Uma Análise Sobre o Ensino de História e o Livro Didático

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UMA ANÁLISE SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA E O LIVRO DIDÁTICO" Sonia Maria Gazo[a Pastro Diná Teresa Conticro * * RESUMO; Este texto pretende expor algumas considerações acerca do Ensino lle História e dos livros did:íticos utilizados em sala de 3ub. Para isso, utilizamos a nossa pr()[lria experiência enquanto de 1º. e 2º. graus. UNITElUvlUS: ensino de história; livro didáticu; indlistri:l cultural. L A idéia de Ensino na escola brasileira hoje supôe a reconstrução social cujos participantes assumam um compromisso histórico na elaboração das respostas às exigências da comunidade. Diante du momento histórico em que vivemos é bastante c importante fazer-se uma reflex<1u, um questionamento, sobre () Ensillu de História. Como instituição sistemática e compromissada com a realídade social, a escola e o ensino, e no nusso caso específico, o ensino de História, tem como finalidade prupiciar aos alunos condiçôes para a formação de indivíduos críticos, participativos e capazes de atuar na transformação da sociedade. Originalmente publicado em História & Ensino, v. 2, p. 35-41, 1996. '"'Professoras de História da Rede Pública Estadual de Ensino e 2º graus - Nov<l Esperança- PRo llisllÍria & bbiJW. Londrina, v. 8, edição p. ;)0-6(,. Ollt. 2002 59

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analise do ensino de historia

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  • UMA ANLISE SOBRE O ENSINO DE HISTRIA

    E O LIVRO DIDTICO"

    Sonia Maria Gazo[a Pastro Din Teresa Conticro* *

    RESUMO; Este texto pretende expor algumas consideraes acerca do Ensino lle Histria e dos livros did:ticos utilizados em sala de 3ub. Para isso, utilizamos a nossa pr()[lria experincia enquanto

    prot(:SS()r~IS de 1. e 2. graus.

    UNITElUvlUS: ensino de histria; livro didticu; indlistri:l cultural.

    L

    A idia de Ensino na escola brasileira hoje supe a reconstruo social cujos participantes assumam um compromisso histrico na elaborao das respostas s exigncias da comunidade.

    Diante du momento histrico em que vivemos bastante ~cnsvel c importante fazer-se uma reflex

  • Lamentavelmente, essa no tem sido a reali,bde. E talvez um dos instrumentos cundicionadores deste st,ltllS qllU, entre outros tantos, tem sido os livros didticos. Quase sempre, os livros did8ticos mostram a histri,1 pelos olhos da classe dominante, ocultando o outro lado da Histria, ou seja, a histria das classes subalternas, como se elas no tivessem tido nenhuma importncia ou participao na formao dos processos histricos.

    Neste sentido, podemos indagar sobre que tipo de histria os estud,mtes hrasileirus tem recebido. Trata-se de um,l histria a servio das cbsses dominantes, factual, ;ltenta s coisas do passado, ocup:l11llo uma funo ideolgica dentro da estratgia da ordem, que re/lete os interesses das classes que detm () pllder. O que rd\m~a esta idia o fato de se procurar oferecer aos estudantes urna histria elaborada a partir de f~ltos fwgmentados que impedem a compreenso de processos como um todo, visando escamotear a dominao da classe existente. Uma histria que omite () conflito entre as classes, no dando importncia ao papel que () indivduo ocupa no prucesso de produo.

    Embora o currculu em vigncia tente propor o contrrio, a realidade do ensino e a atuao dos professores em sala de aula no dia-l-dia refletem o que dissemos acima. Devemos, no entantu, ressaltar a experincia de muitos professores, que em seu 8rdllO e perseverante trabalhu vem procurando contribuir com a transformal) desejada.

    Assim, entenclemus que estudar ou ~malisar a hist6ria procurar est,lbclccer unI dilogo entre o presente c II passado (CHESNEAUX, 1977), tendo como reerncia a histria vivenciada, acompanhada pelo contedo historiogrfico e tambm pelas memrias deixadas pelos homens.

  • lI.

    Sabemos que o conhecimento histrico no um dado pronto e acabado, mas uma constante reelaborao e construo que se d a partir de necessidades e problemas colocados pelo cotidiano. A percepo de possibilidades de elaborao do conhecimento deve tornar o flo condutor de todo () trabalho do conhecimento histrico.

    A histria escrita a partir de fatos que se desenvolvem de lima prublemcltica central. Os fatos cumpe a histria, cabendo portanto, ao historiador recorrer s teorias e s fontes para melhor explicit- las.

    Ao analisarmos o Ensino ele Histria ministrado nas escolas, Lu-se mister compreendermos que estas so um reflexo cid SllliL'llade !lei qual esto inseridos.

    Hoje, muitos se preocupam com a formao dos professores de histria e tambm com a realidade do ensino em nossos dias. Esta preocupao se estende em muitas reas diferentes nas universidades. Como nos afirma Da Fenelon (1985):

    o historiador se julga distanciado do social, concretizando assim a diswr~:lu entre u fazer e o escrever. O conhecilllL'nlO visto como 'llg() pa.i.si\'(l, despolitizado e sempre inLelcclllCliizado e a histria se produz dentro desses limites institllciullais L'0111 esta perspectiva no C(lI1,Scgue mais do ljue formar profissiol1:li . .s que serJU os reprodutores

    lksta~ l'l~rCCpes.

    A grande maioria de nossos estudantes no compreendem a histria que estudam e muito menos a sua finalidade. Talvez seja este um dos motivos do desinteresse dos estudantes de 1". e 2. graus pelo ensino de histria. O que aumenta em muito a responsabilidade do professor em apontar aos alunos novos caminhos que visem criar o interesse pelo conhecimento e

    HisLlria & Ensino. Londrina, v. 8, edio especial. p. 'i9'()(l, out. 2002 61

  • 1 compreenso da his5ria como um processo, pois de nosso conhecimento que h:'\ um certo comprometimento da Histria oficial com certos intere~ses da classe dominante.

    Fica ento a dupla tarefa: repensar nussos equvocos c rever a historiografia que analisa a Histria e o ensino de histria. S assim, poderemus contribuir com a transformao da sociedade em que vivemos.

    O livro did{]tico l) material que prope a uma ao educativa, cujo cOlltedo pensado e elaborado tendo em \ista as conCCp(leS e os valures que o produtor, no caso do autUl; e a escola consideram desejveis para sua clientela.

    Assim sendo, o grande problema deste questionamento, ni'o o aspecto pedaggico e didtico do livro escolar, mas sim o aspecto ideolgico e dos valores explcitos ou implcitos, presentes nos contedos.

    o livro didctico um dos reSl'olls:Jveis pelo conhecimento histrico que CO!1stitlli () que poderi,l ser chamado de conhecimcntu elo homem colllum. ele () cOlbtrutor doconhecinwnto histrico daqueles UlJO "lher no vai ~lllll ,li) que lhes foi trammitidol'cla escola de primeir,) e Sl~gundo gr~\ll' (A nuLl, 1984).

    Esse homem comum acredita na histria factual, onde os personagens principais so os heris. Portanto, a histria de alguns homens so transfonnadas em Histrin cb humanidade, causando um grm'e problema, porque nem todo mundo se sente a altura de imit:.lus, pondo-se tcmicl:tmente margem de qualquer procesw de deciso.

    Mais preocupante se torna o livro didtico, medida que, vem assumindo uma outw funo: a de informar tambm r) professor. Este, em razo das deficincias de formao e das conllir1cs de trab~llh() qUl~ enfrenta, nll procura outro tipo dL'

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  • I11Cltcri~d para preparao de aulas, quer expositivas ou de qualqller outra natureza. Dessa maneira, o trZlbdlho do professor tem se tranformado num reforo das idias contidas no livro didtico adotado, que visto pelos alunos, como a nica fonte dgna de confiana.

    Mesmo no Paran, a partir de 1990, com a implantao do novo currculo hsico, os usuais e velhos livros didticos foram mantidos como recursos nas escolas. Com isso, tanto a cOl1cepJ() Llc histria como a seleo do que de\'(' ser ensinado t;lmbm fixam mantidas (voltamos l rdorar, mais uma vez, que est~llll()S abordando a questo gencric:lmente, no considnando aqui as experincias transfonnacl,JLls, que ainda Scltl poucas, mas com certeza, profCllCls), passando a idia de L!UL' existL' uma histria correta que deyc persistir na formao do estudante. Falta ento a incorporao das idias transmitidas pelas novas propostas historiogrficas, vistas tambm no como verdades imutveis, mas como afirmao possveis de reviso na medida em que se repensa e se reescreve constantemente a histria.

    Um exemplo, o caso de Jim Sharpe, em seu artigo intitubLlo A Histria vista de Baixo (BURKE, 1992), onde ele trata ljuest\leS que abordam as dificuldades dos histuriadores que trc]h,ilham ,] histria por um outro fngulu, e que ao buscar reconstruir ~l cxperincia das classes subalternas, ainda assim, trahalh,] muito restritamente a varielhle de fontes de pesquisas il sua disposio.

    Segundo o autor,

    Ocultou-se um,] questo fundamental: A Histria vista de baixo constitui uma ahordagcm da histria ou um tipo distinto de histria? Como abordagem, a I-list(lria vista de Baixo preenche comprovadamente duas funes import'111tes. A primeira servir como corre-tiv() Histria

    llisl

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    da dite, l':mllllostr,lr, por exemplo, que a batalha de \\!aterl()() envolveu tanto () s(l],bclo como o Duque. A segunch que, oferecendo esta abordagem alternativa, a Histria vist:l de Baixo abre a possibilidade de Ullla sntese mais rica da cllmpreenss:lo histrica de uma fuso da histria da experincia do cotidiano das pessoas com a temtica dos tipos mais tradicionais de Histria (SHARPE, 1992).

    Na verdade essas preocupaes est80 em boa parte entre os profission(lis da produo histrica, mas o prohlem(l se complica quando se ckpara com :l chamada histria de vulgari:a8o, ou da divulgaflo dos saheres, que aquela contida e contada nos livros didticos.

    lU.

    Pelo exposto, conclumos que o Ensino de Histria atravessa por uma fase crtica devido a varios fatores tais como:

    1) podemos perceber que os professores de Histria que ministram aulas no 1 e 2 grmls, pela deficincia da formao e pela Ltlta de recursos financeiros, acabam quase sempre recorrendo aos livros didticos que uanslnitem uma histria factual e fragmentada. Lament~l\'dlllcnte, ao transmitirme)s esta histria para os alunos, esL11l10S contribuindo para () desinteresse dos mesmus, pois assim, eles no conseguem currelacionar os c()nte\~lll()s trabalhados com S\lCl realidade. Se os professures ,k histria no conseguL'1n se apresentar agentes ou produtores do processo histrico, dificilmente conseguir8o que os ,tlunos o sejam.

    2) os livros didticos de histria utilizados nas escolas esto dissociados da realidade do mundo. Jamais poder ser um instrumento vivo se o mesmo no se

    Hist(lri:1 & bbino, Londrina, v. 8, edio especial, 1'. [)9-66, ()llt. 2002

  • utilizar de uma linguagem adequada que venha de encontro s reais necessidades ,h)s nosso alunos. Um material que adote uma viso crtica ela sociedade em que vivemos, que estabelea questionamento de valores sociais, murais, religiosos, polticos e que caminhem uma transformao da sociedade.

    o professor deve usar o contedo de forma que propicie a problcmati::ao do presente e du passado trabalhando de trnlC1 comparativa produo histrica de v,'irias sociedades: prollu

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    por tudo is'so, que os professores e profissionais de histria tem o dever de repensar o ensino de histria, procurando coloc-lo como um instrumento capaz de contrihllir com a transformao da sociedade.

    Referncias

    ABUli, K. O livro didtico e a popularblso do saber hi~t6ricn. 11\: ~IIXA, M. (Org). Rcl1ensanc!o a histrriil. 2. ed. So Paulo: l'vlarCl) Zero/ ANPUII, 191:34. CHESNEAUX, J. Hacemos tabla rasa dei pasado? Madrid: Siglo XXI, 1977.

    FENELON, D. R. A f(mnao do profissional de hist6ria e a rC':llidadl::~ do ensino". Caderno Cedes, So Paulo, n. 8, 1985.

    PRIORI, A A cnncepo de histria nos manuais didticos: uma releitura. I Iistria & Ensino, Londrina, v. 1, p. 17-22, 1995.

    SHARPE, J. A histria vista de baixo. Tn: BURKE, P. (Org). A Escrita ela Histria. So Paulo: Edunesp, 1992.

    ABSTRACT: This text intcnds to exposC' some considerations concerning to History teachin,~ :l1ld I:he text bU,)ks llseel in classroulIl. For rh:lt, wc llSCel ()ur own cxperiencc ~IS tL'achL'rs of 1st. anel 2nd. dq~rees.

    KEY WORDS: history tcaching; text book; cultural industry.

    Hisl