Uma breve historia de um profissional de sucesso

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3ª Edição Dezembro de 2009

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3ª Edição Dezembro de 2009 Marcelo Augusto Prado Sant’Anna Marcelo Sant’Anna Caçapava – SP 2009-07-01 2 Uma breve história de um profissional de sucesso! Marcelo Sant’Anna 3 4 Uma breve história de um profissional de sucesso!

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3ª Edição

Dezembro de 2009

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Marcelo Augusto Prado Sant’Anna

UMA BREVE HISTÓRIA DE UM

PROFISSIONAL DE SUCESSO!

Marcelo Sant’Anna

Caçapava – SP

2009-07-01

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

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Sumário

Prefácio do Autor .................................................................... 7

Dos 7 aos 10 anos – 1974 a 1977 ............................................ 9

Dos 11 aos 14 anos – 1978 a 1981 ........................................ 14

Dos 15 aos 17 anos – 1982 a 1984 ........................................ 20

Aos 18 anos – 1985 ............................................................... 25

Dos 19 aos 23 anos – 1986 a 1990 ........................................ 28

Dos 23 aos 26 anos – 1990 a 1993 ........................................ 35

Aos 27 anos – 1994 ............................................................... 41

Dos 27 aos 31 anos – 1995 a 1998 ........................................ 45

Dos 31 aos 33 anos – 1998 a 1999 ........................................ 50

Dos 33 aos 35 anos – 1999 a 2002 ........................................ 54

Dos 35 aos 36 anos – 2002 a 2003 ........................................ 59

Dos 36 aos 38 anos – 2003 a 2005 ........................................ 63

Dos 38 aos 42 anos – 2005 a 2009 ........................................ 68

Sucesso finalmente! ............................................................... 71

Triângulo do Sucesso da 4B .............................................. 72

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Prefácio do Autor

esde muito jovens, as pessoas são direcionadas para o

sucesso, principalmente os integrantes das classes C, B

e A de nossa sociedade. Aprendemos sempre que o

importante é ter dinheiro e fama, mesmo que o reconhecimento

seja menor. Ganhar dinheiro na verdade é extremamente fácil,

gastar o que se ganha é que requer inteligência. E essa também é

fundamental para uma boa vida, cheia de prazeres e lucros.

Os lucros hoje, principalmente dos investimentos em mercados

financeiros são enormes, tanto os positivos quanto os negativos.

Esse último é exatamente a causa primeira das crises mundiais.

Tudo em nossa vida é passado, até mesmo o que enxergamos,

por isso, viver o máximo do presente é fundamental para o real

sucesso. As oportunidades batem à sua porta a todo tempo, e

muitas vezes sequer olhamos para elas.

Mude seu foco, pense em ter sucesso e você terá! Esqueça se

alguma coisa ruim acontece no momento ou aconteceu no

passado. Viver agora é o importante e planejar seu futuro é

fundamental.

Espero que possam de alguma forma, perceber os nuances do

desenvolvimento profissional de um executivo de sucesso!

Marcelo Sant’Anna

D

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Dos 7 aos 10 anos – 1974 a 1977

os sete anos eu ainda era um analfabeto, ao contrário de

meus filhos que, aos cinco de idade, já praticamente

liam e escreviam. Mas pelos idos de 1974 penso que

isso era normal, pelo menos entre meus amigos de primeira série

primária, se bem que me lembro que alguns tinham um

desenvolvimento bem melhor que o meu. Provavelmente por

terem freqüentado o jardim de infância, coisa que eu detestava.

Odiava comer as merendas e dormir após as brincadeiras era um

tormento, pois sempre urinava quando dormia. Talvez por isso

eu tenha fugido tantas vezes de lá que meus pais simplesmente

desistiram e deixaram para mais tarde meu início nos estudos.

Sempre fui muito falante o que talvez justifique minha tendência

a ser palestrante nos dias de hoje, o que também gerou alguns

problemas disciplinares quando criança. Minha mãe era também

alfabetizadora, como minha tia, e se orgulhava de ter seu filho a

estudar em um colégio estadual, coisa que à época era sinal de

ensino de qualidade. Lamentavelmente eu tinha que freqüentar

um colégio diferente de onde ela lecionava, o que me deixava

constrangido, pois ser filho de professora era motivo de

vantagens para alguns colegas, menos para mim e muitos de

meus aliados amiguinhos. Tia Leda foi minha professora e

sempre elogiava minha letra, que garanto ainda continua bem

legível, mas normalmente reclamava da quantidade de palavras

por segundo que eu pronunciava durante as aulas. O garoto com

certeza seria de alguma profissão que usava bem as palavras,

A

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como professor mesmo, advogado, pedagogo, vendedor entre

outras tantas, mas a escolha foi um pouco diferente, vocês verão.

Na segunda série, tive como professora tia Lourdes que da

mesma forma elogiava minha caligrafia e se preocupava com

minha locução desvairada, mais um sinal de que o profissional

do futuro teria muito sucesso. Além do mais, minha capacidade

de resolver meus problemas só, era impressionante. Algumas

vezes bem resolvidos, outras nem tanto. Mamãe tentou fazer

lições de casa comigo por duas ou três vezes nesse período, e as

respostas prepotentes sempre foram: “não é dessa forma que tia

Lourdes ensina!” Pronto! Estava criado o monstrinho que de

tudo saberia alguma coisa e que jamais aceitaria ser recriminado

pela forma de fazer as tarefas, mas apenas pelos resultados. Os

pobres viventes com esse pequeno gênio, em sua percepção

obviamente, sofreriam com isso para os restos de suas vidas.

Saía de casa sem avisar ninguém para recolher doações para o

Sanatorinhos, e deixava todos em polvorosa. E assim foi a vida

da EEPG1 Lindolpho Machado em Caçapava, cidade do interior

de São Paulo cuja única coisa que evoluiu foi o atraso.

Fiz muitos amigos, fiéis até hoje, durante esses quatro anos de

primário. Os que ainda encontro, são pessoas de sucesso e têm

suas vidas equilibradas e felizes, como deveria ser com todos os

alunos das escolas estaduais daquele tempo delicioso e saudoso.

Sempre íamos para a escola com a perua do seu Liquito, que

carregava um amontoado de crianças, muito mais que a

1 EEPG – Escola Estadual de Primeiro Grau

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capacidade do automóvel, sem cintos de segurança, sem air-bags

e com portas que amassavam os dedos das pobres crianças

distraídas durante a entrada ou saída. Ele estaria preso hoje pelo

estatuto da criança e do adolescente, e seu ganha-pão

provavelmente estaria em um pátio do departamento de trânsito,

interditado. Mas isso se estende para o carro de meus pais

também, dormíamos durante as viagens noturnas totalmente

amontoados e os cintos ficavam embaixo dos bancos, para

desobstruírem nossos assentos. Impressionante como ainda

estamos vivos após todos esses criminosos disparates de

segurança. Além disso, na merenda, comíamos em pratos e com

talheres de alumínio, bebíamos em canecas do mesmo metal,

que eram lavados em bacias também estampadas com palhas de

aço, nada inoxidáveis, e com água da torneira. Apesar disso, me

lembro apenas da catapora que peguei aos oito anos. Nada

comia, mas mantinha uma saúde de ferro. Corria o tempo todo,

tanto em casa quanto na escola. Jogava futebol com pedaço de

tijolo, retirado nem me lembro de onde, que às vezes retirava um

belo pedaço de nosso dedão do pé. Jogávamos bolinhas de gude

no pátio todo de terra do colégio, onde fazíamos as birés2 com

os calcanhares mesmo. Passava as manhãs e noites totalmente

perdido pela Vila Militar, ou no campinho jogando futebol ou no

clube do Círculo Militar, atormentando o seu Hamilton e

algumas vezes furtando alguns refrigerantes e salgados com meu

quase inseparável amigo Claudinho. Quase até que tentei dar

2 Buracos na terra, alguns chamam de casas.

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uma de canibal e comer parte de sua perna, cicatriz que até hoje

ele leva consigo de lembrança. Foi mal!

Assistimos a Copa do Mundo de 1974, da Alemanha, em uma

TV colorida colocada no salão do Círculo. Todos da vila

reunidos para o tão sonhado tetra-campeonato, que só viria

muitos anos depois da era Pelé. Durante as noites, na segurança

de uma área até então respeitada por todos, onde meu pai era

Tenente, tínhamos serestas, íamos às casas dos amiguinhos para

atormentar as mães, corríamos pelas ruas, comprávamos chiclete

no bar da Vila São João. Vi chegar os primeiros telefones com

DDD à cidade, onde roubávamos os fios coloridos dos cabos

para fazer pulseiras e tentar vender para alguém, e essa foi

minha primeira experiência como profissional de vendas: um

verdadeiro fracasso. E eu também fingia que o telefone de

minha casa funcionava para os amigos, só que ele apenas foi

ativado dois meses depois de sua instalação. Tive minha

primeira briga com meu pai, pois fui roubado de suas moedas

colecionadas aos longos de muitos anos e fiquei amedrontado de

apontar os culpados, assumindo que eu tinha trocado por balas.

Hoje essas moedas pertencem a meu filho, pelo menos as que

sobraram.

Ser falante em nada me ajudou, talvez pela timidez que era

enorme e para a qual nada solucionava, tanto quanto me fazer

comer alguma coisa que prestasse. Sempre estava metido em

alguma encrenca, mesmo que pequena, e até mesmo conheci

meu primeiro amor, uma flor de laranjeira, mas carioca. Já viu

né? Caipira só se dá mal nessas situações! Quebrava alguns

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vidros do hotel de trânsito de vez em quando, até que fui

proibido de freqüentar a rua do famigerado. Até que alguns

amigos colocaram fogo no matagal, perto da casa do general e

eu fui imediatamente acusado, sem julgamento. Foi a primeira

vez que minha mãe saiu furiosa em minha defesa com os

militares, já que eu nem estava na cidade. Meu pai, Ten. Dyno,

como subalterno totalmente dedicado ficou calado, apenas a

concordar com a Dona Anita. Isso deixava claro para eles que

jamais eu poderia ser um homem da caserna de sucesso, ao

menos que me colocassem imediatamente como coronel ou

coisas do tipo. Simplesmente impossível!

Foram anos de muito aprendizado e de muitos amigos que

jamais esqueço, apesar do poucos contatos com eles, mas

sempre que nos encontramos, recordamos esses momentos tão

alegres de nossas vidas. Alguns permanecem freqüentes em

minha maturidade, mas alguns até faleceram, o que muito

lamento pela tão breve passagem nesse mundo e de tão pouco

conhecer de seus legados.

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Dos 11 aos 14 anos – 1978 a 1981

os onze anos tive minha primeira experiência fora de

meu reinado. Fui estudar na cidade vizinha de São José

dos Campos no colégio dos ricos e bem aventurados. O

Instituto São José! Colégio preparado para formar os melhores

alunos do Vale do Paraíba, orgulho para todos os pais uma vez

que o ensino público começava a declinar. Muitos de meus

amigos do primário estavam no mesmo barco, mas eu acordava

muito cedo e isso me deixava meio irritado. Além disso, estudar

de manhã me fazia perder quase todos os desenhos animados

que eu gostava de ver na TV. Viajávamos de ônibus fretado,

com um tanto de gente da quinta a oitava série, além dos já no

colegial. Eram umas delícias as badernas que fazíamos durante

as viagens e realmente era a única coisa boa que guardo dessa

época. Foi lá que primeiramente tive contato com o voleibol, e

isso me ajudou bastante, apesar de eu sempre me achar melhor

do que realmente era. Nunca mais retornei ao instituto só para

me manter puro de pensamento. Nem fui tão mal assim nessa

segunda metade do primeiro grau, mas estudar inglês e francês

era simplesmente insuportável. Que futuro eu teria se falasse

uma língua que eu nem entendia caramba? Lembro-me de

ganhar até mesmo um dicionário de expressões idiomáticas de

um tio, e outro de sinônimos. Os dois em inglês! Eles queriam

que eu repetisse o ano para perder a pompa de gênio, com

certeza! Eu nem de longe percebia o esforço financeiro de meus

pais para me manter nesse jardim da fantasia dos estudiosos.

A

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Minha irmã mais velha já estava na faculdade e apenas minha

irmã do meio ainda estudava em colégio estadual, muito pela

escolha dela, mas eles jamais teriam fundos suficientes para três

pagantes em escolas particulares. Quando passei de ano ganhei

até uma bicicleta, enquanto minha irmã do meio ganhava uma

moto de cinqüenta cilindradas, “cinquentinha”, provavelmente

para suprir os gastos com meus estudos. Minha BMX custou

quatro mil cruzeiros, e eu a vendi, um ou dois anos mais tarde

por fantásticos setecentos cruzeiros. Segundo fracasso como

profissional de vendas. Parece que as preces de minhas

professoras, de eu ser um vendedor de sucesso, só se

concretizariam com um milagre. Imagine com uma inflação de

setenta por cento ao mês o quanto os quatro mil reais valiam

dois anos depois. Pura genialidade! Três anos de colégio de

freiras, dos onze aos treze anos, muito me ensinaram. Jamais

mostre a língua para a madre superiora, principalmente se ela for

a irmã Zélia, guardem bem esse nome, ou diga à irmã

Margarida, de ensino religioso, que cristandade é uma grande

bobagem ou passe a mão na menina mais bonita do colégio

chamada Ana Lia, mesmo que seja no cabelo ou ainda, tente

beijar a sobrinha do prefeito da cidade. Isso pode gerar grandes

problemas para seus pais e idas freqüentes à sala da diretoria,

para tomar muita bronca. Sorte que madres e irmãs deixam os

palavrões apenas em pensamentos.

Como é muito claro perceber, muitos profissionais de sucesso

começaram suas vidas de negócios aos onze, doze anos de idade,

alguns até já tinham feito fortuna aos dezoito. Eu nem de longe

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sonhava em ser outra coisa além de Astrofísico. Meu pai

começou a trabalhar aos doze e até tentava me pagar alguma

coisa para ajudá-lo a engraxar os sapatos e botinas do Exército.

Totalmente sem sucesso! Ganhar dinheiro era uma coisa muito

sem importância e apenas me lembrava que ele existia quando

estava de férias na casa de alguns tios, com meus primos, pois

eles pediam e juntavam tanta grana que eu pensava ter que ser

igual. Até pedia para meu tio trocar as notas grandes por

trocados, de forma a ter um bolo maior de notas para preencher

o enorme grampo de metal que ele comprou para mim. Lembro-

me de um natal onde as meninas da casa, as sobrinhas,

ganharam mil e quinhentos cruzeiros, embrulhados em pacotes

de sutiãs e os meninos apena mil cruzeiros. Revoltei-me

profundamente com isso e jamais me esqueço de Tio Dalton,

completar com um cheque a diferença. Aliás, querer ser Físico

foi influência direta desse meu tio. Esse de verdade um gênio,

arquiteto, engenheiro civil, músico, inventor, poliglota entre

outras coisas. Criou até mesmo o que hoje conhecemos como

computador de bolso, em um tempo que nem computador

pessoal existia, mas para ajudar surdos mudos. Perdeu a patente

por falta de tecnologia no Brasil para a construção de um

protótipo. Trabalhava como arquiteto no instituto de previdência

de São Paulo, onde vistoriava obras financiadas pelo governo do

estado e foi dele também a influência pela minha falta de

intimidade com o dinheiro. Por devorar livros sobre ciências,

principalmente física, enciclopédias, livros de história entre

outras coisas, passei a falar menos, principalmente em família. À

exceção de quando estava com papai, tio Dalton e o tio Ewaldo.

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Era para mim de impressionar a falta de conhecimento dos

outros sobre os assuntos que gostava de falar e escutar. Como eu

jamais escutava os outros, sendo já o pequeno dono da verdade,

passaram a me ver como um pouco diferente, da mesma forma

que minha irmã Rita, a mais velha. Ela mesma, estudante de

psicologia, fez alguns testes de QI comigo e deixou-me

tranqüilo. Eu era anormal, mas muito longe de genial.

Começava o estreitamento das profissões de sucesso que eu

poderia galgar no futuro e começa o drama de querer ser físico a

todo custo. Passei ileso pelo Instituto São José. Minhas crenças

permaneciam as mesmas apesar de ter pais totalmente católicos,

um tio mais ou menos qualquer coisa entre católico e gnóstico e

outro tio, totalmente ateu. Nossos encontros eram uma delícia e

eu ficava estupefato com as discussões políticas, religiosas e

futebolísticas dos três, exatamente as três coisas que nunca se

discutem. Santíssima trindade!

Passei a adorar filosofia, argumentações, divagações e algumas

loucuras. Tinha uma teoria sobre a origem do universo e das

coisas e sempre tentava, em vão, entrar para um grupo de

astrônomos amadores de minha cidade. Eles tinham discussões

ótimas sobre os assuntos que adorava, mas jamais fui aceito,

apesar de ainda ser colega de todos eles. Passei a ganhar e

comprar livros e mais livros sobre ciências e me aprofundar cada

vez mais no conhecimento da filosofia. Estava traçado o

caminho para o profissional de sucesso: físico, filósofo,

professor ou advogado? Mas ainda faltavam anos para os

vestibulares da universidade, e antes, eu teria que provar mais

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uma vez minha capacidade intelectual passando no que

chamavam de vestibulinho, para entrar ou na ESPCEX3, ou

EPCAR4 ou ainda a ETEP

5, para somente depois pensar em

minha profissão para o resto de minha vida. Dureza para um

garoto de treze anos estudar para esses testes, ainda mais que

meus conhecimentos e minhas vontades de aprender nada

tinham a ver com as matérias do ginasial, tampouco do colegial.

De qualquer forma, consegui algumas provas anteriores e fui me

preparar para as escolas militares, que eu nem de longe queria

ingressar. Lembro-me de ter sido o penúltimo colocado! Entre

os classificados? Triste sonho. Fui penúltimo mesmo... Caía

mais uma vez por terra o sonho de ser um general genial. Ter

passado no vestibular do colégio de caserna seria o maior

orgulho para meus pais, principalmente para o velho Dyno, que

via cada dia mais seu filho intransigente e dono de seus

pensamentos e atitudes, muitas equivocadas obviamente. Mas

nem tudo estava perdido. Fiquei na turma de reforço da

Everardo Passos, também em São José dos Campos, um semi

internato de pré-engenheiros mecânicos ou eletricistas, onde se

passa todo o dia entre aulas, laboratórios, educação física e aulas

de fortalecimento de conhecimentos esquecidos durante o

colégio. Apesar de meus hercúleos esforços para cair fora da

ETEP, fui obrigado por meus pais a ingressar na escola, pois era

motivo de orgulho um filho ter passado numa entidade dessa

fama e ter praticamente garantido seu emprego depois de

3 ESPCEX – Escola Preparatória de Cadetes do Exército

4 EPCAR – Escola Preparatório de Cadetes da Aeronáutica

5 ETEP – Escola Técnica Professor Everardo Passos

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formado, como um técnico. No meu caso, técnico em mecânica!

Como ferramenteiro de uma GM, Ford ou Volkswagen, eu teria

finalmente uma carreira profissional assegurada e ganharia

muito dinheiro além de ter de aprender a obedecer a ordens,

trabalhar em equipe e a acalmar meus ímpetos de cientista

maluco.

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Dos 15 aos 17 anos – 1982 a 1984

ara todos eu contava com orgulho meu ingresso na

Escola Técnica Professor Everardo Passos, sem jamais

comentar sobre as aulas de reforço obviamente. Isso feria

demais minha consciência tranqüila de ser “quase” um gênio.

Ganhei uma bicicleta nova que usava durante os períodos que

conseguia ficar em Caçapava e podia treinar basquete e voleibol.

Mas após o início real das aulas, começava o inferno novamente.

Além de freqüentar as aulas regulares, ainda tinha que fazer as

aulas de reforços que eram cassete, muito chatas mesmo. Os

professores eram mal humorados de terem que tratar com alunos

inferiores aos superdotados das outras turmas. Mamãe Anita me

acordava às quatro horas da manhã e trazia leite quentinho na

cama. Que dificuldade para levantar! Ela me levou à rodoviária

para pegar o ônibus durante as primeiras semanas, mas depois,

era a caminhada do dia. Durante o verão até que era gostoso,

mas no inverno as coisas complicavam muito. Saia de casa e

mal enxergava a esquina. Além do mais, a falta de grana

complicava ainda mais para meus pais, minha irmã do meio

também entrara na faculdade. Dessa forma, todas as coisas que

usava para as aulas eram de algum ex-aluno, e isso me deixava

constrangido. Minha régua T era de tamanho inferior a dos

outros, meu compasso era de uma marca inferior e o preço da

mensalidade eu considerava abusivo. Papai e mamãe deveriam

dar essa grana para mim que eu faria coisas muito melhores,

como comprar livros instrutivos para o que decidira ser anos

P

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antes. Certos dias da semana eu retornava depois das vinte horas

para casa, e nada das delícias de bagunças dos ônibus fretados.

Era ônibus de frota mesmo. Andar a pé de casa à rodoviária,

rodoviária quase dois quilômetros para a escola, isso para deixar

de usar o circular, que eu considerava muito pobre e impróprio,

além de ser de péssima qualidade de conforto.

Mostrava-se claro que dureza nunca seria meu forte. Eu gostava

de pensar nas coisas, mas fazer era outro departamento. Adorava

jogar voleibol e curtir esses novos amigos, que ainda conservo

após tantos anos de ausência dos jogos. O esporte me ensinou

muitas coisas, mas eu também passei a jogar melhor que muitos

outros atletas, e dessa forma, substituí o gênio que deveria ser

profissionalmente pelo que seria nas quadras. Planejei até

mesmo ganhar dinheiro com isso, fazendo peneiras em times

que tinham equipes quase amadoras, patrocinadas por grandes

empresas e cujos jogos eram transmitidos pela televisão.

Sucesso na certa! Só que parei de crescer. Meus incríveis um

metro e oitenta e cinco centímetros, fantásticos para a época e

aos quatorze anos, permaneceram os mesmos, até hoje. Um

pouco menos agora. E como eu queria ser atacante, nada de

levantador que era coisa de baixinhos, fiquei meio sem meios de

prosseguir com o sonho, mas nutria-o todos os dias. Isso passou

a me fazer displicente com os estudos e passei a ter dificuldades

e, quando percebi que a vaca iria para o brejo, decidi deixar a

ETEP. Meu mundo caiu!

Meu pai ficou louco e pela primeira vez eu vi o Dyno pronto a

me dar uma surra, após quatorze anos de vida! Anitinha chorou

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quase que uma semana inteira, mas por fim, sem muitas opções

e certo que perderia o ano, consegui convencê-los a colocar-me

de volta nos colégios estaduais de Caçapava, só que com uma

condição: eu faria o colégio regular durante as manhãs e faria o

técnico de mecânica à noite. Beleza pura, os treinos de voleibol

sempre eram durante as tardes. Muito mais tranqüilo o ensino

público. Nada de pressões estratosféricas por notas, nem a

competição de ser melhor que seu colega de classe, que poderia

tirar seu emprego na Embraer. A competição se mantinha dentro

das quadras de vôlei, onde eu melhorava a cada treinamento e

até já fazia parte do time da cidade. Jogos regionais à vista! No

primeiro ano de competições oficiais, fora os jogos entre as

escolas do município, já ficamos em quarto lugar nos JICS –

Jogos de Inverno da Cidade Simpatia. Isso era impressionante

para um grupo de moleques. Os jogos de inverno

movimentavam praticamente toda a cidade durante o mês de

julho de cada ano. Os ginásios lotavam para ver as oito equipes

competir em cada uma das muitas modalidades esportivas como

voleibol masculino e feminino, basquetebol, futebol de campo,

futsal, atletismo, natação, malha, bocha entre outros. Muitos

atletas destes dois últimos esportes tinham idade para ser meu

avô. Eu prosseguia a melhorar meu desempenho e meu

condicionamento físico, e passei a me achar importante para o

time. Começava o período de sonhar com a genialidade

novamente e isso traz muita prepotência para um garoto tão

jovem. Nos jogos regionais desse ano, ficamos fora logo no

primeiro turno da competição, mas só fazer parte de uma festa

de todas as cidades vizinhas já era ótimo, além do mais, isso

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poderia trazer uma oportunidade com os olheiros dos times

amadores, mas profissionais da capital e alguns mesmo do

interior. No ano seguinte, um convite inesperado para integrar o

time de veteranos para os jogos de inverno e abandonar os

antigos colegas. Com certo peso na consciência, mas nem tanto,

quis ser vencedor logo em meu segundo ano, e isso veio de fato.

E para completar, ganhei medalha de jogador revelação. Ego no

infinito obviamente! As notas iam bem no ginásio, nas duas

escolas, eu era porta-bandeira durante os desfiles de sete de

setembro, nada mais perfeito. Repara-se que nunca gostei muito

de dureza e trabalho pesado, só no esporte mesmo. Minha irmã

Rita chamava isso de economia de capacidade, eu queria pouco

desperdiçar minha inteligência agora para sobrar mais para

depois, e nisso eu era mestre. E assim foram por mais dois anos,

até que novamente o estresse de um vestibular se aproximava.

Eu precisava me preparar para os testes novamente e ingressar

em uma faculdade que me desse um futuro garantido. Como

estudava em dois períodos, pensei que seria uma moleza passar

em pelo menos uma das minhas investidas. Dulcíssima ilusão!

FUVEST para física na USP, USP São Carlos e UNICAMP,

bomba... Fiquei entre os primeiros, dos desclassificados! Onde

estava a minha genialidade? Com certeza se perdera entre a falta

de comprometimento e a prepotência. Mas ainda restava uma

esperança. Direito na UNITAU6! Cheguei atrasado ao segundo

dia de provas devido a uma quebra do ônibus entre minha cidade

e Taubaté, e como resultado: fora da faculdade! Como podia

6 UNITAU – Universidade de Taubaté

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ser? Esse intelectual perdera praticamente um ano de sua vida

profissional. Um desastre! Eu e meus pais e meus familiares

jamais suportaríamos outro fracasso como esse, afinal, eu era

uma cara tão inteligente, saudável, amado e participante na

sociedade, teria que ter sucesso além do esporte. Meu pai ainda

insistiu para que eu tentasse a AMAN7, que refutei

imediatamente. Eu nem conseguia ver-me subordinado a um

cadete. Isso seria meu fim e com certeza eu passaria grande

parte de meus dias preso, apesar dos militares valorizarem muito

os atletas, e isso eu sairia em vantagem com relação aos outros

calouros. Mas de qualquer forma, isso me arrepiava a alma,

muito por ter convivido com militares a vida inteira de criança e

grande parte da adolescência, que em meu caso foi

“aborrecência” mesmo. Eu deveria me reforçar nos estudos, e

focar nos vestibulares do próximo ano, pois esse estava

totalmente perdido. Ingressaria em um cursinho em uma das

cidades vizinhas, já que eram inexistentes em Caçapava, e como

havia economizado para meus pais as mensalidades escolares de

dois anos e meio da ETEP, eles talvez se convencessem do

sucesso certo da empreitada. Após muito tempo, retorno para

São José dos Campos para a preparação para os vestibulares.

Muitos amigos da época de primário e ginásio juntos. Já mais

velhos, fazíamos bagunça nos ônibus de linha mesmo e

aprontávamos todas nas caminhadas entre as rodoviárias.

7 AMAN – Academia Militar das Agulhas Negras

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Aos 18 anos – 1985

elícia levantar de manhã e assistir aulas de cursinho.

Mundo totalmente distinto do ambiente escolar, onde

os professores sisudos e donos da verdade cospem seus

conhecimentos e você que se vire para entendê-los. Tudo

claríssimo! As apostilas bem feitas, com exercícios, tudo

mastigadinho. “Estou novamente no paraíso, vai ser moleza

passar no vestibular...” Os mestres pareciam conhecer tão

profundamente as matérias, que eu me sentia contagiado e

pasmo com tamanha inteligência. E logo eu que me achava

genial queria ser como eles quando crescesse. Queria ser um

professor de cursinho. Mas para isso, eu teria que ser primeiro

físico caramba, senão jamais teria alguma chance. Só que o final

do ano e os vestibulares ainda estavam longe e eu passava a

maior parte de meu tempo em treinamentos de vôlei, agora em

dois períodos. À tarde a auxiliar o técnico e a noite com o time

da cidade. Isso em quase nada me atrapalhava os estudos, pois

meu fascínio pela forma de ensinar dos profs. de cursinho, que

eram chamados pelo nome próprio, me faziam entender tudo

com muita facilidade, até o primeiro simulado. Nóssinhora!!!

Fui muito mal e pensei: “você tem que se preparar de verdade,

ou vai passar outra vergonha no final do ano”.

Eu de namorada nova fazia alguns meses nem queria me

imaginar saindo da mordomia em que vivia. Eu me preparava

para mais um ano sossegado e, ao final dele, estaria ingressando

em uma grande escola de física ou matemática, pois já haviam

D

Page 27: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

26

ampliados meus leques de opções. Só que no meio do ano,

ingressei em Engenharia de Telecomunicações em Santa Rita do

Sapucaí, no INATEL8. Lá conheci, durante o vestibular, pessoas

amigas até hoje, tomamos o primeiro porre da faculdade juntos e

comemoramos nossa aprovação. Pessoas de Caçapava já

estudavam no instituto. Um deles amigo de infância na Vila

Militar e outro bastante conhecido, que se tornaria meu cunhado

anos depois, casando-se com minha irmã Cristiane. Mas eu

queria ficar em minha cidade e continuar a jogar no time,

continuar o cursinho e ir para a capital ou Campinas, jamais para

Santa Rita nem sei de onde... Nesse momento de dúvidas o

capitão Dyno deu o golpe de misericórdia: “Ou entra no Inatel

ou vai trabalhar! Você escolhe?” Imediatamente fiz minhas

malas e fui para a cidadezinha do sul de Minas Gerais para ser

engenheiro. Ao chegar em agosto, faltavam vagas nas repúblicas

e alguns calouros, eu no meio, tivemos que montar a nossa

própria. Que dificuldade! Encontramos uma casa que nos

cobrava muito caro para a época de aluguel, mil cruzados por

mês. E isso preocupou todos os outros estudantes, pois poderia

inflacionar o mercado imobiliário da cidade.

Beleza! Nem bem chegados, nada sabendo fazer sozinhos e

ainda mal vistos por toda a comunidade acadêmica. Que começo

espetacular! Nós éramos sete calouros e totalmente diferentes

um do outro. Dois caipiras de Caçapava, um mais nobre e

experiente de São José dos Campos, dois baianos de Salvador,

um mineiro de Pouso Alegre e outro de Cataguazes, um de São

8 Instituto Nacional de Telecomunicações

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Marcelo Sant’Anna

27

Luiz do Maranhão e assim fizemos o nosso pardieiro. O duro foi

aprender, além da convivência em grupo, ter responsabilidades.

Minha cabeça permanecia com vontade de ficar em Kansaspava,

mas meu ego me dizia que eu me sairia muito bem como

engenheiro, nem me perguntem o porquê. O primeiro semestre

foi bem tranqüilo e eu imediatamente procurei o time de vôlei da

faculdade para continuar meus treinamentos. Além disso, jogava

também com os nativos, como eram chamados os moradores de

Santa Rita: nós estudantes, eles nativos! As aulas de período

integral me lembravam a Everardo Passos, mas as dificuldades

eram bem menores. Caminhava todo dia da república para a

faculdade, e isso levava uns dez a quinze minutos, dependendo

da preguiça do dia. Só os horários quebrados e morar com doze

pessoas é que era meio estranho, além da comida obviamente.

Acostumado a comer somente arroz, feijão, bife de filé mignon e

batata frita, ter que enfrentar a comida da Dona Maria era outra

experiência que eu deveria ter para crescer um pouco mais.

Outra coisa bastante dura era enfrentar os ônibus de linha até

chegar à cidade simpatia. No mínimo quatro horas de viagem

quando vínhamos por Itajubá, ou muito mais de seis, quando

“cortávamos” caminho por Paraisópolis.

Nesse ano fiz a meu alistamento militar e tinha certeza da

dispensa por estar em uma faculdade, fora de minha cidade de

residência, mas de qualquer forma, a convocação viria somente

no próximo ano e eu pouco me preocupei com isso. E a falta

desse pensamento antecipado me gerou problemas

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

28

Dos 19 aos 23 anos – 1986 a 1990

pós o primeiro semestre concluído, consegui uma vaga

na república Dinossaurus, dos outros taiadas e deixei a

Gambiarra, dos calouros. Eles conseguiram outros

estudantes e tudo ficou em paz, mas lembro que gerei um mal

estar com minha saída, e também fiquei meio chateado, afinal de

contas, era o segundo time que eu abandonava para ter mais

facilidades de atingir meus objetivos em outro lugar. Só que

mesmo antes de voltar, a lembrança e a surpresa! Eu fui

convocado para servir no Regimento Ipiranga, o 6º Batalhão de

Infantaria do Exército, onde meu pai servira com orgulho por

mais de dezoito anos. Um desespero generalizado me bateu:

“Perdi um ano pelo falta de foco nos estudos e agora mais um

como “réco”, que falta de sorte!”

Com muito jeito e da forma mais humilde que eu podia me

expressar, fui solicitar ao amado papai, Capitão Dyno, que

interferisse para minha dispensa, devido ao curso de engenharia.

Só que eu sabia ter comido bola, pois deveria ter pensado nisso

antes... A fúria do homem foi incontestável, ele odiou o pedido:

“Onde já se viu pedir dispensa de servir ao seu país! Isso é um

orgulho para qualquer cidadão brasileiro além de ser a melhor

escola do mundo para tornar-se um homem. Que absurdo! Que

cara eu tenho, eu que servi esse batalhão com todo meu amor

pedir a dispensa de meu próprio filho?” Confesso que pela

primeira vez na vida me arrependi de fazer um pedido a meu pai

A

Page 30: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

29

e decidi que enfrentaria a infantaria com a mesma postura e

honestidade que ele.

Qual foi minha surpresa quando recebi a notícia de minha

dispensa por “ter sido enquadrado no excesso do contingente”,

depois de freqüentar assiduamente o batalhão por quase duas

semanas. Tudo estava acertado desde o princípio pelos amigos

de caserna do capitão, que esconderam até o último instante os

detalhes. Estava eu quite com meu país e com meus pais, por

enquanto!

Em Santa Rita sempre freqüentávamos o bar dos estudantes

alguns dias da semana, onde encontrávamos iguais e nos

divertíamos bastante, até que isso passou a virar rotina. As notas

despencaram e passei a ter a necessidade de alguns exames

finais, e isso prosseguiu no segundo semestre, após as férias de

final de ano de 1985. Acabei por ficar em dependência em

Cálculo Diferencial e Integral e resolvi essa pendência durante o

segundo período a P29. Mas pelo menos o Xando (aquele que

casou com minha irmã!) já tinha seu automóvel. Ele cursava a

P4 e isso lhe deu direito a um presente de seu pai. Os nossos fins

de semana, com retorno para nossa terrinha animavam a outra

inteira de aulas, até que comecei a ter aulas aos sábados na P3!

Isso foi realmente de matar. Algumas vezes, sábados até cinco

horas da tarde, um crime com certeza. Mas novamente tudo em

paz, mais uma dificuldade a ser superada. Meu amigo Binho

9 Cada semestre de aulas no Inatel é chamado de Período. P2 (segundo

período)

Page 31: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

30

(aquele de infância), um semestre a minha frente, ficava alguns

domingos em Santa Rita mesmo, estudando e acabou

conhecendo muito mais a cidade que eu.

As matérias já nem eram mais tanta novidade, mesmo assim,

ainda tive várias dificuldades com exames finais devido à falta

de foco nos estudos durante a semana e o anseio de retornar para

casa todo sábado e domingo, para de novo enfrentar a estrada na

segunda-feira. A vida na rep. Dino´s era bem mais regrada que

na Gambiarra, o próprio nome explica (os moradores tinham

milhões de anos). Sempre precisávamos fazer as compras um dia

da semana, no meu caso às terças-feiras, coisa que nem de longe

eu já fizera em minha vida. E pior que sempre tínhamos que ter

uma carne, legumes e verduras e eu deveria escolher. Para quem

nunca tinha visto uma peça de contrafilé, uma batata com casca,

uma beterraba entre outras coisas, foi um excelente aprendizado.

Apesar de mamãe Anita continuar a enviar meus leites de

caixinha, meu achocolatado preferido além de bananas, aveias e

mel para minhas vitaminas. Eu era um privilegiado mesmo!

Encarei a primeira oportunidade realmente profissional de

minha vida. O monitor de voleibol da faculdade se formaria

nesse período e estaria vaga essa posição. Sopa no mel! Além de

ser o “chefe” do time, eu treinaria as meninas e ainda ganharia

metade da mensalidade da faculdade, dinheiro que dava para

tomar um montão de cervejas no Buffonete10

. Mas precisava

fazer lobby se quisesse ter alguma chance, e passei a conversar

10

Bar dos estudantes. Os donos eram o Buffa e o Cotonete

Page 32: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

31

muita mais com os outros jogadores para descobrir os possíveis

concorrentes à monitoria e também o professor, para saber como

seria o processo seletivo. A descoberta foi maravilhosa. Ao final

do semestre haveria uma prova para a escolha, pelo menos a

confirmação, do novo monitor e qualquer um do time poderia

participar. Minhas notas ainda eram meio capengas na P2, mas

isso era requisito sem avaliação na escolha. Eu me empenhei

ainda mais nos treinamentos e, como jogava todos os finais de

semana em Caçapava e ainda fazia parte do time da cidade,

provei tecnicamente que estava pronto, só faltava a parte teórica.

Orgulhei-me em saber, após a prova que seria eu o novo

monitor, com todos os méritos segundo os professores. Além de

ser um excelente atleta (sorte que eles nem sabiam de minhas

idas ao Buffa) fez uma prova nota 10, irrepreensível. Era tudo

que eu precisava escutar.

Dediquei-me durante a P3 (terceiro período) aos estudos, aos

treinamentos dos times de vôlei masculino e feminino e ainda

por cima melhorei consideravelmente minhas notas. Esse

período passou totalmente sem sustos e fiquei de fora de todos

os exames finais, passando em todas as matérias com média

superior a 80 em 100 possíveis. Mudava meu foco para

realmente me formar engenheiro, mas em nada mudava a minha

prepotência.

Na P4 consegui ainda a monitoria de Física, após também uma

prova e passei a ter toda a mensalidade paga apenas com meu

trabalho, mas a humildade continuava meio esquecida e acabei

perdendo a de vôlei na P6, devido a ajuda que dei para os

Page 33: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

32

veteranos que precisavam de presença em Educação Física.

Passei todo mundo, mas deixei os professores furiosos. Quase

perdi a de Física também, o que ocorreu mais tarde na P8 devido

a um teste prova de laboratório, onde todos os alunos foram

muito mal e eu, com pena de reprovar tanta gente, revisei as

notas de todos que eram de minha responsabilidade. O professor

da matéria nem furioso ficou apenas manteve as notas e me

despediu. Sem problemas pensei, eu já era oitenta por cento

engenheiro e em breve estaria a ganhar uma grana muito maior.

Pobre tolo!

Nas férias de 1988, eu então na P7, fiz uma viagem para

conhecer Macchu Picchu no Peru, passando pela Bolívia para

conhecer Santa Cruz, Cochabamba, La Paz, Tiahuanaco, Puno,

Cuzco entre outras. Tudo de trem e ônibus. Dias sem tomar

banho, trem descarrilado, pernilongos, mosquitos, comidas

esquisitas, gente estranha. Foram duas a três semanas de uma

das aventuras mais bacanas de minha vida. Mochila nas costas e

pouco dinheiro levaram, eu e um grande amigo, a caminho da

cordilheira dos Andes. Nossa passagem pela cidade na divisa

com o Peru, chamada Copacabana, as margens do lago Titicaca

foi hilariante. Nós estávamos eu, que só falava português,

Sérgio11

que falava português, espanhol (pois tinha nascido na

Bolívia) e inglês (pois estudava na faculdade), um alemão

chamado Andy, que falava apenas alemão mesmo e inglês, outro

boliviano que apenas pronunciava-se em espanhol e francês e

mais dois brasileiros na mesma situação que a minha. Quando

11

Ser poliglota como Sérgio eu chamo de ter “foco” na vida profissional!

Page 34: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

33

nos conhecemos, apenas meu amigo falava com o alemão em

inglês e o boliviano em espanhol, mas após a terceira garrafa de

Singani, todos nós conversávamos tranquilamente.

E isso foi o grande toque que eu tive: precisava aprender línguas

com urgência e fui aprender alemão já no Brasil. E foi um pouco

através dessas aulas que conheci e conquistei a que veio a

tornar-se minha primeira esposa alguns anos mais tarde.

Obviamente, meus jogo de cintura e prepotência fizeram

postergar o aprendizado de outras línguas para apenas depois de

formado, mas a experiência de conhecer outras culturas, outros

povos, outros lugares realmente me encantaram e eu retornei

bem mais amadurecido. E graças aos meus pais e tios, que

pagaram minha passagem de retorno, pois quando cheguei ao

aeroporto de saída na Bolívia, nem dinheiro para a taxa de

embarque eu tinha. Sorte que o pessoal da VASP viu o

desespero estampado em meu rosto quando soube que essa tal

cobrança existia. E essa foi a minha primeira experiência com

avião! Tremenda bronca de meus pais pela irresponsabilidade de

ficar sem um centavo para retornar, o que se tornaria uma coisa

comum em minha vida.

Passado a P8, comecei a pensar no estágio obrigatório que

deveria fazer para concluir o curso de engenharia e, se possível,

fazer uma graninha. Minha primeira tentativa de contato para tal

foi com uma empresa alemã (obviamente, pois estudar alemão

de alguma coisa me serviria lá), e onde descobri para minha

surpresa que eles davam muito mais importância ao inglês, o

Page 35: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

34

que também se tornou uma coisa sem problemas para mim, já

que durante meu teste de ingresso no estágio eu queimei um

osciloscópio e perdi a vaga. Um quase engenheiro formado ligar

um equipamento de 110 volts em 220 volts é simplesmente

inaceitável. Mas isso nem abalou minha confiança, pois eu seria

técnico por pouco tempo, em breve seria executivo e usaria

paletó e gravata ao invés de botas de segurança e capacetes,

pensava. Depois de quase seis meses de busca, consegui estagiar

em uma empresa brasileira de lançamento de fibras ópticas em

São Paulo, onde passava todas as madrugadas acordado,

tomando chuva, entrando em caixas subterrâneas, exatamente de

botas de segurança e capacete e pior, sem ganhar um centavo

sequer. Um verdadeiro gênio do planejamento de carreira! Eu

sequer pensava que em meses estaria em busca de emprego e

nem sabia que ganharia em Cruzados Novos! Na verdade,

quadriculados segundo um comentarista, pois eram cruzados

duas vezes. Uma pelo nome e outra pelo governo que estampou

os valores reais em cada uma das notas. Os mais novos que me

acreditem, isso realmente aconteceu...

Page 36: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

35

Dos 23 aos 26 anos – 1990 a 1993

olei grau em julho de 1990 e a festa de formatura estava

marcada já para agosto, Jubileu de Prata do INATEL e

pensei: “Agora vou descansar até a formatura, tirar

umas pequenas férias e depois vou buscar uma colocação no

mercado de trabalho!” Qual foi minha surpresa quando, assim

que cheguei em Caçapava, tudo já havia sido armado para eu ir

para Sampa buscar emprego. Impressionante como os pais

querem tanto que a gente fique com eles quando estamos de

saída para a faculdade, mas como querem que saiamos quando

retornamos dela. Eles tinham toda a razão. Eu precisava fazer

jus ao investimento feito por eles e jamais poderia descansar

sem sequer ter labutado pelo menos por um ano em minha vida.

Deixei os treinos de vôlei e fui correr atrás do prejuízo. Pesava

então 86 kg.

E lá fomos nós! Antigo chefe do ex-estagiário: “Estamos sem

vaga no momento, você pode nos procurar daqui a alguns

meses?” Com certeza meu período de quase contratado agradou

pouco ao pessoal das fibras ópticas, mas vamos em frente.

Currículo para cá, currículo para lá e, de repente, grande notícia.

Xando, quase já cunhado e Binho estavam na mesma empresa

japonesa, um em Guarulhos e outro em São Paulo, já estavam

alocados na capital e iam de ônibus ou metrô ao emprego. Bão

dimai da conta, diriam os mineiros. O meio parente levou o CV

e fui eu para uma entrevista na empresa. Vaga: Engenheiro de

Implantação Rádio. Excelente, pensei! Nem sabia o que

C

Page 37: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

36

significava, mas pelo menos era algo relacionado com a minha

área, uma vez que a empresa era de telecomunicações e

computação. Aceitei na hora e comecei a trabalhar na semana

imediatamente seguinte à conversa. Primeiro dia, um pequenino

susto. Logo que fui apresentado ao departamento, fizeram uma

pequena explanação de como as coisas funcionavam por ali e

alguém foi levar-me ao meu novo departamento. Aquilo tudo era

enorme e estranho. Só havia um pequeno aquário, onde sentava

o gerente geral do departamento e pensei, uai sô, cadê minha

sala! Descubro então que trabalharei em um amontoado de

mesas, postas lado a lado de dois em dois, com seu chefe direto

e sua mesa, perpendiculares às outras mesas dos subalternos.

Havia ali técnicos, desenhistas, engenheiros juniores, seniores e

plenos. Eu era Jr I e ainda deveria passar pelo II, III e IV, ou

seja, ficaria o resto de minha última fase de ex-estudante como

engenheiro! “E usar terno e gravata, é desnecessário nesse

lugar?” para a resposta imediata de um dos colegas: “Aqui você

vai usar capacete e bota de segurança, além de cinto guia entre

outras coisas de EPI”. Vixe Maria eu nasci para esse troço. Lá se

foi, a camisa novinha que tinha comprado para começar, minha

calça social, meu sapato lustrado, tudo isso ficaria guardado para

o futuro. Uma semana depois, fui fazer a confraternização dos

novos entrantes na fábrica. Mostram alguns vídeos, fizeram

algumas palestras e uma tentativa de dinâmica em grupo, onde

fui perguntado onde eu imaginava estar daqui a dez anos, que

para gargalhada geral dos participantes, a resposta foi: “Quero

ser presidente da empresa!” Fui até mesmo elogiado pela

ousadia, mas a arrogância eu tenho minhas dúvidas! Fiz

Page 38: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

37

maravilhosos amigos nesse departamento, alguns que até

considero irmãos, mas também alguns meio amigos e até mesmo

desafetos. Permaneci por dois anos, até metade de 1992,

viajando pelo Brasil e vistoriando, projetando e instalando

sistemas rádio e satélite. Como viajava demais e tinha comprado

meu primeiro carro, o Espada Justiceira I, voltei a morar em

Caçapava para juntar mais dinheiro e poder casar. Passei a jogar

Squash quase todas as noites e pesava então 88 kg. As

raríssimas vezes que estava na fábrica, almoçava no refeitório

especial de engenheiros, separado dos outros funcionários.

Chique! Tinha um computador AT 386 novinho para usar e uma

impressora matricial de última geração. Ainda me recordo até

mesmo do primeiro dia que me deparei com um desses, cheguei

a perguntar onde ligava. Eu apenas conhecia os CP200, CP500 e

TK90X, de fantásticos 48 quilo bytes de memória. HD? Nunca

ouvira falar! Aprendi alguma coisa de japonês e gostei da

comida, menos de polvo cru. Progredi e recebi promoções de Jr

para Pleno, que pensei fossem méritos, mas era política da

empresa mesmo para animar os recém-chegados. Passei meu

primeiro apuro, quando tive que participar de um treinamento,

em importantíssimo cliente no Rio de Janeiro e deveria receber e

tratar do instrutor, um hindu que só falava inglês e indiano.

Lembrei-me imediatamente da falta que as aulas do Fisk em

Caçapava, tantas vezes abandonadas, fariam naquelas duas

semanas. Mas me saí super bem, todos no cliente falavam e se

comunicavam com o professor e eu apenas olhava e dizia: “Ok!

It is fine!” Frase aprendida durante a preparação da viagem

desde Guarulhos.

Page 39: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

38

Trabalhava duro, honestamente e com muita rapidez, resolvi

sempre os problemas da melhor maneira possível, mas como era

de se esperar, solicitava pouco a opinião de meu superior. Fui

taxado de “ingerenciável12

”, rótulo que levei comigo até meus

últimos dias nessa empresa e consegui, por conta disso e após

um pequeno desentendimento com meu gerente, ser transferido

para a matriz em São Paulo, para o departamento comercial e

junto com a presidência e diretoria. Esta era minha chance! “Se

conseguir ficar aqui dez anos, serei presidente com certeza”

pensava. A transferência foi uma confusão danada, pois me

avisaram em cima da hora, nada comentaram com meu chefe

direto e, após muita choradeira, cheguei ao paraíso. Nem mesa

eu tinha para sentar e me enfiaram em um lugar qualquer,

também em um tremendo amontoado de mesas e cadeiras. Pelo

menos o telefone era moderninho e eu possuía um ramal só para

mim. Muito chique! Ao segundo dia encontro um senhor muito

distinto, apesar de meio sério, na porta do elevador do subsolo,

onde prepotente parei meu camelo, junto com o carro dos

gerentes, afinal eu morava duas quadras do edifício, e todo dia

chegava atrasado. Junto com outras quatro pessoas, entramos e

apertei o número de meu novo lar, sétimo andar. Cumprimentei

mui distintamente o senhor pela sua maravilhosa camisa de puro

linho e sua gravata de seda, além de seu alinhadíssimo terno. Ele

agradeceu, apertou o botão do décimo andar e um silêncio

mortal pairou na pequena caixa que subia. Fiquei conhecido

como amigo do presidente pelo resto de meus dias. Sorte que ele

12

Palavra criada por algum gênio dos meus ex-chefes.

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Marcelo Sant’Anna

39

jamais se lembrou disso em nossos encontros futuros, pois meu

constrangimento seria enorme, mas que gostei do apelido, a isso

eu gostei! Mas para compensar, passei a ser, além de

ingerenciável, louco!

Ganhava para sobreviver em São Paulo, mas trabalhar num

edifico de escritórios, todos de uma empresa era muito

charmoso. Trabalhar de gravatinha, camisa social, calça de

pregas, sapato engraxado. Muito bom! Praticava algum esporte

de vez em quando. Entrei e saí de academias por umas doze

vezes e pesava 94 kg. Mas percebi que a área comercial tinha

uma diferença bem grande em relação ao clima de uma fábrica.

A energia das pessoas era estonteante. Trabalhavam até tarde,

saiam somente após o gerente, falavam com o Japão durante as

noites e passei a adorar essa vida dentro, sem vida fora. Primeiro

porque tinha pouco dinheiro, segundo que mal conseguia sair da

empresa. Passei a me apresentar como Marcelo Sant’Anna da

empresa tal! Ainda mais, as pessoas se preocupavam com o

quanto os outros ganhavam. Quem estava a sair da empresa e

quem chegava. Desconfiavam de tudo e de todos, mas eu tinha a

sorte de trabalhar com ex-alunos da faculdade, e isso me

tranqüilizava um pouco, mas era incrível como quem melhor me

considerava eram os que fizeram graduações em outras escolas.

Em compensação, eu trabalhava no centro comercial, almoçava

no shopping de terno e gravata, e ainda tinha meu próprio

computador e acabara de comprar meu primeiro celular. Mas foi

muito pouco de dias tranqüilos, pois nesse meio de tantos

comentários, descobri o salário de alguns amigos superiores ao

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

40

meu, e eles tinham muito menos tempo de empresa. Foi então

que percebi que realmente havia méritos nas promoções, mas eu

tinha mérito nenhum para mudar de faixa, sempre era

promovido pelo tempo de casa dentro do mínimo referente ao

cargo. Fiquei possesso e fui reclamar ao gerente, afinal de contas

eu era um gênio, como poderia ganhar menos que um cara com

menos tempo de casa? Resposta direta: “Ele merece mais que

você na opinião do gerente dele! Na minha você merece isso ai

mesmo que ganha...” Bem feito para mim, ficar a escutar a

conversa dos outros. E a diferença nem era tão grande e o cara

merecia mais mesmo.

Sorte minha eu ter tido contato com algumas outras empresas

durante a minha estadia na fábrica, e, durante uma debandada de

muitos profissionais do Inatel para uma empresa americana que

chegava ao Brasil, eu me aproveitei e aceitei um convite para ser

Engenheiro de Exportações de uma empresa alemã. Essa sim era

minha grande chance! A anterior era apenas ilusão de recém-

formado. Mas imagine, eu trabalharei com toda a América

Latina, que honra! Que visibilidade! Caramba, e o espanhol? E o

inglês, tão importante para as empresas alemãs? Que falta de

planejamento, me amaldiçoei. Mas fui aprender na marra, afinal

de contas, ainda tinha umas duas semanas antes de minha saída

do Japão para a Alemanha.

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Marcelo Sant’Anna

41

Aos 27 anos – 1994

pós intensos estudos e uma oferta para ganhar quase

um quarto a mais que o salário anterior, ingressei em

meu novo emprego. Saíra por livre e espontânea

vontade, e recebi um recado bem claro desde o Japão: “Quem

sai daqui jamais retorna...” E sai com essa que realmente fechou

definitivamente a porta de retorno: “Se a empresa pensa assim,

então aqui eu que jamais trabalharei novamente!” Alguém deve

ter escutado! Mas sem problemas, começava tudo novo. Troquei

de carro por um mais novo, o Espada Justiceira II. Pesava então

96 kg. Minhas avaliações pelos psicólogos nos testes de QI e

MBTI foram excelentes e até mesmo ouvi comentários de

pessoas ligadas ao RH que jamais alguém da empresa tinha ido

tão bem. Ora pensei! Isso é óbvio, eu sou muito bom mesmo.

Comprei meu primeiro Palm Top, usava terno e gravata, tinha

uma caneta tinteiro Waterman, um celular P600 com tela de

cristal líquido e um relógio EcoDrive, o kit babaca estava

pronto, e só me faltava o carro luxuoso, que em breve compraria

ou viria através de uma promoção na empresa. Eu me casei

então com a flor de formosura de Santa Rita do Sapucaí e

passamos a pensar as carreiras juntos. Ela também seria

engenheira do Inatel em mais um ano e já trabalhava em uma

empresa que tinha filial na capital. Em breve estaríamos a

ganhar rodos de dinheiro, para comprar tudo que quiséssemos.

Chefe novo, de costumes antigos, autoritários e comportamento

pouco ético, eu diria. Só que começo tudo é maravilha, a gente

A

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

42

fica se estudando e nem percebe que os funcionários estão

infelizes. Móveis antigos. Pessoal de vendas sem automóvel.

Sem comissões. Horas de trânsito para ir e voltar. Sem

computador para o trabalho diário. Apenas um computador para

todos os vendedores, e sem qualquer pacote de programas, lista

de preços impressa e encadernada com espiral de plástico e

pedidos de compra feitos todos à mão, com cópia em papel

carbono. Voltava eu para a idade da pedra? E logo eu que até

palmtop tinha, é mole?! Além do mais, a empresa havia sido

comprada por um grupo francês. Pensei imediatamente: “Desde

quando francês gosta de alemão?” Com certeza teríamos

problemas em muito breve. Pior que ainda indiquei um amigo

para trabalhar na mesma empresa e disse em claro e bom som

que lá sim teríamos futuro. Futuro incerto obviamente! Mal

sabíamos das maravilhas que tínhamos e perdemos quando

deixamos os japas. Que belíssima avaliação eu fiz de minhas

oportunidades, capacidades e da leitura delas que poderia ser

feita pelos outros! Fiz algumas viagens e pouquíssimos

resultados vieram, além de uma política de vendas totalmente

estapafúrdia em relação a outras filiais da empresa em outros

países, também compradas pela francesa. E os problemas

vieram, só que antes dos problemas com as vendas, com meu

próprio gerente. Discutimos coisas que discordávamos e eis que

ele solicitou, após um ano, que eu me demitisse ou ele faria isso.

Fiquei amedrontado. Como assim ser despedido? Isso vai

manchar minha carteira de trabalho para sempre. Absurdo, vou

agir antes! O gerente esperto conseguiu me enganar direitinho, e

eu que me achava muito genial estava saindo com o rabo entre

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Marcelo Sant’Anna

43

as pernas. Pior é que pouco tempo depois parece que algumas

coisas foram descobertas sobre os comportamentos desse

gerente e ele acabou tendo que sair também da empresa, coisa

que deixou em seu lugar o cara muito bacana que havia me

convidado para mudar de vida. Pelo menos durante esse ano,

passei a falar fluentemente o inglês e o espanhol com as aulas

praticamente diárias que tinha durante os primeiros três meses, e

semanais após isso. E com as aulas continuei durante muitos

anos, até ficar tranqüilo que conseguiria me virar em quaisquer

situações pessoais e profissionais, e nas duas línguas. Só que

para manter tinha que praticar diariamente, então passei a

assistir aos filmes sem legenda ou dublados em uma delas para

aprimorar cada vez mais o entendimento e passei a ler somente

livros estrangeiros em sua língua original. Pesava eu então 100

kg, três dígitos. Minha jovem esposa estava por se formar na

faculdade e eu a perder o emprego, que lindo e romântico isso.

Mas de qualquer forma, nem concordávamos muito com minha

transferência da empresa anterior para essa mesmo. E um

dezembro tenebroso passou, com as graças de um casamento

recém-começado e quase três meses sem emprego vieram. Mas

eu estava confiante, pois tinha algumas propostas, que foram

imediatamente rechaçadas pelos mais próximos. Aliás, quem

assumiu meu lugar em uma delas hoje está milionário de

verdade. O kit babaca desse cara inclui casas na praia e na

montanha, e uns pequenos luxos mais. Só que, afinal de contas,

eu era bom demais e deveria arrumar uma empresa que fosse

grande, globalizada, sólida e garantisse o sustento de minha

nova família, investindo minhas capacidades excepcionais de

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

44

gênio e criando todas as oportunidades possíveis para meu

enriquecimento pessoal e crescimento profissional. Incrível

como pensamos bobagens quando mais jovens e só aprendemos

quando é tarde! Mas somente vim a descobrir que empresa

assim inexiste quando sai de meu terceiro emprego, que foi onde

mais gostei de trabalhar até hoje e de onde eu tiro os maiores

exemplos de profissionalismo desde que me formei engenheiro.

Ah! E ainda tem o meu gerente anterior, aquele de hábitos

duvidosos, que disse que eu traí a empresa “franlemã” para ir

trabalhar na concorrente dela. Pior é que algumas pessoas, que

realmente desconsidero, ainda acreditaram nele. Absurdo! Anos

mais tarde nos encontramos, mas falarei disso mais adiante.

Nutri por anos um desprezo imenso por essa pessoa, hoje tenho

muita pena dela, apesar de estar, provavelmente, milionário...

Page 46: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

45

Dos 27 aos 31 anos – 1995 a 1998

mpresa americana era outra coisa. Foco no cliente.

Computador para todos. Planejamentos e orçamentos

disso e daquilo, produtos excelentes e reconhecidos,

fornecedora confiável de várias multinacionais globalizadas,

chefes bacanas e conhecidos de longa data, essa sim era a minha

empresa. Aqui sim eu teria a chance de desenvolver todo o meu

potencial, seria um raio! Aprendia a cada dia com meu chefe

direto e meu diretor, fazia treinamentos, exercitava o inglês e até

mesmo o espanhol, tinha meu primeiro Lap Top (complemento

do meu kit babaca) e celular da empresa. Continuava sem

comissão ou bônus e sem automóvel (chamado de viatura por

lá), mas até um aumento de salário eu tive para aceitar o convite.

Só um probleminha! Duzentos quilômetros de ida e volta todos

os dias da semana e um trânsito infernal principalmente no

retorno para casa. Mas tudo valeria à pena! Já era mais

reconhecido como profissional, conhecia bem a parte técnica e

me aprofundava cada vez mais nos conceitos comerciais e

negociais. Fazia todas as noites, durante dois anos, a

especialização em marketing tão necessária para quem quer

crescer na carreira. Viajei pela primeira vez aos Estados Unidos

para uma reunião global de vendas, onde troquei meu palmtop

por um muito mais moderno que até acessava a internet e com

tela sensível ao toque. Impressionante aonde ia parar a

tecnologia e eu estava no meio dos negócios dela. Cuidava de

uma linha de produtos só minha e até vendia bem, apesar de

E

Page 47: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

46

muito menos do que eu queria. Depois passei a gerenciar

algumas contas consideradas chaves para a empresa. Recebi

outros aumentos e realmente progredia. O presidente, chefe de

todos, e os outros diretores eram extremamente acessíveis a

todos os funcionários, mesmo os de hierarquia inferior. Era

realmente um lugar delicioso de se trabalhar. Participava como

representante da empresa perante associações patronais,

participava de feiras e convenções nacionais e internacionais, eu

me achava o máximo. Falava quase todo dia ao telefone com a

América (como se aqui fosse outro continente) e era requisitado

a dar opiniões em alguns assuntos e até mesmo participava de

algumas estratégias. Conhecia a todos desde o departamento de

RH até a produção. Indiquei pessoas para serem contratadas,

mas dessa com certeza de sucesso para elas e para mim mesmo.

Até secretária nós tínhamos, e muito aprendia com as pessoas

mais experientes na empresa. A cada dia eu estava mais

confiante do meu trabalho e já planejava me preparar ainda mais

para assumir novas posições, responsabilidades e cargos. Ano

após ano a empresa se modernizava, veio o SAP, o instituto de

competência em instalação para clientes e terceiros, catálogos

eletrônicos, email remoto, controle de vendas e agendamentos.

Cara de americano, tudo moderno e funcionava, ainda que

muitas falhas ocorressem. Um exemplo de empresa, mas com

uma clara certeza: enquanto os mais velhos continuassem na

ativa, eu continuaria a ser um chefe de vendas. E na verdade,

apesar de adorar as pessoas e a empresa em si, eu tinha

projetado coisas no futuro, e esperava que dessa vez isso

ocorresse mesmo. Meu casamento se estabilizou de certa forma,

Page 48: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

47

até que minha mulher perdeu o emprego na empresa filial, mas

logo conseguiu outro em uma multinacional francesa, onde

cresceu de forma meteórica, ou melhor, foguetórica, pois

meteoro cai ao invés de subir. Passou a ganhar muito respeito

interno dos chefes e pares e externo. Até mais dinheiro que eu

ela ganhava e achávamos isso ótimo. Trocamos de carros e

agora ambos tinham modelos mais novos, luxuosos e invejados.

Que delícia! E eu pesava então 106 kg, quase saindo do dial de

FM que vai de 88 a 108. Mudamos de apartamento,

encontrávamos com amigos, fazíamos e participávamos de

jantares de empresas. Íamos a feiras, convenções, painéis e

apresentações em todos os lugares. E quantos mais

reconhecimentos nós tínhamos, mais forte trabalhávamos para

crescer profissionalmente e monetariamente. Ela tornou-se

gerente e respondia diretamente ao diretor geral da unidade de

negócios e tinha sua própria sala, chique mesmo. Eu continuava

somente com minha mesa, mas isso pouco me incomodava já

que tinha bastante espaço em nosso ambiente comercial. Na

minha empresa somente três pessoas tinham salas, e todas

estavam com as portas sempre abertas para receber quem fosse.

Mas eu queria crescer mais, sempre mais. Apesar da vida

confortável, precisava de mais posse para estar feliz. Isso sim

era sinal de sucesso, apesar de que ser reconhecido pelos pares,

chefes, colegas e concorrentes já era uma grande coisa. Comecei

a fazer o trajeto de ida e volta cada vez mais rápido. A potência

dos novos automóveis adquiridos pela família Sant’Anna

permitiam isso e andava, algumas vezes, nos limites do próprio

motor. Voa pela estrada na verdade, sempre querendo chegar e

Page 49: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

48

voltar cada vez mais rápido e investir esse tempo extra em

coisas interessantes que sonhava anteriormente, como um MBA,

estudar física, participar de grupos de network entre outras

coisas, sempre visando o aprofundamento das relações

profissionais.

As oportunidades aumentaram em muito com a venda das

autorizações da chamada banda B de telefonia celular, empresas

que seriam criadas para competir com as concessionárias dos

serviços celulares, e muitas usariam os produtos de nossa

empresa o que alavancaria oportunidades de vendas

espetaculares. Com certeza mais contas viriam para minha

chefia e talvez eu pudesse estar mais bem fundamentado para

meus futuros vôos, que podiam ser dentro ou fora de onde eu

estava.

Veio então a maravilhosa notícia da gravidez de meu primeiro

filho e tudo ficou ainda melhor. Falávamos das mesmas coisas e

tínhamos somente amigos em comum, inclusive nossos chefes.

Descobri que era menino e decidi que seu nome seria Jota

enquanto ainda namorávamos. Incrível, mas o apelido veio antes

do nome e assim foi. Podia ser João, José, Joaquim, Juvenal,

Juvêncio, pouco importava, apesar de minha preferência pelo

primeiro que era o nome do meu avô e do avô do Jota também.

Nasceria em 07 de fevereiro de 1998 com muito amor. E tudo

nós preparamos para sua vinda. Somente quem tem sabe ao que

me refiro agora. Os que pretendem ter filhos saberão um dia!

Programei que compraria um carro novo de presente para a

mamãe fresca.

Page 50: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

49

Foi então que decidi mudar! Agora pai, devia fazer com que

meu filho se orgulhasse de mim, que me visse como um cara

extremamente capaz, super herói, respeitado e elogiado por

todos. Fui indicado para trabalhar na empresa de minha esposa,

com um cargo de extrema importância, em minha visão

obviamente para reportar-se diretamente ao vice-presidente e,

muito melhor, para ganhar muito mais dinheiro. Sempre lembro

que isso só me tiraria de onde estava somente se fosse realmente

muito bom e com mais oportunidades. E nesse caso específico

era! Além de ficar mais perto de casa e de poder ir e voltar com

minha mulher. Ficaria bem mais próximo de meu serzinho mais

amado. Mas nada poderia ser mais perfeito pensava só, até com

um pouco de arrogância. Como poderia dar errado? Tudo se

encaixa! Só que como diria Mané Garrincha, você combinou

com os adversários todas essas jogadas? Oras bolas, claro que eu

jamais faria isso uma vez que nem para meus chefes eu

perguntava as coisas. Aliás, poucas vezes eu o fiz para meu pai.

Tomei a decisão e pronto. Apesar das tentativas improdutivas de

meus chefes tentarem me manter na America, eu decidi ir para a

França e fosse o que Deus quisesse. Pedi minhas desculpas e

toquei o carro para São Paulo novamente. Aliás, essas minhas

idas e vindas já começavam e me enjoar.

Instalou-se um pouco de temor na família, apesar de controlável.

Mas o salário e as facilidades valiam a pena, além de que, havia

uma oportunidade de carreira internacional para ambos. Era o

que faltava para o salto definitivo para meu objetivo principal.

Ser presidente de uma empresa!

Page 51: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

50

Dos 31 aos 33 anos – 1998 a 1999

m fevereiro de 1998 deixei o certo pelo duvidoso e

assumi todos os riscos, como sempre fiz. Eu apenas

imaginava as conseqüências boas e nem sonhava com as

ruins. E tudo foi realmente dentro da normalidade, mas o medo

ainda permanecia de alguma coisa acontecer com a empresa e os

dois perderem seus empregos, nunca por minha parte, já que eu

era bom demais para ser demitido, e o único que ameaçara isso

até aquele dia de minha vida tinha sido uma pessoa

insignificante, e que ainda me enganara na ocasião. Nada

poderia impedir nosso sucesso como casal de executivos. E

assim foi... Passei a freqüentar as reuniões de diretoria com os

gerentes de contas chaves, tinha acesso direto ao presidente e

vice no Brasil e a todos os diretores de unidades de negócios. E

ganhava mais que minha mulher novamente! Só que passamos a

ter tantas coisas em comum em relação ao nosso ambiente de

trabalho que saturamos definitivamente as relações com muitos

dos antigos amigos, e novos vieram. Uns sábios, outros

excêntricos, mas todos muito bons, só que totalmente

desconhecidos antes de eu entrar naquela empresa, e isso pode

ter gerado alguns constrangimentos, nunca em mim que sempre

me achava acima disso, mas em outros. Eu queria ser diretor e

minha mulher também e outro dilema surgiu. Será que a

empresa permitiria isso? Já havia autorizado o trabalho em

unidades de negócios separadas, só que um deles trabalhava com

todas as unidades de negócios, que era meu caso. Agora

E

Page 52: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

51

começava a compreender por que tanto medo quando uma

proposta que parecia perfeita em todos os aspectos gerou quando

foi colocada. Eu pesava então 108 kg. Perdi meu pai, o capitão

Dyno, nessa época, quando o Jota nem um ano tinha.

Alguns meses se passaram e, apesar de poucas empresas terem

se preparado para o tal, o setor de telecomunicações brasileiro

seria privatizado em mais alguns meses. Isso caiu como uma

bomba para os planos de muitas companhias e executivos.

Trabalhávamos muito para tentar adivinhar o que aconteceria

com o leilão das empresas do antigo sistema Telebrás. Fazíamos

lobby, especulações, cálculos, reuniões com todos, reuniões a

sós, três a três e assim até que concluímos como ficaria,

supostamente, a nova composição das concessionárias de

telecomunicações. Que eu me lembre, erramos todas sem

exceção! Mas pelo menos as que compraram as concessões

estavam dentro do portfólio de clientes, e isso geraria negócios

com toda certeza num futuro próximo. E eu cuidava de um setor

que tinha grandes oportunidades devido ao certo aumento do

transporte de sinais de telecomunicações com a privatização,

pois o número de telefones aumentaria consideravelmente, como

ocorrera anteriormente, após a venda da banda B de telefonia

celular.

Meu relacionamento era muito bom com meus pares e chefes,

apesar de achar que pouco de minha capacidade era usada pela

empresa. Fiz relacionamentos com muitos clientes, mas poucos

negócios foram concretizados, e isso passou a me incomodar

profundamente. Das duas uma: ou me deram um mercado sem

Page 53: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

52

nenhum potencial ou sou incompetente mesmo? Novamente

equivocado, pois nenhuma das duas estava correta. A verdade

era que o mercado em que eu atuava retrairia um pouco mesmo

com a privatização da Telebrás, e a empresa estava totalmente

focada em atender a esse mercado especificamente, que é onde

os grandes negócios seriam concretizados e sustentariam a

empresa nos próximos anos. Passei então a me relacionar mais

com alguns diretores das unidades de negócios para verificar se

em alguma delas haveria interesse em meus potenciais clientes,

mesmo que em projetos menores e a resposta foi positiva. Após

essa aproximação e a saída de um dos diretores de marketing e

vendas de uma dessas áreas, eu fui convidado para assumir seu

lugar, e aceitei, com a autorização de meu chefe, diretor e

presidência. Só que seria chamado de gerente ao invés de

diretor. Caramba, o sonho de diretor escapava novamente, mas

por quê? Decidi aceitar e verificar o que acontecia do mesmo

jeito da época da monitoria de vôlei na faculdade. Tanta coisa

bloqueava que fiquei até mesmo impressionado. Uma área com

recônditos escondidos, relacionamentos secretos, círculos de

amizade muito diferentes de círculos de hierarquia e comando,

uma verdadeira loucura. Além de que, nesse clima e sem

qualquer poder de decisão, fiz um horroroso trabalho final, em

minha avaliação pessoal, e considero um grande fracasso.

Poucos eu consegui convencer de minha capacidade e vontade

de fazer as coisas se movimentarem melhor para todos, mas

segurei para ver se algo se alterava nos meses seguintes.

Acredito verdadeiramente que todos queriam que isso

acontecesse, mas tudo permaneceu o mesmo. Uma empresa

Page 54: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

53

desse tamanho tem sérias dificuldades de alterar seu rumo, como

se fosse um transatlântico fazendo curva, derrapar nem pensar.

E veio outra notícia fantástica. A segunda mais maravilhosa e

amada de minha vida, mas nunca em segundo lugar. Estava a

caminho mais um bebê. Dessa vez, uma menina a quem eu

queria chamar de Anninha. Eu sou Sant’Anna, minha mãe

chama-se Anna e minha esposa se chamava anananananana, ou

seja, poli anas. Ela deveria ter esse nome. Nasceu deslumbrante,

pequenina como deveria ser e era esperada, e assim continua.

Repito! Ter uma filha requer um sentimento que somente os que

têm sabem. E os que terão também sentirão!

Mas eu me encontrava meio depressivo com a situação

profissional incerta, sem ser diretor e sem ter a credibilidade que

achava necessária. E minha mulher também se encontrava em

momento delicado de sua carreira. Nesses momentos mais

difíceis é que temos a verdadeira noção de quem realmente nos

respeita e quer bem. Vinha o primeiro milagre profissional!

Após exatos dez anos formado engenheiro... Eu pesava então

110 kg.

Page 55: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

54

Dos 33 aos 35 anos – 1999 a 2002

o ser convidado para participar a concorrer a uma vaga

de diretor geral para a América Latina de uma empresa

que atuava na área de telecomunicações, tecnologia da

informação e banda larga, coisa que nem se comentava muito

naquele tempo. Para termos uma idéia, ainda tentavam vender

um produto chamado redes integradas de serviços integrados,

RDSI que nem de longe caracterizam uma rede de múltiplos

serviços. Um amigo se apresentou. Ele tinha sido altamente

recomendado por outro conhecido, que cobria vagamente as

qualificações e se apresentou. Explanado sobre os

conhecimentos e experiências necessárias para necessidade do

cliente, se posicionou da seguinte forma: “E realmente sou

menos indicado para sua necessidade imediata, mas conheço

uma pessoa que é. Quer o telefone dele?” E esse era eu!

Impressionante a conspiração do universo em meu favor, tinha

que ser dessa vez...

E fui entusiasmado com a possibilidade de me tornar o diretor

geral de uma empresa globalizada aqui na América do Sul.

México estava fora, mas grande parte da Central ainda podia ser

gerenciada. Aceitei sem pestanejar o convite, convencido de que

desta vez estaria totalmente no topo dos executivos de sucesso.

Deveria eu ter uma entrevista com meu novo chefe e me

preparei para isso durante alguns dias. De repente, uma mulher

aparece e se apresenta com a diretora mundial de marketing e

vendas, para quem eu responderia diretamente em minha nova

A

Page 56: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

55

função. E eu que pensava falar inglês fluente tive uma surpresa!

A mulher mal me entendia, e eu muito menos a ela. Dizia a mim

mesmo, ela deve ser da Austrália, ou Nova Zelândia, mas ao

contrário, era americana mesmo. Seu irmão general do

pentágono. Seu chefe israelense. Cada subordinado a trabalhar

em alguma parte do mundo remotamente. Pronto, acabo de

encontrar uma empresa terrorista em pleno Brasil, que quer

transformar nosso país em uma base de ataques contra todos os

inimigos da America, que são os mesmos de Israel. Mas ela

mostrava-se calma e serena. Loira de olhos cintilantes de tão

azuis e com uma paciência para me entender fora do normal. Foi

o segundo melhor chefe que já tive em toda minha existência

como executivo de telecomunicações, e coincidência ou não, em

uma empresa americana, de donos israelenses. Acertamos o

salário, anual obviamente, pois mensal só no Brasil mesmo.

Rita, minha irmã especialista nessas coisas chama isso de “total

cash”. Incluído estavam um aumento substancioso em meu

salário, automóvel e todos os benefícios imagináveis para um

alto executivo, representante da empresa no país. “Que honra!”

E assim foi fechado.

A alegria na residência foi enorme pela desvinculação de laços

empregatícios com a antiga empresa. Mas conseguir informar

isso claramente ao chefe seria outro drama. Confirmada e

recebida a proposta em papel, claro e legível, coisa incomum

aqui em nosso país, fui ao meu diretor direto, pois tinha vários

dentro da hierarquia matricial criada tão genialmente pelos

acionistas e conselheiros da empresa. Apresentei meu pedido de

Page 57: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

56

demissão e pedi para que fosse demitido e pudesse receber meus

benefícios de um funcionário CLT. Obviamente foi negado por

diretrizes diretas da empresa, e que sei foram usadas somente

para funcionários questionadores e “ingerenciáveis” como eu.

Outros conseguiram isso sem o menor estresse. Os comentários

que foram feitos com relação a essa nova empreitada vou omitir

desse livro, muito por respeito ao recíproco recebido de meu ex-

chefe, que até mesmo me presenteou com uma gravata no amigo

secreto de final de ano. Dura coincidência, muito mais para mim

que para ele podem acreditar! Eu pesava então 115 kg.

Até então, minha experiência sempre fora com chefes, gerentes

e diretores que ditavam todas as regras. Já na nova companhia as

regras eram: faça! E se der errado, faça de novo! Novidade pura

para um executivo que se achava o máximo e jamais tinha

ouvido algo parecido com isso. Lembrei-me muito da outra

empresa americana onde trabalhei que o diretor sempre dizia,

bate depois deixa comigo! Isso sim eu considerava liderança...

Poucos meses se passaram até que o governo autorizou o uso

das redes de cabos de TV por assinatura a usarem os serviços da

chamada banda larga. Trabalhava com isso desde a empresa

anterior, e acreditava sem dúvidas, o que é redundante, que essa

seria realmente a telecomunicação do futuro, com ainda creio.

Todos os serviços possíveis chegando ao usuário final por um

único meio. Multimídia! Isso era o futuro, múltiplos serviços

sobre múltiplos meios, sem distinção. A verdadeira

convergência de serviços e meios.

Page 58: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

57

Imediatamente comecei a alterar algumas coisas, comprei o meu

carro funcional e passei a negociar com potenciais clientes e

fornecedores. Grandes eram os dois lados e nós, aqui no Brasil,

ainda uma empresa totalmente dependente de tudo que era

imaginável da matriz. Mas se isso precisava mudar, eu era o

responsável, e tinha a meu ver, todos os créditos necessários

para isso. Comecei por associar a empresa a todas as entidades

de classe relacionadas ao novo serviço, onde bati de frente,

imediatamente, com duas das maiores interessadas no assunto.

Falta de experiência? Certamente que menos que a vontade de

ver o negócio realmente se expandir e consolidar meus sonhos

de ser executivo de primeira linha. Pela ousadia ou mesmo

estupidez, apenas o futuro dirá, três associações, totalmente e

mutuamente excludentes, eram minhas áreas de atuação, além de

um poderoso e único cliente até os primeiros meses de

“presidência”, como eu chamava é claro! De qualquer jeito, era

eu que pensava que mandava na estratégia, e isso foi muito

importante. Passei a fazer o MBA, totalmente em inglês com

especialização em marketing globalizado no Canadá, que

acreditava me daria uma tremenda alavancada na carreira.

Achava absurdas algumas alegações de todas as partes

relacionadas ao desenvolvimento dos sistemas de banda larga.

Uns diziam que feria a lei em vigência. Outros que o provedor

de conteúdo deveria ser o comandante, e os opositores, que os

donos das redes seriam os responsáveis, ou “dignotários” como

eu os chamava. Lutei muito para o crescimento da empresa e

desse mercado tão complicado e cheio de regras manipuladas no

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

58

Brasil. Perdi quase todas elas. Até mesmo surpreendentes idéias,

que nem sempre foram minhas, mas totalmente viáveis,

causaram algum espanto até mesmo nos clientes, como por

exemplo, dar o modem (modulador e demodulador de banda

larga) sem custos para os usuários finais, o que se faz hoje

amplamente. Outro era além do modem, a instalação dos

serviços sem custos para experimentação. O concorrente direto

do sistema usado em televisão por cabo venceu praticamente a

guerra. A demora na ação criou uma ferrenha disputa pelas

então privatizadas concessionárias de telefonia, que

praticamente dominaram todas as possibilidades de expansão

dos serviços. Méritos intelectuais aos diretores da antiga

empresa francesa que diziam que eu sequer passava de um tolo.

“Redes de TV por assinatura continuarão limitadas, pois isso é o

desejo de grandes grupos de investidores no Brasil.” Diziam, e

estavam totalmente corretos. Dois anos depois, após o sistema

aberto de banda larga através de redes de televisão a cabo

finalmente decolou no mundo. Após uma concordata e a perda

de milhões na NASDAQ, minha empresa perdeu o sentido de

existência no país e decidiu que eu seria um encargo a menos.

De pleno acordo, retirei meu nome e fui buscar outra colocação!

Eu pesava então 110 kg. Mais uma barreira a ser vencida nessa

já atribulada vida profissional. Mas os problemas sempre

aumentam...

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Marcelo Sant’Anna

59

Dos 35 aos 36 anos – 2002 a 2003

ecidi que criaria minha própria companhia empenhada

na evolução das comunicações no Brasil ao invés de

procurar outro emprego, o que tentei durante alguns

meses sem sucesso. Mas sequer percebi que, sem um cargo,

consideração e “amigos” influentes, isso seria uma tarefa

praticamente falida de saída! Procurei um sócio, também

desempregado, montei, contratei contador, aluguel imóvel e

investi nesse sonho de ser empreendedor e empresário. Afinal,

precisávamos de coisas novas no mercado e tudo estava muito

lento para meu gosto. Em poucos meses perdi o sócio e ainda

tive que pagar para ele o dinheiro que ele colocou no negócio

para evitar problemas mais futuros. Perdi os amigos influentes.

O cargo já nem tinha e consideração vinha apenas de poucos que

ousavam desafiar as dificuldades de acreditar em uma cara que

já fora chamado de ingerenciável e louco, além de impertinente

pelos poderosos das associações contra as quais lutei. Mas

continuei e conheci outras pessoas visionárias, com excelentes

idéias e para as quais eu tinha muito a acrescentar,

principalmente pelos meus conhecimentos de tecnologia. Passei

a me dedicar em projetos de comunicações sem fio e na

interatividade com a televisão, tanto digital quanto analógica.

Isso parecia ser realmente o futuro e penso que estava correto,

pois as tendências levam para esse caminho sem volta no

momento. Só que o dinheiro passava a ficar cada vez mais curto,

e eu tinha que decidir que rumo tomar na carreira profissional.

D

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

60

Ou voltar e implorar por um novo emprego, ou arriscar tudo e

seguir em frente com a visão e o sonho. Vocês já devem saber a

resposta! Eu começava a pensar menos em dinheiro e passava a

buscar a auto-realização de alguns sonhos. Passei a pensar e

planejar melhor as coisas e a ficar mais calmo. Comecei a

emagrecer e pesava então 100 kg.

Meu casamento acabou, mas eu ainda morava em casa. Cuidava

ao máximo de meus filhos, mas me perdia a tarde em devaneios

sem fim sobre os milhões que faríamos com as novas idéias.

Primeiro foi a consultoria sem resultado algum de expressão.

Diziam que eu era muito jovem para ser consultor, e alguns até

que eu era demasiadamente inovador para tal. E o MBA de nada

me serviu. Respeito a todos! Mas ainda assim consegui algumas

coisas que me ensinaram demasiadamente, convivendo com

pessoas realmente lindas que influenciaram minha vida desde

então. Um deles é meu guru até hoje e me ensinou que as perdas

são realmente necessárias e que devemos nos preparar para elas.

Perder meu pai e meu casamento, e ter que pensar em assumir o

papel de vencedor a todos os custos foi que me influenciaram a

tentar um vôo solo para ganhar mais dinheiro e amparar a todos.

Mas a verdade é que essa perda foi muito mal trabalhada e

acabou culminando em muitos outros problemas.

Depois veio o sistema de interatividade com a TV, tanto

analógica como digital. Esse sim um belo projeto, apesar de

ainda muito inovador para o período. Ele ainda é totalmente

atual e pouca coisa existe no mundo que se pareça com ele. Faz

mais de doze anos que foi criado por um sócio e até hoje poucos

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Marcelo Sant’Anna

61

testes foram feitos efetivamente, apesar da consistência dos

resultados obtidos. Todos ainda hoje acreditam que a televisão

digital é interativa por natureza, e isso é um engano, ou melhor,

um engodo dos manipuladores governamentais para escolher

entre sistemas de diversos países e regiões, o que seria mais

adequado para nós brasileiros. Apesar do segredo da sensação de

interação estar no formato criado para os programas televisivos,

o funcionamento é extremamente simples e engloba todas as

tecnologias hoje existentes de comunicação digital. E foi criada

em 2002, quando ainda tínhamos menos de vinte milhões

celulares, nem cinco milhões internautas e alguns milhares de

usuários de sistemas de banda larga, via quaisquer meios. Outro

fracasso contumaz de minha parte, pois convencer as pessoas da

viabilidade, tanto técnica quanto financeira, era minha parte na

sociedade. Por sorte muito grande, os parceiros antigos me

perdoaram e continuam meus amigos até a presente data.

Depois veio o sistema de vídeo para os celulares, usando uma

tecnologia japonesa, desenvolvida em um laboratório

independente. Chegamos até mesmo a testar o sistema em uma

operadora de telefonia celular que surgia, quase sem retorno de

resultados. Quem hoje tenta enviar uma mensagem MMS, ou

ver um vídeo em seu celular, sabe que é praticamente um parto

de quíntuplos! Esse sistema tornava as coisas bem mais simples,

mas nossa capacidade de convencimento novamente nos

abandonou. Hoje poderíamos estar a assistir muita coisa em

nossos aparelhos celulares se tivéssemos melhorado nosso poder

de relacionamento e lobby com as operadoras, Foi exatamente

Page 63: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Uma breve história de um profissional de sucesso!

62

nesse momento que encontrei meu antigo gerente na empresa

franlemã em cena. Obviamente que pelas circunstâncias

anteriores de nossos desentendimentos, os resultados nem

poderiam ser diferentes. Apesar de meu estágio muito mais

focado em ter paz, desqualifiquei erroneamente o cidadão, e ele

deve ter feito o mesmo comigo. De qualquer forma, a culpa pelo

insucesso foi minha, e ninguém deve levar o peso disso...

Aí veio a TV no PDV – Ponto de Venda, que hoje é amplamente

utilizada, mas que jamais saiu de uma sociedade sem fins

lucrativos entre alguns conhecidos que achavam conhecer muito

bem o mercado. Nem saímos da planilha eletrônica com o plano

de negócios e algumas apresentações eletrônicas.

Page 64: Uma breve historia de um profissional de sucesso

Marcelo Sant’Anna

63

Dos 36 aos 38 anos – 2003 a 2005

pós inúmeras tentativas em vários campos de atividade,

até mesmo consultor de uma empresa de tintas em

plena decadência eu tentei, cedi ao convite de assumir a

direção geral de uma empresa no Rio de Janeiro. Afinal de

contas, meu casamento já tinha ido para o espaço e eu nada mais

tinha para prover para São Paulo.

Empresa fantástica! Meu chefe direto era Astrofísico e o

presidente um ex-astronauta da NASA. Fazia parte da indústria

aeroespacial e se preparava para lançar um satélite para o Brasil.

Foram muitos meses de negociações e vídeos conferências sem

fim, mas tudo se acertou e em abril, fiz minhas malas. Pensei:

“Agora sim estou em um lugar bacana, com pessoas visionárias.

Tudo vai dar certo!” Como toda chegada de alguém estranho,

ela foi meio conturbada no início, mas depois de perceberem

que eu vinha somente para ajudar, as coisas ficaram mais fáceis.

Morar em outra cidade era totalmente novo para mim, ainda

mais se tratando de uma capital como a carioca. Foram dezoito

anos de Caçapava, mais cinco e alguns quebrados de Santa Rita

do Sapucaí, outros praticamente treze de São Paulo e agora, a

cidade maravilhosa, que é mesmo, em todos os aspectos menos

a violência, e quero, se Deus me permitir, ainda voltar e viver

por lá alguns anos de minha velhice com saúde.

Para minha surpresa, encontrei muitos antigos conhecidos,

alguns até mesmo se tornaram amigos, nesse meu retorno às

A

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

64

atividades voltadas para esse mercado. Sempre fui considerado

meio em órbita por minhas idéias, assim, estava em casa

novamente. Nessa indústria, tudo atrasa. Impressiona como os

prazos e datas se alteram a cada semana sobre eventos quase

futuros. Além do mais, eu estava em outro estágio de minha vida

pessoal, longe de meus amados filhos e de meus familiares, o

que me fazia meditar demasiadamente sobre a vida e sobre a

necessidade de realmente ganhar muito dinheiro, logo eu, que

em nada me preocupava com ele já fazia algum tempo. Mas

continuei firme na tentativa de obter realizações pessoais que

satisfizessem meus anseios de auto-realização. Fiz um

treinamento chamado Leader Training através de dois padrinhos

maravilhosos que considero amigos até hoje, e isso alterou ainda

mais minha vida e me fez perceber o que realmente tinha

importância para ela. Ainda entrei em algumas confusões

durante minha estada no Rio, como diretor geral, mas eu

resolvia todas elas com serenidade e calma, apesar de manter

minha mente inovadora e visionária.

Foram alguns meses de espera até o lançamento do foguete, mas

durante esse tempo revi os conceitos do mercado, fiz alguns

planejamentos, pensei em várias estratégias e partimos para

algumas ações. Como era uma empresa globalizada, mas

totalmente enxuta em todos os aspectos, pensei que tudo seria

muito fácil, afinal de contas, conversava diretamente com quem

decidia as coisas. Foi então que empresa também entrou em

concordata. Segunda vez em menos de três anos que sou diretor

geral de um negócio nessa situação. Sorte minha que todos os

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Marcelo Sant’Anna

65

investidores estavam fora do país e tudo era resolvida na

America, caso contrário, eu teria um grande dor de cabeça aqui.

A única real dor que tive foi ter que resolver algumas coisas

sobre uma propaganda veiculada em uma revista sobre o

lançamento de nossos produtos no Brasil. O concorrente se

irritou profundamente com algumas frases que coloquei e

tivemos que nos defender na justiça, mas vi que o problema nem

era com o presidente da rival, que também me pareceu bem

sereno para solucionar as diferenças. Era com a pessoa de

marketing! Eu já o conhecia de outras oportunidades e percebi

claramente que eu fazia as mesmas coisas quando tinha a

posição dele. Lembrei de como eu era arrogante e prepotente,

além de dono da verdade e acabei logo com assunto. Ambos

gastaram com advogados, investimento horas em vão em

reuniões e ao telefone e ninguém ganhou coisa alguma. Todos

perdem em uma briga.

Mas esse pensamento competitivo do executivo só veio à tona

em minha mente quando decidi realmente mudar. Que estranho

é fazer sempre do seu adversário, seu inimigo. Isso são egoísmo

e egocentrismo puro, mas é a realidade do mundo dos negócios.

Eu dificilmente voltaria a me adaptar a esse tipo de

comportamento novamente. Queria paz! Sorte que dentro da

organização em que eu trabalhava os relacionamentos, com

raríssimas exceções, era de cordialidade e colaboração, nada de

luta.

Só que como tudo na vida muda, nossa companhia também

mudou logo que saiu da concordata. Em pouco tempo o antigo

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

66

presidente estava aposentado, o novo presidente era um

“animal” de vendas, os acionistas pressionavam

demasiadamente por resultados, meu chefe físico foi substituído

pelo diretor mundial de vendas, e este colocou uma gerente de

vendas como minha nova chefe. Em pouquíssimos meses, passei

de direto responsável pelas negociações com a presidência para

um chefe de vendas, com cargo e salário de diretor geral.

Totalmente insustentável. Foi então que joguei a toalha

definitivamente para o mundo executivo. Passara a minha ânsia

de resultados a qualquer custo, vendas, lucros, dinheiro, dinheiro

e mais dinheiro.

E aos 38 anos eu era um cara esgotado, triste, em depressão e

pesava 90 kg. Descobri que estava diabético, justamente quando

me preparava para doar meus rins para minha irmã Cristiane

(aquela casada com o Xando). Passei a me tratar e a controlo

como posso desde então. Mas sei que devagar ela vai destruir

cada pedaço de meus rins, fígado e coração. Pouco me preocupo

com ela, confesso! Sofri tantas vezes com o passado e planejei

tantas vezes o futuro que me esqueci de viver o presente. E

pensando exatamente nisso, concordei com a extinção do cargo

de diretor geral para América Latina e decidi ser consultor

novamente. Digo que concordei uma vez que nem tive como

opinar sobre o caso, agora se eles me perguntassem, eu teria a

mesma posição. Eu achava injusto com todos que trabalhavam

lá, eu ganhar tanto para fazer tão pouco.

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Marcelo Sant’Anna

67

Em janeiro de 2005 assinei minha demissão. Estranho você

mandar você mesmo embora, mas foi o que aconteceu. Isso só

me fortaleceu...

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

68

Dos 38 aos 42 anos – 2005 a 2009

inda mantive um apartamento no Rio por seis meses

após minha saída, mas as contas começavam a apertar

bastante e decidi retornar para o interior. Devido à

posição geográfica em relação ao Rio de Janeiro, São Paulo, São

José dos Campos, Guarulhos e sul de Minas Gerais, eu voltei

para Caçapava. Uma fracassada investida, em negócios de

varejo de celulares e clínica odontológica, quebraram

definitivamente as contas, e eu precisava criar alguma coisa com

urgência para sobreviver. Pensei em retornar à vida de executivo

e fiz várias tentativas, com muitos amigos e alguns conhecidos,

mas tudo em vão. Analisei uma empresa de relacionamento com

clientes via Internet que até foi montada, mas meu sócio queria

que ela fosse de cobrança. “Oras bolas” pensei, “Se eu detesto

ser cobrado pelos outros, como passarei a fazer exatamente

isso?” E ela ficou no passado! Mas com dívidas certamente.

Assim, juntavam-se as dívidas das lojas de celulares, da clínica,

da empresa de Internet e a coisa ficava a cada dia, mais feia.

Entrei para trabalhar em uma grande empresa brasileira

globalizada por alguns meses para tentar reiniciar minha carreira

como empregado. Só que minha esposa teve um problema de

saúde, graças ao universo já curado, e logo em seguida minha

mamãe, que veio faleceu alguns meses depois. Perdas

necessárias, mas bem dolorosas!

A

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Marcelo Sant’Anna

69

“Consultoria!” imaginei. Após alguns contatos me tornei

consultor terceirizado de conteúdo de uma empresa americana

de treinamento e aconselhamento em atendimento e vendas para

instituições financeiras. Esse sim foi aprendizado e até admiro e

uso muito das ferramentas que aprendi com eles. Sempre é

muito bom e agora foi decidido que eles precisam de mais

clientes aqui no Brasil, e eu passei a buscar novas

oportunidades. Sei que será um parto de quadrigêmeos, mas

vamos em frente.

A dificuldade de aceitar que sempre precisamos melhorar nosso

atendimento e nossas vendas aos clientes, é impressionante no

nosso país. Por exemplo, apesar de serem campeãs, junto com os

bancos, de reclamações dos consumidores, as telefônicas se

recusam a melhorar se atendimento, pois isso é responsabilidade

dos terceirizados. Pense comigo, você terceiriza exatamente o

que deveria ser o seu foco, a sua razão de existir. Isso me parece

meio incorreto, senão imprudente! Acabei por perceber que isso

acontece com todo tipo de comércio nas capitais e no interior.

Raras são as empresas que realmente tratam seu cliente de uma

forma que ele se torne fiel. A maioria trabalha somente o preço

de seus produtos para ser atrativo, apesar das promoções serem

dificílimas de compreender. Esse sim é o foco do que faço hoje!

Atendimento e Vendas de verdade, com qualidade e reais

benefícios para todos ao contrário de apenas cumprimento de

metas comerciais e financeiras. Muitos dirão que vivo em outro

mundo, como disseram no passado, mas pouco me importo.

Permaneço a lutar para termos um mundo realmente mais justo.

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

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Passei a fazer treinamentos para ensinar aos futuros executivos

como devem se comportar da maneira correta, como fazer seu

planejamento de carreira, de que forma administrar seu tempo,

ética e comprometimentos, a ter sucesso! Ainda hoje faço isso e

é realmente o que me dá mais prazer. Ensinar os outros nos

ensina muito! E se pretendemos ter resultados diferentes,

precisamos fazer coisas diferentes. Eu talvez ainda seja diferente

demais para ser aceito imediatamente como um consultor de

empresas, mas de pessoas eu sou, e muito bom, mesmo que eu

saiba que estou muito longe de ser o melhor. Mostrar aos outros

que ninguém realmente inteligente cria conflitos é complicado,

mas me esforço todos os dias para isso. Muito empresários,

empreendedores, executivos e funcionários têm os mapas

mentais totalmente fundamentados em coisas do passado,

aprendidas pelos ancestrais do ser humano e perpetuadas pelas

sociedades, mas esses mapas estão errados e novos precisam vir.

Em breve eu terei seguidores sobre isso e estarei mais feliz.

Procuro ao máximo acalmar os desempregados e aposentados.

Existe vida inteligente fora das organizações. Sempre lembro

que, em um mundo como o nosso, até fazer filantropia é

complicado, pois muitos usam essa maravilha como trampolim

político ou comercial. Passei a escrever mais sobre isso e o eco

ainda é muito pequeno, mas crescerá. E eu sei por que é o

correto! Todos nós somos feitos do mesmo e pouco importa o

que seja. Somos iguais a tudo que existe.

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Marcelo Sant’Anna

71

Sucesso finalmente!

arece que, até agora, apenas falei das lamúrias de minha

vida profissional e absolutamente nada sobre meu

sucesso, correto? O problema é que muitos consideram

milhões de dólares em contas bancárias, jantares com

presidentes de empresas, reuniões em associações de classe,

casas nas praias, casas nas montanhas, carros luxuosos, jóias

raras e caras, roupas de grife internacional, acessórios de última

geração como o verdadeiro demonstrativo de sucesso, só que

estão errados! Sucesso é fazer algo, conforme o triângulo criado

a seguir:

P

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

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Triângulo do Sucesso da 4B

Fazer Sempre Mais

Fazer HojeMelhor que

Ontem

FazerTodo DIA

Fazer

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Marcelo Sant’Anna

73

Cada passo que damos em nossas vidas é sucesso. Cada dia que

acordamos é milagre. Cada sorriso que damos é lucro. Todas as

outras coisas são apenas necessárias para alguns, mas nada

importantes.

Se eu considero que tive ou tenho realmente sucesso? Vou dizer

para vocês:

João Otávio Teles Sant’Anna, meu amado filho Jota,

hoje com onze anos e Anna Marcela Teles Sant’Anna,

meu amor lindo, hoje com oito anos, são crianças

maravilhosas, inteligentes, bons alunos, excelentes

amigos, caridosos, desconsideram preconceitos, são

companheiros, respeitam os idosos, amam os avós (os

vivos e os mortos) e muito disso aprenderam comigo.

Sucesso?

O amor que tenho e recebo de minhas irmãs, Rita e

Cristiane, que continuamos unidos mesmo depois da

perda de nossos pais, brigamos cada dia menos e nos

ajudamos cada dia mais. Sucesso?

O reconhecimento que recebo dos mais próximos de ser

uma pessoa boa, com bons pensamentos, que só quero

ajudar, com quem eles podem contar e para quem dôo

todo o tempo necessário e amizade. Sucesso?

O respeito e compreensão que recebo e que tenho com a

mãe de meus filhos, Poliana e seu atual marido Alberto,

segundo pai de meus filhos, e suas respectivas famílias.

Sucesso?

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

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O amor que recebo e que nada pede em troca, e que

retribuo da melhor maneira que consigo, de minha

esposa Sandra, segunda mãe dos meus filhos e o respeito

com meus outros dois filhos postiços Ricardo e Bruna.

Sucesso?

A amizade e amor que mantenho com muitos de meus

ex-colegas, alguns deles a mais de 38 anos, além dos

novos que faço a cada dia. Sucesso?

As avaliações sempre positivas e caridosas que recebo de

minhas palestras e treinamentos para jovens nas

universidades e colégios. Sucesso?

E o mais relevante: VOCÊ! Que leu esse livro até o final

e ajudou, sem saber, muita gente com parte da renda

arrecadada por ele.

ucesso?

S

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Marcelo Sant’Anna

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im, eu sou um profissional de SUCESSO!

Até a próxima...

Jota, Sandra e Anninha no escritório em Caçapava

2009

S

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Uma breve história de um profissional de sucesso!

76

Sobre o Autor

Marcelo Sant’Anna é engenheiro de telecomunicações e

eletrônico, pelo Instituto Nacional de Telecomunicações -

INATEL, especialista em marketing pelo Instituto Paulista de

Ensino e Pesquisa - IPEP e tem MBA pela Business School

São Paulo - BSP e Rotman School of Management da

Universidade de Toronto - Canadá. Foi presidente da Loral

Skynet do Brasil, presidente da Terayon do Brasil, diretor de

marketing e vendas da Alcatel, gerente de vendas e

exportações da Andrew e da RFS e gerente de projetos da NEC

do Brasil. É consultor e fundador da 4B – Brain Builders for

Business, professor dos cursos de extensão da FGV e do

INATEL.

Quaisquer comentários sobre esse texto serão muito bem

vindos! [email protected].

Caso o conhecimento aqui adquirido seja válido para sua vida

pessoal e profissional, você pode pagar pelo livro o valor

indicado através do link:

http://www.evolcomm.com/Livros/default.shtml

Muito obrigado por seu tempo e atenção!