Uma extensão de overlaps e naBL-Álgebras para reticulados
Transcript of Uma extensão de overlaps e naBL-Álgebras para reticulados
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA E MATEMÁTICA APLICADA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SISTEMAS E COMPUTAÇÃO
DOUTORADO ACADÊMICO EM SISTEMAS E COMPUTAÇÃO
Uma extensão de overlaps e naBL-Álgebras parareticulados
Rui Eduardo Brasileiro Paiva
Natal-RN
2019
Rui Eduardo Brasileiro Paiva
Uma extensão de overlaps e naBL-Álgebras para reticulados
Tese de Doutorado apresentada ao Programade Pós-Graduação em Sistemas e Computaçãodo Departamento de Informática e Matemá-tica Aplicada da Universidade Federal do RioGrande do Norte como requisito parcial paraa obtenção do grau de Doutor em Sistemas eComputação.Linha de pesquisa: Fundamentos da Compu-tação.
Orientador: Prof. Dr. Regivan Hugo Nunes Santiago
Coorientador: Prof. Dr. Umberto Rivieccio
Natal-RN
2019
Paiva, Rui Eduardo Brasileiro. Uma extensão de overlaps e naBL-Álgebras para reticulados /Rui Eduardo Brasileiro Paiva. - 2019. 116f.: il.
Tese(Doutorado)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte,Centro de Ciências Exatas e da Terra, Programa de Pós-Graduaçãoem Sistemas e Computação, Natal, 2019. Orientador: Dr. Regivan Hugo Nunes Santiago. Coorientador: Dr. Umberto Rivieccio.
1. Overlap - Tese. 2. Quasi-overlap - Tese. 3. Topologia deScott - Tese. 4. Lógica Fuzzy - Tese. 5. naBL-álgebras - Tese.I. Santiago, Regivan Hugo Nunes. II. Rivieccio, Umberto. III.Título.
RN/UF/BCZM CDU 004.03
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede
Elaborado por Raimundo Muniz de Oliveira - CRB-15/429
Dedico este trabalho a minha família, aos meus pais Rui e Cláudia, pela confiança em mim
depositados, à minha linda esposa Emanuela e aos amados filhos Letícia e Rui Lucas.
Agradecimentos
Chegar até aqui definitivamente não foi fácil. Eu não teria conseguido sem a ajuda, presença
ou simplesmente existência de algumas pessoas importantes para mim.
Agradeço a Deus pela força e as oportunidades.
Em seguida, não poderia deixar de demonstrar minha gratidão àquela que tem sido minha
companheira de todas as horas: Emanuela, minha linda esposa. Obrigada, por todo amor,
compreensão e apoio.
Quero também agradecer aos meus amados filhos Letícia e Rui Lucas. São eles quem me
fazem sorrir em todos os momentos e enchem meu coração de alegrias.
Muito obrigada aos meus pais, Rui e Cláudia, por existirem e por tudo que fizeram e ainda
fazem por mim. Amo muito vocês.
Agradeço a minha tia avó Maria de Lourdes - a “tia Duda” (In memoriam) e a minha
sogra, a “dona Hosana”. Muito obrigado pelos deliciosos cafés que mantiveram acordado e me
permitiram estudar até tarde.
Ao estimado amigo Genário, pelos conselhos, amizade e companheirismo.
Agradeço aos meus orientadores Regivan Santiago e Umberto Rivieccio. Obrigado profes-
sores, pela generosidade, pelas discussões matemáticas, pelos conselhos e paciência.
Reservo agora um agradecimento mais do que especial ao Professor Benjamím Bedregal (a
quem considero um grande amigo) por tudo que ele tem feito por mim ao longo deste doutorado.
Obrigada Benja, pelo seu humor contagiante e sua generosidade, pelas excelentes sugestões,
discussões matemáticas e pela paciência.
Agradeço aos amigos do curso: Annaxsuel, Diego, Valdigleis, Vânia, Nicolás, Ranyer,
Ronildo, André, Huliane, Emmanuelly, Suene, Heloisa, Thiago Nascimento e Thiago Vieira,
em especial ao Amigo Thadeu Milfont pela gentileza de permitir minha hospedagem em sua
casa, pela parceria e pelos bate papos culturais e matemáticos.
E finalmente, meu agradecimento ao IFCE pelo apoio.
“Ou a matemática é muito grande para a mente humana, ou a mente humana é mais do que
uma máquina.”
Kurt Gödel
RESUMO
Funções overlap foram introduzidas como uma classe de funções de agregação bivariadas sobre
o intervalo [0, 1] para serem aplicadas no campo de processamento de imagens. Muitos pesqui-
sadores começaram a desenvolver a teoria das funções overlap para explorar suas potenciali-
dades em diferentes cenários, tais como problemas que envolvem classificação ou tomada de
decisão. Recentemente, uma generalização não-associativa das BL-álgebras de Hájek (naBL-
álgebras) foi investigada sob a perspectiva de funções overlap como aplicação residuada. Neste
trabalho, generalizamos a noção de overlap para o contexto de reticulados e introduzimos uma
definição mais fraca, chamada de quasi-overlap, que surge da retirada da condição de continui-
dade. Para este fim, as principais propriedades de (quasi-) overlap sobre reticulados limitados,
a saber: soma convexa, migratividade, homogeneidade, idempotência e lei de cancelamento
são investigadas, bem como uma caracterização de overlap arquimedianas é apresentada. Além
disso, formalizamos o princípio de residuação para o caso de funções quasi-overlap sobre reti-
culados e suas respectivas implicações induzidas, bem como revelamos que a classe de funções
quasi-overlap que cumprem o princípio de residuação é a mesma classe de funções contínuas
segundo a topologia de Scott. Como consequência, fornecemos uma nova generalização da
noção de naBL-álgebras baseadas em overlap sobre reticulados.
Palavras-chave: Overlap, Quasi-overlap, Topologia de Scott, Lógica Fuzzy, naBL-álgebras.
ABSTRACT
Overlap functions were introduced as a class of bivariate aggregation functions on [0, 1] to be ap-
plied in the image processing field. Many researchers have begun to develop overlap functions
in order to explore their potential in different scenarios, such as problems involving classifi-
cation or decision making. Recently, a non-associative generalization of Hájek’s BL-algebras
(naBL-algebras) were investigated from the perspective of overlap functions as a residuated
application. In this work, we generalize the notion of overlap functions for the lattice context
and introduce a weaker definition, called a quasi-overlap, that arises from definition, called a
quasi-overlap, that arises from the removal of the continuity condition. To this end, the main
properties of (quasi-) overlaps over bounded lattices, namely: convex sum, migrativity, homoge-
neity, idempotency, and cancellation law are investigated, as well as an overlap characterization
of Archimedian overlap functions is presented. In addition, we formalized the residual principle
for the case of quasi-overlap functions on lattices and their respective induced implications, as
well as revealing that the class of quasi-overlap functions that fulfill the residual principle is
the same class of continuous functions according the topology of Scott. As a consequence, we
provide a new generalization of the notion of naBL-algebras based on overlap over lattices.
Keywords: Overlap, Quasi-overlap, Scott toplogy, Fuzzy Logic, naBL-algebras.
Sumário
Lista de figuras
1 Introdução p. 10
I Referencial teórico 13
2 Ordens Parciais e Topologia p. 14
2.1 Teoria da ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 14
2.2 Reticulados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 22
2.2.1 Congruências e homomorfismos de reticulados . . . . . . . p. 23
2.2.2 Tipos especiais de reticulados . . . . . . . . . . . . . . . . p. 26
2.3 Noções elementares de topologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 28
2.4 Topologia de Scott . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 32
2.5 Scott-convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 41
3 Funções residuadas e algumas álgebras da lógica fuzzy p. 45
3.1 Conexões de Galois e o Princípio de residuação . . . . . . . . . . . . p. 45
3.2 Funções residuadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 52
3.2.1 t-normas e t-conormas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 52
3.2.2 Funções overlap . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 55
3.2.3 Automorfismos e propriedades relacionadas . . . . . . . . p. 58
3.3 Algumas álgebras da lógica fuzzy . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 60
3.3.1 BL-álgebras: definição e exemplos . . . . . . . . . . . . . p. 60
3.3.2 naBL-algebras: definições e primeiras propriedades . . . . p. 61
3.3.3 Filtros e congruências em naBL-álgebras . . . . . . . . . . p. 63
II Contribuições 65
4 Extensão de overlap para reticulados p. 66
4.1 Overlap e quasi-overlap para reticulados limitados . . . . . . . . . . p. 66
4.2 Soma convexa generalizada de funções overlap e quasi-overlap . . . p. 69
4.3 Principais propriedades das funções quasi-overlap . . . . . . . . . . p. 71
4.3.1 (α,A)-Migratividade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 71
4.3.2 Homogeneidade estendida . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 74
4.3.3 Idempotência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 79
4.3.4 Lei de cancelamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 80
4.4 quasi-overlap arquimedianas e propriedades relacionadas . . . . . . . p. 82
5 implicações residuadas derivadas de Quasi-overlap sobre reticulados p. 86
5.1 Implicações induzidas de quasi-overlap sobre reticulados . . . . . . . p. 86
5.2 Quasi-overlap residuadas e suas RO-implicações . . . . . . . . . . . p. 88
5.3 Quasi-overlap conjugadas e suas implicações induzidas . . . . . . . p. 92
5.4 Quasi-overlap obtidas por distorções . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 96
6 naBL-Álgebras baseadas em overlaps sobre reticulados p. 100
6.1 naBL-álgebras obtidas por quasi-overlap sobre reticulados . . . . . . p. 100
6.2 naBL-álgebras inflacionárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 103
6.3 naBL-álgebras inflacionárias obtidas por (ψ, T )-distorções . . . . . . p. 107
7 Conclusões p. 109
Referências p. 112
Lista de figuras
1 Diagrama de Hasse do poset P (a, b, c). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 16
2 Diagrama de Hasse do CPO plano B. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 19
3 Diagrama de Hasse do CPO plano Z⊥. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 20
4 Representação dos reticulados L e M . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 26
5 Scott continuidade versus continuidade euclidiana. . . . . . . . . . . . . . . p. 35
6 Representação dos posets conexos X e Y . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 40
7 Conexão monotônica de Galois entre os posets X e Y . . . . . . . . . . . . . p. 46
8 Conexão antitônica de Galois entre os posets X e Y . . . . . . . . . . . . . . p. 47
9 Diagrama de Hasse do reticulado L . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 81
10 Diagrama de adjunção e conjugação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 94
11 Diagrama de funções residuadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 95
12 Representação pictórica das conjunções fuzzy que geram a classe naBL. . . . p. 106
13 BL-álgebras obtidas por Scott-automorfismos. . . . . . . . . . . . . . . . . . p. 108
14 naBL-álgebras obtidas pela distorção de t-normas. . . . . . . . . . . . . . . . p. 108
10
1 Introdução
É conhecido da literatura que a formalização dos reticulados residuados não-associativos é
realizada usando generalizações de t-normas a saber: t-normas não associativas (BOTUR, 2011)
e t-normas fracas (ZHANG; MA, 2010). Tais investigações foram baseadas em uma generalização
do conceito de t-nomas. Mas este estudo não incluiu todas as classes de reticulados residuados
não-associativos, uma vez que tais estruturas podem ser derivadas de funções overlap em vez
de t-normas. Além disso, é possível encontrar vários exemplos de funções overlap que não
são t-normas. Por exemplo: Oα(x, y) = xy(1 + α(1 − x)(1 − y)), onde α ∈ [−1, 0) ∪ (0, 1],
OmM(x, y) = min(x, y) ·max(x2, y2) e Omp(x, y) = minxp, yp, para p > 0 e p 6= 1.
Funções overlap foram introduzidas como uma classe de funções de agregação bivariadas
sobre o intervalo [0, 1] para serem aplicadas no campo de processamento de imagens (BUSTINCE
et al., 2010). Basicamente, essas funções transformam imagens com pixels com valores em [0, 1].
Muitos pesquisadores começaram a desenvolver a teoria das funções overlap para explorar suas
potencialidades em diferentes cenários, tais como problemas que envolvem classificação ou
tomada de decisão. Entretanto, quando se leva em consideração que pixels (ou sinais) podem
conter incertezas, por exemplo ruídos, essa informação de ruído pode ser captada em objetos
que estendem os números reais, por exemplo intervalos ou números fuzzy. Nesse caso, a noção
de overlap precisa ser estendida para lidar com esse tipo de objeto.
Além de sua importância em aplicações, vale também salientar algumas características ine-
rentes das funções overlap, tais como: ao contrário das t-normas, a classe das funções overlap
é convexa; o fecho convexo da classe de t-normas contínuas sem divisores de zero (que são
as mesmas funções overlap associativas) é uma subclasse própria de todas as funções overlap.
Outro fato importante é que as funções overlap são preservadas sob transformações externas e
internas por meio de automorfismos (PAIVA et al., 2018). Em (PAIVA et al., 2018) os autores mos-
traram que operadores overlap e seus respectivos resíduos também dão origem a uma classe de
naBL-álgebras. Além disso, eles provaram que essa classe é fechada para automorfismos.
Ante ao exposto, a noção de funções overlap precisa ser estendida de uma operação binária
11
sobre o intervalo [0, 1] para uma operação binária sobre reticulados. E é este um dos propósitos
deste trabalho. Nessa perspectiva, este trabalho versa sobre dois focos:
Primeiro, obter uma generalização para o conceito de funções overlap para reticulados,
fazendo uma ampla discussão sobre as principais propriedades de tais operadores. Também,
introduzir uma definição mais geral, chamada de quasi-overlap, que surge da retirada da con-
dição de continuidade. Além disso, as principais propriedades de (quasi- ) overlap sobre reti-
culados limitados, a saber: soma convexa, migratividade, homogeneidade, idempotência e lei
de cancelamento, são investigadas, bem como uma caracterização de overlap arquimedianas é
apresentada.
Segundo, apresentar um quadro teórico de teoria da ordem e topologia com vistas a es-
tabelecer uma conexão entre a noção de convergência em termos da ordem e a topologia de
Scott para obter um par de aplicações residuadas, a saber: (O, IO), onde O é uma função quasi-
overlap e IO uma implicação induzida de O. Como consequência, fornecer uma generalização
da noção de naBL-álgebras baseadas em overlap sobre reticulados e apresentamos algumas
propriedades a respeito desse tema, em especial apresentar uma versão do conhecido teorema
chinês dos restos para naBL-álgebras baseadas em funções quasi-overlap.
No capítulo 2, é apresentada uma interação entre teoria da ordem e topologia. Nesse capí-
tulo, a classe dos posets completos dirigidos (DCPO’s) e a classe dos posets completos filtrados
(FCPO’s), bem como a classe dos reticulados são largamente explorados. Este capítulo também
mostra como a noção de ordem densa coincide com o conceito de densidade de espaços topoló-
gicos na topologia de Scott. Por fim o capítulo aborda a noção de convergências via nets - uma
generalização de sequências para espaços topológicos gerais.
No capítulo 3, um quadro geral sobre aplicações residuadas e algumas funções de agregação
de duas variáveis, em especial t-normas e funções overlap são apresentados. Serão estabelecidas
as relações entre essas funções e os conceitos de automorfismos e funções conjugadas. Em
seguida, a definição de BL-álgebras e alguns exemplos são apresentados. Por fim, propõe-se
a definição e as primeiras propriedades de uma generalização para o caso não-associativo das
BL-álgebras (naBL-álgebras).
No capítulo 4, estende-se o conceito de funções overlap para reticulados. Nesse capítulo,
verifica-se que mesmo após generalizar a noção de overlap, algumas propriedades são muito
naturais no escopo de reticulados. Também mostra-se como algumas propriedades comuns, tais
como a migratividade, se comportam na configuração de funções overlap e como a propriedade
da homogeneidade pode ser estendida em termos de funções de peso. Outras propriedades
que merecem atenção também são discutidas em detalhes na Proposição 4.1, bem como nos
12
Teoremas 4.6 e 4.7, onde os conceitos de quasi-overlap divisível e t-norma divisível em um
reticulado limitado L são usados para substituir o conhecido Teorema do valor intermediário
(ressalte-se que esses conceitos coincidem apenas quando L é uma cadeia).
No capítulo 5, é introduzido o conceito de implicações residuadas derivadas de funções
quasi-overlap sobre reticulados e prova-se algumas propriedades relacionadas. Além disso,
é formalizado o princípio de residuação para o caso de funções quasi-overlap sobre reticu-
lados e suas respectivas implicações induzidas, bem como revelado que a classe de funções
quasi-overlap que cumprem o princípio de residuação é a mesma classe de funções contínuas
segundo a topologia de Scott. A continuidade de Scott e a noção de posets com ordem densa
são utilizadas para obter um teorema de classificação para funções quasi-overlap residuadas.
Ainda nesse capítulo, os conceitos de automorfismos e pseudo-automorfismos são estendidos
para o contexto de funções quasi-overlap sobre reticulados, com vistas a obter funções quasi-
overlap conjugadas pela ação de Scott-automorfismos, bem como obter funções quasi-overlap
pela distorção de t-normas.
No capítulo 6, as funções quasi-overlap residuadas e suas respectivas implicações residu-
ais utilizadas para modelar operadores conectivos da lógica fuzzy. Inicia-se mostrando que
toda cadeia completa de ordem densa cujo operador ∗ é um quasi-overlap residuado com ele-
mento neutro produz uma naBL-álgebra. Uma consequencia deste resultado é uma versão do
conhecido Teorema chinês dos restos generalizado para naBL-álgebras. A fim de obter uma
generalização para naBL-álgebras baseadas em funções overlap sobre reticulados, discute-se
sobre a adaptação da conhecida propriedade da divisibilidade, bem como as noções de α, β-
prelinearidade para o contexto de quasi-overlap e com isso obtém-se uma nova generalização
não-associativa para BL-álgebras, a qual chamamos naBL-álgebras inflacionárias. O capítulo
também mostra que a classe naBL de todas as naBL-álgebras contém naBL-álgebras que não
são obtidas por t-normas não-associativas.
Finalmente, no capítulo 7 apresenta-se as considerações finais e as conclusões deste traba-
lho. Apresentamos uma visão ampla, relacionando os resultados da tese com o interesse em
diversas áreas como processamento de imagens ou sinais, lógicas e teoria das categorias.
13
Parte I
Referencial teórico
14
2 Ordens Parciais e Topologia
A interação entre teoria da ordem e topologia tem proporcionado bons resultados tanto
em matemática pura quanto em matemática aplicada a ciência da computação, principalmente
em teoria da informação e lógica algébrica. A teoria dos domínios, ramo da matemática onde
esta interação acontece, lida com uma relação especial sobre um conjunto P , ordenando os
seus elementos. Tal relação é chamada de ordem parcial e, quando associada ao conjunto em
questão, fornece uma estrutura chamada de poset. Classes especiais de posets, como veremos
adiante, são a classe dos posets completos dirigidos (DCPO’s) e a classe dos posets completos
filtrados (FCPO’s). Por outro lado, Espaços topológicos cujos abertos “diferenciam” pontos da
seguinte forma: dados dois pontos distintos, existe ao menos um aberto que os distingue, são
conhecidos como espaços T0. Os exemplos mais importantes de espaços T0 são os espaços de
Scott, definidos originalmente para reticulados completos por Dana Scott em (SCOTT, 1972).
Para cada reticulado completo L, Scott introduziu uma topologia, σ(L) em L. Posteriormente,
essa topologia foi definida para DCPO’s (FCPO’s) e, mais recentemente, para posets arbitrários.
Ainda neste capítulo apresenta-se a noção de posets de ordem densa e prova-se que essa noção
coincide com o conceito de densidade de espaços topológicos na topologia de Scott. Por fim
o capítulo aborda a noção de convergências via nets - uma generalização de sequências para
espaços topológicos gerais - bem como destacamos a unicidade da convergência de nets em
espaços Hausdorff. Estas definições e outras mais serão dadas no capítulo atual, a fim de estudar
os próximos capítulos.
2.1 Teoria da ordem
Nesta seção será revisado alguns resultados da teoria da ordem, o ramo da matemática que
lida dentre outras coisas com as relações de ordem. Para mais detalhes, indica-se: (GIERZ et al.,
2003; MISLOVE, 1998; GOUBAULT-LARRECQ, 2016).
Uma relação binária de importância considerável para Lógica Matemática e Ciência da
Computação é a relação de ordem, que captura o sentido intuitivo de conceitos tais como
15
“maior” e “menor” ou “anterior’ e “posterior” para alguns (ou para todos) elementos de um
dado conjunto.
Definição 2.1. Uma relação≤ sobre um conjunto P é chamada ordem parcial (ou simplesmente
ordem) sobre P se para todos a, b, c ∈ P tem-se:
(i) a ≤ a (reflexividade);
(ii) a ≤ b e b ≤ a implica a = b (antissimetria);
(iii) a ≤ b e b ≤ c implica a ≤ c (transitividade).
O par 〈P,≤〉 formado pelo conjunto P juntamente com a ordem parcial ≤ é chamado um
sistema parcialmente ordenado, enquanto que P é um conjunto parcialmente ordenado ou,
abreviadamente, poset.
Observação 2.1.
(i) Se a ordem parcial ≤ verifica a condição: quaisquer que sejam a, b ∈ P , tem-se a ≤ b
ou b ≤ a, diz-se que ≤ é uma relação de ordem total e então o sistema 〈P,≤〉 diz-se
um sistema totalmente ordenado ou cadeia. Evidentemente, Toda ordem total é também
parcial.
(ii) Seja R uma relação de ordem sobre E e consideremos a relação inversa (ou dual) R−1
de R: xR−1y ⇔ yRx. É imediato que R−1 é uma relação de ordem sobre E. Notemos
ainda que R é uma ordem total se, e só se, R−1 também o é.
Se a e b são elementos de um sistema 〈P,≤〉, tais que a ≤ b ou b ≤ a, diz-se que a e b são
comparáveis (notação: a ¨ b). Se não vale a ≤ b e nem b ≤ a, os elementos a e b são ditos
paralelos ou incomparáveis e são denotados por a ‖ b. Uma ordem parcial chama-se também
relação de precedência e “a ≤ b” lê-se “a precede b”. Se temos que a ≤ b mas a 6= b então
escrevemos a < b e dizemos que a precede estritamente b. Dualmente, “b ≥ a” lê-se “b sucede
a”. Também dualmente escreveremos b > a se b ≥ a mas a 6= b, para dizer que b sucede
estritamente a.
Exemplo 2.1. O par 〈N,≤d〉, em que N é o conjunto de todos os números naturais e, para
quaisquer a, b ∈ N, a ≤d b ⇔ a|b, onde o símbolo | representa a relação de divisibilidade nos
naturais, é um sistema parcialmente ordenado.
Exemplo 2.2. Seja X um conjunto. O conjunto P(X) de todos os subconjuntos de X sob a
relação de inclusão “⊆” forma um poset.
16
A próxima definição fornece uma noção de densidade para posets que é dada em termos da
ordem do poset.
Definição 2.2. (Ordem-densidade de posets) Um poset 〈P,≤〉 possui ordem-densa se, para
todos elementos x e y em P que satisfazem a condição x < y, existe um elemento z em P , tal
que x < z < y. Um subconjuntoQ de P possui ordem densa em P se para quaisquer elementos
x, y ∈ P que satisfazem a condição x < y, existe um elemento z em Q tal que x < z < y.
Muitas vezes é conveniente considerar uma representação gráfica dos sistemas parcialmente
ordenados, que de modo simples evidencie as relações hierárquicas existentes entre os elemen-
tos do sistema. Tal representação é chamada diagrama de Hasse. Esse diagrama é obtido como
segue: quaisquer dois elementos comparáveis são unidos por linhas de tal forma que se a ≤ b,
então, a está abaixo de b no diagrama. Elementos incomparáveis não são unidos. Assim, não
haverá linhas horizontais no diagrama de um poset.
Exemplo 2.3. Seja X = a, b, c. O diagrama de Hasse do sistema parcialmente ordenado
〈P(X),⊆〉, é mostrado na Figura 1 abaixo.
a, b, c
a, b a, c b, c
a b c
∅
Figura 1: Diagrama de Hasse do poset P (a, b, c).
No que segue apresenta-se alguns elementos notáveis das ordens parciais.
Definição 2.3. Seja X um conjunto ordenado. Um elemento a ∈ X é chamado maximal se,
sempre que a ≤ x, então x = a, para todo x ∈ X . Dualmente, um elemento a ∈ X é chamado
minimal se, sempre que x ≤ a, então x = a, para todo x ∈ X .
Denotamos o conjunto de todos os elementos maximais (resp. minimais) de um conjunto
ordenado X por M (resp. m). Se existe um elemento > ∈ X tal que x ≤ > para todo x ∈ X ,
17
então > é chamado elemento máximo (ou topo). Por outro lado, se existe um elemento ⊥ ∈ Xtal que ⊥ ∈ x para todo x ∈ X , então ⊥ será chamado elemento mínimo (ou bottom). Deve-se
notar que o conjunto M de todos os elementos maximais de um poset X pode ser um conjunto
vazio. No caso em que |M| = 1 (M contém apenas um elemento) o conjunto X tem um
elemento topo >. Dualmente, se |m| = 1, então o conjunto X tem um elemento bottom ⊥.
Definição 2.4. SejaA um subconjunto de um posetX . Um elemento u ∈ X é um limite superior
(ou cota superior) de A se x ≤ u para todo x ∈ A. O menor limite superior (ou o supremo) de
A - denotado por supA ou∨A - é um limite superior que precede cada limite superior de A.
Um elemento ` ∈ X é um limite inferior (ou cota inferior) de A se ` ≤ x para todo x ∈ A. O
maior limite inferior (ou ínfimo) de A - denotado por inf A ou∧A - é um limite inferior de A
que sucede cada limite inferior de A.
Para um subconjunto A, supA e inf A podem não existir. A é dito ser limitado acima
se tiver um limite superior e limitado abaixo se tiver um limite inferior. Se A possui limites
superior e inferior, então é limitado. Para um subconjunto A de um poset X , o conjunto de
todos os limites superiores (resp. inferiores) de A é denotado por Au (resp. A`).
Definição 2.5. Um subconjunto U de um poset P é um down-set (ou lower-set) se, sempre que
x ∈ U e y ≤ x, então y ∈ U . Por outro lado, um subconjunto U de um poset P é um up-set
(ou upper-set) se, sempre que x ∈ U e x ≤ y, então y ∈ U . Para x ∈ P definimos o down-set
↓x = y ∈ P | y ≤ x; e o up-set ↑x = y ∈ P |x ≤ y. Para um conjunto B ⊆ P , definimos
o down-set ↓B = y ∈ P | (∃x ∈ B) y ≤ x e o up-set ↑B = y ∈ P | (∃x ∈ B)x ≤ y. Neste
caso, ↓x =↓x e ↑x =↑x.
Note que U ⊆ P é um down-set se, e somente se, seu complementar P\U é um up-set.
Exemplo 2.4. Seja R o conjunto dos números reais com a sua ordem usual. Se A,B ⊆ R são
tais que A = [3,∞) e B = (−∞, 0], então A é um up-set e B é um down-set.
Definição 2.6. Seja 〈P,≤〉 um conjunto parcialmente ordenado. Um subconjunto D de P é
chamado dirigido se D é não vazio e ∀u, v ∈ D, ∃w ∈ D tal que u ≤ w e v ≤ w. Por outro
lado, um subconjunto F de P é chamado dualmente dirigido ou co-dirigido ou filtrado se F é
não vazio e ∀u, v ∈ F , ∃w ∈ F tal que w ≤ u e w ≤ v.
Lema 2.1. Seja P um poset. Uma cadeia não vazia em P é dirigida e filtrada.
Demonstração. Seja P um poset e U uma cadeia não vazia em P . Dados u, v ∈ U , desde que
em uma cadeia quaisquer dois elementos são sempre comparáveis, podemos supor sem perda
18
de generalidade que v ≤ u. Assim, temos v ≤ u e u ≤ u (v ≤ v). Portanto U é dirigido
(filtrado).
Exemplo 2.5. Qualquer subconjunto de N, Z, Q e R é um conjunto dirigido (filtrado) com a
ordem usual.
Lema 2.2. Seja P um poset. Então, para qualquer x ∈ P , o conjunto ↓x = y ∈ P | y ≤ x é
dirigido com x como seu supremo.
Demonstração. Para qualquer y, z ∈↓ x, temos que y ≤ x e z ≤ x. Portanto ↓ x é dirigido.
Além disso, desde que y ≤ x para cada y ∈↓ x, então x é uma cota superior em ↓ x. Portanto
x = sup ↓x.
Lema 2.3. Seja P um poset. Então, para qualquer x ∈ P , o conjunto ↑x = y ∈ P |x ≤ y é
filtrado com x como seu ínfimo.
Demonstração. Para qualquer y, z ∈↑ x, temos que x ≤ y e x ≤ z. Portanto ↑ x é filtrado.
Além disso, desde que x ≤ y para cada y ∈↑ x, então x é uma cota inferior em ↑ x. Portanto
x = inf ↑x.
Proposição 2.1. Em um poset finito P , um subconjunto tem um elemento topo “>” se, e so-
mente se, ele é dirigido.
Demonstração. (⇒) Seja U ⊆ P um conjunto não vazio com elemento topo >U . Então para
qualquer u ∈ U , u ≤ >U . Consequentemente, ∀u, v ∈ U , tem-se u ≤ >U e v ≤ >U . Portanto
U é dirigido.
(⇐) Seja U ⊆ P um conjunto dirigido. Então U 6= ∅. Desde que P é finito, U também é finito.
Seja U = u1, u2, . . . , un. Agora, para qualquer ui, uj ∈ U , existe uk ∈ U tal que ui ≤ uk e
uj ≤ uk. Também, para qualquer um ∈ U , existe uw ∈ U tal que uk ≤ uw e um ≤ uw. Portanto,
pela transitividade de “≤” e pelo fato de U ser dirigido tem-se uw = maxui, uj, uk, um, uw.Continuando dessa maneira, nosso processo deve chegar ao fim, já que U é finito. Ou seja,
deve haver um elemento u ∈ U tal que u = maxu1, u2, . . . , un. Portanto, U tem o elemento
topo.
Proposição 2.2. Em um poset finito P , um subconjunto tem um elemento bottom “⊥” se, e
somente se, ele é filtrado.
Demonstração. (⇒) Seja V ⊆ P um conjunto não vazio com elemento bottom⊥V . Então para
qualquer v ∈ V , v⊥V ≤ v. Consequentemente, ∀u, v ∈ V , tem-se⊥V ≤ v e⊥V ≤ u. Portanto
19
V é filtrado.
(⇐) Seja V ⊆ P um conjunto filtrado. Então V 6= ∅. Desde que P é finito, V também é finito.
Seja V = v1, v2, . . . , vn. Agora, para qualquer vi, vj ∈ V , existe vk ∈ V tal que vk ≤ vi e
vk ≤ vj . Também, para qualquer vm ∈ V , existe vw ∈ V tal que vw ≤ vk e vw ≤ vm. Portanto,
pela transitividade de “≤” e pelo fato de V ser filtrado tem-se uw = minui, uj, uk, um, uw.Continuando dessa maneira, nosso processo deve chegar ao fim, já que V é finito. Ou seja,
deve haver um elemento v ∈ V tal que v = minv1, v2, . . . , vn. Portanto, V tem o elemento
bottom.
Definição 2.7. Um poset 〈X,≤〉 chama-se uma ordem parcial completa com respeito a conjun-
tos dirigidos (DCPO), se todo subconjunto dirigido de X possui supremo em X . Dualmente,
um poset 〈X,≤〉 chama-se uma ordem parcial completa com respeito a conjuntos filtrados
(FCPO), se todo subconjunto filtrado de X possui ínfimo em X . Uma ordem parcial que é
completa com respeito a conjuntos dirigidos, bem como a conjuntos filtrados é denotada sim-
plesmente por CPO.
A seguir fornecemos um método para construir um CPO a partir de um conjunto qualquer.
Exemplo 2.6. Seja X um conjunto qualquer. Defina X⊥ = X ∪ ⊥ onde ⊥ /∈ X , e para
x, y ∈ X⊥, defina x ≤ y se, e somente se, x = ⊥ ou x = y. Então 〈X⊥,≤〉 é um CPO.
Um CPO X⊥ construído dessa maneira é chamado de plano, devido à aparência de seu
diagrama de Hasse.
Exemplo 2.7. O conjunto B = V, F⊥, onde V e F são chamados valores verdade, e os in-
teiros Z⊥ = . . . ,−1, 0, 1, . . .⊥ são exemplos de CPO’s planos que podem ser representados,
respectivamente, de acordo com as Figuras 2 e 3. Para esses dois casos, pode-se explicar ⊥como modelando a avaliação de um valor verdade.
V F
⊥
Figura 2: Diagrama de Hasse do CPO plano B.
Exemplo 2.8. Considere Re = R ∪ −∞,∞ o conjunto dos números reais extendidos. Seja
I(Re) o conjunto de todos os intervalos fechados [x, y] ∈ Re, onde −∞ ≤ x ≤ y ≤ ∞. Defina
em I(Re) a ordem [x, y] v [u, v] se, e somente se, x ≤ u e v ≤ y com a ordem usual dos
20
. . . . . .−2 2−1 10
⊥
Figura 3: Diagrama de Hasse do CPO plano Z⊥.
números reais. Nessas condições, o poset 〈I(Re),v〉 é um DCPO. De fato, sejaD = xii∈I =
[xi, xi]i∈I dirigido. Uma condição necessária para a existência de xp = [xp, xp] tal que
xi v xp e xj v xp é a seguinte:
xj ≤ xi, para todo i, j ∈ I. (2.1)
Seja D = xi e D = xi subconjuntos de Re. Como D 6= ∅, então D 6= ∅. Além disso,
D é superiormente limitado por (2.1), logo∨D existe em Re. Analogamente,
∧D existe em
Re. Afirmamos que⊔D =
[∨D,∧D]. Primeiro, para ver que
⊔D está bem definido vamos
mostrar que∨D ≤
∧D. Por contradição, suponha que
∧D <
∨D, então existem xj ∈ D e
xk ∈ D tais que∧D < xj ≤
∨D e D ≤ xk < xj . Esta última desigualdade contradiz (2.1).
Note que[∨
D,∧D]
é uma cota superior, pois claramente [xi, xi] v[∨
D,∧D], para todo
i ∈ I . Agora, suponha que [w,w] é uma cota superior de D, ou seja, [xi, xi] v [w,w], para
todo i ∈ I . Então, para todo i ∈ I temos:
xi ≤ w e w ≤ xi∨i∈I
xi ≤ w e w ≤∧i∈I
xi∨D ≤ w e w ≤
∧D
Logo,[∨
D,∧D]v [w,w]. Assim,
⊔D =
[∨D,∧D]. Portanto 〈I(Re),v〉 é um DCPO.
Definição 2.8. Se 〈P,≤〉 é um DCPO e x, y ∈ P , então dizemos que x aproxima y, e escrevemos
x y, se para todo conjunto dirigido D ⊆ P com y ≤ supD existe algum d ∈ D com x ≤ d.
Um elemento satisfazendo x x é dito ser compacto. O conjunto de todos os elementos
compactos de um poset P é denotado por K(P ).
Exemplo 2.9. O único elemento compacto de 〈I(Re),v〉 é o intevalo [−∞,+∞]. De fato,
seja [x, x] 6= [−∞,+∞]. Note que D[x− 1
n, x+ 1
n
]n∈N é dirigido. Note também que
supD = [x, x], mas [x, x] 6v[x− 1
n, x+ 1
n
], para todo n ≥ 1. Então [x, x] não é compacto.
É frequente referir-se a relação x y como “x está essencialmente abaixo de y”. As
seguintes propriedades de seguem rapidamente.
21
(i) x y implica x ≤ y;
(ii) u ≤ x y ≤ z implica u z;
(iii) 0 x sempre que P tem um elemento menor 0.
(iv) (Propriedade de Interpolação) Se x y então existe z ∈ P tal que x z y.
Em analogia com a Definição 2.5, escrevemos:
⇓x = u ∈ P |u x e ⇑x = v ∈ P |x v (2.2)
Definição 2.9. (i) Um poset P é chamado contínuo se ele satisfaz o axioma de aproximação:
∀x ∈ P , o conjunto ⇓x = u ∈ P |u x é dirigido e x = supu ∈ P |u x;
(ii) Um DCPO que é contínuo como poset será chamado de domínio.
Exemplo 2.10. (i) Qualquer poset finito é contínuo.
(ii) Uma cadeia é contínua se, só se, ela é completa (no sentido de CPO).
(iii) Como consequência da Definição 2.8, o poset 〈P(X),⊆〉 tal que A B se, e somente
se, A é um subconjunto finito de B é contínuo.
Definição 2.10. Um subconjunto B de um DCPO P é uma base para P se para todo x ∈ P , o
conjunto ⇓x ∩B é dirigido e tal que sup (⇓x ∩B) = x.
Lema 2.4. Um DCPO P é contínuo se, e somente se, ele tem uma base B.
Demonstração. Se o DCPO P é contínuo então basta tomar B = P . Inversamente, se o
DCPO P tiver uma base B, pegue um elemento aleatório x ∈ P , devemos provar que cada par
de elementos em ⇓x tem um limite superior. Tome y, z ∈⇑x. Como sup (⇓x ∩B) = x, deve
haver elementos a, a′ ∈⇓ x ∩ B acima de y, z (porque, caso contrário, y ou z seria um limite
superior de ⇓x ∩ B menor que x, contrariando o fato de que x é o supremo). Como ⇓x ∩ B é
dirigido, a e a′ um limite superior w em ⇓x ∩ B, naturalmente, w também está em ⇑x e é um
limite superior de y e z. É fácil ver que x é também o supremo de ⇓x, porque ⇓x ∩ B com o
supremo x e o conjunto ⇑x conterá apenas elementos “bem abaixo” de x.
Definição 2.11. Um DCPO é algébrico se os seus elementos compactos formam uma base.
Define-se uma álgebra A como sendo um conjunto A, munido com uma coleção de ope-
rações n-árias sobre A, para cada n ≥ 0 (veja (BURRIS; SANKAPPANAVAR, 1981)). No pró-
ximo exemplo, define-se relação de congruência sobre A, bem como mostra-se que o conjunto
Cong(A) de todas as congruências sobre A é um DCPO algébrico.
22
Exemplo 2.11. Seja A uma álgebra, uma congruência θ sobre A é uma relação de equivalên-
cia1 tal que para todo n ≥ 1, para n-árias operações α sobreA e todo (a1, · · · , an), (b1, · · · , bn)
em An, tem-se ai θ bi, 1 ≤ i ≤ n ⇒ α(a1, · · · , an) θ α(b1, · · · , bn). Seja Cong(A) o conjunto
de todas as congruências sobre A. Com a restrição herdada de A × A, Cong(A) é um po-
set. Claramente, Cong(A) é fechado sob interseções arbitrárias. Portanto, todo subconjunto
S ⊆ A × A gera uma congruência sobre A, dada por θS =⋂θ ∈ Cong(A) |S ⊆ θ, a me-
nor relação de congruência contendo S. Note que a relação igualdade (a diagonal de A × A,
denotado por ∆A) é o ⊥ de Cong(A), enquanto A × A é o seu >, denotado por ∇A. Assim,
em Cong(A) todo subconjunto possui supremo e ínfimo. Em particular, todo conjunto dirigido
de Cong(A) possui supremo. Agora, para cada (x, y) ∈ A× A, seja a congruência θxy a con-
gruência gerada por (x, y). Claramente θxy = θyx. Note que θxy é compacto em Cong(A) e
para todo θ ∈ Cong(A), θ =∨θxy | (x, y) ∈ θ. Portanto, Cong(A) é um DCPO algébrico.
Lema 2.5. (Domínio Algébrico) Todo DCPO algébrico é contínuo. O conjunto dos elementos
compactos é uma base.
Demonstração. Seja P um DCPO algébrico. Então todo elemento y y com y ≤ x, x ∈ P ,
implica de y x. Então o conjunto de elementos compactos é uma base. Em seguida, aplique
o Lema 2.4.
Exemplo 2.12. Um importante exemplo de um DCPO contínuo que não é algébrico é o inter-
valo real [0, 1] com sua ordem usual. Por um lado temos que a b se, e somente se, a < b ou
a = 0. Por outro lado, o único elemento compacto de [0, 1] é o elemento 0.
Nesta seção, fizemos um apanhado de algumas importantes classes de posets. Outra classe
especial surge quando cada par de elementos em um poset tem um supremo e um ínfimo. Na
próxima seção vamos explorar esse tipo particular de poset conhecido como Reticulados.
2.2 Reticulados
A teoria dos reticulados desempenha um papel importante em muitas áreas da Matemática,
Ciência da Computação e Engenharia. Uma breve explanação sobre os principais pontos dessa
teoria que será útil ao longo desta dissertação. Existem várias referências que tratam desse
assunto, dentre as quais (DAVEY; PRIESTLEY, 2002) e (ROMAN, 2008).
Definição 2.12. Um poset 〈L,≤〉 é chamado reticulado, se existe o supremo e o ínfimo para
qualquer par de elementos x, y ∈ L, denotados respectivamente por x ∨ y e x ∧ y. Se existem1Uma relação sobre um conjunto X é chamada de relação de equivalência se ela é reflexiva, simétrica e transi-
tiva.
23
em L elementos 0L e 1L tais que 0L ≤ x ≤ 1L, para todo x ∈ L, então 〈L,≤, 0L, 1L〉 chama-se
reticulado limitado e os elementos 0L e 1L são chamados respectivamente bottom e topo.
Exemplo 2.13. Toda cadeia é um reticulado, pois quaisquer dois de seus elementos são com-
paráveis. Logo, o supremo de um par x, y será maxx, y e o ínfimo será minx, y, ou
seja, x ∨ y = maxx, y e x ∧ y = minx, y.
A definição 2.12 permite classificar reticulados como um caso especial de conjuntos parcial-
mente ordenados. Um reticulado pode ser definido tanto por meio de um conjunto parcialmente
ordenado como por equações. Estas duas visões são equivalentes. O teorema a seguir fornece
uma abordagem algébrica.
Teorema 2.1. Sejam L um conjunto não vazio e ∧ : L × L → A e ∨ : L × L → L duas
operações binárias em L que possuem as propriedades:
(i) a ∨ b = b ∨ a e a ∧ b = b ∧ a (comutatividade)
(ii) a ∨ (b ∨ c) = (a ∨ b) ∨ c e a ∧ (b ∧ c) = (a ∧ b) ∧ c (associatividade)
(iii) a ∧ (a ∨ b) = a e a ∨ (a ∧ b) = a (absorção)
para quaisquer a, b, c ∈ L. Então, 〈L,∧,∨〉 é um reticulado.
Definição 2.13. Seja 〈L,∧,∨〉 um reticulado e M ⊆ L. Diz-se que 〈M,∧,∨〉 é um sub-
reticulado de 〈L,∧,∨〉 se M é um reticulado com as mesmas operações ∧ e ∨ de L.
Exemplo 2.14. O conjunto R dos números reais munido com a ordem usual é uma cadeia e,
portanto, é um reticulado. Note que o intervalo fechado [a, b] é um sub-reticulado de R. De
fato, se x, y ∈ [a, b], então a ≤ x ≤ b e a ≤ y ≤ b. Assim, a ≤ x ∧ y ≤ b e a ≤ x ∨ y ≤ b. Em
particular, o intervalo [0, 1] munido com a ordem usual dos reais é um reticulado.
Um dos conceitos mais importantes da teoria dos reticulados é o de ideais e filtros. Na
próxima seção trataremos dessas ideias que são decorrentes da teoria dos anéis mas apresentam
bastante aplicações para a teoria dos reticulados: ideais, ideais primos e ideais maximais; filtros,
filtros primos e filtros maximais (ultrafiltros).
2.2.1 Congruências e homomorfismos de reticulados
Definição 2.14. Um ideal I de um reticulado L é um subconjunto de L que goza das seguintes
propriedades:
24
(I1) Para cada a ∈ I e b ∈ L, b ≤ a implica b ∈ I;
(I2) a, b ∈ I implica a ∨ b ∈ I .
Os subconjuntos que satisfazem as relações que são duais para (I1) e (I2) são chamados
filtros.
Definição 2.15. Um filtro F de um reticulado L é um subconjunto de L que goza das seguintes
propriedades:
(F1) Para cada a ∈ F e b ∈ L, a ≤ b implica b ∈ F ;
(F2) a, b ∈ F implica a ∧ b ∈ F .
Exemplo 2.15. Dado um reticulado 〈L,∧,∨〉 e B ⊆ L, os conjuntos down-set
↓B = y ∈ L | (∃x ∈ B) y ≤ x e up-set ↑B = y ∈ L | (∃x ∈ B)x ≤ y apresenta-
dos na Definição 2.5 são, respectivamente, ideais e filtros de L. De fato, dado z ∈↓ B e w ∈ Ltal que w ≤ z, como z ∈↓B, existe x ∈ B tal que w ≤ x. Como w ≤ z, por transitividade,
w ≤ x. Isto é, existe x ∈ B tal que w ≤ x, logo w ∈↓B. Além disso, supondo que u, v ∈↓B,
como u, v ≤ u ∨ v, então u ∨ v ∈↓B. Portanto ↓B é um ideal de L. Dualmente demonstra-se
que ↑B é um filtro de L.
Observação 2.2. É facilmente verificado que ↓B (respectivamente ↑B) é o menor ideal (filtro)
que contém B.
Ideais e filtros são chamados próprios, se eles não coincidem com L. É fácil verificar que o
ideal I de um reticulado limitado é próprio se, e somente se, 1L /∈ I . Dualmente, o filtro F de
um reticulado limitado é próprio se, e somente se, 0L /∈ F . Um ideal próprio I de L é primo se,
e somente se, x, y ∈ L e x ∧ y ∈ I implica que x ∈ I ou y ∈ I . Dualmente, um filtro próprio
F de L é primo se, e somente se, x, y ∈ L e x ∨ y ∈ F implica que x ∈ F ou y ∈ F . Para cada
x ∈ L o ideal ↓ x = y ∈ P | y ≤ x é conhecido na literatura como ideal principal gerado
por x. Dualmente, ↑x = y ∈ P |x ≤ y é o filtro principal gerado por x. Um ideal próprio
de um reticulado L que não está estritamente contido em nenhum outro ideal próprio de L é
chamado um ideal maximal. Dualmente, um filtro próprio que não está estritamente contido
em nenhum outro filtro próprio é chamado um filtro maximal (ou ultrafiltro). Denotaremos por
I(L) e F(L), respectivamente, o conjunto de todos os ideais e o conjunto de todos os filtros de
um reticulado L.
Intimamente ligado aos conceitos de ideal e filtro de um reticulado é a noção de homomor-
fismo.
25
Definição 2.16. (Homomorfismo limitado algébrico) Sejam L e M reticulados. Dizemos que
uma aplicação ϕ : L → M é um homomorfismo (algébrico) de reticulados se ϕ preserva
ínfimos e supremos, isto é, para x, y ∈ L, tem-se ϕ(x ∧ y) = ϕ(x) ∧ ϕ(y) e ϕ(x ∨ y) =
ϕ(x) ∨ ϕ(y). Se, além disso, L é uma reticulado limitado com elemento topo 1L e elemento
bottom 0L, com ϕ eM definidos como acima, então ϕ(x) = ϕ(x∧1L) = ϕ(x)∧ϕ(1L) e ϕ(x) =
ϕ(x∨0L) = ϕ(x)∨ϕ(0L), para todo x ∈ L. Assim, L é mapeado em um reticulado ϕ(L) ⊆M ,
com elemento topo ϕ(1L) = 1M e elemento bottom ϕ(0L) = 0M . Um homomorfismo bijetivo
é um isomorfismo de reticulados. Se ϕ : L → M é um homomorfismo injetivo, então ϕ(L) é
isomorfo a L e nos referiremos a ϕ como uma imersão de L em M .
O exemplo dado a seguir apresenta uma maneira de obter um homomorfismo de reticulados
limitados por meio da ordem dos reticulados.
Exemplo 2.16. (Homomorfismo de ordem) Sejam L e M reticulados limitados. A aplicação
φ : L→ M dada por φ(1L) = 1M , φ(0L) = 0M e, para todo x, y ∈ L, φ(x) ≤ φ(y) se x ≤ y,
é um homomorfismo de ordem de reticulados. De fato, se φ : L → M é um homomorfismo,
então desde que x ≤ y se e somente se x ∧ y = x, logo φ(x) = φ(x ∧ y) = φ(x) ∧ φ(y), e daí,
φ(x) ≤ φ(y). Tal homomorfismo é conhecido na literatura como homomorfismo de ordem de
reticulados.
Todo homomorfismo algébrico de reticulados é um homomorfismo de ordem, entretanto,
em alguns casos a recíproca não é verdadeira, como mostra o próximo exemplo.
Exemplo 2.17. Considere os reticulados L e M representados por seus diagramas de Hasse
na Figura 4. Observe que a aplicação h : L → M definida por h(1L) = 1M , h(0L) = 0M ,
h(x) = u e h(y) = v é um homomorfismo de ordem, de acordo com o Exemplo 2.16, mas
não é um homomorfismo algébrico, de acordo com a Definição 2.16, uma vez que não preserva
ínfimo, já que 0 = h(x ∧ y) 6= h(x) ∧ h(y) = w.
Observação 2.3. Neste trabalho, sempre que nos referirmos a homomorfismos de reticula-
dos, estaremos considerando homomorfismos algébricos (Definição 2.16), uma vez que eles
implicam em homomorfismos de ordem (Exemplo 2.16). Embora as noções de homomorfismos
algébrico e de ordem não coincidam, os conceitos de isomorfismos entre dois reticulados L e
M coincidem, independentemente se estivermos considerando-os no sentido da ordem ou alge-
bricamente. Com efeito, se f : L → M é um isomorfismo de reticulados no sentido da ordem,
então, para todos x, y ∈ L, vale a desigualdade f(x∧ y) ≤ f(x)∧ f(y). Por outro lado, temos
f−1
(f(x)∧ f(y)
)≤ f−1
(f(x)
)∧ f−1
(f(y)
)= x∧ y. Logo, f(x)∧ f(y) ≤ f(x∧ y). Daí
f(x ∧ y) = f(x) ∧ f(y). Analogamente, verifica-se que f(x ∨ y) = f(x) ∨ f(y).
26
Reticulado L
1
x y
0
Reticulado M
1
u v
w
0
Figura 4: Representação dos reticulados L e M .
Exemplo 2.18. Sejam L e M reticulados limitados e f : L→ M um homomorfismo de reticu-
lados. Então, f−1(0M) = x ∈ L | f(x) = 0M é um ideal e f−1(1M) = x ∈ L | f(x) = 1Mé um filtro em L. De fato, seja u ∈ f−1(0M) e w ∈ L tal que w ≤ u. Como f é homomor-
fismo, então preserva ordem, daí segue-se que f(w) ≤ f(u) = 0M . Logo, f(w) = 0M e,
portanto, w ∈ f−1(0M). Além disso, se u, v ∈ f−1(0M), então f(u) = f(v) = 0M . Logo,
f(u∧v) = f(u)∧f(v) = 0M . Portanto u∧v ∈ f−1(0M). Isto mostra que f−1(0M) é um ideal
de L. Raciocinando de maneira dual mostra-se que f−1(1M) é um filtro de L.
2.2.2 Tipos especiais de reticulados
Definição 2.17. (Reticulados completos) Um reticulado L é completo se cada subconjunto X
de L possui supremo e ínfimo.
Exemplo 2.19. Seja X um conjunto e P(X) o conjunto das partes de X . Nessas condições,
〈P(X),∩,∪, ∅, X〉 é um reticulado completo. O supremo e o ínfimo de dois conjuntos são,
respectivamente, a sua união e a sua intersecção.
Observação 2.4. Decorre da Definição 2.17 que todo reticulado completo X é limitado pelos
elementos bottom 0X = inf X e topo 1X = supX . Além disso, verifica-se facilmente que
o conjunto vazio tem supremo 0∅ e ínfimo 1∅. Como consequência, todo reticulado finito é
completo.
Na Definição 2.8 apresentamos a relação chamada de aproximação “”, para explorar
a noção de elemento compacto de um poset, bem como formalizar o conceito de DCPO’s
27
contínuos, algébricos e domínios. Naquela ocasião, vimos que um elemento x pertencente
a um DCPO P é compacto se x x, ou de maneira equivalente: se para todo conjunto
dirigido D ⊆ P , com x ≤ supD, existe z ∈ D satisfazendo x ≤ z. Agora chegou a hora de
transcrever esse conceitos para o contexto de reticulados, que nada mais são que casos especiais
de DCPO’s.
Definição 2.18. (Reticulados contínuos) Seja 〈L,∧,∨, 0L, 1L〉 um reticulado completo munido
com uma relação de aproximação “”. Diz-se que L é um reticulado contínuo se, para todo
x ∈ L, tem-se x = supy ∈ L | y x = sup ⇓x.
Observação 2.5. Constata-se facilmente que todo reticulado completo é um DCPO. Em parti-
cular, segue-se que todo reticulado contínuo é um domínio (ver Definição 2.9).
Exemplo 2.20. Reticulados finitos e cadeias completas são reticulados contínuos.
Definição 2.19. Seja 〈L,∧,∨, 0L, 1L〉 um reticulado completo. Um elemento x ∈ L é compacto
se, para todo conjunto X ⊆ L, sempre que x ≤ supX , então existe um subconjunto finito
A ⊂ X tal que x ≤ supA. O conjunto de todos os elementos compactos de L é denotado por
K(L).
Definição 2.20. (Reticulados algébricos) Um reticulado completo L diz-se algébrico se, para
cada x ∈ L, tem-se x = supw ∈ K(L) |w ≤ x = sup(K(L)∩ ↓w).
Exemplo 2.21. Os reticulado de todos os subgrupos de um grupo, ou de congruências de uma
álgebra geral (ver Exemplo 2.11) são algébricos, sendo os elementos compactos os objetos
finitamente gerados.
Exemplo 2.22. Seja X um conjunto e L = 2X o conjunto das partes de X . Então K(L) =
F ⊂ X |F é finito e ↓ X = F ⊂ X |F ⊂ X. Portanto, segue-se que
K(L)∩ ↓X = F ⊂ X |F é finito. É claro que sup(K(L)∩ ↓X) = X . Logo L é al-
gébrico.
Proposição 2.3. Todo reticulado algébrico é também contínuo.
Demonstração. Seja L um reticulado completo. Se L é algébrico, então para todo x ∈ L tem-se
x = supw ∈ K(L) |w ≤ x
= supw ∈ L |w w ≤ x
= supw ∈ L |w x
= sup ⇓x.
Portanto, L é também contínuo.
28
A recíproca da Proposição 2.3 em geral não é verdadeira, conforme mostra o próximo
exemplo.
Exemplo 2.23. (Contra-exemplo) Considere L = R ∪ −∞,+∞ com a ordenação usual
em R e os elementos −∞ e +∞ são, respectivamente, menor e maior elementos de L. Este
reticulado é contínuo, visto que é uma cadeia completa, mas não é algébrico. De fato, seja
x ∈ R e C = (x − 1, x). Então x ≤ supC = x, mas para qualquer conjunto finito B ⊂ C
tem-se que x > supB. Assim x não é compacto. É fácil verificar que +∞ também não é
compacto. Então, o único elemento compacto de L é −∞ e, desde que sup−∞ é −∞,
não existe elemento em L/−∞ que pode ser representado como o supremo de elementos
compactos.
2.3 Noções elementares de topologia
Nesta seção recorda-se noções elementares de topologia necessárias para relacionar espaços
topológicos com CPO’s. Assim será possível obter propriedades topológicas a partir da ordem
e vice-versa. Os resultados desta seção podem ser apreciados com mais detalhes em (LIMA,
2009; KELLEY, 1975; MUNKRES, 2000; WILLARD, 2004).
Definição 2.21. Seja X um conjunto não vazio. Uma classe T de subconjuntos de X é uma
topologia em X se, e somente se, T satisfaz os seguintes axiomas:
(i) ∅ e X pertencem a T
(ii) Dada uma família arbitrária Aλλ∈L, com Aλ ∈ T , para todo λ ∈ L, tem-se que⋃λ∈L
Aλ ∈ T
(iii) Se A1, A2 ∈ T , então A1 ∩ A2 ∈ T .
Os elementos de T chamam-se conjuntos abertos, o par (X, T ) é chamado um espaço topoló-
gico. Sempre que o contexto permitir, por simplicidade, diz-se que X é um espaço topológico.
Exemplo 2.24. Todo conjunto X não vazio possui as seguintes topologias:
(i) Tind = ∅, X, chamada topologia indiscreta ou trivial. Os únicos subconjuntos abertos
de X são ∅ e o próprio X;
(ii) Tdis = P(X), chamada topologia discreta. Todos os subconjuntos de X são abertos.
29
As topologias discretas e trivial representam extremos opostos. Os próximos exemplos
mostram topologias nem discretas e nem triviais.
Exemplo 2.25. Seja X = 0, 1 e T = ∅, 1, X. Então T é uma topologia em X , conhe-
cida como topologia de Sierpinski.
Exemplo 2.26. Seja X = a, b, c. As famílias ∅, X, a e ∅, X, a, b, a, b de sub-
conjuntos de X são uma topologia em X .
Exemplo 2.27. Seja X = R e definamos a seguinte coleção de subconjuntos de R:
T = A ⊆ R |A = ∅ ou ∀x ∈ A, ∃(a, b) ⊆ R tal que x ∈ (a, b) ⊆ A.
Neste caso, (X, T ) é um espaço topológico e T é chamada topologia euclidiana ou usual da
reta.
Seja S um subconjunto de um espaço topológico X . Um ponto x ∈ S chama-se um ponto
interior de S quando existe um aberto A de X tal que x ∈ A ⊂ S. O interior de S é o conjunto
int(S) formado pelos pontos interiores de S.
Proposição 2.4. O interior de um conjunto S, num espaço topológico X , é a união de todos os
subconjuntos abertos de X que estão contidos em S. Em particular, int(S) é aberto em X .
Demonstração. Seja A = ∪λAλ a união de todos os abertos Aλ ⊂ S. Então, A é aberto em X
e A ⊂ S. Logo, x ∈ A implica x ∈ int(S). Assim, A ⊂ int(S). Reciprocamente, se x ∈ int(S)
existe um aberto A′ em X tal que x ∈ A′ ⊂ S. Logo A′ = Aλ para algum λ e portanto A′ ⊂ A.
Isto mostra que x ∈ A, donde int(S) ⊆ A.
Corolário 2.1. S é aberto se, e somente se, S = int(S).
Definição 2.22. Se X é um espaço topológico e F ⊆ X , dizemos que F é fechado se X\F é
aberto.
Proposição 2.5. Seja X um espaço topológico e F uma família de subconjuntos fechados de
X . Então F tem as seguintes propriedades:
(i) ∅ e X pertencem a F;
(ii) Se F1, F2 ∈ F então F1 ∪ F2 ∈ F;
(iii) Se Fi ⊆ F então ∩i∈IFi ∈ F .
30
Para lidar mais facilmente com uma topologia, usa-se muitas vezes uma coleção menor de
abertos, B ⊆ T , chamada uma base da topologia.
Definição 2.23. Seja X um espaço topológico. Uma coleção de abertos B de X diz-se uma
base de abertos de X se todo aberto de X escreve-se como uma união de abertos de B.
Proposição 2.6. B é uma base de abertos para X se, e somente se, para todo aberto A ⊆ X e
x ∈ A, existe B ∈ B tal que x ∈ B ⊆ A.
Demonstração. (⇐) Seja A um aberto de X . Então para todo x ∈ A existe Bx ∈ B tal que
x ∈ Bx ⊆ A. A = ∪x∈Ax ⊆ ∪x∈ABx ⊆ A. Portanto A = ∪x∈ABx. (⇒) Segue direto da
Definição 2.23.
Definição 2.24. Seja (X, T ) um espaço topológico. Um subconjunto S ⊆ T diz-se uma sub-
base para T se o conjunto
B = B |B é a interseção de uma quantidade finita de membros de S
é uma base para T .
Exemplo 2.28. A família S = (−∞, a) ou (b,+∞) | a, b ∈ Q forma uma sub-base (enume-
rável) para a topologia usual da reta.
Sob o prisma computacional, é bastante relevante o fato de uma topologia sobre X possuir
base enumerável. Isto motiva a seguinte definição.
Definição 2.25. (segundo axioma de enumerabilidade) Diz-se que um espaço topológico (X, T )
satisfaz o segundo axioma de enumerabilidade se ele possui uma base enumerável.
A reta com a topologia usual satisfaz o segundo axioma de enumerabilidade, visto que
B = (a, b) | a, b ∈ Q é uma base enumerável.
Dado um espaço topológico (X, T ) e um conjunto Y ⊆ X , a próxima definição explica
como Y herda a topologia de X de maneira bastante natural.
Definição 2.26. (Topologia induzida) Seja (X, T ) um espaço topológico e Y ⊆ X . Diz-se que
(Y, TY ) é um subespaço topológico de (X, T ) se TY é uma coleção de abertos em Y obtidos
pela intersecção de Y com cada conjunto aberto na topologia T .
Ao indicar os conjuntos abertos em X , isto é, ao fixar uma topologia em X , estamos es-
pecificando “graus de proximidade” entre pontos de X . Quando dois pontos estão em um
31
mesmo aberto, eles são “próximos” no sentido deste aberto. Tal proximidade entre pontos em
um mesmo aberto pode ser interpretada como uma mesma propriedade que esses pontos sa-
tisfazem. Assim, dados dois elementos x e y de um espaço topológico (X, T ), é pertinente
perguntar como esses dois elementos estão relacionados com respeito aos abertos de T . Em
outras palavras, dados dois elementos distintos x e y, existem propriedades de x que não são
propriedades de y? e vice-versa. Desta forma, é possível classificar os espaços topológicos
como segue.
Definição 2.27. Um espaço topológico (X, T ) diz-se T0 se dados dois pontos distintos de X
existe um aberto que contém um e não contém o outro e vice-versa. Em outras palavras, se todo
aberto que contém um também contém o outro, então eles são o mesmo.
Exemplo 2.29. O espaço topológico de Sierpinski (0, 1, ∅, 1, X) do Exemplo 2.25 é T0.
O aberto 1 contém o elemento 1, mas não contém o elemento 0.
Definição 2.28. Seja (X, T ) um espaço topológico e A ⊆ X um subconjunto de X . O fecho
de A, denotado por A, é a interseção de todos os conjuntos fechados de X que contêm A. Em
particular, A é um conjunto fechado.
A próxima proposição tem por objetivo caracterizar os espaços T0.
Proposição 2.7. Seja (X, T ) um espaço topológico e x, y ∈ X com x 6= y. Então todo conjunto
aberto que contém x ou y contém ambos se, e somente se, x = y.
Demonstração. (⇒) Suponha que todo conjunto aberto que contém x ou y contém ambos. Seja
z ∈ x. Então todo conjunto aberto que contém z também contém x. De fato, seA é um aberto
que contém z, mas não contém x, então X\A é um fechado que contém x, mas não contém z.
Logo z poderia não estar em x. Como todo conjunto aberto que contém x também contém y,
e todo aberto que contém z contém y, segue-se que z ∈ y. Logo x ⊆ y. Analogamente
demonstra-se que y ⊆ x. Portanto x = y.(⇐) Suponha x = y. Então x ∈ x e x ∈ y. Analogamente, y ∈ x. Suponha A ∈ Tcom x ∈ A e y /∈ A. Então X\A é um conjunto fechado tal que y ∈ X\A e x /∈ X\A. Mas
y ⊆ X\A eX\A fechado acarreta y ⊆ X\A e daí x /∈ y, o que é um absurdo. Portanto,
não existe conjunto aberto que contenha y mas não contenha x.
Corolário 2.2. Um espaço topológico (X, T ) é T0 se, e somente se, para x, y ∈ X com x 6= y,
então x /∈ y ou y /∈ x.
Definição 2.29. Um espaço topológico (X, T ) diz-se T1 se para cada x, y ∈ X com x 6= y
existem A,B ∈ T com x ∈ A, y /∈ A e x /∈ B, y ∈ B.
32
Proposição 2.8. Um espaço topológico (X, T ) é T1 se, e somente se, para cada x ∈ X , tem-se
x = x.
Demonstração. (⇒) Suponha que X é um espaço T1, x ∈ X tal que z ∈ x e z 6= x. Então
todo aberto contendo z deve conter x. Logo, não existe aberto contendo z que exclua x, um
absurdo já que X é T1. Portanto x = x para todo x ∈ X .
(⇐) Suponha que x = x para cada x ∈ X e y, z ∈ X com y 6= z. Se todo aberto
que contém y contém também z, então z ∈ y = y. Assim, temos que y = z, o que é uma
contradição. Portanto, existe um aberto que contém y, mas não contém z. Analogamente, existe
um aberto que contém z, mas não contém y.
Corolário 2.3. Um espaço topológico (X, T ) é T1 se, e somente se, todo conjunto unitário é
um subconjunto fechado de X .
Definição 2.30. (Espaços de Hausdorff) Um espaço topológico (X, T ) é T2 ou de Hausdorff se
dados x, y ∈ X com x 6= y existem A,A′ ∈ T com x ∈ A, y ∈ A′ e A ∩ A′ = ∅.
Seja (X, T ) um espaço topológico T0. A partir da topologia T é possível definir uma
relação de ordem sobre X como segue:
x, y ∈ X, x ≤ y ⇔ todo A ∈ T que contém x, contém y.
Proposição 2.9. 〈X,≤〉 é uma ordem parcial.
Demonstração. As propriedades reflexiva e transitiva seguem imediatamente da definição da
relação, enquanto que a antissimetria é exatamente a definição da topologia ser T0.
Assim, a todo espaço topológico T0 está associada uma ordem parcial gerada pela topologia.
Reciprocamente, será visto a seguir que, dado um CPO, existe uma topologia T0, a topologia
de Scott, que é compatível com a ordem.
2.4 Topologia de Scott
Definição 2.31. (Abertos de Scott) Seja 〈X,≤〉 um CPO e A ⊆ X . O conjunto A diz-se um
aberto de Scott se satisfaz as seguintes condições:
(i) Se x ∈ A e x ≤ y então y ∈ A
(ii) Se D ⊆ X é um conjunto dirigido e supD ∈ A então D ∩ A 6= ∅.
33
Proposição 2.10. Seja 〈X,≤〉 um CPO e σ (X) = A ⊆ X |A é um aberto de Scott Nessas
condições, σ (X) é uma topologia T0 sobre X , que em geral não é T1. σ (X) será chamada a
topologia de Scott sobre X .
Demonstração. Deve-se mostrar que σ (X) satisfaz os axiomas (i) - (iii) da Definição 2.21.
Com efeito,
(i) ∅ e X são trivialmente abertos de Scott;
(ii) Suponha A1, A2 ∈ σ (X). Deve-se mostrar que A1 ∩ A2 ∈ σ (X). Seja x ∈ A1 ∩ A2 e
x ≤ y. Então x ∈ A1 e x ∈ A2. Como x ≤ y e A1, A2 ∈ σ (X), segue-se que y ∈ A1
e y ∈ A2. Portanto y ∈ A1 ∩ A2. Seja D ⊆ X dirigido, então supD ∩ A1 6= ∅ e
supD ∩ A2 6= ∅. Logo, supD ∩ (A1 ∩ A2) 6= ∅. Portanto, A1 ∩ A2 ∈ σ (X).
(iii) Demonstra-se de modo análogo ao item (ii).
Além disso, σ (X) é T0. De fato, seja Ux = X\↓x = z ∈ X | z 6≤ x. Vamos primeiramente
mostrar que Ux é um aberto de Scott. Com efeito, seja y ∈ Ux e w ∈ X tal que y ≤ w. Suponha
que w /∈ Ux. Então, w ≤ x e assim y ≤ x. Então y /∈ Ux, o que é uma contradição. Assim,
w ∈ Ux. Agora seja D ⊆ X um conjunto dirigido tal que supD ∈ Ux. Então supD 6≤ x.
Assuma que para qualquer s ∈ D, s /∈ Ux. Então, s ≤ x para todo s ∈ D. Logo x é uma cota
superior para D e assim supD ≤ x, o que é uma contradição. Portanto, D ∩ Ux 6= ∅, e assim,
Ux é um aberto de Scott. Para provar que σ (X) é T0, suponha que x, y ∈ X , com x 6= y. Então
x ∈ Uy, y /∈ Uy e Uy é aberto. Portanto σ (X) é T0. Além disso, se x ≤ y então todo aberto que
contém x (vizinhança de x), contém também y. Portanto σ (X) não é necessariamente T1.
Passaremos doravante a considerar todo CPO como um espaço topológico ordenado, em
que a topologia é a de Scott, a menos que seja mencionado o contrário. No que segue, estuda-
remos o conceito de função contínua segundo esta topologia.
Definição 2.32. Sejam (X, T ) e (Y, T ′) espaços topológicos. Uma função f : X → Y diz-se
contínua se para cada subconjunto V aberto de Y , o conjunto f−1(V ) é um aberto de X , i.e,
se para cada V ∈ T ′, f−1(V ) ∈ T .
Teorema 2.2. Para uma função f : X → Y , com X e Y CPO’s, as seguintes condições são
equivalentes:
(1) f é contínua com respeito à topologia de Scott, i.e., f−1(V ) ∈ σ(X), ∀V ∈ σ(Y ).
34
(2) f preserva supremo de conjuntos dirigidos e ínfimo de conjuntos filtrados, i.e., f preserva
ordem e satisfaz: f(supD) = sup f(D) e f(inf F ) = inf f(F ), para todo conjunto
dirigido D e todo conjunto F filtrado, ambos subconjuntos de X .
Demonstração. ((1)⇒ (2)). Primeiro vamos provar que a condição (1) implica que f preserva
ordem. Suponha que existem x, y ∈ X tal que x ≤ y mas f(x) 6≤ f(y), então o conjunto
aberto de Scott Y \↓f(y) = u ∈ Y |u 6≤ f(y) contém f(x). Assim, pela condição (1),
f−1 (Y \↓f(y)) = w ∈ X | f(w) 6≤ f(y) é um aberto de Scott que contém x, mas não
contém y, o que contradiz o item (i) da Definição 2.31. Portanto, f preserva ordem. Agora
seja D um subconjunto dirigido de X . Então, como f preserva ordem, f(D) é dirigido e
f(D) ≤ f(supD). De fato, sejam y1, y2 ∈ f(D). então existem u, v ∈ D tais que y1 = f(u) e
y2 = f(v). ComoD é dirigido, existe w ∈ D tal que u ≤ w e v ≤ w. Segue da monotonicidade
de f que y1 = f(u) ≤ f(w) e y2 = f(v) ≤ f(w). Logo, para todos y1, y2 ∈ F (D), existe
q ∈ f(D) tal que y1 ≤ q e y2 ≤ q, a saber: q = f(w). Além disso, desde que x ≤ supD,
para todo x ∈ D, tem-se que f(x) ≤ f(supD) e daí sup f(D) ≤ f(supD). Por outro lado,
se f(supD) 6≤ sup f(D) então f(supD) ∈ Y \↓sup f(D)=r ∈ Y | r 6≤ sup f(D). Portanto,
f−1(Y \↓sup f(D)) = p ∈ X | f(p) 6≤ sup f(D) contém sup f(D). Isto significa que existe
d ∈ D tal que f(d) 6≤ sup f(D), o que é uma contradição. A demonstração para o caso de
conjuntos filtrados é análoga.
((2) ⇒ (1)). Suponha que f preserva supremo de conjuntos dirigidos, i.e., f preserva ordem
e satisfaz: f(supD) = sup f(D) para todo conjunto dirigido D ⊆ X . Se A ∈ σ(Y ). De-
vemos mostrar que f−1(A) ∈ σ(X). Com efeito, se sup(D) ∈ f−1(A) então f(sup(D)) =
sup f(D) ∈ A. Logo, como f(D) é dirigido e sup f(D) ∈ A, pelo item (ii) da Definição 2.31,
f(D)∩A 6= ∅ e daíD∩f−1(A) 6= ∅. Assim, se x ∈ f−1(A) e x ≤ y, então f(x) ≤ f(y). Como
f(x) ∈ A e A é aberto de Scott, segue-se que f(y) ∈ A. Portanto, f−1 (f(y)) = y ∈ f−1(A).
Ou seja, pelo item (i) da Definição 2.31, f−1(A) ∈ σ(X). A demonstração para o caso em que
f preserva ínfimo de conjuntos filtrados é análoga.
Exemplo 2.30. A topologia de Scott é diferente da topologia euclidiana em [0, 1]. A função
f : [0, 1]→ [0, 1] definida por
f(x) =
0, se 0 ≤ x ≤ 1
2
1, se1
2< x ≤ 1.
é Scott continua, mas não é contínua em relação à topologia usual, desde que x = 12
é um ponto
de descontinuidade nessa topologia. Por outro lado, a função g : [0, 1] → [0, 1] definida por
g(x) = |cos (10 · x)| é contínua em relação à topologia usual, mas não é Scott continua, uma
35
vez que não preserva ordem (veja Figura 5).
(a) Função f Scott contínua (b) Função g contínua na topologia euclidiana
Figura 5: Scott continuidade versus continuidade euclidiana.
Lema 2.6. Seja 〈X,≤〉 um poset. Então valem as seguintes propriedades:
(i) Um conjunto A ⊆ X é um aberto de Scott se, e somente se, A =↑A e para qualquer
conjunto dirigido D ⊆ X , supD ∈ A implica D ∩ A 6= ∅, sempre que supD existe;
(ii) Um conjunto F ⊆ X é um fechado de Scott se, e somente se, F =↓F e para qualquer
conjunto dirigido D ⊆ F , supD ∈ F , sempre que supD existe;
(iii) ↓x = x, para todo x ∈ X;
(iv) Se B ⊆ X então int(B) = x ∈ B | ↑x ⊆ B.
Demonstração.
(i) (⇒) Supondo que A é Scott aberto, resta-nos mostrar que A =↑A. Com efeito, se x ∈↑Aentão a ≤ x, para algum a ∈ A. Assim, como ↑x é aberto de Scott, x ∈↑x ⊆ A, ou seja,
x ∈ int(A). Desde que A é um aberto de Scott, segue-se que x ∈ A. Portanto ↑A ⊆ A. A
inclusão A ⊆↑A segue facilmente.
(⇐) Supondo que ↑A = A, a condição (i) da Definição 2.31 segue trivialmente. Além
disso, se D ⊆ X é um conjunto dirigido, sempre que supD existe em X a condição (ii)
da Definição 2.31 também é satisfeita.
(ii) (⇒) Supondo que F é um fechado de Scott, tem-se que o seu complementar X\F é
aberto de Scott. Assim, para qualquer conjunto dirigido D ⊆ F que possui supremo,
36
com supD ∈ X\F , tem-se que D ∩X\F 6= ∅ e então D 6⊆ F , que é uma contradição.
Portanto, supD ∈ F . Além disso, se x ∈↓F , então x ≤ v para algum v ∈ F . Logo
v /∈ X\F e, como X\F , v /∈↑X\F . Mas ↑X\F = u ∈ X | (∃w ∈ X\F )w ≤ u,então v < w para algumw ∈ X\F . Daí, por transitividade, x < w para algumw ∈ X\F .
Ou seja, x /∈↑X\F . Portanto, x ∈ (X\ ↑(X\F )) = (X\(X\F )) = F . Isto mostra que
↓F ⊆ F . A inclusão F ⊆↓F segue facilmente.
(⇐) Suponha que para qualquer conjunto dirigido D ⊆ F tem-se supD ∈ F , sempre
que supD existe, mas F não é um fechado de Scott ou, equivalentemente, X\F não é
um aberto de Scott. Então existe um conjunto dirigido D ⊆ X tal que (X\F ) ∩D = ∅e supD ∈ X\F , sempre que supD existe. Mas isso contradiz o fato que supD ∈ F .
Portanto, F é um fechado de Scott.
(iii) Como o conjunto ↓ x é um down-set, segue-se que ele é um fechado de Scott contendo
x. Então x ⊆↓ x. Por outro lado, se y ∈↓ x, então y ≤ x. Se y ∈ X\x então para
qualquer w ∈ X tal que y ≤ w, tem-se que w ∈ X\x. Logo, ↑ y ∩ x = ∅. Como
x ∈↑y, tem-se que x /∈ x, o que é uma contradição.
(iv) Seja w ∈ x ∈ B | ↑ x ⊆ B. Então ↑w ⊆ B. Mas ↑w é aberto, logo ↑w ⊆ int(B).
Portanto, w ∈ int(B). Por outro lado, seja y ∈ int(B) ⊆ B. Desde que int(B) =↑ int(B),
tem-se que int(B) ⊆↑B. Então, y ∈ x ∈ B | ↑x ⊆ B.
Lema 2.7. Se X é um DCPO munido com a topologia de Scott σ(X) então, para todo x ∈ X ,
int (↑x) ⊆⇑x. Além disso, se X é contínuo então ⇑x é um aberto de Scott e int (↑x) =⇑x.
Demonstração. Tome a ∈ int (↑x) e assuma que a ≤ supD, para algum subconjunto dirigido
D de X . Como int (↑ x) é Scott aberto, tem-se que supD ∈ int (↑ x) e D ∩ int (↑ x) 6= ∅.Isto significa que d ∈ int (↑ x) ⊆↑ x, para algum d ∈ D, o que implica que x a. Então
int (↑ x) ⊆⇑ x. Obviamente ⇑ x é um up-set. Para ver que ele é aberto de Scott, seja D
um subconjunto dirigido de ⇑ x com supD ∈⇑ x, i.e., x supD. Se X é contínuo, então
podemos empregar a Propriedade de Interpolação (Teorema (iv)) para encontrar y ∈ X tal que
x y supD. Isto implica que y ≤ d para algum d ∈ D e x d, i.e., ⇑ x ∩ D 6= ∅.Portanto, ⇑x é aberto de Scott. Agora, a igualdade int (↑x) =⇑x segue do fato que ⇑x e aberto
de Scott e ⇑x ⊆↑x.
É importante recordar que um subconjunto S de um espaço topológico X é denso em X
quando seu fecho S coincide com o espaço inteiro X . Isto equivale a afirmar que todo aberto
37
não vazio em X contém algum ponto de S, ou ainda que o complementar de S não possui
pontos interiores. Quanto aos posets, a fim de estabelecer uma conexão entre essa definição
topológica para densidade e aquela fornecida pela Definição 2.2 e que é dada em termos da
ordem, apresentamos a seguinte asserção.
Proposição 2.11. Seja 〈X,≤〉 um poset. Um conjunto S ⊆ X possui ordem-densa em X se, e
somente se, S é denso em X na topologia de Scott.
Demonstração. (⇒) Suponha que o conjunto S ⊆ X possui ordem-densa em X . Então, para
todos x, y ∈ X que satisfazem a condição x < y, existe z ∈ S tal que x < z < y. Pela
Proposição 2.6 a coleção B = ↑x = y |x ≤ y forma uma base de abertos de Scott. Então,
como ↑x ∩ S 6= ∅, segue-se que S é denso em X na topologia de Scott.
(⇐) Para cada x ∈ X que satisfaz a condição x < y para algum y ∈ X , defina o conjunto
Px = w ∈ X |x < w. É claro que Px 6= ∅. Vamos mostrar que Px é um aberto de Scott.
Com efeito, a condição (i) da Definição 2.31 é trivialmente satisfeita. Quanto a condição (ii),
para qualquer conjunto dirigido D ⊆ X , suponha que supD ∈ Px e D ∩ Px = ∅ sempre que
supD existe. Então para todo w ∈ D tem-se que w ≤ x. Logo x é uma cota superior para
w. Assim, supD ≤ x, o que contradiz o fato de supD ∈ Px. Portanto, D ∩ Px 6= ∅ e assim
Px é um aberto de Scott. Além disso, desde que S é topologicamente denso em X , tem-se que
Px ∩ S 6= ∅ e portanto existe z ∈ S tal que x < z < y para todos x, y ∈ X que satisfazem a
condição x < y.
Definição 2.33. Dado um espaço topológico X , uma coleção A = Aλλ∈I de subconjuntos
de X é chamada uma cobertura de X , quando X ⊆⋃λ∈I Aλ. Dizemos queA é uma cobertura
aberta (fechada) de X quando todos os elementos da cobertura forem abertos (fechados). Um
espaço X denomina-se compacto quando toda cobertura aberta de X possui uma subcoleção
finita que o cobre. Diremos que Y é um subconjunto compacto de X se Y , com a topologia
induzida por X , é um espaço topológico compacto.
Proposição 2.12. Se X é um poset munido com a topologia de Scott σ(X), então, para todo
y ∈ X , o conjunto ↑y é compacto.
Demonstração. De fato, seja A = Aλλ∈I uma cobertura aberta de X . Então, para todo
y ∈ X , y ∈⋃λ∈I Aλ. Daí, y ∈ Aλ, para algum λ ∈ I . Mas Aλ é aberto de Scott, então
Aλ =↑ Aλ. Além disso, como ↑ y ⊆↑ Aλ, segue-se que ↑ y é uma subcoleção finita de A.
Portanto, desde que ↑y ⊆↑y, segue-se que ↑y é compacto.
Na topologia de Scott, para reticulados completos, compacidade é uma característica trivial.
38
Proposição 2.13. Se 〈L,≤, σ(L)〉 é um reticulado completo munido com a topologia de Scott,
então L é compacto.
Demonstração. De fato, desde que L é completo segue-se que ele é limitado. Seja 0 o seu
elemento bottom. Como os abertos de Scott são filtros, basta tomar o filtro principal gerado por
zero: ↑0 = x ∈ L | 0 ≤ x. Ele será exatamente o espaço todo e qualquer aberto que contenha
o 0, como é um filtro, conterá ↑0.
Definição 2.34. Seja X um espaço topológico. Diz-se que X é localmente compacto se para
todo subconjunto aberto U e x ∈ U , existe um conjunto compacto K que satisfaz a condição
x ∈ int (K) ⊆ K ⊆ U .
Observação 2.6. Um resultado conhecido em topologia geral diz que se X é Hausdorff e com-
pacto, então X é normal2, em particular regular3. Isto equivale a dizer que para cada aberto
U ⊆ X e x ∈ U , existe um aberto B ⊆ X que satisfaz x ∈ B ⊆ B ⊆ U . Portanto, como X é
Hausdorff e B é fechado, segue-se que B é compacto. Portanto X é localmente compacto.
A topologia de Scott combina intimamente com a estrutura da ordem. No entanto, por ser
uma topologia T0, ela possui propriedades de separação fracas e não captura por si só todas
as propriedades de interesse. Por exemplo, espaços compactos não precisam ser localmente
compactos, como constatamos no próximo exemplo.
Exemplo 2.31. Considere o conjunto X = Q ∪ −∞,+∞ com a ordenação usual em Qe os elementos: ⊥X = −∞ e >X = +∞. Note que X é compacto, uma vez que é um
reticulado completo. Porém, ele não é localmente compacto, visto que o intervalo (−1, 1) é
um aberto de Scott que contém 0, mas não existe conjunto compacto K ⊆ (−1, 1) que satisfaz
0 ∈ int (K) ⊆ K ⊆ (−1, 1), desde que o complemento de K é ordem-denso em X e, portanto,
int (K) = ∅.
Não obstante, há uma classe de espaços particularmente bem comportada e importante, que
parece ser uma generalização adequada de espaços compactos de Hausdorff para o cenário T0.
Proposição 2.14. Todo domínio X é localmente compacto na topologia de Scott. Mais pre-
cisamente, para qualquer conjunto aberto de Scott U ⊆ X e x ∈ U , existe y ∈ X tal que
x ∈⇑y ⊆↑y ⊆ U . Em particular, a família de conjuntos ⇑x | y ∈ X forma uma base para a
topologia de Scott σ(X).2Um espaço topológico X é normal se, dados dois fechados disjuntos A e B em X , existem dois abertos
disjuntos U e V em X tais que A ⊆ U e B ⊆ V .3Um espaço topológicoX é regular se, dados um fechado F emX e um ponto b /∈ F , existem abertos disjuntos
U, V em X tais que F ⊆ U e b ∈ V .
39
Demonstração. Seja U ⊆ X um conjunto aberto de Scott e x ∈ U . ComoX é contínuo, tem-se
que ⇓x é dirigido e sup ⇓x = x ∈ U . Além disso, do fato de U ser aberto de Scott, segue-se
que, para algum y, y ∈⇓ x. Então temos que x ∈⇑ y ⊆↑ y ⊆ U . A conclusão segue do Lema
2.7 e da Proposição 2.12.
Assim como compacidade, a conexidade é um requisito fraco para espaços T0. Recordamos
que um espaço topológico X diz-se conexo se, e somente se, toda decomposição X = U ∪ Vonde U ∩ V = ∅ e os conjuntos U e V são abertos de X , implica em U = ∅ ou V = ∅.
O próximo resultado garante que um espaço com o maior (ou menor) elemento em sua
ordem de especialização é conexo.
Proposição 2.15. Se 〈X,≤〉 um poset munido com a topologia de Scott e cujo elemento máximo
(mínimo) é representado por 1X (0X), então X é conexo.
Demonstração. Faremos a demonstração para o caso do poset possuir elemento máximo. De
fato, se X não fosse conexo, existiria uma decomposição X = U ∪ V de abertos de Scott U
e V tais U ∩ V = ∅ com U 6= ∅ e V 6= ∅. Ora, mas como U ∩ V = ∅, podemos supor sem
perda de generalidade que 1x ∈ U e, portanto, 1x /∈ V . Logo, 1x ∈ X\V . Contudo, X\V é um
fechado de Scott que contém 1X , então ↓1X ⊆ X\V . Mas ↓1X é o ideal principal gerado por
1X , portanto ele é o espaço todo e daí conclui-se que V = ∅, o que é um absurdo. Portanto o
poset X é conexo. Uma demonstração análoga é verificada para poset’s 〈X,≤〉 munidos com a
topologia de Scott e que possuem elemento mínimo 0x.
Proposição 2.16. Um poset 〈X,≤〉 munido com a topologia de Scott é conexo se, e somente
se, para todo par a, b ∈ X , existe uma sequência finita a = x1, x2, . . . , xn = b tal que cada
xi ∈ X e, para cada i = 1, 2, . . . , n− 1, tem-se que xi e xi+1 são comparáveis.
Demonstração. (⇐) Sejam p, q ∈ X pontos quaisquer. Então existe uma sequência finita
p = x1, . . . , xn = q tal que cada xi ∈ X e, para i = 1, . . . , n − 1, tem-se que xi e xi+1 são
comparáveis. Isto significa que p e q estão conectados pelas linhas do diagrama de Hasse do
poset finito cujos elementos são os termos p = x1, . . . , xn = q. A partir disso, pode-se definir
sobre X a seguinte relação de equivalência:
a ∼ b⇔ a e b estão conectados.
A única classe de equivalência desta relação chama-se uma componente conexa do poset
X , i.e, para cada w ∈ X , [w] = u ∈ X |u ∼ w é um subconjunto conexo maximal de X .
40
Portanto, desde que todo poset X pode ser escrito como a união disjunta de suas componentes
conexas e, neste caso, desde que X possui apenas uma componente conexa, segue-se que X é
conexo.
(⇒) Raciocinado pela contra-positiva, suponha que existem α, β ∈ X tais que eles não es-
tão conectados, ou seja, toda sequência finita de pontos x1, . . . , xn de X , tais que para todo
i = 1, . . . n − 1, os termos xi e xi+1 são comparáveis, não contém ao mesmo tempo α e β.
Decorre disso que α /∈ [β] e β /∈ [α]. Então, existe pelo menos duas componentes conexas de
X . Portanto X não é conexo.
O próximo teorema é um importante resultado envolvendo posets conexos. Trata-se de
uma generalização do conhecido Teorema do Valor Intermediário. Sua demonstração pode ser
encontrada em (MUNKRES, 2000).
Teorema 2.3. Seja f : X → Y uma aplicação contínua, onde o poset X é conexo e o poset
Y é totalmente ordenado. Se a, b ∈ X e r é um ponto de Y entre f(a) e f(b), então existe um
ponto c ∈ X tal que f(c) = r.
Importa observar que no caso em que Y não é um poset totalmente ordenado, o Teorema
2.3 falha, conforme constata-se no próximo exemplo.
Exemplo 2.32. Considere os posets conexosX e Y representados por seus diagramas de Hasse
na Figura 6. Considere a aplicação f : X → Y tal que f(0) = 0, f(y) = w, f(x) = v e
f(1) = 0. Note que f é Scott contínua, uuma vez que preserva ordem. Entretanto, o elemento
u ∈ Y é tal que w < u < 1, mas não existe r ∈ X tal que f(r) = u.
Poset X
1
x
y
0
Poset Y
1
u v
w
0
Figura 6: Representação dos posets conexos X e Y .
41
Na próxima seção, será introduzido o conceito de nets (ou redes). Elas generalizam a noção
de sequências para alguns resultados familiares relacionando continuidade e compacidade, bem
como outros objetos da topologia em espaços métricos, de modo que possam ser utilizados em
espaços topológicos arbitrários.
2.5 Scott-convergência
Um interessante conceito em espaços topológicos é o de convergência, bem como as pro-
priedades de pontos limites. Nesta seção vamos discutir esses e outros assunto em termos de
nets.
Definição 2.35. Uma net (ou rede) em um conjunto L é uma função j 7→ xj : J → L cujo
domínio é um conjunto dirigido. Nets são também denotadas por (xj)j∈J , por (xj) ou xj ,
sempre que o contexto for claro. Se o conjunto L for munido com uma ordem, então a net xj é
chamada monotônica se i ≤ j implica xi ≤ xj . Uma subnet de (xj) é qualquer net da forma
(xψ(i))i∈I , onde I é um conjunto dirigido e ψ : I → J é uma aplicação tal que para cada j ∈ Jtem-se eventualmente ψ(i) ≥ j em I .
Exemplo 2.33. O conjunto N dos números naturais munido com a ordem usual é um conjunto
dirigido. Logo, toda sequência (xn)n∈N de pontos xn em um conjunto arbitrário X é uma net.
Exemplo 2.34. Qualquer subsequência de uma sequência é também sua subnet. No entanto,
uma sequência pode ter subnets que não são subsequências. Por exemplo, considere a sequên-
cia (n2)n∈N e sua subnet (m2 + 2mn + n2)(m,n)∈N×N, onde a ordem parcial em N × N é da
forma: (a, b) ≤N×N (u, v) se, só se, a ≤ u e b ≤ v com a ordem usual dos naturais. Neste
caso, a aplicação ψ : N × N → N é dada por ψ(m,n) = n. Além disso, uma subnet de uma
sequência não precisa ser indexada por um conjunto enumerável; por exemplo, (btc2)t∈R (onde
btc denota a parte inteira inferior à t).
Como veremos na definição a seguir, a convergência de nets é uma generalização natural
da convergência de sequências.
Definição 2.36. Uma net (xj)j∈J num espaço topológico X converge para x ∈ X (notação
xj → x) se, sempre que U ⊆ X é aberto e x ∈ U , então para algum i ∈ J , temos que xj ∈ Upara todo j ≥ i.
Observação 2.7. Cada subnet de uma net que converge para um ponto (relativamente a um
espaço topológico) converge para o mesmo limite p. (KELLEY, 1975, Afirmação b, pág. 74)
42
Exemplo 2.35. A coleção P de todas as partições finitas do intervalo fechado I = [a, b],
munida da relação P ≤ Q ⇔ Q refina P , é um conjunto dirigido. Seja f : I → R. Podemos
definir uma net Si : P → R com Si(P ) a soma inferior de Riemann de f relativa à partição P .
De modo análogo, definimos a net Ss : P → R com Ss(P ) a soma superior de Riemann de f
relativa à partição P . Se ambas as nets (Si(P ))P∈P e (SS(P ))P∈P convergem para o número
real c, então f é integrável à Riemann e∫ baf = c.
Agora, apresentamos uma caracterização bem conhecida de compacidade de espaços topo-
lógicos via nets.
Proposição 2.17. (KELLEY, 1975, Teorema 2, pág. 136) Um espaço topológico X é compacto
se e somente se cada net em X admite uma subnet convergindo para um ponto de X .
Em geral, uma net em um espaço topológico X pode convergir para vários pontos diferen-
tes, entretanto, a proposição a seguir aponta espaços em que a convergência é única no sentido
de que se uma net sn converge para s e também para um ponto t, então s = t.
Proposição 2.18. (KELLEY, 1975, Teorema 3, pág. 67) Um espaço topológico é um espaço de
Hausdorff se, e somente se, cada net no espaço converge para no máximo um ponto.
Em vista da proposição 2.18 acima, a noção de limite inferior e limite superior para nets é
dada a seguir.
Definição 2.37. Seja L um reticulado. Para uma net (xj)j∈J escrevemos:
limj∈Jxj = supj∈J
infi≥j
xi (2.3)
e chamamos limj∈Jxj o limite inferior ou o liminf da net, enquanto que o seu limite superior
ou limsup é:
limj∈Jxj = infj∈J
supi≥j
xi. (2.4)
Denote por S a classe dos elementos x ∈ L tais que x ≤L limj∈Jxj e, T a classe dos elementos
x ∈ L tais que limj∈Jxj ≤ x, ambos para a net (xj)j∈J . Para cada elemento desses, diz-se
que x1 é um S-limite inferior e x2 é um T -limite superior de (xj)j∈J . Se x1 = supx∈S x e
x2 = infx∈T x, escreveremos respectivamente x ≡S limxi e x ≡T limxi.
Alternativamente, a noção de S-limite inferior (T -limite superior) de uma net (xj)j∈J pode
ser definida em termos de conjuntos dirigidos (filtrados) (GIERZ et al., 2003).
43
Definição 2.38. Seja L um CPO. Um ponto y ∈ L é um eventual limite inferior de uma net
(xj)j∈J se existe um k ∈ J tal que y ≤L xj para todo j ≥ k. Seja S a classe dos pares((xj)j∈J , x
)tais que x ≤L supD para algum conjunto dirigido D de um eventual limite
inferior para a net (xj)j∈J . Para cada tal par diz-se que x é um S-limite inferior para (xj)j∈J
e escreve-se x ≡S limxi. Dualmente, um ponto y ∈ L é um eventual limite superior de uma
net (xj)j∈J se existe um k ∈ J tal que xj ≤L y para todo j ≥ k. Seja T a classe dos
pares(
(xi)i∈J , x
)tais que inf D ≤L x para algum conjunto filtrado D de um eventual limite
superior de uma net (xj)j∈J . Para cada tal par, diz-se que x é um T -limite superior de (xj)j∈J
e escreve-se x ≡T limxi.
Observe que a Definição 2.38 coincide com a Definição 2.37 (veja (GIERZ et al., 2003, p.
133)) para reticulados completos.
Proposição 2.19. (GIERZ et al., 2003, prop. II-2.1) Sejam L e M DCPO’s e f : L → M uma
função. As seguintes condições são equivalentes:
(1) f preserva supremo de conjuntos dirigidos, i.e. f preserva ordem e
f(sup ∆) = supf(x) | x ∈ ∆ (2.5)
para todo conjunto dirigido ∆ de L,
(2) f preserva ordem e
f(limj∈Jxj) ≤L limj∈Jf(xj) (2.6)
para qualquer net (xj)j∈J sobre L tal que limj∈Jxj e limj∈Jf(xj) ambos existem.
Similarmente, a proposição dual pode ser demonstrada.
Proposição 2.20. Sejam L e M FCPO’s e f : L→M uma função. As seguinte condições são
equivalentes:
(1) f preserva ínfimo de conjuntos filtrados, i.e. f preserva ordem e
f(inf ∆) = inff(x) | x ∈ ∆ (2.7)
para todo subconjunto filtrado ∆ de L;
(2) f preserva ordem e
f(limj∈Jxj) ≥L limj∈Jf(xj) (2.8)
para qualquer net (xj)j∈J on L tal que limj∈Jxi e limj∈Jf(xj) ambos existem.
44
Note que todo reticulado completo é um DCPO e um FCPO em que limj∈Jxj e limj∈Jf(xj)
(limj∈Jxj e limj∈Jf(xj)) sempre existe (GIERZ et al., 2003). Assim, as Proposições 2.19 e 2.20
valem para um reticulado completo.
O Teorema 2.2 estabelece uma conexão entre convergência dada em termos da teoria da
ordem por limites inferiores, ou liminfs e a topologia de Scott. Nesta perspectiva, as Equações
(2.5) e (2.7) generalizam as noções de continuidade à esquerda ou à direita para o intervalo
unitário [0, 1]. Esses fatos motivam a seguinte definição.
Definição 2.39. Sejam L e M dois reticulados completos. Uma função f : L→ M é contínua
se, e somente se, ela satisfaz qualquer uma das Equações (2.5) ou (2.7).
Observação 2.8. Observe que se L é finito, então qualquer função f : L → M é contínua
porque para cada conjunto dirigido ∆ de L, sup ∆ ∈ ∆ e para cada conjunto filtrado ∆,
inf ∆ ∈ ∆.
Definição 2.40. Seja f uma função de duas variáveis sobre um reticulado completo L e seja
a, b ∈ L. Denota-se limx→a+
f(x, x) = b se, e somente se, para toda net (xi)i∈J em L tal que
a é um eventual limite inferior de (xi)i∈J e limi∈J xi = a implica limi∈J f(xi, xi) = b. Além
disso, para um caso especial de nets (an)n∈N em L defini-se limn→∞
an = a se, e somente se, existe
k ∈ N tal que an ≤L a, para todo n ≥ k,onde a ∈ L é um eventual limite superior de uma net
(an)n∈N.
45
3 Funções residuadas e algumasálgebras da lógica fuzzy
Em lógica fuzzy uma proposição não é simplesmente verdadeira ou falsa, como na lógica
clássica, o que ocorre são graus de verdade intermediários, tipicamente valores entre 0 (falso
absoluto) e 1 (verdade absoluta). Nesse contexto, objetos matemáticos são utilizados para mo-
delar a extensão de operadores lógicos. Dentre esses objetos destacam-se as normas triangulares
(ou t-normas) e as funções overlap, conjunções fuzzy capazes de apresentar o mesmo compor-
tamento da conjunção para os valores clássicos (0 e 1). Além disso, elas fornecem quadros
algébricos à lógica fuzzy. Por exemplo, t-normas contínuas fornecem um quadro algébrico para
as BL-álgebras introduzidas por Hájek em (HÁJEK, 1998) como uma contrapartida algébrica
para sua Lógica Básica. Em última análise, Lógica Básica generaliza as três lógicas, mais co-
mumente utilizados na teoria dos conjuntos fuzzy: a lógica de Łukasiewicz, a lógica do produto
e a lógica de Gödel. Uma generalização para o caso não-associativo da Lógica Básica de Hájek
foi apresentada em (BOTUR, 2011). Naquele trabalho o modelo algébrico dessa generaliza-
ção chama-se naBL-álgebra e pertence a uma família de álgebras que são geradas apenas por
t-normas não-associativas. Entretanto, em (PAIVA et al., 2018) os autores mostraram que opera-
dores overlap e seus respectivos resíduos também dão origem a uma classe de naBL-álgebras
e que essa classe é fechada para automorfismos. Visando obter um escopo para BL-álgebras
e naBL-álgebras, este capítulo inicia com um quadro geral sobre aplicações residuadas e algu-
mas funções de agregação bivariadas, em especial t-normas e overlap. Serão estabelecidas as
relações entre essas funções e os conceitos de automorfismos, pseudo-automorfismos e funções
conjugadas.
3.1 Conexões de Galois e o Princípio de residuação
As conexões de Galois generalizam a correspondência entre subgrupos e corpos investiga-
dos na teoria de Galois. Em teoria da ordem, uma conexão de Galois é uma correspondência
particular entre posets e está intimamente relacionada ao conceito de funções residuadas. Por
46
sua vez, as funções residuadas além de ter importância por si, tem um papel bastante relevante
na caracterização de ordens parciais.
Definição 3.1. Uma adjunção ou conexão monotônica de Galois de um poset X para um poset
Y consiste em um par (α, γ) de aplicações monotônicasX α→ Yγ→ X tal que para todo x ∈ X
e y ∈ Yα(x) ≤Y y ⇔ x ≤X γ(y).
A aplicação α é chamada adjunta inferior enquanto que a aplicação γ é chamada adjunta
superior da conexão:
X
α
;; Y
γ
.
Figura 7: Conexão monotônica de Galois entre os posets X e Y
Exemplo 3.1. Considere aplicação diagonal ∆ : L→ L2 definida como x 7→ (x, x), onde L é
um reticulado completo. A aplicação (x, y) 7→ x ∨ y é uma adjunta inferior de ∆, enquanto a
aplicação (x, y) 7→ x ∧ y é uma adjunta superior de ∆:
x ∨ y ≤ z ⇔ (x, y) ≤ (z, z) = ∆(z)
∆(z) = (z, z) ≤ (x, y) ⇔ z ≤ x ∧ y
A Definição 3.1 é comum em muitas aplicações e se destaca bastante na teoria dos reticula-
dos. No entanto, a noção original da teoria de Galois é ligeiramente diferente. Nesta definição
alternativa, uma conexão de Galois é caracterizada por um par de funções antitônicas. Vejamos.
Definição 3.2. Uma conexão (antitônica) de Galois de um poset X para outro poset Y consiste
em um par (α, γ) de aplicações antitônicas X α→ Yγ→ X tal que para todo x ∈ X e y ∈ Y
y ≤Y α(x)⇔ γ(y) ≤X x.
A aplicação α é chamada adjunta superior enquanto que a aplicação γ é chamada adjunta
inferior da conexão:
Observação 3.1. As implicações das duas definições de conexão de Galois são muito semelhan-
tes, já que uma conexão de Galois entre X e Y é simplesmente uma conexão monotônica de
Galois entreX e a ordem dual de Y . Portanto, todos os resultados sobre conexões monotônicas
de Galois podem ser facilmente convertidos para conexões antitônicas de Galois.
47
X
α
##Y
γ
cc .
Figura 8: Conexão antitônica de Galois entre os posets X e Y
Proposição 3.1. Se (α1, γ1) é uma conexão monotônica de X para Y e (α2, γ2) é uma conexão
monotônica de Y para Z, então a composição dessas conexões é uma conexão monotônica de
X para Z.
Demonstração. Desde que o par (α1, γ1) é uma conexão monotônica de X para Y , então para
todos x ∈ X e y ∈ Y tem-se
α1(x) ≤Y y ⇔ x ≤X γ1(y). (3.1)
Assim, da monotonicidade de α2 obtém-se α2(α1(x)) ≤Z α2(y). Daí, já que (α2, γ2) é uma
conexão monotônica de Y para Z, tem-se
α2(α1(x)) ≤Z α2(y) = z ⇔ α1(x) ≤Y γ2(z). (3.2)
Mas pela monotonicidade de γ1 chega-se a inequação γ1(α1(x)) ≤X γ1(γ2(z)). Finalmente, das
equivalências em 3.1 e 3.2, conclui-se que α2(α1(x)) ≤Z z ⇔ x ≤X γ1(γ2(z)). Isto significa
que o par (α2 α1, γ2 γ1) é uma conexão monotônica de X para Z.
Dentro da família das funções monotônicas entre ordens parciais existe uma classe de fun-
ções muito importante, são as chamadas funções residuadas.
Definição 3.3. Uma função f : X → Y entre posets X e Y diz-se residuada se ela é monotô-
nica e, além disso, existe uma função monotônica g : Y → X tal que
g f ≥ idX e f g ≤ idY . (3.3)
Exemplo 3.2. A função logaritmica log : (0,+∞) → R é residuada, já que ela é monotônica
e, além disso, a sua inversa, a função exponencial exp : R → (0,+∞), é também monotônica
e satisfaz: exp(log(x)) = x, ∀x ∈ (0,+∞) e log(exp(x)) = x, ∀x ∈ R.
Se f é uma função residuada, a função monotônica g que satisfaz as desigualdades em 3.3
chama-se resíduo de f e é denotada por fR. O próximo resultado revela que o resíduo de uma
função residuada é unico.
48
Lema 3.1. (Unicidade do resíduo) Se f : X → Y é uma função residuada então o seu resíduo
fR é unico.
Demonstração. Suponha que f : X → Y é uma função residuada e existem g1, g2 : Y → X
que satisfazem as desigualdades em 3.3. Então,
g1 = idX g1 ≤ (g2 f) g1 = g2 (f g1) ≤ g2 idY = g2.
Similarmente demonstra-se que g2 ≤ g1. Assim, g1 = g2. Portanto o resíduo de f é único.
Corolário 3.1. Existe uma relação biunívoca entre uma função residuada f e o seu resíduo fR.
Demonstração. Pelo Lema 3.1, dada uma função residuada f : X → Y , existe um único
resíduo fR : Y → X . Por outro lado, suponha que h é o resíduo das funções f, g : X → Y ,
então por definição h f ≥ idX , f h ≤ idY , h g ≥ idX e g h ≤ idY . Mas f = f idX ≤f (h g) = (f h) g ≤ idY g = g. Ou seja f ≤ g. Similarmente, demonstra-se que
g ≤ f , o que resulta em f = g. Portanto, associado a cada resíduo fR : Y → X , está uma
única função residuada, qual seja, a função f .
Observação 3.2. O Lema 3.1 e o Corolário 3.1 estabelecem um princípio de dualidade entre
as funções residuadas e seus resíduos. Assim, se f é uma função residuada, o seu resíduo fR é
uma função dualmente residuada.
Funções residuadas/dualmente residuadas além de terem importância por si, assumem um
papel fundamental na preservação de ideais/filtros principais.
Proposição 3.2. Seja f : X → Y uma aplicação entre posets. As seguintes afirmações são
equivalentes:
(i) f é residuada;
(ii) para cada ideal principal ↓ w de Y , o conjunto f−1 (↓ w) é um ideal principal de X .
Demonstração. (i)⇒ (ii) Como f é residuada, existe g : Y → X , monotônica e tal que
g f ≥ idX e f g ≤ idY .
Primeiro, prova-se que f−1 (↓ w) = r ∈ X | f(r) ≤ w 6= ∅. De fato, desde que f g ≤ idY ,
para cada w ∈ Y tem-se que f(g(w)) ≤ w, ou seja, f(g(w)) ∈↓ w ⇔ g(w) ∈ f−1 (↓ w). Em
seguida, observe que por um lado tem-se: f(x) ≤ w ⇒ x ≤ g(f(x)) ≤ g(w), e por outro lado,
49
tem-se: x ≤ g(w) ⇒ f(x) ≤ f(g(w)) ≤ w. Segue-se dessas observações que x ≤ g(w) se, e
somente se, w ≤ f(x). Assim, f−1 (↓ w) =↓ g(w), que é um ideal principal de X .
(ii) ⇒ (i) Suponha que para cada ideal principal ↓ w de Y , o conjunto f−1 (↓ w) é um ideal
principal de X . Então, para cada u ∈ X , f(u) ≤ f(u), logo f(u) ∈↓ f(u) e u ∈ f−1 (↓ f(u)).
Assim, como f−1 (↓ f(u)) é um ideal, tem-se que
x ≤ u⇒ x ∈ f−1 (↓ f(u))⇒ f(x) ∈↓ f(u)⇒ f(x) ≤ f(u).
Portanto, f é monotônica. Agora, para cada y ∈ Y existe x ∈ X tal que f−1 (↓ y) =↓ x. É
claro que x é único. De fato, se existem x1, x2 ∈ X tais que f−1 (↓ y) =↓ x1 e f−1 (↓ y) =↓ x2.
Isto acarreta que ↓ x1 =↓ x2 ⇔ x1 = x2. Assim, é possível definir uma função g : Y → X em
que g(y) = x = max ↓ x = max f−1 (↓ y) = maxr ∈ X | f(r) ≤ y. Como g é monotônica,
g(y) ∈↓ g(y) = f−1 (↓ y), então por definição, para cada y ∈ Y , tem-se f(g(y)) ≤ y, ou seja,
f g ≤ idY . Além disso, para cada t ∈ X , t ∈ f−1 (↓ f(t)) =↓ g(f(t)). Logo, para cada
t ∈ X , t ≤ g(f(t)), isto é, g f ≥ idX .
Por dualidade prova-se o seguinte resultado.
Proposição 3.3. Seja f : X → Y uma aplicação entre posets. As seguintes afirmações são
equivalentes:
(i) f é dualmente residuada;
(ii) para cada filtro principal ↑ w de Y , o conjunto f−1 (↑ w) é um filtro principal de X .
Proposição 3.4. Uma aplicação monotônica f : X → Y é residuada se, e somente se, a
aplicação fR : Y → X , dada por fR(y) = maxx ∈ X | f(x) ≤ y, está bem definida para
todo y ∈ Y .
Demonstração. Se f : X → Y é residuada, então pela Proposição 3.2, para todo y ∈ Y existe
x ∈ X tal que f−1 (↓ y) =↓ x. É claro que x é único. De fato, se existem x1, x2 ∈ X tais que
f−1 (↓ y) =↓ x1 e f−1 (↓ y) =↓ x2. Isto acarreta que ↓ x1 =↓ x2 ⇔ x1 = x2. Assim,
fR (y) = maxr ∈ X | f(r) ≤ y
= max f−1 (↓ y)
= max ↓ x
= x.
50
Portanto, fR está bem definida. Reciprocamente, suponha que para todo y ∈ Y a aplicação
fR (y) = maxx ∈ X | f(x) ≤ y está bem definida. Então
fR (y) = maxx ∈ X | f(x) ∈↓ y
= max f−1 (↓ y)
Seja r = max f−1 (↓ y). Então, desde que f é monotônica, segue-se para todo x ∈ X tal que
x ≤ r a seguinte desigualdade: f(x) ≤ f(r) ≤ y. Logo x ∈ f−1 (↓ y). Portanto f−1 (↓ y) é
um ideal principal. Assim, segue da Proposição 3.2 que f é uma função residuada.
Teorema 3.1. Sejam X e Y posets. Uma aplicação f : X → Y é residuada se, e somente se, o
par (f, fR) forma uma conexão monotônica de Galois.
Demonstração. Se f é residuada então ela e seu resíduo fR são monotônicas e satisfazem
fR f ≥ idX e f fR ≤ idY . Assim, para todo x ∈ X e y ∈ Y , por um lado tem-se:
f(x) ≤Y y ⇒ x ≤X fR(f(x)) ≤ fR(y) e, por outro lado, tem-se: x ≤X fR(y) ⇒ f(x) ≤Yf(fR(y)) ≤Y y. Segue-se dessas observações que x ≤X fR(y) ⇔ f(x) ≤Y y. Portanto, o
par (f, fR) forma uma conexão monotônica de Galois. Reciprocamente, se o par (f, fR) forma
uma conexão monotônica de Galois, então f e fR são monotônicas e satisfazem
f(x) ≤ f(x) ⇔ x ≤ fR (f(x))
fR(y) ≤ fR(y) ⇔ f(fR(y)
)≤ y.
Portanto, f é residuada e fR o seu resíduo.
Portanto, sempre que f for uma função residuada, fica estabelecido que o par (f, fR) satis-
faz o princípio de residuação, ou princípio de adjunção, ou ainda, que forma uma conexão de
Galois. O próximo resultado trata-se de um teorema de caracterização para funções residuadas.
Teorema 3.2. (Caracterização de Funções Residuadas) Sejam f : X → Y e g : Y → X
funções quaisquer entre os posets X e Y . As seguintes afirmações são equivalentes:
(R1) f é residuada e g = fR;
(R2) para todo x ∈ X e y ∈ Y tem-se x ≤ g(y)⇔ f(x) ≤ y;
(R3) f é monotônica e para cada y ∈ Y , g(y) = maxx ∈ X | f(x) ≤ y;
(R4) g é monotônica e para cada x ∈ X , f(x) = miny ∈ Y |x ≤ g(y).
51
Demonstração. (R1)⇒ (R2) Suponha f residuada e g = fR. Como f e g são monotônicas,
segue que x ≤ g(y) ⇒ f(x) ≤ f(g(y)) ≤ idY (y) = y. Logo, x ≤ g(y) ⇒ f(x) ≤ y. Com
raciocínio análogo, ao aplicar g na desigualdade f(x) ≤ y, prova-se que f(x) ≤ y ⇒ x ≤ g(y).
(R2)⇒ (R1) Suponha que para todo x ∈ X e y ∈ Y tem-se x ≤ g(y)⇔ f(x) ≤ y. Desde que
f(x) ≤ f(x), por hipótese tem-se x ≤ g(f(x)), logo g f ≥ idX . Analogamente, desde que
g(y) ≤ g(y), então f(g(y)) ≤ y, ou seja, f g ≤ idY . Para ver que g é monotônica, suponha
que y1 ≤ y2, então f(g(y1)) ≤ y1 ≤ y2hipótese⇐⇒ g(y1) ≤ g(y2). De modo análogo mostra-se que
f é monotônica.
(R1)⇒ (R3) Suponha f residuada e g = fR. Então, por definição f é monotônica e, para todo
y ∈ Y , (f g)(y) ≤ idY (y) = y. Logo, f(g(y)) ∈↓y e g(y) ∈ f−1(↓y). Além disso, para todo
w ∈ f−1(↓y), f(w) ∈↓y e, portanto, f(w) ≤ y. Desde que f é residuada, w ≤ g(y). Portanto,
g(y) = max f−1(↓y).
(R3)⇒ (R1) Suponha que f é monotônica e para cada y ∈ Y , g(y) = max f−1(↓y) está bem
definida. Então, por hipótese, f−1(↓y) é um ideal com elemento máximo. Assim, x ≤ g(y)⇔x ≤ max f−1(↓y). Como f−1(↓y) é um ideal, então x ∈ f−1(↓y). Logo f(x) ∈↓y e, portanto,
f(x) ≤ y. Ou seja, x ≤ g(y) ⇒ f(x) ≤ y. Por outro lado, f(x) ≤ y ⇒ f(x) ∈↓ y ⇒ x ≤max f−1(↓y) = g(y). Isto é, f(x) ≤ y ⇒ x ≤ g(y).
(R1)⇔ (R4) Segue por dualidade.
Observação 3.3. Nota-se que (R3) e (R4) na Definição 3.2 indicam que f e fR determinam-se
unicamente.
Conexões de Galois podem ser usadas para descrever classes importantes de funções de
agregação. As funções de agregação são bastante eficientes para modelar os conectivos da
lógica fuzzy.
Definição 3.4. Uma função A : [0, 1]n → [0, 1] diz-se de agregação, quando ela satisfaz as
seguintes condições:
(i) A é não-decrescente em cada coordenada: para cada i ∈ 1, . . . , n, se xi ≤ y então
A(x1, . . . , xn) ≤ A(x1, . . . , xi−1, y, xi+1, . . . , xn);
(ii) A satisfaz as condições de fronteira A(0, . . . , 0) = 0 e A(1, . . . 1) = 1.
Em particular, uma função de agregação binária (ou bivariada)C : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se
uma conjunção fuzzy, se ela satisfaz a condição adicional: C(0, 1) = C(1, 0) = 0.
52
Exemplos de conjunção fuzzy são as t-normas e as funções overlap. Existe uma relação
estreita entre as conjunções fuzzy e implicações fuzzy. As implicações fuzzy generalizam a im-
plicação clássica para a lógica fuzzy, considerando valores de verdade que variam no intervalo
unitário [0, 1] em vez do conjunto 0, 1. Uma implicação fuzzy pode ser gerada a partir de uma
conjunção fuzzy e uma conjunção fuzzy pode ser induzida por uma implicação fuzzy (DIMURO;
BEDREGAL, 2015; KRÓL, 2011).
Nas próximas seções, resultados existentes sobre implicações residuadas induzidas por con-
junções fuzzy serão consideradas.
3.2 Funções residuadas
3.2.1 t-normas e t-conormas
Definição 3.5. Uma t-norma é uma operação T : [0, 1]2 → [0, 1] que é associativa, comutativa,
não decrescente em cada entrada, que satisfaz T (1, x) = x (elemento neutro) e T (0, x) = 0
para todo x ∈ [0, 1].
Uma t-norma T é contínua se para todas sequências convergentes xnn∈N e ynn∈N em
[0, 1] tem-se
T(
limn→∞
xn, limn→∞
yn
)= lim
n→∞T (xn, yn).
Por exemplo, as seguintes t-normas contínuas são fundamentais no sentido de que qualquer
outra t-norma contínua será uma combinação dessas.
(1) t-norma de Gödel: T (x, y) = min(x, y);
(2) t-norma do produto: T (x, y) = x · y;
(3) t-norma de Łukasiewicz: T (x, y) = max(0, x+ y − 1).
Para verificar a continuidade em cada item, considere as sequências xnn∈N e ynn∈N em
[0, 1] tais que xn → x e yn → y. A desigualdade
T (x, y)− 1
n≤ T (xn, yn) ≤ T (x, y) +
1
n
fornece, pelo Teorema do confronto de limites, limn→∞
T (xn, yn) = T (x, y) = T(
limn→∞
xn, limn→∞
yn
).
É fácil verificar que as demais condições da definição 3.5 também são válidas.
53
Em muitos casos, formas mais fracas de continuidade são suficientes. Para t-normas, essa
propriedade é chamada semi-continuidade inferior (KLEMENT; MESIAR; PAP, 2000, Seção 1.3).
Uma vez que uma t-norma é não-decrescente e comutativa, ela é semi-contínua inferiormente
se, e somente se, for contínua à esquerda (left-contínuous) em sua primeira componente. Isto
é: Se, e somente se, para cada b ∈ [0, 1] e para toda sequência não decrescente ann∈N tem-se
T(
limn→∞
an, b)
= limn→∞
T (an, b).
A propriedade de continuidade a esquerda está intimamente ligada a noção de residuação.
Isso será visto mais adiante. No que segue apresenta-se a noção de implicações fuzzy.
Definição 3.6. Uma implicação fuzzy é um operador I : [0, 1]2 → [0, 1] satisfazendo as seguin-
tes condições:
(I1) I(0, 0) = I(0, 1) = I(1, 1) = 1 e I(1, 0) = 0
(I2) x ≤ z implica I(x, y) ≥ I(z, y), ∀x, y, z ∈ [0, 1] (Antitonia à esquerda)
(I3) y ≤ z implica I(x, y) ≤ I(x, z), ∀x, y, z ∈ [0, 1] (Monotonia a direita)
A partir de uma t-norma, é possível obter canonicamente uma implicação que satisfaz a
Definição 3.6.
Lema 3.2. (BACZYNSKI; JAYARAM, 2008) Uma função I : [0, 1]2 → [0, 1] é uma implicação se
existe uma t-norma T tal que
I(x, y) = supr ∈ [0, 1] |T (x, r) ≤ y, para cada x, y ∈ [0, 1]. (3.4)
Nesse caso I chama-se uma implicação gerada a partir de uma t-norma T ou R-implicação.
Frequentemente ela será denotada por IT .
O próximo resultado mostra que apenas no caso em que uma t-norma T é contínua à es-
querda, o par (T, IT ) forma uma família de funções que satisfazem conexão de Galois monotô-
nica.
Teorema 3.3. (BACZYNSKI; JAYARAM, 2008) Para uma t-norma T , as seguintes afirmações são
equivalentes:
(i) T é contínua à esquerda;
54
(ii) T e IT formam um par adjunto, isto é, satisfazem o princípio de residuação
T (x, z) ≤ y ⇔ z ≤ IT (x, y), ∀x, y, z ∈ [0, 1];
(iii) o supremo em (3.4) é o máximo, isto é,
IT (x, y) = maxz ∈ [0, 1] |T (x, z) ≤ y
onde o lado direito existe para todos x, y ∈ [0, 1].
Observação 3.4. Se qualquer uma das afirmações acima vale, a função IT é chamada de im-
plicação residuada gerada por T .
As t-normas podem ser divididas em classes. A seguir, descreve-se duas delas que são
consideradas neste trabalho.
Definição 3.7. Diz-se que uma t-norma T é positiva se, ela satisfaz a condição: T (x, y) = 0
se, e somente se, x = 0 ou y = 0.
Definição 3.8. Uma t-norma T chama-se estrita, se ela é contínua e estritamente monotônica,
i.e., T (x, y) < T (x, z) sempre que 0 < x e y < z.
As noções de t-normas podem ser naturalmente estendidas para o contexto mais geral de
reticulados (SAMINGER-PLATZ; KLEMENT; MESIAR, 2008; PALMEIRA et al., 2014; PALMEIRA;
BEDREGAL, 2012). Nessa perspectiva, apresenta-se algumas definições particulares requeridas
ao longo deste trabalho.
Exemplo 3.3. Seja L um reticulado limitado. A função T : L2 → L dada por T (x, y) = x∧L yé uma t-norma que generaliza a clássica t-norma do mínimo, i.e. TM(x, y) = minx, y, para
todos x, y ∈ [0, 1].
Definição 3.9. Uma t-norma T sobre um reticulado limitado L é chamada:
(i) ∧-distributiva, se T (x, y ∧ z) = T (x, y) ∧ T (x, z) para todos x, y, z ∈ L
(ii) ∨-distributiva, se T (x, y ∨ z) = T (x, y) ∨ T (x, z) para todos x, y, z ∈ L
Se os itens (i) e (ii) são ambos satisfeitos, então T é chamada (∧ e ∨)-distributiva.
A seguinte definição fornece uma condição para um elemento y de um reticulado L per-
tencer à imagem da operação unária T (x, ·) : L → L (SAMINGER-PLATZ; KLEMENT; MESIAR,
2008).
55
Definição 3.10. (Divisibilidade) Um reticulado L equipado com uma t-norma
T : L2 → L chama-se divisível, se para todos x, y ∈ L, com y ≤L x, existe algum z ∈ L tal que
y = T (x, z).
Além das conjunções fuzzy, funções de agregação também fornecem modelos para as dis-
junções (para o OU inclusivo) da lógica fuzzy. Uma classe de exemplos de funções de agregação
disjuntivas são as t-conormas.
Definição 3.11. Seja L um reticulado limitado. Uma operação binária S : L2 → L chama-se
t-conorma se, para todos x, y, z ∈ L, tem-se:
(1) S(x, y) = S(y, x) (comutatividade);
(2) S(x, S(y, z)) = S(S(x, y), z) (associatividade);
(3) se x ≤L y então S(x, z) ≤L S(y, z), ∀ z ∈ L (monotonicidade);
(4) S(x, 0L) = x (Elemento neutro).
Observe que T (x, y) 6L x, y e x, y 6L S(x, y), para todos x, y ∈ L. De fato, T (x, y) 6L
x∧y 6L x e x 6L x∨L y 6L S(x, y). Observe também que a Definição 3.10 pode ser reescrita
para t-conormas por dualidade.
Exemplo 3.4. Dado um reticulado limitado arbitrário L, a função S dada por S(x, y) = x∨Ly,
para todos x, y ∈ L, é uma t-conorma sobre L que generaliza: SM(x, y) = maxx, y.
Com base na observação de que t-normas e t-conormas possuem em comum os três axi-
omas: associatividade, comutatividade e um elemento neutro, uma generalização dessas duas
classes de funções de agregação torna-se bastante útil. Trata-se da classe funções chamadas de
uninormas.
Definição 3.12. Considere L um reticulado limitado. Uma uninorma é uma função de agrega-
ção U : L2 → L que é monotônica, associativa, comutativa e que possui um elemento e ∈ Ltal que U(e, x) = x, para todo x ∈ L.
Observação 3.5. Uma uninorma é uma t-norma se e = 1L e uma t-conorma se e = 0L.
3.2.2 Funções overlap
Definição 3.13. (BUSTINCE et al., 2010) Uma aplicação O : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se função
overlap (ou função de sobreposição) se ela satisfaz as seguintes condições:
56
(O1) O(x, y) = O(y, x);
(O2) O(x, y) = 0 se, e somente se, x · y = 0 (O não possui divisores de zero);
(O3) O(x, y) = 1 se, e somente se x · y = 1 (O não possui divisores de um);
(O4) O é não-decrescente;
(O5) O é contínua.
Exemplo 3.5. (BEDREGAL et al., 2013) As aplicações dadas por Omin(x, y) = minx, y,OP (x, y) = xy e Omin max(x, y) = min(x, y) · max(x2, y2), para todos x, y ∈ [0, 1], são
exemplos de funções overlap. Além disso, se O : [0, 1]2 → [0, 1] é uma função overlap en-
tão O2(x, y) = O(x2, y2) e O√
(x, y) = O(√x,√y) são também funções overlap.
Definição 3.14. Uma função overlap O : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se deflacionária se:
∀x ∈ [0, 1], O(x, 1) ≤ x; (3.5)
e chama-se inflacionária se:
∀x ∈ [0, 1], x ≤ O(x, 1). (3.6)
Observação 3.6. Uma função overlap O satisfaz 3.5 e 3.6 se, e somente se, O tem 1 como ele-
mento neutro. No entanto, existem funções overlap satisfazendo 3.5 (ou 3.6) que não possuem
1 como elemento neutro. Por exemplo, a função overlap Omp(x, y) = minxp, yp, com p > 0
e p 6= 1. Sempre que p > 1, Omp satisfaz 3.5, mas não satisfaz 3.6. Por outro lado, quando
p < 1, Omp satisfaz 3.6, mas não satisfaz 3.5.
Dadas duas diferentes funções overlap O1 e O2, é possível obter outros interessantes exem-
plos de overlap como segue:
(1) (O1 ∧O2)(x, y) = min(O1(x, y), O2(x, y));
(2) (O1 ∨O2)(x, y) = max(O1(x, y), O2(x, y));
(3) O(x, y) = wO1(x, y) + (1− w)O2(x, y), para cada w ∈ [0, 1] (soma convexa).
A propriedade da soma convexa para overlap pode ser estendida:
Lema 3.3. Se O1, . . . , Om são funções overlap e w1, . . . , wm são pesos não-negativos tais que∑mi=1wi = 1, então a soma convexa
O(x, y) =m∑i=1
wi ·Oi(x, y)
57
é uma função overlap.
Definição 3.15. Considere α ∈ [0, 1]. Uma operaçãoO : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se α-migrativa
se
O(αx, y) = O(x, αy), para todosx, y ∈ [0, 1]. (3.7)
Se O é α-migrativa para todo α ∈ [0, 1], então O é simplesmente chamada de migrativa.
Exemplo 3.6. A função overlap OP (no Exemplo 3.5) é uma overlap migrativa.
Em (BUSTINCE et al., 2012) foi apresentada uma forma de generalizar a Definição 3.15
considerando uma função de agregação binária A e reescrevendo a Equação (3.7) como segue:
O(A(α, x), y) = O(x,A(α, y)), para todosx, y ∈ [0, 1]. (3.8)
Neste caso, diz-se que O e (α,A)-migrativa e apenas A-migrativa se O é (α,A)-migrativa para
todo α ∈ [0, 1].
Proposição 3.5. (BEDREGAL et al., 2013) Uma função overlap O é associativa se e somente se,
para todos x, y, z ∈ [0, 1], ela satisfaz o conhecido princípio de intercâmbio:
O (x,O(y, z)) = O (y,O(x, z)) .
Proposição 3.6. (PAIVA et al., 2018) Seja F : [0, 1]2 → [0, 1] uma função. F é uma função
overlap associativa se, e somente se, F é uma t-norma contínua e positiva.
A partir de agora, implicações derivadas da classe particular de conjunções fuzzy determi-
nada pelas funções overlap serão consideradas.
Lema 3.4. Uma função I : [0, 1]2 → [0, 1] é uma implicação se existe uma overlap O tal que
I(x, y) = maxr ∈ [0, 1] |O(x, r) ≤ y, para cada x, y ∈ [0, 1]. (3.9)
Se I é uma implicação gerada a partir de uma overlap O, então frequentemente ela será
denotada por IO. Neste caso, IO é chamada uma RO-implicação. Em (DIMURO; BEDREGAL,
2015), os autores consideraram resultados existentes sobre implicações induzidas por conjun-
ções fuzzy para introduzir o conceito de implicação residual derivada de funções overlap, de-
notada por RO-implicações.
Corolário 3.2. As funções O e IO formam um par adjunto, i.e, elas satisfazem princípio de
residuação.
58
Naquele mesmo artigo, foi provado que as RO-implicações são mais fracas que as R-
implicações construídas a partir de t-normas contínuas, no sentido de que as RO-implicações
não satisfazem necessariamente propriedades satisfeitas por tais R-implicações, por exemplo o
princípio de troca.
Corolário 3.3. O é associativa se, e somente se, IO satisfaz princípio de troca:
IO(x, IO(y, z)) = IO(y, IO(x, z)), ∀x, y, z ∈ [0, 1].
O próximo resultado trata-se de um caso particular de um teorema para conjunções fuzzy
residuadas, e seus respectivos resíduos, cuja demonstração pode ser vista em [(KRÓL, 2011),
Teorema 2].
Teorema 3.4. Seja O : [0, 1]2 → [0, 1] uma função overlap. Considere a implicação fuzzy
IO : [0, 1]2 → [0, 1] derivada de O. Então, as seguintes afirmações são equivalentes:
(i) O é contínua à esquerda;
(ii) O e IO satisfazem o princípio de residuação;
(iii) IO(x, y) = maxz ∈ [0, 1] |O(x, z) ≤ y, para todos x, y ∈ [0, 1].
A próxima seção apresenta a ação de automorfismos em funções overlap e algumas propri-
edades relacionadas.
3.2.3 Automorfismos e propriedades relacionadas
Definição 3.16. Uma função ρ : [0, 1] → [0, 1] é um automorfismo se, e somente se, ρ é
monotônica e bijetiva.
Desde que o inverso de um automorfismo é também um automorfismo e automorfismos
são fechados sob a composição, então o conjunto dos automorfismos sobre [0, 1], denotado por
AUT ([0, 1]), com o operador de composição forma um grupo. Assim, como de costume em
álgebra, pode-se considerar a ação do grupo 〈AUT ([0, 1]), ,−1 〉 em um conjunto de funções
de [0, 1]n em [0, 1].
Definição 3.17. A ação de um automorfismo ρ em uma função f : [0, 1]n → [0, 1] é a função
fρ : [0, 1]n → [0, 1] dada por fρ(x1, . . . , xn) = ρ−1 (f (ρ(x1), . . . , ρ(xn))). Neste caso, fρ
chama-se uma conjugada de f .
59
Um conjunto F de funções n-árias em [0, 1] é fechado sob automorfismos se para cada
f ∈ F e ρ ∈ AUT ([0, 1]) tem-se que fρ ∈ F .
Para quaisquer f, g ∈ F defina a relação: f ∼ g se, e somente se, g = fρ. Claramente,
se g é uma conjugada de uma função f , então também f é uma conjugada de g. De fato, se
g = fρ, então (fρ)ρ−1
= f e, portanto, f = gρ−1 . Além disso, se f é uma conjugada de g e,
por sua vez, g é uma conjugada de h, então f é uma conjugada de h. Portanto, cada função é
conjugada de si mesma. Isto mostra que “∼” é uma relação de equivalência sobre o conjunto
F fechado sob automorfismos. Em particular, as classes de t-normas, t-conormas e implicações
são fechadas sob automorfismos (KLEMENT; MESIAR; PAP, 2000; BACZYNSKI; JAYARAM, 2008;
BUSTINCE; BURILLO; SORIA, 2003).
O próximo resultado mostra que a classe das funções overlap também é fechada sob auto-
morfismos (PAIVA et al., 2018; BEDREGAL et al., 2013).
Proposição 3.7. Seja O uma função overlap. Uma conjugada de O, denotada por Oρ, satisfaz
as seguintes propriedades, para qualquer ρ ∈ AUT ([0, 1]) e x, y ∈ [0, 1]:
(i) Oρ é não-decrescente;
(ii) Oρ(x, y) = Oρ(y, x);
(iii) Oρ(x, y) = 0 se, e somente se xy = 0;
(iv) Oρ(x, y) = 1 se, e somente se xy = 1;
(v) Oρ é contínua.
No que segue, apresenta-se uma generalização da noção de automorfismos para o contexto
de reticulados.
Definição 3.18. Seja L um reticulado limitado. Uma função ρ : L→ L é um automorfismo se:
(i) ρ é bijetiva;
(ii) x 6L y se, e somente se, ρ(x) 6L ρ(y).
Proposição 3.8. (PAIVA et al., 2019) Seja ρ : L → L um automorfismo e f : Ln → L uma
operação n-ária. Se ρ (f(x1, . . . , xn)) = f (ρ(x1), . . . , ρ(xn)) Então
ρ−1(f(x1, . . . , xn)) = f(ρ−1(x1), . . . , ρ−1(xn)
). (3.10)
60
Demonstração. Desde que f (ρ−1(x1), . . . , ρ−1(xn)) = ρ−1 (ρ (f (ρ−1(x), . . . , ρ−1(xn)))) segue-
se da hipótese que
ρ−1(f(ρ(ρ−1(x1)
), . . . , ρ
(ρ−1(xn)
)))= ρ−1 (f(x1, . . . , xn))
3.3 Algumas álgebras da lógica fuzzy
3.3.1 BL-álgebras: definição e exemplos
As BL-álgebras foram introduzidas por Hájek em (HÁJEK, 1998) para investigar lógicas
multivaloradas por meios algébricos. Suas motivações para introduzir BL-álgebras eram de
dois tipos; o primeiro foi fornecer uma contrapartida algébrica de uma lógica proposicional,
chamada Logica Básica, que incorpora um fragmento comum a algumas das mais importantes
lógicas multivaloradas, à saber: Lógica de Łukasiewicz, Lógica de Gödel e Logica do Produto.
Esta Lógica Básica (BL para abreviar) é proposta como a lógica multivalorada com valores de
verdade em [0, 1].
Hájek demonstrou em (HÁJEK, 1998, Lema 2.3.10.) que a classe de BL-álgebras é gerada
pela classe de álgebras da forma 〈[0, 1],min,max, ∗,→, 0, 1〉, onde ∗ é uma t-norma contínua e
a implicação→ é o seu resíduo, chamadas BL-álgebras padrão.
No que segue, apresenta-se uma pequena introdução de BL-álgebras, algumas de suas pro-
priedades, bem como alguns exemplos.
Definição 3.19. Uma BL-álgebra é uma estrutura 〈A,∧,∨, ∗,→, 0A, 1A〉 que satisfaz:
(BL1) O reduto 〈A,∧,∨, 0A, 1A〉 é um reticulado limitado com topo 1A e bottom 0A;
(BL2) o reduto 〈A, ∗, 1A〉 é um monóide abeliano;
(BL3) o par (∗,→) forma uma conexão de Galois, i.e: x ∗ z ≤ y se, e somente se, z ≤ x→ y;
(BL4) para todos x, y ∈ A, x ∗ (x→ y) = x ∧ y (divisibilidade);
(BL5) para todos x, y ∈ A, (x→ y) ∨ (y → x) = 1A (prelinearidade).
Observação 3.7. É fácil ver uma equivalência entre as noções de divisibilidade apresentadas
na Definição 3.10 e no Axioma (BL4), da Definição 3.19.
Às vezes, para simplificar a notação, uma BL-álgebra 〈A,∧,∨, ∗,→, 0A, 1A〉 será indicada
pelo seu conjunto de suporte, A. A seguir apresentamos uma lista de BL-álgebras:
61
Exemplo 3.7. (HÁJEK, 1998) As três estruturas a seguir são importantes classes de BL-álgebras.
(1) (Álgebra de Gödel). Esta é a semântica algébrica para a conhecida lógica de Gödel, a
estrutura 〈[0, 1],min,max, ∗,→, 0, 1〉, onde x ∗ y = minx, y e
x→ y =
1, se x ≤ y
y, se x > y
(2) (Álgebra do Produto). Esta é a semântica algébrica para a conhecida lógica do produto,
a estrutura 〈[0, 1],min,max, ∗,→, 0, 1〉, onde ∗ é a multiplicação usual dos números
reais sobre o intervalo unitário [0, 1] e
x→ y =
1, se x ≤ yyx, se x > y
(3) (Álgebra de Łukasiewicz). Esta é a semântica algébrica para a conhecida lógica de
Łukasiewicz, a estrutura 〈[0, 1],min,max, ∗,→, 0, 1〉, onde x ∗ y = max0, x+ y− 1 e
x→ y =
1, se x ≤ y
1− x+ y, se x > y
Algumas classes de BL-álgebras foram estudadas por sua própria importância, uma vez
que são a contraparte algébrica de classes de lógicas bem conhecidas. As MV-álgebras, por
exemplo, são a semântica algébrica para a lógica de Łukasiewicz. Em (BOTUR; HALAS, 2009) os
autores introduziram uma generalização não-associativa das álgebras correspondentes à lógica
de Łukasiewicz.
Na próxima seção, propriedades relacionadas a generalizações razoáveis da lógica fuzzy
tendo uma conjunção não-associativa serão abordadas sob o prisma algébrico.
3.3.2 naBL-algebras: definições e primeiras propriedades
Estruturas algébricas não-associativas surgem em muitas situações da lógica fuzzy baseada
em t-normas. Exemplos notórios são apresentados em (FODOR, 1991; ZHANG, 2009; ZHANG;
MA, 2010; BOTUR, 2011; CHAJDA; KÜHR, 2007).
A formalização dos reticulados residuados não associativos foi realizada usando generaliza-
ções: t-normas não-associativas em (BOTUR, 2011) e t-normas fracas em (FODOR, 1991; ZHANG,
2009; ZHANG; MA, 2010). Ainda em (BOTUR, 2011), o autor define uma naBL-álgebra como um
membro da subvariedade da variedade dos reticulados residuados não associativos que é gerada
62
por seus membros ordenados linearmente e que satisfaz o axioma de divisibilidade. Entretanto,
objetivando seguir uma abordagem semelhante àquela da seção anterior, optou-se pela seguinte
definição.
Definição 3.20. (BOTUR, 2011, Teorema 3) Uma álgebra 〈A,∧,∨, ∗,⇒, 0A, 1A〉 é chamada
BL-álgebra não-associativa (abreviadamente naBL-álgebra), se ela satisfaz:
(naBL1) 〈A,∧,∨, 0A, 1A〉 é um reticulado limitado com bottom 0A e topo 1A;
(naBL2) 〈A, ∗, 1A〉 é um grupóide comutativo com elemento neutro 1A;
(naBL3) O par (∗,⇒) satisfaz o princípio de residuação: x ∗ z ≤ y se só se z ≤ x⇒ y;
(naBL4) Para todos x, y ∈ A, x ∗ (x⇒ y) = x ∧ y (divisibilidade);
(naBL5) Para todos x, y ∈ A, (x⇒ y) ∨ αab (y ⇒ x) = 1A (α-prelinearidade);
(naBL6) Para todos x, y ∈ A, (x⇒ y) ∨ βab (y ⇒ x) = 1A (β-prelinearidade);
onde αab (x) = (a ∗ b)⇒ (a ∗ (b ∗ x)) e βab (x) = b⇒ (a⇒ ((a ∗ b) ∗ x)).
Observação 3.8. Se a álgebra 〈A,∧,∨, ∗,⇒, 0A, 1A〉 satisfaz as propriedades (naBL1), (naBL2)
e (naBL3) da Definição 3.20, então é chamado um reticulado residuado não-associativo. Além
disso, toda naBL-álgebra satisfaz:
(naBL7) x ≤ y se, só se, x⇒ y = 1A;
(naBL8) 1A ⇒ x = x, ∀x ∈ A;
(naBL9) Se x ≤ y então x = y ∗ (y ⇒ x).
Proposição 3.9. (BOTUR, 2011) Se a álgebra 〈A,∧,∨, ∗,⇒, 0A, 1A〉 é uma naBL-álgebra e
x, y, z ∈ A então:
(naBL10) x ∗ (x⇒ y) ≤ y;
(naBL11) Se x ≤ y então x ∗ z ≤ y ∗ z;
(naBL12) x ∗ 0A = 0A;
(naBL13) Se x ≤ y então y ⇒ z ≤ x⇒ z;
(naBL14) Se x ≤ y então z ⇒ x ≤ z ⇒ y;
63
(naBL15) (x ∨ y) ∗ z = (x ∗ z) ∨ (y ∗ z);
(naBL16) (x ∧ y)⇒ x = 1A;
(naBL17) (x⇒ y) = x⇒ (x ∧ y);
(naBL18) x ≤ y ⇒ (x ∗ y).
3.3.3 Filtros e congruências em naBL-álgebras
Agora descreve-se filtros e congruências de reticulados residuados não-associativos.
Definição 3.21. Seja L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 um reticulado residuado e não-associativo.
Um subconjunto não vazio F ⊆ L é um filtro de L se:
(i) x ∈ F e y ∈ L tal que x ≤ y implica y ∈ F ;
(ii) x ∗ y ∈ F , ∀x, y ∈ F ;
(iii) a, b ∈ L e x ∈ F implica αab (x), βab (x) ∈ F .
Seja F(L) o conjunto dos filtros de L. Então 〈F(L),⊆,∧,∨, 1L, F 〉 é um reticulado,
onde ∀Fi, Fj ∈ F(L): Fi ∧Fj = Fi ∩Fj e Fi ∨Fj = 〈Fi ∪Fj〉, onde denota 〈S〉 o filtro gerado
por S.
Além disso, para qualquer filtro F de L, associamos uma relação de congruência. Deste
modo, temos uma bijeção entre F(L) e o conjunto Cong (L) das congruências de L.
Proposição 3.10. (ZHANG; MA, 2010, Teorema 3.4) Sejam 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 um reticulado
residuado não-associativo e F um filtro. Defina a relação ≡F sobre L como segue: x ≡F y se,
só se, x⇒ y e y ⇒ x ∈ F . Então:
(i) “≡F” é uma relação de congruência sobre L.
(ii) Denote por [x]F a classe de equivalência de x ∈ F com respeito a “≡F”. A álgebra
quociente L/ ≡F= [x]F |x ∈ L é um reticulado residuado não-associativo tal que a
ordem parcial sobre L/ ≡F é como segue: [x]F ≤ [y]F se, só se, x⇒ y ∈ F .
Note, em particular, que x ≡F 1L se, só se, x ∈ F e x ≡F 0L se, só se x⇒ 0L ∈ F .
Lema 3.5. A álgebra 〈L/ ≡F ,∧,∨, ∗,⇒, [0L]F , [1L]F 〉 é uma naBL-álgebra onde [1L]F é o
elemento máximo e [0L]F é o elemento mínimo. As operações do conjunto quocienteL/ ≡F são:
[x]F ∗ [y]F = [x∗y]F ; [x]F ∧ [y]F = [x∧y]F ; [x]F ∨ [y]F = [x∨y]F e [x]F ⇒ [y]F = [x⇒ y]F .
64
Em (BOTUR, 2011), o autor denota a classe de todas as naBL-álgebras por naBL e denota
por naT a classe de todas as naBL-álgebras induzidas apenas por t-normas não-associativas. O
principal teorema daquele trabalho afirma que naT é a classe geradora para a variedade naBL.
Além disso, ele conclui observando que em seu artigo foi proposta a semântica algébrica de uma
versão não-associativa da lógica BL de Hájek. Botur, então, propôs a seguinte generalização
para o conceito de T-normas:
Definição 3.22. (nat-normas) Uma operação binária “∗” no intervalo [0, 1] dos reais é cha-
mada uma t-norma não-associativa (nat-norma) se:
(nat1) 〈[0, 1], ∗, 1〉 é um grupóide comutativo com elemento neutro 1;
(nat2) a operação “∗” é contínua no sentido usual;
(nat3) se x, y, z ∈ [0, 1] são tais que x ≤ y, então x ∗ z ≤ y ∗ z.
Entretanto, este estudo não incluiu todas as classes de reticulados residuados não-associativos,
uma vez que tais estruturas podem ser derivadas de funções overlap em vez de t-normas.
Com a finalidade de generalizar a noção reticulados residuados não-associativos derivados
de funções overlap, no próximo capítulo estende-se o conceito de funções overlap para reticu-
lados.
65
Parte II
Contribuições
66
4 Extensão de overlap para reticulados
Este capítulo propõe definições para funções overlap considerando o contexto de reticu-
lados e introduz uma definição mais geral, chamada de quasi-overlap, que surge da remoção
da condição de continuidade. As principais propriedades de quasi-overlap em reticulados li-
mitados, a saber: soma convexa, migratividade, homogeneidade, idempotência e lei de cance-
lamento são investigadas. Finalmente, uma caracterização de quasi-overlap arquimedianas é
apresentada.
4.1 Overlap e quasi-overlap para reticulados limitados
Funções overlap foram propostas por Bustince et al. (BUSTINCE et al., 2010) para resolver o
problema da imprecisão no processo de classificação das imagens. Alguns autores afirmam que
as funções overlap, embora sejam definidas em [0, 1], podem ser naturalmente consideradas em
relação a outros domínios. Considerando isto, a seguir propomos a noção de funções overlap
para reticulados.
Definição 4.1. (PAIVA et al., 2019) Seja L um reticulado limitado. Uma função O : L2 → L é
chamada uma função L-overlap (simplesmente overlap, se o contexto estiver claro) se todas as
propriedades a seguir valem:
(OL1) O(x, y) = O(y, x) para todos x, y ∈ L;
(OL2) O(x, y) = 0L se e somente se x = 0L ou y = 0L;
(OL3) O(x, y) = 1L se e somente se x = y = 1L;
(OL4) O é não-decrescente em cada entrada, isto é
x1 ≤L x2 ⇒ O(x1, y) ≤L O(x2, y)
y1 ≤L y2 ⇒ O(x, y1) ≤L O(x, y2)
;
67
(OL5) O é contínua.
Observação 4.1. Aqui estamos considerando a noção de continuidade como definida na Se-
ção 2.5 para reticulados, a qual diz que O é contínua se ela preserva supremo de conjuntos
dirigidos. No entanto, qualquer outra noção também pode ser considerada.
Em alguns contextos, a continuidade não é uma propriedade indispensável, especialmente
quando consideramos reticulados finitos. Esta situação aparece em algumas situações no campo
do processamento digital de imagens. Bustince et al. em (BUSTINCE et al., 2010) justifica a
exigência de continuidade dizendo que ela é considerada para evitar que O seja uma uninorma,
no entanto, é fácil ver que, se uma uninorma U é uma função overlap, então é necessariamente
uma t-norma.
Então, diferentemente do que foi proposto por Bustince et al. (BUSTINCE et al., 2010) e
na Definição 4.1, essas razões nos levam a enfraquecer a noção de L-overlap, removendo o
requisito de continuidade para L-overlap.
Definição 4.2. Seja L um reticulado limitado e O : L2 → L uma função. Se O satisfaz
as propriedades (OL1)-(OL4) ela é chamada uma função quasi-overlap sobre L, ou apenas
quasi-overlap, se o contexto for claro.
Observação 4.2. Obviamente toda função L-overlap é uma quasi-overlap sobre L. Quando L
é finito, pela Observação 2.8, qualquer quasi-overlap é uma overlap.
Exemplo 4.1. Para cada a ∈ L/0L, 1L a função
Oa(x, y) =
0L , se x = 0L ou y = 0L
1L , se x = y = 1L
a , caso contrário
é uma quasi-overlap que não é uma overlap, desde que existe um conjunto dirigido ∆ tal que
sup ∆ = 1L e 1L 6∈ ∆ ou, equivalentemente, existe um conjunto filtrado ∆ tal que inf ∆ = 0L
e 0L 6∈ ∆.
A noção de overlap divisíveis pode ser reformulada para o caso das funções quasi-overlap.
Definição 4.3. Um reticulado L munido com uma quasi-overlap O : L2 → L diz-se divisível se
para todos x, y ∈ L com y ≤L x, existe algum z ∈ L tal que y = O(x, z).
Proposição 4.1. Seja L um reticulado limitado e O uma quasi-overlap tal que o par 〈L,O〉 é
divisível. Então
68
(1) O é associativa, i.e. ela satifaz
O(x,O(y, z)) = O(O(x, y), z), ∀x, y, z ∈ L (4.1)
se e somente se O é uma t-norma positiva;
(2) se e ∈ L é um elemento neutro de O, i.e.
O(x, e) = O(e, x) = x, ∀x ∈ L (4.2)
então e = 1L.
Demonstração. (1) (⇒) Suponha que O é uma quasi-overlap associativa sobre L. Desde
que O satisfaz comutatividade e é não-decrescente, para O ser uma t-norma positiva,
precisa-se apenas provar que 1L é elemento neutro de O. Desde que O é divisível sobre
L e x ≤L 1L para todo x ∈ L, existe um y ∈ L tal que O(y, 1L) = x. Por outro lado,
como O(0L, 1L) = 0L e O(1L, 1L) = 1L, por (OL2) e (OL3), respectivamente. Então
pela associatividade de O tem-se:
O(x, 1L) = O(O(y, 1L), 1L) = O(y,O(1L, 1L)) = O(y, 1L) = x.
Similarmente prova-se que O(1, x) = x. Portanto 1L é um elemento neutro de O.
(⇐) Reciprocamente, assuma que O é uma t-norma positiva, então 1L = O(x, y) ≤Lmin(x, y), e assim, x = y = 1L. Similarmente tem-se O(1L, 1L) = 1L, desde que
1L é elemento neutro de O. Além disso, se x = 0L ou y = 0L, então é claro que
O(x, y) = 0L. Por outro lado, se fosse 0L <L x, y então como O é uma t-norma
positiva, O(x, y) >L 0L. Portanto, O(x, y) = 0L ⇔ x = 0L ou y = 0L.
(2) De fato, se O(x, e) = O(e, x) = x para todo x ∈ L então O(1L, e) = 1L e assim, por
(OL3), tem-se e = 1L.
Proposição 4.2. Uma quasi-overlap O é associativa se e somente se, para quaisquer x, y, z ∈L, ela satisfaz o princípio de troca: O (x,O(y, z)) = O (y,O(x, z)).
Demonstração. Suponha que O é associativa. Então, desde que O é também simétrica, temos:
O (x,O(y, z)) = O (O(x, y), z)
= O (O(y, x), z)
= O (y,O(x, z)) .
69
Por outro lado, se O satisfaz o princípio de troca, então:
O (x,O(y, z)) = O (y,O(x, z))
= O (y,O(z, x))
= O (z,O(y, x))
= O (z,O(x, y))
= O (O(x, y), z) .
4.2 Soma convexa generalizada de funções overlap e quasi-overlap
A seguir, a noção de soma convexa de overlap, dada em (BUSTINCE et al., 2010; BEDREGAL et
al., 2013), é generalizada por meio de uma família de funções peso como definido por Lizasoain
e Moreno em (LIZASOAIN; MORENO, 2013).
Definição 4.4. (Vetor de pesos) Sejam L um reticulado limitado, ⊗,⊕ : L2 → L uma t-norma
e uma t-conorma respectivamente. O vetor ~w = (w1, . . . , wn) ∈ Ln é chamado um vetor de
pesos sobre 〈L,⊕,⊗〉, sen⊕i=1
wi = 1L (4.3)
Além disso, se para todo λ ∈ L,
λ⊗
(n⊕i=1
wi
)=
n⊕i=1
(λ⊗ wi) (4.4)
então ~w é distributivo.
Definição 4.5. (FARIAS; SANTIAGO; BEDREGAL, 2018, família de funções de peso) Seja 〈L,⊕,⊗〉uma álgebra em que L é um reticulado limitado, ⊗ : L2 → L uma t-norma e ⊕ : L2 → L uma
t-conorma. Uma família finita de funções F = fi : Lm → L| i = 1, 2, . . . , n é chamada a
família de funções de peso se, para cada ~w ∈ Lm, o vetor (f1(~w), . . . , fn(~w)) é um vetor de
pesos em 〈L,⊕,⊗〉. Além disso, se o vetor (f1(~w), . . . , fn(~w)) satisfaz a equação (4.4) para
todo λ ∈ L então F é chamada uma família distributiva de funções de peso.
O próximo resultado fornece uma versão generalizada da soma convexa para funções quasi-
overlap.
Teorema 4.1. Sejam O1, . . . , On : L2 → L funções quasi-overlap sobre um reticulado limitado
L e ⊗,⊕ : L2 → L uma t-norma e uma t-conorma, respectivamente, ambas contínuas. Se
70
OF = O1, . . . , On é uma família de pesos quasi-overlap então a função F : L2 → L dada
por
F (x, y) =n⊕i=1
λi ⊗Oi(x, y) (4.5)
é também uma função quasi-overlap, onden⊕i=1
λi = 1L para todos λi ∈ L. Além disso, se OFsão L-overlap e ⊕ bem como ⊗ são contínuas então F é também uma função L-overlap.
Demonstração. Verifica-se que F satisfaz as condições da Definição 4.2 (e 4.1) como segue:
(OL1) Diretamente da comutatividade das funções Oi com i = 1, 2, . . . , n;
(OL2) Suponha F (x, y) = 0L. Entãon⊕i=1
λi ⊗ Oi(x, y) = 0L se e somente se tem-se
λi ⊗ Oi(x, y) = 0L para cada i = 1, . . . , n. Além disso, comon⊕i=1
λi = 1L para
todos λi ∈ L segue-se que existe i0 ∈ 1, . . . , n tal que λi0 ⊗ Oi0(x, y) = 0L se e
somente se Oi0(x, y) = 0L se e somente se x = 0L ou y = 0L;
(OL3) Suponha F (x, y) = 1L. Entãon⊕i=1
λi ⊗ Oi(x, y) = 1L se e somente se existe i0 tal
que λi0 ⊗ Oi0(x, y) = 1L se e somente se λi0 = Oi0(x, y) = 1L se e somente se
x = y = 1L;
(OL4) F é crescente (portanto não-decrescente) uma vez que é composta por operações
crescentes Oi, ⊕ e ⊗.
(OL5) A continuidade de F pode ser obtida imediatamente da continuidade deOF ,⊕ e⊗.
Proposição 4.3. Seja ⊗ : L2 → L uma t-norma. Se ψ, ϕ : L → L são homomorfismos
crescentes, então a aplicação
Oψ,ϕ(x, y) = ψ(ϕ(x)⊗ ϕ(y))
é uma função quasi-overlap. Além disso, se ⊗, ψ, e ϕ são contínuas então Oψ,ϕ é uma
L-overlap.
Demonstração. Segue-se por verificação direta dos axiomas das Definições 4.1 e 4.2.
71
4.3 Principais propriedades das funções quasi-overlap
Esta seção é dedicada a apresentar as principais propriedades das funções overlap e quasi-
overlap; ou seja, migratividade, homogeneidade e idempotência.
4.3.1 (α,A)-Migratividade
Migratividade para funções de quasi-overlap significa que elas são invariantes com relação
ao mesmo fator, α ∈ [0, 1], quando elas aparecem em ambas as entradas, i.e., O(αx, y) =
O(x, αy) (ver (BUSTINCE et al., 2010; BEDREGAL et al., 2013; BUSTINCE et al., 2012)). Aqui
apresenta-se uma definição generalizada de migratividade por meio de funções de agregação.
Definição 4.6. Sejam L um reticulado limitado e A : L2 → L uma função de agregação. Para
um dado α ∈ L, uma operação bivariada F : L2 → L é chamada (α,A)-migrativa, se ela
satisfaz:
F (A(α, x), y) = F (x,A(α, y)), para todos x, y ∈ L. (4.6)
Caso F seja (α,A)-migrativa, para todo α ∈ L, então ela é chamada A-migrativa.
Proposição 4.4. Seja A : L2 → L uma uninorma com elemento neutro a ∈ L. Uma função
F : L2 → L é A-migrativa se e somente se existe uma função f : L → L tal que F (x, y) =
f(A(x, y)) para todos x, y ∈ L.
Demonstração. Suponha que F é uma função A-migrativa. Observe que se A(x, y) = A(z, w)
então F (x, y) = F (A(a, x), y) = F (a,A(x, y)) = F (a,A(z, w)) = F (A(a, z), w) = F (z, w).
Também, como a ∈ L é um elemento neutro de A, para todo z ∈ L segue-se que z = A(a, z) e
assim a função f : L → L dada por f(z) = F (x, y) tal que A(x, y) = z é uma função bem e
univocamente definida que satisfaz F (x, y) = f(A(x, y)) para todos x, y ∈ L. De fato, como
F é uma função A-migrativa, tem-se
F (a, z) = F (a,A(x, y))
= F (A(a, x), y)
= F (x, y).
Reciprocmente, suponha que existe f : L → L tal que F (x, y) = f(A(x, y)) para todos
x, y ∈ L. Assim, para todos x, y, α ∈ L segue-se que
72
F (A(α, x), y) = f(A(A(α, x), y))
= f(A(A(x, α), y)), pela comutatividade de A
= f(A(x,A(α, y))), pela associatividade de A
= F (x,A(α, y))
Portanto F é uma função A-migrativa.
Observação 4.3. Em particular, se a = 1L, então A é uma t-norma. A próxima proposição usa
este fato.
Proposição 4.5. Sob as condições da Proposição 4.4, se A é uma t-norma e F : L2 → L é
A-migrativa então,
(i) F é comutativa;
(ii) F (1L, 1L) = 1L se e somente se f(1L) = 1L;
(iii) F (0L, 0L) = 0L se e somente se f(0L) = 0L;
(iv) F é contínua se e somente se f e A são contínuas.
Demonstração. (i) Como A é uma t-norma, se F é A-migrativa então
F (x, y) = F (A(1L, x), y) = F (1L, A(x, y)) = F (1L, A(y, x)) = F (A(1L, y), x) =
F (y, x) para todos x, y ∈ L;
(ii) observe que F (1L, 1L) = 1L se e somente se f(1L) = f(A(1L, 1L)) = 1L;
(iii) análoga ao item (ii);
(iv) (⇒) Se F é contínua, deve-se mostrar que f e A são também contínuas. Pela Pro-
posição 4.4, existe uma função f : L → L tal que F (x, y) = f(A(x, y)) para
todos x, y ∈ L. Seja ∆ ⊆ L2 um conjunto dirigido. Afirmação: A(∆) = z ∈L | z = A(x, y), (x, y) ∈ ∆ é também um conjunto dirigido. De fato, como ∆
é um conjunto dirigido, para todos (u, v), (p, q) ∈ ∆, existe (r, s) ∈ ∆ tal que
(u, v) ≤L2 (r, s) e (p, q) ≤L2 (r, s). Assim, pela monotonicidade da t-norma A
segue-se que A(u, v) ≤ A(r, s) e A(p, q) ≤ A(r, s). Portanto A(∆) é um conjunto
dirigido. Além disso, como L é completo, segue-se que existe sup ∆ e supA(∆) e
também é fácil ver que A(sup ∆) = supA(∆). Portanto A é contínua. Ademais,
como F é contínua, tem-se
f(supA(∆)) = f(A(sup ∆)) = F (sup ∆) = supF (∆) = sup f(A(∆)).
73
Portanto f é contínua.
(⇐) Se f e A são funções contínuas então segue diretamente que F é contínua.
Teorema 4.2. Seja A : L2 → L uma uninorma. Uma função O : L2 → L é uma quasi-overlap
A-migrativa se e somente se O(x, y) = f(A(x, y)) vale para alguma função não-decrescente
f : L→ L tal que f(0L) = 0L e f(1L) = 1L.
Demonstração. Diretamente das Proposições 4.4 e 4.5.
Teorema 4.3. Sejam L um reticulado limitado, A : L2 → L uma uninorma e ⊗,⊕ : L2 → L
uma t-norma e uma t-conorma. Uma função F : L2 → L é A-migrativa se e somente se F é
dada por
F (x, y) =n⊕i=1
λi ⊗ Fi(x, y),
onde λi ∈ L tal quen⊕i=1
λi = 1L e FA = Fi : L2 → L |Fi é A-migrativa (i = 1, 2, . . . , n) é
uma família finita de funções peso A-migrativas.
Demonstração. Supondo que F é A-migrativa então tomando-se λ1 = λ2 = · · · = λn−1 = 0L
e λn = 1L segue-se que
F (x, y) =
n−1⊕i=1
0L ⊗ Fi(x, y)
⊕ (1L ⊗ F (x, y))
onden⊕i=1
λi = 1L e FA = F.
Reciprocamente, suponha que a função F : L2 → L é tal que
F (x, y) =n⊕i=1
λi ⊗ Fi(x, y),
onde λi ∈ L tal quen⊕i=1
λi = 1L e Fi ∈ FA. Como cada Fi é A-migrativa para todo α ∈ L
tem-se
F (A(α, x), y) =n⊕i=1
λi ⊗ Fi(A(α, x), y)
=n⊕i=1
λi ⊗ Fi(x,A(α, y))
= F (x,A(α, y)).
Portanto F é A-migrativa.
74
Corolário 4.1. Uma função dada por O(x, y) =n⊕i=1
λi ⊗ Oi(x, y) é uma A-migrativa quasi-
overlap se, e somente se, toda Oi pertence a uma família finita de pesos quasi-overlap
A-migrativas para todos x, y, λi ∈ L tal quen⊕i=1
λi = 1L e i = 1, 2, . . . , n.
4.3.2 Homogeneidade estendida
Lembre-se que uma função F : [0, 1]n → [0, 1] é chamada uma função homogênea de
ordem k ∈ N (ou simplesmente k-homogênea) se, para qualquer λ ∈ [0,∞[ e xi ∈ [0, 1],
i ∈ 1, . . . , n, tal que λxi ∈ [0, 1], vale que
F (λx1, . . . , λxn) = λkF (x1, . . . , xn). (4.7)
Por exemplo, o produto n-dimensional dado por
n∏i=1
xi = Π(x1, . . . , xn) = x1 · x2 · . . . · xn−1 · xn (4.8)
é uma função homogênea de ordem n.
Nesta seção pretende-se estender o conceito de funções homogêneas para funções overlap
sobre reticulados, a fim de fornecer uma caracterização desse tipo de funções por meio da noção
de potência de funções de duas variáveis.
Definição 4.7. Seja L um reticulado limitado e f : L2 → L uma função. A notação potência
λ(n)f , onde n ∈ N, é definida como:
λ(0)f = 1L
λ(1)f = λ
λ(n)f = f(λ, λ
(n−1)f ), (4.9)
para todo λ ∈ L.
Proposição 4.6. Se f : L2 → L é uma função associativa e 1L é o seu elemento neutro, então
λ(p+q)f = f(λ
(p)f , λ
(q)f ) para todos p, q ∈ N e λ ∈ L.
Demonstração. Fixado q > 0, a demonstração segue por indução sobre p.
Proposição 4.7. Seja ⊗ : L2 → L uma t-norma estrita1 sobre um reticulado L. Então
λ(p)⊗ ≤L λ
(q)⊗ ⇔ p ≥ q, para todos 0L <L λ <L 1L e p, q ∈ N.
1Lembre-se que uma t-norma T é estrita, se T é contínua e estritamente monotônica, i.e., T (x, y) <L T (x, z)sempre que 0 <L x e y <L z
75
Demonstração. (⇒) Pela contrapositiva, se p < q então, como ⊗ é estrita e 0L <L λ <L 1L,
tem-se que 0L <L λ(k+1)⊗ <L λ
(k)⊗ para cada k ∈ N. Portanto λ(q)
⊗ <L λ(p)⊗ .
(⇐) Se p > q então, como ⊗ é estrita e 0L <L λ <L 1L, tem-se que 0L <L λ(k+1)⊗ <L λ
(k)⊗ para
cada k ∈ N. Portanto λ(p)⊗ <L λ
(q)⊗ .
Observação 4.4. Observe que a notação potência λ(n)⊗ pode ser vista como o caso particular
de uma net não-crescente (an)n∈N cujo termo geral é an = λ(n)⊗ para todo λ ∈ L.
Definição 4.8. (Homogeneidade estendida) Seja L um reticulado limitado e f : L2 → L uma
função e k ∈ N∗. Uma função F : Ln → L é chamada uma extensão homogênea de ordem k
com respeito a f (ou apenas fk-homogênea) se
F (f(λ, x1), . . . , f(λ, xn)) = f(λ(k)f , F (x1, . . . , xn)) (4.10)
vale para todos λ, x1, . . . , xn ∈ L.
Observação 4.5. A Definição 4.8 generaliza a clássica noção de homogeneidade de ordem k
(cf. Igualdade em (4.7)). De fato, quando L = [0, 1] e f é o produto 2-dimensional como
definido em (4.8) é claro que para qualquer função k-homogênea F : [0, 1]n → [0, 1] tem-se
F (Π(λ, x1), . . . ,Π(λ, xn)) = F (λx1, . . . , λxn)
= λkF (x1, . . . , xn)
= Π(λ(k)Π , F (x1, . . . , xn)),
desde que λ(k)Π = λk por indução. Portanto F é também Πk-homogênea.
Teorema 4.4. Seja L um reticulado limitado, ρ : L → L um automorfismo e f : L2 → L uma
função tal que
ρ(f(x, y)) = f(ρ(x), ρ(y)) ∀x, y ∈ L (4.11)
Se F : Ln → L é uma função fk-homogênea então F ρ é também fk-homogênea.
Demonstração. Observe que (ρ(λ))(k)f = ρ
(λ
(k)f
)pela Definição 4.7 e Identidade (4.11).
Assim, assumindo que F é fk-homogênea, segue-se que
F ρ (f(λ, x1), . . . , f(λ, xn)) = ρ−1 (F (ρ(f(λ, x1)), . . . , ρ(f(λ, xn))))
= ρ−1 (F (f(ρ(λ), ρ(x1)), . . . , f(ρ(λ), ρ(xn)))) por (4.11)
= ρ−1(f((ρ(λ))
(k)f
), F (ρ(x1), . . . , ρ(xn))
)por (4.10)
= f(ρ−1
(ρ(λ(k)f
)), ρ−1 (F (ρ(x1), . . . , ρ(xn)))
)por (3.10)
= f(λ(k)f , F ρ(x1, . . . , xn)
).
76
Teorema 4.5. Seja ⊗ uma t-norma e ⊕ uma t-conorma, ambas sobre um reticulado limitado
L. Seja Fi : L2 → L uma família finita distributiva de ⊗ki-homogêneas funções de peso
(i = 1, 2, . . . , n) e F : L2 → L dada por
F (x, y) =n⊕i=1
wi ⊗ Fi(x, y),
onde pesos escalares wi ∈ L são tais quen⊕i=1
wi = 1L. Então F é ⊗k-homogênea se e somente
se para cada i ∈ 1, 2, . . . , n tal que wi >L 0L vale que ki = k.
Demonstração. Assuma que F é ⊗k-homogênea e considere o conjunto
I = i ∈ 1, . . . , n|wi >L 0L.
Então, como cada Fi é ⊗ki-homogênea tem-se que
F (λ⊗ x, λ⊗ y) =⊕i∈I
wi ⊗ Fi(λ⊗ x, λ⊗ y) =⊕i∈I
wi ⊗(λ
(ki)⊗ ⊗ Fi(x, y)
)
e também F (λ ⊗ x, λ ⊗ y) = λ(k)⊗ ⊗ F (x, y) = λ
(k)⊗ ⊗
(⊕i∈Iwi ⊗ Fi(x, y)
). Portanto, como a
família das⊗ki-homogêneas funções de peso Fi é distributiva e⊗ é associativa, segue-se que⊕i∈I
(wi ⊗ λ(k)
⊗
)⊗ Fi(x, y) =
⊕i∈I
(wi ⊗ λ(ki)
⊗
)⊗ Fi(x, y)
para cada λ ∈ L, que implica que k = ki para todo i ∈ I .
Reciprocamente, assumindo k = ki para todo i ∈ I tem-se
F (λ⊗ x, λ⊗ y) =⊕i∈I
wi ⊗ Fi(λ⊗ x, λ⊗ y)
=⊕i∈I
wi ⊗(λ
(k)⊗ ⊗ Fi(x, y)
)= λ
(k)⊗ ⊗
(⊕i∈I
wi ⊗ Fi(x, y)
)= λ
(k)⊗ ⊗ F (x, y).
Portanto F é ⊗k-homogênea.
Teorema 4.6. Seja ⊗ : L2 → L uma (∧ e ∨)-t-norma distributiva sobre um reticulado L tal
que o par 〈L,⊗〉 é divisível. Uma função F : L2 → L é⊗k-homogênea, tem 1L como elemento
77
neutro e satisfaz F (x, y) = F (x ∧ y, x ∨ y) para todos x, y ∈ L se e somente se
F (x, y) = (x ∧ y)⊗ (x ∨ y)(k−1)⊗ , para todos x, y ∈ L. (4.12)
Demonstração. (⇒) Suponha F (x, y) = F (x ∧ y, x ∨ y) para todos x, y ∈ L. Como o par
〈L,⊗〉 é divisível e x∧ y ≤L x∨ y, existe m ∈ L tal que (x∨ y)⊗m = x∧ y. Portanto, desde
que F é ⊗k-homogênea com elemento neutro 1L tem-se que
F (x, y) = F (x ∧ y, x ∨ y)
= F (m⊗ (x ∨ y), x ∨ y)
= (x ∨ y)(k)⊗ ⊗ F (m, 1L)
= m⊗ (x ∨ y)(k)⊗
= (x ∧ y)⊗ (x ∨ y)(k−1)⊗ .
(⇐) Considere F como definida na Equação 4.12. Note que 1L é o elemento neutro para F
desde que para todo x ∈ L e k ∈ N∗ tem-se x ∧ 1L = x, x ∨ 1L = 1L e (1L)(k−1)⊗ = 1L que
implica que F (1L, x) = F (x, 1L) = x⊗ 1L = x. Além disso, se r = x ∧ y e s = x ∨ y então,
pela Equação 4.12,
F (r, s) = (r ∧ s)⊗ (r ∨ s)(k−1)⊗ = r ⊗ s(k−1)
⊗ .
Portanto F (x, y) = F (x ∧ y, x ∨ y) para todos x, y ∈ L. Agora, se x ¨ y, sem perda de
generalidade assuma que x ≤L y e assim λ⊗ x ≤L λ⊗ y para todo λ ∈ L. Então, vale que
F (λ⊗ x, λ⊗ y) = (λ⊗ x)⊗ (λ⊗ y)(k−1)⊗
= (λ)(k)⊗ ⊗
(x⊗ (y)
(k−1)⊗
)= (λ)
(k)⊗ ⊗ ((x ∧ y)⊗ (x ∨ y)
(k−1)⊗ )
= (λ)(k)⊗ ⊗ F (x, y).
Finalmente, se x ‖ y deve-se mostrar que F (λ ⊗ x, λ ⊗ y) = λ(k)⊗ ⊗ F (x, y), ∀λ ∈ L. Então,
pela Equação 4.12,
F (λ⊗ x, λ⊗ y) = [(λ⊗ x) ∧ (λ⊗ y)]⊗ [(λ⊗ x) ∨ (λ⊗ y)](k−1)⊗ . (4.13)
Além disso, como ⊗ é (∧ e ∨)-distributiva, tem-se
(λ⊗ x) ∧ (λ⊗ y) = λ⊗ (x ∧ y)
(λ⊗ x) ∨ (λ⊗ y) = λ⊗ (x ∨ y).
78
Portanto a Equação 4.13 pode ser reescrita como
F (λ⊗ x, λ⊗ y) = [λ⊗ (x ∧ y)]⊗ [λ⊗ (x ∨ y)](k−1)⊗
= λ(k)⊗ ⊗ (x ∧ y)⊗ (x ∨ y)(k−1)
⊗
= λ(k)⊗ ⊗ F (x, y).
Portanto F é ⊗k-homogênea.
Observação 4.6. Observe que a função F definida na Equação 4.12 não é necessariamente
uma quasi-overlap, como o Axioma (OL2) na Definição 4.1 pode falhar se x ‖ y.
Corolário 4.2. A função F como definida na Equação 4.12 é uma quasi-overlap se e somente
se L é uma cadeia.
Demonstração. Diretamente do Teorema 4.6 e Definição 4.1.
Teorema 4.7. Seja ⊗ : L2 → L uma (∧ e ∨)-t-norma distributiva sobre um reticulado limitado
L tal que o par 〈L,⊗〉 é divisível e F1, F2 : L2 → L funções ⊗-homogêneas de ordem k1
e k2, respectivamente, tal que F1 e F2 têm 1L como elemento neutro e satisfazem Fi(x, y) =
Fi(x ∧ y, x ∨ y), i ∈ 1, 2, para todos x, y ∈ L. sob estas condições, F1 ≤L F2 se, e somente
se, k1 ≥ k2.
Demonstração. (⇒) Observe que para todo λ ∈ L\0L, 1L tem-se λ(k1)⊗ , λ
(k2)⊗ ∈ L\0L, 1L.
Além disso, pela Equação 4.10:
F1 (λ⊗ x, λ⊗ y) = λ(k1)⊗ ⊗ F1(x, y) e F2 (λ⊗ x, λ⊗ y) = λ
(k2)⊗ ⊗ F2(x, y).
Então, como para cada i = 1, 2 a função Fi : L2 → L é ⊗ki-homogênea, pelo Teorema 4.6, se
F1 ≤L F2, então pela Equação (4.12), no caso em que x = y = 1L, tem-se que λ(k1)⊗ ≤L λ(k2)
⊗ e
assim pela Proposição 4.7, k1 ≥ k2.
(⇐) Pelo Teorema 4.6 deve-se considerar dois casos:
(Caso 1) Se x = y = 0L então F1(x, y) = 0L ≤L F2(x, y) = 0L. Se 0 <L x, y e
x ¨ y então sem perda de generalidade pode-se considerar que x ≤L y. Neste
caso, desde que k1 ≥ k2, pela Proposição 4.7 tem-se y(k1)⊗ ≤L y
(k2)⊗ e assim
y(k1)⊗ ⊗ z ≤ y
(k2)⊗ ⊗ z para todos y, z ∈ L. Então, desde que 〈L,⊗〉 é divisível
existe z ∈ L tal que y ⊗ z = x. Portanto, desde que Fi é ⊗ki homogênea para
79
i = 1, 2 então
F1(x, y) = F1(y ⊗ z, y ⊗ 1L)
= y(k1)⊗ ⊗ F1(z, 1L)
= y(k1)⊗ ⊗ z
≤L y(k2)⊗ ⊗ z
= y(k2)⊗ ⊗ F1(z, 1L)
= F2(y ⊗ z, y ⊗ 1L)
= F2(x, y).
(Caso 2) x ‖ y. Neste caso, desde que o par 〈L,⊗〉 é divisível existe m ∈ L tal que
(x ∨ y) ⊗m = x ∧ y. Portanto, para i ∈ 1, 2, Fi(x, y) = Fi (x ∧ y, x ∨ y) =
Fi ((x ∨ y)⊗m,x ∨ y). Deste ponto em diante o raciocínio é análogo ao caso
anterior.
De acordo com o Corolário 4.2, quando L é uma cadeia, cada Fi (i = 1, 2) é uma função
overlap. Então segue o seguinte resultado:
Corolário 4.3. Seja ⊗ : L2 → L uma t-norma sobre uma cadeia L tal que o par 〈L,⊗〉 é
divisível e sejam O1, O2 : L2 → L funções quasi-overlap ⊗-homogêneas de ordem k1 e k2,
respectivamente. Então, vale que:
(i) Se O1 ≤L O2 então k1 ≥ k2;
(ii) sempre que O1 e O2 têm 1L como elemento neutro, se k1 ≥ k2 então O1 ≤L O2.
Demonstração. Segue diretamente do Teorema 4.7.
4.3.3 Idempotência
Lembre-se que um elemento a ∈ L é um elemento idempotente de uma função f : L2 → L,
se f(a, a) = a. No caso de cada elemento a ∈ L ser um elemento idempotente de f , então f
é chamada de função idempotente. Note que 0L e 1L são elementos idempotentes triviais para
qualquer função overlap O.
80
Proposição 4.8. Seja O : L2 → L uma função overlap. Se limx→a+
O(x, x) = a, para algum
a ∈ L\0L, 1L, então a é um elemento idempotente de O.
Demonstração. Se limx→a+
O(x, x) = a então pela Definição 2.40 tem-se que a é um eventual
limite inferior de uma net (xi)i∈J em L e limi∈J xi = a implica limi∈J O(xi, xi) = a. Além
disso, como O é contínua tem-se que
O(a, a) = O
(limi∈J
xi, limi∈J
xi
)= lim
i∈JO(xi, xi)
= a.
Proposição 4.9. Seja O : L2 → L uma função quasi-overlap e a ∈ L. Se a é um elemento
idempotente de O, então existe x ∈ L tal que a = limn→∞
x(n)O , i.e, a é um eventual limite superior
de uma net (x(n)O )n∈N.
Demonstração. Se a é um elemento idempotente de O então a(n)O = a para todo n ∈ N e assim
a = limn→∞
a(n)O .
4.3.4 Lei de cancelamento
Definição 4.9. Uma função quasi-overlap O : L2 → L satisfaz a lei de cancelamento se
O(x, y) = O(x, z) implica que x = 0L ou y = z. Neste caso, O é chamada uma quasi-overlap
cancelativa.
Exemplo 4.2. Seja L = 〈[0, 1],≤〉 um reticulado limitado. A função ODB : L2 → L dada por
ODB(x, y) =
2xy
x+ y, se x+ y 6= 0;
0, caso contrário.
é uma overlap que satisfaz a lei de cancelamento (DIMURO; BEDREGAL, 2014, Exemple 4.5).
Teorema 4.8. Se uma função quasi-overlapO : L2 → L é cancelativa, então ela é estritamente
crescente, i.e. O(x, y) <L O(x, z) sempre que y <L z e 0L <L x.
Demonstração. Suponha que y <L z, 0L <L x e que O é cancelativa. Por (OL4), tem-se
O(x, y) ≤L O(x, z). Considere O(x, y) = O(x, z). Então, como O é cancelativa, x = 0L ou
y = z, que é uma contradição. Portanto, conclui-se que O(x, y) <L O(x, z).
81
Exemplo 4.3. Seja L o reticulado limitado na Figura 9. Então OL : L2 → L dado na tabela 1
é uma função overlap que não satisfaz a lei de cancelamento, desde que ela não é estritamente
crescente. Por exemplo, OL(b, c) = OL(b, d) no entanto b 6= 0L e c 6= d. Na verdade, não existe
overlap cancelativas em reticulados limitados finitos, como se pode ver no Corolário 4.4.
L
1L
d
b c
a
0L
@@@
@@@
Figura 9: Diagrama de Hasse do reticulado L
OL(·, ·) 0L a b c d 1L
0L 0L 0L 0L 0L 0L 0La 0L a b c d db 0L b b d d dc 0L c d d d dd 0L d d d d d1L 0L d d d d 1L
Tabela 1: Tabela da função overlap OL.
Corolário 4.4. Não existem funções quasi-overlap cancelativas sobre reticulados finitos.
Demonstração. Suponha que L é reticulado finito e O é uma função quasi-overlap cancelativa
sobre L. Então, pelo Teorema 4.8 a quasi-overlap O é estritamente crescente, i.e. O(x, y) <L
O(x, z) sempre que y <L z e 0L <L x que implica O restrito a x × L (para um dado
x ∈ L\0L, 1L) deve ser uma função injetiva sobreL\1Lo que é contradição com o princípio
das gavetas.
Sabe-se da literatura que a monotonicidade estrita e o cancelamento são propriedades equi-
valentes para funções overlap no intervalo unitário com a ordem linear padrão (ver (DIMURO;
BEDREGAL, 2014)). No entanto, o próximo exemplo revela que isso não é verdade para as
funções L-overlap.
Exemplo 4.4. Seja α um número real tal que 0 < α < 1 e L = [0, 1] ∪ α o reticulado com
ordem usual restrito para [0, 1] e x ‖ α para todo 0 < x < 1. Então, a aplicação definida por
82
(i) O(x, y) = x · y se x, y ∈ [0, 1];
(ii) O(x, α) = O(α, x) = x2
se x ∈ [0, 1] e
(iii) O(α, α) = 0.4
é uma função L-overlap que é estritamente crescente mas não é cancelativa, desde que
O(0.8, 0.5) = 0.4 = O(0.8, α), mas 0.5 ‖ α.
Teorema 4.9. Se uma função quasi-overlap O : L2 → L é estritamente crescente e satisfaz
O(x, y ∨ z) = O(x, y) ∨O(x, z), para todos x, y, z ∈ L então ela é cancelativa.
Demonstração. Se O é estritamente crescente, então O(x, u) <L O(x, v) sempre que u <L v
e 0L <L x. Suponha que O é não cancelativa. Então, existe x, y, z ∈ L com x 6= 0 tal que
O(x, y) = O(x, z) e y 6= z, i.e., ou y <L z, ou z <L y, ou y ‖ z. Considerando y <L z pode-se
concluir que O(x, y) <L O(x, z) desde que O é estritamente crescente, que é uma contradição.
Similamente, o mesmo resultado é obtido para z <L y. Agora considere que y ‖ z. Desde que L
é um reticulado, segue-se que y∨z existe. Portanto, comoO é estritamente crescente, tem-se que
O(x, y) <L O(x, y ∨ z) e O(x, z) <L O(x, y ∨ z). Entretanto, O(x, y)∨O(x, z) = O(x, y ∨ z)
e isto é suficiente para concluir que O(x, y) ‖ O(x, z). Portanto, O é cancelativa.
Corolário 4.5. Seja L uma cadeia. Uma função quasi-overlap O : L2 → L é cancelativa se, e
somente se, ela é estritamente crescente.
Demonstração. A condição suficiente segue do Teorema 4.8. Para ver a condição necessária
basta considerar o Teorema 4.9 uma vez que a condição O(x, y ∨ z) = O(x, y) ∨ O(x, z)
trivialmente é satisfeita por qualquer função overlap quando L é uma cadeia.
4.4 quasi-overlap arquimedianas e propriedades relacionadas
Dada uma álgebra 〈X,〉, a operação tem a propriedade arquimediana se, à exceção
do elemento neutro, para cada par x, y ∈ X , existe um n ∈ N∗ tal que x · · · x︸ ︷︷ ︸n−vezes
< y.
Este conceito pode naturalmente ser estendido para outros contextos, incluindo para reticulados
(DIMURO; BEDREGAL, 2014). Aqui será discutido sobre essa propriedade para as funções L-
overlap da seguinte forma.
Definição 4.10. Seja L um reticulado limitado. Uma função quasi-overlap O : L2 → L é
chamada arquimediana se para cada x, y ∈ L\ 0L, 1L existe n ∈ N∗ tal que x(n)O <L y, onde
x(n)O é dada na Equação 4.9.
83
Exemplo 4.5. Seja ⊗ : L2 → L uma t-norma estrita contínua. é fácil ver que a função
Op : L2 → L dada porOp(x, y) = x(p)⊗ ⊗y
(p)⊗ com p > 1 é uma função overlap. Desde que para
todo n ∈ N∗ verifica-se que x(n)Op
= x(2pn−1+pn−2+pn−3+...+p)⊗ então para todos x, y ∈ L\ 0L, 1L
vale que limn→∞
x(n)Op
= limn→∞
x(2pn−1+pn−2+pn−3+...+p)⊗
(Prop.4.7)= 0L <L y. Portanto Op é uma função
overlap arquimediana.
Lema 4.1. Seja O : L2 → L uma função quasi-overlap arquimediana. Então para todo
x ∈ L\ 0L, 1L vale que O(x, x) <L x ou O(x, x) ‖ x.
Demonstração. Como O é arquimediana existe n ∈ N∗ tal que x(n)O <L x e assim n 6= 1 desde
que x(1)O = x. Então, tendo o mínimo n 6= 1 tal que x(n)
O <L x segue-se que x(n−1)O ≥L x ou
x(n−1)O ‖ x. Se x(n−1)
O ≥L x então O(x, x) ≤L O(x
(n−1)O , x
)= x
(n)O <L x. Por outro lado, se
x(n−1)O ‖ x então tem-se as seguintes possibilidades:
(i) Suponha que O(x
(n−1)O , x
)= x
(n)O e O(x, x) são incomparáveis. Observe que se
x ≤L O(x, x) deve-se ter x(n)O <L x ≤L O(x, x) que é uma contradição com
x(n)O ‖ O(x, x). Portanto deve-se ter O(x, x) <L x ou O(x, x) ‖ x;
(ii) No caso x(n)O = O
(x
(n−1)O , x
)≥L O(x, x) segue-se que O(x, x) ≤L x(n)
O <L x;
(iii) Finalmente, suponha que x(n)O = O
(x
(n−1)O , x
)≤L O(x, x). Neste caso, devido a
x(n)O <L x tem-se O(x, x) <L x ou O(x, x) ‖ x. De fato, se x ≤L O(x, x) então
aplicando a função O (n− 2) vezes conseguimos a cadeia:
x ≤L x(2)O ≤L x
(3)O ≤L . . . ≤L x
(n−1)O ≤L x(n)
O <L x,
que é, obviamente, uma contradição.
O resultado acima é generalizado no seguinte teorema.
Teorema 4.10. Seja O : L2 → L uma função quasi-overlap arquimediana. Então para todo
x ∈ L\ 0L, 1L vale que x(n+1)O <L x
(n)O ou x(n+1)
O ‖ x(n)O .
Demonstração. A prova segue-se por indução sobre n. De fato, para n = 1 pelo Lema 4.1
tem-se que x(2)O = O(x, x) <L x = x
(1)O ou x(2)
O ‖ x(1)O .
Agora, para um dado p ∈ N∗ assuma como hipótese de indução que
x(p+1)O <L x
(p)O ou x
(p+1)O ‖ x(p)
O (HI)
84
Será provado que x(p+2)O <L x
(p+1)O or x(p+2)
O ‖ x(p+1)O . De fato, suponha por absurdo que
x(p+1)O ≤L x
(p+2)O . Assim, por (HI), se x(p+1)
O <L x(p)O devido a O ser não decrescente então
x(p+2)O = O
(x
(p+1)O , x
)<L O
(x
(p)O , x
)= x
(p+1)O o que é uma contradição com a suposição
x(p+1)O ≤L x
(p+2)O . Caso contrário, suponha por (HI) que tem-se x(p+1)
O e x(p)O incomparáveis.
Observe que existe m ∈ N∗ tal que x(m)O <L x, para todo x ∈ L\ 0L, 1L desde que O é
arquimediana. Portanto, aplicando (p − 1)-vezes a overlap O tem-se x(p+m−1)O <L x
(p)O . Por
outro lado, por suposição x(p+1)O ≤L x(p+2)
O pode-se pegar a cadeia
x(p+1)O ≤L x(p+2)
O ≤L x(p+3)O ≤L . . . ≤L x(p+m−1)
O ≤L . . . ≤L 1L.
e assim x(p+1)O ≤L x
(p+m−1)O <L x
(p)O que é uma contradição com a suposição x(p+1)
O ‖ x(p)O .
Portanto, deve-se ter x(p+2)O <L x
(p+1)O ou x(p+2)
O ‖ x(p+1)O .
Lema 4.2. Uma função quasi-overlap arquimediana tem apenas elementos idempotentes trivi-
ais.
Demonstração. Suponha que existe um elemento idempotente x ∈ L\0L, 1L de uma função
L-overlap O. Neste caso, observe que x(2)O = O(x, x) = x, x(3)
O = O(x, x(2)O ) = O(x, x) = x e
assim x(n)O = x para todo 1 < n ∈ N. Então para todo y ∈ L\0L, 1L tal que x >L y vale que
x(n)O = x >L y para todo 1 < n ∈ N que é uma contradição com o fato que O é uma função
quasi-overlap arquimediana. Portanto O tem apenas elementos idempotentes triviais.
Definição 4.11. Uma função overlap O : L2 → L tem a “propriedade limitadora” se
limn→∞
x(n)O = 0L para todo x ∈ L\0L, 1L.
Teorema 4.11. Seja O : L2 → L uma função overlap e considere as seguintes afirmações:
(i) O satisfaz a propriedade limitadora;
(ii) O é arquimediana;
(iii) O tem apenas elementos idempotentes triviais e existe b ∈ L\0L, 1L tal que
O(b, b) = a sempre que limx→a+
O(x, x) = a para algum a ∈ L\0L, 1L.
Então: (i)⇒ (ii), (ii)⇒ (iii) e (i)⇒ (iii).
Demonstração. (i) ⇒ (ii) Se O satisfaz a propriedade limitadora, então para todo
x ∈ L\0L, 1L vale que limn→∞
x(n)O = 0L. Portanto, para todo x ∈ L\0L, 1L existe n ∈ N∗ tal
que x(n)O <L y.
85
(ii)⇒ (iii) Se O é arquimediana, então pelo Lema 4.2 tem apenas elementos idempotentes tri-
viais. Agora, considere que limx→a+
O(x, x) = a para algum a ∈ L\0L, 1L e O(y, y) >L a ou
O(y, y) ‖ a para todo y ∈ L\0L, 1L. Então, para todos y1, y2 ∈ L\0L, 1L tem-se duas
possibilidades:
(1) y1 e y2 são comparáveis. Neste caso, pode-se assumir sem perda de generalidade que
y1 ≤L y2 e assim, O(y1, y2) ≥L O(y1, y1) >L a ou O(y1, y2) ≥L O(y1, y1) mas
O(y1, y2) ‖ a. Portanto, para todo y ∈ L\0L, 1L vale que y(2)O = O(y, y) >L a ou
y(2)O ‖ a. Agora assuma que y(n)
O >L a ou y(n)O ‖ a para algum 1 < n ∈ N. Então,
desde que y(n)O <L y ou y(n)
O ‖ y (pelo Teorema 4.10), vale que y(n+1)O = O(y, y
(n)O ) ≥L
O(y(n)O , y
(n)O ) >L a ou y(n+1)
O ‖ a. Portanto, para todo n ∈ N∗ conclui-se que y(n)O >L a
ou y(n)O ‖ a que contradiz o fato de O ser arquimediana.
(2) y1 ‖ y2. Neste caso também tem-se duas possibilidades. A primeira é o caso onde
O(y2, y2) eO(y1, y1) são comparáveis. Então, a prova é análoga ao caso (1). A segunda
é o caso onde O(y1, y2) ‖ O(y1, y1). Neste caso, será provado que O(y1, y2) >L a ou
O(y1, y2) ‖ a. De fato, se O(y1, y2) ≤L a vale então pela Definição 2.40 que existem
nets (qr)r∈N e (qs)s∈N em L que convergem para y1 e y2 respectivamente, desde que
a é eventual limite inferior. Então, existe k > maxs0, r0 tal que O(qk, qk) ≤L qk.
desde que qk ∈ L\0L, 1L e O tem apenas elementos idempotentes triviais, segue-se
pelo Teorema 4.10 que O(qk, qk) <L qk implica a = limk→∞
O(qk, qk) <L limk→∞
qk = a ou
a = limk→∞
O(qk, qk) ‖ limk→∞
qk = a, que é uma contradição.
Portanto sempre existe b ∈ L\0L, 1L tal que O(b, b) = a, para algum a ∈ L\0L, 1L tal que
limx→a+
O(x, x) = a.
(i)⇒ (iii) direto.
86
5 implicações residuadas derivadas deQuasi-overlap sobre reticulados
Neste capítulo, é introduzido o conceito de implicações residuadas derivadas de funções
quasi-overlap sobre reticulados e prova-se algumas propriedades relacionadas. Além disso, é
formalizado o princípio de residuação para o caso de funções quasi-overlap sobre reticulados
e suas respectivas implicações induzidas, bem como revelado que a classe de funções quasi-
overlap que cumprem o princípio de residuação é a mesma classe de funções contínuas segundo
a topologia de Scott. A continuidade de Scott e a noção de posets com ordem densa são uti-
lizadas para obter um teorema de classificação para funções quasi-overlap residuadas. Ainda
neste capítulo, os conceitos de automorfismos e pseudo-automorfismos são estendidos para o
contexto de funções quasi-overlap sobre reticulados, com vistas a obter funções quasi-overlap
conjugadas pela ação de automorfismos, bem como obter funções quasi-overlap pela distorção
de t-normas.
5.1 Implicações induzidas de quasi-overlap sobre reticulados
Definição 5.1. Seja L um reticulado limitado. Uma operação binária I : L2 → L é chamada
uma implicação fuzzy se ela é decrescente na primeira entrada, e não-decrescente com respeito
a segunda entrada. Além disso, I(0L, 0L) = I(0L, 1L) = I(1L, 1L) = 1L e I(1L, 0L) = 0L.
No que segue, apresentamos algumas propriedades que podem ser necessárias para impli-
cações fuzzy, que são consideradas nessa tese.
Definição 5.2. Dizemos ainda que uma implicação fuzzy I cumpre:
(PN) Princípio da Neutralidade: I(1L, y) = y, y ∈ L;
(PT) Princípio de Troca: I(x, I(y, z)) = I(y, I(x, z)) x, y, z ∈ L;
(PI) Princípio da Identidade: I(x, x) = 1L x ∈ L;
87
(PO) Princípio da Ordem: x ≤L y ⇔ I(x, y) = 1L x, y ∈ L.
Lema 5.1. Seja L um reticulado completo. Dada uma quasi-overlap O : L2 → L, a função
definida pela fórmula
IO(x, y) = supt ∈ L |O(x, t) ≤L y, ∀x, y ∈ L (5.1)
é não-decrescente com respeito à segunda entrada e decrescente com respeito à primeira en-
trada.
Demonstração. Com efeito, primeiro observe que a função IO é bem definida. Fixe x, y ∈ L e
denote
R(x, y) := t ∈ L |O(x, t) ≤L y. (5.2)
Desde que 0L ≤L O(x, 0L) = 0L, segue-se que 0L ∈ R(x, y). Isto significa que R(x, y) 6= ∅ e,
desde que L é completo, exite supR(x, y) em L. Sejam x, y, v ∈ L, com y ≤L v. Então
t ∈ L |O(x, t) ≤L y ⊆ t ∈ L |O(x, t) ≤L v
e, portanto, supt ∈ L |O(x, t) ≤L y ≤L supt ∈ L |O(x, t) ≤L v, ou seja, IO(x, y) ≤LIO(x, v). Isto significa que a função IO é não-decrescente na segunda entrada. Agora, sejam
x, u, y ∈ L, com x ≤L u. Da monotonicidade de O com respeito a primeira entrada tem-se que
O(x, t) ≤L O(u, t), para todo t ∈ L. Portanto,
t ∈ L |O(u, t) ≤L y ⊆ t ∈ L |O(x, t) ≤L y,
então supt ∈ L |O(u, t) ≤L y ≤L supt ∈ L |O(x, t) ≤L y e, portanto, IO(u, y) ≤LIO(x, y). Logo IO é decrescente na primeira entrada.
Lema 5.2. Se O é uma quasi-overlap sobre um reticulado completo L, então IO(0L, 0L) =
IO(0L, 1L) = IO(1L, 1L) = 1L e IO(1L, 0L) = 0L, onde IO é definida por (5.1).
Demonstração. Como toda quasi-overlap satisfaz (OL2) e (OL3) da Definição 4.1, tem-se
• IO(0L, 0L) = supt ∈ L |O(0L, t) ≤L 0L = 1L;
• IO(0L, 1L) = supt ∈ L |O(0L, t) ≤L 1L = 1L;
• IO(1L, 1L) = supt ∈ L |O(1L, t) ≤L 1L = 1L;
• IO(1L, 0L) = supt ∈ L |O(1L, t) ≤L 0L = 0L.
88
Definição 5.3. SejaO uma quasi-overlap sobre um reticulado completoL. A função IO definida
por (5.1) é chamada a implicação induzida por O.
Na próxima seção será formalizado o conceito RO-implicações (implicações induzidas de
quasi-overlap residuadas).
5.2 Quasi-overlap residuadas e suas RO-implicações
A fim de desenvolver a noção de residuação para quasi-overlap e suas respectivas implica-
ções induzidas, é preciso explorar alguns fatos importantes sobre determinada classe de reticu-
lados, qual seja, a classe dos reticulados completos de ordem densa. O primeiro fato segue das
Proposições 2.11 e 2.13, que declaram que todo reticulado completo de ordem densa é com-
pacto e denso na topologia de Scott. Um outro ponto que merece destaque é o fato de que esses
espaços não necessariamente devem possuir uma ordem total definida sobre eles. Considere o
conjunto dos subintervalos de [0, 1] definido como I([0, 1]) = [a, b] | a ≤ b and a, b ∈ [0, 1],munido com a ordem produto “” definida como segue:
[u, v] [p, q] se, e somente se, u ≤ p e v ≤ q
onde “≤” é a ordem usual de R. Em (PAIVA; SANTIAGO; BEDREGAL, 2019, Proposição 2) é
provado que o conjunto dos subintervalos de um reticulado completo L, munido com a ordem
produto, é um reticulado completo com ordem parcial. Em particular, 〈I([0, 1]),〉 é um re-
ticulado completo parcialmente ordenado. Além disso, uma vez que [0, 1] é de ordem densa,
segue-se que I([0, 1]) também é de ordem densa. Por outro lado, o intervalo [0, 1] munido da
ordem usual dos reais é também um reticulado completo de ordem densa. Por fim, um último
ponto a ser discutido sobre este tema está ligado à questão da convergência, o qual é esclarecido
no próximo lema.
Lema 5.3. Se L é um reticulado completo de ordem densa, então L é Hausdorff.
Demonstração. Sejam x, y ∈ L, então temos as seguintes possibilidades:
(i) x ‖ y: Neste caso, x, y <L supx, y. Então, da densidade de L, existem x0, y0 ∈ Ltais que x <L x0 <L supx, y e y <L y0 <L supx, y. Vamos mostrar que
os conjuntos B = w ∈ L |x ≤L w <L x0 e C = u ∈ L | y ≤L u <L y0 são
abertos não-vazios de L na topologia de Scott e queB∩C = ∅. Com efeito, primeiro
89
observe que por definição int(B) ⊆ B sempre vale. Por outro lado, se b ∈ B ⊆ L,
então x ≤L b <L x0 e mais, o conjunto ↑ x ∩ B = r ∈ B |x ≤L r é um aberto
de B na topologia de Scott induzida de L. Portanto, pelo item (iv) do Lema 2.6,
b ∈ int(B) = r ∈ B | ↑ r ⊆ B. Ou seja, B é um aberto de L que contém x.
Analogamente mostra-se que C = int(C). Ou seja, C é um aberto de L que contém
y. Além disso, se B ∩C 6= ∅ então existe α ∈ L tal que x ≤L α e y ≤L α, o que leva
a uma contradição com supx, y.
(ii) x ¨ y: Neste caso, assuma sem perda de generalidade x <L y. Da densidade de L
existe z ∈ L tal que x <L z <L y. Defina os conjuntos M = p ∈ L |x ≤L p <L ze ↑z = q ∈ L | z ≤L q. Observe que M é um aberto de L que contém x e ↑z é um
aberto de L que contém y. Ademais, M∩ ↑z = ∅.
Portanto, segue-se que o reticulado L é um espaço de Hausdorff.
Observação 5.1. O Lema 5.3 juntamente com a Proposição 2.18 garantem a unicidade da
convergência de nets convergentes em um reticulado completo de ordem densa.
Seja L um reticulado completo de ordem densa. Para cada x ∈ L fixado defina as funções
Ox, IOx : L → L por Ox(z) = O(x, z) e IOx(y) = IO(x, y), para todos y, z ∈ L, onde O
é uma quasi-overlap e IO a sua implicação induzida. Nesta seção, será apresentada sob quais
condições Ox e IOx representam uma família de funções residuadas e sua respectiva família de
resíduos.
Definição 5.4. Diz-se que o par (O, IO) satisfaz o princípio de residuação sempre que
O(x, z) ≤L y ⇔ z ≤L IO(x, y) ∀x, y, z ∈ L. (5.3)
O próximo teorema revela que a classe de quasi-overlap que cumprem o princípio de resi-
duação é classe de funções contínuas segundo a topologia de Scott.
Teorema 5.1. Seja L um reticulado completo de ordem densa e O uma quasi-overlap sobre L.
Então, os seguintes itens são equivalentes:
(i) O é contínua;
(ii) O e IO satisfazem o princípio de residuação;
(iii) IO(x, y) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L y.
90
Demonstração. ((i) ⇒ (ii)): Para quaisquer x, y, z ∈ L suponha que O(x, z) ≤L y. Então
z ∈ R(x, y) (cf. Equação (5.2)). Assim, z ≤L supR(x, y) = IO(x, y). Agora assuma que para
x, y, z ∈ L tem-se z ≤L IO(x, y). Se z <L IO(x, y) então, desde que L é de ordem densa,
existe t0 ∈ L tal que z <L t0 <L IO(x, y) e O(x, t0) ≤L y. Da monotonicidade de O tem-se
que O(x, z) ≤L y. Por outro lado, se z = IO(x, y), então temos duas possibilidades:
(P1) z ∈ R(x, y): Neste caso obviamente que O(x, z) ≤L y;
(P2) z /∈ R(x, y): Neste caso, como L é completo e de ordem densa, então L é compacto
e denso na topologia de Scott. Assim, pela Proposição 2.17, existe uma net não-
decrescente (zj)j∈J em L tal que zj <L z e O(x, zj) ≤L y, para todo j ∈ J . Vamos
mostrar que z = limj∈Jzj . De fato, seja A um aberto de Scott contendo z. Desde que
zj ∈ L |O(x, zj) ≤L y é dirigido (pois (zj) é não-decrescente) e z = supzj ∈L |O(x, zj) ≤L y, então pelo item (ii) da Definição 2.31 (abertos de Scott), segue-se
zj ∈ L |O(x, zj) ≤L y∩A 6= ∅. Portanto, para algum i ∈ J , temos que xj ∈ A para
todo j ≥ i. Assim, pela Definição 2.36, temos que zj → z. Ou seja, z = limj∈Jzj .
Finalmente, desde que O é contínua, pela Proposição 2.19
O(x, z) = O(x, limj∈Jzj) ≤L limj∈JO(x, zj) ≤L y. (5.4)
Portanto, de qualquer modo tem-se que O(x, z) ≤L y.
((ii) ⇒ (iii)): Assuma que o par (O, IO) satisfaz o princípio de residuação. Então, desde que
IO(x, y) ≤L IO(x, y) para todos x, y ∈ L, segue-se que O(x, IO(x, y)) ≤L y. Isto significa que
IO(x, y) ∈ R(x, y) e supR(x, y) = maxR(x, y).
((iii) ⇒ (i)): Suponha que IO(x, y) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L y para todos x, y ∈ L.
Devemos mostrar que O(x, supzj | j ∈ J
)= supO(x, zj) | j ∈ J, para cada x ∈ L e
para qualquer net não-decrescente (zj)j∈J em L. Por um lado, da monotonicidade de O e pela
definição de supremo, segue-se que
supO(x, zj) | j ∈ J ≤L O(x, supzj | j ∈ J
)(5.5)
Por outro lado, seja w = supO(x, zj) | j ∈ J. Então O(x, zj) ≤L w e assim, para todo j ∈ J ,
zj ∈ t ∈ L |O(x, t) ≤L w e, consequentemente, zj ≤L IO(x,w) para todo j ∈ J . Portanto,
pela monotonicidade de O tem-se
O
(x, supzj | j ∈ J
)≤L O(x, IO(x,w)) ≤L w = supO(x, zj) | j ∈ J. (5.6)
Portanto, das desigualdade 5.5 e 5.6, conclui-se que O é contínua.
91
Definição 5.5. As funçõesO e IO são, respectivamente, chamadas de quasi-overlap residuada e
implicação residuada (ouRO-implicação), se qualquer um dos itens do Teorema 5.1 se verifica.
No que segue, propriedades que RO-implicações e sua quasi-overlap residuada satisfazem
são apresentadas.
Proposição 5.1. Seja L um reticulado completo de ordem densa e O uma quasi-overlap resi-
duada sobre L. Então:
(i) IO satisfaz (PN) se, e somente se, 1L é elemento neutro de O;
(ii) IO satisfaz (PT) se, e somente se, O é associativa;
(iii) IO satisfaz (PI) se, e somente se, O é deflacionária: O(x, 1L) ≤L x, x ∈ L;
(iv) IO satisfaz (PO) se, e somente se, O tem elemento neutro 1L.
Demonstração. A prova é baseada em considerações semelhantes à (KRÓL, 2011). Porém adap-
tada para o contexto de reticulados. Com efeito,
(i) (⇒) Suponha que para todo y ∈ L
IO(1, y) = maxt ∈ L |O(1L, t) ≤L y = y. (5.7)
Então para um arbitrário y ∈ L tem-se O(1L, y) ≤L y. Se para algum y0 em L, tem-se
O(1L, y0) <L y0, então pela densidade de L exite z tal que z <L y0 e O(1L, y0) ≤L z. Pelo
princípio de residuação, tem-se z ≤L y0 ≤L IO(1L, z), o que contradiz a Equação (5.7).
(⇐) Suponha que O(1L, r) = r, para todo r ∈ L. Então
IO(1, y) = maxt ∈ L |O(1L, t) ≤L y
= maxt ∈ L | t ≤L y
= y. (5.8)
(ii) (⇒) Assuma que IO cumpre a propriedade do princípio de troca (PT). Suponha, por contra-
dição, que existem x, y, z ∈ L tais que O(x,O(y, z)) 6= O(O(x, y), z). Então, pela Proposição
4.2 segue-se que
O(x,O(y, z)) 6= O(y,O(x, z)).
Assim, podemos assumir, sem perda de generalidade que O(x,O(y, z)) <L O(y,O(x, z)).
Aplicando duas vezes o princípio de residuação obtemos IO(x, IO(y,O(x,O(y, z)))) <L z.
Usando o princípio de troca temos IO(y, IO(x,O(x,O(y, z)))) <L z. Aplicando novamente
92
o princípio de residuação duas vezes voltamos para O(x,O(y, z)) <L O(x,O(y, z)), que é
trivialmente uma contradição.
(⇐) Assuma que O é associativa. Do princípio de residuação temos
IO(x, IO(y, z)) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L IO(y, z)
= maxt ∈ L |O(y,O(x, t)) ≤L z
= maxt ∈ L |O(O(y, x), t) ≤L z
= maxt ∈ L |O(O(x, y), t) ≤L z
= maxt ∈ L |O(x,O(y, t)) ≤L z
= maxt ∈ L |O(y, t) ≤L IO(x, z)
= IO(y, IO(x, z)).
(iii) Basta observar que para um arbitrário x ∈ L, temos
IO(x, x) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L x = 1L ⇔ O(x, 1L) ≤L x.
(iv) (⇒) Suponha que para cada x, y ∈ L, tais que x ¨ y, tem-se x ≤L y ⇔ IO(x, y) = 1L.
Então IO(x, x) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L x = 1L. Isto significa que O(x, 1L) ≤L x, para
todo x ∈ L. Além disso, pela monotonicidade de O,
IO(x,O(x, 1L)) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L O(x, 1L) = 1L.
Assim, x ≤L O(x, 1L). Portanto, para um arbitrário x ∈ L, O(x, 1L) = x.
(⇐) Suponha que O possui elemento neutro 1L. Se para x, y ∈ L,
IO(x, y) = maxt ∈ L |O(x, t) ≤L y = 1L,
então temos x = O(x, 1) ≤L y. Por outro lado, se para cada x, y ∈ L tais que x ¨ y, se
x ≤L y, então desde que 1L é elemento neutro de O, tem-se O(x, 1L) = x ≤L y . Portanto,
pelo princípio de residuação, segue-se que IO(x, y) = 1L.
5.3 Quasi-overlap conjugadas e suas implicações induzidas
Iniciamos esta seção apresentando uma definição que generaliza automorfismos de reticu-
lados limitados, levando em conta esses reticulados como espaços topológicos.
Definição 5.6. Seja L um reticulado limitado e Ω uma topologia sobre L. Uma função
ρ : L→ L é um Ω-automorfismo se:
93
(i) ρ é bijetiva;
(ii) ρ é contínua segundo a topologia Ω;
(iii) x 6L y se, e somente se, ρ(x) 6L ρ(y).
Note que esta definição generaliza a Definição 3.16, pois no caso da Definição 3.16 as con-
dições (i) e (iii) implicam em continuidade na topologia euclideana. Além disso, desde que ρ
é uma bijeção contínua cuja inversa ρ−1 é também contínua, segue-se que ρ é uma aplicação
conhecida em topologia como homeomorfismo. Trata-se de uma aplicação que preserva a es-
trutura topológica do seu espaço. Cabe assinalar também que ρ (bem como sua inversa) pode
ser visto como um isomorfismo de ordem.
Além disso, no que segue o próximo resultado estende a Proposição 3.7 para o contexto
de reticulados. Em outras palavras, vamos mostrar que a classe de funções quasi-overlap é
fechada sob Ω-automorfismos, onde Ω representa, neste contexto, a topologia de Scott e, por
este motivo, em vez de Ω-automorfismo usa-se o termo Scott-automorfismo.
Proposição 5.2. SejaO uma função quasi-overlap e ρ um Scott-automorfismo, ambos definidos
sobre um reticulado L. Então, a conjugada de O, denotada por Oρ, é também uma função
quasi-overlap. Além disso, se O é contínua, Oρ também é contínua.
Demonstração. (OL1): Segue-se diretamente do fato de que composta de funções não-decrescentes
é uma função não-decrescente;
(OL2): Segue imediatamente da comutatividade de O;
(OL3): (⇒) Suponha que Oρ(x, y) = 0L. Então temos
ρ−1 (O (ρ(x), ρ(y))) = 0L ⇔ O (ρ(x), ρ(y)) = 0L
⇔ ρ(x) = 0L ou ρ(y) = 0L
⇔ x = 0L ou y = 0L
(⇐) Se x = 0L ou y = 0L então, suponha sem perda de generalidade que x = 0L. Então,
ρ(x) = 0L e assim,
Oρ(x, y) = ρ−1 (O (ρ(x), ρ(y)))
= ρ−1 (O (0L, ρ(y)))
= ρ−1(0L)
= 0L.
94
(OL4): (⇒) Suponha que Oρ(x, y) = 1L. Então tem-se
ρ−1 (O (ρ(x), ρ(y))) = 1L ⇔ O (ρ(x), ρ(y)) = 1L
⇔ ρ(x) = ρ(y) = 1L
⇔ x = y = 1L
(⇐) Suponha que x = y = 1L, ρ(x) = ρ(y) = 1. Então tem-se
Oρ(x, y) = ρ−1 (O (1L, 1L))
= ρ−1(1L)
= 1L.
(OL5) Segue da composição de funções contínuas.
Uma primeira aplicação da ação de Scott-automorfismos em funções quasi-overlap é que
a conjugada de uma implicação induzida de uma quasi-overlap O coincide com a implicação
induzida da conjugada Oρ.
Proposição 5.3. IρO coincide com IOρ .
Demonstração. De fato,
IρO(x, y) = ρ−1 (IO(ρ(x), ρ(y)))
= ρ−1 (maxρ(z) ∈ L|O(ρ(x), ρ(z)) ≤L ρ(y))
= maxρ(z) ∈ L|ρ−1 (O(ρ(x), ρ(z))) ≤L y
= maxz ∈ L|Oρ (x, z) ≤L y
= IOρ(x, y).
Observação 5.2. A proposição acima afirma que os processos para obter a adjunção da con-
jugada ou a conjugada da adjunção são invariantes, como mostrado na Figura 10.
O IO
Oρ IOρ = IρO
Adjunção
conjugação
Figura 10: Diagrama de adjunção e conjugação
95
Outra aplicação interessante de conjugadas de quasi-overlap está ligada à noção de opera-
dores de fecho1. A seguir, fornecemos uma estrutura teórica para obter o fecho das conjugadas
de O e IO.
Proposição 5.4. Seja L um reticulado completo de ordem densa eOρ uma conjugada da função
quasi-overlap O definida sobre L. As seguintes condições são equivalentes:
(i) Oρ é residuada se, e somente se, Oρy e Oρ
x são ambas monotônicas e contínuas;
(ii) Oρ é residuada se, e somente se, Oρy e Oρ
x são residuadas.
Demonstração. ((i)⇒ (ii)) Sobre o espaço L defina a seguinte relação de ordem parcial:
(a, b) ≤L2 (u, v)⇔ a ≤L u e b ≤L v.
É rotina checar que isto fornece duas topologias naturais sobre L2, a saber: A topologia
de Scott no espaço 〈L,≤L〉 e o produto da topologia de Scott em 〈L2,≤L2〉. Assim, se uma
função definida sobre L2 é contínua, suas projeções sobre o fator L são claramente contínuas.
Portanto, desde queO é comutativa, não-decrescente em cada entrada e residuada (em particular
contínua), então para cada x ∈ L fixado defina Ox : L → L por Ox(z) = O(z, y) para todos
y, z ∈ L, e para cada y ∈ L fixado definaOy : L→ L porOy(z) = O(x, z) para todos x, z ∈ L.
Daí, pelo Teorema 5.1, segue o resultado.
((ii)⇒ (i)) É uma consequência imediata de (i).
Uma representação pictórica da Proposição 5.4 pode ser vista na Figura 11.
L× L L
L L
L× L
Proj.2
Proj.1 Oρ Oρx IOρx
IOρy
Oρy
IOρ
Figura 11: Diagrama de funções residuadas
1Lembre-se de que uma função f : X → X sobre um poset 〈X,≤〉 é um operador de fecho sobre X se f énão-decrescente, idempotente (f(f(x)) = f(x)), e inflacionária (x ≤ f(x)).
96
Portanto, dada uma aplicação residuada Oρ : L2 → L e z ∈ L, a função ϕz : L → L por
ϕz(x) = IOρx(z), onde IOρx é o resíduo de Oρx : L→ L. Similarmente define-se ψz : L→ L por
ψz(y) = IOρy(z), onde IOρy é o resíduo de Oρy : L→ L.
Corolário 5.1. Seja L um reticulado completo de ordem densa. Para todo z ∈ L valem os
seguintes itens:
(i) O par (ψz, ϕz) forma uma adjunção;
(ii) As aplicações ψz e ϕz são operadores de fecho sobre L.
5.4 Quasi-overlap obtidas por distorções
Em (DIMURO; BEDREGAL, 2014), foi introduzida a definição de pseudo-automorfismos para
discutir em quais condições uma função overlap definida sobre [0, 1] pode ser obtida pela distor-
ção de uma t-norma e um pseudo-automorfismo. Nesta seção vamos generalizar essas noções
para o caso de funções quasi-overlap definidas sobre um reticulado L, novamente levando em
conta esse reticulado como espaço topológico.
Definição 5.7. Seja L um reticulado limitado. Uma função ψ : L → L chama-se um pseudo
Scott-automorfismo se satisfaz:
(i) ψ é não-decrescente;
(ii) ψ é contínua segundo Scott;
(iii) ψ(x) = 0L ⇔ x = 0L;
(iv) ψ(x) = 1L ⇔ x = 1L.
Proposição 5.5. Seja ψ : L → L um pseudo Scott-automorfismo. Para toda t-norma contínua
e positiva T : L2 → L, a função Oψ,T : L2 → L dada por Oψ,T (x, y) = ψ (T (x, y)) é uma
função overlap.
Demonstração. Para concluir que Oψ,T é uma quasi-overlap basta uma checagem direta das
propriedades (OL1)-(OL4). A continuidade segue do fato que composição de funções contí-
nuas é uma função contínua.
Observação 5.3. A função Oψ,T é conhecida como a overlap obtida pela distorção da t-norma
T pelo pseudo Scott-automorfismo ψ, ou a overlap obtida pela (ψ, T )-distorção.
97
Proposição 5.6. Seja L um reticulado limitado. Todo Scott-automorfismo ρ sobre L é um
pseudo Scott-automorfismo.
Demonstração. Pela Definição 5.6 temos que ρ é contínuo. Pela sobrejetividade de ρ existem
c, d ∈ L tais que ρ(c) = 0L e ρ(d) = 1L. Mas L é limitado, logo 0L ≤L c, d ≤L 1L.
Assim, pela condição (iii) da Definição 5.6, segue-se que ρ é não-decrescente e ρ(0L) = 0L e
ρ(1L) = 1L.
O próximo teorema mostra como obter funções quasi-overlap distorcidas por t-normas po-
sitivas e um Scott-automorfismo, bem como obter t-normas positivas a partir de quasi-overlap
distorcidas.
Teorema 5.2. Seja L um reticulado limitado, T uma t-norma e ρ um Scott-automorfismo, todos
definidos em L. A função Oρ,T : L2 → L definida por
Oρ,T (x, y) = ρ (T (x, y))
é uma quasi-overlap se, e somente se, T é positiva.
Demonstração. (⇒) ConsidereOρ,T uma quasi-overlap. Desde que ρ é um Scott-automorfismo
e por (OL2), Oρ,T (x, y) = 0L se, e somente se, ρ(T (x, y)) = 0L se, e somente se, T (x, y) = 0L
se, e somente se x = 0L ou y = 0L. Portanto T é positiva.
(⇐) Consequência imediata das Proposições 5.5 e 5.6.
Lema 5.4. Seja L um reticulado limitado e Oψ,T obtida pela distorção de uma t-norma T :
L2 → L por um pseudo Scott-automorfismo ψ : L→ L. Então ψ(x) = Oψ,T (x, 1L).
Demonstração. Oψ,T (x, 1L) = ψ
(T (x, 1L)
)= ψ(x).
Sempre que O é uma quasi-overlap obtida pela distorção de uma t-norma T por um pseudo
Scott-automorfismo ψ, então o Lema 5.4 fornece uma forma para definir tal pseudo Scott-
automorfismo, i.e, ψ(x) = O(x, 1L). No caso em que ψ é um Scott-automorfismo, então a
t-norma T é trivialmente obtida por T = ψ−1 O.
Proposição 5.7. Seja L um reticulado limitado. Nem toda quasi-overlap O : L2 → L é
determinada por um pseudo Scott-automorfismo ψ : L → L e uma t-norma positiva T : L2 →L.
98
Demonstração. Seja ⊗ um operador t-norma definido sobre L. Checando as propriedades
(OL1)-(OL4), observa-se que OmM(x, y) = infx, y ⊗ supx(2)⊗ , y
(2)⊗ é uma quasi-overlap
não-associativa com elemento neutro igual a 1L. Suponha que OmM pode ser determinada
pela (ψ, T )-distorção, por um pseudo Scott-automorfismo ψ : L → L e uma t-norma posi-
tiva T : L2 → L. Pelo Lema 5.4, tem-se que ψ(x) = OmM(x, 1L) = x, que é um Scott-
automorfismo. Segue-se que OmM(x, y) = ψ(T (x, y)) = T (x, y), que é uma contradição, já
que OmM é não associativa.
Proposição 5.8. Seja L um reticulado limitado. Toda função quasi-overlap divisível O : L2 →L que não pode ser obtida por uma (ψ, T )-distorção é não associativa.
Demonstração. Pela contra-positiva, se O é associativa, então pela Proposição 4.1, O é uma
t-norma positiva. Logo, O é obtida pela (id, O)-distorção, onde id : L → L é o Scott-
automorfismo identidade.
Proposição 5.9. SejaL um reticulado limitado,O uma quasi-overlap e ρ um Scott-automorfismo,
ambos definidos em L. O é obtida pela (ρ, T )-distorção se, e somente se, T = ρ−1 O, onde
ρ(x) = O(x, 1L), é associativa.
Demonstração. (⇒) Pelo Teorema 5.2, existe uma t-norma positiva T e um Scott-automorfismo
ρ tais que O(x, y) = Oρ,T (x, y) = ρ(T (x, y)). É imediato que T = ρ−1 O, com ρ(x) =
O(x, 1L) (pelo Lema 5.4). Além disso, desde que T é t-norma, segue-se que T é associativa.
(⇐) Considere a função associativa T = ρ−1 O, com ρ(x) = O(x, 1L). É imediato que T é
não-decrescente, como composição de funções não-decrescentes. Também é imediato que T é
comutativa, pois O é comutativa. Além disso, T (x, 1L) = ρ−1(O(x, 1L)) = ρ−1(ρ(x)) = x.
Portanto, T é uma t-norma. Finalmente, desde que ρ é um Scott-automorfismo, T (x, y) =
ρ−1(O(x, y)) = 0L se, e somente se, O(x, y) = 0Lse, e somente se, x = 0L ou y = 0L.
Logo T é positiva. Então, é imediato que O = ρ T é uma função quasi-overlap obtida pela
(ρ, T )-distorção.
Este capítulo introduziu o conceito de implicações induzidas por funções quasi-overlap
sobre reticulados. Tanto a noção de continuidade de Scott quanto a de ordem densa sobre
reticulados completos foram usadas afim de obter um teorema de classificação para funções
quasi-overlap residuadas (Teorema 5.1). Observou-se que a classe de funções quasi-overlap
que formam uma conexão de Galois é a mesma classe de funções contínuas segundo a topo-
logia de Scott. Como consequência, as funções quasi-overlap residuadas e suas respectivas
RO-implicações podem ser utilizadas para modelar operados conectivos da lógica fuzzy. Nessa
99
perspectiva, no próximo capítulo propõe-se uma generalização da noção de naBL-álgebras ba-
seadas em overlap sobre reticulados.
100
6 naBL-Álgebras baseadas em overlapssobre reticulados
Neste capítulo, as funções quasi-overlap residuadas e suas respectivas RO-implicações são
apresentadas. Inicia-se mostrando que toda cadeia completa de ordem densa cujo operador “∗"é um quasi-overlap residuado com elemento neutro produz uma naBL-álgebra. Em seguida, é
provado uma versão do conhecido Teorema chinês dos restos para naBL-álgebras. O capítulo
ainda discute a respeito da adaptação da conhecida propriedade da divisibilidade, bem como as
noções de α, β-prelinearidade para o contexto de quasi-overlap. Com isso obtém-se uma ge-
neralização não-associativa para BL-álgebras chamada naBL-álgebras inflacionárias. Também
revela-se que a classe de todas as naBL-álgebras, naBL, contém as naBL-álgebras que não são
obtidas por t-normas não-associativas. Em outras palavras, a classe das naBL-álgebras obtidas
por t-normas não-associativas, naT , é uma subclasse própria de naBL.
Por fim, apresenta-se o papel dos Scott-automorfismos nesse contexto; a saber mostra-se:
(i) como as noções de pesudo Scott-automorfismos, Scott-automorfismos e sua ação so-
bre overlap são usadas para obter naBL-álgebras conjugadas,
(ii) como obter naBL-álgebras inflacionárias por meio da distorção de t-normas por pseudo
Scott-automorfismos, e
(iii) como BL-álgebras são obtidas a partir de Scott-automorfismos.
6.1 naBL-álgebras obtidas por quasi-overlap sobre reticulados
No que segue, pretende-se construir álgebras abstratas com operadores que se comportam
de forma semelhante às funções quasi-overlap e seus resíduos. Para este propósito, considera-
se os operadores binários sobre um reticulado completo L: x∗y = O(x, y) e x⇒ y = IO(x, y),
O é uma função quasi-overlap com elemento neutro “1L” e IO sua implicação induzida.
101
Proposição 6.1. Seja L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 uma cadeia completa de ordem densa, onde
“∗” é o operador quasi-overlap residuado com elemento neutro e “⇒” o seu resíduo. Nessas
condições, L é uma naBL-álgebra.
Demonstração. A estrutura L satisfaz as propriedades (naBL1)-(naBL6) da Definição 3.20.
Com efeito, (naBL1) já está satisfeito por hipótese. Quanto à propriedade (naBL2), uma vez
que o operador “∗” é quasi-overlap, e portanto não exige a associatividade, o reduto 〈L, ∗, 1L〉é um grupóide comutativo que possue elemento neutro “1L”. Além disso, como o par (∗,⇒)
satisfaz o princípio de residuação, uma vez que se tratam, respectivamente, do operador quasi-
overlap residuado e o seu resíduo, temos que (naBL3) está satisfeito e L é um reticulado residu-
ado não associativo. Agora, como L é totalmente ordenado, suponha sem perda de generalidade
que x ≤L y então de um lado tem-se x∧y = x e de outro lado tem-se x∗(x⇒ y) = x∗1L = x.
Portanto, vale que x∗(x⇒ y) = x∧y. Entretanto, se x >L y então, de um lado tem-se x∧y = y
e, de outro lado, como L é um reticulado residuado não-associativo, pela Propriedade (naBL9)
do Lema 3.8, y = x∗(x⇒ y). Assim, x∗(x⇒ y) = x∧y. PortantoL satisfaz divisibilidade em
(naBL4). Desde que L é totalmente ordenado, para todos x, y ∈ L, uma das seguintes condi-
ções é atendida: x⇒ y = 1L ou y ⇒ x = 1L. Portanto, desde que αab (y ⇒ x) = αab (1L) = 1L
e βab (y ⇒ x) = βab (1L) = 1L, em qualquer caso, α-prelinearidade (naBL5) e β-prelinearidade
(naBL6) são ambas satisfeitas.
O próximo resultado trata-se de um teorema bem conhecido na teoria dos anéis, chamado
Teorema Chinês dos Restos, uma versão para o contexto de naBL-álgebras.
Teorema 6.1. (Teorema Chinês dos Restos) Sejam F1, . . . , Fn filtros de uma naBL-álgebra L
tais que Fi ∨ Fj = L, ∀i 6= j, i, j = 1, . . . , n. Então, para todo x1, . . . , xn ∈ L existe x ∈ Ltal que x ≡Fi xi para todo i = 1, . . . , n.
Demonstração. Com efeito, para n = 2, se F1 ∨ F2 = L então existe f12 ∈ F1 e f21 ∈ F2
tal que f12 ∗ f21 = 0L. Assim, por residuação, f12 ≤L (f21 ⇒ 0L) se, só se, (f21 ⇒ 0L) =
1L ∈ F1. Então f21 ≡F1 0L. Portanto, desde que para cada x1, x2 ∈ L existe x ∈ L tal que
x = x1 ∗ f12 ∨ x2 ∗ f21. Então
[x]F1 = [x1 ∗ f12 ∨ x2 ∗ f21]F1
= [x1]F1 ∗ [f12]F1 ∨ [x2]F1 ∗ [f21]F1
= [x1]F1 ∗ [1]F1 ∨ [x2]F1 ∗ [0L]F1
= [x1]F1
102
i.e, x ≡F1 x1. Similarmente concluímos que x ≡F2 x2. Para um arbitrário n, com i 6= j,
i, j ∈ 1, . . . , n, existe fij ∈ Fi e fji ∈ Fj tal que fij ∗ fji = 0L. Portanto a conclusão segue
considerando
x =n∨i=1
xi ∗ f1i ∗ . . . ∗ f(i−1)i ∗ f(i+1)i ∗ . . . ∗ fni.
Raciocinando como acima, temos x ≡Fi xi para i = 1, . . . , n.
Proposição 6.2. (naBL-álgebras conjugadas) Se a álgebra L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉, onde
“∗” é o operador quasi-overlap residuado com elemento neutro e “⇒” o seu resíduo, é uma
naBL-álgebra e ρ : L → L é um Scott-automorfismo, então Lρ = 〈L,∧,∨, ∗ρ,⇒ρ, 0L, 1L〉 é
também uma naBL-algebra.
Demonstração. Desde que L é um reticulado residuado não-associativo, em particular, tem-
se que o par (∗,⇒) satisfaz o princípio de residuação. Assim, pela Proposição 5.2, o par
(∗ρ,⇒ρ) também satisfaz o princípio de residuação. Desses fatos conclui-se que Lρ é também
um reticulado residuado não-associativo. Além disso, para todos a, b, x, y ∈ L tem-se
(x⇒ρ y) ∨ αab (y ⇒ρ x) = ρ−1(ρ(ρ−1 (ρ(x)⇒ ρ(y))
)∨ ρ(αab(ρ−1 (ρ(y)⇒ ρ(x))
)))= ρ−1 ((ρ(x)⇒ ρ(y)) ∨ αab (ρ(y)⇒ ρ(x)))
= ρ−1(1L)
= 1L.
Portanto,Lρ satisfaz α-prelinearidade. Similarmente conclui-se queLρ satisfaz β-prelinearidade.
A Proposição 6.1 revela que as nat-normas, definidas sobre o intervalo [0, 1], propostas
por Botur, são generalizadas para reticulados completos como funções quasi-overlap com o
elemento neutro “1L”. Entretanto, definidas sobre L = [0, 1], as naBL-álgebras obtidas pelas
funções overlap com elemento neutro 1 são, na verdade, uma subclasse das nat-normas, já que
funções overlap com elemento neutro 1 são um caso particular de nat-normas (c.f. Definição
3.22). Contudo, conforme já foi dito, muitas características importantes diferenciam a classe de
t-normas da classe das funções overlap, embora essas classes possuam uma interseção, como
foi mostrado pela Proposição 3.6.
A fim de obter uma generalização para naBL-Álgebras baseada em funções overlap sobre
reticulados ainda mais forte, na próxima seção apresenta-se propriedades mais gerais para as
quais uma naBL-álgebra deve satisfazer, tais como a divisibilidade, a retirada da exigência de
103
que as funções quasi-overlap possuam elemento neutro “1L” e, em consequência disso, propor
uma condição mais geral para α, β-prelinearidade.
6.2 naBL-álgebras inflacionárias
No que segue apresenta-se uma generalização da noção de naBL-álgebras chamada naBL-
álgebra inflacionária. Como naBL-álgebras são geradas por nat-normas, propõe-se uma ge-
neralização desses operadores que darão origem às naBL-álgebras inflacionárias. Para isso,
apresenta-se uma conexão entre as noções de divisibilidade para quasi-overlap (c.f. Definição
4.3) e a propriedade de divisibilidade do item (naBL4) na Definição 3.20.
Definição 6.1. Seja L um reticulado e “∗,⇒‘” operadores binários sobre L. Diz-se que o par
〈L, ∗〉 satisfaz:
divisibilidade parcial: Se para todos x, y ∈ L com y ≤L x, existe z em L tal que x ∗ z = y;
divisibilidade total: Se para todos x, y ∈ L, tem-se x ∗ (x⇒ y) = x ∧ y, para todos x, y ∈ L.
Na verdade, como os próprios nomes sugerem, o que ocorre é que uma dessas noções
generaliza a outra. Elas estão intimamente ligadas a relação de ordem que é definida sobre o
reticulado L. Assim, o próximo lema revela que essas noções coincidem quando o reticulado
em questão é totalmente ordenado.
Lema 6.1. Seja 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 uma cadeia residuada não-associativa. O par 〈L, ∗〉satisfaz divisibilidade total se, e somente se, satisfaz divisibilidade parcial, ∀x, y ∈ L.
Demonstração. Suponha que o par 〈L, ∗〉 satisfaz divisibilidade total. Então, para todos x, y ∈L, tem-se y ∗ (y ⇒ x) = x ∧ y. Desde que L é totalmente ordenado, pode-se supor também,
sem perda de generalidade, que x ≤L y. Neste caso, tem-se x ∧ y = x. Assim, existe z ∈ L, a
saber: z = (y ⇒ x), tal que
y ∗ z = y ∗ (y ⇒ x) = x ∧ y = x.
Portanto, o par 〈L, ∗〉 satisfaz divisibilidade parcial. Reciprocamente, se o par 〈L, ∗〉 satisfaz
divisibilidade parcial, como L é totalmente ordenado, pode-se supor sem perda de generali-
dade que x ≤L y. Então existe z ∈ L tal que y ∗ z = x. Daí, por residuação
z ≤L (y ⇒ x) (6.1)
Aplicando o operador “∗” com y na primeira entrada da desigualdade (6.1) acima, obtém-se a
104
seguinte desigualdade:
x = y ∗ z ≤L y ∗ (y ⇒ x). (6.2)
Por outro lado, desde que y ⇒ x ≤L y ⇒ x, também obtém-se por residuação que
y ∗ (y ⇒ x) ≤L x (6.3)
Das inequações obtidas em (6.2) e (6.3) segue-se que y ∗ (y ⇒ x) = x = x∧ y. Portanto, o par
〈L, ∗〉 satisfaz divisibilidade total.
Observação 6.1. Sempre que as noções de divisibilidade total e divisibilidade parcial coinci-
direm, elas serão referidas simplesmente como divisibilidade.
Outra possibilidade que vale a pena investir é a retirada da exigência de que operadores
quasi-overlap possuam elemento neutro “1L”. Nessa perspectiva, os operadores quasi-overlap
inflacionários entram em cena. Isto é, aqueles operadores que cumprem a condição
x ≤L x ∗ 1L, ∀x ∈ L.
Proposição 6.3. Seja L uma cadeia completa de ordem densa. Se “∗” é um operador overlap
inflacionário sobre L, então o par 〈L, ∗〉 satisfaz a propriedade da divisibilidade.
Demonstração. Suponha que “∗” é um operador overlap inflacionário, i.e., ∀x ∈ L tem-se
x ≤L x ∗ 1L. Então, para quaisquer x, y ∈ L, tais que x ≤L y, tem-se
y ∗ 0L ≤L x ≤L y ≤L y ∗ 1L.
Desde que operadores overlap são, na verdade, quasi-overlap contínuos e L é uma cadeia,
segue-se pelo Teorema do valor intermediário que existe z ∈ L tal que y ∗ z = x. Portanto, o
par 〈L, ∗〉 satisfaz a propriedade da divisibilidade.
Desde que quasi-overlap inflacionárias em geral não possuem elemento neutro “1L”, a
propriedade da ordem (PO) não é uma propriedade satisfeita em reticulados residuados não
associativos cuja operação binária “∗” seja uma quasi-overlap inflacionária, como mostrou a
Proposição 5.1. No entanto, o próximo lema indica como contornar esse obstáculo.
Lema 6.2. Seja 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 um reticulado residuado não-associativo, onde o ope-
rador “∗” é inflacionário. Nessas condições, para todos x, y ∈ L tem-se:
(i) Se x⇒ y = 1L então x ≤L y (Propriedade da ordem à direita);
105
(ii) x ≤ y se, e somente se, x ¨ y e x⇒ (y ∗ 1L) = 1L (Propriedade da ordem parcial);
(iii) 1L ⇒ x ≤L x.
Demonstração. (i) Se x⇒ y = 1L, então por residuação temos x ≤L x ∗ 1L ≤L y.
(ii) Se x ≤ y então x ¨ y e x ∗ 1L ≤L y ∗ 1L. Então, por residuação, 1L ≤L x ⇒ (y ∗ 1L), i.e
x ⇒ (y ∗ 1L) = 1L. Reciprocamente, se x ⇒ (y ∗ 1L) = 1L então x ∗ 1L ≤ y ∗ 1L e como
x ¨ y, temos x ≤L y.
(iii) Desde que “∗” é um operador inflacionário residuado, tem-se que
1L ⇒ x = maxt ∈ L | t ≤L t ∗ 1L ≤L x ≤L x.
A próxima definição estabelece uma nova classe de BL-álgebras não-associativas; uma
classe mais geral que as naBL-álgebras obtidas por t-normas não-associativas e para as quais o
operador “∗” em geral não possui elemento neutro.
Definição 6.2. Uma álgebra A = 〈A,∧,∨, ∗,⇒, 0A, 1A〉 é chamada naBL-álgebra inflacio-
nária, se ela satisfaz:
(naBLi1) 〈A,∧,∨, 0A, 1A〉 é um reticulado limitado com botom 0A e topo 1A;
(naBLi2) 〈A, ∗〉 é um grupóide comutativo;
(naBLi3) Para todos x, y, z ∈ A, o par (∗,⇒) satisfaz o princípio de residuação:
x ∗ z ≤ y se só se z ≤ x⇒ y;
(naBLi4) Para todos x, y ∈ A com x ≤A y, existe z ∈ A tal que
y ∗ z = x (divisibilidade parcial);
(naBLi5) Se x ¨ y, então para todos a, b ∈ A vale a identidade
(x⇒ (y ∗ 1A)) ∨ αab (y ⇒ (x ∗ 1A)) = 1A (α-prelinearidade parcial);
(naBLi6) Se x ¨ y, então para todos a, b ∈ A vale a identidade
(x⇒ (y ∗ 1A)) ∨ βab (y ⇒ (x ∗ 1A)) = 1A (β-prelinearidade parcial);
onde αab (x) = (a ∗ b)⇒ (a ∗ (b ∗ x)) e βab (x) = b⇒ (a⇒ ((a ∗ b) ∗ x)).
106
Proposição 6.4. Seja L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 uma cadeia completa de ordem densa, onde
“∗” é o operador overlap inflacionário e “⇒” o seu resíduo. Nessas condições, L é uma
naBL-álgebra inflacionária.
Demonstração. Com efeito, desde que L é uma cadeia completa de ordem densa, segue-se que
L é um reticulado completo, e portanto limitado com bottom 0L e topo 1L (naBLi1). Segue-se
também que o reduto 〈L, ∗〉 é um grupóide comutativo (naBLi2), já que o operador “∗” é um
overlap inflacionário. Além disso, desde que “∗” é overlap, e portanto, quasi-overlap contínuo,
sobre um reticulado completo de ordem densa, segue-se também que o par (∗,⇒) satisfaz o
princípio de residuação (naBLi3). A propriedade (naBLi4) segue-se da Proposição 6.3. Desde
que L é uma cadeia completa, x e y são sempre comparáveis então, se x ≤L y, segue-se da
ordem própria parcial (Lema 6.2) que x ⇒ (y ∗ 1L) = 1L. Portanto, neste caso valem as
propriedades de α, β-prelinearidade parcial. Por outro lado, se y >L x, então novamente pela
ordem própria parcial, y ⇒ (x ∗ 1L) = 1L. Daí αab (1L) = (a ∗ b) ⇒ (a ∗ (b ∗ 1L)) = 1L
e βab (1L) = b ⇒ (a ⇒ ((a ∗ b) ∗ 1L)) = 1L. Portanto, em qualquer caso valem (naBLi5) e
(naBLi6).
A Proposição 6.4 revela que a classe naBL de todas as naBL-álgebras contém naBL-
álgebras que não são obtidas por t-normas não-associativas. Em outras palavras, a classe naTdas naBL-álgebras obtidas por t-normas não-associativas é uma subclasse própria de naBL.
Uma representação pictórica que sintetisa estes fatos é fornecida na Figura 12.
Figura 12: Representação pictórica das conjunções fuzzy que geram a classe naBL.
107
Na próxima seção, naBL-álgebras inflacionárias serão obtidas por meio da distorção de t-
normas por pseudo Scott-automorfismos e, BL-álgebras serão obtidas a partir de naBL-álgebras
inflacionárias, via Scott-automorfismos.
6.3 naBL-álgebras inflacionárias obtidas por (ψ, T )-distorções
Nesta seção, será apresentada uma maneira para transitar entres as BL-álgebras e as naBL-
álgebras inflacionárias. Em outras palavras, serão apresentadas proposições que mostram como
obter naBL-álgebras inflacionárias por meio da distorção de t-normas por pseudo Scott-automor-
fismos e, em caminho inverso, mostra-se como obter BL-álgebras a partir de naBL-álgebras
inflacionárias, via Scott-automorfismos.
Proposição 6.5. Seja L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 uma BL-cadeia1 completa de ordem densa
onde o operador “∗” é uma t-norma contínua e positiva e ρ : L → L um pseudo Scott-
automorfismo que satisfaz: x ≤L ρ(x), para todo x ∈ L. Se, para todos x, y ∈ L, x ~ y =
ρ(x ∗ y), então L′ = 〈L,∧,∨,~,⇒~, 0L, 1L〉 é uma naBL-álgebra inflacionária.
Demonstração. Pela Proposição 5.5 tem-se que “~” é um operador overlap. Além disso, desde
que ρ é um pseudo Scott-automorfismo que satisfaz x ≤L ρ(x), para todo x ∈ L, tem-se que
x ~ 1L = ρ(x ∗ 1L) ≥L x. Logo “~” é um operador overlap‘ inflacionário sobre L. Desde
que L é uma BL-cadeia completa de ordem densa, segue-se da Proposição 6.4 que a estrutura
L′ = 〈L,∧,∨,~,⇒~, 0L, 1L〉 é uma naBL-álgebra inflacionária.
Proposição 6.6. Seja L′ = 〈L,∧,∨,~,⇒~, 0L, 1L〉 uma naBL-álgebra inflacionária, cujo reti-
culado reduto é uma cadeia completa de ordem densa e tal que “~” é um operador overlap ob-
tido pela distorção de uma t-norma contínua e positiva. Se ρ : L→ L é um Scott-automorfismo
então L′′ = 〈L,∧,∨, ,⇒, 0L, 1L〉, onde x y = ρ−1(x~ y) e x⇒ y = ρ−1(x⇒~ y), para
todos x, y ∈ L, é uma naBL-álgebra.
Demonstração. É óbvio que o 〈L,∧,∨, 0L, 1L〉-reduto é um reticulado limitado com elemento
bottom 0L e elemento topo 1L. Desde que “~” é um operador overlap inflacionário, segue-se da
Proposição 5.9 que o operador “” é uma t-norma contínua e positiva. Logo, por um lado tem-
se que o 〈L, , 1L〉-reduto é um monóide comutativo. De outro lado, o par (,⇒) satisfaz o
princípio de residuação. Quanto a Propriedade da divisibilidade, suponha que x ≤L y então de
um lado tem-se x∧ y = x e de outro lado tem-se x (x⇒ y) = x1L = x. Portanto, vale que
x (x⇒ y) = x∧y. Para o caso x >L y o raciocínio é análogo. Assim, x (x⇒ y) = x∧y.
1Uma BL-cadeia é uma BL-álgebra tal que seu reticulado reduto é totalmente ordenado.
108
Para a Propriedade de prelinearidade, como L′′ é linearmente ordenado, para todos x, y ∈ L,
uma das seguintes condições é atendida: x ⇒ y = 1L ou y ⇒ x = 1L. Portanto, segue-se o
resultado.
Observação 6.2. Se ρ : L → L é um Scott-automorfismo e L = 〈L,∧,∨, ∗,⇒, 0L, 1L〉 é uma
BL-álgebra, então das Proposições 6.5 e 6.6 pode-se construir o seguinte diagrama:
L(BL)ρ //
&&
L′(naBL)
ρ−1
L′′(BL)
Figura 13: BL-álgebras obtidas por Scott-automorfismos.
Corolário 6.1. O operador “~(ρ,∗)” obtido pela (ρ, ∗)-distorção possui elemento neutro “1L”
se, e somente se, L e L′′ são ϕ-isomorfas, onde ϕ = ρ−1 ρ.
Analogamente, se ρ : L → L é um Scott-automorfismo e L′ = 〈L,∧,∨,~,⇒~, 0L, 1L〉uma naBL-álgebra em que “~” é um operador overlap obtido pela distorção de uma t-norma
contínua e positiva, então
L′(naBL)ρ−1
//
&&
L′′(BL)
ρ
L(naBL)
Figura 14: naBL-álgebras obtidas pela distorção de t-normas.
Corolário 6.2. O operador ~ possui elemento neutro “1L” se, e somente se, L′ e L são ψ-
isomorfas, onde ψ = ρ ρ−1.
109
7 Conclusões
Este trabalho generalizou a noção de overlap para o contexto de reticulados e introduziu
uma definição mais fraca, chamada de quasi-overlap, que surge da retirada da condição de
continuidade. Para este fim, as principais propriedades de quasi-overlap sobre reticulados -
soma convexa, migratividade, homogeneidade, idempotência e lei de cancelamento - foram
investigadas, bem como uma caracterização de overlap arquimediana foi apresentada. Além
disso, o princípio de residuação foi formalizado para o caso de funções quasi-overlap sobre
reticulados e suas respectivas implicações induzidas, bem como foi formalizado que a classe
de funções quasi-overlap que cumprem o princípio de residuação é a mesma classe de funções
contínuas segundo a topologia de Scott. Como consequência, uma nova generalização da noção
de BL-álgebras não-associativas (naBL-álgebras) baseadas em overlap sobre reticulados foi
obtida.
Funções overlap foram introduzidas como uma classe de funções de agregação com duas
entradas sobre o intervalo [0, 1] para serem aplicadas no campo de processamento de imagens.
Entretanto, quando se leva em consideração que pixels (ou sinais) podem conter incertezas, por
exemplo ruídos, essa informação de ruído pode ser captada em objetos que estendem os núme-
ros reais, por exemplo intervalos ou números fuzzy. Isto foi uma das motivações que culminou
na escrita desta tese que demonstrou a necessidade de uma topologia sobre reticulados. Essa
topologia é a Topologia de Scott. De fato, dado um reticulado qualquer, sempre é possível saber
como cada elemento se comporta em relação aos outros elementos, mas é difícil saber como
a estrutura geral se parece. No entanto, definindo-se a topologia de Scott, as propriedades to-
pológicas relacionadas com a ordem que esse reticulado contém permitiram desenvolver uma
visualização própria para esse reticulado. Assim, um grande número de propriedades que se ve-
rificam no intervalo real fechado [0, 1] (por exemplo, densidade, conexidade, bem como o fato
de ser um espaço Hausdorff) puderam ser generalizadas para reticulados gerais com proprie-
dades topológicas específicas. Desse modo, conceitos como densidade foram expressos tanto
em termos topológicos quanto em termos da relação de ordem definita sobre o conjunto. Outro
exemplo foi o conceito de compacidade, que permitiu generalizações do conhecido teorema
110
do valor extremo1. Os resultados referentes a adjunções sobre reticulados quaisquer usando
funções overlap, permite que esses operadores possam ser usados em ferramentas como Mor-
fologia Matemática, que é aplicada no campo de processamento de sinais e imagens através de
operadores de dilatação, erosão, e outros (Haralick; Sternberg; Zhuang, 1987).
Além da área de processamento de imagens, funções overlap tem sido aplicados em áreas
como: problemas de classificação, processamento de imagens e em alguns problemas de to-
mada de decisão, em que a propriedade associativa não é fortemente requerida. Para a tomada
de decisão, muitas vezes são utilizadas relações de preferência fuzzy, que fornecem graus repre-
sentados por intervalos, números fuzzy ou números fuzzy intervalares (HERRERA, 2012). Como
os dados envolvidos nesses tipos de aplicação nem sempre são livres de imprecisão, é natural se
pensar em dados no formato de intervalos, números fuzzy, etc. e overlap definidos sobre esses
objetos. Dessa forma, essa dissertação fornece o arcabouço teórico para esse tipo de estrutura.
No campo da lógica, um ponto importante é o fato de que a residuação é uma propriedade
algébrica essencial que deve ser requerida para se ter uma boa semântica para sistemas lógicos
fuzzy baseados na regra do modus ponens, a condição necessária e suficiente para que uma con-
junção fuzzy tenha um resíduo não é continuidade, mas continuidade à esquerda. Uma vez que
as funções quasi-overlap contínuas são, na verdade, uma generalização de funções overlap con-
tínuas à esquerda para reticulados, é definitivamente interessante, do ponto de vista lógico, fo-
car no estudo de propriedades relacionadas as funções overlap contínuas à esquerda, bem como
investigar como essas propriedades são interpretadas para o caso das funções quasi-overlap
contínuas. Vale ressaltar que o conhecimento sobre funções overlap contínuas à esquerda é
drasticamente limitado em comparação com a boa descrição que existe na literatura no caso
contínuo. Ainda sobre essas propriedades capturadas por quasi-overlap, mais precisamente
aquelas relacionadas a idempotência, cancelamento, limitação e propriedade arquimediana o
conceito de soma ordinal para funções quasi-overlap também precisa ser investigado. Por outro
lado, o avanço que foi obtido neste trabalho, no estudo das diferentes propriedades das funções
quasi-overlap arquimedianas pode ajudar o desenvolvimento de novas aplicações relacionadas
a funções overlap, em outros campos além do processamento de imagens. Por exemplo, na
aplicação de funções overlap no contexto dos modelos agentes híbrido BDI-fuzzy (FARIAS; DI-
MURO; COSTA, 2011), comumente usados em simulação social (SANTOS et al., 2012; MACEDO
et al., 2012), onde a avaliação de valores sociais e trocas são de natureza qualitativa e subjetiva
(DIMURO et al., 2007; PEREIRA et al., 2008). Funções overlap podem ser usadas para lidar com a
indiferença e incomparabilidade quando raciocinando sobre a base de crença difusa do agente,
1O Teorema do valor extremo garante que uma função contínua definida em um conjunto compacto alcançaseu máximo e mínimo em algum lugar no conjunto.
111
onde um tipo de relação de preferência fraca pode ser definida.
Por sua vez, a nova generalização para BL-álgebras não-associativas (naBL-álgebras) que
surge como consequência desta tese levantam algumas questões para investigações futuras, a
saber:
• Investigar aspectos propriamente lógicos das lógicas associadas às naBL-álgebras consi-
deradas nesse trabalho, tais como decidibilidade, axiomatizabilidade, investigar se essa
classe é equacionalmente definível, entre outros;
• Caracterizar as estrutuas naBL e naT do ponto de vista categórico.
• Investigar as noções de naBL-álgebras para o caso intervalar.
112
Referências
BACZYNSKI, M.; JAYARAM, B. Fuzzy Implications. [S.l.]: Springer, 2008. (Studies inFuzziness and Soft Computing, v. 231).
BEDREGAL, B. et al. New results on overlap and grouping functions. Information Sciences,v. 249, p. 148 – 170, 2013.
BOTUR, M. A non-associative generalization of hájek’s bl-algebras. Fuzzy Sets and Systems,v. 178, n. 1, p. 24 – 37, 2011. ISSN 0165-0114. Theme: Topics in Algebra. Disponível em:<http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0165011411000972>.
BOTUR, M.; HALAS, R. Commutative basic algebras and non-associative fuzzy logics. Arch.Math. Log., v. 48, n. 3-4, p. 243–255, 2009. Disponível em: <https://doi.org/10.1007/s00153-009-0125-7>.
BURRIS, S.; SANKAPPANAVAR, H. P. A Course in Universal Algebra. [S.l.]:Springer-Verlag, 1981. (Graduate Texts in Mathematics, 78). Disponivel online emhttp://www.math.uwaterloo.ca/ snburris/htdocs/ualg.html. ISBN 0387905782.
BUSTINCE, H. et al. A generalization of the migrativity property of aggregation functions.Information Sciences, v. 191, p. 76 – 85, 2012.
BUSTINCE, H.; BURILLO, P.; SORIA, F. Automorphisms, negations and implicationoperators. Fuzzy Sets and Systems, v. 134, n. 2, p. 209 – 229, 2003. ISSN 0165-0114.Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0165011402002142>.
BUSTINCE, H. et al. Overlap functions. Nonlinear Analysis: Theory, Methods & Applications,v. 72, n. 3, p. 1488 – 1499, 2010.
CHAJDA, I.; KÜHR, J. A non-associative generalization of mv-algebras. Mathema-tica Slovaca, v. 57, n. 4, p. 301–312, Aug 2007. ISSN 1337-2211. Disponível em:<https://doi.org/10.2478/s12175-007-0024-5>.
DAVEY, B. A.; PRIESTLEY, H. A. Introduction to Lattices and Order. 2. ed. [S.l.]: CambridgeUniversity Press, 2002.
DIMURO, G. et al. Centralized regulation of social exchanges between personality-basedagents. COIN II 4386 of LNAI, v. 1, p. 338–355, 2007. Cited By 0.
DIMURO, G. P.; BEDREGAL, B. Archimedean overlap functions: The ordinal sum and thecancellation, idempotency and limiting properties. Fuzzy Sets and Systems, v. 252, p. 39 – 54,2014. Theme: Aggregation Functions.
DIMURO, G. P.; BEDREGAL, B. On residual implications derived from overlap functions.Information Sciences, v. 312, p. 78 – 88, 2015. ISSN 0020-0255. Disponível em:<http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0020025515002145>.
113
FARIAS, A. D. S.; SANTIAGO, R. H. N.; BEDREGAL, B. R. C. Dynamic ordered weightedaveraging functions for complete lattices. CoRR, abs/1806.01672, 2018.
FARIAS, G.; DIMURO, G.; COSTA, A. D. R. A fuzzy-bdi agent model for exchanges ofnon-economic services, based on the social exchange theory. In: . [S.l.: s.n.], 2011. p. 134–137.Cited By 7.
FODOR, J. C. Strict preference relations based on weak t-norms. Fuzzy Sets and Systems, v. 43,n. 3, p. 327 – 336, 1991. ISSN 0165-0114. Aggregation and Best Choices of Imprecise Opini-ons. Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/016501149190259S>.
GIERZ, G. et al. Continuous Lattices and Domains. [S.l.]: Cambridge University Press, 2003.(EBSCO ebook academic collection). ISBN 9780521803380.
GOUBAULT-LARRECQ, J. Non-Hausdorff Topology and Domain Theory: Selected Topicsin Point-Set Topology. New York, NY, USA: Cambridge University Press, 2016. ISBN1107034132, 9781107034136.
HÁJEK, P. Metamathematics of Fuzzy Logic. [S.l.]: Kluwer Academic Publishers, 1998.
Haralick, R. M.; Sternberg, S. R.; Zhuang, X. Image analysis using mathematical morphology.IEEE Transactions on Pattern Analysis and Machine Intelligence, PAMI-9, n. 4, p. 532–550,July 1987. ISSN 0162-8828.
HERRERA, F. On the usefulness of interval valued fuzzy sets for learning fuzzy rule basedclassification systems. In: MELO-PINTO, P. et al. (Ed.). Eurofuse 2011. Berlin, Heidelberg:Springer Berlin Heidelberg, 2012. p. 3–4. ISBN 978-3-642-24001-0.
KELLEY, J. L. General Topology. New York: Springer, 1975. (Graduate texts in Mathematics,27).
KLEMENT, E. P.; MESIAR, R.; PAP, E. Triangular Norms. [S.l.]: Springer, 2000.
KRÓL, A. Dependencies between fuzzy conjunctions and implications. In: Proceedingsof the 7th conference of the European Society for Fuzzy Logic and Technology, EUSFLAT2011, Aix-Les-Bains, France, July 18-22, 2011. [s.n.], 2011. p. 230–237. Disponível em:<https://doi.org/10.2991/eusflat.2011.155>.
LIMA, E. Elementos de topologia geral. [S.l.]: Editora SBM, 2009. ISBN 978-85-85818-43-2.
LIZASOAIN, I.; MORENO, C. Owa operators defined on complete lattices. Fuzzy Sets andSystems, v. 224, p. 36 – 52, 2013.
MACEDO, L. et al. Analyzing the evolution of social exchange strategies in social preference-based mas through an evolutionary spatial approach of the ultimatum game. In: . [S.l.: s.n.],2012. p. 83–90. Cited By 9.
MISLOVE, M. W. Topology, domain theory and theoretical computer science. Topology andits Applications, v. 89, n. 1, p. 3 – 59, 1998. ISSN 0166-8641. Domain Theory. Disponível em:<http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0166864197002228>.
MUNKRES, J. Topology. [S.l.]: Prentice-Hall, 2000. (Topology). ISBN 9780131784499.
114
PAIVA, R. et al. Lattice-valued overlap and quasi-overlap functions. CoRR, abs/1902.00133,2019. Disponível em: <http://arxiv.org/abs/1902.00133>.
PAIVA, R.; SANTIAGO, R.; BEDREGAL, B. On bl-algebras and its interval counterpart.TEMA - TendÃancias em Matemática Aplicada e Computacional, v. 20, n. 2, p. 241, 2019.ISSN 2179-8451. Disponível em: <https://tema.sbmac.org.br/tema/article/view/1257>.
PAIVA, R. et al. nabl-algebras based on overlaps and their conjugates. In: 2018 IEEEInternational Conference on Fuzzy Systems, FUZZ-IEEE 2018, Rio de Janeiro, Brazil,July 8-13, 2018. [s.n.], 2018. p. 1–7. Disponível em: <https://doi.org/10.1109/FUZZ-IEEE.2018.8491488>.
PALMEIRA, E.; BEDREGAL, B. Extension of fuzzy logic operators defined on boundedlattices via retractions. Computers & Mathematics with Applications, v. 63, n. 6, p. 1026 –1038, 2012.
PALMEIRA, E. et al. A new way to extend t-norms, t-conorms and negations. Fuzzy Sets andSystems, v. 240, p. 1 – 21, 2014. ISSN 0165-0114. Theme: Aggregation Operators.
PEREIRA, D. R. et al. Towards the self-regulation of personality-based social exchangeprocesses in multiagent systems. In: ZAVERUCHA, G.; COSTA, A. L. da (Ed.). Advances inArtificial Intelligence - SBIA 2008. Berlin, Heidelberg: Springer Berlin Heidelberg, 2008. p.113–123. ISBN 978-3-540-88190-2.
ROMAN, S. Lattices and Ordered Sets. 1. ed. [S.l.]: Springer-Verlag, 2008.
SAMINGER-PLATZ, S.; KLEMENT, E. P.; MESIAR, R. On extensions of triangular norms onbounded lattices. Indagationes Mathematicae, v. 19, n. 1, p. 135 – 150, 2008. ISSN 0019-3577.
SANTOS, F. et al. Modeling role interactions in a social organization for the simulation of thesocial production and management of urban ecosystems: The case of san jeronimo vegetablegarden of seville, spain. In: . [S.l.: s.n.], 2012. p. 136–139. Cited By 11.
SCOTT, D. Continuous lattices. In: LAWVERE, F. W. (Ed.). Toposes, Algebraic Geometryand Logic. Berlin, Heidelberg: Springer Berlin Heidelberg, 1972. p. 97–136. ISBN978-3-540-37609-5.
WILLARD, S. General Topology. [S.l.]: Dover Publications, 2004. (Addison-Wesley series inmathematics). ISBN 9780486434797.
ZHANG, X. Commutative weak t-norm and non-associative residuated lattices. In: 2009Second International Symposium on Knowledge Acquisition and Modeling. [S.l.: s.n.], 2009.v. 2, p. 223–226.
ZHANG, X. H.; MA, H. On filters of non-associative residuated lattices (commutativeresiduated lattice-ordered groupoids). In: 2010 International Conference on Machine Learningand Cybernetics. [S.l.: s.n.], 2010. v. 4, p. 2167–2173. ISSN 2160-133X.