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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A IMPORTÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A VIABILIZAÇÃO DO DIREITO À INFORMAÇÃO Por: Daniele Werner Catalão Orientador Prof. Ana Paula Pereira da Gama Alves Ribeiro Rio de Janeiro 2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A IMPORTÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A

VIABILIZAÇÃO DO DIREITO À INFORMAÇÃO

Por: Daniele Werner Catalão

Orientador

Prof. Ana Paula Pereira da Gama Alves Ribeiro

Rio de Janeiro

2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A IMPORTÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A

VIABILIZAÇÃO DO DIREITO À INFORMAÇÃO

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Gestão Pública

Por: Daniele Werner Catalão

3

AGRADECIMENTOS

A Deus pela oportunidade de mais uma

conquista. Aos meus pais, avó e irmã

pela presença e por todo incentivo. Aos

amigos pelo carinho. E ao Ronaldo

pelo companheirismo.

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais e a

minha avó, que sempre priorizando a

educação, fizeram o possível e o

impossível para proporcionar esta e

muitas outras vitórias em minha vida.

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RESUMO

Com a emergência da Era da Informação o acesso às informações produzidas

pela administração pública tornou-se um requisito indispensável para o

funcionamento eficaz da democracia, pois, é através da transparência

administrativa que se possibilita o controle da sociedade civil sobre o Estado.

Entretanto apesar do significativo avanço na regulamentação do direito à

informação, observam-se diversos obstáculos que impedem a eficácia da

legislação e comprometem, assim, o exercício da cidadania. Nesta perspectiva,

a proposta deste trabalho é demonstrar o quão imprescindível é a

implementação de políticas públicas arquivísticas, tendo em vista que criam as

condições fundamentais para a viabilização da lei no cotidiano arquivístico.

Palavras-chave: Acesso à Informação Arquivística; Legislação Arquivística; Políticas Públicas Arquivísticas.

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METODOLOGIA

A fim de fornecer embasamento teórico para a reflexão proposta neste

trabalho, primeiramente, foi feito o levantamento de fontes bibliográficas entre

livros, trabalhos acadêmicos, artigos eletrônicos, bibliotecas virtuais, além da

legislação pertinente ao tema. Em seguida iniciou-se o processo de leitura e

análise do material selecionado, com o intuito de buscar os autores e as

contribuições mais relevantes para o desenvolvimento desta pesquisa. A partir

de então, foram definidos os assuntos que seriam abordados, necessários

para a compreensão do tema, delimitando assim o conteúdo tratado em cada

capítulo.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

ACESSO À INFORMAÇÃO 10

CAPÍTULO II

A INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE CIDADANIA 20

CAPÍTULO III

O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 29

CONCLUSÃO 38

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 40

8

INTRODUÇÃO

As transformações evidenciadas entre as diferentes civilizações ao

longo dos séculos comprovam a importância do documento de arquivo na

história da humanidade. A preservação do passado é indispensável ao

desenvolvimento do presente e do futuro, afinal, é através dos registros e

testemunhos deixados pelo homem que se constrói a memória e a identidade

cultural de uma nação, essenciais para a evolução e formação das sociedades.

Com a emergência da Era da informação o documento arquivístico

passou a ser um recurso estratégico tanto para o gerenciamento do Estado

Moderno quanto para o desenvolvimento humano, sobretudo na defesa de

direitos do individuo. Em conseqüência disso, a intensa busca pela informação

nos últimos anos resultou na construção de um importante arsenal legislativo

responsável pela regulamentação do direito de acesso à informação.

Baseado na finalidade precípua do tratamento arquivístico de tornar os

documentos acessíveis favorecendo a disseminação da informação, propõe-se

neste trabalho analisar o direito de acesso à informação pública, que embora

garantido desde a Constituição Federal de 1988, ainda apresenta-se como um

desafio para a realidade arquivística. Sabe-se que o aparato legal construído a

partir do processo de redemocratização, estabeleceu critérios importantes para

a preservação da documentação e para a proteção dos direitos fundamentais

do cidadão, no entanto, a elaboração de instrumentos legais não foi suficiente

para garantir o pleno direito de acesso aos documentos produzidos pela

administração pública brasileira.

Considerando o acesso à informação um dos pilares do regime

democrático, na medida em que assegura o diálogo entre o Estado e a

sociedade, pretende-se despertar a atenção acerca da importância da

implementação de políticas públicas arquivísticas no sentido de preencher as

lacunas criadas pelas normas, superando assim os obstáculos que impedem a

concretização dos princípios legais.

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Visando um melhor entendimento do conteúdo pesquisado,

estabeleceu-se a seguinte estrutura:

No primeiro capítulo, elaborou-se uma breve abordagem histórica sobre

a conquista do Direito à informação, analisando a evolução dos usos e valores

atribuídos ao documento de arquivo em diferentes períodos da história. Em

seguida apresentou-se um panorama sobre o processo de construção e

consolidação da legislação arquivística de acesso à informação.

No segundo capítulo, foi feita uma reflexão sobre a questão do acesso e

sigilo na administração pública, considerando a transparência administrativa

um pressuposto crucial para o exercício da cidadania. Além disso, foram

apresentados alguns dos principais problemas que comprometem a efetivação

do direito à informação no cotidiano arquivístico.

No terceiro e último capítulo apresentou-se o conceito e a trajetória das

políticas públicas no Brasil, destacando a importância e os requisitos

fundamentais para implementação destas políticas. Para finalizar, preocupou-

se em demonstrar principalmente, de que maneira estas ações

governamentais podem minimizar os problemas existentes e viabilizar as

determinações legais, garantindo assim através do acesso à informação, o

pleno funcionamento da democracia.

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CAPÍTULO I

ACESSO À INFORMAÇÃO

Um governo do povo, sem informações para o povo ou sem os meios para que ele a obtenha, não é nada mais do que o prólogo de uma farsa ou de uma tragédia ou talvez de ambas. A informação deve sempre governar sobre a ignorância, e o povo que quer ser seu próprio governante deve armar-se com o poder que a informação proporciona. (James Madison, 4º presidente americano).

A história dos arquivos teve inicio no Oriente, entretanto, é no Ocidente

que os usos da informação evoluem e contribuem para o desenvolvimento de

instrumentos compatíveis às novas funções da informação arquivística.

A princípio, os registros humanos eram preservados com o intuito de

comprovar ou testemunhar um fato, porém, no decorrer dos anos, as

transformações econômicas, políticas e tecnológicas atribuíram-lhes novas

utilidades. Além do valor probatório, o documento passou a ser conservado a

fim de atender aos interesses de valor histórico, científico e cultural.

Atualmente a informação tornou-se essencial para o progresso humano,

tendo em vista a capacidade de transformar o homem, a sociedade e a própria

humanidade. Vivenciamos a chamada Era da Informação, onde os arquivos

representam fontes de informações vitais para o gerenciamento do Estado

Moderno e para a defesa dos direitos do cidadão. Por conta disso, “os

processos de transferência e uso da informação constituem um dos cernes da

contemporaneidade.” (JARDIM, 1999, p. 1). Afinal, o objetivo central do

tratamento arquivístico é preservar e tornar acessíveis as informações contidas

no documento de arquivo, salvo àquelas consideradas de caráter sigiloso.

A partir de uma retrospectiva histórica sobre a conquista do direito à

informação constatou-se que a questão do acesso surge pela primeira vez

durante o governo revolucionário Francês. Desde então o conjunto de

11

dispositivos legais sobre este assunto sofreu vários avanços até culminarem na

atual legislação arquivística.

1.1 A Conquista do Direito à Informação: uma breve

abordagem histórica

Durante muitos séculos, a preservação dos documentos visava apenas

os interesses da nobreza. Somente os reis, monges e detentores de títulos

guardavam e utilizavam os arquivos como fontes de prova e testemunho de

seus direitos particulares.

A partir do século XVI destacam-se as funções jurídicas e

administrativas dos arquivos tornando-os essenciais para o exercício do poder

central. Desde então, deixam de ser privilégio de grupos dominantes da

sociedade e enquanto instrumentos básicos da administração passam a servir

ao Estado.

Após a Revolução Francesa, um novo valor é atribuído à informação

arquivística. O forte sentimento nacionalista, atrelado ao desejo de reconstruir

a história do país fez surgir o interesse cultural dando início a procura pelos

arquivos como fontes para a pesquisa histórica. Segundo Schellenberg (2004,

p. 27), “durante toda a revolução francesa, os documentos foram básicos para

a manutenção de uma antiga sociedade e para o estabelecimento de uma

nova.” Este interesse histórico possibilitou a concretização do acesso público

aos documentos, oficializado pela primeira vez na França em 1794, através do

decreto 7 do Messidor.

Assim começa um modo de administração diferente, onde o documento já não desempenha apenas um papel jurídico, mas constitui um instrumento de poder cujo acesso é sinal do poder do povo. (ROSSEAU; COUTURE, 1998, p. 31).

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Na prática este decreto não foi plenamente satisfatório, primeiro porque

a documentação mais recente não estava disponível à consulta pública, e

segundo, porque como o acesso era permitido apenas para a pesquisa, em

geral não era o cidadão comum quem consultava, mas sim o historiador.

Contudo, a atitude do governo revolucionário francês significou um grande

avanço na história da arquivística. Até o momento os arquivos existiam em

função do Estado; porém a partir da legitimação do acesso, havia sido

consagrada a concepção dos arquivos à serviço do cidadão.

Até a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) os progressos sobre a

questão do acesso não foram muito significativos. As leis e regulamentos

criados neste período mantinham o privilégio dos pesquisadores e eruditos.

Somente com a consolidação dos Estados democráticos, na segunda metade

do século XX, a informação adquire uma nova dimensão. A fim de garantir a

transparência governamental, o Estado e a Sociedade passam a interagir no

âmbito público. Com isso,

A informação adquire a relevância jurídica de que carecia porque suas qualidades e as condições nas quais deve dar-se sua circulação e posse repercutem diretamente na forma e alcance da participação da sociedade na tomada de decisões sobre assuntos que a afetam. Em outras palavras, essa relevância jurídica da informação se deve a que o regime jurídico da informação converte-se em um aspecto essencial do exercício da soberania pela coletividade. (JARDIM, 1999, p. 2).

É neste contexto que em 1948 através Declaração Universal dos

Direitos do homem emerge o Direito à Informação :

A declaração Francesa de 1789 já antecipara este direito, ao afirmar não apenas a liberdade de opinião – artigo 10 -, mas também a livre comunicação das idéias e opiniões, que é considerada, no artigo 11, um dos mais preciosos direitos do homem. Na declaração Universal dos Direitos do homem, o direito à informação está contemplado no art. 19 nos seguintes termos: todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer

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meio de expressão (LAFER1, 1991 apud FONSECA, 1996, p. 36).

Diante do exposto, constata-se que em todas as épocas a informação

apresentou-se como um instrumento importante para a sociedade, seja para

testemunho, para sua organização, para o exercício do poder ou para a

conquista de direitos.

Através da evolução dos usos e valores informacionais despertou-se o

interesse pelos documentos de arquivo e, por conseguinte intensificou-se a

busca por mecanismos capazes de garantir o acesso a estes.

Com a conquista do direito à informação, o acesso aos arquivos deixa

de ser restrito à uma elite e torna-se um direito público de todo cidadão. Assim,

a finalidade das instituições arquivísticas desloca-se da questão da guarda

para o acesso, devendo então preservar e principalmente disponibilizar o

Patrimônio Arquivístico sob sua custódia, enquanto fonte de informação e

garantia de direitos. Como afirma Mattar, “Todos se beneficiam dessa tutela. O

Estado, como apoio à sua administração e o indivíduo e a sociedade, como

apoio à informação, prova, ao desenvolvimento científico e à cultura.” (2003,

p.24) Afinal em um sistema democrático, é através da liberdade de expressão

e do livre acesso às informações que os indivíduos exercem seus direitos

constitucionais.

1.2 A Consolidação da Legislação Arquivística

A partir da Declaração Universal dos Direitos do homem, a noção do

direito à informação é transformada em direito democrático. A fim de garantir o

exercício efetivo desse direito, diversos países promulgaram legislações, que

embora suas peculiaridades, apresentam em comum, o princípio do direito de

1 LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos. Rio de Janeiro: Cia das Letras, 1991. 406p.

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acesso aos documentos públicos. Entre eles, a Colômbia em 1985, a África do

Sul em 2000, o Japão em 2001 e o México em 2002.

Nos Estados Unidos de acordo com a “Freedom of information act” (lei

de liberdade de informação) promulgada em 1966 e alterada em 1974, existem

três tipos de documentos. Àqueles que devem ser divulgados, àqueles que

devem ser mantidos à disposição do público e os que dependem de solicitação

prévia para serem consultados. Os prazos de sigilo variam entre 30 e 75 anos.

Os documentos referentes à defesa do Estado são classificados como

supersecretos, secretos ou confidencias. Além disso, os órgãos federais

devem publicar o máximo possível de informações sobre suas atividades, que

quando não publicadas devem ser fornecidas imediatamente após a

solicitação, seja de uma pessoa física, jurídica ou até mesmo estrangeira.

Na França, a lei nº 7.918 de 1979, revista em 2000, permite que a

maioria dos documentos seja consultada desde à sua produção, exceto

àqueles que ferem a privacidade do indivíduo, cuja restrição pode perdurar por

150 anos, ou àqueles que põem em risco a segurança pública, cujo prazo

máximo de sigilo é de 60 anos.

Já no Canadá, a lei nº C-43 de 1982 vincula o acesso ao recolhimento

dos documentos para o arquivo permanente, com exceção apenas dos

arquivos privados que possuem restrições.

No Brasil o direito à informação apareceu pela primeira vez na

legislação brasileira com a Constituição da república de 1988.

Art. 5º XXXIII - Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. (BRASIL, 1988).

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Além do dever da administração pública em viabilizar o acesso à

informação, a Constituição instituiu o mandado de segurança e o habeas-data

como artifícios legais que visam a assegurar tal direito, sendo o primeiro

relacionado à informação de interesse público e o segundo a informação de

interesse particular.

Dois anos depois de promulgada a Constituição, um projeto de lei

dispondo sobre “A política nacional de arquivos públicos e privados” foi

aprovado, sendo a lei nº 8.159, sancionada em 8 de janeiro de 1991. A lei de

arquivo, como ficou conhecida, constituiu uma grande conquista, na medida

em que regulamentou o direito de acesso ao documento, fixando prazos de

restrição à consulta quando a informação nele contida for imprescindível à

segurança da sociedade e do Estado.

Art. 23º §2º O acesso aos documentos sigilosos referentes à segurança da sociedade e do Estado será restrito por um prazo máximo de 30 anos, a contar da data de sua produção, podendo esse prazo ser prorrogado, por uma única vez por igual período. (BRASIL, 1991).

Além disso, prevê a elaboração de decreto estabelecendo critérios a

serem adotados na atribuição de categorias de sigilo, bem como prazos para a

liberação de tais documentos à consulta.

Como é sabido, até o advento da Lei de Arquivos em 1991, a consulta

aos documentos era regulamentada por normas institucionais. No entanto,

mesmo diante da inexistência de dispositivos legais sobre o acesso, a questão

do sigilo sempre foi uma grande preocupação do governo brasileiro. Os

segredos de Estado estiveram regulados por sucessivos decretos, entre eles o

nº 1.801/36, o nº 27.583/49, o nº 60.417/67 e o nº 79.099/77 em vigor até

1997, quando foi revogado pelo nº 2.134.

Dispondo sobre a classificação, reprodução e o acesso aos documentos

públicos de natureza sigilosa, este decreto regulamentou o capítulo V da lei nº

8.159/91 instituindo quatro categorias de sigilo, bem como seus respectivos

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prazos de retenção e as autoridades responsáveis pela classificação. As

categorias são: reservados até 5 anos; confidenciais até 10 anos; secretos até

20 anos; e ultra-secreto até 30 anos. Todas podendo ser renovadas uma única

vez por igual período. Aos documentos relativos à intimidade do indivíduo,

estabeleceu-se prazo de 100 anos de sigilo a partir da sua produção. Além de

outras providências, o decreto prevê também a autorização de acesso caso

haja interesse de pesquisa.

Tais limitações impostas pela legislação objetivam conciliar os princípios

do direito à informação, à privacidade e à segurança nacional. Sendo assim,

estas restrições devem estar justificadas e condicionadas a um determinado

tempo, de modo que em algum momento todos os documentos sejam abertos

ao uso público.

Em que pesem as características político-administrativas e culturais de cada país, a solução mais amplamente utilizada na tentativa de conciliar os princípios mencionados é o estabelecimento de prazos de desclassificação, para aqueles documentos classificados como sigilosos. (FONSECA, 1999, p. 7).

A falta de especificação de critérios para atribuir um determinado grau

de sigilo, ou para permitir a consulta em caso de pesquisa cientifica, são

algumas das falhas presentes no decreto nº 2.134/97. Ainda assim, ele

significou um importante avanço, no sentido de normatizar as possibilidades de

acesso, considerando as necessidades de sigilo estabelecidas pela lei de

arquivo.

Art. 23 §1º Os documentos cuja divulgação ponha em risco a segurança da sociedade e do Estado, bem como aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas são originariamente sigilosos. (BRASIL, 1991).

Em 1997 a lei federal nº 9.507, entrou em vigor, regulando o direito de

acesso à informação e o processo do habeas-data garantido pela Constituição.

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Art. 7º Conceder-se-á habeas data: I – para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público; II – para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo; III – para a anotação nos assentamento do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável. (BRASIL, 1997).

Em 13 de junho de 2000, o decreto nº 3.505, estabeleceu a política de

segurança da informação nos órgãos e entidades da administração pública.

Entre outras medidas visava a “assegurar a garantia ao direito individual e

coletivo das pessoas, à inviolabilidade da sua intimidade e ao sigilo da

correspondência e das comunicações, nos termos previsto na Constituição.”

(BRASIL, 2000).

Em 27 de dezembro de 2002, o decreto nº 2.134/97 foi revogado pelo

decreto nº 4.553, que dispondo sobre a salvaguarda de informações sigilosas

no âmbito da administração pública federal, ampliou os prazos de sigilo,

multiplicou as autoridades responsáveis pela classificação dos documentos

sigilosos, além de ter omitido as questões relativas à privacidade do indivíduo.

Tendo em vista o que determina a lei de arquivo, ao ampliar o prazo de

sigilo dos documentos considerados ultra-secretos de 30 anos para 50 anos,

com a possibilidade de prorrogação por tempo indeterminado, tal decreto

tornou-se inconstitucional.

Art. 7º §1º O prazo de duração da classificação ultra-secreto poderá ser renovado indefinidamente, de acordo com o interesse da segurança da sociedade e do Estado. (BRASIL, 2002).

Somente com a aprovação do decreto nº 5.301, em 09 de dezembro de

2004, os prazos de sigilo retornaram àqueles estabelecidos pela lei 8.159/91. A

proposta deste decreto era revogar o decreto nº 4.553/02, assim como

regulamentar a medida provisória nº 228/04, que dispõe sobre a ressalva

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prevista na parte final do inciso XXXIII do art. 5º da Constituição. Para tal, foi

instituída uma comissão de averiguação e análise de informações sigilosas

com a atribuição de rever os prazos de restrição dos documentos classificados

como ultra-secretos, podendo mesmo decorrido o tempo limite de sigilo (60

anos), manter a ressalva de acesso enquanto for imprescindível à segurança

nacional.

Art. 6º Provocada na forma do art. 5º, a comissão de averiguação e análise de informações sigilosas decidirá pela: I – Autorização de acesso livre ou condicionado ao documento; ou II – permanência da ressalva ao acesso enquanto for imprescindível à segurança nacional. (BRASIL, 2004)

Vale lembrar que em 05 de maio de 2005, a MP nº 228/05 foi convertida

na lei federal nº 11.111, apenas para cumprir normas legislativas. Enquanto a

medida provisória havia sido expedida pelo poder executivo, a lei foi elaborada

pelo poder legislativo.

A regulamentação da ressalva disposta no art. 5º da Constituição criou o

direito ao sigilo, autorizando que alguns documentos permaneçam em segredo

enquanto julgar-se necessário. No entanto, embora constitucional, a

possibilidade do sigilo eterno apresenta-se como uma ameaça à democracia

brasileira.

A restauração da democracia trouxe uma nova configuração para o

cenário arquivístico brasileiro. Desde então diversos mecanismos legais foram

criados a fim de efetivar o direito de acesso à informação. Os decretos

elaborados a partir de 1991 possibilitaram um grande avanço sobre a questão,

todavia, o sigilo eterno, representou um grave retrocesso na legislação

arquivística, tendo em vista que a atual situação legal favorece a opacidade

das práticas do governo comprometendo a democracia. De acordo com Jardim

(1999, p. 49).

O grau de democratização do Estado encontra, na sua viabilidade, um elemento balizador: maior o acesso à informação governamental, mais democráticas as relações

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entre o Estado e a sociedade civil. A visibilidade social do Estado constitui um processo de dimensões políticas, técnicas, tecnológicas e culturais, tendo como um dos seus produtos fundamentais a informação ‘publicizada’.

Sabe-se que assim como o sigilo é indispensável para garantir a

segurança nacional e a privacidade do indivíduo, o acesso é fundamental para

a efetivação do direito à informação. Entretanto, assiste-se a uma preocupação

governamental muito maior com as restrições à consulta do que com a

regulamentação do acesso. Segundo Fonseca (1999, p.8),

os impedimentos do acesso aos arquivos não são de ordem exclusivamente legal; há muitos obstáculos não legais – certamente também políticos - ao acesso aos documentos de arquivo.

A realidade brasileira deixa claro que ainda há um longo caminho a ser

percorrido para que através do acesso às informações públicas, garanta-se a

transparência administrativa. Como afirma Cepik (2001, p. 12),

[...] ainda é preciso enfrentar o enorme desafio político, legal e administrativo de democratizar o acesso às informações, uma condição cada vez mais essencial para a expansão e aprofundamento da própria cidadania.

20

CAPÍTULO II

A INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE CIDADANIA

Sob o modelo jurídico-representativo de Estado, a informação dcumentária começou a crescer e acumular-se como acompanhamento de legitimação dos atos do governo, instrumento de controle e regulação da população, além de base do cálculo antecipador do desempenho das ações do Estado sobre a população. (JARDIM, 1999, p. 17).

A administração pública é responsável pela execução de ações Estatais

consideradas de interesse coletivo. Gerar, processar e possibilitar o acesso às

informações decorrentes de suas atividades são algumas de suas principais

características.

Conforme estabelecido pela Constituição Federal de 1988 e reiterado

pela legislação arquivística, cabe à administração pública a gestão dos

documentos bem como a disponibilização destes à consulta. Segundo os

preceitos constitucionais, os órgãos públicos devem funcionar sob os princípios

da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. Sendo

assim, o acesso à documentação pública é fundamental na democratização

das relações entre Estado e sociedade civil, pois à medida que proporciona a

transparência dos atos administrativos executados pelo Estado, permite à

sociedade monitorar as atitudes e decisões governamentais.

De fato, os registros, além das necessidades do direito e da história, servem à transparência das ações, um novo e atraente nome para o que mais tradicionalmente constitui a obrigação de prestar contas (accountability) tanto do ponto de vista administrativo quanto histórico. (DURANTI2, 1994, p. 55 apud FONSECA, 1996, p. 45).

2 DURANTI, Luciana. Registros Documentais contemporâneos. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 7, n. 13, 1994.

21

No entanto, apesar do aparato legal construído nos últimos anos,

diversos estudos constatam a dificuldade em promover o acesso às

informações geradas pelo Estado, principalmente aquelas produzidas durante

o regime militar. Alguns aspectos legais somados à escassez de recursos e ao

interesse do Estado em manter-se na invisibilidade, limitam significativamente

as possibilidades de acesso.

Os dispositivos que favorecem a produção e reprodução da opacidade informacional na administração Federal apresentam uma relação profunda com a maneira pela qual o conjunto das organizações gera e utiliza as informações que produz e acumula no curso das suas ações. Enquanto expressão resultante da atividade cotidiana do Estado, a informação arquivística traduz, nos termos em que é gerenciada (ou negligenciada), os diversos matizes entre a transparência e a opacidade. (JARDIM, 1999, p. 149).

2.1 Transparência Administrativa: uma função do Estado

Democrático

Com a ascensão do Estado democrático, o acesso à informação pública

tornou-se um direito de cidadania garantido pela Constituição Federal. Ao lado

dos direitos do cidadão surgem os deveres da administração pública, conforme

previsto no artigo 216, parágrafo 2º. “Cabem a administração pública, na forma

de lei a gestão da documentação governamental e as providências para

franquear sua consulta a quantos dela necessitem.” (BRASIL, 1988).

É neste contexto que surge a idéia de transparência administrativa. Na

prática este conceito garante que o cidadão, por pertencer a uma sociedade e

ser responsável pelo bom funcionamento das instituições, tenha acesso aos

documentos produzidos pela administração pública, bem como conheça as

razões e participe das decisões administrativas. Cabe ressaltar que a

administração pública destina-se a execução de tarefas visando a satisfação

das necessidades da coletividade, e sendo assim, a socialização das

informações produzidas pelos órgãos Estatais constitui uma verdadeira

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garantia para que as ações do Estado tenham visibilidade. Segundo Debasch3,

a noção de transparência apresenta três facetas: o direito de saber, tendo em

vista que a administração publica atua em função do interesse geral; o direito

de controle e acompanhamento das decisões administrativas do governo; e o

direito de ser ator e não um mero espectador dessa administração. (1990 apud

JARDIM, 1999, p. 56)

A transparência administrativa pressupõe, portanto, a comunicação e a

publicidade das ações governamentais. O diálogo entre o Estado e a

sociedade através do acesso à informação, constitui a base do regime

democrático, na medida em que representa a concretização dos direitos do

indivíduo.

De acordo com Jardim,

Estado e sociedade civil interatuam no âmbito do público, no qual as questões que podem interessar à coletividade são explicitadas e se discutem. As constituições desses Estados democráticos configuram essa interação e definem os termos desse âmbito público cujo princípio básico é a livre e igual participação de todos os indivíduos nele. Uma condição vital para a participação efetiva nesse âmbito é que essas questões – por afetarem ou poderem afetar a coletividade – sejam debatidas e públicas isto é, possam ser conhecidas por qualquer um. A função do ordenamento jurídico nesta matéria é de garantir que ninguém impeça ao indivíduo de ter conhecimento dos assuntos públicos. (1999, p. 2)

Todavia, se por um lado a transparência nas atividades executadas pela

administração pública possibilita maior eficácia do sistema democrático, por

outro, a obscuridade compromete o exercício da cidadania além de favorecer a

construção de um cenário propício para a prática da corrupção.

O segredo revelaria, antes de mais nada, a sobrevivência de um autoritarismo administrativo, totalmente incompatível com uma construção democrática que implica no debate público e na possibilidade do cidadão ter acesso à informação. A informação ‘confiscada’ pelos governantes e os funcionários seria o indicador da democracia ‘podada’, no qual os cidadãos

3 DEBBASCH, Patrick. La transparence administrative en Europe. Paris: CNRS, 1990.

23

‘considerados como quantidade negligenciável e tratados como intrusos’, permanecem ‘administrados’, sem verdadeiramente adquirir a cidadania. Privados do acesso às fontes de informação e ignorando os motivos das decisões a eles relacionados, os cidadãos encontram-se à mercê de uma administração anônima, sem rosto e impenetrável. [...] Por outro lado, o segredo seria também nefasto à administração, criando u clima de desconfiança que bloqueia a comunicação, entrava a coleta de informações e favorece reações contrárias por parte dos cidadãos. (CHEVALIER4, 1988 apud JARDIM, 1999, p. 52).

O segredo é considerado um instrumento de poder e dominação,

através do qual o Estado assegura seus próprios interesses, mantendo sua

hegemonia, enquanto impede que a sociedade controle e participe

efetivamente de suas ações políticas.

Para Jardim os fatores que contribuem para a presença da opacidade

na administração pública se situam sobre dois planos, dos quais o primeiro

seria o político, tendo em vista que os eleitos não têm interesse em deixar

transparecer informações que poderiam não somente reduzir sua margem de

ação, mas também ser explorada pelos seus adversários; e o segundo o

administrativo, onde a opacidade seria resultado da frágil familiaridade dos

cidadãos com a estrutura burocrática e do temor da transparência reduzir as

possibilidades de manobras do corpo administrativo junto ao cidadão e aos

grupos de interesse. (1999, p. 54)

Sem dúvida é necessário manter a publicidade dos arquivos,

respeitando as restrições cabíveis, pois uma vez estreitada as relações entre o

individuo e o Estado, através da fiscalização social dos atos governamentais, é

possível coibir as práticas de abuso de poder e corrupção, garantindo desta

maneira a eficiência da máquina Estatal e a preservação dos princípios

democráticos.

4 CHEVALIER, Jacques. Le mithe de la transparence administrative. In: CENTRE UNIVERSITAIRE DE RECHERCHES ADMINISTRATIVES ET POLITIQUES DE PICARDIE. Information ete transparence administrative. Paris: PUF, 1988.

24

2.2 O uso da lei no cotidiano arquivístico

O surgimento do capital informacional como um novo protagonista nas

sociedades contemporâneas, a partir da metade do século XX, acentuou a

necessidade de meios para normatizar e assegurar o seu pleno valor. Este

valor não depende apenas da quantidade de informações acumuladas, mas

também e principalmente da utilidade dada a essas informações. Neste caso, o

que se valoriza é o volume e a quantidade de informações em circulação, ou

seja, as informações produzidas devem ser divulgadas, consultadas e não

apenas acumuladas. Assim surge a noção do direito à informação.

O suporte legislativo construído no Brasil a partir da Constituição de

1988 foi crucial para a regulamentação do direito de acesso à informação

pública. No entanto, a literatura comprova que as condições técnicas criadas

pela legislação não foram suficientes para que esta produzisse os efeitos

desejados. Além de alguns ajustes legais, ainda se faz necessário o

cumprimento de um amplo leque de condições, a fim de garantir que as regras

sejam implementadas de maneira criteriosa e coerente, sobretudo zelando

pelo pleno exercício da cidadania.

No que concerne ao sigilo, ainda é preciso muita discussão para o

esclarecimento de alguns pontos abordados, os quais geram dúvidas sobre

sua aplicação. De acordo com a Constituição, é assegurado o acesso do

cidadão à informação governamental, bem como é previsto o sigilo,

imprescindível para a segurança da sociedade e do Estado, e a privacidade do

individuo. Sendo assim, é evidente que nunca haverá transparência absoluta

dos assuntos públicos, pois muitas vezes o segredo será indispensável, como

afirma Chevalier: “Toda sociedade tem efetivamente a necessidade de zonas

de sombra, de espaços de confidencialidade, que assegurem a preservação de

uma esfera de autonomia individual, além da proteção de interesses públicos

maiores.” (1988, p. 225 apud JARDIM, 1999, p.65)

A responsabilidade de classificar um documento como sigiloso não cabe

ao profissional da informação, mas sim ao produtor do documento. Por esta

25

razão é de suma importância para a eficiência do trabalho arquivístico, que os

direitos de acesso, bem como os impedimentos à consulta estejam legalmente

justificados. No entanto deve-se tomar cuidado para que o sigilo não se torne

uma regra, mas que seja somente adotado em casos excepcionais.

Atualmente a Lei Federal vigente de nº 11.111 de 2005 que trata sobre

o sigilo de documentos públicos tem provocado controvérsias inclusive

causando questionamentos sobre sua legalidade. A ação direta de

inconstitucionalidade, ajuizada no Supremo Tribunal Federal em maio deste

ano, se baseia no fato da citada Lei autorizar a Comissão de Averiguação e

Análise de Informações Sigilosas, a manter o sigilo pelo tempo que julgar

necessário.

Art. 6º

§2º Antes de expirada a prorrogação do prazo de que trata o caput deste artigo, a autoridade competente para a classificação do documento no mais alto grau de sigilo poderá provocar, de modo justificado, a manifestação da Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas para que avalie se o acesso ao documento ameaçará a soberania, a integridade territorial nacional ou as relações internacionais do País, caso em que a Comissão poderá manter a permanência da ressalva ao acesso do documento pelo tempo que estipular. (BRASIL, 2005)

Esta comissão composta por membros do Executivo possui total poder

de atribuir categorias de sigilo e impor restrições de acesso. No entanto, a

discricionariedade atribuída a esta comissão demonstra-se no mínimo

incoerente, já que o Poder Executivo é o maior interessado em manter o

silêncio, principalmente em relação aos arquivos da ditadura militar. A

divulgação de alguns episódios deste conturbado momento da história

brasileira marcado pela censura, perseguição e repressão, são bastante

comprometedores.

Para pôr fim a possibilidade do sigilo eterno, tramita no congresso um

novo projeto de lei. A proposta defendida é limitar a 60 anos o prazo de sigilo

26

para os documentos considerados ultra-secretos. Após este período os

documentos estariam integralmente disponíveis no Arquivo Nacional para

consulta de qualquer interessado, seja um pesquisador com objetivo cientifico,

ou um cidadão comum apenas com o desejo de conhecer a sua história, afinal

estas informações não são apenas de interesse técnico-processual, mas

também de interesse público, pois todo o povo brasileiro tem direito de ter

acesso à sua memória e a sua identidade.

Conforme análise de Jardim,

[...] uma legislação adequadamente concebida pode ser um poderoso instrumento a favor da gestão, uso e preservação dos arquivos. No entanto, um marco legal só provoca impactos arquivísticos quando vai além de uma declaração de princípios conceituais bem estruturados, amparado em redefinições institucionais oportunas e promissoras. O desafio maior para as instituições arquivísticas, seus profissionais e a sociedade é a construção cotidiana da legislação no fazer arquivístico. O contrário disso pode redundar num inferno de boas intenções cujo epicentro é uma legislação tornada ‘letra morta’. (2003, p. 38)

Uma vez que a regulamentação existente esteja apropriadamente

estabelecida, é preciso iniciar um longo trabalho com o intuito de atender aos

requisitos essenciais para sua aplicação. Pois, elaborar normas é a parte fácil

do trabalho; mas sua implementação que envolve socialização, aplicação e

monitoramento, é a parte mais difícil; isso sem mencionar a obtenção de

mudança real na cultura. (Bertók; Caddy; Ruffner, 2002, p. 63)

Socializar a legislação é uma das etapas mais importantes para suas

possibilidades de uso. Segundo Chevalier4,

[...] as possibilidades de uso da legislação [...] são socialmente seletivas, ou seja, as demandas emanam de um círculo limitado de cidadãos familiarizados com a administração e seus procedimentos. A liberdade de acesso beneficia inicialmente aos ‘iniciados’ ou seja, os que são capazes, por sua posição social, sua formação, sua profissão, de superar a complexidade dos procedimentos jurídico-administrativos. (1988 apud JARDIM, 1999, p. 71)

27

Embora o termo “público” quando citado nos textos legais soe como um

conjunto de cidadãos iguais, a realidade apresenta categorias diferenciadas de

indivíduos. Alguns são privilegiados, por sua classe social, ou por sua posição

no mercado de trabalho, ou ainda pelo seu nível de escolaridade. Estes

facilmente conhecerão e farão jus ao seu direito. Por outro lado, existe a

grande maioria que com pouca ou nenhuma intimidade com a administração

pública acaba ignorando seus direitos. Estes por sua vez acreditam que o

governo tudo sabe, administra e provê, enquanto o povo, tudo espera, pois

está certo de que o Estado não é ele, mas sim uma entidade maior, abstrata e

soberana. (Faoro5, 1975 apud JARDIM, 1999, p. 75)

Portanto, antes de qualquer coisa é necessária uma mudança cultural

capaz de derrubar estes paradigmas. Somente assim será possível introduzir a

noção de direito à informação nessas camadas “não privilegiadas”,

conscientizando o individuo de que o Estado tem obrigações e ele, como

cidadão, tem o dever de exigir que sejam cumpridas.

Outro desafio a ser superado é a inexistência de um poder fiscalizador

que possibilite averiguar e exigir o cumprimento da lei. Pois como diversas

experiências comprovam, o respeito à norma está condicionado à presença de

monitoramento, pelo menos durante a fase de adaptação, até que a nova regra

seja incorporada à cultura.

Outra questão que dificulta o pleno cumprimento da legislação traduz-se pela fragilidade das estruturas organizacionais responsáveis pela sua aplicação e fiscalização, favorecendo a reprodução da opacidade informacional, em contraposição ao discurso de transparência que as administrações reiteram ao longo dos últimos governos. (FREIXO, 2003, p. 4).

Além disso, o deficiente tratamento arquivístico realizado pelas

administrações, acarreta o acúmulo desordenado dos documentos e também a

perda de registros históricos importantes.

5 FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. São Paulo: Edusp, 1975.

28

Observa-se que há restrições de acesso aos documentos, sendo apontados como principais razões para impedimento de consulta o estado precário de conservação dos documentos, conjunto documental em fase de organização e a falta de identificação dos documentos, fatos que inviabilizam a consulta, e consequentemente, o acesso aos documentos e informações. (OHIRA; MARTINEZ, 2002, p. 20).

É indispensável um efetivo processo de gestão de documentos que

preserve a integridade física e o valor informacional permitindo assim a

recuperação segura das informações, caso contrário, será difícil conseguir

recuperar uma informação em meio a uma massa documental acumulada sem

os devidos critérios de avaliação e seleção.

Desta forma constata-se que “o termo acesso relaciona-se a um direito,

mas também a dispositivos que o viabilizem, ou seja, um conjunto de

procedimentos e condições materiais que permitem o exercício efetivo desse

direito.” (Lochak6, 1988 apud JARDIM, 1999, p. 72).

Nesta perspectiva, torna-se essencial a implementação de políticas

públicas arquivísticas.

Pressupondo que a legislação é implementada no marco do desenvolvimento de políticas arquivísticas, o complexo processo que leva à sua viabilização pode ser mais ou menos lento. Uma lei de arquivos não é efetivada na sua totalidade em curto prazo. Trata-se de um processo permanente cuja vitalidade é assegurada pelo modo como se desenvolvem as políticas públicas arquivísticas. (JARDIM, 2003, p. 42).

6 Lochak, Daniele. Secret, securité et leberté. In: CENTRE UNIVERSITAIRE DE RECHERCHES ADMINISTRATIVES ET POLITIQUES DE PICARDIE. Information e transparence administrative. Paris: PUF, 1988.

29

CAPÍTULO III

O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A busca pela concretização dos direitos humanos a partir do período pós-

guerra vem demandando um aparato de medidas do Estado, de forma a

disciplinar o processo social. Torna-se necessário então, a criação de meios

que promova a inserção do cidadão na sociedade, minimizando a exclusão e

as desigualdades, conseqüentes do sistema capitalista. Neste sentido, as

políticas públicas atuam como instrumento complementar, preenchendo as

lacunas criadas pelas normas e concretizando os princípios legais.

Diferentemente das leis, que se caracterizam pela generalidade e abstração,

as políticas públicas são focadas para realização de objetivos determinados.

Através de programas de ação governamental, voltados para responder

questões sociais de interesse coletivo, estas políticas possuem a finalidade de

efetivar direitos já estabelecidos legalmente.

As políticas públicas devem ser – em sua formulação - a expressão pura e genuína do interesse geral da sociedade, o que num processo legítimo, pressupõe que seja a demanda social auscultada em instâncias democráticas, enfrentada de forma realística pela instituição formuladora e solucionda à luz do possível consenso, entre os atores sociais a partir de eficaz fluxo de informações.(PIRES, 2001 p. 1)

É evidente que diante do expressivo número de direitos assegurados

pela Carta Magna de 1988, muitos mesmo regulamentados por lei, ainda

dependem do desenvolvimento de políticas públicas, a fim de construir um

cenário com as condições essenciais para que sejam efetivamente

cumpridos.

Com ênfase no objeto central deste trabalho, pretende-se demonstrar

como a partir de ações governamentais, voltadas tanto para o usuário

(sociedade), quanto para o produtor (administração pública) da informação,

é possível concretizar o direito de acesso à informação.

30

3.1 – Conceito e Trajetória das Políticas Públicas no Brasil

As alterações ocorridas nos cenários político e econômico a partir do

processo de democratização do Brasil (década de 1980) exigiram um novo

redimensionamento do papel do Estado. A figura autoritária e repressiva que

exercia o controle social como forma de manter a ordem, vai sendo

paulatinamente suplantada por um modelo de Estado de direito que assume

obrigações perante a sociedade.

Com a Carta Constitucional de 1988 novos direitos são agregados ao rol

dos direitos fundamentais, refletindo interesses de diversas camadas sociais,

e, sobretudo promovendo o avanço da cidadania. Aos poucos surge uma nova

relação Estado - Sociedade. O Estado, antes entendido como um espaço

representante da elite torna-se um espaço de interação, onde através da

participação social propõe-se solucionar conflitos e defender interesses

coletivos. Enquanto a sociedade passa a atuar ativamente buscando

restabelecer os direitos do indivíduo, visando à construção de uma sociedade

democrática.

O conceito de participação cidadã está lastreado na universalização dos direitos, na ampliação do conceito de cidadania, para além da dimensão jurídica e numa nova compreensão sobre o papel e o caráter do Estado, remetendo a definição das prioridades nas políticas públicas a partir de um debate público” (GOHN7, 2004 apud KUJAWA, p. 2)

O grande desafio do novo Estado Constitucional está na implementação

dos direitos assegurados pela Constituição, tendo em vista que para isto é

necessária uma atuação direta e efetiva do poder público por meio de políticas

públicas.

7 GOHN, Maria da Gloria. Movimentos sociais na atualidade: manifestações e categorias analíticas. In: GOHN, Maria da Gloria (org). Movimentos sociais no início do século XXI: antigos e novos atores sociais. Petrópolis: Vozes, 2003.

31

As políticas públicas podem ser entendidas como o conjunto de planos e programas de ação governamental voltados à intervenção no domínio social, por meio das quais são traçadas as diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, sobretudo na implantação dos objetivos e direitos fundamentais dispostos na Constituição. (CRISTÓVAM, 2005, p. 06)

De um lado, os textos legais definem os direitos do cidadão, de outro, as

políticas públicas atuam de forma complementar descrevendo os objetivos e

meios para que sejam concretizados. Assim, as políticas públicas passam a

ser o principal instrumento para efetivação de direitos, que depois de

reconhecidos legalmente requerem ação do Estado para atendê-los.

Não basta garantir direitos em leis. É preciso assegurar as condições políticas, materiais e institucionais necessárias para sua concretização, e estabelecer as condições de vida necessárias para que a população possa ter acesso a estes direitos (...) (TORRES, 2007)

O desenvolvimento de políticas públicas implica a participação de

diversos atores sociais, envolvendo governo, profissionais da área em questão,

usuários e cidadãos. Juntos eles discutem o problema, elaboram o plano de

ação e monitoram os resultados da política implementada.

É importante lembrar que as políticas são elaboradas por pessoas ou grupo que possuem valores, interesses, opções e modos diversos de enxergar o mundo. Devemos olhar as políticas públicas como resultados das disputas entre atores distintos. Para que elas realmente garantam direitos, precisam sempre ser acompanhadas e debatidas por uma maior diversidade de atores da sociedade, com suas distintas necessidades e visões de mundo. (POLIS8, 2006 apud TORRES, 2007, p. 5).

8 POLIS. Política Pública como garantia de direitos. Boletim REPENTE. Dez/2006. Disponível em: www.polis.org.br.

32

A fim de compreender o processo de formulação e implementação das

políticas públicas é importante considerar os conceitos de agenda e arenas

decisórias. A agenda define o objeto de conflito sobre o qual será desenvolvida

a política, identificando assim os agentes que participarão do processo. As

arenas decisórias, segundo Lowi9, são tipos ou formatos que uma política

pública pode assumir, de acordo com o seu objeto. O primeiro é o das políticas

distributivas, onde as decisões tomadas pelo governo desconsideram a

questão dos recursos limitados, gerando impactos individuais, ao privilegiar

certos grupos em detrimento do todo. O segundo é o das políticas regulatórias

que envolvem políticos e grupos de interesse e são mais visíveis ao público,

pois trabalham com ordens e proibições. O terceiro é o das políticas

redistributivas que intervem na estrutura econômica criando mecanismos que

diminuam as desigualdades sociais. São em geral as políticas sociais

universais, que apesar de atingirem um maior número de pessoas, impõem

perdas concretas para certos grupos e ganhos incertos para outros, já que o

objetivo é justamente deslocar recursos, ou direitos, entre grupos da

sociedade. E por último, o quarto formato das políticas constitutivas, que

determinam as regras e configurações dos processos de negociação das

políticas. Cabe ressaltar, conforme destaca Lowi9, que cada uma dessas

políticas públicas vai gerar pontos ou grupos de veto e de apoio diferentes,

processando-se, portanto, dentro do sistema político de forma também

diferente. (1964; 1972 apud SOUZA, 2006, p. 28)

Para tornar-se concreta, é necessário que a política pública se traduza

em um plano de ação, o qual deve ser formulado, implementado e avaliado.

Souza propõe uma subdivisão mais detalhada onde a elaboração da política

pública é constituída pelos seguintes estágios: definição de agenda,

identificação do problema, identificação das alternativas, avaliação das opções,

9 Lowi, Theodor. “American Business, Public Policy, Case Studies and Political Theory”, Word Politics, 16: 677 – 715. 1964. Lowi, Theodor. “Four Systems of Policy, Politics, and Choice”. Public Administration Review, 32: 298 -310. 1972.

33

implementação e avaliação (2006, p.29). Ou seja, primeiramente o problema

converte-se em tema da agenda política. Em seguida a partir de um

diagnóstico do problema, as pessoas envolvidas no processo identificam e

analisam a questão a ser resolvida. Posteriormente, as possíveis alternativas

para o problema são avaliadas a fim de selecionar as mais adequadas para a

situação. A partir de então é formulado o plano ou programa de ação, onde

devem constar os detalhes das atividades que serão executadas, os objetivos

e os resultados esperados. Após implementação da política, é indispensável a

construção de metodologias específicas que possibilite o acompanhamento e

avaliação dos resultados.

No entanto na prática, o processo de desenvolvimento de uma política

pública não ocorre necessariamente seguindo todas essas fases. Nem sempre

são bem planejadas, ou às vezes devido às transições entre governos com

prioridades diferentes, não chegam a ser implementadas. Além disso, os

resultados alcançados por certas políticas muitas vezes não correspondem aos

impactos projetados na sua formulação. Na tentativa de minimizar estes

problemas e garantir a eficiência das políticas formuladas, é fundamental

considerar os seguintes pontos: 1º) As políticas públicas podem ser elaboradas

pela esfera municipal, estadual e federal, portanto elas devem dialogar entre si,

apresentando objetivos articulados. Caso contrário elas podem se tornar

conflitantes; 2º) No decorrer de todo o processo de construção de uma política

pública deve existir o monitoramento e a fiscalização, tanto por órgão do

governo quanto pela sociedade civil. Para isso é importante garantir a

transparência das informações sobre todo o processo, permitindo adaptações

ou reformulações do plano.

Contudo, as políticas públicas demonstram ser o caminho mais

adequado para que os direitos amparados por lei sejam na prática garantidos.

Assim, considerando a situação brasileira descrita nos capítulos anteriores,

propõe-se o investimento na elaboração de políticas públicas no sentido de

viabilizar o pleno exercício do direito de acesso à informação. Afinal “a

viabilização dessa legislação torna-se comprometida se não for

34

simultaneamente instrumento e objeto de uma política arquivística” (JARDIM,

2003, p. 38).

3.2- A Implementação de Políticas Públicas Arquivísticas

Entende-se por políticas públicas arquivísticas o conjunto de estratégias

e diretrizes, que visam solucionar problemas apresentados no campo

arquivístico, conforme afirma Jardim:

o conjunto de premissas, decisões e ações – produzidas pelo Estado e inseridas nas agendas governamentais em nome do interesse social – que contemple os diversos aspectos (administrativo, legal, científico, cultural) relativos à produção, uso e preservação da informação arquivística de natureza pública e privada. (2003, p. 38)

A fim de responderem as demandas políticas e metodológicas na área

dos arquivos faz-se necessário definir o cenário geográfico, administrativo,

econômico e social a ser contemplado com a política arquivística,

resguardando as particularidades em certos segmentos do Estado, tendo em

vista que alguns possuem mais recursos e possibilidades de mudanças do que

outros.

Cabe ressaltar que as políticas arquivísticas constituem uma das

dimensões das políticas informacionais, cuja finalidade é

assegurar, com vistas à sua utilização, o acesso ao conhecimento especializado e profissional, às informações científicas, técnicas e econômicas, assim como à soma dos saberes produzidos e reunidos no país e em outras partes do mundo a fim de auxiliar a solução de problemas concretos e ao desenvolvimento de todos os setores da sociedade. (MONTVILOFF10, 1990 apud JARDIM, 1995)

10 Técnico do Programa Geral de Informações da UNESCO, em entrevista concedida em Paris, em 20.09.93.

35

Sendo assim, deve haver um alto grau de compatibilidade entre as

políticas de informação e as arquivísticas, caso contrário, dificilmente se

alcançará os resultados esperados.

Outra premissa a ser considerada é a participação de diversos setores

no processo de elaboração, implementação e avaliação das políticas públicas

arquivísticas, uma vez que para tal é imprescindível a combinação de

conhecimentos técnicos na área da arquivologia, ciência política,

administração, alem de um profundo conhecimento da realidade sobre a qual o

Estado pretende atuar.

Supõe-se que mecanismos legais e institucionais sejam forjados e concretizados de forma a garantir a representatividade de agentes do Estado e da sociedade civil nesse processo. [...] Numa cultura política permeada por valores como participação social e transparência a representatividade da sociedade civil deverá ser assegurada, ao menos quantitativamente, em grau que impeça a hipertrofia a favor do Estado no processo político decisório. Agentes representantes dos diversos tipos de usuário dos arquivos,[...] de instituições de ensino e pesquisa fora do aparelho do Estado e de organizações arquivísticas devem ter assegurado a sua participação. (JARDIM, p. 12, 2006)

Visando minimizar os problemas que permeiam a realidade arquivística

e comprometem o uso adequado da informação tanto pela administração

pública como também pela sociedade, alguns aspectos devem ser priorizados

pelas políticas públicas arquivísticas:

Com o intuito de conscientizar a sociedade quanto à importância da

informação e das instituições arquivísticas é necessário desenvolver

programas no sentido de torná-los mais visíveis dentro do universo cultural, do

qual fazem parte bibliotecas e museus. Através da divulgação dos serviços

oferecidos pelos Arquivos Públicos, bem como por meio de incentivos à

visitação e pesquisa, é possível aproximar o mundo arquivístico da realidade

social;

36

Para garantir que métodos de tratamento e gerenciamento dos

documentos produzidos pela administração pública estejam fundamentados

nos princípios consagrados pela Ciência Arquivística e de acordo com as

normas legais existentes, é indispensável uma política que estabeleça poder

fiscalizador a um órgão capacitado para acompanhar, inspecionar e prestar

assistência às práticas arquivísticas executadas desde a produção ou

recebimento do documento até o momento de sua destinação final11.

As possibilidades de acesso à informação governamental pelo administrador público e o cidadão encontram-se diretamente relacionas com o conjunto de práticas desenvolvidas pela administração pública no decorrer do ciclo informacional. (JARDIM, 1999. p. 33)

Tendo em vista suas atribuições de orientação normativa visando à

gestão documental e à proteção dos documentos, esta função caberia ao

Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ)12, que teria total autonomia para

intervir em caso de perdas informacionais iminentes. A atividade de fiscalizar

poderia ser delegada a uma comissão de profissionais da área que seriam

como auditores arquivísticos, especializados nas diversas espécies

documentais (textuais, audiovisual, fotográfico, sonoro, micrográfico). Esta

estratégia possibilitaria a racionalização das informações, maiores condições

de recuperação e acesso, além de garantir o cumprimento da lei.

Um motivo impeditivo de relevo é a inexistência de poder fiscalizador do Arquivo Nacional que possibilite a imposição de suas atribuições legais de gerir e recolher documentos do Poder Executivo Federal, a exemplo da autoridade que possuem algumas instituições arquivísticas estrangeiras. O Arquivo da França possui seus inspetores de arquivo e o dos Estados Unidos tem em sua estrutura a figura do inspetor geral.( MATTAR, 2003, p. 32)

11 A destinação final pode ser a eliminação, quando o documento não apresenta valor probatório ou informativo, ou a guarda permanente. 12 Órgão colegiado, vinculado ao Arquivo Nacional, que tem por finalidade definir a política nacional de arquivos públicos e privados. Tem sido responsável pela aprovação de importantes decretos e resoluções dispondo sobre matéria arquivística.

37

Evidentemente, a execução dessas ações não é uma tarefa muito

simples, pois envolve além de captação de recursos, questões técnicas,

culturais e principalmente políticas.

38

CONCLUSÃO

A princípio, os registros documentais objetivavam apenas testemunhar

ou comprovar um fato, porém, diante da dinâmica social ao longo da história,

os interesses pelos arquivos transcenderam o valor probatório e adquiriram

também valor administrativo e histórico. Estas novas funções atribuídas à

informação resultaram em 1948 na emergência do direito à informação. Desde

então, vários países criaram seus próprios mecanismos legais a fim de garantir

tal direito. Assim, salvo as necessidades de sigilo que visam a preservar o

direito à privacidade e à segurança nacional, os arquivos tornaram-se um bem

público destinado aos cidadãos.

Com o processo de redemocratização do país e a promulgação da nova

Constituição Federal de 1988, a questão dos arquivos e documentos públicos

ganhou novo estatuto jurídico. Eis que se transformaram em instrumentos

capazes de assegurar direitos individuais e coletivos, bem como o exercício

pleno da cidadania. Além disso, com o surgimento do conceito da

transparência administrativa, a comunicabilidade dos arquivos passa a

representar um meio de controle social.

Entretanto, a realidade comprova que a regulamentação legal não

significou a garantia do direito à informação, uma vez que “a existência da lei

não garante sua aplicação [...] ” (COUTURE13, 1998 apud JARDIM, 2003, p.

38)

Na perspectiva de superar os obstáculos existentes, criando as

condições necessárias para a efetivação deste direito é imprescindível a

implementação de políticas públicas arquivísticas no sentido de desenvolver

ações estratégicas principalmente visando a conscientização social e a

fiscalização do respeito aos princípios arquivísticos, bem como às

determinações legais.

13 COUTURE, Carol. Rôle et champs d’application de la législation archivistique. Ciberlegenda nº 1, 1998. Disponível em: http://www.uff.br/mestcii/carol1.htm. Acesso em: 21 de setembro de 2003.

39

É relevante destacar a título de reflexão, que o interesse do Estado em

conceber uma política pública está condicionado à visibilidade social que o

problema analisado possui. No caso dos arquivos isto implica um

compromisso do Estado em contribuir para a construção de uma sociedade

mais democrática tendo em vista que a legitimação e reconhecimento do valor

documental representam um avanço para a concretização do direito à

informação.

40

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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dominação e de submissão. Ci. Inf. ,Brasília, v. 20, n. 1, p. 37-44. jan/jun.1991.

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41

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no inciso XXXIII do art. 5º da Constituição, e dá outras providências. 9 dez.

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http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm. Acesso

em: 10 mai. 2008.

_________. Decreto Nº 5.301: Regulamenta o disposto na medida provisória

nº 228, de 9 de dezembro de 2004, que dispõe sobre a ressalva prevista na

parte final do disposto no inciso XXXIII do art. 5º da Constituição, e dá outras

providências. 9 dez. 2004. Disponível em:

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__________. Lei nº 11.111. Regulamenta a parte final do disposto no inciso

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