UFPA - POLÍTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES ......implementadas em cidades amazônicas, mais...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ NÚCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZÔNICOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO TRÓPICO ÚMIDO ROSELENE DE SOUZA PORTELA POLÍTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZÔNICAS: BELÉM E SÃO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA Belém/Pa 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute

NUacuteCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZOcircNICOS PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM DESENVOLVIMENTO

SUSTENTAacuteVEL DO TROacutePICO UacuteMIDO

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

BeleacutemPa 2011

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

Tese apresentada ao Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute como requisito parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em Ciecircncias

Desenvolvimento Socioambiental

Orientadora Profordf Drordf Edna Maria Ramos de Castro

BeleacutemPa 2011

Dados Internacionais de Catalogaccedilatildeo de publicaccedilatildeo (CIP) (Biblioteca do NAEAUFPA)

____________________________________________________________________________

Portela Roselene de Souza Poliacuteticas habitacionais em cidades amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luis na perspectiva comparativa

Roselene de Souza Portela orientadora Edna M Ramos de Castro

2011 305 f il 30 cm Inclui Bibliografias

Tese (Doutorado)

Universidade Federal do Paraacute Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido Beleacutem 2011

1 Poliacutetica urbana - Beleacutem (PA) 2 Poliacutetica urbana

Satildeo Luis (MA) 3 Planejamento urbano -Beleacutem (PA) 4 Planejamento urbano - Satildeo Luis (MA) 5 Impacto ambiental - Beleacutem (PA) 6 Impacto ambiental

Satildeo Luis (MA) 7 Segregaccedilatildeo ambiental - Beleacutem (PA) 8 Segregaccedilatildeo ambiental

Satildeo Luis (MA) I Castro Edna M Ramos de orientadora II Tiacutetulo

CDD 21 ed 30223209811

____________________________________________________________________________

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

Tese apresentada ao Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute como requisito parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em Ciecircncias

Desenvolvimento Socioambiental

Banca Examinadora

Profordf Drordf Edna Maria Ramos de Castro Orientadora NAEAUFPA

Prof Dr Saint-Clair Cordeiro da Trindade Junior Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Thomas Hurtienne Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Joseacute Julio Lima Examinador externo PPGAUUFPA

Prof Dr Gilberto de Miranda Rocha Examinador externo PPGGEOUFPA

Aos sujeitos coletivos que buscam na luta cotidiana a diminuiccedilatildeo das desigualdades sociais e o direito agrave cidade

AGRADECIMENTOS

A Deus fonte de luz esperanccedila amor e que estaacute sempre comigo nos momentos de inseguranccedila e desacircnimo me dando forccedila para vencer todos os obstaacuteculos

A Profordf Drordf Edna Castro com quem aprendi muito pelo incentivo nos momentos difiacuteceis pelas criacuteticas e contribuiccedilotildees valiosas que foram fundamentais para a elaboraccedilatildeo dessa tese

Ao Prof Dr Saint-Clair Trindade Junior que sempre me apoiou incentivando-me a superar limitaccedilotildees e a descobrir perspectivas mais amplas de anaacutelise

Aos membros da banca examinadora pelas criacuteticas e importantes contribuiccedilotildees no momento da defesa da tese

A todos os professores do NAEA pela imensuraacutevel contribuiccedilatildeo que ofereceram para ampliaccedilatildeo da minha concepccedilatildeo de mundo

A todos os colegas do curso em especial Andreacuteia Rosana Everaldo Charles Laura Ximenes e Laura Nogueira com os quais vivenciei momentos primorosos de aprendizado de alegrias de dificuldades e de amizade que ultrapassaram os espaccedilos de sala de aula

A minha matildee Francisca Portela que com todo seu esforccedilo sempre me incentivou nessa caminhada

Ao meu pai e aos meus irmatildeos Carlos Augusto Raimir e Raimar que me acompanharam e incentivaram nessa jornada

Ao Dion Monteiro pelo seu apoio carinho compreensatildeo e incentivo constante principalmente nas horas difiacuteceis de elaboraccedilatildeo desse trabalho

As lideranccedilas comunitaacuterias que fazem parte do Foacuterum de Reforma Urbana dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis sujeitos sociais importantes na construccedilatildeo desse trabalho por colaborarem com as entrevistas e pelas importantes contribuiccedilotildees oferecidas agrave realizaccedilatildeo da pesquisa de campo e aos movimentos sociais de luta pelo direito agrave cidade

Aos teacutecnicos das Secretarias de Habitaccedilatildeo dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis que sempre se colocaram a disposiccedilatildeo facilitando o acesso agraves informaccedilotildees e aos documentos pertinentes a Poliacutetica Habitacional

Aos funcionaacuterios do NAEA pelo apoio e incentivo de diversas formas

A todos que direta ou indiretamente contribuiacuteram para a concretizaccedilatildeo dessa tese

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat

e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade)

estatildeo implicados no direito agrave cidade

Henri Lefebvre

RESUMO

O presente trabalho objetiva analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas mais especificamente em Beleacutem (PA) e Satildeo Luis (MA) assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das duas cidades e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo atrelado agraves praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas puacuteblicas Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem e Satildeo Luis enfocando o processo de planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos atores sociais percebendo suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo Os procedimentos metodoloacutegicos adotados foram a pesquisa bibliograacutefica documental e o levantamento de dados estatiacutesticos entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais ligados aos programas ou projetos habitacionais e observaccedilatildeo direta Dentre os resultados da anaacutelise dos dados pode-se dizer que independente do modelo de gestatildeo (tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Palavras-Chave Espaccedilo Urbano Poliacutetica Habitacional Segregaccedilatildeo Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luis

ABSTRACT

This work analyzes the management models of housing policies implemented in the Amazon s cities particularly in Beleacutem (PA) and Satildeo Luiacutes (MA) as well as the impacts on the city spatial organization and the relation with the existent social and spatial segregation Emphasis is given to the challenges faced by urban management in the two cities and how the State deals with social problems We intend to go beyond spatial exclusion forms and use a social and spatial approach in order to evaluate the potential transformation that might be linked to daily practices in the city which ought to be acknowledged as legitimate actions by public policies In order to achieve our goal we use a theoretical construction to gather information on housing policy in Brazil and in the Amazon region It is therefore necessary to analyze the urban space construction and housing based on the capitalist logic which had a great concentrating and excluding influence in the urban development of the two Amazon cities resulting in a social and spatial segregation process The study was carried out through a comparative method allowing us to identify the differences and similarities between two management experiences in the housing policies applied in two municipalities of the Amazon region Beleacutem and Satildeo Luiacutes The study focuses on housing policy planning and management processes targeting social contradictions and intervention strategies Therefore the methodological procedures used in this work are bibliographic and documental research statistical data collection interviews with experts and management staff from governmental institutions related to housing programs or projects and direct observation The results lead us to conclude that regardless the management model used (technocratic or participative) the housing policy has not shown structural advances Therefore the actions implemented by programsprojects did not contribute to reduce the social and spatial segregation pattern and did not change the housing concept in those two cities

Key Words Urban Space Housing Policy Segregation Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luiacutes

LISTA DE ILUSTRACcedilOtildeES

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA) 104

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a

2003

130

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio

segundo Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

144

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar

Mensal (2)

Brasil

2007

145

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem 165

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

171

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de

Agronomia

Beleacutem-PA

179

Fotografia 4

Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA) 185

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes 199

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luis-MA) 206

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luis-

MA)

212

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo 251

LISTA DE QUADROS

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968 111

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil 117

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965 120

Quadro 4

Programas Habitacionais implementados no Governo FHC 128

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo 157

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a

1988)

181

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990 215

Quadro 8

Relaccedilatildeo dos Assentamentos hierarquizados (Satildeo Luis-MA) 240

Quadro 9

Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos

municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

252

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001) 255

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual 257

LISTA DE TABELAS

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1996) no Brasil 106

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-

1989)

121

Tabela 3

Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

142

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem 167

Tabela 5

Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte

1940-2000

176

Tabela 6

Crescimento Populacional do municiacutepio de Satildeo Luiacutes 198

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) 207

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970 208

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970 214

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e

Cooperativas 1971-1980

219

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per

capita

2010

232

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007 237

LISTA DE ABREVIACcedilOtildeES E SIGLAS

ALUMAR Alumiacutenio do Maranhatildeo SA

AMs Associaccedilotildees de Moradores

ASCOM Assessoria Comunitaacuteria

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD Banco Internacional de Reconstruccedilatildeo e Desenvolvimento

BNH

CAEMA

CBB

CCs

CDPs

CEBs

CEF

CELMAR

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo

Comissatildeo de Bairros de Beleacutem

Centros Comunitaacuterios

Comitecircs Democraacuteticos Populares

Comunidades Eclesiais de Base

Caixa Econocircmica Federal

Celulose do Maranhatildeo SA

CEPAL Comissatildeo Econocircmica para Ameacuterica Latina e Caribe

CF Constituiccedilatildeo Federal

CGT Central Geral dos Trabalhadores

CMN Conselho Monetaacuterio Nacional

CODEM Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de

Beleacutem

CODOMAR Companhia de Docas do Maranhatildeo

COGEP Coordenadoria Geral de Planejamento

COHAB-Ma Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo

COHAB-Pa Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute

CONDUMA Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente

COSANPA Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute

COTS Caderno de Orientaccedilatildeo do Trabalho Teacutecnico Social

CTM Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio

CURA Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada

CUT Central Uacutenica dos Trabalhadores

CVRD Companhia Vale do Rio Doce

DESO Departamento Social

DNOS Departamento Nacional de Obras e Saneamento

DPPH Departamento de Programas e Projetos Habitacionais

ELETROBRAS Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA

FADS Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social

FASE Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social e Educacional

FBP Frente Beleacutem Popular

FCP Fundaccedilatildeo da Casa Popular

FEMECAM Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo

FHC Fernando Henrique Cardoso

FINANSA Financiamento de Saneamento

FMRU Foacuterum Metropolitano de Reforma Urbana

FNHIS Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

FNRU Foacuterum Nacional de Reforma Urbana

GEBAM Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas

GETAP Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento

GETAT Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins

IACP Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio

IAPs Institutos de Aposentadoria e Pensotildees

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica

IFCH Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas

IMPUR Instituto Municipal da paisagem Urbana

INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria

IPASE Instituto de Pensionistas e Aposentados Servidores do Estado

IPEA Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada

IPLAN Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano

IPTU Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

LI Letras Imobiliaacuterias

LOM Lei Orgacircnica do Municiacutepio

MBES Ministeacuterio do Bem-Estar Social

MCMV Programa Minha Casa Minha Vida

MHU Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente

MNRU Movimento Nacional pela Reforma Urbana

MPO Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento

MSUs Movimentos Sociais Urbanos

NAEA Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

OGU Orccedilamento Geral da Uniatildeo

ONGs Organizaccedilotildees Natildeo-governamentais

OP Orccedilamento Participativo

PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

PAEG Programa de Accedilatildeo Econocircmica do Governo

PAH Plano de Assistecircncia Habitacional

PAI Plano de Accedilatildeo Imediata

PAIH Plano de Accedilatildeo Imediata para a Habitaccedilatildeo

PAR Programa de Arrendamento Residencial

PCN Projeto Calha Norte

PDDES Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social

PDU Plano Diretor Urbano

PGC Programa Grande Carajaacutes

PETROBRAS Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

PIB Produto Interno Bruto

PLANASA Plano Nacional de Saneamento

PLANHAP Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular

PMB Prefeitura Municipal de Beleacutem

PMBU Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una

PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro

PND Plano Nacional de Desenvolvimento

PNH Plano Nacional de Habitaccedilatildeo

Polamazocircnia Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da Amazocircnia

PPA Plano Plurianual de Accedilatildeo

PRB Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixadas

PROTERRA Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e

Nordeste

PT Partido dos Trabalhadores

PTTS Projeto de Trabalho Teacutecnico e Social

RMB Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

SABs Sociedades de Amigos do Bairro

SBPE Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo

SCI Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio

SCH Sociedade Comunitaacuteria Habitacional

SEAC Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria

SECON Secretaria Municipal de Economia

SEDURB Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado do Paraacute

SEGEP Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral do Planejamento e Gestatildeo

SEHAB Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

SEMTHURB Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana

SEMTUR Secretaria Municipal de Serviccedilos Urbanos

SEPURB Secretaria de Poliacutetica Urbana

SERFHAU Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e Urbanismo

SESAN Secretaria Municipal de Saneamento

SEURB Secretaria Municipal de Urbanismo

SFH Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

SFI Sistema Financeiro Imobiliaacuterio

SFS Sistema Financeiro de Saneamento

SNHIS Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

SNPLI Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado

SOPREN Sociedade de Preservaccedilatildeo aos Recursos Naturais e Culturais da Amazocircnia

SPDDH Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos

SPVEA Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

SUDAM Superintendecircncia de Desenvolvimento da Amazocircnia

SUDENE Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste

SUFRAMA Superintendecircncia da Zona Franca de Manaus

UFMA Universidade Federal do Maranhatildeo

UFPA Universidade Federal do Paraacute

UNAMA Universidade da Amazocircnia

UNIPOP Universidade Popular

ZEIS Zonas Especiais de Interesse Social

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 17

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

27

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

27

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO

ESTADO 38

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

53

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES 75

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

88

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

102

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

102

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

135

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

147

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

162

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

163

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

197

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM E SAtildeO LUIS EXCLUSAtildeO SOCIAL

SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

229

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS

ADOTADOS

246

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

280

REFEREcircNCIAS 294

17

1 INTRODUCcedilAtildeO

Durante a vigecircncia do regime autoritaacuterio (1964-1985) as poliacuteticas puacuteblicas

promovidas pelo Estado brasileiro se caracterizavam por um lado pela centralizaccedilatildeo

decisoacuteria e financeira na esfera federal cabendo aos estados e municiacutepios o papel de

executores das poliacuteticas formuladas centralmente Por outro lado agrave medida que os recursos

eram controlados pelo governo federal tendia a estabelecer-se uma articulaccedilatildeo entre governos

estaduais e municipais baseada na troca de favores de cunho clientelistas

Outra caracteriacutestica era a exclusatildeo da sociedade civil do processo de formulaccedilatildeo das

poliacuteticas da implementaccedilatildeo dos programas e do controle da accedilatildeo governamental que

representou um padratildeo natildeo-democraacutetico de articulaccedilatildeo EstadoSociedade e de gestatildeo

hierarquizada reforccedilando a tendecircncia ao comprometimento das metas de equumlidade assim

como introduziu no sistema um crescente deacuteficit de accountability e de responsabilidade

puacuteblica (DINIZ 1996)

O paradigma que norteou a constituiccedilatildeo do sistema de proteccedilatildeo social no Paiacutes foi o

do Estado do Bem-Estar (Welfare State) implantado nos paiacuteses capitalistas ocidentais no poacutes-

guerra onde a provisatildeo de bens e serviccedilos puacuteblicos era de inteira responsabilidade do Estado

dada agrave insuficiecircncia das respostas oferecidas pelo mercado e diante da fragilidade da

sociedade civil frente aos enormes desafios na aacuterea da reproduccedilatildeo social

A revisatildeo desse modelo embora tenha sido proposta pelas agecircncias multilaterais de

financiamento

como o Banco Mundial

no final dos anos 1950 soacute foi efetivada no final da

deacutecada de 1970 e iniacutecio dos anos 1980 atraveacutes da definiccedilatildeo de uma agenda de reforma do

Estado sob a eacutegide neoliberal que se traduziu na transferecircncia de responsabilidade com a

produccedilatildeo direta de bens e serviccedilos de consumo coletivo do acircmbito do Estado para o mercado

e a sociedade civil

Isto se refletiu na desarticulaccedilatildeo da capacidade de governar por parte dos Estados na

Ameacuterica Latina Grande parte da capacidade de planejamento e da competitividade das

economias nacionais foi drasticamente reduzida Os recursos destinados agraves poliacuteticas sociais e

agrave remuneraccedilatildeo do funcionalismo puacuteblico tecircm sido reduzidos progressivamente

No entanto a crise que atingiu o Paiacutes desde o iniacutecio da deacutecada de 1980 e as

alteraccedilotildees na economia capitalista mundial em que se destacam a reestruturaccedilatildeo produtiva e a

globalizaccedilatildeo redefiniu os termos da inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio internacional Novos

desafios foram colocados aos atores que haviam participado da formulaccedilatildeo da agenda

democraacutetica e estavam engajados com a efetivaccedilatildeo da reforma Na reformulaccedilatildeo dessa

18

agenda natildeo se pretendia o desmantelamento do Estado mas sim uma reforma da accedilatildeo estatal

voltada agrave busca da eficiecircncia da eficaacutecia e da efetividade dessa accedilatildeo

A Constituiccedilatildeo de 1988 constitui-se um marco no tocante a discussatildeo sobre a

governabilidade do sistema poliacutetico e participaccedilatildeo popular Fomentada pelos movimentos e

demais organizaccedilotildees sociais ganhou relevacircncia a discussatildeo sobre descentralizaccedilatildeo

administrativa principalmente a reflexatildeo sobre uma nova cultura poliacutetica alicerccedilada na noccedilatildeo

de direitos do cidadatildeo e da necessidade de incorporaccedilatildeo deste no processo de planejamento e

gestatildeo de planos programas e projetos

Nessa conjuntura a nova cultura poliacutetica que comeccedila a emergir a partir das

discussotildees travadas entre as organizaccedilotildees sociais partidos poliacuteticos intelectuais e parte das

igrejas aponta para novas formas de articulaccedilatildeo do Estado com a sociedade civil e com o

setor privado visando agrave garantia da eficiecircncia atraveacutes da descentralizaccedilatildeo que natildeo significa

apenas a transferecircncia de atribuiccedilotildees mas eacute vista sobretudo como redistribuiccedilatildeo de poder

favorecendo a democratizaccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade e a democratizaccedilatildeo de

acesso aos serviccedilos

No Brasil os movimentos sociais tiveram e tecircm papel fundamental no processo de

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes Nos anos de 1970 e 1980 emergiram novos movimentos sociais

que se organizaram como espaccedilo de accedilatildeo reivindicatoacuteria construindo uma cultura

participativa e autocircnoma colocando novos temas na agenda puacuteblica entre eles o da Reforma

Urbana Em meio a muitos embates esses agentes coletivos multiplicaram-se fortaleceram-se

e tornaram-se propositivos Satildeo hoje reconhecidos como legiacutetimos interlocutores no cenaacuterio

brasileiro (GOHN 1985)

O reconhecimento da importacircncia da participaccedilatildeo popular nos programas e projetos

vinculados agraves poliacuteticas puacuteblicas aqui centradas nas aacutereas de desenvolvimento urbano tem se

tornado um consenso e no entanto natildeo se tem uma clareza sobre como e em que grau de

intensidade seria necessaacuterio para que se atinja ao objetivo de garantir a sustentabilidade das

intervenccedilotildees advindas da execuccedilatildeo de programas de desenvolvimento urbano nas cidades

Nesse sentido a concepccedilatildeo de participaccedilatildeo popular se relaciona com os processos

que visam superar os mecanismos de exclusatildeo social presentes no tecido social atraveacutes da

conquista de espaccedilos onde seja garantida a participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo da cidade

(SADER PAOLI 1988 p 59)

Assim a luta pela participaccedilatildeo popular no acircmbito do planejamento e gestatildeo de

poliacuteticas urbanas no decorrer da histoacuteria brasileira trouxe em seu contexto o constante

enfrentamento da exclusatildeo social propondo uma maior democratizaccedilatildeo da sociedade e

19

buscando intervir no processo de decisatildeo das poliacuteticas urbanas visando dessa maneira uma

melhor distribuiccedilatildeo de bens e serviccedilos

Na Amazocircnia esse processo natildeo foi diferente Desde o periacuteodo militar que os

movimentos populares passaram a se organizar tendo como objetivo pressionar as estruturas

poliacuteticas vigentes ao niacutevel das agecircncias estatais e privadas fazendo frente aos inuacutemeros

problemas provocados pela accedilatildeo autoritaacuteria dos oacutergatildeos estatais e privados e que afetavam as

condiccedilotildees de vida das classes populares na regiatildeo (CRUZ 1994)

Foi um periacuteodo marcado por fortes modificaccedilotildees nos espaccedilos urbano e rural da

regiatildeo que contou com a intervenccedilatildeo direta e centralizada do Estado que desde a deacutecada de

1950 vinha consolidando um modelo nacional-desenvolvimentista introduzindo assim a

Amazocircnia no circuito propriamente capitalista Com isso ocorreu um significativo processo

de ocupaccedilatildeo do espaccedilo regional manifestando-se ao niacutevel da estruturaccedilatildeo do sistema urbano

da regiatildeo e de uma urbanizaccedilatildeo intensiva e crescente do municiacutepio de Beleacutem entre outros

poacutelos urbanos regionais (CASTRO ACEVEDO MARIN 1987)

Nos anos 1960 aleacutem dos projetos agro-pecuaacuterios os governos federal e estadual

investiram na criaccedilatildeo de infraestrutura como a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia que

facilitou o ingresso de grande contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras

abundantes e de faacutecil acesso tendo em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave

implantaccedilatildeo dos grandes projetos (SOUZA 1992)

Em Beleacutem esse fenocircmeno gerou por um lado uma pressatildeo demograacutefica sobre as

aacutereas urbanizadas de cotas altas estimulando a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e por outro uma

ocupaccedilatildeo desordenada das baixadas sem infraestrutura por uma camada popular com

baixo poder aquisitivo A ocupaccedilatildeo irregular a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o

descaso de sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programas e projetos

de poliacuteticas urbanas completavam o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo

ambiental passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Nesse sentido as lutas pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura sauacutede educaccedilatildeo e

habitaccedilatildeo implementaram um haacutebito de construir um poder pela base na praacutexis cotidiana

dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos sujeitos sociais coletivos e natildeo mais individualizados

Contrariando a praacutetica dos anos anteriores em que a sociedade seguia fielmente as orientaccedilotildees

dos grupos oligaacuterquicos

Constituindo-se sujeitos coletivos as organizaccedilotildees de bairros em 1978 unificaram-

se na luta pela posse da terra e por moradia lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que

envolveu vaacuterios bairros como Jurunas Sacramenta etc Essa praacutetica vai culminar com o

20

fortalecimento das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB)

em 1979 (CRUZ 1994)

Os Movimentos Populares atingiram conquistas importantes ateacute 1982 quando

acontecem mudanccedilas na conjuntura poliacutetica do Paiacutes atraveacutes das eleiccedilotildees diretas para

governador e deputados na qual o grande vencedor foi o Partido do Movimento Democraacutetico

Brasileiro (PMDB) que venceu as eleiccedilotildees na maioria das capitais brasileiras Com isso

mudou-se tambeacutem o comportamento do Estado que passaraacute a tratar a organizaccedilatildeo popular

como um instrumento a seu serviccedilo

O Estado passou a orientar seus agentes a realizarem reuniotildees nos bairros e a contar

com a participaccedilatildeo dos moradores nas decisotildees tomadas tentando ainda utilizar-se das

organizaccedilotildees de bairros para viabilizar suas poliacuteticas por meio de cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de

entidades fantasmas com o objetivo de enfraquecer a luta social

Em Satildeo Luiacutes a partir da deacutecada de 1960 ocorreu um dinamismo acelerado de

crescimento populacional em virtude de vaacuterios beneficiamentos realizados na cidade tais

como construccedilatildeo das duas pontes sobre o rio Anil barragem do Bacanga construccedilatildeo da 1ordf

etapa do porto de cargas gerais do Itaqui e asfaltamento da BR-135 Aleacutem desses

acontecimentos as deacutecadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela instalaccedilatildeo de grandes

capitais industriais como as empresas Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) a Companhia

Vale do Rio Doce (CVRD) e a Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR) que favoreceram o

surgimento de ocupaccedilotildees irregulares palafitas e favelas

A cidade de Satildeo Luis passa entatildeo a sofrer modificaccedilotildees profundas destacando-se o

significativo aumento das ocupaccedilotildees de terras para a construccedilatildeo de moradias Os processos

migratoacuterios campocidade se intensificam Milhares de famiacutelias se dirigem para Satildeo Luiacutes em

busca de melhores condiccedilotildees de vida e emprego No entanto grande parte dessas famiacutelias

migrante natildeo encontra emprego fixo e bem remunerado e as formas de sobrevivecircncia

baseiam-se nos serviccedilos domeacutesticos e no mercado informal

Segundo Luz (2004) a deacutecada de 1960 eacute marcada por um intenso debate em torno

dos programas governamentais voltados para a modernizaccedilatildeo conservadora do Maranhatildeo O

Estado passa a ser o facilitador

por meio de instrumentos juriacutedicos poliacuteticos e econocircmicos

da criaccedilatildeo de condiccedilotildees sociais favoraacuteveis para as grandes empresas investirem na regiatildeo com

condiccedilotildees miacutenimas de terra farta e matildeo-de-obra barata Para garantir que o processo natildeo

tivesse obstaacuteculos a sua efetivaccedilatildeo levou-se a cabo um amplo processo de modernizaccedilatildeo da

economia cujo traccedilo principal estava baseado nos grandes projetos e no apoio irrestrito das

elites locais e nacionais ao grande capital nacional e estrangeiro

21

Para isso o Estado inicia a abertura de vaacuterias aacutereas de expansatildeo urbano-industrial

destacando-se a aacuterea hoje compreendida pelo eixo ItaquiBacanga No governo Sarney (1966-

1970) esta aacuterea eacute eleita como um espaccedilo estrateacutegico para o processo de modernizaccedilatildeo

conservadora pelo plano de governo denominado Maranhatildeo Novo Aleacutem dos projetos

industriais e da construccedilatildeo do Porto do Itaquiacute a regiatildeo seria contornada pela construccedilatildeo de

conjuntos habitacionais para a matildeo-de-obra requerida pelas induacutestrias que iriam se implantar

na regiatildeo

A expansatildeo urbana da cidade de Satildeo Luiacutes em direccedilatildeo agrave regiatildeo Industrial do Itaqui

estava articulada com o processo de remoccedilatildeo de famiacutelias das regiotildees alagadas pelos rios

Bacanga e de outras aacutereas destinadas para construccedilatildeo do Anel Viaacuterio Aeroporto Internacional

do Tirirical e de outras regiotildees atingidas pelo processo de implantaccedilatildeo dos grandes projetos e

de renovaccedilatildeo urbaniacutestica de Satildeo Luiacutes

A remoccedilatildeo de famiacutelias das aacutereas de interesse do governo tinha o objetivo de abrir

espaccedilo para garantir a modernizaccedilatildeo urbaniacutestica da cidade dotaacute-la de infraestrutura necessaacuteria

para a implantaccedilatildeo dos grandes projetos

a exemplo da Barragem do Bacanga bem como

dos interesses do capital imobiliaacuterio e mercantil

a exemplo das aacutereas valorizadas do entorno

da cidade e da regiatildeo comercial da KennedyAreinha Satildeo FranciscoRenascenccedila Olho

D aguaAraccedilagi

A segregaccedilatildeo urbano-espacial de Satildeo Luis consolidou-se no Plano Diretor de 1977 o

qual previa de um lado a construccedilatildeo de um nuacutecleo residencial destinado para as famiacutelias de

melhor poder aquisitivo de outro se previa uma seacuterie de intervenccedilotildees estatais com o objetivo

de criar aacutereas e zonas para a implantaccedilatildeo de projetos industriais e de recuperaccedilatildeo de aacutereas que

seriam destinadas para as classes populares

Sendo assim Luz (2004) argumenta que a urbanizaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes eacute o

resultado de um processo de desenvolvimento capitalista no qual o Estado - nos niacuteveis

federal estadual e municipal - esteve empenhado desde o iniacutecio em articular-se para criar as

condiccedilotildees poliacuteticas econocircmicas e juriacutedicas necessaacuterias ao processo de acumulaccedilatildeo de capital

no Estado ao mesmo tempo em que estabeleciam em segundo plano as poliacuteticas para atender

agraves demandas sociais

Gistelinck (1988) enfatiza que a questatildeo do deacuteficit habitacional e da falta de

infraestrutura baacutesica motiva um intenso debate pela necessidade de poliacuteticas puacuteblicas para

atender as demandas criadas pelo processo de modernizaccedilatildeo econocircmica e industrial de Satildeo

Luis

22

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

governo para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades brasileiras

Todavia os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda foram

marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a exemplo

dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Dentro deste contexto histoacuterico eacute possiacutevel se inferir que em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-

Ma ocorreram nas uacuteltimas deacutecadas mudanccedilas nas relaccedilotildees entre o Estado e os movimentos

sociais no que diz respeito ao processo de participaccedilatildeo na poliacutetica urbana como por exemplo

os projetos de habitaccedilatildeo implementados pelo governo municipal nas aacutereas consideradas de

baixadasalagadas das cidades Entretanto estas alteraccedilotildees permitiram a participaccedilatildeo somente

de alguns segmentos que foram incorporados agraves discussotildees

A emergecircncia dos movimentos sociais permitiu a constituiccedilatildeo de canais de

interlocuccedilatildeo com o poder puacuteblico capazes de legitimar socialmente as demandas populares

gerou uma disputa na cena puacuteblica pela formulaccedilatildeo de uma nova agenda poliacutetica de

intervenccedilotildees puacuteblicas e garantiu a participaccedilatildeo popular no processo de implementaccedilatildeo das

poliacuteticas de habitaccedilatildeo que se desenvolveram nas referidas cidades

Esse debate se constitui num importante instrumento para a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de habitaccedilatildeo que foram implementadas na medida em que possibilita lanccedilar luz

sobre algumas dimensotildees que se julgam fundamentais na discussatildeo dos limites e desafios de

tais poliacuteticas entre as quais se destacam a caracterizaccedilatildeo das desigualdades no acesso a

habitaccedilatildeo como expressatildeo das desigualdades sociais e ambientais

Deste modo o presente trabalho intitulado Poliacuteticas Habitacionais em Cidades

Amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luiacutes na perspectiva comparativa teve por objetivo analisar os

modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim

como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem

soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo que possa estar atrelado agraves

praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas

puacuteblicas

Para tanto eacute imprescindiacutevel repensar a participaccedilatildeo do Estado no conjunto das

praacuteticas sociais voltadas para o enfrentamento das vaacuterias dimensotildees da exclusatildeo natildeo apenas

23

pela participaccedilatildeo na partilha do excedente gerado pelo modelo econocircmico mas tambeacutem pelo

reconhecimento de suas formas alternativas de relaccedilotildees sociais e apropriaccedilatildeo dos espaccedilos

Nesse sentido a pesquisa visou responder as seguintes indagaccedilotildees 1) Qual a

concepccedilatildeo de gestatildeo que tem norteado as poliacuteticas habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa

e Satildeo Luiacutes-Ma 2) Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade civil no processo de

planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nos referidos municiacutepios 3) Os modelos de

gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as

diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois

municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem-Pa e Satildeo Luis-Ma enfocando o processo de

planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos agentes sociais percebendo

suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo

O ferramental metodoloacutegico utilizado teve como base a dimensatildeo poliacutetico-

institucional Desse modo para se fazer a anaacutelise dos modelos de gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luiacutes-Ma fez-se imprescindiacutevel buscar

informaccedilotildees nas instituiccedilotildees responsaacuteveis a fim de compreender as accedilotildees do poder puacuteblico

municipal seus interesses estrateacutegias e os resultados alcanccedilados na implementaccedilatildeo da

poliacutetica habitacional nos referidos municiacutepios visando encontrar possiacuteveis semelhanccedilas e

identificaccedilotildees ainda que um pouco diferenciadas quanto agrave forma de produccedilatildeo do espaccedilo

urbano

Para Santos (1996 p 36) quando se pensa nas simultaneidades definidoras do

espaccedilo a discussatildeo natildeo se limita agrave organizaccedilatildeo agrave proposiccedilatildeo ou instituiccedilatildeo de regras mas

tambeacutem natildeo escapa delas Se o modo de produccedilatildeo organiza e produz um espaccedilo a praacutetica

neste mesmo espaccedilo o subverte e o transforma sendo impossiacutevel pensar a organizaccedilatildeo do

espaccedilo sem perceber como ele eacute usado sem percebecirc-lo como impregnado de sujeitos ativos e

por isso poliacuteticos

Assim eacute importante destacar que na anaacutelise das poliacuteticas habitacionais seraacute levada

em conta a forma como eacute percebido e vivido o espaccedilo urbano reconhecendo seu potencial

poliacutetico enquanto elemento que pode determinar eou influenciar o modo como se pensa a

poliacutetica puacuteblica

Massey (2008) argumenta que quando se analisa as poliacuteticas implementadas no

espaccedilo urbano idealiza-se o potencial poliacutetico do espaccedilo como uma genuiacutena multiplicidade de

trajetoacuterias e potencialmente de vozes na enunciaccedilatildeo de atores sociais em suas accedilotildees

24

cotidianas quando se apropriam subvertem e transformam as regras e instituiccedilotildees

incorporando e transcendendo o espaccedilo da poliacutetica

Assim os procedimentos metodoloacutegicos para a coleta de dados que nortearam esse

trabalho foram desenvolvidos em trecircs etapas a) pesquisa bibliograacutefica (com o objetivo

construir um referencial de anaacutelise dos eixos que fundamentam o trabalho planejamento e

gestatildeo democraacutetica poliacuteticas puacuteblicas poliacuteticas habitacionais) documental e levantamento de

dados estatiacutesticos b) entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais

ligados aos programas ou projetos habitacionais e c) observaccedilatildeo direta que se deu por meio

da presenccedila da pesquisadora nas reuniotildees e em vaacuterios foacuteruns onde aconteceram os debates e

as deliberaccedilotildees acerca dos programas ou projetos habitacionais no intuito de observar as

dinacircmicas dos agentes sociais envolvidos

A estrateacutegia metodoloacutegica adotada para a anaacutelise da poliacutetica habitacional foi

apreendida de modo a conjugar dois niacuteveis de informaccedilatildeo em primeiro lugar por meio do

diagnoacutestico habitacional das referidas cidades em segundo se processou uma avaliaccedilatildeo das

poliacuteticas habitacionais com base no levantamento dos programas e projetos desenvolvidos

nas cidades e dos instrumentos de ordenamento no campo da administraccedilatildeo puacuteblica Vale

ressaltar que esses dois momentos satildeo indissociaacuteveis uma vez que existe uma

complementaridade entre os dados de um e de outro possibilitando ampliar a compreensatildeo

sobre a realidade estudada

A avaliaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais teve como base a anaacutelise contextual e

documental sendo que a avaliaccedilatildeo nesse caso se sustentou na anaacutelise de trecircs elementos

institucionais1 normativos2 e operacionais3

Eacute importante enfatizar que nessa tese natildeo se preeeee ot eneme sesee

ei

ele

moeeo e

otrecircs

a

gundo

trecircs e

normativos0914 T76783F1 2048 76783691201155920 09dee operacativos0914 T76783F1 2048 76783585171191490 09p0914 T76783F1 2048 76783593071191490 09l0914 T76783F1 2048 76783597491191490 09a0914 T76783F1 2048 76783604301191490 09n0914 T76783F1 2048 76783612181191490 09o0914 T76783F1 2048 76783620071191490 09se

25

artigos documentos mapas etc que pudessem fornecer subsiacutedios teoacutericos e metodoloacutegicos

ao estudo aleacutem de informaccedilotildees estatiacutesticas referentes aos resultados alcanccedilados com os

Projetos de Habitaccedilatildeo

Assim a pesquisa bibliograacutefica foi efetuada nas bibliotecas Central da Universidade

Federal do Paraacute (UFPA) e da Universidade Federal do Maranhatildeo (UFMA) do Instituto de

Filosofia e Ciecircncias Humanas (IFCHUFPA) do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

(NAEAUFPA) da Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral de Planejamento e Gestatildeo de

Beleacutem (SEGEP) da Secretaria de Planejamento do Municiacutepio de Satildeo Luis entre outros

Na pesquisa documental foram investigados documentos relacionados agraves poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma bem como documentos

referentes aos Projetos Habitacionais Essa pesquisa assemelhou-se agrave pesquisa bibliograacutefica

A diferenccedila entre ambas estaacute na natureza das fontes Enquanto a pesquisa bibliograacutefica se

utiliza fundamentalmente das contribuiccedilotildees dos diversos autores sobre determinado assunto a

pesquisa documental vale-se de materiais que natildeo receberam ainda um tratamento analiacutetico

A pesquisa documental e o levantamento de dados estatiacutesticos foram realizados nos

arquivos bibliograacuteficos e cartograacuteficos da Companhia de Saneamento do Paraacute (COSANPA)

Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute (COHAB) Companhia de Desenvolvimento

Metropolitano de Beleacutem (CODEM) na Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) e na

Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional (SEDURB) na Secretaria

Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) na

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo (CAEMA) Companhia de Habitaccedilatildeo do

Maranhatildeo (COHAB-Ma) entre outros Aleacutem de consultas agraves notiacutecias dos jornais de grande

circulaccedilatildeo em Beleacutem e em Satildeo Luis foi realizada tambeacutem consulta ao acervo bibliograacutefico e

fotograacutefico das aacutereas em estudo

A consulta aos arquivos dessas instituiccedilotildees foi relevante para a presente pesquisa

pois elas tiveram uma atuaccedilatildeo significativa em todo o processo de planejamento e

implementaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais e hoje continua fornecendo-lhe suporte teacutecnico-

institucional

O trabalho de campo faz-se indispensaacutevel Conforme Oliveira (1996) a importacircncia

deste atraveacutes do olhar ouvir e escrever constituem-se como momentos necessaacuterios e

estrateacutegicos para a compreensatildeo do fenocircmeno que se quer estudar especialmente no que diz

respeito ao exerciacutecio da pesquisa empiacuterica e agrave interpretaccedilatildeo de seus resultados

Com relaccedilatildeo agraves entrevistas foram realizadas com teacutecnicos e gestores das Secretarias

de Habitaccedilatildeo das cidades pesquisadas com a finalidade de conhecer os modelos de gestatildeo das

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poliacuteticas habitacionais implementados em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma assim como entender

a importacircncia atribuiacuteda agrave questatildeo habitacional pelos diferentes agentes sociais analisar a

importacircncia e as repercussotildees da participaccedilatildeo popular nos projetos habitacionais buscando

entender as estrateacutegias adotadas pelos setores populares e sua possiacutevel contribuiccedilatildeo ou natildeo

para o desenvolvimento dos mesmos elucidar o papel dos planos diretores na efetivaccedilatildeo do

planejamento urbano identificar os limites e desafios das poliacuteticas habitacionais

desenvolvidas nas referidas cidades comparando suas dinacircmicas composiccedilotildees articulaccedilotildees e

accedilotildees que direcionam e satildeo direcionadas pelos governos municipais

Esse momento constitui-se em uma relaccedilatildeo dialoacutegica com o entrevistado e os

recursos da entrevista foram utilizados tanto nos seus aspectos quantitativos como

qualitativos haja vista que satildeo complementares De acordo com Cardoso (1986 p 96) a

oposiccedilatildeo entre qualitativo e quantitativo natildeo corresponde a modos opostos e inconciliaacuteveis de

ver a realidade Satildeo modos diversos de resgatar a vida social e chegar a iluminar aspectos natildeo

aparentes e natildeo conscientes para os atores envolvidos

Apoacutes a coleta dos dados foram realizadas a interpretaccedilatildeo dos mesmos e a elaboraccedilatildeo

dessa tese que estaacute estruturada da seguinte maneira

O primeiro capiacutetulo descreve a introduccedilatildeo da pesquisa

No segundo capiacutetulo objetivou-se realizar uma siacutentese teoacuterica das principais ideacuteias

que nortearam o debate sobre a questatildeo urbana e habitacional no Brasil abordando a

produccedilatildeo do espaccedilo urbana e da moradia enfocando quem satildeo os agentes produtores desse

espaccedilo com destaque ao papel do Estado uma vez que se compreende esse agente como

fundamental na intervenccedilatildeo organizaccedilatildeo e gestatildeo das cidades assim como ressaltar o

planejamento urbano o direito agrave cidade e o direito agrave moradia

No terceiro capiacutetulo analisou-se a poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia

enfatizando a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional a fim de identificar as intervenccedilotildees urbanas

governamentais e as principais caracteriacutesticas do processo de ocupaccedilatildeo territorial assim como

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica e a participaccedilatildeo dos agentes sociais nas poliacuteticas puacuteblicas

habitacionais

No quarto capiacutetulo buscou-se delinear as principais caracteriacutesticas das poliacuteticas

municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes ressaltando as desigualdades soacutecio-espaciais decorrentes do

processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano nas duas cidades e por fim no quarto capitulo

analisou-se os programasprojetos habitacionais que foram identificados durante a pesquisa

documental nas secretarias municipais

27

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

Refletir sobre a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e nele a da moradia no contexto da

sociedade capitalista requer a necessidade de compreendecirc-lo como uma construccedilatildeo histoacuterica

caracterizando-se em uma condiccedilatildeo necessaacuteria para reproduccedilatildeo do capital e dos diversos

grupos sociais

Sendo assim eacute fundamental uma apreensatildeo de autores que se preocuparam em

investigar o urbano articulando-o ao modo de produccedilatildeo capitalista e agrave dinacircmica dos agentes

que lutam na cidade pela produccedilatildeo de sua existecircncia

O espaccedilo urbano pode ser entendido aqui como um processo construiacutedo

historicamente por agentes que produzem e consomem esse espaccedilo como um produto social

fragmentado e articulado permeado de siacutembolos e tambeacutem como um campo de lutas tendo

a cidade como sua forma que expressa natildeo soacute a localizaccedilatildeo e arranjo de lugares expressa um

modo de vida Esse modo de vida natildeo estaacute ligado somente ao modo de produccedilatildeo econocircmica

embora sofra seus efeitos mas estaacute ligado a todas as esferas da vida social cultural

simboacutelica psicoloacutegica ambiental religiosa e educacional

O urbano pode ser entendido como um modo de vida ligado a certa divisatildeo do

trabalho uma forma social enquanto a cidade seria a materializaccedilatildeo dessa forma (HARVEY

1980)

Trindade Junior (1998) ressalta que o espaccedilo eacute socialmente produzido e esta

produccedilatildeo ocorre paralelamente com a produccedilatildeo de bens materiais necessaacuterios agrave sobrevivecircncia

do homem Portanto a produccedilatildeo do espaccedilo urbano pode ser interpretada como uma dimensatildeo

real e concreta onde se realiza a vida humana e como uma dimensatildeo abstrata que ocorre de

modo diferenciado no tempo e no lugar ganhando materialidade por meio do territoacuterio

A cidade pode ser vista entatildeo como um conjunto de apropriaccedilotildees e usos que a

valoram diferentemente na qual as combinaccedilotildees dinacircmicas produzidas assumem tanto valores

de uso quanto de troca que iratildeo se relacionar dialeticamente entre si A cidade eacute tambeacutem por

excelecircncia lugar ou espaccedilo do estar junto

Para Harvey (1993) as modificaccedilotildees impliacutecitas das relaccedilotildees sociais e as diferentes

apreensotildees cognoscitivas do espaccedilo geograacutefico bem como a ideacuteia de supressatildeo ou ampliaccedilatildeo

dos espaccedilos de lazer podem levar a inuacutemeras modificaccedilotildees do imaginaacuterio coletivo e das

relaccedilotildees culturais no espaccedilo urbano

28

Na visatildeo desse autor a produccedilatildeo do espaccedilo significa coexistecircncia e sobreposiccedilatildeo de

relaccedilotildees sociais Significa tambeacutem materialidade de processos sociais aparentemente

naturais que satildeo estruturados com base em interesses e praacuteticas individuais e coletivas sendo

guiados por um conjunto de disposiccedilotildees duradouras subjacente a tais praacuteticas e processos

Para entender estes processos eacute preciso compreender os mecanismos que consubstanciam as

praacuteticas sociais que materializadas balizam o espaccedilo urbano Este espaccedilo eacute formado por

uma praacutexis social que tem como pano de fundo um sistema econocircmico (e poliacutetico) complexo

e criativo que se renova constantemente se reinventando inclusive em suas proacuteprias crises

naquilo que ficou conhecido como destruiccedilatildeo criativa (HARVEY 2005 p 58)

Aleacutem disso o autor argumenta que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano com fins para o

desenvolvimento baseado na acumulaccedilatildeo do capital expressa a caracteriacutestica peculiar de

permanente mudanccedila de suas praacuteticas e processos materiais de reproduccedilatildeo social assim como

os significados de tempo e espaccedilo que tambeacutem se modificam e essas transformaccedilotildees podem

ter consequumlecircncias para a organizaccedilatildeo da vida diaacuteria

O capital se representa sob a forma de uma paisagem fiacutesica criada agrave sua proacutepria imagem criada como valores de uso favorecedores da acumulaccedilatildeo progressiva do capital A paisagem geograacutefica daiacute resultante eacute a gloacuteria que coroa o desenvolvimento capitalista precedente Mas ao mesmo tempo ela expressa o poder da matildeo-de-obra morta sobre a matildeo-de-obra viva e como tal aprisiona e inibe o processo de acumulaccedilatildeo dentro de um conjunto de restriccedilotildees fiacutesicas especiacuteficas [] O desenvolvimento capitalista portanto tem que negociar um caminho muito estreito entre a preservaccedilatildeo dos valores de troca dos investimentos de capital passado no meio ambiente construiacutedo e a destruiccedilatildeo do valor desses investimentos a fim de abrir um novo espaccedilo para acumulaccedilatildeo No capitalismo portanto haacute uma luta perpeacutetua em que o capital constroacutei uma paisagem fiacutesica apropriada agrave sua proacutepria condiccedilatildeo em determinado momento do tempo simplesmente para ter que destruiacute-la geralmente durante situaccedilotildees de crise num momento posterior do tempo O fluxo e refluxo temporal e geograacutefico do investimento no meio ambiente construiacutedo soacute podem ser entendidos em termos desse processo (HARVEY 1993 p 127)

Uma contribuiccedilatildeo teoacuterica e conceitual importante para a anaacutelise do espaccedilo urbano eacute a

obra de Pierre Bourdieu o qual propotildee uma abordagem socioloacutegica sobre habitus posiccedilotildees

sociais e estrateacutegias que visam superar a dicotomia entre objetividade e subjetividade para

anaacutelise das relaccedilotildees entre indiviacuteduos e os grupos e estruturas nos quais estatildeo implicados

Partindo da premissa de que as regularidades da sociedade se processam mediante a

interiorizaccedilatildeo das estruturas objetivas na subjetividade dos indiviacuteduos Bourdieu (2001 p

115) argumenta que

29

A relaccedilatildeo entre estruturas e accedilotildees individuais natildeo ocorre de modo mecacircnico como afirmam os objetivistas nem de modo consciente conforme apontam os subjetivistas mas de um modo dialeacutetico por meio de um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis que uma vez constituiacutedos no processo de socializaccedilatildeo passam a orientar as praacuteticas dos indiviacuteduos que por sua vez tendem a refletir as caracteriacutesticas das estruturas em que foram forjadas as disposiccedilotildees

Para tanto Bourdieu (2001 p 65) utiliza o conceito de habitus para explicar a

mediaccedilatildeo entre as estruturas objetivas e as subjetivas o qual pode ser compreendido como

uma capacidade infinita de engendrar produtos

pensamentos percepccedilotildees expressotildees accedilotildees

cujos limites satildeo fixados pelas condiccedilotildees histoacuterica e socialmente situadas de sua produccedilatildeo

permitindo tanto operar atos de conhecimento praacutetico fundados no mapeamento e no

reconhecimento de estiacutemulos condicionais e convencionais a que os agentes estatildeo dispostos a

reagir como tambeacutem [] engenderar sem posiccedilatildeo expliacutecita de finalidades nem caacutelculo

racional de meios estrateacutegias adaptadas e incessantemente renovadas situadas poreacutem nos

limites das construccedilotildees estruturais de que satildeo o produto e que as definem

As condiccedilotildees associadas numa classe particular de condiccedilotildees de existecircncia produzem habitus um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis e transferiacuteveis estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes quer dizer como princiacutepios que geram e organizam praacuteticas e representaccedilotildees que podem ser adaptadas objetivamente aos seus resultados sem pressupor um fim objetivo consciente ou um domiacutenio expresso das operaccedilotildees necessaacuterio para o atingir Objetivamente regulador e regulado sem ser de qualquer forma o produto de obediecircncia a regras o habitus pode ser orquestrado coletivamente sem ser o produto da accedilatildeo organizatoacuteria de um condutor (BOURDIEU 2001 p 53)

Nesse sentido o habitus seria um conhecimento adquirido e um capital pelo qual se

indica a disposiccedilatildeo incorporada de um agente os princiacutepios geradores e organizadores de suas

praacuteticas captadas quando da sua accedilatildeo traduzindo-se na forma com que um determinado

grupo interioriza seu comportamento dentro de determinado espaccedilo social Neste caso o

espaccedilo social e o espaccedilo fiacutesico passam a ser um soacute

O espaccedilo social eacute definido como um conjunto de posiccedilotildees distintas e coexistentes

exteriores umas agraves outras definidas umas em relaccedilatildeo agraves outras por sua exterioridade muacutetua e

por relaccedilotildees de proximidade de vizinhanccedila ou de distanciamento e tambeacutem por relaccedilotildees de

ordem como acima abaixo e entre (BOURDIEU 1996 p 18)

30

Bourdieu tambeacutem desenvolveu o conceito de capital simboacutelico o qual natildeo se baseia

unicamente no econocircmico mas fundamentalmente se expressa por outros tipos de capitais4

o cultural o social o poliacutetico o religioso e o esteacutetico reconhecendo a dimensatildeo simboacutelica

enquanto produtora e reprodutora da dominaccedilatildeo que estaacute por traz dos processos de

diferenciaccedilatildeo social

Sendo assim a hierarquia das posiccedilotildees sociais se constitui de acordo com o volume e

com a estrutura do capital possuiacutedo pelos indiviacuteduos e grupos que se distribuem nas diversas

posiccedilotildees do espaccedilo social

Satildeo essas accedilotildees humanas que atuam diretamente na construccedilatildeo transformaccedilatildeo e

reconstruccedilatildeo do espaccedilo Desse modo um conjunto de accedilotildees sociais que compreendem

produccedilatildeo distribuiccedilatildeo e consumo de bens materiais representam praacuteticas econocircmicas em

determinado momento histoacuterico assim como o estabelecimento de relaccedilotildees entre os homens

na sociedade corroboram decisivamente para a construccedilatildeo do arranjo econocircmico social

cultural e poliacutetico do espaccedilo

Segundo Spoacutesito (2004) as praacuteticas econocircmicas modificam o espaccedilo em sua ampla

condiccedilatildeo de valor de troca ou seja as formaccedilotildees sociais em sua evoluccedilatildeo passam de uma

situaccedilatildeo de simples ocupaccedilatildeo e aproveitamento do espaccedilo (adaptaccedilatildeo passiva) para uma

situaccedilatildeo de transformaccedilatildeo cada vez mais ampla e profunda desse espaccedilo (adaptaccedilatildeo ativa)

Essa transformaccedilatildeo compreende natildeo apenas a produccedilatildeo de bens materiais como tambeacutem a

adequaccedilatildeo do meio ambiente circundante agraves necessidades individuais familiares

comunitaacuterias e das formaccedilotildees sociais em seu conjunto

Para Castells (1983 p 181) o espaccedilo eacute um produto material de uma dada formaccedilatildeo

social Eacute determinado pelas forccedilas produtivas e pelas relaccedilotildees de produccedilatildeo que se originam

delas Analisando o espaccedilo urbano enquanto expressatildeo da estrutura social o referido autor

argumenta que a organizaccedilatildeo do espaccedilo pode ser entatildeo compreendida a partir da determinaccedilatildeo

das formas espaciais e diz que todo espaccedilo urbano eacute o espaccedilo aonde vai se configurar o

processo relativo agrave forccedila de trabalho e sua reproduccedilatildeo

Entretanto Lojkine (1981) afirma que tal anaacutelise baseia-se em equiacutevocos e que reduz

o urbano agrave forccedila de trabalho Dentre os equiacutevocos estatildeo a confusatildeo entre processo

teacutecnica

de trabalho e processo social

de produccedilatildeo confusatildeo entre a unidade imediata de produccedilatildeo e

4 Bonnewitz (2005 p 53-54) sintetiza quatro tipos de capital apresentados por Bourdieu que satildeo 1) capital econocircmico que satildeo diferentes fatores de produccedilatildeo e conjunto dos bens econocircmicos 2) capital cultural satildeo as qualificaccedilotildees intelectuais produzidas pelo sistema escolar ou transmitidas pela famiacutelia podendo se apresentar objetivados tais como nos bens culturais incorporados por exemplo no vocabulaacuterio e institucionalizados a exemplo dos tiacutetulos acadecircmicos 3) capital social se constitui pelas relaccedilotildees sociais e pelas redes de sociabilidade 4) capital simboacutelico composto pelo reconhecimento social honra e prestiacutegio

31

a divisatildeo societal do trabalho no conjunto de uma formaccedilatildeo social confusatildeo entre forccedilas

produtivas e forccedilas produtivas materiais

Este autor entende o espaccedilo urbano a partir do contexto das lutas de classes

considerando o urbano como um dos lugares decisivos dessa luta enfatizando a principal

contradiccedilatildeo entre a exigecircncia de desenvolvimento do trabalho vivo e a loacutegica de acumulaccedilatildeo

do trabalho cristalizado que tende a restringir ao maacuteximo esse desenvolvimento em funccedilatildeo de

suas necessidades imediatas

Conforme Lojkine (1981) a cidade eacute o reflexo de uma nova modalidade de conflito

de classes uma vez que o espaccedilo urbano eacute organizado de maneira desigual O acesso aos

serviccedilos de infraestrutura urbana transportes coletivos e equipamentos de lazer varia de

acordo com os diferentes grupos sociais evidenciando um processo de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Para ele existem trecircs tipos de segregaccedilatildeo

1 Uma oposiccedilatildeo entre o centro onde o preccedilo do solo eacute mais alto e a periferia onde

o preccedilo do solo eacute mais baixo5

2 Uma separaccedilatildeo crescente entre as zonas e moradias reservadas agraves camadas

sociais de maior poder aquisitivo e as zonas de moradia popular

3 Um esfacelamento generalizado das funccedilotildees urbanas disseminadas em zonas

geograficamente distintas especializadas zona de escritoacuterios zona industrial

zona de moradia etc

Mediante a reflexatildeo sobre tais conceitos (Castells e Lojkine) pode-se afirmar que o

urbano eacute historicamente construiacutedo enquanto espaccedilo de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho do

capital e das proacuteprias classes sociais

A cidade torna-se assim espaccedilo destinado agrave industrializaccedilatildeo aos serviccedilos

especializados e ao crescimento do capital acarretando na concentraccedilatildeo demograacutefica e no

desenvolvimento desordenado

da cidade gerado pela necessidade de reproduccedilatildeo do capital

5 O conceito de centro utilizado nesse trabalho pode ser definido como ponto central da gestatildeo do territoacuterio centro de decisatildeo e poder Cabe destacar que a apropriaccedilatildeo e uso do solo estatildeo atrelados agraves diferenciaccedilotildees de renda sendo que determinaraacute a acessibilidade ao espaccedilo por ser diretamente vinculada agrave lei do mercado Nesse sentido a discussatildeo sobre centro e periferia natildeo deve desprezar elementos necessaacuterios a compreensatildeo de que uma aacuterea perifeacuterica natildeo eacute apenas aquela distante da aacuterea central de uma determinada cidade Devem ser levados em consideraccedilatildeo vaacuterios aspectos como fiacutesicos econocircmicos sociais e culturais que satildeo determinantes para que se compreenda as condiccedilotildees sociais e modo de vida dos moradores seja da regiatildeo central ou da perifeacuterica Para Spoacutesito (2004 p 116) o conceito de periferia urbana deve ter em vista as transformaccedilotildees que esses espaccedilos vecircm passando no seu conteuacutedo soacutecioespacial tais como os conjuntos habitacionais implantados pelo poder puacuteblico para grupos de menor poder aquisitivo loteamentos clandestinos produzidos pelas praacuteticas de autoconstruccedilatildeo e condomiacutenios fechados para grupos de maior renda e a implantaccedilatildeo de shopping centers Assim sendo esta pluralizaccedilatildeo da paisagem e dos conteuacutedos da periferia urbana revela novas praacuteticas soacutecioespaciais novas formas de diferenciaccedilatildeo e segregaccedilatildeo urbana e por fim aponta para uma fragmentaccedilatildeo territorial e social da cidade

32

uma vez que o modo de vida capitalista eacute determinado pela dinacircmica das forccedilas produtivas

articuladas com a produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Dessa maneira pode-se dizer

que o urbano se constitui em espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e tambeacutem em espaccedilo de

reproduccedilatildeo de classes sociais por meio de confrontos soacutecio-poliacuteticos decorrentes da

divergecircncia de seus interesses

Portanto o urbano eacute representado por uma infraestrutura que propicia a produccedilatildeo

circulaccedilatildeo troca e consumo de mercadorias e serviccedilos aleacutem de ser produto da accedilatildeo e

interaccedilatildeo de diversas forccedilas sociais que possuem perspectivas antagocircnicas as quais satildeo

modeladas pela luta de classes causando conflitos e interesses para aleacutem do local de trabalho

passando para o local de moradia e aacutereas de consumo coletivo

Bourdieu (2001) ao tratar da dimensatildeo simboacutelica das lutas esclarece que as lutas

entre dominantes e dominados se daacute em um campo de forccedilas que podem ser expressos em

trecircs campos campo social campo de poder e campo poliacutetico

Pode-se descrever o campo social como um espaccedilo multidimensional de posiccedilotildees tal que qualquer posiccedilatildeo atual pode ser definida em funccedilatildeo de um sistema multidimensional de coordenadas cujos valores correspondem aos valores das diferentes variaacuteveis pertinentes os agentes distribuem-se assim nele na primeira dimensatildeo segundo o volume global do capital que possuem e na segunda dimensatildeo segundo a composiccedilatildeo do seu capital

quer dizer segundo o peso relativo das diferentes espeacutecies no conjunto de suas posses [] essas espeacutecies satildeo os poderes que definem as probabilidades de ganho num campo determinado (BOURDIEU 2001 p 134-135)

Em relaccedilatildeo ao campo de poder Bourdieu (2001 p 139) o definido como

Relaccedilotildees de forccedila entre as posiccedilotildees sociais que garantem aos seus ocupantes um quantum suficiente de forccedila social

ou de capital

de modo que estes tenham a possibilidade de entrar nas lutas pelo monopoacutelio do poder entre os quais possuem uma dimensatildeo capital as que tecircm por finalidade a definiccedilatildeo de forma legiacutetima de poder

Campo poliacutetico para ele (2001 p 164) eacute ao mesmo tempo campo de forccedilas e

campo de lutas que tecircm em vista transformar as relaccedilotildees de forccedilas que confere a este campo a

sua estrutura em dado momento

Assim sendo enquanto resultado das relaccedilotildees e da accedilatildeo dos homens o espaccedilo

urbano adquire formas que refletem de modo geral as determinaccedilotildees que satildeo hegemocircnicas na

sociedade Esse espaccedilo eacute uma conjuntura histoacuterica e uma forma social que recebe sentido dos

processos sociais que se exprimem por meio dele ou seja por meio das relaccedilotildees estabelecidas

33

entre as diferentes instacircncias de uma estrutura social a econocircmica a poliacutetica a ideoloacutegica

cultural e a conjuntura de relaccedilotildees sociais que dela resulta

Da mesma forma Lefebvre (1991 p 128) ressalta que

O espaccedilo possui no modo de produccedilatildeo o mesmo status ontoloacutegico que o capital ou o trabalho porque tanto as relaccedilotildees de posse quanto agraves de exteriorizaccedilatildeo material (a produccedilatildeo de espaccedilo) estatildeo unidas nas relaccedilotildees de propriedade que formam a essecircncia do modo capitalista de produccedilatildeo O espaccedilo eacute apenas parte das forccedilas e meios de produccedilatildeo constitui tambeacutem um produto dessas mesmas relaccedilotildees tornando o design espacial diferente de qualquer outro fator social ou mercadoria aleacutem da haver um espaccedilo de consumo ou um espaccedilo como aacuterea de impacto para o consumo coletivo haacute tambeacutem o consumo de espaccedilo ou o proacuteprio espaccedilo como objeto de consumo

Milton Santos (1991 p 71) afirma que o espaccedilo natildeo eacute nem uma coisa nem um

sistema de coisas senatildeo uma realidade relacional coisas e relaccedilotildees juntas

O espaccedilo deve ser considerado como um conjunto indissociaacutevel de que participam de um lado certo arranjo de objetos geograacuteficos objetos naturais e objetos sociais e de outro a vida que os preenche e os anima ou seja a sociedade em movimento [] um conjunto de objetos e de relaccedilotildees que se realizam sobre estes objetos natildeo entre estes especificamente mas para as quais eles servem de intermediaacuterios Os objetos ajudam a concretizar uma seacuterie de relaccedilotildees O espaccedilo eacute resultado da accedilatildeo dos homens sobre o proacuteprio espaccedilo intermediado pelos objetos naturais e artificiais

Sendo assim compreende-se que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia satildeo

determinados pelas relaccedilotildees sociais que se constituem no modo de vida capitalista e

determinantes da dinacircmica soacutecioespacial

Harvey (1980 p 5) argumenta que o espaccedilo urbano pode ser compreendido como

uma relaccedilatildeo contiacutenua entre processos sociais e formas espaciais constituiacutedos historicamente

Logo a gecircnese do espaccedilo urbano eacute analisada da seguinte forma o espaccedilo natildeo eacute absoluto

relativo ou relacional em si mesmo mas pode transformar-se em outro dependendo das

circunstacircncias O problema da correta conceituaccedilatildeo do espaccedilo eacute resolvido atraveacutes da praacutetica

humana em relaccedilatildeo a ele

Com o padratildeo de modernizaccedilatildeo fordista o capital instaurou-se natildeo somente por meio

da induacutestria mas tambeacutem nas relaccedilotildees de produccedilatildeo e apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo As

categorias analiacuteticas envolvidas na produccedilatildeo e na apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano satildeo o Estado

34

o capital o trabalho e a terra6 como mercadoria Estas categorias podem ser melhor

identificadas quando verificam-se os fenocircmenos e processos advindos com a modernizaccedilatildeo o

ecircxodo rural a urbanizaccedilatildeo intensa e acelerada a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e o processo de

favelizaccedilatildeo e periferizaccedilatildeo da classe trabalhadora entre outros (HARVEY 1980)

Esses fenocircmenos podem ser reconhecidos assim como em outras cidades nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis que sofrem com os efeitos da intensa especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

acarretando na valorizaccedilatildeo de espaccedilos privilegiados os quais possuem mais investimentos em

infraestrutura serviccedilos e transportes

Para ele as novas configuraccedilotildees desenvolvidas no espaccedilo urbano e na moradia nas

uacuteltimas deacutecadas estatildeo diretamente relacionadas a um novo momento da estruturaccedilatildeo da

sociedade capitalista no qual o desejo exacerbado por acumulaccedilatildeo somado agrave necessidade de

reproduccedilatildeo das classes sociais contribuiu para o processo de descentralizaccedilatildeo das aacutereas

centrais deslocando-se para outros espaccedilos longiacutenquos da cidade como zonas baixadas

favelas etc instigados pelo processo de renovaccedilatildeo urbana

Castells (1996) ressalta que a globalizaccedilatildeo vem alterando profundamente as

estruturas produtivas as relaccedilotildees teacutecnicas e sociais de produccedilatildeo e os padrotildees organizacionais

e locacionais colocando novas questotildees e recolocando tambeacutem velhos desafios nos quais as

desigualdades e as possibilidades de desenvolvimento permanecem no centro desse novo

cenaacuterio Esse processo eacute resultado e condicionante das aceleradas e radicais mudanccedilas

tecnoloacutegicas determinadas pela competiccedilatildeo capitalista sob a lideranccedila da tecnologia da

informaccedilatildeo e da sociedade do conhecimento

A globalizaccedilatildeo permitiu e induziu a generalizaccedilatildeo dos novos meios de comunicaccedilatildeo

e controle (informaacutetica telemaacutetica internet TV a cabo sistemas online etc) que vecircm

facilitando e barateando os transportes e as comunicaccedilotildees potenciando o aumento do fluxo de

informaccedilotildees econocircmicas cientiacuteficas tecnoloacutegicas culturais e poliacuteticas expandindo o

comeacutercio internacional e inter-regional de bens alterando a natureza da produccedilatildeo consumo e

comeacutercio de serviccedilos inclusive possibilitando o crescimento do comeacutercio de serviccedilos agrave

distacircncia aumentando o fluxo de capitais e de pessoas especialmente financeiro construccedilatildeo

de imoacuteveis entre outros portanto acelerando a integraccedilatildeo mundial

6 A terra condiccedilatildeo fundamental para a reproduccedilatildeo do capital por meio de benfeitorias e mudanccedila no uso (passando entatildeo a solo urbano) se transforma em uma mercadoria especial Ao solo passa a ser atribuiacuteda uma condiccedilatildeo utilitarista (mascarando o trabalho) de meio e condiccedilatildeo para reproduccedilatildeo do capital O espaccedilo tambeacutem passou a incorporar esse utilitarismo sendo por vezes condiccedilatildeo indispensaacutevel para a economia urbana (HARVEY 2005)

35

Estas tendecircncias refletem as profundas mudanccedilas ocorridas na dinacircmica capitalista

definindo o redirecionamento das unidades produtivas no qual novos espaccedilos satildeo explorados

para a implantaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de novos equipamentos e infraestrutura que favoreccedilam a

concorrecircncia capitalista aleacutem da abertura de novos mercados o que produz novas

contradiccedilotildees entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo urbano e da moradia e sua

apropriaccedilatildeo privada

As transformaccedilotildees do espaccedilo urbano nesse novo contexto decorrem das inovaccedilotildees

tecnoloacutegicas e sociais como a fragmentaccedilatildeo das classes sociais decorrentes da relaccedilatildeo de

dominaccedilatildeo-subordinaccedilatildeo capitalista Destarte se por um lado as novas atividades produtivas

os empreendimentos imobiliaacuterios o crescimento populacional as poliacuteticas puacuteblicas ineficazes

tecircm ocasionado o adensamento e a intensificaccedilatildeo do uso de determinados espaccedilos por outro

lado tecircm propiciado a saiacuteda de uma grande parcela da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo e

de atividades econocircmicas para outros espaccedilos degradados

O proacuteprio espaccedilo dotado de atributos locacionais em contiacutenua ressignificaccedilatildeo eacute incorporado agrave difusatildeo de inovaccedilotildees tornando-se novo em alguns lugares e velhos em outros Por meio da propriedade privada eacute submetido a praacuteticas espaciais como seletividade esterilizaccedilatildeo antecipaccedilatildeo e marginalizaccedilatildeo que visam agrave sua valorizaccedilatildeo diferenciada na qual o novo e o velho estatildeo presentes em setores distintos O novo espaccedilo valorizado constitui-se ainda que natildeo exclusivamente em local para novas formas espaciais abrigando novas funccedilotildees (CARDOSO 2003 p 51)

A dinacircmica soacutecioespacial sofreu profundas alteraccedilotildees com a nova fase de

internacionalizaccedilatildeo do capital uma vez que o processo de renovaccedilatildeo urbana criou novas

bases espaciais de produccedilatildeo por meio da substituiccedilatildeo e ruptura das estruturas preexistentes

estimulando o mercado imobiliaacuterio e as parcerias entre os setores puacuteblico e privado

De acordo com Carlos (2001) o redirecionamento das formas espaciais produtivas

iraacute provocar a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano por meio da mobilidade social Este

deslocamento eacute justificado principalmente pelos novos locais de instalaccedilatildeo das induacutestrias que

procuram pontos estrateacutegicos (proacuteximos de terminais rodoviaacuterios e mariacutetimos estradas

pavimentadas etc) facilitando assim o escoamento da produccedilatildeo e reduzindo os custos de

operaccedilatildeo

Dessa maneira a intensificaccedilatildeo e extensificaccedilatildeo da urbanizaccedilatildeo satildeo provocadas por

um consumo voraz e crescente do espaccedilo uma vez que para atender agraves necessidades

crescentes do capital satildeo revistas as legislaccedilotildees ambientais e de uso do solo introduzindo

mudanccedilas que visam atender interesses de classes sociais especiacuteficas aleacutem do avanccedilo da

36

destruiccedilatildeo de florestas por meio da ampliaccedilatildeo das fronteiras agriacutecolas e expansatildeo das

monoculturas intensivas como da cana e soja provocando o aumento da exclusatildeo social e da

precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida de grandes contingentes populacionais que buscam os

centros urbanos

As novas configuraccedilotildees dos espaccedilos urbanos na atualidade satildeo justificadas pelos agentes sociais condicionadores do espaccedilo Entre eles merecem destaque o Estado e os promotores imobiliaacuterios A atuaccedilatildeo do Estado no espaccedilo se efetiva com o processo de renovaccedilatildeo urbana que estaacute vinculado agrave necessidade de remodelar espaccedilos deteriorados em aacutereas condizentes com a arquitetura moderna Esta renovaccedilatildeo em geral acontece com o remanejamento de famiacutelias cabendo ao poder puacuteblico efetivar esta accedilatildeo [] As zonas atingidas pela renovaccedilatildeo passam por um processo de valorizaccedilatildeo devido agrave incorporaccedilatildeo de infraestrutura tornando-se propiacutecia agrave especulaccedilatildeo imobiliaacuteria As famiacutelias que residiam nestes espaccedilos no entanto acabam por abandonaacute-los por natildeo possuiacuterem condiccedilotildees de pagar o ocircnus da valorizaccedilatildeo que se processa com o aumento dos impostos e taxas de serviccedilos urbanos (CARLOS 2001 p 64)

Cabe ressaltar que a accedilatildeo do Estado se processa de acordo com as diretrizes do

capital intervindo no espaccedilo urbano e na questatildeo habitacional para suprir as necessidades do

mesmo estabelecendo a renovaccedilatildeo ou abertura de novos espaccedilos que satildeo fragmentados e

intensificam a segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o uso do solo torna-se cada vez mais valorizado

Dessa maneira muitas famiacutelias que moram em aacutereas mais centrais satildeo pressionadas

pelo capital imobiliaacuterio a vender seu imoacutevel o que acaba constituindo-se em uma estrateacutegia

de sobrevivecircncia pois a renda adquirida com a venda do imoacutevel por um valor mais alto gera

uma oportunidade de ganho financeiro jaacute que poderaacute servir para compra de outro imoacutevel por

um preccedilo menor em um local mais distante que sofre com a falta de infraestrutura serviccedilos

etc e o restante da renda seraacute o lucro para ser investido em outras transaccedilotildees financeiras

Atraveacutes da poliacutetica de renovaccedilatildeo urbana o Estado capitalista valoriza simultaneamente vaacuterios interesses De um lado via expulsatildeo dos pobres residentes em corticcedilos junto ao centro da cidade redirecionando a segregaccedilatildeo residencial e viabiliza o capital imobiliaacuterio que tem oportunidade de realizar bons negoacutecios em aacutereas onde o preccedilo da terra eacute pela proximidade do centro bastante elevado eacute a renovaccedilatildeo urbana (CORREcircA 1989 p 28)

Carlos (2001) analisa o processo de renovaccedilatildeo urbana como uma accedilatildeo do Estado por

intermeacutedio do poder local ao intervir no processo de produccedilatildeo da cidade que reforccedila a

hierarquia de lugares criando novas centralidades e expulsando para periferia os antigos

37

habitantes criando um espaccedilo de dominaccedilatildeo Com isso impotildee sua presenccedila em todos os

lugares agora sob controle e vigilacircncia (direta ou indireta)

Assim sendo o espaccedilo produzido assume a caracteriacutestica de fragmentaccedilatildeo em

decorrecircncia da accedilatildeo dos empreendedores imobiliaacuterios e da generalizaccedilatildeo do processo de

mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo homogecircneo (pela dominaccedilatildeo imposta pelo Estado ao espaccedilo) e

hierarquizado (pela divisatildeo espacial do trabalho)

Entatildeo a estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano depende das accedilotildees econocircmicas sociais

culturais e poliacuteticas uma vez que a cidade eacute resultado de intervenccedilotildees puacuteblicas e privadas que

atuam no espaccedilo urbano por meio de investimentos infraestruturais e organizacionais

regulamentando os diversos interesses de poder e de classe estabelecendo estrateacutegias sociais e

poliacuteticas muitas vezes geradoras de segregaccedilotildees e exclusotildees sociais

Percebe-se assim que a accedilatildeo do Estado perpetua as contradiccedilotildees engendradas pelo

processo de reproduccedilatildeo capitalista agrave medida que atende aos interesses da classe dominante

criando mecanismos para quebrar as barreiras que impedem o avanccedilo do progresso ao

implementar infraestrutura e favorecer a liberaccedilatildeo de aacutereas necessaacuterias agrave reproduccedilatildeo do

capital Destarte a renovaccedilatildeo urbana pode ser caracterizada como um conjunto de estrateacutegias

que levam agrave segregaccedilatildeo e agrave hierarquia do espaccedilo alterando a forma de determinadas aacutereas da

cidade promovendo a transformaccedilatildeo da vida urbana modificando sua estrutura e funccedilatildeo

A contradiccedilatildeo do espaccedilo natildeo vem de sua forma racional tal qual se depreende nos matemaacuteticos ela vem do conteuacutedo praacutetico e social especificamente do conteuacutedo capitalista Com efeito esse espaccedilo da sociedade capitalista se quer racional enquanto praacutetica ele eacute comercializado fragmentado vendido em parcelas Eacute assim que ele eacute ao mesmo tempo global e pulverizado Ele parece loacutegico e ele eacute absolutamente recortado Essas contradiccedilotildees explodem no plano institucional Nesse plano se descobre que a burguesia tem um duplo poder sobre o espaccedilo inteiro agrave exceccedilatildeo dos direitos da coletividade e do Estado-e secundariamente pela globalidade a saber o conhecimento a estrateacutegia a accedilatildeo do Estado Haacute conflitos inevitaacuteveis entre esses dois aspectos e notadamente entre o espaccedilo abstrato (concebido ou conceitual global ou estrateacutegico) e o espaccedilo imediato percebido vivido fragmentado e vendido No plano institucional essas contradiccedilotildees aparecem entre os planos gerais do planejamento e os projetos parciais dos mercados do espaccedilo (LEFEBVRE 1991 apud CARLOS 2001 p 237- 238)

Por meio do zoneamento e do planejamento urbano o Estado impotildee e administra

limitaccedilotildees ao mercado imobiliaacuterio ao promover em determinados espaccedilos urbanos serviccedilos

como aacutegua energia esgoto transporte puacuteblico escolas e postos de sauacutede aleacutem de garantir

infraestrutura que contribui indiretamente para o aumento do valor de uso das moradias

38

Portanto como esclarece Harvey (1996) a compreensatildeo da dinacircmica com que se

processam as grandes intervenccedilotildees urbanas e das modificaccedilotildees estruturais geradas por elas eacute

fundamental para a proposiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas direcionadas para a sustentabilidade

urbana O contexto global da perda de capacidade de regulaccedilatildeo da economia por parte do

poder puacuteblico da financeirizaccedilatildeo e desterritorializaccedilatildeo do capital bem como a intensificaccedilatildeo

da sua concentraccedilatildeo satildeo fenocircmenos que afetam de maneira geral todas as grandes cidades

poreacutem os efeitos satildeo muito particulares

Assim a raacutepida transformaccedilatildeo do espaccedilo urbano e da questatildeo habitacional no Brasil

no periacuteodo compreendido pelas trecircs uacuteltimas deacutecadas do seacuteculo XX e na primeira do seacuteculo

XXI induz a questionamentos quanto a questatildeo dos modelos de poliacuteticas puacuteblicas

implementadas assim como os padrotildees da segregaccedilatildeo soacutecioespacial que ora se observa na

estrutura intra-urbana das grandes cidades brasileiras incluindo Beleacutem e Satildeo Luis

Para tanto torna-se imprescindiacutevel refletir sobre a dinacircmica de ocupaccedilatildeo do solo

bem como a interaccedilatildeo dos diferentes agentes que atuam na produccedilatildeo e consumo do espaccedilo

urbano clarificando os aspectos relacionados agrave atuaccedilatildeo do capital imobiliaacuterio e agraves

precariedades soacutecio-espaciais a que estaacute submetida grande parte da populaccedilatildeo como carecircncia

de infraestrutura e serviccedilos urbanos especulaccedilatildeo expulsatildeo de suas terras entre outras uma

vez que a questatildeo habitacional estaacute condicionada tanto pelas mudanccedilas na economia do paiacutes

quanto pelos mecanismos que produzem a estrutura urbana e a distribuiccedilatildeo dos equipamentos

e serviccedilos na cidade

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO ESTADO

Ao comeccedilar a discutir sobre os agentes produtores do espaccedilo urbano faz-se

necessaacuterio resgatar a concepccedilatildeo de espaccedilo urbano desenvolvida por Correcirca (1993) a qual

considera o espaccedilo urbano como espaccedilo construiacutedo no contexto da cidade capitalista como

produto social resultado da accedilatildeo histoacuterica de agentes que produzem e consomem esse espaccedilo

Eis o que eacute o espaccedilo urbano fragmentado e articulado reflexo e condicionante social um conjunto de siacutembolos e campo de lutas Eacute assim a proacutepria sociedade em uma de suas dimensotildees aquela mais aparente materializada nas formas espaciais Eacute o produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem o espaccedilo (CORREcircA 1993 p 9)

39

Dessa maneira a apropriaccedilatildeo e o uso do solo nas cidades capitalistas podem ser

compreendidos pela proacutepria dinacircmica da sociedade que traz em si diversas contradiccedilotildees

estabelecidas nos conflitos existentes entre as exigecircncias do capital e as demandas da

sociedade uma vez que as relaccedilotildees econocircmicas determinam as diretrizes do modo de

produccedilatildeo e a estrutura urbana se constitui pelas accedilotildees dos grupos sociais

De acordo com Correcirca (1993) os processos espaciais definem a organizaccedilatildeo espacial

desigual e mutaacutevel da cidade capitalista Nela o processo espacial eacute concebido como as forccedilas

por meio da qual o movimento de transformaccedilatildeo social compreendido como o proacuteprio

processo se efetiva espacialmente redefinindo a espacialidade da sociedade

Ainda segundo o autor as agentes que produzem socialmente o espaccedilo urbano satildeo

responsaacuteveis pela configuraccedilatildeo da organizaccedilatildeo do espaccedilo das cidades distinguindo-se como

1) Proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo caracterizam-se como os grandes proprietaacuterios industriais e das grandes empresas comerciais portanto como grandes consumidores de espaccedilos Estes espaccedilos satildeo produzidos em torno do interesse de expansatildeo da produccedilatildeo garantidos por meio de terrenos amplos e baratos que satisfaccedilam suas necessidades de circulaccedilatildeo de mercadoria e acabam por interferir no modelamento das cidades

2) Proprietaacuterios fundiaacuterios satildeo os proprietaacuterios de terra que se empenham em obter a maior renda fundiaacuteria de suas propriedades seja no uso comercial ou residencial Portanto sua accedilatildeo se daacute em torno do aumento contiacutenuo da renda fundiaacuteria que obtecircm de suas propriedades Para tanto seus esforccedilos direcionam-se no sentido de garantir infraestrutura urbana para seus terrenos exercendo pressatildeo junto ao poder puacuteblico no processo de definiccedilatildeo das leis de uso do solo e na garantia dos benefiacutecios infraestruturais Significa dizer que estes estatildeo mais preocupados com o valor de troca da terra e natildeo de seu uso

3) Promotores imobiliaacuterios eacute um conjunto de agentes que exercem accedilotildees de compra financiamento estudo teacutecnico construccedilatildeo ou produccedilatildeo fiacutesica de novas habitaccedilotildees transformaccedilatildeo do capital mercadoria em capital dinheiro7 Sua atuaccedilatildeo espacial na cidade tem caraacuteter excludente pois favorece a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para satisfazer a demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo desta forma criando e reforccedilando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial

4) Estado enquanto agente modelador do espaccedilo urbano capitalista atuando na organizaccedilatildeo espacial da cidade como grande industrial consumidor de espaccedilo e de localizaccedilotildees especiacuteficas proprietaacuterio fundiaacuterio e promotor imobiliaacuterio sem deixar de ser tambeacutem um agente de regulaccedilatildeo do uso do solo e alvo dos chamados Movimentos Sociais Urbanos Sua accedilatildeo mais visiacutevel se daacute por meio da implantaccedilatildeo de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos na elaboraccedilatildeo de normas vinculadas ao uso do solo para os quais dispotildee de um conjunto de instrumentos como o direito de desapropriaccedilatildeo a regulamentaccedilatildeo do uso do solo e outros

7 Sobre as funccedilotildees atribuiacutedas aos promotores imobiliaacuterios ver Topalov (1974)

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5) Grupos sociais excluiacutedos satildeo parcelas da populaccedilatildeo que natildeo possuem no que concerne agrave moradia acesso aos bens e serviccedilos produzidos socialmente e eacute na produccedilatildeo de favela em terrenos puacuteblicos ou privados ocupados que esses grupos tornam-se agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito dos outros agentes A produccedilatildeo do espaccedilo eacute uma forma de resistecircncia e de estrateacutegia de sobrevivecircncia (CORREcircA 1993 p 23-24)

Cada um dos agentes a quem o autor se refere desenvolve um papel ativo na

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia tendo como vieacutes a dinacircmica da acumulaccedilatildeo

capitalista considerando que accedilotildees implementadas satildeo em funccedilatildeo dos interesses dominantes

garantindo a reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e portanto a contradiccedilatildeo da luta de classes

Harvey em sua obra A justiccedila social e a cidade argumenta que a aquisiccedilatildeo de terras

e as melhorias implementadas no espaccedilo urbano e habitacional satildeo compreendidas como

mercadorias na sociedade capitalista contemporacircnea

portanto possuem um valor de uso e

um valor de troca

mercadorias estas que natildeo podem ser deslocadas pois tecircm uma

localizaccedilatildeo fixa e que satildeo essenciais uma vez que natildeo se pode viver sem uma habitaccedilatildeo (um

abrigo de qualquer espeacutecie) que ocupa um espaccedilo na cidade (HARVEY 1980 p 157)

Para ele o importante eacute analisar o papel dos agentes do mercado imobiliaacuterio na

determinaccedilatildeo dos valores da terra e para isso destaca os principais grupos que compotildee esse

mercado

1) Moradores cuja situaccedilatildeo familiar ou pessoal (assim como a localizaccedilatildeo da moradia) iraacute determinar o valor de uso da habitaccedilatildeo

o valor de troca apareceraacute em dois momentos na compra e venda da residecircncia e nas reformas e reparos que aumentam esse valor

2) Imobiliaacuterias atores que operam no mercado imobiliaacuterio para obter valor de troca Seu lucro se daacute no processo de compra e venda de habitaccedilotildees e na prestaccedilatildeo de serviccedilos como intermediaacuterias Para as imobiliaacuterias o valor de uso estaacute no volume de transaccedilotildees realizadas das quais obtecircm o valor de troca

3) Proprietaacuterios de terrenos urbanos os proprietaacuterios profissionais ou seja aqueles que adquirem terrenos para vendecirc-los por um preccedilo mais elevado e vecircem na habitaccedilatildeo um meio de troca e natildeo um valor de uso para si mesmo

4) Incorporadoras e a induacutestria da construccedilatildeo atores envolvidos na criaccedilatildeo de novos valores de uso que garantam os subsiacutedios de seus valores de troca Da mesma maneira que as imobiliaacuterias estatildeo interessadas no valor de uso para outrem desde que obtenham valor de troca para si mesma

5) Instituiccedilotildees financeiras estatildeo interessadas em obter valores de troca por meio de financiamentos que promovem a criaccedilatildeo de valores de uso

6) Instituiccedilotildees governamentais interferem no mercado imobiliaacuterio dando apoio agraves instituiccedilotildees financeiras incorporadores e agrave induacutestria da construccedilatildeo garantindo lucros e eliminando alguns riscos Esse suporte

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governamental ao mercado imobiliaacuterio eacute uma das maneiras de assegurar a produccedilatildeo de valores de uso (provisatildeo de moradia para populaccedilatildeo de baixa renda) e valores de troca promovendo melhoria urbana (bens de consumo coletivo) ou implementando leis de zoneamento controle e planejamento do uso do solo urbano (HARVEY 1980 p 139-141)

No processo urbano e da cidade se relacionam diferentes agentes que possuem

estrateacutegias proacuteprias com objetivos e agendas diversas que geram conflitos entre eles e

estrateacutegias comuns que os unem como a apropriaccedilatildeo da renda da terra por meio de praacuteticas

espaciais interligadas nas quais se articulam e se validam arranjos institucionais formas

legais sistemas poliacuteticos e administrativos aleacutem de hierarquias de poder Desse processo

emanam experiecircncias percepccedilotildees leituras simboacutelicas e aspiraccedilotildees

Harvey (1996 p 52) ressalta que o poder de reorganizar a vida urbana estaacute em uma

coalizatildeo de forccedilas na qual o Estado tem apenas o papel de coordenador e de agilizar as

intervenccedilotildees urbanas O poder de organizar o espaccedilo contudo adveacutem do complexo de forccedilas

mobilizadoras por diversos agentes sociais

Na produccedilatildeo do espaccedilo urbano diversos agentes interferem direta ou indiretamente

estabelecendo agraves vezes relaccedilotildees de conflitos de interesses engendrados em torno do espaccedilo

social

local dos valores sociais de uso e do desdobramento de relaccedilotildees sociais no espaccedilo

e

em torno do espaccedilo abstrato

enquanto espaccedilo de desenvolvimento imobiliaacuterio e

administraccedilatildeo governamental por exemplo

que tem acarretado na fragmentaccedilatildeo e na

criaccedilatildeo de guetos hierarquizados representando com sua espacialidade a hierarquia econocircmica

e social

(HARVEY 2005)

A partir da compreensatildeo de que a sociedade eacute produto da inter-relaccedilatildeo entre habitus

e campo Bourdieu (2001) enfatiza que os agentes sociais satildeo dotados de um habitus inscritos

nos corpos pelas experiecircncias passadas

Estes sistemas de esquemas de percepccedilatildeo apreciaccedilatildeo e accedilatildeo permitem operar os atos de conhecimento praacutetico fundados sobre a descoberta e o conhecimento dos estiacutemulos condicionais e convencionais aos quais podem reagir e engendrar sem fins expliacutecitos nem caacutelculo racional de meios de estrateacutegias adaptadas e renovadas continuamente mas de acordo com as exigecircncias estruturais das quais satildeo o produto e que as definem (BOURDIEU 2001 p 166)

De acordo com Bourdieu (1996) os agentes sociais constroem o mundo social e

individual e coletivamente a partir de uma estrutura objetiva de distribuiccedilatildeo de diferentes

tipos de capital (formas de poder) sejam eles fiacutesicos culturais ou simboacutelicos cuja eficiecircncia

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varia de forma contingente e localizada A accedilatildeo dos agentes sobre essas estruturas objetivas

constitui o campo social dentro do qual ocorrem disputas entre os agentes possuidores de

meios e fins diferenciados e um habitus adquirido por sua socializaccedilatildeo preacutevia ou por aquela

praticada dentro do proacuteprio campo

Nessa perspectiva compreende-se que o espaccedilo urbano torna-se um campo de luta

onde se instaura uma luta dos diferentes agentes pelo espaccedilo pelo solo urbano estabelecendo-

se portanto um conflito entre espaccedilo abstrato e o espaccedilo vivido fragmentado pelas

estrateacutegias dos diferentes agentes sociais percebido pelo individuo por meio de sua vida

cotidiana

Cabe inferir que o acesso agrave moradia nas cidades natildeo se daacute de forma igualitaacuteria e pode

ser comparaacutevel a ocupaccedilatildeo sequumlencial de um teatro aonde aqueles que chegam primeiros

adquirem os melhores lugares bem como os que tecircm mais dinheiro Aos pobres cabem os que

sobram

(HARVEY 1980 p 144)

Nesse sentido pode-se afirmar que no processo histoacuterico de ocupaccedilatildeo e uso do

espaccedilo urbano o solo eacute disputado entre os diferentes agentes econocircmicos e classes sociais

pois se considera que a terra na sociedade capitalista atende as demandas tanto de reproduccedilatildeo

do capital como de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e da dimensatildeo simboacutelica uma vez que

essa disputa se daacute por diferentes usos como habitacional cultural religioso comercial e de

serviccedilos industrial etc e mediante diferentes vantagens locacionais e infraestruturais

estabelecendo uma hierarquia de preccedilos que faz do mercado imobiliaacuterio a grande expressatildeo

da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Aleacutem dos espaccedilos existentes esse mercado imobiliaacuterio vai

determinar e criar a futura localizaccedilatildeo da classe trabalhadora

Como observa Santos (1991 p 31)

Eacute assim que se criam nas cidades as infraestruturas a que Manuel Lemes chama de extensores urbanos como a aduccedilatildeo de aacutegua os esgotos a eletricidade o calccedilamento que ao mesmo tempo revalorizam diferencialmente os terrenos impotildeem um crescimento maior agrave superfiacutecie urbana e mediante o papel da especulaccedilatildeo asseguram a permanecircncia de espaccedilos vazios Como estes ficam agrave espera de novas valorizaccedilotildees as extensotildees urbanas reclamadas pela pressatildeo da demanda vatildeo mais uma vez dar-se em aacutereas perifeacutericas O mecanismo de crescimento urbano torna-se assim um alimentador da especulaccedilatildeo a inversatildeo puacuteblica contribuindo para acelerar o processo

Kowarick (1988) ressalta que a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria pode ser demonstrada

tambeacutem quando as aacutereas centrais com zonas estagnadas ou decadentes recebem

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investimentos em serviccedilos ou infraestruturas baacutesicas ou seja uma melhoria urbana de

qualquer tipo repercute imediatamente no preccedilo dos terrenos

Assim a intervenccedilatildeo do poder puacuteblico por meio dos planos de reurbanizaccedilatildeo

contribui para consolidar uma nova configuraccedilatildeo espacial que visa estimular ao mercado

imobiliaacuterio para as camadas de maior poder aquisitivo enquanto os pobres satildeo expulsos para

aacutereas mais distantes A estes na medida em que os espaccedilos urbanos satildeo seletivamente

valorizados com o encarecimento dos alugueacuteis e a remoccedilatildeo ou esgotamento de espaccedilos em

favelas mais proacuteximas das aacutereas centrais resta-lhes outras favelas afastadas ou os loteamentos

perifeacutericos A formaccedilatildeo da periferia pode ser compreendida entatildeo como resultante de []

aglomerados distantes dos centros clandestinos ou natildeo carentes de infraestrutura onde

passa a residir crescente quantidade de matildeo-de-obra necessaacuteria para fazer girar a maquinaria

econocircmica (KOWARICK 1988 p31)

De acordo com Low-Beer (1983 p 33) Marx analisa historicamente a renda

proveniente da terra considerando as relaccedilotildees sociais do homem nos diferentes modos de

produccedilatildeo como no feudalismo a renda eacute obtida pelo proprietaacuterio como pagamento na

forma direta de bens produzidos (diacutezimos) ou horas trabalhadas na terra do senhor [] no

capitalismo a renda da terra eacute parte da mais-valia gerada no processo produtivo

A propriedade privada do solo significa o domiacutenio de uma condiccedilatildeo especifica para a realizaccedilatildeo do processo de produccedilatildeo e circulaccedilatildeo de mercadorias cujo cerne eacute o lucro A aquisiccedilatildeo de terras para gerar renda passa a ser considerada como um investimento e eacute dado agrave terra o status de meio de produccedilatildeo apesar de ser na realidade um fator de produccedilatildeo [] natildeo se trata de qualquer rendimento derivado de terra e sim aquela fraccedilatildeo ou remuneraccedilatildeo da qual se apossa o proprietaacuterio obtida pela cessatildeo deste bem a terceiros para que estes venham extrair algo da terra (LOW-BEER 1983 p 34)

Correcirca (1993 p 84) procura analisar a renda da terra a partir da constituiccedilatildeo da

remuneraccedilatildeo que se obtecircm em razatildeo de

a) propriedade da terra que autoriza o proprietaacuterio extrair uma remuneraccedilatildeo independentemente de qualquer outra coisa

trata-se da renda absoluta b) localizaccedilotildees privilegiadas que incidem na diminuiccedilatildeo dos custos de produccedilatildeo em razatildeo por exemplo da proximidade do porto ou de vias ferroviaacuterios ou de transportes ou no aumento das vendas pela localizaccedilatildeo junto ao centro ou subcentros comerciais intra-urbanos

trata-se da renda diferencial que implica em superlucro c) localizaccedilotildees seletivas por exemplo em aacutereas de amenidades que possuem e conferem status ao seu possuidor

trata-se da renda de monopoacutelio que implica tambeacutem em superlucro

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Sendo assim a produccedilatildeo da habitaccedilatildeo que envolve relaccedilotildees de produccedilatildeo consumo e

troca na qual atuam diferentes agentes pode ser considerada como mercadoria pois a proacutepria

moradia e todos os seus componentes

terra material de construccedilatildeo infraestrutura etc

mesmo tendo um valor de uso possuem um valor de troca e por isso apresentam um

significado ligado agrave loacutegica do mercado aleacutem de ser uma mercadoria que pode ser comprada e

vendida a moradia relaciona-se ao processo de capitalizaccedilatildeo que ela representa uma vez que

o preccedilo da terra eacute influenciado por fatores como

a) Localizaccedilatildeo (acessibilidade acesso a infraestrutura e serviccedilos urbanos)

b) Caracteriacutesticas fiacutesicas do terreno (referem-se agrave dificuldade ou facilidade de se

construir no terreno por fatores topograacuteficos hidroloacutegicos etc)

c) Legislaccedilatildeo existente e seus limites (SMOLKA 1983)

Topalov (1974 p 15-17) analisa o processo de formaccedilatildeo dos preccedilos dos terrenos e

destaca como importante os seguintes conceitos sobre renda fundiaacuteria no meio urbano

a) Renda Absoluta caracteriza-se como determinante dos preccedilos desde que haja

na propriedade privada uma condiccedilatildeo natildeo reproduziacutevel da produccedilatildeo

a terra

agriacutecola a jazida o solo suporte da atividade nas localizaccedilotildees necessaacuterias a

essas Confere ao proprietaacuterio o poder de impedir a sua utilizaccedilatildeo ateacute que as

condiccedilotildees econocircmicas propiciem a sua valorizaccedilatildeo de onde se pode retirar o

excedente

b) Renda Diferencial tem por origem a desigualdade de produtividade do

trabalho nos diversos ramos de produccedilatildeo na qual a desigualdade das

produtividades individuais natildeo provecircm sempre das caracteriacutesticas internas

das empresas em concorrecircncia mas da caracterizaccedilatildeo das condiccedilotildees externas

de suas atividades de acordo com as localizaccedilotildees

c) Renda de Monopoacutelio eacute determinada pelas condiccedilotildees de mercado e estaacute

baseada na natildeo reprodutibilidade de certas mercadorias pelo capital fazendo

sua oferta ser limitada pois natildeo eacute mais determinado pelas condiccedilotildees de

produccedilatildeo de mercadorias mas pelas de sua circulaccedilatildeo isto eacute pela sua

procura A partir de entatildeo fixa-se duravelmente um sobrelucro de monopoacutelio

do qual beneficiam os ofertantes da mercadoria considerada

Destarte pode-se afirmar que a renda diferencial do solo urbano eacute essencialmente

uma renda de localizaccedilatildeo devido agraves condiccedilotildees fiacutesicas do espaccedilo mas tambeacutem devido agraves

condiccedilotildees criadas pelos homens e suas atividades que determinam as relaccedilotildees econocircmicas e

sociais

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Segundo Smolka (1983 p 205) uma das caracteriacutesticas do incorporador imobiliaacuterio

eacute a de promover o empreendimento certo no lugar certo para o consumidor certo ou seja

Estado ao promover melhorias urbanas por meio de infraestrutura construccedilatildeo de

equipamentos de uso coletivo etc atua como gerador de renda diferencial valorizando o solo

urbano e ao mesmo tempo o empreendedor imobiliaacuterio usufruindo-se da situaccedilatildeo constroacutei

moradias neste solo valorizado e as vende por preccedilo elevado

Assim somente as pessoas com maior poder aquisitivo teratildeo acesso a esta habitaccedilatildeo

O acesso agrave terra assume entatildeo um caraacuteter segregativo em funccedilatildeo do poder de renda e as

classes de menor poder aquisitivo excluiacutedas do acesso agrave mercadoria habitaccedilatildeo alteram a

dinacircmica da proacutepria cidade ao produzir novos espaccedilos de moradia na forma de favelas

ocupaccedilotildees coletivas de terrenos vazios etc

Nesse sentido a produccedilatildeo de moradia se daacute em funccedilatildeo de quem pode compraacute-la e

nem sempre em funccedilatildeo de quem precisa dela A localizaccedilatildeo privilegiada isto eacute o acesso faacutecil

agrave infraestrutura e aos serviccedilos urbanos a acessibilidade ao terreno bem como as

caracteriacutesticas de seu entorno iratildeo influenciar sobre o preccedilo da terra uma vez que a produccedilatildeo

do espaccedilo urbano e da moradia natildeo ocorre de maneira uniforme A demanda por terrenos

acontece de acordo com a necessidade da atividade que vai se desenvolver nestes e tem como

um dos determinantes a expansatildeo urbana enquanto fator de valorizaccedilatildeo do preccedilo em funccedilatildeo

de variaacuteveis como a quantidade e a qualidade de serviccedilos e equipamentos urbanos

Todas as atividades capitalistas urbanas se desenvolvem sobre a base de objetos imobiliaacuterios de edifiacutecios produtos do trabalho passado presos a uma localizaccedilatildeo determinada Cada localizaccedilatildeo daacute acesso de uma maneira que eacute especifica a um conjunto de valores de usos complexos nascidos na cidade (TOPALOV 1974 p 22)

Conforme afirmam Ribeiro e Cardoso (1996 p234) a terra teraacute seu preccedilo regulado

pelas condiccedilotildees de competiccedilatildeo entre os vaacuterios capitais e pelas possibilidades de lucratividade

propiciadas pelas diversas localizaccedilotildees no espaccedilo urbano

A localizaccedilatildeo eacute um valor de uso produzido e contecircm a capacidade de aglomerar e de

combinar socialmente meios de produccedilatildeo e meios de reproduccedilatildeo de uma formaccedilatildeo social

Dessa forma eacute possiacutevel dizer que a terra corresponde aos investimentos feitos na ou sobre a

mesma demandando certa parcela de capital e que pode ser considerada enquanto produto do

trabalho humano e natildeo como accedilatildeo da natureza

A diversidade de construccedilotildees habitacionais que vatildeo desde a construccedilatildeo de mansotildees

ateacute as autoconstruccedilotildees e habitaccedilotildees em favelas pode-se a uma produccedilatildeo diferenciada das

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cidades e refere-se agrave capacidade diferente de pagar tanto pela casaterreno quanto pelos

equipamentos e serviccedilos coletivos Portanto os que desfrutam de determinada renda ou

salaacuterio podem morar em aacutereas bem servidas de equipamentos e serviccedilos e aqueles que natildeo

desfrutam moram em locais deteriorados e haacute tambeacutem os que natildeo moram que vivem em

baixo de pontes viadutos em praccedilas pontos de ocircnibus natildeo tecircm um teto fixo

Villaccedila (2001) ao utilizar as anaacutelises de Marx sobre valor de uso e valor de troca

argumenta que o processo de valorizaccedilatildeo da terra urbana leva em consideraccedilatildeo que existe

uma determinada fraccedilatildeo do valor do terreno urbano que natildeo proveacutem de investimentos

puacuteblicos fazendo-se necessaacuterio entender o valor de uso da localizaccedilatildeo que decorre da

aglomeraccedilatildeo humana e sofre variaccedilatildeo nos diversos pontos da cidade Sendo assim eacute possiacutevel

compreender o valor da terra no espaccedilo urbano associado ao conceito de localizaccedilatildeo a terra-

localizaccedilatildeo

da qual a terra urbana eacute a mais oacutebvia manifestaccedilatildeo enquanto produto do trabalho

humano tem tanto valor de uso como valor de troca Seu valor eacute determinado pelo tempo de

trabalho socialmente necessaacuterio para produzi-la (VILLACcedilA 2001 p 10)

Considerando-se a importacircncia da localizaccedilatildeo na garantia de acessibilidade aos

benefiacutecios urbanos o valor de uso de cada terreno eacute diferente em funccedilatildeo de sua localizaccedilatildeo

Logo seus preccedilos que satildeo determinados pelo valor das mercadorias produzidas por seu

intermeacutedio e pela propriedade monopolista da terra aleacutem da oferta de melhores vantagens

locacionais8 de acesso agrave cidade tambeacutem se diferenciam e satildeo alvos de disputa entre os

diversos agentes capitalistas

Dentro desse contexto nota-se que o espaccedilo urbano e a habitaccedilatildeo ganham conotaccedilatildeo

de mercadoria devido agrave sua apropriaccedilatildeo privada e assumem qualidade de troca pela

caracteriacutestica da obtenccedilatildeo de lucro e acumulaccedilatildeo servindo ao interesse do capital agrave medida

que eacute produzido e reproduzido como mercadoria o que leva a modificaccedilatildeo de sua estrutura

criando novas formas e funccedilotildees perdendo seu valor de uso na qual a reproduccedilatildeo da vida

social perde sua razatildeo de ser esfacelando os laccedilos afetivos de vizinhanccedilas e outros

A contradiccedilatildeo entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo e sua apropriaccedilatildeo privada estaacute na base do entendimento do processo de reproduccedilatildeo espacial Isto porque em uma sociedade fundada sobre a troca a apropriaccedilatildeo do espaccedilo ele proacuteprio produzido como mercadoria liga-se cada vez mais agrave forma de mercadoria servindo agraves necessidades de acumulaccedilatildeo por meio das mudanccedilasreadaptaccedilotildees de usos e funccedilotildees dos lugares que tambeacutem se reproduzem sob a lei reprodutiacutevel a partir de estrateacutegias da reproduccedilatildeo em

8 As vantagens locacionais satildeo o complexo de elementos que formam os benefiacutecios urbanos no que diz respeito ao acesso aos locais de trabalho compras lazer aos serviccedilos de infraestrutura como aacutegua energia esgoto pavimentaccedilatildeo coleta de lixo e ainda serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo cultura entre outros

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determinados momentos da histoacuteria do capitalismo Este se estende cada vez mais ao espaccedilo global criando novos setores de atividades produtivas Cada vez mais o espaccedilo produzido como mercadoria entra no circuito da troca atraindo capitais que migram de um setor da economia para outro de modo a viabilizar a reproduccedilatildeo A possibilidade de ocupar o espaccedilo sempre crescente o que explica a emergecircncia de uma loacutegica associada a uma forma de dominaccedilatildeo do espaccedilo que se reproduz ordenando e direcionando a ocupaccedilatildeo fragmentando e tornando os espaccedilos trocaacuteveis a partir de operaccedilotildees que se realizam no mercado Desse modo o espaccedilo eacute produzido e reproduzido como mercadoria reprodutiacutevel (CARLOS 2001 p 15-16)

Conforme enfatiza Carlos (2001 p 18) o processo de transformaccedilatildeo do espaccedilo

urbano natildeo estaacute limitado apenas agrave mercantilizaccedilatildeo desse espaccedilo mas a divisatildeo e organizaccedilatildeo

do trabalho que produz comportamentos e valores que induzem ao consumo exacerbado e

condicionam as diretrizes da vida cotidiana as quais satildeo estabelecidas pelos vaacuterios conflitos

que se intensificam com a imposiccedilatildeo de novos padrotildees culturais em detrimento dos antigos

padrotildees de relacionamento ou seja os antigos laccedilos de sociabilidade vatildeo se desfazendo e as

relaccedilotildees entre as pessoas se tornam cada vez mais distantes sendo substituiacutedas por relaccedilotildees

profissionais e ou institucionais Assim o espaccedilo possiacutevel de ser sentido pensado

apropriado e vivido pelo indiviacuteduo por meio do corpo perde sua essecircncia perde sentido de

lugar e se transforma em natildeo-lugar

O espaccedilo torna-se entatildeo dominado subalternizado pela classe dominante pois ao

se apropriar das vantagens e dos recursos do espaccedilo urbano a referida classe utiliza-o de

acordo com os seus interesses levando a cidade a ser pensada e utilizada como espaccedilo de

reproduccedilatildeo do capital aleacutem de implementar a divisatildeo social do espaccedilo urbano

Tomando-se como base novamente as concepccedilotildees teoacutericas de Lojkine (1981) e

Castells (1983) eacute possiacutevel elucidar como se processa a divisatildeo social do espaccedilo urbano Para

Lojkine (1981) a divisatildeo soacutecioespacial se daacute a partir de uma divisatildeo mais geral do territoacuterio

(cidadecampo) sendo que a primeira eacute concebida como a zona de comando econocircmico e

poliacutetico e que exerce o poder enquanto que a segunda pode ser considerada como uma zona

de execuccedilatildeo e de reproduccedilatildeo limitada da forccedila de trabalho

Castells (1983) entende a divisatildeo social do espaccedilo como um processo de luta

concernente ao conjunto da produccedilatildeo social Esta luta natildeo eacute vista em sua especificidade

(singular) mas opotildee os grupos formados pela inserccedilatildeo diferenciada dos indiviacuteduos

(particularidade) nos diversos componentes da estrutura social (totalidade) intensificando a

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

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de lazer e de esporte equipamentos e serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo para as chamadas classes populares (RODRIGUES 1998 p 20)

Historicamente o estudo acerca do papel do Estado capitalista passa pela discussatildeo

apresentada por Engels (1982) o qual argumenta que a cidade de Atenas era a forma mais

pura e mais claacutessica para se compreender o surgimento do Estado afirmando que o mesmo

tem sua gecircnese fundamentalmente dos antagonismos de classe desenvolvidos no interior da

sociedade

O Estado segundo o autor eacute definido como um produto da sociedade Era necessaacuterio

um poder que aparentemente estava acima da sociedade para tentar atenuar as lutas de

classes e principalmente para manter a ordem ou seja quando a sociedade atinge um

determinado grau de desenvolvimento de suas forccedilas produtivas tornam-se inevitaacuteveis as

contradiccedilotildees sociais que contribuem para a divisatildeo da sociedade em classes sociais Satildeo estas

contradiccedilotildees que justificam o surgimento do Estado

Logo como o Estado nasce para amenizar os conflitos de classes acaba tornando-se

a forccedila materializada de poder ou seja o braccedilo direito

da classe economicamente e

politicamente dominante adquirindo novos meios para a repressatildeo e exploraccedilatildeo da classe

oprimida

A concepccedilatildeo materialista de Estado enquanto produto das relaccedilotildees concretas

estabelecidas entre os homens rompe com o paradigma formal abstrato cuja concepccedilatildeo o

coloca como se fosse algo constituiacutedo independente da vontade dos homens e desvinculado

das lutas sociais travadas ao longo da histoacuteria Ao contraacuterio o Estado eacute produto das relaccedilotildees

sociais objetivas

Marx (1983) considera o Estado como elemento necessaacuterio agrave acumulaccedilatildeo de capital e

percebe a justa relaccedilatildeo existente entre a dimensatildeo econocircmica e a dimensatildeo poliacutetico-

ideoloacutegica considerando-o como instrumento de dominaccedilatildeo

A classe que possui o domiacutenio material possui tambeacutem o domiacutenio espiritual ou seja o controle ideoloacutegico poliacutetico-juriacutedico sobre as demais classes subjugadas a ela A classe dominante por esta forma determina todo o conteuacutedo de uma eacutepoca histoacuterica Mas para garantir sua dominaccedilatildeo natildeo a faz diretamente mas atraveacutes de um poder coercitivo o qual desempenha o papel de reproduzir a dominaccedilatildeo da classe hegemocircnica e garantir a sua manutenccedilatildeo Este poder se materializa naquilo que se conhece como Estado (MARX ENGELS 1995 p56-57)

50

Para Poulantzas (apud LOJKINE 1981) o Estado natildeo estaacute uacutenica e exclusivamente a

serviccedilo da classe dominante poreacutem este eacute a condensaccedilatildeo material e especiacutefica de uma relaccedilatildeo

entre forccedilas de classe e fraccedilotildees de classe

A autonomia do Estado no regime capitalista eacute a forma da dominaccedilatildeo de classe o Estado capitalista comporta inscreve em suas proacuteprias estruturas um jogo que permite dentro dos limites do sistema certa garantia dos interesses econocircmicos de algumas classes dominadas Isso faz parte de sua funccedilatildeo na medida em que essa garantia eacute conforme agrave dominaccedilatildeo hegemocircnica das classes dominantes Eacute essa autonomia do poder poliacutetico institucionalizado que permite agraves vezes atingir o poder econocircmico das classes dominantes sem jamais ameaccedilar-lhes o poder poliacutetico Pode-se perguntar se o que fica claro de um lado ( como o Estado pode ser ao mesmo tempo Estado povo-naccedilatildeo assegurando a coesatildeo do conjunto da formaccedilatildeo social e Estado que organiza a predominacircncia de uma classe ) natildeo faz ainda aumentar a dificuldade e a confusatildeo quando se tenta aplicar essa proposiccedilatildeo teoacuterica agrave relaccedilatildeo Estado-classes sociais Surgem a nosso ver duas dificuldades principais Por natildeo ter sido especificado e sobretudo por natildeo ter sido de fato distinguido de uma total independecircncia entre dois sistemas fechados o princiacutepio de autonomia que fundamenta a anaacutelise de Estado proposta por Poulantzas - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo Estado-classes dominantes a natildeo ser atraveacutes da noccedilatildeo de bloco no poder noccedilatildeo que implica um certo equiliacutebrio estaacutetico entre vaacuterias classes dominantes (mesmo se uma delas a fraccedilatildeo hegemocircnica representa todas as classes dominantes) - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo entre Estado e luta de classes a natildeo ser como dominaccedilatildeo intangiacutevel atraveacutes de variaccedilotildees secundaacuterias de uma classe hegemocircnica sobre classes dominadas (POULANTZAS apud LOJKINE 1981 p 80)

As anaacutelises de Poulantzas tambeacutem satildeo reforccediladas por Souza (2002 p 27-28) ao

enfatizar que

O Estado eacute atravessado por diversos interesses eacute como se houvesse diversos vetores de forccedila (para fazer uma analogia com algo que se aprende nas

aulas de Fiacutesica) onde o vetor resultante seraacute o produto da interaccedilatildeo de forccedilas distintas agraves vezes antagocircnicas O resultado final em mateacuteria de perfil de governo (e o mesmo se aplica agraves casas legislativas) tende a ser conservador mas natildeo precisa necessariamente ser sempre assim Eacute por esta razatildeo que uma sociedade capitalista marcada por conflitos contradiccedilotildees e desigualdades tende a promover accedilotildees de planejamento estatal que normalmente facilitam a manutenccedilatildeo das desigualdades sociais (por exemplo a segregaccedilatildeo residencial as diferenccedilas de infraestrutura entre bairros pobres e bairros ricos etc) Mas eacute por isso tambeacutem que mesmo no que se refere ao planejamento estatal natildeo pode dizer que ele esteja condenado a ser sempre algo com um conteuacutedo antipopular Tudo dependeraacute da correlaccedilatildeo de forccedilas que se estabelecer na sociedade a qual acabaraacute determinando o perfil da accedilatildeo do aparelho de Estado

51

A correlaccedilatildeo de forccedilas estabelecidas na sociedade acaba por assim se dizer

determinando as accedilotildees do Estado Um exemplo das novas formas de atuaccedilatildeo desse agente

modelador do espaccedilo urbano estaacute na forma de incorporar novos instrumentos estrateacutegicos

utilizados na execuccedilatildeo do planejamento de uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano com a inclusatildeo de

uma parcela maior da populaccedilatildeo na decisatildeo do planejamento da cidade e os temas prioritaacuterios

de investimentos como os orccedilamentos participativos (conforme seraacute apresentado no capitulo

III desse trabalho)

A anaacutelise de Poulantzas eacute corroborada por Correcirca (1993 p 26) ao afirmar que accedilatildeo

do Estado eacute marcada pelos conflitos de interesses dos diversos integrantes da sociedade de

classes bem como das alianccedilas entre eles No entanto suas accedilotildees tendem a privilegiar os

interesses daquele segmento ou segmentos da classe dominante que a cada momento estatildeo

no poder

Eacute importante ressaltar que a atuaccedilatildeo do Estado se processa em trecircs esferas a federal

a estadual e a municipal sendo esta uacuteltima de suma importacircncia para anaacutelise do objeto de

estudo desse trabalho pois esta esfera eacute que detecircm o poder sobre o uso do solo e que

determina onde pode

e o que pode

ser construiacutedo em uma determinada aacuterea

Eacute no niacutevel municipal no entanto que estes interesses se tornam mais evidentes e o discurso menos eficaz Afinal a legislaccedilatildeo garante agrave municipalidade muitos poderes sobre o espaccedilo urbano poderes que advecircm ao que parece de uma longa tradiccedilatildeo reforccedilada pelo fato de que numa economia cada vez mais monopolista os setores fundiaacuterio e imobiliaacuterio menos concentrados constituem-se em feacutertil campo de atuaccedilatildeo para as elites locais (CORREcircA 1993 p 26)

O poder municipal apresenta simultaneamente duas caracteriacutesticas ambiacuteguas na

garantia do uso e apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano a saber ao mesmo tempo em que atende agraves

necessidades sociais proporcionando meios de acessos aos equipamentos de consumo

coletivo infraestrutura e serviccedilos propicia a atividade econocircmica dinamizada pelo setor

imobiliaacuterio que tem como principal objetivo a lucratividade

Portanto na sociedade de classes observam-se diferenccedilas sociais no que diz respeito

ao acesso de bens e serviccedilos produzidos socialmente pois as intervenccedilotildees estatais longe de

suprimir as contradiccedilotildees de classes satildeo consideradas paliativas uma vez que natildeo conseguem

abranger a demanda da maioria da populaccedilatildeo no que tange agraves obras de habitaccedilatildeo saneamento

e serviccedilos

52

Nesse sentido na conjuntura atual a crise habitacional eacute marcada pelas contradiccedilotildees

de classes que podem ser evidenciadas pelas peacutessimas condiccedilotildees de habitaccedilatildeo ineficiecircncia ou

escassez de poliacuteticas puacuteblicas que contemplem as reais necessidades dos segmentos excluiacutedos

voltadas agrave habitaccedilatildeo intensificaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio especulaccedilotildees expulsatildeo das terras

ocupadas entre outros Assim o espaccedilo urbano longe de se tornar o locus da reproduccedilatildeo da

vida torna-se distante dos reais interesses da populaccedilatildeo intensificando a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Essa crise habitacional estaacute presente quando se considera a capacidade de pagar dos

compradores pela casaterreno De acordo com Engels (1988 p 125) quando analisa a crise

de moradia na Alemanha em 1872

Uma sociedade natildeo pode existir sem crise habitacional quando a maioria dos trabalhadores soacute tem seu salaacuterio ou seja o indispensaacutevel para sua sobrevivecircncia e reproduccedilatildeo quando melhorias mecacircnicas deixam sem trabalho massas operaacuterias quando crises industriais determinam de um lado a existecircncia de um forte exerciacutecio de desempregados e de outro jogam repetidamente na rua grande massa de trabalhadores quando os proletaacuterios se amontoam nas ruas das grandes cidades quando o ritmo da urbanizaccedilatildeo eacute tanto que o ritmo das construccedilotildees de habitaccedilatildeo natildeo a acompanha quando enfim o proprietaacuterio de uma casa na sua qualidade de capitalista tem o direito de retirar de sua casa os alugueacuteis mais elevados Em tal sociedade a crise habitacional natildeo eacute um acaso eacute uma instituiccedilatildeo necessaacuteria

Assim sendo para Castells (1983 p 185) a crise da moradia trata-se de uma

defasagem necessaacuteria socialmente definida da habitaccedilatildeo e a produccedilatildeo de moradia e

equipamentos residenciais Diante do exposto ressalta-se que esta crise vincula-se agrave loacutegica

do capital imobiliaacuterio pois a crise leva agrave procura contribuindo para a elevaccedilatildeo dos preccedilos

dos imoacuteveis promovendo a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Um exemplo dessa situaccedilatildeo eacute o grande nuacutemero de anuacutencios em jornais de casas

terrenos apartamentos ou seja imoacuteveis em geral para vender ou alugar ofertados pelo capital

imobiliaacuterio que eacute destinado a pessoas que possuem determinada renda para compraacute-los ou

alugaacute-los A dificuldade de morar adequadamente natildeo eacute vivenciada pelos grandes empresaacuterios

ou executivos pois eles podem pagar por essa mercadoria que se tornou tatildeo escassa e cara

Segundo Rodrigues (2001) a crise habitacional se agudiza por trecircs fatores pelo

processo de empobrecimento da classe trabalhadora pela vinculaccedilatildeo da poliacutetica urbana agraves

exigecircncias dos mecanismos financeiros internacionais e pela apropriaccedilatildeo elevada da renda da

terra dos lucros e dos juros na produccedilatildeo das cidades

53

Ao analisar a crise financeira do capitalismo Harvey (2009 p 271) esclarece que ao

longo dos uacuteltimos 30 anos houve muitas crises financeiras e que muitas delas tiveram origem

na urbanizaccedilatildeo mais precisamente na propriedade urbana Destacando a recente crise nos

Estados Unidos diz que foi mais uma crise urbana na qual a classe capitalista para fazerem

mais dinheiro comprou ativos financeiros o que elevou os preccedilos da propriedade imobiliaacuteria

Isso natildeo torna uma cidade melhor torna-a antes mais cara Aleacutem disso para construir

condomiacutenios de luxo e casas exclusivas os capitalistas tecircm de empurrar os pobres para fora

de suas terras

tecircm de tirar o nosso direito agrave cidade

Sendo assim observa-se que o baixo investimento em poliacuteticas puacuteblicas direcionadas

agrave habitaccedilatildeo somado agrave especulaccedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios provoca o processo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial obrigando o Estado a adotar certas medidas de intervenccedilatildeo puacuteblica

objetivando mediar os conflitos sociais e se manter no poder

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

As cidades satildeo historicamente construiacutedas pela accedilatildeo de diversos agentes que

produzem e consomem equipamentos serviccedilos e trabalho sendo que o acesso a esses bens e

serviccedilos produzidos coletivamente natildeo se daacute de forma coletiva Assim sendo o

desenvolvimento capitalista traz em seu bojo um cenaacuterio urbano caracterizado pela

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

A cidade enquanto reflexo da sociedade capitalista apresenta-se tal qual estaacute

estruturado essa formaccedilatildeo econocircmica e social Tomando-se como exemplo a questatildeo

habitacional pode-se afirmar que o espaccedilo da sociedade capitalista eacute fortemente dividido em

aacutereas segregadas o que demonstra a existecircncia de aacutereas nobres destinadas agraves classes mais

abastadas economicamente Estas aacutereas satildeo urbanizadas e equipadas com serviccedilos coletivos

Assim o constante processo de elevaccedilatildeo dos custos de uso do solo urbano impede o acesso do

cidadatildeo mais pobre

Em contrapartida as classes de baixo poder aquisitivo passam a morar em aacutereas

localizadas proacuteximas ao nuacutecleo central poreacutem deterioradas ou inadequadas agrave urbanizaccedilatildeo tais

como morros de difiacutecil acesso e margens inundaacuteveis de riachos ou coacuterregos Essas

populaccedilotildees caracterizam-se por possuiacuterem insuficientes condiccedilotildees de habitaccedilatildeo e uma enorme

carecircncia de serviccedilos urbanos predominando assim a ausecircncia de poliacuteticas puacuteblicas que

garantam a essas aacutereas formas de habitabilidade adequada

54

Dessa maneira a segregaccedilatildeo soacutecioespacial demonstra que o sistema capitalista lanccedila

seus tentaacuteculos de exploraccedilatildeo para aleacutem da esfera de produccedilatildeo marcando tambeacutem

presenccedila nos locais de reproduccedilatildeo da classe trabalhadora

Portanto o urbano constitui ao mesmo tempo espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e

tambeacutem espaccedilo de reproduccedilatildeo das classes sociais A luta contra a exploraccedilatildeo travada no

acircmbito da faacutebrica estende-se para os locais de moradia e consumo coletivo da classe

trabalhadora exigindo um processo de resistecircncia ao sistema de dominaccedilatildeo

Kowarick (1980 p 59) referiu-se ao processo de exploraccedilatildeo capitalista dizendo que

A espoliaccedilatildeo urbana eacute o somatoacuterio de extorsotildees que se opera atraveacutes da inexistecircncia ou precariedade de serviccedilos de consumo coletivo que se apresentam como necessaacuterios em relaccedilatildeo aos niacuteveis de subsistecircncia e que agudizam ainda mais a dilapidaccedilatildeo que se realiza no acircmbito das relaccedilotildees de trabalho

Sendo assim a questatildeo urbana e no seu interior a questatildeo habitacional eacute um dos

grandes desafios posto ao Estado uma vez que a questatildeo da moradia voltada para os

segmentos de baixo poder aquisitivo integra as accedilotildees governamentais em seus diversos niacuteveis

de atuaccedilatildeo com diferentes graus de intensidade e amplitude

Com o advento da Revoluccedilatildeo Industrial pode-se observar praacuteticas relativas ao

saneamento nas cidades Entretanto eram intervenccedilotildees pontuais como construccedilatildeo de

aquedutos galerias de esgoto etc que atendiam parcialmente as necessidades imediatas da

populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo ou eram destinadas aos segmentos privilegiados no

intuito de proporcionar uma melhor condiccedilatildeo de vida Estas intervenccedilotildees natildeo se constituiacuteram

em um planejamento mais amplo das cidades pois estavam associados a uma preocupaccedilatildeo de

organizaccedilatildeo fiacutesica das construccedilotildees urbanas

A intensificaccedilatildeo do processo de industrializaccedilatildeo provocou o enchimento das

cidades a aglomeraccedilatildeo de gente de cheiros feacutetidos de detritos animais a falta de

infraestrutura a maacute circulaccedilatildeo do ar Estes problemas sociais colocaram a tona a necessidade

de uma intervenccedilatildeo estatal mais efetiva nas cidades

De modo geral as peacutessimas condiccedilotildees de higiene fizeram o Estado pensar e executar

as accedilotildees voltadas agrave busca de soluccedilotildees concretas de higienizaccedilatildeo da sociedade O que fez

surgir a legislaccedilatildeo sanitaacuteria considerada a precursora da moderna legislaccedilatildeo urbaniacutestica

demonstrando a necessidade de se criar instrumentos de controle adequados agrave realidade

urbana e seus conflitos o que vai acarretar posteriormente nas discussotildees sobre o

planejamento urbano

55

No caso brasileiro as intensas transformaccedilotildees na estrutura soacutecio-econocircmica

resultaram em expressivo crescimento urbano ao longo do seacuteculo XX redesenhando a

ocupaccedilatildeo no territoacuterio nacional e no contexto intra-urbano das cidades

Nos anos 1930 com o iniacutecio da industrializaccedilatildeo as empresas investiram em

construccedilatildeo de moradias para seus operaacuterios (vilas operaacuterias) situadas proacutexima agraves faacutebricas

cujas residecircncias eram alugadas ou vendidas aos operaacuterios

No entanto com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo verifica-se o agravamento da

questatildeo habitacional uma vez que cresce rapidamente o nuacutemero de trabalhadores e aumenta a

pressatildeo sobre a oferta de habitaccedilatildeo popular Terrenos destinados anteriormente agraves vilas

operaacuterias comeccedilam a valorizar e com a aceleraccedilatildeo do fluxo migratoacuterio aumenta o excedente

da forccedila de trabalho nas cidades Nesse sentido as empresas transferem a responsabilidade

para o Estado dos custos relacionados agrave habitaccedilatildeo transporte e serviccedilos de infraestrutura

urbana Desse momento em diante as vilas operaacuterias tendem a desaparecer e a questatildeo da

moradia passa a ser resolvida pelas relaccedilotildees econocircmicas do mercado imobiliaacuterio (RIBEIRO

1996)

Destarte a raacutepida concentraccedilatildeo de produccedilatildeo e de populaccedilatildeo nas aacutereas urbanas dos

paiacuteses em desenvolvimento (como o Brasil) tem gerado grandes problemas dentre os quais

podem ser citados dispersatildeohiperconcentraccedilatildeo deacuteficit habitacional crescimento perifeacuterico

alto custo dos equipamentos urbanos etc

As demandas dos agentes representantes dos interesses capitalistas (capital

imobiliaacuterio proprietaacuterios fundiaacuterios e proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo) satildeo tratadas com

prioridade pelo poder puacuteblico em detrimento das necessidades das camadas populares

(CORREcircA 1993 p 32)

Na construccedilatildeo da configuraccedilatildeo espacial os diversos agentes sociais mantecircm relaccedilotildees

que podem ser definidas como relaccedilotildees de poder que se reproduzem por meio das aspiraccedilotildees

e necessidades de uma sociedade de classes e que faz da sociedade urbana um campo de lutas

onde os interesses se resolvem pelo jogo econocircmico e poliacutetico das forccedilas sociais

(GOOTTDIENER 1993)

Nesse sentido os interesses e objetivos da sociedade eacute que definiratildeo tanto os

processos quanto as formas que materializam uma relaccedilatildeo sociedade-espaccedilo O Estado

emerge como principal agente social no sentido de intervir e direcionar os possiacuteveis

interesses objetivos conflitos e contradiccedilotildees derivados dessa relaccedilatildeo Uma das formas com

que o Estado interveacutem sobre o espaccedilo nacional eacute instituindo poliacuteticas puacuteblicas sobretudo as

territoriais No entanto estas poliacuteticas se vinculavam ao papel do Estado enquanto planejador

56

Este enfatizava o recorte regional levando a efeito planos programas e projetos de

desenvolvimento

Assim o espaccedilo modificado natildeo eacute resultado natural de evoluccedilatildeo sociocultural da

humanidade eacute na verdade um produto intencional e natildeo-intencional de uma ordem

estabelecida Por isso partindo da compreensatildeo de que ao ser apropriado pelo homem o

espaccedilo eacute territorializado por este por meio de suas accedilotildees transformando-o a fim de melhor

adequaacute-lo agraves suas necessidades Este espaccedilo passa a ter tambeacutem valor de troca aleacutem do valor

de uso

Nesse sentido constitui-se em territoacuterio no qual o sistema capitalista pressupotildee

divisotildees do trabalho superpostas

e que pode ser analisado a partir de seus usos do seu

movimento conjunto e de suas partes reconhecendo as respectivas complementaridades

(SANTOS 2002 p 14) o que remete agrave questatildeo da divisatildeo territorial do trabalho levando a

perceber o territoacuterio natildeo como um mero palco no qual as coisas acontecem mas sobretudo

interagindo como agente ativo na sociedade

Partindo desse pressuposto verifica-se que a concentraccedilatildeo tanto populacional quanto

de atividades produtivas nas aacutereas centrais natildeo eacute realizada de forma aleatoacuteria mas como parte

de um processo analiacutetico construiacutedo pelos agentes produtores do espaccedilo urbano a partir das

necessidades mutaacuteveis da reproduccedilatildeo econocircmica e social

As aacutereas urbanas de todo mundo satildeo consideradas locais privilegiados para geraccedilatildeo de emprego para a inovaccedilatildeo e para ampliar as oportunidades econocircmicas Os centros urbanos revelam enorme agilidade na construccedilatildeo de uma rede de relaccedilotildees no plano da economia da poliacutetica da cultura conectando zonas rurais pequenas meacutedias e grandes cidades No marco destas transformaccedilotildees uma parcela significativa da populaccedilatildeo mundial passou a ter acesso a um niacutevel de consumo e de riqueza sem precedentes (FERREIRA 1997 p 64)

Sendo assim o planejamento urbano torna-se um fator crucial em termos sociais

fiacutesicos econocircmicos e poliacuteticos Estes aspectos podem ser analisados concomitantemente

quando se anseia urbanizar uma aacuterea Entretanto o que ocorre normalmente eacute um tratamento

secundaacuterio em relaccedilatildeo ao aspecto social quando natildeo este eacute visto como consequumlecircncia dos

demais principalmente do econocircmico

Para Maricato (1996) o Estado brasileiro investiu de forma desigual e diferenciada

em equipamentos coletivos necessaacuterios agrave reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho

privilegiando nos seus investimentos a acumulaccedilatildeo e gerando a exclusatildeo de amplas parcelas

da sociedade do mercado de bens de consumo individual e de bens e serviccedilos de consumo

57

coletivo (creches escolas transporte sauacutede saneamento) e as necessidades suscitadas pelo

modo de vida urbana no tempo da informaacutetica e das telecomunicaccedilotildees ampliam e

aprofundam as desigualdades sociais originadas no processo de acumulaccedilatildeo e reforccediladas pela

poliacutetica urbana

A poliacutetica urbana eacute posta em segundo plano face ao ideaacuterio da homogeneizaccedilatildeo

modernizante na qual Estado afasta-se de sua funccedilatildeo claacutessica de provedor de serviccedilos baacutesicos

coletivos deixando a atuaccedilatildeo para as forccedilas de mercado como solucionadoras da crise urbana

Contudo esse afastamento gera um deacuteficit urbano tendo em vista que a natildeo intervenccedilatildeo

estatal provoca a precariedade das condiccedilotildees de trabalho e de vida urbana

A intervenccedilatildeo estatal no urbano eacute a forma mais elaborada mais desenvolvida da

resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas produtivas (LOJKINE 1981 p

168) As poliacuteticas urbanas implementadas pelo Estado capitalista representam contra-

tendecircncias que visam regular e atenuar os efeitos negativos

no niacutevel do funcionamento

global das formaccedilotildees sociais

da segregaccedilatildeo e da mutilaccedilatildeo capitalista dos equipamentos

urbanos constituindo um produto das contradiccedilotildees urbanas resultantes das relaccedilotildees entre

classes sociais antagocircnicas que se manifestam nos modos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Ao longo do seacuteculo XX o planejamento urbano teve sempre uma conotaccedilatildeo de

ordem racionalidade e eficiecircncia Com a industrializaccedilatildeo e a crescente urbanizaccedilatildeo o Estado

passaria a intervir na cidade com o propoacutesito de organizar o territoacuterio a fim de garantir o

processo econocircmico e ampliar as condiccedilotildees de aglomeraccedilatildeo Tendo por base um

planejamento racional da distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo e de suas atividades a intervenccedilatildeo puacuteblica

se daria por meio de investimentos em infraestrutura e da regulaccedilatildeo da produccedilatildeo privada do

ambiente construiacutedo (CARDOSO 2003 p 7)

Para Oliveira (1982 p 41) a industrializaccedilatildeo vai impor um padratildeo de urbanizaccedilatildeo

aparentemente superior ao ritmo da industrializaccedilatildeo Com uma economia fundada na

agricultura de exportaccedilatildeo e com um mercado interno pouco significativo a industrializaccedilatildeo

restringida implicaria em um papel diferenciado do Estado que segundo Cardoso (2003) ao

priorizar o desenvolvimento econocircmico deixaria de estabelecer miacutenimos sociais universais O

que viria ocasionar em relaccedilatildeo ao urbano a disputa de investimentos em infraestrutura entre

grupos sociais e a dificuldade da legislaccedilatildeo urbaniacutestica impor seus padrotildees de forma

universal

Para entender o processo de urbanizaccedilatildeo faz-se necessaacuterio esclarecer alguns

aspectos estruturais de sua organizaccedilatildeo com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo a partir de

58

1930 e a organizaccedilatildeo das cidades e das classes sociais surgidas com o modo de produccedilatildeo

capitalista

O processo de reforma urbaniacutestica no Brasil se inicia nos primoacuterdios do seacuteculo XX

as intervenccedilotildees urbaniacutesticas deste periacuteodo foram baseadas em modelos europeus do

Urbanismo Modernista os quais prezavam pelo embelezamento das avenidas centrais

colocaccedilatildeo de praccedilas parques e a higienizaccedilatildeo com a construccedilatildeo de instrumentos de

saneamento

De base conservadora e positivista as reformas urbaniacutesticas importadas da Europa

representam de forma bastante arbitraacuteria um modelo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de

favelizaccedilatildeo que perdura de maneira anaacuteloga ateacute os dias atuais Todas estas intervenccedilotildees

tinham por resguardo a idealizaccedilatildeo de uma cidade ideal mas de acordo com o interesse da

classe dominante De modo que as questotildees sociais eram totalmente ignoradas ao mesmo

tempo em que parte da sociedade era negligenciada

Com as fortes mudanccedilas no processo de ocupaccedilatildeo e produccedilatildeo do solo urbano

decorrentes da industrializaccedilatildeo que se iniciava no Brasil a partir da deacutecada de 1930 o

planejamento se adapta as novas necessidades do espaccedilo urbano

Na deacutecada de 1930 o Paiacutes ainda possuiacutea uma economia agroexportadora e era

fortemente marcada pelo modelo de substituiccedilatildeo de importaccedilotildees valorizando a induacutestria

nacional e promovendo paralelamente o ecircxodo de numerosos contingentes humanos

provenientes das aacutereas rurais em direccedilatildeo agraves cidades em busca de melhores condiccedilotildees de vida

e de trabalho

Isto provocou o aumento da taxa de urbanizaccedilatildeo e ainda contribuiu para o

desenvolvimento de um grande exeacutercito industrial de reserva necessaacuterio ao desenvolvimento

da induacutestria formado pela populaccedilatildeo que procurava nos centros urbano-industriais novas

perspectivas para suas vidas

Dentre as proposiccedilotildees centrais da estrateacutegia de desenvolvimento nacional se

destacam a intervenccedilatildeo do Estado na provisatildeo de infraestrutura o protecionismo de

determinados ramos industriais e a supervalorizaccedilatildeo das taxas de cacircmbio visando beneficiar

as importaccedilotildees de insumos

Neste sentido a economia industrial que se constituiu no Brasil baseou-se numa

forma de intervenccedilatildeo puacuteblica destinada a propiciar uma accedilatildeo relativamente integrada do

capital estatal associado a capitais privados

ora nacionais ora estrangeiros Do ponto de vista

econocircmico ocorriam periodicamente dois movimentos alternados ora de crescimento

econocircmico ora crise e de endividamento (interno e externo)

59

O Estado assume com mais vigor intervenccedilotildees no mercado de trabalho e na

provisatildeo de infraestrutura e serviccedilos puacuteblicos numa atuaccedilatildeo que lhe conferiu matizes de

Estado do Bem-Estar Desde cedo se caracterizou pelo apoio ao ideaacuterio desenvolvimentista

tendo na induacutestria sua locomotiva e no Estado o seu planejador e impulsor (FIORI 1992 p

06) Visando assegurar o processo interno de acumulaccedilatildeo e produccedilatildeo capitalista pautou sua

atuaccedilatildeo na implementaccedilatildeo de poliacuteticas econocircmicas como instrumento de promoccedilatildeo desse

desenvolvimento As elites nacionais assumiram o projeto desenvolvimentista impulsionado

pela industrializaccedilatildeo

O modelo baacutesico de intervenccedilatildeo adotado pelo Estado foi de promotor da economia e regulador Como promotor teve um papel decisivo no financiamento dos grandes blocos de investimento e na produccedilatildeo direta de insumos principalmente por meio da criaccedilatildeo de infraestrutura Como regulador atuou no sentido de centralizar e normatizar as principais aacutereas da atividade produtiva nacional regulamentando os serviccedilos de utilidade puacuteblica criando instacircncias poliacutetico-administrativas de coordenaccedilatildeo e planejamento setorial e elaborando planos de auto-suficiecircncia energeacutetica (LOW-BEER 2002 p 70)

A Grande Depressatildeo Mundial deu margem para que os governos estendessem suas

accedilotildees agrave economia capitalista Essa intervenccedilatildeo governamental difundiu-se nas economias

nacionais em detrimento do mito do mercado isto eacute do mercado como grande regulador da

economia Neste sentido cabia aos governos das naccedilotildees colocarem em praacutetica a nova teacutecnica

de planejar O planejamento foi adotado pelos governos de economia capitalista subsidiada

pelas noccedilotildees do keynesianismo que primeiramente orientaram o governo de Rossevelt nos

Estados Unidos As ideacuteias keynesianas foram difundidas para outras naccedilotildees como foacutermula de

atingir o desenvolvimento econocircmico e social (RODRIGUES 1998)

Segundo Fiori (1992) depois que o pensamento liberalconservador foi deposto pelo

keynesianismo e pelo avanccedilo dos social-democratas novos caminhos se abriram para a

presenccedila do Estado ativo e interventor cuja marca principal era o pleno emprego o controle

da economia e o Estado de Bem-Estar Social Este funcionou por cerca de 30 anos pois na

deacutecada de 1970 o mesmo se demonstrava incapaz de responder aos novos desafios colocados

para a sociedade novas tecnologias e financcedilas desaceleraccedilatildeo do crescimento econocircmico e

crises fiscais

Enquanto na Europa se tinha o Estado Keynesiano na Ameacuterica Latina introduziu-se

com o pensamento da CEPAL um Estado desenvolvimentista que pregava a superaccedilatildeo da

crise por meio da industrializaccedilatildeo conduzida pelo Estado Entre as suas estrateacutegias estavam o

60

controle do cacircmbio para promover uma industrializaccedilatildeo pautada na substituiccedilatildeo de

importaccedilotildees a produccedilatildeo de insumos e de infraestruturas de transporte e comunicaccedilatildeo o

financiamento de atividades privadas nacionais e a articulaccedilatildeo entre os capitais privados

nacionais e internacionais

Sendo assim o Estado Nacional assumiu a responsabilidade de formar dentro do

sistema capitalista existente natildeo soacute uma rede de oacutergatildeos com o objetivo de acelerar o

desenvolvimento econocircmico brasileiro mas inclusive tentando transformar-se num Estado

empresaacuterio inovador e em menor intensidade banqueiro Isto natildeo significa que o Estado

tenha em si substituiacutedo o empresaacuterio nem que a classe empresarial tenha sido passiva mas

que sua atuaccedilatildeo ao criar instituiccedilotildees e tomar a si a responsabilidade crescente pelas decisotildees

econocircmicas foi fundamental para a mudanccedila de rumo que a economia brasileira conheceu a

partir de 1930 (FONSECA 2003)

O governo de Vargas percebendo a necessidade de transformaccedilatildeo nas accedilotildees estatais

adotou uma funccedilatildeo coordenadora como fica claro na passagem abaixo

Na eacutepoca em que os fins sociais satildeo preponderantemente econocircmicos em que se organiza de maneira cientiacutefica a produccedilatildeo e o pragmatismo industrial eacute elevado a limites extremos assinala-se a funccedilatildeo do Estado antes e acima de tudo como elemento coordenador desses muacuteltiplos esforccedilos devendo sofrer por isso modificaccedilotildees decisivas (VARGAS apud LOW-BEER 2002 p 73)

A partir daquele momento o governo de Vargas passou a investir na modernizaccedilatildeo

da economia brasileira via revisatildeo das legislaccedilotildees que regiam tanto as relaccedilotildees sociais como

as econocircmicas e na criaccedilatildeo de novos oacutergatildeos que tinham por objetivo planejar e concretizar as

poliacuteticas puacuteblicas de planejamento da produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo

Dessa forma criaram-se as instituiccedilotildees que tinham como objetivo o desenvolvimento

econocircmico do Brasil de tal forma que dado o impulso inicial o proacuteprio funcionamento

destas instituiccedilotildees contribuiria para construccedilatildeo de um processo contiacutenuo de desenvolvimento

separando a figura pessoal de Vargas bem como de seu governo do processo nacional

desenvolvimentista

Segundo Teixeira (1998) o iniacutecio do planejamento governamental estaacute associado ao

governo de Vargas quando se registraram os primeiros esforccedilos de racionalizaccedilatildeo da

distribuiccedilatildeo de recursos e de centralizaccedilatildeo do comando da poliacutetica econocircmica brasileira A

partir da Segunda Guerra Mundial a ideologia e teacutecnica do planejamento tornaram-se

fundamentais agraves naccedilotildees capitalistas nos momentos em que tiveram de planejar seu

61

desenvolvimento As ideacuteias de planejamento foram aplicadas agrave Ameacuterica Latina e a outros

paiacuteses em desenvolvimento Num primeiro instante a ideacuteia de planejamento apresentava-se no

Brasil carregada de um cunho nacionalista que caracterizava o governo de Getuacutelio Vargas

entre 19301945 Nesta ocasiatildeo para operacionalizaacute-lo houve uma seacuterie de transformaccedilotildees a

niacutevel institucional

Datam dessa eacutepoca vaacuterios empreendimentos estatais como a Companhia Vale do

Rio Doce (CVRD) fundada em 1942 (resposta nacionalista aos interesses estrangeiros na

exploraccedilatildeo de mineacuterio) a Companhia Nacional de Aacutelcalis criada em 1943 para evitar a

paralisaccedilatildeo das induacutestrias que utilizavam carbonato de soacutedio no caso de escassez do produto

(BAER 1995) Tambeacutem se expandiu o setor de navegaccedilatildeo e em 1943 foi criada a Faacutebrica

Nacional de Motores que acabou fabricando de tratores a geladeiras passando por motores e

carros tendo sido vendida a um grupo privado estrangeiro em 1968

Silva (1989) ressalta que ateacute a deacutecada de 1940 as intervenccedilotildees do Estado em relaccedilatildeo

agrave questatildeo urbana eram mais de cunho sanitarista para o controle de focos de doenccedilas Todas

as medidas do Estado levado pelo interesse econocircmico e poliacutetico e pelo desenvolvimento da

induacutestria soacute contribuiacuteram para a segregaccedilatildeo soacutecioespacial da cidade

A partir da segunda metade do seacuteculo XX com a industrializaccedilatildeo e maior entrada do

capital estrangeiro no Paiacutes por meio das multinacionais surge uma nova oportunidade para os

empresaacuterios os quais viam na classe meacutedia um novo mercado a ser explorado

A consolidaccedilatildeo do Estado desenvolvimentista e regulador durante as deacutecadas de

1950 e 1960 deu-se com a integraccedilatildeo das ideacuteias de progresso e bem-estar social agraves bases

ideoloacutegicas para a implementaccedilatildeo de um grande projeto de industrializaccedilatildeo (SANTOS 1996)

tomando o planejamento estatal realizado por uma elite tecnocraacutetica como instrumento de

orientaccedilatildeo e de definiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas nacionais bem como a capacidade do Estado

de impor de cima para baixo seus planos programas e projetos ao conjunto da sociedade

O desenvolvimento era pensado em termos nacionais podendo ser conduzido

preferencialmente pelos governos centrais Desenvolvimento era acima de tudo expandir a

produccedilatildeo interna e a oferta de bens e serviccedilos padronizados para o mercado domeacutestico

esperando que os efeitos multiplicadores dos investimentos sobre a geraccedilatildeo de renda e

emprego produzissem os resultados desejados em termos de equumlidade Esse era o modelo

hegemocircnico de industrializaccedilatildeo dos paiacuteses retardataacuterios respaldado pelas experiecircncias da

Franccedila Alemanha Japatildeo e Uniatildeo Sovieacutetica dentre outras (FIORI 1992)

Os frutos desse modelo no entanto variaram de um Paiacutes para o outro como resultado

de suas caracteriacutesticas proacuteprias No caso brasileiro a industrializaccedilatildeo em marcha forccedilada

62

especialmente a partir do Governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) contribui para

acentuar desigualdades intra e inter-regionais na alocaccedilatildeo de recursos bem como no perfil de

distribuiccedilatildeo de renda entre os diferentes segmentos sociais Aliado a isso a raacutepida

urbanizaccedilatildeo concentrou pessoas e mazelas sociais nas cidades incrementando a demanda por

habitaccedilatildeo transportes saneamento e outros bens coletivos

Naquela eacutepoca os investimentos do Estado direcionavam-se para a criaccedilatildeo de

infraestrutura para esse novo empresariado e aleacutem disso diminuiu-se ainda mais os gastos

com a classe de menor poder aquisitivo Aumenta-se tambeacutem a exploraccedilatildeo da forccedila de

trabalho e intensifica-se a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria como forma de acumulaccedilatildeo de capital o

que agrava o problema urbano para a classe trabalhadora pois o acesso ao solo urbano

infraestruturado eacute condiccedilatildeo primordial para o acesso agrave vida digna

Na deacutecada de 1950 e os anos de 1960 o Paiacutes passa por um periacuteodo caracterizado pela

aceleraccedilatildeo do processo de urbanizaccedilatildeo As cidades principalmente as maiores

completamente despreparadas tornam-se o destino de grandes fluxos migratoacuterios originados

no campo ou nas pequenas cidades Aleacutem disso as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas na induacutestria

automobiliacutestica e na construccedilatildeo civil aumentam a eficiecircncia da produccedilatildeo ampliando o

nuacutemero de carros nas ruas e possibilitando a verticalizaccedilatildeo nas cidades (ROLNIK 2002 p

217)

A partir de 1955 durante a gestatildeo do Presidente Kubitschek comeccedilaram a ser

fundadas as bases do modelo econocircmico que foi seguido durante as duas deacutecadas seguintes

Foram criadas empresas estatais em setores baacutesicos como accedilo petroacuteleo energia eleacutetrica e

transportes aleacutem de instituiccedilotildees bancaacuterias como o Banco do Estado de Satildeo Paulo o reforccedilo

do Banco do Brasil e a instituiccedilatildeo de agecircncias de fomento ao desenvolvimento como o Banco

do Nordeste do Brasil (BNB)

criado em 1953 principal agente financeiro da

Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)

Vale observar que foi naquele periacuteodo que se iniciou a preocupaccedilatildeo com a questatildeo

regional Naquela eacutepoca foram criados o Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia em

1951 e posteriormente a Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

(SPVEA) em 1953 aleacutem da criaccedilatildeo da Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

(PETROBRAacuteS) e das Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA (ELETROBRAacuteS)

Segundo Rodrigues (1998) em 1956 o Governo de Juscelino Kubistschek criou um

Conselho de Desenvolvimento com atribuiccedilotildees de formular planos e programas realizar

pesquisas econocircmicas acompanhar e controlar as medidas adotadas A primeira accedilatildeo do

63

Conselho foi a elaboraccedilatildeo do Programa de Metas cuja implementaccedilatildeo colocou aquele oacutergatildeo

no centro do processo de tomada de decisatildeo de poliacutetica econocircmica

Com o Plano de Metas de JK o planejamento governamental passou a ser visto como

um instrumento importante para o alcance do desenvolvimento econocircmico e para solucionar

os graves problemas provenientes da pobreza Assim o planejamento foi rapidamente

disseminado e adotado de forma sistematizada e intencional recebendo o apoio tanto dos

partidos poliacuteticos de diversos matizes ideoloacutegicos como dos empresaacuterios e militares

(TEIXEIRA 1998)

O Programa de Metas (1957-1960) elaborado durante o Governo Juscelino Kubitschek representou uma transformaccedilatildeo qualitativa nas relaccedilotildees entre Estado e economia Comeccedila a ganhar forccedila a concepccedilatildeo de planejamento enquanto uma teacutecnica neutra capaz de adequar racionalmente os melhores meios aos diversos fins determinados Portanto o conceito de planejamento e desenvolvimento econocircmico passou a se identificar cada vez mais ganhando adesotildees ou mesmo tornando-se consensuais entre os diversos setores da sociedade (SANTOS JUNIOR 1995 p 28)

Rodrigues (1998) afirma que foi no Governo de Juscelino Kubitschek (1955-1960)

que o Estado estreitou os laccedilos da economia no qual todos os esforccedilos e recursos foram

colocados a serviccedilo do processo de industrializaccedilatildeo do Paiacutes A partir daiacute a poliacutetica

governamental tem tratado de orientar-se de acordo com as condicionantes econocircmicas

definindo setores e investimentos necessaacuterios Mesmo no governo de Jacircnio Quadros havia

uma disposiccedilatildeo para continuar apostando na teacutecnica do planejamento Em seu governo foi

criada a Comissatildeo de Planejamento Nacional em 1961 posteriormente transformada em

Ministeacuterio do Planejamento e Coordenaccedilatildeo econocircmica em 1964 no governo militar

Nos anos 1960 de acordo Ribeiro e Cardoso (2003 p 125) o planejamento assume

um [] papel estrateacutegico-desenvolvimentista e os planejadores passam a ser os

racionalizadores da gestatildeo da cidade Tal afirmaccedilatildeo poderia conduzir agrave conclusatildeo de que as

pessoas envolvidas nesse trabalho teriam uma visatildeo limitada da realidade contudo eacute

importante lembrar que a presenccedila do Estado de exceccedilatildeo predomina contribuindo para um

perfil tecnicista apoliacutetico objetivo do planejador urbano

A nacionalidade ainda estaacute em pauta mas muda o discurso Agora a urbanizaccedilatildeo eacute

fator necessaacuterio para a modernizaccedilatildeo sem o qual natildeo se constroacutei a naccedilatildeo Entretanto a

questatildeo urbana eacute vinculada ao desenvolvimento e natildeo ao social A eficiecircncia e a

racionalidade da produccedilatildeo industrial aplicadas agrave cidade atendem agraves ideacuteias defendidas na eacutepoca

(RIBEIRO CARDOSO 2003 p 129)

64

Para Cruz (1994 p 04) eacute somente na segunda metade da deacutecada de 1960 que pela

primeira vez foi reconhecida a necessidade do governo central intervir diretamente nas

cidades apesar de natildeo haver uma proposta estruturada de poliacutetica urbana nacional

Naquele periacuteodo o Estado se vecirc pressionado a atender agraves carecircncias geradas pelo

processo produtivo e a continuar criando condiccedilotildees para a acumulaccedilatildeo capitalista visto que

ambos fatores fazem parte dos investimentos para o processo de desenvolvimento econocircmico

capitalista

Conforme Nunes e Jacobi (1993 p 36) as organizaccedilotildees populares emergiram com a

consolidaccedilatildeo das bases da economia urbano-industrial e do consequumlente desenvolvimento do

capitalista monopolista no Paiacutes uma vez que a partir da deacutecada de 1950 este modelo passou

a exigir a concentraccedilatildeo fiacutesica das unidades produtivas do mercado consumidor da forccedila de

trabalho e dos serviccedilos relacionados com a sua produccedilatildeo e reproduccedilatildeo

O processo de industrializaccedilatildeo implantado no Brasil alterou significativamente o

espaccedilo urbano das cidades Estas passaram a demonstrar uma seacuterie de problemas sociais

decorrentes das contradiccedilotildees deste padratildeo de acumulaccedilatildeo que podem ser explicitadas

principalmente na crescente demanda por serviccedilos coletivos e pelos conflitos entre classes

oriundos do processo de exclusatildeo das camadas mais pobres na garantia dos direitos poliacuteticos

bem como dos direitos sociais

Ribeiro (1992) ressalta que esses conflitos fomentaram a emergecircncia nos centros

urbanos de formas de organizaccedilatildeo popular expressados nos chamados movimentos sociais

que satildeo formas de organizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo inscritas como elos ativos entre os processos de

reproduccedilatildeo social e a esfera poliacutetica em busca de melhores condiccedilotildees de sobrevivecircncia e dos

direitos de cidadania

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1960 os movimentos sociais estavam relacionados com a

tendecircncia revolucionaacuteria do proletariado ou seja dos sindicatos como por exemplo as

Sociedades de Amigos do Bairro (SAB s) em Satildeo Paulo que surgiram para organizar e

estruturar as demandas da sociedade civil por melhorias sociais e urbanas

Desse modo o Estado passou a intervir mais diretamente no espaccedilo urbano pois de

acordo com Gohn (1991) a intervenccedilatildeo estatal no urbano tem a ver com a criaccedilatildeo de

condiccedilotildees gerais para a acumulaccedilatildeo do capital concentrando assim sua accedilatildeo na regulaccedilatildeo

das formas de produccedilatildeo e para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho por meio da poliacutetica social

de benefiacutecios urbanos na qual o Estado procura atenuar a contradiccedilatildeo entre as necessidades

de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e os interesses da acumulaccedilatildeo do capital via distribuiccedilatildeo

via salaacuterios indiretos

65

A partir da deacutecada de 1960 foram implementados vaacuterios planos no intuito de

garantir as condiccedilotildees gerais da produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do capital por meio de um discurso

teacutecnico-administrativo o qual legitimava a dominaccedilatildeo do Estado por meio da suposta

eficiecircncia e eficaacutecia de um modelo de planejamento que atenderia ao interesse geral

Visando obter apoio das classes populares urbanas o populismo desempenhou um duplo papel legitimando as reivindicaccedilotildees urbanas por um lado e assumindo um papel de provedor geral das necessidades por outro [] Foi no periacuteodo janista que o poder puacuteblico deu certa atenccedilatildeo agraves necessidades imediatas da sociedade civil obtendo ao mesmo tempo um certo apoio da mesma que acabou por identificar o Estado como o alvo a ser atingido pela proacutepria pressatildeo popular (NUNES JACOBI 1993 p 37)

Segundo Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

O golpe militar de marccedilo de 1964 foi resultado do profundo descontentamento dos grupos econocircmicos que desejavam manter as estrateacutegias tiacutepicas do modelo baseado na exportaccedilatildeo de produtos manufaturados e na expansatildeo do mercado interno contraacuterio ao fortalecimento do grupo nacionalista que defendia o desenvolvimento baseado na expansatildeo do mercado interno Como consequumlecircncia das divergecircncias instalou-se uma crise econocircmica profunda com reflexos na reduccedilatildeo da capacidade produtiva e no crescimento das reivindicaccedilotildees sociais (LOW-BEER 2002 p 81)

O agravamento da crise poliacutetica dos governos de Jango e Jacircnio e a crise final do

regime populista com o golpe militar em 1964 liquidaram os movimentos poliacuteticos

revolucionaacuterios exterminando eou exilando muito dos seus participantes Mesmo com esta

repressatildeo vaacuterios liacutederes comunitaacuterios se arriscaram atuando na clandestinidade contra a

poliacutetica de repressatildeo vigente atraveacutes das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e agentes

pastorais9 Estes canais aleacutem de valorizarem a participaccedilatildeo popular em organizaccedilotildees com as

discussotildees sobre as condiccedilotildees de vida dos moradores proporcionaram o desenvolvimento de

formas democraacuteticas de participaccedilatildeo de base e a formaccedilatildeo de lideranccedilas

9 A igreja por meio do seu movimento de renovaccedilatildeo a Teologia da Libertaccedilatildeo tornou-se no periacuteodo autoritaacuterio um canal de expressatildeo da luta dos movimentos sociais pelos Direitos Humanos e pelas reivindicaccedilotildees populares ao abrir espaccedilos fiacutesicos e de orientaccedilatildeo espiritual-ideoloacutegica para as massas (GOHN 1991)

66

Segundo Haddad (1996) foi a partir de 1965 que as atividades de planejamento

governamental tornaram-se mais sistecircmicas no Brasil sob diferentes aspectos Em 1965 o

Governo Federal introduziu em sua administraccedilatildeo uma sistemaacutetica de planejamento que

procurou coordenar objetivos de um programa de estabilizaccedilatildeo de curto prazo (Programa de

Accedilatildeo Econocircmica do Governo (PAEG)) com as metas de um plano de meacutedio e de longo prazo

(Plano Decenal de Desenvolvimento) para o Paiacutes como um todo

Desta forma as macro-regiotildees brasileiras particularmente a Norte e a Nordeste

passaram a dispor de uma atuaccedilatildeo efetiva de organismos de planejamento do

desenvolvimento regional (as superintendecircncias) e de instituiccedilotildees de financiamento para

administrar incentivos fiscais e financeiros a partir das diretrizes de um Plano Diretor de

meacutedio prazo Assim alguns governos estaduais avanccedilaram a organizaccedilatildeo de sistemas de

planejamento que de certa forma tentavam reproduzir em escala subnacional o arranjo

institucional do sistema de planejamento do governo federal

Nos casos do Nordeste e do Norte foram criados e preservados alguns programas

especialmente no que se refere aos estiacutemulos fiscais e financeiros e voltados para a

implantaccedilatildeo de infraestrutura econocircmica como as rodovias e a produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de

energia eleacutetrica

Nesse sentido o PAEG (1965-1966) que propugnava o crescimento econocircmico e o

emprego a reduccedilatildeo das taxas de inflaccedilatildeo a correccedilatildeo dos deacuteficits da balanccedila de pagamentos o

aumento das obras puacuteblicas e a instituiccedilatildeo de um programa habitacional foram criadas vaacuterias

instituiccedilotildees como o Banco Central o Conselho Monetaacuterio Nacional o Banco Nacional da

Habitaccedilatildeo (BNH) as Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio e o Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e

Urbanismo (SERFHAU) aleacutem do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)

O BNH adotava uma estrateacutegia de atuar tambeacutem no desenvolvimento urbano

financiando aleacutem da habitaccedilatildeo e saneamento planos de renovaccedilatildeo urbana transportes e

equipamentos comunitaacuterios Para Bierrenbach (1987 p 48) o BNH foi criado com o

objetivo de favorecer as camadas populares e funcionar como um antiacutedoto ao

descontentamento decorrente do fechamento dos canais de participaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica

Entretanto esses objetivos tinham os princiacutepios organizacionais caracteriacutesticos do mercado

capitalista

O Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social (PDDES)

1967 a 1976

continha um capiacutetulo especiacutefico sobre as questotildees urbanas no qual foi estabelecida uma

regionalizaccedilatildeo

as Regiotildees Programa e os Poacutelos de Desenvolvimento Urbano aleacutem de

67

instituir um Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado (SNPLI) a ser conduzido

pelo SERFHAU e pelo IPEA

Com os governos militares a questatildeo urbana foi tratada de forma diferente e houve

bastante investimento para o melhoramento da urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto a

preocupaccedilatildeo natildeo era com a problemaacutetica social causada pela urbanizaccedilatildeo desordenada mas

sim com a legitimaccedilatildeo de uma forma de governo ditatorial e com a organizaccedilatildeo espacial das

cidades para atender agraves exigecircncias crescentes da economia como produccedilatildeo circulaccedilatildeo e

consumo do capitalismo

No Brasil poacutes-1964 a posiccedilatildeo das poliacuteticas urbanas no contexto das prioridades

governamentais caracterizava-se pela implementaccedilatildeo de um novo conceito de eficiecircncia no

qual os interesses econocircmicos prevaleceram sobre os interesses sociais Como reflexo disto

as poliacuteticas governamentais nas aacutereas de bem-estar social tais como sauacutede saneamento

educaccedilatildeo habitaccedilatildeo e outros tiveram pequeno destaque na agenda governamental Deste

modo o perfil de desigualdade social dominante permaneceu o que somado agrave compressatildeo

salarial e ao desemprego configurou um crescente agravamento das condiccedilotildees gerais das

camadas populares (JACOBI 1989)

Em meados da deacutecada de 1970 o mercado interno - cuja expansatildeo foi limitada pelo

modelo concentrador de renda - comeccedilava a mostrar suas limitaccedilotildees (e exaustatildeo) forccedilando a

mudanccedila em direccedilatildeo a uma poliacutetica orientada para a exportaccedilatildeo aliada a uma capitalizaccedilatildeo

baseada no endividamento crescente Tais poliacuteticas se tornaram o exemplo perfeito do binaacuterio

estado intervencionistacrescimento econocircmico O modelo de atuaccedilatildeo estatal - e que residiu

na base do milagre brasileiro - comeccedilou a mostrar sua fragilidade principalmente quando o

envolvimento do Estado na economia tem mais aspectos negativos que positivos (LOW-

BEER 2002)

Nesse momento como reflexo da postura autoritaacuteria instalada visando o controle

dos movimentos sociais e principalmente o fortalecimento das forccedilas produtivas foi preciso

reforccedilar a atuaccedilatildeo poliacutetica com uma atuaccedilatildeo centralizadora e de planejamento do

desenvolvimento baseado num capitalismo moderno Tambeacutem nessa altura passou a

integrar a pauta da atuaccedilatildeo puacuteblica o planejamento do espaccedilo e a formulaccedilatildeo das poliacuteticas de

reordenamento territorial e urbano com a funccedilatildeo de mecanismos indutores do

desenvolvimento

Naquele periacuteodo o planejamento assume uma forma centralizada despolitizada e

ditatorial jaacute que os planos e projetos passam a ser bandeiras de justificativas de accedilotildees do

Estado no entanto foram elaboradas sem a mediaccedilatildeo representativa dos interesses populares

68

e se dirigiam sobretudo as questotildees geneacutericas distanciando-se da problemaacutetica proacutepria de

cada contexto (SOUZA 1990 p 111)

No entanto as condiccedilotildees objetivas de inchaccedilo e periferizaccedilatildeo das cidades e da

pauperizaccedilatildeo de suas camadas populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees

populares formadas com propoacutesitos religiosos tornassem o uacutenico canal de expressatildeo das

reivindicaccedilotildees por melhores condiccedilotildees de vida

Mesmo nessa fase do regime autoritaacuterio o governo se preocupava em passar no seu

discurso uma imagem positiva para a sociedade no tocante a participaccedilatildeo das classes

populares Todavia o conjunto de poliacuteticas implementadas deixa em evidecircncia que a

participaccedilatildeo efetiva natildeo acontecia na realidade Como ressalta Gohn (1985 p 98) o Estado

elabora atraveacutes da poliacutetica denominada planejamento participativo um discurso no qual todas

as diferenccedilas existentes entre os grupos de indiviacuteduos na sociedade satildeo eliminadas

Ao final da deacutecada de 1970 as praacuteticas e as instituiccedilotildees de planejamento eram

instrumentos de legitimaccedilatildeo do regime poliacutetico autoritaacuterio que pretendia encarnar a imagem

de um governo orientado apenas pelos princiacutepios da racionalidade e da competecircncia teacutecnica

Para Correcirca (1989) o planejamento foi apresentado como um processo racional de

tomada de decisotildees para buscar otimizar recursos ou para melhorar a condiccedilatildeo de vida agrave

sociedade indicado tambeacutem como um processo que visa agrave organizaccedilatildeo das estruturas fiacutesicas

do espaccedilo da cidade representadas por usos e ocupaccedilotildees do solo e pelas infraestruturas que

lhe datildeo suporte utilizando para isso vaacuterios instrumentos urbaniacutesticos como por exemplo o

zoneamento

Nesse contexto o planejamento e a gestatildeo das cidades10 se restringiram aos criteacuterios

e procedimentos de administraccedilatildeo atribuindo ao gestor a competecircncia teacutecnica para

solucionar os problemas urbanos mediante agrave utilizaccedilatildeo de instrumentos normativos tais

como coacutedigos de postura de obras de edificaccedilotildees e de uso do solo que contraditoriamente

acirraram as desigualdades soacutecio-espaciais

No Brasil do ponto de vista da poliacutetica urbana o que se observou no planejamento sob o regime autoritaacuterio foi o agravamento dos problemas urbanos gerados pela expansatildeo industrial pelos intensos fluxos migratoacuterios e pelo crescimento populacional superior agrave absorccedilatildeo da matildeo-de-obra nas cidades No projeto desenvolvimentista e modernizador em curso naquele

10 Para Marcelo Souza (2002) a gestatildeo eacute a administraccedilatildeo dos recursos (de todos os tipos) e dos problemas aqui e agora (presente e futuro de curto prazo) o planejamento eacute a preparaccedilatildeo para o futuro (de meacutedio e longo prazo sobretudo) com o objetivo de evitar ou minimizar problemas e melhor explorar potencialidades Mesmo em uma era de imediatismo e de dificuldades de planejamento no setor puacuteblico natildeo eacute sensato abrir matildeo de se pensar tambeacutem o planejamento

69

periacuteodo o planejamento urbano passou a ocupar o papel de racionalizar as administraccedilotildees municipais e de resolver os problemas urbanos entendidos na eacutepoca como decorrentes do desenvolvimento econocircmico (SANTOS JUNIOR 1995 p 30)

Matus (1996) e Teixeira (1998) afirmam que o modelo de planejamento e gestatildeo

adotado na Ameacuterica Latina e em especial no Brasil foi do tipo normativo tradicional Isto

provocou muitas vezes uma ineficaacutecia das poliacuteticas governamentais

O planejamento normativo tradicional tem como princiacutepio fundamental o argumento

de que quem planeja eacute o governo Este ator estaacute fora ou acima da realidade planejada e

portanto natildeo coexiste nessa realidade com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS

1996 p 65) Eacute um instrumento eminentemente teacutecnico que desconsidera a presenccedila de outros

atores interessados no processo de definiccedilatildeo do planejamento puacuteblico tais como associaccedilotildees

sindicatos empresas etc

Nesse sentido ocorre uma centralizaccedilatildeo de poder de decisatildeo de forma autoritaacuteria e

burocraacutetica nas matildeos dos governantes pois se avalia que tudo que for definido e

implementado pelo Estado seraacute aceito por esses atores sem qualquer tipo de questionamento

O uacutenico aspecto que eacute considerado basicamente eacute o econocircmico cujo comportamento eacute

totalmente previsiacutevel

O planejador tradicional dominado pelo economicismo assume que accedilatildeo eacute sinocircnimo de comportamento no estilo da teoria econocircmica eacute a base da teoria do planejamento Essa eacute uma deformaccedilatildeo economicista proveniente do modo especial e artificial como estaacute construiacuteda a teoria econocircmica Esta eacute via de regra uma teoria do comportamento econocircmico segundo a hipoacutetese de que o mundo eacute regido por leis sociais de alcance similar ao das leis naturais Consequumlentemente o economista tende a raciocinar sobre uma base de comportamentos estaacuteveis que obedecem a leis Para ele natildeo existem processos criativos No entanto a teoria moderna do planejamento refere-se a um tipo especial de accedilatildeo humana ou accedilatildeo social Trata-se da accedilatildeo intencional e reflexiva por meio da qual o autor da accedilatildeo espera alcanccedilar conscientemente determinados resultados E o fundamento dessa accedilatildeo eacute um juiacutezo complexo que foge agraves prediccedilotildees [] tem uma interpretaccedilatildeo situacional e a intenccedilatildeo do autor As accedilotildees ultrapassam os limites daquilo que eles afirmam fazer (MATUS 1996 p 157)

Este tipo de paradigma de planejamento urbano teve (e ainda tem) papel relevante

pois foi um instrumento que fez parte das accedilotildees do aparelho estatal o qual buscava nos

diagnoacutesticos a realidade em que se desejava intervir a fim de transformaacute-la em uma realidade

futura desejaacutevel segundo os padrotildees e normas dominantes

70

Todavia a implementaccedilatildeo desse tipo de planejamento tornou-se problemaacutetica pois

natildeo haacute uma preocupaccedilatildeo em saber qual a representaccedilatildeo que a sociedade civil a ser atingida

pelo planejamento tem de sua condiccedilatildeo de vida mas sim o que dela pensam os planejadores

A sociedade geralmente eacute afastada desse processo muitas vezes natildeo eacute sequer escutada quanto

mais convidada a participar na escolha de alternativas ou de tomada de decisatildeo Ainda assim

delineia-se e potildee-se em praacutetica planos de intervenccedilatildeo da realidade Para contornar resistecircncias

satildeo implementados esquemas de manipulaccedilatildeo onde as vantagens e benefiacutecios dos planos

programas e projetos sociais satildeo alardeados tentando transformar os objetivos do

planejamento em aspiraccedilotildees das camadas populares e a adoccedilatildeo de esquemas de repressatildeo ou

a combinaccedilatildeo de ambos (CORREcircA 1989)

Bandeira (1999) ressalta que a falta de participaccedilatildeo da sociedade civil eacute uma das

principais causas do fracasso de poliacuteticas programas e projetos de diferentes tipos A ausecircncia

de uma interaccedilatildeo entre os segmentos da sociedade tende a fazer com que muitas das accedilotildees

puacuteblicas sejam mal planejadas tornando-se incapazes de alcanccedilar totalmente os objetivos

propostos Aleacutem disso quando tratada apenas como objeto e natildeo como um dos sujeitos do

processo de gestatildeo e implementaccedilatildeo dessas accedilotildees a sociedade tende a natildeo se identificar com

elas

Como consequumlecircncia dessa falta de envolvimento da comunidade muitos programas e projetos governamentais concebidos e implantados de cima para baixo natildeo sobrevivem agraves administraccedilotildees responsaacuteveis pelo seu lanccedilamento Acabam por ser substituiacutedos por outros igualmente efecircmeros num ciclo pateacutetico que envolve grande desperdiacutecio de recursos e soacute contribui para aumentar o desperdiacutecio em relaccedilatildeo agrave eficaacutecia das accedilotildees do setor puacuteblico (BANDEIRA 1999 p 12)

Contrapondo-se ao planejamento normativo tradicional o paradigma do

planejamento estrateacutegico situacional eacute lanccedilado como alternativa para se fazer planejamento na

Ameacuterica Latina

No planejamento estrateacutegico situacional o ator que planeja estaacute dentro da realidade

e que aiacute coexiste com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS 1996 p 67) Ou seja

natildeo existe apenas um uacutenico ator mas sim uma multiplicidade de atores (governo partidos

sindicatos movimentos sociais etc) que planejam

Dessa forma Matus (1996) concebe a ideacuteia de planejamento como um jogo de

conflitos e cooperaccedilatildeo onde o Estado natildeo tem assegurado sua capacidade de controlar a

realidade planejada uma vez que depende da accedilatildeo do outro Natildeo existe um diagnoacutestico uacutenico

71

e nem uma verdade objetiva pois como satildeo vaacuterios atores que coexistem na realidade haacute

vaacuterias explicaccedilotildees da realidade

Nesse sentido o conceito de planejamento que guia este trabalho estaacute relacionado a

um processo de permanente reflexatildeo e anaacutelise dos fatores e condicionantes que permitem

alcanccedilar resultados desejados pelos agentes sociais envolvidos de acordo com a concepccedilatildeo de

Bezerra e Arauacutejo (1999 p 8)

O planejamento eacute concebido como um processo ordenado e sistemaacutetico de decisatildeo que antecipa o futuro e define accedilotildees que viabilizam objetivos que se pretendem alcanccedilar incorporando e combinando uma dimensatildeo poliacutetica e uma dimensatildeo teacutecnica resultando num processo essencialmente teacutecnico e poliacutetico Dessa forma o planejamento como parte do processo poliacutetico de tomada de decisotildees sobre o futuro e as accedilotildees constitui-se um espaccedilo privilegiado de negociaccedilatildeo entre os atores sociais confrontando e articulando seus interesses e suas alternativas para a sociedade No decorrer desse processo quando se negociam as escolhas e as prioridades os atores sociais podem se organizar e constituir alianccedilas e acordos poliacuteticos Tal abordagem parte do princiacutepio de que o futuro eacute incerto e resulta da construccedilatildeo social decorrente da accedilatildeo dos atores sociais organizados que implementam medidas e se movem na criaccedilatildeo de novas condiccedilotildees de estruturaccedilatildeo da realidade

Sendo assim a participaccedilatildeo eacute um dos pressupostos fundamentais para a realizaccedilatildeo

dos projetos que atinjam seus objetivos Participaccedilatildeo entendida como acesso efetivo dos

envolvidos ao planejamento das accedilotildees agrave execuccedilatildeo das atividades e ao acompanhamento e

avaliaccedilatildeo das mesmas

Daiacute a importacircncia do planejamento participativo que possa promover a articulaccedilatildeo

entre os agentes sociais fortalecendo a coesatildeo da comunidade e melhorar a qualidade das

decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar os objetivos comuns

O planejamento participativo pode inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia11

que entenda o cidadatildeo como parte ativa da sociedade reconhecendo o direito de exercer a

cidadania em seu caraacuteter integral ou seja o poder de deliberar questotildees que se tornam

fundamentais para influir na transformaccedilatildeo da cidade

Entretanto segundo Teixeira (1998) verifica-se que as accedilotildees de planejamento do

Estado Brasileiro ateacute este momento tecircm se caracterizado de forma hegemocircnica como accedilotildees

de gabinete totalmente desprovidas da participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores populares o

11 O conceito de democracia utilizado neste trabalho estaacute pautado na visatildeo de Demo (1995) que caracteriza a democracia como um sistema poliacutetico no qual o acesso ao poder pretende ser majoritariamente regulado ou administrado natildeo imposto por minorias ou seja organizado em prol das minorias natildeo de oligarquias onde haja uma igualdade de oportunidades para todos os segmentos sociais bem como a universalidade dos direitos sociais a todos os cidadatildeos

72

que demonstra que se tiveram muitos planos e pouco planejamento vaacuterios planos de

desenvolvimento foram divulgados alguns executados e destes poucos lograram ecircxito

Portanto a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade principalmente dos setores

populares fez com que as iniciativas governamentais de planejamento sempre carecessem de

credibilidade e representatividade poliacutetica

No I Plano Nacional de Desenvolvimento do governo Meacutedici (19711974) o

planejamento era compreendido como um instrumento de racionalidade e eficiecircncia Esse

plano foi colocado em praacutetica visando a contornar a problemaacutetica urbana e a expansatildeo dos

grandes centros urbanos No entanto o objetivo imediato do plano era a elevaccedilatildeo da taxa do

PIB numa tentativa de combate a inflaccedilatildeo e dar continuidade agrave implementaccedilatildeo da poliacutetica

desenvolvimentista do Paiacutes (BIERRENBACH 1987)

Concretizou-se o processo de centralizaccedilatildeo poliacutetica e tributaacuteria que tirou dos

municiacutepios a competecircncia de saneamento baacutesico Criou-se assim o Plano Nacional de

Saneamento (PLANASA) que definiu metas setoriais para todo Paiacutes bem como

instrumentos institucionais e financeiros para implantaccedilatildeo de projetos pelas empresas

estaduais de saneamento baacutesico e pelo BNH

Dentro de um contexto contraditoacuterio de crescimento econocircmico definido de

milagre econocircmico e de aumento das tensotildees sociais geradas pela repressatildeo e queda do

padratildeo de vida da sociedade que se implementou no governo Geisel (19751978) o II Plano

Nacional de Desenvolvimento (II PND) Este plano apontou a necessidade das poliacuteticas

sociais terem objetivo proacuteprio e natildeo mais vinculados agrave poliacutetica econocircmica Explicitou-se

que a distribuiccedilatildeo de renda causa a pobreza absoluta haja vista que muitas famiacutelias natildeo

possuem o miacutenimo admissiacutevel quanto agrave alimentaccedilatildeo sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo No

entanto o Estado natildeo estabelece prioridades setoriais de forma clara na conduccedilatildeo das

poliacuteticas sociais (BIERRENBACH 1987)

Dessa maneira as poliacuteticas adotadas concentravam-se nos pesados investimentos

puacuteblicos em infraestrutura baacutesica Os esforccedilos concentraram-se no financiamento da

construccedilatildeo civil principalmente o segmento habitacional O instrumento fundamental foi o

Sistema Financeiro da Habitaccedilatildeo (SFH) formalmente destinado a prover moradia para as

classes populares mas de fato um meio de financiamento para as classes meacutedia e alta Apesar

de natildeo cumprir com sua destinaccedilatildeo social o sistema contribuiu para girar o capital

dinamizando a economia

Souza (1990) destaca que em 1975 se criou o Programa de Centros Urbanos cuja

finalidade era promover a integraccedilatildeo social nas cidades atraveacutes do desenvolvimento de

73

atividades comunitaacuterias Estimulou-se em niacutevel municipal a criaccedilatildeo de projetos locais de

accedilatildeo comunitaacuteria como meio do Estado se fazer presente junto agraves camadas populares

A estrateacutegia geral do governo tinha como objetivo manter elevadas as taxas de

crescimento econocircmico Todavia tornava-se mais difiacutecil conjugar objetivos de crescimento

econocircmico com o controle social de diversos segmentos sociais haja vista que apesar de toda

repressatildeo aos chamados movimentos sociais e populares aos poucos e timidamente se

organizavam e reivindicavam seus direitos garantidos por meio do discurso do proacuteprio poder

do Estado

Em 1976 foi formulada a Poliacutetica Nacional de Desenvolvimento Urbano

compreendendo um conjunto de programas estrateacutegicos o Programa de Regiotildees

Metropolitanas o Programa de Capitais e Cidades de Porte Meacutedio o Programa de Cidades de

Pequeno Porte o Programa de Nuacutecleos Urbanos de Apoio e o Programa de Cidades

Histoacutericas destinados a reforccedilar as regiotildees metropolitanas e a definiccedilatildeo de poacutelos secundaacuterios

de desconcentraccedilatildeo urbana Foram instituiacutedas tambeacutem as primeiras normas de uso e ocupaccedilatildeo

do solo de zoneamento industrial os arcabouccedilos juriacutedicos de normatizaccedilatildeo da propriedade

das edificaccedilotildees e de desapropriaccedilatildeo

Contudo as crises econocircmicas desencadeadas em meados dos anos 1970 e a

insatisfaccedilatildeo da sociedade civil eclodiram no movimento que revelou as diversas contradiccedilotildees

de interesses e a heterogeneidade dos agentes sociais exigindo uma reforma institucional e

constitucional para a restituiccedilatildeo dos direitos e da democracia sugerindo outra forma de

governo diferente daquela conjuntura (SANTOS JUNIOR 1995)

Para Fiori (1992) o esgotamento da estrutura desenvolvimentista veio da combinaccedilatildeo

da desaceleraccedilatildeo da taxa de investimentos unida com hiperinflaccedilatildeo e incapacidade de

endividamento externo o que levou a um estrangulamento fiscal da possibilidade de gasto

puacuteblico e a exaustatildeo do regime autoritaacuterio com dificuldades para implementar um regime

democraacutetico

Assim no final da deacutecada de 1970 o que se percebia no cenaacuterio urbano era uma

profunda crise que provocou a reorganizaccedilatildeo dos movimentos populares como por exemplo

o movimento sindical com as grandes greves dos operaacuterios da induacutestria automobiliacutestica e

metaluacutergica em Satildeo Paulo e os movimentos de bairro que tinham suas reivindicaccedilotildees

baseadas nos problemas oriundos da falta de bens e equipamentos urbanos

Estas organizaccedilotildees populares ultrapassaram o imediato de suas reivindicaccedilotildees

articulando-se com importantes setores da classe operaacuteria e do movimento social em geral

ganhando assim significado social e poliacutetico pois suas formas de organizaccedilatildeo e praacuteticas

74

associativas a natureza dos direitos reivindicatoacuterios e seus mecanismos de mobilizaccedilatildeo

surgiram como caracteriacutesticas dotadas de sentido poliacutetico

Neste contexto emergem os chamados novos movimentos sociais que segundo

Cardoso (1983 p 224) eram apresentados como um traccedilo inovador da participaccedilatildeo popular

pela sua espontaneidade e seu senso de justiccedila que garantem ao mesmo tempo sua

independecircncia das elites e dos partidos poliacuteticos e a justeza de suas demandas decididas entre

iguais

Para Gohn (1985) o novo nos movimentos populares estava na sua forma de

articularem as demandas e na expressividade que estas passam a ter no cotidiano da vida O

novo estava tambeacutem na sintonia entre as carecircncias e o apelo agrave participaccedilatildeo que as

demandavam

Nessa perspectiva a transformaccedilatildeo de necessidades e carecircncias em direitos que se

opera dentro dos movimentos sociais pode ser vista como um amplo processo de revisatildeo e

redefiniccedilatildeo do espaccedilo de cidadania (SCHERER-WARREN 1993 p 54) Eacute por meio desse

processo que eles passaram a negar o modelo poliacutetico existente bem como as formas de

planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas apontando novos caminhos para as relaccedilotildees

societaacuterias ou seja para uma nova cultura poliacutetica no Paiacutes

Eacute nesse sentido que se entende o surgimento dos movimentos populares como

sujeitos na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e de uma transformaccedilatildeo sentida como necessaacuteria

Haddad (1996) argumenta que a partir do iniacutecio dos anos 1980 constatou-se que os

diferentes sistemas de planejamento passaram por um processo de desmonte institucional por

causa de fatores circunstanciais e doutrinaacuterios Os fatores circunstanciais estatildeo relacionados agrave

falecircncia financeira do estado brasileiro e os fatores doutrinaacuterios ao avanccedilo da ideologia

neoliberal no continente Latino-Americano

A crise fiscal e financeira do Estado brasileiro afetou os emergentes sistemas de

planejamento (nacional estadual e municipal) por diferentes motivos a reduccedilatildeo na

disponibilidade global de recursos financeiros para promover programas e projetos a perda na

capacidade de captaccedilatildeo de financiamentos externos para esses programas e projetos as

dificuldades para definir contrapartidas financeiras para o aporte dos empreacutestimos junto agraves

instituiccedilotildees multilaterais de fomento (BID Banco Mundial etc)

Nesse contexto os projetos econocircmicos e sociais de meacutedio e longo prazo satildeo

substituiacutedos pelas preocupaccedilotildees de curto prazo de ajustamento da economia e da sociedade

aos movimentos da conjuntura do equiliacutebrio das contas puacuteblicas dos compromissos de

75

pagamento da diacutevida externa num primeiro momento e da diacutevida externa e interna num

segundo momento

Com o atual modelo capitalista de globalizaccedilatildeo da economia e ideaacuterio neoliberal

regendo a poliacutetica governamental a questatildeo urbana vem se agravando drasticamente e com

ela a questatildeo habitacional principalmente aquela referenciada aos extratos mais

empobrecidos

O periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo do Estado brasileiro caracterizou-se pela

instabilidade poliacutetica pois pairavam sobre as instituiccedilotildees as influecircncias deixadas pelo

arbitraacuterio regime militar Esse periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo tornou-se histoacuterico sobretudo

para a participaccedilatildeo popular pois com as campanhas das diretas jaacute vaacuterias manifestaccedilotildees

populares se fizeram presentes nas principais capitais do Paiacutes atingindo seu aacutepice na

promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 que restabeleceu os direitos poliacuteticos e civis

garantindo o associativismo e a restituiccedilatildeo da autonomia dos Estados e Municiacutepios

Esse processo de abertura poliacutetica trouxe consigo transformaccedilotildees importantes na

conduta dos movimentos populares que passam a atuar mais diretamente na sociedade civil

com o objetivo de pressionar o poder puacuteblico para a abertura de canais que possibilitem uma

maior participaccedilatildeo nas decisotildees Como consequumlecircncia esses movimentos conseguiram obter

resultados no atendimento de suas reivindicaccedilotildees e ampliaram sua influecircncia poliacutetica e social

junto agraves populaccedilotildees que representam legitimando assim a accedilatildeo das lideranccedilas comunitaacuterias

Neste contexto o Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU) se

desenvolveu como instrumento de participaccedilatildeo poliacutetica e veiacuteculo de pressatildeo das classes

populares contra sua exclusatildeo das poliacuteticas puacuteblicas e objeto de articulaccedilatildeo das entidades da

sociedade civil tendo a funccedilatildeo social da cidade e a gestatildeo democraacutetica como prioridade

prevalecendo o direito agrave cidade

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

A redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade Civil no Brasil no final dos

anos 1970 implicou na construccedilatildeo com muitos entraves de uma esfera societaacuteria autocircnoma

Os agentes sociais que emergiram na sociedade civil agrave revelia do Estado criaram novos

espaccedilos e formas de participaccedilatildeo e relacionamento com o poder puacuteblico Estes espaccedilos foram

construiacutedos tanto pelos movimentos populares como pelas diversas instituiccedilotildees da sociedade

76

civil que articularam demandas e alianccedilas de resistecircncia popular e lutas pela conquista de

direitos civis e sociais

Os movimentos sociais natildeo soacute tiveram papel relevante no estabelecimento de estruturas democraacuteticas fundamentais propiacutecias agrave participaccedilatildeo popular mas tambeacutem exerceram um impacto substancial sobre as formaccedilotildees normativas do eleitorado e portanto sobre a arena poliacutetica formal Ao gerarem novos elementos de conhecimento e de cultura muitos movimentos imprimiram sua marca e orientaram sua accedilatildeo pela defesa de praacuteticas pautadas pela sua autonomia pela necessidade de tornar visiacutevel a sua capacidade de auto-organizar-se e de desenvolver a democracia direta transformando as carecircncias do seu entorno de moradia em praacuteticas reivindicatoacuterias (JACOBI 1990 p 125)

De acordo com Gohn (2000 p 310) nos anos 1980 a temaacutetica da participaccedilatildeo

popular era um ponto de pauta na agenda poliacutetica das elites ocasionando em dois fenocircmenos

de um lado a crise de governabilidade das estruturas de poder do Estado desgastadas e

deslegitimadas pelo autoritarismo de outro a legitimidade das demandas expressas pelos

movimentos sociais

novos ou velhos

e a conquista de espaccedilos institucionais

Nos anos 1990 a agenda poliacutetica das elites se modifica em funccedilatildeo de problemas

internos e das alteraccedilotildees que a globalizaccedilatildeo e as novas poliacuteticas sociais internacionais

passaram a impor ao mundo capitalista

Com a globalizaccedilatildeo a internacionalizaccedilatildeo da economia a reestruturaccedilatildeo produtiva a

revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e a hegemonia do setor financeiro ocorreram grandes mudanccedilas na

esfera econocircmica e no acircmbito poliacutetico-institucional das cidades mundiais O poder municipal

passou a incorporar novas funccedilotildees como a provisatildeo de habitaccedilatildeo e infraestrutura antes

atribuiacutedas ao Estado Naccedilatildeo

De acordo com Low-Beer (2002) hoje nos primeiros anos do seacuteculo XXI observa-

se um desenho totalmente novo das poliacuteticas puacuteblicas e do planejamento governamental fruto

principalmente das transformaccedilotildees poliacuteticas e econocircmicas ocorridas nas uacuteltimas deacutecadas do

seacuteculo passado Com a intenccedilatildeo de subsidiar novas reflexotildees acerca do tema de modo muito

sucinto a autora identifica cinco pontos que caracterizam as novas tendecircncias em curso

1 A dimensatildeo ambiental adquiriu enorme relevacircncia sendo que o conceito e

os criteacuterios de desenvolvimento sustentaacutevel passaram a ser considerados

condiccedilatildeo sine qua non para o desenvolvimento econocircmico e social

incluindo temas como a preservaccedilatildeo dos recursos naturais dentre os quais

se destaca a aacutegua como bem essencial agrave vida

77

2 As poliacuteticas de infraestrutura (saneamento energia comunicaccedilotildees etc)

deixaram de ser consideradas estritamente como insumos para o

desenvolvimento industrial-econocircmico e se tornaram fatores essenciais para

a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais

3 O leque de temas incluiacutedos nas poliacuteticas denominadas sociais adquiriu

maior amplitude incorporando aleacutem das tradicionais educaccedilatildeo e sauacutede as

poliacuteticas de geraccedilatildeo de renda e trabalho

4 Observa-se a ampliaccedilatildeo do papel da Sociedade Civil nas poliacuteticas puacuteblicas

com o reforccedilo gradativo da accedilatildeo de indiviacuteduos empresas e organismos natildeo-

governamentais paralelamente ou em conjunto com a accedilatildeo estatal

participando nas decisotildees de investimento na gestatildeo e avaliaccedilatildeo dos

programas sociais

5 O conceito de sustentabilidade vem se impondo tambeacutem no planejamento

urbano substituindo as poliacuteticas setoriais pelo enfoque integrado de

desenvolvimento metropolitano que articula as poliacuteticas habitacionais com

os investimentos em saneamento baacutesico transportes geraccedilatildeo de renda e

trabalho estimulando a melhoria da qualidade de vida nas aacutereas urbanas do

Paiacutes

A competitividade a descentralizaccedilatildeo de recursos e a crise fiscal contribuiacuteram para

que as cidades viessem a adotar um perfil empresarial o que incluiu uma relaccedilatildeo direta com

agecircncias multilaterais de financiamento e com as agendas urbanas internacionais Igualmente

nos discursos e accedilotildees das administraccedilotildees municipais passou a ser comum a colocaccedilatildeo do

desenvolvimento econocircmico como elemento fundamental para o desenvolvimento social

Harvey (1996) nos chama atenccedilatildeo para o fato de que o empreendedorismo eacute

resultante do papel da urbanizaccedilatildeo na dinacircmica social e que eacute de fundamental importacircncia natildeo

perder de vista a conexatildeo desses dois elementos com o desenvolvimento econocircmico visto que

esse nexo possibilita a apreensatildeo das mudanccedilas radicais proporcionadas pela reestruturaccedilatildeo

radical em andamento nas distribuiccedilotildees geograacuteficas da atividade humana e na dinacircmica

poliacutetico-econocircmica do desenvolvimento geograacutefico desigual dos tempos mais recentes

(HARVEY 1996 p 86) Satildeo portanto elementos essenciais sem os quais natildeo se tem a

compreensatildeo real de como a dinacircmica poliacutetico-econocircmica interferem nos rumos e decisotildees

governamentais nas cidades

78

O empreendedorismo eacute sustentado pela relaccedilatildeo puacuteblico-privada e a parceria se realiza com o intuito de integrar interesses e atrair recursos para tornar a cidade mais atrativa e competitiva entre elas Com essa simbiose entre o puacuteblico e o privado as antigas reivindicaccedilotildees de acircmbito local acabam sendo associadas agraves necessidades de atraccedilatildeo de capital para o interior das cidades empreendedoras Assim a parceria torna-se uma accedilatildeo de natureza empresarial e o centro da gestatildeo torna-se muito mais voltada para a economia local desviando-se dos interesses do territoacuterio e os investimentos satildeo convergidos para poliacuteticas e obras pontuais deixando para um segundo plano os problemas da cidade de um modo geral (HARVEY 1996 p 87)

O contexto de um mundo globalizado bem como de avanccedilos do estado neoliberal

sugerem uma reflexatildeo sobre os instrumentos do planejamento e da gestatildeo localizados no

acircmbito do municiacutepio visto que ao questionar os governos tradicionais e o modelo de

planejamento tradicional os adeptos do neoliberalismo conduziram uma reflexatildeo voltada ao

papel que os governos locais podem desempenhar no contexto do capitalismo globalizado

(MALATO 2006)

Para Lojkine (1981) um novo padratildeo produtivo tendo por referecircncia a ampliaccedilatildeo

das forccedilas produtivas bem como novos padrotildees de informaccedilatildeo levaram a sociedade

contemporacircnea a engendrar uma complexidade tal que provocou mudanccedilas na forma de

organizaccedilatildeo de empresas e Estado A isto ele chama de revoluccedilatildeo informacional e a discussatildeo

localizada no acircmbito municipal se daacute em funccedilatildeo do papel que as cidades vecircm representando

ou seja como agente poliacutetico e econocircmico nos processos de desenvolvimento e ampliaccedilatildeo do

atual sistema produtivo

Ao discutir sobre a importacircncia do papel da cidade no sistema de produccedilatildeo

capitalista Lefebvre (2001 p 49) argumenta que cabe a cidade um papel histoacuterico por

aglutinar populaccedilatildeo meios de produccedilatildeo o capital as necessidades e os prazeres Logo ela

carece da administraccedilatildeo de poliacutecia e impostos dentre outros bem como pode ser

organizada Todas essas necessidades e outras que vatildeo sendo criadas na dinacircmica da

sociedade advecircm da expansatildeo provocada pela via da urbanizaccedilatildeo que acabou por concentrar

nos espaccedilos urbanos tanto as forccedilas produtivas quanto a forccedilas de trabalho ao mesmo tempo

em que excluiacutea populaccedilotildees inteiras do direito a propriedade e proporcionava a concentraccedilatildeo

de poder poliacutetico e econocircmico em matildeos de pequenos grupos no interior destas cidades

O local ganha uma importacircncia estrateacutegica no novo sistema teacutecnico-econocircmico pois

pode atuar em trecircs acircmbitos principais como na produtividade e competitividade econocircmica

na integraccedilatildeo soacutecio-cultural e na representaccedilatildeo e gestatildeo poliacutetica Para o governo local se

tornar eficiente precisa assumir o papel de promotor do desenvolvimento da cidade junto aos

79

consumidores da cidade de forma a criar condiccedilotildees propiacutecias agrave atuaccedilatildeo dos agentes puacuteblicos

ou privados (via planejamento campanhas poliacuteticas compensaccedilotildees econocircmicas)

Dessa maneira dois modelos diferentes um privilegiando a questatildeo social e o outro

o econocircmico teriam a cidade como objeto por meio de seus planos Entretanto por

circunstacircncias e interesses envolvidos natildeo seria raro que apenas parte do plano fosse

cumprida ou entatildeo que sua implementaccedilatildeo viesse a se realizar somente em parte da cidade

(MARICATO 2000) bem como que atos normativos relacionados ao uso e a ocupaccedilatildeo do

solo desconsiderassem diretrizes de planejamento apresentando elementos casuiacutesticos em

seus objetivos normalmente associados a grupos restritos como no caso do setor imobiliaacuterio

A gestatildeo urbana e os investimentos puacuteblicos tecircm aprofundado a concentraccedilatildeo de renda e a desigualdade A representaccedilatildeo da cidade em que parte toma lugar do todo tem uma funccedilatildeo natildeo apenas de encobrir privileacutegios mas tambeacutem de um papel econocircmico ligado agrave geraccedilatildeo e captaccedilatildeo da renda imobiliaacuteria [] O quadro macroeconocircmico determina a produccedilatildeo e a apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo

tanto pela definiccedilatildeo da capacidade de investimentos dos governos municipais quanto na ligaccedilatildeo da produccedilatildeo imobiliaacuteria agraves regras de rentabilidade do capital financeiro (MARICATO 2000 p 165-170)

Oliveira (2001) ressalta que com o enfraquecimento das poliacuteticas puacuteblicas e a

pressatildeo pelas novas exigecircncias da acumulaccedilatildeo do capital colocando agraves cidades novas

demandas surgiu o planejamento estrateacutegico de cidades com ecircnfase na accedilatildeo [local]

(planejamento

pauta em accedilatildeo) (OLIVEIRA 2001 p 179) Formulado a partir de

referecircncias ligadas agrave gestatildeo empresarial visando agrave adaptaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves

caracteriacutesticas de flexibilidade e dinamismo da economia globalizada este modelo tem sido

consolidado por meio dos planos estrateacutegicos apresentados como instrumentos da

administraccedilatildeo urbana

Natildeo eacute a primeira vez que para efeito de seu planejamento a cidade toma como protoacutetipo a empresa privada de fato todo o urbanismo modernista teve como modelo ideal a faacutebrica taylorista com sua racionalidade funcionalidade regularidade e produtos estandartizados [] Agora poreacutem os planejadores se espelham na empresa enquanto unidade de gestatildeo e negoacutecios [] a cidade eacute instaurada como agente econocircmico que atua no contexto de um mercado no qual encontra a regra e o modelo do planejamento e execuccedilatildeo de suas accedilotildees (VAINER 2000 p 85)

Elegendo a eficaacutecia como elemento legitimador das poliacuteticas puacuteblicas o

planejamento estrateacutegico de cidades visa associar tendecircncias de desenvolvimento econocircmico

80

ao curto prazo e aos conceitos de mercado Embora sua iniciativa esteja relacionada agrave

sociedade civil e aos setores privados o poder puacuteblico tem presenccedila marcante com um papel

significativo nas atuaccedilotildees puacuteblico-privadas projetadas sobre um suposto quadro de

cooperaccedilatildeo da sociedade o qual ao agrupar pares comuns tende a minimizar ou a contornar

divergecircncias (OLIVEIRA 2001 p 43)

Assim sendo a participaccedilatildeo da sociedade ou de parte dela eacute entatildeo apontada como

elemento fundamental para o sucesso do plano contando para isso com o despertar de um

sentimento citadino de pertencimento agrave cidade despolitizado e vinculado agrave valorizaccedilatildeo da

imagem local

A participaccedilatildeo dos agentes econocircmicos e sociais junto ao poder puacuteblico na

elaboraccedilatildeo e definiccedilatildeo de estrateacutegias e accedilotildees representa um diferencial entre a metodologia

catalatilde do Plano Estrateacutegico e a metodologia tradicional americana baseada na identificaccedilatildeo

de forccedilas fraquezas oportunidades e ameaccedilas assim como no processo de estabelecimento de

estrateacutegias frente a essas questotildees segundo objetivos definidos

Combinando crescimento econocircmico

como promotor da integraccedilatildeo social

e desenvolvimento urbano o plano parte de alguns pressupostos baacutesicos como a crenccedila [] no futuro da cidade como centro terciaacuterio qualificado o crescente protagonismo poliacutetico das administraccedilotildees locais a cooperaccedilatildeo puacuteblico-privada no financiamento de grandes intervenccedilotildees urbaniacutesticas e a necessidade de construir ou modificar a imagem da cidade para projetaacute-la no exterior atraveacutes do marketing que enfoque sobretudo um principal produto de venda como por exemplo turismo ou cultura (SILVA 2001 p 80)

O modelo estrateacutegico foi fundamentado na competiccedilatildeo entre cidades seja no contexto

regional nacional ou internacional Seus planos ganharam feitios pragmaacuteticos amarrando

recursos agraves accedilotildees aparentemente mais factiacuteveis (SILVA 2001 p 80) Abrangendo temas de

cunho econocircmico institucional social e fiacutesico-territorial suas propostas tecircm tido forte

ingerecircncia sobre a esfera administrativa projetando-se em parte sob o espaccedilo construiacutedo

Segundo Ribeiro (2003 p 18) a adoccedilatildeo do planejamento estrateacutegico no setor

puacuteblico eacute uma das expressotildees da incorporaccedilatildeo dos criteacuterios de mercado na gestatildeo

governamental Tendo como objetivo o crescimento econocircmico da cidade baseando-se na

atraccedilatildeo de investimentos o planejamento estrateacutegico natildeo tem como finalidade o ordenamento

do territoacuterio ou a implementaccedilatildeo de uma poliacutetica urbana uma vez que a dimensatildeo espacial eacute

apenas um de seus meios e natildeo o seu fim

O planejamento em deacutecadas passadas representava a racionalidade tecnocrata o que

tornava inadequado para sua gestatildeo A constataccedilatildeo do esgotamento e das possibilidades dos

81

instrumentos claacutessicos de gestatildeo urbana exigiu de forma paulatina agrave chamada do Estado para

assumir um papel fundamental na manutenccedilatildeo do equiliacutebrio social Sob este enfoque o

desenvolvimento urbano adquire e se traduz mais como um aspecto setorial do

desenvolvimento econocircmico sob a eacutegide do Estado

Maricato (2000 p 101) enfatiza a importacircncia do planejamento puacuteblico para a

conquista de um futuro melhor para as cidades brasileiras apoiada na crenccedila de que nada

pode substituir o papel do Estado na garantia da equalizaccedilatildeo de oportunidades A natureza e a

localizaccedilatildeo dos investimentos governamentais em primeiro plano e privados em segundo

regula quem e quantos teratildeo direito agrave cidade

Assim o planejamento urbano eacute um instrumento de governabilidade de governance

e da proacutepria gestatildeo do territoacuterio Ele se caracteriza como um processo constituiacutedo de um

conjunto de teacutecnicas de origens interdisciplinares aplicado agrave gestatildeo do planejamento urbano

enquanto atividade de avaliaccedilatildeo propostas e controle territoacuterio das cidades

Governanccedila eacute a capacidade governativa em sentido amplo envolvendo a capacidade de accedilatildeo estatal na implementaccedilatildeo das poliacuteticas e na consecuccedilatildeo das metas coletivas [] Governabilidade entretanto refere-se as condiccedilotildees sistecircmicas mais gerais sob as quais se daacute o exerciacutecio do poder em uma dada sociedade tais como as caracteriacutesticas do regime poliacutetico a forma de governo as relaccedilotildees entre os poderes (DINIZ 1996 p 196)

A participaccedilatildeo popular no planejamento e na gestatildeo (no processo orccedilamentaacuterio na

elaboraccedilatildeo de planos e poliacuteticas puacuteblicas etc) pode ser vista como algo crucialmente

relevante a introduccedilatildeo consistente de elementos de democracia direta aleacutem de serem

importantes em si mesmos certamente contribuiraacute para maior transparecircncia e eventualmente

para menor corrupccedilatildeo menos clientelismo menos desperdiacutecio e reduccedilatildeo dos niacuteveis de

desigualdade soacutecioespacial

Bandeira (1999) ressalta que a participaccedilatildeo pode ser compreendida como um

instrumento importante para promover a articulaccedilatildeo entre os agentes sociais fortalecendo a

coesatildeo da sociedade e para melhorar a qualidade das decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar

os objetivos de interesse comum No entanto as praacuteticas natildeo podem ser encaradas como

procedimentos infaliacuteveis capazes de sempre proporcionar soluccedilotildees adequadas para problemas

de todos os tipos

82

Para Carvalho (2000) participar da gestatildeo democraacutetica da cidade12 significa

participar do governo da sociedade disputar espaccedilo no Estado nos processos de definiccedilatildeo

das poliacuteticas puacuteblicas significa questionar o monopoacutelio do Estado como gestor da coisa

puacuteblica significa construir espaccedilos puacuteblicos natildeo estatais afirmando a importacircncia do controle

social sobre o Estado da gestatildeo participativa da co-gestatildeo dos espaccedilos de interface entre

Estado e sociedade civil

Desse modo Gohn (2000) afirma que os movimentos sociais estatildeo operando na

construccedilatildeo de uma sociedade igualitaacuteria e contra as injusticcedilas sociais tais como as

experiecircncias de planejamento do orccedilamento participativo as parcerias entre organizaccedilotildees

populares ONGs e oacutergatildeos puacuteblicos em programas na aacuterea do chamado Terceiro Setor -

puacuteblico natildeo estatal

A autora considera que a participaccedilatildeo dos movimentos sociais nos espaccedilos

interinstitucionais eacute fundamental porque na correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas existentes eles

expressam interesses de maiorias organizadas que lutam pela democratizaccedilatildeo do acesso aos

bens e serviccedilos puacuteblicos e natildeo pela apropriaccedilatildeo privada de privileacutegios lucros

Nas uacuteltimas deacutecadas vem-se firmando um novo paradigma que destaca a maior

participaccedilatildeo popular13 nos processos decisoacuterios como um novo padratildeo de governabilidade

atraveacutes da expansatildeo da esfera puacuteblica com a formaccedilatildeo de parcerias entre as esferas estatais

privadas e societaacuterias

Na Ameacuterica Latina a luta pela conquista de espaccedilos para aumentar a participaccedilatildeo

popular eacute sem duacutevida um dos aspectos mais desafiadores para a anaacutelise sobre os alcances da

democracia nas relaccedilotildees entre o Estado e os Movimentos Sociais

A anaacutelise dos processos existentes estaacute permeada pelos condicionantes da cultura

poliacutetica tanto do Brasil como dos demais paiacuteses da Ameacuterica Latina marcados por tradiccedilotildees

estadistas centralizadoras patrimonialistas e portanto por padrotildees de relaccedilatildeo clientelistas

meritocraacuteticos e de interesses criados entre Sociedade Civil e Estado Entretanto estes

condicionantes natildeo tecircm sido necessariamente um fator impeditivo para a emergecircncia de uma

12 O conceito de gestatildeo democraacutetica que norteia esse estudo estaacute pautado na compreensatildeo de que a sociedade civil se reconhece como principal agente poliacutetico em um processo contiacutenuo de participaccedilatildeo e decisatildeo sobre os assuntos de interesse puacuteblico Assim a gestatildeo democraacutetica compreende tambeacutem uma gestatildeo participativa sem paternalismo no intuito de deselitizar as poliacuteticas puacuteblicas facilitando o acesso aos bens e serviccedilos destinados normalmente a uma elite uma minoria 13 Neste trabalho a participaccedilatildeo popular eacute entendida como a capacidade de apropriaccedilatildeo pelos cidadatildeos do direito de construccedilatildeo democraacutetica possibilitando desde a abertura de espaccedilos de discussatildeo dentro e fora dos limites da comunidade ateacute a definiccedilatildeo de prioridades elaboraccedilatildeo de estrateacutegias de accedilatildeo e estabelecimento de canais de diaacutelogo com o poder puacuteblico no intuito de garantir a participaccedilatildeo efetiva da sociedade civil na gestatildeo democraacutetica da cidade

83

diversidade de formas de participaccedilatildeo dos setores populares em que com frequumlecircncia muitas

se situam no escopo das praacuteticas no contexto das tradiccedilotildees anteriormente descritas enquanto

outras as contradizem abertamente (JACOBI 1999)

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Outro avanccedilo importante foi a regularizaccedilatildeo do Plano Diretor como um instrumento

baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de planejamento para viabilizar a Reforma Urbana

para as cidades com mais de vinte mil habitantes Entretanto a regulamentaccedilatildeo dos

mecanismos para a ordenaccedilatildeo das cidades natildeo mereceu destaque no texto constitucional

ficando para ser regularizado pelas leis orgacircnicas dos municiacutepios e pelo proacuteprio Plano Diretor

de cada local (DE GRAZIA 1990)

Nessa perspectiva emergiram modelos de planejamento e gestatildeo orientados pelo

ideaacuterio da reforma urbana enquanto reforma institucional e social que se tornou referecircncia ao

alcance da cidadania

Santos Junior (1995) ressalta que o planejamento e a gestatildeo da cidade baseados na

concepccedilatildeo de reforma urbana pressupotildee o exerciacutecio da cidadania apreendidas em dois

significados como direito de acesso aos bens que garantam condiccedilotildees de vida urbana digna

culturalmente dinacircmica e condizente com os valores eacuteticos humanitaacuterios mas tambeacutem como

direito dos cidadatildeos agrave informaccedilatildeo e agrave participaccedilatildeo poliacutetica na conduccedilatildeo dos destinos da

cidade

A mudanccedila nas relaccedilotildees sociais que se instaurou naquela fase teve como um dos

principais fundamentos a reflexatildeo sobre a funccedilatildeo social dentro da perspectiva do processo de

gestatildeo nos projetos de habitaccedilatildeo A redefiniccedilatildeo do papel do Estado que se dispotildee a pactuar

com os diversos agentes sociais contrariando os modelos de planejamento e gestatildeo

tecnocraacuteticos tambeacutem revela uma mudanccedila nas concepccedilotildees de cidade e de urbano

De fato em diversos municiacutepios a intervenccedilatildeo do Estado junto aos movimentos

populares se dirigiu no sentido de criar novas formas de relaccedilatildeo entre o Estado e Sociedade

Civil ao niacutevel da gestatildeo urbana compreendendo as poliacuteticas puacuteblicas como elementos de

construccedilatildeo e instrumentalizaccedilatildeo da cidadania na accedilatildeo concreta dos agentes sociais envolvidos

(JACOBI 1990)

A participaccedilatildeo popular se transforma no referencial de ampliaccedilatildeo das possibilidades

de acesso dos setores populares dentro de uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade

84

civil e de fortalecimento dos mecanismos democraacuteticos mas tambeacutem de garantia da execuccedilatildeo

eficiente de programas de compensaccedilatildeo social no contexto das poliacuteticas de ajuste estrutural e

de liberalizaccedilatildeo da economia e de privatizaccedilatildeo do patrimocircnio do Estado Entretanto o que se

observa eacute que no geral as propostas participativas ainda permanecem mais no plano da

retoacuterica do que na praacutetica

As transformaccedilotildees nas praacuteticas de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas tornam

legiacutetima a participaccedilatildeo popular estando direta ou indiretamente associadas agrave necessidade de

imprimir tambeacutem maior eficiecircncia agrave accedilatildeo governamental

A participaccedilatildeo popular se enquadra no processo de redefiniccedilatildeo entre o puacuteblico e o

privado dentro da perspectiva de redistribuir o poder em favor dos sujeitos sociais que

geralmente natildeo tecircm acesso

De um lado a participaccedilatildeo eacute identificada com os argumentos da democratizaccedilatildeo que

tecircm como referecircncia o fortalecimento dos espaccedilos de socializaccedilatildeo de descentralizaccedilatildeo do

poder e de crescente autonomizaccedilatildeo das decisotildees portanto enfatizando a importacircncia de um

papel mais autocircnomo dos sujeitos sociais O outro enfoque aborda a participaccedilatildeo a partir da

criaccedilatildeo de espaccedilos e formas de articulaccedilatildeo do Estado com os sujeitos sociais configurando

um instrumento de socializaccedilatildeo da poliacutetica reforccedilando o seu papel como meio para realizar

interesses e direitos sociais que demandam uma atuaccedilatildeo puacuteblica (JACOBI 1999)

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

A participaccedilatildeo popular na gestatildeo urbana pressupotildee instrumentos e mecanismos de

controle social podendo ser assegurada agrave participaccedilatildeo de setores e membros representativos

das camadas populares e de seus interesses em todas as instacircncias do poder puacuteblico por meio

de conselhos paritaacuterios reguladores fiscalizadores e deliberativos

Os Conselhos como forma apartidaacuteria de exercer poliacutetica podem ser considerados

como um novo sistema de organizaccedilatildeo social para o exerciacutecio poliacutetico tornando-se mais

um espaccedilo de discussatildeo dos problemas cotidianos de uma comunidade podendo constituir-se

como um avanccedilo para o exerciacutecio da democracia na medida em que essa nova forma de

exercer poliacutetica ameniza a centralizaccedilatildeo do poder poliacutetico nos partidos

85

Nesse sentido Souza (2002 p 333-335) destaca trecircs argumentos relevantes sobre a

importacircncia da participaccedilatildeo na gestatildeo democraacutetica da cidade

1- Uma ampla participaccedilatildeo pode contribuir para minimizar certas fontes de distorccedilatildeo quando os especialistas decidem em nome da maioria natildeo se tem chances de monitorar ou controlar o processo de gestatildeo o que pode acarretar numa probabilidade maior de corrupccedilatildeo ou de erros de avaliaccedilatildeo 2- Ao participar de uma decisatildeo o cidadatildeo se sente muito mais responsaacutevel pelo seu resultado o que eacute importante para o amadurecimento poliacutetico 3- A participaccedilatildeo eacute um direito inalienaacutevel participar no sentido essencial de exercer a autonomia eacute a alma mesma de um planejamento e de uma gestatildeo que vislumbra se uma cidade democraacutetica rompendo com o sistema de dominaccedilatildeo

No bojo dessas discussotildees satildeo poucas as experiecircncias de gestatildeo democraacutetica da

cidade que de fato ampliam o potencial participativo Aqui destacam-se duas experiecircncias

que demonstram os processos de gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas implementadas no Brasil a

primeira experiecircncia (Curitiba) eacute pautada na gestatildeo teacutecnico-pragmaacutetica de matriz neoliberal

e a outra (Porto Alegre) eacute baseada na gestatildeo democraacutetica-participativa

Na cidade de Curitiba o modelo de planejamento e gestatildeo da cidade adotado visou

promover uma modernizaccedilatildeo e o enxugamento do Estado atraveacutes do pragmatismo e

eficiecircncia teacutecnica onde a participaccedilatildeo popular se refere a legitimaccedilatildeo dos projetos jaacute

elaborados pois na visatildeo dos representantes do governo uma participaccedilatildeo mais ampla soacute

levaria a discussotildees interminaacuteveis o que impossibilitaria uma accedilatildeo raacutepida e eficiente do poder

puacuteblico (FREY 1996)

Frey (1996) ressalta que o sistema poliacutetico-institucional vigente em Curitiba era de

uma democracia exclusivamente representativa onde o poder de decisatildeo ficava restrito agrave

deliberaccedilatildeo de um corpo tecnocraacutetico Outro ponto de destaque era uma forte hierarquizaccedilatildeo

administrativa uma tendecircncia ao

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86

Nesse sentido Vainer (2000) destaca que o modelo de planejamento estrateacutegico de

cidades baseado nos conceitos e teacutecnicas do planejamento empresarial estrutura-se

basicamente sobre a articulaccedilatildeo de trecircs analogias constitutivas a) a cidade mercadoria b) a

cidade empresa e c) a cidade paacutetria Assim ver a cidade como empresa significa

essencialmente concebecirc-la e instauraacute-la como agente econocircmico que atua no contexto de um

mercado e que encontra neste mercado a regra e o modelo de planejamento e execuccedilatildeo de

suas accedilotildees (VAINER 2000 p 48)

Dentro desse contexto as cidades satildeo tidas como espaccedilos rivais que aguccedilam uma

competitividade de mercado de investimentos industriais de investimentos comerciais e de

serviccedilos o que possibilita um controle da iniciativa privada em relaccedilatildeo agrave produccedilatildeo dos

espaccedilos puacuteblicos (SANCHEZ 1997)

Em contraposiccedilatildeo a esse modelo surge a gestatildeo democraacutetico-participativa ou gestatildeo

poliacutetico-ideoloacutegica como argumenta Frey (1996) cujo objetivo eacute fomentar a participaccedilatildeo

popular e promover uma reestruturaccedilatildeo nos mecanismos decisoacuterios atraveacutes de uma proposta

de inversatildeo de prioridades de igualdade de oportunidades na proposiccedilatildeo e decisatildeo entre os

agentes sociais de transparecircncia na socializaccedilatildeo das informaccedilotildees bem como de rompimento

com estruturas autoritaacuterias e tecnoburocrata na relaccedilatildeo do governo com a sociedade civil

Em Porto Alegre as experiecircncias reforccedilam uma concepccedilatildeo de democracia que

articula representaccedilatildeo poliacutetica e participaccedilatildeo direta como resposta possiacutevel agrave privatizaccedilatildeo

prevalecente na gestatildeo da coisa puacuteblica O discurso predominante acentua a importacircncia da

convergecircncia de praacuteticas da socializaccedilatildeo da poliacutetica do caraacuteter oscilante da participaccedilatildeo da

importacircncia da institucionalidade da convivecircncia com o sistema representativo existente e da

necessidade de governar para toda a cidade

A anaacutelise do caso de Porto Alegre mostra que o desafio para se garantir a eficaacutecia e

continuidade de poliacuteticas puacuteblicas eacute o reforccedilo dos meios para envolver a sociedade e manter o

seu interesse para dimensionar adequadamente os arranjos institucionais A sua

descontinuidade reforccedila o argumento de que gestatildeo democraacutetica e participaccedilatildeo popular

requerem uma forma combinada de fortalecimento das formas de organizaccedilatildeo da sociedade

civil uma mudanccedila na correlaccedilatildeo de forccedilas uma transformaccedilatildeo qualitativa dos padrotildees de

gestatildeo enfim um processo real de democratizaccedilatildeo do Estado e da sua gestatildeo (JACOBI 1996)

Jacobi (1996) defende que a efetiva participaccedilatildeo da sociedade civil nos processos

decisoacuterios como eacute o caso do Orccedilamento Participativo vem se constituindo como um

mecanismo ampliado de engajamento da sociedade na gestatildeo das poliacuteticas puacuteblicas

requerendo um esforccedilo crescente de institucionalizaccedilatildeo da possibilidade de atendimento das

87

demandas em bases negociadas Trata-se de processar demandas e pressotildees e de implementar

mecanismos formais que contemplem tanto os setores organizados e mobilizados

estimulando sua adequaccedilatildeo agrave institucionalidade a partir do respeito agrave autonomia e agrave auto-

organizaccedilatildeo como de envolvimento dos setores desorganizados

A experiecircncia do Orccedilamento Participativo em Porto Alegre estaacute diretamente

vinculada a capacidade que a administraccedilatildeo local teve de criar canais legiacutetimos de

participaccedilatildeo combinando elementos da democracia representativa e de democracia

participativa

Nesse contexto a participaccedilatildeo popular adquire uma praacutetica de ruptura com o

corporativismo territorialmente determinado com ecircnfase numa loacutegica direcionada por uma

abordagem universal da cidade criando para os setores populares uma opccedilatildeo viaacutevel e

altamente competitiva de participaccedilatildeo poliacutetica alternativa agraves praacuteticas clientelistas (JACOBI

1996)

Isto estaacute sendo estabelecido dentro de uma loacutegica que natildeo estaacute apenas permeada pelo

imediatismo e o utilitarismo mas por uma radicalizaccedilatildeo da democracia que alargando os

direitos de cidadania no plano poliacutetico e social constroacutei efetivamente novas relaccedilotildees entre

governantes e governados Este processo de gestatildeo atraveacutes do ingresso da cidadania

organizada na maacutequina do Estado possibilita conhecer seu funcionamento e seus limites e

estimula a construccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de co-responsabilizaccedilatildeo e de disputa visando produzir

consensos cada vez mais qualificados

Mas apesar da sua repercussatildeo positiva esses processos participativos apresentam

limitaccedilotildees e estas residem nas contradiccedilotildees associadas agraves dificuldades de ampliar a

participaccedilatildeo e agrave dependecircncia em relaccedilatildeo agraves autoridades municipais para estruturar a dinacircmica

de funcionamento

Nesse sentido Souza (2002 p 387-388) observa que existem trecircs obstaacuteculos

vinculados agrave participaccedilatildeo popular

1- problemaacutetica da implementaccedilatildeo refere-se agraves diversas dificuldades que uma administraccedilatildeo progressista tem de enfrentar para implementar suas poliacuteticas tais como boicotes patronais escassez de recursos incompetecircncia gerencial e outras 2- problemaacutetica da cooptaccedilatildeo diz respeito agrave deformaccedilatildeo do esquema participativo atraveacutes da instrumentalizaccedilatildeo da sociedade civil por parte das forccedilas poliacuteticas do Estado 3- problemaacutetica da desigualdade tem a ver com as dificuldades para a participaccedilatildeo voluntaacuteria pois em geral natildeo se dispotildee de muitos recursos para participar como dinheiro para se locomover

88

A realidade brasileira eacute marcada por baixa institucionalizaccedilatildeo na qual a maioria da

sociedade pouco se mobiliza para utilizar os instrumentos da democracia participativa que

visam romper com o autoritarismo social que prevalece Os setores organizados que

interagem e pressionam representam iniciativas fragmentaacuterias que natildeo atingem o cerne de

uma sociedade refrataacuteria a praacuteticas coletiva

O desafio existente eacute o de superar as barreiras soacutecio-institucionais e fortalecer as

poliacuteticas puacuteblicas pautadas pela inclusatildeo da noccedilatildeo de interesse geral Esta se concretiza na

medida em que o tema da cidadania eacute assumido como um ponto central para a

institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo dos cidadatildeos em processos decisoacuterios de interesse puacuteblico

(JACOBI 1990)

A reconstituiccedilatildeo do processo de participaccedilatildeo dos movimentos sociais organizados no

niacutevel do executivo e legislativo municipais permite em primeiro lugar ampliar os dados para

uma anaacutelise mais aprofundada sobre o processo de reconhecimento na construccedilatildeo de novos

sujeitos coletivos e na ampliaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Estes elementos possibilitam a

construccedilatildeo de uma institucionalidade ampliada cujos reflexos poderiam nos levar a superar o

ciclo de fluxos e refluxos normalmente presentes nas lutas pela superaccedilatildeo de carecircncias

imediatas

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Eacute preciso construir formas de participaccedilatildeo cidadatilde em que o ambiente signifique o

conjunto de diferentes elementos da produccedilatildeo e do consumo com formas alternativas de

participaccedilatildeo da sociedade civil na construccedilatildeo de uma sociedadecidade sustentaacutevel

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

A cidade como cenaacuterio onde se desenvolve a acumulaccedilatildeo de capital que deteacutem os

meios de produccedilatildeo e que abriga a forccedila de trabalho constitui-se como espaccedilo de lutas de

classes no qual o direito agrave cidade se coloca como um dos agentes motores dessa luta

A nova forma de relaccedilatildeo entre Estado e Movimentos Sociais no Brasil poacutes-1964

levanta um conjunto de questotildees vinculadas agrave formulaccedilatildeo intencional de poliacuteticas agrave questatildeo

89

da crise de governabilidade ao processo de tomada de decisotildees agrave dinacircmica dos movimentos

sociais suas articulaccedilotildees e accedilotildees bem como seu papel na transformaccedilatildeo da sociedade

A reflexatildeo sobre essa temaacutetica nos remete a um desafio de compreender as

ambiguumlidades conflitos e especificidades da relaccedilatildeo entre Estado e classes populares a partir

das contradiccedilotildees do capitalismo monopolista avanccedilado que desloca o centro do conflito de

classes do ambiente das relaccedilotildees industriais para o cenaacuterio do espaccedilo urbano e social

O espaccedilo urbano capitalista

fragmentado e articulado reflexo condicionante social cheio de siacutembolos e campo de lutas

eacute um produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem espaccedilo Satildeo agentes sociais concretos e natildeo um mercado invisiacutevel ou processos aleatoacuterios atuando sobre um espaccedilo abstrato A accedilatildeo desses agentes eacute complexa derivado da dinacircmica de acumulaccedilatildeo de capital das necessidades mutaacuteveis de reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e dos conflitos de classe que dela emergem (CORREcircA 1993 p 11)

Desse modo o urbano pode ser compreendido como produto social historicamente

determinado refletindo o modo de produccedilatildeo vigente A distinccedilatildeo possiacutevel de ser feita entre a

cidade e o urbano resume-se em que a primeira refere-se ao particular ao concreto ao

interno e o segundo corresponde ao geral ao abstrato ao externo ou seja agraves teacutecnicas aos

valores sociais e interesses econocircmicos agrave organizaccedilatildeo e ao controle social da vida coletiva

(SANTOS 1991 p 69)

Para Bourdieu (1996) todas as sociedades se apresentam como espaccedilos sociais

que satildeo entendidos como estruturas de diferenccedilas que natildeo se pode compreender sem se

construir o princiacutepio gerador que funda essas diferenccedilas na objetividade Ele considera que o

princiacutepio gerador eacute o da estrutura de distribuiccedilatildeo das formas de poder ou dos tipos de

capital eficiente no universo social considerado

Segundo ele as formas de poder e os tipos de capital podem variar dependendo dos

lugares e dos momentos Portanto os agentes individuais ou coletivos podem ocupar

posiccedilotildees diferentes no espaccedilo social ao longo do tempo e em funccedilatildeo de suas capacidades de

mobilizaccedilatildeo de recursos simboacutelico eou materiais

Nesse sentido o espaccedilo social pode ser representado como um campo Esta noccedilatildeo

eacute a forma como Bourdieu concebe as instituiccedilotildees de maneira relacional e natildeo como

substacircncia ou seja como configuraccedilotildees de relaccedilotildees entre agentes individuais e coletivos

Assim ratificando o conceito de campo apresentado anteriormente cita-se Bourdieu (1996 p

50)

90

Ao mesmo tempo como campo de forccedilas cuja necessidade se impotildee aos agentes que nele se encontram envolvidos e como campo de lutas no interior do qual os agentes se enfrentam com meios e fins diferenciados conforme sua posiccedilatildeo na estrutura do campo de forccedilas contribuindo assim para a conservaccedilatildeo ou a transformaccedilatildeo de sua estrutura

Campo de forccedilas pode ser entendido como a existecircncia de relaccedilotildees entre dominantes

e dominados marcadas por uma distribuiccedilatildeo desigual dos recursos E campo de luta no

sentido da existecircncia de um confronto entre os agentes sociais para conservar ou transformar

as relaccedilotildees de forccedila (BOURDIEU 1996) O espaccedilo social num determinado momento

histoacuterico eacute portanto composto por diferentes campos que ocupam posiccedilotildees diferenciadas em

seu interior

Nesse sentido o Estado capitalista aleacutem de expressar os interesses das classes

hegemocircnicas eacute um condensador de forccedilas sociais expressando portanto as contradiccedilotildees

das classes que determinam a emergecircncia dos conflitoslutas urbanas e dos Movimentos

Sociais Urbanos (MSU s) como espaccedilo alternativo de expressatildeo popular tendo em vista a

repressatildeo das accedilotildees sindicais e partidaacuterias

Segundo Jacobi (1989) a concepccedilatildeo pautada na polarizaccedilatildeo da relaccedilatildeo

EstadoMovimentos Sociais Urbanos tende a negar um dado cada vez mais presente na

dinacircmica das sociedades capitalistas ou seja o de que o Estado se bem age para assegurar a

reproduccedilatildeo do capital tambeacutem se concretiza em domiacutenios de accedilatildeo funcionalmente vinculados

agrave reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho esfera vinculada agrave accedilatildeo dos movimentos sociais

O Estado assume o papel de articulador e organizador da sociedade independentemente de sua condiccedilatildeo de suporte de certas relaccedilotildees de dominaccedilatildeo adotando o papel de fiador de relaccedilotildees sociais Trata-se de um Estado que tem de exercer funccedilotildees contraditoacuterias de acumulaccedilatildeo e de legitimaccedilatildeo para criar as bases de um consenso atraveacutes da accedilatildeo das suas instituiccedilotildees (JACOBI 1989 p 4)

A accedilatildeo do Estado eacute contraditoacuteria pois se por um lado eacute incontestaacutevel que defenda os

interesses do setor dominante por outro sua atuaccedilatildeo pode e eacute muitas vezes direcionada para

atender agraves demandas populares pois aleacutem de sua funccedilatildeo de acumulaccedilatildeo exerce tambeacutem a

funccedilatildeo de legitimaccedilatildeo Para tal atende aos interesses em curto prazo das classes dominadas

contrariando os interesses econocircmicos das dominantes garantindo no entanto que a estrutura

de poder seja mantida (ABELEacuteM 1988)

91

As contradiccedilotildees entre classes sociais satildeo fundamentais para a compreensatildeo da accedilatildeo

estatal no urbano atraveacutes da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas pois expressam a correlaccedilatildeo

de forccedilas entre os diversos segmentos sociais e os seus diferentes interesses

Complementando esse raciociacutenio Castells (1983) situa a emergecircncia dos

Movimentos Sociais Urbanos14 (MSU s) a partir das contradiccedilotildees urbanas geradas pelo

desenvolvimento do capitalismo frente agraves novas e crescentes necessidades postas agrave

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Estes movimentos satildeo compreendidos como um sistema de

praacuteticas sociais contraditoacuterias que colocam em questatildeo a ordem estabelecida a partir de

contradiccedilotildees especiacuteficas da problemaacutetica urbana Esta problemaacutetica urbana concorre para a

criaccedilatildeo de um processo de politizaccedilatildeo do cotidiano tendo em vista a accedilatildeo contraditoacuteria do

Estado

Touraine (1994 p 46) exprime sua visatildeo sobre o surgimento dos atores sociais e de

seu papel no contexto da sociedade complexa os atores natildeo satildeo mais definidos pela situaccedilatildeo

social (na oacutetica da luta de classes) pelo papel desempenhado numa estrutura econocircmica ou

mais global como as castas

As accedilotildees coletivas mais visiacuteveis formam-se em primeiro lugar em oposiccedilatildeo agraves forccedilas econocircmicas e poliacuteticas que procuram impor a ideologia da globalizaccedilatildeo isto eacute o desaparecimento dos atores sociais e das culturas nos fluxos de produccedilatildeo do consumo e da comunicaccedilatildeo de massa que se estende ateacute os limites do mundo (TOURAINE 1994 p 135)

Moiseacutes (1990) assinala que as formas de participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores

populares urbanos desenvolvidas durante o processo de metropolizaccedilatildeo das cidades

brasileiras especialmente em Satildeo Paulo na deacutecada de 1950 demonstraram que

Essas classes natildeo satildeo apenas objeto da vontade dos grupos dominantes (e do Estado) mas tambeacutem atores dotados de percepccedilatildeo proacutepria de sua situaccedilatildeo e de seus interesses Frequumlentemente essa percepccedilatildeo foi uacutetil para projetar formas organizadas de accedilatildeo coletiva que se expressavam atraveacutes de movimentos sociais cuja eficaacutecia tem relaccedilatildeo com os resultados praacuteticos imediatos (atendimento das reivindicaccedilotildees urbanas) mas tambeacutem com o desenvolvimento de uma nova forccedila social e poliacutetica na vida da cidade (MOISEacuteS 1990 p 14)

Deste mesmo ponto de vista Ribeiro (2003) argumenta que os aspectos relacionados

ao processo endoacutegeno do surgimento da questatildeo urbana no Brasil estavam na reorganizaccedilatildeo

14 Neste trabalho o termo MSU se refere agraves organizaccedilotildees populares imprimidas no chamado movimento popular urbano

92

da ordem soacutecioespacial Esta foi uma necessidade da acumulaccedilatildeo do capital jaacute que se poderia

reorganizar o modo de vida dos trabalhadores para impor o assalariamento e reorganizar o

territoacuterio para que surgisse uma economia de aglomeraccedilatildeo criando assim condiccedilotildees

favoraacuteveis agrave expansatildeo do modo de vida capitalista

Os movimentos populares no final da deacutecada de 1970 tornaram-se imprescindiacuteveis

para a transformaccedilatildeo da arena poliacutetica brasileira principalmente pela organizaccedilatildeo de

associaccedilotildees tais como a de moradores de bairro como forma de reivindicarem uma melhoria

da qualidade de vida dentro de um quadro de profundas desigualdades sociais e degradaccedilatildeo

ambiental e das condiccedilotildees de vida

A luta pela participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas

urbanas no Brasil ganhou forccedilas com a elaboraccedilatildeo da Nova Constituiccedilatildeo Federal iniciada em

1986 na qual vaacuterios movimentos sociais partidos poliacuteticos sindicatos igrejas e outros

articularam-se no intuito de defender a Emenda Popular15 da Reforma Urbana

As discussotildees elaboraccedilatildeo e defesa da Emenda Popular da Reforma Urbana natildeo se

constituiacuteram em tarefa faacutecil devido agrave complexidade dos formatos organizativos envolvidos e

suas diferentes dinacircmicas trajetoacuterias e perspectivas (RIBEIRO 1994)

A Constituiccedilatildeo Federal (CF) de 1988 procurou institucionalizar a participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas por meio de conselhos

comunitaacuterios nas aacutereas de educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social planejamento urbano dentre

outras Isto se caracterizou como um acontecimento marcante para os movimentos sociais

pois serviu como instrumento para avaliar o grau de coesatildeo abrangecircncia e articulaccedilatildeo destes

movimentos jaacute que se constituiu num momento iacutempar de formulaccedilatildeo de novas leis para o

Paiacutes (RIBEIRO 1991)

Em seus artigos 182 e 183 a CF estabeleceu as diretrizes para uma nova poliacutetica

urbana e exigiu uma legislaccedilatildeo nova que fixasse os direitos e deveres do cidadatildeo nas cidades

brasileiras Esse direito foi consolidado e ampliado no Estatuto da Cidade Lei nordm

102572001 que se refere agrave gestatildeo democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo popular

assume papel relevante

Entre as 16 diretrizes constantes dos vaacuterios artigos do Estatuto merece especial

destaque as duas primeiras a garantia do direito agrave cidade sustentaacuteveis e o direito agrave terra

urbana a moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos

15 Esta Emenda Popular contou com cerca de 200000 assinaturas e contribuiu para a incorporaccedilatildeo do capiacutetulo da poliacutetica urbana no interior da Constituiccedilatildeo

93

serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e as futuras geraccedilotildees (OLIVEIRA

2001 p 02)

A participaccedilatildeo da populaccedilatildeo eacute prevista em todas as dimensotildees da poliacutetica urbana ou

seja desde a formulaccedilatildeo do Plano Diretor na fase de sua negociaccedilatildeo e aprovaccedilatildeo na Cacircmara

ateacute sua implementaccedilatildeo e posteriores revisotildees16 Outro meio democraacutetico de participaccedilatildeo na

gestatildeo da cidade se daacute a partir da constituiccedilatildeo de oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias consultas puacuteblicas conferecircncias planos e projetos de lei de iniciativa

popular referendos e plebiscitos

O direito agrave moradia tambeacutem eacute reconhecido nos incisos XIV e XV que fixa como

diretriz urbana a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas por camadas

populares mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do

solo e das normas ediliacutecias com vistas a permitir a reduccedilatildeo dos custos e o aumento da oferta

dos lotes e unidades habitacionais (OLIVEIRA 2001 p 07) Em diversas passagens da

Constituiccedilatildeo nota-se a perspectiva da questatildeo da moradia como objeto das poliacuteticas puacuteblicas

(art 21) uma vez que esse direito eacute fundamental agrave ordem social e econocircmica da solidariedade

e da redistribuiccedilatildeo17

De acordo com De Grazia (2003) colocada em novas bases a luta pela Reforma

Urbana assim como a luta pela moradia digna objetivava a garantia do direito agrave cidade por

meio de mudanccedilas significativas na qualidade de vida com a implementaccedilatildeo de poliacuteticas

puacuteblicas voltadas para o conjunto das camadas populares Para isso elaborou trecircs princiacutepios

baacutesicos para referenciar sua praacutetica

1- Direito agrave Cidade e agrave Cidadania entendido como uma nova loacutegica que universalize o acesso aos equipamentos e serviccedilos urbanos a condiccedilotildees de vida urbana digna e ao usufruto de um espaccedilo culturalmente rico e diversificado e sobretudo em uma dimensatildeo poliacutetica de participaccedilatildeo ampla dos habitantes das cidades na conduccedilatildeo de seus destinos 2- Gestatildeo Democraacutetica da Cidade entendida como forma de planejar produzir operar e governar as cidades submetidas ao controle e participaccedilatildeo social destacando-se como prioritaacuteria a participaccedilatildeo popular 3- Funccedilatildeo Social da Cidade e da Propriedade entendida como a prevalecircncia do interesse comum sobre o direito individual de propriedade o que implica no uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado do espaccedilo urbano (DE GRAZIA 2003 p 54)

16 O Plano Diretor foi considerado como um instrumento baacutesico a ser elaborado pelos governos municipais como condiccedilatildeo para a adoccedilatildeo de instrumentos supostamente capazes de contribuir para promover a funccedilatildeo social da terra urbana e da cidade princiacutepio baacutesico do texto constitucional sobre a poliacutetica urbana 17 Com a aprovaccedilatildeo da emenda constitucional em 2000 o direito agrave moradia ficou expressamente reconhecido entre os direitos sociais no artigo 6ordm ratificando que soacute podem existir direitos e liberdades fundamentais com a garantia a dimensatildeo social da moradia sauacutede educaccedilatildeo trabalho entre outros

94

Esses novos princiacutepios diferente dos propostos em 1960 estatildeo baseados numa

leitura das cidades cujo padratildeo de produccedilatildeo ocupaccedilatildeo e gestatildeo satildeo marcados pela

mercantilizaccedilatildeo do solo da moradia do transporte de massa e dos demais equipamentos e

serviccedilos urbanos

O Estado por sua vez tem tradicionalmente apoiado esses interesses por meio de

poliacuteticas controles e mecanismos reguladores e discriminatoacuterios um modo de ver e fazer a

cidade no qual distribui os homens desigualmente no espaccedilo e que subordina os direitos

poliacuteticos os direitos individuais a cidadania aos modelos de uma racionalidade econocircmica A

distribuiccedilatildeo dos equipamentos e serviccedilos eacute geralmente realizada conforme o lugar onde

melhor satildeo atendidos os criteacuterios de rentabilidade e de retorno do capital investido Esse

modelo excludente deu origem agrave imensa segregaccedilatildeo existente nas cidades em todo o Paiacutes

(DE GRAZIA 2003)

Os princiacutepios da Reforma Urbana ao contraacuterio queriam enfatizar as seguintes

concepccedilotildees

- As cidades satildeo produzidas pelo confronto pela luta e pela apropriaccedilatildeo entre diversos agentes econocircmicos e sociais - As poliacuteticas e instrumentos juriacutedicos ou urbaniacutesticos devem levar em conta a cidade real reconhecendo a desigualdade e o conflito existente entre os produtores e consumidores do espaccedilo urbano - O Estado eacute obrigado a assegurar os direitos urbanos - A necessidade de uma regulaccedilatildeo puacuteblica da produccedilatildeo privada formal e informal do meio ambiente construiacutedo eacute necessaacuterio um controle social do uso do solo - Submissatildeo do direito da propriedade agrave sua funccedilatildeo social - Introduz a noccedilatildeo da necessidade do acesso igualitaacuterio aos bens e serviccedilos urbanos e ao direito agrave cidade atraveacutes de instrumentos e mecanismos redistributivos - O controle social e a participaccedilatildeo da sociedade civil organizada satildeo condiccedilotildees baacutesicas para a conquista dos direitos de novas poliacuteticas puacuteblicas que incorporem os excluiacutedos e de novas referecircncias para as cidades Atraveacutes do exerciacutecio do controle do Poder Puacuteblico as organizaccedilotildees participam da gestatildeo das cidades daiacute o nome de Gestatildeo Democraacutetica da Cidade - Reconhecer a cidade na sua totalidade e repensar o planejamento a partir da negociaccedilatildeo dos agentes que produzem e se apropriam do espaccedilo urbano - Assumir a estrateacutegia da construccedilatildeo de uma nova eacutetica urbana contraacuteria agrave concepccedilatildeo que pensa a cidade como mercado tendo em vista a transformaccedilatildeo da sociedade - O fortalecimento dos sujeitosatores sociais e poliacuteticos como condiccedilatildeo baacutesica para a construccedilatildeo e implementaccedilatildeo das estrateacutegias propostas (DE GRAZIA 2003 p 56)

Todos esses princiacutepios provocaram uma verdadeira revoluccedilatildeo urbana conforme

Vainer (2000 p 99) cujas caracteriacutesticas seriam reduzir as desigualdades e transferir recursos

95

materiais e simboacutelicos para os explorados e oprimidos fortalecer a constituiccedilatildeo de sujeitos

coletivos conscientes enfraquecendo as coalizotildees locais dominantes Nesse sentido a

revoluccedilatildeo urbana aponta para uma accedilatildeo processual de transformaccedilatildeo da cidade e dos agentes

populares para a reconfiguraccedilatildeo da cidade para a redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees de poder de que a

cidade eacute simultaneamente campo e objeto

Para Vainer (2000) a cidade eacute um espaccedilo fundamental da luta econocircmica poliacutetica e

cultural palco privilegiado dos movimentos reivindicatoacuterios assumindo uma posiccedilatildeo

estrateacutegica na constituiccedilatildeo de identidades e da construccedilatildeo de alianccedilas poliacuteticas

Dessa forma a organizaccedilatildeo da sociedade civil pode perpassar por dentro do Estado

alterando as administraccedilotildees estaduais e municipais possibilitando a consolidaccedilatildeo de projetos

participativos e de interesses coletivos Assim a constituiccedilatildeo de conselhos eacute relevante na

atuaccedilatildeo dos processos decisoacuterios jaacute que eacute capaz de encaminhar accedilotildees conjuntas da sociedade

com o Estado orientado pelas proposiccedilotildees do direito agrave cidadania e agrave cidade

Lefebvre (1991) ressalta o direito agrave vida urbana como uma condiccedilatildeo de um

humanismo e de uma democracia renovados Esse direito surge como uma proposta radical

de resistecircncia agrave massificaccedilatildeo imposta pela sociedade burocraacutetica de consumo dirigido

Atraveacutes das instituiccedilotildees e ideologias exercem-se pressotildees e repressotildees sobre a vida cotidiana

no sentido de impor agrave sociedade formas e ritmos de vida impeditivos da reflexatildeo e

consequumlentemente da contestaccedilatildeo desse modo de vida

O autor destaca tambeacutem dois relevantes obstaacuteculos ao alcance do direito agrave cidade e

o direito agrave moradia primeiro a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo urbana

devido ao alto grau de concentraccedilatildeo das decisotildees nas matildeos de administradores e teacutecnicos da

elite dirigente que controla a cidade e segundo a forma como estatildeo organizadas as cidades

expressando a estrutura de classe onde a propriedade e o mercado impedem que seja

alcanccedilada a funccedilatildeo social da cidade

Garantir o valor de uso da cidade constituiacute-se em tarefa primordial para a garantia da plena apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos por todos os habitantes superando o estado de alienaccedilatildeo e massificaccedilatildeo da sociedade burocraacutetica de consumo dirigido atraveacutes da ruptura dos coacutedigos da propriedade privada e do mercado (LEFEBVRE 1991 p 161)

Dessa forma o direito agrave cidade e o direito agrave moradia transcendem agrave elaboraccedilatildeo

juriacutedica e diz respeito agrave vida em sociedade a democratizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agrave accedilatildeo

participativa ainda que haja tensotildees e conflitos Ademais nesse processo emergem novas

96

concepccedilotildees de cidade que perpassam a elaboraccedilatildeo do conteuacutedo poliacutetico dos movimentos

sociais

Aleacutem dos canais de participaccedilatildeo e de gestatildeo democraacutetica criados a partir dos anos

1980 emergiram muacuteltiplas accedilotildees que objetivavam transformar o espaccedilo urbano em lugar de

praacuteticas sociais onde a prioridade eacute pela apropriaccedilatildeo da cidade em detrimento da hegemonia

do valor de troca da cidade-mercadoria

Trata-se de uma superaccedilatildeo pela e na praacutetica trata-se de uma mudanccedila de praacutetica social O valor de uso subordinado ao valor de troca durante seacuteculos pode retornar para primeiro plano Como Pela e na sociedade urbana partindo dessa realidade que ainda resiste e que conserva em noacutes a imagem do valor de uso a cidade Que a realidade urbana esteja destinada aos usuaacuterios

e natildeo aos especuladores aos promotores capitalistas aos planos teacutecnicos (LEFEBVRE 1991 p 128)

Nesse sentido o direito agrave moradia pode ser entendido como um direito agrave moradia

digna natildeo se limitando agrave sua condiccedilatildeo edificada de habitaccedilatildeo correspondendo ao direito de

viver com dignidade seguranccedila e paz Os elementos essenciais para este atendimento satildeo de

acordo com Meirinho e Bertol (2010 p 3)

A seguranccedila incluindo a seguranccedila juriacutedica da posse a disponibilidade e o faacutecil aceso aos serviccedilos (educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social) e agrave infraestrutura custo acessiacutevel agrave moradia (gastos com a moradia tem de ser proporcional agrave renda) habitabilidade (condiccedilotildees fiacutesicas e de salubridade adequadas) acessibilidade (moradia adequada para todos) localizaccedilatildeo (adequada inserccedilatildeo na cidade favorecendo o acesso ao emprego transporte puacuteblico serviccedilos de sauacutede escolas cultura e lazer) adequaccedilatildeo ambiental (caracteriacutesticas fiacutesicas que garantam a salubridade adequado saneamento ambiental disponibilidade de amenidades paisagiacutesticas naturais ou produzidas pela accedilatildeo humana) adequaccedilatildeo cultural (respeito agrave diversidade cultural e aos padrotildees oriundos dos usos e costumes das comunidades e grupos sociais) e o respeito e construccedilatildeo de valores psiacutequicos como o pertencimento e a proteccedilatildeo

O Estatuto da Cidade reconhece a gestatildeo democraacutetica que se daria por meio da

sociedade civil de associaccedilotildees representativas dos vaacuterios segmentos da comunidade de

conselhos de participaccedilatildeo orccedilamento participativo audiecircncias puacuteblicas na formulaccedilatildeo

execuccedilatildeo e acompanhamento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Insere tambeacutem a cooperaccedilatildeo entre os governos a iniciativa privada e os demais setores da

sociedade no processo de urbanizaccedilatildeo em atendimento ao interesse social

97

Como resposta agrave determinaccedilatildeo constitucional e para viabilizar a gestatildeo democraacutetica

das diretrizes urbaniacutesticas vaacuterios municiacutepios criaram os Conselhos de Desenvolvimento

Urbano Estes conselhos satildeo instrumentos de representaccedilatildeo da sociedade civil na gestatildeo de

sua poliacutetica urbana Representam um dos canais de comunicaccedilatildeo entre a sociedade civil e a

administraccedilatildeo local no que diz respeito agrave poliacutetica urbana no municiacutepio Satildeo instacircncias

participativas referente ao planejamento da cidade definiccedilatildeo composiccedilatildeo e

acompanhamento da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e intervenccedilotildees diversas tais como

planos diretores poliacuteticas setoriais de transporte e meio ambiente programas de urbanizaccedilatildeo

de favelas etc (SOUZA 2002 p 359)

A institucionalizaccedilatildeo da relaccedilatildeo entre sociedade civil e Estado por meio de

conselhos sejam setoriais (sauacutede educaccedilatildeo etc) ou comunitaacuterios (para a elaboraccedilatildeo do plano

de governo das obras puacuteblicas) por exemplo eacute o que caracteriza este novo nas

administraccedilotildees puacuteblicas Configura-se assim uma estreita correlaccedilatildeo entre descentralizaccedilatildeo

poliacutetica e eficiecircncia administrativa principalmente no que concerne agrave transparecircncia das accedilotildees

governamentais

Para tal eacute necessaacuterio que ocorram investimentos na mudanccedila da cultura poliacutetica o

que implicaria em participaccedilatildeo na disputa de interesses que definem a apropriaccedilatildeo da cidade

Eacute o direito de ir e vir que assumido como uma das mais fortes expressotildees poliacuteticas da

experiecircncia urbana poderaacute unificar produccedilatildeo e reproduccedilatildeo trabalho e consumo e por fim a

cidade historicamente construiacuteda e o urbano como modo de vida Compreende-se ainda que

a postulaccedilatildeo e a defesa deste direito viraacute permitir a afirmaccedilatildeo de outra escala para a

concepccedilatildeo da funccedilatildeo social e da gestatildeo democraacutetica da cidade a escala da metroacutepole

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade) estatildeo implicados no direito agrave cidade [] Mudariam a realidade se entrassem para a praacutetica social direito ao trabalho agrave instruccedilatildeo agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave habitaccedilatildeo aos lazeres agrave vida Entre esses direitos em formaccedilatildeo figura o direito agrave cidade (natildeo agrave cidade arcaica mas agrave vida urbana agrave centralidade renovada aos locais de encontro e de trocas aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o uso pleno e inteiro desses momentos e locais etc) A proclamaccedilatildeo e a realizaccedilatildeo da vida urbana como reino do uso (da troca e do encontro separados do valor de troca) exigem o domiacutenio do econocircmico (do valor de troca do mercado e da mercadoria) e por conseguinte se inscrevem nas perspectivas da revoluccedilatildeo sob a hegemonia da classe operaacuteria (LEFEBVRE 1991 p143)

98

Dessa maneira o avanccedilo e a consolidaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular como condiccedilatildeo

necessaacuteria agrave proacutepria viabilizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas alteram o conteuacutedo e praacuteticas de

programas e projetos ao mesmo tempo que impotildee novas exigecircncias aos grupos poliacuteticos que

estatildeo no poder

Sendo assim as praacuteticas sociais que constroem cidadania representam a possibilidade

de se constituir num espaccedilo privilegiado para cultivar a responsabilidade pessoal a obrigaccedilatildeo

muacutetua e a cooperaccedilatildeo voluntaacuteria A ampliaccedilatildeo da esfera puacuteblica ocasiona uma demanda agrave

sociedade para obtenccedilatildeo de uma maior influecircncia sobre o Estado tanto como sua limitaccedilatildeo

assumindo que a autonomia social supotildee transcender as assimetrias na representaccedilatildeo social

assim como modificar as relaccedilotildees sociais em favor de uma maior auto-organizaccedilatildeo social

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

Destarte a abertura poliacutetica possibilitou a construccedilatildeo de processos sociais e

institucionais que adquiriram visibilidade por meio da mobilizaccedilatildeo de sujeitos poliacuteticos em

muitos municiacutepios realizando emendas populares para as Constituiccedilotildees Estaduais Leis

Orgacircnicas e Planos Diretores aleacutem de organizarem foacuteruns regionais articuladores da

sociedade civil como por exemplo o Foacuterum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) que se

fortalece a partir desse contexto e passa a ser um articulador dos agentes urbanos no Brasil

Torna-se necessaacuterio portanto ressaltar a participaccedilatildeo da sociedade civil no processo

de gestatildeo do espaccedilo urbano pois este segmento conseguiu implementar as suas lutas pelo

direito agrave cidade e agrave cidadania nas poliacuteticas puacuteblicas

Esses movimentos resistiram e enfrentaram os governos militares por meio do apoio

das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Igreja Catoacutelica e lutaram pela

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes constituindo-se em importante articulaccedilatildeo para mobilizar

organizar e propor mudanccedilas recriando identidades poliacuteticas e culturais

A mobilizaccedilatildeo coletiva aleacutem de uma seacuterie de estrateacutegias de accedilatildeo configura-se como

[] um processo de desenvolvimento de condiccedilotildees materiais psicossociais e poliacuteticas

(PRADO 2002 p 60) que permite a constituiccedilatildeo de identidades poliacuteticas Nesse processo

alguns elementos emergem como estruturas mediadoras fundamentais para a construccedilatildeo e

99

adequaccedilatildeo do universo que apoacuteia a coesatildeo do grupo e a identidade de suas praacuteticas discursivas

e de accedilatildeo

Nesse sentido Castells (2006) ressalta que a construccedilatildeo de identidade dos sujeitos

sociais eacute um processo de construccedilatildeo de sentido a partir de um atributo cultural poliacutetico

social ou de um conjunto coerente de atributos que tecircm prioridade sobre todas as outras

fontes Assim um mesmo indiviacuteduo ou o mesmo ator coletivo pode ter vaacuterias identidades

A identidade natildeo eacute totalmente determinada agrave nascenccedila por fatores exoacutegenos eacute

(re)construiacuteda ao longo da vida como resultado de muacuteltiplos processos temporais de inserccedilatildeo

e interaccedilatildeo e como tal pode ser vista como uma reconstruccedilatildeo permanente flexiacutevel e

dinacircmica e natildeo como uma preacute-construccedilatildeo essencialista

Dessa forma considera-se que a identidade de cada um pode ser eventualmente

segmentada em fraccedilotildees relevantes por exemplo a identidade eacutetnica nacional regional de

classe profissional ou familiar mas tambeacutem eacute proveniente dos grupos de sociabilidade em

que se encontra inserido do bairro que se habita ou da comunidade de interesses a que se

encontra associado

Assim o que fundamenta as novas identidades eacute a experiecircncia de vida comum que

reuacutene o grupo e seu modo democraacutetico de funcionamento que garante a autenticidade do

grupo Tratada deste modo a formaccedilatildeo de identidades novas parece produto apenas de

vivecircncia de carecircncias comuns que explicitam para todos os membros do grupo uma mesma

condiccedilatildeo de dominaccedilatildeo

Castells (2006) argumenta em sua obra O Poder da Identidade a dominacircncia do

espaccedilo de fluxos e a dialeacutetica entre esse espaccedilo e o espaccedilo de lugares que levaram agrave

obsolescecircncia as antigas instituiccedilotildees e organizaccedilotildees da sociedade civil as identidades

legitimadoras construiacutedas em torno do Estado democraacutetico e do contrato social entre capital e

trabalho18 Da mesma forma propiciam o surgimento de identidades de resistecircncia19 que

recusam-se ser apanhadas de roldatildeo pelos fluxos globais poderiam sob determinadas

circunstacircncias e por meio de processos especiacuteficos a cada contexto institucional e cultural

ser cristalizados em identidades de projetos os verdadeiros agentes da mudanccedila capazes de

reconstruir uma nova sociedade civil e por uacuteltimo um novo Estado (CASTELLS 2006 p

423)

18 Nesse sentido para Castells o movimento trabalhista e os partidos poliacuteticos encontram-se ultrapassados como agentes autocircnomos de transformaccedilatildeo social 19 Tanto os movimentos tradicionalistas como o fundamentalismo religioso e os movimentos de auto-afirmaccedilatildeo nacionalista quanto os movimentos sociais ativistas contraacuterios agrave globalizaccedilatildeo como os ambientalistas pertencem a esta forma de identidade

100

Uma vez que para Castells o espaccedilo de fluxos constitui a nova forma espacial de

praacuteticas sociais que dominam e moldam a sociedade em rede tanto os lugares quanto o

poder tecircm suas loacutegicas e seus significados absorvidos na rede Agora o poder deixando de

concentrar-se nas instituiccedilotildees organizaccedilotildees ou mecanismos simboacutelicos de controle

apresenta-se inscrito nos coacutedigos culturais mediante os quais as pessoas e as instituiccedilotildees

representam a vida e tomam decisotildees inclusive poliacuteticas (CASTELLS 2006 p 424)

Giddens (2002) compreende o termo identidade como um termo essencialmente

moderno e que se refere a articulaccedilatildeo que o sujeito faz de diversas forccedilas presentes na

sociedade atual sociedade esta caracterizada pela pluralidade de escolha e pelo

individualismo exacerbado Pode-se entatildeo dizer que a identidade surge da negociaccedilatildeo com o

contexto sendo necessaacuterio o entendimento da loacutegica deste contexto ou seja a compreensatildeo

da concepccedilatildeo de mundo atual no qual se estatildeo inseridos

Essa discussatildeo teve iniacutecio com o reconhecimento de que em uma sociedade

tradicional a identidade social dos indiviacuteduos eacute limitada pela proacutepria tradiccedilatildeo pelo

parentesco pela localidade A modernidade caracterizada como uma ordem poacutes-tradicional

ao romper com as praacuteticas e preceitos preestabelecidos enfatiza o cultivo das potencialidades

individuais oferecendo ao indiviacuteduo uma identidade moacutevel mutaacutevel

Eacute nesse sentido que na modernidade o Eu torna-se cada vez mais um projeto

reflexivo pois aonde natildeo existe mais a referecircncia da tradiccedilatildeo descortina-se para o indiviacuteduo

um mundo de diversidade de possibilidades abertas de escolhas O indiviacuteduo passa a ser

responsaacutevel por si mesmo e o planejamento estrateacutegico da vida assume especial importacircncia

Para De Grazia (2003) a nova forma de ver a cidade de forma participativa foca na

desigualdade de investimentos que haacute entre os seus diversos locais pois as obras de

infraestrutura equipamentos urbanos e serviccedilos estatildeo localizados onde haacute maior concentraccedilatildeo

de capital decisotildees e atividades comerciais desprezando portanto outros locais da cidade

principalmente os locais de moradia da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo que satildeo as

periferias baixadas favelas morros etc

A cidade eacute portanto palco da luta entre o capital e o trabalho Esta se daacute em torno do

ambiente construiacutedo e vivido o qual tem interesses conflitantes e que estabelecem um campo

de poder o capital imobiliaacuterio os proprietaacuterios da terra a induacutestria da construccedilatildeo o Estado e

a forccedila de trabalho conforme discutido no capiacutetulo anterior

O campo de poder (que natildeo deve ser confundido com o campo poliacutetico) natildeo eacute um campo como os outros ele eacute espaccedilo de relaccedilotildees de forccedilas entre os

101

diferentes tipos de capital ou mais precisamente entre os agentes suficientemente providos de um dos diferentes tipos de capital para poderem dominar o campo correspondente e cujas lutas se intensificam sempre que o valor relativo dos diferentes tipos de capital eacute posto em questatildeo isto eacute especialmente quando os equiliacutebrios estabelecidos no interior do campo entre instacircncias especificamente encarregadas da reproduccedilatildeo do campo do poder (BOURDIEU 2001 p 52)

De acordo com Netto (2001) Marx identificou que as relaccedilotildees sociais dentro de

cada sociedade baseiam-se a partir do modo de produccedilatildeo existente e que a histoacuteria de todas

as sociedades sempre esteve fundada na luta de classes esta anaacutelise foi feita por meio do

materialismo histoacuterico dialeacutetico

A cidade passa a ser entatildeo compreendida como a reproduccedilatildeo das divisotildees sociais

natildeo uniforme pois na medida em que se reproduz cria e recria novos espaccedilos consolida

velhos bairros e constituem novos assumindo formas diversas muacuteltiplas interligadas com a

dinacircmica dos atores sociais

Destarte o campo das lutas em torno da habitaccedilatildeo e das condiccedilotildees de vida urbana

em geral ao mesmo tempo em que eacute um espaccedilo da luta de classes eacute tambeacutem espaccedilo

privilegiado de cooptaccedilatildeo e do exerciacutecio da hegemonia burguesa expressando as contradiccedilotildees

do modo de produccedilatildeo capitalista Aleacutem disso expressa a relevacircncia cultural dos grupos

sociais e manifesta as diversas formas de apreender o espaccedilo ou seja a forma como um grupo

apreende o espaccedilo natildeo quer dizer que este espaccedilo tenha o mesmo significado para todos os

grupos

Para tanto eacute necessaacuterio entender algumas discussotildees que permeiam a produccedilatildeo do

espaccedilo urbano e da moradia como o seu papel como produto das relaccedilotildees sociais a

influecircncia da dimensatildeo espacial na produccedilatildeo da moradia entre outros Assim nos capiacutetulos

seguintes seratildeo apresentados elementos dessa poliacutetica em especial a habitacional

implementada no Brasil que se daacute pelo resultado das relaccedilotildees e mobilizaccedilotildees estabelecidas

entre os agentes pelas instituiccedilotildees que podem facilitar ou impedir o acesso dos agentes aos

espaccedilos decisoacuterios pelo processo de decisatildeo no qual se estabelecem coalizotildees e escolhas e

tambeacutem pelos produtos da poliacutetica resultante Assim ao se falar de poliacutetica fala-se em grande

medida de representaccedilatildeo de interesses e por conseguinte de formulaccedilatildeo das poliacuteticas que

implementam ou bloqueiam tais interesses

102

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

Para se entender a problemaacutetica habitacional torna-se fundamental relacionaacute-la com a

sociedade em que se vive e com suas dinacircmicas estruturadas socialmente Portanto eacute

necessaacuterio se reportar agraves relaccedilotildees sociais baacutesicas e agrave organizaccedilatildeo do sistema produtivo pois

no modo de produccedilatildeo capitalista no qual a produccedilatildeo eacute socializada e a apropriaccedilatildeo eacute privada e

concentradora tem-se uma complexa divisatildeo social do trabalho caracterizando um sistema

social estratificado

Nesse sentido pode-se dizer que habitar eacute uma necessidade baacutesica de todo ser

humano independente de qual seja o tipo de sociedade Dessa forma vale ressaltar que a

habitaccedilatildeo eacute compreendida nesse trabalho como algo aleacutem da casa do abrigo do ambiente

fiacutesico mas a interaccedilatildeo desta com a cidade com o conjunto de seus equipamentos serviccedilos

espaccedilos puacuteblicos e lugar de reinvenccedilatildeo de praacuteticas e relaccedilotildees sociais Vale ressaltar que a

cidade concentra um conjunto de processos de trabalho e de produccedilatildeo de empregados

assalariados e do mercado informal cuja anaacutelise eacute essencial na compreensatildeo das diferenccedilas

entre as cidades

Entatildeo afirma-se que a habitaccedilatildeo tem um conteuacutedo poliacutetico social econocircmico e

espacial e possui diversas caracteriacutesticas e formas espaciais diferentes concretizando uma

produccedilatildeo diferenciada da cidade

A cidade capitalista possui condiccedilotildees gerais para a produccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo

e do trabalho evidenciando as contradiccedilotildees inerentes ao capitalismo principalmente nas

relaccedilotildees construiacutedas a partir da apropriaccedilatildeo privada dos bens socialmente produzidos

configurando uma divisatildeo social e territorial do trabalho conforme argumenta Lojkine (1981

p 16)

As formas de urbanizaccedilatildeo satildeo formas de divisatildeo social (e territorial) do trabalho elas satildeo o cerne da contradiccedilatildeo atual entre as novas exigecircncias do progresso teacutecnico

essencialmente em mateacuteria de formaccedilatildeo ampliada das forccedilas produtivas humanas

e as leis de acumulaccedilatildeo de capital

Sendo assim o espaccedilo urbano construiacutedo expressa o modo de vida capitalista e a luta

de classes sociais que compotildeem sua estrutura social uma vez que esse espaccedilo se redefine a

partir da crescente articulaccedilatildeo e complexidade do processo produtivo o qual possibilita o

desenvolvimento dos meios de distribuiccedilatildeo circulaccedilatildeo e troca de mercadorias Dessa maneira

103

o espaccedilo urbano torna-se tambeacutem a proacutepria mercadoria uma vez que dele se obteacutem mateacuteria

prima e forccedila de trabalho

Com o surgimento da faacutebrica enquanto unidade produtiva e a complexidade da divisatildeo teacutecnica e social do trabalho daiacute decorrente o urbano se redefine ante as exigecircncias de concentraccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo e da forccedila de trabalho num soacute lugar e consequumlentemente a forccedila de trabalho passa a exigir certas condiccedilotildees para sua reproduccedilatildeo tais como habitaccedilatildeo alimentaccedilatildeo transporte energia assistecircncia agrave sauacutede lazer comunicaccedilotildees saneamento em geral etc Por outro lado a faacutebrica enquanto unidade de acumulaccedilatildeo de capital tambeacutem coloca uma seacuterie de outras condiccedilotildees que satildeo necessaacuterias para sua reproduccedilatildeo tais como transporte de mateacuterias-primas energia comunicaccedilatildeo saneamento unidades de apoio agrave produccedilatildeo como escritoacuterios bancos transporte para escoamento da produccedilatildeo unidades de distribuiccedilatildeo e comercializaccedilatildeo etc (SILVA 1989 p 23)

Para Blay (apud SILVA 1989 p 20) a mercadoria moradia eacute entendida dentro da

teoria das necessidades sociais em um sistema econocircmico regido livremente pela procura e

oferta e que suscita uma problemaacutetica chave se de um lado existe grande oferta da

mercadoria moradia por outro grande parcela da populaccedilatildeo natildeo dispotildee de renda suficiente

para adquiri-la pois as habitaccedilotildees apresentam um elevado valor agregado e com isso a

populaccedilatildeo de renda baixa natildeo possui condiccedilotildees de comprar ou alugar uma casa com

condiccedilotildees miacutenimas de habitabilidade

Esse cenaacuterio acarreta no processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial que se daacute a partir da

complexificaccedilatildeo e divisatildeo social do trabalho gerada pelas poliacuteticas puacuteblicas seletivas do

Estado e pela auto-segregaccedilatildeo da classe de maior poder aquisitivo que se isola em

condomiacutenios e loteamentos fechados Vale ressaltar que esses locais natildeo satildeo mais exclusivos

das classes mais abastarda mas estendendo-se agraves outras camadas da sociedade (funcionaacuterios

puacuteblicos profissionais liberais comerciantes entre outros) que adquirem seus lotes em aacutereas

muradas dotando de seguranccedila particular (cercas eleacutetricas vigilante portotildees eletrocircnicos entre

outros) sob o pagamento de uma taxa (condomiacutenio)

Diante disso uma grande parcela da populaccedilatildeo natildeo possui local para morar quando

natildeo moram em locais de difiacutecil acesso com condiccedilotildees precaacuterias transformando a questatildeo da

moradia em um problema social e urbaniacutestico pela inadequabilidade habitacional conforme

fotografia 1

Eacute importante enfatizar que podem ser levadas em consideraccedilatildeo quando se pensa na

questatildeo da moradia as diferentes classes e fraccedilotildees de classes que estatildeo envolvidas em uma

luta simboacutelica na produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da cidade as quais objetivam a definiccedilatildeo do mundo

104

social em conformidade com seus interesses formando um campo das posiccedilotildees sociais

passando a integrar a paisagem urbana do capital como parte necessaacuteria de um espaccedilo social

complexo e repleto de contradiccedilotildees

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA)

Fonte Beleacutem (2007)

Sendo assim a questatildeo habitacional brasileira eacute um fenocircmeno que se insere no

desenvolvimento do sistema capitalista e sempre apresentou um cunho marcadamente

excludente refletindo as diversas fases da relaccedilatildeo entre o Estado e as fraccedilotildees de classes

A poliacutetica habitacional como poliacutetica puacuteblica voltada agrave efetivaccedilatildeo do direito agrave

moradia foi compreendida inicialmente de acordo com Frey (1996) como uma poliacutetica de

bem estar e gradativamente mudou do discurso universalista dos direitos fundamentais para

a loacutegica dos mercados articulando-se de maneira inovadora com os novos padrotildees de

acumulaccedilatildeo capitalista

Para o autor na fase de expansatildeo material do sistema capitalista no seacuteculo passado o

fundo puacuteblico constituiacutea-se na principal fonte de financiamento da poliacutetica habitacional No

Estado de Bem-Estar Social o direito agrave moradia era um dos elementos que faziam parte dos

custos da reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e a ideologia da casa proacutepria era uma forma de

controle social aleacutem disso a intervenccedilatildeo estatal foi marcada por uma poliacutetica puacuteblica

105

centralizada isto eacute defendia a universalizaccedilatildeo da poliacutetica sem levar em consideraccedilatildeo as

especificidades de cada regiatildeo

De acordo com Bonduki (1994 p 26) o primeiro evento desencadeador do problema

habitacional no Brasil foi a passagem do escravismo para o trabalho livre no qual o preccedilo da

terra se definiu originalmente como uma forma de impedir no momento histoacuterico da ascensatildeo

do capitalismo o acesso do trabalhador agrave terra Essa constataccedilatildeo surge a partir do

entendimento de que a terra urbana e suas construccedilotildees satildeo mercadorias na economia

capitalista possuindo um valor de uso e um valor de troca

No contexto histoacuterico da economia cafeeira as moradias alugadas nos principais

centros urbanos eram mais utilizadas como a forma predominante de habitaccedilatildeo popular Ateacute

os anos 1920 os centros urbanos reuniam um grande contingente de trabalhadores que

moravam em locais alugados em geral em corticcedilos20 Os outros espaccedilos como as vilas21

eram destinados aos trabalhadores que possuiacuteam uma qualificaccedilatildeo e a classe meacutedia

O Estado tinha uma atuaccedilatildeo limitada pois incentivava a produccedilatildeo privada de

moradias para os trabalhadores de baixo poder aquisitivo geralmente voltadas para a locaccedilatildeo

aleacutem de atuar de forma repressiva em situaccedilatildeo de insalubridade aplicando a lei de

higienizaccedilatildeo (produccedilatildeo de casas higiecircnicas) e de restriccedilatildeo aos corticcedilos por forccedila policial

(BONDUKI 1994)

Assim a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de

saneamento e embelezamento que expulsaram a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo para as

afastadas do centro das cidades como soluccedilatildeo para eliminar epidemias e higienizar os

espaccedilos

Ao mesmo tempo obras paisagiacutesticas eram realizadas nas aacutereas centrais para

favorecer a consolidaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio capitalista que estava surgindo Os

problemas urbanos os males e distuacuterbios sociais eram tratados como responsabilidade do

excessivo tamanho e densidade populacional das cidades e natildeo como fruto do modelo de

industrializaccedilatildeo que estava em desenvolvimento

O fator que garantia a construccedilatildeo das diversas formas de moradias de aluguel eacute que

esse negoacutecio se tornou importante investimento para os diversos agentes econocircmicos que

naquela eacutepoca dispunham de capital e de pequenas poupanccedilas

20 Corticcedilo denominaccedilatildeo geneacuterica da habitaccedilatildeo coletiva que incluiacutea desde uma seacuterie de cocircmodos ao longo de um corredor ou em volta de um paacutetio e dormitoacuterios improvisados no fundo de um bar ou armazeacutem ateacute as casas de cocircmodos e respectivos porotildees (BONDUKI 1986) 21 As vilas se constituiacuteam em conjuntos de pequenas casas unifamiliares germinadas (SILVA 1989)

106

Vivia-se a fase aacuteurea da economia cafeeira e Satildeo Paulo era o centro comercial e bancaacuterio que geria o cafeacute A induacutestria embora jaacute fosse significativa e reunisse um largo contingente de trabalhadores era ainda incipiente e instaacutevel marcada por crises constantes subordinando-se ao capital cafeeiro [] Num periacuteodo em que a inflaccedilatildeo era insignificante o investimento em casas operaacuterias garantia juros de 12 a 15 ao ano considerado na eacutepoca um excelente rendimento aleacutem de possibilitar o usufruto da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria (BONDUKI 1994 138-139)

Com o processo de industrializaccedilatildeo que intensificou a urbanizaccedilatildeo das cidades uma

seacuterie de transformaccedilotildees na estrutura urbana comeccedilaram a surgir na estrutura industrial e na

forma de atuaccedilatildeo do poder puacuteblico provocando o crescimento econocircmico das cidades

modificaccedilotildees no padratildeo de habitaccedilatildeo popular e a concentraccedilatildeo desordenada de pessoas na

busca de produtos e serviccedilos nos corticcedilos favelas baixadas com precaacuterias condiccedilotildees de

moradia

A explosatildeo demograacutefica provocou um excedente da populaccedilatildeo que natildeo encontra emprego suficiente na zona rural Assim o pessoal dessa zona vai procurar trabalho em outros lugares seja nas regiotildees de plantaccedilotildees onde se tornam assalariados agriacutecolas seja diretamente nas cidades (SANTOS 1991 p 24)

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (2000) a populaccedilatildeo

urbana brasileira em 1940 era de 3124 Em 1950 esse quadro passou para 3616

conforme apontam os dados da tabela 1 demonstrando um aumento de aproximadamente

5 naquele periacuteodo

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1970) no Brasil Ano Total Urbana Rural

1940 41236315 12880182 3124 28356133 6876 1950 51914397 18782891 3616 33161506 6384 1960 70070457 31303034 4468 38767423 5532 1970 93139037 52084984 55 93 41054053 4407

Fonte IBGE Censo Demograacutefico (2001)

Nota-se que nas deacutecadas seguintes (1960 e 1970) houve o aumento da taxa de

populaccedilatildeo residente nos centros urbanos saltando para 55 93 no ano de 1970 Pode-se

dizer que isso se deu em virtude do processo de industrializaccedilatildeo ocorrido nas deacutecadas de

1940 a 1980 as quais foram marcadas pelo intenso crescimento do mercado com elevadas

107

taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) acarretando em uma complexa divisatildeo

social do trabalho Aleacutem desses elementos ocorreu um acelerado processo de urbanizaccedilatildeo

com grandes deslocamentos populacionais originando alteraccedilotildees profundas na estrutura

demograacutefica

Esse provocou tambeacutem uma grande retirada da populaccedilatildeo pobre das aacutereas de

interesses econocircmicos e fez com que esta se deslocasse para as aacutereas sem infraestrutura

agravando ainda mais o quadro de pobreza Em contrapartida as fraccedilotildees de classes com maior

poder aquisitivo pressionavam o Estado a reorganizar o espaccedilo urbano tendo em vista a

fluidez das mercadorias neste espaccedilo e a higiene do mesmo uma vez que os corticcedilos locais

onde os trabalhadores viviam estavam localizados geograficamente proacuteximos das classes

dominantes e eram considerados locais de focos de epidemias

Assim cabe destacar que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual pois esse espaccedilo eacute

fruto de uma produccedilatildeo capitalista que se produz desigualmente e eacute materializada pela divisatildeo

do trabalho e se sustenta a partir das relaccedilotildees simboacutelicas estabelecidas

Estava claro que diante do novo padratildeo de desenvolvimento econocircmico que se esboccedilava e do crescimento raacutepido da populaccedilatildeo o corticcedilo passaria a representar um perigo para a sauacutede puacuteblica seja pelas condiccedilotildees de insalubridade que apresentava seja por expressar uma imagem contrastante com a faacutebrica enquanto unidade produtiva que se firmava Dessa forma natildeo era compatiacutevel com o novo modelo econocircmico que necessitava desobstruir a aacuterea central da cidade para a circulaccedilatildeo do capital e localizaccedilatildeo da classe dominante emergente forccedilando o estabelecimento de uma poliacutetica de segregaccedilatildeo dos setores populares acentuando-se principalmente a partir da deacutecada de 30 e 40 com o amadurecimento do modelo econocircmico de caraacuteter urbano-industrial (SILVA 1989 p 36)

Uma das medidas intervencionistas adotadas pelo Estado poacutes-1930 foi a criaccedilatildeo e

regulamentaccedilatildeo das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensotildees (IAPs)22 em

1937 Com o agravamento progressivo das condiccedilotildees habitacionais nos centros urbanos os

trabalhadores pressionaram o Estado para que este atendesse suas reivindicaccedilotildees

Assim os IAPs identificados como vias institucionais responsaacuteveis pelo

atendimento das necessidades dos trabalhadores na questatildeo da moradia assumiram esta

atribuiccedilatildeo objetivando garantir a legitimidade do poder estatal

22 Os IAPs tiveram fundamental importacircncia na provisatildeo do creacutedito imobiliaacuterio uma vez que deixaram de ter exclusivamente a atribuiccedilatildeo de previdecircncia social e assistecircncia meacutedia para incorporarem a funccedilatildeo de provedor de moradia

108

Contudo esta foi a primeira intervenccedilatildeo concreta estatal no setor da habitaccedilatildeo

popular embora tenha obedecido a criteacuterios de clientelismo poliacutetico na distribuiccedilatildeo das

poucas unidades que foram produzidas

Eacute importante destacar que em 1923 foram criadas as Caixas de Aposentadoria

constituiacutedas pelos empregados de uma empresa que organizaram uma caixa comum de

assistecircncia com fundos especiacuteficos objetivando financiar a construccedilatildeo de habitaccedilotildees aos seus

associados Entretanto suas accedilotildees somente se concretizaram em 1930 (SILVA 1989)

Segundo Bonduki (1997) a Fundaccedilatildeo da Casa Popular (FCP) criada em 01 de maio

de 1946 constituiu-se no primeiro oacutergatildeo nacional direcionado agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

populares e estava vinculada ao Ministeacuterio do Trabalho Induacutestria e Comeacutercio A escolha do

dia do trabalhador para fundar a FCP foi considerada reveladora ao alcance poliacutetico que se

pretendia com tal medida pois foi uma forma do governo enfrentar os problemas de habitaccedilatildeo

das faixas de trabalhadores que recebiam baixos salaacuterios

A FCP visava propiciar a construccedilatildeo ou aquisiccedilatildeo da casa proacutepria em zona urbana

ou rural para as classes populares aleacutem de coordenar as accedilotildees dos IAPs e tinha como fonte

de recursos a cobranccedila de taxas sobre as transaccedilotildees imobiliaacuterias Poreacutem esses dois oacutergatildeos

(IAPs e FCP) foram extintos com a criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) em

1964

Segundo Rodrigues (2001) de 1937 a 1964 os IAPs construiacuteram 279 conjuntos em

um total de 47789 moradias e financiadas 72236 habitaccedilotildees Embora os nuacutemeros sejam

modestos demonstram uma nova forma de accedilatildeo do Estado ou seja como o Estado interfere

diretamente na produccedilatildeo da habitaccedilatildeo Jaacute a FCP de 1946 a 1964 construiu 19 mil unidades

pouco mais de 900 unidades por ano concentradas principalmente na regiatildeo sudeste do paiacutes

Estes resultados demonstram que a FCP limitou-se a construir em locais que os recursos

permitiam e os interesses econocircmicos determinavam

A deacutecada de 1940 foi marcada por uma grave crise de habitaccedilatildeo pois esta crise natildeo

se deu pela falta de moradias higiecircnicas e salubres a preccedilos acessiacuteveis que os trabalhadores

poderiam alugar mas pela carecircncia absoluta de moradias

Essa crise foi estrutural embora agravada por fatores conjunturais provocados pela

guerra Bonduki (1994) destaca vaacuterios fatores que explicam esse fenocircmeno tais como a

proacutepria dinacircmica do desenvolvimento capitalista no Brasil que cria novas e mais atraentes

formas de investimento do capital fazendo a rentabilidade crescer as altas taxas de inflaccedilatildeo

levam os investidores a perderem interesse em investir no aluguel de moradias que em outros

periacuteodos eram investimentos rentaacuteveis e a conjuntura da guerra provoca no mercado

109

imobiliaacuterio a aceleraccedilatildeo da especulaccedilatildeo e os imoacuteveis urbanos sofrem uma valorizaccedilatildeo sem

precedentes

A Lei do Inquilinato agravou ainda mais a situaccedilatildeo uma vez que congelou os preccedilos

dos alugueacuteis em 1942 e se configurou em uma intervenccedilatildeo direta do governo de Getuacutelio

Vargas na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia ou seja o Estado passou a intervir nos

diversos setores da economia operando na fixaccedilatildeo de preccedilos na distribuiccedilatildeo dos ganhos e

perdas entre as diversas fraccedilotildees de classes e na regulamentaccedilatildeo da reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho

Os aumentos elevados do valor dos alugueacuteis que subiam em magnitudes superiores

aos salaacuterios dos trabalhadores visavam desestimular a construccedilatildeo de moradias para alugar e

instigar a construccedilatildeo de moradias para venda que em geral natildeo eram acessiacuteveis aos

trabalhadores de menor poder aquisitivo levando-os a recorrer agrave autoconstruccedilatildeo e agrave

favelizaccedilatildeo (SILVA 1989)

Atraveacutes da autoconstruccedilatildeo que a maioria da populaccedilatildeo trabalhadora resolve seu problema de moradia principalmente nas grandes cidades brasileira e de modo geral na Ameacuterica Latina A construccedilatildeo de casas se prolonga por muitos anos absorvendo a maior parte do tempo livre da famiacutelia A construccedilatildeo eacute realizada nos fins-de-semana e em parte das feacuterias [] A autoconstruccedilatildeo eacute executada nos periacuteodos que deveriam ser destinados ao descanso do trabalhador para repor as energias mas na verdade descansa-se trabalhando carregando pedras Este eacute o lema do autoconstrutor por vaacuterios anos [] Em linhas gerais a autoconstruccedilatildeo eacute um processo de trabalho extremamente penosos com elevados custos individuais que caem sobre os setores mais pauperizados Haacute um alongamento da jornada de trabalho que repercute na acumulaccedilatildeo de capital jaacute que permite pagar salaacuterios mais baixos e ao mesmo tempo desgasta rapidamente a capacidade produtiva da forccedila de trabalho sem o miacutenimo descanso necessaacuterio (RODRIGUES 2001 p 30-32)

De acordo com Durham (2000 apud RODRIGUES 2001) eacute comum as famiacutelias de

menor poder aquisitivo construir suas casas com ajuda muacutetua Muitas vezes os filhos se casam

e vatildeo anexando cocircmodos agrave construccedilatildeo original caracterizando a coabitaccedilatildeo A autoconstruccedilatildeo

eacute um processo aacuterduo que requer o esforccedilo de toda a famiacutelia surgindo como um meio de se

obter um imoacutevel Esta alternativa foi utilizada pelos governos como opccedilatildeo viaacutevel e de baixo

custo para minimizar o deacuteficit habitacional mas eacute uma proposta questionaacutevel tanto pelo

sacrifiacutecio imposto pela situaccedilatildeo quanto pelo aspecto caoacutetico das periferias dos grandes e

meacutedios centros urbanos

110

Aleacutem disso Bourdieu (2001) enfatiza que existem outras racionalidades aleacutem da

racionalidade econocircmica e que neste caso podem ser enquadradas tanto para os laccedilos sociais

de uma favela quanto para a autoconstruccedilatildeo na qual famiacutelias se unem para conseguir a casa

proacutepria Dessa maneira a construccedilatildeo de uma moradia representa uma troca de daacutedivas entre

os grupos sociais familiares ou amigos que se unem nesse processo

A partir da deacutecada de 1950 seguiu-se um decliacutenio das construccedilotildees relacionadas agrave

viabilidade econocircmica financeira a inflaccedilatildeo tornava irrisoacuterias as prestaccedilotildees fixas pagas nos

planos de financiamento e natildeo possibilitava novos investimentos o congelamento dos

alugueacuteis a crise da previdecircncia com o esvaziamento progressivo das reservas do sistema

previdenciaacuterio (RODRIGUES 2001)

Silva (1989) argumenta que no periacuteodo do segundo governo Vargas (1951-1954)

houve uma forte pressatildeo dos trabalhadores por melhores salaacuterios ficando a questatildeo

habitacional renegada a segundo plano uma vez que as poliacuteticas implementadas demonstram

a pouca importacircncia que foi dada a essa problemaacutetica

No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) com os grandes projetos

industriais em especial os automobiliacutesticos sob a loacutegica da integralizaccedilatildeo do territoacuterio com a

abertura de estradas para circulaccedilatildeo de mercadorias e comunicaccedilatildeo a urbanizaccedilatildeo eacute acelerada

e marcada pelo desenvolvimento econocircmico aleacutem disso intensificaram as desigualdades

regionais do Paiacutes pois as regiotildees mais distantes do centro financeiro como os estados da

regiatildeo Amazocircnica sofreram menor implementaccedilatildeo de instrumentos urbaniacutesticos

aprofundando a divisatildeo social e territorial do trabalho Em relaccedilatildeo a questatildeo habitacional as

accedilotildees concretas natildeo foram executadas o que agravou ainda mais as condiccedilotildees de vida da

populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Nessa conjuntura de efervescecircncia poliacutetica e de decliacutenio econocircmico a questatildeo habitacional para o governo de Joatildeo Goulart foi contemplada quase tatildeo-somente pelo planejamento governamental A distacircncia entre as necessidades sociais e a falta de recursos para sanar a carecircncia de habitaccedilotildees populares fizeram com que o quadro se agravasse dado o intenso processo de urbanizaccedilatildeo a que as grandes cidades vinham se submetendo (SILVA 1989 p 46)

Vale destacar no quadro 1 a relaccedilatildeo das principais instituiccedilotildees habitacionais ateacute a

criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) suas caracteriacutesticas e os respectivos

governos

111

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968

Instituiccedilotildees Caracteriacutestica Governo Instituto de Aposentadorias

e Pensotildees (IAPs) O Brasil deu os primeiros passos intervindo na oferta de moradia

Getuacutelio Vargas (1930-1945)

Fundaccedilatildeo da Casa Proacutepria (FCP)

Visava atender a populaccedilatildeo que natildeo participava do mercado formal

Eurico Gaspar Dutra (1946-1951)

Plano de Assistecircncia Habitacional (PAH)

A principal inovaccedilatildeo consistia na proporccedilatildeo entre a prestaccedilatildeo do financiamento e o salaacuterio miacutenimo

Juscelino Kubitschek (1956-1961)

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH)

Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo (SFH)

Tinham como objetivos coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos puacuteblicos e orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria eliminaccedilatildeo das favelas

Castello Branco (1964-1967)

Fonte BRASIL (2004)

A partir de meados dos anos de 1960 eacute possiacutevel perceber uma atuaccedilatildeo mais efetiva

do Estado sobre o espaccedilo urbano com a criaccedilatildeo de todo o aparato institucional voltado para a

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia

Por meio do projeto desenvolvimentista a intervenccedilatildeo estatal expandiu a induacutestria e

construiu uma sociedade de consumo predominantemente urbana provocando a dispersatildeo

das cidades Aleacutem da implantaccedilatildeo de hidreleacutetricas portos aeroportos dutos e canais

apoiados em financiamentos externos a expansatildeo da rede de energia de estradas e de

comunicaccedilatildeo foram um meio de eliminar as barreiras agrave circulaccedilatildeo de capital e as poliacuteticas

urbanas tinham vultosos investimentos e deu respaldo agrave urbanizaccedilatildeo como estrateacutegia de

desenvolvimento do territoacuterio

Em 1964 foi criado o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) por meio da Lei nordm

4380 de 21 de agosto de 1964 que institui tambeacutem o Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

(SFH) com a grande inovaccedilatildeo da correccedilatildeo monetaacuteria nos contratos imobiliaacuterios aleacutem das

Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) as Letras Imobiliaacuterias (LI) e o Serviccedilo Federal de

Habitaccedilatildeo e Urbanismo (Serfhau) Este tinha por meta baacutesica promover a elaboraccedilatildeo e a

implantaccedilatildeo de planos de desenvolvimento local e integrado de acordo com o planejamento

nacional e regional e ainda colaborar com os governos municipais na execuccedilatildeo do

planejamento local e integrado inclusive na organizaccedilatildeo de serviccedilos de natureza municipal

assistindo-os em assuntos de seu interesse e realizar estudos relacionados com as migraccedilotildees

internas (BRASIL 2004)

Os objetivos do BNH e SFH eram de coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos

puacuteblicos e o financiamento para o saneamento difundir a propriedade residencial entre as

112

classes de menor poder aquisitivo reduzir o preccedilo da habitaccedilatildeo pelo aumento da oferta da

economia de escala na produccedilatildeo proporcionar melhorias sanitaacuterias agrave populaccedilatildeo redistribuir

regionalmente os investimentos aumentar a eficiecircncia da aplicaccedilatildeo dos recursos estaduais e

municipais orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias populares

financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria propiciando a melhoria do padratildeo habitacional e do

ambiente eliminar as favelas aumentar o investimento da induacutestria de construccedilatildeo civil criar

poacutelos de desenvolvimento para melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas rurais e estimular a

poupanccedila privada e o investimento (RODRIGUES 2001)

Em 1968 foi criado o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS) e o Financiamento

de Saneamento (FINANSA) com subprogramas voltados para a implantaccedilatildeo ou melhoria de

sistemas de abastecimento de aacutegua de esgotos ou de drenagem e poluiccedilatildeo hiacutedrica

De acordo com Ministeacuterio das Cidades (2004) os recursos para o SFH seriam

oriundos principalmente de uma contribuiccedilatildeo compulsoacuteria de empresaacuterios e trabalhadores

do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)23 voltado para a produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

popular do Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo (SBPE)24 destinado a classe

meacutedia e dos lucros dos reembolsos de creacuteditos concedidos Este novo sistema implicou em

um processo de centralizaccedilatildeo o qual eliminou a praacutetica de construccedilatildeo de habitaccedilatildeo popular

por parte de instituiccedilotildees privadas e puacuteblicas como por exemplo sindicatos e institutos

previdenciaacuterios que constituiacuteam formas de alternativas de produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

Esse novo modelo da poliacutetica habitacional eacute implementado como um conjunto de

caracteriacutesticas que deixaram marcas importantes na estrutura institucional e na concepccedilatildeo

dominante de poliacutetica habitacional nos anos que se seguiram pois passou a apresentar um

caraacuteter mais amplo e global emergindo com o propoacutesito de diminuir o deacuteficit habitacional e

gerar novos empregos com o aumento de construccedilotildees legitimando assim o poder estatal e

criando condiccedilotildees para reproduccedilatildeo do capitalismo

Como a induacutestria de construccedilatildeo civil utiliza matildeo-de-obra em larga escala incentivar a induacutestria de construccedilatildeo eacute tambeacutem tentar atenuar a crise econocircmica Ao mesmo tempo difunde mais a ideologia da casa proacutepria contribui para a estabilidade social e torna os proprietaacuterios aliados da ordem A poliacutetica habitacional assume um modelo empresarial num momento em que eacute crucial para o novo regime dar provas de que eacute capaz de

23 O FGTS foi criado por meio da Lei nordm 5107 de 14 de setembro de 1966 e eacute composto por contas vinculadas em nome dos trabalhadores nas quais as empresas depositam mensalmente valor equivalente a 85 das remuneraccedilotildees que lhes satildeo pagas ou devidas (BRASIL 2004 p 22) 24 SBPE era constituiacutedo pelas Caixas Econocircmicas Federal e Estaduais pelas Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) e pelas Associaccedilotildees de Poupanccedilas e Empreacutestimos (BRASIL 2004 p 13)

113

atacar problemas sociais resolvendo a questatildeo da moradia Eacute preciso ocupar os vazios deixados com o fechamento poliacutetico (RODRIGUES 2001 p 57)

Com a criaccedilatildeo do BNH surgiram em todo o Paiacutes oacutergatildeos com a finalidade de

executar a poliacutetica habitacional como as Companhias de Habitaccedilatildeo (Cohab) no Paraacute25

Amazonas e Maranhatildeo26 que tinham como finalidade estudar as questotildees relacionadas agrave

habitaccedilatildeo de interesse social e executar essas poliacuteticas voltadas agraves famiacutelias de menor poder

aquisitivo

As Cohabs e outros oacutergatildeos semelhantes surgiram com o objetivo de apoiarem o SFH

executando o papel de agentes financeiros e promotores estabelecendo-se na qualidade de

sociedades de economia mista com capital originaacuterio constituiacutedo majoritariamente por

recursos do poder puacuteblico

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

regime militar para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades

brasileiras Embora o BNH e as Cohabs tenham surgido com um discurso que enfatizava o

caraacuteter social e o atendimento prioritaacuterio agraves famiacutelias de menor poder aquisitivo na praacutetica

esses oacutergatildeos desenvolveram poliacuteticas que acentuaram as desigualdades sociais e a segregaccedilatildeo

do espaccedilo urbano

Para Maricato (1996) a accedilatildeo do BNH natildeo se limitou apenas agrave habitaccedilatildeo pois acabou

ampliando significativamente suas intervenccedilotildees Passou a atuar no setor de desenvolvimento

urbano sendo considerado como um dos mais expressivos agentes financeiros do processo de

desenvolvimento urbano coordenando a poliacutetica habitacional e o financiamento para o

saneamento Esse banco financiou obras de infraestrutura urbana melhorou o sistema viaacuterio e

pavimentou ruas das cidades bem como aperfeiccediloou a rede de energia eleacutetrica de transportes

e de comunicaccedilatildeo incentivou a educaccedilatildeo a cultura e o desenvolvimento da induacutestria da

construccedilatildeo civil melhorou os serviccedilos puacuteblicos financiou planos e estudos para elaboraccedilatildeo

25 No Paraacute a Cohab instituiacuteda pela Lei Estadual nordm 3282 de 13 de abril de 1965 era uma empresa de economia mista e tinha as seguintes finalidades planejar e executar os programas de habitaccedilatildeo popular adquirir vender e urbanizar os terrenos a serem utilizados em programas habitacionais produzir e comercializar unidades habitacionais de interesse social exercer atividades de construccedilatildeo civil apoiar programas e projetos de desenvolvimento comunitaacuterio comprar e vender materiais de construccedilatildeo visando apoiar as metas do Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (ALVES 1997) 26 Em 1966 foi instituiacuteda a Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo (Cohab-MA) por meio da Lei nordm 2367 com o objetivo de promover a execuccedilatildeo de projetos habitacionais destinados agrave recuperaccedilatildeo ou erradicaccedilatildeo de aglomerados de sub-habitaccedilotildees e tambeacutem ao atendimento da demanda de habitaccedilatildeo de baixo custo destinadas agraves famiacutelias de baixo poder aquisitivo (entre um e trecircs salaacuterios miacutenimos)

114

de legislaccedilatildeo e projetos dentre outros Pode-se entatildeo afirmar que o BNH foi um dos

importantes promotores das transformaccedilotildees urbanas no Brasil

De 1964 a 1984 foram financiadas pelo BNH 4 milhotildees e 369 mil unidades sendo 2

milhotildees e 557 mil na faixa de interesse social o que representou 585 do total de unidades

financiadas Na faixa do SBPE foram financiadas 1 milhatildeo e 812 mil unidades No entanto

quando se considera os valores de financiamentos verificou-se que a maior porcentagem de

recursos foi canalizada para a faixa do SBPE (RODRIGUES 2001)

Entretanto esse modelo da poliacutetica habitacional se transforma em um instrumento de

repressatildeo por meio dos programas de remoccedilatildeo de favelas e passa a atender a nova classe

meacutedia surgida no contexto do desenvolvimento capitalista jaacute que as poliacuteticas puacuteblicas

implementadas natildeo eram eficientes eou suficientes para atender toda demanda

Outro fator relevante eacute que a produccedilatildeo privada tambeacutem natildeo atendia a demanda

habitacional aleacutem do que seu custo era significativamente superior a realidade financeira de

muitos trabalhadores e o aumento populacional nas grandes cidades agravava ainda mais o

problema habitacional no Brasil

Naquela eacutepoca dizia-se que o deacuteficit habitacional seria de 15 milhotildees de unidades

um dado geneacuterico que tinha como objetivo convencer a opiniatildeo puacuteblica da necessidade de um

nuacutemero absurdo de novas construccedilotildees e de angariar recursos para o setor As accedilotildees eram

determinadas pela cuacutepula do poder central com pouca ou nenhuma participaccedilatildeo popular

Destarte a prioridade da poliacutetica habitacional se desloca com o decorrer do tempo

nos primeiros anos os investimentos privilegiam as classes populares para legitimar o novo

regime e no periacuteodo de 1970 a 1975 o segmento popular passa para segundo plano uma vez

que o BNH redimensionou sua clientela e promoveu uma mudanccedila no cenaacuterio das cidades

por meio das verticalizaccedilotildees das edificaccedilotildees voltadas para atender aos funcionaacuterios puacuteblicos

teacutecnicos de niacutevel superior e trabalhadores qualificados

Em 1971 foi lanccedilado o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (PLANHAP) com o

intuito de se reaproximar da produccedilatildeo de moradias para as classes de menor poder aquisitivo

Entretanto natildeo obteve ecircxito

Tambeacutem em 1971 foi criado o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA)

elaborado para regular e propiciar maior dinamismo aos planos e obras e o BNH passou a

funcionar como banco de segunda linha e eacute transformado em empresa puacuteblica Em 1972 foi

criado o Projeto Comunidade Urbana para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) Todos esses

planos programas e projetos demonstram a consolidaccedilatildeo de um modelo econocircmico

115

caracterizado pela modernizaccedilatildeo da economia pela concentraccedilatildeo da renda nas classes altas e

meacutedias e a marginalizaccedilatildeo das classes populares (MARICATO 1996 34)

Vale ressaltar que havia uma desarticulaccedilatildeo entre as accedilotildees dos oacutergatildeos responsaacuteveis

pela construccedilatildeo das casas populares e os encarregados dos serviccedilos urbanos bem como a

construccedilatildeo de grandes conjuntos como forma de baratear o custo das moradias geralmente

feitos em locais distantes e sem infraestrutura e por uacuteltimo o seu modelo financeiro que se

revelou inadequado em uma economia com processo inflacionaacuterio (BRASIL 2004 p10)

Bonduki (1994 p 320) acrescenta que quando o BNH buscou reduzir o custo da

moradia para tentar atender a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo ao inveacutes de alterar o

processo de gestatildeo e produccedilatildeo que encarecia o produto final apoiando iniciativas que a

populaccedilatildeo jaacute vinha promovendo optou por rebaixar a qualidade da construccedilatildeo e tamanho da

unidade financiando moradias cada vez menores mais precaacuterias e distantes

O Promorar instituiacutedo no final do ano de 1979 tinha como bandeira de luta a

urbanizaccedilatildeo das favelas objetivando

a) Erradicar as sub-habitaccedilotildees destituiacutedas de condiccedilotildees miacutenimas de serviccedilos conforto e salubridade especialmente as que compotildeem aglomerados conhecidos por palafitas mocambos e favelas b) Priorizar a erradicaccedilatildeo de sub-habitaccedilotildees componentes de aglomerados que por sua situaccedilatildeo crocircnica socialmente criacutetica devem merecer preferecircncia na programaccedilatildeo dos governos estaduais c) Propiciar a permanecircncia das populaccedilotildees beneficiadas nas aacutereas onde anteriormente se localizavam apoacutes a eliminaccedilatildeo das sub-habitaccedilotildees d) Promover a recuperaccedilatildeo de assentamentos de submoradias sujeitas a inundaccedilotildees mediante a utilizaccedilatildeo de sistemas de aterro (SILVA 1989 p 77)

Todavia Silva (1989 p 77) ressalta que o Promorar demonstrou-se autoritaacuterio no

desenvolvimento da poliacutetica habitacional uma vez que impocircs agrave populaccedilatildeo as aacutereas de

remanejamento sem dialogo com a mesma derrubou barracos sem oferecer nenhuma

indenizaccedilatildeo obrigou as famiacutelias a comprarem uma casa muitas vezes em piores condiccedilotildees

do que a que foi demolida

Foram executados vaacuterios programas habitacionais que determinavam a forma como a

populaccedilatildeo poderia habitar sem nem mesmo ouvi-la Esse processo baseado na centralizaccedilatildeo

das decisotildees resultou muitas vezes em programas inadequados ou ineficazes agrave situaccedilatildeo

social do paiacutes Extensos conjuntos habitacionais obrigavam famiacutelias diferentes a viverem da

mesma forma gerando problemas de poacutes-ocupaccedilatildeo Habitaccedilotildees sem nenhuma particularidade

116

esteacutetica ou funcional eram construiacutedas como uma saiacuteda para o deacuteficit habitacional como se

apenas a quantidade fosse solucionar o problema

No periacuteodo de 1970 a 1980 relacionados agrave crise econocircmica mundial que se agravou

no Brasil acarretando em uma profunda reestruturaccedilatildeo produtiva como privatizaccedilotildees

parcerias entre puacuteblico e privado desregulamentaccedilatildeo e liberalizaccedilatildeo do Estado os recursos do

BNH tornam-se mais escassos decorrendo principalmente da inadimplecircncia dos mutuaacuterios

que foram contemplados com a casa proacutepria do aumento do valor das prestaccedilotildees mensais e

da diminuiccedilatildeo dos recursos oriundos do FGTS mediante o aumento do desemprego e a

retirada dos fundos por parte dos trabalhadores que ficaram desempregados Isto afetou

fortemente o setor habitacional

O aumento da inadimplecircncia deveu-se basicamente a natildeo correspondecircncia entre os

criteacuterios de reajuste salarial das prestaccedilotildees jaacute que a partir de 1983 a poliacutetica salarial passou

a reajustar os salaacuterios por faixa salarial onde os setores de baixo salaacuterio eram corrigidos

pelos iacutendices inflacionaacuterios e aplicados aos setores meacutedios e altos um redutor de reajuste

Poreacutem o valor das prestaccedilotildees continuou a ser corrigido segundo criteacuterio uacutenico sempre em

iacutendices superiores ao aumento meacutedio dos salaacuterios dos mutuaacuterios de renda mais elevada

acarretando inevitavelmente na inadimplecircncia dos mutuaacuterios (CARVALHO 1991 p52)

Segundo Valenccedila (2001) a reduccedilatildeo nos investimentos do Governo Federal voltados

agrave habitaccedilatildeo associados agraves altas taxas de inadimplecircncia contribuiacuteram ainda mais para a crise

do SFH e aleacutem disso a crise econocircmica abalou fortemente a sustentaccedilatildeo do governo militar

abrindo espaccedilo para os movimentos sociais que reivindicavam a reabertura poliacutetica e

melhores condiccedilotildees sociais inclusive com relaccedilatildeo agraves questotildees urbanas e de moradia

Desde 1980 que no Brasil 686 da populaccedilatildeo segundo dados da Fundaccedilatildeo IBGE moram na cidade Esse fato cada vez mais exige uma accedilatildeo positiva do Estado no ato da construccedilatildeo da moradia Dessa forma o Estado Brasileiro ao promover a distribuiccedilatildeo e gestatildeo dos equipamentos de consumo coletivo indispensaacuteveis agrave reproduccedilatildeo da vida nas cidades - no caso particular a moradia - tem contribuiacutedo tambeacutem para a expansatildeo urbana criando condiccedilotildees favoraacuteveis para que outros setores da sociedade ligados diretamente ao capital se reproduziam Eacute o caso das empresas de transportes empreiteiras etc (RODRIGUES 2001 p 59)

Valenccedila (2001) faz uma revisatildeo histoacuterica das poliacuteticas habitacionais desenvolvidas

pelos sucessivos governos brasileiros desde o final do periacuteodo militar ateacute o final dos anos

1990 montando um panorama a partir do quadro 2

117

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil

Periacuteodo Caracteriacutesticas Final dos anos 1970 ateacute 1983

Crises econocircmica e financeira abalam a principal fonte de recursos do SFH a renda da populaccedilatildeo

Governo Figueiredo (1979-85) adota medidas tanto econocircmicas quanto de poliacutetica habitacional que deram iniacutecio a crise do sistema

1983-1986

Governo Figueiredo toma medidas emergenciais

como o Bocircnus do BHN

para

solucionar problemas imediatos do SFH mas a crise se agrava

Ao final do periacuteodo o Governo Sarney (1985-89) patrocina dois foacuteruns de discussatildeo com a sociedade civil o grupo de trabalho sobre reformulaccedilatildeo do SFH - GTRSFH organizado pelo MDU e o debate nacional promovido juntamente pelo IAB e o MDU

Mutuaacuterios do BNH politicamente engajados deixam de pagar prestaccedilotildees e iniciam accedilotildees na justiccedila contra aumentos excessivos

Em 1986 sem grandes justificativas o governo federal fecha o BNH (interesse do poder executivo e de conglomerados financeiros em ter acesso agraves somas vultuosas das cadernetas de poupanccedila e FGTS que eram manipuladas apenas pelo sistema SFH-BNH)

1986-1990

Com o fechamento do BNH a poliacutetica habitacional eacute deixada de lado

O SFH continuou ainda operando minimamente

Eacute criada a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria ligada diretamente agrave Presidecircncia (clientelismo)

Poliacutetica habitacional aceacutefala e sem normas claras

1990-1992

Governo Collor confisca as cadernetas de poupanccedila por 18 meses e prejudica seriamente o SFH

Ministeacuterio da Accedilatildeo Social atraveacutes da Secretaria Nacional de Habitaccedilatildeo tendo como oacutergatildeo operador a Caixa Econocircmica Federal

CEF lanccedila programa habitacional para a aacuterea social mas devido agrave grande participaccedilatildeo da iniciativa privada muitas unidades habitacionais produzidas natildeo havia sido comercializada ateacute 1994 (preccedilo incompatiacutevel com a renda do puacuteblico-alvo)

A partir de 1992 recessatildeo e comprometimento do FGTS paralisam aprovaccedilotildees para projetos habitacionais

1993-1998

Governo Itamar Franco (1994-94) administraccedilatildeo da crise e reforma da CEF

Primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (1995-98) criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana (SEPURB) que junto ao Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento propotildeem a administram a poliacutetica habitacional tendo como oacutergatildeo executor a CEF Principais programas Proacute-Moradia Proacute-Credi e PAR (operaccedilatildeo dos sistemas de caderneta de poupanccedila e FGTS)

Fonte Valenccedila (2001 p 36)

A partir de 1986 quando ocorreu a extinccedilatildeo do BNH a Caixa Econocircmica Federal

(CEF) ficou com a atribuiccedilatildeo de desenvolver a poliacutetica habitacional do Paiacutes e o sistema

habitacional brasileiro passou a vivenciar intensas crises que acarretaram em um alto

endividamento desse sistema e na incapacidade de implementaccedilatildeo de novos projetos

A crise do SFH e a extinccedilatildeo do BNH criaram um hiato em relaccedilatildeo agrave poliacutetica

habitacional no Paiacutes com a desarticulaccedilatildeo progressiva da instacircncia federal a fragmentaccedilatildeo

institucional a perda de capacidade decisoacuteria e a reduccedilatildeo significativa dos recursos

disponibilizados para investimento na aacuterea (BRASIL 2004 p 10)

118

A esse respeito Azevedo (1996) contextualiza que no acircmbito institucional o

governo Sarney tomou diversas medidas que inicialmente indicavam uma intenccedilatildeo

reformadora Entretanto essas medidas demonstraram um retrocesso na adoccedilatildeo das poliacuteticas

habitacionais uma vez que a forma como foi decretada a extinccedilatildeo do BNH causou surpresa

para as entidades envolvidas na reformulaccedilatildeo do SFH jaacute que ocorreu de maneira abrupta e

sem margem para contrapropostas Esse procedimento se chocava com as declaraccedilotildees de

intenccedilotildees e encaminhamentos anteriores feitos pelo proacuteprio governo

Arretche (apud BONDUKI 2008) enfatiza as divergecircncias entre setores do governo

pela disputa em administrar os vultosos recursos envolvidos em investimentos na aacuterea

habitacional e de saneamento baacutesico assim como a estrateacutegia do governo federal em um

momento de reestruturaccedilatildeo poliacutetica para ampliar suas possibilidades de barganha junto aos

governos estaduais como elementos que contribuiacuteram para a extinccedilatildeo do BNH

Bonduki (2008 p 74) ressalta que

Dentre os erros praticados se destaca a opccedilatildeo por grandes conjuntos na periferia das cidades o que gerou verdadeiros bairros dormitoacuterios a desarticulaccedilatildeo entre os projetos habitacionais e a poliacutetica urbana e o absoluto desprezo pela qualidade do projeto gerando soluccedilotildees uniformizadas padronizadas e sem nenhuma preocupaccedilatildeo com a qualidade da moradia com a inserccedilatildeo urbana e com o respeito ao meio fiacutesico Indiferente agrave diversidade existente num paiacutes de dimensotildees continentais o BNH desconsiderou as peculiaridades de cada regiatildeo natildeo levando em conta aspectos culturais ambientais e de contexto urbano reproduzindo agrave exaustatildeo modelos padronizados

Esse panorama revela o papel do Estado enquanto agente promotor da segregaccedilatildeo e

de exclusatildeo de uma grande parcela da populaccedilatildeo ao direto agrave cidade aleacutem de consolidador da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao garantir o acesso agrave moradia apenas a classe meacutedia em detrimento

das classes de menor poder aquisitivo por meio de subsiacutedios oriundos do FGTS que de certa

forma satildeo provenientes dos trabalhadores

Eacute importante destacar que o BNH foi criado objetivando responder agrave forte crise de

moradia ocorrida pelo intenso processo de urbanizaccedilatildeo Para tanto era necessaacuterio

implementar uma poliacutetica de financiamento capaz de estruturar o setor da construccedilatildeo civil

habitacional

Esse fato desvelou o papel econocircmico da poliacutetica habitacional uma vez que

dinamizou a economia por meio da geraccedilatildeo de emprego e fortaleceu o setor da construccedilatildeo

civil transformando-se em um dos elementos centrais da estrateacutegia dos governos militares

119

Azevedo (1996 p 83) aponta as principais diferenccedilas na conduccedilatildeo dos programas

habitacionais apoacutes a mudanccedila do oacutergatildeo operador

a) apesar das duas instituiccedilotildees tratarem-se de bancos o BNH era considerado uma agecircncia financeira de vocaccedilatildeo social enquanto a CAIXA tinha uma atuaccedilatildeo mais comercial com maior preocupaccedilatildeo em equiliacutebrio de investimentos retorno de capital entre outros ressaltando que nessa nova situaccedilatildeo a questatildeo habitacional passou a ser tratada de forma setorial b) o novo arcabouccedilo normativo imposto pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e complementado pela CAIXA dificultou o acesso das Cohabs aos financiamentos habitacionais diminuindo expressivamente sua produccedilatildeo e consequumlentemente restringindo a capacidade das administraccedilotildees municipais e estaduais de atuar em investimentos habitacionais por outro lado facilitando o acesso agrave iniciativa privada neste setor c) a nova posiccedilatildeo das Cohabs no arranjo da poliacutetica habitacional passando de agentes promotores a oacutergatildeos assessores acarretou em enfraquecimento das companhias elevaccedilatildeo da faixa de renda das famiacutelias beneficiadas pelos programas habitacionais (acima de cinco salaacuterios miacutenimos) e desaceleraccedilatildeo dos programas alternativos

A incorporaccedilatildeo das atividades do BNH agrave CEF fez com que a questatildeo habitacional

passasse a depender de uma instituiccedilatildeo em que essa questatildeo embora importante fosse

objetivo setorial Do mesmo modo ainda que considerada como agecircncia financeira de

vocaccedilatildeo social a Caixa possui como eacute natural paradigmas institucionais de um banco

comercial como a busca de equiliacutebrio financeiro retorno do capital aplicado etc

(AZEVEDO 1996 p 84)

Em 1987 foi criado o Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente (MHU)

cujo objetivo era a gestatildeo das poliacuteticas de transportes urbanos e a incorporaccedilatildeo da CEF

estando a poliacutetica habitacional e urbana sob a responsabilidade do referido ministeacuterio

(BRASIL 2004)

Segundo Azevedo (1996 p 17) no primeiro ano apoacutes a extinccedilatildeo do BNH as

Cohabs financiaram 113389 casas populares Poreacutem durante o primeiro semestre de 1988

esse nuacutemero caiu para 30646 unidades Essa reduccedilatildeo ocorreu devido agraves mudanccedilas da

poliacutetica habitacional a partir da Resoluccedilatildeo nordm 1464 de 26 de fevereiro de 1988 do Conselho

Monetaacuterio Nacional (CMN) que sob a alegaccedilatildeo da necessidade de controle das diacutevidas dos

estados e municiacutepios criou medidas restritivas ao acesso a creacuteditos por parte das Cohabs

No que diz respeito ao Maranhatildeo entre os anos de 1962 e 1965 foram construiacutedas

752 unidades habitacionais em sete municiacutepios maranhenses das quais 624 ou 8298

concentraram-se na capital especialmente na aacuterea central conforme quadro 3

120

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965

Municiacutepio Conjunto habitacional Nordm de unidades Satildeo Luiacutes Joseacute Bonifaacutecio A Silva 536

Nossa Sra das Graccedilas 40 Bancaacuterios 48

Caxias Caxias I 30 Caxias II 30

Codoacute Codoacute 10 Carolina Carolina 10 Pedreiras Pedreiras 20 Bacabal Bacabal 20 Timon Timon 08

Total 752 Fonte MARANHAtildeO STDUCPH Diagnoacutestico Habitacional do Estado do Maranhatildeo Satildeo Luiacutes 1988 p 66

A execuccedilatildeo de programas habitacionais por meio da Cohab assumiu papel central

na poliacutetica urbana do Governo Sarney No periacuteodo de 1967 a 1971 foi planejada a construccedilatildeo

de 7000 unidades habitacionais e o financiamento de melhorias habitacionais de outras 7000

unidades habitacionais deficientes na cidade de Satildeo Luiacutes (PEMAS 2004)

Entretanto em funccedilatildeo do jogo poliacutetico e dos interesses econocircmicos das elites que

deram sustentaccedilatildeo ao projeto de modernizaccedilatildeo conservadora as atuaccedilotildees da Cohab tiveram

um alcance limitado no sentido de resolver os graves problemas sociais que se acentuavam na

cidade

De acordo com Luz (2004) na deacutecada de 1970 as aacutereas de palafitas se ampliaram

principalmente em direccedilatildeo agrave regiatildeo do Satildeo Francisco Ilhinha Lagoa da Jansen e para os

manguezais da margem esquerda do Rio Anil proacuteximos dos bairros do Caratatiua Alemanha

Vinhais e Ipase No mesmo periacuteodo foi ampliada a frente de expansatildeo urbana em direccedilatildeo a

Regiatildeo do ItaquiBaganga aleacutem disso novos bairros como Vila Nova Saacute Viana Novo Vila

Embratel Anjo da Guarda e Itaquiacute experimentaram um raacutepido crescimento populacional em

funccedilatildeo da chegada de milhares de famiacutelias expulsas da terra ou deslocadas de suas moradias

para implantaccedilatildeo de grandes projetos no interior da ilha

Em resposta ao agravamento das condiccedilotildees de vida na cidade bem como em uma

estrateacutegia de buscar apoio poliacutetico junto agrave populaccedilatildeo o governo lanccedilou no final de 1979 o

Programa de Erradicaccedilatildeo de Moradias Subnormais o Promorar que seraacute melhor apresentado

no capiacutetulo IV (DIAGNOacuteSTICO HABITACIONAL 1987 p 34)

121

Vale ressaltar que os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda

foram marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a

exemplo dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Em relaccedilatildeo ao Estado do Paraacute pode-se observar que no periacuteodo de 1965 a 1989 a

CohabPa implementou vaacuterios programas habitacionais na Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

(RMB) cujo nuacutemero de unidades habitacionais construiacutedas ateacute o ano de 1989 foi de 22949

conforme tabela 2

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-1989) Nome do Conjunto Ano Nordm Unid Habitacional Municiacutepio

Nova Marambaia I 1965 834 Beleacutem Ananindeua 1971 118 Ananindeua Nova Marambaia II 1972 376 Beleacutem Nova Marambaia III 1973 332 Beleacutem Icoaraci I 1973 296 Beleacutem Icoaraci II 1976 554 Beleacutem Icoaraci III 1976 350 Beleacutem Cidade Nova I 1976 600 Ananindeua Cidade Nova II 1976 1000 Ananindeua Cidade Nova III 1977 461 Ananindeua Cidade Nova IV 1978 2005 Ananindeua Cidade Nova V 1978 3173 Ananindeua Profilurb I 1978 756 Ananindeua Cidade Nova VI 1979 4000 Ananindeua Cidade Nova VII 1980 700 Ananindeua Guajaraacute I 1981 1948 Ananindeua Promorar 1981 1481 Beleacutem Cidade Nova VIII 1986 1879 Ananindeua Cidade Nova IX 1986 120 Ananindeua Cidade Nova (2ordf etapa) 1987 87 Ananindeua Cidade Nova VIII (2ordf etapa) 1988 1109 Ananindeua Catalina 1989 770 Ananindeua

TOTAL 22949 Fonte Alves (1997)

As unidades habitacionais construiacutedas pela CohabPa embora natildeo tenham sido

suficientes para cobrir o deacuteficit habitacional expressivo existente na RMB refletem o

processo de transformaccedilatildeo do uso do solo o qual estaacute articulado intimamente com o mercado

122

de terras e com a segregaccedilatildeo soacutecioespacial expressando as desigualdades de acesso aos

recursos materiais luacutedicos e simboacutelicos da cidade

Na RMB desencadeou-se um padratildeo de urbanizaccedilatildeo alicerccedilada na reproduccedilatildeo de

eixos de expansatildeo horizontal que foi fortemente impulsionado pelo planejamento econocircmico

e territorial e particularmente pelas poliacuteticas de financiamento para a produccedilatildeo habitacional e

de infraestruturas

Destarte a atividade do capital imobiliaacuterio propocircs uma forma de produccedilatildeo do espaccedilo

baseada em uma necessidade de extrair lucro do solo urbano estabelecendo uma relaccedilatildeo

proacutepria entre a ocupaccedilatildeo do solo demandas de mercado e especulaccedilatildeo Dessa maneira atua

sobre o ambiente construiacutedo e depara-se com questotildees que extrapolam o campo econocircmico

Entatildeo os loteamentos ou os conjuntos habitacionais passam a ter tambeacutem um valor

simboacutelico uma vez que o espaccedilo fiacutesico eacute construccedilatildeo do imaginaacuterio individual e coletivo

Smolka (1983 p 140) argumenta que a mediaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio eacute elo

criacutetico do padratildeo de segregaccedilatildeo residencial cujo padratildeo eacute definido por vaacuterios processos que

vatildeo desde a substituiccedilatildeo dos moradores por meio de transaccedilotildees atomizadas de compra e

venda de imoacuteveis usados ateacute as incorporaccedilotildees imobiliaacuterias

conversotildees de uso do solo

visando lucro Esse conjunto de processos assevera a hegemonia da lei do mercado na

determinaccedilatildeo de importantes fenocircmenos que estatildeo diretamente associados agrave geraccedilatildeo e

transformaccedilatildeo de padrotildees de segregaccedilatildeo residencial tais como a mobilidade eou migraccedilotildees

intra-urbana e a valorizaccedilatildeo e desvalorizaccedilatildeo de vizinhanccedilas

De acordo com Trindade Junior (1998) essa eacute a realidade vivenciada na RMB a

qual demonstra a consolidaccedilatildeo da cidade dispersa sendo esta a dimensatildeo espacial do processo

de reproduccedilatildeo do capital com a reafirmaccedilatildeo das divisotildees de mercados e com escalas de

atuaccedilatildeo diferenciadas na qual as empresas de menor forccedila de accedilatildeo tendem a continuar na

dependecircncia direta dos programas de financiamento do Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo na

Aacuterea de Expansatildeo em especial na direccedilatildeo do Municiacutepio de Ananindeua e do distrito de

Icoaraci sob pena de natildeo confirmarem sua permanecircncia no mercado Ao passo que atraveacutes

do programa de lotes urbanizados accedilatildeo prioritaacuteria da CohabPa hoje e do processo ainda

crescente de ocupaccedilotildees urbanas confirme-se a tendecircncia de maior adensamento urbano dos

Municiacutepios de Marituba Benevides e tambeacutem do distrito de Icoaraci

Nesse sentido ao se analisar a produccedilatildeo de unidades habitacionais tanto no Estado

do Maranhatildeo quanto no Estado do Paraacute nota-se que a disponibilidade de creacutedito a juros

voltado para a produccedilatildeo de imoacuteveis novos permitiu agrave classe meacutedia constituir novos bairros e

123

ampliar a fronteira urbana gerando aleacutem da expansatildeo horizontal o gradual esvaziamento dos

centros tradicionais

Aleacutem disso os investimentos na produccedilatildeo de moradias para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo foram reduzidos natildeo alterando o processo de gestatildeo e rebaixando a

qualidade da construccedilatildeo e o tamanho das unidades habitacionais

No acircmbito nacional cabe destacar que em marccedilo de 1989 foi extinto o Ministeacuterio

do Bem-Estar Social (MBES) e criou-se a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria (SEAC)

sob competecircncia do Ministeacuterio do Interior As atividades financeiras desse Sistema estavam

vinculados ao Ministeacuterio da Fazenda

O modelo institucional adotado pelo SEAC privilegiava a iniciativa de estados e

municiacutepios deixando de estabelecer prioridades alocativas o que permitiu maior autonomia

desses governos e o gerenciamento da poliacutetica habitacional

O Programa Nacional de Mutirotildees Habitacionais da SEAC foi um programa

alternativo lanccedilado pelo governo Sarney com o intuito de atender as famiacutelias com renda

mensal ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos Para tanto teria como financiamento os recursos de verba

orccedilamentaacuteria a fundo perdido geralmente em parceria com prefeituras ou estados

acompanhado por grupos constituiacutedos por representantes da comunidade assistida

denominados Sociedade Comunitaacuteria Habitacional (SCH) (AZEVEDO 1996)

No entanto a utilizaccedilatildeo dos recursos do FGTS em quantidade que superava suas

reais disponibilidades financeiras afetou as possibilidades de expansatildeo do financiamento

habitacional levando a sua suspensatildeo temporaacuteria

Para Azevedo (1996 p 83) a experiecircncia da SEAC eacute relevante para se compreender

a poliacutetica habitacional brasileira pois num periacuteodo inferior a dois anos (aproximadamente de

1988 a 1990) o oacutergatildeo que pretendia construir 550000 novas moradias alcanccedilou um terccedilo

disto ainda assim superando a produccedilatildeo realizada pelas Cohabs no mesmo periacuteodo Por

meio de programas tradicionais na CEF que natildeo chegou a 150000 unidades tornando-se

uma experiecircncia importante pois foi a primeira vez na trajetoacuteria da poliacutetica popular

brasileira que um programa alternativo apresentou melhor desempenho quantitativo do que os

convencionais

Contudo alguns fatores satildeo destacados para explicar a natildeo plenitude na execuccedilatildeo

dessas medidas o baixo financiamento unitaacuterio aliado agrave inflaccedilatildeo crescente a maacute utilizaccedilatildeo

dos recursos o processo inflacionaacuterio a dependecircncia exclusiva de verbas orccedilamentaacuterias aleacutem

da inexistecircncia de uma poliacutetica clara de prioridades para alocaccedilatildeo de recursos e as accedilotildees

clientelismo (VALENCcedilA 1999 apud AZEVEDO 1996)

124

Com a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 haacute uma institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas em especial da habitacional O

processo de descentralizaccedilatildeo e a reforma do Estado estabelecem uma redefiniccedilatildeo de

competecircncias passando a ser atribuiccedilatildeo dos Estados e Municiacutepios a gestatildeo dos programas

sociais e dentre eles o de habitaccedilatildeo seja por iniciativa proacutepria seja por adesatildeo a algum

programa proposto por outro niacutevel de governo seja por imposiccedilatildeo Constitucional (BRASIL

2004 p 10)

Conforme foi citado no capiacutetulo anterior o ideaacuterio da reforma urbana corresponde a

uma reforma social estrutural com uma muito forte e evidente dimensatildeo espacial tendo por

objetivo melhorar a qualidade de vida da populaccedilatildeo especialmente de sua parcela mais pobre

e elevar o niacutevel de justiccedila social tendo como objetivos coibir a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

reduzir o niacutevel de disparidade socioeconocircmico-espacial intra-urbano democratizar o

planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano (SOUZA 2002 p112-113)

De acordo com Maricato (1997 p 311) as principais propostas apresentadas na

referida emenda foram

Em relaccedilatildeo agrave propriedade imobiliaacuteria urbana

instrumentos de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Captaccedilatildeo da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria Aplicaccedilatildeo da funccedilatildeo social da propriedade Proteccedilatildeo urbaniacutestica ambiental e cultural Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica habitacional

programas puacuteblicos habitacionais de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Aluguel ou prestaccedilatildeo da casa proacutepria proporcional agrave renda familiar Agecircncia nacional e descentralizaccedilatildeo na gestatildeo da poliacutetica Em relaccedilatildeo aos transportes e serviccedilos pppa

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-008406406 3645 6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 172419 1090)Tj0081743 7Pode6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17279501090)Tj00843 7-6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17285801090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0203201090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17310301090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0319701090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0328001090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0308401090)Tj009187 8445 5727 Tm(a)Tj03Tj01090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0349001090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17357401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj036501090)Tj0r9187 Tf009187 0 0 -009187 17308401090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17389101090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0398701090)Tj0m0 -009187 6928 5727 Tm(413001090)Tj0oj0 Tf009187 0 0 -009187 174)1401090)Tj0g9187 8267 5727 Tm(a)Tj0448401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0449101090)Tj088 Tz(referida emenda for458501090)Tj008406 64eferida emenda for467901090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0408401090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17493501090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0509181090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0511201090)Tj009187 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125

direito fundamental da pessoa humana que soacute pode ser assegurada a partir da efetivaccedilatildeo de

uma poliacutetica habitacional comprometida com a melhoria das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo

Entretanto durante a vigecircncia do governo Collor no periacuteodo de 1990 a 1992

ocorreu um agravamento no desenvolvimento das poliacuteticas habitacionais gerada pelo confisco

das cadernetas de poupanccedila acarretando na estagnaccedilatildeo da mesma e do FGTS visto que parte

do dinheiro que era investido em poupanccedila estava destinado ao SFH

Nesse periacuteodo o Estado reduziu sua participaccedilatildeo no mercado de terras diminuindo

os gastos sociais e a forma de movimentaccedilatildeo de capital deixando a cargo dos especuladores

imobiliaacuterio a produccedilatildeo de moradias o que acarretou no monopoacutelio fundiaacuterio e provocou o

agravamento da crise no setor habitacional

Conforme Azevedo (1996 p 84) houve uma banalizaccedilatildeo da poliacutetica habitacional

por conta da dissociaccedilatildeo das atividades de saneamento e desenvolvimento urbano e sua

transformaccedilatildeo em uma poliacutetica distributiva agora vinculada ao novo Ministeacuterio da Accedilatildeo

Social Portanto a alocaccedilatildeo das unidades construiacutedas tanto pelos programas populares

convencionais como pelos alternativos de autoconstruccedilatildeo continuou sendo feita por criteacuterios

aleatoacuterios

Dois exemplos podem ser destacados para ratificar a argumentaccedilatildeo da autora

primeiro no final dos anos de 1990 o governo brasileiro criou o Programa Carta de Creacutedito

que teve por objetivo proporcionar o financiamento de construccedilatildeo sob a forma associativa

propiciando uma nova maneira de morar na qual as pessoas satildeo agrupadas e coordenadas por

entidades organizadas que constroem os conjuntos habitacionais e condomiacutenios fechados

(AZEVEDO 1996 p 85)

O financiamento individual ficou mantido na faixa de doze salaacuterios miacutenimos com tratamento diferenciado para os mutuaacuterios com renda familiar de ateacute seis salaacuterios miacutenimos sob o discurso da redistribuiccedilatildeo de renda Com relaccedilatildeo agrave taxa de juros praticados pelo Programa variava de 3 a 9 de acordo com as diferentes faixas de renda (AZEVEDO 1996 p 85)

Segundo o governo Collor lanccedilou em maio de 1990 o Plano de Accedilatildeo Imediata para

a Habitaccedilatildeo (PAIH) que previa a construccedilatildeo de 245 mil unidades habitacionais em 180 dias

para famiacutelias de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos com recursos do FGTS e se desenvolveria em

trecircs vertentes programa de moradias populares (produccedilatildeo de novas unidades) programa

de lotes urbanizados (com ou sem cesta baacutesica de materiais) e programa de accedilatildeo municipal

para habitaccedilatildeo popular (unidades acabadas e lotes urbanizados) (AZEVEDO 1996 p 85)

126

Contudo fazendo uma avaliaccedilatildeo do PAIH percebe-se que vaacuterias metas natildeo foram

cumpridas como o prazo estimado de 180 dias prolongou-se por mais de 18 meses 210 mil

unidades habitacionais construiacutedas a valores significativamente maiores que os previstos

inicialmente aleacutem disso a alocaccedilatildeo de recursos natildeo atendeu aos percentuais definidos pelo

Conselho Curador do FGTS para os diversos estados da Federaccedilatildeo

Outro fator importante eacute que as parcerias das empresas privadas fizeram com que as

unidades habitacionais ficassem mais caras e a camada de menor poder aquisitivo que era

tida como puacuteblico-alvo passou a ser excluiacuteda por sua incapacidade do pagamento um dos

motivos que contribuiu para a insatisfaccedilatildeo da populaccedilatildeo ocasionando no impeachment do

presidente Collor27

No periacuteodo de 1992 a 1994 durante o governo de Itamar Franco houve uma

modificaccedilatildeo do cenaacuterio econocircmico por meio do controle da inflaccedilatildeo e fortalecimento da

economia com o Plano Real e a gestatildeo da poliacutetica puacuteblica de habitaccedilatildeo ganha novos rumos

por meio da implantaccedilatildeo dos Programas Habitar Brasil (voltado para os municiacutepios de mais

de 50 mil habitantes) e Morar Municiacutepio

(destinado aos municiacutepios de menor porte) que se

apresentaram como alternativas para a produccedilatildeo de moradias Estes programas na aacuterea de

habitaccedilatildeo popular agora sob o controle do Ministeacuterio do Bem-Estar Social exigiam a

participaccedilatildeo de Conselhos Gestores Estaduais de Poliacutetica Puacuteblica de Habitaccedilatildeo e para os

investimentos poderiam ter uma contrapartida dos governos locais

Segundo Azevedo (1996 p 88) do ponto de vista poliacutetico os programas

apresentaram um avanccedilo quanto agrave gestatildeo da poliacutetica habitacional atraveacutes dos conselhos e a

constituiccedilatildeo de fundos especiacuteficos para a habitaccedilatildeo Do ponto de vista operacional de

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional tiveram pouca efetividade

Em 1995 com o governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) ocorreu a

consolidaccedilatildeo da poliacutetica neoliberal com incentivo a privatizaccedilatildeo e a habitaccedilatildeo passou a ser

tratada no acircmbito da poliacutetica de desenvolvimento urbano integrada agrave poliacutetica urbana e agrave

poliacutetica de saneamento ambiental articulando accedilotildees com os estados e municiacutepios a fim de

garantir o uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano e a funccedilatildeo social das cidades empreendendo uma

reforma mais efetiva nesse setor promovendo uma ampla reorganizaccedilatildeo institucional com a

extinccedilatildeo do Ministeacuterio do Bem Estar Social e com a criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana

(SEPURB) no acircmbito do Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento (MPO) esfera que ficaria

27 O impeachment de Collor foi fruto da articulaccedilatildeo de vaacuterios movimentos sociais dentre eles o Movimento pela Eacutetica na Poliacutetica Movimento dos Caras-Pintadas (composto basicamente por estudantes secundaristas e universitaacuterios) e por meio da organizaccedilatildeo da sociedade civil

127

responsaacutevel pela formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo aleacutem de

defender uma poliacutetica fundiaacuteria urbana adequada de modo a desestimular a formaccedilatildeo de

estoques de terras para fins especulativos (OLIVEIRA 2001)28

No Brasil desenvolveu-se um intenso processo de globalizaccedilatildeo financeira e

produtiva internacional que foi marcado por uma ideologia denominada de neoliberalismo

que pregava a reduccedilatildeo do papel do Estado ao miacutenimo e a liberalizaccedilatildeo do mercado ao

maacuteximo provocando a reduccedilatildeo da intervenccedilatildeo estatal nas poliacuteticas sociais natildeo sendo mais

entendido como o provedor de serviccedilos puacuteblicos mas como promotor e regulador

(BONDUKI 2008)

Neste sentido propotildee que os programas habitacionais

aleacutem de flexiacuteveis para atender a diferentes setores sociais

sejam pensados de forma integrada aos de saneamento ambiental infraestrutura social e transporte urbano Esta mudanccedila de inflexatildeo da poliacutetica habitacional

que deixa de ser vista apenas como uma poliacutetica assistencialista

registra um enfoque de poliacuteticas puacuteblicas que abre maiores possibilidades de accedilotildees integradas e muito mais efetivas no campo do habitat (AZEVEDO 1996 p 92)

No campo da habitaccedilatildeo popular as propostas eram apoiar programas geradores de

tecnologia simplificada que possibilitassem a construccedilatildeo de moradias de qualidade a custo

reduzido privilegiar as formas associativas e cooperativas de produccedilatildeo de habitaccedilotildees e

incentivar programas de assistecircncia teacutecnica aos oacutergatildeos entidades e organizaccedilotildees

comunitaacuterias comprometidas com soluccedilotildees locais e integradas de interesse social Os

princiacutepios adotados como novos referenciais pelo menos na retoacuterica eram flexibilidade

descentralizaccedilatildeo diversidade reconhecimento da cidade real entre outros (BONDUKI

2008)

Bonduki (2008) argumenta que foram retomados os financiamentos de habitaccedilatildeo e

saneamento com base nos recursos do FGTS Tambeacutem foram criadas novas linhas de

financiamento habitacional tendo como base os projetos propostos pelos governos estaduais e

municipais com sua concessatildeo estabelecida a partir de um conjunto de criteacuterios teacutecnicos de

projeto e ainda da capacidade de pagamento dos governos locais

28 No Paraacute de acordo com Holanda (2011) em 1995 a Cohab passou por uma reestruturaccedilatildeo institucional com o objetivo de retomar os financiamentos na aacuterea habitacional passando a executar accedilotildees voltadas agrave instrumentalizaccedilatildeo do planejamento urbano por meio da elaboraccedilatildeo de bases cartograacuteficas e investimentos em urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas e loteamentos aleacutem da produccedilatildeo de habitaccedilotildees em pequena escala destinada ao atendimento de servidores puacuteblicos estadual pois a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para servidores foi uma estrateacutegia encontrada pela COHAB-PA para viabilizar novos empreendimentos visto que nesse periacuteodo os programas habitacionais de FHC se mostravam bastante restritivos e produzi para servidores puacuteblicos facilitava a aprovaccedilatildeo de projetos junto agrave CEF jaacute que os descontos das parcelas do financiamento eram realizados na folha de pagamento mensal ou seja os riscos de inadimplecircncia eram miacutenimos

128

Foram instituiacutedos vaacuterios programas direcionados a questatildeo habitacional no governo

de FHC conforme demonstrado no quadro 4

Quadro 4- Programas Habitacionais implementados no Governo FHC Programas Accedilotildees

Proacute-Moradia

Antigo Morar Municiacutepio era financiado com recursos do FGTS e voltado ao atendimento da melhoria nas condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos e na aquisiccedilatildeo ou produccedilatildeo de lotes urbanizados materiais de construccedilatildeo produccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo de conjuntos habitacionais Deveria ser pleiteados por oacutergatildeos da administraccedilatildeo estadual ou municipal adimplentes junto ao governo federal e ter capacidade de endividamento

Carta de Creacutedito Individual

Visava melhorias das condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 12 salaacuterios miacutenimos por meio das modalidades de aquisiccedilatildeo de unidade habitacional (avaliada no maacuteximo em R$ 8 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 10 mil) conclusatildeo reforma ou ampliaccedilatildeo de imoacutevel usado Utilizava recursos do FGTS e das cadernetas de poupanccedila

Carta de Creacutedito Associativa

Com recursos do FGTS objetivava a construccedilatildeo de unidades habitacionais (valor maacuteximo de R$ 315 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 8 mil) por meio da concessatildeo de financiamento a pessoas fiacutesicas agrupadas em condomiacutenios ou organizadas por sindicatos cooperativas ou associaccedilotildees voltadas agrave produccedilatildeo habitacional

Apoio agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

Apoiava a induacutestria da construccedilatildeo civil na produccedilatildeo de ateacute 500 unidades habitacionais utilizando recursos do FGTS e era voltado para o atendimento de famiacutelias da classe meacutedia e alta Teve um desempenho piacutefio

Habitar Brasil BID

Era financiado com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) tinha como objetivo propiciar melhoria das condiccedilotildees de habitabilidade de aacutereas degradas e era voltada para o poder puacuteblico municipal

Programa de Arrendamento Residencial (PAR)

Programa considerado inovador que concedia empreacutestimo agraves empresas privadas para produccedilatildeo habitacional no intuito de atender as famiacutelias entre trecircs e seis salaacuterios miacutenimos Utilizava um mix de recursos formado pelo FGTS e recursos de origem fiscal

Fonte Valenccedila (2001) Cardoso (2003) Azevedo (2007) Bonduki (2008)

Em 1997 foi criado o Sistema Financeiro Imobiliaacuterio (SFI) por meio da Lei Federal

nordm 9 512 inspirado na experiecircncia norte-americana que operava com recursos da iniciativa

privada tanto nacional como internacional Este Sistema gerava maior seguranccedila aos

investidores imobiliaacuterios atraveacutes da chamada alienaccedilatildeo fiduciaacuteria uma vez que a propriedade

129

soacute era passada ao mutuaacuterio apoacutes a quitaccedilatildeo do valor do imoacutevel o que propiciava ao

financiador a agilidade na retomada dos bens no caso de inadimplecircncia

Isto demonstra a ineficiecircncia do mesmo como modelo de financiamento agrave

estruturaccedilatildeo de poliacuteticas habitacionais pois natildeo combateu o problema do deacuteficit habitacional

dada suas especificidades em conceder creacutedito imobiliaacuterio agrave famiacutelias de maior poder

aquisitivo

O Proacute-Moradia e o Programa Habitar Brasil buscavam-se beneficiar 677100

famiacutelias investindo R$ 52 bilhotildees sendo R$ 4 bilhotildees de recursos do FGTS e R$ 12 milhatildeo

da contrapartida de estados e municiacutepios (SEPURB 1996a 1996b apud AZEVEDO 1996

p24)

Todavia 1996 e 2000 o desempenho do governo no que diz respeito agrave poliacutetica de

habitaccedilatildeo popular stricto sensu pode ser considerado piacutefio ficando aqueacutem do inicialmente

planejado pois para o programa Proacute-Moradia foram investidos cerca de R$ 830 milhotildees

em recursos do FGTS para a construccedilatildeo de 155219 unidades residenciais a um custo meacutedio

unitaacuterio de R$ 540000 No mesmo periacuteodo com recursos a fundo perdido do OGU foram

alocados no Morar Melhor Habitar Brasil em torno de R$ 860 milhotildees que resultaram na

construccedilatildeo de 294595 moradias com custo unitaacuterio meacutedio de R$ 292000

(CAIXA 2000

apud AZEVEDO 1996 p 24)

Bonduki (2008) argumenta que os programas citados acima embora pudessem

expressar uma renovaccedilatildeo na maneira como a questatildeo da habitaccedilatildeo passou a ser tratada pelo

Governo Federal rompendo a riacutegida concepccedilatildeo herdada dos tempos do BNH de fato natildeo

conseguiu se efetivar como nova poliacutetica gerando um conjunto de efeitos perversos do ponto

de vista social econocircmico e urbano

O financiamento para aquisiccedilatildeo de imoacuteveis usados que absorveu 42 do total de recursos destinados agrave habitaccedilatildeo (cerca de 93 bilhotildees) eacute um programa com escasso impacto natildeo gerando empregos a atividade econocircmica O financiamento para material de construccedilatildeo embora tenha o meacuterito de apoiar o enorme conjunto de famiacutelias de baixa renda que auto-empreende a construccedilatildeo da casa proacutepria e de gerar um atendimento massivo (567 mil beneficiados no periacuteodo a de maior alcance quantitativo) tende a estimular a produccedilatildeo informal de moradia agravando os problemas urbanos Ademais o baixo valor do financiamento e a ausecircncia de assessoria teacutecnica natildeo permitem que as famiacutelias beneficiadas alcancem condiccedilotildees adequadas de habitabilidade (BONDUKI 2008 p 80)

Eacute importante observar que apesar do avanccedilo no desenvolvimento das poliacuteticas

habitacionais os programas executados mantiveram ou ateacute mesmo acentuaram o caraacuteter

130

tradicional das poliacuteticas implementadas no Brasil isto eacute de um atendimento privilegiado agraves

camadas de renda meacutedia e alta

De acordo com Bonduki (2008 p 80) referente aos anos de 1995 e 2003 observa-se

que 7884 do total dos recursos foram destinados a famiacutelias com renda superior a 5 salaacuterios

miacutenimos sendo que apenas 85 foram destinados para a baixiacutessima renda (ateacute 3 salaacuterios

miacutenimos) e onde se concentram 832 do deacuteficit quantitativo conforme graacutefico 1

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a 2003

Fonte Bonduki (2008)

Em 2003 inicia-se o Governo Lula Neste governo inicialmente havia uma

preocupaccedilatildeo com a questatildeo habitacional sendo que vaacuterios instrumentos e oacutergatildeos foram

criados objetivando atender agrave demanda habitacional no territoacuterio brasileiro tais como o

Ministeacuterio das Cidades que integralizou a questatildeo habitacional do saneamento e dos

transportes (mobilidade) levando em consideraccedilatildeo o uso e a ocupaccedilatildeo do solo29 o Sistema

Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) criado por meio da Lei nordm 1112430 que

tambeacutem instituiu o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (FNHIS) e seu

29 Foram criadas as Secretarias Nacionais de Habitaccedilatildeo de Saneamento de Mobilidade Urbana e de Programas Urbanos pertencentes ao Ministeacuterio das Cidades 30 Essa lei eacute resultado do projeto apresentado por iniciativa popular em novembro de 1991 e condensa as expectativas de diversas organizaccedilotildees da sociedade civil que atuam no setor da habitaccedilatildeo popular

131

respectivo Conselho Nacional31 centralizando os recursos orccedilamentaacuterios dos programas de

Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Subnormais e de Habitaccedilatildeo de Interesse Social com o intuito

de possibilitar subsiacutedio habitacional para famiacutelias de baixo poder aquisitivo

O SNHIS pretende entre outros objetivos viabilizar para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo o acesso agrave terra urbanizada e agrave habitaccedilatildeo digna e sustentaacutevel Cabe a esse

Sistema a centralizaccedilatildeo de todos os programas e projetos destinados agrave habitaccedilatildeo de interesse

social dando-lhes maior coerecircncia e mais eficiecircncia (BONDUKI 2008)

O FNHIS eacute composto por recursos do Orccedilamento Geral da Uniatildeo (OGU) do Fundo

de Apoio ao Desenvolvimento Social (FADS) dotaccedilotildees recursos de empreacutestimos externos e

internos contribuiccedilotildees e doaccedilotildees de pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas entidades e organismos de

cooperaccedilatildeo nacional e internacional e de receitas de operaccedilotildees realizadas com recursos do

proacuteprio Fundo Tem como objetivo centralizar e gerenciar recursos orccedilamentaacuterios para os

programas estruturados no acircmbito do Sistema como aquisiccedilatildeo construccedilatildeo conclusatildeo

reforma locaccedilatildeo social e arrendamento de unidades habitacionais produccedilatildeo de lotes

urbanizados para fins habitacionais regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbaniacutestica de aacutereas de interesse

social e a implantaccedilatildeo de saneamento baacutesico infraestrutura e equipamentos urbanos

(AZEVEDO 2007)

A poliacutetica de habitaccedilatildeo desenvolvida no governo Lula tem como objetivos

i)universalizar o acesso agrave moradia digna ii) promover a urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo e inserccedilatildeo urbana de assentamentos precaacuterios iii) fortalecer o papel do Estado na gestatildeo da poliacutetica e na regulaccedilatildeo dos agentes privados dentro de um novo modelo com desconcentraccedilatildeo de funccedilotildees e articulaccedilatildeo de accedilotildees para possibilitar a participaccedilatildeo de amplos segmentos da sociedade na sua implantaccedilatildeo iv) tornar a questatildeo habitacional uma prioridade nacional v) democratizar o acesso a terra urbanizada e ao mercado secundaacuterio de imoacuteveis vi) ampliar a produtividade e melhorar a qualidade na produccedilatildeo habitacional e vii) incentivar a geraccedilatildeo de emprego e renda (BRASIL 2004 p 6)

No entanto Bonduki (2008 p 97) diz que mesmo levando em conta o avanccedilo que

representou a criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades faz-se necessaacuterio ressaltar que uma das suas

debilidades eacute sua fraqueza institucional uma vez que a CEF agente operador e principal

agente financeiro dos recursos do FGTS eacute subordinada ao Ministeacuterio da Fazenda

31 No mecircs de outubro do mesmo ano foi realizada a 1ordf Conferecircncia Nacional das Cidades com 2500 delegados em um processo de mobilizaccedilatildeo social que buscava a consolidaccedilatildeo das bases da atuaccedilatildeo do governo visando ainda a criaccedilatildeo e composiccedilatildeo do Conselho Nacional de Habitaccedilatildeo instalado em 2004

132

Em tese o Ministeacuterio das Cidades eacute o responsaacutevel pela gestatildeo da poliacutetica habitacional mas na praacutetica a enorme capilaridade e poder da Caixa presente em todos os municiacutepios do paiacutes acaba fazendo que a decisatildeo sobre a aprovaccedilatildeo dos pedidos de financiamentos e acompanhamento dos empreendimentos seja de sua responsabilidade (BONDUKI 2008 p 97)

O Plano Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) tinha como objetivo planejar as accedilotildees

puacuteblicas e privadas em meacutedio e longo prazo para equacionar as necessidades habitacionais

do Paiacutes no prazo de quinze anos sendo concebido como um plano estrateacutegico de longo prazo

articulado com propostas operacionais a serem implementadas a curto e meacutedio prazo

(BONDUKI 2008)

Contudo observa-se entatildeo que a nova Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) natildeo

conseguiu implantar seus aspectos mais relevantes pois sem subsiacutedios significativos

prevaleceu a visatildeo bancaacuteria da CEF sem alteraccedilotildees substanciais na concessatildeo do creacutedito

Aleacutem disso os programas que foram lanccedilados para atender a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo beneficiaram os financiamentos agrave populaccedilatildeo com maior poder aquisitivo

permanecendo o aspecto segregador dos governos anteriores

Bonduki (2008) ressalta que o FNHIS reiterado na 1ordf Conferecircncia Nacional das

Cidades encontrou forte oposiccedilatildeo na equipe econocircmica e foi aprovado apenas em 2005 e

instalado em julho de 2006 Em vez de ser institucionalizado como um fundo financeiro foi

instituiacutedo como um fundo orccedilamentaacuterio limitado a cumprir seu papel O governo entretanto

comprometeu-se a aportar R$ 1 bilhatildeo por ano para subsidiar os programas habitacionais

No Estado do Paraacute com a implementaccedilatildeo do Programa Cheque Moradia32 a partir

de 2003 houve uma retomada de accedilotildees para a populaccedilatildeo na faixa de renda de ateacute trecircs salaacuterios

miacutenimos Este programa beneficiou 19834 famiacutelias e foi inspirado na experiecircncia de outros

estados brasileiros e financiamento proacuteprio (HOLANDA 2011)

No segundo governo de Lula foi lanccedilado o Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

(PAC) o qual estabeleceu um conjunto de regras compromissos de accedilatildeo e diretrizes de

governo objetivando o crescimento econocircmico de 5 ao ano no periacuteodo de 2007 a 2010

com a implantaccedilatildeo de grandes obras de infraestrutura assim como incluiu um programa de

caraacuteter social a Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Precaacuterios prevendo recursos orccedilamentaacuterios

vultosos para o setor da habitaccedilatildeo

32 De acordo com Holanda (2011) o Programa Cheque Moradia tinha como objetivo viabilizar a compra de materiais de construccedilatildeo para produccedilatildeo e melhorias habitacionais visando o atendimento de famiacutelias com renda de ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos inicialmente voltado apenas a funcionaacuterios puacuteblicos estaduais depois ampliado para alcanccedilar as famiacutelias em situaccedilatildeo de risco e aquelas com moradias atingidas em casos de sinistro

133

O PAC inaugurou uma nova fase na poliacutetica econocircmica retomando a temaacutetica do

crescimento na agenda do paiacutes que havia permanecido ausente nas uacuteltimas deacutecadas Esse

Programa estaacute dividido em trecircs eixos de infraestrutura logiacutestica (rodoviaacuteria ferroviaacuteria

portuaacuteria hidroviaacuteria e aeroportuaacuteria) energeacutetica (geraccedilatildeo e transmissatildeo de energia eleacutetrica

petroacuteleo gaacutes natural e energias renovaacuteveis) e social e urbana (Luz para todos saneamento

habitaccedilatildeo recursos hiacutedricos metrocircs) A previsatildeo do investimento total eacute de R$ 503 9 bilhotildees

(AZEVEDO 2007)

Em 2008 a crise econocircmica iniciada no setor imobiliaacuterio americano chegou ao

Brasil gerando incertezas Nessa conjuntura a decisatildeo governamental de investir com vigor

no setor habitacional (cerca de 34 bilhotildees) culminou com um pacote maturado

inicialmente no Ministeacuterio da Fazenda cunhado como emergencial e anticiacuteclico buscou o

apoio do setor privado para evitar o aprofundamento do desemprego

(BONDUKI 2008 p

89)

Em 2009 o governo federal implantou o Programa Minha Casa Minha Vida

(MCMV) sob responsabilidade do Ministeacuterio das Cidades e executado pela CEF tendo como

meta construir 1 milhatildeo de moradias Sua finalidade era de criar mecanismos de incentivo agrave

produccedilatildeo e compra de novas unidades habitacionais pelas famiacutelias com renda mensal de ateacute

10 salaacuterios miacutenimos

Para atingir sua meta foram divididos em trecircs grupos primeiro famiacutelias de baixa

renda que ganham de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos as quais concentram quase 90 do deacuteficit

habitacional estando previsto R$ 16 bilhotildees para a construccedilatildeo de 400 mil unidades segundo

grupo que inclui as famiacutelias com renda mensal entre 3 a 6 salaacuterios miacutenimos estavam tambeacutem

previstas 400 mil unidades habitacionais e por fim o grupo que inclui as famiacutelias com renda

mensal entre 6 a 10 salaacuterios miacutenimos para o qual estavam previstas 200 mil unidades

(ROLNIK 2010)

Esse Programa atende a todos os municiacutepios com mais de 100 mil habitantes e

regiotildees metropolitanas Para tanto os empreendimentos podem ser implementados por

agentes puacuteblicos ou privados de forma independente ou em parceira Os paracircmetros para a

promoccedilatildeo de empreendimentos satildeo os mesmos em todo o Brasil variando apenas o valor

maacuteximo das unidades habitacionais que eacute estabelecido por Unidade da Federaccedilatildeolocalidade

(BRASIL 2010)

O MCMV apoacuteia a produccedilatildeo de imoacuteveis novos em construccedilatildeo ou em lanccedilamento

Apoacutes a conclusatildeo do empreendimento as habitaccedilotildees satildeo vendidas a famiacutelias indicadas pelo

poder puacuteblico local Estas famiacutelias tecircm que cumprir as condiccedilotildees estabelecidas no programa

134

nomeadamente estar enquadradas na faixa de rendimento familiar estabelecida (BRASIL

2010)

Para Rolnik (2010) o governo ao disponibilizar 34 bilhotildees para a construccedilatildeo sem

nenhuma intervenccedilatildeo em termos urbaniacutesticos e fundiaacuterios desencadeou um processo

inflacionaacuterio resultando em um aumento consideraacutevel no preccedilo dos terrenos

O que eu tenho apontado eacute que muito provavelmente o subsiacutedio vai parar no bolso do proprietaacuterio do terreno Eu dou dois ou trecircs meses para os empresaacuterios dizerem que natildeo estaacute dando mais para fazer casas de 60 e 70 mil (reais) Agora eles jaacute estatildeo dizendo que natildeo daacute para fazer de 50 mil E natildeo eacute porque a casa custa 50 mil reais Eacute porque a terra custa isso Quer dizer que o nosso dinheiro foi diretamente para o bolso dos proprietaacuterios do terreno (ROLNIK 2010 p 2)

Entretanto Rolnik (2010) argumenta que no primeiro ano (entre marccedilo de 2009 e

marccedilo de 2010) foram contratados e portanto jaacute estatildeo prontos para serem construiacutedos 408

mil imoacuteveis O programa estaacute de fato avanccedilando bastante mas alguns problemas jaacute

aparecem e aponta como o principal deles o natildeo cumprimento da meta em atender as

famiacutelias de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos onde se concentra o maior deacuteficit habitacional

Para essa faixa o programa oferece um subsiacutedio integral Ou seja o governo subsidia os imoacuteveis e estabelece um valor maacuteximo para que as construtoras os produzam Por sua vez o custo para os compradores eacute de ateacute 10 da renda mensal sendo no miacutenimo R$ 5000 200 mil unidades deste tipo foram contratadas ateacute agora O problema eacute que quase todas essas unidades foram contratadas em cidades e regiotildees de menor deacuteficit O que estaacute acontecendo eacute que em Satildeo Paulo e nas demais capitais e regiotildees metropolitanas onde realmente estaacute concentrada a demanda da faixa de renda entre 0 e 3 salaacuterios miacutenimos as construtoras estatildeo encontrando muita dificuldade de produzir para o Minha Casa Minha Vida em funccedilatildeo do preccedilo dos terrenos Todas elas reclamam que o preccedilo do terreno estaacute muito caro (ROLNIK 2010 p 2)

A autora diz ainda que eacute para a faixa de 3 a 6 salaacuterios miacutenimos que o programa estaacute

atendendo de fato beneficiando as grandes construtoras que lanccedilam seus produtos em aacutereas

com infraestrutura e serviccedilos O problema eacute que o programa natildeo estaacute conseguindo atender

com preferecircncia os que mais precisam que satildeo os moradores das grandes cidades que estatildeo

indo hoje adensar favelas e construir nas lajes

Cardoso (2009) tambeacutem aponta alguns problemas do Programa MCMV tais como a

distribuiccedilatildeo de recursos federais eacute feita agrave margem do SNHIS injetando muito recurso

financeiro no sistema mas sem o controle social democraacutetico sobre sua utilizaccedilatildeo privilegia

135

as empresas de construccedilatildeo civil aumentou o valor dos imoacuteveis e dos terrenos nas grandes

cidades e regiotildees metropolitanas ou seja toda a disponibilidade de creacutedito estaacute refletindo no

preccedilo do terreno e com isso torna-se difiacutecil produzir uma unidade de R$ 50 mil 60 mil reais

que eacute o valor total da unidade fixado para a faixa de renda mais baixa os recursos satildeo

repassados diretamente agraves empreiteiras dificultando o controle sobre os mesmos natildeo existe

um controle urbaniacutestico acarretando em construccedilatildeo nas aacutereas com precariedade de

infraestrutura distantes da malha urbana e por fim a poliacutetica de habitaccedilatildeo estaacute separada da

poliacutetica de gestatildeo do solo

Percebe-se a reproduccedilatildeo das situaccedilotildees que o BNH havia construiacutedo na deacutecada de

1970 conjuntos de baixa qualidade em uma periferia distante e natildeo inseridos na malha

urbana Aleacutem disso cabe destacar que o mercado imobiliaacuterio tem ditado as regras ao sistema

habitacional uma vez que produz e comercializa um bem escasso que eacute a terra controlando

as leis de mercado pois quando aumenta a demanda o preccedilo da terra aumenta Assim os

imoacuteveis ou terrenos tecircm seus valores aumentados aumentando tambeacutem o excedente para

proprietaacuterios de terra Ao natildeo atender as camadas populares o Programa MCMV acaba

contribuindo para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Portanto diante da anaacutelise das poliacuteticas habitacionais implementadas no Brasil em

especial na regiatildeo Amazocircnica observa-se que a poliacutetica urbana e a habitacional tecircm seguido

um modelo excludente que se perpetua ao longo do tempo uma vez que os programas satildeo

planejados de cima para baixo desconsiderando as relaccedilotildees sociais vivecircncias especificidades

de cada regiatildeo entre outros reforccedilando a loacutegica da divisatildeo territorial e social do trabalho

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

Ao iniciar o debate acerca das poliacuteticas puacuteblicas parte-se da reflexatildeo de que toda

poliacutetica pode ter objetivos bem definidos metas accedilotildees planos e princiacutepios que possam

garantir o bom funcionamento das instituiccedilotildees administrativas dos governos nas trecircs esferas

aleacutem de alcanccedilar o bem-estar a sociedade e o interesse puacuteblico

No item anterior foi destacada a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional no Brasil a partir

da concepccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas como um conjunto de accedilotildees coletivas que se configuram

em um compromisso puacuteblico visando dar conta de determinada demanda em diversas aacutereas

Satildeo mecanismos de regulaccedilatildeo social cujo objetivo eacute diminuir as desigualdades sociais

erradicar a pobreza e garantir os direitos sociais da populaccedilatildeo

136

A noccedilatildeo de poliacutetica puacuteblica eacute concebida segundo Raichellis (2007 p 34-38) como

uma linha de accedilatildeo coletiva que concretiza direitos sociais declarados e garantidos em lei

Diz ainda que a poliacutetica puacuteblica comeccedilou a ser implementada como mecanismo de

enfrentamento das sequumlelas da questatildeo social assim ela eacute convertida em poliacuteticas setoriais e

se configura como mecanismo na mediaccedilatildeo dos conflitos sociais

No que diz respeito agrave incorporaccedilatildeo dos direitos sociais no estatuto legal verifica-se

sua importacircncia pois passa a se inscrever como poliacuteticas sociais que satildeo os instrumentos para

a efetivaccedilatildeo desses direitos jaacute que estas natildeo podem deixar de existir quando haacute troca de

governantes cuja atribuiccedilatildeo eacute do Estado diferentemente dos programas de governo cuja

execuccedilatildeo de accedilotildees depende do governo em questatildeo

Corroborando com esse debate Netto (2001) argumenta que as poliacuteticas sociais tecircm

como alvo as questotildees sociais geradas dentro da sociedade capitalista ou seja o objetivo

principal da poliacutetica eacute conceder benefiacutecios para inserir parte da populaccedilatildeo no mercado de

trabalho e melhorar as condiccedilotildees de vida da mesma O que assegura condiccedilotildees apropriadas

para o desenvolvimento do proacuteprio sistema seja pela reproduccedilatildeo social do trabalhador seja

pelas possibilidades de consumo

Partindo dessa reflexatildeo pode-se afirmar que o Estado atende prioritariamente aos

interesses do capital Apesar disso mesmo que em um menor grau de satisfaccedilatildeo precisa

atender as necessidades do trabalhador

Sendo assim as accedilotildees desenvolvidas pelo Estado buscam uma compatibilidade entre

as duas categorias mediando a relaccedilatildeo contraditoacuteria entre o capital e o trabalho na qual

regula as desigualdades sociais que satildeo geradas pelo desenvolvimento do sistema capitalista

ou seja atende as necessidades sociais baacutesicas de quem natildeo estaacute inserido nos serviccedilos sociais

poreacutem sem interferir no processo de acumulaccedilatildeo de capital Elaborando entatildeo as poliacuteticas

sociais para responder essa contradiccedilatildeo

As poliacuteticas puacuteblicas sociais satildeo criadas para compensar as desigualdades proacuteprias do mercado de forma tal que como se fossem homeostado se torna necessaacuterio que estas sejam tatildeo desiguais quanto o mercado mas em sentido contraditoacuterio [] Essas poliacuteticas satildeo concebidas numa perspectiva tradicional como concessotildees por parte do Estado para redistribuir os escassos recursos sociais Nesta perspectiva as poliacuteticas sociais aparecem de forma naturalizada ou seja natildeo satildeo associadas aos interesses e necessidades do sistema capitalista (PASTORINI 1997 p 84)

Outro fator importante do avanccedilo para o campo dos direitos sociais a ser destacado

refere-se agrave descentralizaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo da gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional

137

com a criaccedilatildeo dos Conselhos em acircmbito nacional estadual e municipal que satildeo mecanismos

de participaccedilatildeo e controle social e satildeo instacircncias de deliberaccedilatildeo sobre accedilotildees dessa poliacutetica

voltados para ampliaccedilatildeo das condiccedilotildees de cidadania cuja representatividade eacute do governo e da

sociedade civil

A definiccedilatildeo constitucional da habitaccedilatildeo como poliacutetica puacuteblica geradora de direitos possibilitou que sua construccedilatildeo fosse acompanhada por mecanismos institucionais de democratizaccedilatildeo e de controle social como satildeo os conselhos e as Conferecircncias instrumentos que se inserem no campo de definiccedilatildeo da responsabilidade puacuteblica Ao mesmo tempo conceber a habitaccedilatildeo nesta perspectiva natildeo implica diluir a responsabilidade estatal por sua conduccedilatildeo Ao contraacuterio situaacute-la no campo dos direitos remete agrave ativa intervenccedilatildeo do Estado para garantir sua efetivaccedilatildeo dentro dos paracircmetros legais que a definem (RAICHELIS 2007 p 39)

Ao se tratar a poliacutetica habitacional como direito social torna-se evidente a maneira

regressiva pela qual se desenvolveram os mecanismos de proteccedilatildeo social agrave moradia

conduzida pelo Estado ao longo anos Se por um lado a legislaccedilatildeo brasileira afirma a

garantia de atendimento aos seus cidadatildeos por outro lado compreende-se uma elevada

parcela da populaccedilatildeo que sequer possui o direito de sobrevivecircncia pela violaccedilatildeo constante de

seus direitos dificultando qualquer possibilidade de acesso agrave moradia digna (AZEVEDO

2007)

A habitaccedilatildeo eacute uma necessidade baacutesica do ser humano eacute parte das suas condiccedilotildees de

sobrevivecircncia e portanto elemento importante no processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da

sociedade ao mesmo tempo uma mercadoria como qualquer outra ou seja possui um valor

de uso e de troca e sua produccedilatildeo segue a loacutegica do mercado

Entender a questatildeo da moradia na sociedade capitalista significa descobrir as

contradiccedilotildees inerentes ao acesso agrave moradia Tal compreensatildeo deve antes de mais nada

procurar desvendar o significado da terra e sua propriedade isto eacute de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido e assim sendo natildeo pode ser criado pelo trabalho

Para se ter acesso a uma moradia eacute preciso ocupar um pedaccedilo de terra sendo que

para isso eacute necessaacuterio pagar por ele Esse pagamento pode ser com a aquisiccedilatildeo de um lote

urbanizado ou natildeo por meio de aluguel troca de um imoacutevel por outro etc cujo valor eacute

ajustado natildeo soacute de acordo com a lei da oferta e da procura como tambeacutem por meio da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Portanto sua origem estaacute na propriedade privada da terra e na sua

condiccedilatildeo de mercadoria dentro do modo de produccedilatildeo capitalista

138

A propriedade privada da terra eacute condiccedilatildeo fundamental para o desenvolvimento do

capital imobiliaacuterio tendo seu valor de uso modificado pela atribuiccedilatildeo de infraestrutura

equipamentos e serviccedilos puacuteblicos aleacutem de suas caracteriacutesticas especificas como a

construtibilidade morfologia entre outros (MARICATO 1996)

Deste modo Rodrigues (2001) afirma que diferentemente do mercado de compra e

venda de outras mercadorias no mercado de terras a lei da oferta e da procura natildeo funciona

da mesma forma ou seja soacute funcionava quando novos terrenos entram nesse mercado e

quando eacute instalada infraestrutura adequada Assim o preccedilo da terra eacute definido segundo a

localizaccedilatildeo dos terrenos que embora com dimensotildees semelhantes possuem preccedilos

diferentes Essa diferenciaccedilatildeo proporciona ao dono da terra uma renda extra propiciada pela

produccedilatildeo social

Segundo a autora a terra eacute uma mercadoria que tem preccedilo que eacute vendida no

mercado e que natildeo eacute reproduziacutevel ou seja tem um preccedilo que independe de sua produccedilatildeo Eacute

uma mercadoria sem valor no sentido de que seu preccedilo natildeo eacute definido pelo trabalho na sua

produccedilatildeo mas pelo estatuto juriacutedico da propriedade da terra pela capacidade de pagar dos

seus possiacuteveis compradores

Para os trabalhadores a possibilidade de extrair alguma renda de sua propriedade

por meio do aluguel ou da sua valorizaccedilatildeo com a implementaccedilatildeo de obras de infraestrutura

em seu entorno mesmo quando se trata de um simples embriatildeo de alvenaria sem

revestimento eacute motivo de grande seguranccedila e sensaccedilatildeo de progresso pessoal pois representar

uma forma segura de investimento

Nesse sentido a aquisiccedilatildeo do imoacutevel ou de um terreno se daacute natildeo em funccedilatildeo da

necessidade de uso mas com vistas agrave venda futura ou aluguel transforma-o em capital

imobiliaacuterio

Como ressalta Engels (1988 p 185)

Ainda que o aluguel natildeo represente extraccedilatildeo de mais valia uma vez que [] eacute a transferecircncia de um valor jaacute produzido a propriedade da casa natildeo determina a classe social ela modifica parcialmente agrave medida que aleacutem do seu valor de uso pode se transformar em capital o que diferencia seu proprietaacuterio dos demais de sua classe O uso da moradia como investimento a torna objeto de especulaccedilatildeo imobiliaacuteria o que leva ainda mais o seu preccedilo

Em principio o salaacuterio recebido pelo trabalhador deveria ser suficiente para

satisfazer agraves suas necessidades baacutesicas mas natildeo o eacute especialmente no que se refere agrave

139

moradia cuja natureza especifica torna-a um bem caro e de difiacutecil acesso principalmente em

situaccedilotildees de crise com especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Na composiccedilatildeo dos salaacuterios

preccedilo da forccedila de trabalho

haacute uma parte destinada a

cobrir os gastos necessaacuterios agrave satisfaccedilatildeo dessa necessidade ou seja o custo da moradia Na

medida em que este aumenta aqueles tambeacutem deveriam fazecirc-lo o que entretanto natildeo ocorre

porque implica em diminuiccedilatildeo do lucro e afeta o processo de acumulaccedilatildeo capitalista

Destarte como se trata de um bem de consumo necessaacuterio agrave reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho cuja satisfaccedilatildeo inadequada tem efeitos sobre o processo de produccedilatildeo o problema da

habitaccedilatildeo torna-se questatildeo social levando a intervenccedilatildeo do Estado no setor

Entatildeo solucionar o problema da moradia no Brasil natildeo eacute uma tarefa faacutecil pois a

terra no modo de produccedilatildeo capitalista mesmo natildeo sendo uma mercadoria produzida

socialmente tem um preccedilo e atribui ao seu proprietaacuterio o direito de auferir uma renda por

posse

Partindo de uma visatildeo socioeconocircmica em que a cidade se constitui no locus da

reproduccedilatildeo do capital a urbanizaccedilatildeo passou a ser vista como um conjunto de relaccedilotildees

sociais que reflete as relaccedilotildees estabelecidas na sociedade como totalidade constituindo-se

assim em um conjunto complexo de relaccedilotildees sociais assumindo novas dinacircmicas a partir

dos estaacutegios do desenvolvimento capitalista e isso configura importantes aspectos de

interesse geral (HARVEY 1996 p 89)

De acordo com Azevedo (1996) ao se analisar a questatildeo habitacional a relaccedilatildeo com

outras poliacuteticas urbanas eacute um dos aspectos a ser considerado Em funccedilatildeo da interdependecircncia

da moradia com outras esferas nem sempre um simples incremento dos programas de

habitaccedilatildeo eacute a soluccedilatildeo mais indicada para melhorar as condiccedilotildees habitacionais da populaccedilatildeo

com menor aquisitivo Isso porque esses programas podem ser inviabilizados caso natildeo sejam

integradas a eles outras poliacuteticas urbanas como de transporte energia eleacutetrica esgotamento

sanitaacuterio e abastecimento de aacutegua

Nesse sentido pode-se afirmar que o problema habitacional urbano no Brasil atinge

hoje grandes proporccedilotildees e estaacute intimamente relacionado ao processo de degradaccedilatildeo fiacutesica e

social das cidades tendo como resultados do seu modelo de crescimento a ocupaccedilatildeo

descontiacutenua definida pela praacutetica especulativa e a produccedilatildeo de espaccedilos com padrotildees muito

diferenciados e desiguais

Eacute resultado da loacutegica excludente que determina a dinacircmica urbana na qual as

famiacutelias de baixo poder aquisitivo adotam inuacutemeras estrateacutegias de sobrevivecircncia tais como

ocupaccedilatildeo de terreno irregular seguida da autoconstruccedilatildeo da moradia como no caso das

140

baixadas aquisiccedilatildeo locaccedilatildeo ou cessatildeo da posse de imoacuteveis construiacutedos em favelas e

assentamentos similares coabitaccedilatildeo moradia em domiciacutelios improvisados como no caso dos

moradores de rua Enfim a maior parte das estrateacutegias citadas resulta na formaccedilatildeo de

assentamentos habitacionais precaacuterios que geralmente concentram problemas relativos agrave

insalubridade condiccedilotildees inadequadas de acessibilidade e irregularidades urbaniacutesticas

O desenvolvimento capitalista ao provocar uma imensa e abrupta expansatildeo do

tecido urbano no Paiacutes gerou aumento da concentraccedilatildeo de riqueza de poder e da propriedade

e consequumlentemente aprofundou a miseacuteria

Eacute nesse cenaacuterio que se expressa a questatildeo do deacuteficit de moradia Nesse sentido a

primeira questatildeo a ser discutida diz respeito ao proacuteprio conceito de deacuteficit habitacional No

sentido tradicional ela induz equivocadamente agrave expectativa de enfrentar o problema da

moradia de forma setorial Aleacutem disso camufla uma complexa realidade por meio de uma

quantificaccedilatildeo padronizada atemporal e neutra

Para a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro (BRASIL 2009) o deacuteficit habitacional eacute entendido

como a noccedilatildeo mais imediata e intuitiva de necessidade de construccedilatildeo de novas moradias para

a soluccedilatildeo de problemas sociais e especiacuteficos de habitaccedilatildeo detectados em certo momento a

partir do conceito mais amplo de necessidades habitacionais

O conceito de deacuteficit habitacional estaacute ligado diretamente agraves deficiecircncias do estoque de moradias Engloba aquelas sem condiccedilotildees de serem habitadas devido agrave precariedade das construccedilotildees ou em virtude de desgaste da estrutura fiacutesica Elas devem ser repostas Inclui ainda a necessidade de incremento do estoque devido agrave coabitaccedilatildeo familiar forccedilada (famiacutelias que pretendem constituir um domicilio unifamiliar) aos moradores de baixa renda sem condiccedilotildees de suportar o pagamento de aluguel e aos que vivem em casas e apartamentos alugados com grande densidade de pessoas Inclui-se ainda nessa rubrica a moradia em imoacuteveis e locais com fins natildeo residenciais O deacuteficit habitacional pode ser entendido portanto como deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque 33 e deacuteficit por incremento de estoque 34 (BRASIL 2009 p 15)

33 O deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque refere-se aos domiciacutelios ruacutesticos aos quais deveria ser acrescida parcela devida agrave depreciaccedilatildeo dos domiciacutelios Tradicionalmente utilizando o conceito do IBGE os domiciacutelios ruacutesticos satildeo aqueles sem paredes de alvenaria ou madeira aparelhada Em decorrecircncia das suas condiccedilotildees de insalubridade esses tipos de edificaccedilatildeo proporcionam desconforto e trazem risco de contaminaccedilatildeo por doenccedilas aos seus moradores (BRASIL 2009 p 15) 34 O deacuteficit por incremento de estoque contempla os domiciacutelios improvisados parte da coabitaccedilatildeo familiar e dois tipos de domiciacutelios alugados os fortemente adensados e aqueles em que famiacutelias pobres (renda familiar ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos) pagam 30 ou mais da sua renda familiar para o locador O conceito de domiciacutelios improvisados engloba todos os locais e imoacuteveis sem fins residenciais e lugares que servem como moradia alternativa (imoacuteveis comerciais embaixo de pontes e viadutos carcaccedilas de carros abandonados barcos e cavernas entre outros) o que indica claramente a carecircncia de novas unidades domiciliares (BRASIL 2009 p 16)

141

O deacuteficit habitacional eacute composto pelos seguintes indicadores habitaccedilotildees precaacuterias

coabitaccedilatildeo familiar e ocircnus excessivo com aluguel Desses o grande responsaacutevel pelos altos

iacutendices brasileiros de ausecircncia de moradia eacute a coabitaccedilatildeo familiar e esse fato eacute observado

em todas as regiotildees do paiacutes principalmente em Satildeo Paulo Minas Gerais Rio de Janeiro

Cearaacute Pernambuco e Paraacute Jaacute as habitaccedilotildees precaacuterias satildeo mais comuns na zona rural e o

ocircnus excessivo com aluguel eacute caracteriacutestico das aacutereas de grande adensamento urbano em

destaque o estado de Satildeo Paulo Esse uacuteltimo indicador eacute reflexo direto das dificuldades do

mercado imobiliaacuterio em se adequar agraves necessidades da populaccedilatildeo

(FJP 2008 p36)

Outro indicador utilizado pela Fundaccedilatildeo no desenvolvimento de sua metodologia de

pesquisa eacute a inadequaccedilatildeo de moradias Esta eacute classificada como domiciacutelios com carecircncia de

infraestrutura com adensamento excessivo de moradores com problemas de natureza

fundiaacuteria cobertura inadequada sem unidade sanitaacuteria domiciliar exclusiva ou em alto grau

de depreciaccedilatildeo (BRASIL 2009)

Com base nos dados da Fundaccedilatildeo (BRASIL 2009) alguns dados satildeo importantes

para se entender a real situaccedilatildeo da habitaccedilatildeo social no Brasil que expressa de forma niacutetida a

pobreza no Paiacutes Estima-se que em 2007 o deacuteficit habitacional eacute de 6273 milhotildees de

domiciacutelios dos quais 5180 milhotildees ou 826 estatildeo localizados nas aacutereas urbanas (conforme

tabela 3) Relativamente corresponde a 111 do estoque de domiciacutelios particulares

permanentes do paiacutes sendo 108 nas aacutereas urbanas e 129 nas rurais35 Eacute importante

observar que em 16 anos (entre 1991 e 2007) houve um acreacutescimo de 257 e um

crescimento de 29 ao ano do deacuteficit habitacional e que 862 do deacuteficit urbano

concentram-se nas famiacutelias de baixa renda

35 Esses nuacutemeros podem conflitar com os dados apresentados em 2006 pois a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro considerou apenas uma parcela das famiacutelias conviventes como carente de moradias o que representa uma queda de 1662 milhatildeo de domiciacutelios nas estimativas entre esses dois anos

142

Tabela 3 - Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

ESPECIFICACcedilAtildeO

DEacuteFICIT HABITACIONAL PERCENTUAL DOS DOMICIacuteLIOS PARTICULARES PERMANENTES

Total Urbana

Rural Total Urbana

Rural Total Rural de

Extensatildeo Urbana

Total Rural de Extensatildeo Urbana

NORTE 652684

487357

165327

4782

167

162

184

141

Rondocircnia 52472

42561

9911

3072

116

136

71

108

Acre 21063

17263

3800

-

126

141

84

-

Amazonas

146268

117496

28772

1530

186

189

174

455

Roraima 16379

14458

1921

-

147

159

93

-

Paraacute 317089

223645

93444

180

171

156

223

83

RM Beleacutem 92734

90817

1917

180

165

165

144

83

Amapaacute 30449

28853

1596

-

202

203

180

-

Tocantins 68964

43081

25883

-

182

154

262

-

NORDESTE 2144384

1461669

682715

6216

150

139

182

74

Maranhatildeo 461396

240415

220981

1742

295

220

467

111

Piauiacute 139318

76157

63161

-

169

147

205

-

Cearaacute 314949

227096

87853

-

139

128

181

-

RM Fortaleza 124282

119970

4312

-

129

128

170

-

Rio Grande do Norte 117647

85191

32456

1375

140

137

150

59

Paraiacuteba 122166

98034

24132

-

122

122

119

-

Pernambuco 281486

224956

56530

2065

117

119

110

66

RM Recife 133059

129892

3167

-

122

122

133

-

Alagoas 123245

89128

34117

1034

148

151

142

80

Sergipe 73499

60907

12592

-

130

130

129

-

Bahia 510677

359784

150893

-

129

131

124

-

RM Salvador 141025

138946

2079

-

137

137

123

-

SUDESTE 2335415

2222957

112458

9398

93

95

61

59

Minas Gerais 521085

465206

55879

-

88

91

67

-

RM Belo Horizonte 129404

129171

233

-

85

86

12

-

Espiacuterito Santo 101124

90079

11045

-

94

101

61

-

Rio de Janeiro 478901

471872

7029

889

91

93

44

50

RM Rio de Janeiro 378797

376139

2658

-

95

95

106

-

Satildeo Paulo 1234306

1195800

38506

8509

96

98

58

60

RM Satildeo Paulo 628624

611936

16688

7594

103

104

78

59

SUL

703167

617333

85834

-

79

83

60

-

Paranaacute 272542

240825

31717

-

83

86

67

-

RM Curitiba 91444

85007

6437

-

89

91

72

-

Santa Catarina 145363

125297

20066

-

76

79

63

-

Rio Grande do Sul 285261

251211

34050

-

78

83

53

-

RM Porto Alegre 136030

128784

7246

-

97

97

100

-

CENTRO-OESTE

436995

390447

46548

217

105

108

83

31

Mato Grosso do Sul 76027

63762

12265

-

105

101

127

-

Mato Grosso 86679

66363

20316

-

98

100

91

-

Goiaacutes 167042

155119

11923

-

92

96

58

-

Distrito Federal 107248

105202

2046

217

146

151

53

31

BRASIL 6272645

5179763

1092882

20613

111

108

129

71

Total das RMs 1855399

1810662

44737

7774

105

105

89

57

Demais Aacutereas 4417246

3369101

1048145

12839

114

110

131

84

143

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) 2007 Nota no caacutelculo do deacuteficit habitacional o componente coabitaccedilatildeo familiar inclui apenas as famiacutelias conviventes que declararam intenccedilatildeo de constituir novo domiciacutelio

Como mostram os nuacutemeros da acima a regiatildeo Nordeste apresenta valores

expressivos em relaccedilatildeo ao deacuteficit habitacional perdendo somente para a regiatildeo Sudeste que

possui deacuteficit habitacional de 2335415 A regiatildeo Norte encontra-se em quarto lugar em

relaccedilatildeo agraves demais regiotildees do paiacutes Entretanto as especificidades das regiotildees Norte e Nordeste

revelam uma grande heterogeneidade intra-regional demonstrado pelo percentual relativo do

estoque dos domiciacutelios particulares permanentes no Norte encontram-se alguns estados com

deacuteficits superiores agrave meacutedia nacional (111) como por exemplo Amazonas (186) e Paraacute

(171) e no Nordeste os estados do Maranhatildeo (295) e Piauiacute (169) apresentam meacutedias

elevadas em relaccedilatildeo ao nacional

Esse quadro de carecircncia habitacional demonstra que o Nordeste possui o pior

desempenho em relaccedilatildeo a regiatildeo Sul que apresenta percentual de domiciacutelios equivalente a

79 melhor meacutedia nacional Isto pode ser explicado pelo volume de recursos

financeiros

teacutecnicos e administrativos

investidos nas regiotildees sul e sudeste

Tambeacutem pode ser levada em consideraccedilatildeo a forma diferenciada que se deu a

urbanizaccedilatildeo nas regiotildees do Paiacutes acarretando em problemas de adensamento escassez de

terras elevaccedilatildeo do preccedilo da terra baixo desenvolvimento econocircmico das cidades como

Beleacutem e Satildeo Luis e ainda pouca capacidade administrativa dos governos municipais

Outro fator que se destaca eacute a falta de uma poliacutetica habitacional especifica para essas

regiotildees uma vez que o financiamento para construccedilatildeo de moradia tem sido inexpressivo e

uma grande parcela da populaccedilatildeo constroacutei suas casas por meio do autofinanciamento e

autoconstruccedilatildeo

Essas situaccedilotildees satildeo agravadas pela escassez de serviccedilos de infraestrutura falta de

oportunidades de emprego falta de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria entre outros fatores que

contribuem para o aumento da exclusatildeo social e da segregaccedilatildeo espacial da populaccedilatildeo pobre

nas aacutereas de baixadas e de assentamentos precaacuterios

Do total do deacuteficit habitacional (6273 milhotildees aproximadamente) a maior parcela

das estimativas eacute composta pela coabitaccedilatildeo familiar (393) seguido pelo ocircnus com aluguel

(322) as habitaccedilotildees precaacuterias representam 23 e o adensamento excessivo dos domiciacutelios

alugados 55 conforme graacutefico 2

144

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees

Metropolitanas (RMs)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007)

Esse quadro evidencia que as poliacuteticas habitacionais devam ser diversificadas de

acordo com cada regiatildeo do Paiacutes para que suas diretrizes possam ser bem sucedidas A

coabitaccedilatildeo eacute responsaacutevel pela maior parte do deacuteficit portanto requer medidas para que novas

famiacutelias que se formem tenham acesso agrave casa proacutepria

Fica demonstrado tambeacutem que a maior parte do deacuteficit habitacional corresponde a

famiacutelias com ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos (aproximadamente 90) o que define o caraacuteter

eminentemente social dos programas a serem desenvolvidos Eacute importante destacar que entre

os anos 2000 e 2007 houve uma significativa reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional para as famiacutelias

de renda mensal de trecircs a cinco salaacuterios miacutenimos Do deacuteficit habitacional 894

correspondem agraves famiacutelias com renda mensal inferior a trecircs salaacuterios miacutenimos e 797 estatildeo

concentradas nas regiotildees Nordeste e Sudeste conforme graacutefico 3

145

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar Mensal (2)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007) Nota sm salaacuterio miacutenimo (1) Inclusive rural de extensatildeo urbana (2) Exclusive sem declaraccedilatildeo de renda

Os indicadores sobre o niacutevel e a distribuiccedilatildeo da renda em todo o territoacuterio brasileiro

os dados da PNADIBGE de 1996 e 2000

evidenciavam que a pobreza absoluta atingia por

volta de 34 da populaccedilatildeo Esse percentual correspondia aproximadamente a 52 milhotildees de

pessoas vivendo nessa situaccedilatildeo Vaacuterios estudos sinalizam que a pobreza no Brasil eacute mais

elevada nas regiotildees Nordeste (53) e Norte (40) e menor nas regiotildees Sul (18) e Sudeste

(oscilando entre 25 e 30 conforme o estado considerado) e desponta com maior nitidez

nos espaccedilos urbanos

Eacute nesse cenaacuterio de desigualdades soacutecio-espaciais que se evidencia a questatildeo

habitacional dos recortes territoriais em estudo ou seja nas regiotildees metropolitanas

amazocircnicas Nessas aacutereas urbanas o deacuteficit de moradia eacute elevado a exemplo do que acontece

no paiacutes e cidade vem seguindo a loacutegica da desigualdade capitalista estampando-se por meio

de uma verdadeira segregaccedilatildeo soacutecioespacial36

Para esta abordagem valer-se-aacute da definiccedilatildeo de Santos (2002) acerca do espaccedilo isto

eacute o espaccedilo submetido ao desenvolvimento das forccedilas produtivas sobremaneira com o papel

desempenhado pela ciecircncia e pelas teacutecnicas tornou-se essencialmente social O autor nos

chama a atenccedilatildeo para o fato de que

36 Compreende-se que a segregaccedilatildeo

tanto social quanto espacial

eacute uma caracteriacutestica importante das cidades As regras que organizam o espaccedilo urbano satildeo basicamente padrotildees de diferenciaccedilatildeo social e de separaccedilatildeo (CALDEIRA 2000 p 211) Para Carlos (1994 p 12) o processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual

isso se evidencia claramente atraveacutes do uso do solo

e decorre do acesso diferenciado da sociedade agrave propriedade privada e da estrateacutegia das empresas que produzem sobre o solo o que faz surgir a segregaccedilatildeo espacial

146

Se a Geografia deseja interpretar o espaccedilo humano como o fato histoacuterico que ele eacute somente a histoacuteria da sociedade mundial aliada agrave sociedade local pode servir como fundamento agrave compreensatildeo da realidade espacial e permitir a sua transformaccedilatildeo a serviccedilo do homem Pois a Histoacuteria natildeo escreve fora do espaccedilo e natildeo haacute sociedade a-espacial O espaccedilo ele mesmo eacute social (SANTOS 2002 p 81)

Segundo o autor o espaccedilo pode ser compreendido de acordo com sua totalidade

estudando-se os seus elementos em conjunto destacando-se neste universo o homem agente

fundamental no fornecimento de trabalho e dessa forma de criaccedilatildeo de infraestruturas

teacutecnicas e sociais no territoacuterio O que vale dizer o trabalho historicamente materializado e

geografizado pela accedilatildeo antroacutepica (SANTOS 2002) Assim os estudos referentes ao tema

proposto natildeo poderatildeo prescindir das relaccedilotildees sociais

Para concluir a cidade apresenta uma grande variedade de situaccedilotildees para a

populaccedilatildeo gerando diferentes formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano e consequumlentemente

produzindo uma segregaccedilatildeo soacutecioespacial aleacutem de demonstrar que a poliacutetica habitacional

voltada para atingir a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo eacute uma utopia

De forma geral a segregaccedilatildeo social no espaccedilo eacute resultante das inter-relaccedilotildees entre os

agentes responsaacuteveis pela estruturaccedilatildeo urbana sendo relevantes o poder puacuteblico (Estado) e o

capital imobiliaacuterio (Mercado) Isso porque a forma como estes agentes organizam a ocupaccedilatildeo

no e do espaccedilo acaba por gerar desiguais oportunidades de apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos

pela populaccedilatildeo que passa a se organizar segundo uma hierarquia social decorrente desta

inter-relaccedilatildeo

Nesse sentido entende-se a segregaccedilatildeo soacutecioespacial como o movimento de

separaccedilatildeo das classes sociais num determinado espaccedilo urbano no qual um dos fatores

determinante para tal segregaccedilatildeo eacute o preccedilo da propriedade que por natildeo disponibilizarem de

recursos financeiros satildeo obrigadas a ir para a periferia onde os acessos a serviccedilos baacutesicos

(como transporte sauacutede saneamento baacutesico seguranccedila lazer etc) natildeo satildeo na maioria das

vezes garantidos pelo Estado quando natildeo praticamente desprovida dos mesmos

Para aleacutem da atuaccedilatildeo diferenciada dos agentes modeladores do espaccedilo haacute outros

elementos que contribuem para a formaccedilatildeo da segregaccedilatildeo como a maacute distribuiccedilatildeo de renda e

o descumprimento das leis para beneficiamento de interesses de determinados segmentos

sociais

Assim as classes populares por natildeo terem o auxiacutelio do Estado em programas ou

projetos habitacionais buscam algumas alternativas para morar Como uma forma de

representaccedilatildeo dessa realidade destaca-se o caso de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-Ma onde as classes

147

empobrecidas se agrupam em vaacuterias modalidades de moradia Destacam-se as ocupaccedilotildees as

modalidades dos corticcedilos e das palafitas como formas de moradia extremamente precarizadas

sem qualquer disponibilidade de equipamentos e serviccedilos baacutesicos o que ocasiona a

fragilidade da sauacutede dessas pessoas

Observa-se tambeacutem como expressatildeo das classes trabalhadoras as modalidades de

moradia que satildeo os conjuntos habitacionais e os preacutedios reformados do governo onde estes

possuem estrutura equipamentos e serviccedilos mais acessiacuteveis em comparaccedilatildeo as trecircs

modalidades citadas anteriormente mas natildeo perdendo de vista que ainda assim constituem-se

como uma forma precaacuteria de moradia pois natildeo disponibiliza o espaccedilo fiacutesico necessaacuterio para a

adequada morada de uma famiacutelia

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

A poliacutetica habitacional se inscreve dentro da concepccedilatildeo de desenvolvimento urbano

integrado no qual a habitaccedilatildeo natildeo se restringe a casa incorpora o direito agrave infraestrutura

saneamento ambiental mobilidade e transporte coletivo equipamentos e serviccedilos urbanos e

sociais buscando garantir o direito agrave cidade

A cidade eacute entendida nesse trabalho como um centro de gestatildeo do territoacuterio eacute um

local onde as pessoas se organizam e interagem com base em interesses e valores diversos

formando grupos de afinidade e de interesse menos ou mais bem definidos territorialmente

com base na identificaccedilatildeo entre certos recursos cobiccedilados e o espaccedilo ou na base de

identidades territoriais que os indiviacuteduos buscam manter e preservar (SOUZA 2002 p 28)

Eacute um lugar geograacutefico no qual se instala a superestrutura poliacutetico-administrativo da

sociedade e supotildee a existecircncia de um sistema de classes sociais de um sistema poliacutetico de

um sistema institucional de investimento e de um sistema de troca com o exterior

(CASTELLS 1983)

Essas conceituaccedilotildees permitem visualizar um ambiente de cidades cuja intensidade

das atividades realizadas das interaccedilotildees entre os diversos componentes o consumo do

espaccedilo ultrapassam da simples categoria funcional do espaccedilo fiacutesico para a real efetivaccedilatildeo das

funccedilotildees da cidade

Isto significa dizer que existe uma estrita relaccedilatildeo entre os mecanismos que regulam o

uso e a ocupaccedilatildeo do solo urbano e os que regulam a produccedilatildeo de moradias Portanto torna-se

necessaacuterio refletir sobre o estabelecimento de regras e normas que determinam a legislaccedilatildeo

148

urbaniacutestica voltada para a regulamentaccedilatildeo e controle das accedilotildees dos produtores e

consumidores do espaccedilo urbano e da moradia e ao mesmo tempo para a promoccedilatildeo da

diminuiccedilatildeo das desigualdades soacutecio-espaciais

Entretanto algumas experiecircncias tecircm demonstrado que a legislaccedilatildeo urbaniacutestica ao

definir formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo que devem ser permitidas ou proibidas acaba por

agir como um delimitador de fronteiras de poder reforccedilando a loacutegica do mercado Isto

porque ao regular a produccedilatildeo do espaccedilo urbano a legislaccedilatildeo pode conferir significados e

gerar certa divisatildeo ou classificaccedilatildeo dos territoacuterios urbanos acirrando as desigualdades soacutecio-

espaciais uma vez que eacute fruto da relaccedilatildeo que se estabelece entre os agentes que atuam na

produccedilatildeo imobiliaacuteria na cidade (ROLNIK 2002 p13)

Como instrumento do planejamento (conforme foi apresentado no capiacutetulo anterior)

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica segundo Matos (1988 p 50) tem como uma de suas finalidades

atuar em prol da paz social isto eacute objetiva reduzir determinados conflitos entre os diversos

agentes que atuam no espaccedilo urbano

Fazendo uma breve contextualizaccedilatildeo histoacuterica da legislaccedilatildeo pode-se observar que

uma das primeiras tentativas de regulamentar o uso do solo foi em 1850 com a Lei das Terras

(Lei nordm 601 de setembro de 1850) estabelecendo que soacute quem podia pagar era reconhecido

como proprietaacuterio juridicamente definido em lei (RODRIGUES 2001 p 19) impedindo

assim o acesso a terra pelos trabalhadores livres Essa lei atribuiu agrave terra um valor de troca

tornando-a assim uma mercadoria do modo de produccedilatildeo capitalista inacessiacutevel a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo

No seacuteculo XX mais precisamente em 1916 foi criado o Coacutedigo Civil o qual definiu

explicitamente a propriedade da terra levando em consideraccedilatildeo o uso da terra e das

habitaccedilotildees o qual se preocupava com as moradias dos operaacuterios (vilas operaacuterias conforme

abordado no item anterior)

Jaacute na deacutecada de 1960 o Serfhau foi instituiacutedo como o organismo federal orientador

da estruturaccedilatildeo de poliacuteticas nacionais urbanas e de planejamento urbano em consonacircncia agraves

regras impostas pelo Estado naquele periacuteodo

Sob a coordenaccedilatildeo e financiamento do Serfhau os planos diretores entatildeo

denominados de planos de desenvolvimento local integrado foram elaborados para as cidades

de meacutedio e grande porte Coerente com a concepccedilatildeo de um sistema articulado e integrado

nacionalmente nas esferas locais a proposta de um sistema de planejamento local integrado

que visava tornar mais racionais os investimentos objetivando o desenvolvimento urbano

149

Natildeo obstante aos esforccedilos agrave eacutepoca realizados a avaliaccedilatildeo desse processo indica os

baixos resultados apresentados dado que natildeo se alcanccedilou a implantaccedilatildeo dos sistemas locais

de planejamento nem mesmo a execuccedilatildeo de intervenccedilotildees sugeridas pelos planos elaborados

aleacutem disso demonstram um distanciamento entre os agentes de elaboraccedilatildeo dos planos

atribuiacutedo a empresas privadas de consultoria

e os agentes executores localizados nas

administraccedilotildees municipais e na ausecircncia de demandas ou reivindicaccedilotildees de accedilotildees puacuteblicas

dessa natureza (ROLNIK 2002)

Nos anos 1970 a poliacutetica urbana pautava-se no planejamento tecnocraacutetico propondo

apenas o planejamento para uma parte da cidade dita formal ou legal Sendo assim as favelas

e os loteamentos irregulares eou clandestinos permaneceram excluiacutedos

Pode-se dizer que ateacute entatildeo a desigualdade social foi ratificada pelas normas

juriacutedicas favorecendo a segregaccedilatildeo soacutecioespacial jaacute que tenderam a expulsar a populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo para os locais mais distantes dos centros urbanos propiciando o

aparecimento de espaccedilos irregulares

Com a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federativa do Brasil em 1988 novos rumos

foram dados a legislaccedilatildeo urbaniacutestica Nos artigos 182 e 183 do capiacutetulo da Poliacutetica Urbana

foi redefinido o papel da cidade destacando-se a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

urbana

Art 182

A poliacutetica de desenvolvimento urbano executada pelo poder puacuteblico municipal conforme diretrizes gerais fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes sect 1ordm O Plano Diretor aprovado pela Cacircmara Municipal eacute obrigatoacuterio para as cidades com mais de 20 mil habitantes eacute o instrumento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana sect 2ordm A propriedade urbana cumpre sua funccedilatildeo social quando atende agraves exigecircncias fundamentais de ordenaccedilatildeo da cidade expressas no plano diretor [] Art 183

Aquele que possuir como sua aacuterea urbana de ateacute 250 msup2 por cinco anos ininterruptamente e sem oposiccedilatildeo utilizando-a para sua moradia ou de sua famiacutelia adquirir-lhe-aacute o domiacutenio desde que natildeo seja proprietaacuterio de outro imoacutevel urbano ou rural (BRASIL 1998)

A funccedilatildeo social da propriedade diz respeito a garantia do exerciacutecio da posse sobre

um imoacutevel ou terreno natildeo visando a limitaccedilatildeo da concepccedilatildeo de propriedade mas assegurando

os direitos sociais bem como o interesse coletivo

De acordo com Rolnik (2002) o direito de uma dada propriedade urbana passa a ser

reconhecido a partir de regras legais municipais definida por suas potencialidades de uso e o

150

seu conteuacutedo econocircmico seria atribuiacutedo pelo Estado mediante a correlaccedilatildeo dos interesses

sociais envolvidos

Para tanto a Constituiccedilatildeo estabeleceu o plano diretor municipal como instrumento

obrigatoacuterio do cumprimento da funccedilatildeo social pela propriedade urbana Cabe ainda destacar o

estabelecimento do artigo 24 sect1ordm 3ordm que determina o Estado como executor da competecircncia

legislativa plena ou seja os Estados poderiam legislar sobre o desenvolvimento urbano ateacute

que a Lei Federal fosse promulgada Entretanto nenhuma accedilatildeo foi efetivada (PASTORINNI

1997)

Ao instrumentalizar a gestatildeo urbana por meio de uma legislaccedilatildeo especiacutefica

instituiacuteram-se novos paracircmetros de accedilatildeo direcionados pela descentralizaccedilatildeo da poliacutetica urbana

que passou a ser executada pelo poder municipal assim como ocorreu nas demais poliacuteticas

sociais

O estabelecimento do Estatuto da Cidade pela Lei Federal nordm 10257 de 10 de julho

de 2001 regulamentou os artigos 182 e 183 da CF e apresentou uma seacuterie de instrumentos

voltados ao combate da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao aumento da oferta de aacutereas para habitaccedilatildeo

popular ou de equipamentos indispensaacuteveis agrave vida urbana e que objetivam facilitar a

urbanizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em favelas ou em loteamentos irregulares e

clandestinos representando um avanccedilo institucional ao tratamento da questatildeo urbana

historicamente marcada pela carecircncia de diretrizes e princiacutepios que fossem integrados e

articulados ao desenvolvimento urbano

O referido Estatuto estaacute estruturado em cinco capiacutetulos quais sejam as diretrizes

gerais (capiacutetulo I) os instrumentos da poliacutetica urbana (capiacutetulo II) o plano diretor (capiacutetulo

III) a gestatildeo democraacutetica da cidade (capiacutetulo IV) e por fim as disposiccedilotildees gerais

No artigo 5ordm haacute o estabelecimento de que a lei municipal poderaacute determinar o

parcelamento a edificaccedilatildeo ou utilizaccedilatildeo compulsoacuterios para as aacutereas delimitadas pelo plano

diretor No caso de natildeo cumprimento as penas aplicaacuteveis compreendem a aplicaccedilatildeo do

imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo (art

7ordm) e a desapropriaccedilatildeo do imoacutevel com pagamento mediante tiacutetulos da diacutevida puacuteblica (art

8ordm)

Um aspecto relevante que se pode destacar do Estatuto da Cidade eacute a gestatildeo

democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo de vaacuterios segmentos da sociedade nos processos

decisoacuterios contribui para a garantia do direito agrave cidade e por conseguinte da moradia

151

O Estatuto da Cidade ao prever um capiacutetulo dedicado agrave gestatildeo democraacutetica evidencia que sem a compreensatildeo mais profunda dos processos e conflitos em jogo na questatildeo urbana dificilmente se atenderaacute aos princiacutepios constitucionais de direito de todos agrave cidade da funccedilatildeo social da propriedade e da justa distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios e ocircnus decorrentes do processo de urbanizaccedilatildeo (OLIVEIRA 2001 p 16)

Dessa forma essas estrateacutegias para implantaccedilatildeo de gestotildees democraacuteticas para as

cidades satildeo praacuteticas que renegam a tradiccedilatildeo centralizadora e excludente de gestatildeo estatal que

foi vivenciada ateacute entatildeo redefinindo os papeacuteis de Estado e sociedade civil apontando para

ampliaccedilatildeo de co-gestatildeo entre puacuteblico e privado aumentando a possibilidade de minimizar os

efeitos negativos da burocratizaccedilatildeo estatal e da mercantilizaccedilatildeo da sociedade

A Sociedade Civil organizada os movimentos populares devem autonomamente elaborar na medida do possiacutevel (contra) propostas de planejamento Tais propostas podem ser coadjuvantes dos esforccedilos oriundos das proacuteprias administraccedilotildees progressistas ou podem mesmo dialeticamente calibraacute-los reafirmando a independecircncia dos movimentos sociais perante o Estado ou o(s) partido(s) (SOUZA 1992 p 134)

Especificamente no que se refere a essas novas estrateacutegias que buscam a

descentralizaccedilatildeo participaccedilatildeo e autonomia no acircmbito do setor de planejamento urbano eacute

interessante e sobretudo importante a realizaccedilatildeo de uma reflexatildeo teoacuterica sobre a conjuntura

poliacutetica institucional que combine em um maior controle social sem desconsiderar o poder

local

Segundo De Grazia (2003) o Estatuto da Cidade enfatiza o papel do Estado nesse

novo cenaacuterio poliacutetico no que se refere ao planejamento do espaccedilo urbano por meio da

elaboraccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas ressaltando que

O poder puacuteblico precisa entender que enquanto continuar se omitindo em relaccedilatildeo a sua obrigaccedilatildeo de fiscalizar o uso adequado das aacutereas puacuteblicas natildeo ocupadas e que enquanto continuar natildeo implantando uma poliacutetica urbana e habitacional que democratize o acesso agrave terra urbana mediante agora os proacuteprios instrumentos previstos no Estatuto da Cidade continuaraacute sendo o principal responsaacutevel pela existecircncia de cidades desordenadas injustas e desumanas (De GRAZI 2003 p 64)

Vale ressaltar que o processo de urbanizaccedilatildeo do Paiacutes foi realizado por meio de

planejamentos que atendiam aos interesses poliacuteticos e econocircmicos das classes de maior poder

aquisitivo sendo desenvolvidos de forma isolada do processo de gestatildeo sem a interlocuccedilatildeo

com a sociedade

152

O Estatuto da Cidade natildeo eacute um modelo ideal e uacutenico de legislaccedilatildeo para

democratizaccedilatildeo da questatildeo urbana mas haacute que se considerar o avanccedilo em relaccedilatildeo a

implementaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular na discussatildeo sobre os problemas da cidade visto que

natildeo havia nenhum instrumento que propiciasse isso

O Estatuto regulamentou e normatizou a garantia da participaccedilatildeo popular por meio

de conselhos oacutergatildeo colegiados de poliacutetica urbana nos niacuteveis nacional estadual e municipal

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano e

iniciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento

urbano

Esses instrumentos satildeo espaccedilos puacuteblicos de diaacutelogo entre os diversos interesses provenientes da sociedade civil de proposiccedilotildees partindo dos diversos setores de avaliaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo de decisotildees referentes aos investimentos puacuteblicos e privados nas cidades (INSTITUTO POacuteLIS 2005 p 194)

Nesse contexto o Estatuto da Cidade estabelece que lei regulamentadora do plano

diretor seja discutida e aprovada com a participaccedilatildeo da sociedade civil Isto porque o referido

plano possibilitaraacute o planejamento das cidades de forma articulada considerando toda a

infraestrutura urbana necessaacuteria para a garantia de sua plena funccedilatildeo social possibilitando

assim melhores condiccedilotildees de moradia Destarte a partir dos princiacutepios da funccedilatildeo social e a

gestatildeo democraacutetica da cidade pode ser embasada a luta pelo direito agrave cidade

Os planos diretores foram institucionalizados na deacutecada de 1970 em meio a um

raacutepido processo de urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto possuiacuteam uma visatildeo tecnocraacutetica do

processo de elaboraccedilatildeo das estrateacutegias de regulaccedilatildeo urbaniacutestica descartando a articulaccedilatildeo

entre habitaccedilatildeo e infraestrutura e quem deveriam ter acesso a eles

Atualmente os planos diretores respondem agraves reivindicaccedilotildees dos movimentos de luta

pela reforma urbana conforme seraacute apresentado no item posterior e inserem-se no processo

de elaboraccedilatildeo dos instrumentos de participaccedilatildeo popular citados anteriormente

O plano diretor pode conter orientaccedilotildees para a poliacutetica de desenvolvimento e de

ordenamento da expansatildeo urbana dos municiacutepios incluindo em seu escopo as determinaccedilotildees

das poliacuteticas nacionais de preservaccedilatildeo cultural e ambiental de turismo de mobilidade urbana

habitaccedilatildeo e outros

O objetivo fundamental do Plano Diretor eacute estabelecer como a propriedade cumpriraacute sua funccedilatildeo social de forma a garantir o acesso agrave terra urbanizada e

153

regularizada reconhecer a todos os cidadatildeos o direito agrave moradia e aos serviccedilos urbanos (BRASIL 2005 p 15)

Nesse sentido o plano diretor pode considerar as contradiccedilotildees e carecircncias dos

municiacutepios a escassez e o alto custo das aacutereas vazias aleacutem da diversidade de interesses dos

diversos agentes produtores e consumidores do espaccedilo urbano estabelecendo prioridades na

gestatildeo dos recursos disponiacuteveis Pode representar tambeacutem um reflexo da poliacutetica adotada nos

municiacutepios para resgatar a melhoria das condiccedilotildees de vida determinando diretrizes nas aacutereas

de habitaccedilatildeo meio ambiente uso do solo infraestrutura transporte e outros

No que diz respeito a poliacutetica habitacional o Estatuto da Cidade e os planos

diretores municipais prevecircem

A garantia do direito a cidades sustentaacuteveis entendido como o direito agrave terra urbana agrave moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e futuras geraccedilotildees [] a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo das aacutereas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do solo e edificaccedilatildeo consideradas a situaccedilatildeo socioeconocircmica da populaccedilatildeo e as normas ambientais (BRASIL 2006 p 36)

Os planos diretores municipais podem estabelecer diretrizes que contenham as

orientaccedilotildees gerais para a elaboraccedilatildeo da poliacutetica habitacional municipal tomando como base

os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade como Zonas Especiais de Interesse Social

(ZEIS) Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria Usucapiatildeo urbana Concessatildeo de uso especial entre outros

instrumentos que tenham interface direta com a questatildeo habitacional

As ZEIS fruto das lutas dos movimentos sociais de assentamentos irregulares pela

natildeo remoccedilatildeo pela melhoria das condiccedilotildees urbaniacutestica e pela regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

permitem inserir assentamentos irregulares agrave malha urbana tornando-os regulares

juridicamente possibilitando a introduccedilatildeo de serviccedilos e de infraestrutura regulando o

mercado de terras aumentando a arrecadaccedilatildeo do municiacutepio Aleacutem disso permitem que

terrenos natildeo edificados natildeo utilizados ou subutilizados sem destinaccedilatildeo social sejam

transformados em aacutereas para programas habitacionais

Em relaccedilatildeo agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria eacute necessaacuterio ressaltar sua importacircncia na

valorizaccedilatildeo do espaccedilo urbano uma vez que os agentes produtores e consumidores dos

espaccedilos irregulares natildeo apresentam poder aquisitivo suficiente para adquirir um imoacutevel

regular No entanto o processo de regularizaccedilatildeo assegura natildeo apenas a seguranccedila de ser

154

proprietaacuterio mas tambeacutem o risco da expulsatildeo pelo capital imobiliaacuterio e pelo ocircnus que tem que

ser pago advindo como saneamento (ROLNIK 1997 p 50)

A regularizaccedilatildeo fundiaacuteria pode ser definida como

Conjunto de poliacuteticas e medidas juriacutedicas urbaniacutesticas ambientais e sociais promovidas pelo poder puacuteblico por razotildees de interesse social ou interesse especiacutefico que visem adequar os assentamentos informais aos princiacutepios legais de modo a garantir o reconhecimento do direito social de moradia o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da propriedade urbana e o direito social ao meio ambiente equilibrado (ROLNIK 1997 p 73)

Segundo Rolnik (1997 p 75) garantir o direito agrave moradia implica em formalizar o

endereccedilo do morador fornecendo a ele serviccedilos por correio infraestrutura saneamento baacutesico

financiamentos etc Entatildeo regularizar e registrar a aacuterea ocupada poderaacute legitimar o acesso a

novos direitos promovendo com isso a elaboraccedilatildeo de novos projetos de organizaccedilatildeo

urbaniacutestica aleacutem de possibilitar a recuperaccedilatildeo ambiental dessa aacuterea

Outro instrumento a usucapiatildeo urbana eacute uma forma de se adquirir a propriedade de

um imoacutevel sobre o qual foi exercida posse contiacutenua pelo tempo miacutenimo determinado em lei

aleacutem de outras exigecircncias previstas para cada tipo de usucapiatildeo prescrito na legislaccedilatildeo

brasileira

Esse instrumento apesar de ter como objetivo transformar um possuidor em um

proprietaacuterio valoriza a posse da terra por meio do exerciacutecio desta [] o possuidor pode

adquirir o imoacutevel daquele que era dono mas natildeo exercia atividades sobre o terreno ou seja

natildeo cumpria com a funccedilatildeo social da propriedade Outro aspecto relevante desse instrumento

eacute a possibilidade de recorrer ao mesmo de modo coletivo (ROLNIK 1997 p 55)

Portanto a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a usucapiatildeo urbana e outros instrumentos satildeo

ferramentas utilizadas na atual Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo objetivando garantir o direito agrave

moradia regular Assim novos dispositivos legais da reforma urbana passaram a ser

instrumentos de intervenccedilatildeo das administraccedilotildees puacuteblicas municipais

Para enfrentar um quadro de carecircncia uma poliacutetica habitacional tem que fazer parte

de uma poliacutetica de desenvolvimento urbano que garanta a integralidade das accedilotildees Dessa

maneira a poliacutetica habitacional no governo Lula trouxe portanto avanccedilos significativos

Dentre eles o marco institucional representado pelo Ministeacuterio das Cidades e a nova relaccedilatildeo

estabelecida entre o governo e a sociedade representada pelas Conferecircncias da cidade

As atribuiccedilotildees do Ministeacuterio das Cidades de acordo com a atual Poliacutetica Nacional de

Habitaccedilatildeo podem ser assim entendidas

155

I

definir as diretrizes prioridades estrateacutegias e instrumentos da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo dentre eles o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo II

elaborar o marco legal da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo e do Sistema Nacional de habitaccedilatildeo III

elaborar criteacuterios e regras para aplicaccedilatildeo dos

recursos no Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo incluindo a poliacutetica de subsiacutedios IV

coordenar a implementaccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo V

orccedilamentos planos de aplicaccedilatildeo e metas anuais e plurianuais dos recursos a serem aplicados em habitaccedilatildeo VI- oferecer subsiacutedios teacutecnicos agrave criaccedilatildeo de fundos e respectivos conselhos estaduais do Distrito Federal regionais e municipais com o objetivo de incentivaacute-los a aderirem ao SNHIS VII

firmar termos de adesatildeo ao SNHIS com Estados e Municiacutepios VIII

instituir sistema de informaccedilotildees para subsidiar a formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo acompanhamento e controle das accedilotildees no acircmbito do SNH incluindo cadastro nacional de beneficiaacuterios das poliacuteticas de subsiacutedios IX

gerir o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social ouvido o Conselho do fundo (BRASIL 2004 p 13-14)

A Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo como uma forma estrateacutegica vincula a poliacutetica

urbana agrave fundiaacuteria cabendo a poliacutetica fundiaacuteria subsidiar a poliacutetica urbana na realizaccedilatildeo de

programas habitacionais nos municiacutepios O que para tanto remete a necessidade da

elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais nos quais a propriedade urbana possa cumprir sua

funccedilatildeo social Aleacutem de accedilotildees de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e de acesso a terra urbanizada

(ROLNIK 1997)

Essa poliacutetica habitacional tem como estrateacutegia o fortalecimento institucional sendo

efetiva nos estados e municiacutepios de acordo com

Incentivar a cooperaccedilatildeo entre os niacuteveis federal estadual e municipal buscando instituir mecanismos indutores de adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo estruturaccedilatildeo eou fortalecimento de oacutergatildeos especiacuteficos de formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e coordenaccedilatildeo das poliacuteticas estaduais e municipais de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo de estrutura institucional de acordo com as peculiaridades locais com o objetivo de articular as poliacuteticas setoriais e de desenvolvimento urbano Estimular a criaccedilatildeo de fundos e conselhos estaduais regionais e municipais afetos agraves questotildees urbanas e habitacionais Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais com ecircnfase na aplicaccedilatildeo dos instrumentos de reforma urbana em consonacircncia com o Estatuto da Cidade Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos habitacionais compatiacuteveis com os planos diretores municipais Apoiar a capacitaccedilatildeo de teacutecnicos e o desenvolvimento institucional dos oacutergatildeos responsaacuteveis pela poliacutetica habitacional no acircmbito estadual e municipal (BRASIL 2004 p 9)

Diante do exposto acima pode-se concluir que de fato as poliacuteticas puacuteblicas visam agrave

efetivaccedilatildeo do direito agrave moradia fundamentam-se na concretizaccedilatildeo do direito de propriedade

a partir de intervenccedilotildees em aacutereas irregulares ocupadas construccedilatildeo ou financiamento da

compra da casa proacutepria entre outros

156

No entanto observa-se que os projetos de renovaccedilatildeo urbana voltam-se cada vez mais

ao atendimento dos interesses do mercado imobiliaacuterio e financeiro atuando

fundamentalmente em benefiacutecio da classe de maior poder aquisitivo e do capital Esses

projetos procuram atrair novas atividades econocircmicas por meio da construccedilatildeo de centros

comerciais e de turismo shopping centers centros de convenccedilotildees edifiacutecios comerciais etc

Para Rolnik (1997 p 75) essas intervenccedilotildees proporcionam e reforccedilam uma

reestruturaccedilatildeo social e espacial nas grandes cidades provocando por outro lado um novo

ordenamento territorial acirrando as exigecircncias competitivas do mercado imobiliaacuterio que

procuram impor seus interesses nas grandes transformaccedilotildees urbaniacutesticas arquitetocircnicas e de

infraestrutura Tal situaccedilatildeo impotildee uma maior atuaccedilatildeo do poder puacuteblico atraveacutes da legislaccedilatildeo

urbaniacutestica na regulamentaccedilatildeo dos usos e da ocupaccedilatildeo territorial para que o desenvolvimento

urbano ocorra com sustentabilidade garantindo a qualidade de vida para a populaccedilatildeo

Nesse sentido pode afirmar que natildeo haacute uma neutralidade do Estado por conseguinte

das normatizaccedilotildees juriacutedicas uma vez que refletem interesses poliacuteticos e econocircmicos de

grupos distintos as accedilotildees desse Estado satildeo visando administrar esses interesses E para tanto

esse Estado estabelece criteacuterios para adotar accedilotildees que garantam sua legitimidade e que natildeo

interfiram nesse modo de produccedilatildeo

Bourdieu (2001) afirma que as produccedilotildees simboacutelicas funcionam como instrumento

de dominaccedilatildeo porque contribuem para integraccedilatildeo real das classes dominantes distinguido-as

de outras classes para a desmobilizaccedilatildeo das classes dominadas para a legitimaccedilatildeo da ordem

estabelecida mediante a hierarquizaccedilatildeo

O que reafirma a concepccedilatildeo de poliacutetica social proposta por Pastorini (1997) como o

produto de uma correlaccedilatildeo entre o Estado a classe que deteacutem o capital e a classe trabalhadora

excluiacuteda que envolve perdas e ganhos entre todos os envolvidos Essa correlaccedilatildeo eacute refletida

nos princiacutepios da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo Como mostra o quadro 5

157

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo

Princiacutepios Finalidades Moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social

Garantir padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais

Funccedilatildeo social da propriedade urbana Implementar instrumentos de reforma urbana possibilitando melhor ordenamento e maior controle do uso do solo de forma a combater a especulaccedilatildeo e garantir acesso a terra urbanizada

Questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado

Legitimar o poder puacuteblico como agente indispensaacutevel na regulaccedilatildeo urbana e do mercado imobiliaacuterio no que se refere a provisatildeo de moradia e regularizaccedilatildeo de assentamentos precaacuterios

Gestatildeo democraacutetica Possibilitar a participaccedilatildeo dos diferentes segmentos da sociedade assim como o controle social e transparecircncia nas decisotildees e procedimentos

Subordinaccedilatildeo das accedilotildees em habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo atrelado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Discutir a questatildeo urbana a partir da integraccedilatildeo das poliacuteticas

Fonte Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (2004)

Ao elaborarformular as poliacuteticas habitacionais o Estado acaba por acirrar os

processos de exclusatildeo social e segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o planejamento habitacional

nas condiccedilotildees atuais reforccedila as tendecircncias segregacionistas e excludentes na urbanizaccedilatildeo

brasileira (SANTOS 2002 p 203)

Dessa forma o Estado acaba definindo alguns fatores segregadores tais como aponta

Azevedo (2007 p 71)

Localizaccedilatildeo

geralmente distante dos centros urbanos ou vazios urbanos em aacutereas inadequadas para o desenvolvimento urbano racional

tamanho e qualidade das habitaccedilotildees

pequenas construiacutedas com material de baixa qualidade na maioria das vezes

infraestrutura

inexistente ou de qualidade precaacuteria

e no financiamento

exigecircncias tantas que a maior parte da populaccedilatildeo natildeo alcanccedila fazendo com que poucos tenham acesso ao projeto [] Apenas uma minoria dos setores populares lograraacute ser inserida nos programas governamentais de habitaccedilatildeo popular

Rolnik (2002) ressalta que a elaboraccedilatildeo de leis e de instrumentos urbaniacutesticos como

por exemplo a Legislaccedilatildeo Especial de Habitaccedilatildeo e de Interesse Social voltados para a

formulaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais com a intenccedilatildeo de facilitar aprovaccedilatildeo de projetos de

159

De acordo com Maricato (2000) a intensificaccedilatildeo da dualidade entre cidade formal e

cidade informal tem sido uma constante na estrutura das cidades brasileiras O ritmo do

crescimento dos loteamentos irregulares das favelas e dos corticcedilos nas periferias das grandes

cidades eacute bastante intenso sobretudo nas aacutereas de ocupaccedilatildeo o que tem reforccedilado a funccedilatildeo

estrutural da informalidade na composiccedilatildeo do espaccedilo urbano

Fernandes (1998 p 36) destaca que a habitaccedilatildeo informal sofre com a ausecircncia de

seguranccedila da posse o que deixa o exerciacutecio do direito agrave moradia em risco permanente de

despejo ou deslocamento forccedilado Sendo assim eacute de suma importacircncia que a legislaccedilatildeo deva

prever instrumentos juriacutedicos e urbaniacutesticos que reconheccedilam o direito das pessoas de

permanecer no local onde residem com seguranccedila e proteccedilatildeo independentemente da forma

com que eacute exercida a posse

Encontra-se em curso portanto uma mudanccedila significativa nas concepccedilotildees

tradicionais de regulaccedilatildeo urbaniacutestica logo das proacuteprias noccedilotildees de legalidade e ilegalidade

Tais mudanccedilas visam principalmente respaldar e instrumentalizar o poder puacuteblico para

intervir nessas aacutereas de forma a melhorar as condiccedilotildees de salubridade e habitabilidade

buscando-se desnaturalizar as relaccedilotildees de poder respaldadas na propriedade privada e na terra

urbana enquanto reserva de valor que cristalizaram a desigualdade e a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Neste sentido pode-se compreender o papel da legislaccedilatildeo urbaniacutestica como

instrumento que vem ganhando relevacircncia na tentativa de regular e controlar a dinacircmica de

atuaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio no meio urbano Acredita-se que a busca de cidades mais

justas e democraacuteticas menos segregadas passa pela adoccedilatildeo de poliacuteticas que regulem a

ocupaccedilatildeo e o uso do solo criando instrumentos capazes de articular os interesses em torno do

processo de produccedilatildeo apropriaccedilatildeo e consumo do espaccedilo urbano com os objetivos de se criar

espaccedilos socialmente mais justos e tecnicamente organizados

Pode-se buscar o direito de propriedade para todos e natildeo a prevalecircncia do direito de

propriedade para alguns ou seja aquele que reconhece a propriedade apenas como

mercadoria

Esses fatos tornam as duas cidades amazocircnicas em cidades com suas dimensotildees

espaciais produto da dualidade pois eacute dividida em cidade legal e cidade ilegal haja vista que

os que natildeo tecircm condiccedilotildees para manter e se manterem na cidade legal procuram alternativas

de sobrevivecircncia resultando em ocupaccedilatildeo de aacutereas consideradas informais e ilegais (como as

aacutereas de baixadas ) nas quais decorrem em irregularidades que geram uma seacuteria

consequumlecircncia ao cenaacuterio urbano

160

Para Rolnik (1997) a cidade legal e a cidade ilegal satildeo situaccedilotildees que coexistem o

tempo todo uma vez que dentro da cidade ideal primeiro o habitante adquire o lote depois

contrata o profissional registra o projeto executa a obra e legaliza a construccedilatildeo junto aos

oacutergatildeos competentes para que as pessoas possam residir Na cidade real ocorre justamente o

contraacuterio primeiro chegam as pessoas constroem-se os barracos lutam pela infraestrutura

pelos lotes e pela propriedade

Conforme Souza (2002 p 51) a informalidade e a ilegalidade da ocupaccedilatildeo tecircm sido

uma das marcas no processo de urbanizaccedilatildeo contemporacircnea ampliando-se particularmente

na uacuteltima deacutecada quando haacute um retorno intensivo de ocupaccedilotildees do tipo favelas

Fernandes (1998) classificaram as informalidades e ilegalidades em dois grupos um

relacionado agrave falta de tiacutetulo de propriedade ou de posse legalmente reconhecido outro

relacionado ao descumprimento de normas de construccedilatildeo na cidade Nesse sentido os

assentamentos informais podem ocorrer por ocupaccedilatildeo direta (organizados por movimentos

sociais em terras puacuteblicas ou privadas) ou por mercados informais (lotes clandestinos vendas

ilegais negociaccedilotildees no mercado informal)

A discussatildeo sobre a cidade ilegal dialoga com uma determinada percepccedilatildeo sobre o

direito urbaniacutestico e em determinados momentos a partir do ponto de vista da regulaccedilatildeo

urbaniacutestica Em uma sociedade regida pela loacutegica da mercadoria a legalidade tambeacutem se

transforma de direito em mercadoria atuando de forma elitizante e excludente

Desse modo a exclusatildeo social manifesta-se no proacuteprio fenocircmeno da segregaccedilatildeo

espanotcial uma vez que separando as aacutereas de moradia na cidade por classes sociais distintas

coloca de fora das melhores condiccedilotildees de habitabilidade as populaccedilotildees mais pobres o que

resulta em acessos diferenciados agraves benfeitorias e ao conforto urbano

Segundo Buarque (1999) existe uma ilegalidade proveniente da impossibilidade de

cumprir com as imposiccedilotildees da cidade mercadoria e existe a ilegalidade fruto da intenccedilatildeo de

burlar a lei para apropriaccedilatildeo de vantagens individuais ou de grupos Dentro desse contexto a

cidade ilegal refere-se a um processo de inclusatildeo-exclusatildeo decorrente de uma determinada

regulaccedilatildeo juriacutedico-urbanistica Assim a dualidade legal-ilegal regular-irregular define-se a

partir de um aparato juriacutedico formal

Portanto a cidade legal eacute fruto de um projeto no qual todos os itens de consumo

coletivo de equipamentos e de serviccedilos encontram-se presentes Eacute construiacuteda pelos agentes

formalmente instituiacutedos A instituiccedilatildeo de regulamentaccedilatildeo para a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria nas

cidades eacute o reconhecimento da inadequaccedilatildeo da regulaccedilatildeo urbaniacutestica agraves necessidades da

populaccedilatildeo de mais baixa renda

161

A partir desse enfoque seratildeo analisadas nos capiacutetulos seguintes as contradiccedilotildees na

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano assim como os conflitos que se desenrolam nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis levando em conta que o espaccedilo urbano engloba a materialidade

e a subjetividade o real e o imaginado de forma interligada apontando duas consideraccedilotildees

importantes ao debate

a) o papel do Poder Puacuteblico na produccedilatildeo do espaccedilo urbano atraveacutes das poliacuteticas

habitacionais

b) neste processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano ressalta-se a importacircncia do

processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

162

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

Conforme foi apresentado anteriormente no Brasil segundo Villaccedila (2001) o

processo de urbanizaccedilatildeo foi marcado por uma intensa concentraccedilatildeo de investimentos em

algumas regiotildees Esse processo foi responsaacutevel pela marginalizaccedilatildeo de alguns lugares onde

se concentra a camada da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo da cidade Essas regiotildees satildeo

desprovidas pelas accedilotildees do Estado Basta uma volta pela cidade

e nem precisa ser uma

metroacutepole

para constatar a diferenciaccedilatildeo entre os bairros tanto no que diz respeito ao perfil

da populaccedilatildeo quanto agraves caracteriacutesticas urbaniacutesticas de infraestrutura de conservaccedilatildeo dos

espaccedilos e equipamentos puacuteblicos etc

Cabe ressaltar que a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute uma realidade vivenciada pelas

pessoas que residem nas periferias das grandes cidades uma vez que a localizaccedilatildeo das

moradias de diferentes classes sociais natildeo se daacute de forma aleatoacuteria ou por escolha proacutepria De

fato essas localizaccedilotildees satildeo direcionadas por diferentes fatores sejam econocircmicos sociais

ambientais culturais ou poliacuteticos o que geram diferentes padrotildees de uso e ocupaccedilatildeo do solo

urbano

Para Santos (2002) o poder puacuteblico torna-se estimulante da especulaccedilatildeo do solo ao

fomentar a produccedilatildeo de espaccedilos vazios dentro das cidades mostra-se inoperante para resolver

problemas de moradia e empurra a maioria da populaccedilatildeo para precaacuterias habitaccedilotildees nas

periferias Assiste-se ao crescimento e aparecimento de inuacutemeros assentamentos ocupaccedilotildees e

favelas que ocupam aacutereas aleatoriamente sem nenhum tipo de (re)organizaccedilatildeo de

conhecimentos geograacuteficos ambientais ou infraestrutura

Nesse sentido a dificuldade do acesso a terra tem sido fator determinante de

desigualdades sociais e diferenciaccedilotildees entre as classes sociais37 Os elevados preccedilos do solo

determinam a segregaccedilatildeo social por estratos de renda infligindo ocircnus sociais inversamente

proporcionais agrave capacidade de pagamento de quem os suporta

Entretanto essas desigualdades sociais natildeo satildeo reflexos apenas dos planos materiais

e objetivos dos indiviacuteduos mas tambeacutem dos planos subjetivos e psicoloacutegicos ou seja satildeo

muacuteltiplas as dimensotildees que os diferentes processos de desigualdades sociais afetam a vida e o

cotidiano da populaccedilatildeo tais como econocircmica cultural poliacutetica social psicoloacutegica etc

37 Para Maricato (2001) ao diferenciar os lugares o preccedilo da terra passa a ser fundamental e determinante sobre a acessibilidade e possibilidade de localizaccedilatildeo no espaccedilo intraurbano das diferentes classes sociais Da mesma forma o espaccedilo produzido com estas caracteriacutesticas tambeacutem passa a reproduzir tais condiccedilotildees de desigualdade social

163

Eacute importante resgatar que conforme discutido nos capiacutetulos anteriores aleacutem do

preccedilo da terra urbana do setor imobiliaacuterio-construtor e do Estado eacute preciso considerar o

conjunto da composiccedilatildeo social do capital e a forma como se reparte o trabalho excedente do

necessaacuterio ou seja quando a oferta de empregos eacute insuficiente ou os salaacuterios satildeo muito

baixos dificultando a aquisiccedilatildeo de uma moradia digna que disponha de saneamento baacutesico

comeacutercio e lazer (KOWARICK 1988)

Sendo assim eacute importante destacar que o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial pode

ser compreendido em sua dinacircmica marcada pela desigualdade contradiccedilatildeo e exclusatildeo trata-

se portanto de um processo estruturador da proacutepria produccedilatildeo do espaccedilo urbano

A seguir procurar-se-aacute apresentar o processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano e a

questatildeo habitacional em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes partindo da perspectiva que entender o

processo de urbanizaccedilatildeo na Amazocircnia eacute um fenocircmeno mais geral que abrange redes

socioeconocircmicas e culturais complexas agentes sociais que fazem a cidade que lutam em

posiccedilotildees de classe diferente e que satildeo os artiacutefices da apropriaccedilatildeo e da produccedilatildeo do espaccedilo da

construccedilatildeo dos direitos agrave cidade

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A construccedilatildeo do espaccedilo urbano na Amazocircnia teve como elemento significativo

desde o periacuteodo colonial as determinaccedilotildees das poliacuteticas nacionais e internacionais O

processo de urbanizaccedilatildeo foi consequumlecircncia de formas especiacuteficas do desenvolvimento do

capitalismo para essa regiatildeo Essa forma se evidenciou nas relaccedilotildees econocircmicas estabelecidas

para apropriaccedilatildeo das riquezas naturais

Assim na Amazocircnia cujo siacutembolo maior eacute a floresta tropical regiatildeo com

caracteriacutesticas geograacuteficas climaacuteticas e ambientais peculiares as poliacuteticas de

desenvolvimento tecircm provocado substanciais transformaccedilotildees na vida econocircmica social e

cultural de seus habitantes com a utilizaccedilatildeo da ciecircncia e tecnologia para modernizar e

incorporar economicamente os recursos naturais hidrograacuteficos e da floresta tropical ao mundo

globalizado

Em maior ou menor grau o processo recente de desenvolvimento eacute resultante da

accedilatildeo ou omissatildeo da elite regional

governantes poliacuteticos fazendeiros empresaacuterios e

intelectuais amazocircnicos

que diretamente eou associada a interesses externos tem ajudado

164

a promover a modernizaccedilatildeo na regiatildeo a partir de objetivos estritamente econocircmicos e

localizados o que tem contribuiacutedo para o crescimento dos problemas sociais e da degradaccedilatildeo

ambiental

Nesse sentido pode-se afirmar que o avanccedilo do capitalismo na regiatildeo amazocircnica

conduziu a uma transformaccedilatildeo natildeo apenas na estrutura fundiaacuteria mas tambeacutem no aspecto

social levando o camponecircs a disputar desigualmente com empresas nacionais e estrangeiras

as terras que ocupa (COSTA 1980)

O papel do Estado nesse contexto aparece de suma importacircncia jaacute que facilitou e

reforccedilou a penetraccedilatildeo do capital nacional e internacional na regiatildeo transformando-a num

cenaacuterio que combina modernizaccedilatildeo e exclusatildeo social cujos princiacutepios norteadores eram o

patrimonialismo e o clientelismo

Mediante esse contexto analisar-se-aacute a cidade de Beleacutem como um espaccedilo de inter-

relaccedilotildees urbanas portanto tendo como fundamento as contradiccedilotildees sociais (derivadas das

relaccedilotildees sociais conflituosas relaccedilotildees de classe) e pressupondo o papel fundamental da praacutexis

das praacuteticas urbanas

A cidade de Beleacutem fundada em 1616 no periacuteodo colonial com o nome de Santa

Maria de Beleacutem do Gratildeo Paraacute a partir da ocupaccedilatildeo das terras indiacutegenas pelos portugueses e

da construccedilatildeo do Forte de Preseacutepio (hoje denominado de Forte do Castelo)38 Seu relevo eacute

baixo com boa parte do territoacuterio situado em aacutereas de baixadas ou seja as vaacuterzeas e igapoacutes

das bacias hidrograacuteficas39 que recortam a cidade determinando assim no seu interior a

existecircncia de diversas faixas de terras abaixo da cota de 04 metros que recebem as influecircncias

do rio e do oceano Estas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees a maior parte do ano satildeo proacuteximas aos

canais nas quais se instalaram vaacuterios migrantes e a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo e se

constituem objeto de accedilotildees de saneamento e de habitaccedilatildeo de interesse social

O aglomerado metropolitano de Beleacutem eacute constituiacutedo espacialmente por dois

conjuntos fisiograacuteficos distintos aacuterea continental e conjunto insular A aacuterea continental

localiza-se na regiatildeo metropolitana e a insular abrange aproximadamente 39 ilhas das quais

as mais importantes satildeo as de Mosqueiro (1911 Kmsup2) e CaratateuaOuteiro (318 Kmsup2)

ambas interligadas ao continente por meio de pontes (Mapa 1)

38 Abrange uma aacuterea de 5058231 kmsup2 cujo centro estaacute localizado aproximadamente a 1ordm 20 de latitude sul e 48ordm 30 de longitude oeste de Greenwich possuindo um clima quente e uacutemido com precipitaccedilatildeo meacutedia anual alcanccedilando os 2834 mm Situa-se numa peniacutensula contornada ao sul pelo rio Guamaacute a oeste pela Baiacutea do Guajaraacute e Baiacutea do Marajoacute ao norte pelo furo do Maguari e a leste a cidade limita-se com os municiacutepios de Ananindeua Marituba Santa Baacuterbara e Santo Antocircnio do Tauaacute (SEGEP 1999) 39 Bacia do Una Bacia do Comeacutercio Tamandareacute e Satildeo Joseacute Bacia da Estrada Nova Bacia do Tucunduba e Bacia das Almas e Reduto (RODRIGUES 2000 p 125)

165

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem

Fonte SEGEP (2001)

166

Na parte continental aacuterea mais densamente ocupada inserem-se os conjuntos

urbaniacutesticos das cidades que compotildeem a Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem (RMB) principal

poacutelo concentrador de atividades secundaacuterias e terciaacuterias irradiadoras de fluxo e intercacircmbios

com todo o territoacuterio paraense

A RMB que abrange uma aacuterea de 18277 Kmsup2 com uma populaccedilatildeo de 2040843 de

habitantes (quase um terccedilo da populaccedilatildeo do Estado do Paraacute)40 foi instituiacuteda pelo governo

federal por meio de Lei complementar nordm 14 de junho de 1973 e complementada pelas Leis

nordm 20 de 1974 e nordm 27 de 1975

Naquela eacutepoca a RMB era constituiacuteda pelos municiacutepios de Beleacutem e Ananindeua

Isto se deveu a uma estrateacutegia geopoliacutetica de induccedilatildeo de desenvolvimento na regiatildeo pois

Beleacutem era um poacutelo regional de articulaccedilatildeo entre diferentes regiotildees do Estado assim como

com o Amapaacute e o Maranhatildeo (CARDOSO LIMA 2006)

Com a Constituiccedilatildeo de 1988 atribui-se aos estados a responsabilidade de instituir

regiotildees metropolitanas aglomeraccedilotildees urbanas e microrregiotildees O governo estadual por meio

da Lei complementar nordm 27 de outubro de 1995 instituiu a RMB com a inclusatildeo dos

municiacutepios de Beleacutem Ananindeua Marituba e Benevides Em 19 de dezembro de 1996 o

municiacutepio de Santa Baacuterbara foi incluiacutedo na RMB (SEPLAN 1998) Mais recentemente na

RMB foi incluiacutedo o municiacutepio de Santa Izabel

Na tabela 4 pode ser evidenciado que o processo de crescimento e consolidaccedilatildeo da

RMB foi baseado na expansatildeo perifeacuterica espraiamento da mancha urbana e paulatina

transformaccedilatildeo de aacutereas rurais em urbanas Este fato eacute demonstrado com os dados de

crescimento de Beleacutem que na deacutecada de 1990 foi menor do que o apresentado pelo

municiacutepio de Ananindeua tornando-se o segundo municiacutepio em importacircncia na RMB e

apresentando uma intensa conurbaccedilatildeo com Beleacutem Os demais municiacutepios (Benevides

Marituba e Santa Baacuterbara) aleacutem de apresentarem populaccedilatildeo menor possuem maior

quantidade de aacutereas consideradas rurais

Aleacutem disso cabe destacar que os fatores geograacuteficos tiveram grande importacircncia no

processo de ocupaccedilatildeo urbana da RBM na medida em que as aacutereas de terra firme foram sendo

ocupadas pelas camadas de maior renda restando somente agraves aacutereas alagadas para a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo Essas caracteriacutesticas geograacuteficas tecircm papel fundamental na forma

como as questotildees socioespaciais estatildeo imbricadas nas questotildees habitacionais bem como na

40 Dados do IBGE Censo Demograacutefico 2010

167

forma como a populaccedilatildeo de baixa renda busca suprir suas necessidades de moradia na cidade

(PINHEIRO et al 2007)

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

Nome do Municiacutepio

Ano 1991

Ano 1996

Ano 2000

Ano 2010

TCA 1991-1996

TCA 1996-2000

TCA 1991-2000

TCA 2000-2010

Ananindeua 88151 341257 392947 471744 311 36 181 - Beleacutem 1244689

1144312

1280614

1392031 -17 29 04 - Benevides 68465 28130 35350 51663 -163 59 -71 - Marituba 0 49239 75448 108251 - 113 - - Santa Baacuterbara

0 11549 11375 17154 - -04 - -

Marituba se tornou municiacutepio no ano de 1996 sendo assim tem-se os nuacutemeros da populaccedilatildeo a partir desse ano TCA Taxa de Crescimento Anual Dados ainda natildeo disponiacuteveis do Censo IBGE 2010 Fonte IBGE (2010)

Na histoacuteria da expansatildeo urbana de Beleacutem a fundaccedilatildeo da cidade teve como objetivo

impedir a tentativa de ingleses franceses e holandeses de se estabelecerem na regiatildeo

A ocupaccedilatildeo da Amazocircnia pela colonizaccedilatildeo portuguesa foi movida por interesses poliacuteticos de fincar pontos avanccedilados com fortificaccedilotildees em lugares estrategicamente relevantes distantes para demarcar a presenccedila portuguesa nessa regiatildeo do norte [] presidida pelos interesses econocircmicos o que pode ser visto [] no modo de produccedilatildeo e de exploraccedilatildeo da matildeo-de-obra praticada nos povoados das missotildees religiosas espalhadas no territoacuterio do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo (CASTRO 2008 p 17)

A colonizaccedilatildeo dessa regiatildeo antes ocupada pelos iacutendios deu-se em um primeiro

momento ainda quando o Brasil era colocircnia de Portugal com o principal objetivo de proteger

o imenso territoacuterio da invasatildeo de outros povos e na tentativa de detectar as possibilidades de

exploraccedilatildeo dos recursos florestais Foram os missionaacuterios e sertanistas os primeiros a

desenvolverem atividades econocircmicas logo no inicio da colonizaccedilatildeo catequizando iacutendios e

colhendo as especiarias (drogas do sertatildeo) para a coroa portuguesa

Com a chegada dos portugueses foram vaacuterios os grupos sociais dentre eles o grupo

indiacutegena que se revoltaram em diversas situaccedilotildees e em diferentes capitanias contra o

domiacutenio que o Governo de Portugal e seus representantes na colocircnia impunham sobre a

populaccedilatildeo bem como lutavam pela posse do territoacuterio

168

Em 07 de janeiro de 1619 houve a primeira revolta dos povos indiacutegenas contra essa

opressatildeo e o assalto agraves suas terras41 Os Tupinambaacutes que moravam agraves margens do rio

Guamaacute e Paraacute invadiram a cidade de Beleacutem com a finalidade de expulsar os lusitanos da

regiatildeo (BEZERRA NETO 1999)

No entanto segundo Bezerra Neto (1999 p 19)

[] os colonos refugiados no Forte do Preseacutepio abriram fogo contra os indiacutegenas matando muito deles e fazendo com que fossem obrigados a bater em retirada deixando Beleacutem destruiacuteda Assim na ocupaccedilatildeo da regiatildeo os portugueses fizeram suas guerras contra as populaccedilotildees nativas quase sempre exterminando-as e subjugando-as ao seu domiacutenio

A produccedilatildeo do espaccedilo urbano de Beleacutem iniciou-se em torno do forte do Preseacutepio

expandindo-se para o sul com a abertura das primeiras ruas acompanhando o litoral ao longo

da Baiacutea do Guajaraacute No entanto o crescimento do nuacutecleo urbano em direccedilatildeo ao sul foi

interrompido pelo igarapeacute do Piri que era longo e tortuoso (CORREcircA 1989)

A situaccedilatildeo topograacutefica do Piri impedia a continuidade do traccedilado urbano tornando-

se ponto de referecircncia da divisatildeo da cidade em dois bairros um a oeste do Piri o bairro da

Cidade (hoje denominado de Cidade Velha) e outro a leste o bairro da Campina (hoje

Comeacutercio) (TRINDADE JUNIOR 1997) O espaccedilo produzido limitava-se aos primeiros

arruamentos com seus preacutedios fortes igrejas e conventos Tambeacutem recebeu as suas primeiras

edificaccedilotildees civis feitas com materiais simples predominantemente a taipa e a taipa de pilatildeo

Inicialmente esse espaccedilo urbano produzido foi organizado levando em consideraccedilatildeo

os terrenos de cotas mais altas deixando grandes aacutereas desocupadas formadas por terrenos

alagaacuteveis ou alagados de cotas baixas Na sua expansatildeo os acidentes hiacutedricos foram sendo

contornados o que provocou uma formaccedilatildeo irregular da cidade acompanhando a topografia

Os principais agentes produtores do espaccedilo desde o periacuteodo colonial eram a

burocracia os comerciantes as ordens religiosas e a camada pobre da populaccedilatildeo

(RODRIGUES apud TRINDADE JUNIOR 1997) A base econocircmica da cidade repousava no

comeacutercio na agricultura de subsistecircncia e no extrativismo

A exploraccedilatildeo das drogas do sertatildeo as atividades agriacutecolas e a economia gomiacutefera que tinham nas vias fluviais o principal meio de circulaccedilatildeo configuraram a existecircncia de uma rede urbana dendriacutetica que definiu a cidade de Beleacutem como cidade primaz ratificada a cada momento por sua posiccedilatildeo estrateacutegica no contexto regional que inclusive marcou o caraacuteter

41 Pode-se dizer que essa situaccedilatildeo foi a primeira manifestaccedilatildeo popular ocorrida em Beleacutem

169

poliacutetico-militar de ocupaccedilatildeo inicial da regiatildeo pelos portugueses (TRINDADE JUNIOR 1998 p 98)

Castro (2008 p 17) ressalta que o surgimento das cidades coloniais tiveram duas

motivaccedilotildees primeiro o avanccedilo da organizaccedilatildeo do sistema extrativista do transporte de

mercadorias do processo de catequese e segundo a dominaccedilatildeo de indiacutegenas para o trabalho

servil A respeito da matildeo-de-obra para o trabalho servil Bezerra Neto (1999 p 57) declara

que

A matildeo-de-obra escrava indiacutegena e africana constituiacutea a base dos trabalhadores da proviacutencia O contingente de cativos africanos no nuacutecleo urbano de Beleacutem e em seu entorno era bastante expressivo chegando a representar 35 da populaccedilatildeo no final da segunda metade do seacuteculo XVIII A eles somavam-se os habitantes brancos que representavam cerca de 52 dos moradores e finalmente os pobres livres pretos iacutendios e mesticcedilos que perfaziam um total de 13 dos indiviacuteduos

Na economia colonial o extrativismo vegetal sempre foi um importante moacutevel de

ocupaccedilatildeo e povoamento pois agrave procura por produtos nativos centenas de pessoas adentravam

na floresta e os vilarejos iam surgindo agraves margens dos rios caracterizando o chamado padratildeo

dendriacutetico de urbanizaccedilatildeo Isso influenciou a formaccedilatildeo de diferentes modos de vida

estrateacutegias de sobrevivecircncia e de trabalho condiccedilotildees de vida e a propagaccedilatildeo de haacutebitos e

valores culturais

que atravessaram geraccedilotildees condicionando os modos de vida nas cidades

espaccedilos de construccedilatildeo das praacuteticas sociais e poliacuteticas (SANTOS 1980)

A expansatildeo da cidade nos seacuteculos XVIII e XIX decorreu de uma economia agriacutecola

em plantaccedilotildees de cacau e cana-de-accediluacutecar nos arredores de Beleacutem em engenhos produtores de

accediluacutecar aguardente e mel aleacutem da agricultura de roccedilas olarias engenhos de pilar arroz de

atividades comerciais e criaccedilatildeo de gado vaccum Contava ainda com faacutebrica de farinha e uma

de chocolate

Nota-se que um dos fatores que influenciaram na forma de ocupaccedilatildeo da cidade de

Beleacutem foi o ambiental pois a ocupaccedilatildeo das margens dos rios que contornavam Beleacutem por

instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas incentivou a populaccedilatildeo a povoar as aacutereas alagadas e

perifeacutericas da cidade

Nesse periacuteodo percebeu-se a preocupaccedilatildeo das autoridades puacuteblicas com as vaacuterzeas

especialmente do Piri que em virtude da forma de ocupaccedilatildeo comeccedilava a apresentar os

efeitos da poluiccedilatildeo e da falta de higiene assim como a viabilizaccedilatildeo do crescimento da cidade

que foram utilizados como argumentos para justificar o ensecamento a terraplenagem e

170

drenagem da baixada do Piri (TRINDADE JUNIOR 1997) Isso fez com que surgisse um

plano de aproveitamento do Piri (FERREIRA 1995)

Esse plano previa o aproveitamento da rede hidrograacutefica de Beleacutem em sua totalidade

tornando-a navegaacutevel Tratava-se de aproveitar as formas naturais do siacutetio urbano para

solucionar os problemas de saneamento e drenagem da cidade ou seja ao inveacutes de aterrar os

rios e igarapeacutes que percorriam Beleacutem era melhor embelezaacute-los e dar-lhes uma proteccedilatildeo

militar segura Entretanto em 1803 foi iniciado o trabalho de ensecamento do Piri

contrariando assim os planos de Gronfelts Com o aterramento do Piri ocorreu a integraccedilatildeo

fiacutesica entre os bairros da Cidade e da Campina (TRINDADE JUNIOR 1997)

Segundo Correcirca (1989 p 80) as obras do Piri foram realizadas num periacuteodo em que

tanto a regiatildeo como a cidade passavam por um decliacutenio econocircmico aproveitando-se assim a

ociosidade da matildeo-de-obra escrava A partir de 1778 a Amazocircnia passou por uma

estagnaccedilatildeo devido agrave extinccedilatildeo da Companhia do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo e agrave emergecircncia de uma

situaccedilatildeo mundial desfavoraacutevel ao mercado dos produtos tropicais em geral agrave agricultura e ao

extrativismo de exportaccedilatildeo Com isso Beleacutem sofreu os efeitos do decliacutenio econocircmico aleacutem

de ter vivenciado fortes confrontos poliacuteticas decorrentes da Cabanagem (1835 - 1840)42

A Cabanagem foi entre as muitas manifestaccedilotildees ocorridas no Periacuteodo Regencial

este considerado de transiccedilatildeo devido agrave transferecircncia do poder das elites portuguesas para as

elites nacionais (ricos proprietaacuterios de terras) a manifestaccedilatildeo de caraacuteter popular que reuniu os

habitantes pobres das cidades e vilarejos ribeirinhos iacutendios negros e mesticcedilos denominados

cabanos

Devido a situaccedilatildeo de miseacuteria das classes populares que natildeo viam os seus anseios

atendidos a conjuntura de crise econocircmica por qual passava o Brasil e a pressatildeo das elites

nacionais o movimento poliacutetico social conseguiu se expandir no Paraacute e mobilizar adesotildees

crescentes no meio dos segmentos sociais pobres Entretanto esses grupos sociais e eacutetnicos

que aderiu em massa agrave revolta na tentativa de encontrar uma saiacuteda para sua situaccedilatildeo

perceberam que poderiam lutar por outros ideais jaacute que o movimento tomou dimensotildees mais

ampla de autodeterminaccedilatildeo

Os chefes cabanos declararam a autonomia da proviacutencia do Paraacute e formaram um

governo revolucionaacuterio em defesa de sua liberdade No entanto foram derrotados e

duramente massacrados

42 Ateacute esse periacuteodo ocorreram vaacuterias revoltas agitaccedilotildees e motins contra a miseacuteria das camadas populares e a opressatildeo dos iacutendios e negros

171

O governo do primeiro ministro portuguecircs Marquecircs de Pombal continuou com o

processo de ocupaccedilatildeo territorial tendo como marco a construccedilatildeo de um reduto (pequena

praccedila de guerra) agraves proximidades do antigo convento de Santo Antocircnio Esse reduto ajudava

a garantir a proteccedilatildeo da cidade jaacute que sua localizaccedilatildeo era estrateacutegica junto agrave baiacutea Assim

surgiu o nome do bairro do Reduto e do igarapeacute que existia laacute (denominado anteriormente de

Igarapeacute da Faacutebrica) Esse Igarapeacute (Fotografia 2) foi aterrado o que possibilitou a abertura de

ruas e caminhos passando desse modo a ligar o nuacutecleo da cidade agraves aacutereas adjacentes

tornando-se definitivamente inseridas ao espaccedilo urbano belenense (TRINDADE JUNIOR

1997)

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Segundo Ferreira (1995) foi a partir de 1860 que as diferenciaccedilotildees soacutecio-espaciais

intra-urbanas comeccedilam a se evidenciar cada vez mais pelo incremento dos elementos

formadores da heterogeneidade do espaccedilo produzido e da sua valorizaccedilatildeo em Beleacutem Ou seja

a cidade jaacute havia se expandido ocupando uma aacuterea que permitiu a diversificaccedilatildeo das

localidades dentro da mesma no que se refere agraves diferenccedilas de acesso e de instalaccedilatildeo de

infraestrutura urbana

A cidade possuiacutea quatro distritos principais Cidade Campina Trindade e Nazareacute

nas quais estavam circunscritas natildeo apenas as aacutereas compreendidas no marco urbano mas

tambeacutem as povoaccedilotildees rurais e ribeirinhas localizadas em seu entorno Outras localidades

172

como Benevides Castanhal Barcarena e Santa Izabel (hoje municiacutepios independentes) faziam

parte dos marcos administrativos de Beleacutem (CANCELA 2007)

As atividades terciaacuterias foram intensificadas no bairro da Campina e no contiacuteguo

bairro do Reduto e implantadas algumas das primeiras induacutestrias de Beleacutem De acordo com

Cancela (2007) frente a liquidez da economia a expansatildeo das aacutereas de ocupaccedilatildeo e os projetos

de urbanizaccedilatildeo os Distritos ganharam novos significados

A Cidade Velha primeiro bairro da capital com suas ruas estreitas passou a ser visto como um lugar insalubre e pantanoso natildeo recomendado para as pessoas de posse Seus moradores mais antigos comeccedilaram a se mudar para as ruas e avenidas mais largas da Estrada de Nazareacute Satildeo Jerocircnimo e as travessas adjacentes O mesmo ocorreu com a Campina conhecida como segundo bairro da Cidade Parte de sua aacuterea compreendia as principais

ruas do comeacutercio de Beleacutem Nela concentrava-se um bom nuacutemero de lojas armazeacutens bancos e casas de aviamento localizados nos arredores das avenidas Joatildeo Alfredo 15ordm de Novembro 13ordm de Maio e Boulevard Castilho Franccedila Tambeacutem em suas ruas encontraacutevamos casas particulares entrecruzadas com corticcedilos hoteacuteis casas de pasto estacircncias oficinas de trabalho com quartos para morada pequenas manufaturas coleacutegios cocheiras e vacarias (CANCELA 2007 p 57-58)

Com a migraccedilatildeo intensa de nordestinos e estrangeiros estimulada pela economia da

borracha a cidade cresceu e se expandiu novas ruas e estradas como eram algumas delas

chamadas surgiram ou foram ampliadas A exemplo disto Cancela (2007) cita as Estradas de

Satildeo Braacutes da Joseacute Bonifaacutecio e do Entroncamento assim como as travessas da Rua do Jurunas

que formavam o 4ordm Distrito a Rua Grande da Pedreira as travessas do Marco da Leacutegua e do

siacutetio da Sacramenta que vieram a compor os receacutem criados 5ordm e 6ordm Distritos

O periacuteodo que compreende a segunda metade do seacuteculo XIX ateacute as primeiras deacutecadas

do seacuteculo XX caracterizou-se pelo predomiacutenio da economia da borracha na Amazocircnia

produzindo-se grandes excedentes direcionados ao mercado mundial Novas elites com

concepccedilotildees de urbano seguindo os modelos europeus direcionaram o processo de

reurbanizaccedilatildeo da cidade de Beleacutem transformando os espaccedilos e os costumes da cidade de

acordo com o que se produzia entatildeo no espelho que representava a cidade de Paris

Houve um crescimento populacional no bairro da Campina avanccedilando para o

interior Aleacutem disso vale destacar o calccedilamento de grande parte de suas ruas e agraves funccedilotildees

econocircmicas e poliacutetico-administrativas que Beleacutem passou a exercer no periacuteodo aacuteureo da Belle

Eacutepoque com a exploraccedilatildeo da borracha

173

As mudanccedilas nos serviccedilos de infraestrutura oferecidos na capital paraense que nos ajudam a entender as alteraccedilotildees pelas quais a cidade vinha passando tornam-se siacutembolos de modernidade de progresso de que algo grande e civilizado estaacute acontecendo inserindo Beleacutem no cenaacuterio das urbes mais contemporacircneas Todavia a forma de uso e vivecircncia desses serviccedilos mostrava-se diferenciado para os diversos segmentos sociais e estavam distantes do dia-a-dia de muita gente O custo da energia eleacutetrica os bonds precaacuterios de terceira linha a incipiente rede de encanamento impondo a continuidade do abastecimento de aacutegua nos poccedilos puacuteblicos para boa parte da populaccedilatildeo foram situaccedilotildees ainda encontradas na capital da belle eacutepoque que deslindaram a dificuldade das mudanccedilas chegarem ao conjunto da populaccedilatildeo A mesma dificuldade podia ser vivida para quem procurava uma casa para morar Com o crescimento da cidade e a intensa migraccedilatildeo a demanda em torno de moradia acentuou-se A compra de imoacuteveis tornou-se um dos investimentos mais rentaacuteveis da elite local Muitos deles eram comprados para arrendamento Os alugueacuteis eram altos e as possibilidades de morada restritas ou distanciadas dos locais de trabalho e de transporte (CANCELA 2007 p 60)

Durante o ciclo da borracha Beleacutem expandiu-se com extrema rapidez seguindo os

limites colocados pela existecircncia de muitas terras cortadas por igarapeacutes eou permanentemente

alagadas Esse periacuteodo da histoacuteria da cidade precisa ser destacado porque foram muitas as

transformaccedilotildees ocorridas no espaccedilo urbano

Castro (2008) argumenta que com a ascensatildeo da economia gomiacutefera a produccedilatildeo e

troca de mercadorias estendeu-se por um territoacuterio maior abrindo novas aacutereas de

povoamento

A rede que organizava a produccedilatildeo e a circulaccedilatildeo preacute-existente foi a base da produccedilatildeo inicial da borracha pois em todas as bocas de igarapeacutes e de rios com recursos e possibilidade de exploraccedilatildeo localizava-se um posto ou comeacutercio que tinha a funccedilatildeo de canalizar a produccedilatildeo agroextrativista trazida das terras interiores e de drenaacute-las para os portos de cidades maiores base da extensa rede de aviamento [] A funccedilatildeo econocircmica de circulaccedilatildeo e gestatildeo da produccedilatildeo a partir da cidade eacute a chave para o entendimento da formaccedilatildeo da rede urbana na Amazocircnia (CASTRO 2008 p 17-18)

A regiatildeo amazocircnica tornou-se interessante para o mercado exterior pois a borracha

transformou-se de droga do sertatildeo em mateacuteria-prima estrateacutegica para as induacutestrias de

pneumaacuteticos dos EUA e Europa configurando-se na quase uacutenica fonte de riqueza desta parte

do Brasil o que provocou segundo Cancela (2007 p 23-24) o periacuteodo de maior expressatildeo

poliacutetica cultural e soacutecio-econocircmico da regiatildeo Amazocircnica gerando condiccedilotildees materiais e de

vida nunca antes experimentadas propiciando novos espaccedilos vitais para a naccedilatildeo aleacutem da

revitalizaccedilatildeo de seu organismo social e financeiro

174

Com o aparecimento da vulcanizaccedilatildeo em 1839 descoberta por Charles Goodyear e

principalmente a invenccedilatildeo dos pneumaacuteticos por Dunlop em 1888 como tambeacutem a invenccedilatildeo

do automoacutevel e a massificaccedilatildeo do uso da bicicleta onde a borracha constituiacutea-se na mateacuteria-

prima fundamental satildeo os fatores responsaacuteveis pela grande corrida

agraves fontes fornecedoras

dessa mateacuteria-prima notadamente para a Amazocircnia que possuiacutea grandes densidades de

seringueiras Esta regiatildeo entatildeo tornou-se a principal fornecedora mundial43

Desta forma Beleacutem que ateacute entatildeo vinha passando por um processo de ocupaccedilatildeo

lenta baseada em atividades bem definidas (coleta extrativa das drogas do sertatildeo e uma

agricultura paralela) comeccedila a sofrer transformaccedilotildees importantes Sua principal atividade

econocircmica passa a basear-se no extrativismo gomiacutefero e um grande esforccedilo em busca da nova

riqueza eacute estabelecido fazendo aparecer novas vilas e povoados e fortalecendo outras cidades

de forma mais expressiva como Manaus

Vale ressaltar que o desenvolvimento dessa atividade provocou um crescimento

populacional e migratoacuterio especialmente a imigraccedilatildeo nordestina para a regiatildeo sendo um

fator importante para o crescimento da economia da borracha uma vez que havia a disposiccedilatildeo

matildeo-de-obra necessaacuteria agrave extraccedilatildeo do laacutetex44 nas matas amazocircnicas por um custo baixo

Analisando a historiografia pode-se afirmar que a elite mercantil formada em sua

maioria por estrangeiros passou a conquistar cada vez mais espaccedilo minimizando a influecircncia

exercida pelas famiacutelias tradicionais locais que construiacuteram suas riquezas a partir do comeacutercio

de terras e da criaccedilatildeo de animais (gado)

Os novos grupos sociais redefiniram as relaccedilotildees de influecircncia e de poder em Beleacutem

a ampliaccedilatildeo do setor de serviccedilos redimensionando a oferta de trabalho a exemplo das

profissotildees liberais e dos trabalhos temporaacuterios

(CANCELA 2007 p 59) provocando uma

alteraccedilatildeo no poder aquisitivo dos antigos proprietaacuterios de terra e dos comerciantes que

trabalhavam com exportaccedilotildees Esses grupos em particular foram os mais beneficiados

porque aleacutem de fortalecerem seu domiacutenio sobre as atividades econocircmicas mais lucrativas

ampliaram seu poder de pressatildeo e de influecircncia sobre a atuaccedilatildeo dos governos

estadual e

municipal

em funccedilatildeo de um volume maior de recursos arrecadados com o incremento das

exportaccedilotildees (SANTOS 1980)

43 Essa fase tem como pano de fundo a chamada segunda Revoluccedilatildeo Industrial caracterizada pelo excepcional progresso tecnoloacutegico da induacutestria quiacutemica da siderurgia e da eletricidade aleacutem da consolidaccedilatildeo do capital financeiro que proporcionou o surgimento das grandes corporaccedilotildees industriais 44 O laacutetex eacute um produto da seringueira tambeacutem denominada hevea brasiliensis que se destaca particularmente por sua elasticidade e impermeabilidade

175

Outro fator importante a ser destacado eacute a implantaccedilatildeo de infraestruturas que

facilitariam de maneira significativa o transporte dos produtos das cidades de Beleacutem e

Manaus para o exterior Estas cidades eram portuaacuterias e se constituiacuteram em porta de entrada

para a Amazocircnia pois possuiacuteam posiccedilatildeo privilegiada no escoamento da produccedilatildeo do Meacutedio

Amazonas e seus afluentes tornando-as com isso mais competitiva Os seringais eram os

lugares de produccedilatildeo e a cidade o lugar de comeacutercio A borracha representa o momento mais

importante da formaccedilatildeo da rede urbana ainda que incipiente com o povoamento e a

formaccedilatildeo de cidades em funccedilatildeo dos fluxos econocircmicos (CASTRO 2008 p 18)

Beleacutem constituiacutea-se num porto privilegiado por sua posiccedilatildeo geograacutefica servindo de entreposto aos navios que chegavam ou saiacuteam da regiatildeo amazocircnica transportando mercadorias e pessoas Durante muito tempo a borracha produzida no Amazonas e no Acre saiacutea do Brasil pelas aacuteguas belenense Mesmo apoacutes a diminuiccedilatildeo da produccedilatildeo da borracha em terras paraenses a capital continuou com um volume alto de negoacutecios em seu porto particularmente em funccedilatildeo das partidas de borracha advindas do Acre (CANCELA 2007 p 62)

Com a abertura dos portos a navios estrangeiros a atratividade de Beleacutem cresceu

muitas empresas fecharam suas portas em Manaus e se mudaram para a cidade portuaacuteria do

Paraacute intensificando o processo de urbanizaccedilatildeo da cidade

Castro (2008) ressalta que o modelo de povoamento baseia-se nos ciclos econocircmicos

e na loacutegica do trabalho escravo nas fazendas no interior e nas cidades nas quais se realizam

o escoamento da produccedilatildeo caracterizando o padratildeo campo-cidade

A respeito disso Lefebvre (1991 p 31-32) argumenta que a separaccedilatildeo entre a cidade

e o campo toma lugar entre as primeiras e fundamentais divisotildees do trabalho (a bioloacutegica e a

teacutecnica) Ela corresponde agrave separaccedilatildeo entre o trabalho material e o trabalho intelectual pois agrave

cidade cabem funccedilotildees de organizaccedilatildeo direccedilatildeo atividades poliacuteticas militares e elaboraccedilatildeo do

conhecimento

Nesse sentido Castro (2008) argumenta que as cidades tinham a funccedilatildeo de organizar

o mercado fluxos de comeacutercio exportaccedilatildeo entre outros e destaca que ateacute 1940 a grande

maioria da populaccedilatildeo brasileira estava no campo sendo que somente em 1960 haacute uma

transformaccedilatildeo do movimento demograacutefico com fluxos migratoacuterios do campo para as cidades

decorrente do processo de industrializaccedilatildeo a qual se constitui um novo processo de

acumulaccedilatildeo do capital conforme demonstrado na tabela 5

176

Tabela 5 - Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte 1940-2000 Ano Brasil Regiatildeo Norte

Populaccedilatildeo Urbano Populaccedilatildeo Urbano 1940 41236315 3120 1462420 2770 1950 51944397 3620 1844655 3150 1960 70070457 4470 2561782 3750 1970 93139037 5590 3603860 4510 1980 119002706 6760 5880268 5170 1991 150367800 7500 9337150 5780 2000 169799170 8100 12900704 6987 Fonte IBGE Censos demograacuteficos de 1940 a 2000 (apud CASTRO 2008)

Dessa forma as poliacuteticas desenvolvimentistas impostas pelo governo federal nesse

periacuteodo fruto do processo de expansatildeo da fronteira capitalista no paiacutes para a regiatildeo

amazocircnica resultaram num processo de desarticulaccedilatildeo da atividade extrativa causando

enormes danos soacutecio-econocircmicos e ambientais agraves populaccedilotildees tradicionais

O aumento das aacutereas desflorestadas da Amazocircnia e os resultados desse processo tais

como a erosatildeo do solo e a poluiccedilatildeo das aacuteguas tecircm evidenciado a necessidade de reflexatildeo

sobre as formas tradicionais de uso da terra paralelo agrave formulaccedilatildeo de perspectivas que

combinem tanto a preservaccedilatildeo dos recursos naturais quanto agrave elevaccedilatildeo e regularidade do

niacutevel de renda dos extrativistas

Para Trindade Junior (1997) coube principalmente ao Estado controlado pela elite

regional a tarefa de direcionar a atividade econocircmica de replanejar a cidade bem como de

criar mecanismos de controle da vida social de seus habitantes de forma a adequar a

organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves exigecircncias trazidas pelo novo momento econocircmico

Esse novo momento aleacutem de gerar um crescimento populacional significativo45

acarretou em uma seacuterie de medidas voltadas para a (re)estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano jaacute que a

cidade passou a ter maiores dimensotildees e relevacircncia enquanto locus de acumulaccedilatildeo e

conservaccedilatildeo da riqueza gerada pela produccedilatildeo gomiacutefera

Dessa maneira a riqueza acumulada associada agrave aquisiccedilatildeo de terras deixou sua

marca na construccedilatildeo de um conjunto arquitetocircnico

teatro palaacutecios palacetes dentre outras

edificaccedilotildees

que realccedilou as influecircncias de estilos e traccedilos proacuteprios da arquitetura francesa

Tambeacutem haacutebitos culturais passaram a tomar como referecircncia valores e comportamentos

45 Na condiccedilatildeo de um dos maiores centros dinacircmicos de exportaccedilatildeo do laacutetez Beleacutem que em 1850 exibia cerca de 20000 habitantes chega em 1900 com cerca de 100000 habitantes Em 1920 eram 236402 os que habitavam esse municiacutepio Em grande medida esse incremento populacional na ordem de 1082 deveu-se ao deslocamento em massa de nordestinos para a regiatildeo norte (RODRIGUES 2000)

177

tiacutepicos dos franceses mais abastados Por sua beleza arquitetocircnica e por seu modo de vida

Beleacutem ficou conhecida como Paris n Ameacuterica 46

Pode-se afirmar que a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano da cidade marcou

historicamente o processo segregatoacuterio que atualmente ainda evidencia-se em Beleacutem Logo

o desenvolvimento urbano foi uma condiccedilatildeo necessaacuteria e estabelecida no periacuteodo de

desenvolvimento industrial no seacuteculo XX na maioria das capitais brasileiras e em Beleacutem natildeo

foi diferente

Ao longo desses anos a cidade principalmente um nuacutecleo mais central onde

residiam as famiacutelias mais tradicionais e poderosas passou a contar com uma seacuterie de

melhoramentos tais como ampliaccedilatildeo da rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica de abastecimento de

aacutegua e esgotos de telefonia e de transportes coletivos

os bondes

A grande expectativa era de que a partir desse momento a cidade pela criaccedilatildeo de

uma melhor infraestrutura urbana atraiacutesse novos comerciantes e investidores interessados em

dinamizar as atividades produtivas tradicionais e gerar novas Contudo a mesma cidade que

ostentava o luxo e o ouro proveniente dos negoacutecios bem sucedidos envolvendo a borracha

por exemplo tambeacutem era marcada pela evidecircncia de um fenocircmeno ainda bastante atual

a

periferizaccedilatildeo das camadas pobres e sua consequumlente deterioraccedilatildeo das condiccedilotildees gerais de

vida

Nesse periacuteodo ocorreram vaacuterios conflitos tipicamente urbanos como protesto contra

o aumento dos impostos o aumento de preccedilos dos produtos consumidos pelas classes

populares melhorias salariais melhores condiccedilotildees de vida e de moradia e outros As elites

dominantes respondiam a essas manifestaccedilotildees via controle social por meio de poliacuteticas e leis

restritivas a trabalhadores imigrantes criando programas sociais integrativos etc

A estrateacutegia de segregaccedilatildeo e de valorizaccedilatildeo espaciais passou a ser tatildeo eficiente que

as pessoas que natildeo possuiacuteam recursos para reformar suas casas e adaptaacute-las aos modelos

concebidos eram direta ou indiretamente levadas a se mudar para aacutereas afastadas do centro

urbano que eram locais muitas vezes sem saneamento baacutesico como por exemplo as aacutereas de

vaacuterzeas poreacutem estas ainda apresentavam nessa eacutepoca ocupaccedilatildeo inexpressiva

Os setores urbanos habitados pelas camadas populares ou de menor poder aquisitivo

e portanto que mais precisavam de melhorias e saneamento ficaram desprovidas de novos

investimentos em infraestrutura urbana uma vez que a maior parte dos recursos financeiros

46 Tambeacutem podem ser destacadas as expressivas construccedilotildees de luxo e modernizaccedilatildeo da cidade tais como a do Palaacutecio Lauro Sodreacute do Coleacutegio Gentil Bittencourt Teatro da Paz (1878) Palaacutecio Antocircnio Lemos e o do Mercado do Ver-o-Peso (1901)

178

estaduais e municipais era destinada ao atendimento dos segmentos sociais ligados ao luxo e

aos gastos que o comeacutercio da borracha propiciava (FERREIRA 1995)

Beleacutem avanccedilou o seacuteculo XX como outras cidades brasileiras com problemas de

administraccedilatildeo e de infraestrutura de poliacuteticas puacuteblicas e de investimentos A formaccedilatildeo de

novos nuacutecleos urbanos e o inchamento dos jaacute existentes seguiu uma loacutegica que atraiu

repentinamente trabalhadores oriundos das mais diversas localidades expulsando-os para a

periferia das cidades tornando seu assentamento e suas condiccedilotildees gerais de vida cada dia

mais difiacuteceis

Com as ocupaccedilotildees irregulares a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o descaso de

sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programasprojetos de poliacuteticas

urbanas completou-se o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo ambiental

passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Na deacutecada de 1940 ocorreu a apropriaccedilatildeo de grandes extensotildees de terras situadas

nas imediaccedilotildees do limite da Primeira Leacutegua Patrimonial47 de Beleacutem por parte de instituiccedilotildees

puacuteblicas tais como Correios Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute (COSANPA)

Universidade Federal do Paraacute (UFPA) e Aeroporto e militares (Marinha Exeacutercito e

Aeronaacuteutica) que passaram a se constituir em um obstaacuteculo agrave expansatildeo da malha urbana

Essa extensa aacuterea apropriada pelas instituiccedilotildees ficou conhecida como cinturatildeo institucional

(FERREIRA 1995)

Com esse impedimento de crescimento seguindo o espigatildeo principal a Av Tito

Franco (hoje denominada de Av Almirante Barroso) (Fotografia 3) as camadas populares

passaram a ocupar as aacutereas de cotas baixas da cidade que satildeo conhecidas como aacutereas de

baixadas nas quais a implantaccedilatildeo de equipamentos coletivos eacute dificultada e quando existe eacute

extremamente precaacuteria

47 Aacuterea de terra de aproximadamente uma leacutegua (contada a partir do marco de fundaccedilatildeo da cidade) doada em 1627 pelo Governo e Capitatildeo Geral do Estado do Maranhatildeo e Gratildeo Paraacute ao Conselho Municipal de Beleacutem ficando a partir desse momento sob o Jus Domini do Governo desse Municiacutepio O limite da Primeira Leacutegua localiza-se no atual bairro do Marco assim chamado por ter sido nele onde foi fixado um marco desse limite (Av Almirante Barroso com a Av Dr Freitas) (CRUZ apud TRINDADE JUNIOR 1997)

179

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de Agronomia

Beleacutem-PA

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Conforme citado anteriormente as baixadas48 satildeo aacutereas alagadas ou alagaacuteveis que

segundo estudo publicado em 1976 correspondiam a 40 da aacuterea urbana do municiacutepio de

Beleacutem (SUDAM apud TRINDADE JUNIOR 1997) abrangendo mais de 45 da populaccedilatildeo

distribuiacuteda nos diversos bairros da cidade Essas aacutereas ficaram conhecidas principalmente a

partir da deacutecada de 1960 por serem espaccedilos de moradia das camadas sociais de baixo poder

aquisitivo (TRINDADE JUNIOR 1997)

De acordo com Pinheiro et al (2007) agrave medida que os igarapeacutes foram aterrados

surgiram outros bairros compondo a 1ordf Leacutegua Patrimonial A rigor as baixadas se

constituiacuteram tambeacutem em aacutereas onde ocorreram os maiores conflitos fundiaacuterios entre os anos

de 1960 e 1970 aleacutem das principais intervenccedilotildees puacuteblicas da poliacutetica habitacional marcada

pelas estrateacutegias de remoccedilatildeo e reassentamento Pode-se dizer que essas estrateacutegias tecircm sido o

principal objetivo das poliacuteticas habitacionais ateacute os dias atuais

Cabe destacar a existecircncia de trecircs grandes vetores de periferizaccedilatildeometropolizaccedilatildeo da

pobreza relacionados agrave questatildeo da moradia no periacuteodo de 1960 a 1990 que segundo Pinheiro

et al (2007 p 159) constata-se uma reproduccedilatildeo simultacircnea de subespaccedilos fiacutesicos e sociais

48 Trindade Junior (1997) tomando como referecircncia a concepccedilatildeo de espaccedilo de Santos considera as baixadas

enquanto espaccedilos segregados socialmente excluiacutedos com deficiecircncia e insuficiecircncia de equipamentos urbanos e comunitaacuterios

como espaccedilo sem cidadatildeos independentemente das condiccedilotildees do siacutetio urbano Nesse sentido para as pessoas que habitam esses espaccedilos eacute negado o direito agrave cidadania e os meios de consumo coletivo satildeo ausentes ou insuficientes

180

marcados pela segregaccedilatildeo e pobreza urbana entre os quais trecircs se destacam as baixadas

invasotildees de terras e conjuntos habitacionais 49

Esses trecircs grandes vetores relacionados agrave questatildeo da moradia das lutas e

mobilizaccedilotildees pelo direito de morar na RMB satildeo

1) As ocupaccedilotildees coletivas na aacuterea central da RMB basicamente nas chamadas aacutereas de baixadas restritas ao municiacutepio de Beleacutem nas deacutecadas de 1960 e 1970 e em menor volume nas deacutecadas de 1980 e 1990

2) As ocupaccedilotildees na chamada aacuterea de transiccedilatildeo apoacutes o centro expandido do municiacutepio de Beleacutem formaccedilatildeo de bairros com famiacutelias removidas das aacutereas urbanizadas no centro de Beleacutem

3) A aacuterea de expansatildeo urbana no sentido nordeste da RMB envolvendo primeiramente os municiacutepios de Ananindeua e ilhas e posteriormente os demais municiacutepios que compotildeem a RMB Em Ananindeua e distritos de Beleacutem (Icoaraci e Outeiro) destacam-se as invasotildees a conjuntos habitacionais (PINHEIRO et al 2007 p 159)

Com relaccedilatildeo aos movimentos populares surgiram nesse periacuteodo vaacuterios movimentos

que organizaram mobilizaccedilotildees manifestaccedilotildees mais radicais atos puacuteblicos manifestos de

todos os tipos reivindicando equipamentos coletivos urbanizaccedilatildeo de aacutereas segregadas e

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Segundo a Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (1984) as vitoacuterias alcanccediladas pelos

Comitecircs foram isenccedilatildeo das deacutecimas (imposto predial) instalaccedilatildeo de postos de abastecimento

de gecircneros alimentiacutecios de 1ordf necessidade instalaccedilatildeo de cooperativas nos bairros limpeza de

ruas abastecimento de aacutegua e fornecimento de energia eleacutetrica e isenccedilatildeo de taxas escolares

Entretanto em 1947 haacute um endurecimento do regime que governava o Paiacutes com uma

perseguiccedilatildeo a toda iniciativa de luta e resistecircncia das camadas populares com isso os

Comitecircs Democraacuteticos Populares (CDP) foram desativados

O modelo autoritaacuterio-centralizador de poliacuteticas puacuteblicas regionais que se

desenvolveram na Amazocircnia (Quadro 6) a partir da deacutecada de 1950 com o objetivo de

integrar a regiatildeo ao Centro-Sul resultou em significativas alteraccedilotildees nos padrotildees soacutecio-

espaciais de ocupaccedilatildeo urbana em Beleacutem

49 Historicamente podem-se indicar dois grandes eixos de ocupaccedilatildeo urbana a BR-316 em direccedilatildeo aos municiacutepios de Ananindeua Marituba Benevides e Santa Baacuterbara e a rodovia Augusto Montenegro em direccedilatildeo aos distritos de Icoaraci Outeiro Val-de-Cans Tenoneacute e Ilhas (PINHEIRO et al 2007)

181

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a 1988)

Ano Programas Projetos e Oacutergatildeos Executores Objetivos

1953

SPVEA

Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo

Econocircmica da AmazocircniaPresidecircncia da Repuacuteblica

Elaborar planejamentos quumlinquumlenais para valorizaccedilatildeo econocircmica da Amazocircnia

1958

Rodovia Beleacutem-Brasiacutelia (BR-010)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a Amazocircnia Oriental ao resto do paiacutes

1960

Rodovia Cuiabaacute-Porto Velho (BR-364)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a porccedilatildeo meridional da Amazocircnia

1966 SUDAM

Superintendecircncia do Desenvolvimento da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior

Coordenar e supervisionar programas e planos regionais decidir sobre a redistribuiccedilatildeo de incentivos fiscais

1967 SUFRAMA

Superintendecircncia da Zona Franca de ManausMinisteacuterio do Interior

Integrar a porccedilatildeo ocidental da Amazocircnia mediante criaccedilatildeo de um centro industrial e agropecuaacuterio e isenccedilatildeo de impostos

1968 Comitecirc Organizador dos Estados Energeacuteticos da AmazocircniaMinisteacuterio das Minas e Energia

Supervisionar estudos referentes ao aproveitamento do potencial energeacutetico

Incentivos FiscaisSUDAM Promover investimentos na regiatildeo por meio de deduccedilotildees tributaacuterias significativas

1970

PIN

Programa de Integraccedilatildeo Nacional Estender a rede rodoviaacuteria e implantar projetos de colonizaccedilatildeo oficial nas aacutereas de atuaccedilatildeo da SUDENE e SUDAM

Proterra

Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e Nordeste

Promover a capitalizaccedilatildeo rural

Incra

Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma AgraacuteriaMinisteacuterio do Interior

Executar a estrateacutegia de distribuiccedilatildeo controlada de terra

1974

Polamazocircnia

Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior Agricultura e Transporte

Concentrar recursos em aacutereas selecionadas visando o estiacutemulo de fluxos migratoacuterios elevaccedilatildeo do rebanho e melhoria da infraestrutura urbana

1980

Getat

Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins Gebam

Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas SGCSPR

Regularizaccedilatildeo fundiaacuteria discriminaccedilatildeo de terras e distribuiccedilatildeo de tiacutetulos

PGC

Programa Grande Carajaacutes SeplanPR

Explorar de forma integrada em grande escala recursos minerais e agroflorestais da regiatildeo

1981 PolonoroesteMinisteacuterio da Agricultura Transportes e Interior

Pavimentar a BR-364 promover a colonizaccedilatildeo

1985 PCN Projeto Calha Norte SGCSNPR

Oficialmente assegurar a soberania nacional fiscalizar a circulaccedilatildeo e assistir iacutendios

1987 Projeto 2010Ministeacuterio das Minas e Energia Eletronorte

Implantar rede hidreleacutetrica para estimular o desenvolvimento industrial da regiatildeo

1988 Programa Nossa NaturezaMinisteacuterio do Interior SA-DENPR

Oficialmente rever legislaccedilatildeo ambiental para a regiatildeo e zoneamento agroecoloacutegico na Amazocircnia

Fonte Becker (1994)

Com a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia facilitou-se a inserccedilatildeo de grande

contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras abundantes e de faacutecil acesso tendo

em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave implantaccedilatildeo dos grandes projetos

182

Desse modo a Amazocircnia consolidava seu papel como fronteira de expansatildeo da

acumulaccedilatildeo por meio da implantaccedilatildeo de projetos destinados agrave exploraccedilatildeo de recursos

minerais agrave extraccedilatildeo de recursos naturais (como os projetos de empresas madeireiras) agraves

produccedilotildees agropecuaacuterias e agro-industriais agraves linhas de montagem industrial etc (SOUZA

1992 p 21-22)

Para Becker (1994) a fronteira natildeo eacute um fenocircmeno isolado Ela eacute definida em

relaccedilatildeo a um espaccedilo estruturado e sua potencialidade alternativa eacute circunscrita a limites

impostos pela formaccedilatildeo social em que se situa A expansatildeo da fronteira amazocircnica soacute pode

portanto ser compreendida a partir da inserccedilatildeo do Brasil no sistema capitalista global do poacutes-

Segunda Guerra Mundial em que o capitalismo atua no espaccedilo planetaacuterio mas os Estados

Nacionais conservam sua funccedilatildeo de controle e hierarquizaccedilatildeo constituindo-se agentes

primordiais na produccedilatildeo do novo espaccedilo

Assim o crescimento da cidade de Beleacutem e das demais capitais amazocircnicas

expressa por um lado a criaccedilatildeo de novas atividades urbanas pelo Estado e pelas empresas

privadas e por outro a profunda decadecircncia e transformaccedilatildeo das atividades agropecuaacuterias e

extrativistas que passam a desencadear correntes migratoacuterias no sentido rural-urbano

definindo formas marcantes de apropriaccedilatildeo do espaccedilo da cidade e de constituiccedilatildeo de sua

paisagem como por exemplo a produccedilatildeo de favelas (CORREcircA 1989)

Segundo Trindade Junior (1997) a produccedilatildeo do espaccedilo belenense eacute influenciada por

programas de renovaccedilatildeo urbana e pelo papel das camadas populares Nesse sentido os

principais agentes do processo de produccedilatildeo do urbano passam a ser aleacutem das camadas

populares o Estado e o capital imobiliaacuterio que exerceram uma accedilatildeo mais expressiva na

organizaccedilatildeo espacial

De acordo com a CODEM (1987) o crescimento demograacutefico que ocorreu em

Beleacutem desde a deacutecada de 1950 deu origem a quatro tipos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo a

verticalizaccedilatildeo a ocupaccedilatildeo dos centros de quadras por meio da propagaccedilatildeo de vilas e

passagens50 aumentando a densidade populacional das terras firmes ou terraccedilos e substituindo

a vegetaccedilatildeo pelas construccedilotildees urbanas a ocupaccedilatildeo das aacutereas aleacutem do cinturatildeo institucional

por meio de conjuntos habitacionais de induacutestrias e de habitaccedilotildees perifeacutericas de baixo padratildeo

construtivo e a ocupaccedilatildeo das planiacutecies de inundaccedilatildeo da cidade

50 Vilas conjunto de pequenas habitaccedilotildees independentes em geral idecircnticas ou de mesmo padratildeo habitacional e disposta de modo a formar rua ou praccedila no interior de quadras Passagens denominaccedilatildeo aplicada agraves vias com largura compreendida entre 4 e 8 metros (CODEM 1987)

183

Com a ultrapassagem do cinturatildeo institucional a malha urbana se expandiu para a

Segunda Leacutegua Patrimonial51 seguindo o eixo das rodovias BR-316 e Augusto Montenegro

ocupando aacutereas vizinhas (Ananindeua Marituba e Benevides)

Entretanto mesmo com a ultrapassagem do cinturatildeo os investimentos urbanos e os

empregos ficaram restritos agraves aacutereas centrais principalmente nos bairros de Nazareacute e

Comeacutercio na Primeira Leacutegua Patrimonial Assim o capital imobiliaacuterio ganhou importacircncia e

avanccedilou os processos de verticalizaccedilatildeo nessas aacutereas Esse processo exigiu a ampliaccedilatildeo e a

renovaccedilatildeo de serviccedilos urbanos e de infraestrutura aumentando ainda mais a valorizaccedilatildeo

desses espaccedilos em detrimento do restante da cidade onde se ampliaram as necessidades de

infraestrutura urbana principalmente nas baixadas

As baixadas satildeo caracterizadas segundo Trindade Junior (1997 p 28) de acordo

com as condiccedilotildees socioeconocircmicas de seus habitantes e satildeo configuradas pela precariedade de

moradia e dos equipamentos coletivos

A populaccedilatildeo dessas aacutereas caracteriza-se pela falta de qualificaccedilatildeo profissional e baixo niacutevel socioeconocircmico enfrentando consequumlentemente seacuterios problemas de empregos e subempregos acrescendo-se a isso grande nuacutemero de elementos que compotildeem os grupos familiares residindo em reduzidos cocircmodos habitaacuteveis sem condiccedilotildees de higiene e conforto refletindo-se essa situaccedilatildeo na sauacutede da comunidade

Trindade Junior ressalta que outras caracteriacutesticas podem ser somada as condiccedilotildees

socioeconocircmicas tais como

1) Aacutereas de habitaccedilatildeo subnormal desordenadamente distribuiacutedas e que obstruem natildeo o raro o escoamento hiacutedrico em face do deficiente sistema de macro drenagem existente

2) Com um sistema viaacuterio deficiente o que impossibilita o desenvolvimento do traacutefego normal da cidade e prejudica os serviccedilos de transporte coletivo destinado ao atendimento dessas populaccedilotildees

3) A circulaccedilatildeo interna de pedestres nas aacutereas de baixadas se faz de forma precaacuteria em geral atraveacutes de estivas de madeira quase sempre em peacutessimo estado de conservaccedilatildeo

4) O transporte coletivo que atende as baixadas se limita a circular dada a falta de condiccedilotildees para traacutefego interno em sua periferia obrigando os moradores de tais aacutereas a realizar por vezes grandes deslocamentos diaacuterios a peacute ateacute os pontos de ocircnibus

5) A impossibilidade de implantaccedilatildeo de sistemas de aacutegua potaacutevel de esgotos sanitaacuterios e de coleta de lixo

51 Corresponde a outra leacutegua acrescentada agrave Primeira Leacutegua Patrimonial no final do seacuteculo XIX doadas pelo Governo do Estado mas que diferentemente da outra doaccedilatildeo natildeo chegou a ser delimitada (TRINDADE JUNIOR 1998 p 104)

184

6) A impossibilidade de distribuiccedilatildeo de energia eleacutetrica atraveacutes de redes de alta tensatildeo e por fim

7) A carecircncia de equipamentos urbanos de educaccedilatildeo e sauacutede obriga o deslocamento da populaccedilatildeo que deles necessita para aacutereas de cotas mais altas (ABELEacuteM apud TRINDADE JUNIOR 1997 p 28)

O referido autor argumenta tambeacutem que as baixadas satildeo consideradas espaccedilos sem

cidadatildeos pois o valor do homem estaacute relacionado ao local onde habita ao qual eacute negado o

direito agrave cidadania Seu valor como produtor consumidor cidadatildeo depende da sua

localizaccedilatildeo no territoacuterio Seu valor vai mudando [] para melhor ou para pior em funccedilatildeo das

diferenccedilas de acessibilidade (TRINDADE JUNIOR 1997 p 29)

As baixadas foram ocupadas por famiacutelias de baixo poder aquisitivo oriundas do

interior do Estado e de outros Estados em especial do Nordeste que seja pela expulsatildeo

acarretada pelas secas ou pelo processo de expansatildeo capitalista na Amazocircnia e seus discursos

ideoloacutegicos de oportunidade de emprego e melhores condiccedilotildees de vida deslocaram-se para a

cidade em busca de satisfazer agraves suas necessidades emprego e de moradia ocupando as aacutereas

alagadas bastante segregadas com grande densidade demograacutefica e com base na

autoconstruccedilatildeo de moradias (tipo palafitas) em terrenos puacuteblicos eou improacuteprias para

ocupaccedilatildeo edificada

Sendo assim essas famiacutelias migrantes ou natildeo para sobreviver na cidade buscaram

soluccedilotildees de moradia principalmente sobre o alagado ou em trechos distantes passando o

cinturatildeo institucional ampliando a periferia da cidade Assim construiacuteram casas de madeira

sobre estacas (Fotografia 4) cujo acesso era possiacutevel por meio de estivas (pontes de madeira)

ou aterravam as aacutereas com material fornecido pela Prefeitura ou conseguindo por ela proacutepria

tais como caroccedilo de accedilaiacute bagaccedilo de cana serragem de madeira e casca de castanha-do-paraacute

185

Fotografia 4 - Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA)

Fonte SEHAB (2010)

Tambeacutem procuravam resolver sua necessidade por serviccedilos de forma alternativa por

meio de ligaccedilotildees clandestinas de energia e aacutegua e na grande maioria das vezes de utilizaccedilatildeo

dos igarapeacutes como esgoto e depoacutesito de lixo Estes fatores criaram uma situaccedilatildeo em que as

condiccedilotildees de habitabilidade estavam muito baixas dos paracircmetros miacutenimos satisfatoacuterios

gerando um quadro de pobreza doenccedilas e baixa perspectiva de vida agravados pela ausecircncia

de efetivas accedilotildees governamentais voltadas ao enfrentamento da segregaccedilatildeo social

O migrante ao chegar a cidade vecirc dissipada sua ilusatildeo de liberdade de opccedilatildeo pelo emprego que mais lhe convecircm ou agrada Na verdade natildeo eacute apenas o direito e opccedilatildeo que natildeo tem muitas vezes natildeo encontra nenhuma chance de obter um emprego no mercado formal de trabalho Recorre entatildeo ao mercado informal de qualquer forma a cidade lhe oferece maiores vantagens do que o campo em termo de oportunidade de educaccedilatildeo assistecircncia meacutedica e tambeacutem de trabalho desempenhando diversas atividades nas quais geralmente tem a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia (ABELEacuteM 1989 p 21)

Destarte a partir do crescimento acelerado da cidade em direccedilatildeo agraves alagadas

agravam-se os problemas sociais a escassez de terras na aacuterea central o seu alto custo e a

consequumlente especulaccedilatildeo imobiliaacuteria a proliferaccedilatildeo de doenccedilas e as pressotildees exercidas pela

populaccedilatildeo principalmente na eacutepoca de chuvas foram fatores que conduziram o poder puacuteblico

a intervir de forma sistemaacutetica inicialmente por meio da instalaccedilatildeo do Departamento

Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) com o objetivo de intervir nas baixadas por meio

de um programa de construccedilotildees de canais iniciado em 1962 na bacia da Tamandareacute

estendendo-se ateacute 1967 Nessa mesma deacutecada tiveram iniacutecio as obras de saneamento do

186

Canal das Almas (atual Av Visconde de Souza Franco) como parte do programa de combate

agraves doenccedilas endecircmicas (TRINDADE JUNIOR 1997)

Na deacutecada de 1970 percebeu-se o crescimento e a expansatildeo urbana do municiacutepio por

meio de unidades imobiliaacuterias cadastradas em sua aacuterea urbana segundo levantamento do

Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio (CTM)52 naquele ano estavam cadastrados 120000

unidades habitacionais e em 2000 existiam 362064 cadastros (CODEMCTM) o que reflete

na taxa de urbanizaccedilatildeo a qual atinge cerca de 9953 segundo dados de Censo2000

Historicamente o fluxo migratoacuterio da referida deacutecada trouxe consequumlecircncias

negativas no que concerne a questatildeo da moradia no municiacutepio de Beleacutem uma vez que as

aacutereas alagadas conhecidas como baixadas foram ocupadas proporcionando uma condiccedilatildeo de

moradia subumana

O principal motivo de ocupaccedilatildeo desses espaccedilos foi a necessidade de moradia e o

faacutecil acesso a cidade aleacutem da ausecircncia de taxas e tributos jaacute que nessas aacutereas os serviccedilos e

equipamentos urbanos satildeo quase que inexistentes acarretando no agravamento da segregaccedilatildeo

e fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Entretanto faz-se necessaacuterio enfatizar que a urbanizaccedilatildeo amazocircnica natildeo eacute fruto

somente da migraccedilatildeo para a regiatildeo eou aumento do nuacutemero de cidades mas estaacute vinculada a

outros dois fatores 1) refere-se ao modo de integraccedilatildeo econocircmica do espaccedilo e 2) trata-se da

ordem ideoloacutegica e cultural responsaacutevel pela introduccedilatildeo na regiatildeo de normas e costumes

Constata-se assim que houve uma ampla intervenccedilatildeo econocircmica na regiatildeo gerando

transformaccedilotildees nos contextos sociais poliacuteticos econocircmicos e culturais produzindo uma nova

(re)configuraccedilatildeo do espaccedilo amazocircnico Esse processo de ocupaccedilatildeo causou a modificaccedilatildeo do

padratildeo de circulaccedilatildeo existente vinculada agrave rede dendriacutetica (BECKER 1994)

A abertura da malha rodoviaacuteria e fluvial implicou na multiplicaccedilatildeo de povoados e

vilarejos na regiatildeo amazocircnica Nesse sentido Beleacutem e Manaus assumiram a posiccedilatildeo de

metroacutepoles regionais A poliacutetica de incentivos fiscais atraiu empresas transnacionais para a

regiatildeo intensificando o fluxo migratoacuterio que formaram nuacutecleos de povoamento proacuteximo aos

grandes investimentos e as margens das estradas Todavia as induacutestrias que se instalaram na

regiatildeo natildeo absorveram o grande contingente populacional acarretando no aumento do

desemprego e consequumlentemente da pobreza na regiatildeo

52 TCM eacute um sistema de dados municipais de natureza alfanumeacuterica e graacutefica (mapas e imagens) organizados de maneira a possibilitar a visualizaccedilatildeo de informaccedilotildees por meio de mapas temaacuteticos tabelas e relatoacuterios que reuacutene dados baacutesicos essenciais ao planejamento e acompanhamento da gestatildeo municipal

187

Nesse sentido iniciou-se em Beleacutem uma seacuterie de pressotildees para desapropriaccedilatildeo seja

para fins de programas de governo de renovaccedilatildeo urbana seja para atender a pressotildees da

populaccedilatildeo que reclamava pelo direito de morar seja para atender a interesses de proprietaacuterios

(ABELEacuteM 1988)

Segundo Abeleacutem (1988) inicialmente a luta pela posse de terra urbana em Beleacutem se

deu de forma isolada e a populaccedilatildeo envolvida reagia em cada caso sem plena consciecircncia de

que seus problemas eram comuns agrave moradores de outros bairros como era o caso da aacuterea dos

Correios no bairro da Marambaia cuja luta pela desapropriaccedilatildeo iniciou-se em 1970 e o de

expulsatildeo dos moradores das terras da Aeronaacuteutica no bairro da Sacramenta em 1972 A

partir daiacute os conflitos se alastraram por vaacuterios bairros de Beleacutem

Os anos 1970 foram marcados em escala nacional por uma forte crise poliacutetica que se abateu sobre o regime militar em vigecircncia o que proporcionou a abertura de mais espaccedilos para a sociedade civil se organizar trazendo para o cenaacuterio poliacutetico atores que passam a redefinir-se a reconhecer-se mutuamente a decidir e a agir em conjunto apresentando-se como novo sujeito social no interior dos movimentos sociais (CRUZ 1994 p 65)

Foi nesse cenaacuterio de conflitos sociais oriundos da segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de luta

pela moradia que surgiram as organizaccedilotildees comunitaacuterias e movimentos em defesa da reforma

urbana nos quais foram gerados processos de reivindicaccedilotildees coletivas em torno do direito de

morar

Essas reivindicaccedilotildees em Beleacutem ganharam expressividade a partir da deacutecada de

197053 devido agraves vaacuterias formas de organizaccedilatildeo popular que passaram a surgir reivindicando

demandas especiacuteficas como saneamento baacutesico creches escolas transportes postos de

sauacutede habitaccedilatildeo dentre outras

Dessa forma a luta pela posse de terra e pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura

sauacutede e educaccedilatildeo implementou formas de constituiccedilatildeo e empoderamento pela base na praacutexis

cotidiana dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos agentes sociais coletivos e de identidades

Conforme Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

53 A participaccedilatildeo popular sempre esteve presente desde a colocircnia portuguesa ateacute hoje na Amazocircnia com as manifestaccedilotildees e demandas de accedilotildees ou poliacuteticas governamentais por parte dos grupos sociais excluiacutedos por exemplo em Beleacutem Nessa perspectiva todas as mobilizaccedilotildees e movimentos sociais satildeo formas de participaccedilatildeo popular que se diferenciam segundo as questotildees reivindicatoacuterias definidas pela conjuntura poliacutetica social e econocircmica que se encontram os atores sociais envolvidos

188

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

No entanto as condiccedilotildees objetivas de periferizaccedilatildeo das cidades e da pauperizaccedilatildeo de

suas classes populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees populares formadas com

propoacutesitos religiosos tornassem-se o uacutenico canal de expressatildeo das reivindicaccedilotildees por

melhores condiccedilotildees de vida frente agrave poliacutetica de exclusatildeo adotada na eacutepoca que alijava um

nuacutemero significativo da sociedade devido agrave negligecircncia do Estado em desenvolver sua

funccedilatildeo ou seja gestar poliacuteticas sociais de consumo coletivo

A igreja catoacutelica passou a incentivar a organizaccedilatildeo de moradores em Beleacutem

conscientizando-os de seus direitos e fomentando a atuaccedilatildeo poliacutetica das bases contribuindo

dessa forma para o fortalecimento das organizaccedilotildees populares54

Aleacutem da igreja catoacutelica outros atores colaboraram para a fomentaccedilatildeo das

organizaccedilotildees populares em Beleacutem tais como a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social

e Educacional (FASE)55 que desenvolveu trabalho de cunho educativo nos bairros

favorecendo assim a reorganizaccedilatildeo de grupos e setores marginalizados e a Sociedade

Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH)56 que passou a dar apoio e a incentivar

os movimentos populares contribuindo dessa forma para a ampliaccedilatildeo das perspectivas de

luta

Dentro desse contexto a sociedade comeccedilou a se organizar por meio dos Centros

Comunitaacuterios (CCs) e Associaccedilotildees de Moradores (AMs) de vaacuterios bairros de Beleacutem que

passaram a dotar uma poliacutetica de mobilizaccedilatildeo com o objetivo de lutar contra a situaccedilatildeo de

exclusatildeo a qual estavam submetidos

As principais lutas desenvolvidas pelas organizaccedilotildees populares no periacuteodo de 1970 a

1979 foram marcadas pela articulaccedilatildeo dessas por meio de Encontros de Comunidades que

oportunizaram as lideranccedilas trocarem experiecircncias de trabalho e decidirem os rumos de suas

54 Com o surgimento de vaacuterias Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) ala progressista da igreja catoacutelica houve uma emergecircncia e proliferaccedilatildeo de organizaccedilotildees comunitaacuterias pois aleacutem de contribuir no processo de formaccedilatildeo poliacutetica das lideranccedilas passaram a ser consideradas como canteiros de onde os movimentos sociais colhiam as lideranccedilas bem como espaccedilo para denuacutencia e questionamentos das praacuteticas poliacuteticas autoritaacuterias implementadas pelo regime militar 55 A FASE foi fundada no ano de 1964 e teve num primeiro momento o papel fundamental de prestar assessoria teacutecnica aos grandes projetos de desenvolvimento na Amazocircnia posteriormente passou a promover assessoria poliacutetico-pedagoacutegica a vaacuterias organizaccedilotildees populares atraveacutes da capacitaccedilatildeo de lideranccedilas em vaacuterios bairros de Beleacutem (CRUZ 1994) 56 A SPDDH surgiu no ano de 1977 e era composta por setores heterogecircneos da sociedade como exigecircncia da luta contra a falta de informaccedilatildeo da sociedade sobre os seus direitos poliacuteticos e sociais como tambeacutem das arbitrariedades e abusos sobre os direitos humanos no governo ditatorial da eacutepoca

189

lutas pela posse de terra por aterro por construccedilatildeo de escolas por aacutegua postos de sauacutede

entre outros

A realizaccedilatildeo desses encontros permitiu uma maior conscientizaccedilatildeo dos movimentos

populares que promoveram a ruptura com a imediaticidade passando a executar uma poliacutetica

de reivindicaccedilatildeo em acircmbito maior frente agrave poliacutetica adotada pelo Estado

Em 1973 a intervenccedilatildeo puacuteblica nas baixadas eacute retomada por meio de uma proposta

global que visava intervir no conjunto formado pelas bacias hidrograacuteficas Assim foi

necessaacuteria a assinatura de um convecircnio entre o DNOS a Superintendecircncia de

Desenvolvimento da Amazocircnia (SUDAM) e o Governo do Estado que deu origem agrave

Monografia das Baixadas de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

No ano de 1976 a Prefeitura Municipal de Beleacutem (PMB) o DNOS a SUDAM e o

Governo do Estado firmaram outro convecircnio instituindo-se desse modo o Programa de

Recuperaccedilatildeo das Baixadas (PRB) que tomou duas direccedilotildees complementares uma

compreendeu o Plano Global que envolve estudos levantamentos e projetos visando atingir

todas as aacutereas de baixadas e a outra o Plano de Accedilatildeo Imediata (PAI) visando viabilizar as

obras do DNOS no Igarapeacute Satildeo Joaquim na aacuterea do Una Este uacuteltimo seria uma experiecircncia

piloto de orientaccedilatildeo para outras obras de drenagem urbana (TRINDADE JUNIOR 1997)

O Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixada transferiu os moradores da aacuterea do Barreiro

para o Conjunto Promorar e Providecircncia Entretanto esta populaccedilatildeo teve suas moradas

financiadas pelo Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo e como natildeo puderam arcar com os custos

desse sistema acabaram retornando agrave aacuterea de baixadas

Abeleacutem (1989) ressalta que o Programa foi executado sem que as famiacutelias pudessem

decidir o seu destino natildeo sendo ouvidas nos aspectos relativos agrave remoccedilatildeo ao novo local de

moradia o que demonstra o niacutevel de imposiccedilatildeo do planejamento urbano sobre a camada pobre

da sociedade residente naquela aacuterea de baixada fator este que posteriormente levou ao

fracasso do programa Segundo Trindade Junior (1997) a partir desse momento foram

realizadas vaacuterias intervenccedilotildees do poder puacuteblico em aacutereas alagadas sendo no entanto de

caraacuteter esparso e natildeo globalizantes

Nesse sentido percebe-se que apesar dos avanccedilos dos movimentos populares uma

total ausecircncia da participaccedilatildeo popular nas tomadas de decisotildees em relaccedilatildeo a tais projetos

evidenciando assim outros interesses em jogo principalmente o econocircmico jaacute que os

benefiacutecios sociais tidos como justificativa primeira do programa tinham na verdade papel

secundaacuterio

190

Ambas experiecircncias em que pese os benefiacutecios em infraestrutura para as aacutereas

atingidas a intervenccedilatildeo esteve pautada pela accedilatildeo racionalizadora do planejamento ficando a

populaccedilatildeo na condiccedilatildeo de objeto e natildeo de sujeitos das accedilotildees desenvolvidas [] A poliacutetica

urbana implementada tendeu a reforccedilar a supremacia do espaccedilo abstrato sobre o espaccedilo social

contribuindo para a reproduccedilatildeo das desigualdades sociais

(SOUZA 1992 p 75)

Em 1977 os conflitos pela posse de terra se acirraram entre moradores Estado

latifundiaacuterios urbanos e imobiliaacuterios devido ao aumento do nuacutemero das ocupaccedilotildees de terras

principalmente nos bairros da Cremaccedilatildeo Jurunas Terra Firme Pedreira Sacramenta Benguiacute

Marco e Una sendo que estes conflitos provocaram a expulsatildeo derrubada de casas repressatildeo

policial e prisotildees57 Essa experiecircncia levou os movimentos populares a se organizarem ainda

mais e lutarem em defesa de um pedaccedilo de terra para morar

Constituindo-se em sujeitos coletivos os movimentos populares unificaram-se na

luta pela posse da terra lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que envolveu vaacuterios

bairros da cidade como Jurunas e Sacramenta Essa praacutetica culminou com o fortalecimento

das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros Pobres de Beleacutem que mais tarde

passou a ser chamada de Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB) em 28 de janeiro de 1979 E

era uma entidade federativa que formaliza a articulaccedilatildeo dos centros comunitaacuterios e

associaccedilotildees de moradores voltada para os problemas da terra e contra a violecircncia policial

Como se vecirc o movimento popular de Beleacutem desde seu surgimento apoacutes o golpe militar realizaram accedilotildees articulando formas de organizaccedilatildeo mais permanente com outros em termos de campanhas e movimentos mais gerais buscando fortalecer a concretizaccedilatildeo de suas demandas (CRUZ 1994 p 85)

De acordo com Cruz (1994) a CBB58 possuiacutea maior inserccedilatildeo nos bairros onde as

contradiccedilotildees sociais e os conflitos eram mais expliacutecitos Sua principal bandeira de luta era

pelo direito de morar Desse modo passou a coordenar grandes mobilizaccedilotildees e atos puacuteblicos

para encaminhar as lutas por melhores condiccedilotildees de vida

Esse fato ocasionou em um aumento significativo na estruturaccedilatildeo do movimento

popular em Beleacutem Os sujeitos sociais que emergiram nesse momento histoacuterico ganharam

mais legitimidade e representatividade poliacutetica nas lutas pelo direito agrave cidade e agrave cidadania

57 Outro movimento importante nessa eacutepoca foi a revolta ou guerra da poeira que emergiu em vaacuterias ruas de Beleacutem para evitar o tracircnsito de carros e coletivos que levantavam poeira provocando problemas de sauacutede aos moradores (CBB 1984) 58 A estrutura interna da CBB foi concebida inicialmente atraveacutes de trecircs representantes por bairro participantes da luta que integraram sua composiccedilatildeo por dois anos ateacute que se realizasse um Congresso para eleger sua diretoria A CBB congregava cerca de 50 entidades comunitaacuterias naquela eacutepoca (CRUZ 1994)

191

Os movimentos populares ultrapassaram o imediatismo de suas reivindicaccedilotildees transformando

suas carecircncias em direitos de cidadania e ganhando significado de uma luta pela reabertura do

social como uma nova alternativa poliacutetica desencadeando formas de atuaccedilatildeo poliacutetica e

ampliando o espaccedilo da cidadania no acircmbito social e poliacutetico Esse processo eacute intermediado

pelo Estado e por diversos agentes de produccedilatildeo do espaccedilo urbano mediante contradiccedilotildees e

ambiguumlidades

Num outro enfoque Cruz (1994) remonta que a luta pelo direito de morar em Beleacutem

interferiu no processo de organizaccedilatildeo espacial da cidade a partir de uma loacutegica proacutepria dos

moradores com os processos desencadeados por meio das diferentes lutas originadas nos

locais de moradia especificamente nas ocupaccedilotildees59

Nessa luta a relaccedilatildeo com o Estado foi alterada passando os teacutecnicos estaduais a

realizarem reuniotildees no proacuteprio bairro e a contar com a participaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo da

sociedade nas demarcaccedilotildees dos lotes nas decisotildees a serem tomadas nos pagamentos a serem

efetivados (ABELEacuteM 1989)

Apesar das vitoacuterias diversos conflitos continuavam latentes permanecendo vaacuterias

questotildees pendentes em quase todos os bairros Os movimentos populares permaneciam se

organizando lutando em busca de soluccedilatildeo para os seus problemas que no primeiro momento

eram mais restritos a questotildees da posse da terra depois passaram a ser mais amplo tais como

aacutegua energia escola60 posto de sauacutede vias de acesso feiras supermercados e saneamento

baacutesico Sendo assim esses movimentos populares de Beleacutem partiram para um trabalho mais

abrangente conscientizando a sociedade da necessidade de participaccedilatildeo e exigindo do

governo natildeo soacute soluccedilotildees imediatas mas tambeacutem a participaccedilatildeo na gestatildeo da cidade mesmo

que dentro de certos limites

Todavia o Estado passou a utilizar-se das organizaccedilotildees de bairros para viabilizar

suas poliacuteticas por meio da cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de entidades fantasmas com o objetivo

de enfraquecer a luta social passando a tratar as organizaccedilotildees populares como um

instrumento a seu serviccedilo incentivando controlando dividindo e apaziguando-as na medida

em que centralizavam o encaminhamento das demandas e atendiam agraves solicitaccedilotildees sem no

entanto nada mudar estruturalmente

59 Apoacutes vaacuterios anos lutando pelo Direito de Morar os movimentos populares unificados com a CBB conseguiram relevantes vitoacuterias como por exemplo a desapropriaccedilatildeo de trecircs aacutereas na Sacramenta (Ferro Costa que foi negociada com a Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) por meio do pagamento simboacutelico de cinco mil cruzeiros na eacutepoca aacuterea pertencente agrave Aeronaacuteutica que foi negociada com o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) e aacuterea pertencente ao governo municipal) que retratou a importacircncia da organizaccedilatildeo para o ecircxito das lutas servindo assim de incentivo para os demais bairros 60 Essa luta desdobrou-se na campanha Escola para Todos

192

Sendo assim evidencia-se que a presenccedila do Estado por meio de poliacuteticas puacuteblicas

de cunho assistencialista orientada e proposta pelo Governo Federal levou ao fortalecimento

das praacuteticas de cooptaccedilatildeo e clientelismo Nesse momento as accedilotildees pelo governo serviram

mais como estrateacutegias poliacuteticas do que proporcionaram melhoria da qualidade de vida da

populaccedilatildeo

Em 20 de outubro de 1985 surgiu a Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros

Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores (FMCCAM) atualmente identificada pela sigla

FEMECAM como forma de articular as entidades comunitaacuterias dissidentes da CBB e outras

novas criadas com o incentivo do governo

Essa federaccedilatildeo era apoiada pelo Estado fruto da cooptaccedilatildeo e do clientelismo e usava

o discurso da participaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo do governo afirmando que havia necessidade de

um gerenciamento mais eficiente do movimento popular nas reivindicaccedilotildees junto ao governo

pois a CBB aleacutem de natildeo estar correspondendo tinha uma preocupaccedilatildeo mais poliacutetica-

partidaacuteria (MORAES 1997)

Desde o I Congresso a Federaccedilatildeo sempre teve muito apoio dos oacutergatildeos estatais e municipais de entidades particulares e de algumas empresas Por exemplo no I Congresso noacutes tivemos um apoio muito grande do governo do Estado e da Prefeitura Municipal na gestatildeo Coutinho Jorge que nos deram muito apoio Do Governo do Estado recebemos um carro com motorista a nossa disposiccedilatildeo para realizarmos o nosso trabalho a Prefeitura arcou com os cartazes a parte da alimentaccedilatildeo a outra foi o governo do Estado atraveacutes do pagamento do local para a realizaccedilatildeo do congresso aleacutem do apoio das empresas de ocircnibus que deslocaram a cada bairro de Beleacutem um veiacuteculo para conduzir as congressistas (CRUZ 1994 p 111)

Esse tipo de posicionamento reflete o interesse que o Estado materializado pelas

administraccedilotildees puacuteblicas tem de se legitimar bem como a falta de maturidade da entidade em

questionar as accedilotildees e estrateacutegias do Estado

Segundo Pinheiro et al (2007) a partir da deacutecada de 1980 com os projetos de macro

e microdrenagem das bacias hidrograacuteficas o Estado avanccedilou na intervenccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de saneamento e reestruturaccedilatildeo urbana das baixadas acarretando a remoccedilatildeo de seus

moradores para aacutereas mais distantes do nuacutecleo urbano e a oferta de novos espaccedilos

infraestruturados ao mercado imobiliaacuterio

Aleacutem disso com a falta de investimento em poliacuteticas de habitaccedilatildeo popular ampliam-

se o deacuteficit habitacional e os conflitos fundiaacuterios pela terra de morar As famiacutelias expulsas das

baixadas e os imigrantes de outros municiacutepios encontram na praacutetica das ocupaccedilotildees coletivas

193

terras ociosas a alternativa para suprir a carecircncia de moradia indicando um segundo vetor de

periferizaccedilatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo (PINHEIRO et al 2007)

No acircmbito municipal em 1986 foi criada a Secretaria Municipal de Saneamento

(SESAN) com o objetivo de sanear e drenar as aacutereas de baixadas passando a desenvolver

accedilotildees que visavam natildeo mais projetos de remoccedilatildeo e abertura de canais e sim uma tentativa de

melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas alagadas por meio dos serviccedilos de drenagem

macrodrenagem terraplanagem revestimentos asfaacutelticos calccediladas e outros Nesse contexto

desenvolveu-se o Projeto Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) que

foi executado nos bairros do Marco e Pedreira (TRINDADE JUNIOR 1997)

A partir de 1987 foi desenvolvido pela PMB o Programa de Recuperaccedilatildeo das

Baixadas (PRB) sendo eleita como prioritaacuteria a Bacia do Una Esse programa possuiacutea um

prazo inicial de quatro anos e incluiacutea obras viaacuterias e de saneamento em uma aacuterea de 3644

hectares envolvendo nove bairros de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

Eacute nesse cenaacuterio que a CBB passou a se preocupar em redimensionar sua intervenccedilatildeo

poliacutetica pois comeccedilou a admitir a importacircncia em ocupar os espaccedilos institucionais como por

exemplo o Comitecirc de Assessoria ao Programa de Macrodrenagem da Bacia do Una

procurando interferir no desenvolvimento do programa apresentando propostas com base nos

debates desenvolvidos junto agraves suas entidades (CRUZ 1994)

Por sua vez a FEMECAM tambeacutem procurou rever sua postura e estrateacutegia junto ao

governo jaacute que percebeu que com a mudanccedila nas administraccedilotildees municipal e estadual nem

sempre teve reconhecida sua importacircncia como interlocutora

Nesse sentido as duas entidades buscaram uma intervenccedilatildeo mais forte na defesa das

causas populares e principalmente frente as novas demandas que exigem maior qualificaccedilatildeo

do movimento popular com o objetivo de proporem alternativas em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo estatal e

para a continuaccedilatildeo da luta por uma cidade democraacutetica

Na deacutecada de 1990 os movimentos ligados agrave luta pela moradia em Beleacutem tiveram

conquistas importantes conseguindo se engajar na luta pela reforma urbana participando na

elaboraccedilatildeo do Plano Diretor da Cidade aleacutem de estarem agrave frente na defesa e nas negociaccedilotildees

de leis de Poliacuteticas Habitacionais e de Desenvolvimento Urbano demonstrando a importacircncia

dessas poliacuteticas para a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo e principalmente

buscando garantir a participaccedilatildeo popular na gestatildeo de controle das poliacuteticas puacuteblicas

O Plano Diretor de Beleacutem elaborado em 1991 e tornado lei em 1993 (Lei nordm 7603

de 13011993) definiu e traccedilou diretrizes agrave poliacutetica urbana e ao sistema de planejamento e

gestatildeo da cidade Aleacutem disso teve como pressuposto baacutesico a implementaccedilatildeo de instrumentos

194

que pudessem combater a pobreza urbana buscando alternativas de desenvolvimento que

superassem suas contradiccedilotildees colocando a sociedade civil como agente principal desse

processo

O Plano Diretor garantiu conquistas importantes tais como solo criado imposto

predial e territorial progressivo no tempo e no espaccedilo usucapiatildeo especial do imoacutevel urbano

zonas especiais de interesse social (ZEIS) fundo de desenvolvimento urbano transporte

coletivo saneamento e a participaccedilatildeo popular viabilizada por meio da regulamentaccedilatildeo do

Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (CONDUMA) dos Conselhos

Setoriais e dos Conselhos Regionais

De acordo com Moraes (1997) no final de dezembro de 1991 iniciaram-se debates

em torno do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (PMBU) suscitados por vaacuterias

entidades do movimento popular sindical e categorias profissionais

A partir desse momento os movimentos populares tomam como pontos de

discussotildees o Plano Diretor Urbano (PDU) e o Projeto de Macrodrenagem aleacutem de dar iniacutecio a

mobilizaccedilotildees que visavam agrave obtenccedilatildeo de maiores informaccedilotildees acerca de outros projetos de

urbanizaccedilatildeo das baixadas de Beleacutem anunciadas pelo poder puacuteblico estadual e municipal61

O movimento popular sentiu-se desafiado a buscar uma estrateacutegia de intervenccedilatildeo que fosse aleacutem das iniciativas ateacute aquele momento efetivadas Constatou-se a necessidade de articular os diversos atores sociais que atuam no enfrentamento da questatildeo urbana como associaccedilotildees de moradores entidades de assessoria sindicatos federaccedilotildees de bairros com o objetivo de redimensionar suas accedilotildees unificando-as e potencializando-as em favor das classes populares [] Duas grandes questotildees passaram a orientar as accedilotildees desenvolvidas pelo movimento popular de Beleacutem a) fazer com que o projeto do Plano Diretor em tramitaccedilatildeo na Cacircmara Municipal voltasse a ser discutido com a populaccedilatildeo antes de sua aprovaccedilatildeo b) intervir no Projeto de Macrodrenagem do Una dada sua efetivaccedilatildeo em curso sem maiores esclarecimentos e sem participaccedilatildeo dos moradores das aacutereas atingidas (SOUZA 1992 p 64)

Diante desse contexto foi instalado no dia 08 de fevereiro de 1992 o Foacuterum

Metropolitano de Reforma Urbana (FMRU) possuindo sua origem vinculada agrave necessidade

de uma intervenccedilatildeo mais qualitativa dos setores populares no processo de elaboraccedilatildeo e

aprovaccedilatildeo do PDU de Beleacutem assim como discutir o Projeto de Macrodrenagem da Bacia do

Una e o seu processo de remanejamento de famiacutelias

61 O governo estadual estava anunciando o Projeto Comunidade com Dignidade com o objetivo de urbanizar as aacutereas de ocupaccedilatildeo de Beleacutem e Ananindeua O governo municipal estava iniciando em 1991 a execuccedilatildeo do Projeto de Microdrenagem da Bacia do Tucunduba atingindo um grande nuacutemero de famiacutelias (FMRU 1992)

195

O Foacuterum configurou-se como uma rede de articulaccedilotildees de diversas entidades urbanas

e visava ser um espaccedilo de debates poliacutetico de proposiccedilatildeo alternativa agraves poliacuteticas puacuteblicas e de

lutas pela Reforma Urbana62 onde as diversas organizaccedilotildees da sociedade civil se uniram pela

conquista de seus direitos baacutesicos como moradia saneamento transporte energia educaccedilatildeo

sauacutede e que nesse momento apontavam para uma reestruturaccedilatildeo geral do espaccedilo urbano

fundamentada numa participaccedilatildeo popular efetiva

Para Ferreira (2004) a necessidade da sua articulaccedilatildeo se fez por dois motivos

primeiro pela possibilidade de se tentar a aprovaccedilatildeo do Plano Diretor Urbano de Beleacutem antes

da revisatildeo acordada anteriormente com a Cacircmara de Vereadores de apreciaccedilatildeo por parte dos

movimentos sociais o atendimento de suas demandas segundo pela necessaacuteria socializaccedilatildeo

com a sociedade civil dos projetos previstos para serem implementados no campo do

saneamento baacutesico nas aacutereas da Bacia do Una tanto pelo governo estadual quanto municipal

O manifesto de criaccedilatildeo do FMRU foi assinado por 21 entidades (associaccedilotildees de

moradores centros comunitaacuterios CBB FEMECAM sindicatos CUT FASE entre outros)

tendo por objetivos os seguintes pontos

1) Lutar pela aprovaccedilatildeo do anteprojeto de Lei do Plano Diretor de Beleacutem 2) Lutar pelo acesso agraves informaccedilotildees contidas nos projetos de macro e micro drenagem do poder puacuteblico 3) Propor alternativas ao processo de ocupaccedilatildeo urbana que atenda aos interesses da populaccedilatildeo e soluccedilotildees alternativas que priorizem a equidade nas futuras accedilotildees de ocupaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano amazocircnico e regional 4) Democratizar o territoacuterio atraveacutes de maior acesso a terra 5) Distribuir equumlitativamente a habitaccedilatildeo os bens naturais materiais e os serviccedilos urbanos 6) Lutar pela gestatildeo democraacutetica do espaccedilo urbano 7) Respeitar e estimular as praacuteticas culturais e histoacutericas das identidades construiacutedas pela populaccedilatildeo 8) Garantir o uso ecologicamente equilibrado e socialmente justo do meio ambiente 9) Priorizar o transporte coletivo nas suas diversas modalidades 10) Efetivar uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e saneamento que garanta construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares realizaccedilatildeo de urbanizaccedilatildeo e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacutereas de baixa renda estabelecimento de mecanismos que garantam condiccedilotildees miacutenimas de infraestrutura aacutegua potaacutevel remoccedilatildeo e tratamento dos esgotos sanitaacuterios e sistema de limpeza 11) Lutar por uma ampla e real participaccedilatildeo popular em todos os projetos e accedilotildees pertinentes agrave reestruturaccedilatildeo urbana (FMRU 1992 p 55)

62 Na perspectiva dos setores populares envolvidos no FMRU a reforma urbana eacute entendida como garantia da cidade para todos (funccedilatildeo social da cidade) na qual a sociedade civil possa intervir em sua construccedilatildeo e ordenamento (gestatildeo democraacutetica da cidade) com equidade de acesso agrave habitaccedilatildeo e infraestrutura urbana (redistribuiccedilatildeo de renda) (SOUSA 1998)

196

Nesse sentido o FMRU passou entatildeo a compor o cenaacuterio poliacutetico municipal

cumprindo funccedilotildees natildeo mais somente reivindicatoacuterias mas funccedilotildees de agente de pressatildeo de

coordenador do processo e de mediador entre os interesses que surgiram nas discussotildees em

torno do Plano Diretor e do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (FERREIRA 2004)

O FMRU incorporou a concepccedilatildeo de ser necessaacuterio a participaccedilatildeo efetiva da populaccedilatildeo nos centros de decisatildeo de seus destinos natildeo apenas no campo reivindicatoacuterio mas tambeacutem no sentido de propor alternativas agraves poliacuteticas puacuteblicas o que exigia uma atuaccedilatildeo qualificada por parte desses movimentos (FMRU 1992 p 72)

No tocante a questatildeo habitacional nos uacuteltimos anos dos seacuteculos XX e XXI a atuaccedilatildeo

governamental foi voltada para a urbanizaccedilatildeo e o saneamento baacutesico de aacutereas de baixadas

com a reassentamento remoccedilatildeo eou remanejamento de famiacutelias que residem nessas aacutereas

objetivando ampliar o estoque de terras infraestruturadas para o mercado imobiliaacuterio assim

como a ampliaccedilatildeo de investimentos para melhorar as condiccedilotildees de habitaccedilatildeo nas aacutereas

alagadas que dependem de urbanizaccedilatildeo como a realizaccedilatildeo de infraestrutura fiacutesica obras de

drenagem recuperaccedilatildeo e abertura de canais Aleacutem disso outra accedilatildeo do poder puacuteblico diz

respeito ao processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de aacutereas de ocupaccedilatildeo

Segundo Pinheiro et al (2007) o processo de ocupaccedilotildees coletivas visando agrave soluccedilatildeo

de moradia tornou-se bastante evidente na RMB uma vez que o problema da moradia se

agravou face ao constante aumento dos preccedilos das terras urbanas dos alugueacuteis e dos baixos

salaacuterios e tambeacutem pela falta de investimento puacuteblico (setor habitacional) para a faixa salarial

de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos

Dessa forma as classes populares foram cada vez mais levadas a ocupar aacutereas

ociosas nas periferias Estas ocupaccedilotildees coletivas de terras para moradia passaram a

representar um foco de resistecircncia da sociedade civil frente ao autoritarismo imprimindo

inuacutemeras transformaccedilotildees nas relaccedilotildees entre Estado e as classes populares que de forma

organizada e coletiva ergueram suas casas (autoconstruccedilotildees) e conquistaram o direito de

morar legitimando as contradiccedilotildees da realidade urbana e colocando o urbano como espaccedilo

socialmente produzido na correlaccedilatildeo de forccedilas da sociedade (PINHEIRO et al 2007)

197

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A cidade se constitui em um produto da economia de mercado assim como um local

de acumulaccedilatildeo de capital e onde as condiccedilotildees para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho podem

mais plenamente ser realizadas Conforme ressaltado por Correcirca (1989) os processos sociais

produzem forma movimento e conteuacutedo sobre o espaccedilo urbano organizando a produccedilatildeo

espacial das metroacutepoles

Essa organizaccedilatildeo caracteriza-se por usos da terra diferenciados tais como o da aacuterea

central aacutereas industriais e aacutereas residenciais diversas e pelas interaccedilotildees como fluxo de

capital migraccedilotildees diaacuterias entre local de residecircncia e local de trabalho entre outros Aleacutem

disso a cidade tem um caraacuteter poliacutetico

Para Harvey (1980) a cidade eacute a expressatildeo concreta de processos sociais na forma de

um ambiente fiacutesico construiacutedo sobre o espaccedilo geograacutefico Corroborando com essa ideacuteia

Souza (2002) diz que a cidade eacute o concreto o conjunto de redes eacute a materialidade visiacutevel do

urbano enquanto este eacute o abstrato entretanto eacute o que daacute sentido e natureza agrave cidade

De acordo com Lefebvre (2001) o urbano expressa determinada formaconteuacutedo

derivada de contextos histoacuterico-espaciais especiacuteficos Isso implica entender o urbano

transcendendo o campo das determinaccedilotildees econocircmicas ou seja concebecirc-lo como condiccedilatildeo

meio e produto ao mesmo tempo manifestaccedilatildeo dos conflitos entre as necessidades do capital

em seu processo de (re)produccedilatildeo e as necessidades da sociedade como um todo

Corroborando com esse pensamento Carlos (1994 p 24) afirma que o urbano deve

ser pensado em suas muacuteltiplas dimensotildees

[] se de um lado o espaccedilo eacute condiccedilatildeo tanto da reproduccedilatildeo do capital quanto da vida humana de outro ele eacute produto e nesse sentido eacute trabalho materializado Ao produzir suas condiccedilotildees de vida a partir das relaccedilotildees capital-trabalho a sociedade como um todo (na cotidianidade de seu processo de trabalho) produz o espaccedilo geograacutefico e com ele um modo de vida de pensar de sentir Assim pensar o urbano significa tambeacutem pensar a dimensatildeo do humano

Reportando-se tambeacutem a discussatildeo sobre o uso do solo urbano especialmente no

que diz respeito ao capital incorporador pode-se afirmar que em Satildeo Luiacutes a produccedilatildeo de

moradia eacute processada por esse tipo de capital principalmente nas uacuteltimas deacutecadas uma vez

que os capitalistas incorporadores articulam a compra de terreno com a finalidade de valorizaacute-

lo a partir da alteraccedilatildeo do seu uso Aleacutem disso eles articulam agentes imobiliaacuterios agentes

198

financeiros e promotores de venda levando em conta as estruturaccedilotildees e transformaccedilotildees do

espaccedilo por conta da urbanizaccedilatildeo e implicaccedilotildees soacutecio-econocircmicas das mobilidades das

construccedilotildees com consequumlecircncias segregativas

Para uma primeira aproximaccedilatildeo do problema da moradia na cidade de Satildeo Luiacutes

torna-se necessaacuterio uma contextualizaccedilatildeo histoacuterica do processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do

espaccedilo urbano

A Ilha de Satildeo Luiacutes ou a Ilha do Maranhatildeo localiza-se no domiacutenio da Amazocircnia em

uma das suas porccedilotildees mais orientais a oeste do Meridiano de 44ordm W na parte norte do Estado

do Maranhatildeo e limita-se ao norte com o Oceano Atlacircntico ao sul com o Estreito dos

Mosquitos e Baiacutea do Arraial a leste com a Baiacutea de Satildeo Joseacute e a oeste com a Baiacutea de Satildeo

Marcos (RIOS 2005)

Com pouco mais de 830 kmsup2 ocupando 57 da ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se entre

os pequenos municiacutepios em extensatildeo territorial no entanto possui a maior aglomeraccedilatildeo

humana e urbana do Estado com 1011891 habitantes e uma densidade demograacutefica superior

a 100 habkmsup2 sendo portanto o mais populoso e densamente povoado municiacutepio

maranhense conforme tabela 6 (IBGE 2010)

Tabela 6 - Crescimento populacional do municiacutepio de Satildeo Luis

Recenseamento Populaccedilatildeo Residente

Total Urbana Rural 1960 158292 137820 (871) 20472 (129) 1970

265486

205413 (773)

60073 (227)

1980 449877 404252 (898) 45625 (102) 1991 695199 246213 (355) 448986 (645) 2000 870028 837584 (963) 32444 (037) 2010 1011891 955620 (945) 56271 (055)

Fonte IBGE

Censo demograacutefico (2010)

A Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes eacute composta de quatro municiacutepios de acordo

com a Lei Complementar nordm 038 de 12 de janeiro de 1998 Satildeo Luiacutes Satildeo Joseacute de Ribamar

Paccedilo do Lumiar e Raposa conforme mapa 2

199

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes

Fonte GEPLAN (2000)

200

De acordo com Diniz (2007) centrados em um territoacuterio insular os municiacutepios de

Satildeo Luiacutes Paccedilo do Lumiar Satildeo Joseacute de Ribamar e Raposa embora politicamente

independentes constituem uma aacuterea contiacutenua na qual se desenvolve o maior fluxo de relaccedilotildees

econocircmicas e poliacutetica-administrativas do Estado

No processo de regionalizaccedilatildeo Satildeo Luiacutes pertence agrave Mesorregiatildeo do Norte

Maranhense na microrregiatildeo da aglomeraccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes O aglomerado urbano da

Ilha do Maranhatildeo representa uma conurbaccedilatildeo cuja capital do Estado Satildeo Luiacutes eacute a cidade

poacutelo e exerce maior influecircncia pois desenvolve em torno de si uma expressiva rede de

relaccedilotildees soacutecio-econocircmicas aleacutem de oferecer um estoque consideraacutevel de equipamentos

urbanos que a torna um centro regional bastante atraente para outros centros menores

Na aacuterea rural o municiacutepio possui uma agricultura voltada agrave produccedilatildeo destinada ao

abastecimento de parte da demanda da capital Existem ainda pequenos estabelecimentos

agriacutecolas destinados agrave produccedilatildeo de gratildeos para a subsistecircncia Parte da aacuterea eacute destinada ao

Distrito Industrial com induacutestrias implantadas nos gecircneros de bebidas alimentaccedilatildeo produtos

metaluacutergicos ceracircmica e o complexo portuaacuterio (ALUMAR Itaqui CVRD) para exportaccedilatildeo

de mineacuterios de ferro e manganecircs alumiacutenio primaacuterio alumina ferro gusa e outros produtos e a

importaccedilatildeo industrializada mineacuterio de alumiacutenio (bauxita) mateacuterias-primas em geral e

combustiacutevel (RIOS 2005)

As alteraccedilotildees que vecircm ocorrendo na estrutura socioeconocircmica do municiacutepio tecircm sua

origem na implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais que forccedilaram o aparecimento de

induacutestrias sateacutelites e o revigoramento de serviccedilos de apoio agraves atividades industriais

O Governo Estadual e a Prefeitura desenvolveram programas de revitalizaccedilatildeo do

Centro Histoacuterico da cidade no intuito de fortalecer a induacutestria do turismo que tem suas raiacutezes

histoacutericas como forte vetor de atraccedilatildeo considerado recentemente pela UNESCO como

Patrimocircnio Cultural da Humanidade

Para Rios (2005) o periacutemetro definido pelos tombamentos em niacutevel federal e

estadual compreende cerca de 35000 imoacuteveis em sua maioria de natureza civil e associados

aos periacuteodos colonial e imperial

Considerada como centro poliacutetico-administrativo do Estado a cidade Satildeo Luiacutes

destaca-se tambeacutem no setor financeiro comercial industrial turiacutestico e mais recentemente

portuaacuterio Nesse sentido examinar a questatildeo urbana requer verificar os diversos fatores que

contribuem para sua dinacircmica uma vez que a urbanizaccedilatildeo apresenta um caraacuteter contraditoacuterio

pois eacute dominada pelas relaccedilotildees sociais de uma sociedade desigual que produz e reproduz no

201

espaccedilo urbano as disparidades de renda a exploraccedilatildeo econocircmica a exclusatildeo dentre outras

mazelas comuns agrave sociedade capitalista

A primeira fase da histoacuteria do Maranhatildeo reporta as lutas pelo territoacuterio e a ilha de

Satildeo Luiacutes constitui-se em uma arena privilegiada onde elas se desenrolam A ocupaccedilatildeo urbana

de Satildeo Luiacutes se iniciou com a formaccedilatildeo de um povoado mariacutetimo fronteiro agrave baiacutea de Satildeo

Marcos no divisor de aacuteguas dos rios Anil e Bacanga Esse povoado que deu origem a cidade

de Satildeo Luiacutes surgiu nos primeiros anos do seacuteculo XVII como afirmaccedilatildeo do expansionismo

colonizador francecircs com objetivo de estabelecer na regiatildeo a Franccedila Equinocial (DINIZ

2007)

A localizaccedilatildeo do povoado foi escolhida em funccedilatildeo da sua posiccedilatildeo estrateacutegica pois

fica em frente a baiacutea de Satildeo Marcos passagem quase que obrigatoacuteria para o acesso agrave Ilha e ao

continente aleacutem de oferecer condiccedilotildees para o ancoramento de embarcaccedilotildees e defesa aos

ataques por via mariacutetima

A implantaccedilatildeo da cidade pelos franceses ocorre por meio da construccedilatildeo de um forte

e de algumas casas toscas formando um pequeno nuacutecleo urbano que teria a funccedilatildeo de servir

de entreposto comercial para a Franccedila instituir em definitivo um sistema de exploraccedilatildeo das

riquezas locais

A implantaccedilatildeo de benfeitorias que se iniciava revela algumas das praacuteticas que

materializaram a presenccedila e atuaccedilatildeo do Estado enquanto agente social pois satildeo essas

operaciones concretas que contribuyen a modelar la cuidad (CAPEL 1974 p 19)

Essas operaccedilotildees visando modelar a cidade satildeo resultado do movimiento de

valorizacioacuten extensiva del espacio em que o processo de colonizaccedilatildeo implica a agregacioacuten

de una cuantidad de espacio y todo lo que conteacuten lo que en la praacutectica significa una adicioacuten

de factores de produccioacuten fuerza de trabajo recursos naturales y tierras en general (CAPEL

1974 p 20)

Assim a cidade de Satildeo Luiacutes foi fundada em 08 de setembro de 1612 pelos

franceses Daniel de La Touche e Franccediloise de Rasilly Todavia foi conquistada e incorporada

ao domiacutenio portuguecircs em 1615 Para tanto entre outras medidas os portugueses traccedilaram o

plano urbaniacutestico para implantaccedilatildeo da cidade com a definiccedilatildeo do arruamento e orientaccedilotildees

para o seu desenvolvimento

Esse plano que pautou o modelo e a ocupaccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes ateacute meados dos

anos sessenta do seacuteculo XX foi elaborado pelo engenheiro-mor do Brasil o portuguecircs

Francisco Frias de Mesquita em 1616 Sua concepccedilatildeo urbaniacutestica com arruamento uniforme

e traccedilado octogonal seguindo a orientaccedilatildeo dos pontos cardeais tinha origem renascentista e

202

obedecia aos padrotildees estabelecidos pelas Leis das Iacutendias conforme determinava a Coroa

Espanhola que agravequela eacutepoca controlava o Reino Portuguecircs (ESPIRITO SANTO 2002)

O processo de colonizaccedilatildeo pelos portugueses tinha como objetivo expandir

preservar e controlar as novas colocircnias que eram estabelecidas no setor setentrional em que os

grandes rios se constituiacuteram em porta de entrada Nesse caso se configura o interesse do

Estado portuguecircs articulado aos detentores do capital (grupos econocircmicos ligados ao

comeacutercio) que iniciaram uma seacuterie de accedilotildees como a ocupaccedilatildeo da Amazocircnia instalaccedilatildeo de

fortes e nuacutecleos de povoamento (por exemplo em Beleacutem no ano de 1616) ampliaccedilatildeo de

benfeitorias jaacute implantadas enfatizar a funccedilatildeo poliacutetico-administrativa-militar e o domiacutenio de

novos fatores de produccedilatildeo (terra mateacuteria-prima matildeo-de-obra escrava) bem como assegurar o

incipiente comeacutercio (ANDRADE 1984) Contudo a cidade sucumbiu ainda no decorrer do

seacuteculo XVII ao domiacutenio holandecircs

Entretanto assim como acontecera com os franceses tambeacutem os holandeses foram expulsos pelos portugueses decorridos trecircs anos da ocupaccedilatildeo em 1645 Eacute quando se inicia de fato e em definitivo a colonizaccedilatildeo portuguesa da antiga Upaon-Accedilu ou Ilha Grande segundo a denominaccedilatildeo tupinambaacute para a Ilha de Satildeo Luiacutes (RIOS 2005 p 216)

Cabe ressaltar que Satildeo Luiacutes tambeacutem esteve sob dominaccedilatildeo holandesa entre os anos

de 1641 a 1644 Periacuteodo de grande turbulecircncia caracterizado por inuacutemeras revoltas e

envolvendo sangrentas lutas entre conquistadores e conquistados Naquela eacutepoca a estrutura

urbana da cidade possuiacutea cerca de 600 casas e se constituiacutea em proacutespero arraial produzindo e

exportando uma boa quantidade de produtos agriacutecolas accediluacutecar fumo algodatildeo entre outros O

que certamente aguccedilava a cobiccedila dos exploradores

A ocupaccedilatildeo portuguesa desenvolveu entre 1650 e 1750 as primeiras atividades

econocircmicas organizadas Essas atividades permitiram a acumulaccedilatildeo de renda por pequenos

grupos de famiacutelias que alternavam a moradia entre a casa grande do latifuacutendio e a residecircncia

na cidade

Elevou-se agrave categoria de cidade no ano de 1677 e no decorrer dos seacuteculos seiscentos e setecentos chegou a disputar com Beleacutem o posto de principal ponto de contato direto da vasta regiatildeo Norte do Brasil a qual compreendia consoante a geopoliacutetica de entatildeo as terras que iam do Oeste do Cearaacute ateacute a longiacutenqua Amazocircnia com o impeacuterio portuguecircs (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 60)

203

De acordo com Diniz (2007) foram edificadas algumas residecircncias e

estabelecimentos comerciais em pontos diversos da cidade e com a prosperidade das

atividades econocircmicas uma aglomeraccedilatildeo de edificaccedilotildees com melhores qualidades

arquitetocircnicas comeccedilou a se formar em torno do Largo do Carmo (atual Praccedila Joatildeo Lisboa)

para mais tarde se estender em direccedilatildeo ao Desterro e agrave Praia Grande

Nesse periacuteodo eram precaacuterias as condiccedilotildees de serviccedilos puacuteblicos e infraestrutura

urbana Somente no final do seacuteculo XVIII eacute que foram melhoradas as condiccedilotildees urbaniacutesticas

poreacutem inexistia um plano a ser obedecido e a cidade crescia de forma desordenada

Naturalmente a cidade desenvolveu-se em torno desse nuacutecleo histoacuterico que sofreu

um forte surto desenvolvimentista notadamente nos seacuteculos XVIII e XIX periacuteodo de apogeu

econocircmico da Proviacutencia do Maranhatildeo por conta da produccedilatildeo de algodatildeo e accediluacutecar Esse

desenvolvimento econocircmico e cultural que se manteve ateacute o iniacutecio do seacuteculo XX produziu o

que hoje eacute considerado o maior e mais homogecircneo conjunto urbano e arquitetocircnico do

periacuteodo colonial brasileiro integrando a lista de Patrimocircnio Histoacuterico Nacional63 desde 1955

Em meados do seacuteculo XVIII Satildeo Luis se constituiu num centro comercial

expressivo com fluxo razoaacutevel de mercadorias importadas Atraveacutes dos navios de grande

porte chegavam artigos os mais refinados vindos da Europa a fim de atender o requinte da

burguesia maranhense Do mesmo modo saiam da cidade grandes carregamentos de

produtos cultivados como arroz algodatildeo entre outros (DINIZ 2007)

A partir de entatildeo o Estado implementou accedilatildeo sob a forma de capital empreendedor

criando instituiccedilotildees no sentido de incrementar a economia e por conseguinte viabilizar os

seus interesses

Integrado ao sistema mundial de comeacutercio por meio da exportaccedilatildeo de arroz do algodatildeo e de materiais regionais o Maranhatildeo canalizou para Satildeo Luiacutes e Alcacircntara os principais portos de escoamento determinando uma circulaccedilatildeo de riquezas que promoveu um florescimento cultural e urbano significativo para as duas cidades (ESPIRITO SANTO 2002 p 162)

Com a raacutepida expansatildeo da cultura algodoeira a Proviacutencia passou por um processo de

enriquecimento que de forma indireta veio a melhorar o aspecto arquitetocircnico da Capital

Edificaccedilotildees com melhores estruturas e acabamento satildeo construiacutedas nos espaccedilos onde hoje

existem as ruas Grande Santana Afogados e suas transversais

como tambeacutem na zona

63 Esse imponente conjunto urbano com seus becos ladeiras e escadarias eacute composto por cerca de 5000 edificaccedilotildees entre essas belos exemplares revestidos de azulejos coloniais Essa caracteriacutestica fez com que fosse denominada de a Pequena Vila dos palaacutecios de porcelana ainda no seacuteculo XIX pelo viajante francecircs Aveacute-Lallemant (1859)

204

comercial da Praia Grande Nesse periacuteodo duas obras monumentais foram construiacutedas o

Palaacutecio dos Leotildees (atual sede do Governo Estadual) e o Teatro Arthur Azevedo

Data desta eacutepoca o conjunto urbaniacutestico de caraacuteter civil que compotildee o Centro Histoacuterico da capital maranhense e se constitui um dos mais representativos e ricos exemplares traccedilados urbanos e a tipologia arquitetocircnica produzidos pela colonizaccedilatildeo portuguesa no Brasil Na realidade a tipologia arquitetocircnica que corresponde aos seacuteculos XVIII e XIX difere significativamente das casas em taipa e madeira que caracterizam os edifiacutecios de caraacuteter civil do seacuteculo XVII constituem-se soacutelidas construccedilotildees de alvenaria de pedra e argamassas com oacuteleo de peixe serralheira e cantarias de lioz de origem europeacuteia emadeira de lei De qualquer maneira os mais representativos exemplares da arquitetura de Satildeo Luiacutes datam sobretudo da segunda metade do seacuteculo XIX Trata-se dos sobrados de fachadas revestidas em azulejos portugueses que se sobressaem como um dos aspectos mais peculiares da construccedilatildeo civil maranhense (RIOS 2005 p 216)

Ainda tendo como sustentaacuteculo a cultura algodoeira a economia maranhense se

expandia de tal forma que chegou a alcanccedilar posiccedilatildeo expressiva na economia brasileira no

iniacutecio do seacuteculo XIX Os efeitos deste fenocircmeno repercutiram significativamente sobre a

cidade de Satildeo Luiacutes As rendas da administraccedilatildeo aumentaram a populaccedilatildeo urbana se

incrementou e os logradouros puacuteblicos e os serviccedilos de sauacutede e educaccedilatildeo receberam

tratamento mais adequado Em 1820 cerca de 20000 habitantes residiam na cidade de Satildeo

Luiacutes o que na eacutepoca representava a quarta concentraccedilatildeo urbana do Paiacutes (RIOS 2005)

Ao longo do seacuteculo XIX a cidade ganhou novo calccedilamento ocorreram a

implantaccedilatildeo do Cais da Sagraccedilatildeo (antigo Passeio Puacuteblico hoje Avenida Beira-Mar) e a

reurbanizaccedilatildeo das principais praccedilas Aleacutem disso sucessivas legislaccedilotildees

os Coacutedigos de

Posturas

determinam a expansatildeo do modelo urbaniacutestico em malha ortogonal e com

dimensotildees e larguras preestabelecidas que chegam a ocupar os atuais limites do Centro

Histoacuterico (ESPIRITO SANTO 2002)

Segundo Diniz (2007) a populaccedilatildeo teve uma participaccedilatildeo importante devido ter sido

incumbida de construir as calccediladas de suas casas Essas medidas foram aos poucos sendo

reformuladas e aperfeiccediloadas pois os moradores erguiam suas calccediladas sem qualquer

harmonia com os padrotildees naturais das ruas Diante disso as autoridades estabeleceram novas

regras para a pavimentaccedilatildeo e calccedilamento das vias

Esse processo de melhorias urbanas sempre esteve voltado para o embelezamento da

aacuterea nobre da cidade (centro) destinava-se especialmente agraves ruas do Trapiche Satildeo Joatildeo

Palma Paz Remeacutedios locais escolhidos pela burguesia como moradia enquanto que as

205

famiacutelias podres estavam sempre afastadas do nuacutecleo central e consequumlentemente natildeo eram

beneficiadas pelo sistema de serviccedilos

Nota-se nesse sentido que o interesse do capital seleciona e direciona a intervenccedilatildeo

do Estado em termos de alocaccedilatildeo de infraestrutura e reproduccedilatildeo do espaccedilo assim como a

reproduccedilatildeo das relaccedilotildees sociais pois as concessotildees de terras eram dadas agraves pessoas brancas

livres e que dispunham de maior capital Estas representavam a nobreza eou a emergente

classe burguesa Jaacute para a populaccedilatildeo de natildeo-brancos (iacutendios e negros) restava morar em aacutereas

mais afastadas em relaccedilatildeo agrave Praia Grande

No processo de urbanizaccedilatildeo desse periacuteodo destaca-se a construccedilatildeo do Cais da

Sagraccedilatildeo pois foi uma das obras mais importantes ateacute entatildeo realizada Esta obra levou vaacuterios

anos para ser concluiacuteda (1841 a 1909) e tinha como objetivo solucionar o problema de erosatildeo

da barreira onde se encontrava a Praccedila do Palaacutecio a qual constantemente sofria os efeitos do

processo erosivo provocado pelo mar (DINIZ 2007)

Dessa maneira torna-se evidente que a cidade de Satildeo Luiacutes foi produzida pela

associaccedilatildeo entre o capital mercantil e o Estado Este se expressa pelas alteraccedilotildees realizadas

sobre o espaccedilo urbano tendo em vista o crescimento horizontal e a construccedilatildeo de canais

No final do seacuteculo XIX e inicio do seacuteculo XX o grande centro maranhense conheceu

um surto industrial consideraacutevel com a expansatildeo das induacutestrias tecircxteis e as de derivados de

babaccedilu uma vez que o ciclo de algodatildeo sofreu significativa alteraccedilatildeo acarretando em seacuterias

dificuldades na sua comercializaccedilatildeo internacional

No uacuteltimo quartel do seacuteculo XIX com o surto da industrializaccedilatildeo no Estado a maior parte das induacutestrias se estabelece na capital Estas induacutestrias geravam empregos diretos para cerca 300 operaacuterios nuacutemero significativo para uma cidade que na eacutepoca chegava a 45000 habitantes (DINIZ 2007 p 168)

A cidade entatildeo para assumir nova feiccedilatildeo de mercantil-administrativa para

industrial Surge o primeiro grande bairro o Anil formado em torno da faacutebrica Rio Anil

(Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Rio Anil) situado a 9 km do centro da cidade Em aacutereas

proacuteximas ao centro as faacutebricas Companhia Fabril Maranhense (conhecida como Santa Isabel)

e Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Maranhense (conhecida como Camboa) provocaram o

surgimento de formaccedilotildees urbanas nos seus arredores (Fotografia 5) Aleacutem dessas destacam-

se a Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Cacircnhamo Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecelagem Satildeo Luiacutes

Companhia Progresso Maranhense e a Induacutestria Maranhense (RIOS 2005)

206

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Acervo Puacuteblico Municipal (2009)

Vale ressaltar que a ascensatildeo da induacutestria tecircxtil ocorreu em funccedilatildeo de preacute-condiccedilotildees

existentes tecnologia relativamente simples mais ou menos estabilizada de faacutecil manejo e

inteiramente contida nos equipamentos disponiacuteveis no mercado internacional tamanho da

planta miacutenima e volume inicial de investimentos acessiacuteveis agrave economia brasileira de entatildeo

(RIBEIRO JUNIOR 2001 p 65) De acordo com Diniz (2007) as faacutebricas serviram como

nuacutecleos de crescimento e expansatildeo urbana pois ao redor das mesmas surgiram sub-

habitaccedilotildees ou seja as vilas operaacuterias

No final do seacuteculo XIX em funccedilatildeo do surto industrial a cidade eacute dotada dos

primeiros serviccedilos urbanos significativos a Companhia de Aacuteguas e a Companhia Telefocircnica

Em 1920 satildeo implantados os serviccedilos de energia eleacutetrica e de bondes por concessatildeo da

Companhia Inglesa ULLEN

Para Diniz (2007) a cidade adentra o seacuteculo XX com uma municipalidade

desestruturada para enfrentar os problemas da expansatildeo urbana da capital Natildeo existia uma

planta atualizada de todos os pontos da cidade e nem um plano de expansatildeo no qual

estivessem delineados os futuros arruamentos uma vez que natildeo havia preocupaccedilatildeo das

autoridades no que tange ao alinhamento das habitaccedilotildees que ficavam em aacutereas proacuteximas ao

centro Estas eram feitas sem nenhum criteacuterio teacutecnico pela proacutepria populaccedilatildeo

Entre 1920 e 1940 a populaccedilatildeo cresceu a taxas mais baixas Verifica-se na tabela 7

que a cidade levou quase dois seacuteculos para dobrar de populaccedilatildeo Nesse periacuteodo a

administraccedilatildeo municipal investiu em demandas de serviccedilos puacuteblicos com a aplicaccedilatildeo de

207

recursos em urbanizaccedilatildeo saneamento sauacutede educaccedilatildeo transporte e energia ainda que os

recursos aplicados natildeo atendessem a real necessidade de infraestrutura urbana vigente

Vale ressaltar que os equipamentos urbanos foram incrementados tanto em funccedilatildeo da

dinacircmica econocircmica decorrente da localizaccedilatildeo de unidades produtivas industriais tecircxteis

quanto devido ao lento crescimento horizontal da cidade que possibilitou ao poder puacuteblico

municipal aplicar mais recursos na estruturaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes o que todavia foi

viabilizado apenas no Centro Histoacuterico ateacute a Vila do Anil ou seja ao longo do Corredor

Centro-Anil (DINIZ 2007)

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) Periacuteodo Nuacutemero de Habitantes

Fins do seacuteculo XVII 10000 Fins do seacuteculo XVIII 17000 1820 20000 1835 25000 1868 30000 1872 31604 1890 35000 1920 42000 1940 58735

Fonte SERFHAU (1970)

Em 1936 foi fundado o Mercado Central da cidade formado por vaacuterios armazeacutens no

qual se comercializavam artigos diversos Este mercado funcionava como alternativa para

vendas em atacado aleacutem disso se constituiu um concorrente do mercado da Praia Grande e

ao comeacutercio realizado no Portinho A expansatildeo desse novo centro comercial desencadeou

investimentos no setor da construccedilatildeo civil expandindo o Plano Urbano Central Assim com a

implantaccedilatildeo da Companhia do Comeacutercio elevou-se o valor do lote urbano restringindo o

acesso da populaccedilatildeo com menor poder aquisitivo ao periacutemetro urbano (RIBEIRO JUNIOR

2001)

Entre os anos 1950 e 1960 o ritmo de crescimento populacional urbana voltou a

crescer e a aacuterea urbana da cidade se expandiu com mais intensidade no eixo Centro-Anil

Nesse periacuteodo novos bairros surgiram enquanto outros se adensaram com a ocupaccedilatildeo das

aacutereas disponiacuteveis Foi o caso do Matadouro (hoje Liberdade) Monte Castelo Joatildeo Paulo

Cavaco (Faacutetima) Caratatiua Jordoa e Sacaveacutem (DINIZ 2007)

208

No final da deacutecada de 1950 um novo quadro urbano comeccedilou a se formar Com a

abertura de vias rodoviaacuterias para o interior do Estado e a integraccedilatildeo com os estados vizinhos

a populaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes aumentou seu ritmo de crescimento (tabela 8)

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970

Ano Divisatildeo por Zona

Total Urbana Rural 1940 58735 26854 85589 1950 79731 40054 119785 1960 137820 20472 158292 1970 205413 60073 265486

Fonte IBGE Censos Demograacuteficos do Maranhatildeo (195019601970)

Grande parte desse contingente populacional era formado pelo processo migratoacuterio

de pessoas que provinham das aacutereas rurais e de outros estados do nordeste por causa do

fenocircmeno da seca Esses fatores acarretaram em uma ocupaccedilatildeo desordenada de aacutereas as

margens dos rios Anil e Bacanga

Essa complexidade do processo migratoacuterio pode ser compreendida a partir da

reestruturaccedilatildeo produtiva que com mudanccedilas nas formas de inserccedilatildeo no mercado de trabalho

torna-se elemento fundamental para o entendimento da nova configuraccedilatildeo espacial da

migraccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo uma vez que o fluxo migratoacuterio de nordestinos se daacute pela procura de

trabalho numa regiatildeo em que sabem que sua matildeo de obra eacute extremamente necessaacuteria

Os outros fatores que intensificaram o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial foram a

falta de investimento do poder puacuteblico tanto estadual como municipal em aacutereas mais

afastadas do centro da cidade a instalaccedilatildeo de empresas provenientes do sul do Paiacutes na regiatildeo

ausecircncia de uma reforma agraacuteria estadual entre outros

A cidade entatildeo se tornou incapaz de incorporar todo esse contingente populacional

em suas atividades econocircmicas pois simultaneamente outro fato negativo para a economia

se tornava evidente com a paralisaccedilatildeo das induacutestrias tecircxteis Tal fato aleacutem de enfraquecer o

ritmo de industrializaccedilatildeo contribuiu para o aumento do desemprego (DINIZ 2007)

Nas uacuteltimas cinco deacutecadas com o decliacutenio das faacutebricas e as constantes crises da economia maranhense a cidade tem sofrido pressotildees econocircmicas muito fortes refletindo-se no enfraquecimento do comeacutercio local dando ecircnfase ao aparecimento de um tipo de atividade comercial caracterizada por baixos investimentos e menor especializaccedilatildeo nos produtos o setor informal da

209

economia ou circuito inferior Por outro lado apesar do decliacutenio no setor agro-exportador surgiram novas perspectivas econocircmicas que viriam a alterar significativamente o panorama soacutecio-econocircmico da cidade (DINIZ 2007 p 169)

Sendo assim com o decliacutenio das induacutestrias tecircxteis e por conseguinte o aumento do

desemprego o Estado passou a atuar como investidor no espaccedilo urbano na medida em que se

tornou responsaacutevel pela circulaccedilatildeo de capital fazendo com que a cidade continuasse a ter no

comeacutercio um dos fatores de sua existecircncia A cidade assumiu dessa maneira a funccedilatildeo de

comercial industrial administrativa e residencial (ANDRADE 1984 p 103)

O baixo poder aquisitivo da populaccedilatildeo as limitaccedilotildees em investimentos puacuteblicos

municipais principalmente nas aacutereas mais carentes e a ausecircncia de um planejamento

adequado dotaram o crescimento da cidade de aspectos negativos em relaccedilatildeo agrave urbanizaccedilatildeo e

aos serviccedilos baacutesicos

Parte do Centro Histoacuterico teve entatildeo sua funccedilatildeo residencial substituiacuteda pelo comeacutercio e serviccedilos A aacuterea sob a tutela da legislaccedilatildeo federal uma vez que foi tombada como Patrimocircnio Histoacuterico sofreu um esvaziamento mais acentuado agravado pela instalaccedilatildeo da funccedilatildeo administrativa federal estadual e municipal em edifiacutecios da aacuterea afastando cada vez mais a populaccedilatildeo residente (ESPIRITO SANTO 2002 p 37)

Dessa forma vaacuterios movimentos sociais urbanos comeccedilaram a surgir objetivando a

organizaccedilatildeo da populaccedilatildeo residente nas aacutereas mais afastadas do centro da cidade no intuito de

reivindicar a presenccedila do Estado em especial no que se refere aos meios de consumo coletivo

como aacutegua energia postos de sauacutede etc culminando em 1959 com a fundaccedilatildeo da Uniatildeo de

Moradores do Lira que foi a primeira organizaccedilatildeo popular de Satildeo Luiacutes Este fato incentivou

a partir de 1960 o surgimento de outras uniotildees e associaccedilotildees de moradores a exemplo

Madre de Deus Floresta Coreacuteia Nossa Senhora da Vitoacuteria Satildeo Vicente e Satildeo Francisco

Com efeito o governo estadual criou em 1959 a Sociedade de Melhoramentos e

Urbanismo de Satildeo Luiacutes (SURCAP) com a finalidade de planificar a cidade Entretanto este

objetivo natildeo se concretizou e se resumiu ao desmembramento dos Serviccedilos de Aacutegua Luz

esgoto Traccedilatildeo e Prensa de Algodatildeo (Saelta) resultando no corte setorial uma vez que foram

instituiacutedos os respectivos oacutergatildeos (LUZ 2004)

Vale notar que por oito anos (1953-1961) natildeo houve registro de investimentos na

aacuterea habitacional Tal situaccedilatildeo foi modificada entre 1962 e 1965 uma vez que a accedilatildeo do

Estado enquanto produtor do espaccedilo foi ampliada e incrementada na medida em que o

210

Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio (IAPC) e o Instituto de Pensionistas e

Aposentados dos Servidores do Estado (IPASE) foram inseridos nesse contexto

Entatildeo a partir da segunda metade da deacutecada de 1960 a iniciativa de incorporar Satildeo

Luiacutes no processo desenvolvimentista da sociedade moderna que aos poucos se consolidava

contou com uma seacuterie de medidas implementadas em conformidade com os planos e projetos

governamentais

O crescimento urbano de Satildeo Luiacutes nesse periacuteodo se deu no sentido sudeste

acompanhando o eixo rodoviaacuterio da cidade que tambeacutem coincide com a localizaccedilatildeo do

aeroporto Essa estreita faixa de terra delimitada pelas zonas alagadiccedilas dos rios Anil e

Bacanga na verdade eacute o eixo rodoviaacuterio principal da ilha com trecircs grandes avenidas Getuacutelio

Vargas Joatildeo Pessoa e Kennedy Naturalmente ali foram localizadas as principais atividades

comerciais e inuacutemeras aacutereas residenciais abrigando os bairros mais populosos Destarte

formou-se inclusive um centro de serviccedilos secundaacuterio no bairro do Joatildeo Paulo com o

agrupamento de vaacuterias atividades comerciais em torno do mercado desse bairro (LUZ 2004)

A partir de 1967 essa tendecircncia comeccedilou a se inverter em decorrecircncia da construccedilatildeo da barragem do Bacanga ligando o centro ao Porto do Itaqui e da ponte Satildeo Francisco sobre o rio Anil (1970) no sentido da orla mariacutetima

praias Essas obras possibilitaram a ocupaccedilatildeo das terras situadas na margem direita do Rio Anil e na margem esquerda do rio Bacanga promovendo uma profunda alteraccedilatildeo no processo de ocupaccedilatildeo do solo no Municiacutepio e induzindo o surgimento de novos eixos viaacuterios novas aacutereas residenciais aleacutem de centros comerciais e de serviccedilos que passaram a rivalizar com os centros tradicionais (DINIZ 2007 p 171)

Segundo argumenta Luz (2004 p 20) ao assumir o governo do Estado em 1966

Joseacute Sarney criou o Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento (GETAP) ligando-o

diretamente ao Gabinete do Governo e atribuindo-lhe amplos poderes em relaccedilatildeo agraves demais

secretarias O GETAP elaborou o Programa de Emergecircncia para 1966 e propocircs medidas

poliacuteticas e econocircmicas de modernizaccedilatildeo que deram as bases para o plano de Governo

conhecido como Maranhatildeo Novo marcando nesse sentido a introduccedilatildeo de mecanismos

que alterariam profundamente o cenaacuterio espacial maranhense

Nesse sentido a preocupaccedilatildeo em melhorar e ampliar a malha rodoviaacuteria e

ferroviaacuteria em conformidade com a futura implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais tais

como Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) Companhia Vale do Rio Doce (CVRD)

Companhia de Docas do Maranhatildeo (Codomar) e Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR)

contribuiacuteram para uma maior proximidade entre os municiacutepios do interior e a capital

211

maranhense na medida em que as populaccedilotildees rurais movidas pela necessidade de melhores

condiccedilotildees de vida deslocavam-se em grandes quantidades ao longo das deacutecadas de 1970 e

1980 por novas vias pavimentadas e por ferrovias em direccedilatildeo as cidades com melhores

infraestruturas destacando-se Imperatriz e Satildeo Luis

A vinda para a capital do Estado significava na maioria das vezes natildeo o abandono

da terra pelo atrativo urbano mas uma decisatildeo em que prevalecia efetivamente a necessidade

conforme se observa na fala de Ribeiro Junior (2001 p 105) sempre se coloca em debates

que as pessoas vecircm para a cidade com o sonho de morar bem arranjar um bom emprego

mudar de vida Mas na maioria das vezes vem-se para sobreviver 64

A situaccedilatildeo logo se agravava com a permanecircncia do desemprego e a falta de

qualificaccedilatildeo profissional suficiente para o ingresso no mercado de trabalho restando na

maioria das vezes a opccedilatildeo por atuar no setor informal do terciaacuterio ou na construccedilatildeo civil65

Assim todos esses eventos proporcionaram agrave cidade vaacuterias mudanccedilas sendo uma

delas o aumento do contingente populacional Este crescimento populacional desordenado

trouxe problemas de habitaccedilatildeo sauacutede seguranccedila e favoreceu o surgimento de ocupaccedilotildees

irregulares palafitas e favelas

Sobre isso Gomes (1992 p115-116) destaca

Satildeo Luiacutes eacute incapaz de incorporar a vida econocircmica esse acreacutescimo populacional resultando dai uma enorme expansatildeo de palafitas que em 1969 atingiram aproximadamente o nuacutemero de 7000 abrigando uma populaccedilatildeo estimada de 40000 pessoas em condiccedilotildees infra-humanas [] Assim entre 1950 e 1970 a populaccedilatildeo da Capital aumenta de aproximadamente 80 alojando-se sobretudo na zona suburbana pela ocupaccedilatildeo bastante desordenada das aacutereas utilizaacuteveis nas fraldas do espigatildeo constituiacutedo pelo divisor de aacuteguas dos rios Bacanga e Anil

64 Segundo Ribeiro Junior (2001 p 104) ao final dos anos 1970 na pesquisa efetuada pelo governo estadual com o objetivo de analisar a populaccedilatildeo de 07 focos de pobreza da cidade que agregavam 181176 pessoas (Bacanga = 59278 Rio Anil = 56370 Alto do Anil = 25156 Anjo da Guarda = 35212 Vila Vicente Fialho = 3059 Nova Divineacuteia = 1414 Corticcedilos do Centro de Satildeo Luiacutes = 687) deixava claro que a grosso modo em todas as aacutereas de populaccedilatildeo predominantemente pobre excetuando-se a aacuterea de Corticcedilos do Centro predominava a procedecircncia rural entre os que moravam anteriormente em outro lugar fora da ilha 65 De forma cada vez mais intensa o espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes tendeu a ser alterado projetando o setor de construccedilatildeo civil na qual de acordo com Ribeiro Junior (2001) se consolidou efetivamente a partir de obras como o Porto do Itaquiacute o Anel Viaacuterio a Ponte Joseacute Sarney a Barragem do Bacanga a substituiccedilatildeo da velha rede de esgoto do Centro da Cidade (originaacuteria da deacutecada de 1920) a Avenida Meacutedici (hoje Africanos) Ponte Bandeira Tribuzi a 3ordf ponte sobre o rio Anil obra iniciada em 1974 e concluiacuteda em 1980 o aterramento da Ponta D areia ligando o bairro do Satildeo Francisco agrave praia que leva aquele nome transpondo o Igarapeacute

da Jansen a pavimentaccedilatildeo da aacuterea litoracircnea

Calhau Ponta D areia e Olho D aacutegua ligando essas aacutereas a certos bairros da cidade perifeacutericos ou centrais e a construccedilatildeo de inuacutemeros conjuntos habitacionais fizeram da deacutecada de 1970 um periacuteodo de fenocircmeno e expansatildeo da construccedilatildeo civil em Satildeo Luiacutes

212

Foi a partir de entatildeo que o processo de favelizaccedilatildeo da periferia se acentuou e em

1969 Satildeo Luiacutes contava com cerca de 7000 casas tipo palafitas onde habitavam em

condiccedilotildees subumanas algo em torno de 40000 pessoas representando 17 da populaccedilatildeo

urbana (ANDRADE 1984)

Por satildeo Luiacutes natildeo ter nenhum Plano Diretor ateacute a deacutecada de 70 que regulamentasse o uso e ocupaccedilatildeo do solo facilitou o surgimento de vaacuterias palafitas principalmente em aacutereas de mangues em decorrecircncia das mesmas estarem proacuteximas o Centro [] Assim por falta de uma poliacutetica do solo e pela populaccedilatildeo migrante natildeo poder pagar aluguel e transporte a deacutecada de 60 eacute marcada por um processo intenso de ocupaccedilatildeo dos mangues para construccedilatildeo de palafitas que passam abrigar essa populaccedilatildeo proacutexima ao mercado de trabalho (ANDRADE 1984 p 37)

O crescimento urbano criava algumas necessidades para facilitar a integraccedilatildeo das

aacutereas jaacute ocupadas e viabilizar o acesso a outras aacutereas para a habitaccedilatildeo Sendo assim a

construccedilatildeo de pontes era uma alternativa importante para esses ajustamentos

Desse modo no final da deacutecada de 1960 foram construiacutedas as pontes Governador

Newton Bello e Governador Joseacute Sarney ambas sobre o rio Anil e a Barragem do Bacanga

sobre o rio do mesmo nome (Fotografia 6) Estas obras permitiram a expansatildeo da cidade nas

direccedilotildees norte e oeste provocando o aparecimento de grandes conjuntos habitacionais para as

classes de menor poder aquisitivo loteamentos isolados e a regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas

na faixa litoracircnea

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte INPE (1999)

213

Com a construccedilatildeo da ponte Governador Newton Bello foi encurtado o percurso para

o bairro do Olho D aacutegua onde jaacute existiam algumas residecircncias de classe meacutedia e foram

implantados os conjuntos habitacionais Ipase Maranhatildeo Novo e Cohama Jaacute com a

construccedilatildeo da ponte Governador Joseacute Sarney foram implantados os conjuntos habitacionais

do BASA Renascenccedila e os loteamentos Satildeo Francisco e IPEM do Calhau aleacutem de propiciar a

ocupaccedilatildeo espontacircnea das aacutereas proacuteximas agrave cabeceira da Ponte por moradores de baixa renda

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

A Barragem do Bacanga facilitou o acesso ao Porto do Itaquiacute com o encurtamento

no seu trajeto em 22 km e contribuiu para o assentamento de famiacutelias de baixo poder

aquisitivo no loteamento Anjo da Guarda

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1970 as ocupaccedilotildees concentravam-se principalmente nas proximidades dos rios Anil e Bacanga natildeo se estendendo muito aleacutem dos arredores do centro Posteriormente outras localidades da cidade passam a ser palco desse processo formando aacutereas com ampla concentraccedilatildeo de populaccedilatildeo carente como o Itaquiacute-Bacanga

assim conhecido apoacutes a inauguraccedilatildeo oficial do Porto do Itaquiacute em 1971 (DINIZ 2007 p 171)

Sendo assim nesse processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano observa-se a accedilatildeo dos

agentes sociais Estado Imobiliaacuterios e Incorporadores interessados na reproduccedilatildeo do capital

por meio da valorizaccedilatildeo da cidade

Para dar seguimento ao eixo viaacuterio da ponte Governador Joseacute Sarney foi construiacuteda a Avenida Colares Moreira que propiciou crescimento urbano da aacuterea do bairro do Satildeo Francisco com a construccedilatildeo dos conjuntos habitacionais (Basa Jardim Satildeo Francisco e Renascenccedila) aleacutem dos modernos edifiacutecios comerciais e de prestaccedilatildeo de serviccedilos que valorizaram e aumentaram consideravelmente o preccedilo do solo (ANDRADE 1984 p 23)

Portanto a construccedilatildeo de tais pontes significou maiores possibilidades de se

materializar a reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e do capital haja vista a valorizaccedilatildeo das terras

localizadas nos mencionados setores o que tornou bastante oportuno o investimento puacuteblico e

privado em novas vias de acesso assim como em demais equipamentos urbanos

Vale ressaltar que a Cohab-MA construiu entre os anos 1967 e 1970 trecircs conjuntos

habitacionais que representaram 2438 unidades residenciais (505 relativas ao Anil I 516

concernentes ao Anil II e 1417 decorrentes do Anil III) tendo como investimento total US$

2742060 (dois milhotildees setecentos e quarenta e dois mil e sessenta doacutelares) gerando 9752

empregos diretos conforme tabela 9

214

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970

Ano Conjunto Habitacional Nordm de Unidades

Valor do Investimento (US$)

Nordm de Empregos

1967 Anil I 505 694950 2020 1969 Anil II 516 712270 2064 1970 Anil III 1417 1334840 5668

Total 2438 2742060 9752 Fonte Luz (2004 p 65)

Nesse sentido a atuaccedilatildeo do Estado visou estruturar a cidade mais precisamente no

que diz respeito agrave ampliaccedilatildeo das vias de acesso por meio da articulaccedilatildeo das esferas estaduais

e federal desencadeando um processo de valorizaccedilatildeo das terras nos setores nortenordeste e

oeste e reorientandoincentivando a reproduccedilatildeo do capital e do espaccedilo urbano

Aleacutem disso sua atuaccedilatildeo tambeacutem pode ser caracterizada como agente promotor

imobiliaacuterio uma vez que possibilitou a construccedilatildeo de unidades habitacionais por intermeacutedio

dos IAPs e Cohab aquecendo dessa forma a economia mediante a quantia de capital

investido e a geraccedilatildeo de empregos impulsionando o poder de atraccedilatildeo da cidade que por seu

turno natildeo estava preparada para tal

Destarte a partir de 1970 foram definidas novas perspectivas de crescimento da

cidade com a decisatildeo do Governo Federal em escoar o mineacuterio da Serra dos Carajaacutes pelo

porto de Satildeo Luiacutes e de implantar um complexo sideruacutergico na Ilha Foram entatildeo implantados

novos loteamentos e construiacutedos grandes conjuntos habitacionais em vaacuterios locais da Ilha sob

o incentivo do BNH conforme verificado no quadro 7

215

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990

Ocupaccedilatildeo Ano Famiacutelias Sujeitos e Forccedilas poliacuteticas Saacute Viana 1961 1200 Igreja Catoacutelica Estudantes e Poliacutecia Militar Redenccedilatildeo 1966 600 IgrejaArcebispado Governo do Estado e Poliacutecia Militar Santa Cruz 1967 2000 Poliacutecia Militar e Prefeitura Coroado 1969 1000 Igreja Catoacutelica Prefeitura e Poliacutecia Militar

Vila Palmeira 1969 4000 Governo do Estado Vila Nova 1972 1000 Governo do Estado

Coroadinho 1977 3000 Igreja Catoacutelica e Prefeitura Vila Padre Xavier

1980 800 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB) e Governo do Estado

Vera Cruz 1980 300 Partidos de Esquerda (MDB) Governo do Estado Lideranccedilas Comunitaacuterias e Igreja

Satildeo Bernardo 1981 2000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Joatildeo de Deus 1981 3000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Bom Jesus 1982 3000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Itamar 1983 2000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Mauro Fecury II

1990 4000 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura

Vila Satildeo Luiacutes 1990 1300 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura TOTAL 29200

Fonte Luz (2004 p 69)

Assim eacute introduzida a preocupaccedilatildeo com o ordenamento do processo de expansatildeo

urbana que se traduz nos primeiros esboccedilos de articular um planejamento viaacutevel agrave cidade de

Satildeo Luiacutes Nesse sentido a Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes realizou uma seacuterie de estudos e

de propostas urbaniacutesticas no sentido de fornecer elementos teacutecnicos para instrumentar o

Poder Puacuteblico no processo de planejamento e desenvolvimento urbano da cidade

Esses estudos culminaram na elaboraccedilatildeo do Plano Diretor de Satildeo Luiacutes de 1977

constituindo-se em instrumentos importantes para o conhecimento da realidade social urbana

e ambiental de Satildeo Luiacutes bem como para determinar as diretrizes do uso e ocupaccedilatildeo territorial

do sistema viaacuterio e transportes do Municiacutepio e seu zoneamento urbano

De acordo com Ribeiro Junior (2001) esses estudos66 apontaram os problemas que

possivelmente a cidade enfrentaria em decorrecircncia da transformaccedilatildeo na sua estrutura urbana

66 Dentre os estudos cabe destaque 19671968

Pesquisa sobre o Desenvolvimento Urbano de Satildeo Luiacutes 19671968

Desenvolvimento Urbano da Aacuterea do Itaqui 1971 - Estudo de Viabilidade Teacutecnico-Econocircmica do

216

e econocircmica frente aos investimentos anunciados Entre eles estatildeo o esvaziamento do centro

histoacuterico e o avanccedilo da ocupaccedilatildeo urbana nas aacutereas de manguezais

Em 1973 surgiu a primeira proposta concreta de erradicaccedilatildeo das palafitas com o

Programa de Despalafitaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes67 por meio de assinatura de convecircnio entre a

Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes e o BNH no valor de 10 milhotildees de cruzeiros Seria dado agrave

cidade um crescimento urbaniacutestico disciplinado e a complementaccedilatildeo de infraestrutura e

saneamento total dos bairros sob intervenccedilatildeo como a construccedilatildeo de calccediladas e a implantaccedilatildeo

de equipamentos comunitaacuterios

Posteriormente outros projetos foram elaborados na tentativa de controlar o

crescimento desordenado

da cidade Sendo que no governo de Joatildeo Castelo iniciado em 15

de marccedilo de 1979 ter-se-ia pela frente entre outras metas a de solucionar o problema

habitacional em Satildeo Luiacutes que jaacute despontava nesse principio de deacutecada como fator expressivo

de atraso social e reflexo direto do mau planejamento das administraccedilotildees anteriores

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

Eacute importante destacar que as intervenccedilotildees municipais e estatais no espaccedilo urbano de

Satildeo Luiacutes natildeo representaram a possibilidade de acesso agrave moradia para uma parte da populaccedilatildeo

isso porque as unidades habitacionais natildeo atenderam agrave demanda e os planos e projetos

relativos agrave urbanizaccedilatildeo foram desvirtuados e natildeo efetivados uma vez que a Surcap acabou se

apresentando como uma empresa imobiliaacuteria possibilitando a accedilatildeo de apropriadores de terras

Diniz (2007) argumenta que no final da deacutecada de 1970 o Estado do Maranhatildeo

apresentou um desenvolvimento econocircmico relevante graccedilas agrave implantaccedilatildeo dos capitais

industriais Esse surto industrial trouxe na deacutecada seguinte mudanccedilas significativas na

estrutura soacutecioespacial da cidade causadas especialmente pelo aumento do contingente

populacional que duplicou nesse periacuteodo

A implantaccedilatildeo desses grandes projetos e o comeacutercio paralelo surgido em decorrecircncia dessas novas instalaccedilotildees podem ter sido os fatores motivadores do crescimento populacional em Satildeo Luis na deacutecada de 1980 Segundo dados estatiacutesticos do IBGE em 1980 Satildeo Luiacutes apresentava um contingente populacional de 449887 habitantes o que correspondia a pouco mais de 12 da populaccedilatildeo estadual concentrada na zona urbana (DINIZ 2007 p 170)

Desenvolvimento Decenal e Plano Diretor dos Portos de Itaqui e Mucuripe 1972 - Estudo de um Estaacutedio para a Cidade de Satildeo Luiacutes 1972

Plano de Desenvolvimento Turiacutestico do Maranhatildeo 19721974

Programa de Recuperaccedilatildeo de Aacutereas Alagadas

Projeto Kennedy e Bares 19721975

Estudos de Viabilidade para Implantaccedilatildeo da Central de Abastecimento de Satildeo Luiacutes 1977

Plano Diretor de Satildeo Luiacutes (LUZ 2004) 67 O Plano objetivava a recuperaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo das aacutereas alagadas de Satildeo Luiacutes abrangendo um total de 8 mil palafitas (RIBEIRO JUNIOR 2001)

217

Paralelamente a isso se acelerou tambeacutem a ocupaccedilatildeo desordenada por contingentes

populacionais de menor poder aquisitivo nas aacutereas alagadiccedilas e nos manguezais Esse

crescimento se direcionou segundo trecircs vetores

1) Em direccedilatildeo ao norte da Ilha compreendendo a orla mariacutetima e as aacutereas situadas

entre os conjuntos habitacionais recentemente implantados

2) Em direccedilatildeo a parte leste acompanhando a ligaccedilatildeo rodoviaacuteria com os outros dois

municiacutepios da Ilha

3) Em direccedilatildeo sul acompanhando a ligaccedilatildeo rodo-ferroviaacuteria da Ilha com o

continente (LUZ 2004)68

Pode-se notar tambeacutem a forte ocorrecircncia de zonas palafitadas principalmente agraves

margens do Rio Anil e nas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees pelo fluxo das mareacutes (Fotografia 7)69

Ao longo da orla mariacutetima existe uma predominacircncia de residecircncias de alto padratildeo com fraco

adensamento e glebas com grandes aacutereas de especulaccedilatildeo (Fotografia 8)

68 Segundo Luz (2004) a Ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se dividida em quatro setores bem definidos por meio de dois corredores viaacuterios o primeiro do Porto Itaqui ateacute Satildeo Joseacute de Ribamar atravessando a Ilha no sentido oeste-leste e o segundo do Olha D aacutegua ateacute o Estreito dos Mosquitos uacutenica ligaccedilatildeo da Ilha com o continente e que se desenvolve no sentido norte-sul Setores o setor noroeste

se caracteriza pela predominacircncia de conjuntos habitacionais do padratildeo de classe meacutedia a alta vaacuterios loteamentos aleacutem da parte da zona central da cidade de Satildeo Luiacutes o setor nordeste

se caracteriza pela presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares nas proximidades dos eixos viaacuterios quase toda aacuterea apresenta caracteriacutesticas rurais e encontra-se comprometida com grandes loteamentos o setor sudeste

eacute caracterizado por vastas glebas com atividades rurais muitos povoados grandes aacutereas institucionais alguns loteamentos e conjuntos habitacionais populares Grande parte deste setor estaacute reservado a atividade industriais onde jaacute se encontram instaladas a maioria das induacutestrias de porte meacutedio de Satildeo Luiacutes O setor sudoeste embora apresente caracteriacutesticas rurais se encontra em fase de transiccedilatildeo com a cessatildeo das terras para o uso industrial Neste setor estatildeo instaladas as grandes induacutestrias o complexo portuaacuterio o Campus Universitaacuterio do Bacanga e a reserva florestal Nas proximidades do centro de Satildeo Luiacutes eacute notada a presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares e aglomeraccedilotildees urbanas com residecircncias de baixo padratildeo assentadas desordenadamente 69 Paulatinamente avanccedilava-se nas ocupaccedilotildees tomando a direccedilatildeo das aacutereas perifeacutericas da capital na proporccedilatildeo em que aumentavam o nuacutemero de famiacutelias vindas do interior do Estado englobando novas caracteriacutesticas ao mapa habitacional da ilha

218

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte PEMAS (2004)

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Portela (2010)

Na aacuterea norte da ilha a interligaccedilatildeo entre o centro e a regiatildeo das praias com a

construccedilatildeo da Ponte Joseacute Sarney marcou a formaccedilatildeo de uma aacuterea nobre da cidade (Satildeo

Francisco Renascenccedila Calhau Ponta D areia Satildeo Marcos Olho D aacutegua) onde os negoacutecios

imobiliaacuterios ganharam grande projeccedilatildeo na deacutecada de 1980 caracterizando-se pela

verticalizaccedilatildeo das construccedilotildees

219

Num periacuteodo de menos de 10 anos abrangendo toda a deacutecada de 1970 foram criados

18 conjuntos habitacionais para atender a procura do segmento social de renda meacutedia

conforme tabela 10

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e Cooperativas 1971-1980

Ano Entidade Financiadora Conjunto Habitacional Nordm de Unidades 1971 Cohab Sacaveacutem 476 1973 Cohab Radional 366 1975 Cooperativa Cohama 700 1976 Cohab Anil IV 1111 1977 Cooperativa Cohapa 41

1978

Cooperativa Cohaserma 364

Cohapam 100

Cohajap 331

Cohatrac I 875

Cohajoli 50 Cohab Bequimatildeo 1190

Vinhais 1627

Hab Turuacute 767

1979

Cohab Rio Anil 365

Angelim 654 Cooperativa Coharev 160

Cohajapa 38 1980 Cooperativa Cohafuma 482

Total 9697 Fonte Luz (2004 p 70)

A partir da deacutecada de 1980 a ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes deu-se de

maneira acelerada e desarticulada Isso porque o governo federal elaborou o Programa de

Desenvolvimento Integrada da Amazocircnia Oriental como uma poliacutetica territorial regional que

visava agrave implantaccedilatildeo de grandes projetos destinados exclusivamente a mineraccedilatildeo

metalurgia agropecuaacuteria e reflorestamento

Durante toda a segunda metade da deacutecada de 1970 especulava-se sobre as profundas transformaccedilotildees estruturais que a capital do Estado atravessaria na qual Satildeo Luiacutes seria o palco de grandes empreendimentos industriais Tal previsatildeo ao passo que fomentava a euforia de grande parcela da populaccedilatildeo carente e desempregada servia ainda de motivaccedilatildeo para o homem do campo

que via uma razatildeo a mais para abandonar sua terra em busca de oportunidades de trabalho (LUZ 2004 p 68)

220

Muitos outros projetos expuseram a Amazocircnia a novos fluxos migratoacuterios O projeto

Carajaacutes por exemplo estabeleceu um poacutelo de desenvolvimento percorrendo o sul do Paraacute ateacute

a cidade de Satildeo Luiacutes no Maranhatildeo Paralelamente a accedilatildeo madeireira serviu e ainda serve

como ponta de lanccedila para outros projetos como os agropecuaacuterios em torno dos quais se

estabeleceu uma arena de conflitos entre agricultores sem terra e grandes latifundiaacuterios Na

consolidaccedilatildeo dos Grandes Projetos e dos latifuacutendios criou-se um ecircxodo rural onde pequenos

agricultores e outros migraram para diferentes locais principalmente para as cidades

amazocircnicas

A implantaccedilatildeo do Programa Grande Carajaacutes (PGC) e a instalaccedilatildeo de grandes

induacutestrias tiveram um grande impacto na cidade provocando um enorme crescimento

populacional aleacutem disso esses projetos foram implantados sem a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo

local natildeo levando em consideraccedilatildeo as peculiaridades econocircmicas sociais e culturais locais e

sem a devida preocupaccedilatildeo com a aplicaccedilatildeo dos recursos financeiros necessaacuterios para

produccedilatildeo de uma infraestrutura que suportasse tal crescimento

Segundo estudos realizados por Castro e Acevedo Marin (1991) e Almeida (1995)

os processos migratoacuterios na Amazocircnia entre as deacutecadas de 1970 e 1980 estiveram fortemente

marcados por intensos fluxos de nordestinos especialmente de maranhenses gauacutechos e

mineiros que contribuiacuteram decisivamente para aumentar o nuacutemero de povoados dos quais

alguns se colocaram como embriotildees de formaccedilatildeo de novos municiacutepios A construccedilatildeo da

Estrada de Ferro na deacutecada de 1980 intensificou a migraccedilatildeo redirecionando os migrantes

nordestinos goianos e mineiros da Transamazocircnica para outras aacutereas do sudeste do Paraacute e

sudoeste do Maranhatildeo O crescimento da populaccedilatildeo atingiu todos os municiacutepios ao longo da

Estrada de Ferro Carajaacutes Cresceu assim a populaccedilatildeo concentrada nas cidades de Marabaacute no

Paraacute Imperatriz e Accedilailacircndia no Maranhatildeo nos antigos povoados de ParauapebasRio Verde

(atualmente cidade de Parauapebas) Km 30 (hoje Curionoacutepolis) e o Km 3 (Eldorado de

Carajaacutes)

situados nas proximidades das aacutereas de lavra da CVRD e dos garimpos

ligados

entre si pela PA-275 e suas vicinais

Heacutebette (2004) em suas investigaccedilotildees ressalta que a aacuterea geograacutefica abrangida pelo

PGC (hidreleacutetrica de Tucuruiacute Poacutelo de Gusa Ferrovia de Carajaacutes

que corta a Ponta da

Madeira a qual atravessa os vales do Parauapebas Itacauacutenas Tocantins Araguaia e corre

paralela aos vales do Pindareacute e do Mearim alcanccedilando a ilha de Satildeo Luiacutes

e exploraccedilatildeo

mineral) sofreu profundas transformaccedilotildees resultantes da pressatildeo de integrar a Regiatildeo Norte

do Paiacutes agrave dinacircmica econocircmica e poliacutetica nacional implementadas a partir dos poacutelos

221

industriais urbanos Aleacutem disso afirma que o PGC exerceu papel redefinidor do aspecto

econocircmico poliacutetico e social da regiatildeo70

Integrar a Amazocircnia ao capitalismo significa inseri-la plena e definitivamente no mercado nacional e internacional nas trocas mediadas pelo dinheiro sob a eacutegide do capital industrial e financeiro Significa transformar seus recursos naturais em valores que pudessem ser incorporados ao circuito das trocas monetaacuterias com a produccedilatildeo industrial nacional e internacional isto eacute se tornar parte integrante da circulaccedilatildeo do capital Isso natildeo podia ser realizado sem a mobilizaccedilatildeo do trabalho que valorize esses recursos (terra mata mineacuterio) isto eacute sem a formaccedilatildeo de um mercado de forccedila de trabalho (HEacuteBETTE 2004 p 62)

Originalmente o PGC foi anunciado como um projeto integrado constituindo o

maior programa de desenvolvimento integrado do mundo que aleacutem da exploraccedilatildeo mineral

incluiacutea projetos agropecuaacuterios silvicultores e de industrializaccedilatildeo Sua implantaccedilatildeo obedeceria

a um zoneamento de acordo com o qual foram definidas as seguintes zonas industriais

Barcarena Marabaacute Serra dos Carajaacutes Satildeo Luiacutes Tucuruiacute e Imperatriz Dos problemas de

ordem fundiaacuteria ficariam encarregados os oacutergatildeos competentes com ecircnfase para o Instituto

Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria (INCRA) Todavia tratou-se de uma integraccedilatildeo

agrave economia capitalista e agrave sociedade burguesa moderna (ALMEIDA 1995)

Vale enfatizar que o PGC ergueu-se como um marco no processo de organizaccedilatildeo do

espaccedilo e definiccedilatildeo do territoacuterio no sudeste paraense e sudoeste maranhense No contraditoacuterio

mega-projeto atuam Estado e iniciativa privada e sob um contexto de avanccedilo de uma nova

etapa do processo de produccedilatildeo capitalista tem conferido agraves empresas multinacionais e

transnacionais hegemonia (CARNEIRO 1994)

Entretanto nota-se que a integraccedilatildeo da fronteira ateacute hoje natildeo proporcionou a

industrializaccedilatildeo capitalista da regiatildeo e que o setor onde se tem dada a acumulaccedilatildeo industrial

e que se desenvolveu foi o da construccedilatildeo (em parte construccedilatildeo habitacional mas sobretudo a

construccedilatildeo de grandes obras puacuteblicas) com a instalaccedilatildeo de grandes firmas construtoras

inclusive de padratildeo internacional (HEacuteBETTE 2004 p 66)

Heacutebette (2004) ressalta que o interesse seletivo do capital se concentrou em torno da

terra da madeira de alguns mineacuterios como manganecircs bauxita e ouro Mas como o interesse

70 O PGC sob responsabilidade da CVRD tinha por objetivo a exploraccedilatildeo das reservas de mineacuterio de ferro ouro e outros minerais em Carajaacutes e dispunha de uma aacuterea geograacutefica que englobava terras situadas entre os rios Amazonas Parnaiacuteba e Xingu ao norte do paralelo 8ordm (oito graus) e compreendia uma aacuterea de cerca de 900 mil kmsup2 incluindo parte do estado do Paraacute Maranhatildeo e Goiaacutes (hoje Tocantins) abrangendo uma proviacutencia mineral extremamente rica e diversificada em recursos (ferro manganecircs cobre bauxita niacutequel ouro) aleacutem disso comporta grande parte da bacia do Araguaia-Tocantins

222

do capital se cruzou com o interesse dos trabalhadores a procura sempre se deu em forma de

uma luta de classes Assim a luta mais conhecida foi pela terra

Dessa forma Castro e Acevedo Marin (1991) argumentam que a luta pela terra eacute

uma questatildeo central quando se analise a realidade social no sudeste do Paraacute uma vez que eacute

marcada por uma dinacircmica econocircmica social e poliacutetica especifica Nessa complexa realidade

competem pelo domiacutenio do espaccedilo e dos recursos naturais atores como empresas de

mineraccedilatildeo (CVRD) pecuaristas Estado madeireiros sem terra assentados posseiros e

garimpeiros Sindicato de Trabalhadores Rurais instituiccedilotildees confessionais

A gestatildeo do territoacuterio de Carajaacutes desvenda a essecircncia logiacutestica dos grandes projetos associados agrave nova ordem cientiacutefico-tecnoloacutegico Carajaacutes eacute um segmento localizado de um conjunto de escala planetaacuteria um espaccedilo transnacional em construccedilatildeo [] Os conflitos e contradiccedilotildees locais e o caraacuteter da gestatildeo da Companhia autocircnoma e baseada no saber teacutecnico-cientiacutefico traduzem-se em dispositivos de controle que fecham o territoacuterio de Carajaacutes transformando-o em verdadeira cidadela (BECKER 1994 p339-340)

Os grupos sociais (sem terra assentados posseiros garimpeiros) foram alijados das

poliacuteticas puacuteblicas e envolvidos em uma luta intensa constituiacuteram uma forccedila de mudanccedila de

forma que organizados ou natildeo ocuparam terras plantaram e deram origem a uma pecuaacuteria

extensiva reestruturando a configuraccedilatildeo espacial

Para muitas famiacutelias ludovicenses a implantaccedilatildeo de grandes complexos industriais

em terras maranhenses iria repercutir como um problema a mais de acordo com o que

Gistelinck (1988 p32) afirma no trecho a seguir

Em 1974 o governo estadual entregou mais de 3000 hectares a CVRD inclusive a praia do Boqueiratildeo a praia dos pescadores e do povo do Anjo da Guarda sem resolver no entanto os problemas habitacionais para os moradores da aacuterea Cinco anos depois mais de 10000 hectares foram entregues a ALUMAR Em torno de 4000 famiacutelias perderam de um dia para o outro o seu sustento da roccedila e da pesca Nos dois casos as famiacutelias foram indenizadas pelas benfeitorias muitas vezes de maneira arbitraacuteria mas natildeo foram criadas novas condiccedilotildees de trabalho adaptados a capacidade da populaccedilatildeo

Tal situaccedilatildeo muito se assemelha ao quadro de desapropriaccedilatildeo de terras das aacutereas do

interior do Estado e que possibilitou a expulsatildeo de inuacutemeras famiacutelias para a capital Com isso

tem-se que os agravantes surgem como desdobramentos da accedilatildeo governamental mal

planejada ou planejada sem considerar os interesses das camadas mais pobres da sociedade

223

Carneiro (1994) sintetiza a disputa pelo controle do territoacuterio na aacuterea de abrangecircncia

do PGC como um palco de transformaccedilotildees ocasionados por conflitos e pelos diferentes

interesses gerados para se definir a gestatildeo do territoacuterio e a resoluccedilatildeo dos interesses contraacuterios

e diversos dos atores presentes no mesmo

Contudo Almeida (1995) adverte que eacute o Estado que impotildee accedilotildees de coerccedilatildeo contra

camponeses na medida em que impulsiona via incentivos fiscais e concessotildees de extensas

aacutereas de terras a grupos empresariais escudados na maior racionalidade econocircmica e

inovaccedilotildees teacutecnicas ocasionando no monopoacutelio da terra nos mecanismos de imobilizaccedilatildeo e

em atos coercitivos como forma de resoluccedilatildeo de conflitos agraacuterios demonstrando a face

autoritaacuteria da modernizaccedilatildeo que tem na violecircncia um elemento inerente agrave disputa pela terra

na fronteira

Nesse sentido a realidade de desorganizaccedilatildeo social que se esboccedilava culminava

inevitavelmente num clima de insatisfaccedilatildeo e protesto reflexo da situaccedilatildeo de crise nacional

em meio ao esgotamento do modelo econocircmico imposto durante o regime militar que se

manifestava na queda do emprego e dos salaacuterios refletindo-se no rebaixamento histoacuterico das

condiccedilotildees de moradia das classes populares em todo o paiacutes

Assim novas tentativas de solucionar o problema habitacional eram implementadas

sem o sucesso esperado pelos oacutergatildeos da administraccedilatildeo puacuteblica Um dos projetos amplamente

propagandeados no final dos anos 1970 foi o PROMORAR que segundo levantamento

realizado pela UFMA em 1981 na eacutepoca de sua implantaccedilatildeo tinha como meta atingir 23

dos habitantes da ilha Sendo que a maioria dessa populaccedilatildeo procedia do interior e 87 tinha

em meacutedia uma renda familiar mensal de dois salaacuterios miacutenimos tratando-se portanto

principalmente de pessoas oriundas do campo desempregadas subempregadas como

biscateiros pedreiros lavadeiras e empregadas domesticas (LUZ 2004)

Os resultados do PROMORAR pouco significaram como soluccedilatildeo do problema habitacional em Satildeo Luis sendo construiacutedas e comercializadas somente 185 unidades habitacionais com baixa qualidade do material utilizado e inuacutemeras deficiecircncias detectadas nas construccedilotildees (LUZ 2004 p57)

Ainda no inicio dos anos 1980 o governo estadual arquitetou a efetivaccedilatildeo de dois

grandes complexos habitacionais para as camadas mais pobres da populaccedilatildeo contando

inclusive com unidades de 01 (um) cocircmodo somente

224

Com a valorizaccedilatildeo das aacutereas nobres foram construiacutedos grandes conjuntos habitacionais tais como a Cidade Operaacuteria (que teve suas obras iniciadas em 1981 numa primeira etapa quando foram levantadas 1500 unidades sendo concluiacuteda em 1987) com 7500 unidades ao todo o Conjunto Jardim Ameacuterica Satildeo Raimundo e o Maiobatildeo (julho82) com 4470 unidades ambos distantes do nuacutecleo central da cidade (16 km e 20 km respectivamente) sendo este uacuteltimo construiacutedo em aacuterea formalmente pertencente ao municiacutepio de Paccedilo do Lumiar (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 98)

Uma das preocupaccedilotildees amplamente mencionadas durante a construccedilatildeo da Cidade

Operaacuteria e do Maiobatildeo eacute que ambas estivessem localizadas perto do receacutem-inaugurado

Distrito Industrial de Satildeo Luiacutes para que houvesse a associaccedilatildeo direta de proximidade entre o

local de trabalho e o trabalhador

Outro poacutelo importante que se formou nos uacuteltimos 30 anos foi ao nordeste da Ilha no

sentido de Satildeo Luiacutes aos Municiacutepios vizinhos de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar Essa

regiatildeo se caracteriza por abrigar uma seacuterie de conjuntos habitacionais populares com alta

densidade populacional

A populaccedilatildeo total de Satildeo Joseacute de Ribamar cresceu a uma taxa anual de 736 saltando de 32320 habitantes em 1980 para 70581 em 1991 O municiacutepio de Paccedilo do Lumiar recebeu tambeacutem um forte impacto populacional evoluindo de pouco mais de 17 mil habitantes em 1980 para 53195 habitantes em 1991 com uma taxa anual de 1080 e crescimento relativo de 22176 (o maior entre os municiacutepios do Estado) (MARANHAtildeO 1997 p 27)

Com esse avanccedilo sobre os espaccedilos vazios da ilha surge uma disparidade gritante em

relaccedilatildeo aos dados populacionais das aacutereas urbana e rural de Satildeo Luis principalmente em

relaccedilatildeo agrave infraestrutura dos novos segmentos habitacionais jaacute que muitos conjuntos e bairros

receacutem inaugurados localizavam-se em regiotildees da zona rural mas mantinham perfil

eminentemente urbano uma vez que atividades primaacuterias natildeo eram neles praticadas ou seja

as periferias de Satildeo Luis natildeo eram ocupadas somente pelas camadas mais pobres mas

tambeacutem conjuntos e bairros eram construiacutedos nos arredores da cidade trazendo consigo todo o

conforto e modernidade para suprir a demanda da classe meacutedia71

A partir da deacutecada de 1990 houve uma consolidaccedilatildeo da tendecircncia que se manifestara

outrora como um surto mas que ganhava agora sintomas de permanecircncia e impressotildees de

71 Com a promulgaccedilatildeo da Lei Orgacircnica do Municiacutepio (LOM) em abril de 1990 foi definido a zona urbana da cidade compreendendo as aacutereas de edificaccedilatildeo contiacutenua das povoaccedilotildees e as partes adjacentes que possuam meio fio calccedilamento abastecimento de aacutegua rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica escola primaacuteria postos de sauacutede e arruamentos (RIBEIRO JUNIOR 2001)

225

descontrole Nesse sentido conveacutem referenciar sobre a continuidade no avanccedilo do

movimento de luta pela posse da terra por meio das ocupaccedilotildees urbanas que saturando as

aacutereas tradicionalmente centrais da cidade ocupavam paulatinamente as periferias a ponto de

adentrar em terras situadas aleacutem das fronteiras da capital do Estado

De 1994 a 2000 inuacutemeras novas ocupaccedilotildees foram criadas em solo ludovicense

marcando um periacuteodo de luta e resistecircncia

aspectos presentes em muitos desses movimentos

de luta pela moradia conforme se constata na argumentaccedilatildeo de Luz (2004 p 78)

Num clima de verdadeira guerra onde a resistecircncia popular tem muitas vezes vencido dando margem agrave formaccedilatildeo de diversos bairros em Satildeo Luiacutes que permanecem precaacuterios por falta de atenccedilatildeo do Estado e do Municiacutepio mas representam a alternativa possiacutevel para aqueles que natildeo podem mais viver no interior

De acordo com Ribeiro Junior (2001) ao se verificar as manchetes de revistas e

jornais da eacutepoca pode-se constatar um amplo panorama da situaccedilatildeo uma vez que a forma

violenta como se desenrolaram os processos de ocupaccedilatildeo explicam a grande repercussatildeo A

exemplo disso tem-se o caso da Cidade Oliacutempica que virou um verdadeiro inferno ontem

pela manhatilde quando a Poliacutecia Militar armada ateacute os dentes invadiu a aacuterea ocupada e

promoveu destruiccedilatildeo espancamentos e prisotildees cenas de horror presenciadas por muitas

crianccedilas que tambeacutem estavam abrigadas na aacuterea

(JORNAL PEQUENO 1997 apud LUZ

2004 p 78)

Esse exemplo chama a atenccedilatildeo entre outros aspectos para um ponto inevitavelmente

discutiacutevel o alarmante deacuteficit de moradias em Satildeo Luiacutes que por sua vez traz como pano de

fundo

a defasagem da estrutura poliacutetica social e econocircmica do Estado Em outras palavras o

que se vecirc na capital maranhense no final do seacuteculo XX traduz-se no descontrole e

incapacidade do Estado em garantir condiccedilotildees de moradia a toda agrave populaccedilatildeo refletindo-se

por meio da proliferaccedilatildeo incontida de ocupaccedilotildees sem a miacutenima infraestrutura

A valorizaccedilatildeo de aacutereas mais proacuteximas do centro da cidade assim como de conjuntos

habitacionais e a consolidaccedilatildeo de aacutereas nobres geraram alta no preccedilo dos alugueacuteis e tornaram

distante para muitos o sonho da casa proacutepria conduzindo as populaccedilotildees de menor poder

aquisitivo cada vez mais para longe do Centro da Ilha

Nesse sentido vai se formando gradualmente uma seacuterie de pequenos

estabelecimentos como quitandas oficinas e lojas que servindo de base de sustento para

inuacutemeras famiacutelias ajudam a compor o quadro espacial dos bairros pobres de Satildeo Luiacutes

226

As atividades alternativas que geralmente se apresentam ao pobre desempregado e

desqualificado natildeo datildeo muitas opccedilotildees de escolha estando o setor do comeacutercio informal entre

as ocupaccedilotildees mais comuns conforme afirma Diniz (2005 p81)

O grande crescimento do setor terciaacuterio informal da economia maranhense deve-se a diversos fatores entre os quais a facilidade de acesso a esse tipo de atividade pois se trata de um negoacutecio que natildeo requer grandes investimentos tampouco necessita de matildeo-de-obra especializada assim como os produtos oferecidos nesse mercado tem boa aceitaccedilatildeo pelos consumidores que na maioria satildeo de classe baixa soacute tendo acesso muitas das vezes a esse tipo de comeacutercio

Principalmente ao longo da deacutecada de 1990 assistiu-se a efetiva incorporaccedilatildeo do

universo das ocupaccedilotildees urbanas ao cotidiano social ludovicense A ocorrecircncia desse

fenocircmeno fez surgir novas linhas de transporte coletivo obedecendo a uma demanda

crescente de usuaacuterios nas aacutereas perifeacutericas

A partir desse quadro do processo de ocupaccedilatildeo territorial de Satildeo Luiacutes pode-se

perceber que nos uacuteltimos anos o Municiacutepio sofreu um acelerado processo de espraiamento

urbano com o consequumlente inchaccedilo populacional levando ao comprometimento da qualidade

do seu espaccedilo urbano

Assim em meio agrave proliferaccedilatildeo de ocupaccedilotildees em direccedilatildeo a periferia da cidade a

organizaccedilatildeo espacial ludovicense convergia para a instabilidade na medida em que a falta de

planejamento espacial gradativamente gerava consequumlecircncias diversas a sociedade

evidenciando o descontrole da situaccedilatildeo por parte da administraccedilatildeo puacuteblica

Nesse sentido levando em consideraccedilatildeo o alto iacutendice de crescimento populacional da

grande Satildeo Luiacutes assim como o conjunto de mudanccedilas em sua organizaccedilatildeo espacial articulou-

se a consolidaccedilatildeo de um perfil soacutecio-econocircmico numa tentativa de sintonia com os padrotildees de

modernidade do mundo capitalista Tal perspectiva pode ser comprovada na evidecircncia da

velha dualidade entre ricos e pobres bairros nobres e ocupaccedilotildees de submoradias sendo esse

aspecto considerado por Ribeiro Junior (2001 p 94) como fator de segregaccedilatildeo em funccedilatildeo da

organizaccedilatildeo dos referidos conjuntos como se refere no trecho a seguir

Cinde-se como de praxe o habitat para os ricos e o habitat para as pobres no complexo urbano revelando-se a estratificaccedilatildeo contida na anaacutelise de Freyre aquele dos Sobrados e Mucambos em equivalecircncia ao existente no rural onde vingavam Casas Grandes e Senzalas unidades pertencentes ao sistema organizacional da civilizaccedilatildeo tropical brasileira contrastante socialmente

227

O crescimento residencial agrave direita do rio Anil (aacuterea da orla mariacutetima) se deu

predominantemente por conjuntos habitacionais de classe meacutedia e meacutedia alta (Satildeo Francisco

Renascenccedila Ponta D Areia Calhau Cohafuma etc) separados por enormes vazios em

virtude da existecircncia de vastos manguezais Nessa regiatildeo inclusive foi localizado o novo

poacutelo administrativo do Governo Estadual com a transferecircncia de diversos oacutergatildeos da

administraccedilatildeo puacuteblica que estavam no centro histoacuterico Do mesmo modo foram instalados

modernos edifiacutecios residenciais shoppings centers e uma seacuterie de serviccedilos

escolas e

universidades particulares comeacutercio especializado etc

para atender essa classe meacutedia que

ali se instalou Atualmente essa eacute a aacuterea de maior dinamismo imobiliaacuterio e econocircmico da

cidade (DINIZ 2007)

Logo se tecircm que a concentraccedilatildeo urbana historicamente composta pelo distrito

central de Satildeo Luiacutes e pelo distrito do Anil era gradativamente suplantada pela acelerada

formaccedilatildeo de nuacutecleos e povoados nos arredores da cidade aproximando-se de maneira

acelerada da fronteira de outros municiacutepios da ilha segundo se observa nos dados de Perfil do

Maranhatildeo (1997 p 27) abaixo

A anaacutelise do Censo Demograacutefico de 1991 segundo a situaccedilatildeo do domicilio permite determinar que a ocupaccedilatildeo da aacuterea urbana de Satildeo Luis jaacute teria alcanccedilado seu ponto de saturaccedilatildeo redirecionando a processo a de ocupaccedilatildeo do territoacuterio para aacutereas rurais do interior da ilha envolvendo os municiacutepios de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar O comportamento da taxa de crescimento populacional desses municiacutepios reitera de modo incontestaacutevel essa tendecircncia enquanto a populaccedilatildeo urbana de Satildeo Luis diminuiu registrando um decliacutenio relativo de 042 sua populaccedilatildeo rural cresceu 12269 passando de 292144 em 1980 para 450158 habitantes em 1991

Atualmente a urbanizaccedilatildeo em Satildeo Luis incrementou ainda mais o processo de

pauperizaccedilatildeo de um grande contingente populacional negando a inserccedilatildeo desse contingente

no mercado formal de trabalho mas ao mesmo tempo transformou os pobres em

consumidores de alimentos e roupas industrializadas de mercadorias eletrocircnicas como raacutedios

e televisores e de serviccedilos puacuteblicos ou privados de transportes energia educaccedilatildeo e sauacutede

Vale destacar que um fator relevante em meio ao processo de ocupaccedilotildees

habitacionais e a iniciativa do poder puacuteblico no intuito de acabar com esse problema eacute que

aleacutem dos impasses burocraacuteticos e o eminente fracasso por falta de planejamento adequado dos

planos de reforma nas moradias o constante crescimento dessas sub-habitaccedilotildees impedia um

alcance maior e definitivo dos projetos jaacute que novos terrenos eram ocupados constantemente

228

formando novos nuacutecleos de palafitas concluindo-se entatildeo que a soluccedilatildeo seria muito mais

estrutural mais orgacircnica e menos paliativa

Outro fator relevante eacute que o espaccedilo urbano de Satildeo Luis assim como em outras

cidades brasileiras organiza-se em funccedilatildeo do preccedilo do solo Os terrenos urbanos tecircm seu

preccedilo regulado pela lei da oferta e da procura assim seus altos preccedilos de venda ou de locaccedilatildeo

selecionam uma clientela restrita empurrando todos os demais pretendentes para terrenos pior

localizados que tecircm preccedilos inferiores

A especulaccedilatildeo imobiliaacuteria vem interferindo de maneira agressiva no processo de

ocupaccedilatildeo e expansatildeo espacial da cidade de Satildeo Luiacutes estabelecendo um novo padratildeo com a

transferecircncia de aacutereas residenciais de alto padratildeo para o subuacuterbio As classes meacutedias e altas

movem-se para condomiacutenios distantes mas equipados com infraestrutura urbana e complexos

comerciais Parque Shalon Ponta do Farol Cohajap Parque Amazonas Santos Dumont

Parque Timbira Cohajoli Jardim dos Faraoacutes Renascenccedila I e II Cohafuma Recanto dos

Vinhais Parque dos Nobres Parque das Bandeiras (DINIZ 2007)

Segundo Diniz (2007) o fenocircmeno das ocupaccedilotildees tornou-se uma constante no dia-a-

dia o surgimento das vilas

a favela maranhense Um sem nuacutemero de terrenos puacuteblicos e

particulares foram e estatildeo sendo precariamente ocupados Vila Cafeteira Vila Itamar Vila

Isabel Vila Mauro Fecury Vila Pavatildeo Filho Vila Kiola Vila Jacarati Vila Brasil Vila

Janaiacutena Vila Santa Clara Jardim Tropical Divineacuteia Satildeo Bernardo Vila Cascavel Todos

esses bairros na aparecircncia satildeo formados por barracos e mocambos construiacutedos com material

de refugo como caixotes taacutebuas soltas folhas de zinco ou satildeo habitaccedilotildees construiacutedas de

palha taipa e adobe

Nessas localidades a pobreza e o aspecto caoacutetico satildeo visiacuteveis Os serviccedilos puacuteblicos

estatildeo ausentes o arruamento eacute desordenado a aacutegua eacute apanhada em uma bica proacutexima ou

atraveacutes de ligaccedilotildees clandestinas a luz eleacutetrica eacute conseguida com o prolongamento dos fios de

um barraco a outro os esgotos satildeo depositados a ceacuteu aberto a coleta de lixo eacute inexistente

(LUZ 2004)

No bojo das contradiccedilotildees e dos conflitos Satildeo Luiacutes se dinamiza estabelece um

processo mais acelerado de urbanizaccedilatildeo A cidade se expande multiplicando a populaccedilatildeo

marginalizada que natildeo podendo comprar terrenos e imoacuteveis deixa a periferia em constante

expansatildeo

229

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA EXCLUSAtildeO SOCIAL SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

Diante do exposto nos capiacutetulos anteriores pode-se afirmar que as estruturas urbanas

das cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes sofreram fortes impactos com a ocupaccedilatildeo da regiatildeo

Amazocircnica e com as perspectivas do capitalismo sob a oacutetica de integraacute-las economicamente a

outras regiotildees do paiacutes por meio das construccedilotildees dos eixos rodo e ferroviaacuterios principalmente

com a mineraccedilatildeo e com os investimentos nos projetos industriais consolidados nos governos

militares repercutindo assim na configuraccedilatildeo soacutecioespacial

Nesse sentido baseado na loacutegica capitalista concentrador e excludente o

desenvolvimento urbano adotado nessas duas cidades amazocircnicas influenciou na estruturaccedilatildeo

do espaccedilo urbano expressando-se em uma forma de apropriaccedilatildeo desigual do mesmo o que

acarretou em um processo de segregaccedilatildeo espacial com a exclusatildeo de grandes aacutereas de

habitaccedilatildeo de padrotildees urbaniacutesticos de habitabilidade aceitaacuteveis Esses espaccedilos produzidos no

mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo

e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e

densificaccedilatildeo

Conforme observado por Correcirca (1989) visto no capiacutetulo II desta tese o espaccedilo

urbano s0 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm(s)09187 0 0 -0071Tj( )Tj009187 0 0 -0095187 0 0 -00918000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm2F1 2048 Tf009187 0 0 78 Tm7 0 0 -009187 7539 6809 Tm(t)Tj 0 0(s)Tj( )Tj009187 0 0 -0(r)3 7133 Tm2F1 2048 Tf0091875640 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -07810 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2i2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2E3a

230

Essa configuraccedilatildeo indicada natildeo por um marco legal no territoacuterio mas pela

apreensatildeo do espaccedilo urbano ante aqueles que nele interagem representa a produccedilatildeo de uma

apropriaccedilatildeo do real pelo homem enquanto sujeito situado

Segundo Bourdieu (2001) existe com efeito uma correlaccedilatildeo entre as posiccedilotildees

ocupadas pelos agentes sociais no espaccedilo social e a posiccedilatildeo que ocupam no espaccedilo fiacutesico

Este eacute inclusivamente um fator simboacutelico importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do

proacuteprio posicionamento social dos atores Estes tecircm uma posiccedilatildeo mais ou menos prestigiada

consoante ocupem espaccedilos mais ou menos valorizados e pela distacircncia que as separa uns dos

outros

A existecircncia destes espaccedilos sociais como espaccedilos de exclusatildeo de certas camadas da

populaccedilatildeo acaba por contribuir como um dos elementos definidores do modo de vida das

apreciaccedilotildees e representaccedilatildeo social e da forma como os atores sociais das cidades estudadas

encaminham as suas vivecircncias biograacuteficas e estrateacutegias de vida

Eacute na produccedilatildeo das favelas em terrenos puacuteblicos ou privados invadidos que os grupos sociais excluiacutedos tornam-se efetivamente agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito de outros agentes A produccedilatildeo desse espaccedilo eacute antes de mais nada uma forma de resistecircncia e ao mesmo tempo uma estrateacutegia de sobrevivecircncia Resistecircncia e sobrevivecircncia agraves diversidades impostas aos grupos sociais receacutem expulsos do campo ou provenientes de aacutereas urbanas agraves operaccedilotildees de renovaccedilatildeo que lutam pelo direito agrave cidade Resistecircncia e sobrevivecircncia que se traduzem na apropriaccedilatildeo de terrenos usualmente inadequados para outros agentes da produccedilatildeo do espaccedilo encostas iacutengremes e aacutereas alagadiccedilas (CORREcircA 1989 p 30)

Vale destacar tambeacutem que a ineficaacutecia na execuccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas para as

demandas relacionadas ao crescimento urbano fez evidenciar as diferenccedilas sociais na

paisagem urbana na constante disputa pelos melhores espaccedilos que aumentando a demanda

diminuiu a oferta ocasionando no encarecimento do uso do solo nas cidades promovendo

assim elevadas especulaccedilotildees pelas construtoras e empresas imobiliaacuterias

A atividade imobiliaacuteria reflete o papel do espaccedilo tanto como fonte de criaccedilatildeo quanto de realizaccedilatildeo de mais-valia eacute realmente impeacutervia aos ciclos de acumulaccedilatildeo de capital exceto no tocante a mudanccedilas em suas formas de investimento (digamos da habitaccedilatildeo suburbana para os edifiacutecios de escritoacuterios e shopping centers na cidade) e representa um processo mais fundamental da criaccedilatildeo da riqueza [] Os especuladores portanto constituem a vanguarda da expansatildeo metropolitana (GOTTDIENER 1993 p 245-246)

231

Sendo assim como foi ressaltado nos toacutepicos anteriores o processo de ocupaccedilatildeo nas

aacutereas perifeacutericas das cidades estudadas pela populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo acentuou as

contradiccedilotildees do sistema capitalista inseridas no contexto das desigualdades sociais

construiacutedas dentro de uma realidade social mais ampla natildeo fugindo das anaacutelises do processo

acelerado da urbanizaccedilatildeo brasileira a qual estaacute embasada na loacutegica da globalizaccedilatildeo

configurada uma revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional determinando natildeo somente as

relaccedilotildees poliacuteticas mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees

sociais e culturais

Os efeitos dessa mundializaccedilatildeo do capital acentuam as diferenccedilas sociais afetando

diretamente as expressotildees da questatildeo social as quais podem ser definidas no acircmbito do modo

capitalista de produccedilatildeo na contradiccedilatildeo capital x trabalho como as expressotildees do processo de

formaccedilatildeo e desenvolvimento da classe operaacuteria e de seu ingresso no cenaacuterio poliacutetico da

sociedade exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado

Eacute a manifestaccedilatildeo no cotidiano da vida social da contradiccedilatildeo entre o proletariado e a

burguesia a qual passa a exigir outros tipos de intervenccedilatildeo mais aleacutem da caridade e

repressatildeo (CARVALHO IAMAMOTO 1983 p 77)

Destarte essas transformaccedilotildees repercutiram em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes assim como

em outras cidades brasileira que permeadas das contradiccedilotildees e de desigualdades sociais satildeo

frutos dos deacuteficits sociais acumulados por deacutecadas de governos descomprometidos com os

interesses da maioria da populaccedilatildeo

Nessas cidades se produz e reproduz as desigualdades sociais por meio de um

intenso processo de precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida com o crescimento do desemprego e

do trabalho informal (sem seguridade social) que somados agrave maneira como as cidades foram

constituiacutedas expotildeem as famiacutelias e indiviacuteduos a situaccedilotildees de risco e vulnerabilidades sociais

O cerceamento do acesso aos bens da cidadania relacionados ao emprego aos serviccedilos de proteccedilatildeo social e tambeacutem ao aumento da violecircncia que levam a uma fragilizaccedilatildeo da cidadania entendida como perda ou ausecircncia de direitos e como precarizaccedilatildeo de serviccedilos coletivos O crescente processo de favelizaccedilatildeo o empobrecimento da populaccedilatildeo o desemprego e o trabalho informal satildeo expressotildees da vulnerabilidade urbana no Brasil (KOWARICK 1988 p 15)

A grande maioria da populaccedilatildeo convive com a inseguranccedila social e de renda com a

falta de acesso a equipamentos e serviccedilos puacuteblicos com moradias precaacuterias e distantes do

trabalho Agrave exemplo disso tem-se as duas cidades estudadas as quais apresentam um

232

crescimento populacional baseado na expansatildeo perifeacuterica e no espraiamento da mancha

urbana aleacutem de renda per capita inferior a meacutedia nacional cujo valor eacute de R$ 50000

conforme tabela 11

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

2010

Municiacutepio

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Valor do rendimento nominal mediano mensal domiciliar per capita dos domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Urbana

Rural

Urbana

Rural

Beleacutem

351078

348191

2887

42200

42500

20800

Satildeo Luis

265175

251726

13449

40000

40400

25000

Fonte IBGE (2010)

Os dados demonstram que a renda per capita de Beleacutem (R$ 42200) mesmo inferior

a meacutedia nacional apresenta 55 a mais que a de Satildeo Luis Vale destacar que os programas

habitacionais adotam uma loacutegica que contribui para a concentraccedilatildeo de renda no paiacutes uma vez

que a maior parte dos recursos satildeo dirigidos para as faixas salariais acima de 4 salaacuterios

miacutenimos o que dificulta o acesso das famiacutelias com baixo poder aquisitivo a esses programas

habitacionais e contribui para o aumento do deacuteficit habitacional a exemplo pode-se citar o

Programa Minha Casa Minha Vida Esse quadro eacute revelador das diferenccedilas das desigualdades

sociais e do modelo concentrador de riquezas e poder que fazem parte da formaccedilatildeo histoacuterica

do Paiacutes

De acordo com Harvey (2005) esse processo interdita a efetivaccedilatildeo do direito agrave

cidade principalmente para os mais pobres que satildeo expulsos para locais cada vez mais

distantes pois natildeo possuem meios para acessar os melhores espaccedilos urbanos O

neoliberalismo provocou depressotildees salariais que aprofundaram esse processo de interdiccedilatildeo

do direito agrave cidade Poreacutem o simples aumento dos ganhos salariais no interior da loacutegica do

capital natildeo resolve esse problema Esses aumentos salariais incorporaram os mais pobres na

economia da diacutevida por meio do mercado imobiliaacuterio

Nesse sentido a desigualdade social existente no Paiacutes eacute estrutural e histoacuterica

alicerccedilada no modelo adotado de capitalismo dependente Dessa maneira eacute balizada pela

visatildeo conservadora de que essa distribuiccedilatildeo desigual eacute um fato natural como resultado do

233

fracasso individual de muitos e sucesso individual de poucos e natildeo como produto da forma

como se organiza a sociedade e pelo modelo de exclusatildeo social

Bonduki (1997) argumenta que a desigualdade social tem suas causas nas formas

com que se organizou a sociedade em particular na maneira com que se construiu o Estado

brasileiro marcado pelo patrimonialismo no qual se confundem o interesse puacuteblico e o

privado nas dinacircmicas de exploraccedilatildeo do trabalho impostas pelas elites dominantes desde a

colocircnia e principalmente no contexto absoluto dessas elites sobre o processo de acesso agrave

terra tanto rural quanto urbana

Sendo assim quando se discute a questatildeo habitacional nas cidades amazocircnicas haacute

que se levar em consideraccedilatildeo que natildeo eacute um fato isolado do restante do paiacutes e que estaacute

associado ao processo de urbanizaccedilatildeo no qual as grandes meacutedias e pequenas cidades

brasileiras foram submetidas aleacutem das poliacuteticas desenvolvidas pelo Estado que contribuiacuteram

para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Caldeira (2000) identifica trecircs formas de segregaccedilatildeo enquanto padratildeo de

diferenciaccedilatildeo e separaccedilatildeo espacial na primeira forma de expressatildeo os diferentes grupos

sociais se comprimem no espaccedilo da cidade e se diferenciam pelo tipo de moradia a segunda

apresenta a distacircncia como variaacutevel de separaccedilatildeo espacial de ricos e pobres materializando a

relaccedilatildeo centro-periferia Por fim os espaccedilos segregados fortificados por muros e sistemas

diversos de seguranccedila concentrando em geotipos de padratildeo meacutedio e alto as expectativas de

lazer consumo trabalho e residecircncia justificado pelo medo da violecircncia urbana Isto eacute o que

a autora chama de enclaves fortificados tendo como exemplo os modernos condomiacutenios

A segregaccedilatildeo espacial para Castells (1983) eacute compreendida pela agregaccedilatildeo do

espaccedilo em zonas de forte homogeneidade social interna onde predominam as disparidades

entre elas as quais se processam tanto em termo de diferenccedila como em hierarquia Dentro

desta forte homogeneidade social a segregaccedilatildeo eacute entendida como sendo a divisatildeo espacial de

uma determinada populaccedilatildeo em aacutereas especiacuteficas que permitem entendecirc-las e destituiacute-las da

sua composiccedilatildeo social das demais aacutereas de seu entorno

Para Lojkine (1981) a segregaccedilatildeo social eacute analisada pelas contradiccedilotildees existentes

entre o centro (que concentra o trabalho intelectual e o comando) e as zonas perifeacutericas (que

se caracterizam como lugar da execuccedilatildeo das leis e atividades que derivam do centro)

Analisando ambos os autores constata-se que a segregaccedilatildeo eacute a expressatildeo soacutecioespacial do

modo de produccedilatildeo capitalista que fragmenta e ao mesmo tempo articula os espaccedilos O

espaccedilo urbano capitalista neste processo passa a ser o lugar concreto da manifestaccedilatildeo e

articulaccedilatildeo do modo de produccedilatildeo capitalista

234

Villaccedila (2001) compreende a segregaccedilatildeo como sendo o processo pelo qual as

camadas de renda elevada se concentram em determinadas regiotildees buscando com isto

privileacutegios em atrair os equipamentos urbanos para a regiatildeo segregada

Trazendo as consideraccedilotildees sobre as regiotildees metropolitanas de Villaccedila (2001) para as

cidades onde a condominizaccedilatildeo estaacute cada vez mais presente pode-se afirmar que essa

concentraccedilatildeo se daacute numa nova escala que natildeo eacute nem a regiatildeo geral e nem um bairro mas sim

o condomiacutenio fechado

O que ocorre com os condomiacutenios fechados eacute que se localizam nas periferias urbanas

e convivem muitas vezes com uma vizinhanccedila mais pobre economicamente Neste sentido

Villaccedila (2001) coloca que natildeo existe presenccedila exclusiva de camadas de alta renda em uma

determinada regiatildeo A segregaccedilatildeo natildeo impede a presenccedila e o crescimento de outras camadas

no mesmo espaccedilo

Dessa maneira as abordagens sobre segregaccedilatildeo soacutecioespacial aqui definidas satildeo

oriundas de um processo dialeacutetico ou seja eacute uma soacute independente do contexto a que ela se

refere derivando da luta de classes na qual ao vencedor

cabem as melhores parcelas do

espaccedilo urbano

Cabe entatildeo destacar o estrateacutegico papel das cidades para a consolidaccedilatildeo do capital

enquanto modelo de sociedade Nesta dinacircmica natildeo soacute o acesso ao solo eacute disputado como

tambeacutem o seu valor eacute definido Assim sendo a cidade eacute tambeacutem um complexo mecanismo de

exploraccedilatildeo e exclusatildeo social na qual todos os aspectos da vida social satildeo afetados pelo

desenvolvimento do capitalismo e manifestam seu caraacuteter desigual no processo de

urbanizaccedilatildeo

A respeito disso Harvey (2005) argumenta que nesse novo contexto as grandes

cidades tornaram-se aacutereas estrateacutegicas para investimento privados especialmente quando

concentradoras de funccedilatildeo uacuteltima geraccedilatildeo associados ao capital financeiro agrave comunicaccedilatildeo e a

tomada de decisotildees bem como agrave cultura ao entretenimento e ao turismo

A dinacircmica de investimentos de capitais na produccedilatildeo e comercializaccedilatildeo de espaccedilos

urbanos e a conformaccedilatildeo da economia da diacutevida revelam a crescente mercantilizaccedilatildeo da

cidade que desembocou na crise global atual [] Os impactos dessa crise estatildeo sendo

profundamente desiguais As execuccedilotildees hipotecaacuterias causadas por inadimplecircncias afetam

principalmente os mais pobres que vivem nas partes mais precaacuterias e antigas das cidades

americanas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Na conferecircncia Alternativas ao Neoliberalismo e o Direito agrave Cidade Harvey

(2009) apresentou um mapa da cidade de Cleveland nos Estados Unidos que mostra as aacutereas

235

onde se concentram as execuccedilotildees hipotecaacuterias e os locais de moradia da populaccedilatildeo afro-

americana de Cleveland Essa populaccedilatildeo eacute a maioria dentre os 2 milhotildees de norte-americanos

que perderam suas casas com a crise Segundo ele a crise atual eacute um furacatildeo Katrina

financeiro Como o furacatildeo que arrasou New Orleans em 2005 e afetou principalmente os

bairros mais pobres os impactos da crise urbana e financeira atual recaem sobre os grupos

sociais mais vulneraacuteveis

Contraditoriamente a injeccedilatildeo de recursos puacuteblicos eacute mais para salvar o sistema financeiro e resgatar os agentes do capital do que para garantir os direitos sociais prejudicados pelos efeitos da crise Os bocircnus obtidos pelos altos executivos das instituiccedilotildees financeiras que quebraram e receberam ajuda governamental chegam agrave casa das centenas de bilhotildees de doacutelares e superam em muito os recursos puacuteblicos usados para ajudar aqueles que perderam suas casas Em muitos locais as casas hipotecadas que foram confiscadas satildeo utilizadas em pacotes financeiros e natildeo em poliacuteticas puacuteblicas voltadas para garantir o direito aacute cidade e agrave moradia digna (HARVEY 2009 natildeo paginado)

E conclui dizendo que eacute preciso empreender novas lutas pelo direito agrave cidade pois

as crises sistecircmicas atuais natildeo representam o fim do neoliberalismo

Os governos atuam para proteger as instituiccedilotildees financeiras a qualquer custo Natildeo atuam para efetivar direitos e garantir o bem estar das pessoas [] Diante do dilema de ajudar os bancos e ajudar as pessoas que perderam suas casas os recursos puacuteblicos satildeo usados para salvar os bancos Esses recursos deveriam ser usados para criar um banco de desenvolvimento urbano voltado para financiar poliacuteticas urbanas e habitacionais que fortaleccedilam os direitos a cidades justas democraacuteticas e sustentaacuteveis e moradias dignas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Corroborando com essa ideacuteia Ozoacuterio (sd p 5) enfatiza que o espaccedilo urbano estaacute

subordinado agraves poliacuteticas de modernizaccedilatildeo de ocupaccedilatildeo e de segmentaccedilatildeo uma vez que

[] a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de saneamento e embelezamento que expulsar

236

formam um mercado proacuteprio de negociaccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de lotes nas ocupaccedilotildees onde

aparece a figura de um liacuteder que comanda organiza e planeja a accedilatildeo dos agentes sociais

Evidencia-se tambeacutem uma estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais

estabelecendo uma rede complexa de procedimentos legaisilegais que acabam por constituir-

se em um conjunto de normas que regulamentam as transaccedilotildees quanto agraves negociaccedilotildees dos

lotes e edificaccedilotildees (habitaccedilatildeo) estabelecendo assim estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas

tanto do lado do Estado quanto do lado dos agentes sociais

Os dados obtidos na pesquisa de campo revelam que nos uacuteltimos estudos feitos nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes registraram-se 449 e 115 (respectivamente) assentamentos

precaacuterios Estes estudos foram feitos por meio de uma parceria entre a Prefeitura de Beleacutem e o

Instituto IAGUA em Beleacutem e pela Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e

Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) em Satildeo Luiacutes

Segundo Beleacutem (2007) a estrutura urbana reproduz a mesma realidade das grandes

cidades brasileiras onde o fenocircmeno da segregaccedilatildeo social aprofunda cada vez mais a situaccedilatildeo

de desigualdade e precarizaccedilatildeo da vida social de fraccedilotildees das classes trabalhadoras que se

reproduzem no interior de suas aacutereas perifeacutericas

Sendo assim os estratos sociais de renda mais elevada encontram-se em Beleacutem nos

bairros do Comeacutercio do Reduto de Nazareacute e de Batista Campos bem como partes

expressivas dos bairros da Cidade Velha do Umarizal e do Marco Os estratos considerados

meacutedios apresentam forte tendecircncia locacional linearizada situada ao longo da Avenida

Augusto Montenegro ficando o niacutevel mais baixo do gradiente de renda posicionado tanto nas

baixadas e na periferia continental mais distante incluindo-se os nuacutecleos urbanos do Distrito

de Icoaraci das Ilhas de Outeiro Mosqueiro e Cotijuba (PEMAS 2001 apud BELEacuteM 2007)

De acordo com Beleacutem (2007) a maior densidade demograacutefica estaacute nas aacutereas de

baixadas fato que associado agrave baixiacutessima renda per capita e aos elevados contingentes

populacional fazem destas os locais de agudos problemas e carecircncias sociais Entretanto a

demanda mais recente natildeo estaacute concentrada nas aacutereas de baixadas e sim nos setores onde

estatildeo localizadas as moradias verticalizadas ocupadas por estratos sociais de renda meacutedia e

baixa conforme pode ser observado na tabela 12

237

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007

Bairro Assentamentos Marco 10

22

Aacuteguas Lindas 9

20

Aacuteguas Negras 9

20

Agulha 2

04

Auraacute 3

07

Bairro da Brasilia e Satildeo Joatildeo do Outeiro 1

02

Barreiro 14

31

Batista Campos 2

04

Benguiacute 10

22

Cabanagem 11

24

Campina 6

13

Canudos 5

11

Castanheira 5

11

Cidade Velha 5

11

Condor 12

27

Coqueiro 13

29

Cremaccedilatildeo 4

09

Cruzeiro 4

09

Curioacute-Utinga 10

22

Faacutetima 6

13

Guamaacute 18

40

Guanabara 3

07

Icoaraci 15

33

Itaiteua 2

04

Jurunas 9

20

Mangueiratildeo 7

16

Maracacuera 15

33

Maracangalha 4

09

Marambaia 15

33

Outeiro 6

13

Paracuri 17

38

Parque Guajaraacute 16

36

Parque Verde 11

24

Pedreira 11

24

Ponta Grossa 5

11

Pratinha 14

31

Sacramenta 20

45

Santana do Auraacute 2

04

Satildeo Braacutes 2

04

Satildeo Clemente 8

18

Souza 3

07

Tapanatilde 27

60

Telegrafo 7

16

Tenoneacute 19

42

Terra Firme 12

27

Uma 13

29

Val de Cans 3

07

Mosqueiro 23

51

Total 449

1000

Fonte Beleacutem (2007)

238

Em Beleacutem satildeo 146359 domiciacutelios existentes nos 449 assentamentos precaacuterios os

quais estatildeo localizados em 48 bairros dos 71 existentes no municiacutepio Os bairros que

apresentam maior nuacutemero de assentamentos precaacuterios satildeo Tapanatilde Sacramenta Tenoneacute

Guamaacute Paracuri Parque Guajaraacute Icoaraci Maracacuera Marambaia Barreiro Pratinha

Coqueiro Una Condor e Terra Firme Nestes bairros aleacutem de apresentarem problemas

infraestruturais como a falta de saneamento baacutesico haacute uma carecircncia de serviccedilos essenciais

como posto de sauacutede escolas entre outros acarretando no aumento da segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Em Satildeo Luiacutes os assentamentos precaacuterios estatildeo concentrados em duas grandes

regiotildees a aacuterea Itaqui-Bacanga localizada no Sul da ilha e as ocupaccedilotildees ao longo do Rio

Anil72 Nestas duas regiotildees estatildeo concentradas cerca de 60 das aacutereas de subnormalidade

identificadas no levantamento feito em 2000 pela SEMTHURB

De acordo com os dados obtidos na Secretaria pela dinacircmica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo

urbano do municiacutepio a habitaccedilatildeo subnormal acontece em grandes aacutereas pertencentes ao

poder puacuteblico e em aacutereas de terreno baixo e alagadiccedilo A ocorrecircncia de construccedilotildees

precaacuterias barracos e palafitas em aacutereas de mangues e sem infraestrutura eacute bastante presente e

ocasiona graves problemas de sauacutede para a populaccedilatildeo aleacutem de comprometer o meio

ambiente (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Com base no Diagnoacutestico da Capacidade Institucional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

para o Setor Urbano Habitacional (PEMAS 2004) a Secretaria de Planejamento e

Coordenaccedilatildeo Geral de Satildeo Luiacutes realizou em 2002 um levantamento nas Ressacas assim

denominadas as aacutereas de baixada sujeitas a inundaccedilotildees frequumlentes sem as miacutenimas condiccedilotildees

de habitabilidade e constituiacutedas por moradias do tipo palafitas construiacutedas de forma precaacuteria

com madeira de pouca durabilidade com acessos geralmente fraacutegeis e sem estabilidade que

geram situaccedilotildees permanentes de risco sobretudo para as crianccedilas73

Embora natildeo existam dados sistematizados sobre o setor habitacional cabe destacar

que nem todos os assentamentos precaacuterios de Satildeo Luis apresentam situaccedilotildees de risco

precariedade de infraestrutura ou satildeo ocupados por populaccedilatildeo de baixa renda pois segundo a

fala do teacutecnico da SEMTHURB na entrevista concedida em 2009

72 Na Bacia do Rio Anil estaacute localizada a Peniacutensula do Ipase aacuterea selecionada para a intervenccedilatildeo do Programa Habitar Brasil-BID no Subprograma de Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Sub-normais 73 Nas aacutereas que foram ocupadas regularmente a subnormalidade ocorre pela ocupaccedilatildeo de zonas destinadas agrave execuccedilotildees de equipamentos puacuteblicos e aacutereas verdes Haacute ocupaccedilotildees em aacutereas de encosta e sobre linhotildees de transmissatildeo de energia eleacutetrica em alta tensatildeo contudo satildeo situaccedilotildees mais raras

239

A questatildeo fundiaacuteria tem especial peso na definiccedilatildeo da quantidade de assentamentos precaacuterios em funccedilatildeo da peculiaridade do municiacutepio pela sua caracteriacutestica de ilha oceacircnica o municiacutepio tem parcelas importantes do seu territoacuterio caracterizadas como terreno da Uniatildeo e apenas algumas poucas glebas privadas geralmente associadas a antigas sesmarias Existe uma grande quantidade de assentamentos humanos que natildeo satildeo precaacuterios tecircm habitaccedilotildees de bom padratildeo construtivo e acesso a toda infraestrutura mas que satildeo subnormais por conta da irregularidade fundiaacuteria jaacute que ocupam terrenos da Uniatildeo sem a devida legalidade

Conforme apresentado as 115 aacutereas de assentamentos identificadas estatildeo assim

caracterizadas de acordo o diagnoacutestico (PEMAS 2004) e demonstrada no quadro 8

a 76 como favelas sendo 48 assentamentos irregulares e muito precaacuterios

denominados localmente como ocupaccedilatildeo e 28 assentamentos irregulares

ocupados por populaccedilotildees pobres mas jaacute com um niacutevel de consolidaccedilatildeo

denominados localmente como favelas mesmo e

b 39 como outras formas de assentamentos subnormais correspondendo a

assentamentos irregulares de ocupaccedilatildeo espontacircnea caracterizados como

subnormais exclusivamente pela ilegalidade fundiaacuteria jaacute que natildeo satildeo precaacuterios

e estatildeo providos da infraestrutura meacutedia existente na cidade74

74 Nessa estimativa natildeo foram computados dados da populaccedilatildeo residente em corticcedilos pois o Municiacutepio natildeo dispotildee de nenhum estudo que quantifique essas habitaccedilotildees

240

Quadro 8 - Relaccedilatildeo dos Assentamentos Hierarquizados (Satildeo Luiacutes-MA) Item Aacuterea Hierarquia Item Aacuterea Hierarquia

1 Vila Independecircncia 8 59 Sitio do Pica-pau-amarelo 4 2 Vila Roseana COHAFUMA 8 60 Tajaccediluaba 4 3 Vila Mauro Fecury II

8

61 Vila Airton Sena

4

4 IPASE de BaixoApicum 7 62 Vila Ariri 4 5 IPASE de CimaMauro Fecury 7 63 Vila Bacanga 4 6 Irmatildeos Coragem Alemanha

Caratatiua 7 64

Vila Cafeteira 4 7 Vila Bom JesusTravessa Bom

Jesus 7 65

Vila Cristalina 4 8

Vila Satildeo Luis 7 66 Vila dos Nobres Pq

Timbiras 4 9 Vila Verde 7 67 Vila Flamengo 4

10 Japatildeo IPASE de Baixo 6 68 Vila Isabel Bacanga 4 11 Conjunto Rio AnilCabeceira

da ponte

6

69 Vila Itamar

4

12 Vila 25 de Maio Rec Vinhais 6 70 Vila Jackson 4 13 Vinhais Velho 6 71 Vila Jambeiro 4 14 Patildeo-de-Accediluacutecar 6 72 Vila Janaiacutena 4 15 Coroadinho 6 73 Vila Kiola 4 16

Rio do Meio

6

74 Vila Lobatildeo Parque Roseana Sarney

4

17 Salina do Sacaveacutem 6 75 Vila Marinha 4 18

Vila 7 de Setembro 6 76 Vila Menino Jesus de

Praga 4 19 Vila dos Frades 6 77 Vila Natal 4 20 Vila Isabel Cafeteira 6 78 Vila Nice Lobatildeo 4 21 Vila Santa Julia 6 79 Vila Nova Repuacuteblica 4 22 Brasilia do Matadouro 5 80 Vila Padre Xavier 4 23 Camboa 5 81 Vila Pavatildeo Filho 4 24 Feacute-em-Deus 5 82 Vila Primavera 4 25 Fumacecirc 5 83 Vila Riod 4 26 Ilha da Paz

5

84 Vila Satildeo Sebastiatildeo

4

27 Jardim Ameacuterica Aacuterea institucional 5

85 Vila Sarney Filho Distrito Industrial 4

28 Jardim Satildeo Raimundo 5 86 Vila Tancredo Neves 4 29 Liberdade 5 87 Vila Uniatildeo 4 30 Santa Cruz Vera Cruz 5 88 Vila Zeni 4 31 Satildeo Joatildeo da Boa Vista 5 89 Altos do Calhau 4 32 Satildeo Mateus Vila Nova 5 90 Cantinho do Ceacuteu 4 33 Satildeo Raimundo Bacanga 5 91 Divineacuteia 4 34 Tibiri 5 92 Ilhinha Satildeo Francisco 4 35 Vera Cruz

5

93 Joatildeo de Deus

4

36 Vila Cascavel 5 94 Novo Angelim 4 37 Vila Conceiccedilatildeo Coroadinho 5 95 Recanto Fialho 4 38 Vila Embratel 5 96 Satildeo Bernardo 3 39 Vila Mauro Fecury I 5 97 Sol e Mar 3

241

40 Vila Nova 5 98 Vila Brasil 3 41 Vila Palmeira 5 99 Vila Buriti Satildeo Francisco 3 42 Vila Vitoacuteria Sta Baacuterbara 5 100 Vila Conceiccedilatildeo Calhau 3 43

Alto da Esperanccedila Bacanga 4 101 Vila ConceiccedilatildeoJoatildeo de

Deus 3 44 Alto da Esperanccedila Zona Rural 4 102 Vila Cruzado 3 45 Anjo da Guarda 4 103 Vila Fialho 3 46 Barreto 4 104 Vila Luisatildeo 3 47 Bom Jesus 4 105 Vila Magril Sta Baacuterbara 3 48

Cidade Olimpica 4 106 Vila Maruim Igarapeacute da

Jansen 3 49 Gancharia 4 107 Vila Regina 3 50

Jaracati lado direito 4 108 Vila Santo Antonio

Calhau 3 51 Jaracati lado esquerdo

4

109 Argola e Tambor

0

52 Morro do Satildeo Francisco 4 110 Itapera 0 53 Pirapora 4 111 Jardim Tropical 0 54 Primavera Pq Timbiras 4 112 Parque Jair 0 55 Residencial Paraiacuteso 4 113 Rio Grande 0 56 Saacute Viana 4 114 Vila Alegria 0 57 Santa Clara 4 115 Vila Paranatilde 0 58 Santa Efigecircnia 4

Fonte PEMAS (2004) Hierarquia estabelecida segundo criteacuterios de possibilidade de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria insalubridade ou risco de desmoronamento e acessibilidade

Pode perceber a partir desses dados que o problema do deacuteficit habitacional eacute mais

grave nas regiotildees urbanas e uma caracteriacutestica importante dessas aacutereas eacute que boa parte do seu

territoacuterio foi ou eacute ocupado de forma irregular e ilegal Essas praacuteticas ilegais de uso do solo das

cidades acarretam maior vulnerabilidade aos estratos sociais mais pobres pela falta de

seguranccedila da posse

apesar da clareza do texto do Estatuto da Cidade sobre o assunto - tendo

em vista o acesso precaacuterio ou inexistente dessa populaccedilatildeo aos processos poliacuteticos de

governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

A partir dessa perspectiva pode-se considerar essas duas cidades como um espaccedilo

em que se datildeo as questotildees sociais resultantes do atual modo de produccedilatildeo - questotildees que hoje

se apresentam cada vez mais acirradas - sendo espaccedilo de desigualdades conflitos e lutas

Fatos motivados pela sua forma de organizaccedilatildeo espacial histoacuterica cultural social e

econocircmica Como exemplo de suas problemaacuteticas haacute o inchaccedilo populacional o trabalho

informal e as habitaccedilotildees informais que satildeo encobertas pelo discurso do desenvolvimento

econocircmico das cidades

242

A concentraccedilatildeo fiacutesica de usos e atividades e o excesso de verticalizaccedilatildeo nos centros urbanos aliada agrave precariedade de infraestrutura social nas aacutereas de baixada satildeo os mais seacuterios problemas urbanos da cidade Problemas de transporte moradia e saneamento enfrentados pela populaccedilatildeo da cidade satildeo continuamente gerados e agravados pela accedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios e pela falta de medidas eneacutergicas do poder puacuteblico incapaz de interferir no crescimento da cidade Tal crescimento desorganizado afeta a vida de todos os habitantes da cidade repercutindo ainda mais negativamente nas camadas empobrecidas que ocupam as periferias A cidade nas duas uacuteltimas deacutecadas sofre com as mazelas da modernidade e isto pode ser percebido nos congestionamentos de veiacuteculos na diminuiccedilatildeo da circulaccedilatildeo de ar no aumento da temperatura e na desfiguraccedilatildeo do centro histoacuterico Os contrastes entre a aacuterea central e seus arredores se tornam extremamente acentuados o custo de habitar a aacuterea central eacute cada vez mais alto sendo impossiacutevel para as famiacutelias de baixa renda continuar mantendo seus imoacuteveis nessas aacutereas tornando-se alvos faacuteceis para o voraz mercado especulativo (BELEacuteM 2007 p 23)

Nesse sentido a accedilatildeo governamental muitas vezes natildeo tem capacidade de planejar e

se antecipar aos problemas vivenciados no espaccedilo urbano e dessa maneira acaba natildeo

controlando a loacutegica da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria tendo como resultado final o acuacutemulo dos

referidos problemas A ausecircncia dessa accedilatildeo planejadora do poder puacuteblico que tenha como

referecircncia central a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo faz com que esta atuaccedilatildeo

natildeo seja abrangente tornando sua atuaccedilatildeo pontual focalizada ou seletiva e desta forma

descuidando-se totalmente das problemaacuteticas sociais dentre elas a habitacional (BELEacuteM

2007 p 24)

Um agente urbano que se destaca nesse processo eacute o Estado como regulador ou

produtor de uma poliacutetica urbana e habitacional de massa que de fato nunca existiu como

tampouco existiram as condiccedilotildees para que o capital investisse de forma sistemaacutetica em

habitaccedilatildeo popular A ilegalidade fruto da desigualdade extrema eacute explicada pela necessidade

de moradia e de deacutecadas de omissatildeo do poder puacuteblico na produccedilatildeo fordista Cria-se assim

uma vinculaccedilatildeo clara entre uma determinada ordem urbaniacutestica relaccedilotildees de propriedade

privada e o mercado imobiliaacuterio formal

Uma das ironias dessa trageacutedia cotidiana eacute que exatamente aquele saber teacutecnico que poderia ser usado para democratizar o acesso da populaccedilatildeo mais necessitada a condiccedilotildees mais dignas de habitabilidade acaba por produzir cada vez maior elitizaccedilatildeo e exclusatildeo Se eacute clara a relaccedilatildeo entre cidade formal e relaccedilotildees mercantis sua antiacutetese natildeo eacute verdadeira ou seja a cidade informalmente construiacuteda eacute tambeacutem eacute palco de um ativo mercado imobiliaacuterio (BUARQUE 1999 p 148)

243

Entretanto Buarque (1999) ressalta que a gestatildeo urbana no Brasil contemporacircneo

vem sendo marcada pela confluecircncia de duas forccedilas por um lado pela racionalidade do

planejamento e da regulaccedilatildeo herdada do modernismo formalmente constituiacuteda pelo Estado

eou pelo mercado imobiliaacuterio Por outro lado pela radicalidade das demandas por condiccedilotildees

baacutesicas de urbanidade e reproduccedilatildeo representadas pelos movimentos sociais organizados

As poliacuteticas puacuteblicas podem ser implementadas com o intuito de efetivar o alcance

do direito agrave moradia digna e a maioria das iniciativas do poder puacuteblico poderatildeo estar baseadas

na garantia da propriedade A funccedilatildeo social da propriedade eacute usada como fundamento na

formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas que buscam promover o direito agrave propriedade para

proporcionar habitaccedilotildees Assim o reconhecimento da moradia como um direito humano eacute de

suma importacircncia para a valorizaccedilatildeo deste direito e para a criaccedilatildeo de estrateacutegias eficientes de

seguranccedila da posse

As poliacuteticas puacuteblicas de renovaccedilatildeo urbana das cidades constituem-se no principal

propulsor para mudanccedila da paisagem e de vida das classes populares residente Entretanto a

urbanizaccedilatildeo do espaccedilo ao causar uma nova dinacircmica na cidade leva tambeacutem a criar

movimentos de enfrentamento diante do Estado por parte dos envolvidos na busca de

minimizar as carecircncias urbanas

De acordo com os princiacutepios da Reforma Urbana a cidade pode ser planejada a partir

da anaacutelise das desigualdades e dos direitos sociais nos quais os conflitos urbanos satildeo vistos

como uma expressatildeo poliacutetica das condiccedilotildees gerais da estrutura socioeconocircmica

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se em

uma das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

A luta de classe se daacute em torno do poder de Estado que vai garantir a unidade de formaccedilatildeo social isto natildeo quer dizer contudo que os centros do poder as diversas instituiccedilotildees de caraacuteter econocircmico poliacutetico militar cultural etc sejam simplesmente instrumentos oacutergatildeos ou apecircndices do poder das classes sociais Eles possuem a sua autonomia e especificidade estrutural que enquanto tal natildeo pode ser redutiacutevel a uma anaacutelise em termos de poder (ABELEacuteM 1989 p 13)

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades

socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de

injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente

criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em

244

determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o

Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e

mobilizaccedilatildeo da sociedade civil

O Estado capitalista eacute a relaccedilatildeo social em que se condensam as contradiccedilotildees do modo de produccedilatildeo capitalista e as lutas sociais que delas suscitam A funccedilatildeo poliacutetica geral do Estado consiste em dispersar essas contradiccedilotildees e essas lutas de modo a mantecirc-las em niacuteveis tensionais funcionalmente compatiacuteveis com os limites estruturais impostos pelo processo de acumulaccedilatildeo e pelas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo em que ele tem lugar Natildeo se trata portanto de resolver (superar) as contradiccedilotildees sociais ao niacutevel de estrutura profunda da formaccedilatildeo social em que elas se produzem mas antes de mantecirc-las em estado de relativa latecircncia mediante accedilotildees dirigidas agraves tensotildees problemas questotildees sociais porque as contradiccedilotildees se

manifestam ao niacutevel da estrutura de superfiacutecie de formaccedilatildeo social (SANTOS 1996 p 15-16)

Cabe ressaltar que a gestatildeo urbana pode ser definida aqui como um conjunto de

instrumentos atividades tarefas e funccedilotildees que visam assegurar de modo eficiente eficaz e

com efetividade as accedilotildees que proporcionaratildeo um bom funcionamento da cidade Visa

tambeacutem garantir natildeo somente a administraccedilatildeo da cidade como tambeacutem a oferta dos serviccedilos

urbanos baacutesicos e necessaacuterios para que a populaccedilatildeo e os vaacuterios agentes privados puacuteblicos e

comunitaacuterios muitas vezes com interesses opostos possam desenvolver e maximizar suas

atuaccedilotildees de forma que possibilitem o uso do solo sem exclusatildeo ou segregaccedilatildeo social

[] o sistema institucional e arquitetura organizacional adequados e necessaacuterios para implementar a estrateacutegia e o plano de desenvolvimento local sustentaacutevel mobilizando e articulando os atores (organizaccedilotildees da sociedade) e os agentes (instacircncias puacuteblicas) com seus diversos instrumentos e assegurando a participaccedilatildeo da sociedade no processo para a execuccedilatildeo e o acompanhamento das accedilotildees (BUARQUE 1999 p 64)

Entatildeo a gestatildeo urbana eacute a administraccedilatildeo de determinadas situaccedilotildees dentro de uma

conjuntura com os recursos disponiacuteveis no presente tendo em vista as necessidades

imediatas diferentemente do planejamento que segundo Souza e Rodrigues (2004 p 15) eacute

uma atividade que remete sempre para o futuro eacute a forma que os homens tecircm de tentar

prever a evoluccedilatildeo de um fenocircmeno ou de um processo e a partir desse conhecimento

procurar se precaver contra problemas ou dificuldades ou ainda aproveitar melhor possiacuteveis

benefiacutecios

245

A diferenccedila baacutesica reside no horizonte temporal de cada uma O planejamento tem a ver com o meacutedio e a longo prazos (em se tratando de planejamento urbano o meacutedio prazo pode dizer respeito a um lapso de tempo de poucos anos e o longo prazo a um periacuteodo de muitos anos) jaacute a gestatildeo refere-se ao curtiacutessimo prazo (dias ou seman

mmo e

u

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246

Para Harvey (2005 p 171) governanccedila urbana significa muito mais do que

governo urbano eacute um conjunto de forccedilas que detecircm o poder de reorganizaccedilatildeo da vida

urbana ou seja [] o poder real de reorganizaccedilatildeo da vida urbana muitas vezes estaacute em outra

parte ou pelo menos numa coalizatildeo de forccedilas mais ampla em que o governo e a

administraccedilatildeo urbana desempenham apenas papel facilitador e empreendedor

Outra questatildeo que pode ser analisada nesse processo eacute a tendecircncia contemporacircnea de

gestatildeo puacuteblica pautada na participaccedilatildeo popular descentralizando as decisotildees e

responsabilidades que historicamente estavam concentradas no poder executivo Entretanto

algumas praacuteticas tecircm demonstrado que a participaccedilatildeo popular fica restrita somente agrave consulta

de certos setores sociais

Nesse sentido procurar-se-aacute responder no toacutepico abaixo aos questionamentos

levantados na pesquisa qual a concepccedilatildeo de gestatildeo tem norteado as poliacuteticas habitacionais

implementadas em Beleacutem e em Satildeo Luis Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade

civil no processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas referidas cidades

Os modelos de gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

partindo da anaacutelise dos programas eou projetos habitacionais implementados em Beleacutem e em

Satildeo Luiacutes desde a implantaccedilatildeo das Secretarias Municipais de Habitaccedilatildeo

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS ADOTADOS

No processo de implementaccedilatildeo das poliacuteticas urbanas emergem conflitos entre os

atores sociais envolvidos que buscam novas formas de fazer valer seus direitos Para tanto

procurou-se analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas nas duas

cidades amazocircnicas estudadas assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e

a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente Aleacutem disso buscou-se analisar

as accedilotildees ou programas implementados pelos governos municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes no

sentido de reduzir as carecircncias habitacionais das referidas cidades e interpretar as conexotildees

entre as praacuteticas governamentais no processo de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais e as

necessidades objetivas dos grupos sociais demandantes de tais poliacuteticas

Dessa forma para um melhor entendimento sobre a Poliacutetica Habitacional eacute

importante destacar que a intervenccedilatildeo estatal possui papel essencial pois por meio dessas

poliacuteticas poderaacute regular organizar e coordenar as accedilotildees interventivas no espaccedilo urbano

247

Assim entende-se que toda poliacutetica puacuteblica eacute uma forma de regulaccedilatildeo ou intervenccedilatildeo na

sociedade [] toda poliacutetica puacuteblica eacute um mecanismo de mudanccedila social (SILVA 2001 p

37-38)

Gramsci (2002 p 222) argumenta que o Estado75 eacute dividido em dois sociedade civil

(responsaacutevel por divulgar as ideologias por meio do sistema escolar as igrejas os partidos

poliacuteticos os sindicatos os meios de comunicaccedilatildeo etc) e sociedade poliacutetica (que satildeo os

aparelhos de coerccedilatildeo sob o controle das burocracias-executivas ligado as forccedilas armadas e

policiais) Declara ainda que o Estado natildeo exerce a coesatildeo pura e simples ele utiliza

mecanismos de consenso para legitimar-se para evitar o conflito de classes buscando atender

as demandas existentes das classes subalternas76

O Estado legitima-se natildeo soacute por meio dos aparelhos coercitivos mas pela sua forte

presenccedila na economia no qual o interesse da sociedade se faz presente Em outros termos o

Estado apesar de servir a classe dominante precisa dar resposta agraves exigecircncias da classe

dominada e as demandas apresentadas Segundo Carvalho (1991 p 11) o Estado ao tomar a

responsabilidade pela formulaccedilatildeo e execuccedilatildeo das poliacuteticas econocircmicas e sociais responde a

demanda e pressatildeo das classes dominadas por meio de poliacuteticas puacuteblicas sendo estas a forma

concreta da intervenccedilatildeo estatal na realidade social

Oszlak e O Donnell (1976 p 21) destacam um importante conceito sobre o que eacute a

poliacutetica puacuteblica

Um conjunto de accedilotildees e omissotildees que manifestam uma modalidade de intervenccedilatildeo do Estado em relaccedilatildeo a uma questatildeo que chama a atenccedilatildeo o interesse e a mobilizaccedilatildeo de outros atores da sociedade civil Desta intervenccedilatildeo pode-se inferir uma determinada direccedilatildeo uma determinada orientaccedilatildeo normativa que presumivelmente afetaraacute o futuro curso do processo social desenvolvido ateacute entatildeo em torno do tema

Entretanto a poliacutetica puacuteblica natildeo abrange apenas as decisotildees e accedilotildees tomadas pelo

Estado mas tambeacutem a omissatildeo estatal frente a algumas realidades que caso natildeo sofram uma

intervenccedilatildeo direta seja por parte do Estado ou de organizaccedilotildees natildeo-governamentais nunca

teratildeo oportunidade de mudanccedila

75 Denominado de Estado ampliado natildeo existindo separaccedilatildeo entre Estado e sociedade 76 No final do seacuteculo XIX os neoliberais defendiam a concepccedilatildeo de que o Estado deveria intervir minimamente na economia agindo de forma neutra desenvolvendo accedilotildees complementares com o mercado como regulador natural das relaccedilotildees sociais No entanto a crise econocircmica de 1929 nos Estados Unidos atinge a economia mundial agravando a questatildeo social fazendo com que o Estado assumisse a funccedilatildeo de mediador nos conflitos sociais entre as classes dominantes e dominadas

248

O Estado atua por meio de poliacuteticas puacuteblicas e sociais visando a manutenccedilatildeo das

relaccedilotildees sociais atraveacutes da garantia de direitos sociais Para Sposati (2001 p 65) natildeo

devemos esquecer que mediante a poliacutetica social eacute que direitos sociais se concretizam e

necessidades humanas (leia-se sociais) satildeo atendidas na perspectiva da cidadania ampliada

Segundo Faleiros (2006 p 31) as poliacuteticas sociais satildeo forma de mecanismos de

relaccedilatildeo e articulaccedilatildeo de processos poliacuteticos e econocircmicos As poliacuteticas sociais satildeo respostas

e formas de enfrentamento das expressotildees da questatildeo social

De acordo com Sposati (2001 p 87)

[] a poliacutetica social natildeo deve ser somente realizada pelo governo mas tem que ser disputada na populaccedilatildeo para que politicamente mesmo que o segmento que natildeo estaacute sendo imediatamente incluiacutedo que natildeo vai usar aquela escola ou aquele programa entenda e incorpore a necessidade de ter aquela atenccedilatildeo

Nota-se que o processo das poliacuteticas puacuteblicas eacute assumido por uma diversidade de

sujeitos que entram saem ou permanecem no processo sendo estes orientados por diferentes

racionalidades e movidos por diferentes interesses Segundo Silva (2001) dentre os principais

sujeitos estatildeo os grupos de pressatildeo (movimentos sociais e outras organizaccedilotildees) partidos

poliacuteticos ou poliacuteticos individualmente (responsaacuteveis por tomar decisotildees fixar prioridades e

objetivos das poliacuteticas) administradores e burocratas teacutecnicos planejadores e avaliadores

(responsaacuteveis por formular alternativas) e o judiciaacuterio (responsaacutevel por garantir direitos) No

que diz respeito agrave poliacutetica habitacional historicamente vem cedendo a influecircncia de atores

sociais do setor imobiliaacuterio e financeiro

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se

numa das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo da sociedade civil (SOUZA RODRIGUES 2004 p 13)

Segundo Rodrigues (1998 p 82) a poliacutetica habitacional nada mais eacute que uma

poliacutetica puacuteblica enquanto estrateacutegia de dominaccedilatildeo burguesa e tambeacutem poliacutetica econocircmica em

249

suas forccedilas sociais operacionais visto que surge no bojo da Reforma Brasileira O Estado

portanto como regulador social aplicador da poliacutetica habitacional distribui de forma

dissociada os equipamentos urbanos acirrando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial a qual tem sido

foco de discussatildeo dos movimentos sociais urbanos que por meio de suas mais diversas

formas tem exigido do Estado respostas concretas agraves suas demandas e o exerciacutecio de gestotildees

democraacuteticas que sejam capazes de amenizar as carecircncias sociais tendo na questatildeo da

moradia uma de suas manifestaccedilotildees mais expressivas

Tomando como base o objeto de estudo pode dizer que a poliacutetica habitacional em

Beleacutem era realizada ateacute meados da deacutecada de 1990 por diversos oacutergatildeos da Prefeitura

Municipal de Beleacutem (PMB) uma vez que somente em 1998 que foi criada a Secretaria

Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Estes oacutergatildeos eram a Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo

Geral do Planejamento e Gestatildeo (SEGEP) criada em 1993 a Companhia de

Desenvolvimento e Administraccedilatildeo da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) a Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) e a SESAN

A SEGEP era responsaacutevel pelo planejamento do orccedilamento municipal vinculado

diretamente ao Prefeito possuindo em sua estrutura o Departamento de Desenvolvimento

Municipal e o Departamento de Orccedilamento Administraccedilatildeo e Financcedilas Cabia a CODEM

buscar financiamentos para a habitaccedilatildeo principalmente por meio da CEF Aleacutem disso a

CODEM criou a Diretoria de Infraestrutura e Habitaccedilatildeo e o Fundo de Habitaccedilatildeo para o

Municiacutepio que funcionava de maneira independente do Fundo de Desenvolvimento Urbano

Sua atuaccedilatildeo era na regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de interesse social e tambeacutem na administraccedilatildeo da

enfiteuse da Primeira Leacutegua Patrimonial

A SEURB tinha uma atuaccedilatildeo fraca no setor uma vez que era responsaacutevel pelo

controle urbaniacutestico

liberaccedilatildeo de alvaraacutes licenciamentos e fiscalizaccedilatildeo A SESAN era

responsaacutevel pelos projetos e execuccedilatildeo das obras de macrodrenagem em aacutereas prioritaacuterias de

urbanizaccedilatildeo

Embora a SEGEP fosse responsaacutevel por articular as poliacuteticas intersetoriais que

visava buscar a integraccedilatildeo entre as accedilotildees e projetos dos diversos oacutergatildeos natildeo proporcionou de

fato a elaboraccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional capaz de envolver uma accedilatildeo integrada dos

diferentes setores do poder puacuteblico municipal

Efetivamente os programas e projetos especiacuteficos para a produccedilatildeo habitacional e

melhorias das condiccedilotildees habitacionais natildeo foram de iniciativa municipal A PMB teve sua

accedilatildeo restrita ao apoio institucional para os reassentamentos de famiacutelias em aacutereas de

intervenccedilatildeo dos programas de saneamento e drenagem coordenados pela COSANPA

250

Com a criaccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) por meio da Lei

Municipal nordm 7865 que tem por objetivo promover a poliacutetica municipal de habitaccedilatildeo de

interesse social contribuindo para a melhoria das condiccedilotildees da habitaccedilatildeo e reduccedilatildeo do deacuteficit

habitacional em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo

por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular (SEHAB 2011) pode-se afirmar que

haacute um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez que reconhece o direito a moradia como

poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da poliacutetica habitacional

De acordo com o entrevistado (teacutecnico da SEHAB)

A SEHAB foi criada em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular A expectativa de atendimento das demandas acumuladas com relaccedilatildeo agraves condiccedilotildees de moradia se ampliaram e acabaram por fortalecer a proposta de criaccedilatildeo de uma secretaria especiacutefica para a temaacutetica habitacional uma vez que a inexistecircncia de uma estrutura institucional clara e definida que encaminhasse uma poliacutetica habitacional consistente apresentava-se como grande empecilho para o municiacutepio (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2009)

A SEHAB visa promover planejar coordenar executar controlar e avaliar as

atividades de poliacutetica habitacional no municiacutepio como oacutergatildeo da administraccedilatildeo direta do

mesmo Conforme organograma institucional da Secretaria (SEHAB 2011) a elaboraccedilatildeo e

implementaccedilatildeo dos Projetos de Obras Fiacutesicas (construccedilatildeo de equipamentos urbanos rede de

drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua equipamentos comunitaacuterios

pavimentaccedilatildeo de ruas e construccedilatildeo de moradias) satildeo de responsabilidade do Departamento de

Programas e Projetos Habitacionais (DPPH)

O Departamento Social (DESO)77 eacute responsaacutevel pelos projetos sociais da referida

secretaria possui uma equipe multidisciplinar composta por Assistente Social Pedagogo

Psicoacutelogo e Historiador objetivando elaborar e implementar os Projetos de Trabalho Social

que se datildeo por meio de trecircs eixos geraccedilatildeo de trabalho e renda educaccedilatildeo soacutecio-poliacutetica e

educaccedilatildeo ambiental

77 Atualmente o quadro teacutecnico do Departamento Social da SEHAB possui duas Assistentes Sociais efetivas trecircs Assistentes Sociais comissionados uma Psicoacuteloga um Historiador e quatro Estagiarias o que na realidade prejudica o desenvolvimento do trabalho uma vez que no ano de 2010 a Secretaria contava com um corpo teacutecnico de doze Assistentes Sociais e dez estagiaacuterios

251

Figura 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

Fonte SEHAB (2011)

Dados da Prefeitura Municipal de Beleacutem relatam que a SEHAB implementa os

programas de fomento ao cooperativismo reassentamento de famiacutelias residentes em aacuterea de

risco e insalubres urbanizaccedilatildeo de aacutereas onde eacute efetiva a detecccedilatildeo de habitaccedilotildees em condiccedilotildees

subumanas assim como reforma e ampliaccedilatildeo de unidades habitacionais (SEHAB 2011)

As accedilotildees da PMB destinadas a questatildeo habitacional tem sido atribuiacuteda aos oacutergatildeos

oficiais diretamente envolvidos com a temaacutetica da poliacutetica habitacional SEHAB Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) Secretaria Municipal de Saneamento (SESAN) CODEM

e SEGEP (conforme demonstrado no quadro abaixo) Contudo o fato de haver sobreposiccedilotildees

de atividades redundou na ausecircncia da participaccedilatildeo articulada de oacutergatildeos importantes da

administraccedilatildeo municipal dificultando o desenvolvimento de uma poliacutetica puacuteblica integrada

(BELEacuteM 2007)

SECRETAacuteRIO DIRETOR GERAL

NUacuteCLEO DE PLANEJAMENTO E

ACOMPANHAMENTO

GABINETE

NUacuteCLEO DE ASSUNTOS JURIacuteDICOS

DEPARTAMENTO SOCIAL

DIV PESQ E HABITACcedilAtildeO

SOCIAL

DIV DESENV COMUNITAacuteRIO

DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO

IMOBILIAacuteRIO

DIV DE RECURSOS HUMANOS

FINANCEIROS MATERIAIS

DIVISAtildeO IMOBILIAacuteRIA

DEPARTAMENTO PROGRAMAS E

PROJETOS SOIAIS

DIV PROJETOS AVALIACcedilAtildeO E

CUSTOS

DIV EXECUCcedilAtildeO E FISALIZACcedilAtildeO

DE OBRAS

252

Quadro 9 - Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

Oacutergatildeo Atribuiccedilatildeo Legal Atribuiccedilatildeo Efetiva Sobreposiccedilatildeo com outros oacutergatildeos

SEHAB

Planejar coordenar executar controlar e avaliar as atividades da Poliacutetica de Habitaccedilatildeo do Municiacutepio

Promoccedilatildeo da avaliaccedilatildeo teacutecnica de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilotildees

A CODEM e Secretaria Municipal de Financcedilas (SEFIN) realizam avaliaccedilotildees de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e emitem laudos teacutecnicos avaliativos com base em criteacuterios diferenciados

Elaboraccedilatildeo de projetos executivos de engenharia e arquitetura de empreendimentos habitacionais de infraestrutura e de urbanizaccedilatildeo

A SEURB tem esta mesma atribuiccedilatildeo aplicada pela Lei nordm 8009 de 250502 (elaboraccedilatildeo gratuita de projetos de engenharia civil para atender agrave construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares)

Remanejamento assentamento e desapropriaccedilatildeo de aacutereas em ocupaccedilotildees conflituosas

A SESAN desenvolve esta atividade nas aacutereas onde implanta projetos

SEURB

Executar coordenar controlar conservar e avaliar as obras de paisagismo e edificaccedilotildees puacuteblicas municipais

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral bem como as obras particulares atraveacutes da legislaccedilatildeo em vigor

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

SEGEP

Coordenar a elaboraccedilatildeo avaliaccedilatildeo reformulaccedilatildeo e atualizaccedilatildeo dos instrumentos baacutesicos do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Promover a articulaccedilatildeo de atividades entre as entidades integrantes do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Administrar o sistema viaacuterio do Municiacutepio de Beleacutem

Idem A SEURB faz planejamento urbano

253

SESAN Administrar os resiacuteduos soacutelidos

Idem

Educaccedilatildeo ambiental Esta atribuiccedilatildeo eacute de competecircncia

legal da SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu a Divisatildeo de Educaccedilatildeo Ambiental e Desenvolvimento Comunitaacuterio vinculada agrave SEURB

Habitaccedilatildeo construccedilatildeo realocaccedilatildeo e desapropriaccedilatildeo na implantaccedilatildeo de projetos relacionados agraves suas atribuiccedilotildees

Egrave uma das atribuiccedilotildees efetivas da SEHAB

CODEM

Pesquisar planejar executar financiar e controlar as atividades de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria urbanizaccedilatildeo e habitaccedilatildeo

Executar as atribuiccedilotildees de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria

SEURB nas atividades de urbanizaccedilatildeo SEHAB nas de habitaccedilatildeo

Promover a Enfiteuse Pelo novo Coacutedigo Civil passa a ser aplicado o Direito de Superfiacutecie

Implementar projetos urbaniacutesticos

SEURB e SEHAB

Implementar a poliacutetica habitacional municipal

SEHAB

Desenvolver atividades de apoio ao SIPLAG

Avaliaccedilatildeo de imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e transaccedilatildeo comerciais para compra

SEHAB e SEFIN

Fonte BELEacuteM Prefeitura Municipal de Diagnoacutestico Institucional Municiacutepio de Beleacutem-Paraacute In______ Plano Estrateacutegico Municipal para Assentamentos Subnormais Beleacutem SEGEP (2005)

Mediante esse quadro nota-se que haacute uma sobreposiccedilatildeo de funccedilotildees acarretada pela

proacutepria lei de criaccedilatildeo dos oacutergatildeos e pela insuficiecircncia institucional da SEHAB o que fez com

que funccedilotildees fossem atribuiacutedas eou assumidas de acordo com o perfil da gestatildeo e dos

responsaacuteveis pelos oacutergatildeos

A PMB aponta como principais aspectos que tecircm sido responsaacuteveis pelas

dificuldades de interaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos do governo municipal nessa aacuterea

A ausecircncia de uma vinculaccedilatildeo da gestatildeo municipal a um modelo espacial de estruturaccedilatildeo urbana capaz de nortear as accedilotildees de planejamento urbano associadas agrave poliacutetica habitacional

A falta de coerecircncia na conduccedilatildeo do ordenamento territorial tem feito com que as accedilotildees puacuteblicas e privadas no territoacuterio municipal se realizem sem benefiacutecios para o desenvolvimento da poliacutetica habitacional no que se refere a

254

inibiccedilatildeo de processos imobiliaacuterios especulativos impossibilitando a implementaccedilatildeo dos instrumentos de poliacutetica habitacional previstos no Plano Diretor

O deacuteficit de recursos materiais humanos e teacutecnicos na maioria dos oacutergatildeos municipais o que implica muitas vezes na natildeo-efetivaccedilatildeo de suas atribuiccedilotildees legais

A ausecircncia de um sistema de informaccedilotildees atualizado e unificado (informaccedilotildees em rede) que apoacuteie o planejamento o acompanhamento dos resultados das accedilotildees enfim a gestatildeo puacuteblica municipal e

As pressotildees sociais por accedilotildees isoladas e localizadas imediatas face aos deacuteficits acumulados historicamente de infraestruturas urbanas e comunitaacuterias e a escassez de recursos financeiros para responder a tais demandas (SEGEP 2005 p 24)

Entretanto apesar das dificuldades apresentadas o Estatuto da Cidade possibilitou a

implementaccedilatildeo de novos instrumentos que contribuiacuteram no desenvolvimento de accedilotildees mais

efetivas por parte do oacutergatildeo gestor no processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Para tanto foram criados o Orccedilamento Participativo (OP)78 e o Congresso da Cidade

como instrumentos para promover a gestatildeo participativa da cidade ou seja como

instrumentos de intermediaccedilatildeo na relaccedilatildeo entre governo municipal e sociedade Eacute um

processo de planejamento que tem como princiacutepio a participaccedilatildeo direta da sociedade nas

decisotildees sobre a aplicaccedilatildeo dos recursos a serem investidos em obras e serviccedilos pela prefeitura

Em Beleacutem a ideacuteia do governo era de que mediante a participaccedilatildeo popular seria

possiacutevel deslanchar um processo de gestatildeo capaz de fazer frente aos problemas da cidade

decorrentes do descaso de sucessivas intervenccedilotildees estatais centralizadoras

A iniciativa da participaccedilatildeo popular no OP teve como base a ausecircncia de poliacuteticas

puacuteblicas para as aacutereas de baixadas o que levou a sociedade a demandar serviccedilos e obras em

especial na aacuterea de saneamento baacutesico

Dessa maneira a administraccedilatildeo municipal priorizou a temaacutetica do saneamento

realizando o planejamento estrateacutegico da Marca Sanear Beleacutem79 com a missatildeo de elevar a

qualidade de vida proporcionando agrave sociedade condiccedilotildees dignas de limpeza drenagem aacutegua

78 Avritzer (2001) ressalta que OP eacute uma estrutura e um processo de participaccedilatildeo baseados em trecircs princiacutepios e em um conjunto de instituiccedilotildees que funcionam como mecanismos ou canais que asseguram a participaccedilatildeo no processo decisoacuterio do governo municipal Esses princiacutepios satildeo 1) participaccedilatildeo aberta a todos os cidadatildeos sem nenhum status especial atribuiacutedo a qualquer organizaccedilatildeo inclusive as comunitaacuterias 2) combinaccedilatildeo da democracia direta e representativa cuja dinacircmica institucional concede aos proacuteprios participantes a definiccedilatildeo de regras internas e 3) alocaccedilatildeo dos recursos para investimentos baseada na combinaccedilatildeo de criteacuterios gerais e teacutecnicos ou seja compatibilidade entre as decisotildees e regras estabelecidas pelos participantes e as exigecircncias teacutecnicas e legais da accedilatildeo governamental respeitando tambeacutem os limites financeiros 79 A administraccedilatildeo municipal definiu 06 (seis) programas baacutesicos que ficaram conhecidos por Marcas de Governo Dar um Futuro agraves Crianccedilas Sauacutede para Todos Transporte Humano Revitalizar Beleacutem Sanear Beleacutem e Participaccedilatildeo Popular (BELEacuteM 1997)

255

potaacutevel esgoto melhoria habitacional e educaccedilatildeo sanitaacuteria e ambiental (BELEacuteM 1997)

Dentre as accedilotildees municipais relacionadas ao Sanear Beleacutem destacam-se conforme quadro 10

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001)

Programa Accedilatildeo

Instituiccedilatildeo Promotora

Natureza da Provisatildeo Projeto Localizaccedilatildeo

Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica

PROacute-MORADIA

PROacute-MORADIA

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Eduardo Angelim I

Icoaraci Construccedilatildeo de 300 unidades habitacionais para famiacutelias oriundas do Canal Mundurucus Cipriano Santos Santa Cruz e Gentil

Eduardo Angelim II

Icoaraci Construccedilatildeo de 410 unidades habitacionais e 01 escola e 02 praccedilas para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo

Eduardo Angelim III

Icoaraci

Construccedilatildeo de 304 unidades habitacionais com ofertas de 304 cestas de material de construccedilatildeo para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo e construccedilatildeo de 01 creche e 01 praccedila

Jardim Bom Futuro

Bengui Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Laranjeiras Jurunas Construccedilatildeo de 202 unidades habitacionais

Malvinas Sacramenta

Construccedilatildeo de 01 creche 01 unidade da Famiacutelia Saudaacutevel 02 quadras poliesportivas revestimento do canal sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus I

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus II

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Nova Beleacutem I

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 220 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

256

Nova Beleacutem II

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 240 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

Radional II Jurunas Construccedilatildeo de 604 unidades habitacionais

Raimundo Jinkings

Tapanatilde Construccedilatildeo de 250 unidades habitacionais e 01 quadra

Satildeo Gaspar Tapanatilde Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

HABITAR BRASIL

SEHAB

Infraestrutura Habitacional e

Lotes Urbanizados

Comandante Cabano Antocircnio Vinagre

Marco

Construccedilatildeo de 126 apartamentos para famiacutelias remanejadas da Av1ordm de Dezembro

Riacho Doce

Guamaacute

MORANDO MELHOR SEHAB

Empreacutestimo para Melhoria das Condiccedilotildees Habitacionais

Vila da Barca Teleacutegrafo Reforma de 60 unidades

habitacionais

Satildeo Gaspar Tapanatilde Reforma de 300 unidades habitacionais

PROJETOS DE

REGULARIZACAtildeO

FUNDIA RIA

CODEM Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

Parque Uniatildeo

Tapanatilde Oferta de 682 lotes construccedilatildeo de 01 escola 01 posto de sauacutede e 617 famiacutelias tituladas

Aldo Almeida Tapanatilde

Oferta de 272 lotes para famiacutelias da Macrodrenagem e 77 famiacutelias tituladas

Fonte Pesquisa HABITAT FASE IPPUR UFRJ (2001)

Entretanto natildeo soacute o governo municipal interveio no espaccedilo urbano de Beleacutem o

governo estadual implementou vaacuterias poliacuteticas de urbanizaccedilatildeo na cidade dentre as quais

destacam-se de acordo com o quadro 11 que tiveram accedilotildees de remanejamento ou

reassentamento de famiacutelias

257

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual

Projeto Periacuteodo Localizaccedilatildeo Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica Projeto Urbanizar Meados da

deacutecada de 1980

Assentamento

Jaderlacircndia

Urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e

equipamentos urbanos

Programa de Saneamento e Geraccedilatildeo de Emprego e

Renda (PROSEGE) 1994-1998 Marambaia e

Guanabara

Sistema viaacuterio esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel sistema

de drenagem e estaccedilatildeo de tratamento

Projeto Paracuri II 1997-1999 Icoaraci Oferta de lotes titulaccedilatildeo de famiacutelias

construccedilatildeo de 01 Centro Comunitaacuterio 01 escola e urbanizaccedilatildeo da aacuterea

Projeto de Macrodrenagem da Bacia

do Una 1985-2004

09 Bairros de Beleacutem

Sistema viaacuterio sistema de drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua

potaacutevel revestimento de canais construccedilatildeo de 2 comportas meio fio

calccedilada construccedilatildeo de pontes e aterro de quintais

Programa de Accedilatildeo Social em Saneamento (PASS)

1996-1998 Guanabara Complementar ao PROSEGE na aacuterea da

Guanabara Abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental Programa de Saneamento

para a Populaccedilatildeo de Baixa Renda

(PROSANEAR)

1994-1996 Aacuterea do IPASEP

Guanabara Coqueiro Benguiacute

Esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental

Fonte Portela (2005)

Assim pode-se afirmar que as experiecircncias acima descritas demonstram um

aprendizado de caraacuteter poliacutetico dentro do contexto em que se apresenta no qual a tocircnica de

planejamento e gestatildeo da cidade sempre estiveram assentados numa concepccedilatildeo tecnocraacutetica e

racionalista com vistas a propoacutesitos bens especiacuteficos de desenvolvimento urbano em geral

associado agrave ideacuteia de modernizaccedilatildeo da cidade (TRINDADE JUNIOR 1998)

A cidade de Beleacutem resulta portanto de um dado processo econocircmico poliacutetico social e cultural e nela se concentram e materializam as praacuteticas de sobrevivecircncia dos setores sociais que se constituiacuteram Sua urbanizaccedilatildeo deve ser entendida como expressatildeo social do processo de reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho a forma como estatildeo estruturadas as relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo numa dada conjuntura e sob um determinado modo de produccedilatildeo que no caso eacute o capitalismo (MOURAtildeO 1987 p 38)

Ampliar a participaccedilatildeo popular nos novos formatos institucionais de gestatildeo tem-se

configurado como um importante instrumento para promover a articulaccedilatildeo entre os atores

sociais e para melhorar a qualidade do processo de tomada de decisatildeo reconhecendo desse

modo a capacidade e a potencialidade da proacutepria sociedade civil quanto agrave indicaccedilatildeo dos

caminhos que a cidade deveria seguir

258

Nesse sentido tentou-se implementar o Congresso da Cidade natildeo como um evento

de discussatildeo e de simples proposiccedilatildeo mas como um foacuterum permanente de tomada de decisatildeo

de participaccedilatildeo e de mobilizaccedilatildeo social sendo portanto um espaccedilo puacuteblico natildeo-estatal de

planejamento da cidade ainda que seja uma proposta apresentada pelo governo na qual o

papel deste coloca-se como de fundamental importacircncia com vistas agrave sua implementaccedilatildeo e

eficaacutecia (TRINDADE JUNIOR 1998)

A ideacuteia central do Congresso da Cidade era o de instituir um modelo de gestatildeo e

planejamento de forma articulada fazendo com que a sociedade passe a se preocupar com o

todo da cidade e natildeo somente com seus espaccedilos de habitaccedilatildeo ou com suas necessidades

especiacuteficas (RODRIGUES 2000) Assim buscou-se ampliar e qualificar a participaccedilatildeo

popular por meio da articulaccedilatildeo das vaacuterias dimensotildees e instacircncias antes vivenciadas e da

criaccedilatildeo de novos espaccedilos de participaccedilatildeo adotando uma estrutura organizativa bastante

complexa e dinacircmica80

A experiecircncia poliacutetica e organizativa de um governo popular local deve se expressar como praacutetica social inovadora revolucionaacuteria [] Um governo de caraacuteter democraacutetico e popular compromissado com o objetivo da transformaccedilatildeo da realidade social deve colocar as dimensotildees cultural e poliacutetica como centrais e estrateacutegicas porque quando natildeo se muda valores natildeo se muda nada (RODRIGUES 2000 p 19)

Dessa forma a inversatildeo de prioridades com a transferecircncia de recursos para a

melhoria das condiccedilotildees de vida da sociedade e a universalizaccedilatildeo da cidadania constituiacuteram-se

objetivos a serem alcanccedilados com a implementaccedilatildeo do Congresso da Cidade pelo poder

puacuteblico municipal Entretanto devido a uma seacuterie de problemas de cunho administrativo e

especialmente poliacutetico os objetivos propostos pelo referido Congresso natildeo foram alcanccedilados

em sua totalidade

Cabe destacar que nos uacuteltimos anos a SEHAB vem realizando intervenccedilotildees

significativas na aacuterea de saneamento habitaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo tais como

a) Projeto Vila da Barca I II e III Etapas no bairro do Telegrafo As obras

foram iniciadas no ano de 2003 e abrangendo 960 por meio dos programas

Morar Melhor Palafita Zero e PAC

80 O Congresso da Cidade eacute formado pelas seguintes instacircncias oficinas e reuniotildees preparatoacuterias os congressos distritais temaacuteticos e assembleacuteias setoriais os congressos municipais temaacuteticos e o congresso de Beleacutem Existem tambeacutem as instacircncias de coordenaccedilatildeo e acompanhamento que satildeo constituiacutedas em forma de conselho os Conselhos Distritais o Conselho da Cidade COFIS Conselhos Gestores da Sauacutede e das Escolas e Conselhos de Poliacuteticas Setoriais

259

b) Projeto Portal da Amazocircnia iniciado em 2008 pretende atingir 400 famiacutelias

que residem na Rua Osvaldo de Caldas Brito (Estrada Nova) financiado

pelo PAC

c) Projeto Paracuri sua aacuterea de abrangecircncia eacute o Paracuri II no Distrito de

Icoaraci foi iniciado em 2008 e tem como puacuteblico-alvo 600 famiacutelias

tambeacutem financiado pelo PAC

Contudo devido a questotildees poliacuteticas e institucionais os projetos Paracuri e Portal da

Amazocircnia desde 2010 estatildeo sob a coordenaccedilatildeo da SEURB

Beleacutem na atualidade faz parte de um programa do governo federal o qual tem por objetivo minimizar o deacuteficit habitacional no Brasil o programa Palafita Zero que faz parte do Plano de Aceleraccedilatildeo do Crescimento e tem o propoacutesito de melhorar as condiccedilotildees habitacionais das populaccedilotildees que ocupam os assentamentos precaacuterios eacute atraveacutes deste que visando atender a necessidade em que se compreende a moradia como um direito humano e fundamental e consequumlentemente a formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo desta poliacutetica Habitacional no acircmbito municipal (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

A SEHAB como oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor de alguns projetos de

urbanizaccedilatildeo tecircm por obrigatoriedade responder as demandas colocadas pela populaccedilatildeo e

garantir o direito a moradia conforme seus objetivos Todavia ressalta-se que tais projetos

natildeo satildeo muitas vezes garantidos natildeo passam pelas as exigecircncias dos agentes financiadores da

obra fiacutesica e da obra de cunho social estes tem paracircmetros conceituais e teacutecnicos jaacute

estipulados verbas jaacute destinadas agraves quais limitam o trabalho social e consequumlentemente ateacute o

projeto fiacutesico (BELEacuteM 2007) Um desses impasses ressalta-se a seguir na fala de uma

Assistente social que compotildee o quadro teacutecnico da referida secretaria (2010)

A SEHAB eacute um oacutergatildeo da PMB destinado agrave questatildeo habitacional e se envolve diretamente com a temaacutetica da poliacutetica habitacional [] a secretaria foi criada para atender as demandas com relaccedilatildeo as condiccedilotildees de moradia Contudo hoje percebemos que soacute a SEHAB natildeo eacute o suficiente para sanar todos esses problemas pois estrutura institucional e fiacutesica insuficiente articulaccedilatildeo insuficiente com os demais oacutergatildeos municipais inexistecircncias de terras estocadas o alto iacutendice de famiacutelias conviventes (56652 famiacutelias) e etc

Segundo o teacutecnico da SEHAB (2010)

O trabalho desenvolvido pela SEHAB diante as ocupaccedilotildees irregulares se da atraveacutes de um planejamento social da aacuterea e da populaccedilatildeo a ser atingida pelo

260

projeto fiacutesico habitacional se baseando nos criteacuterios estabelecidos em cada projeto desenvolvido pela mesma e de acordo com os tramites legais juntamente com base nas diretrizes da poliacutetica habitacional o que atraveacutes da utilizaccedilatildeo dos instrumentos teacutecnicos funcionais busca metodologias para proporcionar a melhoria ou a mudanccedila de um determinado contexto por meio de um diagnoacutestico e levantamento soacutecio econocircmico delimitando desta maneira agrave demanda para que haja a intervenccedilatildeo A SEHAB busca intervir no meio atraveacutes de reuniotildees com a comunidade assembleacuteias accedilotildees educativas e informativas sobre o projeto que possa vir a atingir a aacuterea estudada

Pode-se dessa forma salutar que a SEHAB tem o objetivo de promover a poliacutetica

urbana na cidade contribuindo de alguma forma para a melhoria das condiccedilotildees de moradias

da populaccedilatildeo captando recursos implementando programas e projetos estreitando parceria

com a comunidade e oacutergatildeos puacuteblicos privados e ateacute mesmo organizaccedilotildees internacionais

poreacutem nem sempre se eacute possiacutevel ter o alcance dos objetivos o que pode se destacar na fala do

teacutecnico da secretaria

A garantia de direito eacute insuficiente com relaccedilatildeo a constituiccedilatildeo federal logo nem toda demanda tem seus direitos garantidos os programas satildeo insuficientes Plano diretor existe mais natildeo eacute colocado em praacutetica Direito a moradia natildeo eacute soacute casa p morar mas eacute necessaacuterio ter condiccedilotildees de habitabilidade acesso a serviccedilos [] o poder puacuteblico busca captaccedilatildeo de recursos para investir nos projetos mais esquece de pocircr em praacutetica seus instrumentos como o plano diretor (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

Neste sentido eacute possiacutevel perceber que a moradia enquanto um direito natildeo eacute

garantido a todos esta eacute a loacutegica neoliberal que vem sendo adotada desde a deacutecada de 1990

em que a moradia eacute uma mercadoria de valor muito alto e algumas pessoas somente

conseguem ter acesso a ela por meio de uma poliacutetica social que o Estado atua no combate a

desigualdade poreacutem este Estado tem por base para a sua intervenccedilatildeo a relaccedilatildeo

custobenefiacutecio relaccedilotildees de consumo e de mercado em que se busca o que eacute menos

dispendioso para o mesmo como por exemplo por meio de parcerias entre o puacuteblico e o

privado descentralizaccedilatildeo subsiacutedios fiscais programas de renda miacutenima etc

De acordo com Beleacutem (2007) de uma forma geral no que se refere agrave habitaccedilatildeo

pode-se dizer que diante da accedilatildeo tiacutemida ou insuficiente das poliacuteticas habitacionais somada agrave

desigualdade social resultado dos modelos econocircmicos excludentes adotados pelo paiacutes ao

longo das duas uacuteltimas deacutecadas o que ocorreu nas grandes cidades foi um estiacutemulo agrave

ampliaccedilatildeo de ocupaccedilotildees informais e irregulares A falta de alternativas e o aprofundamento

das situaccedilotildees de precariedade urbana em todo o paiacutes satildeo resultados de um periacuteodo de

261

esvaziamento da poliacutetica urbana no acircmbito federal e o consequumlente enfraquecimento das

demais esferas de governo bem como a retraccedilatildeo dos investimentos puacuteblicos em um periacuteodo

de crescimento da populaccedilatildeo urbana em especial nas grandes cidades e regiotildees

metropolitanas

Os relatoacuterios da PMB chamam a atenccedilatildeo ainda para a grave desestruturaccedilatildeo da

SEHAB para efetivamente assumir a sua competecircncia legal da execuccedilatildeo da Poliacutetica

Habitacional Isso permite por exemplo que a SESAN ou a SEURB com maior e melhor

estrutura justifique a execuccedilatildeo de atividades de competecircncia da Secretaria de Habitaccedilatildeo tais

como o atendimento agraves demandas urgentes para realocaccedilatildeo de populaccedilatildeo avaliaccedilatildeo de

imoacuteveis desapropriaccedilatildeo construccedilatildeo de unidades habitacionais etc

Vale ressaltar que em entrevista concedida por um teacutecnico da SEHAB (2010) a

poliacutetica habitacional eacute entendida como

Nome dado aos diversos processos de urbanizaccedilatildeo adotados pelo poder puacuteblico para atendimento da populaccedilatildeo de baixa renda [] Jaacute tivemos alguns avanccedilos a aprovaccedilatildeo do Estatuto da Cidade (2001) a Criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades (2003) a instituiccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social SNHIS e do Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social FNHIS bem como o seu Conselho Gestor a realizaccedilatildeo de Conferecircncias das Cidades e a retomada da construccedilatildeo de uma poliacutetica nacional de habitaccedilatildeo e fundiaacuteria em Beleacutem esse cenaacuterio tem provocado mudanccedilas institucionais importantes dentre as quais podemos destacar a realizaccedilatildeo da I Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo a instituiccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) a criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) e o novo Plano Diretor de Beleacutem que estabelece as diretrizes para o desenvolvimento urbano e determina a elaboraccedilatildeo de planos setoriais dentre os quais o de habitaccedilatildeo de interesse social Neste sentido ateacute dezembro de 2010 deveraacute ser elaborado o Plano Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social PMHIS de Beleacutem que vai consolidar o planejamento da accedilatildeo municipal referente agrave questatildeo habitacional prevista no Plano Diretor Deve conter as diretrizes linhas programaacuteticas fontes de recursos metas e indicadores que expressem o entendimento do poder puacuteblico e dos agentes sociais a respeito do planejamento habitacional com o objetivo de promover o acesso agrave moradia digna

Dentre os principais desafios a serem enfrentadas pela Secretaria estatildeo implementar

uma poliacutetica habitacional de longo prazo elaborar o PMHIS viabilizar a ampliaccedilatildeo da oferta

de habitaccedilatildeo de interesse social regulamentar as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)

criar a estrutura de coordenaccedilatildeo da elaboraccedilatildeo do PMHIS realizar um seminaacuterio intersetorial

no acircmbito da PMB realizar dezesseis oficinas para diagnoacutestico e elaboraccedilatildeo do plano nos

262

distritos administrativos realizar uma Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo encaminhar a

minuta de Projeto de Lei do PMHIS ao Executivo municipal

Em relaccedilatildeo aos principais avanccedilos a partir da SEHAB podem ser ressaltados a

adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a constituiccedilatildeo do Fundo

Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e

construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a realizaccedilatildeo

do Diagnoacutestico Habitacional e a elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de habitaccedilatildeo A expectativa

eacute que em 2010 os resultados se multipliquem e a SEHAB seja reconhecida pela sua atuaccedilatildeo

responsaacutevel na construccedilatildeo de uma cidade cada vez mais humana (Entrevista concedida por

um teacutecnico da SEHAB 2010)

Na praacutetica nenhum oacutergatildeo ou instituiccedilatildeo eacute de fato responsaacutevel pela articulaccedilatildeo das

accedilotildees nessa escala Nenhum espaccedilo de deliberaccedilatildeo ou debate se apresenta de forma

consolidada e com influecircncia teacutecnica eou poliacutetica suficiente para desencadear um processo de

debate e implementaccedilatildeo de accedilotildees entre os diferentes municiacutepios no que diz respeito agrave poliacutetica

de transporte puacuteblico habitaccedilatildeo saneamento e resiacuteduos soacutelidos (BELEacuteM 2007)

Isso demonstra uma contradiccedilatildeo ao que eacute proposto nos princiacutepios da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo

Direito agrave moradia colocando os direitos humanos mais proacuteximos do centro das preocupaccedilotildees de nossas cidades moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social garantindo padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais funccedilatildeo social da propriedade urbana buscando implementar instrumentos de reforma urbana e garantir acesso a terra urbanizada questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado uma poliacutetica pactuada com a sociedade e que extrapole um soacute governo gestatildeo democraacutetica com participaccedilatildeo dos diferentes segmentos e articulaccedilatildeo das accedilotildees de habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo integrado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Assim pode-se concluir que em Beleacutem embora se tenha avanccedilado em relaccedilatildeo a

poliacutetica habitacional as accedilotildees dos planosprogramas pouco contribuiacuteram para a definiccedilatildeo de

diretrizes de expansatildeo urbana da RMB Fica evidente ainda que os modelos de gestatildeo

implementados desde 1998 natildeo contribuiacuteram para a diminuiccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

e que a relaccedilatildeo entre Estado e sociedade civil avanccedilou em alguns pontos (OP e Congresso da

Cidade) mas depois houve uma estagnaccedilatildeo e a implementaccedilatildeo das accedilotildees observadas nos

diferentes planos e instrumentos de planejamento e controle urbano esbarraram em uma

estrutura administrativa e poliacutetica bastante fraacutegil

263

Em Satildeo Luiacutes constatou-se que o Municiacutepio natildeo dispotildee de uma Poliacutetica Habitacional

elaborada com instrumentos adequados que permita uma gestatildeo compatiacutevel com o niacutevel de

problemas encontrados no mesmo embora possa ser entendido que existe uma preocupaccedilatildeo

com a questatildeo uma vez que em 2006 foi aprovado o Plano Diretor que estaacute em vigor o qual

vem conduzindo o desenvolvimento urbano a partir das diretrizes ali estabelecidas

Entretanto ao lado de toda a sua importacircncia histoacuterica e de sua heranccedila cultural Satildeo

Luiacutes refletido o padratildeo socioeconocircmico do Estado do Maranhatildeo convive com graves

problemas urbanos e sociais apresentando iacutendices de qualidade vida bastante baixos

Notadamente nos itens de alfabetizaccedilatildeo emprego renda esgotamento sanitaacuterio e mortalidade

infantil o que lhe coloca entre as uacuteltimas no ranking das capitais brasileiras (SEMTHURB

2007)

De maneira geral essa situaccedilatildeo eacute fruto de um crescimento urbano carente de avanccedilos

no campo social e de um fortiacutessimo sistema econocircmico que prioriza a concentraccedilatildeo de renda

em detrimento da distribuiccedilatildeo da riqueza produzida pela sociedade Esse modelo ao

promover o empobrecimento da maioria da populaccedilatildeo tem produzido graviacutessimas distorccedilotildees

no processo de ocupaccedilatildeo do territoacuterio e consequumlentemente na produccedilatildeo do espaccedilo urbano

(VILLACcedilA 2001)

Segundo dados da entrevista e do diagnoacutestico realizado pela Prefeitura de Satildeo Luiacutes

as accedilotildees municipais na aacuterea habitacional tecircm acontecido por meio de programas diversos

quase sempre para responder a uma demanda circunstancial Os programas e investimentos

habitacionais derivam de uma sequumlecircncia de iniciativas marcadas por 4 linhas de accedilatildeo e estatildeo

consignadas no Plano Plurianual de Accedilatildeo (PPA)

a) A 1ordf linha chamada Programa Moradia Cidadatilde compreende a melhoria ou

construccedilatildeo da edificaccedilatildeo em que o ocupante possui o terreno desde que a

situaccedilatildeo fundiaacuteria e ambiental do terreno natildeo crie obstaacuteculos

b) A 2ordf linha eacute o Programa de Assentamento Humano de Interesse Social

O

programa prevecirc o reassentamento das famiacutelias que atualmente ocupam

habitaccedilotildees precaacuterias ou em situaccedilatildeo de risco em lote com infraestrutura

baacutesica em terrenos adquiridos e loteados pela Prefeitura

c) A 3ordf eacute o Programa de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

que visa basicamente

oferecer a seguranccedila juriacutedica ao ocupante do imoacutevel O Programa de

Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria jaacute chegou agrave cerca de 10000 lotes registrados de

1989-2002 (Mauro Fecury I e II Coroadinho Vila Satildeo Luis e outros) Os

lotes satildeo oriundos de aacutereas concedidas pela Uniatildeo Federal e outras

264

desapropriadas pelo municiacutepio e destinados a pessoas de ateacute 03 salaacuterios

miacutenimos atraveacutes de um contrato particular de doaccedilatildeo feito pela Prefeitura

que permite a transferecircncia do lote jaacute registrado para o nome do beneficiaacuterio

Ele eacute isento de IPTU se o imoacutevel for avaliado em menos de R$ 1000000 e o

proprietaacuterio natildeo possuir outro imoacutevel

d) A 4ordf linha eacute o Programa de Saneamento Baacutesico e Urbanizaccedilatildeo de Favelas

Os recursos deste Programa como se destinam basicamente agrave infraestrutura

satildeo aplicados principalmente pela Secretaria de Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR)

Entre os incentivos governamentais com impacto na questatildeo habitacional destaca-se

o projeto implementado a partir de 2001 denominado Planejamento e Execuccedilatildeo

Participativos atraveacutes do qual os teacutecnicos do Governo do Estado e da Prefeitura de Satildeo Luis

juntamente com representantes das 14 regiotildees administrativas do municiacutepio discutem

soluccedilotildees para as principais necessidades da comunidade Neste processo demandas de

natureza urbano-habitacional ganharam o peso da prioridade popular sendo muitos deles

resolvidosatendidos

Vale destacar que segundo dados do Pemas no periacuteodo de 1996 a 1998 foram

aplicados pelo Setor Puacuteblico investimentos no valor de R$ 182852160 na produccedilatildeo de

habitaccedilotildees envolvendo a parceria do Municiacutepio com recursos do Estado e da Uniatildeo Esses

investimentos produziram 802 unidades habitacionais sendo 422 no padratildeo embriatildeo e 380

unidades habitacionais aleacutem de 250 lotes urbanizados Foram ainda aplicados recursos na

ordem de R$ 1638350 em melhorias habitacionais e materiais de construccedilatildeo tendo sido

beneficiadas 802 unidades As 380 unidades habitacionais foram produzidas em 1996 com

recursos do programa Proacute-MoradiaCEF e contrapartida municipal no Bairro Coroadinho Os

422 embriotildees foram construiacutedos em 1997 com recursos do Programa Habitar Brasil e

contrapartida fiacutesica do municiacutepio No ano de 2004 foi concluiacuteda a construccedilatildeo de 154 unidades

habitacionais do Residencial Governador Luiz Rocha no Bairro da Cidade Operaacuteria com

recursos do Programa PARCEF no valor de R$ 347220000

Embora a Prefeitura embora tenha realizado algumas accedilotildees na aacuterea habitacional a

partir da integraccedilatildeo de vaacuterias instituiccedilotildees municipais e mesmo fora de sua estrutura

organizacional essa natildeo eacute uma praacutetica sistecircmica e consolidada

De acordo com a estrutura administrativa atual da Prefeitura Municipal de Satildeo Luis

quatro oacutergatildeos da Administraccedilatildeo podem ser identificados como diretamente vinculados agrave

Poliacutetica de Desenvolvimento Urbano Instituto Municipal da Paisagem Urbana (IMPUR)

265

Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPLAN) Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMTUR) e Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo

Urbana (SEMTHURB)

Na realidade o Poder Municipal tem tido dificuldades em instituir um processo de

coordenaccedilatildeo permanente e melhor articulado entre os oacutergatildeos municipais em diversas aacutereas de

atuaccedilatildeo Essa situaccedilatildeo embora natildeo seja exclusiva de Satildeo Luiacutes reflete a maneira autarquizada

de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal (SEMTHURB 2007)

Essa situaccedilatildeo se agrava quando se trata da relaccedilatildeo Estado e Municiacutepio pois satildeo raras

as accedilotildees compartilhadas entre essas duas instacircncias de poderes A razatildeo eacute que essas vecircm

sendo conduzidas por grupos poliacuteticos distintos que buscam consolidar suas atuaccedilotildees na

regiatildeo

Cabe destacar que uma das principais linhas da poliacutetica habitacional da Prefeitura

tem sido a tentativa de promover a geraccedilatildeo de renda para os beneficiaacuterios Nesse sentido tem

havido um compartilhamento de accedilotildees para o desenvolvimento e implementaccedilatildeo do projeto

habitacional envolvendo diversos setores (SEMTHURB 2007)

Desse modo atuam em conjunto com a equipe de projetos o Setor de Serviccedilo Social

da SEMTHURB As instituiccedilotildees SESI e SENAC poderatildeo por meio de convecircnio atuar na

formaccedilatildeo de matildeo-de-obra para construccedilatildeo civil (pedreiros carpinteiros eletricistas etc) e

para outras atividades econocircmicas - corte costura panificaccedilatildeo informaacutetica etc O objetivo eacute

que a populaccedilatildeo envolvida com o projeto seja estimulada a encontrar meios de sobrevivecircncia

gerando renda por meio do recebimento de treinamento e da criaccedilatildeo de cooperativas

No caso da construccedilatildeo civil apoacutes o treinamento os pedreiros satildeo selecionados e os

aprovados satildeo utilizados na produccedilatildeo habitacional na aacuterea do projeto Os recursos satildeo

repassados pela Prefeitura agrave Cooperativa por meio de convecircnio para que ela administre a matildeo-

de-obra com os criteacuterios de acompanhamento fixados pela Prefeitura Apoacutes o teacutermino da

obra os melhores operaacuterios satildeo reaproveitados em outros projetos habitacionais da Prefeitura

(SEMTHURB 2007)81

A fala do teacutecnico da Secretaria (2010) ratifica essas accedilotildees quando narra que

Essas accedilotildees satildeo exemplos de que o Poder Municipal embora com todas as dificuldades de recursos estrutura e da enorme dimensatildeo do problema habitacional no municiacutepio vem se dedicando a encontrar alternativas para o

81 Em Canudos Terra Livre por meio de projeto financiado pelo programa Proacute-Moradia pretendeu-se ampliar essas experiecircncias realizando-se cursos de formaccedilatildeo de matildeo-de-obra em especial na aacuterea de construccedilatildeo civil para capacitar a populaccedilatildeo local a participar da execuccedilatildeo das obras

266

enfrentamento de uma demanda habitacional tatildeo complexa e diversificada Certamente satildeo iniciativas ainda embrionaacuterias que necessitam de um tempo de maturaccedilatildeo para serem avaliadas e reproduzidas em escala maior Poreacutem os resultados satildeo animadores e mostram novas possibilidades de accedilatildeo nessa aacuterea

De acordo com dados do Diagnoacutestico as caracteriacutesticas das unidades habitacionais

produzidas ou financiadas pelo Municiacutepio satildeo

a) As 380 unidades habitacionais produzidas pelo programa Proacute-MoradiaACEF

de 1996 no Bairro Coroadinho constituiacuteram-se de uma edificaccedilatildeo de 4000

msup2 de aacuterea construiacuteda com custo meacutedio por metragem quadrada de R$ 67

50 alcanccedilando o valor de R$ 270000 por unidade habitacional (valores da

eacutepoca e referentes apenas a material) A Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR) foi a executora do projeto adotando o sistema de

autoconstruccedilatildeo

b) As 422 unidades habitacionais de embriatildeo produzidas no Programa Habitar

Brasil 1997 constituiacuteram-se basicamente de um nuacutecleo de 2400 msup2 sem

revestimento composto por dois cocircmodos de permanecircncia

quarto e sala

uma cozinha e um banheiro O custo de construccedilatildeo alcanccedilou o valor de R$

190171 por unidade habitacional a preccedilo meacutedio de R$ 79 2400 o metro

quadrado (valores da eacutepoca) As primeiras unidades foram concluiacutedas em

1999 A contrapartida da Prefeitura foi realizada por meio do apoio teacutecnico e

logiacutestico e remuneraccedilatildeo de parte da matildeo-de-obra

No diagnoacutestico tambeacutem se verificou dados sobre o mercado imobiliaacuterio com

destaque para a construccedilatildeo de moradia no padratildeo popular que apresentam o custo unitaacuterio

meacutedio de R$ 19800 por metro quadrado de construccedilatildeo em uma aacuterea de moradia meacutedia com

5000msup2 em lotes com aacuterea meacutedia de 15000msup282 A relaccedilatildeo entre o preccedilo unitaacuterio meacutedio do

lote em loteamento regularizado na periferia urbana e o da gleba bruta chega a 5 vezes

conforme levantamento realizado pela UEM com base nos preccedilos praticados pelo mercado

82 O preccedilo meacutedio da moradia tiacutepica no Municiacutepio quando em loteamento ou aacuterea regularizada alcanccedila o valor de R$ 2500000 e R$ 1500000 quando situada em loteamentos irregulares ou clandestinos natildeo havendo diferenccedila de valor nesse caso O preccedilo meacutedio do lote popular em torno de R$ 3000m2 quando em loteamento ou aacuterea regularizada se altera para R$ 1300m2 quando localizado em loteamento irregular Quanto ao comprometimento da renda familiar com aluguel conforme informaccedilatildeo levantada pela equipe da UEM a situaccedilatildeo eacute criacutetica para a populaccedilatildeo de um modo geral repercutindo mais nas famiacutelias com renda de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos Estas chegam a comprometer cerca de 30 de sua renda com aluguel mesmo patamar de comprometimento observado no caso das famiacutelias com rendimento de 3 a 5 salaacuterios miacutenimos (SEMTHURB 2010)

267

local demonstrando a dificuldade da populaccedilatildeo de baixa renda em adquirir uma moradia

regular

Logo eacute importante enfatizar que a experiecircncia entretanto mostrou a baixa eficiecircncia

dos programas pontuais A existecircncia de um Conselho a constituiccedilatildeo do Fundo e uma Poliacutetica

habitacional de caraacuteter participativo poderatildeo garantir seguranccedila de que os recursos destinados

aacute aacuterea de habitaccedilatildeo teratildeo a sua utilizaccedilatildeo comprometida com os objetivos aos quais se

destinam ampliando as condiccedilotildees de tornar articuladas as accedilotildees

Cabe ressaltar que natildeo existem em vigor instrumentos juriacutedicos para a

institucionalizaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de uma Poliacutetica Habitacional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

O projeto de Lei de criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo foi enviado agrave

Cacircmara Municipal em 2004 mas ainda natildeo foi implementado

Os instrumentos urbaniacutesticos tais como Plano Diretor Lei de Zoneamento

Parcelamento Uso e Ocupaccedilatildeo do Solo Lei das Operaccedilotildees Urbanas e Lei de Zonas Interesse

Social (ZIS) foram concebidos e aprovados precedidos de amplo debate envolvendo diversos

segmentos da sociedade local

Agrave eacutepoca o conjunto da legislaccedilatildeo representou avanccedilos conceituais e metodoloacutegicos incorporou novos instrumentos de planejamento e gestatildeo e positivamente apontou diretrizes de soluccedilatildeo urbano-espacial e de enfrentamento agrave irregularidade habitacional Todavia a implementaccedilatildeo efetiva dos instrumentos existentes ainda eacute insatisfatoacuterio do ponto de vista da capacidade de facilitar o funcionamento do mercado habitacional na cidade (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2009)

Concorre para essa situaccedilatildeo de um lado a geografia do Municiacutepio suas condiccedilotildees

ambientais a situaccedilatildeo de terrenos da Uniatildeo

marinha e acrescidos especialmente no

segmento constituiacutedo por famiacutelias de baixa renda respeitando-se os padrotildees culturais soacutecio-

econocircmicos da populaccedilatildeo e tendo em vista os princiacutepios de racionalidade no processo de

ocupaccedilatildeo do solo e construccedilatildeo do espaccedilo a cultura urbaniacutestica de ocupaccedilatildeo do solo De outro

lado o estado de pobreza de grande parte da populaccedilatildeo que vem ocupando

desordenadamente o espaccedilo urbano menos valorizado e o que lhe eacute disponibilizado aleacutem do

acelerado e dinacircmico processo de urbanizaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes (SEMTHURB 2007)

Todo esse quadro se associa agrave complexidade de aplicaccedilatildeo da maioria das leis que

em face agrave dinacircmica do crescimento desordenado afastam-se do seu caraacuteter regulamentador

passando a servir tatildeo somente em seus aspectos reparadores Ademais acrescente-se a

268

fragilidade teacutecnico-operacional da Prefeitura Municipal particularmente do seu setor de

fiscalizaccedilatildeo que se ressente de uma melhor estrutura e corpo teacutecnico (SEMTHURB 2007)

Atualmente haacute uma carecircncia no controle de obras e o sistema de informaccedilatildeo se interligado e retroalimentado corretamente poderia facilitar o acesso a essa informaccedilatildeo As informaccedilotildees advindas do geoprocessamento contribuiriam imensamente para um acompanhamento mais efetivo de obras novas que inclusive geram recursos para o municiacutepio atraveacutes do pagamento de tributos (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Nota-se portanto que haacute necessidade de uma qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo

urbana uma tecnologia que emita informaccedilatildeo precisa sobre o crescimento da cidade sobre as

suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar a cidade de modo preventivo com

planejamento de accedilotildees que acompanhem o seu desenvolvimento

Assim para se ter uma gestatildeo qualificada faz-se necessaacuterio primeiramente a

qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa bem como o seu redimensionamento na

medida em que o trabalho com Programas e Projetos Especiais requer essas exigecircncias

Aliado a essa primeira exigecircncia dispor de ferramentas adequadas para o gerenciamento da

cidade atraveacutes do geoprocessamento

No que tange ao processo de fortalecimento da gestatildeo do planejamento urbano

municipal cabe destacar a implementaccedilatildeo do Orccedilamento Participativo a partir de 1998 e

vem se consolidando como importante instrumento de participaccedilatildeo direta dos muniacutecipes

(SEMTHURB 2007)

Outro aspecto a destacar foi o iniacutecio do processo de discussatildeo do Plano Estrateacutegico

da Cidade de Satildeo Luiacutes ao final de 2001 com a mobilizaccedilatildeo de oacutergatildeos puacuteblicos e entidades

representativas da sociedade Em 2002 apoacutes jornadas temaacuteticas foi realizada a Conferecircncia

da Cidade onde foi elaborado o documento estabelecendo as diretrizes princiacutepios linhas

estrateacutegicas metas

a Carta da Cidade Em 2003 foram realizados os estudos teacutecnicos as

propostas de accedilatildeo e elaboraccedilatildeo dos projetos identificados como prioritaacuterios O IPLAM

assumiu a secretaria executiva desse processo (SEMTHURB 2007)83

Dessa maneira o municiacutepio tem o papel de gerar a melhor qualidade de vida para sua

populaccedilatildeo o que eacute difiacutecil complexo pois natildeo eacute apenas fazendo urbanizaccedilatildeo e construindo

casas que se eleva a qualidade de vida ao lado disso eacute preciso haver programas de todas as

esferas de governo para que se tenha geraccedilatildeo de renda Os nuacutecleos de ocupaccedilatildeo indevida

83 Segundo o Diagnoacutestico inicialmente foram estabelecidos trecircs temas baacutesicos para discussatildeo Gestatildeo Democraacutetica Desenvolvimento Sustentaacutevel e Desenvolvimento Urbano e Meio ambiente

269

passam geralmente a ser locais que abrigam uma populaccedilatildeo sem renda o que acarreta em

uacuteltima instacircncia um local de constante violecircncia

Quanto agraves poliacuteticas e aos programas habitacionais a necessidade mais urgente eacute o

conhecimento das populaccedilotildees que hoje jaacute residem em subnormalidade Para conhecimento

dessas habitaccedilotildees e dos nuacutecleos que surgem a cada momento Satildeo Luiacutes assim como a maioria

das cidades principalmente as capitais que estatildeo em franco desenvolvimento vem sofrendo

um crescimento pautado na inexistecircncia de mecanismos de controle sobre as aacutereas de

ocupaccedilatildeo indevida principalmente aacutereas de proteccedilatildeo ambiental aacutereas de mananciais aacutereas de

encostas de rios e aacutereas baixas por exemplo Sobre as aacutereas baixas que satildeo terras da Uniatildeo o

municiacutepio natildeo tem controle absoluto o que dificulta sobremaneira a gestatildeo municipal

Programa de Prevenccedilatildeo Contenccedilatildeo e Controle de Ocupaccedilotildees Irregulares (SEMTHURB

2007) Portanto o cadastramento das ocupaccedilotildees indevidas aliado a programas estaduais

federais e municipais poderaacute garantir melhores condiccedilotildees de vida aos habitantes que hoje

vivem em condiccedilotildees bastante desfavoraacuteveis

Uma das medidas poderia ser a produccedilatildeo de lotes urbanizados que no entanto para

ser viaacutevel poderia ter seus custos minimizados discutindo-se as normativas do governo que

muitas vezes natildeo conseguem ser cumpridas pelos municiacutepios devido ao alto grau de

exigecircncia (SEMTHURB 2007)

A exemplo desse toacutepico algumas qualificaccedilotildees dos programas puacuteblicos por serem

elaborados com regras gerais deixa de observar as caracteriacutesticas particulares de cada

municiacutepio impedindo a sua participaccedilatildeo em programas e projetos conforme a fala do

entrevistado

A contrapartida do municiacutepio em aquisiccedilatildeo de lotes se torna extremamente onerosa pois eacute necessaacuterio que esses sejam adquiridos de empresas particulares pois natildeo se tem acesso agraves terras puacuteblicas na medida em que elas se tornam inviaacuteveis a serem usadas nesses programas Como consequumlecircncia do alto custo da aquisiccedilatildeo de lotes os recursos que restam nem sempre satildeo suficientes para o investimento na infraestrutura ou na produccedilatildeo de mais unidades habitacionais Por outro lado as terras que satildeo adquiridas encontram-se quase sempre afastadas do nuacutecleo urbano o que requer a implantaccedilatildeo de infraestrutura que dote o local de acesso e de qualificaccedilatildeo necessaacuterios para seu funcionamento Se pudeacutessemos usar terras de nuacutecleos urbanos poderiacuteamos tambeacutem utilizar a infraestrutura do local integrando as novas habitaccedilotildees a um nuacutecleo urbano jaacute existente preencher os vazios urbanos de forma organizada e ordenada escolhendo locais apropriados facilitaria sobremaneira a gestatildeo da cidade (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

270

De acordo com os dados levantados na pesquisa uma das grandes dificuldades do

municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra Satildeo Luiacutes por ser uma ilha tem suas terras

como patrimocircnio da Uniatildeo o que dificulta a aplicaccedilatildeo dos programas governamentais Uma

das primeiras exigecircncias por exemplo eacute a titulaccedilatildeo da terra o que eacute praticamente impossiacutevel

de se fazer em aacutereas da Uniatildeo impossibilitando de repassar a titularidade da terra aos

ocupantes muitas vezes exigecircncia do programa puacuteblico (Entrevista concedida pelo teacutecnico

da SEMTHURB 2009)

Pode-se entatildeo concluir que Satildeo Luiacutes apresenta caracteriacutesticas similares em relaccedilatildeo a

Beleacutem no que diz respeito aos modelos de gestatildeo implementados uma vez que esse modelo

demonstra a baixa efetividade da poliacutetica habitacional e que boa parte das accedilotildees no acircmbito

habitacional foram realizadas pelos governos estaduais (COHABs) capital imobiliaacuterio e

incorporadoras acarretando no aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees que retratam

o papel do Estado como ator decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da segregaccedilatildeo

espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do capital

imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrentaram a problemaacutetica da moradia popular

As intervenccedilotildees na aacuterea de moradia ficaram restritas agraves accedilotildees pontuais de concessatildeo

de tiacutetulos de aforamento uso e posse de terrenos inovando-se nas iniciativas de

desapropriaccedilatildeo para reassentamento embora se mantivesse o sistema de remoccedilatildeo de famiacutelias

de aacutereas de risco

Nesse sentido a habitaccedilatildeo passa a ser vista como um investimento complementar

necessaacuterio as condiccedilotildees de produccedilatildeo ao mesmo tempo em que eacute parte das condiccedilotildees de

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho

Para Castells (1893) e Lojkine (1981) o investimento do setor privado na produccedilatildeo

das condiccedilotildees gerais de produccedilatildeo das quais a moradia eacute parte soacute eacute produtivo ateacute certo limite

a partir do qual torna-se desinteressante economicamente falando Eacute nesse momento que o

Estado eacute conclamado a intervir tendo em vista liberar as empresas desse ocircnus a criar as

condiccedilotildees para o processo de produccedilatildeo e acumulaccedilatildeo A produccedilatildeo da moradia como visto

apresenta caracteriacutesticas especiacuteficas Resulta da articulaccedilatildeo de trecircs fatores uso privado do

solo materiais e a construccedilatildeo propriamente dita

O montante de capital exigido para o investimento e o tempo em que ele permanece

sem retorno (imobilizado no processo de construccedilatildeo) provoca a necessidade de uma taxa

maior de lucro o que determina o aumento do preccedilo das moradias ao mesmo tempo em que

desestimula o investimento privado no setor O caraacuteter socialmente necessaacuterio da habitaccedilatildeo

271

tem efeitos sobre a circulaccedilatildeo da mercadoria e a estrutura do seu processo de produccedilatildeo Para

tornaacute-los mais aacutegil nele intervecircm dois tipos de capital o produtivo (construccedilatildeo) e o de

circulaccedilatildeo (imobiliaacuterio) que podem ou natildeo ser compatiacuteveis dependendo do modo de

produccedilatildeo Para que o capital produtivo aumente sua rentabilidade eacute preciso que o capital de

circulaccedilatildeo ou a renda da terra diminua a sua Se a rentabilidade do capital de circulaccedilatildeo cai

diminui o investimento no setor e surge a crise (TOPALOV 1974)

De acordo com Spoacutesito (2004) a moradia apresenta algumas caracteriacutesticas

peculiares que a diferenciam de outras necessidades humanas Primeiramente ela eacute uma

mercadoria e por isso segue as leis de mercado Seu preccedilo eacute regido por estas leis variando de

acordo com alguns aspectos como a localizaccedilatildeo e os equipamentos coletivos disponiacuteveis nas

proximidades

E continua afirmando que a habitaccedilatildeo eacute uma mercadoria relevante porque eacute de

consumo privado

assim como roupa sapato e alimentos aleacutem de ser dispendiosa porque seu

preccedilo eacute muito mais alto que grande parte dos salaacuterios e por isso eacute uma mercadoria

comumente financiada Sua produccedilatildeo eacute lenta porque depende de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido a terra A cada nova moradia exige-se um novo pedaccedilo do espaccedilo

urbano (SPOacuteSITO 2004 p 37)

O solo urbano eacute uma mercadoria sui generis porque natildeo eacute fruto do trabalho e

somente este pode agregar valor a uma mercadoria Entatildeo o valor dado agrave terra natildeo resulta da

forccedila de trabalho mas sim da capacidade de pagar de seus compradores que natildeo eacute igual para

todos os indiviacuteduos As camadas meacutedia e alta podem pagar mais e consequumlentemente se

apropriam de fragmentos urbanos privilegiados (TOPALOV 1974)

Assim as dificuldades geradas no processo de produccedilatildeo soacute poderatildeo ser resolvidas

caso a rentabilidade do setor imobiliaacuterio estimule o investimento Haacute entretanto aqui

tambeacutem outra contradiccedilatildeo jaacute mencionada entre o valor dos salaacuterios e o preccedilo da mercadoria

habitaccedilatildeo o que cria um limite aacute solvabilidade da demanda

Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo do Estado no setor sem a qual a construccedilatildeo da

habitaccedilatildeo social natildeo acontece Essa tem se dado historicamente de vaacuterios modos desde a

existecircncia de uma legislaccedilatildeo regulamentando o uso do solo e o preccedilo de alugueacuteis definindo

espaccedilos e condiccedilotildees especiais que favoreccedilam o acesso da classe trabalhadora agrave moradia ateacute

da construccedilatildeo civil por vezes o construtor eacute o proacuteprio Estado (SPOacuteSITO 2004)

Correcirca (1993 p 29) chama atenccedilatildeo para a precarizaccedilatildeo da questatildeo habitacional

272

No capitalismo as diferenccedilas satildeo muito grandes e maiores ainda em paiacuteses como entre outros os da Ameacuterica Latina A habitaccedilatildeo eacute um desses bens cujo acesso eacute seletivo parcela enorme da populaccedilatildeo natildeo tem acesso quer dizer natildeo possui renda para pagar o aluguel de uma habitaccedilatildeo decente e muito menos comprar um imoacutevel Este eacute um dos mais significativos sintomas de exclusatildeo

Dentre as poliacuteticas concebidas pelo Estado a poliacutetica urbana merece atenccedilatildeo distinta

haja vista que a intervenccedilatildeo estatal no espaccedilo urbano eacute considerada a configuraccedilatildeo mais

elaborada mais desenvolvida da resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas

produtivas (LOJKINE 1981 p 168) Assim o Estado capitalista aparece na forma de

controlar e atenuar as sequumlelas ocasionadas pela segregaccedilatildeo soacutecioespacial imposta por

muitas determinaccedilotildees isto eacute unidade do diverso (MARX 1983 p 14) da produccedilatildeo e

reproduccedilatildeo do modo capitalista

Nota-se que a Poliacutetica Municipal de Habitaccedilatildeo natildeo daacute conta de atender a demanda

populacional das aacutereas atingidas por projetos de intervenccedilatildeo urbaniacutestica visto que os recursos

satildeo limitados e podem ser utilizadas com moderaccedilatildeo no atendimento (exclusivo) agraves famiacutelias

diretamente atingidas pelas obras estabelecendo criteacuterios de acesso que limitam o nuacutemero de

moradores que receberatildeo a unidade habitacional conforme foi apresentado nos capiacutetulos

anteriores

Outro elemento importante a ser discutido em relaccedilatildeo agraves cidades de Beleacutem e de Satildeo

Luiacutes diz respeito ao padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial Percebe-se que na cidade capitalista

o acesso ao espaccedilo urbano eacute restrito e desigual para as diferentes classes sociais que nela se

encontram e que esse acesso desigual fruto da desigualdade social acaba por gerar uma (des)

articulaccedilatildeo espacial e social que por sua vez passa a gerar uma disputa tambeacutem desigual

como aponta Villaccedila (2001 p 148) [] a segregaccedilatildeo deriva de uma luta ou disputa por

localizaccedilatildeo esta se daacute no entanto entre grupos sociais ou entre classes [] A dimensatildeo da

luta aparece quando se introduz a segregaccedilatildeo por classe

De acordo com Villaccedila (2001 p 148) o resultado dessa disputa que articula e

desarticula ao mesmo tempo o espaccedilo urbano gera um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

que cada vez mais procura separardistanciar ricos e pobres e que [] a segregaccedilatildeo seria um

processo dialeacutetico em que a segregaccedilatildeo de uns provoca ao mesmo tempo e pelo mesmo

processo a segregaccedilatildeo de outros O que ele chama de segregaccedilatildeo voluntaacuteria dos mais ricos

que provoca necessariamente a segregaccedilatildeo involuntaacuteria das classes de menor renda

273

Correcirca (1989) descreve trecircs padrotildees de segregaccedilatildeo urbana tais como modelos de

Kohl de Burgess e de Hoyt84 O modelo de Kohl expressa a cidade preacute-industrial marcada

pela segregaccedilatildeo da elite agraves proximidades do centro ficando as camadas de menor poder

aquisitivo na periferia sendo um tipo de organizaccedilatildeo espacial que expressa o interesse da

elite em se localizar proacutexima agraves principais instituiccedilotildees urbanas predominando a

acessibilidade agraves fontes de poder e prestiacutegio (TRINDADE JUNIOR 1998 p 143)

Segundo Trindade Junior (1998 p 143) o modelo de Burgess eacute um tipo de

organizaccedilatildeo espacial e de segregaccedilatildeo no qual os podres passam a habitar os centros

deteriorados e desvalorizados enquanto a elite habita os subuacuterbios apraziacuteveis em virtude do

processo de dispersatildeo de determinadas atividades Jaacute o modelo de Hoyt define um tipo de

segregaccedilatildeo espacial setorizada a partir do centro no qual as aacutereas residenciais de mais alto

padratildeo tenderiam a se localizar nos setores de amenidades e estariam cercadas pelos setores

meacutedios diametralmente opostos encontrar-se-ia um setor mais amplo no qual estaria

localizada a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Dessa forma ressalta-se que em Beleacutem o padratildeo de segregaccedilatildeo que mais se

assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual se percebe

que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas proacuteximas ao

centro

Trindade Junior (1998) argumenta que no momento em que se processa a dispersatildeo

dos assentamentos e da ampliaccedilatildeo do urbano esses locais satildeo valorizados em detrimento dos

novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo dos mesmos pelos agentes que

podem pagar para usufruir da acessibilidade Esses locais passam entatildeo a sofrer

investimentos do capital imobiliaacuterio e incorporador aleacutem disso o Estado atua nessas aacutereas

com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais valorizadas

pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

De acordo com O Neill (1986 apud TRINDADE JUNIOR 1998 p 152) a auto-

segregaccedilatildeo se daacute a partir

[] de modo geral no acircmbito dos grupos sociais dominantes Contudo outros grupos como os assalariados de alto rendimento tecircm se deslocado para aacutereas especificas das cidades criando nelas condiccedilotildees de auto-segregaccedilatildeo Por se constituiacuterem tambeacutem em parte do setor de demanda solvaacutevel do mercado habitacional atraem para si a accedilatildeo dos agentes modeladores Mas esta accedilatildeo soacute eacute possiacutevel na medida em que estes grupos

84 Embora esse tipo de anaacutelise tenha sido superado eacute importante destacar pela descriccedilatildeo da organizaccedilatildeo espacial urbana

274

estatildeo propensos a aceitar os mecanismos criados para moldar suas preferecircncias habitacionais Os novos valores de consumo habitacional permitem a reproduccedilatildeo dos grupos de renda mais alta num ambiente criado especialmente para eles ao mesmo tempo que esta reproduccedilatildeo se constitui em uma garantia para a continuidade da sociedade capitalista dado o niacutevel de renda que estes grupos possuem criando condiccedilotildees de consumo e tendo em vista a reproduccedilatildeo dos quadros profissionais necessaacuterios agrave sociedade Em oposiccedilatildeo a segregaccedilatildeo imposta daacute origem agraves aacutereas residenciais dos grupos de renda mais baixa A formaccedilatildeo destas aacutereas se faz tambeacutem a partir da decomposiccedilatildeo e recomposiccedilatildeo do espaccedilo urbano em direccedilatildeo principalmente agraves aacutereas perifeacutericas preteridas pelos grupos de renda mais alta e agentes que atuam neste modelo Muitas vezes os grupos sem opccedilatildeo de participaccedilatildeo no mercado habitacional utilizam-se de mecanismos espontacircneos para obterem suas moradias Tais mecanismos imprimem a estas aacutereas um ar de informalidade aparente mas na verdade tambeacutem aiacute o uso do solo vem sendo manipulado pelos agentes modeladores do solo

Desse modo a cidade vai ser dividida entre o espaccedilo dos que possuem maior poder

aquisitivo espaccedilo seletivo frequumlentado por aqueles que tecircm altos niacuteveis de renda ou seja os

espaccedilos da auto-segregaccedilatildeo e os espaccedilos dos que possuem menor poder aquisitivo

reduzidos visto que se em sua maioria natildeo tecircm nem condiccedilotildees de possuir uma habitaccedilatildeo que

seja adequada com infraestrutura baacutesica saneamento entre outros

Para Correcirca (1993 p 64) a classe dominante ou algumas de suas fraccedilotildees contribuem

para a segregaccedilatildeo pois

Sua atuaccedilatildeo se faz de um lado atraveacutes da auto-segregaccedilatildeo na medida em que ela pode efetivamente selecionar para si as melhores aacutereas excluindo-as do restante da populaccedilatildeo iraacute habitar onde desejar [] por outro lado segrega os outros grupos sociais na medida em que controla o mercado de terras a incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria e a construccedilatildeo direcionando seletivamente a localizaccedilatildeo dos demais grupos sociais no espaccedilo urbano Indiretamente atua atraveacutes do Estado

Como as poliacuteticas de implantaccedilatildeo e lanccedilamento dos conjuntos habitacionais e dos

loteamentos populares - regulares ou natildeo - satildeo marcadas pelo afastamento espacial e

precariedade das condiccedilotildees de vida urbana os pobres satildeo obrigados a conviver nas aacutereas

mais distantes ficando refeacutens dos territoacuterios em que habitam daiacute a ideacuteia de segregaccedilatildeo

induzida (SPOacuteSITO 2004)

As atuais configuraccedilotildees espaciais e sociais na cidade de Satildeo Luiacutes demonstram um

momento de forte diferenciaccedilatildeo com a verticalizaccedilatildeo e a expansatildeo urbana horizontal

inerentes agraves grandes capitais brasileiras aleacutem da existecircncia de rupturas entre os vaacuterios grupos

sociais organizaccedilotildees e territoacuterios urbanos evidenciando os processos de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial na proliferaccedilatildeo dos novos estilos de morar e de (con)viver no espaccedilo urbano

275

Cabe dizer que esse novo estilo de morar viver e conviver tem se propagado entre a

classe de maior poder aquisitivo acarretando em uma clara distinccedilatildeo entre as classes uma vez

que a classe de padratildeo mais elevado habita aacutereas diferentes das classes meacutedias por exemplo

Em Beleacutem a opccedilatildeo por moradias em condomiacutenios de meacutedio e de alto padratildeo

projetados vertical ou horizontalmente nos eixos Entroncamento-Icoaraci pela Rodovia

Augusto Montenegro e Beleacutem-Ananindeua pela Rodovia BR-316 tem se constituiacutedo em um

dos elementos marcantes da segregaccedilatildeo soacutecioespacial na cidade uma que vez satildeo

incentivados pelos promotores imobiliaacuterios os quais dotam as aacutereas de uma infraestrutura

interna de serviccedilos e lazer (salotildees de festas academias de ginaacutestica lojas supermercados

entre outros) e vendem mais que uma moradia vendem a seguranccedila o conforto e a paisagem

usando-se como justificativa para a consolidaccedilatildeo desses novos habitats urbanos o alto iacutendice

de violecircncia urbana Esses condomiacutenios fechados de enclaves fortificados conferem tambeacutem

um status A construccedilatildeo de siacutembolos de status eacute um processo que elabora diferenccedilas sociais e

cria meios para a afirmaccedilatildeo de distacircncia e desigualdade sociais

Assim verifica-se a consolidaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo urbana convivendo dentro de

um mesmo espaccedilo (a cidade) com processos de segregaccedilatildeo induzida que empurra a camada

de menor poder aquisitivo para as aacutereas sem infraestrutura saneamento equipamentos

urbanos etc Essas novas configuraccedilotildees se datildeo como fruto das praacuteticas accedilotildees e estrateacutegias

dos diversos agentes produtores do espaccedilo urbano geradoras de uma estruturaccedilatildeo urbana

descontiacutenua e segregadora

Para Spoacutesito (2004) a segregaccedilatildeo urbana pode ser vista e entendida como um

processo estrutural ou seja os principais fatores que geram a auto-segregaccedilatildeo e a segregaccedilatildeo

induzida encontram-se na proacutepria sociedade no modo como a sociedade encontra-se

organizada e funciona no estilo de vida e na cultura dominante

Na cidade de Satildeo Luiacutes um significativo processo de verticalizaccedilatildeo pode ser visto na

chamada Cidade Nova onde haacute uma concentraccedilatildeo de escritoacuterios shoppings condomiacutenios

verticais de padratildeo meacutedio e alto e restaurantes situados na orla aleacutem disso a inserccedilatildeo da

cidade no roteiro turiacutestico regional e nacional levou a um massivo investimento na rede

hoteleira Estes fatos acarretaram na transformaccedilatildeo da cidade intensificando a economia e

modernizando seu espaccedilo urbano

Entretanto os condomiacutenios e serviccedilos ofertados aos grupos de maior poder aquisitivo

levam a uma segregaccedilatildeo urbana crescente uma vez que a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo natildeo recebe as benesses da modernizaccedilatildeo da cidade

276

Nesse sentido pode-se dizer que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano no norte da cidade de

Satildeo Luiacutes eacute resultante de uma maior homogeneizaccedilatildeo desse espaccedilo uma vez que se verifica a

tendecircncia da separaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo por meio do emuralhamento das classes com alto

padratildeo aquisitivo

De acordo com Costa (2009) um elemento que deve ser destacado quando se analisa

a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia em Satildeo Luiacutes eacute o sistema poliacutetico oligaacuterquico

estadual que se traduz como patrimonialista e clientelista uma vez que essa produccedilatildeo serve

para atender aos interesses de indiviacuteduos que estatildeo no poder os quais exercem a funccedilatildeo de

empresaacuterios e que deteacutem o controle de serviccedilos

A produccedilatildeo de riquezas pelos grupos dominantes se daacute a partir da construccedilatildeo de patrimocircnios (casas apartamentos fazendas) compra de carros do ano e da moda se constituem empresaacuterios bem sucedidos do comeacutercio de postos de gasolina hospitais escolas hoteacuteis concessionaacuterias Corrupccedilatildeo sistecircmica que produz e reproduz a miseacuteria social e que encontra em Satildeo Luiacutes seu espelho invertido pois alimentou o boom imobiliaacuterio dos condomiacutenios e apartamentos de luxo destinados em vaacuterios casos agrave lavagem de dinheiro (segundo as investigaccedilotildees da PF) Contrapondo nu

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277

urbano que natildeo giram especificamente em torno da produccedilatildeo econocircmica mas do consumo

O interesse se daacute a partir da apropriaccedilatildeo diferenciada do produto do trabalho que satildeo as

vantagens locacionais Isso ocorre porque o espaccedilo urbano eacute heterogecircneo Se as pessoas

estivessem uniformemente distribuiacutedas na cidade os diversos espaccedilos de consumo tenderiam

a satisfazer agrave grande maioria das pessoas (VILLACcedilA 2001 p 97)

A distinccedilatildeo mais importante entre espaccedilo intra-urbano e espaccedilo regional deriva dos transportes e das comunicaccedilotildees Quer no espaccedilo intra-urbano quer no regional o deslocamento de mateacuteria e do ser humano tem um poder estruturador bem maior do que o deslocamento da energia ou das informaccedilotildees A estruturaccedilatildeo do espaccedilo regional eacute dominada pelo deslocamento das informaccedilotildees da energia do capital constante e das mercadorias em geral

eventualmente ateacute da mercadoria forccedila de trabalho O espaccedilo intra-urbano ao contraacuterio eacute estruturado fundamentalmente pelas condiccedilotildees de deslocamento do ser humano seja enquanto portador da mercadoria forccedila de trabalho

como no deslocamento casatrabalho - seja enquanto consumidor

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho deslocamento casas-compra casa lazer escola etc Exatamente daiacute vem por exemplo o enorme poder estruturador intra-urbano das aacutereas comerciais e de serviccedilos a comeccedilar pelo proacuteprio centro urbano Tais aacutereas mesmo nas cidades industriais satildeo as que geram e atraem a maior quantidade de deslocamentos (viagens) pois acumulam os deslocamentos de forccedila de trabalho

os que ali trabalham

com os consumidores

os que ali fazem compras e vatildeo aos serviccedilos (VILLACcedilA 2001 p 20)

A argumentaccedilatildeo de Villaccedila (2001 p 38) para se compreender a dinacircmica intra-

urbana parte do conceito de terra-localizaccedilatildeo as quais satildeo fraccedilotildees da terra urbana (terra-

capital) que desfrutam de determinados graus de acessibilidade e de trabalho acumulado

Assim o preccedilo da terra-localizaccedilatildeo tem um componente essencial que eacute o preccedilo

monopoacutelio

Todo proprietaacuterio de uma terra-localizaccedilatildeo no acircmbito do espaccedilo urbano eacute proprietaacuterio de um bem uacutenico irreproduziacutevel Considerando que nem todos os proprietaacuterios possuem as mesmas vantagens quanto as suas propriedades Embora toda localizaccedilatildeo seja uacutenica haacute entre elas vaacuterios graus de acessibilidades e de trabalho acumulado Na maioria das vezes os proprietaacuterios de lotes perifeacutericos natildeo desfrutam de vantagens no tocante a esses atributos (VILLACcedilA 2001 p 39)

De acordo com Trindade Junior (1998) a dispersatildeo dos assentamentos a expansatildeo

do ambiente construiacutedo e o trabalho social acumulado tendem cada vez mais a elevar os

preccedilos dos imoacuteveis em setores ou regiotildees especificas que por sua vez poderatildeo ser

apropriados e concentrados por um grupo privilegiado de agentes Para tanto ele destaca o

278

capital incorporador como elemento importante dessa tendecircncia uma vez que as empresas

imobiliaacuterias garantem a promoccedilatildeo de moradias com retornos expressivos pelos investimentos

realizados nos espaccedilos urbanos

Dessa forma o mercado imobiliaacuterio exerce sua influecircncia nos processos de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial e exclusatildeo social a partir da construccedilatildeo de cenaacuterios e necessidades

imaginaacuterios vendidos para uma parcela da populaccedilatildeo em busca de status por meio de

grandes campanhas de marketing como por exemplo a venda de lotesterrenos a altos preccedilos

em condomiacutenios ou loteamentos fechados

Maricato (2000 p159) afirma que a escassez de moradias e a segregaccedilatildeo territorial

satildeo produtos de um mercado imobiliaacuterio que entre outras coisas vende o cenaacuterio e a

paisagem como signos de distinccedilatildeo de renda e de poder acirrando os processos excludentes e

segregativos no interior dos espaccedilos urbanos brasileiros Para Spoacutesito (2004 p79) os

interesses fundiaacuterios e imobiliaacuterios desempenham um papel primaz no processo de produccedilatildeo e

estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Tal posiccedilatildeo do capital de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria decorre das particularidades da relaccedilatildeo entre a habitaccedilatildeo e o espaccedilo urbano Primeiro porque o caraacuteter imoacutevel do produto faz com que a reproduccedilatildeo do capital tenha como pressuposto a sua permanente mobilidade espacial A cada novo ciclo um terreno eacute necessaacuterio Segundo porque a potencialidade construtiva da terra natildeo se resume a seus atributos de meio de produccedilatildeo e suporte fiacutesico mas tambeacutem como meio de consumo para isso necessita estaacute em conexatildeo com uma complexidade de bens e serviccedilos urbanos que dependem de processos econocircmicos poliacuteticos e simboacutelicos Essa dinacircmica pressupotildee uma loacutegica de expropriaccedilatildeo natildeo podendo existir fronteira urbano-imobiliaacuteria sem essa loacutegica E o setor imobiliaacuterio eacute estrateacutegico nesse sentido (TRINDADE JUNIOR 1998 p 157)

Pode-se afirmar entatildeo que o mercado imobiliaacuterio influencia diretamente nos

processo de planejamento e gestatildeo das cidades aqui em especial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luiacutes impondo um planejamento urbano baseado em princiacutepios antidemocraacutetico e

favorecendo interesses da classe dominante aleacutem de promover a manutenccedilatildeo e o aumento dos

processos de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de exclusatildeo social

Destarte a estrutura urbana natildeo pode ser compreendida somente como organismo do

tecido urbano pois natildeo existe um modelo exclusivo de estrutura de cidade e sim satildeo

diferentes estruturas e simbolismos

Portanto o Estado enquanto organizador do espaccedilo urbano ao mesmo tempo em que

promove agrave poliacutetica habitacional de interesse social nega a habitaccedilatildeo a quem dela necessita

279

Essa poliacutetica quando oficializada pode prever mecanismos para efetivaccedilatildeo do Plano Diretor

de Beleacutem e de Satildeo Luiacutes a fim de respaldar os direitos das famiacutelias atingidas pelas

intervenccedilotildees de renovaccedilatildeo urbana e eliminar o deacuteficit habitacional das aacutereas de intervenccedilatildeo

Nesse sentido cabe ressaltar que a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia eacute de suma

importacircncia para a resoluccedilatildeo do caos urbano Pode ser alcanccedilada a compreensatildeo de que a

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional eacute um dos caminhos para a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da

cidade tornando-a um lugar onde todos possam viver de forma digna

[] nesta perspectiva o habitar deixa de ser representado simplesmente pela unidade habitacional como produto acabado de consumo passando a ser compreendido como parte de um processo expressando a forma de inserccedilatildeo social e econocircmica de seu ocupante partiacutecipe enquanto sujeito histoacuterico da construccedilatildeo e implementaccedilatildeo de um plano de accedilatildeo de poliacuteticas urbanas (ABELEacuteM 1989 p 64)

Assim a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

habitacionais das cidades para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

280

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Pretendeu-se nessa tese trazer agrave cena reflexotildees sobre a gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim como os impactos na organizaccedilatildeo

espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das cidades de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-

Ma e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais

Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da

poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e

excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando

em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O modelo de desenvolvimento urbano implementado tem contribuiacutedo para aumentar

a exclusatildeo social econocircmica poliacutetica e cultural de uma grande parcela da populaccedilatildeo A falta

de alternativas em relaccedilatildeo agrave moradia leva essa populaccedilatildeo a ocupar espaccedilos inadequados para a

habitaccedilatildeo como encostas vaacuterzeas inundaacuteveis beiras de rios e cursos d aacutegua e ateacute mesmo

aacutereas de proteccedilatildeo de mananciais Essas ocupaccedilotildees frequumlentemente ilegais caracterizam-se

tambeacutem pela construccedilatildeo de moradias muito precaacuterias e em regiotildees sem nenhuma

infraestrutura

Desse modo o processo de urbanizaccedilatildeo nas grandes cidades em especial nas duas

capitais estudadas revela a face avassaladora do modo de produccedilatildeo capitalista na qual a

necessidade de obtenccedilatildeo de espaccedilos e a transformaccedilatildeo dos mesmos em mercadoria

transformam a cidade num palco de luta pelo domiacutenio e pelo poder

Constatou-se que ao longo das uacuteltimas cinco deacutecadas as poliacuteticas puacuteblicas urbanas

natildeo foram eficazes para resolver os principais problemas das cidades estudadas gerando os

conflitos causados pelo baixo padratildeo de vida constituindo-se em contradiccedilotildees do

funcionamento do proacuteprio sistema capitalista

A cidade como forma concretizada do processo de urbanizaccedilatildeo eacute um produto e

condiccedilatildeo de (re) produccedilatildeo de uma sociedade O espaccedilo urbano eacute produzido de modo desigual

em um processo complexo e dinacircmico onde ocorre tanto a expansatildeo do tecido urbano quanto

a verticalizaccedilatildeo em determinadas partes das cidades

Nota-se que a poliacutetica urbana foi orientada para atender a demanda do capital

monopolista expandindo a infraestrutura serviccedilos de comunicaccedilatildeo e de transporte Por meio

de medidas governamentais o Estado procurou garantir todo o suporte necessaacuterio para a

281

dinacircmica industrial aleacutem disso investiu esforccedilos para a expansatildeo nacional da infraestrutura

de transporte o que estimulou a migraccedilatildeo intensiva em direccedilatildeo agraves aacutereas urbanas em busca de

melhores condiccedilotildees de vida

A trajetoacuteria da poliacutetica habitacional eacute notadamente marcada por diversos atores

sociais que estabelecem uma correlaccedilatildeo de forccedilas entre suas posiccedilotildees ocupadas no espaccedilo

social e no espaccedilo fiacutesico Isto se constitui segundo Bourdieu (2001) como um fator simboacutelico

importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do proacuteprio posicionamento social desses atores

Cabe destacar nesse aspecto que no processo de implementaccedilatildeo da poliacutetica

habitacional haacute de um lado as camadas populares que buscam espaccedilos de moradia em aacutereas

insalubres com enorme carecircncia de serviccedilos urbanos essenciais reforccedilando um ciclo de

pobreza cada vez mais difiacutecil de ser rompido e de outro lado a figura do Estado que surge

para atender aos interesses das classes dominantes exercendo sobre a classe trabalhadora

accedilotildees de controle repressatildeo e exclusatildeo Contraditoriamente este mesmo Estado direciona

suas accedilotildees para atender as demandas populares com o objetivo de obter legitimidade

Como ressalta Jacobi (1988) se o Estado cede controla e ateacute impotildee demandas e

canais de filtragem das reivindicaccedilotildees os movimentos sociais alteram suas estrateacutegias de

accedilatildeo passando a agir coletivamente numa nova modalidade de accedilatildeo natildeo fazendo somente

reivindicaccedilotildees mas sobretudo garantindo o controle das poliacuteticas puacuteblicas

Nessa luta pelo espaccedilo tambeacutem se pode identificar os interesses dos grupos

econocircmicos ligados aos processos de acumulaccedilatildeo urbana e defrontando-se com estes atores

as camadas populares que fazem pressatildeo junto ao Estado exigindo deste a efetivaccedilatildeo de

serviccedilos urbanos no intuito de garantir sua sobrevivecircncia

Sendo assim a ocupaccedilatildeo do espaccedilo vai se configurando a partir das correlaccedilotildees de

forccedilas e das alteraccedilotildees intra-urbanas instituiacutedas entre os agentes produtores desse espaccedilo

colocando em evidecircncia a estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais que

estabelecem estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas tanto do lado do Estado quanto do lado

dos agentes sociais

Nota-se que nas deacutecadas de 1960 e 1970 o governo federal implementou um

processo de planejamento municipal e regional nunca antes realizado no Brasil no qual vaacuterios

oacutergatildeos federais foram criados para gerenciar incentivar e financiar a poliacutetica urbana das

cidades principalmente daqueles que formavam as regiotildees metropolitanas do Paiacutes buscando

a implantaccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional em grande escala por meio do BNH e outros

organismos

282

Entretanto os resultados dessa poliacutetica demonstram que o nuacutemero de habitaccedilotildees

construiacutedas ficou muito aqueacutem da necessidade apontada pelo deacuteficit Aleacutem disso o modelo

econocircmico de exclusatildeo social assumido pelos vaacuterios governos a partir dessas deacutecadas e o

crescimento populacional fizeram aumentar ainda mais a demanda por moradias

Destarte as necessidades do processo de acumulaccedilatildeo capitalista e de reproduccedilatildeo

ampliada das classes sociais contribuem para o caraacuteter do uso do solo na cidade do capital O

desenvolvimento das forccedilas produtivas a partir das inovaccedilotildees tecnoloacutegicas levou as unidades

de produccedilatildeo a requererem uma infraestrutura capaz de atender as suas demandas que vatildeo

desde uma boa localizaccedilatildeo ateacute a instalaccedilatildeo de modernos equipamentos com o objetivo de

favorecer a dinacircmica deste modelo econocircmico

Conforme foi discutido anteriormente Villaccedila (2001) afirma que a produccedilatildeo do

espaccedilo eacute na verdade a produccedilatildeo de localizaccedilotildees As diferentes localizaccedilotildees apresentam

diferentes valores associados natildeo somente ao valor dos elementos urbanos aiacute existentes mas

tambeacutem a maior ou menor acessibilidade aos bens e serviccedilos existentes na cidade Essa

diferenciaccedilatildeo entre valores das localizaccedilotildees explica a diferenccedila de valor das aacutereas urbanas

Os diferentes valorespreccedilos das aacutereas urbanas implicam em uma distribuiccedilatildeo

espacial da populaccedilatildeo de acordo com a capacidade desta em arcar com os custos de

localizaccedilotildees especiacuteficas Essa eacute a razatildeo da existecircncia na cidade de aacutereas onde predominam

grupos sociais homogecircneos sob o ponto de vista da renda

As aacutereas melhor localizadas e portanto com maior valor satildeo ocupadas pela

populaccedilatildeo de maior renda restando agrave parcela de menor poder aquisitivo a ocupaccedilatildeo das aacutereas

de menor valor com restrita acessibilidade a bens e serviccedilos urbanos Tal processo se

expressa na segregaccedilatildeo social do espaccedilo (SANTOS 2002)

Dessa forma a apropriaccedilatildeo mercadoloacutegica do espaccedilo urbano reforccedila as accedilotildees

clientelistas e tecnocraacuteticas do poder puacuteblico que em parceria com instituiccedilotildees privadas

priorizam fatores econocircmicos em funccedilatildeo dos sociais provocando o acirramento das

expressotildees da questatildeo social

Conforme Rolnik (2002) apesar das accedilotildees de desenvolvimento ser apresentadas

como forma de melhoria da qualidade de vida e de acesso agrave moradia digna seu objetivo natildeo eacute

suprir as necessidades humanas mas sim acumular capital posto que as accedilotildees

governamentais seguem a loacutegica das agecircncias financiadoras das obras de eficiecircncia e eficaacutecia

neste caso para os investimentos na poliacutetica habitacional

283

Quando se procura analisar compreender ou intervir no espaccedilo urbano onde se

realizam as experiecircncias humanas natildeo pode deixar de ser considerado qualquer que seja a

relaccedilatildeo dos indiviacuteduos com os lugares Poreacutem o que se tem visto eacute exatamente o contraacuterio

As poliacuteticas de renovaccedilatildeo urbana em Beleacutem e em Satildeo Luis buscando maior

funcionalidade do espaccedilo para atender a interesses dos especuladores imobiliaacuterios

comprometem as paisagens e os cenaacuterios dessas cidades que passam a sofrer intervenccedilotildees

sem que se considere a memoacuteria urbana como exemplo pode-se citar bairros tradicionais que

tiveram seus quarteirotildees transformados em shopping centers criando focos geradores de

grande traacutefego patrimocircnios arquitetocircnicos que registravam a histoacuteria e a memoacuteria da cidade

foram substituiacutedos por edifiacutecios acentuando o processo de adensando por verticalizaccedilatildeo que

elevam os preccedilos dos lotes dos terrenos e ameaccedilam outras aacutereas

Harvey (1996) ressalta que muitas das inovaccedilotildees e investimentos destinados a tornar

as cidades mais atraentes como centros culturais e de consumo foram copiadas em outros

lugares e o fato da gestatildeo urbana ser tratada como empresariamento leva agrave competiccedilatildeo

interurbana visando a atraccedilatildeo de financiamentos externos passando a tratar a cidade como

uma mercadoria como um lugar que oferece condiccedilotildees favoraacuteveis a acumulaccedilatildeo capitalista

Para Vainer (2002) os planos estrateacutegicos propostos para serem realizados nas

cidades satildeo muito semelhantes independendo dos locais ou seja eles devem vender a mesma

coisa aos mesmos compradores virtuais que tecircm invariavelmente as mesmas necessidades e

entre eles estatildeo os investidores internacionais

Complementando essa ideacuteia Harvey (1996) argumenta ainda que passando a atuar

como uma empresa a administraccedilatildeo municipal compreende a cidade como coisa cidade-

objeto ou cidade-mercadoria esquecendo de seu aspecto fundamental que eacute cidade-sujeito

Eacute necessaacuterio que se pense a cidade como um lugar em que se estabelece relaccedilotildees de

sociabilidade interesses expectativas mobilidade social e econocircmica Bourdieu (1996) diz

que a cidade eacute um poderoso e complexo campo onde inuacutemeros atores se reuacutenem munidos de

diferentes olhares perspectivas e capitais culturais a fim de disputar a definiccedilatildeo do que eacute a

proacutepria realidade

Entatildeo compreender a cidade como um lugar de accedilotildees caracteriacutesticas de uma cultura

pensamentos e percepccedilotildees permite introduzir a subjetividade dentro do esquema estruturalista

de reproduccedilatildeo social Para Bourdieu (2001 p 349) isso acontece porque o habitus eacute ao

mesmo tempo subjetivo e social Subjetivo porque diz respeito agrave interiorizaccedilatildeo de valores

normas e classificaccedilotildees e eacute social porque os elementos interiorizados fazem parte da estrutura

284

social em reproduccedilatildeo bem como as instituiccedilotildees (famiacutelia escola etc) em que satildeo produzidos

reproduzidos e consagrados

Portanto pode-se dizer que a cidade eacute capaz de ser reinventada reconstruiacuteda

cotidianamente tanto no amplo fiacutesico (obras de engenharia) como no plano das

representaccedilotildees A cidade eacute a imagem que seus cenaacuterios ajudam a constituir mas eacute tambeacutem o

imaginaacuterio que o urbano a ela impotildee complementando a sua construccedilatildeo histoacuterico-cultural na

qual o habitus eacute orientado natildeo soacute pelos interesses econocircmicos mas por elementos muitas

vezes inconscientes expressos em valores gestos religiosidade cultura etc

Partindo do estudo analiacutetico efetivado evidencia-se que as primeiras intervenccedilotildees

urbaniacutesticas nas cidades estudadas foram direcionadas por accedilotildees pontuais no setor de

saneamento seguidas de accedilotildees de infraestrutura que direcionaram o crescimento das mesmas

e o aumento da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria que satildeo refletidos no desenvolvimento do processo

de urbanizaccedilatildeo por possuir um espaccedilo de concentraccedilatildeo e de oportunidades de trabalho e por

reproduzir diariamente o fenocircmeno da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Este aspecto eacute fundamental

para se compreender a gestatildeo de poliacuteticas habitacionais atual na regiatildeo amazocircnica

Ao se analisar o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial em Beleacutem e em Satildeo Luis

constatou-se que foi constituiacuteda desde quando os primeiros colonizadores chegaram agrave regiatildeo

Todavia este processo ganhou conteuacutedo e forma com a ocupaccedilatildeo das aacutereas centrais das

cidades por uma demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo que passou a utilizar-se deste espaccedilo para

subsidiar a reproduccedilatildeo do capital em especial do capital imobiliaacuterio Assim pode-se afirmar

que nas cidades citadas a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute fruto dos deacuteficits sociais acumulados

por deacutecadas de governos descomprometidos com os interesses da maioria da populaccedilatildeo

Conforme visto no capiacutetulo V o processo de ocupaccedilatildeo nas cidades estudadas

aumentou as desigualdades sociais Isto eacute decorrente da urbanizaccedilatildeo embasada na loacutegica da

globalizaccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional que determina natildeo somente as relaccedilotildees poliacuteticas

mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees sociais e culturais

Neste contexto observa-se que a configuraccedilatildeo espacial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luis sofreu uma ampla (re)configuraccedilatildeo tornando-se necessaacuterio a cada novo ciclo

produtivo um novo solo Este fato pode ser verificado no aumento por demandas

habitacionais principalmente para as classes sociais de menor poder aquisitivo

Outro aspecto identificado foi a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano dessas duas cidades

como uma arena na qual se defrontam interesses divergentes na luta pela apropriaccedilatildeo da terra

da renda por melhores condiccedilotildees materiais e simboacutelicas de vida entre outros aspectos uma

vez por meio da anaacutelise do processo de ocupaccedilatildeo territorial nota-se que o modelo de poliacutetica

285

habitacional vem historicamente desconsiderando os laccedilos de vizinhanccedila e a sociabilidade

das famiacutelias atingidas diretamente pelas obras de infraestrutura e saneamento

Bourdieu (2001) ressalta que a cidade pode ser entendida como unidade geograacutefica

permeada de sociabilidade que eacute caracterizada por uma rede de accedilotildees e relaccedilotildees nas quais

estatildeo presentes elementos simboacutelicos e materiais nas relaccedilotildees de vizinhanccedila nos costumes

comuns na identidade na histoacuteria na cultura no parentesco nas lutas no territoacuterio

Faz-se necessaacuterio destacar as intervenccedilotildees urbaniacutesticas implementadas pelo poder

puacuteblico municipal e estadual a partir de 1990 que (re)configuraram as aacutereas de baixadas e de

palafitas Aqui em especial pode-se citar a cidade de Beleacutem uma vez que as intervenccedilotildees

realizadas foram resultantes das reivindicaccedilotildees da sociedade civil que tiveram

gradativamente suas demandas por saneamento e habitaccedilatildeo atendidas pelos gestores

Para o enfrentamento a essas demandas eacute da maior importacircncia agrave garantia de

participaccedilatildeo das populaccedilotildees atingidas no processo de elaboraccedilatildeo dos projetos urbaniacutesticos

Reforccedila-se que a participaccedilatildeo social nos projetos habitacionais eacute fundamental para diminuir

os efeitos negativos dos mesmos e para garantir

ainda que minimamente - os direitos sociais

dos moradores enquanto cidadatildeos

Benevides (1994) argumenta que uma cidadania plena eacute uma cidadania ativa que

instituiacute o cidadatildeo como portador de direitos e deveres mas essencialmente criador de

direitos por abrir novos espaccedilos de participaccedilatildeo poliacutetica onde se vecirc a possibilidade de se

ampliarem os direitos poliacuteticos para a participaccedilatildeo direta do cidadatildeo no processo das decisotildees

de interesse puacuteblico

Outro aspecto a ser enfatizado eacute que a pesquisa comprovou que poliacutetica habitacional

dos referidos municiacutepios natildeo daacute conta de atender efetivamente a demanda social por moradia

digna Os dados sobre assentamentos precaacuterios revelam um nuacutemero elevado em Beleacutem (449)

e em Satildeo Luis (115) aleacutem do alto iacutendice de famiacutelias conviventes o que acarreta na

insustentabilidade das mesmas do ponto de vista soacutecio-ambiental do territoacuterio sendo

necessaacuteria a efetivaccedilatildeo de intervenccedilotildees que visem agrave inclusatildeo soacutecioespacial do expressivo

contingente populacional que reside nesses assentamentos

A necessidade de construccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional com foco na integraccedilatildeo

urbana de assentamentos precaacuterios especialmente na garantia do acesso ao saneamento

baacutesico agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e agrave moradia adequada articulada a outras poliacuteticas sociais e

de desenvolvimento econocircmico eacute essencial na implementaccedilatildeo de qualquer gestatildeo estrateacutegica

de combate agrave pobreza e perspectiva de sustentabilidade urbana

286

Desse modo torna-se imprescindiacutevel a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia para reduccedilatildeo

do deacuteficit habitacional e garantir a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da cidade tornando-a um lugar

onde todos possam viver de forma digna compreendendo que o direito agrave moradia natildeo eacute

somente ter uma unidade habitacional mas eacute um processo de inclusatildeo social cultural e

econocircmica das pessoas que nela habitaratildeo e que podem ser vistas como sujeitos histoacutericos e

partiacutecipes do processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas urbanas

No desenvolvimento da pesquisa verificou-se que em Beleacutem a SEHAB como

oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor da poliacutetica habitacional desenvolveu

programasprojetos de urbanizaccedilatildeo visando atender agraves demandas colocadas pela populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo no intuito de garantir o direito agrave moradia conforme seus objetivos

Todavia vale ressaltar que tais programasprojetos natildeo satildeo muitas vezes garantidos

conforme demonstrado no Capiacutetulo V uma vez que natildeo passam pelas as exigecircncias dos

agentes financiadores da obra fiacutesica e da obra de cunho social Estes tecircm paracircmetros

conceituais e teacutecnicos estipulados verbas destinadas agraves quais limitam o trabalho social e

consequumlentemente ateacute o projeto fiacutesico

A insuficiecircncia de investimentos eou suspensatildeo das obras de urbanizaccedilatildeo por falta

de repasse de recursos por parte do governo federal ou por parte das agecircncias multilaterais eacute

outro problema levantado na pesquisa que impede o alcance dos objetivos propostos dos

programasprojetos habitacionais os quais objetivam diminuir o deacuteficit habitacional

Neste sentido percebe-se que a moradia enquanto um direito do cidadatildeo e dever do

Estado natildeo eacute garantido perpetuando a loacutegica neoliberal em que a moradia eacute compreendida

como uma mercadoria de alto valor a qual soacute tem acesso as pessoas com maior poder

aquisitivo ou para as pessoas que possuem baixa renda satildeo elaboradas poliacuteticas que visam

combater essa desigualdade social Entretanto o Estado acaba investindo em projetos que

objetivam a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano mas que atendem as relaccedilotildees de consumo e de

mercado

Na pesquisa observou-se uma grave desestruturaccedilatildeo da SEHAB Esta possui um

corpo teacutecnico reduzido em termo de quantidade e de qualidade o que leva agrave dificuldade de

acesso aos recursos por falta de capacidade teacutecnica e pouca estrutura para desenvolver os

programasprojetos habitacionais o que acarreta na transferecircncia de sua competecircncia legal de

execuccedilatildeo da Poliacutetica Habitacional para outras secretarias como a SEURB ou SESAN que

possuem uma estrutura maior e melhor Aleacutem disso haacute uma perda de teacutecnicos capacitados em

funccedilatildeo da falta de um plano de cargos e salaacuterio e haacute uma falta de articulaccedilatildeo teacutecnica-poliacutetica

na elaboraccedilatildeo de projetos de captaccedilatildeo de recursos

287

Um fator importante a ser destacado eacute o elevado iacutendice de irregularidade fundiaacuteria e

a inexistecircncia de um Plano Municipal de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria ocasionando na ilegalidade

generalizada em relaccedilatildeo agraves legislaccedilotildees urbanas que eacute visivelmente constatada no

distanciamento existente a cidade legal e a cidade ilegal ou real

Para Rolnik (2002) essa ilegalidade se divide em ilegalidade como estrateacutegia de

acesso agrave moradia das classes de menor poder aquisitivo e ilegalidade como forma de burlar a

legislaccedilatildeo em aacutereas de grande valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria como meio de atender a interesses

especulativos de segmentos organizados da produccedilatildeo imobiliaacuteria inseridos nos processos de

acumulaccedilatildeo revelando a face de exclusatildeo e segregaccedilatildeo da gestatildeo urbana nas cidades

Portanto essas praacuteticas ilegais de uso do solo urbano conduzem a uma maior

vulnerabilidade da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo uma vez estas natildeo possuem a

titularidade de seus terrenos aleacutem de ficarem cada vez mais excluiacutedas dos processos poliacuteticos

de governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

Haacute tambeacutem que se ressaltar o problema de escassez de terras para a produccedilatildeo

habitacional e formaccedilatildeo de estoques de terras que viabilizariam o desenvolvimento dos

programasprojetos habitacionais futuros

Outro problema levantado na pesquisa diz respeito agrave falta de regulamentaccedilatildeo dos

instrumentos do Plano Diretor tais como a outorga onerosa do direito de construir solo

criado imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo entre outros o que

intensifica ainda mais a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo atingida pelos programasprojetos executados

visto que a cobranccedila dos benefiacutecios oriundos dessas accedilotildees estatildeo sob a tutela do poder puacuteblico

o que dificulta as possibilidades de se criarem mecanismos que assegurem a futura

permanecircncia dos moradores na aacuterea

O estudo apontou que em Beleacutem natildeo eacute falta de planejamento urbano que contribui

para a permanecircncia da segregaccedilatildeo soacutecioespacial mas de accedilotildees concretas de aplicabilidade

por parte dos gestores municipais Como informa Villaccedila (2001) natildeo existe falta de

planejamento como justificativa dos problemas urbanos o problema estaacute no tipo de

planejamento e na ineficiecircncia dos gestores puacuteblicos

Considerando a realidade urbana de Beleacutem o plano diretor natildeo estaacute cumprindo sua

funccedilatildeo social pois para que isso ocorra eacute necessaacuterio ampliar as formas participativas da

sociedade a fim de garantir a inserccedilatildeo de diferentes atores organizaccedilotildees lutas e sujeitos no

processo de gestatildeo das poliacuteticas em especial a habitacional exigindo do poder puacuteblico

moradia digna saneamento equipamentos urbanos etc

288

Cabe destacar tambeacutem que a falta de integraccedilatildeo dos projetos de infraestrutura

habitaccedilatildeo e saneamento com as poliacuteticas de mobilidade acessibilidade controle urbaniacutestico

desenvolvimento econocircmico e social implantaccedilatildeo de equipamentos comunitaacuterios tem

provocado accedilatildeo isoladas e fragmentadas sem apreender a cidade como um todo na qual cada

instituiccedilatildeo planeja a partir de sua percepccedilatildeo o modo de operacionalizar as accedilotildees nas aacutereas

urbanas

Entende-se contudo que se faz necessaacuterio estabelecer diretrizes especiacuteficas acerca

desta questatildeo

baseadas nas leis e normas existentes como o Estatuto da Cidade e Plano

Diretor

para entatildeo implementar accedilotildees que possibilitem intervir no meio urbano de forma

eficiente eficaz e com efetividade incluindo o estabelecimento de norma que obriguem as

agecircncias financiadoras e executoras das accedilotildees a garantirem moradia digna transporte urbano

de qualidade acessibilidade infraestrutura adequada agrave toda a populaccedilatildeo

Todavia entre o que o Estatuto da Cidade determina e as interpretaccedilotildees desse

estatuto que orientam as accedilotildees da vida cotidiana (praacutexis) existem toda uma trama de interesses

que expressam o jogo das percepccedilotildees e das cogniccedilotildees da realidade construiacuteda compondo toda

uma gama de poderes simboacutelicos (BOURDIEU 2001) que decerto modo se materializam na

vida das cidades

Todos esses fatores relacionados podem explicar as accedilotildees tiacutemidas ou insuficientes

desenvolvidas pela SEHAB Entretanto cabe destacar que a secretaria conseguiu alguns

avanccedilos nesses uacuteltimos anos como a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse

Social a constituiccedilatildeo do Fundo Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho

Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria (em andamento) a realizaccedilatildeo do Diagnoacutestico Habitacional e a

elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de Habitaccedilatildeo (em andamento)

Dessa forma a SEHAB representa um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez

que reconhece o direito a moradia como poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da

poliacutetica habitacional Aleacutem disso apresenta uma seacuterie de desafios a serem enfrentadas

conforme citado no capiacutetulo V

Em Satildeo Luis a pesquisa realizada constatou que natildeo haacute uma poliacutetica habitacional

elaborada com instrumentos adequados o que possibilitaria a implementaccedilatildeo de uma gestatildeo

eficaz no combate aos problemas de moradia encontrados no municiacutepio Aleacutem disso a

fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano da cidade eacute decorrente dos investimentos industriais e do

Estado que transformaram o solo em mercadoria cujo elevado preccedilo ocasiona na expulsatildeo da

camada de menor poder aquisitivo para aacutereas distantes do centro e sem infra-estrutura

289

Conveacutem salientar que na capital ludovicense satildeo desenvolvidos accedilotildees de intervenccedilatildeo

no solo urbano por meio de projetos habitacionais que visam atender as diretrizes aprovadas

no Plano Diretor Entretanto a SEMTHURB assim como a SEHAB em Beleacutem natildeo tem

conseguido articular accedilotildees em conjunto com os outros oacutergatildeos municipais o que reflete a

forma autarquizada de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal

Ao longo da pesquisa de campo verificou-se que os projetos desenvolvidos pela

SEMTHURB longe de solucionar os problemas habitacionais da populaccedilatildeo ludovicense

acarretaram no agravamento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial uma vez que as famiacutelias que

habitavam as aacutereas de palafitas foram remanejadas para locais bem distantes de sua origem

provocando a perda de laccedilos de vizinhanccedila e da identidade local construiacutedas por esses

moradores durante deacutecadas

Outra questatildeo a ser enfatizada eacute a relaccedilatildeo conflituosa entre a Prefeitura Municipal de

Satildeo Luis e o Governo do Estado do Maranhatildeo pois satildeo raras as accedilotildees compartilhadas entre

essas duas instacircncias de poderes Um dos motivos que se coloca eacute a conduccedilatildeo das accedilotildees por

grupos poliacuteticos distintos que buscam se consolidar na regiatildeo

A pesquisa tambeacutem revelou que natildeo existe um Conselho Municipal da Habitaccedilatildeo de

Interesse Social e que o Fundo natildeo foi constituiacutedo o que fragiliza as accedilotildees da SEMTHURB

no sentido de garantir recursos agrave aacuterea habitacional comprometendo o alcance dos objetivos

propostos nos projetos

Outra questatildeo eacute a baixa qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo das obras urbanas

Para resoluccedilatildeo de tal problemaacutetica eacute necessaacuterio a implementaccedilatildeo de capacitaccedilatildeo adequada agraves

accedilotildees desses agentes puacuteblicos e a instalaccedilatildeo de um sistema de informaccedilatildeo que precise sobre o

crescimento da cidade suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar as accedilotildees de modo

preventivo com planejamento e acompanhamento de seu desenvolvimento Assim para se ter

uma gestatildeo qualificada eacute importante a qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa

De acordo com os dados levantados na pesquisa conforme apresentado

anteriormente uma das grandes dificuldades do municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra

Este fato tambeacutem pode ser observado quando se analisou a cidade de Beleacutem

Assim os espaccedilos produzidos no mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e

das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos

processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e densificaccedilatildeo

Desta forma a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

290

habitacionais dos municiacutepios para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

Isso ratifica a tese aqui levantada que independente do modelo de gestatildeo

(tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente

demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo

contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e natildeo modificaram a

concepccedilatildeo de moradia

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees similares que

retratam o papel do Estado como agente decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da

segregaccedilatildeo espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do

capital imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrenta a problemaacutetica da moradia popular

Eacute importante ressaltar que em Satildeo Luiacutes o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute

decorrente da mercantilizaccedilatildeo do solo na qual os incorporadores imobiliaacuterios financiados

pelo Estado possuem papel fundamental uma vez que modificam a dinacircmica urbana

acarretando na expulsatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo das aacutereas melhores

infraestruturadas que serviratildeo para a construccedilatildeo de condomiacutenios residenciais edifiacutecios

comerciais shopping centers entre outros objetivando a acumulaccedilatildeo de capital

Conforme se pode demonstrar para o caso ludovicense a produccedilatildeo do espaccedilo se daacute a

partir de duas vertentes a dominaccedilatildeo poliacutetica representada por grupos que estatildeo no poder haacute

muito tempo e o consumo Esses dois elementos determinam a divisatildeo social da cidade

levando ao aumento da pobreza e a concentraccedilatildeo dos preccedilos de terrenos mais caros na zona

norte de Satildeo Luis

Dessa forma essa loacutegica de ordenamento territorial daacute origem a uma formaccedilatildeo

soacutecioespacial segregada caracterizada principalmente por novas formas de habitats urbanos

os loteamentos fechados e os condomiacutenios residenciais seja horizontais ou verticais

ocasionando na auto-segregaccedilatildeo a qual cria um ambiente urbano ideal dissociado dos

elementos da cidade real

O cunho empresarial da poliacutetica habitacional ludovicense impulsionado pelos

investimentos estatais promove a produccedilatildeo imobiliaacuteria privada a partir de estrateacutegias que

redefinem a configuraccedilatildeo espacial expandem a fronteira urbana produzindo novas moradias

em aacutereas tidas como natildeo-urbanas e transformam as relaccedilotildees poliacuteticas econocircmicas sociais e

culturais da cidade

No caso de Beleacutem ressalta-se que haacute um padratildeo auto-segregativo das classes que

possuem maior poder aquisitivo em condomiacutenios fechados impulsionando um novo arranjo

291

intra-urbano Aleacutem disso conforme foi apresentado anteriormente o padratildeo de segregaccedilatildeo

que mais se assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual

se percebe que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas

proacuteximas ao centro

Esses locais que sofrem investimentos do capital imobiliaacuterio e estatal satildeo

valorizados em detrimento dos novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo

dos mesmos pelos agentes que podem pagar para usufruir da acessibilidade O Estado atua

nessas aacutereas com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais

valorizadas pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

Como foi enfatizada a accedilatildeo governamental altera as relaccedilotildees intra-urbanas

ampliando a fronteira urbano-imobiliaacuteria atuando em novos assentamentos e investindo em

aacutereas de expansatildeo do capital imobiliaacuterio em particular nos eixos Entroncamento-Icoaraci e

Beleacutem-Ananindeua provocando uma verdadeira mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo

Assim eacute necessaacuterio repensar a forma de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas

cidades amazocircnicas em especial Beleacutem e Satildeo Luis pois a racionalidade do planejamento e da

regulaccedilatildeo herdadas do modernismo do tradicionalismo pode dar lugar as concepccedilotildees

democraacuteticas de gestar essas poliacuteticas com o intuito de efetivar o alcance do direito agrave moradia

digna que valorize os aspectos culturais religiosos laccedilos de vizinhanccedila enfim que leva em

consideraccedilatildeo tambeacutem a subjetividade como ressalta Bourdieu (2001 p 89) a construccedilatildeo da

subjetividade mostraraacute um sujeito fragmentado com uma nova maneira de ser e estar no

tempo e no espaccedilo e de mostrar-se no palco da cidade

Nesse sentido o planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano em Beleacutem e em Satildeo Luis

poderatildeo inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia que entenda o cidadatildeo como parte

ativa da sociedade na qual a garantia de seus direitos dependa de sua organizaccedilatildeo coletiva

Souza e Rodrigues (2004) argumentam que os proacuteprios cidadatildeos devem poder

decidir sobre os destinos dos espaccedilos em que vivem por meio de debates livres abertos e

transparentes e que os teacutecnicos podem e podem participar mas na qualidade de consultores

populares que possam aconselhar principalmente quanto aos meios cabendo a discussatildeo e a

decisatildeo poliacuteticas sobre os fins aos proacuteprios cidadatildeos

Complementando os autores defendem a ideacuteia de que a sociedade civil pode se

organizar de maneira autocircnoma e independente do Estado para criar e realizar accedilotildees e

projetos estabelecer parcerias que fortaleccedilam esse tipo de atividade elaborar e propor accedilotildees

projetos e poliacuteticas puacuteblicas fiscalizar e exigir do Estado o cumprimento das leis Da mesma

forma os processos participativos podem acompanhar as escalas pensadas para o programa

292

reunindo aleacutem de conselhos estaduais e municipais foacuteruns metropolitanos ou

submetropolitanas

As poliacuteticas habitacionais precisam estar vinculadas a outros programas de

desenvolvimento econocircmico e social sem esquecer os programas de proteccedilatildeo ambiental Eacute

fundamental que haja relaccedilotildees estreitas entre o programa de urbanizaccedilatildeo e o programa de

regularizaccedilatildeo buscando sinergias que multipliquem esforccedilos por meio da concentraccedilatildeo e

articulaccedilatildeo de iniciativas e evitando a dispersatildeo das accedilotildees pois a construccedilatildeo de habitaccedilotildees

precaacuterias em aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo de mananciais deteriora o meio ambiente gerando

riscos para a sustentabilidade humana

Sendo assim todas as poliacuteticas ligadas agrave reforma urbana podem ser planejadas e

executadas de forma articulada e integrada com a elaboraccedilatildeo de Planos Diretores que podem

ser com caraacuteter participativo e popular Para isso os governos municipais estaduais e federal

podem atuar englobando poliacuteticas coerentes que se complementem uma vez que a moradia

faz parte de um conjunto de fatores responsaacuteveis pela melhoria das condiccedilotildees de vida

habitaccedilatildeo sauacutede emprego e educaccedilatildeo

Portanto para se ter uma gestatildeo eficaz eficiente e com efetividade das poliacuteticas

habitacionais norteada pelo ideaacuterio da reforma urbana torna-se necessaacuterio um amplo

processo de mobilizaccedilatildeo e conscientizaccedilatildeo popular capaz de criar mecanismos que

assegurem legitimidade agraves decisotildees puacuteblicas articulaccedilatildeo entre as accedilotildees governamentais

ampla poliacutetica de redistribuiccedilatildeo de trabalho e renda e assegurar a permanecircncia dos moradores

atingidos pelos programasprojetos habitacionais no seu local de origem apoacutes o processo de

renovaccedilatildeo urbana para que seus valores e laccedilos constituiacutedos natildeo sejam desfeitos

A criaccedilatildeo de espaccedilos que possibilitam a participaccedilatildeo poliacutetica e que renovam a

promessa de democratizaccedilatildeo da sociedade tem se apresentado como um importante

mecanismo para a configuraccedilatildeo de um novo desenho de gestatildeo puacuteblica visto que trazem na

forma da lei a ideacuteia de transparecircncia descentralizaccedilatildeo controle democraacutetico e participaccedilatildeo

popular

Isso eacute um processo que pode estar em permanente construccedilatildeo estabelecendo novas

formas de relaccedilatildeo entre o poder puacuteblico e a sociedade civil visando a uma nova cultura

poliacutetica assim como agrave garantia de seu direito agrave cidade

Conforme enfatiza Harvey (1980) natildeo eacute possiacutevel solucionar os problemas urbanos e

os conflitos pelo solo urbano se natildeo for garantida a participaccedilatildeo dos cidadatildeos nos processos

de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo das cidades e que o direito agrave cidade envolve o direito de participar

do urbano de forma a atender as necessidades da massa da populaccedilatildeo Entatildeo o direito agrave

293

cidade passa pela luta dos diferentes grupos sociais pela apropriaccedilatildeo e domiacutenio do espaccedilo

urbano a qual gera espaccedilos segregados e formas de resistecircncia

Portanto instigar a participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo das

poliacuteticas habitacionais municipais torna-se um grande desafio e eacute de fundamental importacircncia

uma vez que se pode capacitar os atores sociais populares para qualificar sua participaccedilatildeo nos

espaccedilos institucionais relacionados a poliacuteticas puacuteblicas aleacutem disso eacute necessaacuterio se ampliar o

nuacutemero e a representatividade de organizaccedilotildees integradas em processos concretos de

exerciacutecio ativo de sua cidadania

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SILVA Maria Ozanira da Silva e Poliacutetica habitacional brasileira verso e reverso Satildeo Paulo Cortez 1989

SMOLKA M O Estruturas intra-urbanas e segregaccedilatildeo social no espaccedilo elementos para uma discussatildeo da cidade na teoria econocircmica Rio de Janeiro PNPE 1983

SOUZA Celina RODRIGUES Edmundo Governos locais e gestatildeo de poliacuteticas sociais universais Satildeo Paulo em perspectiva Satildeo Paulo v 18 n 2 2004

SOUZA Denise Gentil Ponte Intervenccedilatildeo estatal no municiacutepio o caso de Beleacutem na deacutecada de 80 1992 247f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)

Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute Beleacutem 1992

SOUZA Maria Luiza de Desenvolvimento de comunidade e participaccedilatildeo 2 ed Satildeo Paulo Cortez 1990

SOUZA Marcelo Lopes O desafio metropolitano um estudo sobre a problemaacutetica soacutecioespacial nas metroacutepoles brasileiras Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2000

______ Mudar a cidade uma introduccedilatildeo criacutetica ao planejamento e agrave gestatildeo urbanos Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2002

305

SOUZA Maria Adeacutelia Aparecida de A identidade da metroacutepole Satildeo Paulo Hucitec 1994

SPOSATI Aldaiacuteza de Oliveira Desafios para fazer avanccedilar a poliacutetica de assistecircncia social no Brasil Revista Serviccedilo Social e Sociedade n 68 Satildeo Paulo Cortez nov 2001

SPOSITO M E B O chatildeo em pedaccedilos urbanizaccedilatildeo economia e cidades no Estado de Satildeo Paulo 2004 504f Tese (Livre Docecircncia em Geografia)

Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Universidade Estadual Paulista Presidente Prudente 2004

TEIXEIRA Alberto Alternativas de planejamento do desenvolvimento Fortaleza Ediccedilotildees IPLANCE 1998 Texto para discussatildeo n 05

TOPALOV Christian Les promoteurs immobiliers contribution agrave analyse de la production capitaliste du logement en France Paris Mouton 1974

TOURAINE Alain A Sociologia da accedilatildeo uma abordagem teoacuterica dos movimentos sociais Satildeo Paulo Anais do Seminaacuterio O Retorno do Ator 1994

TRINDADE JUNIOR Saint-Clair C Produccedilatildeo do espaccedilo e uso do solo urbano em Beleacutem 1997 198f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)

Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute Beleacutem1997

______ A cidade dispersa os novos espaccedilos de assentamento em Beleacutem e reestruturaccedilatildeo metropolitana 1998 395f Tese (Doutorado em Geografia Humana)

Faculdade de Filosofia Letras e Ciecircncias Humanas Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 1998

VAINER C B Paacutetria empresa e mercadoria notas sobre a estrateacutegia discursiva do planejamento estrateacutegico urbano In ARANTES O et al A cidade do pensamento uacutenico desmanchando consensos Petroacutepolis Vozes 2000

VALENCcedilA Maacutercio Moraes Globabitaccedilatildeo sistemas habitacionais no Brasil Gratilde-Bretanha e Portugal Satildeo Paulo Terceira Margem 2001

VILLACcedilA Flaacutevio Espaccedilo intra-urbano no Brasil Satildeo Paulo FAPESP 2001

Page 2: UFPA - POLÍTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES ......implementadas em cidades amazônicas, mais especificamente em Belém (PA) e São Luis (MA), assim como os impactos na organização

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

Tese apresentada ao Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute como requisito parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em Ciecircncias

Desenvolvimento Socioambiental

Orientadora Profordf Drordf Edna Maria Ramos de Castro

BeleacutemPa 2011

Dados Internacionais de Catalogaccedilatildeo de publicaccedilatildeo (CIP) (Biblioteca do NAEAUFPA)

____________________________________________________________________________

Portela Roselene de Souza Poliacuteticas habitacionais em cidades amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luis na perspectiva comparativa

Roselene de Souza Portela orientadora Edna M Ramos de Castro

2011 305 f il 30 cm Inclui Bibliografias

Tese (Doutorado)

Universidade Federal do Paraacute Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido Beleacutem 2011

1 Poliacutetica urbana - Beleacutem (PA) 2 Poliacutetica urbana

Satildeo Luis (MA) 3 Planejamento urbano -Beleacutem (PA) 4 Planejamento urbano - Satildeo Luis (MA) 5 Impacto ambiental - Beleacutem (PA) 6 Impacto ambiental

Satildeo Luis (MA) 7 Segregaccedilatildeo ambiental - Beleacutem (PA) 8 Segregaccedilatildeo ambiental

Satildeo Luis (MA) I Castro Edna M Ramos de orientadora II Tiacutetulo

CDD 21 ed 30223209811

____________________________________________________________________________

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

Tese apresentada ao Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute como requisito parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em Ciecircncias

Desenvolvimento Socioambiental

Banca Examinadora

Profordf Drordf Edna Maria Ramos de Castro Orientadora NAEAUFPA

Prof Dr Saint-Clair Cordeiro da Trindade Junior Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Thomas Hurtienne Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Joseacute Julio Lima Examinador externo PPGAUUFPA

Prof Dr Gilberto de Miranda Rocha Examinador externo PPGGEOUFPA

Aos sujeitos coletivos que buscam na luta cotidiana a diminuiccedilatildeo das desigualdades sociais e o direito agrave cidade

AGRADECIMENTOS

A Deus fonte de luz esperanccedila amor e que estaacute sempre comigo nos momentos de inseguranccedila e desacircnimo me dando forccedila para vencer todos os obstaacuteculos

A Profordf Drordf Edna Castro com quem aprendi muito pelo incentivo nos momentos difiacuteceis pelas criacuteticas e contribuiccedilotildees valiosas que foram fundamentais para a elaboraccedilatildeo dessa tese

Ao Prof Dr Saint-Clair Trindade Junior que sempre me apoiou incentivando-me a superar limitaccedilotildees e a descobrir perspectivas mais amplas de anaacutelise

Aos membros da banca examinadora pelas criacuteticas e importantes contribuiccedilotildees no momento da defesa da tese

A todos os professores do NAEA pela imensuraacutevel contribuiccedilatildeo que ofereceram para ampliaccedilatildeo da minha concepccedilatildeo de mundo

A todos os colegas do curso em especial Andreacuteia Rosana Everaldo Charles Laura Ximenes e Laura Nogueira com os quais vivenciei momentos primorosos de aprendizado de alegrias de dificuldades e de amizade que ultrapassaram os espaccedilos de sala de aula

A minha matildee Francisca Portela que com todo seu esforccedilo sempre me incentivou nessa caminhada

Ao meu pai e aos meus irmatildeos Carlos Augusto Raimir e Raimar que me acompanharam e incentivaram nessa jornada

Ao Dion Monteiro pelo seu apoio carinho compreensatildeo e incentivo constante principalmente nas horas difiacuteceis de elaboraccedilatildeo desse trabalho

As lideranccedilas comunitaacuterias que fazem parte do Foacuterum de Reforma Urbana dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis sujeitos sociais importantes na construccedilatildeo desse trabalho por colaborarem com as entrevistas e pelas importantes contribuiccedilotildees oferecidas agrave realizaccedilatildeo da pesquisa de campo e aos movimentos sociais de luta pelo direito agrave cidade

Aos teacutecnicos das Secretarias de Habitaccedilatildeo dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis que sempre se colocaram a disposiccedilatildeo facilitando o acesso agraves informaccedilotildees e aos documentos pertinentes a Poliacutetica Habitacional

Aos funcionaacuterios do NAEA pelo apoio e incentivo de diversas formas

A todos que direta ou indiretamente contribuiacuteram para a concretizaccedilatildeo dessa tese

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat

e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade)

estatildeo implicados no direito agrave cidade

Henri Lefebvre

RESUMO

O presente trabalho objetiva analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas mais especificamente em Beleacutem (PA) e Satildeo Luis (MA) assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das duas cidades e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo atrelado agraves praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas puacuteblicas Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem e Satildeo Luis enfocando o processo de planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos atores sociais percebendo suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo Os procedimentos metodoloacutegicos adotados foram a pesquisa bibliograacutefica documental e o levantamento de dados estatiacutesticos entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais ligados aos programas ou projetos habitacionais e observaccedilatildeo direta Dentre os resultados da anaacutelise dos dados pode-se dizer que independente do modelo de gestatildeo (tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Palavras-Chave Espaccedilo Urbano Poliacutetica Habitacional Segregaccedilatildeo Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luis

ABSTRACT

This work analyzes the management models of housing policies implemented in the Amazon s cities particularly in Beleacutem (PA) and Satildeo Luiacutes (MA) as well as the impacts on the city spatial organization and the relation with the existent social and spatial segregation Emphasis is given to the challenges faced by urban management in the two cities and how the State deals with social problems We intend to go beyond spatial exclusion forms and use a social and spatial approach in order to evaluate the potential transformation that might be linked to daily practices in the city which ought to be acknowledged as legitimate actions by public policies In order to achieve our goal we use a theoretical construction to gather information on housing policy in Brazil and in the Amazon region It is therefore necessary to analyze the urban space construction and housing based on the capitalist logic which had a great concentrating and excluding influence in the urban development of the two Amazon cities resulting in a social and spatial segregation process The study was carried out through a comparative method allowing us to identify the differences and similarities between two management experiences in the housing policies applied in two municipalities of the Amazon region Beleacutem and Satildeo Luiacutes The study focuses on housing policy planning and management processes targeting social contradictions and intervention strategies Therefore the methodological procedures used in this work are bibliographic and documental research statistical data collection interviews with experts and management staff from governmental institutions related to housing programs or projects and direct observation The results lead us to conclude that regardless the management model used (technocratic or participative) the housing policy has not shown structural advances Therefore the actions implemented by programsprojects did not contribute to reduce the social and spatial segregation pattern and did not change the housing concept in those two cities

Key Words Urban Space Housing Policy Segregation Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luiacutes

LISTA DE ILUSTRACcedilOtildeES

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA) 104

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a

2003

130

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio

segundo Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

144

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar

Mensal (2)

Brasil

2007

145

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem 165

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

171

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de

Agronomia

Beleacutem-PA

179

Fotografia 4

Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA) 185

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes 199

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luis-MA) 206

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luis-

MA)

212

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo 251

LISTA DE QUADROS

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968 111

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil 117

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965 120

Quadro 4

Programas Habitacionais implementados no Governo FHC 128

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo 157

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a

1988)

181

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990 215

Quadro 8

Relaccedilatildeo dos Assentamentos hierarquizados (Satildeo Luis-MA) 240

Quadro 9

Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos

municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

252

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001) 255

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual 257

LISTA DE TABELAS

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1996) no Brasil 106

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-

1989)

121

Tabela 3

Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

142

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem 167

Tabela 5

Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte

1940-2000

176

Tabela 6

Crescimento Populacional do municiacutepio de Satildeo Luiacutes 198

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) 207

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970 208

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970 214

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e

Cooperativas 1971-1980

219

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per

capita

2010

232

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007 237

LISTA DE ABREVIACcedilOtildeES E SIGLAS

ALUMAR Alumiacutenio do Maranhatildeo SA

AMs Associaccedilotildees de Moradores

ASCOM Assessoria Comunitaacuteria

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD Banco Internacional de Reconstruccedilatildeo e Desenvolvimento

BNH

CAEMA

CBB

CCs

CDPs

CEBs

CEF

CELMAR

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo

Comissatildeo de Bairros de Beleacutem

Centros Comunitaacuterios

Comitecircs Democraacuteticos Populares

Comunidades Eclesiais de Base

Caixa Econocircmica Federal

Celulose do Maranhatildeo SA

CEPAL Comissatildeo Econocircmica para Ameacuterica Latina e Caribe

CF Constituiccedilatildeo Federal

CGT Central Geral dos Trabalhadores

CMN Conselho Monetaacuterio Nacional

CODEM Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de

Beleacutem

CODOMAR Companhia de Docas do Maranhatildeo

COGEP Coordenadoria Geral de Planejamento

COHAB-Ma Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo

COHAB-Pa Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute

CONDUMA Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente

COSANPA Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute

COTS Caderno de Orientaccedilatildeo do Trabalho Teacutecnico Social

CTM Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio

CURA Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada

CUT Central Uacutenica dos Trabalhadores

CVRD Companhia Vale do Rio Doce

DESO Departamento Social

DNOS Departamento Nacional de Obras e Saneamento

DPPH Departamento de Programas e Projetos Habitacionais

ELETROBRAS Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA

FADS Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social

FASE Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social e Educacional

FBP Frente Beleacutem Popular

FCP Fundaccedilatildeo da Casa Popular

FEMECAM Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo

FHC Fernando Henrique Cardoso

FINANSA Financiamento de Saneamento

FMRU Foacuterum Metropolitano de Reforma Urbana

FNHIS Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

FNRU Foacuterum Nacional de Reforma Urbana

GEBAM Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas

GETAP Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento

GETAT Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins

IACP Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio

IAPs Institutos de Aposentadoria e Pensotildees

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica

IFCH Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas

IMPUR Instituto Municipal da paisagem Urbana

INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria

IPASE Instituto de Pensionistas e Aposentados Servidores do Estado

IPEA Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada

IPLAN Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano

IPTU Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

LI Letras Imobiliaacuterias

LOM Lei Orgacircnica do Municiacutepio

MBES Ministeacuterio do Bem-Estar Social

MCMV Programa Minha Casa Minha Vida

MHU Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente

MNRU Movimento Nacional pela Reforma Urbana

MPO Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento

MSUs Movimentos Sociais Urbanos

NAEA Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

OGU Orccedilamento Geral da Uniatildeo

ONGs Organizaccedilotildees Natildeo-governamentais

OP Orccedilamento Participativo

PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

PAEG Programa de Accedilatildeo Econocircmica do Governo

PAH Plano de Assistecircncia Habitacional

PAI Plano de Accedilatildeo Imediata

PAIH Plano de Accedilatildeo Imediata para a Habitaccedilatildeo

PAR Programa de Arrendamento Residencial

PCN Projeto Calha Norte

PDDES Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social

PDU Plano Diretor Urbano

PGC Programa Grande Carajaacutes

PETROBRAS Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

PIB Produto Interno Bruto

PLANASA Plano Nacional de Saneamento

PLANHAP Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular

PMB Prefeitura Municipal de Beleacutem

PMBU Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una

PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro

PND Plano Nacional de Desenvolvimento

PNH Plano Nacional de Habitaccedilatildeo

Polamazocircnia Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da Amazocircnia

PPA Plano Plurianual de Accedilatildeo

PRB Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixadas

PROTERRA Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e

Nordeste

PT Partido dos Trabalhadores

PTTS Projeto de Trabalho Teacutecnico e Social

RMB Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

SABs Sociedades de Amigos do Bairro

SBPE Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo

SCI Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio

SCH Sociedade Comunitaacuteria Habitacional

SEAC Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria

SECON Secretaria Municipal de Economia

SEDURB Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado do Paraacute

SEGEP Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral do Planejamento e Gestatildeo

SEHAB Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

SEMTHURB Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana

SEMTUR Secretaria Municipal de Serviccedilos Urbanos

SEPURB Secretaria de Poliacutetica Urbana

SERFHAU Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e Urbanismo

SESAN Secretaria Municipal de Saneamento

SEURB Secretaria Municipal de Urbanismo

SFH Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

SFI Sistema Financeiro Imobiliaacuterio

SFS Sistema Financeiro de Saneamento

SNHIS Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

SNPLI Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado

SOPREN Sociedade de Preservaccedilatildeo aos Recursos Naturais e Culturais da Amazocircnia

SPDDH Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos

SPVEA Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

SUDAM Superintendecircncia de Desenvolvimento da Amazocircnia

SUDENE Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste

SUFRAMA Superintendecircncia da Zona Franca de Manaus

UFMA Universidade Federal do Maranhatildeo

UFPA Universidade Federal do Paraacute

UNAMA Universidade da Amazocircnia

UNIPOP Universidade Popular

ZEIS Zonas Especiais de Interesse Social

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 17

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

27

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

27

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO

ESTADO 38

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

53

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES 75

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

88

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

102

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

102

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

135

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

147

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

162

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

163

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

197

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM E SAtildeO LUIS EXCLUSAtildeO SOCIAL

SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

229

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS

ADOTADOS

246

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

280

REFEREcircNCIAS 294

17

1 INTRODUCcedilAtildeO

Durante a vigecircncia do regime autoritaacuterio (1964-1985) as poliacuteticas puacuteblicas

promovidas pelo Estado brasileiro se caracterizavam por um lado pela centralizaccedilatildeo

decisoacuteria e financeira na esfera federal cabendo aos estados e municiacutepios o papel de

executores das poliacuteticas formuladas centralmente Por outro lado agrave medida que os recursos

eram controlados pelo governo federal tendia a estabelecer-se uma articulaccedilatildeo entre governos

estaduais e municipais baseada na troca de favores de cunho clientelistas

Outra caracteriacutestica era a exclusatildeo da sociedade civil do processo de formulaccedilatildeo das

poliacuteticas da implementaccedilatildeo dos programas e do controle da accedilatildeo governamental que

representou um padratildeo natildeo-democraacutetico de articulaccedilatildeo EstadoSociedade e de gestatildeo

hierarquizada reforccedilando a tendecircncia ao comprometimento das metas de equumlidade assim

como introduziu no sistema um crescente deacuteficit de accountability e de responsabilidade

puacuteblica (DINIZ 1996)

O paradigma que norteou a constituiccedilatildeo do sistema de proteccedilatildeo social no Paiacutes foi o

do Estado do Bem-Estar (Welfare State) implantado nos paiacuteses capitalistas ocidentais no poacutes-

guerra onde a provisatildeo de bens e serviccedilos puacuteblicos era de inteira responsabilidade do Estado

dada agrave insuficiecircncia das respostas oferecidas pelo mercado e diante da fragilidade da

sociedade civil frente aos enormes desafios na aacuterea da reproduccedilatildeo social

A revisatildeo desse modelo embora tenha sido proposta pelas agecircncias multilaterais de

financiamento

como o Banco Mundial

no final dos anos 1950 soacute foi efetivada no final da

deacutecada de 1970 e iniacutecio dos anos 1980 atraveacutes da definiccedilatildeo de uma agenda de reforma do

Estado sob a eacutegide neoliberal que se traduziu na transferecircncia de responsabilidade com a

produccedilatildeo direta de bens e serviccedilos de consumo coletivo do acircmbito do Estado para o mercado

e a sociedade civil

Isto se refletiu na desarticulaccedilatildeo da capacidade de governar por parte dos Estados na

Ameacuterica Latina Grande parte da capacidade de planejamento e da competitividade das

economias nacionais foi drasticamente reduzida Os recursos destinados agraves poliacuteticas sociais e

agrave remuneraccedilatildeo do funcionalismo puacuteblico tecircm sido reduzidos progressivamente

No entanto a crise que atingiu o Paiacutes desde o iniacutecio da deacutecada de 1980 e as

alteraccedilotildees na economia capitalista mundial em que se destacam a reestruturaccedilatildeo produtiva e a

globalizaccedilatildeo redefiniu os termos da inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio internacional Novos

desafios foram colocados aos atores que haviam participado da formulaccedilatildeo da agenda

democraacutetica e estavam engajados com a efetivaccedilatildeo da reforma Na reformulaccedilatildeo dessa

18

agenda natildeo se pretendia o desmantelamento do Estado mas sim uma reforma da accedilatildeo estatal

voltada agrave busca da eficiecircncia da eficaacutecia e da efetividade dessa accedilatildeo

A Constituiccedilatildeo de 1988 constitui-se um marco no tocante a discussatildeo sobre a

governabilidade do sistema poliacutetico e participaccedilatildeo popular Fomentada pelos movimentos e

demais organizaccedilotildees sociais ganhou relevacircncia a discussatildeo sobre descentralizaccedilatildeo

administrativa principalmente a reflexatildeo sobre uma nova cultura poliacutetica alicerccedilada na noccedilatildeo

de direitos do cidadatildeo e da necessidade de incorporaccedilatildeo deste no processo de planejamento e

gestatildeo de planos programas e projetos

Nessa conjuntura a nova cultura poliacutetica que comeccedila a emergir a partir das

discussotildees travadas entre as organizaccedilotildees sociais partidos poliacuteticos intelectuais e parte das

igrejas aponta para novas formas de articulaccedilatildeo do Estado com a sociedade civil e com o

setor privado visando agrave garantia da eficiecircncia atraveacutes da descentralizaccedilatildeo que natildeo significa

apenas a transferecircncia de atribuiccedilotildees mas eacute vista sobretudo como redistribuiccedilatildeo de poder

favorecendo a democratizaccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade e a democratizaccedilatildeo de

acesso aos serviccedilos

No Brasil os movimentos sociais tiveram e tecircm papel fundamental no processo de

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes Nos anos de 1970 e 1980 emergiram novos movimentos sociais

que se organizaram como espaccedilo de accedilatildeo reivindicatoacuteria construindo uma cultura

participativa e autocircnoma colocando novos temas na agenda puacuteblica entre eles o da Reforma

Urbana Em meio a muitos embates esses agentes coletivos multiplicaram-se fortaleceram-se

e tornaram-se propositivos Satildeo hoje reconhecidos como legiacutetimos interlocutores no cenaacuterio

brasileiro (GOHN 1985)

O reconhecimento da importacircncia da participaccedilatildeo popular nos programas e projetos

vinculados agraves poliacuteticas puacuteblicas aqui centradas nas aacutereas de desenvolvimento urbano tem se

tornado um consenso e no entanto natildeo se tem uma clareza sobre como e em que grau de

intensidade seria necessaacuterio para que se atinja ao objetivo de garantir a sustentabilidade das

intervenccedilotildees advindas da execuccedilatildeo de programas de desenvolvimento urbano nas cidades

Nesse sentido a concepccedilatildeo de participaccedilatildeo popular se relaciona com os processos

que visam superar os mecanismos de exclusatildeo social presentes no tecido social atraveacutes da

conquista de espaccedilos onde seja garantida a participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo da cidade

(SADER PAOLI 1988 p 59)

Assim a luta pela participaccedilatildeo popular no acircmbito do planejamento e gestatildeo de

poliacuteticas urbanas no decorrer da histoacuteria brasileira trouxe em seu contexto o constante

enfrentamento da exclusatildeo social propondo uma maior democratizaccedilatildeo da sociedade e

19

buscando intervir no processo de decisatildeo das poliacuteticas urbanas visando dessa maneira uma

melhor distribuiccedilatildeo de bens e serviccedilos

Na Amazocircnia esse processo natildeo foi diferente Desde o periacuteodo militar que os

movimentos populares passaram a se organizar tendo como objetivo pressionar as estruturas

poliacuteticas vigentes ao niacutevel das agecircncias estatais e privadas fazendo frente aos inuacutemeros

problemas provocados pela accedilatildeo autoritaacuteria dos oacutergatildeos estatais e privados e que afetavam as

condiccedilotildees de vida das classes populares na regiatildeo (CRUZ 1994)

Foi um periacuteodo marcado por fortes modificaccedilotildees nos espaccedilos urbano e rural da

regiatildeo que contou com a intervenccedilatildeo direta e centralizada do Estado que desde a deacutecada de

1950 vinha consolidando um modelo nacional-desenvolvimentista introduzindo assim a

Amazocircnia no circuito propriamente capitalista Com isso ocorreu um significativo processo

de ocupaccedilatildeo do espaccedilo regional manifestando-se ao niacutevel da estruturaccedilatildeo do sistema urbano

da regiatildeo e de uma urbanizaccedilatildeo intensiva e crescente do municiacutepio de Beleacutem entre outros

poacutelos urbanos regionais (CASTRO ACEVEDO MARIN 1987)

Nos anos 1960 aleacutem dos projetos agro-pecuaacuterios os governos federal e estadual

investiram na criaccedilatildeo de infraestrutura como a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia que

facilitou o ingresso de grande contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras

abundantes e de faacutecil acesso tendo em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave

implantaccedilatildeo dos grandes projetos (SOUZA 1992)

Em Beleacutem esse fenocircmeno gerou por um lado uma pressatildeo demograacutefica sobre as

aacutereas urbanizadas de cotas altas estimulando a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e por outro uma

ocupaccedilatildeo desordenada das baixadas sem infraestrutura por uma camada popular com

baixo poder aquisitivo A ocupaccedilatildeo irregular a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o

descaso de sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programas e projetos

de poliacuteticas urbanas completavam o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo

ambiental passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Nesse sentido as lutas pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura sauacutede educaccedilatildeo e

habitaccedilatildeo implementaram um haacutebito de construir um poder pela base na praacutexis cotidiana

dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos sujeitos sociais coletivos e natildeo mais individualizados

Contrariando a praacutetica dos anos anteriores em que a sociedade seguia fielmente as orientaccedilotildees

dos grupos oligaacuterquicos

Constituindo-se sujeitos coletivos as organizaccedilotildees de bairros em 1978 unificaram-

se na luta pela posse da terra e por moradia lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que

envolveu vaacuterios bairros como Jurunas Sacramenta etc Essa praacutetica vai culminar com o

20

fortalecimento das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB)

em 1979 (CRUZ 1994)

Os Movimentos Populares atingiram conquistas importantes ateacute 1982 quando

acontecem mudanccedilas na conjuntura poliacutetica do Paiacutes atraveacutes das eleiccedilotildees diretas para

governador e deputados na qual o grande vencedor foi o Partido do Movimento Democraacutetico

Brasileiro (PMDB) que venceu as eleiccedilotildees na maioria das capitais brasileiras Com isso

mudou-se tambeacutem o comportamento do Estado que passaraacute a tratar a organizaccedilatildeo popular

como um instrumento a seu serviccedilo

O Estado passou a orientar seus agentes a realizarem reuniotildees nos bairros e a contar

com a participaccedilatildeo dos moradores nas decisotildees tomadas tentando ainda utilizar-se das

organizaccedilotildees de bairros para viabilizar suas poliacuteticas por meio de cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de

entidades fantasmas com o objetivo de enfraquecer a luta social

Em Satildeo Luiacutes a partir da deacutecada de 1960 ocorreu um dinamismo acelerado de

crescimento populacional em virtude de vaacuterios beneficiamentos realizados na cidade tais

como construccedilatildeo das duas pontes sobre o rio Anil barragem do Bacanga construccedilatildeo da 1ordf

etapa do porto de cargas gerais do Itaqui e asfaltamento da BR-135 Aleacutem desses

acontecimentos as deacutecadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela instalaccedilatildeo de grandes

capitais industriais como as empresas Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) a Companhia

Vale do Rio Doce (CVRD) e a Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR) que favoreceram o

surgimento de ocupaccedilotildees irregulares palafitas e favelas

A cidade de Satildeo Luis passa entatildeo a sofrer modificaccedilotildees profundas destacando-se o

significativo aumento das ocupaccedilotildees de terras para a construccedilatildeo de moradias Os processos

migratoacuterios campocidade se intensificam Milhares de famiacutelias se dirigem para Satildeo Luiacutes em

busca de melhores condiccedilotildees de vida e emprego No entanto grande parte dessas famiacutelias

migrante natildeo encontra emprego fixo e bem remunerado e as formas de sobrevivecircncia

baseiam-se nos serviccedilos domeacutesticos e no mercado informal

Segundo Luz (2004) a deacutecada de 1960 eacute marcada por um intenso debate em torno

dos programas governamentais voltados para a modernizaccedilatildeo conservadora do Maranhatildeo O

Estado passa a ser o facilitador

por meio de instrumentos juriacutedicos poliacuteticos e econocircmicos

da criaccedilatildeo de condiccedilotildees sociais favoraacuteveis para as grandes empresas investirem na regiatildeo com

condiccedilotildees miacutenimas de terra farta e matildeo-de-obra barata Para garantir que o processo natildeo

tivesse obstaacuteculos a sua efetivaccedilatildeo levou-se a cabo um amplo processo de modernizaccedilatildeo da

economia cujo traccedilo principal estava baseado nos grandes projetos e no apoio irrestrito das

elites locais e nacionais ao grande capital nacional e estrangeiro

21

Para isso o Estado inicia a abertura de vaacuterias aacutereas de expansatildeo urbano-industrial

destacando-se a aacuterea hoje compreendida pelo eixo ItaquiBacanga No governo Sarney (1966-

1970) esta aacuterea eacute eleita como um espaccedilo estrateacutegico para o processo de modernizaccedilatildeo

conservadora pelo plano de governo denominado Maranhatildeo Novo Aleacutem dos projetos

industriais e da construccedilatildeo do Porto do Itaquiacute a regiatildeo seria contornada pela construccedilatildeo de

conjuntos habitacionais para a matildeo-de-obra requerida pelas induacutestrias que iriam se implantar

na regiatildeo

A expansatildeo urbana da cidade de Satildeo Luiacutes em direccedilatildeo agrave regiatildeo Industrial do Itaqui

estava articulada com o processo de remoccedilatildeo de famiacutelias das regiotildees alagadas pelos rios

Bacanga e de outras aacutereas destinadas para construccedilatildeo do Anel Viaacuterio Aeroporto Internacional

do Tirirical e de outras regiotildees atingidas pelo processo de implantaccedilatildeo dos grandes projetos e

de renovaccedilatildeo urbaniacutestica de Satildeo Luiacutes

A remoccedilatildeo de famiacutelias das aacutereas de interesse do governo tinha o objetivo de abrir

espaccedilo para garantir a modernizaccedilatildeo urbaniacutestica da cidade dotaacute-la de infraestrutura necessaacuteria

para a implantaccedilatildeo dos grandes projetos

a exemplo da Barragem do Bacanga bem como

dos interesses do capital imobiliaacuterio e mercantil

a exemplo das aacutereas valorizadas do entorno

da cidade e da regiatildeo comercial da KennedyAreinha Satildeo FranciscoRenascenccedila Olho

D aguaAraccedilagi

A segregaccedilatildeo urbano-espacial de Satildeo Luis consolidou-se no Plano Diretor de 1977 o

qual previa de um lado a construccedilatildeo de um nuacutecleo residencial destinado para as famiacutelias de

melhor poder aquisitivo de outro se previa uma seacuterie de intervenccedilotildees estatais com o objetivo

de criar aacutereas e zonas para a implantaccedilatildeo de projetos industriais e de recuperaccedilatildeo de aacutereas que

seriam destinadas para as classes populares

Sendo assim Luz (2004) argumenta que a urbanizaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes eacute o

resultado de um processo de desenvolvimento capitalista no qual o Estado - nos niacuteveis

federal estadual e municipal - esteve empenhado desde o iniacutecio em articular-se para criar as

condiccedilotildees poliacuteticas econocircmicas e juriacutedicas necessaacuterias ao processo de acumulaccedilatildeo de capital

no Estado ao mesmo tempo em que estabeleciam em segundo plano as poliacuteticas para atender

agraves demandas sociais

Gistelinck (1988) enfatiza que a questatildeo do deacuteficit habitacional e da falta de

infraestrutura baacutesica motiva um intenso debate pela necessidade de poliacuteticas puacuteblicas para

atender as demandas criadas pelo processo de modernizaccedilatildeo econocircmica e industrial de Satildeo

Luis

22

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

governo para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades brasileiras

Todavia os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda foram

marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a exemplo

dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Dentro deste contexto histoacuterico eacute possiacutevel se inferir que em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-

Ma ocorreram nas uacuteltimas deacutecadas mudanccedilas nas relaccedilotildees entre o Estado e os movimentos

sociais no que diz respeito ao processo de participaccedilatildeo na poliacutetica urbana como por exemplo

os projetos de habitaccedilatildeo implementados pelo governo municipal nas aacutereas consideradas de

baixadasalagadas das cidades Entretanto estas alteraccedilotildees permitiram a participaccedilatildeo somente

de alguns segmentos que foram incorporados agraves discussotildees

A emergecircncia dos movimentos sociais permitiu a constituiccedilatildeo de canais de

interlocuccedilatildeo com o poder puacuteblico capazes de legitimar socialmente as demandas populares

gerou uma disputa na cena puacuteblica pela formulaccedilatildeo de uma nova agenda poliacutetica de

intervenccedilotildees puacuteblicas e garantiu a participaccedilatildeo popular no processo de implementaccedilatildeo das

poliacuteticas de habitaccedilatildeo que se desenvolveram nas referidas cidades

Esse debate se constitui num importante instrumento para a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de habitaccedilatildeo que foram implementadas na medida em que possibilita lanccedilar luz

sobre algumas dimensotildees que se julgam fundamentais na discussatildeo dos limites e desafios de

tais poliacuteticas entre as quais se destacam a caracterizaccedilatildeo das desigualdades no acesso a

habitaccedilatildeo como expressatildeo das desigualdades sociais e ambientais

Deste modo o presente trabalho intitulado Poliacuteticas Habitacionais em Cidades

Amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luiacutes na perspectiva comparativa teve por objetivo analisar os

modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim

como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem

soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo que possa estar atrelado agraves

praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas

puacuteblicas

Para tanto eacute imprescindiacutevel repensar a participaccedilatildeo do Estado no conjunto das

praacuteticas sociais voltadas para o enfrentamento das vaacuterias dimensotildees da exclusatildeo natildeo apenas

23

pela participaccedilatildeo na partilha do excedente gerado pelo modelo econocircmico mas tambeacutem pelo

reconhecimento de suas formas alternativas de relaccedilotildees sociais e apropriaccedilatildeo dos espaccedilos

Nesse sentido a pesquisa visou responder as seguintes indagaccedilotildees 1) Qual a

concepccedilatildeo de gestatildeo que tem norteado as poliacuteticas habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa

e Satildeo Luiacutes-Ma 2) Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade civil no processo de

planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nos referidos municiacutepios 3) Os modelos de

gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as

diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois

municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem-Pa e Satildeo Luis-Ma enfocando o processo de

planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos agentes sociais percebendo

suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo

O ferramental metodoloacutegico utilizado teve como base a dimensatildeo poliacutetico-

institucional Desse modo para se fazer a anaacutelise dos modelos de gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luiacutes-Ma fez-se imprescindiacutevel buscar

informaccedilotildees nas instituiccedilotildees responsaacuteveis a fim de compreender as accedilotildees do poder puacuteblico

municipal seus interesses estrateacutegias e os resultados alcanccedilados na implementaccedilatildeo da

poliacutetica habitacional nos referidos municiacutepios visando encontrar possiacuteveis semelhanccedilas e

identificaccedilotildees ainda que um pouco diferenciadas quanto agrave forma de produccedilatildeo do espaccedilo

urbano

Para Santos (1996 p 36) quando se pensa nas simultaneidades definidoras do

espaccedilo a discussatildeo natildeo se limita agrave organizaccedilatildeo agrave proposiccedilatildeo ou instituiccedilatildeo de regras mas

tambeacutem natildeo escapa delas Se o modo de produccedilatildeo organiza e produz um espaccedilo a praacutetica

neste mesmo espaccedilo o subverte e o transforma sendo impossiacutevel pensar a organizaccedilatildeo do

espaccedilo sem perceber como ele eacute usado sem percebecirc-lo como impregnado de sujeitos ativos e

por isso poliacuteticos

Assim eacute importante destacar que na anaacutelise das poliacuteticas habitacionais seraacute levada

em conta a forma como eacute percebido e vivido o espaccedilo urbano reconhecendo seu potencial

poliacutetico enquanto elemento que pode determinar eou influenciar o modo como se pensa a

poliacutetica puacuteblica

Massey (2008) argumenta que quando se analisa as poliacuteticas implementadas no

espaccedilo urbano idealiza-se o potencial poliacutetico do espaccedilo como uma genuiacutena multiplicidade de

trajetoacuterias e potencialmente de vozes na enunciaccedilatildeo de atores sociais em suas accedilotildees

24

cotidianas quando se apropriam subvertem e transformam as regras e instituiccedilotildees

incorporando e transcendendo o espaccedilo da poliacutetica

Assim os procedimentos metodoloacutegicos para a coleta de dados que nortearam esse

trabalho foram desenvolvidos em trecircs etapas a) pesquisa bibliograacutefica (com o objetivo

construir um referencial de anaacutelise dos eixos que fundamentam o trabalho planejamento e

gestatildeo democraacutetica poliacuteticas puacuteblicas poliacuteticas habitacionais) documental e levantamento de

dados estatiacutesticos b) entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais

ligados aos programas ou projetos habitacionais e c) observaccedilatildeo direta que se deu por meio

da presenccedila da pesquisadora nas reuniotildees e em vaacuterios foacuteruns onde aconteceram os debates e

as deliberaccedilotildees acerca dos programas ou projetos habitacionais no intuito de observar as

dinacircmicas dos agentes sociais envolvidos

A estrateacutegia metodoloacutegica adotada para a anaacutelise da poliacutetica habitacional foi

apreendida de modo a conjugar dois niacuteveis de informaccedilatildeo em primeiro lugar por meio do

diagnoacutestico habitacional das referidas cidades em segundo se processou uma avaliaccedilatildeo das

poliacuteticas habitacionais com base no levantamento dos programas e projetos desenvolvidos

nas cidades e dos instrumentos de ordenamento no campo da administraccedilatildeo puacuteblica Vale

ressaltar que esses dois momentos satildeo indissociaacuteveis uma vez que existe uma

complementaridade entre os dados de um e de outro possibilitando ampliar a compreensatildeo

sobre a realidade estudada

A avaliaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais teve como base a anaacutelise contextual e

documental sendo que a avaliaccedilatildeo nesse caso se sustentou na anaacutelise de trecircs elementos

institucionais1 normativos2 e operacionais3

Eacute importante enfatizar que nessa tese natildeo se preeeee ot eneme sesee

ei

ele

moeeo e

otrecircs

a

gundo

trecircs e

normativos0914 T76783F1 2048 76783691201155920 09dee operacativos0914 T76783F1 2048 76783585171191490 09p0914 T76783F1 2048 76783593071191490 09l0914 T76783F1 2048 76783597491191490 09a0914 T76783F1 2048 76783604301191490 09n0914 T76783F1 2048 76783612181191490 09o0914 T76783F1 2048 76783620071191490 09se

25

artigos documentos mapas etc que pudessem fornecer subsiacutedios teoacutericos e metodoloacutegicos

ao estudo aleacutem de informaccedilotildees estatiacutesticas referentes aos resultados alcanccedilados com os

Projetos de Habitaccedilatildeo

Assim a pesquisa bibliograacutefica foi efetuada nas bibliotecas Central da Universidade

Federal do Paraacute (UFPA) e da Universidade Federal do Maranhatildeo (UFMA) do Instituto de

Filosofia e Ciecircncias Humanas (IFCHUFPA) do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

(NAEAUFPA) da Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral de Planejamento e Gestatildeo de

Beleacutem (SEGEP) da Secretaria de Planejamento do Municiacutepio de Satildeo Luis entre outros

Na pesquisa documental foram investigados documentos relacionados agraves poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma bem como documentos

referentes aos Projetos Habitacionais Essa pesquisa assemelhou-se agrave pesquisa bibliograacutefica

A diferenccedila entre ambas estaacute na natureza das fontes Enquanto a pesquisa bibliograacutefica se

utiliza fundamentalmente das contribuiccedilotildees dos diversos autores sobre determinado assunto a

pesquisa documental vale-se de materiais que natildeo receberam ainda um tratamento analiacutetico

A pesquisa documental e o levantamento de dados estatiacutesticos foram realizados nos

arquivos bibliograacuteficos e cartograacuteficos da Companhia de Saneamento do Paraacute (COSANPA)

Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute (COHAB) Companhia de Desenvolvimento

Metropolitano de Beleacutem (CODEM) na Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) e na

Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional (SEDURB) na Secretaria

Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) na

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo (CAEMA) Companhia de Habitaccedilatildeo do

Maranhatildeo (COHAB-Ma) entre outros Aleacutem de consultas agraves notiacutecias dos jornais de grande

circulaccedilatildeo em Beleacutem e em Satildeo Luis foi realizada tambeacutem consulta ao acervo bibliograacutefico e

fotograacutefico das aacutereas em estudo

A consulta aos arquivos dessas instituiccedilotildees foi relevante para a presente pesquisa

pois elas tiveram uma atuaccedilatildeo significativa em todo o processo de planejamento e

implementaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais e hoje continua fornecendo-lhe suporte teacutecnico-

institucional

O trabalho de campo faz-se indispensaacutevel Conforme Oliveira (1996) a importacircncia

deste atraveacutes do olhar ouvir e escrever constituem-se como momentos necessaacuterios e

estrateacutegicos para a compreensatildeo do fenocircmeno que se quer estudar especialmente no que diz

respeito ao exerciacutecio da pesquisa empiacuterica e agrave interpretaccedilatildeo de seus resultados

Com relaccedilatildeo agraves entrevistas foram realizadas com teacutecnicos e gestores das Secretarias

de Habitaccedilatildeo das cidades pesquisadas com a finalidade de conhecer os modelos de gestatildeo das

26

poliacuteticas habitacionais implementados em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma assim como entender

a importacircncia atribuiacuteda agrave questatildeo habitacional pelos diferentes agentes sociais analisar a

importacircncia e as repercussotildees da participaccedilatildeo popular nos projetos habitacionais buscando

entender as estrateacutegias adotadas pelos setores populares e sua possiacutevel contribuiccedilatildeo ou natildeo

para o desenvolvimento dos mesmos elucidar o papel dos planos diretores na efetivaccedilatildeo do

planejamento urbano identificar os limites e desafios das poliacuteticas habitacionais

desenvolvidas nas referidas cidades comparando suas dinacircmicas composiccedilotildees articulaccedilotildees e

accedilotildees que direcionam e satildeo direcionadas pelos governos municipais

Esse momento constitui-se em uma relaccedilatildeo dialoacutegica com o entrevistado e os

recursos da entrevista foram utilizados tanto nos seus aspectos quantitativos como

qualitativos haja vista que satildeo complementares De acordo com Cardoso (1986 p 96) a

oposiccedilatildeo entre qualitativo e quantitativo natildeo corresponde a modos opostos e inconciliaacuteveis de

ver a realidade Satildeo modos diversos de resgatar a vida social e chegar a iluminar aspectos natildeo

aparentes e natildeo conscientes para os atores envolvidos

Apoacutes a coleta dos dados foram realizadas a interpretaccedilatildeo dos mesmos e a elaboraccedilatildeo

dessa tese que estaacute estruturada da seguinte maneira

O primeiro capiacutetulo descreve a introduccedilatildeo da pesquisa

No segundo capiacutetulo objetivou-se realizar uma siacutentese teoacuterica das principais ideacuteias

que nortearam o debate sobre a questatildeo urbana e habitacional no Brasil abordando a

produccedilatildeo do espaccedilo urbana e da moradia enfocando quem satildeo os agentes produtores desse

espaccedilo com destaque ao papel do Estado uma vez que se compreende esse agente como

fundamental na intervenccedilatildeo organizaccedilatildeo e gestatildeo das cidades assim como ressaltar o

planejamento urbano o direito agrave cidade e o direito agrave moradia

No terceiro capiacutetulo analisou-se a poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia

enfatizando a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional a fim de identificar as intervenccedilotildees urbanas

governamentais e as principais caracteriacutesticas do processo de ocupaccedilatildeo territorial assim como

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica e a participaccedilatildeo dos agentes sociais nas poliacuteticas puacuteblicas

habitacionais

No quarto capiacutetulo buscou-se delinear as principais caracteriacutesticas das poliacuteticas

municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes ressaltando as desigualdades soacutecio-espaciais decorrentes do

processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano nas duas cidades e por fim no quarto capitulo

analisou-se os programasprojetos habitacionais que foram identificados durante a pesquisa

documental nas secretarias municipais

27

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

Refletir sobre a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e nele a da moradia no contexto da

sociedade capitalista requer a necessidade de compreendecirc-lo como uma construccedilatildeo histoacuterica

caracterizando-se em uma condiccedilatildeo necessaacuteria para reproduccedilatildeo do capital e dos diversos

grupos sociais

Sendo assim eacute fundamental uma apreensatildeo de autores que se preocuparam em

investigar o urbano articulando-o ao modo de produccedilatildeo capitalista e agrave dinacircmica dos agentes

que lutam na cidade pela produccedilatildeo de sua existecircncia

O espaccedilo urbano pode ser entendido aqui como um processo construiacutedo

historicamente por agentes que produzem e consomem esse espaccedilo como um produto social

fragmentado e articulado permeado de siacutembolos e tambeacutem como um campo de lutas tendo

a cidade como sua forma que expressa natildeo soacute a localizaccedilatildeo e arranjo de lugares expressa um

modo de vida Esse modo de vida natildeo estaacute ligado somente ao modo de produccedilatildeo econocircmica

embora sofra seus efeitos mas estaacute ligado a todas as esferas da vida social cultural

simboacutelica psicoloacutegica ambiental religiosa e educacional

O urbano pode ser entendido como um modo de vida ligado a certa divisatildeo do

trabalho uma forma social enquanto a cidade seria a materializaccedilatildeo dessa forma (HARVEY

1980)

Trindade Junior (1998) ressalta que o espaccedilo eacute socialmente produzido e esta

produccedilatildeo ocorre paralelamente com a produccedilatildeo de bens materiais necessaacuterios agrave sobrevivecircncia

do homem Portanto a produccedilatildeo do espaccedilo urbano pode ser interpretada como uma dimensatildeo

real e concreta onde se realiza a vida humana e como uma dimensatildeo abstrata que ocorre de

modo diferenciado no tempo e no lugar ganhando materialidade por meio do territoacuterio

A cidade pode ser vista entatildeo como um conjunto de apropriaccedilotildees e usos que a

valoram diferentemente na qual as combinaccedilotildees dinacircmicas produzidas assumem tanto valores

de uso quanto de troca que iratildeo se relacionar dialeticamente entre si A cidade eacute tambeacutem por

excelecircncia lugar ou espaccedilo do estar junto

Para Harvey (1993) as modificaccedilotildees impliacutecitas das relaccedilotildees sociais e as diferentes

apreensotildees cognoscitivas do espaccedilo geograacutefico bem como a ideacuteia de supressatildeo ou ampliaccedilatildeo

dos espaccedilos de lazer podem levar a inuacutemeras modificaccedilotildees do imaginaacuterio coletivo e das

relaccedilotildees culturais no espaccedilo urbano

28

Na visatildeo desse autor a produccedilatildeo do espaccedilo significa coexistecircncia e sobreposiccedilatildeo de

relaccedilotildees sociais Significa tambeacutem materialidade de processos sociais aparentemente

naturais que satildeo estruturados com base em interesses e praacuteticas individuais e coletivas sendo

guiados por um conjunto de disposiccedilotildees duradouras subjacente a tais praacuteticas e processos

Para entender estes processos eacute preciso compreender os mecanismos que consubstanciam as

praacuteticas sociais que materializadas balizam o espaccedilo urbano Este espaccedilo eacute formado por

uma praacutexis social que tem como pano de fundo um sistema econocircmico (e poliacutetico) complexo

e criativo que se renova constantemente se reinventando inclusive em suas proacuteprias crises

naquilo que ficou conhecido como destruiccedilatildeo criativa (HARVEY 2005 p 58)

Aleacutem disso o autor argumenta que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano com fins para o

desenvolvimento baseado na acumulaccedilatildeo do capital expressa a caracteriacutestica peculiar de

permanente mudanccedila de suas praacuteticas e processos materiais de reproduccedilatildeo social assim como

os significados de tempo e espaccedilo que tambeacutem se modificam e essas transformaccedilotildees podem

ter consequumlecircncias para a organizaccedilatildeo da vida diaacuteria

O capital se representa sob a forma de uma paisagem fiacutesica criada agrave sua proacutepria imagem criada como valores de uso favorecedores da acumulaccedilatildeo progressiva do capital A paisagem geograacutefica daiacute resultante eacute a gloacuteria que coroa o desenvolvimento capitalista precedente Mas ao mesmo tempo ela expressa o poder da matildeo-de-obra morta sobre a matildeo-de-obra viva e como tal aprisiona e inibe o processo de acumulaccedilatildeo dentro de um conjunto de restriccedilotildees fiacutesicas especiacuteficas [] O desenvolvimento capitalista portanto tem que negociar um caminho muito estreito entre a preservaccedilatildeo dos valores de troca dos investimentos de capital passado no meio ambiente construiacutedo e a destruiccedilatildeo do valor desses investimentos a fim de abrir um novo espaccedilo para acumulaccedilatildeo No capitalismo portanto haacute uma luta perpeacutetua em que o capital constroacutei uma paisagem fiacutesica apropriada agrave sua proacutepria condiccedilatildeo em determinado momento do tempo simplesmente para ter que destruiacute-la geralmente durante situaccedilotildees de crise num momento posterior do tempo O fluxo e refluxo temporal e geograacutefico do investimento no meio ambiente construiacutedo soacute podem ser entendidos em termos desse processo (HARVEY 1993 p 127)

Uma contribuiccedilatildeo teoacuterica e conceitual importante para a anaacutelise do espaccedilo urbano eacute a

obra de Pierre Bourdieu o qual propotildee uma abordagem socioloacutegica sobre habitus posiccedilotildees

sociais e estrateacutegias que visam superar a dicotomia entre objetividade e subjetividade para

anaacutelise das relaccedilotildees entre indiviacuteduos e os grupos e estruturas nos quais estatildeo implicados

Partindo da premissa de que as regularidades da sociedade se processam mediante a

interiorizaccedilatildeo das estruturas objetivas na subjetividade dos indiviacuteduos Bourdieu (2001 p

115) argumenta que

29

A relaccedilatildeo entre estruturas e accedilotildees individuais natildeo ocorre de modo mecacircnico como afirmam os objetivistas nem de modo consciente conforme apontam os subjetivistas mas de um modo dialeacutetico por meio de um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis que uma vez constituiacutedos no processo de socializaccedilatildeo passam a orientar as praacuteticas dos indiviacuteduos que por sua vez tendem a refletir as caracteriacutesticas das estruturas em que foram forjadas as disposiccedilotildees

Para tanto Bourdieu (2001 p 65) utiliza o conceito de habitus para explicar a

mediaccedilatildeo entre as estruturas objetivas e as subjetivas o qual pode ser compreendido como

uma capacidade infinita de engendrar produtos

pensamentos percepccedilotildees expressotildees accedilotildees

cujos limites satildeo fixados pelas condiccedilotildees histoacuterica e socialmente situadas de sua produccedilatildeo

permitindo tanto operar atos de conhecimento praacutetico fundados no mapeamento e no

reconhecimento de estiacutemulos condicionais e convencionais a que os agentes estatildeo dispostos a

reagir como tambeacutem [] engenderar sem posiccedilatildeo expliacutecita de finalidades nem caacutelculo

racional de meios estrateacutegias adaptadas e incessantemente renovadas situadas poreacutem nos

limites das construccedilotildees estruturais de que satildeo o produto e que as definem

As condiccedilotildees associadas numa classe particular de condiccedilotildees de existecircncia produzem habitus um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis e transferiacuteveis estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes quer dizer como princiacutepios que geram e organizam praacuteticas e representaccedilotildees que podem ser adaptadas objetivamente aos seus resultados sem pressupor um fim objetivo consciente ou um domiacutenio expresso das operaccedilotildees necessaacuterio para o atingir Objetivamente regulador e regulado sem ser de qualquer forma o produto de obediecircncia a regras o habitus pode ser orquestrado coletivamente sem ser o produto da accedilatildeo organizatoacuteria de um condutor (BOURDIEU 2001 p 53)

Nesse sentido o habitus seria um conhecimento adquirido e um capital pelo qual se

indica a disposiccedilatildeo incorporada de um agente os princiacutepios geradores e organizadores de suas

praacuteticas captadas quando da sua accedilatildeo traduzindo-se na forma com que um determinado

grupo interioriza seu comportamento dentro de determinado espaccedilo social Neste caso o

espaccedilo social e o espaccedilo fiacutesico passam a ser um soacute

O espaccedilo social eacute definido como um conjunto de posiccedilotildees distintas e coexistentes

exteriores umas agraves outras definidas umas em relaccedilatildeo agraves outras por sua exterioridade muacutetua e

por relaccedilotildees de proximidade de vizinhanccedila ou de distanciamento e tambeacutem por relaccedilotildees de

ordem como acima abaixo e entre (BOURDIEU 1996 p 18)

30

Bourdieu tambeacutem desenvolveu o conceito de capital simboacutelico o qual natildeo se baseia

unicamente no econocircmico mas fundamentalmente se expressa por outros tipos de capitais4

o cultural o social o poliacutetico o religioso e o esteacutetico reconhecendo a dimensatildeo simboacutelica

enquanto produtora e reprodutora da dominaccedilatildeo que estaacute por traz dos processos de

diferenciaccedilatildeo social

Sendo assim a hierarquia das posiccedilotildees sociais se constitui de acordo com o volume e

com a estrutura do capital possuiacutedo pelos indiviacuteduos e grupos que se distribuem nas diversas

posiccedilotildees do espaccedilo social

Satildeo essas accedilotildees humanas que atuam diretamente na construccedilatildeo transformaccedilatildeo e

reconstruccedilatildeo do espaccedilo Desse modo um conjunto de accedilotildees sociais que compreendem

produccedilatildeo distribuiccedilatildeo e consumo de bens materiais representam praacuteticas econocircmicas em

determinado momento histoacuterico assim como o estabelecimento de relaccedilotildees entre os homens

na sociedade corroboram decisivamente para a construccedilatildeo do arranjo econocircmico social

cultural e poliacutetico do espaccedilo

Segundo Spoacutesito (2004) as praacuteticas econocircmicas modificam o espaccedilo em sua ampla

condiccedilatildeo de valor de troca ou seja as formaccedilotildees sociais em sua evoluccedilatildeo passam de uma

situaccedilatildeo de simples ocupaccedilatildeo e aproveitamento do espaccedilo (adaptaccedilatildeo passiva) para uma

situaccedilatildeo de transformaccedilatildeo cada vez mais ampla e profunda desse espaccedilo (adaptaccedilatildeo ativa)

Essa transformaccedilatildeo compreende natildeo apenas a produccedilatildeo de bens materiais como tambeacutem a

adequaccedilatildeo do meio ambiente circundante agraves necessidades individuais familiares

comunitaacuterias e das formaccedilotildees sociais em seu conjunto

Para Castells (1983 p 181) o espaccedilo eacute um produto material de uma dada formaccedilatildeo

social Eacute determinado pelas forccedilas produtivas e pelas relaccedilotildees de produccedilatildeo que se originam

delas Analisando o espaccedilo urbano enquanto expressatildeo da estrutura social o referido autor

argumenta que a organizaccedilatildeo do espaccedilo pode ser entatildeo compreendida a partir da determinaccedilatildeo

das formas espaciais e diz que todo espaccedilo urbano eacute o espaccedilo aonde vai se configurar o

processo relativo agrave forccedila de trabalho e sua reproduccedilatildeo

Entretanto Lojkine (1981) afirma que tal anaacutelise baseia-se em equiacutevocos e que reduz

o urbano agrave forccedila de trabalho Dentre os equiacutevocos estatildeo a confusatildeo entre processo

teacutecnica

de trabalho e processo social

de produccedilatildeo confusatildeo entre a unidade imediata de produccedilatildeo e

4 Bonnewitz (2005 p 53-54) sintetiza quatro tipos de capital apresentados por Bourdieu que satildeo 1) capital econocircmico que satildeo diferentes fatores de produccedilatildeo e conjunto dos bens econocircmicos 2) capital cultural satildeo as qualificaccedilotildees intelectuais produzidas pelo sistema escolar ou transmitidas pela famiacutelia podendo se apresentar objetivados tais como nos bens culturais incorporados por exemplo no vocabulaacuterio e institucionalizados a exemplo dos tiacutetulos acadecircmicos 3) capital social se constitui pelas relaccedilotildees sociais e pelas redes de sociabilidade 4) capital simboacutelico composto pelo reconhecimento social honra e prestiacutegio

31

a divisatildeo societal do trabalho no conjunto de uma formaccedilatildeo social confusatildeo entre forccedilas

produtivas e forccedilas produtivas materiais

Este autor entende o espaccedilo urbano a partir do contexto das lutas de classes

considerando o urbano como um dos lugares decisivos dessa luta enfatizando a principal

contradiccedilatildeo entre a exigecircncia de desenvolvimento do trabalho vivo e a loacutegica de acumulaccedilatildeo

do trabalho cristalizado que tende a restringir ao maacuteximo esse desenvolvimento em funccedilatildeo de

suas necessidades imediatas

Conforme Lojkine (1981) a cidade eacute o reflexo de uma nova modalidade de conflito

de classes uma vez que o espaccedilo urbano eacute organizado de maneira desigual O acesso aos

serviccedilos de infraestrutura urbana transportes coletivos e equipamentos de lazer varia de

acordo com os diferentes grupos sociais evidenciando um processo de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Para ele existem trecircs tipos de segregaccedilatildeo

1 Uma oposiccedilatildeo entre o centro onde o preccedilo do solo eacute mais alto e a periferia onde

o preccedilo do solo eacute mais baixo5

2 Uma separaccedilatildeo crescente entre as zonas e moradias reservadas agraves camadas

sociais de maior poder aquisitivo e as zonas de moradia popular

3 Um esfacelamento generalizado das funccedilotildees urbanas disseminadas em zonas

geograficamente distintas especializadas zona de escritoacuterios zona industrial

zona de moradia etc

Mediante a reflexatildeo sobre tais conceitos (Castells e Lojkine) pode-se afirmar que o

urbano eacute historicamente construiacutedo enquanto espaccedilo de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho do

capital e das proacuteprias classes sociais

A cidade torna-se assim espaccedilo destinado agrave industrializaccedilatildeo aos serviccedilos

especializados e ao crescimento do capital acarretando na concentraccedilatildeo demograacutefica e no

desenvolvimento desordenado

da cidade gerado pela necessidade de reproduccedilatildeo do capital

5 O conceito de centro utilizado nesse trabalho pode ser definido como ponto central da gestatildeo do territoacuterio centro de decisatildeo e poder Cabe destacar que a apropriaccedilatildeo e uso do solo estatildeo atrelados agraves diferenciaccedilotildees de renda sendo que determinaraacute a acessibilidade ao espaccedilo por ser diretamente vinculada agrave lei do mercado Nesse sentido a discussatildeo sobre centro e periferia natildeo deve desprezar elementos necessaacuterios a compreensatildeo de que uma aacuterea perifeacuterica natildeo eacute apenas aquela distante da aacuterea central de uma determinada cidade Devem ser levados em consideraccedilatildeo vaacuterios aspectos como fiacutesicos econocircmicos sociais e culturais que satildeo determinantes para que se compreenda as condiccedilotildees sociais e modo de vida dos moradores seja da regiatildeo central ou da perifeacuterica Para Spoacutesito (2004 p 116) o conceito de periferia urbana deve ter em vista as transformaccedilotildees que esses espaccedilos vecircm passando no seu conteuacutedo soacutecioespacial tais como os conjuntos habitacionais implantados pelo poder puacuteblico para grupos de menor poder aquisitivo loteamentos clandestinos produzidos pelas praacuteticas de autoconstruccedilatildeo e condomiacutenios fechados para grupos de maior renda e a implantaccedilatildeo de shopping centers Assim sendo esta pluralizaccedilatildeo da paisagem e dos conteuacutedos da periferia urbana revela novas praacuteticas soacutecioespaciais novas formas de diferenciaccedilatildeo e segregaccedilatildeo urbana e por fim aponta para uma fragmentaccedilatildeo territorial e social da cidade

32

uma vez que o modo de vida capitalista eacute determinado pela dinacircmica das forccedilas produtivas

articuladas com a produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Dessa maneira pode-se dizer

que o urbano se constitui em espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e tambeacutem em espaccedilo de

reproduccedilatildeo de classes sociais por meio de confrontos soacutecio-poliacuteticos decorrentes da

divergecircncia de seus interesses

Portanto o urbano eacute representado por uma infraestrutura que propicia a produccedilatildeo

circulaccedilatildeo troca e consumo de mercadorias e serviccedilos aleacutem de ser produto da accedilatildeo e

interaccedilatildeo de diversas forccedilas sociais que possuem perspectivas antagocircnicas as quais satildeo

modeladas pela luta de classes causando conflitos e interesses para aleacutem do local de trabalho

passando para o local de moradia e aacutereas de consumo coletivo

Bourdieu (2001) ao tratar da dimensatildeo simboacutelica das lutas esclarece que as lutas

entre dominantes e dominados se daacute em um campo de forccedilas que podem ser expressos em

trecircs campos campo social campo de poder e campo poliacutetico

Pode-se descrever o campo social como um espaccedilo multidimensional de posiccedilotildees tal que qualquer posiccedilatildeo atual pode ser definida em funccedilatildeo de um sistema multidimensional de coordenadas cujos valores correspondem aos valores das diferentes variaacuteveis pertinentes os agentes distribuem-se assim nele na primeira dimensatildeo segundo o volume global do capital que possuem e na segunda dimensatildeo segundo a composiccedilatildeo do seu capital

quer dizer segundo o peso relativo das diferentes espeacutecies no conjunto de suas posses [] essas espeacutecies satildeo os poderes que definem as probabilidades de ganho num campo determinado (BOURDIEU 2001 p 134-135)

Em relaccedilatildeo ao campo de poder Bourdieu (2001 p 139) o definido como

Relaccedilotildees de forccedila entre as posiccedilotildees sociais que garantem aos seus ocupantes um quantum suficiente de forccedila social

ou de capital

de modo que estes tenham a possibilidade de entrar nas lutas pelo monopoacutelio do poder entre os quais possuem uma dimensatildeo capital as que tecircm por finalidade a definiccedilatildeo de forma legiacutetima de poder

Campo poliacutetico para ele (2001 p 164) eacute ao mesmo tempo campo de forccedilas e

campo de lutas que tecircm em vista transformar as relaccedilotildees de forccedilas que confere a este campo a

sua estrutura em dado momento

Assim sendo enquanto resultado das relaccedilotildees e da accedilatildeo dos homens o espaccedilo

urbano adquire formas que refletem de modo geral as determinaccedilotildees que satildeo hegemocircnicas na

sociedade Esse espaccedilo eacute uma conjuntura histoacuterica e uma forma social que recebe sentido dos

processos sociais que se exprimem por meio dele ou seja por meio das relaccedilotildees estabelecidas

33

entre as diferentes instacircncias de uma estrutura social a econocircmica a poliacutetica a ideoloacutegica

cultural e a conjuntura de relaccedilotildees sociais que dela resulta

Da mesma forma Lefebvre (1991 p 128) ressalta que

O espaccedilo possui no modo de produccedilatildeo o mesmo status ontoloacutegico que o capital ou o trabalho porque tanto as relaccedilotildees de posse quanto agraves de exteriorizaccedilatildeo material (a produccedilatildeo de espaccedilo) estatildeo unidas nas relaccedilotildees de propriedade que formam a essecircncia do modo capitalista de produccedilatildeo O espaccedilo eacute apenas parte das forccedilas e meios de produccedilatildeo constitui tambeacutem um produto dessas mesmas relaccedilotildees tornando o design espacial diferente de qualquer outro fator social ou mercadoria aleacutem da haver um espaccedilo de consumo ou um espaccedilo como aacuterea de impacto para o consumo coletivo haacute tambeacutem o consumo de espaccedilo ou o proacuteprio espaccedilo como objeto de consumo

Milton Santos (1991 p 71) afirma que o espaccedilo natildeo eacute nem uma coisa nem um

sistema de coisas senatildeo uma realidade relacional coisas e relaccedilotildees juntas

O espaccedilo deve ser considerado como um conjunto indissociaacutevel de que participam de um lado certo arranjo de objetos geograacuteficos objetos naturais e objetos sociais e de outro a vida que os preenche e os anima ou seja a sociedade em movimento [] um conjunto de objetos e de relaccedilotildees que se realizam sobre estes objetos natildeo entre estes especificamente mas para as quais eles servem de intermediaacuterios Os objetos ajudam a concretizar uma seacuterie de relaccedilotildees O espaccedilo eacute resultado da accedilatildeo dos homens sobre o proacuteprio espaccedilo intermediado pelos objetos naturais e artificiais

Sendo assim compreende-se que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia satildeo

determinados pelas relaccedilotildees sociais que se constituem no modo de vida capitalista e

determinantes da dinacircmica soacutecioespacial

Harvey (1980 p 5) argumenta que o espaccedilo urbano pode ser compreendido como

uma relaccedilatildeo contiacutenua entre processos sociais e formas espaciais constituiacutedos historicamente

Logo a gecircnese do espaccedilo urbano eacute analisada da seguinte forma o espaccedilo natildeo eacute absoluto

relativo ou relacional em si mesmo mas pode transformar-se em outro dependendo das

circunstacircncias O problema da correta conceituaccedilatildeo do espaccedilo eacute resolvido atraveacutes da praacutetica

humana em relaccedilatildeo a ele

Com o padratildeo de modernizaccedilatildeo fordista o capital instaurou-se natildeo somente por meio

da induacutestria mas tambeacutem nas relaccedilotildees de produccedilatildeo e apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo As

categorias analiacuteticas envolvidas na produccedilatildeo e na apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano satildeo o Estado

34

o capital o trabalho e a terra6 como mercadoria Estas categorias podem ser melhor

identificadas quando verificam-se os fenocircmenos e processos advindos com a modernizaccedilatildeo o

ecircxodo rural a urbanizaccedilatildeo intensa e acelerada a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e o processo de

favelizaccedilatildeo e periferizaccedilatildeo da classe trabalhadora entre outros (HARVEY 1980)

Esses fenocircmenos podem ser reconhecidos assim como em outras cidades nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis que sofrem com os efeitos da intensa especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

acarretando na valorizaccedilatildeo de espaccedilos privilegiados os quais possuem mais investimentos em

infraestrutura serviccedilos e transportes

Para ele as novas configuraccedilotildees desenvolvidas no espaccedilo urbano e na moradia nas

uacuteltimas deacutecadas estatildeo diretamente relacionadas a um novo momento da estruturaccedilatildeo da

sociedade capitalista no qual o desejo exacerbado por acumulaccedilatildeo somado agrave necessidade de

reproduccedilatildeo das classes sociais contribuiu para o processo de descentralizaccedilatildeo das aacutereas

centrais deslocando-se para outros espaccedilos longiacutenquos da cidade como zonas baixadas

favelas etc instigados pelo processo de renovaccedilatildeo urbana

Castells (1996) ressalta que a globalizaccedilatildeo vem alterando profundamente as

estruturas produtivas as relaccedilotildees teacutecnicas e sociais de produccedilatildeo e os padrotildees organizacionais

e locacionais colocando novas questotildees e recolocando tambeacutem velhos desafios nos quais as

desigualdades e as possibilidades de desenvolvimento permanecem no centro desse novo

cenaacuterio Esse processo eacute resultado e condicionante das aceleradas e radicais mudanccedilas

tecnoloacutegicas determinadas pela competiccedilatildeo capitalista sob a lideranccedila da tecnologia da

informaccedilatildeo e da sociedade do conhecimento

A globalizaccedilatildeo permitiu e induziu a generalizaccedilatildeo dos novos meios de comunicaccedilatildeo

e controle (informaacutetica telemaacutetica internet TV a cabo sistemas online etc) que vecircm

facilitando e barateando os transportes e as comunicaccedilotildees potenciando o aumento do fluxo de

informaccedilotildees econocircmicas cientiacuteficas tecnoloacutegicas culturais e poliacuteticas expandindo o

comeacutercio internacional e inter-regional de bens alterando a natureza da produccedilatildeo consumo e

comeacutercio de serviccedilos inclusive possibilitando o crescimento do comeacutercio de serviccedilos agrave

distacircncia aumentando o fluxo de capitais e de pessoas especialmente financeiro construccedilatildeo

de imoacuteveis entre outros portanto acelerando a integraccedilatildeo mundial

6 A terra condiccedilatildeo fundamental para a reproduccedilatildeo do capital por meio de benfeitorias e mudanccedila no uso (passando entatildeo a solo urbano) se transforma em uma mercadoria especial Ao solo passa a ser atribuiacuteda uma condiccedilatildeo utilitarista (mascarando o trabalho) de meio e condiccedilatildeo para reproduccedilatildeo do capital O espaccedilo tambeacutem passou a incorporar esse utilitarismo sendo por vezes condiccedilatildeo indispensaacutevel para a economia urbana (HARVEY 2005)

35

Estas tendecircncias refletem as profundas mudanccedilas ocorridas na dinacircmica capitalista

definindo o redirecionamento das unidades produtivas no qual novos espaccedilos satildeo explorados

para a implantaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de novos equipamentos e infraestrutura que favoreccedilam a

concorrecircncia capitalista aleacutem da abertura de novos mercados o que produz novas

contradiccedilotildees entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo urbano e da moradia e sua

apropriaccedilatildeo privada

As transformaccedilotildees do espaccedilo urbano nesse novo contexto decorrem das inovaccedilotildees

tecnoloacutegicas e sociais como a fragmentaccedilatildeo das classes sociais decorrentes da relaccedilatildeo de

dominaccedilatildeo-subordinaccedilatildeo capitalista Destarte se por um lado as novas atividades produtivas

os empreendimentos imobiliaacuterios o crescimento populacional as poliacuteticas puacuteblicas ineficazes

tecircm ocasionado o adensamento e a intensificaccedilatildeo do uso de determinados espaccedilos por outro

lado tecircm propiciado a saiacuteda de uma grande parcela da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo e

de atividades econocircmicas para outros espaccedilos degradados

O proacuteprio espaccedilo dotado de atributos locacionais em contiacutenua ressignificaccedilatildeo eacute incorporado agrave difusatildeo de inovaccedilotildees tornando-se novo em alguns lugares e velhos em outros Por meio da propriedade privada eacute submetido a praacuteticas espaciais como seletividade esterilizaccedilatildeo antecipaccedilatildeo e marginalizaccedilatildeo que visam agrave sua valorizaccedilatildeo diferenciada na qual o novo e o velho estatildeo presentes em setores distintos O novo espaccedilo valorizado constitui-se ainda que natildeo exclusivamente em local para novas formas espaciais abrigando novas funccedilotildees (CARDOSO 2003 p 51)

A dinacircmica soacutecioespacial sofreu profundas alteraccedilotildees com a nova fase de

internacionalizaccedilatildeo do capital uma vez que o processo de renovaccedilatildeo urbana criou novas

bases espaciais de produccedilatildeo por meio da substituiccedilatildeo e ruptura das estruturas preexistentes

estimulando o mercado imobiliaacuterio e as parcerias entre os setores puacuteblico e privado

De acordo com Carlos (2001) o redirecionamento das formas espaciais produtivas

iraacute provocar a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano por meio da mobilidade social Este

deslocamento eacute justificado principalmente pelos novos locais de instalaccedilatildeo das induacutestrias que

procuram pontos estrateacutegicos (proacuteximos de terminais rodoviaacuterios e mariacutetimos estradas

pavimentadas etc) facilitando assim o escoamento da produccedilatildeo e reduzindo os custos de

operaccedilatildeo

Dessa maneira a intensificaccedilatildeo e extensificaccedilatildeo da urbanizaccedilatildeo satildeo provocadas por

um consumo voraz e crescente do espaccedilo uma vez que para atender agraves necessidades

crescentes do capital satildeo revistas as legislaccedilotildees ambientais e de uso do solo introduzindo

mudanccedilas que visam atender interesses de classes sociais especiacuteficas aleacutem do avanccedilo da

36

destruiccedilatildeo de florestas por meio da ampliaccedilatildeo das fronteiras agriacutecolas e expansatildeo das

monoculturas intensivas como da cana e soja provocando o aumento da exclusatildeo social e da

precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida de grandes contingentes populacionais que buscam os

centros urbanos

As novas configuraccedilotildees dos espaccedilos urbanos na atualidade satildeo justificadas pelos agentes sociais condicionadores do espaccedilo Entre eles merecem destaque o Estado e os promotores imobiliaacuterios A atuaccedilatildeo do Estado no espaccedilo se efetiva com o processo de renovaccedilatildeo urbana que estaacute vinculado agrave necessidade de remodelar espaccedilos deteriorados em aacutereas condizentes com a arquitetura moderna Esta renovaccedilatildeo em geral acontece com o remanejamento de famiacutelias cabendo ao poder puacuteblico efetivar esta accedilatildeo [] As zonas atingidas pela renovaccedilatildeo passam por um processo de valorizaccedilatildeo devido agrave incorporaccedilatildeo de infraestrutura tornando-se propiacutecia agrave especulaccedilatildeo imobiliaacuteria As famiacutelias que residiam nestes espaccedilos no entanto acabam por abandonaacute-los por natildeo possuiacuterem condiccedilotildees de pagar o ocircnus da valorizaccedilatildeo que se processa com o aumento dos impostos e taxas de serviccedilos urbanos (CARLOS 2001 p 64)

Cabe ressaltar que a accedilatildeo do Estado se processa de acordo com as diretrizes do

capital intervindo no espaccedilo urbano e na questatildeo habitacional para suprir as necessidades do

mesmo estabelecendo a renovaccedilatildeo ou abertura de novos espaccedilos que satildeo fragmentados e

intensificam a segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o uso do solo torna-se cada vez mais valorizado

Dessa maneira muitas famiacutelias que moram em aacutereas mais centrais satildeo pressionadas

pelo capital imobiliaacuterio a vender seu imoacutevel o que acaba constituindo-se em uma estrateacutegia

de sobrevivecircncia pois a renda adquirida com a venda do imoacutevel por um valor mais alto gera

uma oportunidade de ganho financeiro jaacute que poderaacute servir para compra de outro imoacutevel por

um preccedilo menor em um local mais distante que sofre com a falta de infraestrutura serviccedilos

etc e o restante da renda seraacute o lucro para ser investido em outras transaccedilotildees financeiras

Atraveacutes da poliacutetica de renovaccedilatildeo urbana o Estado capitalista valoriza simultaneamente vaacuterios interesses De um lado via expulsatildeo dos pobres residentes em corticcedilos junto ao centro da cidade redirecionando a segregaccedilatildeo residencial e viabiliza o capital imobiliaacuterio que tem oportunidade de realizar bons negoacutecios em aacutereas onde o preccedilo da terra eacute pela proximidade do centro bastante elevado eacute a renovaccedilatildeo urbana (CORREcircA 1989 p 28)

Carlos (2001) analisa o processo de renovaccedilatildeo urbana como uma accedilatildeo do Estado por

intermeacutedio do poder local ao intervir no processo de produccedilatildeo da cidade que reforccedila a

hierarquia de lugares criando novas centralidades e expulsando para periferia os antigos

37

habitantes criando um espaccedilo de dominaccedilatildeo Com isso impotildee sua presenccedila em todos os

lugares agora sob controle e vigilacircncia (direta ou indireta)

Assim sendo o espaccedilo produzido assume a caracteriacutestica de fragmentaccedilatildeo em

decorrecircncia da accedilatildeo dos empreendedores imobiliaacuterios e da generalizaccedilatildeo do processo de

mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo homogecircneo (pela dominaccedilatildeo imposta pelo Estado ao espaccedilo) e

hierarquizado (pela divisatildeo espacial do trabalho)

Entatildeo a estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano depende das accedilotildees econocircmicas sociais

culturais e poliacuteticas uma vez que a cidade eacute resultado de intervenccedilotildees puacuteblicas e privadas que

atuam no espaccedilo urbano por meio de investimentos infraestruturais e organizacionais

regulamentando os diversos interesses de poder e de classe estabelecendo estrateacutegias sociais e

poliacuteticas muitas vezes geradoras de segregaccedilotildees e exclusotildees sociais

Percebe-se assim que a accedilatildeo do Estado perpetua as contradiccedilotildees engendradas pelo

processo de reproduccedilatildeo capitalista agrave medida que atende aos interesses da classe dominante

criando mecanismos para quebrar as barreiras que impedem o avanccedilo do progresso ao

implementar infraestrutura e favorecer a liberaccedilatildeo de aacutereas necessaacuterias agrave reproduccedilatildeo do

capital Destarte a renovaccedilatildeo urbana pode ser caracterizada como um conjunto de estrateacutegias

que levam agrave segregaccedilatildeo e agrave hierarquia do espaccedilo alterando a forma de determinadas aacutereas da

cidade promovendo a transformaccedilatildeo da vida urbana modificando sua estrutura e funccedilatildeo

A contradiccedilatildeo do espaccedilo natildeo vem de sua forma racional tal qual se depreende nos matemaacuteticos ela vem do conteuacutedo praacutetico e social especificamente do conteuacutedo capitalista Com efeito esse espaccedilo da sociedade capitalista se quer racional enquanto praacutetica ele eacute comercializado fragmentado vendido em parcelas Eacute assim que ele eacute ao mesmo tempo global e pulverizado Ele parece loacutegico e ele eacute absolutamente recortado Essas contradiccedilotildees explodem no plano institucional Nesse plano se descobre que a burguesia tem um duplo poder sobre o espaccedilo inteiro agrave exceccedilatildeo dos direitos da coletividade e do Estado-e secundariamente pela globalidade a saber o conhecimento a estrateacutegia a accedilatildeo do Estado Haacute conflitos inevitaacuteveis entre esses dois aspectos e notadamente entre o espaccedilo abstrato (concebido ou conceitual global ou estrateacutegico) e o espaccedilo imediato percebido vivido fragmentado e vendido No plano institucional essas contradiccedilotildees aparecem entre os planos gerais do planejamento e os projetos parciais dos mercados do espaccedilo (LEFEBVRE 1991 apud CARLOS 2001 p 237- 238)

Por meio do zoneamento e do planejamento urbano o Estado impotildee e administra

limitaccedilotildees ao mercado imobiliaacuterio ao promover em determinados espaccedilos urbanos serviccedilos

como aacutegua energia esgoto transporte puacuteblico escolas e postos de sauacutede aleacutem de garantir

infraestrutura que contribui indiretamente para o aumento do valor de uso das moradias

38

Portanto como esclarece Harvey (1996) a compreensatildeo da dinacircmica com que se

processam as grandes intervenccedilotildees urbanas e das modificaccedilotildees estruturais geradas por elas eacute

fundamental para a proposiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas direcionadas para a sustentabilidade

urbana O contexto global da perda de capacidade de regulaccedilatildeo da economia por parte do

poder puacuteblico da financeirizaccedilatildeo e desterritorializaccedilatildeo do capital bem como a intensificaccedilatildeo

da sua concentraccedilatildeo satildeo fenocircmenos que afetam de maneira geral todas as grandes cidades

poreacutem os efeitos satildeo muito particulares

Assim a raacutepida transformaccedilatildeo do espaccedilo urbano e da questatildeo habitacional no Brasil

no periacuteodo compreendido pelas trecircs uacuteltimas deacutecadas do seacuteculo XX e na primeira do seacuteculo

XXI induz a questionamentos quanto a questatildeo dos modelos de poliacuteticas puacuteblicas

implementadas assim como os padrotildees da segregaccedilatildeo soacutecioespacial que ora se observa na

estrutura intra-urbana das grandes cidades brasileiras incluindo Beleacutem e Satildeo Luis

Para tanto torna-se imprescindiacutevel refletir sobre a dinacircmica de ocupaccedilatildeo do solo

bem como a interaccedilatildeo dos diferentes agentes que atuam na produccedilatildeo e consumo do espaccedilo

urbano clarificando os aspectos relacionados agrave atuaccedilatildeo do capital imobiliaacuterio e agraves

precariedades soacutecio-espaciais a que estaacute submetida grande parte da populaccedilatildeo como carecircncia

de infraestrutura e serviccedilos urbanos especulaccedilatildeo expulsatildeo de suas terras entre outras uma

vez que a questatildeo habitacional estaacute condicionada tanto pelas mudanccedilas na economia do paiacutes

quanto pelos mecanismos que produzem a estrutura urbana e a distribuiccedilatildeo dos equipamentos

e serviccedilos na cidade

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO ESTADO

Ao comeccedilar a discutir sobre os agentes produtores do espaccedilo urbano faz-se

necessaacuterio resgatar a concepccedilatildeo de espaccedilo urbano desenvolvida por Correcirca (1993) a qual

considera o espaccedilo urbano como espaccedilo construiacutedo no contexto da cidade capitalista como

produto social resultado da accedilatildeo histoacuterica de agentes que produzem e consomem esse espaccedilo

Eis o que eacute o espaccedilo urbano fragmentado e articulado reflexo e condicionante social um conjunto de siacutembolos e campo de lutas Eacute assim a proacutepria sociedade em uma de suas dimensotildees aquela mais aparente materializada nas formas espaciais Eacute o produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem o espaccedilo (CORREcircA 1993 p 9)

39

Dessa maneira a apropriaccedilatildeo e o uso do solo nas cidades capitalistas podem ser

compreendidos pela proacutepria dinacircmica da sociedade que traz em si diversas contradiccedilotildees

estabelecidas nos conflitos existentes entre as exigecircncias do capital e as demandas da

sociedade uma vez que as relaccedilotildees econocircmicas determinam as diretrizes do modo de

produccedilatildeo e a estrutura urbana se constitui pelas accedilotildees dos grupos sociais

De acordo com Correcirca (1993) os processos espaciais definem a organizaccedilatildeo espacial

desigual e mutaacutevel da cidade capitalista Nela o processo espacial eacute concebido como as forccedilas

por meio da qual o movimento de transformaccedilatildeo social compreendido como o proacuteprio

processo se efetiva espacialmente redefinindo a espacialidade da sociedade

Ainda segundo o autor as agentes que produzem socialmente o espaccedilo urbano satildeo

responsaacuteveis pela configuraccedilatildeo da organizaccedilatildeo do espaccedilo das cidades distinguindo-se como

1) Proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo caracterizam-se como os grandes proprietaacuterios industriais e das grandes empresas comerciais portanto como grandes consumidores de espaccedilos Estes espaccedilos satildeo produzidos em torno do interesse de expansatildeo da produccedilatildeo garantidos por meio de terrenos amplos e baratos que satisfaccedilam suas necessidades de circulaccedilatildeo de mercadoria e acabam por interferir no modelamento das cidades

2) Proprietaacuterios fundiaacuterios satildeo os proprietaacuterios de terra que se empenham em obter a maior renda fundiaacuteria de suas propriedades seja no uso comercial ou residencial Portanto sua accedilatildeo se daacute em torno do aumento contiacutenuo da renda fundiaacuteria que obtecircm de suas propriedades Para tanto seus esforccedilos direcionam-se no sentido de garantir infraestrutura urbana para seus terrenos exercendo pressatildeo junto ao poder puacuteblico no processo de definiccedilatildeo das leis de uso do solo e na garantia dos benefiacutecios infraestruturais Significa dizer que estes estatildeo mais preocupados com o valor de troca da terra e natildeo de seu uso

3) Promotores imobiliaacuterios eacute um conjunto de agentes que exercem accedilotildees de compra financiamento estudo teacutecnico construccedilatildeo ou produccedilatildeo fiacutesica de novas habitaccedilotildees transformaccedilatildeo do capital mercadoria em capital dinheiro7 Sua atuaccedilatildeo espacial na cidade tem caraacuteter excludente pois favorece a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para satisfazer a demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo desta forma criando e reforccedilando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial

4) Estado enquanto agente modelador do espaccedilo urbano capitalista atuando na organizaccedilatildeo espacial da cidade como grande industrial consumidor de espaccedilo e de localizaccedilotildees especiacuteficas proprietaacuterio fundiaacuterio e promotor imobiliaacuterio sem deixar de ser tambeacutem um agente de regulaccedilatildeo do uso do solo e alvo dos chamados Movimentos Sociais Urbanos Sua accedilatildeo mais visiacutevel se daacute por meio da implantaccedilatildeo de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos na elaboraccedilatildeo de normas vinculadas ao uso do solo para os quais dispotildee de um conjunto de instrumentos como o direito de desapropriaccedilatildeo a regulamentaccedilatildeo do uso do solo e outros

7 Sobre as funccedilotildees atribuiacutedas aos promotores imobiliaacuterios ver Topalov (1974)

40

5) Grupos sociais excluiacutedos satildeo parcelas da populaccedilatildeo que natildeo possuem no que concerne agrave moradia acesso aos bens e serviccedilos produzidos socialmente e eacute na produccedilatildeo de favela em terrenos puacuteblicos ou privados ocupados que esses grupos tornam-se agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito dos outros agentes A produccedilatildeo do espaccedilo eacute uma forma de resistecircncia e de estrateacutegia de sobrevivecircncia (CORREcircA 1993 p 23-24)

Cada um dos agentes a quem o autor se refere desenvolve um papel ativo na

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia tendo como vieacutes a dinacircmica da acumulaccedilatildeo

capitalista considerando que accedilotildees implementadas satildeo em funccedilatildeo dos interesses dominantes

garantindo a reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e portanto a contradiccedilatildeo da luta de classes

Harvey em sua obra A justiccedila social e a cidade argumenta que a aquisiccedilatildeo de terras

e as melhorias implementadas no espaccedilo urbano e habitacional satildeo compreendidas como

mercadorias na sociedade capitalista contemporacircnea

portanto possuem um valor de uso e

um valor de troca

mercadorias estas que natildeo podem ser deslocadas pois tecircm uma

localizaccedilatildeo fixa e que satildeo essenciais uma vez que natildeo se pode viver sem uma habitaccedilatildeo (um

abrigo de qualquer espeacutecie) que ocupa um espaccedilo na cidade (HARVEY 1980 p 157)

Para ele o importante eacute analisar o papel dos agentes do mercado imobiliaacuterio na

determinaccedilatildeo dos valores da terra e para isso destaca os principais grupos que compotildee esse

mercado

1) Moradores cuja situaccedilatildeo familiar ou pessoal (assim como a localizaccedilatildeo da moradia) iraacute determinar o valor de uso da habitaccedilatildeo

o valor de troca apareceraacute em dois momentos na compra e venda da residecircncia e nas reformas e reparos que aumentam esse valor

2) Imobiliaacuterias atores que operam no mercado imobiliaacuterio para obter valor de troca Seu lucro se daacute no processo de compra e venda de habitaccedilotildees e na prestaccedilatildeo de serviccedilos como intermediaacuterias Para as imobiliaacuterias o valor de uso estaacute no volume de transaccedilotildees realizadas das quais obtecircm o valor de troca

3) Proprietaacuterios de terrenos urbanos os proprietaacuterios profissionais ou seja aqueles que adquirem terrenos para vendecirc-los por um preccedilo mais elevado e vecircem na habitaccedilatildeo um meio de troca e natildeo um valor de uso para si mesmo

4) Incorporadoras e a induacutestria da construccedilatildeo atores envolvidos na criaccedilatildeo de novos valores de uso que garantam os subsiacutedios de seus valores de troca Da mesma maneira que as imobiliaacuterias estatildeo interessadas no valor de uso para outrem desde que obtenham valor de troca para si mesma

5) Instituiccedilotildees financeiras estatildeo interessadas em obter valores de troca por meio de financiamentos que promovem a criaccedilatildeo de valores de uso

6) Instituiccedilotildees governamentais interferem no mercado imobiliaacuterio dando apoio agraves instituiccedilotildees financeiras incorporadores e agrave induacutestria da construccedilatildeo garantindo lucros e eliminando alguns riscos Esse suporte

41

governamental ao mercado imobiliaacuterio eacute uma das maneiras de assegurar a produccedilatildeo de valores de uso (provisatildeo de moradia para populaccedilatildeo de baixa renda) e valores de troca promovendo melhoria urbana (bens de consumo coletivo) ou implementando leis de zoneamento controle e planejamento do uso do solo urbano (HARVEY 1980 p 139-141)

No processo urbano e da cidade se relacionam diferentes agentes que possuem

estrateacutegias proacuteprias com objetivos e agendas diversas que geram conflitos entre eles e

estrateacutegias comuns que os unem como a apropriaccedilatildeo da renda da terra por meio de praacuteticas

espaciais interligadas nas quais se articulam e se validam arranjos institucionais formas

legais sistemas poliacuteticos e administrativos aleacutem de hierarquias de poder Desse processo

emanam experiecircncias percepccedilotildees leituras simboacutelicas e aspiraccedilotildees

Harvey (1996 p 52) ressalta que o poder de reorganizar a vida urbana estaacute em uma

coalizatildeo de forccedilas na qual o Estado tem apenas o papel de coordenador e de agilizar as

intervenccedilotildees urbanas O poder de organizar o espaccedilo contudo adveacutem do complexo de forccedilas

mobilizadoras por diversos agentes sociais

Na produccedilatildeo do espaccedilo urbano diversos agentes interferem direta ou indiretamente

estabelecendo agraves vezes relaccedilotildees de conflitos de interesses engendrados em torno do espaccedilo

social

local dos valores sociais de uso e do desdobramento de relaccedilotildees sociais no espaccedilo

e

em torno do espaccedilo abstrato

enquanto espaccedilo de desenvolvimento imobiliaacuterio e

administraccedilatildeo governamental por exemplo

que tem acarretado na fragmentaccedilatildeo e na

criaccedilatildeo de guetos hierarquizados representando com sua espacialidade a hierarquia econocircmica

e social

(HARVEY 2005)

A partir da compreensatildeo de que a sociedade eacute produto da inter-relaccedilatildeo entre habitus

e campo Bourdieu (2001) enfatiza que os agentes sociais satildeo dotados de um habitus inscritos

nos corpos pelas experiecircncias passadas

Estes sistemas de esquemas de percepccedilatildeo apreciaccedilatildeo e accedilatildeo permitem operar os atos de conhecimento praacutetico fundados sobre a descoberta e o conhecimento dos estiacutemulos condicionais e convencionais aos quais podem reagir e engendrar sem fins expliacutecitos nem caacutelculo racional de meios de estrateacutegias adaptadas e renovadas continuamente mas de acordo com as exigecircncias estruturais das quais satildeo o produto e que as definem (BOURDIEU 2001 p 166)

De acordo com Bourdieu (1996) os agentes sociais constroem o mundo social e

individual e coletivamente a partir de uma estrutura objetiva de distribuiccedilatildeo de diferentes

tipos de capital (formas de poder) sejam eles fiacutesicos culturais ou simboacutelicos cuja eficiecircncia

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varia de forma contingente e localizada A accedilatildeo dos agentes sobre essas estruturas objetivas

constitui o campo social dentro do qual ocorrem disputas entre os agentes possuidores de

meios e fins diferenciados e um habitus adquirido por sua socializaccedilatildeo preacutevia ou por aquela

praticada dentro do proacuteprio campo

Nessa perspectiva compreende-se que o espaccedilo urbano torna-se um campo de luta

onde se instaura uma luta dos diferentes agentes pelo espaccedilo pelo solo urbano estabelecendo-

se portanto um conflito entre espaccedilo abstrato e o espaccedilo vivido fragmentado pelas

estrateacutegias dos diferentes agentes sociais percebido pelo individuo por meio de sua vida

cotidiana

Cabe inferir que o acesso agrave moradia nas cidades natildeo se daacute de forma igualitaacuteria e pode

ser comparaacutevel a ocupaccedilatildeo sequumlencial de um teatro aonde aqueles que chegam primeiros

adquirem os melhores lugares bem como os que tecircm mais dinheiro Aos pobres cabem os que

sobram

(HARVEY 1980 p 144)

Nesse sentido pode-se afirmar que no processo histoacuterico de ocupaccedilatildeo e uso do

espaccedilo urbano o solo eacute disputado entre os diferentes agentes econocircmicos e classes sociais

pois se considera que a terra na sociedade capitalista atende as demandas tanto de reproduccedilatildeo

do capital como de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e da dimensatildeo simboacutelica uma vez que

essa disputa se daacute por diferentes usos como habitacional cultural religioso comercial e de

serviccedilos industrial etc e mediante diferentes vantagens locacionais e infraestruturais

estabelecendo uma hierarquia de preccedilos que faz do mercado imobiliaacuterio a grande expressatildeo

da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Aleacutem dos espaccedilos existentes esse mercado imobiliaacuterio vai

determinar e criar a futura localizaccedilatildeo da classe trabalhadora

Como observa Santos (1991 p 31)

Eacute assim que se criam nas cidades as infraestruturas a que Manuel Lemes chama de extensores urbanos como a aduccedilatildeo de aacutegua os esgotos a eletricidade o calccedilamento que ao mesmo tempo revalorizam diferencialmente os terrenos impotildeem um crescimento maior agrave superfiacutecie urbana e mediante o papel da especulaccedilatildeo asseguram a permanecircncia de espaccedilos vazios Como estes ficam agrave espera de novas valorizaccedilotildees as extensotildees urbanas reclamadas pela pressatildeo da demanda vatildeo mais uma vez dar-se em aacutereas perifeacutericas O mecanismo de crescimento urbano torna-se assim um alimentador da especulaccedilatildeo a inversatildeo puacuteblica contribuindo para acelerar o processo

Kowarick (1988) ressalta que a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria pode ser demonstrada

tambeacutem quando as aacutereas centrais com zonas estagnadas ou decadentes recebem

43

investimentos em serviccedilos ou infraestruturas baacutesicas ou seja uma melhoria urbana de

qualquer tipo repercute imediatamente no preccedilo dos terrenos

Assim a intervenccedilatildeo do poder puacuteblico por meio dos planos de reurbanizaccedilatildeo

contribui para consolidar uma nova configuraccedilatildeo espacial que visa estimular ao mercado

imobiliaacuterio para as camadas de maior poder aquisitivo enquanto os pobres satildeo expulsos para

aacutereas mais distantes A estes na medida em que os espaccedilos urbanos satildeo seletivamente

valorizados com o encarecimento dos alugueacuteis e a remoccedilatildeo ou esgotamento de espaccedilos em

favelas mais proacuteximas das aacutereas centrais resta-lhes outras favelas afastadas ou os loteamentos

perifeacutericos A formaccedilatildeo da periferia pode ser compreendida entatildeo como resultante de []

aglomerados distantes dos centros clandestinos ou natildeo carentes de infraestrutura onde

passa a residir crescente quantidade de matildeo-de-obra necessaacuteria para fazer girar a maquinaria

econocircmica (KOWARICK 1988 p31)

De acordo com Low-Beer (1983 p 33) Marx analisa historicamente a renda

proveniente da terra considerando as relaccedilotildees sociais do homem nos diferentes modos de

produccedilatildeo como no feudalismo a renda eacute obtida pelo proprietaacuterio como pagamento na

forma direta de bens produzidos (diacutezimos) ou horas trabalhadas na terra do senhor [] no

capitalismo a renda da terra eacute parte da mais-valia gerada no processo produtivo

A propriedade privada do solo significa o domiacutenio de uma condiccedilatildeo especifica para a realizaccedilatildeo do processo de produccedilatildeo e circulaccedilatildeo de mercadorias cujo cerne eacute o lucro A aquisiccedilatildeo de terras para gerar renda passa a ser considerada como um investimento e eacute dado agrave terra o status de meio de produccedilatildeo apesar de ser na realidade um fator de produccedilatildeo [] natildeo se trata de qualquer rendimento derivado de terra e sim aquela fraccedilatildeo ou remuneraccedilatildeo da qual se apossa o proprietaacuterio obtida pela cessatildeo deste bem a terceiros para que estes venham extrair algo da terra (LOW-BEER 1983 p 34)

Correcirca (1993 p 84) procura analisar a renda da terra a partir da constituiccedilatildeo da

remuneraccedilatildeo que se obtecircm em razatildeo de

a) propriedade da terra que autoriza o proprietaacuterio extrair uma remuneraccedilatildeo independentemente de qualquer outra coisa

trata-se da renda absoluta b) localizaccedilotildees privilegiadas que incidem na diminuiccedilatildeo dos custos de produccedilatildeo em razatildeo por exemplo da proximidade do porto ou de vias ferroviaacuterios ou de transportes ou no aumento das vendas pela localizaccedilatildeo junto ao centro ou subcentros comerciais intra-urbanos

trata-se da renda diferencial que implica em superlucro c) localizaccedilotildees seletivas por exemplo em aacutereas de amenidades que possuem e conferem status ao seu possuidor

trata-se da renda de monopoacutelio que implica tambeacutem em superlucro

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Sendo assim a produccedilatildeo da habitaccedilatildeo que envolve relaccedilotildees de produccedilatildeo consumo e

troca na qual atuam diferentes agentes pode ser considerada como mercadoria pois a proacutepria

moradia e todos os seus componentes

terra material de construccedilatildeo infraestrutura etc

mesmo tendo um valor de uso possuem um valor de troca e por isso apresentam um

significado ligado agrave loacutegica do mercado aleacutem de ser uma mercadoria que pode ser comprada e

vendida a moradia relaciona-se ao processo de capitalizaccedilatildeo que ela representa uma vez que

o preccedilo da terra eacute influenciado por fatores como

a) Localizaccedilatildeo (acessibilidade acesso a infraestrutura e serviccedilos urbanos)

b) Caracteriacutesticas fiacutesicas do terreno (referem-se agrave dificuldade ou facilidade de se

construir no terreno por fatores topograacuteficos hidroloacutegicos etc)

c) Legislaccedilatildeo existente e seus limites (SMOLKA 1983)

Topalov (1974 p 15-17) analisa o processo de formaccedilatildeo dos preccedilos dos terrenos e

destaca como importante os seguintes conceitos sobre renda fundiaacuteria no meio urbano

a) Renda Absoluta caracteriza-se como determinante dos preccedilos desde que haja

na propriedade privada uma condiccedilatildeo natildeo reproduziacutevel da produccedilatildeo

a terra

agriacutecola a jazida o solo suporte da atividade nas localizaccedilotildees necessaacuterias a

essas Confere ao proprietaacuterio o poder de impedir a sua utilizaccedilatildeo ateacute que as

condiccedilotildees econocircmicas propiciem a sua valorizaccedilatildeo de onde se pode retirar o

excedente

b) Renda Diferencial tem por origem a desigualdade de produtividade do

trabalho nos diversos ramos de produccedilatildeo na qual a desigualdade das

produtividades individuais natildeo provecircm sempre das caracteriacutesticas internas

das empresas em concorrecircncia mas da caracterizaccedilatildeo das condiccedilotildees externas

de suas atividades de acordo com as localizaccedilotildees

c) Renda de Monopoacutelio eacute determinada pelas condiccedilotildees de mercado e estaacute

baseada na natildeo reprodutibilidade de certas mercadorias pelo capital fazendo

sua oferta ser limitada pois natildeo eacute mais determinado pelas condiccedilotildees de

produccedilatildeo de mercadorias mas pelas de sua circulaccedilatildeo isto eacute pela sua

procura A partir de entatildeo fixa-se duravelmente um sobrelucro de monopoacutelio

do qual beneficiam os ofertantes da mercadoria considerada

Destarte pode-se afirmar que a renda diferencial do solo urbano eacute essencialmente

uma renda de localizaccedilatildeo devido agraves condiccedilotildees fiacutesicas do espaccedilo mas tambeacutem devido agraves

condiccedilotildees criadas pelos homens e suas atividades que determinam as relaccedilotildees econocircmicas e

sociais

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Segundo Smolka (1983 p 205) uma das caracteriacutesticas do incorporador imobiliaacuterio

eacute a de promover o empreendimento certo no lugar certo para o consumidor certo ou seja

Estado ao promover melhorias urbanas por meio de infraestrutura construccedilatildeo de

equipamentos de uso coletivo etc atua como gerador de renda diferencial valorizando o solo

urbano e ao mesmo tempo o empreendedor imobiliaacuterio usufruindo-se da situaccedilatildeo constroacutei

moradias neste solo valorizado e as vende por preccedilo elevado

Assim somente as pessoas com maior poder aquisitivo teratildeo acesso a esta habitaccedilatildeo

O acesso agrave terra assume entatildeo um caraacuteter segregativo em funccedilatildeo do poder de renda e as

classes de menor poder aquisitivo excluiacutedas do acesso agrave mercadoria habitaccedilatildeo alteram a

dinacircmica da proacutepria cidade ao produzir novos espaccedilos de moradia na forma de favelas

ocupaccedilotildees coletivas de terrenos vazios etc

Nesse sentido a produccedilatildeo de moradia se daacute em funccedilatildeo de quem pode compraacute-la e

nem sempre em funccedilatildeo de quem precisa dela A localizaccedilatildeo privilegiada isto eacute o acesso faacutecil

agrave infraestrutura e aos serviccedilos urbanos a acessibilidade ao terreno bem como as

caracteriacutesticas de seu entorno iratildeo influenciar sobre o preccedilo da terra uma vez que a produccedilatildeo

do espaccedilo urbano e da moradia natildeo ocorre de maneira uniforme A demanda por terrenos

acontece de acordo com a necessidade da atividade que vai se desenvolver nestes e tem como

um dos determinantes a expansatildeo urbana enquanto fator de valorizaccedilatildeo do preccedilo em funccedilatildeo

de variaacuteveis como a quantidade e a qualidade de serviccedilos e equipamentos urbanos

Todas as atividades capitalistas urbanas se desenvolvem sobre a base de objetos imobiliaacuterios de edifiacutecios produtos do trabalho passado presos a uma localizaccedilatildeo determinada Cada localizaccedilatildeo daacute acesso de uma maneira que eacute especifica a um conjunto de valores de usos complexos nascidos na cidade (TOPALOV 1974 p 22)

Conforme afirmam Ribeiro e Cardoso (1996 p234) a terra teraacute seu preccedilo regulado

pelas condiccedilotildees de competiccedilatildeo entre os vaacuterios capitais e pelas possibilidades de lucratividade

propiciadas pelas diversas localizaccedilotildees no espaccedilo urbano

A localizaccedilatildeo eacute um valor de uso produzido e contecircm a capacidade de aglomerar e de

combinar socialmente meios de produccedilatildeo e meios de reproduccedilatildeo de uma formaccedilatildeo social

Dessa forma eacute possiacutevel dizer que a terra corresponde aos investimentos feitos na ou sobre a

mesma demandando certa parcela de capital e que pode ser considerada enquanto produto do

trabalho humano e natildeo como accedilatildeo da natureza

A diversidade de construccedilotildees habitacionais que vatildeo desde a construccedilatildeo de mansotildees

ateacute as autoconstruccedilotildees e habitaccedilotildees em favelas pode-se a uma produccedilatildeo diferenciada das

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cidades e refere-se agrave capacidade diferente de pagar tanto pela casaterreno quanto pelos

equipamentos e serviccedilos coletivos Portanto os que desfrutam de determinada renda ou

salaacuterio podem morar em aacutereas bem servidas de equipamentos e serviccedilos e aqueles que natildeo

desfrutam moram em locais deteriorados e haacute tambeacutem os que natildeo moram que vivem em

baixo de pontes viadutos em praccedilas pontos de ocircnibus natildeo tecircm um teto fixo

Villaccedila (2001) ao utilizar as anaacutelises de Marx sobre valor de uso e valor de troca

argumenta que o processo de valorizaccedilatildeo da terra urbana leva em consideraccedilatildeo que existe

uma determinada fraccedilatildeo do valor do terreno urbano que natildeo proveacutem de investimentos

puacuteblicos fazendo-se necessaacuterio entender o valor de uso da localizaccedilatildeo que decorre da

aglomeraccedilatildeo humana e sofre variaccedilatildeo nos diversos pontos da cidade Sendo assim eacute possiacutevel

compreender o valor da terra no espaccedilo urbano associado ao conceito de localizaccedilatildeo a terra-

localizaccedilatildeo

da qual a terra urbana eacute a mais oacutebvia manifestaccedilatildeo enquanto produto do trabalho

humano tem tanto valor de uso como valor de troca Seu valor eacute determinado pelo tempo de

trabalho socialmente necessaacuterio para produzi-la (VILLACcedilA 2001 p 10)

Considerando-se a importacircncia da localizaccedilatildeo na garantia de acessibilidade aos

benefiacutecios urbanos o valor de uso de cada terreno eacute diferente em funccedilatildeo de sua localizaccedilatildeo

Logo seus preccedilos que satildeo determinados pelo valor das mercadorias produzidas por seu

intermeacutedio e pela propriedade monopolista da terra aleacutem da oferta de melhores vantagens

locacionais8 de acesso agrave cidade tambeacutem se diferenciam e satildeo alvos de disputa entre os

diversos agentes capitalistas

Dentro desse contexto nota-se que o espaccedilo urbano e a habitaccedilatildeo ganham conotaccedilatildeo

de mercadoria devido agrave sua apropriaccedilatildeo privada e assumem qualidade de troca pela

caracteriacutestica da obtenccedilatildeo de lucro e acumulaccedilatildeo servindo ao interesse do capital agrave medida

que eacute produzido e reproduzido como mercadoria o que leva a modificaccedilatildeo de sua estrutura

criando novas formas e funccedilotildees perdendo seu valor de uso na qual a reproduccedilatildeo da vida

social perde sua razatildeo de ser esfacelando os laccedilos afetivos de vizinhanccedilas e outros

A contradiccedilatildeo entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo e sua apropriaccedilatildeo privada estaacute na base do entendimento do processo de reproduccedilatildeo espacial Isto porque em uma sociedade fundada sobre a troca a apropriaccedilatildeo do espaccedilo ele proacuteprio produzido como mercadoria liga-se cada vez mais agrave forma de mercadoria servindo agraves necessidades de acumulaccedilatildeo por meio das mudanccedilasreadaptaccedilotildees de usos e funccedilotildees dos lugares que tambeacutem se reproduzem sob a lei reprodutiacutevel a partir de estrateacutegias da reproduccedilatildeo em

8 As vantagens locacionais satildeo o complexo de elementos que formam os benefiacutecios urbanos no que diz respeito ao acesso aos locais de trabalho compras lazer aos serviccedilos de infraestrutura como aacutegua energia esgoto pavimentaccedilatildeo coleta de lixo e ainda serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo cultura entre outros

47

determinados momentos da histoacuteria do capitalismo Este se estende cada vez mais ao espaccedilo global criando novos setores de atividades produtivas Cada vez mais o espaccedilo produzido como mercadoria entra no circuito da troca atraindo capitais que migram de um setor da economia para outro de modo a viabilizar a reproduccedilatildeo A possibilidade de ocupar o espaccedilo sempre crescente o que explica a emergecircncia de uma loacutegica associada a uma forma de dominaccedilatildeo do espaccedilo que se reproduz ordenando e direcionando a ocupaccedilatildeo fragmentando e tornando os espaccedilos trocaacuteveis a partir de operaccedilotildees que se realizam no mercado Desse modo o espaccedilo eacute produzido e reproduzido como mercadoria reprodutiacutevel (CARLOS 2001 p 15-16)

Conforme enfatiza Carlos (2001 p 18) o processo de transformaccedilatildeo do espaccedilo

urbano natildeo estaacute limitado apenas agrave mercantilizaccedilatildeo desse espaccedilo mas a divisatildeo e organizaccedilatildeo

do trabalho que produz comportamentos e valores que induzem ao consumo exacerbado e

condicionam as diretrizes da vida cotidiana as quais satildeo estabelecidas pelos vaacuterios conflitos

que se intensificam com a imposiccedilatildeo de novos padrotildees culturais em detrimento dos antigos

padrotildees de relacionamento ou seja os antigos laccedilos de sociabilidade vatildeo se desfazendo e as

relaccedilotildees entre as pessoas se tornam cada vez mais distantes sendo substituiacutedas por relaccedilotildees

profissionais e ou institucionais Assim o espaccedilo possiacutevel de ser sentido pensado

apropriado e vivido pelo indiviacuteduo por meio do corpo perde sua essecircncia perde sentido de

lugar e se transforma em natildeo-lugar

O espaccedilo torna-se entatildeo dominado subalternizado pela classe dominante pois ao

se apropriar das vantagens e dos recursos do espaccedilo urbano a referida classe utiliza-o de

acordo com os seus interesses levando a cidade a ser pensada e utilizada como espaccedilo de

reproduccedilatildeo do capital aleacutem de implementar a divisatildeo social do espaccedilo urbano

Tomando-se como base novamente as concepccedilotildees teoacutericas de Lojkine (1981) e

Castells (1983) eacute possiacutevel elucidar como se processa a divisatildeo social do espaccedilo urbano Para

Lojkine (1981) a divisatildeo soacutecioespacial se daacute a partir de uma divisatildeo mais geral do territoacuterio

(cidadecampo) sendo que a primeira eacute concebida como a zona de comando econocircmico e

poliacutetico e que exerce o poder enquanto que a segunda pode ser considerada como uma zona

de execuccedilatildeo e de reproduccedilatildeo limitada da forccedila de trabalho

Castells (1983) entende a divisatildeo social do espaccedilo como um processo de luta

concernente ao conjunto da produccedilatildeo social Esta luta natildeo eacute vista em sua especificidade

(singular) mas opotildee os grupos formados pela inserccedilatildeo diferenciada dos indiviacuteduos

(particularidade) nos diversos componentes da estrutura social (totalidade) intensificando a

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

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de lazer e de esporte equipamentos e serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo para as chamadas classes populares (RODRIGUES 1998 p 20)

Historicamente o estudo acerca do papel do Estado capitalista passa pela discussatildeo

apresentada por Engels (1982) o qual argumenta que a cidade de Atenas era a forma mais

pura e mais claacutessica para se compreender o surgimento do Estado afirmando que o mesmo

tem sua gecircnese fundamentalmente dos antagonismos de classe desenvolvidos no interior da

sociedade

O Estado segundo o autor eacute definido como um produto da sociedade Era necessaacuterio

um poder que aparentemente estava acima da sociedade para tentar atenuar as lutas de

classes e principalmente para manter a ordem ou seja quando a sociedade atinge um

determinado grau de desenvolvimento de suas forccedilas produtivas tornam-se inevitaacuteveis as

contradiccedilotildees sociais que contribuem para a divisatildeo da sociedade em classes sociais Satildeo estas

contradiccedilotildees que justificam o surgimento do Estado

Logo como o Estado nasce para amenizar os conflitos de classes acaba tornando-se

a forccedila materializada de poder ou seja o braccedilo direito

da classe economicamente e

politicamente dominante adquirindo novos meios para a repressatildeo e exploraccedilatildeo da classe

oprimida

A concepccedilatildeo materialista de Estado enquanto produto das relaccedilotildees concretas

estabelecidas entre os homens rompe com o paradigma formal abstrato cuja concepccedilatildeo o

coloca como se fosse algo constituiacutedo independente da vontade dos homens e desvinculado

das lutas sociais travadas ao longo da histoacuteria Ao contraacuterio o Estado eacute produto das relaccedilotildees

sociais objetivas

Marx (1983) considera o Estado como elemento necessaacuterio agrave acumulaccedilatildeo de capital e

percebe a justa relaccedilatildeo existente entre a dimensatildeo econocircmica e a dimensatildeo poliacutetico-

ideoloacutegica considerando-o como instrumento de dominaccedilatildeo

A classe que possui o domiacutenio material possui tambeacutem o domiacutenio espiritual ou seja o controle ideoloacutegico poliacutetico-juriacutedico sobre as demais classes subjugadas a ela A classe dominante por esta forma determina todo o conteuacutedo de uma eacutepoca histoacuterica Mas para garantir sua dominaccedilatildeo natildeo a faz diretamente mas atraveacutes de um poder coercitivo o qual desempenha o papel de reproduzir a dominaccedilatildeo da classe hegemocircnica e garantir a sua manutenccedilatildeo Este poder se materializa naquilo que se conhece como Estado (MARX ENGELS 1995 p56-57)

50

Para Poulantzas (apud LOJKINE 1981) o Estado natildeo estaacute uacutenica e exclusivamente a

serviccedilo da classe dominante poreacutem este eacute a condensaccedilatildeo material e especiacutefica de uma relaccedilatildeo

entre forccedilas de classe e fraccedilotildees de classe

A autonomia do Estado no regime capitalista eacute a forma da dominaccedilatildeo de classe o Estado capitalista comporta inscreve em suas proacuteprias estruturas um jogo que permite dentro dos limites do sistema certa garantia dos interesses econocircmicos de algumas classes dominadas Isso faz parte de sua funccedilatildeo na medida em que essa garantia eacute conforme agrave dominaccedilatildeo hegemocircnica das classes dominantes Eacute essa autonomia do poder poliacutetico institucionalizado que permite agraves vezes atingir o poder econocircmico das classes dominantes sem jamais ameaccedilar-lhes o poder poliacutetico Pode-se perguntar se o que fica claro de um lado ( como o Estado pode ser ao mesmo tempo Estado povo-naccedilatildeo assegurando a coesatildeo do conjunto da formaccedilatildeo social e Estado que organiza a predominacircncia de uma classe ) natildeo faz ainda aumentar a dificuldade e a confusatildeo quando se tenta aplicar essa proposiccedilatildeo teoacuterica agrave relaccedilatildeo Estado-classes sociais Surgem a nosso ver duas dificuldades principais Por natildeo ter sido especificado e sobretudo por natildeo ter sido de fato distinguido de uma total independecircncia entre dois sistemas fechados o princiacutepio de autonomia que fundamenta a anaacutelise de Estado proposta por Poulantzas - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo Estado-classes dominantes a natildeo ser atraveacutes da noccedilatildeo de bloco no poder noccedilatildeo que implica um certo equiliacutebrio estaacutetico entre vaacuterias classes dominantes (mesmo se uma delas a fraccedilatildeo hegemocircnica representa todas as classes dominantes) - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo entre Estado e luta de classes a natildeo ser como dominaccedilatildeo intangiacutevel atraveacutes de variaccedilotildees secundaacuterias de uma classe hegemocircnica sobre classes dominadas (POULANTZAS apud LOJKINE 1981 p 80)

As anaacutelises de Poulantzas tambeacutem satildeo reforccediladas por Souza (2002 p 27-28) ao

enfatizar que

O Estado eacute atravessado por diversos interesses eacute como se houvesse diversos vetores de forccedila (para fazer uma analogia com algo que se aprende nas

aulas de Fiacutesica) onde o vetor resultante seraacute o produto da interaccedilatildeo de forccedilas distintas agraves vezes antagocircnicas O resultado final em mateacuteria de perfil de governo (e o mesmo se aplica agraves casas legislativas) tende a ser conservador mas natildeo precisa necessariamente ser sempre assim Eacute por esta razatildeo que uma sociedade capitalista marcada por conflitos contradiccedilotildees e desigualdades tende a promover accedilotildees de planejamento estatal que normalmente facilitam a manutenccedilatildeo das desigualdades sociais (por exemplo a segregaccedilatildeo residencial as diferenccedilas de infraestrutura entre bairros pobres e bairros ricos etc) Mas eacute por isso tambeacutem que mesmo no que se refere ao planejamento estatal natildeo pode dizer que ele esteja condenado a ser sempre algo com um conteuacutedo antipopular Tudo dependeraacute da correlaccedilatildeo de forccedilas que se estabelecer na sociedade a qual acabaraacute determinando o perfil da accedilatildeo do aparelho de Estado

51

A correlaccedilatildeo de forccedilas estabelecidas na sociedade acaba por assim se dizer

determinando as accedilotildees do Estado Um exemplo das novas formas de atuaccedilatildeo desse agente

modelador do espaccedilo urbano estaacute na forma de incorporar novos instrumentos estrateacutegicos

utilizados na execuccedilatildeo do planejamento de uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano com a inclusatildeo de

uma parcela maior da populaccedilatildeo na decisatildeo do planejamento da cidade e os temas prioritaacuterios

de investimentos como os orccedilamentos participativos (conforme seraacute apresentado no capitulo

III desse trabalho)

A anaacutelise de Poulantzas eacute corroborada por Correcirca (1993 p 26) ao afirmar que accedilatildeo

do Estado eacute marcada pelos conflitos de interesses dos diversos integrantes da sociedade de

classes bem como das alianccedilas entre eles No entanto suas accedilotildees tendem a privilegiar os

interesses daquele segmento ou segmentos da classe dominante que a cada momento estatildeo

no poder

Eacute importante ressaltar que a atuaccedilatildeo do Estado se processa em trecircs esferas a federal

a estadual e a municipal sendo esta uacuteltima de suma importacircncia para anaacutelise do objeto de

estudo desse trabalho pois esta esfera eacute que detecircm o poder sobre o uso do solo e que

determina onde pode

e o que pode

ser construiacutedo em uma determinada aacuterea

Eacute no niacutevel municipal no entanto que estes interesses se tornam mais evidentes e o discurso menos eficaz Afinal a legislaccedilatildeo garante agrave municipalidade muitos poderes sobre o espaccedilo urbano poderes que advecircm ao que parece de uma longa tradiccedilatildeo reforccedilada pelo fato de que numa economia cada vez mais monopolista os setores fundiaacuterio e imobiliaacuterio menos concentrados constituem-se em feacutertil campo de atuaccedilatildeo para as elites locais (CORREcircA 1993 p 26)

O poder municipal apresenta simultaneamente duas caracteriacutesticas ambiacuteguas na

garantia do uso e apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano a saber ao mesmo tempo em que atende agraves

necessidades sociais proporcionando meios de acessos aos equipamentos de consumo

coletivo infraestrutura e serviccedilos propicia a atividade econocircmica dinamizada pelo setor

imobiliaacuterio que tem como principal objetivo a lucratividade

Portanto na sociedade de classes observam-se diferenccedilas sociais no que diz respeito

ao acesso de bens e serviccedilos produzidos socialmente pois as intervenccedilotildees estatais longe de

suprimir as contradiccedilotildees de classes satildeo consideradas paliativas uma vez que natildeo conseguem

abranger a demanda da maioria da populaccedilatildeo no que tange agraves obras de habitaccedilatildeo saneamento

e serviccedilos

52

Nesse sentido na conjuntura atual a crise habitacional eacute marcada pelas contradiccedilotildees

de classes que podem ser evidenciadas pelas peacutessimas condiccedilotildees de habitaccedilatildeo ineficiecircncia ou

escassez de poliacuteticas puacuteblicas que contemplem as reais necessidades dos segmentos excluiacutedos

voltadas agrave habitaccedilatildeo intensificaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio especulaccedilotildees expulsatildeo das terras

ocupadas entre outros Assim o espaccedilo urbano longe de se tornar o locus da reproduccedilatildeo da

vida torna-se distante dos reais interesses da populaccedilatildeo intensificando a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Essa crise habitacional estaacute presente quando se considera a capacidade de pagar dos

compradores pela casaterreno De acordo com Engels (1988 p 125) quando analisa a crise

de moradia na Alemanha em 1872

Uma sociedade natildeo pode existir sem crise habitacional quando a maioria dos trabalhadores soacute tem seu salaacuterio ou seja o indispensaacutevel para sua sobrevivecircncia e reproduccedilatildeo quando melhorias mecacircnicas deixam sem trabalho massas operaacuterias quando crises industriais determinam de um lado a existecircncia de um forte exerciacutecio de desempregados e de outro jogam repetidamente na rua grande massa de trabalhadores quando os proletaacuterios se amontoam nas ruas das grandes cidades quando o ritmo da urbanizaccedilatildeo eacute tanto que o ritmo das construccedilotildees de habitaccedilatildeo natildeo a acompanha quando enfim o proprietaacuterio de uma casa na sua qualidade de capitalista tem o direito de retirar de sua casa os alugueacuteis mais elevados Em tal sociedade a crise habitacional natildeo eacute um acaso eacute uma instituiccedilatildeo necessaacuteria

Assim sendo para Castells (1983 p 185) a crise da moradia trata-se de uma

defasagem necessaacuteria socialmente definida da habitaccedilatildeo e a produccedilatildeo de moradia e

equipamentos residenciais Diante do exposto ressalta-se que esta crise vincula-se agrave loacutegica

do capital imobiliaacuterio pois a crise leva agrave procura contribuindo para a elevaccedilatildeo dos preccedilos

dos imoacuteveis promovendo a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Um exemplo dessa situaccedilatildeo eacute o grande nuacutemero de anuacutencios em jornais de casas

terrenos apartamentos ou seja imoacuteveis em geral para vender ou alugar ofertados pelo capital

imobiliaacuterio que eacute destinado a pessoas que possuem determinada renda para compraacute-los ou

alugaacute-los A dificuldade de morar adequadamente natildeo eacute vivenciada pelos grandes empresaacuterios

ou executivos pois eles podem pagar por essa mercadoria que se tornou tatildeo escassa e cara

Segundo Rodrigues (2001) a crise habitacional se agudiza por trecircs fatores pelo

processo de empobrecimento da classe trabalhadora pela vinculaccedilatildeo da poliacutetica urbana agraves

exigecircncias dos mecanismos financeiros internacionais e pela apropriaccedilatildeo elevada da renda da

terra dos lucros e dos juros na produccedilatildeo das cidades

53

Ao analisar a crise financeira do capitalismo Harvey (2009 p 271) esclarece que ao

longo dos uacuteltimos 30 anos houve muitas crises financeiras e que muitas delas tiveram origem

na urbanizaccedilatildeo mais precisamente na propriedade urbana Destacando a recente crise nos

Estados Unidos diz que foi mais uma crise urbana na qual a classe capitalista para fazerem

mais dinheiro comprou ativos financeiros o que elevou os preccedilos da propriedade imobiliaacuteria

Isso natildeo torna uma cidade melhor torna-a antes mais cara Aleacutem disso para construir

condomiacutenios de luxo e casas exclusivas os capitalistas tecircm de empurrar os pobres para fora

de suas terras

tecircm de tirar o nosso direito agrave cidade

Sendo assim observa-se que o baixo investimento em poliacuteticas puacuteblicas direcionadas

agrave habitaccedilatildeo somado agrave especulaccedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios provoca o processo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial obrigando o Estado a adotar certas medidas de intervenccedilatildeo puacuteblica

objetivando mediar os conflitos sociais e se manter no poder

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

As cidades satildeo historicamente construiacutedas pela accedilatildeo de diversos agentes que

produzem e consomem equipamentos serviccedilos e trabalho sendo que o acesso a esses bens e

serviccedilos produzidos coletivamente natildeo se daacute de forma coletiva Assim sendo o

desenvolvimento capitalista traz em seu bojo um cenaacuterio urbano caracterizado pela

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

A cidade enquanto reflexo da sociedade capitalista apresenta-se tal qual estaacute

estruturado essa formaccedilatildeo econocircmica e social Tomando-se como exemplo a questatildeo

habitacional pode-se afirmar que o espaccedilo da sociedade capitalista eacute fortemente dividido em

aacutereas segregadas o que demonstra a existecircncia de aacutereas nobres destinadas agraves classes mais

abastadas economicamente Estas aacutereas satildeo urbanizadas e equipadas com serviccedilos coletivos

Assim o constante processo de elevaccedilatildeo dos custos de uso do solo urbano impede o acesso do

cidadatildeo mais pobre

Em contrapartida as classes de baixo poder aquisitivo passam a morar em aacutereas

localizadas proacuteximas ao nuacutecleo central poreacutem deterioradas ou inadequadas agrave urbanizaccedilatildeo tais

como morros de difiacutecil acesso e margens inundaacuteveis de riachos ou coacuterregos Essas

populaccedilotildees caracterizam-se por possuiacuterem insuficientes condiccedilotildees de habitaccedilatildeo e uma enorme

carecircncia de serviccedilos urbanos predominando assim a ausecircncia de poliacuteticas puacuteblicas que

garantam a essas aacutereas formas de habitabilidade adequada

54

Dessa maneira a segregaccedilatildeo soacutecioespacial demonstra que o sistema capitalista lanccedila

seus tentaacuteculos de exploraccedilatildeo para aleacutem da esfera de produccedilatildeo marcando tambeacutem

presenccedila nos locais de reproduccedilatildeo da classe trabalhadora

Portanto o urbano constitui ao mesmo tempo espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e

tambeacutem espaccedilo de reproduccedilatildeo das classes sociais A luta contra a exploraccedilatildeo travada no

acircmbito da faacutebrica estende-se para os locais de moradia e consumo coletivo da classe

trabalhadora exigindo um processo de resistecircncia ao sistema de dominaccedilatildeo

Kowarick (1980 p 59) referiu-se ao processo de exploraccedilatildeo capitalista dizendo que

A espoliaccedilatildeo urbana eacute o somatoacuterio de extorsotildees que se opera atraveacutes da inexistecircncia ou precariedade de serviccedilos de consumo coletivo que se apresentam como necessaacuterios em relaccedilatildeo aos niacuteveis de subsistecircncia e que agudizam ainda mais a dilapidaccedilatildeo que se realiza no acircmbito das relaccedilotildees de trabalho

Sendo assim a questatildeo urbana e no seu interior a questatildeo habitacional eacute um dos

grandes desafios posto ao Estado uma vez que a questatildeo da moradia voltada para os

segmentos de baixo poder aquisitivo integra as accedilotildees governamentais em seus diversos niacuteveis

de atuaccedilatildeo com diferentes graus de intensidade e amplitude

Com o advento da Revoluccedilatildeo Industrial pode-se observar praacuteticas relativas ao

saneamento nas cidades Entretanto eram intervenccedilotildees pontuais como construccedilatildeo de

aquedutos galerias de esgoto etc que atendiam parcialmente as necessidades imediatas da

populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo ou eram destinadas aos segmentos privilegiados no

intuito de proporcionar uma melhor condiccedilatildeo de vida Estas intervenccedilotildees natildeo se constituiacuteram

em um planejamento mais amplo das cidades pois estavam associados a uma preocupaccedilatildeo de

organizaccedilatildeo fiacutesica das construccedilotildees urbanas

A intensificaccedilatildeo do processo de industrializaccedilatildeo provocou o enchimento das

cidades a aglomeraccedilatildeo de gente de cheiros feacutetidos de detritos animais a falta de

infraestrutura a maacute circulaccedilatildeo do ar Estes problemas sociais colocaram a tona a necessidade

de uma intervenccedilatildeo estatal mais efetiva nas cidades

De modo geral as peacutessimas condiccedilotildees de higiene fizeram o Estado pensar e executar

as accedilotildees voltadas agrave busca de soluccedilotildees concretas de higienizaccedilatildeo da sociedade O que fez

surgir a legislaccedilatildeo sanitaacuteria considerada a precursora da moderna legislaccedilatildeo urbaniacutestica

demonstrando a necessidade de se criar instrumentos de controle adequados agrave realidade

urbana e seus conflitos o que vai acarretar posteriormente nas discussotildees sobre o

planejamento urbano

55

No caso brasileiro as intensas transformaccedilotildees na estrutura soacutecio-econocircmica

resultaram em expressivo crescimento urbano ao longo do seacuteculo XX redesenhando a

ocupaccedilatildeo no territoacuterio nacional e no contexto intra-urbano das cidades

Nos anos 1930 com o iniacutecio da industrializaccedilatildeo as empresas investiram em

construccedilatildeo de moradias para seus operaacuterios (vilas operaacuterias) situadas proacutexima agraves faacutebricas

cujas residecircncias eram alugadas ou vendidas aos operaacuterios

No entanto com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo verifica-se o agravamento da

questatildeo habitacional uma vez que cresce rapidamente o nuacutemero de trabalhadores e aumenta a

pressatildeo sobre a oferta de habitaccedilatildeo popular Terrenos destinados anteriormente agraves vilas

operaacuterias comeccedilam a valorizar e com a aceleraccedilatildeo do fluxo migratoacuterio aumenta o excedente

da forccedila de trabalho nas cidades Nesse sentido as empresas transferem a responsabilidade

para o Estado dos custos relacionados agrave habitaccedilatildeo transporte e serviccedilos de infraestrutura

urbana Desse momento em diante as vilas operaacuterias tendem a desaparecer e a questatildeo da

moradia passa a ser resolvida pelas relaccedilotildees econocircmicas do mercado imobiliaacuterio (RIBEIRO

1996)

Destarte a raacutepida concentraccedilatildeo de produccedilatildeo e de populaccedilatildeo nas aacutereas urbanas dos

paiacuteses em desenvolvimento (como o Brasil) tem gerado grandes problemas dentre os quais

podem ser citados dispersatildeohiperconcentraccedilatildeo deacuteficit habitacional crescimento perifeacuterico

alto custo dos equipamentos urbanos etc

As demandas dos agentes representantes dos interesses capitalistas (capital

imobiliaacuterio proprietaacuterios fundiaacuterios e proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo) satildeo tratadas com

prioridade pelo poder puacuteblico em detrimento das necessidades das camadas populares

(CORREcircA 1993 p 32)

Na construccedilatildeo da configuraccedilatildeo espacial os diversos agentes sociais mantecircm relaccedilotildees

que podem ser definidas como relaccedilotildees de poder que se reproduzem por meio das aspiraccedilotildees

e necessidades de uma sociedade de classes e que faz da sociedade urbana um campo de lutas

onde os interesses se resolvem pelo jogo econocircmico e poliacutetico das forccedilas sociais

(GOOTTDIENER 1993)

Nesse sentido os interesses e objetivos da sociedade eacute que definiratildeo tanto os

processos quanto as formas que materializam uma relaccedilatildeo sociedade-espaccedilo O Estado

emerge como principal agente social no sentido de intervir e direcionar os possiacuteveis

interesses objetivos conflitos e contradiccedilotildees derivados dessa relaccedilatildeo Uma das formas com

que o Estado interveacutem sobre o espaccedilo nacional eacute instituindo poliacuteticas puacuteblicas sobretudo as

territoriais No entanto estas poliacuteticas se vinculavam ao papel do Estado enquanto planejador

56

Este enfatizava o recorte regional levando a efeito planos programas e projetos de

desenvolvimento

Assim o espaccedilo modificado natildeo eacute resultado natural de evoluccedilatildeo sociocultural da

humanidade eacute na verdade um produto intencional e natildeo-intencional de uma ordem

estabelecida Por isso partindo da compreensatildeo de que ao ser apropriado pelo homem o

espaccedilo eacute territorializado por este por meio de suas accedilotildees transformando-o a fim de melhor

adequaacute-lo agraves suas necessidades Este espaccedilo passa a ter tambeacutem valor de troca aleacutem do valor

de uso

Nesse sentido constitui-se em territoacuterio no qual o sistema capitalista pressupotildee

divisotildees do trabalho superpostas

e que pode ser analisado a partir de seus usos do seu

movimento conjunto e de suas partes reconhecendo as respectivas complementaridades

(SANTOS 2002 p 14) o que remete agrave questatildeo da divisatildeo territorial do trabalho levando a

perceber o territoacuterio natildeo como um mero palco no qual as coisas acontecem mas sobretudo

interagindo como agente ativo na sociedade

Partindo desse pressuposto verifica-se que a concentraccedilatildeo tanto populacional quanto

de atividades produtivas nas aacutereas centrais natildeo eacute realizada de forma aleatoacuteria mas como parte

de um processo analiacutetico construiacutedo pelos agentes produtores do espaccedilo urbano a partir das

necessidades mutaacuteveis da reproduccedilatildeo econocircmica e social

As aacutereas urbanas de todo mundo satildeo consideradas locais privilegiados para geraccedilatildeo de emprego para a inovaccedilatildeo e para ampliar as oportunidades econocircmicas Os centros urbanos revelam enorme agilidade na construccedilatildeo de uma rede de relaccedilotildees no plano da economia da poliacutetica da cultura conectando zonas rurais pequenas meacutedias e grandes cidades No marco destas transformaccedilotildees uma parcela significativa da populaccedilatildeo mundial passou a ter acesso a um niacutevel de consumo e de riqueza sem precedentes (FERREIRA 1997 p 64)

Sendo assim o planejamento urbano torna-se um fator crucial em termos sociais

fiacutesicos econocircmicos e poliacuteticos Estes aspectos podem ser analisados concomitantemente

quando se anseia urbanizar uma aacuterea Entretanto o que ocorre normalmente eacute um tratamento

secundaacuterio em relaccedilatildeo ao aspecto social quando natildeo este eacute visto como consequumlecircncia dos

demais principalmente do econocircmico

Para Maricato (1996) o Estado brasileiro investiu de forma desigual e diferenciada

em equipamentos coletivos necessaacuterios agrave reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho

privilegiando nos seus investimentos a acumulaccedilatildeo e gerando a exclusatildeo de amplas parcelas

da sociedade do mercado de bens de consumo individual e de bens e serviccedilos de consumo

57

coletivo (creches escolas transporte sauacutede saneamento) e as necessidades suscitadas pelo

modo de vida urbana no tempo da informaacutetica e das telecomunicaccedilotildees ampliam e

aprofundam as desigualdades sociais originadas no processo de acumulaccedilatildeo e reforccediladas pela

poliacutetica urbana

A poliacutetica urbana eacute posta em segundo plano face ao ideaacuterio da homogeneizaccedilatildeo

modernizante na qual Estado afasta-se de sua funccedilatildeo claacutessica de provedor de serviccedilos baacutesicos

coletivos deixando a atuaccedilatildeo para as forccedilas de mercado como solucionadoras da crise urbana

Contudo esse afastamento gera um deacuteficit urbano tendo em vista que a natildeo intervenccedilatildeo

estatal provoca a precariedade das condiccedilotildees de trabalho e de vida urbana

A intervenccedilatildeo estatal no urbano eacute a forma mais elaborada mais desenvolvida da

resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas produtivas (LOJKINE 1981 p

168) As poliacuteticas urbanas implementadas pelo Estado capitalista representam contra-

tendecircncias que visam regular e atenuar os efeitos negativos

no niacutevel do funcionamento

global das formaccedilotildees sociais

da segregaccedilatildeo e da mutilaccedilatildeo capitalista dos equipamentos

urbanos constituindo um produto das contradiccedilotildees urbanas resultantes das relaccedilotildees entre

classes sociais antagocircnicas que se manifestam nos modos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Ao longo do seacuteculo XX o planejamento urbano teve sempre uma conotaccedilatildeo de

ordem racionalidade e eficiecircncia Com a industrializaccedilatildeo e a crescente urbanizaccedilatildeo o Estado

passaria a intervir na cidade com o propoacutesito de organizar o territoacuterio a fim de garantir o

processo econocircmico e ampliar as condiccedilotildees de aglomeraccedilatildeo Tendo por base um

planejamento racional da distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo e de suas atividades a intervenccedilatildeo puacuteblica

se daria por meio de investimentos em infraestrutura e da regulaccedilatildeo da produccedilatildeo privada do

ambiente construiacutedo (CARDOSO 2003 p 7)

Para Oliveira (1982 p 41) a industrializaccedilatildeo vai impor um padratildeo de urbanizaccedilatildeo

aparentemente superior ao ritmo da industrializaccedilatildeo Com uma economia fundada na

agricultura de exportaccedilatildeo e com um mercado interno pouco significativo a industrializaccedilatildeo

restringida implicaria em um papel diferenciado do Estado que segundo Cardoso (2003) ao

priorizar o desenvolvimento econocircmico deixaria de estabelecer miacutenimos sociais universais O

que viria ocasionar em relaccedilatildeo ao urbano a disputa de investimentos em infraestrutura entre

grupos sociais e a dificuldade da legislaccedilatildeo urbaniacutestica impor seus padrotildees de forma

universal

Para entender o processo de urbanizaccedilatildeo faz-se necessaacuterio esclarecer alguns

aspectos estruturais de sua organizaccedilatildeo com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo a partir de

58

1930 e a organizaccedilatildeo das cidades e das classes sociais surgidas com o modo de produccedilatildeo

capitalista

O processo de reforma urbaniacutestica no Brasil se inicia nos primoacuterdios do seacuteculo XX

as intervenccedilotildees urbaniacutesticas deste periacuteodo foram baseadas em modelos europeus do

Urbanismo Modernista os quais prezavam pelo embelezamento das avenidas centrais

colocaccedilatildeo de praccedilas parques e a higienizaccedilatildeo com a construccedilatildeo de instrumentos de

saneamento

De base conservadora e positivista as reformas urbaniacutesticas importadas da Europa

representam de forma bastante arbitraacuteria um modelo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de

favelizaccedilatildeo que perdura de maneira anaacuteloga ateacute os dias atuais Todas estas intervenccedilotildees

tinham por resguardo a idealizaccedilatildeo de uma cidade ideal mas de acordo com o interesse da

classe dominante De modo que as questotildees sociais eram totalmente ignoradas ao mesmo

tempo em que parte da sociedade era negligenciada

Com as fortes mudanccedilas no processo de ocupaccedilatildeo e produccedilatildeo do solo urbano

decorrentes da industrializaccedilatildeo que se iniciava no Brasil a partir da deacutecada de 1930 o

planejamento se adapta as novas necessidades do espaccedilo urbano

Na deacutecada de 1930 o Paiacutes ainda possuiacutea uma economia agroexportadora e era

fortemente marcada pelo modelo de substituiccedilatildeo de importaccedilotildees valorizando a induacutestria

nacional e promovendo paralelamente o ecircxodo de numerosos contingentes humanos

provenientes das aacutereas rurais em direccedilatildeo agraves cidades em busca de melhores condiccedilotildees de vida

e de trabalho

Isto provocou o aumento da taxa de urbanizaccedilatildeo e ainda contribuiu para o

desenvolvimento de um grande exeacutercito industrial de reserva necessaacuterio ao desenvolvimento

da induacutestria formado pela populaccedilatildeo que procurava nos centros urbano-industriais novas

perspectivas para suas vidas

Dentre as proposiccedilotildees centrais da estrateacutegia de desenvolvimento nacional se

destacam a intervenccedilatildeo do Estado na provisatildeo de infraestrutura o protecionismo de

determinados ramos industriais e a supervalorizaccedilatildeo das taxas de cacircmbio visando beneficiar

as importaccedilotildees de insumos

Neste sentido a economia industrial que se constituiu no Brasil baseou-se numa

forma de intervenccedilatildeo puacuteblica destinada a propiciar uma accedilatildeo relativamente integrada do

capital estatal associado a capitais privados

ora nacionais ora estrangeiros Do ponto de vista

econocircmico ocorriam periodicamente dois movimentos alternados ora de crescimento

econocircmico ora crise e de endividamento (interno e externo)

59

O Estado assume com mais vigor intervenccedilotildees no mercado de trabalho e na

provisatildeo de infraestrutura e serviccedilos puacuteblicos numa atuaccedilatildeo que lhe conferiu matizes de

Estado do Bem-Estar Desde cedo se caracterizou pelo apoio ao ideaacuterio desenvolvimentista

tendo na induacutestria sua locomotiva e no Estado o seu planejador e impulsor (FIORI 1992 p

06) Visando assegurar o processo interno de acumulaccedilatildeo e produccedilatildeo capitalista pautou sua

atuaccedilatildeo na implementaccedilatildeo de poliacuteticas econocircmicas como instrumento de promoccedilatildeo desse

desenvolvimento As elites nacionais assumiram o projeto desenvolvimentista impulsionado

pela industrializaccedilatildeo

O modelo baacutesico de intervenccedilatildeo adotado pelo Estado foi de promotor da economia e regulador Como promotor teve um papel decisivo no financiamento dos grandes blocos de investimento e na produccedilatildeo direta de insumos principalmente por meio da criaccedilatildeo de infraestrutura Como regulador atuou no sentido de centralizar e normatizar as principais aacutereas da atividade produtiva nacional regulamentando os serviccedilos de utilidade puacuteblica criando instacircncias poliacutetico-administrativas de coordenaccedilatildeo e planejamento setorial e elaborando planos de auto-suficiecircncia energeacutetica (LOW-BEER 2002 p 70)

A Grande Depressatildeo Mundial deu margem para que os governos estendessem suas

accedilotildees agrave economia capitalista Essa intervenccedilatildeo governamental difundiu-se nas economias

nacionais em detrimento do mito do mercado isto eacute do mercado como grande regulador da

economia Neste sentido cabia aos governos das naccedilotildees colocarem em praacutetica a nova teacutecnica

de planejar O planejamento foi adotado pelos governos de economia capitalista subsidiada

pelas noccedilotildees do keynesianismo que primeiramente orientaram o governo de Rossevelt nos

Estados Unidos As ideacuteias keynesianas foram difundidas para outras naccedilotildees como foacutermula de

atingir o desenvolvimento econocircmico e social (RODRIGUES 1998)

Segundo Fiori (1992) depois que o pensamento liberalconservador foi deposto pelo

keynesianismo e pelo avanccedilo dos social-democratas novos caminhos se abriram para a

presenccedila do Estado ativo e interventor cuja marca principal era o pleno emprego o controle

da economia e o Estado de Bem-Estar Social Este funcionou por cerca de 30 anos pois na

deacutecada de 1970 o mesmo se demonstrava incapaz de responder aos novos desafios colocados

para a sociedade novas tecnologias e financcedilas desaceleraccedilatildeo do crescimento econocircmico e

crises fiscais

Enquanto na Europa se tinha o Estado Keynesiano na Ameacuterica Latina introduziu-se

com o pensamento da CEPAL um Estado desenvolvimentista que pregava a superaccedilatildeo da

crise por meio da industrializaccedilatildeo conduzida pelo Estado Entre as suas estrateacutegias estavam o

60

controle do cacircmbio para promover uma industrializaccedilatildeo pautada na substituiccedilatildeo de

importaccedilotildees a produccedilatildeo de insumos e de infraestruturas de transporte e comunicaccedilatildeo o

financiamento de atividades privadas nacionais e a articulaccedilatildeo entre os capitais privados

nacionais e internacionais

Sendo assim o Estado Nacional assumiu a responsabilidade de formar dentro do

sistema capitalista existente natildeo soacute uma rede de oacutergatildeos com o objetivo de acelerar o

desenvolvimento econocircmico brasileiro mas inclusive tentando transformar-se num Estado

empresaacuterio inovador e em menor intensidade banqueiro Isto natildeo significa que o Estado

tenha em si substituiacutedo o empresaacuterio nem que a classe empresarial tenha sido passiva mas

que sua atuaccedilatildeo ao criar instituiccedilotildees e tomar a si a responsabilidade crescente pelas decisotildees

econocircmicas foi fundamental para a mudanccedila de rumo que a economia brasileira conheceu a

partir de 1930 (FONSECA 2003)

O governo de Vargas percebendo a necessidade de transformaccedilatildeo nas accedilotildees estatais

adotou uma funccedilatildeo coordenadora como fica claro na passagem abaixo

Na eacutepoca em que os fins sociais satildeo preponderantemente econocircmicos em que se organiza de maneira cientiacutefica a produccedilatildeo e o pragmatismo industrial eacute elevado a limites extremos assinala-se a funccedilatildeo do Estado antes e acima de tudo como elemento coordenador desses muacuteltiplos esforccedilos devendo sofrer por isso modificaccedilotildees decisivas (VARGAS apud LOW-BEER 2002 p 73)

A partir daquele momento o governo de Vargas passou a investir na modernizaccedilatildeo

da economia brasileira via revisatildeo das legislaccedilotildees que regiam tanto as relaccedilotildees sociais como

as econocircmicas e na criaccedilatildeo de novos oacutergatildeos que tinham por objetivo planejar e concretizar as

poliacuteticas puacuteblicas de planejamento da produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo

Dessa forma criaram-se as instituiccedilotildees que tinham como objetivo o desenvolvimento

econocircmico do Brasil de tal forma que dado o impulso inicial o proacuteprio funcionamento

destas instituiccedilotildees contribuiria para construccedilatildeo de um processo contiacutenuo de desenvolvimento

separando a figura pessoal de Vargas bem como de seu governo do processo nacional

desenvolvimentista

Segundo Teixeira (1998) o iniacutecio do planejamento governamental estaacute associado ao

governo de Vargas quando se registraram os primeiros esforccedilos de racionalizaccedilatildeo da

distribuiccedilatildeo de recursos e de centralizaccedilatildeo do comando da poliacutetica econocircmica brasileira A

partir da Segunda Guerra Mundial a ideologia e teacutecnica do planejamento tornaram-se

fundamentais agraves naccedilotildees capitalistas nos momentos em que tiveram de planejar seu

61

desenvolvimento As ideacuteias de planejamento foram aplicadas agrave Ameacuterica Latina e a outros

paiacuteses em desenvolvimento Num primeiro instante a ideacuteia de planejamento apresentava-se no

Brasil carregada de um cunho nacionalista que caracterizava o governo de Getuacutelio Vargas

entre 19301945 Nesta ocasiatildeo para operacionalizaacute-lo houve uma seacuterie de transformaccedilotildees a

niacutevel institucional

Datam dessa eacutepoca vaacuterios empreendimentos estatais como a Companhia Vale do

Rio Doce (CVRD) fundada em 1942 (resposta nacionalista aos interesses estrangeiros na

exploraccedilatildeo de mineacuterio) a Companhia Nacional de Aacutelcalis criada em 1943 para evitar a

paralisaccedilatildeo das induacutestrias que utilizavam carbonato de soacutedio no caso de escassez do produto

(BAER 1995) Tambeacutem se expandiu o setor de navegaccedilatildeo e em 1943 foi criada a Faacutebrica

Nacional de Motores que acabou fabricando de tratores a geladeiras passando por motores e

carros tendo sido vendida a um grupo privado estrangeiro em 1968

Silva (1989) ressalta que ateacute a deacutecada de 1940 as intervenccedilotildees do Estado em relaccedilatildeo

agrave questatildeo urbana eram mais de cunho sanitarista para o controle de focos de doenccedilas Todas

as medidas do Estado levado pelo interesse econocircmico e poliacutetico e pelo desenvolvimento da

induacutestria soacute contribuiacuteram para a segregaccedilatildeo soacutecioespacial da cidade

A partir da segunda metade do seacuteculo XX com a industrializaccedilatildeo e maior entrada do

capital estrangeiro no Paiacutes por meio das multinacionais surge uma nova oportunidade para os

empresaacuterios os quais viam na classe meacutedia um novo mercado a ser explorado

A consolidaccedilatildeo do Estado desenvolvimentista e regulador durante as deacutecadas de

1950 e 1960 deu-se com a integraccedilatildeo das ideacuteias de progresso e bem-estar social agraves bases

ideoloacutegicas para a implementaccedilatildeo de um grande projeto de industrializaccedilatildeo (SANTOS 1996)

tomando o planejamento estatal realizado por uma elite tecnocraacutetica como instrumento de

orientaccedilatildeo e de definiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas nacionais bem como a capacidade do Estado

de impor de cima para baixo seus planos programas e projetos ao conjunto da sociedade

O desenvolvimento era pensado em termos nacionais podendo ser conduzido

preferencialmente pelos governos centrais Desenvolvimento era acima de tudo expandir a

produccedilatildeo interna e a oferta de bens e serviccedilos padronizados para o mercado domeacutestico

esperando que os efeitos multiplicadores dos investimentos sobre a geraccedilatildeo de renda e

emprego produzissem os resultados desejados em termos de equumlidade Esse era o modelo

hegemocircnico de industrializaccedilatildeo dos paiacuteses retardataacuterios respaldado pelas experiecircncias da

Franccedila Alemanha Japatildeo e Uniatildeo Sovieacutetica dentre outras (FIORI 1992)

Os frutos desse modelo no entanto variaram de um Paiacutes para o outro como resultado

de suas caracteriacutesticas proacuteprias No caso brasileiro a industrializaccedilatildeo em marcha forccedilada

62

especialmente a partir do Governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) contribui para

acentuar desigualdades intra e inter-regionais na alocaccedilatildeo de recursos bem como no perfil de

distribuiccedilatildeo de renda entre os diferentes segmentos sociais Aliado a isso a raacutepida

urbanizaccedilatildeo concentrou pessoas e mazelas sociais nas cidades incrementando a demanda por

habitaccedilatildeo transportes saneamento e outros bens coletivos

Naquela eacutepoca os investimentos do Estado direcionavam-se para a criaccedilatildeo de

infraestrutura para esse novo empresariado e aleacutem disso diminuiu-se ainda mais os gastos

com a classe de menor poder aquisitivo Aumenta-se tambeacutem a exploraccedilatildeo da forccedila de

trabalho e intensifica-se a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria como forma de acumulaccedilatildeo de capital o

que agrava o problema urbano para a classe trabalhadora pois o acesso ao solo urbano

infraestruturado eacute condiccedilatildeo primordial para o acesso agrave vida digna

Na deacutecada de 1950 e os anos de 1960 o Paiacutes passa por um periacuteodo caracterizado pela

aceleraccedilatildeo do processo de urbanizaccedilatildeo As cidades principalmente as maiores

completamente despreparadas tornam-se o destino de grandes fluxos migratoacuterios originados

no campo ou nas pequenas cidades Aleacutem disso as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas na induacutestria

automobiliacutestica e na construccedilatildeo civil aumentam a eficiecircncia da produccedilatildeo ampliando o

nuacutemero de carros nas ruas e possibilitando a verticalizaccedilatildeo nas cidades (ROLNIK 2002 p

217)

A partir de 1955 durante a gestatildeo do Presidente Kubitschek comeccedilaram a ser

fundadas as bases do modelo econocircmico que foi seguido durante as duas deacutecadas seguintes

Foram criadas empresas estatais em setores baacutesicos como accedilo petroacuteleo energia eleacutetrica e

transportes aleacutem de instituiccedilotildees bancaacuterias como o Banco do Estado de Satildeo Paulo o reforccedilo

do Banco do Brasil e a instituiccedilatildeo de agecircncias de fomento ao desenvolvimento como o Banco

do Nordeste do Brasil (BNB)

criado em 1953 principal agente financeiro da

Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)

Vale observar que foi naquele periacuteodo que se iniciou a preocupaccedilatildeo com a questatildeo

regional Naquela eacutepoca foram criados o Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia em

1951 e posteriormente a Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

(SPVEA) em 1953 aleacutem da criaccedilatildeo da Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

(PETROBRAacuteS) e das Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA (ELETROBRAacuteS)

Segundo Rodrigues (1998) em 1956 o Governo de Juscelino Kubistschek criou um

Conselho de Desenvolvimento com atribuiccedilotildees de formular planos e programas realizar

pesquisas econocircmicas acompanhar e controlar as medidas adotadas A primeira accedilatildeo do

63

Conselho foi a elaboraccedilatildeo do Programa de Metas cuja implementaccedilatildeo colocou aquele oacutergatildeo

no centro do processo de tomada de decisatildeo de poliacutetica econocircmica

Com o Plano de Metas de JK o planejamento governamental passou a ser visto como

um instrumento importante para o alcance do desenvolvimento econocircmico e para solucionar

os graves problemas provenientes da pobreza Assim o planejamento foi rapidamente

disseminado e adotado de forma sistematizada e intencional recebendo o apoio tanto dos

partidos poliacuteticos de diversos matizes ideoloacutegicos como dos empresaacuterios e militares

(TEIXEIRA 1998)

O Programa de Metas (1957-1960) elaborado durante o Governo Juscelino Kubitschek representou uma transformaccedilatildeo qualitativa nas relaccedilotildees entre Estado e economia Comeccedila a ganhar forccedila a concepccedilatildeo de planejamento enquanto uma teacutecnica neutra capaz de adequar racionalmente os melhores meios aos diversos fins determinados Portanto o conceito de planejamento e desenvolvimento econocircmico passou a se identificar cada vez mais ganhando adesotildees ou mesmo tornando-se consensuais entre os diversos setores da sociedade (SANTOS JUNIOR 1995 p 28)

Rodrigues (1998) afirma que foi no Governo de Juscelino Kubitschek (1955-1960)

que o Estado estreitou os laccedilos da economia no qual todos os esforccedilos e recursos foram

colocados a serviccedilo do processo de industrializaccedilatildeo do Paiacutes A partir daiacute a poliacutetica

governamental tem tratado de orientar-se de acordo com as condicionantes econocircmicas

definindo setores e investimentos necessaacuterios Mesmo no governo de Jacircnio Quadros havia

uma disposiccedilatildeo para continuar apostando na teacutecnica do planejamento Em seu governo foi

criada a Comissatildeo de Planejamento Nacional em 1961 posteriormente transformada em

Ministeacuterio do Planejamento e Coordenaccedilatildeo econocircmica em 1964 no governo militar

Nos anos 1960 de acordo Ribeiro e Cardoso (2003 p 125) o planejamento assume

um [] papel estrateacutegico-desenvolvimentista e os planejadores passam a ser os

racionalizadores da gestatildeo da cidade Tal afirmaccedilatildeo poderia conduzir agrave conclusatildeo de que as

pessoas envolvidas nesse trabalho teriam uma visatildeo limitada da realidade contudo eacute

importante lembrar que a presenccedila do Estado de exceccedilatildeo predomina contribuindo para um

perfil tecnicista apoliacutetico objetivo do planejador urbano

A nacionalidade ainda estaacute em pauta mas muda o discurso Agora a urbanizaccedilatildeo eacute

fator necessaacuterio para a modernizaccedilatildeo sem o qual natildeo se constroacutei a naccedilatildeo Entretanto a

questatildeo urbana eacute vinculada ao desenvolvimento e natildeo ao social A eficiecircncia e a

racionalidade da produccedilatildeo industrial aplicadas agrave cidade atendem agraves ideacuteias defendidas na eacutepoca

(RIBEIRO CARDOSO 2003 p 129)

64

Para Cruz (1994 p 04) eacute somente na segunda metade da deacutecada de 1960 que pela

primeira vez foi reconhecida a necessidade do governo central intervir diretamente nas

cidades apesar de natildeo haver uma proposta estruturada de poliacutetica urbana nacional

Naquele periacuteodo o Estado se vecirc pressionado a atender agraves carecircncias geradas pelo

processo produtivo e a continuar criando condiccedilotildees para a acumulaccedilatildeo capitalista visto que

ambos fatores fazem parte dos investimentos para o processo de desenvolvimento econocircmico

capitalista

Conforme Nunes e Jacobi (1993 p 36) as organizaccedilotildees populares emergiram com a

consolidaccedilatildeo das bases da economia urbano-industrial e do consequumlente desenvolvimento do

capitalista monopolista no Paiacutes uma vez que a partir da deacutecada de 1950 este modelo passou

a exigir a concentraccedilatildeo fiacutesica das unidades produtivas do mercado consumidor da forccedila de

trabalho e dos serviccedilos relacionados com a sua produccedilatildeo e reproduccedilatildeo

O processo de industrializaccedilatildeo implantado no Brasil alterou significativamente o

espaccedilo urbano das cidades Estas passaram a demonstrar uma seacuterie de problemas sociais

decorrentes das contradiccedilotildees deste padratildeo de acumulaccedilatildeo que podem ser explicitadas

principalmente na crescente demanda por serviccedilos coletivos e pelos conflitos entre classes

oriundos do processo de exclusatildeo das camadas mais pobres na garantia dos direitos poliacuteticos

bem como dos direitos sociais

Ribeiro (1992) ressalta que esses conflitos fomentaram a emergecircncia nos centros

urbanos de formas de organizaccedilatildeo popular expressados nos chamados movimentos sociais

que satildeo formas de organizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo inscritas como elos ativos entre os processos de

reproduccedilatildeo social e a esfera poliacutetica em busca de melhores condiccedilotildees de sobrevivecircncia e dos

direitos de cidadania

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1960 os movimentos sociais estavam relacionados com a

tendecircncia revolucionaacuteria do proletariado ou seja dos sindicatos como por exemplo as

Sociedades de Amigos do Bairro (SAB s) em Satildeo Paulo que surgiram para organizar e

estruturar as demandas da sociedade civil por melhorias sociais e urbanas

Desse modo o Estado passou a intervir mais diretamente no espaccedilo urbano pois de

acordo com Gohn (1991) a intervenccedilatildeo estatal no urbano tem a ver com a criaccedilatildeo de

condiccedilotildees gerais para a acumulaccedilatildeo do capital concentrando assim sua accedilatildeo na regulaccedilatildeo

das formas de produccedilatildeo e para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho por meio da poliacutetica social

de benefiacutecios urbanos na qual o Estado procura atenuar a contradiccedilatildeo entre as necessidades

de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e os interesses da acumulaccedilatildeo do capital via distribuiccedilatildeo

via salaacuterios indiretos

65

A partir da deacutecada de 1960 foram implementados vaacuterios planos no intuito de

garantir as condiccedilotildees gerais da produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do capital por meio de um discurso

teacutecnico-administrativo o qual legitimava a dominaccedilatildeo do Estado por meio da suposta

eficiecircncia e eficaacutecia de um modelo de planejamento que atenderia ao interesse geral

Visando obter apoio das classes populares urbanas o populismo desempenhou um duplo papel legitimando as reivindicaccedilotildees urbanas por um lado e assumindo um papel de provedor geral das necessidades por outro [] Foi no periacuteodo janista que o poder puacuteblico deu certa atenccedilatildeo agraves necessidades imediatas da sociedade civil obtendo ao mesmo tempo um certo apoio da mesma que acabou por identificar o Estado como o alvo a ser atingido pela proacutepria pressatildeo popular (NUNES JACOBI 1993 p 37)

Segundo Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

O golpe militar de marccedilo de 1964 foi resultado do profundo descontentamento dos grupos econocircmicos que desejavam manter as estrateacutegias tiacutepicas do modelo baseado na exportaccedilatildeo de produtos manufaturados e na expansatildeo do mercado interno contraacuterio ao fortalecimento do grupo nacionalista que defendia o desenvolvimento baseado na expansatildeo do mercado interno Como consequumlecircncia das divergecircncias instalou-se uma crise econocircmica profunda com reflexos na reduccedilatildeo da capacidade produtiva e no crescimento das reivindicaccedilotildees sociais (LOW-BEER 2002 p 81)

O agravamento da crise poliacutetica dos governos de Jango e Jacircnio e a crise final do

regime populista com o golpe militar em 1964 liquidaram os movimentos poliacuteticos

revolucionaacuterios exterminando eou exilando muito dos seus participantes Mesmo com esta

repressatildeo vaacuterios liacutederes comunitaacuterios se arriscaram atuando na clandestinidade contra a

poliacutetica de repressatildeo vigente atraveacutes das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e agentes

pastorais9 Estes canais aleacutem de valorizarem a participaccedilatildeo popular em organizaccedilotildees com as

discussotildees sobre as condiccedilotildees de vida dos moradores proporcionaram o desenvolvimento de

formas democraacuteticas de participaccedilatildeo de base e a formaccedilatildeo de lideranccedilas

9 A igreja por meio do seu movimento de renovaccedilatildeo a Teologia da Libertaccedilatildeo tornou-se no periacuteodo autoritaacuterio um canal de expressatildeo da luta dos movimentos sociais pelos Direitos Humanos e pelas reivindicaccedilotildees populares ao abrir espaccedilos fiacutesicos e de orientaccedilatildeo espiritual-ideoloacutegica para as massas (GOHN 1991)

66

Segundo Haddad (1996) foi a partir de 1965 que as atividades de planejamento

governamental tornaram-se mais sistecircmicas no Brasil sob diferentes aspectos Em 1965 o

Governo Federal introduziu em sua administraccedilatildeo uma sistemaacutetica de planejamento que

procurou coordenar objetivos de um programa de estabilizaccedilatildeo de curto prazo (Programa de

Accedilatildeo Econocircmica do Governo (PAEG)) com as metas de um plano de meacutedio e de longo prazo

(Plano Decenal de Desenvolvimento) para o Paiacutes como um todo

Desta forma as macro-regiotildees brasileiras particularmente a Norte e a Nordeste

passaram a dispor de uma atuaccedilatildeo efetiva de organismos de planejamento do

desenvolvimento regional (as superintendecircncias) e de instituiccedilotildees de financiamento para

administrar incentivos fiscais e financeiros a partir das diretrizes de um Plano Diretor de

meacutedio prazo Assim alguns governos estaduais avanccedilaram a organizaccedilatildeo de sistemas de

planejamento que de certa forma tentavam reproduzir em escala subnacional o arranjo

institucional do sistema de planejamento do governo federal

Nos casos do Nordeste e do Norte foram criados e preservados alguns programas

especialmente no que se refere aos estiacutemulos fiscais e financeiros e voltados para a

implantaccedilatildeo de infraestrutura econocircmica como as rodovias e a produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de

energia eleacutetrica

Nesse sentido o PAEG (1965-1966) que propugnava o crescimento econocircmico e o

emprego a reduccedilatildeo das taxas de inflaccedilatildeo a correccedilatildeo dos deacuteficits da balanccedila de pagamentos o

aumento das obras puacuteblicas e a instituiccedilatildeo de um programa habitacional foram criadas vaacuterias

instituiccedilotildees como o Banco Central o Conselho Monetaacuterio Nacional o Banco Nacional da

Habitaccedilatildeo (BNH) as Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio e o Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e

Urbanismo (SERFHAU) aleacutem do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)

O BNH adotava uma estrateacutegia de atuar tambeacutem no desenvolvimento urbano

financiando aleacutem da habitaccedilatildeo e saneamento planos de renovaccedilatildeo urbana transportes e

equipamentos comunitaacuterios Para Bierrenbach (1987 p 48) o BNH foi criado com o

objetivo de favorecer as camadas populares e funcionar como um antiacutedoto ao

descontentamento decorrente do fechamento dos canais de participaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica

Entretanto esses objetivos tinham os princiacutepios organizacionais caracteriacutesticos do mercado

capitalista

O Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social (PDDES)

1967 a 1976

continha um capiacutetulo especiacutefico sobre as questotildees urbanas no qual foi estabelecida uma

regionalizaccedilatildeo

as Regiotildees Programa e os Poacutelos de Desenvolvimento Urbano aleacutem de

67

instituir um Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado (SNPLI) a ser conduzido

pelo SERFHAU e pelo IPEA

Com os governos militares a questatildeo urbana foi tratada de forma diferente e houve

bastante investimento para o melhoramento da urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto a

preocupaccedilatildeo natildeo era com a problemaacutetica social causada pela urbanizaccedilatildeo desordenada mas

sim com a legitimaccedilatildeo de uma forma de governo ditatorial e com a organizaccedilatildeo espacial das

cidades para atender agraves exigecircncias crescentes da economia como produccedilatildeo circulaccedilatildeo e

consumo do capitalismo

No Brasil poacutes-1964 a posiccedilatildeo das poliacuteticas urbanas no contexto das prioridades

governamentais caracterizava-se pela implementaccedilatildeo de um novo conceito de eficiecircncia no

qual os interesses econocircmicos prevaleceram sobre os interesses sociais Como reflexo disto

as poliacuteticas governamentais nas aacutereas de bem-estar social tais como sauacutede saneamento

educaccedilatildeo habitaccedilatildeo e outros tiveram pequeno destaque na agenda governamental Deste

modo o perfil de desigualdade social dominante permaneceu o que somado agrave compressatildeo

salarial e ao desemprego configurou um crescente agravamento das condiccedilotildees gerais das

camadas populares (JACOBI 1989)

Em meados da deacutecada de 1970 o mercado interno - cuja expansatildeo foi limitada pelo

modelo concentrador de renda - comeccedilava a mostrar suas limitaccedilotildees (e exaustatildeo) forccedilando a

mudanccedila em direccedilatildeo a uma poliacutetica orientada para a exportaccedilatildeo aliada a uma capitalizaccedilatildeo

baseada no endividamento crescente Tais poliacuteticas se tornaram o exemplo perfeito do binaacuterio

estado intervencionistacrescimento econocircmico O modelo de atuaccedilatildeo estatal - e que residiu

na base do milagre brasileiro - comeccedilou a mostrar sua fragilidade principalmente quando o

envolvimento do Estado na economia tem mais aspectos negativos que positivos (LOW-

BEER 2002)

Nesse momento como reflexo da postura autoritaacuteria instalada visando o controle

dos movimentos sociais e principalmente o fortalecimento das forccedilas produtivas foi preciso

reforccedilar a atuaccedilatildeo poliacutetica com uma atuaccedilatildeo centralizadora e de planejamento do

desenvolvimento baseado num capitalismo moderno Tambeacutem nessa altura passou a

integrar a pauta da atuaccedilatildeo puacuteblica o planejamento do espaccedilo e a formulaccedilatildeo das poliacuteticas de

reordenamento territorial e urbano com a funccedilatildeo de mecanismos indutores do

desenvolvimento

Naquele periacuteodo o planejamento assume uma forma centralizada despolitizada e

ditatorial jaacute que os planos e projetos passam a ser bandeiras de justificativas de accedilotildees do

Estado no entanto foram elaboradas sem a mediaccedilatildeo representativa dos interesses populares

68

e se dirigiam sobretudo as questotildees geneacutericas distanciando-se da problemaacutetica proacutepria de

cada contexto (SOUZA 1990 p 111)

No entanto as condiccedilotildees objetivas de inchaccedilo e periferizaccedilatildeo das cidades e da

pauperizaccedilatildeo de suas camadas populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees

populares formadas com propoacutesitos religiosos tornassem o uacutenico canal de expressatildeo das

reivindicaccedilotildees por melhores condiccedilotildees de vida

Mesmo nessa fase do regime autoritaacuterio o governo se preocupava em passar no seu

discurso uma imagem positiva para a sociedade no tocante a participaccedilatildeo das classes

populares Todavia o conjunto de poliacuteticas implementadas deixa em evidecircncia que a

participaccedilatildeo efetiva natildeo acontecia na realidade Como ressalta Gohn (1985 p 98) o Estado

elabora atraveacutes da poliacutetica denominada planejamento participativo um discurso no qual todas

as diferenccedilas existentes entre os grupos de indiviacuteduos na sociedade satildeo eliminadas

Ao final da deacutecada de 1970 as praacuteticas e as instituiccedilotildees de planejamento eram

instrumentos de legitimaccedilatildeo do regime poliacutetico autoritaacuterio que pretendia encarnar a imagem

de um governo orientado apenas pelos princiacutepios da racionalidade e da competecircncia teacutecnica

Para Correcirca (1989) o planejamento foi apresentado como um processo racional de

tomada de decisotildees para buscar otimizar recursos ou para melhorar a condiccedilatildeo de vida agrave

sociedade indicado tambeacutem como um processo que visa agrave organizaccedilatildeo das estruturas fiacutesicas

do espaccedilo da cidade representadas por usos e ocupaccedilotildees do solo e pelas infraestruturas que

lhe datildeo suporte utilizando para isso vaacuterios instrumentos urbaniacutesticos como por exemplo o

zoneamento

Nesse contexto o planejamento e a gestatildeo das cidades10 se restringiram aos criteacuterios

e procedimentos de administraccedilatildeo atribuindo ao gestor a competecircncia teacutecnica para

solucionar os problemas urbanos mediante agrave utilizaccedilatildeo de instrumentos normativos tais

como coacutedigos de postura de obras de edificaccedilotildees e de uso do solo que contraditoriamente

acirraram as desigualdades soacutecio-espaciais

No Brasil do ponto de vista da poliacutetica urbana o que se observou no planejamento sob o regime autoritaacuterio foi o agravamento dos problemas urbanos gerados pela expansatildeo industrial pelos intensos fluxos migratoacuterios e pelo crescimento populacional superior agrave absorccedilatildeo da matildeo-de-obra nas cidades No projeto desenvolvimentista e modernizador em curso naquele

10 Para Marcelo Souza (2002) a gestatildeo eacute a administraccedilatildeo dos recursos (de todos os tipos) e dos problemas aqui e agora (presente e futuro de curto prazo) o planejamento eacute a preparaccedilatildeo para o futuro (de meacutedio e longo prazo sobretudo) com o objetivo de evitar ou minimizar problemas e melhor explorar potencialidades Mesmo em uma era de imediatismo e de dificuldades de planejamento no setor puacuteblico natildeo eacute sensato abrir matildeo de se pensar tambeacutem o planejamento

69

periacuteodo o planejamento urbano passou a ocupar o papel de racionalizar as administraccedilotildees municipais e de resolver os problemas urbanos entendidos na eacutepoca como decorrentes do desenvolvimento econocircmico (SANTOS JUNIOR 1995 p 30)

Matus (1996) e Teixeira (1998) afirmam que o modelo de planejamento e gestatildeo

adotado na Ameacuterica Latina e em especial no Brasil foi do tipo normativo tradicional Isto

provocou muitas vezes uma ineficaacutecia das poliacuteticas governamentais

O planejamento normativo tradicional tem como princiacutepio fundamental o argumento

de que quem planeja eacute o governo Este ator estaacute fora ou acima da realidade planejada e

portanto natildeo coexiste nessa realidade com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS

1996 p 65) Eacute um instrumento eminentemente teacutecnico que desconsidera a presenccedila de outros

atores interessados no processo de definiccedilatildeo do planejamento puacuteblico tais como associaccedilotildees

sindicatos empresas etc

Nesse sentido ocorre uma centralizaccedilatildeo de poder de decisatildeo de forma autoritaacuteria e

burocraacutetica nas matildeos dos governantes pois se avalia que tudo que for definido e

implementado pelo Estado seraacute aceito por esses atores sem qualquer tipo de questionamento

O uacutenico aspecto que eacute considerado basicamente eacute o econocircmico cujo comportamento eacute

totalmente previsiacutevel

O planejador tradicional dominado pelo economicismo assume que accedilatildeo eacute sinocircnimo de comportamento no estilo da teoria econocircmica eacute a base da teoria do planejamento Essa eacute uma deformaccedilatildeo economicista proveniente do modo especial e artificial como estaacute construiacuteda a teoria econocircmica Esta eacute via de regra uma teoria do comportamento econocircmico segundo a hipoacutetese de que o mundo eacute regido por leis sociais de alcance similar ao das leis naturais Consequumlentemente o economista tende a raciocinar sobre uma base de comportamentos estaacuteveis que obedecem a leis Para ele natildeo existem processos criativos No entanto a teoria moderna do planejamento refere-se a um tipo especial de accedilatildeo humana ou accedilatildeo social Trata-se da accedilatildeo intencional e reflexiva por meio da qual o autor da accedilatildeo espera alcanccedilar conscientemente determinados resultados E o fundamento dessa accedilatildeo eacute um juiacutezo complexo que foge agraves prediccedilotildees [] tem uma interpretaccedilatildeo situacional e a intenccedilatildeo do autor As accedilotildees ultrapassam os limites daquilo que eles afirmam fazer (MATUS 1996 p 157)

Este tipo de paradigma de planejamento urbano teve (e ainda tem) papel relevante

pois foi um instrumento que fez parte das accedilotildees do aparelho estatal o qual buscava nos

diagnoacutesticos a realidade em que se desejava intervir a fim de transformaacute-la em uma realidade

futura desejaacutevel segundo os padrotildees e normas dominantes

70

Todavia a implementaccedilatildeo desse tipo de planejamento tornou-se problemaacutetica pois

natildeo haacute uma preocupaccedilatildeo em saber qual a representaccedilatildeo que a sociedade civil a ser atingida

pelo planejamento tem de sua condiccedilatildeo de vida mas sim o que dela pensam os planejadores

A sociedade geralmente eacute afastada desse processo muitas vezes natildeo eacute sequer escutada quanto

mais convidada a participar na escolha de alternativas ou de tomada de decisatildeo Ainda assim

delineia-se e potildee-se em praacutetica planos de intervenccedilatildeo da realidade Para contornar resistecircncias

satildeo implementados esquemas de manipulaccedilatildeo onde as vantagens e benefiacutecios dos planos

programas e projetos sociais satildeo alardeados tentando transformar os objetivos do

planejamento em aspiraccedilotildees das camadas populares e a adoccedilatildeo de esquemas de repressatildeo ou

a combinaccedilatildeo de ambos (CORREcircA 1989)

Bandeira (1999) ressalta que a falta de participaccedilatildeo da sociedade civil eacute uma das

principais causas do fracasso de poliacuteticas programas e projetos de diferentes tipos A ausecircncia

de uma interaccedilatildeo entre os segmentos da sociedade tende a fazer com que muitas das accedilotildees

puacuteblicas sejam mal planejadas tornando-se incapazes de alcanccedilar totalmente os objetivos

propostos Aleacutem disso quando tratada apenas como objeto e natildeo como um dos sujeitos do

processo de gestatildeo e implementaccedilatildeo dessas accedilotildees a sociedade tende a natildeo se identificar com

elas

Como consequumlecircncia dessa falta de envolvimento da comunidade muitos programas e projetos governamentais concebidos e implantados de cima para baixo natildeo sobrevivem agraves administraccedilotildees responsaacuteveis pelo seu lanccedilamento Acabam por ser substituiacutedos por outros igualmente efecircmeros num ciclo pateacutetico que envolve grande desperdiacutecio de recursos e soacute contribui para aumentar o desperdiacutecio em relaccedilatildeo agrave eficaacutecia das accedilotildees do setor puacuteblico (BANDEIRA 1999 p 12)

Contrapondo-se ao planejamento normativo tradicional o paradigma do

planejamento estrateacutegico situacional eacute lanccedilado como alternativa para se fazer planejamento na

Ameacuterica Latina

No planejamento estrateacutegico situacional o ator que planeja estaacute dentro da realidade

e que aiacute coexiste com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS 1996 p 67) Ou seja

natildeo existe apenas um uacutenico ator mas sim uma multiplicidade de atores (governo partidos

sindicatos movimentos sociais etc) que planejam

Dessa forma Matus (1996) concebe a ideacuteia de planejamento como um jogo de

conflitos e cooperaccedilatildeo onde o Estado natildeo tem assegurado sua capacidade de controlar a

realidade planejada uma vez que depende da accedilatildeo do outro Natildeo existe um diagnoacutestico uacutenico

71

e nem uma verdade objetiva pois como satildeo vaacuterios atores que coexistem na realidade haacute

vaacuterias explicaccedilotildees da realidade

Nesse sentido o conceito de planejamento que guia este trabalho estaacute relacionado a

um processo de permanente reflexatildeo e anaacutelise dos fatores e condicionantes que permitem

alcanccedilar resultados desejados pelos agentes sociais envolvidos de acordo com a concepccedilatildeo de

Bezerra e Arauacutejo (1999 p 8)

O planejamento eacute concebido como um processo ordenado e sistemaacutetico de decisatildeo que antecipa o futuro e define accedilotildees que viabilizam objetivos que se pretendem alcanccedilar incorporando e combinando uma dimensatildeo poliacutetica e uma dimensatildeo teacutecnica resultando num processo essencialmente teacutecnico e poliacutetico Dessa forma o planejamento como parte do processo poliacutetico de tomada de decisotildees sobre o futuro e as accedilotildees constitui-se um espaccedilo privilegiado de negociaccedilatildeo entre os atores sociais confrontando e articulando seus interesses e suas alternativas para a sociedade No decorrer desse processo quando se negociam as escolhas e as prioridades os atores sociais podem se organizar e constituir alianccedilas e acordos poliacuteticos Tal abordagem parte do princiacutepio de que o futuro eacute incerto e resulta da construccedilatildeo social decorrente da accedilatildeo dos atores sociais organizados que implementam medidas e se movem na criaccedilatildeo de novas condiccedilotildees de estruturaccedilatildeo da realidade

Sendo assim a participaccedilatildeo eacute um dos pressupostos fundamentais para a realizaccedilatildeo

dos projetos que atinjam seus objetivos Participaccedilatildeo entendida como acesso efetivo dos

envolvidos ao planejamento das accedilotildees agrave execuccedilatildeo das atividades e ao acompanhamento e

avaliaccedilatildeo das mesmas

Daiacute a importacircncia do planejamento participativo que possa promover a articulaccedilatildeo

entre os agentes sociais fortalecendo a coesatildeo da comunidade e melhorar a qualidade das

decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar os objetivos comuns

O planejamento participativo pode inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia11

que entenda o cidadatildeo como parte ativa da sociedade reconhecendo o direito de exercer a

cidadania em seu caraacuteter integral ou seja o poder de deliberar questotildees que se tornam

fundamentais para influir na transformaccedilatildeo da cidade

Entretanto segundo Teixeira (1998) verifica-se que as accedilotildees de planejamento do

Estado Brasileiro ateacute este momento tecircm se caracterizado de forma hegemocircnica como accedilotildees

de gabinete totalmente desprovidas da participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores populares o

11 O conceito de democracia utilizado neste trabalho estaacute pautado na visatildeo de Demo (1995) que caracteriza a democracia como um sistema poliacutetico no qual o acesso ao poder pretende ser majoritariamente regulado ou administrado natildeo imposto por minorias ou seja organizado em prol das minorias natildeo de oligarquias onde haja uma igualdade de oportunidades para todos os segmentos sociais bem como a universalidade dos direitos sociais a todos os cidadatildeos

72

que demonstra que se tiveram muitos planos e pouco planejamento vaacuterios planos de

desenvolvimento foram divulgados alguns executados e destes poucos lograram ecircxito

Portanto a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade principalmente dos setores

populares fez com que as iniciativas governamentais de planejamento sempre carecessem de

credibilidade e representatividade poliacutetica

No I Plano Nacional de Desenvolvimento do governo Meacutedici (19711974) o

planejamento era compreendido como um instrumento de racionalidade e eficiecircncia Esse

plano foi colocado em praacutetica visando a contornar a problemaacutetica urbana e a expansatildeo dos

grandes centros urbanos No entanto o objetivo imediato do plano era a elevaccedilatildeo da taxa do

PIB numa tentativa de combate a inflaccedilatildeo e dar continuidade agrave implementaccedilatildeo da poliacutetica

desenvolvimentista do Paiacutes (BIERRENBACH 1987)

Concretizou-se o processo de centralizaccedilatildeo poliacutetica e tributaacuteria que tirou dos

municiacutepios a competecircncia de saneamento baacutesico Criou-se assim o Plano Nacional de

Saneamento (PLANASA) que definiu metas setoriais para todo Paiacutes bem como

instrumentos institucionais e financeiros para implantaccedilatildeo de projetos pelas empresas

estaduais de saneamento baacutesico e pelo BNH

Dentro de um contexto contraditoacuterio de crescimento econocircmico definido de

milagre econocircmico e de aumento das tensotildees sociais geradas pela repressatildeo e queda do

padratildeo de vida da sociedade que se implementou no governo Geisel (19751978) o II Plano

Nacional de Desenvolvimento (II PND) Este plano apontou a necessidade das poliacuteticas

sociais terem objetivo proacuteprio e natildeo mais vinculados agrave poliacutetica econocircmica Explicitou-se

que a distribuiccedilatildeo de renda causa a pobreza absoluta haja vista que muitas famiacutelias natildeo

possuem o miacutenimo admissiacutevel quanto agrave alimentaccedilatildeo sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo No

entanto o Estado natildeo estabelece prioridades setoriais de forma clara na conduccedilatildeo das

poliacuteticas sociais (BIERRENBACH 1987)

Dessa maneira as poliacuteticas adotadas concentravam-se nos pesados investimentos

puacuteblicos em infraestrutura baacutesica Os esforccedilos concentraram-se no financiamento da

construccedilatildeo civil principalmente o segmento habitacional O instrumento fundamental foi o

Sistema Financeiro da Habitaccedilatildeo (SFH) formalmente destinado a prover moradia para as

classes populares mas de fato um meio de financiamento para as classes meacutedia e alta Apesar

de natildeo cumprir com sua destinaccedilatildeo social o sistema contribuiu para girar o capital

dinamizando a economia

Souza (1990) destaca que em 1975 se criou o Programa de Centros Urbanos cuja

finalidade era promover a integraccedilatildeo social nas cidades atraveacutes do desenvolvimento de

73

atividades comunitaacuterias Estimulou-se em niacutevel municipal a criaccedilatildeo de projetos locais de

accedilatildeo comunitaacuteria como meio do Estado se fazer presente junto agraves camadas populares

A estrateacutegia geral do governo tinha como objetivo manter elevadas as taxas de

crescimento econocircmico Todavia tornava-se mais difiacutecil conjugar objetivos de crescimento

econocircmico com o controle social de diversos segmentos sociais haja vista que apesar de toda

repressatildeo aos chamados movimentos sociais e populares aos poucos e timidamente se

organizavam e reivindicavam seus direitos garantidos por meio do discurso do proacuteprio poder

do Estado

Em 1976 foi formulada a Poliacutetica Nacional de Desenvolvimento Urbano

compreendendo um conjunto de programas estrateacutegicos o Programa de Regiotildees

Metropolitanas o Programa de Capitais e Cidades de Porte Meacutedio o Programa de Cidades de

Pequeno Porte o Programa de Nuacutecleos Urbanos de Apoio e o Programa de Cidades

Histoacutericas destinados a reforccedilar as regiotildees metropolitanas e a definiccedilatildeo de poacutelos secundaacuterios

de desconcentraccedilatildeo urbana Foram instituiacutedas tambeacutem as primeiras normas de uso e ocupaccedilatildeo

do solo de zoneamento industrial os arcabouccedilos juriacutedicos de normatizaccedilatildeo da propriedade

das edificaccedilotildees e de desapropriaccedilatildeo

Contudo as crises econocircmicas desencadeadas em meados dos anos 1970 e a

insatisfaccedilatildeo da sociedade civil eclodiram no movimento que revelou as diversas contradiccedilotildees

de interesses e a heterogeneidade dos agentes sociais exigindo uma reforma institucional e

constitucional para a restituiccedilatildeo dos direitos e da democracia sugerindo outra forma de

governo diferente daquela conjuntura (SANTOS JUNIOR 1995)

Para Fiori (1992) o esgotamento da estrutura desenvolvimentista veio da combinaccedilatildeo

da desaceleraccedilatildeo da taxa de investimentos unida com hiperinflaccedilatildeo e incapacidade de

endividamento externo o que levou a um estrangulamento fiscal da possibilidade de gasto

puacuteblico e a exaustatildeo do regime autoritaacuterio com dificuldades para implementar um regime

democraacutetico

Assim no final da deacutecada de 1970 o que se percebia no cenaacuterio urbano era uma

profunda crise que provocou a reorganizaccedilatildeo dos movimentos populares como por exemplo

o movimento sindical com as grandes greves dos operaacuterios da induacutestria automobiliacutestica e

metaluacutergica em Satildeo Paulo e os movimentos de bairro que tinham suas reivindicaccedilotildees

baseadas nos problemas oriundos da falta de bens e equipamentos urbanos

Estas organizaccedilotildees populares ultrapassaram o imediato de suas reivindicaccedilotildees

articulando-se com importantes setores da classe operaacuteria e do movimento social em geral

ganhando assim significado social e poliacutetico pois suas formas de organizaccedilatildeo e praacuteticas

74

associativas a natureza dos direitos reivindicatoacuterios e seus mecanismos de mobilizaccedilatildeo

surgiram como caracteriacutesticas dotadas de sentido poliacutetico

Neste contexto emergem os chamados novos movimentos sociais que segundo

Cardoso (1983 p 224) eram apresentados como um traccedilo inovador da participaccedilatildeo popular

pela sua espontaneidade e seu senso de justiccedila que garantem ao mesmo tempo sua

independecircncia das elites e dos partidos poliacuteticos e a justeza de suas demandas decididas entre

iguais

Para Gohn (1985) o novo nos movimentos populares estava na sua forma de

articularem as demandas e na expressividade que estas passam a ter no cotidiano da vida O

novo estava tambeacutem na sintonia entre as carecircncias e o apelo agrave participaccedilatildeo que as

demandavam

Nessa perspectiva a transformaccedilatildeo de necessidades e carecircncias em direitos que se

opera dentro dos movimentos sociais pode ser vista como um amplo processo de revisatildeo e

redefiniccedilatildeo do espaccedilo de cidadania (SCHERER-WARREN 1993 p 54) Eacute por meio desse

processo que eles passaram a negar o modelo poliacutetico existente bem como as formas de

planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas apontando novos caminhos para as relaccedilotildees

societaacuterias ou seja para uma nova cultura poliacutetica no Paiacutes

Eacute nesse sentido que se entende o surgimento dos movimentos populares como

sujeitos na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e de uma transformaccedilatildeo sentida como necessaacuteria

Haddad (1996) argumenta que a partir do iniacutecio dos anos 1980 constatou-se que os

diferentes sistemas de planejamento passaram por um processo de desmonte institucional por

causa de fatores circunstanciais e doutrinaacuterios Os fatores circunstanciais estatildeo relacionados agrave

falecircncia financeira do estado brasileiro e os fatores doutrinaacuterios ao avanccedilo da ideologia

neoliberal no continente Latino-Americano

A crise fiscal e financeira do Estado brasileiro afetou os emergentes sistemas de

planejamento (nacional estadual e municipal) por diferentes motivos a reduccedilatildeo na

disponibilidade global de recursos financeiros para promover programas e projetos a perda na

capacidade de captaccedilatildeo de financiamentos externos para esses programas e projetos as

dificuldades para definir contrapartidas financeiras para o aporte dos empreacutestimos junto agraves

instituiccedilotildees multilaterais de fomento (BID Banco Mundial etc)

Nesse contexto os projetos econocircmicos e sociais de meacutedio e longo prazo satildeo

substituiacutedos pelas preocupaccedilotildees de curto prazo de ajustamento da economia e da sociedade

aos movimentos da conjuntura do equiliacutebrio das contas puacuteblicas dos compromissos de

75

pagamento da diacutevida externa num primeiro momento e da diacutevida externa e interna num

segundo momento

Com o atual modelo capitalista de globalizaccedilatildeo da economia e ideaacuterio neoliberal

regendo a poliacutetica governamental a questatildeo urbana vem se agravando drasticamente e com

ela a questatildeo habitacional principalmente aquela referenciada aos extratos mais

empobrecidos

O periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo do Estado brasileiro caracterizou-se pela

instabilidade poliacutetica pois pairavam sobre as instituiccedilotildees as influecircncias deixadas pelo

arbitraacuterio regime militar Esse periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo tornou-se histoacuterico sobretudo

para a participaccedilatildeo popular pois com as campanhas das diretas jaacute vaacuterias manifestaccedilotildees

populares se fizeram presentes nas principais capitais do Paiacutes atingindo seu aacutepice na

promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 que restabeleceu os direitos poliacuteticos e civis

garantindo o associativismo e a restituiccedilatildeo da autonomia dos Estados e Municiacutepios

Esse processo de abertura poliacutetica trouxe consigo transformaccedilotildees importantes na

conduta dos movimentos populares que passam a atuar mais diretamente na sociedade civil

com o objetivo de pressionar o poder puacuteblico para a abertura de canais que possibilitem uma

maior participaccedilatildeo nas decisotildees Como consequumlecircncia esses movimentos conseguiram obter

resultados no atendimento de suas reivindicaccedilotildees e ampliaram sua influecircncia poliacutetica e social

junto agraves populaccedilotildees que representam legitimando assim a accedilatildeo das lideranccedilas comunitaacuterias

Neste contexto o Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU) se

desenvolveu como instrumento de participaccedilatildeo poliacutetica e veiacuteculo de pressatildeo das classes

populares contra sua exclusatildeo das poliacuteticas puacuteblicas e objeto de articulaccedilatildeo das entidades da

sociedade civil tendo a funccedilatildeo social da cidade e a gestatildeo democraacutetica como prioridade

prevalecendo o direito agrave cidade

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

A redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade Civil no Brasil no final dos

anos 1970 implicou na construccedilatildeo com muitos entraves de uma esfera societaacuteria autocircnoma

Os agentes sociais que emergiram na sociedade civil agrave revelia do Estado criaram novos

espaccedilos e formas de participaccedilatildeo e relacionamento com o poder puacuteblico Estes espaccedilos foram

construiacutedos tanto pelos movimentos populares como pelas diversas instituiccedilotildees da sociedade

76

civil que articularam demandas e alianccedilas de resistecircncia popular e lutas pela conquista de

direitos civis e sociais

Os movimentos sociais natildeo soacute tiveram papel relevante no estabelecimento de estruturas democraacuteticas fundamentais propiacutecias agrave participaccedilatildeo popular mas tambeacutem exerceram um impacto substancial sobre as formaccedilotildees normativas do eleitorado e portanto sobre a arena poliacutetica formal Ao gerarem novos elementos de conhecimento e de cultura muitos movimentos imprimiram sua marca e orientaram sua accedilatildeo pela defesa de praacuteticas pautadas pela sua autonomia pela necessidade de tornar visiacutevel a sua capacidade de auto-organizar-se e de desenvolver a democracia direta transformando as carecircncias do seu entorno de moradia em praacuteticas reivindicatoacuterias (JACOBI 1990 p 125)

De acordo com Gohn (2000 p 310) nos anos 1980 a temaacutetica da participaccedilatildeo

popular era um ponto de pauta na agenda poliacutetica das elites ocasionando em dois fenocircmenos

de um lado a crise de governabilidade das estruturas de poder do Estado desgastadas e

deslegitimadas pelo autoritarismo de outro a legitimidade das demandas expressas pelos

movimentos sociais

novos ou velhos

e a conquista de espaccedilos institucionais

Nos anos 1990 a agenda poliacutetica das elites se modifica em funccedilatildeo de problemas

internos e das alteraccedilotildees que a globalizaccedilatildeo e as novas poliacuteticas sociais internacionais

passaram a impor ao mundo capitalista

Com a globalizaccedilatildeo a internacionalizaccedilatildeo da economia a reestruturaccedilatildeo produtiva a

revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e a hegemonia do setor financeiro ocorreram grandes mudanccedilas na

esfera econocircmica e no acircmbito poliacutetico-institucional das cidades mundiais O poder municipal

passou a incorporar novas funccedilotildees como a provisatildeo de habitaccedilatildeo e infraestrutura antes

atribuiacutedas ao Estado Naccedilatildeo

De acordo com Low-Beer (2002) hoje nos primeiros anos do seacuteculo XXI observa-

se um desenho totalmente novo das poliacuteticas puacuteblicas e do planejamento governamental fruto

principalmente das transformaccedilotildees poliacuteticas e econocircmicas ocorridas nas uacuteltimas deacutecadas do

seacuteculo passado Com a intenccedilatildeo de subsidiar novas reflexotildees acerca do tema de modo muito

sucinto a autora identifica cinco pontos que caracterizam as novas tendecircncias em curso

1 A dimensatildeo ambiental adquiriu enorme relevacircncia sendo que o conceito e

os criteacuterios de desenvolvimento sustentaacutevel passaram a ser considerados

condiccedilatildeo sine qua non para o desenvolvimento econocircmico e social

incluindo temas como a preservaccedilatildeo dos recursos naturais dentre os quais

se destaca a aacutegua como bem essencial agrave vida

77

2 As poliacuteticas de infraestrutura (saneamento energia comunicaccedilotildees etc)

deixaram de ser consideradas estritamente como insumos para o

desenvolvimento industrial-econocircmico e se tornaram fatores essenciais para

a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais

3 O leque de temas incluiacutedos nas poliacuteticas denominadas sociais adquiriu

maior amplitude incorporando aleacutem das tradicionais educaccedilatildeo e sauacutede as

poliacuteticas de geraccedilatildeo de renda e trabalho

4 Observa-se a ampliaccedilatildeo do papel da Sociedade Civil nas poliacuteticas puacuteblicas

com o reforccedilo gradativo da accedilatildeo de indiviacuteduos empresas e organismos natildeo-

governamentais paralelamente ou em conjunto com a accedilatildeo estatal

participando nas decisotildees de investimento na gestatildeo e avaliaccedilatildeo dos

programas sociais

5 O conceito de sustentabilidade vem se impondo tambeacutem no planejamento

urbano substituindo as poliacuteticas setoriais pelo enfoque integrado de

desenvolvimento metropolitano que articula as poliacuteticas habitacionais com

os investimentos em saneamento baacutesico transportes geraccedilatildeo de renda e

trabalho estimulando a melhoria da qualidade de vida nas aacutereas urbanas do

Paiacutes

A competitividade a descentralizaccedilatildeo de recursos e a crise fiscal contribuiacuteram para

que as cidades viessem a adotar um perfil empresarial o que incluiu uma relaccedilatildeo direta com

agecircncias multilaterais de financiamento e com as agendas urbanas internacionais Igualmente

nos discursos e accedilotildees das administraccedilotildees municipais passou a ser comum a colocaccedilatildeo do

desenvolvimento econocircmico como elemento fundamental para o desenvolvimento social

Harvey (1996) nos chama atenccedilatildeo para o fato de que o empreendedorismo eacute

resultante do papel da urbanizaccedilatildeo na dinacircmica social e que eacute de fundamental importacircncia natildeo

perder de vista a conexatildeo desses dois elementos com o desenvolvimento econocircmico visto que

esse nexo possibilita a apreensatildeo das mudanccedilas radicais proporcionadas pela reestruturaccedilatildeo

radical em andamento nas distribuiccedilotildees geograacuteficas da atividade humana e na dinacircmica

poliacutetico-econocircmica do desenvolvimento geograacutefico desigual dos tempos mais recentes

(HARVEY 1996 p 86) Satildeo portanto elementos essenciais sem os quais natildeo se tem a

compreensatildeo real de como a dinacircmica poliacutetico-econocircmica interferem nos rumos e decisotildees

governamentais nas cidades

78

O empreendedorismo eacute sustentado pela relaccedilatildeo puacuteblico-privada e a parceria se realiza com o intuito de integrar interesses e atrair recursos para tornar a cidade mais atrativa e competitiva entre elas Com essa simbiose entre o puacuteblico e o privado as antigas reivindicaccedilotildees de acircmbito local acabam sendo associadas agraves necessidades de atraccedilatildeo de capital para o interior das cidades empreendedoras Assim a parceria torna-se uma accedilatildeo de natureza empresarial e o centro da gestatildeo torna-se muito mais voltada para a economia local desviando-se dos interesses do territoacuterio e os investimentos satildeo convergidos para poliacuteticas e obras pontuais deixando para um segundo plano os problemas da cidade de um modo geral (HARVEY 1996 p 87)

O contexto de um mundo globalizado bem como de avanccedilos do estado neoliberal

sugerem uma reflexatildeo sobre os instrumentos do planejamento e da gestatildeo localizados no

acircmbito do municiacutepio visto que ao questionar os governos tradicionais e o modelo de

planejamento tradicional os adeptos do neoliberalismo conduziram uma reflexatildeo voltada ao

papel que os governos locais podem desempenhar no contexto do capitalismo globalizado

(MALATO 2006)

Para Lojkine (1981) um novo padratildeo produtivo tendo por referecircncia a ampliaccedilatildeo

das forccedilas produtivas bem como novos padrotildees de informaccedilatildeo levaram a sociedade

contemporacircnea a engendrar uma complexidade tal que provocou mudanccedilas na forma de

organizaccedilatildeo de empresas e Estado A isto ele chama de revoluccedilatildeo informacional e a discussatildeo

localizada no acircmbito municipal se daacute em funccedilatildeo do papel que as cidades vecircm representando

ou seja como agente poliacutetico e econocircmico nos processos de desenvolvimento e ampliaccedilatildeo do

atual sistema produtivo

Ao discutir sobre a importacircncia do papel da cidade no sistema de produccedilatildeo

capitalista Lefebvre (2001 p 49) argumenta que cabe a cidade um papel histoacuterico por

aglutinar populaccedilatildeo meios de produccedilatildeo o capital as necessidades e os prazeres Logo ela

carece da administraccedilatildeo de poliacutecia e impostos dentre outros bem como pode ser

organizada Todas essas necessidades e outras que vatildeo sendo criadas na dinacircmica da

sociedade advecircm da expansatildeo provocada pela via da urbanizaccedilatildeo que acabou por concentrar

nos espaccedilos urbanos tanto as forccedilas produtivas quanto a forccedilas de trabalho ao mesmo tempo

em que excluiacutea populaccedilotildees inteiras do direito a propriedade e proporcionava a concentraccedilatildeo

de poder poliacutetico e econocircmico em matildeos de pequenos grupos no interior destas cidades

O local ganha uma importacircncia estrateacutegica no novo sistema teacutecnico-econocircmico pois

pode atuar em trecircs acircmbitos principais como na produtividade e competitividade econocircmica

na integraccedilatildeo soacutecio-cultural e na representaccedilatildeo e gestatildeo poliacutetica Para o governo local se

tornar eficiente precisa assumir o papel de promotor do desenvolvimento da cidade junto aos

79

consumidores da cidade de forma a criar condiccedilotildees propiacutecias agrave atuaccedilatildeo dos agentes puacuteblicos

ou privados (via planejamento campanhas poliacuteticas compensaccedilotildees econocircmicas)

Dessa maneira dois modelos diferentes um privilegiando a questatildeo social e o outro

o econocircmico teriam a cidade como objeto por meio de seus planos Entretanto por

circunstacircncias e interesses envolvidos natildeo seria raro que apenas parte do plano fosse

cumprida ou entatildeo que sua implementaccedilatildeo viesse a se realizar somente em parte da cidade

(MARICATO 2000) bem como que atos normativos relacionados ao uso e a ocupaccedilatildeo do

solo desconsiderassem diretrizes de planejamento apresentando elementos casuiacutesticos em

seus objetivos normalmente associados a grupos restritos como no caso do setor imobiliaacuterio

A gestatildeo urbana e os investimentos puacuteblicos tecircm aprofundado a concentraccedilatildeo de renda e a desigualdade A representaccedilatildeo da cidade em que parte toma lugar do todo tem uma funccedilatildeo natildeo apenas de encobrir privileacutegios mas tambeacutem de um papel econocircmico ligado agrave geraccedilatildeo e captaccedilatildeo da renda imobiliaacuteria [] O quadro macroeconocircmico determina a produccedilatildeo e a apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo

tanto pela definiccedilatildeo da capacidade de investimentos dos governos municipais quanto na ligaccedilatildeo da produccedilatildeo imobiliaacuteria agraves regras de rentabilidade do capital financeiro (MARICATO 2000 p 165-170)

Oliveira (2001) ressalta que com o enfraquecimento das poliacuteticas puacuteblicas e a

pressatildeo pelas novas exigecircncias da acumulaccedilatildeo do capital colocando agraves cidades novas

demandas surgiu o planejamento estrateacutegico de cidades com ecircnfase na accedilatildeo [local]

(planejamento

pauta em accedilatildeo) (OLIVEIRA 2001 p 179) Formulado a partir de

referecircncias ligadas agrave gestatildeo empresarial visando agrave adaptaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves

caracteriacutesticas de flexibilidade e dinamismo da economia globalizada este modelo tem sido

consolidado por meio dos planos estrateacutegicos apresentados como instrumentos da

administraccedilatildeo urbana

Natildeo eacute a primeira vez que para efeito de seu planejamento a cidade toma como protoacutetipo a empresa privada de fato todo o urbanismo modernista teve como modelo ideal a faacutebrica taylorista com sua racionalidade funcionalidade regularidade e produtos estandartizados [] Agora poreacutem os planejadores se espelham na empresa enquanto unidade de gestatildeo e negoacutecios [] a cidade eacute instaurada como agente econocircmico que atua no contexto de um mercado no qual encontra a regra e o modelo do planejamento e execuccedilatildeo de suas accedilotildees (VAINER 2000 p 85)

Elegendo a eficaacutecia como elemento legitimador das poliacuteticas puacuteblicas o

planejamento estrateacutegico de cidades visa associar tendecircncias de desenvolvimento econocircmico

80

ao curto prazo e aos conceitos de mercado Embora sua iniciativa esteja relacionada agrave

sociedade civil e aos setores privados o poder puacuteblico tem presenccedila marcante com um papel

significativo nas atuaccedilotildees puacuteblico-privadas projetadas sobre um suposto quadro de

cooperaccedilatildeo da sociedade o qual ao agrupar pares comuns tende a minimizar ou a contornar

divergecircncias (OLIVEIRA 2001 p 43)

Assim sendo a participaccedilatildeo da sociedade ou de parte dela eacute entatildeo apontada como

elemento fundamental para o sucesso do plano contando para isso com o despertar de um

sentimento citadino de pertencimento agrave cidade despolitizado e vinculado agrave valorizaccedilatildeo da

imagem local

A participaccedilatildeo dos agentes econocircmicos e sociais junto ao poder puacuteblico na

elaboraccedilatildeo e definiccedilatildeo de estrateacutegias e accedilotildees representa um diferencial entre a metodologia

catalatilde do Plano Estrateacutegico e a metodologia tradicional americana baseada na identificaccedilatildeo

de forccedilas fraquezas oportunidades e ameaccedilas assim como no processo de estabelecimento de

estrateacutegias frente a essas questotildees segundo objetivos definidos

Combinando crescimento econocircmico

como promotor da integraccedilatildeo social

e desenvolvimento urbano o plano parte de alguns pressupostos baacutesicos como a crenccedila [] no futuro da cidade como centro terciaacuterio qualificado o crescente protagonismo poliacutetico das administraccedilotildees locais a cooperaccedilatildeo puacuteblico-privada no financiamento de grandes intervenccedilotildees urbaniacutesticas e a necessidade de construir ou modificar a imagem da cidade para projetaacute-la no exterior atraveacutes do marketing que enfoque sobretudo um principal produto de venda como por exemplo turismo ou cultura (SILVA 2001 p 80)

O modelo estrateacutegico foi fundamentado na competiccedilatildeo entre cidades seja no contexto

regional nacional ou internacional Seus planos ganharam feitios pragmaacuteticos amarrando

recursos agraves accedilotildees aparentemente mais factiacuteveis (SILVA 2001 p 80) Abrangendo temas de

cunho econocircmico institucional social e fiacutesico-territorial suas propostas tecircm tido forte

ingerecircncia sobre a esfera administrativa projetando-se em parte sob o espaccedilo construiacutedo

Segundo Ribeiro (2003 p 18) a adoccedilatildeo do planejamento estrateacutegico no setor

puacuteblico eacute uma das expressotildees da incorporaccedilatildeo dos criteacuterios de mercado na gestatildeo

governamental Tendo como objetivo o crescimento econocircmico da cidade baseando-se na

atraccedilatildeo de investimentos o planejamento estrateacutegico natildeo tem como finalidade o ordenamento

do territoacuterio ou a implementaccedilatildeo de uma poliacutetica urbana uma vez que a dimensatildeo espacial eacute

apenas um de seus meios e natildeo o seu fim

O planejamento em deacutecadas passadas representava a racionalidade tecnocrata o que

tornava inadequado para sua gestatildeo A constataccedilatildeo do esgotamento e das possibilidades dos

81

instrumentos claacutessicos de gestatildeo urbana exigiu de forma paulatina agrave chamada do Estado para

assumir um papel fundamental na manutenccedilatildeo do equiliacutebrio social Sob este enfoque o

desenvolvimento urbano adquire e se traduz mais como um aspecto setorial do

desenvolvimento econocircmico sob a eacutegide do Estado

Maricato (2000 p 101) enfatiza a importacircncia do planejamento puacuteblico para a

conquista de um futuro melhor para as cidades brasileiras apoiada na crenccedila de que nada

pode substituir o papel do Estado na garantia da equalizaccedilatildeo de oportunidades A natureza e a

localizaccedilatildeo dos investimentos governamentais em primeiro plano e privados em segundo

regula quem e quantos teratildeo direito agrave cidade

Assim o planejamento urbano eacute um instrumento de governabilidade de governance

e da proacutepria gestatildeo do territoacuterio Ele se caracteriza como um processo constituiacutedo de um

conjunto de teacutecnicas de origens interdisciplinares aplicado agrave gestatildeo do planejamento urbano

enquanto atividade de avaliaccedilatildeo propostas e controle territoacuterio das cidades

Governanccedila eacute a capacidade governativa em sentido amplo envolvendo a capacidade de accedilatildeo estatal na implementaccedilatildeo das poliacuteticas e na consecuccedilatildeo das metas coletivas [] Governabilidade entretanto refere-se as condiccedilotildees sistecircmicas mais gerais sob as quais se daacute o exerciacutecio do poder em uma dada sociedade tais como as caracteriacutesticas do regime poliacutetico a forma de governo as relaccedilotildees entre os poderes (DINIZ 1996 p 196)

A participaccedilatildeo popular no planejamento e na gestatildeo (no processo orccedilamentaacuterio na

elaboraccedilatildeo de planos e poliacuteticas puacuteblicas etc) pode ser vista como algo crucialmente

relevante a introduccedilatildeo consistente de elementos de democracia direta aleacutem de serem

importantes em si mesmos certamente contribuiraacute para maior transparecircncia e eventualmente

para menor corrupccedilatildeo menos clientelismo menos desperdiacutecio e reduccedilatildeo dos niacuteveis de

desigualdade soacutecioespacial

Bandeira (1999) ressalta que a participaccedilatildeo pode ser compreendida como um

instrumento importante para promover a articulaccedilatildeo entre os agentes sociais fortalecendo a

coesatildeo da sociedade e para melhorar a qualidade das decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar

os objetivos de interesse comum No entanto as praacuteticas natildeo podem ser encaradas como

procedimentos infaliacuteveis capazes de sempre proporcionar soluccedilotildees adequadas para problemas

de todos os tipos

82

Para Carvalho (2000) participar da gestatildeo democraacutetica da cidade12 significa

participar do governo da sociedade disputar espaccedilo no Estado nos processos de definiccedilatildeo

das poliacuteticas puacuteblicas significa questionar o monopoacutelio do Estado como gestor da coisa

puacuteblica significa construir espaccedilos puacuteblicos natildeo estatais afirmando a importacircncia do controle

social sobre o Estado da gestatildeo participativa da co-gestatildeo dos espaccedilos de interface entre

Estado e sociedade civil

Desse modo Gohn (2000) afirma que os movimentos sociais estatildeo operando na

construccedilatildeo de uma sociedade igualitaacuteria e contra as injusticcedilas sociais tais como as

experiecircncias de planejamento do orccedilamento participativo as parcerias entre organizaccedilotildees

populares ONGs e oacutergatildeos puacuteblicos em programas na aacuterea do chamado Terceiro Setor -

puacuteblico natildeo estatal

A autora considera que a participaccedilatildeo dos movimentos sociais nos espaccedilos

interinstitucionais eacute fundamental porque na correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas existentes eles

expressam interesses de maiorias organizadas que lutam pela democratizaccedilatildeo do acesso aos

bens e serviccedilos puacuteblicos e natildeo pela apropriaccedilatildeo privada de privileacutegios lucros

Nas uacuteltimas deacutecadas vem-se firmando um novo paradigma que destaca a maior

participaccedilatildeo popular13 nos processos decisoacuterios como um novo padratildeo de governabilidade

atraveacutes da expansatildeo da esfera puacuteblica com a formaccedilatildeo de parcerias entre as esferas estatais

privadas e societaacuterias

Na Ameacuterica Latina a luta pela conquista de espaccedilos para aumentar a participaccedilatildeo

popular eacute sem duacutevida um dos aspectos mais desafiadores para a anaacutelise sobre os alcances da

democracia nas relaccedilotildees entre o Estado e os Movimentos Sociais

A anaacutelise dos processos existentes estaacute permeada pelos condicionantes da cultura

poliacutetica tanto do Brasil como dos demais paiacuteses da Ameacuterica Latina marcados por tradiccedilotildees

estadistas centralizadoras patrimonialistas e portanto por padrotildees de relaccedilatildeo clientelistas

meritocraacuteticos e de interesses criados entre Sociedade Civil e Estado Entretanto estes

condicionantes natildeo tecircm sido necessariamente um fator impeditivo para a emergecircncia de uma

12 O conceito de gestatildeo democraacutetica que norteia esse estudo estaacute pautado na compreensatildeo de que a sociedade civil se reconhece como principal agente poliacutetico em um processo contiacutenuo de participaccedilatildeo e decisatildeo sobre os assuntos de interesse puacuteblico Assim a gestatildeo democraacutetica compreende tambeacutem uma gestatildeo participativa sem paternalismo no intuito de deselitizar as poliacuteticas puacuteblicas facilitando o acesso aos bens e serviccedilos destinados normalmente a uma elite uma minoria 13 Neste trabalho a participaccedilatildeo popular eacute entendida como a capacidade de apropriaccedilatildeo pelos cidadatildeos do direito de construccedilatildeo democraacutetica possibilitando desde a abertura de espaccedilos de discussatildeo dentro e fora dos limites da comunidade ateacute a definiccedilatildeo de prioridades elaboraccedilatildeo de estrateacutegias de accedilatildeo e estabelecimento de canais de diaacutelogo com o poder puacuteblico no intuito de garantir a participaccedilatildeo efetiva da sociedade civil na gestatildeo democraacutetica da cidade

83

diversidade de formas de participaccedilatildeo dos setores populares em que com frequumlecircncia muitas

se situam no escopo das praacuteticas no contexto das tradiccedilotildees anteriormente descritas enquanto

outras as contradizem abertamente (JACOBI 1999)

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Outro avanccedilo importante foi a regularizaccedilatildeo do Plano Diretor como um instrumento

baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de planejamento para viabilizar a Reforma Urbana

para as cidades com mais de vinte mil habitantes Entretanto a regulamentaccedilatildeo dos

mecanismos para a ordenaccedilatildeo das cidades natildeo mereceu destaque no texto constitucional

ficando para ser regularizado pelas leis orgacircnicas dos municiacutepios e pelo proacuteprio Plano Diretor

de cada local (DE GRAZIA 1990)

Nessa perspectiva emergiram modelos de planejamento e gestatildeo orientados pelo

ideaacuterio da reforma urbana enquanto reforma institucional e social que se tornou referecircncia ao

alcance da cidadania

Santos Junior (1995) ressalta que o planejamento e a gestatildeo da cidade baseados na

concepccedilatildeo de reforma urbana pressupotildee o exerciacutecio da cidadania apreendidas em dois

significados como direito de acesso aos bens que garantam condiccedilotildees de vida urbana digna

culturalmente dinacircmica e condizente com os valores eacuteticos humanitaacuterios mas tambeacutem como

direito dos cidadatildeos agrave informaccedilatildeo e agrave participaccedilatildeo poliacutetica na conduccedilatildeo dos destinos da

cidade

A mudanccedila nas relaccedilotildees sociais que se instaurou naquela fase teve como um dos

principais fundamentos a reflexatildeo sobre a funccedilatildeo social dentro da perspectiva do processo de

gestatildeo nos projetos de habitaccedilatildeo A redefiniccedilatildeo do papel do Estado que se dispotildee a pactuar

com os diversos agentes sociais contrariando os modelos de planejamento e gestatildeo

tecnocraacuteticos tambeacutem revela uma mudanccedila nas concepccedilotildees de cidade e de urbano

De fato em diversos municiacutepios a intervenccedilatildeo do Estado junto aos movimentos

populares se dirigiu no sentido de criar novas formas de relaccedilatildeo entre o Estado e Sociedade

Civil ao niacutevel da gestatildeo urbana compreendendo as poliacuteticas puacuteblicas como elementos de

construccedilatildeo e instrumentalizaccedilatildeo da cidadania na accedilatildeo concreta dos agentes sociais envolvidos

(JACOBI 1990)

A participaccedilatildeo popular se transforma no referencial de ampliaccedilatildeo das possibilidades

de acesso dos setores populares dentro de uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade

84

civil e de fortalecimento dos mecanismos democraacuteticos mas tambeacutem de garantia da execuccedilatildeo

eficiente de programas de compensaccedilatildeo social no contexto das poliacuteticas de ajuste estrutural e

de liberalizaccedilatildeo da economia e de privatizaccedilatildeo do patrimocircnio do Estado Entretanto o que se

observa eacute que no geral as propostas participativas ainda permanecem mais no plano da

retoacuterica do que na praacutetica

As transformaccedilotildees nas praacuteticas de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas tornam

legiacutetima a participaccedilatildeo popular estando direta ou indiretamente associadas agrave necessidade de

imprimir tambeacutem maior eficiecircncia agrave accedilatildeo governamental

A participaccedilatildeo popular se enquadra no processo de redefiniccedilatildeo entre o puacuteblico e o

privado dentro da perspectiva de redistribuir o poder em favor dos sujeitos sociais que

geralmente natildeo tecircm acesso

De um lado a participaccedilatildeo eacute identificada com os argumentos da democratizaccedilatildeo que

tecircm como referecircncia o fortalecimento dos espaccedilos de socializaccedilatildeo de descentralizaccedilatildeo do

poder e de crescente autonomizaccedilatildeo das decisotildees portanto enfatizando a importacircncia de um

papel mais autocircnomo dos sujeitos sociais O outro enfoque aborda a participaccedilatildeo a partir da

criaccedilatildeo de espaccedilos e formas de articulaccedilatildeo do Estado com os sujeitos sociais configurando

um instrumento de socializaccedilatildeo da poliacutetica reforccedilando o seu papel como meio para realizar

interesses e direitos sociais que demandam uma atuaccedilatildeo puacuteblica (JACOBI 1999)

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

A participaccedilatildeo popular na gestatildeo urbana pressupotildee instrumentos e mecanismos de

controle social podendo ser assegurada agrave participaccedilatildeo de setores e membros representativos

das camadas populares e de seus interesses em todas as instacircncias do poder puacuteblico por meio

de conselhos paritaacuterios reguladores fiscalizadores e deliberativos

Os Conselhos como forma apartidaacuteria de exercer poliacutetica podem ser considerados

como um novo sistema de organizaccedilatildeo social para o exerciacutecio poliacutetico tornando-se mais

um espaccedilo de discussatildeo dos problemas cotidianos de uma comunidade podendo constituir-se

como um avanccedilo para o exerciacutecio da democracia na medida em que essa nova forma de

exercer poliacutetica ameniza a centralizaccedilatildeo do poder poliacutetico nos partidos

85

Nesse sentido Souza (2002 p 333-335) destaca trecircs argumentos relevantes sobre a

importacircncia da participaccedilatildeo na gestatildeo democraacutetica da cidade

1- Uma ampla participaccedilatildeo pode contribuir para minimizar certas fontes de distorccedilatildeo quando os especialistas decidem em nome da maioria natildeo se tem chances de monitorar ou controlar o processo de gestatildeo o que pode acarretar numa probabilidade maior de corrupccedilatildeo ou de erros de avaliaccedilatildeo 2- Ao participar de uma decisatildeo o cidadatildeo se sente muito mais responsaacutevel pelo seu resultado o que eacute importante para o amadurecimento poliacutetico 3- A participaccedilatildeo eacute um direito inalienaacutevel participar no sentido essencial de exercer a autonomia eacute a alma mesma de um planejamento e de uma gestatildeo que vislumbra se uma cidade democraacutetica rompendo com o sistema de dominaccedilatildeo

No bojo dessas discussotildees satildeo poucas as experiecircncias de gestatildeo democraacutetica da

cidade que de fato ampliam o potencial participativo Aqui destacam-se duas experiecircncias

que demonstram os processos de gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas implementadas no Brasil a

primeira experiecircncia (Curitiba) eacute pautada na gestatildeo teacutecnico-pragmaacutetica de matriz neoliberal

e a outra (Porto Alegre) eacute baseada na gestatildeo democraacutetica-participativa

Na cidade de Curitiba o modelo de planejamento e gestatildeo da cidade adotado visou

promover uma modernizaccedilatildeo e o enxugamento do Estado atraveacutes do pragmatismo e

eficiecircncia teacutecnica onde a participaccedilatildeo popular se refere a legitimaccedilatildeo dos projetos jaacute

elaborados pois na visatildeo dos representantes do governo uma participaccedilatildeo mais ampla soacute

levaria a discussotildees interminaacuteveis o que impossibilitaria uma accedilatildeo raacutepida e eficiente do poder

puacuteblico (FREY 1996)

Frey (1996) ressalta que o sistema poliacutetico-institucional vigente em Curitiba era de

uma democracia exclusivamente representativa onde o poder de decisatildeo ficava restrito agrave

deliberaccedilatildeo de um corpo tecnocraacutetico Outro ponto de destaque era uma forte hierarquizaccedilatildeo

administrativa uma tendecircncia ao

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86

Nesse sentido Vainer (2000) destaca que o modelo de planejamento estrateacutegico de

cidades baseado nos conceitos e teacutecnicas do planejamento empresarial estrutura-se

basicamente sobre a articulaccedilatildeo de trecircs analogias constitutivas a) a cidade mercadoria b) a

cidade empresa e c) a cidade paacutetria Assim ver a cidade como empresa significa

essencialmente concebecirc-la e instauraacute-la como agente econocircmico que atua no contexto de um

mercado e que encontra neste mercado a regra e o modelo de planejamento e execuccedilatildeo de

suas accedilotildees (VAINER 2000 p 48)

Dentro desse contexto as cidades satildeo tidas como espaccedilos rivais que aguccedilam uma

competitividade de mercado de investimentos industriais de investimentos comerciais e de

serviccedilos o que possibilita um controle da iniciativa privada em relaccedilatildeo agrave produccedilatildeo dos

espaccedilos puacuteblicos (SANCHEZ 1997)

Em contraposiccedilatildeo a esse modelo surge a gestatildeo democraacutetico-participativa ou gestatildeo

poliacutetico-ideoloacutegica como argumenta Frey (1996) cujo objetivo eacute fomentar a participaccedilatildeo

popular e promover uma reestruturaccedilatildeo nos mecanismos decisoacuterios atraveacutes de uma proposta

de inversatildeo de prioridades de igualdade de oportunidades na proposiccedilatildeo e decisatildeo entre os

agentes sociais de transparecircncia na socializaccedilatildeo das informaccedilotildees bem como de rompimento

com estruturas autoritaacuterias e tecnoburocrata na relaccedilatildeo do governo com a sociedade civil

Em Porto Alegre as experiecircncias reforccedilam uma concepccedilatildeo de democracia que

articula representaccedilatildeo poliacutetica e participaccedilatildeo direta como resposta possiacutevel agrave privatizaccedilatildeo

prevalecente na gestatildeo da coisa puacuteblica O discurso predominante acentua a importacircncia da

convergecircncia de praacuteticas da socializaccedilatildeo da poliacutetica do caraacuteter oscilante da participaccedilatildeo da

importacircncia da institucionalidade da convivecircncia com o sistema representativo existente e da

necessidade de governar para toda a cidade

A anaacutelise do caso de Porto Alegre mostra que o desafio para se garantir a eficaacutecia e

continuidade de poliacuteticas puacuteblicas eacute o reforccedilo dos meios para envolver a sociedade e manter o

seu interesse para dimensionar adequadamente os arranjos institucionais A sua

descontinuidade reforccedila o argumento de que gestatildeo democraacutetica e participaccedilatildeo popular

requerem uma forma combinada de fortalecimento das formas de organizaccedilatildeo da sociedade

civil uma mudanccedila na correlaccedilatildeo de forccedilas uma transformaccedilatildeo qualitativa dos padrotildees de

gestatildeo enfim um processo real de democratizaccedilatildeo do Estado e da sua gestatildeo (JACOBI 1996)

Jacobi (1996) defende que a efetiva participaccedilatildeo da sociedade civil nos processos

decisoacuterios como eacute o caso do Orccedilamento Participativo vem se constituindo como um

mecanismo ampliado de engajamento da sociedade na gestatildeo das poliacuteticas puacuteblicas

requerendo um esforccedilo crescente de institucionalizaccedilatildeo da possibilidade de atendimento das

87

demandas em bases negociadas Trata-se de processar demandas e pressotildees e de implementar

mecanismos formais que contemplem tanto os setores organizados e mobilizados

estimulando sua adequaccedilatildeo agrave institucionalidade a partir do respeito agrave autonomia e agrave auto-

organizaccedilatildeo como de envolvimento dos setores desorganizados

A experiecircncia do Orccedilamento Participativo em Porto Alegre estaacute diretamente

vinculada a capacidade que a administraccedilatildeo local teve de criar canais legiacutetimos de

participaccedilatildeo combinando elementos da democracia representativa e de democracia

participativa

Nesse contexto a participaccedilatildeo popular adquire uma praacutetica de ruptura com o

corporativismo territorialmente determinado com ecircnfase numa loacutegica direcionada por uma

abordagem universal da cidade criando para os setores populares uma opccedilatildeo viaacutevel e

altamente competitiva de participaccedilatildeo poliacutetica alternativa agraves praacuteticas clientelistas (JACOBI

1996)

Isto estaacute sendo estabelecido dentro de uma loacutegica que natildeo estaacute apenas permeada pelo

imediatismo e o utilitarismo mas por uma radicalizaccedilatildeo da democracia que alargando os

direitos de cidadania no plano poliacutetico e social constroacutei efetivamente novas relaccedilotildees entre

governantes e governados Este processo de gestatildeo atraveacutes do ingresso da cidadania

organizada na maacutequina do Estado possibilita conhecer seu funcionamento e seus limites e

estimula a construccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de co-responsabilizaccedilatildeo e de disputa visando produzir

consensos cada vez mais qualificados

Mas apesar da sua repercussatildeo positiva esses processos participativos apresentam

limitaccedilotildees e estas residem nas contradiccedilotildees associadas agraves dificuldades de ampliar a

participaccedilatildeo e agrave dependecircncia em relaccedilatildeo agraves autoridades municipais para estruturar a dinacircmica

de funcionamento

Nesse sentido Souza (2002 p 387-388) observa que existem trecircs obstaacuteculos

vinculados agrave participaccedilatildeo popular

1- problemaacutetica da implementaccedilatildeo refere-se agraves diversas dificuldades que uma administraccedilatildeo progressista tem de enfrentar para implementar suas poliacuteticas tais como boicotes patronais escassez de recursos incompetecircncia gerencial e outras 2- problemaacutetica da cooptaccedilatildeo diz respeito agrave deformaccedilatildeo do esquema participativo atraveacutes da instrumentalizaccedilatildeo da sociedade civil por parte das forccedilas poliacuteticas do Estado 3- problemaacutetica da desigualdade tem a ver com as dificuldades para a participaccedilatildeo voluntaacuteria pois em geral natildeo se dispotildee de muitos recursos para participar como dinheiro para se locomover

88

A realidade brasileira eacute marcada por baixa institucionalizaccedilatildeo na qual a maioria da

sociedade pouco se mobiliza para utilizar os instrumentos da democracia participativa que

visam romper com o autoritarismo social que prevalece Os setores organizados que

interagem e pressionam representam iniciativas fragmentaacuterias que natildeo atingem o cerne de

uma sociedade refrataacuteria a praacuteticas coletiva

O desafio existente eacute o de superar as barreiras soacutecio-institucionais e fortalecer as

poliacuteticas puacuteblicas pautadas pela inclusatildeo da noccedilatildeo de interesse geral Esta se concretiza na

medida em que o tema da cidadania eacute assumido como um ponto central para a

institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo dos cidadatildeos em processos decisoacuterios de interesse puacuteblico

(JACOBI 1990)

A reconstituiccedilatildeo do processo de participaccedilatildeo dos movimentos sociais organizados no

niacutevel do executivo e legislativo municipais permite em primeiro lugar ampliar os dados para

uma anaacutelise mais aprofundada sobre o processo de reconhecimento na construccedilatildeo de novos

sujeitos coletivos e na ampliaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Estes elementos possibilitam a

construccedilatildeo de uma institucionalidade ampliada cujos reflexos poderiam nos levar a superar o

ciclo de fluxos e refluxos normalmente presentes nas lutas pela superaccedilatildeo de carecircncias

imediatas

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Eacute preciso construir formas de participaccedilatildeo cidadatilde em que o ambiente signifique o

conjunto de diferentes elementos da produccedilatildeo e do consumo com formas alternativas de

participaccedilatildeo da sociedade civil na construccedilatildeo de uma sociedadecidade sustentaacutevel

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

A cidade como cenaacuterio onde se desenvolve a acumulaccedilatildeo de capital que deteacutem os

meios de produccedilatildeo e que abriga a forccedila de trabalho constitui-se como espaccedilo de lutas de

classes no qual o direito agrave cidade se coloca como um dos agentes motores dessa luta

A nova forma de relaccedilatildeo entre Estado e Movimentos Sociais no Brasil poacutes-1964

levanta um conjunto de questotildees vinculadas agrave formulaccedilatildeo intencional de poliacuteticas agrave questatildeo

89

da crise de governabilidade ao processo de tomada de decisotildees agrave dinacircmica dos movimentos

sociais suas articulaccedilotildees e accedilotildees bem como seu papel na transformaccedilatildeo da sociedade

A reflexatildeo sobre essa temaacutetica nos remete a um desafio de compreender as

ambiguumlidades conflitos e especificidades da relaccedilatildeo entre Estado e classes populares a partir

das contradiccedilotildees do capitalismo monopolista avanccedilado que desloca o centro do conflito de

classes do ambiente das relaccedilotildees industriais para o cenaacuterio do espaccedilo urbano e social

O espaccedilo urbano capitalista

fragmentado e articulado reflexo condicionante social cheio de siacutembolos e campo de lutas

eacute um produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem espaccedilo Satildeo agentes sociais concretos e natildeo um mercado invisiacutevel ou processos aleatoacuterios atuando sobre um espaccedilo abstrato A accedilatildeo desses agentes eacute complexa derivado da dinacircmica de acumulaccedilatildeo de capital das necessidades mutaacuteveis de reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e dos conflitos de classe que dela emergem (CORREcircA 1993 p 11)

Desse modo o urbano pode ser compreendido como produto social historicamente

determinado refletindo o modo de produccedilatildeo vigente A distinccedilatildeo possiacutevel de ser feita entre a

cidade e o urbano resume-se em que a primeira refere-se ao particular ao concreto ao

interno e o segundo corresponde ao geral ao abstrato ao externo ou seja agraves teacutecnicas aos

valores sociais e interesses econocircmicos agrave organizaccedilatildeo e ao controle social da vida coletiva

(SANTOS 1991 p 69)

Para Bourdieu (1996) todas as sociedades se apresentam como espaccedilos sociais

que satildeo entendidos como estruturas de diferenccedilas que natildeo se pode compreender sem se

construir o princiacutepio gerador que funda essas diferenccedilas na objetividade Ele considera que o

princiacutepio gerador eacute o da estrutura de distribuiccedilatildeo das formas de poder ou dos tipos de

capital eficiente no universo social considerado

Segundo ele as formas de poder e os tipos de capital podem variar dependendo dos

lugares e dos momentos Portanto os agentes individuais ou coletivos podem ocupar

posiccedilotildees diferentes no espaccedilo social ao longo do tempo e em funccedilatildeo de suas capacidades de

mobilizaccedilatildeo de recursos simboacutelico eou materiais

Nesse sentido o espaccedilo social pode ser representado como um campo Esta noccedilatildeo

eacute a forma como Bourdieu concebe as instituiccedilotildees de maneira relacional e natildeo como

substacircncia ou seja como configuraccedilotildees de relaccedilotildees entre agentes individuais e coletivos

Assim ratificando o conceito de campo apresentado anteriormente cita-se Bourdieu (1996 p

50)

90

Ao mesmo tempo como campo de forccedilas cuja necessidade se impotildee aos agentes que nele se encontram envolvidos e como campo de lutas no interior do qual os agentes se enfrentam com meios e fins diferenciados conforme sua posiccedilatildeo na estrutura do campo de forccedilas contribuindo assim para a conservaccedilatildeo ou a transformaccedilatildeo de sua estrutura

Campo de forccedilas pode ser entendido como a existecircncia de relaccedilotildees entre dominantes

e dominados marcadas por uma distribuiccedilatildeo desigual dos recursos E campo de luta no

sentido da existecircncia de um confronto entre os agentes sociais para conservar ou transformar

as relaccedilotildees de forccedila (BOURDIEU 1996) O espaccedilo social num determinado momento

histoacuterico eacute portanto composto por diferentes campos que ocupam posiccedilotildees diferenciadas em

seu interior

Nesse sentido o Estado capitalista aleacutem de expressar os interesses das classes

hegemocircnicas eacute um condensador de forccedilas sociais expressando portanto as contradiccedilotildees

das classes que determinam a emergecircncia dos conflitoslutas urbanas e dos Movimentos

Sociais Urbanos (MSU s) como espaccedilo alternativo de expressatildeo popular tendo em vista a

repressatildeo das accedilotildees sindicais e partidaacuterias

Segundo Jacobi (1989) a concepccedilatildeo pautada na polarizaccedilatildeo da relaccedilatildeo

EstadoMovimentos Sociais Urbanos tende a negar um dado cada vez mais presente na

dinacircmica das sociedades capitalistas ou seja o de que o Estado se bem age para assegurar a

reproduccedilatildeo do capital tambeacutem se concretiza em domiacutenios de accedilatildeo funcionalmente vinculados

agrave reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho esfera vinculada agrave accedilatildeo dos movimentos sociais

O Estado assume o papel de articulador e organizador da sociedade independentemente de sua condiccedilatildeo de suporte de certas relaccedilotildees de dominaccedilatildeo adotando o papel de fiador de relaccedilotildees sociais Trata-se de um Estado que tem de exercer funccedilotildees contraditoacuterias de acumulaccedilatildeo e de legitimaccedilatildeo para criar as bases de um consenso atraveacutes da accedilatildeo das suas instituiccedilotildees (JACOBI 1989 p 4)

A accedilatildeo do Estado eacute contraditoacuteria pois se por um lado eacute incontestaacutevel que defenda os

interesses do setor dominante por outro sua atuaccedilatildeo pode e eacute muitas vezes direcionada para

atender agraves demandas populares pois aleacutem de sua funccedilatildeo de acumulaccedilatildeo exerce tambeacutem a

funccedilatildeo de legitimaccedilatildeo Para tal atende aos interesses em curto prazo das classes dominadas

contrariando os interesses econocircmicos das dominantes garantindo no entanto que a estrutura

de poder seja mantida (ABELEacuteM 1988)

91

As contradiccedilotildees entre classes sociais satildeo fundamentais para a compreensatildeo da accedilatildeo

estatal no urbano atraveacutes da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas pois expressam a correlaccedilatildeo

de forccedilas entre os diversos segmentos sociais e os seus diferentes interesses

Complementando esse raciociacutenio Castells (1983) situa a emergecircncia dos

Movimentos Sociais Urbanos14 (MSU s) a partir das contradiccedilotildees urbanas geradas pelo

desenvolvimento do capitalismo frente agraves novas e crescentes necessidades postas agrave

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Estes movimentos satildeo compreendidos como um sistema de

praacuteticas sociais contraditoacuterias que colocam em questatildeo a ordem estabelecida a partir de

contradiccedilotildees especiacuteficas da problemaacutetica urbana Esta problemaacutetica urbana concorre para a

criaccedilatildeo de um processo de politizaccedilatildeo do cotidiano tendo em vista a accedilatildeo contraditoacuteria do

Estado

Touraine (1994 p 46) exprime sua visatildeo sobre o surgimento dos atores sociais e de

seu papel no contexto da sociedade complexa os atores natildeo satildeo mais definidos pela situaccedilatildeo

social (na oacutetica da luta de classes) pelo papel desempenhado numa estrutura econocircmica ou

mais global como as castas

As accedilotildees coletivas mais visiacuteveis formam-se em primeiro lugar em oposiccedilatildeo agraves forccedilas econocircmicas e poliacuteticas que procuram impor a ideologia da globalizaccedilatildeo isto eacute o desaparecimento dos atores sociais e das culturas nos fluxos de produccedilatildeo do consumo e da comunicaccedilatildeo de massa que se estende ateacute os limites do mundo (TOURAINE 1994 p 135)

Moiseacutes (1990) assinala que as formas de participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores

populares urbanos desenvolvidas durante o processo de metropolizaccedilatildeo das cidades

brasileiras especialmente em Satildeo Paulo na deacutecada de 1950 demonstraram que

Essas classes natildeo satildeo apenas objeto da vontade dos grupos dominantes (e do Estado) mas tambeacutem atores dotados de percepccedilatildeo proacutepria de sua situaccedilatildeo e de seus interesses Frequumlentemente essa percepccedilatildeo foi uacutetil para projetar formas organizadas de accedilatildeo coletiva que se expressavam atraveacutes de movimentos sociais cuja eficaacutecia tem relaccedilatildeo com os resultados praacuteticos imediatos (atendimento das reivindicaccedilotildees urbanas) mas tambeacutem com o desenvolvimento de uma nova forccedila social e poliacutetica na vida da cidade (MOISEacuteS 1990 p 14)

Deste mesmo ponto de vista Ribeiro (2003) argumenta que os aspectos relacionados

ao processo endoacutegeno do surgimento da questatildeo urbana no Brasil estavam na reorganizaccedilatildeo

14 Neste trabalho o termo MSU se refere agraves organizaccedilotildees populares imprimidas no chamado movimento popular urbano

92

da ordem soacutecioespacial Esta foi uma necessidade da acumulaccedilatildeo do capital jaacute que se poderia

reorganizar o modo de vida dos trabalhadores para impor o assalariamento e reorganizar o

territoacuterio para que surgisse uma economia de aglomeraccedilatildeo criando assim condiccedilotildees

favoraacuteveis agrave expansatildeo do modo de vida capitalista

Os movimentos populares no final da deacutecada de 1970 tornaram-se imprescindiacuteveis

para a transformaccedilatildeo da arena poliacutetica brasileira principalmente pela organizaccedilatildeo de

associaccedilotildees tais como a de moradores de bairro como forma de reivindicarem uma melhoria

da qualidade de vida dentro de um quadro de profundas desigualdades sociais e degradaccedilatildeo

ambiental e das condiccedilotildees de vida

A luta pela participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas

urbanas no Brasil ganhou forccedilas com a elaboraccedilatildeo da Nova Constituiccedilatildeo Federal iniciada em

1986 na qual vaacuterios movimentos sociais partidos poliacuteticos sindicatos igrejas e outros

articularam-se no intuito de defender a Emenda Popular15 da Reforma Urbana

As discussotildees elaboraccedilatildeo e defesa da Emenda Popular da Reforma Urbana natildeo se

constituiacuteram em tarefa faacutecil devido agrave complexidade dos formatos organizativos envolvidos e

suas diferentes dinacircmicas trajetoacuterias e perspectivas (RIBEIRO 1994)

A Constituiccedilatildeo Federal (CF) de 1988 procurou institucionalizar a participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas por meio de conselhos

comunitaacuterios nas aacutereas de educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social planejamento urbano dentre

outras Isto se caracterizou como um acontecimento marcante para os movimentos sociais

pois serviu como instrumento para avaliar o grau de coesatildeo abrangecircncia e articulaccedilatildeo destes

movimentos jaacute que se constituiu num momento iacutempar de formulaccedilatildeo de novas leis para o

Paiacutes (RIBEIRO 1991)

Em seus artigos 182 e 183 a CF estabeleceu as diretrizes para uma nova poliacutetica

urbana e exigiu uma legislaccedilatildeo nova que fixasse os direitos e deveres do cidadatildeo nas cidades

brasileiras Esse direito foi consolidado e ampliado no Estatuto da Cidade Lei nordm

102572001 que se refere agrave gestatildeo democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo popular

assume papel relevante

Entre as 16 diretrizes constantes dos vaacuterios artigos do Estatuto merece especial

destaque as duas primeiras a garantia do direito agrave cidade sustentaacuteveis e o direito agrave terra

urbana a moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos

15 Esta Emenda Popular contou com cerca de 200000 assinaturas e contribuiu para a incorporaccedilatildeo do capiacutetulo da poliacutetica urbana no interior da Constituiccedilatildeo

93

serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e as futuras geraccedilotildees (OLIVEIRA

2001 p 02)

A participaccedilatildeo da populaccedilatildeo eacute prevista em todas as dimensotildees da poliacutetica urbana ou

seja desde a formulaccedilatildeo do Plano Diretor na fase de sua negociaccedilatildeo e aprovaccedilatildeo na Cacircmara

ateacute sua implementaccedilatildeo e posteriores revisotildees16 Outro meio democraacutetico de participaccedilatildeo na

gestatildeo da cidade se daacute a partir da constituiccedilatildeo de oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias consultas puacuteblicas conferecircncias planos e projetos de lei de iniciativa

popular referendos e plebiscitos

O direito agrave moradia tambeacutem eacute reconhecido nos incisos XIV e XV que fixa como

diretriz urbana a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas por camadas

populares mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do

solo e das normas ediliacutecias com vistas a permitir a reduccedilatildeo dos custos e o aumento da oferta

dos lotes e unidades habitacionais (OLIVEIRA 2001 p 07) Em diversas passagens da

Constituiccedilatildeo nota-se a perspectiva da questatildeo da moradia como objeto das poliacuteticas puacuteblicas

(art 21) uma vez que esse direito eacute fundamental agrave ordem social e econocircmica da solidariedade

e da redistribuiccedilatildeo17

De acordo com De Grazia (2003) colocada em novas bases a luta pela Reforma

Urbana assim como a luta pela moradia digna objetivava a garantia do direito agrave cidade por

meio de mudanccedilas significativas na qualidade de vida com a implementaccedilatildeo de poliacuteticas

puacuteblicas voltadas para o conjunto das camadas populares Para isso elaborou trecircs princiacutepios

baacutesicos para referenciar sua praacutetica

1- Direito agrave Cidade e agrave Cidadania entendido como uma nova loacutegica que universalize o acesso aos equipamentos e serviccedilos urbanos a condiccedilotildees de vida urbana digna e ao usufruto de um espaccedilo culturalmente rico e diversificado e sobretudo em uma dimensatildeo poliacutetica de participaccedilatildeo ampla dos habitantes das cidades na conduccedilatildeo de seus destinos 2- Gestatildeo Democraacutetica da Cidade entendida como forma de planejar produzir operar e governar as cidades submetidas ao controle e participaccedilatildeo social destacando-se como prioritaacuteria a participaccedilatildeo popular 3- Funccedilatildeo Social da Cidade e da Propriedade entendida como a prevalecircncia do interesse comum sobre o direito individual de propriedade o que implica no uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado do espaccedilo urbano (DE GRAZIA 2003 p 54)

16 O Plano Diretor foi considerado como um instrumento baacutesico a ser elaborado pelos governos municipais como condiccedilatildeo para a adoccedilatildeo de instrumentos supostamente capazes de contribuir para promover a funccedilatildeo social da terra urbana e da cidade princiacutepio baacutesico do texto constitucional sobre a poliacutetica urbana 17 Com a aprovaccedilatildeo da emenda constitucional em 2000 o direito agrave moradia ficou expressamente reconhecido entre os direitos sociais no artigo 6ordm ratificando que soacute podem existir direitos e liberdades fundamentais com a garantia a dimensatildeo social da moradia sauacutede educaccedilatildeo trabalho entre outros

94

Esses novos princiacutepios diferente dos propostos em 1960 estatildeo baseados numa

leitura das cidades cujo padratildeo de produccedilatildeo ocupaccedilatildeo e gestatildeo satildeo marcados pela

mercantilizaccedilatildeo do solo da moradia do transporte de massa e dos demais equipamentos e

serviccedilos urbanos

O Estado por sua vez tem tradicionalmente apoiado esses interesses por meio de

poliacuteticas controles e mecanismos reguladores e discriminatoacuterios um modo de ver e fazer a

cidade no qual distribui os homens desigualmente no espaccedilo e que subordina os direitos

poliacuteticos os direitos individuais a cidadania aos modelos de uma racionalidade econocircmica A

distribuiccedilatildeo dos equipamentos e serviccedilos eacute geralmente realizada conforme o lugar onde

melhor satildeo atendidos os criteacuterios de rentabilidade e de retorno do capital investido Esse

modelo excludente deu origem agrave imensa segregaccedilatildeo existente nas cidades em todo o Paiacutes

(DE GRAZIA 2003)

Os princiacutepios da Reforma Urbana ao contraacuterio queriam enfatizar as seguintes

concepccedilotildees

- As cidades satildeo produzidas pelo confronto pela luta e pela apropriaccedilatildeo entre diversos agentes econocircmicos e sociais - As poliacuteticas e instrumentos juriacutedicos ou urbaniacutesticos devem levar em conta a cidade real reconhecendo a desigualdade e o conflito existente entre os produtores e consumidores do espaccedilo urbano - O Estado eacute obrigado a assegurar os direitos urbanos - A necessidade de uma regulaccedilatildeo puacuteblica da produccedilatildeo privada formal e informal do meio ambiente construiacutedo eacute necessaacuterio um controle social do uso do solo - Submissatildeo do direito da propriedade agrave sua funccedilatildeo social - Introduz a noccedilatildeo da necessidade do acesso igualitaacuterio aos bens e serviccedilos urbanos e ao direito agrave cidade atraveacutes de instrumentos e mecanismos redistributivos - O controle social e a participaccedilatildeo da sociedade civil organizada satildeo condiccedilotildees baacutesicas para a conquista dos direitos de novas poliacuteticas puacuteblicas que incorporem os excluiacutedos e de novas referecircncias para as cidades Atraveacutes do exerciacutecio do controle do Poder Puacuteblico as organizaccedilotildees participam da gestatildeo das cidades daiacute o nome de Gestatildeo Democraacutetica da Cidade - Reconhecer a cidade na sua totalidade e repensar o planejamento a partir da negociaccedilatildeo dos agentes que produzem e se apropriam do espaccedilo urbano - Assumir a estrateacutegia da construccedilatildeo de uma nova eacutetica urbana contraacuteria agrave concepccedilatildeo que pensa a cidade como mercado tendo em vista a transformaccedilatildeo da sociedade - O fortalecimento dos sujeitosatores sociais e poliacuteticos como condiccedilatildeo baacutesica para a construccedilatildeo e implementaccedilatildeo das estrateacutegias propostas (DE GRAZIA 2003 p 56)

Todos esses princiacutepios provocaram uma verdadeira revoluccedilatildeo urbana conforme

Vainer (2000 p 99) cujas caracteriacutesticas seriam reduzir as desigualdades e transferir recursos

95

materiais e simboacutelicos para os explorados e oprimidos fortalecer a constituiccedilatildeo de sujeitos

coletivos conscientes enfraquecendo as coalizotildees locais dominantes Nesse sentido a

revoluccedilatildeo urbana aponta para uma accedilatildeo processual de transformaccedilatildeo da cidade e dos agentes

populares para a reconfiguraccedilatildeo da cidade para a redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees de poder de que a

cidade eacute simultaneamente campo e objeto

Para Vainer (2000) a cidade eacute um espaccedilo fundamental da luta econocircmica poliacutetica e

cultural palco privilegiado dos movimentos reivindicatoacuterios assumindo uma posiccedilatildeo

estrateacutegica na constituiccedilatildeo de identidades e da construccedilatildeo de alianccedilas poliacuteticas

Dessa forma a organizaccedilatildeo da sociedade civil pode perpassar por dentro do Estado

alterando as administraccedilotildees estaduais e municipais possibilitando a consolidaccedilatildeo de projetos

participativos e de interesses coletivos Assim a constituiccedilatildeo de conselhos eacute relevante na

atuaccedilatildeo dos processos decisoacuterios jaacute que eacute capaz de encaminhar accedilotildees conjuntas da sociedade

com o Estado orientado pelas proposiccedilotildees do direito agrave cidadania e agrave cidade

Lefebvre (1991) ressalta o direito agrave vida urbana como uma condiccedilatildeo de um

humanismo e de uma democracia renovados Esse direito surge como uma proposta radical

de resistecircncia agrave massificaccedilatildeo imposta pela sociedade burocraacutetica de consumo dirigido

Atraveacutes das instituiccedilotildees e ideologias exercem-se pressotildees e repressotildees sobre a vida cotidiana

no sentido de impor agrave sociedade formas e ritmos de vida impeditivos da reflexatildeo e

consequumlentemente da contestaccedilatildeo desse modo de vida

O autor destaca tambeacutem dois relevantes obstaacuteculos ao alcance do direito agrave cidade e

o direito agrave moradia primeiro a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo urbana

devido ao alto grau de concentraccedilatildeo das decisotildees nas matildeos de administradores e teacutecnicos da

elite dirigente que controla a cidade e segundo a forma como estatildeo organizadas as cidades

expressando a estrutura de classe onde a propriedade e o mercado impedem que seja

alcanccedilada a funccedilatildeo social da cidade

Garantir o valor de uso da cidade constituiacute-se em tarefa primordial para a garantia da plena apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos por todos os habitantes superando o estado de alienaccedilatildeo e massificaccedilatildeo da sociedade burocraacutetica de consumo dirigido atraveacutes da ruptura dos coacutedigos da propriedade privada e do mercado (LEFEBVRE 1991 p 161)

Dessa forma o direito agrave cidade e o direito agrave moradia transcendem agrave elaboraccedilatildeo

juriacutedica e diz respeito agrave vida em sociedade a democratizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agrave accedilatildeo

participativa ainda que haja tensotildees e conflitos Ademais nesse processo emergem novas

96

concepccedilotildees de cidade que perpassam a elaboraccedilatildeo do conteuacutedo poliacutetico dos movimentos

sociais

Aleacutem dos canais de participaccedilatildeo e de gestatildeo democraacutetica criados a partir dos anos

1980 emergiram muacuteltiplas accedilotildees que objetivavam transformar o espaccedilo urbano em lugar de

praacuteticas sociais onde a prioridade eacute pela apropriaccedilatildeo da cidade em detrimento da hegemonia

do valor de troca da cidade-mercadoria

Trata-se de uma superaccedilatildeo pela e na praacutetica trata-se de uma mudanccedila de praacutetica social O valor de uso subordinado ao valor de troca durante seacuteculos pode retornar para primeiro plano Como Pela e na sociedade urbana partindo dessa realidade que ainda resiste e que conserva em noacutes a imagem do valor de uso a cidade Que a realidade urbana esteja destinada aos usuaacuterios

e natildeo aos especuladores aos promotores capitalistas aos planos teacutecnicos (LEFEBVRE 1991 p 128)

Nesse sentido o direito agrave moradia pode ser entendido como um direito agrave moradia

digna natildeo se limitando agrave sua condiccedilatildeo edificada de habitaccedilatildeo correspondendo ao direito de

viver com dignidade seguranccedila e paz Os elementos essenciais para este atendimento satildeo de

acordo com Meirinho e Bertol (2010 p 3)

A seguranccedila incluindo a seguranccedila juriacutedica da posse a disponibilidade e o faacutecil aceso aos serviccedilos (educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social) e agrave infraestrutura custo acessiacutevel agrave moradia (gastos com a moradia tem de ser proporcional agrave renda) habitabilidade (condiccedilotildees fiacutesicas e de salubridade adequadas) acessibilidade (moradia adequada para todos) localizaccedilatildeo (adequada inserccedilatildeo na cidade favorecendo o acesso ao emprego transporte puacuteblico serviccedilos de sauacutede escolas cultura e lazer) adequaccedilatildeo ambiental (caracteriacutesticas fiacutesicas que garantam a salubridade adequado saneamento ambiental disponibilidade de amenidades paisagiacutesticas naturais ou produzidas pela accedilatildeo humana) adequaccedilatildeo cultural (respeito agrave diversidade cultural e aos padrotildees oriundos dos usos e costumes das comunidades e grupos sociais) e o respeito e construccedilatildeo de valores psiacutequicos como o pertencimento e a proteccedilatildeo

O Estatuto da Cidade reconhece a gestatildeo democraacutetica que se daria por meio da

sociedade civil de associaccedilotildees representativas dos vaacuterios segmentos da comunidade de

conselhos de participaccedilatildeo orccedilamento participativo audiecircncias puacuteblicas na formulaccedilatildeo

execuccedilatildeo e acompanhamento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Insere tambeacutem a cooperaccedilatildeo entre os governos a iniciativa privada e os demais setores da

sociedade no processo de urbanizaccedilatildeo em atendimento ao interesse social

97

Como resposta agrave determinaccedilatildeo constitucional e para viabilizar a gestatildeo democraacutetica

das diretrizes urbaniacutesticas vaacuterios municiacutepios criaram os Conselhos de Desenvolvimento

Urbano Estes conselhos satildeo instrumentos de representaccedilatildeo da sociedade civil na gestatildeo de

sua poliacutetica urbana Representam um dos canais de comunicaccedilatildeo entre a sociedade civil e a

administraccedilatildeo local no que diz respeito agrave poliacutetica urbana no municiacutepio Satildeo instacircncias

participativas referente ao planejamento da cidade definiccedilatildeo composiccedilatildeo e

acompanhamento da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e intervenccedilotildees diversas tais como

planos diretores poliacuteticas setoriais de transporte e meio ambiente programas de urbanizaccedilatildeo

de favelas etc (SOUZA 2002 p 359)

A institucionalizaccedilatildeo da relaccedilatildeo entre sociedade civil e Estado por meio de

conselhos sejam setoriais (sauacutede educaccedilatildeo etc) ou comunitaacuterios (para a elaboraccedilatildeo do plano

de governo das obras puacuteblicas) por exemplo eacute o que caracteriza este novo nas

administraccedilotildees puacuteblicas Configura-se assim uma estreita correlaccedilatildeo entre descentralizaccedilatildeo

poliacutetica e eficiecircncia administrativa principalmente no que concerne agrave transparecircncia das accedilotildees

governamentais

Para tal eacute necessaacuterio que ocorram investimentos na mudanccedila da cultura poliacutetica o

que implicaria em participaccedilatildeo na disputa de interesses que definem a apropriaccedilatildeo da cidade

Eacute o direito de ir e vir que assumido como uma das mais fortes expressotildees poliacuteticas da

experiecircncia urbana poderaacute unificar produccedilatildeo e reproduccedilatildeo trabalho e consumo e por fim a

cidade historicamente construiacuteda e o urbano como modo de vida Compreende-se ainda que

a postulaccedilatildeo e a defesa deste direito viraacute permitir a afirmaccedilatildeo de outra escala para a

concepccedilatildeo da funccedilatildeo social e da gestatildeo democraacutetica da cidade a escala da metroacutepole

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade) estatildeo implicados no direito agrave cidade [] Mudariam a realidade se entrassem para a praacutetica social direito ao trabalho agrave instruccedilatildeo agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave habitaccedilatildeo aos lazeres agrave vida Entre esses direitos em formaccedilatildeo figura o direito agrave cidade (natildeo agrave cidade arcaica mas agrave vida urbana agrave centralidade renovada aos locais de encontro e de trocas aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o uso pleno e inteiro desses momentos e locais etc) A proclamaccedilatildeo e a realizaccedilatildeo da vida urbana como reino do uso (da troca e do encontro separados do valor de troca) exigem o domiacutenio do econocircmico (do valor de troca do mercado e da mercadoria) e por conseguinte se inscrevem nas perspectivas da revoluccedilatildeo sob a hegemonia da classe operaacuteria (LEFEBVRE 1991 p143)

98

Dessa maneira o avanccedilo e a consolidaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular como condiccedilatildeo

necessaacuteria agrave proacutepria viabilizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas alteram o conteuacutedo e praacuteticas de

programas e projetos ao mesmo tempo que impotildee novas exigecircncias aos grupos poliacuteticos que

estatildeo no poder

Sendo assim as praacuteticas sociais que constroem cidadania representam a possibilidade

de se constituir num espaccedilo privilegiado para cultivar a responsabilidade pessoal a obrigaccedilatildeo

muacutetua e a cooperaccedilatildeo voluntaacuteria A ampliaccedilatildeo da esfera puacuteblica ocasiona uma demanda agrave

sociedade para obtenccedilatildeo de uma maior influecircncia sobre o Estado tanto como sua limitaccedilatildeo

assumindo que a autonomia social supotildee transcender as assimetrias na representaccedilatildeo social

assim como modificar as relaccedilotildees sociais em favor de uma maior auto-organizaccedilatildeo social

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

Destarte a abertura poliacutetica possibilitou a construccedilatildeo de processos sociais e

institucionais que adquiriram visibilidade por meio da mobilizaccedilatildeo de sujeitos poliacuteticos em

muitos municiacutepios realizando emendas populares para as Constituiccedilotildees Estaduais Leis

Orgacircnicas e Planos Diretores aleacutem de organizarem foacuteruns regionais articuladores da

sociedade civil como por exemplo o Foacuterum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) que se

fortalece a partir desse contexto e passa a ser um articulador dos agentes urbanos no Brasil

Torna-se necessaacuterio portanto ressaltar a participaccedilatildeo da sociedade civil no processo

de gestatildeo do espaccedilo urbano pois este segmento conseguiu implementar as suas lutas pelo

direito agrave cidade e agrave cidadania nas poliacuteticas puacuteblicas

Esses movimentos resistiram e enfrentaram os governos militares por meio do apoio

das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Igreja Catoacutelica e lutaram pela

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes constituindo-se em importante articulaccedilatildeo para mobilizar

organizar e propor mudanccedilas recriando identidades poliacuteticas e culturais

A mobilizaccedilatildeo coletiva aleacutem de uma seacuterie de estrateacutegias de accedilatildeo configura-se como

[] um processo de desenvolvimento de condiccedilotildees materiais psicossociais e poliacuteticas

(PRADO 2002 p 60) que permite a constituiccedilatildeo de identidades poliacuteticas Nesse processo

alguns elementos emergem como estruturas mediadoras fundamentais para a construccedilatildeo e

99

adequaccedilatildeo do universo que apoacuteia a coesatildeo do grupo e a identidade de suas praacuteticas discursivas

e de accedilatildeo

Nesse sentido Castells (2006) ressalta que a construccedilatildeo de identidade dos sujeitos

sociais eacute um processo de construccedilatildeo de sentido a partir de um atributo cultural poliacutetico

social ou de um conjunto coerente de atributos que tecircm prioridade sobre todas as outras

fontes Assim um mesmo indiviacuteduo ou o mesmo ator coletivo pode ter vaacuterias identidades

A identidade natildeo eacute totalmente determinada agrave nascenccedila por fatores exoacutegenos eacute

(re)construiacuteda ao longo da vida como resultado de muacuteltiplos processos temporais de inserccedilatildeo

e interaccedilatildeo e como tal pode ser vista como uma reconstruccedilatildeo permanente flexiacutevel e

dinacircmica e natildeo como uma preacute-construccedilatildeo essencialista

Dessa forma considera-se que a identidade de cada um pode ser eventualmente

segmentada em fraccedilotildees relevantes por exemplo a identidade eacutetnica nacional regional de

classe profissional ou familiar mas tambeacutem eacute proveniente dos grupos de sociabilidade em

que se encontra inserido do bairro que se habita ou da comunidade de interesses a que se

encontra associado

Assim o que fundamenta as novas identidades eacute a experiecircncia de vida comum que

reuacutene o grupo e seu modo democraacutetico de funcionamento que garante a autenticidade do

grupo Tratada deste modo a formaccedilatildeo de identidades novas parece produto apenas de

vivecircncia de carecircncias comuns que explicitam para todos os membros do grupo uma mesma

condiccedilatildeo de dominaccedilatildeo

Castells (2006) argumenta em sua obra O Poder da Identidade a dominacircncia do

espaccedilo de fluxos e a dialeacutetica entre esse espaccedilo e o espaccedilo de lugares que levaram agrave

obsolescecircncia as antigas instituiccedilotildees e organizaccedilotildees da sociedade civil as identidades

legitimadoras construiacutedas em torno do Estado democraacutetico e do contrato social entre capital e

trabalho18 Da mesma forma propiciam o surgimento de identidades de resistecircncia19 que

recusam-se ser apanhadas de roldatildeo pelos fluxos globais poderiam sob determinadas

circunstacircncias e por meio de processos especiacuteficos a cada contexto institucional e cultural

ser cristalizados em identidades de projetos os verdadeiros agentes da mudanccedila capazes de

reconstruir uma nova sociedade civil e por uacuteltimo um novo Estado (CASTELLS 2006 p

423)

18 Nesse sentido para Castells o movimento trabalhista e os partidos poliacuteticos encontram-se ultrapassados como agentes autocircnomos de transformaccedilatildeo social 19 Tanto os movimentos tradicionalistas como o fundamentalismo religioso e os movimentos de auto-afirmaccedilatildeo nacionalista quanto os movimentos sociais ativistas contraacuterios agrave globalizaccedilatildeo como os ambientalistas pertencem a esta forma de identidade

100

Uma vez que para Castells o espaccedilo de fluxos constitui a nova forma espacial de

praacuteticas sociais que dominam e moldam a sociedade em rede tanto os lugares quanto o

poder tecircm suas loacutegicas e seus significados absorvidos na rede Agora o poder deixando de

concentrar-se nas instituiccedilotildees organizaccedilotildees ou mecanismos simboacutelicos de controle

apresenta-se inscrito nos coacutedigos culturais mediante os quais as pessoas e as instituiccedilotildees

representam a vida e tomam decisotildees inclusive poliacuteticas (CASTELLS 2006 p 424)

Giddens (2002) compreende o termo identidade como um termo essencialmente

moderno e que se refere a articulaccedilatildeo que o sujeito faz de diversas forccedilas presentes na

sociedade atual sociedade esta caracterizada pela pluralidade de escolha e pelo

individualismo exacerbado Pode-se entatildeo dizer que a identidade surge da negociaccedilatildeo com o

contexto sendo necessaacuterio o entendimento da loacutegica deste contexto ou seja a compreensatildeo

da concepccedilatildeo de mundo atual no qual se estatildeo inseridos

Essa discussatildeo teve iniacutecio com o reconhecimento de que em uma sociedade

tradicional a identidade social dos indiviacuteduos eacute limitada pela proacutepria tradiccedilatildeo pelo

parentesco pela localidade A modernidade caracterizada como uma ordem poacutes-tradicional

ao romper com as praacuteticas e preceitos preestabelecidos enfatiza o cultivo das potencialidades

individuais oferecendo ao indiviacuteduo uma identidade moacutevel mutaacutevel

Eacute nesse sentido que na modernidade o Eu torna-se cada vez mais um projeto

reflexivo pois aonde natildeo existe mais a referecircncia da tradiccedilatildeo descortina-se para o indiviacuteduo

um mundo de diversidade de possibilidades abertas de escolhas O indiviacuteduo passa a ser

responsaacutevel por si mesmo e o planejamento estrateacutegico da vida assume especial importacircncia

Para De Grazia (2003) a nova forma de ver a cidade de forma participativa foca na

desigualdade de investimentos que haacute entre os seus diversos locais pois as obras de

infraestrutura equipamentos urbanos e serviccedilos estatildeo localizados onde haacute maior concentraccedilatildeo

de capital decisotildees e atividades comerciais desprezando portanto outros locais da cidade

principalmente os locais de moradia da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo que satildeo as

periferias baixadas favelas morros etc

A cidade eacute portanto palco da luta entre o capital e o trabalho Esta se daacute em torno do

ambiente construiacutedo e vivido o qual tem interesses conflitantes e que estabelecem um campo

de poder o capital imobiliaacuterio os proprietaacuterios da terra a induacutestria da construccedilatildeo o Estado e

a forccedila de trabalho conforme discutido no capiacutetulo anterior

O campo de poder (que natildeo deve ser confundido com o campo poliacutetico) natildeo eacute um campo como os outros ele eacute espaccedilo de relaccedilotildees de forccedilas entre os

101

diferentes tipos de capital ou mais precisamente entre os agentes suficientemente providos de um dos diferentes tipos de capital para poderem dominar o campo correspondente e cujas lutas se intensificam sempre que o valor relativo dos diferentes tipos de capital eacute posto em questatildeo isto eacute especialmente quando os equiliacutebrios estabelecidos no interior do campo entre instacircncias especificamente encarregadas da reproduccedilatildeo do campo do poder (BOURDIEU 2001 p 52)

De acordo com Netto (2001) Marx identificou que as relaccedilotildees sociais dentro de

cada sociedade baseiam-se a partir do modo de produccedilatildeo existente e que a histoacuteria de todas

as sociedades sempre esteve fundada na luta de classes esta anaacutelise foi feita por meio do

materialismo histoacuterico dialeacutetico

A cidade passa a ser entatildeo compreendida como a reproduccedilatildeo das divisotildees sociais

natildeo uniforme pois na medida em que se reproduz cria e recria novos espaccedilos consolida

velhos bairros e constituem novos assumindo formas diversas muacuteltiplas interligadas com a

dinacircmica dos atores sociais

Destarte o campo das lutas em torno da habitaccedilatildeo e das condiccedilotildees de vida urbana

em geral ao mesmo tempo em que eacute um espaccedilo da luta de classes eacute tambeacutem espaccedilo

privilegiado de cooptaccedilatildeo e do exerciacutecio da hegemonia burguesa expressando as contradiccedilotildees

do modo de produccedilatildeo capitalista Aleacutem disso expressa a relevacircncia cultural dos grupos

sociais e manifesta as diversas formas de apreender o espaccedilo ou seja a forma como um grupo

apreende o espaccedilo natildeo quer dizer que este espaccedilo tenha o mesmo significado para todos os

grupos

Para tanto eacute necessaacuterio entender algumas discussotildees que permeiam a produccedilatildeo do

espaccedilo urbano e da moradia como o seu papel como produto das relaccedilotildees sociais a

influecircncia da dimensatildeo espacial na produccedilatildeo da moradia entre outros Assim nos capiacutetulos

seguintes seratildeo apresentados elementos dessa poliacutetica em especial a habitacional

implementada no Brasil que se daacute pelo resultado das relaccedilotildees e mobilizaccedilotildees estabelecidas

entre os agentes pelas instituiccedilotildees que podem facilitar ou impedir o acesso dos agentes aos

espaccedilos decisoacuterios pelo processo de decisatildeo no qual se estabelecem coalizotildees e escolhas e

tambeacutem pelos produtos da poliacutetica resultante Assim ao se falar de poliacutetica fala-se em grande

medida de representaccedilatildeo de interesses e por conseguinte de formulaccedilatildeo das poliacuteticas que

implementam ou bloqueiam tais interesses

102

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

Para se entender a problemaacutetica habitacional torna-se fundamental relacionaacute-la com a

sociedade em que se vive e com suas dinacircmicas estruturadas socialmente Portanto eacute

necessaacuterio se reportar agraves relaccedilotildees sociais baacutesicas e agrave organizaccedilatildeo do sistema produtivo pois

no modo de produccedilatildeo capitalista no qual a produccedilatildeo eacute socializada e a apropriaccedilatildeo eacute privada e

concentradora tem-se uma complexa divisatildeo social do trabalho caracterizando um sistema

social estratificado

Nesse sentido pode-se dizer que habitar eacute uma necessidade baacutesica de todo ser

humano independente de qual seja o tipo de sociedade Dessa forma vale ressaltar que a

habitaccedilatildeo eacute compreendida nesse trabalho como algo aleacutem da casa do abrigo do ambiente

fiacutesico mas a interaccedilatildeo desta com a cidade com o conjunto de seus equipamentos serviccedilos

espaccedilos puacuteblicos e lugar de reinvenccedilatildeo de praacuteticas e relaccedilotildees sociais Vale ressaltar que a

cidade concentra um conjunto de processos de trabalho e de produccedilatildeo de empregados

assalariados e do mercado informal cuja anaacutelise eacute essencial na compreensatildeo das diferenccedilas

entre as cidades

Entatildeo afirma-se que a habitaccedilatildeo tem um conteuacutedo poliacutetico social econocircmico e

espacial e possui diversas caracteriacutesticas e formas espaciais diferentes concretizando uma

produccedilatildeo diferenciada da cidade

A cidade capitalista possui condiccedilotildees gerais para a produccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo

e do trabalho evidenciando as contradiccedilotildees inerentes ao capitalismo principalmente nas

relaccedilotildees construiacutedas a partir da apropriaccedilatildeo privada dos bens socialmente produzidos

configurando uma divisatildeo social e territorial do trabalho conforme argumenta Lojkine (1981

p 16)

As formas de urbanizaccedilatildeo satildeo formas de divisatildeo social (e territorial) do trabalho elas satildeo o cerne da contradiccedilatildeo atual entre as novas exigecircncias do progresso teacutecnico

essencialmente em mateacuteria de formaccedilatildeo ampliada das forccedilas produtivas humanas

e as leis de acumulaccedilatildeo de capital

Sendo assim o espaccedilo urbano construiacutedo expressa o modo de vida capitalista e a luta

de classes sociais que compotildeem sua estrutura social uma vez que esse espaccedilo se redefine a

partir da crescente articulaccedilatildeo e complexidade do processo produtivo o qual possibilita o

desenvolvimento dos meios de distribuiccedilatildeo circulaccedilatildeo e troca de mercadorias Dessa maneira

103

o espaccedilo urbano torna-se tambeacutem a proacutepria mercadoria uma vez que dele se obteacutem mateacuteria

prima e forccedila de trabalho

Com o surgimento da faacutebrica enquanto unidade produtiva e a complexidade da divisatildeo teacutecnica e social do trabalho daiacute decorrente o urbano se redefine ante as exigecircncias de concentraccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo e da forccedila de trabalho num soacute lugar e consequumlentemente a forccedila de trabalho passa a exigir certas condiccedilotildees para sua reproduccedilatildeo tais como habitaccedilatildeo alimentaccedilatildeo transporte energia assistecircncia agrave sauacutede lazer comunicaccedilotildees saneamento em geral etc Por outro lado a faacutebrica enquanto unidade de acumulaccedilatildeo de capital tambeacutem coloca uma seacuterie de outras condiccedilotildees que satildeo necessaacuterias para sua reproduccedilatildeo tais como transporte de mateacuterias-primas energia comunicaccedilatildeo saneamento unidades de apoio agrave produccedilatildeo como escritoacuterios bancos transporte para escoamento da produccedilatildeo unidades de distribuiccedilatildeo e comercializaccedilatildeo etc (SILVA 1989 p 23)

Para Blay (apud SILVA 1989 p 20) a mercadoria moradia eacute entendida dentro da

teoria das necessidades sociais em um sistema econocircmico regido livremente pela procura e

oferta e que suscita uma problemaacutetica chave se de um lado existe grande oferta da

mercadoria moradia por outro grande parcela da populaccedilatildeo natildeo dispotildee de renda suficiente

para adquiri-la pois as habitaccedilotildees apresentam um elevado valor agregado e com isso a

populaccedilatildeo de renda baixa natildeo possui condiccedilotildees de comprar ou alugar uma casa com

condiccedilotildees miacutenimas de habitabilidade

Esse cenaacuterio acarreta no processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial que se daacute a partir da

complexificaccedilatildeo e divisatildeo social do trabalho gerada pelas poliacuteticas puacuteblicas seletivas do

Estado e pela auto-segregaccedilatildeo da classe de maior poder aquisitivo que se isola em

condomiacutenios e loteamentos fechados Vale ressaltar que esses locais natildeo satildeo mais exclusivos

das classes mais abastarda mas estendendo-se agraves outras camadas da sociedade (funcionaacuterios

puacuteblicos profissionais liberais comerciantes entre outros) que adquirem seus lotes em aacutereas

muradas dotando de seguranccedila particular (cercas eleacutetricas vigilante portotildees eletrocircnicos entre

outros) sob o pagamento de uma taxa (condomiacutenio)

Diante disso uma grande parcela da populaccedilatildeo natildeo possui local para morar quando

natildeo moram em locais de difiacutecil acesso com condiccedilotildees precaacuterias transformando a questatildeo da

moradia em um problema social e urbaniacutestico pela inadequabilidade habitacional conforme

fotografia 1

Eacute importante enfatizar que podem ser levadas em consideraccedilatildeo quando se pensa na

questatildeo da moradia as diferentes classes e fraccedilotildees de classes que estatildeo envolvidas em uma

luta simboacutelica na produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da cidade as quais objetivam a definiccedilatildeo do mundo

104

social em conformidade com seus interesses formando um campo das posiccedilotildees sociais

passando a integrar a paisagem urbana do capital como parte necessaacuteria de um espaccedilo social

complexo e repleto de contradiccedilotildees

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA)

Fonte Beleacutem (2007)

Sendo assim a questatildeo habitacional brasileira eacute um fenocircmeno que se insere no

desenvolvimento do sistema capitalista e sempre apresentou um cunho marcadamente

excludente refletindo as diversas fases da relaccedilatildeo entre o Estado e as fraccedilotildees de classes

A poliacutetica habitacional como poliacutetica puacuteblica voltada agrave efetivaccedilatildeo do direito agrave

moradia foi compreendida inicialmente de acordo com Frey (1996) como uma poliacutetica de

bem estar e gradativamente mudou do discurso universalista dos direitos fundamentais para

a loacutegica dos mercados articulando-se de maneira inovadora com os novos padrotildees de

acumulaccedilatildeo capitalista

Para o autor na fase de expansatildeo material do sistema capitalista no seacuteculo passado o

fundo puacuteblico constituiacutea-se na principal fonte de financiamento da poliacutetica habitacional No

Estado de Bem-Estar Social o direito agrave moradia era um dos elementos que faziam parte dos

custos da reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e a ideologia da casa proacutepria era uma forma de

controle social aleacutem disso a intervenccedilatildeo estatal foi marcada por uma poliacutetica puacuteblica

105

centralizada isto eacute defendia a universalizaccedilatildeo da poliacutetica sem levar em consideraccedilatildeo as

especificidades de cada regiatildeo

De acordo com Bonduki (1994 p 26) o primeiro evento desencadeador do problema

habitacional no Brasil foi a passagem do escravismo para o trabalho livre no qual o preccedilo da

terra se definiu originalmente como uma forma de impedir no momento histoacuterico da ascensatildeo

do capitalismo o acesso do trabalhador agrave terra Essa constataccedilatildeo surge a partir do

entendimento de que a terra urbana e suas construccedilotildees satildeo mercadorias na economia

capitalista possuindo um valor de uso e um valor de troca

No contexto histoacuterico da economia cafeeira as moradias alugadas nos principais

centros urbanos eram mais utilizadas como a forma predominante de habitaccedilatildeo popular Ateacute

os anos 1920 os centros urbanos reuniam um grande contingente de trabalhadores que

moravam em locais alugados em geral em corticcedilos20 Os outros espaccedilos como as vilas21

eram destinados aos trabalhadores que possuiacuteam uma qualificaccedilatildeo e a classe meacutedia

O Estado tinha uma atuaccedilatildeo limitada pois incentivava a produccedilatildeo privada de

moradias para os trabalhadores de baixo poder aquisitivo geralmente voltadas para a locaccedilatildeo

aleacutem de atuar de forma repressiva em situaccedilatildeo de insalubridade aplicando a lei de

higienizaccedilatildeo (produccedilatildeo de casas higiecircnicas) e de restriccedilatildeo aos corticcedilos por forccedila policial

(BONDUKI 1994)

Assim a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de

saneamento e embelezamento que expulsaram a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo para as

afastadas do centro das cidades como soluccedilatildeo para eliminar epidemias e higienizar os

espaccedilos

Ao mesmo tempo obras paisagiacutesticas eram realizadas nas aacutereas centrais para

favorecer a consolidaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio capitalista que estava surgindo Os

problemas urbanos os males e distuacuterbios sociais eram tratados como responsabilidade do

excessivo tamanho e densidade populacional das cidades e natildeo como fruto do modelo de

industrializaccedilatildeo que estava em desenvolvimento

O fator que garantia a construccedilatildeo das diversas formas de moradias de aluguel eacute que

esse negoacutecio se tornou importante investimento para os diversos agentes econocircmicos que

naquela eacutepoca dispunham de capital e de pequenas poupanccedilas

20 Corticcedilo denominaccedilatildeo geneacuterica da habitaccedilatildeo coletiva que incluiacutea desde uma seacuterie de cocircmodos ao longo de um corredor ou em volta de um paacutetio e dormitoacuterios improvisados no fundo de um bar ou armazeacutem ateacute as casas de cocircmodos e respectivos porotildees (BONDUKI 1986) 21 As vilas se constituiacuteam em conjuntos de pequenas casas unifamiliares germinadas (SILVA 1989)

106

Vivia-se a fase aacuteurea da economia cafeeira e Satildeo Paulo era o centro comercial e bancaacuterio que geria o cafeacute A induacutestria embora jaacute fosse significativa e reunisse um largo contingente de trabalhadores era ainda incipiente e instaacutevel marcada por crises constantes subordinando-se ao capital cafeeiro [] Num periacuteodo em que a inflaccedilatildeo era insignificante o investimento em casas operaacuterias garantia juros de 12 a 15 ao ano considerado na eacutepoca um excelente rendimento aleacutem de possibilitar o usufruto da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria (BONDUKI 1994 138-139)

Com o processo de industrializaccedilatildeo que intensificou a urbanizaccedilatildeo das cidades uma

seacuterie de transformaccedilotildees na estrutura urbana comeccedilaram a surgir na estrutura industrial e na

forma de atuaccedilatildeo do poder puacuteblico provocando o crescimento econocircmico das cidades

modificaccedilotildees no padratildeo de habitaccedilatildeo popular e a concentraccedilatildeo desordenada de pessoas na

busca de produtos e serviccedilos nos corticcedilos favelas baixadas com precaacuterias condiccedilotildees de

moradia

A explosatildeo demograacutefica provocou um excedente da populaccedilatildeo que natildeo encontra emprego suficiente na zona rural Assim o pessoal dessa zona vai procurar trabalho em outros lugares seja nas regiotildees de plantaccedilotildees onde se tornam assalariados agriacutecolas seja diretamente nas cidades (SANTOS 1991 p 24)

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (2000) a populaccedilatildeo

urbana brasileira em 1940 era de 3124 Em 1950 esse quadro passou para 3616

conforme apontam os dados da tabela 1 demonstrando um aumento de aproximadamente

5 naquele periacuteodo

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1970) no Brasil Ano Total Urbana Rural

1940 41236315 12880182 3124 28356133 6876 1950 51914397 18782891 3616 33161506 6384 1960 70070457 31303034 4468 38767423 5532 1970 93139037 52084984 55 93 41054053 4407

Fonte IBGE Censo Demograacutefico (2001)

Nota-se que nas deacutecadas seguintes (1960 e 1970) houve o aumento da taxa de

populaccedilatildeo residente nos centros urbanos saltando para 55 93 no ano de 1970 Pode-se

dizer que isso se deu em virtude do processo de industrializaccedilatildeo ocorrido nas deacutecadas de

1940 a 1980 as quais foram marcadas pelo intenso crescimento do mercado com elevadas

107

taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) acarretando em uma complexa divisatildeo

social do trabalho Aleacutem desses elementos ocorreu um acelerado processo de urbanizaccedilatildeo

com grandes deslocamentos populacionais originando alteraccedilotildees profundas na estrutura

demograacutefica

Esse provocou tambeacutem uma grande retirada da populaccedilatildeo pobre das aacutereas de

interesses econocircmicos e fez com que esta se deslocasse para as aacutereas sem infraestrutura

agravando ainda mais o quadro de pobreza Em contrapartida as fraccedilotildees de classes com maior

poder aquisitivo pressionavam o Estado a reorganizar o espaccedilo urbano tendo em vista a

fluidez das mercadorias neste espaccedilo e a higiene do mesmo uma vez que os corticcedilos locais

onde os trabalhadores viviam estavam localizados geograficamente proacuteximos das classes

dominantes e eram considerados locais de focos de epidemias

Assim cabe destacar que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual pois esse espaccedilo eacute

fruto de uma produccedilatildeo capitalista que se produz desigualmente e eacute materializada pela divisatildeo

do trabalho e se sustenta a partir das relaccedilotildees simboacutelicas estabelecidas

Estava claro que diante do novo padratildeo de desenvolvimento econocircmico que se esboccedilava e do crescimento raacutepido da populaccedilatildeo o corticcedilo passaria a representar um perigo para a sauacutede puacuteblica seja pelas condiccedilotildees de insalubridade que apresentava seja por expressar uma imagem contrastante com a faacutebrica enquanto unidade produtiva que se firmava Dessa forma natildeo era compatiacutevel com o novo modelo econocircmico que necessitava desobstruir a aacuterea central da cidade para a circulaccedilatildeo do capital e localizaccedilatildeo da classe dominante emergente forccedilando o estabelecimento de uma poliacutetica de segregaccedilatildeo dos setores populares acentuando-se principalmente a partir da deacutecada de 30 e 40 com o amadurecimento do modelo econocircmico de caraacuteter urbano-industrial (SILVA 1989 p 36)

Uma das medidas intervencionistas adotadas pelo Estado poacutes-1930 foi a criaccedilatildeo e

regulamentaccedilatildeo das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensotildees (IAPs)22 em

1937 Com o agravamento progressivo das condiccedilotildees habitacionais nos centros urbanos os

trabalhadores pressionaram o Estado para que este atendesse suas reivindicaccedilotildees

Assim os IAPs identificados como vias institucionais responsaacuteveis pelo

atendimento das necessidades dos trabalhadores na questatildeo da moradia assumiram esta

atribuiccedilatildeo objetivando garantir a legitimidade do poder estatal

22 Os IAPs tiveram fundamental importacircncia na provisatildeo do creacutedito imobiliaacuterio uma vez que deixaram de ter exclusivamente a atribuiccedilatildeo de previdecircncia social e assistecircncia meacutedia para incorporarem a funccedilatildeo de provedor de moradia

108

Contudo esta foi a primeira intervenccedilatildeo concreta estatal no setor da habitaccedilatildeo

popular embora tenha obedecido a criteacuterios de clientelismo poliacutetico na distribuiccedilatildeo das

poucas unidades que foram produzidas

Eacute importante destacar que em 1923 foram criadas as Caixas de Aposentadoria

constituiacutedas pelos empregados de uma empresa que organizaram uma caixa comum de

assistecircncia com fundos especiacuteficos objetivando financiar a construccedilatildeo de habitaccedilotildees aos seus

associados Entretanto suas accedilotildees somente se concretizaram em 1930 (SILVA 1989)

Segundo Bonduki (1997) a Fundaccedilatildeo da Casa Popular (FCP) criada em 01 de maio

de 1946 constituiu-se no primeiro oacutergatildeo nacional direcionado agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

populares e estava vinculada ao Ministeacuterio do Trabalho Induacutestria e Comeacutercio A escolha do

dia do trabalhador para fundar a FCP foi considerada reveladora ao alcance poliacutetico que se

pretendia com tal medida pois foi uma forma do governo enfrentar os problemas de habitaccedilatildeo

das faixas de trabalhadores que recebiam baixos salaacuterios

A FCP visava propiciar a construccedilatildeo ou aquisiccedilatildeo da casa proacutepria em zona urbana

ou rural para as classes populares aleacutem de coordenar as accedilotildees dos IAPs e tinha como fonte

de recursos a cobranccedila de taxas sobre as transaccedilotildees imobiliaacuterias Poreacutem esses dois oacutergatildeos

(IAPs e FCP) foram extintos com a criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) em

1964

Segundo Rodrigues (2001) de 1937 a 1964 os IAPs construiacuteram 279 conjuntos em

um total de 47789 moradias e financiadas 72236 habitaccedilotildees Embora os nuacutemeros sejam

modestos demonstram uma nova forma de accedilatildeo do Estado ou seja como o Estado interfere

diretamente na produccedilatildeo da habitaccedilatildeo Jaacute a FCP de 1946 a 1964 construiu 19 mil unidades

pouco mais de 900 unidades por ano concentradas principalmente na regiatildeo sudeste do paiacutes

Estes resultados demonstram que a FCP limitou-se a construir em locais que os recursos

permitiam e os interesses econocircmicos determinavam

A deacutecada de 1940 foi marcada por uma grave crise de habitaccedilatildeo pois esta crise natildeo

se deu pela falta de moradias higiecircnicas e salubres a preccedilos acessiacuteveis que os trabalhadores

poderiam alugar mas pela carecircncia absoluta de moradias

Essa crise foi estrutural embora agravada por fatores conjunturais provocados pela

guerra Bonduki (1994) destaca vaacuterios fatores que explicam esse fenocircmeno tais como a

proacutepria dinacircmica do desenvolvimento capitalista no Brasil que cria novas e mais atraentes

formas de investimento do capital fazendo a rentabilidade crescer as altas taxas de inflaccedilatildeo

levam os investidores a perderem interesse em investir no aluguel de moradias que em outros

periacuteodos eram investimentos rentaacuteveis e a conjuntura da guerra provoca no mercado

109

imobiliaacuterio a aceleraccedilatildeo da especulaccedilatildeo e os imoacuteveis urbanos sofrem uma valorizaccedilatildeo sem

precedentes

A Lei do Inquilinato agravou ainda mais a situaccedilatildeo uma vez que congelou os preccedilos

dos alugueacuteis em 1942 e se configurou em uma intervenccedilatildeo direta do governo de Getuacutelio

Vargas na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia ou seja o Estado passou a intervir nos

diversos setores da economia operando na fixaccedilatildeo de preccedilos na distribuiccedilatildeo dos ganhos e

perdas entre as diversas fraccedilotildees de classes e na regulamentaccedilatildeo da reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho

Os aumentos elevados do valor dos alugueacuteis que subiam em magnitudes superiores

aos salaacuterios dos trabalhadores visavam desestimular a construccedilatildeo de moradias para alugar e

instigar a construccedilatildeo de moradias para venda que em geral natildeo eram acessiacuteveis aos

trabalhadores de menor poder aquisitivo levando-os a recorrer agrave autoconstruccedilatildeo e agrave

favelizaccedilatildeo (SILVA 1989)

Atraveacutes da autoconstruccedilatildeo que a maioria da populaccedilatildeo trabalhadora resolve seu problema de moradia principalmente nas grandes cidades brasileira e de modo geral na Ameacuterica Latina A construccedilatildeo de casas se prolonga por muitos anos absorvendo a maior parte do tempo livre da famiacutelia A construccedilatildeo eacute realizada nos fins-de-semana e em parte das feacuterias [] A autoconstruccedilatildeo eacute executada nos periacuteodos que deveriam ser destinados ao descanso do trabalhador para repor as energias mas na verdade descansa-se trabalhando carregando pedras Este eacute o lema do autoconstrutor por vaacuterios anos [] Em linhas gerais a autoconstruccedilatildeo eacute um processo de trabalho extremamente penosos com elevados custos individuais que caem sobre os setores mais pauperizados Haacute um alongamento da jornada de trabalho que repercute na acumulaccedilatildeo de capital jaacute que permite pagar salaacuterios mais baixos e ao mesmo tempo desgasta rapidamente a capacidade produtiva da forccedila de trabalho sem o miacutenimo descanso necessaacuterio (RODRIGUES 2001 p 30-32)

De acordo com Durham (2000 apud RODRIGUES 2001) eacute comum as famiacutelias de

menor poder aquisitivo construir suas casas com ajuda muacutetua Muitas vezes os filhos se casam

e vatildeo anexando cocircmodos agrave construccedilatildeo original caracterizando a coabitaccedilatildeo A autoconstruccedilatildeo

eacute um processo aacuterduo que requer o esforccedilo de toda a famiacutelia surgindo como um meio de se

obter um imoacutevel Esta alternativa foi utilizada pelos governos como opccedilatildeo viaacutevel e de baixo

custo para minimizar o deacuteficit habitacional mas eacute uma proposta questionaacutevel tanto pelo

sacrifiacutecio imposto pela situaccedilatildeo quanto pelo aspecto caoacutetico das periferias dos grandes e

meacutedios centros urbanos

110

Aleacutem disso Bourdieu (2001) enfatiza que existem outras racionalidades aleacutem da

racionalidade econocircmica e que neste caso podem ser enquadradas tanto para os laccedilos sociais

de uma favela quanto para a autoconstruccedilatildeo na qual famiacutelias se unem para conseguir a casa

proacutepria Dessa maneira a construccedilatildeo de uma moradia representa uma troca de daacutedivas entre

os grupos sociais familiares ou amigos que se unem nesse processo

A partir da deacutecada de 1950 seguiu-se um decliacutenio das construccedilotildees relacionadas agrave

viabilidade econocircmica financeira a inflaccedilatildeo tornava irrisoacuterias as prestaccedilotildees fixas pagas nos

planos de financiamento e natildeo possibilitava novos investimentos o congelamento dos

alugueacuteis a crise da previdecircncia com o esvaziamento progressivo das reservas do sistema

previdenciaacuterio (RODRIGUES 2001)

Silva (1989) argumenta que no periacuteodo do segundo governo Vargas (1951-1954)

houve uma forte pressatildeo dos trabalhadores por melhores salaacuterios ficando a questatildeo

habitacional renegada a segundo plano uma vez que as poliacuteticas implementadas demonstram

a pouca importacircncia que foi dada a essa problemaacutetica

No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) com os grandes projetos

industriais em especial os automobiliacutesticos sob a loacutegica da integralizaccedilatildeo do territoacuterio com a

abertura de estradas para circulaccedilatildeo de mercadorias e comunicaccedilatildeo a urbanizaccedilatildeo eacute acelerada

e marcada pelo desenvolvimento econocircmico aleacutem disso intensificaram as desigualdades

regionais do Paiacutes pois as regiotildees mais distantes do centro financeiro como os estados da

regiatildeo Amazocircnica sofreram menor implementaccedilatildeo de instrumentos urbaniacutesticos

aprofundando a divisatildeo social e territorial do trabalho Em relaccedilatildeo a questatildeo habitacional as

accedilotildees concretas natildeo foram executadas o que agravou ainda mais as condiccedilotildees de vida da

populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Nessa conjuntura de efervescecircncia poliacutetica e de decliacutenio econocircmico a questatildeo habitacional para o governo de Joatildeo Goulart foi contemplada quase tatildeo-somente pelo planejamento governamental A distacircncia entre as necessidades sociais e a falta de recursos para sanar a carecircncia de habitaccedilotildees populares fizeram com que o quadro se agravasse dado o intenso processo de urbanizaccedilatildeo a que as grandes cidades vinham se submetendo (SILVA 1989 p 46)

Vale destacar no quadro 1 a relaccedilatildeo das principais instituiccedilotildees habitacionais ateacute a

criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) suas caracteriacutesticas e os respectivos

governos

111

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968

Instituiccedilotildees Caracteriacutestica Governo Instituto de Aposentadorias

e Pensotildees (IAPs) O Brasil deu os primeiros passos intervindo na oferta de moradia

Getuacutelio Vargas (1930-1945)

Fundaccedilatildeo da Casa Proacutepria (FCP)

Visava atender a populaccedilatildeo que natildeo participava do mercado formal

Eurico Gaspar Dutra (1946-1951)

Plano de Assistecircncia Habitacional (PAH)

A principal inovaccedilatildeo consistia na proporccedilatildeo entre a prestaccedilatildeo do financiamento e o salaacuterio miacutenimo

Juscelino Kubitschek (1956-1961)

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH)

Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo (SFH)

Tinham como objetivos coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos puacuteblicos e orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria eliminaccedilatildeo das favelas

Castello Branco (1964-1967)

Fonte BRASIL (2004)

A partir de meados dos anos de 1960 eacute possiacutevel perceber uma atuaccedilatildeo mais efetiva

do Estado sobre o espaccedilo urbano com a criaccedilatildeo de todo o aparato institucional voltado para a

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia

Por meio do projeto desenvolvimentista a intervenccedilatildeo estatal expandiu a induacutestria e

construiu uma sociedade de consumo predominantemente urbana provocando a dispersatildeo

das cidades Aleacutem da implantaccedilatildeo de hidreleacutetricas portos aeroportos dutos e canais

apoiados em financiamentos externos a expansatildeo da rede de energia de estradas e de

comunicaccedilatildeo foram um meio de eliminar as barreiras agrave circulaccedilatildeo de capital e as poliacuteticas

urbanas tinham vultosos investimentos e deu respaldo agrave urbanizaccedilatildeo como estrateacutegia de

desenvolvimento do territoacuterio

Em 1964 foi criado o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) por meio da Lei nordm

4380 de 21 de agosto de 1964 que institui tambeacutem o Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

(SFH) com a grande inovaccedilatildeo da correccedilatildeo monetaacuteria nos contratos imobiliaacuterios aleacutem das

Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) as Letras Imobiliaacuterias (LI) e o Serviccedilo Federal de

Habitaccedilatildeo e Urbanismo (Serfhau) Este tinha por meta baacutesica promover a elaboraccedilatildeo e a

implantaccedilatildeo de planos de desenvolvimento local e integrado de acordo com o planejamento

nacional e regional e ainda colaborar com os governos municipais na execuccedilatildeo do

planejamento local e integrado inclusive na organizaccedilatildeo de serviccedilos de natureza municipal

assistindo-os em assuntos de seu interesse e realizar estudos relacionados com as migraccedilotildees

internas (BRASIL 2004)

Os objetivos do BNH e SFH eram de coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos

puacuteblicos e o financiamento para o saneamento difundir a propriedade residencial entre as

112

classes de menor poder aquisitivo reduzir o preccedilo da habitaccedilatildeo pelo aumento da oferta da

economia de escala na produccedilatildeo proporcionar melhorias sanitaacuterias agrave populaccedilatildeo redistribuir

regionalmente os investimentos aumentar a eficiecircncia da aplicaccedilatildeo dos recursos estaduais e

municipais orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias populares

financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria propiciando a melhoria do padratildeo habitacional e do

ambiente eliminar as favelas aumentar o investimento da induacutestria de construccedilatildeo civil criar

poacutelos de desenvolvimento para melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas rurais e estimular a

poupanccedila privada e o investimento (RODRIGUES 2001)

Em 1968 foi criado o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS) e o Financiamento

de Saneamento (FINANSA) com subprogramas voltados para a implantaccedilatildeo ou melhoria de

sistemas de abastecimento de aacutegua de esgotos ou de drenagem e poluiccedilatildeo hiacutedrica

De acordo com Ministeacuterio das Cidades (2004) os recursos para o SFH seriam

oriundos principalmente de uma contribuiccedilatildeo compulsoacuteria de empresaacuterios e trabalhadores

do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)23 voltado para a produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

popular do Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo (SBPE)24 destinado a classe

meacutedia e dos lucros dos reembolsos de creacuteditos concedidos Este novo sistema implicou em

um processo de centralizaccedilatildeo o qual eliminou a praacutetica de construccedilatildeo de habitaccedilatildeo popular

por parte de instituiccedilotildees privadas e puacuteblicas como por exemplo sindicatos e institutos

previdenciaacuterios que constituiacuteam formas de alternativas de produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

Esse novo modelo da poliacutetica habitacional eacute implementado como um conjunto de

caracteriacutesticas que deixaram marcas importantes na estrutura institucional e na concepccedilatildeo

dominante de poliacutetica habitacional nos anos que se seguiram pois passou a apresentar um

caraacuteter mais amplo e global emergindo com o propoacutesito de diminuir o deacuteficit habitacional e

gerar novos empregos com o aumento de construccedilotildees legitimando assim o poder estatal e

criando condiccedilotildees para reproduccedilatildeo do capitalismo

Como a induacutestria de construccedilatildeo civil utiliza matildeo-de-obra em larga escala incentivar a induacutestria de construccedilatildeo eacute tambeacutem tentar atenuar a crise econocircmica Ao mesmo tempo difunde mais a ideologia da casa proacutepria contribui para a estabilidade social e torna os proprietaacuterios aliados da ordem A poliacutetica habitacional assume um modelo empresarial num momento em que eacute crucial para o novo regime dar provas de que eacute capaz de

23 O FGTS foi criado por meio da Lei nordm 5107 de 14 de setembro de 1966 e eacute composto por contas vinculadas em nome dos trabalhadores nas quais as empresas depositam mensalmente valor equivalente a 85 das remuneraccedilotildees que lhes satildeo pagas ou devidas (BRASIL 2004 p 22) 24 SBPE era constituiacutedo pelas Caixas Econocircmicas Federal e Estaduais pelas Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) e pelas Associaccedilotildees de Poupanccedilas e Empreacutestimos (BRASIL 2004 p 13)

113

atacar problemas sociais resolvendo a questatildeo da moradia Eacute preciso ocupar os vazios deixados com o fechamento poliacutetico (RODRIGUES 2001 p 57)

Com a criaccedilatildeo do BNH surgiram em todo o Paiacutes oacutergatildeos com a finalidade de

executar a poliacutetica habitacional como as Companhias de Habitaccedilatildeo (Cohab) no Paraacute25

Amazonas e Maranhatildeo26 que tinham como finalidade estudar as questotildees relacionadas agrave

habitaccedilatildeo de interesse social e executar essas poliacuteticas voltadas agraves famiacutelias de menor poder

aquisitivo

As Cohabs e outros oacutergatildeos semelhantes surgiram com o objetivo de apoiarem o SFH

executando o papel de agentes financeiros e promotores estabelecendo-se na qualidade de

sociedades de economia mista com capital originaacuterio constituiacutedo majoritariamente por

recursos do poder puacuteblico

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

regime militar para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades

brasileiras Embora o BNH e as Cohabs tenham surgido com um discurso que enfatizava o

caraacuteter social e o atendimento prioritaacuterio agraves famiacutelias de menor poder aquisitivo na praacutetica

esses oacutergatildeos desenvolveram poliacuteticas que acentuaram as desigualdades sociais e a segregaccedilatildeo

do espaccedilo urbano

Para Maricato (1996) a accedilatildeo do BNH natildeo se limitou apenas agrave habitaccedilatildeo pois acabou

ampliando significativamente suas intervenccedilotildees Passou a atuar no setor de desenvolvimento

urbano sendo considerado como um dos mais expressivos agentes financeiros do processo de

desenvolvimento urbano coordenando a poliacutetica habitacional e o financiamento para o

saneamento Esse banco financiou obras de infraestrutura urbana melhorou o sistema viaacuterio e

pavimentou ruas das cidades bem como aperfeiccediloou a rede de energia eleacutetrica de transportes

e de comunicaccedilatildeo incentivou a educaccedilatildeo a cultura e o desenvolvimento da induacutestria da

construccedilatildeo civil melhorou os serviccedilos puacuteblicos financiou planos e estudos para elaboraccedilatildeo

25 No Paraacute a Cohab instituiacuteda pela Lei Estadual nordm 3282 de 13 de abril de 1965 era uma empresa de economia mista e tinha as seguintes finalidades planejar e executar os programas de habitaccedilatildeo popular adquirir vender e urbanizar os terrenos a serem utilizados em programas habitacionais produzir e comercializar unidades habitacionais de interesse social exercer atividades de construccedilatildeo civil apoiar programas e projetos de desenvolvimento comunitaacuterio comprar e vender materiais de construccedilatildeo visando apoiar as metas do Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (ALVES 1997) 26 Em 1966 foi instituiacuteda a Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo (Cohab-MA) por meio da Lei nordm 2367 com o objetivo de promover a execuccedilatildeo de projetos habitacionais destinados agrave recuperaccedilatildeo ou erradicaccedilatildeo de aglomerados de sub-habitaccedilotildees e tambeacutem ao atendimento da demanda de habitaccedilatildeo de baixo custo destinadas agraves famiacutelias de baixo poder aquisitivo (entre um e trecircs salaacuterios miacutenimos)

114

de legislaccedilatildeo e projetos dentre outros Pode-se entatildeo afirmar que o BNH foi um dos

importantes promotores das transformaccedilotildees urbanas no Brasil

De 1964 a 1984 foram financiadas pelo BNH 4 milhotildees e 369 mil unidades sendo 2

milhotildees e 557 mil na faixa de interesse social o que representou 585 do total de unidades

financiadas Na faixa do SBPE foram financiadas 1 milhatildeo e 812 mil unidades No entanto

quando se considera os valores de financiamentos verificou-se que a maior porcentagem de

recursos foi canalizada para a faixa do SBPE (RODRIGUES 2001)

Entretanto esse modelo da poliacutetica habitacional se transforma em um instrumento de

repressatildeo por meio dos programas de remoccedilatildeo de favelas e passa a atender a nova classe

meacutedia surgida no contexto do desenvolvimento capitalista jaacute que as poliacuteticas puacuteblicas

implementadas natildeo eram eficientes eou suficientes para atender toda demanda

Outro fator relevante eacute que a produccedilatildeo privada tambeacutem natildeo atendia a demanda

habitacional aleacutem do que seu custo era significativamente superior a realidade financeira de

muitos trabalhadores e o aumento populacional nas grandes cidades agravava ainda mais o

problema habitacional no Brasil

Naquela eacutepoca dizia-se que o deacuteficit habitacional seria de 15 milhotildees de unidades

um dado geneacuterico que tinha como objetivo convencer a opiniatildeo puacuteblica da necessidade de um

nuacutemero absurdo de novas construccedilotildees e de angariar recursos para o setor As accedilotildees eram

determinadas pela cuacutepula do poder central com pouca ou nenhuma participaccedilatildeo popular

Destarte a prioridade da poliacutetica habitacional se desloca com o decorrer do tempo

nos primeiros anos os investimentos privilegiam as classes populares para legitimar o novo

regime e no periacuteodo de 1970 a 1975 o segmento popular passa para segundo plano uma vez

que o BNH redimensionou sua clientela e promoveu uma mudanccedila no cenaacuterio das cidades

por meio das verticalizaccedilotildees das edificaccedilotildees voltadas para atender aos funcionaacuterios puacuteblicos

teacutecnicos de niacutevel superior e trabalhadores qualificados

Em 1971 foi lanccedilado o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (PLANHAP) com o

intuito de se reaproximar da produccedilatildeo de moradias para as classes de menor poder aquisitivo

Entretanto natildeo obteve ecircxito

Tambeacutem em 1971 foi criado o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA)

elaborado para regular e propiciar maior dinamismo aos planos e obras e o BNH passou a

funcionar como banco de segunda linha e eacute transformado em empresa puacuteblica Em 1972 foi

criado o Projeto Comunidade Urbana para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) Todos esses

planos programas e projetos demonstram a consolidaccedilatildeo de um modelo econocircmico

115

caracterizado pela modernizaccedilatildeo da economia pela concentraccedilatildeo da renda nas classes altas e

meacutedias e a marginalizaccedilatildeo das classes populares (MARICATO 1996 34)

Vale ressaltar que havia uma desarticulaccedilatildeo entre as accedilotildees dos oacutergatildeos responsaacuteveis

pela construccedilatildeo das casas populares e os encarregados dos serviccedilos urbanos bem como a

construccedilatildeo de grandes conjuntos como forma de baratear o custo das moradias geralmente

feitos em locais distantes e sem infraestrutura e por uacuteltimo o seu modelo financeiro que se

revelou inadequado em uma economia com processo inflacionaacuterio (BRASIL 2004 p10)

Bonduki (1994 p 320) acrescenta que quando o BNH buscou reduzir o custo da

moradia para tentar atender a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo ao inveacutes de alterar o

processo de gestatildeo e produccedilatildeo que encarecia o produto final apoiando iniciativas que a

populaccedilatildeo jaacute vinha promovendo optou por rebaixar a qualidade da construccedilatildeo e tamanho da

unidade financiando moradias cada vez menores mais precaacuterias e distantes

O Promorar instituiacutedo no final do ano de 1979 tinha como bandeira de luta a

urbanizaccedilatildeo das favelas objetivando

a) Erradicar as sub-habitaccedilotildees destituiacutedas de condiccedilotildees miacutenimas de serviccedilos conforto e salubridade especialmente as que compotildeem aglomerados conhecidos por palafitas mocambos e favelas b) Priorizar a erradicaccedilatildeo de sub-habitaccedilotildees componentes de aglomerados que por sua situaccedilatildeo crocircnica socialmente criacutetica devem merecer preferecircncia na programaccedilatildeo dos governos estaduais c) Propiciar a permanecircncia das populaccedilotildees beneficiadas nas aacutereas onde anteriormente se localizavam apoacutes a eliminaccedilatildeo das sub-habitaccedilotildees d) Promover a recuperaccedilatildeo de assentamentos de submoradias sujeitas a inundaccedilotildees mediante a utilizaccedilatildeo de sistemas de aterro (SILVA 1989 p 77)

Todavia Silva (1989 p 77) ressalta que o Promorar demonstrou-se autoritaacuterio no

desenvolvimento da poliacutetica habitacional uma vez que impocircs agrave populaccedilatildeo as aacutereas de

remanejamento sem dialogo com a mesma derrubou barracos sem oferecer nenhuma

indenizaccedilatildeo obrigou as famiacutelias a comprarem uma casa muitas vezes em piores condiccedilotildees

do que a que foi demolida

Foram executados vaacuterios programas habitacionais que determinavam a forma como a

populaccedilatildeo poderia habitar sem nem mesmo ouvi-la Esse processo baseado na centralizaccedilatildeo

das decisotildees resultou muitas vezes em programas inadequados ou ineficazes agrave situaccedilatildeo

social do paiacutes Extensos conjuntos habitacionais obrigavam famiacutelias diferentes a viverem da

mesma forma gerando problemas de poacutes-ocupaccedilatildeo Habitaccedilotildees sem nenhuma particularidade

116

esteacutetica ou funcional eram construiacutedas como uma saiacuteda para o deacuteficit habitacional como se

apenas a quantidade fosse solucionar o problema

No periacuteodo de 1970 a 1980 relacionados agrave crise econocircmica mundial que se agravou

no Brasil acarretando em uma profunda reestruturaccedilatildeo produtiva como privatizaccedilotildees

parcerias entre puacuteblico e privado desregulamentaccedilatildeo e liberalizaccedilatildeo do Estado os recursos do

BNH tornam-se mais escassos decorrendo principalmente da inadimplecircncia dos mutuaacuterios

que foram contemplados com a casa proacutepria do aumento do valor das prestaccedilotildees mensais e

da diminuiccedilatildeo dos recursos oriundos do FGTS mediante o aumento do desemprego e a

retirada dos fundos por parte dos trabalhadores que ficaram desempregados Isto afetou

fortemente o setor habitacional

O aumento da inadimplecircncia deveu-se basicamente a natildeo correspondecircncia entre os

criteacuterios de reajuste salarial das prestaccedilotildees jaacute que a partir de 1983 a poliacutetica salarial passou

a reajustar os salaacuterios por faixa salarial onde os setores de baixo salaacuterio eram corrigidos

pelos iacutendices inflacionaacuterios e aplicados aos setores meacutedios e altos um redutor de reajuste

Poreacutem o valor das prestaccedilotildees continuou a ser corrigido segundo criteacuterio uacutenico sempre em

iacutendices superiores ao aumento meacutedio dos salaacuterios dos mutuaacuterios de renda mais elevada

acarretando inevitavelmente na inadimplecircncia dos mutuaacuterios (CARVALHO 1991 p52)

Segundo Valenccedila (2001) a reduccedilatildeo nos investimentos do Governo Federal voltados

agrave habitaccedilatildeo associados agraves altas taxas de inadimplecircncia contribuiacuteram ainda mais para a crise

do SFH e aleacutem disso a crise econocircmica abalou fortemente a sustentaccedilatildeo do governo militar

abrindo espaccedilo para os movimentos sociais que reivindicavam a reabertura poliacutetica e

melhores condiccedilotildees sociais inclusive com relaccedilatildeo agraves questotildees urbanas e de moradia

Desde 1980 que no Brasil 686 da populaccedilatildeo segundo dados da Fundaccedilatildeo IBGE moram na cidade Esse fato cada vez mais exige uma accedilatildeo positiva do Estado no ato da construccedilatildeo da moradia Dessa forma o Estado Brasileiro ao promover a distribuiccedilatildeo e gestatildeo dos equipamentos de consumo coletivo indispensaacuteveis agrave reproduccedilatildeo da vida nas cidades - no caso particular a moradia - tem contribuiacutedo tambeacutem para a expansatildeo urbana criando condiccedilotildees favoraacuteveis para que outros setores da sociedade ligados diretamente ao capital se reproduziam Eacute o caso das empresas de transportes empreiteiras etc (RODRIGUES 2001 p 59)

Valenccedila (2001) faz uma revisatildeo histoacuterica das poliacuteticas habitacionais desenvolvidas

pelos sucessivos governos brasileiros desde o final do periacuteodo militar ateacute o final dos anos

1990 montando um panorama a partir do quadro 2

117

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil

Periacuteodo Caracteriacutesticas Final dos anos 1970 ateacute 1983

Crises econocircmica e financeira abalam a principal fonte de recursos do SFH a renda da populaccedilatildeo

Governo Figueiredo (1979-85) adota medidas tanto econocircmicas quanto de poliacutetica habitacional que deram iniacutecio a crise do sistema

1983-1986

Governo Figueiredo toma medidas emergenciais

como o Bocircnus do BHN

para

solucionar problemas imediatos do SFH mas a crise se agrava

Ao final do periacuteodo o Governo Sarney (1985-89) patrocina dois foacuteruns de discussatildeo com a sociedade civil o grupo de trabalho sobre reformulaccedilatildeo do SFH - GTRSFH organizado pelo MDU e o debate nacional promovido juntamente pelo IAB e o MDU

Mutuaacuterios do BNH politicamente engajados deixam de pagar prestaccedilotildees e iniciam accedilotildees na justiccedila contra aumentos excessivos

Em 1986 sem grandes justificativas o governo federal fecha o BNH (interesse do poder executivo e de conglomerados financeiros em ter acesso agraves somas vultuosas das cadernetas de poupanccedila e FGTS que eram manipuladas apenas pelo sistema SFH-BNH)

1986-1990

Com o fechamento do BNH a poliacutetica habitacional eacute deixada de lado

O SFH continuou ainda operando minimamente

Eacute criada a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria ligada diretamente agrave Presidecircncia (clientelismo)

Poliacutetica habitacional aceacutefala e sem normas claras

1990-1992

Governo Collor confisca as cadernetas de poupanccedila por 18 meses e prejudica seriamente o SFH

Ministeacuterio da Accedilatildeo Social atraveacutes da Secretaria Nacional de Habitaccedilatildeo tendo como oacutergatildeo operador a Caixa Econocircmica Federal

CEF lanccedila programa habitacional para a aacuterea social mas devido agrave grande participaccedilatildeo da iniciativa privada muitas unidades habitacionais produzidas natildeo havia sido comercializada ateacute 1994 (preccedilo incompatiacutevel com a renda do puacuteblico-alvo)

A partir de 1992 recessatildeo e comprometimento do FGTS paralisam aprovaccedilotildees para projetos habitacionais

1993-1998

Governo Itamar Franco (1994-94) administraccedilatildeo da crise e reforma da CEF

Primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (1995-98) criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana (SEPURB) que junto ao Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento propotildeem a administram a poliacutetica habitacional tendo como oacutergatildeo executor a CEF Principais programas Proacute-Moradia Proacute-Credi e PAR (operaccedilatildeo dos sistemas de caderneta de poupanccedila e FGTS)

Fonte Valenccedila (2001 p 36)

A partir de 1986 quando ocorreu a extinccedilatildeo do BNH a Caixa Econocircmica Federal

(CEF) ficou com a atribuiccedilatildeo de desenvolver a poliacutetica habitacional do Paiacutes e o sistema

habitacional brasileiro passou a vivenciar intensas crises que acarretaram em um alto

endividamento desse sistema e na incapacidade de implementaccedilatildeo de novos projetos

A crise do SFH e a extinccedilatildeo do BNH criaram um hiato em relaccedilatildeo agrave poliacutetica

habitacional no Paiacutes com a desarticulaccedilatildeo progressiva da instacircncia federal a fragmentaccedilatildeo

institucional a perda de capacidade decisoacuteria e a reduccedilatildeo significativa dos recursos

disponibilizados para investimento na aacuterea (BRASIL 2004 p 10)

118

A esse respeito Azevedo (1996) contextualiza que no acircmbito institucional o

governo Sarney tomou diversas medidas que inicialmente indicavam uma intenccedilatildeo

reformadora Entretanto essas medidas demonstraram um retrocesso na adoccedilatildeo das poliacuteticas

habitacionais uma vez que a forma como foi decretada a extinccedilatildeo do BNH causou surpresa

para as entidades envolvidas na reformulaccedilatildeo do SFH jaacute que ocorreu de maneira abrupta e

sem margem para contrapropostas Esse procedimento se chocava com as declaraccedilotildees de

intenccedilotildees e encaminhamentos anteriores feitos pelo proacuteprio governo

Arretche (apud BONDUKI 2008) enfatiza as divergecircncias entre setores do governo

pela disputa em administrar os vultosos recursos envolvidos em investimentos na aacuterea

habitacional e de saneamento baacutesico assim como a estrateacutegia do governo federal em um

momento de reestruturaccedilatildeo poliacutetica para ampliar suas possibilidades de barganha junto aos

governos estaduais como elementos que contribuiacuteram para a extinccedilatildeo do BNH

Bonduki (2008 p 74) ressalta que

Dentre os erros praticados se destaca a opccedilatildeo por grandes conjuntos na periferia das cidades o que gerou verdadeiros bairros dormitoacuterios a desarticulaccedilatildeo entre os projetos habitacionais e a poliacutetica urbana e o absoluto desprezo pela qualidade do projeto gerando soluccedilotildees uniformizadas padronizadas e sem nenhuma preocupaccedilatildeo com a qualidade da moradia com a inserccedilatildeo urbana e com o respeito ao meio fiacutesico Indiferente agrave diversidade existente num paiacutes de dimensotildees continentais o BNH desconsiderou as peculiaridades de cada regiatildeo natildeo levando em conta aspectos culturais ambientais e de contexto urbano reproduzindo agrave exaustatildeo modelos padronizados

Esse panorama revela o papel do Estado enquanto agente promotor da segregaccedilatildeo e

de exclusatildeo de uma grande parcela da populaccedilatildeo ao direto agrave cidade aleacutem de consolidador da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao garantir o acesso agrave moradia apenas a classe meacutedia em detrimento

das classes de menor poder aquisitivo por meio de subsiacutedios oriundos do FGTS que de certa

forma satildeo provenientes dos trabalhadores

Eacute importante destacar que o BNH foi criado objetivando responder agrave forte crise de

moradia ocorrida pelo intenso processo de urbanizaccedilatildeo Para tanto era necessaacuterio

implementar uma poliacutetica de financiamento capaz de estruturar o setor da construccedilatildeo civil

habitacional

Esse fato desvelou o papel econocircmico da poliacutetica habitacional uma vez que

dinamizou a economia por meio da geraccedilatildeo de emprego e fortaleceu o setor da construccedilatildeo

civil transformando-se em um dos elementos centrais da estrateacutegia dos governos militares

119

Azevedo (1996 p 83) aponta as principais diferenccedilas na conduccedilatildeo dos programas

habitacionais apoacutes a mudanccedila do oacutergatildeo operador

a) apesar das duas instituiccedilotildees tratarem-se de bancos o BNH era considerado uma agecircncia financeira de vocaccedilatildeo social enquanto a CAIXA tinha uma atuaccedilatildeo mais comercial com maior preocupaccedilatildeo em equiliacutebrio de investimentos retorno de capital entre outros ressaltando que nessa nova situaccedilatildeo a questatildeo habitacional passou a ser tratada de forma setorial b) o novo arcabouccedilo normativo imposto pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e complementado pela CAIXA dificultou o acesso das Cohabs aos financiamentos habitacionais diminuindo expressivamente sua produccedilatildeo e consequumlentemente restringindo a capacidade das administraccedilotildees municipais e estaduais de atuar em investimentos habitacionais por outro lado facilitando o acesso agrave iniciativa privada neste setor c) a nova posiccedilatildeo das Cohabs no arranjo da poliacutetica habitacional passando de agentes promotores a oacutergatildeos assessores acarretou em enfraquecimento das companhias elevaccedilatildeo da faixa de renda das famiacutelias beneficiadas pelos programas habitacionais (acima de cinco salaacuterios miacutenimos) e desaceleraccedilatildeo dos programas alternativos

A incorporaccedilatildeo das atividades do BNH agrave CEF fez com que a questatildeo habitacional

passasse a depender de uma instituiccedilatildeo em que essa questatildeo embora importante fosse

objetivo setorial Do mesmo modo ainda que considerada como agecircncia financeira de

vocaccedilatildeo social a Caixa possui como eacute natural paradigmas institucionais de um banco

comercial como a busca de equiliacutebrio financeiro retorno do capital aplicado etc

(AZEVEDO 1996 p 84)

Em 1987 foi criado o Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente (MHU)

cujo objetivo era a gestatildeo das poliacuteticas de transportes urbanos e a incorporaccedilatildeo da CEF

estando a poliacutetica habitacional e urbana sob a responsabilidade do referido ministeacuterio

(BRASIL 2004)

Segundo Azevedo (1996 p 17) no primeiro ano apoacutes a extinccedilatildeo do BNH as

Cohabs financiaram 113389 casas populares Poreacutem durante o primeiro semestre de 1988

esse nuacutemero caiu para 30646 unidades Essa reduccedilatildeo ocorreu devido agraves mudanccedilas da

poliacutetica habitacional a partir da Resoluccedilatildeo nordm 1464 de 26 de fevereiro de 1988 do Conselho

Monetaacuterio Nacional (CMN) que sob a alegaccedilatildeo da necessidade de controle das diacutevidas dos

estados e municiacutepios criou medidas restritivas ao acesso a creacuteditos por parte das Cohabs

No que diz respeito ao Maranhatildeo entre os anos de 1962 e 1965 foram construiacutedas

752 unidades habitacionais em sete municiacutepios maranhenses das quais 624 ou 8298

concentraram-se na capital especialmente na aacuterea central conforme quadro 3

120

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965

Municiacutepio Conjunto habitacional Nordm de unidades Satildeo Luiacutes Joseacute Bonifaacutecio A Silva 536

Nossa Sra das Graccedilas 40 Bancaacuterios 48

Caxias Caxias I 30 Caxias II 30

Codoacute Codoacute 10 Carolina Carolina 10 Pedreiras Pedreiras 20 Bacabal Bacabal 20 Timon Timon 08

Total 752 Fonte MARANHAtildeO STDUCPH Diagnoacutestico Habitacional do Estado do Maranhatildeo Satildeo Luiacutes 1988 p 66

A execuccedilatildeo de programas habitacionais por meio da Cohab assumiu papel central

na poliacutetica urbana do Governo Sarney No periacuteodo de 1967 a 1971 foi planejada a construccedilatildeo

de 7000 unidades habitacionais e o financiamento de melhorias habitacionais de outras 7000

unidades habitacionais deficientes na cidade de Satildeo Luiacutes (PEMAS 2004)

Entretanto em funccedilatildeo do jogo poliacutetico e dos interesses econocircmicos das elites que

deram sustentaccedilatildeo ao projeto de modernizaccedilatildeo conservadora as atuaccedilotildees da Cohab tiveram

um alcance limitado no sentido de resolver os graves problemas sociais que se acentuavam na

cidade

De acordo com Luz (2004) na deacutecada de 1970 as aacutereas de palafitas se ampliaram

principalmente em direccedilatildeo agrave regiatildeo do Satildeo Francisco Ilhinha Lagoa da Jansen e para os

manguezais da margem esquerda do Rio Anil proacuteximos dos bairros do Caratatiua Alemanha

Vinhais e Ipase No mesmo periacuteodo foi ampliada a frente de expansatildeo urbana em direccedilatildeo a

Regiatildeo do ItaquiBaganga aleacutem disso novos bairros como Vila Nova Saacute Viana Novo Vila

Embratel Anjo da Guarda e Itaquiacute experimentaram um raacutepido crescimento populacional em

funccedilatildeo da chegada de milhares de famiacutelias expulsas da terra ou deslocadas de suas moradias

para implantaccedilatildeo de grandes projetos no interior da ilha

Em resposta ao agravamento das condiccedilotildees de vida na cidade bem como em uma

estrateacutegia de buscar apoio poliacutetico junto agrave populaccedilatildeo o governo lanccedilou no final de 1979 o

Programa de Erradicaccedilatildeo de Moradias Subnormais o Promorar que seraacute melhor apresentado

no capiacutetulo IV (DIAGNOacuteSTICO HABITACIONAL 1987 p 34)

121

Vale ressaltar que os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda

foram marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a

exemplo dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Em relaccedilatildeo ao Estado do Paraacute pode-se observar que no periacuteodo de 1965 a 1989 a

CohabPa implementou vaacuterios programas habitacionais na Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

(RMB) cujo nuacutemero de unidades habitacionais construiacutedas ateacute o ano de 1989 foi de 22949

conforme tabela 2

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-1989) Nome do Conjunto Ano Nordm Unid Habitacional Municiacutepio

Nova Marambaia I 1965 834 Beleacutem Ananindeua 1971 118 Ananindeua Nova Marambaia II 1972 376 Beleacutem Nova Marambaia III 1973 332 Beleacutem Icoaraci I 1973 296 Beleacutem Icoaraci II 1976 554 Beleacutem Icoaraci III 1976 350 Beleacutem Cidade Nova I 1976 600 Ananindeua Cidade Nova II 1976 1000 Ananindeua Cidade Nova III 1977 461 Ananindeua Cidade Nova IV 1978 2005 Ananindeua Cidade Nova V 1978 3173 Ananindeua Profilurb I 1978 756 Ananindeua Cidade Nova VI 1979 4000 Ananindeua Cidade Nova VII 1980 700 Ananindeua Guajaraacute I 1981 1948 Ananindeua Promorar 1981 1481 Beleacutem Cidade Nova VIII 1986 1879 Ananindeua Cidade Nova IX 1986 120 Ananindeua Cidade Nova (2ordf etapa) 1987 87 Ananindeua Cidade Nova VIII (2ordf etapa) 1988 1109 Ananindeua Catalina 1989 770 Ananindeua

TOTAL 22949 Fonte Alves (1997)

As unidades habitacionais construiacutedas pela CohabPa embora natildeo tenham sido

suficientes para cobrir o deacuteficit habitacional expressivo existente na RMB refletem o

processo de transformaccedilatildeo do uso do solo o qual estaacute articulado intimamente com o mercado

122

de terras e com a segregaccedilatildeo soacutecioespacial expressando as desigualdades de acesso aos

recursos materiais luacutedicos e simboacutelicos da cidade

Na RMB desencadeou-se um padratildeo de urbanizaccedilatildeo alicerccedilada na reproduccedilatildeo de

eixos de expansatildeo horizontal que foi fortemente impulsionado pelo planejamento econocircmico

e territorial e particularmente pelas poliacuteticas de financiamento para a produccedilatildeo habitacional e

de infraestruturas

Destarte a atividade do capital imobiliaacuterio propocircs uma forma de produccedilatildeo do espaccedilo

baseada em uma necessidade de extrair lucro do solo urbano estabelecendo uma relaccedilatildeo

proacutepria entre a ocupaccedilatildeo do solo demandas de mercado e especulaccedilatildeo Dessa maneira atua

sobre o ambiente construiacutedo e depara-se com questotildees que extrapolam o campo econocircmico

Entatildeo os loteamentos ou os conjuntos habitacionais passam a ter tambeacutem um valor

simboacutelico uma vez que o espaccedilo fiacutesico eacute construccedilatildeo do imaginaacuterio individual e coletivo

Smolka (1983 p 140) argumenta que a mediaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio eacute elo

criacutetico do padratildeo de segregaccedilatildeo residencial cujo padratildeo eacute definido por vaacuterios processos que

vatildeo desde a substituiccedilatildeo dos moradores por meio de transaccedilotildees atomizadas de compra e

venda de imoacuteveis usados ateacute as incorporaccedilotildees imobiliaacuterias

conversotildees de uso do solo

visando lucro Esse conjunto de processos assevera a hegemonia da lei do mercado na

determinaccedilatildeo de importantes fenocircmenos que estatildeo diretamente associados agrave geraccedilatildeo e

transformaccedilatildeo de padrotildees de segregaccedilatildeo residencial tais como a mobilidade eou migraccedilotildees

intra-urbana e a valorizaccedilatildeo e desvalorizaccedilatildeo de vizinhanccedilas

De acordo com Trindade Junior (1998) essa eacute a realidade vivenciada na RMB a

qual demonstra a consolidaccedilatildeo da cidade dispersa sendo esta a dimensatildeo espacial do processo

de reproduccedilatildeo do capital com a reafirmaccedilatildeo das divisotildees de mercados e com escalas de

atuaccedilatildeo diferenciadas na qual as empresas de menor forccedila de accedilatildeo tendem a continuar na

dependecircncia direta dos programas de financiamento do Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo na

Aacuterea de Expansatildeo em especial na direccedilatildeo do Municiacutepio de Ananindeua e do distrito de

Icoaraci sob pena de natildeo confirmarem sua permanecircncia no mercado Ao passo que atraveacutes

do programa de lotes urbanizados accedilatildeo prioritaacuteria da CohabPa hoje e do processo ainda

crescente de ocupaccedilotildees urbanas confirme-se a tendecircncia de maior adensamento urbano dos

Municiacutepios de Marituba Benevides e tambeacutem do distrito de Icoaraci

Nesse sentido ao se analisar a produccedilatildeo de unidades habitacionais tanto no Estado

do Maranhatildeo quanto no Estado do Paraacute nota-se que a disponibilidade de creacutedito a juros

voltado para a produccedilatildeo de imoacuteveis novos permitiu agrave classe meacutedia constituir novos bairros e

123

ampliar a fronteira urbana gerando aleacutem da expansatildeo horizontal o gradual esvaziamento dos

centros tradicionais

Aleacutem disso os investimentos na produccedilatildeo de moradias para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo foram reduzidos natildeo alterando o processo de gestatildeo e rebaixando a

qualidade da construccedilatildeo e o tamanho das unidades habitacionais

No acircmbito nacional cabe destacar que em marccedilo de 1989 foi extinto o Ministeacuterio

do Bem-Estar Social (MBES) e criou-se a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria (SEAC)

sob competecircncia do Ministeacuterio do Interior As atividades financeiras desse Sistema estavam

vinculados ao Ministeacuterio da Fazenda

O modelo institucional adotado pelo SEAC privilegiava a iniciativa de estados e

municiacutepios deixando de estabelecer prioridades alocativas o que permitiu maior autonomia

desses governos e o gerenciamento da poliacutetica habitacional

O Programa Nacional de Mutirotildees Habitacionais da SEAC foi um programa

alternativo lanccedilado pelo governo Sarney com o intuito de atender as famiacutelias com renda

mensal ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos Para tanto teria como financiamento os recursos de verba

orccedilamentaacuteria a fundo perdido geralmente em parceria com prefeituras ou estados

acompanhado por grupos constituiacutedos por representantes da comunidade assistida

denominados Sociedade Comunitaacuteria Habitacional (SCH) (AZEVEDO 1996)

No entanto a utilizaccedilatildeo dos recursos do FGTS em quantidade que superava suas

reais disponibilidades financeiras afetou as possibilidades de expansatildeo do financiamento

habitacional levando a sua suspensatildeo temporaacuteria

Para Azevedo (1996 p 83) a experiecircncia da SEAC eacute relevante para se compreender

a poliacutetica habitacional brasileira pois num periacuteodo inferior a dois anos (aproximadamente de

1988 a 1990) o oacutergatildeo que pretendia construir 550000 novas moradias alcanccedilou um terccedilo

disto ainda assim superando a produccedilatildeo realizada pelas Cohabs no mesmo periacuteodo Por

meio de programas tradicionais na CEF que natildeo chegou a 150000 unidades tornando-se

uma experiecircncia importante pois foi a primeira vez na trajetoacuteria da poliacutetica popular

brasileira que um programa alternativo apresentou melhor desempenho quantitativo do que os

convencionais

Contudo alguns fatores satildeo destacados para explicar a natildeo plenitude na execuccedilatildeo

dessas medidas o baixo financiamento unitaacuterio aliado agrave inflaccedilatildeo crescente a maacute utilizaccedilatildeo

dos recursos o processo inflacionaacuterio a dependecircncia exclusiva de verbas orccedilamentaacuterias aleacutem

da inexistecircncia de uma poliacutetica clara de prioridades para alocaccedilatildeo de recursos e as accedilotildees

clientelismo (VALENCcedilA 1999 apud AZEVEDO 1996)

124

Com a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 haacute uma institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas em especial da habitacional O

processo de descentralizaccedilatildeo e a reforma do Estado estabelecem uma redefiniccedilatildeo de

competecircncias passando a ser atribuiccedilatildeo dos Estados e Municiacutepios a gestatildeo dos programas

sociais e dentre eles o de habitaccedilatildeo seja por iniciativa proacutepria seja por adesatildeo a algum

programa proposto por outro niacutevel de governo seja por imposiccedilatildeo Constitucional (BRASIL

2004 p 10)

Conforme foi citado no capiacutetulo anterior o ideaacuterio da reforma urbana corresponde a

uma reforma social estrutural com uma muito forte e evidente dimensatildeo espacial tendo por

objetivo melhorar a qualidade de vida da populaccedilatildeo especialmente de sua parcela mais pobre

e elevar o niacutevel de justiccedila social tendo como objetivos coibir a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

reduzir o niacutevel de disparidade socioeconocircmico-espacial intra-urbano democratizar o

planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano (SOUZA 2002 p112-113)

De acordo com Maricato (1997 p 311) as principais propostas apresentadas na

referida emenda foram

Em relaccedilatildeo agrave propriedade imobiliaacuteria urbana

instrumentos de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Captaccedilatildeo da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria Aplicaccedilatildeo da funccedilatildeo social da propriedade Proteccedilatildeo urbaniacutestica ambiental e cultural Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica habitacional

programas puacuteblicos habitacionais de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Aluguel ou prestaccedilatildeo da casa proacutepria proporcional agrave renda familiar Agecircncia nacional e descentralizaccedilatildeo na gestatildeo da poliacutetica Em relaccedilatildeo aos transportes e serviccedilos pppa

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-008406406 3645 6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 172419 1090)Tj0081743 7Pode6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17279501090)Tj00843 7-6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17285801090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0203201090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17310301090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0319701090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0328001090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0308401090)Tj009187 8445 5727 Tm(a)Tj03Tj01090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0349001090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17357401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj036501090)Tj0r9187 Tf009187 0 0 -009187 17308401090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17389101090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0398701090)Tj0m0 -009187 6928 5727 Tm(413001090)Tj0oj0 Tf009187 0 0 -009187 174)1401090)Tj0g9187 8267 5727 Tm(a)Tj0448401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0449101090)Tj088 Tz(referida emenda for458501090)Tj008406 64eferida emenda for467901090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0408401090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17493501090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0509181090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0511201090)Tj009187 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125

direito fundamental da pessoa humana que soacute pode ser assegurada a partir da efetivaccedilatildeo de

uma poliacutetica habitacional comprometida com a melhoria das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo

Entretanto durante a vigecircncia do governo Collor no periacuteodo de 1990 a 1992

ocorreu um agravamento no desenvolvimento das poliacuteticas habitacionais gerada pelo confisco

das cadernetas de poupanccedila acarretando na estagnaccedilatildeo da mesma e do FGTS visto que parte

do dinheiro que era investido em poupanccedila estava destinado ao SFH

Nesse periacuteodo o Estado reduziu sua participaccedilatildeo no mercado de terras diminuindo

os gastos sociais e a forma de movimentaccedilatildeo de capital deixando a cargo dos especuladores

imobiliaacuterio a produccedilatildeo de moradias o que acarretou no monopoacutelio fundiaacuterio e provocou o

agravamento da crise no setor habitacional

Conforme Azevedo (1996 p 84) houve uma banalizaccedilatildeo da poliacutetica habitacional

por conta da dissociaccedilatildeo das atividades de saneamento e desenvolvimento urbano e sua

transformaccedilatildeo em uma poliacutetica distributiva agora vinculada ao novo Ministeacuterio da Accedilatildeo

Social Portanto a alocaccedilatildeo das unidades construiacutedas tanto pelos programas populares

convencionais como pelos alternativos de autoconstruccedilatildeo continuou sendo feita por criteacuterios

aleatoacuterios

Dois exemplos podem ser destacados para ratificar a argumentaccedilatildeo da autora

primeiro no final dos anos de 1990 o governo brasileiro criou o Programa Carta de Creacutedito

que teve por objetivo proporcionar o financiamento de construccedilatildeo sob a forma associativa

propiciando uma nova maneira de morar na qual as pessoas satildeo agrupadas e coordenadas por

entidades organizadas que constroem os conjuntos habitacionais e condomiacutenios fechados

(AZEVEDO 1996 p 85)

O financiamento individual ficou mantido na faixa de doze salaacuterios miacutenimos com tratamento diferenciado para os mutuaacuterios com renda familiar de ateacute seis salaacuterios miacutenimos sob o discurso da redistribuiccedilatildeo de renda Com relaccedilatildeo agrave taxa de juros praticados pelo Programa variava de 3 a 9 de acordo com as diferentes faixas de renda (AZEVEDO 1996 p 85)

Segundo o governo Collor lanccedilou em maio de 1990 o Plano de Accedilatildeo Imediata para

a Habitaccedilatildeo (PAIH) que previa a construccedilatildeo de 245 mil unidades habitacionais em 180 dias

para famiacutelias de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos com recursos do FGTS e se desenvolveria em

trecircs vertentes programa de moradias populares (produccedilatildeo de novas unidades) programa

de lotes urbanizados (com ou sem cesta baacutesica de materiais) e programa de accedilatildeo municipal

para habitaccedilatildeo popular (unidades acabadas e lotes urbanizados) (AZEVEDO 1996 p 85)

126

Contudo fazendo uma avaliaccedilatildeo do PAIH percebe-se que vaacuterias metas natildeo foram

cumpridas como o prazo estimado de 180 dias prolongou-se por mais de 18 meses 210 mil

unidades habitacionais construiacutedas a valores significativamente maiores que os previstos

inicialmente aleacutem disso a alocaccedilatildeo de recursos natildeo atendeu aos percentuais definidos pelo

Conselho Curador do FGTS para os diversos estados da Federaccedilatildeo

Outro fator importante eacute que as parcerias das empresas privadas fizeram com que as

unidades habitacionais ficassem mais caras e a camada de menor poder aquisitivo que era

tida como puacuteblico-alvo passou a ser excluiacuteda por sua incapacidade do pagamento um dos

motivos que contribuiu para a insatisfaccedilatildeo da populaccedilatildeo ocasionando no impeachment do

presidente Collor27

No periacuteodo de 1992 a 1994 durante o governo de Itamar Franco houve uma

modificaccedilatildeo do cenaacuterio econocircmico por meio do controle da inflaccedilatildeo e fortalecimento da

economia com o Plano Real e a gestatildeo da poliacutetica puacuteblica de habitaccedilatildeo ganha novos rumos

por meio da implantaccedilatildeo dos Programas Habitar Brasil (voltado para os municiacutepios de mais

de 50 mil habitantes) e Morar Municiacutepio

(destinado aos municiacutepios de menor porte) que se

apresentaram como alternativas para a produccedilatildeo de moradias Estes programas na aacuterea de

habitaccedilatildeo popular agora sob o controle do Ministeacuterio do Bem-Estar Social exigiam a

participaccedilatildeo de Conselhos Gestores Estaduais de Poliacutetica Puacuteblica de Habitaccedilatildeo e para os

investimentos poderiam ter uma contrapartida dos governos locais

Segundo Azevedo (1996 p 88) do ponto de vista poliacutetico os programas

apresentaram um avanccedilo quanto agrave gestatildeo da poliacutetica habitacional atraveacutes dos conselhos e a

constituiccedilatildeo de fundos especiacuteficos para a habitaccedilatildeo Do ponto de vista operacional de

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional tiveram pouca efetividade

Em 1995 com o governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) ocorreu a

consolidaccedilatildeo da poliacutetica neoliberal com incentivo a privatizaccedilatildeo e a habitaccedilatildeo passou a ser

tratada no acircmbito da poliacutetica de desenvolvimento urbano integrada agrave poliacutetica urbana e agrave

poliacutetica de saneamento ambiental articulando accedilotildees com os estados e municiacutepios a fim de

garantir o uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano e a funccedilatildeo social das cidades empreendendo uma

reforma mais efetiva nesse setor promovendo uma ampla reorganizaccedilatildeo institucional com a

extinccedilatildeo do Ministeacuterio do Bem Estar Social e com a criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana

(SEPURB) no acircmbito do Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento (MPO) esfera que ficaria

27 O impeachment de Collor foi fruto da articulaccedilatildeo de vaacuterios movimentos sociais dentre eles o Movimento pela Eacutetica na Poliacutetica Movimento dos Caras-Pintadas (composto basicamente por estudantes secundaristas e universitaacuterios) e por meio da organizaccedilatildeo da sociedade civil

127

responsaacutevel pela formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo aleacutem de

defender uma poliacutetica fundiaacuteria urbana adequada de modo a desestimular a formaccedilatildeo de

estoques de terras para fins especulativos (OLIVEIRA 2001)28

No Brasil desenvolveu-se um intenso processo de globalizaccedilatildeo financeira e

produtiva internacional que foi marcado por uma ideologia denominada de neoliberalismo

que pregava a reduccedilatildeo do papel do Estado ao miacutenimo e a liberalizaccedilatildeo do mercado ao

maacuteximo provocando a reduccedilatildeo da intervenccedilatildeo estatal nas poliacuteticas sociais natildeo sendo mais

entendido como o provedor de serviccedilos puacuteblicos mas como promotor e regulador

(BONDUKI 2008)

Neste sentido propotildee que os programas habitacionais

aleacutem de flexiacuteveis para atender a diferentes setores sociais

sejam pensados de forma integrada aos de saneamento ambiental infraestrutura social e transporte urbano Esta mudanccedila de inflexatildeo da poliacutetica habitacional

que deixa de ser vista apenas como uma poliacutetica assistencialista

registra um enfoque de poliacuteticas puacuteblicas que abre maiores possibilidades de accedilotildees integradas e muito mais efetivas no campo do habitat (AZEVEDO 1996 p 92)

No campo da habitaccedilatildeo popular as propostas eram apoiar programas geradores de

tecnologia simplificada que possibilitassem a construccedilatildeo de moradias de qualidade a custo

reduzido privilegiar as formas associativas e cooperativas de produccedilatildeo de habitaccedilotildees e

incentivar programas de assistecircncia teacutecnica aos oacutergatildeos entidades e organizaccedilotildees

comunitaacuterias comprometidas com soluccedilotildees locais e integradas de interesse social Os

princiacutepios adotados como novos referenciais pelo menos na retoacuterica eram flexibilidade

descentralizaccedilatildeo diversidade reconhecimento da cidade real entre outros (BONDUKI

2008)

Bonduki (2008) argumenta que foram retomados os financiamentos de habitaccedilatildeo e

saneamento com base nos recursos do FGTS Tambeacutem foram criadas novas linhas de

financiamento habitacional tendo como base os projetos propostos pelos governos estaduais e

municipais com sua concessatildeo estabelecida a partir de um conjunto de criteacuterios teacutecnicos de

projeto e ainda da capacidade de pagamento dos governos locais

28 No Paraacute de acordo com Holanda (2011) em 1995 a Cohab passou por uma reestruturaccedilatildeo institucional com o objetivo de retomar os financiamentos na aacuterea habitacional passando a executar accedilotildees voltadas agrave instrumentalizaccedilatildeo do planejamento urbano por meio da elaboraccedilatildeo de bases cartograacuteficas e investimentos em urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas e loteamentos aleacutem da produccedilatildeo de habitaccedilotildees em pequena escala destinada ao atendimento de servidores puacuteblicos estadual pois a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para servidores foi uma estrateacutegia encontrada pela COHAB-PA para viabilizar novos empreendimentos visto que nesse periacuteodo os programas habitacionais de FHC se mostravam bastante restritivos e produzi para servidores puacuteblicos facilitava a aprovaccedilatildeo de projetos junto agrave CEF jaacute que os descontos das parcelas do financiamento eram realizados na folha de pagamento mensal ou seja os riscos de inadimplecircncia eram miacutenimos

128

Foram instituiacutedos vaacuterios programas direcionados a questatildeo habitacional no governo

de FHC conforme demonstrado no quadro 4

Quadro 4- Programas Habitacionais implementados no Governo FHC Programas Accedilotildees

Proacute-Moradia

Antigo Morar Municiacutepio era financiado com recursos do FGTS e voltado ao atendimento da melhoria nas condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos e na aquisiccedilatildeo ou produccedilatildeo de lotes urbanizados materiais de construccedilatildeo produccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo de conjuntos habitacionais Deveria ser pleiteados por oacutergatildeos da administraccedilatildeo estadual ou municipal adimplentes junto ao governo federal e ter capacidade de endividamento

Carta de Creacutedito Individual

Visava melhorias das condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 12 salaacuterios miacutenimos por meio das modalidades de aquisiccedilatildeo de unidade habitacional (avaliada no maacuteximo em R$ 8 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 10 mil) conclusatildeo reforma ou ampliaccedilatildeo de imoacutevel usado Utilizava recursos do FGTS e das cadernetas de poupanccedila

Carta de Creacutedito Associativa

Com recursos do FGTS objetivava a construccedilatildeo de unidades habitacionais (valor maacuteximo de R$ 315 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 8 mil) por meio da concessatildeo de financiamento a pessoas fiacutesicas agrupadas em condomiacutenios ou organizadas por sindicatos cooperativas ou associaccedilotildees voltadas agrave produccedilatildeo habitacional

Apoio agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

Apoiava a induacutestria da construccedilatildeo civil na produccedilatildeo de ateacute 500 unidades habitacionais utilizando recursos do FGTS e era voltado para o atendimento de famiacutelias da classe meacutedia e alta Teve um desempenho piacutefio

Habitar Brasil BID

Era financiado com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) tinha como objetivo propiciar melhoria das condiccedilotildees de habitabilidade de aacutereas degradas e era voltada para o poder puacuteblico municipal

Programa de Arrendamento Residencial (PAR)

Programa considerado inovador que concedia empreacutestimo agraves empresas privadas para produccedilatildeo habitacional no intuito de atender as famiacutelias entre trecircs e seis salaacuterios miacutenimos Utilizava um mix de recursos formado pelo FGTS e recursos de origem fiscal

Fonte Valenccedila (2001) Cardoso (2003) Azevedo (2007) Bonduki (2008)

Em 1997 foi criado o Sistema Financeiro Imobiliaacuterio (SFI) por meio da Lei Federal

nordm 9 512 inspirado na experiecircncia norte-americana que operava com recursos da iniciativa

privada tanto nacional como internacional Este Sistema gerava maior seguranccedila aos

investidores imobiliaacuterios atraveacutes da chamada alienaccedilatildeo fiduciaacuteria uma vez que a propriedade

129

soacute era passada ao mutuaacuterio apoacutes a quitaccedilatildeo do valor do imoacutevel o que propiciava ao

financiador a agilidade na retomada dos bens no caso de inadimplecircncia

Isto demonstra a ineficiecircncia do mesmo como modelo de financiamento agrave

estruturaccedilatildeo de poliacuteticas habitacionais pois natildeo combateu o problema do deacuteficit habitacional

dada suas especificidades em conceder creacutedito imobiliaacuterio agrave famiacutelias de maior poder

aquisitivo

O Proacute-Moradia e o Programa Habitar Brasil buscavam-se beneficiar 677100

famiacutelias investindo R$ 52 bilhotildees sendo R$ 4 bilhotildees de recursos do FGTS e R$ 12 milhatildeo

da contrapartida de estados e municiacutepios (SEPURB 1996a 1996b apud AZEVEDO 1996

p24)

Todavia 1996 e 2000 o desempenho do governo no que diz respeito agrave poliacutetica de

habitaccedilatildeo popular stricto sensu pode ser considerado piacutefio ficando aqueacutem do inicialmente

planejado pois para o programa Proacute-Moradia foram investidos cerca de R$ 830 milhotildees

em recursos do FGTS para a construccedilatildeo de 155219 unidades residenciais a um custo meacutedio

unitaacuterio de R$ 540000 No mesmo periacuteodo com recursos a fundo perdido do OGU foram

alocados no Morar Melhor Habitar Brasil em torno de R$ 860 milhotildees que resultaram na

construccedilatildeo de 294595 moradias com custo unitaacuterio meacutedio de R$ 292000

(CAIXA 2000

apud AZEVEDO 1996 p 24)

Bonduki (2008) argumenta que os programas citados acima embora pudessem

expressar uma renovaccedilatildeo na maneira como a questatildeo da habitaccedilatildeo passou a ser tratada pelo

Governo Federal rompendo a riacutegida concepccedilatildeo herdada dos tempos do BNH de fato natildeo

conseguiu se efetivar como nova poliacutetica gerando um conjunto de efeitos perversos do ponto

de vista social econocircmico e urbano

O financiamento para aquisiccedilatildeo de imoacuteveis usados que absorveu 42 do total de recursos destinados agrave habitaccedilatildeo (cerca de 93 bilhotildees) eacute um programa com escasso impacto natildeo gerando empregos a atividade econocircmica O financiamento para material de construccedilatildeo embora tenha o meacuterito de apoiar o enorme conjunto de famiacutelias de baixa renda que auto-empreende a construccedilatildeo da casa proacutepria e de gerar um atendimento massivo (567 mil beneficiados no periacuteodo a de maior alcance quantitativo) tende a estimular a produccedilatildeo informal de moradia agravando os problemas urbanos Ademais o baixo valor do financiamento e a ausecircncia de assessoria teacutecnica natildeo permitem que as famiacutelias beneficiadas alcancem condiccedilotildees adequadas de habitabilidade (BONDUKI 2008 p 80)

Eacute importante observar que apesar do avanccedilo no desenvolvimento das poliacuteticas

habitacionais os programas executados mantiveram ou ateacute mesmo acentuaram o caraacuteter

130

tradicional das poliacuteticas implementadas no Brasil isto eacute de um atendimento privilegiado agraves

camadas de renda meacutedia e alta

De acordo com Bonduki (2008 p 80) referente aos anos de 1995 e 2003 observa-se

que 7884 do total dos recursos foram destinados a famiacutelias com renda superior a 5 salaacuterios

miacutenimos sendo que apenas 85 foram destinados para a baixiacutessima renda (ateacute 3 salaacuterios

miacutenimos) e onde se concentram 832 do deacuteficit quantitativo conforme graacutefico 1

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a 2003

Fonte Bonduki (2008)

Em 2003 inicia-se o Governo Lula Neste governo inicialmente havia uma

preocupaccedilatildeo com a questatildeo habitacional sendo que vaacuterios instrumentos e oacutergatildeos foram

criados objetivando atender agrave demanda habitacional no territoacuterio brasileiro tais como o

Ministeacuterio das Cidades que integralizou a questatildeo habitacional do saneamento e dos

transportes (mobilidade) levando em consideraccedilatildeo o uso e a ocupaccedilatildeo do solo29 o Sistema

Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) criado por meio da Lei nordm 1112430 que

tambeacutem instituiu o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (FNHIS) e seu

29 Foram criadas as Secretarias Nacionais de Habitaccedilatildeo de Saneamento de Mobilidade Urbana e de Programas Urbanos pertencentes ao Ministeacuterio das Cidades 30 Essa lei eacute resultado do projeto apresentado por iniciativa popular em novembro de 1991 e condensa as expectativas de diversas organizaccedilotildees da sociedade civil que atuam no setor da habitaccedilatildeo popular

131

respectivo Conselho Nacional31 centralizando os recursos orccedilamentaacuterios dos programas de

Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Subnormais e de Habitaccedilatildeo de Interesse Social com o intuito

de possibilitar subsiacutedio habitacional para famiacutelias de baixo poder aquisitivo

O SNHIS pretende entre outros objetivos viabilizar para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo o acesso agrave terra urbanizada e agrave habitaccedilatildeo digna e sustentaacutevel Cabe a esse

Sistema a centralizaccedilatildeo de todos os programas e projetos destinados agrave habitaccedilatildeo de interesse

social dando-lhes maior coerecircncia e mais eficiecircncia (BONDUKI 2008)

O FNHIS eacute composto por recursos do Orccedilamento Geral da Uniatildeo (OGU) do Fundo

de Apoio ao Desenvolvimento Social (FADS) dotaccedilotildees recursos de empreacutestimos externos e

internos contribuiccedilotildees e doaccedilotildees de pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas entidades e organismos de

cooperaccedilatildeo nacional e internacional e de receitas de operaccedilotildees realizadas com recursos do

proacuteprio Fundo Tem como objetivo centralizar e gerenciar recursos orccedilamentaacuterios para os

programas estruturados no acircmbito do Sistema como aquisiccedilatildeo construccedilatildeo conclusatildeo

reforma locaccedilatildeo social e arrendamento de unidades habitacionais produccedilatildeo de lotes

urbanizados para fins habitacionais regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbaniacutestica de aacutereas de interesse

social e a implantaccedilatildeo de saneamento baacutesico infraestrutura e equipamentos urbanos

(AZEVEDO 2007)

A poliacutetica de habitaccedilatildeo desenvolvida no governo Lula tem como objetivos

i)universalizar o acesso agrave moradia digna ii) promover a urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo e inserccedilatildeo urbana de assentamentos precaacuterios iii) fortalecer o papel do Estado na gestatildeo da poliacutetica e na regulaccedilatildeo dos agentes privados dentro de um novo modelo com desconcentraccedilatildeo de funccedilotildees e articulaccedilatildeo de accedilotildees para possibilitar a participaccedilatildeo de amplos segmentos da sociedade na sua implantaccedilatildeo iv) tornar a questatildeo habitacional uma prioridade nacional v) democratizar o acesso a terra urbanizada e ao mercado secundaacuterio de imoacuteveis vi) ampliar a produtividade e melhorar a qualidade na produccedilatildeo habitacional e vii) incentivar a geraccedilatildeo de emprego e renda (BRASIL 2004 p 6)

No entanto Bonduki (2008 p 97) diz que mesmo levando em conta o avanccedilo que

representou a criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades faz-se necessaacuterio ressaltar que uma das suas

debilidades eacute sua fraqueza institucional uma vez que a CEF agente operador e principal

agente financeiro dos recursos do FGTS eacute subordinada ao Ministeacuterio da Fazenda

31 No mecircs de outubro do mesmo ano foi realizada a 1ordf Conferecircncia Nacional das Cidades com 2500 delegados em um processo de mobilizaccedilatildeo social que buscava a consolidaccedilatildeo das bases da atuaccedilatildeo do governo visando ainda a criaccedilatildeo e composiccedilatildeo do Conselho Nacional de Habitaccedilatildeo instalado em 2004

132

Em tese o Ministeacuterio das Cidades eacute o responsaacutevel pela gestatildeo da poliacutetica habitacional mas na praacutetica a enorme capilaridade e poder da Caixa presente em todos os municiacutepios do paiacutes acaba fazendo que a decisatildeo sobre a aprovaccedilatildeo dos pedidos de financiamentos e acompanhamento dos empreendimentos seja de sua responsabilidade (BONDUKI 2008 p 97)

O Plano Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) tinha como objetivo planejar as accedilotildees

puacuteblicas e privadas em meacutedio e longo prazo para equacionar as necessidades habitacionais

do Paiacutes no prazo de quinze anos sendo concebido como um plano estrateacutegico de longo prazo

articulado com propostas operacionais a serem implementadas a curto e meacutedio prazo

(BONDUKI 2008)

Contudo observa-se entatildeo que a nova Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) natildeo

conseguiu implantar seus aspectos mais relevantes pois sem subsiacutedios significativos

prevaleceu a visatildeo bancaacuteria da CEF sem alteraccedilotildees substanciais na concessatildeo do creacutedito

Aleacutem disso os programas que foram lanccedilados para atender a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo beneficiaram os financiamentos agrave populaccedilatildeo com maior poder aquisitivo

permanecendo o aspecto segregador dos governos anteriores

Bonduki (2008) ressalta que o FNHIS reiterado na 1ordf Conferecircncia Nacional das

Cidades encontrou forte oposiccedilatildeo na equipe econocircmica e foi aprovado apenas em 2005 e

instalado em julho de 2006 Em vez de ser institucionalizado como um fundo financeiro foi

instituiacutedo como um fundo orccedilamentaacuterio limitado a cumprir seu papel O governo entretanto

comprometeu-se a aportar R$ 1 bilhatildeo por ano para subsidiar os programas habitacionais

No Estado do Paraacute com a implementaccedilatildeo do Programa Cheque Moradia32 a partir

de 2003 houve uma retomada de accedilotildees para a populaccedilatildeo na faixa de renda de ateacute trecircs salaacuterios

miacutenimos Este programa beneficiou 19834 famiacutelias e foi inspirado na experiecircncia de outros

estados brasileiros e financiamento proacuteprio (HOLANDA 2011)

No segundo governo de Lula foi lanccedilado o Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

(PAC) o qual estabeleceu um conjunto de regras compromissos de accedilatildeo e diretrizes de

governo objetivando o crescimento econocircmico de 5 ao ano no periacuteodo de 2007 a 2010

com a implantaccedilatildeo de grandes obras de infraestrutura assim como incluiu um programa de

caraacuteter social a Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Precaacuterios prevendo recursos orccedilamentaacuterios

vultosos para o setor da habitaccedilatildeo

32 De acordo com Holanda (2011) o Programa Cheque Moradia tinha como objetivo viabilizar a compra de materiais de construccedilatildeo para produccedilatildeo e melhorias habitacionais visando o atendimento de famiacutelias com renda de ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos inicialmente voltado apenas a funcionaacuterios puacuteblicos estaduais depois ampliado para alcanccedilar as famiacutelias em situaccedilatildeo de risco e aquelas com moradias atingidas em casos de sinistro

133

O PAC inaugurou uma nova fase na poliacutetica econocircmica retomando a temaacutetica do

crescimento na agenda do paiacutes que havia permanecido ausente nas uacuteltimas deacutecadas Esse

Programa estaacute dividido em trecircs eixos de infraestrutura logiacutestica (rodoviaacuteria ferroviaacuteria

portuaacuteria hidroviaacuteria e aeroportuaacuteria) energeacutetica (geraccedilatildeo e transmissatildeo de energia eleacutetrica

petroacuteleo gaacutes natural e energias renovaacuteveis) e social e urbana (Luz para todos saneamento

habitaccedilatildeo recursos hiacutedricos metrocircs) A previsatildeo do investimento total eacute de R$ 503 9 bilhotildees

(AZEVEDO 2007)

Em 2008 a crise econocircmica iniciada no setor imobiliaacuterio americano chegou ao

Brasil gerando incertezas Nessa conjuntura a decisatildeo governamental de investir com vigor

no setor habitacional (cerca de 34 bilhotildees) culminou com um pacote maturado

inicialmente no Ministeacuterio da Fazenda cunhado como emergencial e anticiacuteclico buscou o

apoio do setor privado para evitar o aprofundamento do desemprego

(BONDUKI 2008 p

89)

Em 2009 o governo federal implantou o Programa Minha Casa Minha Vida

(MCMV) sob responsabilidade do Ministeacuterio das Cidades e executado pela CEF tendo como

meta construir 1 milhatildeo de moradias Sua finalidade era de criar mecanismos de incentivo agrave

produccedilatildeo e compra de novas unidades habitacionais pelas famiacutelias com renda mensal de ateacute

10 salaacuterios miacutenimos

Para atingir sua meta foram divididos em trecircs grupos primeiro famiacutelias de baixa

renda que ganham de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos as quais concentram quase 90 do deacuteficit

habitacional estando previsto R$ 16 bilhotildees para a construccedilatildeo de 400 mil unidades segundo

grupo que inclui as famiacutelias com renda mensal entre 3 a 6 salaacuterios miacutenimos estavam tambeacutem

previstas 400 mil unidades habitacionais e por fim o grupo que inclui as famiacutelias com renda

mensal entre 6 a 10 salaacuterios miacutenimos para o qual estavam previstas 200 mil unidades

(ROLNIK 2010)

Esse Programa atende a todos os municiacutepios com mais de 100 mil habitantes e

regiotildees metropolitanas Para tanto os empreendimentos podem ser implementados por

agentes puacuteblicos ou privados de forma independente ou em parceira Os paracircmetros para a

promoccedilatildeo de empreendimentos satildeo os mesmos em todo o Brasil variando apenas o valor

maacuteximo das unidades habitacionais que eacute estabelecido por Unidade da Federaccedilatildeolocalidade

(BRASIL 2010)

O MCMV apoacuteia a produccedilatildeo de imoacuteveis novos em construccedilatildeo ou em lanccedilamento

Apoacutes a conclusatildeo do empreendimento as habitaccedilotildees satildeo vendidas a famiacutelias indicadas pelo

poder puacuteblico local Estas famiacutelias tecircm que cumprir as condiccedilotildees estabelecidas no programa

134

nomeadamente estar enquadradas na faixa de rendimento familiar estabelecida (BRASIL

2010)

Para Rolnik (2010) o governo ao disponibilizar 34 bilhotildees para a construccedilatildeo sem

nenhuma intervenccedilatildeo em termos urbaniacutesticos e fundiaacuterios desencadeou um processo

inflacionaacuterio resultando em um aumento consideraacutevel no preccedilo dos terrenos

O que eu tenho apontado eacute que muito provavelmente o subsiacutedio vai parar no bolso do proprietaacuterio do terreno Eu dou dois ou trecircs meses para os empresaacuterios dizerem que natildeo estaacute dando mais para fazer casas de 60 e 70 mil (reais) Agora eles jaacute estatildeo dizendo que natildeo daacute para fazer de 50 mil E natildeo eacute porque a casa custa 50 mil reais Eacute porque a terra custa isso Quer dizer que o nosso dinheiro foi diretamente para o bolso dos proprietaacuterios do terreno (ROLNIK 2010 p 2)

Entretanto Rolnik (2010) argumenta que no primeiro ano (entre marccedilo de 2009 e

marccedilo de 2010) foram contratados e portanto jaacute estatildeo prontos para serem construiacutedos 408

mil imoacuteveis O programa estaacute de fato avanccedilando bastante mas alguns problemas jaacute

aparecem e aponta como o principal deles o natildeo cumprimento da meta em atender as

famiacutelias de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos onde se concentra o maior deacuteficit habitacional

Para essa faixa o programa oferece um subsiacutedio integral Ou seja o governo subsidia os imoacuteveis e estabelece um valor maacuteximo para que as construtoras os produzam Por sua vez o custo para os compradores eacute de ateacute 10 da renda mensal sendo no miacutenimo R$ 5000 200 mil unidades deste tipo foram contratadas ateacute agora O problema eacute que quase todas essas unidades foram contratadas em cidades e regiotildees de menor deacuteficit O que estaacute acontecendo eacute que em Satildeo Paulo e nas demais capitais e regiotildees metropolitanas onde realmente estaacute concentrada a demanda da faixa de renda entre 0 e 3 salaacuterios miacutenimos as construtoras estatildeo encontrando muita dificuldade de produzir para o Minha Casa Minha Vida em funccedilatildeo do preccedilo dos terrenos Todas elas reclamam que o preccedilo do terreno estaacute muito caro (ROLNIK 2010 p 2)

A autora diz ainda que eacute para a faixa de 3 a 6 salaacuterios miacutenimos que o programa estaacute

atendendo de fato beneficiando as grandes construtoras que lanccedilam seus produtos em aacutereas

com infraestrutura e serviccedilos O problema eacute que o programa natildeo estaacute conseguindo atender

com preferecircncia os que mais precisam que satildeo os moradores das grandes cidades que estatildeo

indo hoje adensar favelas e construir nas lajes

Cardoso (2009) tambeacutem aponta alguns problemas do Programa MCMV tais como a

distribuiccedilatildeo de recursos federais eacute feita agrave margem do SNHIS injetando muito recurso

financeiro no sistema mas sem o controle social democraacutetico sobre sua utilizaccedilatildeo privilegia

135

as empresas de construccedilatildeo civil aumentou o valor dos imoacuteveis e dos terrenos nas grandes

cidades e regiotildees metropolitanas ou seja toda a disponibilidade de creacutedito estaacute refletindo no

preccedilo do terreno e com isso torna-se difiacutecil produzir uma unidade de R$ 50 mil 60 mil reais

que eacute o valor total da unidade fixado para a faixa de renda mais baixa os recursos satildeo

repassados diretamente agraves empreiteiras dificultando o controle sobre os mesmos natildeo existe

um controle urbaniacutestico acarretando em construccedilatildeo nas aacutereas com precariedade de

infraestrutura distantes da malha urbana e por fim a poliacutetica de habitaccedilatildeo estaacute separada da

poliacutetica de gestatildeo do solo

Percebe-se a reproduccedilatildeo das situaccedilotildees que o BNH havia construiacutedo na deacutecada de

1970 conjuntos de baixa qualidade em uma periferia distante e natildeo inseridos na malha

urbana Aleacutem disso cabe destacar que o mercado imobiliaacuterio tem ditado as regras ao sistema

habitacional uma vez que produz e comercializa um bem escasso que eacute a terra controlando

as leis de mercado pois quando aumenta a demanda o preccedilo da terra aumenta Assim os

imoacuteveis ou terrenos tecircm seus valores aumentados aumentando tambeacutem o excedente para

proprietaacuterios de terra Ao natildeo atender as camadas populares o Programa MCMV acaba

contribuindo para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Portanto diante da anaacutelise das poliacuteticas habitacionais implementadas no Brasil em

especial na regiatildeo Amazocircnica observa-se que a poliacutetica urbana e a habitacional tecircm seguido

um modelo excludente que se perpetua ao longo do tempo uma vez que os programas satildeo

planejados de cima para baixo desconsiderando as relaccedilotildees sociais vivecircncias especificidades

de cada regiatildeo entre outros reforccedilando a loacutegica da divisatildeo territorial e social do trabalho

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

Ao iniciar o debate acerca das poliacuteticas puacuteblicas parte-se da reflexatildeo de que toda

poliacutetica pode ter objetivos bem definidos metas accedilotildees planos e princiacutepios que possam

garantir o bom funcionamento das instituiccedilotildees administrativas dos governos nas trecircs esferas

aleacutem de alcanccedilar o bem-estar a sociedade e o interesse puacuteblico

No item anterior foi destacada a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional no Brasil a partir

da concepccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas como um conjunto de accedilotildees coletivas que se configuram

em um compromisso puacuteblico visando dar conta de determinada demanda em diversas aacutereas

Satildeo mecanismos de regulaccedilatildeo social cujo objetivo eacute diminuir as desigualdades sociais

erradicar a pobreza e garantir os direitos sociais da populaccedilatildeo

136

A noccedilatildeo de poliacutetica puacuteblica eacute concebida segundo Raichellis (2007 p 34-38) como

uma linha de accedilatildeo coletiva que concretiza direitos sociais declarados e garantidos em lei

Diz ainda que a poliacutetica puacuteblica comeccedilou a ser implementada como mecanismo de

enfrentamento das sequumlelas da questatildeo social assim ela eacute convertida em poliacuteticas setoriais e

se configura como mecanismo na mediaccedilatildeo dos conflitos sociais

No que diz respeito agrave incorporaccedilatildeo dos direitos sociais no estatuto legal verifica-se

sua importacircncia pois passa a se inscrever como poliacuteticas sociais que satildeo os instrumentos para

a efetivaccedilatildeo desses direitos jaacute que estas natildeo podem deixar de existir quando haacute troca de

governantes cuja atribuiccedilatildeo eacute do Estado diferentemente dos programas de governo cuja

execuccedilatildeo de accedilotildees depende do governo em questatildeo

Corroborando com esse debate Netto (2001) argumenta que as poliacuteticas sociais tecircm

como alvo as questotildees sociais geradas dentro da sociedade capitalista ou seja o objetivo

principal da poliacutetica eacute conceder benefiacutecios para inserir parte da populaccedilatildeo no mercado de

trabalho e melhorar as condiccedilotildees de vida da mesma O que assegura condiccedilotildees apropriadas

para o desenvolvimento do proacuteprio sistema seja pela reproduccedilatildeo social do trabalhador seja

pelas possibilidades de consumo

Partindo dessa reflexatildeo pode-se afirmar que o Estado atende prioritariamente aos

interesses do capital Apesar disso mesmo que em um menor grau de satisfaccedilatildeo precisa

atender as necessidades do trabalhador

Sendo assim as accedilotildees desenvolvidas pelo Estado buscam uma compatibilidade entre

as duas categorias mediando a relaccedilatildeo contraditoacuteria entre o capital e o trabalho na qual

regula as desigualdades sociais que satildeo geradas pelo desenvolvimento do sistema capitalista

ou seja atende as necessidades sociais baacutesicas de quem natildeo estaacute inserido nos serviccedilos sociais

poreacutem sem interferir no processo de acumulaccedilatildeo de capital Elaborando entatildeo as poliacuteticas

sociais para responder essa contradiccedilatildeo

As poliacuteticas puacuteblicas sociais satildeo criadas para compensar as desigualdades proacuteprias do mercado de forma tal que como se fossem homeostado se torna necessaacuterio que estas sejam tatildeo desiguais quanto o mercado mas em sentido contraditoacuterio [] Essas poliacuteticas satildeo concebidas numa perspectiva tradicional como concessotildees por parte do Estado para redistribuir os escassos recursos sociais Nesta perspectiva as poliacuteticas sociais aparecem de forma naturalizada ou seja natildeo satildeo associadas aos interesses e necessidades do sistema capitalista (PASTORINI 1997 p 84)

Outro fator importante do avanccedilo para o campo dos direitos sociais a ser destacado

refere-se agrave descentralizaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo da gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional

137

com a criaccedilatildeo dos Conselhos em acircmbito nacional estadual e municipal que satildeo mecanismos

de participaccedilatildeo e controle social e satildeo instacircncias de deliberaccedilatildeo sobre accedilotildees dessa poliacutetica

voltados para ampliaccedilatildeo das condiccedilotildees de cidadania cuja representatividade eacute do governo e da

sociedade civil

A definiccedilatildeo constitucional da habitaccedilatildeo como poliacutetica puacuteblica geradora de direitos possibilitou que sua construccedilatildeo fosse acompanhada por mecanismos institucionais de democratizaccedilatildeo e de controle social como satildeo os conselhos e as Conferecircncias instrumentos que se inserem no campo de definiccedilatildeo da responsabilidade puacuteblica Ao mesmo tempo conceber a habitaccedilatildeo nesta perspectiva natildeo implica diluir a responsabilidade estatal por sua conduccedilatildeo Ao contraacuterio situaacute-la no campo dos direitos remete agrave ativa intervenccedilatildeo do Estado para garantir sua efetivaccedilatildeo dentro dos paracircmetros legais que a definem (RAICHELIS 2007 p 39)

Ao se tratar a poliacutetica habitacional como direito social torna-se evidente a maneira

regressiva pela qual se desenvolveram os mecanismos de proteccedilatildeo social agrave moradia

conduzida pelo Estado ao longo anos Se por um lado a legislaccedilatildeo brasileira afirma a

garantia de atendimento aos seus cidadatildeos por outro lado compreende-se uma elevada

parcela da populaccedilatildeo que sequer possui o direito de sobrevivecircncia pela violaccedilatildeo constante de

seus direitos dificultando qualquer possibilidade de acesso agrave moradia digna (AZEVEDO

2007)

A habitaccedilatildeo eacute uma necessidade baacutesica do ser humano eacute parte das suas condiccedilotildees de

sobrevivecircncia e portanto elemento importante no processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da

sociedade ao mesmo tempo uma mercadoria como qualquer outra ou seja possui um valor

de uso e de troca e sua produccedilatildeo segue a loacutegica do mercado

Entender a questatildeo da moradia na sociedade capitalista significa descobrir as

contradiccedilotildees inerentes ao acesso agrave moradia Tal compreensatildeo deve antes de mais nada

procurar desvendar o significado da terra e sua propriedade isto eacute de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido e assim sendo natildeo pode ser criado pelo trabalho

Para se ter acesso a uma moradia eacute preciso ocupar um pedaccedilo de terra sendo que

para isso eacute necessaacuterio pagar por ele Esse pagamento pode ser com a aquisiccedilatildeo de um lote

urbanizado ou natildeo por meio de aluguel troca de um imoacutevel por outro etc cujo valor eacute

ajustado natildeo soacute de acordo com a lei da oferta e da procura como tambeacutem por meio da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Portanto sua origem estaacute na propriedade privada da terra e na sua

condiccedilatildeo de mercadoria dentro do modo de produccedilatildeo capitalista

138

A propriedade privada da terra eacute condiccedilatildeo fundamental para o desenvolvimento do

capital imobiliaacuterio tendo seu valor de uso modificado pela atribuiccedilatildeo de infraestrutura

equipamentos e serviccedilos puacuteblicos aleacutem de suas caracteriacutesticas especificas como a

construtibilidade morfologia entre outros (MARICATO 1996)

Deste modo Rodrigues (2001) afirma que diferentemente do mercado de compra e

venda de outras mercadorias no mercado de terras a lei da oferta e da procura natildeo funciona

da mesma forma ou seja soacute funcionava quando novos terrenos entram nesse mercado e

quando eacute instalada infraestrutura adequada Assim o preccedilo da terra eacute definido segundo a

localizaccedilatildeo dos terrenos que embora com dimensotildees semelhantes possuem preccedilos

diferentes Essa diferenciaccedilatildeo proporciona ao dono da terra uma renda extra propiciada pela

produccedilatildeo social

Segundo a autora a terra eacute uma mercadoria que tem preccedilo que eacute vendida no

mercado e que natildeo eacute reproduziacutevel ou seja tem um preccedilo que independe de sua produccedilatildeo Eacute

uma mercadoria sem valor no sentido de que seu preccedilo natildeo eacute definido pelo trabalho na sua

produccedilatildeo mas pelo estatuto juriacutedico da propriedade da terra pela capacidade de pagar dos

seus possiacuteveis compradores

Para os trabalhadores a possibilidade de extrair alguma renda de sua propriedade

por meio do aluguel ou da sua valorizaccedilatildeo com a implementaccedilatildeo de obras de infraestrutura

em seu entorno mesmo quando se trata de um simples embriatildeo de alvenaria sem

revestimento eacute motivo de grande seguranccedila e sensaccedilatildeo de progresso pessoal pois representar

uma forma segura de investimento

Nesse sentido a aquisiccedilatildeo do imoacutevel ou de um terreno se daacute natildeo em funccedilatildeo da

necessidade de uso mas com vistas agrave venda futura ou aluguel transforma-o em capital

imobiliaacuterio

Como ressalta Engels (1988 p 185)

Ainda que o aluguel natildeo represente extraccedilatildeo de mais valia uma vez que [] eacute a transferecircncia de um valor jaacute produzido a propriedade da casa natildeo determina a classe social ela modifica parcialmente agrave medida que aleacutem do seu valor de uso pode se transformar em capital o que diferencia seu proprietaacuterio dos demais de sua classe O uso da moradia como investimento a torna objeto de especulaccedilatildeo imobiliaacuteria o que leva ainda mais o seu preccedilo

Em principio o salaacuterio recebido pelo trabalhador deveria ser suficiente para

satisfazer agraves suas necessidades baacutesicas mas natildeo o eacute especialmente no que se refere agrave

139

moradia cuja natureza especifica torna-a um bem caro e de difiacutecil acesso principalmente em

situaccedilotildees de crise com especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Na composiccedilatildeo dos salaacuterios

preccedilo da forccedila de trabalho

haacute uma parte destinada a

cobrir os gastos necessaacuterios agrave satisfaccedilatildeo dessa necessidade ou seja o custo da moradia Na

medida em que este aumenta aqueles tambeacutem deveriam fazecirc-lo o que entretanto natildeo ocorre

porque implica em diminuiccedilatildeo do lucro e afeta o processo de acumulaccedilatildeo capitalista

Destarte como se trata de um bem de consumo necessaacuterio agrave reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho cuja satisfaccedilatildeo inadequada tem efeitos sobre o processo de produccedilatildeo o problema da

habitaccedilatildeo torna-se questatildeo social levando a intervenccedilatildeo do Estado no setor

Entatildeo solucionar o problema da moradia no Brasil natildeo eacute uma tarefa faacutecil pois a

terra no modo de produccedilatildeo capitalista mesmo natildeo sendo uma mercadoria produzida

socialmente tem um preccedilo e atribui ao seu proprietaacuterio o direito de auferir uma renda por

posse

Partindo de uma visatildeo socioeconocircmica em que a cidade se constitui no locus da

reproduccedilatildeo do capital a urbanizaccedilatildeo passou a ser vista como um conjunto de relaccedilotildees

sociais que reflete as relaccedilotildees estabelecidas na sociedade como totalidade constituindo-se

assim em um conjunto complexo de relaccedilotildees sociais assumindo novas dinacircmicas a partir

dos estaacutegios do desenvolvimento capitalista e isso configura importantes aspectos de

interesse geral (HARVEY 1996 p 89)

De acordo com Azevedo (1996) ao se analisar a questatildeo habitacional a relaccedilatildeo com

outras poliacuteticas urbanas eacute um dos aspectos a ser considerado Em funccedilatildeo da interdependecircncia

da moradia com outras esferas nem sempre um simples incremento dos programas de

habitaccedilatildeo eacute a soluccedilatildeo mais indicada para melhorar as condiccedilotildees habitacionais da populaccedilatildeo

com menor aquisitivo Isso porque esses programas podem ser inviabilizados caso natildeo sejam

integradas a eles outras poliacuteticas urbanas como de transporte energia eleacutetrica esgotamento

sanitaacuterio e abastecimento de aacutegua

Nesse sentido pode-se afirmar que o problema habitacional urbano no Brasil atinge

hoje grandes proporccedilotildees e estaacute intimamente relacionado ao processo de degradaccedilatildeo fiacutesica e

social das cidades tendo como resultados do seu modelo de crescimento a ocupaccedilatildeo

descontiacutenua definida pela praacutetica especulativa e a produccedilatildeo de espaccedilos com padrotildees muito

diferenciados e desiguais

Eacute resultado da loacutegica excludente que determina a dinacircmica urbana na qual as

famiacutelias de baixo poder aquisitivo adotam inuacutemeras estrateacutegias de sobrevivecircncia tais como

ocupaccedilatildeo de terreno irregular seguida da autoconstruccedilatildeo da moradia como no caso das

140

baixadas aquisiccedilatildeo locaccedilatildeo ou cessatildeo da posse de imoacuteveis construiacutedos em favelas e

assentamentos similares coabitaccedilatildeo moradia em domiciacutelios improvisados como no caso dos

moradores de rua Enfim a maior parte das estrateacutegias citadas resulta na formaccedilatildeo de

assentamentos habitacionais precaacuterios que geralmente concentram problemas relativos agrave

insalubridade condiccedilotildees inadequadas de acessibilidade e irregularidades urbaniacutesticas

O desenvolvimento capitalista ao provocar uma imensa e abrupta expansatildeo do

tecido urbano no Paiacutes gerou aumento da concentraccedilatildeo de riqueza de poder e da propriedade

e consequumlentemente aprofundou a miseacuteria

Eacute nesse cenaacuterio que se expressa a questatildeo do deacuteficit de moradia Nesse sentido a

primeira questatildeo a ser discutida diz respeito ao proacuteprio conceito de deacuteficit habitacional No

sentido tradicional ela induz equivocadamente agrave expectativa de enfrentar o problema da

moradia de forma setorial Aleacutem disso camufla uma complexa realidade por meio de uma

quantificaccedilatildeo padronizada atemporal e neutra

Para a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro (BRASIL 2009) o deacuteficit habitacional eacute entendido

como a noccedilatildeo mais imediata e intuitiva de necessidade de construccedilatildeo de novas moradias para

a soluccedilatildeo de problemas sociais e especiacuteficos de habitaccedilatildeo detectados em certo momento a

partir do conceito mais amplo de necessidades habitacionais

O conceito de deacuteficit habitacional estaacute ligado diretamente agraves deficiecircncias do estoque de moradias Engloba aquelas sem condiccedilotildees de serem habitadas devido agrave precariedade das construccedilotildees ou em virtude de desgaste da estrutura fiacutesica Elas devem ser repostas Inclui ainda a necessidade de incremento do estoque devido agrave coabitaccedilatildeo familiar forccedilada (famiacutelias que pretendem constituir um domicilio unifamiliar) aos moradores de baixa renda sem condiccedilotildees de suportar o pagamento de aluguel e aos que vivem em casas e apartamentos alugados com grande densidade de pessoas Inclui-se ainda nessa rubrica a moradia em imoacuteveis e locais com fins natildeo residenciais O deacuteficit habitacional pode ser entendido portanto como deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque 33 e deacuteficit por incremento de estoque 34 (BRASIL 2009 p 15)

33 O deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque refere-se aos domiciacutelios ruacutesticos aos quais deveria ser acrescida parcela devida agrave depreciaccedilatildeo dos domiciacutelios Tradicionalmente utilizando o conceito do IBGE os domiciacutelios ruacutesticos satildeo aqueles sem paredes de alvenaria ou madeira aparelhada Em decorrecircncia das suas condiccedilotildees de insalubridade esses tipos de edificaccedilatildeo proporcionam desconforto e trazem risco de contaminaccedilatildeo por doenccedilas aos seus moradores (BRASIL 2009 p 15) 34 O deacuteficit por incremento de estoque contempla os domiciacutelios improvisados parte da coabitaccedilatildeo familiar e dois tipos de domiciacutelios alugados os fortemente adensados e aqueles em que famiacutelias pobres (renda familiar ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos) pagam 30 ou mais da sua renda familiar para o locador O conceito de domiciacutelios improvisados engloba todos os locais e imoacuteveis sem fins residenciais e lugares que servem como moradia alternativa (imoacuteveis comerciais embaixo de pontes e viadutos carcaccedilas de carros abandonados barcos e cavernas entre outros) o que indica claramente a carecircncia de novas unidades domiciliares (BRASIL 2009 p 16)

141

O deacuteficit habitacional eacute composto pelos seguintes indicadores habitaccedilotildees precaacuterias

coabitaccedilatildeo familiar e ocircnus excessivo com aluguel Desses o grande responsaacutevel pelos altos

iacutendices brasileiros de ausecircncia de moradia eacute a coabitaccedilatildeo familiar e esse fato eacute observado

em todas as regiotildees do paiacutes principalmente em Satildeo Paulo Minas Gerais Rio de Janeiro

Cearaacute Pernambuco e Paraacute Jaacute as habitaccedilotildees precaacuterias satildeo mais comuns na zona rural e o

ocircnus excessivo com aluguel eacute caracteriacutestico das aacutereas de grande adensamento urbano em

destaque o estado de Satildeo Paulo Esse uacuteltimo indicador eacute reflexo direto das dificuldades do

mercado imobiliaacuterio em se adequar agraves necessidades da populaccedilatildeo

(FJP 2008 p36)

Outro indicador utilizado pela Fundaccedilatildeo no desenvolvimento de sua metodologia de

pesquisa eacute a inadequaccedilatildeo de moradias Esta eacute classificada como domiciacutelios com carecircncia de

infraestrutura com adensamento excessivo de moradores com problemas de natureza

fundiaacuteria cobertura inadequada sem unidade sanitaacuteria domiciliar exclusiva ou em alto grau

de depreciaccedilatildeo (BRASIL 2009)

Com base nos dados da Fundaccedilatildeo (BRASIL 2009) alguns dados satildeo importantes

para se entender a real situaccedilatildeo da habitaccedilatildeo social no Brasil que expressa de forma niacutetida a

pobreza no Paiacutes Estima-se que em 2007 o deacuteficit habitacional eacute de 6273 milhotildees de

domiciacutelios dos quais 5180 milhotildees ou 826 estatildeo localizados nas aacutereas urbanas (conforme

tabela 3) Relativamente corresponde a 111 do estoque de domiciacutelios particulares

permanentes do paiacutes sendo 108 nas aacutereas urbanas e 129 nas rurais35 Eacute importante

observar que em 16 anos (entre 1991 e 2007) houve um acreacutescimo de 257 e um

crescimento de 29 ao ano do deacuteficit habitacional e que 862 do deacuteficit urbano

concentram-se nas famiacutelias de baixa renda

35 Esses nuacutemeros podem conflitar com os dados apresentados em 2006 pois a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro considerou apenas uma parcela das famiacutelias conviventes como carente de moradias o que representa uma queda de 1662 milhatildeo de domiciacutelios nas estimativas entre esses dois anos

142

Tabela 3 - Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

ESPECIFICACcedilAtildeO

DEacuteFICIT HABITACIONAL PERCENTUAL DOS DOMICIacuteLIOS PARTICULARES PERMANENTES

Total Urbana

Rural Total Urbana

Rural Total Rural de

Extensatildeo Urbana

Total Rural de Extensatildeo Urbana

NORTE 652684

487357

165327

4782

167

162

184

141

Rondocircnia 52472

42561

9911

3072

116

136

71

108

Acre 21063

17263

3800

-

126

141

84

-

Amazonas

146268

117496

28772

1530

186

189

174

455

Roraima 16379

14458

1921

-

147

159

93

-

Paraacute 317089

223645

93444

180

171

156

223

83

RM Beleacutem 92734

90817

1917

180

165

165

144

83

Amapaacute 30449

28853

1596

-

202

203

180

-

Tocantins 68964

43081

25883

-

182

154

262

-

NORDESTE 2144384

1461669

682715

6216

150

139

182

74

Maranhatildeo 461396

240415

220981

1742

295

220

467

111

Piauiacute 139318

76157

63161

-

169

147

205

-

Cearaacute 314949

227096

87853

-

139

128

181

-

RM Fortaleza 124282

119970

4312

-

129

128

170

-

Rio Grande do Norte 117647

85191

32456

1375

140

137

150

59

Paraiacuteba 122166

98034

24132

-

122

122

119

-

Pernambuco 281486

224956

56530

2065

117

119

110

66

RM Recife 133059

129892

3167

-

122

122

133

-

Alagoas 123245

89128

34117

1034

148

151

142

80

Sergipe 73499

60907

12592

-

130

130

129

-

Bahia 510677

359784

150893

-

129

131

124

-

RM Salvador 141025

138946

2079

-

137

137

123

-

SUDESTE 2335415

2222957

112458

9398

93

95

61

59

Minas Gerais 521085

465206

55879

-

88

91

67

-

RM Belo Horizonte 129404

129171

233

-

85

86

12

-

Espiacuterito Santo 101124

90079

11045

-

94

101

61

-

Rio de Janeiro 478901

471872

7029

889

91

93

44

50

RM Rio de Janeiro 378797

376139

2658

-

95

95

106

-

Satildeo Paulo 1234306

1195800

38506

8509

96

98

58

60

RM Satildeo Paulo 628624

611936

16688

7594

103

104

78

59

SUL

703167

617333

85834

-

79

83

60

-

Paranaacute 272542

240825

31717

-

83

86

67

-

RM Curitiba 91444

85007

6437

-

89

91

72

-

Santa Catarina 145363

125297

20066

-

76

79

63

-

Rio Grande do Sul 285261

251211

34050

-

78

83

53

-

RM Porto Alegre 136030

128784

7246

-

97

97

100

-

CENTRO-OESTE

436995

390447

46548

217

105

108

83

31

Mato Grosso do Sul 76027

63762

12265

-

105

101

127

-

Mato Grosso 86679

66363

20316

-

98

100

91

-

Goiaacutes 167042

155119

11923

-

92

96

58

-

Distrito Federal 107248

105202

2046

217

146

151

53

31

BRASIL 6272645

5179763

1092882

20613

111

108

129

71

Total das RMs 1855399

1810662

44737

7774

105

105

89

57

Demais Aacutereas 4417246

3369101

1048145

12839

114

110

131

84

143

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) 2007 Nota no caacutelculo do deacuteficit habitacional o componente coabitaccedilatildeo familiar inclui apenas as famiacutelias conviventes que declararam intenccedilatildeo de constituir novo domiciacutelio

Como mostram os nuacutemeros da acima a regiatildeo Nordeste apresenta valores

expressivos em relaccedilatildeo ao deacuteficit habitacional perdendo somente para a regiatildeo Sudeste que

possui deacuteficit habitacional de 2335415 A regiatildeo Norte encontra-se em quarto lugar em

relaccedilatildeo agraves demais regiotildees do paiacutes Entretanto as especificidades das regiotildees Norte e Nordeste

revelam uma grande heterogeneidade intra-regional demonstrado pelo percentual relativo do

estoque dos domiciacutelios particulares permanentes no Norte encontram-se alguns estados com

deacuteficits superiores agrave meacutedia nacional (111) como por exemplo Amazonas (186) e Paraacute

(171) e no Nordeste os estados do Maranhatildeo (295) e Piauiacute (169) apresentam meacutedias

elevadas em relaccedilatildeo ao nacional

Esse quadro de carecircncia habitacional demonstra que o Nordeste possui o pior

desempenho em relaccedilatildeo a regiatildeo Sul que apresenta percentual de domiciacutelios equivalente a

79 melhor meacutedia nacional Isto pode ser explicado pelo volume de recursos

financeiros

teacutecnicos e administrativos

investidos nas regiotildees sul e sudeste

Tambeacutem pode ser levada em consideraccedilatildeo a forma diferenciada que se deu a

urbanizaccedilatildeo nas regiotildees do Paiacutes acarretando em problemas de adensamento escassez de

terras elevaccedilatildeo do preccedilo da terra baixo desenvolvimento econocircmico das cidades como

Beleacutem e Satildeo Luis e ainda pouca capacidade administrativa dos governos municipais

Outro fator que se destaca eacute a falta de uma poliacutetica habitacional especifica para essas

regiotildees uma vez que o financiamento para construccedilatildeo de moradia tem sido inexpressivo e

uma grande parcela da populaccedilatildeo constroacutei suas casas por meio do autofinanciamento e

autoconstruccedilatildeo

Essas situaccedilotildees satildeo agravadas pela escassez de serviccedilos de infraestrutura falta de

oportunidades de emprego falta de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria entre outros fatores que

contribuem para o aumento da exclusatildeo social e da segregaccedilatildeo espacial da populaccedilatildeo pobre

nas aacutereas de baixadas e de assentamentos precaacuterios

Do total do deacuteficit habitacional (6273 milhotildees aproximadamente) a maior parcela

das estimativas eacute composta pela coabitaccedilatildeo familiar (393) seguido pelo ocircnus com aluguel

(322) as habitaccedilotildees precaacuterias representam 23 e o adensamento excessivo dos domiciacutelios

alugados 55 conforme graacutefico 2

144

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees

Metropolitanas (RMs)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007)

Esse quadro evidencia que as poliacuteticas habitacionais devam ser diversificadas de

acordo com cada regiatildeo do Paiacutes para que suas diretrizes possam ser bem sucedidas A

coabitaccedilatildeo eacute responsaacutevel pela maior parte do deacuteficit portanto requer medidas para que novas

famiacutelias que se formem tenham acesso agrave casa proacutepria

Fica demonstrado tambeacutem que a maior parte do deacuteficit habitacional corresponde a

famiacutelias com ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos (aproximadamente 90) o que define o caraacuteter

eminentemente social dos programas a serem desenvolvidos Eacute importante destacar que entre

os anos 2000 e 2007 houve uma significativa reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional para as famiacutelias

de renda mensal de trecircs a cinco salaacuterios miacutenimos Do deacuteficit habitacional 894

correspondem agraves famiacutelias com renda mensal inferior a trecircs salaacuterios miacutenimos e 797 estatildeo

concentradas nas regiotildees Nordeste e Sudeste conforme graacutefico 3

145

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar Mensal (2)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007) Nota sm salaacuterio miacutenimo (1) Inclusive rural de extensatildeo urbana (2) Exclusive sem declaraccedilatildeo de renda

Os indicadores sobre o niacutevel e a distribuiccedilatildeo da renda em todo o territoacuterio brasileiro

os dados da PNADIBGE de 1996 e 2000

evidenciavam que a pobreza absoluta atingia por

volta de 34 da populaccedilatildeo Esse percentual correspondia aproximadamente a 52 milhotildees de

pessoas vivendo nessa situaccedilatildeo Vaacuterios estudos sinalizam que a pobreza no Brasil eacute mais

elevada nas regiotildees Nordeste (53) e Norte (40) e menor nas regiotildees Sul (18) e Sudeste

(oscilando entre 25 e 30 conforme o estado considerado) e desponta com maior nitidez

nos espaccedilos urbanos

Eacute nesse cenaacuterio de desigualdades soacutecio-espaciais que se evidencia a questatildeo

habitacional dos recortes territoriais em estudo ou seja nas regiotildees metropolitanas

amazocircnicas Nessas aacutereas urbanas o deacuteficit de moradia eacute elevado a exemplo do que acontece

no paiacutes e cidade vem seguindo a loacutegica da desigualdade capitalista estampando-se por meio

de uma verdadeira segregaccedilatildeo soacutecioespacial36

Para esta abordagem valer-se-aacute da definiccedilatildeo de Santos (2002) acerca do espaccedilo isto

eacute o espaccedilo submetido ao desenvolvimento das forccedilas produtivas sobremaneira com o papel

desempenhado pela ciecircncia e pelas teacutecnicas tornou-se essencialmente social O autor nos

chama a atenccedilatildeo para o fato de que

36 Compreende-se que a segregaccedilatildeo

tanto social quanto espacial

eacute uma caracteriacutestica importante das cidades As regras que organizam o espaccedilo urbano satildeo basicamente padrotildees de diferenciaccedilatildeo social e de separaccedilatildeo (CALDEIRA 2000 p 211) Para Carlos (1994 p 12) o processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual

isso se evidencia claramente atraveacutes do uso do solo

e decorre do acesso diferenciado da sociedade agrave propriedade privada e da estrateacutegia das empresas que produzem sobre o solo o que faz surgir a segregaccedilatildeo espacial

146

Se a Geografia deseja interpretar o espaccedilo humano como o fato histoacuterico que ele eacute somente a histoacuteria da sociedade mundial aliada agrave sociedade local pode servir como fundamento agrave compreensatildeo da realidade espacial e permitir a sua transformaccedilatildeo a serviccedilo do homem Pois a Histoacuteria natildeo escreve fora do espaccedilo e natildeo haacute sociedade a-espacial O espaccedilo ele mesmo eacute social (SANTOS 2002 p 81)

Segundo o autor o espaccedilo pode ser compreendido de acordo com sua totalidade

estudando-se os seus elementos em conjunto destacando-se neste universo o homem agente

fundamental no fornecimento de trabalho e dessa forma de criaccedilatildeo de infraestruturas

teacutecnicas e sociais no territoacuterio O que vale dizer o trabalho historicamente materializado e

geografizado pela accedilatildeo antroacutepica (SANTOS 2002) Assim os estudos referentes ao tema

proposto natildeo poderatildeo prescindir das relaccedilotildees sociais

Para concluir a cidade apresenta uma grande variedade de situaccedilotildees para a

populaccedilatildeo gerando diferentes formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano e consequumlentemente

produzindo uma segregaccedilatildeo soacutecioespacial aleacutem de demonstrar que a poliacutetica habitacional

voltada para atingir a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo eacute uma utopia

De forma geral a segregaccedilatildeo social no espaccedilo eacute resultante das inter-relaccedilotildees entre os

agentes responsaacuteveis pela estruturaccedilatildeo urbana sendo relevantes o poder puacuteblico (Estado) e o

capital imobiliaacuterio (Mercado) Isso porque a forma como estes agentes organizam a ocupaccedilatildeo

no e do espaccedilo acaba por gerar desiguais oportunidades de apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos

pela populaccedilatildeo que passa a se organizar segundo uma hierarquia social decorrente desta

inter-relaccedilatildeo

Nesse sentido entende-se a segregaccedilatildeo soacutecioespacial como o movimento de

separaccedilatildeo das classes sociais num determinado espaccedilo urbano no qual um dos fatores

determinante para tal segregaccedilatildeo eacute o preccedilo da propriedade que por natildeo disponibilizarem de

recursos financeiros satildeo obrigadas a ir para a periferia onde os acessos a serviccedilos baacutesicos

(como transporte sauacutede saneamento baacutesico seguranccedila lazer etc) natildeo satildeo na maioria das

vezes garantidos pelo Estado quando natildeo praticamente desprovida dos mesmos

Para aleacutem da atuaccedilatildeo diferenciada dos agentes modeladores do espaccedilo haacute outros

elementos que contribuem para a formaccedilatildeo da segregaccedilatildeo como a maacute distribuiccedilatildeo de renda e

o descumprimento das leis para beneficiamento de interesses de determinados segmentos

sociais

Assim as classes populares por natildeo terem o auxiacutelio do Estado em programas ou

projetos habitacionais buscam algumas alternativas para morar Como uma forma de

representaccedilatildeo dessa realidade destaca-se o caso de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-Ma onde as classes

147

empobrecidas se agrupam em vaacuterias modalidades de moradia Destacam-se as ocupaccedilotildees as

modalidades dos corticcedilos e das palafitas como formas de moradia extremamente precarizadas

sem qualquer disponibilidade de equipamentos e serviccedilos baacutesicos o que ocasiona a

fragilidade da sauacutede dessas pessoas

Observa-se tambeacutem como expressatildeo das classes trabalhadoras as modalidades de

moradia que satildeo os conjuntos habitacionais e os preacutedios reformados do governo onde estes

possuem estrutura equipamentos e serviccedilos mais acessiacuteveis em comparaccedilatildeo as trecircs

modalidades citadas anteriormente mas natildeo perdendo de vista que ainda assim constituem-se

como uma forma precaacuteria de moradia pois natildeo disponibiliza o espaccedilo fiacutesico necessaacuterio para a

adequada morada de uma famiacutelia

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

A poliacutetica habitacional se inscreve dentro da concepccedilatildeo de desenvolvimento urbano

integrado no qual a habitaccedilatildeo natildeo se restringe a casa incorpora o direito agrave infraestrutura

saneamento ambiental mobilidade e transporte coletivo equipamentos e serviccedilos urbanos e

sociais buscando garantir o direito agrave cidade

A cidade eacute entendida nesse trabalho como um centro de gestatildeo do territoacuterio eacute um

local onde as pessoas se organizam e interagem com base em interesses e valores diversos

formando grupos de afinidade e de interesse menos ou mais bem definidos territorialmente

com base na identificaccedilatildeo entre certos recursos cobiccedilados e o espaccedilo ou na base de

identidades territoriais que os indiviacuteduos buscam manter e preservar (SOUZA 2002 p 28)

Eacute um lugar geograacutefico no qual se instala a superestrutura poliacutetico-administrativo da

sociedade e supotildee a existecircncia de um sistema de classes sociais de um sistema poliacutetico de

um sistema institucional de investimento e de um sistema de troca com o exterior

(CASTELLS 1983)

Essas conceituaccedilotildees permitem visualizar um ambiente de cidades cuja intensidade

das atividades realizadas das interaccedilotildees entre os diversos componentes o consumo do

espaccedilo ultrapassam da simples categoria funcional do espaccedilo fiacutesico para a real efetivaccedilatildeo das

funccedilotildees da cidade

Isto significa dizer que existe uma estrita relaccedilatildeo entre os mecanismos que regulam o

uso e a ocupaccedilatildeo do solo urbano e os que regulam a produccedilatildeo de moradias Portanto torna-se

necessaacuterio refletir sobre o estabelecimento de regras e normas que determinam a legislaccedilatildeo

148

urbaniacutestica voltada para a regulamentaccedilatildeo e controle das accedilotildees dos produtores e

consumidores do espaccedilo urbano e da moradia e ao mesmo tempo para a promoccedilatildeo da

diminuiccedilatildeo das desigualdades soacutecio-espaciais

Entretanto algumas experiecircncias tecircm demonstrado que a legislaccedilatildeo urbaniacutestica ao

definir formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo que devem ser permitidas ou proibidas acaba por

agir como um delimitador de fronteiras de poder reforccedilando a loacutegica do mercado Isto

porque ao regular a produccedilatildeo do espaccedilo urbano a legislaccedilatildeo pode conferir significados e

gerar certa divisatildeo ou classificaccedilatildeo dos territoacuterios urbanos acirrando as desigualdades soacutecio-

espaciais uma vez que eacute fruto da relaccedilatildeo que se estabelece entre os agentes que atuam na

produccedilatildeo imobiliaacuteria na cidade (ROLNIK 2002 p13)

Como instrumento do planejamento (conforme foi apresentado no capiacutetulo anterior)

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica segundo Matos (1988 p 50) tem como uma de suas finalidades

atuar em prol da paz social isto eacute objetiva reduzir determinados conflitos entre os diversos

agentes que atuam no espaccedilo urbano

Fazendo uma breve contextualizaccedilatildeo histoacuterica da legislaccedilatildeo pode-se observar que

uma das primeiras tentativas de regulamentar o uso do solo foi em 1850 com a Lei das Terras

(Lei nordm 601 de setembro de 1850) estabelecendo que soacute quem podia pagar era reconhecido

como proprietaacuterio juridicamente definido em lei (RODRIGUES 2001 p 19) impedindo

assim o acesso a terra pelos trabalhadores livres Essa lei atribuiu agrave terra um valor de troca

tornando-a assim uma mercadoria do modo de produccedilatildeo capitalista inacessiacutevel a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo

No seacuteculo XX mais precisamente em 1916 foi criado o Coacutedigo Civil o qual definiu

explicitamente a propriedade da terra levando em consideraccedilatildeo o uso da terra e das

habitaccedilotildees o qual se preocupava com as moradias dos operaacuterios (vilas operaacuterias conforme

abordado no item anterior)

Jaacute na deacutecada de 1960 o Serfhau foi instituiacutedo como o organismo federal orientador

da estruturaccedilatildeo de poliacuteticas nacionais urbanas e de planejamento urbano em consonacircncia agraves

regras impostas pelo Estado naquele periacuteodo

Sob a coordenaccedilatildeo e financiamento do Serfhau os planos diretores entatildeo

denominados de planos de desenvolvimento local integrado foram elaborados para as cidades

de meacutedio e grande porte Coerente com a concepccedilatildeo de um sistema articulado e integrado

nacionalmente nas esferas locais a proposta de um sistema de planejamento local integrado

que visava tornar mais racionais os investimentos objetivando o desenvolvimento urbano

149

Natildeo obstante aos esforccedilos agrave eacutepoca realizados a avaliaccedilatildeo desse processo indica os

baixos resultados apresentados dado que natildeo se alcanccedilou a implantaccedilatildeo dos sistemas locais

de planejamento nem mesmo a execuccedilatildeo de intervenccedilotildees sugeridas pelos planos elaborados

aleacutem disso demonstram um distanciamento entre os agentes de elaboraccedilatildeo dos planos

atribuiacutedo a empresas privadas de consultoria

e os agentes executores localizados nas

administraccedilotildees municipais e na ausecircncia de demandas ou reivindicaccedilotildees de accedilotildees puacuteblicas

dessa natureza (ROLNIK 2002)

Nos anos 1970 a poliacutetica urbana pautava-se no planejamento tecnocraacutetico propondo

apenas o planejamento para uma parte da cidade dita formal ou legal Sendo assim as favelas

e os loteamentos irregulares eou clandestinos permaneceram excluiacutedos

Pode-se dizer que ateacute entatildeo a desigualdade social foi ratificada pelas normas

juriacutedicas favorecendo a segregaccedilatildeo soacutecioespacial jaacute que tenderam a expulsar a populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo para os locais mais distantes dos centros urbanos propiciando o

aparecimento de espaccedilos irregulares

Com a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federativa do Brasil em 1988 novos rumos

foram dados a legislaccedilatildeo urbaniacutestica Nos artigos 182 e 183 do capiacutetulo da Poliacutetica Urbana

foi redefinido o papel da cidade destacando-se a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

urbana

Art 182

A poliacutetica de desenvolvimento urbano executada pelo poder puacuteblico municipal conforme diretrizes gerais fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes sect 1ordm O Plano Diretor aprovado pela Cacircmara Municipal eacute obrigatoacuterio para as cidades com mais de 20 mil habitantes eacute o instrumento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana sect 2ordm A propriedade urbana cumpre sua funccedilatildeo social quando atende agraves exigecircncias fundamentais de ordenaccedilatildeo da cidade expressas no plano diretor [] Art 183

Aquele que possuir como sua aacuterea urbana de ateacute 250 msup2 por cinco anos ininterruptamente e sem oposiccedilatildeo utilizando-a para sua moradia ou de sua famiacutelia adquirir-lhe-aacute o domiacutenio desde que natildeo seja proprietaacuterio de outro imoacutevel urbano ou rural (BRASIL 1998)

A funccedilatildeo social da propriedade diz respeito a garantia do exerciacutecio da posse sobre

um imoacutevel ou terreno natildeo visando a limitaccedilatildeo da concepccedilatildeo de propriedade mas assegurando

os direitos sociais bem como o interesse coletivo

De acordo com Rolnik (2002) o direito de uma dada propriedade urbana passa a ser

reconhecido a partir de regras legais municipais definida por suas potencialidades de uso e o

150

seu conteuacutedo econocircmico seria atribuiacutedo pelo Estado mediante a correlaccedilatildeo dos interesses

sociais envolvidos

Para tanto a Constituiccedilatildeo estabeleceu o plano diretor municipal como instrumento

obrigatoacuterio do cumprimento da funccedilatildeo social pela propriedade urbana Cabe ainda destacar o

estabelecimento do artigo 24 sect1ordm 3ordm que determina o Estado como executor da competecircncia

legislativa plena ou seja os Estados poderiam legislar sobre o desenvolvimento urbano ateacute

que a Lei Federal fosse promulgada Entretanto nenhuma accedilatildeo foi efetivada (PASTORINNI

1997)

Ao instrumentalizar a gestatildeo urbana por meio de uma legislaccedilatildeo especiacutefica

instituiacuteram-se novos paracircmetros de accedilatildeo direcionados pela descentralizaccedilatildeo da poliacutetica urbana

que passou a ser executada pelo poder municipal assim como ocorreu nas demais poliacuteticas

sociais

O estabelecimento do Estatuto da Cidade pela Lei Federal nordm 10257 de 10 de julho

de 2001 regulamentou os artigos 182 e 183 da CF e apresentou uma seacuterie de instrumentos

voltados ao combate da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao aumento da oferta de aacutereas para habitaccedilatildeo

popular ou de equipamentos indispensaacuteveis agrave vida urbana e que objetivam facilitar a

urbanizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em favelas ou em loteamentos irregulares e

clandestinos representando um avanccedilo institucional ao tratamento da questatildeo urbana

historicamente marcada pela carecircncia de diretrizes e princiacutepios que fossem integrados e

articulados ao desenvolvimento urbano

O referido Estatuto estaacute estruturado em cinco capiacutetulos quais sejam as diretrizes

gerais (capiacutetulo I) os instrumentos da poliacutetica urbana (capiacutetulo II) o plano diretor (capiacutetulo

III) a gestatildeo democraacutetica da cidade (capiacutetulo IV) e por fim as disposiccedilotildees gerais

No artigo 5ordm haacute o estabelecimento de que a lei municipal poderaacute determinar o

parcelamento a edificaccedilatildeo ou utilizaccedilatildeo compulsoacuterios para as aacutereas delimitadas pelo plano

diretor No caso de natildeo cumprimento as penas aplicaacuteveis compreendem a aplicaccedilatildeo do

imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo (art

7ordm) e a desapropriaccedilatildeo do imoacutevel com pagamento mediante tiacutetulos da diacutevida puacuteblica (art

8ordm)

Um aspecto relevante que se pode destacar do Estatuto da Cidade eacute a gestatildeo

democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo de vaacuterios segmentos da sociedade nos processos

decisoacuterios contribui para a garantia do direito agrave cidade e por conseguinte da moradia

151

O Estatuto da Cidade ao prever um capiacutetulo dedicado agrave gestatildeo democraacutetica evidencia que sem a compreensatildeo mais profunda dos processos e conflitos em jogo na questatildeo urbana dificilmente se atenderaacute aos princiacutepios constitucionais de direito de todos agrave cidade da funccedilatildeo social da propriedade e da justa distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios e ocircnus decorrentes do processo de urbanizaccedilatildeo (OLIVEIRA 2001 p 16)

Dessa forma essas estrateacutegias para implantaccedilatildeo de gestotildees democraacuteticas para as

cidades satildeo praacuteticas que renegam a tradiccedilatildeo centralizadora e excludente de gestatildeo estatal que

foi vivenciada ateacute entatildeo redefinindo os papeacuteis de Estado e sociedade civil apontando para

ampliaccedilatildeo de co-gestatildeo entre puacuteblico e privado aumentando a possibilidade de minimizar os

efeitos negativos da burocratizaccedilatildeo estatal e da mercantilizaccedilatildeo da sociedade

A Sociedade Civil organizada os movimentos populares devem autonomamente elaborar na medida do possiacutevel (contra) propostas de planejamento Tais propostas podem ser coadjuvantes dos esforccedilos oriundos das proacuteprias administraccedilotildees progressistas ou podem mesmo dialeticamente calibraacute-los reafirmando a independecircncia dos movimentos sociais perante o Estado ou o(s) partido(s) (SOUZA 1992 p 134)

Especificamente no que se refere a essas novas estrateacutegias que buscam a

descentralizaccedilatildeo participaccedilatildeo e autonomia no acircmbito do setor de planejamento urbano eacute

interessante e sobretudo importante a realizaccedilatildeo de uma reflexatildeo teoacuterica sobre a conjuntura

poliacutetica institucional que combine em um maior controle social sem desconsiderar o poder

local

Segundo De Grazia (2003) o Estatuto da Cidade enfatiza o papel do Estado nesse

novo cenaacuterio poliacutetico no que se refere ao planejamento do espaccedilo urbano por meio da

elaboraccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas ressaltando que

O poder puacuteblico precisa entender que enquanto continuar se omitindo em relaccedilatildeo a sua obrigaccedilatildeo de fiscalizar o uso adequado das aacutereas puacuteblicas natildeo ocupadas e que enquanto continuar natildeo implantando uma poliacutetica urbana e habitacional que democratize o acesso agrave terra urbana mediante agora os proacuteprios instrumentos previstos no Estatuto da Cidade continuaraacute sendo o principal responsaacutevel pela existecircncia de cidades desordenadas injustas e desumanas (De GRAZI 2003 p 64)

Vale ressaltar que o processo de urbanizaccedilatildeo do Paiacutes foi realizado por meio de

planejamentos que atendiam aos interesses poliacuteticos e econocircmicos das classes de maior poder

aquisitivo sendo desenvolvidos de forma isolada do processo de gestatildeo sem a interlocuccedilatildeo

com a sociedade

152

O Estatuto da Cidade natildeo eacute um modelo ideal e uacutenico de legislaccedilatildeo para

democratizaccedilatildeo da questatildeo urbana mas haacute que se considerar o avanccedilo em relaccedilatildeo a

implementaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular na discussatildeo sobre os problemas da cidade visto que

natildeo havia nenhum instrumento que propiciasse isso

O Estatuto regulamentou e normatizou a garantia da participaccedilatildeo popular por meio

de conselhos oacutergatildeo colegiados de poliacutetica urbana nos niacuteveis nacional estadual e municipal

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano e

iniciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento

urbano

Esses instrumentos satildeo espaccedilos puacuteblicos de diaacutelogo entre os diversos interesses provenientes da sociedade civil de proposiccedilotildees partindo dos diversos setores de avaliaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo de decisotildees referentes aos investimentos puacuteblicos e privados nas cidades (INSTITUTO POacuteLIS 2005 p 194)

Nesse contexto o Estatuto da Cidade estabelece que lei regulamentadora do plano

diretor seja discutida e aprovada com a participaccedilatildeo da sociedade civil Isto porque o referido

plano possibilitaraacute o planejamento das cidades de forma articulada considerando toda a

infraestrutura urbana necessaacuteria para a garantia de sua plena funccedilatildeo social possibilitando

assim melhores condiccedilotildees de moradia Destarte a partir dos princiacutepios da funccedilatildeo social e a

gestatildeo democraacutetica da cidade pode ser embasada a luta pelo direito agrave cidade

Os planos diretores foram institucionalizados na deacutecada de 1970 em meio a um

raacutepido processo de urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto possuiacuteam uma visatildeo tecnocraacutetica do

processo de elaboraccedilatildeo das estrateacutegias de regulaccedilatildeo urbaniacutestica descartando a articulaccedilatildeo

entre habitaccedilatildeo e infraestrutura e quem deveriam ter acesso a eles

Atualmente os planos diretores respondem agraves reivindicaccedilotildees dos movimentos de luta

pela reforma urbana conforme seraacute apresentado no item posterior e inserem-se no processo

de elaboraccedilatildeo dos instrumentos de participaccedilatildeo popular citados anteriormente

O plano diretor pode conter orientaccedilotildees para a poliacutetica de desenvolvimento e de

ordenamento da expansatildeo urbana dos municiacutepios incluindo em seu escopo as determinaccedilotildees

das poliacuteticas nacionais de preservaccedilatildeo cultural e ambiental de turismo de mobilidade urbana

habitaccedilatildeo e outros

O objetivo fundamental do Plano Diretor eacute estabelecer como a propriedade cumpriraacute sua funccedilatildeo social de forma a garantir o acesso agrave terra urbanizada e

153

regularizada reconhecer a todos os cidadatildeos o direito agrave moradia e aos serviccedilos urbanos (BRASIL 2005 p 15)

Nesse sentido o plano diretor pode considerar as contradiccedilotildees e carecircncias dos

municiacutepios a escassez e o alto custo das aacutereas vazias aleacutem da diversidade de interesses dos

diversos agentes produtores e consumidores do espaccedilo urbano estabelecendo prioridades na

gestatildeo dos recursos disponiacuteveis Pode representar tambeacutem um reflexo da poliacutetica adotada nos

municiacutepios para resgatar a melhoria das condiccedilotildees de vida determinando diretrizes nas aacutereas

de habitaccedilatildeo meio ambiente uso do solo infraestrutura transporte e outros

No que diz respeito a poliacutetica habitacional o Estatuto da Cidade e os planos

diretores municipais prevecircem

A garantia do direito a cidades sustentaacuteveis entendido como o direito agrave terra urbana agrave moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e futuras geraccedilotildees [] a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo das aacutereas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do solo e edificaccedilatildeo consideradas a situaccedilatildeo socioeconocircmica da populaccedilatildeo e as normas ambientais (BRASIL 2006 p 36)

Os planos diretores municipais podem estabelecer diretrizes que contenham as

orientaccedilotildees gerais para a elaboraccedilatildeo da poliacutetica habitacional municipal tomando como base

os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade como Zonas Especiais de Interesse Social

(ZEIS) Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria Usucapiatildeo urbana Concessatildeo de uso especial entre outros

instrumentos que tenham interface direta com a questatildeo habitacional

As ZEIS fruto das lutas dos movimentos sociais de assentamentos irregulares pela

natildeo remoccedilatildeo pela melhoria das condiccedilotildees urbaniacutestica e pela regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

permitem inserir assentamentos irregulares agrave malha urbana tornando-os regulares

juridicamente possibilitando a introduccedilatildeo de serviccedilos e de infraestrutura regulando o

mercado de terras aumentando a arrecadaccedilatildeo do municiacutepio Aleacutem disso permitem que

terrenos natildeo edificados natildeo utilizados ou subutilizados sem destinaccedilatildeo social sejam

transformados em aacutereas para programas habitacionais

Em relaccedilatildeo agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria eacute necessaacuterio ressaltar sua importacircncia na

valorizaccedilatildeo do espaccedilo urbano uma vez que os agentes produtores e consumidores dos

espaccedilos irregulares natildeo apresentam poder aquisitivo suficiente para adquirir um imoacutevel

regular No entanto o processo de regularizaccedilatildeo assegura natildeo apenas a seguranccedila de ser

154

proprietaacuterio mas tambeacutem o risco da expulsatildeo pelo capital imobiliaacuterio e pelo ocircnus que tem que

ser pago advindo como saneamento (ROLNIK 1997 p 50)

A regularizaccedilatildeo fundiaacuteria pode ser definida como

Conjunto de poliacuteticas e medidas juriacutedicas urbaniacutesticas ambientais e sociais promovidas pelo poder puacuteblico por razotildees de interesse social ou interesse especiacutefico que visem adequar os assentamentos informais aos princiacutepios legais de modo a garantir o reconhecimento do direito social de moradia o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da propriedade urbana e o direito social ao meio ambiente equilibrado (ROLNIK 1997 p 73)

Segundo Rolnik (1997 p 75) garantir o direito agrave moradia implica em formalizar o

endereccedilo do morador fornecendo a ele serviccedilos por correio infraestrutura saneamento baacutesico

financiamentos etc Entatildeo regularizar e registrar a aacuterea ocupada poderaacute legitimar o acesso a

novos direitos promovendo com isso a elaboraccedilatildeo de novos projetos de organizaccedilatildeo

urbaniacutestica aleacutem de possibilitar a recuperaccedilatildeo ambiental dessa aacuterea

Outro instrumento a usucapiatildeo urbana eacute uma forma de se adquirir a propriedade de

um imoacutevel sobre o qual foi exercida posse contiacutenua pelo tempo miacutenimo determinado em lei

aleacutem de outras exigecircncias previstas para cada tipo de usucapiatildeo prescrito na legislaccedilatildeo

brasileira

Esse instrumento apesar de ter como objetivo transformar um possuidor em um

proprietaacuterio valoriza a posse da terra por meio do exerciacutecio desta [] o possuidor pode

adquirir o imoacutevel daquele que era dono mas natildeo exercia atividades sobre o terreno ou seja

natildeo cumpria com a funccedilatildeo social da propriedade Outro aspecto relevante desse instrumento

eacute a possibilidade de recorrer ao mesmo de modo coletivo (ROLNIK 1997 p 55)

Portanto a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a usucapiatildeo urbana e outros instrumentos satildeo

ferramentas utilizadas na atual Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo objetivando garantir o direito agrave

moradia regular Assim novos dispositivos legais da reforma urbana passaram a ser

instrumentos de intervenccedilatildeo das administraccedilotildees puacuteblicas municipais

Para enfrentar um quadro de carecircncia uma poliacutetica habitacional tem que fazer parte

de uma poliacutetica de desenvolvimento urbano que garanta a integralidade das accedilotildees Dessa

maneira a poliacutetica habitacional no governo Lula trouxe portanto avanccedilos significativos

Dentre eles o marco institucional representado pelo Ministeacuterio das Cidades e a nova relaccedilatildeo

estabelecida entre o governo e a sociedade representada pelas Conferecircncias da cidade

As atribuiccedilotildees do Ministeacuterio das Cidades de acordo com a atual Poliacutetica Nacional de

Habitaccedilatildeo podem ser assim entendidas

155

I

definir as diretrizes prioridades estrateacutegias e instrumentos da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo dentre eles o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo II

elaborar o marco legal da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo e do Sistema Nacional de habitaccedilatildeo III

elaborar criteacuterios e regras para aplicaccedilatildeo dos

recursos no Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo incluindo a poliacutetica de subsiacutedios IV

coordenar a implementaccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo V

orccedilamentos planos de aplicaccedilatildeo e metas anuais e plurianuais dos recursos a serem aplicados em habitaccedilatildeo VI- oferecer subsiacutedios teacutecnicos agrave criaccedilatildeo de fundos e respectivos conselhos estaduais do Distrito Federal regionais e municipais com o objetivo de incentivaacute-los a aderirem ao SNHIS VII

firmar termos de adesatildeo ao SNHIS com Estados e Municiacutepios VIII

instituir sistema de informaccedilotildees para subsidiar a formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo acompanhamento e controle das accedilotildees no acircmbito do SNH incluindo cadastro nacional de beneficiaacuterios das poliacuteticas de subsiacutedios IX

gerir o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social ouvido o Conselho do fundo (BRASIL 2004 p 13-14)

A Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo como uma forma estrateacutegica vincula a poliacutetica

urbana agrave fundiaacuteria cabendo a poliacutetica fundiaacuteria subsidiar a poliacutetica urbana na realizaccedilatildeo de

programas habitacionais nos municiacutepios O que para tanto remete a necessidade da

elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais nos quais a propriedade urbana possa cumprir sua

funccedilatildeo social Aleacutem de accedilotildees de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e de acesso a terra urbanizada

(ROLNIK 1997)

Essa poliacutetica habitacional tem como estrateacutegia o fortalecimento institucional sendo

efetiva nos estados e municiacutepios de acordo com

Incentivar a cooperaccedilatildeo entre os niacuteveis federal estadual e municipal buscando instituir mecanismos indutores de adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo estruturaccedilatildeo eou fortalecimento de oacutergatildeos especiacuteficos de formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e coordenaccedilatildeo das poliacuteticas estaduais e municipais de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo de estrutura institucional de acordo com as peculiaridades locais com o objetivo de articular as poliacuteticas setoriais e de desenvolvimento urbano Estimular a criaccedilatildeo de fundos e conselhos estaduais regionais e municipais afetos agraves questotildees urbanas e habitacionais Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais com ecircnfase na aplicaccedilatildeo dos instrumentos de reforma urbana em consonacircncia com o Estatuto da Cidade Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos habitacionais compatiacuteveis com os planos diretores municipais Apoiar a capacitaccedilatildeo de teacutecnicos e o desenvolvimento institucional dos oacutergatildeos responsaacuteveis pela poliacutetica habitacional no acircmbito estadual e municipal (BRASIL 2004 p 9)

Diante do exposto acima pode-se concluir que de fato as poliacuteticas puacuteblicas visam agrave

efetivaccedilatildeo do direito agrave moradia fundamentam-se na concretizaccedilatildeo do direito de propriedade

a partir de intervenccedilotildees em aacutereas irregulares ocupadas construccedilatildeo ou financiamento da

compra da casa proacutepria entre outros

156

No entanto observa-se que os projetos de renovaccedilatildeo urbana voltam-se cada vez mais

ao atendimento dos interesses do mercado imobiliaacuterio e financeiro atuando

fundamentalmente em benefiacutecio da classe de maior poder aquisitivo e do capital Esses

projetos procuram atrair novas atividades econocircmicas por meio da construccedilatildeo de centros

comerciais e de turismo shopping centers centros de convenccedilotildees edifiacutecios comerciais etc

Para Rolnik (1997 p 75) essas intervenccedilotildees proporcionam e reforccedilam uma

reestruturaccedilatildeo social e espacial nas grandes cidades provocando por outro lado um novo

ordenamento territorial acirrando as exigecircncias competitivas do mercado imobiliaacuterio que

procuram impor seus interesses nas grandes transformaccedilotildees urbaniacutesticas arquitetocircnicas e de

infraestrutura Tal situaccedilatildeo impotildee uma maior atuaccedilatildeo do poder puacuteblico atraveacutes da legislaccedilatildeo

urbaniacutestica na regulamentaccedilatildeo dos usos e da ocupaccedilatildeo territorial para que o desenvolvimento

urbano ocorra com sustentabilidade garantindo a qualidade de vida para a populaccedilatildeo

Nesse sentido pode afirmar que natildeo haacute uma neutralidade do Estado por conseguinte

das normatizaccedilotildees juriacutedicas uma vez que refletem interesses poliacuteticos e econocircmicos de

grupos distintos as accedilotildees desse Estado satildeo visando administrar esses interesses E para tanto

esse Estado estabelece criteacuterios para adotar accedilotildees que garantam sua legitimidade e que natildeo

interfiram nesse modo de produccedilatildeo

Bourdieu (2001) afirma que as produccedilotildees simboacutelicas funcionam como instrumento

de dominaccedilatildeo porque contribuem para integraccedilatildeo real das classes dominantes distinguido-as

de outras classes para a desmobilizaccedilatildeo das classes dominadas para a legitimaccedilatildeo da ordem

estabelecida mediante a hierarquizaccedilatildeo

O que reafirma a concepccedilatildeo de poliacutetica social proposta por Pastorini (1997) como o

produto de uma correlaccedilatildeo entre o Estado a classe que deteacutem o capital e a classe trabalhadora

excluiacuteda que envolve perdas e ganhos entre todos os envolvidos Essa correlaccedilatildeo eacute refletida

nos princiacutepios da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo Como mostra o quadro 5

157

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo

Princiacutepios Finalidades Moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social

Garantir padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais

Funccedilatildeo social da propriedade urbana Implementar instrumentos de reforma urbana possibilitando melhor ordenamento e maior controle do uso do solo de forma a combater a especulaccedilatildeo e garantir acesso a terra urbanizada

Questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado

Legitimar o poder puacuteblico como agente indispensaacutevel na regulaccedilatildeo urbana e do mercado imobiliaacuterio no que se refere a provisatildeo de moradia e regularizaccedilatildeo de assentamentos precaacuterios

Gestatildeo democraacutetica Possibilitar a participaccedilatildeo dos diferentes segmentos da sociedade assim como o controle social e transparecircncia nas decisotildees e procedimentos

Subordinaccedilatildeo das accedilotildees em habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo atrelado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Discutir a questatildeo urbana a partir da integraccedilatildeo das poliacuteticas

Fonte Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (2004)

Ao elaborarformular as poliacuteticas habitacionais o Estado acaba por acirrar os

processos de exclusatildeo social e segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o planejamento habitacional

nas condiccedilotildees atuais reforccedila as tendecircncias segregacionistas e excludentes na urbanizaccedilatildeo

brasileira (SANTOS 2002 p 203)

Dessa forma o Estado acaba definindo alguns fatores segregadores tais como aponta

Azevedo (2007 p 71)

Localizaccedilatildeo

geralmente distante dos centros urbanos ou vazios urbanos em aacutereas inadequadas para o desenvolvimento urbano racional

tamanho e qualidade das habitaccedilotildees

pequenas construiacutedas com material de baixa qualidade na maioria das vezes

infraestrutura

inexistente ou de qualidade precaacuteria

e no financiamento

exigecircncias tantas que a maior parte da populaccedilatildeo natildeo alcanccedila fazendo com que poucos tenham acesso ao projeto [] Apenas uma minoria dos setores populares lograraacute ser inserida nos programas governamentais de habitaccedilatildeo popular

Rolnik (2002) ressalta que a elaboraccedilatildeo de leis e de instrumentos urbaniacutesticos como

por exemplo a Legislaccedilatildeo Especial de Habitaccedilatildeo e de Interesse Social voltados para a

formulaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais com a intenccedilatildeo de facilitar aprovaccedilatildeo de projetos de

159

De acordo com Maricato (2000) a intensificaccedilatildeo da dualidade entre cidade formal e

cidade informal tem sido uma constante na estrutura das cidades brasileiras O ritmo do

crescimento dos loteamentos irregulares das favelas e dos corticcedilos nas periferias das grandes

cidades eacute bastante intenso sobretudo nas aacutereas de ocupaccedilatildeo o que tem reforccedilado a funccedilatildeo

estrutural da informalidade na composiccedilatildeo do espaccedilo urbano

Fernandes (1998 p 36) destaca que a habitaccedilatildeo informal sofre com a ausecircncia de

seguranccedila da posse o que deixa o exerciacutecio do direito agrave moradia em risco permanente de

despejo ou deslocamento forccedilado Sendo assim eacute de suma importacircncia que a legislaccedilatildeo deva

prever instrumentos juriacutedicos e urbaniacutesticos que reconheccedilam o direito das pessoas de

permanecer no local onde residem com seguranccedila e proteccedilatildeo independentemente da forma

com que eacute exercida a posse

Encontra-se em curso portanto uma mudanccedila significativa nas concepccedilotildees

tradicionais de regulaccedilatildeo urbaniacutestica logo das proacuteprias noccedilotildees de legalidade e ilegalidade

Tais mudanccedilas visam principalmente respaldar e instrumentalizar o poder puacuteblico para

intervir nessas aacutereas de forma a melhorar as condiccedilotildees de salubridade e habitabilidade

buscando-se desnaturalizar as relaccedilotildees de poder respaldadas na propriedade privada e na terra

urbana enquanto reserva de valor que cristalizaram a desigualdade e a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Neste sentido pode-se compreender o papel da legislaccedilatildeo urbaniacutestica como

instrumento que vem ganhando relevacircncia na tentativa de regular e controlar a dinacircmica de

atuaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio no meio urbano Acredita-se que a busca de cidades mais

justas e democraacuteticas menos segregadas passa pela adoccedilatildeo de poliacuteticas que regulem a

ocupaccedilatildeo e o uso do solo criando instrumentos capazes de articular os interesses em torno do

processo de produccedilatildeo apropriaccedilatildeo e consumo do espaccedilo urbano com os objetivos de se criar

espaccedilos socialmente mais justos e tecnicamente organizados

Pode-se buscar o direito de propriedade para todos e natildeo a prevalecircncia do direito de

propriedade para alguns ou seja aquele que reconhece a propriedade apenas como

mercadoria

Esses fatos tornam as duas cidades amazocircnicas em cidades com suas dimensotildees

espaciais produto da dualidade pois eacute dividida em cidade legal e cidade ilegal haja vista que

os que natildeo tecircm condiccedilotildees para manter e se manterem na cidade legal procuram alternativas

de sobrevivecircncia resultando em ocupaccedilatildeo de aacutereas consideradas informais e ilegais (como as

aacutereas de baixadas ) nas quais decorrem em irregularidades que geram uma seacuteria

consequumlecircncia ao cenaacuterio urbano

160

Para Rolnik (1997) a cidade legal e a cidade ilegal satildeo situaccedilotildees que coexistem o

tempo todo uma vez que dentro da cidade ideal primeiro o habitante adquire o lote depois

contrata o profissional registra o projeto executa a obra e legaliza a construccedilatildeo junto aos

oacutergatildeos competentes para que as pessoas possam residir Na cidade real ocorre justamente o

contraacuterio primeiro chegam as pessoas constroem-se os barracos lutam pela infraestrutura

pelos lotes e pela propriedade

Conforme Souza (2002 p 51) a informalidade e a ilegalidade da ocupaccedilatildeo tecircm sido

uma das marcas no processo de urbanizaccedilatildeo contemporacircnea ampliando-se particularmente

na uacuteltima deacutecada quando haacute um retorno intensivo de ocupaccedilotildees do tipo favelas

Fernandes (1998) classificaram as informalidades e ilegalidades em dois grupos um

relacionado agrave falta de tiacutetulo de propriedade ou de posse legalmente reconhecido outro

relacionado ao descumprimento de normas de construccedilatildeo na cidade Nesse sentido os

assentamentos informais podem ocorrer por ocupaccedilatildeo direta (organizados por movimentos

sociais em terras puacuteblicas ou privadas) ou por mercados informais (lotes clandestinos vendas

ilegais negociaccedilotildees no mercado informal)

A discussatildeo sobre a cidade ilegal dialoga com uma determinada percepccedilatildeo sobre o

direito urbaniacutestico e em determinados momentos a partir do ponto de vista da regulaccedilatildeo

urbaniacutestica Em uma sociedade regida pela loacutegica da mercadoria a legalidade tambeacutem se

transforma de direito em mercadoria atuando de forma elitizante e excludente

Desse modo a exclusatildeo social manifesta-se no proacuteprio fenocircmeno da segregaccedilatildeo

espanotcial uma vez que separando as aacutereas de moradia na cidade por classes sociais distintas

coloca de fora das melhores condiccedilotildees de habitabilidade as populaccedilotildees mais pobres o que

resulta em acessos diferenciados agraves benfeitorias e ao conforto urbano

Segundo Buarque (1999) existe uma ilegalidade proveniente da impossibilidade de

cumprir com as imposiccedilotildees da cidade mercadoria e existe a ilegalidade fruto da intenccedilatildeo de

burlar a lei para apropriaccedilatildeo de vantagens individuais ou de grupos Dentro desse contexto a

cidade ilegal refere-se a um processo de inclusatildeo-exclusatildeo decorrente de uma determinada

regulaccedilatildeo juriacutedico-urbanistica Assim a dualidade legal-ilegal regular-irregular define-se a

partir de um aparato juriacutedico formal

Portanto a cidade legal eacute fruto de um projeto no qual todos os itens de consumo

coletivo de equipamentos e de serviccedilos encontram-se presentes Eacute construiacuteda pelos agentes

formalmente instituiacutedos A instituiccedilatildeo de regulamentaccedilatildeo para a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria nas

cidades eacute o reconhecimento da inadequaccedilatildeo da regulaccedilatildeo urbaniacutestica agraves necessidades da

populaccedilatildeo de mais baixa renda

161

A partir desse enfoque seratildeo analisadas nos capiacutetulos seguintes as contradiccedilotildees na

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano assim como os conflitos que se desenrolam nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis levando em conta que o espaccedilo urbano engloba a materialidade

e a subjetividade o real e o imaginado de forma interligada apontando duas consideraccedilotildees

importantes ao debate

a) o papel do Poder Puacuteblico na produccedilatildeo do espaccedilo urbano atraveacutes das poliacuteticas

habitacionais

b) neste processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano ressalta-se a importacircncia do

processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

162

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

Conforme foi apresentado anteriormente no Brasil segundo Villaccedila (2001) o

processo de urbanizaccedilatildeo foi marcado por uma intensa concentraccedilatildeo de investimentos em

algumas regiotildees Esse processo foi responsaacutevel pela marginalizaccedilatildeo de alguns lugares onde

se concentra a camada da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo da cidade Essas regiotildees satildeo

desprovidas pelas accedilotildees do Estado Basta uma volta pela cidade

e nem precisa ser uma

metroacutepole

para constatar a diferenciaccedilatildeo entre os bairros tanto no que diz respeito ao perfil

da populaccedilatildeo quanto agraves caracteriacutesticas urbaniacutesticas de infraestrutura de conservaccedilatildeo dos

espaccedilos e equipamentos puacuteblicos etc

Cabe ressaltar que a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute uma realidade vivenciada pelas

pessoas que residem nas periferias das grandes cidades uma vez que a localizaccedilatildeo das

moradias de diferentes classes sociais natildeo se daacute de forma aleatoacuteria ou por escolha proacutepria De

fato essas localizaccedilotildees satildeo direcionadas por diferentes fatores sejam econocircmicos sociais

ambientais culturais ou poliacuteticos o que geram diferentes padrotildees de uso e ocupaccedilatildeo do solo

urbano

Para Santos (2002) o poder puacuteblico torna-se estimulante da especulaccedilatildeo do solo ao

fomentar a produccedilatildeo de espaccedilos vazios dentro das cidades mostra-se inoperante para resolver

problemas de moradia e empurra a maioria da populaccedilatildeo para precaacuterias habitaccedilotildees nas

periferias Assiste-se ao crescimento e aparecimento de inuacutemeros assentamentos ocupaccedilotildees e

favelas que ocupam aacutereas aleatoriamente sem nenhum tipo de (re)organizaccedilatildeo de

conhecimentos geograacuteficos ambientais ou infraestrutura

Nesse sentido a dificuldade do acesso a terra tem sido fator determinante de

desigualdades sociais e diferenciaccedilotildees entre as classes sociais37 Os elevados preccedilos do solo

determinam a segregaccedilatildeo social por estratos de renda infligindo ocircnus sociais inversamente

proporcionais agrave capacidade de pagamento de quem os suporta

Entretanto essas desigualdades sociais natildeo satildeo reflexos apenas dos planos materiais

e objetivos dos indiviacuteduos mas tambeacutem dos planos subjetivos e psicoloacutegicos ou seja satildeo

muacuteltiplas as dimensotildees que os diferentes processos de desigualdades sociais afetam a vida e o

cotidiano da populaccedilatildeo tais como econocircmica cultural poliacutetica social psicoloacutegica etc

37 Para Maricato (2001) ao diferenciar os lugares o preccedilo da terra passa a ser fundamental e determinante sobre a acessibilidade e possibilidade de localizaccedilatildeo no espaccedilo intraurbano das diferentes classes sociais Da mesma forma o espaccedilo produzido com estas caracteriacutesticas tambeacutem passa a reproduzir tais condiccedilotildees de desigualdade social

163

Eacute importante resgatar que conforme discutido nos capiacutetulos anteriores aleacutem do

preccedilo da terra urbana do setor imobiliaacuterio-construtor e do Estado eacute preciso considerar o

conjunto da composiccedilatildeo social do capital e a forma como se reparte o trabalho excedente do

necessaacuterio ou seja quando a oferta de empregos eacute insuficiente ou os salaacuterios satildeo muito

baixos dificultando a aquisiccedilatildeo de uma moradia digna que disponha de saneamento baacutesico

comeacutercio e lazer (KOWARICK 1988)

Sendo assim eacute importante destacar que o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial pode

ser compreendido em sua dinacircmica marcada pela desigualdade contradiccedilatildeo e exclusatildeo trata-

se portanto de um processo estruturador da proacutepria produccedilatildeo do espaccedilo urbano

A seguir procurar-se-aacute apresentar o processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano e a

questatildeo habitacional em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes partindo da perspectiva que entender o

processo de urbanizaccedilatildeo na Amazocircnia eacute um fenocircmeno mais geral que abrange redes

socioeconocircmicas e culturais complexas agentes sociais que fazem a cidade que lutam em

posiccedilotildees de classe diferente e que satildeo os artiacutefices da apropriaccedilatildeo e da produccedilatildeo do espaccedilo da

construccedilatildeo dos direitos agrave cidade

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A construccedilatildeo do espaccedilo urbano na Amazocircnia teve como elemento significativo

desde o periacuteodo colonial as determinaccedilotildees das poliacuteticas nacionais e internacionais O

processo de urbanizaccedilatildeo foi consequumlecircncia de formas especiacuteficas do desenvolvimento do

capitalismo para essa regiatildeo Essa forma se evidenciou nas relaccedilotildees econocircmicas estabelecidas

para apropriaccedilatildeo das riquezas naturais

Assim na Amazocircnia cujo siacutembolo maior eacute a floresta tropical regiatildeo com

caracteriacutesticas geograacuteficas climaacuteticas e ambientais peculiares as poliacuteticas de

desenvolvimento tecircm provocado substanciais transformaccedilotildees na vida econocircmica social e

cultural de seus habitantes com a utilizaccedilatildeo da ciecircncia e tecnologia para modernizar e

incorporar economicamente os recursos naturais hidrograacuteficos e da floresta tropical ao mundo

globalizado

Em maior ou menor grau o processo recente de desenvolvimento eacute resultante da

accedilatildeo ou omissatildeo da elite regional

governantes poliacuteticos fazendeiros empresaacuterios e

intelectuais amazocircnicos

que diretamente eou associada a interesses externos tem ajudado

164

a promover a modernizaccedilatildeo na regiatildeo a partir de objetivos estritamente econocircmicos e

localizados o que tem contribuiacutedo para o crescimento dos problemas sociais e da degradaccedilatildeo

ambiental

Nesse sentido pode-se afirmar que o avanccedilo do capitalismo na regiatildeo amazocircnica

conduziu a uma transformaccedilatildeo natildeo apenas na estrutura fundiaacuteria mas tambeacutem no aspecto

social levando o camponecircs a disputar desigualmente com empresas nacionais e estrangeiras

as terras que ocupa (COSTA 1980)

O papel do Estado nesse contexto aparece de suma importacircncia jaacute que facilitou e

reforccedilou a penetraccedilatildeo do capital nacional e internacional na regiatildeo transformando-a num

cenaacuterio que combina modernizaccedilatildeo e exclusatildeo social cujos princiacutepios norteadores eram o

patrimonialismo e o clientelismo

Mediante esse contexto analisar-se-aacute a cidade de Beleacutem como um espaccedilo de inter-

relaccedilotildees urbanas portanto tendo como fundamento as contradiccedilotildees sociais (derivadas das

relaccedilotildees sociais conflituosas relaccedilotildees de classe) e pressupondo o papel fundamental da praacutexis

das praacuteticas urbanas

A cidade de Beleacutem fundada em 1616 no periacuteodo colonial com o nome de Santa

Maria de Beleacutem do Gratildeo Paraacute a partir da ocupaccedilatildeo das terras indiacutegenas pelos portugueses e

da construccedilatildeo do Forte de Preseacutepio (hoje denominado de Forte do Castelo)38 Seu relevo eacute

baixo com boa parte do territoacuterio situado em aacutereas de baixadas ou seja as vaacuterzeas e igapoacutes

das bacias hidrograacuteficas39 que recortam a cidade determinando assim no seu interior a

existecircncia de diversas faixas de terras abaixo da cota de 04 metros que recebem as influecircncias

do rio e do oceano Estas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees a maior parte do ano satildeo proacuteximas aos

canais nas quais se instalaram vaacuterios migrantes e a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo e se

constituem objeto de accedilotildees de saneamento e de habitaccedilatildeo de interesse social

O aglomerado metropolitano de Beleacutem eacute constituiacutedo espacialmente por dois

conjuntos fisiograacuteficos distintos aacuterea continental e conjunto insular A aacuterea continental

localiza-se na regiatildeo metropolitana e a insular abrange aproximadamente 39 ilhas das quais

as mais importantes satildeo as de Mosqueiro (1911 Kmsup2) e CaratateuaOuteiro (318 Kmsup2)

ambas interligadas ao continente por meio de pontes (Mapa 1)

38 Abrange uma aacuterea de 5058231 kmsup2 cujo centro estaacute localizado aproximadamente a 1ordm 20 de latitude sul e 48ordm 30 de longitude oeste de Greenwich possuindo um clima quente e uacutemido com precipitaccedilatildeo meacutedia anual alcanccedilando os 2834 mm Situa-se numa peniacutensula contornada ao sul pelo rio Guamaacute a oeste pela Baiacutea do Guajaraacute e Baiacutea do Marajoacute ao norte pelo furo do Maguari e a leste a cidade limita-se com os municiacutepios de Ananindeua Marituba Santa Baacuterbara e Santo Antocircnio do Tauaacute (SEGEP 1999) 39 Bacia do Una Bacia do Comeacutercio Tamandareacute e Satildeo Joseacute Bacia da Estrada Nova Bacia do Tucunduba e Bacia das Almas e Reduto (RODRIGUES 2000 p 125)

165

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem

Fonte SEGEP (2001)

166

Na parte continental aacuterea mais densamente ocupada inserem-se os conjuntos

urbaniacutesticos das cidades que compotildeem a Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem (RMB) principal

poacutelo concentrador de atividades secundaacuterias e terciaacuterias irradiadoras de fluxo e intercacircmbios

com todo o territoacuterio paraense

A RMB que abrange uma aacuterea de 18277 Kmsup2 com uma populaccedilatildeo de 2040843 de

habitantes (quase um terccedilo da populaccedilatildeo do Estado do Paraacute)40 foi instituiacuteda pelo governo

federal por meio de Lei complementar nordm 14 de junho de 1973 e complementada pelas Leis

nordm 20 de 1974 e nordm 27 de 1975

Naquela eacutepoca a RMB era constituiacuteda pelos municiacutepios de Beleacutem e Ananindeua

Isto se deveu a uma estrateacutegia geopoliacutetica de induccedilatildeo de desenvolvimento na regiatildeo pois

Beleacutem era um poacutelo regional de articulaccedilatildeo entre diferentes regiotildees do Estado assim como

com o Amapaacute e o Maranhatildeo (CARDOSO LIMA 2006)

Com a Constituiccedilatildeo de 1988 atribui-se aos estados a responsabilidade de instituir

regiotildees metropolitanas aglomeraccedilotildees urbanas e microrregiotildees O governo estadual por meio

da Lei complementar nordm 27 de outubro de 1995 instituiu a RMB com a inclusatildeo dos

municiacutepios de Beleacutem Ananindeua Marituba e Benevides Em 19 de dezembro de 1996 o

municiacutepio de Santa Baacuterbara foi incluiacutedo na RMB (SEPLAN 1998) Mais recentemente na

RMB foi incluiacutedo o municiacutepio de Santa Izabel

Na tabela 4 pode ser evidenciado que o processo de crescimento e consolidaccedilatildeo da

RMB foi baseado na expansatildeo perifeacuterica espraiamento da mancha urbana e paulatina

transformaccedilatildeo de aacutereas rurais em urbanas Este fato eacute demonstrado com os dados de

crescimento de Beleacutem que na deacutecada de 1990 foi menor do que o apresentado pelo

municiacutepio de Ananindeua tornando-se o segundo municiacutepio em importacircncia na RMB e

apresentando uma intensa conurbaccedilatildeo com Beleacutem Os demais municiacutepios (Benevides

Marituba e Santa Baacuterbara) aleacutem de apresentarem populaccedilatildeo menor possuem maior

quantidade de aacutereas consideradas rurais

Aleacutem disso cabe destacar que os fatores geograacuteficos tiveram grande importacircncia no

processo de ocupaccedilatildeo urbana da RBM na medida em que as aacutereas de terra firme foram sendo

ocupadas pelas camadas de maior renda restando somente agraves aacutereas alagadas para a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo Essas caracteriacutesticas geograacuteficas tecircm papel fundamental na forma

como as questotildees socioespaciais estatildeo imbricadas nas questotildees habitacionais bem como na

40 Dados do IBGE Censo Demograacutefico 2010

167

forma como a populaccedilatildeo de baixa renda busca suprir suas necessidades de moradia na cidade

(PINHEIRO et al 2007)

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

Nome do Municiacutepio

Ano 1991

Ano 1996

Ano 2000

Ano 2010

TCA 1991-1996

TCA 1996-2000

TCA 1991-2000

TCA 2000-2010

Ananindeua 88151 341257 392947 471744 311 36 181 - Beleacutem 1244689

1144312

1280614

1392031 -17 29 04 - Benevides 68465 28130 35350 51663 -163 59 -71 - Marituba 0 49239 75448 108251 - 113 - - Santa Baacuterbara

0 11549 11375 17154 - -04 - -

Marituba se tornou municiacutepio no ano de 1996 sendo assim tem-se os nuacutemeros da populaccedilatildeo a partir desse ano TCA Taxa de Crescimento Anual Dados ainda natildeo disponiacuteveis do Censo IBGE 2010 Fonte IBGE (2010)

Na histoacuteria da expansatildeo urbana de Beleacutem a fundaccedilatildeo da cidade teve como objetivo

impedir a tentativa de ingleses franceses e holandeses de se estabelecerem na regiatildeo

A ocupaccedilatildeo da Amazocircnia pela colonizaccedilatildeo portuguesa foi movida por interesses poliacuteticos de fincar pontos avanccedilados com fortificaccedilotildees em lugares estrategicamente relevantes distantes para demarcar a presenccedila portuguesa nessa regiatildeo do norte [] presidida pelos interesses econocircmicos o que pode ser visto [] no modo de produccedilatildeo e de exploraccedilatildeo da matildeo-de-obra praticada nos povoados das missotildees religiosas espalhadas no territoacuterio do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo (CASTRO 2008 p 17)

A colonizaccedilatildeo dessa regiatildeo antes ocupada pelos iacutendios deu-se em um primeiro

momento ainda quando o Brasil era colocircnia de Portugal com o principal objetivo de proteger

o imenso territoacuterio da invasatildeo de outros povos e na tentativa de detectar as possibilidades de

exploraccedilatildeo dos recursos florestais Foram os missionaacuterios e sertanistas os primeiros a

desenvolverem atividades econocircmicas logo no inicio da colonizaccedilatildeo catequizando iacutendios e

colhendo as especiarias (drogas do sertatildeo) para a coroa portuguesa

Com a chegada dos portugueses foram vaacuterios os grupos sociais dentre eles o grupo

indiacutegena que se revoltaram em diversas situaccedilotildees e em diferentes capitanias contra o

domiacutenio que o Governo de Portugal e seus representantes na colocircnia impunham sobre a

populaccedilatildeo bem como lutavam pela posse do territoacuterio

168

Em 07 de janeiro de 1619 houve a primeira revolta dos povos indiacutegenas contra essa

opressatildeo e o assalto agraves suas terras41 Os Tupinambaacutes que moravam agraves margens do rio

Guamaacute e Paraacute invadiram a cidade de Beleacutem com a finalidade de expulsar os lusitanos da

regiatildeo (BEZERRA NETO 1999)

No entanto segundo Bezerra Neto (1999 p 19)

[] os colonos refugiados no Forte do Preseacutepio abriram fogo contra os indiacutegenas matando muito deles e fazendo com que fossem obrigados a bater em retirada deixando Beleacutem destruiacuteda Assim na ocupaccedilatildeo da regiatildeo os portugueses fizeram suas guerras contra as populaccedilotildees nativas quase sempre exterminando-as e subjugando-as ao seu domiacutenio

A produccedilatildeo do espaccedilo urbano de Beleacutem iniciou-se em torno do forte do Preseacutepio

expandindo-se para o sul com a abertura das primeiras ruas acompanhando o litoral ao longo

da Baiacutea do Guajaraacute No entanto o crescimento do nuacutecleo urbano em direccedilatildeo ao sul foi

interrompido pelo igarapeacute do Piri que era longo e tortuoso (CORREcircA 1989)

A situaccedilatildeo topograacutefica do Piri impedia a continuidade do traccedilado urbano tornando-

se ponto de referecircncia da divisatildeo da cidade em dois bairros um a oeste do Piri o bairro da

Cidade (hoje denominado de Cidade Velha) e outro a leste o bairro da Campina (hoje

Comeacutercio) (TRINDADE JUNIOR 1997) O espaccedilo produzido limitava-se aos primeiros

arruamentos com seus preacutedios fortes igrejas e conventos Tambeacutem recebeu as suas primeiras

edificaccedilotildees civis feitas com materiais simples predominantemente a taipa e a taipa de pilatildeo

Inicialmente esse espaccedilo urbano produzido foi organizado levando em consideraccedilatildeo

os terrenos de cotas mais altas deixando grandes aacutereas desocupadas formadas por terrenos

alagaacuteveis ou alagados de cotas baixas Na sua expansatildeo os acidentes hiacutedricos foram sendo

contornados o que provocou uma formaccedilatildeo irregular da cidade acompanhando a topografia

Os principais agentes produtores do espaccedilo desde o periacuteodo colonial eram a

burocracia os comerciantes as ordens religiosas e a camada pobre da populaccedilatildeo

(RODRIGUES apud TRINDADE JUNIOR 1997) A base econocircmica da cidade repousava no

comeacutercio na agricultura de subsistecircncia e no extrativismo

A exploraccedilatildeo das drogas do sertatildeo as atividades agriacutecolas e a economia gomiacutefera que tinham nas vias fluviais o principal meio de circulaccedilatildeo configuraram a existecircncia de uma rede urbana dendriacutetica que definiu a cidade de Beleacutem como cidade primaz ratificada a cada momento por sua posiccedilatildeo estrateacutegica no contexto regional que inclusive marcou o caraacuteter

41 Pode-se dizer que essa situaccedilatildeo foi a primeira manifestaccedilatildeo popular ocorrida em Beleacutem

169

poliacutetico-militar de ocupaccedilatildeo inicial da regiatildeo pelos portugueses (TRINDADE JUNIOR 1998 p 98)

Castro (2008 p 17) ressalta que o surgimento das cidades coloniais tiveram duas

motivaccedilotildees primeiro o avanccedilo da organizaccedilatildeo do sistema extrativista do transporte de

mercadorias do processo de catequese e segundo a dominaccedilatildeo de indiacutegenas para o trabalho

servil A respeito da matildeo-de-obra para o trabalho servil Bezerra Neto (1999 p 57) declara

que

A matildeo-de-obra escrava indiacutegena e africana constituiacutea a base dos trabalhadores da proviacutencia O contingente de cativos africanos no nuacutecleo urbano de Beleacutem e em seu entorno era bastante expressivo chegando a representar 35 da populaccedilatildeo no final da segunda metade do seacuteculo XVIII A eles somavam-se os habitantes brancos que representavam cerca de 52 dos moradores e finalmente os pobres livres pretos iacutendios e mesticcedilos que perfaziam um total de 13 dos indiviacuteduos

Na economia colonial o extrativismo vegetal sempre foi um importante moacutevel de

ocupaccedilatildeo e povoamento pois agrave procura por produtos nativos centenas de pessoas adentravam

na floresta e os vilarejos iam surgindo agraves margens dos rios caracterizando o chamado padratildeo

dendriacutetico de urbanizaccedilatildeo Isso influenciou a formaccedilatildeo de diferentes modos de vida

estrateacutegias de sobrevivecircncia e de trabalho condiccedilotildees de vida e a propagaccedilatildeo de haacutebitos e

valores culturais

que atravessaram geraccedilotildees condicionando os modos de vida nas cidades

espaccedilos de construccedilatildeo das praacuteticas sociais e poliacuteticas (SANTOS 1980)

A expansatildeo da cidade nos seacuteculos XVIII e XIX decorreu de uma economia agriacutecola

em plantaccedilotildees de cacau e cana-de-accediluacutecar nos arredores de Beleacutem em engenhos produtores de

accediluacutecar aguardente e mel aleacutem da agricultura de roccedilas olarias engenhos de pilar arroz de

atividades comerciais e criaccedilatildeo de gado vaccum Contava ainda com faacutebrica de farinha e uma

de chocolate

Nota-se que um dos fatores que influenciaram na forma de ocupaccedilatildeo da cidade de

Beleacutem foi o ambiental pois a ocupaccedilatildeo das margens dos rios que contornavam Beleacutem por

instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas incentivou a populaccedilatildeo a povoar as aacutereas alagadas e

perifeacutericas da cidade

Nesse periacuteodo percebeu-se a preocupaccedilatildeo das autoridades puacuteblicas com as vaacuterzeas

especialmente do Piri que em virtude da forma de ocupaccedilatildeo comeccedilava a apresentar os

efeitos da poluiccedilatildeo e da falta de higiene assim como a viabilizaccedilatildeo do crescimento da cidade

que foram utilizados como argumentos para justificar o ensecamento a terraplenagem e

170

drenagem da baixada do Piri (TRINDADE JUNIOR 1997) Isso fez com que surgisse um

plano de aproveitamento do Piri (FERREIRA 1995)

Esse plano previa o aproveitamento da rede hidrograacutefica de Beleacutem em sua totalidade

tornando-a navegaacutevel Tratava-se de aproveitar as formas naturais do siacutetio urbano para

solucionar os problemas de saneamento e drenagem da cidade ou seja ao inveacutes de aterrar os

rios e igarapeacutes que percorriam Beleacutem era melhor embelezaacute-los e dar-lhes uma proteccedilatildeo

militar segura Entretanto em 1803 foi iniciado o trabalho de ensecamento do Piri

contrariando assim os planos de Gronfelts Com o aterramento do Piri ocorreu a integraccedilatildeo

fiacutesica entre os bairros da Cidade e da Campina (TRINDADE JUNIOR 1997)

Segundo Correcirca (1989 p 80) as obras do Piri foram realizadas num periacuteodo em que

tanto a regiatildeo como a cidade passavam por um decliacutenio econocircmico aproveitando-se assim a

ociosidade da matildeo-de-obra escrava A partir de 1778 a Amazocircnia passou por uma

estagnaccedilatildeo devido agrave extinccedilatildeo da Companhia do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo e agrave emergecircncia de uma

situaccedilatildeo mundial desfavoraacutevel ao mercado dos produtos tropicais em geral agrave agricultura e ao

extrativismo de exportaccedilatildeo Com isso Beleacutem sofreu os efeitos do decliacutenio econocircmico aleacutem

de ter vivenciado fortes confrontos poliacuteticas decorrentes da Cabanagem (1835 - 1840)42

A Cabanagem foi entre as muitas manifestaccedilotildees ocorridas no Periacuteodo Regencial

este considerado de transiccedilatildeo devido agrave transferecircncia do poder das elites portuguesas para as

elites nacionais (ricos proprietaacuterios de terras) a manifestaccedilatildeo de caraacuteter popular que reuniu os

habitantes pobres das cidades e vilarejos ribeirinhos iacutendios negros e mesticcedilos denominados

cabanos

Devido a situaccedilatildeo de miseacuteria das classes populares que natildeo viam os seus anseios

atendidos a conjuntura de crise econocircmica por qual passava o Brasil e a pressatildeo das elites

nacionais o movimento poliacutetico social conseguiu se expandir no Paraacute e mobilizar adesotildees

crescentes no meio dos segmentos sociais pobres Entretanto esses grupos sociais e eacutetnicos

que aderiu em massa agrave revolta na tentativa de encontrar uma saiacuteda para sua situaccedilatildeo

perceberam que poderiam lutar por outros ideais jaacute que o movimento tomou dimensotildees mais

ampla de autodeterminaccedilatildeo

Os chefes cabanos declararam a autonomia da proviacutencia do Paraacute e formaram um

governo revolucionaacuterio em defesa de sua liberdade No entanto foram derrotados e

duramente massacrados

42 Ateacute esse periacuteodo ocorreram vaacuterias revoltas agitaccedilotildees e motins contra a miseacuteria das camadas populares e a opressatildeo dos iacutendios e negros

171

O governo do primeiro ministro portuguecircs Marquecircs de Pombal continuou com o

processo de ocupaccedilatildeo territorial tendo como marco a construccedilatildeo de um reduto (pequena

praccedila de guerra) agraves proximidades do antigo convento de Santo Antocircnio Esse reduto ajudava

a garantir a proteccedilatildeo da cidade jaacute que sua localizaccedilatildeo era estrateacutegica junto agrave baiacutea Assim

surgiu o nome do bairro do Reduto e do igarapeacute que existia laacute (denominado anteriormente de

Igarapeacute da Faacutebrica) Esse Igarapeacute (Fotografia 2) foi aterrado o que possibilitou a abertura de

ruas e caminhos passando desse modo a ligar o nuacutecleo da cidade agraves aacutereas adjacentes

tornando-se definitivamente inseridas ao espaccedilo urbano belenense (TRINDADE JUNIOR

1997)

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Segundo Ferreira (1995) foi a partir de 1860 que as diferenciaccedilotildees soacutecio-espaciais

intra-urbanas comeccedilam a se evidenciar cada vez mais pelo incremento dos elementos

formadores da heterogeneidade do espaccedilo produzido e da sua valorizaccedilatildeo em Beleacutem Ou seja

a cidade jaacute havia se expandido ocupando uma aacuterea que permitiu a diversificaccedilatildeo das

localidades dentro da mesma no que se refere agraves diferenccedilas de acesso e de instalaccedilatildeo de

infraestrutura urbana

A cidade possuiacutea quatro distritos principais Cidade Campina Trindade e Nazareacute

nas quais estavam circunscritas natildeo apenas as aacutereas compreendidas no marco urbano mas

tambeacutem as povoaccedilotildees rurais e ribeirinhas localizadas em seu entorno Outras localidades

172

como Benevides Castanhal Barcarena e Santa Izabel (hoje municiacutepios independentes) faziam

parte dos marcos administrativos de Beleacutem (CANCELA 2007)

As atividades terciaacuterias foram intensificadas no bairro da Campina e no contiacuteguo

bairro do Reduto e implantadas algumas das primeiras induacutestrias de Beleacutem De acordo com

Cancela (2007) frente a liquidez da economia a expansatildeo das aacutereas de ocupaccedilatildeo e os projetos

de urbanizaccedilatildeo os Distritos ganharam novos significados

A Cidade Velha primeiro bairro da capital com suas ruas estreitas passou a ser visto como um lugar insalubre e pantanoso natildeo recomendado para as pessoas de posse Seus moradores mais antigos comeccedilaram a se mudar para as ruas e avenidas mais largas da Estrada de Nazareacute Satildeo Jerocircnimo e as travessas adjacentes O mesmo ocorreu com a Campina conhecida como segundo bairro da Cidade Parte de sua aacuterea compreendia as principais

ruas do comeacutercio de Beleacutem Nela concentrava-se um bom nuacutemero de lojas armazeacutens bancos e casas de aviamento localizados nos arredores das avenidas Joatildeo Alfredo 15ordm de Novembro 13ordm de Maio e Boulevard Castilho Franccedila Tambeacutem em suas ruas encontraacutevamos casas particulares entrecruzadas com corticcedilos hoteacuteis casas de pasto estacircncias oficinas de trabalho com quartos para morada pequenas manufaturas coleacutegios cocheiras e vacarias (CANCELA 2007 p 57-58)

Com a migraccedilatildeo intensa de nordestinos e estrangeiros estimulada pela economia da

borracha a cidade cresceu e se expandiu novas ruas e estradas como eram algumas delas

chamadas surgiram ou foram ampliadas A exemplo disto Cancela (2007) cita as Estradas de

Satildeo Braacutes da Joseacute Bonifaacutecio e do Entroncamento assim como as travessas da Rua do Jurunas

que formavam o 4ordm Distrito a Rua Grande da Pedreira as travessas do Marco da Leacutegua e do

siacutetio da Sacramenta que vieram a compor os receacutem criados 5ordm e 6ordm Distritos

O periacuteodo que compreende a segunda metade do seacuteculo XIX ateacute as primeiras deacutecadas

do seacuteculo XX caracterizou-se pelo predomiacutenio da economia da borracha na Amazocircnia

produzindo-se grandes excedentes direcionados ao mercado mundial Novas elites com

concepccedilotildees de urbano seguindo os modelos europeus direcionaram o processo de

reurbanizaccedilatildeo da cidade de Beleacutem transformando os espaccedilos e os costumes da cidade de

acordo com o que se produzia entatildeo no espelho que representava a cidade de Paris

Houve um crescimento populacional no bairro da Campina avanccedilando para o

interior Aleacutem disso vale destacar o calccedilamento de grande parte de suas ruas e agraves funccedilotildees

econocircmicas e poliacutetico-administrativas que Beleacutem passou a exercer no periacuteodo aacuteureo da Belle

Eacutepoque com a exploraccedilatildeo da borracha

173

As mudanccedilas nos serviccedilos de infraestrutura oferecidos na capital paraense que nos ajudam a entender as alteraccedilotildees pelas quais a cidade vinha passando tornam-se siacutembolos de modernidade de progresso de que algo grande e civilizado estaacute acontecendo inserindo Beleacutem no cenaacuterio das urbes mais contemporacircneas Todavia a forma de uso e vivecircncia desses serviccedilos mostrava-se diferenciado para os diversos segmentos sociais e estavam distantes do dia-a-dia de muita gente O custo da energia eleacutetrica os bonds precaacuterios de terceira linha a incipiente rede de encanamento impondo a continuidade do abastecimento de aacutegua nos poccedilos puacuteblicos para boa parte da populaccedilatildeo foram situaccedilotildees ainda encontradas na capital da belle eacutepoque que deslindaram a dificuldade das mudanccedilas chegarem ao conjunto da populaccedilatildeo A mesma dificuldade podia ser vivida para quem procurava uma casa para morar Com o crescimento da cidade e a intensa migraccedilatildeo a demanda em torno de moradia acentuou-se A compra de imoacuteveis tornou-se um dos investimentos mais rentaacuteveis da elite local Muitos deles eram comprados para arrendamento Os alugueacuteis eram altos e as possibilidades de morada restritas ou distanciadas dos locais de trabalho e de transporte (CANCELA 2007 p 60)

Durante o ciclo da borracha Beleacutem expandiu-se com extrema rapidez seguindo os

limites colocados pela existecircncia de muitas terras cortadas por igarapeacutes eou permanentemente

alagadas Esse periacuteodo da histoacuteria da cidade precisa ser destacado porque foram muitas as

transformaccedilotildees ocorridas no espaccedilo urbano

Castro (2008) argumenta que com a ascensatildeo da economia gomiacutefera a produccedilatildeo e

troca de mercadorias estendeu-se por um territoacuterio maior abrindo novas aacutereas de

povoamento

A rede que organizava a produccedilatildeo e a circulaccedilatildeo preacute-existente foi a base da produccedilatildeo inicial da borracha pois em todas as bocas de igarapeacutes e de rios com recursos e possibilidade de exploraccedilatildeo localizava-se um posto ou comeacutercio que tinha a funccedilatildeo de canalizar a produccedilatildeo agroextrativista trazida das terras interiores e de drenaacute-las para os portos de cidades maiores base da extensa rede de aviamento [] A funccedilatildeo econocircmica de circulaccedilatildeo e gestatildeo da produccedilatildeo a partir da cidade eacute a chave para o entendimento da formaccedilatildeo da rede urbana na Amazocircnia (CASTRO 2008 p 17-18)

A regiatildeo amazocircnica tornou-se interessante para o mercado exterior pois a borracha

transformou-se de droga do sertatildeo em mateacuteria-prima estrateacutegica para as induacutestrias de

pneumaacuteticos dos EUA e Europa configurando-se na quase uacutenica fonte de riqueza desta parte

do Brasil o que provocou segundo Cancela (2007 p 23-24) o periacuteodo de maior expressatildeo

poliacutetica cultural e soacutecio-econocircmico da regiatildeo Amazocircnica gerando condiccedilotildees materiais e de

vida nunca antes experimentadas propiciando novos espaccedilos vitais para a naccedilatildeo aleacutem da

revitalizaccedilatildeo de seu organismo social e financeiro

174

Com o aparecimento da vulcanizaccedilatildeo em 1839 descoberta por Charles Goodyear e

principalmente a invenccedilatildeo dos pneumaacuteticos por Dunlop em 1888 como tambeacutem a invenccedilatildeo

do automoacutevel e a massificaccedilatildeo do uso da bicicleta onde a borracha constituiacutea-se na mateacuteria-

prima fundamental satildeo os fatores responsaacuteveis pela grande corrida

agraves fontes fornecedoras

dessa mateacuteria-prima notadamente para a Amazocircnia que possuiacutea grandes densidades de

seringueiras Esta regiatildeo entatildeo tornou-se a principal fornecedora mundial43

Desta forma Beleacutem que ateacute entatildeo vinha passando por um processo de ocupaccedilatildeo

lenta baseada em atividades bem definidas (coleta extrativa das drogas do sertatildeo e uma

agricultura paralela) comeccedila a sofrer transformaccedilotildees importantes Sua principal atividade

econocircmica passa a basear-se no extrativismo gomiacutefero e um grande esforccedilo em busca da nova

riqueza eacute estabelecido fazendo aparecer novas vilas e povoados e fortalecendo outras cidades

de forma mais expressiva como Manaus

Vale ressaltar que o desenvolvimento dessa atividade provocou um crescimento

populacional e migratoacuterio especialmente a imigraccedilatildeo nordestina para a regiatildeo sendo um

fator importante para o crescimento da economia da borracha uma vez que havia a disposiccedilatildeo

matildeo-de-obra necessaacuteria agrave extraccedilatildeo do laacutetex44 nas matas amazocircnicas por um custo baixo

Analisando a historiografia pode-se afirmar que a elite mercantil formada em sua

maioria por estrangeiros passou a conquistar cada vez mais espaccedilo minimizando a influecircncia

exercida pelas famiacutelias tradicionais locais que construiacuteram suas riquezas a partir do comeacutercio

de terras e da criaccedilatildeo de animais (gado)

Os novos grupos sociais redefiniram as relaccedilotildees de influecircncia e de poder em Beleacutem

a ampliaccedilatildeo do setor de serviccedilos redimensionando a oferta de trabalho a exemplo das

profissotildees liberais e dos trabalhos temporaacuterios

(CANCELA 2007 p 59) provocando uma

alteraccedilatildeo no poder aquisitivo dos antigos proprietaacuterios de terra e dos comerciantes que

trabalhavam com exportaccedilotildees Esses grupos em particular foram os mais beneficiados

porque aleacutem de fortalecerem seu domiacutenio sobre as atividades econocircmicas mais lucrativas

ampliaram seu poder de pressatildeo e de influecircncia sobre a atuaccedilatildeo dos governos

estadual e

municipal

em funccedilatildeo de um volume maior de recursos arrecadados com o incremento das

exportaccedilotildees (SANTOS 1980)

43 Essa fase tem como pano de fundo a chamada segunda Revoluccedilatildeo Industrial caracterizada pelo excepcional progresso tecnoloacutegico da induacutestria quiacutemica da siderurgia e da eletricidade aleacutem da consolidaccedilatildeo do capital financeiro que proporcionou o surgimento das grandes corporaccedilotildees industriais 44 O laacutetex eacute um produto da seringueira tambeacutem denominada hevea brasiliensis que se destaca particularmente por sua elasticidade e impermeabilidade

175

Outro fator importante a ser destacado eacute a implantaccedilatildeo de infraestruturas que

facilitariam de maneira significativa o transporte dos produtos das cidades de Beleacutem e

Manaus para o exterior Estas cidades eram portuaacuterias e se constituiacuteram em porta de entrada

para a Amazocircnia pois possuiacuteam posiccedilatildeo privilegiada no escoamento da produccedilatildeo do Meacutedio

Amazonas e seus afluentes tornando-as com isso mais competitiva Os seringais eram os

lugares de produccedilatildeo e a cidade o lugar de comeacutercio A borracha representa o momento mais

importante da formaccedilatildeo da rede urbana ainda que incipiente com o povoamento e a

formaccedilatildeo de cidades em funccedilatildeo dos fluxos econocircmicos (CASTRO 2008 p 18)

Beleacutem constituiacutea-se num porto privilegiado por sua posiccedilatildeo geograacutefica servindo de entreposto aos navios que chegavam ou saiacuteam da regiatildeo amazocircnica transportando mercadorias e pessoas Durante muito tempo a borracha produzida no Amazonas e no Acre saiacutea do Brasil pelas aacuteguas belenense Mesmo apoacutes a diminuiccedilatildeo da produccedilatildeo da borracha em terras paraenses a capital continuou com um volume alto de negoacutecios em seu porto particularmente em funccedilatildeo das partidas de borracha advindas do Acre (CANCELA 2007 p 62)

Com a abertura dos portos a navios estrangeiros a atratividade de Beleacutem cresceu

muitas empresas fecharam suas portas em Manaus e se mudaram para a cidade portuaacuteria do

Paraacute intensificando o processo de urbanizaccedilatildeo da cidade

Castro (2008) ressalta que o modelo de povoamento baseia-se nos ciclos econocircmicos

e na loacutegica do trabalho escravo nas fazendas no interior e nas cidades nas quais se realizam

o escoamento da produccedilatildeo caracterizando o padratildeo campo-cidade

A respeito disso Lefebvre (1991 p 31-32) argumenta que a separaccedilatildeo entre a cidade

e o campo toma lugar entre as primeiras e fundamentais divisotildees do trabalho (a bioloacutegica e a

teacutecnica) Ela corresponde agrave separaccedilatildeo entre o trabalho material e o trabalho intelectual pois agrave

cidade cabem funccedilotildees de organizaccedilatildeo direccedilatildeo atividades poliacuteticas militares e elaboraccedilatildeo do

conhecimento

Nesse sentido Castro (2008) argumenta que as cidades tinham a funccedilatildeo de organizar

o mercado fluxos de comeacutercio exportaccedilatildeo entre outros e destaca que ateacute 1940 a grande

maioria da populaccedilatildeo brasileira estava no campo sendo que somente em 1960 haacute uma

transformaccedilatildeo do movimento demograacutefico com fluxos migratoacuterios do campo para as cidades

decorrente do processo de industrializaccedilatildeo a qual se constitui um novo processo de

acumulaccedilatildeo do capital conforme demonstrado na tabela 5

176

Tabela 5 - Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte 1940-2000 Ano Brasil Regiatildeo Norte

Populaccedilatildeo Urbano Populaccedilatildeo Urbano 1940 41236315 3120 1462420 2770 1950 51944397 3620 1844655 3150 1960 70070457 4470 2561782 3750 1970 93139037 5590 3603860 4510 1980 119002706 6760 5880268 5170 1991 150367800 7500 9337150 5780 2000 169799170 8100 12900704 6987 Fonte IBGE Censos demograacuteficos de 1940 a 2000 (apud CASTRO 2008)

Dessa forma as poliacuteticas desenvolvimentistas impostas pelo governo federal nesse

periacuteodo fruto do processo de expansatildeo da fronteira capitalista no paiacutes para a regiatildeo

amazocircnica resultaram num processo de desarticulaccedilatildeo da atividade extrativa causando

enormes danos soacutecio-econocircmicos e ambientais agraves populaccedilotildees tradicionais

O aumento das aacutereas desflorestadas da Amazocircnia e os resultados desse processo tais

como a erosatildeo do solo e a poluiccedilatildeo das aacuteguas tecircm evidenciado a necessidade de reflexatildeo

sobre as formas tradicionais de uso da terra paralelo agrave formulaccedilatildeo de perspectivas que

combinem tanto a preservaccedilatildeo dos recursos naturais quanto agrave elevaccedilatildeo e regularidade do

niacutevel de renda dos extrativistas

Para Trindade Junior (1997) coube principalmente ao Estado controlado pela elite

regional a tarefa de direcionar a atividade econocircmica de replanejar a cidade bem como de

criar mecanismos de controle da vida social de seus habitantes de forma a adequar a

organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves exigecircncias trazidas pelo novo momento econocircmico

Esse novo momento aleacutem de gerar um crescimento populacional significativo45

acarretou em uma seacuterie de medidas voltadas para a (re)estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano jaacute que a

cidade passou a ter maiores dimensotildees e relevacircncia enquanto locus de acumulaccedilatildeo e

conservaccedilatildeo da riqueza gerada pela produccedilatildeo gomiacutefera

Dessa maneira a riqueza acumulada associada agrave aquisiccedilatildeo de terras deixou sua

marca na construccedilatildeo de um conjunto arquitetocircnico

teatro palaacutecios palacetes dentre outras

edificaccedilotildees

que realccedilou as influecircncias de estilos e traccedilos proacuteprios da arquitetura francesa

Tambeacutem haacutebitos culturais passaram a tomar como referecircncia valores e comportamentos

45 Na condiccedilatildeo de um dos maiores centros dinacircmicos de exportaccedilatildeo do laacutetez Beleacutem que em 1850 exibia cerca de 20000 habitantes chega em 1900 com cerca de 100000 habitantes Em 1920 eram 236402 os que habitavam esse municiacutepio Em grande medida esse incremento populacional na ordem de 1082 deveu-se ao deslocamento em massa de nordestinos para a regiatildeo norte (RODRIGUES 2000)

177

tiacutepicos dos franceses mais abastados Por sua beleza arquitetocircnica e por seu modo de vida

Beleacutem ficou conhecida como Paris n Ameacuterica 46

Pode-se afirmar que a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano da cidade marcou

historicamente o processo segregatoacuterio que atualmente ainda evidencia-se em Beleacutem Logo

o desenvolvimento urbano foi uma condiccedilatildeo necessaacuteria e estabelecida no periacuteodo de

desenvolvimento industrial no seacuteculo XX na maioria das capitais brasileiras e em Beleacutem natildeo

foi diferente

Ao longo desses anos a cidade principalmente um nuacutecleo mais central onde

residiam as famiacutelias mais tradicionais e poderosas passou a contar com uma seacuterie de

melhoramentos tais como ampliaccedilatildeo da rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica de abastecimento de

aacutegua e esgotos de telefonia e de transportes coletivos

os bondes

A grande expectativa era de que a partir desse momento a cidade pela criaccedilatildeo de

uma melhor infraestrutura urbana atraiacutesse novos comerciantes e investidores interessados em

dinamizar as atividades produtivas tradicionais e gerar novas Contudo a mesma cidade que

ostentava o luxo e o ouro proveniente dos negoacutecios bem sucedidos envolvendo a borracha

por exemplo tambeacutem era marcada pela evidecircncia de um fenocircmeno ainda bastante atual

a

periferizaccedilatildeo das camadas pobres e sua consequumlente deterioraccedilatildeo das condiccedilotildees gerais de

vida

Nesse periacuteodo ocorreram vaacuterios conflitos tipicamente urbanos como protesto contra

o aumento dos impostos o aumento de preccedilos dos produtos consumidos pelas classes

populares melhorias salariais melhores condiccedilotildees de vida e de moradia e outros As elites

dominantes respondiam a essas manifestaccedilotildees via controle social por meio de poliacuteticas e leis

restritivas a trabalhadores imigrantes criando programas sociais integrativos etc

A estrateacutegia de segregaccedilatildeo e de valorizaccedilatildeo espaciais passou a ser tatildeo eficiente que

as pessoas que natildeo possuiacuteam recursos para reformar suas casas e adaptaacute-las aos modelos

concebidos eram direta ou indiretamente levadas a se mudar para aacutereas afastadas do centro

urbano que eram locais muitas vezes sem saneamento baacutesico como por exemplo as aacutereas de

vaacuterzeas poreacutem estas ainda apresentavam nessa eacutepoca ocupaccedilatildeo inexpressiva

Os setores urbanos habitados pelas camadas populares ou de menor poder aquisitivo

e portanto que mais precisavam de melhorias e saneamento ficaram desprovidas de novos

investimentos em infraestrutura urbana uma vez que a maior parte dos recursos financeiros

46 Tambeacutem podem ser destacadas as expressivas construccedilotildees de luxo e modernizaccedilatildeo da cidade tais como a do Palaacutecio Lauro Sodreacute do Coleacutegio Gentil Bittencourt Teatro da Paz (1878) Palaacutecio Antocircnio Lemos e o do Mercado do Ver-o-Peso (1901)

178

estaduais e municipais era destinada ao atendimento dos segmentos sociais ligados ao luxo e

aos gastos que o comeacutercio da borracha propiciava (FERREIRA 1995)

Beleacutem avanccedilou o seacuteculo XX como outras cidades brasileiras com problemas de

administraccedilatildeo e de infraestrutura de poliacuteticas puacuteblicas e de investimentos A formaccedilatildeo de

novos nuacutecleos urbanos e o inchamento dos jaacute existentes seguiu uma loacutegica que atraiu

repentinamente trabalhadores oriundos das mais diversas localidades expulsando-os para a

periferia das cidades tornando seu assentamento e suas condiccedilotildees gerais de vida cada dia

mais difiacuteceis

Com as ocupaccedilotildees irregulares a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o descaso de

sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programasprojetos de poliacuteticas

urbanas completou-se o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo ambiental

passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Na deacutecada de 1940 ocorreu a apropriaccedilatildeo de grandes extensotildees de terras situadas

nas imediaccedilotildees do limite da Primeira Leacutegua Patrimonial47 de Beleacutem por parte de instituiccedilotildees

puacuteblicas tais como Correios Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute (COSANPA)

Universidade Federal do Paraacute (UFPA) e Aeroporto e militares (Marinha Exeacutercito e

Aeronaacuteutica) que passaram a se constituir em um obstaacuteculo agrave expansatildeo da malha urbana

Essa extensa aacuterea apropriada pelas instituiccedilotildees ficou conhecida como cinturatildeo institucional

(FERREIRA 1995)

Com esse impedimento de crescimento seguindo o espigatildeo principal a Av Tito

Franco (hoje denominada de Av Almirante Barroso) (Fotografia 3) as camadas populares

passaram a ocupar as aacutereas de cotas baixas da cidade que satildeo conhecidas como aacutereas de

baixadas nas quais a implantaccedilatildeo de equipamentos coletivos eacute dificultada e quando existe eacute

extremamente precaacuteria

47 Aacuterea de terra de aproximadamente uma leacutegua (contada a partir do marco de fundaccedilatildeo da cidade) doada em 1627 pelo Governo e Capitatildeo Geral do Estado do Maranhatildeo e Gratildeo Paraacute ao Conselho Municipal de Beleacutem ficando a partir desse momento sob o Jus Domini do Governo desse Municiacutepio O limite da Primeira Leacutegua localiza-se no atual bairro do Marco assim chamado por ter sido nele onde foi fixado um marco desse limite (Av Almirante Barroso com a Av Dr Freitas) (CRUZ apud TRINDADE JUNIOR 1997)

179

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de Agronomia

Beleacutem-PA

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Conforme citado anteriormente as baixadas48 satildeo aacutereas alagadas ou alagaacuteveis que

segundo estudo publicado em 1976 correspondiam a 40 da aacuterea urbana do municiacutepio de

Beleacutem (SUDAM apud TRINDADE JUNIOR 1997) abrangendo mais de 45 da populaccedilatildeo

distribuiacuteda nos diversos bairros da cidade Essas aacutereas ficaram conhecidas principalmente a

partir da deacutecada de 1960 por serem espaccedilos de moradia das camadas sociais de baixo poder

aquisitivo (TRINDADE JUNIOR 1997)

De acordo com Pinheiro et al (2007) agrave medida que os igarapeacutes foram aterrados

surgiram outros bairros compondo a 1ordf Leacutegua Patrimonial A rigor as baixadas se

constituiacuteram tambeacutem em aacutereas onde ocorreram os maiores conflitos fundiaacuterios entre os anos

de 1960 e 1970 aleacutem das principais intervenccedilotildees puacuteblicas da poliacutetica habitacional marcada

pelas estrateacutegias de remoccedilatildeo e reassentamento Pode-se dizer que essas estrateacutegias tecircm sido o

principal objetivo das poliacuteticas habitacionais ateacute os dias atuais

Cabe destacar a existecircncia de trecircs grandes vetores de periferizaccedilatildeometropolizaccedilatildeo da

pobreza relacionados agrave questatildeo da moradia no periacuteodo de 1960 a 1990 que segundo Pinheiro

et al (2007 p 159) constata-se uma reproduccedilatildeo simultacircnea de subespaccedilos fiacutesicos e sociais

48 Trindade Junior (1997) tomando como referecircncia a concepccedilatildeo de espaccedilo de Santos considera as baixadas

enquanto espaccedilos segregados socialmente excluiacutedos com deficiecircncia e insuficiecircncia de equipamentos urbanos e comunitaacuterios

como espaccedilo sem cidadatildeos independentemente das condiccedilotildees do siacutetio urbano Nesse sentido para as pessoas que habitam esses espaccedilos eacute negado o direito agrave cidadania e os meios de consumo coletivo satildeo ausentes ou insuficientes

180

marcados pela segregaccedilatildeo e pobreza urbana entre os quais trecircs se destacam as baixadas

invasotildees de terras e conjuntos habitacionais 49

Esses trecircs grandes vetores relacionados agrave questatildeo da moradia das lutas e

mobilizaccedilotildees pelo direito de morar na RMB satildeo

1) As ocupaccedilotildees coletivas na aacuterea central da RMB basicamente nas chamadas aacutereas de baixadas restritas ao municiacutepio de Beleacutem nas deacutecadas de 1960 e 1970 e em menor volume nas deacutecadas de 1980 e 1990

2) As ocupaccedilotildees na chamada aacuterea de transiccedilatildeo apoacutes o centro expandido do municiacutepio de Beleacutem formaccedilatildeo de bairros com famiacutelias removidas das aacutereas urbanizadas no centro de Beleacutem

3) A aacuterea de expansatildeo urbana no sentido nordeste da RMB envolvendo primeiramente os municiacutepios de Ananindeua e ilhas e posteriormente os demais municiacutepios que compotildeem a RMB Em Ananindeua e distritos de Beleacutem (Icoaraci e Outeiro) destacam-se as invasotildees a conjuntos habitacionais (PINHEIRO et al 2007 p 159)

Com relaccedilatildeo aos movimentos populares surgiram nesse periacuteodo vaacuterios movimentos

que organizaram mobilizaccedilotildees manifestaccedilotildees mais radicais atos puacuteblicos manifestos de

todos os tipos reivindicando equipamentos coletivos urbanizaccedilatildeo de aacutereas segregadas e

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Segundo a Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (1984) as vitoacuterias alcanccediladas pelos

Comitecircs foram isenccedilatildeo das deacutecimas (imposto predial) instalaccedilatildeo de postos de abastecimento

de gecircneros alimentiacutecios de 1ordf necessidade instalaccedilatildeo de cooperativas nos bairros limpeza de

ruas abastecimento de aacutegua e fornecimento de energia eleacutetrica e isenccedilatildeo de taxas escolares

Entretanto em 1947 haacute um endurecimento do regime que governava o Paiacutes com uma

perseguiccedilatildeo a toda iniciativa de luta e resistecircncia das camadas populares com isso os

Comitecircs Democraacuteticos Populares (CDP) foram desativados

O modelo autoritaacuterio-centralizador de poliacuteticas puacuteblicas regionais que se

desenvolveram na Amazocircnia (Quadro 6) a partir da deacutecada de 1950 com o objetivo de

integrar a regiatildeo ao Centro-Sul resultou em significativas alteraccedilotildees nos padrotildees soacutecio-

espaciais de ocupaccedilatildeo urbana em Beleacutem

49 Historicamente podem-se indicar dois grandes eixos de ocupaccedilatildeo urbana a BR-316 em direccedilatildeo aos municiacutepios de Ananindeua Marituba Benevides e Santa Baacuterbara e a rodovia Augusto Montenegro em direccedilatildeo aos distritos de Icoaraci Outeiro Val-de-Cans Tenoneacute e Ilhas (PINHEIRO et al 2007)

181

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a 1988)

Ano Programas Projetos e Oacutergatildeos Executores Objetivos

1953

SPVEA

Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo

Econocircmica da AmazocircniaPresidecircncia da Repuacuteblica

Elaborar planejamentos quumlinquumlenais para valorizaccedilatildeo econocircmica da Amazocircnia

1958

Rodovia Beleacutem-Brasiacutelia (BR-010)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a Amazocircnia Oriental ao resto do paiacutes

1960

Rodovia Cuiabaacute-Porto Velho (BR-364)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a porccedilatildeo meridional da Amazocircnia

1966 SUDAM

Superintendecircncia do Desenvolvimento da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior

Coordenar e supervisionar programas e planos regionais decidir sobre a redistribuiccedilatildeo de incentivos fiscais

1967 SUFRAMA

Superintendecircncia da Zona Franca de ManausMinisteacuterio do Interior

Integrar a porccedilatildeo ocidental da Amazocircnia mediante criaccedilatildeo de um centro industrial e agropecuaacuterio e isenccedilatildeo de impostos

1968 Comitecirc Organizador dos Estados Energeacuteticos da AmazocircniaMinisteacuterio das Minas e Energia

Supervisionar estudos referentes ao aproveitamento do potencial energeacutetico

Incentivos FiscaisSUDAM Promover investimentos na regiatildeo por meio de deduccedilotildees tributaacuterias significativas

1970

PIN

Programa de Integraccedilatildeo Nacional Estender a rede rodoviaacuteria e implantar projetos de colonizaccedilatildeo oficial nas aacutereas de atuaccedilatildeo da SUDENE e SUDAM

Proterra

Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e Nordeste

Promover a capitalizaccedilatildeo rural

Incra

Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma AgraacuteriaMinisteacuterio do Interior

Executar a estrateacutegia de distribuiccedilatildeo controlada de terra

1974

Polamazocircnia

Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior Agricultura e Transporte

Concentrar recursos em aacutereas selecionadas visando o estiacutemulo de fluxos migratoacuterios elevaccedilatildeo do rebanho e melhoria da infraestrutura urbana

1980

Getat

Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins Gebam

Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas SGCSPR

Regularizaccedilatildeo fundiaacuteria discriminaccedilatildeo de terras e distribuiccedilatildeo de tiacutetulos

PGC

Programa Grande Carajaacutes SeplanPR

Explorar de forma integrada em grande escala recursos minerais e agroflorestais da regiatildeo

1981 PolonoroesteMinisteacuterio da Agricultura Transportes e Interior

Pavimentar a BR-364 promover a colonizaccedilatildeo

1985 PCN Projeto Calha Norte SGCSNPR

Oficialmente assegurar a soberania nacional fiscalizar a circulaccedilatildeo e assistir iacutendios

1987 Projeto 2010Ministeacuterio das Minas e Energia Eletronorte

Implantar rede hidreleacutetrica para estimular o desenvolvimento industrial da regiatildeo

1988 Programa Nossa NaturezaMinisteacuterio do Interior SA-DENPR

Oficialmente rever legislaccedilatildeo ambiental para a regiatildeo e zoneamento agroecoloacutegico na Amazocircnia

Fonte Becker (1994)

Com a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia facilitou-se a inserccedilatildeo de grande

contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras abundantes e de faacutecil acesso tendo

em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave implantaccedilatildeo dos grandes projetos

182

Desse modo a Amazocircnia consolidava seu papel como fronteira de expansatildeo da

acumulaccedilatildeo por meio da implantaccedilatildeo de projetos destinados agrave exploraccedilatildeo de recursos

minerais agrave extraccedilatildeo de recursos naturais (como os projetos de empresas madeireiras) agraves

produccedilotildees agropecuaacuterias e agro-industriais agraves linhas de montagem industrial etc (SOUZA

1992 p 21-22)

Para Becker (1994) a fronteira natildeo eacute um fenocircmeno isolado Ela eacute definida em

relaccedilatildeo a um espaccedilo estruturado e sua potencialidade alternativa eacute circunscrita a limites

impostos pela formaccedilatildeo social em que se situa A expansatildeo da fronteira amazocircnica soacute pode

portanto ser compreendida a partir da inserccedilatildeo do Brasil no sistema capitalista global do poacutes-

Segunda Guerra Mundial em que o capitalismo atua no espaccedilo planetaacuterio mas os Estados

Nacionais conservam sua funccedilatildeo de controle e hierarquizaccedilatildeo constituindo-se agentes

primordiais na produccedilatildeo do novo espaccedilo

Assim o crescimento da cidade de Beleacutem e das demais capitais amazocircnicas

expressa por um lado a criaccedilatildeo de novas atividades urbanas pelo Estado e pelas empresas

privadas e por outro a profunda decadecircncia e transformaccedilatildeo das atividades agropecuaacuterias e

extrativistas que passam a desencadear correntes migratoacuterias no sentido rural-urbano

definindo formas marcantes de apropriaccedilatildeo do espaccedilo da cidade e de constituiccedilatildeo de sua

paisagem como por exemplo a produccedilatildeo de favelas (CORREcircA 1989)

Segundo Trindade Junior (1997) a produccedilatildeo do espaccedilo belenense eacute influenciada por

programas de renovaccedilatildeo urbana e pelo papel das camadas populares Nesse sentido os

principais agentes do processo de produccedilatildeo do urbano passam a ser aleacutem das camadas

populares o Estado e o capital imobiliaacuterio que exerceram uma accedilatildeo mais expressiva na

organizaccedilatildeo espacial

De acordo com a CODEM (1987) o crescimento demograacutefico que ocorreu em

Beleacutem desde a deacutecada de 1950 deu origem a quatro tipos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo a

verticalizaccedilatildeo a ocupaccedilatildeo dos centros de quadras por meio da propagaccedilatildeo de vilas e

passagens50 aumentando a densidade populacional das terras firmes ou terraccedilos e substituindo

a vegetaccedilatildeo pelas construccedilotildees urbanas a ocupaccedilatildeo das aacutereas aleacutem do cinturatildeo institucional

por meio de conjuntos habitacionais de induacutestrias e de habitaccedilotildees perifeacutericas de baixo padratildeo

construtivo e a ocupaccedilatildeo das planiacutecies de inundaccedilatildeo da cidade

50 Vilas conjunto de pequenas habitaccedilotildees independentes em geral idecircnticas ou de mesmo padratildeo habitacional e disposta de modo a formar rua ou praccedila no interior de quadras Passagens denominaccedilatildeo aplicada agraves vias com largura compreendida entre 4 e 8 metros (CODEM 1987)

183

Com a ultrapassagem do cinturatildeo institucional a malha urbana se expandiu para a

Segunda Leacutegua Patrimonial51 seguindo o eixo das rodovias BR-316 e Augusto Montenegro

ocupando aacutereas vizinhas (Ananindeua Marituba e Benevides)

Entretanto mesmo com a ultrapassagem do cinturatildeo os investimentos urbanos e os

empregos ficaram restritos agraves aacutereas centrais principalmente nos bairros de Nazareacute e

Comeacutercio na Primeira Leacutegua Patrimonial Assim o capital imobiliaacuterio ganhou importacircncia e

avanccedilou os processos de verticalizaccedilatildeo nessas aacutereas Esse processo exigiu a ampliaccedilatildeo e a

renovaccedilatildeo de serviccedilos urbanos e de infraestrutura aumentando ainda mais a valorizaccedilatildeo

desses espaccedilos em detrimento do restante da cidade onde se ampliaram as necessidades de

infraestrutura urbana principalmente nas baixadas

As baixadas satildeo caracterizadas segundo Trindade Junior (1997 p 28) de acordo

com as condiccedilotildees socioeconocircmicas de seus habitantes e satildeo configuradas pela precariedade de

moradia e dos equipamentos coletivos

A populaccedilatildeo dessas aacutereas caracteriza-se pela falta de qualificaccedilatildeo profissional e baixo niacutevel socioeconocircmico enfrentando consequumlentemente seacuterios problemas de empregos e subempregos acrescendo-se a isso grande nuacutemero de elementos que compotildeem os grupos familiares residindo em reduzidos cocircmodos habitaacuteveis sem condiccedilotildees de higiene e conforto refletindo-se essa situaccedilatildeo na sauacutede da comunidade

Trindade Junior ressalta que outras caracteriacutesticas podem ser somada as condiccedilotildees

socioeconocircmicas tais como

1) Aacutereas de habitaccedilatildeo subnormal desordenadamente distribuiacutedas e que obstruem natildeo o raro o escoamento hiacutedrico em face do deficiente sistema de macro drenagem existente

2) Com um sistema viaacuterio deficiente o que impossibilita o desenvolvimento do traacutefego normal da cidade e prejudica os serviccedilos de transporte coletivo destinado ao atendimento dessas populaccedilotildees

3) A circulaccedilatildeo interna de pedestres nas aacutereas de baixadas se faz de forma precaacuteria em geral atraveacutes de estivas de madeira quase sempre em peacutessimo estado de conservaccedilatildeo

4) O transporte coletivo que atende as baixadas se limita a circular dada a falta de condiccedilotildees para traacutefego interno em sua periferia obrigando os moradores de tais aacutereas a realizar por vezes grandes deslocamentos diaacuterios a peacute ateacute os pontos de ocircnibus

5) A impossibilidade de implantaccedilatildeo de sistemas de aacutegua potaacutevel de esgotos sanitaacuterios e de coleta de lixo

51 Corresponde a outra leacutegua acrescentada agrave Primeira Leacutegua Patrimonial no final do seacuteculo XIX doadas pelo Governo do Estado mas que diferentemente da outra doaccedilatildeo natildeo chegou a ser delimitada (TRINDADE JUNIOR 1998 p 104)

184

6) A impossibilidade de distribuiccedilatildeo de energia eleacutetrica atraveacutes de redes de alta tensatildeo e por fim

7) A carecircncia de equipamentos urbanos de educaccedilatildeo e sauacutede obriga o deslocamento da populaccedilatildeo que deles necessita para aacutereas de cotas mais altas (ABELEacuteM apud TRINDADE JUNIOR 1997 p 28)

O referido autor argumenta tambeacutem que as baixadas satildeo consideradas espaccedilos sem

cidadatildeos pois o valor do homem estaacute relacionado ao local onde habita ao qual eacute negado o

direito agrave cidadania Seu valor como produtor consumidor cidadatildeo depende da sua

localizaccedilatildeo no territoacuterio Seu valor vai mudando [] para melhor ou para pior em funccedilatildeo das

diferenccedilas de acessibilidade (TRINDADE JUNIOR 1997 p 29)

As baixadas foram ocupadas por famiacutelias de baixo poder aquisitivo oriundas do

interior do Estado e de outros Estados em especial do Nordeste que seja pela expulsatildeo

acarretada pelas secas ou pelo processo de expansatildeo capitalista na Amazocircnia e seus discursos

ideoloacutegicos de oportunidade de emprego e melhores condiccedilotildees de vida deslocaram-se para a

cidade em busca de satisfazer agraves suas necessidades emprego e de moradia ocupando as aacutereas

alagadas bastante segregadas com grande densidade demograacutefica e com base na

autoconstruccedilatildeo de moradias (tipo palafitas) em terrenos puacuteblicos eou improacuteprias para

ocupaccedilatildeo edificada

Sendo assim essas famiacutelias migrantes ou natildeo para sobreviver na cidade buscaram

soluccedilotildees de moradia principalmente sobre o alagado ou em trechos distantes passando o

cinturatildeo institucional ampliando a periferia da cidade Assim construiacuteram casas de madeira

sobre estacas (Fotografia 4) cujo acesso era possiacutevel por meio de estivas (pontes de madeira)

ou aterravam as aacutereas com material fornecido pela Prefeitura ou conseguindo por ela proacutepria

tais como caroccedilo de accedilaiacute bagaccedilo de cana serragem de madeira e casca de castanha-do-paraacute

185

Fotografia 4 - Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA)

Fonte SEHAB (2010)

Tambeacutem procuravam resolver sua necessidade por serviccedilos de forma alternativa por

meio de ligaccedilotildees clandestinas de energia e aacutegua e na grande maioria das vezes de utilizaccedilatildeo

dos igarapeacutes como esgoto e depoacutesito de lixo Estes fatores criaram uma situaccedilatildeo em que as

condiccedilotildees de habitabilidade estavam muito baixas dos paracircmetros miacutenimos satisfatoacuterios

gerando um quadro de pobreza doenccedilas e baixa perspectiva de vida agravados pela ausecircncia

de efetivas accedilotildees governamentais voltadas ao enfrentamento da segregaccedilatildeo social

O migrante ao chegar a cidade vecirc dissipada sua ilusatildeo de liberdade de opccedilatildeo pelo emprego que mais lhe convecircm ou agrada Na verdade natildeo eacute apenas o direito e opccedilatildeo que natildeo tem muitas vezes natildeo encontra nenhuma chance de obter um emprego no mercado formal de trabalho Recorre entatildeo ao mercado informal de qualquer forma a cidade lhe oferece maiores vantagens do que o campo em termo de oportunidade de educaccedilatildeo assistecircncia meacutedica e tambeacutem de trabalho desempenhando diversas atividades nas quais geralmente tem a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia (ABELEacuteM 1989 p 21)

Destarte a partir do crescimento acelerado da cidade em direccedilatildeo agraves alagadas

agravam-se os problemas sociais a escassez de terras na aacuterea central o seu alto custo e a

consequumlente especulaccedilatildeo imobiliaacuteria a proliferaccedilatildeo de doenccedilas e as pressotildees exercidas pela

populaccedilatildeo principalmente na eacutepoca de chuvas foram fatores que conduziram o poder puacuteblico

a intervir de forma sistemaacutetica inicialmente por meio da instalaccedilatildeo do Departamento

Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) com o objetivo de intervir nas baixadas por meio

de um programa de construccedilotildees de canais iniciado em 1962 na bacia da Tamandareacute

estendendo-se ateacute 1967 Nessa mesma deacutecada tiveram iniacutecio as obras de saneamento do

186

Canal das Almas (atual Av Visconde de Souza Franco) como parte do programa de combate

agraves doenccedilas endecircmicas (TRINDADE JUNIOR 1997)

Na deacutecada de 1970 percebeu-se o crescimento e a expansatildeo urbana do municiacutepio por

meio de unidades imobiliaacuterias cadastradas em sua aacuterea urbana segundo levantamento do

Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio (CTM)52 naquele ano estavam cadastrados 120000

unidades habitacionais e em 2000 existiam 362064 cadastros (CODEMCTM) o que reflete

na taxa de urbanizaccedilatildeo a qual atinge cerca de 9953 segundo dados de Censo2000

Historicamente o fluxo migratoacuterio da referida deacutecada trouxe consequumlecircncias

negativas no que concerne a questatildeo da moradia no municiacutepio de Beleacutem uma vez que as

aacutereas alagadas conhecidas como baixadas foram ocupadas proporcionando uma condiccedilatildeo de

moradia subumana

O principal motivo de ocupaccedilatildeo desses espaccedilos foi a necessidade de moradia e o

faacutecil acesso a cidade aleacutem da ausecircncia de taxas e tributos jaacute que nessas aacutereas os serviccedilos e

equipamentos urbanos satildeo quase que inexistentes acarretando no agravamento da segregaccedilatildeo

e fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Entretanto faz-se necessaacuterio enfatizar que a urbanizaccedilatildeo amazocircnica natildeo eacute fruto

somente da migraccedilatildeo para a regiatildeo eou aumento do nuacutemero de cidades mas estaacute vinculada a

outros dois fatores 1) refere-se ao modo de integraccedilatildeo econocircmica do espaccedilo e 2) trata-se da

ordem ideoloacutegica e cultural responsaacutevel pela introduccedilatildeo na regiatildeo de normas e costumes

Constata-se assim que houve uma ampla intervenccedilatildeo econocircmica na regiatildeo gerando

transformaccedilotildees nos contextos sociais poliacuteticos econocircmicos e culturais produzindo uma nova

(re)configuraccedilatildeo do espaccedilo amazocircnico Esse processo de ocupaccedilatildeo causou a modificaccedilatildeo do

padratildeo de circulaccedilatildeo existente vinculada agrave rede dendriacutetica (BECKER 1994)

A abertura da malha rodoviaacuteria e fluvial implicou na multiplicaccedilatildeo de povoados e

vilarejos na regiatildeo amazocircnica Nesse sentido Beleacutem e Manaus assumiram a posiccedilatildeo de

metroacutepoles regionais A poliacutetica de incentivos fiscais atraiu empresas transnacionais para a

regiatildeo intensificando o fluxo migratoacuterio que formaram nuacutecleos de povoamento proacuteximo aos

grandes investimentos e as margens das estradas Todavia as induacutestrias que se instalaram na

regiatildeo natildeo absorveram o grande contingente populacional acarretando no aumento do

desemprego e consequumlentemente da pobreza na regiatildeo

52 TCM eacute um sistema de dados municipais de natureza alfanumeacuterica e graacutefica (mapas e imagens) organizados de maneira a possibilitar a visualizaccedilatildeo de informaccedilotildees por meio de mapas temaacuteticos tabelas e relatoacuterios que reuacutene dados baacutesicos essenciais ao planejamento e acompanhamento da gestatildeo municipal

187

Nesse sentido iniciou-se em Beleacutem uma seacuterie de pressotildees para desapropriaccedilatildeo seja

para fins de programas de governo de renovaccedilatildeo urbana seja para atender a pressotildees da

populaccedilatildeo que reclamava pelo direito de morar seja para atender a interesses de proprietaacuterios

(ABELEacuteM 1988)

Segundo Abeleacutem (1988) inicialmente a luta pela posse de terra urbana em Beleacutem se

deu de forma isolada e a populaccedilatildeo envolvida reagia em cada caso sem plena consciecircncia de

que seus problemas eram comuns agrave moradores de outros bairros como era o caso da aacuterea dos

Correios no bairro da Marambaia cuja luta pela desapropriaccedilatildeo iniciou-se em 1970 e o de

expulsatildeo dos moradores das terras da Aeronaacuteutica no bairro da Sacramenta em 1972 A

partir daiacute os conflitos se alastraram por vaacuterios bairros de Beleacutem

Os anos 1970 foram marcados em escala nacional por uma forte crise poliacutetica que se abateu sobre o regime militar em vigecircncia o que proporcionou a abertura de mais espaccedilos para a sociedade civil se organizar trazendo para o cenaacuterio poliacutetico atores que passam a redefinir-se a reconhecer-se mutuamente a decidir e a agir em conjunto apresentando-se como novo sujeito social no interior dos movimentos sociais (CRUZ 1994 p 65)

Foi nesse cenaacuterio de conflitos sociais oriundos da segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de luta

pela moradia que surgiram as organizaccedilotildees comunitaacuterias e movimentos em defesa da reforma

urbana nos quais foram gerados processos de reivindicaccedilotildees coletivas em torno do direito de

morar

Essas reivindicaccedilotildees em Beleacutem ganharam expressividade a partir da deacutecada de

197053 devido agraves vaacuterias formas de organizaccedilatildeo popular que passaram a surgir reivindicando

demandas especiacuteficas como saneamento baacutesico creches escolas transportes postos de

sauacutede habitaccedilatildeo dentre outras

Dessa forma a luta pela posse de terra e pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura

sauacutede e educaccedilatildeo implementou formas de constituiccedilatildeo e empoderamento pela base na praacutexis

cotidiana dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos agentes sociais coletivos e de identidades

Conforme Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

53 A participaccedilatildeo popular sempre esteve presente desde a colocircnia portuguesa ateacute hoje na Amazocircnia com as manifestaccedilotildees e demandas de accedilotildees ou poliacuteticas governamentais por parte dos grupos sociais excluiacutedos por exemplo em Beleacutem Nessa perspectiva todas as mobilizaccedilotildees e movimentos sociais satildeo formas de participaccedilatildeo popular que se diferenciam segundo as questotildees reivindicatoacuterias definidas pela conjuntura poliacutetica social e econocircmica que se encontram os atores sociais envolvidos

188

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

No entanto as condiccedilotildees objetivas de periferizaccedilatildeo das cidades e da pauperizaccedilatildeo de

suas classes populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees populares formadas com

propoacutesitos religiosos tornassem-se o uacutenico canal de expressatildeo das reivindicaccedilotildees por

melhores condiccedilotildees de vida frente agrave poliacutetica de exclusatildeo adotada na eacutepoca que alijava um

nuacutemero significativo da sociedade devido agrave negligecircncia do Estado em desenvolver sua

funccedilatildeo ou seja gestar poliacuteticas sociais de consumo coletivo

A igreja catoacutelica passou a incentivar a organizaccedilatildeo de moradores em Beleacutem

conscientizando-os de seus direitos e fomentando a atuaccedilatildeo poliacutetica das bases contribuindo

dessa forma para o fortalecimento das organizaccedilotildees populares54

Aleacutem da igreja catoacutelica outros atores colaboraram para a fomentaccedilatildeo das

organizaccedilotildees populares em Beleacutem tais como a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social

e Educacional (FASE)55 que desenvolveu trabalho de cunho educativo nos bairros

favorecendo assim a reorganizaccedilatildeo de grupos e setores marginalizados e a Sociedade

Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH)56 que passou a dar apoio e a incentivar

os movimentos populares contribuindo dessa forma para a ampliaccedilatildeo das perspectivas de

luta

Dentro desse contexto a sociedade comeccedilou a se organizar por meio dos Centros

Comunitaacuterios (CCs) e Associaccedilotildees de Moradores (AMs) de vaacuterios bairros de Beleacutem que

passaram a dotar uma poliacutetica de mobilizaccedilatildeo com o objetivo de lutar contra a situaccedilatildeo de

exclusatildeo a qual estavam submetidos

As principais lutas desenvolvidas pelas organizaccedilotildees populares no periacuteodo de 1970 a

1979 foram marcadas pela articulaccedilatildeo dessas por meio de Encontros de Comunidades que

oportunizaram as lideranccedilas trocarem experiecircncias de trabalho e decidirem os rumos de suas

54 Com o surgimento de vaacuterias Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) ala progressista da igreja catoacutelica houve uma emergecircncia e proliferaccedilatildeo de organizaccedilotildees comunitaacuterias pois aleacutem de contribuir no processo de formaccedilatildeo poliacutetica das lideranccedilas passaram a ser consideradas como canteiros de onde os movimentos sociais colhiam as lideranccedilas bem como espaccedilo para denuacutencia e questionamentos das praacuteticas poliacuteticas autoritaacuterias implementadas pelo regime militar 55 A FASE foi fundada no ano de 1964 e teve num primeiro momento o papel fundamental de prestar assessoria teacutecnica aos grandes projetos de desenvolvimento na Amazocircnia posteriormente passou a promover assessoria poliacutetico-pedagoacutegica a vaacuterias organizaccedilotildees populares atraveacutes da capacitaccedilatildeo de lideranccedilas em vaacuterios bairros de Beleacutem (CRUZ 1994) 56 A SPDDH surgiu no ano de 1977 e era composta por setores heterogecircneos da sociedade como exigecircncia da luta contra a falta de informaccedilatildeo da sociedade sobre os seus direitos poliacuteticos e sociais como tambeacutem das arbitrariedades e abusos sobre os direitos humanos no governo ditatorial da eacutepoca

189

lutas pela posse de terra por aterro por construccedilatildeo de escolas por aacutegua postos de sauacutede

entre outros

A realizaccedilatildeo desses encontros permitiu uma maior conscientizaccedilatildeo dos movimentos

populares que promoveram a ruptura com a imediaticidade passando a executar uma poliacutetica

de reivindicaccedilatildeo em acircmbito maior frente agrave poliacutetica adotada pelo Estado

Em 1973 a intervenccedilatildeo puacuteblica nas baixadas eacute retomada por meio de uma proposta

global que visava intervir no conjunto formado pelas bacias hidrograacuteficas Assim foi

necessaacuteria a assinatura de um convecircnio entre o DNOS a Superintendecircncia de

Desenvolvimento da Amazocircnia (SUDAM) e o Governo do Estado que deu origem agrave

Monografia das Baixadas de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

No ano de 1976 a Prefeitura Municipal de Beleacutem (PMB) o DNOS a SUDAM e o

Governo do Estado firmaram outro convecircnio instituindo-se desse modo o Programa de

Recuperaccedilatildeo das Baixadas (PRB) que tomou duas direccedilotildees complementares uma

compreendeu o Plano Global que envolve estudos levantamentos e projetos visando atingir

todas as aacutereas de baixadas e a outra o Plano de Accedilatildeo Imediata (PAI) visando viabilizar as

obras do DNOS no Igarapeacute Satildeo Joaquim na aacuterea do Una Este uacuteltimo seria uma experiecircncia

piloto de orientaccedilatildeo para outras obras de drenagem urbana (TRINDADE JUNIOR 1997)

O Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixada transferiu os moradores da aacuterea do Barreiro

para o Conjunto Promorar e Providecircncia Entretanto esta populaccedilatildeo teve suas moradas

financiadas pelo Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo e como natildeo puderam arcar com os custos

desse sistema acabaram retornando agrave aacuterea de baixadas

Abeleacutem (1989) ressalta que o Programa foi executado sem que as famiacutelias pudessem

decidir o seu destino natildeo sendo ouvidas nos aspectos relativos agrave remoccedilatildeo ao novo local de

moradia o que demonstra o niacutevel de imposiccedilatildeo do planejamento urbano sobre a camada pobre

da sociedade residente naquela aacuterea de baixada fator este que posteriormente levou ao

fracasso do programa Segundo Trindade Junior (1997) a partir desse momento foram

realizadas vaacuterias intervenccedilotildees do poder puacuteblico em aacutereas alagadas sendo no entanto de

caraacuteter esparso e natildeo globalizantes

Nesse sentido percebe-se que apesar dos avanccedilos dos movimentos populares uma

total ausecircncia da participaccedilatildeo popular nas tomadas de decisotildees em relaccedilatildeo a tais projetos

evidenciando assim outros interesses em jogo principalmente o econocircmico jaacute que os

benefiacutecios sociais tidos como justificativa primeira do programa tinham na verdade papel

secundaacuterio

190

Ambas experiecircncias em que pese os benefiacutecios em infraestrutura para as aacutereas

atingidas a intervenccedilatildeo esteve pautada pela accedilatildeo racionalizadora do planejamento ficando a

populaccedilatildeo na condiccedilatildeo de objeto e natildeo de sujeitos das accedilotildees desenvolvidas [] A poliacutetica

urbana implementada tendeu a reforccedilar a supremacia do espaccedilo abstrato sobre o espaccedilo social

contribuindo para a reproduccedilatildeo das desigualdades sociais

(SOUZA 1992 p 75)

Em 1977 os conflitos pela posse de terra se acirraram entre moradores Estado

latifundiaacuterios urbanos e imobiliaacuterios devido ao aumento do nuacutemero das ocupaccedilotildees de terras

principalmente nos bairros da Cremaccedilatildeo Jurunas Terra Firme Pedreira Sacramenta Benguiacute

Marco e Una sendo que estes conflitos provocaram a expulsatildeo derrubada de casas repressatildeo

policial e prisotildees57 Essa experiecircncia levou os movimentos populares a se organizarem ainda

mais e lutarem em defesa de um pedaccedilo de terra para morar

Constituindo-se em sujeitos coletivos os movimentos populares unificaram-se na

luta pela posse da terra lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que envolveu vaacuterios

bairros da cidade como Jurunas e Sacramenta Essa praacutetica culminou com o fortalecimento

das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros Pobres de Beleacutem que mais tarde

passou a ser chamada de Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB) em 28 de janeiro de 1979 E

era uma entidade federativa que formaliza a articulaccedilatildeo dos centros comunitaacuterios e

associaccedilotildees de moradores voltada para os problemas da terra e contra a violecircncia policial

Como se vecirc o movimento popular de Beleacutem desde seu surgimento apoacutes o golpe militar realizaram accedilotildees articulando formas de organizaccedilatildeo mais permanente com outros em termos de campanhas e movimentos mais gerais buscando fortalecer a concretizaccedilatildeo de suas demandas (CRUZ 1994 p 85)

De acordo com Cruz (1994) a CBB58 possuiacutea maior inserccedilatildeo nos bairros onde as

contradiccedilotildees sociais e os conflitos eram mais expliacutecitos Sua principal bandeira de luta era

pelo direito de morar Desse modo passou a coordenar grandes mobilizaccedilotildees e atos puacuteblicos

para encaminhar as lutas por melhores condiccedilotildees de vida

Esse fato ocasionou em um aumento significativo na estruturaccedilatildeo do movimento

popular em Beleacutem Os sujeitos sociais que emergiram nesse momento histoacuterico ganharam

mais legitimidade e representatividade poliacutetica nas lutas pelo direito agrave cidade e agrave cidadania

57 Outro movimento importante nessa eacutepoca foi a revolta ou guerra da poeira que emergiu em vaacuterias ruas de Beleacutem para evitar o tracircnsito de carros e coletivos que levantavam poeira provocando problemas de sauacutede aos moradores (CBB 1984) 58 A estrutura interna da CBB foi concebida inicialmente atraveacutes de trecircs representantes por bairro participantes da luta que integraram sua composiccedilatildeo por dois anos ateacute que se realizasse um Congresso para eleger sua diretoria A CBB congregava cerca de 50 entidades comunitaacuterias naquela eacutepoca (CRUZ 1994)

191

Os movimentos populares ultrapassaram o imediatismo de suas reivindicaccedilotildees transformando

suas carecircncias em direitos de cidadania e ganhando significado de uma luta pela reabertura do

social como uma nova alternativa poliacutetica desencadeando formas de atuaccedilatildeo poliacutetica e

ampliando o espaccedilo da cidadania no acircmbito social e poliacutetico Esse processo eacute intermediado

pelo Estado e por diversos agentes de produccedilatildeo do espaccedilo urbano mediante contradiccedilotildees e

ambiguumlidades

Num outro enfoque Cruz (1994) remonta que a luta pelo direito de morar em Beleacutem

interferiu no processo de organizaccedilatildeo espacial da cidade a partir de uma loacutegica proacutepria dos

moradores com os processos desencadeados por meio das diferentes lutas originadas nos

locais de moradia especificamente nas ocupaccedilotildees59

Nessa luta a relaccedilatildeo com o Estado foi alterada passando os teacutecnicos estaduais a

realizarem reuniotildees no proacuteprio bairro e a contar com a participaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo da

sociedade nas demarcaccedilotildees dos lotes nas decisotildees a serem tomadas nos pagamentos a serem

efetivados (ABELEacuteM 1989)

Apesar das vitoacuterias diversos conflitos continuavam latentes permanecendo vaacuterias

questotildees pendentes em quase todos os bairros Os movimentos populares permaneciam se

organizando lutando em busca de soluccedilatildeo para os seus problemas que no primeiro momento

eram mais restritos a questotildees da posse da terra depois passaram a ser mais amplo tais como

aacutegua energia escola60 posto de sauacutede vias de acesso feiras supermercados e saneamento

baacutesico Sendo assim esses movimentos populares de Beleacutem partiram para um trabalho mais

abrangente conscientizando a sociedade da necessidade de participaccedilatildeo e exigindo do

governo natildeo soacute soluccedilotildees imediatas mas tambeacutem a participaccedilatildeo na gestatildeo da cidade mesmo

que dentro de certos limites

Todavia o Estado passou a utilizar-se das organizaccedilotildees de bairros para viabilizar

suas poliacuteticas por meio da cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de entidades fantasmas com o objetivo

de enfraquecer a luta social passando a tratar as organizaccedilotildees populares como um

instrumento a seu serviccedilo incentivando controlando dividindo e apaziguando-as na medida

em que centralizavam o encaminhamento das demandas e atendiam agraves solicitaccedilotildees sem no

entanto nada mudar estruturalmente

59 Apoacutes vaacuterios anos lutando pelo Direito de Morar os movimentos populares unificados com a CBB conseguiram relevantes vitoacuterias como por exemplo a desapropriaccedilatildeo de trecircs aacutereas na Sacramenta (Ferro Costa que foi negociada com a Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) por meio do pagamento simboacutelico de cinco mil cruzeiros na eacutepoca aacuterea pertencente agrave Aeronaacuteutica que foi negociada com o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) e aacuterea pertencente ao governo municipal) que retratou a importacircncia da organizaccedilatildeo para o ecircxito das lutas servindo assim de incentivo para os demais bairros 60 Essa luta desdobrou-se na campanha Escola para Todos

192

Sendo assim evidencia-se que a presenccedila do Estado por meio de poliacuteticas puacuteblicas

de cunho assistencialista orientada e proposta pelo Governo Federal levou ao fortalecimento

das praacuteticas de cooptaccedilatildeo e clientelismo Nesse momento as accedilotildees pelo governo serviram

mais como estrateacutegias poliacuteticas do que proporcionaram melhoria da qualidade de vida da

populaccedilatildeo

Em 20 de outubro de 1985 surgiu a Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros

Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores (FMCCAM) atualmente identificada pela sigla

FEMECAM como forma de articular as entidades comunitaacuterias dissidentes da CBB e outras

novas criadas com o incentivo do governo

Essa federaccedilatildeo era apoiada pelo Estado fruto da cooptaccedilatildeo e do clientelismo e usava

o discurso da participaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo do governo afirmando que havia necessidade de

um gerenciamento mais eficiente do movimento popular nas reivindicaccedilotildees junto ao governo

pois a CBB aleacutem de natildeo estar correspondendo tinha uma preocupaccedilatildeo mais poliacutetica-

partidaacuteria (MORAES 1997)

Desde o I Congresso a Federaccedilatildeo sempre teve muito apoio dos oacutergatildeos estatais e municipais de entidades particulares e de algumas empresas Por exemplo no I Congresso noacutes tivemos um apoio muito grande do governo do Estado e da Prefeitura Municipal na gestatildeo Coutinho Jorge que nos deram muito apoio Do Governo do Estado recebemos um carro com motorista a nossa disposiccedilatildeo para realizarmos o nosso trabalho a Prefeitura arcou com os cartazes a parte da alimentaccedilatildeo a outra foi o governo do Estado atraveacutes do pagamento do local para a realizaccedilatildeo do congresso aleacutem do apoio das empresas de ocircnibus que deslocaram a cada bairro de Beleacutem um veiacuteculo para conduzir as congressistas (CRUZ 1994 p 111)

Esse tipo de posicionamento reflete o interesse que o Estado materializado pelas

administraccedilotildees puacuteblicas tem de se legitimar bem como a falta de maturidade da entidade em

questionar as accedilotildees e estrateacutegias do Estado

Segundo Pinheiro et al (2007) a partir da deacutecada de 1980 com os projetos de macro

e microdrenagem das bacias hidrograacuteficas o Estado avanccedilou na intervenccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de saneamento e reestruturaccedilatildeo urbana das baixadas acarretando a remoccedilatildeo de seus

moradores para aacutereas mais distantes do nuacutecleo urbano e a oferta de novos espaccedilos

infraestruturados ao mercado imobiliaacuterio

Aleacutem disso com a falta de investimento em poliacuteticas de habitaccedilatildeo popular ampliam-

se o deacuteficit habitacional e os conflitos fundiaacuterios pela terra de morar As famiacutelias expulsas das

baixadas e os imigrantes de outros municiacutepios encontram na praacutetica das ocupaccedilotildees coletivas

193

terras ociosas a alternativa para suprir a carecircncia de moradia indicando um segundo vetor de

periferizaccedilatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo (PINHEIRO et al 2007)

No acircmbito municipal em 1986 foi criada a Secretaria Municipal de Saneamento

(SESAN) com o objetivo de sanear e drenar as aacutereas de baixadas passando a desenvolver

accedilotildees que visavam natildeo mais projetos de remoccedilatildeo e abertura de canais e sim uma tentativa de

melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas alagadas por meio dos serviccedilos de drenagem

macrodrenagem terraplanagem revestimentos asfaacutelticos calccediladas e outros Nesse contexto

desenvolveu-se o Projeto Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) que

foi executado nos bairros do Marco e Pedreira (TRINDADE JUNIOR 1997)

A partir de 1987 foi desenvolvido pela PMB o Programa de Recuperaccedilatildeo das

Baixadas (PRB) sendo eleita como prioritaacuteria a Bacia do Una Esse programa possuiacutea um

prazo inicial de quatro anos e incluiacutea obras viaacuterias e de saneamento em uma aacuterea de 3644

hectares envolvendo nove bairros de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

Eacute nesse cenaacuterio que a CBB passou a se preocupar em redimensionar sua intervenccedilatildeo

poliacutetica pois comeccedilou a admitir a importacircncia em ocupar os espaccedilos institucionais como por

exemplo o Comitecirc de Assessoria ao Programa de Macrodrenagem da Bacia do Una

procurando interferir no desenvolvimento do programa apresentando propostas com base nos

debates desenvolvidos junto agraves suas entidades (CRUZ 1994)

Por sua vez a FEMECAM tambeacutem procurou rever sua postura e estrateacutegia junto ao

governo jaacute que percebeu que com a mudanccedila nas administraccedilotildees municipal e estadual nem

sempre teve reconhecida sua importacircncia como interlocutora

Nesse sentido as duas entidades buscaram uma intervenccedilatildeo mais forte na defesa das

causas populares e principalmente frente as novas demandas que exigem maior qualificaccedilatildeo

do movimento popular com o objetivo de proporem alternativas em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo estatal e

para a continuaccedilatildeo da luta por uma cidade democraacutetica

Na deacutecada de 1990 os movimentos ligados agrave luta pela moradia em Beleacutem tiveram

conquistas importantes conseguindo se engajar na luta pela reforma urbana participando na

elaboraccedilatildeo do Plano Diretor da Cidade aleacutem de estarem agrave frente na defesa e nas negociaccedilotildees

de leis de Poliacuteticas Habitacionais e de Desenvolvimento Urbano demonstrando a importacircncia

dessas poliacuteticas para a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo e principalmente

buscando garantir a participaccedilatildeo popular na gestatildeo de controle das poliacuteticas puacuteblicas

O Plano Diretor de Beleacutem elaborado em 1991 e tornado lei em 1993 (Lei nordm 7603

de 13011993) definiu e traccedilou diretrizes agrave poliacutetica urbana e ao sistema de planejamento e

gestatildeo da cidade Aleacutem disso teve como pressuposto baacutesico a implementaccedilatildeo de instrumentos

194

que pudessem combater a pobreza urbana buscando alternativas de desenvolvimento que

superassem suas contradiccedilotildees colocando a sociedade civil como agente principal desse

processo

O Plano Diretor garantiu conquistas importantes tais como solo criado imposto

predial e territorial progressivo no tempo e no espaccedilo usucapiatildeo especial do imoacutevel urbano

zonas especiais de interesse social (ZEIS) fundo de desenvolvimento urbano transporte

coletivo saneamento e a participaccedilatildeo popular viabilizada por meio da regulamentaccedilatildeo do

Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (CONDUMA) dos Conselhos

Setoriais e dos Conselhos Regionais

De acordo com Moraes (1997) no final de dezembro de 1991 iniciaram-se debates

em torno do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (PMBU) suscitados por vaacuterias

entidades do movimento popular sindical e categorias profissionais

A partir desse momento os movimentos populares tomam como pontos de

discussotildees o Plano Diretor Urbano (PDU) e o Projeto de Macrodrenagem aleacutem de dar iniacutecio a

mobilizaccedilotildees que visavam agrave obtenccedilatildeo de maiores informaccedilotildees acerca de outros projetos de

urbanizaccedilatildeo das baixadas de Beleacutem anunciadas pelo poder puacuteblico estadual e municipal61

O movimento popular sentiu-se desafiado a buscar uma estrateacutegia de intervenccedilatildeo que fosse aleacutem das iniciativas ateacute aquele momento efetivadas Constatou-se a necessidade de articular os diversos atores sociais que atuam no enfrentamento da questatildeo urbana como associaccedilotildees de moradores entidades de assessoria sindicatos federaccedilotildees de bairros com o objetivo de redimensionar suas accedilotildees unificando-as e potencializando-as em favor das classes populares [] Duas grandes questotildees passaram a orientar as accedilotildees desenvolvidas pelo movimento popular de Beleacutem a) fazer com que o projeto do Plano Diretor em tramitaccedilatildeo na Cacircmara Municipal voltasse a ser discutido com a populaccedilatildeo antes de sua aprovaccedilatildeo b) intervir no Projeto de Macrodrenagem do Una dada sua efetivaccedilatildeo em curso sem maiores esclarecimentos e sem participaccedilatildeo dos moradores das aacutereas atingidas (SOUZA 1992 p 64)

Diante desse contexto foi instalado no dia 08 de fevereiro de 1992 o Foacuterum

Metropolitano de Reforma Urbana (FMRU) possuindo sua origem vinculada agrave necessidade

de uma intervenccedilatildeo mais qualitativa dos setores populares no processo de elaboraccedilatildeo e

aprovaccedilatildeo do PDU de Beleacutem assim como discutir o Projeto de Macrodrenagem da Bacia do

Una e o seu processo de remanejamento de famiacutelias

61 O governo estadual estava anunciando o Projeto Comunidade com Dignidade com o objetivo de urbanizar as aacutereas de ocupaccedilatildeo de Beleacutem e Ananindeua O governo municipal estava iniciando em 1991 a execuccedilatildeo do Projeto de Microdrenagem da Bacia do Tucunduba atingindo um grande nuacutemero de famiacutelias (FMRU 1992)

195

O Foacuterum configurou-se como uma rede de articulaccedilotildees de diversas entidades urbanas

e visava ser um espaccedilo de debates poliacutetico de proposiccedilatildeo alternativa agraves poliacuteticas puacuteblicas e de

lutas pela Reforma Urbana62 onde as diversas organizaccedilotildees da sociedade civil se uniram pela

conquista de seus direitos baacutesicos como moradia saneamento transporte energia educaccedilatildeo

sauacutede e que nesse momento apontavam para uma reestruturaccedilatildeo geral do espaccedilo urbano

fundamentada numa participaccedilatildeo popular efetiva

Para Ferreira (2004) a necessidade da sua articulaccedilatildeo se fez por dois motivos

primeiro pela possibilidade de se tentar a aprovaccedilatildeo do Plano Diretor Urbano de Beleacutem antes

da revisatildeo acordada anteriormente com a Cacircmara de Vereadores de apreciaccedilatildeo por parte dos

movimentos sociais o atendimento de suas demandas segundo pela necessaacuteria socializaccedilatildeo

com a sociedade civil dos projetos previstos para serem implementados no campo do

saneamento baacutesico nas aacutereas da Bacia do Una tanto pelo governo estadual quanto municipal

O manifesto de criaccedilatildeo do FMRU foi assinado por 21 entidades (associaccedilotildees de

moradores centros comunitaacuterios CBB FEMECAM sindicatos CUT FASE entre outros)

tendo por objetivos os seguintes pontos

1) Lutar pela aprovaccedilatildeo do anteprojeto de Lei do Plano Diretor de Beleacutem 2) Lutar pelo acesso agraves informaccedilotildees contidas nos projetos de macro e micro drenagem do poder puacuteblico 3) Propor alternativas ao processo de ocupaccedilatildeo urbana que atenda aos interesses da populaccedilatildeo e soluccedilotildees alternativas que priorizem a equidade nas futuras accedilotildees de ocupaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano amazocircnico e regional 4) Democratizar o territoacuterio atraveacutes de maior acesso a terra 5) Distribuir equumlitativamente a habitaccedilatildeo os bens naturais materiais e os serviccedilos urbanos 6) Lutar pela gestatildeo democraacutetica do espaccedilo urbano 7) Respeitar e estimular as praacuteticas culturais e histoacutericas das identidades construiacutedas pela populaccedilatildeo 8) Garantir o uso ecologicamente equilibrado e socialmente justo do meio ambiente 9) Priorizar o transporte coletivo nas suas diversas modalidades 10) Efetivar uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e saneamento que garanta construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares realizaccedilatildeo de urbanizaccedilatildeo e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacutereas de baixa renda estabelecimento de mecanismos que garantam condiccedilotildees miacutenimas de infraestrutura aacutegua potaacutevel remoccedilatildeo e tratamento dos esgotos sanitaacuterios e sistema de limpeza 11) Lutar por uma ampla e real participaccedilatildeo popular em todos os projetos e accedilotildees pertinentes agrave reestruturaccedilatildeo urbana (FMRU 1992 p 55)

62 Na perspectiva dos setores populares envolvidos no FMRU a reforma urbana eacute entendida como garantia da cidade para todos (funccedilatildeo social da cidade) na qual a sociedade civil possa intervir em sua construccedilatildeo e ordenamento (gestatildeo democraacutetica da cidade) com equidade de acesso agrave habitaccedilatildeo e infraestrutura urbana (redistribuiccedilatildeo de renda) (SOUSA 1998)

196

Nesse sentido o FMRU passou entatildeo a compor o cenaacuterio poliacutetico municipal

cumprindo funccedilotildees natildeo mais somente reivindicatoacuterias mas funccedilotildees de agente de pressatildeo de

coordenador do processo e de mediador entre os interesses que surgiram nas discussotildees em

torno do Plano Diretor e do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (FERREIRA 2004)

O FMRU incorporou a concepccedilatildeo de ser necessaacuterio a participaccedilatildeo efetiva da populaccedilatildeo nos centros de decisatildeo de seus destinos natildeo apenas no campo reivindicatoacuterio mas tambeacutem no sentido de propor alternativas agraves poliacuteticas puacuteblicas o que exigia uma atuaccedilatildeo qualificada por parte desses movimentos (FMRU 1992 p 72)

No tocante a questatildeo habitacional nos uacuteltimos anos dos seacuteculos XX e XXI a atuaccedilatildeo

governamental foi voltada para a urbanizaccedilatildeo e o saneamento baacutesico de aacutereas de baixadas

com a reassentamento remoccedilatildeo eou remanejamento de famiacutelias que residem nessas aacutereas

objetivando ampliar o estoque de terras infraestruturadas para o mercado imobiliaacuterio assim

como a ampliaccedilatildeo de investimentos para melhorar as condiccedilotildees de habitaccedilatildeo nas aacutereas

alagadas que dependem de urbanizaccedilatildeo como a realizaccedilatildeo de infraestrutura fiacutesica obras de

drenagem recuperaccedilatildeo e abertura de canais Aleacutem disso outra accedilatildeo do poder puacuteblico diz

respeito ao processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de aacutereas de ocupaccedilatildeo

Segundo Pinheiro et al (2007) o processo de ocupaccedilotildees coletivas visando agrave soluccedilatildeo

de moradia tornou-se bastante evidente na RMB uma vez que o problema da moradia se

agravou face ao constante aumento dos preccedilos das terras urbanas dos alugueacuteis e dos baixos

salaacuterios e tambeacutem pela falta de investimento puacuteblico (setor habitacional) para a faixa salarial

de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos

Dessa forma as classes populares foram cada vez mais levadas a ocupar aacutereas

ociosas nas periferias Estas ocupaccedilotildees coletivas de terras para moradia passaram a

representar um foco de resistecircncia da sociedade civil frente ao autoritarismo imprimindo

inuacutemeras transformaccedilotildees nas relaccedilotildees entre Estado e as classes populares que de forma

organizada e coletiva ergueram suas casas (autoconstruccedilotildees) e conquistaram o direito de

morar legitimando as contradiccedilotildees da realidade urbana e colocando o urbano como espaccedilo

socialmente produzido na correlaccedilatildeo de forccedilas da sociedade (PINHEIRO et al 2007)

197

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A cidade se constitui em um produto da economia de mercado assim como um local

de acumulaccedilatildeo de capital e onde as condiccedilotildees para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho podem

mais plenamente ser realizadas Conforme ressaltado por Correcirca (1989) os processos sociais

produzem forma movimento e conteuacutedo sobre o espaccedilo urbano organizando a produccedilatildeo

espacial das metroacutepoles

Essa organizaccedilatildeo caracteriza-se por usos da terra diferenciados tais como o da aacuterea

central aacutereas industriais e aacutereas residenciais diversas e pelas interaccedilotildees como fluxo de

capital migraccedilotildees diaacuterias entre local de residecircncia e local de trabalho entre outros Aleacutem

disso a cidade tem um caraacuteter poliacutetico

Para Harvey (1980) a cidade eacute a expressatildeo concreta de processos sociais na forma de

um ambiente fiacutesico construiacutedo sobre o espaccedilo geograacutefico Corroborando com essa ideacuteia

Souza (2002) diz que a cidade eacute o concreto o conjunto de redes eacute a materialidade visiacutevel do

urbano enquanto este eacute o abstrato entretanto eacute o que daacute sentido e natureza agrave cidade

De acordo com Lefebvre (2001) o urbano expressa determinada formaconteuacutedo

derivada de contextos histoacuterico-espaciais especiacuteficos Isso implica entender o urbano

transcendendo o campo das determinaccedilotildees econocircmicas ou seja concebecirc-lo como condiccedilatildeo

meio e produto ao mesmo tempo manifestaccedilatildeo dos conflitos entre as necessidades do capital

em seu processo de (re)produccedilatildeo e as necessidades da sociedade como um todo

Corroborando com esse pensamento Carlos (1994 p 24) afirma que o urbano deve

ser pensado em suas muacuteltiplas dimensotildees

[] se de um lado o espaccedilo eacute condiccedilatildeo tanto da reproduccedilatildeo do capital quanto da vida humana de outro ele eacute produto e nesse sentido eacute trabalho materializado Ao produzir suas condiccedilotildees de vida a partir das relaccedilotildees capital-trabalho a sociedade como um todo (na cotidianidade de seu processo de trabalho) produz o espaccedilo geograacutefico e com ele um modo de vida de pensar de sentir Assim pensar o urbano significa tambeacutem pensar a dimensatildeo do humano

Reportando-se tambeacutem a discussatildeo sobre o uso do solo urbano especialmente no

que diz respeito ao capital incorporador pode-se afirmar que em Satildeo Luiacutes a produccedilatildeo de

moradia eacute processada por esse tipo de capital principalmente nas uacuteltimas deacutecadas uma vez

que os capitalistas incorporadores articulam a compra de terreno com a finalidade de valorizaacute-

lo a partir da alteraccedilatildeo do seu uso Aleacutem disso eles articulam agentes imobiliaacuterios agentes

198

financeiros e promotores de venda levando em conta as estruturaccedilotildees e transformaccedilotildees do

espaccedilo por conta da urbanizaccedilatildeo e implicaccedilotildees soacutecio-econocircmicas das mobilidades das

construccedilotildees com consequumlecircncias segregativas

Para uma primeira aproximaccedilatildeo do problema da moradia na cidade de Satildeo Luiacutes

torna-se necessaacuterio uma contextualizaccedilatildeo histoacuterica do processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do

espaccedilo urbano

A Ilha de Satildeo Luiacutes ou a Ilha do Maranhatildeo localiza-se no domiacutenio da Amazocircnia em

uma das suas porccedilotildees mais orientais a oeste do Meridiano de 44ordm W na parte norte do Estado

do Maranhatildeo e limita-se ao norte com o Oceano Atlacircntico ao sul com o Estreito dos

Mosquitos e Baiacutea do Arraial a leste com a Baiacutea de Satildeo Joseacute e a oeste com a Baiacutea de Satildeo

Marcos (RIOS 2005)

Com pouco mais de 830 kmsup2 ocupando 57 da ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se entre

os pequenos municiacutepios em extensatildeo territorial no entanto possui a maior aglomeraccedilatildeo

humana e urbana do Estado com 1011891 habitantes e uma densidade demograacutefica superior

a 100 habkmsup2 sendo portanto o mais populoso e densamente povoado municiacutepio

maranhense conforme tabela 6 (IBGE 2010)

Tabela 6 - Crescimento populacional do municiacutepio de Satildeo Luis

Recenseamento Populaccedilatildeo Residente

Total Urbana Rural 1960 158292 137820 (871) 20472 (129) 1970

265486

205413 (773)

60073 (227)

1980 449877 404252 (898) 45625 (102) 1991 695199 246213 (355) 448986 (645) 2000 870028 837584 (963) 32444 (037) 2010 1011891 955620 (945) 56271 (055)

Fonte IBGE

Censo demograacutefico (2010)

A Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes eacute composta de quatro municiacutepios de acordo

com a Lei Complementar nordm 038 de 12 de janeiro de 1998 Satildeo Luiacutes Satildeo Joseacute de Ribamar

Paccedilo do Lumiar e Raposa conforme mapa 2

199

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes

Fonte GEPLAN (2000)

200

De acordo com Diniz (2007) centrados em um territoacuterio insular os municiacutepios de

Satildeo Luiacutes Paccedilo do Lumiar Satildeo Joseacute de Ribamar e Raposa embora politicamente

independentes constituem uma aacuterea contiacutenua na qual se desenvolve o maior fluxo de relaccedilotildees

econocircmicas e poliacutetica-administrativas do Estado

No processo de regionalizaccedilatildeo Satildeo Luiacutes pertence agrave Mesorregiatildeo do Norte

Maranhense na microrregiatildeo da aglomeraccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes O aglomerado urbano da

Ilha do Maranhatildeo representa uma conurbaccedilatildeo cuja capital do Estado Satildeo Luiacutes eacute a cidade

poacutelo e exerce maior influecircncia pois desenvolve em torno de si uma expressiva rede de

relaccedilotildees soacutecio-econocircmicas aleacutem de oferecer um estoque consideraacutevel de equipamentos

urbanos que a torna um centro regional bastante atraente para outros centros menores

Na aacuterea rural o municiacutepio possui uma agricultura voltada agrave produccedilatildeo destinada ao

abastecimento de parte da demanda da capital Existem ainda pequenos estabelecimentos

agriacutecolas destinados agrave produccedilatildeo de gratildeos para a subsistecircncia Parte da aacuterea eacute destinada ao

Distrito Industrial com induacutestrias implantadas nos gecircneros de bebidas alimentaccedilatildeo produtos

metaluacutergicos ceracircmica e o complexo portuaacuterio (ALUMAR Itaqui CVRD) para exportaccedilatildeo

de mineacuterios de ferro e manganecircs alumiacutenio primaacuterio alumina ferro gusa e outros produtos e a

importaccedilatildeo industrializada mineacuterio de alumiacutenio (bauxita) mateacuterias-primas em geral e

combustiacutevel (RIOS 2005)

As alteraccedilotildees que vecircm ocorrendo na estrutura socioeconocircmica do municiacutepio tecircm sua

origem na implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais que forccedilaram o aparecimento de

induacutestrias sateacutelites e o revigoramento de serviccedilos de apoio agraves atividades industriais

O Governo Estadual e a Prefeitura desenvolveram programas de revitalizaccedilatildeo do

Centro Histoacuterico da cidade no intuito de fortalecer a induacutestria do turismo que tem suas raiacutezes

histoacutericas como forte vetor de atraccedilatildeo considerado recentemente pela UNESCO como

Patrimocircnio Cultural da Humanidade

Para Rios (2005) o periacutemetro definido pelos tombamentos em niacutevel federal e

estadual compreende cerca de 35000 imoacuteveis em sua maioria de natureza civil e associados

aos periacuteodos colonial e imperial

Considerada como centro poliacutetico-administrativo do Estado a cidade Satildeo Luiacutes

destaca-se tambeacutem no setor financeiro comercial industrial turiacutestico e mais recentemente

portuaacuterio Nesse sentido examinar a questatildeo urbana requer verificar os diversos fatores que

contribuem para sua dinacircmica uma vez que a urbanizaccedilatildeo apresenta um caraacuteter contraditoacuterio

pois eacute dominada pelas relaccedilotildees sociais de uma sociedade desigual que produz e reproduz no

201

espaccedilo urbano as disparidades de renda a exploraccedilatildeo econocircmica a exclusatildeo dentre outras

mazelas comuns agrave sociedade capitalista

A primeira fase da histoacuteria do Maranhatildeo reporta as lutas pelo territoacuterio e a ilha de

Satildeo Luiacutes constitui-se em uma arena privilegiada onde elas se desenrolam A ocupaccedilatildeo urbana

de Satildeo Luiacutes se iniciou com a formaccedilatildeo de um povoado mariacutetimo fronteiro agrave baiacutea de Satildeo

Marcos no divisor de aacuteguas dos rios Anil e Bacanga Esse povoado que deu origem a cidade

de Satildeo Luiacutes surgiu nos primeiros anos do seacuteculo XVII como afirmaccedilatildeo do expansionismo

colonizador francecircs com objetivo de estabelecer na regiatildeo a Franccedila Equinocial (DINIZ

2007)

A localizaccedilatildeo do povoado foi escolhida em funccedilatildeo da sua posiccedilatildeo estrateacutegica pois

fica em frente a baiacutea de Satildeo Marcos passagem quase que obrigatoacuteria para o acesso agrave Ilha e ao

continente aleacutem de oferecer condiccedilotildees para o ancoramento de embarcaccedilotildees e defesa aos

ataques por via mariacutetima

A implantaccedilatildeo da cidade pelos franceses ocorre por meio da construccedilatildeo de um forte

e de algumas casas toscas formando um pequeno nuacutecleo urbano que teria a funccedilatildeo de servir

de entreposto comercial para a Franccedila instituir em definitivo um sistema de exploraccedilatildeo das

riquezas locais

A implantaccedilatildeo de benfeitorias que se iniciava revela algumas das praacuteticas que

materializaram a presenccedila e atuaccedilatildeo do Estado enquanto agente social pois satildeo essas

operaciones concretas que contribuyen a modelar la cuidad (CAPEL 1974 p 19)

Essas operaccedilotildees visando modelar a cidade satildeo resultado do movimiento de

valorizacioacuten extensiva del espacio em que o processo de colonizaccedilatildeo implica a agregacioacuten

de una cuantidad de espacio y todo lo que conteacuten lo que en la praacutectica significa una adicioacuten

de factores de produccioacuten fuerza de trabajo recursos naturales y tierras en general (CAPEL

1974 p 20)

Assim a cidade de Satildeo Luiacutes foi fundada em 08 de setembro de 1612 pelos

franceses Daniel de La Touche e Franccediloise de Rasilly Todavia foi conquistada e incorporada

ao domiacutenio portuguecircs em 1615 Para tanto entre outras medidas os portugueses traccedilaram o

plano urbaniacutestico para implantaccedilatildeo da cidade com a definiccedilatildeo do arruamento e orientaccedilotildees

para o seu desenvolvimento

Esse plano que pautou o modelo e a ocupaccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes ateacute meados dos

anos sessenta do seacuteculo XX foi elaborado pelo engenheiro-mor do Brasil o portuguecircs

Francisco Frias de Mesquita em 1616 Sua concepccedilatildeo urbaniacutestica com arruamento uniforme

e traccedilado octogonal seguindo a orientaccedilatildeo dos pontos cardeais tinha origem renascentista e

202

obedecia aos padrotildees estabelecidos pelas Leis das Iacutendias conforme determinava a Coroa

Espanhola que agravequela eacutepoca controlava o Reino Portuguecircs (ESPIRITO SANTO 2002)

O processo de colonizaccedilatildeo pelos portugueses tinha como objetivo expandir

preservar e controlar as novas colocircnias que eram estabelecidas no setor setentrional em que os

grandes rios se constituiacuteram em porta de entrada Nesse caso se configura o interesse do

Estado portuguecircs articulado aos detentores do capital (grupos econocircmicos ligados ao

comeacutercio) que iniciaram uma seacuterie de accedilotildees como a ocupaccedilatildeo da Amazocircnia instalaccedilatildeo de

fortes e nuacutecleos de povoamento (por exemplo em Beleacutem no ano de 1616) ampliaccedilatildeo de

benfeitorias jaacute implantadas enfatizar a funccedilatildeo poliacutetico-administrativa-militar e o domiacutenio de

novos fatores de produccedilatildeo (terra mateacuteria-prima matildeo-de-obra escrava) bem como assegurar o

incipiente comeacutercio (ANDRADE 1984) Contudo a cidade sucumbiu ainda no decorrer do

seacuteculo XVII ao domiacutenio holandecircs

Entretanto assim como acontecera com os franceses tambeacutem os holandeses foram expulsos pelos portugueses decorridos trecircs anos da ocupaccedilatildeo em 1645 Eacute quando se inicia de fato e em definitivo a colonizaccedilatildeo portuguesa da antiga Upaon-Accedilu ou Ilha Grande segundo a denominaccedilatildeo tupinambaacute para a Ilha de Satildeo Luiacutes (RIOS 2005 p 216)

Cabe ressaltar que Satildeo Luiacutes tambeacutem esteve sob dominaccedilatildeo holandesa entre os anos

de 1641 a 1644 Periacuteodo de grande turbulecircncia caracterizado por inuacutemeras revoltas e

envolvendo sangrentas lutas entre conquistadores e conquistados Naquela eacutepoca a estrutura

urbana da cidade possuiacutea cerca de 600 casas e se constituiacutea em proacutespero arraial produzindo e

exportando uma boa quantidade de produtos agriacutecolas accediluacutecar fumo algodatildeo entre outros O

que certamente aguccedilava a cobiccedila dos exploradores

A ocupaccedilatildeo portuguesa desenvolveu entre 1650 e 1750 as primeiras atividades

econocircmicas organizadas Essas atividades permitiram a acumulaccedilatildeo de renda por pequenos

grupos de famiacutelias que alternavam a moradia entre a casa grande do latifuacutendio e a residecircncia

na cidade

Elevou-se agrave categoria de cidade no ano de 1677 e no decorrer dos seacuteculos seiscentos e setecentos chegou a disputar com Beleacutem o posto de principal ponto de contato direto da vasta regiatildeo Norte do Brasil a qual compreendia consoante a geopoliacutetica de entatildeo as terras que iam do Oeste do Cearaacute ateacute a longiacutenqua Amazocircnia com o impeacuterio portuguecircs (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 60)

203

De acordo com Diniz (2007) foram edificadas algumas residecircncias e

estabelecimentos comerciais em pontos diversos da cidade e com a prosperidade das

atividades econocircmicas uma aglomeraccedilatildeo de edificaccedilotildees com melhores qualidades

arquitetocircnicas comeccedilou a se formar em torno do Largo do Carmo (atual Praccedila Joatildeo Lisboa)

para mais tarde se estender em direccedilatildeo ao Desterro e agrave Praia Grande

Nesse periacuteodo eram precaacuterias as condiccedilotildees de serviccedilos puacuteblicos e infraestrutura

urbana Somente no final do seacuteculo XVIII eacute que foram melhoradas as condiccedilotildees urbaniacutesticas

poreacutem inexistia um plano a ser obedecido e a cidade crescia de forma desordenada

Naturalmente a cidade desenvolveu-se em torno desse nuacutecleo histoacuterico que sofreu

um forte surto desenvolvimentista notadamente nos seacuteculos XVIII e XIX periacuteodo de apogeu

econocircmico da Proviacutencia do Maranhatildeo por conta da produccedilatildeo de algodatildeo e accediluacutecar Esse

desenvolvimento econocircmico e cultural que se manteve ateacute o iniacutecio do seacuteculo XX produziu o

que hoje eacute considerado o maior e mais homogecircneo conjunto urbano e arquitetocircnico do

periacuteodo colonial brasileiro integrando a lista de Patrimocircnio Histoacuterico Nacional63 desde 1955

Em meados do seacuteculo XVIII Satildeo Luis se constituiu num centro comercial

expressivo com fluxo razoaacutevel de mercadorias importadas Atraveacutes dos navios de grande

porte chegavam artigos os mais refinados vindos da Europa a fim de atender o requinte da

burguesia maranhense Do mesmo modo saiam da cidade grandes carregamentos de

produtos cultivados como arroz algodatildeo entre outros (DINIZ 2007)

A partir de entatildeo o Estado implementou accedilatildeo sob a forma de capital empreendedor

criando instituiccedilotildees no sentido de incrementar a economia e por conseguinte viabilizar os

seus interesses

Integrado ao sistema mundial de comeacutercio por meio da exportaccedilatildeo de arroz do algodatildeo e de materiais regionais o Maranhatildeo canalizou para Satildeo Luiacutes e Alcacircntara os principais portos de escoamento determinando uma circulaccedilatildeo de riquezas que promoveu um florescimento cultural e urbano significativo para as duas cidades (ESPIRITO SANTO 2002 p 162)

Com a raacutepida expansatildeo da cultura algodoeira a Proviacutencia passou por um processo de

enriquecimento que de forma indireta veio a melhorar o aspecto arquitetocircnico da Capital

Edificaccedilotildees com melhores estruturas e acabamento satildeo construiacutedas nos espaccedilos onde hoje

existem as ruas Grande Santana Afogados e suas transversais

como tambeacutem na zona

63 Esse imponente conjunto urbano com seus becos ladeiras e escadarias eacute composto por cerca de 5000 edificaccedilotildees entre essas belos exemplares revestidos de azulejos coloniais Essa caracteriacutestica fez com que fosse denominada de a Pequena Vila dos palaacutecios de porcelana ainda no seacuteculo XIX pelo viajante francecircs Aveacute-Lallemant (1859)

204

comercial da Praia Grande Nesse periacuteodo duas obras monumentais foram construiacutedas o

Palaacutecio dos Leotildees (atual sede do Governo Estadual) e o Teatro Arthur Azevedo

Data desta eacutepoca o conjunto urbaniacutestico de caraacuteter civil que compotildee o Centro Histoacuterico da capital maranhense e se constitui um dos mais representativos e ricos exemplares traccedilados urbanos e a tipologia arquitetocircnica produzidos pela colonizaccedilatildeo portuguesa no Brasil Na realidade a tipologia arquitetocircnica que corresponde aos seacuteculos XVIII e XIX difere significativamente das casas em taipa e madeira que caracterizam os edifiacutecios de caraacuteter civil do seacuteculo XVII constituem-se soacutelidas construccedilotildees de alvenaria de pedra e argamassas com oacuteleo de peixe serralheira e cantarias de lioz de origem europeacuteia emadeira de lei De qualquer maneira os mais representativos exemplares da arquitetura de Satildeo Luiacutes datam sobretudo da segunda metade do seacuteculo XIX Trata-se dos sobrados de fachadas revestidas em azulejos portugueses que se sobressaem como um dos aspectos mais peculiares da construccedilatildeo civil maranhense (RIOS 2005 p 216)

Ainda tendo como sustentaacuteculo a cultura algodoeira a economia maranhense se

expandia de tal forma que chegou a alcanccedilar posiccedilatildeo expressiva na economia brasileira no

iniacutecio do seacuteculo XIX Os efeitos deste fenocircmeno repercutiram significativamente sobre a

cidade de Satildeo Luiacutes As rendas da administraccedilatildeo aumentaram a populaccedilatildeo urbana se

incrementou e os logradouros puacuteblicos e os serviccedilos de sauacutede e educaccedilatildeo receberam

tratamento mais adequado Em 1820 cerca de 20000 habitantes residiam na cidade de Satildeo

Luiacutes o que na eacutepoca representava a quarta concentraccedilatildeo urbana do Paiacutes (RIOS 2005)

Ao longo do seacuteculo XIX a cidade ganhou novo calccedilamento ocorreram a

implantaccedilatildeo do Cais da Sagraccedilatildeo (antigo Passeio Puacuteblico hoje Avenida Beira-Mar) e a

reurbanizaccedilatildeo das principais praccedilas Aleacutem disso sucessivas legislaccedilotildees

os Coacutedigos de

Posturas

determinam a expansatildeo do modelo urbaniacutestico em malha ortogonal e com

dimensotildees e larguras preestabelecidas que chegam a ocupar os atuais limites do Centro

Histoacuterico (ESPIRITO SANTO 2002)

Segundo Diniz (2007) a populaccedilatildeo teve uma participaccedilatildeo importante devido ter sido

incumbida de construir as calccediladas de suas casas Essas medidas foram aos poucos sendo

reformuladas e aperfeiccediloadas pois os moradores erguiam suas calccediladas sem qualquer

harmonia com os padrotildees naturais das ruas Diante disso as autoridades estabeleceram novas

regras para a pavimentaccedilatildeo e calccedilamento das vias

Esse processo de melhorias urbanas sempre esteve voltado para o embelezamento da

aacuterea nobre da cidade (centro) destinava-se especialmente agraves ruas do Trapiche Satildeo Joatildeo

Palma Paz Remeacutedios locais escolhidos pela burguesia como moradia enquanto que as

205

famiacutelias podres estavam sempre afastadas do nuacutecleo central e consequumlentemente natildeo eram

beneficiadas pelo sistema de serviccedilos

Nota-se nesse sentido que o interesse do capital seleciona e direciona a intervenccedilatildeo

do Estado em termos de alocaccedilatildeo de infraestrutura e reproduccedilatildeo do espaccedilo assim como a

reproduccedilatildeo das relaccedilotildees sociais pois as concessotildees de terras eram dadas agraves pessoas brancas

livres e que dispunham de maior capital Estas representavam a nobreza eou a emergente

classe burguesa Jaacute para a populaccedilatildeo de natildeo-brancos (iacutendios e negros) restava morar em aacutereas

mais afastadas em relaccedilatildeo agrave Praia Grande

No processo de urbanizaccedilatildeo desse periacuteodo destaca-se a construccedilatildeo do Cais da

Sagraccedilatildeo pois foi uma das obras mais importantes ateacute entatildeo realizada Esta obra levou vaacuterios

anos para ser concluiacuteda (1841 a 1909) e tinha como objetivo solucionar o problema de erosatildeo

da barreira onde se encontrava a Praccedila do Palaacutecio a qual constantemente sofria os efeitos do

processo erosivo provocado pelo mar (DINIZ 2007)

Dessa maneira torna-se evidente que a cidade de Satildeo Luiacutes foi produzida pela

associaccedilatildeo entre o capital mercantil e o Estado Este se expressa pelas alteraccedilotildees realizadas

sobre o espaccedilo urbano tendo em vista o crescimento horizontal e a construccedilatildeo de canais

No final do seacuteculo XIX e inicio do seacuteculo XX o grande centro maranhense conheceu

um surto industrial consideraacutevel com a expansatildeo das induacutestrias tecircxteis e as de derivados de

babaccedilu uma vez que o ciclo de algodatildeo sofreu significativa alteraccedilatildeo acarretando em seacuterias

dificuldades na sua comercializaccedilatildeo internacional

No uacuteltimo quartel do seacuteculo XIX com o surto da industrializaccedilatildeo no Estado a maior parte das induacutestrias se estabelece na capital Estas induacutestrias geravam empregos diretos para cerca 300 operaacuterios nuacutemero significativo para uma cidade que na eacutepoca chegava a 45000 habitantes (DINIZ 2007 p 168)

A cidade entatildeo para assumir nova feiccedilatildeo de mercantil-administrativa para

industrial Surge o primeiro grande bairro o Anil formado em torno da faacutebrica Rio Anil

(Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Rio Anil) situado a 9 km do centro da cidade Em aacutereas

proacuteximas ao centro as faacutebricas Companhia Fabril Maranhense (conhecida como Santa Isabel)

e Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Maranhense (conhecida como Camboa) provocaram o

surgimento de formaccedilotildees urbanas nos seus arredores (Fotografia 5) Aleacutem dessas destacam-

se a Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Cacircnhamo Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecelagem Satildeo Luiacutes

Companhia Progresso Maranhense e a Induacutestria Maranhense (RIOS 2005)

206

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Acervo Puacuteblico Municipal (2009)

Vale ressaltar que a ascensatildeo da induacutestria tecircxtil ocorreu em funccedilatildeo de preacute-condiccedilotildees

existentes tecnologia relativamente simples mais ou menos estabilizada de faacutecil manejo e

inteiramente contida nos equipamentos disponiacuteveis no mercado internacional tamanho da

planta miacutenima e volume inicial de investimentos acessiacuteveis agrave economia brasileira de entatildeo

(RIBEIRO JUNIOR 2001 p 65) De acordo com Diniz (2007) as faacutebricas serviram como

nuacutecleos de crescimento e expansatildeo urbana pois ao redor das mesmas surgiram sub-

habitaccedilotildees ou seja as vilas operaacuterias

No final do seacuteculo XIX em funccedilatildeo do surto industrial a cidade eacute dotada dos

primeiros serviccedilos urbanos significativos a Companhia de Aacuteguas e a Companhia Telefocircnica

Em 1920 satildeo implantados os serviccedilos de energia eleacutetrica e de bondes por concessatildeo da

Companhia Inglesa ULLEN

Para Diniz (2007) a cidade adentra o seacuteculo XX com uma municipalidade

desestruturada para enfrentar os problemas da expansatildeo urbana da capital Natildeo existia uma

planta atualizada de todos os pontos da cidade e nem um plano de expansatildeo no qual

estivessem delineados os futuros arruamentos uma vez que natildeo havia preocupaccedilatildeo das

autoridades no que tange ao alinhamento das habitaccedilotildees que ficavam em aacutereas proacuteximas ao

centro Estas eram feitas sem nenhum criteacuterio teacutecnico pela proacutepria populaccedilatildeo

Entre 1920 e 1940 a populaccedilatildeo cresceu a taxas mais baixas Verifica-se na tabela 7

que a cidade levou quase dois seacuteculos para dobrar de populaccedilatildeo Nesse periacuteodo a

administraccedilatildeo municipal investiu em demandas de serviccedilos puacuteblicos com a aplicaccedilatildeo de

207

recursos em urbanizaccedilatildeo saneamento sauacutede educaccedilatildeo transporte e energia ainda que os

recursos aplicados natildeo atendessem a real necessidade de infraestrutura urbana vigente

Vale ressaltar que os equipamentos urbanos foram incrementados tanto em funccedilatildeo da

dinacircmica econocircmica decorrente da localizaccedilatildeo de unidades produtivas industriais tecircxteis

quanto devido ao lento crescimento horizontal da cidade que possibilitou ao poder puacuteblico

municipal aplicar mais recursos na estruturaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes o que todavia foi

viabilizado apenas no Centro Histoacuterico ateacute a Vila do Anil ou seja ao longo do Corredor

Centro-Anil (DINIZ 2007)

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) Periacuteodo Nuacutemero de Habitantes

Fins do seacuteculo XVII 10000 Fins do seacuteculo XVIII 17000 1820 20000 1835 25000 1868 30000 1872 31604 1890 35000 1920 42000 1940 58735

Fonte SERFHAU (1970)

Em 1936 foi fundado o Mercado Central da cidade formado por vaacuterios armazeacutens no

qual se comercializavam artigos diversos Este mercado funcionava como alternativa para

vendas em atacado aleacutem disso se constituiu um concorrente do mercado da Praia Grande e

ao comeacutercio realizado no Portinho A expansatildeo desse novo centro comercial desencadeou

investimentos no setor da construccedilatildeo civil expandindo o Plano Urbano Central Assim com a

implantaccedilatildeo da Companhia do Comeacutercio elevou-se o valor do lote urbano restringindo o

acesso da populaccedilatildeo com menor poder aquisitivo ao periacutemetro urbano (RIBEIRO JUNIOR

2001)

Entre os anos 1950 e 1960 o ritmo de crescimento populacional urbana voltou a

crescer e a aacuterea urbana da cidade se expandiu com mais intensidade no eixo Centro-Anil

Nesse periacuteodo novos bairros surgiram enquanto outros se adensaram com a ocupaccedilatildeo das

aacutereas disponiacuteveis Foi o caso do Matadouro (hoje Liberdade) Monte Castelo Joatildeo Paulo

Cavaco (Faacutetima) Caratatiua Jordoa e Sacaveacutem (DINIZ 2007)

208

No final da deacutecada de 1950 um novo quadro urbano comeccedilou a se formar Com a

abertura de vias rodoviaacuterias para o interior do Estado e a integraccedilatildeo com os estados vizinhos

a populaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes aumentou seu ritmo de crescimento (tabela 8)

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970

Ano Divisatildeo por Zona

Total Urbana Rural 1940 58735 26854 85589 1950 79731 40054 119785 1960 137820 20472 158292 1970 205413 60073 265486

Fonte IBGE Censos Demograacuteficos do Maranhatildeo (195019601970)

Grande parte desse contingente populacional era formado pelo processo migratoacuterio

de pessoas que provinham das aacutereas rurais e de outros estados do nordeste por causa do

fenocircmeno da seca Esses fatores acarretaram em uma ocupaccedilatildeo desordenada de aacutereas as

margens dos rios Anil e Bacanga

Essa complexidade do processo migratoacuterio pode ser compreendida a partir da

reestruturaccedilatildeo produtiva que com mudanccedilas nas formas de inserccedilatildeo no mercado de trabalho

torna-se elemento fundamental para o entendimento da nova configuraccedilatildeo espacial da

migraccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo uma vez que o fluxo migratoacuterio de nordestinos se daacute pela procura de

trabalho numa regiatildeo em que sabem que sua matildeo de obra eacute extremamente necessaacuteria

Os outros fatores que intensificaram o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial foram a

falta de investimento do poder puacuteblico tanto estadual como municipal em aacutereas mais

afastadas do centro da cidade a instalaccedilatildeo de empresas provenientes do sul do Paiacutes na regiatildeo

ausecircncia de uma reforma agraacuteria estadual entre outros

A cidade entatildeo se tornou incapaz de incorporar todo esse contingente populacional

em suas atividades econocircmicas pois simultaneamente outro fato negativo para a economia

se tornava evidente com a paralisaccedilatildeo das induacutestrias tecircxteis Tal fato aleacutem de enfraquecer o

ritmo de industrializaccedilatildeo contribuiu para o aumento do desemprego (DINIZ 2007)

Nas uacuteltimas cinco deacutecadas com o decliacutenio das faacutebricas e as constantes crises da economia maranhense a cidade tem sofrido pressotildees econocircmicas muito fortes refletindo-se no enfraquecimento do comeacutercio local dando ecircnfase ao aparecimento de um tipo de atividade comercial caracterizada por baixos investimentos e menor especializaccedilatildeo nos produtos o setor informal da

209

economia ou circuito inferior Por outro lado apesar do decliacutenio no setor agro-exportador surgiram novas perspectivas econocircmicas que viriam a alterar significativamente o panorama soacutecio-econocircmico da cidade (DINIZ 2007 p 169)

Sendo assim com o decliacutenio das induacutestrias tecircxteis e por conseguinte o aumento do

desemprego o Estado passou a atuar como investidor no espaccedilo urbano na medida em que se

tornou responsaacutevel pela circulaccedilatildeo de capital fazendo com que a cidade continuasse a ter no

comeacutercio um dos fatores de sua existecircncia A cidade assumiu dessa maneira a funccedilatildeo de

comercial industrial administrativa e residencial (ANDRADE 1984 p 103)

O baixo poder aquisitivo da populaccedilatildeo as limitaccedilotildees em investimentos puacuteblicos

municipais principalmente nas aacutereas mais carentes e a ausecircncia de um planejamento

adequado dotaram o crescimento da cidade de aspectos negativos em relaccedilatildeo agrave urbanizaccedilatildeo e

aos serviccedilos baacutesicos

Parte do Centro Histoacuterico teve entatildeo sua funccedilatildeo residencial substituiacuteda pelo comeacutercio e serviccedilos A aacuterea sob a tutela da legislaccedilatildeo federal uma vez que foi tombada como Patrimocircnio Histoacuterico sofreu um esvaziamento mais acentuado agravado pela instalaccedilatildeo da funccedilatildeo administrativa federal estadual e municipal em edifiacutecios da aacuterea afastando cada vez mais a populaccedilatildeo residente (ESPIRITO SANTO 2002 p 37)

Dessa forma vaacuterios movimentos sociais urbanos comeccedilaram a surgir objetivando a

organizaccedilatildeo da populaccedilatildeo residente nas aacutereas mais afastadas do centro da cidade no intuito de

reivindicar a presenccedila do Estado em especial no que se refere aos meios de consumo coletivo

como aacutegua energia postos de sauacutede etc culminando em 1959 com a fundaccedilatildeo da Uniatildeo de

Moradores do Lira que foi a primeira organizaccedilatildeo popular de Satildeo Luiacutes Este fato incentivou

a partir de 1960 o surgimento de outras uniotildees e associaccedilotildees de moradores a exemplo

Madre de Deus Floresta Coreacuteia Nossa Senhora da Vitoacuteria Satildeo Vicente e Satildeo Francisco

Com efeito o governo estadual criou em 1959 a Sociedade de Melhoramentos e

Urbanismo de Satildeo Luiacutes (SURCAP) com a finalidade de planificar a cidade Entretanto este

objetivo natildeo se concretizou e se resumiu ao desmembramento dos Serviccedilos de Aacutegua Luz

esgoto Traccedilatildeo e Prensa de Algodatildeo (Saelta) resultando no corte setorial uma vez que foram

instituiacutedos os respectivos oacutergatildeos (LUZ 2004)

Vale notar que por oito anos (1953-1961) natildeo houve registro de investimentos na

aacuterea habitacional Tal situaccedilatildeo foi modificada entre 1962 e 1965 uma vez que a accedilatildeo do

Estado enquanto produtor do espaccedilo foi ampliada e incrementada na medida em que o

210

Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio (IAPC) e o Instituto de Pensionistas e

Aposentados dos Servidores do Estado (IPASE) foram inseridos nesse contexto

Entatildeo a partir da segunda metade da deacutecada de 1960 a iniciativa de incorporar Satildeo

Luiacutes no processo desenvolvimentista da sociedade moderna que aos poucos se consolidava

contou com uma seacuterie de medidas implementadas em conformidade com os planos e projetos

governamentais

O crescimento urbano de Satildeo Luiacutes nesse periacuteodo se deu no sentido sudeste

acompanhando o eixo rodoviaacuterio da cidade que tambeacutem coincide com a localizaccedilatildeo do

aeroporto Essa estreita faixa de terra delimitada pelas zonas alagadiccedilas dos rios Anil e

Bacanga na verdade eacute o eixo rodoviaacuterio principal da ilha com trecircs grandes avenidas Getuacutelio

Vargas Joatildeo Pessoa e Kennedy Naturalmente ali foram localizadas as principais atividades

comerciais e inuacutemeras aacutereas residenciais abrigando os bairros mais populosos Destarte

formou-se inclusive um centro de serviccedilos secundaacuterio no bairro do Joatildeo Paulo com o

agrupamento de vaacuterias atividades comerciais em torno do mercado desse bairro (LUZ 2004)

A partir de 1967 essa tendecircncia comeccedilou a se inverter em decorrecircncia da construccedilatildeo da barragem do Bacanga ligando o centro ao Porto do Itaqui e da ponte Satildeo Francisco sobre o rio Anil (1970) no sentido da orla mariacutetima

praias Essas obras possibilitaram a ocupaccedilatildeo das terras situadas na margem direita do Rio Anil e na margem esquerda do rio Bacanga promovendo uma profunda alteraccedilatildeo no processo de ocupaccedilatildeo do solo no Municiacutepio e induzindo o surgimento de novos eixos viaacuterios novas aacutereas residenciais aleacutem de centros comerciais e de serviccedilos que passaram a rivalizar com os centros tradicionais (DINIZ 2007 p 171)

Segundo argumenta Luz (2004 p 20) ao assumir o governo do Estado em 1966

Joseacute Sarney criou o Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento (GETAP) ligando-o

diretamente ao Gabinete do Governo e atribuindo-lhe amplos poderes em relaccedilatildeo agraves demais

secretarias O GETAP elaborou o Programa de Emergecircncia para 1966 e propocircs medidas

poliacuteticas e econocircmicas de modernizaccedilatildeo que deram as bases para o plano de Governo

conhecido como Maranhatildeo Novo marcando nesse sentido a introduccedilatildeo de mecanismos

que alterariam profundamente o cenaacuterio espacial maranhense

Nesse sentido a preocupaccedilatildeo em melhorar e ampliar a malha rodoviaacuteria e

ferroviaacuteria em conformidade com a futura implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais tais

como Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) Companhia Vale do Rio Doce (CVRD)

Companhia de Docas do Maranhatildeo (Codomar) e Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR)

contribuiacuteram para uma maior proximidade entre os municiacutepios do interior e a capital

211

maranhense na medida em que as populaccedilotildees rurais movidas pela necessidade de melhores

condiccedilotildees de vida deslocavam-se em grandes quantidades ao longo das deacutecadas de 1970 e

1980 por novas vias pavimentadas e por ferrovias em direccedilatildeo as cidades com melhores

infraestruturas destacando-se Imperatriz e Satildeo Luis

A vinda para a capital do Estado significava na maioria das vezes natildeo o abandono

da terra pelo atrativo urbano mas uma decisatildeo em que prevalecia efetivamente a necessidade

conforme se observa na fala de Ribeiro Junior (2001 p 105) sempre se coloca em debates

que as pessoas vecircm para a cidade com o sonho de morar bem arranjar um bom emprego

mudar de vida Mas na maioria das vezes vem-se para sobreviver 64

A situaccedilatildeo logo se agravava com a permanecircncia do desemprego e a falta de

qualificaccedilatildeo profissional suficiente para o ingresso no mercado de trabalho restando na

maioria das vezes a opccedilatildeo por atuar no setor informal do terciaacuterio ou na construccedilatildeo civil65

Assim todos esses eventos proporcionaram agrave cidade vaacuterias mudanccedilas sendo uma

delas o aumento do contingente populacional Este crescimento populacional desordenado

trouxe problemas de habitaccedilatildeo sauacutede seguranccedila e favoreceu o surgimento de ocupaccedilotildees

irregulares palafitas e favelas

Sobre isso Gomes (1992 p115-116) destaca

Satildeo Luiacutes eacute incapaz de incorporar a vida econocircmica esse acreacutescimo populacional resultando dai uma enorme expansatildeo de palafitas que em 1969 atingiram aproximadamente o nuacutemero de 7000 abrigando uma populaccedilatildeo estimada de 40000 pessoas em condiccedilotildees infra-humanas [] Assim entre 1950 e 1970 a populaccedilatildeo da Capital aumenta de aproximadamente 80 alojando-se sobretudo na zona suburbana pela ocupaccedilatildeo bastante desordenada das aacutereas utilizaacuteveis nas fraldas do espigatildeo constituiacutedo pelo divisor de aacuteguas dos rios Bacanga e Anil

64 Segundo Ribeiro Junior (2001 p 104) ao final dos anos 1970 na pesquisa efetuada pelo governo estadual com o objetivo de analisar a populaccedilatildeo de 07 focos de pobreza da cidade que agregavam 181176 pessoas (Bacanga = 59278 Rio Anil = 56370 Alto do Anil = 25156 Anjo da Guarda = 35212 Vila Vicente Fialho = 3059 Nova Divineacuteia = 1414 Corticcedilos do Centro de Satildeo Luiacutes = 687) deixava claro que a grosso modo em todas as aacutereas de populaccedilatildeo predominantemente pobre excetuando-se a aacuterea de Corticcedilos do Centro predominava a procedecircncia rural entre os que moravam anteriormente em outro lugar fora da ilha 65 De forma cada vez mais intensa o espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes tendeu a ser alterado projetando o setor de construccedilatildeo civil na qual de acordo com Ribeiro Junior (2001) se consolidou efetivamente a partir de obras como o Porto do Itaquiacute o Anel Viaacuterio a Ponte Joseacute Sarney a Barragem do Bacanga a substituiccedilatildeo da velha rede de esgoto do Centro da Cidade (originaacuteria da deacutecada de 1920) a Avenida Meacutedici (hoje Africanos) Ponte Bandeira Tribuzi a 3ordf ponte sobre o rio Anil obra iniciada em 1974 e concluiacuteda em 1980 o aterramento da Ponta D areia ligando o bairro do Satildeo Francisco agrave praia que leva aquele nome transpondo o Igarapeacute

da Jansen a pavimentaccedilatildeo da aacuterea litoracircnea

Calhau Ponta D areia e Olho D aacutegua ligando essas aacutereas a certos bairros da cidade perifeacutericos ou centrais e a construccedilatildeo de inuacutemeros conjuntos habitacionais fizeram da deacutecada de 1970 um periacuteodo de fenocircmeno e expansatildeo da construccedilatildeo civil em Satildeo Luiacutes

212

Foi a partir de entatildeo que o processo de favelizaccedilatildeo da periferia se acentuou e em

1969 Satildeo Luiacutes contava com cerca de 7000 casas tipo palafitas onde habitavam em

condiccedilotildees subumanas algo em torno de 40000 pessoas representando 17 da populaccedilatildeo

urbana (ANDRADE 1984)

Por satildeo Luiacutes natildeo ter nenhum Plano Diretor ateacute a deacutecada de 70 que regulamentasse o uso e ocupaccedilatildeo do solo facilitou o surgimento de vaacuterias palafitas principalmente em aacutereas de mangues em decorrecircncia das mesmas estarem proacuteximas o Centro [] Assim por falta de uma poliacutetica do solo e pela populaccedilatildeo migrante natildeo poder pagar aluguel e transporte a deacutecada de 60 eacute marcada por um processo intenso de ocupaccedilatildeo dos mangues para construccedilatildeo de palafitas que passam abrigar essa populaccedilatildeo proacutexima ao mercado de trabalho (ANDRADE 1984 p 37)

O crescimento urbano criava algumas necessidades para facilitar a integraccedilatildeo das

aacutereas jaacute ocupadas e viabilizar o acesso a outras aacutereas para a habitaccedilatildeo Sendo assim a

construccedilatildeo de pontes era uma alternativa importante para esses ajustamentos

Desse modo no final da deacutecada de 1960 foram construiacutedas as pontes Governador

Newton Bello e Governador Joseacute Sarney ambas sobre o rio Anil e a Barragem do Bacanga

sobre o rio do mesmo nome (Fotografia 6) Estas obras permitiram a expansatildeo da cidade nas

direccedilotildees norte e oeste provocando o aparecimento de grandes conjuntos habitacionais para as

classes de menor poder aquisitivo loteamentos isolados e a regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas

na faixa litoracircnea

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte INPE (1999)

213

Com a construccedilatildeo da ponte Governador Newton Bello foi encurtado o percurso para

o bairro do Olho D aacutegua onde jaacute existiam algumas residecircncias de classe meacutedia e foram

implantados os conjuntos habitacionais Ipase Maranhatildeo Novo e Cohama Jaacute com a

construccedilatildeo da ponte Governador Joseacute Sarney foram implantados os conjuntos habitacionais

do BASA Renascenccedila e os loteamentos Satildeo Francisco e IPEM do Calhau aleacutem de propiciar a

ocupaccedilatildeo espontacircnea das aacutereas proacuteximas agrave cabeceira da Ponte por moradores de baixa renda

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

A Barragem do Bacanga facilitou o acesso ao Porto do Itaquiacute com o encurtamento

no seu trajeto em 22 km e contribuiu para o assentamento de famiacutelias de baixo poder

aquisitivo no loteamento Anjo da Guarda

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1970 as ocupaccedilotildees concentravam-se principalmente nas proximidades dos rios Anil e Bacanga natildeo se estendendo muito aleacutem dos arredores do centro Posteriormente outras localidades da cidade passam a ser palco desse processo formando aacutereas com ampla concentraccedilatildeo de populaccedilatildeo carente como o Itaquiacute-Bacanga

assim conhecido apoacutes a inauguraccedilatildeo oficial do Porto do Itaquiacute em 1971 (DINIZ 2007 p 171)

Sendo assim nesse processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano observa-se a accedilatildeo dos

agentes sociais Estado Imobiliaacuterios e Incorporadores interessados na reproduccedilatildeo do capital

por meio da valorizaccedilatildeo da cidade

Para dar seguimento ao eixo viaacuterio da ponte Governador Joseacute Sarney foi construiacuteda a Avenida Colares Moreira que propiciou crescimento urbano da aacuterea do bairro do Satildeo Francisco com a construccedilatildeo dos conjuntos habitacionais (Basa Jardim Satildeo Francisco e Renascenccedila) aleacutem dos modernos edifiacutecios comerciais e de prestaccedilatildeo de serviccedilos que valorizaram e aumentaram consideravelmente o preccedilo do solo (ANDRADE 1984 p 23)

Portanto a construccedilatildeo de tais pontes significou maiores possibilidades de se

materializar a reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e do capital haja vista a valorizaccedilatildeo das terras

localizadas nos mencionados setores o que tornou bastante oportuno o investimento puacuteblico e

privado em novas vias de acesso assim como em demais equipamentos urbanos

Vale ressaltar que a Cohab-MA construiu entre os anos 1967 e 1970 trecircs conjuntos

habitacionais que representaram 2438 unidades residenciais (505 relativas ao Anil I 516

concernentes ao Anil II e 1417 decorrentes do Anil III) tendo como investimento total US$

2742060 (dois milhotildees setecentos e quarenta e dois mil e sessenta doacutelares) gerando 9752

empregos diretos conforme tabela 9

214

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970

Ano Conjunto Habitacional Nordm de Unidades

Valor do Investimento (US$)

Nordm de Empregos

1967 Anil I 505 694950 2020 1969 Anil II 516 712270 2064 1970 Anil III 1417 1334840 5668

Total 2438 2742060 9752 Fonte Luz (2004 p 65)

Nesse sentido a atuaccedilatildeo do Estado visou estruturar a cidade mais precisamente no

que diz respeito agrave ampliaccedilatildeo das vias de acesso por meio da articulaccedilatildeo das esferas estaduais

e federal desencadeando um processo de valorizaccedilatildeo das terras nos setores nortenordeste e

oeste e reorientandoincentivando a reproduccedilatildeo do capital e do espaccedilo urbano

Aleacutem disso sua atuaccedilatildeo tambeacutem pode ser caracterizada como agente promotor

imobiliaacuterio uma vez que possibilitou a construccedilatildeo de unidades habitacionais por intermeacutedio

dos IAPs e Cohab aquecendo dessa forma a economia mediante a quantia de capital

investido e a geraccedilatildeo de empregos impulsionando o poder de atraccedilatildeo da cidade que por seu

turno natildeo estava preparada para tal

Destarte a partir de 1970 foram definidas novas perspectivas de crescimento da

cidade com a decisatildeo do Governo Federal em escoar o mineacuterio da Serra dos Carajaacutes pelo

porto de Satildeo Luiacutes e de implantar um complexo sideruacutergico na Ilha Foram entatildeo implantados

novos loteamentos e construiacutedos grandes conjuntos habitacionais em vaacuterios locais da Ilha sob

o incentivo do BNH conforme verificado no quadro 7

215

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990

Ocupaccedilatildeo Ano Famiacutelias Sujeitos e Forccedilas poliacuteticas Saacute Viana 1961 1200 Igreja Catoacutelica Estudantes e Poliacutecia Militar Redenccedilatildeo 1966 600 IgrejaArcebispado Governo do Estado e Poliacutecia Militar Santa Cruz 1967 2000 Poliacutecia Militar e Prefeitura Coroado 1969 1000 Igreja Catoacutelica Prefeitura e Poliacutecia Militar

Vila Palmeira 1969 4000 Governo do Estado Vila Nova 1972 1000 Governo do Estado

Coroadinho 1977 3000 Igreja Catoacutelica e Prefeitura Vila Padre Xavier

1980 800 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB) e Governo do Estado

Vera Cruz 1980 300 Partidos de Esquerda (MDB) Governo do Estado Lideranccedilas Comunitaacuterias e Igreja

Satildeo Bernardo 1981 2000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Joatildeo de Deus 1981 3000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Bom Jesus 1982 3000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Itamar 1983 2000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Mauro Fecury II

1990 4000 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura

Vila Satildeo Luiacutes 1990 1300 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura TOTAL 29200

Fonte Luz (2004 p 69)

Assim eacute introduzida a preocupaccedilatildeo com o ordenamento do processo de expansatildeo

urbana que se traduz nos primeiros esboccedilos de articular um planejamento viaacutevel agrave cidade de

Satildeo Luiacutes Nesse sentido a Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes realizou uma seacuterie de estudos e

de propostas urbaniacutesticas no sentido de fornecer elementos teacutecnicos para instrumentar o

Poder Puacuteblico no processo de planejamento e desenvolvimento urbano da cidade

Esses estudos culminaram na elaboraccedilatildeo do Plano Diretor de Satildeo Luiacutes de 1977

constituindo-se em instrumentos importantes para o conhecimento da realidade social urbana

e ambiental de Satildeo Luiacutes bem como para determinar as diretrizes do uso e ocupaccedilatildeo territorial

do sistema viaacuterio e transportes do Municiacutepio e seu zoneamento urbano

De acordo com Ribeiro Junior (2001) esses estudos66 apontaram os problemas que

possivelmente a cidade enfrentaria em decorrecircncia da transformaccedilatildeo na sua estrutura urbana

66 Dentre os estudos cabe destaque 19671968

Pesquisa sobre o Desenvolvimento Urbano de Satildeo Luiacutes 19671968

Desenvolvimento Urbano da Aacuterea do Itaqui 1971 - Estudo de Viabilidade Teacutecnico-Econocircmica do

216

e econocircmica frente aos investimentos anunciados Entre eles estatildeo o esvaziamento do centro

histoacuterico e o avanccedilo da ocupaccedilatildeo urbana nas aacutereas de manguezais

Em 1973 surgiu a primeira proposta concreta de erradicaccedilatildeo das palafitas com o

Programa de Despalafitaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes67 por meio de assinatura de convecircnio entre a

Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes e o BNH no valor de 10 milhotildees de cruzeiros Seria dado agrave

cidade um crescimento urbaniacutestico disciplinado e a complementaccedilatildeo de infraestrutura e

saneamento total dos bairros sob intervenccedilatildeo como a construccedilatildeo de calccediladas e a implantaccedilatildeo

de equipamentos comunitaacuterios

Posteriormente outros projetos foram elaborados na tentativa de controlar o

crescimento desordenado

da cidade Sendo que no governo de Joatildeo Castelo iniciado em 15

de marccedilo de 1979 ter-se-ia pela frente entre outras metas a de solucionar o problema

habitacional em Satildeo Luiacutes que jaacute despontava nesse principio de deacutecada como fator expressivo

de atraso social e reflexo direto do mau planejamento das administraccedilotildees anteriores

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

Eacute importante destacar que as intervenccedilotildees municipais e estatais no espaccedilo urbano de

Satildeo Luiacutes natildeo representaram a possibilidade de acesso agrave moradia para uma parte da populaccedilatildeo

isso porque as unidades habitacionais natildeo atenderam agrave demanda e os planos e projetos

relativos agrave urbanizaccedilatildeo foram desvirtuados e natildeo efetivados uma vez que a Surcap acabou se

apresentando como uma empresa imobiliaacuteria possibilitando a accedilatildeo de apropriadores de terras

Diniz (2007) argumenta que no final da deacutecada de 1970 o Estado do Maranhatildeo

apresentou um desenvolvimento econocircmico relevante graccedilas agrave implantaccedilatildeo dos capitais

industriais Esse surto industrial trouxe na deacutecada seguinte mudanccedilas significativas na

estrutura soacutecioespacial da cidade causadas especialmente pelo aumento do contingente

populacional que duplicou nesse periacuteodo

A implantaccedilatildeo desses grandes projetos e o comeacutercio paralelo surgido em decorrecircncia dessas novas instalaccedilotildees podem ter sido os fatores motivadores do crescimento populacional em Satildeo Luis na deacutecada de 1980 Segundo dados estatiacutesticos do IBGE em 1980 Satildeo Luiacutes apresentava um contingente populacional de 449887 habitantes o que correspondia a pouco mais de 12 da populaccedilatildeo estadual concentrada na zona urbana (DINIZ 2007 p 170)

Desenvolvimento Decenal e Plano Diretor dos Portos de Itaqui e Mucuripe 1972 - Estudo de um Estaacutedio para a Cidade de Satildeo Luiacutes 1972

Plano de Desenvolvimento Turiacutestico do Maranhatildeo 19721974

Programa de Recuperaccedilatildeo de Aacutereas Alagadas

Projeto Kennedy e Bares 19721975

Estudos de Viabilidade para Implantaccedilatildeo da Central de Abastecimento de Satildeo Luiacutes 1977

Plano Diretor de Satildeo Luiacutes (LUZ 2004) 67 O Plano objetivava a recuperaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo das aacutereas alagadas de Satildeo Luiacutes abrangendo um total de 8 mil palafitas (RIBEIRO JUNIOR 2001)

217

Paralelamente a isso se acelerou tambeacutem a ocupaccedilatildeo desordenada por contingentes

populacionais de menor poder aquisitivo nas aacutereas alagadiccedilas e nos manguezais Esse

crescimento se direcionou segundo trecircs vetores

1) Em direccedilatildeo ao norte da Ilha compreendendo a orla mariacutetima e as aacutereas situadas

entre os conjuntos habitacionais recentemente implantados

2) Em direccedilatildeo a parte leste acompanhando a ligaccedilatildeo rodoviaacuteria com os outros dois

municiacutepios da Ilha

3) Em direccedilatildeo sul acompanhando a ligaccedilatildeo rodo-ferroviaacuteria da Ilha com o

continente (LUZ 2004)68

Pode-se notar tambeacutem a forte ocorrecircncia de zonas palafitadas principalmente agraves

margens do Rio Anil e nas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees pelo fluxo das mareacutes (Fotografia 7)69

Ao longo da orla mariacutetima existe uma predominacircncia de residecircncias de alto padratildeo com fraco

adensamento e glebas com grandes aacutereas de especulaccedilatildeo (Fotografia 8)

68 Segundo Luz (2004) a Ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se dividida em quatro setores bem definidos por meio de dois corredores viaacuterios o primeiro do Porto Itaqui ateacute Satildeo Joseacute de Ribamar atravessando a Ilha no sentido oeste-leste e o segundo do Olha D aacutegua ateacute o Estreito dos Mosquitos uacutenica ligaccedilatildeo da Ilha com o continente e que se desenvolve no sentido norte-sul Setores o setor noroeste

se caracteriza pela predominacircncia de conjuntos habitacionais do padratildeo de classe meacutedia a alta vaacuterios loteamentos aleacutem da parte da zona central da cidade de Satildeo Luiacutes o setor nordeste

se caracteriza pela presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares nas proximidades dos eixos viaacuterios quase toda aacuterea apresenta caracteriacutesticas rurais e encontra-se comprometida com grandes loteamentos o setor sudeste

eacute caracterizado por vastas glebas com atividades rurais muitos povoados grandes aacutereas institucionais alguns loteamentos e conjuntos habitacionais populares Grande parte deste setor estaacute reservado a atividade industriais onde jaacute se encontram instaladas a maioria das induacutestrias de porte meacutedio de Satildeo Luiacutes O setor sudoeste embora apresente caracteriacutesticas rurais se encontra em fase de transiccedilatildeo com a cessatildeo das terras para o uso industrial Neste setor estatildeo instaladas as grandes induacutestrias o complexo portuaacuterio o Campus Universitaacuterio do Bacanga e a reserva florestal Nas proximidades do centro de Satildeo Luiacutes eacute notada a presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares e aglomeraccedilotildees urbanas com residecircncias de baixo padratildeo assentadas desordenadamente 69 Paulatinamente avanccedilava-se nas ocupaccedilotildees tomando a direccedilatildeo das aacutereas perifeacutericas da capital na proporccedilatildeo em que aumentavam o nuacutemero de famiacutelias vindas do interior do Estado englobando novas caracteriacutesticas ao mapa habitacional da ilha

218

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte PEMAS (2004)

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Portela (2010)

Na aacuterea norte da ilha a interligaccedilatildeo entre o centro e a regiatildeo das praias com a

construccedilatildeo da Ponte Joseacute Sarney marcou a formaccedilatildeo de uma aacuterea nobre da cidade (Satildeo

Francisco Renascenccedila Calhau Ponta D areia Satildeo Marcos Olho D aacutegua) onde os negoacutecios

imobiliaacuterios ganharam grande projeccedilatildeo na deacutecada de 1980 caracterizando-se pela

verticalizaccedilatildeo das construccedilotildees

219

Num periacuteodo de menos de 10 anos abrangendo toda a deacutecada de 1970 foram criados

18 conjuntos habitacionais para atender a procura do segmento social de renda meacutedia

conforme tabela 10

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e Cooperativas 1971-1980

Ano Entidade Financiadora Conjunto Habitacional Nordm de Unidades 1971 Cohab Sacaveacutem 476 1973 Cohab Radional 366 1975 Cooperativa Cohama 700 1976 Cohab Anil IV 1111 1977 Cooperativa Cohapa 41

1978

Cooperativa Cohaserma 364

Cohapam 100

Cohajap 331

Cohatrac I 875

Cohajoli 50 Cohab Bequimatildeo 1190

Vinhais 1627

Hab Turuacute 767

1979

Cohab Rio Anil 365

Angelim 654 Cooperativa Coharev 160

Cohajapa 38 1980 Cooperativa Cohafuma 482

Total 9697 Fonte Luz (2004 p 70)

A partir da deacutecada de 1980 a ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes deu-se de

maneira acelerada e desarticulada Isso porque o governo federal elaborou o Programa de

Desenvolvimento Integrada da Amazocircnia Oriental como uma poliacutetica territorial regional que

visava agrave implantaccedilatildeo de grandes projetos destinados exclusivamente a mineraccedilatildeo

metalurgia agropecuaacuteria e reflorestamento

Durante toda a segunda metade da deacutecada de 1970 especulava-se sobre as profundas transformaccedilotildees estruturais que a capital do Estado atravessaria na qual Satildeo Luiacutes seria o palco de grandes empreendimentos industriais Tal previsatildeo ao passo que fomentava a euforia de grande parcela da populaccedilatildeo carente e desempregada servia ainda de motivaccedilatildeo para o homem do campo

que via uma razatildeo a mais para abandonar sua terra em busca de oportunidades de trabalho (LUZ 2004 p 68)

220

Muitos outros projetos expuseram a Amazocircnia a novos fluxos migratoacuterios O projeto

Carajaacutes por exemplo estabeleceu um poacutelo de desenvolvimento percorrendo o sul do Paraacute ateacute

a cidade de Satildeo Luiacutes no Maranhatildeo Paralelamente a accedilatildeo madeireira serviu e ainda serve

como ponta de lanccedila para outros projetos como os agropecuaacuterios em torno dos quais se

estabeleceu uma arena de conflitos entre agricultores sem terra e grandes latifundiaacuterios Na

consolidaccedilatildeo dos Grandes Projetos e dos latifuacutendios criou-se um ecircxodo rural onde pequenos

agricultores e outros migraram para diferentes locais principalmente para as cidades

amazocircnicas

A implantaccedilatildeo do Programa Grande Carajaacutes (PGC) e a instalaccedilatildeo de grandes

induacutestrias tiveram um grande impacto na cidade provocando um enorme crescimento

populacional aleacutem disso esses projetos foram implantados sem a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo

local natildeo levando em consideraccedilatildeo as peculiaridades econocircmicas sociais e culturais locais e

sem a devida preocupaccedilatildeo com a aplicaccedilatildeo dos recursos financeiros necessaacuterios para

produccedilatildeo de uma infraestrutura que suportasse tal crescimento

Segundo estudos realizados por Castro e Acevedo Marin (1991) e Almeida (1995)

os processos migratoacuterios na Amazocircnia entre as deacutecadas de 1970 e 1980 estiveram fortemente

marcados por intensos fluxos de nordestinos especialmente de maranhenses gauacutechos e

mineiros que contribuiacuteram decisivamente para aumentar o nuacutemero de povoados dos quais

alguns se colocaram como embriotildees de formaccedilatildeo de novos municiacutepios A construccedilatildeo da

Estrada de Ferro na deacutecada de 1980 intensificou a migraccedilatildeo redirecionando os migrantes

nordestinos goianos e mineiros da Transamazocircnica para outras aacutereas do sudeste do Paraacute e

sudoeste do Maranhatildeo O crescimento da populaccedilatildeo atingiu todos os municiacutepios ao longo da

Estrada de Ferro Carajaacutes Cresceu assim a populaccedilatildeo concentrada nas cidades de Marabaacute no

Paraacute Imperatriz e Accedilailacircndia no Maranhatildeo nos antigos povoados de ParauapebasRio Verde

(atualmente cidade de Parauapebas) Km 30 (hoje Curionoacutepolis) e o Km 3 (Eldorado de

Carajaacutes)

situados nas proximidades das aacutereas de lavra da CVRD e dos garimpos

ligados

entre si pela PA-275 e suas vicinais

Heacutebette (2004) em suas investigaccedilotildees ressalta que a aacuterea geograacutefica abrangida pelo

PGC (hidreleacutetrica de Tucuruiacute Poacutelo de Gusa Ferrovia de Carajaacutes

que corta a Ponta da

Madeira a qual atravessa os vales do Parauapebas Itacauacutenas Tocantins Araguaia e corre

paralela aos vales do Pindareacute e do Mearim alcanccedilando a ilha de Satildeo Luiacutes

e exploraccedilatildeo

mineral) sofreu profundas transformaccedilotildees resultantes da pressatildeo de integrar a Regiatildeo Norte

do Paiacutes agrave dinacircmica econocircmica e poliacutetica nacional implementadas a partir dos poacutelos

221

industriais urbanos Aleacutem disso afirma que o PGC exerceu papel redefinidor do aspecto

econocircmico poliacutetico e social da regiatildeo70

Integrar a Amazocircnia ao capitalismo significa inseri-la plena e definitivamente no mercado nacional e internacional nas trocas mediadas pelo dinheiro sob a eacutegide do capital industrial e financeiro Significa transformar seus recursos naturais em valores que pudessem ser incorporados ao circuito das trocas monetaacuterias com a produccedilatildeo industrial nacional e internacional isto eacute se tornar parte integrante da circulaccedilatildeo do capital Isso natildeo podia ser realizado sem a mobilizaccedilatildeo do trabalho que valorize esses recursos (terra mata mineacuterio) isto eacute sem a formaccedilatildeo de um mercado de forccedila de trabalho (HEacuteBETTE 2004 p 62)

Originalmente o PGC foi anunciado como um projeto integrado constituindo o

maior programa de desenvolvimento integrado do mundo que aleacutem da exploraccedilatildeo mineral

incluiacutea projetos agropecuaacuterios silvicultores e de industrializaccedilatildeo Sua implantaccedilatildeo obedeceria

a um zoneamento de acordo com o qual foram definidas as seguintes zonas industriais

Barcarena Marabaacute Serra dos Carajaacutes Satildeo Luiacutes Tucuruiacute e Imperatriz Dos problemas de

ordem fundiaacuteria ficariam encarregados os oacutergatildeos competentes com ecircnfase para o Instituto

Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria (INCRA) Todavia tratou-se de uma integraccedilatildeo

agrave economia capitalista e agrave sociedade burguesa moderna (ALMEIDA 1995)

Vale enfatizar que o PGC ergueu-se como um marco no processo de organizaccedilatildeo do

espaccedilo e definiccedilatildeo do territoacuterio no sudeste paraense e sudoeste maranhense No contraditoacuterio

mega-projeto atuam Estado e iniciativa privada e sob um contexto de avanccedilo de uma nova

etapa do processo de produccedilatildeo capitalista tem conferido agraves empresas multinacionais e

transnacionais hegemonia (CARNEIRO 1994)

Entretanto nota-se que a integraccedilatildeo da fronteira ateacute hoje natildeo proporcionou a

industrializaccedilatildeo capitalista da regiatildeo e que o setor onde se tem dada a acumulaccedilatildeo industrial

e que se desenvolveu foi o da construccedilatildeo (em parte construccedilatildeo habitacional mas sobretudo a

construccedilatildeo de grandes obras puacuteblicas) com a instalaccedilatildeo de grandes firmas construtoras

inclusive de padratildeo internacional (HEacuteBETTE 2004 p 66)

Heacutebette (2004) ressalta que o interesse seletivo do capital se concentrou em torno da

terra da madeira de alguns mineacuterios como manganecircs bauxita e ouro Mas como o interesse

70 O PGC sob responsabilidade da CVRD tinha por objetivo a exploraccedilatildeo das reservas de mineacuterio de ferro ouro e outros minerais em Carajaacutes e dispunha de uma aacuterea geograacutefica que englobava terras situadas entre os rios Amazonas Parnaiacuteba e Xingu ao norte do paralelo 8ordm (oito graus) e compreendia uma aacuterea de cerca de 900 mil kmsup2 incluindo parte do estado do Paraacute Maranhatildeo e Goiaacutes (hoje Tocantins) abrangendo uma proviacutencia mineral extremamente rica e diversificada em recursos (ferro manganecircs cobre bauxita niacutequel ouro) aleacutem disso comporta grande parte da bacia do Araguaia-Tocantins

222

do capital se cruzou com o interesse dos trabalhadores a procura sempre se deu em forma de

uma luta de classes Assim a luta mais conhecida foi pela terra

Dessa forma Castro e Acevedo Marin (1991) argumentam que a luta pela terra eacute

uma questatildeo central quando se analise a realidade social no sudeste do Paraacute uma vez que eacute

marcada por uma dinacircmica econocircmica social e poliacutetica especifica Nessa complexa realidade

competem pelo domiacutenio do espaccedilo e dos recursos naturais atores como empresas de

mineraccedilatildeo (CVRD) pecuaristas Estado madeireiros sem terra assentados posseiros e

garimpeiros Sindicato de Trabalhadores Rurais instituiccedilotildees confessionais

A gestatildeo do territoacuterio de Carajaacutes desvenda a essecircncia logiacutestica dos grandes projetos associados agrave nova ordem cientiacutefico-tecnoloacutegico Carajaacutes eacute um segmento localizado de um conjunto de escala planetaacuteria um espaccedilo transnacional em construccedilatildeo [] Os conflitos e contradiccedilotildees locais e o caraacuteter da gestatildeo da Companhia autocircnoma e baseada no saber teacutecnico-cientiacutefico traduzem-se em dispositivos de controle que fecham o territoacuterio de Carajaacutes transformando-o em verdadeira cidadela (BECKER 1994 p339-340)

Os grupos sociais (sem terra assentados posseiros garimpeiros) foram alijados das

poliacuteticas puacuteblicas e envolvidos em uma luta intensa constituiacuteram uma forccedila de mudanccedila de

forma que organizados ou natildeo ocuparam terras plantaram e deram origem a uma pecuaacuteria

extensiva reestruturando a configuraccedilatildeo espacial

Para muitas famiacutelias ludovicenses a implantaccedilatildeo de grandes complexos industriais

em terras maranhenses iria repercutir como um problema a mais de acordo com o que

Gistelinck (1988 p32) afirma no trecho a seguir

Em 1974 o governo estadual entregou mais de 3000 hectares a CVRD inclusive a praia do Boqueiratildeo a praia dos pescadores e do povo do Anjo da Guarda sem resolver no entanto os problemas habitacionais para os moradores da aacuterea Cinco anos depois mais de 10000 hectares foram entregues a ALUMAR Em torno de 4000 famiacutelias perderam de um dia para o outro o seu sustento da roccedila e da pesca Nos dois casos as famiacutelias foram indenizadas pelas benfeitorias muitas vezes de maneira arbitraacuteria mas natildeo foram criadas novas condiccedilotildees de trabalho adaptados a capacidade da populaccedilatildeo

Tal situaccedilatildeo muito se assemelha ao quadro de desapropriaccedilatildeo de terras das aacutereas do

interior do Estado e que possibilitou a expulsatildeo de inuacutemeras famiacutelias para a capital Com isso

tem-se que os agravantes surgem como desdobramentos da accedilatildeo governamental mal

planejada ou planejada sem considerar os interesses das camadas mais pobres da sociedade

223

Carneiro (1994) sintetiza a disputa pelo controle do territoacuterio na aacuterea de abrangecircncia

do PGC como um palco de transformaccedilotildees ocasionados por conflitos e pelos diferentes

interesses gerados para se definir a gestatildeo do territoacuterio e a resoluccedilatildeo dos interesses contraacuterios

e diversos dos atores presentes no mesmo

Contudo Almeida (1995) adverte que eacute o Estado que impotildee accedilotildees de coerccedilatildeo contra

camponeses na medida em que impulsiona via incentivos fiscais e concessotildees de extensas

aacutereas de terras a grupos empresariais escudados na maior racionalidade econocircmica e

inovaccedilotildees teacutecnicas ocasionando no monopoacutelio da terra nos mecanismos de imobilizaccedilatildeo e

em atos coercitivos como forma de resoluccedilatildeo de conflitos agraacuterios demonstrando a face

autoritaacuteria da modernizaccedilatildeo que tem na violecircncia um elemento inerente agrave disputa pela terra

na fronteira

Nesse sentido a realidade de desorganizaccedilatildeo social que se esboccedilava culminava

inevitavelmente num clima de insatisfaccedilatildeo e protesto reflexo da situaccedilatildeo de crise nacional

em meio ao esgotamento do modelo econocircmico imposto durante o regime militar que se

manifestava na queda do emprego e dos salaacuterios refletindo-se no rebaixamento histoacuterico das

condiccedilotildees de moradia das classes populares em todo o paiacutes

Assim novas tentativas de solucionar o problema habitacional eram implementadas

sem o sucesso esperado pelos oacutergatildeos da administraccedilatildeo puacuteblica Um dos projetos amplamente

propagandeados no final dos anos 1970 foi o PROMORAR que segundo levantamento

realizado pela UFMA em 1981 na eacutepoca de sua implantaccedilatildeo tinha como meta atingir 23

dos habitantes da ilha Sendo que a maioria dessa populaccedilatildeo procedia do interior e 87 tinha

em meacutedia uma renda familiar mensal de dois salaacuterios miacutenimos tratando-se portanto

principalmente de pessoas oriundas do campo desempregadas subempregadas como

biscateiros pedreiros lavadeiras e empregadas domesticas (LUZ 2004)

Os resultados do PROMORAR pouco significaram como soluccedilatildeo do problema habitacional em Satildeo Luis sendo construiacutedas e comercializadas somente 185 unidades habitacionais com baixa qualidade do material utilizado e inuacutemeras deficiecircncias detectadas nas construccedilotildees (LUZ 2004 p57)

Ainda no inicio dos anos 1980 o governo estadual arquitetou a efetivaccedilatildeo de dois

grandes complexos habitacionais para as camadas mais pobres da populaccedilatildeo contando

inclusive com unidades de 01 (um) cocircmodo somente

224

Com a valorizaccedilatildeo das aacutereas nobres foram construiacutedos grandes conjuntos habitacionais tais como a Cidade Operaacuteria (que teve suas obras iniciadas em 1981 numa primeira etapa quando foram levantadas 1500 unidades sendo concluiacuteda em 1987) com 7500 unidades ao todo o Conjunto Jardim Ameacuterica Satildeo Raimundo e o Maiobatildeo (julho82) com 4470 unidades ambos distantes do nuacutecleo central da cidade (16 km e 20 km respectivamente) sendo este uacuteltimo construiacutedo em aacuterea formalmente pertencente ao municiacutepio de Paccedilo do Lumiar (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 98)

Uma das preocupaccedilotildees amplamente mencionadas durante a construccedilatildeo da Cidade

Operaacuteria e do Maiobatildeo eacute que ambas estivessem localizadas perto do receacutem-inaugurado

Distrito Industrial de Satildeo Luiacutes para que houvesse a associaccedilatildeo direta de proximidade entre o

local de trabalho e o trabalhador

Outro poacutelo importante que se formou nos uacuteltimos 30 anos foi ao nordeste da Ilha no

sentido de Satildeo Luiacutes aos Municiacutepios vizinhos de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar Essa

regiatildeo se caracteriza por abrigar uma seacuterie de conjuntos habitacionais populares com alta

densidade populacional

A populaccedilatildeo total de Satildeo Joseacute de Ribamar cresceu a uma taxa anual de 736 saltando de 32320 habitantes em 1980 para 70581 em 1991 O municiacutepio de Paccedilo do Lumiar recebeu tambeacutem um forte impacto populacional evoluindo de pouco mais de 17 mil habitantes em 1980 para 53195 habitantes em 1991 com uma taxa anual de 1080 e crescimento relativo de 22176 (o maior entre os municiacutepios do Estado) (MARANHAtildeO 1997 p 27)

Com esse avanccedilo sobre os espaccedilos vazios da ilha surge uma disparidade gritante em

relaccedilatildeo aos dados populacionais das aacutereas urbana e rural de Satildeo Luis principalmente em

relaccedilatildeo agrave infraestrutura dos novos segmentos habitacionais jaacute que muitos conjuntos e bairros

receacutem inaugurados localizavam-se em regiotildees da zona rural mas mantinham perfil

eminentemente urbano uma vez que atividades primaacuterias natildeo eram neles praticadas ou seja

as periferias de Satildeo Luis natildeo eram ocupadas somente pelas camadas mais pobres mas

tambeacutem conjuntos e bairros eram construiacutedos nos arredores da cidade trazendo consigo todo o

conforto e modernidade para suprir a demanda da classe meacutedia71

A partir da deacutecada de 1990 houve uma consolidaccedilatildeo da tendecircncia que se manifestara

outrora como um surto mas que ganhava agora sintomas de permanecircncia e impressotildees de

71 Com a promulgaccedilatildeo da Lei Orgacircnica do Municiacutepio (LOM) em abril de 1990 foi definido a zona urbana da cidade compreendendo as aacutereas de edificaccedilatildeo contiacutenua das povoaccedilotildees e as partes adjacentes que possuam meio fio calccedilamento abastecimento de aacutegua rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica escola primaacuteria postos de sauacutede e arruamentos (RIBEIRO JUNIOR 2001)

225

descontrole Nesse sentido conveacutem referenciar sobre a continuidade no avanccedilo do

movimento de luta pela posse da terra por meio das ocupaccedilotildees urbanas que saturando as

aacutereas tradicionalmente centrais da cidade ocupavam paulatinamente as periferias a ponto de

adentrar em terras situadas aleacutem das fronteiras da capital do Estado

De 1994 a 2000 inuacutemeras novas ocupaccedilotildees foram criadas em solo ludovicense

marcando um periacuteodo de luta e resistecircncia

aspectos presentes em muitos desses movimentos

de luta pela moradia conforme se constata na argumentaccedilatildeo de Luz (2004 p 78)

Num clima de verdadeira guerra onde a resistecircncia popular tem muitas vezes vencido dando margem agrave formaccedilatildeo de diversos bairros em Satildeo Luiacutes que permanecem precaacuterios por falta de atenccedilatildeo do Estado e do Municiacutepio mas representam a alternativa possiacutevel para aqueles que natildeo podem mais viver no interior

De acordo com Ribeiro Junior (2001) ao se verificar as manchetes de revistas e

jornais da eacutepoca pode-se constatar um amplo panorama da situaccedilatildeo uma vez que a forma

violenta como se desenrolaram os processos de ocupaccedilatildeo explicam a grande repercussatildeo A

exemplo disso tem-se o caso da Cidade Oliacutempica que virou um verdadeiro inferno ontem

pela manhatilde quando a Poliacutecia Militar armada ateacute os dentes invadiu a aacuterea ocupada e

promoveu destruiccedilatildeo espancamentos e prisotildees cenas de horror presenciadas por muitas

crianccedilas que tambeacutem estavam abrigadas na aacuterea

(JORNAL PEQUENO 1997 apud LUZ

2004 p 78)

Esse exemplo chama a atenccedilatildeo entre outros aspectos para um ponto inevitavelmente

discutiacutevel o alarmante deacuteficit de moradias em Satildeo Luiacutes que por sua vez traz como pano de

fundo

a defasagem da estrutura poliacutetica social e econocircmica do Estado Em outras palavras o

que se vecirc na capital maranhense no final do seacuteculo XX traduz-se no descontrole e

incapacidade do Estado em garantir condiccedilotildees de moradia a toda agrave populaccedilatildeo refletindo-se

por meio da proliferaccedilatildeo incontida de ocupaccedilotildees sem a miacutenima infraestrutura

A valorizaccedilatildeo de aacutereas mais proacuteximas do centro da cidade assim como de conjuntos

habitacionais e a consolidaccedilatildeo de aacutereas nobres geraram alta no preccedilo dos alugueacuteis e tornaram

distante para muitos o sonho da casa proacutepria conduzindo as populaccedilotildees de menor poder

aquisitivo cada vez mais para longe do Centro da Ilha

Nesse sentido vai se formando gradualmente uma seacuterie de pequenos

estabelecimentos como quitandas oficinas e lojas que servindo de base de sustento para

inuacutemeras famiacutelias ajudam a compor o quadro espacial dos bairros pobres de Satildeo Luiacutes

226

As atividades alternativas que geralmente se apresentam ao pobre desempregado e

desqualificado natildeo datildeo muitas opccedilotildees de escolha estando o setor do comeacutercio informal entre

as ocupaccedilotildees mais comuns conforme afirma Diniz (2005 p81)

O grande crescimento do setor terciaacuterio informal da economia maranhense deve-se a diversos fatores entre os quais a facilidade de acesso a esse tipo de atividade pois se trata de um negoacutecio que natildeo requer grandes investimentos tampouco necessita de matildeo-de-obra especializada assim como os produtos oferecidos nesse mercado tem boa aceitaccedilatildeo pelos consumidores que na maioria satildeo de classe baixa soacute tendo acesso muitas das vezes a esse tipo de comeacutercio

Principalmente ao longo da deacutecada de 1990 assistiu-se a efetiva incorporaccedilatildeo do

universo das ocupaccedilotildees urbanas ao cotidiano social ludovicense A ocorrecircncia desse

fenocircmeno fez surgir novas linhas de transporte coletivo obedecendo a uma demanda

crescente de usuaacuterios nas aacutereas perifeacutericas

A partir desse quadro do processo de ocupaccedilatildeo territorial de Satildeo Luiacutes pode-se

perceber que nos uacuteltimos anos o Municiacutepio sofreu um acelerado processo de espraiamento

urbano com o consequumlente inchaccedilo populacional levando ao comprometimento da qualidade

do seu espaccedilo urbano

Assim em meio agrave proliferaccedilatildeo de ocupaccedilotildees em direccedilatildeo a periferia da cidade a

organizaccedilatildeo espacial ludovicense convergia para a instabilidade na medida em que a falta de

planejamento espacial gradativamente gerava consequumlecircncias diversas a sociedade

evidenciando o descontrole da situaccedilatildeo por parte da administraccedilatildeo puacuteblica

Nesse sentido levando em consideraccedilatildeo o alto iacutendice de crescimento populacional da

grande Satildeo Luiacutes assim como o conjunto de mudanccedilas em sua organizaccedilatildeo espacial articulou-

se a consolidaccedilatildeo de um perfil soacutecio-econocircmico numa tentativa de sintonia com os padrotildees de

modernidade do mundo capitalista Tal perspectiva pode ser comprovada na evidecircncia da

velha dualidade entre ricos e pobres bairros nobres e ocupaccedilotildees de submoradias sendo esse

aspecto considerado por Ribeiro Junior (2001 p 94) como fator de segregaccedilatildeo em funccedilatildeo da

organizaccedilatildeo dos referidos conjuntos como se refere no trecho a seguir

Cinde-se como de praxe o habitat para os ricos e o habitat para as pobres no complexo urbano revelando-se a estratificaccedilatildeo contida na anaacutelise de Freyre aquele dos Sobrados e Mucambos em equivalecircncia ao existente no rural onde vingavam Casas Grandes e Senzalas unidades pertencentes ao sistema organizacional da civilizaccedilatildeo tropical brasileira contrastante socialmente

227

O crescimento residencial agrave direita do rio Anil (aacuterea da orla mariacutetima) se deu

predominantemente por conjuntos habitacionais de classe meacutedia e meacutedia alta (Satildeo Francisco

Renascenccedila Ponta D Areia Calhau Cohafuma etc) separados por enormes vazios em

virtude da existecircncia de vastos manguezais Nessa regiatildeo inclusive foi localizado o novo

poacutelo administrativo do Governo Estadual com a transferecircncia de diversos oacutergatildeos da

administraccedilatildeo puacuteblica que estavam no centro histoacuterico Do mesmo modo foram instalados

modernos edifiacutecios residenciais shoppings centers e uma seacuterie de serviccedilos

escolas e

universidades particulares comeacutercio especializado etc

para atender essa classe meacutedia que

ali se instalou Atualmente essa eacute a aacuterea de maior dinamismo imobiliaacuterio e econocircmico da

cidade (DINIZ 2007)

Logo se tecircm que a concentraccedilatildeo urbana historicamente composta pelo distrito

central de Satildeo Luiacutes e pelo distrito do Anil era gradativamente suplantada pela acelerada

formaccedilatildeo de nuacutecleos e povoados nos arredores da cidade aproximando-se de maneira

acelerada da fronteira de outros municiacutepios da ilha segundo se observa nos dados de Perfil do

Maranhatildeo (1997 p 27) abaixo

A anaacutelise do Censo Demograacutefico de 1991 segundo a situaccedilatildeo do domicilio permite determinar que a ocupaccedilatildeo da aacuterea urbana de Satildeo Luis jaacute teria alcanccedilado seu ponto de saturaccedilatildeo redirecionando a processo a de ocupaccedilatildeo do territoacuterio para aacutereas rurais do interior da ilha envolvendo os municiacutepios de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar O comportamento da taxa de crescimento populacional desses municiacutepios reitera de modo incontestaacutevel essa tendecircncia enquanto a populaccedilatildeo urbana de Satildeo Luis diminuiu registrando um decliacutenio relativo de 042 sua populaccedilatildeo rural cresceu 12269 passando de 292144 em 1980 para 450158 habitantes em 1991

Atualmente a urbanizaccedilatildeo em Satildeo Luis incrementou ainda mais o processo de

pauperizaccedilatildeo de um grande contingente populacional negando a inserccedilatildeo desse contingente

no mercado formal de trabalho mas ao mesmo tempo transformou os pobres em

consumidores de alimentos e roupas industrializadas de mercadorias eletrocircnicas como raacutedios

e televisores e de serviccedilos puacuteblicos ou privados de transportes energia educaccedilatildeo e sauacutede

Vale destacar que um fator relevante em meio ao processo de ocupaccedilotildees

habitacionais e a iniciativa do poder puacuteblico no intuito de acabar com esse problema eacute que

aleacutem dos impasses burocraacuteticos e o eminente fracasso por falta de planejamento adequado dos

planos de reforma nas moradias o constante crescimento dessas sub-habitaccedilotildees impedia um

alcance maior e definitivo dos projetos jaacute que novos terrenos eram ocupados constantemente

228

formando novos nuacutecleos de palafitas concluindo-se entatildeo que a soluccedilatildeo seria muito mais

estrutural mais orgacircnica e menos paliativa

Outro fator relevante eacute que o espaccedilo urbano de Satildeo Luis assim como em outras

cidades brasileiras organiza-se em funccedilatildeo do preccedilo do solo Os terrenos urbanos tecircm seu

preccedilo regulado pela lei da oferta e da procura assim seus altos preccedilos de venda ou de locaccedilatildeo

selecionam uma clientela restrita empurrando todos os demais pretendentes para terrenos pior

localizados que tecircm preccedilos inferiores

A especulaccedilatildeo imobiliaacuteria vem interferindo de maneira agressiva no processo de

ocupaccedilatildeo e expansatildeo espacial da cidade de Satildeo Luiacutes estabelecendo um novo padratildeo com a

transferecircncia de aacutereas residenciais de alto padratildeo para o subuacuterbio As classes meacutedias e altas

movem-se para condomiacutenios distantes mas equipados com infraestrutura urbana e complexos

comerciais Parque Shalon Ponta do Farol Cohajap Parque Amazonas Santos Dumont

Parque Timbira Cohajoli Jardim dos Faraoacutes Renascenccedila I e II Cohafuma Recanto dos

Vinhais Parque dos Nobres Parque das Bandeiras (DINIZ 2007)

Segundo Diniz (2007) o fenocircmeno das ocupaccedilotildees tornou-se uma constante no dia-a-

dia o surgimento das vilas

a favela maranhense Um sem nuacutemero de terrenos puacuteblicos e

particulares foram e estatildeo sendo precariamente ocupados Vila Cafeteira Vila Itamar Vila

Isabel Vila Mauro Fecury Vila Pavatildeo Filho Vila Kiola Vila Jacarati Vila Brasil Vila

Janaiacutena Vila Santa Clara Jardim Tropical Divineacuteia Satildeo Bernardo Vila Cascavel Todos

esses bairros na aparecircncia satildeo formados por barracos e mocambos construiacutedos com material

de refugo como caixotes taacutebuas soltas folhas de zinco ou satildeo habitaccedilotildees construiacutedas de

palha taipa e adobe

Nessas localidades a pobreza e o aspecto caoacutetico satildeo visiacuteveis Os serviccedilos puacuteblicos

estatildeo ausentes o arruamento eacute desordenado a aacutegua eacute apanhada em uma bica proacutexima ou

atraveacutes de ligaccedilotildees clandestinas a luz eleacutetrica eacute conseguida com o prolongamento dos fios de

um barraco a outro os esgotos satildeo depositados a ceacuteu aberto a coleta de lixo eacute inexistente

(LUZ 2004)

No bojo das contradiccedilotildees e dos conflitos Satildeo Luiacutes se dinamiza estabelece um

processo mais acelerado de urbanizaccedilatildeo A cidade se expande multiplicando a populaccedilatildeo

marginalizada que natildeo podendo comprar terrenos e imoacuteveis deixa a periferia em constante

expansatildeo

229

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA EXCLUSAtildeO SOCIAL SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

Diante do exposto nos capiacutetulos anteriores pode-se afirmar que as estruturas urbanas

das cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes sofreram fortes impactos com a ocupaccedilatildeo da regiatildeo

Amazocircnica e com as perspectivas do capitalismo sob a oacutetica de integraacute-las economicamente a

outras regiotildees do paiacutes por meio das construccedilotildees dos eixos rodo e ferroviaacuterios principalmente

com a mineraccedilatildeo e com os investimentos nos projetos industriais consolidados nos governos

militares repercutindo assim na configuraccedilatildeo soacutecioespacial

Nesse sentido baseado na loacutegica capitalista concentrador e excludente o

desenvolvimento urbano adotado nessas duas cidades amazocircnicas influenciou na estruturaccedilatildeo

do espaccedilo urbano expressando-se em uma forma de apropriaccedilatildeo desigual do mesmo o que

acarretou em um processo de segregaccedilatildeo espacial com a exclusatildeo de grandes aacutereas de

habitaccedilatildeo de padrotildees urbaniacutesticos de habitabilidade aceitaacuteveis Esses espaccedilos produzidos no

mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo

e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e

densificaccedilatildeo

Conforme observado por Correcirca (1989) visto no capiacutetulo II desta tese o espaccedilo

urbano s0 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm(s)09187 0 0 -0071Tj( )Tj009187 0 0 -0095187 0 0 -00918000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm2F1 2048 Tf009187 0 0 78 Tm7 0 0 -009187 7539 6809 Tm(t)Tj 0 0(s)Tj( )Tj009187 0 0 -0(r)3 7133 Tm2F1 2048 Tf0091875640 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -07810 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2i2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2E3a

230

Essa configuraccedilatildeo indicada natildeo por um marco legal no territoacuterio mas pela

apreensatildeo do espaccedilo urbano ante aqueles que nele interagem representa a produccedilatildeo de uma

apropriaccedilatildeo do real pelo homem enquanto sujeito situado

Segundo Bourdieu (2001) existe com efeito uma correlaccedilatildeo entre as posiccedilotildees

ocupadas pelos agentes sociais no espaccedilo social e a posiccedilatildeo que ocupam no espaccedilo fiacutesico

Este eacute inclusivamente um fator simboacutelico importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do

proacuteprio posicionamento social dos atores Estes tecircm uma posiccedilatildeo mais ou menos prestigiada

consoante ocupem espaccedilos mais ou menos valorizados e pela distacircncia que as separa uns dos

outros

A existecircncia destes espaccedilos sociais como espaccedilos de exclusatildeo de certas camadas da

populaccedilatildeo acaba por contribuir como um dos elementos definidores do modo de vida das

apreciaccedilotildees e representaccedilatildeo social e da forma como os atores sociais das cidades estudadas

encaminham as suas vivecircncias biograacuteficas e estrateacutegias de vida

Eacute na produccedilatildeo das favelas em terrenos puacuteblicos ou privados invadidos que os grupos sociais excluiacutedos tornam-se efetivamente agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito de outros agentes A produccedilatildeo desse espaccedilo eacute antes de mais nada uma forma de resistecircncia e ao mesmo tempo uma estrateacutegia de sobrevivecircncia Resistecircncia e sobrevivecircncia agraves diversidades impostas aos grupos sociais receacutem expulsos do campo ou provenientes de aacutereas urbanas agraves operaccedilotildees de renovaccedilatildeo que lutam pelo direito agrave cidade Resistecircncia e sobrevivecircncia que se traduzem na apropriaccedilatildeo de terrenos usualmente inadequados para outros agentes da produccedilatildeo do espaccedilo encostas iacutengremes e aacutereas alagadiccedilas (CORREcircA 1989 p 30)

Vale destacar tambeacutem que a ineficaacutecia na execuccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas para as

demandas relacionadas ao crescimento urbano fez evidenciar as diferenccedilas sociais na

paisagem urbana na constante disputa pelos melhores espaccedilos que aumentando a demanda

diminuiu a oferta ocasionando no encarecimento do uso do solo nas cidades promovendo

assim elevadas especulaccedilotildees pelas construtoras e empresas imobiliaacuterias

A atividade imobiliaacuteria reflete o papel do espaccedilo tanto como fonte de criaccedilatildeo quanto de realizaccedilatildeo de mais-valia eacute realmente impeacutervia aos ciclos de acumulaccedilatildeo de capital exceto no tocante a mudanccedilas em suas formas de investimento (digamos da habitaccedilatildeo suburbana para os edifiacutecios de escritoacuterios e shopping centers na cidade) e representa um processo mais fundamental da criaccedilatildeo da riqueza [] Os especuladores portanto constituem a vanguarda da expansatildeo metropolitana (GOTTDIENER 1993 p 245-246)

231

Sendo assim como foi ressaltado nos toacutepicos anteriores o processo de ocupaccedilatildeo nas

aacutereas perifeacutericas das cidades estudadas pela populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo acentuou as

contradiccedilotildees do sistema capitalista inseridas no contexto das desigualdades sociais

construiacutedas dentro de uma realidade social mais ampla natildeo fugindo das anaacutelises do processo

acelerado da urbanizaccedilatildeo brasileira a qual estaacute embasada na loacutegica da globalizaccedilatildeo

configurada uma revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional determinando natildeo somente as

relaccedilotildees poliacuteticas mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees

sociais e culturais

Os efeitos dessa mundializaccedilatildeo do capital acentuam as diferenccedilas sociais afetando

diretamente as expressotildees da questatildeo social as quais podem ser definidas no acircmbito do modo

capitalista de produccedilatildeo na contradiccedilatildeo capital x trabalho como as expressotildees do processo de

formaccedilatildeo e desenvolvimento da classe operaacuteria e de seu ingresso no cenaacuterio poliacutetico da

sociedade exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado

Eacute a manifestaccedilatildeo no cotidiano da vida social da contradiccedilatildeo entre o proletariado e a

burguesia a qual passa a exigir outros tipos de intervenccedilatildeo mais aleacutem da caridade e

repressatildeo (CARVALHO IAMAMOTO 1983 p 77)

Destarte essas transformaccedilotildees repercutiram em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes assim como

em outras cidades brasileira que permeadas das contradiccedilotildees e de desigualdades sociais satildeo

frutos dos deacuteficits sociais acumulados por deacutecadas de governos descomprometidos com os

interesses da maioria da populaccedilatildeo

Nessas cidades se produz e reproduz as desigualdades sociais por meio de um

intenso processo de precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida com o crescimento do desemprego e

do trabalho informal (sem seguridade social) que somados agrave maneira como as cidades foram

constituiacutedas expotildeem as famiacutelias e indiviacuteduos a situaccedilotildees de risco e vulnerabilidades sociais

O cerceamento do acesso aos bens da cidadania relacionados ao emprego aos serviccedilos de proteccedilatildeo social e tambeacutem ao aumento da violecircncia que levam a uma fragilizaccedilatildeo da cidadania entendida como perda ou ausecircncia de direitos e como precarizaccedilatildeo de serviccedilos coletivos O crescente processo de favelizaccedilatildeo o empobrecimento da populaccedilatildeo o desemprego e o trabalho informal satildeo expressotildees da vulnerabilidade urbana no Brasil (KOWARICK 1988 p 15)

A grande maioria da populaccedilatildeo convive com a inseguranccedila social e de renda com a

falta de acesso a equipamentos e serviccedilos puacuteblicos com moradias precaacuterias e distantes do

trabalho Agrave exemplo disso tem-se as duas cidades estudadas as quais apresentam um

232

crescimento populacional baseado na expansatildeo perifeacuterica e no espraiamento da mancha

urbana aleacutem de renda per capita inferior a meacutedia nacional cujo valor eacute de R$ 50000

conforme tabela 11

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

2010

Municiacutepio

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Valor do rendimento nominal mediano mensal domiciliar per capita dos domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Urbana

Rural

Urbana

Rural

Beleacutem

351078

348191

2887

42200

42500

20800

Satildeo Luis

265175

251726

13449

40000

40400

25000

Fonte IBGE (2010)

Os dados demonstram que a renda per capita de Beleacutem (R$ 42200) mesmo inferior

a meacutedia nacional apresenta 55 a mais que a de Satildeo Luis Vale destacar que os programas

habitacionais adotam uma loacutegica que contribui para a concentraccedilatildeo de renda no paiacutes uma vez

que a maior parte dos recursos satildeo dirigidos para as faixas salariais acima de 4 salaacuterios

miacutenimos o que dificulta o acesso das famiacutelias com baixo poder aquisitivo a esses programas

habitacionais e contribui para o aumento do deacuteficit habitacional a exemplo pode-se citar o

Programa Minha Casa Minha Vida Esse quadro eacute revelador das diferenccedilas das desigualdades

sociais e do modelo concentrador de riquezas e poder que fazem parte da formaccedilatildeo histoacuterica

do Paiacutes

De acordo com Harvey (2005) esse processo interdita a efetivaccedilatildeo do direito agrave

cidade principalmente para os mais pobres que satildeo expulsos para locais cada vez mais

distantes pois natildeo possuem meios para acessar os melhores espaccedilos urbanos O

neoliberalismo provocou depressotildees salariais que aprofundaram esse processo de interdiccedilatildeo

do direito agrave cidade Poreacutem o simples aumento dos ganhos salariais no interior da loacutegica do

capital natildeo resolve esse problema Esses aumentos salariais incorporaram os mais pobres na

economia da diacutevida por meio do mercado imobiliaacuterio

Nesse sentido a desigualdade social existente no Paiacutes eacute estrutural e histoacuterica

alicerccedilada no modelo adotado de capitalismo dependente Dessa maneira eacute balizada pela

visatildeo conservadora de que essa distribuiccedilatildeo desigual eacute um fato natural como resultado do

233

fracasso individual de muitos e sucesso individual de poucos e natildeo como produto da forma

como se organiza a sociedade e pelo modelo de exclusatildeo social

Bonduki (1997) argumenta que a desigualdade social tem suas causas nas formas

com que se organizou a sociedade em particular na maneira com que se construiu o Estado

brasileiro marcado pelo patrimonialismo no qual se confundem o interesse puacuteblico e o

privado nas dinacircmicas de exploraccedilatildeo do trabalho impostas pelas elites dominantes desde a

colocircnia e principalmente no contexto absoluto dessas elites sobre o processo de acesso agrave

terra tanto rural quanto urbana

Sendo assim quando se discute a questatildeo habitacional nas cidades amazocircnicas haacute

que se levar em consideraccedilatildeo que natildeo eacute um fato isolado do restante do paiacutes e que estaacute

associado ao processo de urbanizaccedilatildeo no qual as grandes meacutedias e pequenas cidades

brasileiras foram submetidas aleacutem das poliacuteticas desenvolvidas pelo Estado que contribuiacuteram

para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Caldeira (2000) identifica trecircs formas de segregaccedilatildeo enquanto padratildeo de

diferenciaccedilatildeo e separaccedilatildeo espacial na primeira forma de expressatildeo os diferentes grupos

sociais se comprimem no espaccedilo da cidade e se diferenciam pelo tipo de moradia a segunda

apresenta a distacircncia como variaacutevel de separaccedilatildeo espacial de ricos e pobres materializando a

relaccedilatildeo centro-periferia Por fim os espaccedilos segregados fortificados por muros e sistemas

diversos de seguranccedila concentrando em geotipos de padratildeo meacutedio e alto as expectativas de

lazer consumo trabalho e residecircncia justificado pelo medo da violecircncia urbana Isto eacute o que

a autora chama de enclaves fortificados tendo como exemplo os modernos condomiacutenios

A segregaccedilatildeo espacial para Castells (1983) eacute compreendida pela agregaccedilatildeo do

espaccedilo em zonas de forte homogeneidade social interna onde predominam as disparidades

entre elas as quais se processam tanto em termo de diferenccedila como em hierarquia Dentro

desta forte homogeneidade social a segregaccedilatildeo eacute entendida como sendo a divisatildeo espacial de

uma determinada populaccedilatildeo em aacutereas especiacuteficas que permitem entendecirc-las e destituiacute-las da

sua composiccedilatildeo social das demais aacutereas de seu entorno

Para Lojkine (1981) a segregaccedilatildeo social eacute analisada pelas contradiccedilotildees existentes

entre o centro (que concentra o trabalho intelectual e o comando) e as zonas perifeacutericas (que

se caracterizam como lugar da execuccedilatildeo das leis e atividades que derivam do centro)

Analisando ambos os autores constata-se que a segregaccedilatildeo eacute a expressatildeo soacutecioespacial do

modo de produccedilatildeo capitalista que fragmenta e ao mesmo tempo articula os espaccedilos O

espaccedilo urbano capitalista neste processo passa a ser o lugar concreto da manifestaccedilatildeo e

articulaccedilatildeo do modo de produccedilatildeo capitalista

234

Villaccedila (2001) compreende a segregaccedilatildeo como sendo o processo pelo qual as

camadas de renda elevada se concentram em determinadas regiotildees buscando com isto

privileacutegios em atrair os equipamentos urbanos para a regiatildeo segregada

Trazendo as consideraccedilotildees sobre as regiotildees metropolitanas de Villaccedila (2001) para as

cidades onde a condominizaccedilatildeo estaacute cada vez mais presente pode-se afirmar que essa

concentraccedilatildeo se daacute numa nova escala que natildeo eacute nem a regiatildeo geral e nem um bairro mas sim

o condomiacutenio fechado

O que ocorre com os condomiacutenios fechados eacute que se localizam nas periferias urbanas

e convivem muitas vezes com uma vizinhanccedila mais pobre economicamente Neste sentido

Villaccedila (2001) coloca que natildeo existe presenccedila exclusiva de camadas de alta renda em uma

determinada regiatildeo A segregaccedilatildeo natildeo impede a presenccedila e o crescimento de outras camadas

no mesmo espaccedilo

Dessa maneira as abordagens sobre segregaccedilatildeo soacutecioespacial aqui definidas satildeo

oriundas de um processo dialeacutetico ou seja eacute uma soacute independente do contexto a que ela se

refere derivando da luta de classes na qual ao vencedor

cabem as melhores parcelas do

espaccedilo urbano

Cabe entatildeo destacar o estrateacutegico papel das cidades para a consolidaccedilatildeo do capital

enquanto modelo de sociedade Nesta dinacircmica natildeo soacute o acesso ao solo eacute disputado como

tambeacutem o seu valor eacute definido Assim sendo a cidade eacute tambeacutem um complexo mecanismo de

exploraccedilatildeo e exclusatildeo social na qual todos os aspectos da vida social satildeo afetados pelo

desenvolvimento do capitalismo e manifestam seu caraacuteter desigual no processo de

urbanizaccedilatildeo

A respeito disso Harvey (2005) argumenta que nesse novo contexto as grandes

cidades tornaram-se aacutereas estrateacutegicas para investimento privados especialmente quando

concentradoras de funccedilatildeo uacuteltima geraccedilatildeo associados ao capital financeiro agrave comunicaccedilatildeo e a

tomada de decisotildees bem como agrave cultura ao entretenimento e ao turismo

A dinacircmica de investimentos de capitais na produccedilatildeo e comercializaccedilatildeo de espaccedilos

urbanos e a conformaccedilatildeo da economia da diacutevida revelam a crescente mercantilizaccedilatildeo da

cidade que desembocou na crise global atual [] Os impactos dessa crise estatildeo sendo

profundamente desiguais As execuccedilotildees hipotecaacuterias causadas por inadimplecircncias afetam

principalmente os mais pobres que vivem nas partes mais precaacuterias e antigas das cidades

americanas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Na conferecircncia Alternativas ao Neoliberalismo e o Direito agrave Cidade Harvey

(2009) apresentou um mapa da cidade de Cleveland nos Estados Unidos que mostra as aacutereas

235

onde se concentram as execuccedilotildees hipotecaacuterias e os locais de moradia da populaccedilatildeo afro-

americana de Cleveland Essa populaccedilatildeo eacute a maioria dentre os 2 milhotildees de norte-americanos

que perderam suas casas com a crise Segundo ele a crise atual eacute um furacatildeo Katrina

financeiro Como o furacatildeo que arrasou New Orleans em 2005 e afetou principalmente os

bairros mais pobres os impactos da crise urbana e financeira atual recaem sobre os grupos

sociais mais vulneraacuteveis

Contraditoriamente a injeccedilatildeo de recursos puacuteblicos eacute mais para salvar o sistema financeiro e resgatar os agentes do capital do que para garantir os direitos sociais prejudicados pelos efeitos da crise Os bocircnus obtidos pelos altos executivos das instituiccedilotildees financeiras que quebraram e receberam ajuda governamental chegam agrave casa das centenas de bilhotildees de doacutelares e superam em muito os recursos puacuteblicos usados para ajudar aqueles que perderam suas casas Em muitos locais as casas hipotecadas que foram confiscadas satildeo utilizadas em pacotes financeiros e natildeo em poliacuteticas puacuteblicas voltadas para garantir o direito aacute cidade e agrave moradia digna (HARVEY 2009 natildeo paginado)

E conclui dizendo que eacute preciso empreender novas lutas pelo direito agrave cidade pois

as crises sistecircmicas atuais natildeo representam o fim do neoliberalismo

Os governos atuam para proteger as instituiccedilotildees financeiras a qualquer custo Natildeo atuam para efetivar direitos e garantir o bem estar das pessoas [] Diante do dilema de ajudar os bancos e ajudar as pessoas que perderam suas casas os recursos puacuteblicos satildeo usados para salvar os bancos Esses recursos deveriam ser usados para criar um banco de desenvolvimento urbano voltado para financiar poliacuteticas urbanas e habitacionais que fortaleccedilam os direitos a cidades justas democraacuteticas e sustentaacuteveis e moradias dignas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Corroborando com essa ideacuteia Ozoacuterio (sd p 5) enfatiza que o espaccedilo urbano estaacute

subordinado agraves poliacuteticas de modernizaccedilatildeo de ocupaccedilatildeo e de segmentaccedilatildeo uma vez que

[] a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de saneamento e embelezamento que expulsar

236

formam um mercado proacuteprio de negociaccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de lotes nas ocupaccedilotildees onde

aparece a figura de um liacuteder que comanda organiza e planeja a accedilatildeo dos agentes sociais

Evidencia-se tambeacutem uma estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais

estabelecendo uma rede complexa de procedimentos legaisilegais que acabam por constituir-

se em um conjunto de normas que regulamentam as transaccedilotildees quanto agraves negociaccedilotildees dos

lotes e edificaccedilotildees (habitaccedilatildeo) estabelecendo assim estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas

tanto do lado do Estado quanto do lado dos agentes sociais

Os dados obtidos na pesquisa de campo revelam que nos uacuteltimos estudos feitos nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes registraram-se 449 e 115 (respectivamente) assentamentos

precaacuterios Estes estudos foram feitos por meio de uma parceria entre a Prefeitura de Beleacutem e o

Instituto IAGUA em Beleacutem e pela Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e

Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) em Satildeo Luiacutes

Segundo Beleacutem (2007) a estrutura urbana reproduz a mesma realidade das grandes

cidades brasileiras onde o fenocircmeno da segregaccedilatildeo social aprofunda cada vez mais a situaccedilatildeo

de desigualdade e precarizaccedilatildeo da vida social de fraccedilotildees das classes trabalhadoras que se

reproduzem no interior de suas aacutereas perifeacutericas

Sendo assim os estratos sociais de renda mais elevada encontram-se em Beleacutem nos

bairros do Comeacutercio do Reduto de Nazareacute e de Batista Campos bem como partes

expressivas dos bairros da Cidade Velha do Umarizal e do Marco Os estratos considerados

meacutedios apresentam forte tendecircncia locacional linearizada situada ao longo da Avenida

Augusto Montenegro ficando o niacutevel mais baixo do gradiente de renda posicionado tanto nas

baixadas e na periferia continental mais distante incluindo-se os nuacutecleos urbanos do Distrito

de Icoaraci das Ilhas de Outeiro Mosqueiro e Cotijuba (PEMAS 2001 apud BELEacuteM 2007)

De acordo com Beleacutem (2007) a maior densidade demograacutefica estaacute nas aacutereas de

baixadas fato que associado agrave baixiacutessima renda per capita e aos elevados contingentes

populacional fazem destas os locais de agudos problemas e carecircncias sociais Entretanto a

demanda mais recente natildeo estaacute concentrada nas aacutereas de baixadas e sim nos setores onde

estatildeo localizadas as moradias verticalizadas ocupadas por estratos sociais de renda meacutedia e

baixa conforme pode ser observado na tabela 12

237

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007

Bairro Assentamentos Marco 10

22

Aacuteguas Lindas 9

20

Aacuteguas Negras 9

20

Agulha 2

04

Auraacute 3

07

Bairro da Brasilia e Satildeo Joatildeo do Outeiro 1

02

Barreiro 14

31

Batista Campos 2

04

Benguiacute 10

22

Cabanagem 11

24

Campina 6

13

Canudos 5

11

Castanheira 5

11

Cidade Velha 5

11

Condor 12

27

Coqueiro 13

29

Cremaccedilatildeo 4

09

Cruzeiro 4

09

Curioacute-Utinga 10

22

Faacutetima 6

13

Guamaacute 18

40

Guanabara 3

07

Icoaraci 15

33

Itaiteua 2

04

Jurunas 9

20

Mangueiratildeo 7

16

Maracacuera 15

33

Maracangalha 4

09

Marambaia 15

33

Outeiro 6

13

Paracuri 17

38

Parque Guajaraacute 16

36

Parque Verde 11

24

Pedreira 11

24

Ponta Grossa 5

11

Pratinha 14

31

Sacramenta 20

45

Santana do Auraacute 2

04

Satildeo Braacutes 2

04

Satildeo Clemente 8

18

Souza 3

07

Tapanatilde 27

60

Telegrafo 7

16

Tenoneacute 19

42

Terra Firme 12

27

Uma 13

29

Val de Cans 3

07

Mosqueiro 23

51

Total 449

1000

Fonte Beleacutem (2007)

238

Em Beleacutem satildeo 146359 domiciacutelios existentes nos 449 assentamentos precaacuterios os

quais estatildeo localizados em 48 bairros dos 71 existentes no municiacutepio Os bairros que

apresentam maior nuacutemero de assentamentos precaacuterios satildeo Tapanatilde Sacramenta Tenoneacute

Guamaacute Paracuri Parque Guajaraacute Icoaraci Maracacuera Marambaia Barreiro Pratinha

Coqueiro Una Condor e Terra Firme Nestes bairros aleacutem de apresentarem problemas

infraestruturais como a falta de saneamento baacutesico haacute uma carecircncia de serviccedilos essenciais

como posto de sauacutede escolas entre outros acarretando no aumento da segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Em Satildeo Luiacutes os assentamentos precaacuterios estatildeo concentrados em duas grandes

regiotildees a aacuterea Itaqui-Bacanga localizada no Sul da ilha e as ocupaccedilotildees ao longo do Rio

Anil72 Nestas duas regiotildees estatildeo concentradas cerca de 60 das aacutereas de subnormalidade

identificadas no levantamento feito em 2000 pela SEMTHURB

De acordo com os dados obtidos na Secretaria pela dinacircmica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo

urbano do municiacutepio a habitaccedilatildeo subnormal acontece em grandes aacutereas pertencentes ao

poder puacuteblico e em aacutereas de terreno baixo e alagadiccedilo A ocorrecircncia de construccedilotildees

precaacuterias barracos e palafitas em aacutereas de mangues e sem infraestrutura eacute bastante presente e

ocasiona graves problemas de sauacutede para a populaccedilatildeo aleacutem de comprometer o meio

ambiente (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Com base no Diagnoacutestico da Capacidade Institucional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

para o Setor Urbano Habitacional (PEMAS 2004) a Secretaria de Planejamento e

Coordenaccedilatildeo Geral de Satildeo Luiacutes realizou em 2002 um levantamento nas Ressacas assim

denominadas as aacutereas de baixada sujeitas a inundaccedilotildees frequumlentes sem as miacutenimas condiccedilotildees

de habitabilidade e constituiacutedas por moradias do tipo palafitas construiacutedas de forma precaacuteria

com madeira de pouca durabilidade com acessos geralmente fraacutegeis e sem estabilidade que

geram situaccedilotildees permanentes de risco sobretudo para as crianccedilas73

Embora natildeo existam dados sistematizados sobre o setor habitacional cabe destacar

que nem todos os assentamentos precaacuterios de Satildeo Luis apresentam situaccedilotildees de risco

precariedade de infraestrutura ou satildeo ocupados por populaccedilatildeo de baixa renda pois segundo a

fala do teacutecnico da SEMTHURB na entrevista concedida em 2009

72 Na Bacia do Rio Anil estaacute localizada a Peniacutensula do Ipase aacuterea selecionada para a intervenccedilatildeo do Programa Habitar Brasil-BID no Subprograma de Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Sub-normais 73 Nas aacutereas que foram ocupadas regularmente a subnormalidade ocorre pela ocupaccedilatildeo de zonas destinadas agrave execuccedilotildees de equipamentos puacuteblicos e aacutereas verdes Haacute ocupaccedilotildees em aacutereas de encosta e sobre linhotildees de transmissatildeo de energia eleacutetrica em alta tensatildeo contudo satildeo situaccedilotildees mais raras

239

A questatildeo fundiaacuteria tem especial peso na definiccedilatildeo da quantidade de assentamentos precaacuterios em funccedilatildeo da peculiaridade do municiacutepio pela sua caracteriacutestica de ilha oceacircnica o municiacutepio tem parcelas importantes do seu territoacuterio caracterizadas como terreno da Uniatildeo e apenas algumas poucas glebas privadas geralmente associadas a antigas sesmarias Existe uma grande quantidade de assentamentos humanos que natildeo satildeo precaacuterios tecircm habitaccedilotildees de bom padratildeo construtivo e acesso a toda infraestrutura mas que satildeo subnormais por conta da irregularidade fundiaacuteria jaacute que ocupam terrenos da Uniatildeo sem a devida legalidade

Conforme apresentado as 115 aacutereas de assentamentos identificadas estatildeo assim

caracterizadas de acordo o diagnoacutestico (PEMAS 2004) e demonstrada no quadro 8

a 76 como favelas sendo 48 assentamentos irregulares e muito precaacuterios

denominados localmente como ocupaccedilatildeo e 28 assentamentos irregulares

ocupados por populaccedilotildees pobres mas jaacute com um niacutevel de consolidaccedilatildeo

denominados localmente como favelas mesmo e

b 39 como outras formas de assentamentos subnormais correspondendo a

assentamentos irregulares de ocupaccedilatildeo espontacircnea caracterizados como

subnormais exclusivamente pela ilegalidade fundiaacuteria jaacute que natildeo satildeo precaacuterios

e estatildeo providos da infraestrutura meacutedia existente na cidade74

74 Nessa estimativa natildeo foram computados dados da populaccedilatildeo residente em corticcedilos pois o Municiacutepio natildeo dispotildee de nenhum estudo que quantifique essas habitaccedilotildees

240

Quadro 8 - Relaccedilatildeo dos Assentamentos Hierarquizados (Satildeo Luiacutes-MA) Item Aacuterea Hierarquia Item Aacuterea Hierarquia

1 Vila Independecircncia 8 59 Sitio do Pica-pau-amarelo 4 2 Vila Roseana COHAFUMA 8 60 Tajaccediluaba 4 3 Vila Mauro Fecury II

8

61 Vila Airton Sena

4

4 IPASE de BaixoApicum 7 62 Vila Ariri 4 5 IPASE de CimaMauro Fecury 7 63 Vila Bacanga 4 6 Irmatildeos Coragem Alemanha

Caratatiua 7 64

Vila Cafeteira 4 7 Vila Bom JesusTravessa Bom

Jesus 7 65

Vila Cristalina 4 8

Vila Satildeo Luis 7 66 Vila dos Nobres Pq

Timbiras 4 9 Vila Verde 7 67 Vila Flamengo 4

10 Japatildeo IPASE de Baixo 6 68 Vila Isabel Bacanga 4 11 Conjunto Rio AnilCabeceira

da ponte

6

69 Vila Itamar

4

12 Vila 25 de Maio Rec Vinhais 6 70 Vila Jackson 4 13 Vinhais Velho 6 71 Vila Jambeiro 4 14 Patildeo-de-Accediluacutecar 6 72 Vila Janaiacutena 4 15 Coroadinho 6 73 Vila Kiola 4 16

Rio do Meio

6

74 Vila Lobatildeo Parque Roseana Sarney

4

17 Salina do Sacaveacutem 6 75 Vila Marinha 4 18

Vila 7 de Setembro 6 76 Vila Menino Jesus de

Praga 4 19 Vila dos Frades 6 77 Vila Natal 4 20 Vila Isabel Cafeteira 6 78 Vila Nice Lobatildeo 4 21 Vila Santa Julia 6 79 Vila Nova Repuacuteblica 4 22 Brasilia do Matadouro 5 80 Vila Padre Xavier 4 23 Camboa 5 81 Vila Pavatildeo Filho 4 24 Feacute-em-Deus 5 82 Vila Primavera 4 25 Fumacecirc 5 83 Vila Riod 4 26 Ilha da Paz

5

84 Vila Satildeo Sebastiatildeo

4

27 Jardim Ameacuterica Aacuterea institucional 5

85 Vila Sarney Filho Distrito Industrial 4

28 Jardim Satildeo Raimundo 5 86 Vila Tancredo Neves 4 29 Liberdade 5 87 Vila Uniatildeo 4 30 Santa Cruz Vera Cruz 5 88 Vila Zeni 4 31 Satildeo Joatildeo da Boa Vista 5 89 Altos do Calhau 4 32 Satildeo Mateus Vila Nova 5 90 Cantinho do Ceacuteu 4 33 Satildeo Raimundo Bacanga 5 91 Divineacuteia 4 34 Tibiri 5 92 Ilhinha Satildeo Francisco 4 35 Vera Cruz

5

93 Joatildeo de Deus

4

36 Vila Cascavel 5 94 Novo Angelim 4 37 Vila Conceiccedilatildeo Coroadinho 5 95 Recanto Fialho 4 38 Vila Embratel 5 96 Satildeo Bernardo 3 39 Vila Mauro Fecury I 5 97 Sol e Mar 3

241

40 Vila Nova 5 98 Vila Brasil 3 41 Vila Palmeira 5 99 Vila Buriti Satildeo Francisco 3 42 Vila Vitoacuteria Sta Baacuterbara 5 100 Vila Conceiccedilatildeo Calhau 3 43

Alto da Esperanccedila Bacanga 4 101 Vila ConceiccedilatildeoJoatildeo de

Deus 3 44 Alto da Esperanccedila Zona Rural 4 102 Vila Cruzado 3 45 Anjo da Guarda 4 103 Vila Fialho 3 46 Barreto 4 104 Vila Luisatildeo 3 47 Bom Jesus 4 105 Vila Magril Sta Baacuterbara 3 48

Cidade Olimpica 4 106 Vila Maruim Igarapeacute da

Jansen 3 49 Gancharia 4 107 Vila Regina 3 50

Jaracati lado direito 4 108 Vila Santo Antonio

Calhau 3 51 Jaracati lado esquerdo

4

109 Argola e Tambor

0

52 Morro do Satildeo Francisco 4 110 Itapera 0 53 Pirapora 4 111 Jardim Tropical 0 54 Primavera Pq Timbiras 4 112 Parque Jair 0 55 Residencial Paraiacuteso 4 113 Rio Grande 0 56 Saacute Viana 4 114 Vila Alegria 0 57 Santa Clara 4 115 Vila Paranatilde 0 58 Santa Efigecircnia 4

Fonte PEMAS (2004) Hierarquia estabelecida segundo criteacuterios de possibilidade de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria insalubridade ou risco de desmoronamento e acessibilidade

Pode perceber a partir desses dados que o problema do deacuteficit habitacional eacute mais

grave nas regiotildees urbanas e uma caracteriacutestica importante dessas aacutereas eacute que boa parte do seu

territoacuterio foi ou eacute ocupado de forma irregular e ilegal Essas praacuteticas ilegais de uso do solo das

cidades acarretam maior vulnerabilidade aos estratos sociais mais pobres pela falta de

seguranccedila da posse

apesar da clareza do texto do Estatuto da Cidade sobre o assunto - tendo

em vista o acesso precaacuterio ou inexistente dessa populaccedilatildeo aos processos poliacuteticos de

governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

A partir dessa perspectiva pode-se considerar essas duas cidades como um espaccedilo

em que se datildeo as questotildees sociais resultantes do atual modo de produccedilatildeo - questotildees que hoje

se apresentam cada vez mais acirradas - sendo espaccedilo de desigualdades conflitos e lutas

Fatos motivados pela sua forma de organizaccedilatildeo espacial histoacuterica cultural social e

econocircmica Como exemplo de suas problemaacuteticas haacute o inchaccedilo populacional o trabalho

informal e as habitaccedilotildees informais que satildeo encobertas pelo discurso do desenvolvimento

econocircmico das cidades

242

A concentraccedilatildeo fiacutesica de usos e atividades e o excesso de verticalizaccedilatildeo nos centros urbanos aliada agrave precariedade de infraestrutura social nas aacutereas de baixada satildeo os mais seacuterios problemas urbanos da cidade Problemas de transporte moradia e saneamento enfrentados pela populaccedilatildeo da cidade satildeo continuamente gerados e agravados pela accedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios e pela falta de medidas eneacutergicas do poder puacuteblico incapaz de interferir no crescimento da cidade Tal crescimento desorganizado afeta a vida de todos os habitantes da cidade repercutindo ainda mais negativamente nas camadas empobrecidas que ocupam as periferias A cidade nas duas uacuteltimas deacutecadas sofre com as mazelas da modernidade e isto pode ser percebido nos congestionamentos de veiacuteculos na diminuiccedilatildeo da circulaccedilatildeo de ar no aumento da temperatura e na desfiguraccedilatildeo do centro histoacuterico Os contrastes entre a aacuterea central e seus arredores se tornam extremamente acentuados o custo de habitar a aacuterea central eacute cada vez mais alto sendo impossiacutevel para as famiacutelias de baixa renda continuar mantendo seus imoacuteveis nessas aacutereas tornando-se alvos faacuteceis para o voraz mercado especulativo (BELEacuteM 2007 p 23)

Nesse sentido a accedilatildeo governamental muitas vezes natildeo tem capacidade de planejar e

se antecipar aos problemas vivenciados no espaccedilo urbano e dessa maneira acaba natildeo

controlando a loacutegica da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria tendo como resultado final o acuacutemulo dos

referidos problemas A ausecircncia dessa accedilatildeo planejadora do poder puacuteblico que tenha como

referecircncia central a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo faz com que esta atuaccedilatildeo

natildeo seja abrangente tornando sua atuaccedilatildeo pontual focalizada ou seletiva e desta forma

descuidando-se totalmente das problemaacuteticas sociais dentre elas a habitacional (BELEacuteM

2007 p 24)

Um agente urbano que se destaca nesse processo eacute o Estado como regulador ou

produtor de uma poliacutetica urbana e habitacional de massa que de fato nunca existiu como

tampouco existiram as condiccedilotildees para que o capital investisse de forma sistemaacutetica em

habitaccedilatildeo popular A ilegalidade fruto da desigualdade extrema eacute explicada pela necessidade

de moradia e de deacutecadas de omissatildeo do poder puacuteblico na produccedilatildeo fordista Cria-se assim

uma vinculaccedilatildeo clara entre uma determinada ordem urbaniacutestica relaccedilotildees de propriedade

privada e o mercado imobiliaacuterio formal

Uma das ironias dessa trageacutedia cotidiana eacute que exatamente aquele saber teacutecnico que poderia ser usado para democratizar o acesso da populaccedilatildeo mais necessitada a condiccedilotildees mais dignas de habitabilidade acaba por produzir cada vez maior elitizaccedilatildeo e exclusatildeo Se eacute clara a relaccedilatildeo entre cidade formal e relaccedilotildees mercantis sua antiacutetese natildeo eacute verdadeira ou seja a cidade informalmente construiacuteda eacute tambeacutem eacute palco de um ativo mercado imobiliaacuterio (BUARQUE 1999 p 148)

243

Entretanto Buarque (1999) ressalta que a gestatildeo urbana no Brasil contemporacircneo

vem sendo marcada pela confluecircncia de duas forccedilas por um lado pela racionalidade do

planejamento e da regulaccedilatildeo herdada do modernismo formalmente constituiacuteda pelo Estado

eou pelo mercado imobiliaacuterio Por outro lado pela radicalidade das demandas por condiccedilotildees

baacutesicas de urbanidade e reproduccedilatildeo representadas pelos movimentos sociais organizados

As poliacuteticas puacuteblicas podem ser implementadas com o intuito de efetivar o alcance

do direito agrave moradia digna e a maioria das iniciativas do poder puacuteblico poderatildeo estar baseadas

na garantia da propriedade A funccedilatildeo social da propriedade eacute usada como fundamento na

formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas que buscam promover o direito agrave propriedade para

proporcionar habitaccedilotildees Assim o reconhecimento da moradia como um direito humano eacute de

suma importacircncia para a valorizaccedilatildeo deste direito e para a criaccedilatildeo de estrateacutegias eficientes de

seguranccedila da posse

As poliacuteticas puacuteblicas de renovaccedilatildeo urbana das cidades constituem-se no principal

propulsor para mudanccedila da paisagem e de vida das classes populares residente Entretanto a

urbanizaccedilatildeo do espaccedilo ao causar uma nova dinacircmica na cidade leva tambeacutem a criar

movimentos de enfrentamento diante do Estado por parte dos envolvidos na busca de

minimizar as carecircncias urbanas

De acordo com os princiacutepios da Reforma Urbana a cidade pode ser planejada a partir

da anaacutelise das desigualdades e dos direitos sociais nos quais os conflitos urbanos satildeo vistos

como uma expressatildeo poliacutetica das condiccedilotildees gerais da estrutura socioeconocircmica

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se em

uma das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

A luta de classe se daacute em torno do poder de Estado que vai garantir a unidade de formaccedilatildeo social isto natildeo quer dizer contudo que os centros do poder as diversas instituiccedilotildees de caraacuteter econocircmico poliacutetico militar cultural etc sejam simplesmente instrumentos oacutergatildeos ou apecircndices do poder das classes sociais Eles possuem a sua autonomia e especificidade estrutural que enquanto tal natildeo pode ser redutiacutevel a uma anaacutelise em termos de poder (ABELEacuteM 1989 p 13)

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades

socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de

injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente

criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em

244

determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o

Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e

mobilizaccedilatildeo da sociedade civil

O Estado capitalista eacute a relaccedilatildeo social em que se condensam as contradiccedilotildees do modo de produccedilatildeo capitalista e as lutas sociais que delas suscitam A funccedilatildeo poliacutetica geral do Estado consiste em dispersar essas contradiccedilotildees e essas lutas de modo a mantecirc-las em niacuteveis tensionais funcionalmente compatiacuteveis com os limites estruturais impostos pelo processo de acumulaccedilatildeo e pelas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo em que ele tem lugar Natildeo se trata portanto de resolver (superar) as contradiccedilotildees sociais ao niacutevel de estrutura profunda da formaccedilatildeo social em que elas se produzem mas antes de mantecirc-las em estado de relativa latecircncia mediante accedilotildees dirigidas agraves tensotildees problemas questotildees sociais porque as contradiccedilotildees se

manifestam ao niacutevel da estrutura de superfiacutecie de formaccedilatildeo social (SANTOS 1996 p 15-16)

Cabe ressaltar que a gestatildeo urbana pode ser definida aqui como um conjunto de

instrumentos atividades tarefas e funccedilotildees que visam assegurar de modo eficiente eficaz e

com efetividade as accedilotildees que proporcionaratildeo um bom funcionamento da cidade Visa

tambeacutem garantir natildeo somente a administraccedilatildeo da cidade como tambeacutem a oferta dos serviccedilos

urbanos baacutesicos e necessaacuterios para que a populaccedilatildeo e os vaacuterios agentes privados puacuteblicos e

comunitaacuterios muitas vezes com interesses opostos possam desenvolver e maximizar suas

atuaccedilotildees de forma que possibilitem o uso do solo sem exclusatildeo ou segregaccedilatildeo social

[] o sistema institucional e arquitetura organizacional adequados e necessaacuterios para implementar a estrateacutegia e o plano de desenvolvimento local sustentaacutevel mobilizando e articulando os atores (organizaccedilotildees da sociedade) e os agentes (instacircncias puacuteblicas) com seus diversos instrumentos e assegurando a participaccedilatildeo da sociedade no processo para a execuccedilatildeo e o acompanhamento das accedilotildees (BUARQUE 1999 p 64)

Entatildeo a gestatildeo urbana eacute a administraccedilatildeo de determinadas situaccedilotildees dentro de uma

conjuntura com os recursos disponiacuteveis no presente tendo em vista as necessidades

imediatas diferentemente do planejamento que segundo Souza e Rodrigues (2004 p 15) eacute

uma atividade que remete sempre para o futuro eacute a forma que os homens tecircm de tentar

prever a evoluccedilatildeo de um fenocircmeno ou de um processo e a partir desse conhecimento

procurar se precaver contra problemas ou dificuldades ou ainda aproveitar melhor possiacuteveis

benefiacutecios

245

A diferenccedila baacutesica reside no horizonte temporal de cada uma O planejamento tem a ver com o meacutedio e a longo prazos (em se tratando de planejamento urbano o meacutedio prazo pode dizer respeito a um lapso de tempo de poucos anos e o longo prazo a um periacuteodo de muitos anos) jaacute a gestatildeo refere-se ao curtiacutessimo prazo (dias ou seman

mmo e

u

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246

Para Harvey (2005 p 171) governanccedila urbana significa muito mais do que

governo urbano eacute um conjunto de forccedilas que detecircm o poder de reorganizaccedilatildeo da vida

urbana ou seja [] o poder real de reorganizaccedilatildeo da vida urbana muitas vezes estaacute em outra

parte ou pelo menos numa coalizatildeo de forccedilas mais ampla em que o governo e a

administraccedilatildeo urbana desempenham apenas papel facilitador e empreendedor

Outra questatildeo que pode ser analisada nesse processo eacute a tendecircncia contemporacircnea de

gestatildeo puacuteblica pautada na participaccedilatildeo popular descentralizando as decisotildees e

responsabilidades que historicamente estavam concentradas no poder executivo Entretanto

algumas praacuteticas tecircm demonstrado que a participaccedilatildeo popular fica restrita somente agrave consulta

de certos setores sociais

Nesse sentido procurar-se-aacute responder no toacutepico abaixo aos questionamentos

levantados na pesquisa qual a concepccedilatildeo de gestatildeo tem norteado as poliacuteticas habitacionais

implementadas em Beleacutem e em Satildeo Luis Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade

civil no processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas referidas cidades

Os modelos de gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

partindo da anaacutelise dos programas eou projetos habitacionais implementados em Beleacutem e em

Satildeo Luiacutes desde a implantaccedilatildeo das Secretarias Municipais de Habitaccedilatildeo

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS ADOTADOS

No processo de implementaccedilatildeo das poliacuteticas urbanas emergem conflitos entre os

atores sociais envolvidos que buscam novas formas de fazer valer seus direitos Para tanto

procurou-se analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas nas duas

cidades amazocircnicas estudadas assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e

a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente Aleacutem disso buscou-se analisar

as accedilotildees ou programas implementados pelos governos municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes no

sentido de reduzir as carecircncias habitacionais das referidas cidades e interpretar as conexotildees

entre as praacuteticas governamentais no processo de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais e as

necessidades objetivas dos grupos sociais demandantes de tais poliacuteticas

Dessa forma para um melhor entendimento sobre a Poliacutetica Habitacional eacute

importante destacar que a intervenccedilatildeo estatal possui papel essencial pois por meio dessas

poliacuteticas poderaacute regular organizar e coordenar as accedilotildees interventivas no espaccedilo urbano

247

Assim entende-se que toda poliacutetica puacuteblica eacute uma forma de regulaccedilatildeo ou intervenccedilatildeo na

sociedade [] toda poliacutetica puacuteblica eacute um mecanismo de mudanccedila social (SILVA 2001 p

37-38)

Gramsci (2002 p 222) argumenta que o Estado75 eacute dividido em dois sociedade civil

(responsaacutevel por divulgar as ideologias por meio do sistema escolar as igrejas os partidos

poliacuteticos os sindicatos os meios de comunicaccedilatildeo etc) e sociedade poliacutetica (que satildeo os

aparelhos de coerccedilatildeo sob o controle das burocracias-executivas ligado as forccedilas armadas e

policiais) Declara ainda que o Estado natildeo exerce a coesatildeo pura e simples ele utiliza

mecanismos de consenso para legitimar-se para evitar o conflito de classes buscando atender

as demandas existentes das classes subalternas76

O Estado legitima-se natildeo soacute por meio dos aparelhos coercitivos mas pela sua forte

presenccedila na economia no qual o interesse da sociedade se faz presente Em outros termos o

Estado apesar de servir a classe dominante precisa dar resposta agraves exigecircncias da classe

dominada e as demandas apresentadas Segundo Carvalho (1991 p 11) o Estado ao tomar a

responsabilidade pela formulaccedilatildeo e execuccedilatildeo das poliacuteticas econocircmicas e sociais responde a

demanda e pressatildeo das classes dominadas por meio de poliacuteticas puacuteblicas sendo estas a forma

concreta da intervenccedilatildeo estatal na realidade social

Oszlak e O Donnell (1976 p 21) destacam um importante conceito sobre o que eacute a

poliacutetica puacuteblica

Um conjunto de accedilotildees e omissotildees que manifestam uma modalidade de intervenccedilatildeo do Estado em relaccedilatildeo a uma questatildeo que chama a atenccedilatildeo o interesse e a mobilizaccedilatildeo de outros atores da sociedade civil Desta intervenccedilatildeo pode-se inferir uma determinada direccedilatildeo uma determinada orientaccedilatildeo normativa que presumivelmente afetaraacute o futuro curso do processo social desenvolvido ateacute entatildeo em torno do tema

Entretanto a poliacutetica puacuteblica natildeo abrange apenas as decisotildees e accedilotildees tomadas pelo

Estado mas tambeacutem a omissatildeo estatal frente a algumas realidades que caso natildeo sofram uma

intervenccedilatildeo direta seja por parte do Estado ou de organizaccedilotildees natildeo-governamentais nunca

teratildeo oportunidade de mudanccedila

75 Denominado de Estado ampliado natildeo existindo separaccedilatildeo entre Estado e sociedade 76 No final do seacuteculo XIX os neoliberais defendiam a concepccedilatildeo de que o Estado deveria intervir minimamente na economia agindo de forma neutra desenvolvendo accedilotildees complementares com o mercado como regulador natural das relaccedilotildees sociais No entanto a crise econocircmica de 1929 nos Estados Unidos atinge a economia mundial agravando a questatildeo social fazendo com que o Estado assumisse a funccedilatildeo de mediador nos conflitos sociais entre as classes dominantes e dominadas

248

O Estado atua por meio de poliacuteticas puacuteblicas e sociais visando a manutenccedilatildeo das

relaccedilotildees sociais atraveacutes da garantia de direitos sociais Para Sposati (2001 p 65) natildeo

devemos esquecer que mediante a poliacutetica social eacute que direitos sociais se concretizam e

necessidades humanas (leia-se sociais) satildeo atendidas na perspectiva da cidadania ampliada

Segundo Faleiros (2006 p 31) as poliacuteticas sociais satildeo forma de mecanismos de

relaccedilatildeo e articulaccedilatildeo de processos poliacuteticos e econocircmicos As poliacuteticas sociais satildeo respostas

e formas de enfrentamento das expressotildees da questatildeo social

De acordo com Sposati (2001 p 87)

[] a poliacutetica social natildeo deve ser somente realizada pelo governo mas tem que ser disputada na populaccedilatildeo para que politicamente mesmo que o segmento que natildeo estaacute sendo imediatamente incluiacutedo que natildeo vai usar aquela escola ou aquele programa entenda e incorpore a necessidade de ter aquela atenccedilatildeo

Nota-se que o processo das poliacuteticas puacuteblicas eacute assumido por uma diversidade de

sujeitos que entram saem ou permanecem no processo sendo estes orientados por diferentes

racionalidades e movidos por diferentes interesses Segundo Silva (2001) dentre os principais

sujeitos estatildeo os grupos de pressatildeo (movimentos sociais e outras organizaccedilotildees) partidos

poliacuteticos ou poliacuteticos individualmente (responsaacuteveis por tomar decisotildees fixar prioridades e

objetivos das poliacuteticas) administradores e burocratas teacutecnicos planejadores e avaliadores

(responsaacuteveis por formular alternativas) e o judiciaacuterio (responsaacutevel por garantir direitos) No

que diz respeito agrave poliacutetica habitacional historicamente vem cedendo a influecircncia de atores

sociais do setor imobiliaacuterio e financeiro

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se

numa das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo da sociedade civil (SOUZA RODRIGUES 2004 p 13)

Segundo Rodrigues (1998 p 82) a poliacutetica habitacional nada mais eacute que uma

poliacutetica puacuteblica enquanto estrateacutegia de dominaccedilatildeo burguesa e tambeacutem poliacutetica econocircmica em

249

suas forccedilas sociais operacionais visto que surge no bojo da Reforma Brasileira O Estado

portanto como regulador social aplicador da poliacutetica habitacional distribui de forma

dissociada os equipamentos urbanos acirrando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial a qual tem sido

foco de discussatildeo dos movimentos sociais urbanos que por meio de suas mais diversas

formas tem exigido do Estado respostas concretas agraves suas demandas e o exerciacutecio de gestotildees

democraacuteticas que sejam capazes de amenizar as carecircncias sociais tendo na questatildeo da

moradia uma de suas manifestaccedilotildees mais expressivas

Tomando como base o objeto de estudo pode dizer que a poliacutetica habitacional em

Beleacutem era realizada ateacute meados da deacutecada de 1990 por diversos oacutergatildeos da Prefeitura

Municipal de Beleacutem (PMB) uma vez que somente em 1998 que foi criada a Secretaria

Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Estes oacutergatildeos eram a Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo

Geral do Planejamento e Gestatildeo (SEGEP) criada em 1993 a Companhia de

Desenvolvimento e Administraccedilatildeo da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) a Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) e a SESAN

A SEGEP era responsaacutevel pelo planejamento do orccedilamento municipal vinculado

diretamente ao Prefeito possuindo em sua estrutura o Departamento de Desenvolvimento

Municipal e o Departamento de Orccedilamento Administraccedilatildeo e Financcedilas Cabia a CODEM

buscar financiamentos para a habitaccedilatildeo principalmente por meio da CEF Aleacutem disso a

CODEM criou a Diretoria de Infraestrutura e Habitaccedilatildeo e o Fundo de Habitaccedilatildeo para o

Municiacutepio que funcionava de maneira independente do Fundo de Desenvolvimento Urbano

Sua atuaccedilatildeo era na regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de interesse social e tambeacutem na administraccedilatildeo da

enfiteuse da Primeira Leacutegua Patrimonial

A SEURB tinha uma atuaccedilatildeo fraca no setor uma vez que era responsaacutevel pelo

controle urbaniacutestico

liberaccedilatildeo de alvaraacutes licenciamentos e fiscalizaccedilatildeo A SESAN era

responsaacutevel pelos projetos e execuccedilatildeo das obras de macrodrenagem em aacutereas prioritaacuterias de

urbanizaccedilatildeo

Embora a SEGEP fosse responsaacutevel por articular as poliacuteticas intersetoriais que

visava buscar a integraccedilatildeo entre as accedilotildees e projetos dos diversos oacutergatildeos natildeo proporcionou de

fato a elaboraccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional capaz de envolver uma accedilatildeo integrada dos

diferentes setores do poder puacuteblico municipal

Efetivamente os programas e projetos especiacuteficos para a produccedilatildeo habitacional e

melhorias das condiccedilotildees habitacionais natildeo foram de iniciativa municipal A PMB teve sua

accedilatildeo restrita ao apoio institucional para os reassentamentos de famiacutelias em aacutereas de

intervenccedilatildeo dos programas de saneamento e drenagem coordenados pela COSANPA

250

Com a criaccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) por meio da Lei

Municipal nordm 7865 que tem por objetivo promover a poliacutetica municipal de habitaccedilatildeo de

interesse social contribuindo para a melhoria das condiccedilotildees da habitaccedilatildeo e reduccedilatildeo do deacuteficit

habitacional em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo

por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular (SEHAB 2011) pode-se afirmar que

haacute um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez que reconhece o direito a moradia como

poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da poliacutetica habitacional

De acordo com o entrevistado (teacutecnico da SEHAB)

A SEHAB foi criada em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular A expectativa de atendimento das demandas acumuladas com relaccedilatildeo agraves condiccedilotildees de moradia se ampliaram e acabaram por fortalecer a proposta de criaccedilatildeo de uma secretaria especiacutefica para a temaacutetica habitacional uma vez que a inexistecircncia de uma estrutura institucional clara e definida que encaminhasse uma poliacutetica habitacional consistente apresentava-se como grande empecilho para o municiacutepio (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2009)

A SEHAB visa promover planejar coordenar executar controlar e avaliar as

atividades de poliacutetica habitacional no municiacutepio como oacutergatildeo da administraccedilatildeo direta do

mesmo Conforme organograma institucional da Secretaria (SEHAB 2011) a elaboraccedilatildeo e

implementaccedilatildeo dos Projetos de Obras Fiacutesicas (construccedilatildeo de equipamentos urbanos rede de

drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua equipamentos comunitaacuterios

pavimentaccedilatildeo de ruas e construccedilatildeo de moradias) satildeo de responsabilidade do Departamento de

Programas e Projetos Habitacionais (DPPH)

O Departamento Social (DESO)77 eacute responsaacutevel pelos projetos sociais da referida

secretaria possui uma equipe multidisciplinar composta por Assistente Social Pedagogo

Psicoacutelogo e Historiador objetivando elaborar e implementar os Projetos de Trabalho Social

que se datildeo por meio de trecircs eixos geraccedilatildeo de trabalho e renda educaccedilatildeo soacutecio-poliacutetica e

educaccedilatildeo ambiental

77 Atualmente o quadro teacutecnico do Departamento Social da SEHAB possui duas Assistentes Sociais efetivas trecircs Assistentes Sociais comissionados uma Psicoacuteloga um Historiador e quatro Estagiarias o que na realidade prejudica o desenvolvimento do trabalho uma vez que no ano de 2010 a Secretaria contava com um corpo teacutecnico de doze Assistentes Sociais e dez estagiaacuterios

251

Figura 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

Fonte SEHAB (2011)

Dados da Prefeitura Municipal de Beleacutem relatam que a SEHAB implementa os

programas de fomento ao cooperativismo reassentamento de famiacutelias residentes em aacuterea de

risco e insalubres urbanizaccedilatildeo de aacutereas onde eacute efetiva a detecccedilatildeo de habitaccedilotildees em condiccedilotildees

subumanas assim como reforma e ampliaccedilatildeo de unidades habitacionais (SEHAB 2011)

As accedilotildees da PMB destinadas a questatildeo habitacional tem sido atribuiacuteda aos oacutergatildeos

oficiais diretamente envolvidos com a temaacutetica da poliacutetica habitacional SEHAB Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) Secretaria Municipal de Saneamento (SESAN) CODEM

e SEGEP (conforme demonstrado no quadro abaixo) Contudo o fato de haver sobreposiccedilotildees

de atividades redundou na ausecircncia da participaccedilatildeo articulada de oacutergatildeos importantes da

administraccedilatildeo municipal dificultando o desenvolvimento de uma poliacutetica puacuteblica integrada

(BELEacuteM 2007)

SECRETAacuteRIO DIRETOR GERAL

NUacuteCLEO DE PLANEJAMENTO E

ACOMPANHAMENTO

GABINETE

NUacuteCLEO DE ASSUNTOS JURIacuteDICOS

DEPARTAMENTO SOCIAL

DIV PESQ E HABITACcedilAtildeO

SOCIAL

DIV DESENV COMUNITAacuteRIO

DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO

IMOBILIAacuteRIO

DIV DE RECURSOS HUMANOS

FINANCEIROS MATERIAIS

DIVISAtildeO IMOBILIAacuteRIA

DEPARTAMENTO PROGRAMAS E

PROJETOS SOIAIS

DIV PROJETOS AVALIACcedilAtildeO E

CUSTOS

DIV EXECUCcedilAtildeO E FISALIZACcedilAtildeO

DE OBRAS

252

Quadro 9 - Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

Oacutergatildeo Atribuiccedilatildeo Legal Atribuiccedilatildeo Efetiva Sobreposiccedilatildeo com outros oacutergatildeos

SEHAB

Planejar coordenar executar controlar e avaliar as atividades da Poliacutetica de Habitaccedilatildeo do Municiacutepio

Promoccedilatildeo da avaliaccedilatildeo teacutecnica de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilotildees

A CODEM e Secretaria Municipal de Financcedilas (SEFIN) realizam avaliaccedilotildees de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e emitem laudos teacutecnicos avaliativos com base em criteacuterios diferenciados

Elaboraccedilatildeo de projetos executivos de engenharia e arquitetura de empreendimentos habitacionais de infraestrutura e de urbanizaccedilatildeo

A SEURB tem esta mesma atribuiccedilatildeo aplicada pela Lei nordm 8009 de 250502 (elaboraccedilatildeo gratuita de projetos de engenharia civil para atender agrave construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares)

Remanejamento assentamento e desapropriaccedilatildeo de aacutereas em ocupaccedilotildees conflituosas

A SESAN desenvolve esta atividade nas aacutereas onde implanta projetos

SEURB

Executar coordenar controlar conservar e avaliar as obras de paisagismo e edificaccedilotildees puacuteblicas municipais

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral bem como as obras particulares atraveacutes da legislaccedilatildeo em vigor

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

SEGEP

Coordenar a elaboraccedilatildeo avaliaccedilatildeo reformulaccedilatildeo e atualizaccedilatildeo dos instrumentos baacutesicos do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Promover a articulaccedilatildeo de atividades entre as entidades integrantes do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Administrar o sistema viaacuterio do Municiacutepio de Beleacutem

Idem A SEURB faz planejamento urbano

253

SESAN Administrar os resiacuteduos soacutelidos

Idem

Educaccedilatildeo ambiental Esta atribuiccedilatildeo eacute de competecircncia

legal da SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu a Divisatildeo de Educaccedilatildeo Ambiental e Desenvolvimento Comunitaacuterio vinculada agrave SEURB

Habitaccedilatildeo construccedilatildeo realocaccedilatildeo e desapropriaccedilatildeo na implantaccedilatildeo de projetos relacionados agraves suas atribuiccedilotildees

Egrave uma das atribuiccedilotildees efetivas da SEHAB

CODEM

Pesquisar planejar executar financiar e controlar as atividades de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria urbanizaccedilatildeo e habitaccedilatildeo

Executar as atribuiccedilotildees de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria

SEURB nas atividades de urbanizaccedilatildeo SEHAB nas de habitaccedilatildeo

Promover a Enfiteuse Pelo novo Coacutedigo Civil passa a ser aplicado o Direito de Superfiacutecie

Implementar projetos urbaniacutesticos

SEURB e SEHAB

Implementar a poliacutetica habitacional municipal

SEHAB

Desenvolver atividades de apoio ao SIPLAG

Avaliaccedilatildeo de imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e transaccedilatildeo comerciais para compra

SEHAB e SEFIN

Fonte BELEacuteM Prefeitura Municipal de Diagnoacutestico Institucional Municiacutepio de Beleacutem-Paraacute In______ Plano Estrateacutegico Municipal para Assentamentos Subnormais Beleacutem SEGEP (2005)

Mediante esse quadro nota-se que haacute uma sobreposiccedilatildeo de funccedilotildees acarretada pela

proacutepria lei de criaccedilatildeo dos oacutergatildeos e pela insuficiecircncia institucional da SEHAB o que fez com

que funccedilotildees fossem atribuiacutedas eou assumidas de acordo com o perfil da gestatildeo e dos

responsaacuteveis pelos oacutergatildeos

A PMB aponta como principais aspectos que tecircm sido responsaacuteveis pelas

dificuldades de interaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos do governo municipal nessa aacuterea

A ausecircncia de uma vinculaccedilatildeo da gestatildeo municipal a um modelo espacial de estruturaccedilatildeo urbana capaz de nortear as accedilotildees de planejamento urbano associadas agrave poliacutetica habitacional

A falta de coerecircncia na conduccedilatildeo do ordenamento territorial tem feito com que as accedilotildees puacuteblicas e privadas no territoacuterio municipal se realizem sem benefiacutecios para o desenvolvimento da poliacutetica habitacional no que se refere a

254

inibiccedilatildeo de processos imobiliaacuterios especulativos impossibilitando a implementaccedilatildeo dos instrumentos de poliacutetica habitacional previstos no Plano Diretor

O deacuteficit de recursos materiais humanos e teacutecnicos na maioria dos oacutergatildeos municipais o que implica muitas vezes na natildeo-efetivaccedilatildeo de suas atribuiccedilotildees legais

A ausecircncia de um sistema de informaccedilotildees atualizado e unificado (informaccedilotildees em rede) que apoacuteie o planejamento o acompanhamento dos resultados das accedilotildees enfim a gestatildeo puacuteblica municipal e

As pressotildees sociais por accedilotildees isoladas e localizadas imediatas face aos deacuteficits acumulados historicamente de infraestruturas urbanas e comunitaacuterias e a escassez de recursos financeiros para responder a tais demandas (SEGEP 2005 p 24)

Entretanto apesar das dificuldades apresentadas o Estatuto da Cidade possibilitou a

implementaccedilatildeo de novos instrumentos que contribuiacuteram no desenvolvimento de accedilotildees mais

efetivas por parte do oacutergatildeo gestor no processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Para tanto foram criados o Orccedilamento Participativo (OP)78 e o Congresso da Cidade

como instrumentos para promover a gestatildeo participativa da cidade ou seja como

instrumentos de intermediaccedilatildeo na relaccedilatildeo entre governo municipal e sociedade Eacute um

processo de planejamento que tem como princiacutepio a participaccedilatildeo direta da sociedade nas

decisotildees sobre a aplicaccedilatildeo dos recursos a serem investidos em obras e serviccedilos pela prefeitura

Em Beleacutem a ideacuteia do governo era de que mediante a participaccedilatildeo popular seria

possiacutevel deslanchar um processo de gestatildeo capaz de fazer frente aos problemas da cidade

decorrentes do descaso de sucessivas intervenccedilotildees estatais centralizadoras

A iniciativa da participaccedilatildeo popular no OP teve como base a ausecircncia de poliacuteticas

puacuteblicas para as aacutereas de baixadas o que levou a sociedade a demandar serviccedilos e obras em

especial na aacuterea de saneamento baacutesico

Dessa maneira a administraccedilatildeo municipal priorizou a temaacutetica do saneamento

realizando o planejamento estrateacutegico da Marca Sanear Beleacutem79 com a missatildeo de elevar a

qualidade de vida proporcionando agrave sociedade condiccedilotildees dignas de limpeza drenagem aacutegua

78 Avritzer (2001) ressalta que OP eacute uma estrutura e um processo de participaccedilatildeo baseados em trecircs princiacutepios e em um conjunto de instituiccedilotildees que funcionam como mecanismos ou canais que asseguram a participaccedilatildeo no processo decisoacuterio do governo municipal Esses princiacutepios satildeo 1) participaccedilatildeo aberta a todos os cidadatildeos sem nenhum status especial atribuiacutedo a qualquer organizaccedilatildeo inclusive as comunitaacuterias 2) combinaccedilatildeo da democracia direta e representativa cuja dinacircmica institucional concede aos proacuteprios participantes a definiccedilatildeo de regras internas e 3) alocaccedilatildeo dos recursos para investimentos baseada na combinaccedilatildeo de criteacuterios gerais e teacutecnicos ou seja compatibilidade entre as decisotildees e regras estabelecidas pelos participantes e as exigecircncias teacutecnicas e legais da accedilatildeo governamental respeitando tambeacutem os limites financeiros 79 A administraccedilatildeo municipal definiu 06 (seis) programas baacutesicos que ficaram conhecidos por Marcas de Governo Dar um Futuro agraves Crianccedilas Sauacutede para Todos Transporte Humano Revitalizar Beleacutem Sanear Beleacutem e Participaccedilatildeo Popular (BELEacuteM 1997)

255

potaacutevel esgoto melhoria habitacional e educaccedilatildeo sanitaacuteria e ambiental (BELEacuteM 1997)

Dentre as accedilotildees municipais relacionadas ao Sanear Beleacutem destacam-se conforme quadro 10

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001)

Programa Accedilatildeo

Instituiccedilatildeo Promotora

Natureza da Provisatildeo Projeto Localizaccedilatildeo

Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica

PROacute-MORADIA

PROacute-MORADIA

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Eduardo Angelim I

Icoaraci Construccedilatildeo de 300 unidades habitacionais para famiacutelias oriundas do Canal Mundurucus Cipriano Santos Santa Cruz e Gentil

Eduardo Angelim II

Icoaraci Construccedilatildeo de 410 unidades habitacionais e 01 escola e 02 praccedilas para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo

Eduardo Angelim III

Icoaraci

Construccedilatildeo de 304 unidades habitacionais com ofertas de 304 cestas de material de construccedilatildeo para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo e construccedilatildeo de 01 creche e 01 praccedila

Jardim Bom Futuro

Bengui Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Laranjeiras Jurunas Construccedilatildeo de 202 unidades habitacionais

Malvinas Sacramenta

Construccedilatildeo de 01 creche 01 unidade da Famiacutelia Saudaacutevel 02 quadras poliesportivas revestimento do canal sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus I

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus II

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Nova Beleacutem I

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 220 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

256

Nova Beleacutem II

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 240 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

Radional II Jurunas Construccedilatildeo de 604 unidades habitacionais

Raimundo Jinkings

Tapanatilde Construccedilatildeo de 250 unidades habitacionais e 01 quadra

Satildeo Gaspar Tapanatilde Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

HABITAR BRASIL

SEHAB

Infraestrutura Habitacional e

Lotes Urbanizados

Comandante Cabano Antocircnio Vinagre

Marco

Construccedilatildeo de 126 apartamentos para famiacutelias remanejadas da Av1ordm de Dezembro

Riacho Doce

Guamaacute

MORANDO MELHOR SEHAB

Empreacutestimo para Melhoria das Condiccedilotildees Habitacionais

Vila da Barca Teleacutegrafo Reforma de 60 unidades

habitacionais

Satildeo Gaspar Tapanatilde Reforma de 300 unidades habitacionais

PROJETOS DE

REGULARIZACAtildeO

FUNDIA RIA

CODEM Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

Parque Uniatildeo

Tapanatilde Oferta de 682 lotes construccedilatildeo de 01 escola 01 posto de sauacutede e 617 famiacutelias tituladas

Aldo Almeida Tapanatilde

Oferta de 272 lotes para famiacutelias da Macrodrenagem e 77 famiacutelias tituladas

Fonte Pesquisa HABITAT FASE IPPUR UFRJ (2001)

Entretanto natildeo soacute o governo municipal interveio no espaccedilo urbano de Beleacutem o

governo estadual implementou vaacuterias poliacuteticas de urbanizaccedilatildeo na cidade dentre as quais

destacam-se de acordo com o quadro 11 que tiveram accedilotildees de remanejamento ou

reassentamento de famiacutelias

257

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual

Projeto Periacuteodo Localizaccedilatildeo Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica Projeto Urbanizar Meados da

deacutecada de 1980

Assentamento

Jaderlacircndia

Urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e

equipamentos urbanos

Programa de Saneamento e Geraccedilatildeo de Emprego e

Renda (PROSEGE) 1994-1998 Marambaia e

Guanabara

Sistema viaacuterio esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel sistema

de drenagem e estaccedilatildeo de tratamento

Projeto Paracuri II 1997-1999 Icoaraci Oferta de lotes titulaccedilatildeo de famiacutelias

construccedilatildeo de 01 Centro Comunitaacuterio 01 escola e urbanizaccedilatildeo da aacuterea

Projeto de Macrodrenagem da Bacia

do Una 1985-2004

09 Bairros de Beleacutem

Sistema viaacuterio sistema de drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua

potaacutevel revestimento de canais construccedilatildeo de 2 comportas meio fio

calccedilada construccedilatildeo de pontes e aterro de quintais

Programa de Accedilatildeo Social em Saneamento (PASS)

1996-1998 Guanabara Complementar ao PROSEGE na aacuterea da

Guanabara Abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental Programa de Saneamento

para a Populaccedilatildeo de Baixa Renda

(PROSANEAR)

1994-1996 Aacuterea do IPASEP

Guanabara Coqueiro Benguiacute

Esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental

Fonte Portela (2005)

Assim pode-se afirmar que as experiecircncias acima descritas demonstram um

aprendizado de caraacuteter poliacutetico dentro do contexto em que se apresenta no qual a tocircnica de

planejamento e gestatildeo da cidade sempre estiveram assentados numa concepccedilatildeo tecnocraacutetica e

racionalista com vistas a propoacutesitos bens especiacuteficos de desenvolvimento urbano em geral

associado agrave ideacuteia de modernizaccedilatildeo da cidade (TRINDADE JUNIOR 1998)

A cidade de Beleacutem resulta portanto de um dado processo econocircmico poliacutetico social e cultural e nela se concentram e materializam as praacuteticas de sobrevivecircncia dos setores sociais que se constituiacuteram Sua urbanizaccedilatildeo deve ser entendida como expressatildeo social do processo de reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho a forma como estatildeo estruturadas as relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo numa dada conjuntura e sob um determinado modo de produccedilatildeo que no caso eacute o capitalismo (MOURAtildeO 1987 p 38)

Ampliar a participaccedilatildeo popular nos novos formatos institucionais de gestatildeo tem-se

configurado como um importante instrumento para promover a articulaccedilatildeo entre os atores

sociais e para melhorar a qualidade do processo de tomada de decisatildeo reconhecendo desse

modo a capacidade e a potencialidade da proacutepria sociedade civil quanto agrave indicaccedilatildeo dos

caminhos que a cidade deveria seguir

258

Nesse sentido tentou-se implementar o Congresso da Cidade natildeo como um evento

de discussatildeo e de simples proposiccedilatildeo mas como um foacuterum permanente de tomada de decisatildeo

de participaccedilatildeo e de mobilizaccedilatildeo social sendo portanto um espaccedilo puacuteblico natildeo-estatal de

planejamento da cidade ainda que seja uma proposta apresentada pelo governo na qual o

papel deste coloca-se como de fundamental importacircncia com vistas agrave sua implementaccedilatildeo e

eficaacutecia (TRINDADE JUNIOR 1998)

A ideacuteia central do Congresso da Cidade era o de instituir um modelo de gestatildeo e

planejamento de forma articulada fazendo com que a sociedade passe a se preocupar com o

todo da cidade e natildeo somente com seus espaccedilos de habitaccedilatildeo ou com suas necessidades

especiacuteficas (RODRIGUES 2000) Assim buscou-se ampliar e qualificar a participaccedilatildeo

popular por meio da articulaccedilatildeo das vaacuterias dimensotildees e instacircncias antes vivenciadas e da

criaccedilatildeo de novos espaccedilos de participaccedilatildeo adotando uma estrutura organizativa bastante

complexa e dinacircmica80

A experiecircncia poliacutetica e organizativa de um governo popular local deve se expressar como praacutetica social inovadora revolucionaacuteria [] Um governo de caraacuteter democraacutetico e popular compromissado com o objetivo da transformaccedilatildeo da realidade social deve colocar as dimensotildees cultural e poliacutetica como centrais e estrateacutegicas porque quando natildeo se muda valores natildeo se muda nada (RODRIGUES 2000 p 19)

Dessa forma a inversatildeo de prioridades com a transferecircncia de recursos para a

melhoria das condiccedilotildees de vida da sociedade e a universalizaccedilatildeo da cidadania constituiacuteram-se

objetivos a serem alcanccedilados com a implementaccedilatildeo do Congresso da Cidade pelo poder

puacuteblico municipal Entretanto devido a uma seacuterie de problemas de cunho administrativo e

especialmente poliacutetico os objetivos propostos pelo referido Congresso natildeo foram alcanccedilados

em sua totalidade

Cabe destacar que nos uacuteltimos anos a SEHAB vem realizando intervenccedilotildees

significativas na aacuterea de saneamento habitaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo tais como

a) Projeto Vila da Barca I II e III Etapas no bairro do Telegrafo As obras

foram iniciadas no ano de 2003 e abrangendo 960 por meio dos programas

Morar Melhor Palafita Zero e PAC

80 O Congresso da Cidade eacute formado pelas seguintes instacircncias oficinas e reuniotildees preparatoacuterias os congressos distritais temaacuteticos e assembleacuteias setoriais os congressos municipais temaacuteticos e o congresso de Beleacutem Existem tambeacutem as instacircncias de coordenaccedilatildeo e acompanhamento que satildeo constituiacutedas em forma de conselho os Conselhos Distritais o Conselho da Cidade COFIS Conselhos Gestores da Sauacutede e das Escolas e Conselhos de Poliacuteticas Setoriais

259

b) Projeto Portal da Amazocircnia iniciado em 2008 pretende atingir 400 famiacutelias

que residem na Rua Osvaldo de Caldas Brito (Estrada Nova) financiado

pelo PAC

c) Projeto Paracuri sua aacuterea de abrangecircncia eacute o Paracuri II no Distrito de

Icoaraci foi iniciado em 2008 e tem como puacuteblico-alvo 600 famiacutelias

tambeacutem financiado pelo PAC

Contudo devido a questotildees poliacuteticas e institucionais os projetos Paracuri e Portal da

Amazocircnia desde 2010 estatildeo sob a coordenaccedilatildeo da SEURB

Beleacutem na atualidade faz parte de um programa do governo federal o qual tem por objetivo minimizar o deacuteficit habitacional no Brasil o programa Palafita Zero que faz parte do Plano de Aceleraccedilatildeo do Crescimento e tem o propoacutesito de melhorar as condiccedilotildees habitacionais das populaccedilotildees que ocupam os assentamentos precaacuterios eacute atraveacutes deste que visando atender a necessidade em que se compreende a moradia como um direito humano e fundamental e consequumlentemente a formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo desta poliacutetica Habitacional no acircmbito municipal (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

A SEHAB como oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor de alguns projetos de

urbanizaccedilatildeo tecircm por obrigatoriedade responder as demandas colocadas pela populaccedilatildeo e

garantir o direito a moradia conforme seus objetivos Todavia ressalta-se que tais projetos

natildeo satildeo muitas vezes garantidos natildeo passam pelas as exigecircncias dos agentes financiadores da

obra fiacutesica e da obra de cunho social estes tem paracircmetros conceituais e teacutecnicos jaacute

estipulados verbas jaacute destinadas agraves quais limitam o trabalho social e consequumlentemente ateacute o

projeto fiacutesico (BELEacuteM 2007) Um desses impasses ressalta-se a seguir na fala de uma

Assistente social que compotildee o quadro teacutecnico da referida secretaria (2010)

A SEHAB eacute um oacutergatildeo da PMB destinado agrave questatildeo habitacional e se envolve diretamente com a temaacutetica da poliacutetica habitacional [] a secretaria foi criada para atender as demandas com relaccedilatildeo as condiccedilotildees de moradia Contudo hoje percebemos que soacute a SEHAB natildeo eacute o suficiente para sanar todos esses problemas pois estrutura institucional e fiacutesica insuficiente articulaccedilatildeo insuficiente com os demais oacutergatildeos municipais inexistecircncias de terras estocadas o alto iacutendice de famiacutelias conviventes (56652 famiacutelias) e etc

Segundo o teacutecnico da SEHAB (2010)

O trabalho desenvolvido pela SEHAB diante as ocupaccedilotildees irregulares se da atraveacutes de um planejamento social da aacuterea e da populaccedilatildeo a ser atingida pelo

260

projeto fiacutesico habitacional se baseando nos criteacuterios estabelecidos em cada projeto desenvolvido pela mesma e de acordo com os tramites legais juntamente com base nas diretrizes da poliacutetica habitacional o que atraveacutes da utilizaccedilatildeo dos instrumentos teacutecnicos funcionais busca metodologias para proporcionar a melhoria ou a mudanccedila de um determinado contexto por meio de um diagnoacutestico e levantamento soacutecio econocircmico delimitando desta maneira agrave demanda para que haja a intervenccedilatildeo A SEHAB busca intervir no meio atraveacutes de reuniotildees com a comunidade assembleacuteias accedilotildees educativas e informativas sobre o projeto que possa vir a atingir a aacuterea estudada

Pode-se dessa forma salutar que a SEHAB tem o objetivo de promover a poliacutetica

urbana na cidade contribuindo de alguma forma para a melhoria das condiccedilotildees de moradias

da populaccedilatildeo captando recursos implementando programas e projetos estreitando parceria

com a comunidade e oacutergatildeos puacuteblicos privados e ateacute mesmo organizaccedilotildees internacionais

poreacutem nem sempre se eacute possiacutevel ter o alcance dos objetivos o que pode se destacar na fala do

teacutecnico da secretaria

A garantia de direito eacute insuficiente com relaccedilatildeo a constituiccedilatildeo federal logo nem toda demanda tem seus direitos garantidos os programas satildeo insuficientes Plano diretor existe mais natildeo eacute colocado em praacutetica Direito a moradia natildeo eacute soacute casa p morar mas eacute necessaacuterio ter condiccedilotildees de habitabilidade acesso a serviccedilos [] o poder puacuteblico busca captaccedilatildeo de recursos para investir nos projetos mais esquece de pocircr em praacutetica seus instrumentos como o plano diretor (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

Neste sentido eacute possiacutevel perceber que a moradia enquanto um direito natildeo eacute

garantido a todos esta eacute a loacutegica neoliberal que vem sendo adotada desde a deacutecada de 1990

em que a moradia eacute uma mercadoria de valor muito alto e algumas pessoas somente

conseguem ter acesso a ela por meio de uma poliacutetica social que o Estado atua no combate a

desigualdade poreacutem este Estado tem por base para a sua intervenccedilatildeo a relaccedilatildeo

custobenefiacutecio relaccedilotildees de consumo e de mercado em que se busca o que eacute menos

dispendioso para o mesmo como por exemplo por meio de parcerias entre o puacuteblico e o

privado descentralizaccedilatildeo subsiacutedios fiscais programas de renda miacutenima etc

De acordo com Beleacutem (2007) de uma forma geral no que se refere agrave habitaccedilatildeo

pode-se dizer que diante da accedilatildeo tiacutemida ou insuficiente das poliacuteticas habitacionais somada agrave

desigualdade social resultado dos modelos econocircmicos excludentes adotados pelo paiacutes ao

longo das duas uacuteltimas deacutecadas o que ocorreu nas grandes cidades foi um estiacutemulo agrave

ampliaccedilatildeo de ocupaccedilotildees informais e irregulares A falta de alternativas e o aprofundamento

das situaccedilotildees de precariedade urbana em todo o paiacutes satildeo resultados de um periacuteodo de

261

esvaziamento da poliacutetica urbana no acircmbito federal e o consequumlente enfraquecimento das

demais esferas de governo bem como a retraccedilatildeo dos investimentos puacuteblicos em um periacuteodo

de crescimento da populaccedilatildeo urbana em especial nas grandes cidades e regiotildees

metropolitanas

Os relatoacuterios da PMB chamam a atenccedilatildeo ainda para a grave desestruturaccedilatildeo da

SEHAB para efetivamente assumir a sua competecircncia legal da execuccedilatildeo da Poliacutetica

Habitacional Isso permite por exemplo que a SESAN ou a SEURB com maior e melhor

estrutura justifique a execuccedilatildeo de atividades de competecircncia da Secretaria de Habitaccedilatildeo tais

como o atendimento agraves demandas urgentes para realocaccedilatildeo de populaccedilatildeo avaliaccedilatildeo de

imoacuteveis desapropriaccedilatildeo construccedilatildeo de unidades habitacionais etc

Vale ressaltar que em entrevista concedida por um teacutecnico da SEHAB (2010) a

poliacutetica habitacional eacute entendida como

Nome dado aos diversos processos de urbanizaccedilatildeo adotados pelo poder puacuteblico para atendimento da populaccedilatildeo de baixa renda [] Jaacute tivemos alguns avanccedilos a aprovaccedilatildeo do Estatuto da Cidade (2001) a Criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades (2003) a instituiccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social SNHIS e do Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social FNHIS bem como o seu Conselho Gestor a realizaccedilatildeo de Conferecircncias das Cidades e a retomada da construccedilatildeo de uma poliacutetica nacional de habitaccedilatildeo e fundiaacuteria em Beleacutem esse cenaacuterio tem provocado mudanccedilas institucionais importantes dentre as quais podemos destacar a realizaccedilatildeo da I Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo a instituiccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) a criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) e o novo Plano Diretor de Beleacutem que estabelece as diretrizes para o desenvolvimento urbano e determina a elaboraccedilatildeo de planos setoriais dentre os quais o de habitaccedilatildeo de interesse social Neste sentido ateacute dezembro de 2010 deveraacute ser elaborado o Plano Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social PMHIS de Beleacutem que vai consolidar o planejamento da accedilatildeo municipal referente agrave questatildeo habitacional prevista no Plano Diretor Deve conter as diretrizes linhas programaacuteticas fontes de recursos metas e indicadores que expressem o entendimento do poder puacuteblico e dos agentes sociais a respeito do planejamento habitacional com o objetivo de promover o acesso agrave moradia digna

Dentre os principais desafios a serem enfrentadas pela Secretaria estatildeo implementar

uma poliacutetica habitacional de longo prazo elaborar o PMHIS viabilizar a ampliaccedilatildeo da oferta

de habitaccedilatildeo de interesse social regulamentar as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)

criar a estrutura de coordenaccedilatildeo da elaboraccedilatildeo do PMHIS realizar um seminaacuterio intersetorial

no acircmbito da PMB realizar dezesseis oficinas para diagnoacutestico e elaboraccedilatildeo do plano nos

262

distritos administrativos realizar uma Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo encaminhar a

minuta de Projeto de Lei do PMHIS ao Executivo municipal

Em relaccedilatildeo aos principais avanccedilos a partir da SEHAB podem ser ressaltados a

adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a constituiccedilatildeo do Fundo

Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e

construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a realizaccedilatildeo

do Diagnoacutestico Habitacional e a elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de habitaccedilatildeo A expectativa

eacute que em 2010 os resultados se multipliquem e a SEHAB seja reconhecida pela sua atuaccedilatildeo

responsaacutevel na construccedilatildeo de uma cidade cada vez mais humana (Entrevista concedida por

um teacutecnico da SEHAB 2010)

Na praacutetica nenhum oacutergatildeo ou instituiccedilatildeo eacute de fato responsaacutevel pela articulaccedilatildeo das

accedilotildees nessa escala Nenhum espaccedilo de deliberaccedilatildeo ou debate se apresenta de forma

consolidada e com influecircncia teacutecnica eou poliacutetica suficiente para desencadear um processo de

debate e implementaccedilatildeo de accedilotildees entre os diferentes municiacutepios no que diz respeito agrave poliacutetica

de transporte puacuteblico habitaccedilatildeo saneamento e resiacuteduos soacutelidos (BELEacuteM 2007)

Isso demonstra uma contradiccedilatildeo ao que eacute proposto nos princiacutepios da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo

Direito agrave moradia colocando os direitos humanos mais proacuteximos do centro das preocupaccedilotildees de nossas cidades moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social garantindo padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais funccedilatildeo social da propriedade urbana buscando implementar instrumentos de reforma urbana e garantir acesso a terra urbanizada questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado uma poliacutetica pactuada com a sociedade e que extrapole um soacute governo gestatildeo democraacutetica com participaccedilatildeo dos diferentes segmentos e articulaccedilatildeo das accedilotildees de habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo integrado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Assim pode-se concluir que em Beleacutem embora se tenha avanccedilado em relaccedilatildeo a

poliacutetica habitacional as accedilotildees dos planosprogramas pouco contribuiacuteram para a definiccedilatildeo de

diretrizes de expansatildeo urbana da RMB Fica evidente ainda que os modelos de gestatildeo

implementados desde 1998 natildeo contribuiacuteram para a diminuiccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

e que a relaccedilatildeo entre Estado e sociedade civil avanccedilou em alguns pontos (OP e Congresso da

Cidade) mas depois houve uma estagnaccedilatildeo e a implementaccedilatildeo das accedilotildees observadas nos

diferentes planos e instrumentos de planejamento e controle urbano esbarraram em uma

estrutura administrativa e poliacutetica bastante fraacutegil

263

Em Satildeo Luiacutes constatou-se que o Municiacutepio natildeo dispotildee de uma Poliacutetica Habitacional

elaborada com instrumentos adequados que permita uma gestatildeo compatiacutevel com o niacutevel de

problemas encontrados no mesmo embora possa ser entendido que existe uma preocupaccedilatildeo

com a questatildeo uma vez que em 2006 foi aprovado o Plano Diretor que estaacute em vigor o qual

vem conduzindo o desenvolvimento urbano a partir das diretrizes ali estabelecidas

Entretanto ao lado de toda a sua importacircncia histoacuterica e de sua heranccedila cultural Satildeo

Luiacutes refletido o padratildeo socioeconocircmico do Estado do Maranhatildeo convive com graves

problemas urbanos e sociais apresentando iacutendices de qualidade vida bastante baixos

Notadamente nos itens de alfabetizaccedilatildeo emprego renda esgotamento sanitaacuterio e mortalidade

infantil o que lhe coloca entre as uacuteltimas no ranking das capitais brasileiras (SEMTHURB

2007)

De maneira geral essa situaccedilatildeo eacute fruto de um crescimento urbano carente de avanccedilos

no campo social e de um fortiacutessimo sistema econocircmico que prioriza a concentraccedilatildeo de renda

em detrimento da distribuiccedilatildeo da riqueza produzida pela sociedade Esse modelo ao

promover o empobrecimento da maioria da populaccedilatildeo tem produzido graviacutessimas distorccedilotildees

no processo de ocupaccedilatildeo do territoacuterio e consequumlentemente na produccedilatildeo do espaccedilo urbano

(VILLACcedilA 2001)

Segundo dados da entrevista e do diagnoacutestico realizado pela Prefeitura de Satildeo Luiacutes

as accedilotildees municipais na aacuterea habitacional tecircm acontecido por meio de programas diversos

quase sempre para responder a uma demanda circunstancial Os programas e investimentos

habitacionais derivam de uma sequumlecircncia de iniciativas marcadas por 4 linhas de accedilatildeo e estatildeo

consignadas no Plano Plurianual de Accedilatildeo (PPA)

a) A 1ordf linha chamada Programa Moradia Cidadatilde compreende a melhoria ou

construccedilatildeo da edificaccedilatildeo em que o ocupante possui o terreno desde que a

situaccedilatildeo fundiaacuteria e ambiental do terreno natildeo crie obstaacuteculos

b) A 2ordf linha eacute o Programa de Assentamento Humano de Interesse Social

O

programa prevecirc o reassentamento das famiacutelias que atualmente ocupam

habitaccedilotildees precaacuterias ou em situaccedilatildeo de risco em lote com infraestrutura

baacutesica em terrenos adquiridos e loteados pela Prefeitura

c) A 3ordf eacute o Programa de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

que visa basicamente

oferecer a seguranccedila juriacutedica ao ocupante do imoacutevel O Programa de

Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria jaacute chegou agrave cerca de 10000 lotes registrados de

1989-2002 (Mauro Fecury I e II Coroadinho Vila Satildeo Luis e outros) Os

lotes satildeo oriundos de aacutereas concedidas pela Uniatildeo Federal e outras

264

desapropriadas pelo municiacutepio e destinados a pessoas de ateacute 03 salaacuterios

miacutenimos atraveacutes de um contrato particular de doaccedilatildeo feito pela Prefeitura

que permite a transferecircncia do lote jaacute registrado para o nome do beneficiaacuterio

Ele eacute isento de IPTU se o imoacutevel for avaliado em menos de R$ 1000000 e o

proprietaacuterio natildeo possuir outro imoacutevel

d) A 4ordf linha eacute o Programa de Saneamento Baacutesico e Urbanizaccedilatildeo de Favelas

Os recursos deste Programa como se destinam basicamente agrave infraestrutura

satildeo aplicados principalmente pela Secretaria de Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR)

Entre os incentivos governamentais com impacto na questatildeo habitacional destaca-se

o projeto implementado a partir de 2001 denominado Planejamento e Execuccedilatildeo

Participativos atraveacutes do qual os teacutecnicos do Governo do Estado e da Prefeitura de Satildeo Luis

juntamente com representantes das 14 regiotildees administrativas do municiacutepio discutem

soluccedilotildees para as principais necessidades da comunidade Neste processo demandas de

natureza urbano-habitacional ganharam o peso da prioridade popular sendo muitos deles

resolvidosatendidos

Vale destacar que segundo dados do Pemas no periacuteodo de 1996 a 1998 foram

aplicados pelo Setor Puacuteblico investimentos no valor de R$ 182852160 na produccedilatildeo de

habitaccedilotildees envolvendo a parceria do Municiacutepio com recursos do Estado e da Uniatildeo Esses

investimentos produziram 802 unidades habitacionais sendo 422 no padratildeo embriatildeo e 380

unidades habitacionais aleacutem de 250 lotes urbanizados Foram ainda aplicados recursos na

ordem de R$ 1638350 em melhorias habitacionais e materiais de construccedilatildeo tendo sido

beneficiadas 802 unidades As 380 unidades habitacionais foram produzidas em 1996 com

recursos do programa Proacute-MoradiaCEF e contrapartida municipal no Bairro Coroadinho Os

422 embriotildees foram construiacutedos em 1997 com recursos do Programa Habitar Brasil e

contrapartida fiacutesica do municiacutepio No ano de 2004 foi concluiacuteda a construccedilatildeo de 154 unidades

habitacionais do Residencial Governador Luiz Rocha no Bairro da Cidade Operaacuteria com

recursos do Programa PARCEF no valor de R$ 347220000

Embora a Prefeitura embora tenha realizado algumas accedilotildees na aacuterea habitacional a

partir da integraccedilatildeo de vaacuterias instituiccedilotildees municipais e mesmo fora de sua estrutura

organizacional essa natildeo eacute uma praacutetica sistecircmica e consolidada

De acordo com a estrutura administrativa atual da Prefeitura Municipal de Satildeo Luis

quatro oacutergatildeos da Administraccedilatildeo podem ser identificados como diretamente vinculados agrave

Poliacutetica de Desenvolvimento Urbano Instituto Municipal da Paisagem Urbana (IMPUR)

265

Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPLAN) Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMTUR) e Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo

Urbana (SEMTHURB)

Na realidade o Poder Municipal tem tido dificuldades em instituir um processo de

coordenaccedilatildeo permanente e melhor articulado entre os oacutergatildeos municipais em diversas aacutereas de

atuaccedilatildeo Essa situaccedilatildeo embora natildeo seja exclusiva de Satildeo Luiacutes reflete a maneira autarquizada

de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal (SEMTHURB 2007)

Essa situaccedilatildeo se agrava quando se trata da relaccedilatildeo Estado e Municiacutepio pois satildeo raras

as accedilotildees compartilhadas entre essas duas instacircncias de poderes A razatildeo eacute que essas vecircm

sendo conduzidas por grupos poliacuteticos distintos que buscam consolidar suas atuaccedilotildees na

regiatildeo

Cabe destacar que uma das principais linhas da poliacutetica habitacional da Prefeitura

tem sido a tentativa de promover a geraccedilatildeo de renda para os beneficiaacuterios Nesse sentido tem

havido um compartilhamento de accedilotildees para o desenvolvimento e implementaccedilatildeo do projeto

habitacional envolvendo diversos setores (SEMTHURB 2007)

Desse modo atuam em conjunto com a equipe de projetos o Setor de Serviccedilo Social

da SEMTHURB As instituiccedilotildees SESI e SENAC poderatildeo por meio de convecircnio atuar na

formaccedilatildeo de matildeo-de-obra para construccedilatildeo civil (pedreiros carpinteiros eletricistas etc) e

para outras atividades econocircmicas - corte costura panificaccedilatildeo informaacutetica etc O objetivo eacute

que a populaccedilatildeo envolvida com o projeto seja estimulada a encontrar meios de sobrevivecircncia

gerando renda por meio do recebimento de treinamento e da criaccedilatildeo de cooperativas

No caso da construccedilatildeo civil apoacutes o treinamento os pedreiros satildeo selecionados e os

aprovados satildeo utilizados na produccedilatildeo habitacional na aacuterea do projeto Os recursos satildeo

repassados pela Prefeitura agrave Cooperativa por meio de convecircnio para que ela administre a matildeo-

de-obra com os criteacuterios de acompanhamento fixados pela Prefeitura Apoacutes o teacutermino da

obra os melhores operaacuterios satildeo reaproveitados em outros projetos habitacionais da Prefeitura

(SEMTHURB 2007)81

A fala do teacutecnico da Secretaria (2010) ratifica essas accedilotildees quando narra que

Essas accedilotildees satildeo exemplos de que o Poder Municipal embora com todas as dificuldades de recursos estrutura e da enorme dimensatildeo do problema habitacional no municiacutepio vem se dedicando a encontrar alternativas para o

81 Em Canudos Terra Livre por meio de projeto financiado pelo programa Proacute-Moradia pretendeu-se ampliar essas experiecircncias realizando-se cursos de formaccedilatildeo de matildeo-de-obra em especial na aacuterea de construccedilatildeo civil para capacitar a populaccedilatildeo local a participar da execuccedilatildeo das obras

266

enfrentamento de uma demanda habitacional tatildeo complexa e diversificada Certamente satildeo iniciativas ainda embrionaacuterias que necessitam de um tempo de maturaccedilatildeo para serem avaliadas e reproduzidas em escala maior Poreacutem os resultados satildeo animadores e mostram novas possibilidades de accedilatildeo nessa aacuterea

De acordo com dados do Diagnoacutestico as caracteriacutesticas das unidades habitacionais

produzidas ou financiadas pelo Municiacutepio satildeo

a) As 380 unidades habitacionais produzidas pelo programa Proacute-MoradiaACEF

de 1996 no Bairro Coroadinho constituiacuteram-se de uma edificaccedilatildeo de 4000

msup2 de aacuterea construiacuteda com custo meacutedio por metragem quadrada de R$ 67

50 alcanccedilando o valor de R$ 270000 por unidade habitacional (valores da

eacutepoca e referentes apenas a material) A Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR) foi a executora do projeto adotando o sistema de

autoconstruccedilatildeo

b) As 422 unidades habitacionais de embriatildeo produzidas no Programa Habitar

Brasil 1997 constituiacuteram-se basicamente de um nuacutecleo de 2400 msup2 sem

revestimento composto por dois cocircmodos de permanecircncia

quarto e sala

uma cozinha e um banheiro O custo de construccedilatildeo alcanccedilou o valor de R$

190171 por unidade habitacional a preccedilo meacutedio de R$ 79 2400 o metro

quadrado (valores da eacutepoca) As primeiras unidades foram concluiacutedas em

1999 A contrapartida da Prefeitura foi realizada por meio do apoio teacutecnico e

logiacutestico e remuneraccedilatildeo de parte da matildeo-de-obra

No diagnoacutestico tambeacutem se verificou dados sobre o mercado imobiliaacuterio com

destaque para a construccedilatildeo de moradia no padratildeo popular que apresentam o custo unitaacuterio

meacutedio de R$ 19800 por metro quadrado de construccedilatildeo em uma aacuterea de moradia meacutedia com

5000msup2 em lotes com aacuterea meacutedia de 15000msup282 A relaccedilatildeo entre o preccedilo unitaacuterio meacutedio do

lote em loteamento regularizado na periferia urbana e o da gleba bruta chega a 5 vezes

conforme levantamento realizado pela UEM com base nos preccedilos praticados pelo mercado

82 O preccedilo meacutedio da moradia tiacutepica no Municiacutepio quando em loteamento ou aacuterea regularizada alcanccedila o valor de R$ 2500000 e R$ 1500000 quando situada em loteamentos irregulares ou clandestinos natildeo havendo diferenccedila de valor nesse caso O preccedilo meacutedio do lote popular em torno de R$ 3000m2 quando em loteamento ou aacuterea regularizada se altera para R$ 1300m2 quando localizado em loteamento irregular Quanto ao comprometimento da renda familiar com aluguel conforme informaccedilatildeo levantada pela equipe da UEM a situaccedilatildeo eacute criacutetica para a populaccedilatildeo de um modo geral repercutindo mais nas famiacutelias com renda de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos Estas chegam a comprometer cerca de 30 de sua renda com aluguel mesmo patamar de comprometimento observado no caso das famiacutelias com rendimento de 3 a 5 salaacuterios miacutenimos (SEMTHURB 2010)

267

local demonstrando a dificuldade da populaccedilatildeo de baixa renda em adquirir uma moradia

regular

Logo eacute importante enfatizar que a experiecircncia entretanto mostrou a baixa eficiecircncia

dos programas pontuais A existecircncia de um Conselho a constituiccedilatildeo do Fundo e uma Poliacutetica

habitacional de caraacuteter participativo poderatildeo garantir seguranccedila de que os recursos destinados

aacute aacuterea de habitaccedilatildeo teratildeo a sua utilizaccedilatildeo comprometida com os objetivos aos quais se

destinam ampliando as condiccedilotildees de tornar articuladas as accedilotildees

Cabe ressaltar que natildeo existem em vigor instrumentos juriacutedicos para a

institucionalizaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de uma Poliacutetica Habitacional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

O projeto de Lei de criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo foi enviado agrave

Cacircmara Municipal em 2004 mas ainda natildeo foi implementado

Os instrumentos urbaniacutesticos tais como Plano Diretor Lei de Zoneamento

Parcelamento Uso e Ocupaccedilatildeo do Solo Lei das Operaccedilotildees Urbanas e Lei de Zonas Interesse

Social (ZIS) foram concebidos e aprovados precedidos de amplo debate envolvendo diversos

segmentos da sociedade local

Agrave eacutepoca o conjunto da legislaccedilatildeo representou avanccedilos conceituais e metodoloacutegicos incorporou novos instrumentos de planejamento e gestatildeo e positivamente apontou diretrizes de soluccedilatildeo urbano-espacial e de enfrentamento agrave irregularidade habitacional Todavia a implementaccedilatildeo efetiva dos instrumentos existentes ainda eacute insatisfatoacuterio do ponto de vista da capacidade de facilitar o funcionamento do mercado habitacional na cidade (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2009)

Concorre para essa situaccedilatildeo de um lado a geografia do Municiacutepio suas condiccedilotildees

ambientais a situaccedilatildeo de terrenos da Uniatildeo

marinha e acrescidos especialmente no

segmento constituiacutedo por famiacutelias de baixa renda respeitando-se os padrotildees culturais soacutecio-

econocircmicos da populaccedilatildeo e tendo em vista os princiacutepios de racionalidade no processo de

ocupaccedilatildeo do solo e construccedilatildeo do espaccedilo a cultura urbaniacutestica de ocupaccedilatildeo do solo De outro

lado o estado de pobreza de grande parte da populaccedilatildeo que vem ocupando

desordenadamente o espaccedilo urbano menos valorizado e o que lhe eacute disponibilizado aleacutem do

acelerado e dinacircmico processo de urbanizaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes (SEMTHURB 2007)

Todo esse quadro se associa agrave complexidade de aplicaccedilatildeo da maioria das leis que

em face agrave dinacircmica do crescimento desordenado afastam-se do seu caraacuteter regulamentador

passando a servir tatildeo somente em seus aspectos reparadores Ademais acrescente-se a

268

fragilidade teacutecnico-operacional da Prefeitura Municipal particularmente do seu setor de

fiscalizaccedilatildeo que se ressente de uma melhor estrutura e corpo teacutecnico (SEMTHURB 2007)

Atualmente haacute uma carecircncia no controle de obras e o sistema de informaccedilatildeo se interligado e retroalimentado corretamente poderia facilitar o acesso a essa informaccedilatildeo As informaccedilotildees advindas do geoprocessamento contribuiriam imensamente para um acompanhamento mais efetivo de obras novas que inclusive geram recursos para o municiacutepio atraveacutes do pagamento de tributos (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Nota-se portanto que haacute necessidade de uma qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo

urbana uma tecnologia que emita informaccedilatildeo precisa sobre o crescimento da cidade sobre as

suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar a cidade de modo preventivo com

planejamento de accedilotildees que acompanhem o seu desenvolvimento

Assim para se ter uma gestatildeo qualificada faz-se necessaacuterio primeiramente a

qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa bem como o seu redimensionamento na

medida em que o trabalho com Programas e Projetos Especiais requer essas exigecircncias

Aliado a essa primeira exigecircncia dispor de ferramentas adequadas para o gerenciamento da

cidade atraveacutes do geoprocessamento

No que tange ao processo de fortalecimento da gestatildeo do planejamento urbano

municipal cabe destacar a implementaccedilatildeo do Orccedilamento Participativo a partir de 1998 e

vem se consolidando como importante instrumento de participaccedilatildeo direta dos muniacutecipes

(SEMTHURB 2007)

Outro aspecto a destacar foi o iniacutecio do processo de discussatildeo do Plano Estrateacutegico

da Cidade de Satildeo Luiacutes ao final de 2001 com a mobilizaccedilatildeo de oacutergatildeos puacuteblicos e entidades

representativas da sociedade Em 2002 apoacutes jornadas temaacuteticas foi realizada a Conferecircncia

da Cidade onde foi elaborado o documento estabelecendo as diretrizes princiacutepios linhas

estrateacutegicas metas

a Carta da Cidade Em 2003 foram realizados os estudos teacutecnicos as

propostas de accedilatildeo e elaboraccedilatildeo dos projetos identificados como prioritaacuterios O IPLAM

assumiu a secretaria executiva desse processo (SEMTHURB 2007)83

Dessa maneira o municiacutepio tem o papel de gerar a melhor qualidade de vida para sua

populaccedilatildeo o que eacute difiacutecil complexo pois natildeo eacute apenas fazendo urbanizaccedilatildeo e construindo

casas que se eleva a qualidade de vida ao lado disso eacute preciso haver programas de todas as

esferas de governo para que se tenha geraccedilatildeo de renda Os nuacutecleos de ocupaccedilatildeo indevida

83 Segundo o Diagnoacutestico inicialmente foram estabelecidos trecircs temas baacutesicos para discussatildeo Gestatildeo Democraacutetica Desenvolvimento Sustentaacutevel e Desenvolvimento Urbano e Meio ambiente

269

passam geralmente a ser locais que abrigam uma populaccedilatildeo sem renda o que acarreta em

uacuteltima instacircncia um local de constante violecircncia

Quanto agraves poliacuteticas e aos programas habitacionais a necessidade mais urgente eacute o

conhecimento das populaccedilotildees que hoje jaacute residem em subnormalidade Para conhecimento

dessas habitaccedilotildees e dos nuacutecleos que surgem a cada momento Satildeo Luiacutes assim como a maioria

das cidades principalmente as capitais que estatildeo em franco desenvolvimento vem sofrendo

um crescimento pautado na inexistecircncia de mecanismos de controle sobre as aacutereas de

ocupaccedilatildeo indevida principalmente aacutereas de proteccedilatildeo ambiental aacutereas de mananciais aacutereas de

encostas de rios e aacutereas baixas por exemplo Sobre as aacutereas baixas que satildeo terras da Uniatildeo o

municiacutepio natildeo tem controle absoluto o que dificulta sobremaneira a gestatildeo municipal

Programa de Prevenccedilatildeo Contenccedilatildeo e Controle de Ocupaccedilotildees Irregulares (SEMTHURB

2007) Portanto o cadastramento das ocupaccedilotildees indevidas aliado a programas estaduais

federais e municipais poderaacute garantir melhores condiccedilotildees de vida aos habitantes que hoje

vivem em condiccedilotildees bastante desfavoraacuteveis

Uma das medidas poderia ser a produccedilatildeo de lotes urbanizados que no entanto para

ser viaacutevel poderia ter seus custos minimizados discutindo-se as normativas do governo que

muitas vezes natildeo conseguem ser cumpridas pelos municiacutepios devido ao alto grau de

exigecircncia (SEMTHURB 2007)

A exemplo desse toacutepico algumas qualificaccedilotildees dos programas puacuteblicos por serem

elaborados com regras gerais deixa de observar as caracteriacutesticas particulares de cada

municiacutepio impedindo a sua participaccedilatildeo em programas e projetos conforme a fala do

entrevistado

A contrapartida do municiacutepio em aquisiccedilatildeo de lotes se torna extremamente onerosa pois eacute necessaacuterio que esses sejam adquiridos de empresas particulares pois natildeo se tem acesso agraves terras puacuteblicas na medida em que elas se tornam inviaacuteveis a serem usadas nesses programas Como consequumlecircncia do alto custo da aquisiccedilatildeo de lotes os recursos que restam nem sempre satildeo suficientes para o investimento na infraestrutura ou na produccedilatildeo de mais unidades habitacionais Por outro lado as terras que satildeo adquiridas encontram-se quase sempre afastadas do nuacutecleo urbano o que requer a implantaccedilatildeo de infraestrutura que dote o local de acesso e de qualificaccedilatildeo necessaacuterios para seu funcionamento Se pudeacutessemos usar terras de nuacutecleos urbanos poderiacuteamos tambeacutem utilizar a infraestrutura do local integrando as novas habitaccedilotildees a um nuacutecleo urbano jaacute existente preencher os vazios urbanos de forma organizada e ordenada escolhendo locais apropriados facilitaria sobremaneira a gestatildeo da cidade (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

270

De acordo com os dados levantados na pesquisa uma das grandes dificuldades do

municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra Satildeo Luiacutes por ser uma ilha tem suas terras

como patrimocircnio da Uniatildeo o que dificulta a aplicaccedilatildeo dos programas governamentais Uma

das primeiras exigecircncias por exemplo eacute a titulaccedilatildeo da terra o que eacute praticamente impossiacutevel

de se fazer em aacutereas da Uniatildeo impossibilitando de repassar a titularidade da terra aos

ocupantes muitas vezes exigecircncia do programa puacuteblico (Entrevista concedida pelo teacutecnico

da SEMTHURB 2009)

Pode-se entatildeo concluir que Satildeo Luiacutes apresenta caracteriacutesticas similares em relaccedilatildeo a

Beleacutem no que diz respeito aos modelos de gestatildeo implementados uma vez que esse modelo

demonstra a baixa efetividade da poliacutetica habitacional e que boa parte das accedilotildees no acircmbito

habitacional foram realizadas pelos governos estaduais (COHABs) capital imobiliaacuterio e

incorporadoras acarretando no aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees que retratam

o papel do Estado como ator decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da segregaccedilatildeo

espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do capital

imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrentaram a problemaacutetica da moradia popular

As intervenccedilotildees na aacuterea de moradia ficaram restritas agraves accedilotildees pontuais de concessatildeo

de tiacutetulos de aforamento uso e posse de terrenos inovando-se nas iniciativas de

desapropriaccedilatildeo para reassentamento embora se mantivesse o sistema de remoccedilatildeo de famiacutelias

de aacutereas de risco

Nesse sentido a habitaccedilatildeo passa a ser vista como um investimento complementar

necessaacuterio as condiccedilotildees de produccedilatildeo ao mesmo tempo em que eacute parte das condiccedilotildees de

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho

Para Castells (1893) e Lojkine (1981) o investimento do setor privado na produccedilatildeo

das condiccedilotildees gerais de produccedilatildeo das quais a moradia eacute parte soacute eacute produtivo ateacute certo limite

a partir do qual torna-se desinteressante economicamente falando Eacute nesse momento que o

Estado eacute conclamado a intervir tendo em vista liberar as empresas desse ocircnus a criar as

condiccedilotildees para o processo de produccedilatildeo e acumulaccedilatildeo A produccedilatildeo da moradia como visto

apresenta caracteriacutesticas especiacuteficas Resulta da articulaccedilatildeo de trecircs fatores uso privado do

solo materiais e a construccedilatildeo propriamente dita

O montante de capital exigido para o investimento e o tempo em que ele permanece

sem retorno (imobilizado no processo de construccedilatildeo) provoca a necessidade de uma taxa

maior de lucro o que determina o aumento do preccedilo das moradias ao mesmo tempo em que

desestimula o investimento privado no setor O caraacuteter socialmente necessaacuterio da habitaccedilatildeo

271

tem efeitos sobre a circulaccedilatildeo da mercadoria e a estrutura do seu processo de produccedilatildeo Para

tornaacute-los mais aacutegil nele intervecircm dois tipos de capital o produtivo (construccedilatildeo) e o de

circulaccedilatildeo (imobiliaacuterio) que podem ou natildeo ser compatiacuteveis dependendo do modo de

produccedilatildeo Para que o capital produtivo aumente sua rentabilidade eacute preciso que o capital de

circulaccedilatildeo ou a renda da terra diminua a sua Se a rentabilidade do capital de circulaccedilatildeo cai

diminui o investimento no setor e surge a crise (TOPALOV 1974)

De acordo com Spoacutesito (2004) a moradia apresenta algumas caracteriacutesticas

peculiares que a diferenciam de outras necessidades humanas Primeiramente ela eacute uma

mercadoria e por isso segue as leis de mercado Seu preccedilo eacute regido por estas leis variando de

acordo com alguns aspectos como a localizaccedilatildeo e os equipamentos coletivos disponiacuteveis nas

proximidades

E continua afirmando que a habitaccedilatildeo eacute uma mercadoria relevante porque eacute de

consumo privado

assim como roupa sapato e alimentos aleacutem de ser dispendiosa porque seu

preccedilo eacute muito mais alto que grande parte dos salaacuterios e por isso eacute uma mercadoria

comumente financiada Sua produccedilatildeo eacute lenta porque depende de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido a terra A cada nova moradia exige-se um novo pedaccedilo do espaccedilo

urbano (SPOacuteSITO 2004 p 37)

O solo urbano eacute uma mercadoria sui generis porque natildeo eacute fruto do trabalho e

somente este pode agregar valor a uma mercadoria Entatildeo o valor dado agrave terra natildeo resulta da

forccedila de trabalho mas sim da capacidade de pagar de seus compradores que natildeo eacute igual para

todos os indiviacuteduos As camadas meacutedia e alta podem pagar mais e consequumlentemente se

apropriam de fragmentos urbanos privilegiados (TOPALOV 1974)

Assim as dificuldades geradas no processo de produccedilatildeo soacute poderatildeo ser resolvidas

caso a rentabilidade do setor imobiliaacuterio estimule o investimento Haacute entretanto aqui

tambeacutem outra contradiccedilatildeo jaacute mencionada entre o valor dos salaacuterios e o preccedilo da mercadoria

habitaccedilatildeo o que cria um limite aacute solvabilidade da demanda

Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo do Estado no setor sem a qual a construccedilatildeo da

habitaccedilatildeo social natildeo acontece Essa tem se dado historicamente de vaacuterios modos desde a

existecircncia de uma legislaccedilatildeo regulamentando o uso do solo e o preccedilo de alugueacuteis definindo

espaccedilos e condiccedilotildees especiais que favoreccedilam o acesso da classe trabalhadora agrave moradia ateacute

da construccedilatildeo civil por vezes o construtor eacute o proacuteprio Estado (SPOacuteSITO 2004)

Correcirca (1993 p 29) chama atenccedilatildeo para a precarizaccedilatildeo da questatildeo habitacional

272

No capitalismo as diferenccedilas satildeo muito grandes e maiores ainda em paiacuteses como entre outros os da Ameacuterica Latina A habitaccedilatildeo eacute um desses bens cujo acesso eacute seletivo parcela enorme da populaccedilatildeo natildeo tem acesso quer dizer natildeo possui renda para pagar o aluguel de uma habitaccedilatildeo decente e muito menos comprar um imoacutevel Este eacute um dos mais significativos sintomas de exclusatildeo

Dentre as poliacuteticas concebidas pelo Estado a poliacutetica urbana merece atenccedilatildeo distinta

haja vista que a intervenccedilatildeo estatal no espaccedilo urbano eacute considerada a configuraccedilatildeo mais

elaborada mais desenvolvida da resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas

produtivas (LOJKINE 1981 p 168) Assim o Estado capitalista aparece na forma de

controlar e atenuar as sequumlelas ocasionadas pela segregaccedilatildeo soacutecioespacial imposta por

muitas determinaccedilotildees isto eacute unidade do diverso (MARX 1983 p 14) da produccedilatildeo e

reproduccedilatildeo do modo capitalista

Nota-se que a Poliacutetica Municipal de Habitaccedilatildeo natildeo daacute conta de atender a demanda

populacional das aacutereas atingidas por projetos de intervenccedilatildeo urbaniacutestica visto que os recursos

satildeo limitados e podem ser utilizadas com moderaccedilatildeo no atendimento (exclusivo) agraves famiacutelias

diretamente atingidas pelas obras estabelecendo criteacuterios de acesso que limitam o nuacutemero de

moradores que receberatildeo a unidade habitacional conforme foi apresentado nos capiacutetulos

anteriores

Outro elemento importante a ser discutido em relaccedilatildeo agraves cidades de Beleacutem e de Satildeo

Luiacutes diz respeito ao padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial Percebe-se que na cidade capitalista

o acesso ao espaccedilo urbano eacute restrito e desigual para as diferentes classes sociais que nela se

encontram e que esse acesso desigual fruto da desigualdade social acaba por gerar uma (des)

articulaccedilatildeo espacial e social que por sua vez passa a gerar uma disputa tambeacutem desigual

como aponta Villaccedila (2001 p 148) [] a segregaccedilatildeo deriva de uma luta ou disputa por

localizaccedilatildeo esta se daacute no entanto entre grupos sociais ou entre classes [] A dimensatildeo da

luta aparece quando se introduz a segregaccedilatildeo por classe

De acordo com Villaccedila (2001 p 148) o resultado dessa disputa que articula e

desarticula ao mesmo tempo o espaccedilo urbano gera um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

que cada vez mais procura separardistanciar ricos e pobres e que [] a segregaccedilatildeo seria um

processo dialeacutetico em que a segregaccedilatildeo de uns provoca ao mesmo tempo e pelo mesmo

processo a segregaccedilatildeo de outros O que ele chama de segregaccedilatildeo voluntaacuteria dos mais ricos

que provoca necessariamente a segregaccedilatildeo involuntaacuteria das classes de menor renda

273

Correcirca (1989) descreve trecircs padrotildees de segregaccedilatildeo urbana tais como modelos de

Kohl de Burgess e de Hoyt84 O modelo de Kohl expressa a cidade preacute-industrial marcada

pela segregaccedilatildeo da elite agraves proximidades do centro ficando as camadas de menor poder

aquisitivo na periferia sendo um tipo de organizaccedilatildeo espacial que expressa o interesse da

elite em se localizar proacutexima agraves principais instituiccedilotildees urbanas predominando a

acessibilidade agraves fontes de poder e prestiacutegio (TRINDADE JUNIOR 1998 p 143)

Segundo Trindade Junior (1998 p 143) o modelo de Burgess eacute um tipo de

organizaccedilatildeo espacial e de segregaccedilatildeo no qual os podres passam a habitar os centros

deteriorados e desvalorizados enquanto a elite habita os subuacuterbios apraziacuteveis em virtude do

processo de dispersatildeo de determinadas atividades Jaacute o modelo de Hoyt define um tipo de

segregaccedilatildeo espacial setorizada a partir do centro no qual as aacutereas residenciais de mais alto

padratildeo tenderiam a se localizar nos setores de amenidades e estariam cercadas pelos setores

meacutedios diametralmente opostos encontrar-se-ia um setor mais amplo no qual estaria

localizada a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Dessa forma ressalta-se que em Beleacutem o padratildeo de segregaccedilatildeo que mais se

assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual se percebe

que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas proacuteximas ao

centro

Trindade Junior (1998) argumenta que no momento em que se processa a dispersatildeo

dos assentamentos e da ampliaccedilatildeo do urbano esses locais satildeo valorizados em detrimento dos

novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo dos mesmos pelos agentes que

podem pagar para usufruir da acessibilidade Esses locais passam entatildeo a sofrer

investimentos do capital imobiliaacuterio e incorporador aleacutem disso o Estado atua nessas aacutereas

com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais valorizadas

pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

De acordo com O Neill (1986 apud TRINDADE JUNIOR 1998 p 152) a auto-

segregaccedilatildeo se daacute a partir

[] de modo geral no acircmbito dos grupos sociais dominantes Contudo outros grupos como os assalariados de alto rendimento tecircm se deslocado para aacutereas especificas das cidades criando nelas condiccedilotildees de auto-segregaccedilatildeo Por se constituiacuterem tambeacutem em parte do setor de demanda solvaacutevel do mercado habitacional atraem para si a accedilatildeo dos agentes modeladores Mas esta accedilatildeo soacute eacute possiacutevel na medida em que estes grupos

84 Embora esse tipo de anaacutelise tenha sido superado eacute importante destacar pela descriccedilatildeo da organizaccedilatildeo espacial urbana

274

estatildeo propensos a aceitar os mecanismos criados para moldar suas preferecircncias habitacionais Os novos valores de consumo habitacional permitem a reproduccedilatildeo dos grupos de renda mais alta num ambiente criado especialmente para eles ao mesmo tempo que esta reproduccedilatildeo se constitui em uma garantia para a continuidade da sociedade capitalista dado o niacutevel de renda que estes grupos possuem criando condiccedilotildees de consumo e tendo em vista a reproduccedilatildeo dos quadros profissionais necessaacuterios agrave sociedade Em oposiccedilatildeo a segregaccedilatildeo imposta daacute origem agraves aacutereas residenciais dos grupos de renda mais baixa A formaccedilatildeo destas aacutereas se faz tambeacutem a partir da decomposiccedilatildeo e recomposiccedilatildeo do espaccedilo urbano em direccedilatildeo principalmente agraves aacutereas perifeacutericas preteridas pelos grupos de renda mais alta e agentes que atuam neste modelo Muitas vezes os grupos sem opccedilatildeo de participaccedilatildeo no mercado habitacional utilizam-se de mecanismos espontacircneos para obterem suas moradias Tais mecanismos imprimem a estas aacutereas um ar de informalidade aparente mas na verdade tambeacutem aiacute o uso do solo vem sendo manipulado pelos agentes modeladores do solo

Desse modo a cidade vai ser dividida entre o espaccedilo dos que possuem maior poder

aquisitivo espaccedilo seletivo frequumlentado por aqueles que tecircm altos niacuteveis de renda ou seja os

espaccedilos da auto-segregaccedilatildeo e os espaccedilos dos que possuem menor poder aquisitivo

reduzidos visto que se em sua maioria natildeo tecircm nem condiccedilotildees de possuir uma habitaccedilatildeo que

seja adequada com infraestrutura baacutesica saneamento entre outros

Para Correcirca (1993 p 64) a classe dominante ou algumas de suas fraccedilotildees contribuem

para a segregaccedilatildeo pois

Sua atuaccedilatildeo se faz de um lado atraveacutes da auto-segregaccedilatildeo na medida em que ela pode efetivamente selecionar para si as melhores aacutereas excluindo-as do restante da populaccedilatildeo iraacute habitar onde desejar [] por outro lado segrega os outros grupos sociais na medida em que controla o mercado de terras a incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria e a construccedilatildeo direcionando seletivamente a localizaccedilatildeo dos demais grupos sociais no espaccedilo urbano Indiretamente atua atraveacutes do Estado

Como as poliacuteticas de implantaccedilatildeo e lanccedilamento dos conjuntos habitacionais e dos

loteamentos populares - regulares ou natildeo - satildeo marcadas pelo afastamento espacial e

precariedade das condiccedilotildees de vida urbana os pobres satildeo obrigados a conviver nas aacutereas

mais distantes ficando refeacutens dos territoacuterios em que habitam daiacute a ideacuteia de segregaccedilatildeo

induzida (SPOacuteSITO 2004)

As atuais configuraccedilotildees espaciais e sociais na cidade de Satildeo Luiacutes demonstram um

momento de forte diferenciaccedilatildeo com a verticalizaccedilatildeo e a expansatildeo urbana horizontal

inerentes agraves grandes capitais brasileiras aleacutem da existecircncia de rupturas entre os vaacuterios grupos

sociais organizaccedilotildees e territoacuterios urbanos evidenciando os processos de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial na proliferaccedilatildeo dos novos estilos de morar e de (con)viver no espaccedilo urbano

275

Cabe dizer que esse novo estilo de morar viver e conviver tem se propagado entre a

classe de maior poder aquisitivo acarretando em uma clara distinccedilatildeo entre as classes uma vez

que a classe de padratildeo mais elevado habita aacutereas diferentes das classes meacutedias por exemplo

Em Beleacutem a opccedilatildeo por moradias em condomiacutenios de meacutedio e de alto padratildeo

projetados vertical ou horizontalmente nos eixos Entroncamento-Icoaraci pela Rodovia

Augusto Montenegro e Beleacutem-Ananindeua pela Rodovia BR-316 tem se constituiacutedo em um

dos elementos marcantes da segregaccedilatildeo soacutecioespacial na cidade uma que vez satildeo

incentivados pelos promotores imobiliaacuterios os quais dotam as aacutereas de uma infraestrutura

interna de serviccedilos e lazer (salotildees de festas academias de ginaacutestica lojas supermercados

entre outros) e vendem mais que uma moradia vendem a seguranccedila o conforto e a paisagem

usando-se como justificativa para a consolidaccedilatildeo desses novos habitats urbanos o alto iacutendice

de violecircncia urbana Esses condomiacutenios fechados de enclaves fortificados conferem tambeacutem

um status A construccedilatildeo de siacutembolos de status eacute um processo que elabora diferenccedilas sociais e

cria meios para a afirmaccedilatildeo de distacircncia e desigualdade sociais

Assim verifica-se a consolidaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo urbana convivendo dentro de

um mesmo espaccedilo (a cidade) com processos de segregaccedilatildeo induzida que empurra a camada

de menor poder aquisitivo para as aacutereas sem infraestrutura saneamento equipamentos

urbanos etc Essas novas configuraccedilotildees se datildeo como fruto das praacuteticas accedilotildees e estrateacutegias

dos diversos agentes produtores do espaccedilo urbano geradoras de uma estruturaccedilatildeo urbana

descontiacutenua e segregadora

Para Spoacutesito (2004) a segregaccedilatildeo urbana pode ser vista e entendida como um

processo estrutural ou seja os principais fatores que geram a auto-segregaccedilatildeo e a segregaccedilatildeo

induzida encontram-se na proacutepria sociedade no modo como a sociedade encontra-se

organizada e funciona no estilo de vida e na cultura dominante

Na cidade de Satildeo Luiacutes um significativo processo de verticalizaccedilatildeo pode ser visto na

chamada Cidade Nova onde haacute uma concentraccedilatildeo de escritoacuterios shoppings condomiacutenios

verticais de padratildeo meacutedio e alto e restaurantes situados na orla aleacutem disso a inserccedilatildeo da

cidade no roteiro turiacutestico regional e nacional levou a um massivo investimento na rede

hoteleira Estes fatos acarretaram na transformaccedilatildeo da cidade intensificando a economia e

modernizando seu espaccedilo urbano

Entretanto os condomiacutenios e serviccedilos ofertados aos grupos de maior poder aquisitivo

levam a uma segregaccedilatildeo urbana crescente uma vez que a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo natildeo recebe as benesses da modernizaccedilatildeo da cidade

276

Nesse sentido pode-se dizer que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano no norte da cidade de

Satildeo Luiacutes eacute resultante de uma maior homogeneizaccedilatildeo desse espaccedilo uma vez que se verifica a

tendecircncia da separaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo por meio do emuralhamento das classes com alto

padratildeo aquisitivo

De acordo com Costa (2009) um elemento que deve ser destacado quando se analisa

a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia em Satildeo Luiacutes eacute o sistema poliacutetico oligaacuterquico

estadual que se traduz como patrimonialista e clientelista uma vez que essa produccedilatildeo serve

para atender aos interesses de indiviacuteduos que estatildeo no poder os quais exercem a funccedilatildeo de

empresaacuterios e que deteacutem o controle de serviccedilos

A produccedilatildeo de riquezas pelos grupos dominantes se daacute a partir da construccedilatildeo de patrimocircnios (casas apartamentos fazendas) compra de carros do ano e da moda se constituem empresaacuterios bem sucedidos do comeacutercio de postos de gasolina hospitais escolas hoteacuteis concessionaacuterias Corrupccedilatildeo sistecircmica que produz e reproduz a miseacuteria social e que encontra em Satildeo Luiacutes seu espelho invertido pois alimentou o boom imobiliaacuterio dos condomiacutenios e apartamentos de luxo destinados em vaacuterios casos agrave lavagem de dinheiro (segundo as investigaccedilotildees da PF) Contrapondo nu

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277

urbano que natildeo giram especificamente em torno da produccedilatildeo econocircmica mas do consumo

O interesse se daacute a partir da apropriaccedilatildeo diferenciada do produto do trabalho que satildeo as

vantagens locacionais Isso ocorre porque o espaccedilo urbano eacute heterogecircneo Se as pessoas

estivessem uniformemente distribuiacutedas na cidade os diversos espaccedilos de consumo tenderiam

a satisfazer agrave grande maioria das pessoas (VILLACcedilA 2001 p 97)

A distinccedilatildeo mais importante entre espaccedilo intra-urbano e espaccedilo regional deriva dos transportes e das comunicaccedilotildees Quer no espaccedilo intra-urbano quer no regional o deslocamento de mateacuteria e do ser humano tem um poder estruturador bem maior do que o deslocamento da energia ou das informaccedilotildees A estruturaccedilatildeo do espaccedilo regional eacute dominada pelo deslocamento das informaccedilotildees da energia do capital constante e das mercadorias em geral

eventualmente ateacute da mercadoria forccedila de trabalho O espaccedilo intra-urbano ao contraacuterio eacute estruturado fundamentalmente pelas condiccedilotildees de deslocamento do ser humano seja enquanto portador da mercadoria forccedila de trabalho

como no deslocamento casatrabalho - seja enquanto consumidor

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho deslocamento casas-compra casa lazer escola etc Exatamente daiacute vem por exemplo o enorme poder estruturador intra-urbano das aacutereas comerciais e de serviccedilos a comeccedilar pelo proacuteprio centro urbano Tais aacutereas mesmo nas cidades industriais satildeo as que geram e atraem a maior quantidade de deslocamentos (viagens) pois acumulam os deslocamentos de forccedila de trabalho

os que ali trabalham

com os consumidores

os que ali fazem compras e vatildeo aos serviccedilos (VILLACcedilA 2001 p 20)

A argumentaccedilatildeo de Villaccedila (2001 p 38) para se compreender a dinacircmica intra-

urbana parte do conceito de terra-localizaccedilatildeo as quais satildeo fraccedilotildees da terra urbana (terra-

capital) que desfrutam de determinados graus de acessibilidade e de trabalho acumulado

Assim o preccedilo da terra-localizaccedilatildeo tem um componente essencial que eacute o preccedilo

monopoacutelio

Todo proprietaacuterio de uma terra-localizaccedilatildeo no acircmbito do espaccedilo urbano eacute proprietaacuterio de um bem uacutenico irreproduziacutevel Considerando que nem todos os proprietaacuterios possuem as mesmas vantagens quanto as suas propriedades Embora toda localizaccedilatildeo seja uacutenica haacute entre elas vaacuterios graus de acessibilidades e de trabalho acumulado Na maioria das vezes os proprietaacuterios de lotes perifeacutericos natildeo desfrutam de vantagens no tocante a esses atributos (VILLACcedilA 2001 p 39)

De acordo com Trindade Junior (1998) a dispersatildeo dos assentamentos a expansatildeo

do ambiente construiacutedo e o trabalho social acumulado tendem cada vez mais a elevar os

preccedilos dos imoacuteveis em setores ou regiotildees especificas que por sua vez poderatildeo ser

apropriados e concentrados por um grupo privilegiado de agentes Para tanto ele destaca o

278

capital incorporador como elemento importante dessa tendecircncia uma vez que as empresas

imobiliaacuterias garantem a promoccedilatildeo de moradias com retornos expressivos pelos investimentos

realizados nos espaccedilos urbanos

Dessa forma o mercado imobiliaacuterio exerce sua influecircncia nos processos de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial e exclusatildeo social a partir da construccedilatildeo de cenaacuterios e necessidades

imaginaacuterios vendidos para uma parcela da populaccedilatildeo em busca de status por meio de

grandes campanhas de marketing como por exemplo a venda de lotesterrenos a altos preccedilos

em condomiacutenios ou loteamentos fechados

Maricato (2000 p159) afirma que a escassez de moradias e a segregaccedilatildeo territorial

satildeo produtos de um mercado imobiliaacuterio que entre outras coisas vende o cenaacuterio e a

paisagem como signos de distinccedilatildeo de renda e de poder acirrando os processos excludentes e

segregativos no interior dos espaccedilos urbanos brasileiros Para Spoacutesito (2004 p79) os

interesses fundiaacuterios e imobiliaacuterios desempenham um papel primaz no processo de produccedilatildeo e

estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Tal posiccedilatildeo do capital de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria decorre das particularidades da relaccedilatildeo entre a habitaccedilatildeo e o espaccedilo urbano Primeiro porque o caraacuteter imoacutevel do produto faz com que a reproduccedilatildeo do capital tenha como pressuposto a sua permanente mobilidade espacial A cada novo ciclo um terreno eacute necessaacuterio Segundo porque a potencialidade construtiva da terra natildeo se resume a seus atributos de meio de produccedilatildeo e suporte fiacutesico mas tambeacutem como meio de consumo para isso necessita estaacute em conexatildeo com uma complexidade de bens e serviccedilos urbanos que dependem de processos econocircmicos poliacuteticos e simboacutelicos Essa dinacircmica pressupotildee uma loacutegica de expropriaccedilatildeo natildeo podendo existir fronteira urbano-imobiliaacuteria sem essa loacutegica E o setor imobiliaacuterio eacute estrateacutegico nesse sentido (TRINDADE JUNIOR 1998 p 157)

Pode-se afirmar entatildeo que o mercado imobiliaacuterio influencia diretamente nos

processo de planejamento e gestatildeo das cidades aqui em especial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luiacutes impondo um planejamento urbano baseado em princiacutepios antidemocraacutetico e

favorecendo interesses da classe dominante aleacutem de promover a manutenccedilatildeo e o aumento dos

processos de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de exclusatildeo social

Destarte a estrutura urbana natildeo pode ser compreendida somente como organismo do

tecido urbano pois natildeo existe um modelo exclusivo de estrutura de cidade e sim satildeo

diferentes estruturas e simbolismos

Portanto o Estado enquanto organizador do espaccedilo urbano ao mesmo tempo em que

promove agrave poliacutetica habitacional de interesse social nega a habitaccedilatildeo a quem dela necessita

279

Essa poliacutetica quando oficializada pode prever mecanismos para efetivaccedilatildeo do Plano Diretor

de Beleacutem e de Satildeo Luiacutes a fim de respaldar os direitos das famiacutelias atingidas pelas

intervenccedilotildees de renovaccedilatildeo urbana e eliminar o deacuteficit habitacional das aacutereas de intervenccedilatildeo

Nesse sentido cabe ressaltar que a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia eacute de suma

importacircncia para a resoluccedilatildeo do caos urbano Pode ser alcanccedilada a compreensatildeo de que a

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional eacute um dos caminhos para a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da

cidade tornando-a um lugar onde todos possam viver de forma digna

[] nesta perspectiva o habitar deixa de ser representado simplesmente pela unidade habitacional como produto acabado de consumo passando a ser compreendido como parte de um processo expressando a forma de inserccedilatildeo social e econocircmica de seu ocupante partiacutecipe enquanto sujeito histoacuterico da construccedilatildeo e implementaccedilatildeo de um plano de accedilatildeo de poliacuteticas urbanas (ABELEacuteM 1989 p 64)

Assim a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

habitacionais das cidades para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

280

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Pretendeu-se nessa tese trazer agrave cena reflexotildees sobre a gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim como os impactos na organizaccedilatildeo

espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das cidades de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-

Ma e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais

Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da

poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e

excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando

em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O modelo de desenvolvimento urbano implementado tem contribuiacutedo para aumentar

a exclusatildeo social econocircmica poliacutetica e cultural de uma grande parcela da populaccedilatildeo A falta

de alternativas em relaccedilatildeo agrave moradia leva essa populaccedilatildeo a ocupar espaccedilos inadequados para a

habitaccedilatildeo como encostas vaacuterzeas inundaacuteveis beiras de rios e cursos d aacutegua e ateacute mesmo

aacutereas de proteccedilatildeo de mananciais Essas ocupaccedilotildees frequumlentemente ilegais caracterizam-se

tambeacutem pela construccedilatildeo de moradias muito precaacuterias e em regiotildees sem nenhuma

infraestrutura

Desse modo o processo de urbanizaccedilatildeo nas grandes cidades em especial nas duas

capitais estudadas revela a face avassaladora do modo de produccedilatildeo capitalista na qual a

necessidade de obtenccedilatildeo de espaccedilos e a transformaccedilatildeo dos mesmos em mercadoria

transformam a cidade num palco de luta pelo domiacutenio e pelo poder

Constatou-se que ao longo das uacuteltimas cinco deacutecadas as poliacuteticas puacuteblicas urbanas

natildeo foram eficazes para resolver os principais problemas das cidades estudadas gerando os

conflitos causados pelo baixo padratildeo de vida constituindo-se em contradiccedilotildees do

funcionamento do proacuteprio sistema capitalista

A cidade como forma concretizada do processo de urbanizaccedilatildeo eacute um produto e

condiccedilatildeo de (re) produccedilatildeo de uma sociedade O espaccedilo urbano eacute produzido de modo desigual

em um processo complexo e dinacircmico onde ocorre tanto a expansatildeo do tecido urbano quanto

a verticalizaccedilatildeo em determinadas partes das cidades

Nota-se que a poliacutetica urbana foi orientada para atender a demanda do capital

monopolista expandindo a infraestrutura serviccedilos de comunicaccedilatildeo e de transporte Por meio

de medidas governamentais o Estado procurou garantir todo o suporte necessaacuterio para a

281

dinacircmica industrial aleacutem disso investiu esforccedilos para a expansatildeo nacional da infraestrutura

de transporte o que estimulou a migraccedilatildeo intensiva em direccedilatildeo agraves aacutereas urbanas em busca de

melhores condiccedilotildees de vida

A trajetoacuteria da poliacutetica habitacional eacute notadamente marcada por diversos atores

sociais que estabelecem uma correlaccedilatildeo de forccedilas entre suas posiccedilotildees ocupadas no espaccedilo

social e no espaccedilo fiacutesico Isto se constitui segundo Bourdieu (2001) como um fator simboacutelico

importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do proacuteprio posicionamento social desses atores

Cabe destacar nesse aspecto que no processo de implementaccedilatildeo da poliacutetica

habitacional haacute de um lado as camadas populares que buscam espaccedilos de moradia em aacutereas

insalubres com enorme carecircncia de serviccedilos urbanos essenciais reforccedilando um ciclo de

pobreza cada vez mais difiacutecil de ser rompido e de outro lado a figura do Estado que surge

para atender aos interesses das classes dominantes exercendo sobre a classe trabalhadora

accedilotildees de controle repressatildeo e exclusatildeo Contraditoriamente este mesmo Estado direciona

suas accedilotildees para atender as demandas populares com o objetivo de obter legitimidade

Como ressalta Jacobi (1988) se o Estado cede controla e ateacute impotildee demandas e

canais de filtragem das reivindicaccedilotildees os movimentos sociais alteram suas estrateacutegias de

accedilatildeo passando a agir coletivamente numa nova modalidade de accedilatildeo natildeo fazendo somente

reivindicaccedilotildees mas sobretudo garantindo o controle das poliacuteticas puacuteblicas

Nessa luta pelo espaccedilo tambeacutem se pode identificar os interesses dos grupos

econocircmicos ligados aos processos de acumulaccedilatildeo urbana e defrontando-se com estes atores

as camadas populares que fazem pressatildeo junto ao Estado exigindo deste a efetivaccedilatildeo de

serviccedilos urbanos no intuito de garantir sua sobrevivecircncia

Sendo assim a ocupaccedilatildeo do espaccedilo vai se configurando a partir das correlaccedilotildees de

forccedilas e das alteraccedilotildees intra-urbanas instituiacutedas entre os agentes produtores desse espaccedilo

colocando em evidecircncia a estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais que

estabelecem estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas tanto do lado do Estado quanto do lado

dos agentes sociais

Nota-se que nas deacutecadas de 1960 e 1970 o governo federal implementou um

processo de planejamento municipal e regional nunca antes realizado no Brasil no qual vaacuterios

oacutergatildeos federais foram criados para gerenciar incentivar e financiar a poliacutetica urbana das

cidades principalmente daqueles que formavam as regiotildees metropolitanas do Paiacutes buscando

a implantaccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional em grande escala por meio do BNH e outros

organismos

282

Entretanto os resultados dessa poliacutetica demonstram que o nuacutemero de habitaccedilotildees

construiacutedas ficou muito aqueacutem da necessidade apontada pelo deacuteficit Aleacutem disso o modelo

econocircmico de exclusatildeo social assumido pelos vaacuterios governos a partir dessas deacutecadas e o

crescimento populacional fizeram aumentar ainda mais a demanda por moradias

Destarte as necessidades do processo de acumulaccedilatildeo capitalista e de reproduccedilatildeo

ampliada das classes sociais contribuem para o caraacuteter do uso do solo na cidade do capital O

desenvolvimento das forccedilas produtivas a partir das inovaccedilotildees tecnoloacutegicas levou as unidades

de produccedilatildeo a requererem uma infraestrutura capaz de atender as suas demandas que vatildeo

desde uma boa localizaccedilatildeo ateacute a instalaccedilatildeo de modernos equipamentos com o objetivo de

favorecer a dinacircmica deste modelo econocircmico

Conforme foi discutido anteriormente Villaccedila (2001) afirma que a produccedilatildeo do

espaccedilo eacute na verdade a produccedilatildeo de localizaccedilotildees As diferentes localizaccedilotildees apresentam

diferentes valores associados natildeo somente ao valor dos elementos urbanos aiacute existentes mas

tambeacutem a maior ou menor acessibilidade aos bens e serviccedilos existentes na cidade Essa

diferenciaccedilatildeo entre valores das localizaccedilotildees explica a diferenccedila de valor das aacutereas urbanas

Os diferentes valorespreccedilos das aacutereas urbanas implicam em uma distribuiccedilatildeo

espacial da populaccedilatildeo de acordo com a capacidade desta em arcar com os custos de

localizaccedilotildees especiacuteficas Essa eacute a razatildeo da existecircncia na cidade de aacutereas onde predominam

grupos sociais homogecircneos sob o ponto de vista da renda

As aacutereas melhor localizadas e portanto com maior valor satildeo ocupadas pela

populaccedilatildeo de maior renda restando agrave parcela de menor poder aquisitivo a ocupaccedilatildeo das aacutereas

de menor valor com restrita acessibilidade a bens e serviccedilos urbanos Tal processo se

expressa na segregaccedilatildeo social do espaccedilo (SANTOS 2002)

Dessa forma a apropriaccedilatildeo mercadoloacutegica do espaccedilo urbano reforccedila as accedilotildees

clientelistas e tecnocraacuteticas do poder puacuteblico que em parceria com instituiccedilotildees privadas

priorizam fatores econocircmicos em funccedilatildeo dos sociais provocando o acirramento das

expressotildees da questatildeo social

Conforme Rolnik (2002) apesar das accedilotildees de desenvolvimento ser apresentadas

como forma de melhoria da qualidade de vida e de acesso agrave moradia digna seu objetivo natildeo eacute

suprir as necessidades humanas mas sim acumular capital posto que as accedilotildees

governamentais seguem a loacutegica das agecircncias financiadoras das obras de eficiecircncia e eficaacutecia

neste caso para os investimentos na poliacutetica habitacional

283

Quando se procura analisar compreender ou intervir no espaccedilo urbano onde se

realizam as experiecircncias humanas natildeo pode deixar de ser considerado qualquer que seja a

relaccedilatildeo dos indiviacuteduos com os lugares Poreacutem o que se tem visto eacute exatamente o contraacuterio

As poliacuteticas de renovaccedilatildeo urbana em Beleacutem e em Satildeo Luis buscando maior

funcionalidade do espaccedilo para atender a interesses dos especuladores imobiliaacuterios

comprometem as paisagens e os cenaacuterios dessas cidades que passam a sofrer intervenccedilotildees

sem que se considere a memoacuteria urbana como exemplo pode-se citar bairros tradicionais que

tiveram seus quarteirotildees transformados em shopping centers criando focos geradores de

grande traacutefego patrimocircnios arquitetocircnicos que registravam a histoacuteria e a memoacuteria da cidade

foram substituiacutedos por edifiacutecios acentuando o processo de adensando por verticalizaccedilatildeo que

elevam os preccedilos dos lotes dos terrenos e ameaccedilam outras aacutereas

Harvey (1996) ressalta que muitas das inovaccedilotildees e investimentos destinados a tornar

as cidades mais atraentes como centros culturais e de consumo foram copiadas em outros

lugares e o fato da gestatildeo urbana ser tratada como empresariamento leva agrave competiccedilatildeo

interurbana visando a atraccedilatildeo de financiamentos externos passando a tratar a cidade como

uma mercadoria como um lugar que oferece condiccedilotildees favoraacuteveis a acumulaccedilatildeo capitalista

Para Vainer (2002) os planos estrateacutegicos propostos para serem realizados nas

cidades satildeo muito semelhantes independendo dos locais ou seja eles devem vender a mesma

coisa aos mesmos compradores virtuais que tecircm invariavelmente as mesmas necessidades e

entre eles estatildeo os investidores internacionais

Complementando essa ideacuteia Harvey (1996) argumenta ainda que passando a atuar

como uma empresa a administraccedilatildeo municipal compreende a cidade como coisa cidade-

objeto ou cidade-mercadoria esquecendo de seu aspecto fundamental que eacute cidade-sujeito

Eacute necessaacuterio que se pense a cidade como um lugar em que se estabelece relaccedilotildees de

sociabilidade interesses expectativas mobilidade social e econocircmica Bourdieu (1996) diz

que a cidade eacute um poderoso e complexo campo onde inuacutemeros atores se reuacutenem munidos de

diferentes olhares perspectivas e capitais culturais a fim de disputar a definiccedilatildeo do que eacute a

proacutepria realidade

Entatildeo compreender a cidade como um lugar de accedilotildees caracteriacutesticas de uma cultura

pensamentos e percepccedilotildees permite introduzir a subjetividade dentro do esquema estruturalista

de reproduccedilatildeo social Para Bourdieu (2001 p 349) isso acontece porque o habitus eacute ao

mesmo tempo subjetivo e social Subjetivo porque diz respeito agrave interiorizaccedilatildeo de valores

normas e classificaccedilotildees e eacute social porque os elementos interiorizados fazem parte da estrutura

284

social em reproduccedilatildeo bem como as instituiccedilotildees (famiacutelia escola etc) em que satildeo produzidos

reproduzidos e consagrados

Portanto pode-se dizer que a cidade eacute capaz de ser reinventada reconstruiacuteda

cotidianamente tanto no amplo fiacutesico (obras de engenharia) como no plano das

representaccedilotildees A cidade eacute a imagem que seus cenaacuterios ajudam a constituir mas eacute tambeacutem o

imaginaacuterio que o urbano a ela impotildee complementando a sua construccedilatildeo histoacuterico-cultural na

qual o habitus eacute orientado natildeo soacute pelos interesses econocircmicos mas por elementos muitas

vezes inconscientes expressos em valores gestos religiosidade cultura etc

Partindo do estudo analiacutetico efetivado evidencia-se que as primeiras intervenccedilotildees

urbaniacutesticas nas cidades estudadas foram direcionadas por accedilotildees pontuais no setor de

saneamento seguidas de accedilotildees de infraestrutura que direcionaram o crescimento das mesmas

e o aumento da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria que satildeo refletidos no desenvolvimento do processo

de urbanizaccedilatildeo por possuir um espaccedilo de concentraccedilatildeo e de oportunidades de trabalho e por

reproduzir diariamente o fenocircmeno da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Este aspecto eacute fundamental

para se compreender a gestatildeo de poliacuteticas habitacionais atual na regiatildeo amazocircnica

Ao se analisar o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial em Beleacutem e em Satildeo Luis

constatou-se que foi constituiacuteda desde quando os primeiros colonizadores chegaram agrave regiatildeo

Todavia este processo ganhou conteuacutedo e forma com a ocupaccedilatildeo das aacutereas centrais das

cidades por uma demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo que passou a utilizar-se deste espaccedilo para

subsidiar a reproduccedilatildeo do capital em especial do capital imobiliaacuterio Assim pode-se afirmar

que nas cidades citadas a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute fruto dos deacuteficits sociais acumulados

por deacutecadas de governos descomprometidos com os interesses da maioria da populaccedilatildeo

Conforme visto no capiacutetulo V o processo de ocupaccedilatildeo nas cidades estudadas

aumentou as desigualdades sociais Isto eacute decorrente da urbanizaccedilatildeo embasada na loacutegica da

globalizaccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional que determina natildeo somente as relaccedilotildees poliacuteticas

mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees sociais e culturais

Neste contexto observa-se que a configuraccedilatildeo espacial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luis sofreu uma ampla (re)configuraccedilatildeo tornando-se necessaacuterio a cada novo ciclo

produtivo um novo solo Este fato pode ser verificado no aumento por demandas

habitacionais principalmente para as classes sociais de menor poder aquisitivo

Outro aspecto identificado foi a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano dessas duas cidades

como uma arena na qual se defrontam interesses divergentes na luta pela apropriaccedilatildeo da terra

da renda por melhores condiccedilotildees materiais e simboacutelicas de vida entre outros aspectos uma

vez por meio da anaacutelise do processo de ocupaccedilatildeo territorial nota-se que o modelo de poliacutetica

285

habitacional vem historicamente desconsiderando os laccedilos de vizinhanccedila e a sociabilidade

das famiacutelias atingidas diretamente pelas obras de infraestrutura e saneamento

Bourdieu (2001) ressalta que a cidade pode ser entendida como unidade geograacutefica

permeada de sociabilidade que eacute caracterizada por uma rede de accedilotildees e relaccedilotildees nas quais

estatildeo presentes elementos simboacutelicos e materiais nas relaccedilotildees de vizinhanccedila nos costumes

comuns na identidade na histoacuteria na cultura no parentesco nas lutas no territoacuterio

Faz-se necessaacuterio destacar as intervenccedilotildees urbaniacutesticas implementadas pelo poder

puacuteblico municipal e estadual a partir de 1990 que (re)configuraram as aacutereas de baixadas e de

palafitas Aqui em especial pode-se citar a cidade de Beleacutem uma vez que as intervenccedilotildees

realizadas foram resultantes das reivindicaccedilotildees da sociedade civil que tiveram

gradativamente suas demandas por saneamento e habitaccedilatildeo atendidas pelos gestores

Para o enfrentamento a essas demandas eacute da maior importacircncia agrave garantia de

participaccedilatildeo das populaccedilotildees atingidas no processo de elaboraccedilatildeo dos projetos urbaniacutesticos

Reforccedila-se que a participaccedilatildeo social nos projetos habitacionais eacute fundamental para diminuir

os efeitos negativos dos mesmos e para garantir

ainda que minimamente - os direitos sociais

dos moradores enquanto cidadatildeos

Benevides (1994) argumenta que uma cidadania plena eacute uma cidadania ativa que

instituiacute o cidadatildeo como portador de direitos e deveres mas essencialmente criador de

direitos por abrir novos espaccedilos de participaccedilatildeo poliacutetica onde se vecirc a possibilidade de se

ampliarem os direitos poliacuteticos para a participaccedilatildeo direta do cidadatildeo no processo das decisotildees

de interesse puacuteblico

Outro aspecto a ser enfatizado eacute que a pesquisa comprovou que poliacutetica habitacional

dos referidos municiacutepios natildeo daacute conta de atender efetivamente a demanda social por moradia

digna Os dados sobre assentamentos precaacuterios revelam um nuacutemero elevado em Beleacutem (449)

e em Satildeo Luis (115) aleacutem do alto iacutendice de famiacutelias conviventes o que acarreta na

insustentabilidade das mesmas do ponto de vista soacutecio-ambiental do territoacuterio sendo

necessaacuteria a efetivaccedilatildeo de intervenccedilotildees que visem agrave inclusatildeo soacutecioespacial do expressivo

contingente populacional que reside nesses assentamentos

A necessidade de construccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional com foco na integraccedilatildeo

urbana de assentamentos precaacuterios especialmente na garantia do acesso ao saneamento

baacutesico agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e agrave moradia adequada articulada a outras poliacuteticas sociais e

de desenvolvimento econocircmico eacute essencial na implementaccedilatildeo de qualquer gestatildeo estrateacutegica

de combate agrave pobreza e perspectiva de sustentabilidade urbana

286

Desse modo torna-se imprescindiacutevel a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia para reduccedilatildeo

do deacuteficit habitacional e garantir a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da cidade tornando-a um lugar

onde todos possam viver de forma digna compreendendo que o direito agrave moradia natildeo eacute

somente ter uma unidade habitacional mas eacute um processo de inclusatildeo social cultural e

econocircmica das pessoas que nela habitaratildeo e que podem ser vistas como sujeitos histoacutericos e

partiacutecipes do processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas urbanas

No desenvolvimento da pesquisa verificou-se que em Beleacutem a SEHAB como

oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor da poliacutetica habitacional desenvolveu

programasprojetos de urbanizaccedilatildeo visando atender agraves demandas colocadas pela populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo no intuito de garantir o direito agrave moradia conforme seus objetivos

Todavia vale ressaltar que tais programasprojetos natildeo satildeo muitas vezes garantidos

conforme demonstrado no Capiacutetulo V uma vez que natildeo passam pelas as exigecircncias dos

agentes financiadores da obra fiacutesica e da obra de cunho social Estes tecircm paracircmetros

conceituais e teacutecnicos estipulados verbas destinadas agraves quais limitam o trabalho social e

consequumlentemente ateacute o projeto fiacutesico

A insuficiecircncia de investimentos eou suspensatildeo das obras de urbanizaccedilatildeo por falta

de repasse de recursos por parte do governo federal ou por parte das agecircncias multilaterais eacute

outro problema levantado na pesquisa que impede o alcance dos objetivos propostos dos

programasprojetos habitacionais os quais objetivam diminuir o deacuteficit habitacional

Neste sentido percebe-se que a moradia enquanto um direito do cidadatildeo e dever do

Estado natildeo eacute garantido perpetuando a loacutegica neoliberal em que a moradia eacute compreendida

como uma mercadoria de alto valor a qual soacute tem acesso as pessoas com maior poder

aquisitivo ou para as pessoas que possuem baixa renda satildeo elaboradas poliacuteticas que visam

combater essa desigualdade social Entretanto o Estado acaba investindo em projetos que

objetivam a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano mas que atendem as relaccedilotildees de consumo e de

mercado

Na pesquisa observou-se uma grave desestruturaccedilatildeo da SEHAB Esta possui um

corpo teacutecnico reduzido em termo de quantidade e de qualidade o que leva agrave dificuldade de

acesso aos recursos por falta de capacidade teacutecnica e pouca estrutura para desenvolver os

programasprojetos habitacionais o que acarreta na transferecircncia de sua competecircncia legal de

execuccedilatildeo da Poliacutetica Habitacional para outras secretarias como a SEURB ou SESAN que

possuem uma estrutura maior e melhor Aleacutem disso haacute uma perda de teacutecnicos capacitados em

funccedilatildeo da falta de um plano de cargos e salaacuterio e haacute uma falta de articulaccedilatildeo teacutecnica-poliacutetica

na elaboraccedilatildeo de projetos de captaccedilatildeo de recursos

287

Um fator importante a ser destacado eacute o elevado iacutendice de irregularidade fundiaacuteria e

a inexistecircncia de um Plano Municipal de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria ocasionando na ilegalidade

generalizada em relaccedilatildeo agraves legislaccedilotildees urbanas que eacute visivelmente constatada no

distanciamento existente a cidade legal e a cidade ilegal ou real

Para Rolnik (2002) essa ilegalidade se divide em ilegalidade como estrateacutegia de

acesso agrave moradia das classes de menor poder aquisitivo e ilegalidade como forma de burlar a

legislaccedilatildeo em aacutereas de grande valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria como meio de atender a interesses

especulativos de segmentos organizados da produccedilatildeo imobiliaacuteria inseridos nos processos de

acumulaccedilatildeo revelando a face de exclusatildeo e segregaccedilatildeo da gestatildeo urbana nas cidades

Portanto essas praacuteticas ilegais de uso do solo urbano conduzem a uma maior

vulnerabilidade da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo uma vez estas natildeo possuem a

titularidade de seus terrenos aleacutem de ficarem cada vez mais excluiacutedas dos processos poliacuteticos

de governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

Haacute tambeacutem que se ressaltar o problema de escassez de terras para a produccedilatildeo

habitacional e formaccedilatildeo de estoques de terras que viabilizariam o desenvolvimento dos

programasprojetos habitacionais futuros

Outro problema levantado na pesquisa diz respeito agrave falta de regulamentaccedilatildeo dos

instrumentos do Plano Diretor tais como a outorga onerosa do direito de construir solo

criado imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo entre outros o que

intensifica ainda mais a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo atingida pelos programasprojetos executados

visto que a cobranccedila dos benefiacutecios oriundos dessas accedilotildees estatildeo sob a tutela do poder puacuteblico

o que dificulta as possibilidades de se criarem mecanismos que assegurem a futura

permanecircncia dos moradores na aacuterea

O estudo apontou que em Beleacutem natildeo eacute falta de planejamento urbano que contribui

para a permanecircncia da segregaccedilatildeo soacutecioespacial mas de accedilotildees concretas de aplicabilidade

por parte dos gestores municipais Como informa Villaccedila (2001) natildeo existe falta de

planejamento como justificativa dos problemas urbanos o problema estaacute no tipo de

planejamento e na ineficiecircncia dos gestores puacuteblicos

Considerando a realidade urbana de Beleacutem o plano diretor natildeo estaacute cumprindo sua

funccedilatildeo social pois para que isso ocorra eacute necessaacuterio ampliar as formas participativas da

sociedade a fim de garantir a inserccedilatildeo de diferentes atores organizaccedilotildees lutas e sujeitos no

processo de gestatildeo das poliacuteticas em especial a habitacional exigindo do poder puacuteblico

moradia digna saneamento equipamentos urbanos etc

288

Cabe destacar tambeacutem que a falta de integraccedilatildeo dos projetos de infraestrutura

habitaccedilatildeo e saneamento com as poliacuteticas de mobilidade acessibilidade controle urbaniacutestico

desenvolvimento econocircmico e social implantaccedilatildeo de equipamentos comunitaacuterios tem

provocado accedilatildeo isoladas e fragmentadas sem apreender a cidade como um todo na qual cada

instituiccedilatildeo planeja a partir de sua percepccedilatildeo o modo de operacionalizar as accedilotildees nas aacutereas

urbanas

Entende-se contudo que se faz necessaacuterio estabelecer diretrizes especiacuteficas acerca

desta questatildeo

baseadas nas leis e normas existentes como o Estatuto da Cidade e Plano

Diretor

para entatildeo implementar accedilotildees que possibilitem intervir no meio urbano de forma

eficiente eficaz e com efetividade incluindo o estabelecimento de norma que obriguem as

agecircncias financiadoras e executoras das accedilotildees a garantirem moradia digna transporte urbano

de qualidade acessibilidade infraestrutura adequada agrave toda a populaccedilatildeo

Todavia entre o que o Estatuto da Cidade determina e as interpretaccedilotildees desse

estatuto que orientam as accedilotildees da vida cotidiana (praacutexis) existem toda uma trama de interesses

que expressam o jogo das percepccedilotildees e das cogniccedilotildees da realidade construiacuteda compondo toda

uma gama de poderes simboacutelicos (BOURDIEU 2001) que decerto modo se materializam na

vida das cidades

Todos esses fatores relacionados podem explicar as accedilotildees tiacutemidas ou insuficientes

desenvolvidas pela SEHAB Entretanto cabe destacar que a secretaria conseguiu alguns

avanccedilos nesses uacuteltimos anos como a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse

Social a constituiccedilatildeo do Fundo Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho

Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria (em andamento) a realizaccedilatildeo do Diagnoacutestico Habitacional e a

elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de Habitaccedilatildeo (em andamento)

Dessa forma a SEHAB representa um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez

que reconhece o direito a moradia como poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da

poliacutetica habitacional Aleacutem disso apresenta uma seacuterie de desafios a serem enfrentadas

conforme citado no capiacutetulo V

Em Satildeo Luis a pesquisa realizada constatou que natildeo haacute uma poliacutetica habitacional

elaborada com instrumentos adequados o que possibilitaria a implementaccedilatildeo de uma gestatildeo

eficaz no combate aos problemas de moradia encontrados no municiacutepio Aleacutem disso a

fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano da cidade eacute decorrente dos investimentos industriais e do

Estado que transformaram o solo em mercadoria cujo elevado preccedilo ocasiona na expulsatildeo da

camada de menor poder aquisitivo para aacutereas distantes do centro e sem infra-estrutura

289

Conveacutem salientar que na capital ludovicense satildeo desenvolvidos accedilotildees de intervenccedilatildeo

no solo urbano por meio de projetos habitacionais que visam atender as diretrizes aprovadas

no Plano Diretor Entretanto a SEMTHURB assim como a SEHAB em Beleacutem natildeo tem

conseguido articular accedilotildees em conjunto com os outros oacutergatildeos municipais o que reflete a

forma autarquizada de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal

Ao longo da pesquisa de campo verificou-se que os projetos desenvolvidos pela

SEMTHURB longe de solucionar os problemas habitacionais da populaccedilatildeo ludovicense

acarretaram no agravamento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial uma vez que as famiacutelias que

habitavam as aacutereas de palafitas foram remanejadas para locais bem distantes de sua origem

provocando a perda de laccedilos de vizinhanccedila e da identidade local construiacutedas por esses

moradores durante deacutecadas

Outra questatildeo a ser enfatizada eacute a relaccedilatildeo conflituosa entre a Prefeitura Municipal de

Satildeo Luis e o Governo do Estado do Maranhatildeo pois satildeo raras as accedilotildees compartilhadas entre

essas duas instacircncias de poderes Um dos motivos que se coloca eacute a conduccedilatildeo das accedilotildees por

grupos poliacuteticos distintos que buscam se consolidar na regiatildeo

A pesquisa tambeacutem revelou que natildeo existe um Conselho Municipal da Habitaccedilatildeo de

Interesse Social e que o Fundo natildeo foi constituiacutedo o que fragiliza as accedilotildees da SEMTHURB

no sentido de garantir recursos agrave aacuterea habitacional comprometendo o alcance dos objetivos

propostos nos projetos

Outra questatildeo eacute a baixa qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo das obras urbanas

Para resoluccedilatildeo de tal problemaacutetica eacute necessaacuterio a implementaccedilatildeo de capacitaccedilatildeo adequada agraves

accedilotildees desses agentes puacuteblicos e a instalaccedilatildeo de um sistema de informaccedilatildeo que precise sobre o

crescimento da cidade suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar as accedilotildees de modo

preventivo com planejamento e acompanhamento de seu desenvolvimento Assim para se ter

uma gestatildeo qualificada eacute importante a qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa

De acordo com os dados levantados na pesquisa conforme apresentado

anteriormente uma das grandes dificuldades do municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra

Este fato tambeacutem pode ser observado quando se analisou a cidade de Beleacutem

Assim os espaccedilos produzidos no mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e

das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos

processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e densificaccedilatildeo

Desta forma a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

290

habitacionais dos municiacutepios para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

Isso ratifica a tese aqui levantada que independente do modelo de gestatildeo

(tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente

demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo

contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e natildeo modificaram a

concepccedilatildeo de moradia

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees similares que

retratam o papel do Estado como agente decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da

segregaccedilatildeo espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do

capital imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrenta a problemaacutetica da moradia popular

Eacute importante ressaltar que em Satildeo Luiacutes o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute

decorrente da mercantilizaccedilatildeo do solo na qual os incorporadores imobiliaacuterios financiados

pelo Estado possuem papel fundamental uma vez que modificam a dinacircmica urbana

acarretando na expulsatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo das aacutereas melhores

infraestruturadas que serviratildeo para a construccedilatildeo de condomiacutenios residenciais edifiacutecios

comerciais shopping centers entre outros objetivando a acumulaccedilatildeo de capital

Conforme se pode demonstrar para o caso ludovicense a produccedilatildeo do espaccedilo se daacute a

partir de duas vertentes a dominaccedilatildeo poliacutetica representada por grupos que estatildeo no poder haacute

muito tempo e o consumo Esses dois elementos determinam a divisatildeo social da cidade

levando ao aumento da pobreza e a concentraccedilatildeo dos preccedilos de terrenos mais caros na zona

norte de Satildeo Luis

Dessa forma essa loacutegica de ordenamento territorial daacute origem a uma formaccedilatildeo

soacutecioespacial segregada caracterizada principalmente por novas formas de habitats urbanos

os loteamentos fechados e os condomiacutenios residenciais seja horizontais ou verticais

ocasionando na auto-segregaccedilatildeo a qual cria um ambiente urbano ideal dissociado dos

elementos da cidade real

O cunho empresarial da poliacutetica habitacional ludovicense impulsionado pelos

investimentos estatais promove a produccedilatildeo imobiliaacuteria privada a partir de estrateacutegias que

redefinem a configuraccedilatildeo espacial expandem a fronteira urbana produzindo novas moradias

em aacutereas tidas como natildeo-urbanas e transformam as relaccedilotildees poliacuteticas econocircmicas sociais e

culturais da cidade

No caso de Beleacutem ressalta-se que haacute um padratildeo auto-segregativo das classes que

possuem maior poder aquisitivo em condomiacutenios fechados impulsionando um novo arranjo

291

intra-urbano Aleacutem disso conforme foi apresentado anteriormente o padratildeo de segregaccedilatildeo

que mais se assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual

se percebe que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas

proacuteximas ao centro

Esses locais que sofrem investimentos do capital imobiliaacuterio e estatal satildeo

valorizados em detrimento dos novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo

dos mesmos pelos agentes que podem pagar para usufruir da acessibilidade O Estado atua

nessas aacutereas com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais

valorizadas pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

Como foi enfatizada a accedilatildeo governamental altera as relaccedilotildees intra-urbanas

ampliando a fronteira urbano-imobiliaacuteria atuando em novos assentamentos e investindo em

aacutereas de expansatildeo do capital imobiliaacuterio em particular nos eixos Entroncamento-Icoaraci e

Beleacutem-Ananindeua provocando uma verdadeira mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo

Assim eacute necessaacuterio repensar a forma de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas

cidades amazocircnicas em especial Beleacutem e Satildeo Luis pois a racionalidade do planejamento e da

regulaccedilatildeo herdadas do modernismo do tradicionalismo pode dar lugar as concepccedilotildees

democraacuteticas de gestar essas poliacuteticas com o intuito de efetivar o alcance do direito agrave moradia

digna que valorize os aspectos culturais religiosos laccedilos de vizinhanccedila enfim que leva em

consideraccedilatildeo tambeacutem a subjetividade como ressalta Bourdieu (2001 p 89) a construccedilatildeo da

subjetividade mostraraacute um sujeito fragmentado com uma nova maneira de ser e estar no

tempo e no espaccedilo e de mostrar-se no palco da cidade

Nesse sentido o planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano em Beleacutem e em Satildeo Luis

poderatildeo inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia que entenda o cidadatildeo como parte

ativa da sociedade na qual a garantia de seus direitos dependa de sua organizaccedilatildeo coletiva

Souza e Rodrigues (2004) argumentam que os proacuteprios cidadatildeos devem poder

decidir sobre os destinos dos espaccedilos em que vivem por meio de debates livres abertos e

transparentes e que os teacutecnicos podem e podem participar mas na qualidade de consultores

populares que possam aconselhar principalmente quanto aos meios cabendo a discussatildeo e a

decisatildeo poliacuteticas sobre os fins aos proacuteprios cidadatildeos

Complementando os autores defendem a ideacuteia de que a sociedade civil pode se

organizar de maneira autocircnoma e independente do Estado para criar e realizar accedilotildees e

projetos estabelecer parcerias que fortaleccedilam esse tipo de atividade elaborar e propor accedilotildees

projetos e poliacuteticas puacuteblicas fiscalizar e exigir do Estado o cumprimento das leis Da mesma

forma os processos participativos podem acompanhar as escalas pensadas para o programa

292

reunindo aleacutem de conselhos estaduais e municipais foacuteruns metropolitanos ou

submetropolitanas

As poliacuteticas habitacionais precisam estar vinculadas a outros programas de

desenvolvimento econocircmico e social sem esquecer os programas de proteccedilatildeo ambiental Eacute

fundamental que haja relaccedilotildees estreitas entre o programa de urbanizaccedilatildeo e o programa de

regularizaccedilatildeo buscando sinergias que multipliquem esforccedilos por meio da concentraccedilatildeo e

articulaccedilatildeo de iniciativas e evitando a dispersatildeo das accedilotildees pois a construccedilatildeo de habitaccedilotildees

precaacuterias em aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo de mananciais deteriora o meio ambiente gerando

riscos para a sustentabilidade humana

Sendo assim todas as poliacuteticas ligadas agrave reforma urbana podem ser planejadas e

executadas de forma articulada e integrada com a elaboraccedilatildeo de Planos Diretores que podem

ser com caraacuteter participativo e popular Para isso os governos municipais estaduais e federal

podem atuar englobando poliacuteticas coerentes que se complementem uma vez que a moradia

faz parte de um conjunto de fatores responsaacuteveis pela melhoria das condiccedilotildees de vida

habitaccedilatildeo sauacutede emprego e educaccedilatildeo

Portanto para se ter uma gestatildeo eficaz eficiente e com efetividade das poliacuteticas

habitacionais norteada pelo ideaacuterio da reforma urbana torna-se necessaacuterio um amplo

processo de mobilizaccedilatildeo e conscientizaccedilatildeo popular capaz de criar mecanismos que

assegurem legitimidade agraves decisotildees puacuteblicas articulaccedilatildeo entre as accedilotildees governamentais

ampla poliacutetica de redistribuiccedilatildeo de trabalho e renda e assegurar a permanecircncia dos moradores

atingidos pelos programasprojetos habitacionais no seu local de origem apoacutes o processo de

renovaccedilatildeo urbana para que seus valores e laccedilos constituiacutedos natildeo sejam desfeitos

A criaccedilatildeo de espaccedilos que possibilitam a participaccedilatildeo poliacutetica e que renovam a

promessa de democratizaccedilatildeo da sociedade tem se apresentado como um importante

mecanismo para a configuraccedilatildeo de um novo desenho de gestatildeo puacuteblica visto que trazem na

forma da lei a ideacuteia de transparecircncia descentralizaccedilatildeo controle democraacutetico e participaccedilatildeo

popular

Isso eacute um processo que pode estar em permanente construccedilatildeo estabelecendo novas

formas de relaccedilatildeo entre o poder puacuteblico e a sociedade civil visando a uma nova cultura

poliacutetica assim como agrave garantia de seu direito agrave cidade

Conforme enfatiza Harvey (1980) natildeo eacute possiacutevel solucionar os problemas urbanos e

os conflitos pelo solo urbano se natildeo for garantida a participaccedilatildeo dos cidadatildeos nos processos

de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo das cidades e que o direito agrave cidade envolve o direito de participar

do urbano de forma a atender as necessidades da massa da populaccedilatildeo Entatildeo o direito agrave

293

cidade passa pela luta dos diferentes grupos sociais pela apropriaccedilatildeo e domiacutenio do espaccedilo

urbano a qual gera espaccedilos segregados e formas de resistecircncia

Portanto instigar a participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo das

poliacuteticas habitacionais municipais torna-se um grande desafio e eacute de fundamental importacircncia

uma vez que se pode capacitar os atores sociais populares para qualificar sua participaccedilatildeo nos

espaccedilos institucionais relacionados a poliacuteticas puacuteblicas aleacutem disso eacute necessaacuterio se ampliar o

nuacutemero e a representatividade de organizaccedilotildees integradas em processos concretos de

exerciacutecio ativo de sua cidadania

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SMOLKA M O Estruturas intra-urbanas e segregaccedilatildeo social no espaccedilo elementos para uma discussatildeo da cidade na teoria econocircmica Rio de Janeiro PNPE 1983

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SOUZA Denise Gentil Ponte Intervenccedilatildeo estatal no municiacutepio o caso de Beleacutem na deacutecada de 80 1992 247f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)

Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute Beleacutem 1992

SOUZA Maria Luiza de Desenvolvimento de comunidade e participaccedilatildeo 2 ed Satildeo Paulo Cortez 1990

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SPOSITO M E B O chatildeo em pedaccedilos urbanizaccedilatildeo economia e cidades no Estado de Satildeo Paulo 2004 504f Tese (Livre Docecircncia em Geografia)

Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Universidade Estadual Paulista Presidente Prudente 2004

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Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute Beleacutem1997

______ A cidade dispersa os novos espaccedilos de assentamento em Beleacutem e reestruturaccedilatildeo metropolitana 1998 395f Tese (Doutorado em Geografia Humana)

Faculdade de Filosofia Letras e Ciecircncias Humanas Universidade de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 1998

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VALENCcedilA Maacutercio Moraes Globabitaccedilatildeo sistemas habitacionais no Brasil Gratilde-Bretanha e Portugal Satildeo Paulo Terceira Margem 2001

VILLACcedilA Flaacutevio Espaccedilo intra-urbano no Brasil Satildeo Paulo FAPESP 2001

Page 3: UFPA - POLÍTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES ......implementadas em cidades amazônicas, mais especificamente em Belém (PA) e São Luis (MA), assim como os impactos na organização

Dados Internacionais de Catalogaccedilatildeo de publicaccedilatildeo (CIP) (Biblioteca do NAEAUFPA)

____________________________________________________________________________

Portela Roselene de Souza Poliacuteticas habitacionais em cidades amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luis na perspectiva comparativa

Roselene de Souza Portela orientadora Edna M Ramos de Castro

2011 305 f il 30 cm Inclui Bibliografias

Tese (Doutorado)

Universidade Federal do Paraacute Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido Beleacutem 2011

1 Poliacutetica urbana - Beleacutem (PA) 2 Poliacutetica urbana

Satildeo Luis (MA) 3 Planejamento urbano -Beleacutem (PA) 4 Planejamento urbano - Satildeo Luis (MA) 5 Impacto ambiental - Beleacutem (PA) 6 Impacto ambiental

Satildeo Luis (MA) 7 Segregaccedilatildeo ambiental - Beleacutem (PA) 8 Segregaccedilatildeo ambiental

Satildeo Luis (MA) I Castro Edna M Ramos de orientadora II Tiacutetulo

CDD 21 ed 30223209811

____________________________________________________________________________

ROSELENE DE SOUZA PORTELA

POLIacuteTICAS HABITACIONAIS EM CIDADES AMAZOcircNICAS BELEacuteM E SAtildeO LUIS NA PERSPECTIVA COMPARATIVA

Tese apresentada ao Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Desenvolvimento Sustentaacutevel do Troacutepico Uacutemido do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos Universidade Federal do Paraacute como requisito parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em Ciecircncias

Desenvolvimento Socioambiental

Banca Examinadora

Profordf Drordf Edna Maria Ramos de Castro Orientadora NAEAUFPA

Prof Dr Saint-Clair Cordeiro da Trindade Junior Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Thomas Hurtienne Examinador interno NAEAUFPA

Prof Dr Joseacute Julio Lima Examinador externo PPGAUUFPA

Prof Dr Gilberto de Miranda Rocha Examinador externo PPGGEOUFPA

Aos sujeitos coletivos que buscam na luta cotidiana a diminuiccedilatildeo das desigualdades sociais e o direito agrave cidade

AGRADECIMENTOS

A Deus fonte de luz esperanccedila amor e que estaacute sempre comigo nos momentos de inseguranccedila e desacircnimo me dando forccedila para vencer todos os obstaacuteculos

A Profordf Drordf Edna Castro com quem aprendi muito pelo incentivo nos momentos difiacuteceis pelas criacuteticas e contribuiccedilotildees valiosas que foram fundamentais para a elaboraccedilatildeo dessa tese

Ao Prof Dr Saint-Clair Trindade Junior que sempre me apoiou incentivando-me a superar limitaccedilotildees e a descobrir perspectivas mais amplas de anaacutelise

Aos membros da banca examinadora pelas criacuteticas e importantes contribuiccedilotildees no momento da defesa da tese

A todos os professores do NAEA pela imensuraacutevel contribuiccedilatildeo que ofereceram para ampliaccedilatildeo da minha concepccedilatildeo de mundo

A todos os colegas do curso em especial Andreacuteia Rosana Everaldo Charles Laura Ximenes e Laura Nogueira com os quais vivenciei momentos primorosos de aprendizado de alegrias de dificuldades e de amizade que ultrapassaram os espaccedilos de sala de aula

A minha matildee Francisca Portela que com todo seu esforccedilo sempre me incentivou nessa caminhada

Ao meu pai e aos meus irmatildeos Carlos Augusto Raimir e Raimar que me acompanharam e incentivaram nessa jornada

Ao Dion Monteiro pelo seu apoio carinho compreensatildeo e incentivo constante principalmente nas horas difiacuteceis de elaboraccedilatildeo desse trabalho

As lideranccedilas comunitaacuterias que fazem parte do Foacuterum de Reforma Urbana dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis sujeitos sociais importantes na construccedilatildeo desse trabalho por colaborarem com as entrevistas e pelas importantes contribuiccedilotildees oferecidas agrave realizaccedilatildeo da pesquisa de campo e aos movimentos sociais de luta pelo direito agrave cidade

Aos teacutecnicos das Secretarias de Habitaccedilatildeo dos municiacutepios Beleacutem e Satildeo Luis que sempre se colocaram a disposiccedilatildeo facilitando o acesso agraves informaccedilotildees e aos documentos pertinentes a Poliacutetica Habitacional

Aos funcionaacuterios do NAEA pelo apoio e incentivo de diversas formas

A todos que direta ou indiretamente contribuiacuteram para a concretizaccedilatildeo dessa tese

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat

e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade)

estatildeo implicados no direito agrave cidade

Henri Lefebvre

RESUMO

O presente trabalho objetiva analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas mais especificamente em Beleacutem (PA) e Satildeo Luis (MA) assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das duas cidades e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo atrelado agraves praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas puacuteblicas Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem e Satildeo Luis enfocando o processo de planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos atores sociais percebendo suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo Os procedimentos metodoloacutegicos adotados foram a pesquisa bibliograacutefica documental e o levantamento de dados estatiacutesticos entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais ligados aos programas ou projetos habitacionais e observaccedilatildeo direta Dentre os resultados da anaacutelise dos dados pode-se dizer que independente do modelo de gestatildeo (tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Palavras-Chave Espaccedilo Urbano Poliacutetica Habitacional Segregaccedilatildeo Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luis

ABSTRACT

This work analyzes the management models of housing policies implemented in the Amazon s cities particularly in Beleacutem (PA) and Satildeo Luiacutes (MA) as well as the impacts on the city spatial organization and the relation with the existent social and spatial segregation Emphasis is given to the challenges faced by urban management in the two cities and how the State deals with social problems We intend to go beyond spatial exclusion forms and use a social and spatial approach in order to evaluate the potential transformation that might be linked to daily practices in the city which ought to be acknowledged as legitimate actions by public policies In order to achieve our goal we use a theoretical construction to gather information on housing policy in Brazil and in the Amazon region It is therefore necessary to analyze the urban space construction and housing based on the capitalist logic which had a great concentrating and excluding influence in the urban development of the two Amazon cities resulting in a social and spatial segregation process The study was carried out through a comparative method allowing us to identify the differences and similarities between two management experiences in the housing policies applied in two municipalities of the Amazon region Beleacutem and Satildeo Luiacutes The study focuses on housing policy planning and management processes targeting social contradictions and intervention strategies Therefore the methodological procedures used in this work are bibliographic and documental research statistical data collection interviews with experts and management staff from governmental institutions related to housing programs or projects and direct observation The results lead us to conclude that regardless the management model used (technocratic or participative) the housing policy has not shown structural advances Therefore the actions implemented by programsprojects did not contribute to reduce the social and spatial segregation pattern and did not change the housing concept in those two cities

Key Words Urban Space Housing Policy Segregation Amazocircnia Beleacutem Satildeo Luiacutes

LISTA DE ILUSTRACcedilOtildeES

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA) 104

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a

2003

130

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio

segundo Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

144

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar

Mensal (2)

Brasil

2007

145

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem 165

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

171

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de

Agronomia

Beleacutem-PA

179

Fotografia 4

Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA) 185

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes 199

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luis-MA) 206

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luis-

MA)

212

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luis-MA) 218

Fotografia 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo 251

LISTA DE QUADROS

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968 111

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil 117

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965 120

Quadro 4

Programas Habitacionais implementados no Governo FHC 128

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo 157

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a

1988)

181

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990 215

Quadro 8

Relaccedilatildeo dos Assentamentos hierarquizados (Satildeo Luis-MA) 240

Quadro 9

Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos

municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

252

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001) 255

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual 257

LISTA DE TABELAS

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1996) no Brasil 106

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-

1989)

121

Tabela 3

Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

142

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem 167

Tabela 5

Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte

1940-2000

176

Tabela 6

Crescimento Populacional do municiacutepio de Satildeo Luiacutes 198

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) 207

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970 208

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970 214

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e

Cooperativas 1971-1980

219

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per

capita

2010

232

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007 237

LISTA DE ABREVIACcedilOtildeES E SIGLAS

ALUMAR Alumiacutenio do Maranhatildeo SA

AMs Associaccedilotildees de Moradores

ASCOM Assessoria Comunitaacuteria

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD Banco Internacional de Reconstruccedilatildeo e Desenvolvimento

BNH

CAEMA

CBB

CCs

CDPs

CEBs

CEF

CELMAR

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo

Comissatildeo de Bairros de Beleacutem

Centros Comunitaacuterios

Comitecircs Democraacuteticos Populares

Comunidades Eclesiais de Base

Caixa Econocircmica Federal

Celulose do Maranhatildeo SA

CEPAL Comissatildeo Econocircmica para Ameacuterica Latina e Caribe

CF Constituiccedilatildeo Federal

CGT Central Geral dos Trabalhadores

CMN Conselho Monetaacuterio Nacional

CODEM Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de

Beleacutem

CODOMAR Companhia de Docas do Maranhatildeo

COGEP Coordenadoria Geral de Planejamento

COHAB-Ma Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo

COHAB-Pa Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute

CONDUMA Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente

COSANPA Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute

COTS Caderno de Orientaccedilatildeo do Trabalho Teacutecnico Social

CTM Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio

CURA Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada

CUT Central Uacutenica dos Trabalhadores

CVRD Companhia Vale do Rio Doce

DESO Departamento Social

DNOS Departamento Nacional de Obras e Saneamento

DPPH Departamento de Programas e Projetos Habitacionais

ELETROBRAS Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA

FADS Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social

FASE Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social e Educacional

FBP Frente Beleacutem Popular

FCP Fundaccedilatildeo da Casa Popular

FEMECAM Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo

FHC Fernando Henrique Cardoso

FINANSA Financiamento de Saneamento

FMRU Foacuterum Metropolitano de Reforma Urbana

FNHIS Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

FNRU Foacuterum Nacional de Reforma Urbana

GEBAM Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas

GETAP Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento

GETAT Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins

IACP Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio

IAPs Institutos de Aposentadoria e Pensotildees

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica

IFCH Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas

IMPUR Instituto Municipal da paisagem Urbana

INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria

IPASE Instituto de Pensionistas e Aposentados Servidores do Estado

IPEA Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada

IPLAN Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano

IPTU Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

LI Letras Imobiliaacuterias

LOM Lei Orgacircnica do Municiacutepio

MBES Ministeacuterio do Bem-Estar Social

MCMV Programa Minha Casa Minha Vida

MHU Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente

MNRU Movimento Nacional pela Reforma Urbana

MPO Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento

MSUs Movimentos Sociais Urbanos

NAEA Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

OGU Orccedilamento Geral da Uniatildeo

ONGs Organizaccedilotildees Natildeo-governamentais

OP Orccedilamento Participativo

PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

PAEG Programa de Accedilatildeo Econocircmica do Governo

PAH Plano de Assistecircncia Habitacional

PAI Plano de Accedilatildeo Imediata

PAIH Plano de Accedilatildeo Imediata para a Habitaccedilatildeo

PAR Programa de Arrendamento Residencial

PCN Projeto Calha Norte

PDDES Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social

PDU Plano Diretor Urbano

PGC Programa Grande Carajaacutes

PETROBRAS Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

PIB Produto Interno Bruto

PLANASA Plano Nacional de Saneamento

PLANHAP Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular

PMB Prefeitura Municipal de Beleacutem

PMBU Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una

PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro

PND Plano Nacional de Desenvolvimento

PNH Plano Nacional de Habitaccedilatildeo

Polamazocircnia Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da Amazocircnia

PPA Plano Plurianual de Accedilatildeo

PRB Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixadas

PROTERRA Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e

Nordeste

PT Partido dos Trabalhadores

PTTS Projeto de Trabalho Teacutecnico e Social

RMB Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

SABs Sociedades de Amigos do Bairro

SBPE Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo

SCI Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio

SCH Sociedade Comunitaacuteria Habitacional

SEAC Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria

SECON Secretaria Municipal de Economia

SEDURB Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado do Paraacute

SEGEP Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral do Planejamento e Gestatildeo

SEHAB Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

SEMTHURB Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana

SEMTUR Secretaria Municipal de Serviccedilos Urbanos

SEPURB Secretaria de Poliacutetica Urbana

SERFHAU Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e Urbanismo

SESAN Secretaria Municipal de Saneamento

SEURB Secretaria Municipal de Urbanismo

SFH Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

SFI Sistema Financeiro Imobiliaacuterio

SFS Sistema Financeiro de Saneamento

SNHIS Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social

SNPLI Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado

SOPREN Sociedade de Preservaccedilatildeo aos Recursos Naturais e Culturais da Amazocircnia

SPDDH Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos

SPVEA Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

SUDAM Superintendecircncia de Desenvolvimento da Amazocircnia

SUDENE Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste

SUFRAMA Superintendecircncia da Zona Franca de Manaus

UFMA Universidade Federal do Maranhatildeo

UFPA Universidade Federal do Paraacute

UNAMA Universidade da Amazocircnia

UNIPOP Universidade Popular

ZEIS Zonas Especiais de Interesse Social

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 17

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

27

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

27

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO

ESTADO 38

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

53

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES 75

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

88

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

102

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

102

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

135

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

147

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

162

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

163

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO

HABITACIONAL

197

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM E SAtildeO LUIS EXCLUSAtildeO SOCIAL

SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

229

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS

ADOTADOS

246

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

280

REFEREcircNCIAS 294

17

1 INTRODUCcedilAtildeO

Durante a vigecircncia do regime autoritaacuterio (1964-1985) as poliacuteticas puacuteblicas

promovidas pelo Estado brasileiro se caracterizavam por um lado pela centralizaccedilatildeo

decisoacuteria e financeira na esfera federal cabendo aos estados e municiacutepios o papel de

executores das poliacuteticas formuladas centralmente Por outro lado agrave medida que os recursos

eram controlados pelo governo federal tendia a estabelecer-se uma articulaccedilatildeo entre governos

estaduais e municipais baseada na troca de favores de cunho clientelistas

Outra caracteriacutestica era a exclusatildeo da sociedade civil do processo de formulaccedilatildeo das

poliacuteticas da implementaccedilatildeo dos programas e do controle da accedilatildeo governamental que

representou um padratildeo natildeo-democraacutetico de articulaccedilatildeo EstadoSociedade e de gestatildeo

hierarquizada reforccedilando a tendecircncia ao comprometimento das metas de equumlidade assim

como introduziu no sistema um crescente deacuteficit de accountability e de responsabilidade

puacuteblica (DINIZ 1996)

O paradigma que norteou a constituiccedilatildeo do sistema de proteccedilatildeo social no Paiacutes foi o

do Estado do Bem-Estar (Welfare State) implantado nos paiacuteses capitalistas ocidentais no poacutes-

guerra onde a provisatildeo de bens e serviccedilos puacuteblicos era de inteira responsabilidade do Estado

dada agrave insuficiecircncia das respostas oferecidas pelo mercado e diante da fragilidade da

sociedade civil frente aos enormes desafios na aacuterea da reproduccedilatildeo social

A revisatildeo desse modelo embora tenha sido proposta pelas agecircncias multilaterais de

financiamento

como o Banco Mundial

no final dos anos 1950 soacute foi efetivada no final da

deacutecada de 1970 e iniacutecio dos anos 1980 atraveacutes da definiccedilatildeo de uma agenda de reforma do

Estado sob a eacutegide neoliberal que se traduziu na transferecircncia de responsabilidade com a

produccedilatildeo direta de bens e serviccedilos de consumo coletivo do acircmbito do Estado para o mercado

e a sociedade civil

Isto se refletiu na desarticulaccedilatildeo da capacidade de governar por parte dos Estados na

Ameacuterica Latina Grande parte da capacidade de planejamento e da competitividade das

economias nacionais foi drasticamente reduzida Os recursos destinados agraves poliacuteticas sociais e

agrave remuneraccedilatildeo do funcionalismo puacuteblico tecircm sido reduzidos progressivamente

No entanto a crise que atingiu o Paiacutes desde o iniacutecio da deacutecada de 1980 e as

alteraccedilotildees na economia capitalista mundial em que se destacam a reestruturaccedilatildeo produtiva e a

globalizaccedilatildeo redefiniu os termos da inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio internacional Novos

desafios foram colocados aos atores que haviam participado da formulaccedilatildeo da agenda

democraacutetica e estavam engajados com a efetivaccedilatildeo da reforma Na reformulaccedilatildeo dessa

18

agenda natildeo se pretendia o desmantelamento do Estado mas sim uma reforma da accedilatildeo estatal

voltada agrave busca da eficiecircncia da eficaacutecia e da efetividade dessa accedilatildeo

A Constituiccedilatildeo de 1988 constitui-se um marco no tocante a discussatildeo sobre a

governabilidade do sistema poliacutetico e participaccedilatildeo popular Fomentada pelos movimentos e

demais organizaccedilotildees sociais ganhou relevacircncia a discussatildeo sobre descentralizaccedilatildeo

administrativa principalmente a reflexatildeo sobre uma nova cultura poliacutetica alicerccedilada na noccedilatildeo

de direitos do cidadatildeo e da necessidade de incorporaccedilatildeo deste no processo de planejamento e

gestatildeo de planos programas e projetos

Nessa conjuntura a nova cultura poliacutetica que comeccedila a emergir a partir das

discussotildees travadas entre as organizaccedilotildees sociais partidos poliacuteticos intelectuais e parte das

igrejas aponta para novas formas de articulaccedilatildeo do Estado com a sociedade civil e com o

setor privado visando agrave garantia da eficiecircncia atraveacutes da descentralizaccedilatildeo que natildeo significa

apenas a transferecircncia de atribuiccedilotildees mas eacute vista sobretudo como redistribuiccedilatildeo de poder

favorecendo a democratizaccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade e a democratizaccedilatildeo de

acesso aos serviccedilos

No Brasil os movimentos sociais tiveram e tecircm papel fundamental no processo de

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes Nos anos de 1970 e 1980 emergiram novos movimentos sociais

que se organizaram como espaccedilo de accedilatildeo reivindicatoacuteria construindo uma cultura

participativa e autocircnoma colocando novos temas na agenda puacuteblica entre eles o da Reforma

Urbana Em meio a muitos embates esses agentes coletivos multiplicaram-se fortaleceram-se

e tornaram-se propositivos Satildeo hoje reconhecidos como legiacutetimos interlocutores no cenaacuterio

brasileiro (GOHN 1985)

O reconhecimento da importacircncia da participaccedilatildeo popular nos programas e projetos

vinculados agraves poliacuteticas puacuteblicas aqui centradas nas aacutereas de desenvolvimento urbano tem se

tornado um consenso e no entanto natildeo se tem uma clareza sobre como e em que grau de

intensidade seria necessaacuterio para que se atinja ao objetivo de garantir a sustentabilidade das

intervenccedilotildees advindas da execuccedilatildeo de programas de desenvolvimento urbano nas cidades

Nesse sentido a concepccedilatildeo de participaccedilatildeo popular se relaciona com os processos

que visam superar os mecanismos de exclusatildeo social presentes no tecido social atraveacutes da

conquista de espaccedilos onde seja garantida a participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo da cidade

(SADER PAOLI 1988 p 59)

Assim a luta pela participaccedilatildeo popular no acircmbito do planejamento e gestatildeo de

poliacuteticas urbanas no decorrer da histoacuteria brasileira trouxe em seu contexto o constante

enfrentamento da exclusatildeo social propondo uma maior democratizaccedilatildeo da sociedade e

19

buscando intervir no processo de decisatildeo das poliacuteticas urbanas visando dessa maneira uma

melhor distribuiccedilatildeo de bens e serviccedilos

Na Amazocircnia esse processo natildeo foi diferente Desde o periacuteodo militar que os

movimentos populares passaram a se organizar tendo como objetivo pressionar as estruturas

poliacuteticas vigentes ao niacutevel das agecircncias estatais e privadas fazendo frente aos inuacutemeros

problemas provocados pela accedilatildeo autoritaacuteria dos oacutergatildeos estatais e privados e que afetavam as

condiccedilotildees de vida das classes populares na regiatildeo (CRUZ 1994)

Foi um periacuteodo marcado por fortes modificaccedilotildees nos espaccedilos urbano e rural da

regiatildeo que contou com a intervenccedilatildeo direta e centralizada do Estado que desde a deacutecada de

1950 vinha consolidando um modelo nacional-desenvolvimentista introduzindo assim a

Amazocircnia no circuito propriamente capitalista Com isso ocorreu um significativo processo

de ocupaccedilatildeo do espaccedilo regional manifestando-se ao niacutevel da estruturaccedilatildeo do sistema urbano

da regiatildeo e de uma urbanizaccedilatildeo intensiva e crescente do municiacutepio de Beleacutem entre outros

poacutelos urbanos regionais (CASTRO ACEVEDO MARIN 1987)

Nos anos 1960 aleacutem dos projetos agro-pecuaacuterios os governos federal e estadual

investiram na criaccedilatildeo de infraestrutura como a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia que

facilitou o ingresso de grande contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras

abundantes e de faacutecil acesso tendo em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave

implantaccedilatildeo dos grandes projetos (SOUZA 1992)

Em Beleacutem esse fenocircmeno gerou por um lado uma pressatildeo demograacutefica sobre as

aacutereas urbanizadas de cotas altas estimulando a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e por outro uma

ocupaccedilatildeo desordenada das baixadas sem infraestrutura por uma camada popular com

baixo poder aquisitivo A ocupaccedilatildeo irregular a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o

descaso de sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programas e projetos

de poliacuteticas urbanas completavam o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo

ambiental passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Nesse sentido as lutas pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura sauacutede educaccedilatildeo e

habitaccedilatildeo implementaram um haacutebito de construir um poder pela base na praacutexis cotidiana

dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos sujeitos sociais coletivos e natildeo mais individualizados

Contrariando a praacutetica dos anos anteriores em que a sociedade seguia fielmente as orientaccedilotildees

dos grupos oligaacuterquicos

Constituindo-se sujeitos coletivos as organizaccedilotildees de bairros em 1978 unificaram-

se na luta pela posse da terra e por moradia lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que

envolveu vaacuterios bairros como Jurunas Sacramenta etc Essa praacutetica vai culminar com o

20

fortalecimento das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB)

em 1979 (CRUZ 1994)

Os Movimentos Populares atingiram conquistas importantes ateacute 1982 quando

acontecem mudanccedilas na conjuntura poliacutetica do Paiacutes atraveacutes das eleiccedilotildees diretas para

governador e deputados na qual o grande vencedor foi o Partido do Movimento Democraacutetico

Brasileiro (PMDB) que venceu as eleiccedilotildees na maioria das capitais brasileiras Com isso

mudou-se tambeacutem o comportamento do Estado que passaraacute a tratar a organizaccedilatildeo popular

como um instrumento a seu serviccedilo

O Estado passou a orientar seus agentes a realizarem reuniotildees nos bairros e a contar

com a participaccedilatildeo dos moradores nas decisotildees tomadas tentando ainda utilizar-se das

organizaccedilotildees de bairros para viabilizar suas poliacuteticas por meio de cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de

entidades fantasmas com o objetivo de enfraquecer a luta social

Em Satildeo Luiacutes a partir da deacutecada de 1960 ocorreu um dinamismo acelerado de

crescimento populacional em virtude de vaacuterios beneficiamentos realizados na cidade tais

como construccedilatildeo das duas pontes sobre o rio Anil barragem do Bacanga construccedilatildeo da 1ordf

etapa do porto de cargas gerais do Itaqui e asfaltamento da BR-135 Aleacutem desses

acontecimentos as deacutecadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela instalaccedilatildeo de grandes

capitais industriais como as empresas Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) a Companhia

Vale do Rio Doce (CVRD) e a Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR) que favoreceram o

surgimento de ocupaccedilotildees irregulares palafitas e favelas

A cidade de Satildeo Luis passa entatildeo a sofrer modificaccedilotildees profundas destacando-se o

significativo aumento das ocupaccedilotildees de terras para a construccedilatildeo de moradias Os processos

migratoacuterios campocidade se intensificam Milhares de famiacutelias se dirigem para Satildeo Luiacutes em

busca de melhores condiccedilotildees de vida e emprego No entanto grande parte dessas famiacutelias

migrante natildeo encontra emprego fixo e bem remunerado e as formas de sobrevivecircncia

baseiam-se nos serviccedilos domeacutesticos e no mercado informal

Segundo Luz (2004) a deacutecada de 1960 eacute marcada por um intenso debate em torno

dos programas governamentais voltados para a modernizaccedilatildeo conservadora do Maranhatildeo O

Estado passa a ser o facilitador

por meio de instrumentos juriacutedicos poliacuteticos e econocircmicos

da criaccedilatildeo de condiccedilotildees sociais favoraacuteveis para as grandes empresas investirem na regiatildeo com

condiccedilotildees miacutenimas de terra farta e matildeo-de-obra barata Para garantir que o processo natildeo

tivesse obstaacuteculos a sua efetivaccedilatildeo levou-se a cabo um amplo processo de modernizaccedilatildeo da

economia cujo traccedilo principal estava baseado nos grandes projetos e no apoio irrestrito das

elites locais e nacionais ao grande capital nacional e estrangeiro

21

Para isso o Estado inicia a abertura de vaacuterias aacutereas de expansatildeo urbano-industrial

destacando-se a aacuterea hoje compreendida pelo eixo ItaquiBacanga No governo Sarney (1966-

1970) esta aacuterea eacute eleita como um espaccedilo estrateacutegico para o processo de modernizaccedilatildeo

conservadora pelo plano de governo denominado Maranhatildeo Novo Aleacutem dos projetos

industriais e da construccedilatildeo do Porto do Itaquiacute a regiatildeo seria contornada pela construccedilatildeo de

conjuntos habitacionais para a matildeo-de-obra requerida pelas induacutestrias que iriam se implantar

na regiatildeo

A expansatildeo urbana da cidade de Satildeo Luiacutes em direccedilatildeo agrave regiatildeo Industrial do Itaqui

estava articulada com o processo de remoccedilatildeo de famiacutelias das regiotildees alagadas pelos rios

Bacanga e de outras aacutereas destinadas para construccedilatildeo do Anel Viaacuterio Aeroporto Internacional

do Tirirical e de outras regiotildees atingidas pelo processo de implantaccedilatildeo dos grandes projetos e

de renovaccedilatildeo urbaniacutestica de Satildeo Luiacutes

A remoccedilatildeo de famiacutelias das aacutereas de interesse do governo tinha o objetivo de abrir

espaccedilo para garantir a modernizaccedilatildeo urbaniacutestica da cidade dotaacute-la de infraestrutura necessaacuteria

para a implantaccedilatildeo dos grandes projetos

a exemplo da Barragem do Bacanga bem como

dos interesses do capital imobiliaacuterio e mercantil

a exemplo das aacutereas valorizadas do entorno

da cidade e da regiatildeo comercial da KennedyAreinha Satildeo FranciscoRenascenccedila Olho

D aguaAraccedilagi

A segregaccedilatildeo urbano-espacial de Satildeo Luis consolidou-se no Plano Diretor de 1977 o

qual previa de um lado a construccedilatildeo de um nuacutecleo residencial destinado para as famiacutelias de

melhor poder aquisitivo de outro se previa uma seacuterie de intervenccedilotildees estatais com o objetivo

de criar aacutereas e zonas para a implantaccedilatildeo de projetos industriais e de recuperaccedilatildeo de aacutereas que

seriam destinadas para as classes populares

Sendo assim Luz (2004) argumenta que a urbanizaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes eacute o

resultado de um processo de desenvolvimento capitalista no qual o Estado - nos niacuteveis

federal estadual e municipal - esteve empenhado desde o iniacutecio em articular-se para criar as

condiccedilotildees poliacuteticas econocircmicas e juriacutedicas necessaacuterias ao processo de acumulaccedilatildeo de capital

no Estado ao mesmo tempo em que estabeleciam em segundo plano as poliacuteticas para atender

agraves demandas sociais

Gistelinck (1988) enfatiza que a questatildeo do deacuteficit habitacional e da falta de

infraestrutura baacutesica motiva um intenso debate pela necessidade de poliacuteticas puacuteblicas para

atender as demandas criadas pelo processo de modernizaccedilatildeo econocircmica e industrial de Satildeo

Luis

22

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

governo para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades brasileiras

Todavia os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda foram

marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a exemplo

dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Dentro deste contexto histoacuterico eacute possiacutevel se inferir que em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-

Ma ocorreram nas uacuteltimas deacutecadas mudanccedilas nas relaccedilotildees entre o Estado e os movimentos

sociais no que diz respeito ao processo de participaccedilatildeo na poliacutetica urbana como por exemplo

os projetos de habitaccedilatildeo implementados pelo governo municipal nas aacutereas consideradas de

baixadasalagadas das cidades Entretanto estas alteraccedilotildees permitiram a participaccedilatildeo somente

de alguns segmentos que foram incorporados agraves discussotildees

A emergecircncia dos movimentos sociais permitiu a constituiccedilatildeo de canais de

interlocuccedilatildeo com o poder puacuteblico capazes de legitimar socialmente as demandas populares

gerou uma disputa na cena puacuteblica pela formulaccedilatildeo de uma nova agenda poliacutetica de

intervenccedilotildees puacuteblicas e garantiu a participaccedilatildeo popular no processo de implementaccedilatildeo das

poliacuteticas de habitaccedilatildeo que se desenvolveram nas referidas cidades

Esse debate se constitui num importante instrumento para a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de habitaccedilatildeo que foram implementadas na medida em que possibilita lanccedilar luz

sobre algumas dimensotildees que se julgam fundamentais na discussatildeo dos limites e desafios de

tais poliacuteticas entre as quais se destacam a caracterizaccedilatildeo das desigualdades no acesso a

habitaccedilatildeo como expressatildeo das desigualdades sociais e ambientais

Deste modo o presente trabalho intitulado Poliacuteticas Habitacionais em Cidades

Amazocircnicas Beleacutem e Satildeo Luiacutes na perspectiva comparativa teve por objetivo analisar os

modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim

como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

Mais do que uma forma espacializada da exclusatildeo pretende-se uma abordagem

soacutecioespacial que procure avaliar o potencial de transformaccedilatildeo que possa estar atrelado agraves

praacuteticas cotidianas da cidade as quais podem ser reconhecidas como legiacutetimas nas poliacuteticas

puacuteblicas

Para tanto eacute imprescindiacutevel repensar a participaccedilatildeo do Estado no conjunto das

praacuteticas sociais voltadas para o enfrentamento das vaacuterias dimensotildees da exclusatildeo natildeo apenas

23

pela participaccedilatildeo na partilha do excedente gerado pelo modelo econocircmico mas tambeacutem pelo

reconhecimento de suas formas alternativas de relaccedilotildees sociais e apropriaccedilatildeo dos espaccedilos

Nesse sentido a pesquisa visou responder as seguintes indagaccedilotildees 1) Qual a

concepccedilatildeo de gestatildeo que tem norteado as poliacuteticas habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa

e Satildeo Luiacutes-Ma 2) Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade civil no processo de

planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nos referidos municiacutepios 3) Os modelos de

gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O estudo foi conduzido pelo meacutetodo comparativo que permite identificar as

diferenccedilas e semelhanccedilas entre as experiecircncias de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais em dois

municiacutepios da Regiatildeo Amazocircnica Beleacutem-Pa e Satildeo Luis-Ma enfocando o processo de

planejamento e gestatildeo da poliacutetica habitacional e a dinacircmica dos agentes sociais percebendo

suas contradiccedilotildees e estrateacutegias de intervenccedilatildeo

O ferramental metodoloacutegico utilizado teve como base a dimensatildeo poliacutetico-

institucional Desse modo para se fazer a anaacutelise dos modelos de gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luiacutes-Ma fez-se imprescindiacutevel buscar

informaccedilotildees nas instituiccedilotildees responsaacuteveis a fim de compreender as accedilotildees do poder puacuteblico

municipal seus interesses estrateacutegias e os resultados alcanccedilados na implementaccedilatildeo da

poliacutetica habitacional nos referidos municiacutepios visando encontrar possiacuteveis semelhanccedilas e

identificaccedilotildees ainda que um pouco diferenciadas quanto agrave forma de produccedilatildeo do espaccedilo

urbano

Para Santos (1996 p 36) quando se pensa nas simultaneidades definidoras do

espaccedilo a discussatildeo natildeo se limita agrave organizaccedilatildeo agrave proposiccedilatildeo ou instituiccedilatildeo de regras mas

tambeacutem natildeo escapa delas Se o modo de produccedilatildeo organiza e produz um espaccedilo a praacutetica

neste mesmo espaccedilo o subverte e o transforma sendo impossiacutevel pensar a organizaccedilatildeo do

espaccedilo sem perceber como ele eacute usado sem percebecirc-lo como impregnado de sujeitos ativos e

por isso poliacuteticos

Assim eacute importante destacar que na anaacutelise das poliacuteticas habitacionais seraacute levada

em conta a forma como eacute percebido e vivido o espaccedilo urbano reconhecendo seu potencial

poliacutetico enquanto elemento que pode determinar eou influenciar o modo como se pensa a

poliacutetica puacuteblica

Massey (2008) argumenta que quando se analisa as poliacuteticas implementadas no

espaccedilo urbano idealiza-se o potencial poliacutetico do espaccedilo como uma genuiacutena multiplicidade de

trajetoacuterias e potencialmente de vozes na enunciaccedilatildeo de atores sociais em suas accedilotildees

24

cotidianas quando se apropriam subvertem e transformam as regras e instituiccedilotildees

incorporando e transcendendo o espaccedilo da poliacutetica

Assim os procedimentos metodoloacutegicos para a coleta de dados que nortearam esse

trabalho foram desenvolvidos em trecircs etapas a) pesquisa bibliograacutefica (com o objetivo

construir um referencial de anaacutelise dos eixos que fundamentam o trabalho planejamento e

gestatildeo democraacutetica poliacuteticas puacuteblicas poliacuteticas habitacionais) documental e levantamento de

dados estatiacutesticos b) entrevistas com teacutecnicos e gestores das instituiccedilotildees governamentais

ligados aos programas ou projetos habitacionais e c) observaccedilatildeo direta que se deu por meio

da presenccedila da pesquisadora nas reuniotildees e em vaacuterios foacuteruns onde aconteceram os debates e

as deliberaccedilotildees acerca dos programas ou projetos habitacionais no intuito de observar as

dinacircmicas dos agentes sociais envolvidos

A estrateacutegia metodoloacutegica adotada para a anaacutelise da poliacutetica habitacional foi

apreendida de modo a conjugar dois niacuteveis de informaccedilatildeo em primeiro lugar por meio do

diagnoacutestico habitacional das referidas cidades em segundo se processou uma avaliaccedilatildeo das

poliacuteticas habitacionais com base no levantamento dos programas e projetos desenvolvidos

nas cidades e dos instrumentos de ordenamento no campo da administraccedilatildeo puacuteblica Vale

ressaltar que esses dois momentos satildeo indissociaacuteveis uma vez que existe uma

complementaridade entre os dados de um e de outro possibilitando ampliar a compreensatildeo

sobre a realidade estudada

A avaliaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais teve como base a anaacutelise contextual e

documental sendo que a avaliaccedilatildeo nesse caso se sustentou na anaacutelise de trecircs elementos

institucionais1 normativos2 e operacionais3

Eacute importante enfatizar que nessa tese natildeo se preeeee ot eneme sesee

ei

ele

moeeo e

otrecircs

a

gundo

trecircs e

normativos0914 T76783F1 2048 76783691201155920 09dee operacativos0914 T76783F1 2048 76783585171191490 09p0914 T76783F1 2048 76783593071191490 09l0914 T76783F1 2048 76783597491191490 09a0914 T76783F1 2048 76783604301191490 09n0914 T76783F1 2048 76783612181191490 09o0914 T76783F1 2048 76783620071191490 09se

25

artigos documentos mapas etc que pudessem fornecer subsiacutedios teoacutericos e metodoloacutegicos

ao estudo aleacutem de informaccedilotildees estatiacutesticas referentes aos resultados alcanccedilados com os

Projetos de Habitaccedilatildeo

Assim a pesquisa bibliograacutefica foi efetuada nas bibliotecas Central da Universidade

Federal do Paraacute (UFPA) e da Universidade Federal do Maranhatildeo (UFMA) do Instituto de

Filosofia e Ciecircncias Humanas (IFCHUFPA) do Nuacutecleo de Altos Estudos Amazocircnicos

(NAEAUFPA) da Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo Geral de Planejamento e Gestatildeo de

Beleacutem (SEGEP) da Secretaria de Planejamento do Municiacutepio de Satildeo Luis entre outros

Na pesquisa documental foram investigados documentos relacionados agraves poliacuteticas

habitacionais implementadas em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma bem como documentos

referentes aos Projetos Habitacionais Essa pesquisa assemelhou-se agrave pesquisa bibliograacutefica

A diferenccedila entre ambas estaacute na natureza das fontes Enquanto a pesquisa bibliograacutefica se

utiliza fundamentalmente das contribuiccedilotildees dos diversos autores sobre determinado assunto a

pesquisa documental vale-se de materiais que natildeo receberam ainda um tratamento analiacutetico

A pesquisa documental e o levantamento de dados estatiacutesticos foram realizados nos

arquivos bibliograacuteficos e cartograacuteficos da Companhia de Saneamento do Paraacute (COSANPA)

Companhia de Habitaccedilatildeo do Estado do Paraacute (COHAB) Companhia de Desenvolvimento

Metropolitano de Beleacutem (CODEM) na Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) e na

Secretaria Executiva de Desenvolvimento Urbano e Regional (SEDURB) na Secretaria

Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) na

Companhia de Aacutegua e Esgoto do Maranhatildeo (CAEMA) Companhia de Habitaccedilatildeo do

Maranhatildeo (COHAB-Ma) entre outros Aleacutem de consultas agraves notiacutecias dos jornais de grande

circulaccedilatildeo em Beleacutem e em Satildeo Luis foi realizada tambeacutem consulta ao acervo bibliograacutefico e

fotograacutefico das aacutereas em estudo

A consulta aos arquivos dessas instituiccedilotildees foi relevante para a presente pesquisa

pois elas tiveram uma atuaccedilatildeo significativa em todo o processo de planejamento e

implementaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais e hoje continua fornecendo-lhe suporte teacutecnico-

institucional

O trabalho de campo faz-se indispensaacutevel Conforme Oliveira (1996) a importacircncia

deste atraveacutes do olhar ouvir e escrever constituem-se como momentos necessaacuterios e

estrateacutegicos para a compreensatildeo do fenocircmeno que se quer estudar especialmente no que diz

respeito ao exerciacutecio da pesquisa empiacuterica e agrave interpretaccedilatildeo de seus resultados

Com relaccedilatildeo agraves entrevistas foram realizadas com teacutecnicos e gestores das Secretarias

de Habitaccedilatildeo das cidades pesquisadas com a finalidade de conhecer os modelos de gestatildeo das

26

poliacuteticas habitacionais implementados em Beleacutem-Pa e em Satildeo Luis-Ma assim como entender

a importacircncia atribuiacuteda agrave questatildeo habitacional pelos diferentes agentes sociais analisar a

importacircncia e as repercussotildees da participaccedilatildeo popular nos projetos habitacionais buscando

entender as estrateacutegias adotadas pelos setores populares e sua possiacutevel contribuiccedilatildeo ou natildeo

para o desenvolvimento dos mesmos elucidar o papel dos planos diretores na efetivaccedilatildeo do

planejamento urbano identificar os limites e desafios das poliacuteticas habitacionais

desenvolvidas nas referidas cidades comparando suas dinacircmicas composiccedilotildees articulaccedilotildees e

accedilotildees que direcionam e satildeo direcionadas pelos governos municipais

Esse momento constitui-se em uma relaccedilatildeo dialoacutegica com o entrevistado e os

recursos da entrevista foram utilizados tanto nos seus aspectos quantitativos como

qualitativos haja vista que satildeo complementares De acordo com Cardoso (1986 p 96) a

oposiccedilatildeo entre qualitativo e quantitativo natildeo corresponde a modos opostos e inconciliaacuteveis de

ver a realidade Satildeo modos diversos de resgatar a vida social e chegar a iluminar aspectos natildeo

aparentes e natildeo conscientes para os atores envolvidos

Apoacutes a coleta dos dados foram realizadas a interpretaccedilatildeo dos mesmos e a elaboraccedilatildeo

dessa tese que estaacute estruturada da seguinte maneira

O primeiro capiacutetulo descreve a introduccedilatildeo da pesquisa

No segundo capiacutetulo objetivou-se realizar uma siacutentese teoacuterica das principais ideacuteias

que nortearam o debate sobre a questatildeo urbana e habitacional no Brasil abordando a

produccedilatildeo do espaccedilo urbana e da moradia enfocando quem satildeo os agentes produtores desse

espaccedilo com destaque ao papel do Estado uma vez que se compreende esse agente como

fundamental na intervenccedilatildeo organizaccedilatildeo e gestatildeo das cidades assim como ressaltar o

planejamento urbano o direito agrave cidade e o direito agrave moradia

No terceiro capiacutetulo analisou-se a poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia

enfatizando a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional a fim de identificar as intervenccedilotildees urbanas

governamentais e as principais caracteriacutesticas do processo de ocupaccedilatildeo territorial assim como

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica e a participaccedilatildeo dos agentes sociais nas poliacuteticas puacuteblicas

habitacionais

No quarto capiacutetulo buscou-se delinear as principais caracteriacutesticas das poliacuteticas

municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes ressaltando as desigualdades soacutecio-espaciais decorrentes do

processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano nas duas cidades e por fim no quarto capitulo

analisou-se os programasprojetos habitacionais que foram identificados durante a pesquisa

documental nas secretarias municipais

27

2 QUESTAtildeO URBANA E HABITACIONAL NO BRASIL CONTEMPORAcircNEO

21 A PRODUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO E DA MORADIA

Refletir sobre a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e nele a da moradia no contexto da

sociedade capitalista requer a necessidade de compreendecirc-lo como uma construccedilatildeo histoacuterica

caracterizando-se em uma condiccedilatildeo necessaacuteria para reproduccedilatildeo do capital e dos diversos

grupos sociais

Sendo assim eacute fundamental uma apreensatildeo de autores que se preocuparam em

investigar o urbano articulando-o ao modo de produccedilatildeo capitalista e agrave dinacircmica dos agentes

que lutam na cidade pela produccedilatildeo de sua existecircncia

O espaccedilo urbano pode ser entendido aqui como um processo construiacutedo

historicamente por agentes que produzem e consomem esse espaccedilo como um produto social

fragmentado e articulado permeado de siacutembolos e tambeacutem como um campo de lutas tendo

a cidade como sua forma que expressa natildeo soacute a localizaccedilatildeo e arranjo de lugares expressa um

modo de vida Esse modo de vida natildeo estaacute ligado somente ao modo de produccedilatildeo econocircmica

embora sofra seus efeitos mas estaacute ligado a todas as esferas da vida social cultural

simboacutelica psicoloacutegica ambiental religiosa e educacional

O urbano pode ser entendido como um modo de vida ligado a certa divisatildeo do

trabalho uma forma social enquanto a cidade seria a materializaccedilatildeo dessa forma (HARVEY

1980)

Trindade Junior (1998) ressalta que o espaccedilo eacute socialmente produzido e esta

produccedilatildeo ocorre paralelamente com a produccedilatildeo de bens materiais necessaacuterios agrave sobrevivecircncia

do homem Portanto a produccedilatildeo do espaccedilo urbano pode ser interpretada como uma dimensatildeo

real e concreta onde se realiza a vida humana e como uma dimensatildeo abstrata que ocorre de

modo diferenciado no tempo e no lugar ganhando materialidade por meio do territoacuterio

A cidade pode ser vista entatildeo como um conjunto de apropriaccedilotildees e usos que a

valoram diferentemente na qual as combinaccedilotildees dinacircmicas produzidas assumem tanto valores

de uso quanto de troca que iratildeo se relacionar dialeticamente entre si A cidade eacute tambeacutem por

excelecircncia lugar ou espaccedilo do estar junto

Para Harvey (1993) as modificaccedilotildees impliacutecitas das relaccedilotildees sociais e as diferentes

apreensotildees cognoscitivas do espaccedilo geograacutefico bem como a ideacuteia de supressatildeo ou ampliaccedilatildeo

dos espaccedilos de lazer podem levar a inuacutemeras modificaccedilotildees do imaginaacuterio coletivo e das

relaccedilotildees culturais no espaccedilo urbano

28

Na visatildeo desse autor a produccedilatildeo do espaccedilo significa coexistecircncia e sobreposiccedilatildeo de

relaccedilotildees sociais Significa tambeacutem materialidade de processos sociais aparentemente

naturais que satildeo estruturados com base em interesses e praacuteticas individuais e coletivas sendo

guiados por um conjunto de disposiccedilotildees duradouras subjacente a tais praacuteticas e processos

Para entender estes processos eacute preciso compreender os mecanismos que consubstanciam as

praacuteticas sociais que materializadas balizam o espaccedilo urbano Este espaccedilo eacute formado por

uma praacutexis social que tem como pano de fundo um sistema econocircmico (e poliacutetico) complexo

e criativo que se renova constantemente se reinventando inclusive em suas proacuteprias crises

naquilo que ficou conhecido como destruiccedilatildeo criativa (HARVEY 2005 p 58)

Aleacutem disso o autor argumenta que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano com fins para o

desenvolvimento baseado na acumulaccedilatildeo do capital expressa a caracteriacutestica peculiar de

permanente mudanccedila de suas praacuteticas e processos materiais de reproduccedilatildeo social assim como

os significados de tempo e espaccedilo que tambeacutem se modificam e essas transformaccedilotildees podem

ter consequumlecircncias para a organizaccedilatildeo da vida diaacuteria

O capital se representa sob a forma de uma paisagem fiacutesica criada agrave sua proacutepria imagem criada como valores de uso favorecedores da acumulaccedilatildeo progressiva do capital A paisagem geograacutefica daiacute resultante eacute a gloacuteria que coroa o desenvolvimento capitalista precedente Mas ao mesmo tempo ela expressa o poder da matildeo-de-obra morta sobre a matildeo-de-obra viva e como tal aprisiona e inibe o processo de acumulaccedilatildeo dentro de um conjunto de restriccedilotildees fiacutesicas especiacuteficas [] O desenvolvimento capitalista portanto tem que negociar um caminho muito estreito entre a preservaccedilatildeo dos valores de troca dos investimentos de capital passado no meio ambiente construiacutedo e a destruiccedilatildeo do valor desses investimentos a fim de abrir um novo espaccedilo para acumulaccedilatildeo No capitalismo portanto haacute uma luta perpeacutetua em que o capital constroacutei uma paisagem fiacutesica apropriada agrave sua proacutepria condiccedilatildeo em determinado momento do tempo simplesmente para ter que destruiacute-la geralmente durante situaccedilotildees de crise num momento posterior do tempo O fluxo e refluxo temporal e geograacutefico do investimento no meio ambiente construiacutedo soacute podem ser entendidos em termos desse processo (HARVEY 1993 p 127)

Uma contribuiccedilatildeo teoacuterica e conceitual importante para a anaacutelise do espaccedilo urbano eacute a

obra de Pierre Bourdieu o qual propotildee uma abordagem socioloacutegica sobre habitus posiccedilotildees

sociais e estrateacutegias que visam superar a dicotomia entre objetividade e subjetividade para

anaacutelise das relaccedilotildees entre indiviacuteduos e os grupos e estruturas nos quais estatildeo implicados

Partindo da premissa de que as regularidades da sociedade se processam mediante a

interiorizaccedilatildeo das estruturas objetivas na subjetividade dos indiviacuteduos Bourdieu (2001 p

115) argumenta que

29

A relaccedilatildeo entre estruturas e accedilotildees individuais natildeo ocorre de modo mecacircnico como afirmam os objetivistas nem de modo consciente conforme apontam os subjetivistas mas de um modo dialeacutetico por meio de um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis que uma vez constituiacutedos no processo de socializaccedilatildeo passam a orientar as praacuteticas dos indiviacuteduos que por sua vez tendem a refletir as caracteriacutesticas das estruturas em que foram forjadas as disposiccedilotildees

Para tanto Bourdieu (2001 p 65) utiliza o conceito de habitus para explicar a

mediaccedilatildeo entre as estruturas objetivas e as subjetivas o qual pode ser compreendido como

uma capacidade infinita de engendrar produtos

pensamentos percepccedilotildees expressotildees accedilotildees

cujos limites satildeo fixados pelas condiccedilotildees histoacuterica e socialmente situadas de sua produccedilatildeo

permitindo tanto operar atos de conhecimento praacutetico fundados no mapeamento e no

reconhecimento de estiacutemulos condicionais e convencionais a que os agentes estatildeo dispostos a

reagir como tambeacutem [] engenderar sem posiccedilatildeo expliacutecita de finalidades nem caacutelculo

racional de meios estrateacutegias adaptadas e incessantemente renovadas situadas poreacutem nos

limites das construccedilotildees estruturais de que satildeo o produto e que as definem

As condiccedilotildees associadas numa classe particular de condiccedilotildees de existecircncia produzem habitus um sistema de disposiccedilotildees duraacuteveis e transferiacuteveis estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes quer dizer como princiacutepios que geram e organizam praacuteticas e representaccedilotildees que podem ser adaptadas objetivamente aos seus resultados sem pressupor um fim objetivo consciente ou um domiacutenio expresso das operaccedilotildees necessaacuterio para o atingir Objetivamente regulador e regulado sem ser de qualquer forma o produto de obediecircncia a regras o habitus pode ser orquestrado coletivamente sem ser o produto da accedilatildeo organizatoacuteria de um condutor (BOURDIEU 2001 p 53)

Nesse sentido o habitus seria um conhecimento adquirido e um capital pelo qual se

indica a disposiccedilatildeo incorporada de um agente os princiacutepios geradores e organizadores de suas

praacuteticas captadas quando da sua accedilatildeo traduzindo-se na forma com que um determinado

grupo interioriza seu comportamento dentro de determinado espaccedilo social Neste caso o

espaccedilo social e o espaccedilo fiacutesico passam a ser um soacute

O espaccedilo social eacute definido como um conjunto de posiccedilotildees distintas e coexistentes

exteriores umas agraves outras definidas umas em relaccedilatildeo agraves outras por sua exterioridade muacutetua e

por relaccedilotildees de proximidade de vizinhanccedila ou de distanciamento e tambeacutem por relaccedilotildees de

ordem como acima abaixo e entre (BOURDIEU 1996 p 18)

30

Bourdieu tambeacutem desenvolveu o conceito de capital simboacutelico o qual natildeo se baseia

unicamente no econocircmico mas fundamentalmente se expressa por outros tipos de capitais4

o cultural o social o poliacutetico o religioso e o esteacutetico reconhecendo a dimensatildeo simboacutelica

enquanto produtora e reprodutora da dominaccedilatildeo que estaacute por traz dos processos de

diferenciaccedilatildeo social

Sendo assim a hierarquia das posiccedilotildees sociais se constitui de acordo com o volume e

com a estrutura do capital possuiacutedo pelos indiviacuteduos e grupos que se distribuem nas diversas

posiccedilotildees do espaccedilo social

Satildeo essas accedilotildees humanas que atuam diretamente na construccedilatildeo transformaccedilatildeo e

reconstruccedilatildeo do espaccedilo Desse modo um conjunto de accedilotildees sociais que compreendem

produccedilatildeo distribuiccedilatildeo e consumo de bens materiais representam praacuteticas econocircmicas em

determinado momento histoacuterico assim como o estabelecimento de relaccedilotildees entre os homens

na sociedade corroboram decisivamente para a construccedilatildeo do arranjo econocircmico social

cultural e poliacutetico do espaccedilo

Segundo Spoacutesito (2004) as praacuteticas econocircmicas modificam o espaccedilo em sua ampla

condiccedilatildeo de valor de troca ou seja as formaccedilotildees sociais em sua evoluccedilatildeo passam de uma

situaccedilatildeo de simples ocupaccedilatildeo e aproveitamento do espaccedilo (adaptaccedilatildeo passiva) para uma

situaccedilatildeo de transformaccedilatildeo cada vez mais ampla e profunda desse espaccedilo (adaptaccedilatildeo ativa)

Essa transformaccedilatildeo compreende natildeo apenas a produccedilatildeo de bens materiais como tambeacutem a

adequaccedilatildeo do meio ambiente circundante agraves necessidades individuais familiares

comunitaacuterias e das formaccedilotildees sociais em seu conjunto

Para Castells (1983 p 181) o espaccedilo eacute um produto material de uma dada formaccedilatildeo

social Eacute determinado pelas forccedilas produtivas e pelas relaccedilotildees de produccedilatildeo que se originam

delas Analisando o espaccedilo urbano enquanto expressatildeo da estrutura social o referido autor

argumenta que a organizaccedilatildeo do espaccedilo pode ser entatildeo compreendida a partir da determinaccedilatildeo

das formas espaciais e diz que todo espaccedilo urbano eacute o espaccedilo aonde vai se configurar o

processo relativo agrave forccedila de trabalho e sua reproduccedilatildeo

Entretanto Lojkine (1981) afirma que tal anaacutelise baseia-se em equiacutevocos e que reduz

o urbano agrave forccedila de trabalho Dentre os equiacutevocos estatildeo a confusatildeo entre processo

teacutecnica

de trabalho e processo social

de produccedilatildeo confusatildeo entre a unidade imediata de produccedilatildeo e

4 Bonnewitz (2005 p 53-54) sintetiza quatro tipos de capital apresentados por Bourdieu que satildeo 1) capital econocircmico que satildeo diferentes fatores de produccedilatildeo e conjunto dos bens econocircmicos 2) capital cultural satildeo as qualificaccedilotildees intelectuais produzidas pelo sistema escolar ou transmitidas pela famiacutelia podendo se apresentar objetivados tais como nos bens culturais incorporados por exemplo no vocabulaacuterio e institucionalizados a exemplo dos tiacutetulos acadecircmicos 3) capital social se constitui pelas relaccedilotildees sociais e pelas redes de sociabilidade 4) capital simboacutelico composto pelo reconhecimento social honra e prestiacutegio

31

a divisatildeo societal do trabalho no conjunto de uma formaccedilatildeo social confusatildeo entre forccedilas

produtivas e forccedilas produtivas materiais

Este autor entende o espaccedilo urbano a partir do contexto das lutas de classes

considerando o urbano como um dos lugares decisivos dessa luta enfatizando a principal

contradiccedilatildeo entre a exigecircncia de desenvolvimento do trabalho vivo e a loacutegica de acumulaccedilatildeo

do trabalho cristalizado que tende a restringir ao maacuteximo esse desenvolvimento em funccedilatildeo de

suas necessidades imediatas

Conforme Lojkine (1981) a cidade eacute o reflexo de uma nova modalidade de conflito

de classes uma vez que o espaccedilo urbano eacute organizado de maneira desigual O acesso aos

serviccedilos de infraestrutura urbana transportes coletivos e equipamentos de lazer varia de

acordo com os diferentes grupos sociais evidenciando um processo de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Para ele existem trecircs tipos de segregaccedilatildeo

1 Uma oposiccedilatildeo entre o centro onde o preccedilo do solo eacute mais alto e a periferia onde

o preccedilo do solo eacute mais baixo5

2 Uma separaccedilatildeo crescente entre as zonas e moradias reservadas agraves camadas

sociais de maior poder aquisitivo e as zonas de moradia popular

3 Um esfacelamento generalizado das funccedilotildees urbanas disseminadas em zonas

geograficamente distintas especializadas zona de escritoacuterios zona industrial

zona de moradia etc

Mediante a reflexatildeo sobre tais conceitos (Castells e Lojkine) pode-se afirmar que o

urbano eacute historicamente construiacutedo enquanto espaccedilo de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho do

capital e das proacuteprias classes sociais

A cidade torna-se assim espaccedilo destinado agrave industrializaccedilatildeo aos serviccedilos

especializados e ao crescimento do capital acarretando na concentraccedilatildeo demograacutefica e no

desenvolvimento desordenado

da cidade gerado pela necessidade de reproduccedilatildeo do capital

5 O conceito de centro utilizado nesse trabalho pode ser definido como ponto central da gestatildeo do territoacuterio centro de decisatildeo e poder Cabe destacar que a apropriaccedilatildeo e uso do solo estatildeo atrelados agraves diferenciaccedilotildees de renda sendo que determinaraacute a acessibilidade ao espaccedilo por ser diretamente vinculada agrave lei do mercado Nesse sentido a discussatildeo sobre centro e periferia natildeo deve desprezar elementos necessaacuterios a compreensatildeo de que uma aacuterea perifeacuterica natildeo eacute apenas aquela distante da aacuterea central de uma determinada cidade Devem ser levados em consideraccedilatildeo vaacuterios aspectos como fiacutesicos econocircmicos sociais e culturais que satildeo determinantes para que se compreenda as condiccedilotildees sociais e modo de vida dos moradores seja da regiatildeo central ou da perifeacuterica Para Spoacutesito (2004 p 116) o conceito de periferia urbana deve ter em vista as transformaccedilotildees que esses espaccedilos vecircm passando no seu conteuacutedo soacutecioespacial tais como os conjuntos habitacionais implantados pelo poder puacuteblico para grupos de menor poder aquisitivo loteamentos clandestinos produzidos pelas praacuteticas de autoconstruccedilatildeo e condomiacutenios fechados para grupos de maior renda e a implantaccedilatildeo de shopping centers Assim sendo esta pluralizaccedilatildeo da paisagem e dos conteuacutedos da periferia urbana revela novas praacuteticas soacutecioespaciais novas formas de diferenciaccedilatildeo e segregaccedilatildeo urbana e por fim aponta para uma fragmentaccedilatildeo territorial e social da cidade

32

uma vez que o modo de vida capitalista eacute determinado pela dinacircmica das forccedilas produtivas

articuladas com a produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Dessa maneira pode-se dizer

que o urbano se constitui em espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e tambeacutem em espaccedilo de

reproduccedilatildeo de classes sociais por meio de confrontos soacutecio-poliacuteticos decorrentes da

divergecircncia de seus interesses

Portanto o urbano eacute representado por uma infraestrutura que propicia a produccedilatildeo

circulaccedilatildeo troca e consumo de mercadorias e serviccedilos aleacutem de ser produto da accedilatildeo e

interaccedilatildeo de diversas forccedilas sociais que possuem perspectivas antagocircnicas as quais satildeo

modeladas pela luta de classes causando conflitos e interesses para aleacutem do local de trabalho

passando para o local de moradia e aacutereas de consumo coletivo

Bourdieu (2001) ao tratar da dimensatildeo simboacutelica das lutas esclarece que as lutas

entre dominantes e dominados se daacute em um campo de forccedilas que podem ser expressos em

trecircs campos campo social campo de poder e campo poliacutetico

Pode-se descrever o campo social como um espaccedilo multidimensional de posiccedilotildees tal que qualquer posiccedilatildeo atual pode ser definida em funccedilatildeo de um sistema multidimensional de coordenadas cujos valores correspondem aos valores das diferentes variaacuteveis pertinentes os agentes distribuem-se assim nele na primeira dimensatildeo segundo o volume global do capital que possuem e na segunda dimensatildeo segundo a composiccedilatildeo do seu capital

quer dizer segundo o peso relativo das diferentes espeacutecies no conjunto de suas posses [] essas espeacutecies satildeo os poderes que definem as probabilidades de ganho num campo determinado (BOURDIEU 2001 p 134-135)

Em relaccedilatildeo ao campo de poder Bourdieu (2001 p 139) o definido como

Relaccedilotildees de forccedila entre as posiccedilotildees sociais que garantem aos seus ocupantes um quantum suficiente de forccedila social

ou de capital

de modo que estes tenham a possibilidade de entrar nas lutas pelo monopoacutelio do poder entre os quais possuem uma dimensatildeo capital as que tecircm por finalidade a definiccedilatildeo de forma legiacutetima de poder

Campo poliacutetico para ele (2001 p 164) eacute ao mesmo tempo campo de forccedilas e

campo de lutas que tecircm em vista transformar as relaccedilotildees de forccedilas que confere a este campo a

sua estrutura em dado momento

Assim sendo enquanto resultado das relaccedilotildees e da accedilatildeo dos homens o espaccedilo

urbano adquire formas que refletem de modo geral as determinaccedilotildees que satildeo hegemocircnicas na

sociedade Esse espaccedilo eacute uma conjuntura histoacuterica e uma forma social que recebe sentido dos

processos sociais que se exprimem por meio dele ou seja por meio das relaccedilotildees estabelecidas

33

entre as diferentes instacircncias de uma estrutura social a econocircmica a poliacutetica a ideoloacutegica

cultural e a conjuntura de relaccedilotildees sociais que dela resulta

Da mesma forma Lefebvre (1991 p 128) ressalta que

O espaccedilo possui no modo de produccedilatildeo o mesmo status ontoloacutegico que o capital ou o trabalho porque tanto as relaccedilotildees de posse quanto agraves de exteriorizaccedilatildeo material (a produccedilatildeo de espaccedilo) estatildeo unidas nas relaccedilotildees de propriedade que formam a essecircncia do modo capitalista de produccedilatildeo O espaccedilo eacute apenas parte das forccedilas e meios de produccedilatildeo constitui tambeacutem um produto dessas mesmas relaccedilotildees tornando o design espacial diferente de qualquer outro fator social ou mercadoria aleacutem da haver um espaccedilo de consumo ou um espaccedilo como aacuterea de impacto para o consumo coletivo haacute tambeacutem o consumo de espaccedilo ou o proacuteprio espaccedilo como objeto de consumo

Milton Santos (1991 p 71) afirma que o espaccedilo natildeo eacute nem uma coisa nem um

sistema de coisas senatildeo uma realidade relacional coisas e relaccedilotildees juntas

O espaccedilo deve ser considerado como um conjunto indissociaacutevel de que participam de um lado certo arranjo de objetos geograacuteficos objetos naturais e objetos sociais e de outro a vida que os preenche e os anima ou seja a sociedade em movimento [] um conjunto de objetos e de relaccedilotildees que se realizam sobre estes objetos natildeo entre estes especificamente mas para as quais eles servem de intermediaacuterios Os objetos ajudam a concretizar uma seacuterie de relaccedilotildees O espaccedilo eacute resultado da accedilatildeo dos homens sobre o proacuteprio espaccedilo intermediado pelos objetos naturais e artificiais

Sendo assim compreende-se que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia satildeo

determinados pelas relaccedilotildees sociais que se constituem no modo de vida capitalista e

determinantes da dinacircmica soacutecioespacial

Harvey (1980 p 5) argumenta que o espaccedilo urbano pode ser compreendido como

uma relaccedilatildeo contiacutenua entre processos sociais e formas espaciais constituiacutedos historicamente

Logo a gecircnese do espaccedilo urbano eacute analisada da seguinte forma o espaccedilo natildeo eacute absoluto

relativo ou relacional em si mesmo mas pode transformar-se em outro dependendo das

circunstacircncias O problema da correta conceituaccedilatildeo do espaccedilo eacute resolvido atraveacutes da praacutetica

humana em relaccedilatildeo a ele

Com o padratildeo de modernizaccedilatildeo fordista o capital instaurou-se natildeo somente por meio

da induacutestria mas tambeacutem nas relaccedilotildees de produccedilatildeo e apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo As

categorias analiacuteticas envolvidas na produccedilatildeo e na apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano satildeo o Estado

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o capital o trabalho e a terra6 como mercadoria Estas categorias podem ser melhor

identificadas quando verificam-se os fenocircmenos e processos advindos com a modernizaccedilatildeo o

ecircxodo rural a urbanizaccedilatildeo intensa e acelerada a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria e o processo de

favelizaccedilatildeo e periferizaccedilatildeo da classe trabalhadora entre outros (HARVEY 1980)

Esses fenocircmenos podem ser reconhecidos assim como em outras cidades nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis que sofrem com os efeitos da intensa especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

acarretando na valorizaccedilatildeo de espaccedilos privilegiados os quais possuem mais investimentos em

infraestrutura serviccedilos e transportes

Para ele as novas configuraccedilotildees desenvolvidas no espaccedilo urbano e na moradia nas

uacuteltimas deacutecadas estatildeo diretamente relacionadas a um novo momento da estruturaccedilatildeo da

sociedade capitalista no qual o desejo exacerbado por acumulaccedilatildeo somado agrave necessidade de

reproduccedilatildeo das classes sociais contribuiu para o processo de descentralizaccedilatildeo das aacutereas

centrais deslocando-se para outros espaccedilos longiacutenquos da cidade como zonas baixadas

favelas etc instigados pelo processo de renovaccedilatildeo urbana

Castells (1996) ressalta que a globalizaccedilatildeo vem alterando profundamente as

estruturas produtivas as relaccedilotildees teacutecnicas e sociais de produccedilatildeo e os padrotildees organizacionais

e locacionais colocando novas questotildees e recolocando tambeacutem velhos desafios nos quais as

desigualdades e as possibilidades de desenvolvimento permanecem no centro desse novo

cenaacuterio Esse processo eacute resultado e condicionante das aceleradas e radicais mudanccedilas

tecnoloacutegicas determinadas pela competiccedilatildeo capitalista sob a lideranccedila da tecnologia da

informaccedilatildeo e da sociedade do conhecimento

A globalizaccedilatildeo permitiu e induziu a generalizaccedilatildeo dos novos meios de comunicaccedilatildeo

e controle (informaacutetica telemaacutetica internet TV a cabo sistemas online etc) que vecircm

facilitando e barateando os transportes e as comunicaccedilotildees potenciando o aumento do fluxo de

informaccedilotildees econocircmicas cientiacuteficas tecnoloacutegicas culturais e poliacuteticas expandindo o

comeacutercio internacional e inter-regional de bens alterando a natureza da produccedilatildeo consumo e

comeacutercio de serviccedilos inclusive possibilitando o crescimento do comeacutercio de serviccedilos agrave

distacircncia aumentando o fluxo de capitais e de pessoas especialmente financeiro construccedilatildeo

de imoacuteveis entre outros portanto acelerando a integraccedilatildeo mundial

6 A terra condiccedilatildeo fundamental para a reproduccedilatildeo do capital por meio de benfeitorias e mudanccedila no uso (passando entatildeo a solo urbano) se transforma em uma mercadoria especial Ao solo passa a ser atribuiacuteda uma condiccedilatildeo utilitarista (mascarando o trabalho) de meio e condiccedilatildeo para reproduccedilatildeo do capital O espaccedilo tambeacutem passou a incorporar esse utilitarismo sendo por vezes condiccedilatildeo indispensaacutevel para a economia urbana (HARVEY 2005)

35

Estas tendecircncias refletem as profundas mudanccedilas ocorridas na dinacircmica capitalista

definindo o redirecionamento das unidades produtivas no qual novos espaccedilos satildeo explorados

para a implantaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de novos equipamentos e infraestrutura que favoreccedilam a

concorrecircncia capitalista aleacutem da abertura de novos mercados o que produz novas

contradiccedilotildees entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo urbano e da moradia e sua

apropriaccedilatildeo privada

As transformaccedilotildees do espaccedilo urbano nesse novo contexto decorrem das inovaccedilotildees

tecnoloacutegicas e sociais como a fragmentaccedilatildeo das classes sociais decorrentes da relaccedilatildeo de

dominaccedilatildeo-subordinaccedilatildeo capitalista Destarte se por um lado as novas atividades produtivas

os empreendimentos imobiliaacuterios o crescimento populacional as poliacuteticas puacuteblicas ineficazes

tecircm ocasionado o adensamento e a intensificaccedilatildeo do uso de determinados espaccedilos por outro

lado tecircm propiciado a saiacuteda de uma grande parcela da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo e

de atividades econocircmicas para outros espaccedilos degradados

O proacuteprio espaccedilo dotado de atributos locacionais em contiacutenua ressignificaccedilatildeo eacute incorporado agrave difusatildeo de inovaccedilotildees tornando-se novo em alguns lugares e velhos em outros Por meio da propriedade privada eacute submetido a praacuteticas espaciais como seletividade esterilizaccedilatildeo antecipaccedilatildeo e marginalizaccedilatildeo que visam agrave sua valorizaccedilatildeo diferenciada na qual o novo e o velho estatildeo presentes em setores distintos O novo espaccedilo valorizado constitui-se ainda que natildeo exclusivamente em local para novas formas espaciais abrigando novas funccedilotildees (CARDOSO 2003 p 51)

A dinacircmica soacutecioespacial sofreu profundas alteraccedilotildees com a nova fase de

internacionalizaccedilatildeo do capital uma vez que o processo de renovaccedilatildeo urbana criou novas

bases espaciais de produccedilatildeo por meio da substituiccedilatildeo e ruptura das estruturas preexistentes

estimulando o mercado imobiliaacuterio e as parcerias entre os setores puacuteblico e privado

De acordo com Carlos (2001) o redirecionamento das formas espaciais produtivas

iraacute provocar a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano por meio da mobilidade social Este

deslocamento eacute justificado principalmente pelos novos locais de instalaccedilatildeo das induacutestrias que

procuram pontos estrateacutegicos (proacuteximos de terminais rodoviaacuterios e mariacutetimos estradas

pavimentadas etc) facilitando assim o escoamento da produccedilatildeo e reduzindo os custos de

operaccedilatildeo

Dessa maneira a intensificaccedilatildeo e extensificaccedilatildeo da urbanizaccedilatildeo satildeo provocadas por

um consumo voraz e crescente do espaccedilo uma vez que para atender agraves necessidades

crescentes do capital satildeo revistas as legislaccedilotildees ambientais e de uso do solo introduzindo

mudanccedilas que visam atender interesses de classes sociais especiacuteficas aleacutem do avanccedilo da

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destruiccedilatildeo de florestas por meio da ampliaccedilatildeo das fronteiras agriacutecolas e expansatildeo das

monoculturas intensivas como da cana e soja provocando o aumento da exclusatildeo social e da

precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida de grandes contingentes populacionais que buscam os

centros urbanos

As novas configuraccedilotildees dos espaccedilos urbanos na atualidade satildeo justificadas pelos agentes sociais condicionadores do espaccedilo Entre eles merecem destaque o Estado e os promotores imobiliaacuterios A atuaccedilatildeo do Estado no espaccedilo se efetiva com o processo de renovaccedilatildeo urbana que estaacute vinculado agrave necessidade de remodelar espaccedilos deteriorados em aacutereas condizentes com a arquitetura moderna Esta renovaccedilatildeo em geral acontece com o remanejamento de famiacutelias cabendo ao poder puacuteblico efetivar esta accedilatildeo [] As zonas atingidas pela renovaccedilatildeo passam por um processo de valorizaccedilatildeo devido agrave incorporaccedilatildeo de infraestrutura tornando-se propiacutecia agrave especulaccedilatildeo imobiliaacuteria As famiacutelias que residiam nestes espaccedilos no entanto acabam por abandonaacute-los por natildeo possuiacuterem condiccedilotildees de pagar o ocircnus da valorizaccedilatildeo que se processa com o aumento dos impostos e taxas de serviccedilos urbanos (CARLOS 2001 p 64)

Cabe ressaltar que a accedilatildeo do Estado se processa de acordo com as diretrizes do

capital intervindo no espaccedilo urbano e na questatildeo habitacional para suprir as necessidades do

mesmo estabelecendo a renovaccedilatildeo ou abertura de novos espaccedilos que satildeo fragmentados e

intensificam a segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o uso do solo torna-se cada vez mais valorizado

Dessa maneira muitas famiacutelias que moram em aacutereas mais centrais satildeo pressionadas

pelo capital imobiliaacuterio a vender seu imoacutevel o que acaba constituindo-se em uma estrateacutegia

de sobrevivecircncia pois a renda adquirida com a venda do imoacutevel por um valor mais alto gera

uma oportunidade de ganho financeiro jaacute que poderaacute servir para compra de outro imoacutevel por

um preccedilo menor em um local mais distante que sofre com a falta de infraestrutura serviccedilos

etc e o restante da renda seraacute o lucro para ser investido em outras transaccedilotildees financeiras

Atraveacutes da poliacutetica de renovaccedilatildeo urbana o Estado capitalista valoriza simultaneamente vaacuterios interesses De um lado via expulsatildeo dos pobres residentes em corticcedilos junto ao centro da cidade redirecionando a segregaccedilatildeo residencial e viabiliza o capital imobiliaacuterio que tem oportunidade de realizar bons negoacutecios em aacutereas onde o preccedilo da terra eacute pela proximidade do centro bastante elevado eacute a renovaccedilatildeo urbana (CORREcircA 1989 p 28)

Carlos (2001) analisa o processo de renovaccedilatildeo urbana como uma accedilatildeo do Estado por

intermeacutedio do poder local ao intervir no processo de produccedilatildeo da cidade que reforccedila a

hierarquia de lugares criando novas centralidades e expulsando para periferia os antigos

37

habitantes criando um espaccedilo de dominaccedilatildeo Com isso impotildee sua presenccedila em todos os

lugares agora sob controle e vigilacircncia (direta ou indireta)

Assim sendo o espaccedilo produzido assume a caracteriacutestica de fragmentaccedilatildeo em

decorrecircncia da accedilatildeo dos empreendedores imobiliaacuterios e da generalizaccedilatildeo do processo de

mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo homogecircneo (pela dominaccedilatildeo imposta pelo Estado ao espaccedilo) e

hierarquizado (pela divisatildeo espacial do trabalho)

Entatildeo a estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano depende das accedilotildees econocircmicas sociais

culturais e poliacuteticas uma vez que a cidade eacute resultado de intervenccedilotildees puacuteblicas e privadas que

atuam no espaccedilo urbano por meio de investimentos infraestruturais e organizacionais

regulamentando os diversos interesses de poder e de classe estabelecendo estrateacutegias sociais e

poliacuteticas muitas vezes geradoras de segregaccedilotildees e exclusotildees sociais

Percebe-se assim que a accedilatildeo do Estado perpetua as contradiccedilotildees engendradas pelo

processo de reproduccedilatildeo capitalista agrave medida que atende aos interesses da classe dominante

criando mecanismos para quebrar as barreiras que impedem o avanccedilo do progresso ao

implementar infraestrutura e favorecer a liberaccedilatildeo de aacutereas necessaacuterias agrave reproduccedilatildeo do

capital Destarte a renovaccedilatildeo urbana pode ser caracterizada como um conjunto de estrateacutegias

que levam agrave segregaccedilatildeo e agrave hierarquia do espaccedilo alterando a forma de determinadas aacutereas da

cidade promovendo a transformaccedilatildeo da vida urbana modificando sua estrutura e funccedilatildeo

A contradiccedilatildeo do espaccedilo natildeo vem de sua forma racional tal qual se depreende nos matemaacuteticos ela vem do conteuacutedo praacutetico e social especificamente do conteuacutedo capitalista Com efeito esse espaccedilo da sociedade capitalista se quer racional enquanto praacutetica ele eacute comercializado fragmentado vendido em parcelas Eacute assim que ele eacute ao mesmo tempo global e pulverizado Ele parece loacutegico e ele eacute absolutamente recortado Essas contradiccedilotildees explodem no plano institucional Nesse plano se descobre que a burguesia tem um duplo poder sobre o espaccedilo inteiro agrave exceccedilatildeo dos direitos da coletividade e do Estado-e secundariamente pela globalidade a saber o conhecimento a estrateacutegia a accedilatildeo do Estado Haacute conflitos inevitaacuteveis entre esses dois aspectos e notadamente entre o espaccedilo abstrato (concebido ou conceitual global ou estrateacutegico) e o espaccedilo imediato percebido vivido fragmentado e vendido No plano institucional essas contradiccedilotildees aparecem entre os planos gerais do planejamento e os projetos parciais dos mercados do espaccedilo (LEFEBVRE 1991 apud CARLOS 2001 p 237- 238)

Por meio do zoneamento e do planejamento urbano o Estado impotildee e administra

limitaccedilotildees ao mercado imobiliaacuterio ao promover em determinados espaccedilos urbanos serviccedilos

como aacutegua energia esgoto transporte puacuteblico escolas e postos de sauacutede aleacutem de garantir

infraestrutura que contribui indiretamente para o aumento do valor de uso das moradias

38

Portanto como esclarece Harvey (1996) a compreensatildeo da dinacircmica com que se

processam as grandes intervenccedilotildees urbanas e das modificaccedilotildees estruturais geradas por elas eacute

fundamental para a proposiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas direcionadas para a sustentabilidade

urbana O contexto global da perda de capacidade de regulaccedilatildeo da economia por parte do

poder puacuteblico da financeirizaccedilatildeo e desterritorializaccedilatildeo do capital bem como a intensificaccedilatildeo

da sua concentraccedilatildeo satildeo fenocircmenos que afetam de maneira geral todas as grandes cidades

poreacutem os efeitos satildeo muito particulares

Assim a raacutepida transformaccedilatildeo do espaccedilo urbano e da questatildeo habitacional no Brasil

no periacuteodo compreendido pelas trecircs uacuteltimas deacutecadas do seacuteculo XX e na primeira do seacuteculo

XXI induz a questionamentos quanto a questatildeo dos modelos de poliacuteticas puacuteblicas

implementadas assim como os padrotildees da segregaccedilatildeo soacutecioespacial que ora se observa na

estrutura intra-urbana das grandes cidades brasileiras incluindo Beleacutem e Satildeo Luis

Para tanto torna-se imprescindiacutevel refletir sobre a dinacircmica de ocupaccedilatildeo do solo

bem como a interaccedilatildeo dos diferentes agentes que atuam na produccedilatildeo e consumo do espaccedilo

urbano clarificando os aspectos relacionados agrave atuaccedilatildeo do capital imobiliaacuterio e agraves

precariedades soacutecio-espaciais a que estaacute submetida grande parte da populaccedilatildeo como carecircncia

de infraestrutura e serviccedilos urbanos especulaccedilatildeo expulsatildeo de suas terras entre outras uma

vez que a questatildeo habitacional estaacute condicionada tanto pelas mudanccedilas na economia do paiacutes

quanto pelos mecanismos que produzem a estrutura urbana e a distribuiccedilatildeo dos equipamentos

e serviccedilos na cidade

22 AGENTES PRODUTORES E CONSUMIDORES DO ESPACcedilO E O PAPEL DO ESTADO

Ao comeccedilar a discutir sobre os agentes produtores do espaccedilo urbano faz-se

necessaacuterio resgatar a concepccedilatildeo de espaccedilo urbano desenvolvida por Correcirca (1993) a qual

considera o espaccedilo urbano como espaccedilo construiacutedo no contexto da cidade capitalista como

produto social resultado da accedilatildeo histoacuterica de agentes que produzem e consomem esse espaccedilo

Eis o que eacute o espaccedilo urbano fragmentado e articulado reflexo e condicionante social um conjunto de siacutembolos e campo de lutas Eacute assim a proacutepria sociedade em uma de suas dimensotildees aquela mais aparente materializada nas formas espaciais Eacute o produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem o espaccedilo (CORREcircA 1993 p 9)

39

Dessa maneira a apropriaccedilatildeo e o uso do solo nas cidades capitalistas podem ser

compreendidos pela proacutepria dinacircmica da sociedade que traz em si diversas contradiccedilotildees

estabelecidas nos conflitos existentes entre as exigecircncias do capital e as demandas da

sociedade uma vez que as relaccedilotildees econocircmicas determinam as diretrizes do modo de

produccedilatildeo e a estrutura urbana se constitui pelas accedilotildees dos grupos sociais

De acordo com Correcirca (1993) os processos espaciais definem a organizaccedilatildeo espacial

desigual e mutaacutevel da cidade capitalista Nela o processo espacial eacute concebido como as forccedilas

por meio da qual o movimento de transformaccedilatildeo social compreendido como o proacuteprio

processo se efetiva espacialmente redefinindo a espacialidade da sociedade

Ainda segundo o autor as agentes que produzem socialmente o espaccedilo urbano satildeo

responsaacuteveis pela configuraccedilatildeo da organizaccedilatildeo do espaccedilo das cidades distinguindo-se como

1) Proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo caracterizam-se como os grandes proprietaacuterios industriais e das grandes empresas comerciais portanto como grandes consumidores de espaccedilos Estes espaccedilos satildeo produzidos em torno do interesse de expansatildeo da produccedilatildeo garantidos por meio de terrenos amplos e baratos que satisfaccedilam suas necessidades de circulaccedilatildeo de mercadoria e acabam por interferir no modelamento das cidades

2) Proprietaacuterios fundiaacuterios satildeo os proprietaacuterios de terra que se empenham em obter a maior renda fundiaacuteria de suas propriedades seja no uso comercial ou residencial Portanto sua accedilatildeo se daacute em torno do aumento contiacutenuo da renda fundiaacuteria que obtecircm de suas propriedades Para tanto seus esforccedilos direcionam-se no sentido de garantir infraestrutura urbana para seus terrenos exercendo pressatildeo junto ao poder puacuteblico no processo de definiccedilatildeo das leis de uso do solo e na garantia dos benefiacutecios infraestruturais Significa dizer que estes estatildeo mais preocupados com o valor de troca da terra e natildeo de seu uso

3) Promotores imobiliaacuterios eacute um conjunto de agentes que exercem accedilotildees de compra financiamento estudo teacutecnico construccedilatildeo ou produccedilatildeo fiacutesica de novas habitaccedilotildees transformaccedilatildeo do capital mercadoria em capital dinheiro7 Sua atuaccedilatildeo espacial na cidade tem caraacuteter excludente pois favorece a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para satisfazer a demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo desta forma criando e reforccedilando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial

4) Estado enquanto agente modelador do espaccedilo urbano capitalista atuando na organizaccedilatildeo espacial da cidade como grande industrial consumidor de espaccedilo e de localizaccedilotildees especiacuteficas proprietaacuterio fundiaacuterio e promotor imobiliaacuterio sem deixar de ser tambeacutem um agente de regulaccedilatildeo do uso do solo e alvo dos chamados Movimentos Sociais Urbanos Sua accedilatildeo mais visiacutevel se daacute por meio da implantaccedilatildeo de serviccedilos e equipamentos puacuteblicos na elaboraccedilatildeo de normas vinculadas ao uso do solo para os quais dispotildee de um conjunto de instrumentos como o direito de desapropriaccedilatildeo a regulamentaccedilatildeo do uso do solo e outros

7 Sobre as funccedilotildees atribuiacutedas aos promotores imobiliaacuterios ver Topalov (1974)

40

5) Grupos sociais excluiacutedos satildeo parcelas da populaccedilatildeo que natildeo possuem no que concerne agrave moradia acesso aos bens e serviccedilos produzidos socialmente e eacute na produccedilatildeo de favela em terrenos puacuteblicos ou privados ocupados que esses grupos tornam-se agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito dos outros agentes A produccedilatildeo do espaccedilo eacute uma forma de resistecircncia e de estrateacutegia de sobrevivecircncia (CORREcircA 1993 p 23-24)

Cada um dos agentes a quem o autor se refere desenvolve um papel ativo na

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia tendo como vieacutes a dinacircmica da acumulaccedilatildeo

capitalista considerando que accedilotildees implementadas satildeo em funccedilatildeo dos interesses dominantes

garantindo a reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e portanto a contradiccedilatildeo da luta de classes

Harvey em sua obra A justiccedila social e a cidade argumenta que a aquisiccedilatildeo de terras

e as melhorias implementadas no espaccedilo urbano e habitacional satildeo compreendidas como

mercadorias na sociedade capitalista contemporacircnea

portanto possuem um valor de uso e

um valor de troca

mercadorias estas que natildeo podem ser deslocadas pois tecircm uma

localizaccedilatildeo fixa e que satildeo essenciais uma vez que natildeo se pode viver sem uma habitaccedilatildeo (um

abrigo de qualquer espeacutecie) que ocupa um espaccedilo na cidade (HARVEY 1980 p 157)

Para ele o importante eacute analisar o papel dos agentes do mercado imobiliaacuterio na

determinaccedilatildeo dos valores da terra e para isso destaca os principais grupos que compotildee esse

mercado

1) Moradores cuja situaccedilatildeo familiar ou pessoal (assim como a localizaccedilatildeo da moradia) iraacute determinar o valor de uso da habitaccedilatildeo

o valor de troca apareceraacute em dois momentos na compra e venda da residecircncia e nas reformas e reparos que aumentam esse valor

2) Imobiliaacuterias atores que operam no mercado imobiliaacuterio para obter valor de troca Seu lucro se daacute no processo de compra e venda de habitaccedilotildees e na prestaccedilatildeo de serviccedilos como intermediaacuterias Para as imobiliaacuterias o valor de uso estaacute no volume de transaccedilotildees realizadas das quais obtecircm o valor de troca

3) Proprietaacuterios de terrenos urbanos os proprietaacuterios profissionais ou seja aqueles que adquirem terrenos para vendecirc-los por um preccedilo mais elevado e vecircem na habitaccedilatildeo um meio de troca e natildeo um valor de uso para si mesmo

4) Incorporadoras e a induacutestria da construccedilatildeo atores envolvidos na criaccedilatildeo de novos valores de uso que garantam os subsiacutedios de seus valores de troca Da mesma maneira que as imobiliaacuterias estatildeo interessadas no valor de uso para outrem desde que obtenham valor de troca para si mesma

5) Instituiccedilotildees financeiras estatildeo interessadas em obter valores de troca por meio de financiamentos que promovem a criaccedilatildeo de valores de uso

6) Instituiccedilotildees governamentais interferem no mercado imobiliaacuterio dando apoio agraves instituiccedilotildees financeiras incorporadores e agrave induacutestria da construccedilatildeo garantindo lucros e eliminando alguns riscos Esse suporte

41

governamental ao mercado imobiliaacuterio eacute uma das maneiras de assegurar a produccedilatildeo de valores de uso (provisatildeo de moradia para populaccedilatildeo de baixa renda) e valores de troca promovendo melhoria urbana (bens de consumo coletivo) ou implementando leis de zoneamento controle e planejamento do uso do solo urbano (HARVEY 1980 p 139-141)

No processo urbano e da cidade se relacionam diferentes agentes que possuem

estrateacutegias proacuteprias com objetivos e agendas diversas que geram conflitos entre eles e

estrateacutegias comuns que os unem como a apropriaccedilatildeo da renda da terra por meio de praacuteticas

espaciais interligadas nas quais se articulam e se validam arranjos institucionais formas

legais sistemas poliacuteticos e administrativos aleacutem de hierarquias de poder Desse processo

emanam experiecircncias percepccedilotildees leituras simboacutelicas e aspiraccedilotildees

Harvey (1996 p 52) ressalta que o poder de reorganizar a vida urbana estaacute em uma

coalizatildeo de forccedilas na qual o Estado tem apenas o papel de coordenador e de agilizar as

intervenccedilotildees urbanas O poder de organizar o espaccedilo contudo adveacutem do complexo de forccedilas

mobilizadoras por diversos agentes sociais

Na produccedilatildeo do espaccedilo urbano diversos agentes interferem direta ou indiretamente

estabelecendo agraves vezes relaccedilotildees de conflitos de interesses engendrados em torno do espaccedilo

social

local dos valores sociais de uso e do desdobramento de relaccedilotildees sociais no espaccedilo

e

em torno do espaccedilo abstrato

enquanto espaccedilo de desenvolvimento imobiliaacuterio e

administraccedilatildeo governamental por exemplo

que tem acarretado na fragmentaccedilatildeo e na

criaccedilatildeo de guetos hierarquizados representando com sua espacialidade a hierarquia econocircmica

e social

(HARVEY 2005)

A partir da compreensatildeo de que a sociedade eacute produto da inter-relaccedilatildeo entre habitus

e campo Bourdieu (2001) enfatiza que os agentes sociais satildeo dotados de um habitus inscritos

nos corpos pelas experiecircncias passadas

Estes sistemas de esquemas de percepccedilatildeo apreciaccedilatildeo e accedilatildeo permitem operar os atos de conhecimento praacutetico fundados sobre a descoberta e o conhecimento dos estiacutemulos condicionais e convencionais aos quais podem reagir e engendrar sem fins expliacutecitos nem caacutelculo racional de meios de estrateacutegias adaptadas e renovadas continuamente mas de acordo com as exigecircncias estruturais das quais satildeo o produto e que as definem (BOURDIEU 2001 p 166)

De acordo com Bourdieu (1996) os agentes sociais constroem o mundo social e

individual e coletivamente a partir de uma estrutura objetiva de distribuiccedilatildeo de diferentes

tipos de capital (formas de poder) sejam eles fiacutesicos culturais ou simboacutelicos cuja eficiecircncia

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varia de forma contingente e localizada A accedilatildeo dos agentes sobre essas estruturas objetivas

constitui o campo social dentro do qual ocorrem disputas entre os agentes possuidores de

meios e fins diferenciados e um habitus adquirido por sua socializaccedilatildeo preacutevia ou por aquela

praticada dentro do proacuteprio campo

Nessa perspectiva compreende-se que o espaccedilo urbano torna-se um campo de luta

onde se instaura uma luta dos diferentes agentes pelo espaccedilo pelo solo urbano estabelecendo-

se portanto um conflito entre espaccedilo abstrato e o espaccedilo vivido fragmentado pelas

estrateacutegias dos diferentes agentes sociais percebido pelo individuo por meio de sua vida

cotidiana

Cabe inferir que o acesso agrave moradia nas cidades natildeo se daacute de forma igualitaacuteria e pode

ser comparaacutevel a ocupaccedilatildeo sequumlencial de um teatro aonde aqueles que chegam primeiros

adquirem os melhores lugares bem como os que tecircm mais dinheiro Aos pobres cabem os que

sobram

(HARVEY 1980 p 144)

Nesse sentido pode-se afirmar que no processo histoacuterico de ocupaccedilatildeo e uso do

espaccedilo urbano o solo eacute disputado entre os diferentes agentes econocircmicos e classes sociais

pois se considera que a terra na sociedade capitalista atende as demandas tanto de reproduccedilatildeo

do capital como de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e da dimensatildeo simboacutelica uma vez que

essa disputa se daacute por diferentes usos como habitacional cultural religioso comercial e de

serviccedilos industrial etc e mediante diferentes vantagens locacionais e infraestruturais

estabelecendo uma hierarquia de preccedilos que faz do mercado imobiliaacuterio a grande expressatildeo

da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Aleacutem dos espaccedilos existentes esse mercado imobiliaacuterio vai

determinar e criar a futura localizaccedilatildeo da classe trabalhadora

Como observa Santos (1991 p 31)

Eacute assim que se criam nas cidades as infraestruturas a que Manuel Lemes chama de extensores urbanos como a aduccedilatildeo de aacutegua os esgotos a eletricidade o calccedilamento que ao mesmo tempo revalorizam diferencialmente os terrenos impotildeem um crescimento maior agrave superfiacutecie urbana e mediante o papel da especulaccedilatildeo asseguram a permanecircncia de espaccedilos vazios Como estes ficam agrave espera de novas valorizaccedilotildees as extensotildees urbanas reclamadas pela pressatildeo da demanda vatildeo mais uma vez dar-se em aacutereas perifeacutericas O mecanismo de crescimento urbano torna-se assim um alimentador da especulaccedilatildeo a inversatildeo puacuteblica contribuindo para acelerar o processo

Kowarick (1988) ressalta que a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria pode ser demonstrada

tambeacutem quando as aacutereas centrais com zonas estagnadas ou decadentes recebem

43

investimentos em serviccedilos ou infraestruturas baacutesicas ou seja uma melhoria urbana de

qualquer tipo repercute imediatamente no preccedilo dos terrenos

Assim a intervenccedilatildeo do poder puacuteblico por meio dos planos de reurbanizaccedilatildeo

contribui para consolidar uma nova configuraccedilatildeo espacial que visa estimular ao mercado

imobiliaacuterio para as camadas de maior poder aquisitivo enquanto os pobres satildeo expulsos para

aacutereas mais distantes A estes na medida em que os espaccedilos urbanos satildeo seletivamente

valorizados com o encarecimento dos alugueacuteis e a remoccedilatildeo ou esgotamento de espaccedilos em

favelas mais proacuteximas das aacutereas centrais resta-lhes outras favelas afastadas ou os loteamentos

perifeacutericos A formaccedilatildeo da periferia pode ser compreendida entatildeo como resultante de []

aglomerados distantes dos centros clandestinos ou natildeo carentes de infraestrutura onde

passa a residir crescente quantidade de matildeo-de-obra necessaacuteria para fazer girar a maquinaria

econocircmica (KOWARICK 1988 p31)

De acordo com Low-Beer (1983 p 33) Marx analisa historicamente a renda

proveniente da terra considerando as relaccedilotildees sociais do homem nos diferentes modos de

produccedilatildeo como no feudalismo a renda eacute obtida pelo proprietaacuterio como pagamento na

forma direta de bens produzidos (diacutezimos) ou horas trabalhadas na terra do senhor [] no

capitalismo a renda da terra eacute parte da mais-valia gerada no processo produtivo

A propriedade privada do solo significa o domiacutenio de uma condiccedilatildeo especifica para a realizaccedilatildeo do processo de produccedilatildeo e circulaccedilatildeo de mercadorias cujo cerne eacute o lucro A aquisiccedilatildeo de terras para gerar renda passa a ser considerada como um investimento e eacute dado agrave terra o status de meio de produccedilatildeo apesar de ser na realidade um fator de produccedilatildeo [] natildeo se trata de qualquer rendimento derivado de terra e sim aquela fraccedilatildeo ou remuneraccedilatildeo da qual se apossa o proprietaacuterio obtida pela cessatildeo deste bem a terceiros para que estes venham extrair algo da terra (LOW-BEER 1983 p 34)

Correcirca (1993 p 84) procura analisar a renda da terra a partir da constituiccedilatildeo da

remuneraccedilatildeo que se obtecircm em razatildeo de

a) propriedade da terra que autoriza o proprietaacuterio extrair uma remuneraccedilatildeo independentemente de qualquer outra coisa

trata-se da renda absoluta b) localizaccedilotildees privilegiadas que incidem na diminuiccedilatildeo dos custos de produccedilatildeo em razatildeo por exemplo da proximidade do porto ou de vias ferroviaacuterios ou de transportes ou no aumento das vendas pela localizaccedilatildeo junto ao centro ou subcentros comerciais intra-urbanos

trata-se da renda diferencial que implica em superlucro c) localizaccedilotildees seletivas por exemplo em aacutereas de amenidades que possuem e conferem status ao seu possuidor

trata-se da renda de monopoacutelio que implica tambeacutem em superlucro

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Sendo assim a produccedilatildeo da habitaccedilatildeo que envolve relaccedilotildees de produccedilatildeo consumo e

troca na qual atuam diferentes agentes pode ser considerada como mercadoria pois a proacutepria

moradia e todos os seus componentes

terra material de construccedilatildeo infraestrutura etc

mesmo tendo um valor de uso possuem um valor de troca e por isso apresentam um

significado ligado agrave loacutegica do mercado aleacutem de ser uma mercadoria que pode ser comprada e

vendida a moradia relaciona-se ao processo de capitalizaccedilatildeo que ela representa uma vez que

o preccedilo da terra eacute influenciado por fatores como

a) Localizaccedilatildeo (acessibilidade acesso a infraestrutura e serviccedilos urbanos)

b) Caracteriacutesticas fiacutesicas do terreno (referem-se agrave dificuldade ou facilidade de se

construir no terreno por fatores topograacuteficos hidroloacutegicos etc)

c) Legislaccedilatildeo existente e seus limites (SMOLKA 1983)

Topalov (1974 p 15-17) analisa o processo de formaccedilatildeo dos preccedilos dos terrenos e

destaca como importante os seguintes conceitos sobre renda fundiaacuteria no meio urbano

a) Renda Absoluta caracteriza-se como determinante dos preccedilos desde que haja

na propriedade privada uma condiccedilatildeo natildeo reproduziacutevel da produccedilatildeo

a terra

agriacutecola a jazida o solo suporte da atividade nas localizaccedilotildees necessaacuterias a

essas Confere ao proprietaacuterio o poder de impedir a sua utilizaccedilatildeo ateacute que as

condiccedilotildees econocircmicas propiciem a sua valorizaccedilatildeo de onde se pode retirar o

excedente

b) Renda Diferencial tem por origem a desigualdade de produtividade do

trabalho nos diversos ramos de produccedilatildeo na qual a desigualdade das

produtividades individuais natildeo provecircm sempre das caracteriacutesticas internas

das empresas em concorrecircncia mas da caracterizaccedilatildeo das condiccedilotildees externas

de suas atividades de acordo com as localizaccedilotildees

c) Renda de Monopoacutelio eacute determinada pelas condiccedilotildees de mercado e estaacute

baseada na natildeo reprodutibilidade de certas mercadorias pelo capital fazendo

sua oferta ser limitada pois natildeo eacute mais determinado pelas condiccedilotildees de

produccedilatildeo de mercadorias mas pelas de sua circulaccedilatildeo isto eacute pela sua

procura A partir de entatildeo fixa-se duravelmente um sobrelucro de monopoacutelio

do qual beneficiam os ofertantes da mercadoria considerada

Destarte pode-se afirmar que a renda diferencial do solo urbano eacute essencialmente

uma renda de localizaccedilatildeo devido agraves condiccedilotildees fiacutesicas do espaccedilo mas tambeacutem devido agraves

condiccedilotildees criadas pelos homens e suas atividades que determinam as relaccedilotildees econocircmicas e

sociais

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Segundo Smolka (1983 p 205) uma das caracteriacutesticas do incorporador imobiliaacuterio

eacute a de promover o empreendimento certo no lugar certo para o consumidor certo ou seja

Estado ao promover melhorias urbanas por meio de infraestrutura construccedilatildeo de

equipamentos de uso coletivo etc atua como gerador de renda diferencial valorizando o solo

urbano e ao mesmo tempo o empreendedor imobiliaacuterio usufruindo-se da situaccedilatildeo constroacutei

moradias neste solo valorizado e as vende por preccedilo elevado

Assim somente as pessoas com maior poder aquisitivo teratildeo acesso a esta habitaccedilatildeo

O acesso agrave terra assume entatildeo um caraacuteter segregativo em funccedilatildeo do poder de renda e as

classes de menor poder aquisitivo excluiacutedas do acesso agrave mercadoria habitaccedilatildeo alteram a

dinacircmica da proacutepria cidade ao produzir novos espaccedilos de moradia na forma de favelas

ocupaccedilotildees coletivas de terrenos vazios etc

Nesse sentido a produccedilatildeo de moradia se daacute em funccedilatildeo de quem pode compraacute-la e

nem sempre em funccedilatildeo de quem precisa dela A localizaccedilatildeo privilegiada isto eacute o acesso faacutecil

agrave infraestrutura e aos serviccedilos urbanos a acessibilidade ao terreno bem como as

caracteriacutesticas de seu entorno iratildeo influenciar sobre o preccedilo da terra uma vez que a produccedilatildeo

do espaccedilo urbano e da moradia natildeo ocorre de maneira uniforme A demanda por terrenos

acontece de acordo com a necessidade da atividade que vai se desenvolver nestes e tem como

um dos determinantes a expansatildeo urbana enquanto fator de valorizaccedilatildeo do preccedilo em funccedilatildeo

de variaacuteveis como a quantidade e a qualidade de serviccedilos e equipamentos urbanos

Todas as atividades capitalistas urbanas se desenvolvem sobre a base de objetos imobiliaacuterios de edifiacutecios produtos do trabalho passado presos a uma localizaccedilatildeo determinada Cada localizaccedilatildeo daacute acesso de uma maneira que eacute especifica a um conjunto de valores de usos complexos nascidos na cidade (TOPALOV 1974 p 22)

Conforme afirmam Ribeiro e Cardoso (1996 p234) a terra teraacute seu preccedilo regulado

pelas condiccedilotildees de competiccedilatildeo entre os vaacuterios capitais e pelas possibilidades de lucratividade

propiciadas pelas diversas localizaccedilotildees no espaccedilo urbano

A localizaccedilatildeo eacute um valor de uso produzido e contecircm a capacidade de aglomerar e de

combinar socialmente meios de produccedilatildeo e meios de reproduccedilatildeo de uma formaccedilatildeo social

Dessa forma eacute possiacutevel dizer que a terra corresponde aos investimentos feitos na ou sobre a

mesma demandando certa parcela de capital e que pode ser considerada enquanto produto do

trabalho humano e natildeo como accedilatildeo da natureza

A diversidade de construccedilotildees habitacionais que vatildeo desde a construccedilatildeo de mansotildees

ateacute as autoconstruccedilotildees e habitaccedilotildees em favelas pode-se a uma produccedilatildeo diferenciada das

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cidades e refere-se agrave capacidade diferente de pagar tanto pela casaterreno quanto pelos

equipamentos e serviccedilos coletivos Portanto os que desfrutam de determinada renda ou

salaacuterio podem morar em aacutereas bem servidas de equipamentos e serviccedilos e aqueles que natildeo

desfrutam moram em locais deteriorados e haacute tambeacutem os que natildeo moram que vivem em

baixo de pontes viadutos em praccedilas pontos de ocircnibus natildeo tecircm um teto fixo

Villaccedila (2001) ao utilizar as anaacutelises de Marx sobre valor de uso e valor de troca

argumenta que o processo de valorizaccedilatildeo da terra urbana leva em consideraccedilatildeo que existe

uma determinada fraccedilatildeo do valor do terreno urbano que natildeo proveacutem de investimentos

puacuteblicos fazendo-se necessaacuterio entender o valor de uso da localizaccedilatildeo que decorre da

aglomeraccedilatildeo humana e sofre variaccedilatildeo nos diversos pontos da cidade Sendo assim eacute possiacutevel

compreender o valor da terra no espaccedilo urbano associado ao conceito de localizaccedilatildeo a terra-

localizaccedilatildeo

da qual a terra urbana eacute a mais oacutebvia manifestaccedilatildeo enquanto produto do trabalho

humano tem tanto valor de uso como valor de troca Seu valor eacute determinado pelo tempo de

trabalho socialmente necessaacuterio para produzi-la (VILLACcedilA 2001 p 10)

Considerando-se a importacircncia da localizaccedilatildeo na garantia de acessibilidade aos

benefiacutecios urbanos o valor de uso de cada terreno eacute diferente em funccedilatildeo de sua localizaccedilatildeo

Logo seus preccedilos que satildeo determinados pelo valor das mercadorias produzidas por seu

intermeacutedio e pela propriedade monopolista da terra aleacutem da oferta de melhores vantagens

locacionais8 de acesso agrave cidade tambeacutem se diferenciam e satildeo alvos de disputa entre os

diversos agentes capitalistas

Dentro desse contexto nota-se que o espaccedilo urbano e a habitaccedilatildeo ganham conotaccedilatildeo

de mercadoria devido agrave sua apropriaccedilatildeo privada e assumem qualidade de troca pela

caracteriacutestica da obtenccedilatildeo de lucro e acumulaccedilatildeo servindo ao interesse do capital agrave medida

que eacute produzido e reproduzido como mercadoria o que leva a modificaccedilatildeo de sua estrutura

criando novas formas e funccedilotildees perdendo seu valor de uso na qual a reproduccedilatildeo da vida

social perde sua razatildeo de ser esfacelando os laccedilos afetivos de vizinhanccedilas e outros

A contradiccedilatildeo entre o processo de produccedilatildeo social do espaccedilo e sua apropriaccedilatildeo privada estaacute na base do entendimento do processo de reproduccedilatildeo espacial Isto porque em uma sociedade fundada sobre a troca a apropriaccedilatildeo do espaccedilo ele proacuteprio produzido como mercadoria liga-se cada vez mais agrave forma de mercadoria servindo agraves necessidades de acumulaccedilatildeo por meio das mudanccedilasreadaptaccedilotildees de usos e funccedilotildees dos lugares que tambeacutem se reproduzem sob a lei reprodutiacutevel a partir de estrateacutegias da reproduccedilatildeo em

8 As vantagens locacionais satildeo o complexo de elementos que formam os benefiacutecios urbanos no que diz respeito ao acesso aos locais de trabalho compras lazer aos serviccedilos de infraestrutura como aacutegua energia esgoto pavimentaccedilatildeo coleta de lixo e ainda serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo cultura entre outros

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determinados momentos da histoacuteria do capitalismo Este se estende cada vez mais ao espaccedilo global criando novos setores de atividades produtivas Cada vez mais o espaccedilo produzido como mercadoria entra no circuito da troca atraindo capitais que migram de um setor da economia para outro de modo a viabilizar a reproduccedilatildeo A possibilidade de ocupar o espaccedilo sempre crescente o que explica a emergecircncia de uma loacutegica associada a uma forma de dominaccedilatildeo do espaccedilo que se reproduz ordenando e direcionando a ocupaccedilatildeo fragmentando e tornando os espaccedilos trocaacuteveis a partir de operaccedilotildees que se realizam no mercado Desse modo o espaccedilo eacute produzido e reproduzido como mercadoria reprodutiacutevel (CARLOS 2001 p 15-16)

Conforme enfatiza Carlos (2001 p 18) o processo de transformaccedilatildeo do espaccedilo

urbano natildeo estaacute limitado apenas agrave mercantilizaccedilatildeo desse espaccedilo mas a divisatildeo e organizaccedilatildeo

do trabalho que produz comportamentos e valores que induzem ao consumo exacerbado e

condicionam as diretrizes da vida cotidiana as quais satildeo estabelecidas pelos vaacuterios conflitos

que se intensificam com a imposiccedilatildeo de novos padrotildees culturais em detrimento dos antigos

padrotildees de relacionamento ou seja os antigos laccedilos de sociabilidade vatildeo se desfazendo e as

relaccedilotildees entre as pessoas se tornam cada vez mais distantes sendo substituiacutedas por relaccedilotildees

profissionais e ou institucionais Assim o espaccedilo possiacutevel de ser sentido pensado

apropriado e vivido pelo indiviacuteduo por meio do corpo perde sua essecircncia perde sentido de

lugar e se transforma em natildeo-lugar

O espaccedilo torna-se entatildeo dominado subalternizado pela classe dominante pois ao

se apropriar das vantagens e dos recursos do espaccedilo urbano a referida classe utiliza-o de

acordo com os seus interesses levando a cidade a ser pensada e utilizada como espaccedilo de

reproduccedilatildeo do capital aleacutem de implementar a divisatildeo social do espaccedilo urbano

Tomando-se como base novamente as concepccedilotildees teoacutericas de Lojkine (1981) e

Castells (1983) eacute possiacutevel elucidar como se processa a divisatildeo social do espaccedilo urbano Para

Lojkine (1981) a divisatildeo soacutecioespacial se daacute a partir de uma divisatildeo mais geral do territoacuterio

(cidadecampo) sendo que a primeira eacute concebida como a zona de comando econocircmico e

poliacutetico e que exerce o poder enquanto que a segunda pode ser considerada como uma zona

de execuccedilatildeo e de reproduccedilatildeo limitada da forccedila de trabalho

Castells (1983) entende a divisatildeo social do espaccedilo como um processo de luta

concernente ao conjunto da produccedilatildeo social Esta luta natildeo eacute vista em sua especificidade

(singular) mas opotildee os grupos formados pela inserccedilatildeo diferenciada dos indiviacuteduos

(particularidade) nos diversos componentes da estrutura social (totalidade) intensificando a

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

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de lazer e de esporte equipamentos e serviccedilos de sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo para as chamadas classes populares (RODRIGUES 1998 p 20)

Historicamente o estudo acerca do papel do Estado capitalista passa pela discussatildeo

apresentada por Engels (1982) o qual argumenta que a cidade de Atenas era a forma mais

pura e mais claacutessica para se compreender o surgimento do Estado afirmando que o mesmo

tem sua gecircnese fundamentalmente dos antagonismos de classe desenvolvidos no interior da

sociedade

O Estado segundo o autor eacute definido como um produto da sociedade Era necessaacuterio

um poder que aparentemente estava acima da sociedade para tentar atenuar as lutas de

classes e principalmente para manter a ordem ou seja quando a sociedade atinge um

determinado grau de desenvolvimento de suas forccedilas produtivas tornam-se inevitaacuteveis as

contradiccedilotildees sociais que contribuem para a divisatildeo da sociedade em classes sociais Satildeo estas

contradiccedilotildees que justificam o surgimento do Estado

Logo como o Estado nasce para amenizar os conflitos de classes acaba tornando-se

a forccedila materializada de poder ou seja o braccedilo direito

da classe economicamente e

politicamente dominante adquirindo novos meios para a repressatildeo e exploraccedilatildeo da classe

oprimida

A concepccedilatildeo materialista de Estado enquanto produto das relaccedilotildees concretas

estabelecidas entre os homens rompe com o paradigma formal abstrato cuja concepccedilatildeo o

coloca como se fosse algo constituiacutedo independente da vontade dos homens e desvinculado

das lutas sociais travadas ao longo da histoacuteria Ao contraacuterio o Estado eacute produto das relaccedilotildees

sociais objetivas

Marx (1983) considera o Estado como elemento necessaacuterio agrave acumulaccedilatildeo de capital e

percebe a justa relaccedilatildeo existente entre a dimensatildeo econocircmica e a dimensatildeo poliacutetico-

ideoloacutegica considerando-o como instrumento de dominaccedilatildeo

A classe que possui o domiacutenio material possui tambeacutem o domiacutenio espiritual ou seja o controle ideoloacutegico poliacutetico-juriacutedico sobre as demais classes subjugadas a ela A classe dominante por esta forma determina todo o conteuacutedo de uma eacutepoca histoacuterica Mas para garantir sua dominaccedilatildeo natildeo a faz diretamente mas atraveacutes de um poder coercitivo o qual desempenha o papel de reproduzir a dominaccedilatildeo da classe hegemocircnica e garantir a sua manutenccedilatildeo Este poder se materializa naquilo que se conhece como Estado (MARX ENGELS 1995 p56-57)

50

Para Poulantzas (apud LOJKINE 1981) o Estado natildeo estaacute uacutenica e exclusivamente a

serviccedilo da classe dominante poreacutem este eacute a condensaccedilatildeo material e especiacutefica de uma relaccedilatildeo

entre forccedilas de classe e fraccedilotildees de classe

A autonomia do Estado no regime capitalista eacute a forma da dominaccedilatildeo de classe o Estado capitalista comporta inscreve em suas proacuteprias estruturas um jogo que permite dentro dos limites do sistema certa garantia dos interesses econocircmicos de algumas classes dominadas Isso faz parte de sua funccedilatildeo na medida em que essa garantia eacute conforme agrave dominaccedilatildeo hegemocircnica das classes dominantes Eacute essa autonomia do poder poliacutetico institucionalizado que permite agraves vezes atingir o poder econocircmico das classes dominantes sem jamais ameaccedilar-lhes o poder poliacutetico Pode-se perguntar se o que fica claro de um lado ( como o Estado pode ser ao mesmo tempo Estado povo-naccedilatildeo assegurando a coesatildeo do conjunto da formaccedilatildeo social e Estado que organiza a predominacircncia de uma classe ) natildeo faz ainda aumentar a dificuldade e a confusatildeo quando se tenta aplicar essa proposiccedilatildeo teoacuterica agrave relaccedilatildeo Estado-classes sociais Surgem a nosso ver duas dificuldades principais Por natildeo ter sido especificado e sobretudo por natildeo ter sido de fato distinguido de uma total independecircncia entre dois sistemas fechados o princiacutepio de autonomia que fundamenta a anaacutelise de Estado proposta por Poulantzas - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo Estado-classes dominantes a natildeo ser atraveacutes da noccedilatildeo de bloco no poder noccedilatildeo que implica um certo equiliacutebrio estaacutetico entre vaacuterias classes dominantes (mesmo se uma delas a fraccedilatildeo hegemocircnica representa todas as classes dominantes) - natildeo permite pensar a relaccedilatildeo entre Estado e luta de classes a natildeo ser como dominaccedilatildeo intangiacutevel atraveacutes de variaccedilotildees secundaacuterias de uma classe hegemocircnica sobre classes dominadas (POULANTZAS apud LOJKINE 1981 p 80)

As anaacutelises de Poulantzas tambeacutem satildeo reforccediladas por Souza (2002 p 27-28) ao

enfatizar que

O Estado eacute atravessado por diversos interesses eacute como se houvesse diversos vetores de forccedila (para fazer uma analogia com algo que se aprende nas

aulas de Fiacutesica) onde o vetor resultante seraacute o produto da interaccedilatildeo de forccedilas distintas agraves vezes antagocircnicas O resultado final em mateacuteria de perfil de governo (e o mesmo se aplica agraves casas legislativas) tende a ser conservador mas natildeo precisa necessariamente ser sempre assim Eacute por esta razatildeo que uma sociedade capitalista marcada por conflitos contradiccedilotildees e desigualdades tende a promover accedilotildees de planejamento estatal que normalmente facilitam a manutenccedilatildeo das desigualdades sociais (por exemplo a segregaccedilatildeo residencial as diferenccedilas de infraestrutura entre bairros pobres e bairros ricos etc) Mas eacute por isso tambeacutem que mesmo no que se refere ao planejamento estatal natildeo pode dizer que ele esteja condenado a ser sempre algo com um conteuacutedo antipopular Tudo dependeraacute da correlaccedilatildeo de forccedilas que se estabelecer na sociedade a qual acabaraacute determinando o perfil da accedilatildeo do aparelho de Estado

51

A correlaccedilatildeo de forccedilas estabelecidas na sociedade acaba por assim se dizer

determinando as accedilotildees do Estado Um exemplo das novas formas de atuaccedilatildeo desse agente

modelador do espaccedilo urbano estaacute na forma de incorporar novos instrumentos estrateacutegicos

utilizados na execuccedilatildeo do planejamento de uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano com a inclusatildeo de

uma parcela maior da populaccedilatildeo na decisatildeo do planejamento da cidade e os temas prioritaacuterios

de investimentos como os orccedilamentos participativos (conforme seraacute apresentado no capitulo

III desse trabalho)

A anaacutelise de Poulantzas eacute corroborada por Correcirca (1993 p 26) ao afirmar que accedilatildeo

do Estado eacute marcada pelos conflitos de interesses dos diversos integrantes da sociedade de

classes bem como das alianccedilas entre eles No entanto suas accedilotildees tendem a privilegiar os

interesses daquele segmento ou segmentos da classe dominante que a cada momento estatildeo

no poder

Eacute importante ressaltar que a atuaccedilatildeo do Estado se processa em trecircs esferas a federal

a estadual e a municipal sendo esta uacuteltima de suma importacircncia para anaacutelise do objeto de

estudo desse trabalho pois esta esfera eacute que detecircm o poder sobre o uso do solo e que

determina onde pode

e o que pode

ser construiacutedo em uma determinada aacuterea

Eacute no niacutevel municipal no entanto que estes interesses se tornam mais evidentes e o discurso menos eficaz Afinal a legislaccedilatildeo garante agrave municipalidade muitos poderes sobre o espaccedilo urbano poderes que advecircm ao que parece de uma longa tradiccedilatildeo reforccedilada pelo fato de que numa economia cada vez mais monopolista os setores fundiaacuterio e imobiliaacuterio menos concentrados constituem-se em feacutertil campo de atuaccedilatildeo para as elites locais (CORREcircA 1993 p 26)

O poder municipal apresenta simultaneamente duas caracteriacutesticas ambiacuteguas na

garantia do uso e apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano a saber ao mesmo tempo em que atende agraves

necessidades sociais proporcionando meios de acessos aos equipamentos de consumo

coletivo infraestrutura e serviccedilos propicia a atividade econocircmica dinamizada pelo setor

imobiliaacuterio que tem como principal objetivo a lucratividade

Portanto na sociedade de classes observam-se diferenccedilas sociais no que diz respeito

ao acesso de bens e serviccedilos produzidos socialmente pois as intervenccedilotildees estatais longe de

suprimir as contradiccedilotildees de classes satildeo consideradas paliativas uma vez que natildeo conseguem

abranger a demanda da maioria da populaccedilatildeo no que tange agraves obras de habitaccedilatildeo saneamento

e serviccedilos

52

Nesse sentido na conjuntura atual a crise habitacional eacute marcada pelas contradiccedilotildees

de classes que podem ser evidenciadas pelas peacutessimas condiccedilotildees de habitaccedilatildeo ineficiecircncia ou

escassez de poliacuteticas puacuteblicas que contemplem as reais necessidades dos segmentos excluiacutedos

voltadas agrave habitaccedilatildeo intensificaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio especulaccedilotildees expulsatildeo das terras

ocupadas entre outros Assim o espaccedilo urbano longe de se tornar o locus da reproduccedilatildeo da

vida torna-se distante dos reais interesses da populaccedilatildeo intensificando a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Essa crise habitacional estaacute presente quando se considera a capacidade de pagar dos

compradores pela casaterreno De acordo com Engels (1988 p 125) quando analisa a crise

de moradia na Alemanha em 1872

Uma sociedade natildeo pode existir sem crise habitacional quando a maioria dos trabalhadores soacute tem seu salaacuterio ou seja o indispensaacutevel para sua sobrevivecircncia e reproduccedilatildeo quando melhorias mecacircnicas deixam sem trabalho massas operaacuterias quando crises industriais determinam de um lado a existecircncia de um forte exerciacutecio de desempregados e de outro jogam repetidamente na rua grande massa de trabalhadores quando os proletaacuterios se amontoam nas ruas das grandes cidades quando o ritmo da urbanizaccedilatildeo eacute tanto que o ritmo das construccedilotildees de habitaccedilatildeo natildeo a acompanha quando enfim o proprietaacuterio de uma casa na sua qualidade de capitalista tem o direito de retirar de sua casa os alugueacuteis mais elevados Em tal sociedade a crise habitacional natildeo eacute um acaso eacute uma instituiccedilatildeo necessaacuteria

Assim sendo para Castells (1983 p 185) a crise da moradia trata-se de uma

defasagem necessaacuteria socialmente definida da habitaccedilatildeo e a produccedilatildeo de moradia e

equipamentos residenciais Diante do exposto ressalta-se que esta crise vincula-se agrave loacutegica

do capital imobiliaacuterio pois a crise leva agrave procura contribuindo para a elevaccedilatildeo dos preccedilos

dos imoacuteveis promovendo a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Um exemplo dessa situaccedilatildeo eacute o grande nuacutemero de anuacutencios em jornais de casas

terrenos apartamentos ou seja imoacuteveis em geral para vender ou alugar ofertados pelo capital

imobiliaacuterio que eacute destinado a pessoas que possuem determinada renda para compraacute-los ou

alugaacute-los A dificuldade de morar adequadamente natildeo eacute vivenciada pelos grandes empresaacuterios

ou executivos pois eles podem pagar por essa mercadoria que se tornou tatildeo escassa e cara

Segundo Rodrigues (2001) a crise habitacional se agudiza por trecircs fatores pelo

processo de empobrecimento da classe trabalhadora pela vinculaccedilatildeo da poliacutetica urbana agraves

exigecircncias dos mecanismos financeiros internacionais e pela apropriaccedilatildeo elevada da renda da

terra dos lucros e dos juros na produccedilatildeo das cidades

53

Ao analisar a crise financeira do capitalismo Harvey (2009 p 271) esclarece que ao

longo dos uacuteltimos 30 anos houve muitas crises financeiras e que muitas delas tiveram origem

na urbanizaccedilatildeo mais precisamente na propriedade urbana Destacando a recente crise nos

Estados Unidos diz que foi mais uma crise urbana na qual a classe capitalista para fazerem

mais dinheiro comprou ativos financeiros o que elevou os preccedilos da propriedade imobiliaacuteria

Isso natildeo torna uma cidade melhor torna-a antes mais cara Aleacutem disso para construir

condomiacutenios de luxo e casas exclusivas os capitalistas tecircm de empurrar os pobres para fora

de suas terras

tecircm de tirar o nosso direito agrave cidade

Sendo assim observa-se que o baixo investimento em poliacuteticas puacuteblicas direcionadas

agrave habitaccedilatildeo somado agrave especulaccedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios provoca o processo de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial obrigando o Estado a adotar certas medidas de intervenccedilatildeo puacuteblica

objetivando mediar os conflitos sociais e se manter no poder

23 A QUESTAtildeO HABITACIONAL NO PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

As cidades satildeo historicamente construiacutedas pela accedilatildeo de diversos agentes que

produzem e consomem equipamentos serviccedilos e trabalho sendo que o acesso a esses bens e

serviccedilos produzidos coletivamente natildeo se daacute de forma coletiva Assim sendo o

desenvolvimento capitalista traz em seu bojo um cenaacuterio urbano caracterizado pela

segregaccedilatildeo soacutecioespacial

A cidade enquanto reflexo da sociedade capitalista apresenta-se tal qual estaacute

estruturado essa formaccedilatildeo econocircmica e social Tomando-se como exemplo a questatildeo

habitacional pode-se afirmar que o espaccedilo da sociedade capitalista eacute fortemente dividido em

aacutereas segregadas o que demonstra a existecircncia de aacutereas nobres destinadas agraves classes mais

abastadas economicamente Estas aacutereas satildeo urbanizadas e equipadas com serviccedilos coletivos

Assim o constante processo de elevaccedilatildeo dos custos de uso do solo urbano impede o acesso do

cidadatildeo mais pobre

Em contrapartida as classes de baixo poder aquisitivo passam a morar em aacutereas

localizadas proacuteximas ao nuacutecleo central poreacutem deterioradas ou inadequadas agrave urbanizaccedilatildeo tais

como morros de difiacutecil acesso e margens inundaacuteveis de riachos ou coacuterregos Essas

populaccedilotildees caracterizam-se por possuiacuterem insuficientes condiccedilotildees de habitaccedilatildeo e uma enorme

carecircncia de serviccedilos urbanos predominando assim a ausecircncia de poliacuteticas puacuteblicas que

garantam a essas aacutereas formas de habitabilidade adequada

54

Dessa maneira a segregaccedilatildeo soacutecioespacial demonstra que o sistema capitalista lanccedila

seus tentaacuteculos de exploraccedilatildeo para aleacutem da esfera de produccedilatildeo marcando tambeacutem

presenccedila nos locais de reproduccedilatildeo da classe trabalhadora

Portanto o urbano constitui ao mesmo tempo espaccedilo de reproduccedilatildeo do capital e

tambeacutem espaccedilo de reproduccedilatildeo das classes sociais A luta contra a exploraccedilatildeo travada no

acircmbito da faacutebrica estende-se para os locais de moradia e consumo coletivo da classe

trabalhadora exigindo um processo de resistecircncia ao sistema de dominaccedilatildeo

Kowarick (1980 p 59) referiu-se ao processo de exploraccedilatildeo capitalista dizendo que

A espoliaccedilatildeo urbana eacute o somatoacuterio de extorsotildees que se opera atraveacutes da inexistecircncia ou precariedade de serviccedilos de consumo coletivo que se apresentam como necessaacuterios em relaccedilatildeo aos niacuteveis de subsistecircncia e que agudizam ainda mais a dilapidaccedilatildeo que se realiza no acircmbito das relaccedilotildees de trabalho

Sendo assim a questatildeo urbana e no seu interior a questatildeo habitacional eacute um dos

grandes desafios posto ao Estado uma vez que a questatildeo da moradia voltada para os

segmentos de baixo poder aquisitivo integra as accedilotildees governamentais em seus diversos niacuteveis

de atuaccedilatildeo com diferentes graus de intensidade e amplitude

Com o advento da Revoluccedilatildeo Industrial pode-se observar praacuteticas relativas ao

saneamento nas cidades Entretanto eram intervenccedilotildees pontuais como construccedilatildeo de

aquedutos galerias de esgoto etc que atendiam parcialmente as necessidades imediatas da

populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo ou eram destinadas aos segmentos privilegiados no

intuito de proporcionar uma melhor condiccedilatildeo de vida Estas intervenccedilotildees natildeo se constituiacuteram

em um planejamento mais amplo das cidades pois estavam associados a uma preocupaccedilatildeo de

organizaccedilatildeo fiacutesica das construccedilotildees urbanas

A intensificaccedilatildeo do processo de industrializaccedilatildeo provocou o enchimento das

cidades a aglomeraccedilatildeo de gente de cheiros feacutetidos de detritos animais a falta de

infraestrutura a maacute circulaccedilatildeo do ar Estes problemas sociais colocaram a tona a necessidade

de uma intervenccedilatildeo estatal mais efetiva nas cidades

De modo geral as peacutessimas condiccedilotildees de higiene fizeram o Estado pensar e executar

as accedilotildees voltadas agrave busca de soluccedilotildees concretas de higienizaccedilatildeo da sociedade O que fez

surgir a legislaccedilatildeo sanitaacuteria considerada a precursora da moderna legislaccedilatildeo urbaniacutestica

demonstrando a necessidade de se criar instrumentos de controle adequados agrave realidade

urbana e seus conflitos o que vai acarretar posteriormente nas discussotildees sobre o

planejamento urbano

55

No caso brasileiro as intensas transformaccedilotildees na estrutura soacutecio-econocircmica

resultaram em expressivo crescimento urbano ao longo do seacuteculo XX redesenhando a

ocupaccedilatildeo no territoacuterio nacional e no contexto intra-urbano das cidades

Nos anos 1930 com o iniacutecio da industrializaccedilatildeo as empresas investiram em

construccedilatildeo de moradias para seus operaacuterios (vilas operaacuterias) situadas proacutexima agraves faacutebricas

cujas residecircncias eram alugadas ou vendidas aos operaacuterios

No entanto com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo verifica-se o agravamento da

questatildeo habitacional uma vez que cresce rapidamente o nuacutemero de trabalhadores e aumenta a

pressatildeo sobre a oferta de habitaccedilatildeo popular Terrenos destinados anteriormente agraves vilas

operaacuterias comeccedilam a valorizar e com a aceleraccedilatildeo do fluxo migratoacuterio aumenta o excedente

da forccedila de trabalho nas cidades Nesse sentido as empresas transferem a responsabilidade

para o Estado dos custos relacionados agrave habitaccedilatildeo transporte e serviccedilos de infraestrutura

urbana Desse momento em diante as vilas operaacuterias tendem a desaparecer e a questatildeo da

moradia passa a ser resolvida pelas relaccedilotildees econocircmicas do mercado imobiliaacuterio (RIBEIRO

1996)

Destarte a raacutepida concentraccedilatildeo de produccedilatildeo e de populaccedilatildeo nas aacutereas urbanas dos

paiacuteses em desenvolvimento (como o Brasil) tem gerado grandes problemas dentre os quais

podem ser citados dispersatildeohiperconcentraccedilatildeo deacuteficit habitacional crescimento perifeacuterico

alto custo dos equipamentos urbanos etc

As demandas dos agentes representantes dos interesses capitalistas (capital

imobiliaacuterio proprietaacuterios fundiaacuterios e proprietaacuterios dos meios de produccedilatildeo) satildeo tratadas com

prioridade pelo poder puacuteblico em detrimento das necessidades das camadas populares

(CORREcircA 1993 p 32)

Na construccedilatildeo da configuraccedilatildeo espacial os diversos agentes sociais mantecircm relaccedilotildees

que podem ser definidas como relaccedilotildees de poder que se reproduzem por meio das aspiraccedilotildees

e necessidades de uma sociedade de classes e que faz da sociedade urbana um campo de lutas

onde os interesses se resolvem pelo jogo econocircmico e poliacutetico das forccedilas sociais

(GOOTTDIENER 1993)

Nesse sentido os interesses e objetivos da sociedade eacute que definiratildeo tanto os

processos quanto as formas que materializam uma relaccedilatildeo sociedade-espaccedilo O Estado

emerge como principal agente social no sentido de intervir e direcionar os possiacuteveis

interesses objetivos conflitos e contradiccedilotildees derivados dessa relaccedilatildeo Uma das formas com

que o Estado interveacutem sobre o espaccedilo nacional eacute instituindo poliacuteticas puacuteblicas sobretudo as

territoriais No entanto estas poliacuteticas se vinculavam ao papel do Estado enquanto planejador

56

Este enfatizava o recorte regional levando a efeito planos programas e projetos de

desenvolvimento

Assim o espaccedilo modificado natildeo eacute resultado natural de evoluccedilatildeo sociocultural da

humanidade eacute na verdade um produto intencional e natildeo-intencional de uma ordem

estabelecida Por isso partindo da compreensatildeo de que ao ser apropriado pelo homem o

espaccedilo eacute territorializado por este por meio de suas accedilotildees transformando-o a fim de melhor

adequaacute-lo agraves suas necessidades Este espaccedilo passa a ter tambeacutem valor de troca aleacutem do valor

de uso

Nesse sentido constitui-se em territoacuterio no qual o sistema capitalista pressupotildee

divisotildees do trabalho superpostas

e que pode ser analisado a partir de seus usos do seu

movimento conjunto e de suas partes reconhecendo as respectivas complementaridades

(SANTOS 2002 p 14) o que remete agrave questatildeo da divisatildeo territorial do trabalho levando a

perceber o territoacuterio natildeo como um mero palco no qual as coisas acontecem mas sobretudo

interagindo como agente ativo na sociedade

Partindo desse pressuposto verifica-se que a concentraccedilatildeo tanto populacional quanto

de atividades produtivas nas aacutereas centrais natildeo eacute realizada de forma aleatoacuteria mas como parte

de um processo analiacutetico construiacutedo pelos agentes produtores do espaccedilo urbano a partir das

necessidades mutaacuteveis da reproduccedilatildeo econocircmica e social

As aacutereas urbanas de todo mundo satildeo consideradas locais privilegiados para geraccedilatildeo de emprego para a inovaccedilatildeo e para ampliar as oportunidades econocircmicas Os centros urbanos revelam enorme agilidade na construccedilatildeo de uma rede de relaccedilotildees no plano da economia da poliacutetica da cultura conectando zonas rurais pequenas meacutedias e grandes cidades No marco destas transformaccedilotildees uma parcela significativa da populaccedilatildeo mundial passou a ter acesso a um niacutevel de consumo e de riqueza sem precedentes (FERREIRA 1997 p 64)

Sendo assim o planejamento urbano torna-se um fator crucial em termos sociais

fiacutesicos econocircmicos e poliacuteticos Estes aspectos podem ser analisados concomitantemente

quando se anseia urbanizar uma aacuterea Entretanto o que ocorre normalmente eacute um tratamento

secundaacuterio em relaccedilatildeo ao aspecto social quando natildeo este eacute visto como consequumlecircncia dos

demais principalmente do econocircmico

Para Maricato (1996) o Estado brasileiro investiu de forma desigual e diferenciada

em equipamentos coletivos necessaacuterios agrave reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho

privilegiando nos seus investimentos a acumulaccedilatildeo e gerando a exclusatildeo de amplas parcelas

da sociedade do mercado de bens de consumo individual e de bens e serviccedilos de consumo

57

coletivo (creches escolas transporte sauacutede saneamento) e as necessidades suscitadas pelo

modo de vida urbana no tempo da informaacutetica e das telecomunicaccedilotildees ampliam e

aprofundam as desigualdades sociais originadas no processo de acumulaccedilatildeo e reforccediladas pela

poliacutetica urbana

A poliacutetica urbana eacute posta em segundo plano face ao ideaacuterio da homogeneizaccedilatildeo

modernizante na qual Estado afasta-se de sua funccedilatildeo claacutessica de provedor de serviccedilos baacutesicos

coletivos deixando a atuaccedilatildeo para as forccedilas de mercado como solucionadoras da crise urbana

Contudo esse afastamento gera um deacuteficit urbano tendo em vista que a natildeo intervenccedilatildeo

estatal provoca a precariedade das condiccedilotildees de trabalho e de vida urbana

A intervenccedilatildeo estatal no urbano eacute a forma mais elaborada mais desenvolvida da

resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas produtivas (LOJKINE 1981 p

168) As poliacuteticas urbanas implementadas pelo Estado capitalista representam contra-

tendecircncias que visam regular e atenuar os efeitos negativos

no niacutevel do funcionamento

global das formaccedilotildees sociais

da segregaccedilatildeo e da mutilaccedilatildeo capitalista dos equipamentos

urbanos constituindo um produto das contradiccedilotildees urbanas resultantes das relaccedilotildees entre

classes sociais antagocircnicas que se manifestam nos modos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Ao longo do seacuteculo XX o planejamento urbano teve sempre uma conotaccedilatildeo de

ordem racionalidade e eficiecircncia Com a industrializaccedilatildeo e a crescente urbanizaccedilatildeo o Estado

passaria a intervir na cidade com o propoacutesito de organizar o territoacuterio a fim de garantir o

processo econocircmico e ampliar as condiccedilotildees de aglomeraccedilatildeo Tendo por base um

planejamento racional da distribuiccedilatildeo da populaccedilatildeo e de suas atividades a intervenccedilatildeo puacuteblica

se daria por meio de investimentos em infraestrutura e da regulaccedilatildeo da produccedilatildeo privada do

ambiente construiacutedo (CARDOSO 2003 p 7)

Para Oliveira (1982 p 41) a industrializaccedilatildeo vai impor um padratildeo de urbanizaccedilatildeo

aparentemente superior ao ritmo da industrializaccedilatildeo Com uma economia fundada na

agricultura de exportaccedilatildeo e com um mercado interno pouco significativo a industrializaccedilatildeo

restringida implicaria em um papel diferenciado do Estado que segundo Cardoso (2003) ao

priorizar o desenvolvimento econocircmico deixaria de estabelecer miacutenimos sociais universais O

que viria ocasionar em relaccedilatildeo ao urbano a disputa de investimentos em infraestrutura entre

grupos sociais e a dificuldade da legislaccedilatildeo urbaniacutestica impor seus padrotildees de forma

universal

Para entender o processo de urbanizaccedilatildeo faz-se necessaacuterio esclarecer alguns

aspectos estruturais de sua organizaccedilatildeo com a intensificaccedilatildeo da industrializaccedilatildeo a partir de

58

1930 e a organizaccedilatildeo das cidades e das classes sociais surgidas com o modo de produccedilatildeo

capitalista

O processo de reforma urbaniacutestica no Brasil se inicia nos primoacuterdios do seacuteculo XX

as intervenccedilotildees urbaniacutesticas deste periacuteodo foram baseadas em modelos europeus do

Urbanismo Modernista os quais prezavam pelo embelezamento das avenidas centrais

colocaccedilatildeo de praccedilas parques e a higienizaccedilatildeo com a construccedilatildeo de instrumentos de

saneamento

De base conservadora e positivista as reformas urbaniacutesticas importadas da Europa

representam de forma bastante arbitraacuteria um modelo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de

favelizaccedilatildeo que perdura de maneira anaacuteloga ateacute os dias atuais Todas estas intervenccedilotildees

tinham por resguardo a idealizaccedilatildeo de uma cidade ideal mas de acordo com o interesse da

classe dominante De modo que as questotildees sociais eram totalmente ignoradas ao mesmo

tempo em que parte da sociedade era negligenciada

Com as fortes mudanccedilas no processo de ocupaccedilatildeo e produccedilatildeo do solo urbano

decorrentes da industrializaccedilatildeo que se iniciava no Brasil a partir da deacutecada de 1930 o

planejamento se adapta as novas necessidades do espaccedilo urbano

Na deacutecada de 1930 o Paiacutes ainda possuiacutea uma economia agroexportadora e era

fortemente marcada pelo modelo de substituiccedilatildeo de importaccedilotildees valorizando a induacutestria

nacional e promovendo paralelamente o ecircxodo de numerosos contingentes humanos

provenientes das aacutereas rurais em direccedilatildeo agraves cidades em busca de melhores condiccedilotildees de vida

e de trabalho

Isto provocou o aumento da taxa de urbanizaccedilatildeo e ainda contribuiu para o

desenvolvimento de um grande exeacutercito industrial de reserva necessaacuterio ao desenvolvimento

da induacutestria formado pela populaccedilatildeo que procurava nos centros urbano-industriais novas

perspectivas para suas vidas

Dentre as proposiccedilotildees centrais da estrateacutegia de desenvolvimento nacional se

destacam a intervenccedilatildeo do Estado na provisatildeo de infraestrutura o protecionismo de

determinados ramos industriais e a supervalorizaccedilatildeo das taxas de cacircmbio visando beneficiar

as importaccedilotildees de insumos

Neste sentido a economia industrial que se constituiu no Brasil baseou-se numa

forma de intervenccedilatildeo puacuteblica destinada a propiciar uma accedilatildeo relativamente integrada do

capital estatal associado a capitais privados

ora nacionais ora estrangeiros Do ponto de vista

econocircmico ocorriam periodicamente dois movimentos alternados ora de crescimento

econocircmico ora crise e de endividamento (interno e externo)

59

O Estado assume com mais vigor intervenccedilotildees no mercado de trabalho e na

provisatildeo de infraestrutura e serviccedilos puacuteblicos numa atuaccedilatildeo que lhe conferiu matizes de

Estado do Bem-Estar Desde cedo se caracterizou pelo apoio ao ideaacuterio desenvolvimentista

tendo na induacutestria sua locomotiva e no Estado o seu planejador e impulsor (FIORI 1992 p

06) Visando assegurar o processo interno de acumulaccedilatildeo e produccedilatildeo capitalista pautou sua

atuaccedilatildeo na implementaccedilatildeo de poliacuteticas econocircmicas como instrumento de promoccedilatildeo desse

desenvolvimento As elites nacionais assumiram o projeto desenvolvimentista impulsionado

pela industrializaccedilatildeo

O modelo baacutesico de intervenccedilatildeo adotado pelo Estado foi de promotor da economia e regulador Como promotor teve um papel decisivo no financiamento dos grandes blocos de investimento e na produccedilatildeo direta de insumos principalmente por meio da criaccedilatildeo de infraestrutura Como regulador atuou no sentido de centralizar e normatizar as principais aacutereas da atividade produtiva nacional regulamentando os serviccedilos de utilidade puacuteblica criando instacircncias poliacutetico-administrativas de coordenaccedilatildeo e planejamento setorial e elaborando planos de auto-suficiecircncia energeacutetica (LOW-BEER 2002 p 70)

A Grande Depressatildeo Mundial deu margem para que os governos estendessem suas

accedilotildees agrave economia capitalista Essa intervenccedilatildeo governamental difundiu-se nas economias

nacionais em detrimento do mito do mercado isto eacute do mercado como grande regulador da

economia Neste sentido cabia aos governos das naccedilotildees colocarem em praacutetica a nova teacutecnica

de planejar O planejamento foi adotado pelos governos de economia capitalista subsidiada

pelas noccedilotildees do keynesianismo que primeiramente orientaram o governo de Rossevelt nos

Estados Unidos As ideacuteias keynesianas foram difundidas para outras naccedilotildees como foacutermula de

atingir o desenvolvimento econocircmico e social (RODRIGUES 1998)

Segundo Fiori (1992) depois que o pensamento liberalconservador foi deposto pelo

keynesianismo e pelo avanccedilo dos social-democratas novos caminhos se abriram para a

presenccedila do Estado ativo e interventor cuja marca principal era o pleno emprego o controle

da economia e o Estado de Bem-Estar Social Este funcionou por cerca de 30 anos pois na

deacutecada de 1970 o mesmo se demonstrava incapaz de responder aos novos desafios colocados

para a sociedade novas tecnologias e financcedilas desaceleraccedilatildeo do crescimento econocircmico e

crises fiscais

Enquanto na Europa se tinha o Estado Keynesiano na Ameacuterica Latina introduziu-se

com o pensamento da CEPAL um Estado desenvolvimentista que pregava a superaccedilatildeo da

crise por meio da industrializaccedilatildeo conduzida pelo Estado Entre as suas estrateacutegias estavam o

60

controle do cacircmbio para promover uma industrializaccedilatildeo pautada na substituiccedilatildeo de

importaccedilotildees a produccedilatildeo de insumos e de infraestruturas de transporte e comunicaccedilatildeo o

financiamento de atividades privadas nacionais e a articulaccedilatildeo entre os capitais privados

nacionais e internacionais

Sendo assim o Estado Nacional assumiu a responsabilidade de formar dentro do

sistema capitalista existente natildeo soacute uma rede de oacutergatildeos com o objetivo de acelerar o

desenvolvimento econocircmico brasileiro mas inclusive tentando transformar-se num Estado

empresaacuterio inovador e em menor intensidade banqueiro Isto natildeo significa que o Estado

tenha em si substituiacutedo o empresaacuterio nem que a classe empresarial tenha sido passiva mas

que sua atuaccedilatildeo ao criar instituiccedilotildees e tomar a si a responsabilidade crescente pelas decisotildees

econocircmicas foi fundamental para a mudanccedila de rumo que a economia brasileira conheceu a

partir de 1930 (FONSECA 2003)

O governo de Vargas percebendo a necessidade de transformaccedilatildeo nas accedilotildees estatais

adotou uma funccedilatildeo coordenadora como fica claro na passagem abaixo

Na eacutepoca em que os fins sociais satildeo preponderantemente econocircmicos em que se organiza de maneira cientiacutefica a produccedilatildeo e o pragmatismo industrial eacute elevado a limites extremos assinala-se a funccedilatildeo do Estado antes e acima de tudo como elemento coordenador desses muacuteltiplos esforccedilos devendo sofrer por isso modificaccedilotildees decisivas (VARGAS apud LOW-BEER 2002 p 73)

A partir daquele momento o governo de Vargas passou a investir na modernizaccedilatildeo

da economia brasileira via revisatildeo das legislaccedilotildees que regiam tanto as relaccedilotildees sociais como

as econocircmicas e na criaccedilatildeo de novos oacutergatildeos que tinham por objetivo planejar e concretizar as

poliacuteticas puacuteblicas de planejamento da produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo

Dessa forma criaram-se as instituiccedilotildees que tinham como objetivo o desenvolvimento

econocircmico do Brasil de tal forma que dado o impulso inicial o proacuteprio funcionamento

destas instituiccedilotildees contribuiria para construccedilatildeo de um processo contiacutenuo de desenvolvimento

separando a figura pessoal de Vargas bem como de seu governo do processo nacional

desenvolvimentista

Segundo Teixeira (1998) o iniacutecio do planejamento governamental estaacute associado ao

governo de Vargas quando se registraram os primeiros esforccedilos de racionalizaccedilatildeo da

distribuiccedilatildeo de recursos e de centralizaccedilatildeo do comando da poliacutetica econocircmica brasileira A

partir da Segunda Guerra Mundial a ideologia e teacutecnica do planejamento tornaram-se

fundamentais agraves naccedilotildees capitalistas nos momentos em que tiveram de planejar seu

61

desenvolvimento As ideacuteias de planejamento foram aplicadas agrave Ameacuterica Latina e a outros

paiacuteses em desenvolvimento Num primeiro instante a ideacuteia de planejamento apresentava-se no

Brasil carregada de um cunho nacionalista que caracterizava o governo de Getuacutelio Vargas

entre 19301945 Nesta ocasiatildeo para operacionalizaacute-lo houve uma seacuterie de transformaccedilotildees a

niacutevel institucional

Datam dessa eacutepoca vaacuterios empreendimentos estatais como a Companhia Vale do

Rio Doce (CVRD) fundada em 1942 (resposta nacionalista aos interesses estrangeiros na

exploraccedilatildeo de mineacuterio) a Companhia Nacional de Aacutelcalis criada em 1943 para evitar a

paralisaccedilatildeo das induacutestrias que utilizavam carbonato de soacutedio no caso de escassez do produto

(BAER 1995) Tambeacutem se expandiu o setor de navegaccedilatildeo e em 1943 foi criada a Faacutebrica

Nacional de Motores que acabou fabricando de tratores a geladeiras passando por motores e

carros tendo sido vendida a um grupo privado estrangeiro em 1968

Silva (1989) ressalta que ateacute a deacutecada de 1940 as intervenccedilotildees do Estado em relaccedilatildeo

agrave questatildeo urbana eram mais de cunho sanitarista para o controle de focos de doenccedilas Todas

as medidas do Estado levado pelo interesse econocircmico e poliacutetico e pelo desenvolvimento da

induacutestria soacute contribuiacuteram para a segregaccedilatildeo soacutecioespacial da cidade

A partir da segunda metade do seacuteculo XX com a industrializaccedilatildeo e maior entrada do

capital estrangeiro no Paiacutes por meio das multinacionais surge uma nova oportunidade para os

empresaacuterios os quais viam na classe meacutedia um novo mercado a ser explorado

A consolidaccedilatildeo do Estado desenvolvimentista e regulador durante as deacutecadas de

1950 e 1960 deu-se com a integraccedilatildeo das ideacuteias de progresso e bem-estar social agraves bases

ideoloacutegicas para a implementaccedilatildeo de um grande projeto de industrializaccedilatildeo (SANTOS 1996)

tomando o planejamento estatal realizado por uma elite tecnocraacutetica como instrumento de

orientaccedilatildeo e de definiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas nacionais bem como a capacidade do Estado

de impor de cima para baixo seus planos programas e projetos ao conjunto da sociedade

O desenvolvimento era pensado em termos nacionais podendo ser conduzido

preferencialmente pelos governos centrais Desenvolvimento era acima de tudo expandir a

produccedilatildeo interna e a oferta de bens e serviccedilos padronizados para o mercado domeacutestico

esperando que os efeitos multiplicadores dos investimentos sobre a geraccedilatildeo de renda e

emprego produzissem os resultados desejados em termos de equumlidade Esse era o modelo

hegemocircnico de industrializaccedilatildeo dos paiacuteses retardataacuterios respaldado pelas experiecircncias da

Franccedila Alemanha Japatildeo e Uniatildeo Sovieacutetica dentre outras (FIORI 1992)

Os frutos desse modelo no entanto variaram de um Paiacutes para o outro como resultado

de suas caracteriacutesticas proacuteprias No caso brasileiro a industrializaccedilatildeo em marcha forccedilada

62

especialmente a partir do Governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) contribui para

acentuar desigualdades intra e inter-regionais na alocaccedilatildeo de recursos bem como no perfil de

distribuiccedilatildeo de renda entre os diferentes segmentos sociais Aliado a isso a raacutepida

urbanizaccedilatildeo concentrou pessoas e mazelas sociais nas cidades incrementando a demanda por

habitaccedilatildeo transportes saneamento e outros bens coletivos

Naquela eacutepoca os investimentos do Estado direcionavam-se para a criaccedilatildeo de

infraestrutura para esse novo empresariado e aleacutem disso diminuiu-se ainda mais os gastos

com a classe de menor poder aquisitivo Aumenta-se tambeacutem a exploraccedilatildeo da forccedila de

trabalho e intensifica-se a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria como forma de acumulaccedilatildeo de capital o

que agrava o problema urbano para a classe trabalhadora pois o acesso ao solo urbano

infraestruturado eacute condiccedilatildeo primordial para o acesso agrave vida digna

Na deacutecada de 1950 e os anos de 1960 o Paiacutes passa por um periacuteodo caracterizado pela

aceleraccedilatildeo do processo de urbanizaccedilatildeo As cidades principalmente as maiores

completamente despreparadas tornam-se o destino de grandes fluxos migratoacuterios originados

no campo ou nas pequenas cidades Aleacutem disso as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas na induacutestria

automobiliacutestica e na construccedilatildeo civil aumentam a eficiecircncia da produccedilatildeo ampliando o

nuacutemero de carros nas ruas e possibilitando a verticalizaccedilatildeo nas cidades (ROLNIK 2002 p

217)

A partir de 1955 durante a gestatildeo do Presidente Kubitschek comeccedilaram a ser

fundadas as bases do modelo econocircmico que foi seguido durante as duas deacutecadas seguintes

Foram criadas empresas estatais em setores baacutesicos como accedilo petroacuteleo energia eleacutetrica e

transportes aleacutem de instituiccedilotildees bancaacuterias como o Banco do Estado de Satildeo Paulo o reforccedilo

do Banco do Brasil e a instituiccedilatildeo de agecircncias de fomento ao desenvolvimento como o Banco

do Nordeste do Brasil (BNB)

criado em 1953 principal agente financeiro da

Superintendecircncia de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)

Vale observar que foi naquele periacuteodo que se iniciou a preocupaccedilatildeo com a questatildeo

regional Naquela eacutepoca foram criados o Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia em

1951 e posteriormente a Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo Econocircmica da Amazocircnia

(SPVEA) em 1953 aleacutem da criaccedilatildeo da Companhia de Petroacuteleo Brasileiro SA

(PETROBRAacuteS) e das Centrais Eleacutetricas Brasileiras SA (ELETROBRAacuteS)

Segundo Rodrigues (1998) em 1956 o Governo de Juscelino Kubistschek criou um

Conselho de Desenvolvimento com atribuiccedilotildees de formular planos e programas realizar

pesquisas econocircmicas acompanhar e controlar as medidas adotadas A primeira accedilatildeo do

63

Conselho foi a elaboraccedilatildeo do Programa de Metas cuja implementaccedilatildeo colocou aquele oacutergatildeo

no centro do processo de tomada de decisatildeo de poliacutetica econocircmica

Com o Plano de Metas de JK o planejamento governamental passou a ser visto como

um instrumento importante para o alcance do desenvolvimento econocircmico e para solucionar

os graves problemas provenientes da pobreza Assim o planejamento foi rapidamente

disseminado e adotado de forma sistematizada e intencional recebendo o apoio tanto dos

partidos poliacuteticos de diversos matizes ideoloacutegicos como dos empresaacuterios e militares

(TEIXEIRA 1998)

O Programa de Metas (1957-1960) elaborado durante o Governo Juscelino Kubitschek representou uma transformaccedilatildeo qualitativa nas relaccedilotildees entre Estado e economia Comeccedila a ganhar forccedila a concepccedilatildeo de planejamento enquanto uma teacutecnica neutra capaz de adequar racionalmente os melhores meios aos diversos fins determinados Portanto o conceito de planejamento e desenvolvimento econocircmico passou a se identificar cada vez mais ganhando adesotildees ou mesmo tornando-se consensuais entre os diversos setores da sociedade (SANTOS JUNIOR 1995 p 28)

Rodrigues (1998) afirma que foi no Governo de Juscelino Kubitschek (1955-1960)

que o Estado estreitou os laccedilos da economia no qual todos os esforccedilos e recursos foram

colocados a serviccedilo do processo de industrializaccedilatildeo do Paiacutes A partir daiacute a poliacutetica

governamental tem tratado de orientar-se de acordo com as condicionantes econocircmicas

definindo setores e investimentos necessaacuterios Mesmo no governo de Jacircnio Quadros havia

uma disposiccedilatildeo para continuar apostando na teacutecnica do planejamento Em seu governo foi

criada a Comissatildeo de Planejamento Nacional em 1961 posteriormente transformada em

Ministeacuterio do Planejamento e Coordenaccedilatildeo econocircmica em 1964 no governo militar

Nos anos 1960 de acordo Ribeiro e Cardoso (2003 p 125) o planejamento assume

um [] papel estrateacutegico-desenvolvimentista e os planejadores passam a ser os

racionalizadores da gestatildeo da cidade Tal afirmaccedilatildeo poderia conduzir agrave conclusatildeo de que as

pessoas envolvidas nesse trabalho teriam uma visatildeo limitada da realidade contudo eacute

importante lembrar que a presenccedila do Estado de exceccedilatildeo predomina contribuindo para um

perfil tecnicista apoliacutetico objetivo do planejador urbano

A nacionalidade ainda estaacute em pauta mas muda o discurso Agora a urbanizaccedilatildeo eacute

fator necessaacuterio para a modernizaccedilatildeo sem o qual natildeo se constroacutei a naccedilatildeo Entretanto a

questatildeo urbana eacute vinculada ao desenvolvimento e natildeo ao social A eficiecircncia e a

racionalidade da produccedilatildeo industrial aplicadas agrave cidade atendem agraves ideacuteias defendidas na eacutepoca

(RIBEIRO CARDOSO 2003 p 129)

64

Para Cruz (1994 p 04) eacute somente na segunda metade da deacutecada de 1960 que pela

primeira vez foi reconhecida a necessidade do governo central intervir diretamente nas

cidades apesar de natildeo haver uma proposta estruturada de poliacutetica urbana nacional

Naquele periacuteodo o Estado se vecirc pressionado a atender agraves carecircncias geradas pelo

processo produtivo e a continuar criando condiccedilotildees para a acumulaccedilatildeo capitalista visto que

ambos fatores fazem parte dos investimentos para o processo de desenvolvimento econocircmico

capitalista

Conforme Nunes e Jacobi (1993 p 36) as organizaccedilotildees populares emergiram com a

consolidaccedilatildeo das bases da economia urbano-industrial e do consequumlente desenvolvimento do

capitalista monopolista no Paiacutes uma vez que a partir da deacutecada de 1950 este modelo passou

a exigir a concentraccedilatildeo fiacutesica das unidades produtivas do mercado consumidor da forccedila de

trabalho e dos serviccedilos relacionados com a sua produccedilatildeo e reproduccedilatildeo

O processo de industrializaccedilatildeo implantado no Brasil alterou significativamente o

espaccedilo urbano das cidades Estas passaram a demonstrar uma seacuterie de problemas sociais

decorrentes das contradiccedilotildees deste padratildeo de acumulaccedilatildeo que podem ser explicitadas

principalmente na crescente demanda por serviccedilos coletivos e pelos conflitos entre classes

oriundos do processo de exclusatildeo das camadas mais pobres na garantia dos direitos poliacuteticos

bem como dos direitos sociais

Ribeiro (1992) ressalta que esses conflitos fomentaram a emergecircncia nos centros

urbanos de formas de organizaccedilatildeo popular expressados nos chamados movimentos sociais

que satildeo formas de organizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo inscritas como elos ativos entre os processos de

reproduccedilatildeo social e a esfera poliacutetica em busca de melhores condiccedilotildees de sobrevivecircncia e dos

direitos de cidadania

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1960 os movimentos sociais estavam relacionados com a

tendecircncia revolucionaacuteria do proletariado ou seja dos sindicatos como por exemplo as

Sociedades de Amigos do Bairro (SAB s) em Satildeo Paulo que surgiram para organizar e

estruturar as demandas da sociedade civil por melhorias sociais e urbanas

Desse modo o Estado passou a intervir mais diretamente no espaccedilo urbano pois de

acordo com Gohn (1991) a intervenccedilatildeo estatal no urbano tem a ver com a criaccedilatildeo de

condiccedilotildees gerais para a acumulaccedilatildeo do capital concentrando assim sua accedilatildeo na regulaccedilatildeo

das formas de produccedilatildeo e para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho por meio da poliacutetica social

de benefiacutecios urbanos na qual o Estado procura atenuar a contradiccedilatildeo entre as necessidades

de reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e os interesses da acumulaccedilatildeo do capital via distribuiccedilatildeo

via salaacuterios indiretos

65

A partir da deacutecada de 1960 foram implementados vaacuterios planos no intuito de

garantir as condiccedilotildees gerais da produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do capital por meio de um discurso

teacutecnico-administrativo o qual legitimava a dominaccedilatildeo do Estado por meio da suposta

eficiecircncia e eficaacutecia de um modelo de planejamento que atenderia ao interesse geral

Visando obter apoio das classes populares urbanas o populismo desempenhou um duplo papel legitimando as reivindicaccedilotildees urbanas por um lado e assumindo um papel de provedor geral das necessidades por outro [] Foi no periacuteodo janista que o poder puacuteblico deu certa atenccedilatildeo agraves necessidades imediatas da sociedade civil obtendo ao mesmo tempo um certo apoio da mesma que acabou por identificar o Estado como o alvo a ser atingido pela proacutepria pressatildeo popular (NUNES JACOBI 1993 p 37)

Segundo Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

O golpe militar de marccedilo de 1964 foi resultado do profundo descontentamento dos grupos econocircmicos que desejavam manter as estrateacutegias tiacutepicas do modelo baseado na exportaccedilatildeo de produtos manufaturados e na expansatildeo do mercado interno contraacuterio ao fortalecimento do grupo nacionalista que defendia o desenvolvimento baseado na expansatildeo do mercado interno Como consequumlecircncia das divergecircncias instalou-se uma crise econocircmica profunda com reflexos na reduccedilatildeo da capacidade produtiva e no crescimento das reivindicaccedilotildees sociais (LOW-BEER 2002 p 81)

O agravamento da crise poliacutetica dos governos de Jango e Jacircnio e a crise final do

regime populista com o golpe militar em 1964 liquidaram os movimentos poliacuteticos

revolucionaacuterios exterminando eou exilando muito dos seus participantes Mesmo com esta

repressatildeo vaacuterios liacutederes comunitaacuterios se arriscaram atuando na clandestinidade contra a

poliacutetica de repressatildeo vigente atraveacutes das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e agentes

pastorais9 Estes canais aleacutem de valorizarem a participaccedilatildeo popular em organizaccedilotildees com as

discussotildees sobre as condiccedilotildees de vida dos moradores proporcionaram o desenvolvimento de

formas democraacuteticas de participaccedilatildeo de base e a formaccedilatildeo de lideranccedilas

9 A igreja por meio do seu movimento de renovaccedilatildeo a Teologia da Libertaccedilatildeo tornou-se no periacuteodo autoritaacuterio um canal de expressatildeo da luta dos movimentos sociais pelos Direitos Humanos e pelas reivindicaccedilotildees populares ao abrir espaccedilos fiacutesicos e de orientaccedilatildeo espiritual-ideoloacutegica para as massas (GOHN 1991)

66

Segundo Haddad (1996) foi a partir de 1965 que as atividades de planejamento

governamental tornaram-se mais sistecircmicas no Brasil sob diferentes aspectos Em 1965 o

Governo Federal introduziu em sua administraccedilatildeo uma sistemaacutetica de planejamento que

procurou coordenar objetivos de um programa de estabilizaccedilatildeo de curto prazo (Programa de

Accedilatildeo Econocircmica do Governo (PAEG)) com as metas de um plano de meacutedio e de longo prazo

(Plano Decenal de Desenvolvimento) para o Paiacutes como um todo

Desta forma as macro-regiotildees brasileiras particularmente a Norte e a Nordeste

passaram a dispor de uma atuaccedilatildeo efetiva de organismos de planejamento do

desenvolvimento regional (as superintendecircncias) e de instituiccedilotildees de financiamento para

administrar incentivos fiscais e financeiros a partir das diretrizes de um Plano Diretor de

meacutedio prazo Assim alguns governos estaduais avanccedilaram a organizaccedilatildeo de sistemas de

planejamento que de certa forma tentavam reproduzir em escala subnacional o arranjo

institucional do sistema de planejamento do governo federal

Nos casos do Nordeste e do Norte foram criados e preservados alguns programas

especialmente no que se refere aos estiacutemulos fiscais e financeiros e voltados para a

implantaccedilatildeo de infraestrutura econocircmica como as rodovias e a produccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de

energia eleacutetrica

Nesse sentido o PAEG (1965-1966) que propugnava o crescimento econocircmico e o

emprego a reduccedilatildeo das taxas de inflaccedilatildeo a correccedilatildeo dos deacuteficits da balanccedila de pagamentos o

aumento das obras puacuteblicas e a instituiccedilatildeo de um programa habitacional foram criadas vaacuterias

instituiccedilotildees como o Banco Central o Conselho Monetaacuterio Nacional o Banco Nacional da

Habitaccedilatildeo (BNH) as Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio e o Serviccedilo Federal de Habitaccedilatildeo e

Urbanismo (SERFHAU) aleacutem do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)

O BNH adotava uma estrateacutegia de atuar tambeacutem no desenvolvimento urbano

financiando aleacutem da habitaccedilatildeo e saneamento planos de renovaccedilatildeo urbana transportes e

equipamentos comunitaacuterios Para Bierrenbach (1987 p 48) o BNH foi criado com o

objetivo de favorecer as camadas populares e funcionar como um antiacutedoto ao

descontentamento decorrente do fechamento dos canais de participaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica

Entretanto esses objetivos tinham os princiacutepios organizacionais caracteriacutesticos do mercado

capitalista

O Plano Decenal de Desenvolvimento Econocircmico e Social (PDDES)

1967 a 1976

continha um capiacutetulo especiacutefico sobre as questotildees urbanas no qual foi estabelecida uma

regionalizaccedilatildeo

as Regiotildees Programa e os Poacutelos de Desenvolvimento Urbano aleacutem de

67

instituir um Sistema Nacional de Planejamento Local Integrado (SNPLI) a ser conduzido

pelo SERFHAU e pelo IPEA

Com os governos militares a questatildeo urbana foi tratada de forma diferente e houve

bastante investimento para o melhoramento da urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto a

preocupaccedilatildeo natildeo era com a problemaacutetica social causada pela urbanizaccedilatildeo desordenada mas

sim com a legitimaccedilatildeo de uma forma de governo ditatorial e com a organizaccedilatildeo espacial das

cidades para atender agraves exigecircncias crescentes da economia como produccedilatildeo circulaccedilatildeo e

consumo do capitalismo

No Brasil poacutes-1964 a posiccedilatildeo das poliacuteticas urbanas no contexto das prioridades

governamentais caracterizava-se pela implementaccedilatildeo de um novo conceito de eficiecircncia no

qual os interesses econocircmicos prevaleceram sobre os interesses sociais Como reflexo disto

as poliacuteticas governamentais nas aacutereas de bem-estar social tais como sauacutede saneamento

educaccedilatildeo habitaccedilatildeo e outros tiveram pequeno destaque na agenda governamental Deste

modo o perfil de desigualdade social dominante permaneceu o que somado agrave compressatildeo

salarial e ao desemprego configurou um crescente agravamento das condiccedilotildees gerais das

camadas populares (JACOBI 1989)

Em meados da deacutecada de 1970 o mercado interno - cuja expansatildeo foi limitada pelo

modelo concentrador de renda - comeccedilava a mostrar suas limitaccedilotildees (e exaustatildeo) forccedilando a

mudanccedila em direccedilatildeo a uma poliacutetica orientada para a exportaccedilatildeo aliada a uma capitalizaccedilatildeo

baseada no endividamento crescente Tais poliacuteticas se tornaram o exemplo perfeito do binaacuterio

estado intervencionistacrescimento econocircmico O modelo de atuaccedilatildeo estatal - e que residiu

na base do milagre brasileiro - comeccedilou a mostrar sua fragilidade principalmente quando o

envolvimento do Estado na economia tem mais aspectos negativos que positivos (LOW-

BEER 2002)

Nesse momento como reflexo da postura autoritaacuteria instalada visando o controle

dos movimentos sociais e principalmente o fortalecimento das forccedilas produtivas foi preciso

reforccedilar a atuaccedilatildeo poliacutetica com uma atuaccedilatildeo centralizadora e de planejamento do

desenvolvimento baseado num capitalismo moderno Tambeacutem nessa altura passou a

integrar a pauta da atuaccedilatildeo puacuteblica o planejamento do espaccedilo e a formulaccedilatildeo das poliacuteticas de

reordenamento territorial e urbano com a funccedilatildeo de mecanismos indutores do

desenvolvimento

Naquele periacuteodo o planejamento assume uma forma centralizada despolitizada e

ditatorial jaacute que os planos e projetos passam a ser bandeiras de justificativas de accedilotildees do

Estado no entanto foram elaboradas sem a mediaccedilatildeo representativa dos interesses populares

68

e se dirigiam sobretudo as questotildees geneacutericas distanciando-se da problemaacutetica proacutepria de

cada contexto (SOUZA 1990 p 111)

No entanto as condiccedilotildees objetivas de inchaccedilo e periferizaccedilatildeo das cidades e da

pauperizaccedilatildeo de suas camadas populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees

populares formadas com propoacutesitos religiosos tornassem o uacutenico canal de expressatildeo das

reivindicaccedilotildees por melhores condiccedilotildees de vida

Mesmo nessa fase do regime autoritaacuterio o governo se preocupava em passar no seu

discurso uma imagem positiva para a sociedade no tocante a participaccedilatildeo das classes

populares Todavia o conjunto de poliacuteticas implementadas deixa em evidecircncia que a

participaccedilatildeo efetiva natildeo acontecia na realidade Como ressalta Gohn (1985 p 98) o Estado

elabora atraveacutes da poliacutetica denominada planejamento participativo um discurso no qual todas

as diferenccedilas existentes entre os grupos de indiviacuteduos na sociedade satildeo eliminadas

Ao final da deacutecada de 1970 as praacuteticas e as instituiccedilotildees de planejamento eram

instrumentos de legitimaccedilatildeo do regime poliacutetico autoritaacuterio que pretendia encarnar a imagem

de um governo orientado apenas pelos princiacutepios da racionalidade e da competecircncia teacutecnica

Para Correcirca (1989) o planejamento foi apresentado como um processo racional de

tomada de decisotildees para buscar otimizar recursos ou para melhorar a condiccedilatildeo de vida agrave

sociedade indicado tambeacutem como um processo que visa agrave organizaccedilatildeo das estruturas fiacutesicas

do espaccedilo da cidade representadas por usos e ocupaccedilotildees do solo e pelas infraestruturas que

lhe datildeo suporte utilizando para isso vaacuterios instrumentos urbaniacutesticos como por exemplo o

zoneamento

Nesse contexto o planejamento e a gestatildeo das cidades10 se restringiram aos criteacuterios

e procedimentos de administraccedilatildeo atribuindo ao gestor a competecircncia teacutecnica para

solucionar os problemas urbanos mediante agrave utilizaccedilatildeo de instrumentos normativos tais

como coacutedigos de postura de obras de edificaccedilotildees e de uso do solo que contraditoriamente

acirraram as desigualdades soacutecio-espaciais

No Brasil do ponto de vista da poliacutetica urbana o que se observou no planejamento sob o regime autoritaacuterio foi o agravamento dos problemas urbanos gerados pela expansatildeo industrial pelos intensos fluxos migratoacuterios e pelo crescimento populacional superior agrave absorccedilatildeo da matildeo-de-obra nas cidades No projeto desenvolvimentista e modernizador em curso naquele

10 Para Marcelo Souza (2002) a gestatildeo eacute a administraccedilatildeo dos recursos (de todos os tipos) e dos problemas aqui e agora (presente e futuro de curto prazo) o planejamento eacute a preparaccedilatildeo para o futuro (de meacutedio e longo prazo sobretudo) com o objetivo de evitar ou minimizar problemas e melhor explorar potencialidades Mesmo em uma era de imediatismo e de dificuldades de planejamento no setor puacuteblico natildeo eacute sensato abrir matildeo de se pensar tambeacutem o planejamento

69

periacuteodo o planejamento urbano passou a ocupar o papel de racionalizar as administraccedilotildees municipais e de resolver os problemas urbanos entendidos na eacutepoca como decorrentes do desenvolvimento econocircmico (SANTOS JUNIOR 1995 p 30)

Matus (1996) e Teixeira (1998) afirmam que o modelo de planejamento e gestatildeo

adotado na Ameacuterica Latina e em especial no Brasil foi do tipo normativo tradicional Isto

provocou muitas vezes uma ineficaacutecia das poliacuteticas governamentais

O planejamento normativo tradicional tem como princiacutepio fundamental o argumento

de que quem planeja eacute o governo Este ator estaacute fora ou acima da realidade planejada e

portanto natildeo coexiste nessa realidade com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS

1996 p 65) Eacute um instrumento eminentemente teacutecnico que desconsidera a presenccedila de outros

atores interessados no processo de definiccedilatildeo do planejamento puacuteblico tais como associaccedilotildees

sindicatos empresas etc

Nesse sentido ocorre uma centralizaccedilatildeo de poder de decisatildeo de forma autoritaacuteria e

burocraacutetica nas matildeos dos governantes pois se avalia que tudo que for definido e

implementado pelo Estado seraacute aceito por esses atores sem qualquer tipo de questionamento

O uacutenico aspecto que eacute considerado basicamente eacute o econocircmico cujo comportamento eacute

totalmente previsiacutevel

O planejador tradicional dominado pelo economicismo assume que accedilatildeo eacute sinocircnimo de comportamento no estilo da teoria econocircmica eacute a base da teoria do planejamento Essa eacute uma deformaccedilatildeo economicista proveniente do modo especial e artificial como estaacute construiacuteda a teoria econocircmica Esta eacute via de regra uma teoria do comportamento econocircmico segundo a hipoacutetese de que o mundo eacute regido por leis sociais de alcance similar ao das leis naturais Consequumlentemente o economista tende a raciocinar sobre uma base de comportamentos estaacuteveis que obedecem a leis Para ele natildeo existem processos criativos No entanto a teoria moderna do planejamento refere-se a um tipo especial de accedilatildeo humana ou accedilatildeo social Trata-se da accedilatildeo intencional e reflexiva por meio da qual o autor da accedilatildeo espera alcanccedilar conscientemente determinados resultados E o fundamento dessa accedilatildeo eacute um juiacutezo complexo que foge agraves prediccedilotildees [] tem uma interpretaccedilatildeo situacional e a intenccedilatildeo do autor As accedilotildees ultrapassam os limites daquilo que eles afirmam fazer (MATUS 1996 p 157)

Este tipo de paradigma de planejamento urbano teve (e ainda tem) papel relevante

pois foi um instrumento que fez parte das accedilotildees do aparelho estatal o qual buscava nos

diagnoacutesticos a realidade em que se desejava intervir a fim de transformaacute-la em uma realidade

futura desejaacutevel segundo os padrotildees e normas dominantes

70

Todavia a implementaccedilatildeo desse tipo de planejamento tornou-se problemaacutetica pois

natildeo haacute uma preocupaccedilatildeo em saber qual a representaccedilatildeo que a sociedade civil a ser atingida

pelo planejamento tem de sua condiccedilatildeo de vida mas sim o que dela pensam os planejadores

A sociedade geralmente eacute afastada desse processo muitas vezes natildeo eacute sequer escutada quanto

mais convidada a participar na escolha de alternativas ou de tomada de decisatildeo Ainda assim

delineia-se e potildee-se em praacutetica planos de intervenccedilatildeo da realidade Para contornar resistecircncias

satildeo implementados esquemas de manipulaccedilatildeo onde as vantagens e benefiacutecios dos planos

programas e projetos sociais satildeo alardeados tentando transformar os objetivos do

planejamento em aspiraccedilotildees das camadas populares e a adoccedilatildeo de esquemas de repressatildeo ou

a combinaccedilatildeo de ambos (CORREcircA 1989)

Bandeira (1999) ressalta que a falta de participaccedilatildeo da sociedade civil eacute uma das

principais causas do fracasso de poliacuteticas programas e projetos de diferentes tipos A ausecircncia

de uma interaccedilatildeo entre os segmentos da sociedade tende a fazer com que muitas das accedilotildees

puacuteblicas sejam mal planejadas tornando-se incapazes de alcanccedilar totalmente os objetivos

propostos Aleacutem disso quando tratada apenas como objeto e natildeo como um dos sujeitos do

processo de gestatildeo e implementaccedilatildeo dessas accedilotildees a sociedade tende a natildeo se identificar com

elas

Como consequumlecircncia dessa falta de envolvimento da comunidade muitos programas e projetos governamentais concebidos e implantados de cima para baixo natildeo sobrevivem agraves administraccedilotildees responsaacuteveis pelo seu lanccedilamento Acabam por ser substituiacutedos por outros igualmente efecircmeros num ciclo pateacutetico que envolve grande desperdiacutecio de recursos e soacute contribui para aumentar o desperdiacutecio em relaccedilatildeo agrave eficaacutecia das accedilotildees do setor puacuteblico (BANDEIRA 1999 p 12)

Contrapondo-se ao planejamento normativo tradicional o paradigma do

planejamento estrateacutegico situacional eacute lanccedilado como alternativa para se fazer planejamento na

Ameacuterica Latina

No planejamento estrateacutegico situacional o ator que planeja estaacute dentro da realidade

e que aiacute coexiste com outros atores que tambeacutem planejam (MATUS 1996 p 67) Ou seja

natildeo existe apenas um uacutenico ator mas sim uma multiplicidade de atores (governo partidos

sindicatos movimentos sociais etc) que planejam

Dessa forma Matus (1996) concebe a ideacuteia de planejamento como um jogo de

conflitos e cooperaccedilatildeo onde o Estado natildeo tem assegurado sua capacidade de controlar a

realidade planejada uma vez que depende da accedilatildeo do outro Natildeo existe um diagnoacutestico uacutenico

71

e nem uma verdade objetiva pois como satildeo vaacuterios atores que coexistem na realidade haacute

vaacuterias explicaccedilotildees da realidade

Nesse sentido o conceito de planejamento que guia este trabalho estaacute relacionado a

um processo de permanente reflexatildeo e anaacutelise dos fatores e condicionantes que permitem

alcanccedilar resultados desejados pelos agentes sociais envolvidos de acordo com a concepccedilatildeo de

Bezerra e Arauacutejo (1999 p 8)

O planejamento eacute concebido como um processo ordenado e sistemaacutetico de decisatildeo que antecipa o futuro e define accedilotildees que viabilizam objetivos que se pretendem alcanccedilar incorporando e combinando uma dimensatildeo poliacutetica e uma dimensatildeo teacutecnica resultando num processo essencialmente teacutecnico e poliacutetico Dessa forma o planejamento como parte do processo poliacutetico de tomada de decisotildees sobre o futuro e as accedilotildees constitui-se um espaccedilo privilegiado de negociaccedilatildeo entre os atores sociais confrontando e articulando seus interesses e suas alternativas para a sociedade No decorrer desse processo quando se negociam as escolhas e as prioridades os atores sociais podem se organizar e constituir alianccedilas e acordos poliacuteticos Tal abordagem parte do princiacutepio de que o futuro eacute incerto e resulta da construccedilatildeo social decorrente da accedilatildeo dos atores sociais organizados que implementam medidas e se movem na criaccedilatildeo de novas condiccedilotildees de estruturaccedilatildeo da realidade

Sendo assim a participaccedilatildeo eacute um dos pressupostos fundamentais para a realizaccedilatildeo

dos projetos que atinjam seus objetivos Participaccedilatildeo entendida como acesso efetivo dos

envolvidos ao planejamento das accedilotildees agrave execuccedilatildeo das atividades e ao acompanhamento e

avaliaccedilatildeo das mesmas

Daiacute a importacircncia do planejamento participativo que possa promover a articulaccedilatildeo

entre os agentes sociais fortalecendo a coesatildeo da comunidade e melhorar a qualidade das

decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar os objetivos comuns

O planejamento participativo pode inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia11

que entenda o cidadatildeo como parte ativa da sociedade reconhecendo o direito de exercer a

cidadania em seu caraacuteter integral ou seja o poder de deliberar questotildees que se tornam

fundamentais para influir na transformaccedilatildeo da cidade

Entretanto segundo Teixeira (1998) verifica-se que as accedilotildees de planejamento do

Estado Brasileiro ateacute este momento tecircm se caracterizado de forma hegemocircnica como accedilotildees

de gabinete totalmente desprovidas da participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores populares o

11 O conceito de democracia utilizado neste trabalho estaacute pautado na visatildeo de Demo (1995) que caracteriza a democracia como um sistema poliacutetico no qual o acesso ao poder pretende ser majoritariamente regulado ou administrado natildeo imposto por minorias ou seja organizado em prol das minorias natildeo de oligarquias onde haja uma igualdade de oportunidades para todos os segmentos sociais bem como a universalidade dos direitos sociais a todos os cidadatildeos

72

que demonstra que se tiveram muitos planos e pouco planejamento vaacuterios planos de

desenvolvimento foram divulgados alguns executados e destes poucos lograram ecircxito

Portanto a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade principalmente dos setores

populares fez com que as iniciativas governamentais de planejamento sempre carecessem de

credibilidade e representatividade poliacutetica

No I Plano Nacional de Desenvolvimento do governo Meacutedici (19711974) o

planejamento era compreendido como um instrumento de racionalidade e eficiecircncia Esse

plano foi colocado em praacutetica visando a contornar a problemaacutetica urbana e a expansatildeo dos

grandes centros urbanos No entanto o objetivo imediato do plano era a elevaccedilatildeo da taxa do

PIB numa tentativa de combate a inflaccedilatildeo e dar continuidade agrave implementaccedilatildeo da poliacutetica

desenvolvimentista do Paiacutes (BIERRENBACH 1987)

Concretizou-se o processo de centralizaccedilatildeo poliacutetica e tributaacuteria que tirou dos

municiacutepios a competecircncia de saneamento baacutesico Criou-se assim o Plano Nacional de

Saneamento (PLANASA) que definiu metas setoriais para todo Paiacutes bem como

instrumentos institucionais e financeiros para implantaccedilatildeo de projetos pelas empresas

estaduais de saneamento baacutesico e pelo BNH

Dentro de um contexto contraditoacuterio de crescimento econocircmico definido de

milagre econocircmico e de aumento das tensotildees sociais geradas pela repressatildeo e queda do

padratildeo de vida da sociedade que se implementou no governo Geisel (19751978) o II Plano

Nacional de Desenvolvimento (II PND) Este plano apontou a necessidade das poliacuteticas

sociais terem objetivo proacuteprio e natildeo mais vinculados agrave poliacutetica econocircmica Explicitou-se

que a distribuiccedilatildeo de renda causa a pobreza absoluta haja vista que muitas famiacutelias natildeo

possuem o miacutenimo admissiacutevel quanto agrave alimentaccedilatildeo sauacutede educaccedilatildeo e habitaccedilatildeo No

entanto o Estado natildeo estabelece prioridades setoriais de forma clara na conduccedilatildeo das

poliacuteticas sociais (BIERRENBACH 1987)

Dessa maneira as poliacuteticas adotadas concentravam-se nos pesados investimentos

puacuteblicos em infraestrutura baacutesica Os esforccedilos concentraram-se no financiamento da

construccedilatildeo civil principalmente o segmento habitacional O instrumento fundamental foi o

Sistema Financeiro da Habitaccedilatildeo (SFH) formalmente destinado a prover moradia para as

classes populares mas de fato um meio de financiamento para as classes meacutedia e alta Apesar

de natildeo cumprir com sua destinaccedilatildeo social o sistema contribuiu para girar o capital

dinamizando a economia

Souza (1990) destaca que em 1975 se criou o Programa de Centros Urbanos cuja

finalidade era promover a integraccedilatildeo social nas cidades atraveacutes do desenvolvimento de

73

atividades comunitaacuterias Estimulou-se em niacutevel municipal a criaccedilatildeo de projetos locais de

accedilatildeo comunitaacuteria como meio do Estado se fazer presente junto agraves camadas populares

A estrateacutegia geral do governo tinha como objetivo manter elevadas as taxas de

crescimento econocircmico Todavia tornava-se mais difiacutecil conjugar objetivos de crescimento

econocircmico com o controle social de diversos segmentos sociais haja vista que apesar de toda

repressatildeo aos chamados movimentos sociais e populares aos poucos e timidamente se

organizavam e reivindicavam seus direitos garantidos por meio do discurso do proacuteprio poder

do Estado

Em 1976 foi formulada a Poliacutetica Nacional de Desenvolvimento Urbano

compreendendo um conjunto de programas estrateacutegicos o Programa de Regiotildees

Metropolitanas o Programa de Capitais e Cidades de Porte Meacutedio o Programa de Cidades de

Pequeno Porte o Programa de Nuacutecleos Urbanos de Apoio e o Programa de Cidades

Histoacutericas destinados a reforccedilar as regiotildees metropolitanas e a definiccedilatildeo de poacutelos secundaacuterios

de desconcentraccedilatildeo urbana Foram instituiacutedas tambeacutem as primeiras normas de uso e ocupaccedilatildeo

do solo de zoneamento industrial os arcabouccedilos juriacutedicos de normatizaccedilatildeo da propriedade

das edificaccedilotildees e de desapropriaccedilatildeo

Contudo as crises econocircmicas desencadeadas em meados dos anos 1970 e a

insatisfaccedilatildeo da sociedade civil eclodiram no movimento que revelou as diversas contradiccedilotildees

de interesses e a heterogeneidade dos agentes sociais exigindo uma reforma institucional e

constitucional para a restituiccedilatildeo dos direitos e da democracia sugerindo outra forma de

governo diferente daquela conjuntura (SANTOS JUNIOR 1995)

Para Fiori (1992) o esgotamento da estrutura desenvolvimentista veio da combinaccedilatildeo

da desaceleraccedilatildeo da taxa de investimentos unida com hiperinflaccedilatildeo e incapacidade de

endividamento externo o que levou a um estrangulamento fiscal da possibilidade de gasto

puacuteblico e a exaustatildeo do regime autoritaacuterio com dificuldades para implementar um regime

democraacutetico

Assim no final da deacutecada de 1970 o que se percebia no cenaacuterio urbano era uma

profunda crise que provocou a reorganizaccedilatildeo dos movimentos populares como por exemplo

o movimento sindical com as grandes greves dos operaacuterios da induacutestria automobiliacutestica e

metaluacutergica em Satildeo Paulo e os movimentos de bairro que tinham suas reivindicaccedilotildees

baseadas nos problemas oriundos da falta de bens e equipamentos urbanos

Estas organizaccedilotildees populares ultrapassaram o imediato de suas reivindicaccedilotildees

articulando-se com importantes setores da classe operaacuteria e do movimento social em geral

ganhando assim significado social e poliacutetico pois suas formas de organizaccedilatildeo e praacuteticas

74

associativas a natureza dos direitos reivindicatoacuterios e seus mecanismos de mobilizaccedilatildeo

surgiram como caracteriacutesticas dotadas de sentido poliacutetico

Neste contexto emergem os chamados novos movimentos sociais que segundo

Cardoso (1983 p 224) eram apresentados como um traccedilo inovador da participaccedilatildeo popular

pela sua espontaneidade e seu senso de justiccedila que garantem ao mesmo tempo sua

independecircncia das elites e dos partidos poliacuteticos e a justeza de suas demandas decididas entre

iguais

Para Gohn (1985) o novo nos movimentos populares estava na sua forma de

articularem as demandas e na expressividade que estas passam a ter no cotidiano da vida O

novo estava tambeacutem na sintonia entre as carecircncias e o apelo agrave participaccedilatildeo que as

demandavam

Nessa perspectiva a transformaccedilatildeo de necessidades e carecircncias em direitos que se

opera dentro dos movimentos sociais pode ser vista como um amplo processo de revisatildeo e

redefiniccedilatildeo do espaccedilo de cidadania (SCHERER-WARREN 1993 p 54) Eacute por meio desse

processo que eles passaram a negar o modelo poliacutetico existente bem como as formas de

planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas apontando novos caminhos para as relaccedilotildees

societaacuterias ou seja para uma nova cultura poliacutetica no Paiacutes

Eacute nesse sentido que se entende o surgimento dos movimentos populares como

sujeitos na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e de uma transformaccedilatildeo sentida como necessaacuteria

Haddad (1996) argumenta que a partir do iniacutecio dos anos 1980 constatou-se que os

diferentes sistemas de planejamento passaram por um processo de desmonte institucional por

causa de fatores circunstanciais e doutrinaacuterios Os fatores circunstanciais estatildeo relacionados agrave

falecircncia financeira do estado brasileiro e os fatores doutrinaacuterios ao avanccedilo da ideologia

neoliberal no continente Latino-Americano

A crise fiscal e financeira do Estado brasileiro afetou os emergentes sistemas de

planejamento (nacional estadual e municipal) por diferentes motivos a reduccedilatildeo na

disponibilidade global de recursos financeiros para promover programas e projetos a perda na

capacidade de captaccedilatildeo de financiamentos externos para esses programas e projetos as

dificuldades para definir contrapartidas financeiras para o aporte dos empreacutestimos junto agraves

instituiccedilotildees multilaterais de fomento (BID Banco Mundial etc)

Nesse contexto os projetos econocircmicos e sociais de meacutedio e longo prazo satildeo

substituiacutedos pelas preocupaccedilotildees de curto prazo de ajustamento da economia e da sociedade

aos movimentos da conjuntura do equiliacutebrio das contas puacuteblicas dos compromissos de

75

pagamento da diacutevida externa num primeiro momento e da diacutevida externa e interna num

segundo momento

Com o atual modelo capitalista de globalizaccedilatildeo da economia e ideaacuterio neoliberal

regendo a poliacutetica governamental a questatildeo urbana vem se agravando drasticamente e com

ela a questatildeo habitacional principalmente aquela referenciada aos extratos mais

empobrecidos

O periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo do Estado brasileiro caracterizou-se pela

instabilidade poliacutetica pois pairavam sobre as instituiccedilotildees as influecircncias deixadas pelo

arbitraacuterio regime militar Esse periacuteodo de redemocratizaccedilatildeo tornou-se histoacuterico sobretudo

para a participaccedilatildeo popular pois com as campanhas das diretas jaacute vaacuterias manifestaccedilotildees

populares se fizeram presentes nas principais capitais do Paiacutes atingindo seu aacutepice na

promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 que restabeleceu os direitos poliacuteticos e civis

garantindo o associativismo e a restituiccedilatildeo da autonomia dos Estados e Municiacutepios

Esse processo de abertura poliacutetica trouxe consigo transformaccedilotildees importantes na

conduta dos movimentos populares que passam a atuar mais diretamente na sociedade civil

com o objetivo de pressionar o poder puacuteblico para a abertura de canais que possibilitem uma

maior participaccedilatildeo nas decisotildees Como consequumlecircncia esses movimentos conseguiram obter

resultados no atendimento de suas reivindicaccedilotildees e ampliaram sua influecircncia poliacutetica e social

junto agraves populaccedilotildees que representam legitimando assim a accedilatildeo das lideranccedilas comunitaacuterias

Neste contexto o Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU) se

desenvolveu como instrumento de participaccedilatildeo poliacutetica e veiacuteculo de pressatildeo das classes

populares contra sua exclusatildeo das poliacuteticas puacuteblicas e objeto de articulaccedilatildeo das entidades da

sociedade civil tendo a funccedilatildeo social da cidade e a gestatildeo democraacutetica como prioridade

prevalecendo o direito agrave cidade

24 CONCEPCcedilOtildeES DE PLANEJAMENTO E GESTAtildeO DE CIDADES

A redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees entre Estado e Sociedade Civil no Brasil no final dos

anos 1970 implicou na construccedilatildeo com muitos entraves de uma esfera societaacuteria autocircnoma

Os agentes sociais que emergiram na sociedade civil agrave revelia do Estado criaram novos

espaccedilos e formas de participaccedilatildeo e relacionamento com o poder puacuteblico Estes espaccedilos foram

construiacutedos tanto pelos movimentos populares como pelas diversas instituiccedilotildees da sociedade

76

civil que articularam demandas e alianccedilas de resistecircncia popular e lutas pela conquista de

direitos civis e sociais

Os movimentos sociais natildeo soacute tiveram papel relevante no estabelecimento de estruturas democraacuteticas fundamentais propiacutecias agrave participaccedilatildeo popular mas tambeacutem exerceram um impacto substancial sobre as formaccedilotildees normativas do eleitorado e portanto sobre a arena poliacutetica formal Ao gerarem novos elementos de conhecimento e de cultura muitos movimentos imprimiram sua marca e orientaram sua accedilatildeo pela defesa de praacuteticas pautadas pela sua autonomia pela necessidade de tornar visiacutevel a sua capacidade de auto-organizar-se e de desenvolver a democracia direta transformando as carecircncias do seu entorno de moradia em praacuteticas reivindicatoacuterias (JACOBI 1990 p 125)

De acordo com Gohn (2000 p 310) nos anos 1980 a temaacutetica da participaccedilatildeo

popular era um ponto de pauta na agenda poliacutetica das elites ocasionando em dois fenocircmenos

de um lado a crise de governabilidade das estruturas de poder do Estado desgastadas e

deslegitimadas pelo autoritarismo de outro a legitimidade das demandas expressas pelos

movimentos sociais

novos ou velhos

e a conquista de espaccedilos institucionais

Nos anos 1990 a agenda poliacutetica das elites se modifica em funccedilatildeo de problemas

internos e das alteraccedilotildees que a globalizaccedilatildeo e as novas poliacuteticas sociais internacionais

passaram a impor ao mundo capitalista

Com a globalizaccedilatildeo a internacionalizaccedilatildeo da economia a reestruturaccedilatildeo produtiva a

revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e a hegemonia do setor financeiro ocorreram grandes mudanccedilas na

esfera econocircmica e no acircmbito poliacutetico-institucional das cidades mundiais O poder municipal

passou a incorporar novas funccedilotildees como a provisatildeo de habitaccedilatildeo e infraestrutura antes

atribuiacutedas ao Estado Naccedilatildeo

De acordo com Low-Beer (2002) hoje nos primeiros anos do seacuteculo XXI observa-

se um desenho totalmente novo das poliacuteticas puacuteblicas e do planejamento governamental fruto

principalmente das transformaccedilotildees poliacuteticas e econocircmicas ocorridas nas uacuteltimas deacutecadas do

seacuteculo passado Com a intenccedilatildeo de subsidiar novas reflexotildees acerca do tema de modo muito

sucinto a autora identifica cinco pontos que caracterizam as novas tendecircncias em curso

1 A dimensatildeo ambiental adquiriu enorme relevacircncia sendo que o conceito e

os criteacuterios de desenvolvimento sustentaacutevel passaram a ser considerados

condiccedilatildeo sine qua non para o desenvolvimento econocircmico e social

incluindo temas como a preservaccedilatildeo dos recursos naturais dentre os quais

se destaca a aacutegua como bem essencial agrave vida

77

2 As poliacuteticas de infraestrutura (saneamento energia comunicaccedilotildees etc)

deixaram de ser consideradas estritamente como insumos para o

desenvolvimento industrial-econocircmico e se tornaram fatores essenciais para

a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais

3 O leque de temas incluiacutedos nas poliacuteticas denominadas sociais adquiriu

maior amplitude incorporando aleacutem das tradicionais educaccedilatildeo e sauacutede as

poliacuteticas de geraccedilatildeo de renda e trabalho

4 Observa-se a ampliaccedilatildeo do papel da Sociedade Civil nas poliacuteticas puacuteblicas

com o reforccedilo gradativo da accedilatildeo de indiviacuteduos empresas e organismos natildeo-

governamentais paralelamente ou em conjunto com a accedilatildeo estatal

participando nas decisotildees de investimento na gestatildeo e avaliaccedilatildeo dos

programas sociais

5 O conceito de sustentabilidade vem se impondo tambeacutem no planejamento

urbano substituindo as poliacuteticas setoriais pelo enfoque integrado de

desenvolvimento metropolitano que articula as poliacuteticas habitacionais com

os investimentos em saneamento baacutesico transportes geraccedilatildeo de renda e

trabalho estimulando a melhoria da qualidade de vida nas aacutereas urbanas do

Paiacutes

A competitividade a descentralizaccedilatildeo de recursos e a crise fiscal contribuiacuteram para

que as cidades viessem a adotar um perfil empresarial o que incluiu uma relaccedilatildeo direta com

agecircncias multilaterais de financiamento e com as agendas urbanas internacionais Igualmente

nos discursos e accedilotildees das administraccedilotildees municipais passou a ser comum a colocaccedilatildeo do

desenvolvimento econocircmico como elemento fundamental para o desenvolvimento social

Harvey (1996) nos chama atenccedilatildeo para o fato de que o empreendedorismo eacute

resultante do papel da urbanizaccedilatildeo na dinacircmica social e que eacute de fundamental importacircncia natildeo

perder de vista a conexatildeo desses dois elementos com o desenvolvimento econocircmico visto que

esse nexo possibilita a apreensatildeo das mudanccedilas radicais proporcionadas pela reestruturaccedilatildeo

radical em andamento nas distribuiccedilotildees geograacuteficas da atividade humana e na dinacircmica

poliacutetico-econocircmica do desenvolvimento geograacutefico desigual dos tempos mais recentes

(HARVEY 1996 p 86) Satildeo portanto elementos essenciais sem os quais natildeo se tem a

compreensatildeo real de como a dinacircmica poliacutetico-econocircmica interferem nos rumos e decisotildees

governamentais nas cidades

78

O empreendedorismo eacute sustentado pela relaccedilatildeo puacuteblico-privada e a parceria se realiza com o intuito de integrar interesses e atrair recursos para tornar a cidade mais atrativa e competitiva entre elas Com essa simbiose entre o puacuteblico e o privado as antigas reivindicaccedilotildees de acircmbito local acabam sendo associadas agraves necessidades de atraccedilatildeo de capital para o interior das cidades empreendedoras Assim a parceria torna-se uma accedilatildeo de natureza empresarial e o centro da gestatildeo torna-se muito mais voltada para a economia local desviando-se dos interesses do territoacuterio e os investimentos satildeo convergidos para poliacuteticas e obras pontuais deixando para um segundo plano os problemas da cidade de um modo geral (HARVEY 1996 p 87)

O contexto de um mundo globalizado bem como de avanccedilos do estado neoliberal

sugerem uma reflexatildeo sobre os instrumentos do planejamento e da gestatildeo localizados no

acircmbito do municiacutepio visto que ao questionar os governos tradicionais e o modelo de

planejamento tradicional os adeptos do neoliberalismo conduziram uma reflexatildeo voltada ao

papel que os governos locais podem desempenhar no contexto do capitalismo globalizado

(MALATO 2006)

Para Lojkine (1981) um novo padratildeo produtivo tendo por referecircncia a ampliaccedilatildeo

das forccedilas produtivas bem como novos padrotildees de informaccedilatildeo levaram a sociedade

contemporacircnea a engendrar uma complexidade tal que provocou mudanccedilas na forma de

organizaccedilatildeo de empresas e Estado A isto ele chama de revoluccedilatildeo informacional e a discussatildeo

localizada no acircmbito municipal se daacute em funccedilatildeo do papel que as cidades vecircm representando

ou seja como agente poliacutetico e econocircmico nos processos de desenvolvimento e ampliaccedilatildeo do

atual sistema produtivo

Ao discutir sobre a importacircncia do papel da cidade no sistema de produccedilatildeo

capitalista Lefebvre (2001 p 49) argumenta que cabe a cidade um papel histoacuterico por

aglutinar populaccedilatildeo meios de produccedilatildeo o capital as necessidades e os prazeres Logo ela

carece da administraccedilatildeo de poliacutecia e impostos dentre outros bem como pode ser

organizada Todas essas necessidades e outras que vatildeo sendo criadas na dinacircmica da

sociedade advecircm da expansatildeo provocada pela via da urbanizaccedilatildeo que acabou por concentrar

nos espaccedilos urbanos tanto as forccedilas produtivas quanto a forccedilas de trabalho ao mesmo tempo

em que excluiacutea populaccedilotildees inteiras do direito a propriedade e proporcionava a concentraccedilatildeo

de poder poliacutetico e econocircmico em matildeos de pequenos grupos no interior destas cidades

O local ganha uma importacircncia estrateacutegica no novo sistema teacutecnico-econocircmico pois

pode atuar em trecircs acircmbitos principais como na produtividade e competitividade econocircmica

na integraccedilatildeo soacutecio-cultural e na representaccedilatildeo e gestatildeo poliacutetica Para o governo local se

tornar eficiente precisa assumir o papel de promotor do desenvolvimento da cidade junto aos

79

consumidores da cidade de forma a criar condiccedilotildees propiacutecias agrave atuaccedilatildeo dos agentes puacuteblicos

ou privados (via planejamento campanhas poliacuteticas compensaccedilotildees econocircmicas)

Dessa maneira dois modelos diferentes um privilegiando a questatildeo social e o outro

o econocircmico teriam a cidade como objeto por meio de seus planos Entretanto por

circunstacircncias e interesses envolvidos natildeo seria raro que apenas parte do plano fosse

cumprida ou entatildeo que sua implementaccedilatildeo viesse a se realizar somente em parte da cidade

(MARICATO 2000) bem como que atos normativos relacionados ao uso e a ocupaccedilatildeo do

solo desconsiderassem diretrizes de planejamento apresentando elementos casuiacutesticos em

seus objetivos normalmente associados a grupos restritos como no caso do setor imobiliaacuterio

A gestatildeo urbana e os investimentos puacuteblicos tecircm aprofundado a concentraccedilatildeo de renda e a desigualdade A representaccedilatildeo da cidade em que parte toma lugar do todo tem uma funccedilatildeo natildeo apenas de encobrir privileacutegios mas tambeacutem de um papel econocircmico ligado agrave geraccedilatildeo e captaccedilatildeo da renda imobiliaacuteria [] O quadro macroeconocircmico determina a produccedilatildeo e a apropriaccedilatildeo do ambiente construiacutedo

tanto pela definiccedilatildeo da capacidade de investimentos dos governos municipais quanto na ligaccedilatildeo da produccedilatildeo imobiliaacuteria agraves regras de rentabilidade do capital financeiro (MARICATO 2000 p 165-170)

Oliveira (2001) ressalta que com o enfraquecimento das poliacuteticas puacuteblicas e a

pressatildeo pelas novas exigecircncias da acumulaccedilatildeo do capital colocando agraves cidades novas

demandas surgiu o planejamento estrateacutegico de cidades com ecircnfase na accedilatildeo [local]

(planejamento

pauta em accedilatildeo) (OLIVEIRA 2001 p 179) Formulado a partir de

referecircncias ligadas agrave gestatildeo empresarial visando agrave adaptaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves

caracteriacutesticas de flexibilidade e dinamismo da economia globalizada este modelo tem sido

consolidado por meio dos planos estrateacutegicos apresentados como instrumentos da

administraccedilatildeo urbana

Natildeo eacute a primeira vez que para efeito de seu planejamento a cidade toma como protoacutetipo a empresa privada de fato todo o urbanismo modernista teve como modelo ideal a faacutebrica taylorista com sua racionalidade funcionalidade regularidade e produtos estandartizados [] Agora poreacutem os planejadores se espelham na empresa enquanto unidade de gestatildeo e negoacutecios [] a cidade eacute instaurada como agente econocircmico que atua no contexto de um mercado no qual encontra a regra e o modelo do planejamento e execuccedilatildeo de suas accedilotildees (VAINER 2000 p 85)

Elegendo a eficaacutecia como elemento legitimador das poliacuteticas puacuteblicas o

planejamento estrateacutegico de cidades visa associar tendecircncias de desenvolvimento econocircmico

80

ao curto prazo e aos conceitos de mercado Embora sua iniciativa esteja relacionada agrave

sociedade civil e aos setores privados o poder puacuteblico tem presenccedila marcante com um papel

significativo nas atuaccedilotildees puacuteblico-privadas projetadas sobre um suposto quadro de

cooperaccedilatildeo da sociedade o qual ao agrupar pares comuns tende a minimizar ou a contornar

divergecircncias (OLIVEIRA 2001 p 43)

Assim sendo a participaccedilatildeo da sociedade ou de parte dela eacute entatildeo apontada como

elemento fundamental para o sucesso do plano contando para isso com o despertar de um

sentimento citadino de pertencimento agrave cidade despolitizado e vinculado agrave valorizaccedilatildeo da

imagem local

A participaccedilatildeo dos agentes econocircmicos e sociais junto ao poder puacuteblico na

elaboraccedilatildeo e definiccedilatildeo de estrateacutegias e accedilotildees representa um diferencial entre a metodologia

catalatilde do Plano Estrateacutegico e a metodologia tradicional americana baseada na identificaccedilatildeo

de forccedilas fraquezas oportunidades e ameaccedilas assim como no processo de estabelecimento de

estrateacutegias frente a essas questotildees segundo objetivos definidos

Combinando crescimento econocircmico

como promotor da integraccedilatildeo social

e desenvolvimento urbano o plano parte de alguns pressupostos baacutesicos como a crenccedila [] no futuro da cidade como centro terciaacuterio qualificado o crescente protagonismo poliacutetico das administraccedilotildees locais a cooperaccedilatildeo puacuteblico-privada no financiamento de grandes intervenccedilotildees urbaniacutesticas e a necessidade de construir ou modificar a imagem da cidade para projetaacute-la no exterior atraveacutes do marketing que enfoque sobretudo um principal produto de venda como por exemplo turismo ou cultura (SILVA 2001 p 80)

O modelo estrateacutegico foi fundamentado na competiccedilatildeo entre cidades seja no contexto

regional nacional ou internacional Seus planos ganharam feitios pragmaacuteticos amarrando

recursos agraves accedilotildees aparentemente mais factiacuteveis (SILVA 2001 p 80) Abrangendo temas de

cunho econocircmico institucional social e fiacutesico-territorial suas propostas tecircm tido forte

ingerecircncia sobre a esfera administrativa projetando-se em parte sob o espaccedilo construiacutedo

Segundo Ribeiro (2003 p 18) a adoccedilatildeo do planejamento estrateacutegico no setor

puacuteblico eacute uma das expressotildees da incorporaccedilatildeo dos criteacuterios de mercado na gestatildeo

governamental Tendo como objetivo o crescimento econocircmico da cidade baseando-se na

atraccedilatildeo de investimentos o planejamento estrateacutegico natildeo tem como finalidade o ordenamento

do territoacuterio ou a implementaccedilatildeo de uma poliacutetica urbana uma vez que a dimensatildeo espacial eacute

apenas um de seus meios e natildeo o seu fim

O planejamento em deacutecadas passadas representava a racionalidade tecnocrata o que

tornava inadequado para sua gestatildeo A constataccedilatildeo do esgotamento e das possibilidades dos

81

instrumentos claacutessicos de gestatildeo urbana exigiu de forma paulatina agrave chamada do Estado para

assumir um papel fundamental na manutenccedilatildeo do equiliacutebrio social Sob este enfoque o

desenvolvimento urbano adquire e se traduz mais como um aspecto setorial do

desenvolvimento econocircmico sob a eacutegide do Estado

Maricato (2000 p 101) enfatiza a importacircncia do planejamento puacuteblico para a

conquista de um futuro melhor para as cidades brasileiras apoiada na crenccedila de que nada

pode substituir o papel do Estado na garantia da equalizaccedilatildeo de oportunidades A natureza e a

localizaccedilatildeo dos investimentos governamentais em primeiro plano e privados em segundo

regula quem e quantos teratildeo direito agrave cidade

Assim o planejamento urbano eacute um instrumento de governabilidade de governance

e da proacutepria gestatildeo do territoacuterio Ele se caracteriza como um processo constituiacutedo de um

conjunto de teacutecnicas de origens interdisciplinares aplicado agrave gestatildeo do planejamento urbano

enquanto atividade de avaliaccedilatildeo propostas e controle territoacuterio das cidades

Governanccedila eacute a capacidade governativa em sentido amplo envolvendo a capacidade de accedilatildeo estatal na implementaccedilatildeo das poliacuteticas e na consecuccedilatildeo das metas coletivas [] Governabilidade entretanto refere-se as condiccedilotildees sistecircmicas mais gerais sob as quais se daacute o exerciacutecio do poder em uma dada sociedade tais como as caracteriacutesticas do regime poliacutetico a forma de governo as relaccedilotildees entre os poderes (DINIZ 1996 p 196)

A participaccedilatildeo popular no planejamento e na gestatildeo (no processo orccedilamentaacuterio na

elaboraccedilatildeo de planos e poliacuteticas puacuteblicas etc) pode ser vista como algo crucialmente

relevante a introduccedilatildeo consistente de elementos de democracia direta aleacutem de serem

importantes em si mesmos certamente contribuiraacute para maior transparecircncia e eventualmente

para menor corrupccedilatildeo menos clientelismo menos desperdiacutecio e reduccedilatildeo dos niacuteveis de

desigualdade soacutecioespacial

Bandeira (1999) ressalta que a participaccedilatildeo pode ser compreendida como um

instrumento importante para promover a articulaccedilatildeo entre os agentes sociais fortalecendo a

coesatildeo da sociedade e para melhorar a qualidade das decisotildees tornando mais faacutecil alcanccedilar

os objetivos de interesse comum No entanto as praacuteticas natildeo podem ser encaradas como

procedimentos infaliacuteveis capazes de sempre proporcionar soluccedilotildees adequadas para problemas

de todos os tipos

82

Para Carvalho (2000) participar da gestatildeo democraacutetica da cidade12 significa

participar do governo da sociedade disputar espaccedilo no Estado nos processos de definiccedilatildeo

das poliacuteticas puacuteblicas significa questionar o monopoacutelio do Estado como gestor da coisa

puacuteblica significa construir espaccedilos puacuteblicos natildeo estatais afirmando a importacircncia do controle

social sobre o Estado da gestatildeo participativa da co-gestatildeo dos espaccedilos de interface entre

Estado e sociedade civil

Desse modo Gohn (2000) afirma que os movimentos sociais estatildeo operando na

construccedilatildeo de uma sociedade igualitaacuteria e contra as injusticcedilas sociais tais como as

experiecircncias de planejamento do orccedilamento participativo as parcerias entre organizaccedilotildees

populares ONGs e oacutergatildeos puacuteblicos em programas na aacuterea do chamado Terceiro Setor -

puacuteblico natildeo estatal

A autora considera que a participaccedilatildeo dos movimentos sociais nos espaccedilos

interinstitucionais eacute fundamental porque na correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas existentes eles

expressam interesses de maiorias organizadas que lutam pela democratizaccedilatildeo do acesso aos

bens e serviccedilos puacuteblicos e natildeo pela apropriaccedilatildeo privada de privileacutegios lucros

Nas uacuteltimas deacutecadas vem-se firmando um novo paradigma que destaca a maior

participaccedilatildeo popular13 nos processos decisoacuterios como um novo padratildeo de governabilidade

atraveacutes da expansatildeo da esfera puacuteblica com a formaccedilatildeo de parcerias entre as esferas estatais

privadas e societaacuterias

Na Ameacuterica Latina a luta pela conquista de espaccedilos para aumentar a participaccedilatildeo

popular eacute sem duacutevida um dos aspectos mais desafiadores para a anaacutelise sobre os alcances da

democracia nas relaccedilotildees entre o Estado e os Movimentos Sociais

A anaacutelise dos processos existentes estaacute permeada pelos condicionantes da cultura

poliacutetica tanto do Brasil como dos demais paiacuteses da Ameacuterica Latina marcados por tradiccedilotildees

estadistas centralizadoras patrimonialistas e portanto por padrotildees de relaccedilatildeo clientelistas

meritocraacuteticos e de interesses criados entre Sociedade Civil e Estado Entretanto estes

condicionantes natildeo tecircm sido necessariamente um fator impeditivo para a emergecircncia de uma

12 O conceito de gestatildeo democraacutetica que norteia esse estudo estaacute pautado na compreensatildeo de que a sociedade civil se reconhece como principal agente poliacutetico em um processo contiacutenuo de participaccedilatildeo e decisatildeo sobre os assuntos de interesse puacuteblico Assim a gestatildeo democraacutetica compreende tambeacutem uma gestatildeo participativa sem paternalismo no intuito de deselitizar as poliacuteticas puacuteblicas facilitando o acesso aos bens e serviccedilos destinados normalmente a uma elite uma minoria 13 Neste trabalho a participaccedilatildeo popular eacute entendida como a capacidade de apropriaccedilatildeo pelos cidadatildeos do direito de construccedilatildeo democraacutetica possibilitando desde a abertura de espaccedilos de discussatildeo dentro e fora dos limites da comunidade ateacute a definiccedilatildeo de prioridades elaboraccedilatildeo de estrateacutegias de accedilatildeo e estabelecimento de canais de diaacutelogo com o poder puacuteblico no intuito de garantir a participaccedilatildeo efetiva da sociedade civil na gestatildeo democraacutetica da cidade

83

diversidade de formas de participaccedilatildeo dos setores populares em que com frequumlecircncia muitas

se situam no escopo das praacuteticas no contexto das tradiccedilotildees anteriormente descritas enquanto

outras as contradizem abertamente (JACOBI 1999)

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Outro avanccedilo importante foi a regularizaccedilatildeo do Plano Diretor como um instrumento

baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de planejamento para viabilizar a Reforma Urbana

para as cidades com mais de vinte mil habitantes Entretanto a regulamentaccedilatildeo dos

mecanismos para a ordenaccedilatildeo das cidades natildeo mereceu destaque no texto constitucional

ficando para ser regularizado pelas leis orgacircnicas dos municiacutepios e pelo proacuteprio Plano Diretor

de cada local (DE GRAZIA 1990)

Nessa perspectiva emergiram modelos de planejamento e gestatildeo orientados pelo

ideaacuterio da reforma urbana enquanto reforma institucional e social que se tornou referecircncia ao

alcance da cidadania

Santos Junior (1995) ressalta que o planejamento e a gestatildeo da cidade baseados na

concepccedilatildeo de reforma urbana pressupotildee o exerciacutecio da cidadania apreendidas em dois

significados como direito de acesso aos bens que garantam condiccedilotildees de vida urbana digna

culturalmente dinacircmica e condizente com os valores eacuteticos humanitaacuterios mas tambeacutem como

direito dos cidadatildeos agrave informaccedilatildeo e agrave participaccedilatildeo poliacutetica na conduccedilatildeo dos destinos da

cidade

A mudanccedila nas relaccedilotildees sociais que se instaurou naquela fase teve como um dos

principais fundamentos a reflexatildeo sobre a funccedilatildeo social dentro da perspectiva do processo de

gestatildeo nos projetos de habitaccedilatildeo A redefiniccedilatildeo do papel do Estado que se dispotildee a pactuar

com os diversos agentes sociais contrariando os modelos de planejamento e gestatildeo

tecnocraacuteticos tambeacutem revela uma mudanccedila nas concepccedilotildees de cidade e de urbano

De fato em diversos municiacutepios a intervenccedilatildeo do Estado junto aos movimentos

populares se dirigiu no sentido de criar novas formas de relaccedilatildeo entre o Estado e Sociedade

Civil ao niacutevel da gestatildeo urbana compreendendo as poliacuteticas puacuteblicas como elementos de

construccedilatildeo e instrumentalizaccedilatildeo da cidadania na accedilatildeo concreta dos agentes sociais envolvidos

(JACOBI 1990)

A participaccedilatildeo popular se transforma no referencial de ampliaccedilatildeo das possibilidades

de acesso dos setores populares dentro de uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade

84

civil e de fortalecimento dos mecanismos democraacuteticos mas tambeacutem de garantia da execuccedilatildeo

eficiente de programas de compensaccedilatildeo social no contexto das poliacuteticas de ajuste estrutural e

de liberalizaccedilatildeo da economia e de privatizaccedilatildeo do patrimocircnio do Estado Entretanto o que se

observa eacute que no geral as propostas participativas ainda permanecem mais no plano da

retoacuterica do que na praacutetica

As transformaccedilotildees nas praacuteticas de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas urbanas tornam

legiacutetima a participaccedilatildeo popular estando direta ou indiretamente associadas agrave necessidade de

imprimir tambeacutem maior eficiecircncia agrave accedilatildeo governamental

A participaccedilatildeo popular se enquadra no processo de redefiniccedilatildeo entre o puacuteblico e o

privado dentro da perspectiva de redistribuir o poder em favor dos sujeitos sociais que

geralmente natildeo tecircm acesso

De um lado a participaccedilatildeo eacute identificada com os argumentos da democratizaccedilatildeo que

tecircm como referecircncia o fortalecimento dos espaccedilos de socializaccedilatildeo de descentralizaccedilatildeo do

poder e de crescente autonomizaccedilatildeo das decisotildees portanto enfatizando a importacircncia de um

papel mais autocircnomo dos sujeitos sociais O outro enfoque aborda a participaccedilatildeo a partir da

criaccedilatildeo de espaccedilos e formas de articulaccedilatildeo do Estado com os sujeitos sociais configurando

um instrumento de socializaccedilatildeo da poliacutetica reforccedilando o seu papel como meio para realizar

interesses e direitos sociais que demandam uma atuaccedilatildeo puacuteblica (JACOBI 1999)

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

A participaccedilatildeo popular na gestatildeo urbana pressupotildee instrumentos e mecanismos de

controle social podendo ser assegurada agrave participaccedilatildeo de setores e membros representativos

das camadas populares e de seus interesses em todas as instacircncias do poder puacuteblico por meio

de conselhos paritaacuterios reguladores fiscalizadores e deliberativos

Os Conselhos como forma apartidaacuteria de exercer poliacutetica podem ser considerados

como um novo sistema de organizaccedilatildeo social para o exerciacutecio poliacutetico tornando-se mais

um espaccedilo de discussatildeo dos problemas cotidianos de uma comunidade podendo constituir-se

como um avanccedilo para o exerciacutecio da democracia na medida em que essa nova forma de

exercer poliacutetica ameniza a centralizaccedilatildeo do poder poliacutetico nos partidos

85

Nesse sentido Souza (2002 p 333-335) destaca trecircs argumentos relevantes sobre a

importacircncia da participaccedilatildeo na gestatildeo democraacutetica da cidade

1- Uma ampla participaccedilatildeo pode contribuir para minimizar certas fontes de distorccedilatildeo quando os especialistas decidem em nome da maioria natildeo se tem chances de monitorar ou controlar o processo de gestatildeo o que pode acarretar numa probabilidade maior de corrupccedilatildeo ou de erros de avaliaccedilatildeo 2- Ao participar de uma decisatildeo o cidadatildeo se sente muito mais responsaacutevel pelo seu resultado o que eacute importante para o amadurecimento poliacutetico 3- A participaccedilatildeo eacute um direito inalienaacutevel participar no sentido essencial de exercer a autonomia eacute a alma mesma de um planejamento e de uma gestatildeo que vislumbra se uma cidade democraacutetica rompendo com o sistema de dominaccedilatildeo

No bojo dessas discussotildees satildeo poucas as experiecircncias de gestatildeo democraacutetica da

cidade que de fato ampliam o potencial participativo Aqui destacam-se duas experiecircncias

que demonstram os processos de gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas implementadas no Brasil a

primeira experiecircncia (Curitiba) eacute pautada na gestatildeo teacutecnico-pragmaacutetica de matriz neoliberal

e a outra (Porto Alegre) eacute baseada na gestatildeo democraacutetica-participativa

Na cidade de Curitiba o modelo de planejamento e gestatildeo da cidade adotado visou

promover uma modernizaccedilatildeo e o enxugamento do Estado atraveacutes do pragmatismo e

eficiecircncia teacutecnica onde a participaccedilatildeo popular se refere a legitimaccedilatildeo dos projetos jaacute

elaborados pois na visatildeo dos representantes do governo uma participaccedilatildeo mais ampla soacute

levaria a discussotildees interminaacuteveis o que impossibilitaria uma accedilatildeo raacutepida e eficiente do poder

puacuteblico (FREY 1996)

Frey (1996) ressalta que o sistema poliacutetico-institucional vigente em Curitiba era de

uma democracia exclusivamente representativa onde o poder de decisatildeo ficava restrito agrave

deliberaccedilatildeo de um corpo tecnocraacutetico Outro ponto de destaque era uma forte hierarquizaccedilatildeo

administrativa uma tendecircncia ao

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86

Nesse sentido Vainer (2000) destaca que o modelo de planejamento estrateacutegico de

cidades baseado nos conceitos e teacutecnicas do planejamento empresarial estrutura-se

basicamente sobre a articulaccedilatildeo de trecircs analogias constitutivas a) a cidade mercadoria b) a

cidade empresa e c) a cidade paacutetria Assim ver a cidade como empresa significa

essencialmente concebecirc-la e instauraacute-la como agente econocircmico que atua no contexto de um

mercado e que encontra neste mercado a regra e o modelo de planejamento e execuccedilatildeo de

suas accedilotildees (VAINER 2000 p 48)

Dentro desse contexto as cidades satildeo tidas como espaccedilos rivais que aguccedilam uma

competitividade de mercado de investimentos industriais de investimentos comerciais e de

serviccedilos o que possibilita um controle da iniciativa privada em relaccedilatildeo agrave produccedilatildeo dos

espaccedilos puacuteblicos (SANCHEZ 1997)

Em contraposiccedilatildeo a esse modelo surge a gestatildeo democraacutetico-participativa ou gestatildeo

poliacutetico-ideoloacutegica como argumenta Frey (1996) cujo objetivo eacute fomentar a participaccedilatildeo

popular e promover uma reestruturaccedilatildeo nos mecanismos decisoacuterios atraveacutes de uma proposta

de inversatildeo de prioridades de igualdade de oportunidades na proposiccedilatildeo e decisatildeo entre os

agentes sociais de transparecircncia na socializaccedilatildeo das informaccedilotildees bem como de rompimento

com estruturas autoritaacuterias e tecnoburocrata na relaccedilatildeo do governo com a sociedade civil

Em Porto Alegre as experiecircncias reforccedilam uma concepccedilatildeo de democracia que

articula representaccedilatildeo poliacutetica e participaccedilatildeo direta como resposta possiacutevel agrave privatizaccedilatildeo

prevalecente na gestatildeo da coisa puacuteblica O discurso predominante acentua a importacircncia da

convergecircncia de praacuteticas da socializaccedilatildeo da poliacutetica do caraacuteter oscilante da participaccedilatildeo da

importacircncia da institucionalidade da convivecircncia com o sistema representativo existente e da

necessidade de governar para toda a cidade

A anaacutelise do caso de Porto Alegre mostra que o desafio para se garantir a eficaacutecia e

continuidade de poliacuteticas puacuteblicas eacute o reforccedilo dos meios para envolver a sociedade e manter o

seu interesse para dimensionar adequadamente os arranjos institucionais A sua

descontinuidade reforccedila o argumento de que gestatildeo democraacutetica e participaccedilatildeo popular

requerem uma forma combinada de fortalecimento das formas de organizaccedilatildeo da sociedade

civil uma mudanccedila na correlaccedilatildeo de forccedilas uma transformaccedilatildeo qualitativa dos padrotildees de

gestatildeo enfim um processo real de democratizaccedilatildeo do Estado e da sua gestatildeo (JACOBI 1996)

Jacobi (1996) defende que a efetiva participaccedilatildeo da sociedade civil nos processos

decisoacuterios como eacute o caso do Orccedilamento Participativo vem se constituindo como um

mecanismo ampliado de engajamento da sociedade na gestatildeo das poliacuteticas puacuteblicas

requerendo um esforccedilo crescente de institucionalizaccedilatildeo da possibilidade de atendimento das

87

demandas em bases negociadas Trata-se de processar demandas e pressotildees e de implementar

mecanismos formais que contemplem tanto os setores organizados e mobilizados

estimulando sua adequaccedilatildeo agrave institucionalidade a partir do respeito agrave autonomia e agrave auto-

organizaccedilatildeo como de envolvimento dos setores desorganizados

A experiecircncia do Orccedilamento Participativo em Porto Alegre estaacute diretamente

vinculada a capacidade que a administraccedilatildeo local teve de criar canais legiacutetimos de

participaccedilatildeo combinando elementos da democracia representativa e de democracia

participativa

Nesse contexto a participaccedilatildeo popular adquire uma praacutetica de ruptura com o

corporativismo territorialmente determinado com ecircnfase numa loacutegica direcionada por uma

abordagem universal da cidade criando para os setores populares uma opccedilatildeo viaacutevel e

altamente competitiva de participaccedilatildeo poliacutetica alternativa agraves praacuteticas clientelistas (JACOBI

1996)

Isto estaacute sendo estabelecido dentro de uma loacutegica que natildeo estaacute apenas permeada pelo

imediatismo e o utilitarismo mas por uma radicalizaccedilatildeo da democracia que alargando os

direitos de cidadania no plano poliacutetico e social constroacutei efetivamente novas relaccedilotildees entre

governantes e governados Este processo de gestatildeo atraveacutes do ingresso da cidadania

organizada na maacutequina do Estado possibilita conhecer seu funcionamento e seus limites e

estimula a construccedilatildeo de uma relaccedilatildeo de co-responsabilizaccedilatildeo e de disputa visando produzir

consensos cada vez mais qualificados

Mas apesar da sua repercussatildeo positiva esses processos participativos apresentam

limitaccedilotildees e estas residem nas contradiccedilotildees associadas agraves dificuldades de ampliar a

participaccedilatildeo e agrave dependecircncia em relaccedilatildeo agraves autoridades municipais para estruturar a dinacircmica

de funcionamento

Nesse sentido Souza (2002 p 387-388) observa que existem trecircs obstaacuteculos

vinculados agrave participaccedilatildeo popular

1- problemaacutetica da implementaccedilatildeo refere-se agraves diversas dificuldades que uma administraccedilatildeo progressista tem de enfrentar para implementar suas poliacuteticas tais como boicotes patronais escassez de recursos incompetecircncia gerencial e outras 2- problemaacutetica da cooptaccedilatildeo diz respeito agrave deformaccedilatildeo do esquema participativo atraveacutes da instrumentalizaccedilatildeo da sociedade civil por parte das forccedilas poliacuteticas do Estado 3- problemaacutetica da desigualdade tem a ver com as dificuldades para a participaccedilatildeo voluntaacuteria pois em geral natildeo se dispotildee de muitos recursos para participar como dinheiro para se locomover

88

A realidade brasileira eacute marcada por baixa institucionalizaccedilatildeo na qual a maioria da

sociedade pouco se mobiliza para utilizar os instrumentos da democracia participativa que

visam romper com o autoritarismo social que prevalece Os setores organizados que

interagem e pressionam representam iniciativas fragmentaacuterias que natildeo atingem o cerne de

uma sociedade refrataacuteria a praacuteticas coletiva

O desafio existente eacute o de superar as barreiras soacutecio-institucionais e fortalecer as

poliacuteticas puacuteblicas pautadas pela inclusatildeo da noccedilatildeo de interesse geral Esta se concretiza na

medida em que o tema da cidadania eacute assumido como um ponto central para a

institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo dos cidadatildeos em processos decisoacuterios de interesse puacuteblico

(JACOBI 1990)

A reconstituiccedilatildeo do processo de participaccedilatildeo dos movimentos sociais organizados no

niacutevel do executivo e legislativo municipais permite em primeiro lugar ampliar os dados para

uma anaacutelise mais aprofundada sobre o processo de reconhecimento na construccedilatildeo de novos

sujeitos coletivos e na ampliaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos Estes elementos possibilitam a

construccedilatildeo de uma institucionalidade ampliada cujos reflexos poderiam nos levar a superar o

ciclo de fluxos e refluxos normalmente presentes nas lutas pela superaccedilatildeo de carecircncias

imediatas

O planejamento participativo aponta para a necessidade dos governos da sociedade

civil e dos setores produtivos buscarem a construccedilatildeo de espaccedilos institucionais onde a gestatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas sejam compartilhadas pelos agentes sociais

envolvidos

Eacute preciso construir formas de participaccedilatildeo cidadatilde em que o ambiente signifique o

conjunto de diferentes elementos da produccedilatildeo e do consumo com formas alternativas de

participaccedilatildeo da sociedade civil na construccedilatildeo de uma sociedadecidade sustentaacutevel

25 O DIREITO Agrave CIDADE E O DIREITO Agrave MORADIA

A cidade como cenaacuterio onde se desenvolve a acumulaccedilatildeo de capital que deteacutem os

meios de produccedilatildeo e que abriga a forccedila de trabalho constitui-se como espaccedilo de lutas de

classes no qual o direito agrave cidade se coloca como um dos agentes motores dessa luta

A nova forma de relaccedilatildeo entre Estado e Movimentos Sociais no Brasil poacutes-1964

levanta um conjunto de questotildees vinculadas agrave formulaccedilatildeo intencional de poliacuteticas agrave questatildeo

89

da crise de governabilidade ao processo de tomada de decisotildees agrave dinacircmica dos movimentos

sociais suas articulaccedilotildees e accedilotildees bem como seu papel na transformaccedilatildeo da sociedade

A reflexatildeo sobre essa temaacutetica nos remete a um desafio de compreender as

ambiguumlidades conflitos e especificidades da relaccedilatildeo entre Estado e classes populares a partir

das contradiccedilotildees do capitalismo monopolista avanccedilado que desloca o centro do conflito de

classes do ambiente das relaccedilotildees industriais para o cenaacuterio do espaccedilo urbano e social

O espaccedilo urbano capitalista

fragmentado e articulado reflexo condicionante social cheio de siacutembolos e campo de lutas

eacute um produto social resultado de accedilotildees acumuladas atraveacutes do tempo e engendradas por agentes que produzem e consomem espaccedilo Satildeo agentes sociais concretos e natildeo um mercado invisiacutevel ou processos aleatoacuterios atuando sobre um espaccedilo abstrato A accedilatildeo desses agentes eacute complexa derivado da dinacircmica de acumulaccedilatildeo de capital das necessidades mutaacuteveis de reproduccedilatildeo das relaccedilotildees de produccedilatildeo e dos conflitos de classe que dela emergem (CORREcircA 1993 p 11)

Desse modo o urbano pode ser compreendido como produto social historicamente

determinado refletindo o modo de produccedilatildeo vigente A distinccedilatildeo possiacutevel de ser feita entre a

cidade e o urbano resume-se em que a primeira refere-se ao particular ao concreto ao

interno e o segundo corresponde ao geral ao abstrato ao externo ou seja agraves teacutecnicas aos

valores sociais e interesses econocircmicos agrave organizaccedilatildeo e ao controle social da vida coletiva

(SANTOS 1991 p 69)

Para Bourdieu (1996) todas as sociedades se apresentam como espaccedilos sociais

que satildeo entendidos como estruturas de diferenccedilas que natildeo se pode compreender sem se

construir o princiacutepio gerador que funda essas diferenccedilas na objetividade Ele considera que o

princiacutepio gerador eacute o da estrutura de distribuiccedilatildeo das formas de poder ou dos tipos de

capital eficiente no universo social considerado

Segundo ele as formas de poder e os tipos de capital podem variar dependendo dos

lugares e dos momentos Portanto os agentes individuais ou coletivos podem ocupar

posiccedilotildees diferentes no espaccedilo social ao longo do tempo e em funccedilatildeo de suas capacidades de

mobilizaccedilatildeo de recursos simboacutelico eou materiais

Nesse sentido o espaccedilo social pode ser representado como um campo Esta noccedilatildeo

eacute a forma como Bourdieu concebe as instituiccedilotildees de maneira relacional e natildeo como

substacircncia ou seja como configuraccedilotildees de relaccedilotildees entre agentes individuais e coletivos

Assim ratificando o conceito de campo apresentado anteriormente cita-se Bourdieu (1996 p

50)

90

Ao mesmo tempo como campo de forccedilas cuja necessidade se impotildee aos agentes que nele se encontram envolvidos e como campo de lutas no interior do qual os agentes se enfrentam com meios e fins diferenciados conforme sua posiccedilatildeo na estrutura do campo de forccedilas contribuindo assim para a conservaccedilatildeo ou a transformaccedilatildeo de sua estrutura

Campo de forccedilas pode ser entendido como a existecircncia de relaccedilotildees entre dominantes

e dominados marcadas por uma distribuiccedilatildeo desigual dos recursos E campo de luta no

sentido da existecircncia de um confronto entre os agentes sociais para conservar ou transformar

as relaccedilotildees de forccedila (BOURDIEU 1996) O espaccedilo social num determinado momento

histoacuterico eacute portanto composto por diferentes campos que ocupam posiccedilotildees diferenciadas em

seu interior

Nesse sentido o Estado capitalista aleacutem de expressar os interesses das classes

hegemocircnicas eacute um condensador de forccedilas sociais expressando portanto as contradiccedilotildees

das classes que determinam a emergecircncia dos conflitoslutas urbanas e dos Movimentos

Sociais Urbanos (MSU s) como espaccedilo alternativo de expressatildeo popular tendo em vista a

repressatildeo das accedilotildees sindicais e partidaacuterias

Segundo Jacobi (1989) a concepccedilatildeo pautada na polarizaccedilatildeo da relaccedilatildeo

EstadoMovimentos Sociais Urbanos tende a negar um dado cada vez mais presente na

dinacircmica das sociedades capitalistas ou seja o de que o Estado se bem age para assegurar a

reproduccedilatildeo do capital tambeacutem se concretiza em domiacutenios de accedilatildeo funcionalmente vinculados

agrave reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho esfera vinculada agrave accedilatildeo dos movimentos sociais

O Estado assume o papel de articulador e organizador da sociedade independentemente de sua condiccedilatildeo de suporte de certas relaccedilotildees de dominaccedilatildeo adotando o papel de fiador de relaccedilotildees sociais Trata-se de um Estado que tem de exercer funccedilotildees contraditoacuterias de acumulaccedilatildeo e de legitimaccedilatildeo para criar as bases de um consenso atraveacutes da accedilatildeo das suas instituiccedilotildees (JACOBI 1989 p 4)

A accedilatildeo do Estado eacute contraditoacuteria pois se por um lado eacute incontestaacutevel que defenda os

interesses do setor dominante por outro sua atuaccedilatildeo pode e eacute muitas vezes direcionada para

atender agraves demandas populares pois aleacutem de sua funccedilatildeo de acumulaccedilatildeo exerce tambeacutem a

funccedilatildeo de legitimaccedilatildeo Para tal atende aos interesses em curto prazo das classes dominadas

contrariando os interesses econocircmicos das dominantes garantindo no entanto que a estrutura

de poder seja mantida (ABELEacuteM 1988)

91

As contradiccedilotildees entre classes sociais satildeo fundamentais para a compreensatildeo da accedilatildeo

estatal no urbano atraveacutes da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas pois expressam a correlaccedilatildeo

de forccedilas entre os diversos segmentos sociais e os seus diferentes interesses

Complementando esse raciociacutenio Castells (1983) situa a emergecircncia dos

Movimentos Sociais Urbanos14 (MSU s) a partir das contradiccedilotildees urbanas geradas pelo

desenvolvimento do capitalismo frente agraves novas e crescentes necessidades postas agrave

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho Estes movimentos satildeo compreendidos como um sistema de

praacuteticas sociais contraditoacuterias que colocam em questatildeo a ordem estabelecida a partir de

contradiccedilotildees especiacuteficas da problemaacutetica urbana Esta problemaacutetica urbana concorre para a

criaccedilatildeo de um processo de politizaccedilatildeo do cotidiano tendo em vista a accedilatildeo contraditoacuteria do

Estado

Touraine (1994 p 46) exprime sua visatildeo sobre o surgimento dos atores sociais e de

seu papel no contexto da sociedade complexa os atores natildeo satildeo mais definidos pela situaccedilatildeo

social (na oacutetica da luta de classes) pelo papel desempenhado numa estrutura econocircmica ou

mais global como as castas

As accedilotildees coletivas mais visiacuteveis formam-se em primeiro lugar em oposiccedilatildeo agraves forccedilas econocircmicas e poliacuteticas que procuram impor a ideologia da globalizaccedilatildeo isto eacute o desaparecimento dos atores sociais e das culturas nos fluxos de produccedilatildeo do consumo e da comunicaccedilatildeo de massa que se estende ateacute os limites do mundo (TOURAINE 1994 p 135)

Moiseacutes (1990) assinala que as formas de participaccedilatildeo social e poliacutetica dos setores

populares urbanos desenvolvidas durante o processo de metropolizaccedilatildeo das cidades

brasileiras especialmente em Satildeo Paulo na deacutecada de 1950 demonstraram que

Essas classes natildeo satildeo apenas objeto da vontade dos grupos dominantes (e do Estado) mas tambeacutem atores dotados de percepccedilatildeo proacutepria de sua situaccedilatildeo e de seus interesses Frequumlentemente essa percepccedilatildeo foi uacutetil para projetar formas organizadas de accedilatildeo coletiva que se expressavam atraveacutes de movimentos sociais cuja eficaacutecia tem relaccedilatildeo com os resultados praacuteticos imediatos (atendimento das reivindicaccedilotildees urbanas) mas tambeacutem com o desenvolvimento de uma nova forccedila social e poliacutetica na vida da cidade (MOISEacuteS 1990 p 14)

Deste mesmo ponto de vista Ribeiro (2003) argumenta que os aspectos relacionados

ao processo endoacutegeno do surgimento da questatildeo urbana no Brasil estavam na reorganizaccedilatildeo

14 Neste trabalho o termo MSU se refere agraves organizaccedilotildees populares imprimidas no chamado movimento popular urbano

92

da ordem soacutecioespacial Esta foi uma necessidade da acumulaccedilatildeo do capital jaacute que se poderia

reorganizar o modo de vida dos trabalhadores para impor o assalariamento e reorganizar o

territoacuterio para que surgisse uma economia de aglomeraccedilatildeo criando assim condiccedilotildees

favoraacuteveis agrave expansatildeo do modo de vida capitalista

Os movimentos populares no final da deacutecada de 1970 tornaram-se imprescindiacuteveis

para a transformaccedilatildeo da arena poliacutetica brasileira principalmente pela organizaccedilatildeo de

associaccedilotildees tais como a de moradores de bairro como forma de reivindicarem uma melhoria

da qualidade de vida dentro de um quadro de profundas desigualdades sociais e degradaccedilatildeo

ambiental e das condiccedilotildees de vida

A luta pela participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo de poliacuteticas

urbanas no Brasil ganhou forccedilas com a elaboraccedilatildeo da Nova Constituiccedilatildeo Federal iniciada em

1986 na qual vaacuterios movimentos sociais partidos poliacuteticos sindicatos igrejas e outros

articularam-se no intuito de defender a Emenda Popular15 da Reforma Urbana

As discussotildees elaboraccedilatildeo e defesa da Emenda Popular da Reforma Urbana natildeo se

constituiacuteram em tarefa faacutecil devido agrave complexidade dos formatos organizativos envolvidos e

suas diferentes dinacircmicas trajetoacuterias e perspectivas (RIBEIRO 1994)

A Constituiccedilatildeo Federal (CF) de 1988 procurou institucionalizar a participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas por meio de conselhos

comunitaacuterios nas aacutereas de educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social planejamento urbano dentre

outras Isto se caracterizou como um acontecimento marcante para os movimentos sociais

pois serviu como instrumento para avaliar o grau de coesatildeo abrangecircncia e articulaccedilatildeo destes

movimentos jaacute que se constituiu num momento iacutempar de formulaccedilatildeo de novas leis para o

Paiacutes (RIBEIRO 1991)

Em seus artigos 182 e 183 a CF estabeleceu as diretrizes para uma nova poliacutetica

urbana e exigiu uma legislaccedilatildeo nova que fixasse os direitos e deveres do cidadatildeo nas cidades

brasileiras Esse direito foi consolidado e ampliado no Estatuto da Cidade Lei nordm

102572001 que se refere agrave gestatildeo democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo popular

assume papel relevante

Entre as 16 diretrizes constantes dos vaacuterios artigos do Estatuto merece especial

destaque as duas primeiras a garantia do direito agrave cidade sustentaacuteveis e o direito agrave terra

urbana a moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos

15 Esta Emenda Popular contou com cerca de 200000 assinaturas e contribuiu para a incorporaccedilatildeo do capiacutetulo da poliacutetica urbana no interior da Constituiccedilatildeo

93

serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e as futuras geraccedilotildees (OLIVEIRA

2001 p 02)

A participaccedilatildeo da populaccedilatildeo eacute prevista em todas as dimensotildees da poliacutetica urbana ou

seja desde a formulaccedilatildeo do Plano Diretor na fase de sua negociaccedilatildeo e aprovaccedilatildeo na Cacircmara

ateacute sua implementaccedilatildeo e posteriores revisotildees16 Outro meio democraacutetico de participaccedilatildeo na

gestatildeo da cidade se daacute a partir da constituiccedilatildeo de oacutergatildeos colegiados de poliacutetica urbana

debates audiecircncias consultas puacuteblicas conferecircncias planos e projetos de lei de iniciativa

popular referendos e plebiscitos

O direito agrave moradia tambeacutem eacute reconhecido nos incisos XIV e XV que fixa como

diretriz urbana a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas por camadas

populares mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do

solo e das normas ediliacutecias com vistas a permitir a reduccedilatildeo dos custos e o aumento da oferta

dos lotes e unidades habitacionais (OLIVEIRA 2001 p 07) Em diversas passagens da

Constituiccedilatildeo nota-se a perspectiva da questatildeo da moradia como objeto das poliacuteticas puacuteblicas

(art 21) uma vez que esse direito eacute fundamental agrave ordem social e econocircmica da solidariedade

e da redistribuiccedilatildeo17

De acordo com De Grazia (2003) colocada em novas bases a luta pela Reforma

Urbana assim como a luta pela moradia digna objetivava a garantia do direito agrave cidade por

meio de mudanccedilas significativas na qualidade de vida com a implementaccedilatildeo de poliacuteticas

puacuteblicas voltadas para o conjunto das camadas populares Para isso elaborou trecircs princiacutepios

baacutesicos para referenciar sua praacutetica

1- Direito agrave Cidade e agrave Cidadania entendido como uma nova loacutegica que universalize o acesso aos equipamentos e serviccedilos urbanos a condiccedilotildees de vida urbana digna e ao usufruto de um espaccedilo culturalmente rico e diversificado e sobretudo em uma dimensatildeo poliacutetica de participaccedilatildeo ampla dos habitantes das cidades na conduccedilatildeo de seus destinos 2- Gestatildeo Democraacutetica da Cidade entendida como forma de planejar produzir operar e governar as cidades submetidas ao controle e participaccedilatildeo social destacando-se como prioritaacuteria a participaccedilatildeo popular 3- Funccedilatildeo Social da Cidade e da Propriedade entendida como a prevalecircncia do interesse comum sobre o direito individual de propriedade o que implica no uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado do espaccedilo urbano (DE GRAZIA 2003 p 54)

16 O Plano Diretor foi considerado como um instrumento baacutesico a ser elaborado pelos governos municipais como condiccedilatildeo para a adoccedilatildeo de instrumentos supostamente capazes de contribuir para promover a funccedilatildeo social da terra urbana e da cidade princiacutepio baacutesico do texto constitucional sobre a poliacutetica urbana 17 Com a aprovaccedilatildeo da emenda constitucional em 2000 o direito agrave moradia ficou expressamente reconhecido entre os direitos sociais no artigo 6ordm ratificando que soacute podem existir direitos e liberdades fundamentais com a garantia a dimensatildeo social da moradia sauacutede educaccedilatildeo trabalho entre outros

94

Esses novos princiacutepios diferente dos propostos em 1960 estatildeo baseados numa

leitura das cidades cujo padratildeo de produccedilatildeo ocupaccedilatildeo e gestatildeo satildeo marcados pela

mercantilizaccedilatildeo do solo da moradia do transporte de massa e dos demais equipamentos e

serviccedilos urbanos

O Estado por sua vez tem tradicionalmente apoiado esses interesses por meio de

poliacuteticas controles e mecanismos reguladores e discriminatoacuterios um modo de ver e fazer a

cidade no qual distribui os homens desigualmente no espaccedilo e que subordina os direitos

poliacuteticos os direitos individuais a cidadania aos modelos de uma racionalidade econocircmica A

distribuiccedilatildeo dos equipamentos e serviccedilos eacute geralmente realizada conforme o lugar onde

melhor satildeo atendidos os criteacuterios de rentabilidade e de retorno do capital investido Esse

modelo excludente deu origem agrave imensa segregaccedilatildeo existente nas cidades em todo o Paiacutes

(DE GRAZIA 2003)

Os princiacutepios da Reforma Urbana ao contraacuterio queriam enfatizar as seguintes

concepccedilotildees

- As cidades satildeo produzidas pelo confronto pela luta e pela apropriaccedilatildeo entre diversos agentes econocircmicos e sociais - As poliacuteticas e instrumentos juriacutedicos ou urbaniacutesticos devem levar em conta a cidade real reconhecendo a desigualdade e o conflito existente entre os produtores e consumidores do espaccedilo urbano - O Estado eacute obrigado a assegurar os direitos urbanos - A necessidade de uma regulaccedilatildeo puacuteblica da produccedilatildeo privada formal e informal do meio ambiente construiacutedo eacute necessaacuterio um controle social do uso do solo - Submissatildeo do direito da propriedade agrave sua funccedilatildeo social - Introduz a noccedilatildeo da necessidade do acesso igualitaacuterio aos bens e serviccedilos urbanos e ao direito agrave cidade atraveacutes de instrumentos e mecanismos redistributivos - O controle social e a participaccedilatildeo da sociedade civil organizada satildeo condiccedilotildees baacutesicas para a conquista dos direitos de novas poliacuteticas puacuteblicas que incorporem os excluiacutedos e de novas referecircncias para as cidades Atraveacutes do exerciacutecio do controle do Poder Puacuteblico as organizaccedilotildees participam da gestatildeo das cidades daiacute o nome de Gestatildeo Democraacutetica da Cidade - Reconhecer a cidade na sua totalidade e repensar o planejamento a partir da negociaccedilatildeo dos agentes que produzem e se apropriam do espaccedilo urbano - Assumir a estrateacutegia da construccedilatildeo de uma nova eacutetica urbana contraacuteria agrave concepccedilatildeo que pensa a cidade como mercado tendo em vista a transformaccedilatildeo da sociedade - O fortalecimento dos sujeitosatores sociais e poliacuteticos como condiccedilatildeo baacutesica para a construccedilatildeo e implementaccedilatildeo das estrateacutegias propostas (DE GRAZIA 2003 p 56)

Todos esses princiacutepios provocaram uma verdadeira revoluccedilatildeo urbana conforme

Vainer (2000 p 99) cujas caracteriacutesticas seriam reduzir as desigualdades e transferir recursos

95

materiais e simboacutelicos para os explorados e oprimidos fortalecer a constituiccedilatildeo de sujeitos

coletivos conscientes enfraquecendo as coalizotildees locais dominantes Nesse sentido a

revoluccedilatildeo urbana aponta para uma accedilatildeo processual de transformaccedilatildeo da cidade e dos agentes

populares para a reconfiguraccedilatildeo da cidade para a redefiniccedilatildeo das relaccedilotildees de poder de que a

cidade eacute simultaneamente campo e objeto

Para Vainer (2000) a cidade eacute um espaccedilo fundamental da luta econocircmica poliacutetica e

cultural palco privilegiado dos movimentos reivindicatoacuterios assumindo uma posiccedilatildeo

estrateacutegica na constituiccedilatildeo de identidades e da construccedilatildeo de alianccedilas poliacuteticas

Dessa forma a organizaccedilatildeo da sociedade civil pode perpassar por dentro do Estado

alterando as administraccedilotildees estaduais e municipais possibilitando a consolidaccedilatildeo de projetos

participativos e de interesses coletivos Assim a constituiccedilatildeo de conselhos eacute relevante na

atuaccedilatildeo dos processos decisoacuterios jaacute que eacute capaz de encaminhar accedilotildees conjuntas da sociedade

com o Estado orientado pelas proposiccedilotildees do direito agrave cidadania e agrave cidade

Lefebvre (1991) ressalta o direito agrave vida urbana como uma condiccedilatildeo de um

humanismo e de uma democracia renovados Esse direito surge como uma proposta radical

de resistecircncia agrave massificaccedilatildeo imposta pela sociedade burocraacutetica de consumo dirigido

Atraveacutes das instituiccedilotildees e ideologias exercem-se pressotildees e repressotildees sobre a vida cotidiana

no sentido de impor agrave sociedade formas e ritmos de vida impeditivos da reflexatildeo e

consequumlentemente da contestaccedilatildeo desse modo de vida

O autor destaca tambeacutem dois relevantes obstaacuteculos ao alcance do direito agrave cidade e

o direito agrave moradia primeiro a ausecircncia de participaccedilatildeo da sociedade na gestatildeo urbana

devido ao alto grau de concentraccedilatildeo das decisotildees nas matildeos de administradores e teacutecnicos da

elite dirigente que controla a cidade e segundo a forma como estatildeo organizadas as cidades

expressando a estrutura de classe onde a propriedade e o mercado impedem que seja

alcanccedilada a funccedilatildeo social da cidade

Garantir o valor de uso da cidade constituiacute-se em tarefa primordial para a garantia da plena apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos por todos os habitantes superando o estado de alienaccedilatildeo e massificaccedilatildeo da sociedade burocraacutetica de consumo dirigido atraveacutes da ruptura dos coacutedigos da propriedade privada e do mercado (LEFEBVRE 1991 p 161)

Dessa forma o direito agrave cidade e o direito agrave moradia transcendem agrave elaboraccedilatildeo

juriacutedica e diz respeito agrave vida em sociedade a democratizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agrave accedilatildeo

participativa ainda que haja tensotildees e conflitos Ademais nesse processo emergem novas

96

concepccedilotildees de cidade que perpassam a elaboraccedilatildeo do conteuacutedo poliacutetico dos movimentos

sociais

Aleacutem dos canais de participaccedilatildeo e de gestatildeo democraacutetica criados a partir dos anos

1980 emergiram muacuteltiplas accedilotildees que objetivavam transformar o espaccedilo urbano em lugar de

praacuteticas sociais onde a prioridade eacute pela apropriaccedilatildeo da cidade em detrimento da hegemonia

do valor de troca da cidade-mercadoria

Trata-se de uma superaccedilatildeo pela e na praacutetica trata-se de uma mudanccedila de praacutetica social O valor de uso subordinado ao valor de troca durante seacuteculos pode retornar para primeiro plano Como Pela e na sociedade urbana partindo dessa realidade que ainda resiste e que conserva em noacutes a imagem do valor de uso a cidade Que a realidade urbana esteja destinada aos usuaacuterios

e natildeo aos especuladores aos promotores capitalistas aos planos teacutecnicos (LEFEBVRE 1991 p 128)

Nesse sentido o direito agrave moradia pode ser entendido como um direito agrave moradia

digna natildeo se limitando agrave sua condiccedilatildeo edificada de habitaccedilatildeo correspondendo ao direito de

viver com dignidade seguranccedila e paz Os elementos essenciais para este atendimento satildeo de

acordo com Meirinho e Bertol (2010 p 3)

A seguranccedila incluindo a seguranccedila juriacutedica da posse a disponibilidade e o faacutecil aceso aos serviccedilos (educaccedilatildeo sauacutede assistecircncia social) e agrave infraestrutura custo acessiacutevel agrave moradia (gastos com a moradia tem de ser proporcional agrave renda) habitabilidade (condiccedilotildees fiacutesicas e de salubridade adequadas) acessibilidade (moradia adequada para todos) localizaccedilatildeo (adequada inserccedilatildeo na cidade favorecendo o acesso ao emprego transporte puacuteblico serviccedilos de sauacutede escolas cultura e lazer) adequaccedilatildeo ambiental (caracteriacutesticas fiacutesicas que garantam a salubridade adequado saneamento ambiental disponibilidade de amenidades paisagiacutesticas naturais ou produzidas pela accedilatildeo humana) adequaccedilatildeo cultural (respeito agrave diversidade cultural e aos padrotildees oriundos dos usos e costumes das comunidades e grupos sociais) e o respeito e construccedilatildeo de valores psiacutequicos como o pertencimento e a proteccedilatildeo

O Estatuto da Cidade reconhece a gestatildeo democraacutetica que se daria por meio da

sociedade civil de associaccedilotildees representativas dos vaacuterios segmentos da comunidade de

conselhos de participaccedilatildeo orccedilamento participativo audiecircncias puacuteblicas na formulaccedilatildeo

execuccedilatildeo e acompanhamento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano

Insere tambeacutem a cooperaccedilatildeo entre os governos a iniciativa privada e os demais setores da

sociedade no processo de urbanizaccedilatildeo em atendimento ao interesse social

97

Como resposta agrave determinaccedilatildeo constitucional e para viabilizar a gestatildeo democraacutetica

das diretrizes urbaniacutesticas vaacuterios municiacutepios criaram os Conselhos de Desenvolvimento

Urbano Estes conselhos satildeo instrumentos de representaccedilatildeo da sociedade civil na gestatildeo de

sua poliacutetica urbana Representam um dos canais de comunicaccedilatildeo entre a sociedade civil e a

administraccedilatildeo local no que diz respeito agrave poliacutetica urbana no municiacutepio Satildeo instacircncias

participativas referente ao planejamento da cidade definiccedilatildeo composiccedilatildeo e

acompanhamento da implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e intervenccedilotildees diversas tais como

planos diretores poliacuteticas setoriais de transporte e meio ambiente programas de urbanizaccedilatildeo

de favelas etc (SOUZA 2002 p 359)

A institucionalizaccedilatildeo da relaccedilatildeo entre sociedade civil e Estado por meio de

conselhos sejam setoriais (sauacutede educaccedilatildeo etc) ou comunitaacuterios (para a elaboraccedilatildeo do plano

de governo das obras puacuteblicas) por exemplo eacute o que caracteriza este novo nas

administraccedilotildees puacuteblicas Configura-se assim uma estreita correlaccedilatildeo entre descentralizaccedilatildeo

poliacutetica e eficiecircncia administrativa principalmente no que concerne agrave transparecircncia das accedilotildees

governamentais

Para tal eacute necessaacuterio que ocorram investimentos na mudanccedila da cultura poliacutetica o

que implicaria em participaccedilatildeo na disputa de interesses que definem a apropriaccedilatildeo da cidade

Eacute o direito de ir e vir que assumido como uma das mais fortes expressotildees poliacuteticas da

experiecircncia urbana poderaacute unificar produccedilatildeo e reproduccedilatildeo trabalho e consumo e por fim a

cidade historicamente construiacuteda e o urbano como modo de vida Compreende-se ainda que

a postulaccedilatildeo e a defesa deste direito viraacute permitir a afirmaccedilatildeo de outra escala para a

concepccedilatildeo da funccedilatildeo social e da gestatildeo democraacutetica da cidade a escala da metroacutepole

O direito agrave cidade se manifesta como forma superior dos direitos direito agrave liberdade agrave individualizaccedilatildeo na socializaccedilatildeo ao habitat e ao habitar O direito agrave obra (agrave atividade participante) e o direito agrave apropriaccedilatildeo (bem distinto do direito agrave propriedade) estatildeo implicados no direito agrave cidade [] Mudariam a realidade se entrassem para a praacutetica social direito ao trabalho agrave instruccedilatildeo agrave educaccedilatildeo agrave sauacutede agrave habitaccedilatildeo aos lazeres agrave vida Entre esses direitos em formaccedilatildeo figura o direito agrave cidade (natildeo agrave cidade arcaica mas agrave vida urbana agrave centralidade renovada aos locais de encontro e de trocas aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o uso pleno e inteiro desses momentos e locais etc) A proclamaccedilatildeo e a realizaccedilatildeo da vida urbana como reino do uso (da troca e do encontro separados do valor de troca) exigem o domiacutenio do econocircmico (do valor de troca do mercado e da mercadoria) e por conseguinte se inscrevem nas perspectivas da revoluccedilatildeo sob a hegemonia da classe operaacuteria (LEFEBVRE 1991 p143)

98

Dessa maneira o avanccedilo e a consolidaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular como condiccedilatildeo

necessaacuteria agrave proacutepria viabilizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas alteram o conteuacutedo e praacuteticas de

programas e projetos ao mesmo tempo que impotildee novas exigecircncias aos grupos poliacuteticos que

estatildeo no poder

Sendo assim as praacuteticas sociais que constroem cidadania representam a possibilidade

de se constituir num espaccedilo privilegiado para cultivar a responsabilidade pessoal a obrigaccedilatildeo

muacutetua e a cooperaccedilatildeo voluntaacuteria A ampliaccedilatildeo da esfera puacuteblica ocasiona uma demanda agrave

sociedade para obtenccedilatildeo de uma maior influecircncia sobre o Estado tanto como sua limitaccedilatildeo

assumindo que a autonomia social supotildee transcender as assimetrias na representaccedilatildeo social

assim como modificar as relaccedilotildees sociais em favor de uma maior auto-organizaccedilatildeo social

A institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular eacute permeada de dificuldades decorrentes

da heterogeneidade dos grupos comunitaacuterios e associativos o que torna complexos os

problemas de representaccedilatildeo criando tensotildees quanto aos criteacuterios de escolha acirrando a

concorrecircncia e trazendo agrave tona a pressatildeo dos grupos organizados no sentido de reforccedilo das

praacuteticas neocorporativas Isso provoca frequumlentemente um esvaziamento dos mecanismos de

decisatildeo coletiva

Destarte a abertura poliacutetica possibilitou a construccedilatildeo de processos sociais e

institucionais que adquiriram visibilidade por meio da mobilizaccedilatildeo de sujeitos poliacuteticos em

muitos municiacutepios realizando emendas populares para as Constituiccedilotildees Estaduais Leis

Orgacircnicas e Planos Diretores aleacutem de organizarem foacuteruns regionais articuladores da

sociedade civil como por exemplo o Foacuterum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) que se

fortalece a partir desse contexto e passa a ser um articulador dos agentes urbanos no Brasil

Torna-se necessaacuterio portanto ressaltar a participaccedilatildeo da sociedade civil no processo

de gestatildeo do espaccedilo urbano pois este segmento conseguiu implementar as suas lutas pelo

direito agrave cidade e agrave cidadania nas poliacuteticas puacuteblicas

Esses movimentos resistiram e enfrentaram os governos militares por meio do apoio

das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Igreja Catoacutelica e lutaram pela

redemocratizaccedilatildeo do Paiacutes constituindo-se em importante articulaccedilatildeo para mobilizar

organizar e propor mudanccedilas recriando identidades poliacuteticas e culturais

A mobilizaccedilatildeo coletiva aleacutem de uma seacuterie de estrateacutegias de accedilatildeo configura-se como

[] um processo de desenvolvimento de condiccedilotildees materiais psicossociais e poliacuteticas

(PRADO 2002 p 60) que permite a constituiccedilatildeo de identidades poliacuteticas Nesse processo

alguns elementos emergem como estruturas mediadoras fundamentais para a construccedilatildeo e

99

adequaccedilatildeo do universo que apoacuteia a coesatildeo do grupo e a identidade de suas praacuteticas discursivas

e de accedilatildeo

Nesse sentido Castells (2006) ressalta que a construccedilatildeo de identidade dos sujeitos

sociais eacute um processo de construccedilatildeo de sentido a partir de um atributo cultural poliacutetico

social ou de um conjunto coerente de atributos que tecircm prioridade sobre todas as outras

fontes Assim um mesmo indiviacuteduo ou o mesmo ator coletivo pode ter vaacuterias identidades

A identidade natildeo eacute totalmente determinada agrave nascenccedila por fatores exoacutegenos eacute

(re)construiacuteda ao longo da vida como resultado de muacuteltiplos processos temporais de inserccedilatildeo

e interaccedilatildeo e como tal pode ser vista como uma reconstruccedilatildeo permanente flexiacutevel e

dinacircmica e natildeo como uma preacute-construccedilatildeo essencialista

Dessa forma considera-se que a identidade de cada um pode ser eventualmente

segmentada em fraccedilotildees relevantes por exemplo a identidade eacutetnica nacional regional de

classe profissional ou familiar mas tambeacutem eacute proveniente dos grupos de sociabilidade em

que se encontra inserido do bairro que se habita ou da comunidade de interesses a que se

encontra associado

Assim o que fundamenta as novas identidades eacute a experiecircncia de vida comum que

reuacutene o grupo e seu modo democraacutetico de funcionamento que garante a autenticidade do

grupo Tratada deste modo a formaccedilatildeo de identidades novas parece produto apenas de

vivecircncia de carecircncias comuns que explicitam para todos os membros do grupo uma mesma

condiccedilatildeo de dominaccedilatildeo

Castells (2006) argumenta em sua obra O Poder da Identidade a dominacircncia do

espaccedilo de fluxos e a dialeacutetica entre esse espaccedilo e o espaccedilo de lugares que levaram agrave

obsolescecircncia as antigas instituiccedilotildees e organizaccedilotildees da sociedade civil as identidades

legitimadoras construiacutedas em torno do Estado democraacutetico e do contrato social entre capital e

trabalho18 Da mesma forma propiciam o surgimento de identidades de resistecircncia19 que

recusam-se ser apanhadas de roldatildeo pelos fluxos globais poderiam sob determinadas

circunstacircncias e por meio de processos especiacuteficos a cada contexto institucional e cultural

ser cristalizados em identidades de projetos os verdadeiros agentes da mudanccedila capazes de

reconstruir uma nova sociedade civil e por uacuteltimo um novo Estado (CASTELLS 2006 p

423)

18 Nesse sentido para Castells o movimento trabalhista e os partidos poliacuteticos encontram-se ultrapassados como agentes autocircnomos de transformaccedilatildeo social 19 Tanto os movimentos tradicionalistas como o fundamentalismo religioso e os movimentos de auto-afirmaccedilatildeo nacionalista quanto os movimentos sociais ativistas contraacuterios agrave globalizaccedilatildeo como os ambientalistas pertencem a esta forma de identidade

100

Uma vez que para Castells o espaccedilo de fluxos constitui a nova forma espacial de

praacuteticas sociais que dominam e moldam a sociedade em rede tanto os lugares quanto o

poder tecircm suas loacutegicas e seus significados absorvidos na rede Agora o poder deixando de

concentrar-se nas instituiccedilotildees organizaccedilotildees ou mecanismos simboacutelicos de controle

apresenta-se inscrito nos coacutedigos culturais mediante os quais as pessoas e as instituiccedilotildees

representam a vida e tomam decisotildees inclusive poliacuteticas (CASTELLS 2006 p 424)

Giddens (2002) compreende o termo identidade como um termo essencialmente

moderno e que se refere a articulaccedilatildeo que o sujeito faz de diversas forccedilas presentes na

sociedade atual sociedade esta caracterizada pela pluralidade de escolha e pelo

individualismo exacerbado Pode-se entatildeo dizer que a identidade surge da negociaccedilatildeo com o

contexto sendo necessaacuterio o entendimento da loacutegica deste contexto ou seja a compreensatildeo

da concepccedilatildeo de mundo atual no qual se estatildeo inseridos

Essa discussatildeo teve iniacutecio com o reconhecimento de que em uma sociedade

tradicional a identidade social dos indiviacuteduos eacute limitada pela proacutepria tradiccedilatildeo pelo

parentesco pela localidade A modernidade caracterizada como uma ordem poacutes-tradicional

ao romper com as praacuteticas e preceitos preestabelecidos enfatiza o cultivo das potencialidades

individuais oferecendo ao indiviacuteduo uma identidade moacutevel mutaacutevel

Eacute nesse sentido que na modernidade o Eu torna-se cada vez mais um projeto

reflexivo pois aonde natildeo existe mais a referecircncia da tradiccedilatildeo descortina-se para o indiviacuteduo

um mundo de diversidade de possibilidades abertas de escolhas O indiviacuteduo passa a ser

responsaacutevel por si mesmo e o planejamento estrateacutegico da vida assume especial importacircncia

Para De Grazia (2003) a nova forma de ver a cidade de forma participativa foca na

desigualdade de investimentos que haacute entre os seus diversos locais pois as obras de

infraestrutura equipamentos urbanos e serviccedilos estatildeo localizados onde haacute maior concentraccedilatildeo

de capital decisotildees e atividades comerciais desprezando portanto outros locais da cidade

principalmente os locais de moradia da populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo que satildeo as

periferias baixadas favelas morros etc

A cidade eacute portanto palco da luta entre o capital e o trabalho Esta se daacute em torno do

ambiente construiacutedo e vivido o qual tem interesses conflitantes e que estabelecem um campo

de poder o capital imobiliaacuterio os proprietaacuterios da terra a induacutestria da construccedilatildeo o Estado e

a forccedila de trabalho conforme discutido no capiacutetulo anterior

O campo de poder (que natildeo deve ser confundido com o campo poliacutetico) natildeo eacute um campo como os outros ele eacute espaccedilo de relaccedilotildees de forccedilas entre os

101

diferentes tipos de capital ou mais precisamente entre os agentes suficientemente providos de um dos diferentes tipos de capital para poderem dominar o campo correspondente e cujas lutas se intensificam sempre que o valor relativo dos diferentes tipos de capital eacute posto em questatildeo isto eacute especialmente quando os equiliacutebrios estabelecidos no interior do campo entre instacircncias especificamente encarregadas da reproduccedilatildeo do campo do poder (BOURDIEU 2001 p 52)

De acordo com Netto (2001) Marx identificou que as relaccedilotildees sociais dentro de

cada sociedade baseiam-se a partir do modo de produccedilatildeo existente e que a histoacuteria de todas

as sociedades sempre esteve fundada na luta de classes esta anaacutelise foi feita por meio do

materialismo histoacuterico dialeacutetico

A cidade passa a ser entatildeo compreendida como a reproduccedilatildeo das divisotildees sociais

natildeo uniforme pois na medida em que se reproduz cria e recria novos espaccedilos consolida

velhos bairros e constituem novos assumindo formas diversas muacuteltiplas interligadas com a

dinacircmica dos atores sociais

Destarte o campo das lutas em torno da habitaccedilatildeo e das condiccedilotildees de vida urbana

em geral ao mesmo tempo em que eacute um espaccedilo da luta de classes eacute tambeacutem espaccedilo

privilegiado de cooptaccedilatildeo e do exerciacutecio da hegemonia burguesa expressando as contradiccedilotildees

do modo de produccedilatildeo capitalista Aleacutem disso expressa a relevacircncia cultural dos grupos

sociais e manifesta as diversas formas de apreender o espaccedilo ou seja a forma como um grupo

apreende o espaccedilo natildeo quer dizer que este espaccedilo tenha o mesmo significado para todos os

grupos

Para tanto eacute necessaacuterio entender algumas discussotildees que permeiam a produccedilatildeo do

espaccedilo urbano e da moradia como o seu papel como produto das relaccedilotildees sociais a

influecircncia da dimensatildeo espacial na produccedilatildeo da moradia entre outros Assim nos capiacutetulos

seguintes seratildeo apresentados elementos dessa poliacutetica em especial a habitacional

implementada no Brasil que se daacute pelo resultado das relaccedilotildees e mobilizaccedilotildees estabelecidas

entre os agentes pelas instituiccedilotildees que podem facilitar ou impedir o acesso dos agentes aos

espaccedilos decisoacuterios pelo processo de decisatildeo no qual se estabelecem coalizotildees e escolhas e

tambeacutem pelos produtos da poliacutetica resultante Assim ao se falar de poliacutetica fala-se em grande

medida de representaccedilatildeo de interesses e por conseguinte de formulaccedilatildeo das poliacuteticas que

implementam ou bloqueiam tais interesses

102

3 POLIacuteTICA HABITACIONAL NO BRASIL E NA AMAZOcircNIA

31 TRAJETOacuteRIA DA POLIacuteTICA HABITACIONAL

Para se entender a problemaacutetica habitacional torna-se fundamental relacionaacute-la com a

sociedade em que se vive e com suas dinacircmicas estruturadas socialmente Portanto eacute

necessaacuterio se reportar agraves relaccedilotildees sociais baacutesicas e agrave organizaccedilatildeo do sistema produtivo pois

no modo de produccedilatildeo capitalista no qual a produccedilatildeo eacute socializada e a apropriaccedilatildeo eacute privada e

concentradora tem-se uma complexa divisatildeo social do trabalho caracterizando um sistema

social estratificado

Nesse sentido pode-se dizer que habitar eacute uma necessidade baacutesica de todo ser

humano independente de qual seja o tipo de sociedade Dessa forma vale ressaltar que a

habitaccedilatildeo eacute compreendida nesse trabalho como algo aleacutem da casa do abrigo do ambiente

fiacutesico mas a interaccedilatildeo desta com a cidade com o conjunto de seus equipamentos serviccedilos

espaccedilos puacuteblicos e lugar de reinvenccedilatildeo de praacuteticas e relaccedilotildees sociais Vale ressaltar que a

cidade concentra um conjunto de processos de trabalho e de produccedilatildeo de empregados

assalariados e do mercado informal cuja anaacutelise eacute essencial na compreensatildeo das diferenccedilas

entre as cidades

Entatildeo afirma-se que a habitaccedilatildeo tem um conteuacutedo poliacutetico social econocircmico e

espacial e possui diversas caracteriacutesticas e formas espaciais diferentes concretizando uma

produccedilatildeo diferenciada da cidade

A cidade capitalista possui condiccedilotildees gerais para a produccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo

e do trabalho evidenciando as contradiccedilotildees inerentes ao capitalismo principalmente nas

relaccedilotildees construiacutedas a partir da apropriaccedilatildeo privada dos bens socialmente produzidos

configurando uma divisatildeo social e territorial do trabalho conforme argumenta Lojkine (1981

p 16)

As formas de urbanizaccedilatildeo satildeo formas de divisatildeo social (e territorial) do trabalho elas satildeo o cerne da contradiccedilatildeo atual entre as novas exigecircncias do progresso teacutecnico

essencialmente em mateacuteria de formaccedilatildeo ampliada das forccedilas produtivas humanas

e as leis de acumulaccedilatildeo de capital

Sendo assim o espaccedilo urbano construiacutedo expressa o modo de vida capitalista e a luta

de classes sociais que compotildeem sua estrutura social uma vez que esse espaccedilo se redefine a

partir da crescente articulaccedilatildeo e complexidade do processo produtivo o qual possibilita o

desenvolvimento dos meios de distribuiccedilatildeo circulaccedilatildeo e troca de mercadorias Dessa maneira

103

o espaccedilo urbano torna-se tambeacutem a proacutepria mercadoria uma vez que dele se obteacutem mateacuteria

prima e forccedila de trabalho

Com o surgimento da faacutebrica enquanto unidade produtiva e a complexidade da divisatildeo teacutecnica e social do trabalho daiacute decorrente o urbano se redefine ante as exigecircncias de concentraccedilatildeo dos meios de produccedilatildeo e da forccedila de trabalho num soacute lugar e consequumlentemente a forccedila de trabalho passa a exigir certas condiccedilotildees para sua reproduccedilatildeo tais como habitaccedilatildeo alimentaccedilatildeo transporte energia assistecircncia agrave sauacutede lazer comunicaccedilotildees saneamento em geral etc Por outro lado a faacutebrica enquanto unidade de acumulaccedilatildeo de capital tambeacutem coloca uma seacuterie de outras condiccedilotildees que satildeo necessaacuterias para sua reproduccedilatildeo tais como transporte de mateacuterias-primas energia comunicaccedilatildeo saneamento unidades de apoio agrave produccedilatildeo como escritoacuterios bancos transporte para escoamento da produccedilatildeo unidades de distribuiccedilatildeo e comercializaccedilatildeo etc (SILVA 1989 p 23)

Para Blay (apud SILVA 1989 p 20) a mercadoria moradia eacute entendida dentro da

teoria das necessidades sociais em um sistema econocircmico regido livremente pela procura e

oferta e que suscita uma problemaacutetica chave se de um lado existe grande oferta da

mercadoria moradia por outro grande parcela da populaccedilatildeo natildeo dispotildee de renda suficiente

para adquiri-la pois as habitaccedilotildees apresentam um elevado valor agregado e com isso a

populaccedilatildeo de renda baixa natildeo possui condiccedilotildees de comprar ou alugar uma casa com

condiccedilotildees miacutenimas de habitabilidade

Esse cenaacuterio acarreta no processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial que se daacute a partir da

complexificaccedilatildeo e divisatildeo social do trabalho gerada pelas poliacuteticas puacuteblicas seletivas do

Estado e pela auto-segregaccedilatildeo da classe de maior poder aquisitivo que se isola em

condomiacutenios e loteamentos fechados Vale ressaltar que esses locais natildeo satildeo mais exclusivos

das classes mais abastarda mas estendendo-se agraves outras camadas da sociedade (funcionaacuterios

puacuteblicos profissionais liberais comerciantes entre outros) que adquirem seus lotes em aacutereas

muradas dotando de seguranccedila particular (cercas eleacutetricas vigilante portotildees eletrocircnicos entre

outros) sob o pagamento de uma taxa (condomiacutenio)

Diante disso uma grande parcela da populaccedilatildeo natildeo possui local para morar quando

natildeo moram em locais de difiacutecil acesso com condiccedilotildees precaacuterias transformando a questatildeo da

moradia em um problema social e urbaniacutestico pela inadequabilidade habitacional conforme

fotografia 1

Eacute importante enfatizar que podem ser levadas em consideraccedilatildeo quando se pensa na

questatildeo da moradia as diferentes classes e fraccedilotildees de classes que estatildeo envolvidas em uma

luta simboacutelica na produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da cidade as quais objetivam a definiccedilatildeo do mundo

104

social em conformidade com seus interesses formando um campo das posiccedilotildees sociais

passando a integrar a paisagem urbana do capital como parte necessaacuteria de um espaccedilo social

complexo e repleto de contradiccedilotildees

Fotografia 1

Moradia com condiccedilotildees precaacuterias (Canal da Quintino

Beleacutem-PA)

Fonte Beleacutem (2007)

Sendo assim a questatildeo habitacional brasileira eacute um fenocircmeno que se insere no

desenvolvimento do sistema capitalista e sempre apresentou um cunho marcadamente

excludente refletindo as diversas fases da relaccedilatildeo entre o Estado e as fraccedilotildees de classes

A poliacutetica habitacional como poliacutetica puacuteblica voltada agrave efetivaccedilatildeo do direito agrave

moradia foi compreendida inicialmente de acordo com Frey (1996) como uma poliacutetica de

bem estar e gradativamente mudou do discurso universalista dos direitos fundamentais para

a loacutegica dos mercados articulando-se de maneira inovadora com os novos padrotildees de

acumulaccedilatildeo capitalista

Para o autor na fase de expansatildeo material do sistema capitalista no seacuteculo passado o

fundo puacuteblico constituiacutea-se na principal fonte de financiamento da poliacutetica habitacional No

Estado de Bem-Estar Social o direito agrave moradia era um dos elementos que faziam parte dos

custos da reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho e a ideologia da casa proacutepria era uma forma de

controle social aleacutem disso a intervenccedilatildeo estatal foi marcada por uma poliacutetica puacuteblica

105

centralizada isto eacute defendia a universalizaccedilatildeo da poliacutetica sem levar em consideraccedilatildeo as

especificidades de cada regiatildeo

De acordo com Bonduki (1994 p 26) o primeiro evento desencadeador do problema

habitacional no Brasil foi a passagem do escravismo para o trabalho livre no qual o preccedilo da

terra se definiu originalmente como uma forma de impedir no momento histoacuterico da ascensatildeo

do capitalismo o acesso do trabalhador agrave terra Essa constataccedilatildeo surge a partir do

entendimento de que a terra urbana e suas construccedilotildees satildeo mercadorias na economia

capitalista possuindo um valor de uso e um valor de troca

No contexto histoacuterico da economia cafeeira as moradias alugadas nos principais

centros urbanos eram mais utilizadas como a forma predominante de habitaccedilatildeo popular Ateacute

os anos 1920 os centros urbanos reuniam um grande contingente de trabalhadores que

moravam em locais alugados em geral em corticcedilos20 Os outros espaccedilos como as vilas21

eram destinados aos trabalhadores que possuiacuteam uma qualificaccedilatildeo e a classe meacutedia

O Estado tinha uma atuaccedilatildeo limitada pois incentivava a produccedilatildeo privada de

moradias para os trabalhadores de baixo poder aquisitivo geralmente voltadas para a locaccedilatildeo

aleacutem de atuar de forma repressiva em situaccedilatildeo de insalubridade aplicando a lei de

higienizaccedilatildeo (produccedilatildeo de casas higiecircnicas) e de restriccedilatildeo aos corticcedilos por forccedila policial

(BONDUKI 1994)

Assim a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de

saneamento e embelezamento que expulsaram a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo para as

afastadas do centro das cidades como soluccedilatildeo para eliminar epidemias e higienizar os

espaccedilos

Ao mesmo tempo obras paisagiacutesticas eram realizadas nas aacutereas centrais para

favorecer a consolidaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio capitalista que estava surgindo Os

problemas urbanos os males e distuacuterbios sociais eram tratados como responsabilidade do

excessivo tamanho e densidade populacional das cidades e natildeo como fruto do modelo de

industrializaccedilatildeo que estava em desenvolvimento

O fator que garantia a construccedilatildeo das diversas formas de moradias de aluguel eacute que

esse negoacutecio se tornou importante investimento para os diversos agentes econocircmicos que

naquela eacutepoca dispunham de capital e de pequenas poupanccedilas

20 Corticcedilo denominaccedilatildeo geneacuterica da habitaccedilatildeo coletiva que incluiacutea desde uma seacuterie de cocircmodos ao longo de um corredor ou em volta de um paacutetio e dormitoacuterios improvisados no fundo de um bar ou armazeacutem ateacute as casas de cocircmodos e respectivos porotildees (BONDUKI 1986) 21 As vilas se constituiacuteam em conjuntos de pequenas casas unifamiliares germinadas (SILVA 1989)

106

Vivia-se a fase aacuteurea da economia cafeeira e Satildeo Paulo era o centro comercial e bancaacuterio que geria o cafeacute A induacutestria embora jaacute fosse significativa e reunisse um largo contingente de trabalhadores era ainda incipiente e instaacutevel marcada por crises constantes subordinando-se ao capital cafeeiro [] Num periacuteodo em que a inflaccedilatildeo era insignificante o investimento em casas operaacuterias garantia juros de 12 a 15 ao ano considerado na eacutepoca um excelente rendimento aleacutem de possibilitar o usufruto da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria (BONDUKI 1994 138-139)

Com o processo de industrializaccedilatildeo que intensificou a urbanizaccedilatildeo das cidades uma

seacuterie de transformaccedilotildees na estrutura urbana comeccedilaram a surgir na estrutura industrial e na

forma de atuaccedilatildeo do poder puacuteblico provocando o crescimento econocircmico das cidades

modificaccedilotildees no padratildeo de habitaccedilatildeo popular e a concentraccedilatildeo desordenada de pessoas na

busca de produtos e serviccedilos nos corticcedilos favelas baixadas com precaacuterias condiccedilotildees de

moradia

A explosatildeo demograacutefica provocou um excedente da populaccedilatildeo que natildeo encontra emprego suficiente na zona rural Assim o pessoal dessa zona vai procurar trabalho em outros lugares seja nas regiotildees de plantaccedilotildees onde se tornam assalariados agriacutecolas seja diretamente nas cidades (SANTOS 1991 p 24)

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (2000) a populaccedilatildeo

urbana brasileira em 1940 era de 3124 Em 1950 esse quadro passou para 3616

conforme apontam os dados da tabela 1 demonstrando um aumento de aproximadamente

5 naquele periacuteodo

Tabela 1

Populaccedilatildeo residente por situaccedilatildeo do domicilio (1940-1970) no Brasil Ano Total Urbana Rural

1940 41236315 12880182 3124 28356133 6876 1950 51914397 18782891 3616 33161506 6384 1960 70070457 31303034 4468 38767423 5532 1970 93139037 52084984 55 93 41054053 4407

Fonte IBGE Censo Demograacutefico (2001)

Nota-se que nas deacutecadas seguintes (1960 e 1970) houve o aumento da taxa de

populaccedilatildeo residente nos centros urbanos saltando para 55 93 no ano de 1970 Pode-se

dizer que isso se deu em virtude do processo de industrializaccedilatildeo ocorrido nas deacutecadas de

1940 a 1980 as quais foram marcadas pelo intenso crescimento do mercado com elevadas

107

taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) acarretando em uma complexa divisatildeo

social do trabalho Aleacutem desses elementos ocorreu um acelerado processo de urbanizaccedilatildeo

com grandes deslocamentos populacionais originando alteraccedilotildees profundas na estrutura

demograacutefica

Esse provocou tambeacutem uma grande retirada da populaccedilatildeo pobre das aacutereas de

interesses econocircmicos e fez com que esta se deslocasse para as aacutereas sem infraestrutura

agravando ainda mais o quadro de pobreza Em contrapartida as fraccedilotildees de classes com maior

poder aquisitivo pressionavam o Estado a reorganizar o espaccedilo urbano tendo em vista a

fluidez das mercadorias neste espaccedilo e a higiene do mesmo uma vez que os corticcedilos locais

onde os trabalhadores viviam estavam localizados geograficamente proacuteximos das classes

dominantes e eram considerados locais de focos de epidemias

Assim cabe destacar que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual pois esse espaccedilo eacute

fruto de uma produccedilatildeo capitalista que se produz desigualmente e eacute materializada pela divisatildeo

do trabalho e se sustenta a partir das relaccedilotildees simboacutelicas estabelecidas

Estava claro que diante do novo padratildeo de desenvolvimento econocircmico que se esboccedilava e do crescimento raacutepido da populaccedilatildeo o corticcedilo passaria a representar um perigo para a sauacutede puacuteblica seja pelas condiccedilotildees de insalubridade que apresentava seja por expressar uma imagem contrastante com a faacutebrica enquanto unidade produtiva que se firmava Dessa forma natildeo era compatiacutevel com o novo modelo econocircmico que necessitava desobstruir a aacuterea central da cidade para a circulaccedilatildeo do capital e localizaccedilatildeo da classe dominante emergente forccedilando o estabelecimento de uma poliacutetica de segregaccedilatildeo dos setores populares acentuando-se principalmente a partir da deacutecada de 30 e 40 com o amadurecimento do modelo econocircmico de caraacuteter urbano-industrial (SILVA 1989 p 36)

Uma das medidas intervencionistas adotadas pelo Estado poacutes-1930 foi a criaccedilatildeo e

regulamentaccedilatildeo das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensotildees (IAPs)22 em

1937 Com o agravamento progressivo das condiccedilotildees habitacionais nos centros urbanos os

trabalhadores pressionaram o Estado para que este atendesse suas reivindicaccedilotildees

Assim os IAPs identificados como vias institucionais responsaacuteveis pelo

atendimento das necessidades dos trabalhadores na questatildeo da moradia assumiram esta

atribuiccedilatildeo objetivando garantir a legitimidade do poder estatal

22 Os IAPs tiveram fundamental importacircncia na provisatildeo do creacutedito imobiliaacuterio uma vez que deixaram de ter exclusivamente a atribuiccedilatildeo de previdecircncia social e assistecircncia meacutedia para incorporarem a funccedilatildeo de provedor de moradia

108

Contudo esta foi a primeira intervenccedilatildeo concreta estatal no setor da habitaccedilatildeo

popular embora tenha obedecido a criteacuterios de clientelismo poliacutetico na distribuiccedilatildeo das

poucas unidades que foram produzidas

Eacute importante destacar que em 1923 foram criadas as Caixas de Aposentadoria

constituiacutedas pelos empregados de uma empresa que organizaram uma caixa comum de

assistecircncia com fundos especiacuteficos objetivando financiar a construccedilatildeo de habitaccedilotildees aos seus

associados Entretanto suas accedilotildees somente se concretizaram em 1930 (SILVA 1989)

Segundo Bonduki (1997) a Fundaccedilatildeo da Casa Popular (FCP) criada em 01 de maio

de 1946 constituiu-se no primeiro oacutergatildeo nacional direcionado agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

populares e estava vinculada ao Ministeacuterio do Trabalho Induacutestria e Comeacutercio A escolha do

dia do trabalhador para fundar a FCP foi considerada reveladora ao alcance poliacutetico que se

pretendia com tal medida pois foi uma forma do governo enfrentar os problemas de habitaccedilatildeo

das faixas de trabalhadores que recebiam baixos salaacuterios

A FCP visava propiciar a construccedilatildeo ou aquisiccedilatildeo da casa proacutepria em zona urbana

ou rural para as classes populares aleacutem de coordenar as accedilotildees dos IAPs e tinha como fonte

de recursos a cobranccedila de taxas sobre as transaccedilotildees imobiliaacuterias Poreacutem esses dois oacutergatildeos

(IAPs e FCP) foram extintos com a criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) em

1964

Segundo Rodrigues (2001) de 1937 a 1964 os IAPs construiacuteram 279 conjuntos em

um total de 47789 moradias e financiadas 72236 habitaccedilotildees Embora os nuacutemeros sejam

modestos demonstram uma nova forma de accedilatildeo do Estado ou seja como o Estado interfere

diretamente na produccedilatildeo da habitaccedilatildeo Jaacute a FCP de 1946 a 1964 construiu 19 mil unidades

pouco mais de 900 unidades por ano concentradas principalmente na regiatildeo sudeste do paiacutes

Estes resultados demonstram que a FCP limitou-se a construir em locais que os recursos

permitiam e os interesses econocircmicos determinavam

A deacutecada de 1940 foi marcada por uma grave crise de habitaccedilatildeo pois esta crise natildeo

se deu pela falta de moradias higiecircnicas e salubres a preccedilos acessiacuteveis que os trabalhadores

poderiam alugar mas pela carecircncia absoluta de moradias

Essa crise foi estrutural embora agravada por fatores conjunturais provocados pela

guerra Bonduki (1994) destaca vaacuterios fatores que explicam esse fenocircmeno tais como a

proacutepria dinacircmica do desenvolvimento capitalista no Brasil que cria novas e mais atraentes

formas de investimento do capital fazendo a rentabilidade crescer as altas taxas de inflaccedilatildeo

levam os investidores a perderem interesse em investir no aluguel de moradias que em outros

periacuteodos eram investimentos rentaacuteveis e a conjuntura da guerra provoca no mercado

109

imobiliaacuterio a aceleraccedilatildeo da especulaccedilatildeo e os imoacuteveis urbanos sofrem uma valorizaccedilatildeo sem

precedentes

A Lei do Inquilinato agravou ainda mais a situaccedilatildeo uma vez que congelou os preccedilos

dos alugueacuteis em 1942 e se configurou em uma intervenccedilatildeo direta do governo de Getuacutelio

Vargas na produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia ou seja o Estado passou a intervir nos

diversos setores da economia operando na fixaccedilatildeo de preccedilos na distribuiccedilatildeo dos ganhos e

perdas entre as diversas fraccedilotildees de classes e na regulamentaccedilatildeo da reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho

Os aumentos elevados do valor dos alugueacuteis que subiam em magnitudes superiores

aos salaacuterios dos trabalhadores visavam desestimular a construccedilatildeo de moradias para alugar e

instigar a construccedilatildeo de moradias para venda que em geral natildeo eram acessiacuteveis aos

trabalhadores de menor poder aquisitivo levando-os a recorrer agrave autoconstruccedilatildeo e agrave

favelizaccedilatildeo (SILVA 1989)

Atraveacutes da autoconstruccedilatildeo que a maioria da populaccedilatildeo trabalhadora resolve seu problema de moradia principalmente nas grandes cidades brasileira e de modo geral na Ameacuterica Latina A construccedilatildeo de casas se prolonga por muitos anos absorvendo a maior parte do tempo livre da famiacutelia A construccedilatildeo eacute realizada nos fins-de-semana e em parte das feacuterias [] A autoconstruccedilatildeo eacute executada nos periacuteodos que deveriam ser destinados ao descanso do trabalhador para repor as energias mas na verdade descansa-se trabalhando carregando pedras Este eacute o lema do autoconstrutor por vaacuterios anos [] Em linhas gerais a autoconstruccedilatildeo eacute um processo de trabalho extremamente penosos com elevados custos individuais que caem sobre os setores mais pauperizados Haacute um alongamento da jornada de trabalho que repercute na acumulaccedilatildeo de capital jaacute que permite pagar salaacuterios mais baixos e ao mesmo tempo desgasta rapidamente a capacidade produtiva da forccedila de trabalho sem o miacutenimo descanso necessaacuterio (RODRIGUES 2001 p 30-32)

De acordo com Durham (2000 apud RODRIGUES 2001) eacute comum as famiacutelias de

menor poder aquisitivo construir suas casas com ajuda muacutetua Muitas vezes os filhos se casam

e vatildeo anexando cocircmodos agrave construccedilatildeo original caracterizando a coabitaccedilatildeo A autoconstruccedilatildeo

eacute um processo aacuterduo que requer o esforccedilo de toda a famiacutelia surgindo como um meio de se

obter um imoacutevel Esta alternativa foi utilizada pelos governos como opccedilatildeo viaacutevel e de baixo

custo para minimizar o deacuteficit habitacional mas eacute uma proposta questionaacutevel tanto pelo

sacrifiacutecio imposto pela situaccedilatildeo quanto pelo aspecto caoacutetico das periferias dos grandes e

meacutedios centros urbanos

110

Aleacutem disso Bourdieu (2001) enfatiza que existem outras racionalidades aleacutem da

racionalidade econocircmica e que neste caso podem ser enquadradas tanto para os laccedilos sociais

de uma favela quanto para a autoconstruccedilatildeo na qual famiacutelias se unem para conseguir a casa

proacutepria Dessa maneira a construccedilatildeo de uma moradia representa uma troca de daacutedivas entre

os grupos sociais familiares ou amigos que se unem nesse processo

A partir da deacutecada de 1950 seguiu-se um decliacutenio das construccedilotildees relacionadas agrave

viabilidade econocircmica financeira a inflaccedilatildeo tornava irrisoacuterias as prestaccedilotildees fixas pagas nos

planos de financiamento e natildeo possibilitava novos investimentos o congelamento dos

alugueacuteis a crise da previdecircncia com o esvaziamento progressivo das reservas do sistema

previdenciaacuterio (RODRIGUES 2001)

Silva (1989) argumenta que no periacuteodo do segundo governo Vargas (1951-1954)

houve uma forte pressatildeo dos trabalhadores por melhores salaacuterios ficando a questatildeo

habitacional renegada a segundo plano uma vez que as poliacuteticas implementadas demonstram

a pouca importacircncia que foi dada a essa problemaacutetica

No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) com os grandes projetos

industriais em especial os automobiliacutesticos sob a loacutegica da integralizaccedilatildeo do territoacuterio com a

abertura de estradas para circulaccedilatildeo de mercadorias e comunicaccedilatildeo a urbanizaccedilatildeo eacute acelerada

e marcada pelo desenvolvimento econocircmico aleacutem disso intensificaram as desigualdades

regionais do Paiacutes pois as regiotildees mais distantes do centro financeiro como os estados da

regiatildeo Amazocircnica sofreram menor implementaccedilatildeo de instrumentos urbaniacutesticos

aprofundando a divisatildeo social e territorial do trabalho Em relaccedilatildeo a questatildeo habitacional as

accedilotildees concretas natildeo foram executadas o que agravou ainda mais as condiccedilotildees de vida da

populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Nessa conjuntura de efervescecircncia poliacutetica e de decliacutenio econocircmico a questatildeo habitacional para o governo de Joatildeo Goulart foi contemplada quase tatildeo-somente pelo planejamento governamental A distacircncia entre as necessidades sociais e a falta de recursos para sanar a carecircncia de habitaccedilotildees populares fizeram com que o quadro se agravasse dado o intenso processo de urbanizaccedilatildeo a que as grandes cidades vinham se submetendo (SILVA 1989 p 46)

Vale destacar no quadro 1 a relaccedilatildeo das principais instituiccedilotildees habitacionais ateacute a

criaccedilatildeo do Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) suas caracteriacutesticas e os respectivos

governos

111

Quadro 1

Relaccedilatildeo das Instituiccedilotildees Habitacionais no Brasil periacuteodo de 1930 a 1968

Instituiccedilotildees Caracteriacutestica Governo Instituto de Aposentadorias

e Pensotildees (IAPs) O Brasil deu os primeiros passos intervindo na oferta de moradia

Getuacutelio Vargas (1930-1945)

Fundaccedilatildeo da Casa Proacutepria (FCP)

Visava atender a populaccedilatildeo que natildeo participava do mercado formal

Eurico Gaspar Dutra (1946-1951)

Plano de Assistecircncia Habitacional (PAH)

A principal inovaccedilatildeo consistia na proporccedilatildeo entre a prestaccedilatildeo do financiamento e o salaacuterio miacutenimo

Juscelino Kubitschek (1956-1961)

Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH)

Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo (SFH)

Tinham como objetivos coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos puacuteblicos e orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria eliminaccedilatildeo das favelas

Castello Branco (1964-1967)

Fonte BRASIL (2004)

A partir de meados dos anos de 1960 eacute possiacutevel perceber uma atuaccedilatildeo mais efetiva

do Estado sobre o espaccedilo urbano com a criaccedilatildeo de todo o aparato institucional voltado para a

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia

Por meio do projeto desenvolvimentista a intervenccedilatildeo estatal expandiu a induacutestria e

construiu uma sociedade de consumo predominantemente urbana provocando a dispersatildeo

das cidades Aleacutem da implantaccedilatildeo de hidreleacutetricas portos aeroportos dutos e canais

apoiados em financiamentos externos a expansatildeo da rede de energia de estradas e de

comunicaccedilatildeo foram um meio de eliminar as barreiras agrave circulaccedilatildeo de capital e as poliacuteticas

urbanas tinham vultosos investimentos e deu respaldo agrave urbanizaccedilatildeo como estrateacutegia de

desenvolvimento do territoacuterio

Em 1964 foi criado o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) por meio da Lei nordm

4380 de 21 de agosto de 1964 que institui tambeacutem o Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo

(SFH) com a grande inovaccedilatildeo da correccedilatildeo monetaacuteria nos contratos imobiliaacuterios aleacutem das

Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) as Letras Imobiliaacuterias (LI) e o Serviccedilo Federal de

Habitaccedilatildeo e Urbanismo (Serfhau) Este tinha por meta baacutesica promover a elaboraccedilatildeo e a

implantaccedilatildeo de planos de desenvolvimento local e integrado de acordo com o planejamento

nacional e regional e ainda colaborar com os governos municipais na execuccedilatildeo do

planejamento local e integrado inclusive na organizaccedilatildeo de serviccedilos de natureza municipal

assistindo-os em assuntos de seu interesse e realizar estudos relacionados com as migraccedilotildees

internas (BRASIL 2004)

Os objetivos do BNH e SFH eram de coordenar a poliacutetica habitacional dos oacutergatildeos

puacuteblicos e o financiamento para o saneamento difundir a propriedade residencial entre as

112

classes de menor poder aquisitivo reduzir o preccedilo da habitaccedilatildeo pelo aumento da oferta da

economia de escala na produccedilatildeo proporcionar melhorias sanitaacuterias agrave populaccedilatildeo redistribuir

regionalmente os investimentos aumentar a eficiecircncia da aplicaccedilatildeo dos recursos estaduais e

municipais orientar a iniciativa privada estimulando a construccedilatildeo de moradias populares

financiar a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria propiciando a melhoria do padratildeo habitacional e do

ambiente eliminar as favelas aumentar o investimento da induacutestria de construccedilatildeo civil criar

poacutelos de desenvolvimento para melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas rurais e estimular a

poupanccedila privada e o investimento (RODRIGUES 2001)

Em 1968 foi criado o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS) e o Financiamento

de Saneamento (FINANSA) com subprogramas voltados para a implantaccedilatildeo ou melhoria de

sistemas de abastecimento de aacutegua de esgotos ou de drenagem e poluiccedilatildeo hiacutedrica

De acordo com Ministeacuterio das Cidades (2004) os recursos para o SFH seriam

oriundos principalmente de uma contribuiccedilatildeo compulsoacuteria de empresaacuterios e trabalhadores

do Fundo de Garantia por Tempo de Serviccedilo (FGTS)23 voltado para a produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

popular do Sistema Brasileiro de Poupanccedila e Empreacutestimo (SBPE)24 destinado a classe

meacutedia e dos lucros dos reembolsos de creacuteditos concedidos Este novo sistema implicou em

um processo de centralizaccedilatildeo o qual eliminou a praacutetica de construccedilatildeo de habitaccedilatildeo popular

por parte de instituiccedilotildees privadas e puacuteblicas como por exemplo sindicatos e institutos

previdenciaacuterios que constituiacuteam formas de alternativas de produccedilatildeo de habitaccedilatildeo

Esse novo modelo da poliacutetica habitacional eacute implementado como um conjunto de

caracteriacutesticas que deixaram marcas importantes na estrutura institucional e na concepccedilatildeo

dominante de poliacutetica habitacional nos anos que se seguiram pois passou a apresentar um

caraacuteter mais amplo e global emergindo com o propoacutesito de diminuir o deacuteficit habitacional e

gerar novos empregos com o aumento de construccedilotildees legitimando assim o poder estatal e

criando condiccedilotildees para reproduccedilatildeo do capitalismo

Como a induacutestria de construccedilatildeo civil utiliza matildeo-de-obra em larga escala incentivar a induacutestria de construccedilatildeo eacute tambeacutem tentar atenuar a crise econocircmica Ao mesmo tempo difunde mais a ideologia da casa proacutepria contribui para a estabilidade social e torna os proprietaacuterios aliados da ordem A poliacutetica habitacional assume um modelo empresarial num momento em que eacute crucial para o novo regime dar provas de que eacute capaz de

23 O FGTS foi criado por meio da Lei nordm 5107 de 14 de setembro de 1966 e eacute composto por contas vinculadas em nome dos trabalhadores nas quais as empresas depositam mensalmente valor equivalente a 85 das remuneraccedilotildees que lhes satildeo pagas ou devidas (BRASIL 2004 p 22) 24 SBPE era constituiacutedo pelas Caixas Econocircmicas Federal e Estaduais pelas Sociedades de Creacutedito Imobiliaacuterio (SCI) e pelas Associaccedilotildees de Poupanccedilas e Empreacutestimos (BRASIL 2004 p 13)

113

atacar problemas sociais resolvendo a questatildeo da moradia Eacute preciso ocupar os vazios deixados com o fechamento poliacutetico (RODRIGUES 2001 p 57)

Com a criaccedilatildeo do BNH surgiram em todo o Paiacutes oacutergatildeos com a finalidade de

executar a poliacutetica habitacional como as Companhias de Habitaccedilatildeo (Cohab) no Paraacute25

Amazonas e Maranhatildeo26 que tinham como finalidade estudar as questotildees relacionadas agrave

habitaccedilatildeo de interesse social e executar essas poliacuteticas voltadas agraves famiacutelias de menor poder

aquisitivo

As Cohabs e outros oacutergatildeos semelhantes surgiram com o objetivo de apoiarem o SFH

executando o papel de agentes financeiros e promotores estabelecendo-se na qualidade de

sociedades de economia mista com capital originaacuterio constituiacutedo majoritariamente por

recursos do poder puacuteblico

A criaccedilatildeo dos oacutergatildeos de gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional tanto no plano

federal quanto estadual eacute um claro sinal da importacircncia da poliacutetica urbana na estrateacutegia do

regime militar para o enfrentamento da questatildeo social que se agudizava nas cidades

brasileiras Embora o BNH e as Cohabs tenham surgido com um discurso que enfatizava o

caraacuteter social e o atendimento prioritaacuterio agraves famiacutelias de menor poder aquisitivo na praacutetica

esses oacutergatildeos desenvolveram poliacuteticas que acentuaram as desigualdades sociais e a segregaccedilatildeo

do espaccedilo urbano

Para Maricato (1996) a accedilatildeo do BNH natildeo se limitou apenas agrave habitaccedilatildeo pois acabou

ampliando significativamente suas intervenccedilotildees Passou a atuar no setor de desenvolvimento

urbano sendo considerado como um dos mais expressivos agentes financeiros do processo de

desenvolvimento urbano coordenando a poliacutetica habitacional e o financiamento para o

saneamento Esse banco financiou obras de infraestrutura urbana melhorou o sistema viaacuterio e

pavimentou ruas das cidades bem como aperfeiccediloou a rede de energia eleacutetrica de transportes

e de comunicaccedilatildeo incentivou a educaccedilatildeo a cultura e o desenvolvimento da induacutestria da

construccedilatildeo civil melhorou os serviccedilos puacuteblicos financiou planos e estudos para elaboraccedilatildeo

25 No Paraacute a Cohab instituiacuteda pela Lei Estadual nordm 3282 de 13 de abril de 1965 era uma empresa de economia mista e tinha as seguintes finalidades planejar e executar os programas de habitaccedilatildeo popular adquirir vender e urbanizar os terrenos a serem utilizados em programas habitacionais produzir e comercializar unidades habitacionais de interesse social exercer atividades de construccedilatildeo civil apoiar programas e projetos de desenvolvimento comunitaacuterio comprar e vender materiais de construccedilatildeo visando apoiar as metas do Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (ALVES 1997) 26 Em 1966 foi instituiacuteda a Companhia de Habitaccedilatildeo Popular do Maranhatildeo (Cohab-MA) por meio da Lei nordm 2367 com o objetivo de promover a execuccedilatildeo de projetos habitacionais destinados agrave recuperaccedilatildeo ou erradicaccedilatildeo de aglomerados de sub-habitaccedilotildees e tambeacutem ao atendimento da demanda de habitaccedilatildeo de baixo custo destinadas agraves famiacutelias de baixo poder aquisitivo (entre um e trecircs salaacuterios miacutenimos)

114

de legislaccedilatildeo e projetos dentre outros Pode-se entatildeo afirmar que o BNH foi um dos

importantes promotores das transformaccedilotildees urbanas no Brasil

De 1964 a 1984 foram financiadas pelo BNH 4 milhotildees e 369 mil unidades sendo 2

milhotildees e 557 mil na faixa de interesse social o que representou 585 do total de unidades

financiadas Na faixa do SBPE foram financiadas 1 milhatildeo e 812 mil unidades No entanto

quando se considera os valores de financiamentos verificou-se que a maior porcentagem de

recursos foi canalizada para a faixa do SBPE (RODRIGUES 2001)

Entretanto esse modelo da poliacutetica habitacional se transforma em um instrumento de

repressatildeo por meio dos programas de remoccedilatildeo de favelas e passa a atender a nova classe

meacutedia surgida no contexto do desenvolvimento capitalista jaacute que as poliacuteticas puacuteblicas

implementadas natildeo eram eficientes eou suficientes para atender toda demanda

Outro fator relevante eacute que a produccedilatildeo privada tambeacutem natildeo atendia a demanda

habitacional aleacutem do que seu custo era significativamente superior a realidade financeira de

muitos trabalhadores e o aumento populacional nas grandes cidades agravava ainda mais o

problema habitacional no Brasil

Naquela eacutepoca dizia-se que o deacuteficit habitacional seria de 15 milhotildees de unidades

um dado geneacuterico que tinha como objetivo convencer a opiniatildeo puacuteblica da necessidade de um

nuacutemero absurdo de novas construccedilotildees e de angariar recursos para o setor As accedilotildees eram

determinadas pela cuacutepula do poder central com pouca ou nenhuma participaccedilatildeo popular

Destarte a prioridade da poliacutetica habitacional se desloca com o decorrer do tempo

nos primeiros anos os investimentos privilegiam as classes populares para legitimar o novo

regime e no periacuteodo de 1970 a 1975 o segmento popular passa para segundo plano uma vez

que o BNH redimensionou sua clientela e promoveu uma mudanccedila no cenaacuterio das cidades

por meio das verticalizaccedilotildees das edificaccedilotildees voltadas para atender aos funcionaacuterios puacuteblicos

teacutecnicos de niacutevel superior e trabalhadores qualificados

Em 1971 foi lanccedilado o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo Popular (PLANHAP) com o

intuito de se reaproximar da produccedilatildeo de moradias para as classes de menor poder aquisitivo

Entretanto natildeo obteve ecircxito

Tambeacutem em 1971 foi criado o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA)

elaborado para regular e propiciar maior dinamismo aos planos e obras e o BNH passou a

funcionar como banco de segunda linha e eacute transformado em empresa puacuteblica Em 1972 foi

criado o Projeto Comunidade Urbana para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) Todos esses

planos programas e projetos demonstram a consolidaccedilatildeo de um modelo econocircmico

115

caracterizado pela modernizaccedilatildeo da economia pela concentraccedilatildeo da renda nas classes altas e

meacutedias e a marginalizaccedilatildeo das classes populares (MARICATO 1996 34)

Vale ressaltar que havia uma desarticulaccedilatildeo entre as accedilotildees dos oacutergatildeos responsaacuteveis

pela construccedilatildeo das casas populares e os encarregados dos serviccedilos urbanos bem como a

construccedilatildeo de grandes conjuntos como forma de baratear o custo das moradias geralmente

feitos em locais distantes e sem infraestrutura e por uacuteltimo o seu modelo financeiro que se

revelou inadequado em uma economia com processo inflacionaacuterio (BRASIL 2004 p10)

Bonduki (1994 p 320) acrescenta que quando o BNH buscou reduzir o custo da

moradia para tentar atender a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo ao inveacutes de alterar o

processo de gestatildeo e produccedilatildeo que encarecia o produto final apoiando iniciativas que a

populaccedilatildeo jaacute vinha promovendo optou por rebaixar a qualidade da construccedilatildeo e tamanho da

unidade financiando moradias cada vez menores mais precaacuterias e distantes

O Promorar instituiacutedo no final do ano de 1979 tinha como bandeira de luta a

urbanizaccedilatildeo das favelas objetivando

a) Erradicar as sub-habitaccedilotildees destituiacutedas de condiccedilotildees miacutenimas de serviccedilos conforto e salubridade especialmente as que compotildeem aglomerados conhecidos por palafitas mocambos e favelas b) Priorizar a erradicaccedilatildeo de sub-habitaccedilotildees componentes de aglomerados que por sua situaccedilatildeo crocircnica socialmente criacutetica devem merecer preferecircncia na programaccedilatildeo dos governos estaduais c) Propiciar a permanecircncia das populaccedilotildees beneficiadas nas aacutereas onde anteriormente se localizavam apoacutes a eliminaccedilatildeo das sub-habitaccedilotildees d) Promover a recuperaccedilatildeo de assentamentos de submoradias sujeitas a inundaccedilotildees mediante a utilizaccedilatildeo de sistemas de aterro (SILVA 1989 p 77)

Todavia Silva (1989 p 77) ressalta que o Promorar demonstrou-se autoritaacuterio no

desenvolvimento da poliacutetica habitacional uma vez que impocircs agrave populaccedilatildeo as aacutereas de

remanejamento sem dialogo com a mesma derrubou barracos sem oferecer nenhuma

indenizaccedilatildeo obrigou as famiacutelias a comprarem uma casa muitas vezes em piores condiccedilotildees

do que a que foi demolida

Foram executados vaacuterios programas habitacionais que determinavam a forma como a

populaccedilatildeo poderia habitar sem nem mesmo ouvi-la Esse processo baseado na centralizaccedilatildeo

das decisotildees resultou muitas vezes em programas inadequados ou ineficazes agrave situaccedilatildeo

social do paiacutes Extensos conjuntos habitacionais obrigavam famiacutelias diferentes a viverem da

mesma forma gerando problemas de poacutes-ocupaccedilatildeo Habitaccedilotildees sem nenhuma particularidade

116

esteacutetica ou funcional eram construiacutedas como uma saiacuteda para o deacuteficit habitacional como se

apenas a quantidade fosse solucionar o problema

No periacuteodo de 1970 a 1980 relacionados agrave crise econocircmica mundial que se agravou

no Brasil acarretando em uma profunda reestruturaccedilatildeo produtiva como privatizaccedilotildees

parcerias entre puacuteblico e privado desregulamentaccedilatildeo e liberalizaccedilatildeo do Estado os recursos do

BNH tornam-se mais escassos decorrendo principalmente da inadimplecircncia dos mutuaacuterios

que foram contemplados com a casa proacutepria do aumento do valor das prestaccedilotildees mensais e

da diminuiccedilatildeo dos recursos oriundos do FGTS mediante o aumento do desemprego e a

retirada dos fundos por parte dos trabalhadores que ficaram desempregados Isto afetou

fortemente o setor habitacional

O aumento da inadimplecircncia deveu-se basicamente a natildeo correspondecircncia entre os

criteacuterios de reajuste salarial das prestaccedilotildees jaacute que a partir de 1983 a poliacutetica salarial passou

a reajustar os salaacuterios por faixa salarial onde os setores de baixo salaacuterio eram corrigidos

pelos iacutendices inflacionaacuterios e aplicados aos setores meacutedios e altos um redutor de reajuste

Poreacutem o valor das prestaccedilotildees continuou a ser corrigido segundo criteacuterio uacutenico sempre em

iacutendices superiores ao aumento meacutedio dos salaacuterios dos mutuaacuterios de renda mais elevada

acarretando inevitavelmente na inadimplecircncia dos mutuaacuterios (CARVALHO 1991 p52)

Segundo Valenccedila (2001) a reduccedilatildeo nos investimentos do Governo Federal voltados

agrave habitaccedilatildeo associados agraves altas taxas de inadimplecircncia contribuiacuteram ainda mais para a crise

do SFH e aleacutem disso a crise econocircmica abalou fortemente a sustentaccedilatildeo do governo militar

abrindo espaccedilo para os movimentos sociais que reivindicavam a reabertura poliacutetica e

melhores condiccedilotildees sociais inclusive com relaccedilatildeo agraves questotildees urbanas e de moradia

Desde 1980 que no Brasil 686 da populaccedilatildeo segundo dados da Fundaccedilatildeo IBGE moram na cidade Esse fato cada vez mais exige uma accedilatildeo positiva do Estado no ato da construccedilatildeo da moradia Dessa forma o Estado Brasileiro ao promover a distribuiccedilatildeo e gestatildeo dos equipamentos de consumo coletivo indispensaacuteveis agrave reproduccedilatildeo da vida nas cidades - no caso particular a moradia - tem contribuiacutedo tambeacutem para a expansatildeo urbana criando condiccedilotildees favoraacuteveis para que outros setores da sociedade ligados diretamente ao capital se reproduziam Eacute o caso das empresas de transportes empreiteiras etc (RODRIGUES 2001 p 59)

Valenccedila (2001) faz uma revisatildeo histoacuterica das poliacuteticas habitacionais desenvolvidas

pelos sucessivos governos brasileiros desde o final do periacuteodo militar ateacute o final dos anos

1990 montando um panorama a partir do quadro 2

117

Quadro 2

Os periacuteodos da poliacutetica habitacional no Brasil

Periacuteodo Caracteriacutesticas Final dos anos 1970 ateacute 1983

Crises econocircmica e financeira abalam a principal fonte de recursos do SFH a renda da populaccedilatildeo

Governo Figueiredo (1979-85) adota medidas tanto econocircmicas quanto de poliacutetica habitacional que deram iniacutecio a crise do sistema

1983-1986

Governo Figueiredo toma medidas emergenciais

como o Bocircnus do BHN

para

solucionar problemas imediatos do SFH mas a crise se agrava

Ao final do periacuteodo o Governo Sarney (1985-89) patrocina dois foacuteruns de discussatildeo com a sociedade civil o grupo de trabalho sobre reformulaccedilatildeo do SFH - GTRSFH organizado pelo MDU e o debate nacional promovido juntamente pelo IAB e o MDU

Mutuaacuterios do BNH politicamente engajados deixam de pagar prestaccedilotildees e iniciam accedilotildees na justiccedila contra aumentos excessivos

Em 1986 sem grandes justificativas o governo federal fecha o BNH (interesse do poder executivo e de conglomerados financeiros em ter acesso agraves somas vultuosas das cadernetas de poupanccedila e FGTS que eram manipuladas apenas pelo sistema SFH-BNH)

1986-1990

Com o fechamento do BNH a poliacutetica habitacional eacute deixada de lado

O SFH continuou ainda operando minimamente

Eacute criada a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria ligada diretamente agrave Presidecircncia (clientelismo)

Poliacutetica habitacional aceacutefala e sem normas claras

1990-1992

Governo Collor confisca as cadernetas de poupanccedila por 18 meses e prejudica seriamente o SFH

Ministeacuterio da Accedilatildeo Social atraveacutes da Secretaria Nacional de Habitaccedilatildeo tendo como oacutergatildeo operador a Caixa Econocircmica Federal

CEF lanccedila programa habitacional para a aacuterea social mas devido agrave grande participaccedilatildeo da iniciativa privada muitas unidades habitacionais produzidas natildeo havia sido comercializada ateacute 1994 (preccedilo incompatiacutevel com a renda do puacuteblico-alvo)

A partir de 1992 recessatildeo e comprometimento do FGTS paralisam aprovaccedilotildees para projetos habitacionais

1993-1998

Governo Itamar Franco (1994-94) administraccedilatildeo da crise e reforma da CEF

Primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (1995-98) criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana (SEPURB) que junto ao Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento propotildeem a administram a poliacutetica habitacional tendo como oacutergatildeo executor a CEF Principais programas Proacute-Moradia Proacute-Credi e PAR (operaccedilatildeo dos sistemas de caderneta de poupanccedila e FGTS)

Fonte Valenccedila (2001 p 36)

A partir de 1986 quando ocorreu a extinccedilatildeo do BNH a Caixa Econocircmica Federal

(CEF) ficou com a atribuiccedilatildeo de desenvolver a poliacutetica habitacional do Paiacutes e o sistema

habitacional brasileiro passou a vivenciar intensas crises que acarretaram em um alto

endividamento desse sistema e na incapacidade de implementaccedilatildeo de novos projetos

A crise do SFH e a extinccedilatildeo do BNH criaram um hiato em relaccedilatildeo agrave poliacutetica

habitacional no Paiacutes com a desarticulaccedilatildeo progressiva da instacircncia federal a fragmentaccedilatildeo

institucional a perda de capacidade decisoacuteria e a reduccedilatildeo significativa dos recursos

disponibilizados para investimento na aacuterea (BRASIL 2004 p 10)

118

A esse respeito Azevedo (1996) contextualiza que no acircmbito institucional o

governo Sarney tomou diversas medidas que inicialmente indicavam uma intenccedilatildeo

reformadora Entretanto essas medidas demonstraram um retrocesso na adoccedilatildeo das poliacuteticas

habitacionais uma vez que a forma como foi decretada a extinccedilatildeo do BNH causou surpresa

para as entidades envolvidas na reformulaccedilatildeo do SFH jaacute que ocorreu de maneira abrupta e

sem margem para contrapropostas Esse procedimento se chocava com as declaraccedilotildees de

intenccedilotildees e encaminhamentos anteriores feitos pelo proacuteprio governo

Arretche (apud BONDUKI 2008) enfatiza as divergecircncias entre setores do governo

pela disputa em administrar os vultosos recursos envolvidos em investimentos na aacuterea

habitacional e de saneamento baacutesico assim como a estrateacutegia do governo federal em um

momento de reestruturaccedilatildeo poliacutetica para ampliar suas possibilidades de barganha junto aos

governos estaduais como elementos que contribuiacuteram para a extinccedilatildeo do BNH

Bonduki (2008 p 74) ressalta que

Dentre os erros praticados se destaca a opccedilatildeo por grandes conjuntos na periferia das cidades o que gerou verdadeiros bairros dormitoacuterios a desarticulaccedilatildeo entre os projetos habitacionais e a poliacutetica urbana e o absoluto desprezo pela qualidade do projeto gerando soluccedilotildees uniformizadas padronizadas e sem nenhuma preocupaccedilatildeo com a qualidade da moradia com a inserccedilatildeo urbana e com o respeito ao meio fiacutesico Indiferente agrave diversidade existente num paiacutes de dimensotildees continentais o BNH desconsiderou as peculiaridades de cada regiatildeo natildeo levando em conta aspectos culturais ambientais e de contexto urbano reproduzindo agrave exaustatildeo modelos padronizados

Esse panorama revela o papel do Estado enquanto agente promotor da segregaccedilatildeo e

de exclusatildeo de uma grande parcela da populaccedilatildeo ao direto agrave cidade aleacutem de consolidador da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao garantir o acesso agrave moradia apenas a classe meacutedia em detrimento

das classes de menor poder aquisitivo por meio de subsiacutedios oriundos do FGTS que de certa

forma satildeo provenientes dos trabalhadores

Eacute importante destacar que o BNH foi criado objetivando responder agrave forte crise de

moradia ocorrida pelo intenso processo de urbanizaccedilatildeo Para tanto era necessaacuterio

implementar uma poliacutetica de financiamento capaz de estruturar o setor da construccedilatildeo civil

habitacional

Esse fato desvelou o papel econocircmico da poliacutetica habitacional uma vez que

dinamizou a economia por meio da geraccedilatildeo de emprego e fortaleceu o setor da construccedilatildeo

civil transformando-se em um dos elementos centrais da estrateacutegia dos governos militares

119

Azevedo (1996 p 83) aponta as principais diferenccedilas na conduccedilatildeo dos programas

habitacionais apoacutes a mudanccedila do oacutergatildeo operador

a) apesar das duas instituiccedilotildees tratarem-se de bancos o BNH era considerado uma agecircncia financeira de vocaccedilatildeo social enquanto a CAIXA tinha uma atuaccedilatildeo mais comercial com maior preocupaccedilatildeo em equiliacutebrio de investimentos retorno de capital entre outros ressaltando que nessa nova situaccedilatildeo a questatildeo habitacional passou a ser tratada de forma setorial b) o novo arcabouccedilo normativo imposto pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e complementado pela CAIXA dificultou o acesso das Cohabs aos financiamentos habitacionais diminuindo expressivamente sua produccedilatildeo e consequumlentemente restringindo a capacidade das administraccedilotildees municipais e estaduais de atuar em investimentos habitacionais por outro lado facilitando o acesso agrave iniciativa privada neste setor c) a nova posiccedilatildeo das Cohabs no arranjo da poliacutetica habitacional passando de agentes promotores a oacutergatildeos assessores acarretou em enfraquecimento das companhias elevaccedilatildeo da faixa de renda das famiacutelias beneficiadas pelos programas habitacionais (acima de cinco salaacuterios miacutenimos) e desaceleraccedilatildeo dos programas alternativos

A incorporaccedilatildeo das atividades do BNH agrave CEF fez com que a questatildeo habitacional

passasse a depender de uma instituiccedilatildeo em que essa questatildeo embora importante fosse

objetivo setorial Do mesmo modo ainda que considerada como agecircncia financeira de

vocaccedilatildeo social a Caixa possui como eacute natural paradigmas institucionais de um banco

comercial como a busca de equiliacutebrio financeiro retorno do capital aplicado etc

(AZEVEDO 1996 p 84)

Em 1987 foi criado o Ministeacuterio da Habitaccedilatildeo Urbanismo e Meio Ambiente (MHU)

cujo objetivo era a gestatildeo das poliacuteticas de transportes urbanos e a incorporaccedilatildeo da CEF

estando a poliacutetica habitacional e urbana sob a responsabilidade do referido ministeacuterio

(BRASIL 2004)

Segundo Azevedo (1996 p 17) no primeiro ano apoacutes a extinccedilatildeo do BNH as

Cohabs financiaram 113389 casas populares Poreacutem durante o primeiro semestre de 1988

esse nuacutemero caiu para 30646 unidades Essa reduccedilatildeo ocorreu devido agraves mudanccedilas da

poliacutetica habitacional a partir da Resoluccedilatildeo nordm 1464 de 26 de fevereiro de 1988 do Conselho

Monetaacuterio Nacional (CMN) que sob a alegaccedilatildeo da necessidade de controle das diacutevidas dos

estados e municiacutepios criou medidas restritivas ao acesso a creacuteditos por parte das Cohabs

No que diz respeito ao Maranhatildeo entre os anos de 1962 e 1965 foram construiacutedas

752 unidades habitacionais em sete municiacutepios maranhenses das quais 624 ou 8298

concentraram-se na capital especialmente na aacuterea central conforme quadro 3

120

Quadro 3

Conjuntos habitacionais estatais produzidos pelos IAPs 1962-1965

Municiacutepio Conjunto habitacional Nordm de unidades Satildeo Luiacutes Joseacute Bonifaacutecio A Silva 536

Nossa Sra das Graccedilas 40 Bancaacuterios 48

Caxias Caxias I 30 Caxias II 30

Codoacute Codoacute 10 Carolina Carolina 10 Pedreiras Pedreiras 20 Bacabal Bacabal 20 Timon Timon 08

Total 752 Fonte MARANHAtildeO STDUCPH Diagnoacutestico Habitacional do Estado do Maranhatildeo Satildeo Luiacutes 1988 p 66

A execuccedilatildeo de programas habitacionais por meio da Cohab assumiu papel central

na poliacutetica urbana do Governo Sarney No periacuteodo de 1967 a 1971 foi planejada a construccedilatildeo

de 7000 unidades habitacionais e o financiamento de melhorias habitacionais de outras 7000

unidades habitacionais deficientes na cidade de Satildeo Luiacutes (PEMAS 2004)

Entretanto em funccedilatildeo do jogo poliacutetico e dos interesses econocircmicos das elites que

deram sustentaccedilatildeo ao projeto de modernizaccedilatildeo conservadora as atuaccedilotildees da Cohab tiveram

um alcance limitado no sentido de resolver os graves problemas sociais que se acentuavam na

cidade

De acordo com Luz (2004) na deacutecada de 1970 as aacutereas de palafitas se ampliaram

principalmente em direccedilatildeo agrave regiatildeo do Satildeo Francisco Ilhinha Lagoa da Jansen e para os

manguezais da margem esquerda do Rio Anil proacuteximos dos bairros do Caratatiua Alemanha

Vinhais e Ipase No mesmo periacuteodo foi ampliada a frente de expansatildeo urbana em direccedilatildeo a

Regiatildeo do ItaquiBaganga aleacutem disso novos bairros como Vila Nova Saacute Viana Novo Vila

Embratel Anjo da Guarda e Itaquiacute experimentaram um raacutepido crescimento populacional em

funccedilatildeo da chegada de milhares de famiacutelias expulsas da terra ou deslocadas de suas moradias

para implantaccedilatildeo de grandes projetos no interior da ilha

Em resposta ao agravamento das condiccedilotildees de vida na cidade bem como em uma

estrateacutegia de buscar apoio poliacutetico junto agrave populaccedilatildeo o governo lanccedilou no final de 1979 o

Programa de Erradicaccedilatildeo de Moradias Subnormais o Promorar que seraacute melhor apresentado

no capiacutetulo IV (DIAGNOacuteSTICO HABITACIONAL 1987 p 34)

121

Vale ressaltar que os poucos recursos destinados para a populaccedilatildeo de baixa renda

foram marcados pelo clientelismo eou por accedilotildees urbanas de caraacuteter pontual e segregador a

exemplo dos programas de remoccedilatildeo de favelas e palafitas

Em relaccedilatildeo ao Estado do Paraacute pode-se observar que no periacuteodo de 1965 a 1989 a

CohabPa implementou vaacuterios programas habitacionais na Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

(RMB) cujo nuacutemero de unidades habitacionais construiacutedas ateacute o ano de 1989 foi de 22949

conforme tabela 2

Tabela 2

Unidades Habitacionais construiacutedas pela COHABPa na RMB (1965-1989) Nome do Conjunto Ano Nordm Unid Habitacional Municiacutepio

Nova Marambaia I 1965 834 Beleacutem Ananindeua 1971 118 Ananindeua Nova Marambaia II 1972 376 Beleacutem Nova Marambaia III 1973 332 Beleacutem Icoaraci I 1973 296 Beleacutem Icoaraci II 1976 554 Beleacutem Icoaraci III 1976 350 Beleacutem Cidade Nova I 1976 600 Ananindeua Cidade Nova II 1976 1000 Ananindeua Cidade Nova III 1977 461 Ananindeua Cidade Nova IV 1978 2005 Ananindeua Cidade Nova V 1978 3173 Ananindeua Profilurb I 1978 756 Ananindeua Cidade Nova VI 1979 4000 Ananindeua Cidade Nova VII 1980 700 Ananindeua Guajaraacute I 1981 1948 Ananindeua Promorar 1981 1481 Beleacutem Cidade Nova VIII 1986 1879 Ananindeua Cidade Nova IX 1986 120 Ananindeua Cidade Nova (2ordf etapa) 1987 87 Ananindeua Cidade Nova VIII (2ordf etapa) 1988 1109 Ananindeua Catalina 1989 770 Ananindeua

TOTAL 22949 Fonte Alves (1997)

As unidades habitacionais construiacutedas pela CohabPa embora natildeo tenham sido

suficientes para cobrir o deacuteficit habitacional expressivo existente na RMB refletem o

processo de transformaccedilatildeo do uso do solo o qual estaacute articulado intimamente com o mercado

122

de terras e com a segregaccedilatildeo soacutecioespacial expressando as desigualdades de acesso aos

recursos materiais luacutedicos e simboacutelicos da cidade

Na RMB desencadeou-se um padratildeo de urbanizaccedilatildeo alicerccedilada na reproduccedilatildeo de

eixos de expansatildeo horizontal que foi fortemente impulsionado pelo planejamento econocircmico

e territorial e particularmente pelas poliacuteticas de financiamento para a produccedilatildeo habitacional e

de infraestruturas

Destarte a atividade do capital imobiliaacuterio propocircs uma forma de produccedilatildeo do espaccedilo

baseada em uma necessidade de extrair lucro do solo urbano estabelecendo uma relaccedilatildeo

proacutepria entre a ocupaccedilatildeo do solo demandas de mercado e especulaccedilatildeo Dessa maneira atua

sobre o ambiente construiacutedo e depara-se com questotildees que extrapolam o campo econocircmico

Entatildeo os loteamentos ou os conjuntos habitacionais passam a ter tambeacutem um valor

simboacutelico uma vez que o espaccedilo fiacutesico eacute construccedilatildeo do imaginaacuterio individual e coletivo

Smolka (1983 p 140) argumenta que a mediaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio eacute elo

criacutetico do padratildeo de segregaccedilatildeo residencial cujo padratildeo eacute definido por vaacuterios processos que

vatildeo desde a substituiccedilatildeo dos moradores por meio de transaccedilotildees atomizadas de compra e

venda de imoacuteveis usados ateacute as incorporaccedilotildees imobiliaacuterias

conversotildees de uso do solo

visando lucro Esse conjunto de processos assevera a hegemonia da lei do mercado na

determinaccedilatildeo de importantes fenocircmenos que estatildeo diretamente associados agrave geraccedilatildeo e

transformaccedilatildeo de padrotildees de segregaccedilatildeo residencial tais como a mobilidade eou migraccedilotildees

intra-urbana e a valorizaccedilatildeo e desvalorizaccedilatildeo de vizinhanccedilas

De acordo com Trindade Junior (1998) essa eacute a realidade vivenciada na RMB a

qual demonstra a consolidaccedilatildeo da cidade dispersa sendo esta a dimensatildeo espacial do processo

de reproduccedilatildeo do capital com a reafirmaccedilatildeo das divisotildees de mercados e com escalas de

atuaccedilatildeo diferenciadas na qual as empresas de menor forccedila de accedilatildeo tendem a continuar na

dependecircncia direta dos programas de financiamento do Sistema Financeiro de Habitaccedilatildeo na

Aacuterea de Expansatildeo em especial na direccedilatildeo do Municiacutepio de Ananindeua e do distrito de

Icoaraci sob pena de natildeo confirmarem sua permanecircncia no mercado Ao passo que atraveacutes

do programa de lotes urbanizados accedilatildeo prioritaacuteria da CohabPa hoje e do processo ainda

crescente de ocupaccedilotildees urbanas confirme-se a tendecircncia de maior adensamento urbano dos

Municiacutepios de Marituba Benevides e tambeacutem do distrito de Icoaraci

Nesse sentido ao se analisar a produccedilatildeo de unidades habitacionais tanto no Estado

do Maranhatildeo quanto no Estado do Paraacute nota-se que a disponibilidade de creacutedito a juros

voltado para a produccedilatildeo de imoacuteveis novos permitiu agrave classe meacutedia constituir novos bairros e

123

ampliar a fronteira urbana gerando aleacutem da expansatildeo horizontal o gradual esvaziamento dos

centros tradicionais

Aleacutem disso os investimentos na produccedilatildeo de moradias para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo foram reduzidos natildeo alterando o processo de gestatildeo e rebaixando a

qualidade da construccedilatildeo e o tamanho das unidades habitacionais

No acircmbito nacional cabe destacar que em marccedilo de 1989 foi extinto o Ministeacuterio

do Bem-Estar Social (MBES) e criou-se a Secretaria Especial de Accedilatildeo Comunitaacuteria (SEAC)

sob competecircncia do Ministeacuterio do Interior As atividades financeiras desse Sistema estavam

vinculados ao Ministeacuterio da Fazenda

O modelo institucional adotado pelo SEAC privilegiava a iniciativa de estados e

municiacutepios deixando de estabelecer prioridades alocativas o que permitiu maior autonomia

desses governos e o gerenciamento da poliacutetica habitacional

O Programa Nacional de Mutirotildees Habitacionais da SEAC foi um programa

alternativo lanccedilado pelo governo Sarney com o intuito de atender as famiacutelias com renda

mensal ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos Para tanto teria como financiamento os recursos de verba

orccedilamentaacuteria a fundo perdido geralmente em parceria com prefeituras ou estados

acompanhado por grupos constituiacutedos por representantes da comunidade assistida

denominados Sociedade Comunitaacuteria Habitacional (SCH) (AZEVEDO 1996)

No entanto a utilizaccedilatildeo dos recursos do FGTS em quantidade que superava suas

reais disponibilidades financeiras afetou as possibilidades de expansatildeo do financiamento

habitacional levando a sua suspensatildeo temporaacuteria

Para Azevedo (1996 p 83) a experiecircncia da SEAC eacute relevante para se compreender

a poliacutetica habitacional brasileira pois num periacuteodo inferior a dois anos (aproximadamente de

1988 a 1990) o oacutergatildeo que pretendia construir 550000 novas moradias alcanccedilou um terccedilo

disto ainda assim superando a produccedilatildeo realizada pelas Cohabs no mesmo periacuteodo Por

meio de programas tradicionais na CEF que natildeo chegou a 150000 unidades tornando-se

uma experiecircncia importante pois foi a primeira vez na trajetoacuteria da poliacutetica popular

brasileira que um programa alternativo apresentou melhor desempenho quantitativo do que os

convencionais

Contudo alguns fatores satildeo destacados para explicar a natildeo plenitude na execuccedilatildeo

dessas medidas o baixo financiamento unitaacuterio aliado agrave inflaccedilatildeo crescente a maacute utilizaccedilatildeo

dos recursos o processo inflacionaacuterio a dependecircncia exclusiva de verbas orccedilamentaacuterias aleacutem

da inexistecircncia de uma poliacutetica clara de prioridades para alocaccedilatildeo de recursos e as accedilotildees

clientelismo (VALENCcedilA 1999 apud AZEVEDO 1996)

124

Com a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 haacute uma institucionalizaccedilatildeo da participaccedilatildeo da

sociedade civil organizada na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas em especial da habitacional O

processo de descentralizaccedilatildeo e a reforma do Estado estabelecem uma redefiniccedilatildeo de

competecircncias passando a ser atribuiccedilatildeo dos Estados e Municiacutepios a gestatildeo dos programas

sociais e dentre eles o de habitaccedilatildeo seja por iniciativa proacutepria seja por adesatildeo a algum

programa proposto por outro niacutevel de governo seja por imposiccedilatildeo Constitucional (BRASIL

2004 p 10)

Conforme foi citado no capiacutetulo anterior o ideaacuterio da reforma urbana corresponde a

uma reforma social estrutural com uma muito forte e evidente dimensatildeo espacial tendo por

objetivo melhorar a qualidade de vida da populaccedilatildeo especialmente de sua parcela mais pobre

e elevar o niacutevel de justiccedila social tendo como objetivos coibir a especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

reduzir o niacutevel de disparidade socioeconocircmico-espacial intra-urbano democratizar o

planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano (SOUZA 2002 p112-113)

De acordo com Maricato (1997 p 311) as principais propostas apresentadas na

referida emenda foram

Em relaccedilatildeo agrave propriedade imobiliaacuteria urbana

instrumentos de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Captaccedilatildeo da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria Aplicaccedilatildeo da funccedilatildeo social da propriedade Proteccedilatildeo urbaniacutestica ambiental e cultural Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica habitacional

programas puacuteblicos habitacionais de regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas Aluguel ou prestaccedilatildeo da casa proacutepria proporcional agrave renda familiar Agecircncia nacional e descentralizaccedilatildeo na gestatildeo da poliacutetica Em relaccedilatildeo aos transportes e serviccedilos pppa

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-008406406 3645 6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 172419 1090)Tj0081743 7Pode6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17279501090)Tj00843 7-6687 Tm(m)Tj( 09187 0 0 -009187 17285801090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0203201090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17310301090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0319701090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0328001090)Tj009187 8215 5727 Tm(t)Tj0308401090)Tj009187 8445 5727 Tm(a)Tj03Tj01090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0349001090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17357401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj036501090)Tj0r9187 Tf009187 0 0 -009187 17308401090)Tj0cf009187 0 0 -009187 17389101090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0398701090)Tj0m0 -009187 6928 5727 Tm(413001090)Tj0oj0 Tf009187 0 0 -009187 174)1401090)Tj0g9187 8267 5727 Tm(a)Tj0448401090)Tj0aj0 8038 5727 Tm(e)Tj0449101090)Tj088 Tz(referida emenda for458501090)Tj008406 64eferida emenda for467901090)Tj0oj0 8445 5727 Tm(a)Tj0408401090)Tj009187 Tf009187 0 0 -009187 17493501090)Tj0dj0 8038 5727 Tm(e)Tj0509181090)Tj009187 3645 5727 Tm(a)Tj0511201090)Tj009187 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125

direito fundamental da pessoa humana que soacute pode ser assegurada a partir da efetivaccedilatildeo de

uma poliacutetica habitacional comprometida com a melhoria das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo

Entretanto durante a vigecircncia do governo Collor no periacuteodo de 1990 a 1992

ocorreu um agravamento no desenvolvimento das poliacuteticas habitacionais gerada pelo confisco

das cadernetas de poupanccedila acarretando na estagnaccedilatildeo da mesma e do FGTS visto que parte

do dinheiro que era investido em poupanccedila estava destinado ao SFH

Nesse periacuteodo o Estado reduziu sua participaccedilatildeo no mercado de terras diminuindo

os gastos sociais e a forma de movimentaccedilatildeo de capital deixando a cargo dos especuladores

imobiliaacuterio a produccedilatildeo de moradias o que acarretou no monopoacutelio fundiaacuterio e provocou o

agravamento da crise no setor habitacional

Conforme Azevedo (1996 p 84) houve uma banalizaccedilatildeo da poliacutetica habitacional

por conta da dissociaccedilatildeo das atividades de saneamento e desenvolvimento urbano e sua

transformaccedilatildeo em uma poliacutetica distributiva agora vinculada ao novo Ministeacuterio da Accedilatildeo

Social Portanto a alocaccedilatildeo das unidades construiacutedas tanto pelos programas populares

convencionais como pelos alternativos de autoconstruccedilatildeo continuou sendo feita por criteacuterios

aleatoacuterios

Dois exemplos podem ser destacados para ratificar a argumentaccedilatildeo da autora

primeiro no final dos anos de 1990 o governo brasileiro criou o Programa Carta de Creacutedito

que teve por objetivo proporcionar o financiamento de construccedilatildeo sob a forma associativa

propiciando uma nova maneira de morar na qual as pessoas satildeo agrupadas e coordenadas por

entidades organizadas que constroem os conjuntos habitacionais e condomiacutenios fechados

(AZEVEDO 1996 p 85)

O financiamento individual ficou mantido na faixa de doze salaacuterios miacutenimos com tratamento diferenciado para os mutuaacuterios com renda familiar de ateacute seis salaacuterios miacutenimos sob o discurso da redistribuiccedilatildeo de renda Com relaccedilatildeo agrave taxa de juros praticados pelo Programa variava de 3 a 9 de acordo com as diferentes faixas de renda (AZEVEDO 1996 p 85)

Segundo o governo Collor lanccedilou em maio de 1990 o Plano de Accedilatildeo Imediata para

a Habitaccedilatildeo (PAIH) que previa a construccedilatildeo de 245 mil unidades habitacionais em 180 dias

para famiacutelias de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos com recursos do FGTS e se desenvolveria em

trecircs vertentes programa de moradias populares (produccedilatildeo de novas unidades) programa

de lotes urbanizados (com ou sem cesta baacutesica de materiais) e programa de accedilatildeo municipal

para habitaccedilatildeo popular (unidades acabadas e lotes urbanizados) (AZEVEDO 1996 p 85)

126

Contudo fazendo uma avaliaccedilatildeo do PAIH percebe-se que vaacuterias metas natildeo foram

cumpridas como o prazo estimado de 180 dias prolongou-se por mais de 18 meses 210 mil

unidades habitacionais construiacutedas a valores significativamente maiores que os previstos

inicialmente aleacutem disso a alocaccedilatildeo de recursos natildeo atendeu aos percentuais definidos pelo

Conselho Curador do FGTS para os diversos estados da Federaccedilatildeo

Outro fator importante eacute que as parcerias das empresas privadas fizeram com que as

unidades habitacionais ficassem mais caras e a camada de menor poder aquisitivo que era

tida como puacuteblico-alvo passou a ser excluiacuteda por sua incapacidade do pagamento um dos

motivos que contribuiu para a insatisfaccedilatildeo da populaccedilatildeo ocasionando no impeachment do

presidente Collor27

No periacuteodo de 1992 a 1994 durante o governo de Itamar Franco houve uma

modificaccedilatildeo do cenaacuterio econocircmico por meio do controle da inflaccedilatildeo e fortalecimento da

economia com o Plano Real e a gestatildeo da poliacutetica puacuteblica de habitaccedilatildeo ganha novos rumos

por meio da implantaccedilatildeo dos Programas Habitar Brasil (voltado para os municiacutepios de mais

de 50 mil habitantes) e Morar Municiacutepio

(destinado aos municiacutepios de menor porte) que se

apresentaram como alternativas para a produccedilatildeo de moradias Estes programas na aacuterea de

habitaccedilatildeo popular agora sob o controle do Ministeacuterio do Bem-Estar Social exigiam a

participaccedilatildeo de Conselhos Gestores Estaduais de Poliacutetica Puacuteblica de Habitaccedilatildeo e para os

investimentos poderiam ter uma contrapartida dos governos locais

Segundo Azevedo (1996 p 88) do ponto de vista poliacutetico os programas

apresentaram um avanccedilo quanto agrave gestatildeo da poliacutetica habitacional atraveacutes dos conselhos e a

constituiccedilatildeo de fundos especiacuteficos para a habitaccedilatildeo Do ponto de vista operacional de

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional tiveram pouca efetividade

Em 1995 com o governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) ocorreu a

consolidaccedilatildeo da poliacutetica neoliberal com incentivo a privatizaccedilatildeo e a habitaccedilatildeo passou a ser

tratada no acircmbito da poliacutetica de desenvolvimento urbano integrada agrave poliacutetica urbana e agrave

poliacutetica de saneamento ambiental articulando accedilotildees com os estados e municiacutepios a fim de

garantir o uso e ocupaccedilatildeo do solo urbano e a funccedilatildeo social das cidades empreendendo uma

reforma mais efetiva nesse setor promovendo uma ampla reorganizaccedilatildeo institucional com a

extinccedilatildeo do Ministeacuterio do Bem Estar Social e com a criaccedilatildeo da Secretaria de Poliacutetica Urbana

(SEPURB) no acircmbito do Ministeacuterio do Planejamento e Orccedilamento (MPO) esfera que ficaria

27 O impeachment de Collor foi fruto da articulaccedilatildeo de vaacuterios movimentos sociais dentre eles o Movimento pela Eacutetica na Poliacutetica Movimento dos Caras-Pintadas (composto basicamente por estudantes secundaristas e universitaacuterios) e por meio da organizaccedilatildeo da sociedade civil

127

responsaacutevel pela formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo aleacutem de

defender uma poliacutetica fundiaacuteria urbana adequada de modo a desestimular a formaccedilatildeo de

estoques de terras para fins especulativos (OLIVEIRA 2001)28

No Brasil desenvolveu-se um intenso processo de globalizaccedilatildeo financeira e

produtiva internacional que foi marcado por uma ideologia denominada de neoliberalismo

que pregava a reduccedilatildeo do papel do Estado ao miacutenimo e a liberalizaccedilatildeo do mercado ao

maacuteximo provocando a reduccedilatildeo da intervenccedilatildeo estatal nas poliacuteticas sociais natildeo sendo mais

entendido como o provedor de serviccedilos puacuteblicos mas como promotor e regulador

(BONDUKI 2008)

Neste sentido propotildee que os programas habitacionais

aleacutem de flexiacuteveis para atender a diferentes setores sociais

sejam pensados de forma integrada aos de saneamento ambiental infraestrutura social e transporte urbano Esta mudanccedila de inflexatildeo da poliacutetica habitacional

que deixa de ser vista apenas como uma poliacutetica assistencialista

registra um enfoque de poliacuteticas puacuteblicas que abre maiores possibilidades de accedilotildees integradas e muito mais efetivas no campo do habitat (AZEVEDO 1996 p 92)

No campo da habitaccedilatildeo popular as propostas eram apoiar programas geradores de

tecnologia simplificada que possibilitassem a construccedilatildeo de moradias de qualidade a custo

reduzido privilegiar as formas associativas e cooperativas de produccedilatildeo de habitaccedilotildees e

incentivar programas de assistecircncia teacutecnica aos oacutergatildeos entidades e organizaccedilotildees

comunitaacuterias comprometidas com soluccedilotildees locais e integradas de interesse social Os

princiacutepios adotados como novos referenciais pelo menos na retoacuterica eram flexibilidade

descentralizaccedilatildeo diversidade reconhecimento da cidade real entre outros (BONDUKI

2008)

Bonduki (2008) argumenta que foram retomados os financiamentos de habitaccedilatildeo e

saneamento com base nos recursos do FGTS Tambeacutem foram criadas novas linhas de

financiamento habitacional tendo como base os projetos propostos pelos governos estaduais e

municipais com sua concessatildeo estabelecida a partir de um conjunto de criteacuterios teacutecnicos de

projeto e ainda da capacidade de pagamento dos governos locais

28 No Paraacute de acordo com Holanda (2011) em 1995 a Cohab passou por uma reestruturaccedilatildeo institucional com o objetivo de retomar os financiamentos na aacuterea habitacional passando a executar accedilotildees voltadas agrave instrumentalizaccedilatildeo do planejamento urbano por meio da elaboraccedilatildeo de bases cartograacuteficas e investimentos em urbanizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas e loteamentos aleacutem da produccedilatildeo de habitaccedilotildees em pequena escala destinada ao atendimento de servidores puacuteblicos estadual pois a produccedilatildeo de habitaccedilotildees para servidores foi uma estrateacutegia encontrada pela COHAB-PA para viabilizar novos empreendimentos visto que nesse periacuteodo os programas habitacionais de FHC se mostravam bastante restritivos e produzi para servidores puacuteblicos facilitava a aprovaccedilatildeo de projetos junto agrave CEF jaacute que os descontos das parcelas do financiamento eram realizados na folha de pagamento mensal ou seja os riscos de inadimplecircncia eram miacutenimos

128

Foram instituiacutedos vaacuterios programas direcionados a questatildeo habitacional no governo

de FHC conforme demonstrado no quadro 4

Quadro 4- Programas Habitacionais implementados no Governo FHC Programas Accedilotildees

Proacute-Moradia

Antigo Morar Municiacutepio era financiado com recursos do FGTS e voltado ao atendimento da melhoria nas condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos e na aquisiccedilatildeo ou produccedilatildeo de lotes urbanizados materiais de construccedilatildeo produccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo de conjuntos habitacionais Deveria ser pleiteados por oacutergatildeos da administraccedilatildeo estadual ou municipal adimplentes junto ao governo federal e ter capacidade de endividamento

Carta de Creacutedito Individual

Visava melhorias das condiccedilotildees de moradia de famiacutelias com renda mensal de ateacute 12 salaacuterios miacutenimos por meio das modalidades de aquisiccedilatildeo de unidade habitacional (avaliada no maacuteximo em R$ 8 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 10 mil) conclusatildeo reforma ou ampliaccedilatildeo de imoacutevel usado Utilizava recursos do FGTS e das cadernetas de poupanccedila

Carta de Creacutedito Associativa

Com recursos do FGTS objetivava a construccedilatildeo de unidades habitacionais (valor maacuteximo de R$ 315 mil) ou lote urbanizado (valor maacuteximo de R$ 8 mil) por meio da concessatildeo de financiamento a pessoas fiacutesicas agrupadas em condomiacutenios ou organizadas por sindicatos cooperativas ou associaccedilotildees voltadas agrave produccedilatildeo habitacional

Apoio agrave produccedilatildeo de habitaccedilotildees

Apoiava a induacutestria da construccedilatildeo civil na produccedilatildeo de ateacute 500 unidades habitacionais utilizando recursos do FGTS e era voltado para o atendimento de famiacutelias da classe meacutedia e alta Teve um desempenho piacutefio

Habitar Brasil BID

Era financiado com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) tinha como objetivo propiciar melhoria das condiccedilotildees de habitabilidade de aacutereas degradas e era voltada para o poder puacuteblico municipal

Programa de Arrendamento Residencial (PAR)

Programa considerado inovador que concedia empreacutestimo agraves empresas privadas para produccedilatildeo habitacional no intuito de atender as famiacutelias entre trecircs e seis salaacuterios miacutenimos Utilizava um mix de recursos formado pelo FGTS e recursos de origem fiscal

Fonte Valenccedila (2001) Cardoso (2003) Azevedo (2007) Bonduki (2008)

Em 1997 foi criado o Sistema Financeiro Imobiliaacuterio (SFI) por meio da Lei Federal

nordm 9 512 inspirado na experiecircncia norte-americana que operava com recursos da iniciativa

privada tanto nacional como internacional Este Sistema gerava maior seguranccedila aos

investidores imobiliaacuterios atraveacutes da chamada alienaccedilatildeo fiduciaacuteria uma vez que a propriedade

129

soacute era passada ao mutuaacuterio apoacutes a quitaccedilatildeo do valor do imoacutevel o que propiciava ao

financiador a agilidade na retomada dos bens no caso de inadimplecircncia

Isto demonstra a ineficiecircncia do mesmo como modelo de financiamento agrave

estruturaccedilatildeo de poliacuteticas habitacionais pois natildeo combateu o problema do deacuteficit habitacional

dada suas especificidades em conceder creacutedito imobiliaacuterio agrave famiacutelias de maior poder

aquisitivo

O Proacute-Moradia e o Programa Habitar Brasil buscavam-se beneficiar 677100

famiacutelias investindo R$ 52 bilhotildees sendo R$ 4 bilhotildees de recursos do FGTS e R$ 12 milhatildeo

da contrapartida de estados e municiacutepios (SEPURB 1996a 1996b apud AZEVEDO 1996

p24)

Todavia 1996 e 2000 o desempenho do governo no que diz respeito agrave poliacutetica de

habitaccedilatildeo popular stricto sensu pode ser considerado piacutefio ficando aqueacutem do inicialmente

planejado pois para o programa Proacute-Moradia foram investidos cerca de R$ 830 milhotildees

em recursos do FGTS para a construccedilatildeo de 155219 unidades residenciais a um custo meacutedio

unitaacuterio de R$ 540000 No mesmo periacuteodo com recursos a fundo perdido do OGU foram

alocados no Morar Melhor Habitar Brasil em torno de R$ 860 milhotildees que resultaram na

construccedilatildeo de 294595 moradias com custo unitaacuterio meacutedio de R$ 292000

(CAIXA 2000

apud AZEVEDO 1996 p 24)

Bonduki (2008) argumenta que os programas citados acima embora pudessem

expressar uma renovaccedilatildeo na maneira como a questatildeo da habitaccedilatildeo passou a ser tratada pelo

Governo Federal rompendo a riacutegida concepccedilatildeo herdada dos tempos do BNH de fato natildeo

conseguiu se efetivar como nova poliacutetica gerando um conjunto de efeitos perversos do ponto

de vista social econocircmico e urbano

O financiamento para aquisiccedilatildeo de imoacuteveis usados que absorveu 42 do total de recursos destinados agrave habitaccedilatildeo (cerca de 93 bilhotildees) eacute um programa com escasso impacto natildeo gerando empregos a atividade econocircmica O financiamento para material de construccedilatildeo embora tenha o meacuterito de apoiar o enorme conjunto de famiacutelias de baixa renda que auto-empreende a construccedilatildeo da casa proacutepria e de gerar um atendimento massivo (567 mil beneficiados no periacuteodo a de maior alcance quantitativo) tende a estimular a produccedilatildeo informal de moradia agravando os problemas urbanos Ademais o baixo valor do financiamento e a ausecircncia de assessoria teacutecnica natildeo permitem que as famiacutelias beneficiadas alcancem condiccedilotildees adequadas de habitabilidade (BONDUKI 2008 p 80)

Eacute importante observar que apesar do avanccedilo no desenvolvimento das poliacuteticas

habitacionais os programas executados mantiveram ou ateacute mesmo acentuaram o caraacuteter

130

tradicional das poliacuteticas implementadas no Brasil isto eacute de um atendimento privilegiado agraves

camadas de renda meacutedia e alta

De acordo com Bonduki (2008 p 80) referente aos anos de 1995 e 2003 observa-se

que 7884 do total dos recursos foram destinados a famiacutelias com renda superior a 5 salaacuterios

miacutenimos sendo que apenas 85 foram destinados para a baixiacutessima renda (ateacute 3 salaacuterios

miacutenimos) e onde se concentram 832 do deacuteficit quantitativo conforme graacutefico 1

Graacutefico 1

Contrataccedilotildees do FGTS Programas por faixas de renda (em )

1995 a 2003

Fonte Bonduki (2008)

Em 2003 inicia-se o Governo Lula Neste governo inicialmente havia uma

preocupaccedilatildeo com a questatildeo habitacional sendo que vaacuterios instrumentos e oacutergatildeos foram

criados objetivando atender agrave demanda habitacional no territoacuterio brasileiro tais como o

Ministeacuterio das Cidades que integralizou a questatildeo habitacional do saneamento e dos

transportes (mobilidade) levando em consideraccedilatildeo o uso e a ocupaccedilatildeo do solo29 o Sistema

Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) criado por meio da Lei nordm 1112430 que

tambeacutem instituiu o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (FNHIS) e seu

29 Foram criadas as Secretarias Nacionais de Habitaccedilatildeo de Saneamento de Mobilidade Urbana e de Programas Urbanos pertencentes ao Ministeacuterio das Cidades 30 Essa lei eacute resultado do projeto apresentado por iniciativa popular em novembro de 1991 e condensa as expectativas de diversas organizaccedilotildees da sociedade civil que atuam no setor da habitaccedilatildeo popular

131

respectivo Conselho Nacional31 centralizando os recursos orccedilamentaacuterios dos programas de

Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Subnormais e de Habitaccedilatildeo de Interesse Social com o intuito

de possibilitar subsiacutedio habitacional para famiacutelias de baixo poder aquisitivo

O SNHIS pretende entre outros objetivos viabilizar para a populaccedilatildeo de menor

poder aquisitivo o acesso agrave terra urbanizada e agrave habitaccedilatildeo digna e sustentaacutevel Cabe a esse

Sistema a centralizaccedilatildeo de todos os programas e projetos destinados agrave habitaccedilatildeo de interesse

social dando-lhes maior coerecircncia e mais eficiecircncia (BONDUKI 2008)

O FNHIS eacute composto por recursos do Orccedilamento Geral da Uniatildeo (OGU) do Fundo

de Apoio ao Desenvolvimento Social (FADS) dotaccedilotildees recursos de empreacutestimos externos e

internos contribuiccedilotildees e doaccedilotildees de pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas entidades e organismos de

cooperaccedilatildeo nacional e internacional e de receitas de operaccedilotildees realizadas com recursos do

proacuteprio Fundo Tem como objetivo centralizar e gerenciar recursos orccedilamentaacuterios para os

programas estruturados no acircmbito do Sistema como aquisiccedilatildeo construccedilatildeo conclusatildeo

reforma locaccedilatildeo social e arrendamento de unidades habitacionais produccedilatildeo de lotes

urbanizados para fins habitacionais regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbaniacutestica de aacutereas de interesse

social e a implantaccedilatildeo de saneamento baacutesico infraestrutura e equipamentos urbanos

(AZEVEDO 2007)

A poliacutetica de habitaccedilatildeo desenvolvida no governo Lula tem como objetivos

i)universalizar o acesso agrave moradia digna ii) promover a urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo e inserccedilatildeo urbana de assentamentos precaacuterios iii) fortalecer o papel do Estado na gestatildeo da poliacutetica e na regulaccedilatildeo dos agentes privados dentro de um novo modelo com desconcentraccedilatildeo de funccedilotildees e articulaccedilatildeo de accedilotildees para possibilitar a participaccedilatildeo de amplos segmentos da sociedade na sua implantaccedilatildeo iv) tornar a questatildeo habitacional uma prioridade nacional v) democratizar o acesso a terra urbanizada e ao mercado secundaacuterio de imoacuteveis vi) ampliar a produtividade e melhorar a qualidade na produccedilatildeo habitacional e vii) incentivar a geraccedilatildeo de emprego e renda (BRASIL 2004 p 6)

No entanto Bonduki (2008 p 97) diz que mesmo levando em conta o avanccedilo que

representou a criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades faz-se necessaacuterio ressaltar que uma das suas

debilidades eacute sua fraqueza institucional uma vez que a CEF agente operador e principal

agente financeiro dos recursos do FGTS eacute subordinada ao Ministeacuterio da Fazenda

31 No mecircs de outubro do mesmo ano foi realizada a 1ordf Conferecircncia Nacional das Cidades com 2500 delegados em um processo de mobilizaccedilatildeo social que buscava a consolidaccedilatildeo das bases da atuaccedilatildeo do governo visando ainda a criaccedilatildeo e composiccedilatildeo do Conselho Nacional de Habitaccedilatildeo instalado em 2004

132

Em tese o Ministeacuterio das Cidades eacute o responsaacutevel pela gestatildeo da poliacutetica habitacional mas na praacutetica a enorme capilaridade e poder da Caixa presente em todos os municiacutepios do paiacutes acaba fazendo que a decisatildeo sobre a aprovaccedilatildeo dos pedidos de financiamentos e acompanhamento dos empreendimentos seja de sua responsabilidade (BONDUKI 2008 p 97)

O Plano Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) tinha como objetivo planejar as accedilotildees

puacuteblicas e privadas em meacutedio e longo prazo para equacionar as necessidades habitacionais

do Paiacutes no prazo de quinze anos sendo concebido como um plano estrateacutegico de longo prazo

articulado com propostas operacionais a serem implementadas a curto e meacutedio prazo

(BONDUKI 2008)

Contudo observa-se entatildeo que a nova Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (PNH) natildeo

conseguiu implantar seus aspectos mais relevantes pois sem subsiacutedios significativos

prevaleceu a visatildeo bancaacuteria da CEF sem alteraccedilotildees substanciais na concessatildeo do creacutedito

Aleacutem disso os programas que foram lanccedilados para atender a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo beneficiaram os financiamentos agrave populaccedilatildeo com maior poder aquisitivo

permanecendo o aspecto segregador dos governos anteriores

Bonduki (2008) ressalta que o FNHIS reiterado na 1ordf Conferecircncia Nacional das

Cidades encontrou forte oposiccedilatildeo na equipe econocircmica e foi aprovado apenas em 2005 e

instalado em julho de 2006 Em vez de ser institucionalizado como um fundo financeiro foi

instituiacutedo como um fundo orccedilamentaacuterio limitado a cumprir seu papel O governo entretanto

comprometeu-se a aportar R$ 1 bilhatildeo por ano para subsidiar os programas habitacionais

No Estado do Paraacute com a implementaccedilatildeo do Programa Cheque Moradia32 a partir

de 2003 houve uma retomada de accedilotildees para a populaccedilatildeo na faixa de renda de ateacute trecircs salaacuterios

miacutenimos Este programa beneficiou 19834 famiacutelias e foi inspirado na experiecircncia de outros

estados brasileiros e financiamento proacuteprio (HOLANDA 2011)

No segundo governo de Lula foi lanccedilado o Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento

(PAC) o qual estabeleceu um conjunto de regras compromissos de accedilatildeo e diretrizes de

governo objetivando o crescimento econocircmico de 5 ao ano no periacuteodo de 2007 a 2010

com a implantaccedilatildeo de grandes obras de infraestrutura assim como incluiu um programa de

caraacuteter social a Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Precaacuterios prevendo recursos orccedilamentaacuterios

vultosos para o setor da habitaccedilatildeo

32 De acordo com Holanda (2011) o Programa Cheque Moradia tinha como objetivo viabilizar a compra de materiais de construccedilatildeo para produccedilatildeo e melhorias habitacionais visando o atendimento de famiacutelias com renda de ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos inicialmente voltado apenas a funcionaacuterios puacuteblicos estaduais depois ampliado para alcanccedilar as famiacutelias em situaccedilatildeo de risco e aquelas com moradias atingidas em casos de sinistro

133

O PAC inaugurou uma nova fase na poliacutetica econocircmica retomando a temaacutetica do

crescimento na agenda do paiacutes que havia permanecido ausente nas uacuteltimas deacutecadas Esse

Programa estaacute dividido em trecircs eixos de infraestrutura logiacutestica (rodoviaacuteria ferroviaacuteria

portuaacuteria hidroviaacuteria e aeroportuaacuteria) energeacutetica (geraccedilatildeo e transmissatildeo de energia eleacutetrica

petroacuteleo gaacutes natural e energias renovaacuteveis) e social e urbana (Luz para todos saneamento

habitaccedilatildeo recursos hiacutedricos metrocircs) A previsatildeo do investimento total eacute de R$ 503 9 bilhotildees

(AZEVEDO 2007)

Em 2008 a crise econocircmica iniciada no setor imobiliaacuterio americano chegou ao

Brasil gerando incertezas Nessa conjuntura a decisatildeo governamental de investir com vigor

no setor habitacional (cerca de 34 bilhotildees) culminou com um pacote maturado

inicialmente no Ministeacuterio da Fazenda cunhado como emergencial e anticiacuteclico buscou o

apoio do setor privado para evitar o aprofundamento do desemprego

(BONDUKI 2008 p

89)

Em 2009 o governo federal implantou o Programa Minha Casa Minha Vida

(MCMV) sob responsabilidade do Ministeacuterio das Cidades e executado pela CEF tendo como

meta construir 1 milhatildeo de moradias Sua finalidade era de criar mecanismos de incentivo agrave

produccedilatildeo e compra de novas unidades habitacionais pelas famiacutelias com renda mensal de ateacute

10 salaacuterios miacutenimos

Para atingir sua meta foram divididos em trecircs grupos primeiro famiacutelias de baixa

renda que ganham de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos as quais concentram quase 90 do deacuteficit

habitacional estando previsto R$ 16 bilhotildees para a construccedilatildeo de 400 mil unidades segundo

grupo que inclui as famiacutelias com renda mensal entre 3 a 6 salaacuterios miacutenimos estavam tambeacutem

previstas 400 mil unidades habitacionais e por fim o grupo que inclui as famiacutelias com renda

mensal entre 6 a 10 salaacuterios miacutenimos para o qual estavam previstas 200 mil unidades

(ROLNIK 2010)

Esse Programa atende a todos os municiacutepios com mais de 100 mil habitantes e

regiotildees metropolitanas Para tanto os empreendimentos podem ser implementados por

agentes puacuteblicos ou privados de forma independente ou em parceira Os paracircmetros para a

promoccedilatildeo de empreendimentos satildeo os mesmos em todo o Brasil variando apenas o valor

maacuteximo das unidades habitacionais que eacute estabelecido por Unidade da Federaccedilatildeolocalidade

(BRASIL 2010)

O MCMV apoacuteia a produccedilatildeo de imoacuteveis novos em construccedilatildeo ou em lanccedilamento

Apoacutes a conclusatildeo do empreendimento as habitaccedilotildees satildeo vendidas a famiacutelias indicadas pelo

poder puacuteblico local Estas famiacutelias tecircm que cumprir as condiccedilotildees estabelecidas no programa

134

nomeadamente estar enquadradas na faixa de rendimento familiar estabelecida (BRASIL

2010)

Para Rolnik (2010) o governo ao disponibilizar 34 bilhotildees para a construccedilatildeo sem

nenhuma intervenccedilatildeo em termos urbaniacutesticos e fundiaacuterios desencadeou um processo

inflacionaacuterio resultando em um aumento consideraacutevel no preccedilo dos terrenos

O que eu tenho apontado eacute que muito provavelmente o subsiacutedio vai parar no bolso do proprietaacuterio do terreno Eu dou dois ou trecircs meses para os empresaacuterios dizerem que natildeo estaacute dando mais para fazer casas de 60 e 70 mil (reais) Agora eles jaacute estatildeo dizendo que natildeo daacute para fazer de 50 mil E natildeo eacute porque a casa custa 50 mil reais Eacute porque a terra custa isso Quer dizer que o nosso dinheiro foi diretamente para o bolso dos proprietaacuterios do terreno (ROLNIK 2010 p 2)

Entretanto Rolnik (2010) argumenta que no primeiro ano (entre marccedilo de 2009 e

marccedilo de 2010) foram contratados e portanto jaacute estatildeo prontos para serem construiacutedos 408

mil imoacuteveis O programa estaacute de fato avanccedilando bastante mas alguns problemas jaacute

aparecem e aponta como o principal deles o natildeo cumprimento da meta em atender as

famiacutelias de 0 a 3 salaacuterios miacutenimos onde se concentra o maior deacuteficit habitacional

Para essa faixa o programa oferece um subsiacutedio integral Ou seja o governo subsidia os imoacuteveis e estabelece um valor maacuteximo para que as construtoras os produzam Por sua vez o custo para os compradores eacute de ateacute 10 da renda mensal sendo no miacutenimo R$ 5000 200 mil unidades deste tipo foram contratadas ateacute agora O problema eacute que quase todas essas unidades foram contratadas em cidades e regiotildees de menor deacuteficit O que estaacute acontecendo eacute que em Satildeo Paulo e nas demais capitais e regiotildees metropolitanas onde realmente estaacute concentrada a demanda da faixa de renda entre 0 e 3 salaacuterios miacutenimos as construtoras estatildeo encontrando muita dificuldade de produzir para o Minha Casa Minha Vida em funccedilatildeo do preccedilo dos terrenos Todas elas reclamam que o preccedilo do terreno estaacute muito caro (ROLNIK 2010 p 2)

A autora diz ainda que eacute para a faixa de 3 a 6 salaacuterios miacutenimos que o programa estaacute

atendendo de fato beneficiando as grandes construtoras que lanccedilam seus produtos em aacutereas

com infraestrutura e serviccedilos O problema eacute que o programa natildeo estaacute conseguindo atender

com preferecircncia os que mais precisam que satildeo os moradores das grandes cidades que estatildeo

indo hoje adensar favelas e construir nas lajes

Cardoso (2009) tambeacutem aponta alguns problemas do Programa MCMV tais como a

distribuiccedilatildeo de recursos federais eacute feita agrave margem do SNHIS injetando muito recurso

financeiro no sistema mas sem o controle social democraacutetico sobre sua utilizaccedilatildeo privilegia

135

as empresas de construccedilatildeo civil aumentou o valor dos imoacuteveis e dos terrenos nas grandes

cidades e regiotildees metropolitanas ou seja toda a disponibilidade de creacutedito estaacute refletindo no

preccedilo do terreno e com isso torna-se difiacutecil produzir uma unidade de R$ 50 mil 60 mil reais

que eacute o valor total da unidade fixado para a faixa de renda mais baixa os recursos satildeo

repassados diretamente agraves empreiteiras dificultando o controle sobre os mesmos natildeo existe

um controle urbaniacutestico acarretando em construccedilatildeo nas aacutereas com precariedade de

infraestrutura distantes da malha urbana e por fim a poliacutetica de habitaccedilatildeo estaacute separada da

poliacutetica de gestatildeo do solo

Percebe-se a reproduccedilatildeo das situaccedilotildees que o BNH havia construiacutedo na deacutecada de

1970 conjuntos de baixa qualidade em uma periferia distante e natildeo inseridos na malha

urbana Aleacutem disso cabe destacar que o mercado imobiliaacuterio tem ditado as regras ao sistema

habitacional uma vez que produz e comercializa um bem escasso que eacute a terra controlando

as leis de mercado pois quando aumenta a demanda o preccedilo da terra aumenta Assim os

imoacuteveis ou terrenos tecircm seus valores aumentados aumentando tambeacutem o excedente para

proprietaacuterios de terra Ao natildeo atender as camadas populares o Programa MCMV acaba

contribuindo para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Portanto diante da anaacutelise das poliacuteticas habitacionais implementadas no Brasil em

especial na regiatildeo Amazocircnica observa-se que a poliacutetica urbana e a habitacional tecircm seguido

um modelo excludente que se perpetua ao longo do tempo uma vez que os programas satildeo

planejados de cima para baixo desconsiderando as relaccedilotildees sociais vivecircncias especificidades

de cada regiatildeo entre outros reforccedilando a loacutegica da divisatildeo territorial e social do trabalho

32 POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS HABITACIONAIS REALIDADE OU UTOPIA

Ao iniciar o debate acerca das poliacuteticas puacuteblicas parte-se da reflexatildeo de que toda

poliacutetica pode ter objetivos bem definidos metas accedilotildees planos e princiacutepios que possam

garantir o bom funcionamento das instituiccedilotildees administrativas dos governos nas trecircs esferas

aleacutem de alcanccedilar o bem-estar a sociedade e o interesse puacuteblico

No item anterior foi destacada a trajetoacuteria da poliacutetica habitacional no Brasil a partir

da concepccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas como um conjunto de accedilotildees coletivas que se configuram

em um compromisso puacuteblico visando dar conta de determinada demanda em diversas aacutereas

Satildeo mecanismos de regulaccedilatildeo social cujo objetivo eacute diminuir as desigualdades sociais

erradicar a pobreza e garantir os direitos sociais da populaccedilatildeo

136

A noccedilatildeo de poliacutetica puacuteblica eacute concebida segundo Raichellis (2007 p 34-38) como

uma linha de accedilatildeo coletiva que concretiza direitos sociais declarados e garantidos em lei

Diz ainda que a poliacutetica puacuteblica comeccedilou a ser implementada como mecanismo de

enfrentamento das sequumlelas da questatildeo social assim ela eacute convertida em poliacuteticas setoriais e

se configura como mecanismo na mediaccedilatildeo dos conflitos sociais

No que diz respeito agrave incorporaccedilatildeo dos direitos sociais no estatuto legal verifica-se

sua importacircncia pois passa a se inscrever como poliacuteticas sociais que satildeo os instrumentos para

a efetivaccedilatildeo desses direitos jaacute que estas natildeo podem deixar de existir quando haacute troca de

governantes cuja atribuiccedilatildeo eacute do Estado diferentemente dos programas de governo cuja

execuccedilatildeo de accedilotildees depende do governo em questatildeo

Corroborando com esse debate Netto (2001) argumenta que as poliacuteticas sociais tecircm

como alvo as questotildees sociais geradas dentro da sociedade capitalista ou seja o objetivo

principal da poliacutetica eacute conceder benefiacutecios para inserir parte da populaccedilatildeo no mercado de

trabalho e melhorar as condiccedilotildees de vida da mesma O que assegura condiccedilotildees apropriadas

para o desenvolvimento do proacuteprio sistema seja pela reproduccedilatildeo social do trabalhador seja

pelas possibilidades de consumo

Partindo dessa reflexatildeo pode-se afirmar que o Estado atende prioritariamente aos

interesses do capital Apesar disso mesmo que em um menor grau de satisfaccedilatildeo precisa

atender as necessidades do trabalhador

Sendo assim as accedilotildees desenvolvidas pelo Estado buscam uma compatibilidade entre

as duas categorias mediando a relaccedilatildeo contraditoacuteria entre o capital e o trabalho na qual

regula as desigualdades sociais que satildeo geradas pelo desenvolvimento do sistema capitalista

ou seja atende as necessidades sociais baacutesicas de quem natildeo estaacute inserido nos serviccedilos sociais

poreacutem sem interferir no processo de acumulaccedilatildeo de capital Elaborando entatildeo as poliacuteticas

sociais para responder essa contradiccedilatildeo

As poliacuteticas puacuteblicas sociais satildeo criadas para compensar as desigualdades proacuteprias do mercado de forma tal que como se fossem homeostado se torna necessaacuterio que estas sejam tatildeo desiguais quanto o mercado mas em sentido contraditoacuterio [] Essas poliacuteticas satildeo concebidas numa perspectiva tradicional como concessotildees por parte do Estado para redistribuir os escassos recursos sociais Nesta perspectiva as poliacuteticas sociais aparecem de forma naturalizada ou seja natildeo satildeo associadas aos interesses e necessidades do sistema capitalista (PASTORINI 1997 p 84)

Outro fator importante do avanccedilo para o campo dos direitos sociais a ser destacado

refere-se agrave descentralizaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo da gestatildeo e execuccedilatildeo da poliacutetica habitacional

137

com a criaccedilatildeo dos Conselhos em acircmbito nacional estadual e municipal que satildeo mecanismos

de participaccedilatildeo e controle social e satildeo instacircncias de deliberaccedilatildeo sobre accedilotildees dessa poliacutetica

voltados para ampliaccedilatildeo das condiccedilotildees de cidadania cuja representatividade eacute do governo e da

sociedade civil

A definiccedilatildeo constitucional da habitaccedilatildeo como poliacutetica puacuteblica geradora de direitos possibilitou que sua construccedilatildeo fosse acompanhada por mecanismos institucionais de democratizaccedilatildeo e de controle social como satildeo os conselhos e as Conferecircncias instrumentos que se inserem no campo de definiccedilatildeo da responsabilidade puacuteblica Ao mesmo tempo conceber a habitaccedilatildeo nesta perspectiva natildeo implica diluir a responsabilidade estatal por sua conduccedilatildeo Ao contraacuterio situaacute-la no campo dos direitos remete agrave ativa intervenccedilatildeo do Estado para garantir sua efetivaccedilatildeo dentro dos paracircmetros legais que a definem (RAICHELIS 2007 p 39)

Ao se tratar a poliacutetica habitacional como direito social torna-se evidente a maneira

regressiva pela qual se desenvolveram os mecanismos de proteccedilatildeo social agrave moradia

conduzida pelo Estado ao longo anos Se por um lado a legislaccedilatildeo brasileira afirma a

garantia de atendimento aos seus cidadatildeos por outro lado compreende-se uma elevada

parcela da populaccedilatildeo que sequer possui o direito de sobrevivecircncia pela violaccedilatildeo constante de

seus direitos dificultando qualquer possibilidade de acesso agrave moradia digna (AZEVEDO

2007)

A habitaccedilatildeo eacute uma necessidade baacutesica do ser humano eacute parte das suas condiccedilotildees de

sobrevivecircncia e portanto elemento importante no processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da

sociedade ao mesmo tempo uma mercadoria como qualquer outra ou seja possui um valor

de uso e de troca e sua produccedilatildeo segue a loacutegica do mercado

Entender a questatildeo da moradia na sociedade capitalista significa descobrir as

contradiccedilotildees inerentes ao acesso agrave moradia Tal compreensatildeo deve antes de mais nada

procurar desvendar o significado da terra e sua propriedade isto eacute de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido e assim sendo natildeo pode ser criado pelo trabalho

Para se ter acesso a uma moradia eacute preciso ocupar um pedaccedilo de terra sendo que

para isso eacute necessaacuterio pagar por ele Esse pagamento pode ser com a aquisiccedilatildeo de um lote

urbanizado ou natildeo por meio de aluguel troca de um imoacutevel por outro etc cujo valor eacute

ajustado natildeo soacute de acordo com a lei da oferta e da procura como tambeacutem por meio da

especulaccedilatildeo imobiliaacuteria Portanto sua origem estaacute na propriedade privada da terra e na sua

condiccedilatildeo de mercadoria dentro do modo de produccedilatildeo capitalista

138

A propriedade privada da terra eacute condiccedilatildeo fundamental para o desenvolvimento do

capital imobiliaacuterio tendo seu valor de uso modificado pela atribuiccedilatildeo de infraestrutura

equipamentos e serviccedilos puacuteblicos aleacutem de suas caracteriacutesticas especificas como a

construtibilidade morfologia entre outros (MARICATO 1996)

Deste modo Rodrigues (2001) afirma que diferentemente do mercado de compra e

venda de outras mercadorias no mercado de terras a lei da oferta e da procura natildeo funciona

da mesma forma ou seja soacute funcionava quando novos terrenos entram nesse mercado e

quando eacute instalada infraestrutura adequada Assim o preccedilo da terra eacute definido segundo a

localizaccedilatildeo dos terrenos que embora com dimensotildees semelhantes possuem preccedilos

diferentes Essa diferenciaccedilatildeo proporciona ao dono da terra uma renda extra propiciada pela

produccedilatildeo social

Segundo a autora a terra eacute uma mercadoria que tem preccedilo que eacute vendida no

mercado e que natildeo eacute reproduziacutevel ou seja tem um preccedilo que independe de sua produccedilatildeo Eacute

uma mercadoria sem valor no sentido de que seu preccedilo natildeo eacute definido pelo trabalho na sua

produccedilatildeo mas pelo estatuto juriacutedico da propriedade da terra pela capacidade de pagar dos

seus possiacuteveis compradores

Para os trabalhadores a possibilidade de extrair alguma renda de sua propriedade

por meio do aluguel ou da sua valorizaccedilatildeo com a implementaccedilatildeo de obras de infraestrutura

em seu entorno mesmo quando se trata de um simples embriatildeo de alvenaria sem

revestimento eacute motivo de grande seguranccedila e sensaccedilatildeo de progresso pessoal pois representar

uma forma segura de investimento

Nesse sentido a aquisiccedilatildeo do imoacutevel ou de um terreno se daacute natildeo em funccedilatildeo da

necessidade de uso mas com vistas agrave venda futura ou aluguel transforma-o em capital

imobiliaacuterio

Como ressalta Engels (1988 p 185)

Ainda que o aluguel natildeo represente extraccedilatildeo de mais valia uma vez que [] eacute a transferecircncia de um valor jaacute produzido a propriedade da casa natildeo determina a classe social ela modifica parcialmente agrave medida que aleacutem do seu valor de uso pode se transformar em capital o que diferencia seu proprietaacuterio dos demais de sua classe O uso da moradia como investimento a torna objeto de especulaccedilatildeo imobiliaacuteria o que leva ainda mais o seu preccedilo

Em principio o salaacuterio recebido pelo trabalhador deveria ser suficiente para

satisfazer agraves suas necessidades baacutesicas mas natildeo o eacute especialmente no que se refere agrave

139

moradia cuja natureza especifica torna-a um bem caro e de difiacutecil acesso principalmente em

situaccedilotildees de crise com especulaccedilatildeo imobiliaacuteria

Na composiccedilatildeo dos salaacuterios

preccedilo da forccedila de trabalho

haacute uma parte destinada a

cobrir os gastos necessaacuterios agrave satisfaccedilatildeo dessa necessidade ou seja o custo da moradia Na

medida em que este aumenta aqueles tambeacutem deveriam fazecirc-lo o que entretanto natildeo ocorre

porque implica em diminuiccedilatildeo do lucro e afeta o processo de acumulaccedilatildeo capitalista

Destarte como se trata de um bem de consumo necessaacuterio agrave reproduccedilatildeo da forccedila de

trabalho cuja satisfaccedilatildeo inadequada tem efeitos sobre o processo de produccedilatildeo o problema da

habitaccedilatildeo torna-se questatildeo social levando a intervenccedilatildeo do Estado no setor

Entatildeo solucionar o problema da moradia no Brasil natildeo eacute uma tarefa faacutecil pois a

terra no modo de produccedilatildeo capitalista mesmo natildeo sendo uma mercadoria produzida

socialmente tem um preccedilo e atribui ao seu proprietaacuterio o direito de auferir uma renda por

posse

Partindo de uma visatildeo socioeconocircmica em que a cidade se constitui no locus da

reproduccedilatildeo do capital a urbanizaccedilatildeo passou a ser vista como um conjunto de relaccedilotildees

sociais que reflete as relaccedilotildees estabelecidas na sociedade como totalidade constituindo-se

assim em um conjunto complexo de relaccedilotildees sociais assumindo novas dinacircmicas a partir

dos estaacutegios do desenvolvimento capitalista e isso configura importantes aspectos de

interesse geral (HARVEY 1996 p 89)

De acordo com Azevedo (1996) ao se analisar a questatildeo habitacional a relaccedilatildeo com

outras poliacuteticas urbanas eacute um dos aspectos a ser considerado Em funccedilatildeo da interdependecircncia

da moradia com outras esferas nem sempre um simples incremento dos programas de

habitaccedilatildeo eacute a soluccedilatildeo mais indicada para melhorar as condiccedilotildees habitacionais da populaccedilatildeo

com menor aquisitivo Isso porque esses programas podem ser inviabilizados caso natildeo sejam

integradas a eles outras poliacuteticas urbanas como de transporte energia eleacutetrica esgotamento

sanitaacuterio e abastecimento de aacutegua

Nesse sentido pode-se afirmar que o problema habitacional urbano no Brasil atinge

hoje grandes proporccedilotildees e estaacute intimamente relacionado ao processo de degradaccedilatildeo fiacutesica e

social das cidades tendo como resultados do seu modelo de crescimento a ocupaccedilatildeo

descontiacutenua definida pela praacutetica especulativa e a produccedilatildeo de espaccedilos com padrotildees muito

diferenciados e desiguais

Eacute resultado da loacutegica excludente que determina a dinacircmica urbana na qual as

famiacutelias de baixo poder aquisitivo adotam inuacutemeras estrateacutegias de sobrevivecircncia tais como

ocupaccedilatildeo de terreno irregular seguida da autoconstruccedilatildeo da moradia como no caso das

140

baixadas aquisiccedilatildeo locaccedilatildeo ou cessatildeo da posse de imoacuteveis construiacutedos em favelas e

assentamentos similares coabitaccedilatildeo moradia em domiciacutelios improvisados como no caso dos

moradores de rua Enfim a maior parte das estrateacutegias citadas resulta na formaccedilatildeo de

assentamentos habitacionais precaacuterios que geralmente concentram problemas relativos agrave

insalubridade condiccedilotildees inadequadas de acessibilidade e irregularidades urbaniacutesticas

O desenvolvimento capitalista ao provocar uma imensa e abrupta expansatildeo do

tecido urbano no Paiacutes gerou aumento da concentraccedilatildeo de riqueza de poder e da propriedade

e consequumlentemente aprofundou a miseacuteria

Eacute nesse cenaacuterio que se expressa a questatildeo do deacuteficit de moradia Nesse sentido a

primeira questatildeo a ser discutida diz respeito ao proacuteprio conceito de deacuteficit habitacional No

sentido tradicional ela induz equivocadamente agrave expectativa de enfrentar o problema da

moradia de forma setorial Aleacutem disso camufla uma complexa realidade por meio de uma

quantificaccedilatildeo padronizada atemporal e neutra

Para a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro (BRASIL 2009) o deacuteficit habitacional eacute entendido

como a noccedilatildeo mais imediata e intuitiva de necessidade de construccedilatildeo de novas moradias para

a soluccedilatildeo de problemas sociais e especiacuteficos de habitaccedilatildeo detectados em certo momento a

partir do conceito mais amplo de necessidades habitacionais

O conceito de deacuteficit habitacional estaacute ligado diretamente agraves deficiecircncias do estoque de moradias Engloba aquelas sem condiccedilotildees de serem habitadas devido agrave precariedade das construccedilotildees ou em virtude de desgaste da estrutura fiacutesica Elas devem ser repostas Inclui ainda a necessidade de incremento do estoque devido agrave coabitaccedilatildeo familiar forccedilada (famiacutelias que pretendem constituir um domicilio unifamiliar) aos moradores de baixa renda sem condiccedilotildees de suportar o pagamento de aluguel e aos que vivem em casas e apartamentos alugados com grande densidade de pessoas Inclui-se ainda nessa rubrica a moradia em imoacuteveis e locais com fins natildeo residenciais O deacuteficit habitacional pode ser entendido portanto como deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque 33 e deacuteficit por incremento de estoque 34 (BRASIL 2009 p 15)

33 O deacuteficit por reposiccedilatildeo do estoque refere-se aos domiciacutelios ruacutesticos aos quais deveria ser acrescida parcela devida agrave depreciaccedilatildeo dos domiciacutelios Tradicionalmente utilizando o conceito do IBGE os domiciacutelios ruacutesticos satildeo aqueles sem paredes de alvenaria ou madeira aparelhada Em decorrecircncia das suas condiccedilotildees de insalubridade esses tipos de edificaccedilatildeo proporcionam desconforto e trazem risco de contaminaccedilatildeo por doenccedilas aos seus moradores (BRASIL 2009 p 15) 34 O deacuteficit por incremento de estoque contempla os domiciacutelios improvisados parte da coabitaccedilatildeo familiar e dois tipos de domiciacutelios alugados os fortemente adensados e aqueles em que famiacutelias pobres (renda familiar ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos) pagam 30 ou mais da sua renda familiar para o locador O conceito de domiciacutelios improvisados engloba todos os locais e imoacuteveis sem fins residenciais e lugares que servem como moradia alternativa (imoacuteveis comerciais embaixo de pontes e viadutos carcaccedilas de carros abandonados barcos e cavernas entre outros) o que indica claramente a carecircncia de novas unidades domiciliares (BRASIL 2009 p 16)

141

O deacuteficit habitacional eacute composto pelos seguintes indicadores habitaccedilotildees precaacuterias

coabitaccedilatildeo familiar e ocircnus excessivo com aluguel Desses o grande responsaacutevel pelos altos

iacutendices brasileiros de ausecircncia de moradia eacute a coabitaccedilatildeo familiar e esse fato eacute observado

em todas as regiotildees do paiacutes principalmente em Satildeo Paulo Minas Gerais Rio de Janeiro

Cearaacute Pernambuco e Paraacute Jaacute as habitaccedilotildees precaacuterias satildeo mais comuns na zona rural e o

ocircnus excessivo com aluguel eacute caracteriacutestico das aacutereas de grande adensamento urbano em

destaque o estado de Satildeo Paulo Esse uacuteltimo indicador eacute reflexo direto das dificuldades do

mercado imobiliaacuterio em se adequar agraves necessidades da populaccedilatildeo

(FJP 2008 p36)

Outro indicador utilizado pela Fundaccedilatildeo no desenvolvimento de sua metodologia de

pesquisa eacute a inadequaccedilatildeo de moradias Esta eacute classificada como domiciacutelios com carecircncia de

infraestrutura com adensamento excessivo de moradores com problemas de natureza

fundiaacuteria cobertura inadequada sem unidade sanitaacuteria domiciliar exclusiva ou em alto grau

de depreciaccedilatildeo (BRASIL 2009)

Com base nos dados da Fundaccedilatildeo (BRASIL 2009) alguns dados satildeo importantes

para se entender a real situaccedilatildeo da habitaccedilatildeo social no Brasil que expressa de forma niacutetida a

pobreza no Paiacutes Estima-se que em 2007 o deacuteficit habitacional eacute de 6273 milhotildees de

domiciacutelios dos quais 5180 milhotildees ou 826 estatildeo localizados nas aacutereas urbanas (conforme

tabela 3) Relativamente corresponde a 111 do estoque de domiciacutelios particulares

permanentes do paiacutes sendo 108 nas aacutereas urbanas e 129 nas rurais35 Eacute importante

observar que em 16 anos (entre 1991 e 2007) houve um acreacutescimo de 257 e um

crescimento de 29 ao ano do deacuteficit habitacional e que 862 do deacuteficit urbano

concentram-se nas famiacutelias de baixa renda

35 Esses nuacutemeros podem conflitar com os dados apresentados em 2006 pois a Fundaccedilatildeo Joatildeo Pinheiro considerou apenas uma parcela das famiacutelias conviventes como carente de moradias o que representa uma queda de 1662 milhatildeo de domiciacutelios nas estimativas entre esses dois anos

142

Tabela 3 - Deacuteficit Habitacional (1) e Percentual em Relaccedilatildeo aos Domiciacutelios Particulares Permanentes por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees Geograacuteficas Unidades da Federaccedilatildeo e Regiotildees Metropolitanas (RMs)

Brasil

2007

ESPECIFICACcedilAtildeO

DEacuteFICIT HABITACIONAL PERCENTUAL DOS DOMICIacuteLIOS PARTICULARES PERMANENTES

Total Urbana

Rural Total Urbana

Rural Total Rural de

Extensatildeo Urbana

Total Rural de Extensatildeo Urbana

NORTE 652684

487357

165327

4782

167

162

184

141

Rondocircnia 52472

42561

9911

3072

116

136

71

108

Acre 21063

17263

3800

-

126

141

84

-

Amazonas

146268

117496

28772

1530

186

189

174

455

Roraima 16379

14458

1921

-

147

159

93

-

Paraacute 317089

223645

93444

180

171

156

223

83

RM Beleacutem 92734

90817

1917

180

165

165

144

83

Amapaacute 30449

28853

1596

-

202

203

180

-

Tocantins 68964

43081

25883

-

182

154

262

-

NORDESTE 2144384

1461669

682715

6216

150

139

182

74

Maranhatildeo 461396

240415

220981

1742

295

220

467

111

Piauiacute 139318

76157

63161

-

169

147

205

-

Cearaacute 314949

227096

87853

-

139

128

181

-

RM Fortaleza 124282

119970

4312

-

129

128

170

-

Rio Grande do Norte 117647

85191

32456

1375

140

137

150

59

Paraiacuteba 122166

98034

24132

-

122

122

119

-

Pernambuco 281486

224956

56530

2065

117

119

110

66

RM Recife 133059

129892

3167

-

122

122

133

-

Alagoas 123245

89128

34117

1034

148

151

142

80

Sergipe 73499

60907

12592

-

130

130

129

-

Bahia 510677

359784

150893

-

129

131

124

-

RM Salvador 141025

138946

2079

-

137

137

123

-

SUDESTE 2335415

2222957

112458

9398

93

95

61

59

Minas Gerais 521085

465206

55879

-

88

91

67

-

RM Belo Horizonte 129404

129171

233

-

85

86

12

-

Espiacuterito Santo 101124

90079

11045

-

94

101

61

-

Rio de Janeiro 478901

471872

7029

889

91

93

44

50

RM Rio de Janeiro 378797

376139

2658

-

95

95

106

-

Satildeo Paulo 1234306

1195800

38506

8509

96

98

58

60

RM Satildeo Paulo 628624

611936

16688

7594

103

104

78

59

SUL

703167

617333

85834

-

79

83

60

-

Paranaacute 272542

240825

31717

-

83

86

67

-

RM Curitiba 91444

85007

6437

-

89

91

72

-

Santa Catarina 145363

125297

20066

-

76

79

63

-

Rio Grande do Sul 285261

251211

34050

-

78

83

53

-

RM Porto Alegre 136030

128784

7246

-

97

97

100

-

CENTRO-OESTE

436995

390447

46548

217

105

108

83

31

Mato Grosso do Sul 76027

63762

12265

-

105

101

127

-

Mato Grosso 86679

66363

20316

-

98

100

91

-

Goiaacutes 167042

155119

11923

-

92

96

58

-

Distrito Federal 107248

105202

2046

217

146

151

53

31

BRASIL 6272645

5179763

1092882

20613

111

108

129

71

Total das RMs 1855399

1810662

44737

7774

105

105

89

57

Demais Aacutereas 4417246

3369101

1048145

12839

114

110

131

84

143

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) 2007 Nota no caacutelculo do deacuteficit habitacional o componente coabitaccedilatildeo familiar inclui apenas as famiacutelias conviventes que declararam intenccedilatildeo de constituir novo domiciacutelio

Como mostram os nuacutemeros da acima a regiatildeo Nordeste apresenta valores

expressivos em relaccedilatildeo ao deacuteficit habitacional perdendo somente para a regiatildeo Sudeste que

possui deacuteficit habitacional de 2335415 A regiatildeo Norte encontra-se em quarto lugar em

relaccedilatildeo agraves demais regiotildees do paiacutes Entretanto as especificidades das regiotildees Norte e Nordeste

revelam uma grande heterogeneidade intra-regional demonstrado pelo percentual relativo do

estoque dos domiciacutelios particulares permanentes no Norte encontram-se alguns estados com

deacuteficits superiores agrave meacutedia nacional (111) como por exemplo Amazonas (186) e Paraacute

(171) e no Nordeste os estados do Maranhatildeo (295) e Piauiacute (169) apresentam meacutedias

elevadas em relaccedilatildeo ao nacional

Esse quadro de carecircncia habitacional demonstra que o Nordeste possui o pior

desempenho em relaccedilatildeo a regiatildeo Sul que apresenta percentual de domiciacutelios equivalente a

79 melhor meacutedia nacional Isto pode ser explicado pelo volume de recursos

financeiros

teacutecnicos e administrativos

investidos nas regiotildees sul e sudeste

Tambeacutem pode ser levada em consideraccedilatildeo a forma diferenciada que se deu a

urbanizaccedilatildeo nas regiotildees do Paiacutes acarretando em problemas de adensamento escassez de

terras elevaccedilatildeo do preccedilo da terra baixo desenvolvimento econocircmico das cidades como

Beleacutem e Satildeo Luis e ainda pouca capacidade administrativa dos governos municipais

Outro fator que se destaca eacute a falta de uma poliacutetica habitacional especifica para essas

regiotildees uma vez que o financiamento para construccedilatildeo de moradia tem sido inexpressivo e

uma grande parcela da populaccedilatildeo constroacutei suas casas por meio do autofinanciamento e

autoconstruccedilatildeo

Essas situaccedilotildees satildeo agravadas pela escassez de serviccedilos de infraestrutura falta de

oportunidades de emprego falta de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria entre outros fatores que

contribuem para o aumento da exclusatildeo social e da segregaccedilatildeo espacial da populaccedilatildeo pobre

nas aacutereas de baixadas e de assentamentos precaacuterios

Do total do deacuteficit habitacional (6273 milhotildees aproximadamente) a maior parcela

das estimativas eacute composta pela coabitaccedilatildeo familiar (393) seguido pelo ocircnus com aluguel

(322) as habitaccedilotildees precaacuterias representam 23 e o adensamento excessivo dos domiciacutelios

alugados 55 conforme graacutefico 2

144

Graacutefico 2

Composiccedilatildeo do Deacuteficit Habitacional por Situaccedilatildeo do Domiciacutelio segundo Regiotildees

Metropolitanas (RMs)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007)

Esse quadro evidencia que as poliacuteticas habitacionais devam ser diversificadas de

acordo com cada regiatildeo do Paiacutes para que suas diretrizes possam ser bem sucedidas A

coabitaccedilatildeo eacute responsaacutevel pela maior parte do deacuteficit portanto requer medidas para que novas

famiacutelias que se formem tenham acesso agrave casa proacutepria

Fica demonstrado tambeacutem que a maior parte do deacuteficit habitacional corresponde a

famiacutelias com ateacute trecircs salaacuterios miacutenimos (aproximadamente 90) o que define o caraacuteter

eminentemente social dos programas a serem desenvolvidos Eacute importante destacar que entre

os anos 2000 e 2007 houve uma significativa reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional para as famiacutelias

de renda mensal de trecircs a cinco salaacuterios miacutenimos Do deacuteficit habitacional 894

correspondem agraves famiacutelias com renda mensal inferior a trecircs salaacuterios miacutenimos e 797 estatildeo

concentradas nas regiotildees Nordeste e Sudeste conforme graacutefico 3

145

Graacutefico 3

Deacuteficit Habitacional Urbano (1) por Faixas de Renda Meacutedia Familiar Mensal (2)

Brasil - 2007

Fonte Dados baacutesicos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE) Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios (Pnad) (2007) Nota sm salaacuterio miacutenimo (1) Inclusive rural de extensatildeo urbana (2) Exclusive sem declaraccedilatildeo de renda

Os indicadores sobre o niacutevel e a distribuiccedilatildeo da renda em todo o territoacuterio brasileiro

os dados da PNADIBGE de 1996 e 2000

evidenciavam que a pobreza absoluta atingia por

volta de 34 da populaccedilatildeo Esse percentual correspondia aproximadamente a 52 milhotildees de

pessoas vivendo nessa situaccedilatildeo Vaacuterios estudos sinalizam que a pobreza no Brasil eacute mais

elevada nas regiotildees Nordeste (53) e Norte (40) e menor nas regiotildees Sul (18) e Sudeste

(oscilando entre 25 e 30 conforme o estado considerado) e desponta com maior nitidez

nos espaccedilos urbanos

Eacute nesse cenaacuterio de desigualdades soacutecio-espaciais que se evidencia a questatildeo

habitacional dos recortes territoriais em estudo ou seja nas regiotildees metropolitanas

amazocircnicas Nessas aacutereas urbanas o deacuteficit de moradia eacute elevado a exemplo do que acontece

no paiacutes e cidade vem seguindo a loacutegica da desigualdade capitalista estampando-se por meio

de uma verdadeira segregaccedilatildeo soacutecioespacial36

Para esta abordagem valer-se-aacute da definiccedilatildeo de Santos (2002) acerca do espaccedilo isto

eacute o espaccedilo submetido ao desenvolvimento das forccedilas produtivas sobremaneira com o papel

desempenhado pela ciecircncia e pelas teacutecnicas tornou-se essencialmente social O autor nos

chama a atenccedilatildeo para o fato de que

36 Compreende-se que a segregaccedilatildeo

tanto social quanto espacial

eacute uma caracteriacutestica importante das cidades As regras que organizam o espaccedilo urbano satildeo basicamente padrotildees de diferenciaccedilatildeo social e de separaccedilatildeo (CALDEIRA 2000 p 211) Para Carlos (1994 p 12) o processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano eacute desigual

isso se evidencia claramente atraveacutes do uso do solo

e decorre do acesso diferenciado da sociedade agrave propriedade privada e da estrateacutegia das empresas que produzem sobre o solo o que faz surgir a segregaccedilatildeo espacial

146

Se a Geografia deseja interpretar o espaccedilo humano como o fato histoacuterico que ele eacute somente a histoacuteria da sociedade mundial aliada agrave sociedade local pode servir como fundamento agrave compreensatildeo da realidade espacial e permitir a sua transformaccedilatildeo a serviccedilo do homem Pois a Histoacuteria natildeo escreve fora do espaccedilo e natildeo haacute sociedade a-espacial O espaccedilo ele mesmo eacute social (SANTOS 2002 p 81)

Segundo o autor o espaccedilo pode ser compreendido de acordo com sua totalidade

estudando-se os seus elementos em conjunto destacando-se neste universo o homem agente

fundamental no fornecimento de trabalho e dessa forma de criaccedilatildeo de infraestruturas

teacutecnicas e sociais no territoacuterio O que vale dizer o trabalho historicamente materializado e

geografizado pela accedilatildeo antroacutepica (SANTOS 2002) Assim os estudos referentes ao tema

proposto natildeo poderatildeo prescindir das relaccedilotildees sociais

Para concluir a cidade apresenta uma grande variedade de situaccedilotildees para a

populaccedilatildeo gerando diferentes formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo urbano e consequumlentemente

produzindo uma segregaccedilatildeo soacutecioespacial aleacutem de demonstrar que a poliacutetica habitacional

voltada para atingir a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo eacute uma utopia

De forma geral a segregaccedilatildeo social no espaccedilo eacute resultante das inter-relaccedilotildees entre os

agentes responsaacuteveis pela estruturaccedilatildeo urbana sendo relevantes o poder puacuteblico (Estado) e o

capital imobiliaacuterio (Mercado) Isso porque a forma como estes agentes organizam a ocupaccedilatildeo

no e do espaccedilo acaba por gerar desiguais oportunidades de apropriaccedilatildeo dos recursos urbanos

pela populaccedilatildeo que passa a se organizar segundo uma hierarquia social decorrente desta

inter-relaccedilatildeo

Nesse sentido entende-se a segregaccedilatildeo soacutecioespacial como o movimento de

separaccedilatildeo das classes sociais num determinado espaccedilo urbano no qual um dos fatores

determinante para tal segregaccedilatildeo eacute o preccedilo da propriedade que por natildeo disponibilizarem de

recursos financeiros satildeo obrigadas a ir para a periferia onde os acessos a serviccedilos baacutesicos

(como transporte sauacutede saneamento baacutesico seguranccedila lazer etc) natildeo satildeo na maioria das

vezes garantidos pelo Estado quando natildeo praticamente desprovida dos mesmos

Para aleacutem da atuaccedilatildeo diferenciada dos agentes modeladores do espaccedilo haacute outros

elementos que contribuem para a formaccedilatildeo da segregaccedilatildeo como a maacute distribuiccedilatildeo de renda e

o descumprimento das leis para beneficiamento de interesses de determinados segmentos

sociais

Assim as classes populares por natildeo terem o auxiacutelio do Estado em programas ou

projetos habitacionais buscam algumas alternativas para morar Como uma forma de

representaccedilatildeo dessa realidade destaca-se o caso de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-Ma onde as classes

147

empobrecidas se agrupam em vaacuterias modalidades de moradia Destacam-se as ocupaccedilotildees as

modalidades dos corticcedilos e das palafitas como formas de moradia extremamente precarizadas

sem qualquer disponibilidade de equipamentos e serviccedilos baacutesicos o que ocasiona a

fragilidade da sauacutede dessas pessoas

Observa-se tambeacutem como expressatildeo das classes trabalhadoras as modalidades de

moradia que satildeo os conjuntos habitacionais e os preacutedios reformados do governo onde estes

possuem estrutura equipamentos e serviccedilos mais acessiacuteveis em comparaccedilatildeo as trecircs

modalidades citadas anteriormente mas natildeo perdendo de vista que ainda assim constituem-se

como uma forma precaacuteria de moradia pois natildeo disponibiliza o espaccedilo fiacutesico necessaacuterio para a

adequada morada de uma famiacutelia

33 A POLIacuteTICA HABITACIONAL E A LEGISLACcedilAtildeO URBANIacuteSTICA

A poliacutetica habitacional se inscreve dentro da concepccedilatildeo de desenvolvimento urbano

integrado no qual a habitaccedilatildeo natildeo se restringe a casa incorpora o direito agrave infraestrutura

saneamento ambiental mobilidade e transporte coletivo equipamentos e serviccedilos urbanos e

sociais buscando garantir o direito agrave cidade

A cidade eacute entendida nesse trabalho como um centro de gestatildeo do territoacuterio eacute um

local onde as pessoas se organizam e interagem com base em interesses e valores diversos

formando grupos de afinidade e de interesse menos ou mais bem definidos territorialmente

com base na identificaccedilatildeo entre certos recursos cobiccedilados e o espaccedilo ou na base de

identidades territoriais que os indiviacuteduos buscam manter e preservar (SOUZA 2002 p 28)

Eacute um lugar geograacutefico no qual se instala a superestrutura poliacutetico-administrativo da

sociedade e supotildee a existecircncia de um sistema de classes sociais de um sistema poliacutetico de

um sistema institucional de investimento e de um sistema de troca com o exterior

(CASTELLS 1983)

Essas conceituaccedilotildees permitem visualizar um ambiente de cidades cuja intensidade

das atividades realizadas das interaccedilotildees entre os diversos componentes o consumo do

espaccedilo ultrapassam da simples categoria funcional do espaccedilo fiacutesico para a real efetivaccedilatildeo das

funccedilotildees da cidade

Isto significa dizer que existe uma estrita relaccedilatildeo entre os mecanismos que regulam o

uso e a ocupaccedilatildeo do solo urbano e os que regulam a produccedilatildeo de moradias Portanto torna-se

necessaacuterio refletir sobre o estabelecimento de regras e normas que determinam a legislaccedilatildeo

148

urbaniacutestica voltada para a regulamentaccedilatildeo e controle das accedilotildees dos produtores e

consumidores do espaccedilo urbano e da moradia e ao mesmo tempo para a promoccedilatildeo da

diminuiccedilatildeo das desigualdades soacutecio-espaciais

Entretanto algumas experiecircncias tecircm demonstrado que a legislaccedilatildeo urbaniacutestica ao

definir formas de apropriaccedilatildeo do espaccedilo que devem ser permitidas ou proibidas acaba por

agir como um delimitador de fronteiras de poder reforccedilando a loacutegica do mercado Isto

porque ao regular a produccedilatildeo do espaccedilo urbano a legislaccedilatildeo pode conferir significados e

gerar certa divisatildeo ou classificaccedilatildeo dos territoacuterios urbanos acirrando as desigualdades soacutecio-

espaciais uma vez que eacute fruto da relaccedilatildeo que se estabelece entre os agentes que atuam na

produccedilatildeo imobiliaacuteria na cidade (ROLNIK 2002 p13)

Como instrumento do planejamento (conforme foi apresentado no capiacutetulo anterior)

a legislaccedilatildeo urbaniacutestica segundo Matos (1988 p 50) tem como uma de suas finalidades

atuar em prol da paz social isto eacute objetiva reduzir determinados conflitos entre os diversos

agentes que atuam no espaccedilo urbano

Fazendo uma breve contextualizaccedilatildeo histoacuterica da legislaccedilatildeo pode-se observar que

uma das primeiras tentativas de regulamentar o uso do solo foi em 1850 com a Lei das Terras

(Lei nordm 601 de setembro de 1850) estabelecendo que soacute quem podia pagar era reconhecido

como proprietaacuterio juridicamente definido em lei (RODRIGUES 2001 p 19) impedindo

assim o acesso a terra pelos trabalhadores livres Essa lei atribuiu agrave terra um valor de troca

tornando-a assim uma mercadoria do modo de produccedilatildeo capitalista inacessiacutevel a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo

No seacuteculo XX mais precisamente em 1916 foi criado o Coacutedigo Civil o qual definiu

explicitamente a propriedade da terra levando em consideraccedilatildeo o uso da terra e das

habitaccedilotildees o qual se preocupava com as moradias dos operaacuterios (vilas operaacuterias conforme

abordado no item anterior)

Jaacute na deacutecada de 1960 o Serfhau foi instituiacutedo como o organismo federal orientador

da estruturaccedilatildeo de poliacuteticas nacionais urbanas e de planejamento urbano em consonacircncia agraves

regras impostas pelo Estado naquele periacuteodo

Sob a coordenaccedilatildeo e financiamento do Serfhau os planos diretores entatildeo

denominados de planos de desenvolvimento local integrado foram elaborados para as cidades

de meacutedio e grande porte Coerente com a concepccedilatildeo de um sistema articulado e integrado

nacionalmente nas esferas locais a proposta de um sistema de planejamento local integrado

que visava tornar mais racionais os investimentos objetivando o desenvolvimento urbano

149

Natildeo obstante aos esforccedilos agrave eacutepoca realizados a avaliaccedilatildeo desse processo indica os

baixos resultados apresentados dado que natildeo se alcanccedilou a implantaccedilatildeo dos sistemas locais

de planejamento nem mesmo a execuccedilatildeo de intervenccedilotildees sugeridas pelos planos elaborados

aleacutem disso demonstram um distanciamento entre os agentes de elaboraccedilatildeo dos planos

atribuiacutedo a empresas privadas de consultoria

e os agentes executores localizados nas

administraccedilotildees municipais e na ausecircncia de demandas ou reivindicaccedilotildees de accedilotildees puacuteblicas

dessa natureza (ROLNIK 2002)

Nos anos 1970 a poliacutetica urbana pautava-se no planejamento tecnocraacutetico propondo

apenas o planejamento para uma parte da cidade dita formal ou legal Sendo assim as favelas

e os loteamentos irregulares eou clandestinos permaneceram excluiacutedos

Pode-se dizer que ateacute entatildeo a desigualdade social foi ratificada pelas normas

juriacutedicas favorecendo a segregaccedilatildeo soacutecioespacial jaacute que tenderam a expulsar a populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo para os locais mais distantes dos centros urbanos propiciando o

aparecimento de espaccedilos irregulares

Com a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federativa do Brasil em 1988 novos rumos

foram dados a legislaccedilatildeo urbaniacutestica Nos artigos 182 e 183 do capiacutetulo da Poliacutetica Urbana

foi redefinido o papel da cidade destacando-se a funccedilatildeo social da cidade e da propriedade

urbana

Art 182

A poliacutetica de desenvolvimento urbano executada pelo poder puacuteblico municipal conforme diretrizes gerais fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes sect 1ordm O Plano Diretor aprovado pela Cacircmara Municipal eacute obrigatoacuterio para as cidades com mais de 20 mil habitantes eacute o instrumento baacutesico da poliacutetica de desenvolvimento e de expansatildeo urbana sect 2ordm A propriedade urbana cumpre sua funccedilatildeo social quando atende agraves exigecircncias fundamentais de ordenaccedilatildeo da cidade expressas no plano diretor [] Art 183

Aquele que possuir como sua aacuterea urbana de ateacute 250 msup2 por cinco anos ininterruptamente e sem oposiccedilatildeo utilizando-a para sua moradia ou de sua famiacutelia adquirir-lhe-aacute o domiacutenio desde que natildeo seja proprietaacuterio de outro imoacutevel urbano ou rural (BRASIL 1998)

A funccedilatildeo social da propriedade diz respeito a garantia do exerciacutecio da posse sobre

um imoacutevel ou terreno natildeo visando a limitaccedilatildeo da concepccedilatildeo de propriedade mas assegurando

os direitos sociais bem como o interesse coletivo

De acordo com Rolnik (2002) o direito de uma dada propriedade urbana passa a ser

reconhecido a partir de regras legais municipais definida por suas potencialidades de uso e o

150

seu conteuacutedo econocircmico seria atribuiacutedo pelo Estado mediante a correlaccedilatildeo dos interesses

sociais envolvidos

Para tanto a Constituiccedilatildeo estabeleceu o plano diretor municipal como instrumento

obrigatoacuterio do cumprimento da funccedilatildeo social pela propriedade urbana Cabe ainda destacar o

estabelecimento do artigo 24 sect1ordm 3ordm que determina o Estado como executor da competecircncia

legislativa plena ou seja os Estados poderiam legislar sobre o desenvolvimento urbano ateacute

que a Lei Federal fosse promulgada Entretanto nenhuma accedilatildeo foi efetivada (PASTORINNI

1997)

Ao instrumentalizar a gestatildeo urbana por meio de uma legislaccedilatildeo especiacutefica

instituiacuteram-se novos paracircmetros de accedilatildeo direcionados pela descentralizaccedilatildeo da poliacutetica urbana

que passou a ser executada pelo poder municipal assim como ocorreu nas demais poliacuteticas

sociais

O estabelecimento do Estatuto da Cidade pela Lei Federal nordm 10257 de 10 de julho

de 2001 regulamentou os artigos 182 e 183 da CF e apresentou uma seacuterie de instrumentos

voltados ao combate da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria ao aumento da oferta de aacutereas para habitaccedilatildeo

popular ou de equipamentos indispensaacuteveis agrave vida urbana e que objetivam facilitar a

urbanizaccedilatildeo e a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em favelas ou em loteamentos irregulares e

clandestinos representando um avanccedilo institucional ao tratamento da questatildeo urbana

historicamente marcada pela carecircncia de diretrizes e princiacutepios que fossem integrados e

articulados ao desenvolvimento urbano

O referido Estatuto estaacute estruturado em cinco capiacutetulos quais sejam as diretrizes

gerais (capiacutetulo I) os instrumentos da poliacutetica urbana (capiacutetulo II) o plano diretor (capiacutetulo

III) a gestatildeo democraacutetica da cidade (capiacutetulo IV) e por fim as disposiccedilotildees gerais

No artigo 5ordm haacute o estabelecimento de que a lei municipal poderaacute determinar o

parcelamento a edificaccedilatildeo ou utilizaccedilatildeo compulsoacuterios para as aacutereas delimitadas pelo plano

diretor No caso de natildeo cumprimento as penas aplicaacuteveis compreendem a aplicaccedilatildeo do

imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo (art

7ordm) e a desapropriaccedilatildeo do imoacutevel com pagamento mediante tiacutetulos da diacutevida puacuteblica (art

8ordm)

Um aspecto relevante que se pode destacar do Estatuto da Cidade eacute a gestatildeo

democraacutetica da cidade na qual a participaccedilatildeo de vaacuterios segmentos da sociedade nos processos

decisoacuterios contribui para a garantia do direito agrave cidade e por conseguinte da moradia

151

O Estatuto da Cidade ao prever um capiacutetulo dedicado agrave gestatildeo democraacutetica evidencia que sem a compreensatildeo mais profunda dos processos e conflitos em jogo na questatildeo urbana dificilmente se atenderaacute aos princiacutepios constitucionais de direito de todos agrave cidade da funccedilatildeo social da propriedade e da justa distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios e ocircnus decorrentes do processo de urbanizaccedilatildeo (OLIVEIRA 2001 p 16)

Dessa forma essas estrateacutegias para implantaccedilatildeo de gestotildees democraacuteticas para as

cidades satildeo praacuteticas que renegam a tradiccedilatildeo centralizadora e excludente de gestatildeo estatal que

foi vivenciada ateacute entatildeo redefinindo os papeacuteis de Estado e sociedade civil apontando para

ampliaccedilatildeo de co-gestatildeo entre puacuteblico e privado aumentando a possibilidade de minimizar os

efeitos negativos da burocratizaccedilatildeo estatal e da mercantilizaccedilatildeo da sociedade

A Sociedade Civil organizada os movimentos populares devem autonomamente elaborar na medida do possiacutevel (contra) propostas de planejamento Tais propostas podem ser coadjuvantes dos esforccedilos oriundos das proacuteprias administraccedilotildees progressistas ou podem mesmo dialeticamente calibraacute-los reafirmando a independecircncia dos movimentos sociais perante o Estado ou o(s) partido(s) (SOUZA 1992 p 134)

Especificamente no que se refere a essas novas estrateacutegias que buscam a

descentralizaccedilatildeo participaccedilatildeo e autonomia no acircmbito do setor de planejamento urbano eacute

interessante e sobretudo importante a realizaccedilatildeo de uma reflexatildeo teoacuterica sobre a conjuntura

poliacutetica institucional que combine em um maior controle social sem desconsiderar o poder

local

Segundo De Grazia (2003) o Estatuto da Cidade enfatiza o papel do Estado nesse

novo cenaacuterio poliacutetico no que se refere ao planejamento do espaccedilo urbano por meio da

elaboraccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas ressaltando que

O poder puacuteblico precisa entender que enquanto continuar se omitindo em relaccedilatildeo a sua obrigaccedilatildeo de fiscalizar o uso adequado das aacutereas puacuteblicas natildeo ocupadas e que enquanto continuar natildeo implantando uma poliacutetica urbana e habitacional que democratize o acesso agrave terra urbana mediante agora os proacuteprios instrumentos previstos no Estatuto da Cidade continuaraacute sendo o principal responsaacutevel pela existecircncia de cidades desordenadas injustas e desumanas (De GRAZI 2003 p 64)

Vale ressaltar que o processo de urbanizaccedilatildeo do Paiacutes foi realizado por meio de

planejamentos que atendiam aos interesses poliacuteticos e econocircmicos das classes de maior poder

aquisitivo sendo desenvolvidos de forma isolada do processo de gestatildeo sem a interlocuccedilatildeo

com a sociedade

152

O Estatuto da Cidade natildeo eacute um modelo ideal e uacutenico de legislaccedilatildeo para

democratizaccedilatildeo da questatildeo urbana mas haacute que se considerar o avanccedilo em relaccedilatildeo a

implementaccedilatildeo da participaccedilatildeo popular na discussatildeo sobre os problemas da cidade visto que

natildeo havia nenhum instrumento que propiciasse isso

O Estatuto regulamentou e normatizou a garantia da participaccedilatildeo popular por meio

de conselhos oacutergatildeo colegiados de poliacutetica urbana nos niacuteveis nacional estadual e municipal

debates audiecircncias e consultas puacuteblicas conferecircncias sobre assuntos de interesse urbano e

iniciativa popular de projeto de lei e de planos programas e projetos de desenvolvimento

urbano

Esses instrumentos satildeo espaccedilos puacuteblicos de diaacutelogo entre os diversos interesses provenientes da sociedade civil de proposiccedilotildees partindo dos diversos setores de avaliaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo de decisotildees referentes aos investimentos puacuteblicos e privados nas cidades (INSTITUTO POacuteLIS 2005 p 194)

Nesse contexto o Estatuto da Cidade estabelece que lei regulamentadora do plano

diretor seja discutida e aprovada com a participaccedilatildeo da sociedade civil Isto porque o referido

plano possibilitaraacute o planejamento das cidades de forma articulada considerando toda a

infraestrutura urbana necessaacuteria para a garantia de sua plena funccedilatildeo social possibilitando

assim melhores condiccedilotildees de moradia Destarte a partir dos princiacutepios da funccedilatildeo social e a

gestatildeo democraacutetica da cidade pode ser embasada a luta pelo direito agrave cidade

Os planos diretores foram institucionalizados na deacutecada de 1970 em meio a um

raacutepido processo de urbanizaccedilatildeo das cidades No entanto possuiacuteam uma visatildeo tecnocraacutetica do

processo de elaboraccedilatildeo das estrateacutegias de regulaccedilatildeo urbaniacutestica descartando a articulaccedilatildeo

entre habitaccedilatildeo e infraestrutura e quem deveriam ter acesso a eles

Atualmente os planos diretores respondem agraves reivindicaccedilotildees dos movimentos de luta

pela reforma urbana conforme seraacute apresentado no item posterior e inserem-se no processo

de elaboraccedilatildeo dos instrumentos de participaccedilatildeo popular citados anteriormente

O plano diretor pode conter orientaccedilotildees para a poliacutetica de desenvolvimento e de

ordenamento da expansatildeo urbana dos municiacutepios incluindo em seu escopo as determinaccedilotildees

das poliacuteticas nacionais de preservaccedilatildeo cultural e ambiental de turismo de mobilidade urbana

habitaccedilatildeo e outros

O objetivo fundamental do Plano Diretor eacute estabelecer como a propriedade cumpriraacute sua funccedilatildeo social de forma a garantir o acesso agrave terra urbanizada e

153

regularizada reconhecer a todos os cidadatildeos o direito agrave moradia e aos serviccedilos urbanos (BRASIL 2005 p 15)

Nesse sentido o plano diretor pode considerar as contradiccedilotildees e carecircncias dos

municiacutepios a escassez e o alto custo das aacutereas vazias aleacutem da diversidade de interesses dos

diversos agentes produtores e consumidores do espaccedilo urbano estabelecendo prioridades na

gestatildeo dos recursos disponiacuteveis Pode representar tambeacutem um reflexo da poliacutetica adotada nos

municiacutepios para resgatar a melhoria das condiccedilotildees de vida determinando diretrizes nas aacutereas

de habitaccedilatildeo meio ambiente uso do solo infraestrutura transporte e outros

No que diz respeito a poliacutetica habitacional o Estatuto da Cidade e os planos

diretores municipais prevecircem

A garantia do direito a cidades sustentaacuteveis entendido como o direito agrave terra urbana agrave moradia ao saneamento ambiental agrave infraestrutura urbana ao transporte e aos serviccedilos puacuteblicos ao trabalho e ao lazer para as presentes e futuras geraccedilotildees [] a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e urbanizaccedilatildeo das aacutereas ocupadas por populaccedilatildeo de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanizaccedilatildeo uso e ocupaccedilatildeo do solo e edificaccedilatildeo consideradas a situaccedilatildeo socioeconocircmica da populaccedilatildeo e as normas ambientais (BRASIL 2006 p 36)

Os planos diretores municipais podem estabelecer diretrizes que contenham as

orientaccedilotildees gerais para a elaboraccedilatildeo da poliacutetica habitacional municipal tomando como base

os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade como Zonas Especiais de Interesse Social

(ZEIS) Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria Usucapiatildeo urbana Concessatildeo de uso especial entre outros

instrumentos que tenham interface direta com a questatildeo habitacional

As ZEIS fruto das lutas dos movimentos sociais de assentamentos irregulares pela

natildeo remoccedilatildeo pela melhoria das condiccedilotildees urbaniacutestica e pela regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

permitem inserir assentamentos irregulares agrave malha urbana tornando-os regulares

juridicamente possibilitando a introduccedilatildeo de serviccedilos e de infraestrutura regulando o

mercado de terras aumentando a arrecadaccedilatildeo do municiacutepio Aleacutem disso permitem que

terrenos natildeo edificados natildeo utilizados ou subutilizados sem destinaccedilatildeo social sejam

transformados em aacutereas para programas habitacionais

Em relaccedilatildeo agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria eacute necessaacuterio ressaltar sua importacircncia na

valorizaccedilatildeo do espaccedilo urbano uma vez que os agentes produtores e consumidores dos

espaccedilos irregulares natildeo apresentam poder aquisitivo suficiente para adquirir um imoacutevel

regular No entanto o processo de regularizaccedilatildeo assegura natildeo apenas a seguranccedila de ser

154

proprietaacuterio mas tambeacutem o risco da expulsatildeo pelo capital imobiliaacuterio e pelo ocircnus que tem que

ser pago advindo como saneamento (ROLNIK 1997 p 50)

A regularizaccedilatildeo fundiaacuteria pode ser definida como

Conjunto de poliacuteticas e medidas juriacutedicas urbaniacutesticas ambientais e sociais promovidas pelo poder puacuteblico por razotildees de interesse social ou interesse especiacutefico que visem adequar os assentamentos informais aos princiacutepios legais de modo a garantir o reconhecimento do direito social de moradia o pleno desenvolvimento das funccedilotildees sociais da propriedade urbana e o direito social ao meio ambiente equilibrado (ROLNIK 1997 p 73)

Segundo Rolnik (1997 p 75) garantir o direito agrave moradia implica em formalizar o

endereccedilo do morador fornecendo a ele serviccedilos por correio infraestrutura saneamento baacutesico

financiamentos etc Entatildeo regularizar e registrar a aacuterea ocupada poderaacute legitimar o acesso a

novos direitos promovendo com isso a elaboraccedilatildeo de novos projetos de organizaccedilatildeo

urbaniacutestica aleacutem de possibilitar a recuperaccedilatildeo ambiental dessa aacuterea

Outro instrumento a usucapiatildeo urbana eacute uma forma de se adquirir a propriedade de

um imoacutevel sobre o qual foi exercida posse contiacutenua pelo tempo miacutenimo determinado em lei

aleacutem de outras exigecircncias previstas para cada tipo de usucapiatildeo prescrito na legislaccedilatildeo

brasileira

Esse instrumento apesar de ter como objetivo transformar um possuidor em um

proprietaacuterio valoriza a posse da terra por meio do exerciacutecio desta [] o possuidor pode

adquirir o imoacutevel daquele que era dono mas natildeo exercia atividades sobre o terreno ou seja

natildeo cumpria com a funccedilatildeo social da propriedade Outro aspecto relevante desse instrumento

eacute a possibilidade de recorrer ao mesmo de modo coletivo (ROLNIK 1997 p 55)

Portanto a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a usucapiatildeo urbana e outros instrumentos satildeo

ferramentas utilizadas na atual Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo objetivando garantir o direito agrave

moradia regular Assim novos dispositivos legais da reforma urbana passaram a ser

instrumentos de intervenccedilatildeo das administraccedilotildees puacuteblicas municipais

Para enfrentar um quadro de carecircncia uma poliacutetica habitacional tem que fazer parte

de uma poliacutetica de desenvolvimento urbano que garanta a integralidade das accedilotildees Dessa

maneira a poliacutetica habitacional no governo Lula trouxe portanto avanccedilos significativos

Dentre eles o marco institucional representado pelo Ministeacuterio das Cidades e a nova relaccedilatildeo

estabelecida entre o governo e a sociedade representada pelas Conferecircncias da cidade

As atribuiccedilotildees do Ministeacuterio das Cidades de acordo com a atual Poliacutetica Nacional de

Habitaccedilatildeo podem ser assim entendidas

155

I

definir as diretrizes prioridades estrateacutegias e instrumentos da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo dentre eles o Plano Nacional de Habitaccedilatildeo II

elaborar o marco legal da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo e do Sistema Nacional de habitaccedilatildeo III

elaborar criteacuterios e regras para aplicaccedilatildeo dos

recursos no Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo incluindo a poliacutetica de subsiacutedios IV

coordenar a implementaccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo V

orccedilamentos planos de aplicaccedilatildeo e metas anuais e plurianuais dos recursos a serem aplicados em habitaccedilatildeo VI- oferecer subsiacutedios teacutecnicos agrave criaccedilatildeo de fundos e respectivos conselhos estaduais do Distrito Federal regionais e municipais com o objetivo de incentivaacute-los a aderirem ao SNHIS VII

firmar termos de adesatildeo ao SNHIS com Estados e Municiacutepios VIII

instituir sistema de informaccedilotildees para subsidiar a formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo acompanhamento e controle das accedilotildees no acircmbito do SNH incluindo cadastro nacional de beneficiaacuterios das poliacuteticas de subsiacutedios IX

gerir o Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social ouvido o Conselho do fundo (BRASIL 2004 p 13-14)

A Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo como uma forma estrateacutegica vincula a poliacutetica

urbana agrave fundiaacuteria cabendo a poliacutetica fundiaacuteria subsidiar a poliacutetica urbana na realizaccedilatildeo de

programas habitacionais nos municiacutepios O que para tanto remete a necessidade da

elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais nos quais a propriedade urbana possa cumprir sua

funccedilatildeo social Aleacutem de accedilotildees de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e de acesso a terra urbanizada

(ROLNIK 1997)

Essa poliacutetica habitacional tem como estrateacutegia o fortalecimento institucional sendo

efetiva nos estados e municiacutepios de acordo com

Incentivar a cooperaccedilatildeo entre os niacuteveis federal estadual e municipal buscando instituir mecanismos indutores de adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo estruturaccedilatildeo eou fortalecimento de oacutergatildeos especiacuteficos de formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e coordenaccedilatildeo das poliacuteticas estaduais e municipais de Habitaccedilatildeo Estimular a criaccedilatildeo de estrutura institucional de acordo com as peculiaridades locais com o objetivo de articular as poliacuteticas setoriais e de desenvolvimento urbano Estimular a criaccedilatildeo de fundos e conselhos estaduais regionais e municipais afetos agraves questotildees urbanas e habitacionais Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos diretores municipais com ecircnfase na aplicaccedilatildeo dos instrumentos de reforma urbana em consonacircncia com o Estatuto da Cidade Apoiar a elaboraccedilatildeo de planos habitacionais compatiacuteveis com os planos diretores municipais Apoiar a capacitaccedilatildeo de teacutecnicos e o desenvolvimento institucional dos oacutergatildeos responsaacuteveis pela poliacutetica habitacional no acircmbito estadual e municipal (BRASIL 2004 p 9)

Diante do exposto acima pode-se concluir que de fato as poliacuteticas puacuteblicas visam agrave

efetivaccedilatildeo do direito agrave moradia fundamentam-se na concretizaccedilatildeo do direito de propriedade

a partir de intervenccedilotildees em aacutereas irregulares ocupadas construccedilatildeo ou financiamento da

compra da casa proacutepria entre outros

156

No entanto observa-se que os projetos de renovaccedilatildeo urbana voltam-se cada vez mais

ao atendimento dos interesses do mercado imobiliaacuterio e financeiro atuando

fundamentalmente em benefiacutecio da classe de maior poder aquisitivo e do capital Esses

projetos procuram atrair novas atividades econocircmicas por meio da construccedilatildeo de centros

comerciais e de turismo shopping centers centros de convenccedilotildees edifiacutecios comerciais etc

Para Rolnik (1997 p 75) essas intervenccedilotildees proporcionam e reforccedilam uma

reestruturaccedilatildeo social e espacial nas grandes cidades provocando por outro lado um novo

ordenamento territorial acirrando as exigecircncias competitivas do mercado imobiliaacuterio que

procuram impor seus interesses nas grandes transformaccedilotildees urbaniacutesticas arquitetocircnicas e de

infraestrutura Tal situaccedilatildeo impotildee uma maior atuaccedilatildeo do poder puacuteblico atraveacutes da legislaccedilatildeo

urbaniacutestica na regulamentaccedilatildeo dos usos e da ocupaccedilatildeo territorial para que o desenvolvimento

urbano ocorra com sustentabilidade garantindo a qualidade de vida para a populaccedilatildeo

Nesse sentido pode afirmar que natildeo haacute uma neutralidade do Estado por conseguinte

das normatizaccedilotildees juriacutedicas uma vez que refletem interesses poliacuteticos e econocircmicos de

grupos distintos as accedilotildees desse Estado satildeo visando administrar esses interesses E para tanto

esse Estado estabelece criteacuterios para adotar accedilotildees que garantam sua legitimidade e que natildeo

interfiram nesse modo de produccedilatildeo

Bourdieu (2001) afirma que as produccedilotildees simboacutelicas funcionam como instrumento

de dominaccedilatildeo porque contribuem para integraccedilatildeo real das classes dominantes distinguido-as

de outras classes para a desmobilizaccedilatildeo das classes dominadas para a legitimaccedilatildeo da ordem

estabelecida mediante a hierarquizaccedilatildeo

O que reafirma a concepccedilatildeo de poliacutetica social proposta por Pastorini (1997) como o

produto de uma correlaccedilatildeo entre o Estado a classe que deteacutem o capital e a classe trabalhadora

excluiacuteda que envolve perdas e ganhos entre todos os envolvidos Essa correlaccedilatildeo eacute refletida

nos princiacutepios da Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo Como mostra o quadro 5

157

Quadro 5

Princiacutepios da nova Poliacutetica de Habitaccedilatildeo

Princiacutepios Finalidades Moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social

Garantir padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais

Funccedilatildeo social da propriedade urbana Implementar instrumentos de reforma urbana possibilitando melhor ordenamento e maior controle do uso do solo de forma a combater a especulaccedilatildeo e garantir acesso a terra urbanizada

Questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado

Legitimar o poder puacuteblico como agente indispensaacutevel na regulaccedilatildeo urbana e do mercado imobiliaacuterio no que se refere a provisatildeo de moradia e regularizaccedilatildeo de assentamentos precaacuterios

Gestatildeo democraacutetica Possibilitar a participaccedilatildeo dos diferentes segmentos da sociedade assim como o controle social e transparecircncia nas decisotildees e procedimentos

Subordinaccedilatildeo das accedilotildees em habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo atrelado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Discutir a questatildeo urbana a partir da integraccedilatildeo das poliacuteticas

Fonte Poliacutetica Nacional de Habitaccedilatildeo (2004)

Ao elaborarformular as poliacuteticas habitacionais o Estado acaba por acirrar os

processos de exclusatildeo social e segregaccedilatildeo soacutecioespacial pois o planejamento habitacional

nas condiccedilotildees atuais reforccedila as tendecircncias segregacionistas e excludentes na urbanizaccedilatildeo

brasileira (SANTOS 2002 p 203)

Dessa forma o Estado acaba definindo alguns fatores segregadores tais como aponta

Azevedo (2007 p 71)

Localizaccedilatildeo

geralmente distante dos centros urbanos ou vazios urbanos em aacutereas inadequadas para o desenvolvimento urbano racional

tamanho e qualidade das habitaccedilotildees

pequenas construiacutedas com material de baixa qualidade na maioria das vezes

infraestrutura

inexistente ou de qualidade precaacuteria

e no financiamento

exigecircncias tantas que a maior parte da populaccedilatildeo natildeo alcanccedila fazendo com que poucos tenham acesso ao projeto [] Apenas uma minoria dos setores populares lograraacute ser inserida nos programas governamentais de habitaccedilatildeo popular

Rolnik (2002) ressalta que a elaboraccedilatildeo de leis e de instrumentos urbaniacutesticos como

por exemplo a Legislaccedilatildeo Especial de Habitaccedilatildeo e de Interesse Social voltados para a

formulaccedilatildeo das poliacuteticas habitacionais com a intenccedilatildeo de facilitar aprovaccedilatildeo de projetos de

159

De acordo com Maricato (2000) a intensificaccedilatildeo da dualidade entre cidade formal e

cidade informal tem sido uma constante na estrutura das cidades brasileiras O ritmo do

crescimento dos loteamentos irregulares das favelas e dos corticcedilos nas periferias das grandes

cidades eacute bastante intenso sobretudo nas aacutereas de ocupaccedilatildeo o que tem reforccedilado a funccedilatildeo

estrutural da informalidade na composiccedilatildeo do espaccedilo urbano

Fernandes (1998 p 36) destaca que a habitaccedilatildeo informal sofre com a ausecircncia de

seguranccedila da posse o que deixa o exerciacutecio do direito agrave moradia em risco permanente de

despejo ou deslocamento forccedilado Sendo assim eacute de suma importacircncia que a legislaccedilatildeo deva

prever instrumentos juriacutedicos e urbaniacutesticos que reconheccedilam o direito das pessoas de

permanecer no local onde residem com seguranccedila e proteccedilatildeo independentemente da forma

com que eacute exercida a posse

Encontra-se em curso portanto uma mudanccedila significativa nas concepccedilotildees

tradicionais de regulaccedilatildeo urbaniacutestica logo das proacuteprias noccedilotildees de legalidade e ilegalidade

Tais mudanccedilas visam principalmente respaldar e instrumentalizar o poder puacuteblico para

intervir nessas aacutereas de forma a melhorar as condiccedilotildees de salubridade e habitabilidade

buscando-se desnaturalizar as relaccedilotildees de poder respaldadas na propriedade privada e na terra

urbana enquanto reserva de valor que cristalizaram a desigualdade e a segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Neste sentido pode-se compreender o papel da legislaccedilatildeo urbaniacutestica como

instrumento que vem ganhando relevacircncia na tentativa de regular e controlar a dinacircmica de

atuaccedilatildeo do mercado imobiliaacuterio no meio urbano Acredita-se que a busca de cidades mais

justas e democraacuteticas menos segregadas passa pela adoccedilatildeo de poliacuteticas que regulem a

ocupaccedilatildeo e o uso do solo criando instrumentos capazes de articular os interesses em torno do

processo de produccedilatildeo apropriaccedilatildeo e consumo do espaccedilo urbano com os objetivos de se criar

espaccedilos socialmente mais justos e tecnicamente organizados

Pode-se buscar o direito de propriedade para todos e natildeo a prevalecircncia do direito de

propriedade para alguns ou seja aquele que reconhece a propriedade apenas como

mercadoria

Esses fatos tornam as duas cidades amazocircnicas em cidades com suas dimensotildees

espaciais produto da dualidade pois eacute dividida em cidade legal e cidade ilegal haja vista que

os que natildeo tecircm condiccedilotildees para manter e se manterem na cidade legal procuram alternativas

de sobrevivecircncia resultando em ocupaccedilatildeo de aacutereas consideradas informais e ilegais (como as

aacutereas de baixadas ) nas quais decorrem em irregularidades que geram uma seacuteria

consequumlecircncia ao cenaacuterio urbano

160

Para Rolnik (1997) a cidade legal e a cidade ilegal satildeo situaccedilotildees que coexistem o

tempo todo uma vez que dentro da cidade ideal primeiro o habitante adquire o lote depois

contrata o profissional registra o projeto executa a obra e legaliza a construccedilatildeo junto aos

oacutergatildeos competentes para que as pessoas possam residir Na cidade real ocorre justamente o

contraacuterio primeiro chegam as pessoas constroem-se os barracos lutam pela infraestrutura

pelos lotes e pela propriedade

Conforme Souza (2002 p 51) a informalidade e a ilegalidade da ocupaccedilatildeo tecircm sido

uma das marcas no processo de urbanizaccedilatildeo contemporacircnea ampliando-se particularmente

na uacuteltima deacutecada quando haacute um retorno intensivo de ocupaccedilotildees do tipo favelas

Fernandes (1998) classificaram as informalidades e ilegalidades em dois grupos um

relacionado agrave falta de tiacutetulo de propriedade ou de posse legalmente reconhecido outro

relacionado ao descumprimento de normas de construccedilatildeo na cidade Nesse sentido os

assentamentos informais podem ocorrer por ocupaccedilatildeo direta (organizados por movimentos

sociais em terras puacuteblicas ou privadas) ou por mercados informais (lotes clandestinos vendas

ilegais negociaccedilotildees no mercado informal)

A discussatildeo sobre a cidade ilegal dialoga com uma determinada percepccedilatildeo sobre o

direito urbaniacutestico e em determinados momentos a partir do ponto de vista da regulaccedilatildeo

urbaniacutestica Em uma sociedade regida pela loacutegica da mercadoria a legalidade tambeacutem se

transforma de direito em mercadoria atuando de forma elitizante e excludente

Desse modo a exclusatildeo social manifesta-se no proacuteprio fenocircmeno da segregaccedilatildeo

espanotcial uma vez que separando as aacutereas de moradia na cidade por classes sociais distintas

coloca de fora das melhores condiccedilotildees de habitabilidade as populaccedilotildees mais pobres o que

resulta em acessos diferenciados agraves benfeitorias e ao conforto urbano

Segundo Buarque (1999) existe uma ilegalidade proveniente da impossibilidade de

cumprir com as imposiccedilotildees da cidade mercadoria e existe a ilegalidade fruto da intenccedilatildeo de

burlar a lei para apropriaccedilatildeo de vantagens individuais ou de grupos Dentro desse contexto a

cidade ilegal refere-se a um processo de inclusatildeo-exclusatildeo decorrente de uma determinada

regulaccedilatildeo juriacutedico-urbanistica Assim a dualidade legal-ilegal regular-irregular define-se a

partir de um aparato juriacutedico formal

Portanto a cidade legal eacute fruto de um projeto no qual todos os itens de consumo

coletivo de equipamentos e de serviccedilos encontram-se presentes Eacute construiacuteda pelos agentes

formalmente instituiacutedos A instituiccedilatildeo de regulamentaccedilatildeo para a regularizaccedilatildeo fundiaacuteria nas

cidades eacute o reconhecimento da inadequaccedilatildeo da regulaccedilatildeo urbaniacutestica agraves necessidades da

populaccedilatildeo de mais baixa renda

161

A partir desse enfoque seratildeo analisadas nos capiacutetulos seguintes as contradiccedilotildees na

produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano assim como os conflitos que se desenrolam nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luis levando em conta que o espaccedilo urbano engloba a materialidade

e a subjetividade o real e o imaginado de forma interligada apontando duas consideraccedilotildees

importantes ao debate

a) o papel do Poder Puacuteblico na produccedilatildeo do espaccedilo urbano atraveacutes das poliacuteticas

habitacionais

b) neste processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano ressalta-se a importacircncia do

processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

162

4 BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA CIDADES DAS DESIGUALDADES

Conforme foi apresentado anteriormente no Brasil segundo Villaccedila (2001) o

processo de urbanizaccedilatildeo foi marcado por uma intensa concentraccedilatildeo de investimentos em

algumas regiotildees Esse processo foi responsaacutevel pela marginalizaccedilatildeo de alguns lugares onde

se concentra a camada da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo da cidade Essas regiotildees satildeo

desprovidas pelas accedilotildees do Estado Basta uma volta pela cidade

e nem precisa ser uma

metroacutepole

para constatar a diferenciaccedilatildeo entre os bairros tanto no que diz respeito ao perfil

da populaccedilatildeo quanto agraves caracteriacutesticas urbaniacutesticas de infraestrutura de conservaccedilatildeo dos

espaccedilos e equipamentos puacuteblicos etc

Cabe ressaltar que a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute uma realidade vivenciada pelas

pessoas que residem nas periferias das grandes cidades uma vez que a localizaccedilatildeo das

moradias de diferentes classes sociais natildeo se daacute de forma aleatoacuteria ou por escolha proacutepria De

fato essas localizaccedilotildees satildeo direcionadas por diferentes fatores sejam econocircmicos sociais

ambientais culturais ou poliacuteticos o que geram diferentes padrotildees de uso e ocupaccedilatildeo do solo

urbano

Para Santos (2002) o poder puacuteblico torna-se estimulante da especulaccedilatildeo do solo ao

fomentar a produccedilatildeo de espaccedilos vazios dentro das cidades mostra-se inoperante para resolver

problemas de moradia e empurra a maioria da populaccedilatildeo para precaacuterias habitaccedilotildees nas

periferias Assiste-se ao crescimento e aparecimento de inuacutemeros assentamentos ocupaccedilotildees e

favelas que ocupam aacutereas aleatoriamente sem nenhum tipo de (re)organizaccedilatildeo de

conhecimentos geograacuteficos ambientais ou infraestrutura

Nesse sentido a dificuldade do acesso a terra tem sido fator determinante de

desigualdades sociais e diferenciaccedilotildees entre as classes sociais37 Os elevados preccedilos do solo

determinam a segregaccedilatildeo social por estratos de renda infligindo ocircnus sociais inversamente

proporcionais agrave capacidade de pagamento de quem os suporta

Entretanto essas desigualdades sociais natildeo satildeo reflexos apenas dos planos materiais

e objetivos dos indiviacuteduos mas tambeacutem dos planos subjetivos e psicoloacutegicos ou seja satildeo

muacuteltiplas as dimensotildees que os diferentes processos de desigualdades sociais afetam a vida e o

cotidiano da populaccedilatildeo tais como econocircmica cultural poliacutetica social psicoloacutegica etc

37 Para Maricato (2001) ao diferenciar os lugares o preccedilo da terra passa a ser fundamental e determinante sobre a acessibilidade e possibilidade de localizaccedilatildeo no espaccedilo intraurbano das diferentes classes sociais Da mesma forma o espaccedilo produzido com estas caracteriacutesticas tambeacutem passa a reproduzir tais condiccedilotildees de desigualdade social

163

Eacute importante resgatar que conforme discutido nos capiacutetulos anteriores aleacutem do

preccedilo da terra urbana do setor imobiliaacuterio-construtor e do Estado eacute preciso considerar o

conjunto da composiccedilatildeo social do capital e a forma como se reparte o trabalho excedente do

necessaacuterio ou seja quando a oferta de empregos eacute insuficiente ou os salaacuterios satildeo muito

baixos dificultando a aquisiccedilatildeo de uma moradia digna que disponha de saneamento baacutesico

comeacutercio e lazer (KOWARICK 1988)

Sendo assim eacute importante destacar que o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial pode

ser compreendido em sua dinacircmica marcada pela desigualdade contradiccedilatildeo e exclusatildeo trata-

se portanto de um processo estruturador da proacutepria produccedilatildeo do espaccedilo urbano

A seguir procurar-se-aacute apresentar o processo de construccedilatildeo do espaccedilo urbano e a

questatildeo habitacional em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes partindo da perspectiva que entender o

processo de urbanizaccedilatildeo na Amazocircnia eacute um fenocircmeno mais geral que abrange redes

socioeconocircmicas e culturais complexas agentes sociais que fazem a cidade que lutam em

posiccedilotildees de classe diferente e que satildeo os artiacutefices da apropriaccedilatildeo e da produccedilatildeo do espaccedilo da

construccedilatildeo dos direitos agrave cidade

41 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM BELEacuteM E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A construccedilatildeo do espaccedilo urbano na Amazocircnia teve como elemento significativo

desde o periacuteodo colonial as determinaccedilotildees das poliacuteticas nacionais e internacionais O

processo de urbanizaccedilatildeo foi consequumlecircncia de formas especiacuteficas do desenvolvimento do

capitalismo para essa regiatildeo Essa forma se evidenciou nas relaccedilotildees econocircmicas estabelecidas

para apropriaccedilatildeo das riquezas naturais

Assim na Amazocircnia cujo siacutembolo maior eacute a floresta tropical regiatildeo com

caracteriacutesticas geograacuteficas climaacuteticas e ambientais peculiares as poliacuteticas de

desenvolvimento tecircm provocado substanciais transformaccedilotildees na vida econocircmica social e

cultural de seus habitantes com a utilizaccedilatildeo da ciecircncia e tecnologia para modernizar e

incorporar economicamente os recursos naturais hidrograacuteficos e da floresta tropical ao mundo

globalizado

Em maior ou menor grau o processo recente de desenvolvimento eacute resultante da

accedilatildeo ou omissatildeo da elite regional

governantes poliacuteticos fazendeiros empresaacuterios e

intelectuais amazocircnicos

que diretamente eou associada a interesses externos tem ajudado

164

a promover a modernizaccedilatildeo na regiatildeo a partir de objetivos estritamente econocircmicos e

localizados o que tem contribuiacutedo para o crescimento dos problemas sociais e da degradaccedilatildeo

ambiental

Nesse sentido pode-se afirmar que o avanccedilo do capitalismo na regiatildeo amazocircnica

conduziu a uma transformaccedilatildeo natildeo apenas na estrutura fundiaacuteria mas tambeacutem no aspecto

social levando o camponecircs a disputar desigualmente com empresas nacionais e estrangeiras

as terras que ocupa (COSTA 1980)

O papel do Estado nesse contexto aparece de suma importacircncia jaacute que facilitou e

reforccedilou a penetraccedilatildeo do capital nacional e internacional na regiatildeo transformando-a num

cenaacuterio que combina modernizaccedilatildeo e exclusatildeo social cujos princiacutepios norteadores eram o

patrimonialismo e o clientelismo

Mediante esse contexto analisar-se-aacute a cidade de Beleacutem como um espaccedilo de inter-

relaccedilotildees urbanas portanto tendo como fundamento as contradiccedilotildees sociais (derivadas das

relaccedilotildees sociais conflituosas relaccedilotildees de classe) e pressupondo o papel fundamental da praacutexis

das praacuteticas urbanas

A cidade de Beleacutem fundada em 1616 no periacuteodo colonial com o nome de Santa

Maria de Beleacutem do Gratildeo Paraacute a partir da ocupaccedilatildeo das terras indiacutegenas pelos portugueses e

da construccedilatildeo do Forte de Preseacutepio (hoje denominado de Forte do Castelo)38 Seu relevo eacute

baixo com boa parte do territoacuterio situado em aacutereas de baixadas ou seja as vaacuterzeas e igapoacutes

das bacias hidrograacuteficas39 que recortam a cidade determinando assim no seu interior a

existecircncia de diversas faixas de terras abaixo da cota de 04 metros que recebem as influecircncias

do rio e do oceano Estas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees a maior parte do ano satildeo proacuteximas aos

canais nas quais se instalaram vaacuterios migrantes e a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo e se

constituem objeto de accedilotildees de saneamento e de habitaccedilatildeo de interesse social

O aglomerado metropolitano de Beleacutem eacute constituiacutedo espacialmente por dois

conjuntos fisiograacuteficos distintos aacuterea continental e conjunto insular A aacuterea continental

localiza-se na regiatildeo metropolitana e a insular abrange aproximadamente 39 ilhas das quais

as mais importantes satildeo as de Mosqueiro (1911 Kmsup2) e CaratateuaOuteiro (318 Kmsup2)

ambas interligadas ao continente por meio de pontes (Mapa 1)

38 Abrange uma aacuterea de 5058231 kmsup2 cujo centro estaacute localizado aproximadamente a 1ordm 20 de latitude sul e 48ordm 30 de longitude oeste de Greenwich possuindo um clima quente e uacutemido com precipitaccedilatildeo meacutedia anual alcanccedilando os 2834 mm Situa-se numa peniacutensula contornada ao sul pelo rio Guamaacute a oeste pela Baiacutea do Guajaraacute e Baiacutea do Marajoacute ao norte pelo furo do Maguari e a leste a cidade limita-se com os municiacutepios de Ananindeua Marituba Santa Baacuterbara e Santo Antocircnio do Tauaacute (SEGEP 1999) 39 Bacia do Una Bacia do Comeacutercio Tamandareacute e Satildeo Joseacute Bacia da Estrada Nova Bacia do Tucunduba e Bacia das Almas e Reduto (RODRIGUES 2000 p 125)

165

Mapa 1

Bairros que compotildeem o municiacutepio de Beleacutem

Fonte SEGEP (2001)

166

Na parte continental aacuterea mais densamente ocupada inserem-se os conjuntos

urbaniacutesticos das cidades que compotildeem a Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem (RMB) principal

poacutelo concentrador de atividades secundaacuterias e terciaacuterias irradiadoras de fluxo e intercacircmbios

com todo o territoacuterio paraense

A RMB que abrange uma aacuterea de 18277 Kmsup2 com uma populaccedilatildeo de 2040843 de

habitantes (quase um terccedilo da populaccedilatildeo do Estado do Paraacute)40 foi instituiacuteda pelo governo

federal por meio de Lei complementar nordm 14 de junho de 1973 e complementada pelas Leis

nordm 20 de 1974 e nordm 27 de 1975

Naquela eacutepoca a RMB era constituiacuteda pelos municiacutepios de Beleacutem e Ananindeua

Isto se deveu a uma estrateacutegia geopoliacutetica de induccedilatildeo de desenvolvimento na regiatildeo pois

Beleacutem era um poacutelo regional de articulaccedilatildeo entre diferentes regiotildees do Estado assim como

com o Amapaacute e o Maranhatildeo (CARDOSO LIMA 2006)

Com a Constituiccedilatildeo de 1988 atribui-se aos estados a responsabilidade de instituir

regiotildees metropolitanas aglomeraccedilotildees urbanas e microrregiotildees O governo estadual por meio

da Lei complementar nordm 27 de outubro de 1995 instituiu a RMB com a inclusatildeo dos

municiacutepios de Beleacutem Ananindeua Marituba e Benevides Em 19 de dezembro de 1996 o

municiacutepio de Santa Baacuterbara foi incluiacutedo na RMB (SEPLAN 1998) Mais recentemente na

RMB foi incluiacutedo o municiacutepio de Santa Izabel

Na tabela 4 pode ser evidenciado que o processo de crescimento e consolidaccedilatildeo da

RMB foi baseado na expansatildeo perifeacuterica espraiamento da mancha urbana e paulatina

transformaccedilatildeo de aacutereas rurais em urbanas Este fato eacute demonstrado com os dados de

crescimento de Beleacutem que na deacutecada de 1990 foi menor do que o apresentado pelo

municiacutepio de Ananindeua tornando-se o segundo municiacutepio em importacircncia na RMB e

apresentando uma intensa conurbaccedilatildeo com Beleacutem Os demais municiacutepios (Benevides

Marituba e Santa Baacuterbara) aleacutem de apresentarem populaccedilatildeo menor possuem maior

quantidade de aacutereas consideradas rurais

Aleacutem disso cabe destacar que os fatores geograacuteficos tiveram grande importacircncia no

processo de ocupaccedilatildeo urbana da RBM na medida em que as aacutereas de terra firme foram sendo

ocupadas pelas camadas de maior renda restando somente agraves aacutereas alagadas para a populaccedilatildeo

de menor poder aquisitivo Essas caracteriacutesticas geograacuteficas tecircm papel fundamental na forma

como as questotildees socioespaciais estatildeo imbricadas nas questotildees habitacionais bem como na

40 Dados do IBGE Censo Demograacutefico 2010

167

forma como a populaccedilatildeo de baixa renda busca suprir suas necessidades de moradia na cidade

(PINHEIRO et al 2007)

Tabela 4

Populaccedilatildeo da Regiatildeo Metropolitana de Beleacutem

Nome do Municiacutepio

Ano 1991

Ano 1996

Ano 2000

Ano 2010

TCA 1991-1996

TCA 1996-2000

TCA 1991-2000

TCA 2000-2010

Ananindeua 88151 341257 392947 471744 311 36 181 - Beleacutem 1244689

1144312

1280614

1392031 -17 29 04 - Benevides 68465 28130 35350 51663 -163 59 -71 - Marituba 0 49239 75448 108251 - 113 - - Santa Baacuterbara

0 11549 11375 17154 - -04 - -

Marituba se tornou municiacutepio no ano de 1996 sendo assim tem-se os nuacutemeros da populaccedilatildeo a partir desse ano TCA Taxa de Crescimento Anual Dados ainda natildeo disponiacuteveis do Censo IBGE 2010 Fonte IBGE (2010)

Na histoacuteria da expansatildeo urbana de Beleacutem a fundaccedilatildeo da cidade teve como objetivo

impedir a tentativa de ingleses franceses e holandeses de se estabelecerem na regiatildeo

A ocupaccedilatildeo da Amazocircnia pela colonizaccedilatildeo portuguesa foi movida por interesses poliacuteticos de fincar pontos avanccedilados com fortificaccedilotildees em lugares estrategicamente relevantes distantes para demarcar a presenccedila portuguesa nessa regiatildeo do norte [] presidida pelos interesses econocircmicos o que pode ser visto [] no modo de produccedilatildeo e de exploraccedilatildeo da matildeo-de-obra praticada nos povoados das missotildees religiosas espalhadas no territoacuterio do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo (CASTRO 2008 p 17)

A colonizaccedilatildeo dessa regiatildeo antes ocupada pelos iacutendios deu-se em um primeiro

momento ainda quando o Brasil era colocircnia de Portugal com o principal objetivo de proteger

o imenso territoacuterio da invasatildeo de outros povos e na tentativa de detectar as possibilidades de

exploraccedilatildeo dos recursos florestais Foram os missionaacuterios e sertanistas os primeiros a

desenvolverem atividades econocircmicas logo no inicio da colonizaccedilatildeo catequizando iacutendios e

colhendo as especiarias (drogas do sertatildeo) para a coroa portuguesa

Com a chegada dos portugueses foram vaacuterios os grupos sociais dentre eles o grupo

indiacutegena que se revoltaram em diversas situaccedilotildees e em diferentes capitanias contra o

domiacutenio que o Governo de Portugal e seus representantes na colocircnia impunham sobre a

populaccedilatildeo bem como lutavam pela posse do territoacuterio

168

Em 07 de janeiro de 1619 houve a primeira revolta dos povos indiacutegenas contra essa

opressatildeo e o assalto agraves suas terras41 Os Tupinambaacutes que moravam agraves margens do rio

Guamaacute e Paraacute invadiram a cidade de Beleacutem com a finalidade de expulsar os lusitanos da

regiatildeo (BEZERRA NETO 1999)

No entanto segundo Bezerra Neto (1999 p 19)

[] os colonos refugiados no Forte do Preseacutepio abriram fogo contra os indiacutegenas matando muito deles e fazendo com que fossem obrigados a bater em retirada deixando Beleacutem destruiacuteda Assim na ocupaccedilatildeo da regiatildeo os portugueses fizeram suas guerras contra as populaccedilotildees nativas quase sempre exterminando-as e subjugando-as ao seu domiacutenio

A produccedilatildeo do espaccedilo urbano de Beleacutem iniciou-se em torno do forte do Preseacutepio

expandindo-se para o sul com a abertura das primeiras ruas acompanhando o litoral ao longo

da Baiacutea do Guajaraacute No entanto o crescimento do nuacutecleo urbano em direccedilatildeo ao sul foi

interrompido pelo igarapeacute do Piri que era longo e tortuoso (CORREcircA 1989)

A situaccedilatildeo topograacutefica do Piri impedia a continuidade do traccedilado urbano tornando-

se ponto de referecircncia da divisatildeo da cidade em dois bairros um a oeste do Piri o bairro da

Cidade (hoje denominado de Cidade Velha) e outro a leste o bairro da Campina (hoje

Comeacutercio) (TRINDADE JUNIOR 1997) O espaccedilo produzido limitava-se aos primeiros

arruamentos com seus preacutedios fortes igrejas e conventos Tambeacutem recebeu as suas primeiras

edificaccedilotildees civis feitas com materiais simples predominantemente a taipa e a taipa de pilatildeo

Inicialmente esse espaccedilo urbano produzido foi organizado levando em consideraccedilatildeo

os terrenos de cotas mais altas deixando grandes aacutereas desocupadas formadas por terrenos

alagaacuteveis ou alagados de cotas baixas Na sua expansatildeo os acidentes hiacutedricos foram sendo

contornados o que provocou uma formaccedilatildeo irregular da cidade acompanhando a topografia

Os principais agentes produtores do espaccedilo desde o periacuteodo colonial eram a

burocracia os comerciantes as ordens religiosas e a camada pobre da populaccedilatildeo

(RODRIGUES apud TRINDADE JUNIOR 1997) A base econocircmica da cidade repousava no

comeacutercio na agricultura de subsistecircncia e no extrativismo

A exploraccedilatildeo das drogas do sertatildeo as atividades agriacutecolas e a economia gomiacutefera que tinham nas vias fluviais o principal meio de circulaccedilatildeo configuraram a existecircncia de uma rede urbana dendriacutetica que definiu a cidade de Beleacutem como cidade primaz ratificada a cada momento por sua posiccedilatildeo estrateacutegica no contexto regional que inclusive marcou o caraacuteter

41 Pode-se dizer que essa situaccedilatildeo foi a primeira manifestaccedilatildeo popular ocorrida em Beleacutem

169

poliacutetico-militar de ocupaccedilatildeo inicial da regiatildeo pelos portugueses (TRINDADE JUNIOR 1998 p 98)

Castro (2008 p 17) ressalta que o surgimento das cidades coloniais tiveram duas

motivaccedilotildees primeiro o avanccedilo da organizaccedilatildeo do sistema extrativista do transporte de

mercadorias do processo de catequese e segundo a dominaccedilatildeo de indiacutegenas para o trabalho

servil A respeito da matildeo-de-obra para o trabalho servil Bezerra Neto (1999 p 57) declara

que

A matildeo-de-obra escrava indiacutegena e africana constituiacutea a base dos trabalhadores da proviacutencia O contingente de cativos africanos no nuacutecleo urbano de Beleacutem e em seu entorno era bastante expressivo chegando a representar 35 da populaccedilatildeo no final da segunda metade do seacuteculo XVIII A eles somavam-se os habitantes brancos que representavam cerca de 52 dos moradores e finalmente os pobres livres pretos iacutendios e mesticcedilos que perfaziam um total de 13 dos indiviacuteduos

Na economia colonial o extrativismo vegetal sempre foi um importante moacutevel de

ocupaccedilatildeo e povoamento pois agrave procura por produtos nativos centenas de pessoas adentravam

na floresta e os vilarejos iam surgindo agraves margens dos rios caracterizando o chamado padratildeo

dendriacutetico de urbanizaccedilatildeo Isso influenciou a formaccedilatildeo de diferentes modos de vida

estrateacutegias de sobrevivecircncia e de trabalho condiccedilotildees de vida e a propagaccedilatildeo de haacutebitos e

valores culturais

que atravessaram geraccedilotildees condicionando os modos de vida nas cidades

espaccedilos de construccedilatildeo das praacuteticas sociais e poliacuteticas (SANTOS 1980)

A expansatildeo da cidade nos seacuteculos XVIII e XIX decorreu de uma economia agriacutecola

em plantaccedilotildees de cacau e cana-de-accediluacutecar nos arredores de Beleacutem em engenhos produtores de

accediluacutecar aguardente e mel aleacutem da agricultura de roccedilas olarias engenhos de pilar arroz de

atividades comerciais e criaccedilatildeo de gado vaccum Contava ainda com faacutebrica de farinha e uma

de chocolate

Nota-se que um dos fatores que influenciaram na forma de ocupaccedilatildeo da cidade de

Beleacutem foi o ambiental pois a ocupaccedilatildeo das margens dos rios que contornavam Beleacutem por

instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas incentivou a populaccedilatildeo a povoar as aacutereas alagadas e

perifeacutericas da cidade

Nesse periacuteodo percebeu-se a preocupaccedilatildeo das autoridades puacuteblicas com as vaacuterzeas

especialmente do Piri que em virtude da forma de ocupaccedilatildeo comeccedilava a apresentar os

efeitos da poluiccedilatildeo e da falta de higiene assim como a viabilizaccedilatildeo do crescimento da cidade

que foram utilizados como argumentos para justificar o ensecamento a terraplenagem e

170

drenagem da baixada do Piri (TRINDADE JUNIOR 1997) Isso fez com que surgisse um

plano de aproveitamento do Piri (FERREIRA 1995)

Esse plano previa o aproveitamento da rede hidrograacutefica de Beleacutem em sua totalidade

tornando-a navegaacutevel Tratava-se de aproveitar as formas naturais do siacutetio urbano para

solucionar os problemas de saneamento e drenagem da cidade ou seja ao inveacutes de aterrar os

rios e igarapeacutes que percorriam Beleacutem era melhor embelezaacute-los e dar-lhes uma proteccedilatildeo

militar segura Entretanto em 1803 foi iniciado o trabalho de ensecamento do Piri

contrariando assim os planos de Gronfelts Com o aterramento do Piri ocorreu a integraccedilatildeo

fiacutesica entre os bairros da Cidade e da Campina (TRINDADE JUNIOR 1997)

Segundo Correcirca (1989 p 80) as obras do Piri foram realizadas num periacuteodo em que

tanto a regiatildeo como a cidade passavam por um decliacutenio econocircmico aproveitando-se assim a

ociosidade da matildeo-de-obra escrava A partir de 1778 a Amazocircnia passou por uma

estagnaccedilatildeo devido agrave extinccedilatildeo da Companhia do Gratildeo-Paraacute e Maranhatildeo e agrave emergecircncia de uma

situaccedilatildeo mundial desfavoraacutevel ao mercado dos produtos tropicais em geral agrave agricultura e ao

extrativismo de exportaccedilatildeo Com isso Beleacutem sofreu os efeitos do decliacutenio econocircmico aleacutem

de ter vivenciado fortes confrontos poliacuteticas decorrentes da Cabanagem (1835 - 1840)42

A Cabanagem foi entre as muitas manifestaccedilotildees ocorridas no Periacuteodo Regencial

este considerado de transiccedilatildeo devido agrave transferecircncia do poder das elites portuguesas para as

elites nacionais (ricos proprietaacuterios de terras) a manifestaccedilatildeo de caraacuteter popular que reuniu os

habitantes pobres das cidades e vilarejos ribeirinhos iacutendios negros e mesticcedilos denominados

cabanos

Devido a situaccedilatildeo de miseacuteria das classes populares que natildeo viam os seus anseios

atendidos a conjuntura de crise econocircmica por qual passava o Brasil e a pressatildeo das elites

nacionais o movimento poliacutetico social conseguiu se expandir no Paraacute e mobilizar adesotildees

crescentes no meio dos segmentos sociais pobres Entretanto esses grupos sociais e eacutetnicos

que aderiu em massa agrave revolta na tentativa de encontrar uma saiacuteda para sua situaccedilatildeo

perceberam que poderiam lutar por outros ideais jaacute que o movimento tomou dimensotildees mais

ampla de autodeterminaccedilatildeo

Os chefes cabanos declararam a autonomia da proviacutencia do Paraacute e formaram um

governo revolucionaacuterio em defesa de sua liberdade No entanto foram derrotados e

duramente massacrados

42 Ateacute esse periacuteodo ocorreram vaacuterias revoltas agitaccedilotildees e motins contra a miseacuteria das camadas populares e a opressatildeo dos iacutendios e negros

171

O governo do primeiro ministro portuguecircs Marquecircs de Pombal continuou com o

processo de ocupaccedilatildeo territorial tendo como marco a construccedilatildeo de um reduto (pequena

praccedila de guerra) agraves proximidades do antigo convento de Santo Antocircnio Esse reduto ajudava

a garantir a proteccedilatildeo da cidade jaacute que sua localizaccedilatildeo era estrateacutegica junto agrave baiacutea Assim

surgiu o nome do bairro do Reduto e do igarapeacute que existia laacute (denominado anteriormente de

Igarapeacute da Faacutebrica) Esse Igarapeacute (Fotografia 2) foi aterrado o que possibilitou a abertura de

ruas e caminhos passando desse modo a ligar o nuacutecleo da cidade agraves aacutereas adjacentes

tornando-se definitivamente inseridas ao espaccedilo urbano belenense (TRINDADE JUNIOR

1997)

Fotografia 2

Canal do Reduto (entre a Rua 28 de Setembro e a Praccedila Magalhatildees

Beleacutem-PA)

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Segundo Ferreira (1995) foi a partir de 1860 que as diferenciaccedilotildees soacutecio-espaciais

intra-urbanas comeccedilam a se evidenciar cada vez mais pelo incremento dos elementos

formadores da heterogeneidade do espaccedilo produzido e da sua valorizaccedilatildeo em Beleacutem Ou seja

a cidade jaacute havia se expandido ocupando uma aacuterea que permitiu a diversificaccedilatildeo das

localidades dentro da mesma no que se refere agraves diferenccedilas de acesso e de instalaccedilatildeo de

infraestrutura urbana

A cidade possuiacutea quatro distritos principais Cidade Campina Trindade e Nazareacute

nas quais estavam circunscritas natildeo apenas as aacutereas compreendidas no marco urbano mas

tambeacutem as povoaccedilotildees rurais e ribeirinhas localizadas em seu entorno Outras localidades

172

como Benevides Castanhal Barcarena e Santa Izabel (hoje municiacutepios independentes) faziam

parte dos marcos administrativos de Beleacutem (CANCELA 2007)

As atividades terciaacuterias foram intensificadas no bairro da Campina e no contiacuteguo

bairro do Reduto e implantadas algumas das primeiras induacutestrias de Beleacutem De acordo com

Cancela (2007) frente a liquidez da economia a expansatildeo das aacutereas de ocupaccedilatildeo e os projetos

de urbanizaccedilatildeo os Distritos ganharam novos significados

A Cidade Velha primeiro bairro da capital com suas ruas estreitas passou a ser visto como um lugar insalubre e pantanoso natildeo recomendado para as pessoas de posse Seus moradores mais antigos comeccedilaram a se mudar para as ruas e avenidas mais largas da Estrada de Nazareacute Satildeo Jerocircnimo e as travessas adjacentes O mesmo ocorreu com a Campina conhecida como segundo bairro da Cidade Parte de sua aacuterea compreendia as principais

ruas do comeacutercio de Beleacutem Nela concentrava-se um bom nuacutemero de lojas armazeacutens bancos e casas de aviamento localizados nos arredores das avenidas Joatildeo Alfredo 15ordm de Novembro 13ordm de Maio e Boulevard Castilho Franccedila Tambeacutem em suas ruas encontraacutevamos casas particulares entrecruzadas com corticcedilos hoteacuteis casas de pasto estacircncias oficinas de trabalho com quartos para morada pequenas manufaturas coleacutegios cocheiras e vacarias (CANCELA 2007 p 57-58)

Com a migraccedilatildeo intensa de nordestinos e estrangeiros estimulada pela economia da

borracha a cidade cresceu e se expandiu novas ruas e estradas como eram algumas delas

chamadas surgiram ou foram ampliadas A exemplo disto Cancela (2007) cita as Estradas de

Satildeo Braacutes da Joseacute Bonifaacutecio e do Entroncamento assim como as travessas da Rua do Jurunas

que formavam o 4ordm Distrito a Rua Grande da Pedreira as travessas do Marco da Leacutegua e do

siacutetio da Sacramenta que vieram a compor os receacutem criados 5ordm e 6ordm Distritos

O periacuteodo que compreende a segunda metade do seacuteculo XIX ateacute as primeiras deacutecadas

do seacuteculo XX caracterizou-se pelo predomiacutenio da economia da borracha na Amazocircnia

produzindo-se grandes excedentes direcionados ao mercado mundial Novas elites com

concepccedilotildees de urbano seguindo os modelos europeus direcionaram o processo de

reurbanizaccedilatildeo da cidade de Beleacutem transformando os espaccedilos e os costumes da cidade de

acordo com o que se produzia entatildeo no espelho que representava a cidade de Paris

Houve um crescimento populacional no bairro da Campina avanccedilando para o

interior Aleacutem disso vale destacar o calccedilamento de grande parte de suas ruas e agraves funccedilotildees

econocircmicas e poliacutetico-administrativas que Beleacutem passou a exercer no periacuteodo aacuteureo da Belle

Eacutepoque com a exploraccedilatildeo da borracha

173

As mudanccedilas nos serviccedilos de infraestrutura oferecidos na capital paraense que nos ajudam a entender as alteraccedilotildees pelas quais a cidade vinha passando tornam-se siacutembolos de modernidade de progresso de que algo grande e civilizado estaacute acontecendo inserindo Beleacutem no cenaacuterio das urbes mais contemporacircneas Todavia a forma de uso e vivecircncia desses serviccedilos mostrava-se diferenciado para os diversos segmentos sociais e estavam distantes do dia-a-dia de muita gente O custo da energia eleacutetrica os bonds precaacuterios de terceira linha a incipiente rede de encanamento impondo a continuidade do abastecimento de aacutegua nos poccedilos puacuteblicos para boa parte da populaccedilatildeo foram situaccedilotildees ainda encontradas na capital da belle eacutepoque que deslindaram a dificuldade das mudanccedilas chegarem ao conjunto da populaccedilatildeo A mesma dificuldade podia ser vivida para quem procurava uma casa para morar Com o crescimento da cidade e a intensa migraccedilatildeo a demanda em torno de moradia acentuou-se A compra de imoacuteveis tornou-se um dos investimentos mais rentaacuteveis da elite local Muitos deles eram comprados para arrendamento Os alugueacuteis eram altos e as possibilidades de morada restritas ou distanciadas dos locais de trabalho e de transporte (CANCELA 2007 p 60)

Durante o ciclo da borracha Beleacutem expandiu-se com extrema rapidez seguindo os

limites colocados pela existecircncia de muitas terras cortadas por igarapeacutes eou permanentemente

alagadas Esse periacuteodo da histoacuteria da cidade precisa ser destacado porque foram muitas as

transformaccedilotildees ocorridas no espaccedilo urbano

Castro (2008) argumenta que com a ascensatildeo da economia gomiacutefera a produccedilatildeo e

troca de mercadorias estendeu-se por um territoacuterio maior abrindo novas aacutereas de

povoamento

A rede que organizava a produccedilatildeo e a circulaccedilatildeo preacute-existente foi a base da produccedilatildeo inicial da borracha pois em todas as bocas de igarapeacutes e de rios com recursos e possibilidade de exploraccedilatildeo localizava-se um posto ou comeacutercio que tinha a funccedilatildeo de canalizar a produccedilatildeo agroextrativista trazida das terras interiores e de drenaacute-las para os portos de cidades maiores base da extensa rede de aviamento [] A funccedilatildeo econocircmica de circulaccedilatildeo e gestatildeo da produccedilatildeo a partir da cidade eacute a chave para o entendimento da formaccedilatildeo da rede urbana na Amazocircnia (CASTRO 2008 p 17-18)

A regiatildeo amazocircnica tornou-se interessante para o mercado exterior pois a borracha

transformou-se de droga do sertatildeo em mateacuteria-prima estrateacutegica para as induacutestrias de

pneumaacuteticos dos EUA e Europa configurando-se na quase uacutenica fonte de riqueza desta parte

do Brasil o que provocou segundo Cancela (2007 p 23-24) o periacuteodo de maior expressatildeo

poliacutetica cultural e soacutecio-econocircmico da regiatildeo Amazocircnica gerando condiccedilotildees materiais e de

vida nunca antes experimentadas propiciando novos espaccedilos vitais para a naccedilatildeo aleacutem da

revitalizaccedilatildeo de seu organismo social e financeiro

174

Com o aparecimento da vulcanizaccedilatildeo em 1839 descoberta por Charles Goodyear e

principalmente a invenccedilatildeo dos pneumaacuteticos por Dunlop em 1888 como tambeacutem a invenccedilatildeo

do automoacutevel e a massificaccedilatildeo do uso da bicicleta onde a borracha constituiacutea-se na mateacuteria-

prima fundamental satildeo os fatores responsaacuteveis pela grande corrida

agraves fontes fornecedoras

dessa mateacuteria-prima notadamente para a Amazocircnia que possuiacutea grandes densidades de

seringueiras Esta regiatildeo entatildeo tornou-se a principal fornecedora mundial43

Desta forma Beleacutem que ateacute entatildeo vinha passando por um processo de ocupaccedilatildeo

lenta baseada em atividades bem definidas (coleta extrativa das drogas do sertatildeo e uma

agricultura paralela) comeccedila a sofrer transformaccedilotildees importantes Sua principal atividade

econocircmica passa a basear-se no extrativismo gomiacutefero e um grande esforccedilo em busca da nova

riqueza eacute estabelecido fazendo aparecer novas vilas e povoados e fortalecendo outras cidades

de forma mais expressiva como Manaus

Vale ressaltar que o desenvolvimento dessa atividade provocou um crescimento

populacional e migratoacuterio especialmente a imigraccedilatildeo nordestina para a regiatildeo sendo um

fator importante para o crescimento da economia da borracha uma vez que havia a disposiccedilatildeo

matildeo-de-obra necessaacuteria agrave extraccedilatildeo do laacutetex44 nas matas amazocircnicas por um custo baixo

Analisando a historiografia pode-se afirmar que a elite mercantil formada em sua

maioria por estrangeiros passou a conquistar cada vez mais espaccedilo minimizando a influecircncia

exercida pelas famiacutelias tradicionais locais que construiacuteram suas riquezas a partir do comeacutercio

de terras e da criaccedilatildeo de animais (gado)

Os novos grupos sociais redefiniram as relaccedilotildees de influecircncia e de poder em Beleacutem

a ampliaccedilatildeo do setor de serviccedilos redimensionando a oferta de trabalho a exemplo das

profissotildees liberais e dos trabalhos temporaacuterios

(CANCELA 2007 p 59) provocando uma

alteraccedilatildeo no poder aquisitivo dos antigos proprietaacuterios de terra e dos comerciantes que

trabalhavam com exportaccedilotildees Esses grupos em particular foram os mais beneficiados

porque aleacutem de fortalecerem seu domiacutenio sobre as atividades econocircmicas mais lucrativas

ampliaram seu poder de pressatildeo e de influecircncia sobre a atuaccedilatildeo dos governos

estadual e

municipal

em funccedilatildeo de um volume maior de recursos arrecadados com o incremento das

exportaccedilotildees (SANTOS 1980)

43 Essa fase tem como pano de fundo a chamada segunda Revoluccedilatildeo Industrial caracterizada pelo excepcional progresso tecnoloacutegico da induacutestria quiacutemica da siderurgia e da eletricidade aleacutem da consolidaccedilatildeo do capital financeiro que proporcionou o surgimento das grandes corporaccedilotildees industriais 44 O laacutetex eacute um produto da seringueira tambeacutem denominada hevea brasiliensis que se destaca particularmente por sua elasticidade e impermeabilidade

175

Outro fator importante a ser destacado eacute a implantaccedilatildeo de infraestruturas que

facilitariam de maneira significativa o transporte dos produtos das cidades de Beleacutem e

Manaus para o exterior Estas cidades eram portuaacuterias e se constituiacuteram em porta de entrada

para a Amazocircnia pois possuiacuteam posiccedilatildeo privilegiada no escoamento da produccedilatildeo do Meacutedio

Amazonas e seus afluentes tornando-as com isso mais competitiva Os seringais eram os

lugares de produccedilatildeo e a cidade o lugar de comeacutercio A borracha representa o momento mais

importante da formaccedilatildeo da rede urbana ainda que incipiente com o povoamento e a

formaccedilatildeo de cidades em funccedilatildeo dos fluxos econocircmicos (CASTRO 2008 p 18)

Beleacutem constituiacutea-se num porto privilegiado por sua posiccedilatildeo geograacutefica servindo de entreposto aos navios que chegavam ou saiacuteam da regiatildeo amazocircnica transportando mercadorias e pessoas Durante muito tempo a borracha produzida no Amazonas e no Acre saiacutea do Brasil pelas aacuteguas belenense Mesmo apoacutes a diminuiccedilatildeo da produccedilatildeo da borracha em terras paraenses a capital continuou com um volume alto de negoacutecios em seu porto particularmente em funccedilatildeo das partidas de borracha advindas do Acre (CANCELA 2007 p 62)

Com a abertura dos portos a navios estrangeiros a atratividade de Beleacutem cresceu

muitas empresas fecharam suas portas em Manaus e se mudaram para a cidade portuaacuteria do

Paraacute intensificando o processo de urbanizaccedilatildeo da cidade

Castro (2008) ressalta que o modelo de povoamento baseia-se nos ciclos econocircmicos

e na loacutegica do trabalho escravo nas fazendas no interior e nas cidades nas quais se realizam

o escoamento da produccedilatildeo caracterizando o padratildeo campo-cidade

A respeito disso Lefebvre (1991 p 31-32) argumenta que a separaccedilatildeo entre a cidade

e o campo toma lugar entre as primeiras e fundamentais divisotildees do trabalho (a bioloacutegica e a

teacutecnica) Ela corresponde agrave separaccedilatildeo entre o trabalho material e o trabalho intelectual pois agrave

cidade cabem funccedilotildees de organizaccedilatildeo direccedilatildeo atividades poliacuteticas militares e elaboraccedilatildeo do

conhecimento

Nesse sentido Castro (2008) argumenta que as cidades tinham a funccedilatildeo de organizar

o mercado fluxos de comeacutercio exportaccedilatildeo entre outros e destaca que ateacute 1940 a grande

maioria da populaccedilatildeo brasileira estava no campo sendo que somente em 1960 haacute uma

transformaccedilatildeo do movimento demograacutefico com fluxos migratoacuterios do campo para as cidades

decorrente do processo de industrializaccedilatildeo a qual se constitui um novo processo de

acumulaccedilatildeo do capital conforme demonstrado na tabela 5

176

Tabela 5 - Crescimento Populacional e Urbanizaccedilatildeo no Brasil e na Regiatildeo Norte 1940-2000 Ano Brasil Regiatildeo Norte

Populaccedilatildeo Urbano Populaccedilatildeo Urbano 1940 41236315 3120 1462420 2770 1950 51944397 3620 1844655 3150 1960 70070457 4470 2561782 3750 1970 93139037 5590 3603860 4510 1980 119002706 6760 5880268 5170 1991 150367800 7500 9337150 5780 2000 169799170 8100 12900704 6987 Fonte IBGE Censos demograacuteficos de 1940 a 2000 (apud CASTRO 2008)

Dessa forma as poliacuteticas desenvolvimentistas impostas pelo governo federal nesse

periacuteodo fruto do processo de expansatildeo da fronteira capitalista no paiacutes para a regiatildeo

amazocircnica resultaram num processo de desarticulaccedilatildeo da atividade extrativa causando

enormes danos soacutecio-econocircmicos e ambientais agraves populaccedilotildees tradicionais

O aumento das aacutereas desflorestadas da Amazocircnia e os resultados desse processo tais

como a erosatildeo do solo e a poluiccedilatildeo das aacuteguas tecircm evidenciado a necessidade de reflexatildeo

sobre as formas tradicionais de uso da terra paralelo agrave formulaccedilatildeo de perspectivas que

combinem tanto a preservaccedilatildeo dos recursos naturais quanto agrave elevaccedilatildeo e regularidade do

niacutevel de renda dos extrativistas

Para Trindade Junior (1997) coube principalmente ao Estado controlado pela elite

regional a tarefa de direcionar a atividade econocircmica de replanejar a cidade bem como de

criar mecanismos de controle da vida social de seus habitantes de forma a adequar a

organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano agraves exigecircncias trazidas pelo novo momento econocircmico

Esse novo momento aleacutem de gerar um crescimento populacional significativo45

acarretou em uma seacuterie de medidas voltadas para a (re)estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano jaacute que a

cidade passou a ter maiores dimensotildees e relevacircncia enquanto locus de acumulaccedilatildeo e

conservaccedilatildeo da riqueza gerada pela produccedilatildeo gomiacutefera

Dessa maneira a riqueza acumulada associada agrave aquisiccedilatildeo de terras deixou sua

marca na construccedilatildeo de um conjunto arquitetocircnico

teatro palaacutecios palacetes dentre outras

edificaccedilotildees

que realccedilou as influecircncias de estilos e traccedilos proacuteprios da arquitetura francesa

Tambeacutem haacutebitos culturais passaram a tomar como referecircncia valores e comportamentos

45 Na condiccedilatildeo de um dos maiores centros dinacircmicos de exportaccedilatildeo do laacutetez Beleacutem que em 1850 exibia cerca de 20000 habitantes chega em 1900 com cerca de 100000 habitantes Em 1920 eram 236402 os que habitavam esse municiacutepio Em grande medida esse incremento populacional na ordem de 1082 deveu-se ao deslocamento em massa de nordestinos para a regiatildeo norte (RODRIGUES 2000)

177

tiacutepicos dos franceses mais abastados Por sua beleza arquitetocircnica e por seu modo de vida

Beleacutem ficou conhecida como Paris n Ameacuterica 46

Pode-se afirmar que a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano da cidade marcou

historicamente o processo segregatoacuterio que atualmente ainda evidencia-se em Beleacutem Logo

o desenvolvimento urbano foi uma condiccedilatildeo necessaacuteria e estabelecida no periacuteodo de

desenvolvimento industrial no seacuteculo XX na maioria das capitais brasileiras e em Beleacutem natildeo

foi diferente

Ao longo desses anos a cidade principalmente um nuacutecleo mais central onde

residiam as famiacutelias mais tradicionais e poderosas passou a contar com uma seacuterie de

melhoramentos tais como ampliaccedilatildeo da rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica de abastecimento de

aacutegua e esgotos de telefonia e de transportes coletivos

os bondes

A grande expectativa era de que a partir desse momento a cidade pela criaccedilatildeo de

uma melhor infraestrutura urbana atraiacutesse novos comerciantes e investidores interessados em

dinamizar as atividades produtivas tradicionais e gerar novas Contudo a mesma cidade que

ostentava o luxo e o ouro proveniente dos negoacutecios bem sucedidos envolvendo a borracha

por exemplo tambeacutem era marcada pela evidecircncia de um fenocircmeno ainda bastante atual

a

periferizaccedilatildeo das camadas pobres e sua consequumlente deterioraccedilatildeo das condiccedilotildees gerais de

vida

Nesse periacuteodo ocorreram vaacuterios conflitos tipicamente urbanos como protesto contra

o aumento dos impostos o aumento de preccedilos dos produtos consumidos pelas classes

populares melhorias salariais melhores condiccedilotildees de vida e de moradia e outros As elites

dominantes respondiam a essas manifestaccedilotildees via controle social por meio de poliacuteticas e leis

restritivas a trabalhadores imigrantes criando programas sociais integrativos etc

A estrateacutegia de segregaccedilatildeo e de valorizaccedilatildeo espaciais passou a ser tatildeo eficiente que

as pessoas que natildeo possuiacuteam recursos para reformar suas casas e adaptaacute-las aos modelos

concebidos eram direta ou indiretamente levadas a se mudar para aacutereas afastadas do centro

urbano que eram locais muitas vezes sem saneamento baacutesico como por exemplo as aacutereas de

vaacuterzeas poreacutem estas ainda apresentavam nessa eacutepoca ocupaccedilatildeo inexpressiva

Os setores urbanos habitados pelas camadas populares ou de menor poder aquisitivo

e portanto que mais precisavam de melhorias e saneamento ficaram desprovidas de novos

investimentos em infraestrutura urbana uma vez que a maior parte dos recursos financeiros

46 Tambeacutem podem ser destacadas as expressivas construccedilotildees de luxo e modernizaccedilatildeo da cidade tais como a do Palaacutecio Lauro Sodreacute do Coleacutegio Gentil Bittencourt Teatro da Paz (1878) Palaacutecio Antocircnio Lemos e o do Mercado do Ver-o-Peso (1901)

178

estaduais e municipais era destinada ao atendimento dos segmentos sociais ligados ao luxo e

aos gastos que o comeacutercio da borracha propiciava (FERREIRA 1995)

Beleacutem avanccedilou o seacuteculo XX como outras cidades brasileiras com problemas de

administraccedilatildeo e de infraestrutura de poliacuteticas puacuteblicas e de investimentos A formaccedilatildeo de

novos nuacutecleos urbanos e o inchamento dos jaacute existentes seguiu uma loacutegica que atraiu

repentinamente trabalhadores oriundos das mais diversas localidades expulsando-os para a

periferia das cidades tornando seu assentamento e suas condiccedilotildees gerais de vida cada dia

mais difiacuteceis

Com as ocupaccedilotildees irregulares a falta de uma infraestrutura sanitaacuteria e o descaso de

sucessivas administraccedilotildees municipais com a qualidade dos programasprojetos de poliacuteticas

urbanas completou-se o quadro de agravamento da miseacuteria social e da degradaccedilatildeo ambiental

passando a se constituir em importantes moacuteveis de lutas urbanas

Na deacutecada de 1940 ocorreu a apropriaccedilatildeo de grandes extensotildees de terras situadas

nas imediaccedilotildees do limite da Primeira Leacutegua Patrimonial47 de Beleacutem por parte de instituiccedilotildees

puacuteblicas tais como Correios Companhia de Saneamento do Estado do Paraacute (COSANPA)

Universidade Federal do Paraacute (UFPA) e Aeroporto e militares (Marinha Exeacutercito e

Aeronaacuteutica) que passaram a se constituir em um obstaacuteculo agrave expansatildeo da malha urbana

Essa extensa aacuterea apropriada pelas instituiccedilotildees ficou conhecida como cinturatildeo institucional

(FERREIRA 1995)

Com esse impedimento de crescimento seguindo o espigatildeo principal a Av Tito

Franco (hoje denominada de Av Almirante Barroso) (Fotografia 3) as camadas populares

passaram a ocupar as aacutereas de cotas baixas da cidade que satildeo conhecidas como aacutereas de

baixadas nas quais a implantaccedilatildeo de equipamentos coletivos eacute dificultada e quando existe eacute

extremamente precaacuteria

47 Aacuterea de terra de aproximadamente uma leacutegua (contada a partir do marco de fundaccedilatildeo da cidade) doada em 1627 pelo Governo e Capitatildeo Geral do Estado do Maranhatildeo e Gratildeo Paraacute ao Conselho Municipal de Beleacutem ficando a partir desse momento sob o Jus Domini do Governo desse Municiacutepio O limite da Primeira Leacutegua localiza-se no atual bairro do Marco assim chamado por ter sido nele onde foi fixado um marco desse limite (Av Almirante Barroso com a Av Dr Freitas) (CRUZ apud TRINDADE JUNIOR 1997)

179

Fotografia 3

Av Tito Franco (hoje Av Almirante Barroso)

Preacutedio da Escola de Agronomia

Beleacutem-PA

Fonte Acervo Beleacutem da Saudade (sd)

Conforme citado anteriormente as baixadas48 satildeo aacutereas alagadas ou alagaacuteveis que

segundo estudo publicado em 1976 correspondiam a 40 da aacuterea urbana do municiacutepio de

Beleacutem (SUDAM apud TRINDADE JUNIOR 1997) abrangendo mais de 45 da populaccedilatildeo

distribuiacuteda nos diversos bairros da cidade Essas aacutereas ficaram conhecidas principalmente a

partir da deacutecada de 1960 por serem espaccedilos de moradia das camadas sociais de baixo poder

aquisitivo (TRINDADE JUNIOR 1997)

De acordo com Pinheiro et al (2007) agrave medida que os igarapeacutes foram aterrados

surgiram outros bairros compondo a 1ordf Leacutegua Patrimonial A rigor as baixadas se

constituiacuteram tambeacutem em aacutereas onde ocorreram os maiores conflitos fundiaacuterios entre os anos

de 1960 e 1970 aleacutem das principais intervenccedilotildees puacuteblicas da poliacutetica habitacional marcada

pelas estrateacutegias de remoccedilatildeo e reassentamento Pode-se dizer que essas estrateacutegias tecircm sido o

principal objetivo das poliacuteticas habitacionais ateacute os dias atuais

Cabe destacar a existecircncia de trecircs grandes vetores de periferizaccedilatildeometropolizaccedilatildeo da

pobreza relacionados agrave questatildeo da moradia no periacuteodo de 1960 a 1990 que segundo Pinheiro

et al (2007 p 159) constata-se uma reproduccedilatildeo simultacircnea de subespaccedilos fiacutesicos e sociais

48 Trindade Junior (1997) tomando como referecircncia a concepccedilatildeo de espaccedilo de Santos considera as baixadas

enquanto espaccedilos segregados socialmente excluiacutedos com deficiecircncia e insuficiecircncia de equipamentos urbanos e comunitaacuterios

como espaccedilo sem cidadatildeos independentemente das condiccedilotildees do siacutetio urbano Nesse sentido para as pessoas que habitam esses espaccedilos eacute negado o direito agrave cidadania e os meios de consumo coletivo satildeo ausentes ou insuficientes

180

marcados pela segregaccedilatildeo e pobreza urbana entre os quais trecircs se destacam as baixadas

invasotildees de terras e conjuntos habitacionais 49

Esses trecircs grandes vetores relacionados agrave questatildeo da moradia das lutas e

mobilizaccedilotildees pelo direito de morar na RMB satildeo

1) As ocupaccedilotildees coletivas na aacuterea central da RMB basicamente nas chamadas aacutereas de baixadas restritas ao municiacutepio de Beleacutem nas deacutecadas de 1960 e 1970 e em menor volume nas deacutecadas de 1980 e 1990

2) As ocupaccedilotildees na chamada aacuterea de transiccedilatildeo apoacutes o centro expandido do municiacutepio de Beleacutem formaccedilatildeo de bairros com famiacutelias removidas das aacutereas urbanizadas no centro de Beleacutem

3) A aacuterea de expansatildeo urbana no sentido nordeste da RMB envolvendo primeiramente os municiacutepios de Ananindeua e ilhas e posteriormente os demais municiacutepios que compotildeem a RMB Em Ananindeua e distritos de Beleacutem (Icoaraci e Outeiro) destacam-se as invasotildees a conjuntos habitacionais (PINHEIRO et al 2007 p 159)

Com relaccedilatildeo aos movimentos populares surgiram nesse periacuteodo vaacuterios movimentos

que organizaram mobilizaccedilotildees manifestaccedilotildees mais radicais atos puacuteblicos manifestos de

todos os tipos reivindicando equipamentos coletivos urbanizaccedilatildeo de aacutereas segregadas e

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Segundo a Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (1984) as vitoacuterias alcanccediladas pelos

Comitecircs foram isenccedilatildeo das deacutecimas (imposto predial) instalaccedilatildeo de postos de abastecimento

de gecircneros alimentiacutecios de 1ordf necessidade instalaccedilatildeo de cooperativas nos bairros limpeza de

ruas abastecimento de aacutegua e fornecimento de energia eleacutetrica e isenccedilatildeo de taxas escolares

Entretanto em 1947 haacute um endurecimento do regime que governava o Paiacutes com uma

perseguiccedilatildeo a toda iniciativa de luta e resistecircncia das camadas populares com isso os

Comitecircs Democraacuteticos Populares (CDP) foram desativados

O modelo autoritaacuterio-centralizador de poliacuteticas puacuteblicas regionais que se

desenvolveram na Amazocircnia (Quadro 6) a partir da deacutecada de 1950 com o objetivo de

integrar a regiatildeo ao Centro-Sul resultou em significativas alteraccedilotildees nos padrotildees soacutecio-

espaciais de ocupaccedilatildeo urbana em Beleacutem

49 Historicamente podem-se indicar dois grandes eixos de ocupaccedilatildeo urbana a BR-316 em direccedilatildeo aos municiacutepios de Ananindeua Marituba Benevides e Santa Baacuterbara e a rodovia Augusto Montenegro em direccedilatildeo aos distritos de Icoaraci Outeiro Val-de-Cans Tenoneacute e Ilhas (PINHEIRO et al 2007)

181

Quadro 6

Principais elementos da estrateacutegia de ocupaccedilatildeo da Amazocircnia (1953 a 1988)

Ano Programas Projetos e Oacutergatildeos Executores Objetivos

1953

SPVEA

Superintendecircncia do Plano de Valorizaccedilatildeo

Econocircmica da AmazocircniaPresidecircncia da Repuacuteblica

Elaborar planejamentos quumlinquumlenais para valorizaccedilatildeo econocircmica da Amazocircnia

1958

Rodovia Beleacutem-Brasiacutelia (BR-010)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a Amazocircnia Oriental ao resto do paiacutes

1960

Rodovia Cuiabaacute-Porto Velho (BR-364)Ministeacuterio dos Transportes DNER

Implantar um eixo pioneiro para articular a porccedilatildeo meridional da Amazocircnia

1966 SUDAM

Superintendecircncia do Desenvolvimento da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior

Coordenar e supervisionar programas e planos regionais decidir sobre a redistribuiccedilatildeo de incentivos fiscais

1967 SUFRAMA

Superintendecircncia da Zona Franca de ManausMinisteacuterio do Interior

Integrar a porccedilatildeo ocidental da Amazocircnia mediante criaccedilatildeo de um centro industrial e agropecuaacuterio e isenccedilatildeo de impostos

1968 Comitecirc Organizador dos Estados Energeacuteticos da AmazocircniaMinisteacuterio das Minas e Energia

Supervisionar estudos referentes ao aproveitamento do potencial energeacutetico

Incentivos FiscaisSUDAM Promover investimentos na regiatildeo por meio de deduccedilotildees tributaacuterias significativas

1970

PIN

Programa de Integraccedilatildeo Nacional Estender a rede rodoviaacuteria e implantar projetos de colonizaccedilatildeo oficial nas aacutereas de atuaccedilatildeo da SUDENE e SUDAM

Proterra

Programa de Redistribuiccedilatildeo de Terras e Estimulo agrave Agroinduacutestria do Norte e Nordeste

Promover a capitalizaccedilatildeo rural

Incra

Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma AgraacuteriaMinisteacuterio do Interior

Executar a estrateacutegia de distribuiccedilatildeo controlada de terra

1974

Polamazocircnia

Programa de Poacutelos Agropecuaacuterios e Agrominerais da AmazocircniaMinisteacuterio do Interior Agricultura e Transporte

Concentrar recursos em aacutereas selecionadas visando o estiacutemulo de fluxos migratoacuterios elevaccedilatildeo do rebanho e melhoria da infraestrutura urbana

1980

Getat

Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins Gebam

Grupo Executivo para a Regiatildeo do Baixo Amazonas SGCSPR

Regularizaccedilatildeo fundiaacuteria discriminaccedilatildeo de terras e distribuiccedilatildeo de tiacutetulos

PGC

Programa Grande Carajaacutes SeplanPR

Explorar de forma integrada em grande escala recursos minerais e agroflorestais da regiatildeo

1981 PolonoroesteMinisteacuterio da Agricultura Transportes e Interior

Pavimentar a BR-364 promover a colonizaccedilatildeo

1985 PCN Projeto Calha Norte SGCSNPR

Oficialmente assegurar a soberania nacional fiscalizar a circulaccedilatildeo e assistir iacutendios

1987 Projeto 2010Ministeacuterio das Minas e Energia Eletronorte

Implantar rede hidreleacutetrica para estimular o desenvolvimento industrial da regiatildeo

1988 Programa Nossa NaturezaMinisteacuterio do Interior SA-DENPR

Oficialmente rever legislaccedilatildeo ambiental para a regiatildeo e zoneamento agroecoloacutegico na Amazocircnia

Fonte Becker (1994)

Com a construccedilatildeo da rodovia Beleacutem-Brasiacutelia facilitou-se a inserccedilatildeo de grande

contingente migratoacuterio estimulado pela promessa de terras abundantes e de faacutecil acesso tendo

em vista a garantia da forccedila de trabalho necessaacuteria agrave implantaccedilatildeo dos grandes projetos

182

Desse modo a Amazocircnia consolidava seu papel como fronteira de expansatildeo da

acumulaccedilatildeo por meio da implantaccedilatildeo de projetos destinados agrave exploraccedilatildeo de recursos

minerais agrave extraccedilatildeo de recursos naturais (como os projetos de empresas madeireiras) agraves

produccedilotildees agropecuaacuterias e agro-industriais agraves linhas de montagem industrial etc (SOUZA

1992 p 21-22)

Para Becker (1994) a fronteira natildeo eacute um fenocircmeno isolado Ela eacute definida em

relaccedilatildeo a um espaccedilo estruturado e sua potencialidade alternativa eacute circunscrita a limites

impostos pela formaccedilatildeo social em que se situa A expansatildeo da fronteira amazocircnica soacute pode

portanto ser compreendida a partir da inserccedilatildeo do Brasil no sistema capitalista global do poacutes-

Segunda Guerra Mundial em que o capitalismo atua no espaccedilo planetaacuterio mas os Estados

Nacionais conservam sua funccedilatildeo de controle e hierarquizaccedilatildeo constituindo-se agentes

primordiais na produccedilatildeo do novo espaccedilo

Assim o crescimento da cidade de Beleacutem e das demais capitais amazocircnicas

expressa por um lado a criaccedilatildeo de novas atividades urbanas pelo Estado e pelas empresas

privadas e por outro a profunda decadecircncia e transformaccedilatildeo das atividades agropecuaacuterias e

extrativistas que passam a desencadear correntes migratoacuterias no sentido rural-urbano

definindo formas marcantes de apropriaccedilatildeo do espaccedilo da cidade e de constituiccedilatildeo de sua

paisagem como por exemplo a produccedilatildeo de favelas (CORREcircA 1989)

Segundo Trindade Junior (1997) a produccedilatildeo do espaccedilo belenense eacute influenciada por

programas de renovaccedilatildeo urbana e pelo papel das camadas populares Nesse sentido os

principais agentes do processo de produccedilatildeo do urbano passam a ser aleacutem das camadas

populares o Estado e o capital imobiliaacuterio que exerceram uma accedilatildeo mais expressiva na

organizaccedilatildeo espacial

De acordo com a CODEM (1987) o crescimento demograacutefico que ocorreu em

Beleacutem desde a deacutecada de 1950 deu origem a quatro tipos de ocupaccedilatildeo do espaccedilo a

verticalizaccedilatildeo a ocupaccedilatildeo dos centros de quadras por meio da propagaccedilatildeo de vilas e

passagens50 aumentando a densidade populacional das terras firmes ou terraccedilos e substituindo

a vegetaccedilatildeo pelas construccedilotildees urbanas a ocupaccedilatildeo das aacutereas aleacutem do cinturatildeo institucional

por meio de conjuntos habitacionais de induacutestrias e de habitaccedilotildees perifeacutericas de baixo padratildeo

construtivo e a ocupaccedilatildeo das planiacutecies de inundaccedilatildeo da cidade

50 Vilas conjunto de pequenas habitaccedilotildees independentes em geral idecircnticas ou de mesmo padratildeo habitacional e disposta de modo a formar rua ou praccedila no interior de quadras Passagens denominaccedilatildeo aplicada agraves vias com largura compreendida entre 4 e 8 metros (CODEM 1987)

183

Com a ultrapassagem do cinturatildeo institucional a malha urbana se expandiu para a

Segunda Leacutegua Patrimonial51 seguindo o eixo das rodovias BR-316 e Augusto Montenegro

ocupando aacutereas vizinhas (Ananindeua Marituba e Benevides)

Entretanto mesmo com a ultrapassagem do cinturatildeo os investimentos urbanos e os

empregos ficaram restritos agraves aacutereas centrais principalmente nos bairros de Nazareacute e

Comeacutercio na Primeira Leacutegua Patrimonial Assim o capital imobiliaacuterio ganhou importacircncia e

avanccedilou os processos de verticalizaccedilatildeo nessas aacutereas Esse processo exigiu a ampliaccedilatildeo e a

renovaccedilatildeo de serviccedilos urbanos e de infraestrutura aumentando ainda mais a valorizaccedilatildeo

desses espaccedilos em detrimento do restante da cidade onde se ampliaram as necessidades de

infraestrutura urbana principalmente nas baixadas

As baixadas satildeo caracterizadas segundo Trindade Junior (1997 p 28) de acordo

com as condiccedilotildees socioeconocircmicas de seus habitantes e satildeo configuradas pela precariedade de

moradia e dos equipamentos coletivos

A populaccedilatildeo dessas aacutereas caracteriza-se pela falta de qualificaccedilatildeo profissional e baixo niacutevel socioeconocircmico enfrentando consequumlentemente seacuterios problemas de empregos e subempregos acrescendo-se a isso grande nuacutemero de elementos que compotildeem os grupos familiares residindo em reduzidos cocircmodos habitaacuteveis sem condiccedilotildees de higiene e conforto refletindo-se essa situaccedilatildeo na sauacutede da comunidade

Trindade Junior ressalta que outras caracteriacutesticas podem ser somada as condiccedilotildees

socioeconocircmicas tais como

1) Aacutereas de habitaccedilatildeo subnormal desordenadamente distribuiacutedas e que obstruem natildeo o raro o escoamento hiacutedrico em face do deficiente sistema de macro drenagem existente

2) Com um sistema viaacuterio deficiente o que impossibilita o desenvolvimento do traacutefego normal da cidade e prejudica os serviccedilos de transporte coletivo destinado ao atendimento dessas populaccedilotildees

3) A circulaccedilatildeo interna de pedestres nas aacutereas de baixadas se faz de forma precaacuteria em geral atraveacutes de estivas de madeira quase sempre em peacutessimo estado de conservaccedilatildeo

4) O transporte coletivo que atende as baixadas se limita a circular dada a falta de condiccedilotildees para traacutefego interno em sua periferia obrigando os moradores de tais aacutereas a realizar por vezes grandes deslocamentos diaacuterios a peacute ateacute os pontos de ocircnibus

5) A impossibilidade de implantaccedilatildeo de sistemas de aacutegua potaacutevel de esgotos sanitaacuterios e de coleta de lixo

51 Corresponde a outra leacutegua acrescentada agrave Primeira Leacutegua Patrimonial no final do seacuteculo XIX doadas pelo Governo do Estado mas que diferentemente da outra doaccedilatildeo natildeo chegou a ser delimitada (TRINDADE JUNIOR 1998 p 104)

184

6) A impossibilidade de distribuiccedilatildeo de energia eleacutetrica atraveacutes de redes de alta tensatildeo e por fim

7) A carecircncia de equipamentos urbanos de educaccedilatildeo e sauacutede obriga o deslocamento da populaccedilatildeo que deles necessita para aacutereas de cotas mais altas (ABELEacuteM apud TRINDADE JUNIOR 1997 p 28)

O referido autor argumenta tambeacutem que as baixadas satildeo consideradas espaccedilos sem

cidadatildeos pois o valor do homem estaacute relacionado ao local onde habita ao qual eacute negado o

direito agrave cidadania Seu valor como produtor consumidor cidadatildeo depende da sua

localizaccedilatildeo no territoacuterio Seu valor vai mudando [] para melhor ou para pior em funccedilatildeo das

diferenccedilas de acessibilidade (TRINDADE JUNIOR 1997 p 29)

As baixadas foram ocupadas por famiacutelias de baixo poder aquisitivo oriundas do

interior do Estado e de outros Estados em especial do Nordeste que seja pela expulsatildeo

acarretada pelas secas ou pelo processo de expansatildeo capitalista na Amazocircnia e seus discursos

ideoloacutegicos de oportunidade de emprego e melhores condiccedilotildees de vida deslocaram-se para a

cidade em busca de satisfazer agraves suas necessidades emprego e de moradia ocupando as aacutereas

alagadas bastante segregadas com grande densidade demograacutefica e com base na

autoconstruccedilatildeo de moradias (tipo palafitas) em terrenos puacuteblicos eou improacuteprias para

ocupaccedilatildeo edificada

Sendo assim essas famiacutelias migrantes ou natildeo para sobreviver na cidade buscaram

soluccedilotildees de moradia principalmente sobre o alagado ou em trechos distantes passando o

cinturatildeo institucional ampliando a periferia da cidade Assim construiacuteram casas de madeira

sobre estacas (Fotografia 4) cujo acesso era possiacutevel por meio de estivas (pontes de madeira)

ou aterravam as aacutereas com material fornecido pela Prefeitura ou conseguindo por ela proacutepria

tais como caroccedilo de accedilaiacute bagaccedilo de cana serragem de madeira e casca de castanha-do-paraacute

185

Fotografia 4 - Casas de madeira construiacutedas sobre estacas (Vila da Barca

Beleacutem-PA)

Fonte SEHAB (2010)

Tambeacutem procuravam resolver sua necessidade por serviccedilos de forma alternativa por

meio de ligaccedilotildees clandestinas de energia e aacutegua e na grande maioria das vezes de utilizaccedilatildeo

dos igarapeacutes como esgoto e depoacutesito de lixo Estes fatores criaram uma situaccedilatildeo em que as

condiccedilotildees de habitabilidade estavam muito baixas dos paracircmetros miacutenimos satisfatoacuterios

gerando um quadro de pobreza doenccedilas e baixa perspectiva de vida agravados pela ausecircncia

de efetivas accedilotildees governamentais voltadas ao enfrentamento da segregaccedilatildeo social

O migrante ao chegar a cidade vecirc dissipada sua ilusatildeo de liberdade de opccedilatildeo pelo emprego que mais lhe convecircm ou agrada Na verdade natildeo eacute apenas o direito e opccedilatildeo que natildeo tem muitas vezes natildeo encontra nenhuma chance de obter um emprego no mercado formal de trabalho Recorre entatildeo ao mercado informal de qualquer forma a cidade lhe oferece maiores vantagens do que o campo em termo de oportunidade de educaccedilatildeo assistecircncia meacutedica e tambeacutem de trabalho desempenhando diversas atividades nas quais geralmente tem a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia (ABELEacuteM 1989 p 21)

Destarte a partir do crescimento acelerado da cidade em direccedilatildeo agraves alagadas

agravam-se os problemas sociais a escassez de terras na aacuterea central o seu alto custo e a

consequumlente especulaccedilatildeo imobiliaacuteria a proliferaccedilatildeo de doenccedilas e as pressotildees exercidas pela

populaccedilatildeo principalmente na eacutepoca de chuvas foram fatores que conduziram o poder puacuteblico

a intervir de forma sistemaacutetica inicialmente por meio da instalaccedilatildeo do Departamento

Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) com o objetivo de intervir nas baixadas por meio

de um programa de construccedilotildees de canais iniciado em 1962 na bacia da Tamandareacute

estendendo-se ateacute 1967 Nessa mesma deacutecada tiveram iniacutecio as obras de saneamento do

186

Canal das Almas (atual Av Visconde de Souza Franco) como parte do programa de combate

agraves doenccedilas endecircmicas (TRINDADE JUNIOR 1997)

Na deacutecada de 1970 percebeu-se o crescimento e a expansatildeo urbana do municiacutepio por

meio de unidades imobiliaacuterias cadastradas em sua aacuterea urbana segundo levantamento do

Cadastro Teacutecnico Multifinalitaacuterio (CTM)52 naquele ano estavam cadastrados 120000

unidades habitacionais e em 2000 existiam 362064 cadastros (CODEMCTM) o que reflete

na taxa de urbanizaccedilatildeo a qual atinge cerca de 9953 segundo dados de Censo2000

Historicamente o fluxo migratoacuterio da referida deacutecada trouxe consequumlecircncias

negativas no que concerne a questatildeo da moradia no municiacutepio de Beleacutem uma vez que as

aacutereas alagadas conhecidas como baixadas foram ocupadas proporcionando uma condiccedilatildeo de

moradia subumana

O principal motivo de ocupaccedilatildeo desses espaccedilos foi a necessidade de moradia e o

faacutecil acesso a cidade aleacutem da ausecircncia de taxas e tributos jaacute que nessas aacutereas os serviccedilos e

equipamentos urbanos satildeo quase que inexistentes acarretando no agravamento da segregaccedilatildeo

e fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Entretanto faz-se necessaacuterio enfatizar que a urbanizaccedilatildeo amazocircnica natildeo eacute fruto

somente da migraccedilatildeo para a regiatildeo eou aumento do nuacutemero de cidades mas estaacute vinculada a

outros dois fatores 1) refere-se ao modo de integraccedilatildeo econocircmica do espaccedilo e 2) trata-se da

ordem ideoloacutegica e cultural responsaacutevel pela introduccedilatildeo na regiatildeo de normas e costumes

Constata-se assim que houve uma ampla intervenccedilatildeo econocircmica na regiatildeo gerando

transformaccedilotildees nos contextos sociais poliacuteticos econocircmicos e culturais produzindo uma nova

(re)configuraccedilatildeo do espaccedilo amazocircnico Esse processo de ocupaccedilatildeo causou a modificaccedilatildeo do

padratildeo de circulaccedilatildeo existente vinculada agrave rede dendriacutetica (BECKER 1994)

A abertura da malha rodoviaacuteria e fluvial implicou na multiplicaccedilatildeo de povoados e

vilarejos na regiatildeo amazocircnica Nesse sentido Beleacutem e Manaus assumiram a posiccedilatildeo de

metroacutepoles regionais A poliacutetica de incentivos fiscais atraiu empresas transnacionais para a

regiatildeo intensificando o fluxo migratoacuterio que formaram nuacutecleos de povoamento proacuteximo aos

grandes investimentos e as margens das estradas Todavia as induacutestrias que se instalaram na

regiatildeo natildeo absorveram o grande contingente populacional acarretando no aumento do

desemprego e consequumlentemente da pobreza na regiatildeo

52 TCM eacute um sistema de dados municipais de natureza alfanumeacuterica e graacutefica (mapas e imagens) organizados de maneira a possibilitar a visualizaccedilatildeo de informaccedilotildees por meio de mapas temaacuteticos tabelas e relatoacuterios que reuacutene dados baacutesicos essenciais ao planejamento e acompanhamento da gestatildeo municipal

187

Nesse sentido iniciou-se em Beleacutem uma seacuterie de pressotildees para desapropriaccedilatildeo seja

para fins de programas de governo de renovaccedilatildeo urbana seja para atender a pressotildees da

populaccedilatildeo que reclamava pelo direito de morar seja para atender a interesses de proprietaacuterios

(ABELEacuteM 1988)

Segundo Abeleacutem (1988) inicialmente a luta pela posse de terra urbana em Beleacutem se

deu de forma isolada e a populaccedilatildeo envolvida reagia em cada caso sem plena consciecircncia de

que seus problemas eram comuns agrave moradores de outros bairros como era o caso da aacuterea dos

Correios no bairro da Marambaia cuja luta pela desapropriaccedilatildeo iniciou-se em 1970 e o de

expulsatildeo dos moradores das terras da Aeronaacuteutica no bairro da Sacramenta em 1972 A

partir daiacute os conflitos se alastraram por vaacuterios bairros de Beleacutem

Os anos 1970 foram marcados em escala nacional por uma forte crise poliacutetica que se abateu sobre o regime militar em vigecircncia o que proporcionou a abertura de mais espaccedilos para a sociedade civil se organizar trazendo para o cenaacuterio poliacutetico atores que passam a redefinir-se a reconhecer-se mutuamente a decidir e a agir em conjunto apresentando-se como novo sujeito social no interior dos movimentos sociais (CRUZ 1994 p 65)

Foi nesse cenaacuterio de conflitos sociais oriundos da segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de luta

pela moradia que surgiram as organizaccedilotildees comunitaacuterias e movimentos em defesa da reforma

urbana nos quais foram gerados processos de reivindicaccedilotildees coletivas em torno do direito de

morar

Essas reivindicaccedilotildees em Beleacutem ganharam expressividade a partir da deacutecada de

197053 devido agraves vaacuterias formas de organizaccedilatildeo popular que passaram a surgir reivindicando

demandas especiacuteficas como saneamento baacutesico creches escolas transportes postos de

sauacutede habitaccedilatildeo dentre outras

Dessa forma a luta pela posse de terra e pelos serviccedilos baacutesicos de infraestrutura

sauacutede e educaccedilatildeo implementou formas de constituiccedilatildeo e empoderamento pela base na praacutexis

cotidiana dando origem agrave constituiccedilatildeo de novos agentes sociais coletivos e de identidades

Conforme Souza (1990) de 1964 a 1974 a poliacutetica do Estado Nacional brasileiro foi

sobretudo uma poliacutetica de resistecircncia e opressatildeo agraves camadas populares e se expressou por

meio de prisotildees suspensatildeo dos direitos poliacuteticos cassaccedilatildeo de mandatos controle poliacutetico e

53 A participaccedilatildeo popular sempre esteve presente desde a colocircnia portuguesa ateacute hoje na Amazocircnia com as manifestaccedilotildees e demandas de accedilotildees ou poliacuteticas governamentais por parte dos grupos sociais excluiacutedos por exemplo em Beleacutem Nessa perspectiva todas as mobilizaccedilotildees e movimentos sociais satildeo formas de participaccedilatildeo popular que se diferenciam segundo as questotildees reivindicatoacuterias definidas pela conjuntura poliacutetica social e econocircmica que se encontram os atores sociais envolvidos

188

repressivo das organizaccedilotildees populares e sobretudo arrocho salarial O Estado se afastou cada

vez mais das camadas populares pelas medidas arbitraacuterias que tomou ante a problemaacutetica

urbana

No entanto as condiccedilotildees objetivas de periferizaccedilatildeo das cidades e da pauperizaccedilatildeo de

suas classes populares favoreceram que as lideranccedilas e organizaccedilotildees populares formadas com

propoacutesitos religiosos tornassem-se o uacutenico canal de expressatildeo das reivindicaccedilotildees por

melhores condiccedilotildees de vida frente agrave poliacutetica de exclusatildeo adotada na eacutepoca que alijava um

nuacutemero significativo da sociedade devido agrave negligecircncia do Estado em desenvolver sua

funccedilatildeo ou seja gestar poliacuteticas sociais de consumo coletivo

A igreja catoacutelica passou a incentivar a organizaccedilatildeo de moradores em Beleacutem

conscientizando-os de seus direitos e fomentando a atuaccedilatildeo poliacutetica das bases contribuindo

dessa forma para o fortalecimento das organizaccedilotildees populares54

Aleacutem da igreja catoacutelica outros atores colaboraram para a fomentaccedilatildeo das

organizaccedilotildees populares em Beleacutem tais como a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para Assistecircncia Social

e Educacional (FASE)55 que desenvolveu trabalho de cunho educativo nos bairros

favorecendo assim a reorganizaccedilatildeo de grupos e setores marginalizados e a Sociedade

Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH)56 que passou a dar apoio e a incentivar

os movimentos populares contribuindo dessa forma para a ampliaccedilatildeo das perspectivas de

luta

Dentro desse contexto a sociedade comeccedilou a se organizar por meio dos Centros

Comunitaacuterios (CCs) e Associaccedilotildees de Moradores (AMs) de vaacuterios bairros de Beleacutem que

passaram a dotar uma poliacutetica de mobilizaccedilatildeo com o objetivo de lutar contra a situaccedilatildeo de

exclusatildeo a qual estavam submetidos

As principais lutas desenvolvidas pelas organizaccedilotildees populares no periacuteodo de 1970 a

1979 foram marcadas pela articulaccedilatildeo dessas por meio de Encontros de Comunidades que

oportunizaram as lideranccedilas trocarem experiecircncias de trabalho e decidirem os rumos de suas

54 Com o surgimento de vaacuterias Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) ala progressista da igreja catoacutelica houve uma emergecircncia e proliferaccedilatildeo de organizaccedilotildees comunitaacuterias pois aleacutem de contribuir no processo de formaccedilatildeo poliacutetica das lideranccedilas passaram a ser consideradas como canteiros de onde os movimentos sociais colhiam as lideranccedilas bem como espaccedilo para denuacutencia e questionamentos das praacuteticas poliacuteticas autoritaacuterias implementadas pelo regime militar 55 A FASE foi fundada no ano de 1964 e teve num primeiro momento o papel fundamental de prestar assessoria teacutecnica aos grandes projetos de desenvolvimento na Amazocircnia posteriormente passou a promover assessoria poliacutetico-pedagoacutegica a vaacuterias organizaccedilotildees populares atraveacutes da capacitaccedilatildeo de lideranccedilas em vaacuterios bairros de Beleacutem (CRUZ 1994) 56 A SPDDH surgiu no ano de 1977 e era composta por setores heterogecircneos da sociedade como exigecircncia da luta contra a falta de informaccedilatildeo da sociedade sobre os seus direitos poliacuteticos e sociais como tambeacutem das arbitrariedades e abusos sobre os direitos humanos no governo ditatorial da eacutepoca

189

lutas pela posse de terra por aterro por construccedilatildeo de escolas por aacutegua postos de sauacutede

entre outros

A realizaccedilatildeo desses encontros permitiu uma maior conscientizaccedilatildeo dos movimentos

populares que promoveram a ruptura com a imediaticidade passando a executar uma poliacutetica

de reivindicaccedilatildeo em acircmbito maior frente agrave poliacutetica adotada pelo Estado

Em 1973 a intervenccedilatildeo puacuteblica nas baixadas eacute retomada por meio de uma proposta

global que visava intervir no conjunto formado pelas bacias hidrograacuteficas Assim foi

necessaacuteria a assinatura de um convecircnio entre o DNOS a Superintendecircncia de

Desenvolvimento da Amazocircnia (SUDAM) e o Governo do Estado que deu origem agrave

Monografia das Baixadas de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

No ano de 1976 a Prefeitura Municipal de Beleacutem (PMB) o DNOS a SUDAM e o

Governo do Estado firmaram outro convecircnio instituindo-se desse modo o Programa de

Recuperaccedilatildeo das Baixadas (PRB) que tomou duas direccedilotildees complementares uma

compreendeu o Plano Global que envolve estudos levantamentos e projetos visando atingir

todas as aacutereas de baixadas e a outra o Plano de Accedilatildeo Imediata (PAI) visando viabilizar as

obras do DNOS no Igarapeacute Satildeo Joaquim na aacuterea do Una Este uacuteltimo seria uma experiecircncia

piloto de orientaccedilatildeo para outras obras de drenagem urbana (TRINDADE JUNIOR 1997)

O Programa de Recuperaccedilatildeo das Baixada transferiu os moradores da aacuterea do Barreiro

para o Conjunto Promorar e Providecircncia Entretanto esta populaccedilatildeo teve suas moradas

financiadas pelo Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo e como natildeo puderam arcar com os custos

desse sistema acabaram retornando agrave aacuterea de baixadas

Abeleacutem (1989) ressalta que o Programa foi executado sem que as famiacutelias pudessem

decidir o seu destino natildeo sendo ouvidas nos aspectos relativos agrave remoccedilatildeo ao novo local de

moradia o que demonstra o niacutevel de imposiccedilatildeo do planejamento urbano sobre a camada pobre

da sociedade residente naquela aacuterea de baixada fator este que posteriormente levou ao

fracasso do programa Segundo Trindade Junior (1997) a partir desse momento foram

realizadas vaacuterias intervenccedilotildees do poder puacuteblico em aacutereas alagadas sendo no entanto de

caraacuteter esparso e natildeo globalizantes

Nesse sentido percebe-se que apesar dos avanccedilos dos movimentos populares uma

total ausecircncia da participaccedilatildeo popular nas tomadas de decisotildees em relaccedilatildeo a tais projetos

evidenciando assim outros interesses em jogo principalmente o econocircmico jaacute que os

benefiacutecios sociais tidos como justificativa primeira do programa tinham na verdade papel

secundaacuterio

190

Ambas experiecircncias em que pese os benefiacutecios em infraestrutura para as aacutereas

atingidas a intervenccedilatildeo esteve pautada pela accedilatildeo racionalizadora do planejamento ficando a

populaccedilatildeo na condiccedilatildeo de objeto e natildeo de sujeitos das accedilotildees desenvolvidas [] A poliacutetica

urbana implementada tendeu a reforccedilar a supremacia do espaccedilo abstrato sobre o espaccedilo social

contribuindo para a reproduccedilatildeo das desigualdades sociais

(SOUZA 1992 p 75)

Em 1977 os conflitos pela posse de terra se acirraram entre moradores Estado

latifundiaacuterios urbanos e imobiliaacuterios devido ao aumento do nuacutemero das ocupaccedilotildees de terras

principalmente nos bairros da Cremaccedilatildeo Jurunas Terra Firme Pedreira Sacramenta Benguiacute

Marco e Una sendo que estes conflitos provocaram a expulsatildeo derrubada de casas repressatildeo

policial e prisotildees57 Essa experiecircncia levou os movimentos populares a se organizarem ainda

mais e lutarem em defesa de um pedaccedilo de terra para morar

Constituindo-se em sujeitos coletivos os movimentos populares unificaram-se na

luta pela posse da terra lanccedilando a Campanha pelo Direito de Morar que envolveu vaacuterios

bairros da cidade como Jurunas e Sacramenta Essa praacutetica culminou com o fortalecimento

das organizaccedilotildees e com a criaccedilatildeo da Comissatildeo de Bairros Pobres de Beleacutem que mais tarde

passou a ser chamada de Comissatildeo de Bairros de Beleacutem (CBB) em 28 de janeiro de 1979 E

era uma entidade federativa que formaliza a articulaccedilatildeo dos centros comunitaacuterios e

associaccedilotildees de moradores voltada para os problemas da terra e contra a violecircncia policial

Como se vecirc o movimento popular de Beleacutem desde seu surgimento apoacutes o golpe militar realizaram accedilotildees articulando formas de organizaccedilatildeo mais permanente com outros em termos de campanhas e movimentos mais gerais buscando fortalecer a concretizaccedilatildeo de suas demandas (CRUZ 1994 p 85)

De acordo com Cruz (1994) a CBB58 possuiacutea maior inserccedilatildeo nos bairros onde as

contradiccedilotildees sociais e os conflitos eram mais expliacutecitos Sua principal bandeira de luta era

pelo direito de morar Desse modo passou a coordenar grandes mobilizaccedilotildees e atos puacuteblicos

para encaminhar as lutas por melhores condiccedilotildees de vida

Esse fato ocasionou em um aumento significativo na estruturaccedilatildeo do movimento

popular em Beleacutem Os sujeitos sociais que emergiram nesse momento histoacuterico ganharam

mais legitimidade e representatividade poliacutetica nas lutas pelo direito agrave cidade e agrave cidadania

57 Outro movimento importante nessa eacutepoca foi a revolta ou guerra da poeira que emergiu em vaacuterias ruas de Beleacutem para evitar o tracircnsito de carros e coletivos que levantavam poeira provocando problemas de sauacutede aos moradores (CBB 1984) 58 A estrutura interna da CBB foi concebida inicialmente atraveacutes de trecircs representantes por bairro participantes da luta que integraram sua composiccedilatildeo por dois anos ateacute que se realizasse um Congresso para eleger sua diretoria A CBB congregava cerca de 50 entidades comunitaacuterias naquela eacutepoca (CRUZ 1994)

191

Os movimentos populares ultrapassaram o imediatismo de suas reivindicaccedilotildees transformando

suas carecircncias em direitos de cidadania e ganhando significado de uma luta pela reabertura do

social como uma nova alternativa poliacutetica desencadeando formas de atuaccedilatildeo poliacutetica e

ampliando o espaccedilo da cidadania no acircmbito social e poliacutetico Esse processo eacute intermediado

pelo Estado e por diversos agentes de produccedilatildeo do espaccedilo urbano mediante contradiccedilotildees e

ambiguumlidades

Num outro enfoque Cruz (1994) remonta que a luta pelo direito de morar em Beleacutem

interferiu no processo de organizaccedilatildeo espacial da cidade a partir de uma loacutegica proacutepria dos

moradores com os processos desencadeados por meio das diferentes lutas originadas nos

locais de moradia especificamente nas ocupaccedilotildees59

Nessa luta a relaccedilatildeo com o Estado foi alterada passando os teacutecnicos estaduais a

realizarem reuniotildees no proacuteprio bairro e a contar com a participaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo da

sociedade nas demarcaccedilotildees dos lotes nas decisotildees a serem tomadas nos pagamentos a serem

efetivados (ABELEacuteM 1989)

Apesar das vitoacuterias diversos conflitos continuavam latentes permanecendo vaacuterias

questotildees pendentes em quase todos os bairros Os movimentos populares permaneciam se

organizando lutando em busca de soluccedilatildeo para os seus problemas que no primeiro momento

eram mais restritos a questotildees da posse da terra depois passaram a ser mais amplo tais como

aacutegua energia escola60 posto de sauacutede vias de acesso feiras supermercados e saneamento

baacutesico Sendo assim esses movimentos populares de Beleacutem partiram para um trabalho mais

abrangente conscientizando a sociedade da necessidade de participaccedilatildeo e exigindo do

governo natildeo soacute soluccedilotildees imediatas mas tambeacutem a participaccedilatildeo na gestatildeo da cidade mesmo

que dentro de certos limites

Todavia o Estado passou a utilizar-se das organizaccedilotildees de bairros para viabilizar

suas poliacuteticas por meio da cooptaccedilatildeo e da criaccedilatildeo de entidades fantasmas com o objetivo

de enfraquecer a luta social passando a tratar as organizaccedilotildees populares como um

instrumento a seu serviccedilo incentivando controlando dividindo e apaziguando-as na medida

em que centralizavam o encaminhamento das demandas e atendiam agraves solicitaccedilotildees sem no

entanto nada mudar estruturalmente

59 Apoacutes vaacuterios anos lutando pelo Direito de Morar os movimentos populares unificados com a CBB conseguiram relevantes vitoacuterias como por exemplo a desapropriaccedilatildeo de trecircs aacutereas na Sacramenta (Ferro Costa que foi negociada com a Companhia de Administraccedilatildeo do Desenvolvimento da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) por meio do pagamento simboacutelico de cinco mil cruzeiros na eacutepoca aacuterea pertencente agrave Aeronaacuteutica que foi negociada com o Banco Nacional de Habitaccedilatildeo (BNH) e aacuterea pertencente ao governo municipal) que retratou a importacircncia da organizaccedilatildeo para o ecircxito das lutas servindo assim de incentivo para os demais bairros 60 Essa luta desdobrou-se na campanha Escola para Todos

192

Sendo assim evidencia-se que a presenccedila do Estado por meio de poliacuteticas puacuteblicas

de cunho assistencialista orientada e proposta pelo Governo Federal levou ao fortalecimento

das praacuteticas de cooptaccedilatildeo e clientelismo Nesse momento as accedilotildees pelo governo serviram

mais como estrateacutegias poliacuteticas do que proporcionaram melhoria da qualidade de vida da

populaccedilatildeo

Em 20 de outubro de 1985 surgiu a Federaccedilatildeo Metropolitana de Centros

Comunitaacuterios e Associaccedilotildees de Moradores (FMCCAM) atualmente identificada pela sigla

FEMECAM como forma de articular as entidades comunitaacuterias dissidentes da CBB e outras

novas criadas com o incentivo do governo

Essa federaccedilatildeo era apoiada pelo Estado fruto da cooptaccedilatildeo e do clientelismo e usava

o discurso da participaccedilatildeo e democratizaccedilatildeo do governo afirmando que havia necessidade de

um gerenciamento mais eficiente do movimento popular nas reivindicaccedilotildees junto ao governo

pois a CBB aleacutem de natildeo estar correspondendo tinha uma preocupaccedilatildeo mais poliacutetica-

partidaacuteria (MORAES 1997)

Desde o I Congresso a Federaccedilatildeo sempre teve muito apoio dos oacutergatildeos estatais e municipais de entidades particulares e de algumas empresas Por exemplo no I Congresso noacutes tivemos um apoio muito grande do governo do Estado e da Prefeitura Municipal na gestatildeo Coutinho Jorge que nos deram muito apoio Do Governo do Estado recebemos um carro com motorista a nossa disposiccedilatildeo para realizarmos o nosso trabalho a Prefeitura arcou com os cartazes a parte da alimentaccedilatildeo a outra foi o governo do Estado atraveacutes do pagamento do local para a realizaccedilatildeo do congresso aleacutem do apoio das empresas de ocircnibus que deslocaram a cada bairro de Beleacutem um veiacuteculo para conduzir as congressistas (CRUZ 1994 p 111)

Esse tipo de posicionamento reflete o interesse que o Estado materializado pelas

administraccedilotildees puacuteblicas tem de se legitimar bem como a falta de maturidade da entidade em

questionar as accedilotildees e estrateacutegias do Estado

Segundo Pinheiro et al (2007) a partir da deacutecada de 1980 com os projetos de macro

e microdrenagem das bacias hidrograacuteficas o Estado avanccedilou na intervenccedilatildeo das poliacuteticas

puacuteblicas de saneamento e reestruturaccedilatildeo urbana das baixadas acarretando a remoccedilatildeo de seus

moradores para aacutereas mais distantes do nuacutecleo urbano e a oferta de novos espaccedilos

infraestruturados ao mercado imobiliaacuterio

Aleacutem disso com a falta de investimento em poliacuteticas de habitaccedilatildeo popular ampliam-

se o deacuteficit habitacional e os conflitos fundiaacuterios pela terra de morar As famiacutelias expulsas das

baixadas e os imigrantes de outros municiacutepios encontram na praacutetica das ocupaccedilotildees coletivas

193

terras ociosas a alternativa para suprir a carecircncia de moradia indicando um segundo vetor de

periferizaccedilatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo (PINHEIRO et al 2007)

No acircmbito municipal em 1986 foi criada a Secretaria Municipal de Saneamento

(SESAN) com o objetivo de sanear e drenar as aacutereas de baixadas passando a desenvolver

accedilotildees que visavam natildeo mais projetos de remoccedilatildeo e abertura de canais e sim uma tentativa de

melhorar as condiccedilotildees de vida nas aacutereas alagadas por meio dos serviccedilos de drenagem

macrodrenagem terraplanagem revestimentos asfaacutelticos calccediladas e outros Nesse contexto

desenvolveu-se o Projeto Comunidades Urbanas para Recuperaccedilatildeo Acelerada (CURA) que

foi executado nos bairros do Marco e Pedreira (TRINDADE JUNIOR 1997)

A partir de 1987 foi desenvolvido pela PMB o Programa de Recuperaccedilatildeo das

Baixadas (PRB) sendo eleita como prioritaacuteria a Bacia do Una Esse programa possuiacutea um

prazo inicial de quatro anos e incluiacutea obras viaacuterias e de saneamento em uma aacuterea de 3644

hectares envolvendo nove bairros de Beleacutem (TRINDADE JUNIOR 1997)

Eacute nesse cenaacuterio que a CBB passou a se preocupar em redimensionar sua intervenccedilatildeo

poliacutetica pois comeccedilou a admitir a importacircncia em ocupar os espaccedilos institucionais como por

exemplo o Comitecirc de Assessoria ao Programa de Macrodrenagem da Bacia do Una

procurando interferir no desenvolvimento do programa apresentando propostas com base nos

debates desenvolvidos junto agraves suas entidades (CRUZ 1994)

Por sua vez a FEMECAM tambeacutem procurou rever sua postura e estrateacutegia junto ao

governo jaacute que percebeu que com a mudanccedila nas administraccedilotildees municipal e estadual nem

sempre teve reconhecida sua importacircncia como interlocutora

Nesse sentido as duas entidades buscaram uma intervenccedilatildeo mais forte na defesa das

causas populares e principalmente frente as novas demandas que exigem maior qualificaccedilatildeo

do movimento popular com o objetivo de proporem alternativas em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo estatal e

para a continuaccedilatildeo da luta por uma cidade democraacutetica

Na deacutecada de 1990 os movimentos ligados agrave luta pela moradia em Beleacutem tiveram

conquistas importantes conseguindo se engajar na luta pela reforma urbana participando na

elaboraccedilatildeo do Plano Diretor da Cidade aleacutem de estarem agrave frente na defesa e nas negociaccedilotildees

de leis de Poliacuteticas Habitacionais e de Desenvolvimento Urbano demonstrando a importacircncia

dessas poliacuteticas para a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo e principalmente

buscando garantir a participaccedilatildeo popular na gestatildeo de controle das poliacuteticas puacuteblicas

O Plano Diretor de Beleacutem elaborado em 1991 e tornado lei em 1993 (Lei nordm 7603

de 13011993) definiu e traccedilou diretrizes agrave poliacutetica urbana e ao sistema de planejamento e

gestatildeo da cidade Aleacutem disso teve como pressuposto baacutesico a implementaccedilatildeo de instrumentos

194

que pudessem combater a pobreza urbana buscando alternativas de desenvolvimento que

superassem suas contradiccedilotildees colocando a sociedade civil como agente principal desse

processo

O Plano Diretor garantiu conquistas importantes tais como solo criado imposto

predial e territorial progressivo no tempo e no espaccedilo usucapiatildeo especial do imoacutevel urbano

zonas especiais de interesse social (ZEIS) fundo de desenvolvimento urbano transporte

coletivo saneamento e a participaccedilatildeo popular viabilizada por meio da regulamentaccedilatildeo do

Conselho de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (CONDUMA) dos Conselhos

Setoriais e dos Conselhos Regionais

De acordo com Moraes (1997) no final de dezembro de 1991 iniciaram-se debates

em torno do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (PMBU) suscitados por vaacuterias

entidades do movimento popular sindical e categorias profissionais

A partir desse momento os movimentos populares tomam como pontos de

discussotildees o Plano Diretor Urbano (PDU) e o Projeto de Macrodrenagem aleacutem de dar iniacutecio a

mobilizaccedilotildees que visavam agrave obtenccedilatildeo de maiores informaccedilotildees acerca de outros projetos de

urbanizaccedilatildeo das baixadas de Beleacutem anunciadas pelo poder puacuteblico estadual e municipal61

O movimento popular sentiu-se desafiado a buscar uma estrateacutegia de intervenccedilatildeo que fosse aleacutem das iniciativas ateacute aquele momento efetivadas Constatou-se a necessidade de articular os diversos atores sociais que atuam no enfrentamento da questatildeo urbana como associaccedilotildees de moradores entidades de assessoria sindicatos federaccedilotildees de bairros com o objetivo de redimensionar suas accedilotildees unificando-as e potencializando-as em favor das classes populares [] Duas grandes questotildees passaram a orientar as accedilotildees desenvolvidas pelo movimento popular de Beleacutem a) fazer com que o projeto do Plano Diretor em tramitaccedilatildeo na Cacircmara Municipal voltasse a ser discutido com a populaccedilatildeo antes de sua aprovaccedilatildeo b) intervir no Projeto de Macrodrenagem do Una dada sua efetivaccedilatildeo em curso sem maiores esclarecimentos e sem participaccedilatildeo dos moradores das aacutereas atingidas (SOUZA 1992 p 64)

Diante desse contexto foi instalado no dia 08 de fevereiro de 1992 o Foacuterum

Metropolitano de Reforma Urbana (FMRU) possuindo sua origem vinculada agrave necessidade

de uma intervenccedilatildeo mais qualitativa dos setores populares no processo de elaboraccedilatildeo e

aprovaccedilatildeo do PDU de Beleacutem assim como discutir o Projeto de Macrodrenagem da Bacia do

Una e o seu processo de remanejamento de famiacutelias

61 O governo estadual estava anunciando o Projeto Comunidade com Dignidade com o objetivo de urbanizar as aacutereas de ocupaccedilatildeo de Beleacutem e Ananindeua O governo municipal estava iniciando em 1991 a execuccedilatildeo do Projeto de Microdrenagem da Bacia do Tucunduba atingindo um grande nuacutemero de famiacutelias (FMRU 1992)

195

O Foacuterum configurou-se como uma rede de articulaccedilotildees de diversas entidades urbanas

e visava ser um espaccedilo de debates poliacutetico de proposiccedilatildeo alternativa agraves poliacuteticas puacuteblicas e de

lutas pela Reforma Urbana62 onde as diversas organizaccedilotildees da sociedade civil se uniram pela

conquista de seus direitos baacutesicos como moradia saneamento transporte energia educaccedilatildeo

sauacutede e que nesse momento apontavam para uma reestruturaccedilatildeo geral do espaccedilo urbano

fundamentada numa participaccedilatildeo popular efetiva

Para Ferreira (2004) a necessidade da sua articulaccedilatildeo se fez por dois motivos

primeiro pela possibilidade de se tentar a aprovaccedilatildeo do Plano Diretor Urbano de Beleacutem antes

da revisatildeo acordada anteriormente com a Cacircmara de Vereadores de apreciaccedilatildeo por parte dos

movimentos sociais o atendimento de suas demandas segundo pela necessaacuteria socializaccedilatildeo

com a sociedade civil dos projetos previstos para serem implementados no campo do

saneamento baacutesico nas aacutereas da Bacia do Una tanto pelo governo estadual quanto municipal

O manifesto de criaccedilatildeo do FMRU foi assinado por 21 entidades (associaccedilotildees de

moradores centros comunitaacuterios CBB FEMECAM sindicatos CUT FASE entre outros)

tendo por objetivos os seguintes pontos

1) Lutar pela aprovaccedilatildeo do anteprojeto de Lei do Plano Diretor de Beleacutem 2) Lutar pelo acesso agraves informaccedilotildees contidas nos projetos de macro e micro drenagem do poder puacuteblico 3) Propor alternativas ao processo de ocupaccedilatildeo urbana que atenda aos interesses da populaccedilatildeo e soluccedilotildees alternativas que priorizem a equidade nas futuras accedilotildees de ocupaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do espaccedilo urbano amazocircnico e regional 4) Democratizar o territoacuterio atraveacutes de maior acesso a terra 5) Distribuir equumlitativamente a habitaccedilatildeo os bens naturais materiais e os serviccedilos urbanos 6) Lutar pela gestatildeo democraacutetica do espaccedilo urbano 7) Respeitar e estimular as praacuteticas culturais e histoacutericas das identidades construiacutedas pela populaccedilatildeo 8) Garantir o uso ecologicamente equilibrado e socialmente justo do meio ambiente 9) Priorizar o transporte coletivo nas suas diversas modalidades 10) Efetivar uma poliacutetica de habitaccedilatildeo e saneamento que garanta construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares realizaccedilatildeo de urbanizaccedilatildeo e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacutereas de baixa renda estabelecimento de mecanismos que garantam condiccedilotildees miacutenimas de infraestrutura aacutegua potaacutevel remoccedilatildeo e tratamento dos esgotos sanitaacuterios e sistema de limpeza 11) Lutar por uma ampla e real participaccedilatildeo popular em todos os projetos e accedilotildees pertinentes agrave reestruturaccedilatildeo urbana (FMRU 1992 p 55)

62 Na perspectiva dos setores populares envolvidos no FMRU a reforma urbana eacute entendida como garantia da cidade para todos (funccedilatildeo social da cidade) na qual a sociedade civil possa intervir em sua construccedilatildeo e ordenamento (gestatildeo democraacutetica da cidade) com equidade de acesso agrave habitaccedilatildeo e infraestrutura urbana (redistribuiccedilatildeo de renda) (SOUSA 1998)

196

Nesse sentido o FMRU passou entatildeo a compor o cenaacuterio poliacutetico municipal

cumprindo funccedilotildees natildeo mais somente reivindicatoacuterias mas funccedilotildees de agente de pressatildeo de

coordenador do processo e de mediador entre os interesses que surgiram nas discussotildees em

torno do Plano Diretor e do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una (FERREIRA 2004)

O FMRU incorporou a concepccedilatildeo de ser necessaacuterio a participaccedilatildeo efetiva da populaccedilatildeo nos centros de decisatildeo de seus destinos natildeo apenas no campo reivindicatoacuterio mas tambeacutem no sentido de propor alternativas agraves poliacuteticas puacuteblicas o que exigia uma atuaccedilatildeo qualificada por parte desses movimentos (FMRU 1992 p 72)

No tocante a questatildeo habitacional nos uacuteltimos anos dos seacuteculos XX e XXI a atuaccedilatildeo

governamental foi voltada para a urbanizaccedilatildeo e o saneamento baacutesico de aacutereas de baixadas

com a reassentamento remoccedilatildeo eou remanejamento de famiacutelias que residem nessas aacutereas

objetivando ampliar o estoque de terras infraestruturadas para o mercado imobiliaacuterio assim

como a ampliaccedilatildeo de investimentos para melhorar as condiccedilotildees de habitaccedilatildeo nas aacutereas

alagadas que dependem de urbanizaccedilatildeo como a realizaccedilatildeo de infraestrutura fiacutesica obras de

drenagem recuperaccedilatildeo e abertura de canais Aleacutem disso outra accedilatildeo do poder puacuteblico diz

respeito ao processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de aacutereas de ocupaccedilatildeo

Segundo Pinheiro et al (2007) o processo de ocupaccedilotildees coletivas visando agrave soluccedilatildeo

de moradia tornou-se bastante evidente na RMB uma vez que o problema da moradia se

agravou face ao constante aumento dos preccedilos das terras urbanas dos alugueacuteis e dos baixos

salaacuterios e tambeacutem pela falta de investimento puacuteblico (setor habitacional) para a faixa salarial

de ateacute cinco salaacuterios miacutenimos

Dessa forma as classes populares foram cada vez mais levadas a ocupar aacutereas

ociosas nas periferias Estas ocupaccedilotildees coletivas de terras para moradia passaram a

representar um foco de resistecircncia da sociedade civil frente ao autoritarismo imprimindo

inuacutemeras transformaccedilotildees nas relaccedilotildees entre Estado e as classes populares que de forma

organizada e coletiva ergueram suas casas (autoconstruccedilotildees) e conquistaram o direito de

morar legitimando as contradiccedilotildees da realidade urbana e colocando o urbano como espaccedilo

socialmente produzido na correlaccedilatildeo de forccedilas da sociedade (PINHEIRO et al 2007)

197

42 CONSTRUCcedilAtildeO DO ESPACcedilO URBANO EM SAtildeO LUIS E A QUESTAtildeO HABITACIONAL

A cidade se constitui em um produto da economia de mercado assim como um local

de acumulaccedilatildeo de capital e onde as condiccedilotildees para a reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho podem

mais plenamente ser realizadas Conforme ressaltado por Correcirca (1989) os processos sociais

produzem forma movimento e conteuacutedo sobre o espaccedilo urbano organizando a produccedilatildeo

espacial das metroacutepoles

Essa organizaccedilatildeo caracteriza-se por usos da terra diferenciados tais como o da aacuterea

central aacutereas industriais e aacutereas residenciais diversas e pelas interaccedilotildees como fluxo de

capital migraccedilotildees diaacuterias entre local de residecircncia e local de trabalho entre outros Aleacutem

disso a cidade tem um caraacuteter poliacutetico

Para Harvey (1980) a cidade eacute a expressatildeo concreta de processos sociais na forma de

um ambiente fiacutesico construiacutedo sobre o espaccedilo geograacutefico Corroborando com essa ideacuteia

Souza (2002) diz que a cidade eacute o concreto o conjunto de redes eacute a materialidade visiacutevel do

urbano enquanto este eacute o abstrato entretanto eacute o que daacute sentido e natureza agrave cidade

De acordo com Lefebvre (2001) o urbano expressa determinada formaconteuacutedo

derivada de contextos histoacuterico-espaciais especiacuteficos Isso implica entender o urbano

transcendendo o campo das determinaccedilotildees econocircmicas ou seja concebecirc-lo como condiccedilatildeo

meio e produto ao mesmo tempo manifestaccedilatildeo dos conflitos entre as necessidades do capital

em seu processo de (re)produccedilatildeo e as necessidades da sociedade como um todo

Corroborando com esse pensamento Carlos (1994 p 24) afirma que o urbano deve

ser pensado em suas muacuteltiplas dimensotildees

[] se de um lado o espaccedilo eacute condiccedilatildeo tanto da reproduccedilatildeo do capital quanto da vida humana de outro ele eacute produto e nesse sentido eacute trabalho materializado Ao produzir suas condiccedilotildees de vida a partir das relaccedilotildees capital-trabalho a sociedade como um todo (na cotidianidade de seu processo de trabalho) produz o espaccedilo geograacutefico e com ele um modo de vida de pensar de sentir Assim pensar o urbano significa tambeacutem pensar a dimensatildeo do humano

Reportando-se tambeacutem a discussatildeo sobre o uso do solo urbano especialmente no

que diz respeito ao capital incorporador pode-se afirmar que em Satildeo Luiacutes a produccedilatildeo de

moradia eacute processada por esse tipo de capital principalmente nas uacuteltimas deacutecadas uma vez

que os capitalistas incorporadores articulam a compra de terreno com a finalidade de valorizaacute-

lo a partir da alteraccedilatildeo do seu uso Aleacutem disso eles articulam agentes imobiliaacuterios agentes

198

financeiros e promotores de venda levando em conta as estruturaccedilotildees e transformaccedilotildees do

espaccedilo por conta da urbanizaccedilatildeo e implicaccedilotildees soacutecio-econocircmicas das mobilidades das

construccedilotildees com consequumlecircncias segregativas

Para uma primeira aproximaccedilatildeo do problema da moradia na cidade de Satildeo Luiacutes

torna-se necessaacuterio uma contextualizaccedilatildeo histoacuterica do processo de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo do

espaccedilo urbano

A Ilha de Satildeo Luiacutes ou a Ilha do Maranhatildeo localiza-se no domiacutenio da Amazocircnia em

uma das suas porccedilotildees mais orientais a oeste do Meridiano de 44ordm W na parte norte do Estado

do Maranhatildeo e limita-se ao norte com o Oceano Atlacircntico ao sul com o Estreito dos

Mosquitos e Baiacutea do Arraial a leste com a Baiacutea de Satildeo Joseacute e a oeste com a Baiacutea de Satildeo

Marcos (RIOS 2005)

Com pouco mais de 830 kmsup2 ocupando 57 da ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se entre

os pequenos municiacutepios em extensatildeo territorial no entanto possui a maior aglomeraccedilatildeo

humana e urbana do Estado com 1011891 habitantes e uma densidade demograacutefica superior

a 100 habkmsup2 sendo portanto o mais populoso e densamente povoado municiacutepio

maranhense conforme tabela 6 (IBGE 2010)

Tabela 6 - Crescimento populacional do municiacutepio de Satildeo Luis

Recenseamento Populaccedilatildeo Residente

Total Urbana Rural 1960 158292 137820 (871) 20472 (129) 1970

265486

205413 (773)

60073 (227)

1980 449877 404252 (898) 45625 (102) 1991 695199 246213 (355) 448986 (645) 2000 870028 837584 (963) 32444 (037) 2010 1011891 955620 (945) 56271 (055)

Fonte IBGE

Censo demograacutefico (2010)

A Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes eacute composta de quatro municiacutepios de acordo

com a Lei Complementar nordm 038 de 12 de janeiro de 1998 Satildeo Luiacutes Satildeo Joseacute de Ribamar

Paccedilo do Lumiar e Raposa conforme mapa 2

199

Mapa 2

Regiatildeo Metropolitana de Satildeo Luiacutes

Fonte GEPLAN (2000)

200

De acordo com Diniz (2007) centrados em um territoacuterio insular os municiacutepios de

Satildeo Luiacutes Paccedilo do Lumiar Satildeo Joseacute de Ribamar e Raposa embora politicamente

independentes constituem uma aacuterea contiacutenua na qual se desenvolve o maior fluxo de relaccedilotildees

econocircmicas e poliacutetica-administrativas do Estado

No processo de regionalizaccedilatildeo Satildeo Luiacutes pertence agrave Mesorregiatildeo do Norte

Maranhense na microrregiatildeo da aglomeraccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes O aglomerado urbano da

Ilha do Maranhatildeo representa uma conurbaccedilatildeo cuja capital do Estado Satildeo Luiacutes eacute a cidade

poacutelo e exerce maior influecircncia pois desenvolve em torno de si uma expressiva rede de

relaccedilotildees soacutecio-econocircmicas aleacutem de oferecer um estoque consideraacutevel de equipamentos

urbanos que a torna um centro regional bastante atraente para outros centros menores

Na aacuterea rural o municiacutepio possui uma agricultura voltada agrave produccedilatildeo destinada ao

abastecimento de parte da demanda da capital Existem ainda pequenos estabelecimentos

agriacutecolas destinados agrave produccedilatildeo de gratildeos para a subsistecircncia Parte da aacuterea eacute destinada ao

Distrito Industrial com induacutestrias implantadas nos gecircneros de bebidas alimentaccedilatildeo produtos

metaluacutergicos ceracircmica e o complexo portuaacuterio (ALUMAR Itaqui CVRD) para exportaccedilatildeo

de mineacuterios de ferro e manganecircs alumiacutenio primaacuterio alumina ferro gusa e outros produtos e a

importaccedilatildeo industrializada mineacuterio de alumiacutenio (bauxita) mateacuterias-primas em geral e

combustiacutevel (RIOS 2005)

As alteraccedilotildees que vecircm ocorrendo na estrutura socioeconocircmica do municiacutepio tecircm sua

origem na implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais que forccedilaram o aparecimento de

induacutestrias sateacutelites e o revigoramento de serviccedilos de apoio agraves atividades industriais

O Governo Estadual e a Prefeitura desenvolveram programas de revitalizaccedilatildeo do

Centro Histoacuterico da cidade no intuito de fortalecer a induacutestria do turismo que tem suas raiacutezes

histoacutericas como forte vetor de atraccedilatildeo considerado recentemente pela UNESCO como

Patrimocircnio Cultural da Humanidade

Para Rios (2005) o periacutemetro definido pelos tombamentos em niacutevel federal e

estadual compreende cerca de 35000 imoacuteveis em sua maioria de natureza civil e associados

aos periacuteodos colonial e imperial

Considerada como centro poliacutetico-administrativo do Estado a cidade Satildeo Luiacutes

destaca-se tambeacutem no setor financeiro comercial industrial turiacutestico e mais recentemente

portuaacuterio Nesse sentido examinar a questatildeo urbana requer verificar os diversos fatores que

contribuem para sua dinacircmica uma vez que a urbanizaccedilatildeo apresenta um caraacuteter contraditoacuterio

pois eacute dominada pelas relaccedilotildees sociais de uma sociedade desigual que produz e reproduz no

201

espaccedilo urbano as disparidades de renda a exploraccedilatildeo econocircmica a exclusatildeo dentre outras

mazelas comuns agrave sociedade capitalista

A primeira fase da histoacuteria do Maranhatildeo reporta as lutas pelo territoacuterio e a ilha de

Satildeo Luiacutes constitui-se em uma arena privilegiada onde elas se desenrolam A ocupaccedilatildeo urbana

de Satildeo Luiacutes se iniciou com a formaccedilatildeo de um povoado mariacutetimo fronteiro agrave baiacutea de Satildeo

Marcos no divisor de aacuteguas dos rios Anil e Bacanga Esse povoado que deu origem a cidade

de Satildeo Luiacutes surgiu nos primeiros anos do seacuteculo XVII como afirmaccedilatildeo do expansionismo

colonizador francecircs com objetivo de estabelecer na regiatildeo a Franccedila Equinocial (DINIZ

2007)

A localizaccedilatildeo do povoado foi escolhida em funccedilatildeo da sua posiccedilatildeo estrateacutegica pois

fica em frente a baiacutea de Satildeo Marcos passagem quase que obrigatoacuteria para o acesso agrave Ilha e ao

continente aleacutem de oferecer condiccedilotildees para o ancoramento de embarcaccedilotildees e defesa aos

ataques por via mariacutetima

A implantaccedilatildeo da cidade pelos franceses ocorre por meio da construccedilatildeo de um forte

e de algumas casas toscas formando um pequeno nuacutecleo urbano que teria a funccedilatildeo de servir

de entreposto comercial para a Franccedila instituir em definitivo um sistema de exploraccedilatildeo das

riquezas locais

A implantaccedilatildeo de benfeitorias que se iniciava revela algumas das praacuteticas que

materializaram a presenccedila e atuaccedilatildeo do Estado enquanto agente social pois satildeo essas

operaciones concretas que contribuyen a modelar la cuidad (CAPEL 1974 p 19)

Essas operaccedilotildees visando modelar a cidade satildeo resultado do movimiento de

valorizacioacuten extensiva del espacio em que o processo de colonizaccedilatildeo implica a agregacioacuten

de una cuantidad de espacio y todo lo que conteacuten lo que en la praacutectica significa una adicioacuten

de factores de produccioacuten fuerza de trabajo recursos naturales y tierras en general (CAPEL

1974 p 20)

Assim a cidade de Satildeo Luiacutes foi fundada em 08 de setembro de 1612 pelos

franceses Daniel de La Touche e Franccediloise de Rasilly Todavia foi conquistada e incorporada

ao domiacutenio portuguecircs em 1615 Para tanto entre outras medidas os portugueses traccedilaram o

plano urbaniacutestico para implantaccedilatildeo da cidade com a definiccedilatildeo do arruamento e orientaccedilotildees

para o seu desenvolvimento

Esse plano que pautou o modelo e a ocupaccedilatildeo urbana de Satildeo Luiacutes ateacute meados dos

anos sessenta do seacuteculo XX foi elaborado pelo engenheiro-mor do Brasil o portuguecircs

Francisco Frias de Mesquita em 1616 Sua concepccedilatildeo urbaniacutestica com arruamento uniforme

e traccedilado octogonal seguindo a orientaccedilatildeo dos pontos cardeais tinha origem renascentista e

202

obedecia aos padrotildees estabelecidos pelas Leis das Iacutendias conforme determinava a Coroa

Espanhola que agravequela eacutepoca controlava o Reino Portuguecircs (ESPIRITO SANTO 2002)

O processo de colonizaccedilatildeo pelos portugueses tinha como objetivo expandir

preservar e controlar as novas colocircnias que eram estabelecidas no setor setentrional em que os

grandes rios se constituiacuteram em porta de entrada Nesse caso se configura o interesse do

Estado portuguecircs articulado aos detentores do capital (grupos econocircmicos ligados ao

comeacutercio) que iniciaram uma seacuterie de accedilotildees como a ocupaccedilatildeo da Amazocircnia instalaccedilatildeo de

fortes e nuacutecleos de povoamento (por exemplo em Beleacutem no ano de 1616) ampliaccedilatildeo de

benfeitorias jaacute implantadas enfatizar a funccedilatildeo poliacutetico-administrativa-militar e o domiacutenio de

novos fatores de produccedilatildeo (terra mateacuteria-prima matildeo-de-obra escrava) bem como assegurar o

incipiente comeacutercio (ANDRADE 1984) Contudo a cidade sucumbiu ainda no decorrer do

seacuteculo XVII ao domiacutenio holandecircs

Entretanto assim como acontecera com os franceses tambeacutem os holandeses foram expulsos pelos portugueses decorridos trecircs anos da ocupaccedilatildeo em 1645 Eacute quando se inicia de fato e em definitivo a colonizaccedilatildeo portuguesa da antiga Upaon-Accedilu ou Ilha Grande segundo a denominaccedilatildeo tupinambaacute para a Ilha de Satildeo Luiacutes (RIOS 2005 p 216)

Cabe ressaltar que Satildeo Luiacutes tambeacutem esteve sob dominaccedilatildeo holandesa entre os anos

de 1641 a 1644 Periacuteodo de grande turbulecircncia caracterizado por inuacutemeras revoltas e

envolvendo sangrentas lutas entre conquistadores e conquistados Naquela eacutepoca a estrutura

urbana da cidade possuiacutea cerca de 600 casas e se constituiacutea em proacutespero arraial produzindo e

exportando uma boa quantidade de produtos agriacutecolas accediluacutecar fumo algodatildeo entre outros O

que certamente aguccedilava a cobiccedila dos exploradores

A ocupaccedilatildeo portuguesa desenvolveu entre 1650 e 1750 as primeiras atividades

econocircmicas organizadas Essas atividades permitiram a acumulaccedilatildeo de renda por pequenos

grupos de famiacutelias que alternavam a moradia entre a casa grande do latifuacutendio e a residecircncia

na cidade

Elevou-se agrave categoria de cidade no ano de 1677 e no decorrer dos seacuteculos seiscentos e setecentos chegou a disputar com Beleacutem o posto de principal ponto de contato direto da vasta regiatildeo Norte do Brasil a qual compreendia consoante a geopoliacutetica de entatildeo as terras que iam do Oeste do Cearaacute ateacute a longiacutenqua Amazocircnia com o impeacuterio portuguecircs (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 60)

203

De acordo com Diniz (2007) foram edificadas algumas residecircncias e

estabelecimentos comerciais em pontos diversos da cidade e com a prosperidade das

atividades econocircmicas uma aglomeraccedilatildeo de edificaccedilotildees com melhores qualidades

arquitetocircnicas comeccedilou a se formar em torno do Largo do Carmo (atual Praccedila Joatildeo Lisboa)

para mais tarde se estender em direccedilatildeo ao Desterro e agrave Praia Grande

Nesse periacuteodo eram precaacuterias as condiccedilotildees de serviccedilos puacuteblicos e infraestrutura

urbana Somente no final do seacuteculo XVIII eacute que foram melhoradas as condiccedilotildees urbaniacutesticas

poreacutem inexistia um plano a ser obedecido e a cidade crescia de forma desordenada

Naturalmente a cidade desenvolveu-se em torno desse nuacutecleo histoacuterico que sofreu

um forte surto desenvolvimentista notadamente nos seacuteculos XVIII e XIX periacuteodo de apogeu

econocircmico da Proviacutencia do Maranhatildeo por conta da produccedilatildeo de algodatildeo e accediluacutecar Esse

desenvolvimento econocircmico e cultural que se manteve ateacute o iniacutecio do seacuteculo XX produziu o

que hoje eacute considerado o maior e mais homogecircneo conjunto urbano e arquitetocircnico do

periacuteodo colonial brasileiro integrando a lista de Patrimocircnio Histoacuterico Nacional63 desde 1955

Em meados do seacuteculo XVIII Satildeo Luis se constituiu num centro comercial

expressivo com fluxo razoaacutevel de mercadorias importadas Atraveacutes dos navios de grande

porte chegavam artigos os mais refinados vindos da Europa a fim de atender o requinte da

burguesia maranhense Do mesmo modo saiam da cidade grandes carregamentos de

produtos cultivados como arroz algodatildeo entre outros (DINIZ 2007)

A partir de entatildeo o Estado implementou accedilatildeo sob a forma de capital empreendedor

criando instituiccedilotildees no sentido de incrementar a economia e por conseguinte viabilizar os

seus interesses

Integrado ao sistema mundial de comeacutercio por meio da exportaccedilatildeo de arroz do algodatildeo e de materiais regionais o Maranhatildeo canalizou para Satildeo Luiacutes e Alcacircntara os principais portos de escoamento determinando uma circulaccedilatildeo de riquezas que promoveu um florescimento cultural e urbano significativo para as duas cidades (ESPIRITO SANTO 2002 p 162)

Com a raacutepida expansatildeo da cultura algodoeira a Proviacutencia passou por um processo de

enriquecimento que de forma indireta veio a melhorar o aspecto arquitetocircnico da Capital

Edificaccedilotildees com melhores estruturas e acabamento satildeo construiacutedas nos espaccedilos onde hoje

existem as ruas Grande Santana Afogados e suas transversais

como tambeacutem na zona

63 Esse imponente conjunto urbano com seus becos ladeiras e escadarias eacute composto por cerca de 5000 edificaccedilotildees entre essas belos exemplares revestidos de azulejos coloniais Essa caracteriacutestica fez com que fosse denominada de a Pequena Vila dos palaacutecios de porcelana ainda no seacuteculo XIX pelo viajante francecircs Aveacute-Lallemant (1859)

204

comercial da Praia Grande Nesse periacuteodo duas obras monumentais foram construiacutedas o

Palaacutecio dos Leotildees (atual sede do Governo Estadual) e o Teatro Arthur Azevedo

Data desta eacutepoca o conjunto urbaniacutestico de caraacuteter civil que compotildee o Centro Histoacuterico da capital maranhense e se constitui um dos mais representativos e ricos exemplares traccedilados urbanos e a tipologia arquitetocircnica produzidos pela colonizaccedilatildeo portuguesa no Brasil Na realidade a tipologia arquitetocircnica que corresponde aos seacuteculos XVIII e XIX difere significativamente das casas em taipa e madeira que caracterizam os edifiacutecios de caraacuteter civil do seacuteculo XVII constituem-se soacutelidas construccedilotildees de alvenaria de pedra e argamassas com oacuteleo de peixe serralheira e cantarias de lioz de origem europeacuteia emadeira de lei De qualquer maneira os mais representativos exemplares da arquitetura de Satildeo Luiacutes datam sobretudo da segunda metade do seacuteculo XIX Trata-se dos sobrados de fachadas revestidas em azulejos portugueses que se sobressaem como um dos aspectos mais peculiares da construccedilatildeo civil maranhense (RIOS 2005 p 216)

Ainda tendo como sustentaacuteculo a cultura algodoeira a economia maranhense se

expandia de tal forma que chegou a alcanccedilar posiccedilatildeo expressiva na economia brasileira no

iniacutecio do seacuteculo XIX Os efeitos deste fenocircmeno repercutiram significativamente sobre a

cidade de Satildeo Luiacutes As rendas da administraccedilatildeo aumentaram a populaccedilatildeo urbana se

incrementou e os logradouros puacuteblicos e os serviccedilos de sauacutede e educaccedilatildeo receberam

tratamento mais adequado Em 1820 cerca de 20000 habitantes residiam na cidade de Satildeo

Luiacutes o que na eacutepoca representava a quarta concentraccedilatildeo urbana do Paiacutes (RIOS 2005)

Ao longo do seacuteculo XIX a cidade ganhou novo calccedilamento ocorreram a

implantaccedilatildeo do Cais da Sagraccedilatildeo (antigo Passeio Puacuteblico hoje Avenida Beira-Mar) e a

reurbanizaccedilatildeo das principais praccedilas Aleacutem disso sucessivas legislaccedilotildees

os Coacutedigos de

Posturas

determinam a expansatildeo do modelo urbaniacutestico em malha ortogonal e com

dimensotildees e larguras preestabelecidas que chegam a ocupar os atuais limites do Centro

Histoacuterico (ESPIRITO SANTO 2002)

Segundo Diniz (2007) a populaccedilatildeo teve uma participaccedilatildeo importante devido ter sido

incumbida de construir as calccediladas de suas casas Essas medidas foram aos poucos sendo

reformuladas e aperfeiccediloadas pois os moradores erguiam suas calccediladas sem qualquer

harmonia com os padrotildees naturais das ruas Diante disso as autoridades estabeleceram novas

regras para a pavimentaccedilatildeo e calccedilamento das vias

Esse processo de melhorias urbanas sempre esteve voltado para o embelezamento da

aacuterea nobre da cidade (centro) destinava-se especialmente agraves ruas do Trapiche Satildeo Joatildeo

Palma Paz Remeacutedios locais escolhidos pela burguesia como moradia enquanto que as

205

famiacutelias podres estavam sempre afastadas do nuacutecleo central e consequumlentemente natildeo eram

beneficiadas pelo sistema de serviccedilos

Nota-se nesse sentido que o interesse do capital seleciona e direciona a intervenccedilatildeo

do Estado em termos de alocaccedilatildeo de infraestrutura e reproduccedilatildeo do espaccedilo assim como a

reproduccedilatildeo das relaccedilotildees sociais pois as concessotildees de terras eram dadas agraves pessoas brancas

livres e que dispunham de maior capital Estas representavam a nobreza eou a emergente

classe burguesa Jaacute para a populaccedilatildeo de natildeo-brancos (iacutendios e negros) restava morar em aacutereas

mais afastadas em relaccedilatildeo agrave Praia Grande

No processo de urbanizaccedilatildeo desse periacuteodo destaca-se a construccedilatildeo do Cais da

Sagraccedilatildeo pois foi uma das obras mais importantes ateacute entatildeo realizada Esta obra levou vaacuterios

anos para ser concluiacuteda (1841 a 1909) e tinha como objetivo solucionar o problema de erosatildeo

da barreira onde se encontrava a Praccedila do Palaacutecio a qual constantemente sofria os efeitos do

processo erosivo provocado pelo mar (DINIZ 2007)

Dessa maneira torna-se evidente que a cidade de Satildeo Luiacutes foi produzida pela

associaccedilatildeo entre o capital mercantil e o Estado Este se expressa pelas alteraccedilotildees realizadas

sobre o espaccedilo urbano tendo em vista o crescimento horizontal e a construccedilatildeo de canais

No final do seacuteculo XIX e inicio do seacuteculo XX o grande centro maranhense conheceu

um surto industrial consideraacutevel com a expansatildeo das induacutestrias tecircxteis e as de derivados de

babaccedilu uma vez que o ciclo de algodatildeo sofreu significativa alteraccedilatildeo acarretando em seacuterias

dificuldades na sua comercializaccedilatildeo internacional

No uacuteltimo quartel do seacuteculo XIX com o surto da industrializaccedilatildeo no Estado a maior parte das induacutestrias se estabelece na capital Estas induacutestrias geravam empregos diretos para cerca 300 operaacuterios nuacutemero significativo para uma cidade que na eacutepoca chegava a 45000 habitantes (DINIZ 2007 p 168)

A cidade entatildeo para assumir nova feiccedilatildeo de mercantil-administrativa para

industrial Surge o primeiro grande bairro o Anil formado em torno da faacutebrica Rio Anil

(Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Rio Anil) situado a 9 km do centro da cidade Em aacutereas

proacuteximas ao centro as faacutebricas Companhia Fabril Maranhense (conhecida como Santa Isabel)

e Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Maranhense (conhecida como Camboa) provocaram o

surgimento de formaccedilotildees urbanas nos seus arredores (Fotografia 5) Aleacutem dessas destacam-

se a Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecidos Cacircnhamo Companhia de Fiaccedilatildeo e Tecelagem Satildeo Luiacutes

Companhia Progresso Maranhense e a Induacutestria Maranhense (RIOS 2005)

206

Fotografia 5

Faacutebricas em aacutereas proacuteximas ao centro (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Acervo Puacuteblico Municipal (2009)

Vale ressaltar que a ascensatildeo da induacutestria tecircxtil ocorreu em funccedilatildeo de preacute-condiccedilotildees

existentes tecnologia relativamente simples mais ou menos estabilizada de faacutecil manejo e

inteiramente contida nos equipamentos disponiacuteveis no mercado internacional tamanho da

planta miacutenima e volume inicial de investimentos acessiacuteveis agrave economia brasileira de entatildeo

(RIBEIRO JUNIOR 2001 p 65) De acordo com Diniz (2007) as faacutebricas serviram como

nuacutecleos de crescimento e expansatildeo urbana pois ao redor das mesmas surgiram sub-

habitaccedilotildees ou seja as vilas operaacuterias

No final do seacuteculo XIX em funccedilatildeo do surto industrial a cidade eacute dotada dos

primeiros serviccedilos urbanos significativos a Companhia de Aacuteguas e a Companhia Telefocircnica

Em 1920 satildeo implantados os serviccedilos de energia eleacutetrica e de bondes por concessatildeo da

Companhia Inglesa ULLEN

Para Diniz (2007) a cidade adentra o seacuteculo XX com uma municipalidade

desestruturada para enfrentar os problemas da expansatildeo urbana da capital Natildeo existia uma

planta atualizada de todos os pontos da cidade e nem um plano de expansatildeo no qual

estivessem delineados os futuros arruamentos uma vez que natildeo havia preocupaccedilatildeo das

autoridades no que tange ao alinhamento das habitaccedilotildees que ficavam em aacutereas proacuteximas ao

centro Estas eram feitas sem nenhum criteacuterio teacutecnico pela proacutepria populaccedilatildeo

Entre 1920 e 1940 a populaccedilatildeo cresceu a taxas mais baixas Verifica-se na tabela 7

que a cidade levou quase dois seacuteculos para dobrar de populaccedilatildeo Nesse periacuteodo a

administraccedilatildeo municipal investiu em demandas de serviccedilos puacuteblicos com a aplicaccedilatildeo de

207

recursos em urbanizaccedilatildeo saneamento sauacutede educaccedilatildeo transporte e energia ainda que os

recursos aplicados natildeo atendessem a real necessidade de infraestrutura urbana vigente

Vale ressaltar que os equipamentos urbanos foram incrementados tanto em funccedilatildeo da

dinacircmica econocircmica decorrente da localizaccedilatildeo de unidades produtivas industriais tecircxteis

quanto devido ao lento crescimento horizontal da cidade que possibilitou ao poder puacuteblico

municipal aplicar mais recursos na estruturaccedilatildeo da cidade de Satildeo Luiacutes o que todavia foi

viabilizado apenas no Centro Histoacuterico ateacute a Vila do Anil ou seja ao longo do Corredor

Centro-Anil (DINIZ 2007)

Tabela 7

Crescimento Demograacutefico da Cidade de Satildeo Luiacutes (XVII-1940) Periacuteodo Nuacutemero de Habitantes

Fins do seacuteculo XVII 10000 Fins do seacuteculo XVIII 17000 1820 20000 1835 25000 1868 30000 1872 31604 1890 35000 1920 42000 1940 58735

Fonte SERFHAU (1970)

Em 1936 foi fundado o Mercado Central da cidade formado por vaacuterios armazeacutens no

qual se comercializavam artigos diversos Este mercado funcionava como alternativa para

vendas em atacado aleacutem disso se constituiu um concorrente do mercado da Praia Grande e

ao comeacutercio realizado no Portinho A expansatildeo desse novo centro comercial desencadeou

investimentos no setor da construccedilatildeo civil expandindo o Plano Urbano Central Assim com a

implantaccedilatildeo da Companhia do Comeacutercio elevou-se o valor do lote urbano restringindo o

acesso da populaccedilatildeo com menor poder aquisitivo ao periacutemetro urbano (RIBEIRO JUNIOR

2001)

Entre os anos 1950 e 1960 o ritmo de crescimento populacional urbana voltou a

crescer e a aacuterea urbana da cidade se expandiu com mais intensidade no eixo Centro-Anil

Nesse periacuteodo novos bairros surgiram enquanto outros se adensaram com a ocupaccedilatildeo das

aacutereas disponiacuteveis Foi o caso do Matadouro (hoje Liberdade) Monte Castelo Joatildeo Paulo

Cavaco (Faacutetima) Caratatiua Jordoa e Sacaveacutem (DINIZ 2007)

208

No final da deacutecada de 1950 um novo quadro urbano comeccedilou a se formar Com a

abertura de vias rodoviaacuterias para o interior do Estado e a integraccedilatildeo com os estados vizinhos

a populaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes aumentou seu ritmo de crescimento (tabela 8)

Tabela 8

Evoluccedilatildeo Demograacutefica do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes 1940-1970

Ano Divisatildeo por Zona

Total Urbana Rural 1940 58735 26854 85589 1950 79731 40054 119785 1960 137820 20472 158292 1970 205413 60073 265486

Fonte IBGE Censos Demograacuteficos do Maranhatildeo (195019601970)

Grande parte desse contingente populacional era formado pelo processo migratoacuterio

de pessoas que provinham das aacutereas rurais e de outros estados do nordeste por causa do

fenocircmeno da seca Esses fatores acarretaram em uma ocupaccedilatildeo desordenada de aacutereas as

margens dos rios Anil e Bacanga

Essa complexidade do processo migratoacuterio pode ser compreendida a partir da

reestruturaccedilatildeo produtiva que com mudanccedilas nas formas de inserccedilatildeo no mercado de trabalho

torna-se elemento fundamental para o entendimento da nova configuraccedilatildeo espacial da

migraccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo uma vez que o fluxo migratoacuterio de nordestinos se daacute pela procura de

trabalho numa regiatildeo em que sabem que sua matildeo de obra eacute extremamente necessaacuteria

Os outros fatores que intensificaram o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial foram a

falta de investimento do poder puacuteblico tanto estadual como municipal em aacutereas mais

afastadas do centro da cidade a instalaccedilatildeo de empresas provenientes do sul do Paiacutes na regiatildeo

ausecircncia de uma reforma agraacuteria estadual entre outros

A cidade entatildeo se tornou incapaz de incorporar todo esse contingente populacional

em suas atividades econocircmicas pois simultaneamente outro fato negativo para a economia

se tornava evidente com a paralisaccedilatildeo das induacutestrias tecircxteis Tal fato aleacutem de enfraquecer o

ritmo de industrializaccedilatildeo contribuiu para o aumento do desemprego (DINIZ 2007)

Nas uacuteltimas cinco deacutecadas com o decliacutenio das faacutebricas e as constantes crises da economia maranhense a cidade tem sofrido pressotildees econocircmicas muito fortes refletindo-se no enfraquecimento do comeacutercio local dando ecircnfase ao aparecimento de um tipo de atividade comercial caracterizada por baixos investimentos e menor especializaccedilatildeo nos produtos o setor informal da

209

economia ou circuito inferior Por outro lado apesar do decliacutenio no setor agro-exportador surgiram novas perspectivas econocircmicas que viriam a alterar significativamente o panorama soacutecio-econocircmico da cidade (DINIZ 2007 p 169)

Sendo assim com o decliacutenio das induacutestrias tecircxteis e por conseguinte o aumento do

desemprego o Estado passou a atuar como investidor no espaccedilo urbano na medida em que se

tornou responsaacutevel pela circulaccedilatildeo de capital fazendo com que a cidade continuasse a ter no

comeacutercio um dos fatores de sua existecircncia A cidade assumiu dessa maneira a funccedilatildeo de

comercial industrial administrativa e residencial (ANDRADE 1984 p 103)

O baixo poder aquisitivo da populaccedilatildeo as limitaccedilotildees em investimentos puacuteblicos

municipais principalmente nas aacutereas mais carentes e a ausecircncia de um planejamento

adequado dotaram o crescimento da cidade de aspectos negativos em relaccedilatildeo agrave urbanizaccedilatildeo e

aos serviccedilos baacutesicos

Parte do Centro Histoacuterico teve entatildeo sua funccedilatildeo residencial substituiacuteda pelo comeacutercio e serviccedilos A aacuterea sob a tutela da legislaccedilatildeo federal uma vez que foi tombada como Patrimocircnio Histoacuterico sofreu um esvaziamento mais acentuado agravado pela instalaccedilatildeo da funccedilatildeo administrativa federal estadual e municipal em edifiacutecios da aacuterea afastando cada vez mais a populaccedilatildeo residente (ESPIRITO SANTO 2002 p 37)

Dessa forma vaacuterios movimentos sociais urbanos comeccedilaram a surgir objetivando a

organizaccedilatildeo da populaccedilatildeo residente nas aacutereas mais afastadas do centro da cidade no intuito de

reivindicar a presenccedila do Estado em especial no que se refere aos meios de consumo coletivo

como aacutegua energia postos de sauacutede etc culminando em 1959 com a fundaccedilatildeo da Uniatildeo de

Moradores do Lira que foi a primeira organizaccedilatildeo popular de Satildeo Luiacutes Este fato incentivou

a partir de 1960 o surgimento de outras uniotildees e associaccedilotildees de moradores a exemplo

Madre de Deus Floresta Coreacuteia Nossa Senhora da Vitoacuteria Satildeo Vicente e Satildeo Francisco

Com efeito o governo estadual criou em 1959 a Sociedade de Melhoramentos e

Urbanismo de Satildeo Luiacutes (SURCAP) com a finalidade de planificar a cidade Entretanto este

objetivo natildeo se concretizou e se resumiu ao desmembramento dos Serviccedilos de Aacutegua Luz

esgoto Traccedilatildeo e Prensa de Algodatildeo (Saelta) resultando no corte setorial uma vez que foram

instituiacutedos os respectivos oacutergatildeos (LUZ 2004)

Vale notar que por oito anos (1953-1961) natildeo houve registro de investimentos na

aacuterea habitacional Tal situaccedilatildeo foi modificada entre 1962 e 1965 uma vez que a accedilatildeo do

Estado enquanto produtor do espaccedilo foi ampliada e incrementada na medida em que o

210

Instituto de Aposentados e Pensionistas do Comeacutercio (IAPC) e o Instituto de Pensionistas e

Aposentados dos Servidores do Estado (IPASE) foram inseridos nesse contexto

Entatildeo a partir da segunda metade da deacutecada de 1960 a iniciativa de incorporar Satildeo

Luiacutes no processo desenvolvimentista da sociedade moderna que aos poucos se consolidava

contou com uma seacuterie de medidas implementadas em conformidade com os planos e projetos

governamentais

O crescimento urbano de Satildeo Luiacutes nesse periacuteodo se deu no sentido sudeste

acompanhando o eixo rodoviaacuterio da cidade que tambeacutem coincide com a localizaccedilatildeo do

aeroporto Essa estreita faixa de terra delimitada pelas zonas alagadiccedilas dos rios Anil e

Bacanga na verdade eacute o eixo rodoviaacuterio principal da ilha com trecircs grandes avenidas Getuacutelio

Vargas Joatildeo Pessoa e Kennedy Naturalmente ali foram localizadas as principais atividades

comerciais e inuacutemeras aacutereas residenciais abrigando os bairros mais populosos Destarte

formou-se inclusive um centro de serviccedilos secundaacuterio no bairro do Joatildeo Paulo com o

agrupamento de vaacuterias atividades comerciais em torno do mercado desse bairro (LUZ 2004)

A partir de 1967 essa tendecircncia comeccedilou a se inverter em decorrecircncia da construccedilatildeo da barragem do Bacanga ligando o centro ao Porto do Itaqui e da ponte Satildeo Francisco sobre o rio Anil (1970) no sentido da orla mariacutetima

praias Essas obras possibilitaram a ocupaccedilatildeo das terras situadas na margem direita do Rio Anil e na margem esquerda do rio Bacanga promovendo uma profunda alteraccedilatildeo no processo de ocupaccedilatildeo do solo no Municiacutepio e induzindo o surgimento de novos eixos viaacuterios novas aacutereas residenciais aleacutem de centros comerciais e de serviccedilos que passaram a rivalizar com os centros tradicionais (DINIZ 2007 p 171)

Segundo argumenta Luz (2004 p 20) ao assumir o governo do Estado em 1966

Joseacute Sarney criou o Grupo de Trabalho de Assessoria e Planejamento (GETAP) ligando-o

diretamente ao Gabinete do Governo e atribuindo-lhe amplos poderes em relaccedilatildeo agraves demais

secretarias O GETAP elaborou o Programa de Emergecircncia para 1966 e propocircs medidas

poliacuteticas e econocircmicas de modernizaccedilatildeo que deram as bases para o plano de Governo

conhecido como Maranhatildeo Novo marcando nesse sentido a introduccedilatildeo de mecanismos

que alterariam profundamente o cenaacuterio espacial maranhense

Nesse sentido a preocupaccedilatildeo em melhorar e ampliar a malha rodoviaacuteria e

ferroviaacuteria em conformidade com a futura implantaccedilatildeo de grandes projetos industriais tais

como Alumiacutenio do Maranhatildeo SA (ALUMAR) Companhia Vale do Rio Doce (CVRD)

Companhia de Docas do Maranhatildeo (Codomar) e Celulose do Maranhatildeo SA (CELMAR)

contribuiacuteram para uma maior proximidade entre os municiacutepios do interior e a capital

211

maranhense na medida em que as populaccedilotildees rurais movidas pela necessidade de melhores

condiccedilotildees de vida deslocavam-se em grandes quantidades ao longo das deacutecadas de 1970 e

1980 por novas vias pavimentadas e por ferrovias em direccedilatildeo as cidades com melhores

infraestruturas destacando-se Imperatriz e Satildeo Luis

A vinda para a capital do Estado significava na maioria das vezes natildeo o abandono

da terra pelo atrativo urbano mas uma decisatildeo em que prevalecia efetivamente a necessidade

conforme se observa na fala de Ribeiro Junior (2001 p 105) sempre se coloca em debates

que as pessoas vecircm para a cidade com o sonho de morar bem arranjar um bom emprego

mudar de vida Mas na maioria das vezes vem-se para sobreviver 64

A situaccedilatildeo logo se agravava com a permanecircncia do desemprego e a falta de

qualificaccedilatildeo profissional suficiente para o ingresso no mercado de trabalho restando na

maioria das vezes a opccedilatildeo por atuar no setor informal do terciaacuterio ou na construccedilatildeo civil65

Assim todos esses eventos proporcionaram agrave cidade vaacuterias mudanccedilas sendo uma

delas o aumento do contingente populacional Este crescimento populacional desordenado

trouxe problemas de habitaccedilatildeo sauacutede seguranccedila e favoreceu o surgimento de ocupaccedilotildees

irregulares palafitas e favelas

Sobre isso Gomes (1992 p115-116) destaca

Satildeo Luiacutes eacute incapaz de incorporar a vida econocircmica esse acreacutescimo populacional resultando dai uma enorme expansatildeo de palafitas que em 1969 atingiram aproximadamente o nuacutemero de 7000 abrigando uma populaccedilatildeo estimada de 40000 pessoas em condiccedilotildees infra-humanas [] Assim entre 1950 e 1970 a populaccedilatildeo da Capital aumenta de aproximadamente 80 alojando-se sobretudo na zona suburbana pela ocupaccedilatildeo bastante desordenada das aacutereas utilizaacuteveis nas fraldas do espigatildeo constituiacutedo pelo divisor de aacuteguas dos rios Bacanga e Anil

64 Segundo Ribeiro Junior (2001 p 104) ao final dos anos 1970 na pesquisa efetuada pelo governo estadual com o objetivo de analisar a populaccedilatildeo de 07 focos de pobreza da cidade que agregavam 181176 pessoas (Bacanga = 59278 Rio Anil = 56370 Alto do Anil = 25156 Anjo da Guarda = 35212 Vila Vicente Fialho = 3059 Nova Divineacuteia = 1414 Corticcedilos do Centro de Satildeo Luiacutes = 687) deixava claro que a grosso modo em todas as aacutereas de populaccedilatildeo predominantemente pobre excetuando-se a aacuterea de Corticcedilos do Centro predominava a procedecircncia rural entre os que moravam anteriormente em outro lugar fora da ilha 65 De forma cada vez mais intensa o espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes tendeu a ser alterado projetando o setor de construccedilatildeo civil na qual de acordo com Ribeiro Junior (2001) se consolidou efetivamente a partir de obras como o Porto do Itaquiacute o Anel Viaacuterio a Ponte Joseacute Sarney a Barragem do Bacanga a substituiccedilatildeo da velha rede de esgoto do Centro da Cidade (originaacuteria da deacutecada de 1920) a Avenida Meacutedici (hoje Africanos) Ponte Bandeira Tribuzi a 3ordf ponte sobre o rio Anil obra iniciada em 1974 e concluiacuteda em 1980 o aterramento da Ponta D areia ligando o bairro do Satildeo Francisco agrave praia que leva aquele nome transpondo o Igarapeacute

da Jansen a pavimentaccedilatildeo da aacuterea litoracircnea

Calhau Ponta D areia e Olho D aacutegua ligando essas aacutereas a certos bairros da cidade perifeacutericos ou centrais e a construccedilatildeo de inuacutemeros conjuntos habitacionais fizeram da deacutecada de 1970 um periacuteodo de fenocircmeno e expansatildeo da construccedilatildeo civil em Satildeo Luiacutes

212

Foi a partir de entatildeo que o processo de favelizaccedilatildeo da periferia se acentuou e em

1969 Satildeo Luiacutes contava com cerca de 7000 casas tipo palafitas onde habitavam em

condiccedilotildees subumanas algo em torno de 40000 pessoas representando 17 da populaccedilatildeo

urbana (ANDRADE 1984)

Por satildeo Luiacutes natildeo ter nenhum Plano Diretor ateacute a deacutecada de 70 que regulamentasse o uso e ocupaccedilatildeo do solo facilitou o surgimento de vaacuterias palafitas principalmente em aacutereas de mangues em decorrecircncia das mesmas estarem proacuteximas o Centro [] Assim por falta de uma poliacutetica do solo e pela populaccedilatildeo migrante natildeo poder pagar aluguel e transporte a deacutecada de 60 eacute marcada por um processo intenso de ocupaccedilatildeo dos mangues para construccedilatildeo de palafitas que passam abrigar essa populaccedilatildeo proacutexima ao mercado de trabalho (ANDRADE 1984 p 37)

O crescimento urbano criava algumas necessidades para facilitar a integraccedilatildeo das

aacutereas jaacute ocupadas e viabilizar o acesso a outras aacutereas para a habitaccedilatildeo Sendo assim a

construccedilatildeo de pontes era uma alternativa importante para esses ajustamentos

Desse modo no final da deacutecada de 1960 foram construiacutedas as pontes Governador

Newton Bello e Governador Joseacute Sarney ambas sobre o rio Anil e a Barragem do Bacanga

sobre o rio do mesmo nome (Fotografia 6) Estas obras permitiram a expansatildeo da cidade nas

direccedilotildees norte e oeste provocando o aparecimento de grandes conjuntos habitacionais para as

classes de menor poder aquisitivo loteamentos isolados e a regularizaccedilatildeo de aacutereas ocupadas

na faixa litoracircnea

Fotografia 6

Pontes Governador Newton Bello e Governador Joseacute Sarney (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte INPE (1999)

213

Com a construccedilatildeo da ponte Governador Newton Bello foi encurtado o percurso para

o bairro do Olho D aacutegua onde jaacute existiam algumas residecircncias de classe meacutedia e foram

implantados os conjuntos habitacionais Ipase Maranhatildeo Novo e Cohama Jaacute com a

construccedilatildeo da ponte Governador Joseacute Sarney foram implantados os conjuntos habitacionais

do BASA Renascenccedila e os loteamentos Satildeo Francisco e IPEM do Calhau aleacutem de propiciar a

ocupaccedilatildeo espontacircnea das aacutereas proacuteximas agrave cabeceira da Ponte por moradores de baixa renda

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

A Barragem do Bacanga facilitou o acesso ao Porto do Itaquiacute com o encurtamento

no seu trajeto em 22 km e contribuiu para o assentamento de famiacutelias de baixo poder

aquisitivo no loteamento Anjo da Guarda

Ateacute o iniacutecio da deacutecada de 1970 as ocupaccedilotildees concentravam-se principalmente nas proximidades dos rios Anil e Bacanga natildeo se estendendo muito aleacutem dos arredores do centro Posteriormente outras localidades da cidade passam a ser palco desse processo formando aacutereas com ampla concentraccedilatildeo de populaccedilatildeo carente como o Itaquiacute-Bacanga

assim conhecido apoacutes a inauguraccedilatildeo oficial do Porto do Itaquiacute em 1971 (DINIZ 2007 p 171)

Sendo assim nesse processo de produccedilatildeo do espaccedilo urbano observa-se a accedilatildeo dos

agentes sociais Estado Imobiliaacuterios e Incorporadores interessados na reproduccedilatildeo do capital

por meio da valorizaccedilatildeo da cidade

Para dar seguimento ao eixo viaacuterio da ponte Governador Joseacute Sarney foi construiacuteda a Avenida Colares Moreira que propiciou crescimento urbano da aacuterea do bairro do Satildeo Francisco com a construccedilatildeo dos conjuntos habitacionais (Basa Jardim Satildeo Francisco e Renascenccedila) aleacutem dos modernos edifiacutecios comerciais e de prestaccedilatildeo de serviccedilos que valorizaram e aumentaram consideravelmente o preccedilo do solo (ANDRADE 1984 p 23)

Portanto a construccedilatildeo de tais pontes significou maiores possibilidades de se

materializar a reproduccedilatildeo do espaccedilo urbano e do capital haja vista a valorizaccedilatildeo das terras

localizadas nos mencionados setores o que tornou bastante oportuno o investimento puacuteblico e

privado em novas vias de acesso assim como em demais equipamentos urbanos

Vale ressaltar que a Cohab-MA construiu entre os anos 1967 e 1970 trecircs conjuntos

habitacionais que representaram 2438 unidades residenciais (505 relativas ao Anil I 516

concernentes ao Anil II e 1417 decorrentes do Anil III) tendo como investimento total US$

2742060 (dois milhotildees setecentos e quarenta e dois mil e sessenta doacutelares) gerando 9752

empregos diretos conforme tabela 9

214

Tabela 9

Conjuntos habitacionais produzidos pela Cohab-MA 1967-1970

Ano Conjunto Habitacional Nordm de Unidades

Valor do Investimento (US$)

Nordm de Empregos

1967 Anil I 505 694950 2020 1969 Anil II 516 712270 2064 1970 Anil III 1417 1334840 5668

Total 2438 2742060 9752 Fonte Luz (2004 p 65)

Nesse sentido a atuaccedilatildeo do Estado visou estruturar a cidade mais precisamente no

que diz respeito agrave ampliaccedilatildeo das vias de acesso por meio da articulaccedilatildeo das esferas estaduais

e federal desencadeando um processo de valorizaccedilatildeo das terras nos setores nortenordeste e

oeste e reorientandoincentivando a reproduccedilatildeo do capital e do espaccedilo urbano

Aleacutem disso sua atuaccedilatildeo tambeacutem pode ser caracterizada como agente promotor

imobiliaacuterio uma vez que possibilitou a construccedilatildeo de unidades habitacionais por intermeacutedio

dos IAPs e Cohab aquecendo dessa forma a economia mediante a quantia de capital

investido e a geraccedilatildeo de empregos impulsionando o poder de atraccedilatildeo da cidade que por seu

turno natildeo estava preparada para tal

Destarte a partir de 1970 foram definidas novas perspectivas de crescimento da

cidade com a decisatildeo do Governo Federal em escoar o mineacuterio da Serra dos Carajaacutes pelo

porto de Satildeo Luiacutes e de implantar um complexo sideruacutergico na Ilha Foram entatildeo implantados

novos loteamentos e construiacutedos grandes conjuntos habitacionais em vaacuterios locais da Ilha sob

o incentivo do BNH conforme verificado no quadro 7

215

Quadro 7

Ocupaccedilotildees no periacuteodo de 1961 agrave 1990

Ocupaccedilatildeo Ano Famiacutelias Sujeitos e Forccedilas poliacuteticas Saacute Viana 1961 1200 Igreja Catoacutelica Estudantes e Poliacutecia Militar Redenccedilatildeo 1966 600 IgrejaArcebispado Governo do Estado e Poliacutecia Militar Santa Cruz 1967 2000 Poliacutecia Militar e Prefeitura Coroado 1969 1000 Igreja Catoacutelica Prefeitura e Poliacutecia Militar

Vila Palmeira 1969 4000 Governo do Estado Vila Nova 1972 1000 Governo do Estado

Coroadinho 1977 3000 Igreja Catoacutelica e Prefeitura Vila Padre Xavier

1980 800 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB) e Governo do Estado

Vera Cruz 1980 300 Partidos de Esquerda (MDB) Governo do Estado Lideranccedilas Comunitaacuterias e Igreja

Satildeo Bernardo 1981 2000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Joatildeo de Deus 1981 3000 Igreja Catoacutelica Partidos de Esquerda (MDB PDT PT) ASP e Governo do Estado

Bom Jesus 1982 3000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Itamar 1983 2000 Igreja Catoacutelica COHAB Caacuteritas FASE SMDDH Prefeitura e Partidos de Esquerda (PMDB PCdoB PT)

Vila Mauro Fecury II

1990 4000 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura

Vila Satildeo Luiacutes 1990 1300 Construtora Igreja Catoacutelica Poliacutecia Militar e Prefeitura TOTAL 29200

Fonte Luz (2004 p 69)

Assim eacute introduzida a preocupaccedilatildeo com o ordenamento do processo de expansatildeo

urbana que se traduz nos primeiros esboccedilos de articular um planejamento viaacutevel agrave cidade de

Satildeo Luiacutes Nesse sentido a Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes realizou uma seacuterie de estudos e

de propostas urbaniacutesticas no sentido de fornecer elementos teacutecnicos para instrumentar o

Poder Puacuteblico no processo de planejamento e desenvolvimento urbano da cidade

Esses estudos culminaram na elaboraccedilatildeo do Plano Diretor de Satildeo Luiacutes de 1977

constituindo-se em instrumentos importantes para o conhecimento da realidade social urbana

e ambiental de Satildeo Luiacutes bem como para determinar as diretrizes do uso e ocupaccedilatildeo territorial

do sistema viaacuterio e transportes do Municiacutepio e seu zoneamento urbano

De acordo com Ribeiro Junior (2001) esses estudos66 apontaram os problemas que

possivelmente a cidade enfrentaria em decorrecircncia da transformaccedilatildeo na sua estrutura urbana

66 Dentre os estudos cabe destaque 19671968

Pesquisa sobre o Desenvolvimento Urbano de Satildeo Luiacutes 19671968

Desenvolvimento Urbano da Aacuterea do Itaqui 1971 - Estudo de Viabilidade Teacutecnico-Econocircmica do

216

e econocircmica frente aos investimentos anunciados Entre eles estatildeo o esvaziamento do centro

histoacuterico e o avanccedilo da ocupaccedilatildeo urbana nas aacutereas de manguezais

Em 1973 surgiu a primeira proposta concreta de erradicaccedilatildeo das palafitas com o

Programa de Despalafitaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes67 por meio de assinatura de convecircnio entre a

Prefeitura Municipal de Satildeo Luiacutes e o BNH no valor de 10 milhotildees de cruzeiros Seria dado agrave

cidade um crescimento urbaniacutestico disciplinado e a complementaccedilatildeo de infraestrutura e

saneamento total dos bairros sob intervenccedilatildeo como a construccedilatildeo de calccediladas e a implantaccedilatildeo

de equipamentos comunitaacuterios

Posteriormente outros projetos foram elaborados na tentativa de controlar o

crescimento desordenado

da cidade Sendo que no governo de Joatildeo Castelo iniciado em 15

de marccedilo de 1979 ter-se-ia pela frente entre outras metas a de solucionar o problema

habitacional em Satildeo Luiacutes que jaacute despontava nesse principio de deacutecada como fator expressivo

de atraso social e reflexo direto do mau planejamento das administraccedilotildees anteriores

(RIBEIRO JUNIOR 2001)

Eacute importante destacar que as intervenccedilotildees municipais e estatais no espaccedilo urbano de

Satildeo Luiacutes natildeo representaram a possibilidade de acesso agrave moradia para uma parte da populaccedilatildeo

isso porque as unidades habitacionais natildeo atenderam agrave demanda e os planos e projetos

relativos agrave urbanizaccedilatildeo foram desvirtuados e natildeo efetivados uma vez que a Surcap acabou se

apresentando como uma empresa imobiliaacuteria possibilitando a accedilatildeo de apropriadores de terras

Diniz (2007) argumenta que no final da deacutecada de 1970 o Estado do Maranhatildeo

apresentou um desenvolvimento econocircmico relevante graccedilas agrave implantaccedilatildeo dos capitais

industriais Esse surto industrial trouxe na deacutecada seguinte mudanccedilas significativas na

estrutura soacutecioespacial da cidade causadas especialmente pelo aumento do contingente

populacional que duplicou nesse periacuteodo

A implantaccedilatildeo desses grandes projetos e o comeacutercio paralelo surgido em decorrecircncia dessas novas instalaccedilotildees podem ter sido os fatores motivadores do crescimento populacional em Satildeo Luis na deacutecada de 1980 Segundo dados estatiacutesticos do IBGE em 1980 Satildeo Luiacutes apresentava um contingente populacional de 449887 habitantes o que correspondia a pouco mais de 12 da populaccedilatildeo estadual concentrada na zona urbana (DINIZ 2007 p 170)

Desenvolvimento Decenal e Plano Diretor dos Portos de Itaqui e Mucuripe 1972 - Estudo de um Estaacutedio para a Cidade de Satildeo Luiacutes 1972

Plano de Desenvolvimento Turiacutestico do Maranhatildeo 19721974

Programa de Recuperaccedilatildeo de Aacutereas Alagadas

Projeto Kennedy e Bares 19721975

Estudos de Viabilidade para Implantaccedilatildeo da Central de Abastecimento de Satildeo Luiacutes 1977

Plano Diretor de Satildeo Luiacutes (LUZ 2004) 67 O Plano objetivava a recuperaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo das aacutereas alagadas de Satildeo Luiacutes abrangendo um total de 8 mil palafitas (RIBEIRO JUNIOR 2001)

217

Paralelamente a isso se acelerou tambeacutem a ocupaccedilatildeo desordenada por contingentes

populacionais de menor poder aquisitivo nas aacutereas alagadiccedilas e nos manguezais Esse

crescimento se direcionou segundo trecircs vetores

1) Em direccedilatildeo ao norte da Ilha compreendendo a orla mariacutetima e as aacutereas situadas

entre os conjuntos habitacionais recentemente implantados

2) Em direccedilatildeo a parte leste acompanhando a ligaccedilatildeo rodoviaacuteria com os outros dois

municiacutepios da Ilha

3) Em direccedilatildeo sul acompanhando a ligaccedilatildeo rodo-ferroviaacuteria da Ilha com o

continente (LUZ 2004)68

Pode-se notar tambeacutem a forte ocorrecircncia de zonas palafitadas principalmente agraves

margens do Rio Anil e nas aacutereas sujeitas a inundaccedilotildees pelo fluxo das mareacutes (Fotografia 7)69

Ao longo da orla mariacutetima existe uma predominacircncia de residecircncias de alto padratildeo com fraco

adensamento e glebas com grandes aacutereas de especulaccedilatildeo (Fotografia 8)

68 Segundo Luz (2004) a Ilha de Satildeo Luiacutes encontra-se dividida em quatro setores bem definidos por meio de dois corredores viaacuterios o primeiro do Porto Itaqui ateacute Satildeo Joseacute de Ribamar atravessando a Ilha no sentido oeste-leste e o segundo do Olha D aacutegua ateacute o Estreito dos Mosquitos uacutenica ligaccedilatildeo da Ilha com o continente e que se desenvolve no sentido norte-sul Setores o setor noroeste

se caracteriza pela predominacircncia de conjuntos habitacionais do padratildeo de classe meacutedia a alta vaacuterios loteamentos aleacutem da parte da zona central da cidade de Satildeo Luiacutes o setor nordeste

se caracteriza pela presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares nas proximidades dos eixos viaacuterios quase toda aacuterea apresenta caracteriacutesticas rurais e encontra-se comprometida com grandes loteamentos o setor sudeste

eacute caracterizado por vastas glebas com atividades rurais muitos povoados grandes aacutereas institucionais alguns loteamentos e conjuntos habitacionais populares Grande parte deste setor estaacute reservado a atividade industriais onde jaacute se encontram instaladas a maioria das induacutestrias de porte meacutedio de Satildeo Luiacutes O setor sudoeste embora apresente caracteriacutesticas rurais se encontra em fase de transiccedilatildeo com a cessatildeo das terras para o uso industrial Neste setor estatildeo instaladas as grandes induacutestrias o complexo portuaacuterio o Campus Universitaacuterio do Bacanga e a reserva florestal Nas proximidades do centro de Satildeo Luiacutes eacute notada a presenccedila de alguns conjuntos habitacionais populares e aglomeraccedilotildees urbanas com residecircncias de baixo padratildeo assentadas desordenadamente 69 Paulatinamente avanccedilava-se nas ocupaccedilotildees tomando a direccedilatildeo das aacutereas perifeacutericas da capital na proporccedilatildeo em que aumentavam o nuacutemero de famiacutelias vindas do interior do Estado englobando novas caracteriacutesticas ao mapa habitacional da ilha

218

Fotografia 7

Palafitas no Rio Anil (Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte PEMAS (2004)

Fotografia 8

Condomiacutenios de alto padratildeo (Lagoa Jansen

Satildeo Luiacutes-MA)

Fonte Portela (2010)

Na aacuterea norte da ilha a interligaccedilatildeo entre o centro e a regiatildeo das praias com a

construccedilatildeo da Ponte Joseacute Sarney marcou a formaccedilatildeo de uma aacuterea nobre da cidade (Satildeo

Francisco Renascenccedila Calhau Ponta D areia Satildeo Marcos Olho D aacutegua) onde os negoacutecios

imobiliaacuterios ganharam grande projeccedilatildeo na deacutecada de 1980 caracterizando-se pela

verticalizaccedilatildeo das construccedilotildees

219

Num periacuteodo de menos de 10 anos abrangendo toda a deacutecada de 1970 foram criados

18 conjuntos habitacionais para atender a procura do segmento social de renda meacutedia

conforme tabela 10

Tabela 10

Conjuntos habitacionais estatais produzidos por meio da Cohab e Cooperativas 1971-1980

Ano Entidade Financiadora Conjunto Habitacional Nordm de Unidades 1971 Cohab Sacaveacutem 476 1973 Cohab Radional 366 1975 Cooperativa Cohama 700 1976 Cohab Anil IV 1111 1977 Cooperativa Cohapa 41

1978

Cooperativa Cohaserma 364

Cohapam 100

Cohajap 331

Cohatrac I 875

Cohajoli 50 Cohab Bequimatildeo 1190

Vinhais 1627

Hab Turuacute 767

1979

Cohab Rio Anil 365

Angelim 654 Cooperativa Coharev 160

Cohajapa 38 1980 Cooperativa Cohafuma 482

Total 9697 Fonte Luz (2004 p 70)

A partir da deacutecada de 1980 a ocupaccedilatildeo do espaccedilo urbano de Satildeo Luiacutes deu-se de

maneira acelerada e desarticulada Isso porque o governo federal elaborou o Programa de

Desenvolvimento Integrada da Amazocircnia Oriental como uma poliacutetica territorial regional que

visava agrave implantaccedilatildeo de grandes projetos destinados exclusivamente a mineraccedilatildeo

metalurgia agropecuaacuteria e reflorestamento

Durante toda a segunda metade da deacutecada de 1970 especulava-se sobre as profundas transformaccedilotildees estruturais que a capital do Estado atravessaria na qual Satildeo Luiacutes seria o palco de grandes empreendimentos industriais Tal previsatildeo ao passo que fomentava a euforia de grande parcela da populaccedilatildeo carente e desempregada servia ainda de motivaccedilatildeo para o homem do campo

que via uma razatildeo a mais para abandonar sua terra em busca de oportunidades de trabalho (LUZ 2004 p 68)

220

Muitos outros projetos expuseram a Amazocircnia a novos fluxos migratoacuterios O projeto

Carajaacutes por exemplo estabeleceu um poacutelo de desenvolvimento percorrendo o sul do Paraacute ateacute

a cidade de Satildeo Luiacutes no Maranhatildeo Paralelamente a accedilatildeo madeireira serviu e ainda serve

como ponta de lanccedila para outros projetos como os agropecuaacuterios em torno dos quais se

estabeleceu uma arena de conflitos entre agricultores sem terra e grandes latifundiaacuterios Na

consolidaccedilatildeo dos Grandes Projetos e dos latifuacutendios criou-se um ecircxodo rural onde pequenos

agricultores e outros migraram para diferentes locais principalmente para as cidades

amazocircnicas

A implantaccedilatildeo do Programa Grande Carajaacutes (PGC) e a instalaccedilatildeo de grandes

induacutestrias tiveram um grande impacto na cidade provocando um enorme crescimento

populacional aleacutem disso esses projetos foram implantados sem a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo

local natildeo levando em consideraccedilatildeo as peculiaridades econocircmicas sociais e culturais locais e

sem a devida preocupaccedilatildeo com a aplicaccedilatildeo dos recursos financeiros necessaacuterios para

produccedilatildeo de uma infraestrutura que suportasse tal crescimento

Segundo estudos realizados por Castro e Acevedo Marin (1991) e Almeida (1995)

os processos migratoacuterios na Amazocircnia entre as deacutecadas de 1970 e 1980 estiveram fortemente

marcados por intensos fluxos de nordestinos especialmente de maranhenses gauacutechos e

mineiros que contribuiacuteram decisivamente para aumentar o nuacutemero de povoados dos quais

alguns se colocaram como embriotildees de formaccedilatildeo de novos municiacutepios A construccedilatildeo da

Estrada de Ferro na deacutecada de 1980 intensificou a migraccedilatildeo redirecionando os migrantes

nordestinos goianos e mineiros da Transamazocircnica para outras aacutereas do sudeste do Paraacute e

sudoeste do Maranhatildeo O crescimento da populaccedilatildeo atingiu todos os municiacutepios ao longo da

Estrada de Ferro Carajaacutes Cresceu assim a populaccedilatildeo concentrada nas cidades de Marabaacute no

Paraacute Imperatriz e Accedilailacircndia no Maranhatildeo nos antigos povoados de ParauapebasRio Verde

(atualmente cidade de Parauapebas) Km 30 (hoje Curionoacutepolis) e o Km 3 (Eldorado de

Carajaacutes)

situados nas proximidades das aacutereas de lavra da CVRD e dos garimpos

ligados

entre si pela PA-275 e suas vicinais

Heacutebette (2004) em suas investigaccedilotildees ressalta que a aacuterea geograacutefica abrangida pelo

PGC (hidreleacutetrica de Tucuruiacute Poacutelo de Gusa Ferrovia de Carajaacutes

que corta a Ponta da

Madeira a qual atravessa os vales do Parauapebas Itacauacutenas Tocantins Araguaia e corre

paralela aos vales do Pindareacute e do Mearim alcanccedilando a ilha de Satildeo Luiacutes

e exploraccedilatildeo

mineral) sofreu profundas transformaccedilotildees resultantes da pressatildeo de integrar a Regiatildeo Norte

do Paiacutes agrave dinacircmica econocircmica e poliacutetica nacional implementadas a partir dos poacutelos

221

industriais urbanos Aleacutem disso afirma que o PGC exerceu papel redefinidor do aspecto

econocircmico poliacutetico e social da regiatildeo70

Integrar a Amazocircnia ao capitalismo significa inseri-la plena e definitivamente no mercado nacional e internacional nas trocas mediadas pelo dinheiro sob a eacutegide do capital industrial e financeiro Significa transformar seus recursos naturais em valores que pudessem ser incorporados ao circuito das trocas monetaacuterias com a produccedilatildeo industrial nacional e internacional isto eacute se tornar parte integrante da circulaccedilatildeo do capital Isso natildeo podia ser realizado sem a mobilizaccedilatildeo do trabalho que valorize esses recursos (terra mata mineacuterio) isto eacute sem a formaccedilatildeo de um mercado de forccedila de trabalho (HEacuteBETTE 2004 p 62)

Originalmente o PGC foi anunciado como um projeto integrado constituindo o

maior programa de desenvolvimento integrado do mundo que aleacutem da exploraccedilatildeo mineral

incluiacutea projetos agropecuaacuterios silvicultores e de industrializaccedilatildeo Sua implantaccedilatildeo obedeceria

a um zoneamento de acordo com o qual foram definidas as seguintes zonas industriais

Barcarena Marabaacute Serra dos Carajaacutes Satildeo Luiacutes Tucuruiacute e Imperatriz Dos problemas de

ordem fundiaacuteria ficariam encarregados os oacutergatildeos competentes com ecircnfase para o Instituto

Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria (INCRA) Todavia tratou-se de uma integraccedilatildeo

agrave economia capitalista e agrave sociedade burguesa moderna (ALMEIDA 1995)

Vale enfatizar que o PGC ergueu-se como um marco no processo de organizaccedilatildeo do

espaccedilo e definiccedilatildeo do territoacuterio no sudeste paraense e sudoeste maranhense No contraditoacuterio

mega-projeto atuam Estado e iniciativa privada e sob um contexto de avanccedilo de uma nova

etapa do processo de produccedilatildeo capitalista tem conferido agraves empresas multinacionais e

transnacionais hegemonia (CARNEIRO 1994)

Entretanto nota-se que a integraccedilatildeo da fronteira ateacute hoje natildeo proporcionou a

industrializaccedilatildeo capitalista da regiatildeo e que o setor onde se tem dada a acumulaccedilatildeo industrial

e que se desenvolveu foi o da construccedilatildeo (em parte construccedilatildeo habitacional mas sobretudo a

construccedilatildeo de grandes obras puacuteblicas) com a instalaccedilatildeo de grandes firmas construtoras

inclusive de padratildeo internacional (HEacuteBETTE 2004 p 66)

Heacutebette (2004) ressalta que o interesse seletivo do capital se concentrou em torno da

terra da madeira de alguns mineacuterios como manganecircs bauxita e ouro Mas como o interesse

70 O PGC sob responsabilidade da CVRD tinha por objetivo a exploraccedilatildeo das reservas de mineacuterio de ferro ouro e outros minerais em Carajaacutes e dispunha de uma aacuterea geograacutefica que englobava terras situadas entre os rios Amazonas Parnaiacuteba e Xingu ao norte do paralelo 8ordm (oito graus) e compreendia uma aacuterea de cerca de 900 mil kmsup2 incluindo parte do estado do Paraacute Maranhatildeo e Goiaacutes (hoje Tocantins) abrangendo uma proviacutencia mineral extremamente rica e diversificada em recursos (ferro manganecircs cobre bauxita niacutequel ouro) aleacutem disso comporta grande parte da bacia do Araguaia-Tocantins

222

do capital se cruzou com o interesse dos trabalhadores a procura sempre se deu em forma de

uma luta de classes Assim a luta mais conhecida foi pela terra

Dessa forma Castro e Acevedo Marin (1991) argumentam que a luta pela terra eacute

uma questatildeo central quando se analise a realidade social no sudeste do Paraacute uma vez que eacute

marcada por uma dinacircmica econocircmica social e poliacutetica especifica Nessa complexa realidade

competem pelo domiacutenio do espaccedilo e dos recursos naturais atores como empresas de

mineraccedilatildeo (CVRD) pecuaristas Estado madeireiros sem terra assentados posseiros e

garimpeiros Sindicato de Trabalhadores Rurais instituiccedilotildees confessionais

A gestatildeo do territoacuterio de Carajaacutes desvenda a essecircncia logiacutestica dos grandes projetos associados agrave nova ordem cientiacutefico-tecnoloacutegico Carajaacutes eacute um segmento localizado de um conjunto de escala planetaacuteria um espaccedilo transnacional em construccedilatildeo [] Os conflitos e contradiccedilotildees locais e o caraacuteter da gestatildeo da Companhia autocircnoma e baseada no saber teacutecnico-cientiacutefico traduzem-se em dispositivos de controle que fecham o territoacuterio de Carajaacutes transformando-o em verdadeira cidadela (BECKER 1994 p339-340)

Os grupos sociais (sem terra assentados posseiros garimpeiros) foram alijados das

poliacuteticas puacuteblicas e envolvidos em uma luta intensa constituiacuteram uma forccedila de mudanccedila de

forma que organizados ou natildeo ocuparam terras plantaram e deram origem a uma pecuaacuteria

extensiva reestruturando a configuraccedilatildeo espacial

Para muitas famiacutelias ludovicenses a implantaccedilatildeo de grandes complexos industriais

em terras maranhenses iria repercutir como um problema a mais de acordo com o que

Gistelinck (1988 p32) afirma no trecho a seguir

Em 1974 o governo estadual entregou mais de 3000 hectares a CVRD inclusive a praia do Boqueiratildeo a praia dos pescadores e do povo do Anjo da Guarda sem resolver no entanto os problemas habitacionais para os moradores da aacuterea Cinco anos depois mais de 10000 hectares foram entregues a ALUMAR Em torno de 4000 famiacutelias perderam de um dia para o outro o seu sustento da roccedila e da pesca Nos dois casos as famiacutelias foram indenizadas pelas benfeitorias muitas vezes de maneira arbitraacuteria mas natildeo foram criadas novas condiccedilotildees de trabalho adaptados a capacidade da populaccedilatildeo

Tal situaccedilatildeo muito se assemelha ao quadro de desapropriaccedilatildeo de terras das aacutereas do

interior do Estado e que possibilitou a expulsatildeo de inuacutemeras famiacutelias para a capital Com isso

tem-se que os agravantes surgem como desdobramentos da accedilatildeo governamental mal

planejada ou planejada sem considerar os interesses das camadas mais pobres da sociedade

223

Carneiro (1994) sintetiza a disputa pelo controle do territoacuterio na aacuterea de abrangecircncia

do PGC como um palco de transformaccedilotildees ocasionados por conflitos e pelos diferentes

interesses gerados para se definir a gestatildeo do territoacuterio e a resoluccedilatildeo dos interesses contraacuterios

e diversos dos atores presentes no mesmo

Contudo Almeida (1995) adverte que eacute o Estado que impotildee accedilotildees de coerccedilatildeo contra

camponeses na medida em que impulsiona via incentivos fiscais e concessotildees de extensas

aacutereas de terras a grupos empresariais escudados na maior racionalidade econocircmica e

inovaccedilotildees teacutecnicas ocasionando no monopoacutelio da terra nos mecanismos de imobilizaccedilatildeo e

em atos coercitivos como forma de resoluccedilatildeo de conflitos agraacuterios demonstrando a face

autoritaacuteria da modernizaccedilatildeo que tem na violecircncia um elemento inerente agrave disputa pela terra

na fronteira

Nesse sentido a realidade de desorganizaccedilatildeo social que se esboccedilava culminava

inevitavelmente num clima de insatisfaccedilatildeo e protesto reflexo da situaccedilatildeo de crise nacional

em meio ao esgotamento do modelo econocircmico imposto durante o regime militar que se

manifestava na queda do emprego e dos salaacuterios refletindo-se no rebaixamento histoacuterico das

condiccedilotildees de moradia das classes populares em todo o paiacutes

Assim novas tentativas de solucionar o problema habitacional eram implementadas

sem o sucesso esperado pelos oacutergatildeos da administraccedilatildeo puacuteblica Um dos projetos amplamente

propagandeados no final dos anos 1970 foi o PROMORAR que segundo levantamento

realizado pela UFMA em 1981 na eacutepoca de sua implantaccedilatildeo tinha como meta atingir 23

dos habitantes da ilha Sendo que a maioria dessa populaccedilatildeo procedia do interior e 87 tinha

em meacutedia uma renda familiar mensal de dois salaacuterios miacutenimos tratando-se portanto

principalmente de pessoas oriundas do campo desempregadas subempregadas como

biscateiros pedreiros lavadeiras e empregadas domesticas (LUZ 2004)

Os resultados do PROMORAR pouco significaram como soluccedilatildeo do problema habitacional em Satildeo Luis sendo construiacutedas e comercializadas somente 185 unidades habitacionais com baixa qualidade do material utilizado e inuacutemeras deficiecircncias detectadas nas construccedilotildees (LUZ 2004 p57)

Ainda no inicio dos anos 1980 o governo estadual arquitetou a efetivaccedilatildeo de dois

grandes complexos habitacionais para as camadas mais pobres da populaccedilatildeo contando

inclusive com unidades de 01 (um) cocircmodo somente

224

Com a valorizaccedilatildeo das aacutereas nobres foram construiacutedos grandes conjuntos habitacionais tais como a Cidade Operaacuteria (que teve suas obras iniciadas em 1981 numa primeira etapa quando foram levantadas 1500 unidades sendo concluiacuteda em 1987) com 7500 unidades ao todo o Conjunto Jardim Ameacuterica Satildeo Raimundo e o Maiobatildeo (julho82) com 4470 unidades ambos distantes do nuacutecleo central da cidade (16 km e 20 km respectivamente) sendo este uacuteltimo construiacutedo em aacuterea formalmente pertencente ao municiacutepio de Paccedilo do Lumiar (RIBEIRO JUNIOR 2001 p 98)

Uma das preocupaccedilotildees amplamente mencionadas durante a construccedilatildeo da Cidade

Operaacuteria e do Maiobatildeo eacute que ambas estivessem localizadas perto do receacutem-inaugurado

Distrito Industrial de Satildeo Luiacutes para que houvesse a associaccedilatildeo direta de proximidade entre o

local de trabalho e o trabalhador

Outro poacutelo importante que se formou nos uacuteltimos 30 anos foi ao nordeste da Ilha no

sentido de Satildeo Luiacutes aos Municiacutepios vizinhos de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar Essa

regiatildeo se caracteriza por abrigar uma seacuterie de conjuntos habitacionais populares com alta

densidade populacional

A populaccedilatildeo total de Satildeo Joseacute de Ribamar cresceu a uma taxa anual de 736 saltando de 32320 habitantes em 1980 para 70581 em 1991 O municiacutepio de Paccedilo do Lumiar recebeu tambeacutem um forte impacto populacional evoluindo de pouco mais de 17 mil habitantes em 1980 para 53195 habitantes em 1991 com uma taxa anual de 1080 e crescimento relativo de 22176 (o maior entre os municiacutepios do Estado) (MARANHAtildeO 1997 p 27)

Com esse avanccedilo sobre os espaccedilos vazios da ilha surge uma disparidade gritante em

relaccedilatildeo aos dados populacionais das aacutereas urbana e rural de Satildeo Luis principalmente em

relaccedilatildeo agrave infraestrutura dos novos segmentos habitacionais jaacute que muitos conjuntos e bairros

receacutem inaugurados localizavam-se em regiotildees da zona rural mas mantinham perfil

eminentemente urbano uma vez que atividades primaacuterias natildeo eram neles praticadas ou seja

as periferias de Satildeo Luis natildeo eram ocupadas somente pelas camadas mais pobres mas

tambeacutem conjuntos e bairros eram construiacutedos nos arredores da cidade trazendo consigo todo o

conforto e modernidade para suprir a demanda da classe meacutedia71

A partir da deacutecada de 1990 houve uma consolidaccedilatildeo da tendecircncia que se manifestara

outrora como um surto mas que ganhava agora sintomas de permanecircncia e impressotildees de

71 Com a promulgaccedilatildeo da Lei Orgacircnica do Municiacutepio (LOM) em abril de 1990 foi definido a zona urbana da cidade compreendendo as aacutereas de edificaccedilatildeo contiacutenua das povoaccedilotildees e as partes adjacentes que possuam meio fio calccedilamento abastecimento de aacutegua rede de iluminaccedilatildeo puacuteblica escola primaacuteria postos de sauacutede e arruamentos (RIBEIRO JUNIOR 2001)

225

descontrole Nesse sentido conveacutem referenciar sobre a continuidade no avanccedilo do

movimento de luta pela posse da terra por meio das ocupaccedilotildees urbanas que saturando as

aacutereas tradicionalmente centrais da cidade ocupavam paulatinamente as periferias a ponto de

adentrar em terras situadas aleacutem das fronteiras da capital do Estado

De 1994 a 2000 inuacutemeras novas ocupaccedilotildees foram criadas em solo ludovicense

marcando um periacuteodo de luta e resistecircncia

aspectos presentes em muitos desses movimentos

de luta pela moradia conforme se constata na argumentaccedilatildeo de Luz (2004 p 78)

Num clima de verdadeira guerra onde a resistecircncia popular tem muitas vezes vencido dando margem agrave formaccedilatildeo de diversos bairros em Satildeo Luiacutes que permanecem precaacuterios por falta de atenccedilatildeo do Estado e do Municiacutepio mas representam a alternativa possiacutevel para aqueles que natildeo podem mais viver no interior

De acordo com Ribeiro Junior (2001) ao se verificar as manchetes de revistas e

jornais da eacutepoca pode-se constatar um amplo panorama da situaccedilatildeo uma vez que a forma

violenta como se desenrolaram os processos de ocupaccedilatildeo explicam a grande repercussatildeo A

exemplo disso tem-se o caso da Cidade Oliacutempica que virou um verdadeiro inferno ontem

pela manhatilde quando a Poliacutecia Militar armada ateacute os dentes invadiu a aacuterea ocupada e

promoveu destruiccedilatildeo espancamentos e prisotildees cenas de horror presenciadas por muitas

crianccedilas que tambeacutem estavam abrigadas na aacuterea

(JORNAL PEQUENO 1997 apud LUZ

2004 p 78)

Esse exemplo chama a atenccedilatildeo entre outros aspectos para um ponto inevitavelmente

discutiacutevel o alarmante deacuteficit de moradias em Satildeo Luiacutes que por sua vez traz como pano de

fundo

a defasagem da estrutura poliacutetica social e econocircmica do Estado Em outras palavras o

que se vecirc na capital maranhense no final do seacuteculo XX traduz-se no descontrole e

incapacidade do Estado em garantir condiccedilotildees de moradia a toda agrave populaccedilatildeo refletindo-se

por meio da proliferaccedilatildeo incontida de ocupaccedilotildees sem a miacutenima infraestrutura

A valorizaccedilatildeo de aacutereas mais proacuteximas do centro da cidade assim como de conjuntos

habitacionais e a consolidaccedilatildeo de aacutereas nobres geraram alta no preccedilo dos alugueacuteis e tornaram

distante para muitos o sonho da casa proacutepria conduzindo as populaccedilotildees de menor poder

aquisitivo cada vez mais para longe do Centro da Ilha

Nesse sentido vai se formando gradualmente uma seacuterie de pequenos

estabelecimentos como quitandas oficinas e lojas que servindo de base de sustento para

inuacutemeras famiacutelias ajudam a compor o quadro espacial dos bairros pobres de Satildeo Luiacutes

226

As atividades alternativas que geralmente se apresentam ao pobre desempregado e

desqualificado natildeo datildeo muitas opccedilotildees de escolha estando o setor do comeacutercio informal entre

as ocupaccedilotildees mais comuns conforme afirma Diniz (2005 p81)

O grande crescimento do setor terciaacuterio informal da economia maranhense deve-se a diversos fatores entre os quais a facilidade de acesso a esse tipo de atividade pois se trata de um negoacutecio que natildeo requer grandes investimentos tampouco necessita de matildeo-de-obra especializada assim como os produtos oferecidos nesse mercado tem boa aceitaccedilatildeo pelos consumidores que na maioria satildeo de classe baixa soacute tendo acesso muitas das vezes a esse tipo de comeacutercio

Principalmente ao longo da deacutecada de 1990 assistiu-se a efetiva incorporaccedilatildeo do

universo das ocupaccedilotildees urbanas ao cotidiano social ludovicense A ocorrecircncia desse

fenocircmeno fez surgir novas linhas de transporte coletivo obedecendo a uma demanda

crescente de usuaacuterios nas aacutereas perifeacutericas

A partir desse quadro do processo de ocupaccedilatildeo territorial de Satildeo Luiacutes pode-se

perceber que nos uacuteltimos anos o Municiacutepio sofreu um acelerado processo de espraiamento

urbano com o consequumlente inchaccedilo populacional levando ao comprometimento da qualidade

do seu espaccedilo urbano

Assim em meio agrave proliferaccedilatildeo de ocupaccedilotildees em direccedilatildeo a periferia da cidade a

organizaccedilatildeo espacial ludovicense convergia para a instabilidade na medida em que a falta de

planejamento espacial gradativamente gerava consequumlecircncias diversas a sociedade

evidenciando o descontrole da situaccedilatildeo por parte da administraccedilatildeo puacuteblica

Nesse sentido levando em consideraccedilatildeo o alto iacutendice de crescimento populacional da

grande Satildeo Luiacutes assim como o conjunto de mudanccedilas em sua organizaccedilatildeo espacial articulou-

se a consolidaccedilatildeo de um perfil soacutecio-econocircmico numa tentativa de sintonia com os padrotildees de

modernidade do mundo capitalista Tal perspectiva pode ser comprovada na evidecircncia da

velha dualidade entre ricos e pobres bairros nobres e ocupaccedilotildees de submoradias sendo esse

aspecto considerado por Ribeiro Junior (2001 p 94) como fator de segregaccedilatildeo em funccedilatildeo da

organizaccedilatildeo dos referidos conjuntos como se refere no trecho a seguir

Cinde-se como de praxe o habitat para os ricos e o habitat para as pobres no complexo urbano revelando-se a estratificaccedilatildeo contida na anaacutelise de Freyre aquele dos Sobrados e Mucambos em equivalecircncia ao existente no rural onde vingavam Casas Grandes e Senzalas unidades pertencentes ao sistema organizacional da civilizaccedilatildeo tropical brasileira contrastante socialmente

227

O crescimento residencial agrave direita do rio Anil (aacuterea da orla mariacutetima) se deu

predominantemente por conjuntos habitacionais de classe meacutedia e meacutedia alta (Satildeo Francisco

Renascenccedila Ponta D Areia Calhau Cohafuma etc) separados por enormes vazios em

virtude da existecircncia de vastos manguezais Nessa regiatildeo inclusive foi localizado o novo

poacutelo administrativo do Governo Estadual com a transferecircncia de diversos oacutergatildeos da

administraccedilatildeo puacuteblica que estavam no centro histoacuterico Do mesmo modo foram instalados

modernos edifiacutecios residenciais shoppings centers e uma seacuterie de serviccedilos

escolas e

universidades particulares comeacutercio especializado etc

para atender essa classe meacutedia que

ali se instalou Atualmente essa eacute a aacuterea de maior dinamismo imobiliaacuterio e econocircmico da

cidade (DINIZ 2007)

Logo se tecircm que a concentraccedilatildeo urbana historicamente composta pelo distrito

central de Satildeo Luiacutes e pelo distrito do Anil era gradativamente suplantada pela acelerada

formaccedilatildeo de nuacutecleos e povoados nos arredores da cidade aproximando-se de maneira

acelerada da fronteira de outros municiacutepios da ilha segundo se observa nos dados de Perfil do

Maranhatildeo (1997 p 27) abaixo

A anaacutelise do Censo Demograacutefico de 1991 segundo a situaccedilatildeo do domicilio permite determinar que a ocupaccedilatildeo da aacuterea urbana de Satildeo Luis jaacute teria alcanccedilado seu ponto de saturaccedilatildeo redirecionando a processo a de ocupaccedilatildeo do territoacuterio para aacutereas rurais do interior da ilha envolvendo os municiacutepios de Satildeo Joseacute de Ribamar e Paccedilo do Lumiar O comportamento da taxa de crescimento populacional desses municiacutepios reitera de modo incontestaacutevel essa tendecircncia enquanto a populaccedilatildeo urbana de Satildeo Luis diminuiu registrando um decliacutenio relativo de 042 sua populaccedilatildeo rural cresceu 12269 passando de 292144 em 1980 para 450158 habitantes em 1991

Atualmente a urbanizaccedilatildeo em Satildeo Luis incrementou ainda mais o processo de

pauperizaccedilatildeo de um grande contingente populacional negando a inserccedilatildeo desse contingente

no mercado formal de trabalho mas ao mesmo tempo transformou os pobres em

consumidores de alimentos e roupas industrializadas de mercadorias eletrocircnicas como raacutedios

e televisores e de serviccedilos puacuteblicos ou privados de transportes energia educaccedilatildeo e sauacutede

Vale destacar que um fator relevante em meio ao processo de ocupaccedilotildees

habitacionais e a iniciativa do poder puacuteblico no intuito de acabar com esse problema eacute que

aleacutem dos impasses burocraacuteticos e o eminente fracasso por falta de planejamento adequado dos

planos de reforma nas moradias o constante crescimento dessas sub-habitaccedilotildees impedia um

alcance maior e definitivo dos projetos jaacute que novos terrenos eram ocupados constantemente

228

formando novos nuacutecleos de palafitas concluindo-se entatildeo que a soluccedilatildeo seria muito mais

estrutural mais orgacircnica e menos paliativa

Outro fator relevante eacute que o espaccedilo urbano de Satildeo Luis assim como em outras

cidades brasileiras organiza-se em funccedilatildeo do preccedilo do solo Os terrenos urbanos tecircm seu

preccedilo regulado pela lei da oferta e da procura assim seus altos preccedilos de venda ou de locaccedilatildeo

selecionam uma clientela restrita empurrando todos os demais pretendentes para terrenos pior

localizados que tecircm preccedilos inferiores

A especulaccedilatildeo imobiliaacuteria vem interferindo de maneira agressiva no processo de

ocupaccedilatildeo e expansatildeo espacial da cidade de Satildeo Luiacutes estabelecendo um novo padratildeo com a

transferecircncia de aacutereas residenciais de alto padratildeo para o subuacuterbio As classes meacutedias e altas

movem-se para condomiacutenios distantes mas equipados com infraestrutura urbana e complexos

comerciais Parque Shalon Ponta do Farol Cohajap Parque Amazonas Santos Dumont

Parque Timbira Cohajoli Jardim dos Faraoacutes Renascenccedila I e II Cohafuma Recanto dos

Vinhais Parque dos Nobres Parque das Bandeiras (DINIZ 2007)

Segundo Diniz (2007) o fenocircmeno das ocupaccedilotildees tornou-se uma constante no dia-a-

dia o surgimento das vilas

a favela maranhense Um sem nuacutemero de terrenos puacuteblicos e

particulares foram e estatildeo sendo precariamente ocupados Vila Cafeteira Vila Itamar Vila

Isabel Vila Mauro Fecury Vila Pavatildeo Filho Vila Kiola Vila Jacarati Vila Brasil Vila

Janaiacutena Vila Santa Clara Jardim Tropical Divineacuteia Satildeo Bernardo Vila Cascavel Todos

esses bairros na aparecircncia satildeo formados por barracos e mocambos construiacutedos com material

de refugo como caixotes taacutebuas soltas folhas de zinco ou satildeo habitaccedilotildees construiacutedas de

palha taipa e adobe

Nessas localidades a pobreza e o aspecto caoacutetico satildeo visiacuteveis Os serviccedilos puacuteblicos

estatildeo ausentes o arruamento eacute desordenado a aacutegua eacute apanhada em uma bica proacutexima ou

atraveacutes de ligaccedilotildees clandestinas a luz eleacutetrica eacute conseguida com o prolongamento dos fios de

um barraco a outro os esgotos satildeo depositados a ceacuteu aberto a coleta de lixo eacute inexistente

(LUZ 2004)

No bojo das contradiccedilotildees e dos conflitos Satildeo Luiacutes se dinamiza estabelece um

processo mais acelerado de urbanizaccedilatildeo A cidade se expande multiplicando a populaccedilatildeo

marginalizada que natildeo podendo comprar terrenos e imoacuteveis deixa a periferia em constante

expansatildeo

229

5 A QUESTAtildeO HABITACIONAL EM BELEacuteM-PA E SAtildeO LUIS-MA EXCLUSAtildeO SOCIAL SEGREGACcedilAtildeO ESPACIAL E GESTAtildeO URBANA

Diante do exposto nos capiacutetulos anteriores pode-se afirmar que as estruturas urbanas

das cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes sofreram fortes impactos com a ocupaccedilatildeo da regiatildeo

Amazocircnica e com as perspectivas do capitalismo sob a oacutetica de integraacute-las economicamente a

outras regiotildees do paiacutes por meio das construccedilotildees dos eixos rodo e ferroviaacuterios principalmente

com a mineraccedilatildeo e com os investimentos nos projetos industriais consolidados nos governos

militares repercutindo assim na configuraccedilatildeo soacutecioespacial

Nesse sentido baseado na loacutegica capitalista concentrador e excludente o

desenvolvimento urbano adotado nessas duas cidades amazocircnicas influenciou na estruturaccedilatildeo

do espaccedilo urbano expressando-se em uma forma de apropriaccedilatildeo desigual do mesmo o que

acarretou em um processo de segregaccedilatildeo espacial com a exclusatildeo de grandes aacutereas de

habitaccedilatildeo de padrotildees urbaniacutesticos de habitabilidade aceitaacuteveis Esses espaccedilos produzidos no

mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo

e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e

densificaccedilatildeo

Conforme observado por Correcirca (1989) visto no capiacutetulo II desta tese o espaccedilo

urbano s0 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 -009187 2867 5510 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm(s)09187 0 0 -0071Tj( )Tj009187 0 0 -0095187 0 0 -00918000 Tj009187 0 0 -009187 2333 7133 Tm2F1 2048 Tf009187 0 0 78 Tm7 0 0 -009187 7539 6809 Tm(t)Tj 0 0(s)Tj( )Tj009187 0 0 -0(r)3 7133 Tm2F1 2048 Tf0091875640 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2F1 204(i)Tj0 -07810 Tm(a)Tj000 Tj009187 0 0 -009187 2i2F1 204(i)Tj0 -009187 2333 7133 Tm2E3a

230

Essa configuraccedilatildeo indicada natildeo por um marco legal no territoacuterio mas pela

apreensatildeo do espaccedilo urbano ante aqueles que nele interagem representa a produccedilatildeo de uma

apropriaccedilatildeo do real pelo homem enquanto sujeito situado

Segundo Bourdieu (2001) existe com efeito uma correlaccedilatildeo entre as posiccedilotildees

ocupadas pelos agentes sociais no espaccedilo social e a posiccedilatildeo que ocupam no espaccedilo fiacutesico

Este eacute inclusivamente um fator simboacutelico importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do

proacuteprio posicionamento social dos atores Estes tecircm uma posiccedilatildeo mais ou menos prestigiada

consoante ocupem espaccedilos mais ou menos valorizados e pela distacircncia que as separa uns dos

outros

A existecircncia destes espaccedilos sociais como espaccedilos de exclusatildeo de certas camadas da

populaccedilatildeo acaba por contribuir como um dos elementos definidores do modo de vida das

apreciaccedilotildees e representaccedilatildeo social e da forma como os atores sociais das cidades estudadas

encaminham as suas vivecircncias biograacuteficas e estrateacutegias de vida

Eacute na produccedilatildeo das favelas em terrenos puacuteblicos ou privados invadidos que os grupos sociais excluiacutedos tornam-se efetivamente agentes modeladores produzindo seu proacuteprio espaccedilo na maioria dos casos independentemente e a despeito de outros agentes A produccedilatildeo desse espaccedilo eacute antes de mais nada uma forma de resistecircncia e ao mesmo tempo uma estrateacutegia de sobrevivecircncia Resistecircncia e sobrevivecircncia agraves diversidades impostas aos grupos sociais receacutem expulsos do campo ou provenientes de aacutereas urbanas agraves operaccedilotildees de renovaccedilatildeo que lutam pelo direito agrave cidade Resistecircncia e sobrevivecircncia que se traduzem na apropriaccedilatildeo de terrenos usualmente inadequados para outros agentes da produccedilatildeo do espaccedilo encostas iacutengremes e aacutereas alagadiccedilas (CORREcircA 1989 p 30)

Vale destacar tambeacutem que a ineficaacutecia na execuccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas para as

demandas relacionadas ao crescimento urbano fez evidenciar as diferenccedilas sociais na

paisagem urbana na constante disputa pelos melhores espaccedilos que aumentando a demanda

diminuiu a oferta ocasionando no encarecimento do uso do solo nas cidades promovendo

assim elevadas especulaccedilotildees pelas construtoras e empresas imobiliaacuterias

A atividade imobiliaacuteria reflete o papel do espaccedilo tanto como fonte de criaccedilatildeo quanto de realizaccedilatildeo de mais-valia eacute realmente impeacutervia aos ciclos de acumulaccedilatildeo de capital exceto no tocante a mudanccedilas em suas formas de investimento (digamos da habitaccedilatildeo suburbana para os edifiacutecios de escritoacuterios e shopping centers na cidade) e representa um processo mais fundamental da criaccedilatildeo da riqueza [] Os especuladores portanto constituem a vanguarda da expansatildeo metropolitana (GOTTDIENER 1993 p 245-246)

231

Sendo assim como foi ressaltado nos toacutepicos anteriores o processo de ocupaccedilatildeo nas

aacutereas perifeacutericas das cidades estudadas pela populaccedilatildeo de baixo poder aquisitivo acentuou as

contradiccedilotildees do sistema capitalista inseridas no contexto das desigualdades sociais

construiacutedas dentro de uma realidade social mais ampla natildeo fugindo das anaacutelises do processo

acelerado da urbanizaccedilatildeo brasileira a qual estaacute embasada na loacutegica da globalizaccedilatildeo

configurada uma revoluccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional determinando natildeo somente as

relaccedilotildees poliacuteticas mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees

sociais e culturais

Os efeitos dessa mundializaccedilatildeo do capital acentuam as diferenccedilas sociais afetando

diretamente as expressotildees da questatildeo social as quais podem ser definidas no acircmbito do modo

capitalista de produccedilatildeo na contradiccedilatildeo capital x trabalho como as expressotildees do processo de

formaccedilatildeo e desenvolvimento da classe operaacuteria e de seu ingresso no cenaacuterio poliacutetico da

sociedade exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado

Eacute a manifestaccedilatildeo no cotidiano da vida social da contradiccedilatildeo entre o proletariado e a

burguesia a qual passa a exigir outros tipos de intervenccedilatildeo mais aleacutem da caridade e

repressatildeo (CARVALHO IAMAMOTO 1983 p 77)

Destarte essas transformaccedilotildees repercutiram em Beleacutem e em Satildeo Luiacutes assim como

em outras cidades brasileira que permeadas das contradiccedilotildees e de desigualdades sociais satildeo

frutos dos deacuteficits sociais acumulados por deacutecadas de governos descomprometidos com os

interesses da maioria da populaccedilatildeo

Nessas cidades se produz e reproduz as desigualdades sociais por meio de um

intenso processo de precarizaccedilatildeo das condiccedilotildees de vida com o crescimento do desemprego e

do trabalho informal (sem seguridade social) que somados agrave maneira como as cidades foram

constituiacutedas expotildeem as famiacutelias e indiviacuteduos a situaccedilotildees de risco e vulnerabilidades sociais

O cerceamento do acesso aos bens da cidadania relacionados ao emprego aos serviccedilos de proteccedilatildeo social e tambeacutem ao aumento da violecircncia que levam a uma fragilizaccedilatildeo da cidadania entendida como perda ou ausecircncia de direitos e como precarizaccedilatildeo de serviccedilos coletivos O crescente processo de favelizaccedilatildeo o empobrecimento da populaccedilatildeo o desemprego e o trabalho informal satildeo expressotildees da vulnerabilidade urbana no Brasil (KOWARICK 1988 p 15)

A grande maioria da populaccedilatildeo convive com a inseguranccedila social e de renda com a

falta de acesso a equipamentos e serviccedilos puacuteblicos com moradias precaacuterias e distantes do

trabalho Agrave exemplo disso tem-se as duas cidades estudadas as quais apresentam um

232

crescimento populacional baseado na expansatildeo perifeacuterica e no espraiamento da mancha

urbana aleacutem de renda per capita inferior a meacutedia nacional cujo valor eacute de R$ 50000

conforme tabela 11

Tabela 11

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

2010

Municiacutepio

Domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Valor do rendimento nominal mediano mensal domiciliar per capita dos domiciacutelios particulares com rendimento nominal mensal domiciliar per capita

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Total

Situaccedilatildeo do domiciacutelio

Urbana

Rural

Urbana

Rural

Beleacutem

351078

348191

2887

42200

42500

20800

Satildeo Luis

265175

251726

13449

40000

40400

25000

Fonte IBGE (2010)

Os dados demonstram que a renda per capita de Beleacutem (R$ 42200) mesmo inferior

a meacutedia nacional apresenta 55 a mais que a de Satildeo Luis Vale destacar que os programas

habitacionais adotam uma loacutegica que contribui para a concentraccedilatildeo de renda no paiacutes uma vez

que a maior parte dos recursos satildeo dirigidos para as faixas salariais acima de 4 salaacuterios

miacutenimos o que dificulta o acesso das famiacutelias com baixo poder aquisitivo a esses programas

habitacionais e contribui para o aumento do deacuteficit habitacional a exemplo pode-se citar o

Programa Minha Casa Minha Vida Esse quadro eacute revelador das diferenccedilas das desigualdades

sociais e do modelo concentrador de riquezas e poder que fazem parte da formaccedilatildeo histoacuterica

do Paiacutes

De acordo com Harvey (2005) esse processo interdita a efetivaccedilatildeo do direito agrave

cidade principalmente para os mais pobres que satildeo expulsos para locais cada vez mais

distantes pois natildeo possuem meios para acessar os melhores espaccedilos urbanos O

neoliberalismo provocou depressotildees salariais que aprofundaram esse processo de interdiccedilatildeo

do direito agrave cidade Poreacutem o simples aumento dos ganhos salariais no interior da loacutegica do

capital natildeo resolve esse problema Esses aumentos salariais incorporaram os mais pobres na

economia da diacutevida por meio do mercado imobiliaacuterio

Nesse sentido a desigualdade social existente no Paiacutes eacute estrutural e histoacuterica

alicerccedilada no modelo adotado de capitalismo dependente Dessa maneira eacute balizada pela

visatildeo conservadora de que essa distribuiccedilatildeo desigual eacute um fato natural como resultado do

233

fracasso individual de muitos e sucesso individual de poucos e natildeo como produto da forma

como se organiza a sociedade e pelo modelo de exclusatildeo social

Bonduki (1997) argumenta que a desigualdade social tem suas causas nas formas

com que se organizou a sociedade em particular na maneira com que se construiu o Estado

brasileiro marcado pelo patrimonialismo no qual se confundem o interesse puacuteblico e o

privado nas dinacircmicas de exploraccedilatildeo do trabalho impostas pelas elites dominantes desde a

colocircnia e principalmente no contexto absoluto dessas elites sobre o processo de acesso agrave

terra tanto rural quanto urbana

Sendo assim quando se discute a questatildeo habitacional nas cidades amazocircnicas haacute

que se levar em consideraccedilatildeo que natildeo eacute um fato isolado do restante do paiacutes e que estaacute

associado ao processo de urbanizaccedilatildeo no qual as grandes meacutedias e pequenas cidades

brasileiras foram submetidas aleacutem das poliacuteticas desenvolvidas pelo Estado que contribuiacuteram

para o aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Caldeira (2000) identifica trecircs formas de segregaccedilatildeo enquanto padratildeo de

diferenciaccedilatildeo e separaccedilatildeo espacial na primeira forma de expressatildeo os diferentes grupos

sociais se comprimem no espaccedilo da cidade e se diferenciam pelo tipo de moradia a segunda

apresenta a distacircncia como variaacutevel de separaccedilatildeo espacial de ricos e pobres materializando a

relaccedilatildeo centro-periferia Por fim os espaccedilos segregados fortificados por muros e sistemas

diversos de seguranccedila concentrando em geotipos de padratildeo meacutedio e alto as expectativas de

lazer consumo trabalho e residecircncia justificado pelo medo da violecircncia urbana Isto eacute o que

a autora chama de enclaves fortificados tendo como exemplo os modernos condomiacutenios

A segregaccedilatildeo espacial para Castells (1983) eacute compreendida pela agregaccedilatildeo do

espaccedilo em zonas de forte homogeneidade social interna onde predominam as disparidades

entre elas as quais se processam tanto em termo de diferenccedila como em hierarquia Dentro

desta forte homogeneidade social a segregaccedilatildeo eacute entendida como sendo a divisatildeo espacial de

uma determinada populaccedilatildeo em aacutereas especiacuteficas que permitem entendecirc-las e destituiacute-las da

sua composiccedilatildeo social das demais aacutereas de seu entorno

Para Lojkine (1981) a segregaccedilatildeo social eacute analisada pelas contradiccedilotildees existentes

entre o centro (que concentra o trabalho intelectual e o comando) e as zonas perifeacutericas (que

se caracterizam como lugar da execuccedilatildeo das leis e atividades que derivam do centro)

Analisando ambos os autores constata-se que a segregaccedilatildeo eacute a expressatildeo soacutecioespacial do

modo de produccedilatildeo capitalista que fragmenta e ao mesmo tempo articula os espaccedilos O

espaccedilo urbano capitalista neste processo passa a ser o lugar concreto da manifestaccedilatildeo e

articulaccedilatildeo do modo de produccedilatildeo capitalista

234

Villaccedila (2001) compreende a segregaccedilatildeo como sendo o processo pelo qual as

camadas de renda elevada se concentram em determinadas regiotildees buscando com isto

privileacutegios em atrair os equipamentos urbanos para a regiatildeo segregada

Trazendo as consideraccedilotildees sobre as regiotildees metropolitanas de Villaccedila (2001) para as

cidades onde a condominizaccedilatildeo estaacute cada vez mais presente pode-se afirmar que essa

concentraccedilatildeo se daacute numa nova escala que natildeo eacute nem a regiatildeo geral e nem um bairro mas sim

o condomiacutenio fechado

O que ocorre com os condomiacutenios fechados eacute que se localizam nas periferias urbanas

e convivem muitas vezes com uma vizinhanccedila mais pobre economicamente Neste sentido

Villaccedila (2001) coloca que natildeo existe presenccedila exclusiva de camadas de alta renda em uma

determinada regiatildeo A segregaccedilatildeo natildeo impede a presenccedila e o crescimento de outras camadas

no mesmo espaccedilo

Dessa maneira as abordagens sobre segregaccedilatildeo soacutecioespacial aqui definidas satildeo

oriundas de um processo dialeacutetico ou seja eacute uma soacute independente do contexto a que ela se

refere derivando da luta de classes na qual ao vencedor

cabem as melhores parcelas do

espaccedilo urbano

Cabe entatildeo destacar o estrateacutegico papel das cidades para a consolidaccedilatildeo do capital

enquanto modelo de sociedade Nesta dinacircmica natildeo soacute o acesso ao solo eacute disputado como

tambeacutem o seu valor eacute definido Assim sendo a cidade eacute tambeacutem um complexo mecanismo de

exploraccedilatildeo e exclusatildeo social na qual todos os aspectos da vida social satildeo afetados pelo

desenvolvimento do capitalismo e manifestam seu caraacuteter desigual no processo de

urbanizaccedilatildeo

A respeito disso Harvey (2005) argumenta que nesse novo contexto as grandes

cidades tornaram-se aacutereas estrateacutegicas para investimento privados especialmente quando

concentradoras de funccedilatildeo uacuteltima geraccedilatildeo associados ao capital financeiro agrave comunicaccedilatildeo e a

tomada de decisotildees bem como agrave cultura ao entretenimento e ao turismo

A dinacircmica de investimentos de capitais na produccedilatildeo e comercializaccedilatildeo de espaccedilos

urbanos e a conformaccedilatildeo da economia da diacutevida revelam a crescente mercantilizaccedilatildeo da

cidade que desembocou na crise global atual [] Os impactos dessa crise estatildeo sendo

profundamente desiguais As execuccedilotildees hipotecaacuterias causadas por inadimplecircncias afetam

principalmente os mais pobres que vivem nas partes mais precaacuterias e antigas das cidades

americanas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Na conferecircncia Alternativas ao Neoliberalismo e o Direito agrave Cidade Harvey

(2009) apresentou um mapa da cidade de Cleveland nos Estados Unidos que mostra as aacutereas

235

onde se concentram as execuccedilotildees hipotecaacuterias e os locais de moradia da populaccedilatildeo afro-

americana de Cleveland Essa populaccedilatildeo eacute a maioria dentre os 2 milhotildees de norte-americanos

que perderam suas casas com a crise Segundo ele a crise atual eacute um furacatildeo Katrina

financeiro Como o furacatildeo que arrasou New Orleans em 2005 e afetou principalmente os

bairros mais pobres os impactos da crise urbana e financeira atual recaem sobre os grupos

sociais mais vulneraacuteveis

Contraditoriamente a injeccedilatildeo de recursos puacuteblicos eacute mais para salvar o sistema financeiro e resgatar os agentes do capital do que para garantir os direitos sociais prejudicados pelos efeitos da crise Os bocircnus obtidos pelos altos executivos das instituiccedilotildees financeiras que quebraram e receberam ajuda governamental chegam agrave casa das centenas de bilhotildees de doacutelares e superam em muito os recursos puacuteblicos usados para ajudar aqueles que perderam suas casas Em muitos locais as casas hipotecadas que foram confiscadas satildeo utilizadas em pacotes financeiros e natildeo em poliacuteticas puacuteblicas voltadas para garantir o direito aacute cidade e agrave moradia digna (HARVEY 2009 natildeo paginado)

E conclui dizendo que eacute preciso empreender novas lutas pelo direito agrave cidade pois

as crises sistecircmicas atuais natildeo representam o fim do neoliberalismo

Os governos atuam para proteger as instituiccedilotildees financeiras a qualquer custo Natildeo atuam para efetivar direitos e garantir o bem estar das pessoas [] Diante do dilema de ajudar os bancos e ajudar as pessoas que perderam suas casas os recursos puacuteblicos satildeo usados para salvar os bancos Esses recursos deveriam ser usados para criar um banco de desenvolvimento urbano voltado para financiar poliacuteticas urbanas e habitacionais que fortaleccedilam os direitos a cidades justas democraacuteticas e sustentaacuteveis e moradias dignas (HARVEY 2009 natildeo paginado)

Corroborando com essa ideacuteia Ozoacuterio (sd p 5) enfatiza que o espaccedilo urbano estaacute

subordinado agraves poliacuteticas de modernizaccedilatildeo de ocupaccedilatildeo e de segmentaccedilatildeo uma vez que

[] a urbanizaccedilatildeo brasileira nasceu marcada por reformas urbanas por obras de saneamento e embelezamento que expulsar

236

formam um mercado proacuteprio de negociaccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de lotes nas ocupaccedilotildees onde

aparece a figura de um liacuteder que comanda organiza e planeja a accedilatildeo dos agentes sociais

Evidencia-se tambeacutem uma estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais

estabelecendo uma rede complexa de procedimentos legaisilegais que acabam por constituir-

se em um conjunto de normas que regulamentam as transaccedilotildees quanto agraves negociaccedilotildees dos

lotes e edificaccedilotildees (habitaccedilatildeo) estabelecendo assim estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas

tanto do lado do Estado quanto do lado dos agentes sociais

Os dados obtidos na pesquisa de campo revelam que nos uacuteltimos estudos feitos nas

cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes registraram-se 449 e 115 (respectivamente) assentamentos

precaacuterios Estes estudos foram feitos por meio de uma parceria entre a Prefeitura de Beleacutem e o

Instituto IAGUA em Beleacutem e pela Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e

Fiscalizaccedilatildeo Urbana (SEMTHURB) em Satildeo Luiacutes

Segundo Beleacutem (2007) a estrutura urbana reproduz a mesma realidade das grandes

cidades brasileiras onde o fenocircmeno da segregaccedilatildeo social aprofunda cada vez mais a situaccedilatildeo

de desigualdade e precarizaccedilatildeo da vida social de fraccedilotildees das classes trabalhadoras que se

reproduzem no interior de suas aacutereas perifeacutericas

Sendo assim os estratos sociais de renda mais elevada encontram-se em Beleacutem nos

bairros do Comeacutercio do Reduto de Nazareacute e de Batista Campos bem como partes

expressivas dos bairros da Cidade Velha do Umarizal e do Marco Os estratos considerados

meacutedios apresentam forte tendecircncia locacional linearizada situada ao longo da Avenida

Augusto Montenegro ficando o niacutevel mais baixo do gradiente de renda posicionado tanto nas

baixadas e na periferia continental mais distante incluindo-se os nuacutecleos urbanos do Distrito

de Icoaraci das Ilhas de Outeiro Mosqueiro e Cotijuba (PEMAS 2001 apud BELEacuteM 2007)

De acordo com Beleacutem (2007) a maior densidade demograacutefica estaacute nas aacutereas de

baixadas fato que associado agrave baixiacutessima renda per capita e aos elevados contingentes

populacional fazem destas os locais de agudos problemas e carecircncias sociais Entretanto a

demanda mais recente natildeo estaacute concentrada nas aacutereas de baixadas e sim nos setores onde

estatildeo localizadas as moradias verticalizadas ocupadas por estratos sociais de renda meacutedia e

baixa conforme pode ser observado na tabela 12

237

Tabela 12

Nuacutemero de assentamentos precaacuterios em Beleacutem

2007

Bairro Assentamentos Marco 10

22

Aacuteguas Lindas 9

20

Aacuteguas Negras 9

20

Agulha 2

04

Auraacute 3

07

Bairro da Brasilia e Satildeo Joatildeo do Outeiro 1

02

Barreiro 14

31

Batista Campos 2

04

Benguiacute 10

22

Cabanagem 11

24

Campina 6

13

Canudos 5

11

Castanheira 5

11

Cidade Velha 5

11

Condor 12

27

Coqueiro 13

29

Cremaccedilatildeo 4

09

Cruzeiro 4

09

Curioacute-Utinga 10

22

Faacutetima 6

13

Guamaacute 18

40

Guanabara 3

07

Icoaraci 15

33

Itaiteua 2

04

Jurunas 9

20

Mangueiratildeo 7

16

Maracacuera 15

33

Maracangalha 4

09

Marambaia 15

33

Outeiro 6

13

Paracuri 17

38

Parque Guajaraacute 16

36

Parque Verde 11

24

Pedreira 11

24

Ponta Grossa 5

11

Pratinha 14

31

Sacramenta 20

45

Santana do Auraacute 2

04

Satildeo Braacutes 2

04

Satildeo Clemente 8

18

Souza 3

07

Tapanatilde 27

60

Telegrafo 7

16

Tenoneacute 19

42

Terra Firme 12

27

Uma 13

29

Val de Cans 3

07

Mosqueiro 23

51

Total 449

1000

Fonte Beleacutem (2007)

238

Em Beleacutem satildeo 146359 domiciacutelios existentes nos 449 assentamentos precaacuterios os

quais estatildeo localizados em 48 bairros dos 71 existentes no municiacutepio Os bairros que

apresentam maior nuacutemero de assentamentos precaacuterios satildeo Tapanatilde Sacramenta Tenoneacute

Guamaacute Paracuri Parque Guajaraacute Icoaraci Maracacuera Marambaia Barreiro Pratinha

Coqueiro Una Condor e Terra Firme Nestes bairros aleacutem de apresentarem problemas

infraestruturais como a falta de saneamento baacutesico haacute uma carecircncia de serviccedilos essenciais

como posto de sauacutede escolas entre outros acarretando no aumento da segregaccedilatildeo

soacutecioespacial

Em Satildeo Luiacutes os assentamentos precaacuterios estatildeo concentrados em duas grandes

regiotildees a aacuterea Itaqui-Bacanga localizada no Sul da ilha e as ocupaccedilotildees ao longo do Rio

Anil72 Nestas duas regiotildees estatildeo concentradas cerca de 60 das aacutereas de subnormalidade

identificadas no levantamento feito em 2000 pela SEMTHURB

De acordo com os dados obtidos na Secretaria pela dinacircmica de ocupaccedilatildeo do espaccedilo

urbano do municiacutepio a habitaccedilatildeo subnormal acontece em grandes aacutereas pertencentes ao

poder puacuteblico e em aacutereas de terreno baixo e alagadiccedilo A ocorrecircncia de construccedilotildees

precaacuterias barracos e palafitas em aacutereas de mangues e sem infraestrutura eacute bastante presente e

ocasiona graves problemas de sauacutede para a populaccedilatildeo aleacutem de comprometer o meio

ambiente (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Com base no Diagnoacutestico da Capacidade Institucional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

para o Setor Urbano Habitacional (PEMAS 2004) a Secretaria de Planejamento e

Coordenaccedilatildeo Geral de Satildeo Luiacutes realizou em 2002 um levantamento nas Ressacas assim

denominadas as aacutereas de baixada sujeitas a inundaccedilotildees frequumlentes sem as miacutenimas condiccedilotildees

de habitabilidade e constituiacutedas por moradias do tipo palafitas construiacutedas de forma precaacuteria

com madeira de pouca durabilidade com acessos geralmente fraacutegeis e sem estabilidade que

geram situaccedilotildees permanentes de risco sobretudo para as crianccedilas73

Embora natildeo existam dados sistematizados sobre o setor habitacional cabe destacar

que nem todos os assentamentos precaacuterios de Satildeo Luis apresentam situaccedilotildees de risco

precariedade de infraestrutura ou satildeo ocupados por populaccedilatildeo de baixa renda pois segundo a

fala do teacutecnico da SEMTHURB na entrevista concedida em 2009

72 Na Bacia do Rio Anil estaacute localizada a Peniacutensula do Ipase aacuterea selecionada para a intervenccedilatildeo do Programa Habitar Brasil-BID no Subprograma de Urbanizaccedilatildeo de Assentamentos Sub-normais 73 Nas aacutereas que foram ocupadas regularmente a subnormalidade ocorre pela ocupaccedilatildeo de zonas destinadas agrave execuccedilotildees de equipamentos puacuteblicos e aacutereas verdes Haacute ocupaccedilotildees em aacutereas de encosta e sobre linhotildees de transmissatildeo de energia eleacutetrica em alta tensatildeo contudo satildeo situaccedilotildees mais raras

239

A questatildeo fundiaacuteria tem especial peso na definiccedilatildeo da quantidade de assentamentos precaacuterios em funccedilatildeo da peculiaridade do municiacutepio pela sua caracteriacutestica de ilha oceacircnica o municiacutepio tem parcelas importantes do seu territoacuterio caracterizadas como terreno da Uniatildeo e apenas algumas poucas glebas privadas geralmente associadas a antigas sesmarias Existe uma grande quantidade de assentamentos humanos que natildeo satildeo precaacuterios tecircm habitaccedilotildees de bom padratildeo construtivo e acesso a toda infraestrutura mas que satildeo subnormais por conta da irregularidade fundiaacuteria jaacute que ocupam terrenos da Uniatildeo sem a devida legalidade

Conforme apresentado as 115 aacutereas de assentamentos identificadas estatildeo assim

caracterizadas de acordo o diagnoacutestico (PEMAS 2004) e demonstrada no quadro 8

a 76 como favelas sendo 48 assentamentos irregulares e muito precaacuterios

denominados localmente como ocupaccedilatildeo e 28 assentamentos irregulares

ocupados por populaccedilotildees pobres mas jaacute com um niacutevel de consolidaccedilatildeo

denominados localmente como favelas mesmo e

b 39 como outras formas de assentamentos subnormais correspondendo a

assentamentos irregulares de ocupaccedilatildeo espontacircnea caracterizados como

subnormais exclusivamente pela ilegalidade fundiaacuteria jaacute que natildeo satildeo precaacuterios

e estatildeo providos da infraestrutura meacutedia existente na cidade74

74 Nessa estimativa natildeo foram computados dados da populaccedilatildeo residente em corticcedilos pois o Municiacutepio natildeo dispotildee de nenhum estudo que quantifique essas habitaccedilotildees

240

Quadro 8 - Relaccedilatildeo dos Assentamentos Hierarquizados (Satildeo Luiacutes-MA) Item Aacuterea Hierarquia Item Aacuterea Hierarquia

1 Vila Independecircncia 8 59 Sitio do Pica-pau-amarelo 4 2 Vila Roseana COHAFUMA 8 60 Tajaccediluaba 4 3 Vila Mauro Fecury II

8

61 Vila Airton Sena

4

4 IPASE de BaixoApicum 7 62 Vila Ariri 4 5 IPASE de CimaMauro Fecury 7 63 Vila Bacanga 4 6 Irmatildeos Coragem Alemanha

Caratatiua 7 64

Vila Cafeteira 4 7 Vila Bom JesusTravessa Bom

Jesus 7 65

Vila Cristalina 4 8

Vila Satildeo Luis 7 66 Vila dos Nobres Pq

Timbiras 4 9 Vila Verde 7 67 Vila Flamengo 4

10 Japatildeo IPASE de Baixo 6 68 Vila Isabel Bacanga 4 11 Conjunto Rio AnilCabeceira

da ponte

6

69 Vila Itamar

4

12 Vila 25 de Maio Rec Vinhais 6 70 Vila Jackson 4 13 Vinhais Velho 6 71 Vila Jambeiro 4 14 Patildeo-de-Accediluacutecar 6 72 Vila Janaiacutena 4 15 Coroadinho 6 73 Vila Kiola 4 16

Rio do Meio

6

74 Vila Lobatildeo Parque Roseana Sarney

4

17 Salina do Sacaveacutem 6 75 Vila Marinha 4 18

Vila 7 de Setembro 6 76 Vila Menino Jesus de

Praga 4 19 Vila dos Frades 6 77 Vila Natal 4 20 Vila Isabel Cafeteira 6 78 Vila Nice Lobatildeo 4 21 Vila Santa Julia 6 79 Vila Nova Repuacuteblica 4 22 Brasilia do Matadouro 5 80 Vila Padre Xavier 4 23 Camboa 5 81 Vila Pavatildeo Filho 4 24 Feacute-em-Deus 5 82 Vila Primavera 4 25 Fumacecirc 5 83 Vila Riod 4 26 Ilha da Paz

5

84 Vila Satildeo Sebastiatildeo

4

27 Jardim Ameacuterica Aacuterea institucional 5

85 Vila Sarney Filho Distrito Industrial 4

28 Jardim Satildeo Raimundo 5 86 Vila Tancredo Neves 4 29 Liberdade 5 87 Vila Uniatildeo 4 30 Santa Cruz Vera Cruz 5 88 Vila Zeni 4 31 Satildeo Joatildeo da Boa Vista 5 89 Altos do Calhau 4 32 Satildeo Mateus Vila Nova 5 90 Cantinho do Ceacuteu 4 33 Satildeo Raimundo Bacanga 5 91 Divineacuteia 4 34 Tibiri 5 92 Ilhinha Satildeo Francisco 4 35 Vera Cruz

5

93 Joatildeo de Deus

4

36 Vila Cascavel 5 94 Novo Angelim 4 37 Vila Conceiccedilatildeo Coroadinho 5 95 Recanto Fialho 4 38 Vila Embratel 5 96 Satildeo Bernardo 3 39 Vila Mauro Fecury I 5 97 Sol e Mar 3

241

40 Vila Nova 5 98 Vila Brasil 3 41 Vila Palmeira 5 99 Vila Buriti Satildeo Francisco 3 42 Vila Vitoacuteria Sta Baacuterbara 5 100 Vila Conceiccedilatildeo Calhau 3 43

Alto da Esperanccedila Bacanga 4 101 Vila ConceiccedilatildeoJoatildeo de

Deus 3 44 Alto da Esperanccedila Zona Rural 4 102 Vila Cruzado 3 45 Anjo da Guarda 4 103 Vila Fialho 3 46 Barreto 4 104 Vila Luisatildeo 3 47 Bom Jesus 4 105 Vila Magril Sta Baacuterbara 3 48

Cidade Olimpica 4 106 Vila Maruim Igarapeacute da

Jansen 3 49 Gancharia 4 107 Vila Regina 3 50

Jaracati lado direito 4 108 Vila Santo Antonio

Calhau 3 51 Jaracati lado esquerdo

4

109 Argola e Tambor

0

52 Morro do Satildeo Francisco 4 110 Itapera 0 53 Pirapora 4 111 Jardim Tropical 0 54 Primavera Pq Timbiras 4 112 Parque Jair 0 55 Residencial Paraiacuteso 4 113 Rio Grande 0 56 Saacute Viana 4 114 Vila Alegria 0 57 Santa Clara 4 115 Vila Paranatilde 0 58 Santa Efigecircnia 4

Fonte PEMAS (2004) Hierarquia estabelecida segundo criteacuterios de possibilidade de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria insalubridade ou risco de desmoronamento e acessibilidade

Pode perceber a partir desses dados que o problema do deacuteficit habitacional eacute mais

grave nas regiotildees urbanas e uma caracteriacutestica importante dessas aacutereas eacute que boa parte do seu

territoacuterio foi ou eacute ocupado de forma irregular e ilegal Essas praacuteticas ilegais de uso do solo das

cidades acarretam maior vulnerabilidade aos estratos sociais mais pobres pela falta de

seguranccedila da posse

apesar da clareza do texto do Estatuto da Cidade sobre o assunto - tendo

em vista o acesso precaacuterio ou inexistente dessa populaccedilatildeo aos processos poliacuteticos de

governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

A partir dessa perspectiva pode-se considerar essas duas cidades como um espaccedilo

em que se datildeo as questotildees sociais resultantes do atual modo de produccedilatildeo - questotildees que hoje

se apresentam cada vez mais acirradas - sendo espaccedilo de desigualdades conflitos e lutas

Fatos motivados pela sua forma de organizaccedilatildeo espacial histoacuterica cultural social e

econocircmica Como exemplo de suas problemaacuteticas haacute o inchaccedilo populacional o trabalho

informal e as habitaccedilotildees informais que satildeo encobertas pelo discurso do desenvolvimento

econocircmico das cidades

242

A concentraccedilatildeo fiacutesica de usos e atividades e o excesso de verticalizaccedilatildeo nos centros urbanos aliada agrave precariedade de infraestrutura social nas aacutereas de baixada satildeo os mais seacuterios problemas urbanos da cidade Problemas de transporte moradia e saneamento enfrentados pela populaccedilatildeo da cidade satildeo continuamente gerados e agravados pela accedilatildeo dos agentes imobiliaacuterios e pela falta de medidas eneacutergicas do poder puacuteblico incapaz de interferir no crescimento da cidade Tal crescimento desorganizado afeta a vida de todos os habitantes da cidade repercutindo ainda mais negativamente nas camadas empobrecidas que ocupam as periferias A cidade nas duas uacuteltimas deacutecadas sofre com as mazelas da modernidade e isto pode ser percebido nos congestionamentos de veiacuteculos na diminuiccedilatildeo da circulaccedilatildeo de ar no aumento da temperatura e na desfiguraccedilatildeo do centro histoacuterico Os contrastes entre a aacuterea central e seus arredores se tornam extremamente acentuados o custo de habitar a aacuterea central eacute cada vez mais alto sendo impossiacutevel para as famiacutelias de baixa renda continuar mantendo seus imoacuteveis nessas aacutereas tornando-se alvos faacuteceis para o voraz mercado especulativo (BELEacuteM 2007 p 23)

Nesse sentido a accedilatildeo governamental muitas vezes natildeo tem capacidade de planejar e

se antecipar aos problemas vivenciados no espaccedilo urbano e dessa maneira acaba natildeo

controlando a loacutegica da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria tendo como resultado final o acuacutemulo dos

referidos problemas A ausecircncia dessa accedilatildeo planejadora do poder puacuteblico que tenha como

referecircncia central a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo faz com que esta atuaccedilatildeo

natildeo seja abrangente tornando sua atuaccedilatildeo pontual focalizada ou seletiva e desta forma

descuidando-se totalmente das problemaacuteticas sociais dentre elas a habitacional (BELEacuteM

2007 p 24)

Um agente urbano que se destaca nesse processo eacute o Estado como regulador ou

produtor de uma poliacutetica urbana e habitacional de massa que de fato nunca existiu como

tampouco existiram as condiccedilotildees para que o capital investisse de forma sistemaacutetica em

habitaccedilatildeo popular A ilegalidade fruto da desigualdade extrema eacute explicada pela necessidade

de moradia e de deacutecadas de omissatildeo do poder puacuteblico na produccedilatildeo fordista Cria-se assim

uma vinculaccedilatildeo clara entre uma determinada ordem urbaniacutestica relaccedilotildees de propriedade

privada e o mercado imobiliaacuterio formal

Uma das ironias dessa trageacutedia cotidiana eacute que exatamente aquele saber teacutecnico que poderia ser usado para democratizar o acesso da populaccedilatildeo mais necessitada a condiccedilotildees mais dignas de habitabilidade acaba por produzir cada vez maior elitizaccedilatildeo e exclusatildeo Se eacute clara a relaccedilatildeo entre cidade formal e relaccedilotildees mercantis sua antiacutetese natildeo eacute verdadeira ou seja a cidade informalmente construiacuteda eacute tambeacutem eacute palco de um ativo mercado imobiliaacuterio (BUARQUE 1999 p 148)

243

Entretanto Buarque (1999) ressalta que a gestatildeo urbana no Brasil contemporacircneo

vem sendo marcada pela confluecircncia de duas forccedilas por um lado pela racionalidade do

planejamento e da regulaccedilatildeo herdada do modernismo formalmente constituiacuteda pelo Estado

eou pelo mercado imobiliaacuterio Por outro lado pela radicalidade das demandas por condiccedilotildees

baacutesicas de urbanidade e reproduccedilatildeo representadas pelos movimentos sociais organizados

As poliacuteticas puacuteblicas podem ser implementadas com o intuito de efetivar o alcance

do direito agrave moradia digna e a maioria das iniciativas do poder puacuteblico poderatildeo estar baseadas

na garantia da propriedade A funccedilatildeo social da propriedade eacute usada como fundamento na

formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas que buscam promover o direito agrave propriedade para

proporcionar habitaccedilotildees Assim o reconhecimento da moradia como um direito humano eacute de

suma importacircncia para a valorizaccedilatildeo deste direito e para a criaccedilatildeo de estrateacutegias eficientes de

seguranccedila da posse

As poliacuteticas puacuteblicas de renovaccedilatildeo urbana das cidades constituem-se no principal

propulsor para mudanccedila da paisagem e de vida das classes populares residente Entretanto a

urbanizaccedilatildeo do espaccedilo ao causar uma nova dinacircmica na cidade leva tambeacutem a criar

movimentos de enfrentamento diante do Estado por parte dos envolvidos na busca de

minimizar as carecircncias urbanas

De acordo com os princiacutepios da Reforma Urbana a cidade pode ser planejada a partir

da anaacutelise das desigualdades e dos direitos sociais nos quais os conflitos urbanos satildeo vistos

como uma expressatildeo poliacutetica das condiccedilotildees gerais da estrutura socioeconocircmica

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se em

uma das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

A luta de classe se daacute em torno do poder de Estado que vai garantir a unidade de formaccedilatildeo social isto natildeo quer dizer contudo que os centros do poder as diversas instituiccedilotildees de caraacuteter econocircmico poliacutetico militar cultural etc sejam simplesmente instrumentos oacutergatildeos ou apecircndices do poder das classes sociais Eles possuem a sua autonomia e especificidade estrutural que enquanto tal natildeo pode ser redutiacutevel a uma anaacutelise em termos de poder (ABELEacuteM 1989 p 13)

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades

socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de

injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente

criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em

244

determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o

Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e

mobilizaccedilatildeo da sociedade civil

O Estado capitalista eacute a relaccedilatildeo social em que se condensam as contradiccedilotildees do modo de produccedilatildeo capitalista e as lutas sociais que delas suscitam A funccedilatildeo poliacutetica geral do Estado consiste em dispersar essas contradiccedilotildees e essas lutas de modo a mantecirc-las em niacuteveis tensionais funcionalmente compatiacuteveis com os limites estruturais impostos pelo processo de acumulaccedilatildeo e pelas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo em que ele tem lugar Natildeo se trata portanto de resolver (superar) as contradiccedilotildees sociais ao niacutevel de estrutura profunda da formaccedilatildeo social em que elas se produzem mas antes de mantecirc-las em estado de relativa latecircncia mediante accedilotildees dirigidas agraves tensotildees problemas questotildees sociais porque as contradiccedilotildees se

manifestam ao niacutevel da estrutura de superfiacutecie de formaccedilatildeo social (SANTOS 1996 p 15-16)

Cabe ressaltar que a gestatildeo urbana pode ser definida aqui como um conjunto de

instrumentos atividades tarefas e funccedilotildees que visam assegurar de modo eficiente eficaz e

com efetividade as accedilotildees que proporcionaratildeo um bom funcionamento da cidade Visa

tambeacutem garantir natildeo somente a administraccedilatildeo da cidade como tambeacutem a oferta dos serviccedilos

urbanos baacutesicos e necessaacuterios para que a populaccedilatildeo e os vaacuterios agentes privados puacuteblicos e

comunitaacuterios muitas vezes com interesses opostos possam desenvolver e maximizar suas

atuaccedilotildees de forma que possibilitem o uso do solo sem exclusatildeo ou segregaccedilatildeo social

[] o sistema institucional e arquitetura organizacional adequados e necessaacuterios para implementar a estrateacutegia e o plano de desenvolvimento local sustentaacutevel mobilizando e articulando os atores (organizaccedilotildees da sociedade) e os agentes (instacircncias puacuteblicas) com seus diversos instrumentos e assegurando a participaccedilatildeo da sociedade no processo para a execuccedilatildeo e o acompanhamento das accedilotildees (BUARQUE 1999 p 64)

Entatildeo a gestatildeo urbana eacute a administraccedilatildeo de determinadas situaccedilotildees dentro de uma

conjuntura com os recursos disponiacuteveis no presente tendo em vista as necessidades

imediatas diferentemente do planejamento que segundo Souza e Rodrigues (2004 p 15) eacute

uma atividade que remete sempre para o futuro eacute a forma que os homens tecircm de tentar

prever a evoluccedilatildeo de um fenocircmeno ou de um processo e a partir desse conhecimento

procurar se precaver contra problemas ou dificuldades ou ainda aproveitar melhor possiacuteveis

benefiacutecios

245

A diferenccedila baacutesica reside no horizonte temporal de cada uma O planejamento tem a ver com o meacutedio e a longo prazos (em se tratando de planejamento urbano o meacutedio prazo pode dizer respeito a um lapso de tempo de poucos anos e o longo prazo a um periacuteodo de muitos anos) jaacute a gestatildeo refere-se ao curtiacutessimo prazo (dias ou seman

mmo e

u

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246

Para Harvey (2005 p 171) governanccedila urbana significa muito mais do que

governo urbano eacute um conjunto de forccedilas que detecircm o poder de reorganizaccedilatildeo da vida

urbana ou seja [] o poder real de reorganizaccedilatildeo da vida urbana muitas vezes estaacute em outra

parte ou pelo menos numa coalizatildeo de forccedilas mais ampla em que o governo e a

administraccedilatildeo urbana desempenham apenas papel facilitador e empreendedor

Outra questatildeo que pode ser analisada nesse processo eacute a tendecircncia contemporacircnea de

gestatildeo puacuteblica pautada na participaccedilatildeo popular descentralizando as decisotildees e

responsabilidades que historicamente estavam concentradas no poder executivo Entretanto

algumas praacuteticas tecircm demonstrado que a participaccedilatildeo popular fica restrita somente agrave consulta

de certos setores sociais

Nesse sentido procurar-se-aacute responder no toacutepico abaixo aos questionamentos

levantados na pesquisa qual a concepccedilatildeo de gestatildeo tem norteado as poliacuteticas habitacionais

implementadas em Beleacutem e em Satildeo Luis Qual a relaccedilatildeo existente entre governo e sociedade

civil no processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas referidas cidades

Os modelos de gestatildeo adotados tecircm contribuiacutedo para a reduccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

partindo da anaacutelise dos programas eou projetos habitacionais implementados em Beleacutem e em

Satildeo Luiacutes desde a implantaccedilatildeo das Secretarias Municipais de Habitaccedilatildeo

51 PROGRAMASPROJETOS HABITACIONAIS AVALIACcedilAtildeO DOS MODELOS ADOTADOS

No processo de implementaccedilatildeo das poliacuteticas urbanas emergem conflitos entre os

atores sociais envolvidos que buscam novas formas de fazer valer seus direitos Para tanto

procurou-se analisar os modelos de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais implementadas nas duas

cidades amazocircnicas estudadas assim como os impactos na organizaccedilatildeo espacial das cidades e

a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente Aleacutem disso buscou-se analisar

as accedilotildees ou programas implementados pelos governos municipais de Beleacutem e Satildeo Luiacutes no

sentido de reduzir as carecircncias habitacionais das referidas cidades e interpretar as conexotildees

entre as praacuteticas governamentais no processo de gestatildeo de poliacuteticas habitacionais e as

necessidades objetivas dos grupos sociais demandantes de tais poliacuteticas

Dessa forma para um melhor entendimento sobre a Poliacutetica Habitacional eacute

importante destacar que a intervenccedilatildeo estatal possui papel essencial pois por meio dessas

poliacuteticas poderaacute regular organizar e coordenar as accedilotildees interventivas no espaccedilo urbano

247

Assim entende-se que toda poliacutetica puacuteblica eacute uma forma de regulaccedilatildeo ou intervenccedilatildeo na

sociedade [] toda poliacutetica puacuteblica eacute um mecanismo de mudanccedila social (SILVA 2001 p

37-38)

Gramsci (2002 p 222) argumenta que o Estado75 eacute dividido em dois sociedade civil

(responsaacutevel por divulgar as ideologias por meio do sistema escolar as igrejas os partidos

poliacuteticos os sindicatos os meios de comunicaccedilatildeo etc) e sociedade poliacutetica (que satildeo os

aparelhos de coerccedilatildeo sob o controle das burocracias-executivas ligado as forccedilas armadas e

policiais) Declara ainda que o Estado natildeo exerce a coesatildeo pura e simples ele utiliza

mecanismos de consenso para legitimar-se para evitar o conflito de classes buscando atender

as demandas existentes das classes subalternas76

O Estado legitima-se natildeo soacute por meio dos aparelhos coercitivos mas pela sua forte

presenccedila na economia no qual o interesse da sociedade se faz presente Em outros termos o

Estado apesar de servir a classe dominante precisa dar resposta agraves exigecircncias da classe

dominada e as demandas apresentadas Segundo Carvalho (1991 p 11) o Estado ao tomar a

responsabilidade pela formulaccedilatildeo e execuccedilatildeo das poliacuteticas econocircmicas e sociais responde a

demanda e pressatildeo das classes dominadas por meio de poliacuteticas puacuteblicas sendo estas a forma

concreta da intervenccedilatildeo estatal na realidade social

Oszlak e O Donnell (1976 p 21) destacam um importante conceito sobre o que eacute a

poliacutetica puacuteblica

Um conjunto de accedilotildees e omissotildees que manifestam uma modalidade de intervenccedilatildeo do Estado em relaccedilatildeo a uma questatildeo que chama a atenccedilatildeo o interesse e a mobilizaccedilatildeo de outros atores da sociedade civil Desta intervenccedilatildeo pode-se inferir uma determinada direccedilatildeo uma determinada orientaccedilatildeo normativa que presumivelmente afetaraacute o futuro curso do processo social desenvolvido ateacute entatildeo em torno do tema

Entretanto a poliacutetica puacuteblica natildeo abrange apenas as decisotildees e accedilotildees tomadas pelo

Estado mas tambeacutem a omissatildeo estatal frente a algumas realidades que caso natildeo sofram uma

intervenccedilatildeo direta seja por parte do Estado ou de organizaccedilotildees natildeo-governamentais nunca

teratildeo oportunidade de mudanccedila

75 Denominado de Estado ampliado natildeo existindo separaccedilatildeo entre Estado e sociedade 76 No final do seacuteculo XIX os neoliberais defendiam a concepccedilatildeo de que o Estado deveria intervir minimamente na economia agindo de forma neutra desenvolvendo accedilotildees complementares com o mercado como regulador natural das relaccedilotildees sociais No entanto a crise econocircmica de 1929 nos Estados Unidos atinge a economia mundial agravando a questatildeo social fazendo com que o Estado assumisse a funccedilatildeo de mediador nos conflitos sociais entre as classes dominantes e dominadas

248

O Estado atua por meio de poliacuteticas puacuteblicas e sociais visando a manutenccedilatildeo das

relaccedilotildees sociais atraveacutes da garantia de direitos sociais Para Sposati (2001 p 65) natildeo

devemos esquecer que mediante a poliacutetica social eacute que direitos sociais se concretizam e

necessidades humanas (leia-se sociais) satildeo atendidas na perspectiva da cidadania ampliada

Segundo Faleiros (2006 p 31) as poliacuteticas sociais satildeo forma de mecanismos de

relaccedilatildeo e articulaccedilatildeo de processos poliacuteticos e econocircmicos As poliacuteticas sociais satildeo respostas

e formas de enfrentamento das expressotildees da questatildeo social

De acordo com Sposati (2001 p 87)

[] a poliacutetica social natildeo deve ser somente realizada pelo governo mas tem que ser disputada na populaccedilatildeo para que politicamente mesmo que o segmento que natildeo estaacute sendo imediatamente incluiacutedo que natildeo vai usar aquela escola ou aquele programa entenda e incorpore a necessidade de ter aquela atenccedilatildeo

Nota-se que o processo das poliacuteticas puacuteblicas eacute assumido por uma diversidade de

sujeitos que entram saem ou permanecem no processo sendo estes orientados por diferentes

racionalidades e movidos por diferentes interesses Segundo Silva (2001) dentre os principais

sujeitos estatildeo os grupos de pressatildeo (movimentos sociais e outras organizaccedilotildees) partidos

poliacuteticos ou poliacuteticos individualmente (responsaacuteveis por tomar decisotildees fixar prioridades e

objetivos das poliacuteticas) administradores e burocratas teacutecnicos planejadores e avaliadores

(responsaacuteveis por formular alternativas) e o judiciaacuterio (responsaacutevel por garantir direitos) No

que diz respeito agrave poliacutetica habitacional historicamente vem cedendo a influecircncia de atores

sociais do setor imobiliaacuterio e financeiro

Partindo dessa compreensatildeo verifica-se que as poliacuteticas puacuteblicas transformam-se

numa das principais instacircncias de confronto e contradiccedilotildees entre Estado e classes populares na

garantia de seus interesses diante do espaccedilo urbano

Em uma sociedade capitalista marcada por profundas desigualdades socioeconocircmicas o papel do Estado em princiacutepio natildeo eacute o de se contrapor agrave situaccedilatildeo de injusticcedila estrutural mas o de colaborar para manter as regras do jogo que justamente criam as disparidades e privaccedilotildees relativas Existe a possibilidade poreacutem de que em determinados momentos se estabeleccedila uma correlaccedilatildeo de forccedilas poliacuteticas que permita que o Estado exerccedila um papel diferente isso vai depender e muito do grau de conscientizaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo da sociedade civil (SOUZA RODRIGUES 2004 p 13)

Segundo Rodrigues (1998 p 82) a poliacutetica habitacional nada mais eacute que uma

poliacutetica puacuteblica enquanto estrateacutegia de dominaccedilatildeo burguesa e tambeacutem poliacutetica econocircmica em

249

suas forccedilas sociais operacionais visto que surge no bojo da Reforma Brasileira O Estado

portanto como regulador social aplicador da poliacutetica habitacional distribui de forma

dissociada os equipamentos urbanos acirrando a segregaccedilatildeo soacutecioespacial a qual tem sido

foco de discussatildeo dos movimentos sociais urbanos que por meio de suas mais diversas

formas tem exigido do Estado respostas concretas agraves suas demandas e o exerciacutecio de gestotildees

democraacuteticas que sejam capazes de amenizar as carecircncias sociais tendo na questatildeo da

moradia uma de suas manifestaccedilotildees mais expressivas

Tomando como base o objeto de estudo pode dizer que a poliacutetica habitacional em

Beleacutem era realizada ateacute meados da deacutecada de 1990 por diversos oacutergatildeos da Prefeitura

Municipal de Beleacutem (PMB) uma vez que somente em 1998 que foi criada a Secretaria

Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) Estes oacutergatildeos eram a Secretaria Municipal de Coordenaccedilatildeo

Geral do Planejamento e Gestatildeo (SEGEP) criada em 1993 a Companhia de

Desenvolvimento e Administraccedilatildeo da Aacuterea Metropolitana de Beleacutem (CODEM) a Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) e a SESAN

A SEGEP era responsaacutevel pelo planejamento do orccedilamento municipal vinculado

diretamente ao Prefeito possuindo em sua estrutura o Departamento de Desenvolvimento

Municipal e o Departamento de Orccedilamento Administraccedilatildeo e Financcedilas Cabia a CODEM

buscar financiamentos para a habitaccedilatildeo principalmente por meio da CEF Aleacutem disso a

CODEM criou a Diretoria de Infraestrutura e Habitaccedilatildeo e o Fundo de Habitaccedilatildeo para o

Municiacutepio que funcionava de maneira independente do Fundo de Desenvolvimento Urbano

Sua atuaccedilatildeo era na regularizaccedilatildeo fundiaacuteria de interesse social e tambeacutem na administraccedilatildeo da

enfiteuse da Primeira Leacutegua Patrimonial

A SEURB tinha uma atuaccedilatildeo fraca no setor uma vez que era responsaacutevel pelo

controle urbaniacutestico

liberaccedilatildeo de alvaraacutes licenciamentos e fiscalizaccedilatildeo A SESAN era

responsaacutevel pelos projetos e execuccedilatildeo das obras de macrodrenagem em aacutereas prioritaacuterias de

urbanizaccedilatildeo

Embora a SEGEP fosse responsaacutevel por articular as poliacuteticas intersetoriais que

visava buscar a integraccedilatildeo entre as accedilotildees e projetos dos diversos oacutergatildeos natildeo proporcionou de

fato a elaboraccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional capaz de envolver uma accedilatildeo integrada dos

diferentes setores do poder puacuteblico municipal

Efetivamente os programas e projetos especiacuteficos para a produccedilatildeo habitacional e

melhorias das condiccedilotildees habitacionais natildeo foram de iniciativa municipal A PMB teve sua

accedilatildeo restrita ao apoio institucional para os reassentamentos de famiacutelias em aacutereas de

intervenccedilatildeo dos programas de saneamento e drenagem coordenados pela COSANPA

250

Com a criaccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) por meio da Lei

Municipal nordm 7865 que tem por objetivo promover a poliacutetica municipal de habitaccedilatildeo de

interesse social contribuindo para a melhoria das condiccedilotildees da habitaccedilatildeo e reduccedilatildeo do deacuteficit

habitacional em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo

por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular (SEHAB 2011) pode-se afirmar que

haacute um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez que reconhece o direito a moradia como

poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da poliacutetica habitacional

De acordo com o entrevistado (teacutecnico da SEHAB)

A SEHAB foi criada em um contexto de mobilizaccedilatildeo dos movimentos de moradia e de valorizaccedilatildeo por parte do governo municipal da participaccedilatildeo popular A expectativa de atendimento das demandas acumuladas com relaccedilatildeo agraves condiccedilotildees de moradia se ampliaram e acabaram por fortalecer a proposta de criaccedilatildeo de uma secretaria especiacutefica para a temaacutetica habitacional uma vez que a inexistecircncia de uma estrutura institucional clara e definida que encaminhasse uma poliacutetica habitacional consistente apresentava-se como grande empecilho para o municiacutepio (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2009)

A SEHAB visa promover planejar coordenar executar controlar e avaliar as

atividades de poliacutetica habitacional no municiacutepio como oacutergatildeo da administraccedilatildeo direta do

mesmo Conforme organograma institucional da Secretaria (SEHAB 2011) a elaboraccedilatildeo e

implementaccedilatildeo dos Projetos de Obras Fiacutesicas (construccedilatildeo de equipamentos urbanos rede de

drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua equipamentos comunitaacuterios

pavimentaccedilatildeo de ruas e construccedilatildeo de moradias) satildeo de responsabilidade do Departamento de

Programas e Projetos Habitacionais (DPPH)

O Departamento Social (DESO)77 eacute responsaacutevel pelos projetos sociais da referida

secretaria possui uma equipe multidisciplinar composta por Assistente Social Pedagogo

Psicoacutelogo e Historiador objetivando elaborar e implementar os Projetos de Trabalho Social

que se datildeo por meio de trecircs eixos geraccedilatildeo de trabalho e renda educaccedilatildeo soacutecio-poliacutetica e

educaccedilatildeo ambiental

77 Atualmente o quadro teacutecnico do Departamento Social da SEHAB possui duas Assistentes Sociais efetivas trecircs Assistentes Sociais comissionados uma Psicoacuteloga um Historiador e quatro Estagiarias o que na realidade prejudica o desenvolvimento do trabalho uma vez que no ano de 2010 a Secretaria contava com um corpo teacutecnico de doze Assistentes Sociais e dez estagiaacuterios

251

Figura 9

Organograma estrutural da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo

Fonte SEHAB (2011)

Dados da Prefeitura Municipal de Beleacutem relatam que a SEHAB implementa os

programas de fomento ao cooperativismo reassentamento de famiacutelias residentes em aacuterea de

risco e insalubres urbanizaccedilatildeo de aacutereas onde eacute efetiva a detecccedilatildeo de habitaccedilotildees em condiccedilotildees

subumanas assim como reforma e ampliaccedilatildeo de unidades habitacionais (SEHAB 2011)

As accedilotildees da PMB destinadas a questatildeo habitacional tem sido atribuiacuteda aos oacutergatildeos

oficiais diretamente envolvidos com a temaacutetica da poliacutetica habitacional SEHAB Secretaria

Municipal de Urbanismo (SEURB) Secretaria Municipal de Saneamento (SESAN) CODEM

e SEGEP (conforme demonstrado no quadro abaixo) Contudo o fato de haver sobreposiccedilotildees

de atividades redundou na ausecircncia da participaccedilatildeo articulada de oacutergatildeos importantes da

administraccedilatildeo municipal dificultando o desenvolvimento de uma poliacutetica puacuteblica integrada

(BELEacuteM 2007)

SECRETAacuteRIO DIRETOR GERAL

NUacuteCLEO DE PLANEJAMENTO E

ACOMPANHAMENTO

GABINETE

NUacuteCLEO DE ASSUNTOS JURIacuteDICOS

DEPARTAMENTO SOCIAL

DIV PESQ E HABITACcedilAtildeO

SOCIAL

DIV DESENV COMUNITAacuteRIO

DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO

IMOBILIAacuteRIO

DIV DE RECURSOS HUMANOS

FINANCEIROS MATERIAIS

DIVISAtildeO IMOBILIAacuteRIA

DEPARTAMENTO PROGRAMAS E

PROJETOS SOIAIS

DIV PROJETOS AVALIACcedilAtildeO E

CUSTOS

DIV EXECUCcedilAtildeO E FISALIZACcedilAtildeO

DE OBRAS

252

Quadro 9 - Demonstrativo das sobreposiccedilotildees de atribuiccedilotildees entre os oacutergatildeos municipais diretamente vinculados a questatildeo habitacional

Oacutergatildeo Atribuiccedilatildeo Legal Atribuiccedilatildeo Efetiva Sobreposiccedilatildeo com outros oacutergatildeos

SEHAB

Planejar coordenar executar controlar e avaliar as atividades da Poliacutetica de Habitaccedilatildeo do Municiacutepio

Promoccedilatildeo da avaliaccedilatildeo teacutecnica de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilotildees

A CODEM e Secretaria Municipal de Financcedilas (SEFIN) realizam avaliaccedilotildees de bens imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e emitem laudos teacutecnicos avaliativos com base em criteacuterios diferenciados

Elaboraccedilatildeo de projetos executivos de engenharia e arquitetura de empreendimentos habitacionais de infraestrutura e de urbanizaccedilatildeo

A SEURB tem esta mesma atribuiccedilatildeo aplicada pela Lei nordm 8009 de 250502 (elaboraccedilatildeo gratuita de projetos de engenharia civil para atender agrave construccedilatildeo de habitaccedilotildees populares)

Remanejamento assentamento e desapropriaccedilatildeo de aacutereas em ocupaccedilotildees conflituosas

A SESAN desenvolve esta atividade nas aacutereas onde implanta projetos

SEURB

Executar coordenar controlar conservar e avaliar as obras de paisagismo e edificaccedilotildees puacuteblicas municipais

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral bem como as obras particulares atraveacutes da legislaccedilatildeo em vigor

As obras de paisagismo satildeo realizadas pela SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu o Departamento de Paisagismo e Meio Ambiente da SEURB

Controlar e preservar o meio ambiente em geral inclusive do patrimocircnio arquitetocircnico histoacuterico e artiacutestico

SEGEP

Coordenar a elaboraccedilatildeo avaliaccedilatildeo reformulaccedilatildeo e atualizaccedilatildeo dos instrumentos baacutesicos do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Promover a articulaccedilatildeo de atividades entre as entidades integrantes do Sistema Municipal de Planejamento e Gestatildeo

Idem

Administrar o sistema viaacuterio do Municiacutepio de Beleacutem

Idem A SEURB faz planejamento urbano

253

SESAN Administrar os resiacuteduos soacutelidos

Idem

Educaccedilatildeo ambiental Esta atribuiccedilatildeo eacute de competecircncia

legal da SEMMA cuja lei de criaccedilatildeo extinguiu a Divisatildeo de Educaccedilatildeo Ambiental e Desenvolvimento Comunitaacuterio vinculada agrave SEURB

Habitaccedilatildeo construccedilatildeo realocaccedilatildeo e desapropriaccedilatildeo na implantaccedilatildeo de projetos relacionados agraves suas atribuiccedilotildees

Egrave uma das atribuiccedilotildees efetivas da SEHAB

CODEM

Pesquisar planejar executar financiar e controlar as atividades de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria urbanizaccedilatildeo e habitaccedilatildeo

Executar as atribuiccedilotildees de legalizaccedilatildeo fundiaacuteria

SEURB nas atividades de urbanizaccedilatildeo SEHAB nas de habitaccedilatildeo

Promover a Enfiteuse Pelo novo Coacutedigo Civil passa a ser aplicado o Direito de Superfiacutecie

Implementar projetos urbaniacutesticos

SEURB e SEHAB

Implementar a poliacutetica habitacional municipal

SEHAB

Desenvolver atividades de apoio ao SIPLAG

Avaliaccedilatildeo de imoacuteveis para fins de desapropriaccedilatildeo e transaccedilatildeo comerciais para compra

SEHAB e SEFIN

Fonte BELEacuteM Prefeitura Municipal de Diagnoacutestico Institucional Municiacutepio de Beleacutem-Paraacute In______ Plano Estrateacutegico Municipal para Assentamentos Subnormais Beleacutem SEGEP (2005)

Mediante esse quadro nota-se que haacute uma sobreposiccedilatildeo de funccedilotildees acarretada pela

proacutepria lei de criaccedilatildeo dos oacutergatildeos e pela insuficiecircncia institucional da SEHAB o que fez com

que funccedilotildees fossem atribuiacutedas eou assumidas de acordo com o perfil da gestatildeo e dos

responsaacuteveis pelos oacutergatildeos

A PMB aponta como principais aspectos que tecircm sido responsaacuteveis pelas

dificuldades de interaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos do governo municipal nessa aacuterea

A ausecircncia de uma vinculaccedilatildeo da gestatildeo municipal a um modelo espacial de estruturaccedilatildeo urbana capaz de nortear as accedilotildees de planejamento urbano associadas agrave poliacutetica habitacional

A falta de coerecircncia na conduccedilatildeo do ordenamento territorial tem feito com que as accedilotildees puacuteblicas e privadas no territoacuterio municipal se realizem sem benefiacutecios para o desenvolvimento da poliacutetica habitacional no que se refere a

254

inibiccedilatildeo de processos imobiliaacuterios especulativos impossibilitando a implementaccedilatildeo dos instrumentos de poliacutetica habitacional previstos no Plano Diretor

O deacuteficit de recursos materiais humanos e teacutecnicos na maioria dos oacutergatildeos municipais o que implica muitas vezes na natildeo-efetivaccedilatildeo de suas atribuiccedilotildees legais

A ausecircncia de um sistema de informaccedilotildees atualizado e unificado (informaccedilotildees em rede) que apoacuteie o planejamento o acompanhamento dos resultados das accedilotildees enfim a gestatildeo puacuteblica municipal e

As pressotildees sociais por accedilotildees isoladas e localizadas imediatas face aos deacuteficits acumulados historicamente de infraestruturas urbanas e comunitaacuterias e a escassez de recursos financeiros para responder a tais demandas (SEGEP 2005 p 24)

Entretanto apesar das dificuldades apresentadas o Estatuto da Cidade possibilitou a

implementaccedilatildeo de novos instrumentos que contribuiacuteram no desenvolvimento de accedilotildees mais

efetivas por parte do oacutergatildeo gestor no processo de regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Para tanto foram criados o Orccedilamento Participativo (OP)78 e o Congresso da Cidade

como instrumentos para promover a gestatildeo participativa da cidade ou seja como

instrumentos de intermediaccedilatildeo na relaccedilatildeo entre governo municipal e sociedade Eacute um

processo de planejamento que tem como princiacutepio a participaccedilatildeo direta da sociedade nas

decisotildees sobre a aplicaccedilatildeo dos recursos a serem investidos em obras e serviccedilos pela prefeitura

Em Beleacutem a ideacuteia do governo era de que mediante a participaccedilatildeo popular seria

possiacutevel deslanchar um processo de gestatildeo capaz de fazer frente aos problemas da cidade

decorrentes do descaso de sucessivas intervenccedilotildees estatais centralizadoras

A iniciativa da participaccedilatildeo popular no OP teve como base a ausecircncia de poliacuteticas

puacuteblicas para as aacutereas de baixadas o que levou a sociedade a demandar serviccedilos e obras em

especial na aacuterea de saneamento baacutesico

Dessa maneira a administraccedilatildeo municipal priorizou a temaacutetica do saneamento

realizando o planejamento estrateacutegico da Marca Sanear Beleacutem79 com a missatildeo de elevar a

qualidade de vida proporcionando agrave sociedade condiccedilotildees dignas de limpeza drenagem aacutegua

78 Avritzer (2001) ressalta que OP eacute uma estrutura e um processo de participaccedilatildeo baseados em trecircs princiacutepios e em um conjunto de instituiccedilotildees que funcionam como mecanismos ou canais que asseguram a participaccedilatildeo no processo decisoacuterio do governo municipal Esses princiacutepios satildeo 1) participaccedilatildeo aberta a todos os cidadatildeos sem nenhum status especial atribuiacutedo a qualquer organizaccedilatildeo inclusive as comunitaacuterias 2) combinaccedilatildeo da democracia direta e representativa cuja dinacircmica institucional concede aos proacuteprios participantes a definiccedilatildeo de regras internas e 3) alocaccedilatildeo dos recursos para investimentos baseada na combinaccedilatildeo de criteacuterios gerais e teacutecnicos ou seja compatibilidade entre as decisotildees e regras estabelecidas pelos participantes e as exigecircncias teacutecnicas e legais da accedilatildeo governamental respeitando tambeacutem os limites financeiros 79 A administraccedilatildeo municipal definiu 06 (seis) programas baacutesicos que ficaram conhecidos por Marcas de Governo Dar um Futuro agraves Crianccedilas Sauacutede para Todos Transporte Humano Revitalizar Beleacutem Sanear Beleacutem e Participaccedilatildeo Popular (BELEacuteM 1997)

255

potaacutevel esgoto melhoria habitacional e educaccedilatildeo sanitaacuteria e ambiental (BELEacuteM 1997)

Dentre as accedilotildees municipais relacionadas ao Sanear Beleacutem destacam-se conforme quadro 10

Quadro 10

Projetos executados pelo poder puacuteblico municipal (periacuteodo 1997

2001)

Programa Accedilatildeo

Instituiccedilatildeo Promotora

Natureza da Provisatildeo Projeto Localizaccedilatildeo

Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica

PROacute-MORADIA

PROacute-MORADIA

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Secretaria Municipal

de Habitaccedilatildeo (SEHAB)

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Projeto de Urbanizaccedilatildeo

Eduardo Angelim I

Icoaraci Construccedilatildeo de 300 unidades habitacionais para famiacutelias oriundas do Canal Mundurucus Cipriano Santos Santa Cruz e Gentil

Eduardo Angelim II

Icoaraci Construccedilatildeo de 410 unidades habitacionais e 01 escola e 02 praccedilas para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo

Eduardo Angelim III

Icoaraci

Construccedilatildeo de 304 unidades habitacionais com ofertas de 304 cestas de material de construccedilatildeo para famiacutelias oriundas do Canal Tucunduba Satildeo Joaquim e Parque Uniatildeo e construccedilatildeo de 01 creche e 01 praccedila

Jardim Bom Futuro

Bengui Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental e regularizaccedilatildeo fundiaacuteria

Laranjeiras Jurunas Construccedilatildeo de 202 unidades habitacionais

Malvinas Sacramenta

Construccedilatildeo de 01 creche 01 unidade da Famiacutelia Saudaacutevel 02 quadras poliesportivas revestimento do canal sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus I

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Morada de Deus II

Icoaraci Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto meio fio calccedilada arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

Nova Beleacutem I

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 220 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

256

Nova Beleacutem II

Tenoneacute

Construccedilatildeo de 240 unidades habitacionais sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo preservaccedilatildeo ambiental construccedilatildeo de 01 praccedila 01 quadra meio fio e calccedilada

Radional II Jurunas Construccedilatildeo de 604 unidades habitacionais

Raimundo Jinkings

Tapanatilde Construccedilatildeo de 250 unidades habitacionais e 01 quadra

Satildeo Gaspar Tapanatilde Sistema viaacuterio sistema de drenagem abastecimento de aacutegua esgoto arborizaccedilatildeo e preservaccedilatildeo ambiental

HABITAR BRASIL

SEHAB

Infraestrutura Habitacional e

Lotes Urbanizados

Comandante Cabano Antocircnio Vinagre

Marco

Construccedilatildeo de 126 apartamentos para famiacutelias remanejadas da Av1ordm de Dezembro

Riacho Doce

Guamaacute

MORANDO MELHOR SEHAB

Empreacutestimo para Melhoria das Condiccedilotildees Habitacionais

Vila da Barca Teleacutegrafo Reforma de 60 unidades

habitacionais

Satildeo Gaspar Tapanatilde Reforma de 300 unidades habitacionais

PROJETOS DE

REGULARIZACAtildeO

FUNDIA RIA

CODEM Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

Parque Uniatildeo

Tapanatilde Oferta de 682 lotes construccedilatildeo de 01 escola 01 posto de sauacutede e 617 famiacutelias tituladas

Aldo Almeida Tapanatilde

Oferta de 272 lotes para famiacutelias da Macrodrenagem e 77 famiacutelias tituladas

Fonte Pesquisa HABITAT FASE IPPUR UFRJ (2001)

Entretanto natildeo soacute o governo municipal interveio no espaccedilo urbano de Beleacutem o

governo estadual implementou vaacuterias poliacuteticas de urbanizaccedilatildeo na cidade dentre as quais

destacam-se de acordo com o quadro 11 que tiveram accedilotildees de remanejamento ou

reassentamento de famiacutelias

257

Quadro 11

Projetos de Urbanizaccedilatildeo executados pelo governo estadual

Projeto Periacuteodo Localizaccedilatildeo Forma de Intervenccedilatildeo Puacuteblica Projeto Urbanizar Meados da

deacutecada de 1980

Assentamento

Jaderlacircndia

Urbanizaccedilatildeo regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e

equipamentos urbanos

Programa de Saneamento e Geraccedilatildeo de Emprego e

Renda (PROSEGE) 1994-1998 Marambaia e

Guanabara

Sistema viaacuterio esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel sistema

de drenagem e estaccedilatildeo de tratamento

Projeto Paracuri II 1997-1999 Icoaraci Oferta de lotes titulaccedilatildeo de famiacutelias

construccedilatildeo de 01 Centro Comunitaacuterio 01 escola e urbanizaccedilatildeo da aacuterea

Projeto de Macrodrenagem da Bacia

do Una 1985-2004

09 Bairros de Beleacutem

Sistema viaacuterio sistema de drenagem esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua

potaacutevel revestimento de canais construccedilatildeo de 2 comportas meio fio

calccedilada construccedilatildeo de pontes e aterro de quintais

Programa de Accedilatildeo Social em Saneamento (PASS)

1996-1998 Guanabara Complementar ao PROSEGE na aacuterea da

Guanabara Abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental Programa de Saneamento

para a Populaccedilatildeo de Baixa Renda

(PROSANEAR)

1994-1996 Aacuterea do IPASEP

Guanabara Coqueiro Benguiacute

Esgoto sanitaacuterio abastecimento de aacutegua potaacutevel e campanha de educaccedilatildeo

sanitaacuteria e ambiental

Fonte Portela (2005)

Assim pode-se afirmar que as experiecircncias acima descritas demonstram um

aprendizado de caraacuteter poliacutetico dentro do contexto em que se apresenta no qual a tocircnica de

planejamento e gestatildeo da cidade sempre estiveram assentados numa concepccedilatildeo tecnocraacutetica e

racionalista com vistas a propoacutesitos bens especiacuteficos de desenvolvimento urbano em geral

associado agrave ideacuteia de modernizaccedilatildeo da cidade (TRINDADE JUNIOR 1998)

A cidade de Beleacutem resulta portanto de um dado processo econocircmico poliacutetico social e cultural e nela se concentram e materializam as praacuteticas de sobrevivecircncia dos setores sociais que se constituiacuteram Sua urbanizaccedilatildeo deve ser entendida como expressatildeo social do processo de reproduccedilatildeo do capital e da forccedila de trabalho a forma como estatildeo estruturadas as relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo numa dada conjuntura e sob um determinado modo de produccedilatildeo que no caso eacute o capitalismo (MOURAtildeO 1987 p 38)

Ampliar a participaccedilatildeo popular nos novos formatos institucionais de gestatildeo tem-se

configurado como um importante instrumento para promover a articulaccedilatildeo entre os atores

sociais e para melhorar a qualidade do processo de tomada de decisatildeo reconhecendo desse

modo a capacidade e a potencialidade da proacutepria sociedade civil quanto agrave indicaccedilatildeo dos

caminhos que a cidade deveria seguir

258

Nesse sentido tentou-se implementar o Congresso da Cidade natildeo como um evento

de discussatildeo e de simples proposiccedilatildeo mas como um foacuterum permanente de tomada de decisatildeo

de participaccedilatildeo e de mobilizaccedilatildeo social sendo portanto um espaccedilo puacuteblico natildeo-estatal de

planejamento da cidade ainda que seja uma proposta apresentada pelo governo na qual o

papel deste coloca-se como de fundamental importacircncia com vistas agrave sua implementaccedilatildeo e

eficaacutecia (TRINDADE JUNIOR 1998)

A ideacuteia central do Congresso da Cidade era o de instituir um modelo de gestatildeo e

planejamento de forma articulada fazendo com que a sociedade passe a se preocupar com o

todo da cidade e natildeo somente com seus espaccedilos de habitaccedilatildeo ou com suas necessidades

especiacuteficas (RODRIGUES 2000) Assim buscou-se ampliar e qualificar a participaccedilatildeo

popular por meio da articulaccedilatildeo das vaacuterias dimensotildees e instacircncias antes vivenciadas e da

criaccedilatildeo de novos espaccedilos de participaccedilatildeo adotando uma estrutura organizativa bastante

complexa e dinacircmica80

A experiecircncia poliacutetica e organizativa de um governo popular local deve se expressar como praacutetica social inovadora revolucionaacuteria [] Um governo de caraacuteter democraacutetico e popular compromissado com o objetivo da transformaccedilatildeo da realidade social deve colocar as dimensotildees cultural e poliacutetica como centrais e estrateacutegicas porque quando natildeo se muda valores natildeo se muda nada (RODRIGUES 2000 p 19)

Dessa forma a inversatildeo de prioridades com a transferecircncia de recursos para a

melhoria das condiccedilotildees de vida da sociedade e a universalizaccedilatildeo da cidadania constituiacuteram-se

objetivos a serem alcanccedilados com a implementaccedilatildeo do Congresso da Cidade pelo poder

puacuteblico municipal Entretanto devido a uma seacuterie de problemas de cunho administrativo e

especialmente poliacutetico os objetivos propostos pelo referido Congresso natildeo foram alcanccedilados

em sua totalidade

Cabe destacar que nos uacuteltimos anos a SEHAB vem realizando intervenccedilotildees

significativas na aacuterea de saneamento habitaccedilatildeo e urbanizaccedilatildeo tais como

a) Projeto Vila da Barca I II e III Etapas no bairro do Telegrafo As obras

foram iniciadas no ano de 2003 e abrangendo 960 por meio dos programas

Morar Melhor Palafita Zero e PAC

80 O Congresso da Cidade eacute formado pelas seguintes instacircncias oficinas e reuniotildees preparatoacuterias os congressos distritais temaacuteticos e assembleacuteias setoriais os congressos municipais temaacuteticos e o congresso de Beleacutem Existem tambeacutem as instacircncias de coordenaccedilatildeo e acompanhamento que satildeo constituiacutedas em forma de conselho os Conselhos Distritais o Conselho da Cidade COFIS Conselhos Gestores da Sauacutede e das Escolas e Conselhos de Poliacuteticas Setoriais

259

b) Projeto Portal da Amazocircnia iniciado em 2008 pretende atingir 400 famiacutelias

que residem na Rua Osvaldo de Caldas Brito (Estrada Nova) financiado

pelo PAC

c) Projeto Paracuri sua aacuterea de abrangecircncia eacute o Paracuri II no Distrito de

Icoaraci foi iniciado em 2008 e tem como puacuteblico-alvo 600 famiacutelias

tambeacutem financiado pelo PAC

Contudo devido a questotildees poliacuteticas e institucionais os projetos Paracuri e Portal da

Amazocircnia desde 2010 estatildeo sob a coordenaccedilatildeo da SEURB

Beleacutem na atualidade faz parte de um programa do governo federal o qual tem por objetivo minimizar o deacuteficit habitacional no Brasil o programa Palafita Zero que faz parte do Plano de Aceleraccedilatildeo do Crescimento e tem o propoacutesito de melhorar as condiccedilotildees habitacionais das populaccedilotildees que ocupam os assentamentos precaacuterios eacute atraveacutes deste que visando atender a necessidade em que se compreende a moradia como um direito humano e fundamental e consequumlentemente a formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo desta poliacutetica Habitacional no acircmbito municipal (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

A SEHAB como oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor de alguns projetos de

urbanizaccedilatildeo tecircm por obrigatoriedade responder as demandas colocadas pela populaccedilatildeo e

garantir o direito a moradia conforme seus objetivos Todavia ressalta-se que tais projetos

natildeo satildeo muitas vezes garantidos natildeo passam pelas as exigecircncias dos agentes financiadores da

obra fiacutesica e da obra de cunho social estes tem paracircmetros conceituais e teacutecnicos jaacute

estipulados verbas jaacute destinadas agraves quais limitam o trabalho social e consequumlentemente ateacute o

projeto fiacutesico (BELEacuteM 2007) Um desses impasses ressalta-se a seguir na fala de uma

Assistente social que compotildee o quadro teacutecnico da referida secretaria (2010)

A SEHAB eacute um oacutergatildeo da PMB destinado agrave questatildeo habitacional e se envolve diretamente com a temaacutetica da poliacutetica habitacional [] a secretaria foi criada para atender as demandas com relaccedilatildeo as condiccedilotildees de moradia Contudo hoje percebemos que soacute a SEHAB natildeo eacute o suficiente para sanar todos esses problemas pois estrutura institucional e fiacutesica insuficiente articulaccedilatildeo insuficiente com os demais oacutergatildeos municipais inexistecircncias de terras estocadas o alto iacutendice de famiacutelias conviventes (56652 famiacutelias) e etc

Segundo o teacutecnico da SEHAB (2010)

O trabalho desenvolvido pela SEHAB diante as ocupaccedilotildees irregulares se da atraveacutes de um planejamento social da aacuterea e da populaccedilatildeo a ser atingida pelo

260

projeto fiacutesico habitacional se baseando nos criteacuterios estabelecidos em cada projeto desenvolvido pela mesma e de acordo com os tramites legais juntamente com base nas diretrizes da poliacutetica habitacional o que atraveacutes da utilizaccedilatildeo dos instrumentos teacutecnicos funcionais busca metodologias para proporcionar a melhoria ou a mudanccedila de um determinado contexto por meio de um diagnoacutestico e levantamento soacutecio econocircmico delimitando desta maneira agrave demanda para que haja a intervenccedilatildeo A SEHAB busca intervir no meio atraveacutes de reuniotildees com a comunidade assembleacuteias accedilotildees educativas e informativas sobre o projeto que possa vir a atingir a aacuterea estudada

Pode-se dessa forma salutar que a SEHAB tem o objetivo de promover a poliacutetica

urbana na cidade contribuindo de alguma forma para a melhoria das condiccedilotildees de moradias

da populaccedilatildeo captando recursos implementando programas e projetos estreitando parceria

com a comunidade e oacutergatildeos puacuteblicos privados e ateacute mesmo organizaccedilotildees internacionais

poreacutem nem sempre se eacute possiacutevel ter o alcance dos objetivos o que pode se destacar na fala do

teacutecnico da secretaria

A garantia de direito eacute insuficiente com relaccedilatildeo a constituiccedilatildeo federal logo nem toda demanda tem seus direitos garantidos os programas satildeo insuficientes Plano diretor existe mais natildeo eacute colocado em praacutetica Direito a moradia natildeo eacute soacute casa p morar mas eacute necessaacuterio ter condiccedilotildees de habitabilidade acesso a serviccedilos [] o poder puacuteblico busca captaccedilatildeo de recursos para investir nos projetos mais esquece de pocircr em praacutetica seus instrumentos como o plano diretor (entrevista concedida pelo teacutecnico da SEHAB 2010)

Neste sentido eacute possiacutevel perceber que a moradia enquanto um direito natildeo eacute

garantido a todos esta eacute a loacutegica neoliberal que vem sendo adotada desde a deacutecada de 1990

em que a moradia eacute uma mercadoria de valor muito alto e algumas pessoas somente

conseguem ter acesso a ela por meio de uma poliacutetica social que o Estado atua no combate a

desigualdade poreacutem este Estado tem por base para a sua intervenccedilatildeo a relaccedilatildeo

custobenefiacutecio relaccedilotildees de consumo e de mercado em que se busca o que eacute menos

dispendioso para o mesmo como por exemplo por meio de parcerias entre o puacuteblico e o

privado descentralizaccedilatildeo subsiacutedios fiscais programas de renda miacutenima etc

De acordo com Beleacutem (2007) de uma forma geral no que se refere agrave habitaccedilatildeo

pode-se dizer que diante da accedilatildeo tiacutemida ou insuficiente das poliacuteticas habitacionais somada agrave

desigualdade social resultado dos modelos econocircmicos excludentes adotados pelo paiacutes ao

longo das duas uacuteltimas deacutecadas o que ocorreu nas grandes cidades foi um estiacutemulo agrave

ampliaccedilatildeo de ocupaccedilotildees informais e irregulares A falta de alternativas e o aprofundamento

das situaccedilotildees de precariedade urbana em todo o paiacutes satildeo resultados de um periacuteodo de

261

esvaziamento da poliacutetica urbana no acircmbito federal e o consequumlente enfraquecimento das

demais esferas de governo bem como a retraccedilatildeo dos investimentos puacuteblicos em um periacuteodo

de crescimento da populaccedilatildeo urbana em especial nas grandes cidades e regiotildees

metropolitanas

Os relatoacuterios da PMB chamam a atenccedilatildeo ainda para a grave desestruturaccedilatildeo da

SEHAB para efetivamente assumir a sua competecircncia legal da execuccedilatildeo da Poliacutetica

Habitacional Isso permite por exemplo que a SESAN ou a SEURB com maior e melhor

estrutura justifique a execuccedilatildeo de atividades de competecircncia da Secretaria de Habitaccedilatildeo tais

como o atendimento agraves demandas urgentes para realocaccedilatildeo de populaccedilatildeo avaliaccedilatildeo de

imoacuteveis desapropriaccedilatildeo construccedilatildeo de unidades habitacionais etc

Vale ressaltar que em entrevista concedida por um teacutecnico da SEHAB (2010) a

poliacutetica habitacional eacute entendida como

Nome dado aos diversos processos de urbanizaccedilatildeo adotados pelo poder puacuteblico para atendimento da populaccedilatildeo de baixa renda [] Jaacute tivemos alguns avanccedilos a aprovaccedilatildeo do Estatuto da Cidade (2001) a Criaccedilatildeo do Ministeacuterio das Cidades (2003) a instituiccedilatildeo do Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social SNHIS e do Fundo Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social FNHIS bem como o seu Conselho Gestor a realizaccedilatildeo de Conferecircncias das Cidades e a retomada da construccedilatildeo de uma poliacutetica nacional de habitaccedilatildeo e fundiaacuteria em Beleacutem esse cenaacuterio tem provocado mudanccedilas institucionais importantes dentre as quais podemos destacar a realizaccedilatildeo da I Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo a instituiccedilatildeo da Secretaria Municipal de Habitaccedilatildeo (SEHAB) a criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social (SNHIS) e o novo Plano Diretor de Beleacutem que estabelece as diretrizes para o desenvolvimento urbano e determina a elaboraccedilatildeo de planos setoriais dentre os quais o de habitaccedilatildeo de interesse social Neste sentido ateacute dezembro de 2010 deveraacute ser elaborado o Plano Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social PMHIS de Beleacutem que vai consolidar o planejamento da accedilatildeo municipal referente agrave questatildeo habitacional prevista no Plano Diretor Deve conter as diretrizes linhas programaacuteticas fontes de recursos metas e indicadores que expressem o entendimento do poder puacuteblico e dos agentes sociais a respeito do planejamento habitacional com o objetivo de promover o acesso agrave moradia digna

Dentre os principais desafios a serem enfrentadas pela Secretaria estatildeo implementar

uma poliacutetica habitacional de longo prazo elaborar o PMHIS viabilizar a ampliaccedilatildeo da oferta

de habitaccedilatildeo de interesse social regulamentar as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)

criar a estrutura de coordenaccedilatildeo da elaboraccedilatildeo do PMHIS realizar um seminaacuterio intersetorial

no acircmbito da PMB realizar dezesseis oficinas para diagnoacutestico e elaboraccedilatildeo do plano nos

262

distritos administrativos realizar uma Conferecircncia Municipal de Habitaccedilatildeo encaminhar a

minuta de Projeto de Lei do PMHIS ao Executivo municipal

Em relaccedilatildeo aos principais avanccedilos a partir da SEHAB podem ser ressaltados a

adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse Social a constituiccedilatildeo do Fundo

Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e

construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para regularizaccedilatildeo fundiaacuteria a realizaccedilatildeo

do Diagnoacutestico Habitacional e a elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de habitaccedilatildeo A expectativa

eacute que em 2010 os resultados se multipliquem e a SEHAB seja reconhecida pela sua atuaccedilatildeo

responsaacutevel na construccedilatildeo de uma cidade cada vez mais humana (Entrevista concedida por

um teacutecnico da SEHAB 2010)

Na praacutetica nenhum oacutergatildeo ou instituiccedilatildeo eacute de fato responsaacutevel pela articulaccedilatildeo das

accedilotildees nessa escala Nenhum espaccedilo de deliberaccedilatildeo ou debate se apresenta de forma

consolidada e com influecircncia teacutecnica eou poliacutetica suficiente para desencadear um processo de

debate e implementaccedilatildeo de accedilotildees entre os diferentes municiacutepios no que diz respeito agrave poliacutetica

de transporte puacuteblico habitaccedilatildeo saneamento e resiacuteduos soacutelidos (BELEacuteM 2007)

Isso demonstra uma contradiccedilatildeo ao que eacute proposto nos princiacutepios da Poliacutetica

Nacional de Habitaccedilatildeo

Direito agrave moradia colocando os direitos humanos mais proacuteximos do centro das preocupaccedilotildees de nossas cidades moradia digna como direito e vetor de inclusatildeo social garantindo padratildeo miacutenimo de qualidade infraestrutura baacutesica transporte coletivo e serviccedilos sociais funccedilatildeo social da propriedade urbana buscando implementar instrumentos de reforma urbana e garantir acesso a terra urbanizada questatildeo habitacional como uma poliacutetica de Estado uma poliacutetica pactuada com a sociedade e que extrapole um soacute governo gestatildeo democraacutetica com participaccedilatildeo dos diferentes segmentos e articulaccedilatildeo das accedilotildees de habitaccedilatildeo agrave poliacutetica urbana de modo integrado com as demais poliacuteticas sociais e ambientais

Assim pode-se concluir que em Beleacutem embora se tenha avanccedilado em relaccedilatildeo a

poliacutetica habitacional as accedilotildees dos planosprogramas pouco contribuiacuteram para a definiccedilatildeo de

diretrizes de expansatildeo urbana da RMB Fica evidente ainda que os modelos de gestatildeo

implementados desde 1998 natildeo contribuiacuteram para a diminuiccedilatildeo da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

e que a relaccedilatildeo entre Estado e sociedade civil avanccedilou em alguns pontos (OP e Congresso da

Cidade) mas depois houve uma estagnaccedilatildeo e a implementaccedilatildeo das accedilotildees observadas nos

diferentes planos e instrumentos de planejamento e controle urbano esbarraram em uma

estrutura administrativa e poliacutetica bastante fraacutegil

263

Em Satildeo Luiacutes constatou-se que o Municiacutepio natildeo dispotildee de uma Poliacutetica Habitacional

elaborada com instrumentos adequados que permita uma gestatildeo compatiacutevel com o niacutevel de

problemas encontrados no mesmo embora possa ser entendido que existe uma preocupaccedilatildeo

com a questatildeo uma vez que em 2006 foi aprovado o Plano Diretor que estaacute em vigor o qual

vem conduzindo o desenvolvimento urbano a partir das diretrizes ali estabelecidas

Entretanto ao lado de toda a sua importacircncia histoacuterica e de sua heranccedila cultural Satildeo

Luiacutes refletido o padratildeo socioeconocircmico do Estado do Maranhatildeo convive com graves

problemas urbanos e sociais apresentando iacutendices de qualidade vida bastante baixos

Notadamente nos itens de alfabetizaccedilatildeo emprego renda esgotamento sanitaacuterio e mortalidade

infantil o que lhe coloca entre as uacuteltimas no ranking das capitais brasileiras (SEMTHURB

2007)

De maneira geral essa situaccedilatildeo eacute fruto de um crescimento urbano carente de avanccedilos

no campo social e de um fortiacutessimo sistema econocircmico que prioriza a concentraccedilatildeo de renda

em detrimento da distribuiccedilatildeo da riqueza produzida pela sociedade Esse modelo ao

promover o empobrecimento da maioria da populaccedilatildeo tem produzido graviacutessimas distorccedilotildees

no processo de ocupaccedilatildeo do territoacuterio e consequumlentemente na produccedilatildeo do espaccedilo urbano

(VILLACcedilA 2001)

Segundo dados da entrevista e do diagnoacutestico realizado pela Prefeitura de Satildeo Luiacutes

as accedilotildees municipais na aacuterea habitacional tecircm acontecido por meio de programas diversos

quase sempre para responder a uma demanda circunstancial Os programas e investimentos

habitacionais derivam de uma sequumlecircncia de iniciativas marcadas por 4 linhas de accedilatildeo e estatildeo

consignadas no Plano Plurianual de Accedilatildeo (PPA)

a) A 1ordf linha chamada Programa Moradia Cidadatilde compreende a melhoria ou

construccedilatildeo da edificaccedilatildeo em que o ocupante possui o terreno desde que a

situaccedilatildeo fundiaacuteria e ambiental do terreno natildeo crie obstaacuteculos

b) A 2ordf linha eacute o Programa de Assentamento Humano de Interesse Social

O

programa prevecirc o reassentamento das famiacutelias que atualmente ocupam

habitaccedilotildees precaacuterias ou em situaccedilatildeo de risco em lote com infraestrutura

baacutesica em terrenos adquiridos e loteados pela Prefeitura

c) A 3ordf eacute o Programa de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria

que visa basicamente

oferecer a seguranccedila juriacutedica ao ocupante do imoacutevel O Programa de

Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria jaacute chegou agrave cerca de 10000 lotes registrados de

1989-2002 (Mauro Fecury I e II Coroadinho Vila Satildeo Luis e outros) Os

lotes satildeo oriundos de aacutereas concedidas pela Uniatildeo Federal e outras

264

desapropriadas pelo municiacutepio e destinados a pessoas de ateacute 03 salaacuterios

miacutenimos atraveacutes de um contrato particular de doaccedilatildeo feito pela Prefeitura

que permite a transferecircncia do lote jaacute registrado para o nome do beneficiaacuterio

Ele eacute isento de IPTU se o imoacutevel for avaliado em menos de R$ 1000000 e o

proprietaacuterio natildeo possuir outro imoacutevel

d) A 4ordf linha eacute o Programa de Saneamento Baacutesico e Urbanizaccedilatildeo de Favelas

Os recursos deste Programa como se destinam basicamente agrave infraestrutura

satildeo aplicados principalmente pela Secretaria de Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR)

Entre os incentivos governamentais com impacto na questatildeo habitacional destaca-se

o projeto implementado a partir de 2001 denominado Planejamento e Execuccedilatildeo

Participativos atraveacutes do qual os teacutecnicos do Governo do Estado e da Prefeitura de Satildeo Luis

juntamente com representantes das 14 regiotildees administrativas do municiacutepio discutem

soluccedilotildees para as principais necessidades da comunidade Neste processo demandas de

natureza urbano-habitacional ganharam o peso da prioridade popular sendo muitos deles

resolvidosatendidos

Vale destacar que segundo dados do Pemas no periacuteodo de 1996 a 1998 foram

aplicados pelo Setor Puacuteblico investimentos no valor de R$ 182852160 na produccedilatildeo de

habitaccedilotildees envolvendo a parceria do Municiacutepio com recursos do Estado e da Uniatildeo Esses

investimentos produziram 802 unidades habitacionais sendo 422 no padratildeo embriatildeo e 380

unidades habitacionais aleacutem de 250 lotes urbanizados Foram ainda aplicados recursos na

ordem de R$ 1638350 em melhorias habitacionais e materiais de construccedilatildeo tendo sido

beneficiadas 802 unidades As 380 unidades habitacionais foram produzidas em 1996 com

recursos do programa Proacute-MoradiaCEF e contrapartida municipal no Bairro Coroadinho Os

422 embriotildees foram construiacutedos em 1997 com recursos do Programa Habitar Brasil e

contrapartida fiacutesica do municiacutepio No ano de 2004 foi concluiacuteda a construccedilatildeo de 154 unidades

habitacionais do Residencial Governador Luiz Rocha no Bairro da Cidade Operaacuteria com

recursos do Programa PARCEF no valor de R$ 347220000

Embora a Prefeitura embora tenha realizado algumas accedilotildees na aacuterea habitacional a

partir da integraccedilatildeo de vaacuterias instituiccedilotildees municipais e mesmo fora de sua estrutura

organizacional essa natildeo eacute uma praacutetica sistecircmica e consolidada

De acordo com a estrutura administrativa atual da Prefeitura Municipal de Satildeo Luis

quatro oacutergatildeos da Administraccedilatildeo podem ser identificados como diretamente vinculados agrave

Poliacutetica de Desenvolvimento Urbano Instituto Municipal da Paisagem Urbana (IMPUR)

265

Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPLAN) Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMTUR) e Secretaria Municipal de Terras Habitaccedilatildeo Urbanismo e Fiscalizaccedilatildeo

Urbana (SEMTHURB)

Na realidade o Poder Municipal tem tido dificuldades em instituir um processo de

coordenaccedilatildeo permanente e melhor articulado entre os oacutergatildeos municipais em diversas aacutereas de

atuaccedilatildeo Essa situaccedilatildeo embora natildeo seja exclusiva de Satildeo Luiacutes reflete a maneira autarquizada

de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal (SEMTHURB 2007)

Essa situaccedilatildeo se agrava quando se trata da relaccedilatildeo Estado e Municiacutepio pois satildeo raras

as accedilotildees compartilhadas entre essas duas instacircncias de poderes A razatildeo eacute que essas vecircm

sendo conduzidas por grupos poliacuteticos distintos que buscam consolidar suas atuaccedilotildees na

regiatildeo

Cabe destacar que uma das principais linhas da poliacutetica habitacional da Prefeitura

tem sido a tentativa de promover a geraccedilatildeo de renda para os beneficiaacuterios Nesse sentido tem

havido um compartilhamento de accedilotildees para o desenvolvimento e implementaccedilatildeo do projeto

habitacional envolvendo diversos setores (SEMTHURB 2007)

Desse modo atuam em conjunto com a equipe de projetos o Setor de Serviccedilo Social

da SEMTHURB As instituiccedilotildees SESI e SENAC poderatildeo por meio de convecircnio atuar na

formaccedilatildeo de matildeo-de-obra para construccedilatildeo civil (pedreiros carpinteiros eletricistas etc) e

para outras atividades econocircmicas - corte costura panificaccedilatildeo informaacutetica etc O objetivo eacute

que a populaccedilatildeo envolvida com o projeto seja estimulada a encontrar meios de sobrevivecircncia

gerando renda por meio do recebimento de treinamento e da criaccedilatildeo de cooperativas

No caso da construccedilatildeo civil apoacutes o treinamento os pedreiros satildeo selecionados e os

aprovados satildeo utilizados na produccedilatildeo habitacional na aacuterea do projeto Os recursos satildeo

repassados pela Prefeitura agrave Cooperativa por meio de convecircnio para que ela administre a matildeo-

de-obra com os criteacuterios de acompanhamento fixados pela Prefeitura Apoacutes o teacutermino da

obra os melhores operaacuterios satildeo reaproveitados em outros projetos habitacionais da Prefeitura

(SEMTHURB 2007)81

A fala do teacutecnico da Secretaria (2010) ratifica essas accedilotildees quando narra que

Essas accedilotildees satildeo exemplos de que o Poder Municipal embora com todas as dificuldades de recursos estrutura e da enorme dimensatildeo do problema habitacional no municiacutepio vem se dedicando a encontrar alternativas para o

81 Em Canudos Terra Livre por meio de projeto financiado pelo programa Proacute-Moradia pretendeu-se ampliar essas experiecircncias realizando-se cursos de formaccedilatildeo de matildeo-de-obra em especial na aacuterea de construccedilatildeo civil para capacitar a populaccedilatildeo local a participar da execuccedilatildeo das obras

266

enfrentamento de uma demanda habitacional tatildeo complexa e diversificada Certamente satildeo iniciativas ainda embrionaacuterias que necessitam de um tempo de maturaccedilatildeo para serem avaliadas e reproduzidas em escala maior Poreacutem os resultados satildeo animadores e mostram novas possibilidades de accedilatildeo nessa aacuterea

De acordo com dados do Diagnoacutestico as caracteriacutesticas das unidades habitacionais

produzidas ou financiadas pelo Municiacutepio satildeo

a) As 380 unidades habitacionais produzidas pelo programa Proacute-MoradiaACEF

de 1996 no Bairro Coroadinho constituiacuteram-se de uma edificaccedilatildeo de 4000

msup2 de aacuterea construiacuteda com custo meacutedio por metragem quadrada de R$ 67

50 alcanccedilando o valor de R$ 270000 por unidade habitacional (valores da

eacutepoca e referentes apenas a material) A Secretaria Municipal de Serviccedilos

Urbanos (SEMSUR) foi a executora do projeto adotando o sistema de

autoconstruccedilatildeo

b) As 422 unidades habitacionais de embriatildeo produzidas no Programa Habitar

Brasil 1997 constituiacuteram-se basicamente de um nuacutecleo de 2400 msup2 sem

revestimento composto por dois cocircmodos de permanecircncia

quarto e sala

uma cozinha e um banheiro O custo de construccedilatildeo alcanccedilou o valor de R$

190171 por unidade habitacional a preccedilo meacutedio de R$ 79 2400 o metro

quadrado (valores da eacutepoca) As primeiras unidades foram concluiacutedas em

1999 A contrapartida da Prefeitura foi realizada por meio do apoio teacutecnico e

logiacutestico e remuneraccedilatildeo de parte da matildeo-de-obra

No diagnoacutestico tambeacutem se verificou dados sobre o mercado imobiliaacuterio com

destaque para a construccedilatildeo de moradia no padratildeo popular que apresentam o custo unitaacuterio

meacutedio de R$ 19800 por metro quadrado de construccedilatildeo em uma aacuterea de moradia meacutedia com

5000msup2 em lotes com aacuterea meacutedia de 15000msup282 A relaccedilatildeo entre o preccedilo unitaacuterio meacutedio do

lote em loteamento regularizado na periferia urbana e o da gleba bruta chega a 5 vezes

conforme levantamento realizado pela UEM com base nos preccedilos praticados pelo mercado

82 O preccedilo meacutedio da moradia tiacutepica no Municiacutepio quando em loteamento ou aacuterea regularizada alcanccedila o valor de R$ 2500000 e R$ 1500000 quando situada em loteamentos irregulares ou clandestinos natildeo havendo diferenccedila de valor nesse caso O preccedilo meacutedio do lote popular em torno de R$ 3000m2 quando em loteamento ou aacuterea regularizada se altera para R$ 1300m2 quando localizado em loteamento irregular Quanto ao comprometimento da renda familiar com aluguel conforme informaccedilatildeo levantada pela equipe da UEM a situaccedilatildeo eacute criacutetica para a populaccedilatildeo de um modo geral repercutindo mais nas famiacutelias com renda de ateacute 3 salaacuterios miacutenimos Estas chegam a comprometer cerca de 30 de sua renda com aluguel mesmo patamar de comprometimento observado no caso das famiacutelias com rendimento de 3 a 5 salaacuterios miacutenimos (SEMTHURB 2010)

267

local demonstrando a dificuldade da populaccedilatildeo de baixa renda em adquirir uma moradia

regular

Logo eacute importante enfatizar que a experiecircncia entretanto mostrou a baixa eficiecircncia

dos programas pontuais A existecircncia de um Conselho a constituiccedilatildeo do Fundo e uma Poliacutetica

habitacional de caraacuteter participativo poderatildeo garantir seguranccedila de que os recursos destinados

aacute aacuterea de habitaccedilatildeo teratildeo a sua utilizaccedilatildeo comprometida com os objetivos aos quais se

destinam ampliando as condiccedilotildees de tornar articuladas as accedilotildees

Cabe ressaltar que natildeo existem em vigor instrumentos juriacutedicos para a

institucionalizaccedilatildeo e implementaccedilatildeo de uma Poliacutetica Habitacional do Municiacutepio de Satildeo Luiacutes

O projeto de Lei de criaccedilatildeo do Fundo e do Conselho Municipal de Habitaccedilatildeo foi enviado agrave

Cacircmara Municipal em 2004 mas ainda natildeo foi implementado

Os instrumentos urbaniacutesticos tais como Plano Diretor Lei de Zoneamento

Parcelamento Uso e Ocupaccedilatildeo do Solo Lei das Operaccedilotildees Urbanas e Lei de Zonas Interesse

Social (ZIS) foram concebidos e aprovados precedidos de amplo debate envolvendo diversos

segmentos da sociedade local

Agrave eacutepoca o conjunto da legislaccedilatildeo representou avanccedilos conceituais e metodoloacutegicos incorporou novos instrumentos de planejamento e gestatildeo e positivamente apontou diretrizes de soluccedilatildeo urbano-espacial e de enfrentamento agrave irregularidade habitacional Todavia a implementaccedilatildeo efetiva dos instrumentos existentes ainda eacute insatisfatoacuterio do ponto de vista da capacidade de facilitar o funcionamento do mercado habitacional na cidade (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2009)

Concorre para essa situaccedilatildeo de um lado a geografia do Municiacutepio suas condiccedilotildees

ambientais a situaccedilatildeo de terrenos da Uniatildeo

marinha e acrescidos especialmente no

segmento constituiacutedo por famiacutelias de baixa renda respeitando-se os padrotildees culturais soacutecio-

econocircmicos da populaccedilatildeo e tendo em vista os princiacutepios de racionalidade no processo de

ocupaccedilatildeo do solo e construccedilatildeo do espaccedilo a cultura urbaniacutestica de ocupaccedilatildeo do solo De outro

lado o estado de pobreza de grande parte da populaccedilatildeo que vem ocupando

desordenadamente o espaccedilo urbano menos valorizado e o que lhe eacute disponibilizado aleacutem do

acelerado e dinacircmico processo de urbanizaccedilatildeo de Satildeo Luiacutes (SEMTHURB 2007)

Todo esse quadro se associa agrave complexidade de aplicaccedilatildeo da maioria das leis que

em face agrave dinacircmica do crescimento desordenado afastam-se do seu caraacuteter regulamentador

passando a servir tatildeo somente em seus aspectos reparadores Ademais acrescente-se a

268

fragilidade teacutecnico-operacional da Prefeitura Municipal particularmente do seu setor de

fiscalizaccedilatildeo que se ressente de uma melhor estrutura e corpo teacutecnico (SEMTHURB 2007)

Atualmente haacute uma carecircncia no controle de obras e o sistema de informaccedilatildeo se interligado e retroalimentado corretamente poderia facilitar o acesso a essa informaccedilatildeo As informaccedilotildees advindas do geoprocessamento contribuiriam imensamente para um acompanhamento mais efetivo de obras novas que inclusive geram recursos para o municiacutepio atraveacutes do pagamento de tributos (Entrevista concedida por um teacutecnico da SEMTHURB 2010)

Nota-se portanto que haacute necessidade de uma qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo

urbana uma tecnologia que emita informaccedilatildeo precisa sobre o crescimento da cidade sobre as

suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar a cidade de modo preventivo com

planejamento de accedilotildees que acompanhem o seu desenvolvimento

Assim para se ter uma gestatildeo qualificada faz-se necessaacuterio primeiramente a

qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa bem como o seu redimensionamento na

medida em que o trabalho com Programas e Projetos Especiais requer essas exigecircncias

Aliado a essa primeira exigecircncia dispor de ferramentas adequadas para o gerenciamento da

cidade atraveacutes do geoprocessamento

No que tange ao processo de fortalecimento da gestatildeo do planejamento urbano

municipal cabe destacar a implementaccedilatildeo do Orccedilamento Participativo a partir de 1998 e

vem se consolidando como importante instrumento de participaccedilatildeo direta dos muniacutecipes

(SEMTHURB 2007)

Outro aspecto a destacar foi o iniacutecio do processo de discussatildeo do Plano Estrateacutegico

da Cidade de Satildeo Luiacutes ao final de 2001 com a mobilizaccedilatildeo de oacutergatildeos puacuteblicos e entidades

representativas da sociedade Em 2002 apoacutes jornadas temaacuteticas foi realizada a Conferecircncia

da Cidade onde foi elaborado o documento estabelecendo as diretrizes princiacutepios linhas

estrateacutegicas metas

a Carta da Cidade Em 2003 foram realizados os estudos teacutecnicos as

propostas de accedilatildeo e elaboraccedilatildeo dos projetos identificados como prioritaacuterios O IPLAM

assumiu a secretaria executiva desse processo (SEMTHURB 2007)83

Dessa maneira o municiacutepio tem o papel de gerar a melhor qualidade de vida para sua

populaccedilatildeo o que eacute difiacutecil complexo pois natildeo eacute apenas fazendo urbanizaccedilatildeo e construindo

casas que se eleva a qualidade de vida ao lado disso eacute preciso haver programas de todas as

esferas de governo para que se tenha geraccedilatildeo de renda Os nuacutecleos de ocupaccedilatildeo indevida

83 Segundo o Diagnoacutestico inicialmente foram estabelecidos trecircs temas baacutesicos para discussatildeo Gestatildeo Democraacutetica Desenvolvimento Sustentaacutevel e Desenvolvimento Urbano e Meio ambiente

269

passam geralmente a ser locais que abrigam uma populaccedilatildeo sem renda o que acarreta em

uacuteltima instacircncia um local de constante violecircncia

Quanto agraves poliacuteticas e aos programas habitacionais a necessidade mais urgente eacute o

conhecimento das populaccedilotildees que hoje jaacute residem em subnormalidade Para conhecimento

dessas habitaccedilotildees e dos nuacutecleos que surgem a cada momento Satildeo Luiacutes assim como a maioria

das cidades principalmente as capitais que estatildeo em franco desenvolvimento vem sofrendo

um crescimento pautado na inexistecircncia de mecanismos de controle sobre as aacutereas de

ocupaccedilatildeo indevida principalmente aacutereas de proteccedilatildeo ambiental aacutereas de mananciais aacutereas de

encostas de rios e aacutereas baixas por exemplo Sobre as aacutereas baixas que satildeo terras da Uniatildeo o

municiacutepio natildeo tem controle absoluto o que dificulta sobremaneira a gestatildeo municipal

Programa de Prevenccedilatildeo Contenccedilatildeo e Controle de Ocupaccedilotildees Irregulares (SEMTHURB

2007) Portanto o cadastramento das ocupaccedilotildees indevidas aliado a programas estaduais

federais e municipais poderaacute garantir melhores condiccedilotildees de vida aos habitantes que hoje

vivem em condiccedilotildees bastante desfavoraacuteveis

Uma das medidas poderia ser a produccedilatildeo de lotes urbanizados que no entanto para

ser viaacutevel poderia ter seus custos minimizados discutindo-se as normativas do governo que

muitas vezes natildeo conseguem ser cumpridas pelos municiacutepios devido ao alto grau de

exigecircncia (SEMTHURB 2007)

A exemplo desse toacutepico algumas qualificaccedilotildees dos programas puacuteblicos por serem

elaborados com regras gerais deixa de observar as caracteriacutesticas particulares de cada

municiacutepio impedindo a sua participaccedilatildeo em programas e projetos conforme a fala do

entrevistado

A contrapartida do municiacutepio em aquisiccedilatildeo de lotes se torna extremamente onerosa pois eacute necessaacuterio que esses sejam adquiridos de empresas particulares pois natildeo se tem acesso agraves terras puacuteblicas na medida em que elas se tornam inviaacuteveis a serem usadas nesses programas Como consequumlecircncia do alto custo da aquisiccedilatildeo de lotes os recursos que restam nem sempre satildeo suficientes para o investimento na infraestrutura ou na produccedilatildeo de mais unidades habitacionais Por outro lado as terras que satildeo adquiridas encontram-se quase sempre afastadas do nuacutecleo urbano o que requer a implantaccedilatildeo de infraestrutura que dote o local de acesso e de qualificaccedilatildeo necessaacuterios para seu funcionamento Se pudeacutessemos usar terras de nuacutecleos urbanos poderiacuteamos tambeacutem utilizar a infraestrutura do local integrando as novas habitaccedilotildees a um nuacutecleo urbano jaacute existente preencher os vazios urbanos de forma organizada e ordenada escolhendo locais apropriados facilitaria sobremaneira a gestatildeo da cidade (Entrevista concedida pelo teacutecnico da SEMTHURB 2010)

270

De acordo com os dados levantados na pesquisa uma das grandes dificuldades do

municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra Satildeo Luiacutes por ser uma ilha tem suas terras

como patrimocircnio da Uniatildeo o que dificulta a aplicaccedilatildeo dos programas governamentais Uma

das primeiras exigecircncias por exemplo eacute a titulaccedilatildeo da terra o que eacute praticamente impossiacutevel

de se fazer em aacutereas da Uniatildeo impossibilitando de repassar a titularidade da terra aos

ocupantes muitas vezes exigecircncia do programa puacuteblico (Entrevista concedida pelo teacutecnico

da SEMTHURB 2009)

Pode-se entatildeo concluir que Satildeo Luiacutes apresenta caracteriacutesticas similares em relaccedilatildeo a

Beleacutem no que diz respeito aos modelos de gestatildeo implementados uma vez que esse modelo

demonstra a baixa efetividade da poliacutetica habitacional e que boa parte das accedilotildees no acircmbito

habitacional foram realizadas pelos governos estaduais (COHABs) capital imobiliaacuterio e

incorporadoras acarretando no aumento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees que retratam

o papel do Estado como ator decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da segregaccedilatildeo

espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do capital

imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrentaram a problemaacutetica da moradia popular

As intervenccedilotildees na aacuterea de moradia ficaram restritas agraves accedilotildees pontuais de concessatildeo

de tiacutetulos de aforamento uso e posse de terrenos inovando-se nas iniciativas de

desapropriaccedilatildeo para reassentamento embora se mantivesse o sistema de remoccedilatildeo de famiacutelias

de aacutereas de risco

Nesse sentido a habitaccedilatildeo passa a ser vista como um investimento complementar

necessaacuterio as condiccedilotildees de produccedilatildeo ao mesmo tempo em que eacute parte das condiccedilotildees de

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho

Para Castells (1893) e Lojkine (1981) o investimento do setor privado na produccedilatildeo

das condiccedilotildees gerais de produccedilatildeo das quais a moradia eacute parte soacute eacute produtivo ateacute certo limite

a partir do qual torna-se desinteressante economicamente falando Eacute nesse momento que o

Estado eacute conclamado a intervir tendo em vista liberar as empresas desse ocircnus a criar as

condiccedilotildees para o processo de produccedilatildeo e acumulaccedilatildeo A produccedilatildeo da moradia como visto

apresenta caracteriacutesticas especiacuteficas Resulta da articulaccedilatildeo de trecircs fatores uso privado do

solo materiais e a construccedilatildeo propriamente dita

O montante de capital exigido para o investimento e o tempo em que ele permanece

sem retorno (imobilizado no processo de construccedilatildeo) provoca a necessidade de uma taxa

maior de lucro o que determina o aumento do preccedilo das moradias ao mesmo tempo em que

desestimula o investimento privado no setor O caraacuteter socialmente necessaacuterio da habitaccedilatildeo

271

tem efeitos sobre a circulaccedilatildeo da mercadoria e a estrutura do seu processo de produccedilatildeo Para

tornaacute-los mais aacutegil nele intervecircm dois tipos de capital o produtivo (construccedilatildeo) e o de

circulaccedilatildeo (imobiliaacuterio) que podem ou natildeo ser compatiacuteveis dependendo do modo de

produccedilatildeo Para que o capital produtivo aumente sua rentabilidade eacute preciso que o capital de

circulaccedilatildeo ou a renda da terra diminua a sua Se a rentabilidade do capital de circulaccedilatildeo cai

diminui o investimento no setor e surge a crise (TOPALOV 1974)

De acordo com Spoacutesito (2004) a moradia apresenta algumas caracteriacutesticas

peculiares que a diferenciam de outras necessidades humanas Primeiramente ela eacute uma

mercadoria e por isso segue as leis de mercado Seu preccedilo eacute regido por estas leis variando de

acordo com alguns aspectos como a localizaccedilatildeo e os equipamentos coletivos disponiacuteveis nas

proximidades

E continua afirmando que a habitaccedilatildeo eacute uma mercadoria relevante porque eacute de

consumo privado

assim como roupa sapato e alimentos aleacutem de ser dispendiosa porque seu

preccedilo eacute muito mais alto que grande parte dos salaacuterios e por isso eacute uma mercadoria

comumente financiada Sua produccedilatildeo eacute lenta porque depende de um bem natural que natildeo

pode ser reproduzido a terra A cada nova moradia exige-se um novo pedaccedilo do espaccedilo

urbano (SPOacuteSITO 2004 p 37)

O solo urbano eacute uma mercadoria sui generis porque natildeo eacute fruto do trabalho e

somente este pode agregar valor a uma mercadoria Entatildeo o valor dado agrave terra natildeo resulta da

forccedila de trabalho mas sim da capacidade de pagar de seus compradores que natildeo eacute igual para

todos os indiviacuteduos As camadas meacutedia e alta podem pagar mais e consequumlentemente se

apropriam de fragmentos urbanos privilegiados (TOPALOV 1974)

Assim as dificuldades geradas no processo de produccedilatildeo soacute poderatildeo ser resolvidas

caso a rentabilidade do setor imobiliaacuterio estimule o investimento Haacute entretanto aqui

tambeacutem outra contradiccedilatildeo jaacute mencionada entre o valor dos salaacuterios e o preccedilo da mercadoria

habitaccedilatildeo o que cria um limite aacute solvabilidade da demanda

Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo do Estado no setor sem a qual a construccedilatildeo da

habitaccedilatildeo social natildeo acontece Essa tem se dado historicamente de vaacuterios modos desde a

existecircncia de uma legislaccedilatildeo regulamentando o uso do solo e o preccedilo de alugueacuteis definindo

espaccedilos e condiccedilotildees especiais que favoreccedilam o acesso da classe trabalhadora agrave moradia ateacute

da construccedilatildeo civil por vezes o construtor eacute o proacuteprio Estado (SPOacuteSITO 2004)

Correcirca (1993 p 29) chama atenccedilatildeo para a precarizaccedilatildeo da questatildeo habitacional

272

No capitalismo as diferenccedilas satildeo muito grandes e maiores ainda em paiacuteses como entre outros os da Ameacuterica Latina A habitaccedilatildeo eacute um desses bens cujo acesso eacute seletivo parcela enorme da populaccedilatildeo natildeo tem acesso quer dizer natildeo possui renda para pagar o aluguel de uma habitaccedilatildeo decente e muito menos comprar um imoacutevel Este eacute um dos mais significativos sintomas de exclusatildeo

Dentre as poliacuteticas concebidas pelo Estado a poliacutetica urbana merece atenccedilatildeo distinta

haja vista que a intervenccedilatildeo estatal no espaccedilo urbano eacute considerada a configuraccedilatildeo mais

elaborada mais desenvolvida da resposta capitalista agrave necessidade de socializaccedilatildeo das forccedilas

produtivas (LOJKINE 1981 p 168) Assim o Estado capitalista aparece na forma de

controlar e atenuar as sequumlelas ocasionadas pela segregaccedilatildeo soacutecioespacial imposta por

muitas determinaccedilotildees isto eacute unidade do diverso (MARX 1983 p 14) da produccedilatildeo e

reproduccedilatildeo do modo capitalista

Nota-se que a Poliacutetica Municipal de Habitaccedilatildeo natildeo daacute conta de atender a demanda

populacional das aacutereas atingidas por projetos de intervenccedilatildeo urbaniacutestica visto que os recursos

satildeo limitados e podem ser utilizadas com moderaccedilatildeo no atendimento (exclusivo) agraves famiacutelias

diretamente atingidas pelas obras estabelecendo criteacuterios de acesso que limitam o nuacutemero de

moradores que receberatildeo a unidade habitacional conforme foi apresentado nos capiacutetulos

anteriores

Outro elemento importante a ser discutido em relaccedilatildeo agraves cidades de Beleacutem e de Satildeo

Luiacutes diz respeito ao padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial Percebe-se que na cidade capitalista

o acesso ao espaccedilo urbano eacute restrito e desigual para as diferentes classes sociais que nela se

encontram e que esse acesso desigual fruto da desigualdade social acaba por gerar uma (des)

articulaccedilatildeo espacial e social que por sua vez passa a gerar uma disputa tambeacutem desigual

como aponta Villaccedila (2001 p 148) [] a segregaccedilatildeo deriva de uma luta ou disputa por

localizaccedilatildeo esta se daacute no entanto entre grupos sociais ou entre classes [] A dimensatildeo da

luta aparece quando se introduz a segregaccedilatildeo por classe

De acordo com Villaccedila (2001 p 148) o resultado dessa disputa que articula e

desarticula ao mesmo tempo o espaccedilo urbano gera um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

que cada vez mais procura separardistanciar ricos e pobres e que [] a segregaccedilatildeo seria um

processo dialeacutetico em que a segregaccedilatildeo de uns provoca ao mesmo tempo e pelo mesmo

processo a segregaccedilatildeo de outros O que ele chama de segregaccedilatildeo voluntaacuteria dos mais ricos

que provoca necessariamente a segregaccedilatildeo involuntaacuteria das classes de menor renda

273

Correcirca (1989) descreve trecircs padrotildees de segregaccedilatildeo urbana tais como modelos de

Kohl de Burgess e de Hoyt84 O modelo de Kohl expressa a cidade preacute-industrial marcada

pela segregaccedilatildeo da elite agraves proximidades do centro ficando as camadas de menor poder

aquisitivo na periferia sendo um tipo de organizaccedilatildeo espacial que expressa o interesse da

elite em se localizar proacutexima agraves principais instituiccedilotildees urbanas predominando a

acessibilidade agraves fontes de poder e prestiacutegio (TRINDADE JUNIOR 1998 p 143)

Segundo Trindade Junior (1998 p 143) o modelo de Burgess eacute um tipo de

organizaccedilatildeo espacial e de segregaccedilatildeo no qual os podres passam a habitar os centros

deteriorados e desvalorizados enquanto a elite habita os subuacuterbios apraziacuteveis em virtude do

processo de dispersatildeo de determinadas atividades Jaacute o modelo de Hoyt define um tipo de

segregaccedilatildeo espacial setorizada a partir do centro no qual as aacutereas residenciais de mais alto

padratildeo tenderiam a se localizar nos setores de amenidades e estariam cercadas pelos setores

meacutedios diametralmente opostos encontrar-se-ia um setor mais amplo no qual estaria

localizada a populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo

Dessa forma ressalta-se que em Beleacutem o padratildeo de segregaccedilatildeo que mais se

assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual se percebe

que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas proacuteximas ao

centro

Trindade Junior (1998) argumenta que no momento em que se processa a dispersatildeo

dos assentamentos e da ampliaccedilatildeo do urbano esses locais satildeo valorizados em detrimento dos

novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo dos mesmos pelos agentes que

podem pagar para usufruir da acessibilidade Esses locais passam entatildeo a sofrer

investimentos do capital imobiliaacuterio e incorporador aleacutem disso o Estado atua nessas aacutereas

com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais valorizadas

pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

De acordo com O Neill (1986 apud TRINDADE JUNIOR 1998 p 152) a auto-

segregaccedilatildeo se daacute a partir

[] de modo geral no acircmbito dos grupos sociais dominantes Contudo outros grupos como os assalariados de alto rendimento tecircm se deslocado para aacutereas especificas das cidades criando nelas condiccedilotildees de auto-segregaccedilatildeo Por se constituiacuterem tambeacutem em parte do setor de demanda solvaacutevel do mercado habitacional atraem para si a accedilatildeo dos agentes modeladores Mas esta accedilatildeo soacute eacute possiacutevel na medida em que estes grupos

84 Embora esse tipo de anaacutelise tenha sido superado eacute importante destacar pela descriccedilatildeo da organizaccedilatildeo espacial urbana

274

estatildeo propensos a aceitar os mecanismos criados para moldar suas preferecircncias habitacionais Os novos valores de consumo habitacional permitem a reproduccedilatildeo dos grupos de renda mais alta num ambiente criado especialmente para eles ao mesmo tempo que esta reproduccedilatildeo se constitui em uma garantia para a continuidade da sociedade capitalista dado o niacutevel de renda que estes grupos possuem criando condiccedilotildees de consumo e tendo em vista a reproduccedilatildeo dos quadros profissionais necessaacuterios agrave sociedade Em oposiccedilatildeo a segregaccedilatildeo imposta daacute origem agraves aacutereas residenciais dos grupos de renda mais baixa A formaccedilatildeo destas aacutereas se faz tambeacutem a partir da decomposiccedilatildeo e recomposiccedilatildeo do espaccedilo urbano em direccedilatildeo principalmente agraves aacutereas perifeacutericas preteridas pelos grupos de renda mais alta e agentes que atuam neste modelo Muitas vezes os grupos sem opccedilatildeo de participaccedilatildeo no mercado habitacional utilizam-se de mecanismos espontacircneos para obterem suas moradias Tais mecanismos imprimem a estas aacutereas um ar de informalidade aparente mas na verdade tambeacutem aiacute o uso do solo vem sendo manipulado pelos agentes modeladores do solo

Desse modo a cidade vai ser dividida entre o espaccedilo dos que possuem maior poder

aquisitivo espaccedilo seletivo frequumlentado por aqueles que tecircm altos niacuteveis de renda ou seja os

espaccedilos da auto-segregaccedilatildeo e os espaccedilos dos que possuem menor poder aquisitivo

reduzidos visto que se em sua maioria natildeo tecircm nem condiccedilotildees de possuir uma habitaccedilatildeo que

seja adequada com infraestrutura baacutesica saneamento entre outros

Para Correcirca (1993 p 64) a classe dominante ou algumas de suas fraccedilotildees contribuem

para a segregaccedilatildeo pois

Sua atuaccedilatildeo se faz de um lado atraveacutes da auto-segregaccedilatildeo na medida em que ela pode efetivamente selecionar para si as melhores aacutereas excluindo-as do restante da populaccedilatildeo iraacute habitar onde desejar [] por outro lado segrega os outros grupos sociais na medida em que controla o mercado de terras a incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria e a construccedilatildeo direcionando seletivamente a localizaccedilatildeo dos demais grupos sociais no espaccedilo urbano Indiretamente atua atraveacutes do Estado

Como as poliacuteticas de implantaccedilatildeo e lanccedilamento dos conjuntos habitacionais e dos

loteamentos populares - regulares ou natildeo - satildeo marcadas pelo afastamento espacial e

precariedade das condiccedilotildees de vida urbana os pobres satildeo obrigados a conviver nas aacutereas

mais distantes ficando refeacutens dos territoacuterios em que habitam daiacute a ideacuteia de segregaccedilatildeo

induzida (SPOacuteSITO 2004)

As atuais configuraccedilotildees espaciais e sociais na cidade de Satildeo Luiacutes demonstram um

momento de forte diferenciaccedilatildeo com a verticalizaccedilatildeo e a expansatildeo urbana horizontal

inerentes agraves grandes capitais brasileiras aleacutem da existecircncia de rupturas entre os vaacuterios grupos

sociais organizaccedilotildees e territoacuterios urbanos evidenciando os processos de segregaccedilatildeo

soacutecioespacial na proliferaccedilatildeo dos novos estilos de morar e de (con)viver no espaccedilo urbano

275

Cabe dizer que esse novo estilo de morar viver e conviver tem se propagado entre a

classe de maior poder aquisitivo acarretando em uma clara distinccedilatildeo entre as classes uma vez

que a classe de padratildeo mais elevado habita aacutereas diferentes das classes meacutedias por exemplo

Em Beleacutem a opccedilatildeo por moradias em condomiacutenios de meacutedio e de alto padratildeo

projetados vertical ou horizontalmente nos eixos Entroncamento-Icoaraci pela Rodovia

Augusto Montenegro e Beleacutem-Ananindeua pela Rodovia BR-316 tem se constituiacutedo em um

dos elementos marcantes da segregaccedilatildeo soacutecioespacial na cidade uma que vez satildeo

incentivados pelos promotores imobiliaacuterios os quais dotam as aacutereas de uma infraestrutura

interna de serviccedilos e lazer (salotildees de festas academias de ginaacutestica lojas supermercados

entre outros) e vendem mais que uma moradia vendem a seguranccedila o conforto e a paisagem

usando-se como justificativa para a consolidaccedilatildeo desses novos habitats urbanos o alto iacutendice

de violecircncia urbana Esses condomiacutenios fechados de enclaves fortificados conferem tambeacutem

um status A construccedilatildeo de siacutembolos de status eacute um processo que elabora diferenccedilas sociais e

cria meios para a afirmaccedilatildeo de distacircncia e desigualdade sociais

Assim verifica-se a consolidaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo urbana convivendo dentro de

um mesmo espaccedilo (a cidade) com processos de segregaccedilatildeo induzida que empurra a camada

de menor poder aquisitivo para as aacutereas sem infraestrutura saneamento equipamentos

urbanos etc Essas novas configuraccedilotildees se datildeo como fruto das praacuteticas accedilotildees e estrateacutegias

dos diversos agentes produtores do espaccedilo urbano geradoras de uma estruturaccedilatildeo urbana

descontiacutenua e segregadora

Para Spoacutesito (2004) a segregaccedilatildeo urbana pode ser vista e entendida como um

processo estrutural ou seja os principais fatores que geram a auto-segregaccedilatildeo e a segregaccedilatildeo

induzida encontram-se na proacutepria sociedade no modo como a sociedade encontra-se

organizada e funciona no estilo de vida e na cultura dominante

Na cidade de Satildeo Luiacutes um significativo processo de verticalizaccedilatildeo pode ser visto na

chamada Cidade Nova onde haacute uma concentraccedilatildeo de escritoacuterios shoppings condomiacutenios

verticais de padratildeo meacutedio e alto e restaurantes situados na orla aleacutem disso a inserccedilatildeo da

cidade no roteiro turiacutestico regional e nacional levou a um massivo investimento na rede

hoteleira Estes fatos acarretaram na transformaccedilatildeo da cidade intensificando a economia e

modernizando seu espaccedilo urbano

Entretanto os condomiacutenios e serviccedilos ofertados aos grupos de maior poder aquisitivo

levam a uma segregaccedilatildeo urbana crescente uma vez que a populaccedilatildeo de menor poder

aquisitivo natildeo recebe as benesses da modernizaccedilatildeo da cidade

276

Nesse sentido pode-se dizer que a produccedilatildeo do espaccedilo urbano no norte da cidade de

Satildeo Luiacutes eacute resultante de uma maior homogeneizaccedilatildeo desse espaccedilo uma vez que se verifica a

tendecircncia da separaccedilatildeo da auto-segregaccedilatildeo por meio do emuralhamento das classes com alto

padratildeo aquisitivo

De acordo com Costa (2009) um elemento que deve ser destacado quando se analisa

a produccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia em Satildeo Luiacutes eacute o sistema poliacutetico oligaacuterquico

estadual que se traduz como patrimonialista e clientelista uma vez que essa produccedilatildeo serve

para atender aos interesses de indiviacuteduos que estatildeo no poder os quais exercem a funccedilatildeo de

empresaacuterios e que deteacutem o controle de serviccedilos

A produccedilatildeo de riquezas pelos grupos dominantes se daacute a partir da construccedilatildeo de patrimocircnios (casas apartamentos fazendas) compra de carros do ano e da moda se constituem empresaacuterios bem sucedidos do comeacutercio de postos de gasolina hospitais escolas hoteacuteis concessionaacuterias Corrupccedilatildeo sistecircmica que produz e reproduz a miseacuteria social e que encontra em Satildeo Luiacutes seu espelho invertido pois alimentou o boom imobiliaacuterio dos condomiacutenios e apartamentos de luxo destinados em vaacuterios casos agrave lavagem de dinheiro (segundo as investigaccedilotildees da PF) Contrapondo nu

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277

urbano que natildeo giram especificamente em torno da produccedilatildeo econocircmica mas do consumo

O interesse se daacute a partir da apropriaccedilatildeo diferenciada do produto do trabalho que satildeo as

vantagens locacionais Isso ocorre porque o espaccedilo urbano eacute heterogecircneo Se as pessoas

estivessem uniformemente distribuiacutedas na cidade os diversos espaccedilos de consumo tenderiam

a satisfazer agrave grande maioria das pessoas (VILLACcedilA 2001 p 97)

A distinccedilatildeo mais importante entre espaccedilo intra-urbano e espaccedilo regional deriva dos transportes e das comunicaccedilotildees Quer no espaccedilo intra-urbano quer no regional o deslocamento de mateacuteria e do ser humano tem um poder estruturador bem maior do que o deslocamento da energia ou das informaccedilotildees A estruturaccedilatildeo do espaccedilo regional eacute dominada pelo deslocamento das informaccedilotildees da energia do capital constante e das mercadorias em geral

eventualmente ateacute da mercadoria forccedila de trabalho O espaccedilo intra-urbano ao contraacuterio eacute estruturado fundamentalmente pelas condiccedilotildees de deslocamento do ser humano seja enquanto portador da mercadoria forccedila de trabalho

como no deslocamento casatrabalho - seja enquanto consumidor

reproduccedilatildeo da forccedila de trabalho deslocamento casas-compra casa lazer escola etc Exatamente daiacute vem por exemplo o enorme poder estruturador intra-urbano das aacutereas comerciais e de serviccedilos a comeccedilar pelo proacuteprio centro urbano Tais aacutereas mesmo nas cidades industriais satildeo as que geram e atraem a maior quantidade de deslocamentos (viagens) pois acumulam os deslocamentos de forccedila de trabalho

os que ali trabalham

com os consumidores

os que ali fazem compras e vatildeo aos serviccedilos (VILLACcedilA 2001 p 20)

A argumentaccedilatildeo de Villaccedila (2001 p 38) para se compreender a dinacircmica intra-

urbana parte do conceito de terra-localizaccedilatildeo as quais satildeo fraccedilotildees da terra urbana (terra-

capital) que desfrutam de determinados graus de acessibilidade e de trabalho acumulado

Assim o preccedilo da terra-localizaccedilatildeo tem um componente essencial que eacute o preccedilo

monopoacutelio

Todo proprietaacuterio de uma terra-localizaccedilatildeo no acircmbito do espaccedilo urbano eacute proprietaacuterio de um bem uacutenico irreproduziacutevel Considerando que nem todos os proprietaacuterios possuem as mesmas vantagens quanto as suas propriedades Embora toda localizaccedilatildeo seja uacutenica haacute entre elas vaacuterios graus de acessibilidades e de trabalho acumulado Na maioria das vezes os proprietaacuterios de lotes perifeacutericos natildeo desfrutam de vantagens no tocante a esses atributos (VILLACcedilA 2001 p 39)

De acordo com Trindade Junior (1998) a dispersatildeo dos assentamentos a expansatildeo

do ambiente construiacutedo e o trabalho social acumulado tendem cada vez mais a elevar os

preccedilos dos imoacuteveis em setores ou regiotildees especificas que por sua vez poderatildeo ser

apropriados e concentrados por um grupo privilegiado de agentes Para tanto ele destaca o

278

capital incorporador como elemento importante dessa tendecircncia uma vez que as empresas

imobiliaacuterias garantem a promoccedilatildeo de moradias com retornos expressivos pelos investimentos

realizados nos espaccedilos urbanos

Dessa forma o mercado imobiliaacuterio exerce sua influecircncia nos processos de

segregaccedilatildeo soacutecioespacial e exclusatildeo social a partir da construccedilatildeo de cenaacuterios e necessidades

imaginaacuterios vendidos para uma parcela da populaccedilatildeo em busca de status por meio de

grandes campanhas de marketing como por exemplo a venda de lotesterrenos a altos preccedilos

em condomiacutenios ou loteamentos fechados

Maricato (2000 p159) afirma que a escassez de moradias e a segregaccedilatildeo territorial

satildeo produtos de um mercado imobiliaacuterio que entre outras coisas vende o cenaacuterio e a

paisagem como signos de distinccedilatildeo de renda e de poder acirrando os processos excludentes e

segregativos no interior dos espaccedilos urbanos brasileiros Para Spoacutesito (2004 p79) os

interesses fundiaacuterios e imobiliaacuterios desempenham um papel primaz no processo de produccedilatildeo e

estruturaccedilatildeo do espaccedilo urbano

Tal posiccedilatildeo do capital de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria decorre das particularidades da relaccedilatildeo entre a habitaccedilatildeo e o espaccedilo urbano Primeiro porque o caraacuteter imoacutevel do produto faz com que a reproduccedilatildeo do capital tenha como pressuposto a sua permanente mobilidade espacial A cada novo ciclo um terreno eacute necessaacuterio Segundo porque a potencialidade construtiva da terra natildeo se resume a seus atributos de meio de produccedilatildeo e suporte fiacutesico mas tambeacutem como meio de consumo para isso necessita estaacute em conexatildeo com uma complexidade de bens e serviccedilos urbanos que dependem de processos econocircmicos poliacuteticos e simboacutelicos Essa dinacircmica pressupotildee uma loacutegica de expropriaccedilatildeo natildeo podendo existir fronteira urbano-imobiliaacuteria sem essa loacutegica E o setor imobiliaacuterio eacute estrateacutegico nesse sentido (TRINDADE JUNIOR 1998 p 157)

Pode-se afirmar entatildeo que o mercado imobiliaacuterio influencia diretamente nos

processo de planejamento e gestatildeo das cidades aqui em especial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luiacutes impondo um planejamento urbano baseado em princiacutepios antidemocraacutetico e

favorecendo interesses da classe dominante aleacutem de promover a manutenccedilatildeo e o aumento dos

processos de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e de exclusatildeo social

Destarte a estrutura urbana natildeo pode ser compreendida somente como organismo do

tecido urbano pois natildeo existe um modelo exclusivo de estrutura de cidade e sim satildeo

diferentes estruturas e simbolismos

Portanto o Estado enquanto organizador do espaccedilo urbano ao mesmo tempo em que

promove agrave poliacutetica habitacional de interesse social nega a habitaccedilatildeo a quem dela necessita

279

Essa poliacutetica quando oficializada pode prever mecanismos para efetivaccedilatildeo do Plano Diretor

de Beleacutem e de Satildeo Luiacutes a fim de respaldar os direitos das famiacutelias atingidas pelas

intervenccedilotildees de renovaccedilatildeo urbana e eliminar o deacuteficit habitacional das aacutereas de intervenccedilatildeo

Nesse sentido cabe ressaltar que a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia eacute de suma

importacircncia para a resoluccedilatildeo do caos urbano Pode ser alcanccedilada a compreensatildeo de que a

reduccedilatildeo do deacuteficit habitacional eacute um dos caminhos para a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da

cidade tornando-a um lugar onde todos possam viver de forma digna

[] nesta perspectiva o habitar deixa de ser representado simplesmente pela unidade habitacional como produto acabado de consumo passando a ser compreendido como parte de um processo expressando a forma de inserccedilatildeo social e econocircmica de seu ocupante partiacutecipe enquanto sujeito histoacuterico da construccedilatildeo e implementaccedilatildeo de um plano de accedilatildeo de poliacuteticas urbanas (ABELEacuteM 1989 p 64)

Assim a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

habitacionais das cidades para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

280

6 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Pretendeu-se nessa tese trazer agrave cena reflexotildees sobre a gestatildeo das poliacuteticas

habitacionais implementadas em cidades amazocircnicas assim como os impactos na organizaccedilatildeo

espacial das cidades e a relaccedilatildeo com o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial existente

ressaltando os desafios colocados para a gestatildeo urbana das cidades de Beleacutem-Pa e Satildeo Luiacutes-

Ma e como o Estado tem atuado no enfrentamento dos problemas sociais

Para tanto procurou-se fazer por meio de uma construccedilatildeo teoacuterica o resgate da

poliacutetica habitacional no Brasil e na Amazocircnia Nesse sentido fez-se necessaacuterio analisar a

construccedilatildeo do espaccedilo urbano e da moradia que baseado na loacutegica capitalista concentradora e

excludente influenciou no desenvolvimento urbano das duas cidades amazocircnicas acarretando

em um processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial

O modelo de desenvolvimento urbano implementado tem contribuiacutedo para aumentar

a exclusatildeo social econocircmica poliacutetica e cultural de uma grande parcela da populaccedilatildeo A falta

de alternativas em relaccedilatildeo agrave moradia leva essa populaccedilatildeo a ocupar espaccedilos inadequados para a

habitaccedilatildeo como encostas vaacuterzeas inundaacuteveis beiras de rios e cursos d aacutegua e ateacute mesmo

aacutereas de proteccedilatildeo de mananciais Essas ocupaccedilotildees frequumlentemente ilegais caracterizam-se

tambeacutem pela construccedilatildeo de moradias muito precaacuterias e em regiotildees sem nenhuma

infraestrutura

Desse modo o processo de urbanizaccedilatildeo nas grandes cidades em especial nas duas

capitais estudadas revela a face avassaladora do modo de produccedilatildeo capitalista na qual a

necessidade de obtenccedilatildeo de espaccedilos e a transformaccedilatildeo dos mesmos em mercadoria

transformam a cidade num palco de luta pelo domiacutenio e pelo poder

Constatou-se que ao longo das uacuteltimas cinco deacutecadas as poliacuteticas puacuteblicas urbanas

natildeo foram eficazes para resolver os principais problemas das cidades estudadas gerando os

conflitos causados pelo baixo padratildeo de vida constituindo-se em contradiccedilotildees do

funcionamento do proacuteprio sistema capitalista

A cidade como forma concretizada do processo de urbanizaccedilatildeo eacute um produto e

condiccedilatildeo de (re) produccedilatildeo de uma sociedade O espaccedilo urbano eacute produzido de modo desigual

em um processo complexo e dinacircmico onde ocorre tanto a expansatildeo do tecido urbano quanto

a verticalizaccedilatildeo em determinadas partes das cidades

Nota-se que a poliacutetica urbana foi orientada para atender a demanda do capital

monopolista expandindo a infraestrutura serviccedilos de comunicaccedilatildeo e de transporte Por meio

de medidas governamentais o Estado procurou garantir todo o suporte necessaacuterio para a

281

dinacircmica industrial aleacutem disso investiu esforccedilos para a expansatildeo nacional da infraestrutura

de transporte o que estimulou a migraccedilatildeo intensiva em direccedilatildeo agraves aacutereas urbanas em busca de

melhores condiccedilotildees de vida

A trajetoacuteria da poliacutetica habitacional eacute notadamente marcada por diversos atores

sociais que estabelecem uma correlaccedilatildeo de forccedilas entre suas posiccedilotildees ocupadas no espaccedilo

social e no espaccedilo fiacutesico Isto se constitui segundo Bourdieu (2001) como um fator simboacutelico

importante na determinaccedilatildeo e configuraccedilatildeo do proacuteprio posicionamento social desses atores

Cabe destacar nesse aspecto que no processo de implementaccedilatildeo da poliacutetica

habitacional haacute de um lado as camadas populares que buscam espaccedilos de moradia em aacutereas

insalubres com enorme carecircncia de serviccedilos urbanos essenciais reforccedilando um ciclo de

pobreza cada vez mais difiacutecil de ser rompido e de outro lado a figura do Estado que surge

para atender aos interesses das classes dominantes exercendo sobre a classe trabalhadora

accedilotildees de controle repressatildeo e exclusatildeo Contraditoriamente este mesmo Estado direciona

suas accedilotildees para atender as demandas populares com o objetivo de obter legitimidade

Como ressalta Jacobi (1988) se o Estado cede controla e ateacute impotildee demandas e

canais de filtragem das reivindicaccedilotildees os movimentos sociais alteram suas estrateacutegias de

accedilatildeo passando a agir coletivamente numa nova modalidade de accedilatildeo natildeo fazendo somente

reivindicaccedilotildees mas sobretudo garantindo o controle das poliacuteticas puacuteblicas

Nessa luta pelo espaccedilo tambeacutem se pode identificar os interesses dos grupos

econocircmicos ligados aos processos de acumulaccedilatildeo urbana e defrontando-se com estes atores

as camadas populares que fazem pressatildeo junto ao Estado exigindo deste a efetivaccedilatildeo de

serviccedilos urbanos no intuito de garantir sua sobrevivecircncia

Sendo assim a ocupaccedilatildeo do espaccedilo vai se configurando a partir das correlaccedilotildees de

forccedilas e das alteraccedilotildees intra-urbanas instituiacutedas entre os agentes produtores desse espaccedilo

colocando em evidecircncia a estreita relaccedilatildeo entre poliacuteticos especuladores e agentes sociais que

estabelecem estrateacutegias de accedilatildeo que satildeo capitalizadas tanto do lado do Estado quanto do lado

dos agentes sociais

Nota-se que nas deacutecadas de 1960 e 1970 o governo federal implementou um

processo de planejamento municipal e regional nunca antes realizado no Brasil no qual vaacuterios

oacutergatildeos federais foram criados para gerenciar incentivar e financiar a poliacutetica urbana das

cidades principalmente daqueles que formavam as regiotildees metropolitanas do Paiacutes buscando

a implantaccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional em grande escala por meio do BNH e outros

organismos

282

Entretanto os resultados dessa poliacutetica demonstram que o nuacutemero de habitaccedilotildees

construiacutedas ficou muito aqueacutem da necessidade apontada pelo deacuteficit Aleacutem disso o modelo

econocircmico de exclusatildeo social assumido pelos vaacuterios governos a partir dessas deacutecadas e o

crescimento populacional fizeram aumentar ainda mais a demanda por moradias

Destarte as necessidades do processo de acumulaccedilatildeo capitalista e de reproduccedilatildeo

ampliada das classes sociais contribuem para o caraacuteter do uso do solo na cidade do capital O

desenvolvimento das forccedilas produtivas a partir das inovaccedilotildees tecnoloacutegicas levou as unidades

de produccedilatildeo a requererem uma infraestrutura capaz de atender as suas demandas que vatildeo

desde uma boa localizaccedilatildeo ateacute a instalaccedilatildeo de modernos equipamentos com o objetivo de

favorecer a dinacircmica deste modelo econocircmico

Conforme foi discutido anteriormente Villaccedila (2001) afirma que a produccedilatildeo do

espaccedilo eacute na verdade a produccedilatildeo de localizaccedilotildees As diferentes localizaccedilotildees apresentam

diferentes valores associados natildeo somente ao valor dos elementos urbanos aiacute existentes mas

tambeacutem a maior ou menor acessibilidade aos bens e serviccedilos existentes na cidade Essa

diferenciaccedilatildeo entre valores das localizaccedilotildees explica a diferenccedila de valor das aacutereas urbanas

Os diferentes valorespreccedilos das aacutereas urbanas implicam em uma distribuiccedilatildeo

espacial da populaccedilatildeo de acordo com a capacidade desta em arcar com os custos de

localizaccedilotildees especiacuteficas Essa eacute a razatildeo da existecircncia na cidade de aacutereas onde predominam

grupos sociais homogecircneos sob o ponto de vista da renda

As aacutereas melhor localizadas e portanto com maior valor satildeo ocupadas pela

populaccedilatildeo de maior renda restando agrave parcela de menor poder aquisitivo a ocupaccedilatildeo das aacutereas

de menor valor com restrita acessibilidade a bens e serviccedilos urbanos Tal processo se

expressa na segregaccedilatildeo social do espaccedilo (SANTOS 2002)

Dessa forma a apropriaccedilatildeo mercadoloacutegica do espaccedilo urbano reforccedila as accedilotildees

clientelistas e tecnocraacuteticas do poder puacuteblico que em parceria com instituiccedilotildees privadas

priorizam fatores econocircmicos em funccedilatildeo dos sociais provocando o acirramento das

expressotildees da questatildeo social

Conforme Rolnik (2002) apesar das accedilotildees de desenvolvimento ser apresentadas

como forma de melhoria da qualidade de vida e de acesso agrave moradia digna seu objetivo natildeo eacute

suprir as necessidades humanas mas sim acumular capital posto que as accedilotildees

governamentais seguem a loacutegica das agecircncias financiadoras das obras de eficiecircncia e eficaacutecia

neste caso para os investimentos na poliacutetica habitacional

283

Quando se procura analisar compreender ou intervir no espaccedilo urbano onde se

realizam as experiecircncias humanas natildeo pode deixar de ser considerado qualquer que seja a

relaccedilatildeo dos indiviacuteduos com os lugares Poreacutem o que se tem visto eacute exatamente o contraacuterio

As poliacuteticas de renovaccedilatildeo urbana em Beleacutem e em Satildeo Luis buscando maior

funcionalidade do espaccedilo para atender a interesses dos especuladores imobiliaacuterios

comprometem as paisagens e os cenaacuterios dessas cidades que passam a sofrer intervenccedilotildees

sem que se considere a memoacuteria urbana como exemplo pode-se citar bairros tradicionais que

tiveram seus quarteirotildees transformados em shopping centers criando focos geradores de

grande traacutefego patrimocircnios arquitetocircnicos que registravam a histoacuteria e a memoacuteria da cidade

foram substituiacutedos por edifiacutecios acentuando o processo de adensando por verticalizaccedilatildeo que

elevam os preccedilos dos lotes dos terrenos e ameaccedilam outras aacutereas

Harvey (1996) ressalta que muitas das inovaccedilotildees e investimentos destinados a tornar

as cidades mais atraentes como centros culturais e de consumo foram copiadas em outros

lugares e o fato da gestatildeo urbana ser tratada como empresariamento leva agrave competiccedilatildeo

interurbana visando a atraccedilatildeo de financiamentos externos passando a tratar a cidade como

uma mercadoria como um lugar que oferece condiccedilotildees favoraacuteveis a acumulaccedilatildeo capitalista

Para Vainer (2002) os planos estrateacutegicos propostos para serem realizados nas

cidades satildeo muito semelhantes independendo dos locais ou seja eles devem vender a mesma

coisa aos mesmos compradores virtuais que tecircm invariavelmente as mesmas necessidades e

entre eles estatildeo os investidores internacionais

Complementando essa ideacuteia Harvey (1996) argumenta ainda que passando a atuar

como uma empresa a administraccedilatildeo municipal compreende a cidade como coisa cidade-

objeto ou cidade-mercadoria esquecendo de seu aspecto fundamental que eacute cidade-sujeito

Eacute necessaacuterio que se pense a cidade como um lugar em que se estabelece relaccedilotildees de

sociabilidade interesses expectativas mobilidade social e econocircmica Bourdieu (1996) diz

que a cidade eacute um poderoso e complexo campo onde inuacutemeros atores se reuacutenem munidos de

diferentes olhares perspectivas e capitais culturais a fim de disputar a definiccedilatildeo do que eacute a

proacutepria realidade

Entatildeo compreender a cidade como um lugar de accedilotildees caracteriacutesticas de uma cultura

pensamentos e percepccedilotildees permite introduzir a subjetividade dentro do esquema estruturalista

de reproduccedilatildeo social Para Bourdieu (2001 p 349) isso acontece porque o habitus eacute ao

mesmo tempo subjetivo e social Subjetivo porque diz respeito agrave interiorizaccedilatildeo de valores

normas e classificaccedilotildees e eacute social porque os elementos interiorizados fazem parte da estrutura

284

social em reproduccedilatildeo bem como as instituiccedilotildees (famiacutelia escola etc) em que satildeo produzidos

reproduzidos e consagrados

Portanto pode-se dizer que a cidade eacute capaz de ser reinventada reconstruiacuteda

cotidianamente tanto no amplo fiacutesico (obras de engenharia) como no plano das

representaccedilotildees A cidade eacute a imagem que seus cenaacuterios ajudam a constituir mas eacute tambeacutem o

imaginaacuterio que o urbano a ela impotildee complementando a sua construccedilatildeo histoacuterico-cultural na

qual o habitus eacute orientado natildeo soacute pelos interesses econocircmicos mas por elementos muitas

vezes inconscientes expressos em valores gestos religiosidade cultura etc

Partindo do estudo analiacutetico efetivado evidencia-se que as primeiras intervenccedilotildees

urbaniacutesticas nas cidades estudadas foram direcionadas por accedilotildees pontuais no setor de

saneamento seguidas de accedilotildees de infraestrutura que direcionaram o crescimento das mesmas

e o aumento da especulaccedilatildeo imobiliaacuteria que satildeo refletidos no desenvolvimento do processo

de urbanizaccedilatildeo por possuir um espaccedilo de concentraccedilatildeo e de oportunidades de trabalho e por

reproduzir diariamente o fenocircmeno da segregaccedilatildeo soacutecioespacial Este aspecto eacute fundamental

para se compreender a gestatildeo de poliacuteticas habitacionais atual na regiatildeo amazocircnica

Ao se analisar o processo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial em Beleacutem e em Satildeo Luis

constatou-se que foi constituiacuteda desde quando os primeiros colonizadores chegaram agrave regiatildeo

Todavia este processo ganhou conteuacutedo e forma com a ocupaccedilatildeo das aacutereas centrais das

cidades por uma demanda solvaacutevel da populaccedilatildeo que passou a utilizar-se deste espaccedilo para

subsidiar a reproduccedilatildeo do capital em especial do capital imobiliaacuterio Assim pode-se afirmar

que nas cidades citadas a segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute fruto dos deacuteficits sociais acumulados

por deacutecadas de governos descomprometidos com os interesses da maioria da populaccedilatildeo

Conforme visto no capiacutetulo V o processo de ocupaccedilatildeo nas cidades estudadas

aumentou as desigualdades sociais Isto eacute decorrente da urbanizaccedilatildeo embasada na loacutegica da

globalizaccedilatildeo tecnoloacutegica e informacional que determina natildeo somente as relaccedilotildees poliacuteticas

mas principalmente as relaccedilotildees econocircmicas perpassando pelas relaccedilotildees sociais e culturais

Neste contexto observa-se que a configuraccedilatildeo espacial das cidades de Beleacutem e de

Satildeo Luis sofreu uma ampla (re)configuraccedilatildeo tornando-se necessaacuterio a cada novo ciclo

produtivo um novo solo Este fato pode ser verificado no aumento por demandas

habitacionais principalmente para as classes sociais de menor poder aquisitivo

Outro aspecto identificado foi a configuraccedilatildeo do espaccedilo urbano dessas duas cidades

como uma arena na qual se defrontam interesses divergentes na luta pela apropriaccedilatildeo da terra

da renda por melhores condiccedilotildees materiais e simboacutelicas de vida entre outros aspectos uma

vez por meio da anaacutelise do processo de ocupaccedilatildeo territorial nota-se que o modelo de poliacutetica

285

habitacional vem historicamente desconsiderando os laccedilos de vizinhanccedila e a sociabilidade

das famiacutelias atingidas diretamente pelas obras de infraestrutura e saneamento

Bourdieu (2001) ressalta que a cidade pode ser entendida como unidade geograacutefica

permeada de sociabilidade que eacute caracterizada por uma rede de accedilotildees e relaccedilotildees nas quais

estatildeo presentes elementos simboacutelicos e materiais nas relaccedilotildees de vizinhanccedila nos costumes

comuns na identidade na histoacuteria na cultura no parentesco nas lutas no territoacuterio

Faz-se necessaacuterio destacar as intervenccedilotildees urbaniacutesticas implementadas pelo poder

puacuteblico municipal e estadual a partir de 1990 que (re)configuraram as aacutereas de baixadas e de

palafitas Aqui em especial pode-se citar a cidade de Beleacutem uma vez que as intervenccedilotildees

realizadas foram resultantes das reivindicaccedilotildees da sociedade civil que tiveram

gradativamente suas demandas por saneamento e habitaccedilatildeo atendidas pelos gestores

Para o enfrentamento a essas demandas eacute da maior importacircncia agrave garantia de

participaccedilatildeo das populaccedilotildees atingidas no processo de elaboraccedilatildeo dos projetos urbaniacutesticos

Reforccedila-se que a participaccedilatildeo social nos projetos habitacionais eacute fundamental para diminuir

os efeitos negativos dos mesmos e para garantir

ainda que minimamente - os direitos sociais

dos moradores enquanto cidadatildeos

Benevides (1994) argumenta que uma cidadania plena eacute uma cidadania ativa que

instituiacute o cidadatildeo como portador de direitos e deveres mas essencialmente criador de

direitos por abrir novos espaccedilos de participaccedilatildeo poliacutetica onde se vecirc a possibilidade de se

ampliarem os direitos poliacuteticos para a participaccedilatildeo direta do cidadatildeo no processo das decisotildees

de interesse puacuteblico

Outro aspecto a ser enfatizado eacute que a pesquisa comprovou que poliacutetica habitacional

dos referidos municiacutepios natildeo daacute conta de atender efetivamente a demanda social por moradia

digna Os dados sobre assentamentos precaacuterios revelam um nuacutemero elevado em Beleacutem (449)

e em Satildeo Luis (115) aleacutem do alto iacutendice de famiacutelias conviventes o que acarreta na

insustentabilidade das mesmas do ponto de vista soacutecio-ambiental do territoacuterio sendo

necessaacuteria a efetivaccedilatildeo de intervenccedilotildees que visem agrave inclusatildeo soacutecioespacial do expressivo

contingente populacional que reside nesses assentamentos

A necessidade de construccedilatildeo de uma poliacutetica habitacional com foco na integraccedilatildeo

urbana de assentamentos precaacuterios especialmente na garantia do acesso ao saneamento

baacutesico agrave regularizaccedilatildeo fundiaacuteria e agrave moradia adequada articulada a outras poliacuteticas sociais e

de desenvolvimento econocircmico eacute essencial na implementaccedilatildeo de qualquer gestatildeo estrateacutegica

de combate agrave pobreza e perspectiva de sustentabilidade urbana

286

Desse modo torna-se imprescindiacutevel a valorizaccedilatildeo do direito agrave moradia para reduccedilatildeo

do deacuteficit habitacional e garantir a efetivaccedilatildeo da funccedilatildeo social da cidade tornando-a um lugar

onde todos possam viver de forma digna compreendendo que o direito agrave moradia natildeo eacute

somente ter uma unidade habitacional mas eacute um processo de inclusatildeo social cultural e

econocircmica das pessoas que nela habitaratildeo e que podem ser vistas como sujeitos histoacutericos e

partiacutecipes do processo de planejamento e gestatildeo das poliacuteticas urbanas

No desenvolvimento da pesquisa verificou-se que em Beleacutem a SEHAB como

oacutergatildeo municipal fiscalizador e executor da poliacutetica habitacional desenvolveu

programasprojetos de urbanizaccedilatildeo visando atender agraves demandas colocadas pela populaccedilatildeo de

menor poder aquisitivo no intuito de garantir o direito agrave moradia conforme seus objetivos

Todavia vale ressaltar que tais programasprojetos natildeo satildeo muitas vezes garantidos

conforme demonstrado no Capiacutetulo V uma vez que natildeo passam pelas as exigecircncias dos

agentes financiadores da obra fiacutesica e da obra de cunho social Estes tecircm paracircmetros

conceituais e teacutecnicos estipulados verbas destinadas agraves quais limitam o trabalho social e

consequumlentemente ateacute o projeto fiacutesico

A insuficiecircncia de investimentos eou suspensatildeo das obras de urbanizaccedilatildeo por falta

de repasse de recursos por parte do governo federal ou por parte das agecircncias multilaterais eacute

outro problema levantado na pesquisa que impede o alcance dos objetivos propostos dos

programasprojetos habitacionais os quais objetivam diminuir o deacuteficit habitacional

Neste sentido percebe-se que a moradia enquanto um direito do cidadatildeo e dever do

Estado natildeo eacute garantido perpetuando a loacutegica neoliberal em que a moradia eacute compreendida

como uma mercadoria de alto valor a qual soacute tem acesso as pessoas com maior poder

aquisitivo ou para as pessoas que possuem baixa renda satildeo elaboradas poliacuteticas que visam

combater essa desigualdade social Entretanto o Estado acaba investindo em projetos que

objetivam a intervenccedilatildeo no espaccedilo urbano mas que atendem as relaccedilotildees de consumo e de

mercado

Na pesquisa observou-se uma grave desestruturaccedilatildeo da SEHAB Esta possui um

corpo teacutecnico reduzido em termo de quantidade e de qualidade o que leva agrave dificuldade de

acesso aos recursos por falta de capacidade teacutecnica e pouca estrutura para desenvolver os

programasprojetos habitacionais o que acarreta na transferecircncia de sua competecircncia legal de

execuccedilatildeo da Poliacutetica Habitacional para outras secretarias como a SEURB ou SESAN que

possuem uma estrutura maior e melhor Aleacutem disso haacute uma perda de teacutecnicos capacitados em

funccedilatildeo da falta de um plano de cargos e salaacuterio e haacute uma falta de articulaccedilatildeo teacutecnica-poliacutetica

na elaboraccedilatildeo de projetos de captaccedilatildeo de recursos

287

Um fator importante a ser destacado eacute o elevado iacutendice de irregularidade fundiaacuteria e

a inexistecircncia de um Plano Municipal de Regularizaccedilatildeo Fundiaacuteria ocasionando na ilegalidade

generalizada em relaccedilatildeo agraves legislaccedilotildees urbanas que eacute visivelmente constatada no

distanciamento existente a cidade legal e a cidade ilegal ou real

Para Rolnik (2002) essa ilegalidade se divide em ilegalidade como estrateacutegia de

acesso agrave moradia das classes de menor poder aquisitivo e ilegalidade como forma de burlar a

legislaccedilatildeo em aacutereas de grande valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria como meio de atender a interesses

especulativos de segmentos organizados da produccedilatildeo imobiliaacuteria inseridos nos processos de

acumulaccedilatildeo revelando a face de exclusatildeo e segregaccedilatildeo da gestatildeo urbana nas cidades

Portanto essas praacuteticas ilegais de uso do solo urbano conduzem a uma maior

vulnerabilidade da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo uma vez estas natildeo possuem a

titularidade de seus terrenos aleacutem de ficarem cada vez mais excluiacutedas dos processos poliacuteticos

de governanccedila das cidades e ao planejamento do desenvolvimento urbaniacutestico

Haacute tambeacutem que se ressaltar o problema de escassez de terras para a produccedilatildeo

habitacional e formaccedilatildeo de estoques de terras que viabilizariam o desenvolvimento dos

programasprojetos habitacionais futuros

Outro problema levantado na pesquisa diz respeito agrave falta de regulamentaccedilatildeo dos

instrumentos do Plano Diretor tais como a outorga onerosa do direito de construir solo

criado imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo entre outros o que

intensifica ainda mais a situaccedilatildeo da populaccedilatildeo atingida pelos programasprojetos executados

visto que a cobranccedila dos benefiacutecios oriundos dessas accedilotildees estatildeo sob a tutela do poder puacuteblico

o que dificulta as possibilidades de se criarem mecanismos que assegurem a futura

permanecircncia dos moradores na aacuterea

O estudo apontou que em Beleacutem natildeo eacute falta de planejamento urbano que contribui

para a permanecircncia da segregaccedilatildeo soacutecioespacial mas de accedilotildees concretas de aplicabilidade

por parte dos gestores municipais Como informa Villaccedila (2001) natildeo existe falta de

planejamento como justificativa dos problemas urbanos o problema estaacute no tipo de

planejamento e na ineficiecircncia dos gestores puacuteblicos

Considerando a realidade urbana de Beleacutem o plano diretor natildeo estaacute cumprindo sua

funccedilatildeo social pois para que isso ocorra eacute necessaacuterio ampliar as formas participativas da

sociedade a fim de garantir a inserccedilatildeo de diferentes atores organizaccedilotildees lutas e sujeitos no

processo de gestatildeo das poliacuteticas em especial a habitacional exigindo do poder puacuteblico

moradia digna saneamento equipamentos urbanos etc

288

Cabe destacar tambeacutem que a falta de integraccedilatildeo dos projetos de infraestrutura

habitaccedilatildeo e saneamento com as poliacuteticas de mobilidade acessibilidade controle urbaniacutestico

desenvolvimento econocircmico e social implantaccedilatildeo de equipamentos comunitaacuterios tem

provocado accedilatildeo isoladas e fragmentadas sem apreender a cidade como um todo na qual cada

instituiccedilatildeo planeja a partir de sua percepccedilatildeo o modo de operacionalizar as accedilotildees nas aacutereas

urbanas

Entende-se contudo que se faz necessaacuterio estabelecer diretrizes especiacuteficas acerca

desta questatildeo

baseadas nas leis e normas existentes como o Estatuto da Cidade e Plano

Diretor

para entatildeo implementar accedilotildees que possibilitem intervir no meio urbano de forma

eficiente eficaz e com efetividade incluindo o estabelecimento de norma que obriguem as

agecircncias financiadoras e executoras das accedilotildees a garantirem moradia digna transporte urbano

de qualidade acessibilidade infraestrutura adequada agrave toda a populaccedilatildeo

Todavia entre o que o Estatuto da Cidade determina e as interpretaccedilotildees desse

estatuto que orientam as accedilotildees da vida cotidiana (praacutexis) existem toda uma trama de interesses

que expressam o jogo das percepccedilotildees e das cogniccedilotildees da realidade construiacuteda compondo toda

uma gama de poderes simboacutelicos (BOURDIEU 2001) que decerto modo se materializam na

vida das cidades

Todos esses fatores relacionados podem explicar as accedilotildees tiacutemidas ou insuficientes

desenvolvidas pela SEHAB Entretanto cabe destacar que a secretaria conseguiu alguns

avanccedilos nesses uacuteltimos anos como a adesatildeo ao Sistema Nacional de Habitaccedilatildeo de Interesse

Social a constituiccedilatildeo do Fundo Municipal de Habitaccedilatildeo de Interesse Social e seu Conselho

Gestor as obras de urbanizaccedilatildeo e construccedilatildeo de unidades habitacionais as parcerias para

regularizaccedilatildeo fundiaacuteria (em andamento) a realizaccedilatildeo do Diagnoacutestico Habitacional e a

elaboraccedilatildeo do Plano Municipal de Habitaccedilatildeo (em andamento)

Dessa forma a SEHAB representa um marco na poliacutetica urbana de Beleacutem uma vez

que reconhece o direito a moradia como poliacutetica puacuteblica e representa o fortalecimento da

poliacutetica habitacional Aleacutem disso apresenta uma seacuterie de desafios a serem enfrentadas

conforme citado no capiacutetulo V

Em Satildeo Luis a pesquisa realizada constatou que natildeo haacute uma poliacutetica habitacional

elaborada com instrumentos adequados o que possibilitaria a implementaccedilatildeo de uma gestatildeo

eficaz no combate aos problemas de moradia encontrados no municiacutepio Aleacutem disso a

fragmentaccedilatildeo do espaccedilo urbano da cidade eacute decorrente dos investimentos industriais e do

Estado que transformaram o solo em mercadoria cujo elevado preccedilo ocasiona na expulsatildeo da

camada de menor poder aquisitivo para aacutereas distantes do centro e sem infra-estrutura

289

Conveacutem salientar que na capital ludovicense satildeo desenvolvidos accedilotildees de intervenccedilatildeo

no solo urbano por meio de projetos habitacionais que visam atender as diretrizes aprovadas

no Plano Diretor Entretanto a SEMTHURB assim como a SEHAB em Beleacutem natildeo tem

conseguido articular accedilotildees em conjunto com os outros oacutergatildeos municipais o que reflete a

forma autarquizada de organizaccedilatildeo e funcionamento da estrutura puacuteblica municipal

Ao longo da pesquisa de campo verificou-se que os projetos desenvolvidos pela

SEMTHURB longe de solucionar os problemas habitacionais da populaccedilatildeo ludovicense

acarretaram no agravamento da segregaccedilatildeo soacutecioespacial uma vez que as famiacutelias que

habitavam as aacutereas de palafitas foram remanejadas para locais bem distantes de sua origem

provocando a perda de laccedilos de vizinhanccedila e da identidade local construiacutedas por esses

moradores durante deacutecadas

Outra questatildeo a ser enfatizada eacute a relaccedilatildeo conflituosa entre a Prefeitura Municipal de

Satildeo Luis e o Governo do Estado do Maranhatildeo pois satildeo raras as accedilotildees compartilhadas entre

essas duas instacircncias de poderes Um dos motivos que se coloca eacute a conduccedilatildeo das accedilotildees por

grupos poliacuteticos distintos que buscam se consolidar na regiatildeo

A pesquisa tambeacutem revelou que natildeo existe um Conselho Municipal da Habitaccedilatildeo de

Interesse Social e que o Fundo natildeo foi constituiacutedo o que fragiliza as accedilotildees da SEMTHURB

no sentido de garantir recursos agrave aacuterea habitacional comprometendo o alcance dos objetivos

propostos nos projetos

Outra questatildeo eacute a baixa qualificaccedilatildeo da equipe de fiscalizaccedilatildeo das obras urbanas

Para resoluccedilatildeo de tal problemaacutetica eacute necessaacuterio a implementaccedilatildeo de capacitaccedilatildeo adequada agraves

accedilotildees desses agentes puacuteblicos e a instalaccedilatildeo de um sistema de informaccedilatildeo que precise sobre o

crescimento da cidade suas aacutereas de ocupaccedilatildeo para que se possa gestar as accedilotildees de modo

preventivo com planejamento e acompanhamento de seu desenvolvimento Assim para se ter

uma gestatildeo qualificada eacute importante a qualificaccedilatildeo da equipe teacutecnica e administrativa

De acordo com os dados levantados na pesquisa conforme apresentado

anteriormente uma das grandes dificuldades do municiacutepio eacute a questatildeo da titularidade da terra

Este fato tambeacutem pode ser observado quando se analisou a cidade de Beleacutem

Assim os espaccedilos produzidos no mercado informal satildeo ocupados agrave revelia das leis e

das normas estabelecidas para edificaccedilatildeo e uso do solo situaccedilatildeo que se agrava pelos

processos intensivos de verticalizaccedilatildeo e densificaccedilatildeo

Desta forma a elaboraccedilatildeo de poliacuteticas programas e projetos visando o atendimento agrave

populaccedilatildeo de baixa renda e a manutenccedilatildeo do ordenamento do solo eacute uma accedilatildeo imprescindiacutevel

Poreacutem ela pressupotildee a realizaccedilatildeo de um estudo especiacutefico sobre as necessidades

290

habitacionais dos municiacutepios para que se tenha a dimensatildeo exata do problema com a

caracterizaccedilatildeo das aacutereas de subnormalidade e de precariedade

Isso ratifica a tese aqui levantada que independente do modelo de gestatildeo

(tecnocraacutetica ou participativa) a poliacutetica habitacional natildeo tem avanccedilado estruturalmente

demonstrando que as accedilotildees implementadas por meio dos programasprojetos natildeo

contribuiacuteram para a reduccedilatildeo do padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial e natildeo modificaram a

concepccedilatildeo de moradia

Nota-se portanto que as cidades de Beleacutem e Satildeo Luiacutes vivem situaccedilotildees similares que

retratam o papel do Estado como agente decisivo na produccedilatildeo das desigualdades sociais e da

segregaccedilatildeo espacial desenvolvendo poliacuteticas que aleacutem de favorecerem os interesses do

capital imobiliaacuterio e das classes meacutedia e alta natildeo enfrenta a problemaacutetica da moradia popular

Eacute importante ressaltar que em Satildeo Luiacutes o padratildeo de segregaccedilatildeo soacutecioespacial eacute

decorrente da mercantilizaccedilatildeo do solo na qual os incorporadores imobiliaacuterios financiados

pelo Estado possuem papel fundamental uma vez que modificam a dinacircmica urbana

acarretando na expulsatildeo da populaccedilatildeo de menor poder aquisitivo das aacutereas melhores

infraestruturadas que serviratildeo para a construccedilatildeo de condomiacutenios residenciais edifiacutecios

comerciais shopping centers entre outros objetivando a acumulaccedilatildeo de capital

Conforme se pode demonstrar para o caso ludovicense a produccedilatildeo do espaccedilo se daacute a

partir de duas vertentes a dominaccedilatildeo poliacutetica representada por grupos que estatildeo no poder haacute

muito tempo e o consumo Esses dois elementos determinam a divisatildeo social da cidade

levando ao aumento da pobreza e a concentraccedilatildeo dos preccedilos de terrenos mais caros na zona

norte de Satildeo Luis

Dessa forma essa loacutegica de ordenamento territorial daacute origem a uma formaccedilatildeo

soacutecioespacial segregada caracterizada principalmente por novas formas de habitats urbanos

os loteamentos fechados e os condomiacutenios residenciais seja horizontais ou verticais

ocasionando na auto-segregaccedilatildeo a qual cria um ambiente urbano ideal dissociado dos

elementos da cidade real

O cunho empresarial da poliacutetica habitacional ludovicense impulsionado pelos

investimentos estatais promove a produccedilatildeo imobiliaacuteria privada a partir de estrateacutegias que

redefinem a configuraccedilatildeo espacial expandem a fronteira urbana produzindo novas moradias

em aacutereas tidas como natildeo-urbanas e transformam as relaccedilotildees poliacuteticas econocircmicas sociais e

culturais da cidade

No caso de Beleacutem ressalta-se que haacute um padratildeo auto-segregativo das classes que

possuem maior poder aquisitivo em condomiacutenios fechados impulsionando um novo arranjo

291

intra-urbano Aleacutem disso conforme foi apresentado anteriormente o padratildeo de segregaccedilatildeo

que mais se assemelha a realidade urbana eacute o modelo de Kohl (cidade preacute-industrial) no qual

se percebe que a acessibilidade eou localizaccedilatildeo de moradias de maior valor estatildeo situadas

proacuteximas ao centro

Esses locais que sofrem investimentos do capital imobiliaacuterio e estatal satildeo

valorizados em detrimento dos novos espaccedilos de assentamentos acarretando na apropriaccedilatildeo

dos mesmos pelos agentes que podem pagar para usufruir da acessibilidade O Estado atua

nessas aacutereas com projetos de urbanizaccedilatildeo reforccedilando a concentraccedilatildeo das aacutereas mais

valorizadas pressupondo uma auto-segregaccedilatildeo e uma segregaccedilatildeo induzida ou imposta

Como foi enfatizada a accedilatildeo governamental altera as relaccedilotildees intra-urbanas

ampliando a fronteira urbano-imobiliaacuteria atuando em novos assentamentos e investindo em

aacutereas de expansatildeo do capital imobiliaacuterio em particular nos eixos Entroncamento-Icoaraci e

Beleacutem-Ananindeua provocando uma verdadeira mercantilizaccedilatildeo do espaccedilo

Assim eacute necessaacuterio repensar a forma de gestatildeo das poliacuteticas habitacionais nas

cidades amazocircnicas em especial Beleacutem e Satildeo Luis pois a racionalidade do planejamento e da

regulaccedilatildeo herdadas do modernismo do tradicionalismo pode dar lugar as concepccedilotildees

democraacuteticas de gestar essas poliacuteticas com o intuito de efetivar o alcance do direito agrave moradia

digna que valorize os aspectos culturais religiosos laccedilos de vizinhanccedila enfim que leva em

consideraccedilatildeo tambeacutem a subjetividade como ressalta Bourdieu (2001 p 89) a construccedilatildeo da

subjetividade mostraraacute um sujeito fragmentado com uma nova maneira de ser e estar no

tempo e no espaccedilo e de mostrar-se no palco da cidade

Nesse sentido o planejamento e a gestatildeo do espaccedilo urbano em Beleacutem e em Satildeo Luis

poderatildeo inscrever-se em uma concepccedilatildeo de democracia que entenda o cidadatildeo como parte

ativa da sociedade na qual a garantia de seus direitos dependa de sua organizaccedilatildeo coletiva

Souza e Rodrigues (2004) argumentam que os proacuteprios cidadatildeos devem poder

decidir sobre os destinos dos espaccedilos em que vivem por meio de debates livres abertos e

transparentes e que os teacutecnicos podem e podem participar mas na qualidade de consultores

populares que possam aconselhar principalmente quanto aos meios cabendo a discussatildeo e a

decisatildeo poliacuteticas sobre os fins aos proacuteprios cidadatildeos

Complementando os autores defendem a ideacuteia de que a sociedade civil pode se

organizar de maneira autocircnoma e independente do Estado para criar e realizar accedilotildees e

projetos estabelecer parcerias que fortaleccedilam esse tipo de atividade elaborar e propor accedilotildees

projetos e poliacuteticas puacuteblicas fiscalizar e exigir do Estado o cumprimento das leis Da mesma

forma os processos participativos podem acompanhar as escalas pensadas para o programa

292

reunindo aleacutem de conselhos estaduais e municipais foacuteruns metropolitanos ou

submetropolitanas

As poliacuteticas habitacionais precisam estar vinculadas a outros programas de

desenvolvimento econocircmico e social sem esquecer os programas de proteccedilatildeo ambiental Eacute

fundamental que haja relaccedilotildees estreitas entre o programa de urbanizaccedilatildeo e o programa de

regularizaccedilatildeo buscando sinergias que multipliquem esforccedilos por meio da concentraccedilatildeo e

articulaccedilatildeo de iniciativas e evitando a dispersatildeo das accedilotildees pois a construccedilatildeo de habitaccedilotildees

precaacuterias em aacutereas de risco ou de proteccedilatildeo de mananciais deteriora o meio ambiente gerando

riscos para a sustentabilidade humana

Sendo assim todas as poliacuteticas ligadas agrave reforma urbana podem ser planejadas e

executadas de forma articulada e integrada com a elaboraccedilatildeo de Planos Diretores que podem

ser com caraacuteter participativo e popular Para isso os governos municipais estaduais e federal

podem atuar englobando poliacuteticas coerentes que se complementem uma vez que a moradia

faz parte de um conjunto de fatores responsaacuteveis pela melhoria das condiccedilotildees de vida

habitaccedilatildeo sauacutede emprego e educaccedilatildeo

Portanto para se ter uma gestatildeo eficaz eficiente e com efetividade das poliacuteticas

habitacionais norteada pelo ideaacuterio da reforma urbana torna-se necessaacuterio um amplo

processo de mobilizaccedilatildeo e conscientizaccedilatildeo popular capaz de criar mecanismos que

assegurem legitimidade agraves decisotildees puacuteblicas articulaccedilatildeo entre as accedilotildees governamentais

ampla poliacutetica de redistribuiccedilatildeo de trabalho e renda e assegurar a permanecircncia dos moradores

atingidos pelos programasprojetos habitacionais no seu local de origem apoacutes o processo de

renovaccedilatildeo urbana para que seus valores e laccedilos constituiacutedos natildeo sejam desfeitos

A criaccedilatildeo de espaccedilos que possibilitam a participaccedilatildeo poliacutetica e que renovam a

promessa de democratizaccedilatildeo da sociedade tem se apresentado como um importante

mecanismo para a configuraccedilatildeo de um novo desenho de gestatildeo puacuteblica visto que trazem na

forma da lei a ideacuteia de transparecircncia descentralizaccedilatildeo controle democraacutetico e participaccedilatildeo

popular

Isso eacute um processo que pode estar em permanente construccedilatildeo estabelecendo novas

formas de relaccedilatildeo entre o poder puacuteblico e a sociedade civil visando a uma nova cultura

poliacutetica assim como agrave garantia de seu direito agrave cidade

Conforme enfatiza Harvey (1980) natildeo eacute possiacutevel solucionar os problemas urbanos e

os conflitos pelo solo urbano se natildeo for garantida a participaccedilatildeo dos cidadatildeos nos processos

de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo das cidades e que o direito agrave cidade envolve o direito de participar

do urbano de forma a atender as necessidades da massa da populaccedilatildeo Entatildeo o direito agrave

293

cidade passa pela luta dos diferentes grupos sociais pela apropriaccedilatildeo e domiacutenio do espaccedilo

urbano a qual gera espaccedilos segregados e formas de resistecircncia

Portanto instigar a participaccedilatildeo popular no processo de planejamento e gestatildeo das

poliacuteticas habitacionais municipais torna-se um grande desafio e eacute de fundamental importacircncia

uma vez que se pode capacitar os atores sociais populares para qualificar sua participaccedilatildeo nos

espaccedilos institucionais relacionados a poliacuteticas puacuteblicas aleacutem disso eacute necessaacuterio se ampliar o

nuacutemero e a representatividade de organizaccedilotildees integradas em processos concretos de

exerciacutecio ativo de sua cidadania

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