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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO
ENSINO-APRENDIZAGEM
Por: Luciana Chaves de Miranda
Orientadora
Prof. Mary Sue
Rio de Janeiro
2007
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO
ENSINO-APRENDIZAGEM
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em
Psicopedagogia.
Por: Luciana Chaves de Miranda
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AGRADECIMENTOS
Aos meus pais que sempre me
incentivaram. Ao meu marido e meu
filho que me apoiaram durante todo o
curso.
A Deus por iluminar minha caminhada.
A minha orientadora pela ajuda e troca
de experiências durante o trabalho.
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“O nascimento do pensamento é
igual ao nascimento de uma criança:
tudo começa com um ato de amor.
Uma semente há de ser depositada
no ventre vazio. E a semente
do pensamento é o sonho.”
Rubem Alves
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DEDICATÓRIA
Ao meu filho Leonardo por fazer parte da
minha vida e por dar sentido a tudo o que
faço.
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RESUMO
As controvérsias sobre problemas e dificuldades de aprendizagem, a
busca de definições claras e consistentes, atravessam os anos e fronteiras sem
uma resposta satisfatória.
Os frutos da educação já não podem se resumir a conhecimentos
acumulados, mas devem avaliar-se nas experiências de aprendizagem e na
competência para continuar aprendendo. Por isso, nós educadores devemos
ter sensibilidade ao promover a motivação mais adequada para que a
aprendizagem realmente aconteça, em toda a sua plenitude, tornando o
educando um ser humano capaz de transformar a sociedade.
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METODOLOGIA
O estudo será realizado com um enfoque teórico, através de pesquisas
bibliográficas de autores conceituados, bem como as vivências adquiridas no
decorrer da minha jornada como educadora do Ensino Fundamental I.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO 1 - A Educação
1.1 – O que é a educação 11
1.2 – Educação e sedução 15
CAPÍTULO 2 - Dificuldades de Aprendizagem 2.1 – Dificuldades de aprendizagem e problemas motivacionais 19 2.2 – Estratégias de aprendizagem 23 2.3 – Aspectos afetivos das dificuldades de aprendizagem 27
CAPÍTULO 3 - O enlace desejo-inteligência na aprendizagem 32 CONCLUSÃO 36 BIBLIOGRAFIA 39
ÍNDICE 41
FOLHA DE AVALIAÇÃO 42
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INTRODUÇÃO
Segundo Paulo Ronca (1998), nós educadores, devemos pensar que
educação deve significar reavaliar, redefinir, refletir sobre si mesmo, buscando
assim, a possibilidade de compreensão do educar, do fazer pensar e do
estimular. Isto é, o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro podem
estar relacionados a esse desejo de aprender e não só de ensinar.
A afetividade deve estar diretamente ligada a esse desejo de aprender.
Educadores e educandos devem estar envoltos num clima emotivo, equilibrado
e seguro, para que possam estabelecer relações afetivas de respeito mútuo e
confiança.
O ambiente pedagógico tem de ser lugar de fascinação e inventividade.
Não podemos inibir, mas sim propiciar aquela dose de alucinação consensual
entusiástica necessária para que o processo ensino-aprendizagem possa
acontecer.
É importante reintroduzir na escola o princípio de que toda
morfogênese do conhecimento tem algo a ver com a experiência do prazer.
Quando esta dimensão está ausente, a aprendizagem vira um processo
meramente instrucional.
Informar e instruir saberes já acumulados pela humanidade é um
aspecto importante da escola, e deve ser de qualidade, mas a experiência de
aprendizagem implica, além da instrução informativa, a reinvenção e
construção personalizada do conhecimento. E nisso o prazer representa uma
dimensão-chave.
Reencantar a educação significa colocar a ênfase numa visão da ação
educativa como produção de experiências de aprendizagem.
Como diz Piaget (1972, Discurso), o papel do mestre deve ser aquele
de incitar à pesquisa, de fazer tomar consciência dos problemas e não aquele
de ditar a verdade. Não podemos nos esquecer que uma verdade imposta não
é mais uma verdade: compreender é inventar e reinventar e, dar uma lição
prematuramente, é impedir a criança de inventar e redescobrir as soluções por
si mesma.
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A escola deve considerar que os anos de formação que nela
acontecem não são meros momentos de construção de novos conhecimentos.
Trata-se de uma vida palpitante, cheia de vicissitudes, de dores e de prazeres.
Mais do que saber dar respostas para as questões de hoje, o aluno
deve ser incentivado ao exercício do próprio pensamento, o que o torna apto a
enfrentar as questões que aparecerão no decorrer de sua vida.
Mais do que ser preparado para os desafios de hoje, a escola tem a
função de deixar o aluno criativamente apto para enfrentar o seu futuro. Não se
trata propriamente de ensiná-lo, mas prepará-lo para os desafios de hoje e
principalmente os futuros.
O ato de educar envolve sedução e deve estar a serviço do
desenvolvimento e do bem estar do homem.
Tendo isto assegurado, o aluno terá condições de desenvolver atitudes
autônomas, agir com mais espontaneidade e controle sobre as situações que
aparecerem em sua vida cotidiana.
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CAPÍTULO I
A EDUCAÇÃO
“ O Homem prolonga-se para além do espaço e do
tempo, num outro mundo. E deste, que é ele próprio,
pode, se assim quiser, percorrer os ciclos infinitos. O ciclo
da Beleza que contemplam os sábios, os artistas e os
poetas. O do Amor, que inspira o sacrifício, o heroísmo e
a renúncia. O da Graça, recompensa suprema daqueles
que apaixonadamente buscaram o princípio de todas as
coisas (...). Chegou o momento de começar a obra da
nossa renovação. Mas não lhe estabeleceremos o
programa porque um programa asfixiaria a realidade viva
numa armadura rígida, impediria o jorrar do imprevisível, e
fixaria o futuro nos limites do nosso espírito.”
(ALEXIS CARREL)
1.1 – O que é a educação
No resgate de um passado pleno, o mundo hoje torna-se significativo.
Então, faz-se necessário perceber que o investimento afetivo nas inúmeras
relações que se estabelecem, como adulto/criança, professor/aluno,
mestre/discípulo, mãe/bebê, construirão não somente o físico deste ser
humano, mas acima de tudo o homem-ser, capaz de inventar, criar, renovar e
descobrir.
A educação deve ser pensada não através de suas diversas
disciplinas, mas principalmente como meio de promover a própria vida,
apropriando-se dela com as próprias mãos.
Passamos anos de nossas vidas prestando atenção apenas ao
professor, sem alguém jamais prestar atenção em nós.
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Quando falamos sobre inteligência e aprendizagem precisamos nos
referir também à emoção, às ligações e inter-relações afetivas. Seria
impossível entender o desenvolvimento da inteligência sem um
desenvolvimento integrado e convergente cada vez maior de nossos interesses
e amores por aquilo que olhamos, tocamos e que nos alimenta a curiosidade.
Claparède (1954), ao se referir à curiosidade e ao interesse, diz que a
escola não deve esperar que as crianças façam tudo o que querem, mas que
elas queiram tudo o que fazem e que ajam e não sejam forçadas à ação (...) O
que se deve fazer é explorar seus interesses, ligar a eles, isto é, à sua vida o
que se deseja ensinar. A didática deve transformar os fins futuros a que visam
os programas escolares em interesses presentes para a criança.
É importante pensar na educação e no papel da escola sob três
aspectos:
• A educação é um processo que deveria permitir ao indivíduo chegar a
ser sujeito de sua ação e de suas abstrações e não o objeto de outro
sujeito. O sujeito graças a sua capacidade de assimilar e acomodar se
auto-constrói, se auto-transforma e se auto-regula.
• A educação é o meio pelo qual o homem pode construir-se como pessoa
plena em termos de ser e não de ter. Por isso a escola deve priorizar o
ser e não o ter (não somente ter informações, mas agir sobre elas).
• A educação é uma iniciação à crítica, à interpretação e à transformação
do mundo, inovando-o.
O principal objetivo da educação seria criar homens capazes de inventar
coisas novas e não apenas meros repetidores daquilo que outras gerações
fizeram. A meta deveria ser formar homens criativos, inventivos e
descobridores; pessoas capazes de criticar, que vão em busca de verificação e
não aceitam tudo o que lhes é imposto.
Temos necessidade de alunos ativos, que aprendam a descobrir por conta
própria, por um lado através de sua atividade espontânea e por outro por meio do
material colocado por nós à sua disposição.
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Esse processo é uma conquista árdua e difícil, pois para criticar e resistir
individualmente são precisos muitos conhecimentos específicos e coragem moral.
A educação deveria ser vista como uma via para a doação do homem a
si mesmo, um trabalho de amor, dando ao próprio homem aquilo que lhe
pertence, ou seja, sua capacidade de inventar, criar, fazendo coisas novas,
criticando o que já existe, buscando novos caminhos e aprendendo a descobrir
por ele mesmo, sentado comodamente no banco de sua própria segurança,
confiando na sua espontaneidade e tendo a coragem de ser.
É preciso haver uma transformação quase completa sobre o conceito e a
significação de educação. Educação não é uma transmissão do conhecimento,
de um saber ou até mesmo de uma conduta, mas, sobretudo uma iniciação à
vida.
Para que uma educação seja válida, toda a ação
educativa deverá necessariamente ser precedida de
uma reflexão sobre o homem, e uma análise
profunda do meio de vida concreta daquele que se
quer educar. Sem esta reflexão sobre o homem,
arriscamos a adotar métodos educativos e de agir de
tal modo que o homem ficaria reduzido à condição
de objeto. Sem a análise do meio cultural e concreto,
corremos o risco de realizar uma educação pré-
fabricada e castradora. Para ser válida, a educação
deverá levar em conta que o fator primordial do
homem, sua vocação ontológica, é aquela de Ser-
Sujeito e nas condições em que ele vive; em um
lugar preciso, em um momento e num certo
contexto. (Freire, 1974, p.37).
A vida nos propõe atitudes de constante transformação, compreendendo
as necessidades do momento e do tempo dos indivíduos perante os problemas
sempre novos que se apresentam.
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A educação deve ter uma certa sensibilidade com isso, pois quando nos
colocamos diante de uma criança devemos pensar em como prepará-la para
viver daqui a vinte ou trinta anos. Não podemos encaminhá-la para lições,
informações e soluções que são válidas somente para hoje.
É preciso preparar a pessoa para a vida e não para o mero acúmulo de
informações.
1.2 – Educação e sedução
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Educar tem tudo a ver com sedução. Educador é quem consegue
desfazer as resistências ao prazer do conhecimento. Devemos seduzir para um
saber.
Educar é encantar-se e seduzir-se reciprocamente com experiências
de aprendizagem.
O educador deve tornar visível o prazer de estar colaborando com essa
coisa estupenda que é possibilitar e incrementar a união profunda entre
processos vitais e processos de conhecimento.
O educador não pode ser aquele indivíduo que fala horas a fio a seu
aluno, mas aquele que estabelece uma relação e um diálogo íntimo com ele,
bem como uma afetividade que busca mobilizar sua energia interna. É aquele
que acredita que o aluno tem capacidade de gerar idéias e colocá-las ao
serviço de sua vida.
O educador deve ser um parteiro. Um parteiro de idéias e
pensamentos. Como uma criança se origina de uma célula, um embrião, e aos
poucos é gestada e transformada em um bebê, todos nós concebemos e
fecundamos idéias que ao serem gestadas se transformam. Mas, não há
auxílio no sentido de nos ajudar a exteriorizar tais idéias e a mostrar a beleza
de nossas criações. Todo o mundo quer mostrar suas idéias e ninguém nos
auxilia a trazê-las à luz.
Esta simples metáfora mostra que assim como uma mulher “produz” o
filho no ventre, o homem (ser) produz idéias e necessita de alguém para
auxiliá-lo nesse “parto”, papel este que nos cabe como educadores.
O nosso coração e a nossa razão são, também, o “coração e a razão”
da cultura em que vivemos. A sensibilidade, a paixão, a auto-estima, a auto-
persuasão, a reflexão sobre o sentido da vida ou o sentido do sagrado, a vida-
interior, a compreensão de mundo, a mentalidade cívica, o campo neurológico
das ações da atenção, da percepção e da memorização, a análise das
experiências históricas, o silêncio, o exemplo e tantas e tantas outras
dimensões participam de uma linguagem pela qual temos que nos apropriar
para atingirmos o nosso aluno.
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A missão de um educador tenderá, pois, a ser completa se desenvolver
a “vida interior” nos jovens, e vida interior significa análises e “conversas”
sistemáticas consigo próprio, aprofundamento de pensamentos (auto) críticos e
criativos, ebulição de sentimentos e sensações.
Em uma sociedade cruelmente competitiva e tecnocrata, onde o verbo
Ter, endeusado, é mais conjugado que o verbo Ser, a afetividade passou a ser
vista e sentida de forma empobrecida. Basta abrir os olhos para percebermos
alguns de seus sinônimos, tais como amorosidade, emotividade, cordialidade,
perdem a força e diminuem o eco.
O afetivo tem função inicial e iniciadora em todo o processo cognitivo,
sendo assim é possível afirmar que afetividade e cognição são dois processos
interdependentes: um não subsiste sem o outro.
Piaget via o afeto como o motor da ação, então como motor da
inteligência e da própria existência. Vygotsky insistia em ligar conhecimentos
aos processos pelos quais o afeto e o intelecto se desenvolvem. Sendo assim,
reforçamos a idéia de que, educadores que somos, temos que desenvolver nos
nossos alunos o afeto pela escola, pelas salas de aula e pelas carteiras onde
se senta; afeto pelos professores, pelos amigos e pelo conteúdo estudado. E
todo esse processo de formação de personalidade dá-se, concomitantemente,
ao desenvolvimento da sensibilidade.
É imprescindível ver o aluno como ser individual, pensante que constrói
seu mundo, espaço e o conhecimento com sua afetividade, percepções, sua
expressão, sua crítica, seus sentidos.
A afetividade no ambiente escolar contribui para o processo ensino-
aprendizagem, considerando que o educador cria uma relação de troca, dando-
lhe atenção e cuidando para que aprenda a se expressar e tenha suas opções
próprias.
A afetividade não se dá apenas por contato físico; discutir a capacidade
do aluno, elogiar seu trabalho, reconhecer seu esforço e motivá-lo sempre, são
também formas cognitivas de ligação afetiva.
Afetividade e inteligência são fatores indissociáveis, intimamente
ligados e influenciados pela socialização.
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A afetividade é necessária na formação de pessoas felizes, éticas,
seguras e capazes de conviver com o mundo que a cerca. No ambiente escolar
é além de dar carinho, é aproximar-se do aluno, é ouvi-lo, valorizá-lo, dando
abertura para a sua expressão.
O olhar do professor para o seu aluno é indispensável para a
construção e o sucesso da sua aprendizagem.
A afetividade deve ser compreendida como substância que nutre estas
ações e não um puro ato de melosidade.
A afetividade para Wallon, é uma fase do desenvolvimento, a mais
arcaica, pois o ser humano logo que sai da vida puramente orgânica é um ser
afetivo. Portanto no início da vida, a afetividade e inteligência estão
sincreticamente misturadas, com o domínio da primeira.
A sua diferenciação logo se inicia, mas a reciprocidade entre os dois
desenvolvimentos se mantém de tal forma que as aquisições de cada uma
repercutem sobre a outra permanentemente. Ao longo do trajeto, elas alternam
preponderâncias, e a afetividade reflui para dar espaço à intensa atividade
cognitiva assim que a maturação põe em ação o equipamento sensório-motor
necessário à exploração da realidade.
Observando a criança de uma maneira contextualizada percebe-se que
a cada idade acontece um tipo de interação entre o sujeito e o ambiente, onde
a criança retira dele os recursos para o seu desenvolvimento. Assim sendo, a
criança modifica o meio e este se transforma juntamente com ela.
Wallon vê o desenvolvimento da pessoa como uma construção
progressiva em que se sucedem fases com predominância alternadamente
afetiva e cognitiva. [...] As atividades predominantes correspondem aos
recursos que a criança dispõe, no momento, para interagir com o ambiente
(Galvão, 1995, p.43).
A dimensão afetiva ocupa lugar central na psicogenética de Wallon,
tanto do ponto de vista da construção da pessoa quanto do conhecimento, pois
ambos se iniciam num período denominado por Wallon de impulso-emocional e
se estende ao longo do primeiro ano de vida. E, neste momento, a afetividade
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reduz-se praticamente às manifestações fisiológicas da emoção, que constitui,
portanto, o ponto de partida do psiquismo.
Ao nascer, o bebê depende exclusivamente da ajuda do adulto, tanto
que ele se manifesta com choro, riso, grito, para satisfazer suas necessidades.
Aos poucos, o bebê vai expressando estado afetivo de bem-estar ou mal-estar,
através de suas reações.
As reações do bebê, aos poucos vão se tornando intencionais, daí a
afirmação Walloniana de que a inteligência não se dissociou ainda da
afetividade, cuja conseqüência inevitável é que, neste momento, estimular a
primeira equivale nutrir a segunda. Portanto, a afetividade e inteligência estão
intimamente interligadas, predominando a afetividade no início da vida.
A partir daí, a história da construção da pessoa será constituída por
uma sucessão pendular de movimentos dominantemente afetivos ou
dominantemente cognitivos, não paralelos, mas integrados.
Desta forma, avançar para a afetividade depende da inteligência assim
como a inteligência depende da afetividade.
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CAPÍTULO II
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Para ser válida toda educação, toda ação educativa,
deve necessariamente ser precedida de uma reflexão
sobre o homem e de uma análise do meio de vida
concreto, do homem concreto a quem queremos educar
ou melhor: a quem queremos ajudar a que se eduque.
Se vier a faltar tal reflexão sobre o homem, corre-se o
risco de adotar métodos educativos e maneiras de agir
que reduzem o homem à condição de objeto, quando a
sua vocação é a de ser sujeito e não objeto.
Paulo Freire
2.1 – Dificuldades de Aprendizagem e Problemas Motivacionais
Evidências sugerem que um grande número de alunos possui
características que requerem atenção educacional diferenciada. Alunos com
retardo mental, com dificuldades de aprendizagem e aqueles que são
superdotados constituem-se nos principais grupos que vêm sendo foco de
ações educacionais.
No entanto, dificuldade de aprendizagem implicaria em qualquer
dificuldade observável vivenciada pelo aluno para acompanhar o ritmo de
aprendizagem de seus colegas da mesma idade, independente do fator
determinante da defasagem.
Assim sendo, dentro da categoria dificuldades de aprendizagem podem
ser encontrados, mais precisamente, alunos com: problemas situacionais de
aprendizagem (apresentando comprometimento em algumas circunstâncias e
não em outras), problemas de comportamento, problemas de comunicação
(distúrbio da fala e da linguagem), problemas físicos, de visão e de audição, e,
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por fim, problemas múltiplos (presença simultânea de mais de um dos
problemas anteriormente mencionados).
Dificuldades de aprendizagem estariam relacionadas a dificuldades dos
alunos para colocar em prática rotinas de planejamento e controle dos
processos cognitivos, envolvidos na realização de uma dada tarefa.
No Brasil, as dificuldades de aprendizagem são centrais no complexo
fenômeno fracasso escolar, caracterizado por um alto índice de repetição e de
evasão escolar.
Não há dúvida de que as dificuldades de aprendizagem só podem ser
entendidas na complexa interação entre os fatores intra e extra-escolares,
requerendo intervenções tanto no âmbito do aluno, das práticas pedagógicas e
de formação de professores, quanto no âmbito de mudanças mais amplas de
natureza política, econômica e social.
Do ponto de vista psicológico, pesquisas indicam que alunos com
dificuldades de aprendizagem apresentam descrença ou percepção distorcida
quanto à própria capacidade de realizar tarefas escolares com sucesso. Essas
percepções negativas contribuem ainda mais para aumentar as dificuldades de
aprendizagem.
Alunos motivados, geralmente, são marcados pelo interesse de busca,
pelo esforço, pela persistência e pelo engajamento em atividades acadêmicas.
Já estudantes desmotivados não se esforçam intencionalmente, resistem em
procurar ajuda e desistem facilmente diante de desafios e dificuldades.
Algumas características são mais freqüentemente encontradas em
crianças tanto com problemas motivacionais quanto dificuldades de
aprendizagem, seriam cinco tipos de crianças com disfunções motivacionais:
as defensivas, as desesperançosas, as inseguras, as satisfeitas e as ansiosas.
As defensivas seriam aquelas crianças que concentram todos os seus
esforços para que ninguém nunca interprete suas dificuldades de
aprendizagem como falta de capacidade ou de inteligência. Usam estratégias
autoprejudicadoras, como: copiar do amigo, deixar claro que não está tentando,
passar um tempo enorme com distrações, entre outras.
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Já os alunos desesperançosos nunca tentam porque partem do princípio
de que realmente não sabem fazer sem mesmo sequer olhar a tarefa. São
vistos como “burros” pelos colegas e acreditam que o fracasso é inevitável.
Com um grau elevado de descrença na própria capacidade, esses estudantes
consolidam o mais sério ciclo vicioso de nunca conseguir aprender e
desenvolver habilidades. Quando conseguem experimentar o sucesso, os
desesperançosos nunca se sentem responsáveis por ele, constituindo assim, o
tipo de problema motivacional mais disfuncional, caracterizado por um
sentimento de impotência para a aprendizagem.
Os satisfeitos e os inseguros são, em geral, muito inteligentes. Enquanto
os satisfeitos sempre se contentam com pouco e nunca fazem nada a mais do
que o mínimo, os inseguros evitam envolver-se em tarefas que, embora
desafiantes, não têm garantia de 100% de sucesso.
Os ansiosos, por sua vez, são alunos que em geral entram em pânico
em determinadas disciplinas, passam mal, por exemplo, em aulas de
matemática, não conseguem se concentrar nas explicações fornecidas pelos
professores e distraem-se facilmente com pensamento auto depreciativos.
Muitas vezes as dificuldades de aprendizagem são agravadas por
problemas motivacionais e os problemas motivacionais também se traduzem
direta ou indiretamente em dificuldades de aprendizagem, tornando-se, muitas
vezes, a discriminação correta dos problemas, uma tarefa árdua, mesmo para
os especialistas.
Cognição e afeto são fatores-chave na compreensão e no sucesso do
funcionamento do indivíduo. É certo que uma disposição afetiva positiva para
aprender manifesta-se através de atitudes, interesses e confiança em suas
capacidades cognitivas, facilita a aprendizagem, possibilitando aos indivíduos
atingir um melhor desempenho, além de aumentar a rapidez de ocorrência de
novas aprendizagens, em comparação com os alunos que se encontram sem
entusiasmo e desinteressados.
As relações entre o desempenho acadêmico e disposições afetivas têm
sido estudadas, segundo Bloom (1981), enfatizando-se dois pontos básicos: a)
tentativa de estabelecer relações entre certas características afetivas e o
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desempenho acadêmico; e b) investigações de características afetivas e a
possibilidade de predição do desempenho a partir dessas. Um terceiro ponto,
segundo Bloom, importante de ser explorado, mas para o qual ainda não se
encontra dados de pesquisa, trata das relações causais entre as características
afetivas e o processo de aprendizagem.
Essa lacuna, apontada por ele em 1981, encontra-se presente até hoje e
muitas questões continuam em aberto na discussão sobre as relações entre o
domínio afetivo e cognitivo. Incertezas também pairam sobre o próprio campo
das dificuldades de aprendizagem.
A psicopedagogia tem sido identificada como a área de estudo
responsável por estudar e tentar compreender as dificuldades encontradas no
campo das aprendizagens humanas.
23
2.2 – Estratégias de Aprendizagem
Psicólogos cognitivos que se baseiam na teoria da informação apontam
para a importância das técnicas baseadas no processamento da informação,
voltadas para o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem e destinadas
à promoção do aprender a aprender. Vem sendo dada ênfase ao
desenvolvimento de estratégias que atuem nos três principais momentos do
fluxo da informação: a captação, a reestruturação e a comunicação ou
utilização da informação.
As estratégias de aprendizagem consistem num conjunto de
procedimentos que tem por objetivo facilitar a aprendizagem. Mais
precisamente, o termo estratégias de aprendizagem engloba vários tipos de
estratégias: cognitivas, metacognitivas, primárias e de apoio.
As estratégias cognitivas são seqüências direcionadas de ações que
representam mais especificamente o que nós fazemos para aprender e
lembrar.
As estratégias metacognitivas dizem respeito aos procedimentos
orientados para o planejamento e controle das atividades cognitivas. O
monitoramento e a regulação do pensamento também são atributos essenciais
dessas estratégias. Metacognição se refere ao conhecimento que as pessoas
têm dos próprios processos cognitivos e é esse conhecimento que lhes permite
o planejamento, monitoramento e controle das atividades cognitivas, bem como
lhes possibilita avaliar as chances de sucesso e modificar as estratégias
sempre que necessário.
Estratégias primárias e de apoio são outros nomes dados para designar
as estratégias de aprendizagem. Assim como as estratégias denominadas
cognitivas, as primárias são destinadas a ajudar o aluno a organizar, elaborar e
integrar a informação. Já as estratégias de apoio são voltadas para a
manutenção de um estado interno satisfatório que favoreça a aprendizagem.
Foram identificados também outros cinco tipos de estratégias de
aprendizagem: estratégias de ensaio, elaboração, organização, monitoramento
e estratégias afetivas.
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A repetição ativa, ora verbalmente, ora por escrito do material a ser
aprendido se constitui num exemplo de estratégia de ensaio simples.
Reescrever, resumir, criar analogias, tomar notas que vão além da
simples repetição, criar e responder perguntas sobre o material a ser aprendido
são ações que permitem a realização de conexões entre o conteúdo a ser
adquirido e o conhecimento prévio, caracterizando as estratégias de
elaboração.
As estratégias de organização se referem à imposição de estrutura ao
material a ser aprendido, seja subdividindo-o em partes, seja identificando
relações subordinadas ou superordenadas (topificar um texto, criar uma
hierarquia ou rede de conceitos, elaborar diagramas mostrando relações entre
conceitos).
As estratégias de monitoramento da compreensão implicam que o
indivíduo esteja constantemente com a consciência realista do quanto ele está
sendo capaz de captar e absorver o conteúdo que está sendo ensinado (tomar
alguma providência quando se percebe que não entendeu, autoquestionar-se
para investigar se houve compreensão, modificar as estratégias utilizadas, se
necessário).
A eliminação de sentimentos desagradáveis, que não condizem com a
aprendizagem, o estabelecimento e a manutenção da motivação, a
manutenção da atenção e da concentração, o controle da ansiedade, o
planejamento apropriado do tempo e do desempenho, bem como a
organização do ambiente, são consideradas estratégias afetivas.
O acesso às estratégias de aprendizagem maximiza a aprendizagem já
que possibilita que alunos diminuam suas dificuldades pessoais e aprendam a
controlar melhor os fatores ambientais que interferem no desempenho escolar
satisfatório.
Alunos com dificuldades de aprendizagem e baixo rendimento escolar,
geralmente, apresentam pouco domínio de estratégias de aprendizagem e
através delas é possível melhorar o rendimento desses alunos.
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A motivação é uma variável-chave para a aprendizagem. O professor
pode e deve contribuir para atenuar as dificuldades de aprendizagem e
aumentar a motivação de seus alunos.
As estratégias para facilitar a aprendizagem devem atuar em dois níveis
simultaneamente. Elas precisam ser específicas a ponto de auxiliar o progresso
cognitivo (sublinhar, resumir, prover exemplos etc) e também ajudar na
promoção e manutenção de condições internas adequadas no aprendiz,
atuando nos estados psicológicos que interferem com a aprendizagem.
Para maximizar a aprendizagem de alunos com dificuldades, o professor
pode tomar certas providências como:
a) Estabelecimento de metas apropriadas;
b) Escolha de atividades nas quais o sucesso pode ser vivenciado;
c) Clareza na apresentação de objetivos;
d) Verificação constante da compreensão, por parte dos alunos, quanto ao
que foi solicitado;
e) Repetição freqüente de instruções;
f) Remoção de distrações, entre outras.
O professor deve levar em consideração que os alunos se motivam mais
facilmente se as tarefas propostas forem desafiantes. O nível de dificuldade da
tarefa deve ser sempre moderado, de modo que esta não se torne
desmotivante por ser fácil demais, ou por ser difícil demais.
A tarefa precisa ser um risco, um desafio, entretanto o medo do fracasso
e do erro deve ser foco de reflexão por parte dos educadores, já que aprender
implica, muitas vezes, em errar.
Os professores precisam, sempre que possível, encontrar tarefas que:
- Tenham um valor para o aluno;
- Estejam relacionadas com as metas e os interesses pessoais dos
alunos;
- Possibilitem um certo grau de escolha;
- Ofereçam oportunidades para o exercício do controle e da
responsabilidade pelo próprio processo de aprendizagem.
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Outro ponto que deve ser enfatizado é a criação de um clima favorável à
aprendizagem. Ambientes que promovam a cooperação, por oposição à
competição entre os alunos, que respeitem as diferenças individuais bem como
que valorizem as diversas habilidades do ser humano, ao invés da ênfase
maciça na habilidade intelectual, são fundamentais na promoção da motivação
para a aprendizagem.
O professor deve estar comprometido com o crescimento pessoal do
aluno e auxiliá-lo, cada vez mais, a assumir responsabilidade pelo próprio
processo de aprendizagem, pois aprender não é algo que se possa fazer por
alguém.
2.3 – Aspectos afetivos das dificuldades de aprendizagem
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O aspecto afetivo é um importante elemento a se considerar quando se
pretende compreender o processo de aprendizagem dos indivíduos. Situações
como abandono, a separação dos pais, a perda de um dos progenitores, um
ambiente desfavorável à manifestação afetiva, a depreciação, são variáveis
intervenientes no processo de aprendizagem humana.
A experiência repetida de insucesso, por parte dos indivíduos, pode
levar ao caminho do fracasso escolar e ao abandono do processo de
escolarização.
Sendo assim, a manifestação de um baixo desempenho bem como o
surgimento de dificuldades de aprendizagem, seja de caráter momentâneo ou
duradouro, deve ser sempre motivo de preocupação e atenção por parte dos
pais e educadores em geral.
Na tentativa de compreender mais acerca das dificuldades de
aprendizagem, é enfatizada a relação entre o aspecto cognitivo (mais
especificamente no que se refere ao estudo das aprendizagens humanas) e o
afetivo (pela análise dos traços da personalidade e de condutas mais
adaptadas do ponto de vista emocional).
Não há como negar essa relação entre os fatores afetivos e os atos
inteligentes, uma vez que em qualquer atividade que se realiza pode-se notar
interesses de ordem intrínseca ou extrínseca, ou seja, um desejo de realização
que no decorrer do trabalho pode sofrer interferências de estados de decepção,
fadiga, prazer pelo que se tem alcançado, esforço por melhorar os resultados,
entre outros sentimentos básicos de tristeza, sucesso ou fracasso, bem como
aprovação social e recompensa das mais variadas, desde um simples carinho
até obtenção de prêmios.
É consenso o fato de que os estados afetivos interferem no cognitivo. A
afetividade pode ser desencadeadora de novas condutas, pode acelerar ou
retardar o desenvolvimento intelectual, mas não é capaz de gerar novas
estruturas nem tampouco modificar as já existentes.
Para Piaget toda conduta, seja ela de origem afetiva ou cognitiva, é
sempre adaptativa, visando sempre o restabelecimento do equilíbrio entre o
28
organismo e o meio. Sendo assim, o retorno do estado equilibrado proporciona
ao sujeito um sentimento de satisfação que se deve ao fato de o sujeito ter
satisfeito um desejo, que a princípio o havia desequilibrado.
Do ponto de vista afetivo, a assimilação pode ser definida como o
interesse que faz com que o sujeito busque, no meio, elementos novos para
serem compreendidos. A acomodação, por sua vez, também pode ser
traduzida por um interesse, mas relativo aos aspectos novos do objeto a serem
conhecidos.
A afetividade, para Piaget, seria a energia da qual depende o
funcionamento da inteligência, sem, contudo, modificar as estruturas dessa
última.
Pode-se dizer então que a afetividade pode ser a desencadeadora de
novas condutas, pode acelerar ou retardar o desenvolvimento intelectual, mas
não é capaz de gerar novas estruturas nem tampouco modificar as já
existentes.
Essa maneira de compreender os aspectos estruturais do funcionamento
cognitivo e suas relações com o funcionamento afetivo mostram que, segundo
Piaget, esses dois processos são de naturezas distintas.
Para Piaget, uma estrutura privilegia os aspectos qualitativos enquanto a
energia se refere a uma intensidade, supõe sempre estruturas preexistentes e
opera independentemente do conteúdo, enquanto o afeto seleciona o objeto ou
conteúdo sobre o qual quer agir e de acordo com seu interesse.
Sentimentos básicos de alegria e tristeza, sucesso e fracasso,
experimentados em relação aos objetos e situações, também serão
experimentados futuramente em relação às próprias pessoas, o que dará
origem aos sentimentos interindividuais.
Pode-se, então, dizer que a afetividade está de alguma forma
direcionando os interesses (motivação) do indivíduo e controlando a
intensidade ou quantidade de energia despendida em cada conhecimento, em
razão do valor que lhe é atribuído, ou seja, os sentimentos que aquela
atividade desperta no indivíduo.
29
Para Piaget, o interesse ou a motivação para fazer algo é sempre
decorrente de uma necessidade.
As relações defendidas por Piaget entre a cognição e a afetividade,
embora se restrinjam ao campo teórico, já apontam para a importância de se
considerar os elementos afetivos em todos os atos inteligentes.
Nota-se que uma criança que vive em um ambiente familiar equilibrado e
que lhe oferece condições mínimas de experimentar e expressar suas
emoções tem chances de lidar com maior segurança e tranqüilidade com seus
sentimentos e pode, dessa maneira, trabalhar com seus sucessos e fracassos
de forma mais adequada.
A adaptação ao meio escolar, principalmente no início da escolarização,
bem como as exigências demandadas por ela, pode ser motivo de muitas
angústias e geradora de inseguranças por parte dos sujeitos envolvidos nesse
processo, que vêem obrigados a corresponder às exigências tanto dos pais
como dos educadores.
Seu desempenho, sempre colocado à prova, é visto como motivo de
status e aceitação, tanto por parte dos adultos como de seus pares. Passar por
uma situação de fracasso ou que coloque sua capacidade em dúvida pode
gerar um desconforto e um sentimento de desvalorização, que uma vez
prolongado pode gerar problemas mais sérios de adaptação da conduta, além
de afetar de maneira intensa a confiança e o valor atribuído a si mesmo.
Deve-se considerar também que uma criança ou mesmo adolescente,
que se vê diante da eminência de fracasso tende a buscar uma maneira de
compensar a frustração vivida, podendo nesse caso partir para
comportamentos agressivos, fugas da situação frustrante por meio da
dispersão, problemas de comportamento, assim como pode também
demonstrar um comportamento de apatia, descaso em relação aos estudos,
afastamento do convívio social, comportamentos esses causados por um
processo de desmotivação generalizada.
Esses, entre uma série de outros elementos, podem, em um
determinado momento, interferir no comportamento dos indivíduos, bem como
sobre seu processo de aprendizagem, afetando o seu rendimento escolar.
30
Pensar as dificuldades de aprendizagem envolve pensar sobre uma
situação que pode estar ocorrendo tanto momentaneamente – e que neste
caso merece atenção porque pode comprometer o desenvolvimento do
indivíduo – quanto a longo prazo, porque pode gerar problemas mais
duradouros.
No entanto, as dificuldades de aprendizagem, de caráter mais duradouro
e que afetam o indivíduo em diferentes contextos da vida acadêmica e pessoal,
merecem ser vistos e analisados com mais cuidado e o professor é o elemento-
chave nesse processo.
Os aspectos afetivos têm um papel fundamental no desenvolvimento do
indivíduo como um todo. Embora não se saiba exatamente como todos os
elementos se relacionam, sabe-se da importância de cada um deles no
desenvolvimento individual.
Assim, propiciar um ambiente favorável à aprendizagem em que sejam
trabalhados a auto-estima, a confiança, o respeito mútuo, a valorização do
aluno, sem contudo esquecermos da importância de um ambiente desafiador,
mas que mantenha um nível aceitável de tensões e cobranças, são algumas
das situações que devem ser pensadas e avaliadas pelos educadores na
condução de seu trabalho.
Um ambiente que não coloque ao indivíduo nenhum tipo de solicitação,
que não apresente desafios e que não cause nenhum tipo de ansiedade, pode
ser tão prejudicial ao seu desenvolvimento quanto o seu oposto.
Independentemente da postura teórica adotada, é sabe-se que na base
de todo processo de conhecimento existe uma necessidade, uma curiosidade,
um desejo ou mesmo uma recompensa a ser atingida e que nos faz buscar o
novo, sendo esta a fonte de outros conhecimentos.
Embora se saiba que são inúmeras as variáveis afetivas que podem
interferir na vida de um indivíduo e que, nesse sentido, ainda se tem muito a
fazer, não se pode desconsiderar o caminho já percorrido e os elementos que
ele nos trouxe para pensar.
31
CAPÍTULO III
O ENLACE DESEJO-INTELIGÊNCIA NA
APRENDIZAGEM
32
A construção do conhecimento, bem como sua conseqüente
problemática, só pode ser pensada a partir de um mosaico, onde estão
presentes os fatores cognitivos e emocionais, que se caracterizam,
respectivamente, pela organização lógica e significação simbólica, que
permeiam a relação do sujeito com o objeto de conhecimento.
Fernández (1990) enuncia que o processo de aprendizagem pode ser
comparado a uma rede entrelaçada, onde os “fios” que a constituem
identificam-se, de um lado, pelas aquisições específicas que compõem as
estruturas cognitivas e, de outro, pela estrutura desejante do sujeito.
Um olhar mais atento sobre os problemas de aprendizagem nos
possibilita a observação da interação sujeito-objeto, revelando-nos a trama
dialética da objetividade e da subjetividade na qual o sujeito está inserido.
Sob esta ótica, encontramos em Piaget (1964) uma referência à
importância dos aspectos afetivos e cognitivos na construção do conhecimento:
“existe um estreito paralelismo entre o desenvolvimento da afetividade e das
funções intelectuais, já que estes são aspectos indissociáveis de cada ação”
(p.38).
Embora saibamos a importância dos eixos teóricos que se incumbiram
da tarefa explicativa da análise de cada fator implicado na aprendizagem,
principalmente a epistemologia genética e a psicanálise, faz-se necessário
transcender o objeto de estudo de cada teoria em particular, inscrevendo-se
numa perspectiva psicopedagógica que se fundamenta numa relação entre a
constituição do sujeito epistemológico e do sujeito do desejo, postulando a
conceituação do ser cognoscente.
Nesse sentido, a psicopedagogia emergiu, configurando o processo de
aprendizagem, a partir de algumas dimensões específicas que compreendem o
marco histórico do sujeito que aprende, bem como o seu desenvolvimento
cognitivo. Considerando esse enfoque, a construção do conhecimento só pode
ser pensada através de uma aliança entre três grandes eixos: a dimensão
cognitiva, que se caracteriza pela ação do sujeito no objeto, bem como pela
estruturação dessa ação em percepções, organizações e conceitos,
33
constituindo, assim, o sujeito epistêmico; a dimensão relacional, que
contextualiza o sujeito da aprendizagem e a dimensão afetiva, que explicita a
implicação do desejo nessa construção.
Sendo assim, o ser cognoscente é concebido como uma unidade de
complexidades, não sendo possível desconsiderar que o processo da
construção do conhecimento englobe aspectos que o próprio sujeito conhece.
Se de um lado a estrutura cognitiva se caracteriza pela tendência a organizar,
classificar e generalizar, de outro, o desejo tende a individualizar e diferenciar,
revelando a subjetividade original de cada sujeito.
Para compreender o processo de aprendizagem, é necessário ir além da
experiência imediata, pois o conhecimento se encontra antes, por longos
períodos, inconsciente. Nesse sentido, Freud (1915) ressalta a importância do
inconsciente na vida mental, ao afirmar que tudo que se manifesta na
consciência esteve antes reprimido no inconsciente.
Portanto para compreender a construção do conhecimento devemos
relacionar o princípio do prazer ao princípio da realidade, concebendo o ser
cognoscente como um ser contextualizado, pensante e apaixonado. Esta
postura se caracteriza por uma visão de saúde dentro da educação, onde se
considera não só a necessidade de aprender, mas, principalmente, o desejo do
sujeito, desejo que este se configura, como diz Piaget (1964), numa mola que
impulsiona o sujeito à ação.
Não se pode entender o processo de aprendizagem desconectado da
própria história do sujeito aprendente, uma vez que este significa suas novas
experiências a partir da revivescência singular de seu passado.
Para aprender é preciso se colocar no lugar do não-saber, que significa
suportar a dor da incompletude. Para “saber” é preciso aprender a lidar com a
angústia da castração. O saber se apresenta sempre como algo da ordem do
incompleto, permitindo apenas construções provisórias e fragmentadas, um
eterno vir-a-ser.
O que vemos hoje são escolas que objetivam um saber cristalizado e
obstrui o desejo de aprender. Nas práticas educativas cotidianas, entende-se
que a dúvida e o desequilíbrio são ruins e, por essa razão, devem ser evitados.
34
Ao inserir uma pedagogia voltada para as respostas contribui-se para a morte
do desejo.
Portanto, para provocar o desejo de aprender deve-se provocar a falta,
apresentando enigmas, problematizando, perguntando, ao invés de
simplesmente responder.
Para se pensar no enigma do desejo de aprender é preciso refletir sobre
a função da ignorância, sendo necessário para tal pensar os motivos que levam
uma pessoa a desistir de aprender.
Há de se considerar a ignorância como uma forma de saber, que pode
estar a serviço de um gozo que apresenta no seu cerne uma diretriz: o desejo
de não-desejar, constituindo-se num saber que não pode ser sabido; um saber
que, por alguma razão, precisa ser ocultado. Por trás desse gozo
comprometido pulsionalmente com a morte, explicita-se uma tentativa
inconsciente de esconder a trama de sua própria história, a qual o sujeito não
suporta conhecer.
Na maioria das vezes, o sintoma, que se expressa sob a forma de um
problema de aprendizagem, nos indica que a inteligência, como afirma
Fernández (1990), encontra-se aprisionada, apesar da estrutura cognitiva estar
preservada.
Fernández (1990) afirma que para entendermos o aprisionamento no
qual a inteligência se encontra deve-se analisar o interjogo dos fatores que
influenciam a construção do conhecimento.
A partir do recorte teórico da psicopedagogia é preciso caminhar na
direção da compreensão da criança enquanto um sujeito da aprendizagem; um
ser único e singular, que traz consigo uma história de vida, proveniente de um
determinado ambiente psicológico, familiar e cultural, sendo portador de um
nível cognitivo específico.
Com o objetivo de desenvolver ações que propiciem a superação dos
problemas de aprendizagem, o educador deve contribuir para que a criança
integre seu passado, vivenciando o presente e projetando o futuro,
ressignificando suas perdas, suas posições e dificuldades.
35
O professor deve funcionar como uma mãe-suficientemente-boa, que
nutre, alimenta e aceita ataques e possibilita a reparação, coloca limites e,
principalmente, se conscientiza tranqüilamente de seus próprios erros e falhas,
se descartando de um discurso militante.
Portanto, qualquer proposta psicopedagógica dentro de um caráter
institucional e preventivo deve incluir permanentemente a necessidade de
submeter o docente a um processo corretor de sua própria aprendizagem, para
que possa internalizar e concluir que para aprender é preciso não-saber.
CONCLUSÃO
As escolas deveriam entender mais de seres humanos e de
amor do que de conteúdos e técnicas educativas. Elas têm
contribuído em demasia para a construção de neuróticos
36
por não entenderem de amor, de sonhos, de fantasias, de
símbolos e de dores.
Cláudio Saltini
O início deste se estudo aconteceu a partir de observações feitas no dia-
a-dia de uma prática pedagógica.
De início, muitos questionamentos foram feitos em torno de
aprendizagem significativa e de como a afetividade estava presente,
permeando tais momentos.
As suposições se tornam verdadeiras e viáveis e, para que aconteçam
na prática, é fundamental uma mudança paradigmática acerca das concepções
da criança e da aprendizagem.
O estudo, que chega ao fim, reafirma que da relação educativa nasce a
“postura”. A “postura” que aqui se constitui de um conjunto de atitudes
derivadas da forma de estar, de se conduzir e de interpretar o ato educativo.
Esta postura nasce da relação e da compreensão que se tem do homem
colocado sob condições de aprender e conhecer. Também deriva diretamente
de um conjunto de idéias que se tem, de como a criança aprende e para que
ela aprende e aonde se pretende chegar, ou seja, que modelo de homem
queremos formar.
Far-se-á necessário, então, que o educador assuma essa postura e se
torne atento e sensível, questionando suas ações e percebendo sua
importância no desenvolvimento cognitivo e emocional do seu aluno.
A criança deseja e necessita ser amada, aceita, acolhida e ouvida para
que possa despertar para a vida da curiosidade e do aprendizado.
O papel do educador será de organizar e preparar um universo onde a
criança busque e se interesse. A postura desse profissional se manifestará na
percepção e na sensibilidade aos interesses da criança, que em cada idade,
difere em seu pensamento e modo de sentir o mundo.
A postura que vem sendo adotada até agora pela grande maioria dos
educadores é a de funcionar como intermediário entre a criança e o meio. Sua
37
atitude é a de substituir a interação entre estes dois elementos pela palavra, o
que cria uma barreira entre a criança e o mundo, pois assim ela não atua sobre
o meio e, sim, recebe informações do educador. Percebe-se, então, que há um
desprezo da capacidade de inventar e descobrir.
A postura que se espera do educador consciente é daquele que
promove a interação entre a criança e o meio, que tenha flexibilidade para
atuar em torno desses dois elementos, ora criando situações-problema para
que a criança descubra e invente soluções, ora dando apoio no sentido de que
estejam juntos nessa busca.
Dessa forma, não se criam bloqueios à atuação da criança, mas sim,
incita-se à pesquisa, criam-se situações em que ela se sinta desafiada e
estimulada a buscar o conhecimento. Dá-se prioridade ao pensar ligando o
conhecimento tanto ao interesse quanto a projetos de ação sobre o mundo.
O profissional de educação deve estar aberto a mudanças, a reflexões
contínuas sobre sua prática pedagógica, não podemos ficar paralisados diante
de tantas vidas que passam em nossas mãos.
Nesse momento de transformação de sua prática pedagógica o
educador também deve repensar suas atitudes perante o outro educador, seu
colega de trabalho.
As relações entre os educadores vêm se baseando na competição na
grande maioria dos atos educativos, sua prática se baseia no empirismo e
pouco ou nada se estuda sobre o desenvolvimento da inteligência. Seu
planejamento não estabelece relações entre o conteúdo programático e as
estruturas do desenvolvimento da inteligência, não se trabalha para o
desenvolvimento da autonomia moral e intelectual do próprio grupo, as regras
são ditadas sempre por uma entidade superior (supervisão, coordenação,
direção) e não se tomam decisões baseadas num consenso comum entre os
membros do grupo de educadores, a coordenação e as necessidades dos
alunos.
É preciso mudar, pois é fundamental que o educador aprofunde
constantemente seus estudos sobre o desenvolvimento e a gênese das
38
estruturas da inteligência, participe de reuniões e trabalhos em grupo e que
tenha como objetivo a busca constante da própria autonomia.
Também não podemos esquecer que a relação com os pais dos alunos
deve ter outro enfoque, pois hoje cria-se uma escola para o “desenvolvimento
do pensar da criança”.
Para isso, é preciso que os pais conheçam os objetivos e metas da
educação. Precisamos tornar a família uma aliada no trabalho para o
desenvolvimento da autonomia moral e intelectual do aluno, esclarecendo-a no
sentido de propiciar maior independência à criança não fazendo por ela o que
tem capacidade de fazer sozinha.
As constatações feitas são o início de um longo caminho que se começa
a se abrir. Que este caminho apresente sempre novos questionamentos e
indagações no sentido de nossa própria construção permanente como
educadores.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
39
ASSMANN, Hugo. Reencantar a Educação. Petrópolis, RJ: Editora Vozes,
1998.
BLOOM, B.S. Características humanas e aprendizagem escolar. Trad. Maria
Ângela Vinagre de Almeida. Porto Alegre: Globo, 1981.
CLAPARÈDE, E. A educação funcional. Trad. J. B. Damasco Penna. São
Paulo: Cia Editora Nacional, 1954.
FERNÁNDEZ, A. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica
clínica da criança e sua família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
FREIRE, Paulo. Concientizacion: teoria y practica de la liberacion. Buenos
Aires: Ediciones Busqueda, 1974.
FREUD, S. O inconsciente. Rio de Janeiro: Imago, 1974.
GALVÃO, Izabel. Henry Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento
infantil. Petróplis: 1995.
PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1964.
PICHON-RIVIÈRE, Enrique. Teoria do Vínculo. São Paulo: Martins Fontes,
1995.
RONCA, Afonso Caruso e GONÇALVES, Luiz Carlos. A Clara e a Gema. São
Paulo: Edesplan, 1998.
SALTINI, Cláudio J. P. Afetividade e Inteligência. Rio de Janeiro: DP&A, 1997.
SISTO, Fermino Fernandes, BORUCHOVITCH, Evely, FINI, Lucila Diehl
Tolaine, BRENELLI, Rosely Palermo, MARTINELLI, Selma de Cássia.
40
Dificuldades de Aprendizagem no Contexto Psicopedagógico. Petrópolis,RJ:
Editora Vozes, 2001.
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
41
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 5
RESUMO 6
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I
A Educação
1.1 – O que é a educação 11
1.2 – Educação e sedução 15
CAPITULO II
Dificuldades de Aprendizagem
2.1 – Dificuldades de aprendizagem e problemas motivacionais 19
2.2 – Estratégias de aprendizagem 23
2.3 – Aspectos afetivos das dificuldades de aprendizagem 27
CAPÍTULO III
O enlace desejo-inteligência na aprendizagem 32
CONCLUSÃO 36
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 39
ÍNDICE 41
FOLHA DE AVALIAÇÃO
42
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES – PÓS-
GRADUAÇÃO “LATU SENSO” PROJETO A VEZ DO MESTRE -
PSICOPEDAGOGIA
Título da Monografia: A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO
ENSINO-APRENDIZAGEM
Autor: LUCIANA CHAVES DE MIRANDA
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito: