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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A interdisciplinaridade como metodologia no desenvolvimento do currículo escolar Por: Eliana de Alcantara Rey Orientador Prof. Flávia Cavalcanti Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A interdisciplinaridade como metodologia no desenvolvimento

do currículo escolar

Por: Eliana de Alcantara Rey

Orientador

Prof. Flávia Cavalcanti

Rio de Janeiro

2012

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AGRADECIMENTOS

A Deus por me possibilitar sonhar e,

principalmente realizar os meus sonhos. A

minha irmã Dorotéia, por me ter ensinado

a persistir. A Bárbara, querida filha, pela

colaboração na construção desta

produção.

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DEDICATÓRIA

A minha família, amigos e todos os

professores da AVM.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 5

CAPÍTULO 1 7

CAPÍTULO 2 12

CAPÍTULO 3 33

CONCLUSÃO 36

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 37

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INTRODUÇÃO

Ao buscar um saber mais integrado e livre, a

Interdisciplinaridade conduz a uma metamorfose que pode

alterar completamente o curso dos fatos em Educação; pode

transformar o sombrio em brilhante e alegria, o tímido em

audaz e arrogante e a esperança em possibilidade.

Ivani C. A. Fazenda

A motivação para a produção de um trabalho sobre a interdisciplinaridade

como metodologia no desenvolvimento do currículo escolar surgiu pela necessidade

de que a escola atual precisa passar necessariamente por uma mudança de

perspectiva, na qual conteúdos escolares tradicionais deixem de ser encarados como

“fins na educação”.

O estudo deste tema contribuirá para uma reflexão mais profunda sobre o

conceito de currículo que leve à compreensão de que este é o documento de

identidade escolar e um novo olhar sobre a prática escolar que ainda se fundamenta

na disciplinarização.

O modelo curricular de base interdisciplinar visa garantir a construção de um

conhecimento globalizante, rompendo as fronteiras disciplinares. Para isso, integrar

conteúdos não seria suficiente. Seria preciso uma atitude de postura interdisciplinar.

Atitude de busca, envolvimento, compromisso e reciprocidade diante de conhecimento

interdisciplinar. Os conteúdos curriculares devem ser transferidos de maneira atraente

e real aos alunos e assim as aulas passam por uma mudança rápida para que o

professor possa galgar mecanismos a permanência do aluno na escola. Este modelo

curricular também visa construir uma nova visão de escola criativa, ousada e com uma

nova concepção de divisão de saber, pois a especificidade de cada conteúdo precisa

ser garantida paralelamente à sua integração num todo harmonioso e significativo.

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O relato será desenvolvido em três capítulos:

-Primeiro capítulo: Interdisciplinaridade: um novo paradigma educacional;

-Segundo capítulo: construção de conhecimento através de um processo curricular

interdisciplinar, com os seguintes tópicos: conhecimento, aprendizagem e educação

formal. O papel da escola na elaboração de sua proposta pedagógica. Um breve

histórico sobre a organização curricular no Brasil. Transversalidade e

interdisciplinaridade;

- Terceiro capítulo: indicação para a construção de Projeto Curricular Interdisciplinar.

Neste item apresentarei um projeto desenvolvido em uma escola do Município do Rio

de Janeiro.

Os capítulos terão suporte teórico em autores: Morin, Edgard (2000), Palmade,

G (1979), Piaget, Jean (1976) e outros. Temos também como contribuição artigos de

revista, jornais e “sites” da internet.

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Capítulo 1

Interdisciplinaridade: um novo paradigma educacional.

Entre os princípios pedagógicos que estruturam as áreas de conhecimento

destaca-se, como eixo articulador, a interdisciplinaridade. A interdisciplinaridade visa

integrar os vários conhecimentos num todo significativo. Este modelo leva em conta as

características e necessidades do desenvolvimento cognitivo do ser. É a substituição

de uma concepção fragmentária por uma unitária do ser.

Trata-se de um tema complexo, pois é preciso se considerar a forma de ver e

sentir o mundo. O homem vê e entende o mundo de forma holística, em sua rede

infinita de relações, em sua complexidade.

Pensar a interdisciplinaridade enquanto processo de integração recíproca entre

várias disciplinas e campos de conhecimento “capaz de romper as estruturas de cada

uma delas para alcançar uma visão unitária e comum do saber trabalhando em

parceria”, conforme afirma Palmade (1979), é sem dúvida, uma tarefa difícil uma vez

que implica o rompimento de uma série de obstáculos relacionados a uma

racionalidade extremamente positivista de nossa sociedade, que sufocou o antigo

conceito de interdisciplinaridade, impondo uma divisão no trabalho intelectual e

fragmentando. Deve-se, no entanto, romper com essa tendência que desarticula o

processo do conhecimento e não dá importância à interação entre as diversas áreas

do saber.

A proposta de currículo interdisciplinar respalda-se, portanto, além de numa

ideologia própria, em questões sócio-políticas e econômicas. Vivendo em uma

sociedade pós-moderna, com uma política educacional fortemente marcada pela

concepção neoliberal, em que se busca novo sentido para a noção de cidadania e em

que alguns valores são repensados. As novas exigências do mercado de trabalho

passaram a requerer das escolas uma ação pedagógica voltada para o

desenvolvimento de competências e habilidades, uma vez que se exigem pessoas

criativas, com rapidez de raciocínio e competências múltiplas. Busca-se,

incessantemente, a transformação do conhecimento em valor econômico e,

consequentemente, social.

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Todos esses fatores supracitados nos impulsionam a repensar o currículo

escolar de modo que o conhecimento seja visto como uma rede de significados, e a

escola, um espaço de construção coletiva do saber; a concepção que deveria ser

adotada por todos os profissionais de educação é a de que o currículo é uma

produção social, construída por pessoas que vivem em determinados contextos

históricos e sociais.

O que se objetiva é propor um currículo escolar a partir do que é vivido,

pensado e realizado nas escolas e pelas escolas, com base no que dizem autores

como Esteban e Zaccur (2002: 23): “O objetivo centras é que o/a professor/a seja

competente para agir criticamente em seu cotidiano. Tal competência se constrói num

processo coletivo, no qual tanto o crescimento individual, quanto o coletivo, são

resultantes da troca e da reflexão sobre as experiências e conhecimentos acumulados

por todos e por cada um.”

Ao longo de anos tem-se organizado o trabalho escolar por meio das

disciplinas, preservando a identidade, a autonomia e os objetivos próprios de cada

uma delas. Ao ser mantida uma disciplinarização, existente ainda nos currículos

escolares, a organização da escola se mantém inflexível, o que dificulta uma prática

docente mais articulada e significativa para os alunos. As aulas se sucedem de acordo

com uma “grade” curricular em tempos sucessivos, tratando de temas dissociados um

dos outros. O que se vê é que ainda prevalece nas escolas o modelo multidisciplinar

em que as diversas disciplinas são justapostas e não se relacionam entre si. Mesmo

quando há tentativas de se trabalhar por área, o que já é uma tentativa de se superar

as deficiências do modelo curricular multidisciplinar, o que se dá é a integração vertical

dos conteúdos da grade curricular, i.e., de uma série para outra, mas não a integração

entre conteúdos fins na mesma série.

É importante deixar claro que ao se propor a adoção da interdisciplinaridade

como metodologia no desenvolvimento do currículo escolar, não se deseja o

abandono das disciplinas nem se espera que o professor possua “pluriespecialização”.

Não se defende na prática interdisciplinar uma “unificação”, na qual romper-se-iam

definitivamente as fronteiras disciplinares. A interdisciplinaridade não nega as

especialidades, e respeita o território de cada campo do conhecimento.

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O que se defende neste trabalho, é que se estabeleça um eixo comum, teórico

e/ou metodológico, entre as disciplinas, garantindo a integração entre os conteúdos

oferecidos aos alunos, observando-se as especificidades de cada disciplina,

integrando-as num todo harmonioso e significativo.

A transversalidade e a interdisciplinaridade são modos de se trabalhar o

conhecimento buscando uma reintegração entre aspectos que ficaram isolados uns

dos outros pelo tratamento disciplinar. Com isso, busca-se conseguir uma visão mais

ampla e adequada da realidade, que tantas vezes aparece fragmentada pelos meios

de que dispomos para conhecê-la e não porque o seja em si mesma.

1.1-Indicações para a Construção de um Projeto Curricular

Interdisciplinar

Com base na teoria pesquisada no Portal do MEC, foi constatado que ao longo

de anos, a organização do trabalho escolar tem-se dado por meio das disciplinas, cujo

enfoque preserva a identidade, a autonomia e os objetivos próprios de cada uma

delas.

Assentados sobre a base ético-política do projeto escolar, e sobre o princípio

da interdisciplinaridade, acredita-se que o currículo, como dimensão especificamente

epistemológica e metodológica deste projeto, pode mobilizar intensamente os alunos,

assim como os diversos recursos didáticos disponíveis e/ou construídos

coletivamente.

Pressupomos, com isto, a possibilidade de se dinamizar o processo de ensino-

aprendizagem numa perspectiva dialética, em que o conhecimento é compreendido e

apreendido como construções histórico-sociais.

Tomando os objetivos das áreas de conhecimento organizadoras da educação

básica, vemos que os estudos na área de códigos e linguagens visam à compreensão

do significado das letras e das artes; dar destaque à língua portuguesa como

instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania. O

eixo curricular dessa área pode ter como referência a construção do sujeito nas

relações inter-subjetivas e coletivas mediadas pelas linguagens.

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Os estudos das ciências da natureza e da matemática devem destacar a

educação tecnológica básica e a compreensão do significado da ciência. Um eixo de

organização dos conteúdos pode ser a complexidade e o equilíbrio dinâmico da vida

no processo de desenvolvimento dos indivíduos e da sociedade.

A área de ciências humanas e sociais assenta-se sobre a compreensão do

processo histórico de transformação da sociedade e da cultura, podendo-se organizar

em torno do eixo da cidadania e dos processos de socialização, na perspectiva sócio-

histórica.

Algumas abordagens metodológicas podem conferir ao currículo uma

perspectiva de totalidade, respeitando-se as especificidades epistemológicas das

áreas de conhecimento e das disciplinas. Propomos a organização dos planos de

estudo de forma interdisciplinar, sugerindo que o processo pedagógico tenha como

base:

-Atendimento, a partir de 2004, de todos os concluintes do ensino fundamental, com

idade de 14 a 16 anos;

-O trabalho sistematizado com leituras de publicações diversas, além do livro didático,

selecionando temas e construindo objetos de estudo capazes de integrar os

conhecimentos trabalhados nas respectivas áreas de conhecimento e

interdisciplinarmente; envolvimento dos alunos nesse processo de escolha;

valorização da cultura e o contexto local referenciados na cultura global, levando-se

em conta os interesses, a realidade e os projetos pessoais/sociais dos alunos;

-A produção própria e coletiva dos textos, de acordo com a identidade da escola, dos

alunos e da região, de forma a ultrapassar a perspectiva homogeneizante imposta pelo

livro didático;

-A utilização intensa da Biblioteca, como meio de educar para a leitura e desenvolver

a criatividade, o espírito crítico, o interesse pela investigação e pelo desenvolvimento

de projetos, diluindo a fronteira da leitura como obrigação e como prazer;

-O uso de diversos recursos pedagógicos disponíveis na escola, como meio de levar o

aluno a reconhecer as diversas formas e estruturas da linguagem, bem como os

processos históricos e sociais que determinaram a construção do conhecimento

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11 científico, utilizando filmes, livros, documentos históricos e outros, que ajudem a

relacionar fatos e idéias;

-A exploração de recursos externos à escola, como as Bibliotecas, os Cinemas, os

Teatros, os Museus, as Exposições etc, como meio de incentivar o gosto por

atividades culturais e como processo de integração entre o conhecimento do aluno e a

realidade sócio-cultural de seu contexto de vivência;

-A investigação de problemas de ordem sócio-econômica, do ponto de vista histórico,

geográfico, sociológico, filosófico e político;

-A realização de atividades práticas, como aulas em laboratórios e visitas de campo,

tais como fábricas, estações de tratamento de água e de esgoto, estações de geração

elétrica, áreas de atividades agropecuárias, reservas de preservação ambiental,

museus histórico-científicos etc, explorando os recursos externos à escola e

aprofundando o conhecimento sobre a realidades econômico-produtiva, social e

cultural da região;

-O uso de acervos e patrimônios histórico-culturais da região, propiciando o contato

direto do aluno com a preservação da memória, incentivando-o a se apropriar dessa

memória como cidadão, valorizando-a e preservando-a.

Para fazermos essas proposições, partimos da premissa que o conhecimento

da sua realidade mais próxima pode motivar o aluno a compreender as complexas

relações existentes em nível mais global. Um projeto deste tipo pode articular-se em

torno de cinco fundamentos da vida societária: físico-ambiental; sócio-histórico, sócio-

cultural, sócio-político e econômico-produtivo, sabendo-se que nenhum deles é

independente do outro.

A formação básica para o trabalho é defendida como necessária para se

compreender a tecnologia e a produção, com o propósito de preparar os jovens para a

realidade contemporânea.

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Capítulo 2

APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO NA PERSPECTIVA DE

VYGOTSKY

Um modo diferente de abordar o desenvolvimento e a aquisição do

conhecimento é proposta por Vygotsky (1997/1999). A partir de seus trabalhos

apresentam-se alternativas teóricas mais adequadas quando se trata de servir de

marco para a intervenção educativa.

Para tanto, abordam-se conceitos que auxiliam na questão escolar trazendo

recursos teóricos capazes de guiar uma prática pedagógica construtiva. Dentre suas

contribuições temos como marco o conceito de “Zona do Desenvolvimento Proximal”,

que detalhamos neste texto.

Segundo Garcia (1998, p. 105):

Uma maneira diferente de abordar o

desenvolvimento e aquisição do conhecimento e do

pensamento e, portanto, sua aplicação nas dificuldades de

aprendizagem foi proposta por Vygotsky, no primeiro quarto

deste século e, recentemente, tem sido atualizada e

aprofundada pelo enfoque sócio-histórico-cultural [...] que se

oferece como alternativa teórica mais adequada quando se

trata de servir de marco para a intervenção educativa e

resolver a difícil questão das relações entre desenvolvimento e

educação.

O nível de desenvolvimento das crianças vem sendo avaliado de maneira a

medir apenas o que a criança já sabe, ou seja, seu desenvolvimento mental

consolidado. Vygotsky(1997) “propões que se considerem também, nessas

avaliações, as funções que ainda não amadureceram, que estão em maturação, ou

seja, que se veja o desenvolvimento mental também de maneira prospectiva .” Aquilo

que a criança consegue fazer com ajuda dos outros pode ser, de alguma maneira,

indicativo de seu desenvolvimento.

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Vygotsky postulou, assim, a Zona de Desenvolvimento Proximal que

encaminha uma reflexão mais detalhada deste processo em que conceitos de certo e

errado desaparecem,

Dando lugar ao desafio e a interação dos pares em sala de aula. A função do

professor é valorizar, não na forma tradicional do poder, da autoridade, mas na

dinâmica de conjunto, de auxiliar, de mediador da aprendizagem, juntamente com a

participação de colegas mais experientes que existem nas classes, pois lida-se no dia-

a-dia com a heterogeneidade de nossos alunos.

Segundo Bock (2002, p. 125) para Vygotsky:

A Zona do Desenvolvimento Proximal é a distância entre o nível

de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução de problemas

sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros.

A concepção de Vygotsky(1997) sobre o processo de aprendizagem parte de

sua constatação de que os problemas encontrados na análise psicológica do ensino

não podem ser corretamente resolvidos, ou formulados, sem que a relação entre o

aprendizado e o desenvolvimento sejam referidos.

Segundo Bock (2002, p.114) “são muitas as questões consideradas

importantes pelos teóricos da aprendizagem [...] as respostas a essas questões têm

originado controvérsias entre os estudiosos”, dentre os quais Vygotsky e Piaget.

Piaget privilegia a maturação biológica; Vygostky, o ambiente social. Piaget,

por postular que os fatores internos se sobressaem aos externos, diz que o

desenvolvimento segue uma sequência fixa e única de estágios. Vygotsky, ao colocar

em evidência o ambiente social em que a criança nasceu, reconhece que em se

variando este ambiente, o desenvolvimento também irá variar. Neste sentido, para

este autor, não se pode aceitar uma visão única, universal, de desenvolvimento

humano.

Piaget acredita que o desenvolvimento da fala egocêntrica e do pensamento

egocêntrico são elaborados espontaneamente pela criança, de acordo com o estágio

de desenvolvimento em que esta se encontra. A visão de egocentrismo que as

crianças mantêm sobre o mundo, na visão do autor, vai se definhando ao passo que a

criança vai se aproximando da idade adulta, tornando-se socializada e objetiva.

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Em sua descrição da fala egocêntrica e de seu desenvolvimento inevitável,

Piaget, segundo Vygotsky (2000, p.19) enfatiza que ela não cumpre nenhuma função

verdadeiramente útil no comportamento da criança, e que simplesmente se atrofia à

medida que a criança se aproxima da idade escolar.

A concepção da função da fala egocêntrica para Vygotsky(1997) deve

influenciar a nossa concepção de seu destino quanto ao futuro, e terá que ser

questionada no que diz respeito à questão do seu desaparecimento na idade escolar.

Vygotsky discute que as experiências podem nos dar um testemunho indireto

quanto às causas desse desaparecimento, mas nenhuma resposta definitiva. O autor

(2000, p.21) “trabalha com a hipótese de que a fala egocêntrica seja um estágio

transitório na evolução da fala oral para a fala interior.”

A concepção do desenvolvimento do pensamento para Piaget, é baseada no

pressuposto extraído da psicanálise de que, o pensamento infantil é autístico, só se

transformando em pensamento realista através de uma longa e persistente pressão

social.

Vygotsky discorda de que o desenvolvimento da fala e do pensamento parta do

indivíduo para o social. Em seu entender a criança já nasce num mundo social e

desde o nascimento, vai formando uma visão de mundo através da interação com as

atividades e do meio em que vive.

Para Piaget, o pensamento aparece antes da fala, que apenas é uma das

formas de expressão da criança. A formação do pensamento depende basicamente da

lógica da criança e não da fala. Esta só pode ocorrer depois que a criança já alcançou

um determinado nível de habilidades mentais, subordinando-se aos processos do

pensamento.

Segundo Vygotsky (1997, p.19), a linguagem que a criança utiliza em sua

atividade fundamental, o brinquedo, para Piaget, é uma linguagem de gestos,

movimentos e mímica, tanto quanto de palavras.

A fala em Piaget, possibilita à criança a imaginar um objeto ou acontecimento

que não estão presentes na comunicação de conceitos. Piaget, estabeleceu uma clara

separação entre as informações que podem ser passadas por meio da fala e os

processos que não parecem sofrer qualquer influência dela.

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É a linguagem egocêntrica, diz Piaget segundo Vygotsky (1997, p.19), que não

tem uma função de comunicação, de troca com outro. Aos poucos é que a linguagem

da criança se torna socializada.

Vygotsky(1997) ao contrário, diz que a fala é desde o início social e

socializada. O que sinaliza a existência da fala, muito mais do que a sua expressão

oral, é a troca e a compreensão dos significados, seja por gestos, olhares, choro

palavras. Pois a fala que é social e socializada vai se tornando fala interior.

A aquisição da fala pela criança modifica suas funções mentais superiores, ela

dá uma forma definida ao pensamento, possibilita o aparecimento, o uso da memória e

o planejamento da ação. Neste sentido, a fala, diferentemente daquilo que Piaget

defende , sistematiza a atividade direta da criança e por isso adquire uma função

central no desenvolvimento cognitivo, reorganizando os processos que neles estão em

andamento.

Em resumo, a teoria de Piaget é cognitivista e portanto, prioriza as estruturas

mentais operatórias do pensamento secundarizando o papel da linguagem no

desenvolvimento do pensamento da criança.

Contrapondo-se à Piaget, Vygotsky a partir da abordagem histórico-social que

o orienta, analisa a construção do conhecimento na criança estabelecendo a inter-

relação pensamento/linguagem, tornando-os um todo indissociável, coerente,

coexistindo em uma mesma totalidade rica, viva e em constante mudança. É o

pensamento e a linguagem que são indissociáveis.

Deste modo, Bock (2002, p.123) sinaliza que Vygotsky criticou as concepções

que afirmavam serem as propriedades intelectuais dos homens resultado da

maturação do organismo, como se o desenvolvimento estivesse pré-determinado e, o

seu afloramento, vinculado apenas a uma questão de tempo.

Para Vygotsky(1997) a educação escolarizada e o professor tem um papel

singular no desenvolvimento dos indivíduos. Bock (op. Cit., p. 126) afirma que “para

Vygotsky o desenvolvimento é resultado desse processo, e a escola, o lugar

privilegiado para essa estimulação.”

Embora a criança chegue á escola já dominando inúmeros conhecimentos e

modos de funcionamento intelectual necessários á elaboração dos conhecimentos

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16 científicos sistematizados, durante o processo de educação escolar a criança realiza a

reelaboração desses conhecimentos mediante o estabelecimento de uma nova

relação cognitiva com o mundo e com o seu próprio pensamento.

Segundo Bock (op. Cit., p. 124):

O desenvolvimento para Vygotsky, não é pensado

como algo natural nem mesmo como produto exclusivo da

maturação do organismo, mas como um processo em que

estão presentes a maturação do organismo, o contato com a

cultura produzida pela humanidade e as relações sociais que

permitem a aprendizagem.

Na escola as condições se modificam. Ali as relações de conhecimento são

intencionais e planejadas. A criança sabe que está ali para apropriar-se de

determinado tipo de conhecimento e modos de pensar e explicar o mundo,

organizados segundo uma lógica que ela deverá aprender.

A professora acompanha, orienta, faz junto, fornece pistas, instrui, dá

assistência, problematiza, interferindo assim no desenvolvimento proximal de seus

alunos, contribuindo para emergência de processos de elaboração e de

desenvolvimento que não ocorreriam espontaneamente e enquanto isso a criança

raciocina com a professora.

Weisz (2000, p.23) alerta que:

Nessa abordagem a função do professor é criar as condições

para que o aluno possa exercer a sua ação aprender

participando de situações que favoreçam isso. As ações, nesse

caso, não implicam necessariamente atividade física aparente,

mas atividade mental, exercício intelectual.

Nessas situações compartilhadas com a professora, a criança aprende

significados, modos de agir e de pensar e começa a elaborá-los. Ela também re-

significa e reestrutura significados, modos de agir e de pensar, e começar a se dar

conta das atividades mentais que realiza e do conhecimento que está elaborando.

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Weisz (op. Cit., p.23-24) segue dizendo que, “para interpretar adequadamente

o que está acontecendo com a aprendizagem de seu aluno, o professor precisa de um

conhecimento que é produzido no território da ciência.”

O papel do professor não implica em ensinar ou explicar diretamente o

significado de uma palavra à criança, e sim dar oportunidades para a criança adquirir

novos conceitos e palavras na dinâmica das interações verbais mediadas por ele. O

professor participa ativamente do processo de elaboração conceitual da criança.

Segundo Bock (2002, p. 126):

A partir destas concepções de Vigotsky, a escola torna-

se um novo lugar, um espaço que deve privilegiar o contato

social entre seus membros e torná-los mediadores da cultura.

Alunos e professores devem ser considerados parceiros nesta

reta social.[...] Qualquer dificuldade neste processo deverá se

analisada como uma responsabilidade de todos os envolvidos.

Desta forma, trabalhar em sala de aula com a Zona de Desenvolvimento

Proximal implica que o educador tenha consciência dos vários processos evolutivos

das crianças e que veja possibilidades de mudanças que venham a dar qualidades ao

ensino, com vistas a obter uma certa meta.

Segundo Bock (op. Cit., p. 125) para Vygotsky o bom ensino é aquele que se

volta para funções psicológicas emergentes, potenciais, e pode ser facilmente

estimulado pelo contato com os colegas que já aprenderam determinado conteúdo.

Segundo Piaget (1976), a evolução do conhecimento humano teve três fases

bem claras:

a)Fase Empírica: corresponde ao período que antecede aos Gregos. Neste

período, a humanidade viveu séculos sem se preocupar muito com as explicações do

“porquê” dos fenômenos; o homem mais praticava do que explicava.

b)Fase Gnóstica: Período correspondente ao Helenismo, em que o homem

tentou explicar racionalmente os fenômenos, dando início ao nosso conhecimento

científico ocidental.

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c)Fase da aplicação: Dias atuais em que não se indaga somente o porquê das

coisas, mas sua aplicação prática.

Piaget (op.cit.) demonstra que este também é o percurso natural de

desenvolvimento da inteligência do homem. Há uma fase em que a criança tem uma

inteligência prática, outra em que ela faz afirmações a respeito do mundo sem se

preocupar em demonstrar ou justificar; e outra fase em que realiza uma auto-

submissão a uma disciplina qualquer, aplicando a si própria um plano de vida. “A

criança não assimila objetos puros, definidos por seus parâmetros empíricos. Ela

assimila situações nas quais os objetos cumprem certas funções e não outras”. (Piaget

& Garcia, 1983).

O Conhecimento não é algo rígido e estanque, mas sim flexível e mutável. Nos

dias atuais, o conhecimento que o homem tem de si mesmo e do mundo não é o

mesmo que possuíam seus antepassados. Ao longo dos séculos, o homem tem

acumulado informação sobre muitos assuntos, alguns utilizados no seu dia-a-dia que

se tem à disposição para deles se servir, quando necessário. É mister, portanto, que

se levantem discussões acerca da multidimensionalidade do Conhecimento humano.

A aprendizagem, embora provocada por situações externas, para que se

efetive necessita de um indivíduo que assimile, atue e opere sobre os objetos a sua

volta, construindo-os e desconstruindo-os. O ser humano está imerso num meio em

que a aprendizagem ocorre de forma constante. A todo o momento nos deparamos

com situações inteiramente novas ou situações que já são conhecidas, mas portam

alguns elementos diferentes. Espera-se que sejamos capazes de utilizar as novas

informações adquiridas em diferentes contextos evocando o que se aprendeu, não

somente na situação em que foram geradas e assimiladas, mas em diferentes

contextos da vida.

Para o psicólogo da aprendizagem Ausubel (1978), o principal no processo de

ensino é que a aprendizagem seja significativa, o que quer dizer que o material a ser

aprendido precisa fazer algum sentido para o aprendiz. Novas informações devem

ancorar-se em conceitos já assimilados e interiorizados na estrutura cognitiva do

aluno, interagindo assim, o novo e o velho. Quando novas informações são

aprendidas sem interagirem com conceitos relevantes existentes na estrutura

cognitiva, ocorre o que o autor denomina de “role learning”, que pode ser traduzido por

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19 “aprendizagem mecânica” ou popularmente “decoreba”; é o que se decora e logo é

esquecido.

Para haver aprendizagem significativa é preciso a combinação de dois fatores:

o aluno tem que ter vontade de aprender e o material a ser aprendido tem que ser

potencialmente significativo para ele.

A educação formal é uma é uma prática social que envolve relações entre os

homens conduzidas politicamente, sedo mediadora para a construção da cidadania,

contribuindo para a integração dos homens no que tange ao trabalho, á sociedade e à

cultura. Esta deve, pois, reservar tempo e ocasiões suficientes em seus programas

para iniciar os jovens em projetos de cooperação, logo desde a infância, no campo das

atividades desportivas e culturais, evidentemente, mas também estimulando a sua

participação em atividades sociais: renovação de bairros, ajuda aos mais

desfavorecidos, ações humanitárias, serviços de solidariedade entre gerações... As

outras organizações educativas e associações devem, neste campo, continuar o

trabalho iniciado pela escola. Por outro lado, na prática letiva diária, a participação de

professores e alunos em projetos comuns podem dar origem à aprendizagem de

métodos de resolução de conflitos e constituir uma referência para a vida futura dos

alunos, enriquecendo a relação professor/aluno.

À medida que as descobertas científicas se dão em um ritmo acelerado,

coloca-se em foco a maneira como se processa a construção do Saber, prevalecendo

no mundo um modelo globalizante, que embora pareça defender a liberdade

individual, encara o Homem como um recurso a ser consumido como qualquer outro,

construindo um homem “unidimensional”, como assim classifica Herbert Marcuse, sem

capacidade para fazer suas próprias escolhas. Nos últimos tempos, vimos surgir em

nossa sociedade esse tipo de indivíduo, receptor passivo domesticado, sem o hábito

de refletir critica e criativamente sobre sua realidade.

Há uma inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os

saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas e, por outro

lado, realidades e problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais,

multidimensionais, transnacionais, globais, planetários. [...] A hiperespecialização

impede de ver o global (que ela fragmenta em parcelas), bem como o essencial (que

ela dilui). [...] o retalhamento das disciplinas (no Ensino) torna impossível apreender ”o

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20 que é tecido junto”, isto é, o complexo, segundo o sentido original do termo. Edgar

Morin, 2000

Estudos sobre o papel da educação no mundo contemporâneo, tanto os

produzidos no Brasil como os de nível internacional, apontam para a qualificação

intelectual e o desenvolvimento emocional e afetivo como as fontes principais de

competência do mundo moderno, e a escola como o lugar de construção e

desenvolvimento dessa qualificação.

Entende-se por qualificação intelectual a que envolve maior capacidade de

abstração e de raciocínio, de integração, de tomada de decisões, a que permite

trabalho em equipe, melhor assimilação de mudanças, autonomia, exercício de

solidariedade e, principalmente, respeito às diferenças. Essa exigência moderna

apresenta um alto nível de complexidade, i.e., necessitam ser construídas ou

adquiridas essas habilidades através de um processo sistemático e contínuo. É a

escola a instituição responsável pelo alcance de tal qualificação, por ser a instituição

responsável pela transmissão do conhecimento sistematizado. É na escola que se vai

dar o processo de iniciação do aluno no conjunto de regras que regem o mundo

letrado.

Saber ler e escrever é, na sociedade contemporânea, imprescindível ao acesso

a todo o tipo de informação, o que permite ao cidadão participar de atividades

produtivas e coletivas. Não dominar a leitura gera desvantagens e dependências de

todo o tipo.

2.1-O papel da escola na elaboração de sua proposta

pedagógica

A gestão democrática, proposta pela Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional

(1996), propõe de forma incisiva a autonomia da escola em construir seu plano

pedagógico, através da participação de todos os interessados - professores, alunos,

pais e funcionários; entendendo que este planejamento deve ser a base que sustenta

todas as decisões, objetivos e rumos da escola.

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21 A concretização da gestão democrática nas escolas teria sua culminância com a

elaboração do Proposta Pedagógica, que aborda as idéias coletivas da escolas a

respeito de homem, sociedade e educação, concepções que de forma consentânea,

deveriam ser definidas pelos atores da escola. Estas determinações viriam a justificar

as finalidades sociais e políticas da Educação em relação à sociedade e a formação

dos alunos, assim como vir a promover a mobilização dos professores a um trabalho

conjunto de construção de meios e fins da Educação, através de uma postura

interdisciplinar (BERNARDI, 2006).

Na concepção de gestão democrático-participativa, a construção e efetivação da

Proposta Pedagógica, exige uma participação coletiva e um grande envolvimento de

todos os professores. Para isso é necessário constantes conversas, leituras,

discussões e reflexões dos professores e seus pares, no ambiente de trabalho, antes,

durante e após a construção do seu projeto. Nas palavras de Alarcão (2001) “a escola

que se pensa e se avalia em seu projeto educativo é uma organização aprendente que

qualifica não apenas os que nela estudam, mas também os que nela ensinam ou

apóiam estes ou aqueles” (p. 15). Pois, a escola deve ser o ambiente onde os

professores tenham a possibilidade de reconstruir suas práticas, o que resulta em

mudanças pessoais e profissionais.

A Proposta Pedagógica, depois de formulado, deve nortear, juntamente com o

Regimento Escolar, todas as ações da escola, devendo explicitar os fundamentos

teórico-metodológicos, objetivos, tipo de organização e as formas de implementação e

avaliação da escola. A construção deve considerar igualmente relevantes, tanto à

dimensão pedagógica quanto à política, porque como nos coloca a autora, são

perspectivas indissociáveis, porém com características próprias. O político não pode

ser entendido como mais uma dimensão “senão que o político atravessa

constantemente todas as demais. Eu não posso ser um sujeito social, sem ser um

sujeito político [...]” (VEIGA-NETO, 1996, p. 170).

A participação do professor na elaboração e efetivação da Proposta Pedagógica da

escola possibilita um importante momento de reflexão, estudo, discussão, pesquisa,

por meio de temáticas elencadas para embasar todo um estudo referente às práticas

pedagógicas e as práticas educacionais desenvolvidas na e pela escola, através das

ações de seus atores.

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22

2.2-Um breve histórico sobre a organização curricular no

Brasil

Visões alternativas sobre o conceito de currículo são apresentadas a seguir:

-O currículo tem que ser entendido como a cultura real que surge de uma série

de processos, mais que como um objeto delimitado e estático que se pode planejar e

depois implantar; aquilo que é, na realidade, a cultura nas salas de aula, fica

configurado em uma série de processos: as decisões prévias acerca do que se vai

fazer no ensino, as tarefas acadêmicas reais que são desenvolvidas, a forma como a

vida interna das salas de aula e os conteúdos de ensino se vinculam com o mundo

exterior, as relações grupais, o uso e o aproveitamento de materiais, as práticas de

avaliação etc. (Sacristán, J.G., 1995, p.86-87).

-Currículo é o conjunto daquilo que se ensina e daquilo que se aprende, de

acordo com uma ordem de progressão determinada, no quadro de um dado ciclo de

estudos. Um currículo é um programa de estudos ou um programa de formação, mas

considerado em sua globalidade, em sua coerência didática e em sua continuidade

temporal, isto é, de acordo com a organização seqüencial das situações e das

atividades de aprendizagem às quais dá lugar. (Forquin, 1996, p.188).

-O currículo representa muito mais do que um programa de estudos, um texto

em sala de aula ou o vocabulário de um curso. Mais do que isso, ele representa a

introdução de uma forma particular de vida; ele serve, em parte, para preparar os

estudantes para posições dominantes ou subordinadas na sociedade existente. O

currículo favorece certas formas de conhecimento sobre outras e afirma os sonhos,

desejos e valores de grupos seletos de estudantes sobre outros grupos, com

freqüência discriminando certos grupos raciais, de classe ou gênero. (McLaren, 1977,

p. 216)

-Na perspectiva de Alice Casimiro Lopes(2001), o currículo disciplinar

permanece sendo a organização dominante em nossas escolas. Tal constatação por si

só seria suficiente para demonstrar que a relação entre integração curricular e

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23 disciplinas escolares merece uma problematização maior que nos afaste da simples

dicotomia entre currículo integrado e currículo disciplinar. Há, no entanto, ainda outros

argumentos favoráveis à necessidade de investigação dessa problemática. O

desenvolvimento dos estudos sobre cultura escolar e sobre história das disciplinas, em

anos recentes, tem ampliado as discussões até então desenvolvidas no campo da

história do currículo, chamando a atenção para a forma como a dinâmica interna da

escola atua na constituição das disciplinas. Outro aspecto a salientar é a centralidade

que as reformas curriculares vêm assumindo nas políticas educacionais atuais, tanto

no Brasil quanto no exterior. Nessas reformas, em diferentes níveis de ensino, as

mudanças na organização curricular têm sido um dos eixos principais. Assim, são

propostas áreas interdisciplinares, temas transversais, áreas de projeto, currículos por

competências. É ainda importante ressaltar que, da mesma forma que as políticas

educacionais, a apropriação que delas é feita também não é homogênea, permitindo

recriações dos sujeitos envolvidos no fazer curricular. Ainda assim, acreditamos que

os estudos sobre propostas curriculares se justificam na medida em que permitem

analisar os projetos políticos, econômicos e sociais construídos em um determinado

momento histórico, facilitando, também, a compreensão da dinâmica envolvida no

funcionamento dos sistemas educativos.

Nos trechos acima, alguns aspectos merecem ser destacados:

1º - Os currículos escolares transcendem os guias curriculares

O material escrito representa apenas uma das dimensões do currículo: o currículo

formal ou escrito. Nele encontram-se cristalizados os acordos estabelecidos entre os

participantes do processo de elaboração curricular. Embora o cotidiano da sala de aula

sofra uma grande influência do currículo formal, ele não é totalmente determinado por

esse documento. No dia-a-dia curricular acontecem muitas manifestações não

prescritas no currículo escrito. Esse cotidiano da sala de aula é também uma das

dimensões do currículo denominada currículo vivido.

Tanto o currículo formal, quanto o vivido, constituem um ambiente simbólico,

material e humano que se modifica constantemente. Dessa forma, as decisões

curriculares não são neutras nem científicas, envolvendo questões técnicas, políticas,

éticas e estéticas (Apple, 1991). Essas dimensões que perpassam qualquer

formulação curricular constituem o que se denomina currículo oculto. É por intermédio,

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24 especialmente, do currículo oculto que diferentes mecanismos de poder penetram na

escola sem que estejam explícitos no currículo formal ou vivido.

2º - O currículo não é um conjunto de objetivos, conteúdos, experiências de

aprendizagem e avaliação

Objetivos, conteúdos, procedimentos metodológicos e procedimentos de

avaliação são componentes curriculares. O estabelecimento da periodização do tempo

escolar, a opção por uma determinada forma de organização dos conteúdos

(disciplinar, por eixos, por temáticas), a integração entre os conteúdos de um mesmo

período ou de período subseqüentes são outros aspectos que precisam ser

considerados ao se elaborar um currículo.

No entanto, esses aspectos requerem decisões que não são apenas de natureza

técnica. Elas têm implicações nas formas de conceber a sociedade, a escola, o

conhecimento. Elas são formas culturais de organização da escolarização e essas

formas configuram o currículo. Por exemplo, uma prática de avaliação meramente

classificatória funciona como mecanismo de diferenciação social dos indivíduos não

apenas na escola, mas em toda a sua vida social. Não se trata, portanto, apenas de

uma decisão técnica acerca de uma determinada metodologia de trabalho em sala de

aula.

3º - O currículo escolar não lida apenas com o conhecimento escolar, mas com

diferentes aspectos da cultura

A escola moderna está muito acostumada com a idéia de que deve se ocupar da

transmissão/ assimilação/ construção do conhecimento. Isso é verdade, na medida em

que a especificidade da escola é o trato com o conhecimento escolar. No entanto, o

conhecimento é apenas uma das facetas da cultura construída e reconstruída no

ambiente escolar.

Ainda que a ênfase dos currículos escolares tenda a recair constantemente sobre

os conteúdos escolares, esses conteúdos fazem parte de um padrão cultural

influenciado pelo currículo oculto. A escolha de um determinado padrão cultural na

seleção de conteúdos para um dado currículo expressa uma valorização desse padrão

em detrimento de outros.

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Todo currículo é um processo de seleção, de decisões acerca do que será e do

que não será legitimado pela escola. A existência um conjunto de culturas negadas

pelo currículo cria nos alunos pertencentes a essas culturas um sentimento de

alijamento do que é socialmente aceito.

4º- A seleção de conteúdos e procedimentos que comporão o currículo é um

processo político

Os modelos curriculares técnicos sempre buscaram definir parâmetros científicos

através dos quais se deveria realizar a seleção e a organização dos conteúdos e dos

procedimentos escolares. Embora alguns parâmetros científicos existam, eles não são

neutros e desinteressados. Ao contrário, embutem em si uma compreensão política do

mundo e são, também eles, negociados pelas comunidades que os definem. Assim, os

professores de matemática, por exemplo, partilham crenças e atitudes que direcionam

a seleção dos conteúdos e dos procedimentos escolares. Tais crenças e atitudes

originam-se no processo histórico do qual participam esses atores.

Em síntese, ao propor determinada organização curricular, a sociedade está

realizando uma seleção histórica, problemática que reflete, em alguma medida, a

distribuição de poder que se dá em seu interior.

Na década de 50, o currículo escolar era visto como um instrumento neutro de

controle do planejamento e da atividade educativa. A partir dos anos 60, um avanço

em prol da descentralização da educação foi consolidado nas diretrizes e bases da

educação contidas na Lei 4024/61, hoje revogada. Em sua vigência, esta lei foi

alterada pela Lei 5692/71 em que dispositivos incluíam o Município como responsável

pela manutenção da educação pré-escolar e, juntamente com o Estado, pelas escolas

de ensino do 1º grau.

Na década de 70 diversos autores nacionais se empenham em fazer a releitura

do fracasso escolar brasileiro. A tarefa da pedagogia histórico-crítica se insere na

tentativa de reverter o quadro de desorganização que torna uma escola excludente,

com altos índices de analfabetismo, evasão, repetência e, portanto, de seletividade. A

partir deste período, começa a ser discutida a maneira pela qual a estrutura sócio-

econômica condiciona a educação.

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Nos anos 80, em pleno processo de redemocratização do país, o movimento

pela descentralização da gestão pública e fortalecimento do poder municipal ampliou e

desembocou, com êxito, nas discussões da Assembléia Nacional Constituinte. E hoje

está no artigo 18 da Constituição Brasileira de 1988 o reconhecimento do Município

como um ente da federação, autônomo e com a competência de “manter, com a

cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-

escolar e de ensino fundamental”, conforme consta no inciso VI do artigo 30.

A partir da década de 80, estudos têm apontado para a necessidade de se

reformular a idéia de currículo numa perspectiva interdisciplinar, i.e., o currículo seria

construído a partir do cruzamento de campos de atividades diferenciadas e inter-

relacionadas. A educação brasileira, a partir daí, vem acompanhando o que já

acontecia em grande parte dos países ocidentais, sendo fortemente influenciada por

duas ideologias: o Liberalismo e a Dialética de origem marxista.

Sob a influência da Dialética, para conhecer o processo educacional é

necessário, antes, compreender a estrutura da sociedade onde a escola existe. A

sociedade, formada por uma estrutura (os meios de produção, como a terra, a

indústria e o comércio) e uma superestrutura que justifica a manutenção da estrutura,

como a escola, a religião e os meios de comunicação social, com os meios de

produção nas mãos da classe capitalista, tinha que ser justificada e reproduzida; tal

função era exercida pela superestrutura (escola, religião, etc). A Dialética teve grande

influência na obra de diversos pensadores contemporâneos, como Michael Apple,

José Gimeno Sacristán, Moacir Gadotti, Dermeval Saviani e Paulo Freire, alguns deles

citados neste trabalho.

As idéias desses educadores acabaram levando ao aparecimento, no Brasil, de

uma nova tendência educacional, no início dos anos 90: a Teoria Crítica da Educação

ou Teoria da Reconstrução Social. Esta ainda se apresenta como uma tendência

emergente que poderá marcar as políticas públicas educacionais do século XXI.

A Teoria Crítica representa o aparecimento das primeiras propostas brasileiras

de concepção da educação. Ela considera a pessoa concreta, inserida na sua

realidade. Desse ponto de vista, o enfoque sociológico supera o pedagógico. Esta

teoria, na organização escolar, absorve elementos da linha tradicional, ao se

estabelecerem objetivos, e da linha cognitivista, com enfoque no processo, e não no

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27 produto. Para a Teoria Crítica, o principal objetivo da escola é a formação do aluno

para exercer sua cidadania, e não apenas formar um profissional integrado no

mercado de trabalho. E o professor passa a ser um orientador, estimulador e

interventor durante o processo de aprendizagem.

O principal teórico desta tendência foi Paulo Freire (1921-1997), para quem a

educação pode fazer das pessoas donas da história ou acomodá-las ao mundo como

animais: a que apenas “passa” conhecimentos unidirecionalmente não faz dos alunos

sujeitos da aprendizagem e, sim, objetos. Ele se embasa em uma teologia libertadora,

preocupada com o contraste entre a pobreza e a riqueza que resulta em privilégios.

Em sua obra Pedagogia do Oprimido faz uma abordagem dialética da realidade, cujos

determinantes se encontram nos fatores econômicos, políticos e sociais. Considera

que o conhecer não pode ser um ato de “doação” do educador ou educando, mas um

processo que se estabelece no contato do homem com o mundo vivido. E este não é

estático, mas dinâmico, em contínua transformação. Paulo Freire defende a

autogestão pedagógica, com o professor sendo o animador do processo, evitando as

formas de autoritarismo que costumam minar a relação pedagógica.

A educação, segundo esta teoria, deve ser:

a)Libertadora: a que propicia o diálogo e na qual ambos, professor e aluno,

aprendem com a cultura um do outro;

b)Problematizadora: devem ser escolhidos temas que o aluno conheça e que

possa usar como ponto de partida para a construção de conhecimento;

c)Crítica: a que possibilita a consciência da responsabilidade social e política

do aluno, formando um cidadão;

d)Fundamentada na prática do aluno: o aluno chega à escola com sua

experiência de vida (a prática), recebe na escola o saber elaborado (a teoria) e

ao voltar para sua realidade tem uma nova prática, agora enriquecida em

teoria.

Diferente do Liberalismo, que possui a crença ingênua de que a educação

pode mudar a sociedade e do Marxismo, para quem a escola é apenas um agente

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28 passivo da classe dominante, a Teoria Crítica acredita que, se a educação não pode

tudo, alguma coisa fundamental a escola pode fazer.

No Brasil, a aprovação, após anos de discussão, da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional (LDB) marcou a década de 90; nela, a autonomia do Município

é reafirmada, permitida a organização de seu sistema de ensino (art.8º).. Além dessa

lei, foram elaboradas as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) pelo Conselho

Nacional de Educação, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) propostos pelo

MEC e a Multieducação pelo Município do Rio de Janeiro.

Quase dez anos se passaram e o que se vê é que a reforma pretendida não se

efetivou completamente. Mas, o que de positivo se pôde tirar é que, a partir da

elaboração desses documentos, surgiram discussões sobre o que e como ensinar,

colocando na berlinda o currículo escolar, que norteia as ações pedagógicas.

À guisa de informação, ao lado do currículo formal, que é o apresentado nas

diretrizes curriculares, nas propostas pedagógicas e nos planejamentos de aula, há

um currículo “de fato”, que é aquilo que, de fato, acontece na escola e o currículo

oculto, que é o que não está formalmente explicitado; está implícito nas atividades

escolares.

O currículo “de fato” é aquilo que é construído pelos professores e alunos no

dia-a-dia da escola, a partir dos elementos do currículo formal e das experiências

pessoais de cada um. O currículo oculto é o que diz respeito às aprendizagens que

fogem ao controle da própria escolha e do professor: relações de aceitação ou rejeição

de pessoas que pertencem a grupos diferentes e comportamentos de discriminação

dissimulada das diferenças, por exemplo.

Para que seja construído e posto em prática um currículo escolar que

realmente permita a inserção do aluno na vida cidadã, é preciso que os profissionais

da educação estejam bem preparados, com autonomia intelectual, para conduzirem

um processo de ensino que vá além da simples transmissão de alguns

conhecimentos.

Há várias formas de organização curricular, indo de modelos multidisciplinares

que vêm dominando a escola brasileira e de outros países, em que o saber é oferecido

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29 de forma fortemente fragmentada, a modelos que seguem uma perspectiva

interdisplinar e transdisciplinar.

A Interdisciplinaridade é a concepção marcada pela interdependência, pela

interação e pela comunicação entre as disciplinas voltadas para a integração do

conhecimento em áreas significativas. E a Transdisciplinaridade coordena o

conhecimento do modo a permitir que se transite de um campo de saber para outro,

ultrapassando, portanto, a concepção de disciplina.

Com base nessas duas últimas formas de organização curricular, é que os

Parâmetros Curriculares Nacionais introduzem os temas transversais e a

Multieducação os Princípios Educativos e os Núcleos Conceituais. Essa

transversalidade necessita que se trate cada questão numa perspectiva plural.

2.3-Transversalidade e interdisciplinaridade

2.3.1- Transversalidade

Temas transversais são um conjunto de conteúdos educativos

e eixos condutores da atividade escolar que, não estando

ligados a nenhuma matéria particular, pode se considerar que

são comuns a todas, de forma que, mais do que crias novas

disciplinas, acha-se conveniente que seu tratamento seja

transversal num currículo global da escola.

(YUS, 1998, p.17)

Sendo assim, esses temas expressão conceitos e valores fundamentais à

democracia e à cidadania e correspondem a questões importantes e urgentes para a

sociedade brasileira de hoje, presentes sob varias formas na vida cotidiana. São

amplos o bastante para traduzir preocupações de todo o país são questões em debate

na sociedade atual.

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Diante desse contexto optou-se por integrá-las no currículo por meio do que se

chama transversalidade, ou seja, pretende-se que “esses temas integrem as áreas

convencionais de forma a estarem presentes em todas elas, relacionando-os às

questões da atualidade e que sejam orientadores também do convívio escolar”.

(BRASIL, 1998, p.27)

2.3.2- Interdisciplinaridade

A interdisciplinaridade surgiu no final do século XIX, pela necessidade de dar uma

resposta à fragmentação causada pela concepção positivista, pois as ciências

foram subdivididas surgindo, várias disciplinas. Após longas décadas convivendo

com um reducionismo científico, a idéia de interdisciplinaridade foi elaborada

visando restabelecer um diálogo entre as diversas áreas dos conhecimentos

científicos.

No livro “Práticas Interdisciplinares na Escola”, organizado por Ivani

Fazenda (1993), Ferreira ressalta que no idioma latino:

O prefixo ‘inter’ dentre as diversas conotações que podemos

lhes atribuir, tem o significado de ‘troca’, ‘reciprocidade’, e

‘disciplina’, de ‘ensino’, ‘instrução’, ‘ciência’. Logo, a

interdisciplinaridade pode ser compreendida como sendo a

troca, de reciprocidade entre as disciplinas ou ciências, ou

melhor áreas do conhecimento. (FEREIRA in FAZENDA, 1993,

p. 21-22)

Como sabemos, os PCNs diferenciam a transversalidade e a interdisciplinaridade.

A interdisciplinaridade é definida nos PCNs como a dimensão que

(...) questiona a segmentação entre os diferentes campos do

conhecimento produzida por uma abordagem que não leva em

conta a inter-relação e a influência entre eles, questiona a visão

compartimentada (disciplinar) da realidade sobre a qual a

escola, tal como é conhecida, historicamente se constituiu

(BRASIL, 1998, p. 30).

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Já a transversalidade diz respeito a:

... à possibilidade de se estabelecer, na prática educativa

uma relação entre aprender conhecimentos teoricamente

sistematizados (aprender sobre a realidade) e as

questões da vida real e de sua transformação (aprender a

realidade da realidade) (BRASIL, 1998, p. 30).

Se tomarmos as afirmações de Japiassu (1976), como referências veremos

que a interdisciplinaridade consiste em um trabalho comum, tendo em vista a interação

de disciplinas científicas, de seus conceitos básicos, dados, metodologias, com base

na organização cooperativa e coordenada do ensino. Trata-se do redimensionamento

epistemológico das disciplinas científicas e da reformulação total das estruturas

pedagógicas de ensino, de forma a possibilitar que as diferentes disciplinas se

interajam em um processo de intensiva reflexão.

Essa concepção pressupõe educadores imbuídos de um verdadeiro espírito

crítico, aberto para a cooperação, o intercâmbio entre as diferentes disciplinas, o

constante questionamento ao saber arbitrário e desvinculado da realidade. Por outro

lado, exige a prática de pesquisa, a troca e sistematização de idéias, a construção do

conhecimento, em um processo de indagação e busca permanente. Mas, acima de

tudo, pressupõe a clareza dos fins, a certeza dos objetivos da interdisciplinaridade. À

medida que fica claro o seu sentido com a prática que possibilita a escola investir

coletivamente na elaboração de conhecimentos significativos, torna-se possível uma

nova atitude pedagógica e a luta pela reformulação das estruturas de ensino.

Portanto, a transversalidade e a interdisciplinaridade são nesse sentido, modos

de trabalhar o conhecimento que visam reintegração de dimensões isoladas uns dos

outros pelo tratamento disciplinar. Com isso, pretendemos conseguir uma visão mais

ampla da realidade que, tantas vezes, aparece fragmentada pelos meios de que

dispomos para conhecê-la.

A interdisciplinaridade permite questionar a fragmentação dos diferentes

campos de conhecimento. Nessa perspectiva, procuramos tecer os possíveis pontos

de convergência entre as várias áreas e a relação epistemológica entre as disciplinas.

Com a interdisciplinaridade adquirimos mais conhecimentos dos fenômenos naturais e

sociais, que são normalmente complexos e irredutíveis ao conhecimento obtido

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32 quando são estudados por meio de uma única disciplina. As interconexões que

acontecem nas disciplinas facilitará a compreensão dos conteúdos de uma forma

integrada, aprimorando o conhecimento do educando.

Existem temas cujo estudo exige uma abordagem particularmente ampla e

diversificada, que foram denominados temas transversais que tratam de processos

que estão sendo intensamente vividos pela sociedade, pelas comunidades, pelas

famílias, pelos alunos e educadores em seu cotidiano. São discutidos em diferentes

espaços sociais, em busca de soluções e de alternativas, confrontando

posicionamentos diversos tanto em relação a intervenção no âmbito social mais amplo

quanto a atuação pessoal. São questões urgentes que interrogam sobre a vida

humana, sobre a realidade que está sendo construída e que demandam

transformações macro-sociais e também atitudes pessoais, exigindo, portanto, ensino

e aprendizagem de conteúdos relativos a essas duas dimensões. Estes temas

envolvem um aprender sobre a realidade e da realidade, destinando-se também a um

intervir para transformá-la. Na verdade, os temas transversais prestam-se de modo

muito especial para levar à prática a concepção de formação integral da pessoa.

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Capitulo 3

Neste item apresentarei um projeto desenvolvido em uma escola do

Município do Rio de Janeiro.

Gincana Ecológica

Projeto interdisciplinar recolhe das ruas cerca de 700 quilos de pets.

Criatividade, parceria, competitividade e muita animação marcaram a Gincana

Ecológica, projeto interdisciplinar realizado no Ciep 168 – Ilda Silveira Rodrigues, no

bairro Jardim Laranjeiras, em Nova Iguaçu, que tem tradição de trabalhos pedagógicos

envolvendo a cultura da preservação ambiental. Ao longo de uma semana, alunos dos

turnos da manhã e tarde do Ensino Fundamental (sexto ao nono ano) e do Médio

foram incentivados pelos professores a participar de tarefas ou provas que

estimulassem a reflexão para os problemas ambientais decorrentes das atitudes do

próprio homem.

As tarefas da gincana foram de caráter lúdico e competitivo desenvolvidas por

professores de diferentes áreas – Matemática, História, Geografia, Artes, Biologia,

Português, Educação Física, Língua Estrangeira. Como em toda boa gincana, houve

premiações – troféus e medalhas – para as equipes que conquistaram o maior número

de pontos obtidos na execução das diferentes tarefas.

As atividades, apresentadas às equipes com antecedência de 30 dias do

evento, foram compostas de: recolhimento de latinhas e de garrafas pet, coleta de

alimentos não perecíveis, criação de brinquedos construídos com coisas com coisas

recicláveis, desfile de casal com vestimenta de materiais reaproveitados, gritos de

guerra, soletrando, paródia, jogos matemáticos, jogo de pergunta e resposta, cabo de

guerra (misto), atividade desportiva e pré-desportiva (vôlei bolão e queimado), além de

atividades extras (touro mecânico, escalada de muro).

De acordo com Heverson Reis, professor de Educação Física e coordenador

do projeto, este trabalho busca fazer com que o aluno se perceba integrante,

dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as

interações entre eles, e assim possa contribuir ativamente para a melhora do lugar em

que vive. Por isso é estimulada a participação do estudante em atividades corporais e

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34 artísticas de natureza relacional, organizando e intervindo nas tarefas de forma

autônoma, adotando atitudes de respeito mútuo e de solidariedade.

Dividida em três fases (inicial, medial e final), a Gincana Ecológica foi iniciada

com a formação das equipes, sorteios das bandeiras (amarelas, azul, vermelha, verde,

lilás, preta e rosa) que cada grupo iria representar e a distribuição das sete primeiras

tarefas da disputa. Para organizar as equipes buscou-se mesclar turmas de séries

diferentes, com vistas à integração e equilíbrio de competências entre os participantes.

Cada grupo teve um professor mediador com a responsabilidade de apoiar, incentivar

e avaliar o comprometimento dos alunos.

Foram realizadas reuniões com representantes das equipes para

monitoramento do andamento das atividades e esclarecimento de dúvidas. “ As sete

primeiras tarefas eram as de maior peso da gincana, exigindo muito esforço, trabalho

coletivo e criatividade por parte das equipes. A paródia, o grito de guerra, o desfile de

vestimenta, a criação de brinquedos com materiais recicláveis, a coleta de pets e de

latinhas e alimentos não perecíveis faziam parte dessas tarefas”, ressaltou Heverson.

As equipes entregavam os materiais recicláveis para a no colégio, que depois

eram entregues ao ferro-velho de forma fracionada para a pesagem. Foram retirados

das ruas cerca de 700 quilos de pets e latinhas que, certamente, teriam um destino

incorreto, passando a causar danos ambientais. Neste mesmo período, as equipes

unidas arrecadaram cerca de dois mil quilos de alimentos não perecíveis doados por

moradores da região. Os próprios alunos montaram cestas básicas e as distribuíram

às famílias carentes da localidade.

Segunda fase

A segunda fase, a medial, traduziu-se por um grande espetáculo marcado pela

animação das torcidas: todas as equipes – amarelas, preta, rosa, azul, verde e

vermelha – apresentaram suas tarefas e participaram das atividades que somavam

pontos para a gincana. Motivação, determinação e empenho no trabalho coletivo eram

alguns dos critérios observados pelos jurados, formados pelos professores Lina

(Matemática), Cremilda (Artes), Marcio, Lucimere e Solange (Língua Portuguesa),

Érica (História) e Cristina (Inglês).

Dessa forma, analisaram atentamente os gritos de guerra temáticos produzidos

pelas equipes ou a preferência do pública pelo desfile do casal com vestimentas e

acessórios de materiais recicláveis; sacos de lixo preto foram transformados em

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35 blazers, de jornal surgiu um par de sandálias e bolsa, assim como sacos plásticos cor-

de-rosa foram ressignificados para virarem um lindo vestido. Um espetáculo è parte foi

a mascote de peso: um elefante! O boneco inflável, em tamanho natural, chamava

atenção e adornava o ambiente, além de representar os animais vitimados pelos

problemas ambientais acarretados pela prevenção do ser humano.

Uma gincana interdisciplinar

“A Matemática esteve bastante presente na gincana. Transformamos o

ambiente de puro agito ocasionado pelas características das provas em um ambiente

de extremo silêncio oscilando com grandes vibrações provocadas pelas equipes que

comemoravam o sucesso de seus representantes no jogo matemático de perguntas e

respostas”, disse Heverson. Mas também é bom lembrar que os conceitos dessa

disciplina foram amplamente usados quando se fazia a pesagem das sucatas, no

preparo das cestas básicas e sua distribuição. E as disciplinas de Português e

Ciências se fizeram presentes no jogo Soletrando, cujas palavras seguiam o tema

“ecologia”. Vencia a equipe que fizesse o maior número de acertos em dois minutos.

No jogo perguntas e respostas, as equipes receberam um texto de ecologia

para estudo na fase inicial do projeto. O representante da equipe, para ter o direito de

responder, teria que passar por obstáculos (circuito) e estourar a bola no final do

percurso. O grupo vencedor foi o que teve o maior número de acertos. As grandes

finais dos jogos mobilizaram outras equipes, visto que o terceiro lugar seria da que

perdeu para a equipe campeã. No final da disputa, 20 alunos foram eleitos por suas

participações especiais no evento e, em seguida, foi divulgado o resultado final da

gincana e houve a entrega dos troféus às equipes campeãs.

Dados:

Ciep 168 – Hilda Silveira Rodrigues

Avenida Santa Cruz, s/nº - Jardim laranjeiras – Nova Iguaçu/RJ

CEP:26341-490

Tel: (21) 3778-0032

Direção Sonia Regina do Nascimento da Silva

Coordenador do projeto: professor Heverson Reis

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Conclusão

Chegamos ao término deste trabalho, buscando transmitir ao leitor a ideia de que o currículo está intimamente ligado às condições concretas sociais e culturais em que está inserida a educação.

Propor a interdisciplinaridade como novo paradigma metodológico é ainda causar controvérsias entre educadores. Mas o que se pretende é questionar a segmentação dos diferentes campos de conhecimento, buscando-se o diálogo entre as disciplinas, de modo a se ter objetivos comuns e planejamento em conjunto.

Estabelecemos como grande desafio deste trabalho provocar debates entre os profissionais de educação sobre a necessidade de se repensar o currículo escolar, visando uma reflexão mais profunda sobre o conceito de currículo que leve à compreensão de que este deveria ser um documento de identidade escolar.

Apresentamos vários ideais que foram apresentados de forma didática como a organização curricular no Brasil em breve histórico. Falou-se um pouco sobre as ideologias que influenciaram a educação brasileira nos últimos anos, além de explicar nomenclaturas utilizadas ao longo do texto.

Ao propormos que a organização curricular fosse feita de forma interdisciplinar, oferecemos, também, ideias de como este caminho pudesse ser construído na prática, apresentando um projeto pedagógico que se encaixa nos moldes propostos.

O fim deste estudo alcançou o seguinte resultado concreto: é possível, respeitando-se o espaço de cada campo do saber, trabalhar o conhecimento através de interdependências e de conexões recíprocas, selecionando temas como eixo unificador, em torno do qual possam ser organizadas as disciplinas, que estudarão os seus próprios conteúdos, mantendo-se preservadas suas identidades e autonomias em torno de objetivos comuns.

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Referências Bibliográficas

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PALMADE, G. (1979). Interdisciplinaridade e Ideologias, Madri: Narcea.

PIAGET, Jean. (1976) Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro, Forense.

SACRISTÁN, J. G. (1998). O currículo: uma reflexão sob a prática. 3ed. Porto

Revista APPAI

Site: WWW.urutagua.uem.br//007/07bovo.htm