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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE RESPONSABILIDADE DO PROVEDOR DA INTERNET FRENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Por: Denise dos Santos Tavares Orientador Prof. Sérgio Ribeiro da Silva Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

RESPONSABILIDADE DO PROVEDOR DA INTERNET

FRENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Por: Denise dos Santos Tavares

Orientador

Prof. Sérgio Ribeiro da Silva

Rio de Janeiro

2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

RESPONSABILIDADE DO PROVEDOR DA INTERNET

FRENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes

como condição prévia para a conclusão do Curso de Pós-

Graduação “Lato Sensu” em Direito do Consumidor

Por: . Denise dos Santos Tavares

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AGRADECIMENTOS

...a Deus, a minha mãe pela apoio e incentivo

nesta jornada, ao meu pai, mesmo em outro

plano tenho a certeza que está me abençoando

e ao meu grande amigo Diogo que me ajudou

na formatação desta monografia.

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RESUMO

A tecnologia digital e, principalmente, a vasta gama de informações que vêm sendo

difundidas, trocadas e elaboradas em decorrência deste que podemos tranqüilamente

denominar do mais fabuloso e espetacular meio de comunicação já criado pelo homem,

surge ao Direito a obrigação de, na mesma velocidade, acompanhar tal exorbitante

evolução, preenchendo as lacunas necessárias, sem, todavia, afrontar o que a rede mundial

de computadores tem de mais fascinante: a liberdade e a descentralização, elementos

cruciais determinantes na sua desenfreada expansão e, por que não, sucesso.

O presente estudo abordou e delineou algumas dessas questões, em especial

demonstrando a plena configuração dessas operações como relação de consumo e a

amplitude da responsabilidade dos provedores de acesso à internet, bem como outras

peculiaridades contratuais observadas.

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METODOLOGIA

Os métodos que me levaram ao desenvolvimento deste trabalho foram pesquisas de

campo, bibliográficas, internet, jornais, revistas e “relatos informais” de consumidores que

tiveram experiências com a prestação de serviços da internet.

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

Título da Monografia: RESPONSABILIDADE DO PROVEDOR DA INTERNET

FRENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Autora: Denise dos Santos Tavares

Data da entrega: 22/02/2005

Avaliado por: Conceito:

Avaliado por: Conceito:

Avaliado por: Conceito:

Conceito Final:

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8

2 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PROVEDOR – OBJETO ...10

3 CONCEITO DE CONSUMIDOR ........................................................................... 11

3.1 Requisitos para a formação do contrato .......................................................19

4 RELAÇÃO DE CONSUMO ....................................................................................21

4.1 Natureza jurídica da relação ........................................................................ 21

4.2 Vulnerabilidade e hipossuficiência ..............................................................23

4.3 Contrato de adesão .......................................................................................24

5 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL ..............................................................25

5.1 Responsabilidade do provedor de internet frente ao seu usuário .................25

5.2 Responsabilidade solidária .......................................................................... 26

5.3 Responsabilidade do provedor pelo fato de terceiro com sua atividade

relacionado ................................................................................................... 27

5.4 Responsabilidade do provedor pelo fato de terceiro ................................... 29

5.5 Responsabilidade do fornecedor ..................................................................31

5.5.1 Elementos da relação de consumo ....................................................32

5.5.2 Princípios que regem a responsabilidade do fornecedor; teoria do

risco do empreendimento, responsabilidade objetiva .................................. 33

5.5.3 Responsabilidade pelo fato do produto e do serviço ....................... 34

5.5.4 Fato do Serviço ................................................................................ 35

6 CONTRATOS GRATUITOS ................................................................................. 36

7 CONCLUSÃO .........................................................................................................40

8 BIBLIOGRAFIA .....................................................................................................43

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1 INTRODUÇÃO

O Brasil possui atualmente em torno de 9 milhões de internautas com a perspectiva

de movimentar bilhões no comércio eletrônico. Já existem 240 milhões de pessoas

conectadas à rede no mundo inteiro, com uma frota de microcomputadores, no Brasil, perto

de 11 milhões de unidades, sendo a internet o setor líder na atração de investimentos

estrangeiros em nossa nação. O sucesso dos negócios na rede de computadores é altamente

promitente e vem atraindo de uma maneira fugaz empresas e empresários. Estudos

concluem que a presença virtual pode significar a sobrevivência da própria empresa. O

consumidor tem no atrativo seu interesse maior: a redução do custo do produto. O

fornecedor pode ter reduzidos em até 80 % seus custos associados a estrutura e

fornecimento do produto vendido.

Assim como a tecnologia digital e, principalmente, a vasta gama de informações

que vêm sendo difundidas, trocadas e elaboradas em decorrência deste que podemos

tranqüilamente denominar do mais fabuloso e espetacular meio de comunicação já criado

pelo homem, surge ao Direito a obrigação de, na mesma velocidade, acompanhar tal

exorbitante evolução, preenchendo as lacunas necessárias, sem, todavia, afrontar o que a

rede mundial de computadores tem de mais fascinante: a liberdade e a descentralização,

elementos cruciais determinantes na sua desenfreada expansão e, por que não, sucesso.

Assim, se ao Direito cabe regular os negócios jurídicos de uma forma geral, cabe

também acompanhar a genialidade humana a fim de possibilitar uma garantia à população,

e, em especial, à classe dos consumidores, da qual todos pertencemos, em maior ou menor

grau, ante situações de vulnerabilidade e/ou hipossuficiência.

Deparamo-nos, então, com a necessidade iminente de estudo e discussão do

chamado Direito do Ciberespaço, definido por CERQUEIRA1, como “o conjunto de leis,

regulamentações em geral e práticas contratuais de todos os tipos e níveis, que envolvem a

utilização e funcionamento de redes de software e computadores. É também chamado

[direito online], debatido nos Estados Unidos desde 1985, com o objetivo de se

1 CERQUEIRA, Tarcísio Queiroz. Software: lei, comércio, contratos e serviços de informática. Rio de Janeiro, Ed. Esplanada, 2000. p. 235.

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estabelecerem regras para a comunicação. Os negócios e o uso em geral das redes de

computadores.”

Temas como a aplicação das normas comerciais e de consumo nas transações via

Internet (responsabilidade perante o Código do Consumidor), a publicidade na internet e a

vulnerabilidade dos navegadores, os contratos on line , o recebimento indesejado de

mensagens por e-mail (Spam), a utilização da mensagem eletrônica e sua autenticidade nas

relações comercias e como meio de prova em juízo (assinatura digital) e a responsabilidade

dos provedores de acesso à Internet têm relevância eminente e carecem de estudo

aprofundado.

Aqui se faz importante trazermos a amplitude dos serviços e a gama de efeitos que o

acesso à internet produz no consumidor dos serviços do provedor: através da internet,

enviam-se arquivos de grande complexidade, efetuam-se transações bancárias, que vão

desde a simples conferência da movimentação bancária até investimentos de grande porte,

podendo ainda configurar-se operações como compra e venda compra e venda em leilões

virtuais ou diretamente em lojas virtuais especializadas, assim como as mais diversas

relações comerciais entre consumidores fornecedores, ou ainda entre empresas.

O presente estudo pretende abordar e delinear algumas dessas questões, em especial

demonstrando a plena configuração dessas operações como relação de consumo e a

amplitude da responsabilidade dos provedores de acesso à internet, bem como outras

peculiaridades contratuais observadas.

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2 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE

PROVEDOR – OBJETO

O contrato de prestação de serviços do provedor tem por objeto principal o acesso à

internet, com ou sem licenciamento de programas, em caráter individualizado e contínuo, a

título oneroso ou gratuito, por prazo determinado ou indeterminado. Seu objeto pode

incluir, dependendo do preço acordado e da amplitude da empresa, os seguintes serviços:

· aesso à rede de computadores, mediante protocolo TCP/IP, via fax modem

mediante ligação telefônica, ou por cabo, incluindo aqui o acesso aos mais

variados bancos de dados, com possibilidade de envio, cópia e gravação de

arquivos de distintas naturezas;

· serviço de correspondência eletrônica, mediante disponibilização de correio

eletrônico e caixa postal, para comunicação entre usuários e entre os

próprios contratantes;

· locação de espaço para o alojamento de home-pages;

· salas de bate-papo exclusivo;

· acesso a banco de dados específicos do provedor em área exclusivas sob sua

responsabilidade, com disponibilizados para cópia (download) no

computador do usuário2;

· acessos a grupos de discussão, “newsgroups”, jogos, etc.”

2 Aqui um exemplo típico de privilégios de acesso e conseqüente diferenciação de classes de consumidores dos serviços, dependendo do contrato firmado entre o usuário.

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3 CONCEITO DE CONSUMIDOR

O conceito de consumidor frente à nova concepção social do contrato.

Após a participação no Curso de Direitos do Consumidor ministrado como extensão

universitária, é pretensão deste trabalho não a análise apronfundada da aplicação do código

em determinados ramos da relação de consumo mas sim, apreender esta nova filosofia

sobre as relações de consumo no que diz respeito aos seus fundamentos sua razão de ser.

Neste sentido, destacou-se a análise do conceito de consumidor, o destinatário desta

proteção jurídica, de forma a demonstrar através da exposição desta nova filosofia de forma

geral, assim como, especificamente, pela nova concepção social do contrato, que a

ampliação deste conceito deve ocorrer sempre que a vulnerabilidade daquele que consome

for identificada, não havendo nisto prejuízo da eficácia social deste código pois, tende o

CDC a ter sua aplicação ampliada como decorrência da evolução histórica desta inovação

no entendimento do mercado de consumo em seu contexto social.

Fatos históricos da evolução dos direitos do consumidor.

O movimento consumirista está inserido no macrotema “direitos humanos”, sendo

indiscutível que somente com a necessidade e a consciência de que o homem deve buscar

melhores condições de vida em todos os níveis é que a relação de consumo passa a ser

questionada, notadamente, em paralelo aos movimentos sindicalistas que questionavam a

relação de trabalho em todos os aspectos que impactam a qualidade de vida. De forma que,

a que se considerar o início para um histórico deste movimento, a célebre “Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão”, no contexto da Revolução de 1789, pois antes de

considerar o sujeito da relação de consumo é preciso reconhecer o indivíduo como cidadão,

sujeito de direitos individuais. Esta consciência de uma liberdade individual é a etapa

fundamental da evolução histórica, a base para o desenvolvimento de novas aspirações para

o homem que passa a pensar, em todas as suas relações, no atendimento às suas

necessidades básicas.

Esta consciência abrange a ideologia da igualdade entre os homens, o que permeia

toda a evolução histórica e passa a ceder às constatações de desigualdades reais, sofrendo

assim uma espécie de lapidação quando da aplicação prática da ideologia no decorrer da

história.

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Esta é chamada 1ª fase da evolução dos direitos, no trabalho de Wagner Rocha

D’Angelis (1989), citado pelo Doutor José Geraldo Brito Filomeno em seu Manual de

Direitos do Consumidor (1991). A 2ª fase é marcada pelo “Pacto Internacional sobre

direitos econômicos, Sociais e Culturais”, aprovado pelas Nações Unidas em 1966, onde

por certo encontra-se a proteção ao consumidor em face de abusos cometidos por

fornecedores.

Ainda consoante o autor, a 3ª fase consiste na elaboração de diretrizes para o

alcance dos direitos conquistados, bem como no aperfeiçoamento do instrumental colocado

à disposição dos povos para validação destes direitos. Neste momento, sob a inspiração da

declaração dos direitos do consumidor, proferida pelo presidente John Kennedy, em

15.03.1962, marcando a necessidade de legislação específica para o consumidor, a

Resolução nº 39/248 da organização das Nações Unidas, aprovada em 1985, traçando uma

política geral de proteção ao consumidor, destinada aos Estados filiados.

No que diz respeito ao “movimento consumirista” com consciência dos interesses a

serem defendidos e estratégias de defesa destaca-se a criação em 1891 da “Consumer’s

League”, o que hoje é a “Consumer’s Union” dos estados Unidos. A referida entidade

desenvolve a conscientização dos consumidores, promoção de ações judiciais, além da

análise de quase todos os produtos lançados para publicação dos resultados em revista

própria.

O chamado “Movimento Consumirista Brasileiro”, em rigor, surgiu em 1976,

quando o então governador paulista Paulo Egydio Martins designou comissão

especialmente para estudar a implantação do já aludido “sistema estadual de defesa o

consumidor” do que resultou a Lei nº 1.903/78 e, concretamente, a instalação do “Grupo

Executivo de Proteção ao Consumidor”, em princípios de 1979, sendo atualmente a

Fundação de Proteção ao Consumidor, órgão da Secretária de Estado de Justiça.

A proteção ao consumidor é tema complexo de grande importância inclusive para o

Estado, a simples constatação de que todos nós somos, em maior ou menor grau,

consumidores de bens e serviços já fundamentaria esta afirmação, mas além disso, temos

que os meios de produção com vistas ao consumo é uma das facetas do próprio bem-

comum, de forma que, como sociedade política, o estado em sua estruturação revela não só

sua organização do poder pelo ordenamento jurídico, como também a disciplinação dos

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meios de produção. Em 1998 éramos 160 milhões de consumidores no Brasil gerando

outros tantos milhões em relações por todas as áreas do mercado de consumo.

Como mencionado nos fatos históricos, os direitos do consumidor estão inseridos

nos direitos do cidadão, como bem destacou o 16º Encontro de defesa do Consumidor do

estado de São Paulo, sob o tema: Cidadania fragmentada – direitos do consumidor em risco.

A constatação da desigualdade real entre os homens, em razão de aspectos econômicos e

sociais, exigiu do Poder Público um posicionamento diferente do exaltado liberalismo e a

supremacia da liberdade individual, um posicionamento de intervenção estatal para garantir

o tratamento desigual para os desiguais como forma de garantir a igualdade entre os

cidadãos.

O Estado Democrático Social de Direito, traz em sua ideologia o exercício do poder

em função do povo, exigindo do Estado condutas positivas em qualquer área, inclusive na

área do domínio econômico para o alcance do bem-comum, de forma que, na nossa

Constituição da República, no capítulo referente aos “direitos e deveres individuais e

coletivos”, em seu artigo 5º, inciso XXXII, dispõe como dever do Estado o de “promover,

na forma da lei, a defesa do consumidor”. Destacado também no artigo 170 ao determinar

que a “ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,

tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”

sendo um dos seus princípios, a defesa do consumidor, elencado no inciso V.

Toda esta proteção estatal tem fundamento pela amplitude das relações de consumo

e principalmente, pela notável situação de hipossuficiência do consumidor de proteger seus

direitos de cidadão se estes forem lesados pelos fornecedores, consoante a flagrante

desigualdade social e econômica. É o estudo das implicações desta desigualdade que

solidifica a necessidade de uma proteção efetiva ao consumidor, tanto antes da aquisição do

produto ou da prestação de serviço, como na tutela dos direitos já lesados nestas relações.

Esta proteção se materializa no Código de Defesa do Consumidor, pois não se trata

apenas de um conjunto de normas mas instrumento para “o exercício da cidadania, ou seja,

a qualidade do todo ser humano,como destinatário final do bem comum de qualquer

Estado, que o habilita a ver reconhecida toda a gama de seus direitos individuais e sociais,

mediante tutelas adequadas colocadas à sua disposição pelos organismos

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institucionalizados, bem como a prerrogativa de organizar-se para obter esses resultados ou

acesso àqueles meios de proteção e defesa.

Nesse sentido, o referido código possui princípios próprios, sendo eles a

vulnerabilidade do consumidor de um lado, e a destinação final de produtos e serviços de

outro, assim como, pela amplitude das relações de consumo, relaciona diversos ramos do

direito.

Dispõe o art. 3º do CDC: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou

privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem

atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,

exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. Sendo

que, como serviço, o parágrafo 2º entende também as atividades bancária, financeira, de

crédito e securitária, ficando excluídas somente as trabalhistas. A definição é ampla,

ficando claro que o legislador pretendeu assegurar a inclusão de um grande número de

prestadores de serviço, ficando à aplicação na dependência única de ser o co-contratante um

consumidor, para a definição da outra parte como fornecedor.

As relações de consumo são as relações jurídicas por excelência que envolvem

sempre:

· Basicamente duas partes bem definidas: de um lado um adquirente de um

produto ou serviço ( consumidor); de outro o fornecedor ou vendedor de um

produto ou serviço ( produtor / fornecedor);

· Destina-se à satisfação de uma necessidade privada do consumidor.

O consumidor, não dispondo, por si só, de controle sobre a produção de bens de

consumo ou prestação de serviços que lhe são destinados, arrisca-se a submeter-se ao poder

e condições dos produtores daqueles daqueles mesmos bens e serviços.

Evidentemente devemos partir do conceito fornecido pelo próprio código em seu

artigo 2º: “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou

serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade

de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.”

Trata-se de uma definição objetiva que tem como única restrição que seja a utilização do

produto ou do serviço feita por destinatário final, de forma que, surge a dúvida em relação

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àquele que consome para utilização em sua profissão, com fim de lucro. Sobre esta questão

existem duas correntes doutrinárias: os finalistas e os maximalistas.

Para os finalistas, se a tutela especial existe em razão da vulnerabilidade dos

consumidores, a restrição no conceito deve basear-se nesta linha divisória e seguir a

interpretação teleológica. Nesse sentido, destinatário final é aquele destinatário fático e

econômico do bem ou do serviço, logo, o destinatário final econômico não engloba a

utilização para revenda, ou o uso profissional de forma a integrar o valor do serviço ou

produto produzido. Restringe-se a figura do consumidor àquele que consome para uso

próprio ou de sua família, é o consumidor não-profissional. Há nesta corrente a

preocupação em evitar que profissionais – consumidores reclamem mais benefícios que o

direito comercial já lhes concede.

Coloca-se que esta corrente sofreu um abrandamento, visto ter identificado no

âmbito dos consumidores profissionais, pequenas empresas e profissionais que na prática

são vulneráveis diante dos fornecedores, assim, pelo fim da norma, analogicamente,

estende-se a aplicação do CDC.

Na 2ª corrente, os maximalistas concebem o CDC não como um conjunto de normas

direcionadas à proteção do consumidor não-profissional mas sim, como um novo

regulamento do mercado de consumo brasileiro, de forma que seu destinatário é a

sociedade de consumo, especificamente, o destinatário final fático, e esta seria a

interpretação do artigo 2º do CDC.

Sobre a discussão que procura definir o conceito de consumidor, utilizaremos a

análise feita pela autora Cláudia Lima Marques, em sua obra Contratos no Código de

Defesa do Consumidor, sendo o foco o consumidor na relação contratual, já que no campo

extra contratual o CDC estende sua aplicação ao consumidor por equiparação.

No caso dos contratos a proteção é fundada no desequilíbrio flagrante entre as partes

contratantes, devendo ser protegido todo consumidor que se encontra em condição de

hipossuficiência frente ao fornecedor. A questão vital é considerar ou não o consumidor-

profissional como hipossuficiente, o que em princípio parece destoar da ideologia que

embasa esta política de proteção ao consumidor, no entanto, pela análise do que seria

exatamente a hipossuficiência, fica clara a possibilidade desta consideração e, com base

nestes elementos é que pretende-se focalizar o alargamento do conceito de consumidor.

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Segundo a mesma autora, existem três tipos de vulnerabilidade: a técnica, a jurídica

e a fática. A técnica consiste na ausência de conhecimentos, por parte do consumidor, sobre

o produto ou serviço que consome, ficando portanto, vulnerável ao fornecedor na relação

contratual. No CDC, esta vulnerabilidade é presumida para o consumidor não-profissional.

A vulnerabilidade jurídica é a falta de conhecimentos jurídicos específicos,

conhecimentos de contabilidade e econômicos. O consumidor não-profissional tem esta

vulnerabilidade presumida pelo CDC, e o consumidor-profissional sofre de presunção

contrária, de que este tem conhecimentos mínimos devido ao exercício de sua atividade ou,

condições de consultar advogados e profissionais especializados antes de contratar.

Já a vulnerabilidade fática ou sócio-econômica consiste na posição de superioridade

do fornecedor, seja por sua posição de monopólio, fático ou jurídico, seja por seu poderio

econômico ou em razão da essencialidade do serviço, de forma que, todos que contaratarem

com este fornecedor se encontram em condição de hipossuficiência.

Por esta análise é possível verificar que a possibilidade de um consumidor

profissional encontra-se em situação de hipossuficiência é bastante grande, principalmente

se considerarmos os pequenos empresários e profissionais com menor nível econômico e

social. Mesmo assim, seria possível dizer que a estes se aplica a proteção dada pelo código

civil ou comercial, não há a necessidade de uma tutela especial do CDC. Verifica-se neste

trabalho que estes consumidores merecem tal tutela em razão de um entendimento

específico sobre o CDC, com fundamentação na própria ideologia desta política sobre as

relações de consumo expressada pela nova concepção contratual que analisamos a seguir.

Primeiramente, o liberalismo acentuado ensejou a dogmatização da teoria geral do

contrato, fundada na autonomia privada, fazendo do contrato o negócio jurídico mais

relevante celebrado entre as pessoas. O princípio da autonomia da vontade e pacta sunt

servanda foram elevados às suas conseqüências máximas.

A liberdade de contratar é o reflexo da filosofia do Estado liberal que exigia uma

separação quase absoluta entre o Estado e a sociedade, consoante a ideologia de igualdade e

absoluta liberdade entre a pessoas. O progresso industrial e tecnológico veio demonstrar

que o dogma da liberdade contratual não passava de uma ficção em face do desequilíbrio

econômico das partes, não havendo igualdade real entre os homens na sociedade.

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O dogma da autonomia da vontade no contrato fazia com que o consentimento livre

de vícios obrigasse o indivíduo mesmo sendo o conteúdo do contrato injusto ou abusivo.

Nas discussões do fim do séc. XIX, no início do séc. XX, sobre a prevalência da

vontade interna ou da vontade declarada encontra-se já a semente da nova concepção de

direito dos contratos.

O contrato passa a ter uma concepção social, para o qual não só o momento da

contratação importa com a manifestação da vontade, mas também de seus efeitos, a eficácia

jurídica do contrato não mais depende apenas da manifestação de vontade mas também, e

principalmente, dos seus efeitos sociais e das condições econômicas e sociais das partes

que o celebram.

Na busca pelo equilíbrio contratual, na sociedade de consumo moderna, a Lei passa

a proteger determinados interesses sociais, valorizando a confiança depositada no vínculo,

as expectativas e a boa-fé das partes contratantes. Os conceitos tradicionais não são

abandonados, mas o espaço destinado para que os particulares auto-regulem é reduzido por

normas imperativas, como o CDC. Trata-se de fruto do Estado Social que dá superioridade

à vontade social, agindo com intervencionismo nas relações contratuais para atender às

exigências sociais tornando o contrato um instrumento à disposição dos indivíduos na

sociedade de consumo mas, assim como o direito de propriedade, limitado e eficazmente

regulado para o alcance de sua função social.

Este alcance é almejado através de princípios que renovaram toda teoria geral dos

contratos. Para este trabalho, o que mais nos importa é a nova noção de equilíbrio mínimo

nas relações contratuais. De maneira efetiva, esta nova concepção tem como principal

função o equilíbrio na relação contratual, como visto nos fatos históricos, o homem construí

sua história a partir da revolução de 1789 com base na igualdade entre os homens mas, esta

nunca foi real. Com o incremento dos métodos de contratação em massa, principalmente, a

desigualdade entre os parceiros contratuais fez surgir as cláusulas abusivas, a ausência de

informações e outros elementos que aprisionavam a parte hipossuficiente.

O Código de Defesa do Consumidor aplica esta nova teoria fazendo com que a

vontade das partes não seja a única fonte de obrigação contratual, dando à lei posição

dominante para que este dote ou não de eficácia jurídica determinado contrato de consumo,

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justamente porque, convencido da desigualdade intrínseca e excludente entre os indivíduos,

deseja proteger a confiança do contratante mais fraco.

· Contratos submetidos às regras da legislação consumirista.

Denomina-se contrato de consumo toda relação contratual da qual são sujeitos um

consumidor e um profissional fornecedor de bens ou serviços, englobando todos os

contratos civis e mesmo mercantis onde existe um consumidor e um provável desequilíbrio

entre os contratantes.

Na concepção tradicional de contrato, a relação contratual seria elaborada por dois

parceiros em posição de igualdade, os quais discutiriam individual e livremente as cláusulas

de seu acordo de vontades. Atualmente, na sociedade de consumo, com seu sistema de

produção e de distribuição em grande quantidade, o comércio jurídico se despersonalizou e

os métodos de contratação em massa predominam. Dentre as técnicas de conclusão e

disciplina destes contratos analisaremos os contratos de adesão e as condições gerais dos

contratos ou cláusulas gerais contratuais.

Estes contratos são homogêneos em seu conteúdo mas, concluídos com uma série

indefinida de contratantes. Logo, por uma questão de economia, racionalização e

segurança, a empresa predispõe um esquema contratual, oferecido à simples adesão dos

consumidores.

Esta técnica de pré-elaboração do contrato também é utilizada por empresas

públicas ou concessionárias de serviços públicos. Por fim, nas relações de massa existem

também os contratos não-escritos, como os contratos orais, simples recibos, aceitação pelas

chamadas condutas sociais típicas e outros.

Estas novas técnicas são atualmente indispensáveis, não havendo como retroceder e

eliminá- las, mas ninguém dúvida de seus perigos para os contratantes vulneráveis ou

consumidores, pois, estes aderem sem conhecer as cláusulas, confiando nas empresas que

as pré-elaboraram. Esta confiança nem sempre encontra respaldo, visto a elaboração

unilateral tender às conveniências do fornecedor, incluindo uma série de cláusulas

ineqüitativas e abusivas.

Em nosso cotidiano, o contrato de adesão é a técnica mais comum, contratamos

desta forma o seguro, serviços telefônicos, assistência médica e serviços bancários entre

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muitos outros de importância indiscutível. Nesta modalidade de contrato, o consumidor

limita-se a aceitar um bloco de cláusulas elaboradas unilateralmente, assumindo o papel de

simples aderente à vontade manifestada pela empresa, portanto, seu elemento essencial é a

ausência de uma fase pré-negocial, a falta de um debate sobre as cláusulas, não sendo

possível modificá- las de maneira relevante. São características deste contrato:

a) pré-elaboração unilateral;

b)oferta uniforme e de caráter geral para um número indeterminado de

consumidores;

c) o consentimento se dá por simples adesão à vontade do parceiro contratual mais

forte.

3.1 Requisitos para a formação do contrato

A formação do contrato se dá, geralmente, pela própria rede, através de e-mail.

Logo, é contrato entre ausentes. Seu objeto é a prestação de serviços, com ou sem

licenciamento de programas, de forma individualizada e intransferível. A individualização

se configura mediante cadastro específico do usuário, em formulário padrão, e na

contratação daquele provedor específico. Ainda, no oferecimento e escolha de planos com

acessos de horas que variam conforme horário e limite, bem como na gama de serviços e

arquivos disponibilizados pelo servidor, que poderão variar conforme classes distintas e

selecionadas pelo provedor de usuários em função justamente da quantia paga mensalmente

e do número de horas de acesso consumidas em determinado período.

Como em qualquer outro contrato, para a validade e eficácia do mesmo, necessário

se percebe a atenção aos requisitos e exigências previstos em lei. Assim, conforme a

determinação explicita trazida pelo art. 82 e seguintes de nosso Código Civil, para a

validade do contrato, como ato jurídico que é, se faz necessário seja o agente capaz, o

objeto lícito e forma não prescrita ou não defesa em lei, além da inexistência de qualquer

tipo de coação, quer seja física ou psíquica, necessitando, o contratante, estar plenamente

livre e disposto na sua intenção de contratar.

Temos, então, a necessidade de informação ao consumidor como um requisito

essencial de validade das disposições contratuais, devendo conter o instrumento, de forma

clara e inequívoca, todas as informações pertinentes ao objeto do contrato, forma de

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execução, rescisão ou resolução, pagamento, responsabilidades, etc... Com relação à

capacidade, verifica-se que o contrato será nulo uma vez celebrado entre partes com idade

inferior a 21 anos, a não ser na hipótese em que o contratante tenha entre 16 e 21 anos,

desde que haja, nesta hipótese, autorização específica e assistência de seus responsáveis

legais, geralmente seus genitores.

A identificação dos contratantes, com respectiva qualificação, em especial no

tocante ao endereço físico do estabelecimento do contratado são requisitos essenciais a

serem observados, sob pena de configuração da criação de óbice à localização efetiva para

fins de responsabilização do provedor contratado3.

De grande valia aqui a lição trazida por CERQUEIRA4, no tocante à efetiva

formação dos contratos chamados de virtuais, como o contrato de prestação de serviço por

parte do provedor de internet, aqui estudado:

“O contrato se completa através de mensagem eletrônica enviada, pelo

oblato, ao ofertante, confirmando a aceitação do negócio proposto, ou através do

preenchimento de documentos eletrônicos padrões, disponibilizados pelo próprio

proponente em seu site na Internet. Esta aceitação, quando manifestada

expressamente pelo consumidor (seja através de um clique de mouse, envio de e-

mail e outros), aperfeiçoa o contrato e torna completa a contratação entre as

partes, obrigando-as nos termos da oferta aceita e tornando exigíveis as condições

estabelecidas”.

3 Especialmente para fins de configuração de competência territorial para ajuizamento de demanda com cunho reparatório, na orientação do art. 9º da LICC e do art. 1087 do Código Civil. 4 CERQUEIRA, T.Q., p. 83.

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21

4 RELAÇÃO DE CONSUMO

4.1 Natureza jurídica da relação

Podemos definir provedor de internet como a empresa que coloca à disposição de

usuários o acesso à rede mundial de computadores, usualmente via fax modem, mediante

conexão telefônica.

Na outra ponta, temos o usuário dos serviços, aquele que irá usufruir do acesso à

rede mundial, podendo, dependendo da amplitude do contrato, usufruir ainda dos benefícios

oferecidos na rede pelo próprio provedor contratado, através de uma diversa gama de

serviços, produtos e promoções e exclusivos disponibilizados pelo provedor contratado.

A relação de consumo, que segundo a professora Cláudia Lima Marques5, são

“todas aquelas relações contratuais ligando um consumidor a um profissional, fornecedor

de bens ou serviços” está devidamente caracterizada, conforme se demonstra a seguir: Pelo

art. 2º do Código do Consumidor, temos que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica

que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Sem sombra de dúvidas,

que presente o requisito principal para a configuração jurídica da relação de consumo, pois

o acesso, as informações, o lazer e a pesquisa são consumidas pelo contratante. Ainda que

repassasse ou utilizasse de outro modo as informações da rede retiradas, como, por

exemplo, para finalidades profissionais/comerciais, numa aplicação da chamada teoria

finalista6, ainda assim figuraria o usuário como consumidor, posto ser impossível a

fiscalização absoluta e o acompanhamento do destino dado à todas os benefícios e produtos

retirados do acesso à rede mundial de computadores.

Da mesma forma, a pessoa jurídica que mantém contrato com provedor, ao nosso

ver, deve ser considerada consumidora, enquanto utiliza a rede para obtenção de dados e

envio de mensagens, por exemplo, entre suas filiais ou representantes. Não há como provar

que a pessoa jurídica utiliza a internet tão somente com o objetivo de agregar as

5 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do consumidor. 2ª Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 98. 6 Sustentada por alguns doutrinadores, segundo a qual qualquer destinação do produto ou serviço, que não seja com cunho exclusivamente de consumo final, sem qualquer repasse a terceiros, direta ou indiretamente, excluiria a relação de consumo bem como a incidência das regras do Código do Consumidor.

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informações e benefícios de tal uso colhidos para exclusivamente agregá- los à cadeia

produtiva, única forma de admitirmos sua não configuração na posição de consumidora.

O enquadramento do provedor de acesso à internet está consubstanciado no conceito

trazido pelo art. 3º da lei 8.078/90: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou

privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem

atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,

exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” E o

produto objeto do contrato, ainda que em parte imaterial (porém avaliável

economicamente), também é abrangido pela lei. Nas palavras de José Geraldo Brito

Filomeno7 “produto (entenda-se “bens”) é qualquer objeto de interesse em dada relação de

consumo, e destinado a satisfazer uma necessidade do adquirente, como destinatário final.”

Por tal conceito, o próprio acesso à rede é, de forma direta, bem de consumo, que dirá os

serviços dali obtidos. Configurada a relação, daí surgindo seus efeitos jurídicos, em

especial a proteção aos internautas (usuários da rede mundial de computadores) ante os

abusos que começam a ser constados.

Percebe-se, assim, a incidência aos contratos de acesso, prestação de serviços e afins

correlacionados à internet, de todas as normas inerentes à tutela dos direitos do consumidor

atualmente vigentes, ente elas, com maior destaque, o próprio Código de Defesa do

Consumidor - Lei 8.078, de 11/09/90, além da seguinte legislação pertinente:

· Lei 1.521/51, que dispões sobre os delitos praticados contra a economia

popular;

· Lei Delegada 4, de 26/09/62, que trata da intervenção no domínio

econômico com o intuito de garantia da livre distribuição de produtos de

consumo;

· Lei 7.347/85, que versa e especifica procedimentos para ação civil interposta

em face a danos causados ao consumidor;

· Lei 8.137/90, que define os crimes contra as relações de consumo;

· Decreto 861/73, que disciplina o Sistema Nacional de Defesa do consumidor

e traz sanções administrativas;

7 GRINOVER, Ada Pelegrini ... [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998. p. 40.

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· Lei complementar 80/94, que regulamenta a ação da Defensoria Pública da

União para lutar pela tutela dos direitos e interesses do consumidor

eventualmente prejudicado;

· Lei 8.884/94, que regulamente e define atribuições ao CADE - Conselho

Administrativo de Defesa Econômica, determinando competência e

procedimentos para a constatação da incidência de infração à ordem

econômica e aplicação de penalidades;

· Decreto 1.306/94 que cria e regulamenta o Fundo de Defesa dos Direitos

Difusos visando a reparação de danos causados ao consumidor.

4.2 Vulnerabilidade e hipossuficiência

Importante destacar uma característica presente na relação de consumo aqui

analisada: o consumidor, nos contratos que envolvem a utilização dos serviços do provedor,

é altamente hipossuficiente e vulnerável. Tal vulnerabilidade, característica inerente a todos

os consumidores, encontra-se presente na necessidade indiscutível de acesso à rede mundial

de computadores. Também, na oferta indiscriminada, abundante e direta que usam os meios

de publicidade entrando diretamente na tela do computador do usuário, numa verdadeira

pescaria de consumo.

A hipossuficiência também encontra aqui grande ancoradouro. ANTÔNIO

HERMAN DE VASCONCELOS E BENJAMIN8, define consumidor hipossuficiente como

aqueles “ignorantes e de pouco conhecimento, de idade pequena e avançada, de saúde

frágil, bem como aqueles cuja posição social não lhes permita avaliar com adequação o

produto ou serviço que estão adquirindo”. Ainda: “A utilização, pelo fornecedor, de

técnicas mercadológicas que se aproveitem da hipossuficiência do consumidor caracteriza a

abusividade da prática” Como quando falamos em internet estamos falando em tecnologia

de ponta, dominada por poucos, deparamo-nos com a hipossuficiência dos navegadores

normais, quer seja frente ao poderio econômico dos grandes provedores e fabricantes de

softwares, quer pela absoluta falta de esclarecimentos e conhecimento sobre as tecnologias,

linguagens e o protocolo da rede.

8 GRINOVER, Ada Pelegrini ... [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998. p. 300.

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Aliás, geralmente, nem sabe o contratante quais os serviços que está adquirindo,

vindo a aprender a explorá- los e a melhor conhecê- los tão somente após o transcurso

regular do contrato. Nesta linha, poucos são os que não se enquadram na condição de

hipossuficientes, uma vez considerada a tecnologia e o desenvolvimento avassalador de

proporções desmesuradas que tomam a rede de computadores e o comércio virtual como

um todo (e-commerce, e-business, business to business).

4.3 Contrato de adesão

Destaque também para a característica de contrato de adesão que acompanham os

contratos de prestação de serviços aqui estudados.

A contratação dos serviços de provedor, usualmente, ocorre sem contato direto entre

as partes, mediante simples adesão a contrato padrão disponibilizado na própria rede

(WWW). É a forma mais pura da adesão: ou contratante aceita, ou não aceita e não tem

acesso ao serviço.

Ao usuário cabe tão somente a escolha de qual plano, dentro de sua necessidade e

respectivamente disponibilidade econômica, melhor lhe convém. Nenhuma outra discussão,

a princípio, parece possível nesta categoria de contratos.

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5 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL

Do que se extrai pelo acima demonstrado, aplicam-se aos contratos de provedor de

internet todas as disposições presentes na lei 8.078/90, principalmente no que tange à

reparação de danos.

Algumas questões, todavia, merecem comentários, justamente pelas peculiaridades

inerentes a esses contratos atípicos: Como a rede permite o acesso a pontos de venda

infinitos e sem identidade geográfica, aplica-se o disposto no art. 9º da LICC e do art. 1087

do Código Civil: “reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”.

Necessária se faz, então, a verificação da comarca onde se encontra sediado o provedor de

serviços. Parece a única solução para fixação de competência para dirimir eventuais

conflitos existentes nas relações comerciais com empresas alienígenas. Daí surge a

importância de se configurar justamente a aplicação da legislação nacional, em especial o

Código de Defesa do Consumidor, às relações operadas pela internet e, no caso específico

do presente trabalho, a delimitação da responsabilidade do provedor de serviços de acesso e

afins.

5.1 Responsabilidade do provedor de internet frente ao seu usuário

É de solar clareza a responsabilidade oriunda das relações e produtos oferecidos

pelo provedor ao usuário, de forma direta. Ou seja, o provedor de internet responde por

qualquer vício ou defeito no fornecimento dos serviços objeto do contrato, como o

gerenciamento da caixa postal, o fornecimento de programas, a lentidão nos acessos, a

venda direta de softwares por parte do provedor, etc... É a configuração típica da chamada

responsabilidade contratual, inerente às normas que tutelam os direitos do consumidor.

Portanto, todas as normas da lei de proteção ao consumidor são aqui aplicáveis. aos

abusos existentes nos contratos formulários de serviços de provedor de internet.

Como exemplo de tais abusos, citamos a cláusula que limita a responsabilidade pelo

congestionamento das linhas telefônicas, que, em primeiro lugar, trata-se de maneira fácil

de eximir-se de danos, imputando qualquer falha à terceiro, no caso o operador dos serviços

de telefone, e, por segundo, bate de afronta ao artigo 39, I do CDC:

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“Art. 39 – É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços dentre outras

práticas abusivas: I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao

fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites

quantitativos”;

A desculpa da linha ocupada também não encontra guarida no art. 20, § 2º: Art. 20 –

§ 2º - São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que

razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam às normas

regulamentares de prestabilidade.

Também é abusiva a cláusula que permite a alteração unilateral do contrato. Veja-se

o art. 51, XIII:

“Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais

relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

XIII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a

qualidade do contrato, após sua celebração”.

Diversos outros abusos podem ser encontrados na análise especifica de cada

contrato, mas não serão aqui abordados pela simples colocação que aplica-se o Código do

Consumidor de forma integral às praticas pela norma vedadas eventualmente encontradas

em tais instrumentos.

5.2 Responsabilidade solidária

Questão mais complexa é aquela que levanta a hipótese de responder o provedor de

internet por todas as transações e conteúdos ofertados por terceiros, dentro de uma

responsabilidade extracontratual, que ultrapassa a gama de serviços e produtos por ele

diretamente disponibilizados para o consumo direto de seus serviços.

Aqui, deparamo-nos com a necessidade de distinção de duas classes de terceiros,

para a respectiva delimitação da responsabilidade do provedor de internet.

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27

5.3 Responsabilidade do provedor pelo fato de terceiro com sua

atividade relacionado

Uma vez superada a questão da responsabilização contratual do usuário do serviço

do provedor por parte do próprio provedor na qualidade de fornecedor de serviços e

produtos, surge aqui a necessidade de demonstração de uma responsabilidade inerente a

terceiros que, de uma forma ou outra, interagem com a atividade empresarial do provedor

de internet, atraindo para o provedor, conforme se demonstrará a seguir, uma

responsabilidade extracontratual.

É a responsabilidade para com os atos de terceiros que utilizam, da mesma forma

que o usuário aqui em tal condição retratado, dos serviços do provedor, quer seja locando

espaço em seu servidor, quer seja anunciando em suas páginas, quer seja vendendo

produtos e serviços e remunerando o servidor para tanto, e, de tal forma, contribuindo para

que o consumidor adquira ou utilize de tais produtos ofertados, mediante a participação

indireta do provedor de acesso à internet.

Para uma melhor visualização da responsabilidade aqui demonstrada, deve-se

esclarecer, primeiramente, se ao fornecedor ligado de forma direta ou indireta ao provedor,

pode-se aplicar o disposto no parágrafo único do art. 7º do Código de Defesa do

Consumidor, para o caso de defeito ou vício qualquer na execução de serviços ou na

entrega da coisa (em caso de compra e venda on line) imputado ao terceiro fabricante

fornecedor:

“Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão

solidariamente pela reparação dos danos, previstos nas normas de consumo”.

Ao comentar tal norma, os autores do anteprojeto do Código do Consumidor,

afirmam que “Como a responsabilidade é objetiva, decorrente de simples colocação no

mercado de determinado produto ou prestação de dado serviço, ao consumidor é conferido

o direito de intentar as medidas contra todos os que estiveram na cadeia de responsabilidade

que propiciou a colocação do mesmo produto no mercado ou então a prestação do serviço”.

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Ora, parece que por tal visão responde o provedor de internet pelo conteúdo ali

disponibilizado por seus clientes, considerando ainda que possui o controle sobre a locação

de seu espaço e seu material publicitário.

Mas a solução não parece tão fácil. Se admitirmos com total frieza a aplicação de

citada norma, teremos uma responsabilidade sem limites imputada ao provedor, sob todos

os produtos e serviços negociados, ainda que sem sua participação direta, condição que

poderia tornar impraticável a atividade.

É bem verdade que os provedores têm se mostrado displicentes com o conteúdo do

material por eles colocado na rede, procurando eximir-se de qualquer responsabilidade

neste sentido.

Um de nossos maiores provedores, o UOL, tem em seu contrato a seguinte

disposição: “O UOL não se responsabiliza pelas transações comerciais efetuadas on line

que são de responsabilidade de quem colocar produtos ou serviços à venda via UOL ou

internet”.

Nelson Nery Júnior9 nos ensina que “... no regime jurídico do Código de Defesa do

Consumidor, toda e qualquer cláusula que contenha óbice ao dever legal de o fornecedor

indenizar é considerada abusiva e, portanto, nula de pleno direito, sendo, pois, ilegítima sua

inclusão nos contratos de consumo”.

Nota-se, portanto, uma tendência generalizada dos provedores de internet em argüir

que figuram numa condição de mero intermediário, mero veículo, sem nenhuma

responsabilidade ou intervenção nas relações existentes na rede. Cláusulas como a supra

transcrita demonstram justamente o temor à responsabilização civil e devem ser tidas como

inexistentes.

No lado contrário, verifica-se que os usuários estão cada vez mais preocupados com

a proliferação generalizada das informações na internet. São os casos de pedofilia, ataques

piratas a base de dados, empresas que não entregam os produtos, divulgação e incitação ao

uso de drogas, incentivo a programas de jogos (como, por ex., sites de cassino em países

como o Brasil, onde o jogo é ilícito). Atento à tais perigosas tendências, somos da opinião

9 NERY, Nelson Júnior; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de processo Civil Comentado e Legislação Processul Extravagante em vigor. 3º Ed. São Paulo, RT, 1997, pág. 1380.

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de que os provedores devem assumir e serem responsabilizados pelo conteúdo e as

transações que, de uma forma indireta, utilizam de seus serviços.

No direito comparado, citamos os recentes casos do provedor eBay, processado

pelos pais de adolescentes intoxicados após adquirirem uma substância chamada DXM –

droga para tosse, em um de seus sites de leilão, sendo que as normas da eBay proíbem a

venda de drogas ou medicamentos que exigem a receita médica, como era o caso do

produto.

Também o mega portal (provedor de grande porte) Yahoo está sofrendo severo

processo por parte das empresas Nintendo, Eletronic Arts e Sega, que acusam o site de

permitir a venda ilegal de videogames falsificados em seus leilões. As concorrentes, que se

uniram no objetivo de combater a falsificação, informaram que notificaram a Yahoo para

que tomasse medidas de controle de segurança, instrução ignorada e que enseja a reparação

dos danos, de grande monta.

Dependendo do caso, o provedor poderá eximir-se de sua responsabilidade se

provar a culpa exclusiva do consumidor ou terceiro (art. 12, § 3º, III e art. 14, § 3º, II do

CDC).

Sugerimos, então, que a aplicação da solidariedade passiva às relações de consumo

oriundas de serviços que envolvam de forma indireta os provedores de serviço de internet

seja aplicada, sim, mas de forma ponderada analisando-se a peculiaridades do caso

concreto, atento para a efetiva possibilidade de controle por parte do servidor sobre as

informações e idoneidade de seus anunciantes e contratantes.

5.4 Responsabilidade do provedor pelo fato de terceiro

Uma fez definida a responsabilidade acima demonstrada, inerente a terceiros de uma

forma ou outra correlacionados para com o provedor de internet, que, em virtude desse fato

e em decorrência das normas que regem as relações de consumo, atrai para si tal ônus, na

ausência de disposição contratual diversa ou outra delimitação legal específica, passamos a

uma análise da responsabilidade em campo mais abrangente, não ligado ao ramo de

atividade, parcerias comerciais e afins do provedor de internet aqui considerado

singularmente como sujeito passível ou não de responsabilização civil.

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São os chamados terceiros que não possuem qualquer relação para com o provedor.

O usuário chega ao seu conhecimento não mediante anúncio, indicação ou outro meio de

divulgação utilizado de forma direta ou indireta pelo provedor, mas sim através de outras

fontes, tendo o provedor de internet participação tão somente em virtude de ter

disponibilizado ao usuário o acesso do mesmo à rede mundial de computadores.

Nesta situação, querer responsabilizar o provedor é utopia. Excede as barreiras do

direito, do senso de justiça e do sustentável. É absurdo pretender responda o provedor por

casos, como, por exemplo, ter o usuário obtido acesso a métodos de fabricação de

entorpecente químico obtido em home-page européia, ou ainda pela contaminação de seu

computador através de vírus de um arquivo à sua pessoa enviado aleatoriamente,

simplesmente pelo fato de ter o provedor permitido ao usuário o acesso do mesmo à rede

mundial de computadores, e, conseqüentemente, às informações consideradas ilícitas ou

que eventualmente venham a causar qualquer tipo de dano reparável ou indenizável. É, ao

nosso ponto de vista, o mesmo que pretender responsabilizar o fabricante de fax pelas

mensagens a ele transmitidas.

Compartilha de nossa opinião CORRÊA10, ao afirmar que:

“Ou seja, além de inexistir lei acerca da responsabilidade dos provedores,

existe norma constitucional que lhes proíbe o exame dos dados de seus servidores.

Também, é impossível a fiscalização de todas as informações que entram e saem de

um provedor, pois, além de servir seus usuários, também serve de [pista] para a

internet. Assim, um infindável número de informações, como e-mails, home-pages,

listas de discussões, chats, é atualizado instantaneamente por meio de

procedimentos eletrônicos automáticos, sobre os quais o provedor não tem nenhum

controle. Como responsabilizar alguém por aquilo a que não deu causa?”.

É bem verdade que, atualmente, pode o provedor de internet, até como meio de

constatar a eficiência de sua publicidade indireta, rastrear as páginas visitadas pelo seu

usuário, mas tal rastreamento não pode, em hipótese alguma, ser confundido com controle

ou censura, ficando completamente impossível ao provedor limitar ou tutelar o acesso de

10 CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos Jurídicos da Internet. São Paulo. Saraiva, 2.000, p. 24.

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seu usuário às infinitas variedades de home pages, serviços e produtos disponibilizados na

rede mundial de computadores.

5.5 Responsabilidade do Fornecedor

A sociedade contemporânea vem sofrendo incontrolável difusão de danos

decorrentes do uso de produtos defeituosos, resultado da industrialização e da produção em

massa. Países mais desenvolvidos que o nosso, ao atingir o grau de industrialização que

temos hoje, regularam as relações de consumo a partir da criação de leis extravagantes.

No Brasil atual, o responsável por essa relação de consumo foi o Código de Defesa

do Consumidor - CDC - Lei 8078 de 11 de setembro de 1990. O CDC veio criar uma

situação especial de exceção perante alguns princípios tradicionais, enquanto estabeleceu

um tratamento novo para situações já reguladas. E com seu advento foi introduzida

considerável mudança nas relações de consumo, já que o "direito privado das obrigações"

passou a ser disciplinado por três regimes jurídicos: o civil, o comercial e a tutela do

consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor foi criado por expressa determinação

constitucional, inseriu a defesa do consumidor entre os direitos e garantias fundamentais ao

determinar, em seu artigo 5º, inciso XXXII, que "o Estado promoverá na forma da lei, a

defesa do consumidor". O claro objetivo do legislador constituinte, portanto, era de que

fosse implantada uma Política Nacional de Relações de Consumo, uma disciplina jurídica

única e uniforme destinada a tutelar os interesses patrimoniais e morais de todos os

consumidores.

Assim, devemos esquecer os princípios individualísticos do século passado para

solucionar as questões referentes às relações de consumo, em que se faz obrigatória a

presença de dois sujeitos: o consumidor e o fornecedor.

Pode-se dizer que a intenção principal do CDC é garantir efetiva e integral

reparação de danos causados pelo fornecedor ao consumidor, seja com relação a produtos

como também de serviços prestados. Esse código também veio para corrigir os "efeitos

perversos" do mercado de consumo, atribuindo ao consumidor uma igualdade jurídica

destinada a compensar a sua desigualdade econômica frente ao fornecedor.

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A transformação da responsabilidade civil nas relações de consumo, adveio de dois

fatores fundamentais: em primeiro lugar, a produção é feita em série, e não mais sob

encomenda unitária, multiplicando-se, por conseqüência, a potencialidade danosa; em

segundo lugar, criou-se um círculo de distribuição de bens em massa totalmente diverso do

pequeno comércio de antigamente. Era preciso, portanto, rever certos princípios

tradicionais da responsabilidade civil e os esquemas de tutela jurisdicional para resolver os

inumeráveis problemas decorrentes da relação de consumo e atingir os objetivos descritos

no CDC.

5.5.1 Elementos da Relação de Consumo

Os elementos de uma relação de consumo são representados pelos sujeitos e objeto.

No pólo ativo da relação de consumo figura o fornecedor, definido no artigo 3º do CDC,

caput como sendo "toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou

estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de

produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,

distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".

No pólo passivo da mesma relação estará o consumidor, definido no artigo 2º do

Código como sendo "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou

serviço como destinatário final". Tal como a pessoa física, a pessoa jurídica só poderá ser

considerada consumidor quando os bens ou serviços adquiridos não tiverem vinculação

com a sua atividade, ou seja quando este produto é adquirido pelo consumidor final, ou

ainda não tiver ela caráter empresarial, como as fundações, as associações e as sociedades

civis sem fins lucrativos. O legislador também equiparou o consumidor a coletividade de

pessoas.

O objetivo da relação de consumo será sempre produtos ou serviços, definidos,

respectivamente, nos parágrafos 1º e 2º do artigo 3º do CDC. Produto, diz o código, "é

qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial". Serviço, por sua vez, "é qualquer

atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive de natureza

bancária, financeira de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter

trabalhista".

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Enquanto o produto tem por essência um bem, serviço diz respeito a uma atividade

prestada mediante remuneração. Deva-se entender que por produto é toda utilidade

produzida, sendo designado tanto pelas utilidades materiais, tiradas do solo e subsolo, ou

produzidas direta ou indiretamente por eles, como os que se fabricam ou se produzem pela

ação do homem, pela transformação de uma coisa em outras e pelo trabalho.

5.5.2 Princípios que Regem a Responsabilidade do Fornecedor; Teoria

do Risco do empreendimento, Responsabilidade objetiva

Até o advento do CDC, a proteção do comprador resumia-se à garantia pelos vícios

redibitórios. O vendedor só respondia pelos vícios ou defeitos ocultos da coisa, enquanto

que os riscos do consumo corriam por conta do comprador. A partir daí surgiram uma série

de questionamentos tais como responsabilizar o comerciante pelo defeito oculto de produto

que lhe foi fornecido, ou a dúvida de que a garantia contra os vícios redibitórios exige

vínculo contratual, o que não existe entre consumidor e fabricante. Essa situação jurídica

foi tornando-se insustentável, pois o fabricante é o verdadeiro introdutor da coisa perigosa

ou com defeito no mercado, e não o distribuidor.

Pensou-se na responsabilidade regressiva em cadeia na qual o adquirente da coisa

defeituosa aciona o vendedor, que aciona o atacadista e assim sucessivamente até chegar ao

fabricante. Tal sistema, entretanto, seria muito oneroso e demorado acarretando prejuízos

principalmente para o consumidor lesado.

Dessa maneira, o instituto dos vícios redibitórios mostrava-se absolutamente

incapaz de reparar os danos do consumidor nas modernas relações de consumo. O CDC,

então, deslocou a responsabilidade do comerciante para o fornecedor ( fabricante, produtor,

etc); transferir também, do consumidor para o produtor os riscos do consumo. Pode-se dizer

que o código esposou a teoria do risco do empreendimento, que se contrapõe à teoria do

risco do consumo.

Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer

alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios

ou defeitos dos bens ou serviços fornecidos, independentemente da culpa. O fornecedor

passa a ser o garantidor dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo,

respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos.

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O artigo 12 do CDC consagrou, sem sombra de dúvida, a responsabilidade objetiva

fundada no risco do empreendimento. O consumidor, portanto, tem apenas que provar o

dano e o nexo causal. A discussão da culpa é inteiramente estranha às relações de consumo.

Mesmo em relação ao dano e ao nexo causal, pode vir a ser beneficiado com a inversão do

ônus da prova (artigo 6º, VIII).

5.5.3 Responsabilidade Pelo Fato do Produto e do Serviço

Entende-se por fato do produto o acontecimento externo que causa dano material ou

moral ao consumidor, decorrente de um defeito do produto. O fornecimento de produtos ou

serviços nocivos à saúde ou comprometedores da segurança do consumidor é responsável

pela grande maioria dos acidentes de consumo. Um exemplo disso é uma deficiência no

sistema de freios do veículo que causa acidente com graves conseqüências.

Portanto, em se tratando de danos decorrentes das relações de consumo, produzidos

por produtos defeituosos, o Código Civil fica afastado. O fundamento dessa

responsabilidade deixa de ser a relação contratual para se materializar em função da

existência de outro tipo de vínculo: o produto defeituoso que foi lançado no mercado e que,

numa relação de consumo, contratual ou não, dá causa a um acidente consoante artigo 12

do CDC.

A responsabilidade por acidentes de consumo (fato do produto) tem por

pressupostos o defeito do produto, o dano ("eventus damni") e a relação de causalidade

entre o defeito e o dano. Quanto aos responsáveis, o Código criou três modalidades de

responsáveis: o real (fabricante, construtor, produtor); o presumido (importador); o aparente

(comerciante). Tratando-se de responsabilidade por fato do produto, todavia, o artigo 12 do

Código responsabiliza somente o fabricante, o produtor, o construtor e o importador. O

comerciante foi excluído porque nas relações de consumo em massa, ele não possui

nenhum controle sobre a segurança e qualidade das mercadorias. Portanto, cabe ao

fabricante assumir os riscos de todo o processo de produção e do ciclo de consumo.

A respeito da solidariedade, havendo mais de um fabricante para um mesmo

produto, ou mais de um causador do dano, todos respondem solidariamente pela reparação.

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5.5.4 Fato do Serviço

A responsabilidade pelo fato do serviço vem disciplinada no artigo 14 do CDC, nos

mesmos moldes da responsabilidade pelo fato do produto. Também aqui teremos acidente

de consumo, acontecimentos externos que causam dano material ou moral ao consumidor,

só que decorrentes de defeitos do serviço, aos quais serão aplicáveis, com os devidos

ajustes, os mesmos princípios emergentes do artigo 12. O serviço é defeituoso quando não

fornece a segurança que o consumidor pode dele esperar; aqui os defeitos podem ser de

concepção, de prestação ou de comercialização.

Quanto às excludentes de responsabilidade, mesmo na responsabilidade objetiva, é

indispensável a existência do nexo causal. Esta é a regra universal, quase absoluta, só

excepcionada nos raríssimos casos em que a responsabilidade é fundada no risco integral, o

que não ocorre no CDC. Inexistindo relação de causa e efeito, ocorre a exoneração da

responsabilidade. Essa é a razão das regras do artigo 12, parágrafo 3º, e artigo 14, parágrafo

3º do CDC, porquanto, em todas as hipóteses de exclusão de responsabilidade ali

mencionadas, o fundamento é a inexistência do nexo causal.

São excludentes de responsabilidade as hipóteses em que o fornecedor provar: I-

que não colocou o produto no mercado; II- que, embora haja colocado o produto no

mercado, o defeito inexiste; III- a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. As

hipóteses que não foram consideradas excludentes de responsabilidade são caso fortuito e

força maior e o risco do desenvolvimento

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6 CONTRATOS GRATUITOS

Uma nova modalidade de serviços de provedor vem surgindo com força devastadora e

velocidade surpreendente: são os chamados provedores gratuitos, que permitem o acesso

aos serviços do provedor da internet e seu portal sem qualquer remuneração direta pelo

serviço, ou seja, sem precisar o usuário remunerar o servidor pelo número de acessos ou o

número de horas que permaneceu conectado.

A questão, de grande importância prática que nos surge, é se tais contratos, gratuitos,

estariam sujeitos às regras pertinentes ao Código de Defesa do Consumidor.

Primeiramente, trazemos o disposto no artigo 3º, § 2º da lei 8.078/90:

“§ 2º : Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,

mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e

securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”

Numa interpretação literal e isolada, extraímos que, inexistindo remuneração, não há o

que se falar em serviço e consequentemente relação de consumo para fins de aplicação da

lei protetiva.

Eduardo Gabriel Saad11, em seus Comentários ao Código de Defesa do Consumidor,

nos traz que:

“Por derradeiro, de lembrar-se que há quem preste, gratuitamente, um serviço

a outrem. Desnecessário frisar que, no caso, não há relação de consumo sujeita a este

Código”.

Pois bem, cabe analisar se o contrato de “internet gratuita” é realmente gratuito sob a

ótica jurídica. Maria Helena Diniz12 nos traz o conceito de tal espécie contratual:

11 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: Lei nº 8.078, de 11.09.90. 3º Ed., - São Paulo: LTr Editora Ltda., 1998, pág. 88. 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 3º volume. São Paulo: Saraiva. 1995. Pág. 63.

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“Os contratos benéficos ou a título gratuito são aqueles que oneram somente

uma das partes, proporcionando à outra uma vantagem, sem qualquer

contraprestação. Logo, apenas um dos contratantes obtém proveito, que corresponde

a um sacrifício do outro, como ocorre, por ex., com a doação pura e simples, com o

depósito ou com o mutuo sem retribuição. Em regra, esse tipo de contrato encerra

uma liberalidade, em que uma das partes sofre redução no seu patrimônio em

benefício da outra. Geralmente, todos os contratos onerosos são bilaterais, e os

gratuitos, unilaterais, porém nem sempre, pois pode haver um contrato que seja,

concomitantemente, unilateral e oneroso, como, p. ex., o mútuo sujeito a pagamento

de juros...”.

Realmente, o usuário dos serviços do provedor gratuito, não o remunera de forma

direta, pagando pelo acesso. Todavia, essa característica não retira a onerosidade do

contrato, posto que o usuário consume do provedor outros serviços diversos, como

programas fornecidos, aquisição de arquivos e produtos e, principalmente a publicidade ali

disponibilizada de uma forma até agressiva e indiscreta. Publicidade esta, que é o carro

forte destes provedores. É o que os mantém e de onde retira-se seu faturamento, dando

margem, conforme o caso, a projeções de valores para o serviço com base justamente no

número de usuários que estão ligados ao servidor e que o acessam diariamente. O acesso

“gratuito” não traz, portanto, qualquer diminuição no patrimônio do provedor. Tão pouco

há uma ausência de contraprestação. Muito pelo contrário: o provedor/servidor lucra e

muito com o acesso do usuário. Sem ele, seu negócio fracassa, pois é o internauta que

consome seus serviços, seus produtos, sua propaganda e softwares no provedor hospedados

ou divulgados, disponibilizando seu tempo e tornando-se dependente dos serviços por este

prestados.

A relação de dependência é tamanha ao ponto de que uma ruptura no fornecimento dos

serviços de acesso poder causar ao usuário transtornos e prejuízos mil, ante justamente a

importância que o serviço lhe causa em hábito adquiridos mediante o acesso diário e a troca

de informações entre os usuários (e-mail, chat, etc...).

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Da mesma opinião compartilha CERQUEIRA13, que nos traz a lição de que:

“Nenhum serviço poderá ser descontinuado - mesmo que seja gratuito - sem

que o usuário seja avisado com certa antecedência. Isto porque usuários acabam se

fiando em certos serviços, mesmo que não paguem por eles, e podem ser prejudicados

em caso de corte abrupto. Em certos casos, mesmo que não seja uma violação

contratual, quando há cláusulas contratuais que o prevejam, o corte repentino de um

determinado serviço pode gerar obrigações de indenizar, do âmbito do direito civil, e

ser péssimo negócio para as relações entre provedor e usuário”.

A onerosidade e contraprestação por parte do usuário está, assim, mais que

caracterizada.

Vejamos, ainda, o enquadramento dos contratos de prestação gratuita de acesso à

internet e serviços afins entre a classe dos contratos bilaterais ou unilaterais:

Para tanto, frisamos que, como nos ensina o Prof. Orlando Gomes14, “Todo contrato

bilateral é, entretanto, oneroso, por isso que, suscitando prestações correlatas, a relação

entre vantagens e sacrifício decorre da própria estrutura do negócio jurídico.”

Os contratos unilaterais caracterizam-se justamente pelo fato de apenas uma parte se

obrigar, ficando a outra desincumbida de qualquer ônus. “O peso do contrato é todo de um

lado, os efeitos são somente passivos de um lado, e somente ativos do outro”15. Já os

contratos bilaterais trazem obrigações para ambas as partes, obrigações essas que uma vez

rompidas geram o rompimento do pacto.

Assim, cabe verificar, se, além da onerosidade já demonstrada, são os contratos de

acesso à internet unilaterais ou bilaterais. Tal dúvida é suprida pela simples análise de

qualquer desses contratos formulários exibidos nos sites de “internet gratuita”. Ali,

claramente se constata que não é só a parte contratada que tem obrigações, mas também o

usuário contratante. Como exemplo, citamos a exigência do uso apropriado do serviço com

vedações de práticas como a divulgação comercial de produtos ou serviços, a invasão de

13 CERQUEIRA, Tarcísio Queiroz. Software: lei, comércio, contratos e serviços de informática. Rio de Janeiro: Ed. Esplanada, 2000. p. 240. 14 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro. Forense, 1995. Pág. 74. 15 GOMES, Orlando, p. 71

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privacidade, a divulgação de textos e mensagens não desejadas, consideradas imorais ou

indecentes.

Assim, percebe-se que os contratos de provedor de internet devem ser tidos como

verdadeiros contratos de consumo, aplicando-se, da mesma forma que nos contratos onde

existe uma contraprestação pecuniária direta, todas as normas presentes no Código do

Consumidor. Caso contrário, a gratuidade serviria tão somente como uma máscara para

eximir os provedores de suas responsabilidades legais

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7 CONCLUSÃO

Após a realização de um curso sobre os direitos do consumidor, o mais importante é

buscar a compreensão da ideologia que permeia o Código de Defesa do Consumidor, desta

Política de Proteção ao Consumidor que na verdade, traz à tona uma nova maneira de

pensar o instituto jurídico da obrigação, uma luz sobre a importância da tutela dos

contratos, de forma geral, das obrigações a que se sujeitam as pessoas físicas e jurídicas nas

relações de consumo, já que são importantes facetas da paz social.

Consideramos como princípio de toda esta filosofia, o reconhecimento da

desigualdade entre consumidores e fornecedores, de forma a ser necessário o tratamento

desigual para os desiguais, sendo ele uma tutela especial destinada aos consumidores,

materializada no Código de defesa do Consumidor.

Especificamente, na nova concepção do contrato que o reconhece como importante

instrumento de distribuição econômica, que pode evitar a exclusão social e o

superendividamento através da nova proteção contratual estabelecida pelo CDC, fundada

em uma visão mais social e controlada do contrato, é que percebe-se não só a importância

atual desta filosofia da política de defesa do consumidor mas, os caminhos a serem abertos

para a expansão destes princípios por todo o mercado de consumo.

Muito positiva a posição dos maximalistas que concebem o CDC não como um

conjunto de normas direcionadas à proteção do consumidor não-profissional mas sim, como

um novo regulamento do mercado de consumo brasileiro.

Dentro desta nova ideologia, pela análise dos tipos de hipossuficiência a que estão

sujeitos os consumidores, assim como, pelo estudo das atuais técnicas de contratação, é

possível apreender o conceito de consumidor utilizado em nosso CDC e a coerente

extensão da aplicação deste conceito a partir da interpretação que focaliza identificar a

existência ou não da hipossuficiência.

Entendo que não só consumidor não-profissional deve ser tutelado como

consumidor, mas também o profissional, mesmo que não seja um destinatário final

econômico, sempre que for idntificada sua hipossuficiência frente ao fornecedor.

Não basta a consideração da condição social ou econômica do pequeno empresário

ou profissional para definir se há ou não essa desigualdade. A hipossuficiência fática,

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vulnerabilidade fática ou sócio-econômica que consiste na posição de superioridade do

fornecedor, seja por sua posição de monopólio, fático ou jurídico, seja por seu poderio

econômico ou em razão da essencialidade do serviço, de forma que, todos que contaratarem

com este fornecedor se encontram em condição de hipossuficiência, traz à tona a grande

possibilidade de mesmo um profissional se encontrar vulnerável em uma relação de

consumo, necessitando da tutela especial.

As relações inerentes aos contratos de serviço de provedores de internet trazem

grande pertinência à relações comerciais e intra pessoais observadas em crescimento

avançado nos últimos tempos. Conflitos e problemas jurídicos oriundos de tais relações

começam a ser percebidos e confrontam-se com a ausência de estudos aprofundados e

principalmente de legislação específica que regule a matéria. Talvez tal ausência de

regulamentação, que, usualmente, apenas define vantagens e distribui privilégios seja o

grande impulso da própria rede mundial de computadores (www).

De qualquer sorte, a relação de consumo está caracterizada nas relações entre

provedores e usuários. As dimensões da responsabilidade de tais provedores podem ser

delimitadas de três formas distintas: respondem os servidores pelos serviços

disponibilizados de forma direta a seus usuários (responsabilidade contratual); respondem

de forma solidária pelos serviços disponibilizados de forma indireta por terceiros com

vínculo ao provedor e conseqüente participação dentro da relação de consumo, dos quais o

usuário do serviço acabou contratando, e não respondem por terceiros sem qualquer ligação

com o provedor dos serviços, por inexistir qualquer capacidade de controle do provedor

sobre as informações e o conteúdo de todo material existente na internet.

São aplicáveis às relações entre usuários e provedor o Código do Consumidor,

inclusive para os casos dos chamados “provedores gratuitos” onde, embora não haja uma

remuneração direta do usuário, há uma contraprestação indireta e uma dependência de

consumo, que configura a bilateralidade e a onerosidade desses contratos atípicos.

Por fim, têm-se que os abusos existentes nos contratos de adesão de serviços de

provedores de internet são passíveis de coibição pela lei 8.078/90 e demais legislações

pertinentes, e a discussão de tais problemas, bem como a limitação dos campos de

responsabilidades são essenciais para evitar-se abusos de proporções maiores oriundos do

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crescente comércio virtual, quer seja ente consumidores e fornecedores, quer entre

empresas.

A finalidade do presente trabalho foi justamente traçar singelas considerações sobre

o tema, procurando clarear um pouco a obscuridade que paira sobre tão recente e

inexplorada matéria.

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