidalgo: Pera senhor de tal marcaNão há aqui mais cortesia?Venha a prancha e o atavio29;Levai-me desta ribeira.

Anjo: Não vindes vós de maneiraPera entrar neste navio.Ess’outro vai mais vazio,a cadeira entrará,E o rabo30 caberá,e todo vosso senhorio.Ireis lá mais espaçoso,vós e vossa senhoria,contando da tirania,de que éreis tão curioso.E porque de generoso31

desprezastes os pequenos;achar-vos-eis tanto menos,quanto mais fostes fumoso32.

(Obras completas de Gil Vicente.Lisboa: Sá da Costa, 1942)

26 deixeis27 fidalgo de nobrelinhagem

28 vaidade, presunção

29 enfeite, ornamento

30 manto de longa caudaque o Fidalgo usava

31 sendo nobre

32 vaidoso, presunçoso

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Transcrevemos a seguir fragmento da Farsa de Inês Pereiraque apresenta o diálogo da primeira entrevista entre Inês e seuingênuo pretendente:

VEM PÊRO MARQUES E DIZ:

Homem que vai aonde eu vouNão se deve de correr;Ria embora quem quiser,Que eu em meu siso estou.Não sei onde mora aqui:Olhai que me esquece a mi!Eu creio que nesta rua,E esta parreira é sua,Já conheço que é aqui.

Chega a casa de Inês Pereira

Digo que esteis muito embora,Folguei ora de vir cá,Eu vos escrevi de láUma cartinha senhora;E assim que de maneira...

Mãe Tomai aquela cadeira.

Pêro E que val aqui uma destas?

Inês Ó Jesus! Que João das bestas!Olhai aquela canseira!

Assentou-se com as costas para elas, e diz:

Eu cuido que não estou bem:

Mãe Como vos chamais amigo?

Pêro Eu Pêro Marques me digo,Como meu pai que Deus tem:Faleceu perdoe-lhe Deus,

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Que fora bem escusado,E ficamos dous eréusPorém meu é o morgado.

Mãe De morgado é vosso estado!Isso viria dos céus!

Pêro Mais gado tenho eu já quanto,E o maior de todo o gado,Digo maior algum tanto.E desejo ser casado,Proguesse ao Espírito Santo,Com Inês; que eu m’espantoQuem me fez seu namorado.Parece moça de bem,E eu de bem, er também,Ora vós er ide vendoSe lhe vem melhor ninguém,A segundo o que eu entendo.Cuido que lhe trago aquiPêras da minha pereiraHão d’estar na derradeira.Tende ora, Inês, per hi.

Inês Hei isso de ter na mão?

Pêro Deitai as peias no chão.

Inês As perlas pera enfiarTrês chocalhos e um novelo,E as peias no capelo:E as pêras onde estão?

Pêro Nunca tal me aconteceu:Algum rapaz mas comeu;Que as meti no capelo,E ficou aqui o novelo,E o pente não se perdeu:Pois trazia-as de boa mente.

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Inês Fresco vinha aí o presenteCom folhinhas borrifadas!

Pêro Não que elas vinham chentadasCá em fundo no mais quente.Vossa mãe foi-se? Ora bem!Só nos deixou ela assi?Cant’eu quero me ir daqui,Não diga algum demo alguém...

Inês vós que me havíeis de fazer,Nem ninguém que há de dizer?O galante desejado!

Pêro Se eu fora já casado,Doutra arte havia de ser,Como homem de bom pecado.

Inês Quão desviado este está!Todos andam por caçarSuas damas sem casar,E este, tomade-o lá!

Pêro Vossa mãe é lá no muro?

Inês Minha mãe e vós seguroQue ela venha cá dormir.

Pêro Pois, senhora, eu quero me irAntes que venha o escuro.

Inês E não cureis mais de vir.

Pêro Virá cá Leonor Vaz,Veremos que lhe dizeis.

Inês Homem, não aporfieis,Que não quero nem me praz;Ide casar a Cascais.

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Pêro Não vos anojarei mais,Ainda que saiba estalar;E prometo não casarAté que vós não queirais.Estas vos são elas a vós:Anda homem a gastar calçado,E quando cuida, que é, aviado,Escarnefucham de vós!Creio que lá fica a peia:Pardeus! Bom ia eu “a aldeia.Senhora, cá fica o fato.

Inês Olhai se o levou o gato...

Pêro Inda não tendes candeia?Ponho per cajo que alguémVem como eu vim agora,E vós a escuras a tal horaParece-vos que será bem?Ficai-vos ora com Deus:Cerrai a porta sobre vósCom vossa candeiazinha;E siquais serei vós minha,Entonces veremos nós. *

(Obras Completas de Gil Vicente, 6 vols.Lisboa: Sá da Costa, 1942-1944, vol V, pp..232-236)

* João das Bestas = tolo; olhai aquela canseira = olhai que o homem enfadonho;eréus = herdeiros; e eu de quem, er também = e eu também sou homem de bem; er

= isso; tende ora , Inês, per hi = Inês, segurai isto aí; peias = laços; chentadas =plantadas, assentes; cant’eu = quanto a mim; não diga algum demo alguém = não

diga alguém alguma coisa; despejado = atrevido; anojarei = enfadarei; estalar =estourar; aviado = correspondido; escarnefucham = escarnecem; ponho per cajo =

suponho por caso; siquais = se porventura.

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Questões de Vestibular

1 (UNESP)“Coração, já repousavas,já não tinhas sojuçãojá vivias, já folgavas;pois por que te sojugavasoutras vez, meu coração?

Sofre, pois te não sofrestena vida que já vivias;sofre, pois te tu perdeste;sofre, pois não conhecestecomo t’outra vez perdias!

Sofre, pois já livre estavase quiseste sojeição;sofre, pois te não lembravasdas dores de qu’escapavas;sofre, sofre, coração!”

A literatura portuguesa é fértil em obras onde se reúnem composiçõespoéticas de diversos autores, obras a que normalmente se dá o nomegeral de cancioneiros. E é através deles que se pode ter uma idéiaexata da evolução da poesia nos primeiros quatro séculos de literaturapeninsular, nomeadamente da passagem da poesia trovadoresca, comseus cenários simples e seu universo rural, para a poesia palaciana, quenos mostra jogos verbais e conceptuais mais elaborados.A composição acima transcrita é de um cancioneiro famoso, publica-do em 1516.Assinale, nas alternativas abaixo indicadas, o cancioneiro a que pertence.a) Cancioneiro popular;b) Cancioneiro alegre, de Camilo Castelo Branco;c) Cancioneiro da Vaticana;d) Cancioneiro de Luis Franco Correia;e) Cancioneiro geral de Garcia de Resende;

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2 (UNESP)“Então se despediu da Rainha, e tomou o conde pela mão, saíramambos da câmara a uma grande casa que era diante, e os do Mes-tre todos com ele, e Rui Pereira e Lourenço Martins mais acerca. Echegando-se o Mestre com o Conde acerca duma fresta, sentiramos seus que o Mestre lhe começava a falar passo, e estiveram to-dos quedos. E as palavras foram entre eles tão poucas, e tão baixoditas, que nenhum por então entendeu quejandas eram. Porém afir-mam que foram desta guisa:– Conde, eu me maravilho muito de vós serdes homem a que eu bemqueria, e trabalhardes-vos de minha desonra e morte!– Eu, Senhor? disse ele. Quem vos tal cousa disse, mentiu-vos muigrã mentira.O Mestre, que mais tinha vontade de o matar, que de estar com eleem razões, tirou logo um cutelo comprido e enviou-lhe um golpe àcabeça; porém não foi a ferida tamanha que dela morrera, se maisnão houvera.Os outros todos, que estavam de arredor, quando viram isto, lança-ram logo as espadas fora, para lhe dar; e ele movendo para se acolherà câmara da Rainha, com aquela ferida; e Rui Pereira, que era maisacerca, meteu um estoque de armas por ele, de que logo caiu emterra, morto.Os outros quiseram-lhe dar mais feridas, e o Mestre disse que estives-sem quedos, e nenhum foi ousado de lhe mais dar.”

O texto transcrito acima é de Fernão Lopes e pertence à Crônica deD. João I.As crônicas de Fernão Lopes caracterizam-se por tentarem reproduzira verdade histórica como se esta tivesse sido testemunhada. Por ou-tro lado, é com Fernão Lopes que a língua portuguesa inicia o percur-so da sua modernidade.

Nestes termos, assinale, nas alternativas abaixo indicadas, a que me-lhor caracteriza o trecho transcrito da Crônica de D. João I.

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a) Narração realista e dinâmica que quase nos faz visualizar os acon-tecimentos.

b) Fidelidade absoluta aos acontecimentos históricos.c) Utilização de uma linguagem elevada, de acordo com a reprodução

dos fatos históricos.d) Preocupação em mencionar os nomes de todas as pessoas pre-

sentes à morte do Conde.e) Exaltação do feito heróico do Mestre ao matar o inimigo do Reino.

3 (F. Objetivo-SP) Seu teatro caracteriza-se, antes de tudo, por ser pri-mitivo, rudimentar e popular, muito embora tenha surgido e se tenhadesenvolvido no ambiente da Corte, para servir de entretenimento nosanimados serões oferecidos pelo Rei. Entre suas obras destacam-seMonólogo do Vaqueiro, Floresta de Enganos, O velho da Horta, Quemtem Farelos?. Trata-se de:a) Martins Pena d) Artur Azevedob) José de Alencar e) Sá de Mirandac) Gil Vicente

4 (FUVEST-SP) Aponte a alternativa correta em relação a Gil Vicente:a) Compôs peças de caráter sacro e satírico.b) Introduziu a lírica trovadoresca em Portugal.c) Escreveu a novela Amadis de Gaula.d) Só escreveu peças em português.e) Representa o melhor do teatro clássico português.

5 (UM-SP) Assinale a alternativa em que se encontra uma afirmaçãoincorreta sobre a obra de Gil Vicente:a) Sofre influência de Juan del Encina, principalmente no teatro pasto-

ril de sua primeira fase.b) Seus personagens representam tipos de uma vasta galeria de es-

tratos da sociedade portuguesa da época.c) Por viver em pleno Renascimento, apega-se aos valores greco-ro-

manos, desprezando os princípios da Idade Média.

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d) Um dos maiores valores de sua obra é ter contrabalançado umasátira contundente com o pensamento cristão.

e) Suas obras-primas, como a Farsa de Inês Pereira, são escritas naterceira fase de sua carreira, período de maturidade intelectual.

6 (FUVEST-SP) Caracteriza o teatro de Gil Vicente:a) a revolta contra o cristianismo;b) a obra escrita em prosa;c) a elaboração requintada dos quadros e cenários apresentados;d) a preocupação com o homem e com a religião;e) a busca dos conceitos universais.

7 (UNIP-SP) Seu teatro caracteriza-se, antes de tudo, por ser primitivo,rudimentar e popular, muito embora tenha surgido e se desenvolvidono ambiente da corte, para servir de entretenimento nos animadosserões oferecidos pelo Rei. Entre suas obras destacam-se Monópoliodo Vaqueiro, Floresta de Enganos, O Velho da Horta, Quem temFarelos? Trata-se de:a) Martins Pena d) Artur Azevedob) José de Alencar e) Sá de Mirandac) Gil Vicente

8 (FUVEST-SP) Texto para as questões A e B.Todo o Mundo – Folgo muito d’enganar

e mentir nasceu comigo.Ninguém – Eu sempre verdade digo

sem nunca me desviar(Berzebu para Dinato)

Berzebu – Ora escreve lá, compadre,não sejas tu preguiçoso!

Dinato – Quê?Berzebu – Que Todo o Mundo é mentiroso

e Ninguém diz a verdade.(Auto da Lusitânia – Gil Vicente)

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A. No texto, Todo o Mundo e Ninguém constituem tipos:

a) arcaicos d) políticosb) alegóricos e) religiososc) amorais

B. O texto afirma que:

a) Todo o Mundo é mentiroso.b) Ninguém é mentiroso.c) Todo o Mundo diz a verdade.d) Ninguém diz a verdade.e) Todo o Mundo é mentiroso.

9 (FUVEST-SP) Na Farsa de Inês Pereira, Gil Vicente:a) retoma a análise do amor do velho apaixonado, desenvolvida em O

velho da horta.b) mostra a humilhação da jovem que não pode escolher seu marido,

tema de várias peças desse autor.c) denuncia a revolta da jovem confinada aos serviços domésticos, o

que confere atualidade à obra.d) conta a história de uma jovem que assassina o marido para se livrar

dos maus-tratos.e) aponta, quando Lianor narra as ações do clérigo, uma solução reli-

giosa para a decadência moral de seu tempo.

10 (UM-SP) Leia as três afirmações abaixo a respeito da Farsa de InêsPereira.

II – Pode ser colocada como representante do teatro de costumesvicentino.

III – Encaixa-se na tradição da farsa medieval sobre o adultério femi-nino desenvolvida por Gil Vicente.

III – Inês Pereira é uma moça que vive na vila e pretende subir decondição.

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a) Todas estão corretas.b) Todas estão incorretas.c) Apenas a I e a II estão corretas.d) Apenas a I e a III estão corretas.e) Apenas a II e a III estão corretas.

11 (UNESP) Vem o Anjo Custódio com a Alma e diz:

Anjo

Alma humana formadaDe nenhua cousa, feitaMui preciosa,De corrupção separada,E esmaltadaNaquella frágoa perfeitaGloriosa;Planta neste valle postaPera dar celestes floresOlorosas,E pera serdes trespostaEm a alta costaOnde se crião primoresMais que rosas;Planta sois e caminheira,Que ainda que estais, vos isDonde viestes.Vossa patria verdadeiraHe ser herdeiraDa glória que conseguis:Andae prestes.”

O texto acima transcrito pertence ao autor teatral de maior destaquena literatura portuguesa. Pelo próprio texto se pode identificar a épocaem que foi escrito. Assim, assinale, em uma das alternativas, a relaçãoépoca-autor a que o texto pertence:

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a) teatro medieval – Gil Vicenteb) teatro clássico – Luís de Camõesc) teatro romântico – Almeida Garretd) teatro naturalista – Teixeira de Queiróse) teatro moderno – Almada-Negreiros

“Entra Todo o Mundo, homem como rico mercador, e faz que andabuscando alguma cousa que se lhe perdeu; e logo após ele um ho-mem vestido como pobre. Este se chama Ninguém, e diz:

Nin. Que andas tu aí buscando?

Tod. Mil cousas ando a buscar:delas não posso achar,porém ando perfiando,por quão bom é perfiar.

Nin. Como hás nome cavaleiro?

Tod. Eu hei nome Todo o Mundo,e meu tempo todo inteirosempre é buscar dinheiro,e sempre nisto me fundo.

Nin. E eu hei nome Ninguéme busco a consciência.”

12 (CESCEA) O fragmento acima é de autoria de:a) Garrett d) Camõesb) Sá de Miranda e) não seic) Gil Vicente

13 (CESCEA) Uma das obras seguintes é de autoria de Fernão Lopes.Indique-a:a) Crônica d’el Rei D. Pedro d) Crônica de D. Duarteb) Crônica de D. João II e) não seic) Crônica de D. Dinis

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14 (CESCEA) Fernão Lopes distinguiu-se, na Literatura Portuguesa, por:a) ter introduzido a “medida nova” na poesia quinhentista.b) ter sido o primeiro historiador da Língua.c) ter escrito crônicas acerca dos conflitos ultramarinos.d) ter sido o presuntivo autor do Amadis de Gaula.e) não sei.

15 (UM-SP) Assinale a alternativa incorreta a respeito da obra de GilVicente.a) Embora servisse para o entretenimento da Corte, seu teatro carac-

teriza-se por ser primitivo, rudimentar e popular.b) Algumas de suas peças têm caráter misto, de oscilante classifica-

ção como o Auto dos Quatro Tempos.c) Apresenta-se como traço de união entre a Idade Média e a Renas-

cença.d) Ao lado da sátira, encontram-se elevados valores cristãos.e) Aprofunda-se nos valores clássicos, seguindo rigidamente os pa-

drões do teatro grego.

16 (FUVEST-SP) Indique a afirmação correta sobre o Auto da Barca doInferno, de Gil Vicente:a) É intrincada a estruturação de suas cenas, que surpreendem o pú-

blico com o inesperado de cada situação.b) O moralismo vicentino localiza os vícios não nas instituições, mas

nos indivíduos que as fazem viciosas.c) É complexa a crítica aos costumes da época, já que o autor é o

primeiro a relativizar a distinção entre o Bem e o Mal.d) A ênfase desta sátira recai sobre as personagens populares, as mais

ridicularizadas e as mais severamente punidas.e) A sátira é aqui demolidora e indiscriminada, não fazendo referência

a qualquer exemplo de valor positivo.

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CLASSICISMO(1527-1580)

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Inspirado na mitologia clássica, Sandro Botticelli representa a deusa Vênus grávida,simbolizando a fertilidade da natureza, e as três Graças vestidas de véustransparentes, que dançam diante de Mercúrio, o deus do comércio. As formashumanizadas e a referência mitológica serão características do Renascimento.

A primavera, de Botticelli.

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CLASSICISMO: século XVI

CONTEXTO HISTÓRICO: ascensão da burguesiacentralização do poderReforma ProtestanteGrandes Navegaçõesinvenções e progresso científico

CARACTERÍSTICAS: culto e imitação dos clássicosneoplatonismomitologia greco-latinaantropocentrismoracionalismolinguagem eruditadolce stil nuovo

AUTORES: CamõesSá de MirandaAntônio FerreiraJoão de BarrosFernão Mendes PintoBernardim RibeiroSamuel UsqueFrei Heitor PintoFrei Amadis Arrais

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O Classicismo ou Quinhentismo inicia-se em 1527, quandoSá de Miranda regressa de sua viagem de seis anos à Itália, tra-zendo novidades estéticas. Termina em 1580, ano da morte deCamões, quando Portugal é dominado pela Espanha. Nesse mo-vimento, que pregava a imitação dos modelos greco-romanos,desenvolveram-se a poesia (lírica e épica), a historiografia, a lite-ratura de viagens, a novelística, a prosa doutrinária e o teatro.

Contexto HistóricoDá-se o nome de Renascimento ao período de supervalorização

da cultura clássica, compreendido entre os séculos XV e XVI e cor-respondente ao Classicismo em literatura. Resultado do triunfo docomércio baseado na moeda e no crédito sobre o antigo sistemamedieval de tráfico por permuta, o Renascimento foi uma época deintensas transformações (políticas, econômicas e culturais), em cujabase estava a ascensão da burguesia, que representava o prestígioadquirido pelo próprio esforço e talento. Mas somente com umgoverno forte esse desenvolvimento econômico poderia efetivar-se; adveio, daí, a centralização do poder na figura do rei.

O Renascimento foi marcado pelas grandes navegações,pelas invenções (pólvora, imprensa, papel, mapa-múndi, reló-gio), por uma visão mais científica e racional do mundo, basea-da na observação e na experimentação. Nicolau Copérnico,Galileu Galilei e Johann Kepler contribuíram para provocar umaruptura na tradição da Idade Média, profundamente religiosa eteocêntrica. A Reforma Protestante (1517), movimento iniciadopor Martinho Lutero, encontrou o apoio da burguesia, pois, pornão considerar o comércio um pecado, justificava os lucros.

Portugal não ficou fora desse contexto. A burguesia mercantilpatrocinou as grandes navegações, por meio das quais a corteportuguesa conheceu uma prosperidade econômica única.Autores humanistas começaram a ser lidos (em 1487 a imprensa foi

CLASSICISMO (1527-1580)

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Adão e Eva,de Raphael. Na arte

do Renascimentohá interessse em

retratar o nu.

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rodu

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introduzida em Portugal), asletras desenvolveram-se eo palácio foi o principal focode cultura. D. João III criou,em 1548, o Colégio das Ar-tes e confiou a direção a hu-manistas de renome inter-nacional. Sob seu reinadoo estudo da gramática tor-nou-se obrigatório, sendoesse o momento em que alíngua portuguesa atingiusua maturidade.

Manifestações ArtísticasA arte do Renascimento voltou-se para a Antigüidade clás-

sica, considerada modelo de civilização e fonte inspiradora. Aimitação dos modelos greco-latinos foi o traço principal da pro-dução artística do período. Imitação não como mera cópia, mascomo criação de obras de arte segundo regras preestabelecidas.

Os artistas buscavam na figura humana as proporçõesideais. Tanto a pintura quanto a escultura interessaram-se pelo nu.

Foi em 1570 que MartinhoLutero (monge e doutor emTeologia) divulgou folhetos

que continham os primeiros prin-cípios da Reforma. Foi excomun-gado pelo papa Leão X e, em 1523,apresentou a tradução do NovoTestamento. Durante todo o tem-po em que se dedicou à causa daReforma redigiu inúmeros panfletospolêmicos.

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Túmulo de Luís de Camões noMosteiro dos Jerônimos, Lisboa.:

Em Portugal, vigora o estilo manuelino, que apresenta deco-rações vigorosas nas paredes, rendilhados e portais com obje-tos de navegação, frutos do mar, pilares torcidos, abóbadas deconformações elaboradas e incrustações.

LiteraturaO Renascimento, em literatura, recebeu o nome de Classi-

cismo ou Quinhentismo e, como as outras manifestações artís-ticas, procurou seguir os modelos clássicos: busca da perfei-ção formal, universalismo, racionalismo. Procurou, enfim, aobjetividade e o equilíbrio. Nesse período desenvolveram-se:

a) a poesia lírica: Sá de Miranda, Antônio Ferreira, Camões;

b) a poesia épica: Camões;

c) o teatro: Antônio Ferreira e Camões;

d) a novelística: Bernardim Ribeiro;

e) a historiografia: João de Barros e Damião Góis;

f) os roteiros de viagens: Fernão Mendes Pinto;

g) a prosa doutrinária: Samuel Usque e Frei Heitor Pinto;

O etnomusiológico, radialis-ta e pesquisador musicalportuguês José Moças

organizou 12 CDs da coleção A via-gem dos Sonhos que documentama combinação da música portugue-sa com as músicas locais, quando,no século XV, os portugueses em bus-ca de terras e riquezas levaram parao mundo sua língua e sua música.

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Sá de Miranda (1481-1558)Francisco Sá de Miranda, durante sua viagem à Itália, teve

contato com os maiores escritores renascentistas vivos. Quan-do voltou, em 1527, introduziu em Portugal o dolce stil nuovo(doce estilo novo): o verso decassílabo, a medida nova (atéentão usava-se a redondilha maior ou menor, chamada de medi-da velha) e novas formas poéticas: o soneto, a ode, a elegia,aégloga,a epístola, a sextina, o epitalâmio.

Sá de Miranda escreveu poe-mas e peças de teatro tanto namedida velha quanto na nova. Leiaeste seu texto:

TROVA

Comigo me desavim,sou posto em todo perigo;não posso viver comigonem posso fugir de mim.Com dor, da gente fugia,antes que esta assi crescesse;agora já fugiriade mim, se de mim pudesse.Que meio espero ou que fimdo vão trabalho que sigo,pois que trago a mim comigo,tamanho imigo* de mim? *inimigo

(Obras Completas. Lisboa:Sá da Costa, 1942)

Sá de Miranda

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O poema “Trova” foi escrito namedida velha (à maneira medieval, emredondilha maior). Um dos primeirosna literatura portuguesa a tematizar oproblema do homem dividido, Sá deMiranda revela, aqui, uma profundaanálise da personalidade humananuma linguagem castiça, porém viva.

O termo “indiví-duo” foi introduzidona língua portuguesano século XVI, oriun-da do latim individuus(indivisível)

Outros poetas:

Diogo Bernardes (1540-1605), chamado “o poeta do Lima”,porque era da região banhada por esse rio, situado no extremonorte de Portugal (o Lima nasce na Galiza e deságua no Atlânti-co, em Viana do Castelo). Em sua obra, dividida em três volu-mes, é nota permanente o rio Lima: Várias Rimas ao Bom Jesus(1594), Rimas Várias – Flores do Lima (1596) e O Lima (1596).Cultivou a “medida velha” e a “medida nova”, em sonetos, car-tas, canções e églogas. A poesia bucólica e ribeirinha é o seuforte. Dotado de talento para a composição do soneto, faz lem-brar em alguns passos a maestria camoniana.

Cristóvão Falcão (desconhecem-se-lhe as datas de nascimentoe morte), presuntivo autor da égloga Crisfal (1554), graças ao fatode o seu título ser formado das primeiras sílabas do nome e osobrenome do poeta. Atribuível ainda a Bernardim Ribeiro, oumeramente de autor desconhecido, Crisfal é das mais bem reali-zadas composições do gênero durante o século XVI, sobretudopelo caráter anticonvencional em matéria de lirismo pastoril.

Bernardim Ribeiro (nada se conhece de sua vida) vale maispor sua novela, Menina e Moça (ou Saudades), estudada maisadiante, do que por sua poesia (cinco églogas e colaboração noCancioneiro Geral de Garcia de Resende; as primeiras, publicadasem 1554, como apêndice à novela, constituem as primeiras ma-nifestações do bucolismo em Portugal).

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Luís de Camões (1524? - 1580)Camões viveu e estudou

alguns anos em Coimbra. Além deter lido os clássicos e os huma-nistas italianos (Virgílio, Homero,Horácio, Ovídio, Petrarca), suainstrução abrangeu todos osramos do conhecimento, comoera comum aos humanistas.

Teve muitos amores na cor-te que o levaram ao desterro.Depois seguiu carreira militar eem Ceuta (norte da África), com-batendo os mouros, perdeu oolho direito. Em 1552, na procissão de Corpus Christi, fere aGonçalo Borges, servidor do Paço. Preso, logo mais é libertosob a condição de engajar-se no serviço militar ultramarino.Com efeito, em fins de 1553, chega à Índia. Em 1556, dá bai-xa, e é nomeado “provedor mor dos bens de defuntos e au-sentes”, em Macau. Ali, teria escrito parte dOs Lusíadas. Acu-sado de prevaricação, vai a Goa defender-se, mas naufragana foz do rio Mecon: salva-se a nado, levando Os Lusíadas,como quer a lenda, e perdendo sua companheira, Dinamene.Finalmente, chega a Goa, é encarcerado e solto pouco de-pois. Está-se em 1563. Quatro anos depois, em Moçambique,dá outra vez com os costados na cadeia por causa de dívi-das. Posto em liberdade, arrasta uma vida miserável, até queDiogo do Couto o encontra e se empenha em recambiá-lopara a Pátria, aonde chega a 23 de abril de 1569. em 1572,publica Os Lusíadas e recebe como recompensa uma pensãoanual de 15.000 réis, que, porém, não o tira da miséria emque vive até o fim. Morre pobre e abandonado, a 10 de junhode 1580.

Luís de Camões

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OUTRO

De que me serve fugir

De morte, dor e perigo,Se me eu levo comigo?

Escreveu teatro ao modo vicentino (Auto de Filodemo e El-Rei Seleuco) e ao clássico (Anfitriões), mas sem alcançar maiornível, relativamente à sua poesia e aos comediógrafos do tem-po. Sua correspondência encerra valor biográfico ou histórico-literário.

Poeta de seu tempo, Camões soube harmonizar tradição einovação, saber letrado e experiência de vida, mitologia e cristia-nismo. Escreveu poesia lírica, uma epopéia e peças de teatro.Veja:

1) Poesia LíricaNa lírica camoniana coexistem poemas escritos na medida ve-

lha, sob influência da tradição popular da Península Ibérica, heran-ça das cantigas trovadorescas e composições escritas na medidanova. No primeiro dos textos selecionados, escrito em redondilhamaior, é tratado o mesmo tema do poema de Sá de Miranda:

VOLTAS

Tenho-me persuadido,Por razão conveniente,Que não posso ser contente,Pois que pude ser nascido.Anda sempre tão unidoO meu tormento comigo,Que eu mesmo sou meu perigo.E se de mi me livrasse,Nenhum gosto me seria:Quem, senão eu, não teriaMal, que esse bem me tirasse?Força é logo que assi passe,Ou com desgosto comigo,Ou sem desgosto e sem perigo.

(Obras Completas. Lisboa, Sá da Costa, 1962)

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Neste segundo texto, já estão presentes características for-mais clássicas (soneto, verso decassílabo); o tema é o mesmo dopoema anterior. Em ambos percebem-se as emoções controladaspela razão, uma das características fundamentais do Classicismo.

Que poderei do mundo já quererque naquilo em que pus tamanho amor,não vi senão desgosto e desamor,e morte, enfim, que mais não pode ser!

Pois vida me não farta de viver,pois já sei que não mata grande dor,se cousa há que mágoa dê maior,eu a verei: que tudo posso ver.

A morte, a meu pesar, me asseguroude quanto mal me vinha; já perdio que perder o medo me ensinou.

Na vida, desamor somente vi,na morte, a grande dor que me ficou,parece que pera isso só nasci!

(Obras completas. Op. cit.)

As características predominantes da lírica camoniana (todaselas interdependentes e complementares) são:

a) racionalismo: o amor é mais pensado que sentido. A ra-zão controla a emoção dentro dos limites do equilíbrio eda harmonia:

Transforma-se o amador na cousa amada,Por virtude do muito imaginar;Não tenho logo mais que desejar,Pois em mim tenho a parte desejada.

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b) idealização: a procura do equilíbrio e da harmonia levam àprocura do absoluto, do ideal: interessa ao poeta mais aMulher (conceito) do que a mulher (matéria), o Amor (ideal)que o amor (individual, carnal):

Uma coisa, senhora, por certo asseleQue nunca amor se afina, nem se apura,Enquanto está presente a causa dele.ouPede o desejo, Dama, que vos veja.Não sabe o que pede; está enganado.É este amor tão fino e tão delgado,Que quem o tem não sabe o que deseja.

c) neoplatonismo: essa idealização remete-nos a Platão,cujas idéias influenciaram toda a produção artística doClassicismo. Segundo Platão, havia dois mundos: o inte-ligível, morada das idéias puras, das essências, cujo re-flexo imperfeito é o mundo sensível, onde vivemos, lugardas realidades concretas. Observe estes versos de“Sobolos rios que vão”:

Quem do vil contentamentoCá deste mundo visibil,Quanto ao homem for possibil,Passar logo entendimentoPara o mundo inteligibil;

Ali achará alegriaEm tudo perfeita, e cheiaDe tão suave harmonia,Que nem por pouca recreia,Nem por sobeja enfastia.

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d) desconcerto do mundo: a conscientização da desarmoniado mundo leva ao sofrimento:

Ao desconcerto do mundoOs bons vi sempre passarNo mundo graves tormentos;E para mais m”espantar,Os maus vi sempre nadarEm mar de contentamentos.Cuidando alcançar assiO bem tão mal ordenado,Fui mau; mas fui castigado.Assi, que só para miAnda o mundo concertado.

(Luís de Camões, Obras Completas. Op. cit.)

Na década de 1990, Renato Russo mescloutrechos da poesia camoniana com uma epístola

biblica e os musicou, com o título Monte Castelo.

2) Poesia ÉpicaPortugal atingira, no século XVI, o apogeu, o máximo de gló-

ria pelas conquistas ultramarinas. Precisava, naquele momento,de alguém que cantasse em linguagem solene seus feitos herói-cos, que cantasse o domínio do homem sobre a natureza.

Seguindo os modelos clássicos de Homero (Ilíada e Odis-séia) e de Virgílio (Eneida), Camões, em Os Lusíadas, conta ahistória de Portugal, tendo como assunto central a viagem deVasco da Gama às Índias.

A frota portuguesa partiu em 8 de julho de 1497 e chegou aCalicute a 24 de maio de 1498.

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Estruturalmente o poema divide-se em dez cantos compos-tos de 1102 estrofes de oito versos decassílabos cada (oitavarima), cujo esquema rímico é ABABABCC. Os dez cantos sãodivididos em cinco partes, como toda epopéia clássica:

• Proposição: formada pelas três primeiras estrofes, traz oassunto do poema, ou seja, o elogio do heróis portugue-ses que fundaram a nacionalidade e a ampliaram com asnavegações.

• Invocação: nas quarta e quinta estrofes, o poeta pedeinspiração às Tágides, nin-fas do rio Tejo, para comporo poema.

• Dedicatória: inicia-se na sex-ta estrofe e termina na 18ª-,o poeta oferece seu poemaao rei D.Sebastião

• Narração: estende-se da 19ª-estrofe do Canto I até a es-trofe 144 do Canto X. AquiCamões conta toda a via-gem de Vasco da Gama e ahistória de Portugal.

Começa pelo fato capital da História de Portugal, os desco-brimentos. Tudo centrado na viagem de Vasco da Gama, queconstitui a espinha dorsal do poema. É em torno dela que o poe-ta agrupa os fatos históricos, ou tidos como tais, que se deramantes de Vasco da Gama e os que se seguiram. Desse modo, aHistória de Portugal é contada.

No rastro das epopéias clássicas, ele não se livrou do pa-drão greco-romano – numa época eivada de cristianismo – emanteve o maravilhoso mitológico em sua narrativa. Mistura en-tão, no seu texto, o cristão e o pagão, colocando lado a lado

A epopéia é um poe-ma narrativo em que pre-valece o maravilhoso: amistura de fatos reaisa mitos, heróis e deuses.Seu herói representa umpovo e vive em aventu-ras que envolvem gran-des viagens.

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Vênus, Marte, Júpiter com a Divina Providência, Deus, religiososem procissão solene, Cristo e outras entidades do Cristianismo.

São os versos mais interessantes de ler em toda a epopéia.Entre eles citamos episódios como:

• O velho do Restelo: quando as naus partem, um velho fala aosmarinheiros sobre os perigos futuros e censura-lhes a ambi-ção e a cobiça. Estudaremos esse trecho no final desta lição.

• Inês de Castro: a amante do príncipe D. Pedro é assassinada amando do rei, na ausência do filho. De volta, D. Pedro mandaexumar o cadáver de Inês, “a que depois de morta foi rainha”.

• O gigante Adamastor: uma tempestade é descrita como o apa-recimento de um monstro a defender a região marítima queVasco da Gama estava atravessando.

• A ilha dos amores: um lugar privilegiado que Vênus ofereceaos marinheiros.

• Epílogo: estrofes 145 a 156 do Canto X. O tom é de desilu-são e Camões parece prenunciar a derrocada de Portugal.

Quando a ação do poema começa (estância 19), as nausestão navegando em pleno Oceano Índico, a meio da viagem.Enquanto isso, no Olimpio se reúnem os deuses em concílio, adeliberar acerca dos navegantes. Júpiter é-lhes favorável, Bacoopõe-se-lhes; com a adesão de Vênus e Marte, o concílio des-faz-se a bem dos portugueses. Chegam a Moçambique; Vascoda Gama desce à terra; Baco prepara-lhe uma cilada, mas ocomandante da frota triunfa e segue viagem. Chegada aMombaça; não atraca, graças à ajuda de Vênus, que perceberaoutra armadilha de Baco, Indignada, reclama a Júpiter maior pro-teção aos portugueses, e consegue-a.

Chegada a Melinde, onde são magnificamente recebidos. ORei de Melinde vem a bordo e pede ao Gama que lhe conte a

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história de Portugal. O Gama descreve a Europa e inicia o relatodesde Luso, fundador da Lusitânia, passa por D. Henrique deBorgonha, e prossegue com uma série de episódios históricos:o de Egas Moniz, Inês de Castro, a batalha de Ourique, a batalhado Salado, a batalha de Aljubarrota, a tomada de Ceuta, o sonhoprofético de D. Manuel, os aprestos da viagem, a fala do Velhodo Restelo e a largada; a seguir, o Gama conta a primeira parteda viagem, cujas peripécias mais importantes são o fogo deSantelmo, a tromba marinha, a aventura de Veloso, o GiganteAdamastor, chegada a Melinde.

Partida. Baco desce ao fundo do mar para incitar os deusesmarinhos contra a frota. Éolo, deus dos ventos, decide soltá-los.Enquanto dura a calmaria, conta-se o caso dos “doze da Ingla-terra”. Desata pavorosa tempestade, mas Vênus envia as ninfasamorosas para abrandar o furor dos ventos.

Cessada a tormenta, chegam a Calicut. O Gama desembar-ca e é recepcionado pelo Samorim. Enquanto isso, Paulo daGama recebe a bordo da nau capitânia o Catual, a quem comu-nica o Significado das figuras desenhadas nas bandeiras; umaúltima tentativa de Baco é desfeita.

Regresso à Pátria. Chegada à Ilha dos Amores, onde osnavegantes são favorecidos pelas ninfas em recompensa doheróico feito. Depois do banquete, Tethys conduz Vasco da Gamaao ponto mais alto da ilha e desvenda-lhe a “máquina do mun-do” e o futuro dos portugueses. Partida. Chegada a Portugal.

Vejamos um resumo da obra por meio de seus cantos:

CANTO I: contém a introdução, a invocação e a dedicatória.A narração tem início com os portugueses já no oceano Índico,quando surgem as primeiras dificuldades. No Olimpo, os deusesreúnem-se num concílio para decidir o destino dos navegado-res: Vênus e Marte protegem os portugueses e Baco e Netunosão contra eles. Júpiter decide permitir a continuidade da via-gem. Chegada a Mombaça.

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Leia a proposição do poema, constituída das seis primeirasestrofes:

1. As armas e os Barões assinalados* * célebres

Que, da Ocidental praia Lusitana,Por mares nunca dantes navegados,Passaram ainda além da Taprobana* * atual Sri Lanka, ilha a

Em perigos e guerras esforçados, sudeste da Índia

Mais do que prometia a força humana,E entre gente remota edificaramNovo Reino, que tanto sublimaram;

2. E também as memórias gloriosasDaqueles Reis que foram dilatandoA Fé, o Império, e as terras viciosas* *terras da África e da Ásia

De África e Ásia andaram devastando,E aqueles que por obras valerosasSe vão da lei da Morte libertando:Cantando espalharei por toda parte,Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

3. Cessem do sábio Grego* e do Troiano* * Ulisses * Enéias

As navegações grandes que fizeram;Cale-se de Alexandro e de TrajanoA fama das vitórias que tiveram;Que eu canto o peito ilustre Lusitano,A quem Netuno* e Marte* obedeceram. * deus dos mares * deus

Cesse tudo o que a Musa antiga canta, da guerra

Que outro valor mais alto se alevanta.

4. E vós, Tágides minhas, pois criadoTendes em mim um novo engenho ardente,Se sempre em verso humilde, celebradoFoi de mim vosso rio alegremente,Dai-me agora um som alto, e sublimado,Um estilo grandiloco e corrente,

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Porque de vossas águas Febo ordene,Que não tenham inveja às de Hipocrene.

5. Dai-me uma fúria grande e sonorosa,E não de agreste avena ou frauta ruda,Mas de tuba canora e belicosa,Que o peito acende e a cor ao gesto muda;Dai-me igual canto aos feitos da famosaGenta vossa, que a Marte tanto ajuda,Que se espalhe e se cante no Universo,Se tão sublime preço cabe em verso.

6. E vós, ó bem nascida segurançaDa Lusitana antiga liberdade.E não menos certíssima esperançaDe aumento da pequena Cristandade,Vós, ó novo temor da Maura lança,Maravilha fatal da nossa idade,Dada ao mundo por Deus, que todo o mandePera do mundo a Deus dar parte grande;

Além da riqueza de informações históricas de seu tempo eda Antigüidade clássica, estão presentes nesse trecho as refe-rências mitológicas e a imitação da sintaxe latina: as duas pri-meiras estrofes constituem um só período, cuja oração princi-pal – espalharei por toda parte — encontra-se no final da se-gunda estrofe.

CANTO II: Baco tenta destruir a frota, salva por Vênus. Che-gada a Melinde, onde o rei hospeda Vasco da Gama e pede-lheque conte a história de Portugal.

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No Mosteiro de Santa Maria, em Alcobaça,está o túmulo de D. Pedro e Inês de Castro.

1A castelhana Inês de Castro era dama decompanhia de D. Constança,

casada com D. Pedro, filho do rei D. Afonso IV.Pedro apaixonou-se por Inês e quis casar-se

com ela após a morte de Constança, pararegularizar a situação de seus filhos bastardos. O rei e a nobreza não queriam o

casamento, pois tinham medo de que Castela pudesse interferir na política do reino.Assim, D. Afonso ordenou, em 1355, que degolassem Inês. Diz a lenda que D. Pedro

mandou vestir de noiva o cadáver, sentou-o no trono e fez os nobres lhe beijarem amão. Por isso se diz que Inês foi “rainha depois de morta”. No entanto, a verdade é

que, em 1361, quando já era rei, D. Pedro mandou transladar os restos mortais deInês de Castro, com pompas de rainha. Esse episódio, desde o século XV, tem

inspirado poetas ao longo de toda a literatura portuguesa.

CANTO III: Vasco da Gama conta-lhe a história desde a forma-ção de Portugal até o reinado de D. Fernando. Pertence a este cantoo primeiro episódio lírico da obra: o assassinato de Inês de Castro1.

118. Passada esta tão próspera vitória,Tornado Afonso à lusitana terra,A se lograr* da paz com tanta glória * gozar

Quanta soube ganhar na dura guerra,O caso triste e digno da memória,Que do sepulcro os homens desenterra,Aconteceu da mísera e mesquinha* * infeliz e indefesa

Que depois de ser morta foi rainha.

119. Tu, só tú, puro Amor, com força crua,Que os corações humanos tanto obriga,Deste causa à molesta morte sua,Como se fora pérfida inimiga.Se dizem, fero Amor, que a sede tuaNem com lágrimas tristes se mitiga,É porque queres, áspero e tirano,Tuas aras banhar em sangue humano.

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120. Estavas, linda Inês, posta em sossego,De teus anos colhendo doce fruito,Naquele engano da alma, ledo e cego,Que a fortuna* não deixa durar muito, * destino

Nos saudosos campos do Mondego,De teus formosos olhos nunca enxuito,Aos montes ensinando e às ervinhasO nome que no peito escrito tinhas.

121. Do teu Príncipe ali te respondiamAs lembranças que na alma lhe moravam,Que sempre ante seus olhos te traziam,Quando dos teus fermosos se apartavam;De noite, em doces sonhos, que mentiam,De dia em pensamentos que voavam;E quando, enfim, cuidava, e quando via,Eram tudo memórias de alegria.

122. De outras belas senhoras e princesasOs desejados tálamos enjeita,Que tudo, enfim, tu, puro amor, desprezasQuando um gesto suave te sujeita.Vendo estas namoradas estranhezasO velho pai sisudo, que respeitaO murmurar do povo e a fantasiaDo filho, que casar-se não queria.

123. Tirar Inês ao mundo determina,Por lhe tirar o filho que tem preso,Crendo co’o sangue só da morte indinaMatar do firme amor o fogo aceso.Que furor consentiu que a espada finaQue pôde sustentar o grande pesoDo furor Mauro, fosse alevantadaContra uma fraca dama delicada?

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124. Traziam-na os horríficos algozesAnte o Rei, já movido a piedade:Mas o povo, com falsas e ferozesRazões, à morte crua o persuade,Ela, com tristes e piedosas vozes,Saídas só da mágoa, e saudadeDo seu Príncipe, e filhos, que deixava,Que mais que a própria morte a mogoava.

Canto IV: continua a narrar a história até a saída da frotade Portugal, sob o governo de D. Manuel. Quando os portu-gueses vão iniciar a viagem, na praia do Restelo, surge umvelho que critica duramente as navegações e amaldiçoa osque partem, acusando os portugueses de ambição e vaidadeexcessivas.

Restelo era um bairro ao lado do porto. Lá ficava a capelaonde a armada rezou antes da partida.

O ancião que toma a palavra na epopéia não era ninguémespecialmente conhecido. Talvez seja apenas um recurso deque Camões se serviu para dizer o que ele próprio julgava detudo aquilo: é um conselho à tripulação contra a ambição, odesejo de glória e a cobiça dos que detêm o poder. Levadospor esses sentimentos é que os poderosos ordenam viagenstão arriscadas. O velho do Restelo vem alertar a todos sobre operigo desta vaidade a quem chamamos Fama.

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O VELHO DO RESTELO

93. Nós outros, sem a vista alevantarmosNem a mãe, nem a esposa, neste estado,Por nos não magoarmos, ou mudarmosDo propósito firme começado,Determinei de assi nos embarcarmosSem o despedimento costumado,Que, posto que é de amor usança boa,A quem se aparta ou fica, mais magoa.

94. Mas um velho de aspecto venerando,Que ficava nas praias, entre a gente,Postos em nós os olhos, meneandoTrês vezes a cabeça, descontente,A voz pesada um pouco alevantando,Que nós no mar ouvimos claramente,C’um saber só de experiências feito,Tais palavras tirou do experto peito:

95. -“Ó glória de mandar! Ó vã cobiçaDesta vaidade a quem chamamos Fama!Ó fraudulento gosto que se atiçaCua aura popular* que honra se chama!Que castigo tamanho e que justiçaFazes no peito vão que muito te ama!Que mortes, que perigos, que tormentas,Que crueldades neles exp’rimentas!

96. “Dura inquietação d’alma e da vidaFonte de desemparos e adultérios,Sagaz consumidora conhecidaDe fazendas, de reinos e de impérios!Chamam-te ilustre, chamam-te subida,Sendo digna de infames vitupérios*;Chamam-te Fama e Glória soberana,Nomes com quem se o povo néscio* engana!

*em nome dahonra do povo

* Insultos, injúrias

* ignorante

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97. “A que novos desastres determinasDe levar estes reinos e esta gente?Que perigos, que mortes lhe destinasDebaixo dalgum nome preminente*?Que promessas de reinos e de minasDe ouro, que lhe farás tão facilmente?Que famas lhe prometerás? Que histórias?Que triunfos? Que palmas? Que vitórias?

98. “Mas ó tu, geração daquele insano,Cujo pecado e desobediênciaNão somente do Reino soberanoTe pôs neste desterro* e triste ausência,Mas inda doutro estado mais que humano,Da quieta e da simples inocência,Da idade de ouro, tanto te privou,Que na de ferro e de armas te deitou:

99. “Já que nesta gostosa vaidadeTanto enlevas* a leve fantasia,Já que à bruta crueza e feridade*Puseste nome esforço e valentia,Já que prezas em tanta quantidadeO desprezo da vida, que deviaDe ser sempre estimada, pois que jáTemeu tanto perdê-la quem a dá,

100. “Não tens junto contigo o Ismaelita,Com quem sempre terás guerras sobejas?Não segue ele do Arábio a lei maldita,Se tu pela de Cristo só pelejas?Não tem cidades mil, terra infinita,Se terras e riqueza mais desejas?Não é ele por armas esforçado,Se queres por vitórias ser louvado?

*preeminente:superior, nobre

*solidão

*encantas, deleitas

*perversidade

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101. “Deixas criar às portas o inimigoPor ires buscar outro de tão longe,Por quem se despovoe o Reino antigo,Se enfraqueça e se vá deitando a longe!Buscas o incerto e incógnito perigo,Por que a fama te exalte e te lisonje*,Chamando-te senhor, com larga cópia,Da Índia, Pérsia, Arábia e de Etiópia!

102. “Oh! Maldito o primeiro que no mundoNas ondas vela pôs em seco lenho!Digno da eterna pena do ProfundoSe é justa a justa lei que sigo e tenho!Nunca juízo algum, alto e profundo,Nem cítara* sonora ou vivo engenhoTe dê por isso fama nem memória,Mas contigo se acabe o nome e glória!

103. “Trouxe o filho de Jápeto do céuO fogo que ajuntou ao peito humano,Fogo que o mundo em armas acendeu,Em mortes, em desonras – grande engano!Quanto melhor nos fora, Prometeu,E quando para o mundo menos dano,Que a tua estátua ilustre não tiveraFogo de altos desejos que a movera!

104. “Não cometera o moço miserandoO carro alto do pai, nem o ar vazioO grande arquitector co’o filho, dandoUm, nome ao mar, e o outro, fama ao rio.Nenhum cometimento alto e nefando*,Por fogo, ferro, água, calma e frio,Deixa intentado* a humana geração!Mísera sorte! Estranha condição!”

*agrade

* instrumento decordas

* indigno

*projetado

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Canto V

Estas sentenças tais o velho honradoVociferando estava, quando abrimosAs asas ao sereno e sossegadoVento, e do porto amado nos partimos;E, como é já no mar costume usado,A vela desfraldando, o céu ferimos,Dizendo: – “Boa viagem!”. Logo o ventoNos troncos fez o usado movimento.

Canto V: Gama, ainda em Melinde, conta a viagem pela cos-ta africana, pontuada de vários obstáculos, o maior dos quais éa passagem pelo Cabo das Tormentas, personificado na figurado Gigante Adamastor.

37. Porém, já cinco sóis eram passadosQue dali nos partíramos, cortandoOs mares nunca de outrem navegados,Prosperamente os ventos assoprando,Quando uma noite, estando descuidadosNa cortadora proa vigiando,Uma nuvem que os ares escurece,Sobre nossas cabeças aparece.

38. Tão temerosa vinha e carregada,Que pôs nos corações um grande medo;Bramindo, o negro mar de longe bradaComo se desse em vão nalgum rochedo.Ó Potestade, disse, sublimada:Que ameaço divino ou que segredoEste clima e este mar nos apresenta,Que mor cousa parece que tormenta?

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39. Não acabava, quando uma figuraSe nos mostra no ar, robusta e válidaDe disforme e grandíssima estatura;O rosto carregado, a barba esquálida,Os olhos encovados, e a posturaMedonha e má e a cor terrena e pálidaCheios de terra e crespos os cabelos,A boca negra, os dentes amarelos.

Canto VI: partida de Melinde para Calicute. Baco e Netunoconvencem Éolo, rei dos ventos, a armar uma tempestade. Vênuse as ninfas surgem diante dos ventos, seus apaixonados, e atempestade cessa. Chegam às Índias.

Canto VII: descrição das Índias e os primeiros contatos comos mouros.

Canto VIII: problemas com os mouros, pois adivinhos dizemque os portugueses vêm para escravizar os indianos. Prisão deVasco da Gama, que é libertado a troco de mercadorias.

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Vasco da Gama em sua viagem às Índias.

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145. No “mais, Musa, no” mais, que a lira tenhoDestemperada* e a voz enrouquecida, * desafinada

E não do canto, mas de ver que venhoCantar a gente surda e endurecida.O favor com que mais se acende o engenho,Não no dá a Pátria, não, que está metidaNo gosto da cobiça e na rudezaDuma austera, apagada e vil tristeza.

A Viagem de Vasco da Gama e os Cantos de Os Lusíadas.

Canto IX: começa a viagem de volta a Portugal. Segue-se oepisódio lírico da Ilha dos Amores: Vênus e Cupido preparamuma recepção para os portugueses a fim de compensar seussofrimentos. Os marinheiros recebem o carinho das ninfas e Vascoda Gama ama a deusa Tétis.

Canto X: descrição do banquete oferecido por Tétis, que con-duz Gama a um monte de onde lhe mostra um globo transparenteque representa o mundo. Regresso a Lisboa. No epílogo, Camõesqueixa-se da decadência de Portugal e da indiferença pelas letras.

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Canto I: portugueses enfrentam cilada no canal de MoçambiqueCanto II: viagem de Mombaça a Melinde.Canto III e IV: Vasco da Gama conta ao rei de Melinde a histó-

ria de Portugal (episódios de Inês de Castro e do Velho do Restelo).Canto V: Vasco da Gama conta ao rei a viagem de Lisboa até

Melinde (episódio do gigante Adamastor).Canto VI: Viagem de Melinde a Calicute.Cantos VII, VIII e IX: portugueses na Índia.Cantos IX e X: viagem de regresso.

3) TeatroO teatro de Camões é inferior à sua lírica e à sua épica. Ele dei-

xou três autos: Auto de Filodemo e El-Rei Seleuco, com caracterís-ticas vicentinas, e Anfitriões, uma composição à moda clássica.

Antônio Ferreira (1528-1569)

Defensor da cultura clássica, é doutri-nador do Classicismo em Portugal. Suaobra mais notável é a tragédia Castro, emque narra, assim como Camões, a histó-ria de Inês de Castro.

Fernão Mendes Pinto (1510?-1583)

É o autor mais importante do gêneroliteratura de viagens. Escreveu Peregrina-ção, fruto de suas experiências pessoais,em que descreve hábitos dos povos orien-tais e critica a ação portuguesa no Oriente.

João de Barros (1496-1570)

Escreveu ficção (Crônica do Impera-dor Clarimundo), filosofia (Rópica Pnefma),gramática (Gramática da Língua Portugue-sa) e historiografia (Décadas).

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Bernardim Ribeiro (1482-1552)

Escreveu Menina e Moça, novela em que apresenta a psico-logia amorosa feminina como principal foco da narrativa.

4) Prosa DoutrináriaEsse gênero revela o espírito cristão que resistiu ao paganis-

mo desse período. O judeu-português Samuel Usque escreveuTribulações de Israel; Frei Heitor Pinto, Imagens da Vida Cristã eFrei Amador Arrais, Diálogos.

Questões de Vestibular 1 (FUVEST-SP) Camões:

a) nasceu no dia 10 de junho de 1580.b) escreveu uma epopéia publicada no ano de 1572.c) tomou a Divina Comédia como modelo de seu poema.d) foi amigo de Gil Vicente, com quem conviveu na corte.e) esteve na Itália, de onde levou para Portugal os princípios da esté-

tica clássica.

2 (FUVEST-SP):“Amor é um fogo que arde sem se ver,É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente,É dor que desatina sem doer.”

De poeta muito conhecido, esta é a primeira estrofe de um poemaque parece comprazer-se com o paradoxo, enfeixando sensaçõescontraditórias do sentimento humano, se examinadas sob o prismada razão.Indique, na relação abaixo, o nome do autor.a) Bocage. d) Luís de Camões.b) Camilo Pessanha. e) Manuel Bandeira.c) Gil Vicente.

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3 (Mackenzie-SP):O digno representante do povo português, herói de Os Lusíadas, foi:

a) Alexandre, o Grande.b) Trajano.c) Vasco da Gama.

4 (VUNESP)

“Tanto de meu estado me acho incerto,que em vivo ardor tremendo estou de frio;sem causa, juntamente choro e rio,o mundo todo abarco e nada aperto.É tudo quanto sinto, um desconcerto;da alma um fogo me sai, da vista um rio;agora espero, agora desconfio,agora desvario, agora acerto.

Estando em terra, chego ao céu voando,num’hora acho mil anos, e é de jeitoque em mil anos não posso achar um’hora.

Se me pergunta alguém por que assi ando,respondo que não sei; porém suspeitoque só porque vos vi, minha Senhora.”

O soneto acima transcrito é de Luís de Camões. Nele se acha umacaracterística da poesia clássica renascentista. Assinale essa caracte-rística, em uma das alternativas:

a) A suspeita de amor que o poeta declara na conclusão.b) O jogo de contradições e perplexidades que atormentam o poeta.c) O fato de todos perguntarem ao poeta porque assim anda.d) O fato de o poeta não saber responder a quem o interroga.e) A utilização de um soneto para relato das suas amarguras.

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Texto para as questões 5 e 6:“Busque Amor novas artes, novo engenhopara matar-me, e novas esquivanças;que não pode tirar-me as esperançasque mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!vede que perigosas seguranças:que não temo contrastes nem mudançasandando em bravo mar perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgostoonde esperança falta, lá me escondeAmor um mal, que mata e não se vê;

que dias há que na alma me tem postoum não sei quê, que nasce não sei ondevem não sei como e dói não sei porquê.”

5 (FGV-SP) Neste poema é possível reconhecer que uma dialética amo-rosa trabalha a oposição entre:a) o bem e o mal d) a razão e o sentimentob) a proximidade e a distância e) o mistério e a realidadec) o desejo e a idealização

6 (FGV-SP) Uma imagem de forte expressividade deixa implícita umacomparação com o arriscado jogo do amor. Assinalar a alternativaque contém essa imagem:a) o engenho do amor d) mar tempestuosob) o perigo da segurança e) um não sei quêc) naufrágio em bravo mar

7 (FUVEST-SP) Na Lírica de Camões:a) o metro usado para a composição dos sonetos é a redondilha maior.b) encontram-se sonetos, odes, sátiras e autos.c) cantar a Pátria é o centro das preocupações.

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d) encontra-se uma fonte de inspiração de muitos poetas brasileirosdo século XX.

e) a mulher é vista em seus aspectos físicos, despojada deespiritualidade.

8 (FUVEST-SP) Camões escreveu obra épica ou lírica? Justifique suaresposta, exemplificando com obras do autor.

9 (UM-SP) Sobre a lírica camoniana, é incorreto afirmar que:a) boa parte de sua realização se encontra na poesia de inspiração

clássica.b) sua temática é variada, encontrando-se desde temas abstratos até

tradicionais.c) no aspecto formal, é toda construída em versos decassílabos em

oitava rima.d) sonda o sombrio mundo do “eu”, da mulher, da pátria e de Deus.e) muitas vezes, o poeta procura conceituar o amor, lançando mão de

antíteses e paradoxos.

10 (FESL-SP) Em Os Lusíadas, Camões:a) narra a viagem de Vasco da Gama às Índias.b) tem por objetivo criticar a ambição dos navegantes portugueses

que abandonam a pátria à mercê dos inimigos para buscar ouro eglória em terras distantes.

c) afasta-se dos modelos clássicos, criando a epopéia lusitana, umgênero inteiramente original na época.

d) lamenta que, apesar de ter dominado os mares e descoberto no-vas terras, Portugal acabe subjugado pela Espanha.

e) tem como objetivo elogiar a bravura dos portugueses e o faz atravésda narração dos episódios mais valorosos da colonização brasileira.

11 (VUNESP)“Ó tu, que tens de humano o gesto e o peito(Se de humano é matar uma donzela,Fraca e sem força, só por ter sujeito

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O coração a quem soube vencê-la).A estas criancinhas tem respeito,Pois o não tens à morte escura dela;Mova-te a piedade sua e minha,Pois te não move a culpa que não tinha.”A estância acima transcrita pertence a Os Lusíadas de Luís de Camões,e faz parte de um dos mais conhecidos “episódios” daquela obra.Indique-o nas alternativas abaixo assinaladas:a) Episódio da Ilha dos Amores.b) Episódio do Gigante Adamastor.c) Episódio de Inês de Castro.d) Episódio dos Doze de Inglaterra.e) Episódio da Batalha de Aljubarrota.

12 (FUVEST-SP)“Destarte, enfim, conformes já as fermosasNinfas cos seus amados navegantes,Os ornam de capelas deleitosasDe louro e de ouro e flores abundantes.As mãos alvas lhe davam como esposas;Com palavras formais e estipulantesSe prometem eterna companhia,Em vida e morte, de honra e alegria.”Quem escreveu a estrofe acima?a) Luís de Camões d) Fernando Pessoab) Almeida Garrett e) Antero de Quentalc) Gil Vicente

13 (FUVEST-SP)“No mar, tanta tormenta e tanto dano,Tantas vezes a morte apercebida;Na terra, tanta guerra, tanto engano,Tanta necessidade aborrecida!Onde pode acolher-se um fraco humano,

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Onde terá segura a curta vida,Que não se arme e se indigne o céu serenoContra um bicho da terra tão pequeno?”Nessa estrofe, Camõesa) exalta a coragem dos homens que enfrentam os perigos do mar e

da terra.b) considera quanto deve o homem confiar na providência divina que

o ampara nos riscos e adversidades.c) lamenta a condição humana ante os perigos, sofrimentos e incerte-

zas da vida.d) propõe uma explicação a respeito do destino do homem.e) classifica o homem como um bicho da terra, dada a sua agres-

sividade.

14 (FUVEST-SP)“Não mais, Musa, não mais, que a Lira tenhoDestemperada e a voz enrouquecida,E não do canto, mas de ver que venhoCantar a gente surda e endurecida.O favor com que mais se acende o engenhoNão no dá a pátria, não, que está metidaNo gosto da cobiça e na rudezaDe uma austera, apagada e vil tristeza.”Os versos acima pertencem a que parte de Os Lusíadas?a) Proposição d) Narraçãob) Invocação e) Epílogoc) Dedicatória

As duas questões a seguir referem-se ao fragmento“Converte-se-me a carne em terra dura;Em penedos os ossos se fizeram;Estes membros que vês e esta figuraPor estas longas águas se estenderam,Enfim, minha grandíssima estatura

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Neste remoto cabo converteramOs deuses; e, por mais dobradas mágoas,Me anda Tétis cercando destas águas.”

15 (ESAN-SP) Tem-se a figura do Gigante Adamastor criada pelo poeta:a) português, Luís de Camões, em Os Lusíadasb) brasileiro, Basílio da Gama, em O Uruguaic) português, Pe. Antônio Veira, em Sermão da Sexagésimad) brasileiro, Mário de Andrade, em Macunaímae) n.d.a.

16 (ESAN-SP) A figura da retórica que compõe o texto é:a) metáfora: “consiste na transferência do nome de um elemento para

outro, em vista de uma relação de semelhança entre ambos”.b) prosopopéia: “atribui vida, ou qualidades humanas, a seres inani-

mados, irracionais, espécie de animismo”.c) paronomásia: vocábulos semelhantes na forma, mas opostos ou

aparentados no sentido.d) metonímia: emprego de um vocábulo por outro, com o qual esta-

belece uma constante e lógica relação de contigüidade.e) sinédoque: designa-se o mais restrito pelo mais extenso, ou seja, a

espécie pelo gênero, a parte pelo todo.

17 (F.C. Chagas) “Nem cinco sóis eram passados que de vós nos partíra-mos, quando a mais temerosa desdita pesou sobre nós. Por uma belanoite dos idos de maio do ano translato, perdíamos a muiraquitã; queoutrem grafara muraquitã, e alguns doutos, ciosos de etimologiasesdrúxulas, ortografam muyrakitan e até mesmo muraquéitã, não sorriais!”Neste fragmento da “Carta pràs Icamiabas”, em Macunaíma, de Máriode Andrade, encontramos:a) uma paródia do estilo clássico lusitano.b) um elogio à eloqüência dos parnasianos.c) a valorização da linguagem utilizada pela estética do século XVIII.d) uma apologia do estilo pretensioso e da oratória vazia de conteúdo.e) uma sátira aos romances indianistas do século XIX.

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18 (Sta. Casa-SP) Os versos pertencem a Os Lusíadas, poema épico queimortalizou o “ilustre peito lusitano”. Assinale a alternativa certa:Tu só, tu, puro amor, com força crua,Que os corações humanos tanto obriga,Deste causa à molesta morte sua,Como se fora pérfida inimiga,Se dizem, fero amor, que a sede tuaNem com lágrimas tristes se mitiga...a) A Tromba Marítima (Tromba D’Água).b) Episódio Inês de Castro.c) A Tempestade.d) O Gigante Adamastor.e) Descrição da Ilha dos Amores.

19 (CESCEA) A Época Quinhentista da Literatura Portuguesa caracteri-zou-se:a) pela revalorização da cultura greco-latina.b) pela reação contra o movimento humanista iniciado no século ante-

rior.c) pelo culto da subjetividade.d) pelo aparecimento dos primeiros grandes romancistas da Língua.e) não sei.

20 (CESCEA) Camões celebrizou-se, na Literatura Portuguesa, por:a) suas peças teatrais.b) sua vida aventuresca e galante.c) sua poesia jocosa.d) seus sonetos.e) não sei.

.21 (UF-PA) Pode-se afirmar que o Velho do Restelo é:

a) personagem central de Os Lusíadas.b) o mais fervoroso defensor da viagem do Gama.c) símbolo dos que valorizam a cobiça e a ambição.

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d) símbolo das forças contrárias às investidas marítimas lusas.e) a figura que incentiva a ideologia expansionista.

As questões 22 e 23 tomam por base o seguinte texto:“Cessem do sábio Grego e do TroianoAs navegações grandes que fizeram;Cale-se de Alexandre e de TrajanoA fama das vitórias que tiveram;Que eu canto o peito ilustre Lusitano,A quem Neptuno e Marte obedeceram.Cesse tudo o que a Musa antiga canta,Que outro valor mais alto se alevanta.”

22 (VUNESP-SP) A oitava acima constitui a terceira estrofe de Os Lusíadas,de Luís de Camões, poema épico publicado em 1572, obra máximado Classicismo português. O tipo de verso que Camões empregou éde origem italiana e fora introduzido na literatura portuguesa algumasdécadas antes, por Sá de Miranda. Quanto ao conteúdo, o poema OsLusíadas toma como ponto de referência um episódio da história dePortugal. Baseado nestes comentários e em seus próprios conheci-mentos, releia a estrofe citada e indique:a) O tipo de verso utilizado (pode mencionar simplesmente o númerode sílabas métricas).b) O episódio da história de Portugal que serve de núcleo narrativo aopoema.

23 (VUNESP) Uma leitura atenta da estrofe citada revela que o conteúdodos primeiros seis versos é retomado e sintetizado nos últimos doisversos. Interprete a estrofe de acordo com esta observação.

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BARROCO(1580-1756)

O Êxtase de Santa Teresa, de Bernini, é um exemplo da tentativa barrocade conciliar o erótico e o místico, o celestial e o terreno.

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Classicismo Barroco

• equilíbrio • rebuscamento formal

• racionalismo • tensão: racionalidade/ emotividade

• estaticidade e • preferência por aspectos sobriedade clássicas dinâmicos, dramáticos

BARROCO: final do século XVI, séc. XVII emetade do séc. XVIII

CONTEXTO HISTÓRICO: estados absolutistasContra-Reforma: Companhia de

Jesus e Concílio de Trentodesaparecimento de D. Sebastião

em Alcácer-Quibirdomínio espanhol sobre Portugal

CARACTERÍSTICAS: rebuscamento da forma(gongorismo)

rebuscamento do conteúdo(conceptismo) tentativa deconciliação de opostos

AUTORES: Padre Antônio VieiraD. Francisco Manuel de MeloPadre Manuel BernardesAntônio José da Silva, “o Judeu”Sóror Mariana AlcoforadoFrei Luís de Sousa

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O Barroco ou Seiscentismo tem início em 1580, ano que,além de registrar a morte de Camões, marca a passagem dePortugal para o domínio espanhol, e termina em 1756, quando éfundada a Arcádia Lusitana. Nesse movimento, que vai caracte-rizar-se pela tensão e tentativa de fusão de opostos, desenvol-veram-se a oratória, a prosa doutrinária, a poesia, a historiografia,a epistolografia e o teatro.

Contexto HistóricoO século XVII assistiu a profundas alterações no quadro po-

lítico, econômico, social, religioso e artístico da Europa em fun-ção de vários fatores:

1) formação de estados absolutistas: o poder político foi for-temente centralizado na figura do rei (que se confundiacom o próprio Estado). Esse sistema respondia às neces-sidades da burguesia, que precisava de um poder centra-lizador para garantir as condições de mercado. Era a der-rocada final do feudalismo.

2) revolução comercial: o mercantilismo exigia a ampliação demercados fornecedores e consumidores. A circulaçãode mercadorias era a principal fonte de acumulação de ca-pitais, representada na Espanha pela exploração de me-tais preciosos das colônias.

3) ascensão econômica da burguesia: no século XVII, embo-ra economicamente dominante, a burguesia, ainda, erapoliticamente submetida.

4) Contra-Reforma: conseqüência da Reforma Protestante(1517), ela foi a reação da Igreja católica para conter aexpansão do protestantismo. A Contra-Reforma propu-nha a volta ao teocentrismo (fé irrestrita na autoridadeda Igreja), abolindo o individualismo religioso do Renas-

BARROCO (1580-1756)

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cimento. A Companhia de Jesus, criada pelo espanholInácio de Loiola em 1540, foi a arma usada pela Igrejapara manter e recuperar fiéis. Os jesuítas monopoliza-ram a educação para difundir a ideologia católica. OConcílio de Trento (1545-1563) fortaleceu o Tribunal doSanto Ofício da Inquisição, que não só reprimiu todasas tentativas de manifestações científicas, culturais ereligiosas contrárias à Igreja católica, como tambémcontrolou a produção literária por meio da censura.

A Península Ibérica, berço da Contra-Reforma, esteve afastadade toda a efervescência cultural dos países onde a Reforma se con-solidara e onde se desenvolveram a ciência mecânica e o racionalismomoderno (Newton, Descartes, Galileu, Copérnico, Kepler).

Depois do desaparecimento de D. Sebastião na batalha deAlcácer-Quibir, Portugal, em 1580, caiu sob o domínio espanhol*.Muitos escritores portugueses foram para a Espanha (onde viviamGôngora, Cervantes, Lope de Vega, Calderón); outros passaram aescrever em castelhano. Só em 1640, com a Restauração (movi-mento português de independência financiado pela burguesia e peloscristãos-novos), a cultura portuguesa romperia o isolamento e seriainfluenciada, principalmente, pela literatura francesa.

*Esses dois fatos criam o mito do Sebastianismo, segundo o qualD. Sebastião voltaria e tornaria Portugal o Quinto Império do Mundo.

Também o panorama brasileiro do séc. XVII se ca-racteriza por profundas reformas, principalmen-te as ocorridas no Nordeste em conseqüência das

invasões holandesas, pela presença cada vez maior doscomerciantes e pelo apogeu e decadência da atividadeaçucareira.

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Manifestações ArtísticasO homem desse período foi marcado pela tensão da

dualidade: de um lado a afirmação do racionalismo renascentistaantropocêntrico e, de outro, o retorno aos valores espirituais dateocêntrica Idade Média. A arte foi uma das armas mais eficazesda Contra-Reforma para provocar e influenciar as emoções. Ha-via na obra dos jesuítas — que se empenhavam em recuperarhereges e consolidar a fé dos cris-tãos— o desejo contínuo de impres-sionar e dominar a todo custo.

O Barroco caracteriza-se pelo mo-vimento, pela tentativa de sugerir o in-finito, pelos contrastes, pela audacio-sa mistura da arquitetura, pintura e es-cultura. Ele é exuberante na riquezade detalhes, teatral e dramático, poisescolhe os momentos de dor ou co-moção para impressionar os sentidos.

O sebastianismo se difundiu também no Brasil,onde inspirou manifestações messiânicas nos sécu-los XVI, XVII e XIX, aí se incluindo, segundo alguns, o

movimento de Canudos em que Antônio Conselheiro anuncia-va a vinda de D. Sebastião. A Guerra de Canudos é tema dolivro Os Sertões, de Euclides da Cunha.

Fernando Pessoa, em seu livro Mensagem (1934), retomao mito sebastianista.

Em Apolo e Dafne, Bernini captou o momento emque Dafne, ao ser agarrada por

Apolo, transforma-se numa árvore.

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LiteraturaA literatura também refletiu esse momento de tensão vivido

pelo homem do período Barroco. Como as outras artes, empre-gou uma linguagem adequada à monumentalidade e à ostenta-ção, exagerando no rebuscamento formal ao abusar de antíte-ses (que refletem a contradição do homem barroco, seudualismo), de metáforas (que enfatizam a apreensão da realida-de pelos sentidos) e de hipérboles (que traduzem a pompa, agrandiosidade do Barroco).

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Andrea Pozzo foi o responsável pelapintura do teto da igreja de Santo Inácio,em Roma. Aqui estão presentesquase todas as característicasbarrocas: grandiosidade,movimento, ilusão de infinito.

No Santuário de Wies, naAlemanha, vê-se a mistura de

arquitetura, escultura e pintura.

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Há duas correntes barrocas em literatura:

• o cultismo, que consiste na supervalorização da forma:emprego de linguagem rebuscada, culta, extravagante,que abusa de trocadilhos. É também chamado degongorismo, porque nele é clara a influência do poeta es-panhol Luís de Gôngora (1561-1627). Observe o jogo depalavras nesta estrofe de Francisco Rodrigues Lobo:

Fermoso Tejo meu, quão diferenteTe vejo e vi me vês agora e viste:Turvo te vejo a ti, tu a mim triste,Claro te vi eu já, tu a mim contente.

• o conceptismo, que ocorre sobretudo na prosa e torna aliteratura um jogo retórico de idéias, de conceitos, pormeio do raciocínio e da lógica. Neste trecho do Sermãoda Sexagésima, Vieira, por meio de idéias logicamenteestruturadas, discute a sutil diferença entre o substanti-vo (nome) e a ação — a única que pode transformar,converter o mundo:

Será porventura o não fazer fruto hoje a palavra de Deus,pela circunstância da pessoa? Será porque antigamente ospregadores eram santos, eram varões apostólicos e exem-plares, e hoje os pregadores são eu e outros como eu?

– Boa razão é esta. A definição do pregador é a vida e oexemplo. Por isso Cristo, no Evangelho, não comparouao semeador, senão ao que semeia. Reparai. Não diz Cris-to: saiu a semear o semeador, senão, saiu a semear o quesemeia. Entre o semeador e o que semeia há muita dife-rença. Uma coisa é o soldado e outra coisa o que peleja;uma coisa é o governador e outra o que governa. Da mesmamaneira, uma coisa é o semeador e outra o que semeia;uma coisa é o pregador e outra o que prega. O semeadore o pregador é o nome; o que semeia e o que prega é

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Vieira nasceu em Lisboa. Comsete anos veio para o Brasil, ondeentrou para a Companhia de Je-sus. Após a Restauração (1640),voltou a Portugal, tornou-se confessor do rei D. João IV e foinomeado para várias embaixadas diplomáticas no estrangeiro.Foi um pregador eloqüente, no entanto, sua crença sebastianistae a defesa dos cristãos-novos, do capitalismo judaico e dos in-dígenas custaram-lhe uma condenação pela Inquisição e a proi-bição de pregar durante alguns anos. Voltou ao Brasil em 1681 ededicou seus últimos anos à compilação de seus sermões.

Sua obra divide-se em:

a) profecias (que encerram um patriotismo exacerbado): His-tória do Futuro, Esperanças de Portugal e ClavisProphetarum, em que profetiza para Portugal o destinode Quinto Império do Mundo, previsto, segundo ele, naBíblia, no Livro de Daniel.

b) cartas: cerca de 500 em que trata de questões políticasimportantes, como o tratamento dado pela Inquisição aoscristãos-novos e o relacionamento entre Portugal eHolanda, entre outras.

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ação; e as ações são as que dão o ser ao pregador. Ternome de pregador, ou ser pregador de nome, não importanada; as ações, a vida, o exemplo, as obras são as queconvertem o Mundo. O melhor conceito que o pregadorleva ao púlpito, qual cuidais que é? – É o conceito que desua vida têm os ouvintes.

Padre Antônio Vieira(1608- 1697)

PadreAntônioVieira

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c) sermões: são cerca de 200 sermões conceptistas, entreos quais se destacam:

• Sermão de Santo Antônio aos Peixes (proferido no Maranhãoem 1654). Nele, critica a escravidão dos indígenas;

• Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal Con-tra as de Holanda (proferido na Bahia em 1640), em quefaz pregação contra os holandeses, que ameaçam in-vadir Salvador;

• Sermão do Mandato (proferido na Capela Real de Lisboaem 1645), em que desenvolve o tema do amor místico;

• Sermão da Sexagésima (proferido na Capela Real de Lis-boa em 1653), nele apresenta uma teoria da arte de pre-gar na qual critica o gongorismo dos padres dominicanos.

Leia este trecho do Sermão do Mandato e perceba comoVieira parte de um exemplo da realidade próxima dos fiéis (oamor humano) e, por meio de um raciocínio sutil, demonstra asupremacia do amor de Cristo:

Outra vicissitude do tempo é a ingratidão. Esfriar o amor aausência é sem razão de que todos se queixam; mas que a in-gratidão mude o amor e o converta em aborrecimento, a mesmarazão “quase” o aprova, o persuade e parece que o manda. Quesentença mais justa que privar do amor a um ingrato? A ausên-cia pode ser força, a ingratidão sempre é delito. Se ponderar-mos os efeitos de cada um destes contrários, acharemos que aingratidão é o mais forte. A ausência tira ao amor a comunica-ção, a ingratidão tira-lhe o motivo. De sorte que o amigo, porestar ausente, não perde o merecimento de ser amado; se odeixamos de amar não é culpa sua, é injustiça nossa. Porém, sefoi ingrato, ficou indigno de amor. Finalmente a ausência com-bate o amor pela memória, a ingratidão pelo entendimento e pelavontade; e ferido o amor no cérebro e ferido no coração, comopode viver? “Assim o ensina a experiência no amor humano.”

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Foi um dos escritores quemais se destacaram na formaçãodo estilo barroco na Península.Quase todos seus textos são emcastelhano, demonstrando a in-fluência de Gôngora. Em Cortena Aldeia faz uma espécie deteoria literária do Barroco.

Francisco Rodrigues Lobo(1580-1621)

1. enfraquecerem, diminuírem; 2. “Como amasse aos seus queestavam no mundo, amou-os até o fim.”

É a ingratidão com o amor, como o vento com o fogo: se o fogoé pequeno, apaga-o o vento; se é grande, acende mais. “E talfoi o amor de Cristo.” Quantas ingratidões usaram com ele oshomens! Mas nenhuma, nem todas juntas foram bastantes paralhe remitirem 1 um ponto o amor, nem vivo, nem morto: Cumdilexisset suos qui erant in mundo, in finem dilexit eos2.

Dizem que um amor com outro se paga; o mais certo é que umamor com outro se apaga. Ora grande coisa deve de ser o amor:pois, sendo assim que não bastam a encher um coração mil mun-dos, não cabem em um coração dois amores. Daqui vem que seacaso se encontram e pleiteiam sobre o lugar, sempre fica a vitóriapelo melhor objeto. É o amor entre os afetos, como a luz entre asqualidades. “Uma luz apaga-se por outra maior; e assim vemosque em aparecendo o sol, que é luz maior, desaparecem as estre-las. O mesmo sucede ao amor, por grande e extremado que seja.Em aparecendo maior e melhor objeto, logo se desamou o menor.

Francisco Rodrigues Lobo

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Talvez cristão-novo, nasceu em Leiria, por volta de 1580,e faleceu afogado no Tejo em fins de 1622. Cultivou a poesia(Romanceiro/Primeira e Segunda Parte dos Romances, 1596;Églogas, 1605, o poema épico O Condestabre, 1610; Jorna-da... que Dom Filipe hizo a Portugal, 1623), a novela pastoril(A Primavera, 1601; O Pastor Peregrino, 1608 e o Desenga-nado, 1614), a prosa doutrinária (Corte na Aldeia e Noites deInverno, 1619).

SONETOS

1

Que amor sigo? Que busco? Que desejo?Que enleio é este vão da fantasia?Que tive? Que perdi? Quem me diria?Quem me faz guerra? Contra quem pelejo?

Foi por encantamento o meu desejoE por sombra passou minha alegria;Mostrou-me Amor, dormindo, o que não via,E eu ceguei do que vi, pois já não vejo.

Fez à sua medida o pensamentoAquela estranha e nova fermosuraE aquele parecer quase divino;

Ou imaginação, sombra, ou figura,É certo e verdadeiro meu tormento:Eu morro do que vi, do que imagino.

2

Fermosos olhos, quem ver-vos pretendeA vista dera em preço, se vos vira,Que inda que por perder-vos a sentira,A perda de não ver-vos não se entende;

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A graça dessa luz não na compreendeQuem, qual ao Sol, a vós seus olhos vira,Que o cego Amor, que cego deles tira,Com vossos próprios raios a defende.

Não pode a vista humana conhecerQual seja a vossa cor, que a luz forçosaNão consente mostrar tanta beleza;

Se eu, que em vendo-a ceguei, pude ainda ver,Uma cor vi, porém, cor tão fermosaQue me não pareceu da natureza.

(Poesias, sel.,pref. e notas de AfonsoLopes Vieira. Lisboa: Sá da Costa, 1940, pp., 77 e 78)

Sua obra compreende poesia,historiografia, teatro, biografia, literaturamoralista e epistolografia. Sua poesia égongórica, mas revela influências clás-sicas de Camões e Sá de Miranda.Como historiador, relatou fatos fatos que viveu (teve uma vida bas-tante agitada e variada a que não faltaram crime passional, degre-do, carreira diplomática). Sua intenção é oferecer ensinamentospráticos para militares e diplomatas. Seguindo a linha do teatrovicentino, escreveu a comédia Auto do Fidalgo Aprendiz, em queretrata o burguês que quer afidalgar-se. As cartas, de tom conser-vador, têm um caráter moralista e doutrinário. Destacam-se Car-tas Familiares e Carta de Guia dos Casados.

D. Francisco Manuel de Melo(1608-1666)

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D. Francisco Manuel de Melo

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çãoPadre Manuel Bernardes

(1644-1710)

Antônio José da Silva, “o Judeu”(1705-1739)

Depois de Gil Vicente, o teatro entrou em decadência emPortugal. Foi preciso esperar até o Barroco para que AntônioJosé da Silva alterasse esse quadro.

Brasileiro, de uma família de cristãos-novos, aos oito anosfoi para Lisboa. Acusando-o de judaísmo, a Inquisição o conde-na a morrer degolado e queimado.

Suas comédias, nas quais utilizava bonecos (títeres ou ma-rionetes), eram por ele chamadas de óperas, pois se faziamacompanhar de música e canto. Ele sofreu influência de GilVicente, da comédia clássica e do teatro francês, italiano eespanhol da época. A grande inovação foi ter escrito suaspeças em prosa. Guerras do Alecrim e Manjerona é sua obramais conhecida.

A vida desse poeta foi tema da peça de Gonçalves de Maga-lhães, que inaugurou o teatro brasileiro. Antônio José ou O Poe-ta e a Inquisição.

Padre Manuel Bernardes

Nova Floresta é sua obramais conhecida. Nela, Bernar-des recorre a um processo di-dático de organizar alfabetica-mente virtudes e pecados econtar um caso ou dar umexemplo para ser compreen-dido pelo leitor.

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154

Sóror Mariana Alcoforado(1640-1723)

Religiosa portuguesa apaixonada por um general francês queserviu em Portugal, Sóror Mariana revela em suas Cartas Portu-guesas a bipolaridade barroca: o aspecto racional (que lhe dizpara esquecer o amante) e a súplica sentimental para que elevolte. Constate essa afirmação no seguinte trecho:

Tua injustiça e ingratidão são demais. Mas ficava desespe-rada se disso te proviesse qualquer dano, pois antes quero quenão recebas castigos, do que ver-me eu vingada. Resisto a to-das as mostras que em demasia me convencem de que me nãoestimas já, e sinto mais vontade de entregar-me cegamente àpaixão do que às razões que me dás de me lembrar do teupouco caso.

(Sóror Mariana, Alcoforado. In: Mariana Alcaforado– Cartas. Rio de Janeiro: Agir, 1962)

Frei Luís de Sousa(1555- 1632)

Sua obra mais importante é Vida de Frei Bartolomeu dosMártires. Ficou famoso, no entanto, pelos lances trágicos de suavida que deram material ao romântico Almeida Garrett para apeça Frei Luís de Sousa.

Cartas Portuguesas virou peça de tea-tro no início da década de 1990. Uma dasatrizes que participou da peça foi CarlaCamurati, que alguns anos mais tarde di-

rigiu o filme Carlota Joaquina, sátira da vida da cor-te portuguesa no Brasil

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Manuel de Sousa Coutinho (seu nome de batismo) casou-secom D. Madalena Vilhena, viúva de D. João de Portugal, suposta-mente morto na batalha de Alcácer-Quibir. Tiveram uma filha. Noentanto, D. João não morrera e, ao retornar a Portugal, a filha docasal morre. Esse fato é visto como castigo pelo casamento adúl-tero. Madalena e Manuel decidem, então, entrar para o convento.

No Barroco português destacam-se ainda:

1) Arte de Furtar: obra anônima publicada em 1652. Trata-se deuma sátira social da época de D. João IV. Denuncia a corrupçãogeral no alto funcionalismo e na burguesia financeira.

2) Fênix Renascida: importante antologia da poesia seiscen-tista portuguesa. Em cinco volumes, reúne poesias deautores cultistas e conceptistas.

Os Anais de D. João III foram publicados em 1844 de formaincompleta já que foi obra póstuma.

Seu manuscrito foi considerado perdido durante muito tem-po, até que Alexandre Herculano o localizou e o fez publicar, em1844. Da obra, selecionou-se um trecho de um capítulo da pri-meira parte, intitulado “Guerra da África. Capitães: em Tanger D.Duarte de Menezes; em Arzila Antônio da Silveira”:

É caso digno de ficar em lembrança o que em um dia destessucedeu a D. Jorge de Noronha com o valente Amelix. EstavaD. Jorge doente de sezões: não consentiu o conde que caval-gasse, por muito que o desejou, por se lhe não agravar o mal.Saiu o conde deixando-o na cama, e ficando acompanhado domédico; mas ele disse ao médico que se houvesse repique nãohaveria febre nem frio que lhe tolhesse acudir ao campo. O quesendo ouvido pelo médico, lhe aconselhou que, pois assim odeterminava, seria melhor irem-se ambos passeando devagaraté o facho, que não depois que repicassem, correndo. Pareceubem a D. Jorge a razão; mandou-lhe dar um dos seus cavalos eforam-se ambos devagar, caminho do facho.

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Não chegavam bem às tranqueiras quando o facheiro, gritan-do quando podia, deixou cair o facho, e vindo-se pera a vila, dissea D. Jorge que as atalaias do Corvo vinham com pressa deman-dar o vale; porque sete ou oito mouros os vinham atalhando. Aper-tou D. Jorge as pernas ao cavalo e foi-se correndo pera onde ofacheiro dizia, senão quando, chegado à tranqueira de baixo, viuum mouro abraçado com o atalaia, que ao parecer trabalhava comoum luta polo cativar e tomar vivo, e ele forcejava por se defenderconquanto estava cercado de outros sete ou oito mouros.

Saiu D. Jorge fora da tranqueira e bradou-lhe dizendo: – Lar-ga! Larga! E pondo a lança em um dos mouros que o veio receberdeu com ele em terra e foi-se aos que estavam abraçados; e nãopor ofender ao cristão largou a lança e levando da espada deuuma boa ferida póla cabeça ao mouro, que foi causa que, sentiu-se ferido, largou o que quisera cativar; e com um golpe de treçadolhe cortou meia mão e juntamente lhe fez uma grande ferida nacabeça. Porém assim ferido teve lugar de se salvar e recolher àtranqueira, ficando D. Jorge e o doutor e outros dois cavaleirosque lhe acudiram pelejando com os mouros até que o condeos veio recolher, sentido de ver D. Jorge, que deixara ardendo emfebre, misturado com os mouros. E como ainda não sabia a boasorte que tinha feito, lhe disse com aspereza: – Pera fazerdes des-mancho ficastes na vila. E passando por ele disse pera Antônio daSilveira: – Alcançai-me, senhor, todo homem que virdes sair trásmim, que vou por este doudo. Dizia-o por D. João de Sande que,invejoso de D. Jorge, se ia metendo nos mouros desalembrada-mente no melhor cavalo que havia em África. E o conde ia tãoraivoso que nenhum homem achou diante de si que não fizessedebruçar sobre o pescoço do cavalo às contoadas.*

(Anais de S. João III, pref. e notas de M. Rodrigues Lapa, 2 vols.,Lisboa: Sá da Costa, 1938, vol. I, liv. III, Cap. V., pp. 211-212)

* facho = facho de luz, farol; levando da espada = levantando a espada; desmancho= desordem, indisciplina; contoadas = pancadas com o “conto”, cabo da lança.

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Questões de Vestibular

1 (Centec-BA) Não é característica do Barroco a:a) preferência pelos aspectos científicos da vida.b) tentativa de reunir, num todo, realidades contraditórias.c) angústia diante da transitoriedade da vida.d) preferência pelos aspectos cruéis, dolorosos e sangrentos do mun-

do, numa tentativa de mostrar ao homem a sua miséria.e) intenção de exprimir intensamente o sentido da existência, expres-

sa no abuso da hipérbole.

2 (FCMSC-SP) A preocupação com a brevidade da vida induz o poetabarroco a assumir uma atitude que:a) descrê da misericórdia divina e contesta os valores da religião.b) desiste de lutar contra o tempo, menosprezando a mocidade e a

beleza.c) se deixa subjugar pelo desânimo e pela apatia dos céticos.d) se revolta contra os insondáveis desígnios de Deus.e) quer gozar ao máximo seus dias, enquanto a mocidade dure.

3 (Positivo-PR) O estilo rebuscado que retrata os dilemas entre os ape-los de ordem espiritual e os atrativos de ordem material, mais o exage-ro no emprego dos recursos estilísticos, são características da escola:a) barrocab) arcádicac) românticad) realistae) modernista

4 (Sta. Casa-SP) “Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como ospregadores fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parteestá branco, da outra há de estar negra.”

5 (Positivo-PR) Preencha as lacunas com a alternativa que completaadequadamente o texto:

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“O ..., formalismo que se distingue pelo jogo de palavras, de constru-ções e de imagens; e o ... em que a temática se torna sutil pelo jogodas idéias e dos conceitos dão origem ao chamado ... .a) universalismo – individualismo – classicismob) cultismo – conceptismo – barrococ) subjetivismo – sentimentalismo – romantismod) objetivismo – universalismo – realismoe) idealismo – pragmatismo – simbolismo

6 (F. C. Chagas-BA) Assinale o texto que, pela linguagem e pelas idéias,pode ser considerado como representante da corrente barroca.a) “Brando e meigo sorriso se deslizava em seus lábios; os negros

caracóis de suas belas madeixas brincavam, mercê do zéfiro, sobresuas faces... e ela também suspirava.”

b) “Estiadas amáveis iluminavam instantes de céus sobre ruas molha-das de pipilos nos arbustos dos squares. Mas a abóbada de garoadesabava os quarteirões.”

c) “Os sinos repicavam numa impaciência alegre. Padre Antônio con-tinuou a caminhar lentamente, pensando que cem vezes estivera acair, cedendo à fatalidade da herança e à influência do meio que oarrastavam para o pecado.”

d) “De súbito, porém, as lancinantes incertezas, as brumosas noites pe-sadas de tanta agonia, de tanto pavor de morte, desfaziam-se, desa-pareciam completamente como os tênues vapores de um letargo...”

e) “Ah! Peixes, quantas invejas vos tenho a essa natural irregularidade! Avossa bruteza é melhor que o meu alvedrio. Eu falo, mas vós não ofendeisa Deus com as palavras: eu lembro-me, mas vós não ofendeis a Deuscom a memória: eu discorro, mas vós não ofendeis a Deus com oentendimento: eu quero, mas vós não ofendeis a Deus com a vontade.”

7 (FUVEST-SP) A respeito do Padre Antônio Vieira, pode-se afirmar:a) Embora vivesse no Brasil, por sua formação lusitana não se ocupou

de problemas locais.b) Procurava adequar os textos bíblicos às realidades de que tratava.

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c) Dada sua espiritualidade, demonstrava desinteresse por assuntosmundanos.

d) Em função de seu zelo para com Deus, utilizava-O para justificartodos os acontecimentos políticos e sociais.

e) Mostrou-se tímido diante dos interesses dos poderosos.

8 (UFMS) “Célebre como orador, epistológrafo e prosador em geral, con-ciliou muito bem os fundamentos de sua formação jesuítica com oestilo da época. Atingiu o máximo de virtuosidade nos sermões, carre-gados de alegorias e antíteses.”O autor e o estilo a que se refere o texto acima são:a) Pero Vaz de Caminha – classicistab) Pe. Antônio Vieira – Barrococ) Gregório de Matos – Barrocod) Pe. Antônio Vieira – Arcádicoe) Gregório de Matos – Arcádico

9 (FUVEST) Texto para as questões A, B e C.

“A primeira coisa que me desedifica, peixes, de vós, é que comeis unsaos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o faz aindamaior. Não só comeis uns aos outros, senão que os grandes comemos pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenoscomeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mascomo os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos,nem mil, para um só grande... Os homens, com suas más e perversascobiças, vêm a ser como os peixes que se comem uns aos outros.Tão alheia coisa é, não só da razão, mas da mesma natureza, que,sendo todos criados no mesmo elemento, todos cidadãos da mesmapátria, e todos finalmente irmãos, vivais de vos comer.”

a. Reescreva a frase grifada no texto, pondo no plural grande escân-dalo e fazendo as adaptações necessárias.

b. Explique a diferença semântica entre as duas ocorrências da pala-vra mesma, grifadas no texto.

c. Qual o autor do texto? Em que época ele viveu?

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10 (PUC-SP) “Há de tomar o pregador uma só matéria, há de defini-lapara que conheça, há de dividi-la para que se distinga, há de prová-lacom a Escritura, há de declará-la com a razão, há de confirmá-la como exemplo, há de amplificá-la com as causas, com os efeitos, com ascircunstâncias, com as conveniências que se hão de seguir, com osinconvenientes que se devem evitar; há de responder às dúvidas, háde satisfazer às dificuldades, há de impugnar e refutar com toda aforça da eloqüência os argumentos contrários, e depois disto há decolher, há de apertar, há de concluir, há de persuadir, há de acabar.”(Padre Antônio Vieira)

Este trecho do Sermão da Sexagésima, de autoria do Padre AntônioVieira, aponta as partes que compõem o discurso argumentativo eilustra o Barroco, em seu estilo conceptista. – Em que consiste esteestilo? Exemplifique-o com o texto anterior.

11 (UM-SP) Aponte a alternativa incorreta sobre o Sermão da Sexagési-ma:a) O autor desenvolve dialeticamente a seguinte tese: “A semente é a

palavra de Deus”.b) O estilo é Barroco e privilegia a corrente conceptista de composi-

ção.c) O orador discute no sermão cinco causas possíveis que não permi-

tiriam a entrada da palavra de Deus no coração dos homens.d) Vieira baseia-se em parábolas bíblicas, e sua linguagem se vale de

estruturas retóricas clássicas.e) Pela sua capacidade de argumentação, Vieira consegue, neste ser-

mão, convencer os indígenas a se converterem.

12 (FUVEST-SP) “Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem asemear, há outros que semeiam sem sair. Os que saem a semear sãoos que vão pregar à Índia, à China, ao Japão; os que semeiam semsair são os que se contentam com pregar na pátria. Todos terão suarazão, mas tudo tem sua conta. Aos que têm a seara em casa, pagar-lhes-ão a semeadura: aos que vão buscar a seara tão longe, hão-lhes

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de medir a semeadura, e hão-lhes de contar os passos. Ah! dia dojuízo! Ah! pregadores! Os de cá, achar-vos-ei com mais paço; os de lá,com mais passos...”

A passagem acima é representativa de uma das tendências estéticastípicas da prosa seiscentista, a saber:a) O Sebastianismo, isto é, a celebração do mito da volta de D. Se-

bastião, rei de Portugal, morto na batalha de Alcácer-Quibir.b) A busca do exotismo e da aventura ultramarina, presentes nas crô-

nicas e narrativas de viagem.c) A exaltação do heróico e do épico, por meio das metáforas

grandiloqüentes da epopéia.d) O lirismo trovadoresco, caracterizado por figuras de estilo passionais

e místicas.e) O Conceptismo, caracterizado pela utilização constante dos recur-

sos da dialética.

13 (FUVEST-SP) A respeito do Padre Antônio Vieira, pode-se afirmar:a) Embora vivesse no Brasil, por sua formação lusitana não se ocupou

de problemas locais.b) Procurava adequar os textos bíblicos às realidades de que tratava.c) Dada sua espiritualidade, demonstrava desinteresse por assuntos

mundanos.d) Em função de seu zelo para com Deus, utilizava-O para justificar

todos os acontecimentos políticos e sociais.e) Mostrou-se tímido diante dos interesses dos poderosos.

14 (FEBA-SP) “Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, souladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador? Assimé. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza: o roubar compouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres... Oladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno: os que nãosó vão, mas que levam, de que eu trato, são os outros – ladrões demaior calibre e de mais alta esfera... Os outros ladrões roubam umhomem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo de

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seu risco, estes, sem temor nem perigo; os outros se furtam, são en-forcados, estes furtam e enforcam.”(Sermão do Bom Ladrão – Vieira)

Em relação ao estilo empregado por Vieira neste trecho, pode-se afir-mar:a) O autor recorre ao Cultismo da linguagem com o intuito de conven-

cer o ouvinte e por isto cria um jogo de imagens.b) Vieira recorre ao preciosismo da linguagem, isto é, através de fatos

corriqueiros, cotidianos, procura converter o ouvinte.c) Padre Vieira emprega, principalmente, o Conceptismo, ou seja, o

predomínio das idéias, da lógica, do raciocínio.d) O pregador procura ensinar preceitos religiosos ao ouvinte, o que

era prática comum entre os escritores gongóricos.

15 (FUVEST-SP) Sobre o estilo de Coelho Neto:

“Pode-se mesmo dizer... que o seu maior compromisso é com a lin-guagem, presa à tradição de prosadores seiscentistas, donde o ex-cessivo aportuguesamento do estilo.”(Antônio Cândido e J. Aderaldo Castello)

É obra representativa da prosa seiscentista:a) Monólogo do Vaqueiro, de Gil Vicente.b) Os Lusíadas, de Camões.c) Eurico, o Presbítero, de Alexandre Herculano.d) Nova Floresta, de Manuel Bernardes.e) Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett.

16 (VUNE-SP) “Ecce exiit qui seminat, seminare”. Diz Cristo, que saiu opregador evangélico a semear a palavra divina. Bem parece este textodos livros de Deus. Não só faz menção do semear, mas faz tambémcaso de sair. “Exiit”, porque no dia da messe hão-nos de medir a se-meadura, e hão-nos de contar os passos. O mundo, aos que lavraiscom ele, nem vos satisfaz o que despendeis, nem vos paga o queandais, Deus não é assim. Para quem lavra com Deus até o sair é

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semear, porque também das passadas colhe fruto. Entre os semea-dores do Evangelho, há uns que saem a semear, há outros que se-meiam sem sair. Os que saem a semear, são os que vão pregar àÍndia, à China, ao Japão: os que semeiam sem sair são os que secontentam com pregar na Pátria. Todos terão sua razão, mas tudotem sua conta. Aos que têm a seara em casa, pagar-lhes-ão a se-meadura: aos que vão buscar a seara tão longe, hão-lhes de medir asemeadura, e hão-lhes de contar os passos. Ah dia do Juízo! Ah pre-gadores! Os de cá, achar-vos-ei com mais paço; os de lá, com maispassos: “Exiit seminare”.

O trecho acima transcrito pertence ao mais famoso sermão do PadreAntônio Vieira, o Sermão da Sexagésima. Os sermões de Vieira, alémde obedecerem às regras próprias da arte sermonária, pertencem igual-mente à literatura. Justamente a prosa de Vieira é um dos mais belosexemplos da literatura da época, que se caracterizava, de um lado,pela utilização de imagens sonoras e coloridas, metáforas audacio-sas, em suma, por um luxo verbal dirigido aos sentidos; tudo isso temo nome de cultismo. Por outro lado, a literatura empenhava-se emproduzir um jogo de conceitos, analogias, trocadilhos, armadilhas se-mânticas que punham à prova a inteligência do leitor; a isso se dá onome de conceptismo.

Apesar das poucas linhas do texto transcrito, é possível identificar aépoca literária a que ele pertence e a que estética obedece, dentrodas características acima indicadas. Assinale a alternativa que tem aresposta correta:a) Literatura medieval. Conceptismo.b) Literatura barroca. Conceptismo.c) Literatura romântica. Cultismo.d) Literatura romântica. Conceptismo.e) Literatura moderna. Conceptismo.

17 (CESCEA) Qual a escola característica da literatura portuguesa, aotempo em que viveu o Padre Antônio Vieira:

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a) provençalb) dos poetas palacianosc) arcádicad) românticae) gongórica

18 (CESCEA) A Época Seiscentista da Literatura Portuguesa caracteri-zou-se:a) pelo culto da antiguidade clássica.b) pelo desenvolvimento havido no teatro popular.c) por não ter existido nenhum grande orador ou grande historiador.d) pelo Gongorismo, isto é, pelo culto da forma retorcida e obscura.e) não sei.

19 (UF-RO) No fim do século XVI, as renovações culturais trazidas peloRenascimento na Península Ibérica começaram a sofrer uma evolu-ção, que deu origem a um novo estilo literário. Assinale a alternativacorrespondente ao estilo literário originado em conseqüência do fatoacima expresso:a) Realismob) Arcadismoc) Barrocod) Romantismoe) Modernismo

20 (FUVEST-SP) O bifrontismo do homem, santo e pecador; o impulsopessoal prevalecendo sobre normas ditadas por modelos; o culto docontraste; a riqueza de pormenores – são traços constantes da:a) composição poética parnasianab) poesia simbolistac) produção poética arcádica de inspiração bucólicad) poesia barrocae) poesia condoreira

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As questões de números 21 e 22 baseiam-se no seguinte texto:

“Tão inteiramente conhecia Cristo a Judas, como a Pedro e aos de-mais; mas notou o Evangelista com especialidade a ciência do Se-nhor, em respeito de Judas, porque em Judas mais que em nenhumdos outros campeou a fineza do seu amor. Ora vede: Definindo S.Bernardo o amor fino, diz assim: Amor non quaerit causam, nec fructum:“O amor fino não busca causa nem fruto.” Se amo, porque me amam,tem o amor causa; se amo, para que me amem, tem fruto: e amor finonão há de ter por quê, nem para quê. Se amo porque me amam, éobrigação, faço o que devo; se amo para que me amem, é negocia-ção, busco o que desejo. Pois como há de amar o amor para ser fino?Amo, quia amo, amo, ut amem: amo, porque amo, e amo para amar.Quem ama porque o amam, é agradecido; quem ama para que oamem, é interesseiro; quem ama, não porque o amam, nem para queo amem, esse só é fino. E tal foi a fineza de Cristo, em respeito deJudas, fundada na ciência que tinha dele e dos demais discípulos.”(Pe Antônio Vieira. In: Vieira, Sermões. 4. ed.Rio de Janeiro: Agir, 1966, p. 64.)

21 (VUNESP-SP) O Padre Antônio Vieira (1608-1697), em cuja prosa ora-tória coexistem os princípios barrocos do cultismo e do conceptismo, éconsiderado um dos maiores oradores de todos os tempos, em línguaportuguesa. Em seus sermões, se serve freqüentemente do simbolis-mo das Sagradas Escrituras para desenvolver argumentos de raciocí-nio complexo, mas sempre de modo claro e preciso. No fragmentoacima transcrito, Vieira aborda fundamentalmente o tema do amor. Releiao texto dado e, a seguir, responda: Quantas e quais são as espécies deamor, segundo Vieira?

22) (VUNESP-SP) Verifique no texto as menções feitas por Vieira ao amorde Cristo pelos apóstolos e, a seguir, justifique como se dá o amor deCristo a Judas, de acordo com a argumentação de Vieira.

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ARCADISMO(1756-1825)

Equilíbrio, clareza e racionalidade. Este edifício, construídoem 1792, em Washington, Estados Unidos, revela aretomada desses valores clássicos.

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ARCADISMO,NEOCLASSICISMOOU SETECENTISMO: século XVIII

CONTEXTO HISTÓRICO: Iluminismoindependência dos Estados

UnidosRevolução FrancesaPrimeira Revolução Industrialliberalismo econômicoascensão política da burguesiaexpulsão dos jesuítas de Portugal

CARACTERÍSTICAS: fundação de arcádiasnovo interesse pelos clássicosnovo predomínio da razãorestabelecimento do equilíbriosimplicidadedesprezo dos exageros barrocosinutilia truncataurea mediocritasfugere urbem

AUTORES: BocageAntônio Dinis da Cruz e SilvaNicolau TolentinoFilinto ElísioMarquesa de Alorna

Barroco Arcadismo

• rebuscamento formal • culto da simplicidade (intilia truncat)

• exagero, contrastes • equilíbrio, harmonia

• tensão: racionalidade/ • racionalismo emotividade

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Arcadismo, Neoclassicismoou Setecentismo foi um movimen-to literário iniciado em 1756, coma fundação da Arcádia Lusitana,e encerrado em 1825, com a pu-blicação do poema Camões, deAlmeida Garrett. Surgido numaépoca de modificações político-econômico-sociais radicais, oArcadismo insurgiu-se contra osexageros barrocos e propôs umavolta aos ideais clássicos de artee vida. Em Portugal foi um perío-do marcado por intensa atividadecrítica e doutrinária em prosa e noqual, literariamente, floresceu tão-somente a poesia.

A Arcádia é uma região montanhosa do Peloponeso, Grécia.Um dos seus montes, o Mênalo, era celebrado pelos poetaspor ser consagrado a Apolo, deus da inspiração e condutordas musas. A Arcádia era também uma região de pastores.

Contexto HistóricoNa Europa, sobretudo na França – onde as academias se

mutiplicaram –, toda a segunda metade do século XVIII foimarcada pelo espírito científico, baseado na razão, na observa-ção e na experimentação. Os resultados da revolução técnica

Arcádia Lusitana (símbolo).

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ARCADISMO (1756-1825)

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* Principal expressão do pensamento iluminista, a Enciclopédia,coordenada por d´Alembert, Diderot e Voltaire e

publicada entre 1750 e 1780, traduzia a nova concepçãode organização social e política baseada no culto à razão, ao progresso,

às ciências.

O homem voltou a acreditar na sua capacidade de modi-ficar a natureza, agora, pela técnica: o uso da energia a vaporna indústria têxtil inglesa, invento fundamental da Primeira Re-volução Industrial, definiu o papel da máquina na produção.

Ao lado desse progresso técnico, a física de Newton, oempirismo de Locke e as idéias filosóficas dos enciclopedis-tas* propiciaram o desenvolvimento do Iluminismo europeu,que acreditava no poder da ciência e na razão que havia depenetrar as trevas da superstição e fazer ver a desordem domundo, para que a sociedade, enfim, se reestruturasse se-gundo critérios racionais.

Os autores que mais influenciaram o período foram:

• Montesquieu: no seu livro, O espírito das leis, propõe adivisão do governo em três poderes — executivo,legislativo e judiciário;

• Rousseau: autor de Discurso sobre a origem da desi-gualdade dos homens, O contrato social, Emílio, ele de-fende a teoria do “bom selvagem”, segundo a qual ohomem nasce bom e a sociedade o corrompe, portanto,só a volta à natureza pura é garantia de felicidade (essateoria será a base da literatura indianista brasileira);

• Voltaire: um dos ideólogos do despotismo esclarecido.

iniciada no Renascimento apareceram nesse momento, quandoa burguesia, finalmente, se afirmou como força não só econômi-ca, mas também politicamente dominante.

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“Quando menino esteve na escolaera aplicado, tinha religiãoquando jogava bola

era escolhido para capitãomas a vida tem os seus revesesdiz sempre, Chico, defendendo tesesse o homem nasceu bome bom não se conservoua culpa é da sociedadeque o transformou.”

O compositor brasileiro Paulinho da Viola canta um sambaintitulado “Chico Brito”, de Wilson Batista e Afonso Teixeira, queincorpora o pensamento rousseauniano:

A burguesia dominava o comércio ultramarino e estabeleci-mentos bancários e lutava contra a decadente aristocracia here-ditária e fundiária. Os déspotas esclarecidos, soberanos educa-dos dentro dessa nova mentalidade, protegiam os interesses daburguesia e foram agentes do Iluminismo.

Toda essa efervescência preparou o campo não só para a inde-pendência dos Estados Unidos (1776) e de vários outros paíseslatino-americanos, como também para a Revolução Francesa (1789).

Em Portugal, no reinado de D. João V (1707 a 1750), os conta-tos com os outros países da Europa intensificaram-se pela açãodo grupo de pensadores afugentados pela Inquisição. Luís Antô-nio Verney propôs, em seu livro Verdadeiro método de estudar, areforma do ensino superior, segundo os princípios iluministas.

No reinado do déspota esclarecido D. José I (1750 a 1777), soba condução de seu primeiro-ministro – o marquês de Pombal –, ces-sou a perseguição aos cristãos-novos; em 1755, depois do terremo-to, Lisboa foi reconstruída segundo arrojadas linhas arquitetônicas;em 1759, os jesuítas foram expulsos de Portugal e o ensino tornou-se leigo; em 1779, foi fundada a Academia de Ciências de Lisboa.

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Manifestações ArtÍsticasA preocupação em recuperar a arte clássica, recém-revelada

pelas escavações de Herculano e Pompéia, reflete-se na arquiteturae na escultura: simetria, simplicidade, equilíbrio e sobriedade, quali-dades que se opunham frontalmente ao Barroco. A estátua Ebe, doescultor Canova, ilustra esse retorno à Antiguidade clássica.

Embora a pintura não imite os clássicos (mesmo porque nãohavia muitas referências da Antigüidade), todo tema deveria inspi-rar-se na história e na mitologia clássicas. O Juramento dos Horácios,

de David, inaugura o Neoclassicis-mo. Observe a imobilidade escul-tórica das figuras, o retorno à so-briedade e à severidade clássicas.

LiteraturaEm 1756, Antônio Dinis da Cruz e Silva fundou a Arcádia

Lusitana ou Ulissiponense, que definiu o Arcadismo como esco-la literária. Os sócios da Arcádia deviam adotar pseudônimospastoris e tinham por divisa o dístico Inutilia truncat (corta o inú-til), isto é, os exageros, o rebuscamento e a extravagância barro-cos deveriam ser cortados para a literatura voltar ao equilíbrio dosclássicos. Inspirados em Horácio, procuravam nas suas poesiasseguir alguns princípios:

Ebe, de Canova. O juramento dos Horácios, de David.

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• fugere urbem (fugir da cidade): influenciados pela teoriado “bom selvagem” de Rousseau, os árcades voltavam-se para a natureza, vista como lugar de perfeição, para aílevar uma vida simples, bucólica, pastoril;

• carpe diem (aproveita o dia): postura comum no Arcadis-mo, que consiste em aproveitar ao máximo o momentopresente;

• aurea mediocritas (áurea mediocridade): exaltação da simpli-cidade, do equilíbrio conseguido em contato com a natureza.

Observe como se manifestam esses princípios neste sonetoem que Bocage enaltece a simplicidade da vida no campo:

As características fundamentais do Arcadismo são:1) volta aos modelos clássicos, com a retomada da mitolo-

gia como elemento estético;

Doçura da vida campestreNos campos o vilão* sem sustos passa,Inquieto na corte o nobre mora;O que é ser infeliz aquele ignora,Este encontra nas pompas a desgraça;

Aquele canta e ri, não se embaraçaCom essas cousas vãs que o mundo adora;Este (oh! cega ambição!) mil vezes chora,Porque não acha bem que o satisfaça.

Aquele dorme em paz no chão deitado;Este no ebúrneo leito preciosoNutre, exaspera velador cuidado.

Triste, sai do palácio majestoso:Se hás de ser cortesão, mas desgraçado,Antes sê camponês e venturoso.

(Bocage. Poesias. Lisboa: Sá da Costa, 1943)

* vilão: habitante da vila, do campo

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2) simplicidade como forma de reação aos exageros da lin-guagem barroca;

3) poesia bucólica, pastoril;4) fingimento poético: uso de pseudônimos pastoris.Veja como todas elas estão presentes neste outro soneto de

Bocage, cuja linguagem é simples e sóbria:

Convite a Marília* * pseudônimo pastoril

XVI

Já se afastou de nós o Inverno agresteEnvolto nos seus úmidos vapores;A fértil Primavera, a mãe das floresO prado ameno* de boninas veste: * paisagem bucólica

Varrendo os ares o sutil nordesteOs torna azuis; as aves de mil coresAdejam entre Zéfiros*, e Amores, * referências mitológicas

E toma o fresco Tejo a cor celeste:

Vem, ó Marília, vem lograr comigoDestes alegres campos a beleza,Destas copadas árvores o abrigo:

Deixa louvar da corte a vã grandeza:Quanto me agrada mais estar contigoNotando as perfeições da Natureza!

(Bocage. Poesias. Op. cit.)

Os sonetos de Bocage que transpõem poeticamente a expe-riência do autor na região colonial de Goa apresentam algunstraços semelhantes aos dos poemas em que, anteriormente,Gregório de Mattos enfocara a sociedade colonial da Bahia.Assim, a presunção da superioridade, crítica da vaidade e pre-conceito de cor são traços comuns a ambos os poetas.

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Rep

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çãoBocage

(1765- 1805)

Principal autor do Arcadismo,Manuel Maria Barbosa du Bocageparticipou da Nova Arcádia com opseudônimo árcade de ElmanoSadino (Elmano é o anagrama quase perfeito de Manuel e Sadinorefere-se ao rio Sado, que passa pela sua cidade natal).

Bocage levou uma vida agitada, boêmia e infeliz, muito se-melhante à de Camões, que considerava seu mestre.

Existem dois Bocages:o satírico e o lírico. Suaobra satírica, às vezesgrosseiramente obscena eerótica, critica a nobrezadecadente, o clero e seuscontemporâneos, mas é aparte menos importante desua produção. A mais im-portante é a lírica, em que se percebem duas fases:

Muitos autores tomam os riosda terra natal como tema poéti-co. Camões celebrou os rios Mon-dego e Tejo; Bocage cantou o Tejoe o Sado, rio que passa por suaterra natal: Setúbal.

1) a árcade: nela Bocage segue as convenções neoclássicas:bucolismo, postura pastoril, apuro formal;

2) a pré-romântica (novidade para a época): aqui o poetaoscila entre a razão e o sentimento, imprime um tomconfessional a seus poemas, valoriza o sentimentalis-mo, experimenta o gosto pela noite e encara a mortecomo solução para seus problemas, antecipando, as-sim, a geração ultra-romântica. Perceba essas caracte-rísticas neste soneto:

Bocage

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Rep

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ção

Ó retrato da morte, ó Noite amigaPor cuja escuridão suspiro há tanto!Calada testemunha de meu pranto,De meus desgostos secretária antiga!

Pois manda Amor, que a ti somente os diga,Dá-lhes pio* agasalho no teu manto; * piedoso

Ouve-os, como costumas, ouve, enquantoDorme a cruel, que a delirar me obriga:

E vós, ó cortesãos da escuridade,Fantasmas vagos, mochos piadores,Inimigos, como eu, da claridade!

Em bandos acudi aos meus clamores;Quero a vossa medonha sociedade,Quero fartar meu coração de horrores.

Antônio Dinis da Cruz e Silva(1731-1799)

Rep

rodu

ção

Fundador da Arcádia Lusitana, adotou opseudônimo de Elpino Nonacriense. De sua obradestaca-se o poema herói-cômico O hissope,em que ridiculariza a mentalidade escolástica, overso gongórico e a sociedade nobre e clerical.

Nicolau Tolentino(1740- 1811)

Famoso por sua obra satírica, Tolentino ana-lisa com humor fino a sociedade burguesa deseu tempo. Seu humor, no entanto, não tem umaintenção moralista, apenas constata o ridículodas situações e das pessoas que nelas atuam.

Antônio Dinisda Cruz e Silva

Nicolau Tolentino

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Os sonetos seguintes exemplificam a veia satírica de NicolauTolentino.

A UM LEIGO ARRÁBIDO* VESGO DESPEDIDO DA MESA DES. C. P. SILVA, POR TOMAR A MELHOR PÊRA DA MESA.

O vesgo monstro que côa gente ralhaE de manhã a todos atravessa,A cuja hirsuta sórdida cabeçaNunca chegou juízo, nem navalha;

Que os gázeos olhos pela mesa espalhaPor ver se há mais comer que tire, ou peça,Entrando nele com tal fome e pressaQual faminto frisão em branda palha;

Por crimes de alta gula e pouco siso,De mesa bem servida, mas severa,Foi um dia lançado de improviso.

Hoje chorando o seu perdão espera:Perderam dois glutões o paraíso,O antigo por maçã, este por pêra.

O COLCHÃO DENTRO DO TOUCADO

Chaves na mão, melena desgrenha,Batendo o pé na casa, a mãe ordena,Que o furtado colchão, fofo, e de pena,A filha o ponha ali, ou a criada:

A filha, moça esbelta, e aparaltada,Lhe diz côa doce voz, que o ar serena:“Sumiu-se-lhe um colchão, é forte pena;Olhe não fique a casa arruinada:”

* arrábido = frade do convento da Serra da Arrábida (Setúbal).

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“Tu respondes assim? Tu zombas disto?Tu cuidas que por ter pai embarcado,Já a mãe não tem mãos?” E dizendo isto,

Arremete-lhe à cara e ao penteado;Eis senão quando (caso nunca visto!)Sai-lhe o colchão de dentro do toucado.

DEITANDO UM CAVALO À MARGEM

Vai, mísero cavalo lazarento,Pastar longas Campinas livremente;Não percas tempo, enquanto to consenteDe tão magros cães faminto ajuntamento:

Esta sela, teu único ornamento,Para sinal de minha dor veemente,De torto prego ficará pendente,Despojo inútil do inconstante vento:

Morre em paz; que em havendo algum dinheiro,Hei de mandar, em honra de teu nome,Abrir em negra pedra este letreiro:

“Aqui, piedoso entulho os ossos comeDo mais fiel, mais rápido sendeiro,Que fora eterno a não morrer de fome.”

(Obras Completas, ens. biografia-crit. porJosé de Torres. Lisboa: Castro, Irmão

& Cia., 1861, pp. 26, 39 e 51.)

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çãoPadre José Agostinho de Macedo

(1734- 1819)

Seu pseudônimo arcádico era FilintoElísio. Seguiu à risca os postulados neoclás-sicos e refletiu claramente a influência doIluminismo quando fez a divulgação da físicade Newton. Em seu poema épico “O Orien-te”, pretendeu corrigir Camões, parafrasean-do Os Lusíadas, mas sem usar a mitologia.

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rodu

ção

Por suas viagens pela França, Alemanha,Áustria e Inglaterra, Leonor de Almeida, amarquesa de Alorna, foi uma das divulga-doras do Romantismo em Portugal. Sob opseudônimo de Alcipe, escreveu poemascuja temática (a morte, a noite, o sofrimento)antecipa esse movimento literário.

Marquesa de Alorna(1750-1839)

Padre José Agostinhode Macedo

Marquesa de Alorna

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Questões de Vestibular

1 (Positivo-PR)“Magnífica idéia de banir da poesia o inútil adorno das palavras empo-ladas, conceitos estudados, freqüentes antíteses, metáforasexorbitantes e hipérboles sem modo, introduzindo em nossos versoso delicioso e apetecido ar de simplicidade.”Este excerto pode muito bem representar um resumo das intenções do:a) Modernismo d) Arcadismob) Barroco e) Romantismoc) Simbolismo

2 (Mackenzie-SP) Aponte a alternativa cujo conteúdo não se aplica aoArcadismo:a) Desenvolvimento do gênero épico, registrando o início da corrente

indianista na poesia brasileira.b) Presença da mitologia grega na poesia de alguns poetas desse

período.c) Propagação do gênero lírico, em que os poetas assumem a postu-

ra de pastores e transformam a realidade num quadro idealizado.d) Circulação de manuscritos anônimos de teor satírico e conteúdo

político.e) Penetração da tendência mística e religiosa, vinculada à expressão

de ter ou não ter fé.

3 (ABC-SP) “...”, um dos termos usuais para caracterizar o estilo da épocase prende, por um lado, à tendência a imitar os clássicos franceses,comum na Europa de setecentos, e, no que se refere à literatura por-tuguesa e brasileira, identificaria a preocupação de combater oCultismo, imitar gregos e romanos, como Virgílio, Horácio, Teócrito eAnacreonte, tomar como modelo as atitudes literárias do século XVI. Alacuna seria corretamente preenchida por:a) Barroco d) Parnasianismob) Neoclassicismo e) Simbolismoc) Romantismo

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4 (FUVEST-SP) “Por fim, acentua o polimorfismo cultural dessa época ofato de se desenrolarem acontecimentos historicamente relevantes,como a Inconfidência Mineira e a transladação da corte de D. João VIpara o Rio de Janeiro.”(Massaud Moisés)A época histórica a que se refere o crítico é a do:a) Simbolismo d) Realismob) Arcadismo e) Romantismoc) Parnasianismo

5 (CESESP-PE)I. “O momento ideológico, na literatura do Setecentos, traduz a críti-

ca da burguesia culta aos abusos da nobreza e do clero.”II. “O momento poético, na literatura do Setecentos, nasce de um

encontro, embora ainda amaneirado, com a natureza e os afetoscomuns do homem.”

III. “Façamos, sim, façamos, doce amada,Os nossos breves dias mais ditosos”

A característica que está presente nestes versos é o carpe diem (go-zar a vida).a) Só a proposição I é correta.b) Só a proposição II é correta.c) Só a proposição III é correta.d) São corretas as proposições I e II.e) Todas as proposições são corretas.

6 (F. Objetivo-SP) Ele é considerado um dos três maiores sonetistas dalíngua portuguesa, ao lado de Camões e de Antero de Quental. Suapoesia lírica, extremamente pessoal, é marcada por um rebeldelibertarismo emocional, às vezes violento, às vezes calmo. Sua vastaobra poética apresenta dois aspectos fundamentais: o satírico e o líri-co; mas é no lírico que o poeta se realiza plenamente e fica famoso.Foi, sem dúvida, o maior poeta do século XVIII português. Seu pseu-dônimo arcádico é Elmano Sadino. Trata-se de:

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a) Cruz e Silva d) Almeida Garrettb) Domingos Caldas Barbosa e) Bocagec) Filinto Elíseo

7 (FUVEST-SP) “...tem no temperamento a exaltação que há de carac-terizar os românticos, e foge, mais de uma vez, aos temas literários daArcádia, mas obedece aos princípios da estética expressional doNeoclassicismo setecentista...”(Hernâni Cidade)a) Camilo Pessanha d) João de Deusb) Antero de Quental e) Barbosa du Bocagec) Bernardim Ribeiro

8 (FUVEST-SP) “E em arte aos de Minerva se não rendemTeus alvos, curtos dedos melindrosos.”

Indique a característica presente nos versos acima, de autoria deBocage:a) uso de pseudônimos d) predominância de subjetivismob) rompimento com os clássicos e) tema pastorilc) recurso à mitologia greco-romana

9 (FUVEST-SP) “Razão feroz, o coração me indagas,De meus erros a sombra esclarecendo,E vás nele (ai de mim!) palpando, e vendoDe agudas ânsias venenosas chagas:”

O Pré-romantismo é uma fase de transição do Arcadismo para o Ro-mantismo. Aponte no fragmento deste soneto de Bocage uma carac-terística árcade e outra romântica.

10 (UM-SP) “Olha, Marília, as flautas dos pastoresQue bem que soam, como estão cadentes!Olha o Tejo, a sorrir-se! Olha, não sentesOs Zéfiros brincar por entre as flores?

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Vê como ali beijando-se os AmoresIncitam nossos ósculos ardentes!Ei-las de planta em planta as inocentes,As vagas borboletas de mil cores!”

Observando as características arcádicas que se apresentam nos quar-tetos acima, pode-se afirmar corretamente que são da autoria de:a) Cláudio Manuel da Costab) Basílio da Gamac) Camõesd) Tomás Antônio Gonzagae) Bocage

11 (CESCEM) Movimento estético preocupado com a articulação da cul-tura e das virtudes civis, situa a natureza como pedra de toque daharmonia do mundo e faz, do racionalismo e do combate a excessossentimentais, pólos de seu ideário. Trata-se do:a) Barroco d) Simbolismob) Arcadismo e) Modernismoc) Romantismo

12 (CESCEM) Movimento estético que gravita em torno de três geratrizes.Natureza, Verdade e Razão, buscando fazer da literatura a “expressãoracional da natureza para, assim, manifestar a verdade”. Trata-se do:a) Barroco d) Neoclassicismob) Romantismo e) Modernismoc) Simbolismo

13 (UF-RO) Os árcades tiveram suas inspirações na sobriedade dos poe-tas clássicos, daí o nome Neoclassicismo. Onde passaram a valorizar:a) o bucolismo, a prosa e o subjetivismo burguês.b) a razão, a simplicidade e a disciplina.c) o bucolismo, o teocentrismo e a razão.d) A prosa, a linguagem rebuscada e o subjetivismo burguês.e) Antítese, a razão e a simplicidade.

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14 (OSEC) A ordem arcádica “Inutilia truncat” ‘é de inspiração:a) horaciana c) platônicab) aristotélica d) socrática

15 (UF-PA)Texto 1“Queres que fuja de Marília Bela,Que a maldiga, a desdenhe; e o meu desejoÉ carpir, delirar, morrer por ela”

Texto 2“Musa, não cantes bárbara proezaDe um braço audaz, de um coração tirano:Não celebres o undívago troiano,Pérfido à tíria, mísera princesa”

O lirismo dos dois trechos acima se orienta pelo academicismo doséculo XVIII. Seu autor éa) Antônio Nobre d) Luís de Camõesb) Almeida Garrett e) Gregório de Matos Guerrac) Barbosa du Bocage

16 (UF-PA) “Outro Aretino fui... A santidadeManchei... Oh!, se me creste, gente ímpia,Rasga meus versos, crê na eternidade”

O autor destes versos é um dos maiores sonetistas da língua por-tuguesa, criador de textos marcados por subjetividade, confessio-nalismo, autolamentação, pastorialismo e ardente admiração a Luísde Camões. Pode-se compreender esse escritor integrado aosperíodos:a) Barroco e Árcade d) Romântico e Parnasianob) Árcade e Pré-romântico e) Parnasiano e Simbolistac) Pré-romântico e Romântico

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ROMANTISMO(1825-1865)

A liberdade conduzindo o povo, de Delacroix

A palavra de ordem do Romantismo é liberdade: do eu, dospovos, da arte.

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ção

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Arcadismo Romantismo

• literatura de elite • literatura aproxima-se do povo

• universalismo • nacionalismo (folclore)

• linguagem erudita • linguagem popular

• mitologia pagã • religiosidade cristã

• predomínio da razão • domínio do sentimento

• regras e convenções • liberdade de criação

ROMANTISMO: século XIX

CONTEXTO HISTÓRICO: triunfo da burguesiapopularização das artesliberalismo econômicoNapoleão invade Portugalvinda da Família Real para o Brasil

CARACTERÍSTICAS: individualismosubjetivismofuga da realidade através do sonhoda loucurada morteda naturezado tempo (retorno à Idade Média)

AUTORES: 1o momento (influência neoclássica):Almeida GarrettAlexandre HerculanoAntônio Feliciano de Castilho

2o momento (ultra-romantismo):Camilo Castelo BrancoSoares de Passos

3o momento (transição para o Realismo):João de DeusJúlio Dinis

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Dom Pedro IV, de Portugal, é omesmo D. Pedro I, do Brasil. Aqui eraum conservador; lá, um liberal que as-sume a luta contra os conservadores,liderados por seu irmão, Dom Miguel.

O Romantismo, em Portugal, inicia-se com a publicação dopoema “Camões”, de Almeida Garrett, em 1825, e termina, em1865, com a “Questão Coimbrã”, que deu início à estética realis-ta. Durante os 40 anos de vigência, o Romantismo apresentoutrês fases: a primeira, cuja produção ainda refletia alguns valoresneoclássicos; a segunda, em que as características românticassão levadas ao exagero; e a terceira, que representa uma transi-ção para o Realismo.

Contexto HistóricoO século XIX assistiu a modificações radicais, conseqüência

da Revolução Industrial, que provocou o aparecimento do prole-tariado concentrado nas grandes cidades, e da Revolução Fran-cesa, que, com seu ideal de Liberdade, Igualdade e Fraternidade,subverteu as relações sociais.

O absolutismo deu lugar ao liberalismo. Como resultado,economicamente, instalou-se a livre concorrência e, politicamen-te, reforçou-se a liberdade individual.

A burguesia triunfava. Capitalista e liberal, ela suscitou umacivilização materialista, desenvolveu o capitalismo comercial,controlou a política. O dinheiro era rei, por isso a geração jovemdesenvolveu um desejo de evasão ou revolta contra esse mate-rialismo que desembocou no Romantismo.

Portugal viveu também esse clima, agravado pela invasãode Napoleão, que obrigou a Família Real, em 1808, a vir para oBrasil. Os portugue-ses viveram um mo-mento caótico: foramgovernados pelos in-gleses, que lá comba-teram as tropas napo-leônicas; o Brasil tor-

ROMANTISMO (1825-1865)

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Mulheresargelinasem seus

aposentos,de Delacroix.

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nou-se independente; D. Miguel e D. Pedro IV (I do Brasil) luta-ram pelo trono. Após a vitória de D. Miguel, houve uma violentaonda de emigração de intelectuais liberais. Esse fato propiciou oaparecimento de uma elite atualizada, pois achava-se em sintoniacom as novidades européias.

Manifestações ArtísticasO Romantismo representou uma verdadeira revolução na

concepção de vida e, por conseqüência, na arte. Rompeu com atradição clássica e o culto da Antigüidade, com o racionalismo,com as convenções.

A liberdade de criação, o individualismo, a emotividade, oexotismo e o nacionalismo foram a tônica na pintura e na músi-ca. Observe o fascínio romântico pelo exotismo presente nestequadro de Delacroix:

Na música, o aproveitamento de canções populares de seuspaíses para óperas em miniatura manifestou-se nas obras de

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Schumann e Schubert. O polonês Frédéric Chopin buscou inspi-ração nas danças populares de sua terra para expressar suaspaixões. Os noturnos de Chopin representam outra característi-ca romântica em música: a sentimental atração pela noite.

A arquitetura e a escultura, no entanto, sofreram pouca influên-cia da nova estética, atendo-se ainda aos padrões neoclássicos.

LiteraturaAs origens do Romantismo remontam a dois países:

1) Alemanha: em fins do século XVIII, o movimento Sturmund Drang (tempestade e ímpeto) é responsável poruma onda européia de emotividade levada ao extre-mo. O sentimentalismo do Werther, romance de Goetheque conta os sofrimentos de um jovem que se matapor causa de um amor impossível, tornou moda na Eu-ropa o suicídio.

2) Inglaterra: Sir Walter Scott, autor de Ivanhoé, escrevendoromances históricos, iniciou a corrente de superstições efantasmas. Lord Byron mostrou que a vida do artista con-fundia-se com a própria obra, ele é a expressão do idealromântico: além de escrever poesia ultra-romântica, cheiade pessimismo, participou das lutas pela independênciada Grécia.

À França coube a tarefa de divulgar essas novas idéias.

O surgimento de um público consumidor – sem educaçãoliterária, que ignorava os valores clássicos, as referências mito-lógicas, que preferia a linguagem mais simples e direta, os enre-dos romanescos, o sentimentalismo – determinou a profissiona-lização do escritor, que ganhou consciência do seu papel juntoàs massas, chegando a sentir-se algumas vezes um profeta, umcondutor dos povos.

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Reagindo aos clássicos, os românticos revoltaram-se contraas regras, os modelos, defendendo a liberdade de criação. Quantoà forma, foi comum a utilização do verso livre (sem métrica nemestrofação) e do verso branco (sem rima). Quanto ao conteúdo,alguns temas, francamente opostos aos do Arcadismo, lhe sãocaracterísticos:

1) sentimentalismo: o “eu” torna-se o centro do universo(egocentrismo). As razões do coração opõem-se ao racio-nalismo clássico;

2) supervalorização do amor (conseqüência do sentimenta-lismo): o amor foi encarado como o valor mais importanteda vida em oposição àquele mais cultivado pela burgue-sia: o dinheiro.

3) mal-do-século: o poeta sentimental, que supervalorizavao amor, sentia-se frustrado e desajustado diante da reali-dade, o que gerava uma sensação de angústia, tédio, in-satisfação, melancolia.

4) evasão: tentando encontrar saídas para esse estado deangústia, o romântico desenvolveu mecanismos de fugada realidade:

a) evasão no tempo: o romântico procurou as raízes da na-cionalidade na Idade Média cavaleiresca e cristã e criouheróis nacionais;

b) evasão no espaço: o romântico exalta a natureza, conce-bida como extensão do próprio “eu” — se o poeta é tris-te, o cenário natural também o é, com uma predileçãopelas paisagens noturnas;

c) a morte: essa foi a fuga mais radical, a solução definitivade todos os conflitos.

O Romantismo português apresentou três momentos:

• primeiro momento: escritores ainda presos a alguns prin-cípios neoclássicos, mas responsáveis pela introdução do

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Primeiro Momento

Almeida Garrett(1799-1854)

Na poesia de Garrett, introdutordo Romantismo em Portugal, exis-tem três fases:

a) a primeira, totalmente ligadaao Arcadismo, a que perten-cem os textos da Lírica deJoão Mínimo;

b) a segunda, ainda não totalmente romântica, em que seencontram dois poemas narrativos. Em “Camões”, marcoinicial do Romantismo, o poeta explorou os aspectos sen-timentais, a vida pessoal do autor de Os Lusíadas. Em “D.Branca”, Garrett resgatou a história medieval portuguesa.

c) a terceira revela um autor tipicamente romântico. Em Flo-res sem fruto e Folhas caídas misturam-se dor, angústia,sentimentalismo e sensualidade. Observe como, nestepoema, seu lirismo fundamenta-se no desejo de excitar asensualidade:

Romantismo em Portugal: Almeida Garrett, AlexandreHerculano e Antônio Feliciano de Castilho.

• segundo momento: superados os laços arcádicos, seguiu-se o pleno domínio da estética romântica. São represen-tantes de ultra-romantismo (romantismo levado ao exa-gero): Camilo Castelo Branco e Soares de Passos.

• terceiro momento: caracterizou-se por um romantismomais contido que anuncia a transição para o Realismo:João de Deus e Júlio Dinis.

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Almeida Garret

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Não te amoNão te amo, quero-te: o amar vem d´alma.E eu n´alma – tenho a calma,A calma – do jazigo.Ai! Não te amo, não.

Não te amo, quero-te: o amor é vidaE a vida – nem sentidaA trago eu já comigo.Ai! Não te amo, não!

Ai! Não te amo, não; e só te queroDe um querer bruto e feroQue o sangue me devora,Não chega ao coração.

Não te amo, és bela; e eu não te amo, ó bela.Quem ama a aziaga estrelaQue lhe luz na má horaDa sua perdição?

E quero-te, e não te amo, que é forçado,De mau feitiço azadoEste indigno furor.Mas oh! Não te amo, não.

E infame sou, porque te quero;Que de mim tenho espanto,De ti medo e terror...Mas amar!... não te amo, não.

(Obras. Porto: Lello & Irmão, 1963)

Além de poeta, Garrett foi o fundador do teatro nacional por-tuguês. O nacionalismo está presente em duas peças que sebaseiam no passado histórico:

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1) Um Auto de Gil Vicente é uma homenagem ao iniciadordo teatro em Portugal;

2) Frei Luís de Sousa, ambientada no século XVII, conta odestino trágico (romântico!) desse autor barroco (ver ocapítulo 5), além de referir-se ao mito de D. Sebastião e àbatalha de Alcácer-Quibir.

FREI LUÍS DE SOUZAComposta em três atos em prosa, e representada pela pri-

meira vez em 1843 e publicada no ano seguinte, a tragédia FreiLuís de Souza gravita em torno da vida do prosador cujo nomelhe empresta o titulo. Como se sabe, Madalena de Vilhena eManuel de Souza Coutinho haviam contraído núpcias certos deque D. João de Portugal, marido da primeira, desaparecera emAlcácer-Quibir em companhia de D. Sebastião. Entretanto, eleestava vivo e de regresso à casa, oculto sob os andrajos de umromeiro. Aterrados pela surpresa, colhidos em pecado, os côn-juges buscam ilibar-se do involuntário delito tomando hábito:durante a cerimônia, Maria de Noronha, única filha do casal, morrea seus pés. O fragmento que se vai ler corresponde a parte dacena XIV e à cena XV do ato II.

JORGE (cortando a conversação)Bom velho, dissestes trazer um recado a esta dama: dai-lho

já, que havereis mister de ir descansar. . .

ROMEIRO (sorrindo amargamente)Quereis lembrar-me que estou abusando da paciência com

que me tem ouvido? Fizestes bem, padre; eu ia-me esquecen-do. . . estou tão velho e mudado do que fui!

MADALENADeixai, deixai, não importa; eu folgo de vos ouvir; dir-me-eis

vosso recado quando quiserdes... logo, amanhã...

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ROMEIROHoje há de ser. Há três dias que não durmo nem descanso,

nem pousei esta cabeça, nem pararam estes pés dia nem noite,para chegar aqui hoje, para vos dar meu recado... e morrer de-pois... ainda que morreste depois; porque jurei... faz hoje umano... quando me libertaram, dei juramento sobre a pedra doSepulcro de Cristo...

MADALENAPois éreis cativo em Jerusalém?

ROMEIROEra: não vos disse que vivi lá vinte anos?

MADALENASim, mas...

ROMEIROMas o juramento que dei foi que, antes de um ano cumprido,

estaria diante de vós e vos diria da parte de quem me mandou...

MADALENAE quem vos mandou, homem?

ROMEIROUm homem foi, e um honrado homem... a quem unicamente

devi a liberdade... a ninguém mais. Jurei fazer-lhe a vontade, e vim.

MADALENAComo se chama?

ROMEIROO seu nome nem o da sua gente nunca o disse a ninguém no

cativeiro.

MADALENAMas enfim, dizei vós...

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Em seus romances, a importância do nacionalismo não foimenor. Ele incorporou o gosto pela tradição popular em O Arcode Sant´Anna, inspirado na Crônica de D. Pedro I, de FernãoLopes. Em Viagens na Minha Terra, Garrett entremeia as peripé-cias da história de amor de Joaninha, Carlos e Georgina ao rela-to de uma viagem (que realmente fez) a Santarém.

As viagens na minha terra estão para a prosa portuguesa as-sim como as Folhas Caídas estão para a poesia. Ambas deno-tam simplicidade, naturalidade e espontaneidade, característi-cas até então ausentes na literatura portuguesa.

Almeida Garret, Eça de Queirós e Machado de Assis forammestres de românticos e realistas na arte de substituir oempertigamento e a preconcepção estilística tradicional.

O celibato clerical foi objeto de ampla discussão entre osautores portugueses e, também, entre os brasileiros.

No Romantismo, Alexandre Herculano explora o tema emEurico, o Presbítero e em O Monge de Cister. No Brasil, es-sas obras encontram eco no romance O seminarista, deBernardo Guimarães.

Alexandre Herculano(1810-1877)

Herculano foi o consolidador do romance his-tórico na literatura portuguesa. Em O Bobo re-trata a época de emancipação do CondadoPortucalense (século XII). Sob o título deMonásticon, reúnem-se dois romances: OMonge de Cister, cuja ação se passa duranteo reinado de D. João I, o Mestre de Avis, e Eurico, o Presbítero,

Alexandre Herculano

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Então, recuando, o cavaleiro cristão exclamou:

“Meu Deus! Meu Deus! – Possa o sangue do mártir remir ocrime do presbítero!”

E, largando o franquisque, levou as mãos ao capacete debronze e arrojou-o para longe de si.

Mugueiz, cego de cólera, vibrava a espada: o crânio do seuadversário rangeu, e um jorro de sangue salpicou as faces doSarraceno.

Como tomba o abeto solitário da encosta ao passar do fura-cão, assim o guerreiro misterioso do Críssus caía para não maisse erguer!...

Nessa noite, quando Pelágio voltou à caverna, Hermengarda,deitada sobre o seu leito, parecia dormir. Cansado do combate evendo-a tranqüila, o mancebo adormeceu, também, perto dela,sobre o duro pavimento da gruta. Ao romper da manhã, acordouao som de canto suavíssimo. Era sua irmã que cantava um doshinos sagrados que muitas vezes ele ouvira entoar na catedralde Tárraco. Dizia-se que seu autor fora um presbítero da diocesede Híspalis, chamado Eurico.

Quando Hermengarda acabou de cantar, ficou um momentopensando. Depois, repentinamente, soltou uma destas risadasque fazem eriçar os cabelos, tão tristes, soturnas e dolorosas

sua obra-prima, ambientada na época das lutas da Reconquista.Nesta obra, Herculano discute o celibato clerical. Leia o trecho finaldesse romance, quando é narrada a morte de Eurico, o cavaleiromisterioso, e o enlouquecimento de Hermengarda: duas soluçõesde conflito tipicamente românticas:

Um contra três! – Era um combate calado e temeroso. Ocavaleiro da Cruz parecia desprezar Mugueiz: os seus golpesretiniam só nas armaduras dos dois Godos. Primeiro o velhoOpas, depois Juliano caíram.

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são elas: tão completamente exprimem irremediável alienaçãodo espírito.

A desgraçada tinha, de feito, enlouquecido.(Eurico, o Presbítero. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1a- ed., 1907)

Essa preocupação em retratar a Idade Média já estavapresente em Lendas e Narrativas, obra que contém contos enovelas.

Em Harpa do Crente, cujo poema mais famoso é “A cruzmutilada”, encontra-se o melhor de sua produção lírica.

A cultura atual cultua o herói misterioso como o cavaleirode Eurico. Zorro, cavaleiro negro que luta pela justiça, é exem-plo no cinema, na tevê e nos quadrinhos.

Batman troca o cavalo negro pelo Batmóvel e, em vezdos árabes, combate as tramas de seus rivais Pingüim eCoringa e da Mulher-Gato.

Rep

rodu

ção

Antônio Feliciano de Castilho(1800-1875)

Conhecido por provocar a “Ques-tão Coimbrã” (que deu início ao Rea-lismo em Portugal), Castilho nunca selibertou da influência neoclássica. Seuvalor reside tão-somente no apuro eelegância lingüísticos. Antônio Feliciano de Castilho

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Segundo Momento

Camilo Castelo Branco(1825-1890)

Sua vida afetiva foi um romancede folhetim. Órfão desde os 10 anos,casou-se aos 15. Raptou uma outramoça (sua prima), com quem passoua viver; acusado de bigamia, foi preso. Sua primeira esposa esua filha morreram. Camilo abandonou a prima. Apaixonou-sepor uma poetisa e por uma freira. Conheceu Ana Plácido (casa-da com um rico comerciante). Ingressa num seminário. Saiu epassou a viver com Ana; ambos, acusados de adultério, forampresos (na prisão escreveu Amor de Perdição). Absolvidos, tive-ram dois filhos com problemas de saúde. Casaram-se e passa-ram por dificuldades financeiras. Ana morreu. Cego, por causada sífilis, Camilo suicidou-se.

Camilo Castelo Branco foi o escritor mais fértil de Portu-gal: escreveu perto de 300 obras entre teatro, historiografia,poesia, epistolografia, polêmica e, sobretudo, prosa de fic-ção. Como soube interpretar o gosto do público, escreveunovelas passionais de fácil consumo, grande parte delaspublicadas em folhetins dos jornais da época. Uma narrativa

Rep

rodu

ção

A palavra novela vem do italiano novella, ou seja, peque-nas histórias, como as de Boccaccio em seu Decameron.Em espanhol, o romance é chamado de novela; a nossa

novela é chamada de novela corta; e o conto de cuento.Em inglês, novel é o termo usado para designar romance; shortstory para conto e long story para novela.

Camilo Castelo Branco

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linear, mas densa e objetiva, com poucas descrições e exces-so de peripécias e sentimentalismo, abordando o conflito en-tre as razões do coração e as convenções sociais foram osegredo do seu sucesso.

Em sua novela mais famosa, Amor de Perdição, Camilo contao namoro de Teresa Albuquerque e Simão Botelho, cujas famí-lias, separadas por antigos motivos, não querem o namoro. Elavai para o convento e Simão para o exílio. Ela e Simão morrem.Nesse trecho final da novela, Mariana, que era apaixonada porSimão (e fora, juntamente com uma mendiga, portadora das car-tas dos amantes), atira-se com o cadáver do amado ao mar emorre. Conheça um trecho dessa novela:

Viram-na um momento bracejar, não para resistir à morte,mas para abraçar-se ao cadáver de Simão, que uma onda lheatirou aos braços. O comandante olhou para o sítio dondeMariana se atirara, e viu, enleado no cordame o avental, e à florda água, um rolo de papéis, que os marujos recolheram na lan-cha. Eram, como sabem, a correspondência de Teresa e Simão.

Da família de Simão Botelho vive ainda em Vila-real de Trás-os-Montes a senhora Dona Rita Emília da Veiga Castelo Branco,a irmã predileta dele. A última pessoa falecida, há 26 anos foiManuel Botelho, pai do autor deste livro.”

(Amor de Perdição. São Paulo: Saraiva, Coleção Jabuti)

A QUEDA DUM ANJO

Publicada primeiramente em folhetim, de 30 de abril a 12 deagosto de 1865, A Queda dum Anjo apareceu em volume emfins de dezembro do mesmo ano. Seu enredo consiste no se-guinte: Calisto Elói, um fidalgo transmontano, quarentão e con-versador, elege-se deputado e abandona sua aldeia por Lisboa.Ali, vestido de modo anacrônico e defendendo idéias retrógra-das, é posto em ridículo. Em breve, porém, vai impondo o seu

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feitio pessoal ao mesmo tempo que vai cedendo às tentações dacidade grande, que culminam quando se apaixona perdidamentepor sua prima Ifigênia. Resultado: moderniza-se no falar e no tra-jar, entrega-se ao luxo, viaja pelo estrangeiro e termina por bandear-se para a política dominante, esquecido de sua filiação às hostesoposicionistas. Em compensação, sente-se feliz e realizado. Quan-to à sua mulher, Teodora, que ficara vegetando na província, liga-se a um primo apenas interessado em suas posses. Baixa o pano.

Soares de Passos(1826-1860)

De temperamento sentimentalista, foi um dos mais autênti-cos poetas ultra-românticos portugueses. Morreu tuberculosoaos 33 anos. Neste trecho da balada «O noivado do sepulcro»,aspectos mórbidos, tipicamente românticos, estão presentes:

O NOIVADO DO SEPULCRO

BaladaVai alta a lua! Na mansão da morteJá meia-noite com vagar soouQue paz tranqüila; dos vaivéns da sorteSó tem descanso quem ali baixou

Que paz tranqüila!... mas eis longe, ao longeFunérea campa com fragor rangeu;Branco fantasma semelhante a um monge,Dentre os sepulcros a cabeça ergueu (...)

“Mulher formosa, que adorei na vida,“E que na tumba não cessei de amar,“Por que atraiçoas, desleal, mentida,“O amor eterno que te ouvi jurar?

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Rep

rodu

ção

“Amor! Engano que na campa finda,“Que a morte despe da ilusão falaz:“Quem dentre os vivos se lembrara ainda“Do pobre morto que na terra jaz?

“Abandonado neste chão repousa“Há já três dias, e não vens aqui . . .“Ai, quão pesada me tem sido a lousa“Sobre este peito que bateu por ti!

(Poesias. Porto: Chardon, 1925)

Terceiro Momento

João de Deus(1830-1896)

Em Flores do Campo e Campo deFlores, João de Deus versa sobre ostemas prediletos do Romantismo: mu-lher amada, saudade, amor, destino,religiosidade, numa linguagem que re-toma o ritmo das cantigas populares.Observe o ritmo conferido a este textopela utilização da redondilha menor:

Leia o comentário do crítico José Augusto França sobre apopularidade da balada “O noivado do sepulcro” ainda hoje can-tada nas ruas de Portugal:

“. . . ainda hoje é o poema mais popular do romantismo na-cional:

recitava-se nos salões da burguesia, tanto no Porto comoem Lisboa, com acompanhamento de piano, e o povo can-tava-o nas ruas, ao luar, alterando as palavras eruditas”.

João de Deus

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Amores, amoresNão sou eu tão tola,Que caia em casar;Mulher não é rola,Que tenha um só par:Eu quero um moreno,Tenho um de outra cor,Tenho um mais pequeno,Tenho outro maior.

Que mal faz um beijo,Se apenas o dou,Desfaz-me o pejo,E o gosto ficou?

Um d’eles por graçaDeu-me um, e depoisGostei da chalaça,Paguei-lhe com dois.

Abraços, abraços,Que mal nos farão?Se Deus me deu braços,Foi essa razão:

Um dia que o altoMe vinha abraçar,Fiquei-lhe de um saltoSuspensa no ar.

Vivendo e gozando,Que a morte é fatal,E a rosa em murchandoNão vale um real:

Eu sou muito amada,E há muito que seiQue Deus não fez nadaSem ser para quê.

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Amores, amores,Deixai-os dizer;Se Deus me deu flores,Foi para as colher:

Eu tenho um moreno,Tenho um de outra cor,Tenho um mais pequeno,Tenho outro maior.

(João de Deus. In Torres, Alexandre Pinheiro de. Op. cit.)

Rep

rodu

çãoJúlio Dinis

(1839-1871)

Júlio Dinis era o pseudônimo do médi-co Joaquim Guilherme Gomes Coelho. Aocontrário de Camilo Castelo Branco, emseus romances não há tragédia nem fata-lismo, mas uma visão otimista do mundo esempre um epílogo feliz que culmina nocasamento. Sua linguagem é simples e,embora os temas tratados sejam os mesmos de outros românti-cos — amor e casamento —, ele detém-se na análise psicológicae no perfil moral de seus personagens, e sobretudo no contextosocioeconômico em que se movimentam. Com exceção de UmaFamília Inglesa, cuja ação se passa no Porto, os outros romances— As Pupilas do Senhor Reitor, A Morgadinha dos Canaviais e OsFidalgos da Casa Mourisca —são ambientados no campo.

As Pupilas do Senhor Reitor foi adaptada para atelevisão e fez muito sucesso no início da década

de 1990.

Júlio Dinis

Conheça o enredo e um fragmento de A morgadinha doscanaviais.

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204

A MORGADINHA DOS CANAVIAIS

A Morgadinha dos Canaviais foi publicada pela primeiravez em folhetim no Diário do Porto, em 1868, e nesse mesmoano em volume. Seu enredo resume-se no seguinte: Henriquede Souselas, moço rico e galante, abandona Lisboa e vai pro-curar numa aldeia do Minho, em casa da tia Dorotéia, cura parao seu tédio. Em pouco tempo recompõe-se e enamora-se deMadalena, morgadinha da quinta do Mosteiro, mas esta o trataironicamente. Acontece que Cristina, prima de Madalena, seapaixona por Henrique, o qual percebe, despeitado, amorgadinha corresponder ao afeto que lhe dedica Augusto, umsimples mestre-escola rural. Ambos, rivalizados, seantagonizam. Enquanto isso dois acontecimentos precipitam odesenlace: a construção de uma estrada de ferro e proibiçãode enterramentos de mortos na igrejas. Das arruaças que cer-cam as duas novidades do progresso, sai ferido Henrique; tra-tado por Cristina, descobre que a ama. Tudo termina com ocasamento de Henrique e Cristina e de Augusto e Madalena. Otrecho que se vai ler foi extraído do capitulo III, e contém anarração dos primeiros contactos revigorantes de Henrique como clima aldeão:

Ao romper da manhã, quando a consciência principia, pou-co a pouco, a acudir aos sentidos, até então tomados pelo torporde um sono profundo, Henrique de Souselas sonhava-se como-damente sentado em uma cadeira de S. Carlos, disposto a as-sistir ao desempenho de uma ópera favorita.

Moviam-se os arcos nas cordas dos violinos, violoncelos econtra-baixos; sopravam, a plena boca, os tocadores dos ins-trumentos de vento; agitavam descompostamente os braçosos ruidosos timbaleiros; dedos amestrados faziam vibrar ascordas da harpa; a batuta do mestre fendia airosamente os ares,e contudo não chegava aos ouvidos de Henrique, de toda esta

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riqueza de instrumentação, mais do que uma nota única, arras-tada, contínua, plangente, baixando e subindo na escala dostons, e sem formular uma só frase musical.

Era de desesperar um diletante como ele; torcia-se na cadei-ra, inclinava convenientemente a cabeça. Fazia das mãos cor-netas acústicas, e sempre o mesmo resultado!

Este violento estado de atenção, este esforço do sensó-rio, principiou nele a obra do despertar; principiou pois pelosouvidos, mas cedo se transmitiu a todos os outros órgãos.

Antes de dar a si próprio conta do que era aquele som, equase esquecido ainda do lugar em que estava, Henrique abriuos olhos.

A luz do dia penetrava já pelas frestas mal vedadas das jane-las e espelhava no aposento uma tênue claridade.

Veio então a Henrique a consciência do lugar em que estava,e uma alegria profunda lhe dilatou o coração.

O leitor, se ainda não padeceu de insônias, de pesadelos,ou de sonos febris, não avalia por certo o contentamento ínti-mo que se apossa das desgraçadas vítimas desses demôniosnoturnos, quando por exceção eles as deixam em paz, e lhesrespeitam o sono de uma noite completa. Acordar só aos raiosda aurora é um dos mais inefáveis prazeres a que eles aspiramna vida.

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Questões de Vestibulares

1 (Positivo-PR) O período literário dominado pelo espírito liberal e nacio-nalista, em que houve predomínio da emotividade, do individualismo,mais o indianismo, a identificação com a natureza e a exaltação dosideais patrióticos foi o:a) Parnasianismo d) Simbolismob) Romantismo e) Pré-modernismoc) Barroco

2 (Santa Casa-SP) A renovação das formas, a liberdade de expressão ea tentativa de incorporar à literatura nossas coisas mais típicas – comopeculiaridades regionais e termos indígenas – são marcas freqüentesno:a) Barroco d) Realismob) Arcadismo e) Pré-Modernismoc) Romantismo

3 (UFPR) “Dá grande ênfase à vida sentimental, tornando-se intimistae egocêntrico, enquanto o coração é a medida mais exata da suaexistência. Cultiva o amor e a confidência, ou se dispõe à renúnciae ao isolamento, e por aí procura uma identificação essencial coma natureza. Também alimenta o sentimento religioso, vibra com apátria e se irmana com a humanidade. Pula assim do círculo fecha-do de sua fantasia interior, da sua realidade alimentada deidealizações e de fugas, luminosa ou sombria, entre o bem e o mal,para as cogitações morais e espirituais, para a defesa das grandescausas sociais e da realidade.”O texto se refere a um dos seguintes movimentos literários:a) Arcadismob) Barrococ) Romantismod) Parnasianismoe) Simbolismo

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4 (UFPR) Assinale a(s) alternativa(s) que caracteriza(m) a produção ro-mântica:(01) – Atitude subjetivista marcada por intenso sentimentalismo.(02) – Decadência do romance entre os gêneros narrativos.(04) – Crença no papel do poeta como gênio portador de verdades,

cumpridor de missões.(08) – Presença da natureza com função expressiva, significando e

relevando.(16) – culto do mito da nação, num momento de grande afirmação

cultural.(32) – Idealização do herói, visto como ser extraordinário, poderoso,

justiceiro e bom.(64) – Conservação dos gêneros poéticos herdados da Renascença.

Soma

5 (FMU/FIAM-SP) O homem de todas as épocas se preocupa com anatureza. Cada período a vê de um modo particular. No Romantismo,a natureza aparece como:a) um cenário cientificamente estudado pelo homem; a natureza é mais

importante que o elemento humano.b) um cenário estático, indiferente; só o homem se projeta em busca

de sua realização.c) um cenário sem importância nenhuma; é apenas pano de fundo

para as emoções humanas.d) confidente do poeta, que compartilha com a paisagem os seus sen-

timentos; a natureza se modifica, de acordo com o estado emocio-nal do poeta.

e) um cenário idealizado onde todos são felizes e os poetas são pastores.

6 (UFV-MG) Assinale a alternativa falsa.a) O Romantismo, como estilo, não é modelado pela individualidade

do autor; a forma predomina sempre sobre o conteúdo.b) O Romantismo é um movimento de expressão universal, inspirado

nos modelos medievais e unificado pela prevalência de característi-cas comuns a todos os escritores da época.

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c) O Romantismo, como Estilo de Época, consistiu basicamente numfenômeno estético-literário, desenvolvido em oposição aointelectualismo e à tradição racionalista e clássica do século XVIII.

d) O Romantismo, ou melhor, o espírito romântico, pode ser sintetiza-do numa única qualidade: a imaginação. Pode-se creditar à imagi-nação a capacidade extraordinária dos românticos de criarem mun-dos imaginários.

e) O Romantismo caracterizou-se por um complexo de característi-cas como o subjetivismo, o ilogismo, o senso de mistério, o exage-ro, o culto da natureza e o escapismo.

7 (FUVEST-SP)a) Dentre as obras – Camões; Eurico, o Presbítero; Flores sem Fruto –

qual a iniciadora do movimento romântico em Portugal?b) Qual o seu autor?

8 (FUVEST-SP) O medievalismo, a valorização do passado pátrio, a re-criação de lendas tradicionais ibéricas constituíram um aspecto im-portante dos programas estéticos de:a) Almeida Garrett e Alexandre Herculanob) Guerra Junqueiro e Júlio Dinisc) Barbosa du Bocage e Antônio Vieirad) Eça de Queirós e João de Deuse) Antero de Quental e Cesário Verde

9 (FUVEST-SP) O autor de Lendas e Narrativas pertenceu ao movimen-to romântico.a) Quem foi ele?b) Em que época se passam as Lendas e Narrativas?

(FUVEST-SP) Texto para as questões 10 e 11:

“O pacto feito por ele com os árabes não tardou a ser por mil modosviolado, e o ilustre guerreiro teve de se arrepender, mas já debalde,

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por haver deposto a espada aos pés dos infiéis, em vez de pelejar atéa morte pela liberdade. Fora isto o que Pelágio preferira, e a vitóriacoroou o seu confiar no esforço dos verdadeiros godos e na piedadede Deus.”

10 Qual das características abaixo está presente no texto?a) Retomada dos valores medievaisb) Denúncia de males sociaisc) Despreocupação formald) Análise psicopatológicae) Aproveitamento da mitologia clássica

11 O autor do texto é:a) Eça de Queirósb) Camilo Castelo Brancoc) Padre Antônio Vieirad) Fernando Namorae) Alexandre Herculano

12 (UNESP) “Mas, quando, ao primeiro alvor da manhã, Pelágio se en-caminhava com o seu pequeno esquadrão para a garganta das ser-ras, já os árabes rompiam por ela e começavam a espraiar-se, comoribeira que, saindo do leito apertado, se dilata pela campina. Os cris-tãos recuaram, e os infiéis, atribuindo ao temor esta fuga simulada,precipitaram-se após eles. Pouco a pouco, o duque de Cantábriaatraiu-os para a entrada da gruta de Covadonga. Chegado ali, pon-do a boca à sua buzina, tirou um som prolongado. Imediatamente oscimos dos rochedos, que pareciam inacessíveis, cobriram-se defundibulários e frecheiros, e uma nuvem de tiros choveu de toda aparte sobre os africanos e sobre os renegados godos. (...) Pela voltada tarde, apenas do numeroso e brilhante exército dos árabes al-guns milhares de valeiros fugiam desalentados diante dos foragidosdas Astúrias, que os perseguiam além de Cangas de Onis.

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(...) Nessa noite, quando Pelágio voltou à caverna, Hermengarda, dei-tada sobre o seu leito, parecia dormir. Cansado do combate e vendo-a tranqüila, o mancebo adormeceu também perto dela, sobre o duropavimento da gruta.”

O texto acima transcrito é de autoria de um dos introdutores do Ro-mantismo em Portugal. O autor e a obra estão assinalados em umadas alternativas:a) Almeida Garrett – O Alfageme de Santarémb) Júlio Dinis – A Morgadinha dos Canaviaisc) Camilo Castelo Branco – Agostinho de Ceutad) Oliveira Martins – A Vida de Nun’Álvarese) Alexandre Herculano – Eurico, o presbítero

13 (FUVEST-SP) Qual o autor considerado o mestre da novela passionalportuguesa? Indique o século e o movimento literário em que se situasua obra.

(UNESP) Texto para as questões de 14 a 16:

“Simão, meu esposo. Sei tudo... Está conosco a morte. Olha que teescrevo sem lágrimas. A minha agonia começou há sete meses. Deusé bom, que me poupou ao crime. Ouvi a notícia da tua próxima morte,e então compreendi por que estou morrendo hora a hora. Aqui está onosso fim, Simão!.. Olha as nossas esperanças! Quando tu me diziasos teus sonhos de felicidade, e eu te dizia os meus!... Por que nãomerecemos nós o que tanta gente tem!.. Assim acabaria tudo, Si-mão? Não posso crê-lo! A eternidade apresenta-se-me tenebrosa,porque a esperança era a luz que me guiava de ti para a fé. Mas nãopode findar assim o nosso destino. Vê se pode segurar o último fio datua vida a uma esperança qualquer. Ver-nos-emos num outro mundo,Simão? Terei eu merecido a Deus contemplar-te? Eu rezo, suplico,mas desfaleço na fé, quando me lembram as últimas agonias do teumartírio.”

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O texto acima transcrito pertence a uma carta que Teresa deAlbuquerque escreve a Simão Botelho, numa novela considerada comoo melhor exemplo da novelística romântica em Portugal. O texto é,portanto, característico do estilo romântico e evidencia elementos quepermitem identificar a novela a que pertence e o nome do seu autor.Assim sendo, responda às seguintes questões:

14 Qual o nome do autor e o título da novela a que o texto pertence?

15 Indique alguns segmentos (frases ou palavras) que, no texto, são ca-racterísticos da escola romântica.

16 Que outros romancistas e poetas românticos você conhece na litera-tura portuguesa?

17 (UM-SP) Assinale a alternativa onde se encontra um traço não perti-nente a Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco.a) Diálogos geralmente marcados por retórica sentimental.b) Narração densa e rápida das ações decisivas.c) Comprometimento com propostas realistas de Eça de Queirós.d) Grandeza trágica de paixões e situações.e) Mostragem de alguns personagens extraídos do meio popular.

18 (FUVEST-SP) Autor de novelas satíricas, escreveu também novelaspassionais, cujas personagens se entregam aos extremos do amor eque, por isso mesmo, são levadas à destruição.a) Eça de Queirós d) Camilo Castelo Brancob) Alexandre Herculano e) Júlio Dinisc) Almeida Garrett

19 (UNESP) “Desde que saímos da igreja até a entrada de casa, cami-nhamos sempre debaixo de nuvens de flores. O estrondo dosbacamartes era atroador, e os dos sinos da freguesia repicaram des-de que saímos do templo até ao anoitecer desse dia.

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Meia hora depois que chegamos, entrei no quarto de minha mulher,e encontrei-a de joelhos diante duma imagem de S. João dos BemCasados.Ergue-se ela, benzendo-se, e esperou que eu a beijasse pela segundavez. Penso que o público me releva a confissão de que, ao dar-lheeste segundo beijo, encontrei os lábios. Era o instinto das sensaçõesagradáveis, mas honestas, que ensinou a minha mulher o segredo domáximo prazer de um beijo.Estava o almoço na mesa.”

O texto que você acabou de ler pertence a uma novela de CamiloCastelo Branco que é considerada como um bom exemplo da sátiracamiliana. A leitura atenta do texto permitirá identificar o título da no-vela, em uma das alternativas abaixo indicadas:a) Coração, Cabeça e Estômagob) O Romance dum Homem ricoc) A Mulher Fatald) Amor de Salvaçãoe) A Queda dum Anjo

20 (FUVEST-SP) Na novela Amor de Perdição, de Camilo Castelo Bran-co:a) Simão ficou indeciso entre o amor de Mariana e o de Teresa.b) Simão rejeitou a oportunidade que lhe foi oferecida para livrar-se do

desterro.c) a apresentação do pai e de suas origens justifica o orgulho que a

família de Simão ostenta.d) o autor revela grande respeito pelas instituições religiosas de seu

tempo.e) Ritinha, irmã mais nova de Simão, abandonou a família para apoiá-

lo em suas dificuldades.

21 (UM-SP) Assinale a alternativa incorreta sobre a obra de Camilo Cas-telo Branco.

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a) A pequena burguesia do Porto é enfoque comum em sua novelística.b) Apega-se exclusivamente ao real, sem se transportar para o domí-

nio imaginário.c) Em Amor de Perdição, os sentimentos se submetem aos precon-

ceitos e se põem em luta com as convenções sociais.d) A queda dum Anjo é uma narrativa de caráter satírico e humorístico.e) É uma das obras mais férteis da literatura portuguesa, pois nela

encontramos poesia, teatro, crítica literária, ensaios, memórias, no-velas e romances.

22 (CESCEA) Aponte as três expressões máximas do Romantismo por-tuguês:a) Garrett, Herculano e Castilho.b) Garrett, Herculano e Antero de Quental.c) Herculano, Eça de Queirós e Camilo.d) Camões, Herculano e Castilho.e) Camões, Alexandre, Herculano e Eça de Queirós.

23 (Sta. Casa-SP) Nas alternativas abaixo estão cinco autores e cincoobras conhecidas da literatura portuguesa. Assinale a alternativa emque autor e obra não se correspondem:a) Antônio Nobre – Sób) Fernando Pessoa – Mensagemc) Júlio Dantas – As Pupilas do Senhor Reitord) Guerra Junqueiro – A Velhice do Padre Eternoe) Almeida Garrett – Camões

24 (CESCEA) Uma das três figuras máximas do Romantismo português.Apaixonado pela história, dignificou-a, orientando-se pelo princípiodiretor de que o historiador não pode arredar-se das verdadeiras fon-tes da História – os documentos. Dessa convicção nasceu um traba-lho, fruto de erudição e pesquisa em bibliotecas e arquivos, públicos eparticulares – Portugaliae Monumenta Historica (Monumentos Históri-cos de Portugal). Autor de Lendas e Narrativas, Eurico, o Presbítero,

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O Monge de Cister e O Bobo. Seu nome:a) Antônio Feliciano de Castilhob) Almeida Garrettc) Alexandre Herculanod) Camilo Castelo Brancoe) Eça de Queirós

25 (CESCEA) “Aos vinte e quatro anos descobriu sua verdadeira vocaçãoquando publicou Anátema – o seu primeiro romance. As obras anterio-res são como tentativas hesitantes à busca de um gênero que se afi-nasse com o seu temperamento.“A partir de então, os lucros se multiplicam, vem a consagração, mascontinuam, mais ou menos ininterruptas, as cenas dramáticas em suavida: Prisão, crises íntimas, polêmicas rumorosas, e, em 1890, a ca-tástrofe: – Num acesso de nervos, em conseqüência do excesso detrabalho e da cegueira que se aproximava, um tiro pôs-lhe um pontofinal na existência” (Antonio Sales Campos, Português Colegial).De quem se trata?a) Machado de Assis d) Eça de Queirósb) Raul Pompéia e) Camilo Castelo Brancoc) Ramalho Urtigão

26 (CESCEA) Das obras de Camilo Castelo Branco, abaixo arroladas, qualpertence ao gênero “teatro”?a) O Condenado d) Doze Casamentos Felizesb) Eusébio Macário e) Maria da Fontec) Agulha em Palheiro

27 (CESCEA) O poema “Camões”, escrito à margem do Sena, conta, emdez cantos e versos soltos, a história romanceada do maior épicoportuguês. Esse poema inaugura em Portugal:a) A Poesia épica d) O Modernismob) O Trovadorismo e) O Romantismoc) O Realismo

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28 (Mackenzie-SP) Individualismo, subjetivismo, liberdade criadora, valo-rização da Idade Média, religiosidade cristã são algumas das caracte-rísticas do movimento:a) Arcádico c) Parnasianob) Romântico d) Simbolista

29 (Sta. Casa-SP) “A natureza é como um espelho no qual se refletem asdilacerações e sofrimentos do autor; as paisagens distantes, o gostopelos cenários exóticos, pelas civilizações longínquas, são outras for-mas de escapismo. Representam formas de deslocações no espaço,outro lugar, que substitui a sociedade do século XIX.”O que se escreveu, expõe resumidamente o programa literário dos:a) Arcadistas d) Realistasb) Românticos e) Simbolistasc) Naturalistas

30 (UF-PI) Em Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, o relaciona-mento entre Teresa e Simão se mantém por meio das cartas. Estascorrespondências chegam ao destinatário por intermédio das perso-nagens:a) Baltasar e Mendigab) Rita e Marianac) Mendiga e Manueld) Mariana e Mendigae) Luiza e João da Cruz

31 (UF-PI) Em Amor de Perdição, a personagem Simão, de volta a Viseu,durante três meses, apaixona-se por Teresa e este amor o transformanum sujeito:a) agressivo e passionalb) irreverente e teimosoc) desordenado e temíveld) recolhido e pensativoe) passivo e medroso

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32 (UCP-PR) “O público gostava de obras que lhe permitissem auto-iden-tificar-se com as personagens, que lhe fornecessem meios de esque-cer, com a leitura, a monotonia da vida regulada pelos estreitos hori-zontes burgueses.”O texto acima faz referência à estética:a) Barrocab) Simbolistac) Modernistad) Românticae) Parnasiana

33 (UNIP-SP) Assinale a característica não aplicável à poesia romântica.a) O artista goza de liberdade na metrificação e na distribuição rítmica.b) O importante é o culto da forma, a arte pela arte.c) A poesia é primordialmente pessoal, intimista e amorosa.d) Enfatiza-se a auto-expressão, o subjetivismo, o individualismo.e) A linguagem do poeta é a mesma do povo: simples, espontânea.

34 (Unicamp-SP) No final do segundo ato de Frei Luis de Sousa, deAlmeida Garrett, desenrola-se uma cena entre Frei Jorge e o Romeiro.O que está em questão é a identidade desse Romeiro, que sabemosser D. João de Portugal:Jorge: Romeiro, romeiro! Quem és tu?Romeiro (apontando com o bordão para o retrato de D. João de Por-tugal): Ninguém.a) Por que D. João se apresenta disfarçado de romeiro?b) Explique, com base na obra, por que D. João diz ser ninguém.

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REALISMO(1865-1890)

Rep

rodu

ção

O Realismo quis criar uma arte que representasse objetivamentea realidade, que se ocupasse do homem e de seus problemas.

Mulheres peneirando trigo, de Gustave Coubert

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REALISMO: século XIX

CONTEXTO HISTÓRICO: segunda Revolução Industrialcientificismo - socialismo científicopositivismoevolucionismodeterminismo

CARACTERÍSTICAS: objetividadepredomínio da razãoobservação, análise e denúncia dosmales sociaiscriação do romance de análiseaceitação dos determinismoscientíficos (Naturalismo)

AUTORES: Antero de QuentalGomes LealGuerra JunqueiroCesário VerdeGonçalves CrespoEça de Queirós

Romantismo Realismo

• subjetivismo • objetivismo

• sentimentalismo • materialismo/racionalismo

• fantasia/imaginação • observação da realidade

• volta ao passado/Idade • comprometimento com o Média momento presente

• verdade individual • verdade universal

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REALISMO (1865-1890)O Realismo surgiu como reação ao sentimentalismo exacer-

bado dos ultra-românticos e propunha a observação e análiserigorosa da realidade, a fim de retratá-la fiel e objetivamente. Ini-ciou-se em 1865 com a “Questão Coimbrã”, em que se con-frontaram as velhas idéias dos românticos com as da nova ge-ração realista, e terminou em 1890 com a publicação de Oaris-tos, de Eugênio de Castro. Esse período produziu poesia, pro-sa de ficção, jornalismo doutrinário, historiografia, crítica e his-toriografia literária.

Contexto HistóricoNa segunda metade do século XIX, a burguesia consolidou

seu poder político. No entanto, o crescimento do capitalismo e aacelerada industrialização (Europa e América vivem a segundafase da Revolução Industrial) determinaram o aparecimento doproletariado, constituído por miseráveis trabalhadores assalaria-dos sem direito a nenhuma vantagem trazida pelo avanço indus-trial e científico do período.

Os novos inventos (telefone, telégrafo, locomotiva a vapor),a utilização de novas fontes de energia (petróleo, eletricidade) eas novas descobertas científicas ajudaram o homem a explicarracionalmente fenômenos até então inexplicáveis, determinan-do uma nova postura diante do mundo. Com a vitória do cienti-ficismo, o homem passou a basear-se na observação e na expe-rimentação e a criticar o misticismo, a religião e o subjetivismo.Foram determinantes para essa situação:

• o positivismo: filosofia de Augusto Comte que defendia aexplicação de todos os fenômenos pela ciência. Só im-portava o que podia ser medido e provado;

• o socialismo científico: Karl Marx e Engels denunciaram aexploração do operariado;

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• o evolucionismo: Charles Darwin expôs sua teoria sobre aevolução das espécies pelo processo da seleção natural.Essa teoria foi combatida por todos que acreditavam naorigem divina do homem, defendida pela Igreja;

• o determinismo: teoria de Taine que explicava a obra dearte como conseqüência de três fatores: raça (hereditarie-dade), meio e momento histórico. Segundo ele, o homemera produto do meio em que vivia;

• a medicina experimental: o médico Claude Bernard deubases científicas à medicina. Apoiado na observação einvestigação dos fenômenos biológicos, demonstrou aimportância da Fisiologia no comportamento humano.

Em Portugal, enquanto crescia um forte sentimento anticleri-cal e antimonárquico, uma rica burguesia instalava-se no Porto eem Coimbra. Em 1864, uma estrada de ferro passou a ligar estaúltima cidade a Paris, intensificando a chegada de novas idéias.O ano de 1871 assistiu às primeiras greves operárias. Nessecontexto, surge o Realismo, cujas tendências, levadas ao extre-mo, desembocaram no Naturalismo.

Manifestações ArtísticasO primeiro quadro realista foi o Enterro em Ornans, do pintor

francês Courbet. Socialista convicto, filho de camponeses, eleera antiburguês e que-ria pintar o mundo visí-vel tal qual era sem osentimentalismo român-tico, por isso deu espa-ço em seus quadros aoshomens no trabalho.

As catadoras de espigas,de Millet

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Estufa no parque de Londres, dos arquitetos Burton e Turner

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LiteraturaAs origens do Realismo remontam à França, quando, em 1857,

Flaubert publicou o romance Madame Bovary, que conta a histó-ria do adultério de uma romântica jovem burguesa que terminaem suicídio. A filosofia e a ciência da época incitam os escritoresrealistas a reproduzir integralmente o real. Para tanto, opuseramao excessivo sentimen-talismo romântico o ma-terialismo e o raciona-lismo; ao subjetivismo, oobjetivismo; à fantasia eà imaginação, a observa-ção; ao retorno à IdadeMédia, o comprome-timento com o momentopresente; ao nacionalis-mo, o universalismo.

Procurando renovar o material e as técnicas, tanto a arquite-tura quanto a escultura insurgem-se contra o academicismo.

Amplie seus conhecimentossobre a literatura realista conhe-cendo os seguintes vídeos:

A sedutora Madame Bovary, deVincent Minnelli; Germinal deClaude Berri; Os companheiros, deMario Monicelli; Tempos Moder-nos, de Charles Chaplin; Brás Cu-bas , de Júlio Bressane; O primoBasílio, de Daniel Filho; O cortiço,de Francisco Ramalho Júnior.

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Os realistas — em sua maioria republicanos e até socialistas— eram antimonárquicos, antiburgueses e anticlericais, traçospresentes em suas obras.

Em Portugal, jovens estudantes da Universidade de Coimbra,desde os anos 60, já se empolgavam com as novas idéias surgidasno resto da Europa. Em 1864, com a inauguração da estrada deferro que ligava Coimbra a Paris, o intercâmbio cultural entre asduas cidades intensificou-se, distanciando cada vez mais os con-servadores (românticos de Lisboa) dos estudantes e intelectuaisde Coimbra, partidários da função social da literatura, comprome-tidos com seu momento histórico (a futura geração realista).

A “Questão Coimbrã”, de 1865, que marcou o início do Re-alismo, representou a primeira reação pública contra o Roman-tismo. Ela originou-se de uma carta-posfácio de AntônioFeliciano de Castilho ao livro Poema da mocidade, do tambémromântico Pinheiro Chagas. Nesse texto, Castilho elogiava olivro de Pinheiro e criticava a nova poesia dos moços deCoimbra, sobretudo Teófilo Braga (que publicara Visão dos Tem-pos e Tempestades Sonoras) e Antero de Quental (que publica-ra Odes Modernas).

Antero respondeu com uma carta aberta intitulada Bom sen-so e bom gosto em que acusava Castilho (seu velho professorde francês) de obscurantismo, ao mesmo tempo que defendiaa liberdade de pensamento e a independência dos jovens es-critores.

Iniciada a polêmica, formaram-se dois partidos que publica-ram algumas dezenas de pequenas obras defendendo ou criti-cando cada um dos lados. A vitória foi do grupo dos jovens deCoimbra, que, em 1871, organizou o ciclo de Conferências De-mocráticas no Cassino Lisbonense. Das dez conferências, sócinco foram realizadas, pois um decreto real fechou o Cassino eproibiu as conferências, sob a alegação de que atacavam a reli-gião e o Estado. No entanto, a semente do Realismo fora lançada.

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Produção Literária

Poesia

Antero de Quental(1842-1891)

Ele foi o líder intelectual da geraçãode 1870 e divulgador das idéias socia-listas em Portugal. Embora filho de ricosproprietários, logo após a “QuestãoCoimbrã” trabalhou como operário emParis. Em 1873, com a morte do pai,assumiu o comando das propriedades,vivendo em constante conflito. Suicidou-se em 1891.

Sua obra pode ser assim dividida:

a) Raios de Extinta Luz e Primaveras Românticas: são obrasanteriores à “Questão Coimbrã” e apresentam caracterís-ticas românticas, em que o lirismo é realçado;

b) Odes Modernas: obra revolucionária contra os ultra-ro-mânticos, que provocou escândalo nos meios literários;

c) Sonetos: essa obra marca um período de introversão, comuma poesia autobiográfica, marcadamente filosófica, emque predominam as desilusões.

Ao lado de Camões e Bocage, Antero de Quental forma atrinca dos mais perfeitos sonetistas portugueses. Leia o so-neto abaixo e perceba como Antero classifica o poeta român-tico como o amante do lúgubre, alienado do seu momentopresente, que deve acordar, ver a luz e produzir uma poesiaengajada:

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Antero de Quental

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A UM POETATu que dormes, espírito sereno,Posto à sombra dos cedros seculares,Como um levita à sombra dos altares,Longe da luta e do fragor terreno,

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno,Afugentou as larvas tumulares...Para surgir do seio desses mares,Um mundo novo espera só um aceno...

Escuta! é a grande voz das multidões!São teus irmãos, que se erguem! são canções...Mas de guerra... e são vozes de rebate!

Ergue-te, pois, soldado do Futuro,E dos raios de luz do sonho puro,Sonhador, faze espada de combate!

(Sonetos, 6a ed., Lisboa: Sá da Costa, 1979)

Ainda representaram a poesia realista quatro autores, assimagrupados, segundo suas tendências:

1) obras de caráter revolucionário, reformista e panfletário

Gomes Leal(1848-1921)

Sua obra divide-se em três fases. Na pri-meira, sua poesia oscila entre o Romantis-mo e o Realismo, Claridades do Sul é o livromais importante. Na segunda fase, em OAnticristo, aceita o credo positivista e socia-lista. Seu terceiro momento caracteriza-se poruma postura mais simbolista, expressa emO fim dum Mundo.

Gomes Leal

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çãoGuerra Junqueiro

(1850-1923)

Principal poeta panfletário do Realis-mo, criticou severamente a mentalidadeburguesa. Em sua primeira fase lembra apoesia social de Victor Hugo: em A Mor-te de D. João retrata a corrupção da so-ciedade da época, em A Velhice do Pa-dre Eterno critica a luxúria do clero. Nasegunda fase, substitui o cientificismo pela poesia lírica a servi-ço da salvação do homem. É desse período Os Simples.

A VELHICE DO PADRE ETERNO

A Velhice do Padre Eterno, publicada em 1885, correspondiaà segunda parte de uma trilogia poética iniciada por A Morte deD. João (1874), e que teria seqüência com o Prometeu Liberta-do, que ficou incompleto. Na primeira parte, Guerra Junqueirosatiriza o vício romântico, representado na figura de D. João;na segunda, ataca o clero corrupto e venal; na terceira, comodeclara na nota final de A Velhice do Padre Eterno, cantaria aliberdade de Prometeu, pois “significa o desaparecimento detodas as tiranias e a ressurreição de Jesus, a morte de todosos dogmas”. A Velhice do Padre Eterno, que primitivamente seintitulava A Morte de Jeová, consta de uma série de quadroslíricos em torno de alguns dos principais aspectos da históriado Catolicismo, ao ver de Guerra Junqueiro: o poema de aber-tura, “Aos simples”, contém um hino de louvor aos humildes esofredores para quem não soou ainda a hora da justiça, preci-samente por causa dos males que, no entender do poeta, in-festavam a Pátria, dentre os quais avultavam a hipocrisia dos

Guerra Junqueiro

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sentimentos (retratada em A Morte de D. João) e a hipocrisiada crença religiosa (tema de A Velhice do Padre Eterno). Se-guem-se os quadros, como “A Vinha do Senhor”, “A Caridadee a Justiça”, “Parasitas”, “O Papão” etc. O trecho que se vailer, pertence a “A Sesta do Sr. Abade”:

Caminhavam por fim, ronceiros, devagar,Os grandes carroções da Côngrua e Pé de Altar,Puxados a duas mil parelhas de jumentos,Zurrando esta epopéia heróica aos quatro ventos”:

Senhor Pároco, toda a freguesia,Uns quatro mil ônagros

Muito magrosVem trazer isto a Vossa Senhora.

Desculpe, Senhor Pároco, a ousadia . . .

A oferta é bem mesquinha, é desgraçada,Uns oitocentos moios simplesmenteDe milho, de feijão, trigo e cevada.E nós sabemos que um tão mau presente

Para o seu denteNão chega a nada! Não chega a nada!

Mas é boa a intenção;Nós reservamos para si o pão,E para nós a palha unicamente.

Dar ao senhor PriorMiséria assim, é vergonhoso até . . .Mas aceite este mimo sem valor . . .Senhor Pároco, aceito-o, por quem é! . . .E, agora, Senhor Pároco, a sua benção,

Porque os ônagros pensamQue ela salva das chamas infernais;

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2) poesia do cotidiano, inspirada no prosaico dia-a-dia, semcaráter revolucionário nem social

Cesário Verde(1855-1866)

Sua poesia (que se preocupa com o apu-ro formal), ao mesmo tempo que transita en-tre o Romantismo e o Realismo, é uma pontepara atitudes que estariam em moda no Sim-bolismo e no Modernismo. Ele retratou deforma exata a realidade cotidiana das ruasde Lisboa.

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“Nas nossas ruas, ao anoitecer,Há tal soturnidade, há tal melancolia,Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresiaDespertam-me um desejo absurdo de sofrer.

O céu parece baixo e de neblina,O gás extravasado enjoa-me, perturba;E os edifícios, com as chaminés, e a turbaToldam-se duma cor monótona e londrina.

Batem os carros de aluguer, ao fundo,Levando à via férrea os que se vão. Felizes!Ocorrem-me em revista exposições, países:Madri, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!

Semelham-se a gaiolas, com viveiros,As edificações somente emadeiradas:Como morcegos, ao cair das badaladas,Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.”

(Obra completa. Lisboa:0 Portugália, 1964)

Cesário Verde

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çãoGonçalves Crespo

(1846-1883)

Ele também se filia à linha da poe-sia do cotidiano e destaca-se, sobre-tudo, pelo culto da forma, uma dasprincipais características do Parnasia-nismo, que não vingou em Portugal,ao contrário da França e do Brasil.

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Prosa

A prosa de FicçãoDurante o apogeu de Realismo em Portugal, cultivaram-se o

romance e o conto. O primeiro, que podia ser realista ou naturalista,conforme o grau de cientificismo empregado e o modo de enfocara sociedade coetânea, entra em cheio na Literatura Portuguesa(não esquecer que antes predominava a novela); o segundo, quevinha sendo cultivado desde o século XVI (com Gonçalo FernandesTrancoso) nessa altura atinge maioridade e níveis de primeira gran-deza. Dentre os ficcionistas do tempo, destaca-se Eça de Queirósseguido de Fialho de Almeida, Abel Botelho, Teixeira de Queirós,Conde Arnoso, Júlio Lourenço Pinto, Trindade Coelho, e outros.

Eça de Queirós(1845-1900)

Eça de Queirós, o melhor prosador doRealismo português, não participou da“Questão Coimbrã”, mantendo-se somen-te como espectador. No entanto, em 1871,nas Conferências Democráticas, apresen-

Gonçalves Crespo

Eça de Queirós

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tou o trabalho O Realismo como expressão da arte. No mesmoano fundou com Ramalho Ortigão o jornal As Farpas, em quecriticava o Romantismo e satirizava a sociedade portuguesa.

Sua produção literária pode ser agrupada em três fases:

a) primeira fase, de 1866 a 1875: em que sofreu a influên-cia de românticos de inspiração germânica (Michelet,Gerard Nerval, Heine e Baudelaire). É dessa fase, a me-nos importante de sua carreira, o romance Mistério daEstrada de Sintra, em parceria com Ramalho Ortigão eProsas Bárbaras.

b) segunda fase, de 1875 a 1888: inicia-se com a publica-ção de O Crime do Padre Amaro, que inaugura o romancerealista português. Nessa fase defende os princípios doRealismo, atacando a burguesia, o clero e a monarquia.Eça denomina de Cenas Portuguesas a trilogia de roman-ces desse período:

• O Crime do Padre Amaro, cujo subtítulo irônico é Cenas daVida Devota. Anticlerical, Eça analisa aqui o celibato religiosoe denuncia a depravação de costumes numa estreita socie-dade provinciana. A cena passa-se na pequena vila de Leiria,onde um jovem padre, Amaro (“impelido para o sacerdóciocomo um boi para o curral!”), apaixona-se pela ingênua esonhadora Amélia. Ela engravida, morre, e seu filho também.Amaro muda-se de cidade e continua sua vida de padre.

O filme Amor & Cia, 1998, do diretor de ci-nema brasileiro Helvécio Ratton, foi baseado na

novela Alves & Cia (1883), de Eça de Queirós. Amor &Cia narra a história dos amores extraconjugais deLudovina, que trai o marido com o sócio deste, bem aoestilo de Madame Bovary, de Flaubert.

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• Os Maias ou Episódios da Vida Romântica retrata o amorcarnal entre dois irmãos, tendo como fundo a alta burgue-sia e a aristocracia de Lisboa com seus vícios e intrigas.

c) terceira fase, de 1888 até sua morte. Seus romances afas-tam-se dos postulados realistas e apresentam uma con-

• O Primo Basílio, com o subtítulo de Episódio da Vida Do-méstica. Sua crítica agora se volta para a hipocrisia dasrelações familiares da pequena-burguesia de Lisboa e oinevitável adultério. O romance conta a história de Luísa,uma lisboeta fútil, casada com Jorge, um engenheiro quese ausenta a negócios. Visita-a um ex-namorado, seu pri-mo Basílio, e instaura-se o triângulo amoroso, descober-to pela criada Juliana. De posse das cartas amorosas deLuísa, a criada começa a chantageá-la. Luísa consegue,com a ajuda de um amigo da família, reaver as cartas,mas adoece. O marido volta, sabe de tudo e perdoa. Ela,no entanto, morre. Basílio, quando sabe de sua morte,cinicamente lamenta apenas o fato de não ter trazido umaamante de Paris para entretê-lo em Lisboa.

Os Maias foi adaptado para a televisão.Pelo seu sucesso e também de O Primo

Basílio, podemos perceber como obras clássicassão temporais, pois tratam de questões comuns atodos os homens de qualquer época.

O Primo Basílio foi exibidocomo seriado na televisão

brasileira no final da década de 1980.

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cepção mais humana e otimista da realidade. Eça deQueirós volta-se para a defesa da vida do campo, da po-lítica colonialista e do nacionalismo. Pertencem a essafase, também chamada de nacionalista ou social-nacio-nalista, estes dois romances:

• A Ilustre Casa de Ramires, que conta a história de Gonça-lo Mendes de Ramires, fidalgo de família tradicional, quetem pretensões literárias e políticas, mas só conhece fra-cassos e decepções. Cínico, não hesita em colaborar noadultério da irmã para conseguir cargos políticos. Quan-do se muda para a África, torna-se rico e feliz. É assimque volta a Portugal, ao qual Gonçalo é comparado aofim do romance.

• A Cidade e as Serras: aqui, por meio de Jacinto, Eça de-fende a idéia de que o homem só é verdadeiramente felizlonge da civilização, do progresso e da máquina.

Ficou fora dessa tripartição o romance A Tragédia da Ruadas Flores, que, embora escrito em 1877, só foi publicado em1980. Nele, o autor narra um incesto involuntário.

Leia, agora, um fragmento de O Primo Basílio. Observe comoLuísa tem seu caráter deformado por leituras românticas que alevam a imaginar/fantasiar a realidade, que logo depois se mostraobjetivamente. Sinta a força da descrição, seu apelo sensorial.

Ia encontrar Basílio no Paraíso pela primeira vez. E estavamuito nervosa; não pudera dominar, desde pela manhã, um medoindefinido que lhe fizera pôr um véu muito espesso, e bater ocoração ao encontrar Sebastião. Mas, ao mesmo tempo, umacuriosidade intensa, múltipla, impelia-a com um estremecimen-tozinho de prazer. – Ia, enfim, ter ela própria aquela aventura quelera tantas vezes nos romances amorosos! Era uma forma novado amor que ia experimentar, sensações excepcionais! Havia tudo– a casinha misteriosa, o segredo ilegítimo, todas as palpitaçõesdo perigo! Porque o aparato impressionava-a mais que o senti-

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mento; e a casa em si interessava-a, atraía-a mais que Basílio!Como seria? Era para os lados de Arroios, adiante do largo deSanta Bárbara; lembrava-se vagamente que havia ali uma cor-renteza de casas velhas... Desejaria antes que fosse no campo,numa Quinta, com arvoredos murmurosos e relvas fofas; passe-ariam então, com as mãos enlaçadas, num silêncio poético; edepois o som da água que cai nas bacias de pedra daria umritmo lânguido aos sonos amorosos... mas era num terceiro an-dar – quem sabe como seria dentro? (...)

(...)

A carruagem parou ao pé de uma casa amarelada, com umaportinha pequena. Logo à entrada um cheiro mole e salobroenojou-a. A escada, de degraus gastos, subia ingrememente,apertada entre paredes onde a cal caía, e a umidade fizera nó-doas. No patamar da sobreloja, uma janela com um gradea-dozinho de arame, parda do pó acumulado, coberta de teiasde aranha, coava a luz suja do saguão. E por trás de uma por-tinha, ao lado, sentia-se o ranger de um berço, o chorar doloro-so de uma criança.

(O Primo Basílio. 14a ed., São Paulo, Ática, 1993)

Neste trecho, Eça de Queirós faz uma crítica aoRomantismo, pois acreditava que os romances iludiam

os leitores com suas histórias açucaradas. Essa crítica,atualmente, é feita às telenovelas, que ditam comportamentoe linguajar de muitas pessoas.

Agora conheça um fragmento de A cidade e as serras:

Ora nesse tempo Jacinto concebera uma idéia... Este Prín-cipe concebera a Idéia de que “o homem só é superiormentefeliz quando é superiormente civilizado”. E por homem civili-

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zado o meu camarada entendia aquele que, robustecendo asua força pensante com todas as noções adquiridas desdeAristóteles, e multiplicando a potência corporal dos seus ór-gãos com todos os mecânicos inventados desde Terâmenes,criador da roda, se torna um magnífico Adão, que onipotente,quase omnisciente, e apto portanto a recolher dentro dumasociedade e nos limites do Progresso (tal como ele se com-portava em 1875) todos os gozos e todos os proveitos queresultam de Saber e de Poder... Pelo menos assim Jacintoformulava copiosamente a sua Idéia, quando conversávamosde fins e destinos humanos, sorvendo bocks poeirentos, sobo toldo das cervejarias filosóficas, no Boulevard Saint-Michel.

Este conceito de Jacinto impressionara os nossos ca-maradas de cenáculo, que, tendo surgido para a vida intelec-tual, de 1866 a 1875, entre a batalha de Sedan, e ouvindoconstantemente, desde então, aos técnicos e aos filósofos,que fora a Espingarda-de-agulha que vencera em Sadova efora o Mestre-de-escola quem vencera em Sedan, estavamlargamente preparados a acreditar que a felicidade dos indiví-duos, como a das nações, se realiza pelo ilimitado desenvol-vimento da Mecânica e da Erudição. Um desses moços mes-mo, o nosso inventivo Jorge Carlande, reduzia a teoria de Ja-cinto, para lhe facilitar a circulação a lhe condensar o brilho, auma forma algébrica:

Suma ciência

X } Suma felicidade

Suma potência

E durante dias, do Odeon à Sorbona, foi louvada pela moci-dade positiva a Equação Metafísica de Jacinto.

Para Jacinto, porém, o seu conceito não era meramentemetafísico e lançado pelo gozo elegante de exercer a razãoespeculativa: – mas constituia uma regra, toda de realidade e

14243

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de utilidade, determinando a conduta, modalizando a vida. Ejá a esse tempo, em concordância com o seu preceito – elese surtira da Pequena Enciclopédia dos Conhecimentos Uni-versais em setenta e cinco volumes e instalara, sobre os te-lhados do 202, num mirante envidraçado, um telescópio. Jus-tamente com esse telescópio me tornou ele palpável a suaidéia, numa noite de agosto, de mole e dormente calor. Noscéus remotos lampejavam relâmpagos lânguidos. Pela Aveni-da dos Campos Elísios, os fiacres rolavam para as frescurasdo Bosque, lentos, abertos, cansados, transbordando de ves-tidos claros.

Questões de Vestibulares

1 (VUNESP) A mais famosa polêmica da história da literatura portugue-sa ficou conhecida como “Questão Coimbrã” ou “Questão do BomSenso e Bom Gosto”, e foi iniciada por Antero de Quental com umacarta-resposta a um posfácio de Antônio Feliciano de Castilho, incluí-do no livro Poema da Mocidade, de Manuel Pinheiro Chagas. Nessapolêmica, que começou em 1865 e terminou um ano depois, amadu-receram conceitos que, mais tarde, norteariam a chamada “Geraçãode 70”.

Dos escritores ou simples intervenientes na polêmica abaixo men-cionados, um único não participou dela, sendo todavia o seu maisbrilhante produto. Indique a alternativa na qual se encontra esseescritor:

a) Camilo Castelo Branco, Teixeira de Vasconcelos.b) Ramalho Ortigão, Teófilo Braga.c) Júlio de Castilho, Eça de Queirós.d) Rui de Porto-Carrero, Manuel Roussado.e) Augusto Malheiro Dias, Luciano Cordeiro.

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2 (UM-SP) Assinale a alternativa incorreta a respeito do Realismo emPortugal.a) Seus seguidores reagiram violentamente contra tudo que se identi-

ficava com o Romantismo.b) No plano político, o posicionamento dos autores é monarquista e

conservador.c) Um de seus principais aspectos é o racionalismo.d) Seus personagens são escolhidos nas várias camadas e grupos

sociais de seu tempo.e) Apresenta vários pontos comuns em relação ao Naturalismo.

3 (F. C. Chagas-BA) Assinale a alternativa onde estão indicados os tex-tos que analisam corretamente alguns aspectos do romance realista.I) As personagens independem do julgamento do narrador, reagindo

cada uma de acordo com sua própria vontade e temperamento.II) A linguagem é poeticamente elaborada nos diálogos, mas procura

alcançar um tom coloquial, com traços de oralidade, nas partesnarrativas e descritivas.

III) Observa-se o predomínio da razão e da observação sobre o sen-timento e a imaginação.

a) I, II, III d) I e IIIb) I e II e) IIc) II e III

4 (FUVEST-SP) “Sabe-se que o folheto ‘Bom Senso e Bom Gosto’ pro-vocou uma polêmica das mais ruidosas (...)”(Antônio Sérgio)Explique, em breves linhas, o que foi e o que significou essa polêmica.

5 (FUVEST-SP) “A sala esteirada, alegrava, com o seu teto de madeira pin-tado a branco, o seu papel claro de ramagens verdes. Era em julho, umdomingo; fazia um grande calor; as duas janelas estavam cerradas, massentia-se fora o sol faiscar nas vidraças, escaldar a pedra da varanda.”(O Primo Basílio, Eça de Queirós)

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Indique:a) o movimento literário a que pertence O Primo Basílio;b) uma característica do movimento presente no trecho acima.

6 (FUVEST-SP) Podemos afirmar que a obra de Eça de Queirós estávoltada prioritariamente para a defesa dos pobres e oprimidos? Justi-fique sua resposta.

7 (FUVEST-SP) Empenhado em diagnosticar problemas da sociedade,o romance realista-naturalista os toma como peças de demonstraçãode tese. Com O Primo Basílio, Eça de Queirós trata o adultério nasociedade lisboeta, buscando as causas que teriam levado Luísa, apersonagem principal, a cometê-lo.Escolha dentre as alternativas seguintes a que mais se aproxima dascausas que abriram a Luísa o caminho do adultério.a) Personalidade forte, Luísa conduz a ação de acordo com suas

ambições pessoais.b) Frívola e em disponibilidade, ela fica à mercê de circunstâncias pro-

pícias.c) Doentiamente apaixonada pelo primo, deixa-se conduzir sem opor

resistência.d) Insatisfeita com o marido, burguês insensível, busca na aventura

sua satisfação.e) Conhecedora dos casos extraconjugais do marido, procura uma

forma de vingança.

8 (FUVEST-SP) “Luísa sabia-o. Porque o conselheiro, o ConselheiroAcácio, nunca vinha aos chás de D. Luísa, como ele dizia, sem ter idona véspera ao ministério de obras públicas procurar Jorge...”

Na passagem acima aparece uma personagem que se tornou célebrecomo símbolo de:a) vacuidade e convencionalismo d) espontaneidade e franquezab) probidade e originalidade e) sagacidade e espírito críticoc) generosidade e simpatia

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9 (FUVEST-SP) Sobre a obra de Coelho Neto, observa Alfredo Bosi:“Em 1893, saiu seu primeiro romance: A Capital Federal. A simplesconferência das datas afasta a hipótese de tomar como fontes A Ci-dade e as Serras ou A capital...”A Cidade e as Serras e A Capital foram escritos:a) por Alexandre Herculano.b) respectivamente por Artur de Azevedo e Almeida Garrett.c) por Eça de Queirós.d) respectivamente por Eça de Queirós e Karl Marx.e) respectivamente por Camilo Castelo Branco e Antero de Quental.

10 (FUVEST-SP) O romance O Primo Basílio investe contra a família bur-guesa. Desse modo, na classificação da obra de seu autor, á aponta-do como pertencente à mesma fase literária de:a) A Ilustre Casa de Ramires e Os Maiasb) A Ilustre Casa de Ramires e O Crime do Padre Amaroc) Os Maias e A Correspondência de Fradique Mendesd) O Crime do Padre Amaro e A Cidade e as Serrase) O Crime do Padre Amaro e Os Maias.

11 (VUNESP) Leia com atenção:

“Ele soube, com efeito, continuando e metodizando o trabalho deGarrett, reaproveitar a linguagem corrente, orientar-se no sentido dosseus ritmos e da sua sintaxe, tirar partido do seu vocabulário habitual,torná-la apta a exprimir uma intencionalidade ideológica e estética maisrica do que aquela em que anteriormente fora utilizada.”

(Óscar Lopes e A. José Saraiva).

A apreciação anterior diz respeito ao maior prosador realista da litera-tura portuguesa. A alternativa que o indica é:a) Alexandre Herculano d) Eça de Queirósb) Camilo Castelo Branco e) Fialho de Almeidac) Antero de Quental

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12 (FMABC-SP) Aponte a alternativa correta:a) Eça de Queirós é um dos maiores prosadores românticos de Portu-

gal.b) Camões, além de poeta épico, é notável como lírico.c) Toda a poesia de Bocage se enquadra no Arcadismo.d) Vieira representa o melhor da poesia barroca.e) Camilo Castelo Branco é sobretudo lembrado pelo romance histó-

rico.

Questões 13 a 15

De tarde“Naquele ‘pic-nic’ de burguesas,Houve uma coisa simplesmente bela,E que, sem ter história nem grandezas,Em todo o caso dava uma aquarela.Foi quando tu, descendo do burrico,Foste colher, sem imposturas tolas,A um granzoal azul de grão-de-bicoUm ramalhete rubro da papoulas.Pouco depois, em cima duns penhascos,Nós acampamos, inda o Sol se via;E houve talhadas de melão, damascos,E pão-de-ló molhado em malvasia.Mas, todo púrpuro a sair da rendaDos teus dois seios como duas rolas,Era o supremo encanto da merendaO ramalhete rubro das papoulas!”

O poema acima transcrito é de autoria de Cesário Verde, poeta portu-guês cuja obra oscila entre o parnasianismo e o realismo.Responda às seguintes questões:

13 (VUNESP) Se tivesse de caracterizar o poema como parnasiano ourealista, por qual das nomenclaturas optaria?

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14 (VUNESP) Ainda que se possa, de fato, optar por uma, e só uma, dasnomenclaturas, existem no poema características nitidamenteparnasianas e segmentos que pertencem à técnica da poesia realista.Indique sucintamente quais são as características parnasianas e oselementos da poesia realista que o poema apresenta.

15 (VUNESP) Que outros autores portugueses parnasianos e realistasconhece?

16 (FUVEST-SP) Guerra Junqueiro pode ser enquadrado no movimentoestético realista porque:a) voltou-se para a análise das camadas profundas do inconsciente.b) escreveu poemas de combate social.c) desenvolveu, em seus romances, a crítica social.d) buscou revitalizar a musicalidade do verso.e) procurou as raízes históricas da nação.

17 (FUVEST-SP) Na Literatura Portuguesa, ao lado de Camões e Bocage,considera-se grande sonetista:a) Diogo Bernardes d) Guerra Junqueirob) Sá de Miranda e) Antero de Quentalc) Almeida Garrett

18 (VUNESP)“Lá! Mas onde é lá? – Espera,Coração indomado! O Céu, que anseiaA alma fiel, o Céu, o Céu da Idéia,Em vão o buscas nessa imensa esfera!O espaço é mudo: a imensidade austeraDebalde noite e dia se incendeia...Em nenhum astro, em nenhum sol, se alteiaA rosa ideal da eterna Primavera!O Paraíso e o templo da Verdade,Ó mundos, astros, sóis, constelações!

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Nenhum de vós o tem na imensidade...A Idéia, o sumo bem, o Verbo, e a Essência,Só se revela aos homens e às naçõesNo céu incorruptível da Consciência!”

O soneto acima transcrito é da autoria de um dos mais importantesintervenientes na Questão Coimbrã, e destacado mentor da Geraçãode 70.Assinale a alternativa correta.a) Antônio Feliciano de Castilho d) Antero de Quentalb) Camilo Castelo Branco e) Eça de Queirósc) Guerra Junqueiro

19 (Sta. Casa-SP) Numere a 2a coluna de acordo com a 1a e responda,observando as seguintes instruções:1. Almeida Garrett ( ) Odes Modernas2. Antero de Quental ( ) O Crime do Pe. Amaro3. Eça de Queirós ( ) D. Branca

( ) Mistérios da Estrada de Sintra( ) Raios da Extinta Luz

a) 3 – 2 – 2 – 1 – 3 d) 2 – 3 – 3 – 1 – 2b) 2 – 3 – 1 – 3 – 2 e) 2 – 2 – 3 – 3 – 1c) 1 – 3 – 2 – 3 – 2

20 (CESCEA) Qual o título da obra em que o Conselheiro Acácio figuracomo personagem:a) A Capital d) O Primo Basíliob) Alves e Cia e) Não seic) O Conde d’Abranhos

21 (Sta. Casa-SP) Assinale a alternativa em que se encontra o autor cujascaracterísticas fogem ao Romantismo:a) Alexandre Herculano d) Camilo Castelo Brancob) Eça de Queirós e) Antônio Feliciano de Castilhoc) Almeida Garrett

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22 (UM-SP) Assinale a alternativa incorreta a respeito do Realismo emPortugal.a) Seus seguidores reagiram violentamente contra tudo que se identi-

ficava com o Romantismo.b) No plano político, o posicionamento dos autores é monarquista e

conservador.c) Um de seus principais aspectos é o racionalismo.d) Suas personagens são escolhidas nas várias camadas e grupos

sociais de seu tempo.e) Apresenta vários pontos comuns em relação ao Naturalismo.

23 (UF-PI) Um traço estético presente em O Primo Basílio, de Eça deQueirós, é:a) linguagem fortemente descritivab) linguagem contida, sem detalhesc) emprego de recursos gráficosd) linguagem introspectivae) linguagem cinematográfica

24 (UF-PI) São temas de O Primo Basílio, exceto:a) a ociosidade burguesab) uma intensa idealização amorosac) uma visão pessimista da sociedade portuguesad) o adultérioe) o erotismo

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SIMBOLISMO(1890-1910)

Os pintores impressionistas saem ao ar livre para captar os efeitos da luz sobreos objetos. Pintam paisagens em que o movimento, o instante e a sugestão sãomais importantes que as formas nítidas.

Rep

rodu

ção

Les Nymphéas, de Monet

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SIMBOLISMO: século XIX

CONTEXTO HISTÓRICO: neocolonialismoUltimato Inglês

CARACTERÍSTICAS: musicalidadesinestesiasugestão

AUTORES: Eugênio de CastroAntônio NobreCamilo Pessanha

Realismo Simbolismo

• positivismo/materialismo/ • idealismo/misticismo/ cientificismo metafísica

• racionalismo • valorização da intuição

• representação objetiva e • sugestão, evocação da nítida da realidade realidade

• objetividade* • mergulho no inconsciente

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SIMBOLISMO (1890- 1910)O Simbolismo surge com reação ao positivismo, ao materia-

lismo, ao cientificismo. Iniciou-se em Portugal em 1890 com apublicação do livro de poemas Oaristos, de Eugênio de Castro, eterminou em 1910, com a instauração da república em Portugal.Foi um período em que se produziu, sobretudo, poesia.

Contexto HistóricoO final do século XIX foi marcado por uma industrialização

acelerada, que levou as grandes potências a se expandirem pelomundo, buscando matérias-primas para a indústria e mercadosconsumidores para os produtos industrializados.

Esse processo, chamado de imperialismo ou neocolonialis-mo, gerou um clima internacional de rivalidades e provocou umaacirrada competição entre as nações para dominar regiões daÁfrica e da Ásia. A rica burguesia industrial obtinha lucros comesse imperialismo, mas as desigualdades sociais cresciam e aclasse média entrava em colapso.

Portugal vivia uma crise monárquica em conseqüência dasgreves operárias, das idéias republicanas e da crise econômica.Agravando esse quadro, o Ultimato Inglês de 1890 levou ao ex-tremo a insatisfação popular: cedendo aos ingleses, Portugalretirou as tropas que ocupavam os territórios entre suas colôniasde Angola e Moçambique, pois os britânicos ameaçavam tomá-las pela força.

Em toda a Europa o materialismo começou a ser questiona-do, renovando-se, então, as tendências idealistas como reaçãoao pessimismo dominante. O homem voltou-se para o misticis-mo, a metafísica, a religião, a fé, a análise do inconsciente. Énítida a influência de Henri Bergson, cuja filosofia defendia a idéiade que a intuição permite captar a realidade de modo mais com-pleto do que a razão.

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A dançarina no palco, de DegasR

epro

duçã

o

LiteraturaO Simbolismo opôs ao racionalismo, ao cientificismo, ao ma-

terialismo do período anterior, a valorização da intuição, das ma-nifestações espirituais e metafísicas. Os simbolistas, a exemplodos românticos, voltaram-se para dentro deles mesmos. Masesse novo egocentrismo foi além: à procura de zonas mais pro-fundas do “eu”, mergulhou no caos do inconsciente e do sub-consciente, dos estados d´alma.

No entanto, essas zonas mais profundas são inefáveis, istoé, indizíveis, não se deixam exprimir por palavras, por isso os

Manifestações ArtísticasO Impressionismo, na pintura e na música, foi o movimento

correspondente ao Simbolismo. Os pintores pretendiam captar anatureza, em contínua transformação, com rápidas pinceladas,preocupando-se mais com o efeito geral do que com as formasnítidas, os detalhes. Isso porque, mais do que a representação,interessava-lhes a sugestão. Observe esse poder de sugestão nodelicado quadro de Degas.

A música, que se inspira noexotismo do extremo oriente,afasta-se da temática épica doRomantismo. Seu maior repre-sentante é Claude Debussy.

Procure conhecer as obrasdos pintores impressionistas epós-impressionistas: Manet,Renoir, Monet, Cèzanne, VanGogh, Gauguin, Toulouse-Lautrec e Klimt, e dos pinto-res simbolistas Moreau,Odilon Redón e Gauguin.

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simbolistas diziam que as palavras deveriam sugerir, evocar enão definir nem descrever. Para isso usaram o símbolo comorecurso expressivo. O símbolo é uma metáfora polivalente quetenta apreender todo o conteúdo difuso e multifacetado do inte-rior do artista: o poema reveste-se de mistério e vaguidão maisfacilmente evocáveis pela música.

Paul Verlaine, simbolista francês, afirmava que a poesia de-veria ser “música antes de qualquer coisa” (de la musique avanttoute chose), por isso a musicalidade — conseguida pelo eco,pela rima e, sobretudo, pela ali-teração — foi tão perseguida pe-los simbolistas. E como tudo erasugestão, os símbolos criavamrelações entre os cinco sentidos,apelando para a totalidade denossa percepção: as cores ti-nham cheiros; os aromas, textu-ras; as texturas, cheiros — a issose chama sinestesia.

Produção Literária

Eugênio De Castro(1869-1944)

Embora seja o introdutor doSimbolismo em Portugal com suaobra Oaristos, de 1890, seu simbo-lismo é forçado e superficial. Noentanto, neste pequeno trecho deOaristos, percebe-se a preocupaçãocom a musicalidade — conseguidapelas rimas internas, pelas alitera-

Os simbolistas francesesVerlaine e Rimbaud vivemum intenso relacionamen-to afetivo e poético no fil-me O eclipse de uma pai-xão (1997), dirigido porAgnieszka Holland

Rep

rodu

ção

Eugênio de Castro

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1. plantação em época de colheita2. cantiga suave

3. discos luminosos que envolvem alguns astros4. gaitas de foles

5. antigos instrumentos musicais, semelhantes a castanholas6. o mesmo que cítaras, instrumentos musicais de corda

7. antigos instrumentos de percussão

ções, pela alternância de metros. A atmosfera do poema é rare-feita, própria do caos onírico retratado e reforçada pela escolhade palavras raras:

(...)Na messe1, que enlourece,estremece a quermesse...O sol, o celestial girassol, esmorece...E as cantilenas2 de serenos sons amenosFogem fluidas, fluindo à fina flor dos fenos...As estrelas com seus halos3

Brilham com brilhos sinistros...Cornamusas4 e crotalos5,Cítolas6, cítaras, sistros7,Soam suaves, sonolentos,Sonolentos e suaves,Em suaves,Suaves, lentos lamentosDe acentosGravesSuaves...

(Eugênio de Castro. In: Torres,Alexandre Pinheiro (org.). Op.cit.)

Oaristo, termo grego, significa “diálogo íntimo” ou “diálogoentre esposos ou amantes”. As inovações no livro de poemasOaristos pautam-se principalmente no plano formal: explora-ção do verso alexandrino com cesuras diferentes, rimas ori-ginais e aliterações.

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Rep

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çãoAntônio Nobre

(1867-1900)

Poeta saudosista, seus temas preferi-dos são o sofrimento, a saudade e o tédio.Coexistem em sua obra um vocabulário co-tidiano, coloquial, e o vocabulário requin-tado do Simbolismo. Em 1892, publicouseu livro de poesias Só.

VIAGENS NA MINHA TERRA

Às vezes, passo horas inteirasOlhos fitos nestas braseiras,Sonhando o tempo que lá vai;E jornadeio em fantasiaEssas jornadas que eu faziaAo velho Douro, mais meu Pai.

Que pitoresca era a jornada!Logo, ao subir da madrugada,Prontos os dois para partir:– Adeus! adeus! é curta a ausência,Adeus! – rodava a diligênciaCom campainhas a tinir! (...)

(Só, 10a ed., Porto, Tavares Martins, 1955)

Este fragmento de texto remete-nos ao Romantismo (de queo Simbolismo é um prolongamento) e, nele, a Almeida Garrett.Nobre foi um poeta de sensibilidade romântica, a qual soubeexpressar de forma simbolista e moderna.

Antônio Nobre

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Camilo Pessanha(1867-1926)

Pessanha viveu a maior parte desua vida em Macau (colônia portu-guesa na China), onde se viciou emópio. Maior representante do Simbo-lismo português, é o único poeta quese enquadra nas características fun-damentais da estética simbolista:musicalidade, sugestão, imagensfragmentadas, desarticuladas e usodo símbolo. É o poeta da dor, da ilusão, da nostalgia. Publicou,em 1920, Clepsidra, seu único livro.

Rep

rodu

ção

Clepsidra é um relógio que marca a passagemdo tempo através do fluir da água.Klepsydra = Klepto (furto, roubo) + hydro (água)Portanto, o relógio rouba a água, isto é, o tem-po, assim como a vida nos é roubada.

No texto seguinte, à moda de Verlaine, a preocupação com asonoridade é patente. As imagens são “impressões” que se jun-tam desarticuladamente num mosaico sensorial:

Chorai, arcadasDo violoncelo!Convulsionadas,Pontes aladasDe pesadelo...

Camilo Pessanha

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De que esvoaçam,brancos, os arcos...Por baixo passam,Se despedaçam,No rio, os barcos.

Fundas, soluçamCaudais de choro...Que ruínas, (ouçam)!Se se debruçam,Que sorvedouro!...

Trêmulos astros...Soidões lacustres...– Lemes e mastros...E os alabastrosDos balaústres!

Urnas quebradas!Blocos de gelo...– Chorai, arcadas,Despedaçadas,Do violoncelo.

(Clepsidra, “Violoncelo”. Lisboa: Ática,1945)

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Questões de Vestibulares 1 (FUVEST) O Simbolismo se iniciou em Portugal em 1890, graças a

Eugênio de Castro.a) Indique o título da obra publicada nessa data.b) Cite outro autor simbolista português.

2 (Mackenzie-SP) Assinale a alternativa incorreta.a) A poesia lírico-amorosa de Camões apresenta uma meditação acer-

ca do amor.b) Camilo Pessanha, através de seus sonetos neoclássicos, aproxi-

ma-se da temática camoniana.c) A poesia de Bocage divide-se em duas partes: satírica e lírica.d) Enquanto ficcionista, Camilo Castelo Branco cultivou a novela

passional.e) Eça de Queirós tanto escreveu romances como contos realistas.

3 (FUVEST-SP) Encontre a alternativa em que há erro na correlação es-tética/característica.a) Romantismo – sentimentalismob) Naturalismo – determinismoc) Parnasianismo – descritivismod) Simbolismo – materialismoe) Modernismo – nacionalismo

4 (F. Objetivo-SP) A negação do Positivismo, do Materialismo e das es-téticas neles fundamentadas; a criação poética como fruto do incons-ciente, da intuição, da sugestão, da associação de imagens e idéias; otom vago, impreciso, nebuloso; o uso acentuado de sinestesias e in-tensa musicalidade são características do:a) Realismob) Simbolismoc) Naturalismod) Romantismoe) Parnasianismo

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5 (FUVEST-SP) Só e Clepsidra são obras de um mesmo movimento lite-rário. Indique:a) O movimento.b) O autor de cada obra.

6 (FUVEST-SP)a) Qual a estética que mais explorou as sonoridades da língua, procu-

rando aproximar a poesia da música?b) Cite dois representantes dessa estética.

7 (FUVEST-SP)a) Em que século e em que movimento literário se situa a obra de

Camilo Pessanha?b) Dê razões que permitam situar sua obra nesse movimento.

8 (VUNESP) Assinale a alternativa em que se caracteriza a estética sim-bolista.a) Culto do contraste, que opõe elementos como amor e sofrimento, vida

e morte, razão e fé, numa tentativa de conciliar pólos antagônicos.b) Busca do equilíbrio e da simplicidade dos modelos greco-romanos,

através, sobretudo, de uma linguagem simples, porém nobre.c) Culto do sentimento nativista, que faz do homem primitivo e sua

civilização um símbolo de independência espiritual, política, social eliterária.

d) Exploração de ecos, assonâncias, aliterações, numa tentativa devalorizar a sonoridade da linguagem, aproximando-a da música.

e) Preocupação com ‘a perfeição formal, sobretudo com o vocabulá-rio carregado de termos científicos, o que revela a objetividade dopoeta.

9 (UFV-MG) Assinale a alternativa em que todas as características deestilo são do Simbolismo.a) Impassibilidade, vida descrita objetivamente, ecletismo.b) Hermetismo intencional, alquimia verbal, musicalidade.

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c) Favor da forma, expressões ousadas, fidelidade nas observações.d) Atmosfera de imprecisão, realismo cru, religiosidade.e) Complexidade, ressurreição dos valores humanos, materialismo

pornográfico.

10 (FCMSC-SP) Disse o grande professor de Literatura: “O trecho queacabo de ler é objetivo, comedido, as descrições são minuciosas esão freqüentes as evocações de figuras mitológicas. É elaborado; temformas eruditas. É freqüente o hipérbato.”Com mais probabilidade, o trecho que o professor acabara de ler:a) é de um romance do Romantismo brasileiro (1" fase).b) é de um poema do Indianismo brasileiro.c) é de uma obra realista ou naturalista (conto ou romance).d) é um poema parnasiano.e) é de algum autor simbolista, mas, sem dúvida, em prosa.

11 (FUVEST-SP)

“Só, incessante, um som de flauta chora,Viúva, grácil, na escuridão tranqüila,– Perdida voz que de entre as mais se exila,– Festões de som dissimulando a hora.”

Os versos acima são marcados pela presença ............ e pela predo-minância de imagens auditivas, o que nos sugere a sua inclusão naestética ............ . Assinale a alternativa que completa os espaços.a) da comparação – românticab) da aliteração – simbolistac) do paralelismo – trovadorescad) da antítese – barrocae) do polissíndeto – modernista

12 (UNIFICADO-RS)

“Nasce a manhã, a luz tem cheiro... Ei-la que assomaPelo ar sutil... Tem cheiro a luz, a manhã nasce...Oh sonora audição colorida do aroma!”

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A linguagem poética, em todas as épocas, foi e é simbólica; o Simbo-lismo recebeu esse nome por levar essa tendência ao paroxismo.Os versos acima atestam essa exuberância, pela fusão de imagensauditivas, olfativas e visuais, construindo rico exemplo de:a) eufemismob) sinestesiac) antítesed) polissíndetoe) paradoxo

13 (CESESP-PE) “O .......... está para o Parnasianismo, assim como a......... está para o Simbolismo.”A alternativa que não preenche as lacunas é:a) verso de ouro – dimensão místicab) artesanato da palavra – liturgiac) culto da forma – musicalidaded) lirismo exacerbado – realidade cháe) perfeccionismo métrico – flexibilidade

14 (FUVEST-SP)

“Só, incessante, um som de flauta chora,Viúva, grácil, na escuridão tranqüila.”

Esses versos de Camilo Pessanha, além de se referirem a um instru-mento musical, exploram, acentuadamente, o aspecto sonoro daspalavras. Portanto, o poeta filia-se ao:a) Romantismob) Arcadismoc) Modernismod) Barrocoe) Simbolismo

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Com base no texto, responda às questões de 15 a 17

O visionário ou Som e cor

A Eça de Queirós

III

“ ‘O vermelho deve ser como o som de uma trombeta...’(Um cego)Alucina-me a Cor! – a rosa é como a Lira,A Lira pelo tempo há muito engrinaldada,E é já velha a união, a núpcia sagrada,Entre a cor que nos prende e a nota que suspira.

Se a terra, às vezes, brota a flor que não inspira,A teatral camélia, a branca enfastiada,Muitas vezes, no ar, perpassa a nota aladaComo a perdida cor de alguma flor que expira...

Há plantas ideais de um cântico divino,Irmãs do oboé, gêmeas do violino,Há gemidos no azul, gritos no carmesim...

A magnólia é uma harpa etérea e perfumada.E o cacto, a larga flor, vermelha, ensangüentada,– Tem notas marciais, soa como um clarim.”

O Soneto transcrito é de autoria de Gomes Leal, poeta português comuma longa vida literária, pois, tendo publicado seu primeiro livro em1875, esteve em plena atividade poética praticamente até 1921. Poressa razão, sua obra acusa diversas influências, desde a impassibilidadeparnasiana, o satanismo à maneira de Baudelaire, até os mecanismosda imagem e da metáfora do Simbolismo francês. Sendo injustamen-te um poeta menos estudado, dele já se disse que foi “o mais estra-nho gênio poético e vital depois de Camões”.

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15 (UNESP) Que mecanismo poético do Simbolismo é mais evidente nosoneto?

16 (UNESP) Explique esse mecanismo e dê exemplos retirados do soneto.

17 (UNESP) Que outros poetas portugueses parnasianos e/ou simbolis-tas você conhece?

18 (Fund. Santo Andr-SP) “Os ......... voltam-se para o seu mundo interiorem busca dos estratos mais recônditos: ultrapassam o nível do cons-ciente, mergulham no subconsciente e inconsciente, e atingem o “eu”profundo. Dispõem-se a criar uma gramática psicológica e um léxicooriginal, cunhando neologismos e regenerando arcaísmos desusados,e recorrem a expedientes gráficos (as maiúsculas, o y pelo i, etc ...).Criam o verso livre, capaz de abraçar as modulações do mar interior,no encalço do mito da “poesia pura”, um dos seus mais caros ideais”.(M. Moisés, Dicionário de Termos Literários)A lacuna da citação será corretamente preenchida por:a) barrocosb) árcadesc) românticosd) parnasianose) simbolistas

As questões 19 e 20 devem ser respondidas com base no poema.

“Ó virgem que passais, ao sol-poente,Pelas estradas ermas, a cantar!Eu quero ouvir uma canção ardente,Que me transporte ao meu perdido lar

Cantai-me, nessa voz onipotente,O sol que tomba, aureolando o Mar,A fartura da seara reluzente,O vinho, a Graça, a formosura, o luar!

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Cantai! Cantai as límpidas cantigas!Das ruínas do meu Lar desaterraiTodas aquelas ilusões antigas

Que eu vi morrer num sonho, como um ai...Ò suaves e frescas raparigas,Adormecei-me nessa voz... Cantai!

19 (UF-PA) Ressai do poema dolente saudade de um tempo passado,bem como a musicalidade dos versos que expressam tristeza, desa-lento, desilusão. Tudo isso e o jogo de imagens sutis possibilitam vin-cular este texto à estéticaa) árcadeb) simbolistac) românticad) parnasianae) modernista

20 (UF-PA) O autor do texto éa) Álvaro de Camposb) Fernando Pessoac) Antônio Nobred) Almeida Garrette) Barbosa du Bocage

21 (UF-PA)

“Ainda e sempre, música!Que teu verso seja a coisa volátilque se sente fugir de uma alma em vôopara outros céus e para outras paixões.”(Paul Verlaine)

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MODERNISMO(1915)

A arte do século XX decretou o fim da forma tradicional de representaçãorenascentista.Guernica constitui o protesto de Pablo Picasso contra o bombardeio a essacidade basca pelos alemães.

Rep

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ção

Guernica, de Pablo Picasso.

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MODERNISMO: século XX

CONTEXTO HISTÓRICO: Primeira Guerra MundialRevolução Russaascensão dos Estados Unidos àpotência mundialtotalitarismo (Nazismo, Fascismo,Salazarismo, Franquismo)Segunda Guerra MundialGuerra Friaconquista espacialTerceira Revolução Industrialtransformações do Leste europeu:dissolução da União Soviética

CARACTERÍSTICAS: rejeição da tradiçãoliberdade de criaçãovanguarda européia (Futurismo,Expressionismo, Cubismo,

Dadaísmo Surrealismo)

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MOMENTOS E AUTORES:Primeiro momento: geração da revista Orpheu (1915-1927) –introdução de novos padrões artísticos, predomínio da poesia:Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Florbela Espanca,Aquilino Ribeiro.

Segundo momento: geração da revista Presença (1927-1940) –continuação das idéias da geração anterior, acrescidas de in-trospecção e análise interior: José Régio, Miguel Torga, AdolfoCasais Monteiro.

Terceiro momento: Neo-Realismo (1940-1947) – literatura dedenúncia social: Alves Redol, Fernando Namora, Vergílio Ferreira.

Quarto momento: Surrealismo (1947-1960) – valorização do in-consciente e do sonho, ruptura com a ordenação lógica de idéias:Mário Cesariny de Vasconcelos e José-Augusto França.

Atualidade: (1960-) – poesia: ecletismo e influências pessoanas;prosa: permanência do Neo-Realismo e prosa intimista. HerbertoHelder, Antônio Gedeão, David Mourão-Ferreira, Sophia de MeloBreyner Andresen, Eugênio de Andrade, Agustina Bessa-Luís,José Saramago.

MODERNISMO (1915-)O Modernismo em Portugal iniciou-se em 1915, com o lan-

çamento da revista Orpheu, e estende-se até as produções maisrecentes. Didaticamente, pode ser assim dividido:

a) primeiro momento: geração da revista Orpheu (1915);

b) segundo momento: geração da revista Presença (1927);

c) terceiro momento. Neo-Realismo (1940);

d) quarto momento: Surrealismo (1947);

e) atualidade(1960).

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Contexto HistóricoO progresso industrial e os avanços técnico-científicos de

final do século XIX e início do XX — invenção do telégrafo, dotelefone, do cinema, do avião, da lâmpada, do automóvel —abrem novas perspectivas para a comunicação e produzem nasociedade um estado de intensa euforia. O burguês quer viver,bem e confortavelmente, o momento presente. Este é o períododa belle époque. No entanto, esse clima de euforia termina coma eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Essa guerraassistiu ao surgimento de uma nova era: a contemporaneidade,que se caracterizou pela industrialização (com base na eletrici-dade, no petróleo e no aço); pelo aparecimento de uma novapotência internacional — os Estados Unidos da América —; peloacirramento das rivalidades internacionais.

Com a Revolução Russa, de 1917, a classe operária, quesempre fora marginalizada, tomou o poder. Começaram então adelinear-se, na década de 20, dois regimes antagônicos: o co-munismo e o capitalismo.

A Europa, esfacelada, enfrentava uma séria crise, com algumasmonarquias chegando ao fim e com o aparecimento de governostotalitários e anticomunistas na Alemanha (Hitler), na Itália (Mussolini),na Espanha (General Franco) e em Portugal (Salazar). Enquanto issoos Estados Unidos viviam uma fase de otimismo só interrompidapelo crack (quebra) da Bolsa de Nova York, em 1929, que gerouuma gigantesca onda de desemprego em todo o mundo.

A partir da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), houve umareorganização geopolítica mundial. Os Estados Unidos e a URSSfirmaram-se como superpotências rivais e instalou-se a GuerraFria, um confronto entre o bloco socialista e o capitalista sem guerradeclarada. Essa guerra terminou quando Mikhail Gorbatchov éeleito presidente da União Soviética, em 1988. Sacudida por con-flitos separatistas, em 1991, a URSS deixa de existir, sendo subs-tituída pela Comunidade dos Estados Independentes (CEI).

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O século XX foi, também, o da conquista espacial e da TerceiraRevolução Industrial, caracterizada pelos grandes complexos in-dustriais, empresas multinacionais e pelos avanços da informática.

PortugalNas três primeiras décadas deste século, Portugal também

passou por mudanças radicais. Em 1908, o rei D. Carlos e seufilho foram assassinados. Assumiu D. Manuel II, de apenas 18anos, que não resistiu ao clima de descontentamento com amonarquia: em 1910, foi proclamada a República, que sofreucontínua oposição dos integralistas, os contra-revolucionáriosde extrema-direita. Um golpe militar, em 1926, colocou-os nopoder. Em 1932, Antônio de Oliveira Salazar iniciou uma ditadu-ra, inspirada no fascismo italiano, que manteve o país não sóneutro durante a Segunda Guerra, mas também bastante isola-do do resto da Europa. Ela só iria terminar em 25 de abril de1974, com a Revolução dos Cravos.

Em 1975, as colônias africanas, mantidas sob um regime deatraso e espoliação durante o governo de Salazar, tornam-seindependentes. Em 1986, Portugal ingressou na ComunidadeEconômica Européia (CEE), transformada, em 1991, em UniãoEuropéia (UE)— bloco econômico formado pela maioria dos paí-ses europeus.

Vanguarda EuropéiaO início do século XX reuniu todas as condições para o apa-

recimento de várias tendências artístico-culturais, as quais sedeu o nome de vanguarda européia: Futurismo, Expressionismo,Cubismo, Dadaísmo e Surrealismo. Conheça-as.

1) FuturismoMovimento estético lançado por Marinetti em 1909, o Futuris-

mo valorizava o futuro, exaltava a vida moderna, cultuava a má-

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quina e a velocidade e pregava a destruição do passado. Agressi-vo, encarava a guerra como uma forma de higienizar o mundo eidentificava-se com o fascismo nascente. Literariamente defendiaa liberdade de expressão e a destruição da sintaxe, dos conectivose da pontuação, substituindo-a por símbolos matemáticos e mu-sicais. Exigia, também, o compromisso da literatura com a novacivilização técnica. Esta foi a estética que mais influenciou o pri-meiro momento do Modernismo português.

2) ExpressionismoContemporâneo do Futurismo e do Cubismo, o Expressio-

nismo foi um movimento iniciadona Alemanha e inspirado em VanGogh, que se caracterizou pelaexpressão patética de intensasemoções da vida interior (medo,terror, sobressalto, solidão). Suasprincipais características são: dis-tanciamento da pintura acadêmi-ca, resgate da arte primitiva, usoaleatório de cores intensas. Ob-serve esses traços no quadro Ogrito, do pintor norueguês EdvardMunch:

3) CubismoO Cubismo, resultado de experiências do espanhol Pablo

Picasso e do francês Georges Braque em pintura, surgiu emParis em 1907. Rompendo com a perspectiva, os artistas elimi-naram a noção tridimensional e mostraram, monocromatica-mente, vários ângulos da figura ao mesmo tempo. Retrataramsempre figuras geométricas que estruturavam todos os obje-tos representados.

O grito de Edvard Munch.

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Nu sentado, de Picasso.

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Em literatura, o expoente foi o francês Apollinaire, que repro-duziu na poesia os mesmos aspectos das telas de Braque ePicasso: rompeu com o verso tradicional e trabalhou com o es-paço branco da folha, prenunciando o Concretismo.

No Brasil, a poesia concreta desenvolve-se nadécada de 1950 e, dentre seus representan-tes, destacou-se os irmãos Augusto eHaroldo de Campos. Arnaldo Antunes, conhe-

cido compositor/cantor brasileiro, também trabalhou oconcretismo na década de 1980.

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4) DadaísmoO Dadaísmo, fundado na

Suíça em 1916 por Tristan Tza-ra, foi o mais radical movimentoda vanguarda. Anarquista, pre-tendeu destruir todas as formasde arte institucionalizada. Osdadaístas consideravam o pro-cesso de criação, guiado pelacasualidade e pelo automatismopsíquico, mais importante doque a obra de arte final. Em lite-ratura, aboliram a lógica e a co-erência, afirmando que “a me-lhor técnica é a ausência de téc-nica”. Confira esses traços notexto de Tristan Tzara:

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PaysageVOI

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CI MAISONOÚ NAISSENTLES ÉTOI LESET LES DIVINITÉS

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(Apollinaire, Paysage, Calligrammes,Éditions Gallimard, 1966)

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Trabalho de KurtSchwitters, dadaísta.

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Para fazer um poema dadaístaPegue um jornal.Pegue a tesoura.Escolha no jornal um artigo do tamanho que você desejadar ao seu poema.Recorte o artigo.Recorte em seguida com atenção algumas palavras queformam esse artigo e meta-as num saco.Agite suavemente.Tire em seguida cada pedaço um após o outro.Copie conscienciosamente na ordem em que elas sãotiradas do saco.O poema se parecerá com você.E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibili-dade graciosa, ainda que incompreendido do público.

5) SurrealismoEste é o último movimento da vanguarda européia. Em 1924,

André Breton lançou o Manifesto Surrealista em Paris, no entanto,só em 1947, o Surrealismo produziu frutos em Portugal. Influen-ciado pelas teorias de Freud, o Surrealismo enfatizava o papel doinconsciente na atividade artística. Suas características são: libera-ção do inconsciente, sondagem do mundo interior, valorização dosonho, busca do homem pri-mitivo, ainda não corrompidopela sociedade. Na tentativade descoberta desse homem,muitas vezes recorriam à ma-gia, ao ocultismo, à alquimiamedieval. Observe esses ele-mentos em A tentação de San-to Antônio, de Salvador Dali,um dos mais importantes re-presentantes do Surrealismo.

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A tentação de Santo Antônio, de Salvador Dali.

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ModernismoPortugal não esteve alheio a essas tendências da vanguar-

da. A atividade artística dos republicanos iniciou um períodode resgate da cultura portuguesa orientado para a modernidade.Em 1910, ano também da proclamação da República, Teixeirade Pascoaes fundou A Águia. Essa revista mensal de literatura,arte, ciência, filosofia e crítica social, órgão da sociedade Re-nascença Portuguesa, tinha como programa o revigoramentoda cultura portuguesa, em moldes modernos. Ela foi a precur-sora de outra revista, a Orpheu, que deu início, em 1915, aoModernismo.

Teixeira de Pascoaes(1877-1952)

Esse era o pseudônimo de JoaquimTeixeira de Vasconcelos, poeta que es-tabeleceu as bases de uma filosofia au-tenticamente lusitana, o Saudosismo,com a qual começou, a rigor, o Moder-nismo português. Nacionalismo arraigado e visionário e espe-rança messiânica são a tônica de sua poesia, em que se fazemsentir as influências de Antero e João de Deus.

Deixou obra numerosa entre prosa e poesia. Marânus cons-titui um vasto poema em dezenove cantos, composto em de-cassílabos brancos e rimados.

Marânus, figura mítica entre visionário e iluminado, trava contí-nuos diálogos com símbolos ou seres sobrenaturais, como Eleonor,a Saudade, a Primavera, O Apolo, O Bruxo, D. Quixote etc.

Leia os primeiros versos do poema em que se dá o encontroentre Marânus e Eleonor:

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Teixeira de Pascoaes

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MARÂNUS E ELEONOR

Marânus era o ser que divagava,Condigo, pelo mundo solitário.A sua própria alma o alimentavaE dava-lhe a beber das suas lágrimas.

Empeceralhe a noite. E, desde então,Rodeado de espantos e de assombros,Vive numa perpétua inquietação.Falho de ânimo e pobre de esperançaApenas o salvou da negra morteEsta misteriosa simpatia,Que, semelhante à tua lira, Orfeu,As feras enternece e a luz di dua!Atrai as selvas virgens que murmuram,Os inertes penedos taciturnosE as estrelas do céu que nos procuram,Com seus olhos de eterna claridade.

Por isso, ele ia andando, neste doceEnlevo da paisagem, neste encanto,Que paira, magoado, sobre as cousas,Onde, em silêncio, jaz divino canto . . .

Conheça os momentos da literatura modernista de Portugal:

Primeiro Momento (1915–1927)A revista Orpheu (lançada em 1915 e que só teve dois núme-

ros) reunia poetas e artistas, influenciados sobretudo pelo Futu-rismo, que se propunham criar uma poesia alucinada, chocante,irritante e irreverente para chocar o burguês (épater le bourgeois).Com ela inaugurou-se o Modernismo, já prenunciado por A Águia.Em 1927, a publicação da revista Presença iniciou a segundafase desse movimento.

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O homem do século XX não é me-nos individualista, nem é menor suaruptura com o mundo e consigomesmo que no individualismo ini-ciado no século XVI e na expres-são intensa no Romantismo do sé-culo XIX. Releia o poema Dispersão.

Mário de Sá-Carneiro

a) Mário de Sá-Carneiro(1890-1916)

Mário de Sá-Carneiro, ao lado de FernandoPessoa e Almada Negreiros, entre outros, fundoua revista Orpheu. Ele financiou seus dois únicosnúmeros. Nele vida e obra confundem-se. Emambas há o sentimento de inadaptação ao mun-do, que se revela pela desintegração do eu. Leia estes versos dopoema Dispersão:

Em prosa, Sá-Car-neiro escreveu Princípio,Céu em fogo, A confis-são de Lúcio; em poe-sia, Dispersão e Indíciosde Ouro. O poeta suici-dou-se em Paris em 26de abril de 1916 quan-do regressou de Lisboa,

em decorrência de uma profunda crise financeira e moral. Alémde poesias, escreveu um livro de contos (1912) e teatro (1912 –Amizade, em colaboração com Tomás Cabreia Jr).

Perdi-me dentro de mimPorque eu era labirinto,E hoje, quando me sinto,É com saudades de mim. (...)Perdi a morte e a vida,E, louco, não enlouqueço...A hora foge vividaEu sigo-a, mas permaneço... (...)

(Poesias. Lisboa: Ática, 1946)

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Quando da publicação da revista Orpheu em 1915, os artis-tas, influenciados pelo Futurismo de Marinetti, conseguiram criaro clima de escândalo que pretendiam. As críticas mais violentasreferem-se ao poema “Ode Triunfal” de Fernando Pessoa (publi-cado sob o heterônimo Álvaro de Campos, e “Manucure”, deMário de Sá-Carneiro.

Conheça um fragmento desse longo poema:

– Ó beleza futurista das mercadorias!

– Serapilheira dos fardos,Como eu quisera togar-me de Ti!– Madeira dos Caixotes,Como eu ansiara cravar os dentes em Ti!E os pregos, as cordas, os aros... –Mas, acima de tudo, como bailam faiscantesA meus olhos audazes de beleza,As inscrições de todos esses fardos –Negras, vermelhas, azuis ou verdes –Gritos de atual e Comércio & IndústriaEm trânsito cosmopolita: (...)

(SÁ-CARNEIRO, Mário de. In: MORNA, Fátima Freitas.A poesia de Orpheu. Lisboa: Editorial Comunicação, 1982. p.156.)

b) Fernando Pessoa(1888-1935)

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Órfão aos cinco anos, FernandoPessoa foi levado pela mãe e pelo pa-drasto para a África do Sul, onde estu-dou até 1905, quando retornou a Portu-gal. Colaborou na revista A Águia, fun-dou e foi diretor da Orpheu. Só uma de Fernando Pessoa

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suas obras, em português, foi publicada em vida: Mensagem,ganhadora do segundo prêmio num concurso oficial de poesia,em 1934.

Fernando Pessoa é a figura mais im-portante do Modernismo em função daobra, peculiaríssima, na qual se desdobraem três heterônimos* principais: AlbertoCaeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos,além de escrever como Fernando Pessoaele-mesmo. Já se disse que sua obracorresponde a uma literatura inteira, poiscada um dos heterônimos tem um estilo euma atitude que os distinguem. Mensagem apresenta três par-tes: Brasão, Mar Portuguez e O Encoberto. Cada uma destaspartes sugere uma parte da História de Portugal, além de permi-tir, pela riqueza de sua simbologia, uma série de significações.Nessa obra, o poeta alterna palavras em português moderno comoutras do português arcaico.

Em Brasão, o poeta fala da nação portuguesa, das origens atépouco antes dos grandes descobrimentos; em Mar Portuguez,composta de doze poemas, sem subdivisões, conta o período dasGrandes Navegações, o auge da história lusitana, quando Portugalestava livre de obstáculos e desejoso de dominar os mares; a ter-ceira parte O Encoberto está subdividida em três seções em quehá expressão do sentimento de decadência que se seguiu ao apo-geu lusitano.. De enfoque sebastianista, essa parte fixa-se na figurado rei D. Sebastião e na crença no Quinto Império.

Conheça algumas estrofes do poema Hora Absurda conti-das em seu livro Poesias, 1942.

* Heterônimo: nome que um escritor dá a um autor criado por ele, com biografia eobra distintas da sua. No caso de Fernando Pessoa, essa criação é um meio de

conhecer a plenitude cósmica, tarefa impossível para uma só pessoa.

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Conforme o próprio Fernando Pessoa, os hete-rônimos representam diferentes visões de mun-do e diferentes personalidades poéticas:

“Multipliquei-me, para me sentir,

Para me sentir, precisei sentir tudo,

Transbordei-me, não fez senão extravasar-me”

HORA ABSURDA

O teu silêncio é uma nau com todas as velas pandas . . .Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso . . .E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andasCom que me findo mais alto e ao pé de qualquer paraíso . . .

Meu coração é uma ânfora que cai e que se parte . . .O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, a um canto . . .Minha idéia de ti é um cadáver que o mar traz à praia . . .,

e entantoTu és a tela irreal em que erro em cor a minha arte . . .

Abre todas as portas e que o vento varra a idéiaQue temos de que um fumo perfuma de ócio os salõesMinha alma é uma caverna enchida p’la maré cheia,E a minha idéia de te sonhar uma caravana de histriões . . .

Chove ouro baço, mas não no lá-fora . . . É em mim . . .Sou a Hora,

E a Hora é de assombros e toda ela escombros dela . . .Na minha atenção há uma viúva pobre que nunca chora . . .No meu céu interior nunca houve uma única estrela . . .(...)

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Conheça esse belo poema de Fernando Pessoa “ele mesmo”.

EM BUSCA DA BELEZA

O sono – Oh, ilusão! – o sono? quemLogrará esse vácuo ao qual aspiraA alma que de aspirar em vão deliraE já nem força para querer tem?

Que sono apetecemos? O d’alguémAdormecido na feliz mentiraDa sonolência vaga que nos tiraTodo o sentir no qual a dor nos vem?

Ilusão tudo! Querer um sono eterno,Um descanso, uma paz, não é senãoO último anseio desesperado e vão.

Perdido, resta o derradeiro infernoDo tédio intérmino, esse de já nãoNem aspirar a ter aspiração.

Alberto Caeiro

Heterônimo considerado mestre de todos os outros, Caeiro“nasceu” a 16 de março de 1889, “morreu” em 1915 e só teveinstrução primária. Poeta que busca o campo e a vida ingênua esimples, para ele o mundo é só o real-sensível, o que percebemospelos sentidos, por isso “pensar é estar doente dos olhos”, diz.Leia esta “autobiografia”:

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A obra poética de Alberto Caieiro compõe-se de OGuardador de Rebanhos, conjunto de 49 poemas quenos revela a visão de mundo do “mestre dosheterônimos”; O pastor amoroso, pequeno conjuntode seis poemas, e os Poemas Inconjuntos.

Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,Não há nada mais simplesTem só duas datas — a da minha nascença e a da minhamorte.Entre uma e outra cousa todos os dias são meus.Sou fácil de definir.Vivi como um danado.Amei as cousas sem sentimentalidade nenhuma.Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porquenunca ceguei.Mesmo ouvir nunca foi para mim senão umacompanhamento de ver.Compreendi que as cousas são reais e todas diferentesumas das outras;Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

(Caeiro, Alberto, het. [Pessoa, Fernando]. In Fernando Pessoa — Obra Poética.3a ed. Rio de Janeiro: Aguilar, 1969)

Leia um trecho de um poema extraído de “O guardador derebanhos”

Sou um guardador de rebanhosO rebanho é os meus pensamentosE os meus pensamentos são todos sensações.Penso com os olhos e com os ouvidos

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E com as mãos e os pésE com o nariz e a boca.

Pensar uma flor é vê-la e cheirá-laE comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Por isso quando num dia de calorMe sinto triste de gozá-lo tanto.E me deito ao comprido na erva,E fecho os olhos quentes,

Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,Sei a verdade e sou feliz.

Ricardo Reis

“Nasceu” a 19 de setembro de 1887. Formou-se em medici-na e exilou-se no Brasil porque, como era monarquista, nãoconcordava com a República. Ricardo Reis é o poeta pagão,estudioso da cultura clássica. Em suas odes manifesta a tran-qüilidade horaciana e o correspondente epicurismo: como a vidaé breve seus momentos devem ser prazerosamente desfrutados(carpe diem). Reconheça essas características nesta ode:

Bocas roxas de vinho,Testas brancas sob rosas,Nus, brancos antebraçosDeixados sobre a mesa;

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Tal seja, Lídia, o quadroEm que fiquemos, mudos,Eternamente inscritosNa consciência dos deuses.

Antes isto que a vidaComo os homens a vivem,Cheia da negra poeiraQue erguem das estradas.

Só os deuses socorremCom seu exemplo aquelesQue nada mais pretendemQue ir no rio das coisas.

(Reis, Ricardo, het. [Pessoa, Fernando].In: op.cit.)

Álvaro de Campos“Nasceu” a 15 de outubro de 1890. Era engenheiro naval for-

mado na Escócia. Poeta modernista, Álvaro de Campos é oheterônimo que mais se aproxima da vanguarda, sobretudo doFuturismo, por isso cultua a máquina e a velocidade. Álvaro deCampos é o habitante da cidade grande, agressivo, moderno,voltado para seu tempo. Dois longos poemas e bem conhecidosrevelam esse futurismo; “Ode Triunfal” e “Ode Marítima”.

Conheça um fragmento de Ode Triunfal.

ODE TRIUNFAL

À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábricaTenho febre e escrevo.Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!

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Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!Em fúria fora e dentro de mim,Por todos os meus nervos dissecados fora,Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,De vos ouvir demasiadamente de perto,E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excessoDe expressão de todas as minhas sensações,Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! (...)

(Campos, Álvaro de, het. /Pessoa, Fernando/.In: op. cit.)

Inadaptado, vivendo sempre à margem, Álvaro de Campos épessimista, descrente e angustiado, mas, antes de tudo, lúcido:

Esta velha angústia,Esta angústia que trago há séculos em mim,Transbordou da vasilha,Em lágrimas, em grandes imaginações,Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,Em grandes emoções súbitas sem sentido nenhum.Transbordou.Mal sei como conduzir-me na vidaCom este mal-estar a fazer-me pregas na alma!Se ao menos endoidecesse deveras!Mas não: é este estar entre,Este quase,Este pode ser que...,Isto.Um internado num manicômio é, ao menos, alguém,Eu sou um internado num manicômio sem manicômio.Estou doido a frio,Estou lúcido e louco,Estou alheio a tudo e igual a todos:

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Estou dormindo desperto com sonhos que são loucuraPorque não são sonhos.Estou assim... (...)

(Campos, Álvaro de, het. [Pessoa, Fernando]. In: op.cit.)

Fernando Pessoa ele-mesmo Fernando Pessoa ortônimo é um poeta que retoma a tradi-

ção lírica portuguesa tanto na ingenuidade de Quadras ao gostopopular quanto no desencanto de Cancioneiro. Observe, nestasduas quadras, o ritmo conseguido pelo uso da redondilha maiore a graça simples do conteúdo:

Cantigas de portuguesesSão como barcos no mar—Vão de uma alma para outraCom riscos de naufragar.

Vesti-me toda de novoE calcei sapato baixoPara passar entre o povoE procurar quem não acho.

(Pessoa, Fernando. In: op. cit.)

Lendo este outro poema, perceba toda a melancolia e intro-versão que faziam com que Caeiro dissesse que Fernando Pes-soa era um “novelo embrulhado para o lado de dentro”:

Nada sou, nada posso, nada sigo.Trago, por ilusão, meu ser comigo.Não compreendo compreender, nem seiSe hei de ser, sendo nada, o que serei.

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Fora disto, que é nada, sob o azulDo lato céu um vento vão do sulAcorda-me e estremece no verdor.Ter razão, ter vitória, ter amor

Murcharam na haste morta da ilusão.Sonhar é nada e não saber é vão.Dorme na sombra, incerto coração.

(Pessoa, Fernando. In: op. cit.)

O Saudosismo de Teixeira de Pascoaes, seu projeto de revi-gorar a cultura portuguesa, resgatando o passado glorioso dapátria, aparece em Mensagem, um conjunto de poemas de ins-piração teosófica, sebastianista (o sonho do Quinto Império por-tuguês) e épica. Neste poema, Pessoa refere-se à época dasGrandes Navegações e, por isso, grafou algumas palavras emportuguês arcaico:

MAR PORTUGUEZ

Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraram,Quantos filhos em vão resaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a penaSe a alma não é pequena.Quem quere passar além do Bojador*Tem que passar além da dor.Deus ao mar o perigo e o abysmo deu,Mas nelle é que espelhou o céu.

(Pessoa, Fernando. In: op.cit.)

* cabo da costa africana.Era até onde seconhecia a África naépoca das GrandesNavegações.

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Dois autores ainda merecem destaque neste primeiro mo-mento, embora não tenham feito parte da geração da Orpheu:

1. Florbela Espanca (1894-1930) é considerada a mais im-portante poetisa do Modernismo. Sua poesia revela uma delica-da trabalhadora do verso e uma sensualista, pelo erotismo, pelaexaltação dos sentimentos e dos prazeres, pelo mergulho napaixão. Suas obras principais são: Livro de Mágoas, Livro deSóror Saudade, Charneca em flor;

Conheça o belo soneto Eu.

Eu sou a que no mundo anda perdidaEu sou a que na vida não tem morte,Sou a irmã do Sonho, e desta sorteSou a crucificada . . . a dolorida . . .

Sombra de névoa tênue e esvaecida,E que o destino amargo, triste e forteImpede brutalmente para a morte!Alma de luto sempre incompreendida! . . .

Sou aquela que passa e ninguém vê . . .Sou a que chamam triste sem ver . . .Sou a que chora sem saber por quê . . .

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,Alguém que veio ao mundo pra me verE que nunca na vida me encontrou!

ESPANCA, Florbela. Apud:MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. 9. ed. São Paulo: Cultrix, 1980, p. 470.

Os versos iniciais de “Mar portuguez” dialoga com osdois últimos versos da estrofe 92 de Os Lusíadas:“A branca areia as lágrimas banhavam,

Que em multidão com elas se igualavam”

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2. Aquilino Ribeiro (1885-1963) destaca-se pela pesquisaestilística. Nele, as palavras servem menos para significar doque para impressionar. O melhor de sua obra está na novela “OMalhadinhas”, que faz parte do livro Estrada de Santiago. Emseus romances defendeu o homem rústico sempre oprimido,por isso abriu caminho para o Neo-Realismo que se iniciariaem 1940.

Conheça um fragmento de sua novela O malhadinhas. Esseentretrecho gira em torno do Malhadinhas de Barrelas, almocre-ve de muitas andanças, que no fim da vida se põe a contá-las“perante escrivães da vida e manatas”:

Danado aquele Malhadinhas de Barrelas, homem sobre omeanho, reles de figura, voz tão untosa e tal ar de sisudez quenem o próprio Demo o julgaria capaz de, por uma nonada, crivarà naifa o abdômen dum cristão. Desciam-lhe umas farripas ra-las, em guisa de suíças, à borda das orelhas pequeninas e car-nudas como cascas de noz; trajava jaleca curta de montanhaque;sapato de tromba erguida; faixa preta de seis voltas a aparar asvolutas dobradas da corrente de muita prata – e Aveiro vai, Aveiovem, no ofício de almocreve, os olhos sempre frios mas semmalícia, apenas as mandíbulas de dogue a atraiçoar o bom-se-rás, as suas façanhas deixaram eco por toda aquela corda depovos que anos e anos recorreu. Na velhice, o negócio tilintadoatravés de gerações, as andanças de recoveiro, o ver e aturarmundo, tinham-no provido de lábia muito pitoresca, levementeimpregnada dum egoísmo pândego e glorioso. Nas tardes defreira, sentado na banda de fora do Guilhermino, ou num dospoiais de pedra, donde já tivessem erguido as belfurinhas, ale-gre do verdeal, desbocava-se a desfiar a sua crônica peranteescrivães da vila e manatas, e eu tinha a impressão de ouvir agesta bárbara e forte dum Portugal que morreu.

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Segundo Momento (1927-1940)Este segundo momento iniciou-se com o lançamento da re-

vista Presença, em 1927, e prolongou-se até seu último número,em 1940. A geração presencista continuou as idéias órficas,acrescentando-lhes a análise interior e a introspecção. Atacan-do o passado e o academicismo, defendeu o predomínio da“literatura viva” sobre a “literatura livresca”.

José Régio(1901-1940)

Esse é o pseudônimo literário deJosé Maria dos Reis Pereira, um dos fun-dadores da revista Presença. O centrode sua obra, sobretudo a poética, éo conflito entre o bem e o mal, Deus eo Diabo, o relativo e o absoluto. Em OJogo da Cabra-Cega, seu romance maisimportante, a audácia de suas cenas erótico-sacrílegas fez comque o livro fosse retirado de circulação em sua primeira edição.

Conheça fragmentos do poema Cântico Negro, do livro Poe-ma de Deus lê do Diabo (1925)

CÂNTICO NEGRO

“Vem por aqui” - dizem-me alguns com olhos doces,Estendendo-me os braços, e segurosDe que seria bom que eu os ouvisseQuando me dizem: “vem por aqui”!Eu olho-os com olhos lassos,(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)E nunca vou por ali . . .

José Régio

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A minha glória é esta:Criar desumanidade!Não acompanhar ninguém.– Que eu vivo com o mesmo sem-vontadeCom que rasguei o ventre a minha Mãe.Não, não vou por aí! Só vou por ondeMe levam meus próprios passos . . .

Se ao que busco saber nenhum de vós responde,Por que me repetis: vem por aqui”?Prefiro escorregar nos becos lamacentos,

Redemoinhar aos ventos,Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,A ir por aí . . .

Ainda destacaram-se os presencistas Miguel Torga, autor queprocura, em sua terra natal, entre vales e montanhas, as respos-tas para o enigma da existência; e o poeta, ensaísta e professorAdolfo Casais Monteiro.

Terceiro Momento – O Neo-Realismo (1940-1947)Insurgindo-se contra o “psicologismo” da geração presencista,

os neo-realistas fizeram uma literatura voltada para o exterior, paraa denúncia social. A Guerra Civil espanhola, o advento do nazismo,a crise econômica mundial e a repressão portuguesa ao sindicalismocontribuíram para o engajamento dos escritores neo-realistas. Elesforam influenciados pela literatura norte-americana da época e pe-los escritores regionalistas brasileiros (José Lins do Rego, GracilianoRamos, Rachel de Queirós). A obra introdutora da nova tendênciafoi o romance Gaibéus, de Alves Redol. No entanto, os romances ASelva e Emigrantes, de Ferreira de Castro, ambientados na selvaamazônica, onde o autor trabalhara como seringueiro, já haviamprenunciado, na década de 30, o Neo-Realismo.

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Três autores destacaram-se, neste momento:

a) Antônio Alves Redol (1911-1969) introduziu o Neo-Realis-mo com um romance que conta a vida injustiçada e sofri-da dos gaibéus, modestos camponeses do Ribatejo;

O trecho que se vai ler corresponde aos parágrafos ini-ciais do capítulo intitulado “Mensagem da Nuvem Negra”,um dos tantos episódios da biografia sempre igual dosgaibéus anônimos:

Pareciam cercados no trabalho pelo braseiro de um fogoque alastrasse na Lezíria Grande. Como se da Ponta de Ervaao Vau a leiva se consumisse nas labaredas de um incêndioque irrompesse ao mesmo tempo por toda a parte.

O ar escaldava; lambia-lhes de febre os rostos corridos pelosuor e vincados por esgares que o esforço da ceifa provo-cava. O Sol desaparecera há muito, envolvido pela massacinzenta das nuvens cerradas. Os ceifeiros não o sentiampenetrar-lhes a carne abalada pela fadiga. Lento, mas per-sistente, parecia ter-se dissolvido no ar que respiravam,pastoso e espesso. Trabalhavam à porta de uma fornalhaque lhes alimentava os pulmões com metal em fusão.

Quase exaustos, os peitos arfavam num ritmo de máqui-nas velhas saturadas de movimento.

A ceifa, porém, não parava, e ainda bem – a ceifa levava oseu tempo marcado. Se chovesse, o patrão apanharia umboléu de aleijar, diziam os rabezanos na sua linguagemtaurina. Eles próprios não a desejavam; se as foices nãocortassem arroz, as jornas acabariam também. E se aosábado o apontador não enchesse a folha, as fateiras nãotrariam pão e conduto da vila.

b) Fernando Namora (1919-1989) também fez crítica social,mas tendeu para um realismo psicológico, para a análisecomportamental das personagens. Seu romance mais im-

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portante é O Homem Disfarçado publicado pela primeiravez em 1957. O dinheiro é fator importante na vida do per-sonagem João Eduardo e no mundo ficcional de FernandoNamora. Para o personagem, é tudo, a ponto de levá-lo aonaufrágio interior. Para o romancista, serve como denúnciade uma situação social: a alimentação da burguesia as-cendente e, por tabela, das classes dominantes.

c) Vergílio Ferreira (1916-) mesclou, em sua obra, Neo-Rea-lismo com preocupações metafísicas. Escreveu ManhãSubmersa e Aparição, entre outras obras.

Quarto Momento – O Surrealismo(1947-1960)

Em 1947, apareceram grupos que se insurgiram contra os neo-realistas e recolocaram o eu-profundo do artista em primeiro pla-no: os surrealistas. Eles produziram poesia que revelava, atravésda linguagem automática, um mundo inconsciente e onírico. Em1949, realizou-se em Lisboa a Exposição Surrealista, que reuniupintores, poetas e intelectuais (influenciados pelas teorias de AndréBreton, líder do Surrealismo francês) e que escandalizou a sensi-bilidade burguesa. São seus representantes mais destacados:

a) Mário Cesariny de Vasconcelos – a personalidade maisforte do movimento e

b) José-Augusto França – o teórico do Surrealismo.

Entre outras obras de Mário Cesariny de Vasconcelos desta-ca-se o poema Parada inserido em sua obra Poesia, 1961.

PARADA

Com um grande termômetro no chapéue um certo ar marcial de gênero eqüidistantetodos saíram hoje das suas casas na dunapara a rua a soprar o vento que vem de longe

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a certeza que há de vir de longea formiga que vem de muito longeOs prisioneiros polícias dos polícias prisioneirosnas montras nos passeios por baixo dos bancospassam os pontos escuros para o outro ladosem esquecer o espelhosem esquecer o aranhiço meticulosamente pequenino parafazer a surpresasem esquecer a borboleta tonta que sobe no horizonte decor do solo pescoço da nossa felicidade

(Poesia. Lisboa: Delfos [1963], pp.146, 147.)

Nesse poema, o poeta estabelece analogias e aproximaçõesinsólitas “Com um grande termômetro no chapéu”, etc.), dum talmodo que o mundo se lhe afigura imerso num formidável pesa-delo ou ele houvesse aberto as comportas que preservam o sub-consciente de vir à luz. Percebe-se, contudo, que o caos do poe-ma é aparecer: no fundo, guarda uma ordem, ordem poéticadecerto, como se a realidade estivesse sendo vista de cabeçapara baixo. Ao mesmo tempo, uma brisa de emoção varre o poe-ma todo, denotando um poeta autêntico que do real cotidianoextrai cargas, para todos insuspeitas, de lirismo Imanente. Damelhor poesia surrealista, sem dúvida alguma.

Atualidade (1960)Na poesia, predomina o ecletismo (poesia experimental e

poesia de caráter social) ao lado de influências pessoanas.

Destacam-se Herberto Helder, Antônio Gedeão, DavidMourão-Ferreira, Sophia de Melo Breyner Andresen e Eugêniode Andrade.

Na prosa, a permanência do Neo-Realismo alterna-se com aprosa intimista. Nela sobressaem:

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a) Agustina Bessa-Luís: após a publicação de A Sibila, tem sidoconsiderada o segundo milagre do século XX depois deFernando Pessoa, tal acontribuição originalque deu à prosa portu-guesa. Em seus roman-ces, as personagens re-duzem-se a símbolosmitológicos e tempos eespaços intersec-cionam-se. A Sibila foipublicado em 1953.Conta a história de uma família provinciana, de Maria eFrancisco. Estina, Quina e três rapazes são os filhos docasal; Quina é a sibila do título.Conheça um trecho desse romance:

Quina não era bonita. Tinha de seu pai a estatura, que erapequena, e as falas um tanto capciosas, o gênio profunda-mente equilibrado. Possuía a virtude de ser frívola apenascom as coisas frívolas, e, o que era mais, compreenderexatamente onde havia, de fato, frivolidade. Todos os seusdefeitos eram um por um, os de tia Balbina, sua madrinha.Era, como ela, mentirosa e chicaneira, gostava de grandesrelações e não tolerava tudo quanto não conseguia obter.O apuro de educação com que fora criada Estina faltou-lhea ela, e Quina empenhava-se em demonstrar que supera-ria sempre essa ou qualquer educação. A mãe habituara-se a vê-la acudir a todas as lidas, presente nas sachas, naslavouras, nas regas. E na casa, vacilante já, faziam faltabraços ativos e o feitio esfogueteado da moça. Mas às ve-zes pensava que Quina estava feita mulher, chamando jáas falas dos casadoiros, e que não fazia honra especial àcasa da Vessada, cujas raparigas primavam pelos dons de

Agustina Bessa-Luís

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tecedeiras, com bom conhecimento de caligrafia para te-cer “saudade”, ”felicidade”, ”lembrança”, nas barras dastoalhas com efeitos de puxados muito artísticos. Ora, Qui-na não era, pela instrução, mais do que qualquer moça quese aluga por salário anual, com os “usos”, isto é, determi-nadas mudas de roupa de estamenha e de linho.

Augustina Bessa-Luís, ao lado do brasileiro GuimarãesRosa, foi tida como a contribuição mais original da prosapara a literatura mundial.

b) José Saramago: Nasceuna aldeia de Azinhaga, pro-víncia de Ribatejo, no anode 1922.Fez o curso técnico secun-dário. Foi serralheiro mecâ-nico e exerceu diversas ou-tras profissões: desenhista,funcionário da Saúde e daPrevidência Social. Traba-lhou em vários jornais. Pu-blicou o seu primeiro livroem 1947. A partir de 1976passou a viver exclusiva-mente do seu trabalho literário. Fixou-se definitivamentena ilha de Lanzarote, arquipélago das Canárias. Em 1980publicou o livro que marca o estilo saramaguiano: Levan-tando do chão. Escreveu romances históricos fantástico-realistas em que, num tom oral, usa a paródia, um fraseadocontinuamente irônico e pontuação personalíssima. Aintertextualidade está presente quando dialoga com outrostextos da literatura ou personagens de outras obras. Algu-mas de suas obras são Memorial do Convento, O Ano daMorte de Ricardo Reis, História do Cerco de Lisboa.

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emJosé Saramago

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A ficção de Saramago versa sob a ótica dos fracos, dosmarginalizados e humilhados. Conheça sua explicaçãosobre o que o levou a escrever Memorial do Convento:

“A construção do convento de Mafra foi uma demonstra-ção, entre outras, da megalomania de João V, graças à ex-ploração do ouro e de diamantes do Brasil. Ali foi enterradauma fortuna incalculável. Mas é impossível apurar quanto,porque todos os documentos foram destruídos. Pois bem,sendo eu um homem de esquerda, com um pensamentomarxista, não poderia deixar de me impressionar com ofato de 40 mil homens terem construído aquela obra”.

José Saramago, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de1999, é o responsável pelo real reconhecimento internacionalda prosa em língua portuguesa.

Memorial do Convento estrutura-se em duas linhas narrati-vas: a arquitetura do palácio-convento de Mafra; e a cons-trução da passarola, uma máquina-voadora.O ambiente da corte portuguesa no reinado de D. João V, noséculo XVIII, é retratado na primeira narrativa; na segunda, háuma história de amor entre Baltasar Mateus, ex-soldado muti-lado de guerra e Blimunda de Jesus, cristã nova e vidente.A seguir será transcrito um trecho, parte da segunda narrati-va. Observe que Saramago opta por parágrafos extensos,utilizando vírgulas no lugar dos travessões nos diálogos.

“Baltasar e o padre Bartolomeu Lourenço olharam-se perple-xos, e depois para fora. Blimunda estava ali, com um cesto cheiode cerejas, e respondia, Há um tempo para construir e um tem-po para destruir, umas mãos assentaram as telhas deste telha-do, outras o deixarão abaixo, e todas as paredes, se for preciso.Esta é que é Blimunda, disse o padre, Sete-Luas, acrescentou omúsico. Ela tinha brincos de cerejas nas orelhas, trazia-as

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assim para se mostrar a Baltasar, e por isso foi para ele, sor-rindo e oferecendo o cesto, É Vénus e Vulcano, pensou o mú-sico, perdoemos-lhe a óbvia comparação clássica, sabe ele lácomo é o corpo de Blimunda debaixo das roupas grosseirasque veste, e Baltasar não é apenas o tição negro que parece,além de não ser coxo como foi Vulcano, maneta sim, mas issotambém Deus é. Sem falar que a Vênus cantariam todos osgalos do mundo se tivesse os olhos que Blimunda tem, veriafacilmente nos corações amantes, em algumas coisas há deum simples mortal prevalecer sobre as divindades. E sem con-tar que sobre Vulcano também Baltasar ganha, porque se odeus perdeu a deusa, este homem perderá a mulher.Sentaram-se todos em redor da merenda, metendo a mão nocesto, à vez, sem outro resguardar de conveniências que nãoatropelar os dedos dos outros, agora o cepo que é a mão deBaltasar, cascosa como um tronco de oliveira, depois amão eclesiástica e macia do padre Bartolomeu Lourenço,a mão exacta de Scarlatti, enfim Blimunda, mão discreta emaltratada, com as unhas sujas de quem veio da horta e an-dou a sachar antes de apanhar as cerejas. Todos eles atiramos caroços para o chão, el-rei que aqui estivesse faria o mes-mo, é por pequenas coisas assim que se vê serem os ho-mens realmente iguais. As cerejas são grossas, carnudas, al-gumas já vêm bicadas pelos pássaros, que cerejal haverá nocéu para que também lá possa ir alimentar-se, chegando ahora, este outro pássaro que ainda não tem cabeça, porém,se vier a ser de gaivota ou falcão podem os anjos e os santosconfiar que comerão as cerejas intactas, pois, como se sabe,aquelas são aves que desprezam o vegetal.Disse o padre Bartolomeu Lourenço, Não irei revelar o segredoúltimo do vôo, mas, tal como escrevi na petição e memória, todaa máquina se moverá por obra de uma virtude atractiva contrá-ria à queda dos graves, se eu largar este caroço de cereja, ele cai

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para o chão, ora, a dificuldade está em encontrar o que o façasubir, E encontrou, O segredo descobri-o eu, quanto a encontrar,colher e reunir é trabalho de nós três, É uma trindade terrestre, opai, o filho e o espírito santo, Eu e Baltasar temos a mesma ida-de, trinta e cinco anos, não poderíamos ser pai e filho naturais,isto é, segundo a natureza, mais facilmente irmãos, mas, sendo-o gémeos teríamos de ser, ora ele nasceu em Mafra, eu no Brasil,e as parecenças são nenhumas, Quanto ao espírito, Esse seriaBlimunda, talvez seja ela a que mais perto estaria de ser partenuma trindade não terrenal, Trinta e cinco anos é também a mi-nha idade, mas nasci em Nápoles, não poderíamos ser uma trin-dade de gêmeos, e Blimunda, que idade tem, Tenho vinte e oito,e sem irmão ou irmã, e isto dizendo levantou Blimunda os olhos,quase brancos na meia penumbra da abegoaria, e DomenicoScarlatti ouviu ressoar dentro de si a corda mais grave de umaharpa. Ostensivamente Baltasar levantou o cesto quase vaziocom o seu gancho, e disse, Acabou a merenda, vamos trabalhar.

SARAMAGO, José. Memorial do Convento. 14 ed. Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 1995, pp. 168-70.

Vocabulário:cepo: toro ou pedaço de toro cortado transversalmentesachar: escavar com o sacho (pequena enxada)abegoaria: lugar onde se recolhe gado e/ou guardam utensílios delavoura.

Poemas do livro Mensagem foram musicados por AndréLuiz de Oliveira, CD do selo Eldorado.Alguns poemas de Fernando Pessoa são declamados por

Maria Bethânia, no show Rosa-dos-Ventos, gravado pela Philips.Jean Villaret declama poemas de Fernando Pessoa em um disco.Ouça-os.

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Questões de Vestibulares 1 (CESCEA) Fernando Pessoa distingue-se, na literatura portuguesa,

dentre outras razões:a) Por ter sido, na altura de 1890, o introdutor do Simbolismo, em

Portugal.b) Por ter escrito uma das obras mais lidas do Simbolismo português,

o Só.c) Por ter sido um dos iniciadores do movimento modernista português.d) Por ter sido, em seu país, o mais popular dos poetas, dada a simplicida-

de de sua expressão lingüística e o caráter tradicional de seus temas.e) Não sei.

2 (FAAP) Fernando Pessoa adotou vários nomes, cada heterônimo abran-gendo uma personalidade, com um fim poético certo. Assim: AlbertoCaeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos são respectivamente:a) o poeta desembaraçado e o homem simples; o poeta que se apro-

xima do humanismo clássico e o homem filósofo e o poetaultramoderno de técnica futurista e o homem identificado com o“seu” tempo.

b) o poeta lírico e polêmico e o homem complexo; o poeta românticoe o homem simples e o ensaísta lírico e o homem identificado como futuro.

c) o poeta simples e o homem complexo; o poeta romântico e o ho-mem lírico e o poeta polêmico e o homem modernista.

d) n.d.a

3 (FUVEST) O movimento estético que inaugura o Modernismo em Por-tugal, e cujos poetas buscaram viver a “aventura do espírito”, foi o:a) Saudosismob) Surrealismoc) Presencismod) Orfismoe) Neo-Realismo

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4 (UM-SP) A respeito de Fernando Pessoa, é incorreto afirmar que:a) não só assimilou o passado lírico de seu povo, como refletiu em si

as grandes inquietações humanas do começo do século.b) os heterônimos são meios de conhecer a complexidade cósmica

impossível para uma só pessoa.c) Ricardo Reis simboliza uma forma humanística de ver o mundo atra-

vés do espírito da Antigüidade Clássica.d) Junto com Mário de Sá Carneiro, dirige a publicação do segundo

número de Orpheu, em 1916.e) “Tabacaria”, de Alberto Caeiro, mostra seu desejo de deixar o gran-

de centro em busca da simplicidade do campo.

5 (FUVEST-SP) Participaram da primeira geração do movimento moder-nista português:a) Eugênio de Castro, Mário de Sá Carneiro, João de Deusb) Camilo Pessanha, Antônio Nobre, Guerra Junqueiroc) Antero de Quental, Fernando Pessoa, Cesário Verded) Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Almada Negreirose) Almada Negreiros, Eugênio de Castro, Fernando Pessoa

6 (FUVEST-SP) Do programa estético da Geração de Orpheu constava a:a) restauração dos temas clássicosb) vinculação da obra de arte ao quadro socialc) instalação das vanguardas futuristasd) originalidade em Artee) implantação do movimento surrealista

7 (FUVEST-SP) O movimento estético que inaugura o Modernismo emPortugal, e cujos poetas buscaram viver a “aventura do espírito”, foi o:a) Saudosismob) Surrealismoc) Presencismod) Orfismoe) Neo-realismo

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8 (FMABC-SP) A alternativa que apresenta erro na correlação autor/obra/época é:a) Fernando Pessoa / Clepsidra / séc. XXb) Eça de Queirós / Os Maias / séc. XIXc) Bocage / Sonetos / séc. XVIIId) Vieira / Sermões / séc. XVIIe) Camões / Os Lusíadas / séc. XVI

9 (FUVEST-SP)a) Situe Fernando Pessoa no tempo e no espaço.b) O que, fundamentalmente, lhe caracteriza o processo criativo?

10 (FUVEST-SP)

1. O poeta é um fingidor.Finge tão completamenteQue chega a fingir que é dorA dor que deveras sente.

2. Sonho que sou um cavaleiro andantePor desertos, por sóis, por noite escura,Paladino do amor, busco anelanteO palácio encantado da Ventura!

As estrofes acima são, respectivamente, dos poetas:a) Fernando Pessoa e Barbosa du Bocage.b) Cesário Verde e Luís de Camões.c) Guerra Junqueiro e Antero de Quental.d) Sá-Carneiro e Luís de Camões.e) Fernando Pessoa e Antero de Quental.

11 Há um poeta em mim que Deus me disse ...A Primavera esquece nos barrancosAs grinaldas que trouxe dos arrancosDa sua efêmera e espectral ledice ...Pelo prado orvalhado a meninice

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Faz soar a alegria os seus tamancos ...Pobre de anseios teu ficar nos bancosOlhando a hora como quem sorrisse ...Florir do dia a capitéis de Luz ...Violinos do silêncio enternecidos ...Tédio onde o só ter tédio nos seduz ...Minha alma beija o quadro que pintou ...Sento-me ao pé dos séculos perdidosE cismo o seu perfil de inércia e vôo ...

(CESCEA) Poema de:a) Fernando Pessoa (ele próprio)b) Alberto Caeiroc) Ricardo Reisd) Álvaro de Campose) Não sei

12 (VUNESP) O texto a seguir pode ser tomado como exemplo ilustrativodo estilo de um dos heterônimos de Fernando Pessoa:

“Negue-me tudo a sorte, menos vê-la,Que eu, stóico sem dureza,Na sentença gravada do DestinoQuero gozar as letras.”

O heterônimo em questão é:a) Alberto Caeirob) Ricardo Reisc) Bernardo Soaresd) Álvaro de Campose) Antônio Mora

13 (UM-SP)

“O mistério das coisas, onde está ele?Onde está ele que não aparece

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Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?Sempre que olho para as cousas e penso no que os homens pensamdelas,Rio como um regato que soa fresco numa pedra.Porque o único sentido oculto das cousasÉ elas não terem sentido oculto nenhum,É mais estranho do que todas as estranhezasE do que os sonhos de todos os poetasE os pensamentos de todos os filósofos,Que as cousas sejam realmente o que parecem serE não haja nada que compreender.

Sim, eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos:— As cousas não têm significação: têm existência.As cousas são o único sentido oculto das cousas.

A. O texto, extraído de O Guardador de Rebanhos, mostra a formasimples e natural de sentir e dizer do seu autor, heterônimo de FernandoPessoa, voltado para a natureza e para as coisas puras. A leitura dotexto permite que se conheça o poeta a quem tais versos são credita-dos. Assinale a alternativa em que se encontra seu nome.a) Fernando Pessoa ele-mesmo d) Alberto Caeirob) Álvaro de Campos e) Camilo Pessanhac) Ricardo Reis

B. O autor do texto é considerado um dos maiores fenômenos da lite-ratura portuguesa, tendo sido representante e porta-voz de um gran-de movimento literário. Assinale a alternativa em que se encontra onome de tal movimento.a) Modernismo d) Romantismob) Arcadismo e) Humanismoc) Simbolismo

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Texto para as questões 14, 15 e 16Leia com atenção:

“Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!Ser completo como uma máquina!Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passentoA todos os perfumes de óleos e calores e carvõesDesta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!Fraternidade com todas as dinâmicas!Promíscua fúria de ser parte-agenteDo rodar férreo e cosmopolitaDos comboios estrêmuos.Da faina transportadora-de-cargas dos navios.Do giro lúbrico e lento dos guindastes.Do tumulto disciplinado das fábricas,E do quase-silêncio ciciante e monótono das correias de transmissão!”

O texto acima transcrito pertence ao poema de Álvaro de Campos“Ode triunfal”. Álvaro de Campos, como se sabe, é um heterônimo deFernando Pessoa, e a “Ode triunfal” constitui um dos poucos textosdo efêmero futurismo na literatura portuguesa. No entanto, a “Odetriunfal” torna-se muito importante, na medida em que nela se reflete oManifesto do Futurismo, de Marinetti. Assim sendo, responda às se-guintes questões:

14 (VUNESP) Quais os segmentos do trecho transcrito da “Ode triunfal”que justificam chamarmos-lhe um poema futurista?

15 (VUNESP) O que significa ser um heterônimo de Fernando Pessoa?

16 (VUNESP) Que outros heterônimos de Fernando Pessoa vocêconhece?

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17 (UM-SP)

“Incultas produções da mocidadeExponho a vossos olhos, – leitores:Vede-as com mágoa, vede-as com piedade,Que elas buscam piedade, e não louvores:Ponderei da Fortuna a variedadeNos meus suspiros, lágrimas e amores;Notai dos males seus a imensidade,A curta duração dos seus favores.E, se entre versos mil de sentimentoEncontrardes alguns, cuja aparênciaIndique festival contentamento,Crede, ó mortais, que foram com violênciaEscritos pela mão do Fingimento,Cantados pela voz da Dependência.”

Através da estrutura e do conteúdo do soneto acima, é correto afirmarque fazem parte da obra de:a) Camõesb) Ricardo Reisc) Camilo Pessanhad) Bocagee) Alberto Caeiro

18 (UM-SP)

“Transforma-se o amador na cousa amada,Por virtude do muito imaginar;Não tenho logo mais que desejar,Pois em mim tenho a parte desejada.Se nela está minha alma transformada,Que mais deseja o corpo de alcançar?Em si somente pode descansar,Pois consigo tal alma está liada.Mas esta linda e pura semidéia,

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Que, como um acidente em seu sujeito,Assim coa alma minha se conforma,Está no pensamento como idéia;E o vivo e puro amor de que sou feito,Como a matéria simples busca a forma.”

Através da leitura dos versos acima, pode-se concluir que:a) constituem uma redondilha em que Camões divaga sobre o amor.b) pertencem à parte lírica da obra de Bocage, pois se volta ao modelo

clássico.c) formam um típico soneto camoniano, pela estrutura formal apre-

sentada.d) foram escritos por Ricardo Reis, o heterônimo de Fernando Pessoa

que mais se ligou aos moldes clássicos.e) sua proposta neoclássica permite que os situemos na obra de Camilo

Pessanha.

19 (FUVEST-SP) “O poeta é um fingidor.” (Fernando Pessoa)

Qual a relação entre o verso acima e Poesias de Álvaro de Campos,Poemas de Alberto Caieiro e Odes de Ricardo Reis?

20 (MACKENZIE-SP)

Sebastião, Rei de PortugalLouco, sim, louco, porque quis grandezaQual a sorte não dá.Não soube em mim minha certeza;Por isso onde o areal estáFicou meu ser que houve, não o que há.Minha loucura, outros que me a tomemCom o que nela ia.Sem a loucura que é o homemMais que a besta sadia,Cadáver adiado que procria?

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Os versos acima encaixam-se na obra de:a) Alberto Caeirob) Ricardo Reisc) Fernando Pessoad) Camõese) Bocage

21 (UF-PA)

“Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraram,Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, – mar!”

Este poema de Fernando Pessoa retorna, no século XX, a temática daexpansão ultramarina também utilizada por

a) Gil Vicente em seus autos

b) D. Dinis em seus poemas de amor

c) D. Dinis em seus poemas de amigo

d) Camões em sua épica

e) Bocage em seus sonetos

22 (MEDICINA-ABC) As questões de A a E baseiam-se no seguinte texto:

1. “Não acredito em Deus porque nunca o vi.Se ele quisesse que eu acreditasse nele,Sem dúvida que viria falar comigoE entraria pela minha porta dentro,

5. Dizendo-me Aqui estou!(Isto é talvez ridículo aos ouvidosDe quem, por não saber o que é olhar para as coisas,Não compreende quem fala delasCom o modo de falar que reparar para elas ensina.)

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10. Mas se Deus é as flores e as árvoresE os montes e sol e o luar,Então acredito nele,Então acredito nele a toda a hora,E a minha vida é toda uma oração e uma missa,

15. E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.Mas se Deus é as árvores e as floresE os montes e o luar e o sol,Para que lhe chamo eu Deus?Chamo-lhe flores e árvores e montes,

20. Se ele me aparece como sendo árvores e montesE luar e sol e flores,É que ele quer que eu o conheçaComo árvores e montes e flores e luar e sol.”(Do poema V de O Guardador de Rebanhos. Alberto Caeiro)

A. É lícito afirmar que Caeiro nega a existência de Deus? Por quê?B. Em suas palavras, resumidamente, dê o sentido do trecho entreparênteses (2ª estrofe).C. É válido garantir que Caeiro identifica Deus com a Natureza? Porquê?D. Reescreva o trecho “Se ele quisesse que eu acreditasse nele”,substituindo o verbo querer por convir (lhe) e acreditar por crer.E. Reescreva “o modo de falar que reparar para elas ensina”, substi-tuindo o verbo reparar por observar, fazendo as alterações que sefizerem necessárias.

23 (UM-SP) Assinale a alternativa correta a respeito das três afirmaçõesabaixo.I) Os heterônimos de Fernando Pessoa nascem de um múltiplo des-

dobramento de sua personalidade.II) Alberto Caeiro é o poeta que se volta para o campo, procurando

viver em simplicidade.III) Ricardo Reis é um poeta moderno, que do desespero extrai a pró-

pria razão de ser.

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a) Apenas a I e a II estão corretas.b) Todas estão corretas.c) Apenas a I e a III estão corretas.d) Nenhuma está correta.e) Apenas a II e a III estão corretas.

Texto para as questões 24 e 25

“Aquela senhora tem um pianoQue é agradável mas não é o correr dos riosNem o murmúrio que as árvores fazem...Por que é preciso ter um piano?O melhor é ter ouvidos.E amar a Natureza.”

24 (FUVEST-SP)a) Qual a opinião do poeta em relação ao piano?b) Que simboliza o piano no poema?

25 (FUVEST-SP) Verifique se há no poema:a) alguma característica que permita situá-lo em determinada estética

literária;b) algum elemento que evidencie ser o autor português ou brasileiro.

Em caso afirmativo, justifique sua resposta.

26 (MEDICINA-ABC) Aponte a alternativa em que aparece um escritorcuja obra não está filiada a nenhuma das correntes do Modernismoem Portugal:a) Camilo Pessanhab) Mário de Sá-Carneiroc) Fernando Pessoad) José Régioe) Fernando Namora

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27 (VUNESP)

“Contemplo o lago mudoQue uma brisa estremece.Não sei se penso em tudoOu se tudo me esquece.O lago nada me diz,Não sinto a brisa mexê-lo.Não sei se sou feliz.Nem se desejo sê-lo.Trêmulos vincos risonhosNa água adormecida.Por que fiz eu dos sonhosA minha única vida?”

O poema acima transcrito é de Fernando Pessoa, e pode ser conside-rado como um dos melhores exemplos do processo poético de seuautor. Qual das alternativas abaixo indicadas corresponde a esse pro-cesso utilizado no poema?

a) A descrição perfeita dos vincos na água adormecida do lago.b) A relação entre o ver, o sentir e o pensar.c) A certeza de que a vida é feita de sonhos.d) O colorido das imagens e a riqueza das metáforas.e) A animização do lago com motivação

28 (UF-PA) É incorreto dizer-se de Fernando Pessoa que:

a) “Inventando os seus heterônimos – ou deixando-se invadir poresses outros – ele não foi nem deixou de ser sincero”

b) criou indivíduos poéticos que são simples pseudônimosc) produz uma poesia em que associa reflexão filosófica e teorização

poéticad) criou um heterônimo vinculado à estética futuristae) foi um dos responsáveis pela introdução do modernismo em

Portugal.

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29 (UF-PA)

Texto 1“Que noite de Inverno! Que frio, que frio!Gelou meu carvão:Mas boto-o à lareira, tal qual pelo Estio,Faz sol de Verão.

Texto 2Tudo o que sonho ou passo,O que me falha ou finda,É como que um terraçoSobre outra coisa aindaEssa coisa é que é linda

Texto 3“Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?”Os três fragmentos acima foram escritos respectivamente pora) Bocage / Fernando Pessoa-ortônimo / Camõesb) Garrett / Álvaro de Campos / Antônio Nobrec) Antônio Nobre / Bocage / Álvaro de Camposd) Antônio Nobre / Fernando Pessoa-ortônimo / Álvaro de Campose) Álvaro de Campos / Antônio Nobre / Álvaro de Campos

30 (UNICAMP-SP) Leia com atenção os fragmentos de poemas transcri-tos abaixo:

Fragmento 1:Trova à maneira antiga(Francisco de Sá Miranda, 1595)“Comigo me desavim,sou posto em todo perigo;não posso viver comigonem posso fugir de mim.(...)Que meio espero ou que fimDo vão trabalho que sigo,

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Pois que trago a mim comigo,Tamanho imigo de mim?” (imigo = inimigo)

Fragmento 2:

Dispersão(Mário de Sá-Carneiro, 1913)“Perdi-me dentro de mimPorque eu era labirintoE hoje, quando me sinto,É com saudades de mim.(...)E sinto que a minha morte –Minha dispersão total –Existe lá longe, ao norte,Numa grande capital.”

Ambos os poemas tratam do tema das relações do eu consigo mes-mo, mas desenvolvem-no de maneira diferente. Exponha em que con-siste esse desenvolvimento diferenciado do tema, em cada poema.

31 (STA CASA) José Régio – pseudônimo de José Maria dos Reis Pereira– traz à literatura a problemática religiosa que é comparada a:a) Antero de Quental e Guerra Junqueirob) Antero de Quental e Fernando Pessoac) João de Deus e Guerra Junqueirod) Antero de Quental e João de Deuse) João de Deus e Fernando Pessoa

32 (FUVEST-SP) “Já vai andando a récua dos homens de Arganil, acom-panham-nos até fora da vila as infelizes, que vão clamando, qual emcabelo, Ó doce e amado esposo; e outra protestando, Ó filho, a quemeu tinha só para refrigério e doce amparo desta cansada já velhiceminha; não se acabavam as lamentações, tanto que os montes demais perto respondiam, quase movidos de alta piedade (...)”

(J. Saramago. Memorial do Convento)

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Em muitas passagens do texto transcrito, o narrador cita textualmentepalavras de um episódio de Os Lusíadas, visando criticar o mesmo as-pecto da vida de Portugal que Camões, nesse episódio, já criticava. Oepisódio camoniano citado e o aspecto criticado são, respectivamente:a) O Velho do Restelo; a posição subalterna da mulher na sociedade

tradicional portuguesa.b) Aljubarrota; a sangria populacional provocada pelos empreendimen-

tos coloniais portugueses.c) Aljubarrota; o abandono dos idosos decorrente dos empreendimen-

tos bélicos, marítimos e suntuários.d) O Velho do Restelo; o sofrimento popular decorrente dos empreen-

dimentos dos nobres.e) Inês de Castro; o sofrimento feminino causado pelas perseguições

da Inquisição.

33 (UNICAMP-SP)

“Mas um velho, de aspecto venerando.(...)A voz pesada um pouco alevantando.(...)Tais palavras tirou do experto* peito:Ó glória de mandar, ó vá cobiçaDesta vaidade a quem chamamos FamaÓ Fraudulento gosto, que se atiçaCua aura popular, que honra se chama.”(Camões, Os Lusíadas, canto IV)

“... e então uma grande voz se levanta, é um labrego** de tanta idadejá que o não quiseram, e grita subido a um valado***, que á púlpito dosrústicos, Ó glória de mandar, ó vá cobiça, – rei infame, – pátria semjustiça, e tendo assim clamado, veio dar-lhe o quadrilheiro uma cace-tada na cabeça, que ali mesmo o deixou por morto.” (José Saramago,Memorial do Convento, p. 293)

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*experto – que tem experiência**labrego – indivíduo grosseiro, rude, tosco (...)***valado – elevação de terra que limita propriedade rústica(Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa)

Confrontando os fragmentos acima, percebe-se que Memorial doConvento dialoga com os clássicos. O episódio do Velho do Restelo,do Canto IV de Os Lusíadas, refere-se ao engajamento voluntário dosportugueses na grande empresa que foi a descoberta de novos mun-dos. Já no Memorial do Convento, entretanto, o recrutamento paraMafra deu-se, em geral, à força.a) Cite ao menos uma razão que levou “o rei infame” de Memorial do

Convento a tornar obrigatório o engajamento de todos os operáriosdo reino, quaisquer que fossem suas profissões.

b) Quem era esse “rei infame” a que se refere o trecho citado e em queséculo essa ação do romance se passa?

c) Aponte, no trecho, ao menos uma passagem que indique airreverência de Saramago em relação ao texto de Luis de Camões.

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Respostas das Questões de Vestibular

Capítulo 1 - A arte literária 1- b 2- O conteúdo. Na poesia lírica, predomina o eu, o subjetivismo; já a

poesia épica é objetiva e busca narrar um fato grandioso. 3- O texto teatral é escrito para ser representado; o romance é uma

narração. 4- 07 5- d 6- d 7- c 8- 58 9- 2910- 19

Capítulo 2 - Trovadorismo 1- d 2- a 3- e 4- a 5- a) Trovadorismo-Barroco- Arcadismo- Romantismo-Simbolismo.

b) Trovadorismo. 6- a) amigo;

b) Trovadorismo; 7- a) Trovadorismo;

b) cantigas. 8- c 9- a) As quatro estrofes ( mais o fecho) do poema se distribuem em duas

séries de estrofes paralelas: a primeira série corresponde às estro-fes 1 e 2; a segunda, às estrofes 3 e 4.

b) A primeira série apresenta o quadro da moça que fia e canta; asegunda série corresponde à intervenção de alguém, que comentao canto e a emoção que ele exprimiu.

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Portanto, nas duas primeiras estrofes, enfatiza-se o canto: uma can-tiga amorosa (de amigo); na 3ª e 4ª, fala-se da desilusão amorosaque motivou a excelência do canto.

10- a) Quem se exprime no último verso é a moça, a “formosa” que cantacantigas de amigo.

b) O último verso indica que o interlocutor da moça concluiu adequa-damente que o canto exprimia uma realidade vivida pela cantora.

11- c12- d

Capítulo 3 - Humanismo 1- e 2- e 3- c 4- a 5- c 6- d 7- c 8- a) b

b) e 9- e10- a11- a12- c13- a14- b15- e16- b

Capítulo 4 - Classicismo 1- b 2- d 3- c 4- b 5- d

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6- c 7- d 8- Escreveu obra lírica e épica. Os lusíadas é sua epopéia, composições

do livro Rimas são exemplo de obra lírica. 9- c10- a11- c12- a13- c14- e15- a16- b17- a18- b19- a20- d21- b22- a) versos decassílabos;

b) viagem de Vasco da Gama às Índias, em 1498.23- Nos seis primeiros versos, Camões coloca em segundo plano a litera-

tura clássica (sábio Grego é Ulisses, herói da Odisséia; Troiano é Enéias,personagem da Eneida) e os grandes impérios antigos (Alexandre é oimperador da Macedônia e Trajano, um imperador romano). Isso édevido ao fato de que agora Camões vai cantar as glórias de Portugal.Essas considerações são sintetizadas nos dois últimos versos: umvalor superior aos antigos — os portugueses— vai ser louvado.

Capítulo 5 - Barroco 1- a 2- e 3- a 4- a 5- b 6- e

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7- b 8- b 9- a) Grandes escândalos são esses, mas a circunstância os faz ainda

maiores.b) mesma natureza = própria natureza // mesma pátria = pátria co-

mum a todos cidadãos.c) Pe. Antônio Vieira. Século XVII.

10- O conceptismo revela-se através da retórica apurada com forte argu-mentação e exemplificação. É a arte de persuadir.

11- e12- e13- b14- c15- d16- b17- e18- d19- c20- d21- Três espécies: 1) o amor que tem causa (amo porque me amam);

2) o amor que tem frutos (amo para que me amem);3) o amor fino, sem causa nem efeito (amo, simplesmente).

22- O amor de Cristo por Judas é o amor desinteressado. Cristo conheciaos demais apóstolos e amava-os porque era amado por eles e paraque eles o amassem. Cristo conhecia Judas e, apesar de sua traição,amou-o: era esse um amor sem causa e sem efeito, ou seja, a realiza-ção plena do amor.

Capítulo 6 - Arcadismo 1- d 2- e 3- b 4- b 5- e

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6- e 7- e 8- c 9- Árcade: invocação da razão; romântica: subjetivismo e sofrimento.10- e11- b12- d13- b14- a15- c16- b

Capítulo 7 - Romantismo 1- b 2- c 3- c 4- 53 5- d 6- a 7- a) Camões;

b) Almeida Garrett. 8- a 9- a) Alexandre Herculano;

b) Idade Média.10- a11- e12- e13- Camilo Castelo Branco, século XIX, 2o momento.14- Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição.15- Amor, morte, sofrimento, sonhos de felicidade, religiosidade.16- Alexandre Herculano, Almeida Garrett, João de Deus, Soares de

Passos.17- c18- d

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19- a20- b21- b22- a23- c24- c25- e26- c27- e28- b29- b30- d31- d32- d33- b34- a) D. João volta a casa, após mais de vinte anos de seu desapareci-

mento em Alcácer-Quibir, disfarçado de romeiro, para sondar areceptividade que seu possível retorno teria e constatar se o recadoque ele daria (D. João estava vivo) provocaria alteração emocionalem sua esposa, Madalena de Vilhena, agora casada com D. Manuelde Sousa Coutinho. O disfarce é um recurso que tenta alterar odesfecho trágico.

b) D. João tornou-se prisioneiro após a derrota portuguesa em Alcá-cer-Quibir, tendo ficado vinte anos em cativeiro. Sua esposa, consi-derando-se viúva, casa-se com Manuel de Sousa Coutinho, nas-cendo dessa união Maria de Noronha. Como D. João perdeu a fa-mília, a pátria, a dignidade e a identidade psicológica, diz que éninguém.

Capítulo 8 - Realismo 1- c 2- b 3- d 4- A «Questão Coimbrã» foi uma polêmica entre o romântico Antônio

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Feliciano de Castilho e Antero de Quental, defensor da poesia realista.Ela marca o início do Realismo em Portugal.

5- a) Realismo;b) descrição objetiva do ambiente.

6- Não. Ele critica a sociedade burguesa. 7- b 8- a 9- c10- e11- d12- b13- Realista, porque o importante é a temática.14- Formalmente o soneto é parnasiano; tematicamente, realista.15- Guerra Junqueiro, Gomes Leal, Gonçalves Crespo.16- b17- e18- d19- b20- d21- b22- b23- a24- b

Capítulo 9 - Simbolismo 1- a) Oaristos;

b) Antônio Nobre e Camilo Pessanha. 2- b 3- d 4- b 5- a) Simbolismo;

b) Antônio Nobre e Camilo Pessanha. 6- a) Simbolismo;

b) Camilo Pessanha, Antônio Nobre, Eugênio de Castro.

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7- a) final do século XIX, Simbolismo;b) musicalidade, valorização do inconsciente, manifestações de esta-dos d´alma, o vago, o diáfano.

8- d 9- b10- d11- b12- b13- d14- e15- sinestesia.16- Sinestesia é o entrecruzar de sensações. Gemidos no azul, gritos no

carmesim// harpa etérea e perfumada.17- Gonçalves Crespo, Camilo Pessanha, Antônio Nobre, Eugênio de Castro.18- e19- b20- c21- d

Capítulo 10 - Modernismo1- c2- a3- d4- e5- d6- c7- d8- a9- a) Foi o poeta mais importante do Modernismo português) primeira

metade do século XX), nasceu e morreu em Lisboa, viveu a infânciae estudou na África do Sul.

b) a criação de heterônimos com estilo e emoções peculiares.10- e11- a

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12- b13- a) d

b) a14- Frases em que há destaque para a exaltação da máquina, do motor,

das fábricas, isto é, exaltação ao século XX.15- As diferentes visões de mundo das personagens criadas por Fernando

Pessoa.16- Ricardo Reis, Alberto Caeiro.17- d18- c19- Realçar o processo de produção dos heterônimos.20- c21- d22- a) Não. Para ele Deus é um ser real, projetado nas coisas da natureza.

b) é preciso saber olhar e compreender o universo das coisas paracompreender quem fala delas.

c) Sim. Basta observar os versos de 20 a 23.d) Se lhe conviesse que eu cresse nele.e) O modo de falar que observá-las ensina.

23- a24- a) Apesar do som agradável do piano, o poeta prefere o som da natu-

reza.b) A cultura que se opõe à natureza.

25- a) Os versos livres e a aproximação com a prosa permitem encaixá-lono Modernismo;

b) não.26- a27- b28- b29- d30- Sá de Miranda: o conflito, a luta, se estabelece na relação do eu con-

sigo mesmo.Sá-Carneiro: preocupa-se em entender a despersonalização do eu,sua dispersão.

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31- a32- e33- a) O Rei D. João V queria que a sagração da basílica de Mafra fosse

feita, custasse o que custasse, no dia 22 de outubro de 1730. O reitinha receio de que pudesse morrer sem ter completado a obra, porisso exigiu o trabalho obrigatório de seus súditos, antecipando asagração da basílica, que estava inicialmente prevista para 1740,data em que o rei teria 51 anos.

b) D. João V é o rei infame. A ação de Memorial do Convento ocorrena primeira metade do século XVIII.

c) Camões refere-se a “um velho de aspecto venerando”; Saramago,irreverentemente, fala em “labrego”. O velho, em Camões, é qualifi-cado por sua experiência (“experto”); em Saramago, sua velhicenão indica sabedoria, mas incapacidade para o trabalho (“de tantaidade que já não o quiseram”).

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