UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO … · O compromisso com o social levou Paulo Freire...
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA CLASSE DE ALFABETIZAÇÃO: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO
Por: ROSANE COELHO DA ENCARNAÇÃO
Orientador
CARLY MACHADO
RIO DE JANEIRO
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA CLASSE DE ALFABETIZAÇÃO: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO
Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia. Por: Rosane Coelho da Encarnação.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela realização de um sonho, por todos os momentos em que
pude perceber que não estava sozinha. Agradeço a todos da minha família que
me apoiaram, meus amigos, meus professores e também as pessoas que conheci
e que agora fazem parte da história da minha vida, pois contribuíram muito para
esse momento de vitória.
Obrigada Pai!
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos educadores comprometidos com a educação e que
buscam aprimorar seus saberes. Também aos que acreditam na prática dialógica
que contribui para a formação cidadã e para a liberdade.
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RESUMO
A aprendizagem é um fenômeno de suma importância na vida do ser
humano. O estímulo à aprendizagem contribui para a formação do sujeito
reflexivo, no entanto, enumeras pesquisas sobre educação constatam que várias
dificuldades de aprendizagem ocorrem no decurso da vida acadêmica.
Considerando que a leitura e a escrita são elementos fundamentais e
extremamente exigidos, tanto pela sociedade letrada como pela escola, elas se
configuram também como elementos básicos para avaliação. Na busca de
solucionar as dificuldades de aprendizagem de leitura e escrita do aluno, os
docentes, na maior parte dos casos, não interpretam os erros da criança como
tentativas e possibilidades de acertos. A interpretação inadequada causa os
entraves, dificultando o processo da aprendizagem da criança. A abordagem
sobre alfabetização será baseada à luz dos ensinamentos de Paulo Freire que
defendeu a educação como prática de liberdade. As educadoras Magda Soares e
Emília Ferreiro enfatizam a alfabetização como o processo pelo qual o aluno
adquire o domínio do código e as habilidades carregadas de significados para
utilizá-lo linguisticamente. Os conceitos e métodos de alfabetização serão
analisados dentro da proposta de letramento. Ao final o direcionamento do “olhar”
psicopedagógico frente às possíveis dificuldades de aprendizagem.
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METODOLOGIA
Os procedimentos metodológicos aplicados ao presente estudo de cunho
etnográfico tratam em primeiro lugar de uma reflexão teórica. É importante
destacar que a busca desta reflexão ocorreu em função da observação das
dificuldades dos alunos em fase inicial da aprendizagem da leitura e da escrita. No
desenvolvimento da investigação tomamos como referencia o contexto de uma
classe de alfabetização de uma escola particular, no bairro de Campo Grande, na
zona Oeste do Rio de Janeiro. A organização da escolaridade é seriada, atende
desde o maternal ao 9º ano do Ensino Fundamental. No segundo momento o
interesse em buscar aprofundar o conhecimento sobre os temas: alfabetização,
letramento e dificuldades de aprendizagem. Dentre os autores analisados
destacamos os ensinamentos de Paulo Freire na visão de educação como prática
de liberdade, da autora Emília Ferreiro com a análise da psicogênese da língua
escrita, dos postulados de Vygotsky com ênfase na zona do desenvolvimento
proximal e por último o enfoque psicopedagógico de Olívia Porto na conceituação
e definição de aprendizagem.
A proposta da pesquisa é discutir qual deve ser o “olhar” do
psicopedagogo frente às dificuldades de aprendizagem do educando. O termo
“olhar” está sendo empregado no sentido de discernir as habilidades e as
competências do aluno mediante as dificuldades que possivelmente haverá
durante o processo de aprendizagem da leitura e da escrita.
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO........................................................................................................08 CAPÍTULO I EDUCAÇÃO LIBERTADORA..........................................................10 CAPÍTULO II ALFABETIZAÇÃO..........................................................................19 CAPÍTULO III DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM.........................................33 CONCLUSÃO.........................................................................................................52 BILBIOGRAFIA CONSULTADA.............................................................................54 ÍNDICE....................................................................................................................56 FOLHA DE AVALIAÇÃO........................................................................................58
8 INTRODUÇÃO
A aprendizagem é a temática que tem afrontado os educadores não só da
atualidade. Ao longo da história da educação os estudiosos se preocuparam em
aprofundar seus conhecimentos a respeito do assunto: como as crianças
aprendem a ler e escrever e quais são as dificuldades que enfrentam ao
aprenderem?
Numa sociedade letrada a relação com a escrita começa antes mesmo da
criança entrar na escola. O processo de alfabetização se configura como um
momento de enfrentamento de diferentes dificuldades de aprendizagem. Pelo
menos duas são inerentes ao processo: a primeira é a dificuldade de ler e
interpretar o que lê e a segunda é a de escrever.
Pensando em uma educação problematizadora que conduzisse o educando
a um processo de conscientização e libertação, Paulo Freire defendeu a idéia de
que alfabetizar é ensinar o uso da palavra. A vida deste educador articula-se
coerentemente com as idéias que defendeu.
A presente pesquisa tem por finalidade principal discutir e “conscientiza”
educadores que possíveis dificuldades de aprendizagem que as crianças
enfrentam na alfabetização não estão relacionadas exclusivamente às práticas
educativas como métodos e técnicas de ensino, nem tão pouco a “motivação” do
indivíduo. A questão é considerar que “o olhar” do educador deve ser lançado em
direção à criança como sujeito que busca aprender, que propõe e trata de
solucionar problemas seguindo sua própria metodologia. Metodologia que nem
sempre é percebida pelo educador como algo importante durante o processo de
ensino aprendizagem. O significado do termo “olhar” está sendo empregada no
sentido de discernir as habilidades e competências do aluno mediante as
9dificuldades que possivelmente haverá durante o processo de aprendizagem na
alfabetização.
Diante desse fato as perguntas são: O que é necessário que o educador
compreenda e conheça durante o processo de alfabetização? Quais são as
hipóteses que as crianças desenvolvem em relação à leitura e a escrita? Quais
são as possíveis dificuldades de aprendizagem que uma criança enfrenta na
classe de alfabetização? O que deve nortear o olhar do psicopedagogo frente às
dificuldades de aprendizagem?
Compreender que o “olhar” deve ser no sujeito que aprende, possivelmente
torna-se critério para o professor a “reorientação” da sua prática pedagógica por
meio de uma proposta lúdica como instrumento facilitador do processo de
alfabetização.
10 Capítulo I 1.1 Paulo Freire e a Educação Libertadora A paixão do grande educador Paulo Freire e o respeito para com o ser
humano o conduziram a elaborar um método simples e eficiente para alfabetizar
jovens e adultos.
O compromisso com o social levou Paulo Freire a analisar e propor um novo
paradigma para a educação brasileira que significa um novo modelo de educação,
que rompe com os elos de uma cadeia que aprisionam o indivíduo na “ignorância”.
Esta última vem do fato do sujeito ignorar seu potencial e suas possibilidades
porque lhe é negado o direito de construir o conhecimento. A negação é
sustentada pelo modelo “tradicional” de educação, que olha para o educando
como um depósito que precisa ser cheio com conteúdos, mas apenas os
conteúdos que o educador (opressor) julgar conveniente, porque o professor é o
único detentor do saber.
Segundo Freire (1987), outro elo dessa cadeia que precisa ser quebrado é
a falsa visão de homem, na qual este não é estimulado a pensar, a ser crítico ou a
ser criativo. Para Freire o novo modelo de educação deveria ser pautado na
responsabilidade e no respeito mútuo, na conscientização do homem de suas
relações com o mundo, num processo contínuo de transformação.
O conceito central das idéias de Paulo Freire (1980) sobre Educação
Popular no Brasil é a palavra “conscientização”, que significa educação como
prática da liberdade e aproximação crítica da realidade.
Somente o homem é capaz de agir de maneira consciente a partir de uma
reflexão sobre o mundo, o que Freire (1980) vai chamar de “práxis”. A
conscientização está além da apreensão da realidade, é o pensar a respeito dela
e assumir uma postura epistemológica. Ela não existe fora da práxis, sem o ato
ação reflexão e está baseada na relação consciência mundo. A conscientização
11exige que os homens creiam que sua existência é um material que a vida lhes
oferece.
Segundo Freire (1980) o processo da alfabetização pode se apresentar
como uma prática manipuladora de idéias ou opostamente uma prática libertadora
e utópica, no sentido de dialetização dos atos de denunciar a estrutura
desumanizante e de anunciar a estrutura humanizante, por isso, ela é um
compromisso histórico. A conscientização é o olhar crítico da realidade que
desvela os mitos e enganos que mantém a estrutura dominante. A realidade é
percebida por meio da abstração, sua “descodificação” se configura na passagem
do real para o concreto num movimento contínuo. Essa análise bem realizada
conduz à substituição da abstração pela percepção crítica da realidade. O objetivo
da descodificação deve ser chegar ao nível crítico do conhecimento, que parte da
experiência real e cotidiana do aluno.
Freire (1980) afirma que o tema gerador precisa ser buscado a partir do
pensamento e a ação humana sobre a realidade. O tema gerador é buscado a
partir das palavras carregadas de sentidos da realidade do educando. Essa busca
se transforma numa luta de conscientização da realidade, tornando-se o início do
processo de educação libertadora. Na concepção crítica, a educação e a
investigação temática se configuram em momentos diferentes do mesmo
processo.
“A procura temática implica na procura do pensamento dos homens, pensamento que se encontra somente no meio dos homens que questionam reunidos a esta realidade. Não posso pensar no lugar dos outros ou sem os outros, e os demais também não podem pensar em substituição aos homens”.(p.33)
As concepções de educação de Freire (1980) estão orientadas por aquilo que ele
chama de idéia força.
12“Mais exatamente, para ser instrumento válido, a educação deve ajudar o homem, a partir de tudo o que constitui sua vida, a chegar a ser sujeito. É isso que expressam frases como: A educação não é um instrumento válido se não estabalece uma relação dialética com o contexto da sociedade na qual o homem está radicado” (p.34).
A conscientização consciente em fazer o homem compreender o
mecanismo social ao qual se submete por tradição e fazê-lo examinar e
questionar essa tradição que o conduz à rotina de atos inconscientes. Na
integração do homem com o seu contexto, ele passa a refletir e modificar tanto o
próprio contexto quanto a si mesmo. Respondendo a desafios, estabelece
relações e cria cultura. Para Freire (1980):
“Cultura é todo o resultado da atividade humana do esforço criador e recriador do homem de seu trabalho por transformar e estabelecer relações de diálogo com outros homens” (p.28).
Neste sentido, à medida que capta os temas próprios de sua época e surgem
novas mudanças na maneira de atuar, nas atitudes e nos comportamentos, o
homem torna-se um fazedor de história. Em Freire (1980):
“A realidade não pode ser modificada, senão quando o homem descobre que é modificável e que ele pode fazê-lo. É preciso, portanto fazer desta conscientização o primeiro objetivo de toda educação: antes de tudo provocar uma atitude crítica, de reflexão, que comprometa a ação” (p.40)
O método pensado por Paulo Freire (1980) teve como objetivo uma
alfabetização ligada à democratização da cultura. O material utilizado para
aprendizagem deveria ser compatível com o trabalhador e sua experiência. Uma
alfabetização que fosse propulsora de atos criadores resultantes do interesse do
13sujeito na busca do conhecimento. A metodologia voltada para o educando, que
identificasse o conteúdo da aprendizagem com o processo mesmo de aprender.
“Abecedários que pretendem oferecer a montagem dos signos gráficos, reduzindo o analfabeto ao estado de objeto e não de sujeito de sua alfabetização. Tínhamos, por outro lado, que pensar em limitar o número de palavras, fundamentais, chamadas geradoras, na aprendizagem de uma língua silábica como a nossa” (p.41).
A elaboração e aplicação do método abrangiam cinco fases. A primeira fase
marcava a “descoberta do universo vocabular”. Por meio de encontros informais
com os grupos a serem alcançados, buscavam-se as palavras carregadas de
sentidos emocional, profissional como também expressões típicas. Essa procura
fornecia as palavras geradoras.
A segunda parte era a “seleção de palavras, dentro de um universo
vocabular”, que obedeceriam aos critérios da riqueza silábica, as dificuldades
fonéticas (colocadas na ordem de dificuldades crescentes) e do conteúdo prático
da palavra.
Na fase seguinte envolvia a criação de situações problemáticas típicas do
grupo quer seja nacional ou regional. Situações que tivessem elementos que
fossem descodificados pelo grupo por meio de debate intermediado por um
coordenador.
A quarta fase era a elaboração de fichas que auxiliassem os coordenadores
no trabalho de verificação.
A última fase envolvia a elaboração de fichas que continham as famílias
fonéticas das palavras geradoras.
Somente após a elaboração do material e da constituição das equipes
(supervisores e coordenadores) treinados nos debates e com as fichas
indicadoras, iniciava-se o trabalho de alfabetização. A partir da apresentação de
uma situação, representava-se graficamente a palavra (tema gerador) conduzindo
14a um debate que é o processo, chamado por Freire (1980) de descodificação.
Visualizava-se a palavra (geradora) sozinha e depois separada por sílabas. Após
o reconhecimento das partes, apresentavam-se as famílias das palavras que
conduziam as identificações das vogais. Assumindo este mecanismo de maneira
crítica e não pela memorização o analfabeto começa a estabelecer por si mesmo
seu sistema de sinais gráfico.
No momento final eram apresentadas simultaneamente as três famílias, por
exemplo: se a palavra utilizada fosse tijolo, propunha-se a leitura na horizontal e
na vertical. A partir daí os alunos deveriam criar, oralmente, palavras com as
combinações possíveis, só depois do reconhecimento, “sem o qual não há
verdadeiro aprendizado”, garante Freire (1980), o aluno passaria à escrita. O
primordial era que o aluno descobrisse o mecanismo das combinações fonéticas,
e assim, criasse outras palavras. A alfabetização não deveria ser mecânica, mas
conduziria o adulto à conscientização para que ele se auto-alfabetizasse. O autor
(1980) buscou desenvolver um método fácil de aprendizagem de leitura e escrita,
e procurou fazer isso partindo da intencionalidade da consciência, ou seja, do
poder de reflexão da consciência.
A concepção de liberdade, segundo Freire (1980) se concretiza à medida que
os educandos tomam parte nela, de maneira livre e crítica. Tal princípio é
essencial na organização dos currículos de cultura, unidade de ensino que
substitui a escola tradicional por um trabalho de conquista da linguagem.
O homem precisa se inserido na construção e mudança da sociedade por
meio de um método de educação dialético e crítico e que modifique o conteúdo
dos programas educativos.
Para Freire (1980) a primeira dimensão desse novo conteúdo era fazer o
homem simples tomar consciência de que toda a criação humana e cultura e que
ele, como intelectual, é criador.
A partir da visão cristã de mundo, Freire (1980) concordava que a sociedade
brasileira precisava se tornar democrática e o povo emergia nesse processo,
15participando de maneira crítica, sendo sujeito da história, lutando pela sua
humanização.
Paiva (1973) se referindo à sociedade brasileira neste período
“A educação brasileira deveria ser corajosa, propondo ao povo a reflexão sobre si mesmo, sobre seu tempo, sobre seu papel no novo clima cultural da época de transição. Uma educação que lhe propiciasse a reflexão sobre seu próprio poder de refletir e que tivesse sua instrumentalidade, por isso mesmo, no desenvolvimento desse poder, na explicitação de suas potencialidades, de que decorreria sua capacidade de opção. Esta educação corajosa, exigia um método que permitisse ao educador ajudar o homem a ajudar-se, a fazer-se gente de sua própria recuperação através de uma postura consciente crítica diante de seus problemas (p.252)
O diálogo seria o caminho coerente para evitar os erros de uma educação
alienada. Paiva (1973) concorda que o conteúdo desse diálogo deveria ser
delineado
“Pelo conceito antropológico de cultura, a distinção entre o mundo da natureza e o mundo da cultura e o realce do papel ativo do homem sobre a realidade criando cultura, seria o conteúdo mais adequado para ajudar o analfabeto a super a sua compreensão mágica do mundo e desenvolver uma postura crítica diante da realidade. Ele ajudaria o homem a perceber o seu papel como sujeito e não como mero objeto e serviria de base para a mudança de atitudes. Só depois da compreensão da cultura como aquisição sistemática da experiência humana, através dos debates, iniciava-se a alfabetização” (p.235).
A educação de jovens e adultos é hoje marcada profundamente pela filosofia
e método pensado por Paulo Freire que tinha como alvo a liberdade do educando.
Torna-se relevante que o educador reconheça a necessidade de uma práxis que
contribua para o educando exercitar a reflexão sobre seus atos de aprendizagem
16desenvolvendo assim, potencialidades para sua criatividade e também para uma
consciência crítica.
Ferreiro e Teberosky alertam em seus estudos as duas faces da
alfabetização: uma relativa aos adultos, no sentido de sanar uma carência da
educação. A segunda é com relação às crianças, a prevenção contra os futuros
analfabetos. Esta prevenção perpassa pelo significado do conceito de
alfabetização Freireana: alfabetizar é ensinar o uso da palavra.
1.2- Educação Bancaria X Educação Problematizadora O termo “educação bancária” foi criado por Paulo Freire como crítica ao
modelo da educação brasileira, ele descreveu seus pressupostos e apontou o
caminho para uma “educação libertadora”.
Segundo Freire (1987) as relações entre educador e educando se configuram
em narradoras e dissertadoras. Há uma quase enfermidade na narração. A tônica
da educação é preponderantemente esta – narra, sempre narra. A tarefa do
educador é “encher” os educandos dos conteúdos de sua narração. Tal narração
é desconectada da realidade, tornam-se palavras vazias, mais som do que
significação. A “sonoridade” da palavra é uma das características desta educação
dissertadora quando na realidade a palavra deveria ser uma força transformadora.
“A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educados à memorização mecânica do conteúdo narrador. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante” (p.59).
17 Segundo Freire (1987), neste modelo de educação não há criatividade, nem
transformação ou saber. O “saber” é visto como elemento que é doado, por
aqueles que se julgam sábios e que julgam que os outros nada sabem. Essa
“doação” se manifesta como instrumento da ideologia da opressão perpetuando
assim a ignorância. A posição invariável do educador como aquele que sabe,
enquanto olha para os educandos como os que não sabem, nega a educação e o
conhecimento como processo de busca.
Nesta perspectiva o homem tende a adaptar-se e ajustar-se à realidade e ao
mundo, ele não é estimulado a desenvolver a consciência crítica nem sua
criatividade.
Freire (1987) afirma que os opressores pretendem transformar a mentalidade
dos oprimidos e não a situação que os oprime, e isto para que, melhor adaptando-
os a esta situação, melhor os dominem. Esse modelo de educação que serve aos
objetivos dos opressores jamais trabalhará para conscientizar os educandos
especialmente na educação de adultos propondo-lhes o pensar autêntico e o
desvelamento do mundo.
“E porque os homens, nesta visão modelo de educação que serve aos objetivos dos opressores, ao receberem o mundo que neles entra, já são seres passivos, cabe à educação apassivá-los mais ainda e adaptá-los ao mundo. Quanto mais adaptados, para a concepção “bancária” tanto mais “educados”, porque adequados ao mundo” (p.63).
A prática de dominação da educação bancária é categoricamente manter a
ingenuidade do educando e moldar sua acomodação no mundo da opressão.
Freire (1987) chama a atenção para a educação comprometida com a
libertação. É ela quem conscientiza o homem a problematizar, exige a superação
da contradição educador-educandos, numa relação dialógica. A educação ocorre
18por meio do diálogo que opera o resultado de uma nova relação educador-
educando e educando-educador. O autor afirma que
“Ninguém educa ninguém, como tampouco educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetivos cognoscíveis que na prática “bancária” são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos passivos (p.69).
A educação como prática libertadora efetiva-se na aprendizagem mútua, no
ato constante de desvelamento e compreensão da realidade, na reflexão autêntica
do homem consciente sobre suas relações com o mundo, e não com uma
realidade estática, mas, uma realidade em processo de transformação. Efetiva-se
também na importância da luta consciente do homem por sua emancipação
superando a falsa consciência do mundo. Assim o mundo torna-se o mediatizador
dos sujeitos da educação onde a incidência da ação transformadora do homem
resulta na sua humanização.
Freire afirma (1987) que esta é a razão porque a concepção
problematizadora de educação não pode servir ao opressor. Portanto, é
importante que o educador reconheça e desvele os mecanismos que aprisionam e
negam ao educando o direito de construir o saber. Para o autor, alfabetizar
significa ensinar o uso da palavra.
O conceito e os métodos de alfabetização serão analisados no próximo
capítulo.
19
Capítulo II Alfabetização 2.1 Conceito de Alfabetização Na consulta ao dicionário de língua portuguesa Aurélio B. Ferreira (2004)
define alfabetização como ato ou efeito, modo ou processo de alfabetizar. E define
alfabetizar como ensinar ou aprender a ler e a escrever (com a devida
compreesão do significado das palavras e do contexto) (p.31).
O sentido etimológico do termo alfabetizar representa levar à aquisição do
alfabeto.
Soares (1985) define alfabetizar, sobretudo como um processo de aquisição
do código escrito, das habilidades de leitura e escrita. Alfabetizar é propiciar
condições para que o individuo tenha acesso ao mundo da escrita. A autora
considera que o debate básico sobre o conceito de alfabetização pode apontar
para a aquisição de decodificar a língua oral em escrito ou apontar também para a
apreensão da significados. A classificação dos métodos de alfabetização pode ser
vista segundo a ênfase que é dada às duas perspectivas do processo.
Soares (2003) define alfabetização como processo pelo qual se adquire o
domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou seja: o
domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas – para exercer a arte e ciência da
escrita.
Para Ferreiro (1999), o ato de leitura não pode ser concebido como uma
adição de informações, mas sim como um processo de coordenação de
informações e cujo objetivo final é a obtenção de significado expresso
lingüisticamente.
202.2 Os métodos de Alfabetização
O processo de alfabetização se constitui inevitavelmente pela adoção de
uma metodologia. Torna-se necessário analisar as formas como essas
metodologias se efetivam através da historia e os seus efeitos na construção do
conhecimento dos sujeitos nas sociedades.
A perspectiva histórica de leitura escrita analisada por Barbosa (1991) é
retratada em três períodos: da Antiguidade até meados do século XVIII, com o
uso exclusivo do método sintético; período a partir do século XVIII, com a
oposição teórica ao método sintético, representado pelo método global, que se
efetivou no século XX, com Decroly.
Segundo Kato (1997) o método é eficaz quando contém hipóteses claras a
respeito da natureza do objeto a ser apreendido e sobre a natureza da
aprendizagem. A autora afirma que método, porem para uma grande maioria de
professores, é definido meramente como conjunto de materiais, técnicas e
procedimentos para se atingir um fim, isto é, um conjunto programado de
atividades para o professor e o aluno.
Guedes (1993) afirma que as metodologias de alfabetização bem como as
concepções do processo deslocam-se progressivamente no tempo de acordo
com as necessidades sociais e dos avanços tecnológicos. A autora constata a
existência de dois aspectos na teoria da alfabetização: o método sintético e o
método analítico. Chama atenção para a abordagem do método sintético silábico
que tem como ponto de partida o enfoque global.
O método sintético parte dos menores elementos da língua: letras, fonemas,
sílabas que são aprendidos isoladamente pressupondo que a partir da junção
dos elementos menores o aluno chega a unidades maiores, como palavras,
frases e textos. O método analítico aponta a direção contraria, partindo dos
elementos de significação da língua como palavras, frases, textos e por meio da
analise, chega às unidades componentes: fonemas e sílabas (Lemle, 1990).
21 Embora as abordagens se oponham nas operações de analise e síntese,
elas compartilham da correspondência entre som e grafia.
Ferreiro e Teberosky (1999) descrevem o método sintético como partindo do
elemento menor que a palavra. É a correspondência de elementos mínimos;
consiste em ir da parte para o todo. Este seria o método mais tradicional, já em
desuso. O método fonético parte do fonema associando-o a sua representação
gráfica. O sujeito precisa ser capaz de isolar e reconhecer os diferentes fonemas
para redimensioná-los aos sinais gráficos.
Barbosa (1991) aponta como representantes do modelo sintético: Viard e
Cherrier (século XVIII) defensores da silabação, Laffore (1828) defensor do
método fônico. Na abordagem analítica, Radonvilliers (1768) foi o precursor do
método; Adam (1787) da palavração; Jacotot como precursor do método global e
Clapariede (século XIX), que representa o sincretismo infantil como
fundamentação teórica dos métodos globais.
No inicio do século XX a discussão gira em torno do caráter mecânico e não
funcional do método sintético e da inovação do método global, fundamentado
pela psicologia. Essa mudança gerou o método chamado analítico sintético
(misto ou eclético) confirmado por estudos da UNESCO por Gray e confirmada
por Braslavsky (Barbosa, 1991).
Segundo Barbosa (1991) os métodos analíticos só foram introduzidos no
Brasil por volta do século XIX, por influencia européia e americana. A discussão a
respeito dos métodos analítico e sintético no Brasil gerou grande conflito. Na
cidade de São Paulo determinaram a adoção obrigatória do método analítico,
revogada em 1920, por questionamento dos professores, pois eles conquistaram
a liberdade de escolher o método de ensino da leitura e da escrita. A autora
constata que a busca do método “excelente” atravessou os séculos. Ao priorizar
as questões de ensino, a transmissão dos conteúdos e os procedimentos,
desvalorizavam a aprendizagem e os processos de assimilação do sujeito.
Grandes transformações sobre métodos de ensino ocorreram até nossos dias.
22 Os defensores do método fonético concordam que a aprendizagem da leitura
e da escrita é uma questão mecânica, trata-se de adquirir a técnica para decifrar
o texto. Nesta concepção, ler equivale decodificar a escrita em som.
Ferreiro e Teberosky (1999) afirmam que as sílabas são utilizadas
regularmente, o que acarreta a conseqüência inevitável de dissociar o som da
significação e, portanto, a leitura da fala. O processo de aprendizagem segundo
as autoras é compreendido como associação entre resposta e estímulos gráficos.
Argumentam que a psicologia, a lingüística e a pedagogia estão de acordo ao
considerar a leitura inicial como puro mecanismo. Para os defensores do método
analítico, a leitura é um ato global,
“A analise dos componentes é uma tarefa posterior. Não importa qual seja a dificuldade auditiva daquilo que se aprende, posto que a leitura é uma tarefa fundamentalmente visual” (p.23).
A divergência entre os métodos está no enfoque da estratégia de percepção
auditiva para uns e visual para outros. Ambos abordam concepções diferentes
tanto do funcionamento psicológico quanto das teorias da aprendizagem.
Ferreiro (1993) considera três elementos básicos no processo de
alfabetização e de representação da linguagem. O primeiro elemento básico é a
relação entre o método utilizado e o estado de “maturidade” ou “prontidão” da
criança. O elemento está relacionado aos pólos do processo de aprendizagem,
ou seja, quem ensina e quem aprende. O terceiro se relaciona à natureza do
objeto do conhecimento que envolve a aprendizagem. A escrita pode ser
considerada uma representação da linguagem (silabação) e também como um
código de transcrição gráfica das unidades sonoras (fonéticas). Qualquer dos
sistemas envolve um processo de diferenciação dos elementos e relações
conhecidas no objeto a ser representado. Para a autora, não existe um modelo
padrão da realidade nem realidade padrão, o que existe é um modelo adequado
a uma realidade. Afirma também que as crianças constroem o conhecimento a
23respeito de certos objetos antes mesmo da escola e elas conseguem representar
a aparência gráfica mesmo não sabendo escrever. O modelo tradicional observa
apenas os aspectos gráficos: qualidade do traço, distribuição espacial, orientação
dos caracteres e orientação predominante. Já os aspectos construtivos observam
o que a criança quis representar e os meios que usou para criar diferenças entre
as representações.
Para Ferreiro e Teberosky (1999), a relação que a criança faz não é entre
significantes, mas entre símbolos lingüísticos em sua totalidade, significante e
significado, e a sua representação escrita. As crianças estabelecem relações
entre aspectos qualitativos do objeto e aspectos quantificáveis da escrita, e não
entre aspecto figural do objeto e aspecto figural do escrito.
Kato (1997) concorda que na fase rítmica, a escrita da criança seria
representacional, na fase do pictograma a escrita teria uma função instrumental.
Para a autora, essa diferença aponta para estratégias distintas para a leitura e
escrita.
“Enquanto a criança está apenas preocupada em representar o que lhe é ditado, o produto de sua escrita aproxima-se mais da natureza do significante: quando começa, porém, a preocupar-se em usar a sua escrita para a leitura e conseqüentemente rememoração das palavras ou frases ditadas, a forma de sua escrita aproxima-se mais do seu conteúdo” (p.20).
Segundo Kato (1997) é na fase da transcrição entre a escrita icônica e a
simbólica a criança aprende que pode representar simbolicamente só não sabe
como fazer.
Para Ferreiro e Teberosky (1999) e Ferreiro (1993,1991) este é o primeiro
nível de aquisição da escrita. A partir dessa distinção, a criança constrói a
hipótese do nome, um princípio organizacional que auxilia na construção de
problema do relacionamento entre desenho e escrita. Na hipótese do nome, a
24criança passa a conceber as letras ordenadas como objetos que constituem
totalidades que vão representar propriedades dos objetos que o desenho é
incapaz de representar: seu nome.
Ferreiro (1991) investiga a psicogênese dos sistemas de interpretação
constituídos pela criança para compreender a representação alfabética da escrita.
A autora analisa as marcas escritas e também inclui as intenções, os
comentários, as modificações e interpretações das crianças durante a escrita.
Kato (1997) cita Ferreiro e declara que a criança nesta fase constrói as três
hipóteses. Na primeira, a criança começa a procurar letras similares para
representar sons similares e a compreender a representação escrita focalizando o
padrão sonoro da palavra. Esta tentativa de relacionar o todo (uma seqüência
escrita) e as partes (as letras). A escrita utilizada por adultos vai levar a criança a
tentar uma segunda hipótese – a silábico-alfabética, que vai direcioná-la a
construção da nova fase, a hipótese alfabética.
Segundo Ferreiro (1999) as discussões tradicionais visão os diferentes
métodos utilizados: analítico versos sintético, fonético versos global. A autora
aponta outras bases de discussão: “a criança não é tabula rasa”, o conceito de
fácil ou difícil precisa ser definido na perspectiva do aluno, a informação deve ser
assimilada e transformada para ser realizada. A autora analisa as práticas em
diferentes metodologias e indaga em que ordens devem ser introduzidas às
atividades de leitura e de escrita? Ela responde, se o objetivo do ensino da língua
escrita for decifrar um código de transcrição então se pode supor que o ensino da
leitura e escrita são aprendizagens de duas técnicas diferentes e complementares
requeridas para a leitura e escrita, ou um processo de representação de objetos
diversos, de naturezas diferentes. A autora ressalta a importância da teoria de
Piaget na compreensão dos processos da aquisição da leitura e escrita é o
fundamento do sujeito cognoscente. O sujeito que busca compreender o mundo
no qual está inserido. Empenha-se em resolver as questões provocadas pelo
mundo que a cerca e aprende, tendo por base as próprias ações sobre as
questões. Na perspectiva de Piaget, segundo a autora, o sujeito da aprendizagem
25é o centro do processo. Este é um marco teórico que permite compreender de
uma maneira diferente qualquer processo de aquisição do conhecimento. O
processo na construção do conhecimento não é linear, se dá através de grandes
reestruturações globais e o erro passa a ser essencial nessa construção.
“A teoria de Piaget nos permite – como já dissemos – introduzir a escrita enquanto objeto de conhecimento, e o sujeito da aprendizagem, enquanto sujeito cognoscente” (p.31).
Ferreiro (1991) afirma que sendo o erro um ponto essencial na construção
do saber do aluno cabe aos educadores considerar e identificar quais são os tipos
de erros. Identificar os tipos de erros constitutivos é identificar as
conceitualizações que a criança está fazendo a cerca da escrita. A importância de
detectar momentos cruciais nos quais o sujeito está sensível às perturbações e às
suas próprias contradições e direcioná-lo no sentido de avançar a armar nova
reestruturação é um ponto fundamental para o desenvolvimento da
aprendizagem.
Na próxima seção analisaremos o letramento focalizando os aspectos
sócio-históricos da aquisição de um sistema de escrita por uma sociedade.
2.3 Modelo de letramento As pesquisas sobre letramento no Brasil têm procurado suscitar
transformações da realidade dos grupos socialmente marginalizados. O conceito
de letramento é relativamente novo e complexo, o que tem gerado dificuldade
para sua interpretação.
26 Segundo Kleiman (1995) o conceito letramento tem sido utilizado para
separar os estudos sobre o “impacto social da escrita” dos estudos de
alfabetização. Os efeitos da expansão da escrita e o desenvolvimento social
tornaram-se o campo de estudos sobre letramento, ou seja, o efeito do letramento
relacionado ao desenvolvimento e às práticas sociais.
No dicionário de língua portuguesa Ferreira (2004), letramento significa ato
ou efeito de letrar (-se). Estado ou condição do indivíduo ou grupo capaz de
utilizar-se da leitura e da escrita, ou de exercê-las como instrumentos de sua
realização e de seu desenvolvimento cultural e social. Letrar significa tornar
letrado; capacitar ao uso social e cultural da leitura da escrita; tornar-se letrado.
A complexidade do termo varia de acordo com o tipo de estudo Kleiman
(1995) afirma que se um trabalho sobre letramento examina a capacidade de
refletir sobre a própria linguagem de alfabetizados versos analfabetos, então,
“Ser letrado significa ter desenvolvido e usar uma capacidade meta lingüística em relação à própria linguagem (p.17). Se o pesquisador investiga a fala dos sujeitos de grupos diferentes relacionada ao sucesso escolar, então, nesta perspectiva letramento significa prática discursiva de um grupo social, que está relacionada ao papel da escrita para tornar significativa essa intenção oral, mesmo que não envolva, necessariamente as atividades especificas de ler e escrever”(p.18).
A autora concorda que o termo letramento pode ser utilizado quando os sujeitos
(mesmo analfabetos) adquirem estratégias orais letradas através da prática de
eventos de letramento.
“Um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos (ef. Scribner e Cole, 1981)” (p.19).
27 Essa definição aponta a prática escolar como um tipo, que desenvolve
alguns tipos de habilidades, e que determina uma forma de utilizar o
conhecimento sobre a escrita.
Segundo Kleiman (1995) o letramento é um fenômeno que explora o mundo da
escrita tornando importante e necessária a articulação entre os saberes da vida o
os saberes escolares. As agências que realizam diferentes formas de letramento
são a família, a igreja, o trabalho e a rua. A escola é a agência mais importante,
pois se preocupa com apenas um tipo de prática de letramento, a alfabetização,
ou seja, a aquisição de códigos (alfabético, numérico) pelo processo de
competência individual necessária para o sucesso e promoção escolar.
Para alguns pesquisadores, as práticas de uso da escrita escolar
sustentam-se num modelo de letramento equivocado.
Kleiman (1995) aponta dois modelos de letramento: o autônomo e o
ideológico, os quais serão apresentados a seguir.
2 .4 Modelo Autônomo de Letramento Kleiman (1995) se refere à autonomia no sentido da escrita como “um
produto completo em si mesmo”, o processo de interpretação estaria ligado ao
funcionamento lógico interno do texto escrito e não às estratégias da oralidade. A
escrita representando uma ordem diferente de comunicação, a oralidade
representando outra ordem, pois se utiliza de vários recursos entre os
interlocutores. As características de funcionamento regido pela lógica apontam
para a correlação entre a aquisição da escrita e o desenvolvimento cognitivo, para
a dicotomização entre a oralidade e a escrita e também para a atribuição de
poderes e qualidades intrínsecas à escrita e aos povos ou grupos que a possuem.
Segundo Kleiman (1995) o desenvolvimento de “habilidades cognitivas” no
modelo autônomo do letramento aponta a escrita como conseqüência da
escolarização acentuando a divisão entre grupo letrado e grupo não letrado. Para
28a autora o letramento e a escolarização acontecem simultaneamente e a escola é
a principal agência. A autora cita autores como Tannen (19980), Chafe (1984)
que propõem uma continuidade entre oralidade e escrita ao invés de colocá-los
em pólos diferentes. Afirma também que o dialogismo na linguagem e da polifonia
do texto, a oralidade e a escrita podem ser investigados não apenas na
perspectiva da diferença, mas também da perspectiva da semelhança e do
compartilhamento. De acordo com a autora, se olharmos a linguagem oral e
escrita através de semelhanças constitutivas. Podemos pensar na aquisição da
escrita como um processo que aponta para o desenvolvimento linguístico da
criança, onde o suporte do adulto é essencial.
2 .5 Modelo Ideológico de Letramento
Para Kleiman (1995) as práticas de letramento estão relacionadas a
estruturas de poder da sociedade e também mudam segundo o contexto. As
práticas de letramento na escola, no modelo autônomo, consideram a aquisição
da escrita como um processo neutro, mesmo sem levar em conta o contexto
social devem promover atividades necessárias para desenvolver no aprendiz a
capacidade de interpretar e escrever textos abstratos do tipo ensaio. Segundo a
autora, a prática de letramento ideológico é a que:
“Encaminha o aluno por trilha previamente determinada em função de sua classe social, não em função de sua inteligência ou potencialidade, reproduzindo as desigualdades do sistema” (p.44).
Kleiman (1995) aponta as falhas do sistema educacional na formação do
sujeito como os pressupostos que embasam o modelo de letramento escolar.
29"O ensino da escrita como o desenvolvimento das habilidades necessárias para produzir uma linguagem cada vez mais abstrata está em contradição com outros dois modelos que consideram a aquisição da escrita como prática discursiva” (p.47).
Tfouni (2002) chama a atenção para o uso do termo “iletrado”, pois este
não pode ser usado como antítese de letrado, no entanto, afirma que existem
“graus de letramento” mas nunca podemos verificar sua inexistência completa.
Ela considera alfabetização e letramento como processos interligados e
contínuos, entretanto, separados quanto à sua abrangência e natureza. A autora
concorda que os não alfabetizados têm capacidade para resolver conflitos e
contradições no plano da dialogia, pois, eles utilizam vários mecanismos para
solucionar os problemas. Ocorre a influência das sociedades letradas que afetam
cognitivamente os não alfabetizados, exigindo o desenvolvimento a nível
individual simultâneo e ao desenvolvimento cientifico e tecnológico. Por outro
lado, ocorre a “alienação” do individuo, negando-lhes o acesso ao conhecimento
sistematizado. Conseqüentemente, os não alfabetizados abrem mão de sua
cultura própria confirmando a relação de poder e dominação, um ponto relevante
quando se busca compreender a alfabetização e letramento como produto
humano.
Guedes (1993) considera que as transformações do século XIX
proporcionaram um maior tempo da ação para a psicologia e através da busca do
interesse da relação ensino aprendizagem, o foco da observação passou a ser a
criança e as etapas de seu desenvolvimento. O aluno é o principal sujeito do
processo e os métodos passam para um plano secundário.
Os estudos sobre lingüística, a partir dos anos 60, apresentam a
perspectiva da escrita como sistema de representação da fala em que o sujeito
realiza a leitura. A lingüística estrutural importante para Barbosa (1991), é a
fonética (estudos dos sons da fala do ponto de vista físico) e a fonologia estudo
30das distinções funcionais entre as unidades do significante dentro do sistema
linguístico.
Segundo Guedes (1993) o enfoque da sociolingüística se direciona para as
diferenças dialetais ou de registro. A psicolingüística se preocupa com as
relações entre linguagem e pensamento também como comportamento do leitor
com o ato de ler.
Nos estudos de Ferreiro e Teberosky (1999), novos paradigmas são
apontados para o processo de aprendizagem através da psicogênese da língua
escrita. Neste processo, a leitura é uma apropriação pessoal, o leitor vai se
construindo como tal, por meio do contato e situações diversas onde a escrita é
utilizada. Segundo este ponto de vista, a construção do leitor tem inicio na
escolarização.
Para Kato (1997) o processo de letramento começa com os primeiros
contatos coma palavra escrita. A autora cita Kohl (1933) que discute que a
criança traz para a escola uma consciência formada a partir da interação com o
meio em que vive. Kato cita também Farr (1985) que afirma que esse
conhecimento entra em conflito com as concepções da escola causando
dificuldades na aprendizagem da criança. Farr chama isso de “letramento
emergente”, definido também por Sulzby (1989) como “os comportamentos de
leitura e escrita” que precedem a alfabetização convencional e a ela dão lugar.
Segundo Kato (1997) as pesquisas sobre letramento emergente destacam
pontos como: Primeiro: a pré-disposição da criança em ser alfabetizada, e o
papel do adulto é proporcioná-la um ambiente rico em escrita. Segundo: é na
interação da criança com o meio ambiente que se dá a construção da linguagem
e como os conceitos são construídos, desenvolvidos, modificados e diferem do
conceitos dos adultos. Terceiro: alfabetização e aprendizagem na perspectiva
vigotskiana de interação social entre adulto letrado e criança. Os pontos
principais abrangem quatro áreas: escrita, leitura, consciência metalingüística e
processos de socialização em torno da escrita. A autora afirma que segundo
Vygotsky a primeira tarefa para estudar a aquisição da escrita é desvendar as
31habilidades precursoras, ou seja, o gesto, o jogo do faz de contas e o desenho. A
concepção da fala como um simbolismo de primeira ordem que pode sustentar a
escrita que é um simbolismo de segunda ordem através do jogo do faz de conta.
Vygotsky entende que o desenho da criança passa por fases de
desenvolvimento. Na primeira fase ela desenha e só depois descobre o que
desenhou, na segunda ela decide durante a atividade o que o desenho vai
representar e na terceira ela planeja antes o que vai desenhar. Na primeira fase
da escrita ela reproduz rabiscos indiferenciados para imitar as ações dos adultos.
Na segunda etapa a criança deve diferenciar a escrita de modo que expresse um
conteúdo especifico. Diferença na representação do ritmo ou forma do “input” e
conteúdo. A criança faz distinção entre o tamanho da palavra com o tamanho do
rabisco, demonstrando uma consciência da relação entre significantes da forma
oral e forma escrita.
Kleiman (1995) afirma que a ideologia do letramento se compõe na
construção das práticas escolares que integram as questões da sala de aula com
questões sociais. A autora declara que a linguagem oral e a linguagem escrita
funcionam de formas diferenciadas, conflituosas e com funções diferentes no
meio social. A língua escrita tem sido objeto da herança literária, pois reproduz e
divulga valores da cultura de grupos poderosos da comunidade.
Segundo Kleiman (1995) não são todos os grupos letrados que se apóiam
na escrita para desenvolver etapas na realização de tarefas e os grupos não
letrados têm outras estratégias para auxiliar a memória. A introdução da prática
de escrita como mera tradução da fala é decorrente da concepção de letramento
autônomo. Os programas de alfabetização de adultos são organizados segundo
as necessidades de leitura diversificada e também pelo critério de utilidade com
objetivo de facilitar o acesso à informação e a funcionalidade da escrita.
Alfabetização de adultos visa a substituição de prática discursivas por práticas da
sociedade dominante, que são necessárias a mobilidade social do sujeito.
Não existe uma idade ideal para a criança ser alfabetizada. O que existe é
o momento correto. O momento em que cada sujeito está biologicamente
32preparado, numa linguagem popular esteja “maduro” ou seja, se a criança já
pensa a respeito e conhece sobre a leitura e a escrita. É necessário que o
educador compreenda os aspectos ligados ao desenvolvimento dos processos
neurais para a aquisição da aprendizagem da linguagem e da escrita. A partir da
análise do processo biológico o professor encontra respaldo para desenvolver um
trabalho coerente, com obtenção de resultados satisfatórios de aprendizagem.
Os questionamentos sobre como se desencadeiam os processos da
aprendizagem no cérebro humano e como ocorre a alfabetização na mente da
criança tem mobilizado professores estudiosos em busca de respostas. A
instrução de novos conceitos e referenciais teóricos que modificam a prática dos
velhos métodos e procedimentos do professor irá instrumentalizá-lo ao
conhecimento científico, conhecendo tanto o processo pedagógico, quanto às
ciências biológicas. Assunto que serão contemplados no próximo capítulo.
33
Capítulo 3 Dificuldades de Aprendizagem A evolução das ciências e a utilização das novas tecnologias na área da
educação têm exigido uma transformação na atuação dos profissionais de
educação: professores, psicólogos educacionais, psicopedagogos etc. O
paradigma de modelo único de educação tradicional é colocado em “xeque”, face
aos avanços científicos e culturais. A forma tradicional de educação vai sendo
substituída pela subjetividade e pela pluralidade de paradigmas. A concepção de
que todos os sujeitos devem ser tratados como se fossem idênticos, se
enquadram no mesmo padrão e aprendem da mesma maneira também é
confrontada constantemente por uma universalidade multicultural. É fundamental
respeitar e tratar as diferenças para direcionar a melhora da qualidade do ensino.
Compreender as diferenças essenciais que cada aluno possui e conduzi-los de
modo coerente demanda habilidade e competência pedagógica de educador.
O conhecimento da anatomia e fisiologia cerebral evitam erros conceituais e
pré-julgamentos discriminatórios contra a criança durante o processo de
aprendizagem não só na alfabetização, mas em sua vida escolar.
3.1 Conceito da Neurociência Segundo Relvas (2008) o processo de aprendizagem é um desafio para os
educadores. O desenvolvimento tecnológico tem exigido uma mudança efetiva na
manutenção da aprendizagem no espaço da sala de aula. O olhar do educador
precisa está voltado para o aluno especificamente em sua morfologia, ou seja, no
movimento de conexões nervosas que estão em constantes atividades. O
professor também é o responsável por promover o desenvolvimento das diversas
inteligências, por compreender os processos e os princípios das estruturas
cerebrais identificando sua funcionalidade com o objetivo de apontar novas
34alternativas para aquisição da aprendizagem. Para a autora o ser humano se
adapta ao meio ambiente em função de três aspectos: irritabilidade,
condutibilidade e contratilidade. No mecanismo de irritabilidade a célula detecta as
modificações do ambiente, o estimulo é conduzido através da condutibilidade e
possibilita uma resposta. O desenvolvimento filogenético dessas células formou o
sistema nervoso central com três tipos de neurônios: os sensitivos ou aferentes
que colhem informações do ambiente, os neurônios eferentes ou motores que
reagem ao estímulo com uma determinada resposta e os neurônios de
associações. Eles associam as respostas a serem dadas ao estímulo.
Relvas (2008) afirma que o sistema nervoso central tem partes situadas no
cérebro, na coluna vertebral e outras distribuídas pelo corpo todo. No sistema
nervoso periférico estão um grande numero de prolongamentos chamados fibras
nervosas que funcionam como fios condutores de informações motoras e
sensitivas. Os nervos são divididos em aferentes que levam informações para o
sistema nervoso central e os eferentes que levam informações do sistema nervoso
central. As três partes dos neurônios são: o corpo celular que é a parte central e
possui o núcleo celular, os axônios e os dendritos. O corpo celular ramifica
prolongamentos que são os dendritos. É através deles que cada neurônio recebe
informações. O processamento e transmissão de informação são chamados de
sinapse. A transmissão sináptica pode ser química, quando é feita através de
neurotransmissores; ou elétricas, as correntes iônicas passam pela região de
aproximação entre as duas células. As células motoras e sensitivas produzem
energia o que as mantém vivas e ativas. Para autora a plasticidade cerebral é a
capacidade do sistema nervoso alterar o funcionamento motor e perceptivo
baseado nas mudanças do ambiente. A plasticidade é mais comum em crianças,
podendo ocorrer no adulto através de uma repaginação do movimento cerebral.
“Estudos comprovam a hipótese sobre o desenvolvimento neural e a aprendizagem na qual funções particulares de processamentos de informação são controladas por grupos especiais de neurônios, mas quando uma dessas funções
35ficam inutilizadas, os neurônios, associados a ela passam a controlar outra função”.(p.14)
Em função das mudanças cerebrais o cérebro remodela-se para aprender e entra
em ação a memória. As memórias são construções que se modificam conforme o
contexto, podem ser recuperadas. Os neurotransmissores são responsáveis por
ampliar a comunicação entre as células e provocam as reações químicas e ativam
enzimas que sintetizam as proteínas que estão envolvidas no recrutamento das
lembranças.
O sistema nervoso de uma criança em desenvolvimento é mais plástico que
o sistema nervoso de um adulto. Exercícios mentais e atividades físicas
aumentam a produção de endorfina e retarda os problemas cognitivos associados
ao envelhecimento.
Relvas (2008) declara que a memória é a base de todo saber.
“Um certo número de cheiros, sabores, objetos, rostos, conhecimentos, sons, tatos, medos, números, comportamentos e cenários vão sendo estocados no cérebro. Ele é capaz de remeter à infância, em questão de segundos, quando percebe-se um cheiro familiar, lembranças surgem no momento exato em que aquele fato ocorre. Isso vale dizer que de nada valeria tanta informação guardada se ela não pudesse ser rapidamente recuperada” (p.15)
É uma das funções mais importantes do cérebro, está ligada ao aprendizado e à
capacidade de refletir acertos e evitar erros. A memória está relacionada à
capacidade de planejamento, abstração, julgamento crítico e atenção. Quando o
estudante não aprende um conteúdo é porque não encontrou nenhuma referencia
nos arquivos mentais. Por meio de procedimentos pedagógicos e estratégias
mnemônicas (memorização) o educador pode levar o aluno ao uso racional do
exercício consciente da memória facilitando assim a aprendizagem. Segundo a
autora o ser humano é dotado de duas memórias: uma trata da emoção e a outra
36da razão. Essa dualidade se completa e se articula através de um elemento
dinâmico. O elemento responsável pelo prazer e aprendizado no sistema límbico é
a libidinação. A memória é a base para a aprendizagem, com as experiências a
memória é armazenada e temos oportunidade e habilidade de mudar nosso
comportamento. A memória não está localizada isolada em uma estrutura no
cérebro, é um fenômeno biológico e psicológico envolvendo os sistemas cerebrais
que funcionam juntos. Quanto mais conexões, mais memórias. A memória ultra-
rápida, de curto prazo ou de longo prazo são atividades relacionadas ao
armazenamento de informações. A perda da memória pode estar ligada a
doenças neurológicas, distúrbios psicológicos, problemas metabólicos e
intoxicações. A memória não declarativa está ligada ao conhecimento clássico,
habilidades e hábitos em parte ou completamente inconscientes. A memória
declarativa envolve a recuperação consciente de fatos que já tenham ocorrido.
Desta forma o homem constrói sua história através dos acontecimentos pela
memória.
“A formação de memórias desde a aquisição, passando pela consolidação até chegar à evocação ou lembrança, são processos dependentes da transmissão de informações célula a célula por meio da ajuda de neurotransmissores ou moléculas, que agem no espaço existente entre dois neurônios (sinapses)” (p.71).
Relvas (2008) afirma que o hemisfério esquerdo do cérebro é responsável
pela realização mental de cálculos matemáticos, comando da escrita e pela
compreensão dela através da leitura. O hemisfério direito é responsável pela fala
afetiva, reconhecimento das faces e percepção de sons musicais, e pela função
não verbal. O cérebro necessita de estímulos para produzir neurotofinas que são
moléculas que estimulam seu crescimento e reação. A mudança na rotina
desestabiliza o “piloto automático” criado pelo cérebro gerando neutrofinas que é
um fertilizante cerebral. Os seres vivos são dotados de capacidade de
37aprendizado e adaptação ao meio em que vivem. O professor é um especialista
no domínio dos conteúdos, portanto é responsável por despertar nos alunos as
estratégias para a memorização consciente. Os exercícios cerebrais são
estímulos às funções cerebrais. As aulas são transformadas em estímulos para o
cérebro e circulam no córtex antes de serem arquivadas ou descartadas. A
dificuldade de aprendizagem de um conteúdo se estabelece em função do aluno
não encontrar referencias para abrigara nova informação.
Ao abordar os temas inteligência e afetividade Relvas (2008) descreve o
cérebro emocional como controlador das funções cardíacas e entre outras
inclusive do sistema imunológico. O cérebro cognitivo sendo o responsável por
funções tais como pensamento, atenção, concentração e linguagem. A autora cita
descreve:
“De acordo com a Enciclopédia Britânica,“ela é a habilidade de se adaptar efetivamente ao ambiente, seja fazendo uma mudança em nós mesmos, ou mudando o ambiente, ou achando um novo ambiente”. Esta é uma mudança inteligente, porque incorpora aprendizado (uma mudança em nós mesmos), manufatura e abrigo (mudança do ambiente) e migração (encontrando um novo ambiente). De modo a nos adapta efetivamente, o cérebro deve usar todas as funções” (p.86).
São três os aspectos elencados por Relvas (2008) que estão interligados à
inteligência: o mundo interno, as relações com o mundo externo e as experiências
que relacionam ao mundo. Uma importante propriedade humana é a consciência
ou auto percepção. A auto consciência nos permite construir a realidade.
O sujeito que a teoria Piagetina aponta, Ferreiro (1999) descreve como
sujeito cognoscente que busca compreender o mundo que o cerca e procura
resolver as indagações provocadas por este mundo.
38“É um sujeito que aprende basicamente através de suas próprias ações sobre os objetos do mundo e que constrói suas próprias categorias de pensamento ao mesmo tempo que organiza seu mundo” (p.29).
O molde de educação postulada por Freire (1996) conduzia o olhar da
alfabetização para a democratização da cultura e que fosse uma introdução a
esta cultura. A partir do pressuposto de que a posição normal do homem não era
apenas estar no mundo, mas de travar relações permanentes com este mundo
criando, recriando, acrescentando ou não à realidade cultural.
“Nestas relações com a realidade e na realidade, trava o homem uma relação especifica – de sujeito para objeto – de que resulta o conhecimento, que expressa pela linguagem” (p.105).
Para Relvas (2008) a percepção não é um atributo exclusivo do cérebro,
todo organismo reage. É preciso reconhecer a relevância das emoções nos
processos de raciocínio. A autora firma que a meta principal da atual educação da
escola nacional e internacional é preparar o aluno para pensar sistematicamente e
ecologicamente. A perda do sentido e significados para a vida é a ponta da crise
na educação, os valores precisam ser vividos no cotidiano. Em função dessas
dificuldades é preciso pensar criativamente o cotidiano e desenvolver habilidades
para enfrentar as incertezas na educação é necessário também uma pedagogia
menos assistencialista. A autora cita Piaget, Vygotsky e wallon, estes descrevem
de forma simples e objetiva o ponto de vista sobre inteligência, aprendizagem e
desenvolvimento. Piaget explica o desenvolvimento intelectual partindo da ideia de
adaptação ao meio físico. O conhecimento é gerado por meio da interação do
sujeito com o meio, a partir de estruturas previamente existente no sujeito. O
processo cognitivo se distingue em dois momentos: A aprendizagem que estava
relacionada a uma resposta particular aprendida por causa de uma experiência. A
39formação da inteligência se dá por estágios: inteligência sensório-motora, lógico
concreta e estágios da inteligência lógico-formal. A primeira ideia das funções
psicológicas postuladas por Vygotsky, a autora afirma que não são transmitidas
por hereditariedade, nem são adquiridas passivamente e pelo ambiente externo.
Mas é o resultado da interação do individuo com o meio sócio-cultural. O homem
atua sobre a natureza transformando-a e sofre os efeitos dessas mudanças. A
segunda idéia é que as funções psicológicas humanas têm origem nas relações
sócio-histórica do homem. A terceira ideia é que o cérebro e a base biológica do
funcionamento psicológico. Este é o substrato material da atividade psíquica que
os membros da espécie carregam consigo. A próxima ideia defendida por
Vygotsky é a relação do homem e com o mundo é mediada por instrumentos
técnicos e o sistema de signos (instrumentos psicológicos). A quinta é a da zona
do desenvolvimento proximal. Hoje é desenvolvimento proximal, amanhã será
desenvolvimento real. O professor é o ser interativo no processo de aprendizagem
respeitando as individualidades dos alunos e mediando a aprendizagem.
Relvas (2008) afirma que Wallon considera a pessoa como um todo.
Inteligência é o desenvolvimento que cada um faz das diferentes realidades O
meio exerce influencia sobre o desenvolvimento da pessoa. Wallon descreve os
estágios do desenvolvimento: impulsivo emocional (movimentos de bruscos),
sensório-motor e projetivo (exploração do espaço físico), personalismo
(exploração de si mesmo), categorial (exploração mental do mundo físico),
puberdade e adolescência (exploração de si mesmo com uma identidade
autônoma).
3. 2 Definindo o que é aprendizagem Os conceitos e definições de aprendizagem tem sido o foco de diversos
estudos e pesquisas na área educacional.
Porto (2009) aponta o resultado da busca pelo entendimento do
desconhecido é o conhecimento. O centro específico da aprendizagem é o
40conhecimento, para que este se concretize é fundamental que ocorra a relação
entre o sujeito e o objeto.
“Logo, verificamos que em todo conhecimento, está implicada uma relação entre sujeito (s) e objeto (o), sendo que a “revelação” de algo (o) como uma “verdade” só se realiza em virtude da presença de um sujeito (s), que se define como sujeito cognoscente” (p.11).
Segundo Porto (2009) a aprendizagem é entendida como aquisição de
conhecimento é um aspecto psicológico que será entendido como pensamento,
juízo ou raciocínio. O aspecto intelectivo da aprendizagem supõe abstração,
comparação e a diferenciação que viabiliza o ato de pensar e conduz a resolução
antecipada de problemas. O “livre jogo de idéias” acontece de forma quase lúdica,
sem pressões. “Em uma situação de conflito ou de tensão psicológica, a
sobrecarga de energia psíquica bloqueia ou, por vezes paralisa ação do
pensamento”. As diferentes áreas do conhecimento recebem contribuições dos
diversos enfoques das teorias da aprendizagem.
Porto (2009) confirma que a afetividade é um regulador de ações que
influenciam na escolha de objetivos, na valorização de determinados elementos.
Expressividade e comunicação se incluem na dimensão afetiva. A relação
existente entre aspectos cognitivos e afetivos tanto da quanto na constituição do
sujeito devem ser compreendida através do processo psicológico. A motivação
para aprender está ligada à consciência do individuo e aos aspectos
inconscientes de seu aparelho psíquico.
“A aprendizagem constitui-se em um processo, uma função, que vai além da aprendizagem escola e que não se circunscreve exclusivamente à criança. A aprendizagem, como experiência, guarda um elemento universal do homem, na medida em que permite a transmissão do conhecimento por meio desse processo, garante a semelhança e a continuidade do coletivo, ao mesmo tempo permitindo
41diferenciação e a transformação. O aprender envolve simultaneamente a inteligência, os desejos e as necessidades e, por meio do cognitivo, busca-se generalizar, classificar, ordenar, identificando-se semelhanças, enquanto que, por meio dos desejos e das necessidades, buscam-se o individual, o subjetivo e o diferente” (p.14).
Configura-se então uma relação do sujeito com o conhecimento e o significado de
aprender. A aprendizagem se efetiva por meio da ação da pessoa que transforma
e reproduz as informações em função dos recursos próprios. Ela está relacionada
ao desenvolvimento psicológico, é também o produto da interação que se
modifica influenciando as próximas etapas do desenvolvimento que serão
experimentadas pelo sujeito. Um dos indicadores da capacidade de aprender está
relacionado ao padrão de adaptação da criança. Os alunos precisam estar
envolvidos na construção de significados para que a aprendizagem se efetive.
Segundo a autora:
“Para se poder ensinas bem, é necessário conhecer os modelos mentais que os alunos utilizam na compreensão de mundo que os rodeia e os pressupostos que suportam esses modelos. Aprender é construir o seu próprio significado e não encontrar as “respostas certas” dadas por alguém” (p.16).
A aprendizagem tem início com o nascimento do ser humano e se prolonga
até a morte. A aprendizagem leva o individuo a viver de acordo com o que ele
aprende.
A explicação de Porto (2009) sobre a diferença entre percepção e
inteligência na visão de Piaget afirma que percepção é o processo referente ao
conhecimento dos objetos. Inteligência possibilita ao conhecimento dos aspectos
e movimento do objeto mesmo sem contato direto. Compreender significa captar o
sentido ou aprender uma rede de significações. O aluno é capaz de apreender
42cada passo do processo mental de cada conteúdo desde que o conteúdo tenha
sentido para ele, ou seja, vinculado com a vida cotidiana.
3 . 3 Discutindo dificuldades de Aprendizagem Porto (2009) considera que as dificuldades de aprendizagem podem levar o
aluno não só ao fracasso escolar, mas ao fracasso de vida. O desafio é rever as
práticas envolvendo todo elenco que participa do processo educacional. Entra em
cena a psicopedagogia. Os estudos revelam a patologização do cotidiano escolar
onde as resoluções dos problemas se deslocam do político-pedagógico, para as
soluções medicas, psíquicas e fonoaudiológicas. As dificuldades de aprendizagem
configuram um dos maiores desafios educacionais e clínicos. Para a autora o
sucesso individual está diretamente ligado ao desempenho escolar.
“As dificuldades especiais de aprendizagem se referem àquela situação que ocorre com crianças que não conseguem acompanhar um grau de adiantamento escolar compatível com sua capacidade cognitiva. Muitas crianças em fase escolar apresentam certas dificuldades em realizar certas tarefas, que podem surgir por diversos motivos, como proposta pedagógica, capacitação do professor, problemas familiares, déficits cognitivos entre alunos motivos” (p.56).
Vários termos envolvem as dificuldades de aprendizagem para a autora:
dificuldade que o aluno apresente em alguma matéria, falta de motivação, baixa
estima. Alguns casos podem ser resolvidos com um suporte intra e extra-escola.
Os sujeitos com dificuldades de aprendizagem deveriam ser identificados por meio
de: “Uma gama de atributos e características cognitivas e comportamentais que
deveria construir uma “taxonomia educacional” e consubstanciam com
propriedade uma definição teórica estável”.
Fonseca (1995) define o termo:
43
“Dificuldades de aprendizagem é um termo geral que se refere a um grupo heterogêneo de desordens manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e utilizações da compreensão auditiva, da fala, da leitura, da escrita e do raciocínio matemático. Tais desordens, consideradas intrínsecas ao individuo, presumindo-se que sejam devidas a uma disfunção do sistema nervoso central, podem ocorrer durante toda a vida. Problemas na autorregulação do comportamento, na percepção social e na interação social podem existir com as dificuldades de aprendizagem ocorrem com outras deficiências (por exemplo, deficiência sensual, deficiência mental, distúrbios socioemocionais) ou com influências extrínsecas (por exemplo, diferenças culturais, insuficientes ou inapropriada instrução etc.), elas não são resultados dessas condições” (p.71).
Porto (2009) relata a falta de consenso para a definição das dificuldades de
aprendizagem. O enfoque está no individuo que não alcança o nível que é
esperado a partir do seu potencial intelectual, e não está numa boa pedagogia e
num professor eficiente. As dificuldades significativas entre a inteligência e o nível
da linguagem, na leitura e escrita podem apresentar-se somadas a outros termos
tais como transtornos do desenvolvimento, da conduta da personalidade. As
dificuldades de aprendizagem:
“Trata-se de um conjunto de condições e de problemas heterogêneos e de uma diversidade de sintomas e de atributos que obviamente subentendem diversificadas e diferenciadas respostas clínico educacionais” (p.59).
Oliveira (2002) chama a tenção à diferença entre dificuldade de
aprendizagem e transtorno.
44“A presença de uma dificuldade de aprendizagem não implica necessariamente m um transtorno, que se traduz por um conjunto de sinais sintomatológicos que provocam uma serie de perturbações no aprender da criança, interferindo no processo de aquisição e manutenção, de forma acentuada. Os transtornos da aprendizagem compreendem uma inabilidade especifica como de leitura, escrita, matemática entre outros fatores” (p.62 e 63).
Smith e Strick (2001) o termo dificuldade de aprendizagem:
“Refere-se não a um único distúrbio, mas a uma ampla gama de qualquer problema que podem afetar qualquer área do desempenho acadêmico. Raramente, elas podem ser atribuídas a uma única causa: muitos aspectos diferentes podem prejudicar o funcionamento cerebral, e os problemas psicológicos dessas crianças freqüentemente. São complicados, até certo ponto, por seus ambientes doméstico e escolar. As dificuldades de aprendizagem podem ser divididas em tipos gerais, mas uma vez que, com frequência, ocorrem em combinações – e também variam imensamente em gravidade - pode-se muito difícil perceber o que os estudantes agrupados sob esse rótulo têm em comum” (p.15).
3 . 4 O “olhar” Psicopedagógico Porto (2009) discute a intervenção reeducativa tradicional que se utilizam de
pontos que dão atenção ao produto e pouca atenção ao processo ensino-
aprendizagem.
“Os métodos pedagógicos – reeducativos de leitura, escrita (ortografia) e de cálculos tendem a ser impíricos e, por vezes, inconscientes e ambíguos, sem teoria ou racional aprofundado que os enquadre. Freqüentemente apresentam-se sem objetivos, sem estratégias de mediatização e de interação, sem conteúdos psicolingüísticos (fonológicos,
45semânticos, sintáxicos etc.) e sem rotinas psicofuncionais, cognitivas e metacognitivas compensativas e subaquisição da leitura: sintaxe, analise, compreensão, ideação etc) bem como sem estratégias de intervenção de informação, sem reforços sociais, sem técnicas de comportamento e sem enfoque direto em outras variáveis significativas de aprendizagem” (p.63).
Segundo Porto (2009) o conjunto de aptidões que trabalham
simultaneamente para que a escrita ocorra são:
“a) discriminação auditiva; b) composição e decodificação dos sons; c) discriminação visual; d) organização e orientação dos elementos no espaço; e) seqüência temporal; f) coordenação dos movimentos finos; g) conhecimento e controle do próprio corpo; h) noção de lateralidade” (p.64).
Para Porto (2009) classificar os distúrbios que prejudicam a aprendizagem
torna-se tarefa difícil, pois não existe uma definição do que seja distúrbio de
comportamento ou o que seja um comportamento considerado normal. As
definições sobre mudanças ou variações será relativa sempre ao ambiente sócio-
histórico-cultural do sujeito. Ele será considerado normal se agir com as mesmas
características de comportamento da maior parte dos elementos do grupo caso
contrário será considerado anormal. Diversas são as causas que originam todos
os distúrbios (da fala, da audição, do comportamento etc.). No entanto todos eles
se constituem em obstáculos que impedem ou prejudicam a aprendizagem. Os
profissionais de saúde como médicos, psicólogos tem interesse pelas origens dos
distúrbios, seus sintomas e seu provável tratamento. O educador se preocupa
com a aprendizagem.
O foco desse trabalho não se constitui na exposição pormenorizada de todos
os distúrbios da aprendizagem, o que demandaria longa discussão. Serão
46abordados de forma sucinta, apenas para melhor compreensão, os distúrbios que
encontramos na sala de aula com mais frequência e que constituem obstáculos à
aprendizagem.
As definições utilizadas por Porto (2009) descrevem:
“Disgrafia - É a dificuldade na utilização dos símbolos gráficos para exprimir idéias. Caracteriza-se pelo traçado irregular das letras e pela má distribuição das palavras no papel. Disortografia – É a incapacidade de apresentar uma escrita correta, com o uso adequado dos símbolos gráficos. Discalculia – É o termo usado para indicar dificuldade em matemática. Dislexia – É a incapacidade de aprender a ler de um individuo que possui a capacidade intelectual necessária. A dislexia representaria um tipo especial de maturidade cerebral, na qual se atravessaria a função de reconhecimento verbal. Distúrbios da Motricidade – Os transtornos psicomotores compreendem as funções psíquicas e neurológicas, além de um atraso na maturação do sistema nervoso central. Hiperatividade – É um dos distúrbios mais freqüentes em crianças com transtornos motores. A hiperatividade é uma perturbação psicomotora” (p.65,66,68).
Para Porto (2009) a Sindrome de Déficit de Atenção em Hiperativos – TDAH
– a partir da filtragem os estímulos interessantes formam o sujeito consciente. O
que ocorre numa formação imatura é que todo tipo de estimulo é absorvido
impedindo assim a formação de um foco de atenção. Sujeitos co TDAH
apresentam simultaneamente problemas de hiperatividade, impulsividade e
desatenção em diferentes graus de intensidade. A autora discute:
“Distúrbios da Fala: Gagueira – Esses distúrbios prejudicam muito a aprendizagem, principalmente da leitura.
47Distúrbios Emocionais – A angustia e a depressão podem aparecer na infância. É principalmente a sensação de insegurança que mais perturba a criança” (p.72,73).
As autoras Smith e Strick (2001) apontam alguns comportamentos que
observados em sujeitos com dificuldades de aprendizagem: fraco alcance de
atenção, dificuldades para seguir instruções, imaturidade social, dificuldades de
conversação, inflexibilidade, fraco planejamento e habilidades de organização,
distração, falta de destreza e falta de controle dos impulsos. Tais comportamentos
surgem a partir das mesmas condições neurológicas que ocasionam problemas
de dificuldades. As autoras recomendam que o trabalho do profissional de
educação em reconhecer e identificar as dificuldades de aprendizagem nos
alunos envolve tempo de observação, entrevistas e avaliação individualizadas. A
participação familiar é fundamental no processo de desenvolvimento do aluno
com dificuldades de aprendizagem. Os responsáveis não deverão exitar em
solicitar uma intervenção precoce. Faz-se necessário estabelecer uma parceria
entre família e escola. No sentido ajudar o professor da criança identificar as
habilidades que apresentam atrasos. Ao identificar as dificuldades o professor
pode intensificar uma instrução adicional para melhor desenvolvimento da
criança. Utilizar diferentes métodos e materiais diversificados de instrução ou até
mesmo reduzir o ritmo da instrução e manter seu foco sobre as habilidades mais
necessárias ao sucesso de uma construção sólida de aprendizagem.
3 . 5 Intervenção Psicopedagógica Porto (2009) relata que a Psicopedagogia no Brasil vem sendo desenvolvida
desde a década de 80. É um campo novo de estudos voltado para o atendimento
de sujeitos que apresentam problemas de aprendizagem; Ela não se constitui uma
ciência e tem o objetivo de atender a essa demanda. A autora define:
48“ A Psicopedagogia vai além da aplicação da Psicologia à Pedagogia, pois não pode ser vista sem um caráter interdisciplinar, que implica a dependência da contribuição teórica e prática de outras áreas de estudos para se constituir como tal. Por outro lado, a Psicopedagogia não é apenas o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem, visto que não se limita à aprendizagem da criança, mas abrange todo o processo de aprendizagem e, conseqüentemente, inclui quem está aprendendo, independente de ser criança, adolescente ou adulto. Psicopedagogia é um campo de atuação que integra saúde e educação e lida com o conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, suas distorções, suas diferenças e seu desenvolvimento por meio de múltiplos processos” (p.17,18).
Segundo Porto (2009) o papel do psicopedagogo é auxiliar o sujeito a
desenvolver condições para obter prazer em desempenhar e realizar o trabalho e
as tarefas sozinho. O profissional precisa muito mais que o bom manejo de
técnicas pedagógicas. O tratamento psicopedagógico é sintomático, por tanto o
sintoma deve ser investigado, ou seja, realizado um rastreamento minucioso, para
que haja a elaboração de hipóteses, análise e síntese. Ao compreender o sintoma
e seu significado, o desafio se constitui em seu deslocamento. Quando aprender
não significa mais uma ameaça ao paciente; dá-se início ao processo de
reeducação.
Lamonico (1992) afirma que o termo Psicopedagogia é utilizado em países
europeus ao referir-se à Psicologia dos processos ligados à aprendizagem e
ensino.
“ Originalmente, esta área surgiu das vinculações entre Psicologia e Pedagogia, tendo como objeto de estudo a pessoa a ser educada, seus processos de desenvolvimento e as alterações de tais processos, visando resolver os problemas de aprendizagem, mediante atendimento individual e terapêutico. Hoje, ela tende a ampliar-se para
49uma realidade institucional, quer seja escolar, hospitalar ou outra, atingindo faixas etárias mais diversas” (p.15).
Para Lamonico (1992) alguns princípios que devem nortear a atuação do
psicopedagogo utilizam a afetividade como incentivador da aprendizagem, facilitar
a aprendizagem respeitando o ritmo de desenvolvimento do sujeito, criar
condições ambientais no sentido de motivar o aluno para aquisição de
aprendizagem como leitura e escrita, considerar que os processos cognitivos
estão atrelados às condições psiconeurológicas e são direcionados pela emoção,
afetividade e valores culturais; desmitificar crenças e valores relacionados ao
ensino que descaracterizam o processo educativo como um todo. A formação do
psicopedagogo é multidisciplinar, reúne conhecimentos de diversas áreas e
estratégias pedagógicas e psicológicas que o torna habilitado a lidar com certos
fenômenos ligados à aprendizagem.
“Em síntese o Psicopedagogo irá atuar, preferencialmente, junto ao corpo docente com base nos conhecimentos e princípios da Psicopedagogia, a fim de garantir o alcance dos desempenhos esperados na organização curricular evitam os altos índices de repetência das escolas da periferia” (p.20).
O campo teórico correspondente às dificuldades de aprendizagem pode ser
agrupado segundo Lamonico (1992) em os que se prendem as bases científicas e
/ ou técnicas do problema e enfocam atendimento clinico terapêutico e individual.
O outro grupo que busca estudar o problema em seus aspectos fisiológicos e
sociais enfoca o atendimento institucional, incentivando o trabalho preventivo.
“ Pertencem ao primeiro grupo as propostas dos neurologistas Myklebust e Johnson sobre os distúrbios de aprendizagem, a tese do psicólogo behaviorista Allan O. Ross sobre distúrbios de aprendizagem e a teoria da Epistemologia Convergente sobre os obstáculos da aprendizagem, de Jorge Visca. O segundo grupo, fazem
50parte o estudo sobre aconselhamento escolar ao aluno difícil de Masini (1984), os trabalhos referentes às relações existentes entre o fracasso escolar e a desnutrição, o mito da privação cultural etc.” (p.21).
Para Lamonico (1992) a abordagem afetiva Epistemologia Convergente de
Jorge Visca elaborou a abordagem teórica-técnica baseado nas escolas
psicanalítica, piagetiana e em Enrique Pichon Riviére da psicologia social. Seus
postulados são as interações da organização biológica com o meio, a totalidade
indiscriminada se diferencia em sistemas e a personalidade possui unidade
funcional não estrutural. Em relação à aprendizagem o sistema evolutivo se
divide em quatro níveis: proto e deutro –aprendizagem e aprendizagem
assistemática e sistemática. A aprendizagem ocorre pela tematização dos
esquemas de ação e aspectos estruturais; todo o processo de aprendizagem
responde a princípios estruturais, construtivistas e interacionistas. Os obstáculos
de aprendizagem estão ligados a certas funções ou capacidades: Pichon Riviére
denomina de obstáculos de aprendizagem que se forem inadequados dificultam
ou impedem a mesma. O obstáculo epistemológico mais ligado à estrutura
cognoscitiva (lentificação, parada no desenvolvimento, defasagem etc.) e
também a competência definem as possibilidades de desempenho. Obstáculo
funcional se refere a uma hipótese auxiliar ou às diferenças funcionais. A
pesquisa investigativa prossegue com o levantamento diagnóstico numa consulta
inicial e termina com a devolução das informações, nas quais constam as
hipóteses sobre o estado futuro adotado pelo atual fenômeno. O tratamento
segue três etapas: aprendizagem lúdica, semi-real e real. A aprendizagem lúdica
é realizada por meio dos jogos que correspondem à faixa etária do individuo. Há
a aprendizagem consciente e inconsciente. É uma atividade criativa e curativa;
permite o sujeito viver e reviver situações conflituosas que viveu passivamente e
modificar os entraves dolorosos.
Porto (2009) relata:
51 “São transtornos derivados da vida e de relações e que apresentam sintomas móveis na infância e adolescência. Esses sintomas funcionam como mecanismos de defesa e aparecem em situação de conflito, indicando que há um sofrimento, que algo precisa ser modificado para que o sujeito prossiga o curso do desenvolvimento. É importante que o psicopedagogo possa jogar o jogo da criança, sem, no entanto perder de vista o seu compromisso com a aprendizagem e lembrando que toda relação do sujeito com o mundo, depois que deixa de ser conseqüência de um reflexo, demanda aprendizagem” (p.84).
A aprendizagem semi-real, Lamonico (1992) descreve como atividades da
área escolar que estão fora do conflito do sujeito. E aprendizagem real, nesta
etapa o sujeito, mais seguro de suas capacidades deverá perceber que seus
erros são aceitos e que fazem parte do processo de aprendizagem. A
Abordagem Fenomenológica Aconselhamento ao Aluno Difícil, de Masini (1984),
a autora afirma que toda teoria busca consolidar o sujeito de trabalho o homem
social e político. A criança traz experiência que podem ser usadas como ponto de
partida para aquisições de manifestações diversas. O significado é considerado
como um produto “fenomenológico” do processo de aprendizagem. O significado
potencial converte em conteúdo significativo de acordo com cada individuo. A
proposta segundo a autora é de compreender dois conceitos: a aprendizagem
totalizante – refere-se à tentativa de compreender o homem em sua totalidade. O
segundo conceito: problemas de aprendizagem refletem um bloqueio na
comunicação do aluno com o mundo. A análise do erro junto ao sujeito é o ponto
crucial nesta teoria. A orientação psicopedagógica ao catalisar as experiências e
reflexões dos sujeitos, possibilitando-os a assumirem seus próprios caminhos.
52 Conclusão O presente trabalho foi desenvolvendo a partir da importância do tema
escolhido, sendo enriquecedor e indispensável para se entender a seriedade do
“olhar” psicopedagógico mediante as dificuldades de aprendizagem na classe de
alfabetização. Assim há o entendimento de que alfabetização se constitui uma
fase de peculiar importância na vida do sujeito.
A alfabetização não pode ser vista como uma atividade secundária,
desprezando seu impacto em relação do seu efeito na vida escolar da criança.
Lamentavelmente, alguns educadores esquecem que o aluno é um ser
criativo, único em suas peculiaridades, independente, que necessita construir seu
conhecimento e fazer suas descobertas de modo prazeroso e espontâneo. Por
meio de um trabalho lúdico na alfabetização, a criança poderá ter possibilidades
para aprender a ler e escrever, sem “sofrer” com os entreves das dificuldades de
aprendizagem evitando possíveis complicações ao longo do processo.
O trabalho lúdico na alfabetização, essencialmente, além de contribuir e
influenciar na educação da criança possibilitando aprendizagem por meio do
letramento e possibilita também um processo de conscientização do uso da
palavra.
A utilização de jogos, brinquedos e brincadeiras assumem um importante
lugar na alfabetização para a formação do aluno, pois permite o acesso entre o
real e a fantasia simultaneamente, permitindo-o agir, criar, sentir, pensar, aprender
a lidar com seus erros além de tudo desenvolver-se pessoalmente. Tais
atividades, por fazerem parte do universo infantil, oferecem condições ideais de
aprendizagem.
Além disso, ressalta-se a importância do psicopedagogo como um mediador
de aprendizagem. Identificando e compreendendo as metodologias e hipóteses
construídas pela própria criança, no momento da alfabetização, direcionando as
atividades de modo a auxiliá-la no enfrentamento das dificuldades inerentes ao
53processo. Cabe também ao psicopedagogo criar oportunidades de contato da
criança com objetos de leitura, escrita e jogos, que proporcione espaços de
metacognição, troca e interação.
Para planejar a intervenção é necessário identificar as necessidades da
criança e nada melhor observá-la através das brincadeiras. O psicopedagogo
deve refletir, buscar alternativas para as questões sobre dificuldades de
aprendizagem, tanto a partir de sua prática, quanto nas pesquisas, aprofundando
seus saberes sobre a teoria.
Enfim, este trabalho teve como um dos principais objetivos refletir sobre o
“olhar” que o psicopedagogo precisa ter sobre a criança, como sujeito no centro
do processo de aprendizagem e a necessidade de uma proposta lúdica de
educação principalmente quando relacionada à alfabetização. Assim sendo, torna-
se criterioso a entrada efetiva do lúdico no trabalho de alfabetização. Para isso, é
necessário que todos os profissionais de educação se interessem e busquem
priorizar cada vez mais, na escola a importância do trabalho do psicopedagogo no
desenvolvimento e na aprendizagem de todos os sujeitos envolvidos no processo
educacional.
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57
ÌNDICE FOLHA DE ROSTO................................................................................................02 AGRADECIMENTOS..............................................................................................03 DEDICATÓRIAS.....................................................................................................04 RESUMO................................................................................................................05 METODOLOGIA.....................................................................................................06 SUMÁRIO...............................................................................................................07 INTRODUÇÃO........................................................................................................08 CAPÍTULO I EDUCAÇÃO LIBERTADORA................................................................................10 I. 1- PAULO FREIRE E A EDUCAÇÃO LIBERTADORA.......................................10 I. 2- EDUCAÇÃO BANCÁRIA X EDUCAÇÃO PROBLEMATIZADORA................16 CAPÍTULO II ALFABETIZAÇÃO..................................................................................................19 2.1 - CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO..............................................................19 2.2 - OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO...........................................................20 2.3 MODELO DE LETRAMENTO...........................................................................25 2.4 - MODELO AUTÔNOMO DE LETRAMENTO..................................................27 2.5 - MODELO IDEOLÓGICO DE LETRAMENTO.................................................28 CAPÍTULO III
58 DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM.................................................................33 3.1 – CONCEITOS DA NEUROCIÊNCIA...............................................................33 3 . 2 – DEFININDO O QUE É APRENDIZAGEM...................................................39 3 . 3 – DISCUTINDO DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM...............................42 3 . 4 – O “OLHAR” PSICOPEDAGOGICO.............................................................44 3 . 5 – INTERVENSÃO PSICOPEDAGOGICA......................................................47 CONCLUSÃO.........................................................................................................52 BILBIOGRAFIA CONSULTADA............................................................................54 ÍNDICE....................................................................................................................57 FOLHA DE AVALIAÇÃO........................................................................................58
59
FOLHA DE AVALIAÇÃO NOME DA INSTITUIÇÃO: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES – INSTITUTO VEZ DO MESTRE TITULO DA MONOGRAFIA: DICULDADES DE APRENDIZAGEM NA CLASSE DE ALFABETIZAÇÃO: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO AUTOR: ROSANE COELHO DA ENCARNAÇÃO DATA DA ENTREGA: AVALIADO POR: CONCEITO: