UERN Plano de Aula (Dir Empresarial I)
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DIREITO EMPRESARIAL I
I. TEORIA GERAL
1. Viso histrica
- Estudando a evoluo do comrcio identificamos uma fase primitiva:
Primeiros homindeos: sobrevivncia, caadores ou ladres de carcaas? Perodo Paleoltico Mdio (200.000 a 10.000 a.C.): fogo e maior avano tcnico e cultural Perodo Neoltico: primeiras criaes de animais para corte e agricultura Antiguidade: Mesopotmia, Sumrios, revoluo tecnolgica com o controle dos rios,
armazenagens, cidades etc
- Pontos marcantes
1 A figura do escambo de produtos excedentes 2 Surgimento da moeda (sec. VII a.C.): compra e venda (incio da economia de mercado)
- Primeiras normas regulamentando a atividade comercial (2.083 a.C.)
Remontam ao Cdigo de Manu na ndia e ao Cdigo de Hammurabi da Babilnia (contratos agrcolas, emprstimos, juros, medidas de proteo ao agricultor, tabelamento etc).
- Comrcio e mercado so fenmenos vitais humanos
Negcio: um ato jurdico Mercado: espao de negociao e busca de vantagem Direito: viabiliza e otimiza as prticas mercantis
- Direito Comercial
Surgiu de uma necessidade de regulamentar as relaes entre os novos personagens que se apresentaram ao mundo na Idade Mdia: os comerciantes
- Tal ramo era o direito do comrcio
Entendido como o complexo de atos de intromisso entre o produtor e consumidor, que, exercidos habitualmente com fins de lucro, realizam, promovem ou facilitam a circulao dos
produtos da natureza e da indstria, para tornar mais fcil e pronta a procura e a oferta (VIDARI)
- Identificamos 3 fases/perodos do Direito Comercial
1 Perodo: subjetivo, corporativista (Idade Mdia) 2 Perodo: objetivo, atos de comrcio (Revoluo Francesa) 3 Perodo: subjetivo-moderno, idia de empresa (dcada de 40 do Sec. XX)
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Texto de Leitura Complementar: Evoluo histrica do Direito Comercial, de autoria de Guilherme Teixeira Pereira, do curso de Direito da
UNIFACS.
EVOLUO HISTRICA DO DIREITO COMERCIAL
Como toda obra elaborada pela natureza humana, faz-se necessrio nos reportarmos ao passado para entendermos o novo direito comercial, ou
como preferem alguns, o novo direito empresarial, que passar a fazer parte do nosso cotidiano a partir de janeiro de 2003, momento este em que
o novo cdigo civil entrar em vigor.
H notcias de que a atividade comercial j era praticada desde a Antiguidade por vrios povos, principalmente pelos fencios. No entanto, neste
perodo, esta atividade ainda no encontrava-se bem difundida e organizada, posto que a mesma ainda no era submetida a normas e princpios
especficos, mas sim a um direito comum dos cidados e aos usos e costumes vigentes em cada regio. Portanto, apesar da constatao da
existncia de legislao na idade antiga que abarcava as relaes comerciais, como por exemplo o Cdigo de Manu na ndia, o Cdigo de
Hammurabi da Babilnia, e ainda o influente direito civil romano compilado no to famoso Corpus Juris Civile de Justiniano, tais sistemas jurdicos
primitivos no so suficientes para considerar a existncia de um direito comercial autnomo nesta poca.
Neste sentido, so elucidativas as palavras do professor Fran Martins (MARTINS, 2001, p. 03):
No se pode, com segurana, dizer que houve um direito comercial na mais remota antiguidade. Os fencios, que, so considerados um povo que
praticou o comrcio em larga escala, no possuam regras especiais aplicveis s relaes comerciais.
Portanto, o direito comercial como um sistema autnomo s veio a desencadear-se na idade mdia, na medida em que o fomento das relaes
comerciais encontrava-se to consolidado na sociedade, que os comerciantes passaram a se organizar em corporaes, com o intuito de definir as
regras e diretrizes que deveriam balizar o desenvolvimento do comrcio.
A partir de ento, atravs de uma estrutura de classe organizada, os comerciantes passam a elaborar as normas que iriam regular a sua atividade
cotidiana, e que deveriam ser aplicadas por eles mesmos, j que era designado um julgador, denominado de cnsul, necessariamente membro da
corporao, para com base nas normas estabelecidas dirimir os conflitos que por ventura aparecessem. Logo, nota-se que os comerciantes na
idade mdia no s elaboravam suas prprias leis, como tambm estavam sujeitos jurisdio prpria, conforme podemos constatar das lies do
professor Rubens Requio (REQUIO, 1998, p. 10/11):
nessa fase histrica que comea a se cristalizar o direito comercial, deduzindo das regras corporativas e, sobretudo, dos assentos
jurisprudenciais das decises dos cnsules, juzes designados pela corporao, para, em seu mbito, dirimirem as disputas entre comerciantes.
Diante disso podemos concluir que o direito comercial, na sua origem autnoma, surgiu como um direito corporativo o qual deveria ser aplicado
apenas aos comerciantes matriculados nas corporaes, caracterstica esta que culminou na construo da teoria subjetiva, marcando o estudo
deste ramo do direito.
Com o passar do tempo, a concepo do direito comercial como o direito dos comerciantes matriculados nas corporaes foi perdendo sentido,
pois paralelamente a esta realidade, o comrcio tambm era praticado por pessoas que no faziam parte dessas organizaes de classe, e que
inclusive se utilizavam de institutos, como a letra de cmbio, que foi criada na poca para facilitar a circulao de mercadorias. Situao curiosa era
quando um comerciante inscrito em uma corporao mantinha negociao com um comerciante que no fazia parte de nenhuma corporao.
Neste caso a competncia do juzo consular deveria se estender ao comerciante no matriculado, conforme podemos observar no comentrio do
professor Rubens Requio acerca da fragilidade da teoria subjetivista (REQUIO, 1998, p.12):
E, malgrado a reao do direito territorial, se foi ampliando a competncia dos cnsules aos estranhos s corporaes, que t ivessem contratado
com um comerciante nela inscrito. Ao mesmo tempo, relaxa-se a exigncia da matrcula como condio para o comerciante submeter-se
jurisdio consular, estendendo-se sua competncia a comerciantes no matriculados.
Por outro lado, com a ascenso do mercantilismo e o consequente enfraquecimento do sistema feudal, o Estado passou por um processo de
consolidao que exerceu grande influncia na elaborao de legislaes comerciais que possuam aplicabilidade ampla a todos os cidados que
exercessem o comrcio, atravs da jurisdio do Estado, sobrepondo, desta maneira as normas editadas pelas corporaes. Como exemplo
podemos citar a Frana que em 1673 editou as Ordenaes Francesas que ficou conhecida como Cdigo de Savary, servindo de base para a
elaborao do Cdigo Napolenico de 1807.
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Tais documentos legislativos, sobretudo o famoso Cdigo Napolenico, se baseavam na teoria objetiva dos atos de comrcio. Segundo esta teoria,
um sujeito passa a ser considerado comerciante se praticar os atos de comrcio elencados na lei. Portanto, a condio subjetiva da matrcula em
uma corporao de comrcio deixou de ser requisito para a qualificao de comerciante, passando esta a ser definida pela prt ica habitual dos
atos referentes explorao de uma atividade econmica determinados na lei.
Nota-se que a teoria objetiva foi influenciada pelos ideais de liberdade, igualdade, e fraternidade, fomentados pela Revoluo Francesa, que
procurou excluir o privilgio de classe ampliando a tutela do direito comercial a todos os sujeitos que exercessem o comrcio, independentemente
de estarem matriculados em corporaes.
Apesar desta teoria ter influenciado na elaborao de legislaes de outros pases, como o Cdigo Comercial Espanhol de 1829, o Cdigo
Comercial Italiano de 1882, o Cdigo Comercial Portugus de 1833 e o Cdigo Comercial Brasileiro de 1850, a mesma incorreu numa grande
lacuna, pois no conceituou cientificamente os atos de comrcio, gerando, muitas vezes, dificuldades para definir um critrio a partir do qual
determinada atividade desempenhada passaria a ser classificada como ato de comrcio.
O Cdigo Napolenico, por exemplo, elencou nos seus artigos 632 e 633 os atos tradicionalmente realizados pelos comerciantes na sua atividade
habitual, sem, contudo, indicar nenhum critrio que pudesse defini-los. J o Cdigo Comercial ptrio, apesar de sofrer um pouco a influncia da
teoria subjetiva em virtude da meno do requisito da matrcula em Tribunal de Comrcio atravs do seu artigo 4 , faz referncia no final deste
mesmo dispositivo orientao da teoria objetiva, seno vejamos:
Art. 4 - Ningum reputado comerciante para efeito de gozar da proteo que este cdigo liberaliza em favor do comrcio, sem que se tenha
matriculado em algum dos Tribunais do Comrcio do Imprio, e faa da mercancia profisso habitual. (grifo nosso)
Da anlise do dispositivo citado, podemos observar que o diploma comercial ptrio no se reportou expresso atos de comrcio, mas sim
palavra mercancia, que inclusive foi posteriormente definida atravs do artigo 19 do decreto n. 737, documento este que foi revogado
posteriormente pelo Cdigo de Processo Civil Brasileiro.
A dificuldade de se conceituar os atos de comrcio ou simplesmente a mercancia, levou o legislador dos pases que aderiram teoria objetiva a
enumerar os atos de comrcio ou mercancia, com base em fatores histricos, que no acompanharam a dinmica evoluo das atividades
econmicas. Logo, algumas atividades que, tradicionalmente, no eram praticadas pelos comerciantes, ficaram de fora do regime comercial, como
por exemplo a atividade imobiliria, a agrcola e a prestao de servios. Inclusive deve-se ressaltar que em virtude desta excluso, alguns
sistemas jurdicos, como, por exemplo, o brasileiro, passaram a editar leis esparsas posteriores, a fim de incluir na seara do direito comercial
determinadas atividades econmicas, como foi o caso da atividade de construo civil, atravs da Lei n. 4.068/62.
Portanto, resta patente que a teoria objetiva falha e encontra-se ultrapassada, em virtude da sua deficincia jurdico - conceitual que distorce o
alcance do Direito Comercial, restringindo a matria do comrcio, conforme assinala o professor Rubens Requio ( REQUIO, 1998, p.13):
O sistema objetivista, que desloca a base do direito comercial da figura tradicional do comerciante para a dos atos de comrcio , tem sido acoimado
de infeliz, de vez que at hoje no conseguiram os comerciantes definir satisfatoriamente o que sejam eles.
Em virtude desta incongruncia apresentada pela teoria objetivista, muitos pases que detinham legislaes influenciadas por ela, implementaram
reformas significativas, que culminaram em alguns casos na adoo de novos cdigos totalmente modificados, conforme ilustra o eminente
comercialista Fran Martins (MARTINS, 2001, p. 09):
Em vrios pases influenciados pelo Cdigo francs, os cdigos primitivos foram grandemente modificados e alguns, mesmo, subs titudos por
outros, contendo normas mais atualizadas para a soluo das questes comerciais. A Espanha substituiu o Cdigo de 1829 pelo de 1885; em
Portugal, o de 1833 foi substitudo pelo de 1888. Na Itlia, o Cdigo de 1865 foi revogado, em 1882, por um outro, e este, em 1942, substitudo
pelo Cdigo Civil. Em muitos outros pases tambm os cdigos foram revogados ou alterados de tal modo que dos primitivos pouco resta.
Nesse panorama de mudanas e reflexes, surge na Itlia uma teoria que superou a teoria objetiva em virtude da sua capacidade de reestruturar a
amplitude do direito comercial em consonncia com o desenvolvimento das atividades econmicas. Essa teoria, que surgiu sob a nomenclatura de
teoria da empresa, substituiu, portanto, a teoria dos atos de comrcio, atravs do seu enfoque no instituto da empresa como a atividade econmica
organizada para a produo ou circulao de bens ou servios, que culminou na unificao legislativa do direito privado atravs da edio do
Cdigo Civil italiano de 1942.
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Nesse novo contexto jurdico, surge a figura do empresrio, em detrimento da do comerciante, na medida em que a teoria da empresa se desvia da
importncia do gnero da atividade econmica desenvolvida (rol dos atos de comrcio), passando a considerar a forma organizada pela qual
qualquer atividade de produo ou circulao de bens ou servios implementada, atravs da reunio dos quatros elementos bsicos de
produo: capital, trabalho, insumos e tecnologia.
A respeito do tema, importante colacionar a ilustrao do professor Fbio Ulha Coelho (COELHO, 2002, p. 08):
Em 1942, na Itlia, surge um novo sistema de regulao das atividades econmicas dos particulares. Nele, alarga-se o mbito de incidncia do
Direito Comercial, passando as atividades de prestao de servios e ligadas terra a se submeterem s mesmas normas aplicveis s
comerciais, bancrias, securitrias e industriais. Chamou-se o novo sistema de disciplina das atividades privadas de teoria da empresa. O Direito
Comercial em sua terceira etapa evolutiva deixa de cuidar de determinadas atividades (as de mercncia) e passa a disciplinar uma forma
especfica de produzir ou circular bens ou servios, a empresarial.
Essa nova viso do direito comercial passou a exercer influncia sob todo o mundo, sendo considerada, atualmente, por muitos juristas, como a
sistemtica mais coerente e adequada para a regulamentao do desenvolvimento das atividades econmicas. Nesse sentido, o nov o cdigo civil
brasileiro, atendendo aos reclamos da doutrina e jurisprudncia, adotou a teoria da empresa em seu Livro II - Do Direito de Empresa -, que
implementar a partir de janeiro de 2003 essa nova realidade no cotidiano da sociedade brasileira.
Diante desta abordagem evolutiva do direito comercial, podemos concluir que a histria deste ramo da cincia jurdica pode ser compreendida em
trs fases. A primeira seria traduzida na idade antiga, pela introduo da teoria subjetiva corporativista; a segunda traduzida na idade mdia,
marcada pela adoo da teoria objetiva dos atos de comrcio; e a terceira, na idade moderna contempornea, marcada pela teoria da empresa.
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Texto de Leitura Complementar: Histria e evoluo do Direito Empresarial, de autoria de Luis Eduardo Oliveira Alejarra.
HISTRIA E EVOLUO DO DIREITO EMPRESARIAL
1. INTRODUO
Na busca pelo nascimento do comrcio, depara-se com Plato[1], o qual o descreve de forma sucinta e completa em seu livro A Repblica. O
filsofo ao explicar a origem da justia, de forma indireta indica a origem do Estado e do comrcio. Segundo este filsofo, pelo fato dos indivduos
no conseguirem saciar todas as suas necessidades, se viram obrigados a aproximarem-se uns dos outros com o intuito de trocar os excedentes
de seus trabalhos. Tal aproximao acarreta a vida em grupo e posteriormente a sociedade.
MARTINS[2] assinala que no incio os grupos sociais buscavam bastar-se a si mesmos, mantendo-se com suas produes rurais familiares. O
natural crescimento populacional forou as trocas de mercadorias e posteriormente a criao da moeda, o que tinha o nico intuito de facilitar o
escambo. Segundo CAVALCANTE[3], inaugura-se o cum merx, ou escambo de mercadorias, derivando mais tarde na expresso cummerciun. J
TOMAZETTE[4], afirma que a palavra comrcio vem do latim commutatio mercium, o que significa troca de mercadorias.
Em decorrncia de algumas limitaes impostas pelo escambo (economia de troca) ocorre a evoluo para a economia de mercado e o uso da
moeda, em sistema muito similar ao utilizado at hoje. Com esta atualizao no comrcio, o produtor de determinado insumo produz mais e com
mais variedade, pois a produo deixou de ser unicamente para subsistncia e troca do excedente, agora tambm para venda.
Comrcio foi bem conceituado por ROCCO[5], o comrcio aquele ramo de produo econmica que faz aumentar o valor dos produtos pela
interposio entre produtos e consumidores, a fim de facilitar a troca das mercadorias.
Neste sentido encontra-se o conceito de BORGES[6], o ramo da atividade que tem por objeto a aproximao de produtores e consumidores,
para a realizao ou facilitao de trocas.
A atividade comercial remonta Antiguidade, tendo como bom exemplo de grandes comerciantes os fencios. Segundo PALMA[7], os fencios so
ancestrais dos Libaneses, e fizeram de seu territrio um dos maiores recantos de prosperidade do Oriente.
O ilustre professor PALMA[8] demonstra a pujana comercial dos fencios nos sculos X e IX a.C.:
... a Fencia vivia em absoluto estado de esplendor graas ao intenso comrcio e dedicao s navegaes martimas, que legaram sua gente
uma slida reputao nesse campo. Com muita habilidade e coragem mpar, os fencios ousaram singrar os oceanos a bordo de embarcaes
bem construdas. Fundaram colnias no Norte da frica, dentre as quais Cartago se evidencia ...
Urge salientar que o conceito de comrcio no se confunde com o objeto de estudo do direito comercial, ou modernamente o direito empresarial,
no devendo limitar o direito comercial como direito do comrcio. Um bom exemplo de que o direito comercial mais amplo que o comrcio, e sua
necessidade de lucro, so aspectos das associaes sem fins lucrativos que fazem parte do direito comercial, como a criao e alterao de seus
estatutos.
Destarte, ocasionado por essa comum confuso entre direito comercial e comrcio diversos doutrinadores modernos, como Rubens Requio[9],
entendem que a nomenclatura mais correta seria Direito Empresarial, ou Direito das empresas mercantis.
2. HISTRICO DO DIREITO COMERCIAL
H uma enorme controvrsia entre doutrinadores do direito, filsofos, socilogos e antroplogos sobre o nascimento do Direito Comercial.
REQUIO[10], afirma que o direito comercial surgiu na Idade Mdia com o desenvolvimento do trfico mercantil.
De acordo com FERNANDES[11], o desenvolvimento histrico do Direito Comercial perpassa pela poca romana, pelos fencios, assrios,
babilnicos e os gregos onde estes no trouxeram contribuies diretas para o desenvolvimento da matria.
Todavia, relata que alguns historiadores encontraram vestgios de normas de direito comercial no Cdigo de Manu, na ndia. No Museu do Louvre,
est a pedra em que foi esculpido o Cdigo de Hamurabi, a mais de 2.000 anos a.C., contendo normas de regulavam a atividade mercantil, mas
sem configurar um sistema de normas passvel de ser chamado de Direito Comercial.
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MAMEDE[12] cita o aparecimento de normas de Direito Comercial em pocas mais longnquas ainda nas regies de Ur e Lagash, porm
informando que a macia doutrina indica como florescimento desse ramo do direito privado o aparecimento dos primeiros burgos (cidades
burguesas).
Muitos anos aps, no Imprio Romano, bero da Civil Law, com sua estrutura social fundada sobre a propriedade e atividade rural, ainda no havia
surgido o Direito Comercial como ramo autnomo do direito. At mesmo por seu carter social aristocrtico, os Senadores e Patrcios eram
proibidos de exercer atividade mercantil, restringindo-se tais prticas aos escravos.
Em Roma encontravam-se algumas normas fragmentadas que versavam sobre a regulao do comrcio, porm nada substancial capaz de
caracterizar o nascimento de um ramo autnomo do direito.
REQUIO[13] entende que apesar de existir algumas regras de direito comercial em tempos remotos, tais regras esparsas no formaram um corpo
sistematizado de normas capazes de inaugurarem a autonomia do Direito Comercial.
Com a derrocada de Roma e, por conseguinte a ausncia de um poder estatal unificado e central, diversas pequenas cidades foram brotando no
territrio romano. Estas cidadelas no eram autossuficientes e necessitavam de outras cidades e povos prximos para sobreviverem, fomentando o
comrcio entre essas cidades.
Acrescido ao advento da era Crist, e a decadncia da aristocracia, nasce o capitalismo mercantil em territrio romano e os primeiros esboos do
Direito Comercial como disciplina autnoma, impulsionado pelo trfego mundial no Mediterrneo.
Segundo REQUIO[14], com a invaso brbara e o retalhamento do territrio romano, inicia-se a fase feudal. Nos sculos VIII e IX surgem em
Bizncio, oriundas das Institutas de Justiniano, as leis pseudrias e o jus greco-romano incorporando os costumes Mediterrneos, bem como a
origem do direito comercial medieval.
Este doutrinador ainda afirma que no sculo XI se inicia o desenvolvimento econmico da Europa, ainda mal visto pelos preceitos do direito
cannico, o qual tem averso s atividades lucrativas, citando o versculo bblico de Deuteronmio, Ao teu irmo no emprestars com
usura....[15]
Na Idade Mdia com a ascenso da burguesia e crescimento das cidades, haja vista o xodo rural, bem como a abertura das vias comerciais do
norte e do sul da Europa, observa-se a pequena sobrevida do sistema feudal.
TOMAZETTE[16] descreve tal situao: Essa mudana foi provocada pela crise do sistema feudal, resultado da subutilizao dos recursos do
solo, da baixa produtividade do trabalho servil, aliadas ao aumento da presso exercida pelos senhores feudais sobre a populao. Em funo da
citada crise, houve uma grande migrao que envolveu, dentre outros, os mercadores ambulantes, que viajavam em grupos e conseguiram um
capital inicial, que permitiu a estabilizao de uma segunda gerao de mercadores nas cidades, desenvolvendo um novo modo de produo.
Assim, nascem as corporaes de mercadores, onde se renem os comerciantes, que detm riquezas, porm no possuem ttulos de nobreza.
Essas corporaes visavam proteo dos comerciantes frente ao decadente sistema feudal. Assim, vo paulatinamente ganhando poder poltico
e militar, chegando a conseguir a autonomia de centros comerciais, como as cidades italianas de Veneza, Florena e Gnova.
3. SISTEMA SUBJETIVO AS CORPORAES DE MERCADORES
Em toda a Europa Ocidental viu-se rapidamente o fortalecimento das corporaes mercantes as quais se sobrepuseram aos soberanos,
principalmente na Itlia e Alemanha, nas costas do Mar do Norte, esta ltima onde foi criada a Hansa, que era uma liga de cidades comerciais
alems dentre elas Hamburgo e Lubeck, congregando em torno de oitenta cidades comerciais, desde Bergen at os Pases Baixos, monopolizando
o comrcio exterior da Inglaterra.
REHME[17], explica que nessa regio da Alemanha, diversos povoados que possuam boas feiras, grandes mercados, se expandiram rapidamente
fomentados pelo forte comrcio e tornaram-se cidades medievais.
De acordo com GARRIGUES[18], tais mercados brotavam em territrios neutros, geralmente fronteirios, onde se pactuava uma paz em prol do
mercado e protetora dos estrangeiros. A Lei 4, Ttulo 7, das Leis das Setes Partidas, Da Espanha, assegurava, todos los que vengan a las ferias
de estes Reynos o a otro ponto de ellos en cualquier tiempo, sin distinccin de cristianos, morros e judos, seron salvos y seguros em sus
personas, bienes y mercaderas, as em la venida como e su estada y vuelta.
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Nessa fase histrica comea a se desenvolver o direito comercial, atravs do direito costumeiro aplicado no interior das corporaes de
mercadores pelos juzes consulares. A partir da surgiram os primeiros repositrios de costumes e decises emanadas dos juzes consulares, tais
como Rles dOleron, da Frana; Consuetudines, de Gnova; Capitulare Nauticum, de Veneza; Constitutum Usus, de Pisa; Consolat Del Mare, de
Barcelona.
Explica PEREIRA[19], que como o direito comum da poca no apresentava regramento capaz de regular as relaes comerciais de forma
satisfatria. Assim, os comerciantes se viram compelidos a organizarem-se e criarem uma estrutura jurdica interna nas corporaes, onde o direito
era aplicado pelos juzes consulares, que eram eleitos em assembleias cerradas para os membros das corporaes mercantis.
O direito comercial exercido no interior das corporaes era um direito corporativo, consuetudinrio e subjetivista, vez que era limitado aos
membros das corporaes. ROCCO[20] aduz:
Aos costumes formados e difundidos pelos mercadores, se estes estavam vinculados; os estatutos das corporaes estendiam a sua autor idade
at onde chegava autoridade dos magistrados das corporaes, isto , at os inscritos na matrcula; e, igualmente jurisdio consular que
estavam sujeitos, somente, os membros da corporao.
Os cnsules objetivando ampliar seu poder de atuao, sua jurisdio, modificaram as regras das corporaes de mercadores passando a aplicar
o direito comercial no s para os inscritos nas corporaes, mas a todos que praticarem atos condizentes com o comrcio, delineando-se o novo
conceito objetivista do direito comercial.
A abertura do direito das corporaes aos demais cidados foi vista pela populao em geral com bons olhos, visto que o direito outorgado pelo
Estado era precrio e com srias tendncias usurpadoras. Assim, o povo comeou a depositar grande confiana nas decises emanadas pelos
juzes consulares.
Neste nterim, as corporaes da Idade Mdia foram o trampolim do Direito Comercial para se estabelecer como um direito especial e autnomo,
tendo principalmente a Itlia como bero desse ramo do direito.
4. SISTEMA OBJETIVO - TEORIA DOS ATOS DO COMRCIO
Com o incremento do comrcio e novas prticas de atividades mercantis, o crdito comercial ganha importncia e surge a atividade bancria
concedendo crdito tanto para os comerciantes como para os consumidores. As transaes de crdito bancrio eram documentadas atravs de
ttulos cambiais, deixando tais atos acessrios ao comrcio de serem exclusivos de comerciantes para abrangerem toda a populao, impondo
uma objetivao do direito comercial.
REQUIO[21] cita muito bem Vivante quando este explica esta transio do sistema subjetivo para o objetivismo aduzido pela Teoria dos Atos de
Comrcio;
... passou-se do sistema subjetivo ao objetivo, valendo-se da fico segundo a qual deve reputar-se comerciante qualquer pessoa que atue em
juzo por motivo comercial. Essa fico favoreceu a extenso do direito especial dos comerciantes a todos os atos do comrcio, fosse quem fosse
seu autor, do mesmo modo que hoje a fico atribui, por ordem do legislador, o carter de ato de comrcio quele que verdadei ramente no o tem,
serve para estender os benefcios da lei mercantil aos institutos que no pertencem ao comrcio.
Seguindo esta teoria, encontra-se o primeiro Cdigo Comercial moderno, o Cdigo de Savary, da ordenao de Colbert, datado de 1673, o qual
fixa a figura do comerciante de forma objetiva, sendo todo aquele que pratica atos pertinentes matria comercial.
Outro cdigo que adota a teoria objetiva o famoso Cdigo Napolenico de 1807, pois agindo de acordo com a Teoria dos Atos de Comrcio
estaria a servio da Revoluo Francesa, com suas ideias de igualdade em confronto com a teoria subjetiva que restringia o privilgio do Direito
Comercial aos inscritos nas corporaes.
O Cdigo Napolenico expressamente tinha o objetivo de romper com o sistema aristocrtico feudal e consolidar o poder da burguesia emergente.
Neste liame, encontram-se as sbias palavras do professor NEZ[22]:
En efecto, tal como lo ha sealado Francesco Galgano, el Code pudo ms que la guillotina. Con unos cuantos artculos fractur la propriedade
nobiliaria, destruyendo para siempre las bases materiales del poder aristrocrtico y abri a la burguesia el acceso a la propriedade de la tierra. La
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Revolucin francesa, la verdadeira revolucin disse Galgano no fue obra de Robespierre, sino de Pothier. Fue el produto de la fuerza poderosa
del Derecho.
Salienta-se que na mesma poca foi editada a celebre Lei Chapelier, a qual visava assegurar plena liberdade profissional, extinguindo os
privilgios de determinadas classes ou corporaes, bem como fez o Cdigo Napolenico ao incorporar a Teoria dos Atos de Comrcio.
No Brasil esta concepo foi adotada pelo Cdigo Comercial de 1850. Contudo, ao perceber que este dispositivo limitou-se a disciplinar a atividade
profissional do comerciante, sem mencionar ou definir atos de comrcio, viu-se a latente necessidade de tal regulamentao.
A necessria regulamentao na legislao brasileira surgiu atravs do Regulamento 737, de 25 de novembro de 1850, definindo no artigo 19 o
que era considerado atos de comrcio.
Artigo 19. Considera-se mercancia:
1 - A compra e venda ou troca de efeitos mveis ou para os vender por grosso ou a retalho, na mesma espcie ou manufaturados , ou para
alugar o seu uso;
2 - As operaes de cmbio, banco e corretagem;
3 - As empresas de fbricas, de comisses, de depsitos, de expedio, consignao e transporte de mercadorias, de espetculos pblicos;
4 - Os seguros, fretamentos, risco e quaisquer contratos relativos ao comrcio martimo;
5 - A armao e expedio de navios.[23]
Por se resumir ao estabelecimento de uma relao de atividades econmicas, o sistema francs dos atos de comrcio gerou indefinies quanto
natureza mercantil de algumas delas, principalmente, porque quando poca de sua definio pelo legislador ptrio, apenas fo i considerada a
natureza comercial dos atos que j eram realizados pelos comerciantes, ou seja, baseando exclusivamente na tradio histrica do comrcio. Essa
foi a razo de algumas atividades no terem sido consideradas atos de comrcio, tais como a prestao de servios, a agricu ltura e a negociao
imobiliria, uma vez que essas atividades no eram tradicionalmente desenvolvidas pelos comerciantes da poca.
A inexistncia de parmetros cientficos na estipulao das atividades econmicas e a excluso de importantes atividades no rol dos atos
comerciais constituram os principais motivos ensejadores para que a Teoria dos Atos do Comrcio perdesse prestgio e fosse substituda pelo
sistema italiano da Teoria da Empresa. Vale destacar que tal substituio s ocorre mais de um sculo aps editado o Cdigo Napolenico, tempo
mais que suficiente para inspirar todas as legislaes que seguiram seus princpios, dentre elas o Cdigo Comercial Brasileiro de 1850.
A Teoria da Empresa chegou ao Brasil e propagou-se pela legislao ptria, sendo encontrada atualmente em diversos dispositivos normativos,
como o Cdigo do Consumidor e o Cdigo Civil de 2002, sendo esta a teoria utilizada pelo Direito Empresarial brasileiro.
5. TEORIA DA EMPRESA SISTEMA SUBJETIVO MODERNO
Alguns passos adiante e com o crescimento do entendimento de que o Direito Comercial muito maior que a simples prtica de atos de comrcio,
bem como as falhas encontradas na Teoria dos Atos de Comrcio, iniciou-se uma nova forma de enxergar o Direito Comercial, ultrapassando os
limites dos atos de comrcio e buscando a empresa como um todo.
O extraordinrio desenvolvimento da economia capitalista tornou a viso objetiva e isolada de ato de comrcio desacreditada. No sculo XIX, auge
da Revoluo Industrial, destaca um novo ponto de vista do comrcio e do Direito Comercial, tendo como foco o empresrio e a empresa.
Na pobre viso dos atos de comrcio e por bvios motivos de completo rompimento com o sistema feudalista, a agricultura e a pecuria no eram
entendidos como comrcio, bem como outras atividades que essencialmente eram empresariais, e assim, faziam a circulao de bens e riquezas,
o que gerava falhas e lacunas na competncia do Direito Comercial.
A limitao imposta ao Direito Comercial pela Teoria dos Atos de Comrcio era tamanha que segundo o artigo 632, do Cdigo Francs, empresa
nada mais era que a prtica reiterada e em cadeia dos atos de comrcio, conceito este que no valora a organizao do capital e trabalho[24].
Na vanguarda da troca do foco no comrcio puro e simples para uma viso mais complexa de empresa, encontra-se o Cdigo Comercial de 1897,
da Alemanha, o qual reintroduziu o conceito subjetivo, devidamente modernizado e readequado aos tempos em que se inseria[25].
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O referido cdigo, no artigo 343, expressa que os atos de comrcio so aqueles praticados por comerciantes, relativos e estritamente relacionados
prtica comercial, vinculando o comerciante a explorao empresarial. Com este novo conceito surge o Direito das empesas, tal como
conceituado tambm em 1942 no respeitado Cdigo Unificado Italiano.
De acordo com a Teoria da Empresa, o Direito Comercial tem seu campo de abrangncia ampliado, incorporando atividades at ento excludas
pela Teoria dos Atos de Comrcio. Ao contrrio da teoria francesa no se divide mais as atividades econmicas em dois grandes grupos, civil e
comercial. A Teoria da Empresa prev de forma ampla as atividades econmicas, excluindo somente atividades especficas, que so, as atividades
intelectuais, de natureza literria, artstica ou cientfica.
J no tocante a atividade agrcola o Direito Empresarial brasileiro deixou a cargo do agricultor decidir, vez que cabe a este a opo pelo regime
comercial, atravs do registro empresarial perante as Juntas Comerciais e Registro Pblico de Empresas. Vale consignar que tal opo no
caracteriza a manuteno da agricultura e pecuria fora do direito empresarial.
Tal opo somente existe em face dos pequenos produtores rurais e da agricultura familiar, que efetivamente no podem ser considerados
empresas ou empresrios, pois praticamente trabalham para sua subsistncia e no com o intuito de comercializar sua produo.
A Teoria da Empresa nasceu em 1942, na Itlia, alargando a incidncia do Direito Comercial. Esta terceira etapa de desenvolvimento do Direito
Comercial apareceu aos olhos do mundo em poca e local que devem ser considerados, haja vista o mundo estar em plena Segunda Guerra
Mundial e a Itlia ser governada pelo ditador fascista Mussolini.
O fascismo buscava a harmonizao da luta de classes intermediada pelo estado nacional. A empresa no iderio fascista representa o local de
harmonizao entre o proletariado e a burguesia, reunindo os ideais econmicos da empresa com os interesses dos trabalhadores .
Obviamente a configurao empresarial moderna no encontra como seu princpio norteador os interesses dos trabalhadores, porm a Teoria da
Empresa sobreviveu a redemocratizao da Itlia graas aos seus mritos jurdico-tecnolgicos, facilitando a operacionalidade das empresas
perante o ordenamento jurdico moderno.
A Teoria da Empresa comea a surgir no direito brasileiro a partir de 1960 em contraposio defasada Teoria dos Atos de Comrcio,
especialmente pela no incluso de atividades de extrema importncia ao desenvolvimento econmico nacional, como a prestao de servios,
atividades rurais e negociao de imveis.
Em 1965 a Teoria da Empresa adotada pelo Projeto de Cdigo das Obrigaes que no veio a se tornar lei. Posteriormente em 1975 esta teoria
figura novamente no Projeto de Cdigo Civil, o qual tramitou com lentido histrica, tornando-se o atual Cdigo Civil de 2002. Todavia, durante a
tramitao do Cdigo Civil diversas leis de interesse comercial utilizaram o sistema italiano, por exemplo o Cdigo de Defesa do Consumidor de
1990, a Lei de Locao Predial Urbana de 1991 e a Lei de Registro de Empresas de 1994[26].
6. HISTRIA E EVOLUO DO DIREITO COMERCIAL NO BRASIL
No Brasil colonial as relaes jurdicas eram caracterizadas pela legislao da ptria me, Portugal, vigorando a poca as Ordenaes Filipinas e
forte influncia do Direito Cannico e Romano.
Todavia, com a chegada da famlia real ao solo da colnia tupiniquim, acossada pela invaso de Portugal pelas tropas de Napoleo, foi
imprescindvel a atualizao das prticas comerciais implantadas no Brasil, e consequentemente do Direito Comercial que regia tais transaes.
Ato de Dom Joo VI, assinado em 28 de janeiro de 1808, seis dias aps a chegada da Famlia Real portuguesa a Salvador, dec retou a abertura
dos portos brasileiros s naes amigas de Portugal, o que exclua a Frana, ento em guerra contra Portugal. Antes da vignc ia da abertura dos
portos toda mercadoria que era importada ou exportada pelo Brasil deveria obrigatoriamente ter como entreposto Portugal, onde era pesadamente
taxada.
No mesmo ano outros avanos legislativos e econmicos vieram tona, como a criao do Banco do Brasil atravs do alvar de 12 de outubro de
1808 e a criao da Real Junta de Comrcio, Agricultura, Fbricas e Navegao, que tinha como intuito fomentar a produo e comercio de
insumos brasileiros.
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A principal funo da Junta de Comrcio, Agricultura, Fbricas e Navegao era organizar as frotas, fiscalizar o comrcio e intervir nas falncias,
alm de receber as contribuies para pagamento dos marinheiros da ndia, definir a capacidade e preo do frete dos navios e fiscalizar a carga e
descarga de produtos nos navios, atuando como agente alfandegrio.
Com a Proclamao da Independncia no houve uma completa seco da legislao portuguesa, fato este comprovado pela Lei da Boa Razo,
que autorizava em caso de lacuna da lei ptria, invocar os subsdios da legislao comercial das naes crists mais evoludas e depuradas da
boa jurisprudncia. Neste liame, durante anos a legislao comercial brasileira foi na verdade o Cdigo Francs de 1807, o Cdigo Comercial
Espanhol de 1829 e por fim o de Portugal de 1833[27].
O jovem Imprio no satisfeito com a utilizao de legislao estrangeira, atravs da Real Junta de Comrcio, Agricultura, Fbricas e Navegao,
incumbiu o Visconde de Cairu de organizar um novo Cdigo Comercial puramente brasileiro. Em 1832, o Prncipe Regente nomeou comisso para
este fim, a qual era composta quase integralmente de grandes comerciantes nacionais da poca, dentre eles Antnio Paulino Limpo de Abreu,
Jos Antnio Lisboa, Incio Ratton, Guilherme Midosi, e Loureno Westin. A comisso presidida por Antnio Paulino Limpo de Abreu e
posteriormente por Jos Clemente Pereira enviou o projeto do Cdigo Comercial Brasileiro Cmara em 1834.
Frisa-se que quase todos os idealizadores do Cdigo Comercial eram homens vinculados a importantes atividades comerciais: Ratton era
banqueiro e membro da Sociedade dos Assinantes da Praa do Comrcio do Rio de Janeiro, Midosi era comerciante sediado no Rio de Janeiro,
Westin cnsul da Sucia no Brasil e proprietrio da casa de comrcio Westin e Cia, Limpo de Abreu era genro de um importante fazendeiro e
comerciante de Minas Gerais, figurando como principal abastecedor de alimentos da Corte[28].
O projeto foi exaustivamente debatido no legislativo at sua promulgao em 1850, Lei 556 de 25 de junho de 1850. O atual Cd igo Comercial
Brasileiro, atualmentequase inteiramente esvaziado pelo Cdigo Civil de 2002, permanecendo em vigncia somente as normas de Direito Martimo.
De acordo com MENDONA[29], o cdigo Comercial no cpia servil de nenhum diploma antes encontrado, sendo o primeiro trabalho original
que apareceu na Amrica, porm baseou-se principalmente no Cdigo Portugus de 1833, e subsidiariamente no Francs de 1807 e Espanhol de
1829.
Revela esclarecer que o Cdigo Comercial brasileiro apesar de baseado na Teoria dos Atos de Comrcio, em nenhum de seus artigos apresenta a
enumerao dos atos de comrcio, nos moldes do Cdigo Comercial Francs de 1807, o qual delimita os atos de comrcio nos artigos 632 e
633[30].
Visando sanar esta lacuna o legislador brasileiro editou o Regulamento n. 737, de 1850, que tratava do processo comercial, e nos artigos 19 e 20
enumerou os atos de comrcio baseando-se novamente no Cdigo Comercial Francs.
Com o advento do Cdigo Comercial os tribunais do comrcio foram modificando-se at sua extino pela Lei 2.662, de 1875, com a unificao do
processo judicial. Em 1866 o juzo arbitral, que era obrigatrio, ganhou carter facultativo e, em 1882, as sociedades annimas desvincularam-se
do controle estatal, podendo serem constitudas livremente. Em 1908, o Direito Cambirio, por meio do Decreto 2.044, adaptou-se nova fase do
pas, dando origem ao instituto da concordata[31].
A importncia do rol dos atos de comrcio do Regulamento 737 s veio a diminuir a partir do ano de 1960, com a aproximao do direito italiano e
a utilizao da teoria da empresa no Projeto de Cdigo das Obrigaes.
Com o advento do Cdigo Civil de 2002, o Direito Comercial, modernamente chamado de Direito Empresarial, voltou a aplicar o c arter subjetivo,
focando no profissional empresrio, aquele que exerce como profisso atividade empresarial, voltada para a produo e circulao de bens e
servios, conforme estabelecido pelo Cdigo Civil de 2002 nos artigos 966 a 1195[32].
7. CONSIDERAES FINAIS
A proposta deste artigo foi realizar um levantamento histrico do comrcio e do Direito Comercial, visando um melhor entendimento da atual
situao dessa to importante matria do Direito Privado. Decalca-se que indispensvel o estudo histrico do Direito para que se possa
compreender profundamente as instituies e dispositivos existentes na atualidade.
No decorrer do levantamento bibliogrfico pode-se perceber algumas contradies sobre o incio das atividades comerciais no mundo antigo, bem
como do Direito Comercial, seja atravs de normas esparsas, as quais regulavam situaes pontuais na evoluo comercial, seja atravs do Direito
Comercial como disciplina autnoma na seara jurdica.
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Vale consignar que a dificuldade para delimitar a atividade comercial e o Direito Comercial no tempo grandemente fruto da falta de estudos mais
detalhados e da falta de documentos antigos escritos, capazes de convalidar as diversas teorias sobre o nascimento deste ramo do dire ito privado.
A autonomia do Direito Comercial, hoje Direito Empresarial, no direito nacional pode ser defendida sobre trs aspectos: didtica, formal e
substancial ou jurdica.
A autonomia didtica percebe-se atravs de fcil anlise curricular nas universidades de Direito, sendo o Direito Empresarial uma ctedra
autnoma. O ponto de vista formal o mais difcil de ser defendido, haja vista o esvaziamento do Cdigo Comercial pelo Cdigo Civil de 2002,
persistindo as regras de Direito Martimo.
Todavia, ao analisar a vasta legislao esparsa que trata exclusivamente de questes puramente empresariais, como a Lei 6.404 /1976 (Lei das
Sociedades Annimas), o Decreto 57.663/1966 (Letra de Cmbio e Nota Promissria), Lei 7.357/1985 (Lei do Cheque), Lei 8.934/1994 (Registro
de Empresas), dentre outras, comprava a autonomia substancial ou jurdica.
Conclui-se que do comrcio empresa, o Direito Comercial modificou-se em decorrncia da necessidade de acompanhar as rpidas
transformaes econmicas, das arcaicas corporaes de ofcio s atuais multinacionais e empresas digitais. Neste cenrio espera-se um ritmo
cada vez maior de evoluo do comrcio e sua consequente transformao no Direito Comercial que deve estar em constante mutao e
atualizao para regulamentar a nova economia globalizada.
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Notas:
[1] PERINE, Marcelo. Repblica/Plato: Traduo e adaptao em portugus. 1ed. So Paulo: Scipione, 2001.
[2] MARTINS, Fran Martins. Curso de Direito Comercial. Rio de Janeiro, 1996.
[3] CAVALCANTE, Benigno. Manual de Direito Empresarial. 1ed. Leme: Cronus, 2010.
[4] TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: teoria geral e direito societrio. 2ed. So Paulo: Atlas, 2009.
[5] ROCCO, Alfredo. Princpios do Direito Comercial. So Paulo: Saraiva, 1931.
[6] BORGES, Jos Ferreira. Dicionrio Jurdico Comercial. Rio Janeiro: Freitas Bastos, 1953.
[7] PALMA, Rodrigo Freitas. Histria do Direito. 4ed. So Paulo: Saraiva, 2011.
[8] PALMA, R F. op.cit. 2011.
[9] REQUIO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 1 volume. 31ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[10] REQUIO, R. op.cit. 2012.
[11] FERNANDES, Jean Carlos. Direito Empresarial Aplicado. Belo Horizonte: Del rey, 2007.
[12] MAMEDE, Gladston. Direito Societrio: sociedades simples e empresrias. So Paulo: Atlas, 2004.
[13] REQUIO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 1 volume. 31ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[14] REQUIO, R. op. cit.2012.
[15] REQUIO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 1 volume. 31ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[16] TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: teoria geral e direito societrio. 2ed. So Paulo: Atlas, 2009.
[17] REHME, Paul. Historia Universal Del Derecho Mercantil. Madrid (Espaa): Revista de Derecho Privado, 1941.
[18] GARRIGUES, Joaqun. Tratado de Derecho Mercantil. Madrid (Espaa): Revista de Derecho Mercantil, 1947.
[19] PEREIRA, Caio Mrio Silva. Instituies de Direito Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2010.
[20] ROCCO, Alfredo. Princpios do Direito Comercial. So Paulo: Saraiva, 1931.
[21] REQUIO, Rubens. Curso de Direito Comercial, 1 volume. 31ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[22] NEZ, Carlos Ramos. El Cdigo Napolenico y su Recepcin en Amrica Latina. 1ed. Lima (Peru): Pontificia Universidad Catlica Del Per,
1997.
[23] NEGRO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresas, volume 1. 9ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[24] LIMA, Adilson de Siqueira. Direito Empresarial e Evoluo Histrica. Revista Eletrnica de Administrao. 7ed. Disponvel em:
http//www.revista.inf.br/adm07/pages/artigos/artigo01.pdf. Acesso em: 07 fev. 2013.
[25] COELHO, Fbio Ulha. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 25ed. So Paulo: Saraiva, 2013.
[26] COELHO, Fbio Ulha. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 25ed. So Paulo: Saraiva, 2013
[27] NEGRO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresas, volume 1. 9ed. So Paulo: Saraiva, 2012.
[28] SABA, Roberto N. P. F., As Praas Comerciais do Imprio e a Aprovao do Cdigo Comercial Brasileiro na Cmara dos Deputados. Revista
Angelus Novus, n. 1. Agosto de 2010. Disponvel em: http//www.usp.br/banco de teses. Acesso em: 12 fev. 2013.
[29] MENDONA, J. X. Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro, ed. Atualizada por Ricardo Negro. Campinas: Bookseller, 2000.
[30] LIMA, Adilson de Siqueira. Direito Empresarial e Evoluo Histrica. Revista Eletrnica de Administrao. 7ed. Disponve l em:
http//www.revista.inf.br/adm07/pages/artigos/artigo01.pdf. Acesso em: 07 fev. 2013.
[31] SILVA, Vander Brusso, Para aprender Direito: Direito Comercial. So Paulo: Barros, Fisher e Associados, 2009.
[32] FERNANDES, Jean Carlos. Direito Empresarial Aplicado. Belo Horizonte: Del rey, 2007.
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Texto de Leitura Complementar: Noes histricas de Direito Comercial, de autoria de Ayrton Sanches Garcia, Professor de Direito Comercial na
FURG/RS Advogado no Rio Grande/RS.
NOES HISTRICAS DE DIREITO COMERCIAL
1. ORIGENS
No h como pretender conhecer as origens do direito comercial sem uma amostragem, ligeira que seja, do comrcio - atividade que o precedeu e
razo da sua criao e existncia. Difcil, seno impossvel, estudar o direito comercial dissociado do desenvolvimento do comrcio.
No estaria completo o estudo do direito comercial, se o fizesse isolado da atividade comercial. Seria o mesmo que, num feliz exemplo, pretender
estudar a pena sem conhecer o prvio e correspondente delito; conhecer a cura sem saber da doena que lhe d causa. Assim que ,
necessariamente, o estudioso ter que conhecer primeiro o COMRCIO num plano superior e original, para garantir serena admisso ao estudo do
DIREITO COMERCIAL.
Mesmo, porque o COMRCIO causa (pressuposto, segundo Sampaio de Lacerda)1 de cujos efeitos, um o DIREITO COMERCIAL - ramo da
cincia do Direito destinado a disciplinar as relaes e os atos jurdicos decorrentes da atividade mercantil e dos comerciantes, seja entre si
mesmos; seja entre esses e os no comerciantes. Melhor apanha essa questo Hernani Estrella: O direito comercial, algumas vezes chamado
direito do comrcio, pressupe necessariamente o conhecimento do fenmeno econmico sobre que assentam muitssimas de suas disposies e
de onde se originam os institutos que foi chamado a regular. Em razo disso, quase todos os autores que escrevem sobre direito comercial,
consagram ateno mais ou menos demorada, ao comrcio, como preliminar do estudo da disciplina. 2
Foi-se o tempo em que alguns admitiam que o comrcio e o direito comercial surgiram simultaneamente, ao mesmo tempo, defendendo que tal
originou do fato de que o comrcio e o direito comercial resultam de causas scio-econmicas. Para aqueles, s quando estas despertaram
interesse cientfico que surgiu o comrcio e sua concomitante disciplinao jurdica atravs do Direito Comercial. Defende esse entendimento,
dentre outros, Octvio Mdici3: A histria do Direito Comercial se fez paralelamente histria do Comrcio. Enquanto este no se erigiu em
instituio scio-econmica, aquele no tinha razo de ser.
Esse errneo entendimento, porm, j foi revisto e vencido desde priscos tempos. Assim, porque nunca se teve dvida de que o COMRCIO
surgiu bem antes da economia social, na acepo cientfica dada pela doutrina. Ele fruto da necessidade primria do homem obter as coisas
indispensveis sua subsistncia. Sampaio de Lacerda diz que originou do excesso de produo de mercadorias para o consumo prprio)4, e a
economia social uma das formas criadas para aperfeioa-lo. Surgiu, esta, indubitavelmente, muito depois do comrcio. Pedro Barbosa Pereira
parece encontrar melhor explicao para a situao no bem provada ao conjugar as duas assertivas propostas. Diz o autor ptr io: sabido que
nos primitivos agrupamentos humanos cada um chegou ao ponto de produzir mais do que necessitava. Mas, no produziu tudo de que
necessitava.5 Ento, cada um produzindo alm do que necessitava para atender s suas exigncias, permutava o excesso com outro que produzia
o que lhe faltava para satisfazer s suas necessidades.
As necessidades pessoais e coletivas remontam aos tempos em que surgiram os primeiros grupos humanos e, vm crescendo, umas e outros na
mesma velocidade e proporo. O homem logo tornou-se incapaz de produzir tudo o que precisava para satisfazer as suas necessidades.
Superada a forma primria de uso dos recursos pessoais e, esgotados os desforos pessoais investidos no trabalho, s restou-lhe servir-se das
coisas tidas ou produzidas por outros.
De outro lado, desde que foi absorvido pela idia de consumo, no foi mais capaz de obter por si s tudo o que necessita e deseja - condio que o
arrastar por tempo inimaginvel. Errado pensar, ento, que o comrcio originrio da economia social; mas, correto, que resultou da
necessidade bsica do homem adquirir o que precisava para a sua existncia e bem-estar.
H notcia de que manifestaes de cunho comercial, sob qualquer de suas formas ou prticas, tm antecedentes histricos que remontam s mais
recuadas eras da humanidade6, tendo alguns afirmado que na idade da pedra polida praticaram trocas de coisas in natura, mercadoria por
mercadoria7, at evoluir fase da pecnia, do dinheiro. Por certo que tais manifestaes creditadas como de natureza comercial, em nada se
pareciam com as prticas comerciais de hoje e de algum tempo atrs. Mesmo, porque o comrcio evoluiu acompanhando e, as vezes,
antecipando-se aos avanos sociais.
Os fencios, que tanto praticaram o comrcio na antigidade - adiante sucedidos pelos libaneses -, no construram regras especiais relativas s
atividades comerciais. Apesar de lhes atriburem a vanguarda do comrcio entre a sia e a Europa, partindo de Sidon e Tiro, no se preocuparam
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em editar leis comerciais. Carregando em barcas, linho, cavalos, marfim, perfumes e escravos, retornavam da Europa com trigo, mrmore, metais
(cobre, prata e estanho, principalmente).
O crescente aumento do contingente humano que integrava as diferentes comunidades da poca, somado diversidade de interesses, desejos e
necessidades de cada um dos seres ou grupos que as compunham, levou-os, ao cabo de algum tempo, criar forma capaz de solucionar a seguinte
equao que se lhes apresentava: nem sempre o que um tinha em excesso, ao outro interessava na quantidade e qualidade oferecidas; muitas
vezes o que um procurava, o outro no tinha para lhe fornecer. Em razo desse instigante mas compreensvel fato, introduziram s trocas um novo
elemento: a moeda.
Antes do surgimento da moeda as trocas eram praticadas dispensando o valor econmico das coisas trocadas. O valor (importncia) atribudo a
cada bem era restrito e variava segundo o maior ou menor interesse, necessidade ou desejo do adquirente. Assim que, alm da d ificuldade de
encontrar reciprocidade entre as coisas ofertadas e as procuradas, existia um outro complicador: a falta de sincronia entre os valores pessoalmente
atribudos por cada um dos envolvidos aos bens sujeitos transao. Essa compreensvel dificuldade que, no raramente resultava em
impraticabilidade, foi assim exemplificada: O tenente Cameron em sua viagem pela frica (1884) narra como se arranjou para obter uma barca: O
homem de Said queria ser pago em marfim e eu no o tinha. Dei, ento, a Ibn Guerib o eqivalente em fios de cobre; este me deu em troca pano,
que passei a Ibn Selib; este enfim, entregou a importncia em marfim ao agente de Said; e eu obtive a barca.8
No distante tempo da famlia patriarcal no existiu o comrcio, porque o poderoso patriarca reunia em si a distribuio do trabalho e o resultado
que ele frutificava, repartindo-os entre os sditos segundo livre e incontestvel arbtrio.
No entanto, a forte predominncia do regime autoritrio, apesar de impedir o surgimento da livre economia de mercado atravs comrcio, mesmo
que na sua expresso mais pura, mais elementar, no foi capaz de impedir a presena da troca sob a forma primria do seu com o meu9.
Esse tipo de troca para alguns ainda no expressava o comrcio. Joo Eunpio Borges seguindo esse entendimento explica que n ela no se
identifica a indstria mercantil, o comrcio, como o fazia uma primitiva posio doutrinria, h muito superada e inspirada nas velhas definies de
Ulpiano e de Scaccia. Nem se confunde com o transporte, como pretendia Verri10. Comerciar, no sentido econmico - explica Inglz de Souza -
haver do productor a riqueza por elle destinada ao consumo, para offerecel-a ao consumidor. Assim, a funco do commercio, economicamente
encarado, a de fazer circular e entregar ao consumo a riqueza produzida; ou, por outras palavras, o commercio toma a seu cargo a phase
intermedia do cyclo que a riqueza deve percorrer e em cujos extremos se acham, de um lado, o productor e de outro, o consumidor.11
Pontearam em tais pocas, a pirataria tanto por terra como por mar, os nmades, os antigos mercadores, (mercadejadores), os peregrinos, todos
constituindo verdadeiros organismos voltados para as trocas, sendo destacvel que escolhiam ou formavam rotas por onde viajavam em
caravanas. Se quem tinha necessidade de meios de vida se via na contingncia de os buscar onde se achassem, no faltaram os cuja bastana
levasse a movimento oposto, de oferecimento do desejado12.
Resultado das expedies organizadas por mercadores, peregrinos e seus auxiliares, foi o surgimento das primeiras sociedades mercantis. De
igual sorte, foram responsveis pelo aparecimento de povoados, vilas e cidades. Os caravaneiros se abasteciam no s de mercadorias e viveres
para enfrentar as duras e demoradas e, por vezes, distantes viagens atravs dos desertos. Levavam guias, escoltas, sacerdotes , juizes e mais uma
leva de auxiliares, formando verdadeiras sociedades itinerantes. Igual sorte de viagens praticavam por mar e por rios, oportunizando florescerem
em suas margens, prsperas comunidades. Praticaram o comrcio s margens do Nilo e do Eufrates e nas costas da Arbia e da Fencia.
Com a peregrinao comercial surgiu a pirataria. Para uns, verdadeira cumplicidade. Waldemar Ferreira, em obra antes referida transcreve nota de
Pierre Benaerts (Pierre Benaerts, Les Hommes, Paris, 1950): nos tempos antigos, a prtica da pirataria e do comrcio muitas vzes se
associaram, o que explicaria a duplicidade simblica ligada pela tradio aos deus Mercrio. Os primeiros comerciantes da Fencia, da Grcia ou
de Creta, reputados navegadores ousados, no foram seno corsrios, aventureiros, dedicados pilhagem em regies longnquas, pela fra ou
pela astcia, de mercadorias que revendiam em seu pas natal em condies vantajosas: metais preciosos, gneros alimentcios e escravos: Que
mais a Odissia se no panegrico da glria de pirata feliz que fz belas prsas? (R. Cohen, Clio).
A partir da introduo da moeda inaugurou-se nova fase nas relaes interpessoais, convertendo-se a troca, em larga escala, em compra e venda.
Porm, a troca no desapareceu definitivamente, sendo praticada at hoje.
Modernamente no se admite a existncia do COMRCIO sem interesse econmico, porm, isso j est noutra fase da histria. Alm do mais, o
propsito scio-econmico pode estar distanciado do interesse puramente econmico, explicado no interesse pelo lucro.13
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A economia social, tal como o direito comercial, so cincias postas a servio da sociedade e do comrcio: fenmeno que os leva a profundo
estudo e constante aprimoramento, para que, cada vez mais, melhor atendam s mltiplas exigncias que resultam do binmio necessidade
social/atividade comercial. A economia social e o direito comercial so instrumentos de que se utiliza o comrcio para qua lificar-se e disciplinar-
se, tendo como objetivo melhor suprir o conjunto multidiversificado de valores humanos.
Por todo exposto, resta claro ser difcil precisar quando surgiu o COMRCIO. Todavia, isso no inibe saber quando surgiu o DIREITO
COMERCIAL e qual a sua funo precpua.
2. NOO HISTRICA
Tanto quanto ocorreu em relao ao comrcio, h igual dificuldade em precisar quando surgiram as primeiras manifestaes legislativas que,
depois, resultaram no Direito Comercial. grande a discordncia entre autores, o que dificulta, seno impossibilita saber com exatido quando
surgiram as primeiras manifestaes jurdicas de natureza estritamente comercial. A especializao da matria at chegar ao atual Direito
Comercial, adiante se ver, percorreu caminhos difceis, marcados por disputadas lutas entre juristas em diferentes pocas e, em diversos pases.
Apesar dessas dificuldades, necessrio e atrativo enveredar-se pelos caminhos sinuosos da histria do direito, vez que de suma importncia
conhecer toda a sua estrutura orgnica, cujo incio remonta distantes pocas e diferentes povos. O direito, nunca se teve dvida, um produto
social e histrico. clssico e elucidativo o ensinamento de J. X. Carvalho de Mendona sobre o tema: O direito no se inven ta, no nasce do
arbtrio, nem surge espontneamente dos congressos legislativos. Desenvolve-se no terreno social, num ambiente histrico em relao ao grau de
civilizao, aos usos e costumes, organizao poltica dos Estados14.
Por isso no demais reafirmar o que constou em edio anterior desta obra, posto que se mantm intangvel: O direito comercial no surgiu
pronto, institucionalizado, a partir de determinado momento em que o ordenamento jurdico de certo povo ou certa nao o tenha pretendido ao
capricho dos seus interesses. Ao contrrio, ele veio se corporificando em respeito s necessidades dos diversos povos e nas diferentes pocas,
at que, alcanando um larga gama de normas, tornou-se obrigatria a sua adjetivao, o seu credenciamento, sob pena de que, assim no o
fazendo, tornar-se-ia dificultosa ou at impossvel a sua aplicao.
bem possvel ento que em meio a regras de outros ramos do direito, especialmente, do direito civil, contassem os povos da antigidade com
normas de direito comercial.
Rocco, citado por Walter T. Alvares diz que s na Idade Mdia que o direito comercial aparece e se reafirma como direito autnomo15. E,
justamente essa autonomia, essa independncia, esse verdadeiro credenciamento que lhe d o ordenamento jurdico contemporneo , que vem
preocupando tantos quantos pretendem saber sobre as suas origens. Sem que tal se conhea bem a fundo, difcil ser mergulhar no estudo
particular desse ramo especial do Direito.
Coerente com o acima registado est a unnime informao da Histria, de que nas mais remotas pocas inexistiram normas de Direito
Comercial. No bastasse o fato do seu aparecimento ter-se condicionado previa existncia da atividade mercantil, as primeiras manifestaes
jurdicas sobre a matria mais se aproximavam, ou mesmo se confundiam, com o Direito Administrativo e com o Direito Civil. Com esse ltimo,
mais acentuadamente. S mais tarde o crescente e diversificado nmero de regras de cunho comercial foi-se corporificando, de tal sorte a exigir a
especializao que resultou no atual DIREITO COMERCIAL.
De qualquer forma costuma-se estudar a histria do Direito Comercial, dividindo-a em trs pocas, a saber: Antigidade, Idade Mdia e Tempos
Modernos (ou Histria Contempornea). Sobre o passado mais distante, quase nada se sabe, tendo levado a maioria dos autores a firmar que em
tal poca inexistiu direito comercial. A Histria no registra notas relevantes e com segura confiana sobre a presena de disposies legislativas
especiais ao comrcio ou aos comerciantes.
2.1 CDIGO DE HAMURABI
Algumas das mais antigas manifestaes legislativas, materialmente comprovadas, foram registradas no Cdigo de Hamurabi (a grafia correta
Hammurabi, embora muitos autores usem uma s consoante), do rei Hammurabi, sexto monarca da primeira dinastia da Babilnia, que afirmava
t-lo recebido do deu sol. Foi encontrado em escavaes feitas por um grupo de arquelogos franceses chefiados por Jacques de Morgan, nas
runas da cidade islamita de Susa (Prsia), em 1901 (Carvalho de Mendona diz que as escavaes foram feitas entre 1897-1899). Mantido no
Museu do Louvre, em Paris, o Cdigo foi gravada num pesado bloco de diorite, uma rocha de 2,25 metros de altura e 1,90 metros de circunferncia
na base, no sculo XXIII a.C.16 Monumento e marco de referncia histrica do direito de vrios dos povos da sua poca, at hoje citado nas
principais obras de direito comercial, tanto no Brasil como nos demais pases.
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A festejada obra histrico-jurdica contm 282 artigos (pargrafos), foi decifrada e traduzida pelo erudito arquelogo alemo Von Winckler. Tratava
especialmente de regras de direito consuetudinrio - umas das fontes e pilares do Direito Comercial contemporneo. Mas, regulava quase que
exclusivamente as atividades primrias, principalmente a agricultura e a pecuria: bases da economia daquela poca.
De tal sorte que, tanto se preocupou com a agricultura, a pecuria e outras atividades e interesses, mas pouca importncia deu ao comrcio e
nenhuma ateno aos comerciantes. No deixou de ser um diploma voltado para profissionais, porque continha regras dirigidas aos mdicos,
pedreiros, oleiros, empreiteiros, alfaiates (definindo-lhes responsabilidades, salrios e honorrios), sobre a venda de bebidas em tavernas,
contratos de depsito de cereais (prevendo responsabilidade para o depositrio), de emprstimos (com juros e sem juros), de comisso, de
mediao, de representao (exigindo-lhes forma escrita), referncias ttulos ao portador, permutas, moeda, arquitetura, etc. Os 101 a 107
que esto legveis, referem a emprstimo de dinheiro ou gneros: ao credor denomina damkaru ou damgar; ao devedor, samallo.
Registrou, ainda, normas de direito martimo, especialmente, sobre a construo de barcos, abalroao e fretamento martimo, navegao interior,
fixao de taxas para arrendamento de barcos, responsabilidade do dono do barco e do barqueiro em caso de perda da prpria coisa ou do carga.
Reservou alguns artigos para regular questes sobre imveis, crimes, adultrio, herana, adoo, ptrio-poder e normas processuais. Verdadeiro
diploma multidisciplinar.
Apesar de j ser intenso o comrcio naquela poca, inclusive na Mesopotnia - sede do imprio assrio-babilnico - (Naum, 3,16, Antigo
Testamento disse: os seus negociantes eram em maior nmero que as estrelas do cu), a maioria dos autores afirma no ter havido destacada
preocupao em elaborar regras para disciplinar a atividade comercial. Por isso, s mais adiante que surgem leis de acentuado interesse jurdico-
mercantil. Ademais, a Histria revela que a edio do Cdigo estava mais voltada para interesses polticos do que jurdicos, servindo de marco de
uma fase monrquica regida por Hammurabi. De tal sorte que o direito nele regulado estendeu-se alm fronteiras, sendo praticado em toda sia
menor e at na Sria, para onde era levado pelos mercadores.
De outro modo, parte das inscries do Cdigo esto ilegveis, principalmente em torno da estrela de Hammurabi, onde cerca de 35 artigos no
foram decifrados, e a total reconstituio ainda no foi possvel ser feita. Por esse motivo, alguns afirmam ser impossvel assegurar que na
Babilnia vigeu o direito comercial, a despeito de contrrio entendimento de Eunpio Borges: Os dispositivos do Cdigo de Hammurabi que, sem
dvida, se referem especialmente ao comrcio, no podem ser integralmente conhecidos porque o como daquela srie de normas encontra-se
precisamente no lugar em que so ilegveis.17 Posio radicalmente oposta tomou Octvio Mdici referindo ao tema: Nada porm que indicasse
atividade comercial propriamente dita.18
Importante que, sobre a legislao na Babilnia a nica notcia histrica a da existncia do Cdigo de Hamurabi.
Informaes tiradas das partes decifradas indicam ter sido um diploma com regras bastante rgidas, contendo sanes tais, como a da pena de
morte. O Prof. Walter T. lvares da Universidade de Minas Gerais assim explica: ...pena de morte para uma acusao falsa de assassinato; se o
ladro no devolvesse ao menos um dcimo do que roubou, pena de morte, etc. Sua seqncia de lgica inumana, explana Schreiber, ia a ponto
de punir com a morte do filho do construtor se o filho do proprietrio da casa tivesse morrido por imperfeio da construo (164) - Schreiber, Der
Mensch und seine Recht. 49. Darmstadt, 1945.19
2.2 O COMPORTAMENTO NA GRCIA
Na Grcia existiram alguns tipos de contratos mercantis que evoluram e foram aproveitados pelo Direito Comercial. Estariam a, segundo
historiadores, as primeiras manifestaes jurdicas que mais tarde contribuiriam para a disciplinao do Direito Comercia l, como um ramo
autnomo, especial, direcionado a regular os atos de comrcio e dos comerciantes. Fran Martins citando Vicente Agustin Y Gella, explica: Na
Grcia comeam a aparecer alguns contratos que mais tarde so aceitos no direito comercial, como cmbio martimo, de que h referncia nos
discursos de Demstenes, variando a taxa de 21% a 30%, em caso de feliz arribada dos navios.20
Creditam a Alexandre a surpreendente expanso do comrcio na Grcia, tendo como seu esplendor a cidade de Atenas. Preocupado em ver
difundido o sentimento helnico por todos os povos do mundo, o notvel conquistador estimulou o nascimento da histrica fase helenstica. Foi o
grande salto desenvolvimentista do povo grego, destacado que foi nas artes, nas cincias, nos novos costumes e no comrcio. Voltado para uma
poltica que se expandia atravs da colonizao, firmou bases pela via do Mediterrneo, a partir do Mar Negro at a Siclia ou Lbia.. Depois
alcanou a Itlia, a Espanha, a Frana e Marselha, a quem se atribui a sua fundao. Fundou colnias em todas as ilhas do Jnio e do Mar Egeu,
em Siabaris, Taranto, Chipre, Crotona, Npoles, Siracusa e Agrigento.
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Sobressai-se no regime escolhido pelo soberano a predominncia econmica sob forma imperialista. Desponta um capitalismo traduzido na livre
troca, tendo por objetivo conquistar vrios povos que se viam atrados pelo novo modelo adotado. No fortalecem, porm, o esprito de classe, mas
crescem em nmero as sociedade mercantis, quase todas constitudas sob a forma de comandita.
Notadamente em razo de condies naturais, o desenvolvimento mercantil mais se expandiu para os infinitos limites do mar do que em terra.
Tornou-se intenso e crescente o intercmbio martimo.
Grande incentivador do comrcio martimo, Alexandre foi responsvel pelo incremento do intercmbio internacional, a partir da Grcia. Preocupado
em aumentar divisas, editou leis que regulavam e garantiam o florescente comrcio internacional. Leis quase sem contedo comercial, mais de
estmulo ao comrcio. Ao invs de regular estritamente atividades comerciais, mais se destinavam a atrair povos aliengenas, oferecendo
incentivos a quem participasse do crescente intercmbio grego.
De outro lado, deram maior importncia aos interesse privados do que aos pblicos, dirigidos particularmente aos negcios externos, consolidados,
acentuadamente, atravs de um direito consuetudinrio no escrito. Vigora o princpio de que o uso se sobrepunha lei. Apesar da destacada
importncia dada ao direito privado, se preocupavam com as coisas do Estado, que exercia severa vigilncia quanto ao cumprimento das suas leis.
Era a predominncia poltica que se fazia presente no seio do Imprio, cujas bases do crescimento decorriam tanto dos incentivos oferecidos aos
mercadores, quanto das suas implacveis exigncias.
Surge a figura do trapezitai ou trapezista (banqueiro), pessoa que recebia depsitos de outros - atividade mais tarde transferida para os templos
gregos. Conquistada Alexandria, o embrionrio e rudimentar sistema bancrio atinge todo o Egito.
Surgem as denominadas leis rdias (lex Rhodia). Em que pese o direito grego no tenha alcanado o esplendor do direito romano , por este
tambm foi aproveitado, no sendo poucos os costumes da Ilha de Rodes - notvel centro comercial da poca -, adotados em Roma e institudos
por sua rival, Cartago. Sua importncia chegou at nossos dias, especialmente na regulao da avaria grossa (art. 764, II, do Cdigo Comercial).
Digesto, 14, 2, De lege Rhodia de jactu: 1 - Paulus libro II, Sentetiarum - Lhege Rodhia cavetur, ut, si leviandae navis gratia iactus mercium factus
est, omnium contributione sarciatur, quod pro omnibus est. Isto , dispe-se na lei Rhodia que se para aliviar um navio se fz alijamento de
mercadorias, seja ressarcido pela contribuio de todos o dano que em benefcio de todos se causou21. Ainda sobre a sua notvel influncia no
direito martimo, o Digesto registra declarao do imperador Antonino Severo a litigante que pretendia deciso diversa da prevista na lei: rex et
dominus mundi sum; lex Rhodia, autem, regina et domina maris est. - se ele era o rei e senhor do mundo, a lei rdia era a senhora e rainha do
mar. - Sou eu o rei e senhor do mundo; mas senhora e rainha do mar a lei Rhodia22.
A enorme ingerncia poltica nos negcios privados decorria da preocupao do Estado em suprir a falta de iniciativa particular, vez que pairava no
meio do povo a descrena na evoluo da livre iniciativa. A liberdade em exercer o comrcio no era sem nus, pois continha responsabilidades
que passavam a ser exigidas dos comerciantes.
Instituram o emprstimo a risco (cmbio martimo), possibilitando obter grandes recursos financeiros com vista ao crescente desenvolvimento que
experimentavam. No existindo mais a funo do trapezista, destaca-se como referncia histrica o Templo de Delos, que chegou ao seu apogeu
como instituio de crdito, ao emprestar fundos para as administraes das cidades. Circulam ttulos ao portador e ordem, facilitando o
desempenho das atividades comerciais.
2.3 A IDADE MDIA
Com a invaso dos povos brbaros e a queda do Imprio Romano, surgem novas formas de regramento jurdico. Inaugura-se novo critrio na
execuo contra devedores. Surge a execuo individual, recaindo a obrigao sobre a pessoa ou sobre os bens mveis do devedor. No primeiro
caso, quando o executado no tinha bens capazes de responder pela dvida; no segundo, quando era solvente. Os imveis, em raz o do carter
corporativo dado propriedade imobiliria, ficavam excludos da execuo.
Nessa fase histrica os povos europeus, em especial, j haviam alcanado considervel desenvolvimento comercial e industrial. Surgem as
corporaes comerciais contribuindo satisfatoriamente para o crescimento da economia - resposta aos anseios de um comrcio mais capitalizado e
independente. As corporaes ou associaes eram dirigidas por cnsules, constitudos mandatrios, que juravam respeitar os costumes da
entidade que chefiavam. Chamadas de Brevi dei Cosuli, essas normas se constituam num rol de ordens as quais os cnsules deviam obedincia.
Cresce o interesse em disputar os louros da economia com outras potncias que afrontavam o mercado. De tal sorte que, sem a soma de esforos
atravs de associaes no chegariam a resultado vantajoso. Em razo dessa solidariedade calcada no capitalismo surgem novos usos, mais
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tarde transformados em leis que passaram a ser aplicadas pelas prprias corporaes contra os seus concorrentes e contratante s. nessa fase
que desponta o Direito Comercial, como conjunto de regras jurdicas especiais, distintas daquelas previstas no Direito Civil.
Historiadores separaram essa fase em Alta Idade Mdia e Baixa Idade Mdia. Tem incio a Alta Idade Mdia no sculo VII, quando comearam as
invases dos povos brbaros, resultando na conquista do Mediterrneo pelos rabes. Estende-se at o sculo XII, registrando episdios marcados
de forma indelvel na histria universal, particularmente, a opresso sofrida pelo Ocidente, sujeito que se manteve a isolamento e conseqente
fragilidade e diviso da sua fora poltica.
Em tal perodo tem predominncia o regime feudal, caracterizado economicamente pela propriedade fundiria. Somava-se a isso as reduzidas
formas de comunicao, e tem-se como resultado a dificuldade de circular a riqueza. Sobressai-se, ento, o princpio da autonomia feudal em
relao produo.
Com o advento do sculo XII nasce novo perodo - o da Baixa Idade Mdia. Os rabes so expulsos, abrindo-se as portas do continente para um
novo mundo europeu. O comrcio e a indstria tomam novos contornos. O trfego martimo adquire maior amplitude. Surge novo modelo
econmico - o artesanal - e a burguesia se alastra pelas cidades, estimulando o consumo. Com o crescente impulso do comrcio martimo, as
cidades localizadas na orla mediterrnea se transformam em ricos centros comerciais. Como conseqncia, os proprietrios feudais abandonam
suas propriedades, fazem parceria (meao) com os servos, e se transferem para as cidades. Atravs das Cruzadas, desenvolve -se ainda mais o
intercmbio mercantil, e nas margens das estradas que ligam os diversos centros florescem novas comunidades voltadas para o comrcio. Tem
destaque como rico centro comercial Lyon, situada margem da estrada entre o Reno ao Mediterrneo.
Com o novo sistema nasce um outro instituto jurdico: o seqestro. Com ele, o devedor que fugia sem cumprir com os seus contratos tinha seus
bens mveis seqestrados para garantir o cumprimento da obrigao. Perdia o devedor, assim, a propriedade e a administrao do seu
patrimnio. Surge a commenda, embrio da sociedade em conta de participao de nossos dias. Atravs dela, donos de grandes fortunas
praticavam a agiotagem, emprestando somas em dinheiro a risco, a comandantes de embarcaes. Apesar da reprovao do clero, vez que o
direito cannico no a admitia, o negcio prosperou e se estendeu at o comrcio em terra.
O processo de execuo coletiva, porm, vigia somente nas cidades do norte da Itlia, como Veneza, Gnova, Florena e Milo. Foi nessas
cidades que surgiram normas que mais tarde serviram de modelo ao direito falimentar de vrios pases, inclusive o Brasil. Carvalho de Mendona
citado por Amador Paes de Almeida exalta: O velho direito italiano constitui o laboratrio da falncia moderna.23
O novo instituto passa a ter carter de direito pblico. Embora o interesse jurdico fosse o de tutelar direito individual do part icular, estava
impregnado de carter pblico, com a presena marcante do Estado exigindo o cumprimento da obrigao em favor do credor. Waldemar Ferreira,
referido por Rubens SantAnna melhor explica: Sobre o conceito e direito privado, estabeleceu-se o direito pblico. Justia cumpria apoderar-se
do patrimnio devedor e zelar por sua liquidao e partilha. No era em virtude de direito prprio dos credores, mas de acordo com a idia de alta
tutela do Estado, que o devedor se desapossava dos seus bens. No podia ter essa tutela outro fim se no o de atender aos cre dores; mas essa
finalidade no afastava o carter pblico do instituto.24
A figura do magistrado tem nova feio, sendo exigida a sua presena no ato de entrega dos bens. Surge a penhora gravando o patrimnio
devedor em garantia do credor. Para requerer declarao de insolvncia do devedor, o credor tinha que previamente provar sua qualidade. S
depois de atendida a exigncia, o devedor era intimado a comparecer a juzo, sujeitando-se ao seqestro do seu patrimnio, se fosse revel.
Atendendo ao chamado judicial e confessando a insolvncia, o devedor podia optar pelo benefcio da cessio bonorum, ou pelo seqestro de todo
seu patrimnio. Podia ainda oferecer defesa negando a insolvncia e, conseqentemente, provada a solvncia era compelido a pagar o credor.
Instituram o princpio da proporcionalidade no rateio aos credores. Ao curator atriburam a realizao do ativo em dinheiro, mediante venda do
patrimnio. Surge o princpio da retroatividade, prevendo a nulidade de atos fraudulentos praticados pelo devedor antes da da ta da declarao de
insolvncia. Reunidos em assemblia os credores escolhiam o sndico por maioria devotos, podendo ser indicado para o cargo, credor ou pessoa
estranha ao feito.
O rigor exigido sobre a autenticidade dos crditos, podia levar o credor a confirmar a sua validade, sob juramento. Provado inautntico o crdito, ao
credor era imputada pena de recolher certa quantia que destinavam comunidade. Se habilitasse valor superior ao devido, sofr ia pena de perder o
direito sobre o respectivo crdito.
Com toda evidncia o direito falencial italiano foi mais pujante que o francs, servido-lhe de referncia. Amador P. de Almeida, sentencia: a
Ordenao de 1675, em Frana, j dispunha sobre a falncia.25 Walter lvares: das cidades italianas, o instituto passou Frana e j a
Ordenao de 1663 dispunha sobre a matria da falncia e bancarrota.26 Sampaio de Lacerda: Os princpios do direito estatutrio italiano
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penetraram facilmente em Frana, principalmente em Leo (regto. De 1667) e Champagne, cidades que mantinham intenso comrcio com as
cidades italianas.27 Rubens SantAnna: o direito estatutrio influenciou o francs, especialmente a Ordenao de 1673, que disciplinava as
falncias e bancarrotas.28 Em que pese divergirem sobre o ano em que se deu a Ordenao Francesa, h unanimidade entre os autores quanto
penetrao do direito estatutrio italiano no sistema jurdico francs.
Sob a influncia de Gobert, Ministro das Finanas de Luiz XIV, surgiu a primeira das ordenaes em maro de 1673. Continha 122 artigos
distribudos em 12 ttulos regulando matria sobre agentes de bancos, negociantes, sociedades, notas promissrias, letras de cmbio, juros
comerciais moratrios, precluso, falncias, bancarrotas e outras matrias. Conhecida como Cdigo de Savary, numa homenagem ao trabalho de
um comerciante de mesmo nome vigeu por mais de um sculo. So criadas as lettres de rpit, concedendo moratria vinculada ao instituto da
precluso na execuo. Segundo Provincialli, esse o ponto de origem da moderna concordata.
Ainda em Frana, criam ordenaes distintas para negcios em terra e para o comrcio martimo. Surgem a Ordennance sur le commerce de terre,
em 1673 e a Ordennance sur le commerce de mer, em 1681, consideradas por Hernani Estrella, marcos legislativos do direito mercantil.29
(Carvalho de Mendona, Tratado, pg. 60, grafou Ordonnance, como adiante ser observado, quando estudado o ttulo: O CDIGO
NAPOLENICO). Darcy Arruda Miranda Jnior referindo s Ordenaes assim exalta-as: As Ordenaes ou ditos de Luis XIV so verdadeiras
codificaes, pois contm uma regulamentao mais ou menos extensa e sistematizada do direito comercial, e foram, pode-se dizer, conseqncia
do grande impulso dado ao comrcio, pela indstria e pela tcnica, que encontravam insuficiente apoio no direito costumeiro ou escrito de ento,
determinando o surgimento das primeiras ordenaes, assim chamadas por serem o resultado de uma ordem real.30
Em 1660, acompanhando o momento histrico, a Espanha publica sua primeira obra sobre matria concursal.
2.4 A CONTRIBUIO DOS ROMANOS
Para a maioria dos autores o direito comercial teve origem em Roma. Bero de institutos jurdicos aproveitados por vrios povos, em todos os
tempos, o direito romano foi responsvel, tambm, pela formao de boa parte do direito comercial. Presente nas diversas reas em que se
ramifica o Direito, foi modelo e exemplo de cultura, tanto para povos antigos quanto para naes modernas. Banido h muito do cenrio mundial, o
histrico Imprio Romano continua presente atravs das instituies jurdicas que legou a tantos. Isso, pois, justifica o seu permanente estudo.
Lendria em suas origens, Roma deixou contribuies jurdicas que at hoje so aproveitadas, algumas absolutamente intocveis . No dizer de
Jos Carlos Moreira Alves, o conjunto de normas que regeram a sociedade romana desde as origens (segundo a tradio, Roma foi fundada em
754 a. C.) at o ano 565 d. C., quando ocorreu a morte do Imperador Justiniano.31
Guilherme Haddad citando Ihering (Geist des ronischen Rechts, vl. I, pgs. 8 e 9) melhor explica: a importncia do Direito Romano no consiste em
ter sido por algum tempo a fonte ou origem do Direito. Esse valor foi passageiro. Sua autoridade reside na profunda revoluo interna, na
transformao completa que h feito experimentar todo nosso pensamento jurdico e em ver chegado a ser como o Cristianismo, um elemento da
civilizao moderna.32 Com acerto, o Direito Romano foi valioso para o regramento social de vrios povos, em todas pocas, no havendo erro ao
comparar a sua influncia sobre as civilizaes modernas, como o foi o Cristianismo. Em razo de desenvolver economia assemelhada dos
gregos, destes, por muito tempo sofreu influncia no apenas filosfica, mas tambm jurdica. S aps transformada em implacvel poderio
mundial, Roma construiu instituies sociais, econmicas e polticas prprias, diferentes das modeladas na Grcia.
Apesar de guerreiros se preocuparam com o comrcio, mas s raramente o exerciam pessoalmente. Em Roma o comrcio era praticado por
escravos e estrangeiros (cerca de noventa mil, s em Roma), transformados em pequenos comerciantes e artejanos. Orgulhosos de sua nobreza,
de suas conquistas, os romanos consideravam o comrcio atividade desprezvel. Mas, existia um comrcio interno, exercido pelos filhos-famlias e
mulheres. Estes, mesmo com o advento do jus gentium tinham suas atividades reguladas pelo jus civile que tratava, inclusive, sobre a capacidad