Uma Copa ainda mais 'do mundo'

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16 | Geral | 3 a 9 de julho de 2014 | www.arquidiocesedesaopaulo.org.br Angola Guiné Conacri Colombia Iraque República do Congo Afeganistão Siria Burkina Faso Nigéria Costa do Marfim Mali Camarões Bangladesh Cuba Paquistão Serra Leoa X X X X X X X X JOGOS DA COPA DOS REFUGIADOS Dias 2 e 3 de agosto no Centro Esportivo do Glicério, mais conhecido como Campo da Tia Eva. Desde o início do ano, um grupo de estrangeiros refugiados trabalhando em conjunto e com o apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ANCUR), da Ca- ritas Arquidiocesana de São Paulo e da Missão Paz, começou a organi- zar a Copa. Entre eles, um é poeta, outro é engenheiro de informática; dois são músicos e um é dono de uma pequena lan house. E, entre ex- periências de guerra e perseguição, eles mantêm e transmitem um clima de muita alegria e animação. O hino desta Copa foi composto por dois rappers refugiados e a reali- zação dos jogos que estava prevista para os dias 5 e 6 de julho, foi adiada em virtude do advento do Ramadã. Muitas das seleções que participa- Uma Copa ainda mais ‘do mundo’ Refugiados de 16 países participarão de um torneio de futebol que acontecerá dias 2 e 3 de agosto NAYÁ FERNANDES REPORTAGEM NO CENTRO Cadê a bandeira da Síria? As outras 15 estavam lá. Teria sido uma falha da organização do evento represen- tar a Síria com um pedaço de papel em branco? A resposta veio no fim da abertura da Copa dos Refugia- dos, sábado, 28, no pátio da Igreja Nossa Senhora da Paz, onde fun- ciona também a Missão Paz e a Casa do Migrante, no Glicério. “A atual bandeira da Síria não representa o povo, é a bandeira de um país em guerra, dominado por interesses de fora.” Quem explicou foi Abdul Ibrahim, 40, sírio que está no Brasil há 18 meses e, atual- mente, é professor de inglês. O lugar foi escolhido proposi- talmente e, além dos representan- tes de cada uma das seleções, parti- ciparam da abertura os apoiadores, hóspedes e um grupo de crianças que está na Casa dos Migrantes com os pais. Uma delas, de Ango- la, na África, começou a dar os pri- meiros passos na Casa. Outra, da República Democrática do Congo, ficou 19 dias em um navio de carga até chegar a Santos (SP). As crianças brincavam com um grupo de voluntários e enquan- to isso, os paroquianos construí- am as barracas para a festa junina que começou também no sábado à noite. Mas, o clima de normali- dade esconde dramas e histórias de superação e sofrimento. Os re- fugiados, diferente dos imigrantes comuns, saíram do seu país por uma situação limite e, a maioria, para continuar vivendo. Alguns deles preferem não aparecer na mídia, e, por isso, fo- ram identificados com uma faixa laranja no braço. Uchen Henry, 21, é cantor e veio da Nigéria. Ele precisou sair do país porque estava sendo perseguido e um dos seus ir- mãos já tinha sido assassinado por isso. Com uma camisa do Brasil e muita animação, Uchem cantou durante o evento e, mesmo sendo nigeriano, disse que está torcendo para o Brasil na Copa da Fifa. Já a seleção escolhida por Mi- guel Soufan, 27, foi a Alemanha. Ele também é sírio e está há cin- co meses no Brasil. Membro da equipe de organização da Copa dos Refugiados, afirmou que “a ideia é muito boa. O Brasil abre as portas para os refugiados que vêm em busca de trabalho, de um lugar para viver em paz. As atividades promovem o conhecimento e a integração entre diferentes países”. Miguel já morou na Síria e na Malásia e disse se adaptar facil- mente, mas sente por outras pes- soas, para quem essa adaptação é muito difícil. “Tive que sair do meu país porque participei de protestos na rua e pedi liberdade na políti- ca, na economia, como aconteceu no Brasil há 50 anos. Os Estados Unidos da América usam a Síria, mas não fornecem nenhum tipo de ajuda à população. Então, a polícia de inteligência da Síria começou a me perseguir.” Para ele, o Governo do Brasil ainda não respeita os sírios e é con- veniente com as ações dos Estados Unidos. As Nações Unidas reali- zam sanções que, na verdade, não favorecem os interesses da Síria, são ações pro form. Para colaborar com a Copa dos Refugiados você pode fazer um depósito de qualquer quantia para Caritas Arquidiocesana de São Paulo Banco Itaú (0341) Agência 7657 – Conta 10834-1 CNPJ 62021308/0001-70 *As doações serão utilizadas na compra de uniformes e materiais para os jogos. De quem é o primeiro chute? DA REPORTAGEM rão são compostas por muçulmanos e, em respeito ao período sagrado e de jejum que celebram, a organiza- ção do evento decidiu pela transfe- rência das datas. Os jogos acontecerão nos dias 2 e 3 de agosto, no Centro Esportivo do Glicério, mais conhecido como Campo da Tia Eva. No primeiro dia do campeonato, sábado, 2, a partir das 8h, as 16 equipes se enfrenta- rão em oito jogos eliminatórios e os vencedores passarão para a fase seguinte da competição. As quartas de final, as semifinais e a grande final ocorrerão no domin- go, 3, que será o dia mais festivo do evento, com a presença de torcida e com apresentações culturais, ativi- dades recreativas, oficinas de arte e exposições realizadas. Fotógrafos, jornalistas e até um DJ também di- vidirão as tarefas do evento. Larissa Leite, responsável pelas relações externas do Centro de Aco- lhida para Refugiados, afirmou que a premiação, por enquanto, será com a entrega de medalhas para primeiro e segundo lugar e de um troféu para o campeão. “Mas outras ações estão sendo pensadas a partir do resultado da campanha de doações”, explicou Larissa. (NF) Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

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O encontro entre sírios, africanos, brasileiros, haitianos e refugiados de 16 países vai ser diferente nos dias 2 e 3 de agosto. Eles vão disputar a Copa dos Refugiados, no campinho da Tia Eva, no Glicério, centro da capital paulista. Nesta Copa, o mais importante não é só ganhar, é mostrar ao mundo que ele pode ser, de verdade, solidário quando acolhe alguém que precisou fugir. Assim, o futebol não é refúgio, é encontro.

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16 | Geral | 3 a 9 de julho de 2014 | www.arquidiocesedesaopaulo.org.br

Angola

Guiné Conacri

Colombia

Iraque

República do Congo

Afeganistão

Siria

Burkina Faso

Nigéria

Costa do Marfim

Mali

Camarões

Bangladesh

Cuba

Paquistão

Serra Leoa

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Jogos da Copa dos Refugiadosdias 2 e 3 de agosto no Centro esportivo do glicério, mais conhecido como Campo da Tia eva.

Desde o início do ano, um grupo de estrangeiros refugiados trabalhando em conjunto e com o apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ANCUR), da Ca-ritas Arquidiocesana de São Paulo e da Missão Paz, começou a organi-zar a Copa. Entre eles, um é poeta, outro é engenheiro de informática; dois são músicos e um é dono de uma pequena lan house. E, entre ex-periências de guerra e perseguição, eles mantêm e transmitem um clima de muita alegria e animação.

O hino desta Copa foi composto por dois rappers refugiados e a reali-zação dos jogos que estava prevista para os dias 5 e 6 de julho, foi adiada em virtude do advento do Ramadã. Muitas das seleções que participa-

Uma Copa ainda mais ‘do mundo’Refugiados de 16 países participarão de um torneio de futebol que acontecerá dias 2 e 3 de agosto

Nayá FerNaNdesreportagem No CeNtro

Cadê a bandeira da Síria? As outras 15 estavam lá. Teria sido uma falha da organização do evento represen-tar a Síria com um pedaço de papel em branco? A resposta veio no fim da abertura da Copa dos Refugia-dos, sábado, 28, no pátio da Igreja Nossa Senhora da Paz, onde fun-ciona também a Missão Paz e a Casa do Migrante, no Glicério.

“A atual bandeira da Síria não representa o povo, é a bandeira de um país em guerra, dominado por interesses de fora.” Quem explicou foi Abdul Ibrahim, 40, sírio que está no Brasil há 18 meses e, atual-mente, é professor de inglês.

O lugar foi escolhido proposi-talmente e, além dos representan-tes de cada uma das seleções, parti-ciparam da abertura os apoiadores, hóspedes e um grupo de crianças que está na Casa dos Migrantes com os pais. Uma delas, de Ango-la, na África, começou a dar os pri-meiros passos na Casa. Outra, da República Democrática do Congo,

ficou 19 dias em um navio de carga até chegar a Santos (SP).

As crianças brincavam com um grupo de voluntários e enquan-to isso, os paroquianos construí-am as barracas para a festa junina que começou também no sábado à noite. Mas, o clima de normali-dade esconde dramas e histórias de superação e sofrimento. Os re-fugiados, diferente dos imigrantes comuns, saíram do seu país por uma situação limite e, a maioria, para continuar vivendo.

Alguns deles preferem não aparecer na mídia, e, por isso, fo-ram identificados com uma faixa laranja no braço. Uchen Henry, 21, é cantor e veio da Nigéria. Ele precisou sair do país porque estava sendo perseguido e um dos seus ir-mãos já tinha sido assassinado por isso. Com uma camisa do Brasil e muita animação, Uchem cantou durante o evento e, mesmo sendo nigeriano, disse que está torcendo para o Brasil na Copa da Fifa.

Já a seleção escolhida por Mi-guel Soufan, 27, foi a Alemanha. Ele também é sírio e está há cin-

co meses no Brasil. Membro da equipe de organização da Copa dos Refugiados, afirmou que “a ideia é muito boa. O Brasil abre as portas para os refugiados que vêm em busca de trabalho, de um lugar para viver em paz. As atividades promovem o conhecimento e a integração entre diferentes países”.

Miguel já morou na Síria e na Malásia e disse se adaptar facil-mente, mas sente por outras pes-soas, para quem essa adaptação é muito difícil. “Tive que sair do meu país porque participei de protestos na rua e pedi liberdade na políti-ca, na economia, como aconteceu no Brasil há 50 anos. Os Estados Unidos da América usam a Síria, mas não fornecem nenhum tipo de ajuda à população. Então, a polícia de inteligência da Síria começou a me perseguir.”

Para ele, o Governo do Brasil ainda não respeita os sírios e é con-veniente com as ações dos Estados Unidos. As Nações Unidas reali-zam sanções que, na verdade, não favorecem os interesses da Síria, são ações pro form.

Para colaborar com a Copa dos Refugiados você pode fazer um depósito de qualquer quantia para Caritas Arquidiocesana de São PauloBanco Itaú (0341)Agência 7657 – Conta 10834-1CNPJ 62021308/0001-70*As doações serão utilizadas na compra de uniformes e materiais para os jogos.

de quem é o primeiro chute?da reportagem rão são compostas por muçulmanos

e, em respeito ao período sagrado e de jejum que celebram, a organiza-ção do evento decidiu pela transfe-rência das datas.

Os jogos acontecerão nos dias 2 e 3 de agosto, no Centro Esportivo do Glicério, mais conhecido como Campo da Tia Eva. No primeiro dia do campeonato, sábado, 2, a partir das 8h, as 16 equipes se enfrenta-

rão em oito jogos eliminatórios e os vencedores passarão para a fase seguinte da competição.

As quartas de final, as semifinais e a grande final ocorrerão no domin-go, 3, que será o dia mais festivo do evento, com a presença de torcida e com apresentações culturais, ativi-dades recreativas, oficinas de arte e exposições realizadas. Fotógrafos, jornalistas e até um DJ também di-vidirão as tarefas do evento.

Larissa Leite, responsável pelas relações externas do Centro de Aco-lhida para Refugiados, afirmou que a premiação, por enquanto, será com a entrega de medalhas para primeiro e segundo lugar e de um troféu para o campeão. “Mas outras ações estão sendo pensadas a partir do resultado da campanha de doações”, explicou Larissa. (NF)

Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO