Unidade Na Diversidade-Darrel L. Bock

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DIGITALIZADO POR: PRESBÍTERO (TEÓLOGO APOLOGISTA) PROJETO SEMEADORES DA PALAVRA VISITE O FÓRUM http://semeadoresdapalavra.forumeiros.com/forum

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DIGITALIZADO POR: PRESBÍTERO

(TEÓLOGO APOLOGISTA) PROJETO SEMEADORES DA PALAVRA

VISITE O FÓRUMhttp://semeadoresdapalavra.forumeiros.com/forum

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© 2002 , de D arre ll L. BockT ítu lo d o o rig inal Purpose-directed theology,ed ição p u b licad a pelaI n t f .r V a r s i t y P r e s s

(D o w n e rs G rove, Illino is , l i a׳ )

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por

E d i t o r a V i d a

R u a Jú lio de C astilhos , 2 8 0 * B e lenzinhoc e p 0 3 0 5 9 -0 0 0 * São P au lo , s p

T el.: 0 xx 11 6 6 1 8 7 0 0 0Fax: 0 xx 11 6 6 1 8 7 0 5 0w w w .e d ito ra v id a .c o m .b r

P r o i b i d a a r e p r o d u ç ã o p o r q u a i s q u e r m e i o s ,

SALVO EM BREVES CITA Ç Õ ES, C O M IN D IC A Ç Ã O DA E O N TL.

T odas as citações bíblicas fo ram extraídas da N ova Versão In te rnac iona l (n v i),© 2001 , p u b lic a d a p o r E d ito ra V ida , salvo ind icação em con trá rio .

D ados Internacionais de Catalogação na Publicação ( c i p )

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Bock, D arrell L. -U n id ad e na d iversidade : rum o ao consenso em m eio às

controvérsias teológicas / D arrell L. Bock ; tradução D orcas C ristina Santos Freire. — São Paulo : Editora Vida, 2004.

T ítu lo original: Pwpose-directed theology i s b n 85-7367-733-3

1. C ontrovérsias teológicas 2 . Evangelicalism o 3 · Teologia doutrinai I. T ítulo.

03-7360___________________________________________________________________________c d d - 230.04624

índice para catálogo sistem ático

1. Evangelicalismo : Teologia : D ou trina cristã 230.04624

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S u m á rio

I n t r o d u ç ã o _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 7

1 . I n t r o d u ç ã o à p o l ê m ic a no e v a n g e l ic a l is m o e à t e o l o g ia

DA UNIDADE NA D IVERSIDADE_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 1 5

2 . OS LIMITES E A HISTÓRIA QUE RELATAM O MOVIMENTO EVANGÉLICO _ 4 1

3 . Q u a l é n o s s a p o s iç ã o h o j e ? _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 5 9

4 . Q u a l d ir e ç ã o d e v e m o s t o m a r ? _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 8 1

5 . A BUSCA DA VERDADE EM ÁREAS POLÊMICAS NAS INSTITUIÇÕESABERTAS AO DEBATE _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 1 0 3

6 . C o n c l u s ã o _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 1 2 1

ÍNDICE ONOMÁSTICO _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 1 2 9

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In tro d u çã o

ode parecer estranho um livro começar sua his- tória sem a intenção de tornar-se um livro, mas

é o caso desta obra. A sua origem foi um discurso presidencial proferido no encontro da ETS (Evangelical Theological Society) [Sociedade Teológica Evangélica], em C olorado Springs, em novem bro de 2001. A dissertação original foi escrita alguns meses antes e apresentada na form a de esboço prelim inar no workshop realizado na faculdade do DTS (Dallas Theological Seminary) [Seminário Teológico de Dallas], em agosto de 2001. Entre a apresentação do esboço original para a faculdade em Dallas e o discurso para a ETS ocorreu o cham ado 11 de se- tem bro. Q uando delineei esse debate interno para a ETS, real- m ente não imaginava que tal acontecim ento trágico daria ainda mais repercussão a meus comentários. De repente, habitávamos um m undo onde a importância da visão religiosa m undial foi co- locada em foco de maneira devastadora.

O contexto inicial do discurso para a ETS foi a discussão/ debate polêm ico em torno do teísmo aberto: se seus p ropo­

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nentes deveriam continuar fazendo parte da ETS. M eu objeti- vo no discurso não era solucionar essa questão, mas discutir com o os evangélicos, com o um a com unidade, precisam e de- vem resolver discussões polêmicas e com o sua abordagem da teologia deve dedicar-se a essa questão polêm ica em sua essên- cia, m étodo e tom . A m eu ver, não nos com prom etem os m uito uns com os outros quando sentimos que a verdade é complexa demais. E ntretanto , a dissertação procurou discutir um a ques- tão a in d a m ais fu n d am en ta l: o que deveria co n d u z ir ou direcionar nossas energias e atividades teológicas, especialmente nesses m om entos quando evangélicos de diversas origens se unem? Isso explica por que assuntos focados na ETS são tão destacados em m eus com entários. N o en tan to , analiso essas discussões apenas com o um m icrocosm o de questões que se refletem em todo o m undo evangélico e que poderiam estar projetadas em qualquer assunto que nos preocupa. Assim, o livro utiliza essas discussões particularm ente focadas com o um a am ostra do m odo com o estamos com prom etidos e de como deveríamos nos com prom eter uns com os outros.

Após o discurso, os editores da InterVarsity Press (1VP) me convidaram a considerar a possibilidade de transform ar meus com entários em um pequeno livro. Assim, este livro aborda questões im portantes sobre o m étodo, o tom e o diálogo den- tro do evangelicalismo, especialmente em um debate polêm i- co. G ostaria tam bém de considerar a natureza desse debate em relação ao cham ado m aior da igreja para missões, pois re- ceio que essa missão corra o risco de ser engolida pela tendên- cia do evangelicalismo de gastar mais energia nesses debates entre quatro paredes. A discussão foi levem ente revisada no que diz respeito à premissa de que a deliberação da ETS é so- m ente um sintom a de outras m uitas discussões evangélicas. Os leitores se identificarão com os pontos de conexão, m esm o que as questões específicas tratadas forem diferentes.

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M eu discurso na ETS não conseguiria levantar um a série de assuntos im portantes vinculados ao futuro evangélico, a saber: a m etanarrativa, o pós-m odernism o e com o os cristãos podem e devem dirigir-se a outras culturas. Incluí esses tópicos em m eu esboço original para os estudantes do Sem inário Teológi- co de Dallas, mas decidi retirá-los de m eu discurso para a ETS,

pois to rnariam a apresentação original com plexa demais. A oportunidade de passar da form a oral para a escrita me pro- porcionou a liberdade de inserir essas questões fundam entais novam ente na discussão com o um a im portan te in trodução geral. A abrangência do capítulo inicial sugere sua im portân- cia. U m esboço mais trabalhado desse m aterial específico foi apresentado em discurso plenário no encontro regional da ETS,

em m arço de 2002. O incentivo que recebi serviu para confir- m ar que eu deveria acrescentar essa discussão ao conjunto da obra. Dessa forma, o prim eiro capítulo é um a introdução de com o buscar um a teologia da unidade na diversidade com um a essência ou um eixo de prioridades versus um conjunto centra- lizado ou lim itado proposto pelos outros. Esse m odelo é pro- missor com o um guia para a igreja em seus vários debates. U m a essência ou núcleo de prioridades pode tam bém nos ajudar a dialogar, especialmente à m edida que começamos a conside- rar quais diferenças são fundam entais e quais não devem rece- ber tan to enfoque. A determ inação dessa essência pode nos ajudar a focar não só o contexto da teologia, mas tam bém o m érito e a im portância de nossas várias discussões. O evange- licalismo pode utilizar um a discussão séria sobre o que perten- ce e o que, historicam ente, pertenceu a essa essência dentro da igreja. N ão farei nenhum a proposta específica de conteúdo. Esta é um a função da com unidade. E ntretanto , realm ente es- pero fazer observações sobre o m odo de olhar para essa essên- cia e sobre o que é crucial para trazê-la à tona.

O corpo principal do ensaio é apresentado a seguir. O que era um simples ensaio agora está dividido em pequenos capí­

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tulos distintos nos quais discorro sobre várias preocupações que refletem m inha jornada no evangeiicalismo e além dele. O u- tra vez, a base é um a discussão sobre as raízes históricas do evangeiicalismo e da ETS, um a organização profissional de es- tudiosos com cinqüenta e três anos de existência que, particu- larm ente, tem sido um term ôm etro evangélico conservador das discussões que ocorrem no evangeiicalismo norte-am ericano de m aneira mais abrangente. Portanto, trato de sua história e da do evangeiicalismo, assim como de temas diversos referentes à com posição do crescim ento internacional do evangeiicalismo, aos estudos sobre Jesus, à crítica bíblica, à form ação espiritual, à questão das m ulheres, à globalização, à análise cultural e ao teísmo aberto. A essas questões acrescentei breves com entários sobre a recém -retom ada polêm ica a respeito da tradução da Bíblia, ou tro exemplo de com o, às vezes m ediocrem ente, nos com portam os em tais polêmicas. Fiz tam bém um breve comentá- rio sobre a declaração “A palavra se fez nova”, feita por aqueles que estão preocupados com o tom e as prioridades do evangeli- calismo, caso estejam sendo conduzidos erroneam ente. N enhu- m a dessas abordagens é com pleta. O pon to principal, todavia, não é um a análise detalhada dessas questões (cada um a delas poderia gerar um a m onografia), mas sim que as questões estu- dadas sejam aquelas relacionadas ao m étodo e ao princípio do m odo de trabalhar nosso cam inho para a avaliação e com - preensão da com unidade e com o deveríam os trabalhar em missões.

Tam bém é im portan te que os leitores com preendam que não estou me dirigindo ao m odo com o determ inada denom i- nação ou sem inário deve funcionar, mas à m aneira com o algo tão heterogêneo quanto o evangeiicalismo deveria funcionar. E fundam ental com preender a diferença entre os tipos de es- tru tu ra que Deus usou e tem usado. Em toda esta obra, faço distinção entre instituições abertas e fechadas, nas quais algu­

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mas escolas confessionais e denom inacionais se encaixam. Um a de m inhas premissas é que o evangelicalismo está presente nos dois tipos de instituições. M uitas instituições evangélicas são fechadas até certo ponto , enquan to outras bem estruturadas se m antêm com prom etidas a um a essência evangélica de fé, porém , algumas instituições abertas, e in tencionalm ente estru- turadas, são boas. Cada instituição deve ter consciência de sua identidade e do papel que procura desem penhar. Existe espa- ço tanto para instituições especificamente fechadas com o para aquelas que pretendem ser mais abertas, em bora estas, com o instituições evangélicas, tam bém tenham seus limites. A dife- rença serve para nos m anter responsáveis pela verdade, de for- ma que a existência e a condução de instituições fechadas por si só não nos levem a crer que as instituições abertas não ve- nham a se tornar um festival teologicam ente indisciplinado. Acredito que meus com entários sobre os grupos eruditos, as escolas e as denom inações tam bém se aplicam aos m ercados de m ídia evangélica e editoras. A credito tam bém que existe certa confusão sobre nossas instituições, e vê-las com o m esm o objetivo contribui para a polêm ica de alguns debates a respei- to de certos grupos evangélicos.

O evangelicalismo é a expressão mais vibrante da fé cristã. Ele considera de form a séria os vários elem entos do cham ado da igreja: a adoração e o culto ao trino Deus criador, a cen- tralidade de Jesus Cristo, a im portância da obra do Espírito, a verdade, o evangelho, a teologia, a exegese, o pecado, a salva- ção, a missão, o m inistério, a santidade, a form ação espiritual, o engajam ento cultural, a com unidade da fé e do m undo em geral e o reconhecim ento de que todos somos e seremos res- ponsáveis perante Deus. Algumas pessoas ficam tão incom o- dadas com a falta de defin ição de evangelicalismo , com a polêm ica dentro do m ovim ento ou com sua falta de estrutura e responsabilidade teológica, que se perguntam se o term o ainda

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é útil. Escrevi esta obra acreditando que o evangelicalismo, com o m ovim ento e conceito, merece ser m antido, desde que não se torne implosivo assim com o o fundam entalism o no últi- m o século. Este livro é apresentado com o um a reflexão sobre com o falar a respeito dos assuntos vinculados a um a com uni- dade heterogênea e complexa com o o evangelicalismo. A di- versidade de sua com posição gera, inevitavelm ente, tensões entre os crentes, sem m encionar quando a m ensagem cristã é levada para o m undo. M eu objetivo é modesto: fazer que os leitores reflitam não som ente no que os evangélicos discutem, mas tam bém que analisem assuntos teológicos, diálogos e ver- dades polêmicas em um m undo cada vez mais globalizado no qual os evangélicos são m inoria — um detalhe fácil de esque- cer em algumas partes dos Estados Unidos, onde os evangéli- cos representam um a m aioria significativa da cultura local. Se o presente estudo gerar um a com preensão mais abrangente da dinâm ica da discussão teológica e de com o conduzi-la di- ante de questões maiores, então terei alcançado m eu objetivo, este tão m odesto quanto o tam anho desta obra.

Agradeço aos m em bros do Sem inário Teológico de Dallas e da Sociedade Teológica Evangélica, que pacientem ente supor- taram as prim eiras edições desta discussão. A resposta e o diá- logo provenientes dessas prim eiras apresentações aperfeiçoaram m inha com preensão dos assuntos levantados e dem onstraram o que o diálogo pode realizar de m aneira positiva. G ostaria tam bém de agradecer aos editores acadêmicos da IVP, que gen- tilm ente m e convidaram a transform ar m inhas reflexões sobre evangelicalismo e m étodo teológico em um livro.

D edico este livro aos m em bros de sete instituições evangéli- cas diferentes — algumas fechadas, outras mais abertas, além de um a com unidade de adoração — que tornaram m inha ca- m inhada com Deus mais profunda por causa da seriedade de seu relacionam ento com Deus. O corpo de Cristo é privilegia­

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do por sua existência. D edico a eles esta obra: Sem inário Teo- lógico de Dallas, Sociedade Teológica Evangélica, Institu to de Pesquisa Bíblica, Fórum de Formação Espiritual, Sem inário Te- ológico de Talbot, Seminário Teológico Centro-am ericano (ci- dade da Guatem ala) e Trinity Fellowship C hurch. Sou grato a Deus por essas instituições e a eles pelo com panheirism o e pe- los com entários que realm ente foram revigorantes.

Darrell L. Bock

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INTRODUÇÃO À POLÊMICA NO EVANGELICALISMO E À TEOLOGIA DA UNIDADE NA DIVERSIDADE

Um a p e lo à m e ta n a rra t iv a , ao rea lism o crítico e à abordagem bíb lica fundam entalista

ou um exegeta m ergulhando em águas teoló- gicas no que diz respeito ao direcionam ento

evangélico e aos m étodos em meio a um m undo em turbulên- cia. M ergulhei porque, com o exegeta, observo que nos últi- mos debates de especialistas em teologia sistemática e de filósofos sobre o m étodo e a introdução ao m étodo teológico, as Escri- turas não têm sido diretam ente trabalhadas. Neste capítulo, faço o mesmo, pois a maneira como abordam os a Bíblia influen- cia a m aneira com o a lemos. O papel que dam os à Bíblia afeta a m aneira com o a usamos. Assim, este capítulo é um a in trodu- ção sobre com o pensam os e agimos teologicam ente.

O texto e a argumentação deste capítulo estão dispostos em camadas, o que significa que os detalhes mais técnicos são, em algumas discussões, mais minuciosos e margeados por um a regra vertical. Os leitores que não desejarem ler todos os detalhes pode- rão pular este trecho e, mesmo assim, conseguirão acompanhar m inha argumentação. Entretanto, esses detalhes são importantes demais para serem relegados a notas. Além disso, são destinados

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aos leitores que desejam ver exemplos de áreas nas quais os evan- gélicos deveriam se engajar, contudo têm permanecido em silên- cio por m uito tempo. Comprometer-se diretamente com nossa cultura é trabalhoso, especialmente para escritores que a tratam e a m oldam de acordo com seus estudos e análises.

M ergulhei porque ouço acusações e críticas no debate a respeito da abertura e do m étodo teológico evangélico de um a m aneira em geral. O s estudiosos fazem alegações de que um dos lados do debate é prisioneiro de algum tipo de idéia sedu- tora filosófica, seja a veterana do neoplatonism o e da filosofia grega, a sedutora m eia-idade do m odern ism o, na form a de teologia princetoniana, seja a atraente jovem do pós-m oder- nism o ou pós-m odernidade. O debate naturalm ente levanta as questões sobre a direção do evangelicalismo e para onde devemos ir, especialmente dentro do evangelicalismo.

Estam os lidando, em parte, com um m undo de conheci- m entos preestabelecidos e raízes filosóficas e assim, relutante- m ente, mas po r necessidade, busco nos próxim os capítulos algum a perspectiva filosófica, histórica e bíblica de com o tra- tar das questões a respeito da identidade, do propósito e do direcionam ento evangélico. Para obter mais detalhes, peço aos leitores que acom panhem as notas de rodapé de cada seção. Nessas notas, vocês encontrarão discussões e diálogos que os evangélicos perigosam ente ignoram , se querem os avaliar cor- retam ente com o falamos com o m undo onde vivemos e somos cham ados para servir. Só posso esboçar os assuntos principais desta obra e expor sugestões de cam inhos que devemos pensar em trilhar jun tos a fim de nos dirigir de m aneira mais eficiente a um m undo carente. U m m undo de D eus e nosso tam bém .

PÓS-MODERNISMO E EVANGELICALISMOCom eço com o pós-m odernism o, que é o produ to de um m un- do que se torna cada vez mais globalizado e diverso, pelo me-

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I N T R O D U Ç Ã O À P O L Ê M I C A NO E V A N G E L I C A L I S M O E À T E O L O G I A D A U N I D A D E N A D I V E R S I D A D E 1 7

nos em term os da complexa composição de nossa consciência. A coisa mais fácil de fazer é abraçar a diversidade e deixar cada escolha ou preferência a cargo de cada indivíduo. Isso é aban- donar o diálogo sério e a aprendizagem proveniente do com - prom isso , especialm ente sob o aspecto das diferenças em com prom etim entos e orientações fundam entais. U m a teolo- g ia da u n id a d e na d iv ers id ad e está c o m p ro m e tid a pelo envolvim ento e até m esm o pelo diálogo desafiante a respeito de D eus no m undo . Ela procede dessa form a quando reco- nhece que há um a tensão fundam ental entre a alegação de falar por Deus e o conhecim ento de que nenhum ser hum ano possui um a com preensão perfeita. Assim, com o podem os en- trar em um acordo entre abraçar um a verdade revelada que traz vida e a necessidade de crescer, aprender e ser continua- m ente transform ado por essa verdade? C om o perm itim os que essa verdade nos m olde de novo até que o seu trabalho esteja com pleto em glória? C om o subm etem os nossa vida a Deus em relação ao seu m undo, à sua Palavra e à sua com unidade, de m aneira que continuem os a aprender e ao m esm o tem po nos com prom etendo com ele e sua verdade? Talvez essa seja a mai- or tensão que os evangélicos enfrentam em sua busca pelo cha- m ado divino. Buscar isso em meio a um m undo que tem pouca paciência com um objetivo que fala de verdade e m oralidade sem dificuldades, torna um a missão árdua ainda mais difícil, especialmente quando os próprios evangélicos não conseguem chegar a um acordo sobre a verdade.

Com eço recom endando a leitura obrigatória de um con- jun to de pequenos ensaios sobre as questões pós-m odernistas que descrevem nosso cenário atual. São eles: Delete “post” from “postconservative” , de R ichard M ouw, Books a n d Culture, m aio-junho de 2001, p. 21-2; C hristianity and postm odernity, de Alan G. Padgett, Christian Scholar’s Review 26, n.° 2 (1996): p. 129-32, que contém tipos de respostas evangélicas úteis ao

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pós-modernismo; e Postmodernism and the gospel: onto-theology, metanarratives andperspectivism, de M erold Westphal, Perspectives 15 (2000): p. 6 -1 0 .1

O títu lo do ensaio de M ouw revela sua tese. Em seu ponto de vista, o prefixo não é útil. W estphal discute com o os cristãos reagiram de m aneira exagerada ao avaliar o pós-m odernism o, da m esm a form a que a m aioria dos pós-m odernistas analisou erroneam ente todas as expressões do cristianism o com o objeto de repressão nos ensinam entos que W estphal cham ou de “a gangue dos seis”: N ietzsche, H eidegger, D errida, Foucault, Lyotard e Rorty. Ele discute a crítica de H eidegger à on to- ontologia, a reação de Lyotard contra a m etanarrativa e a afir- m ação pós-m odernista do relativismo e perspectivism o com o três exemplos m erecedores de um a reflexão mais cuidadosa. As preocupações de W estphal em sua discussão do pós-m o- dernism o são os m esmos pontos nos quais os realistas críticos se m ostram sensíveis, conform e é dem onstrado a seguir. Padgett critica um trabalho recente de W estphal, rejeita a dupla classi- ficação proposta po r ele e, ao m esm o tem po, apresenta um artigo de G ary Percesepe.2 A parte in trodu tó ria do trabalho de W estphal à qual Padgett reage é “A avestruz e o bicho-papão: posicionando o pós-m odernism o”,3 em que ele argum enta que há duas reações cristãs predom inantes em relação ao pós-m o- dernism o: ser com o um a avestruz (fingir que ele vai embora) ou enxergá-lo com o um bicho-papão (um ser dem oníaco, pro- du to dos pensadores ateístas e não bíblicos). Padgett responde

1Sou grato a Steve Spencer, da W heaton College, por esses dois arti- gos fmais.

2T h e unbearable lightness o f being postm odern , Christian Scholar’s Review 20, 1990: p. 118-35.

3T h e ostrich and the boobeym an: placing the postm odernism , The Christian Scholar’s Review 20, 1990, p. 114-7.

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que W estphal não considera duas outras opções: o “m elhor amigo” (um a aceitação rápida demais do pós-m odernism o) e o “parceiro crítico de diálogo” (que ouve as preocupações da pós- m odernidade e conduz seu público a um a discussão crítica). Eu argum ento a favor dessa quarta opção e insisto que, se a teologia tem de perm anecer crista e evangélica, as raízes bíblicas e cristológicas da narrativa cristã não devem ser com prom eti- das. Padgett tam bém questiona se devemos falar de “pós-mo- dern ismo” pois, a seu ver, o term o não é um sistema articulado suficientem ente coerente para ser considerado um ismo. Ele prefere falar de um a atitude pós-m oderna ou do pós-m oderno, que “celebra a m orte da rainha razão (incluindo o pensam ento linear e científico’), do ego independente, da verdade absoluta e de quaisquer metanarrativas unificadoras (ou ‘totalizadoras’)”.4

Gosto dessas discussões de m étodo não apenas porque sou um exegeta, mas tam bém como alguém que nos últimos anos assumiu a responsabilidade de refletir na formação espiritual e cultural no C entro de Liderança Cristã do Seminário Teológico de Dallas. Tam bém tenho lido com interesse Stanley Grenz, cuja obra provocante tem estado no centro das propostas evangélicas que indicam que direção os evangélicos devem tom ar.5 Em mi- nha opinião, a discussão que ele propõe focaliza m uito a proble- mática do pós-m odernismo, atenuando o papel central da Bíblia como revelação pro-posicional que afirma a verdade e a realida- de. Entretanto, representativamente, a linguagem de sua obra assim procede. Sua obra tam bém atenua as raízes dos possíveis meios de, teologicamente, adquirir conhecim ento e fazer julga- mentos. Ela deixa m uito do texto para interpretação da comu- nidade em detrim ento de um com prom isso expresso com os

4Christianity and postm odernity, Christian Scholar’s Review 26, n.° 2, 1996:129.

’Renewing the center, G rand Rapids: Baker, 2000.

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parâmetros que a Bíblia nos apresenta em relação ao pensamen- to cristão, especialmente em nossa avaliação da cultura e na de- fesa dos “novos paradigmas” de exercer a teologia. Concluindo, a Bíblia funcionaria como o principal empecilho que nos afasta de “trilharm os nossos cam inhos” enquanto contem plam os as coisas de Deus e tentam os viver de m odo diferente daquele para o qual Deus nos chamou.

A BÍBLIA NO CONTEXTO PÓS-MODERNOM eus com entários se aplicam à “pauta” proposta no Renewing the center. O utras obras de Grenz talvez tratem mais profun- dam ente esse tem a. M as em Renewing the center não há deta- lhes suficientes sobre com o alguém trabalha com a Bíblia e com o esta desem penha um papel norm ativo ou central.6 N ão gostaria de ser mal com preendido em m inha crítica a Grenz. N em estou dizendo que lhe falta um a visão m aior da Bíblia ou que sua abordagem geral não m erece um a reflexão séria ou que ela não é evangélica. Afirm o que a falta de discussão sobre o papel da Bíblia nesse caso não é desenvolvida em Renewing the center. U m a apresentação mais clara sobre o m odo de a Bíblia ajustar-se com o “norm a” poderia ajudar alguns evangé- licos a unir-se mais facilm ente a esse m odelo. Tal discussão apa- rece em sua obra com John R. Franke, na qual Grenz enfatiza que a Bíblia funciona com o o m eio pelo qual o Espírito fala à igreja, o “padrão norm ativo”.7 Em bora a função da Bíblia seja mais desenvolvida neste livro do que em Renewing the center com

6V. os com entários sobre esta discussão na nota 14, assim com o na discussão em fontes pequenas após o parágrafo de resumo dos principais destaques sobre a natureza da Bíblia aqui.

Beyond fundamentalism: shaping theology in a postm odern context, Lousville, Ky.: W estm inster John Knox, 2001, p. 57-92.

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I N T R O D U Ç Ã O A P O L Ê M I C A N O E V A N G E L I C A L I S M O E Ã T E O L O G I A D A U N I D A D E N A D I V E R S I D A D E 21

atenção especial à doutrina da Palavra-Espírito, ainda sinto certa hesitação para expressar a qualidade do resultado da escrita de maneira clara. E como se a Palavra não fosse nada sem o Espírito.

C ontudo , o fato de o Espírito inspirar a Palavra e ter ajuda- do a criá-la sugere que o produ to e sua narrativa, proposições e promessas possuem autoridade não som ente sobre com o o Es- pírito as usa, mas tam bém com respeito ao que elas afirmam. H á um a autoridade no texto, pois ela é induzida pelo Espírito, seja o produ to “delegado” ou “apropriado”. Ao defender essa posição, não questiono a valiosa sugestão de G renz de que par- te do que faz o Espírito é “projetar um m odo de ser no m un- do” e de que a Bíblia fala além do contexto do cenário do texto original. A rgum ento que esse m odo de ser é e em grande par- te form ado em razão da m aneira com o o Espírito leva a com u- nidade a ver e a en tender o m u n d o que D eus criou, assim com o o m undo que pode ser criado no Espírito. O Espírito está explicando através das Escrituras e utiliza contextos espe- cíficos, um m odo divino de ver, para ajudar a fundam entar os exemplos da vida real. Portan to , eu afirm aria com G renz o papel principal da leitura da narrativa proveniente da Bíblia com o o centro da história, o que ele cham a de prim azia da leitura do texto bíblico sobre nossas construções teológicas. Essa é a razão pela qual eu falo (com o creio que ele poderia ter falado) de um a m etanarrativa que os cristãos declaram ao m undo inteiro. Além disso, da m aneira que G renz argum en- ta, o Espírito é central para ajudar o leitor a alcançar o enten- dim ento pretendido. E ntretan to , m inha reclamação contra o m odelo de G renz é que a Bíblia ainda descreve um a realidade divinam ente criada e concebida, quer o leitor a com preenda quer não. O julgam ento surgirá porque a m ensagem não re- cebida de bom grado por alguns leitores tem sido rejeitada, m esm o que essa m ensagem expresse um a realidade divina. As pessoas darão conta a D eus por essa “supressão da verdade”,

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pois esta veio em Jesus e através da m ensagem sobre ele no Espírito pelo evangelho e pela Bíblia (Rm 10). A posição da Bíblia em relação àqueles que a rejeitam e à obra m ediadora do Espírito tam bém necessita ser analisada sob o ponto de vis- ta das funções da Bíblia com o autoridade. Essa responsabili- dade faz parte da definição do que é realm ente a Bíblia. A definição nesse m odo de “rejeição” parece pouco desenvolvi- da em Grenz. Tal diferença talvez resulte em um a sistemática mais com plicada do que G renz sugere e que talvez ainda seja válido dedicar-se à “construção” da doutrina, em bora isso ne- cessite exatam ente do tipo de ciclo herm enêutico (ou melhor, espiral) que G renz descreve para alcançá-la. Am bos concor- dam os, en tre tan to , que a m era conferência das referências bíblicas pode levar a um a leitura m uito superficial da Bíblia.

0 VALOR DO "REALISMO CRÍTICO״ E DO FUNDAMENTALISMO BÍBLICOQ ue direção devemos tomar? Recom endaria um a abordagem crítico-realista, bíblica e filosoficamente melhor. Portanto, sigo mais a linha de The genesis o f doctrine8 de Alister M cGrath. Ο evangelicalismo tam bém necessita m ovim entar-se na nova are- na de com prom etim ento com as obras m odernas desses estu- diosos que pesquisam a cultura sociologicam ente.9 Essa análise

8Oxford: Basil Blackwell, 1990, esp. p. 1-80; v. tb. Evangelicalism and the fu tu re 0 Christianity (Downers Grove, 111..: Intervarsity Press, 1995) e The foundation o f dialogue in the science and religion (Oxford Blackwell, 1998) esp. p. 140-64; T he reality o f the w orld and critical realism, M illiard Erickson, Postmodernizing the faith: evangelical responses to the challenge o f postm odernism (Grand Rapids, M ich.: Baker, 1998).

9Para fazer um a seleção sobre as monografias recentes sobre as cultu- ras de maneira geral que apresentam um a variedade de posições e fazem parte de um im portante cenário sociológico da cultura dos Estados Uni- dos e seus debates atuais, consulte os trabalhos de M orris Berman, The

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é necessária porque tais obras representam , de várias formas, as “teologias” dos nossos dias.

Essas obras têm um papel diagnóstico de grande valor na ava- liaçao do que está acontecendo com as raízes culturais e histó- ricas, e culturais e filosóficas por trás desses movimentos. Elas são também o tipo de obra que a maioria dos evangélicos, infe- lizmente, ignora. Stephen Toulmin (Cosmopolis) traça a histó- ria da m odernidade e explica como nos movimentamos culturalmente nesta terceira fase da modernidade, ou pós- modernismo. O que é fascinante nesses livros é que eles, de um modo ou de outro, defendem o valor e a necessidade cultural de uma mente vibrante e da busca da verdade em uma cultura que diminui o seu valor. A maioria das buscas está enraizada no Iluminismo ou nos valores humanistas arraigados no mo- delo educacional humanístico, um movimento em oposição ao pós-modernismo. Toulmin é uma exceção, argumentando a favor da terceira fase do modernismo (ou pós-modernismo). Morris Berman {Twilight o f american culture, p. 33-52) forne- ce algumas estatísticas alarmantes a respeito da instrução nos Estados Unidos, o que os alunos em nossos seminários estão herdando. O que também se torna interessante é como muitos

► tw ilight o f american culture (New York: W. W. N orton , 2000); de Robert H . Bork, Slouching towards gomorrah: m odem liberalism and am erican decline (New York: Regan Books, 1996), esp. p. 272-95; de Robert Co- les, The secular m ind (Princeton, N .J.: Princeton University Press, 1999); de K e n n e th G erg en , The sa tu ra ted self: d ile m m a s o f id e n tify in contem porary life (reim p., N ew York: BasicBooks, 2000); de G ertrude Heim melfarb: One nation, two cultures (New York: R andom H ouse, 1999); de Neil Postman, Am using ourselves to death: public discourse in the age o f show business (New York: V iking, 1985) e B uilding a bridge to the eighteen century, how the past can improve our future (New York: R andom H ouse, 1999); de S tephen Toulm in, Cosmopolis: the h idden agenda o f modernity׳ (Chicago: University o f Chicago Press, 1990).

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desses argumentos não têm outro telos senão a honra do esfor- ço e sua utilidade potencial em preservar o ideal do eu indivi- dual. Essas “virtudes” ainda estão separadas de Deus e de qualquer consideração séria de revelação (v. Berman, p. 182- 83, ou a ambivalência da situação em 1900, descrita em Secu- lar mind, p. 95, de Robert Coles). Eis outra razão por que a Bíblia deve ser estudada diligentemente, a fim de que possa falar de uma nova maneira para nossa era. Se pudéssemos cons- truir uma ponte de volta para o século XVIII, conforme os títu- los de Postman argumentam (p. ex., Iluminismo e no melhor do “modernismo”), talvez os cuidados e pensamentos pudes- sem ser gastos na construção de uma ponte ainda maior de volta às raízes da fé bíblica do século I (p. ex., de volta para Deus e para o reconhecimento da condição pecaminosa da humanidade que necessita de uma redenção submissa, indivi- dual e coletiva). Ao tratar do raciocínio moral, Robert Bork {Slouching towards Gomorrah, p. 278) fala bem sobre isso: “So- mente a religião pode fazer a uma sociedade moderna o que a tradição, a razão e a observação empírica não podem. O cristi- anismo e o judaísmo oferecem as maiores premissas de raciocí- nio moral por meio da revelação e das histórias na Bíblia. Não há necessidade de tentar a tarefa impossível de raciocinar do seu modo em relação aos princípios iniciais. Esses princípios são aceitos como dados por Deus”. Em seguida, Bork traz a poderosa citação de José Ortega y Gasset sobre o valor dos imperativos religiosos morais que devem ser ponderados por todos. Ortega y Gasset diz que “Os decálogos têm o seu peso desde quando foram escritos na pedra [...]. As classes sociais mais baixas ao redor do mundo estão cansadas de receber or- dens, mandamentos, e em tempos com ares de férias, aprovei- tam o período de liberdade de imperativos pesados. Mas as férias não duram para sempre. Sem mandamentos que nos obriguem a viver de certo modo, nossa existência não é bem empregada’. Essa é a terrível situação espiritual na qual gran- de parte da juventude do mundo se encontra hoje. Por meio de seu sentimento de liberdade, sem restrições, os jovens sen-

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tem -se vazios [...]. E m p o u co te m p o , será o u v id o p o r to d o o p la n e ta u m tre m e n d o clam or, p e d in d o p ara q u e a lguém to m e o co m an d o , p a ra im p o r u m a ocu p ação , u m d ev e r” .10 B o rk em segu ida fala do su rg im e n to de u m a p o lítica d e sign ificado . E o q u e u m g a n h a d o r do p rê m io N o b e l, o e c o n o m is ta R o b e rt W illia m Fogel, levan ta em seu e s tu d o , m as q u e to m a a v ir tu o - sa d ireção d o “p ó s-m o d e rn ism o ” .11 A p ro p o s ta de Fogel é u m apelo tão in te ressan te ao “e sp iritu a l”, q u e eu a analisarei em sua co m p lex id ad e p o s te rio rm en te .

Por “realismo crítico”, quero dizer que há um a realidade que nos é externa. Temos consciência e conhecimento dessa realidade, de m odo que nossa descrição, pelo menos de forma bruta, corres- ponde a ela, embora não sejamos infalíveis ou completos em nos- so entendim ento.12 Assim, devemos constantem ente examinar e reexaminar nosso entendim ento para verificar nossa inclinação de en tendê-la de form a incom pleta, se não errada. N ancey M urphy, outra proponente dos benefícios das abordagens pós- modernas, chama essa abordagem crítico-realista de “modernis- mo disciplinado”, a qual, afirma, argumenta a favor de um a for- m a adaptada de fundam entalism o (filosófico) extrem am ente vinculado à Bíblia. Prefiro chamar de fundamentalismo corrigido ou, m elhor ainda, fundamentalismo bíblico. Também poderia acei- tar de idéia de que, como leitor da Bíblia, preciso ser disciplinado acerca de como leio esse texto. Entretanto, um a posição bíblico- fundamentalista considera que a Bíblia como revelação tem um a sustentação principal e privilegiada na formação e modelagem de

10Revolt o f the masses, New York: W. W. N orton, 1957, p. 135,136.11 The fourth great awakening and the fu ture o f egalitarianism, Chicago:

University o f Chicago Press, 2000.12Agradeço a D oug B lount do Southwestern Baptist Theological Semi-

nary por sua sugestão e interação com esta obra.

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nosso entendim ento , em bora ainda devamos estar envolvidos na difícil tarefa de ler e determ inar o que a Bíblia afirma. E esse entendim ento do cuidado e da autocrítica que nos envolve como leitores, que faz do fundam entalism o bíblico um a expressão do realismo crítico. Vivemos em um m undo real, mas continuam os sendo autocríticos como leitores. Entretanto, rejeito a descrição de M urphy em relação a essas posições teológicas tradicionais, como o complexo fundam entalism o filosófico, pois não desejo dar à razão um papel soberano na epistemologia nem endossar a pauta do m odernism o (i. e., os conceitos do Ilum inismo, do uso da razão independente, da autonom ia, do individualismo excessivo e da confiança de que a ciência é a solução para todos os problemas da hum anidade). N ão defendo o fundam entalism o filosófico, que se baseia no “conhecim ento de que o m undo está apoiado em um fundam ento de crenças indubitáveis das quais podem-se tirar suposições adicionais para produzir um a supe- restru tu ra de verdades conhecidas”.13 N ão acredito que seja possível construir um a estrutura cognitiva (noética) bem orde- nada que tenha em seu nível mais fundam ental som ente cren- ças indubitáveis e incorrigíveis.

Sou a favor do fundam entalism o bíblico disciplinado por- que aceito que a verdade e a m etanarrativa estão baseadas na força da explicação bíblica com o base de m inha visão de m un- do, m esm o que eu não possa com provar com pletam ente a via- bilidade de todos os aspectos desse fundam ento com provas indub itáveis.14 O realismo crítico tam bém afirm a que o que

13 Oxford Companion o f Philosophy, s. v. F O U N D A M E N T A L IS M ; p. 289.14V. os com entários de Alister M cG rath, Reality, symbol and history:

theological reflections on N . T. W right’s portrayal o f Jesus, in: Jesus and the restoration o f Israel, o rg ., C arey C. N ew m an (D ow ners G rove, 111.: InterVarsity Press, 1999), p. 162-8. V. tb. a obra de Nicholas Wolterstorff,

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está na Bíblia vem de D eus em um a variedade de formas lin- güísticas e expressões, enquanto o reconhecim ento de m inha leitura da revelação não é autom aticam ente correto .15 H á no “realismo crítico” um a realidade, além disso, um a criação, para d iscu tir e descrever. A criação é verdadeira e tem a tribu tos que posso analisar, descrever e conhecer, mas esse realismo é “crítico” e, por isso, tenho que testar a form a com o leio essa realidade e esse texto dotado de autoridade.16 Esse realismo crí-

► C an belief in G od be rational if it has no foundations?, in: Faith and rationality: fa ith and belief in God, Alvin Plantinga e Nicholas Wolterstorff, orgs. (Notre Dame, Ind.: University o f N otre D am e Press, 1983), p. 175- 81 e Reason within the bounds o f religion, 2. ed. (G rand Rapids, M ich.: Eerdmans, 1984), onde ele argum enta que o fundam entalism o filosófico está m orto e enterrado, um ponto que parece correto. O fato dessa crítica do realismo e do fundamentalismo não necessariamente andarem juntas é argum entado por J. Wentsel Van Huyssteen em Essays in postfoundamentalism theology (G rand Rapids, M ich.: Eerdmans, 1997), esp. p. 40-52, 73-90, em que ele critica a reação de M urphy contra o realismo crítico, e p. 124- 61, onde afirma a autoridade bíblica e ao mesmo tem po defende a abor- dagem crítico -realista que com preende a cen tra lidade e o papel das afirm ações bíblicas no processo de teologia. O envolvim ento de Van H uyssteen com o realismo crítico m ostra que este pode vir de m uitas formas diferentes pois relaciona-se com a epistem ologia e bibliologia. Então, novam ente, é necessário o diálogo a respeito de um m odelo que funcione com exatidão.

1,N ancey MURPHY, A nglo-Am erican postm odernity. ph ilo soph ica l perspectives on science, religion and ethics, Boulder, Colo.: Wetview,1997, p. 41.

1:,Consulte Ben F Meyer, Reality and illusion in N ew Testament scholarship: a prim er in critical realist herm eneutics (Collegeville, M inn .: M ichael Glazier, 1994) e seu Critical realism and the N ew Testament, Princeton Theological M onograph Series 17 (Allison Park, Penn.: Pickwick Publi- ca-tions, 1989); observe especialmente os com entários de Kevin Vanhoozer, Is there a meaning in this text?׳. The bible, the reader and the m orality o f literary knowledge (Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1998), esp. p. 300-3;

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tico necessita casar-se com a sólida teoria do discurso-ação para superar as questões epistemológicas levantadas na herm enêutica contem porânea. Abordagens como as de Kevin Vanhoozer são m uito promissoras, mas essa obra é som ente o com eço.' Os evangélicos precisam prestar m uita atenção nas causas do surgi- m ento dessa discussão para, então, se envolver nela.

Uso o termo fundamentalismo em um sentido muito específi- co aqui, não no seu sentido filosófico completo. Essa é a ra- zão por que aplico o adjetivo bíblico na descrição. No centro de sua mensagem, que é crista e evangélica, está a Bíblia, sua natureza e autoridade como documento inspirado. Aqui, a “visão do alto” é expressa como parte da inspiração bíblica, embora esse conhecimento seja expresso dentro dos limites da linguagem humana e da estrutura conceituai dos autores humanos da Bíblia. Essa inspiração é a razão de muitos evan-

► C. Stephen Evans, The historical christ and the Jesus offaith: The incarnational narrative as history (Oxford: C larendon, 1996), p. 201-30. Evans trata das dimensões filosóficas dessa discussão como parte do que ele descreve como “fundam entalism o m odificado”. Para trabalhos sobre m étodo teológico, consulte Richard Lints, The fabric o f theology: a prolegom enon to evangelical theology (G rand Rapids, M ich.: Eerdmans, 1993), e Trevor H art, Taith thinking: th e dynam ics o f Christian theo logy (D ow ners G rove, 111.: InterVarsity Press, 1995). Para obter mais inform ações sobre com o essa abordagem se relaciona ao que E. D. Hirsch escreveu, v. Thorston Moritz, Critical bu t real: reflecting on N .T . W right’s rools for the task, in: Renewing Biblical Interpretation, Craig Bartholomew, Colin Greene e Karl Mõller, orgs. Scripture and hermeneutics series 1 (Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 2000), p. 172-97, esp. p. 174-84.

17Is there a meaning in this text? obra anterior alinha־se com o trabalho de A nthony C. Thistleton, The two horizons: New Testam ent hermeneutics an d p h ilo so p h ica l d esc rip tio n w ith special reference to H eidegger, B ultm ann, G adam er and W ittgenstein (G rand Rapids, M ich.: Eerdmans, 1980), e seu novo N ew horizons in hermemeutics: the theory and practice o f transform ing biblical reading (G rand Rapids, M ich.: Zondervan, 1992).

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gélicos fa la rem u lt im a m e n te em u m a m e ta n a rra tiv a q u e faz u m apelo em to d a a v id a h u m a n a . A ssim , ta lvez seja m e lh o r d izer qu e alguém é crítico-realista do qu e fundam en ta lista , pois essa pessoa p o d e ser crítico-realista sem estar co m p le tam e n te c o m p ro m etid a co m a p au ta do fu n d am en ta lism o filosófico. A expressão “fu n d am en ta lism o b íb lico” é u m a ten ta tiv a de d istin - g u ir duas posições fundam entalistas. O fu n d am e n ta lism o b í- b lico vê a B íb lia co m o o fu n d a m e n to m ais básico de u m sis- te m a de crenças sob re teo log ia , m e sm o re c o n h e c e n d o q u e a le itu ra d a B íb lia é u m p ro b le m a q u e envo lve d iscussão e co m - p ro m isso . S eg u n d o essa v isão , a B íb lia é a u to r id a d e e te m p rim az ia .

M in h a co n te s taçã o nessa a b o rd a g e m crítico -re a lis ta te m

g ra n d e p o te n c ia l p a ra os evangélicos. E la necessita ser consi- d e ra d a se ria m e n te co m o u m m o d e lo h e rm e n ê u tic o , c o n ta n to

q u e tra te co m resp e ito su fic ien te a n a tu re z a e a a u to r id a d e d a

B íb lia , n ão co m u m a ênfase n a re sp o sta d o le ito r, c o n fo rm e J.

W en tze l V an H u y ss te en [Essays in p o s tfu n d a m e n ta lis t theology]

p arece a rg u m e n ta r . C o n tu d o , essa ab o rd a g e m ta m b é m deve

ser rea lista n o q u e d iz resp e ito aos o b s tá cu lo s à le itu ra co rre -

ta de u m te x to e deve te r ce rto g rau de h u m ild a d e em sua

fo rm ação . O rea lism o c rítico é u m a m a n e ira de ver o m u n d o

e a c riação de D eu s . A rg u m e n to q u e , p a ra m u ito s cristãos, a

B íb lia te m ex erc id o u m p a p e l ce n tra l e fu n d a m e n ta l , po is

sem p re foi rec o n h e c id a n a c o m u n id a d e c ris tã c o m o m e io es-

sencia l e a té m e sm o d e te rm in a n te p a ra e n te n d e r a D e u s e

sua criação p o r in te rm é d io de seu a to p r in c ip a l em C ris to .

Essa q u a lid a d e rev e lad o ra e cap ac id a d e d e te rm in a n te to rn a m to d a a B íb lia u m a revelação especial. Esse p ap e l d a B íb lia é

p a r te in te g ra n te d o sig n ificad o de ser cristão , po is através d a

o b ra do E sp ír ito nos do is te s ta m e n to s vêm o e n te n d im e n to e

a a firm ação do q u e é a ex p e riên c ia c ris tã e d o q u e D e u s fez p o r in te rm é d io de Jesus, o C ris to . Se esse rea lism o c rítico é

v isto em ú ltim a análise c o m o fu n d a m e n ta lism o o u n ão , de-

p e n d e d a m a n e ira co m o o te rm o é d e f in id o e o co n c e ito de

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“fundamento” é aplicado. A forma de realismo crítico que defendo tem a visão do papel central e determinante da Bí- blia para a teologia e argumenta que esse papel tem sido, historicamente, a posição da Bíblia na comunidade cristã. Novamente, trata-se do uso teológico do termo fundamento metaforicamente, e não de seu uso filosófico, que significa um fundamento baseado na demonstração da prova de uma convicção. Anthonv Thistleton argumenta a favor do termo basicalidãde para descrever como certos termos funcionam teologicamente. Talvez esse seja um termo mais claro.18 Essa afirmação a respeito da natureza da Bíblia é o ponto em que a preocupação evangélica sobre “verdade” se encaixa em nos- sa discussão. Os evangélicos não devem deixar de buscar a verdade. O comprometimento principal com a Bíblia nos mantém focados na busca e na defesa da verdade.

As discussões sobre epistem ologia entre evangélicos de es- querda, de direita e de centro precisam continuar. Vale a pena refletir em grande parte da obra de M urphy, e pode existir um diálogo im portan te entre a sua form a de pós-m odernidade anglo-am ericana e a m inha de realismo crítico, com raízes na Bíblia. A obra de M urphy é um lem brete im portan te de que nem todo pós-m odernism o é desconstrutivism o, um erro que m uitos evangélicos com etem ao avaliar e s in te tizar a pós- m o d ern id ad e .19 A lém disso, a pós-m odern idade tem quatro

18C om m unicative action and promise in interdisciplinary, biblical and theological herm eneutics, in: The promise o f hermeneutics, Roger Lundin, Clarence W althout e A nthony Thistleton, orgs. (G rand Rapids, Eerdman, 1999), p. 209-14.

15 Beyond liberalism and fundam entalism : how m odern and postm odern philosophy set the theological agenda, Valley Forge, Penn.: Trinity Press International, 1996.

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coisas im portantes para nos dizer.20 Faço essa observação por- que a pós-m odernidade tornou-se um tipo de bode expiatório em m uitas correntes do evangelicalismo, que a consideram com- pletam ente ruim . E um a visão bem sim plista de um fenôm eno tão complexo.

0 QUE HÁ DE VALIOSO NO PÓS-MODERNISMO?Temos a seguir quatro coisas que o pós-m odernism o diz e que devemos valorizar:

1. A interpretação não é neutra ou objetiva, com o freqüen- tem ente retratam os. Todos tem os conceitos que influen- ciam a m aneira com o lemos os textos. O m odo com o construím os nossa percepção da realidade e com o ela nos foi legada influencia a leitura dessa realidade. Essa é a razão principal, en tre tan to , de ter a Bíblia e D eus por trás dela, nos desafiando com um a perspectiva que não está enraizada em nosso contexto e cultura. É po r isso que necessitamos de um a exegese historicam ente funda- m entada e de um a reflexão herm enêutica em nossa lei- tura. A ntes de confiarm os na verdade encon trada em um texto, devemos ter o cuidado de nos certificarmos de que estamos lendo da m aneira apropriada.

20Para obter um a excelente pesquisa in trodutória da pós-m odernidade descrita em categorias sociológicas, consulte D avid Lyon, Postmodernity, 2nd. Ed. (M inneapolis: University o f M innesota Press, 1999). M eu cole- ga Jeff Bingham observa perceptivam ente que esses quatro elementos da pós-m odernidade tam bém faziam parte das perspectivas pré-m odernas, o que fica muito claro nos itens 1, 2 e 4 e possivelmente, talvez com poucas diferenças, no item 3. Assim, ao avançarm os para a pós-m odernidade, podem os tam bém estar vo ltando em alguns p o n to s que estão sendo levantados.

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2. C om unidades, não som ente indivíduos, têm problem as de interpretação. Porém, essa observação tam bém abre a porta não som ente para sermos mais sensíveis às leituras de um a com unidade ou de um a época específica (por exemplo, a atual), mas tam bém para considerar leituras feitas por toda a história da igreja e das com unidades que dela fizeram parte. U m dos perigos do pós-m oder- nism o é que som ente as leituras contem porâneas são ana- lisadas. As com u n id ad es do passado gera lm en te são excluídas. M as nossa solidariedade com o corpo de Cris- to através dos tem pos nos alerta para não sermos tão mí- opes cronologicam ente.

3. E im portante exam inarm os determ inado assunto simul- taneam en te de diferentes ângulos ou cam adas. C ada ângulo tem seu valor. Essa observação significa que algu- m as discussões sobre tóp icos não são un ila tera is ou m onocronológicas. D iscutirei um pouco mais esse assun- to posteriorm ente. M uitos dos debates teológicos atuais m ostram cada lado trabalhando som ente com um a ca- m ada da discussão, correndo o risco de contrapor um a cam ada com a outra. Em alguns casos, as duas camadas defendidas são bíblicas, portan to , a questão é com o rela- cionar consistentem ente os fragm entos nos quais cada lado se baseia.

4. O significado de perversão e nossos meros limites hum a- nos é dizer que nem tudo que vemos está aí para ser visto. Q uer dizer, nossas interpretações não estão autom atica- m ente corretas, em bora sejam bem -intencionadas e fun- d a m e n tad a s m e to d o lo g ic a m e n te . É p o r isso q u e a interpretação necessita de testes e de interação com a co- m unidade, sem falar na necessidade de um período de pausa, antes de canonizarmos um a expressão específica de

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doutrina. Esse m ovim ento de “canonização”, quando ne- cessário (e há m om entos em que é necessário), precisa ser feito com muitíssimo cuidado e paciência.

DOUTRINA PRIORIZADA ALINHADA COM AS ÊNFASES BÍBLICAS — À PROCURA DE UM CENTRO

M uitos dos argum entos de Grenz sobre o com prom isso e a m anutenção do foco central do evangelicalismo têm méritos. Prefiro cham ar seu m odelo de conjunto centralizado de con- jun to priorizado. “Priorizado” significa que essas doutrinas cen- trais pertencem ao âmago da fé, sendo pontos prioritários a serem focados. Elas são prioritárias quanto à ênfase bíblica e form am a essência da verdade que são os temas principais da fé. Representam o que é enfatizado na teologia bíblica, em bo- ra outros elem entos da revelação sejam verdadeiros e dignos de valor. C om o verdades priorizadas, esses elem entos centrais e enfatizados form am aquelas partes da fé cristã sobre as quais houve menos debates na história.

O pon to de vista de Grenz sobre a “ortodoxia generosa” precisa ser ouvido. Já m eu ponto central é mais cristocêntrico, m issionário e b ib licam ente fundam en tado do que a am pla abordagem dirigida pelo Espírito. U m a definição cristocêntrica e missionária do cham ado divino para a com unidade é bibli- cam ente cen trada nos principais tem as das Escrituras. Em co n trap artid a , o realism o crítico desafia filosoficam ente o relativismo para o qual o pós-m odernism o serve de prato prin- cipal. O m enu da pós-m odernidade, apesar de m etanarrativo ao negar as m etanarrativas, em últim a análise esvazia quais- quer reivindicações cristãs sobre a singularidade de Cristo, le- vando na tu ra lm en te a todos os tipos de universalism o. A singularidade de Cristo é algo sobre o qual o povo de Deus jamais poderá transigir.

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A inconsistência das afirmações pós-modernas é irônica, pois para sustentá-las também há fundamentos (não há metanarrativas), mesmo quando negam a existência de qualquer fundamento. Tal- vez todos nós sejamos fimdamentalistas disciplinados no que se refere a diretrizes. A questão talvez seja qual fundamento é consi- derado como eixo principal de nossos entendimentos prévios. (Estou propositadamente misturando metáforas de rede e de fundamentos, que são metáforas pós-modernistas e modernis- tas, respectivamente.)

Se existe um centro para nossa abordagem , este deve estar arraigado especialm ente na visão trin a de D eus, pois enfoca o trabalho único de D eus no Filho po r m eio do Espírito. Esse centro trino é bem articulado nos clássicos prim órdios da fé.21

Infelizmente, o evangelicalismo, por autodefinição, surgiu sem sensibilidade suficiente para perceber o valor desses princípios de fé. Ao desejar reservar-se o direito de avaliar esses princípios de fé sob pontos de vistas específicos contrários ao que a Bíblia ensina com uma implicação da sola Scriptura, devemos reco- nhecer que a igreja dispensou muita energia e esforço por muito tempo para expressar-se perante essas definições do centro de nossa fé. A força do que eles afirmam sobre a teologia própria- mente dita e sobre a cristologia merece ser questionada em nossas comunidades, a não ser que se possa provar o contrário. Se a ETS e o evangelicalismo tivessem que buscar uma base

21Para obter um a im portan te discussão sobre o papel da tradição no m étodo teológico e que sola scriptura não significa que as Escrituras se- jam a única au toridade que aplicam os à tarefa teológica, mas que é a autoridade principal e final, consulte a obra de R obert A. Pyne e Stephen R. Spencer, A critique o f free-will theism , pare 2, Biblioteca Sacra 158 (2001): p. 387-405, esp. p. 387-96. Eles tam bém fazem argum entações im portantes sobre a inadequação do fundam entalism o filosófico e suas raízes no Ilum inism o (p. 389-91).

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doutrinária além da Bíblia e da trindade, este seria o lugar para procurá-la. É uma opção bem melhor que tentar escrever hoje esses princípios de fé a partir do zero, pois ao olhar para trás afirmaria a unidade de nossa comunidade com aqueles que foram antes de nós e, finalmente, seria um ato que afirma- ria a obra do Espírito na comunidade cristã através da história.

N ão poderem os entender a história divinam ente ativa e trina, ou ajudar a com unidade cristã a encontrar seu lugar no m un- do, se a Bíblia não for o eixo determ inante ou a fundação cuja m ensagem deve ser inteiram ente defendida, se com preendida corretam ente.22 Q ualquer igreja local construída sobre as pre- missas pós-m odernas terá de tom ar cuidado para não deixar que a centralidade e o conhecim ento da Bíblia se percam em meio à busca de um a m ensagem form ulada na relevância tec- nológica ou narrativa. Se algumas formas de pós-m odernidade consideram essas afirmações exclusivas sobre a centralidade de nossa teologia com o arrogantes, politicam ente insensíveis ou m eram ente provincianas (um a m etanarrativa para nossa co- m unidade, mas não para os outros), então que assim seja.23 Acredito que os m undos judaico e rom ano fizeram um julga- m ento pré-m oderno sem elhante acerca das afirmações exclu- sivas de nosso Senhor. Essa insistência sobre a singularidade de Jesus é o que para os evangélicos, especialmente os acadêmicos, atualm ente corresponde a suportar a cruz. O elemento central da leitura da Bíblia e da mensagem bíblica é a m etanarrativa

22N ovam ente , a m esm a questão com G renz. N ão que ele negue aBíblia, pois ele lhe dá um lugar de importância. Entretanto, ele centraliza tanto a função da com unidade definida pela Bíblia, que não fica tão clara- m ente articulado e enfatizado como deveria em Renewing the center. V. meus comentários nas p. 20-2 sobre a avaliação desta visão da Bíblia em suas outras obras. A ausência desses comentários talvez mostrem para onde as tendências do pós-modernism o podem nos levar em termos de texto.

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em torno de Jesus, o prom etido que envia o Espírito para ha- bitar e transform ar pecadores perdoados que reconhecem que necessitam do tra tam ento de Deus. A história relacionada a isso está arraigada no centro da Palavra de Deus. O cham ado da igreja é para contar essa história dentro de quaisquer limites de linguagem que nos são im postos tratando-se de expressão rem idora da verdade. Essa m etanarrativa torna-se verdadeira quando en tram os em com unhão e em un idade com ele. A Palavra de D eus tam bém é a expressão de sua m ente e vonta- de, baseada na inspiração do Espírito e registrada por meio das palavras essenciais e adequadas para nosso en tendim ento espiritual. Por isso, a Bíblia deve ter sempre um papel central no m odo de a igreja pensar, viver e form ar o povo de Deus. Sem a Bíblia, não tem os a história divina. A história da Palavra escrita é tam bém onde a Verdade se baseia para os cristãos, naquele que é cham ado de a Palavra. Por essa razão, os evangé- licos, na luta pela verdade em um m undo que parece ter desis- tid o de c re r em u m a v e rd ad e c o m p le ta , devem sem pre relem brar sua história. A rgum ento que a Bíblia, com o texto divino, é um fundam ento ou eixo para a igreja, dependendo de com o se deseja constru ir a m etáfora epistemológica. A Bí- blia nos dá um a “visão do alto” expressa na língua de baixo.

0 PAPEL CONJUNTO DO ESPÍRITO NA LEITURAO u tra questão deve ser considerada: a afirmação de que a ori- entação do Espírito nos afastará do erro e nos esclarecerá o significado do texto. Observe o dilem a em que ficamos, inde- pendentem ente do lado que ocupam os no debate. Se os dois lados afirm am ter o discernim ento claro da Bíblia e ainda as- sim discordam , só nos resta algumas alternativas: 1) um lado está certo (geralmente o meu) e o outro está errado (geralmen- te o seu); 2) os dois lados estão errados; e 3) n enhum lado conseguiu entender. Em outras palavras, necessitamos ver se é

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possível fazer um a síntese m elhor dos dados bíblicos. Devemos sempre perm anecer abertos para a possibilidade de correlacionar os dados bíblicos, respeitando o tem po e os esforços gastos em tentativas anteriores de correlação do texto. Observe tam bém quanto essa doutrina do Espírito corre o risco de ser individu- alizada: eu li o texto corretam ente, mas você, que tam bém é m em bro da com unidade, o leu de m aneira errada. E aqui que a ação conjunta da obra do Espírito precisa ser aplicada à dis- cussão. O diálogo saudável não deve ser visto com o algo ruim para os evangélicos, contan to que todos concordem os que o texto é o principal árbitro em nossa discussão. O reconheci- m ento da natureza dos julgam entos que fazemos na condição de leitores nos ajudará a tom ar cuidado ao afirm ar com certe- za que nossa leitura é a melhor. Devem os tam bém reconhecer que a m aioria das denom inações é confessional e, portan to , precisa ser capaz de delinear limites. Se elas tiverem ainda um sentido histórico a respeito do centro sobre o qual a fé está baseada (i. e., a Bíblia), os evangélicos devem recebê-las de bom grado. C oncluindo, os evangélicos precisam de lugares com o a ETS e outras instituições evangélicas com o editoras e institu- tos educacionais, onde possam realizar essas discussões com abertura para explorar com o a Bíblia poderia ser lida. A res- ponsabilidade m ú tua que essa discussão possivelm ente gerar será saudável para todos e criará um tipo de responsabilidade para o debate. Se os debates ocorrerem devotadam ente em solos bíblicos sólidos, aqueles que defendem a Bíblia não terão m uito o que temer, em bora reconheçam os que nunca chega- remos à unanim idade neste lado da glória. Som ente a glória com sua renovação com pleta rem overá a venda de nossos olhos.

O u tr a observação im p o r ta n te a ser feita a respe ito do E sp írito é qu e o seu papel p r in c ip a l é nos a ju d a r a receber e a ab raçar a m en sag em , a d iscern i-la co m o m en sag em d e D eus. E m o u tras palavras, o E sp írito não g aran te q u e o le ito r c o m p re e n d e rá co r­

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re ta m en te o c o n te ú d o d a B íblia, p o r m ais q u e ele reco n h eça e abrace sua a u to rid ad e de coração . U m a ilu stração basta. O s líderes ju d eu s consideravam o c o n te ú d o das afirm ações de Je- sus co rre to . E m b o ra en ten d essem suas afirm ações in te lectua l- m e n te , n u n c a as aceitaram e, p o r ta n to , não fo ram ensinados pelo E sp írito . Eles não co n seg u iram c o m p re en d e r o significa- do das afirm ações n e m d iscern ir q u e eram verdades v indas de D eus. A cred ito q u e esse é o p rin c ip a l p o n to d o trab a lh o do E sp írito em tex tos co m o I C o 1 .18— 2.1 6 .

A NECESSIDADE DA LEITURA INTEGRADORA E METODOLÓGICA E 0 PONTO CENTRAL DA BÍBLIA

A rgum ento não som ente a favor do lugar da Bíblia em nossa teologia, mas tam bém a favor de um pouco de reflexão filosófica cuidadosa sobre o m odo como pensamos e entendem os a reali- dade. Essa reflexão filosófica cuidadosa é um a necessidade no- tória no evangelicalismo. M esm o o cuidadoso trabalho de exegese de correlacionar os textos bíblicos deve continuar reconhecen- do m elhor o vasto debate herm enêutico, filosófico e teológico sobre o m odo como os textos são vistos e correlacionados. Ne- cessitamos de teólogos, filósofos e exegetas que tenham um a só- lida base firmada no evangelicalismo. Tornar grande demais a dicotom ia entre esses papéis não ajudará a igreja. N orm alm ente em nossos currículos e na modelagem de nosso trabalho distan- ciamos a teologia, a filosofia e a exegese. O u elas têm pouco contato umas com as outras, ou as colocamos como concorren- tes para fazer articulações teológicas. Ao entrar em debates es- pecíficos, empobrecem os os parceiros de diálogo quando não reconhecemos questões centrais integradoras vinculadas ao mé- todo e à tom ada de decisão teológica.

Existem tensões semelhantes com relação à harm onização do texto bíblico e à construção de doutrinas teológicas basea- das em sínteses complexas dos dados bíblicos. Até m esm o nos- so freqüente apelo para fazer um a analogia da fé com o um a

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form a de correlacionar textos contrastantes é um assunto com - plexo. Depois de tratar de algumas perspectivas histórias ne- cessárias sobre as raízes do evangelicalismo, o restante deste livro buscará abranger esse assunto. Por exemplo, os debates abertos nos ensinam que um texto claro definindo um texto mais difícil está norm alm ente nos olhos de quem o lê. Cada lado traça um suporte bíblico. Cada lado tam bém corre o ris- co de não com preender de m aneira clara o bastante com o os textos que parecem estar contrários aos seus paradigm as se encaixam em um todo coerente. Estam os aprendendo que idéi- as sedutoras, sejam velhas, m aduras ou jovens, às vezes se tor- nam difíceis de distinguir perante a elegante sabedoria divina. U m a é sabedoria divina, a ou tra é um a idéia sedutora. Som en- te um a com unidade sólida e aberta ao diálogo im pedirá que nossas tendências individuais sejam atraídas para onde não per- tencemos. Nessa busca legítim a pelo discernim ento e pela ver- dade, devemos insistir que o m aior foco precisa ser a Bíblia em sua totalidade, e não qualquer autoridade local. Seja o senso com um , o racionalismo, os sentim entos, as experiências, o com - promisso com a diversidade, a filosofia, a cultura local, as afir- m ações estabelecidas ou a tradição, o que é um a lista bem grande para evitar! Em suma, a centralidade da Bíblia é cruci- al para o bem -estar do evangelicalismo e para o m étodo teoló- gico em nossos tem pos de m udanças. É por isso que a ETS

com eçou com um a ênfase na Bíblia e tam bém nossa sociedade e os evangélicos de m aneira geral devem m anter sua im por- tância centralizada.

A centralidade da Bíblia sempre foi a afirmação fundam en- tal da ETS. E deve perm anecer no centro da teologia evangéli- ca. Nesse centro gostaria de destacar a centralidade da história principal sobre o Pai, o Filho e o Espírito Santo em um a mis- são, um a história proveniente da Bíblia conform e indicado e que leva à form ação de um a com unidade que respeita D eus e

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sua história, perm itindo que ele a transform e e m ude sua visão de vida. Esse pon to central deveria direcionar nossa obra con- form e avaliamos a im portância de nossos respectivos debates. Em m eu próxim o estudo, m ostrarei com o a concentração nes- se centro nos conduzirá a um a obra teológica dirigida por um centro que nos m antêm focados nas tarefas prim ordiais de nosso cham ado. M eus com entários aqui pretendem som ente provo- car reflexões sobre a im portância da centralidade da Bíblia. Espero que nos ajudem a enxergar que o m odo com o lemos o texto, quer com o indivíduos quer com o parte de um a tradição isolada, não pode igualar-se à m aneira com o deveríamos lê-lo e discuti-lo. N em pode esgotá-la. A Bíblia é central na defini- çao da identidade que a com unidade evangélica deveria ter, mas é a leitura dessa com unidade, com o um todo, que pode ajudar-nos a reconhecer o escopo, a profundidade e as várias facetas do caráter da m ensagem de Deus.

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OS LIMITES E A HISTÓRIA QUE RELATAM Ο MOVIMENTO EVANGÉLICO

com prom isso de fazer teologia em nosso m un- do é bem expresso por Paul Johnson em sua

obra A History o f Christianity [ Uma história do cristianismo\, em que afirma: “C ertam ente, a hum anidade sem o cristianis- m o evoca um a perspectiva sombria. O s registros da hum ani- dade com o cristianism o são suficientem ente atem orizantes [...] N a últim a geração, com a retirada im petuosa de cena do cris- tianism o, tivemos a prim eira visão distante de um m undo des- cristianizado, o que não é nada encorajador”.1 Neste capítulo, gostaria de começar a discussão sobre com o m inistrar em um m undo onde os limites parecem miragens, m esm o que o evan- gelicalismo se prenda a eles e argum ente que esses limites estão arraigados nos cam inhos de Deus.

N־ ew York: Sim on e Schuster, 1976, p. 157.

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OS LIMITES: UM COMPROMISSO DIVINO E O EVANGELICALISMO DA UNIDADE NA DIVERSIDADE

Nos últim os anos, surgiu um intenso desejo de estabelecer li- mites dentro do evangelicalismo. Assim, gostaria de conside- rar com o discutir questões sobre a colocação de limites e que tipos de limites devem ser estabelecidos.2 Nossa obrigação diz respeito som ente à verdade? C om o lidam os com o fato de que m uitos de nós defendem os verdades diferentes quando leva- mos em consideração nossos diversos subgrupos? C om o de- fendem os a questão da verdade, não apenas tra tando-se de m étodo e fatos bíblicos, mas tam bém de com o nos dirigim os uns aos outros? Nossa m eta no evangelicalismo deve estabele- cer mais limites além daqueles que a ortodoxia histórica nos legou, ou devemos dar atenção às outras coisas? Se fossem co- locados mais limites, com o deveria ser feito? As mesmas regras valeriam para todas as organizações dentro do evangelicalismo? Algumas organizações dentro do evangelicalismo deveriam ser estruturadas de m odo que facilitassem o diálogo sobre ques- toes polêmicas para que as pessoas pudessem falar abertam en- te, sem m edo de punição, contanto que as propostas fossem plausíveis e dentro das diretrizes bíblicas? Organizações evan- gélicas com o a ETS e editoras interdenom inacionais deveriam ter essa função? N ão era esta a intenção dos fundadores quan- do form aram a ETS em 1949: aceitar pessoas de diversas tradi- ções teológicas? Por que a ETS a princípio se m anteve fiel a um valor, a saber, um com prom isso com a autoridade e o caráter inerente da Bíblia com o a Palavra de Deus? E um valor que vale a pena reafirmar? A ETS e outras organizações deveriam ser estru turadas de form a que criassem um lugar adequado

2Agradeço a Jeffrey Bingham, um colega antigo de teologia histórica que agora é professor de teologia no Southw estern Baptist Theological Seminary, pelo im portante apoio dado neste capítulo.

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para evangélicos, o que seria mais difícil de ser feito em organi- zações diferentes?

Todas essas questões são cruciais para um a entidade hetero- gênea e não m uito bem definida com o o evangelicalismo. O evangelicalismo precisa focar seu com prom etim ento no evan- gelho, na autoridade única da Bíblia e na verdade. M as preci- sa fazer isso à luz do princíp io saudável e auto-reflexivo da reforma, no qual estamos sempre crescendo em nossa com pre- ensão e necessidade, visto que não somos perfeitos até que o Senhor nos glorifique. Essa falta de com preensão com pleta de- veria nos rem eter cada vez mais à Bíblia e m esm o levar-nos à submissão perante o Espírito de Deus, para buscar a sua dire- ção para com preender a sua vontade e caminhos.

Defendo que o evangelicalismo necessita da ETS e de grupos de estudos e reflexão como esse, com sua estrutura, para ser lu- gar de debates onde a Bíblia é afirmada e levada a sério com o a Palavra de Deus. A ETS é única dentro do evangelicalismo. As- sim, sua resposta às questões polêmicas deve ser séria no que diz respeito à verdade e, ao mesmo tem po, deve ser aberta para a discussão de possíveis configurações da verdade. Em algum lu- gar deve haver um local para analisar áreas obscuras do conhe- cimento. Então, a resposta da ETS deve ser m edida pelo m odo com o julga os limites difíceis. M ais im portante, eu afirmaria que na busca por um a reflexão in terna não perdem os a visão de outros aspectos cruciais de nosso cham ado: sermos servos da igreja em geral e testem unhas no m undo. A reflexão teoló- gica séria do evangelicalismo precisa envolver-se em desafios tam bém sérios. Desafios gerados no m undo para o coração e alma das pessoas. C ontrabalançam os duas grandes preocupa- ções no evangelicalismo: a busca da verdade divina e um estu- do espiritual, baseado na Bíblia, que prepara a igreja para viver de m odo cristão e para dirigir-se de form a significativa a um m undo necessitado. Precisamos tom ar cuidado para que a ver­

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dade e o envolvim ento do m undo perm aneçam em nossa tela de radar.

H á lições que podem os aprender com a história do evange- licalismo, com a história de um a organização como a ETS e com as possibilidades existentes para o evangelicalismo hoje. Essas lições nos ajudarão a evitar que sejamos autocontem -plativos demais. Pode surgir um a preocupação potencial com nossos debates internos em detrim ento de nossa função fundam ental de atender à incum bência do Senhor de envolvermos o m un- do com a esperança do evangelho. Esse não é um ofício para o evangelicalismo.

V oltando à história, comecemos com um a m etáfora bíblica. Vejo a história com o um ím ã da missão que D eus nos deu. Suscito esse assunto à luz de um m undo evangélico que fala da história teológica com o um a inclinação perigosa que inevita- velm ente nos puxa para a escuridão e para o desvio. C om cer- teza, há m uito mais a ser considerado sobre essa questão. A história m ostra que, quando abandonam os nossos ancoradou- ros bíblicos e espirituais, somos levados pela correnteza. M as o evangelicalismo precisa mais do que um a m etáfora predom i- nante. Ele necessita de um a m etáfora de esperança, além de um a que nos alerte sobre o perigo. Creio que os votos m atri- m oniais seriam um a m etáfora mais útil. Além da vinda de Cris- to, os votos m atrim oniais para m uitos de nós representam o m om ento mais sagrado da vida. É o instante em que dizemos com nosso cônjuge “até que a m orte nos separe”. Duas pessoas com prom etendo-se um a com a ou tra para o resto da vida. M inha com paração é um lem brete im portan te de com o co- m eçamos. Pois D eus em Cristo tam bém nos fez o seu voto nupcial. Ele apresentará sua igreja a si m esm o com o um a noi- va pura, sem m ácula (Ef 5.26,27). Algumas vezes, quando ouço todo o negativismo sobre o que está acontecendo na igreja ou no evangelicalismo, ou leio a respeito do declínio de institu i­

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ções a princípio com prom etidas com Deus, eu me pergunto: onde está a f é de que 0 voto que Deus nos fe z é sua promessa inal- terável? Deus nos prom eteu: “Até que a glória nos com plete”. Se falharmos, ele não falhará em erguer do m undo e de sua igreja aqueles que forem fiéis a ele e à sua Palavra. Sua promes- sa não nos libera de nossa m ordom ia espiritual de servi-lo. C on- tudo, deve nos m otivar a lem brar que ele está com prom etido em nos dar apoio quando buscarm os orientação e sabedoria (Tg 1.5-8). Aqueles que verdadeiram ente buscam a face de Deus o acharão. C om o o autor de H ebreus afirma: “ [...] pois quem dele se aproxim a precisa crer que ele existe e que recom - pensa aqueles que o buscam ”.

C om base nessa promessa, consideramos um editorial de 1993 do ex-secretário-tesoureiro da ETS Sam Kistemaker. Essa socie- dade é composta por estudiosos e pastores, a maioria da Améri- ca do N o rte , que o b tiv e ram o g rau de m estrad o ou são m estrandos em estudos teológicos. Eles se reúnem duas vezes ao ano, um a vez nacionalm ente e outra regionalmente, para discu- tir questões de estudo e interesse teológicos. A declaração doutrinai atual da sociedade sustenta a infalibilidade e a trinda- de. Kistemaker escreveu um a nota de despedida encorajadora em nosso jornal teológico, quando se aposentou da função que exerceu de 1974 a 1992. Ele falou como m em bro da segunda geração da ETS para a terceira geração. Traçou o crescimento da sociedade desde os encontros ocorridos no câmpus do seminário até os realizados em hotéis. Observou o crescimento da ETS de 600 m embros para 2 100 (a ETS tinha quase 3 500 m embros até novembro de 2001). Fechou seu editorial dizendo:

E sto u satisfeito de e n c o n tra r diversos estud iosos jovens e capa- zes em nossos en c o n tro s reg ionais e nac ionais. Ê u m b o m sinal p a ra a ETS. in c en tiv am o s es tud io sos m ais jovens a p a rtic ip a r de funções de lid e ran ça e co ra jo sam en te ap re sen ta r pesquisas

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evangélicas n a v an g u a rd a d a busca acadêm ica. C o n fo rm e o g u ard ião m ais velho passa a to ch a para a geração m ais jovem , ac red itam o s que, co m as bênçãos d o S enhor, a ETS co n tin u a rá a ser fiel a seu p ro p ó sito : “F o m e n ta r a pesqu isa b íb lica conser- vadora , sen d o u m m eio p ara a tro ca verba l e expressão escrita dos p en sam e n to s e para a pesqu isa n o ca m p o geral das disci- p linas teológicas cen trad as n a B íblia” .3

C ertam ente, Sam estava falando diretam ente àqueles que, com o eu, participaram de encontros após encontros, em m eu caso, desde 1976. Sam concluiu seu m andato, passando adi- ante a declaração dos propósitos da constituição da sociedade, escrita em 1949. Ela serve com o um voto de direcionam ento que conduz um a sociedade orientada pela busca da unidade na diversidade. D evem os fom entar a pesquisa conservadora por m eio do diálogo verbal e escrito e pesquisar disciplinas teológicas, desde que centradas na Bíblia. Com o essa organiza- ção faz isso e m antém sua característica erudita, sua com uni- dade e sua integridade teológica? Podemos estar na extrem idade cortante sem correrm os o risco de nos cortam os até a morte? Além disso, será que as lições que aprendem os e estamos apren- dendo ajudam o vasto m undo evangélico? Com eço voltando o olhar para a história da origem do evangelicalismo, então po- derem os considerar onde um a sociedade com o a ETS encaixa- se no m ovim ento e com o pode contribuir com ele.

UMA REVISÃO HISTÓRICA DE NOSSAS RAÍZES EVANGÉLICASM inha in trodução a este capítulo foi elaborada, mas o evan- gelicalismo é um a entidade complexa e sua im portância para a igreja dificilm ente será exagerada, por causa de sua com posi­

3Editorial de convidado, Journal o f the Evangelical Theological Society 36, η." 1, 1993: p. 2.

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ção m ultidenom inacional e m ultinacional. O evangelicalismo possui tan to a un idade quan to a diversidade da igreja, com quem com partilha o com prom isso fundam ental da Bíblia, a busca da verdade e da missão teológica. H oje, ele enfren ta os grandes desafios de um m undo que se encon tra em um im- portante fluxo cultural e filosófico, conform e indicou o capí- tulo de abertura.

O m eu prim eiro ponto de vista sobre o evangelicalismo é direcionado às suas subdivisões, a qualquer grupo denom ina- cional ou tradicional da igreja que se identifique com o evan- gélico. Lembre-se: um subgrupo não é o evangelicalismo, mas som ente um a parte dele. Nossa história m ostra que nossas raízes são variadas. A hum ildade adequada nos ajudará a definir cia- ram ente nossa função, conform e buscamos o com prom etim en- to do evangelicalismo com a verdade e com a igreja.

Primeiro estágio: a reforma e 0 p iet ism o a le m ã oA história revela que o prim eiro estabelecimento das raízes evan- gélicas ocorreu na Reform a e em suas conseqüências. As raízes do term o evangélico são as mesmas da Reforma. Os reforma- dores usavam esse term o a respeito de si mesmos, antes do ter- m o protestante tornar-se popular.4 Erasmo altercou com Lutero sobre o term o evangélico. A igreja protestante na Alemanha ain- da é conhecida como evamelisch, e não luterana. N o centro da

O

confissão luterana perm aneceu a justificação pela fé.Em Calvino, foi desenvolvida um a ênfase com respeito a

questões mais abrangentes com o santificação (vida santifica- da) e regeneração (enraizada no Espírito). O regenerado é transform ado e torna-se frutífero. A justificação foi feita um a

*Stanley J. GRENZ, Renewing the center, G rand Rapids, Mich.: Baker, 2000, p. 26.

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só vez para todos, seguida da santificação. Para Calvino, as obras são um resultado da justificação, não a justificação como resultado das obras, com o na teologia católica medieval. Se- gundo Stanley G renz, a palavra, o sacram ento e, posterior- mente, a disciplina, incluindo a da igreja (puritanos), tornaram-se as marcas da igreja pura, tam bém conhecida como invisível e eleita. A certeza individual da salvação passou a ser baseada na evidência da santificação. Então, as raízes evangélicas abrangem o luteranismo e o calvinismo, assim como outros grupos da Re- forma, como os anabatistas. Todos eles passaram a crer que a salvação é somente pela fé em Cristo por meio da graça.

O pietism o alemão cresceu sob o olhar observador de Phi- lipp Jakob Spener, H erm an Francke e outros. Esses pietistas enfa- tizaram o sacerdócio universal e o valor de um a classe leiga treinada que deveria avançar a obra da igreja. Adoração, ora- ção, estudo da Bíblia e com unhão eram os princípios funda- m entais, e o novo nascim ento tornou-se o objeto principal do pietism o. O foco era o coração transform ado que conduzisse a um viver adequado. A conversão pessoal, e não o sacramento do batism o, tornou-se a evidência mais im portante que alguém poderia ter. Testem unhos indicando m om entos de experiên- cia consciente de com preensão da vinda a Cristo tornaram -se o principal meio de definir a entrada de alguém para a igreja e o com ponente fundam ental das características evangélicas. A certeza da salvação surgiu em meio à natureza dessas experiên- cias. Essas ênfases parecem familiares? Elas são parte de nossa herança. Esses pietistas não buscavam um a igreja pura, mas um a “igreja dentro da igreja”. Aqueles que buscavam um a igreja pu ra lu ta ram para encon trá-la , com o a fam osa h istória de Roger W illiam s deixa claro. Estavam surgindo abordagens di- ferentes do com prom etim ento evangélico, em bora Jonathan Edwards com sua ênfase nas tendências religiosas parecesse re- presentar um a fusão das ênfases, com binando conteúdo e cora­

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ção. O que tam bém significa, contudo, um foco no indivíduo em relação às questões e tentativas conjuntas. Alguns sugerem que a m odernidade, com sua ênfase na experiência “provável” (por fim, expressa de form a poderosa em Schleiermacher), tor- nou essa m udança socio logicam ente possível.’ Ela deu ao evangelicalismo seu foco mais valioso, o das dimensões pessoais e individuais da fé, mas suas raízes tam bém amenizaram a preo- cupação com as dimensões conjuntas da cam inhada cristã com Deus.

Segundo estágio na América do Norte: Os dois grandes reavivamentos do século xvm e começo do século xix.

Esse segundo estágio histórico surgiu na Am érica do N orte com os dois reavivamentos do século XVIII e começo do século XIX. Esses reavivamentos foram diferentes teologicam ente e de formas relevantes, mas me concentrarei aqui em seu im pacto sobre o evangelicalismo e em suas características sociológicas. As figuras principais são Jonathan Edwards, George W hitefield, os Wesleys, Charles Finney e seus seguidores. Enquanto o pri- m eiro grande despertam ento foi principalm ente calvinista, no segundo, evangelism o e p ragm atism o, com binados com o m etodism o pietista, focavam em m enor grau a ordenança di- vina em relação ao que aconteceu com os reform adores.6 Os

Tbid, p . 49-50.1’D onald D A Y TO N , Discovering an evangelical heritage, 1996, Peadbody,

Mass.: H endrickson, 1994. C om bino propositalm ente a discussão sobre os dois grandes despertam entos na América do N orte. O prim eiro sur- giu em m eados do século XVIII com W hitefie ld e Edw ards sendo os catalisadores de um grande despertam ento reform ado e calvinista. O segundo surgiu no século XIX e foi mais diverso, refletindo o crescimento do metodism o. Em parte, junto as discussões porque o prim eiro, sendo tão calvinista, era de certo m odo um a extensão das ênfases da Reforma, enquanto o segundo era um a reação em parte às ênfases do prim eiro e às

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reavivadores não só pregavam o evangelho, mas tam bém ti- nham preocupações sociais (cham adas de “reform a m oral”) com os pobres, escravos, m ulheres e finalm ente com a absti- nência ao álcool. Todo o ím peto dessas preocupações surgiu dos evangélicos, já que ainda não havia o evangelho social, um a expressão da teologia voltada para a reação política. Essas pre- ocupações pelo próxim o em ergiram da defesa de um a visão de vida de santidade, diferente do m odo com o o m undo vivia e que marcava a poderosa presença transform adora de vidas pelo Espírito, incluindo o m odo de servir ao próxim o.

Tais m ovim entos tinham tam bém raízes escatológicas. A mai- oria das pessoas hoje não sabe que Jonathan Blanchard, funda- do r da Faculdade de W h eato n , tin h a sim patia pelas visões pós-milenaristas. N a realidade, ele considerava-se ao mesmo tem- po pré e pós-milenarista.7 Blanchard certa vez argum entou que

► raízes da Reforma. O pon to básico é saber com o foram essas raízes do evangelicalism o am ericano por séculos. H á tam bém outras preocupa- ções im portantes sobre o segundo despertam ento, particularm ante quan- to aos aspectos da teologia de Finney que Pelágío insinua, um a perversão tão mal expressada que tornava clara a necessidade de um a obra da graça divina. Ao fazer esse com prom etim ento , faço distinção entre dois tipos de soteriologia: a de F inney e a do M etodism o e A rm inianism o. Sua abordagem sugere que os possíveis efeitos poderiam levar à resposta, subestim ar a im portância da obra divina que transform a nosso coração. Sobre o reavivam ento, v. M ark A. N oll, The scandal o f the evangelical m ind (G rand Rapids, M ich.: Eerdm ans, 1994) p. 96. N oll observa um outro grande perigo que veio à tona durante o Segundo D espertam ento que tam bém foi fun d id o com o ind iv idualism o e o im ed ia tism o da nova form a de pesquisa. E no antitradicionalism o que o evangelicalismo perde o sentido de conexão e fidelidade à história da igreja que o apóia. (p. 60-4).

7Paul M . BECHTEL, Wheaton College·. A heritage rem em bered 1960- 1984 (W heaton, 111.: H arold Shaw, 1984), p. 40. Sobre algumas diferen- ças de ações simultâneas de pré e pós-milenarism o, v. Christian Cynosure, 5 de abril de 1977.

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“a sociedade é perfeita onde o que é certo na teoria existe de fato; onde a prática coincide com o princípio, e a lei de Deus é a lei da terra”. Imagine alguém hoje argum entando que esse é um padrão atingível para a nação. N a realidade, alguns ainda o fa- zem, enquanto outros apenas flertaram com a idéia.8 Recente- mente, David C hilton disse: “Nossa m eta é o dom ínio do m undo sob o senhorio de Cristo, o controle do m undo’, se desejar [...] somos os formatadores da história do m undo”.9 Em bora discor- de dessa missão triunfalista, chamei a atenção desse ponto para m ostrar quão abrangente o evangelicalismo era anos atrás. D u- rante o século XIX, os evangélicos britânicos e de outros países europeus formaram a Aliança Evangélica em 1846, e suas preo- cupações refletiam o que foi visto nos Estados Unidos. Algumas das reform as sociais mais significativas na Inglaterra foram conduzidas por evangélicos no período vitoriano. A Aliança Evangélica é antecessora da Sociedade Evangélica M undial, um a organização líder internacional.

O ponto principal de tudo isso foi o com prom etim ento com a Bíblia (sola Scriptura), inicialm ente em oposição ao apelo do catolicism o rom ano à tradição e, posteriorm ente, em reação ao surgim ento de um a racionalidade secularizada e das reivin- dicações científicas sobre o m undo; e seguida, aos m ovim entos subseqüentes em direção ao liberalism o teológico, baseados exclusivamente no experim entalism o.10 O m ovim ento de con- ferência bíblica no século XIX, liderado em parte por aqueles

‘",Paul BOYER, When time shall be no more׳. Prophecy belief in m odern american culture, Cambridge, Mas.: Belknap Press, 1992, p. 303-4, ob- serva que o dom ínio da teologia de Rushdoony, G rim stread, N o rth e C hilton encaixam-se neste ponto, e argum enta que Pat Robertson flertou com a idéia.

‘1Para esta citação, v. Dave H unt: Whatever happened to heaven? (Eugene, Ore: Harvest House, 1988), p. 205■

10G rz x z , Renewing the center, p. 53-80.

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que focavam a volta do Senhor e o fu turo de Israel, tam bém contribuiu. Esse foi o ponto em que o dispensacionalismo em sua fo rm a o r ig in a l c o m e ç o u a d e ix a r suas m arcas no evangelicalismo, com prom etido com toda a Bíblia, ainda que se especializando naqueles elem entos vinculados à profecia.11 É interessante que tal m ovim ento tenha surgido em um perío- do de intenso teor teológico e dúvidas nas principais igrejas. É com preensível que tenha ocorrido um a im ensa pressão para defender tudo em m eio ao crescente caos e ataque à fé. Essa defesa tornou-se tão relacionada ao m odelo literal ou corres- p o n d en te da verdade que a herm enêu tica de M ilton Terry poderia ser “amilenarista” e “literal” ao m esm o tem po.

Alguns descrevem o evangelicalismo arraigado na reforma com o possuidor das cinco solas׳, sola Scriptura, sola gratia, sola fide, solus Christus e soli Deo Gloria. Aqui está um ótim o fun- d am en to cen tra l a ser ad ic ionado à confissão cristo lógica trinitariana da igreja prim itiva, conform e encontrado nos prin- cípios de N icéia.12 Se o evangelicalismo nunca perder sua for- m a enquanto vagueia por suas m uitas subform as, perm anecerá conectado às prioridades da igreja ortodoxa histórica e aos seus princípios, da m esm a form a que a reforma, e tam bém às solas que poderão m antê-lo no curso em meio à sua capacidade de adaptar-se às forças sociológicas transform adoras.

Agora chegamos a meados do século XX quando os evangéli- cos estavam em toda parte: luteranos, presbiterianos, episcopais, metodistas, batistas, pentecostais, carismáticos, dispensacionalistas e outros, todos contribuíram significativamente para o que fi­

11C raig B LA ISIN G , D ispensationalism : the search for defin ition , in: Dispensationalism, Israel and the church: the search fo r definition, (Grand Rapids, M ich.: Zodervan, 1992), esp. p. 16-20.

12Modern Reformation 10, n.° 2 (2001): p. 33.

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cou conhecido como m ovim ento evangélico, um agrupam ento que tam bém estava engajando o m undo de maneira que pudes- sem ser diferenciados do fundam entalism o. M uitos permanece- ram em suas denominações, enquanto outros seguiram caminhos separados para construir a partir da base suas instituições eclesi- ásticas. Praticam ente, todos os grandes seminários evangélicos de hoje têm suas origens no período da metade do século XIX à m etade do século XX. Surgiram numerosas organizações evan- gélicas, incluindo editoras, revistas como a Christianity Today e organizações como a Associação Nacional de Evangélicos, na ten- tativa de serem canais dos acontecimentos, ainda sem estrutura formal, de um m ovim ento evangélico. Billy G raham era reco- nhecidam ente o sím bolo do que o evangelicalism o defendia e acreditava. A ETS em ergiu nesse m esm o contexto em 1949. D e certa form a, o evangelicalism o estava em toda parte den- tro da igreja e em lugar n en h u m , tratando-se de estru tu ra form al. Iron icam ente , quando esse segundo período decisi- vo de form ação chegou ao fim , o evangelicalism o estabele- ceu-se, mas não se firm ando em quaisquer instituições form ais que pudessem estru tu ralm ente abrigá-lo. O que o un iu foi o com prom etim en to com o evangelho, a Bíblia e a verdade, o que m anteve suas m uitas partes diferentes costuradas livre- m ente no Espírito, apesar de o evangelicalism o ter funciona- do em várias divisões denom inacionais. O foco teológico central do evangelicalismo o m anteve coeso, em bora de form a livre, apesar de seu crescimento em várias subpartes.

0 QUE FAZ 0 EVANGELICALISMO HOJE: SUAS RAÍZES FORA DO FUNDAMENTALISMO E SUA BATALHA COM 0 MODERNISMO

N ão trato aqui detalhadam ente de outra subtram a im portante da história do evangelicalismo: sua urgência em destacar-se do fundam entalism o no meio do século passado. Essa expressão de evangelicalismo procura conscientem ente distinguir-se da sepa­

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ração do fundam entalism o da sociedade, do m undo e até mes- m o da igreja. Conseqüentem ente, o fundam entalism o fragmenta- se em muitas direções na m etade do século XX. Eis um a lição do que pode acontecer quando um desejo intransigente de estabe- lecer limites, se não for tem perado com um sentido de perspec- tiva histórica. Q uando começa, onde e quando vai parar? A não ser que os princípios centrais da teologia perm aneçam como um a questão de prioridade, com todas as outras questões abertas para discussão, para que seja possível saber quais batalhas são priori- tárias e quais são secundárias, a busca de limites apenas construi- rá m uros que separam e dividem. Existe um perigo semelhante quando todos os tópicos estão abertos para o debate e são tolera- dos com indiferença doutrinária.13

Assim , ninguém mais sabe com o distinguir as verdades cen- trais da fé, que m antêm a igreja no curso dos debates mais internos. É nesse ponto que o trinitarianism o e os princípios da igreja prim itiva assum em o papel instrutivo e crucial de nos lem brar dos elem entos centrais e prioritários da fé. A igreja sempre considerou a im portância dessas doutrinas. Sem um grande fundam ento teológico bem arraigado na história da igreja, rem etendo-se à era prim itiva, os fios livres, que de algu- m a form a m antêm o evangelicalismo unido, no curso se enfra- quecerão e se quebrarão.

13E aqui que a recente declaração “W ord m ade fresh” ( A palavra se fez nova) torna-se insuficiente. Ela disse tudo em bom tom em nossos debates, alertando para não não cairmos no perigoso tom fundam entalista e divisor ou traçarm os limites demais, não oferece nenhum a ajuda im- portante para determ inar a verdade e discernir quais debates são priori- tários de tal m odo que a igreja deve lutar por sua alma teológica. Arrisca-se a sugerir que alguns debates teológicos são criados da m esm a form a e que as inovações propostas são para isentá-los da crítica. Algumas vezes, a igreja deve se posicionar firme contra inovações que destróem o cará- ter único da revelação ou da doutrina de Deus e sua graça.

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A batalha com o m odernism o nos séculos XIX e XX m arcou o evangelicalismo com um a valiosa paixão pela verdade em cada detalhe. O cristianism o, com o verdade, precisava de um a de- fesa com pletam ente desenvolvida, e ainda precisa. A Bíblia era (e precisa perm anecer) a principal característica dessa apoio- gética. A verdade foi defendida com o parte de um a guerra de visões de m undo, pois a batalha não era som ente intelectual, mas sim, ainda mais im portante, espiritual. O sentido de vida ou m orte im pregnou esses debates, à m edida que o princípio bíblico lutava por sua sobrevivência.

Porém, ao adotarem um a análise da cultura e do m undo e suas diferenças dentro da igreja visível do século XIX e começo do século XX com o um a batalha, os conservadores tam bém ad- m itiram um a análise sem elhante das disputas mais internas en- tre aqueles que eram claram ente crentes e que m antinham o respeito pela Bíblia. A análise racional foi que o m enor desvio da verdade nos levaria a um a inclinação perigosa de abando- nar a Bíblia, a revelação e a verdade. A posição era com preen- sível na prim eira m etade do século XX, pois a sobrevivência do conservadorismo teológico estava em jogo diante do liberalis- m o que aparentem ente em ergira num érica e adm inistrativa- m ente vitorioso (pelo m enos por algum tem po) na m aioria das denom inações. N a m ente da m aioria que tinha consideração pelo cristianism o, a igreja visível tornara-se defeituosa. M as D eus p rom eteu à igreja, bem antes de tudo isso acontecer: “Até que a glória nos com plete”. E a seu m odo misterioso, con- tudo soberano, ele agiu para preservar a igreja confian te e m antê-la viva, principalm ente, graças em grande parte à obra fiel daqueles que form aram as prim eiras gerações da ETS e de outras organizações com o esta. A derrota, até certo ponto , se- ria bem possível, mas os tem pos estavam em transform ação. Deus ainda estava trabalhando. Ele estava trabalhando em todo o período desde a Reforma. E as raízes do evangelicalismo cres­

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ceram e se estenderam para englobar um a herança form ada por m uitas correntes diferentes.

A LIÇÃO DEIXADA PELA HISTÓRIA DO EVANGELICALISMOH á um a grande lição nessa história que proporciona ao evan- gelicalismo sua vibração e vitalidade. E o desejo de ser fiel a Deus na sua missão, caráter e m ensagem e ao m esm o tem po existir surpreendentem ente em diversas formas. Sua hesitação em ser centralizador e seu com prom isso de concentrar-se em torno de um ponto principal o m anteve verdadeiro e flexível o suficiente para adaptar-se a tem pos de mudanças.

N o início do século XXI, vemos que a teologia evangélica conservadora sobreviveu por causa de m uitas pessoas que fo- ram diligentes em perm anecer fiéis à Bíblia, com prom etidas com Cristo e preocupadas com o m undo, m esm o enquanto buscavam as reflexões doutrinárias e a integridade espiritual. Em m uitos casos, as instituições foram reconstruídas e agora se desenvolvem. O utras se recuperaram . Nossa recuperação foi tão forte que alcançou um nível em que o m áxim o que pode- ríam os tem er era nosso desejo de buscar um a popularidade cultural e social, provavelmente em detrim ento de nossa m en- sagem. Essa sobrevivência possivelmente foi difícil de visualizar na virada do século. Deus m udou os tem pos e novam ente tra- balhou para m anter sua promessa “até que a glória nos com- plete”. A inda estamos nessa jornada; os riscos perm anecem , e tam bém a promessa de Deus.

O evangelicalismo tam bém se to rnou vibrante porque as gerações de crentes do século XX tentaram perm anecer focadas em atender ao vasto m undo em que se encontravam .14 A ETS

1,Para um estudo fascinante do im pacto do evangelicalismo na histó- ria dos Estados Unidos e da perspectiva dos Grandes Despertam entos, v. a obra do econom ista e prêm io N obel Robert W illiam Fogel, The fourth

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nasceu nesse contex to , e sua m eta era co n trib u ir para um evangelicalismo que ainda necessitava de um lugar para a re- flexão e o engajam ento teológicos. Paradoxalmente, quando a luta teológica estava mais acirrada, as fundações tam bém fo- ram estabelecidas por ou tro con jun to de evangélicos que se preocupavam com o m undo e com a universidade. Entre esses estão grupos com o o InterVarsity C hristian Fellowship, a C ru- zada Estudantil para Cristo, o Young Life e o Navigators, sem m encionar várias organizações missionárias ao redor do m un- do que atingiram quase todas as nações do globo. Essas organi- zações buscaram um alcance m issionário e agora estão colhendo m uito fruto pelo m undo. A com binação teológico-missionária não é por acaso. Essa é um a lição para nós, visto que enfrenta- mos um a nova era de desafio. E a razão pela qual a teologia deve perm anecer focada em Cristo, na transform ação que ele traz pelo Espírito e no caráter único da graça e da hum anida- de que dela necessita. E ntretan to , a teologia tam bém deve ser missionária para sobreviver, e ainda m anter os olhos fitos na fidelidade à verdade.

Então, qual é a nossa posição hoje com o m ovim ento e no m undo? E o que analisaremos a seguir.

p great awakening and the fu ture o f egalitarianism (Chicago: University o f Chicago Press, 2000). Fogel argum enta que o evangelicalismo tem en- tendido os efeitos debilitantes da tecnologia sobre a cultura m elhor que qualquer outro grupo, porque continua a valorizar as preocupações espi- rituais que a tecnologia tende a ignorar e que o processo tecnológico norm alm ente retira as vísceras da sociedade. (Por egalitarianismo, Fogel não quer referir-se à questão do gênero, com o em nossas discussões teológicas, mas a um a série de questões sociais que pertencem de form a equalitária à sociedade, inclu indo raça, classe social e opo rtun idade). Para obter mais com entários sobre este im portante estudo de Fogel, v. o capítulo três.

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QUAL É NOSSA POSIÇÃO HOJE?

O evangelicalism o necessita preservar diferentes tipos de organizações

oje, o evangelicalismo vibra com um conjunto de instituições e estruturas recém -construídas,

das quais a ETS é o p rincipal exem plo. O evangelicalism o, sendo um a força para a renovação na igreja, que eu definiria com o pessoas com prom etidas com C risto , com o evangelho e com a prim azia da Bíblia, está crescendo m und ia lm en te , em bora, provavelm ente, não seja um a presença dom inan te . N ão há dúvidas de que tam bém tem os po tencial para au- m entar nossa influência. E n tre tan to , o cam inho nem sem- pre foi fácil e não será. As vozes de desespero acim a da con- dição do evangelicalismo con tinuam a soar advertências. Essas advertências não podem e não devem ser ignoradas, mas nem podem ser exageradam ente afirm adas. M an te r o equilíbrio na corda bam ba nos rem ete à idéia de alguém com os braços abertos e m ovim entando-os de um lado para o outro , ten- tando equilibrar-se para não cair.

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OS TIPOS DIFERENTES DE ORGANIZAÇÕES EVANGÉLICAS: ESPECIFICAMENTE TRADICIONAIS, MODERADAS, TRADICIONAIS INCLUSIVAS E ABERTAS

A avaliação de nosso estado atual conduz à m inha proposta, que está baseada no objetivo que norteou a fundação de um a organização com o a ETS, e assim tem sido por mais de meio século. M inha tese é que nem todas as instituições evangélicas são criadas para o m esm o objetivo. E essencial saber a que tipo de organização você pertence e em qual você está atuando. O evangelicalismo necessita de instituições confessionais para re- presentar suas várias subcorrentes e de lugares m enos lim ita- dos, onde essas subcorrentes possam encontrar-se e interagir.

U m a análise das edições passadas da M odem Refoi'mation [Reforma Moderna\ (março-abril e m aio-junho de 2001) ilus- tra m inha tese sobre a necessidade de instituições diversas no evangelicalismo. O que torna a M odern Reformation tão inte- ressante é que ela foi criada por um a instituição confessional e reformista, a Alliance o f Confessing Evangelicals. Esse grupo é com prom etido com um a fé dou trinária e biblicam ente fun- dada, baseada em um a rica tradição teológica. Entretanto , seus m em bros sentem a necessidade crucial do diálogo aberto e da busca da defesa da verdade. Eles entendem que existem neces- sidades a ser acolhidas dentro do evangelicalismo, em que há a possibilidade de ocorrer discussões pacientes para classificar as coisas. Essas instituições são locais onde ocorrem discussões e interações, ao passo que existem instituições onde as decisões são tom adas e os lim ites mais cuidadosam ente estabelecidos. H á tam bém épocas em que cada instituição, seja ela confessional ou m enos lim itada, deve posicionar-se com relação a questões difíceis e assumir um discurso mais duro. Entretanto , o pro- cesso de tom ada de decisão e de fazer julgam entos teológicos precisa ser mais deliberativo e paciente antes de decidir pelo estabelecim ento de direções. Por exemplo, Thom as O den, que não é adm irador da teologia aberta, contesta o uso de seus co- m entários críticos a respeito da abertura por algumas linhas re­

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formistas tradicionais. Ele fala francam ente na M odem Refor- mation 10 dedicada ao tópico “Nosso débito para com a here- sia: m apeando lim ites”.

Continuo comprometido com a teologia irenista e com a paz da igreja. Lamento que tenha causado um conflito que neces- site de um diálogo paciente e de uma conversa cuidadosa. Es- sas conversas devem ocorrer com amor, da forma como tentei argumentar no artigo [em Christian Today, 9 de fevereiro de 1998; p. 46]: “Se os reformistas insistem em manter as fron- teiras da heresia aberta, deve-se opor a eles, mas com amor”. Isso não significa que “qualquer coisa passe”, mas que o debate sobre a presciência divina, assim como outras questões polê- micas, ocorra com civilidade, amor e empatia.1

!N .° 3 (m aio-junho 2001): p. 42. N o últim o artigo da Cristianity Today, O den disse que “a fantasia de que D eus não conhece o nosso futuro é um a heresia que dever ser com batida com base bíblica (‘Desde o início faço conhecido o fim, desde tem pos remotos, o que ainda virá’; Is 46.10; v. tb. Jó 28; SI 90; Rm 8.29; E f 1), existente na história da exegese de passagens im portantes. Essa questão foi am plam ente discuti- da por exegetas patrísticos desde o princípio, com o em Contra Celso de Orígenes. M anter estes limites da fé não definidos é um a tentação dem o- níaca que os evangélicos den tro da linha principal aprenderam m uito bem e todos sofreram queim aduras dolorosas”. A força desses com entá- rios os to rna mais im portantes, apontando para o equilíbrio cuidadoso que devemos m anter. O s lim ites são im portan tes de serem m antidos, mas tam bém o diálogo justo e direto que ten ta entender e avaliar. Ter tem po para avaliar e in teragir é im p o rtan te para fazer um a avaliação correta. O den conclui seus com entários em Christianity Today com esta afirmação: ‘'Em bora adm ito que há outras tarefas mais im portantes do que expor a heresia, alerto; se não houver um sistema im une, que resis- ta. em breve não haverá nada mais além da proliferação e infestação da heresia. Falo com o alguém que já foi am ante da heresia”. Essas são pala- vras sensatas de alguém que já passou pelos dois lados da rua teológica.O diálogo paciente e a conversa cuidadosa são pré-requisitos para a com- preensão e avaliação precisa.

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A m esm a preocupação aparece em um a edição mais recen- te da Aíodern Reformation sob o tema: “Evangelicalismo: Q uem é seu dono?”, em que M ichael H o rto n com para o evange- licalismo com um a “aldeia com arena para debates” a fim de diferenciá-lo da igreja local. Ele diz:

Nossas igrejas são esferas de disciplina, mas o evangelicalismo é uma “aldeia com arena para debates”, onde as causas comuns são criadas e onde ocorrem as discussões. Isso nos libera para interagir e, se possível, buscar acordo e cooperação em tarefas comuns. Essa “aldeia” não tem poder de excomunhão, mas deve assegurar proteção aos coléricos calvinistas e luteranos, assim como aos bondosos arminianos, conforme são caracteri- zados.2

N a m esm a edição, há um artigo de Lewis Smedes, escrito orig inariam ente em 1980, que nos alerta sobre o perigo de confundir o evangelicalismo com a igreja. A principal argu- m entação de Smedes é que

o evangelicalismo, sendo uma estrutura poderosa, com hierar- quia, é provavelmente uma fantasia [...]. Essa é uma fantasia perigosa, pois leva os evangélicos a representá-la e isso significa que eles ignoram a igreja real e investem sua energia somente na quase-igreja chamada evangelicalismo [...]. O povo evangé- lico precisa proteger-se contra o evangelicalismo e sua hierar- quia. A teologia evangélica precisa libertar-se do jogo de poder criado por líderes partidários. A teologia evangélica deve ser a teologia da igreja e para a igreja.3

2T he batdes over the label “evangelical”, M odem Reformation 10, n ״ 2.(março-abril de 2001): p. 20.

3Evangelicalism - a fantasy, Reformed Journal 30, n.° 2, 1980: p. 2-3, reimpresso na M odern Reformation 10, n.° 3 (m arço-abril de 2001): p.

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Acredito que Smedes exagera em sua afirmação com rela- ção à retórica. C on tudo , considerando o cenário dos valiosos debates da década de 1980 sobre a infalibilidade em que ele defendia um afastam ento desse tipo de com prom etim ento com as Escrituras, há um tom de verdade no que ele afirma. N ão h á u m a e s tru tu ra c la ra de re s p o n s a b il id a d e d e n tro do evangelicalismo que perm ita que ele se m anifeste com o um a entidade de voz única, m onolítica, claram ente definida socio- lógica e religiosam ente. C om o todos sabem os do fundo do coração, o evangelicalismo em sua extensão e im portância é um a entidade heterogênea, não im porta o quan to estamos vin- culados a rótulos. M esm o aqueles que pertencem à ETS ou a outras organizações evangélicas im portan tes são m eram ente um a voz nessa aldeia m uito m aior e crescente.

N a realidade, a aldeia está se to rnando um a cosm ópole à m edida que se espalha pelo m undo . A ETS, sendo um a voz evangélica entre m uitas outras, é um a instituição com prom e- tida com o diálogo sobre a exegese, com a teologia e com a história teológica, baseada no com prom etim ento com a Bíblia. E ntretan to , seja dentro da ETS ou em outra esquina qualquer da cidade evangélica, devemos ser cautelosos ao afirm ar que possuir um a leitura diferente da Bíblia, m esm o alegando sua abrangência com o um todo, requer a desqualificação de ser evangélico sim plesm ente porque outros dentro do m ovim en- to a consideram incoerente dentro de suas bases doutrinárias. R etornarei posteriorm ente a esse assunto polêm ico, pois há m om entos em que é necessário rem over ou censurar de form a séria, e isso precisa acontecer para o bem -estar do m ovim ento com o um todo . C o n tu d o , m in h a p rincipal preocupação é q u an d o essa sanção to rna-se necessária. E la será ap licada deliberadam ente ou som ente às questões centrais mais óbvias em que um a grande parte da com unidade evangélica tom a decisões com base no m áxim o de informações possível. Sendo

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um a com unidade teológica voltada à reflexão e com prom eti- da com o crescim ento espiritual pela autocom preensão por meio do Espírito, não devemos m eram ente reagir tão rapida- m ente para pôr correntes de opiniões em circulação na arena de debates. Devemos ser cuidadosos a fim de refletirmos o má- ximo possível nessas decisões.

A inda em o u tro artigo dessa m esm a edição da M odem Reformation, Shane Rosenthal fez distinção entre os círculos de nossa própria instituição confessional ou igreja e a praça pública mais abrangente. Em bora essa distinção traga à tona im portantes questões eclesiásticas sobre a igreja visível e a invi- sível, m anter essas áreas separadas nos ajudará a determ inar que os limites podem funcionar de m aneiras diferentes em um contexto especificamente tradicional e confessional (círculos) versus ou tro tradicional e aberto (praça pública). M eu argu- m ento é que a ETS e m uitas outras organizações evangélicas, com o nossas editoras, são entidades destinadas principalm en- te a serem praças públicas para debates. A m aioria das igrejas locais opera dentro de um círculo fechado, enquanto as deno- minações e seminários, por autodefinição, podem estar em qual- quer um dos dois lados, dependendo da base doutrinária que defendem . C ada instituição deve estar consciente do espaço que ocupa e por quê. H á mais de meio século, ao fazer sua afirmação doutrinária de m aneira tão sucinta, lim itando-a a um a declaração sobre a Bíblia, a ETS indicava que tipo de ins- tituição seria. N a realidade, a declaração da ETS jamais foi cha- m ada de declaração doutrinária, mas sim de base doutrinária. O s fundadores tam bém estavam conscientes de que essa base de associação e sociedade nunca foi projetada para ser um a declaração com pleta. Eles sabiam que tipo de organização es- tavam criando e qual a função que ela teria no evangelicalismo. O evangelicalismo precisa de algumas organizações que pos- sam atuar em m eio à divisão dos círculos fechados confessionais.

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D efendo a tese de que a ETS e outras organizações evangéli- cas desse tipo são projetadas in tencionalm ente para ser insti- tuições para o debate aberto. Volto a citar a missão da ETS para exemplificar com o certas organizações evangélicas devem fun- cionar, se correntes diversas do evangelicalismo tiverem qual- quer chance de trabalhar juntas para realizar o cham ado m ai- or da igreja. Tal exemplo deve nos fornecer o contexto para ajudar-nos a definir com o essas organizações devem posicionar- se à m edida que o evangelicalismo m ovim enta-se em um a de- term inada direção. Essa distinção de estru tura tam bém pode nos auxiliar a discernir com o deveríamos proceder ao fazer dis- cursos mais duros em áreas doutrinárias polêmicas. As organi- zações abertas estão estrategicam ente colocadas para terem di- álogos abertos, ao passo que as organizações mais “confessionais” podem contribu ir ou sim plesm ente observar a sua própria re- flexão e crescim ento. E ntretan to , antes de analisarmos com o d ia lo g a r u m a com a o u tra , p rec isam os c o n te x tu a liza r o evangelicalismo em term os globais.

SITUANDO 0 EVANGELICALISMO NO CONTEXTO GLOBAL: A ORDEM MISSIONÁRIA

Vamos pensar globalm ente em missões. Nos últim os 25 anos, o total de cristãos cresceu 60% , de 1,25 bilhão para 1,95 bi- lhão. A m aior parte desse crescim ento não ocorreu na Améri- ca do N orte, mas sim na Ásia, na Am érica Latina e na África. Entretanto , a porcentagem de cristãos em relação à população m und ia l perm aneceu estagnada perto de 34% , enquan to a p o rcen tag em de m u çu lm a n o s a u m e n to u de 15 ,9% para 19,6% . O núm ero de m uçulm anos dobrou desde 1970, de 564 m ilhões para 1,3 bilhão. A razão principal é a alta taxa de natalidade. H oje, 58% dos 600 m ilhões de protestantes ao redor do m undo vivem na África e na Ásia. Isso deixa de fora1,3 bilhão de cristãos que pertencem a outra tradição religiosa

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im portante. Os evangélicos tiveram um a taxa anual de cresci- m ento de 5% , de 125 m ilhões em 1970 para mais de 300 milhões. M esm o com esse crescim ento, os evangélicos repre- sentam cerca de 15,3% daqueles que se in titu lam cristãos.4 C ertam ente que são apenas estimativas, mas são esclarecedoras. N ós evangélicos somos parte de um a m inoria cristã global e os evangélicos da Am érica do N orte são parte de um a m inoria ainda m enor de evangélicos no m undo, visto que estes repre- sentam cerca de 5% da população m undial.

Pensando em relação a missões, até 2025 haverá mais de8,3 bilhões de pessoas no m undo. Esses bilhões necessitarão de missões transculturais para ouvir e entender o evangelho. A m aioria vive na janela 10/40, localização geográfica onde os principais desafios espirituais, ideológicos, sociais, urbanos e com unitários de missões são mais proem inentes. E tam bém a área dos principais pontos de tensão do m undo. Essa, todavia, não é a única janela missionária. As discussões tam bém envoi- vem a janela 4 /14 das crianças, onde um terço da população m undial tem m enos de 15 anos de idade. O outro fator é o crescim ento da urbanização m undial. M ais pessoas vivem nas cidades, incluindo as megalópoles, do que fora delas. Existe ainda a janela a 40 /70 da Europa, região que anteriorm ente formava a União Soviética e que precisa ser evangelizada nova- m ente. Finalm ente, há a janela 35/45 da Turquia, que é em sua m aioria m uçulm ana.

Existe um a estim ativa de que 1,2 bilhão a 1,4 bilhão de pessoas nunca ouviram o evangelho e que mais de 95% dessas pessoas vivem na janela 10/40. Essa é a região onde vive 85% da população mais pobre e desprovida do m undo. E é tam -

,Estatísticas do site www.worldevangelical.org, notícias e com entári- os de Patrick Johnstone, diretor de pesquisa, WEC International.

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bém onde vivem mais de 95% dos m uçulm anos, h indus e bu- distas do m u n d o .5

N o futuro, m uitos de nós precisaremos fazer um trabalho m aior com as religiões do m undo. M inha filha, que estudava em W ake Forest quando ocorreu o ataque de 11 de setem bro, assistia a um a aula de religião em que se tentava enfatizar as raízes religiosas similares do judaísm o, islamismo e cristianis- m o, bem com o d im inu ir a ênfase em suas diferenças. Esse é o pon to para onde nossa cultura quer conduzir a próxim a gera- ção. A recente tragédia do ataque ao W orld Trade C enter e as contínuas tensões no O rien te M édio enfatizam a im portância de entender as várias correntes presentes em cada religião do m undo. Poucos cristãos sabem algo sobre o islamismo, sem m en- cionar suas várias manifestações. O m esm o poderia ser dito, em bora em m enor grau, com relação ao conhecim ento dos cristãos sobre o judaísm o. N o que diz respeito às outras gran- des religiões do m undo, a m aioria dos cristãos, incluindo semi- naristas, ignora o que as m antêm vivas. A inda mais desafiador é o fato de que essas religiões m undiais são freqüentem ente sincretizadas com as religiões folclóricas locais, lem brando-nos que o problem a da influência cultural local (globalização)6 nas maiores tradições religiosas nunca está m uito longe de nós. Esse relacionam ento entre cultura e expressão religiosa é um a par- te im portante da iniciativa teológica, en tretan to raro é o semi- nário ou pauta teológica que dedica m uito tem po a essas ques- tões. O relacionam ento entre cultura e religião não deve ser relegado à periferia do evangelicalismo, especialm ente quan-

,Estatísticas do AD 2000 People CD distribuído pela WEH.'D avid LVON utiliza o term o globalização para observar o aparente

conflito entre a globalização e sua expressão local peculiar, que se form a em m uitos tipos de subform as locais h íbridas (Postmodernity [2. ed., M inneapolis: University o f M innesota Press, 1999, p. 64]).

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do os países estão se tornando cada vez mais globalizados e o evangelicalismo está se expandido pelo m undo. M uitos evangé- licos da próxim a geração precisam atacar tais questões, recolhendo o que foi deixado para trás pelos pioneiros desta geração.

Portanto, os estudantes de teologia precisam valorizar os as- pectos globais das religiões e suas expressões locais. Quando esses estudantes se formarem, andarão profissionalmente neste mundo globalizado, quer na expressão peculiar de sua congre- gação local quer em manifestações de fé circunvizinhas. Tais realidades mostram a extrema importância da compreensão da contextualização por nossos estudantes. Eles devem ser estu- dantes de teologia de sua cultura específica e das culturas ao seu redor.

Talvez nada melhor ilustre o problema da leitura cuidadosa de nossa cultura do que o modo como Robert Fogel define o termo espiritual, tentando conferir-lhe um valor positivo a ser buscado por nossa cultura. Como os outros livros citados no primeiro capítulo que analisam nossa cultura, Fogel foca os valores relacionados à qualidade de vida. O estudo é valioso para uma compreensão do impacto cultural de uma série de fenômenos no último século. Essas mudanças prolongaram a vida e o trabalho, assim como formataram as novas realidades econômicas, incluindo oportunidades sem precedentes para o uso cada vez maior do tempo de lazer e do trabalho voluntário, que contribui para o indivíduo e a sociedade. Fogel posiciona o quarto grande avivamento na década de 1960. Ele diz:

A iniciativa de moldar essa nova pauta foi transmitida, em grande escala, para os discípulos do Quarto Grande Avi- vamento que focaram as questões de igualdade espiritual (não material). A proposta pode surpreender aqueles que se opõem à ideologia do direito religioso. Entretanto, é a subs- tância da proposta, não a retórica, que é importante. A ques- tão é se essas reformas contribuirão para uma maior igual­

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dade na distribuição dos patrimônios espirituais que terão impacto tanto na busca pela auto-realização quanto pelo sucesso econômico no mercado.

Embora Fogel reconheça que os valores espirituais afetam profundamente o mundo, ele relaciona as questões espirituais às preocupações das pessoas comuns com a auto-realização e com o mercado.

Quando estudei sua análise inicialmente, eu me perguntei se o evangelicalismo havia feito o mesmo compromisso. O evangelicalismo estabeleceu metas espirituais como meio para aquelas coisas que normalmente são vistas como a principal finalidade da vida, isto é, auto-realização e sucesso no merca- do? Acredito que essas são prioridades que Jesus desafiaria, con- forme indica sua orientação a respeito de dinheiro e bens ma- teriais (v. esp. Lc 6.20-26; 8.14; 9.57-62; 12.13-34; 16.1-13; 19-31; 18.18-30; 19.1-10). Na realidade, conforme continu- ava em minha leitura, a análise de Fogel tornava-se mais com- plexa do que a questão anterior sugere, pois ele contrasta a busca pela auto-realização e pelo sucesso no mercado com a “eterna acumulação de bens de consumo duráveis e a busca do prazer” (p. 176), que é para muitos de nós o que representa a auto-realização. Ele também faz distinção entre o reino sagra- do (fé religiosa) e a “gama completa de produtos insignifican- tes necessários para lidar com o trauma emocional” que, ele reconhece, tem pouco a ver com o mercado (p. 178). O signi- ficado de “espiritual” para Fogel é mais abrangente do que normalmente o termo significa para os evangélicos ou religio- sos, mostrando que a cultura pós-moderna está acrescentando significado ao termo espiritual, definindo-o com uma cobertu- ra maior que no passado. Portanto, para Fogel, a auto-realiza- ção é a busca da virtude (não uma auto-realização egoísta). Ele

The fourth great awakening and the fu ture o f egalitarianism, Chicago: University o f Chicago Press, 2000, p. 12-3.

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define sua formação com quinze elementos (p. 205-7): senso de propósito, visão de oportunidade, senso de trabalho e vida de relevância, forte ética familiar, senso de comunidade, capa- cidade de engajamento em grupos diversos, ética de benevo- lência, ética de trabalho, senso de disciplina, capacidade de foco e concentração no próprio esforço, capacidade de resistir ao amor ao hedonismo, capacidade autodidata, sede de conhe- cimento, valorização da qualidade e auto-estima.

A definição de Fogel sobre o termo espiritual é surpreen- dentemente desprovida de elementos transcendentais, embo- ra pudesse haver espaço para isso. O conteúdo espiritual é de- cididamente antropocêntrico e humanístico. O lugar do Espírito (com E maiúsculo) no empenho espiritual está se per- dendo. Este é o ponto que o evangelicalismo está enfrentando ao dirigir-se a uma cultura que quer valores espirituais, porém, deseja buscar virtude em termos antropológicos desprovidos de discussão sobre o que é sagrado ou divino em qualquer sen- tido do termo, sem mencionar no que se refere ao Deus das Escrituras. Eis a razão principal pela qual os evangélicos não podem se afastar da metanarrativa da Bíblia e devem ser cada vez mais claros sobre seu conteúdo. O risco consiste em Deus ficar perdido em uma cultura que busca uma espiritualidade na qual seja possível fazer pouco ou nenhum esforço de refle- xão ou de envolvimento com o Deus vivo. Algo assim os evan- gélicos não reconheceriam como espiritualidade. O potencial para confusão sobre esse tópico ao engajar nossa sociedade é imenso. O verdadeiro risco é o de que alguns evangélicos em nossas igrejas talvez tenham definições do termo espiritual que sejam estabelecidas tanto pela classificação de Fogel quanto pelas questões levantadas pela presença do Deus vivo e de seu Espírito em nossa vida.

Concluo esta seção lem brando que nenhum subgrupo é o evangelicalismo, mas apenas um a parte dele, especialmente quan- do o evangelicalismo é visto histórica e globalmente. E ainda

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resta um a imensa missão para todos nós m em bros da igreja. Essa missão e a complexa composição da igreja dizem que te- mos m uito à fazer, e temos apenas arranhado a superfície de com o estar biblicam ente com prom etidos em relação as ques- tões globais e locais que dom inam a realidade atual.

ANALISANDO UM EXEMPLO DE GRUPO ABERTO: A ETS À LUZ DA ORDENANÇA MISSIONÁRIA E DE SUA HISTÓRIA

E FUNÇÃO NO EVANGELICALISMOO evangelicalismo é um a entidade tão complexa quanto a igreja visível e invisível. O evangelicalismo necessita de instituições que confessem determ inada herança e história, as instituições fechadas. Necessita tam bém de organizações que atravessem os limites de m aneira que unam livrem ente os diversos tipos de círculos fechados e os m antenham compreensíveis. N esta se- ção, m ostro como foi fundada um a dessas organizações aber- tas, a ETS, e qual foi seu objetivo de criação. (M uito do que trato acerca da ETS poderia ser aplicado a outras organizações abertas do evangelicalismo.) Necessitamos de várias organiza- ções estratégicas com o essa para m anter as diversas correntes do evangelicalismo em contato umas com as outras em benefí- cio da missão m aior da igreja.

A ETS não é o evangelicalismo. E n tre tan to , é um com po- nente im portan te do m ovim ento , parte de um a com unidade reflexiva da igreja que é especialm ente com prom etida com a Bíblia. M as o serviço que a ETS tem prestado à igreja não é m eram ente ou m esm o estritam ente acadêm ico. Ele tam bém existe para ser um exemplo para a igreja da m aneira de en- volver-se seriam ente com a Bíblia, m esm o em disputas, com respeito não só ao que ela diz, mas tam bém em como diz. Porém , seu p ro p ó sito supera as questões de c o n te ú d o e nuanças: coincide com o propósito da igreja de m aneira ge- ral, isto é, p roporcionar a força necessária para alcançarm os

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o m undo necessitado, m uito mais m ultiform e que o existen- te em 1949. Esse m undo chegou à nossa porta não som ente p o r in term édio dos meios de transporte e trocas crescentes, m as tam bém pela m íd ia e po r redes de culturas m undiais visíveis e complexas.

O valor principal da ETS e de organizações semelhantes é a m istura nelas apresentada (e tais organizações necessitam me- lh o ra r em relação à sua m is tu ra de sexo, e tn ias e nacio- nalidades). A ETS é um dos poucos lugares onde encontram os essa heterogeneidade de pessoas que se confraternizam e dia- logam face a face. Vemos aqui a igreja, não só nossos subgrupos provincianos, trabalhando no diálogo e no debate sobre a Bí- blia. C reio que os fundadores da ETS foram sábios ao ter a Bíblia com o o pon to de reagrupam ento e torná-la a parte cen- trai da base confessional. H á ainda um a questão im portante a ser tratada: ao m anterem -se com prom etidos com a Bíblia com o elem ento central, a ETS especificamente e o evangelicalismo, de m aneira geral, são bem -sucedidos além da Bíblia para en- volverem a si mesmos e ao m undo com a m ensagem que apon- ta para o único de onde procede a Palavra e para quem essa norm alm ente conduz?

Alguns perguntarão: com o podem os trabalhar jun tos quan- do não concordamos? C om o podem os prosseguir, se não te- mos a m esm a opinião sobre a verdade? C om o podem os desafi- ar e envolver o m undo quando nossa visão da m ensagem e de Deus são diferentes? Esses são questionam entos justos e rele- vantes. Podem os aprender um a lição m uito im portante com o projeto da ETS, pois ele revela o que é a teologia da unidade na diversidade.

Vamos exem plificar com a história das grandes questões dentro da ETS para verificar com o instituições abertas tratam a diferença teológica. U m exame no boletim e no jornal da ETS

(inaugurado em 1958) m ostra que em suas cinco décadas de

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existência cinco grandes questões vieram à tona, praticam ente um a por década. Essas questões são a ciência e a Bíblia, especi- alm ente as origens (1959); a infalibilidade, sua definição e a herm enêutica que a apóia (1979); o papel da crítica histórica (1983); as m ulheres e a Bíblia (1986); e a teologia aberta (2001). Em todos esses casos, exceto um , a ETS recontinuou a dialogar e nem m esm o iniciou um m ovim ento para votar con- tra seus m em bros. O caso em que um m em bro realm ente saiu, ele o fez voluntariam ente, após ter sido convidado a reconsi- derar a decisão. M as nunca se chegou ao voto final. Tam bém em 1990 houve um a adição à base doutrinária da ETS para enfatizar a visão histórica e trinitariana da natureza divina. Foi algo que a m aior parte da sociedade (80% ) achou necessário e representou um a boa m udança. M as o acréscimo desse tipo de declaração só pode ser feito com m uita deliberação e cui- dado para preservar a heterogeneidade da ETS. E sábia a exi- gência de 80% ou mais dos votos para obter aprovações com o essa. Isso significa que nenhum a ação pode ser tom ada sem que um a m aioria esmagadora da sociedade decida ir nessa di- reção. Nas instituições abertas, é um meio prudente de estabe- lecer o que é central e o que pode ser considerado um a ques- tão mais periférica.

Alguns com entários dos discursos dos presidentes ou alguns resum os históricos sobre a ETS de 1959 a 1982 serão úteis. Eles nos falam m uito da tensão entre a exploração teológica e o com prom etim ento com a verdade. Em 1959, indicando a tensão existente entre dois estudos teológicos criativos, a ques- tão das origens e o perigo do erro, W arren Young escreveu o seguinte em seu discurso presidencial:

Isso não significa q u e n ão devem os avaliar os trab a lh o s uns dos o u tro s . N a realidade, o o p o sto é v e rdadeiro . N a verdade , sig- n ifica qu e a ETS estará rea lizando m e lh o r sua fu n ção q u a n d o os

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esforços dos o u tro s fo rem avaliados em u m a a tm o sfera lím p id a p o r m eio d a pesqu isa teo lóg ica. A o m esm o te m p o , sabem os q u e to d o s co m ete m o s erros, m u ito s [...]. M as vam os nos esfor- çar co m o irm ãos em C ris to p ara ju lgar os esforços dos o u tro s d e n tro d o esp írito de am o r q u e nos m o tiv a a realizar to d a a o b ra de Jesus C ris to . Se n a busca pela v erd ad e e rrarm o s, per- m itam o s q u e o u tro s nos a p o n te m p ro n ta m e n te a n a tu reza de nosso erro para q u e dessa fo rm a sejam os levados uns pelos o u - tros de v o lta p a ra o c e n tro d e nossa fé evangélica. Se nos aju- d a rm o s assim , co n seg u irem o s fazer avanços reais n a causa de C ris to e não nos desv iarem os p ara m u ito longe o u p o r m u ito te m p o d aq u e le ce n tro n o rm a tiv o q u e deve sem p re ser nossa m eta . P or o u tro lado , se os esforços h o n es to s e sinceros p ara avanços n a área acadêm ica fo rem vistos sob u m a a tm o sfera ne- gativa de suspe ita , d es tru ire m o s n ossa p ró p ria u til id a d e e a razão d e serm os co m o soc iedade .8

Considere os com entários de Stan G undry em seu discurso presidencial de 1979:

A ETS deve ser u m fó ru m o n d e os qu e estão co m p ro m e tid o s co m a in fa lib ilid ad e po ssam atacar os p ro b lem as de defin ição e h e rm e n êu tica . N ó s (e nossos críticos) deveríam os nos le m b rar d e q u e nossa declaração (base d o u tr in a i d a ETS) jam ais teve a in te n çã o de ser u m p rin c íp io q u e resum isse a d e q u a d a m e n te o s ign ificado d e ser cristão o u evangélico .9

Jo h n W isem an, fazendo um a revisão da h istó ria da ETS

em 1982, escreveu sobre o tam anho reduzido da base dou- trinária:

8W hither evangelicalism?, Bulletin o f Evangelical Theological Society 2, 1959: p. 14.

9Evangelical theology: where should we be going?, ] E T S 22, 1979: p. 7.

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A o assum irem a visão de cen tra lid ad e da B íblia co m o sua u n i- ca base d o u trin á ria , pois esta afirm a ser a palavra de D eus infa- lível, os fo rm adores d a ETS não estavam in s in u an d o qu e as ou- tras do u trin as evangélicas não eram im p o rtan tes . A o con trário , foi considerado qu e essa breve declaração teológica p erm itiria o b te r u m a libe rdade teo lógica ad eq u ad a p ara a associação de evangélicos de d iferen tes características d e n o m in a c io n a is .10

Por fim, cito o discurso de Alan Johnson, que trata do deba- te sobre o m étodo histórico-crítico em 1982:

E m nossa sociedade, h á aqueles qu e nos a le rtam c o rre ta m e n te co n tra o perigo d a descrença expressa em nossos m é to d o s e c o n tra a caracterização genérica e fácil dem ais dos aspectos in - desejáveis da m o d e rn id a d e [eu acrescen taria , ta m b ém , d a pós- m o d e rn id ad e ], N o e n ta n to , som os a in d a u m a soc iedade em q u e aqueles envolv idos co m o re f in am en to das m e todo log ias críticas sob o exercício de u m a au to rid a d e b íb lica infalível po - d em m over-se suavem ente em direção a u m a com preensão m ais p ro fu n d a das sagradas E scritu ras e de sua co m p le ta ap licação à nossa v ida e à m issão d a igreja em nossa e ra .11

Essas citações levantam um a questão im portante sobre a ten- são entre a reflexão teológica fiel e a busca da verdade. Somente o com prom etim en to com a infalibilidade pode m anter-nos dentro dos limites adequados?

Afirm o que é possível haver, desde que o evangelicalismo tam bém m antenha seu foco no que é revelado pela Bíblia, um a concepção vibrante e trin itariana de Deus, que cuida de sua

1'1Introduction, Index to the Bulleting /Journal o f the Evangelical Theology Societ)1. vols. 1-25, 1958-1982, p. 9.

1 T he historical-critical m ethod: egyptian gold or pagan precipice?,J e t s 26, 1983: p. 15■

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criação e busca a hum anidade perdida, conform e definido pela igreja prim itiva. Essa fidelidade à verdade pode funcionar, m esm o se alguns m em bros ficarem indecisos às margens para explorar a funcionalidade da Bíblia inspirada. Essa exploração dem anda permissão e análise.

Se a ETS desejasse adotar um princípio mais com pleto, eu diria que não seria necessário redigir um novo, mas olhar para os princípios históricos da igreja prim itiva. Este é um ponto em que o evangelicalismo pode encontrar questões que mere- çam ser priorizadas com o preocupações principais no diálogo doutrinário . E aqui que a pessoa de Deus, o caráter único de C risto e sua oferta pela graça, a necessidade prem ente da hu- m anidade pela salvação que som ente Cristo oferece, a com po- sição da unidade da única e verdadeira igreja e a im portância da fé com o resposta são firmadas. Alguns poderiam contestar com razão que a bibliologia, o que eu já havia destacado, não é tratada nesses princípios. E ntretan to , m inha resposta seria que nesse período o com prom etim ento com a Bíblia era im plícito e não explícito, pois os prim eiros debates da igreja não eram sobre a Bíblia, mas sobre a definição cuidadosa de sua mensa- gem, especialm ente no que se refere à natureza d ivina.12

12Para obras que m ostram a visão antiga da Bíblia e com o era o seu entendim ento implícito, v. Geoffrey W. Bromiley, T he C hurch doctrine o f insp ira tion , in: Revelation a n d the B ible׳, con tem porary evangelical thoughts, Carl Henry, org. (G rand Rapids, M ich.: Baker, 1958), p. 205־ 17; R obert D . Preus, “A atitude da igreja peran te a Bíblia: da igreja prim itiva a Lutero” e John H . Gerstner, “A atitude da igreja perante a Bíblia: Calvino e os teólogos de W estm inster”, in: A inerrância da Bíblia , N orm an L. Geisler, org. (São Paulo: V ida, 2003), p. 423-96; e todo o volum e de Inerrancy and the Church, org., John H annah (Chicago: M oody Press, 1984). Para o período anterior à história da igreja, os artigos de Bromiley e Preus e o artigo de abertura de H annah , editados nesse volu- me, são fundam entais. Bromiley fala sobre autores patrísticos analisando a inspiração e a autoridade da Bíblia com o “auto-evidente” (p. 207).

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A rm ada com a sabedoria de nosso passado (a necessidade ranto da exploração teológica quan to da verdade), para a ETS

a questão crítica é o que fazer agora para “fom entar o conheci- m ento bíblico conservador, provendo meios para a troca ver- bal e a expressão escrita do pensam ento e da pesquisa no cam- po geral das disciplinas teológicas centradas na Bíblia?”. M ais im portante, com o ela deveria proceder com o surgim ento de um a questão relevante a cada década? Para o evangelicalismo, a questão é “com o prosseguir quando tantos debates, alguns m uito im portantes, reagem com fúria contra nós?”.

Em um a instituição aberta como a ETS, nossos precursores sabiamente escolheram um a declaração doutrinária curta. A ETS

não é nem um seminário nem um a denominação. O nde mais poderiam interagir Oswald Allis, Roger Nicole, Carl Henry, John W alvoord e outros da prim eira geração? O nde mais eles poderi- am ponderar sobre o m odo de encorajar a igreja a realizar sua missão m aior de forma intencionalm ente reflexiva, mesmo em meio às suas diferenças? Eles se reuniram em torno de um com- prom etim ento, a princípio amplo, com o propósito de envolver um a cultura m aior: desenvolver um a nova ética social, um a apologética intelectualm ente louvável, um corajoso avanço no evangelismo, novas instituições de educação e pesquisa e coope- ração transdenom inacional. Eles reconheceram um a unidade espiritual básica, firmada em seu com prom etim ento com a pa- lavra e com sua história central, relembrando onde o verdadeiro inimigo se esconde (no m undo sedutor) e qual era a missão real (glorificar a Deus, clamando o máximo por sua liderança).13 Eles propositadam ente m antiveram a base doutrinária reduzida, tal­

11M illard E R IC K S O N , The new evangelical theology, W estwood, N .J.: Revell, 1968, p. 31-44. Ironicam ente de novo, talvez o centro que con- duza à renovação esteve presente por um bom tem po, um a vez que o seguramos firme e às ferramentas que nos foram dadas para o entendi- m ento.

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vez em parte porque os debates teológicos sempre estarão em nosso meio. Eles tinham consciência de que legislar tais crenças poderia transformar a ETS em uma grande organização legislativa, e sabe- mos bem como são essas organizações. Eles sabiam que a preocu- pação com os debates internos poderia transformar a ETS em uma instituição voltada para si mesma de m odo tão intenso que pode- ria implodir, conforme as batalhas que o fundamentalismo nas décadas anteriores os ensinou. Portanto, esse tipo de organização aberta é o local certo para debater, para concordar e discordar, contanto que todos concordemos que os argumentos estejam fun- damentados em um a tentativa sincera de trabalhar com a fideli- dade da Escritura. O evangelicalismo não deve temer organiza- ções destinadas a essas reflexões e discussões. Elas devem valorizar o que são e o que não são destinadas a ser.

POR QUE 0 EVANGELICALISMO NECESSITA DAS ORGANIZAÇÕES QUE PROMOVEM 0 DEBATE ABERTO COMO A ETS

A ETS é um local de diálogo dentro do evangelicalismo, e este necessita desesperadam ente preservá-la. D e m aneira geral, o evangelicalismo precisa de diversas organizações desse tipo em seu meio, assim como necessita daquelas que, confessionalmente, representam os vários subgrupos que o compõem . A alternati- va, ou seja, traçar limites mais definidos em todas as organiza- ções evangélicas, é repleta de perigos. Se cada organização co- m eçar a servir de câmara de compensação doutrinária dentro do evangelicalismo, aonde vamos parar e onde conversaremos sobre as diferenças sem implodir? Creio que firm ar limites de- talhados em cada organização é um a rua sem saída que nos m anterá ocupados com quais pontos diferimos um as das ou- tras. O que perderíam os é precioso.

As organizações evangélicas abertas têm a oportunidade de produzir um a obra bíblica verdadeiram ente colaboradora. Essa obra deve envolver e desafiar nossa cultura m ultiform e, que

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está ten tando rapidam ente transform ar a im agem do verda- deiro e todo-poderoso D eus em um ídolo im potente. Temos que assegurar que um a boa parte de nossa obra desafie as pes- soas que estão fora de nossa com unidade e convide-as a ouvir a voz de Deus. C ertam ente essa preocupação por missões preci- sa ser reacendida novam ente na ETS e no evangelicalismo de m aneira geral.

M as alguns dirão que devemos guardar os portões da verda- de diligentemente. Concordo. Isto faz parte de nosso propósito: discutir e deliberar sobre a mensagem da Bíblia e m antê-la como ponto central de foco, para servir de limite para a ETS e de pro- teção para a Bíblia e para a teologia do evangelicalismo. Porém, se surgirem assuntos mais im portantes a cada década, a ETS po- derá dar-se ao luxo de ser repetidam ente autoconsum ida, con- forme se discute, devendo-se traçar mais linhas de limites? N ão estaria ela fracassando em desafiar um a cultura de diversidade religiosa que está claramente do lado de fora da fé?

Q uando realm ente nos envolvemos in ternam ente, necessi- tam os de discussões m aduras que garantam tem po suficiente para refletir na verdade bíblica. As pessoas em cada lado des- ses debates acreditam , em geral apaixonadam ente, que seu lado detém a verdade, a justiça e o m odo divino, mas um pouco de hum ildade da parte de todos nós tornaria o diálogo m elhor e poderia contribu ir para um tom saudável.

E ntendo que, quando surge um assunto polêm ico, o deba- te, em geral, consiste em identificar se estamos em um a discus- são in terna de nuanças ou se estam os lidando com grandes intrusos e desvios externos. É por isso que apresentei no início deste livro a imagem da idéia sedutora, observando que as afir- mações de um a idéia sedutora assum em m uitas formas e tam a- nhos diferentes. M eu pon to de vista é que a incerteza a respei- to do tipo de questão com que estamos lidando (interna ou externa) exige que tratem os nossos debates com o um a com u­

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nidade m adura. A im portância do problem a exige um a venti- lação com pleta de todos os lados, além de tem po para proces- sar o debate por com pleto. Todos precisamos estar sensíveis a Deus e ao Espírito ao nos envolvermos em um a discussão cui- dadosa e deliberada, a fim de determ inarm os jun tos se o deba- te é a respeito de desenvolvim ento, da diferença ou da falha. O pon to central de tudo isso é a existência de algumas com u- nidades que definiram e priorizaram a essência da fé, portan- to, todos os lados podem envolver-se em um a séria discussão face a face. Em outras palavras, as instituições evangélicas não devem ser todas criadas sob os mesmos padrões. Tipos diferen- tes de organizações d en tro do evangelicalism o ajudarão a preservá-lo, por um lado, perm itindo um diálogo saudável e au to-reflex ivo e, p o r o u tro , q u es tio n an d o a com preensão confessional da verdade. A com binação nos m antém respon- sáveis e tam bém sensíveis às possíveis áreas obscuras no enten- dim ento de qualquer pessoa ou subtradição.

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QUAL DIREÇÃO DEVEMOS TOMAR?

Os estudos sobre Jesus e outros exemplos ao avançarmos rumo ao impacto cultural

E ntão, qual a direção que devemos tomar? Gos- taria de usar vários exemplos diferentes para

indicar onde estamos tendo êxito e onde estamos fracassando. M eu objetivo é simples: convocar m inha geração e a próxim a do evangelicalismo para envolver-se com as questões biblica- m ente, buscando a verdade de form a hum ilde e com m útuo respeito, a fim de instruir e avançar em direção à missão, bem com o à edificação teológica.

Um dos pontos principais que defendo é que o cham ado de missões da igreja é imenso e, ao m esm o tem po um tem a fun- dam ental da Bíblia que encerra pelo m enos dois dos quatro evangelhos (M t 28 .16-20 ; Lc 24 .44-49). Esse tem a central conduziu m uitos grandes ministérios, com o, por exemplo, o do apóstolo Paulo. Esse cham ado deve contribu ir para o obje- tivo das principais instituições do evangelicalismo, sejam fe- chadas ou abertas. Essas instituições devem se enxergar com o um subgrupo da igreja entre m uitos que com partilham o seu grande cham ado.

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Para realizar a tarefa, os evangélicos devem gastar mais re־ flexões e energia para combinar, onde for possível, os recursos e habilidades do m inistério a fim de se tornarem mais eficien- tes para levar o evangelho ao m undo. E ntretan to , porque “os tem pos estão m udando e rápido”, precisamos olhar de m odo diferente as questões que tem os em mãos, talvez descobrindo novos tópicos, categorias e meios de envolvim ento em nosso m undo novo e mais globalizado. C om o devemos proceder di- ante da trem enda necessidade e do sim ultâneo crescim ento da população e estreitam ento do m undo por meio das com uni- cações e dos meios de transportes?

UM EXEMPLO DE ENVOLVIMENTO CULTURAL: OS ESTUDOS SOBRE JESUSCom eço com m inha especialidade: os estudos sobre Jesus. Ah, se a herm enêutica e o m étodo erguessem suas m entes sempre presentes ao analisarmos esse assunto!

N a ETS, com o na m aioria das com unidades evangélicas, h á

dois paradigm as no que se refere aos estudos sobre Jesus. Esses paradigmas datam dos prim eiros dias da ETS e causaram o ú n ic o

afastam ento público de um m em bro , envolvendo a extensa utilização ou não do m étodo crítico-histórico nos estudos so- bre Jesus e os evangelhos.

Alguns estudiosos afirm am que existem diferentes pressu- posições entre os evangélicos e o m étodo crítico-histórico. A diferença é tão grave em sua base que a adoção do m étodo levaria, inevitavelmente, ao abandono da fidelidade bíblica ou, pelo m enos, a corroeria severamente. Eles acreditam que a ques- tão do m étodo é um conflito estritam ente ideológico e traçam limites que honrem totalm ente as palavras de Jesus e que pro- m ovam um a harm onia consistente. Eles rejeitam aqueles que vêem autenticidade histórica naquelas passagens em que se afir- m a existir a “voz” de Jesus, em bora ele não seja citado. O único cam inho para engajar-se na oposição é ser com pletam ente con­

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trário ao seu m étodo e adotar um a nova abordagem dos textos sobre Jesus. Afirma-se que esse m étodo herm enêutico em par- ticular é consistente com a Bíblia e am plam ente, se não com- pletam ente fechado para outras opções além de não ortodoxo, conform e norm alm ente m encionado .1

O utros estudiosos afirm am que os evangélicos podem e de- vem engajar-se na oposição e em seu m étodo. Eles argum en- tam que deveríam os p ro cu ra r as in co n sis tên c ias daquele m étodo, norm alm ente resultado da síntese cultural, e expor

1Este debate é antigo, conform e m ostra a referência ao tópico de Alan Johnson neste discurso de 1982. Para um a visão m enos envolvida com a crítica histórica, v. Robert L. Thom as, Im pact o f historical criticism on theology and apologetics, in: The Jesus crisis, Robert L. Thom as e F. David Farnell orgs., e seu Historical criticism and the evangelical: another view, J E T S 43 (2000): p. 97-111; D onald Green, Evangelicals and ipsissima vox, TheMaster’s Seminary Journal (2001): p. 49-69. Para o uso cuidadoso de tais métodos, v. G rant O sborne, Historical cristicism and the evange- lical, J E T S 42 (1999): p. 193-210 e Historical criticism: a brief response to Robert Thom as’s other view’, J E T S 43 (2000): p. 113-7; Darell Bock, The words o f Jesus in thegGospels: live, jive or memorex?, in: Jesus under fire: moderns Scholarship reinvents and historical Jesus, M ichael J. W ilkins e J. P. M oreland, orgs. (G rand Rapids, M ich.: Zondervan 1995), p. 73- 99; m eu Studying the historical Jesus·, a guide to sources and m ethods (G rand Rapids, M ich.: Baker, 2002) e m inhas revisões de T h e Jesus Crisis, Bib Sac 1 5 7 (2000): p. 232-6 e o artigo de Greens em Bib Sac 158 (2001): p. 478-80. O debate que m enciono envolve o uso e o não-uso de m étodos críticos e da questão de ipsissima verba (palavras exatas de Jesus) conform e presentes nos evangelhos versus a possibilidade que em alguns locais temos o ipsissima vox (a voz de Jesus). Este tam bém é um debate antigo. Aqueles que são a favor do uso do ipsissima vox foram ratificados por Paul Feinberg, "O significado da inerrância”, in: A inerrância da Bíblia, de N orm an L. Geisler, org. (São Paulo: Vida, 2003, p. 313-61), p. 301. Para saber com o a vida de Jesus é tratata a partir desta perspec- tiva, v. D arrel Bock: Jesus according to scripture: restoring the p o rtra it trom the gospels (Grand Rapids, M ich.: Baker, 2002).

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esses padrões suspeitos quando seriam ente afetados. C ontudo , acreditam que, com um respeito saudável pela Bíblia, a utiliza- ção m odificada desses padrões é possível e até m esm o valiosa na com preensão de com o a Bíblia funciona e deveria ser lida. Essa abordagem nos im pede de levar a Bíblia a fazer mais do que ela pretende. A honestidade intelectual tam bém pode for- çar-nos a reconhecer que essas críticas, às vezes, estavam certas. Além disso, por que os evangélicos deveriam ser os únicos a se colocarem na defensiva? Se, ao nos engajarm os na utilização cuidadosa da Bíblia, podem os argum entar a favor de Jesus e do p o n to central de seus ensinam entos para a cu ltura mais am pla, então não deveríamos buscar essa linha de estudos e levantar questionam entos sobre os cham ados resultados asse- gurados da crítica, usando a própria crítica para expor os pro- blemas dos resultados apresentados? Nossa tarefa nesse segundo m odelo é analisar cuidadosam ente as complexas questões his- tóricas, exigir a verdade e apresentar e defender a Bíblia, utili- zando todos os meios necessários para sustentar nossa tese.

O resultado requer um a estratégia de duas pontas a fim de envolver os debates in terno e externo com o fenôm eno da Bí- blia, sempre na linha de frente. Vejo precedente para esses dois níveis de interação na Bíblia quando leio Rom anos 1 lado a lado com Atos 1 7 . 0 prim eiro é um a crítica fu lm inante à cul- tu ra pagã, mas quando Paulo, provocado pela presença de ído- los, se dirige àquela cultura (Atos 17), ele não poderia ter tido mais trabalho para dirigir-se aos pagãos em um tom de convi- te, com eçando pelo contexto deles, usando as próprias pala- vras deles, m as e x p o n d o o que fa ltava n a q u e la c u ltu ra . Precisamos de mais, e não menos, engajam entos com o esse em nossa cultura indócil.

A d iferen ça de to m nos co m en tá rio s de P aulo em R o m an o s 1 e A tos 17 é tão g ran d e q u e críticos céticos n ão co n seg u em acre­

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d ita r q u e a m esm a pessoa p o d e ria te r d ito essas duas coisas! M as a d ife ren ça expõe u m a es tra tég ia de e n g a ja m en to q u e sen- sibiliza o p úb lico -a lvo . O m o d o de ana lisarm os in te rn a m e n te a c u ltu ra n ão é necessariam en te o to m co m o q u a l devem os nos d irig ir d ire ta m e n te a ela. E m o u tras palavras, h á m o m e n - tos de c o n fro n ta r a cu ltu ra e ta m b é m h á o u tro s q u a n d o seus in s tin to s nos c o n d u z em a u m a d ireção positiva em co m p ara- ção co m as a lternativas dessa cu ltu ra , e m b o ra essa d ireção seja talvez in su fic ien te e possa usar os benefícios d a co m p reen são e c o n h e c im e n to ad ic iona is ad q u irid o s d a perspectiva d iv in a da B íblia .

Observe o que esse tipo de engajam ento aberto da cultura perm ite. Ele possibilita que os evangélicos coloquem na defen- siva aqueles que recebem a m aior parte da atenção do público, com o os m em bros do Sem inário Jesus. O bserve o que aconte- ce quando nos deixamos levar som ente pela prim eira impres- são; isso freqüentem ente nos coloca na defensiva e focados em pequenos detalhes da história de Jesus, m uitas vezes nos pon- tos mais tangenciais. H á m om entos para essa defesa, mas tam - bém há outros quando a m aior parte de nossa atenção deve estar voltada para outro lugar, para os elem entos principais da história de Jesus. Será que querem os gastar a m aior parte do tem po defendendo cada pequeno detalhe que os não conser- vadores geram? O u ainda gastar toneladas de energia lu tando uns com os outros por causa da solução de tais diferenças por- que nós, conservadores, tratam os essas soluções de m odo dife- rente? O u desejamos aproveitar o tem po trabalhando juntos, no grande quadro de Jesus, em seu m inistério e na form a pela qual a Bíblia, m esm o quando sua leitura é considerada “basi- cam ente digna de confiança”, ainda conduz a Jesus, a resposta para o m undo em perdição? Devemos insistir com nossa cul- tu ra para que aceite nossa visão da Bíblia antes de vir para Jesus? O u podem os argum entar que ver o Jesus da Bíblia em

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seus detalhes mais básicos ajudará as pessoas em nossa cultura a reconsiderar sua visão de m undo mais ampla, que as leva às Escrituras em um plano inferior? Desejo m anter as duas linhas de argum entação abertas. M illard Erickson, ao defender essa abordagem , usa a m etáfora de levar o cavalo para beber água. N o contexto atual pós-m oderno, o cavalo é a pessoa para quem estamos testem unhando. Ele diz:

Isso significa q u e p rec isarem os atravessar a p o n te até o local o n d e o cavalo se e n c o n tra , em vez de p e rm a n ec er de pé do o u tro lado , te n ta n d o co n v en ce r o cavalo a v ir até nós. F inal- m e n te , é claro, devem os atravessar a p o n te co m o cavalo, m as, a p rin c íp io , talvez isso n ão seja possível. P recisarem os en tra r n a perspec tiva d a o u tra pessoa, p en sarm o s de aco rd o co m suas p re ssu p o s içõ es.2

Erickson sugere que neste processo precisamos expor as in- consistências da abordagem não conservadora. É possível fa- zer isso com os críticos céticos e seu retrato do Jesus histórico, segundo o qual m uito do que está escrito nos evangelhos (até 50% ) não tem nada a ver com ele. Temos alguns textos proble- máticos e questões internas significativas, mas o retrato de Je- sus apresentado pelos não conservadores são mega-problemas. O s liberais podem levantar questões sobre detalhes com o o censo de Q uirino ou quantos cegos Jesus curou em determ i- nado m om ento ou o núm ero de testem unhas no sepulcro va- zio. E ntretan to , gostaria que eles não perdessem de vista o fato de que Jesus realm ente curou. E docum entos não cristãos re- conhecem isso quando cham am Jesus de mágico ou encanta- dor. A evidência histórica que tem os sobre Jesus não dá lugar à

2Postmodernizing the faith: evangelical responses to the challenge of postm odernism , G rand Rapids, M ich.: Baker, 1998, p. 155·

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opção que m uitos críticos desejam ter para afirm ar que nada acontecera. As expulsões de dem ônios e as curas realizadas por Jesus, o esforço de seus oponentes para explicar seu poder e a afirmação dos discípulos de que ele ressuscitou dos m ortos ne- cessitam de um a decisão sobre a fonte da obra de Jesus: a pre- sença de Deus trabalhando por interm édio dele. Os sinais estão firm ados no reino de Deus. Eles indicam que Jesus é m uito mais que o sábio, o profeta ou o exemplo que m uitos do Semi- nário Jesus prom ovem para enquadrá-lo com o um a grande figura religiosa entre m uitas no panteão religioso.

As duas abordagens têm seu valor. Tanto a que defende a Bíblia detalhadam ente quanto a que analisa o paradigm a exis- tente no m étodo, sem perder de vista todo o contexto. M as necessitamos mais da segunda abordagem para envolvermos nossa cultura diversa e nos certificarmos de que missões, não nossa autopresunção no debate interno, sempre serão o prin- cipal elem ento de nossa obra.

E po r isso que grupos evangélicos e editoras que patroci- nam os estudos sobre Jesus precisam fornecer sua obra para a igreja a fim de que a reflexão in terna perm ita ter diferentes opiniões. Devemos ser m uito cuidadosos ao excluir alguém (sem deixar de considerar a possibilidade de que a exclusão às vezes é necessária). H á tam bém a necessidade de um lugar onde os passos em falso possam ser dados no início e a com unidade possa trabalhar para m ostrá-los, sem usar im ediatam ente a gui- lhotina.

Q uando enfatizamos continuam ente os detalhes da verda- de, correm os o risco de falarmos som ente para nós mesmos sobre aquilo que julgamos im portante e, assim, perderm os o cham ado m aior de Deus. O perigo do outro lado do espectro é tornar os ensinam entos bíblicos irrelevantes e recusar envoi- ver-se uns com os outros no que diz respeito à verdade. Mas ainda existe um terceiro perigo para a cultura em nossa m is­

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são: o envolvim ento na apologética quando outros jamais sen- tirão que sua visão de m undo está sob coação. Os que não têm fé sempre levantarão esses pontos do debate in terno para nos afastar da m ensagem m aior que podem os afirm ar juntos, em um a única voz. Sei que essa é um a estratégia de desvio. Eu costum ava fazer isso quando não era crente, m udando o as- sunto para as pessoas que nunca ouviram falar de Jesus na África ou na Ásia de m odo que a discussão não ficasse focada em m im ou em m inha necessidade. O esforço obteve êxito até que alguém que me falava de Jesus disse: “N ão vamos para lá ago- ra. Vamos nos concentrar no tem a principal: com o Deus está falando com você e com o você o enxerga”.

M inha opinião é que um evangelicalismo que transform a cada discordância em um a grande batalha corre o risco de gastar todas as suas energias internam ente. Correm os o risco de ignorar aqueles a quem somos cham ados para buscar. Per- deremos nosso propósito e cam inho final. Nossa missão se trans- form ará em corrigirmos uns aos outros em lugar de desafiarmos o m undo com a esperança da m ensagem e o caráter do evan- gelho.

Então, quando falamos a respeito dos estudos sobre Jesus, qual é o objetivo de missões? Q ue sugestões positivas existem para o cam inho que deveríamos seguir?

G ostaria de destacar três exemplos nessa área.Prim eiro, precisamos de m onografias individuais do mais

alto padrão (existem m uitos exemplos ultim am ente). Conquis- tam os o tipo correto de reconhecim ento in ternacional pela qualidade de nossa obra. U m artigo recente de M artin Hengel relaciona um a série de estudiosos evangélicos cujas obras estão sendo reconhecidas com o ím pares.3 N a lista, há pessoas que

3Raising the bar, Christianity Today; 22 de outubro de 2001, p. 76.

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pertencem à ETS e ao IBR (Institute for Biblical Research) [Ins- titu to de pesquisas bíblicas], outra organização evangélica de pesquisa form ada por estudiosos do A ntigo e do Novo Testa- m ento que defendem a infalibilidade da Bíblia. Isso dem ons- tra que nossa presença nos grandes debates está crescendo.

Em segundo lugar, há um esforço genuíno de equipe. O grupo de estudos sobre Jesus do IBR é com posto por especialis- tas da com unidade evangélica. Todo ano, já há vinte anos, eles produzem para o Bulletin fo r Biblical Research um artigo téc- nico de excelente qualidade sobre um dos vinte principais even- tos na v ida de Jesus. Esse esforço recebe apo io p rivado: evangélicos leigos de rara visão têm enxergado o grande po- tencial em apoiar os esforços desses estudiosos. Trata-se de um exemplo dos recursos dos estudiosos e das pessoas no m ercado destinados a influenciar a discussão técnica e popular sobre Jesus. O exemplo tem potencial em várias áreas, incluindo o argum ento de Hengel por um institu to evangélico onde pu- dessem ocorrer simpósios anuais. São necessários em preendi- m entos evangélicos no m ercado e fundações missionárias para apoiar financeiram ente os esforços que po r definição seriam orientados para o debate aberto.

O objetivo do projeto do IBR é tornar disponíveis ao máxi- m o estudos atualizados sobre Jesus que envolvam com pleta- m ente os m étodos e discussões atuais e que afirm em a história fundam ental dos eventos principais da sua vida. Finalm ente, vários livros acadêmicos e populares serão lançados para dis- cutir a ênfase principal da vida de Jesus. Essa obra será de na- tureza bem diferente da do Seminário Jesus. O grupo do IBR

objetará, com base crítica histórica, qualquer tentativa de re- duzir Jesus a um nível não messiânico e rejeitará a acusação de que ele não fez afirmações únicas sobre o seu relacionam ento com Deus. C om bom planejam ento e atenção cuidadosa ao clima teológico contem porâneo, os grupos de estudos da ETS

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terão potencial semelhante. Todos esses esforços necessitam dar atenção à distribuição dos resultados de seu trabalho, não so- m ente dentro da igreja, mas tam bém externam ente no m un- do. N ão obtivem os êxito em levar a m ensagem por canais abrangentes da m ídia.

Em terceiro lugar, há esforços intencionais para alcançar nossa cultura por m eio da m ídia visual. A estrada aqui é de acesso um pouco mais difícil. Fomos lentos em estabelecer um a rede de contatos e em obter recursos financeiros que apoias- sem os esforços em preendidos. M as o potencial existe, basta que a com unidade evangélica agarre a oportunidade.

O objetivo em tais esforços nem sem pre é a conversão da atual com unidade de estudiosos. N em ganhar aceitação aca- dêm ica, com o alguns de nossos críticos in ternos erroneam en- te afirm am . Se quiséssemos esse tipo de aceitação, a coisa mais fácil a fazer seria negar a infalibilidade e o com prom etim en- to sério com a Bíblia. N osso alvo principal é a próxim a gera- ção de estudantes que está decid indo com o discorrer sobre a Bíblia, fazer teologia e en tender Jesus; aqueles que estão len- do os pon tos de vista e observando os conjuntos de especiais de m ídia, fo rm ando suas opiniões du ran te o processo. Em outras palavras, nosso objetivo é form atar o fu tu ro do debate teológico.

Perm itam -m e destacar nossos problem as atuais, falando a respeito de Jesus na m ídia. Nos últim os anos, foram produzi- dos pelo m enos três grandes vídeos sobre o Jesus histórico: o especial da PBS in titu lado De Jesus a Cristo; o especial de Peter Jennings cham ado A busca por Jesus, que ganhou espaço em horário nobre, ating iu 15 m ilhões de espectadores e exigiu bastante dos participantes do Sem inário Jesus; e um especial p ro d u z id o p o r Jam es C h a rle sw o rth de P rin c e to n pa ra o Discovery C hannel e que, diferentem ente dos outros dois es­

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peciais, gastou parte do tem po defendendo m uitos aspectos dos relatos bíblicos sobre Jesus.4

H ouve duas respostas nos círculos evangélicos. U m pro- gram a de um a hora de duração com o dr. Jam es K ennedy que foi ao ar em horário nobre em 85 estações do país. V isto po r 13 m ilhões de telespectadores, esse especial envolveu poucos evangélicos especialistas nos estudos sobre Jesus. Foi principalm ente inform ativo, usando o dr. K ennedy e o ator D ean Jones para argum entar. Esse esforço enorm e provável- m ente custou alguns m ilhões de dólares. O u tro esforço im - po rtan te foi a produção de Jo h n A nkerberg, que utilizou 16 estudiosos de três continentes; todos eles especialistas em es- tudos sobre Jesus ou sobre o segundo tem plo judaico. Este foi ao ar várias vezes na rede Insp iration C hristian em horá- rio nobre de duas horas e con tinua a ser exibido periodica- m ente no program a de John A nkerberg em cinco episódios, tam bém em um a rede de televisão evangélica. FFá um esfor- ço para levantar 4,5 m ilhões de dólares, o custo para levá-lo ao ar em horário nobre em cerca de duzentos m ercados pelo país. U tilizando vários m em bros da ETS e do IBR, a produção interage d ire tam ente com o especial de Jennings. Após qua- se um ano, ainda não conseguim os angariar os fundos neces- sários. Q ue ironia term os um a indústria de en tre ten im en to cristã de 3 bilhões de dólares anuais, g randem ente apoiada por evangélicos, mas ser tão difícil ob ter d inheiro para apre- sentar e defender Jesus no contexto de m ídia cultural mais

4Para ob te r um a avaliação sólida sobre Jesus e a m íd ia em nossa cultura até a época do especial de Jennings, v. Philip Jenkins, H idden gospels■. how the search for Jesus lost its way (Oxford U niversity Press, 2001), esp. p. 178-204. Este artigo escrito por um professor em Penn State é tam bém um a análise com petente das raízes do que está aconte- cendo culturalm ente.

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visível.'’ O que essa incapacidade de investir no engajam ento cultural revela-nos sobre o posicionam ento de nossa missão e nossas prioridades de gastos? N a realidade, quando o especial de Jennings foi ao ar pela prim eira vez, a com unidade evangé- lica, com exceção dos batistas do sul dos EUA, estava totalm en- te despreparada para responder, nem qualquer rede evangélica estava p ron ta para reagir em tem po real, o que significa dias, não meses. Portanto, deixamos para responder tardiam ente, e aos poucos, o que levará meses, ou m esm o anos.

Essas questões estendem -se além de qualquer sociedade aca- dêm ica única, mas m ostram quão os pontos da com unidade evangélica encontram -se desconectados no que se refere ao envolvim ento cultural.

N ão teria sido bom , quando o especial de Jennings foi ao ar, que em questão de dias os presidentes dos maiores seminários evangélicos tivessem feito um a declaração pública que afirmasse que Jesus é estudado cuidadosam ente por m eio de pesquisas em suas instituições, mas que os resultados desses estudos são diferentes daqueles que o especial de Jennings apresentou? Se- ria possível o evangelicalismo tivesse um a voz única suficiente em relação à nossa com preensão sobre Jesus de m odo que nos- sa posição fosse claram ente m anifesta e com provada por um a obra cooperadora? Q ue lugar m elhor para fazer essa defesa do que na ETS, no IBR e em outros centros de pesquisa evangélicos e acadêmicos? Já passou o tem po quando um único especialis- ta bastava para defender um a tese com o essa. A bibliografia atual é complexa demais para ser deixada sob a responsabili- dade de um a única pessoa.

,Podemos cham ar a atenção da m ídia com a m anchete Jesus Rocks na Newsweek de 16 de julho de 2001, mas o que está sendo destacado? Q uantas editoras, músicas e mídias se espelham em m étodos do m undo. E não há drogas nem sexo em nossos concertos de rock, o que felizmente é um contraste m arcante em relação a cultura contem porânea do rock.

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Estamos quase perdendo a batalha cultural. As editoras po- deriam ajudar-nos assegurando que nossas redes de distribuição não se limitassem exclusivamente às lojas ou às redes de televisão cristãs, como acontece nos EUA. Precisamos ser agressivos em ter- mos de marketing para conseguirmos penetrar nas grandes re- des de livraria, incluindo as da Internet, bem como em outras áreas além das seções de “inspiração cristã”. É necessário traba- lharmos para ganhar acesso à m ídia local e nacional, assim como outras editoras e instituições religiosas e não religiosas fazem.

Sei que estou indo além do escopo de um a obra acadêmica norm al, mas o fato é que os especialistas nos quais a m ídia se apóia deveriam em parte vir de nosso meio. Por que os evan- gélicos estão fracassando? Seria em parte porque estamos tão fragm entados, discutindo uns com os outros e fundando or- ganizações com objetivos lim itados de público e de distribui- ção? Seria porque falamos em um a linguagem técnica tão cheia de jargões internos, que n inguém consegue en tender o que estamos dizendo? Será porque desistimos, afirm ando que esse preconceito jamais nos deixaria penetrar? Será que realm ente tentam os ou pagamos o preço por sentarm os à mesa de discus- são cultural? M eu envolvim ento em tais contextos m e diz que é m uito fácil reclamar da m ídia quando não tivemos visão para nos envolvermos nesse nível. A situação está m elhorando, po- rém, precisamos encorajar tais tentativas.

Tam bém fracassamos porque m uitos evangélicos não valo- rizam suficientem ente a m udança da cultura de palavras para a cultura de imagens. A geração que está por vir, que é mais sagaz no que se refere à im agem e à tecnologia do que a gera- ção passada, tem que trabalhar m ais.6 N orm alm ente, não re-

1'U m exemplo de estudo envolvendo nossa cultura consciente da ima- gem em term os de filmes e das doutrinas sobre Deus é o de Robert K. Johnson, Reel spirituality: theology and film in dialogue, in: Engaging culture (G rand Rapids, M ich.: Baker 2000).

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digimos com substância e com estilo que envolva esse público maior.7 H á livros que cam inham em um a direção mais orien- tada a imagens, com o, por exemplo, A oração de Jabes e as obras de ficção cristã da série Deixados para trás. Essas e m uitas ou- tras obras populares conseguiram quebrar a barreira secular que norm alm ente detém a distribuição mais ampla. Digo para aqueles que estão tentando, geralm ente de maneiras inovado- ras: “Prossigam”.

Em bora exista crítica a essas obras, e há questões im portan- tes a serem levantadas sobre a tendência ao escapismo ou a simplificação exagerada, elas realm ente conseguem fazer que as pessoas conversem sobre Deus de um a m aneira que as obras mais densas não conseguem. Seria nossa culpa com o autores? Tentam os escrever som ente para um público, deixando as obras populares para os outros? Será que escrevemos e depois limita- mos nossa distribuição ao cenário interno? Será que, às vezes,

U m a exceção no debate sobre Jesus é a obra editada por M ichael W ilkins e J. F. M oreland, Jesus under fire . A obra popular conduzida p o r não-proFissionais com o de Lee S trobel, Em defesa de Cristo׳, um jornalista ex-ateu investiga as provas da existência de Cristo (São Paulo: Vida, 2001) e a obra de Jeffrey L. Sheler, Is the bible true? H ow modem debates a n d discoveries a ffirm the essence o f the scriptures (N ew York: H apersSan Francisco, Z ondervan , 1999). Louvo o esforço deles, mas os estudiosos e as pessoas que trabalham com obras populares preci- sam cooperar uns com os ou tros sobre com o tra tar estas questões. Os acadêm icos fariam bem em considerar com o to rn ar a nós m esm os e nossa o b ra m ais d isp o n ív e is p ara essas pessoas. Talvez os ed ito res possam nos ajudar a estabelecer um a rede de contatos m elhor nesses níveis. Um ou tro bom exem plo de in tercâm bio foi a obra de G ary H. H aberm as, The historical Jesus׳, ancien t evidence for the life o f C hrist (Jop lin , M o.: C ollege Press, 1996). Esta obra foi lançada po r um a editora m enos conhecida. A lgum as vezes, boas obras evangélicas sur- gem em cenários desconhecidos, o que infelizm ente lim ita sua distri- bu ição .

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usamos vocabulário e estilos que im possibilitam o envolvim ento das pessoas com uns?8

OUTROS EXEMPLOS DE POSSÍVEL COLABORAÇÃO COM 0 PROPÓSITO DE ENVOLVER A CULTURA

Temos alguns exemplos de com o as diferenças podem ser tra- tadas de m odo que possa haver colaboração.

Vamos analisar o dispensacionalism o-aliança com o exem- pio de discussões que atravessam as tradições dentro do cam po evangélico. O prim eiro grupo de estudo da ETS, iniciado em m eados da década de 1980, foi o que tratava do estudo do dispensacionalismo. Ele m ostrou o potencial do que poderia ser alcançado entre as tradições evangélicas com o envolvim ento sério em um diálogo face a face, em vez de escrever separada- m ente a distância. Essa não era um a m eta, mas um subproduto da discussão de áreas de interesse m útuo . O s encontros não rem overam as diferenças, mas levaram a um a m elhor com pre- ensão e tom do nosso debate. Essa discussão chegou a ponto de um dispensacionalista fazer parte da diretoria da Reform ed Alliance o f Confessing Evangelicals. O diálogo continua entre os m em bros das duas correntes, incluindo convites para que os m em bros de um a tradição façam palestras na outra. A dis- cussão d im inu iu o nível de aspereza entre m uitos dos m em - bros das tradições, tornando-os livres para trabalharem juntos em questões de interesse m útuo . A proliferação de grupos de estudo constituídos por pessoas de várias subtradições é um bom sinal para a ETS e para o evangelicalismo, supondo que

sSou tão culpado disso com o qualquer um, com um vasto com enta- rio em dois volumes sobre Lucas. Entretanto, o com prom etim ento com um público mais popular foi refletido na tentativa e tem po adicionais tam bém para escrever para pastores e leigos no NVIApplication Commentary e na Ι\Ψ New Testament Commentary Series.

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elas produzam obras que alcancem a com unidade teológica e eclesiástica de m aneira geral.

Vamos tam bém considerar a recém-surgida área de forma- ção espiritual. Nos últim os cinco anos, um grupo de acadêmi- cos evangélicos in teressados em form ação esp iritu a l tem trabalhado para definir um conjunto de com prom etim entos centralizados em torno de um conceito teológico essencial de espiritualidade. Por interm édio de um a organização emergen- te, agora conhecida com o Fórum de Formação Espiritual, eles buscam integrar a form ação espiritual à pesquisa acadêmica de seminários e faculdades cristãs. Esse grupo não está centra- lizado em um a instituição; foi projetado desde o início para ser um a instituição aberta para envolver pessoas as mais diversas. Ao expandir essa visão inicial, o grupo afiliou-se recentem ente a um a rede ainda m aior de igrejas evangélicas e líderes leigos, a Sum m it on Discipleship. O que ocorre nos seminários refle- te o que acontece nas igrejas e organizações pareclesiásticas. A iniciativa foi liderada por acadêmicos de vários seminários pre- ocupados em que os seminaristas não se sentissem perdidos ao envolver-se nessas questões.

Houve duas conferências internacionais sobre formação es- piritual nos últimos três anos, além de um a mesa-redonda reu- n indo líderes de igrejas e acadêmicos. O diálogo entre diferentes tradições tem um foco central na Bíblia e na preocupação pas- toral. As escolas, cujo papel é im portante, representam um a sé- rie surpreendente desse espectro. M inha lista de escolas está em ordem alfabética, mas o lugar de destaque deve ser conferido à Regent College, por colocar a formação espiritual na base de seu program a acadêmico desde o início, bem antes de o fórum existir. Entre as escolas que agora se uniram a essa discussão es- tão Asbury, Bethel, Dallas, Fuller, Talbot, Trinity e W estminster, um a combinação interessante. Esse m ovim ento está ocorrendo

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fo ra d a ETS, m a s m u ito s d e seus m e m b r o s e s tão a s s u m in d o p a -

p é is d e lid e ra n ç a .

O próxim o passo será um envolvim ento ainda m aior de outras parcelas da com unidade evangélica, incluindo igrejas, organizações pareclesiásticas e internacionais. Todas essas com- partilham a m esm a preocupação com um a espiritualidade bi- blicam ente fundam en tada . O desejo é d iscu tir a form ação espiritual não som ente de acordo com práticas úteis, mas tam - bém com obras bíblicas e teológicas sólidas que estim ulem a igreja a confiar em Deus com o seu form ador de discípulos. A questão da form ação e a adoração essencialmente a Deus são im portantes dimensões de nosso cham ado e unidade. N a co- m unidade, a pessoa estuda e vive a form ação espiritual que Deus realiza internam ente por interm édio do seu Espírito em Cristo. Aqui podem os m odelar o que o evangelho produz.

C on tudo , há trabalho a ser feito. C om o tra tar da espiri- tualidade em um contexto evangélico diverso, em que tanto a espiritualidade quanto suas práticas adm item várias formas di- ferentes? O u com o proceder dessa m aneira em um m undo pós-m oderno onde m uitas histórias sobre espiritualidade, in- elusive algumas que não têm nada a ver com o Deus judaico- cristão, disputam atenção? Por que o estilo musical tornou-se um assunto que causa tan ta divisão quando deveria unir? To- das essas questões são problem as m eram ente de gosto ou de cultura? O surgim ento dessa divisão em to rno da adoração revela quão superficial é a form ação espiritual dentro de nos- sas com unidades. C om o determ inam os o que é e o que não é saudável no que se refere a essas expressões variadas? Essas e outras questões necessitam ser expostas, para nos ajudar a trans- por o que é um a questão polêm ica, e às vezes fundam ental, dentro da igreja. Em suma, com o deixarmos claro o que é a espiritualidade bíblica em um m undo que se to rnou espiritu- alm ente mais sobrecarregado e aberto à discussão espiritual?

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C ertam ente há aqui m aior necessidade de colaboração séria dentro do evangelicalismo.

R etornando à ETS e a outros contextos acadêmicos evangé- licos, há questões im portantes a serem tratadas a respeito da definição do contexto espiritual de nossos debates e discus- soes. As prim eiras reuniões da ETS incluíam a adoração em conjunto. A ETS não faz mais isso, a não ser nos poucos cinco m inutos de devocional antes das assembléias gerais. As duas tentativas feitas nos últim os anos para incluir a adoração de form a mais extensiva tiveram apenas resultados modestos. Nossa orientação acadêmica sugere que a adoração pode ocorrer em outro lugar, mas nos lem bra de que nossa unidade em Cristo é um ato com unitário central que pode reforçar nosso propósi- to, m esm o quando conversamos e debatem os juntos. Nosso estudo é, em últim a análise, para o seu serviço. N ão honram os a Deus em resposta a essas oportunidades de adoração. Nova- m ente, acredito que nossos precursores agiram corretam ente ao incluir a adoração nas características da ETS. O IBR come- çou a fazer isso e convidará os líderes de adoração da igreja local a fim de ajudá-los quando se reunirem nos encontros na- cionais aos dom ingos. Reconheço que a ETS não se reúne aos dom ingos, mas por que não enfatizar nosso com prom etim en- to com o Senhor em m om entos de com unhão verdadeira e de louvor durante um a noite a cada encontro anual? N ão somos m eram ente ou m esm o essencialmente acadêmicos. Adorar jun- tos, ainda que por pouco tem po, afirma algo fundam ental so- bre nossa identidade. A adoração é algo pertinente a um a ETS

que busca a unidade na diversidade.N a realidade, o m esm o questionam ento poderia ser feito

para o evangelicalism o de m aneira geral. O casionalm ente , adorar jun tos atravessando as linhas denom inacionais não pode ser um a coisa ruim . E com o a troca de púlpito que algumas igrejas fazem para destacar que sua unidade em Cristo vai além

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de suas congregações locais. Tais eventos de vez em quando nas principais cidades seria um a poderosa declaração pública sobre o princípio do evangelicalismo de que o cristianism o não está restrito a qualquer denom inação em particular.

O que o evangelicalismo faz para m ostrar a composição in- ternacional de seu corpo? N ovam ente, um a resposta curta: pou- co. A reunião anual da ETS em 2000 foi talvez o encontro mais internacional, quanto à participação, que ela já teve. O tem a foi: “Israel: passado, presente e futuro”, um tópico de im por- tância ainda m aior à luz das tensões travadas no O riente M édio em 2001 e 2002. Os palestrantes eram judeus e palestinos cris- tãos vindos de Israel. A troca de experiências foi quase um acor- do m útuo.

E n tre tan to , precisam os de um a perspectiva m aior sobre com o os crentes vivem a experiência cristã em outras partes do m undo. U m resultado dessa reunião foi a proposta para apoi- ar a viagem de alguns líderes cristãos de outros países, especial- m ente do terceiro m undo, para m antê-los em contato com o que está acontecendo na ETS e vice-versa. A m eta inicial m uito m odesta é que pelo menos um a sessão plenária, ou pelo menos a principal, a cada ano seja cedida a um a figura internacional, isto é, de fora da América do Norte. Alguém que pudesse nos dar a noção exata do que está acontecendo no corpo de Cristo em outros lugares. N ós nos debatemos porque não avaliamos com precisão a teologia praticada em outros países.

Por exemplo, um a sessão plenária em um a reunião anual da ETS em 2000 gerou um a discussão franca sobre Israel e nossos irmãos palestinos. Os judeus e palestinos cristãos revezaram-se para explicar sua visão sobre Israel. Após essas reuniões, ouvi alguns com entários sobre a discussão. A crítica era que a dis- cussão foi m uito política e sociológica, e não teológica o sufici- ente. M as o p on to de justaposição que judeus e palestinos estavam m ostrando era o quanto a cultura e o cenário afetam a

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leitura do cham ado de Deus. C om o falar sobre Israel hoje sem incluir política? C om o ignorar a m aneira com o Israel, a nação mais incrédula, trata nossos irmãos e irmãs em Cristo palesti- nos, m isturando-os à grande sociedade árabe m uçulm ana? Es- sas questões sobre com o os cristãos vêem os crentes palestinos em Israel, e com o se identificam com eles, são aplicáveis, não im porta o m odo com o analisamos o fu turo de Israel com o na- ção. Se considerarm os a teologia som ente para o futuro, mas ignorarm os o cham ado étnico de D eus para os crentes e para as nações, fracassaremos em fazer teologia. Em cada época de- vemos ser sensíveis às pessoas perseguidas por causa de seu re- lacionam ento com o Senhor. Podem os passar por cim a do constante cham ado da Bíblia para que seus santos busquem o am or e a justiça? N ão é verdade que Deus disse a Israel para tratar o estrangeiro com justiça, pois o povo de Israel sabia o que era ser estrangeiro (Ex 22.21)? Se ignorarmos esses temas, nossa teologia é inocente e não tem nada a dizer àqueles que caíram na arm adilha infernal hum ana que está sendo prepara- da há milênios. Sem Cristo e sem o abandono da mentalidade do dente por dente no O riente M édio, a solução será frustrada na região. Se a reconciliação é um tem a central da Bíblia, então como dem onstram os essa qualidade divina na região do Orien- te M édio, dividida étnica e religiosamente? As questões são difí- ceis; as respostas não são fáceis. M as devem ser enfrentadas realisticamente conform e D eus nos ordena, até que ele venha. Eis ou tra área que m ostra quanto necessitamos uns dos outros para obter um a perspectiva equilibrada dos problem as.

Além disso, o tem a sobre Israel foi im portan te para a ETS

por outra razão: nossa busca por envolvim ento internacional e o tópico sobre Israel trouxeram , pela prim eira vez, m uitos cren- tes judeus à nossa reunião. Para alguns, foi a prim eira vez que tiveram a oportunidade de encontrar tantos crentes do meio judaico. Para os judeus presentes foi um a oportunidade de en­

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volverem-se em um diálogo transcultural sério sobre questões que eles vêm discutindo isolados culturalm ente há m uito tem- po. Essa troca nos faz lem brar que a ETS não deve ignorar o chamado de Deus para ajudarmos os crentes judeus messiânicos a serem reconhecidos como parte integrante da igreja. Tal dis- cussão, transpondo os grupam entos internacionais e raciais, está de acordo com a missão fundam ental de Deus para o m undo, para a qual a ETS e o evangelicalismo devem contribuir. Um a reflexão bem -sucedida de um a série de relações de qualidade nessas áreas teria m uito a dizer à nossa cultura, que não tem a m enor idéia de como reconciliar grupos divergentes.

A NECESSIDADE DE UM TRABALHO DE COLABORAÇÃOEntão, qual a direção que devemos tomar? Q uer considere- mos os estudos acadêmicos com o aqueles sobre Jesus, o diálo- go entre as tradições com o, por exemplo, as discussões sobre aliança e dispensacionalism o, tópicos com o a form ação espiri- tual ou adoração, quer examinem os as questões relacionadas à composição internacional e étnica da igreja, um a coisa é clara: para o evangelicalismo poder afirm ar o seu com prom etim en- to com o corpo, devemos trabalhar jun tos nessas várias frentes com o testem unhas do vínculo que D eus nos deu em Cristo. Jesus disse que o m undo saberia que somos seus discípulos se nos amássemos uns aos outros (Jo 13.35). A m ar uns aos outros não significa acordos irracionais ou sentim entalism o de uns para com os outros. N a realidade, significa term os um senti- m ento de respeito m útuo . As vezes, quer dizer com partilhar juntos o m inistério. Será que nosso testem unho não é com o deveria ser porque não conseguim os ir até onde deveríamos uns com os outros? Seria possível encontrarm os juntos um ca- m inho, m antendo os olhos fitos em um a teologia que prom o- va a unidade na diversidade em áreas essenciais da fé?

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A BUSCA DA VERDADE EM ÁREAS POLÊMICAS NAS INSTITUIÇÕES ABERTAS AO DEBATE

A questão atual da abertura em um contexto de unidade na diversidade

ssim, chegamos à questão altam ente polêm ica da abertura, tendo-a posicionada em um con-

texto mais am plo para nossa reflexão.1 Trata-se de assunto atu- alm ente em alta dentro do evangelicalismo. N ada mexe tanto com nossas paixões do que a dou trina de Deus. Essa paixão é compreensível, pois estamos discutindo o caráter do D eus trino a quem am am os e que nos ama. C om o ele age em sua criação, entre suas criaturas? O que a soberania divina realm ente signi- fica? N o encontro anual da ETS em 2 0 0 1 , essa foi um a daque- las grandes questões que surgem a cada dez anos. Utilizo como exemplo o processo com o qual estamos envolvidos, cham an- do a atenção para o fato de que esse processo reflexivo ainda

1As principais obras recentes que dão suporte à abertu ra são a de John Sanders, The God who risks׳, a theology o f providence (D ow ners Grove, 111.: Intervarsity Press, 1998), e a de Gregory A. Boyd, God o f the possible: a biblical in troduction to the open view o f G od (G rand Rapids, M ich.: Baker, 2000).

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não está concluído para a ETS. C om o procedem os enquanto instituição aberta diante de preocupações legítimas relativas à compreensão do nosso amado D eus׳׳ Com o buscamos um de- bate dentro de nossa sociedade ou do evangelicalismo a respeito de visões diferentes? C om o determ inam os quando essa diferen- ça é um a questão prioritária central no que diz respeito à fé ou se envolve questões significativas, mas que não estão no eixo da fé? Uso outro exemplo da ETS porque se trata de um a entidade aberta, constitu ída por vários subgrupos que têm diferenças doutrinárias em questões m enos centrais.

ALGUMAS ORIENTAÇÕES E PROCEDIMENTOSU m teste dentro da ETS foi, e deve continuar a ser, com o ava- liar quanto a proposta está biblicam ente fundam entada. O pa- drão não é se eu concordo com as conclusões ou o m odelo. Se isso se to rnar padrão, então a associação a essa instituição aber- ta se tornará um a questão política determ inada pela m aioria dos votos, e, portanto , não haverá variedade de pontos de vista para serem debatidos abertam ente. Se o padrão para partici- pação se to rnar um a m aioria que determ ina se um a posição está correta ou não, o que nos im pedirá de dizer que a infalibi- lidade ou m esm o a autoridade bíblica realm ente está ligada a essa ou àquela conclusão específica? O diálogo abrangente e a troca de experiências nas instituições abertas devem ocorrer por m eio de argum entação e contra-argum entação.

O u tra orientação (observe que não utilizei a palavra padrão, pois os julgam entos da história não são necessariamente infalí- veis) deveria ser a história da reflexão doutrinária nas questões que estão sendo analisadas. Debates passados similares podem ter m uito a nos ensinar. A m aioria de nós conhece a história dos debates. A história pode servir de proteção para evitar que sejamos arbitrários no que aceitamos ou rejeitamos.

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N ovam ente, a ETS dá um a orientação sábia, estabelecendo procedim entos antes que a atual polêm ica sobre a abertura viesse à tona. Esse é um detalhe im portante, pois significa que ninguém pode reclam ar que os procedim entos foram estabe- lecidos para tratar desse assunto polêm ico em particular. An- tes, a com unidade estabeleceu um caráter de reflexão in terna ao excluir alguém da arena de debates da ETS. A expulsão na ETS foi propositada e sabiam ente dificultada para evitar esco- lher tal cam inho com facilidade. O artigo 4o, seção IV, exige que um com itê executivo seja o pon to inicial de referência para os m em bros cujas obras ou ensinam entos sejam considerados diferentes da base doutrinária da ETS. Eles são convocados para um a reunião com a pessoa ou pessoas em questão.2 Se o com itê executivo subm eter o caso aos m em bros da ETS, então é feita um a votação no ano seguinte. É necessária um a m aioria de dois terços dos presentes para realizar a votação de desliga- m ento. Padrões ainda mais rígidos são aplicados no que se re- fere emendas na base doutrinária. Nesse caso, são necessários quatro quintos dos votos. Q uando se atinge esse padrão, em outras palavras, quando a com unidade atua de acordo com um consenso público, acredito que é o m om ento apropriado de agir. C om o em um júri, deve-se estabelecer limites quando a com unidade, em sua m aior parte, manifesta-se em conjunto de form a unificada, mas não quando um a simples m aioria ou pluralidade se expressa. Reduzir um m ovim ento tão sério de censura a um a simples votação de procedim ento da m aioria não é algo sensato, a longo prazo, para a saúde das instituições abertas.

:Deve-se observar que quando o com itê executivo reuniu-se em 2000 e colocou o tem a da abertura para discussão na reunião anual de 2001, não se iniciou um procedim ento de exclusão. Procurou-se envolver toda a sociedade em um diálogo sobre um a questão altam ente polêmica.

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Em um a entidade tão heterogênea como o evangelicalismo, esse processo tam bém proporciona tem po para debater e pro- cessar o debate. Isso tem a vantagem de perm itir que a discussão sobre a questão seja analisada profundam ente, possibilitando que o debate alcance novos estágios de m aturidade no processo de troca. O período de espera durante esse processo pode ser ator- m entador para aqueles que desejam determinação, que é atingi- da quando som os cuidadosos com a discussão em questão. Q uando temos certeza de que o assunto será adequadam ente coberto e analisado, é válida qualquer espera. Podem surgir in- form ações fundam entais no processo de debate deliberativo, conduzido de form a bíblica, sistemática e histórica. Fóruns como a ETS são pontos de encontro im portantes para essas discussões, pois envolvem defensores qualificados de várias perspectivas em um processo projetado para ser deliberativo e público. U m pro- cesso que conscientem ente leva vários anos é algo sábio.

Q ue tal nos prenderm os à análise de um a posição antes de chegar a ponto de decidir pela censura ou exclusão imediata? Nossa questão inicial deveria ser esta: a visão é biblicam ente fundam entada? Isso significa que os textos têm que ser analisa- dos exegética e sistem aticam ente para verificar com o se inte- gram com outros textos que fazem parte do cânon. M as há um a im portan te consideração herm enêutica que precisam os levar em conta. Sair de textos isolados para a integração bíblica em um a leitura sistemática é um a dedução que qualquer um pode fazer. M uitos debates entre sistemas teológicos dentro do evangelicalismo relacionam-se, em grande parte, com o m odo com o tornam os esses m ovim entos mais sistemáticos. Em ou- tras palavras, é necessário um trabalho cuidadoso para verifi- car se as passagens exegéticas estão alinhadas com o escopo dos textos em um tópico com o esse. E possível conseguir ajuda em pregando a teologia bíblica com o um m ovim ento interm e- diário entre a exegese e todo o sistema teológico. U m indício

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A B U S C A D A V E R D A D E E M Á R E A S P O L Ê M I C A S N A S I N S T I T U I Ç Õ E S A B E R T A S A O D E B A T E 1 0 7

de que um a questão complexa específica está presente no ce- nário surge quando exegetas e adeptos da teologia sistemática com eçam a alinhar-se em lados diferentes da discussão. H á alguns elem entos desse tipo de divisão no debate atual.

ANÁLISE DA ABERTURAVamos aplicar esse padrão ao debate atual sobre a abertura. O m o v im e n to de a b e rtu ra tem u m a posição séria sob re o envolvim ento com o texto, pelo m enos em alguns de seus estu- dos. E em um ponto eles parecem ter levado os m em bros da ETS a refletir em algumas questões im portantes. O eixo da nar- rativa bíblica sobre a aliança e a ação de D eus não é resgatar sua criação para fazê-la relacionar-se novam ente com ele? Se- ria possível existir um a relação entre a providência geral e a específica que não seja unidim ensional ou monocronológica? Será que temos certeza de que separamos tudo isso?

E ntretan to , ao falarmos da abertura de Deus para arriscar um a reação de nossa parte, pergunto-m e: será que essa questão tem sido levantada correta, bíblica e teologicamente? D eus re- alm ente deixa o futuro em aberto com o m uitos dizem? Deus fala diretam ente sobre o que finalm ente acontecerá no futuro, e a Bíblia fala m uito daquilo que ele de fato tem completo co- nhecim ento. Q ual a base que ele usa para falar do futuro? Pare- ce que vários textos na parte final de Isaías, partes do livro de Daniel, as seções de conclusão do livro de Jó, algumas passagens de Salmos, João 13— 17, Romanos 8 e Apocalipse, enfim, todos sugerem que Deus tem um projeto baseado em sua total presci- ência. Algumas coisas “devem ser”, conform e os textos indicam com o uso do term o grego dei. Nesse contexto básico, não creio que a explicação para a abertura seja convincente bastante para im pedir-m e de ouvir as questões levantadas.

A abertura é um a visão que parte do pressuposto de que D eus determinou certos elementos-chave, conform e observado

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em m uitos dos textos m encionados anteriorm ente (e argum en- ta-se para o hom em que os pontos de vista sobre a abertura que não fazem essas distinções não têm lugar nesses debates). O s defensores da abertura argum entam que grande parte dos detalhes na vida é deixada em aberto. M as m uitos desses textos tra tam do com pleto envolvim ento de D eus na criação, não dos detalhes específicos de seu plano, assim, ten to ver onde eles se apóiam para fazer essa distinção.

A inda há questões que eu gostaria m uito de discutir, não apenas de criticar e julgar. M ais im portan te, se quisermos to- m ar decisões com base em informações, precisamos de tem po para separar os detalhes do debate para alcançarmos um a con- clusão conjunta, m esm o se no final chegarmos a um ponto em que concordem os em discordar. Som ente quando esse debate inicial chegar ao fim, estaremos em condições de avaliar se o desacordo é um assunto prioritário ou mais periférico. Se exis- tisse um a votação para excluir um m em bro por esse ou outro m otivo polêm ico, então cada um de nós deveria dar esse voto com responsabilidade. Só poderem os votar de form a respon- sável quando estivermos adequadam ente preparados, confor- me o m odo como a com unidade tratou o assunto em seus encontros.

Por causa dessas questões e contrapropostas e da necessida- de de envolvim ento e interação, o m ovim ento de abertura deve ter tem po para envolver-se, para refletir e para responder à crítica. Creio que essa abordagem do diálogo teológico é fun- dam ental para um a sociedade estruturada e direcionada para a unidade na diversidade em to rno da Bíblia e do diálogo. O que quer que façamos, devemos ser deliberativos, conform e nosso ritm o, nos certificarmos de que somos justos e mesmo enxergarmos onde há algo que podem os aprender no debate e por meio deste. Mover-se rápido demais pode criar um curto- circuito no processo de aprendizagem para todos nós. O pro- cesso e o resultado são im portantes.

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OUTRO EXEMPLO DE COMO ANALISAR A QUESTÃOO utro exemplo de com o isso pode funcionar é com partilhar o que fizemos no Dallas Theological Sem inary (D T S ), o que m e dá a opo rtun idade de tra tar de ou tro fenôm eno que geral- m ente esconde sua face nada agradável em tal conflito. Trata- se da circulação de rum ores (que podem ocorrer tão rápido quanto à onisciência de Deus, mas não com a m esm a preci- são). As reuniões não foram preparadas porque alguém no DTS

era defensor da abertura, em bora m uitos tenham ouvido esse rum or. N ós nos encontram os porque acreditam os que as ques- tões levantadas eram im portantes e necessitavam de um estu- do cuidadoso. Em 2000 -2001 , nos reunim os seis vezes em blocos de noventa m inutos. O m odelo do DTS para essa dis- cussão não é perfeito, e observarei em alguns pontos com o ele poderia ter sido m elhorado. M inha observação não é sobre o m odelo detalhado, mas sobre o caráter deliberativo do proces- so e a integridade da intenção de buscar a verdade. Após um a discussão geral em um workshop na faculdade em 2000, nossa divisão de estudos bíblicos (Antigo e Novo Testam entos e ex- posição da Bíblia) escolheu tratar desse assunto durante o ano acadêm ico de 2000-2001. N o período de 2001-2002, pedi- mos à divisão teológica (teologia sistemática e histórica) que se unisse a nós.3 Teria sido m elhor se a tivéssemos incluído desde

3Os sistemáticos do DTS e W heaton fizeram um bom trabalho, con- forme m ostra a crítica de Robert A. Pvne e Stephen R. Spencer, A criti- que o f free will theism, parte um , Bib Sac 138 (julho-setem bro 2001): p. 259-86. A parte dois aparece na edição de outubro-dezem bro: p. 387־ 405· O prim eiro artigo foca as questões cristológicas levantadas pela abertura. Alguns teólogos desejam jun tar alguns desses textos cristológicos e torná-los um a exceção como parte do plano divino vinculado a Cristo. E ntretan to , a existência desse tipo de conhecim ento por D eus levanta questões sobre o seu modelo. Se existirem exceções aqui, então por que a sua presença representa um a grande violação do relacionam ento entre

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o início. Mas, tradicionalm ente, nossa estrutura de divisão au- tom aticam ente realiza reuniões separadas. Nesse caso, conse- guimos assim porque o assunto exigia e sabíamos que a discussão tinha que envolver exegetas e teólogos sistemáticos. Nossa aten- ção estava voltada para textos e m étodos. Com eçam os discu- tin d o com o a analogia da fé trabalha q u ando dois grupos afirm am que há várias passagens de controle claras do seu lado.

A divisão de estudos bíblicos com eçou suas reuniões em 2000-2001 discutindo os textos sobre a soberania e pancau- salidade, para verificar se expressam um a idéia universal ou um a situação contextualizada específica. Por exemplo, pode- mos não concordar se Amós 3.1-8 está relacionado som ente a um exemplo (i. e., contextualizado som ente nesse exemplo par-

Deus e o homem? Poderia ser argum entado que se isso acontecer com os relacionamentos de Deus ao seu principal representante hum ano, então, certam ente, se aplica aos outros relacionam entos, tam bém sem violar o caráter da aliança de D eus para com a sua criação. O im portan te na critica de Pyne-Spencer é a idéia de que a vontade hum ana e as escolhas responsáveis não são incompatíveis com a presciência divina. O caso de Judas, por exemplo, discutido nas páginas 279-81, nos m ostra isso. Tam- bém im portante é a outra questão herm enêutica de com o tratar “direta- m ente”a leitura dos textos do Antigo Testamento baseados nas questões canônicas (p 281,282). Foi em torno desta questão tam bém que as dis- cussões divergentes sobre estudos bíblicos aconteceram no D T S . As dife- renças entre a vontade moral de Deus e a soberania tam bém devem ser analisadas com seriedade (p. 282-5). A caracterização da abertura da posição tradicional m onolítica e unidim ensional é um argum ento hum a- no insignificante. A natureza do nosso debate deve m elhorar ao nos cer- tificarmos de que estamos sendo justos com os dois lados. Tais argumentos norm alm ente aparecem nos estágios iniciais de um debate, o que tam - bém é um a outra razão porque é necessário tem po para separar as ques- tões. Certificar-se de que consideram os o argum ento do outro lado é im portan te e é tam bém um a outra razão para continuarm os as discus- sões à m edida que avançamos no entendim ento e solução da questão.

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ticular) ou se proporciona um a declaração característica e uni- versalmente aceita de com o Deus sempre reage. C on tudo , ao discutirm os Am ós 3.1-8 com o um exemplo particularm ente útil, logo com preendem os que o m odo com o cada lado lia o texto estava, em grande parte, correlacionado à m aneira pela qual cada lado com preendia e integrava a ênfase mais am pla na Bíblia. H á várias questões levantadas sobre os tipos de tex- tos com o o de Am ós e os seus correspondentes no Novo Testa- m ento. O m odelo helenístico de pessoa divina é a única cortina de fundo a ser considerada para a com preensão da dou trina de Deus? E verdade que esse m odelo é estático e não se encaixa com a com preensão bíblica ou judaica de Deus, que é mais dinâm ico e aberto? Será que um a base judaica de segundo tem - pio (p. ex., a C om unidade do M ar M orto) nos ajudaria a en- tender com o o judaísm o do Novo Testam ento via Deus, o tem po e a presciência? Em outras palavras, será que alguns estudos culturais e históricos nos ajudariam a entender com o os textos e doutrinas do A ntigo T estam ento eram com preendidos no prim eiro século, especialm ente os principais textos presentes no debate atual? N ão conheço ninguém que tenha explorado esse cam inho ao estudar tal tópico. As referências ao A ntigo Testam ento recaem sobre os dois lados do debate e de certa form a dão origem à questão. O s precedentes da abertura nes- se m aterial paralelo m ostram que o A ntigo Testam ento estava sendo lido da form a proposta?4 O bservam os a lacuna na dis- cussão atual e fizemos pressão, pois nosso objetivo não era re- solver todos os problem as, mas abranger todos os lados do debate.

4Confesso suspeitar de que nesta cultura D eus não foi interpretado da m aneira correta que a visão aberta sugere. Este estudo não resolveria o problem a, mas significaria que deve existir um a idéia cen tral para dem onstrar que o entendim ento do Novo Testamento é diferente aqui.

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Os textos seguintes referem-se ao “arrependim ento”, à “mu- dança de opinião” e a “ira” de Deus. Estamos questionando como a antropopatia funciona. Com o ela trabalha exatamente? A lin- guagem figurativa aqui, reconhecida como tal por todos, deve afirm ar algo além da m era descrição de D eus quanto a um a analogia em relação aos sentimentos das pessoas. H á um con- senso nesse ponto de que Deus revelou-se como o único que interage com suas criaturas sob o aspecto de relacionamento e pacto, envolvendo-as no contexto em que vivem e no tempo.

Não vou entrar no debate teológico e filosófico que está no centro da questão sobre Deus, tempo e espaço — um debate que poderia afetar o modo pelo qual as questões anteriores de- veriam ser articuladas detalhadamente. Os exegetas expressa- ram-se nesses termos tentando explorar a linguagem dos textos. Os teólogos, corretamente, têm um conjunto de questões adi- cionais levantadas sobre os conceitos relacionados a esse tópi- co. Nesse ponto do estudo, fica muito claro por que exegetas e sistemáticos têm que trabalhar juntos nesses assuntos. Agrade- ço a Robert Pyne ter interagido comigo a respeito da redação dessa discussão sobre a antropopatia, embora eu seja o único responsável pelo seu conteúdo. As diferenças sobre como tra- tamos, estruturamos e examinamos esses assuntos mostram a importância de trabalhar de modo interdisciplinar.

Há também uma rica história de interpretações patrísticas e medievais nessa área que ainda não foram analisadas. Devo essa observação a Jeff Bingham, que trabalha com teologia his- tórica e especialmente patrística. Um estudioso reformado e bem conhecido, também crítico da abertura, está muito cons- ciente deste problema, mas não o desenvolve quanto seria pos- sível em sua obra volumosa como um livro, em que o critica (consulte Bruce Ware, An evangelical reformulation of the doctrine of immutability of God, in: JETS 29 [1986], p. 431- 46). Ware diz pouco, mas menciona esse artigo quando inves- tiga mais profundamente o problema fundamental em God’s

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lesser glory. Faço alusão à doutrina da im utabilidade ou impassividade absoluta de Deus nesta nota e nestes parágra- fos. A maior parte dos textos bíblicos descreve Deus envolvido com sua criação, a encarnação e o trabalho específico do Espí- rito, tudo apontando a necessidade de analisar cuidadosamen- te essas questões e avaliar seu histórico de discussão. Nossa discussão não alcançará o ponto de maturidade até que isso seja feito. Essa observação final reflete a interação que tive com Craig Blaising em relação a essas questões. Outra vez, a vanta- gem da discussão interdisciplinar é demonstrada. Eu me be- neficiei imensamente de minha interação com esses sistemáticos, até mesmo quando procurei uma exegese satisfatória desses textos.

As questões relacionadas à antropopatia perm anecem . Será que existem na Bíblia, tratando-se de form a literária de apre- sentação, dois tipos diferentes de textos sobre o tem po de Deus, aqueles que descrevem as ações em linguagem vinculada à ex- periência hum ana tem poral e aqueles que descrevem a trans- cendência de D eus e sua intransitabilidade eterna?’ Acredito que existe, e nossa divisão de estudos reconhece os dois tipos de textos nas Escrituras. Então, de que m aneira relacionamos esses dois tipos de textos? Podem os falar com certeza e clareza

Ά 0 expressar-me em termos de dois tipos de texto, não sugiro que estas classes de textos são tão distintas ao ponto de ser irreconciliáveis. N em estou tentando dizer que esta taxonom ia literária deveria ser mais retida. Antes, a observação é feita sob o ponto de vista da exegese de que essas categorias aparentem ente presentes do texto tratam de forma dife- rente a discussão bíblica sobre Deus a partir de dois ângulos distintos. O relacionam ento entre esses ângulos é a questão que exponho neste pará- grafo, dizendo que essa, assim com o as questões fdosóficas e teológicas que surgem precisam de m aior atenção antes de entrar em um a discus- são com pleta e m adura que poderá causar o ju lgam ento por parte de alguém no debate.

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sobre os textos transcendentais a partir de nossa perspectiva finita? Ajudaria fazer um a distinção a respeito do conhecim ento de Deus: o que ele sabe em sua presciência antes da criação e o que ele pode vir a experim entar (ou, talvez melhor, o que pode ser descrito com o experiência) em relação à sua criação? E nes- sa últim a categoria que os principais textos sobre a abertura se encaixam e, portan to , podem ser lidos com o afirmação de algo acima da m era antropopatia? N enhum dos lados do atual de- bate tratou clara ou com pletam ente dessas alternativas adicio- nais ou de outras com binações que essas distinções trazem à tona. Estaria Deus, em vez de estar aberto sobre as opções de futuro, usando a linguagem do relacionam ento para destacar o seu envolvim ento conosco e saber previam ente com exati- dão com o esses relacionam entos con tinuarão , por causa do m odo pelo qual sua criação foi feita e dele ser quem é? Poderi- am esses textos estar expressando sentim entos análogos aos re- lacionam entos hum anos, por exemplo, quando o cônjuge fica p rofundam ente desapontado com a infidelidade do parceiro ou quando os pais, sabendo da tendência de seu filho de rebe- lar-se, ainda sofrem por essa revolta em razão da quebra de relacionam ento entre eles? Deveríam os considerar as reações de Deus e até m esm o suas “m udanças” fundam entadas no ca- ráter divino que sabe quais serão nossas respostas, mas que ain- da tem que com unicar a reação no tem po e no espaço para que toque não som ente nossa m ente, mas tam bém nosso cora- ção? Pois dizer que Deus “m uda” por causa de nós e de nossas ações talvez signifique afirm ar as dimensões de tem po e espaço de nosso lim itado relacionam ento com ele com o seres hum a- nos, além de enfatizar sua reação genuína conosco à parte de fazer quaisquer declarações sobre a extensão do conhecim ento e da essência de Deus. Esses cam inhos adicionais conduziram a divisão de estudos bíblicos a um a interação fértil, proporcio- nando m uito a ser contem plado. C oncluindo, essas alternati-

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vas precisam ser com pletam ente exploradas exegética e histo- ricam ente para term os um a discussão m adura. Será que o mis- tério reside na justaposição do conhecim ento de Deus e de seu relacionam ento conosco, utilizando a linguagem do tem po e da aliança? Podemos nos conten tar com nossas lim itações para deixar as coisas ficarem no cam po do m istério neste pon to da discussão. Seria possível que a Bíblia não nos fornecesse expli- citam ente as respostas para as questões que levantam os ou para aquelas que talvez não sejamos capazes de com preender, pois “vemos apenas um reflexo obscuro, com o em espelho?” (IC o 13 . 12).

Em seguida, voltam os herm eneuticam ente e perguntam os com o norm alm ente lidamos com dois conjuntos de textos apa- rentem ente opostos. Será que um conjunto se posiciona acima do outro? C om base em quê? Em lógica, núm eros absolutos, histórico das discussões teológicas ou ou tro m eio qualquer? Q uando começamos a procurar tipos diferentes de textos den- tro de um conjunto para ajudar a resolver as tensões? A teolo- gia histórica e sistem ática pode nos ajudar por m eio de seu conhecim ento dos antigos debates e soluções da igreja? Q uan- do é que as tensões nos levam ao lim ite do m istério divino ou daquilo que a Bíblia não nos revela diretamente?

Nesse ponto term inam os a discussão de nosso prim eiro ano. Nossas reuniões seguintes analisaram outro conjunto de textos justapostos (salvação pela fé e julgam ento pelas obras) a fim de verificar se poderíam os aprender algo com o m odo com o esses temas foram tratados para ajudar-nos nessa mais nova discus- são. Conseguir pegar o ângulo de um texto específico analisa- do parecia ser o ponto principal ao relacionar esses textos sobre fé e obras. Isso sugeria que algumas da diferenças que emergi- ram na discussão da abertura poderiam ser um m odo útil de refletir no tratam ento da questão. Para fazer um a investigação detalhada sobre a questão, ainda teríamos que passar por al-

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guns dos principais textos de comprovação cuja tradução e sen- tido são contestados (como SI 139.16). Acredito que estamos prosseguindo m etodologicamente nos aspectos textuais e teoló- gicos, procedendo como um a com unidade de especialistas.

A ETS e m uitos outros grupos evangélicos têm a vantagem de serem constituídos por um a com unidade ainda mais abran- gente que o DTS, de m odo que o potencial de envolvim ento significativo é maior. Foram essas preocupações que motiva- ram o com itê executivo da ETS em 2000 a fazer da abertura um subtem a principal de sua reunião anual em 2001. A m eta era ter discussões saudáveis sobre a questão com o m áxim o de m em bros possível. Creio que esse é só o começo de um proces- so bom e necessário de diálogo, que pode ou não ir além disso. O m otivo para a discussão do tem a é dar orientação à com uni- dade da ETS sobre o que é ou não necessário, nada mais, nada m enos. O evangelicalismo precisa de tem po para analisar os novos pontos de vista e resolver novos conflitos por meio de processos deliberativos. O u tra vez, o processo e o resultado são im portantes.

CONSELHO RESUMIDO SOBRE ESSES DEBATESEis m eu conselho básico sobre os principais debates doutriná- rios: vá com calma. A igreja existe há cerca de dois mil anos. D eus tem cuidado dela até aqui. N ão podem os fazer um jul- gam ento instantâneo. A discussão é contínua e som ente agora está alcançando o estágio em que os principais pontos de polê- m ica estão surgindo. Precisamos dar tem po para que nossas com unidades, com o um todo, assimilem a questão antes de qualquer coisa. U m editor disse-me recentem ente que sua edi- tora (não a IVP) tem cinco títulos a serem lançados nos próxi- mos anos sobre esse tópico. A exposição de livros dos editores na reunião da ETS no final de 2001 m ostrou vários livros no- vos a respeito de D eus e do tem po. Precisamos assimilá-los.

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Precisamos dar tem po ao debate interno, para buscar a verda- de e o en tendim ento m ú tuo e, especialmente, analisar o tom das discussões.

U m pequeno exemplo referente ao tom desse debate e de outros com o esse surgiu de um a dissertação publicada na edi- ção de 12 de junho de 2001 da revista Cristianity Ibday.0' Na dissertação, C hristopher H all e John Sanders concluem um debate-diálogo sobre a abertura, realizado por e-m ail e publi- cado em duas edições da revista. Apesar das diferenças de opini- ões sobre o assunto, eles concordaram em seis pontos: 1) observar a importância de um a exegese bíblica sólida; 2) o m odelo deve reconhecer e preservar o discernim ento sobre o assunto que recebemos da com unidade cristã duran te séculos; 3) não de- vemos tem er a argum entação franca e cordial; 4) a com unida- de evangélica deve trabalhar m uito para resolver os debates teológicos em conjunto; 5) praticar a em patia intelectual com aqueles com quem discordam os (i. e., evitarmos a caricatura, sermos capazes de falar sobre a posição de oponentes de m odo que eles possam ratificar); 6) e depois de procurar seguir fir- me, verdadeira e generosam ente essas cinco etapas, com certe- za é necessário tem po para aceitar ou rejeitar um m odelo teológico. A posição que dizem que ocupam os no m om ento é onde acho que estamos: “O debate precisa continuar para que as questões possam ser esclarecidas fu turam ente”. A inda é cedo demais para agirmos de m odo decisivo e com pleto. Após al- guns anos de diálogo com unitário in terno e genuíno, será o m om ento apropriado de a ETS fazer um a reflexão séria e con- centrada sobre o tópico.

6W here do we go from here?, Christianity Today, 11 de ju n h o de 2001 , p. 56. A edição de 21 de m aio de 2001 co n tin h a parte deste diálogo.

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A p o lêm ica sobre a N ova Versão In te rn ac io n a l d a B íblia tem u m a q u alid ad e sem elhan te . O co m itê de trad u ção d a X \1 , com - p o s to em sua m a io r p a rte p o r trad ic iona listas, te n to u d em o n s- tra r sensib ilidade co m relação aos gêneros fem in in o e m ascu lino em sua tradução . C o n tu d o , a versão en fren to u fortes oposições, em alguns casos expressivas. O s q u e re je itam essas traduções a rg u m e n ta m q u e a Palavra de D eu s está sen d o g ran d e m en te ad u lte rad a . E m alguns casos, as a rg u m en taçõ es são de qu e as trad u çõ es estão erradas. E m o u tro s , de q u e resu ltam em u m a subversão su til das relações sobre gênero ensinadas pela Bíblia. T rata-se de u m a q u es tão im p o r ta n te po is estam os lid a n d o com a Palavra de D eus. E n tre ta n to , os dois lados erraram no m o d o co m o a conduz iram . C o m o sem pre ocorre em debates com o esses o processo não foi fácil. A lgum as das pessoas que pro testa- ram o fizeram em aspecto de d iscurso qu e não desenvolveu ou refletiu a n a tu reza com plexa d a discussão sobre a teo ria da tra- dução . R efiro -m e n ão àqueles qu e fizeram q u es tio n a m en to s justos sobre algum as traduções, m as alguns d a m íd ia qu e no ti- ciaram esse debate e qu e descaradam ente in flam aram a discus- são e criaram u m am b ien te de ju lg am en to in stan tâneo em qu e o d iálogo to rn o u -se difícil. H o u v e ta m b ém u m a in tensa pressão p o lítica p o r u m lado para conseguir u m acordo sobre os padrões de in te rp re tação que a in d a não hav iam sido trabalhados. Por o u tro lado, as pessoas q u e traba lhavam n a tradução em itiram sua versão e o p ta ra m p o r u m acordo prévio , sem q u alq u er tipo de no tificação prévia. T em os de a d m itir qu e fizeram isso, em parte , p o r causa d a m an eira com o a ob ra inicial foi tra tad a pelo o u tro lado. O processo to d o p erd eu sua função e p ro d u z iu u m

Para questões sobre tradução e o que os tradutores enfrentam ao fazer tais julgam entos sobre passagens individuais,v. o artigo de Darell Bock: D o gender-sensitive translations d istort scripture? not necessarily, no site do DTS www.dts.edu. O artigo aborda alguns dos exemplos mais debatidos envolvendo a NVI.O artigo não endossa a versão, mas tenta posicionar a questão, mesmo para quem não sabe grego.

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clim a no qual as discussões en tre os dois lados ficaram difíceis. Essa não é m an eira de lidar com tais questões. E spero qu e as discussões subseqüen tes possam oco rrer em p lano m ais elevado.

N ão estou ten tando resolver o problem a do debate sobre a a b e rtu ra , m as, q u a n to m ais tra b a lh o essa q u es tão , m ais questionam entos tenho em relação a ela. As questões que le- vantei aqui sugerem que os teólogos defensores da abertura têm trabalho sobrando para m ostrar que estão solidam ente ba- seados na Bíblia. E ntretan to , não é o m om ento de insistir na exclusão. E m bora eu considere essa um a questão central, por tratar dos atributos fundam entais de Deus, reconheço os jul- gam entos que todos estamos fazendo a respeito do processo. A im portância do tópico faz parte de m eu argum ento por um processo deliberativo. Devem os reservar um tem po para colo- car os debates sobre as doutrinas centrais no lugar certo. A m aior parte das disputas doutrinárias da igreja prim itiva levou décadas para ser resolvida. Precisamos tom ar o m áxim o de cui- dado, mas os debates podem ajudar a todos nós a valorizar mais as doutrinas relacionadas à pessoa de Deus. Até agora, a discussão já aproxim ou um pouco mais a com unidade de um a compreensão da verdade, incluindo sua complexidade e mis- tério, m esm o que todos nós term inem os desem barcando em um lugar diferente.

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CONCLUSÃO

O evangelicalismo do unidade na diversidade e 0 chamado para missões além de

nossos debotes internos

oncluo relem brando nossas prioridades. Afinal de contas, um a abordagem teológica da uni-

dade na diversidade para os debates en tre os evangélicos deve nos a judar a trab a lh a r bem lado a lado, m esm o que haja pon tos em que concordem os em discordar. O N ovo Testa- m en to valoriza m u ito a verdade e a un idade (Jo 13.34,35; 17.1-26; A t 20 .28 -30 ; E f 4 .1 -6). É difícil saber com o solu- cionar tensões q u ando duas pessoas ou grupos se opõem . M inha esperança é que refletir nas questões relacionadas à abordagem da unidade na diversidade ajude a nos envolver com a verdade e a trabalhar para m anter a unidade, onde for possível.

O perigo, em bora sutil, de focarmos constantem ente nos- sos debates internos é tão significativo quanto o risco potencial de m udarm os o curso da verdade, subentendido na necessida- de de traçar limites. Esses debates im portantes e necessários ex- põem o risco de nos desviar de nossos cam inhos mais básicos e de nosso m aior potencial como um a com unidade de crentes.

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Podemos nos tornar tão autocontem plativos sobre nosso esta- do de saúde teológico, que esqueceríamos a missão de alcançar o vasto m undo . A rgum entei que valorizar a discussão entre instituições fechadas e abertas nos ajudará a en tender com o devemos funcionar e debater um as com as outras. Perm itir a existência dos dois tipos de estruturas dentro do evangelicalismo pode m antê-lo criativo e responsável.

M inha esperança final é que um a m aior parte de nossa ener- gia seja d irecionada para afirmar, a ting ir e m elhorar nossos relacionam entos uns com os outros à m edida que enfrentar- m os jun tos o m undo vasto e perdido. Em um evangelicalismo direcionado por propósitos, nosso estudo dever ser especial- m ente produtivo em responder às questões que nossa cultura d istorcida e diversa apresenta, m esm o se houver algum a diver- sidade em nossas respostas. Nossa cultura parece estar mais aber- ta para tratar de assuntos em um plano espiritual, então vamos avançar nas discussões, esclarecendo que o simples uso do ter- m o espiritual não é autom aticam ente benéfico. Podem os e de- vemos nos dirigir à mesa de negociações e nos unir ao debate. Devem os envolver esta cultura pós-m oderna, pois ela norm al- m ente observa todas as formas de igualdade espiritual para as respostas às questões que a ciência e a tecnologia não podem resolver. Creio que nessa busca os evangélicos devem se apro- xim ar mais, valorizando quan to tem os em com um em face da tendência de julgarm os uns aos outros ao debaterm os alguma questão.

Para os evangélicos, especialmente aqueles que estão come- çando sua obra, digo que considerem o m undo perdido em seu trabalho de pesquisa. D en tro do evangelicalismo, vamos fazer o m elhor, hum ildem ente, para ouvir e interagir uns com os outros sobre a m ensagem da Bíblia e para buscar a com u- nhão para a qual Cristo nos cham ou e até m esm o orou para que tivéssemos (Jo 17). Efésios 4 .1-6 pode ser um bom lem ­

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brete de onde se baseiam biblicam ente nossa unidade e o cen- tro de nossa fé: um só corpo, um só Espírito, um só Senhor, um a só fé, um só batism o, um só D eus e Pai de todos. A aber- tura para Deus significa ser aberto ao seu Espírito — aquele Espírito que habita em nós quando somos form ados por ele e pelo ensinam ento encontrado na Bíblia. Em bora os m em bros entre nós elaborem os detalhes dessa questão de form a dife- rente, a unidade espiritual e bíblica form a a base da ETS e de nossa com unidade evangélica. Ao afirm arm os esse pon to cen- trai, estamos nos posicionando de form a que possamos debater e dialogar proveitosam ente. N ão acredito que limites traçados e princípios escritos sejam nossos propósitos principais. Por dois milênios, a igreja tem tido princípios sólidos que podem guiar a m aior parte do m ovim ento evangélico. Em áreas recém-cria- das, em que talvez sejam necessários novos limites, precisamos nos certificar de que a discussão seja deliberativa, assum indo um tom que perm ita discussões significativas. Sejamos mais vagarosos para traçar lim ites rígidos, a não ser que grande par- te de nossa com unidade, depois de um a reflexão in terna cui- dadosa, acredite que a linha deva ser traçada.

Faz sentido para os estudiosos a questão estar à frente das publi- cações e dos debates. Os dois lados do debate devem ter opor- tunidade ampla de apresentar os prós e os contras ao avaliarmos a situação. Essa condução do debate por parte deles nos bene- ficia; fez parte da análise racional na reunião da ETS sobre a abertura, isto é, dar oportunidade para que os dois lados fos- sem ouvidos. Foi o que aconteceu quando permitiu-se que cada lado se dirigisse ao outro. Esse procedimento dialogai é útil e uma das razões principais para que a ETS seja uma instituição aberta. Os oradores do plenário e aqueles que apresentaram tra- balhos sobre tal tópico ajudaram muito a ETS e o evangelicalismo. Eles merecem ser valorizados pelo que fizeram e farão por nós nessa discussão e em outras como essa. Entretanto, o trabalho

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in d iv id u a l deles não p o d e su b s titu ir a resp o n sab ilid ad e ética d a ETS p ara enco ra ja r os m e m b ro s a expor em p rim e ira m ão as questões em qu e for observado q u e h á u m a séria d ivergência de op in iões. N e m o p ad rão de p ro c e d im e n to d e ou v ir cada lado deve ser m u d a d o q u a n d o a d iscussão u ltrapassar a ETS e chegar à c o m u n id a d e evangélica. É fácil dem ais fo rm u la r ju lg am en - tos q u e não p ro v êm o rig in a ria m e n te d a fo n te o u co n h ece r ape- nas u m lado do d ebate .

U m evangelicalism o guiado pela unidade na diversidade concentrará suas principais forças e potencial além dos deba- tes internos. Neste pon to encontram -se as implicações práticas expressas de m odo que sejam reconhecidas. C om o se fosse um apelo, faço vários convites.

O convite que faço a m inha geração e àqueles que nos pre- cederam é encorajar a próxim a geração a trabalhar em proje- tos que possam tam bém alcançar a igreja com o um todo e ajudá-la com a ordem bíblica de missões em nossa cultura di- versa. Abrigá-los e dar-lhes permissão para que se dirijam às culturas que lhes são familiares de um a m aneira diferente das nossas. Ao m esm o tem po, insistir com eles para que sejam res- ponsáveis perante Deus, seu Espírito e sua Palavra. Caso eles assimilem as coisas de maneiras diferentes, que então as avali- em em sua essência, não de acordo com seu estilo próprio ou porque são diferentes. E preciso tentar não confundir conteú- do com forma. Essas diferenças podem ser questões de cultura de gerações ou gosto pessoal.

Convido a próxim a geração de m em bros da ETS a ser fiel ao buscar projetos que desafiem mais o m undo perdido, que esti- m ulem mais uns aos outros e que se desafiem menos. Entretan- to, não esqueça que n en h u m período tem o m onopólio da verdade ou do m étodo. A história prova isso. Às vezes, ouvir as palavras de um a geração passada, se não de milênios atrás, pro- duz um a com preensão produ tiva dos problem as m odernos.

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Cuidado para não sucum bir ao espírito do m undo que expressa dúvida excessiva sobre o encontro e o conhecim ento da verda- de. A Bíblia diz que Jesus é a verdade (Jo 14.6). Temos um a metanarrativa que está inseparavelmente vinculada a Jesus, e a obra associada a ele. Ao contar as histórias para nossa geração, somos cham ados para apresentar e m esm o definir a história, em bora o m undo pós-m oderno odeie envolver-se com defini- ções e reflexões conceituais e cognitivas. Existe um a doutrina que merece ser estudada, articulada, definida e passada adiante.

Nos últimos dez anos, a ETS nos im pulsionou cada vez mais nessa direção, para o aprim oram ento da sociedade com o um todo. C ontudo, ainda temos um longo cam inho a percorrer. A ETS é um a sociedade espiritual e acadêmica de debates, diálo- gos, crescimento e estudos. Os m em bros buscam trabalhar em conjunto para dar um a resposta ou respostas às questões que estão em debate não só entre nós, mas tam bém no m undo. De- sejamos discutir essas coisas que o m undo não consegue enxer- gar, e que são im portantes para Deus, em um nível mais visível. O que se aplica à ETS tam bém se aplica ao evangelicalismo.

G rupos de estudo que trabalham em conjunto são um dos grandes sucessos atuais da ETS. Esses grupos devem intencio- nalm ente visar às publicações de conteúdo substancial com o objetivo de alcançar os perdidos ou ajudar aqueles que estão envolvidos nessa missão. Os editores e os donos de livrarias pre- cisam nos ajudar, pois esse trabalho cuidadoso em geral não é econom icam ente viável, pelo m enos o que está sendo atual- m ente vendido nas livrarias. Tam bém devemos considerar o que pode ser feito visualm ente na m ídia para alcançar nossa cultura, especialm ente com os tópicos acerca dos quais real- m ente chegamos a um acordo. Vamos nos esforçar para que nossa voz, em uníssono, seja ouvida em alto e bom som, mes- m o que cada um de nós tenha que trilhar cam inhos um pouco diferentes para chegar lá.

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Para finalizar, retorno à promessa: D eus cuidará de nós. Somos cham ados para sermos fiéis ao noivo até que ele volte. N a Bíblia encon tram os a sabedoria da virgem p ru d en te ao buscarmos o único que é o Logos. Em outras palavras, a sabe- doria encontra-se nele e na busca do cam inho e das priorida- des que ele estabeleceu para nós (Pv 8.23; Jo 1.1-18; Cl 2.1-3). Se não deixarmos o Logos partir, nunca nos desviaremos do cam inho. Se nos desviarmos, outros com certeza serão fiéis. Seja diligente para observar nosso com prom etim ento com a Bíblia; seja um a com unidade que aponte para a história cen- trai de Deus. Seja fiel a ele, ao que cremos, ao m odo como cremos e a quem somos. Faça isso de form a que não desonre a Deus. Precisamos pedir, hum ildem ente , que ele nos proteja daquelas idéias sedutoras que mascaram a sabedoria. Elas exis- tiram em todas as épocas, por isso precisamos da orientação de Deus. Devem os ter fé para nos abraçarmos e nos m anterm os fiéis à m etanarrativa de que Jesus, a Palavra, é revelado na Pala- vra escrita, a história que sustenta o centro da Bíblia. A Bíblia não é o fim do nosso estudo, mas um meio, um a lente pela qual podem os apreender m elhor o único que encarna a Pala- vra e a vontade de Deus. Este Logos to rna possível o relaciona- m ento com Deus por meio de sua obra de sacrifício e da provisão do Espírito. Ele to rna possível um a vida que é eterna não so- m ente em duração, mas tam bém em qualidade. Declaramos a verdade de que a vida (real e verdadeiram ente eterna) está nele. Essa é nossa missão. Q uem não deseja saber onde a vida real e de qualidade pode ser encontrada?

Nossa com unidade necessita usar com o fonte tudo aquilo que ele nos forneceu. Devemos trabalhar até que chegue nos- sa hora ou até que o Senhor volte. C ertam ente, nossos debates e a m ultiplicidade de abordagens para cada problem a sempre estarão entre nós. M as o esclarecimento e um m ovim ento me- lhor em direção à com preensão m útua são objetivos realistas.

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Vamos ter a certeza de que nos lem brarem os do m undo e bus- caremos nossa missão maior, observando cuidadosam ente a m u- dança dos tem pos que, contudo, perm anecem iguais. Vamos debater de m aneira justa e com pleta, com dignidade que refli- ta o respeito por nossos irmãos e irmãs no Senhor, até que ve- nha em glória. Deus cum prirá sua promessa de nos fazer sua noiva por inteiro. N ão podem os fazer isso por ele.

O que Deus nos pede é fidelidade à sua verdade e de uns para com os outros. Ele nos aperfeiçoará um dia, respondendo a todas as perguntas e solucionando m uitos de nossos debates. U m d ia , D eu s nos tra n s fo rm a rá , d i lu in d o to d o s nossos questionam entos em respostas eternas. A té lá, vamos perm itir que nossa teologia seja direcionada por propósitos. D iscutir a verdade com honestidade, im parcialidade e hum ildade. Aci- m a de tudo, buscar ardentem ente a missão que Jesus nos deu para ser realizada pelo seu Espírito. A própria Bíblia resum e o propósito da atividade de Deus nestes termos:

P o rq u e a graça d e D e u s se m a n ife s to u sa lvadora a to d o s os h o m e n s . E la nos en s in a a re n u n c ia r à im p ied a d e e às paixões m u n d a n a s e a v iver d e m a n e ira sensata , ju s ta e p ied o sa nes ta era p resen te , e n q u a n to ag u a rd am o s a b e n d ita esperança: a glo- riosa m an ifestação d e nosso g ran d e D eu s e Salvador, Jesus C ris- to. E le se e n tre g o u p o r nós a fim d e n o s re m ir d e to d a a m a ld ad e e p u rifica r p a ra si m e sm o u m povo p a r tic u la rm e n te seu, ded i- cado à p rá tic a de boas obras. E isso q u e você deve ensinar, ex o rta n d o -o s e re p ree n d en d o -o s co m to d a a a u to rid ad e . N in - g u ém o despreze (T t 2 .1 1 -1 5 ).

Eis o cham ado para a unidade na diversidade em m eio às divergências teológicas.

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In d ice onomástico

Erasmo 47Erickson, M illard 77, 86 Evans, C. Stephen 28

Farnell, F. David 83 Feinberg, Paul 83 Finney, Charles 49 Fogel, Robert W illiam 25, 56,

68, 69, 70 Francke, H erm ann 48 Franke, John R. 20

Gasset, José Ortega y 24 Geisier, Norm an L. 76 Gergen, Kenneth 23 Gerstner, John H. 76 Graham, Billy 53 Green, Donald 28 Greene, Colin 28

Alii, Oswald 77

Bartholomew, Craig 28 Berman, Morris 24 Bingham, Jeffrey 42 Blaising, Craig 52 Blanchard, Jonathan 60 Blount, Doug 25 Bock, Darrell 3, 4, 13, 83 Bork, Robert 24, 25 Boyd, Gregory A. 103 Boyer, Paul 51 Bromiley, Geoffrey W. 76

Calvino, João 47, 48, 76 Chilton, David 51 Coles, Robert 24 Dayton, Donald 49 Edwards, Jonathan 48

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Osborne, G rant 83

Padgett, Alan 17 Percesepe, Gary 18 Plantinga, Alvin 27 Postman, Neil 23, 24 Preus, Robert A. 76 Pyne, Robert A. 34, 109, 110,

112

Rosenthal, Shane 64

Sanders, John 103 ,117 Schleiermacher, Friederick 49 Sheler, Jeffrey R. 94 Smedes, Lewis 62, 63 Spencer, Stephen R. 18 ,34 Spener, Philipp Jakob 48 Strobel, Lee 94

Terry, M ilton 52 Thistleton, A nthony C. 28, 30 Thomas, Robert L. 83 Toulmin, Stephen 23

Van Huyssteen, J. Wentzel 29 Vanhoozer, Kewin 28

W althout, Clarence 30 Walyoord, John 77 Ware, Bruce 112 Westphal, M erold 18 W hitefield, George 49 Wilkins, Michael J. 83, 94 Williams, Roger 48 W iseman, John 74 Wolterstorff, Nicholas 27 W right, N . T. 27, 28

Young, Warren 73

Grenz, Stanley 1 9 ,2 0 ,2 1 ,2 2 , 33, 35, 48

Gundry, Stan 74

Habermas, Gary R. 94 Hall, Christopher 117 Hannah, John 76 H art, Trevos 24 Hengel, M artin 88 Henry, Carl 77 Himmelfarb, Gertrude 23 Hirsch, E. D. 28 H orton, Michael 62 H unt, Dave 51

Jenkins, Philip 91 Johnson, Alan 7 5 ,8 3 Johnson, Paul 41 Johnson, Robert K. 93 Johnstone, Patrick 66

Kistemaker, Simon J. 45

Lints, Richard 28 Lutero, M artinho 47, 76 Lundin, Roger 30 Lyon, David 31, 67

M cGrath, Alister 22, 27 Meyer, Ben F. 28 Mõller, Karl 28 Moreland, J. P. 83, 94 Mouw, Richard 17 Murphy, Nancey 25, 26, 27, 30

Newman, Carey C. 27 Nicole, Roger 77 Noll, M ark 50

Oden, Thomas C. 60, 61 Origenes 61

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S o b r e o l i v r o

Categoria 1 Teologia

F im da execução se te mbro dc 2 004

l . “ edição o u tu b r o de 2 0 0 4

I iragem A n o1 2 3 4 ר 6 ־ 8 9 10 09 08 07 06 05 04

Formato 14 x 21 cm

M ancha x 18,5 cm ׳·׳ 10,5

Fipo e corpo!entrelinha 6 A g a r a m o n d 1 2 . 5 1 5 ׳' (rcxto); G e o m e t r ic 7 0 6 Bd C n R T 15/ 18 ( t í t u l o )

Papel ־ O ff-Se t ”7ר g / m 2 (mio lo:: C a r tão S u p rem o 2 5 0 g / m 2 (capa)

Tiragem 4 mil exemplares

Impressão I m p re n sa d a Fé

Im presso no Brasil / P rin ted in B ra z il

E q u i p e d e r e a l i z a ç ã o

Produção gráfica

SupervisãoS w d r a L l i ' i l

hotoliio I m p r f x s a o a h'.

Produção editorial

CoordenaçãoA i d o M hní./Ls

A ssistência M.AL'RO X o C l 'H R A

N orm alização de texto T.ÃMA S 1 i.\ t1 r \

Edição de texto J a í r A . R l c h i a

S o n i a A c j o u A m a d o r

Revisão de provas Ji-.FFLRSOX R o n R K .L l.s

R o g l r i o P o r t e l l a

Projeto grafico S o m a P l t i c o y

Composição S l t - u p T i m e A r t e s G r á f ic a s

CapaM a RCLLO íVÍOSCHFTA

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Como os evangélicos devem lidar com os assuntos controversos? Quais métodos e princípios precisam guiar o debate teológico em meio a tantas bases doutrinárias existentes?

Ao mesmo tempo em que trata da história do evangelicalismo, essa obra desafiadora reflete sobre como os evangélicos devem resolver discussões polêmicas e como sua abordagem teológica deve dedicar-se a essa questão em sua essência, método e tom.Também adverte para a natureza desses debates em relação ao chamado maior da igreja para missões, alertando-nos sobre a tendência de empregarmos demasiada energia entre quatro paredes.

Temas diversos como a crítica bíblica, a questão das mulheres, a globalização, a análise cultural e o teísmo aberto também são tratados nestas páginas esclarecedoras. A essas questões importantes foram acrescentados breves comentários sobre a recém-retomada polêmica a respeito da tradução da Bíblia, outro exemplo de como muitas pessoas se comportam de forma equivocada em tais embates.

Darrell Bock não apenas leva os leitores a refletir sobre o que os evangélicos discutem, mas também os estimula a analisar assuntos teológicos, diálogos e verdades polêmicas em um mundo cada vez mais globalizado, no qual os evangélicos são minoria. Uma contribuição única para que verdadeiramente alcancemos unidade na diversidade.

Darrell Bock é professor no Seminário Teológico de Dallas e trabalha na área de pesquisa do NovoTestamento.Também foi presidente da ETS (Evangelical Theological Society) [Sociedade Teológica Evangélica].

VVida

www.editoravida.com.br

ISBN 85 - 7 3 6 7 - 73 3 -3

9 7 8 8 5 7 3 6 7 7 3 3 1 >

Categoria:Teoiogia