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Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
O ESTUDO DA COINFECÇÃO LEISHMANIOSE-HIV EM MULHERES
GRÁVIDAS: PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL E INFEÇÃO
CONGÉNITA
Stefanie Paixão Baptista
Relatório de estágio orientado pela Prof. Doutora Quirina dos Santos Costa
e coorientado pelo Dr. Carlos Cardoso
Mestrado em Análises Clínicas
2018
Parte I
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Prefácio
v
Prefácio
Tendo em mente que o incrível corpo humano sempre me fascinou, bem como
tudo o que está relacionado com a área da saúde, licenciei-me no curso de Ciências da
Saúde pela Universidade de Lisboa, que me deu bases nas várias áreas da saúde. Durante
os três anos adquiri conhecimentos teóricos e práticos, principalmente ao nível da
Bioquímica, Microbiologia, Imunologia e Biologia Molecular. Com isto, conclui que o
meu desejo era trabalhar na área laboratorial e como o curso não é profissionalizante,
decidi continuar o 2º ciclo de estudos na área das Análises Clínicas. Assim, ingressei no
Mestrado em Análises Clínicas da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa,
cujo plano curricular é apelativo e enriquecedor, de forma a complementar os meus
conhecimentos e alcançar o alvo de trabalhar nesta fascinante área. O presente relatório
diz respeito ao estágio curricular realizado no âmbito do mestrado.
Relativamente à organização, este relatório encontra-se dividido em cinco partes:
na Parte I apresentam-se o prefácio, o resumo em português e inglês, os índices e lista de
abreviaturas; na Parte II expõe-se o relatório de estágio, onde é apresentado um resumo
do local de estágio, descrevendo os conhecimentos adquiridos nos mesmos, para as
valências de Pré-Analítica, Hematologia, Bioquímica (incluindo o Radioimunoensaio e a
Química Analítica) e Microbiologia (incluindo a Biologia Molecular); a Parte III diz
respeito à monografia, desenvolvida no âmbito da valência de Microbiologia, com o título
“O estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV em mulheres grávidas: prevenção da
transmissão vertical e infeção congénita”. Na Parte IV, apresentam-se as conclusões e
perspetivas futuras. Por último, a Parte V apresenta os Anexos.
Este relatório está de acordo com o disposto no Artigo 37.º do Regulamento Geral
do Ciclo de Estudos conducente ao Grau de Mestre da FFULisboa, nº 134/2016, DR, 2.ª
série — N.º 26, de 8 de fevereiro de 2016.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Resumo
vi
Resumo
O estágio descrito neste relatório integra o plano de estudos do Mestrado em
Análises Clínicas pela Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa decorreu no
Laboratório Dr. Joaquim Chaves nas áreas de Pré-Analítica, Hematologia, Bioquímica e
Microbiologia.
Este relatório apresenta um resumo da experiência e conhecimentos adquiridos ao
longo dos cerca de seis meses, descrevendo os produtos biológicos, a execução dos
parâmetros analíticos, bem como as metodologias, sistemas e equipamentos utilizados.
Refere ainda os procedimentos adotados para a implementação do Controlo de Qualidade
Interno e Avaliação Externa da Qualidade.
O estágio realizado foi, sem dúvida, uma mais valia pois permitiu colocar em
prática os conhecimentos teóricos obtidos durante o mestrado, aprender metodologias
avançadas e ainda adquirir experiência profissional.
Neste documento é também apresentada, no âmbito da área de Microbiologia, uma
revisão bibliográfica sobre o seguinte tema: o estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV
em mulheres grávidas: prevenção da transmissão vertical e infeção congénita.
Palavras-chave: Pré-Analítica, Hematologia, Bioquímica, Microbiologia, Qualidade
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Abstract
vii
Abstract
The interneship described in this report integrates the study plan of the Masters in
Clinical Analysis by the Faculty of Pharmacy of the University of Lisbon. It was carried
out at the Dr. Joaquim Chaves Laboratory with respect to the areas of Pre-Analytical,
Hematology, Biochemistry and Microbiology.
This report summarizes the experience and knowledge over six months,
describing the biological products needed to implement the respective analytical
parameters, as well as the methodologies and equipment used for this purpose. It also
refers to the procedures adopted for the implementation of Internal Quality Control and
External Quality Assessment.
This internship was, undoubtedly, an added value because it allowed to put into
practice the theoretical knowledge obtained during the Master's degree, learning
advanced methodologies and still gain professional experience.
In this document is also presented a bibliographic review entitled: the study of
Leishmaniasis-HIV coinfection in pregnant women: prevention of vertical transmission
and congenital infection.
Keywords: Pre-Analytical, Hematology, Biochemistry, Microbiology, Quality
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Agradecimentos
viii
Agradecimentos
Agradeço primariamente a todos os docentes e convidados pelos conhecimentos
transmitidos, bem como pela acessibilidade demonstrada ao longo do Mestrado em
Análises Clínicas.
Quero agradecer também ao Dr. Carlos Cardoso pela oportunidade de estagiar
num laboratório tão conceituado, ao Dr. Rui Pimentel pela sua grande disposição em
ajudar, bem como a toda a equipa do Laboratório Dr. Joaquim Chaves, que me recebeu
muitíssimo bem e me fez sentir tão integrada.
Em especial, quero expressar o meu agradecimento à Prof. Doutora Quirina
Santos Costa pela orientação, disponibilidade e apoio.
Acima de tudo, quero agradecer à minha família e amigos, especialmente aos
meus pais, por todos os sacrifícios que têm feito para eu poder concluir os estudos.
Aos meus avós por me terem acolhido nos últimos anos. E ao meu querido Andrei,
por todo o amor, carinho, paciência e compreensão que tem demonstrado nestes últimos
meses. Sem o vosso apoio, isto não teria sido possível. Agradeço do fundo do meu
coração!
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
ix
Lista de Abreviaturas
Parte II
Relatório de Estágio
aa Aminoácidos
Ac Anticorpo
AEQ Avaliação Externa da Qualidade
Ag Antigénio
AgHBs Antigénio de superfície do vírus da Hepatite B
Anti-HBs Anticorpo do antigénio de superfície da hepatite B
ALP Fosfatase alcalina
ALT Alanina aminotransferase
AST Aspartato aminotransferase
AT Antidepressivos Tricíclicos
ATCC American Type Culture Collection
ATP Trifosfato de adenosina
AVC Acidente Vascular Cerebral
BASO Basófilos
Ca2+ Ião cálcio
CCR Recetor de quimiocinas do grupo CC, do inglês, CC Chemokine Receptor
CHOD Colesterol oxidase
CK Creatina Quinase
CK-MB Isoenzima MB da creatina Quinase
Cl- Ião cloro
CLED Gelose Cistina Lactose Deficiente em Eletrólitos
CLSI Clinical and Laboratory Standards Institute
CMI Concentração Mínima Inibitória
CNA Gelose Columbia ANC + 5% de sangue de carneiro
CO2 Dióxido de carbono
CQ Controlo da Qualidade
CQI Controlo da Qualidade Interno
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
x
DIG Diagnóstico Imunológico de Gravidez
DGS Direção-Geral da Saúde
DNA Ácido Desoxirribonucleico, do inglês, Deoxyribonucleic acid
EAM Enfarte agudo do miocárdio
ECLIA Eletroquimioluminescência
EDTA Ácido etilenodiaminotetracético
EIA Ensaio imunoenzimático, do inglês, Enzyme Immunoassay
ELISA Ensaio de imunoabsorção enzimática, do inglês, Enzime-linked
immunosorbent assay
EPO Eritropoietina
FA Fosfatase Alcalina
GGT γ-glutamil transferase
GI Gastrointestinal
GN Gram negativo
GOT Glutamato Oxalacetato Transaminase
Gp Glicoproteína
GP Gram positivo
GPT Glutamato Piruvato Transaminase
Hb Hemoglobina
HbA1c Hemoglobina Glicada
HBV Vírus da Hepatite B, do inglês, Hepatitis B Virus
hCG Gonadotropina coriónica humana
HCO3 Ião bicarbonato
HDL Lipoproteína(s) de alta densidade, do inglês, High Density Lipoprotein
HEKT Gelose Hektoen
HFLC Células linfocitárias de elevada fluorescência
HFR Reticulócitos de Alta Fluorescência, do inglês, High-Flourescence
Reticulocytes
HIV Vírus da Imunodeficiência Humana, do inglês, Human Immunodeficiency
Virus
HK Hexoquinase
HPLC Cromatografia Líquida de alta eficiência, do inglês, High performance
liquid chromatography
IgG Imunoglobulina G
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
xi
IgM Imunoglobulina M
IG Granulócitos imaturos
INSA Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge
ISSO Organização Internacional de Normalização, do inglês, International
Organization for Standardization
IRMA Ensaio Imunoradiométrico
K+ Ião potássio
KCl Cloreto de potássio
Lac Lactose
LCR Líquido Cefalorraquidiano
LDH Lactato desidrogenase
LFR Reticulócitos de Baixa Fluorescência, do inglês, Low-Flourescence
Reticulocytes
LJC Laboratório Joaquim Chaves
MCK Gelose MacConkey
MFR Reticulócitos de Média Fluorescência, do inglês, Median-Flourescence
Reticulocytes
MRSA Staphylococcus aureus Meticilina-resistentes, do inglês, Methicillin-
resistant Staphylococcus aureus
Na+ Ião sódio
NADP Nicotinamida Adenina Dinucleótido Fosfato
NADPH Nicotinamida Adenina Dinucleótido Fosfato reduzida
nm Nanómetros
NRBC Eritrócitos nucleados, do inglês, Nucleated Red Blood Cells
PBJ Proteínas de Bence-Jones
PCR Reação em Cadeia da Polimerase, do inglês, Polymerase Chain Reaction
pH Potencial de hidrogénio
PCT% Plaquetócrito
PLT Plaquetas
PNAEQ Programa Nacional de Avaliação Externa da Qualidade
PSOF Pesquisa de Sangue Oculto nas Fezes
PTGO Prova de Tolerância à Glicose Oral
RBC Eritrócito, do inglês, Red Blood Cell
RET Reticulócito
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
xii
RIA Radioimunoensaio, do inglês, Radioimmunoassay
RN Recém-nascido
Rpm Rotações por minuto
RT-PCR Reação em Cadeia da Polimerase com Transcriptase Reversa, do inglês,
Reverse Transcriptase Polymerase Chain Reaction
SCA Síndrome Coronária Aguda
SIDA Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
SHBG Globulina Ligante de Hormonas Sexuais
SRC Síndrome da Rubéola Congénita
T3 Tiroxina
T4 Triiodotironina
TA Temperatura ambiente
TBG Globulina Ligadora de Tiroxina
TMB Tetrametilbenzidina
TSA Teste(s) de Suscetibilidade aos Antibióticos
TSH Hormona Estimulante da Tiroide
TVP Trombose Venosa Profunda
UFC Unidades Formadoras de Colónias
UK-NEQAS Serviço Nacional de Avaliação Externa da Qualidade do Reino Unido, do
inglês, The United Kingdom National External Quality Assessment Service
UV Ultravioleta
VCAT Meio de gelose chocolate polyvitex
VLDL Lipoproteínas de muito baixa densidade, do inglês, Very Low Density
Lipoprotein
VS Velocidade de Sedimentação
WBC Leucócito, do inglês, White Blood Cell
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
xiii
Parte III
O estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV em mulheres grávidas:
prevenção da transmissão vertical e infeção congénita
AmB Anfotericina B, do inglês, Amphotericin B
ART Terapêutica Antirretroviral, do Inglês, Antiretroviral Therapy
Ca2+ Cálcio
CDC Centros para o Controlo e Prevenção de Doenças, do inglês, Centers for
Control and Prevention
CL-AmB Complexo lipídico de anfotericina B, do inglês, Amphotericin B lipid
complex
CMSPs Células Mononucleares do Sangue Periférico
DAT Teste de aglutinação direta, do inglês, Direct agglutination test
DGS Direção-Geral da Saúde
DNA Ácido Desoxirribonucleico, do inglês, Deoxyribonucleic acid
ELISA Ensaio de imunoabsorção enzimática, do inglês, Enzime-linked
immunosorbent assay
EP4 Recetor da Prostaglandina E2 do tipo 4
Gp Glicoproteína
HAART Terapêutica Anti-retroviral Altamente Ativa
HIV Vírus da Imunodeficiência Humana, do inglês, Human Immunodeficiency
Virus
IFAT Teste de imunofluorescência indireta, do inglês, Immunofluorescence
antibody test
IFN Interferão, do inglês, Interferon
IkB Molécula inibidora do fator nuclear-kB
IL Interleucina
L-AmB Anfotericina B lipossomal, do inglês, Liposomal Amphotericin B
LC Leishmaniose Cutânea
LCD Leishmaniose Cutânea Difusa
LCDS Leishmaniose Cutânea Disseminada
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
xiv
LCL Leishmaniose Cutânea Localizada
LCR Líquido Cefalorraquidiano
LMC Leishmaniose Mucocutânea
LPG Lipofosfatoglicano
LTR Terminal de Longa Repetição
LV Leishmaniose Visceral
NK Assassinas Naturais, do inglês, Natural Killer
Nm Nanómetro
NRTIs Nucleoside reverse transcriptase inhibitors
PCR Reação de Polimerase em Cadeia, do inglês, Polymerase Chain Reaction
PGE2 Prostaglandina E2
PIs Inibidores de Protease Viral, do inglês, Protease Inhibitors
PKA Proteína quinase A
PKC Proteina quinase C
POC Point of care
PTK Proteína Tirosina Quinase
p65/p50 Elementos ativos do fator nuclear kB
qPCR Reação de Polimerase em Cadeia quantitativo, do inglês, quantitative
Polymerase Chain Reaction
R Recetor do LPG e/ou o seu núcleo de fosfatidil inositol
rK39 Antigénio K39 recombinante
RNA Ácido Ribonucleico, do inglês, Ribonucleic acid
Sb Antimónio (símbolo químico)
SIDA Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
TAN Técnica dos Ácidos Nucleicos
Tat Proteína Transativadora da transcrição, do inglês, Trans-Activator of
Transcription
TGF-ß Fator de Crescimento Transformante Beta
Th1 Células T Auxiliares do tipo 1
Th2 Células T Auxiliares do tipo 2
Th17 Células T Auxiliares do tipo 17
TNF- Fator de Necrose Tumoral
TREG Linfócito T Regulador, do inglês, Regulatory T cell
UDI Utilizadores de Drogas Injetáveis
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Lista de Abreviaturas
xv
WB Western Blot
WHO Organização Mundial de Saúde, do inglês, World Health Organization
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice Geral
xvii
ÍNDICE GERAL
PARTE I ................................................................................................................... III
PREFÁCIO ................................................................................................................ V
RESUMO ................................................................................................................. VI
ABSTRACT ............................................................................................................ VII
AGRADECIMENTOS ...........................................................................................VIII
LISTA DE ABREVIATURAS ................................................................................. IX
ÍNDICE DE FIGURAS .......................................................................................... XXI
ÍNDICE DE TABELAS ....................................................................................... XXV
PARTE II ..................................................................................................................... 1
RELATÓRIO DE ESTÁGIO ..................................................................................... 3
INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 5
1. FASE PRÉ-ANALÍTICA - COLHEITAS E TRIAGEM ............................... 7
2. HEMATOLOGIA ......................................................................................... 13
2.1. HEMOGRAMA ............................................................................................... 13
2.2. VELOCIDADE DE SEDIMENTAÇÃO .................................................................. 20
2.3. HEMOGLOBINA GLICADA (HBA1C) ................................................................ 21
2.4. ELETROFORESE DAS HEMOGLOBINAS ............................................................ 22
2.5. AVALIAÇÃO DA HEMOSTASE E COAGULAÇÃO ............................................... 24
2.6. IMUNOHEMATOLOGIA ................................................................................... 28
3. BIOQUÍMICA ............................................................................................... 31
3.1. IONOGRAMA ................................................................................................. 31
3.2. QUÍMICA CLÍNICA E IMUNOENSAIOS.............................................................. 32
3.2.1. Metabolismo dos Hidratos de Carbono ............................................. 33
3.2.2. Metabolismo Lipídico ...................................................................... 34
3.2.3. Metabolismo Proteico ...................................................................... 36
3.2.4. Função Hepática e Tracto Biliar ....................................................... 36
3.2.5. Função Renal ................................................................................... 38
3.2.6. Função Pancreática .......................................................................... 40
3.2.7. Metabolismo Fosfocálcico ............................................................... 40
3.2.8. Função Cardíaca .............................................................................. 42
3.2.9. Marcadores Tumorais....................................................................... 45
3.2.10. Doenças Infeciosas ........................................................................... 47
3.2.11. Rastreio Serológico da Grávida ........................................................ 50
3.2.12. Sistema Endócrino ........................................................................... 52
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice Geral
xviii
3.3. URIANÁLISE ................................................................................................. 58
3.3.1. Diagnóstico Imunológico da Gravidez (DIG) ................................... 66
3.4. ELETROFORESE DAS PROTEÍNAS .................................................................... 68
3.5. LIPIDOGRAMA .............................................................................................. 73
4. RADIOIMUNOENSAIO (RIA) .................................................................... 74
5. QUIMIOLUMINESCÊNCIA ....................................................................... 77
6. QUÍMICA ANALÍTICA ............................................................................... 79
6.1. CROMATOGRAFIA LÍQUIDA DE ALTA DEFINIÇÃO (HPLC) .............................. 79
6.2. ESPECTROFOTOMETRIA DE ABSORÇÃO NO INFRAVERMELHO .......................... 81
6.3. ESPECTROFOTOMETRIA DE ABSORÇÃO ATÓMICA .......................................... 82
6.4. ESPECTROMETRIA DE EMISSÃO ÓTICA POR PLASMA ACOPLADO
INDUTIVAMENTE (ICP)............................................................................................. 83
6.5. ESPECTROFOTOMETRIA DE ABSORÇÃO NO ULTRAVIOLETA E NO VISÍVEL ....... 84
6.6. CROMATOGRAFIA GASOSA/ESPECTROMETRIA DE MASSA (GC/MS) ............... 85
7. MICROBIOLOGIA ...................................................................................... 87
7.1. HEMOCULTURA ............................................................................................ 87
7.2. URINA ASSÉTICA .......................................................................................... 88
7.3. EXSUDADO VAGINAL ................................................................................... 92
7.4. EXSUDADO FARÍNGEO .................................................................................. 95
7.5. EXSUDADO NASAL ....................................................................................... 95
7.6. EXPETORAÇÃO ............................................................................................. 96
7.7. EXSUDADO AURICULAR ................................................................................ 97
7.8. ESPERMOCULTURA ....................................................................................... 98
7.9. COPROCULTURA ........................................................................................... 99
7.10. EXAME MICOLÓGICO .................................................................................. 100
7.11. EXAME URETRAL ....................................................................................... 101
7.12. PESQUISA DE OVOS, QUISTOS E PARASITAS ................................................. 104
7.13. PESQUISA DE SANGUE OCULTO NAS FEZES (PSOF) ..................................... 105
8. BIOLOGIA MOLECULAR........................................................................ 106
8.1. EXTRAÇÃO DE ÁCIDOS NUCLEICOS ............................................................. 106
8.2. AMPLIFICAÇÃO E DETEÇÃO - PCR .............................................................. 107
8.3. MICROARRAYS DE BAIXA INTENSIDADE – CLART-STRIP........................... 108
8.4. SONDAS EM LINHA - DNA STRIP ............................................................... 109
8.5. ELISA ....................................................................................................... 110
8.6. IMMUNOCAP ISAC SIGE 112 ................................................................... 110
8.7. TESTES RÁPIDOS - IMUNOCROMATOGRAFIA ................................................. 111
9. HIGIENE E SEGURANÇA ........................................................................ 112
10. CONTROLO DA QUALIDADE ................................................................ 114
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 119
PARTE III ............................................................................................................... 127
O ESTUDO DA COINFECÇÃO LEISHMANIOSE-HIV EM MULHERES
GRÁVIDAS: PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL E INFEÇÃO
CONGÉNITA .......................................................................................................... 129
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice Geral
xix
RESUMO ................................................................................................................ 131
ABSTRACT ............................................................................................................ 132
OBJETIVOS ........................................................................................................... 133
MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................... 134
INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 135
1. EPIDEMIOLOGIA ..................................................................................... 139
1.1. EUROPA ..................................................................................................... 141
1.2. ÁSIA .......................................................................................................... 143
1.2.1. Índia .............................................................................................. 144
1.3. AMÉRICA ................................................................................................... 145
1.3.1. Brasil ............................................................................................. 146
1.4. ÁFRICA ...................................................................................................... 146
1.4.1. Burkina Faso .................................................................................. 147
1.4.2. Etiópia ........................................................................................... 147
1.4.3. Somália .......................................................................................... 148
1.4.4. Uganda .......................................................................................... 148
1.4.5. Quénia ........................................................................................... 148
1.4.6. Sudão ............................................................................................. 148
2. ASPETOS CLÍNICOS ................................................................................ 150
2.1. COINFECÇÃO ASSINTOMÁTICA .................................................................... 151
2.2. COINFECÇÃO LEISHMANIOSE VISCERAL/HIV .............................................. 151
2.2.1. Coinfecção Leishmaniose Dérmica Pós Kala-Azar (LDPK)/HIV ... 152
2.2.2. Coinfecção Leishmaniose Visceral/HIV em Mulheres Grávidas ..... 153
2.3. COINFECÇÃO LEISHMANIOSE CUTÂNEA/HIV .............................................. 153
2.3.1. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Localizada/HIV ....................... 154
2.3.2. Coinfecção Leishmaniose Recidiva Cutis/HIV ............................... 154
2.3.3. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Disseminada/HIV .................... 154
2.3.4. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Difusa/HIV .............................. 155
2.3.5. Coinfecção Leishmaniose Mucocutânea/HIV em Mulheres Grávidas
155
2.4. COINFECÇÃO DOENÇA DE RECONSTITUIÇÃO IMUNOLÓGICA (DRI)/HIV ....... 155
3. IMUNOPATOGÉNESE .............................................................................. 157
4. DIAGNÓSTICO .......................................................................................... 161
4.1. PARASITOLÓGICO ....................................................................................... 161
4.1.1. Microscopia ................................................................................... 161
4.1.2. Cultura ........................................................................................... 161
4.2. SEROLÓGICO .............................................................................................. 162
4.3. ANTIGÉNICO............................................................................................... 163
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice Geral
xx
4.4. MOLECULAR .............................................................................................. 163
4.5. ESTRATÉGIA DE DIAGNÓSTICO NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DE ÁREAS ENDÉMICAS
164
5. TERAPÊUTICA .......................................................................................... 168
5.1. LEISHMANIOSE ........................................................................................... 169
5.1.1. Antimoniais Pentavalentes (AP) – Sb5+.......................................... 169
5.1.2. Desoxicolato de Anfotericina B (ANB) .......................................... 170
5.1.3. Anfotericina B Lipídica (ANB-L) .................................................. 170
5.1.4. Miltefosina ..................................................................................... 171
5.1.5. Sulfato de Paramomicina ou Aminosidina ...................................... 172
5.1.6. Isotionato de Pentamidina .............................................................. 172
5.1.7. Outros Fármacos ............................................................................ 173
5.1.8. Combinações ................................................................................. 173
5.2. OUTRAS ABORDAGENS TERAPÊUTICAS ....................................................... 173
5.3. PREVENÇÃO ............................................................................................... 173
CONCLUSÃO ......................................................................................................... 175
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 177
PARTE IV ................................................................................................................ 181
CONCLUSÕES E PERSPETIVAS FUTURAS ..................................................... 183
PARTE V ................................................................................................................. 185
ANEXOS ................................................................................................................. 187
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Figuras
xxi
Índice de Figuras
Parte II
Relatório de Estágio
Figura 1. Sistema de vácuo da BD Vacutainer® utilizado para a colheita de sangue ..... 8
Figura 2. Tubo coletor para pesquisa de sangue oculto nas fezes para o aparelho OC-
Sensor Diana® (Eiken) ......................................................................................... 11
Figura 3. Cobas conection modules (CCM) e sua conexão com analisadores e
sistemas pré-analíticos e pós-analíticos da cobas ............................................... 12
Figura 4. Sysmex XN-1000™ Hematology Analyzer ................................................. 14
Figura 5. Gráfico WDF scattergram obtido pelo Sysmex XN-1000™ ........................ 14
Figura 6. Canal de análise diferencial de leucócitos .................................................... 15
Figura 7. Canal WNR obtido pelo Sysmex XN-1000™ .............................................. 15
Figura 8. Método de impedância utilizado no canal RBC/PLT Sysmex XN-1000™ ... 16
Figura 9. Exemplo de gráficos obtidos para RBC e PLT com equipamento Sysmex XN-
1000™ ................................................................................................................ 16
Figura 10. Método de acumulação da altura dos impulsos dos eritrócitos num volume
fixo para obtenção do valor do hematócrito (HCT%) ........................................... 17
Figura 11. Representação esquemática da determinação da hemoglobina pelo método
de deteção SLS .................................................................................................... 17
Figura 12. Canal Ret/PLT-O obtido através do Sysmex XN-1000™ .......................... 19
Figura 13. Aparelho VES-MaticTM Cube-200 ................ Erro! Marcador não definido.
Figura 14. Método de Westergren modificado para determinar a VS ... Erro! Marcador
não definido.
Figura 15. Sistemas automáticos para determinação da HbA1c.................................... 22
Figura 16. Resultado de uma eletroforese de hemoglobinas obtidos por HPLC com o
VARIANT™ II TURBO Hemoglobin Testing System ........................................ 23
Figura 17. Aparelho BCS® XP System ....................................................................... 25
Figura 18. Aparelho ORTHO AutoVue® Innova System ............................................ 28
Figura 19. Esquematização do Teste de Coombs ........................................................ 30
Figura 20. Cobas 8000 modular analyzer series. ....................................................... 31
Figura 21. Evolução dos marcadores cardíacos após ocorrência de lesão tecidular ..... 44
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Figuras
xxii
Figura 22.Evolução dos marcadores serológicos durante a Hepatite B aguda .............. 48
Figura 23. Resposta serológica à infeção por Toxoplasma gondii ............................... 51
Figura 24. Aparelho Cobas 6500 urine analyzer series ............................................. 59
Figura 25. Tiras Siemens Multistix 10 SG ................................................................ 63
Figura 26. Eritrócitos no sedimento urinário............................................................... 64
Figura 27. Leucócitos segmentados na urina .............................................................. 64
Figura 28. Células escamosas. .................................................................................... 65
Figura 29. Cilindros urinários..................................................................................... 65
Figura 30. Cristais urinários. ...................................................................................... 66
Figura 31. Resultados possíveis obtidos com o kit hCG Pregnancy Test ..................... 67
Figura 32. Eletroforese das proteínas séricas. ............................................................. 68
Figura 33. Perfil eletroforético de situações clínicas em que há redução da fração
albumina ............................................................................................................. 69
Figura 34. Perfil eletroforético das proteínas de fase aguda e na Síndrome Nefrótica.. 70
Figura 35. Estrutura esquemática de Ig ....................................................................... 70
Figura 36. Perfil eletroforético de pico policlonal, pico monoclonal de
hipoglobulinemia/agamaglobulinemia ................................................................. 71
Figura 37. Aparelho HYDRASYS 2® da Sebia........................................................... 72
Figura 38. Eletroforese em gel obtida com o kit Hydragel Bence Jones ...................... 72
Figura 39. Eletroforese em gel obtida com o kit Hydragel 7 LIPO +Lp (a) ................. 73
Figura 40. Contador de Raios Gama Wallac Wizard................................................... 74
Figura 41. Aparelho IMMULITE® 2000 da Siemens .................................................. 77
Figura 42. Sistema HPLC Shimadzu .......................................................................... 80
Figura 43. Determinação do interferograma ............................................................... 82
Figura 44. Espectrofotómetro de Absorção Atómica Shimadzu AA 6800. .................. 83
Figura 45. Equipamento Varian Vista MPX – ICP/OES ............................................. 84
Figura 46. Espectrofotómetro Genesys 5 UV-VIS ...................................................... 84
Figura 47. Determinação de substâncias por GC/MS .................................................. 85
Figura 48. Equipamento BacT/ALERT ...................................................................... 88
Figura 49. Equipamento Sysmex UF-1000iTM ............................................................ 89
Figura 50. Meios de cultura utilizados para identificação e TSA da bactéria
Staphylococcus aureus em amostra de urina ........................................................ 91
Figura 51. Meios de cultura utilizados para identificação e TSA da bactéria Echerichia
coli em amostra de urina ...................................................................................... 91
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Figuras
xxiii
Figura 52. Amostras de urina em Meio CLED............................................................ 92
Figura 53. Exame direto com coloração Gram do exsudado vaginal ........................... 94
Figura 54. Trichomonas vaginallis em exame citológico vaginal ................................ 94
Figura 55. Diplococcos GN no exame direto corado pelo Gram, com morfologia
sugestiva de Neisseria gonorrhoeae .................................................................. 102
Figura 56. Aparelho MagNA Pure LC 2.0 Instrument .............................................. 106
Figura 57. Componentes necessários para a realização da RT-PCR e respetivo produto
.......................................................................................................................... 107
Figura 58. Equipamento cobas 4800 System da Roche ........................................... 108
Figura 59. Equipamento LigthtCycler 2.0 da Roche ............................................... 108
Figura 60. Esquema do método de visualização das sondas CLART-Strip .............. 109
Figura 61. Padrão específico de bandas nas DNA-STRIP para vários genótipos do
Mycobacterium ................................................................................................. 110
Figura 62. Representação esquemática do erro total ................................................. 117
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Figuras
xxiv
Parte III
O estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV em mulheres grávidas:
prevenção da transmissão vertical e infeção congénita
Figura 1. Formas promastigotas de Leishmania sp em cultura. ................................. 135
Figura 2. Phlebotomus papatasi, flebótomo responsável pela transmissão do parasita
Leishmania ........................................................................................................ 135
Figura 3. Estrutura do HIV ....................................................................................... 136
Figura 4. Endemicidade da LV no mundo em 2015 .................................................. 139
Figura 5. Endemicidade da LC no mundo em 2015 .................................................. 140
Figura 6. Prevalência do HIV nos adultos de idades compreendidas entre os 15 e os 49
anos, em 2016 ................................................................................................... 141
Figura 7. Ciclo de Vida da Leishmania sp no ser humano......................................... 150
Figura 8. Lesões de Leishmaniose Cutânea .............................................................. 154
Figura 9. Representação esquemática dos mecanismos de sinalização envolvidos na
expressão da Leishmania sp-Lipofosfoglicano-mediada pelo HIV-1 através dos
monócitos/macrófagos e linfócitos T ................................................................. 159
Figura 10. Resposta Imunológica de células T maternas e os seus efeitos durante a
gravidez coexistente com infeção por Leishmania sp ......................................... 160
Figura 11. Microscopia ótica de formas amastigotas de Leishmania spp. num aspirado
de medula óssea ................................................................................................ 162
Figura 12. Algoritmo para o diagnóstico de LV em indivíduos infetados com HIV .. 165
Figura 13. Algoritmo para o diagnóstico de HIV ...................................................... 167
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Tabelas
xxv
Índice de Tabelas
Parte II
Relatório de Estágio
Tabela 1. Índices eritrocitários e respetivas fórmulas .................................................. 18
Tabela 2. Resultados das tiras-teste para a Esterase Leucocitária ................................ 60
Tabela 3. Resultados das tiras-teste para as Proteínas ................................................. 61
Tabela 4. Resultados das tiras-teste para os Eritrócitos ............................................... 62
Tabela 5. Descrição de análises executadas por radioimunoensaio competitivo .......... 75
Tabela 6. Descrição de análises executadas por ensaio IRMA .................................... 76
Tabela 7. Descrição de análises executadas por HPLC ............................................... 80
Tabela 8. Produtos Biológicos e respetivos meios de cultura .................................... 103
IX Mestrado Análises Clínicas Parte I
Stefanie Baptista Índice de Tabelas
xxvi
Parte III
O estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV em mulheres grávidas:
prevenção da transmissão vertical e infeção congénita
Tabela 1. Técnicas predefinidas para o diagnóstico de Leishmaniose Visceral em áreas
altamente endémicas, por nível de sistema de saúde, segundo a estratégia da WHO
.......................................................................................................................... 164
Parte II
Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
RELATÓRIO DE ESTÁGIO
Stefanie Paixão Baptista
Relatório de Estágio orientado pelo Dr. Carlos Cardoso
Mestrado em Análises Clínicas
2018
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Introdução
5
INTRODUÇÃO
O estágio descrito neste relatório integra o plano de estudos do Mestrado em
Análises Clínicas pela Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa e foi realizado
no Laboratório de Análises Clínicas Dr. Joaquim Chaves (LJC) em Miraflores, Lisboa
para as seguintes valências: Pré-Analítica, Hematologia, Bioquímica e Microbiologia,
orientado pelo Dr. Carlos Cardoso.
A Joaquim Chaves Saúde (JCS) é um grupo português que, desde 1959, opera
exclusivamente no sector da saúde, participando com competência e elevada qualidade
no progresso da medicina, num percurso de rigor e qualidade na prestação de cuidados
de saúde às populações. Após a criação do Laboratório de Análises Clínicas Dr. Joaquim
Chaves, a primeira empresa a ser constituída, a JCS cresceu de forma sustentada no sector
da saúde com a sucessiva abertura de modernas unidades em Portugal Continental,
Madeira e Açores, com particular destaque para as áreas de Laboratório - Análises
Clínicas, Clínicas Médicas, Tratamento Oncológico e Saúde Mental. A motivação e o
compromisso da empresa é proporcionar o acesso às melhores soluções existentes no
sector da saúde, aliando uma elevada competência e especialização humana à
disponibilização das tecnologias mais avançadas (1).
O LJC adotou um Sistema de Gestão da Qualidade, em que são aplicados e
cumpridos os requisitos da Norma 9001:2015 da Organização Internacional de
Normalização (ISO, do inglês, International Organization for Standardization), Normas
para o Laboratório Clínico da Ordem dos Farmacêuticos e do Manual de Boas Práticas
Laboratoriais.
Neste relatório resumo a experiência e conhecimento adquiridos nas várias áreas
do laboratório, ao longo dos cerca de sete meses, mais concretamente 1080 horas,
distribuídas da seguinte forma: 104 horas na Fase Pré-Analítica, 280 horas na
Hematologia, 368 horas na Bioquímica e 256 horas na Microbiologia. As imagens aqui
apresentadas foram obtidas a partir da bibliografia indicada, bem como dos folhetos
informativos e datasheets das técnicas e equipamentos disponibilizadas pelo próprio
Laboratório Dr. Joaquim Chaves, referentes especificamente ao período de estágio
indicado.
Os objetivos da realização do estágio passaram por promover a integração no meio
profissional, aplicando os conhecimentos adquiridos ao longo das unidades curriculares
do mestrado e desenvolver capacidades como a organização, trabalho em equipa e
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Introdução
6
capacidade crítica. Este relatório descreve a metodologia utilizada em cada área, os
parâmetros analisados e ainda o seu significado clínico. Por fim, é brevemente descrito o
sistema de higiene e segurança no LJC, bem como o Controlo de Qualidade.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
7
1. FASE PRÉ-ANALÍTICA - COLHEITAS E TRIAGEM
De modo a corresponder às necessidades da população, o Laboratório Dr. Joaquim
Chaves conta com uma rede de mais de 150 Postos de Colheitas a nível nacional. Nestes,
realiza-se a colheita das amostras biológicas, formação e informação relacionada com o
material de colheita de acordo com a natureza do produto e a determinação analítica a
efetuar. Todos os procedimentos das colheitas são seguidos conforme descrito abaixo, a
fim de garantir a fiabilidade dos resultados (2).
Colheita de Produtos Biológicos:
Antes de realizar a colheita é importante certificar-se que o utente está em
condições de a fazer (preparação prévia) e se aplicável preencher os questionários e
modelos. O material utilizado deve ser todo identificado com código de barras na
presença do utente e as informações clínicas relevantes devem ser referidas na Ficha
Individual de Utente (3).
Sangue
A colheita de sangue deve ser efetuada durante o período da manhã e o utente
deve estar em jejum (mínimo de 8h), à exceção dos casos de urgência ou quando há
indicação em contrário. No entanto, nas colheitas para o estudo do Metabolismo Lipídico
o jejum deve ser de 10-12h. Nos recém-nascidos e nos lactentes, a colheita deve ser feita
nos 30 minutos antes da refeição.
Usar luvas descartáveis, selecionar o sistema de vácuo ou sistema de seringa-
agulha, desinfetar a região a puncionar com algodão embebido em solução de Etanol a
70% (substituir o Etanol por Betadine® na determinação da alcoolemia) e aplicar o
garrote. A ordem de colheita dos tubos deve ser a seguinte (conforme recomendado pela
casa comercial BD Vacutainer® e de forma a evitar contaminações):
1º Frascos para hemocultura
2º Tubos para coagulação (citrato de sódio)
3º Tubos para soro, com gel separador
4º Tubos isentos de metais
5º Tubos com heparina
6º Tubos com EDTA, com ou sem gel separador (EDTA-gel e hemograma)
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
8
Seguidamente pressionar com o algodão a zona puncionada durante alguns
minutos e homogeneizar cuidadosamente por inversões sucessivas (5-10 vezes) todas as
amostras colhidas para tubos com aditivos e depois colocá-las na posição vertical. As
agulhas devem ser colocadas em contentos próprios para cortantes (3).
Urina
- Urina tipo II/ 2 – Exame Sumário de Urina
A colheita da urina tipo II deve ser a primeira da manhã ou com uma retenção
vesical de pelo menos 4h, para um tubo próprio. Limpa-se os genitais externos, da frente
para trás na mulher e a glande nos homens, ou a região perineal nas crianças. A colheita
deve ser efetuada, preferencialmente 7 dias depois da administração de produtos de
contraste radiológico (TAC ou ressonância magnética) (3).
- Urina assética
A colheita da urina assética deve corresponder à primeira urina da manhã ou após
duas a três horas de retenção vesical. Antes de efetuar a colheita lavar as mãos, depois
limpar os genitais externos, de seguida desprezar as primeiras gotas de urina e finalmente
recolher o jato médio para o coletor. Deve ser enviado o coletor, estável 24h refrigerado,
juntamente com o tubo com conservante, estável 24h à TA (3).
- Urina de 24h
A colheita da urina de 24h realiza-se, tal como o nome indica, durante 24h. Por
exemplo, iniciando-se a colheita às 8h, esta deve ser rejeitada e a partir daí, recolhe-se
toda a urina até às 8h do dia seguinte, inclusive. Antes de cada micção, limpar os genitais
externos, da frente para trás na mulher e a glande nos homens, ou a região perineal nas
crianças (3).
Figura 1. Sistema de vácuo da BD Vacutainer® utilizado para a colheita de sangue. a) tubo para soro b) tubo para hemograma c) tubo para coagulação d) agulha butterfly e) agulha e adaptador de tubo de vácuo [Adaptado de (4)].
a) b) c) d)
e)
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
9
Esperma
- Espermocultura
A colheita para espermocultura deve ser uma colheita de esperma recente após
higiene prévia das mãos e órgãos genitais, com uma abstinência sexual nos 3 dias
anteriores à colheita. A estabilidade é de 12h à TA (3).
- Espermograma
A colheita para o espermograma trata-se de uma colheita de esperma realizada no
laboratório, que necessita de um período de abstinência sexual de 3 dias antes do exame
(3).
Expetoração
A colheita da expetoração deve ser realizada de manhã, para um coletor estéril,
após higiene nasal e oral apenas com água, e deve ser resultante de tosse provocada (3).
Exsudado
- Exsudado amigdalino
A colheita do exsudado amigdalino realiza-se pressionando a língua para baixo
com a espátula e passando a zaragatoa sobre toda a superfície de aspeto patológico
(vermelho ou com pus), evitando tocar nos lábios, língua e úvula. A zaragatoa deve ser
introduzida no meio de Stuart. O doente não deve comer ou beber 2 a 3 horas antes da
colheita (3).
- Exsudado Ano rectal
A colheita do exsudado Ano rectal realiza-se com um zaragatoa ao nível do reto
devendo ser colocada no meio de Stuart e torna-se importante na grávida para pesquisa
de Streptococcus do grupo B. É estável 24h refrigerado (3).
- Exsudado auricular
A colheita do exsudado auricular realiza-se no canal auditivo externo, com 2
zaragatoas. Uma deve ser introduzida no meio de Stuart e outra é utilizada para o
esfregaço de duas lâminas. É estável 12h à TA (3).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
10
- Exsudado faríngeo
A colheita do exsudado faríngeo realiza-se pressionando a língua para baixo com a
espátula e passando a zaragatoa sobre toda a superfície de aspeto patológico (vermelho
ou com pus), evitando tocar nos lábios, língua e úvula. A zaragatoa deve ser introduzida
no meio de Stuart. O doente não deve comer ou beber 2 a 3 horas antes da colheita (3).
- Exsudado nasal
A colheita do exsudado nasal realiza-se introduzindo uma zaragatoa na mucosa
nasal e rodando-a até encontrar resistência. Repete-se o processo na outra narina e
introduz-se as zaragatoas no meio de Stuart. O Utente não deve assoar-se e a colheita é
estável 24h refrigerada (3).
- Exsudado ocular
A colheita do exsudado ocular deve ser realizada com zaragatoa na parte interna
da pálpebra inferior, introduzindo-a em meio de Stuart. Caso seja necessário, pode-se
humedecer a zaragatoa com soro fisiológico. Devem ser feitos também dois esfregaços
com outra zaragatoa. A amostra é estável 12h à TA (3).
- Exsudado uretral
A colheita do exsudado uretral deve ser realizada de manhã, antes de urinar, ou
no mínimo 3h após a última micção. Colher o exsudado com uma zaragatoa e colocá-la
no meio de Stuart e com outra zaragatoa realizar dois esfregaços. No caso do homem,
pressionar a uretra de modo a estimular a saída de corrimento e efetuar os esfregaços. De
seguida, utilizar a outra zaragatoa, colher mais corrimento e colocá-la em meio de Stuart.
Quando não há corrimento introduzir uma zaragatoa fina e flexível cerca de 2 cm no
meato uretral. A colheita é estável 12h a TA (3).
- Exsudado vaginal
A colheita do exsudado vaginal realiza-se após a limpeza dos genitais externos,
introduz-se o espéculo estéril até expor corretamente o colo do útero e efetua-se a colheita
com zaragatoa, introduzindo-a no meio de Stuart. Seguidamente utiliza-se outra zaragatoa
para fazer dois esfregaços. A colheita é estável 12h à TA. Se pedido pesquisa de
Chlamydia juntar também uma zaragatoa ao kit Chlamydia (3).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
11
- Exsudado vulvar
A colheita do exsudado vulvar realiza-se passando uma zaragatoa sobre a região
inflamada e realizar dois esfregaços e colocando uma segunda zaragatoa no meio de
Stuart (3).
Fezes
A colheita de fezes deve ser feita para um tubo estéril, uma amostra do tamanho
de uma noz. Estabilidade variável conforme a análise (3).
- Pesquisa de Sangue Oculto nas fezes
A colheita para a pesquisa de sangue oculto nas fezes não deve ser realizada
durante o período menstrual nem em situações de hemorroidas com hemorragia e deve-
se evitar que as fezes sejam contaminadas com urina. A amostra deve ser colhida com a
vareta, no caso do coletor para sangue oculto (Figura 2) e é estável 7 dias refrigerada, ou
deve ser colhida uma amostra do tamanho de noz, no caso do coletor estéril e é estável 3
dias refrigerada (3).
- Pesquisa de ovos, quistos e parasitas nas fezes
A colheita para pesquisa de ovos, quistos e parasitas nas fezes deve ser realizada
para o coletor próprio ou para um coletor lavado e seco. A amostra é estável 3 dias
refrigerada (3).
- Coprocultura
A colheita para a coprocultura deve ser realizada para um coletor com meio de
transporte ou para um coletor estéril. Colocar fezes até à linha com a seta vermelha no
caso do coletor com o meio de transporte, que é estável 4 dias à TA. Colocar uma amostra
do tamanho de uma noz no caso do coletor estéril e entregar no próprio dia (3).
Figura 2. Tubo coletor para pesquisa de sangue oculto nas fezes para o
aparelho OC-Sensor Diana® (Eiken) [Adaptado de (5)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Fase Pré-Analítica
12
Triagem dos Produtos Biológicos:
As amostras colhidas nos postos próprios da Joaquim Chaves Saúde, bem como
as dos postos de terceiros, de outros laboratórios e de hospitais chegam ao Laboratório à
área da triagem, que é responsável pela execução e controlo da fase pré-analítica do
Laboratório, nomeadamente pela receção, verificação, processamento e manipulação
primária das amostras biológicas. Aqui são também registadas as falhas de colheitas e
comunicadas aos postos, laboratórios ou hospitais (6).
A partir da triagem, as amostras são encaminhadas até às respetivas áreas. Nesta
fase, o cobas conection modules (CCM) desempenha um papel importante, já que este
aparelho automático permite a conexão com analisadores e sistemas pré-analíticos e pós-
analíticos da cobas, conforme a Figura 3.
Figura 3. Cobas conection modules (CCM) e sua conexão com analisadores e sistemas pré-analíticos e
pós-analíticos da cobas [Adaptado de (7)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
13
2. HEMATOLOGIA
A Hematologia é a especialidade que estuda o sangue e os seus componentes nas
vertentes clínica e de laboratório, nomeadamente as células sanguíneas – eritrócitos,
leucócitos e plaquetas – e os órgãos que os produzem (órgãos hemapoiéticos) – medula
óssea, baço e gânglios linfáticos (8).
Ao nível da investigação hematológica, os exames complementares de
diagnóstico requisitados incluem o Hemograma, a Velocidade de Sedimentação, a
Hemoglobina Glicada, a Eletroforese de Hemoglobinas, a avaliação da Hemostase e
Coagulação e parâmetros Imunohematolgógicos. Todos estes serão descritos de seguida.
2.1. Hemograma
O hemograma tem como objetivo analisar os elementos figurados do sangue,
nomeadamente o eritrograma, o leucograma e também as plaquetas, bem como
determinar os índices de cada série.
O Sysmex XN-1000™ Hematology Analyzer (Figura 4) é um equipamento
hematológico que realiza a determinação destes mesmos parâmetros, utilizando a
citometria de fluxo com fluorescência, que fornece informação sobre o tamanho e
estrutura celulares, assim como sobre o conteúdo das células. Neste método, as células
são examinadas enquanto fluem através de uma célula de fluxo muito estreita. Primeiro,
a amostra de sangue é aspirada e diluída de acordo com um fator pré-determinado e é
marcada com um marcador fluorescente que se liga especificamente aos ácidos nucleicos.
Em seguida, a amostra é transportada para a célula de fluxo e iluminada por um laser
semicondutor (=639nm), que consegue separar as células utilizando três sinais diretos:
- Luz fluorescente lateral, que indica a quantidade de DNA/RNA presente
na célula.
- Luz dispersa lateralmente, que fornece informação sobre o conteúdo
celular, nomeadamente núcleos e grânulos.
- Luz dispersa frontalmente, que indica o tamanho celular (9).
Células com propriedades físico-químicas similares constituem um grupo num
gráfico denominado diagrama de dispersão (p.e. Figura 5).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
14
Canal de Análise diferencial de leucócitos - WBC
O Canal de Análise diferencial de leucócitos é obtido através de uma reação
citoquímica das células com um reagente que perfura as membranas celulares, deixando-
as intactas. De seguida, o DNA e o RNA intracelular são marcados com o corante de
fluorescência e analisados por citometria de fluxo com fluorescência. A intensidade do
sinal de fluorescência é diretamente proporcional ao conteúdo dos ácidos nucleicos
presentes. O canal diferencial fornece as contagens de todas as subpopulações celulares
normais de leucócitos, sinalizando também a informação referente a anomalias,
nomeadamente Granulócitos imaturos (IG) e Células linfocitárias de elevada
fluorescência - Linfócitos Atípicos (HFLC), conforme se verifica na Figura 6.
No canal WDF scattergram, as células são diferenciadas de acordo com a sua
estrutura interna e fluorescência (9).
Neste sentido, existem seis diferentes parâmetros que descrevem uma população
de células (no que diz respeito à nuvem no
diagrama):
- Tamanho da nuvem (tamanho total da
população)
- Comprimento da nuvem (distância
longitudinal)
- Largura da nuvem (distância transversal)
- Posição (centro da nuvem)
- Momentum (forma da nuvem)
- Ângulo (direção dos eixos longitudinais)
Figura 4. Sysmex XN-1000™ Hematology Analyzer [Adaptado de (10)].
Figura 5. Gráfico WDF scattergram obtido pelo Sysmex XN-1000™ [Adaptado de (9)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
15
No canal WNR (Figura 7), a membrana celular dos eritroblastos (NRBC) é
completamente lisada e apenas os seus núcleos são corados. O pH baixo do reagente
estabiliza os basófilos, reduzindo ligeiramente o tamanho de todas as outras células.
(a) (b)
(c)
Figura 6. Canal de análise diferencial de leucócitos. (a) LEFT SHIFT- neutrófilos em banda e com baixa contagem de Granulócitos Imaturos. Os Neutrófios em banda não interferem com a contagem de granulócitos
imaturos. (b) Exemplo de amostra com elevada contagem de Granulócitos Imaturos (IG=7,2%). (c) Exemplo de amostra com elevada contagem de Linfócitos Atípicos (HFLC=6,0%) [Adaptado de (9)].
Figura 7. Canal WNR obtido pelo Sysmex XN-1000™ [Adaptado de (9)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
16
Método de deteção de fluxo envolvente de corrente contínua – RBC e PLT
O analisador Sysmex XN-1000™ utiliza ainda o método de deteção de fluxo
envolvente de corrente contínua para contar os eritrócitos (RBC) e plaquetas (PLT). Uma
parte do sangue é separada do sangue inteiro aspirado e misturada com o diluente. Desta
diluição, uma quantidade definida é enviada para a câmara de deteção, passando através
de um pequeno orifício, a abertura. Cada lado da abertura apresenta elétrodos, através dos
quais passa a corrente contínua (Figura 8). A resistência a essa corrente contínua varia
conforme as células suspensas no diluente passam através da abertura. Esta resistência
provoca uma alteração do pulso elétrico proporcional ao tamanho da célula sanguínea.
Estes dados elétricos são convertidos em representações gráficas, conforme a Figura 9
(9).
O equipamento fornece também o valor do hematócrito (HCT%) através do
método de acumulação da altura dos impulsos dos eritrócitos num volume fixo, conforme
ilustrado na figura 10. O plaquetócrito (PCT%) é equivalente à soma dos impulsos das
plaquetas que são detetadas individualmente pelo princípio da impedância e corresponde
ao hematócrito dos eritrócitos (9).
Figura 8. Método de impedância utilizado no canal RBC/PLT Sysmex XN-
1000™ [Adaptado de (9)].
Figura 9. Exemplo de gráficos obtidos para RBC e PLT com equipamento Sysmex XN-1000™ [Adaptado de (9)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
17
Método de Deteção SLS – Determinação da Hemoglobina
O método de deteção SLS de hemoglobina utiliza laurilsulfato de sódio (SLS) sem
cianeto. O reagente hemolisa os eritrócitos e leucócitos da amostra e a reação inicia-se
com a alteração da conformação da globina, devido à ligação dos grupos hidrofóbicos da
molécula de SLS na molécula de globina e oxidando depois o grupo heme (Fe2+→ Fe3+).
Os grupos hidrofílicos da molécula do SLS ligam-se então ao grupo heme, formando um
complexo corado estável (SLS-HGB), conforme a Figura 11, e que é analisado
fotometricamente a 555nm. Um LED emite uma luz monocromática e, ao passar pela
mistura, a luz é absorvida pelos complexos SLS-HGB. A restante luz é medida por um
fotossensor e é inversamente proporcional à concentração de hemoglobina da amostra
(9).
Ao realizar então a contagem total dos eritrócitos, para determinar o valor da
hemoglobina e do hematócrito, o equipamento calcula os restantes índices, tal como
exemplificado nas seguintes fórmulas da tabela 1:
(a) (b) (c)
Figura 10. Método de acumulação da altura dos impulsos dos eritrócitos num volume fixo para obtenção do valor do hematócrito (HCT%) [Adaptado de (9)].
Figura 11. Representação esquemática da determinação da hemoglobina pelo método de deteção SLS. (a) Alteração
da conformação da globina (b) Oxidação do grupo heme (c) Ligação dos grupos hidrofílicos da molécula do SLS ao grupo heme, com formação de um complexo corado estável (SLS-HGB) [Adaptado de (9)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Hematologia
18
Tabela 1. Índices eritrocitários e respetivas fórmulas [Adaptado de (11)]
Canal RET/PLT-O
No canal RET, o reagente de lise perfura ligeiramente as membranas celulares dos
eritrócitos, leucócitos e plaquetas, permitindo a penetração do marcador fluorescente nas
células, mas deixando-as intactas. Em seguida, os ácidos nucleicos intracelulares são
marcados pela fluorescência do corante e o sinal emitido é diretamente proporcional à
quantidade de ácidos nucleicos dos reticulócitos. Ao utilizar a dispersão frontal de luz e
o sinal de fluorescência, os reticulócitos podem então ser distinguidos das outras células.
Os reticulócitos emitem um sinal de fluorescência maior que os eritrócitos (que não têm
RNA) e consideravelmente inferior ao sinal dos leucócitos.
Os reticulócitos dividem-se em três categorias, de acordo com a sua intensidade
de fluorescência, representando diferentes graus de maturação:
- LFR, reticulócitos de baixa fluorescência.
- MFR, reticulócitos de média fluorescência.
- HFR, reticulócitos de alta fluorescência.
A IRF (Fração de Reticulócitos Imaturos) reflete a proporção de reticulócitos
imaturos e é calculada pela soma de MFR + HFR. A hemoglobina reticulocitária (RET-
He) refere-se à medição celular direta da disponibilidade de ferro e é usada na
monitorização da eritropoietina (EPO) e/ou na terapia de ferro. Se o valor aumenta, é um
indicador de que a terapia está a ser eficaz (9).
O canal RET fornece também a contagem ótica de plaquetas (Figura 12).
Pârametro Fórmula Valor de
Referência
Volume Globular Médio 𝑉𝐺𝑀(𝑓𝐿) = 𝐻𝑇𝐶(𝐿/𝐿) 𝑥𝐻𝑇𝐶 (𝐿/𝐿)
𝐺𝑉 (𝑥1012/𝐿) 80,0-97,0 fL
Hemoglobina Globular Média 𝐻𝐺𝑀(𝑝𝑔) =𝐻𝐺𝐵 (𝑔/𝑑𝐿)
𝐺𝑉(𝑥1012)/𝐿)𝑥10 26,0-34,0 pg
Concentração de Hemoglobina
Globular Média 𝐶𝐻𝐺𝑀 =
𝐻𝐺𝐵(𝑔/𝑑𝐿)
𝐻𝑇𝐶(𝐿/𝐿) 32,0-36,0 g/dl
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
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19
O Sysmex XN-1000™ Hematology Analyzer fornece complementarmente alguns
alarmes de modo a chamar a atenção para possíveis anormalidades. Nestes casos, são
feitas lâminas de esfregaços sanguíneos automaticamente, para serem vistas ao
microscópio ótico.
Os valores de referência são os seguintes:
Eritrograma (Homem/Mulher)
Eritrócitos 4,30-6,40/ 3,90-5,20 x 1012/L
Hemoglobina: 13,6-16,5/ 12,0-16,0 g/dl
Hematócrito: 39,8-52,0/ 34,7-46,0%
VGM: 80,0-97,0 fL
HGM: 26,0-34,0 pg
CHGM: 32,0-36,0 g/dL
Índice de dispersão eritrocitária: 11,5-15,0%
Leucograma
Leucócitos: 4,0-10,0 x109/L
Neutrófilos: 1,5-8,0 x109/L
Eosinófilos: <0,5 x109/L
Basófilos: <0,3 x109/L
Linfócitos: 0,8-4,0 x109/L
Monócitos: <1,2 x109/L
Trombocitograma
Plaquetas: 140-440 x109/L
Figura 12. Canal Ret/PLT-O obtido através do Sysmex XN-1000™ [Adaptado de (9)].
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Plaquetócrito: 0,15-0,42%
VPM: 6,5-12,4 fL
Índice de dispersão plaquetária: 9,9-15,3 fL
Reticulócitos: 0,5-2,5%
Hemoglobina Reticulocitária: >27,0 pg
Fração de Reticulócitos Imaturos (IRF): 3,0-14,0%
Índice de Reticulócitos: 0,5-2,5%
2.2. Velocidade de Sedimentação
A velocidade de sedimentação (VS) representa a velocidade da queda dos
eritrócitos existentes no sangue tornado incoagulável (citratado) e colocado num tubo
estreito, graduado, vertical.
O fenómeno de sedimentação caracteriza-se por três etapas: a agregação, que
corresponde à formação de pilhas de eritrócitos; a sedimentação ou queda rápida, que
corresponde à queda das pilhas de eritrócitos a uma velocidade constante; e
a sedimentação final, que corresponde ao seu empilhamento no fundo do tubo.
A VS é expressa pela distância percorrida pelos eritrócitos durante uma hora, em
milímetros. A sua determinação é clinicamente útil em doenças associadas ao aumento
de produção de proteínas de fase aguda (12).
O VES-MaticTM Cube-200 (Figura 13) é um analisador automático para
determinar a VS. A amostra a utilizar é sangue total colhido em tubo de EDTA, com
volume mínimo de 1,5 mL. O equipamento realiza uma homogeneização automática,
mantendo a amostra em repouso por tempo predefinido e permitindo que a sedimentação
ocorra. Através de sensores analógicos, é determinado o nível de sedimentação dos
eritrócitos e calculado automaticamente o valor. As leituras são efetuadas por feixe de luz
visível e os resultados são obtidos em 26 minutos e comparáveis com os obtidos pelo
método de Westergren em 1 hora (13).
Por vezes, recorre-se ao Método de Westergren modificado, conforme a figura 14,
para fazer a confirmação de resultados muito elevados obtidos com o VES-MaticTM Cube-
200 ou quando a quantidade de amostra não é suficiente. Nestes casos, dilui-se 1 ml da
amostra de sangue total colhido em tubo de EDTA em citrato de sódio na proporção de 4
volumes de sangue para 1 volume de anticoagulante. Depois introduz-se a pipeta de
Westergren, graduada de 0 a 150 mm, no suporte adequado e em posição vertical, inicia-
se a contagem no cronómetro e deixa-se 1 hora à temperatura ambiente. Ao fim de 1 hora
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21
faz-se a leitura em milímetros, ao nível da coluna dos glóbulos que se separam do plasma
(14).
Os valores de referência para a VS são os seguintes:
– 20 mm/h no Homem
– 30 mm/h na Mulher
– 10 mm/h na criança
Valores superiores a 120 mm/h são reportados como 120 mm/h.
2.3. Hemoglobina Glicada (HbA1c)
A hemoglobina é a principal proteína no interior dos eritrócitos e quando os níveis
de glicose no sangue estão altos, parte desta proteína é sujeita a uma reação química não
enzimática com a glicose em excesso.
A ligação entre a HbA e a glicose é um tipo de glicação não-enzimática, contínua,
lenta e irreversível. A quantidade de hemoglobina glicada que é formada depende assim
da concentração de glicose no sangue e do tempo de vida médio dos eritrócitos (cerca de
120 dias). Desta forma, a medida da quantidade de glicose ligada à hemoglobina pode
fornecer uma avaliação da glicémia média no período de 90 a 120 dias antes da análise
(16).
Os sistemas automáticos D-100™ System e o VARIANT™ II TURBO
Hemoglobin Testing System (Figura 15) utilizam a tecnologia de Cromatografia Líquida
de alta eficiência (HPLC) com troca iónica, em que a coluna é composta por uma resina
de troca catiónica de fase reversa. O aparelho é capaz de utilizar uma amostra de sangue
Figura 13. Aparelho VES-MaticTM Cube-200 [Adaptado de (13)]. Figura 14. Método de Westergren modificado
para determinar a VS [Adaptado de (15)].
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22
total em tubo com anticoagulante EDTA e de a diluir, hemolisar e remover a base de
schiff (HbA1c lábil), permitindo a obtenção de resultados precisos para HbA1c (17, 18).
O doseamento da hemoglobina glicada é importante para o diagnóstico da
diabetes, bem como na monitorização do controle glicémico. Esta análise apresenta
vantagens em relação à determinação da glicemia em jejum uma vez que não é necessária
a condição de jejum, o seu valor não é influenciado pela ingestão alimentar ou prática de
exercício recente, não sofre alterações em casos de stress ou doença e tem ainda uma
maior estabilidade.
Os valores de referência para a hemoglobina glicada são os seguintes:
- 5,7-6,4%: risco de diabetes mellitus
- >6,4%: diabetes mellitus
2.4. Eletroforese das Hemoglobinas
A eletroforese de hemoglobinas tem como objetivo separar e quantificar os
diferentes tipos de hemoglobinas presentes no sangue periférico, com o interesse de
diagnosticar patologias que envolvem formas anormais de hemoglobina
(hemoglobinopatias) (19).
Os tipos de hemoglobina mais comuns são a hemoglobina A (maior percentagem
de hemoglobina encontrada nos adultos), a hemoglobina F (principal hemoglobina
presente no feto e no recém-nascido e após o nascimento decresce e é substituída pela
HbA) e a hemoglobina A2 (encontrada em pequenas quantidades nos adultos).
Figura 15. Sistemas automáticos para determinação da HbA1c a) D-100™ System e b) VARIANT™ II TURBO Hemoglobin Testing System [Adaptado de (17,18)]).
a) b)
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As hemoglobinopatias podem ser classificadas como hemoglobinopatias
qualitativas - resultantes de alterações na estrutura das globulinas, onde se inclui as
variantes de hemoglobina HbS, HbC, HbE e HbD - ou quantitativas - em que há ausência
ou diminuição da síntese das cadeias globínicas originando talassémias (20).
Sempre que é pedida a Eletroforese das Hemoglobinas, o LJC recorre ao sistema
automático VARIANT™ II TURBO Hemoglobin Testing System (Figura 15) que utiliza
a tecnologia de HPLC com troca iónica, em que a coluna é composta por uma resina de
troca catiónica de fase reversa. A amostra utilizada é sangue total em tubo com
anticoagulante EDTA. A análise da área sob a curva dos picos de absorção obtidos
fornece a percentagem relativa a cada fração detetada (Figura 16). O tempo de eluição,
ou de retenção, de qualquer hemoglobina presente é comparado com o de hemoglobinas
conhecidas, permitindo a quantificação tanto das hemoglobinas normais A, F e A2, como
de outras variantes. Deve-se ter em consideração que existem variantes com tempos de
retenção semelhantes, por isso a identificação é presuntiva. Para identificar
definitivamente a Hb é necessário recorrer à análise do DNA ou dos aa da cadeia de
globina.
A drepanocitose e as talassemias são as hemoglobinopatias mais comuns
mundialmente.
A drepanocitose resulta de uma mutação no gene que codifica a cadeia β-globina,
sendo detetada na eletroforese pela presença da HbS. Esta hemoglobina pode estar
presente em quantidades moderadas, indicando que se trata de um portador
heterozigótico, ou em grandes quantidades (juntamente com presença de HbF e ausência
Figura 16. Resultados das percentagens de hemoglobinas obtidos por HPLC com o VARIANT™ II TURBO Hemoglobin Testing System [Adaptado de (21)].
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de HbA), indicando que se trata de um portador homozigótico, causando uma anemia
hemolítica grave (20).
As talassemias podem ser classificadas de acordo com o tipo de cadeia globina
afetada. Caso a deficiência se verifique na síntese das cadeias alfa, trata-se de uma α-
talassemia, se for na cadeia β trata-se de uma β-talassémia. Estas hemoglobinopatias
podem ainda ser classificadas como talassémia minor (um gene com defeito) ou
talassémia major (dois genes com defeito). A presença de β-talassémia minor na
electroforese é detectada pela diminuição do pico de hemoglobina A e aumento da
hemoglobina A2 e HbF, e a β-talassémia major pela ausência da hemoglobina A,
acompanhada de níveis elevados de hemoglobina fetal F (20).
Níveis elevados de Hb F também se verificam numa condição rara denominada
persistência hereditária de hemoglobina fetal, um distúrbio hereditário assintomático.
Podem ainda ser detetadas outras hemoglobinopatias como a hemoglobinopatia C
e a hemoglobinopatia E, no entanto, são menos frequentes.
Os valores de referência para as hemoglobinas são os seguintes:
Hemoglobina A – 96-98%
Hemoglobina A2 – 1,5-3,5%
Hemoglobina F – 0-1%
2.5. Avaliação da Hemostase e Coagulação
A Hemostase é um processo fisiológico complexo que protege o sistema vascular
aquando de uma lesão, de forma a preservar a integridade da circulação e limitar a perda
de sangue. Este processo envolve vasos sanguíneos e células endoteliais, plaquetas e
proteínas plasmáticas e pode ser divido em três fases: Hemostase primária (avaliada pela
contagem de plaquetas, Agregação Plaquetária e Tempo de Hemorragia), Hemostase
secundária (avaliada pelo Tempo de Protrombina, Tempo de Tromboplastina Parcial
Ativada, Fibrinogénio, Tempo de Trombina, Proteína C, Proteína S, ATIII e Fatores de
Coagulação) e Fibrinólise (avaliada pelos D-dímeros e Plasminogénio) (22).
A avaliação da hemostase torna-se então muito importante por auxiliar na
compreensão do estado do indivíduo quanto a este conjunto de mecanismos fisiológicos
por meio dos quais ocorre a paragem de uma hemorragia, incluindo a vasoconstrição, a
agregação plaquetária e a coagulação.
O BCS® XP System (Figura 17) é um aparelho automático que realiza testes
funcionais para a avaliação da hemostase e da coagulação, com processamento de análises
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coagulométricas, cromogénicas e de química imunológica, através do método de
fotometria/turbidimetria e recorrendo a uma amostra de plasma obtido em tubo de citrato.
Este método utiliza uma fonte de luz intermitente de xénon com um filtro, que permite
obter um feixe com comprimento de onda desejado. A luz é direcionada em partes iguais
através de um canal de medição e um canal de referência. Ao passar pela cuvete, o feixe
de luz diminui de intensidade devido à difusão por partículas ou à absorção na solução.
Durante o processo de coagulação, a preparação torna-se cada vez mais turva e, por sua
vez, a intensidade é menor. Nas análises cromogéneas, durante a reação é libertado um
pigmento, reduzindo a quantidade de luz que passa pela cuvete. A luz desviada é
bloqueada por um sistema de diafragma e a luz que passa no outro canal é direcionada
até ao segundo detetor. O equipamento tem a capacidade de medir dois pontos por
segundo, por cuvete, sendo a intensidade da luz convertida em sinal elétrico.
Tempo de Protrombina (TP) e INR
O TP permite avaliar a via extrínseca da cascata de coagulação através dos fatores
V, VII, X, protrombina (II) e fibrinogénio (I). A determinação deste parâmetro baseia-se
na adição da tromboplastina tecidular ao plasma do doente, na presença de iões cálcio,
iniciando-se assim a ativação da via extrínseca. Com isto, verifica-se a conversão do
fibrinogénio em fibrina, sendo que o tempo até à formação deste mesmo coágulo de
fibrina é medido em segundos. O resultado é apresentado em tempo (segundos), taxa de
protrombina (%) e INR (Razão normalizada Internacional) e é muito requisitado para
monitorização de anticoagulantes orais, excluindo os novos anticoagulantes que não
requerem monitorização (NOACS). Este último torna-se importante já que podem ser
Figura 17. Aparelho BCS® XP System [Adaptado de (23)].
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26
utilizados diferentes reagentes durante o método e desta forma o resultado obtido é
padronizado. O INR é assim calculado do seguinte modo:
𝐼𝑁𝑅 = [𝑇𝑃 (𝐷𝑜𝑒𝑛𝑡𝑒)
𝑇𝑃(𝑚é𝑑𝑖𝑎 𝑑𝑜𝑠 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑟𝑜𝑙𝑜𝑠)]𝐼𝑆𝐼
(ISI – Índice de Sensibilidade Internacional, que varia de lote para lote entre 1,0 e 1,4)
Nestes casos, os valores de referência são os seguintes:
- INR 2,0-3,0 – profilaxia de TVP recorrente, embolia pulmonar e doenças
arteriais (incluindo enfarte agudo do miocárdio).
- INR 3,0-4,5 – prevenção da embolia sistémica recorrente e para válvulas
cardíacas artificiais. (22)
Tempo de Tromboplastina Parcial Ativada (aPTT)
O aPTT é o tempo necessário para a formação de um coágulo de fibrina num
plasma com citrato. A determinação deste valor consiste na incubação a 37ºC da amostra
de plasma com uma quantidade otimizada de fosfolípidos, sílica e iões de cálcio,
iniciando a ativação da via intrínseca da coagulação e desencadeando a formação do
coágulo. A sua determinação permite detetar anomalias dos fatores envolvidos na via
intrínseca: os fatores II, V, VIII, IX, X, XI e XII. Esta análise é ainda útil para a
monitorização da terapêutica com heparina. (22)
Os valores de referência são os seguintes:
- 26-40 s
- RN: 26-60 s
Fibrinogénio
O Fibrinogénio (Fator I) é uma proteína sanguínea produzida pelo fígado que tem
um papel importante na formação do coágulo. Níveis baixos de fibrinogénio podem
significar deficiências adquiridas, como a proteólise intravascular do fibrinogénio pela
trombina, ou congénitas, como em casos de afibrinogenemia ou hipofibrinogenemia.
Níveis temporariamente elevados são encontrados devido ao comportamento do
fibrinogénio como proteína de fase aguda. (22)
Os valores de referência são os seguintes:
- 150-400 mg/dl
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Tempo de Trombina (TT)
O TT é o tempo necessário para que o fibrinogénio da amostra seja convertido em
coágulo de fibrina, através da adição de trombina bovina purificada. Este valor é
inversamente proporcional à quantidade de fibrinogénio da amostra. (22)
O valor de referência é o seguinte:
- 30 s
Proteína C
A Proteína C (PC) é um inibidor da coagulação dependente da vitamina K e que
regula a atividade dos fatores V e VIII. Para determinar a quantidade de PC
funcionalmente ativa, utiliza-se um substrato cromogénico e cujo produto da reação é lido
a 405 nm. A deficiência congénita de PC origina manifestações trombóticas graves,
quando em homozigotia. (22)
Os valores de referência são os seguintes:
- 64-128%
- RN: 17-53%
Proteína S
A Proteína S (PS) é uma proteína plasmática dependente da vitamina K que atua
como cofator da Proteína C ativada na inativação dos fatores Va e VIIIa. Circula no
plasma sob a forma livre ativa e sob a forma inativa ligada à proteína de ligação C4b. A
deficiência congénita de PS origina manifestações trombóticas graves, quando em
homozigotia, e risco elevado de desenvolvimento de trombose venosa em jovens, quando
em heterozigotia. (22)
Os valores de referência são os seguintes:
- 60-124%
- RN: 12-61%
D-dímeros
Os D-dímeros são produtos de degradação de fibrina ligados transversalmente
gerados por fibrinólise reativa. Neste teste, partículas de polistireno covalente com Ac
monoclonal reagem com os D-dímeros da amostra, aglutinando. Essa mesma aglutinação
é detetada turbidimetricamente pelo aumento da turvação. Este teste é importante para a
exclusão de eventos tromboembólicos como trombose venosa profunda ou embolismo
pulmonar. Níveis aumentados estão associados ao risco de eventos tromboembólicos
recorrentes após interrupção da terapêutica anticoagulante oral (22).
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Os valores de referência são os seguintes:
- <0,55 g/ml
Plasminogénio
O Plasminogénio é uma proenzima da plasmina e é convertido nesta pelos
ativadores internos (uroquinase) ou pelos ativadores externos (estreptoquinase). Utiliza-
se um subtrato cromogénico para determinar o plasminogénio biologicamente ativo e o
produto da reação é lido a 405 nm. Este teste é requisitado para avaliar desordens
fibrinolíticas e para controlo da terapia. Níveis diminuídos estão associados a doenças
hepáticas e fibrinólise terapêutica. Níveis elevados relacionam-se com carcinomas e
diabetes mellitus (22).
Os valores de referência são os seguintes:
- 77-122 %
2.6. Imunohematologia
A imunohematologia é a área que estuda os antigénios presentes nos eritrócitos,
os anticorpos correspondentes e o seu significado clínico e relaciona-se ainda com a
medicina transfusional.
O ORTHO AutoVue® Innova System (Figura l8) é um equipamento automático
para a realização de testes imunohematológicos numa amostra de sangue total. Utiliza o
método de aglutinação em coluna (reação de aglutinação Ag-Ac). As colunas contêm
reagentes e esferas de vidro e, através da centrifugação de cassetes, os eritrócitos
aglutinados formam uma camada no topo da mistura (formação de precipitado), enquanto
que os não aglutinados depositam-se na parte inferior da coluna.
Figura 18. Aparelho ORTHO AutoVue® Innova System [Adaptado de (24)].
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Este aparelho utiliza a tecnologia de cassetes e a edição de imagem digital, tendo
a capacidade de automatizar a pipetagem líquida, a incubação, a centrifugação e a
interpretação de resultados. A medição dos resultados é feita através de uma câmara que
lê as cassetes cerca de 25 vezes (24).
À superfície dos eritrócitos existem antigénios determinados geneticamente. As
diversas categorias de antigénios eritrocitários representam cerca de 23 sistemas de
grupos sanguíneos, cujos principais são o sistema AB0 e o sistema Rhésus (Rh), e que o
equipamento procura estudar.
No sistema AB0, os eritrócitos podem ser testados quanto à presença/ausência de
Ags (Prova Direta) ou quanto à presença/ausência de Acs (Prova Reversa). Isto porque
os Ags. A e B têm uma estrutura muito semelhante aos Ags das bactérias e plantas, aos
quais estamos constantemente expostos e por isso, como resultado, praticamente todos os
indivíduos com idade >6 meses que não tenha os Ags. A e B produzem o Ac. Estes Acs
são geralmente IgM e denominam-se Aloanticorpos Naturais ou Regulares.
No sistema Rh apenas existe produção de Acs após exposição com eritrócitos
Rh+. Estes Acs. são geralmente IgG e denominam-se Aloanticorpos Imunes ou
Irregulares. Neste sistema, existem 5 Ags de maior importância e é a presença/ausência
do antigénio D que determina se o indivíduo é Rh+ ou Rh-.
Teste de Coombs direto (Teste Direto da Antiglobulina)
Nesta prova, deteta-se a presença ou ausência de Ag de superfície nos eritrócitos
de amostras de sangue total, pela sua ligação a Ac Anti-A e Ac Anti-B em soros teste
(Figura 19a). Este teste é usado no diagnóstico de doenças auto-imunes e doença
hemolítica do recém-nascido (25).
Teste de Coombs indireto/Pesquisa de anticorpos anti-eritrocitários
irregulares (PAI)
Na prova indireta, testa-se o soro/plasma do doente com eritrócitos A1 e B,
detetando-se a presença ou ausência dos respetivos anticorpos (Figura 19b). Tem como
objetivo detetar anticorpos anti-eritrocitários clinicamente relevantes, ou seja, anticorpos
anti-eritrocitários encontrados no soro ou plasma que não sejam os de ocorrência natural
(anti-A e anti-B). A imunização a antígenos (estranhos) pode ser resultado de gravidez
e/ou transfusão de sangue prévia.
Utilizam-se três suspensões eritrocitárias de dadores selecionados do grupo 0.
Estes apresentam fenótipos conhecidos e que se caracterizam pela presença de antigénios
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que originam a formação de anticorpos com significado clínico. O resultado obtido é
semiquantitativo, com escala de 1 a 4, sendo que resultados de valor numérico 1 são
duvidosos e devem ser confirmados. Para se apresentar um resultado semiquantitativo
devem ser executadas diversas diluições, de modo a indicar a diluição mais baixa para a
qual o resultado se mantém positivo. Quando o resultado é positivo deve-se proceder à
identificação do Ac específico. O grupo AB0 do paciente é definido quando se observa
concordância no resultado de ambas as provas. Este teste é assim útil em exames pré-
natais de grávidas Rh- e antes de transfusões sanguíneas (25).
a) TESTE DE COOMBS DIRETO
b) TESTE DE COOMBS INDIRETO
Figura 19. Esquematização do Teste de Coombs a) direto e b) indireto [Adaptado de (26)].
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3. BIOQUÍMICA
A Bioquímica é uma área que estuda e aplica a química da vida e os processos
químicos que ocorrem nos organismos vivos, nomeadamente as estruturas moleculares e
as funções metabólicas de biomoléculas e componentes celulares, como proteínas,
enzimas, lípidos, ácidos nucleicos, hidratos de carbono, entre outros.
O cobas 8000 modular analyzer series (Figura 20) é o equipamento automático
utilizado no laboratório para determinar inúmeros parâmetros bioquímicos com valor
semiológico, recorrendo a métodos tais como a potenciometria, a colorimetria e a
imunoturbidimetria. Este equipamento consiste num conjunto de quatro módulos
analíticos ligados entre si: o módulo cobas ISE (módulo do ionograma), o módulo cobas
c 702 (módulo de química clínica) e dois módulos cobas e 602 (módulos de
imunoensaios). Abaixo serão apresentados os vários parâmetros, bem como os princípios
realizados em cada um destes módulos.
Já o cobas 6500 urine analyzer series (Figura 26) é o equipamento utilizado para
realizar a análise sumária da urina e é composto por dois módulos ligados: o módulo
cobas u 601 (módulo das tiras-teste) e o cobas u 701 (módulo do sedimento urinário).
3.1. Ionograma
O ionograma é um quadro numérico que indica a quantidade de iões básicos
(catiões) e de iões ácidos (aniões) no plasma (ionograma sanguíneo) ou na urina
(ionograma urinário). Os catiões determinados nesta análise são o sódio (Na+) e o potássio
(K+); o anião determinado é o cloro (Cl-). Esta análise é prescrita principalmente em casos
de perda de consciência, no contexto de doença cardíaca, renal ou hepática, em doentes
sob terapêutica com fluidos endovenosos ou com fármacos que alterem a concentração
destes iões, em doentes com poliúria, oligúria, polidipsia, vómitos ou diarreia, em doentes
com diálise, entre outras. Em relação às condições da colheita, são necessários alguns
Figura 20. Cobas 8000 modular analyzer series [Adaptado de (27)].
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Stefanie Baptista Bioquímica
32
cuidados especiais. Nas colheitas de sangue, é importante usar o garrote o menor tempo
possível ou preferencialmente não usar garrote e deve ser colhido em tubo seco. (28)
Esta determinação é feita no módulo ISE (Ion-Selective Electrode) do cobas
8000, através do método de potenciometria indireta, ou tal como o próprio nome do
módulo indica, através de um Elétrodo Seletivo de Ião. Um ISE é um sensor que converte
a atividade de um ião específico dissolvido numa solução em potencial elétrico. Utiliza
um elétrodo específico para o ião a analisar e um elétrodo de referência, sendo ambos
imersos na amostra a ser analisada. A diferença de potencial é teoricamente dependente
do logaritmo da atividade iónica, de acordo com a equação de Nerst e é dessa forma que
se calcula a concentração iónica.
Os valores de referência no sangue são os seguintes:
Na+: 136-145 mmol/l
K+: 3,5-5,5 mmol/l
Cl-: 98-109 mmol/l
3.2. Química Clínica e Imunoensaios
O módulo c 702 do cobas 8000 utiliza o método de colorimetria para determinar
variados parâmetros de química clínica. Esta técnica é utilizada para determinar a
concentração de compostos coloridos em solução, utilizando um colorímetro, ou seja, um
dispositivo que determina a concentração de um analito através da medição da
absorvância a um determinado comprimento de onda de luz visível.
O módulo e 602 do cobas 8000 utiliza o método de eletroquimioluminescência
(ECLIA) para determinar variados parâmetros bioquímicos. Esta técnica utiliza a emissão
de luz através da aplicação de potenciais de oxidação ou redução a um elétrodo imerso
em soluções que emitem radiação. O equipamento apresenta micropartículas revestidas
de estreptavidina, um anticorpo monoclonal específico biotinilado e um anticorpo
monoclonal especifico para cada analito. Esta mistura é fixada magneticamente na
superfície do elétrodo e a parte que não é fixada é removida. Seguidamente, aplica-se
corrente elétrica no elétrodo, induzindo emissão quimioluminescente que é medida por
um fotomultiplicador.
De seguida são descritos alguns dos principais parâmetros determinados por estes
módulos.
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3.2.1. Metabolismo dos Hidratos de Carbono
Glucose
A glucose é o principal hidrato de carbono presente no sangue periférico. A
concentração da glucose no sangue é mantida dentro de limites estreitos por ação de várias
hormonas, sendo algumas produzidas pelo pâncreas. No entanto, uma diminuição no
valor da glicemia traduz-se em hipoglicémia (menos frequente) e o aumento traduz-se em
hiperglicemia. A causa mais frequente de hiperglicemia é a diabetes mellitus, causada por
um défice da secreção ou da ação da insulina, outras causas são a pancreatite, a disfunção
da tiroide, a insuficiência renal e hepatopatias (29).
A determinação da glucose no sangue serve de diagnóstico da diabetes mellitus.
Segundo a DGS, a observação de pelo menos um dos seguintes critérios serve de
diagnóstico (deve ser confirmado com uma segunda análise) (30):
• Glicémia em jejum ≥ 126 mg/dl
• Sintomas clássicos e glicémia ocasional ≥ 200 mg/dl
• Glicémia ≥ 200mg/dl às 2h, numa PTGO (Prova de Tolerância à Glucose
Oral) com 75g de glucose
• HbA1c ≥ 6,5% (ver 2.3. Hemoglobina Glicada)
O diagnóstico da hiperglicemia intermédia ou identificação de categorias de risco
aumentado para diabetes, faz-se com base nos seguintes parâmetros:
• Anomalia da Glicemia de Jejum (AGJ): glicemia de jejum ≥ 110 e < 126
mg/dl
• Tolerância Diminuída à Glicose (TDG): glicemia às 2 horas na PTGO ≥
140 e < 200 mg/dl
O diagnóstico da diabetes gestacional faz-se com base nos seguintes valores para
plasma venoso:
• Glicemia de jejum, a realizar na 1.ª consulta de gravidez, ≥ 92 mg/dl e <
126 mg/dl
• Se glicemia de jejum < 92 mg/dl, realiza-se PTGO com 75 g de glicose, às
24-28 semanas de gestação. É critério para diagnóstico de diabetes
gestacional, a confirmação de um ou mais valores
i. às 0 horas, glicemia ≥ 92 mg/dl
ii. à 1 hora, glicemia ≥ 180 mg/dl
iii. às 2 horas, glicemia ≥ 153 mg/dl
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34
A determinação da glucose é feita pelo método da hexoquinase. Conforme as
equações abaixo, a hexoquinase catalisa a fosforilação da glucose em glucose-6-fosfato
por ATP. A glucose-6-fosfato desidrogenase oxida o glocose-6-fosfato na presença de
NADP em gluconato-6-fosfato. A taxa de formação de NADPH durante a reação é
diretamente proporcional à concentração de glucose, sendo determinada
fotometricamente (29).
𝐺𝑙𝑢𝑐𝑜𝑠𝑒 + 𝐴𝑇𝑃𝐻𝐾→ 𝐺 − 6 − 𝑃 + 𝐴𝐷𝑃
𝐺 − 6 − 𝑃 + 𝑁𝐴𝐷𝑃+𝐺−6−𝑃𝐷𝐻→ 𝑔𝑙𝑢𝑐𝑜𝑛𝑎𝑡𝑜 − 6 − 𝑃 +𝑁𝐴𝐷𝑃𝐻 + 𝐻+ (29)
Os valores de referência são os seguintes:
- 50-100 mg/dl
Microalbuminúria
A microalbuminúria (albumina de baixa concentração) é utilizada como um
parâmetro de avaliação e prevenção da nefropatia diabética. Corresponde à presença de
pequenas quantidades de albumina na urina. Considera-se positiva quando o seu valor
oscila entre 20-200 mg/dl. As causas da microalbuminúria podem ser glomerulares
(devido a microangiopatia diabética, hipertensão), tubulares (inibição da reabsorção) ou
pós-renais (31).
A determinação da albumina em baixa concentração é feita por
imunoturbidimetria. Os anticorpos anti-albumina reagem com o antigénio na amostra e
formam complexos Ag-Ac. Estes, após a aglutinação são determinados por turbidimetria.
A amostra a utilizar é preferencialmente a urina de 24h mas pode também ser utilizada
uma urina ocasional. Neste último caso, é efetuada a quantificação da creatinina
juntamente com a quantificação da microalbumina, como fator corretivo e o resultado é
apresentado como a relação microalbumina/creatinina (também designada relação
albumina/creatinina).
Os valores de referência são os seguintes:
- Em urina de 24h: até 30,0 mg/24h
3.2.2. Metabolismo Lipídico
Colesterol total
O colesterol é um esteroide sintetizado sobretudo no fígado e na parede intestinal.
A sua determinação é útil para o despiste do risco aterogénico e no diagnóstico e
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35
tratamento de doenças que envolvem níveis elevados de colesterol bem como
perturbações do metabolismo lipídico e lipoproteico (32).
A determinação é feita por colorimetria enzimática de acordo com as reações
abaixo:
É𝑠𝑡𝑒𝑟𝑒𝑠 𝑑𝑒 𝑐𝑜𝑙𝑒𝑠𝑡𝑒𝑟𝑜𝑙 + 𝐻2𝑂𝐶𝐸→ 𝑐𝑜𝑙𝑒𝑠𝑡𝑒𝑟𝑜𝑙 + 𝑅𝐶𝑂𝑂𝐻
𝐶𝑜𝑙𝑒𝑠𝑡𝑒𝑟𝑜𝑙 + 𝑂2𝐶𝐻𝑂𝐷→ 𝑐𝑜𝑙𝑒𝑠𝑡 − 4 − 𝑒𝑛 − 3 − 𝑜𝑛𝑎 + 𝐻2𝑂2
2𝐻2𝑂2 + 4 − 𝐴𝐴𝑃 + 𝑓𝑒𝑛𝑜𝑙𝑃𝑂𝐷→ 𝑐𝑜𝑟𝑎𝑛𝑡𝑒 𝑞𝑢𝑖𝑛𝑜𝑛𝑎 − 𝑖𝑚𝑖𝑛𝑎 + 4 𝐻2𝑂 (32)
Os valores de referência são os seguintes:
- <200 mg/dl
HDL (High Density Lipoproteins)
As lipoproteínas de alta densidade (HDL) são responsáveis pelo transporte inverso
do colesterol das células periféricas para o fígado. No fígado, o colesterol é ainda
transformado em ácidos biliares que são excretados para os intestinos através das vias
biliares. Trata-se de uma análise importante já que concentrações elevadas de colesterol
HDL são um fator protetor contra a doença cardíaca coronária, enquanto que
concentrações reduzidas, principalmente se associadas a níveis elevados de triglicéridos,
aumentam o risco cardiovascular (33).
A determinação é feita por colorimetria enzimática homogénea. Os valores de
referência são os seguintes:
- >59 mg/dl
LDL (Low Density Lipoproteins)
As lipoproteínas de baixa densidade (LDL) derivam das lipoproteínas VLDL,
ricas em triglicéridos, através da ação de enzimas sintetizadas no fígado. Concentrações
elevadas de LDL no sangue e o aumento do seu tempo de permanência, em associação
com um aumento da taxa de modificação biológica, resultam na destruição da função
endotelial e numa captação superior do colesterol HDL pelo sistema
monócitos/macrófagos e pelas células das paredes dos vasos sanguíneos. Sendo que
apresenta um valor preditivo em relação à aterosclerose coronária (34).
A determinação é feita por colorimetria enzimática homogénea. Os valores de
referência são os seguintes:
- Até 130 mg/dl
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36
Triglicéridos
Os triglicéridos são ésteres do glicerol-álcool tri-hidratado com 3 ácidos gordos
de cadeia longa. Parte deles é sintetizada no fígado e outra parte é adquirida através da
alimentação. A sua determinação é importante para o diagnóstico e tratamento de doentes
com diabetes mellitus, nefrose, obstrução hepática, alterações do metabolismo dos
lípidos, entre outras doenças endócrinas (35).
A determinação é feita por colorimetria enzimática homogénea. Os valores de
referência são os seguintes:
- Até 150 mg/dl
3.2.3. Metabolismo Proteico
Proteínas Totais
As proteínas plasmáticas são sintetizadas no fígado, células plasmáticas, gânglios
linfáticos, baço e medula óssea. Pode verificar-se hipoproteinemia em casos de perdas de
sangue, caquexia aftosa, síndrome nefrótico, queimaduras graves, síndrome de retenção
de sal e Kwashiorkor. Pode observar-se hiperproteinemia em casos de desidratação grave
e mieloma múltiplo. Alterações na percentagem de frações proteicas (ver 3.4. Eletroforese
das Proteínas) pode não se refletir na quantidade das proteínas totais (36).
A determinação é feita por ensaio colorimétrico. Os valores de referência são os
seguintes:
- 1ºmês: 4,5-7,0 g/dl
- 2 meses a 1 ano: 5,5-7,2 g/dl
- 2 a 60 anos: 6,0-8,3 g/dl
- >60 anos: 5,8-8,1 g/dl
3.2.4. Função Hepática e Tracto Biliar
AST (Aspartato aminotrasferase)
A AST (ou GOT) é uma enzima distribuída pelos tecidos, mas principalmente
pelo tecido hepático, cardíaco, muscular e renal. As doenças hepatobiliares, como a
cirrose, o carcinoma metástico e a hepatite viral provocam um aumento nos níveis séricos
da AST, sendo por isso a sua determinação importante para o diagnóstico e monitorização
da terapêutica nestas situações (37).
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37
A determinação é feita por ensaio colorimétrico, conforme as equações abaixo:
𝐿 − 𝐴𝑠𝑝𝑎𝑟𝑡𝑎𝑡𝑜 + 2 − 𝑜𝑥𝑜𝑔𝑙𝑢𝑡𝑎𝑟𝑎𝑡𝑜𝐴𝑆𝑇→ 𝑜𝑥𝑎𝑙𝑜𝑎𝑐𝑒𝑡𝑎𝑡𝑜 + 𝐿 − 𝑔𝑙𝑢𝑡𝑎𝑚𝑎𝑡𝑜
𝑜𝑥𝑎𝑙𝑜𝑎𝑐𝑒𝑡𝑎𝑡𝑜 + 𝑁𝐴𝐷𝐻 +𝐻+𝑀𝐷𝐻→ 𝐿 − 𝑚𝑎𝑙𝑎𝑡𝑜 + 𝑁𝐴𝐷+ (37)
*A taxa de oxidação de NADH é diretamente proporcional à atividade catalítica de AST.
É determinada medindo a diminuição da absorvância.
Os valores de referência são os seguintes:
- Até 32 U/L
ALT (Alanina aminotransferase)
A ALT (ou GPT) é uma enzima cuja principal fonte é o fígado e por isso muito
útil para o diagnóstico de doenças hepática. Observam-se níveis elevados de ALT na
hepatite, cirrose, icterícia obstrutiva, carcinoma hepático e alcoolismo. A ALT catalisa
uma reação semelhante aquela que é catalisada pela AST, sendo que o aspartato é
substituído pela alanina e o oxaloacetato pelo piruvato (38).
A determinação é feita por ensaio colorimétrico. O valor de referência é o
seguinte: - Até 45 U/L
GGT (Gama Glutamiltransferase)
A GGT é uma enzima utilizada no diagnóstico e monitorização das doenças
hepatobiliares. A sua atividade é um dos marcadores hepáticos mais sensíveis, servindo
de teste de despiste para o alcoolismo, bem como na discriminação da origem da fosfatase
alcalina elevada (39).
A determinação é feita por ensaio colorimétrico enzimático, conforme a equação
abaixo:
𝐿 − − 𝑔𝑙𝑢𝑡𝑎𝑚𝑖𝑙 − 3 − 𝑐𝑎𝑟𝑏𝑜𝑥𝑖 − 4 − 𝑛𝑖𝑡𝑟𝑜𝑎𝑛𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎 + 𝑔𝑙𝑖𝑐𝑖𝑙𝑔𝑙𝑖𝑐𝑖𝑛𝑎
𝐺𝐺𝑇→ 𝐿 − − 𝑔𝑙𝑢𝑡𝑎𝑚𝑖𝑙 − 𝑔𝑙𝑖𝑐𝑖𝑙𝑔𝑙𝑖𝑐𝑖𝑛𝑎 + 5 − 𝑎𝑚𝑖𝑛𝑜 − 2 − 𝑛𝑖𝑡𝑟𝑜𝑏𝑒𝑛𝑧𝑜𝑎𝑡𝑜 (39)
*A quantidade de 5-amino-2-nitrobenzoato libertada é proporcional à atividade da GGT
na amostra. É determinada medindo o aumento da absorvância.
O valor de referência é o seguinte:
- Até 42 U/L
FA (Fosfatase Alcalina)
A fosfatase alcalina (ou ALP) no soro é constituída por 4 genótipos estruturais
(tipo fígado-osso-rim, tipo intestinal, tipo placentário e variante das células germinais),
sendo a isoenzima fígado-osso-rim a mais importante, auxiliando no diagnóstico de
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38
doenças hepatobiliares e ósseas. Verifica-se um aumento da FA em todas as formas de
colestase, particularmente na icterícia obstrutiva (40).
A determinação é feita por ensaio colorimétrico, conforme a equação abaixo:
𝑝 − 𝑛𝑖𝑡𝑟𝑜𝑓𝑒𝑛𝑖𝑙 𝑓𝑜𝑠𝑓𝑎𝑡𝑜 + 𝐻2𝑂𝐴𝐿𝑃→ 𝑓𝑜𝑠𝑓𝑎𝑡𝑜 + 𝑝 − 𝑛𝑖𝑡𝑟𝑜𝑓𝑒𝑛𝑜𝑙 (40)
*A quantidade de p-nitrofenol libertada é proporcional à atividade da FA na amostra. É
determinada medindo o aumento da absorvância.
Os valores de referência são os seguintes:
- 35-136 U/L (variam com a idade, sexo e gravidez)
Bilirrubinas
A bilirrubina forma-se no sistema reticuloendotelial durante a degradação dos
eritrócitos envelhecidos. A porção heme da hemoglobina e de outras proteínas que
contêm heme é removida, metabolizada em bilirrubina e transportada para o fígado sob a
forma de complexo com a albumina sérica. No fígado, a bilirrubina é conjugada com
ácido glucorónico, para solubilização e consequente transporte através do canal biliar, e
eliminação através do aparelho digestivo.
Quando a produção de bilirrubina é mais rápida do que a capacidade do fígado a
metabolizar (em processos hemolíticos), os níveis de bilirrubina não conjugada (indireta)
aumentam no sangue. A obstrução do canal biliar ou lesões da estrutura hepatocelular
provocam aumentos dos níveis séricos da bilirrubina conjugada (direta) bem como da não
conjugada (41).
A determinação é feita por diazométodo colorimétrico, conforme a equação
abaixo:
𝐵𝑖𝑙𝑖𝑟𝑟𝑢𝑏𝑖𝑛𝑎 +3,5 − 𝐷𝑃𝐷á𝑐𝑖𝑑𝑜→ 𝑎𝑧𝑜𝑏𝑖𝑙𝑖𝑟𝑟𝑢𝑏𝑖𝑛𝑎 (41)
Os valores de referência são os seguintes:
- Bilirrubina total: até 1,20 mg/dl
- Bilirrubina direta/conjugada: até 0,30 mg/dl
3.2.5. Função Renal
Creatinina
A creatinina é a forma cíclica da creatina e produto do metabolismo muscular
(proteínas endógenas). É formada a uma taxa relativamente constante pelos músculos e a
sua excreção, feita a nível renal, não é afetada pela dieta. A sua determinação tem por
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39
objetivo o diagnóstico e a monitorização da insuficiência renal aguda e crónica e a
monitorização da diálise renal (43).
A determinação baseia-se numa modificação ao método de Jaffé cinético que
utiliza supressão da velocidade e correção da interceção, conforme a equação abaixo:
𝐶𝑟𝑒𝑎𝑡𝑖𝑛𝑖𝑛𝑎 +Á𝑐. 𝑃í𝑐𝑟𝑖𝑐𝑜𝑁𝑎𝑂𝐻→ 𝐶𝑟𝑒𝑎𝑡𝑖𝑛𝑖𝑛𝑎 − 𝑃𝑖𝑐𝑟𝑎𝑡𝑜 (𝑣𝑒𝑟𝑚𝑒𝑙ℎ𝑜) (43)
Os valores de referência são os seguintes:
- Até 1,20 mg/dl (variam com a massa muscular)
Ureia
A ureia é o principal produto final do metabolismo do azoto proteico. É sintetizada
no ciclo da ureia no fígado a partir da amónia, que é produzida por desaminação dos
aminoácidos. A ureia é principalmente excretada pelos rins, mas também pelo suor em
quantidades mínimas, sendo degradada nos intestinos por ação bacteriana. A
determinação do azoto ureico no sangue é o parâmetro mais utilizado para testar a função
renal. Os aumentos da concentração de azoto de ureia no sangue são verificados nos casos
de perfusão renal inadequada, choque, diminuição do volume sanguíneo (causas pré-
renais), nefrite crónica, nefrosclerose, necrose tubular, nefrite glomerular (causas renais)
e obstrução do aparelho urinário (causas pós-renais). Podem também ocorrer valores
elevados durante períodos de elevada ingestão proteica (44).
A determinação é feita por teste cinético com urease e glutamato desidrogenase,
segundo a reação enzimática Roch-Ramel. Os valores de referência são os seguintes:
- 18-65 anos: <50 mg/dl
- >65 anos: <71 mg/dl
Ácido Úrico
O ácido úrico é o produto final do metabolismo das purinas e a sua determinação
é usada no diagnóstico e monitorização de patologias renais e metabólicas,
nomeadamente a insuficiência renal (45).
A determinação é feita por teste colorimétrico, segundo a reação enzimática de
Fossati, utilizando a uricase como ponto final. Os valores de referência são os seguintes:
- 2,4-6,0 mg/dl
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40
3.2.6. Função Pancreática
Amilase
A amilase é uma enzima produzida apenas no pâncreas e na saliva, sendo por isso
um ótimo parâmetro para avaliar a função pancreática, principalmente para o diagnóstico
e monitorização da pancreatite aguda. Os seus valores encontram-se elevados na
pancreatite aguda, na parotidite e na presença de úlceras perfuradas (estômago e duodeno)
(46).
A determinação é feita por teste colorimétrico, utilizando o p-nitrofenil-
maltoheptósido bloqueado por etilideno como substrato. Os valores de referência são os
seguintes:
- Até 118 U/L
Lipase
A lípase é uma enzima também utilizada para apoiar o diagnóstico e
monitorização de doenças pancreáticas tais como a pancreatite aguda e obstrução do
ducto pancreático, já que permanece mais tempo em circulação em episódios agudos,
quando comparado com a amilase (47).
A determinação é feita por teste colorimétrico enzimático, onde o substrato
produzido na reação é proporcional à concentração de lipase presente na amostra. Os
valores de referência são os seguintes:
- Até 59 U/L
3.2.7. Metabolismo Fosfocálcico
A homeostase do cálcio e do fósforo dá-se através da interação de 4 sistemas
fisiológicos, que estão separados, mas intimamente ligados: sistema GI. O sistema
endócrino, o sistema renal e o sistema músculo-esquelético ou ossos.
O cálcio e fósforo entram no sistema GI através da dieta, sendo que parte é
excretada pelas fezes e outra parte é absorvida para a corrente sanguínea. Estes eletrólitos
são sujeitos a uma contínua mineralização, com formação e destruição óssea, num
processo denominado de “Bone turnover” (Adaptado de 48).
No sistema renal sofrem filtração, no glomérulo, onde podem ser reabsorvidos nos
túbulos renais ou excretados através da urina.
O sistema endócrino é responsável por regular todos estes sistemas através de
hormonas produzidas pela paratiroide.
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41
Cálcio
O cálcio é o quinto elemento mineral mais abundante no corpo humano e tem um
papel importante na mineralização óssea. É um elemento vital nalguns processos
fisiológicos básicos como a coagulação, a contração do músculo cardíaco e esquelético e
na condução neuromuscular. A maioria do cálcio está armazenada no esqueleto sob a
forma de hidroxiapatite. A sua determinação é assim importante para o diagnóstico e
monitorização de doenças da paratiroide, doenças ósseas e doenças renais crónicas (50).
A determinação é feita por teste colorimétrico, já que o cálcio forma um complexo
corado com o Arsenazo III, a baixo pH. Os valores de referência são os seguintes:
- Cálcio Total: 2,15-2,55 mmol/L/ 8,60-10,20 mg/dl
Fósforo inorgânico
O fósforo inorgânico (H2PO4, PO4, fosfato inorgânico) existe combinado com o
cálcio no esqueleto, sendo os seus níveis regulados pela PTH, vitamina D e calcitonina.
É determinado para o diagnóstico e monitorização de doenças renais, perturbações da
glândula paratiroide e desequilíbrios da vitamina D. Os seus valores encontram-se
fisiologicamente aumentados nas crianças, devido ao seu envolvimento no metabolismo
da formação óssea (51).
A determinação é feita por teste colorimétrico enzimático, onde o fósforo
inorgânico reage com o molibdato de amónia na presença de ácido sulfúrico, para formar
o complexo fosfomolibdato não reduzido. Os valores de referência são os seguintes:
- 2,48-4,50 mg/dl
PTH (Hormona Paratiroide)
A PTH é uma hormona formada na glândula paratiroide e segregada na circulação
sanguínea. Esta hormona, juntamente com a vitamina D e a calcitonina, provoca a
mobilização de cálcio e de fosfato no sistema esquelético e aumenta a absorção de cálcio
no intestino, assim como a eliminação de fosfatos através dos rins. Garante ainda que a
concentração sanguínea de cálcio se mantenha constante (52).
A secreção de PTH é inibida pelas concentrações elevadas de cálcio e promovida
pelas baixas concentrações. Deficiências da função da paratiroide provocam o aumento
(hipercalcemia) ou a diminuição (hipocalcemia) do nível de cálcio no sangue. Uma
hiperfunção da paratiroide resulta em aumento da secreção da PTH (hiperparatiroidismo).
A causa primária são os adenomas da paratiroide, e no hiperparatiroidismo secundário a
causa poderá ser a diminuição da vitamina D (52).
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42
A determinação é feita pela técnica de sandwich, em que o anticorpo monoclonal
biotinilado reage com o fragmento N-terminal e o anticorpo monoclonal marcado com
um complexo de ruténio reage com o fragmento C-terminal. Os valores de referência são
os seguintes:
- 15,0-65,0 ng/L
Vitamina D
A vitamina D é um percursor da hormona esteroide lipossolúvel que é produzida
principalmente na pele, por exposição solar. A vitamina D é biologicamente inerte e tem
de passar por duas hidroxilações sucessivas no fígado e nos rins, para se transformar na
1,25-diidroxivitamina D biologicamente ativa. As duas principais formas da vitamina D
são a vitamina D3 (colecalciferol) e a vitamina D2 (ergocalciferol) e esta última só é
adquirida através da alimentação (53).
A vitamina D é essencial para a saúde dos ossos e a sua deficiência grave em
crianças pode levar ao raquitismo e nos adultos, juntamente com o aumento da PTH, pode
levar a osteomalacia (53).
A determinação é feita por imunoensaio de competição. Os valores recomendados
internacionalmente são os seguintes:
- Carência: <32 g/L
- Desejável: 32-100 g/L
- Eventual toxicidade: >100 g/L
3.2.8. Função Cardíaca
Os marcadores cardíacos são substâncias libertadas no sangue quando existe uma
lesão no coração. O teste a estes marcadores é usado para ajudar a diagnosticar, avaliar e
controlar os doentes com suspeita de síndrome coronária aguda (SCA). Os sintomas estão
associados a enfarte agudo do miocárdio e anginas, mas podem também ser detetados em
condições que não estão relacionadas com o coração. As subidas de um ou mais
marcadores podem identificar doentes com SCA, permitindo um rápido diagnóstico e o
tratamento adequado do seu estado. O SCA é causado por uma diminuição repentina na
quantidade de sangue e oxigénio que chegam ao coração. Esta diminuição, também
chamada isquémia, deve-se normalmente ao forte estreitamento das artérias coronárias
ou ao bloqueio do fluxo sanguíneo nas artérias. Quando o fluxo sanguíneo para o coração
é bloqueado ou significativamente reduzido, pode causar necrose das células cardíacas,
provocando um enfarte agudo do miocárdio (EAM). Isto pode levar à morte do músculo
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43
cardíaco afetado ou a uma lesão permanente, e posterior cicatrização do tecido cardíaco.
Os marcadores cardíacos são descritos de seguida (54).
Creatina Quinase (CK)
A creatina quinase é uma enzima dimérica que ocorre em 4 isoformas diferentes:
uma isoenzima mitocondrial e as isoenzimas citosólicas CK-MM (tipo músculo-
esquelética), CK-BB (tipo cerebral) e CK-MB (tipo miocárdica). Após lesão do
miocárdio, tal como acontece no EAM, a CK é libertada pelas células lesadas. Pode-se
encontrar uma atividade de CK aumentada cerca de 4 horas após o enfarte e atinge o seu
máximo após 12-24h (Figura 23) (55).
A determinação é feita por teste UV, segundo o método de Oliver e aperfeiçoado
por Szasz, em que a CK é rapidamente inativada por oxidação dos grupos sulfidrilo no
seu centro ativo. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 200 U/L
CK-MB
A CK-MB é detetável no sangue cerca de 3-8 horas após o início dos sintomas
cardíacos, podendo continuar detetável por um período de tempo relativamente longo,
dependendo da evolução da doença (Figura 23) (56).
A determinação é feita por ensaio de ECLIA, utilizando dois anticorpos
monoclonais diferentes, dirigidos especificamente contra a CK-MB humana. Os valores
de referência são os seguintes:
- Até 24 U/L
Troponina T (cTnT)
A troponina constitui um complexo proteico que regula a contração do músculo
estriado. É composta por três subunidades organizadas periodicamente ao longo do
filamento das miofibrilas. A troponina C liga-se ao Cálcio, a troponina T liga-se à
tropomiosina no filamento fino e a troponina I inibe a actomiosina ATPase.
A Troponina T é um marcador específico do músculo estriado cardíaco e em
situações de Enfarte Agudo do Miocárdio, observa-se um grande aumento 3-4h após
ocorrência dos sintomas cardíacos, mantendo-se aumentada até 14 dias seguintes (57).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 0,014 g/L
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44
Troponina I (cTnI)
A Troponina I é uma proteína inibidora que existe em três isoformas distintas, a
do músculo cardíaco, do músculo esquelético de contração lenta e do músculo esquelético
de contração rápida. Cada isoforma apresenta uma sequência de aminoácidos especifica,
sendo a forma cardíaca (cTnI) a mais distinta, garantindo bons resultados enquanto
marcador cardíaco para o diagnóstico do EAM. Pode ser detetada entre 4-8h após início
dos sintomas, apresentando concentração máxima 12-16h depois. Mantém-se aumentada
entre 5 a 9 dias (Figura 23) (58).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 0,160 g/L
Mioglobina
A mioglobina é uma hemoproteína monomérica de ligação ao oxigénio,
encontrada principalmente no tecido muscular cardíaco. Em situações de lesão tecidular
a mioglobina é rapidamente libertada, tornando-se um marcador de resposta rápida. Pode
ser detetada 2-4h após ocorrência de lesão tecidular, apresentando valores máximos entre
9-12h depois. Os valores basais são restabelecidos 24-36h depois (Figura 23) (59).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 100 g/L
Homocisteína
A homocisteína é um aminoácido formado a partir da metionina, sendo o seu
metabolismo regulado por três vias enzimáticas que a convertem em cisteína. Apresenta
Figura 21. Evolução dos marcadores cardíacos após ocorrência de lesão tecidular [Adaptado de (60)].
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45
interesse clínico para avaliar se existe risco de EAM ou AVC, para detetar défices de
ácido fólico ou vitamina B12, ou ainda para diagnosticar a doença hereditária
homocisteinúria (67).
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- 15-65 Anos: < 15,0 µmol/L
- > 65 Anos: < 20,0 µmol/L
- Grávida: < 10,0 µmol/L
3.2.9. Marcadores Tumorais
Os marcadores tumorais (ou marcadores biológicos) são substâncias encontradas
no sangue, na urina ou em outros fluídos corporais e tecidos que podem estar em
quantidades aumentadas quando um determinado tipo de cancro está presente. Assim,
estas substâncias funcionam como indicadores da presença de cancro, e podem ser
produzidas diretamente pelo tumor ou pelo organismo, em resposta à presença do tumor.
É importante realçar que os marcadores tumorais por si só são insuficientes para
indicar a presença de cancro. O resultado de marcador tumoral deve ser analisado
juntamente com o histórico do doente, exame físico, análises clínicas e exames
imagiológicos (61).
Neoplasia da mama
CEA (Antigénio Carcinoembrionário)
O CEA é uma glicoproteína oncofetal sintetizada durante os primeiros seis meses
de vida fetal no trato gastrointestinal e no pâncreas. Nos adultos, a síntese de CEA não
está totalmente reduzida. Apesar de o CEA ser considerado como o marcador tumoral de
eleição na monitorização do cancro colo-rectal, outras doenças noutros órgãos podem
provocar uma elevação dos níveis de CEA, como o ovário, mama, pulmão e estômago.
Outras situações podem causar elevação dos níveis normais de CEA, como a inflamação
do pulmão, fígado (cirrose) e tumores benignos. Os fumadores possuem um limite de
referência superior aos não fumadores. O CEA não é um marcador de deteção nem de
diagnóstico do cancro colo-rectal, mas deve ser utilizado para ajudar ao prognóstico da
doença, monitorização das recidivas e avaliação da resposta terapêutica. Os níveis de
CEA normalizam entre 1-4 meses após remoção cirúrgica do tecido neoplásico (62).
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46
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 5,0 (fumadores até 10,0) g/L
CA 15.3
O CA 15.3 é uma glicoproteína polimórfica, pertencente á família das mucinas,
produto do gene MUC-1. A sua presença em circulação está associada ao cancro da mama
metastásico. É utilizado como indicador de prognóstico na neoplasia da mama e para
avaliação do estadio da doença bem como monitorização da sua evolução e da resposta à
terapêutica. Apresenta também bons resultados enquanto indicador precoce de recidivas
(63).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 35 kU/L
Ovário e Endométrio - CA 125
O CA 125 é uma glicoproteína que pertence à família dos marcadores tumorais
definidos por hibridoma e encontra-se numa percentagem elevada nos tumores dos
ovários não-mucinosos de origem epitelial e pode ser detetado no soro. Não ocorre no
epitélio de superfície dos ovários normais. Por vezes, observam-se também valores
elevados em várias doenças ginecológicas benignas, tais como quistos do ovário,
metaplasias dos ovários, endometriose, útero miomatoso ou inflamação do colo do útero.
Também se verificam valores aumentados em doenças hepáticas benignas.
Apesar de ser um marcador relativamente inespecífico, é atualmente o marcador
tumoral mais importante para a monitorização da terapêutica e da evolução dos pacientes
com carcinoma seroso do ovário (64).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Pré-menopausa: <35 kU/L
- Pós-menopausa: <20 kU/L
PSA (Antigénio Específico da Próstata)
O PSA é uma glicoproteína cujas concentrações elevadas no soro são geralmente
indicadoras de patologia da próstata (prostatite, hiperplasia benigna ou carcinoma). A sua
determinação é útil na monitorização da progressão e da eficiência da terapêutica em
doentes com carcinoma da próstata ou que estejam a fazer terapêutica hormonal. A
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47
inflamação ou trauma da próstata (retenção urinária, após toque retal, citoscopia,
coloscopia, biópsia transuretral, tratamento laser ou ergometria) podem originar
resultados elevados do PSA (65).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 4,0 g/L
Carcinoma do pâncreas - CA 19.9
O CA 19.9 é uma mucina de alto peso molecular e rica em carbohidratos utilizada
na monitoração do tratamento de carcinomas, principalmente do pâncreas, mas também
nos do estômago, fígado, vias biliares e colon. É importante realçar que este marcador
não pode ser utilizado para deteção precoce do carcinoma do pâncreas. Nos casos de
carcinoma gástrico é aconselhável a determinação concomitante de CA 72.4 e CEA, já
nos casos de carcinoma colo retal, basta a determinação de CEA (a determinação de CA
19.9 pode ser útil nos casos CEA negativos, que são raros) (66).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 39 kU/L
CA 72.4
O CA 72.4 é um marcador tumoral utilizado para a monitorização da terapêutica
do carcinoma do estômago e ovários, no entanto a sua especificidade é baixa, podendo
encontrar-se aumentado em situações benignas (68).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Até 8,2 kU/L
3.2.10. Doenças Infeciosas
HBV (Vírus da Hepatite B)
O HBV é um vírus que causa hepatite B e que apresenta 3 antigénios proteicos
virais: o antigénio de superfície (HBsAg), o antigénio do núcleo (HBcAg) e o antigénio
e (HBeAg). A infeção por HBV é transmitida por via sanguínea, sexual e perinatal e pode
provocar hepatites agudas e crónicas, que podem conduzir à cirrose ou hepatocarcinoma
(69).
O HBsAg é um dos componentes do invólucro externo da partícula do HBV e a
sua deteção no soro ou plasma humano é um indicador de infeção. Este é o primeiro
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marcador imunológico, encontrando-se geralmente já presente alguns dias ou semanas
antes de os primeiros sintomas clínicos começarem a manifestar-se, sendo observados em
situações agudas e crónicas (Figura 22), serve assim de diagnóstico e monitorização da
doença. Os anti-HBs (geralmente IgG) são anticorpos específicos dirigidos contra o
antigénio de superfície da hepatite B. Podem formar-se após uma infeção de HBV ou
após a vacina contra a hepatite B. A sua determinação é útil para avaliar a eficácia da
vacina bem como a evolução da doença (69).
O HBeAg é um produto do gene pré-C/C que foi encontrado nos hepatócitos após
a proliferação do vírus. A seguir à proteólise, a proteína HBe é segregada em forma não
particulada para o soro. O HBeAg aparece no soro durante infeções agudas por HBV,
sendo detetável durante um curto período de tempo (dias a semanas). Na fase de
recuperação posterior à hepatite B aguda, o HBeAg é o primeiro marcador serológico
negativo substituído pelo anticorpo correspondente (anti-HBe), conforme a Figura 22. A
determinação destes marcadores é assim útil para monitorizar a evolução da infeção (69).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os resultados apresentados são os seguintes:
- Reativo
- Não reativo
HCV (Vírus da Hepatite C)
O HCV é um vírus que causa hepatite C e é uma das principais causas de doença
hepática. A infeção por HCV é transmitida sobretudo por via sanguínea, podendo
Figura 22.Evolução dos marcadores serológicos durante a Hepatite B aguda [Adaptado de (70)].
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provocar hepatites agudas e crónicas e consequentemente conduzir à cirrose ou carcinoma
hepatocelular. Devido à elevada taxa de infeções assintomáticas, o diagnóstico clínico é
difícil por isso os testes de rastreio são muito importantes. Esta infeção pode ser detetada
medindo a quantidade de RNA do HCV, ALT e dos anticorpos anti-HCV no soro. Os Ac
anti-HCV surgem entre 15 dias a 6 meses após a infeção (71).
A determinação dos anticorpos anti-HCV é feita por imunoensaio do tipo
sandwich, com deteção por quimioluminescência direta. Os resultados apresentados são
os seguintes:
- Reativo
- Não reativo
HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana)
O HIV pertence ao grupo dos retrovírus e já foram descritos dois tipos: HIV-1 e
HIV-2. Na sequência da infeção por este vírus, surgem normalmente no soro anticorpos
para as proteínas do HIV, após um período de tempo variável, que servem exatamente de
evidência de infeção (72).
Antes de surgirem no sangue os anticorpos contra o HIV, podem estar presentes
vírus livres que podem ser detetados através do teste do antigénio p24 (proteína do core
do vírus). O tempo necessário para que seja possível detetar o antigénio p24 é,
geralmente, 3-5 semanas. Este antigénio também pode ser detetado na fase mais tardia da
doença provocada pelo HIV (SIDA), em resultado do excesso de virémia (72).
O teste do antigénio HIV é realizado por técnica de sandwich, por ECLIA utiliza
anticorpos monoclonais para determinar o antigénio p24 do HIV-1 e serve para identificar
uma infeção por HIV:
• Em associação com o teste de rastreio do anticorpo anti-HIV em pessoas
com risco conhecido de contrair infeção por HIV
• Em bebés recém-nascidos cujas mães estão infetadas pelo HIV
• No apoio à monitorização durante a terapêutica anti-viral
O diagnóstico de uma infeção por HIV-1 e HIV-2 baseia-se, na prática corrente,
na deteção dos anticorpos séricos por EIA. A deteção combinada do antigénio p24 e dos
anticorpos do HIV-1 e do HIV-2 permite reduzir o período janela compreendido entre a
contaminação e o diagnóstico da infeção, que só será finalizado após obtenção do
resultado de técnicas de confirmação, realizadas na área da Imunologia.
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Os resultados apresentados são os seguintes:
- Reativo
- Não reativo
3.2.11. Rastreio Serológico da Grávida
Toxoplasmose
A toxoplasmose é uma infeção comum provocada pelo parasita protozoário
Toxoplasma gondii. Esta infeção é adquirida principalmente por ingestão de alimentos ou
de água contaminada por fezes de gatos (e que contenham oócitos maduros de T. gondii),
ou pela ingestão de carne malcozinhada proveniente de animais infetados (73). A infeção
primária materna por Toxoplasma durante a gravidez pode ter como resultado lesões
graves no feto, já que o parasita pode ser transmitido através da placenta. Ainda que a
maioria dos bebés infetados não apresente sintomas clínicos ao nascer, podem surgir
sequelas graves mais tarde, como por exemplo atraso mental e psicomotor, retinite e perda
de audição. Interessa realçar que o risco de ocorrerem manifestações clínicas graves é
mais alto quando a infeção materna ocorre no início da gravidez (73).
Na ausência de sintomas clínicos agudos, o diagnóstico da infeção por
Toxoplasma baseia-se em testes com marcadores serológicos, nomeadamente IgG e IgM.
A IgM é um marcador da fase aguda, mas também podem ser observados resultados
positivos da IgM devido à estimulação ou deteção policlonal de IgM residual ou
persistente durante meses ou anos após a infeção primária. De forma a refinar a data da
infeção são feitos ensaios de avidez de IgG do Toxoplasma, permitindo uma exclusão de
infeções ocorridas nos últimos 4 meses. Este ensaio mede a afinidade da ligação funcional
da IgG em resposta à infeção. Os anticorpos produzidos durante a resposta não primária
ou na fase remota da infeção têm uma avidez de antigénios mais alta do que os anticorpos
produzidos durante a resposta primária (Figura 23). Um resultado de avidez alta após o
quarto mês de gestação não permite excluir uma infeção primária numa fase mais precose
da gestação, numa altura em que pode ter estado presente uma avidez baixa de IgG anti.T.
gondii. A deteção de uma avidez de IgG alta durante o primeiro trimestre de gravidez
pode ser considerada um bom indicador de infeção antiga (73).
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A determinação destes parâmetros é feita por imunoensaio ECLIA. Os resultados
são apresentados da seguinte forma:
Ac IgM: - Reativo
- Não reativo
Ac IgG: Até 6 kUI/L (não imune)
Rubéola
O vírus da rubéola é o agente etiológico da rubéola, uma doença da infância que
se caracteriza por exantema e que pode ser uma doença grave na mulher grávida, em
especial durante o primeiro trimestre. Este vírus pode ser transmitido pela placenta e
resultar na morte do feto ou causar malformações graves no mesmo, a síndrome da
rubéola congénita (SRC) (75).
A deteção de anticorpos específicos anti-rubéola é utilizada para determinar o
estado imunitário de um indivíduo e para auxiliar no diagóstico da infeção aguda. A
presença de anticorpos IgG anti-vírus da rubéola indica exposição prévia por vacinação
ou devido a infeção anterior pelo vírus; a deteção de anticorpos IgM específicos da
rubéola é utilizada como auxiliar de diagnóstico na infeção aguda pelo vírus. A
seroconversão de anticorpos ou um aumento significativo de anticorpos IgG entre uma
primeira e uma segunda amostra permitem corroborar o diagnóstico de infeção aguda
(75).
A determinação destes parâmetros é feita por imunoensaio ECLIA. Os resultados
são apresentados da seguinte forma:
Ac IgM: - Reativo
- Não reativo
Ac IgG: < 10 kUI/L (não imune)
Figura 23. Resposta serológica à infeção por Toxoplasma gondii [Adaptado de (74)].
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Citomegalovírus (CMV)
O citomegalovírus é um vírus da família dos Herpesvírus. Este vírus é transmitido
normalmente por via sexual. A infeção na mulher grávida pode trazer consequências
graves para o feto, nomeadamente atraso mental, cegueira, surdez ou paralisia cerebral
(76).
A deteção dos anticorpos anti-CMV (IgG e IgM) é útil no diagnóstico das
infecções primárias recentes.
A determinação destes parâmetros é feita por imunoensaio ECLIA. Os resultados
são apresentados da seguinte forma:
Ac IgM: - Reativo
- Não reativo
Ac IgG: < 1,0 kU/L (não imune)
3.2.12. Sistema Endócrino
Eixo Hipotálamo-Hipófise-Suprarrenais
ACTH (Hormona adrenocorticotrópica)
A ACTH é uma hormona produzida na pituitária anterior do cérebro que estimula
a formação e a secreção de glucocorticoides (especialmente o cortisol) pelo córtex
suprarrenal. As concentrações de ACTH apresentam uma variação diurna com níveis
elevados de manhã e níveis baixos à noite, tornando importante conhecer a hora da
colheita. A determinação desta hormona é útil no diagnóstico diferencial da doença de
Cushing (hipersecreção ACTH), de tumores da pituitária e da doença de Addison (77).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- 7h-10h: 7,2-63,3 ng/L
Cortisol
O cortisol (hidrocortisona) é quantitativamente o principal produto
glucocorticoide do córtex suprarrenal, tendo os níveis mais elevados de manhã e os mais
baixos na primeira metade da noite. A sua determinação é útil para o diagnóstico de
doenças provocadas pela sobreprodução de cortisol na síndrome de Cushing, deficiência
da excreção esteroide suprarrenal na doença de Addison e para monitorização da
terapêutica (78).
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A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- 7-10 horas: 5,0-23,0 g/dl
- 15-17 horas: 3,0-16,0 g/dl
- 19-21 horas: <50% do valor às 7-10h
Eixo Hipotálamo-Hipófise-Gónadas
FSH (Hormona Folículo-estimulante)
A FSH pertence à família das gonadotropinas, regulando e estimulando o
crescimento e o funcionamento das gónadas (ovários e testículos) de modo sinérgico. Nas
mulheres, as gonadotropinas atuam de forma a controlar o ciclo menstrual. Nos ovários,
as gonadotropinas estimulam o crescimento e amadurecimento do folículo e
consequentemente a síntese dos estrogénios e progesteronas. A concentração de FSH
apresenta um pico a meio do ciclo, apesar de ser menos marcado do que o que é obtido
com a LH. Devido a alterações na função ovárica e a uma redução da secreção de
estrogénios, verifica-se a ocorrência de concentrações elevadas de FSH durante a
menopausa. Nos homens, a FSH induz o desenvolvimento de espermatogónios (79).
A determinação da FSH serve para reconhecer perturbações funcionais no interior
do sistema hipotálamo-hipófise-gónadas.
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Fase Folicular: 1,4-10,2 UI/L
(3º dia do ciclo) - <10,0
- Fase Ovulatória: 3,4-33,4 UI/L
- Fase Luteínica: 1,1-9,1 UI/L
- Gravidez: <3,0 UI/L
- Pós-menopausa: 15,0-124,3 UI/L
LH (Hormona Luteinizante)
A LH pertence à família das gonadotropinas, tal como a FSH, sendo responsável
por regular e estimular o crescimento e o funcionamento das gónadas de modo sinérgico.
As concentrações mais elevadas de LH ocorrem durante o pico, a meio do ciclo, e
induzem a ovulação e formação do corpo lúteo, cujo principal produto segregado é a
progesterona. Nas células de Leydig dos testículos, a LH estimula a produção de
testosterona (80).
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A determinação da LH em conjunto com a FSH é utilizada nas doenças congénitas
com anomalias cromossómicas, ovários poliquísticos, clarificação das causas de
amenorreia, síndrome da menopausa e suspeita de insuficiência de células de Leydig.
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- Fase Folicular: 1,7-15,0 UI/L
- Fase Ovulatória: 14,0-95,6 UI/L
- Fase Luteínica: 0,6-16,3 UI/L
- Gravidez: <1,5 UI/L
- Menopausa: 14,2-58,5 UI/L
Estradiol
O estradiol é o estrogénio biologicamente mais ativo. Os estrogénios são
responsáveis pelo desenvolvimento das características sexuais secundárias femininas e
controlam os processos importantes da reprodução na mulher. São produzidos pelos
ovários, mas também em pequena quantidade pelos testículos e córtex suprarrenal,
estando ligados a proteínas de transporte (SHBG) (81).
A secreção de estradiol é bifásica durante o ciclo menstrual, sendo a sua
determinação útil para avaliação de problemas de fertilidade no eixo gónado-hipotálamo-
hipofisário, ginecomastia, produção de estrogénios por diferentes tumores e hiperplasia
do córtex suprarrenal.
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- Fase Folicular: 66,3-315,0 ng/L
(3º dia do ciclo - >30,0 ng/L)
- Fase Ovulatória: 28,6-525,0 ng/L
- Fase Luteínica: 7,7-752,0 ng/L
- Pós-menopausa: <138,0 ng/L
- Gravidez:
1º Trimestre: 127,0-4161,0 ng/L
2º Trimestre: 1137,0-25130,0 ng/L
3º Trimestre: >7397,0 ng/L
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Progesterona
A progesterona é uma hormona esteroide formada nas células do corpo lúteo e,
durante a gravidez, na placenta. A concentração de progesterona está relacionada com o
desenvolvimento e regressão do corpo lúteo, que é quase indetetável na fase folicular do
ciclo menstrual, regista um aumento um dia antes da ovulação e durante a fase luteínica
(82).
A determinação da progesterona é utilizada no diagnóstico de fertilidade para
deteção de ovulação e avaliação da fase luteínica.
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- Fase Folicular: <1,5 g/L
- Fase Ovulatória: 0,8-3,0 g/L
- Fase Luteínica: 3,3-28,0 g/L
- Pós-menopausa: <0,8 g/L
- Gravidez:
1º Trimestre: 11,2-90,0 g/L
2º Trimestre: 25,6-89,4 g/L
3º Trimestre: 48,4-422,5 g/L
hCG (Gonadotropina Coriónica humana)
A hCG é uma hormona glicoproteica produzida pelo tecido trofoblástico e serve
para manter o corpo lúteo durante as primeiras semanas de gravidez. Além disso também
influencia a produção de esteroides. Naturalmente, esta hormona aparece apenas no
sangue e urina de mulheres grávidas. O pico é atingido perto das 9 semanas de gestação.
Nas mulheres não grávidas a hCG pode ser produzida por tumores (83).
O soro das grávidas contém principalmente hCG intacta, mas pequenas frações de
subunidades e circulam sob a forma não ligada. A concentração de hCG livre no
soro é um marcador de aneuploidia fetal e em associação com outros parâmetros como a
PAPP-A é possível avaliar o risco de trissomia 21 (Síndrome de Down).
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes (UI/L):
- Não grávida: até 5
Gravidez (idade gestacional aproximada):
3ª semana: 6-71
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4ª semana: 9-750
5ª semana: 217-7138
6ª semana: 158-31795
7ª semana: 3697-163563
8ª semana: 158-31795
9ª semana: 63803-151410
10ª semana: 46509-186977
11ª semana: 15000-200000
12ª semana: 27832-210612
13ª-14ª semanas: 13950-62530
15ª semana: 12039-70971
16ª semana: 9040-56451
17ª semana: 8175-55858
18ª semana: 8099-58176
Eixo Hipotálamo-Hipófise-Tiroide
TSH (Hormona Estimuladora da Tiroide)
A TSH é uma glicoproteína formada na hipófise anterior e apresenta um ritmo de
secreção circadiano. A sua libertação é o principal mecanismo de regulação da ação
biológica das hormonas da tiroide. A TSH tem uma ação estimuladora em todas as fases
de formação e secreção das hormonas da tiroide (84).
A determinação da TSH é útil como teste inicial no diagnóstico da tiroide, já que
é muito sensível e específica.
A determinação é feita por imunoensaio do tipo sandwich, com deteção por
quimioluminescência direta. Os valores de referência são os seguintes:
- 19 aos 70 anos: 0,4-4,2 mUI/L
- >70 anos: 0,4-6,0 mUI/L
- Gravidez:
1º Trimestre: 0,100-2,5 mUI/L
2º Trimestre: 0,200-3,0 mUI/L
3º Trimestre: 0,300-3,0 mUI/L
T3 (Triiodotironina)
A T3 é a principal hormona responsável pelo desenvolvimento dos efeitos das
hormonas da tiroide nos órgãos-alvo. Esta hormona é essencialmente formada no fígado,
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por conversão da T4, e por isso a sua concentração no soro reflete mais o estado funcional
do tecido periférico do que o desempenho secretor da tiroide. Mais de 99% da T3 está
ligada a proteínas de transporte, sendo a T3 livre (T3L) a forma ativa não ligada. A sua
determinação tem a vantagem de não depender de alterações das concentrações nem das
propriedades de fixação das proteínas de ligação (TBG) (85).
Estas determinações são úteis no diagnóstico diferencial das alterações da tiroide
e são necessárias para distinguir diferentes formas de hipertiroidismo e identificar doentes
com tirotoxicose da T3.
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- T3:
- 19 aos 50 anos: 70-204 ng/L
- >50 anos: 40-181 ng/L
- Gravidez:
1ºTrimestre: 81-190 ng/L
2ºTrimestre: 100-260 ng/L
3ºTrimestre: 100-260 ng/L
- T3L: 2,1-4,4 ng/L
T4 (Hormona Tiroxina)
A T4 é o principal produto segregado pela tiroide e tem a função de influenciar
anabolicamente o metabolismo. Mais de 99% da T4 está ligada a proteínas de transporte,
sendo a T4 livre (T4L) a forma ativa não ligada e tal como no caso da T3L, a sua
determinação tem a vantagem de não depender de alterações das concentrações nem das
propriedades de fixação das proteínas de ligação (TBG) (86).
Estas determinações são úteis na deteção de hipertiroidismo, hipotiroidismo
primário e secundário e monitorização da terapêutica de supressão da TSH.
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- T4: Criança:
1ª semana: 9,9-23,2 g/dl
7 dias a 11 meses: 5,9-13,7 g/dl
1-8 anos: 6,2-10,3 g/dl
9-11 anos:5,5-9,3 g/dl
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12-13 anos: 5,0-8,3 g/dl
14-18 anos (M): 4,7-8,6 g/dl
14-18 anos (F): 5,5-13,0 g/dl
Homem: 4,5-10,9 g/dl
Mulher: 5,5-11,0 g/dl
Grávida: 6,4-15,0 g/dl
- T4L: 0,7-1,8 ng/dl
Anticorpos Anti-tiroideus
Os anticorpos anti-tiroideus (Anti-tiroglobulina e Anti-peroxidase) são auto-
anticorpos dirigidos contra enzimas importantes da tiroide. Concentrações elevadas
destes anticorpos indicam tiroidite com infiltração linfocítica crónica (Tiroidite de
Hashimoto) ou doença de Graves (87).
Estas determinações são úteis para monitorização da evolução da tiroidite bem
como para o seu diagnóstico diferencial.
A determinação é feita por imunoensaio competitivo. Os valores de referência são
os seguintes:
- Anti-tiroglobulina: até 115 kUI/L
- Anti-peroxidase: até 34 kUI/L
3.3. Urianálise
A urianálise, também denominada de exame sumário da urina ou urina tipo II é a
análise da urina que tem como objetivo despistar doenças metabólicas e sistémicas,
diagnosticar patologias do aparelho urinário e diagnosticar, avaliar a atividade e
monitorizar a evolução clínica e a resposta ao tratamento, sendo uma análise muito
completa e com valor semiológico significativo e, por isso, bastante requisitada. (88)
As condições da colheita da urina são extremamente importantes para garantir
resultados válidos, de modo que deve ser colhida a primeira urina da manhã para tubo
coletor ou em alternativa, uma urina com uma retenção de pelo menos 4h. Caso o utente
tenha sido submetido a administração de contraste radiológico, a colheita só deve ser feita
3 a 4 dias depois.
Este exame é constituído pela avaliação física, pela análise bioquímica da urina e
ainda pela análise microscópica do sedimento urinário, através do aparelho Cobas 6500
urine analyzer series (Figura 24).
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O módulo u 601 do cobas 6500 utiliza tiras reativas com resistência ao ácido
ascórbico para realizar a análise bioquímica da urina. Cada tira apresenta 10 zonas
reativas independentes, impregnadas de substâncias químicas e que vão reagir com os
compostos presentes na urina, originando mudanças de cor. O equipamento é capaz de
ler a cor e a intensidade da luz refletida por cada zona reativa, em comprimentos de onda
definidos (465, 528, 560 e 615 nm), por meio da fotometria de refletância, de modo a
transformar essas leituras em resultados específicos.
O aparelho também consegue realizar o exame físico, que inclui a cor e a turvação
da amostra. A cor é determinada por fotometria e a turvação é definida por turbidimetria,
pela medição da transmissão e dispersão da luz que passa pela amostra.
Os parâmetros a determinar são os seguintes:
pH
O teste do ph baseia-se num princípio de duplo indicador e produz um leque de
cores, do laranja ao amarelo e do verde a turquesa, permite a diferenciação do nível do
pH. A contaminação bacteriológica pode conduzir a falsos resultados, no entanto as
proteínas não afetam os indicadores. A tira é composta por vermelho de metilo e azul de
bromotimol (90).
Os valores de referência são os seguintes:
- 5,0-8,0
Esterase Leucocitária
Neste teste, as esterases contidas nos granulócitos hidrolisam um carboxilato
heterocíclico e os fragmentos reagem com sal diazónico para formar um pigmento violeta.
Amostras de indivíduos saudáveis não contêm leucócitos, portanto resultados positivos
são clinicamente relevantes. O limite de sensibilidade são 15 leucócitos/l na urina.
Amostras extremamente coloridas (p.e. Nitrofurantoina) podem afetar a cor na área de
Figura 24. Aparelho Cobas 6500 urine analyzer series [Adaptado de (89)].
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teste, bem como glicose em grandes concentrações ou determinados antibióticos podem
diminuir a sua reatividade. Falsos positivos podem ser causados por amostras
contaminadas com corrimento vaginal. A tira é composta por Derivado heterocíclico
carboxilado e sal diazónico (90).
Tabela 2. Resultados das tiras-teste para a Esterase Leucocitária [Adaptado de (90)]
Tiras Reativas Leucócitos/l
+ 15 (limite de deteção)
++ 70
+++ 125
++++ 500
Nitritos
O teste dos nitritos é baseado no princípio da reação de Griess. Qualquer grau de
coloração laranja-rosa deve ser interpretado como um teste positivo relativamente aos
nitritos, sugerindo 105 organismos em 1 ml de urina, sendo o limite de deteção 0,06
mg/dl. Resultados negativos não constituem regra para uma bacteriúria significativa.
Devem ser negativados sempre que houver evidência de contaminação por secreções
vaginais ou da região balano-prepucial, e, mesmo que a bacteriúria seja
significativamente “positiva” (≥ 100/μL), em todos os pacientes com esterase negativa e
leucocitúria < 20/μL. As tiras são compostas por 4-ácido arsanílico e N-(naftil)-
etilenodiamina diidroclorido (90).
Proteínas
Este teste baseia-se no “erro proteico” de um indicador de pH. É particularmente
sensível à albumina (três vezes mais sensível) e menos sensível a outras proteínas
urinárias. Normalmente, nenhuma proteína é detetável na urina, apesar de uma
quantidade mínima ser excretada por rins saudáveis. A proteinúria patológica
normalmente produz valores acima dos 30 mg/dl e é persistente. Falsos positivos podem
ser encontrados em urinas fortemente alcalinas (pH>9) de grande densidade. As tiras
contêm azul de tetra-bromofenol (90).
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Tabela 3. Resultados das tiras-teste para as Proteínas [Adaptado de (90)]
Tiras Reativas Proteínas (mg/dl)
Vestígios 10 (limite de deteção)
+ 30 mg/dl / 0,300 g/l
++ 100
+++ 300
++++ 1000
cutoff para a microalbuminúria
Glicose
O teste baseia-se no método específico da glicose oxidase/peroxidase, sendo que
a área reagente não reage com outros açúcares. Normalmente, não se deteta qualquer
glicose na urina, apesar de uma quantidade mínima ser excretada por rins saudáveis. O
limite de deteção são 30 mg/dl (0,30 g/l) e o limiar de absorção renal varia entre 160-200
mg/dl. Glicosúrias normoglicémicas (diabetes renal) surgem na gravidez, com lesão dos
túbulos proximais renais (Síndrome de Fanconi). Glicosúrias hiperglicémicas são comuns
na diabetes mellitus, no Síndrome de Cushing, no hipertiroidismo, no
hiperaldosteronismo primário, hipertensão intracraneana e feocromocitoma. As tiras
contêm glicose oxidase, peroxidase e tolidina hidroclorido (Adaptado de 90).
Corpos cetónicos
O ácido acetoacético e as cetonas reagem com o nitroprussiato de sódio em
soluções alcalinas, originando um complexo violeta (Teste de Legal). Normalmente, a
urina está livre de cetonas, no entanto, concentrações detetáveis podem ser originadas por
stress fisiológico, nomeadamente jejum, gravidez, desporto excessivo, eclampsia,
vómitos e diarreia bem como por uma situação de cetoacidose diabética. O limite de
deteção são 5 mg/dl. As tiras contêm nitroprussiato de sódio (Adaptado de 90).
Urobilinogénio
O teste baseia-se na mistura de urobilinogénio com um sal estável diazóico e é
específico para urobilinogénio e estercobilinogénio. Baixa concentração de
urobilinogénio pode ser resultado de síndromes hiperbilirrubínicas. Níveis elevados
podem indicar icterícia hemolítica, sobrecarga hepática, destruição excessiva de
eritrócitos, produção de urobilinogénio aumentada, função hepática comprometida,
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infeção hepática, envenenamento ou cirrose hepática. O limite de deteção é 1,0 mg/dl
(=1,0 unidade Ehrlich). A tira contém sal diazónico (90).
Pigmentos biliares
O teste baseia-se na mistura de bilirrubina com um sal estável num forte meio
ácido. Normalmente, a bilirrubina não é detetada na urina, portanto pequenas quantidades
conduzindo a uma cor de pêssego são suficientes para indicar um estádio inicial de
doenças do fígado que devem ser posteriormente investigadas. O limite de deteção são
0,2 mg/dl (bilirrubina direta). As tiras contêm sal diazónico (Adaptado de 90).
Eritrócitos
O teste baseia-se na atividade de peroxidação da hemoglobina e mioglobina que
catalisa a oxidação do indicador na presença do peróxido orgânico na área de teste. O
teste é sensível a hemoglobina livre e pode detetar concentrações correspondentes a 5
eritrócitos/l, equivalente a, aproximadamente 0,015 mg de hemoglobina por dl de urina.
O teste apresenta a mesma sensibilidade relativamente à mioglobina. Pontos verdes
(eritrócitos intactos) ou a verde (hemoglobina livre, mioglobina) requerem avaliação
clínica pois o seu significado pode variar de caso para caso. As tiras são compostas de
isopropilbenzol hidroperoxido e tetrametilbenzina diidroclorido (Adaptado de 90).
Tabela 4. Resultados das tiras-teste para os Eritrócitos [Adaptado de (90)]
Densidade
Este teste baseia-se na mudança de cor do reagente de azul-verde para verde-
amarelo ou castanho, dependendo da concentração de constituintes iónicos na urina. A
escala de cores com cores de comparação de 1,000 e 1,030 é otimizada para um pH médio
da urina de 6,00. Urinas fortemente alcalinas (pH>8) ou ácido (pH<6) conduzem a
ligeiras flutuações dos resultados. As tiras são compostas por dibromo-3-hidróxido-4-
isopropil-toluol-sulfoftalaine (89).
A densidade reflete o estado de hidratação e capacidade de concentração.
Tiras Reativas Eritrócitos/l
Vestígios (150 gHb/l)
+ 80
++ 200
+++ 560
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Os valores de referência são os seguintes:
- 1,003-1,030
Cor
A cor da urina faz parte do seu exame físico e os resultados podem variar da
seguinte forma:
- Amarelo pálido: urina diluída (diabetes, consumo excessivo)
- Amarelo: urina normal
- Âmbar: urina concentrada, pigmentos de bilirrubina
- Castanho: bilirrubina, hemoglobina e metahemoglobina
- Verde: bilirrubina oxidada, azul de metileno, fármacos
- Vermelho/rosa: porfirinas, mioglobina, hemoglobina, fármacos
- Laranja: fármacos
- Preto: melanina e ácido homogentísico
Turvação
A turvação ou aspeto faz parte do exame físico e refere-se à transparência da
amostra e os resultados variam da seguinte forma:
- Transparente/límpida
- Semi-turva
- Turva/opaca
- Leitosa
Quando o aparelho não consegue fazer a análise
bioquímica da urina, por não ter amostra suficiente, por
exemplo, a análise é feita manualmente, recorrendo a tiras
Siemens Multistix 10 SG (Figura 25), tiras reativas para
urianálise.
Sempre que surgem variações na avaliação bioquímica
é feito automaticamente o sedimento da urina.
O módulo u 701 do cobas 6500 utiliza pequenas cuvetes onde introduz o
sedimento urinário e realiza a contagem dos elementos figurados, através do método de
citometria de fluxo combinado com a impedância, gravando imagens que podem ser
rapidamente analisadas pelo utilizador.
Os elementos figurados contados pelo aparelho são os descritos de seguida.
Figura 25. Tiras Siemens
Multistix 10 SG [Adaptado de (91)].
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Eritrócitos
A hematúria é clinicamente significativa quando os eritrócitos são superiores a
20-25/l com hemoglobinúria positiva (Figura 26). A origem pode ser glomerular
(associada a acantócitos com proteinúria e cilindros), renal (associada a proteinúria sem
acantócitos nem cilindros) ou urológica/pós-renal (sem acantócitos nem cilindros) (92).
Leucócitos
A piúria refere-se à presença de anormal número de leucócitos na urina (Figura
27), que pode surgir em caso de infeção (92).
Células
Células epiteliais do túbulo renal são maiores que os leucócitos e podem surgir
em grande número na Síndrome Nefrótica. Células epiteliais transitórias são um pouco
maiores que as do túbulo renal e as células epiteliais escamosas (Figura 28) são muito
grandes e podem significar contaminação da amostra com flora da pele (92).
Figura 26. Eritrócitos no sedimento urinário. À direita, acantócitos (100x) [Adaptado de (92)].
Figura 27. Leucócitos segmentados na urina (1000x) [Adaptado de (92)].
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Cilindros
Os cilindros urinários são formados no túbulo contornado distal e no túbulo
coletor. Cilindros hialinos são compostos principalmente por mucoproteína. Também
podem surgir cilindros de eritrócitos, que indica lesão glomerular ou renal ou de
leucócitos, que indica presença de pielonefrite aguda ou glomerulonefrite, e inflamação
do rim em ambos os casos. Cilindros granulares podem surgir devido à acumulação de
células (Figura 29) (92).
Cristais
Alguns cristais podem surgir em utentes saudáveis, tais como os de oxalato de
cálcio, de trifosfato ou de fosfato amorfo. Outros são sempre patológicos, tais como os
de leucina, cistina e tirosina (Figura 30) (92).
Figura 28. Células escamosas (400x) [Adaptado de (92)].
Figura 29. Cilindros urinários: a) hialino b) de eritrócitos c) de leucócitos d) granular (400x) [Adaptado de (92)].
a)
b)
c)
d)
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Bactérias e elementos leveduriformes
As bactérias e os elementos leveduriformes são comuns nas amostras de urina
devido à contaminação da flora da vagina ou do meato uretral ou numa real infeção, mas
não devem ser valorizados nesta análise (92).
Espermatozoides
Os espermatozoides são também contabilizados pelo aparelho, mas não
apresentam valor semiológico (92).
3.3.1. Diagnóstico Imunológico da Gravidez (DIG)
O DIG é um teste qualitativo que permite a deteção da -hCG na urina, de modo
a diagnosticar uma possível gravidez. Esta hormona é uma glicoproteína produzida
durante a formação da placenta, após a fertilização, e aumenta no soro e na urina ao longo
da gestação. É a única hormona exclusiva da gravidez, tornando-a um ótimo marcador no
diagnóstico precoce da gravidez (93).
O kit utilizado, o hCG Pregnancy Test, da Dedicio Medical Test, é qualitativo,
uma vez que apenas deteta a presença da hormona, e recorre ao método de
imunocromatografia numa amostra de urina. Nesta técnica, a amostra migra por
capilaridade sobre uma membrana onde reage com anticorpos, sendo que um resultado
positivo é indicado pela presença de duas linhas coloridas. A primeira linha contém um
anticorpo monoclonal hCG que deteta a presença da hormona hCG. A segunda linha serve
de controlo e é composta por anticorpos policlonais de cabra e partículas de ouro
Figura 30. Cristais urinários: a) oxalato b) trifosfato c) cistina d) leucina e) tirosina. Ampliação de 400x [Adaptado de (92)].
a) b) c)
d) e)
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coloidais, de forma a garantir que a quantidade de amostra seja suficiente e que haja
absorção da mesma na membrana (Figura 31).
Figura 31. Resultados possíveis obtidos com o kit hCG Pregnancy
Test, da Dedicio Medical Test [Adaptado de (94)].
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3.4. Eletroforese das Proteínas
3.4.1. Eletroforese das proteínas séricas
A eletroforese das proteínas séricas tem como objetivo separar as proteínas do
soro em frações, com o interesse de diagnosticar e monitorizar patologias que envolvem
alterações do perfil das proteínas, nomeadamente mieloma múltiplo, síndrome nefrótico
e cirrose (95).
As proteínas são formadas por uma cadeia de aminoácidos unidos por ligações
peptídicas. A combinação de diferentes aminoácidos, bem como a quantidade de
aminoácidos presentes na proteína, resulta em peso e carga elétrica distinta.
O CAPILLARYS 2 FLEX piercing® da Sebia (Figura 32) é um aparelho que
realiza eletroforese capilar, separando as proteínas pelo seu tamanho e outras
propriedades físico-químicas, através do tubo capilar, originando diferentes bandas de um
eletroforetograma (albumina e globulinas alfa, beta e gama). Esta técnica apresenta maior
resolução do que a técnica em gel de agarose, permitindo a separação de bandas pouco
visíveis no método convencional, tais como os picos da β1 (transferrina e hemopexina) e
β2 (complemento C3), resultando num padrão de 6 bandas. É também mais sensível à
deteção de componentes monoclonais em pequenas concentrações, nomeadamente IgA
ou cadeias leves, que podem não ser detetadas pela eletroforese em gel de agarose, devido
à co-migração com a transferrina e o C3. As frações são quantificadas criando um gráfico,
conforme na Figura 32.
Os resultados são sempre expressos em percentagem e concentração das diversas
frações e em forma gráfica.
Figura 32. Eletroforese das proteínas séricas. À esquerda, aparelho automático CAPILLARYS 2 FLEX piercing® da Sebia, à direita, gráfico de corrida eletroforética normal [Adaptado de (96,97)].
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A albumina é a proteína mais abundante no plasma, correspondendo a cerca de
60% da concentração total de proteínas e é sintetizada no fígado. A hipoalbuminemia é
muito inespecífica e pode verificar-se em muitas doenças, em situações de síntese
diminuída (cirrose hepática e hepatite viral), aumento do catabolismo e aumentos das
perdas (pelos rins e intestinos). Os menores níveis de albumina sérica verificam-se na
síndrome nefrótica ou em enteropatias perdedoras de proteínas (Figura 33) (97).
As alfa-1 globulinas são um grupo constituído pela alfa-1-antitripsina,
protrombina, transcortina, globulina ligadora de tiroxina (TBG) e alfa-fetoproteína.
Normalmente, o aumento desta fração deve-se a processos inflamatórios, infeciosos e
imunes, de forma inespecífica (97).
A banda das alfa-2 globulinas é constituída pela haptoglobina, alfa-2-
macroglobulina, ceruloplasmina, eritropoietina e colinesterase. Tal como as alfa-1
globulinas, também se comportam como proteínas de fase aguda (Figura 34) (97).
A alfa-2-macroglobulina é uma das maiores proteínas globulínicas presentes no
plasma e a sua concentração aumenta cerca de 10 vezes ou mais na Síndrome Nefrótica,
já que são perdidas as outras proteínas de peso molecular mais baixo. Nesta situação, o
nível sérico pode ser igual ou superior ao da albumina, conforme a Figura 34 (97).
Figura 33. Perfil eletroforético de situações clínicas em que há redução da fração albumina: Cirrose hepática, à esquerda, e Enteropatia Perdedora, à direita. (A: albumina; α1: alfa-1-globulina; α2: alfa-2-
globulina; β: betaglobulina e γ: gamaglobulina) [Adaptado de (97)].
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A fração das betaglobulinas é formada pelas beta-lipoptoteínas, pela transferrina
e pelo componente C3 do complemento. A transferrina encontra-se aumentada na anemia
ferropénica e na gravidez (97).
A banda das gamaglobulinas corresponde às imunoglobulinas. Todas as classes
de Igs são formadas por duas cadeias pesadas (G, A, M, D e E) e duas cadeias leves
(kappa ou lambda), conforme a Figura 35. O soro é a amostra de eleição para esta
determinação exatamente para evitar o aparecimento da banda do fibrinogénio nesta
região onde geralmente migram as imunoglobulinas (97).
A fração gama apresenta três principais padrões eletroforéticos (97):
- Pico policlonal: representa a resposta imunológica simultânea de diversos clones
plasmocitários a determinado estímulo antigénico, seja inflamatório, imune ou infecioso,
Este padrão aparece como aumento difuso da fração gama, representado pela presença de
uma curva de base larga, demonstrando a produção de todas as classes de
imunoglobulinas (Figura 36a).
- Pico monoclonal: consiste no aumento homogéneo da fração gama, que
representa a produção por um único clone plasmocitário de um tipo específico de
imunoglobulina, levando à produção de uma curva de base estreita conhecida como pico
Figura 34. Perfil eletroforético das proteínas de fase aguda (à esquerda) e na Síndrome Nefrótica (à direita) [Adaptado de (97)].
Figura 35. Estrutura esquemática de Ig [Adaptado de (97)].
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monoclonal (Figura 36b). No mieloma múltiplo, a eletroforese de proteínas séricas faz
parte dos critérios de diagnóstico.
- Hipogamaglobulinemia/agamaglobulinemia - consiste na redução do nível das
gamaglobulinas, geralmente sem alteração significativa nas outras frações. É sugestiva
da variante de cadeia leve do mieloma múltiplo (cerca de 20% dos casos de mieloma, no
qual o pico monoclonal se encontra na eletroforese urinária e não na sérica, devido ao
componente de cadeia leve exclusivo) (Figura 36c).
O HYDRASYS 2® da Sebia (Figura 37) é um aparelho que realiza a eletroforese
de proteínas e a imunofixação, recorrendo às forças eletroforéticas e eletroendosmóticas
presentes no sistema. A amostra de soro é aplicada no gel de agarose e, em seguida, sofre
a ação de um potencial elétrico gerado por um polo positivo (ânodo) e outro negativo
(cátodo). Esse potencial provoca a migração das proteínas em direção ao ânodo e, de
acordo com o peso molecular e carga elétrica, elas percorrem distâncias distintas,
originando diferentes bandas de um eletroforetograma (albumina e globulinas alfa, beta
e gama). Em seguida, é realizada a imunoprecipitação e a fixação com anti-soros. Após a
imunofixação, as frações proteicas são reveladas corando as bandas, que se apresentam
conforme a Figura 38.
a) b)
c)
Figura 36. Perfil eletroforético de a) pico policlonal b) pico monoclonal c) hipoglobulinemia/agamaglobulinemia [Adaptado de (97)].
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3.4.2. Eletroforese das proteínas urinárias
A eletroforese das proteínas urinárias tem como objetivo fazer uma avaliação
qualitativa da proteinúria, sendo bastante importante na suspeita de proteinúria de
sobrecarga. Identifica picos monoclonais na fracção gama, relacionados com a presença
de cadeias leves de imunoglobulinas (Proteínas de Bence-Jones - PBJ) e característicos
das discrasias plasmocitárias. A PBJ é formada por dímeros de cadeias leves (kappa e
lambda) de imunoglobulinas monoclonais encontradas na urina. A presença ou a ausência
da proteína de Bence Jones na urina depende da taxa e da quantidade de síntese de cadeias
leves e do estado renal do paciente, tendo em conta que a proteinúria de Bence Jones tem
um efeito nefrotóxico. Pacientes com mieloma que secretam só proteína de Bence Jones
têm prognóstico pior, sendo que os com Mieloma de cadeias lambda têm prognóstico pior
do que os de cadeias kappa (99).
A associação da eletroforese à imunofixação, obtida com o kit Hydragel Bence
Jones pelo aparelho HYDRASYS 2® da Sebia (a amostra pode ser urina ou soro), permite
identificar o tipo de cadeia em causa (k ou λ), aumentando a sensibilidade para deteção
da paraproteína (Figura 38). Os valores de referência são os seguintes:
Soro (Imunoturbidimetria):
- Cadeia kappa: 170-370 mg/dl
- Cadeia lambda: 90-210 mg/dl
- Razão K/Lambda: 1,3-2,7
Urina (Nefelometria):
- Cadeia kappa: <9,0 mg/L
- Cadeia lambda: <5,0 mg/L
Figura 37. Aparelho HYDRASYS 2® da Sebia [Adaptado de (98)].
Figura 38. Eletroforese em gel obtida com o kit Hydragel Bence Jones pelo aparelho HYDRASYS 2® da Sebia [Adaptado de (100)].
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3.5. Lipidograma
O HYDRASYS 2® da Sebia (Figura 37) determina ainda o lipidograma. Esta é
uma análise muito útil no diagnóstico de dislipidémias e é muito importante já que estas
estão associadas a aterosclerose e a processos trombóticos. Trata-se da separação e
quantificação das maiores lipoproteínas encontradas no soro (com colheita em jejum de
10-12h), nomeadamente as quilomícrons, as beta-lipoproteínas (LDL), pré-beta-
lipoproteínas (VLDL) e as alfa-lipoproteínas (HDL) (101).
A análise é feita por eletroforese em gel, conforme a Figura 39, e em todos os
ensaios deve ser incluída uma amostra de referência com valores normais de colesterol
e triglicéridos. Em seguida, a leitura por densitometria permite definir concentrações
relativas de cada fração obtida.
Os valores de referência são os seguintes:
- Beta-lipoproteínas (LDL): 42,3 a 69,5%
- Pré-beta-Lipoproteínas (VLDL): 2,0 a 31,2%
- Alfa-Lipoproteínas (HDL) 15,1 a 39,9%
Figura 39. Eletroforese em gel obtida com o kit Hydragel 7 LIPO +Lp (a) pelo
aparelho HYDRASYS 2® da Sebia
[Adaptado de (102)].
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4. RADIOIMUNOENSAIO (RIA)
O Radioimunoensaio é uma área do LJC que se dedica ao estudo bioquímico e
avaliação funcional dos eixos endocrinológicos e ainda ao estudo laboratorial da doença
alérgica e das atopias. É uma área muito específica do laboratório e que segue uma série
de regras de segurança devido ao facto de trabalhar com isótopo radioativo, o 125I. Trata-
se de um método muito específico, por recorrer a uma reação imunológica, e ao mesmo
tempo muito sensível, devido à utilização de radioisótopos. O Contador de Raios Gama
Wallac Wizard (Figura 40) é um equipamento que utiliza como radioisótopo o 125I, sendo
constituído por um cristal de iodeto de sódio, um condutor de luz, um escudo de chumbo
e um tubo fotomultiplicador. No detetor de cintilação com cristais de iodeto de sódio, a
absorção da radiação produz excitação e ionização, convertendo essa energia em luz
visível ou ultravioleta que vai atingir o fotomultiplicador. Este transforma as cintilações
em impulsos elétricos que são medidos (103, 104).
A intensidade da radiação gama emitida é direta ou inversamente proporcional à
concentração do analito presente na amostra, dependendo do tipo de técnica. Para o
cálculo da concentração, recorre-se a uma curva de calibração.
Radioimunoensaio competitivo
No radioimunoensaio competitivo, o antigénio é marcado com um isótopo
radioativo que compete com o antigénio presente na amostra pela ligação ao anticorpo
anti-analito que reveste o tubo do ensaio. As concentrações de anticorpo específico e do
antigénio marcado são fixas e quando é atingido o equilíbrio de reação, são removidos os
conjugados não reativos. Neste caso, a quantidade de antigénio marcado com o isótopo
radioativo ligado ao anticorpo é inversamente proporcional à concentração de antigénio
presente na amostra.
Figura 40. Contador de Raios Gama Wallac Wizard [Adaptado de (104)].
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75
Alguns dos parâmetros realizados por este equipamento são brevemente descritos
abaixo na tabela 5.
Tabela 5. Descrição de análises executadas por radioimunoensaio competitivo [Adaptado de (105, 106)].
Analito Amostra Descrição Valores de Referência
11-Desoxicortisol Soro
Esteroide intermediário
na biossíntese de
glucocorticoides.
Variação circadiária.
Normal: 7,2 nm/L (2,55
ng/ml)
17-OH
Progesterona (17-
OHP)
Soro ou no
líquido
amniótico
Hormona esteroide C-
21 produzida pela 17-
hidroxipregnenolona
na adrenal e também
nos ovários, testículos e
placenta
Homens: 0,59 – 3,44 ng/ml
Mulheres:
- Fase Folicular: 0,11 – 1,08
- Fase Luteínica: 0,95 –
5,00
Gravidez:
- Primeiro Trimestre: 2,50 –
9,78
- Segundo Trimestre: 3,40 –
8,50
- Terceiro Trimestre: 4,53 –
18,86
Recém-nascidos: 2,67
Aldosterona Soro e urina
24h
Hormona sintetizada
nas glândulas
suprarrenais e que tem
como alvo os rins,
sendo responsável por
regular o equilíbrio
eletrolítico. Esta
hormona tem um papel
importante na
manutenção da pressão
arterial e do ph
Soro:
- Manhã: 49,3-175 pg/ml
- Em estado vertical há pelo
menos 2 horas: 34,7-275
pg/ml
Urina de 24h: 2,84-33,99
g/dia
AMP cíclico Urina ou
plasma
Segundo mensageiro
no sinal de transdução
de várias hormonas,
nomeadamente
adrenalina, ACTH, LH,
FSH, glicagina e
calcitonina
Urina: 2,82 1,71 nmol/ml
4,25 – 1,42 mol/g
creatinina
Plasma: 16,4 3,32
pmol/ml
Estrona-E1 Soro ou plasma
Hormona estrogénica
secretada pelo ovário e
é produzida a partir da
androstenediona.
Homens: 10-60 pg/ml
Mulheres:
Fase Folicular: 50-100
Fase Luteínica: 100-300
Menopausa: ND-60
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Ensaio imunoradiométrico (IRMA)
No ensaio imunoradiométrico (IRMA), utiliza-se um anticorpo marcado com o
isótopo radioativo. Nesta reação são usados dois anticorpos específicos para o antigénio
a dosear. O anticorpo encontra-se associado a uma fase sólida (em esferas ou a revestir
os tubos de reação), formando um complexo com o antigénio. O anticorpo marcado é
adicionado posteriormente para reagir com o complexo Ag-Ac. Quando é atingido o
equilíbrio da reação, são removidos os excessos que não reagiram. Neste caso, as
concentrações do anticorpo e do anticorpo marcado são constantes, de modo que a
concentração de antigénio da amostra é diretamente proporcional à concentração de
anticorpo marcado.
Alguns dos parâmetros realizados por este equipamento são brevemente descritos
abaixo, na tabela 6.
Tabela 6. Descrição de análises executadas por ensaio IRMA [Adaptado de (105, 106)]
Analito Amostra Descrição Valores de Referência
Auto anticorpos
contra os recetores
da acetilcolina
(ARAb)
Soro ou plasma
Responsáveis pela
fraqueza muscular e
fadiga da miastenia
gravis
<0,25 nmol/L– negativo
0,25–0,4–indeterminado
>0,4 – positivo
Arginina
Vasopressina -
ADH
Plasma
Produzida pelo eixo
hipotálamo e libertada
pela hipófise.
responsável por regular a quantidade
de água no sangue
Normal: 6,7 pg/ml
Renina ativa Plasma
Ativa o sistema
renina-angiotensina
através da clivagem de
angiotensinogénio.
regulação da pressão
arterial e o controlo da
filtração glomerular
Posição ereta:
1,3-13,8 pg/ml
Decúbito dorsal:
1,0-8,2 pg/ml
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5. QUIMIOLUMINESCÊNCIA
No laboratório JCS, a área da RIA é responsável por realizar os ensaios de
quimioluminescência, um método em que um tipo de reação química é processado de
modo a gerar energia luminosa. Durante essa reação, os reagentes passam para estados
eletronicamente mais excitados e, consequentemente, ao passarem para um estado menos
excitado, libertam energia sob a forma de luz. O IMMULITE® 2000 (Figura 41) é um
equipamento de imunoensaio que utiliza este método para analisar vários parâmetros.
Para cada um deles, recorre a uma fase sólida, composta por uma esfera de poliestireno
revestida com uma camada de anticorpos específicos (mono ou policlonais), e uma fase
líquida. A esfera é dispensada num tubo de reação que funciona como reservatório da
reação imunológica e onde ocorre a lavagem, incubação e emissão do sinal de leitura.
Neste método, a esfera é revestida com o anticorpo e é incubada com a amostra que
contém o antigénio a analisar. Após realizar a lavagem, adiciona-se o anticorpo específico
marcado com fosfatase alcalina e forma-se assim um complexo Ac-Ag-Ac-enzima, em
fase sólida. Depois da incubação, a esfera é lavada por rotação sobre o seu eixo vertical,
provocando a passagem do líquido para as paredes do tubo. Este líquido é recolhido numa
câmara, havendo assim a separação entre a fase líquida e a fase sólida (ligada). E seguida,
adiciona-se um substrato quimioluminescente que é transformado em produto, na
presença da fosfatase alcalina, e com concentração diretamente proporcional à
concentração do antigénio presente na amostra. Caso se pretenda fazer a pesquisa de
anticorpos, associa-se o antigénio à fase sólida (107).
Figura 41. Aparelho IMMULITE® 2000 da Siemens [Adaptado de (107)].
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78
Alguns parâmetros realizados por este equipamento são os seguintes:
- Delta 4-Androstenediona
- DPD - Desoxipiridinolina
- E3 Livre - Estriol Livre ou não conjugado
- EPO - Eritropoietina
- Estriol (E3) livre ou não conjugado
- Fosfatase Ácida Prostática - PAP
- Gastrina
- Globulina Fixadora da Tiroxina – TBG
- IGF-1 - Somatomedina C
- PAP – Fracção prostática da Fosfatase Ácida
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6. QUÍMICA ANALÍTICA
A Química Analítica é uma área do LJC que se dedica ao estudo laboratorial de
metabolitos, hormonas, vitaminas, elementos traço, neurotransmissores, metais pesados
e outros bioconstituintes através do recurso a sistemas analíticos próprios. Realiza
também a confirmação da presença de drogas ilícitas em diversos produtos biológicos,
bem como a monitorização de fármacos e identificação dos seus metabolitos. Executa
ainda a análise físico-química e espectroscópica do cálculo urinário, vesículo-biliar e
prostático (108).
De seguida são descritos os métodos utilizados para realizar estas análises.
6.1. Cromatografia Líquida de Alta Definição (HPLC)
A Cromatografia Líquida de Alta Definição (High Performance Liquid
Chromatography) é o processo através do qual uma mistura de compostos é separada nos
seus constituintes, utilizando uma fase líquida móvel sob pressão, utilizando colunas com
enchimentos de partículas de dimensões reduzidas e com sistemas de deteção contínua
do eluído. A separação baseia-se não só na relação entre a solubilidade dos solutos nas
duas fases, mas também na sua interação com a fase estacionária (109).
Um sistema de HPLC é constituído por várias partes, nomeadamente um
reservatório de solvente, uma bomba, um injetor, uma coluna de alta eficiência, um
detetor e um computador. Este método é utilizado para a análise de variados parâmetros,
sendo que as características específicas da bomba e da coluna, por exemplo, podem variar.
Assim, devem ser realizadas purgas ao sistema sempre que se troca a técnica.
De forma a obter uma análise quantitativa, é necessário avaliar a área e/ou a altura
dos picos cromatográficos, dados obtidos através de um cromatograma. Para que os
resultados sejam aceitáveis, é necessário recorrer também a calibração e eventualmente a
adição de padrão interno (dependente dos parâmetros). Neste sentido, o traçado gráfico
da curva de calibração representa-se pela concentração do componente i (Ci) em função
da razão das áreas do componente i e do padrão interno (Ai/Ap).
No sistema HPLC Shimadzu (Figura 42), a cromatografia realiza-se geralmente
em coluna de fase reversa (os grupos funcionais da fase estacionária são apolares) em
sistema isocrático ou gradiente de solventes, cuja deteção varia consoante o parâmetro
que queremos determinar.
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80
A tabela 7 enuncia vários parâmetros analisados por este método, bem como
algumas especificidades.
Tabela 7a. Descrição de análises executadas por HPLC [Adaptado de (111)].
Analito Amostra Tipo de HPLC Valores de Referência
Ácido
Vanilmandélico Urina
Sistema isocrático
com deteção Eletroquímica
<13,6 mg/24h
Hidroxiprolina Urina e Soro
Sistema isocrático
com deteção espectrofotométrica
no visível
16,0-40,0 mg/24h
Metanefrinas Urina
Sistema isocrático
com deteção
eletroquímica Até 1000,0 g/24h
Catecolaminas Urina e
Plasma
Sistema isocrático
com deteção eletroquímica
Urina
(g/24h)
Noradrenalina:
até 97,0
Adrenalina: até 27,0
Dopamina:
até 500,0
Plasma
(pg/mL)
Noradrenalina: até 420,0
Adrenalina:
até 84,0 Dopamina:
até 85,0
Serotonina Soro e Urina
Sistema isocrático
com deteção eletroquímica
117,5-193,3 g/L
Porfirinas
Urina,
Plasma e
Fezes
Deteção por fluorescência
Urina: <150 g/24h
Plasma: <32,5 g/L
Fezes: <123,8 g/g fezes
Vitamina A e E Soro
Sistema isocrático
com deteção espectrofotométrica
no visível
Vitamina A: 30-80 l/dl
Vitamina E: 500-1800 l/dl
Figura 42. Sistema HPLC Shimadzu [Adaptado de (110)].
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Tabela 7b. Descrição de análises executadas por HPLC [Adaptado de (111)]
Vitamina B6 Soro
Derivatização em
coluna. Deteção por fluorescência
3,6-18,0 ng/mL
Vitamina B1 Sangue
total
Deteção por
fluorescência 28,0 a 85,0 g/L
Vitamina B2 Sangue
total
Deteção por
fluorescência 137 – 370 g/L
Carotenos Soro Sistema isocrático
com deteção no
visível
P.e: -carotenos: 100,0 a 850,0 ng/mL
Benzodiazepinas
e
Antidepressivos
tricíclicos (AT)
Soro
Sistema isocrático com deteção
espectrofotométrica
no visível
Benzodiazepinas
(ng/ml): Alprazolam:
5-50
Diazepam: 200-2000
AT (ng/ml):
Amitriptilina:
50-300 Maprotilina:
100-250
Aminoácidos Soro e Urina
Deteção por fluorescência
P.e: Tirosina
Soro: Adulto: 0,40-1,57 mg/dl
Urina: Adulto 12-55 mg/24h
6.2. Espectrofotometria de Absorção no Infravermelho
A espectrofotometria de absorção no infravermelho é usada para determinar a
composição química dos cálculos renais e biliares. Neste método, a radiação passa por
um divisor de feixe (beamsplitter) que a divide em duas direções, em ângulos retos. Um
dos feixes de radiação é enviado para um espelho fixo e volta para trás e o outro é enviado
para um espelho móvel. O movimento do espelho móvel torna variável a distância total
percorrida pela radiação em relação à do espelho fixo e quando os dois feixes de radiação
(procedentes dos espelhos) se encontram de novo no divisor do feixe, recombinam-se.
No entanto, a diferença entre as distâncias percorridas origina interferências construtivas
e destrutivas, que se refletem num interferograma (Figura 43). Estas interferências
devem-se a vibrações específicas de alongamento e deformação, bem como às relações
entre os grupos funcionais e a molécula, em consequência da absorção ou ausência de
absorção de radiação infravermelha (IV). O espectro de absorção obtido é extremamente
complexo e característico (112).
Desta forma, compara-se o espetro obtido com a biblioteca dos espetros puros e
assim é possível estabelecer a presença ou ausência bem como a percentagem de certos
grupos funcionais e identificar a natureza do cálculo.
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82
O Perkin-Elmer 500 RXI FT-IR (Figura 43) é um aparelho automático que utiliza
esta metodologia e que trabalha na zona do IV médio, sendo a sua lâmpada constituída
por uma bobina de fio de Nicromo.
Antes de ser sujeito a esta análise química, o cálculo é analisado quanto às suas
características físicas: número de cálculos, peso, dimensões, forma, cor, depósitos
superficiais e estrutura interna. De seguida, sofre um tratamento com base na técnica da
“pastilha”. Nesta técnica, com a ajuda de um pilão e almofariz, uma pequenina parte da
amostra é misturada e pulverizada com brometo de potássio em pó e depois é sujeita a
uma grande pressão através de uma prensa, de modo a produzir um disco transparente.
Este disco é então introduzido no aparelho e é feita a leitura.
Normalmente, os cálculos renais são compostos por oxalato de cálcio
monohidratado, fosfato de amónio magnesiano e fosfato tricálcico e os cálculos biliares
são compostos por ácidos biliares ou colesterol.
6.3. Espectrofotometria de Absorção Atómica
A espectrofotometria de absorção atómica é um método de absorção específica e
quantitativa por parte de um elemento mantido no estado de vapor atómico através de
energia calorífica. Esta energia é conseguida pela radiação de uma lâmpada cujo emissor
(cátodo) contém o elemento a ser medido. Interessa que os elementos absorventes estejam
no estado fundamental de modo a poderem absorver radiação. A radiação é então emitida
em vários comprimentos de onda, numa banda estreita, na zona em que o metal tem o seu
máximo. Este corresponde à energia necessária para a transição eletrónica do estado
fundamental a um estado excitado, sendo assim característico de cada elemento. A
amostra sofre dessolvatação, vaporização e atomização, que ocorre no forno de grafite
(115).
Figura 43. Determinação do interferograma. À esquerda: Sistema Perkin-Elmer 500 RXI FT-IR. À direita: Espetro IV do oxalato de cálcio monohidratado (muito comum nos cálculos renais) [Adaptado de (113, 114)].
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83
A absorção de radiação é diretamente proporcional à concentração da solução
distribuída na câmara, sendo medida pela diferença entre o sinal transmitido ao detetor
na presença e na ausência do elemento a determinar. Para obter os valores da
concentração recorre-se a uma curva de calibração preparada inicialmente com soluções-
padrão.
O Espectrofotómetro de Absorção Atómica Shimadzu AA 6800 (Figura 44)
utiliza esta metodologia e determina o alumínio no soro, o chumbo na urina e no sangue
total, o selénio no soro, o cobre na urina, o cádmio no sangue total, o crómio no soro e na
urina, o mercúrio no sangue total e na urina e o níquel no soro e na urina.
6.4. Espectrometria de Emissão Ótica por Plasma Acoplado
Indutivamente (ICP)
Este tipo de espectrometria baseia-se na excitação de átomos ou iões livres no
estado gasoso e a consequente emissão de radiação eletromagnética, conseguida pelo
retorno dos eletrões excitados ao seu estado fundamental. A amostra é introduzida no
plasma (conseguido através de uma fonte corrente de árgon), nebulizando-a sob a forma
de aerossol e este é transportado para a zona aquecida, onde é submetido a dessolvatação,
a volatilização para níveis moleculares e a dissociação em átomos, em que alguns são
ionizados. O vapor atómico resultante apresenta-se no estado fundamental de energia e
uma parte é excitada ou ionizada. Ao regressarem ao estado fundamental, os átomos e
iões excitados emitem energia, que é medida na cauda do plasma através de um
espectrofotómetro. Recorrendo a uma curva de calibração, é possível calcular a
concentração do analito na amostra (117).
Figura 44. Espectrofotómetro de Absorção Atómica Shimadzu AA 6800 [Adaptado de (116)].
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O Varian Vista MPX – ICP/OES (Figura 45) utiliza esta metodologia e determina
o alumínio no soro, o chumbo na urina e no sangue total, o selénio no soro, o cobre na
urina, o cádmio no sangue total, o crómio no soro e na urina, o mercúrio no sangue total
e na urina e o níquel no soro e na urina.
6.5. Espectrofotometria de Absorção no Ultravioleta e no Visível
A espectrofotometria de absorção no UV-VIS é um método de medição da
intensidade da luz em função do comprimento de onda, cuja fonte de radiação pode ser
de tungsténio ou halogénio (zona do visível) ou de deutério ou hidrogénio (zona do
ultravioleta. Os testes em si podem ser de ponto final, cinéticos, complexométricos e
enzimáticos (119).
O Espectrofotómetro Genesys 5 UV-VIS (Figura 46) utiliza esta metodologia para
determinar analitos tais como a glucose-6-fosfato desidrogenase no sangue total, os
oxalatos na urina, a xilose no soro e urina, a D-glucose/D-frutose no sangue total e a
lactato desidrogenase no soro, plasma, LCR e derrames.
Figura 45. Equipamento Varian Vista MPX – ICP/OES [Adaptado de (118)].
Figura 46. Espectrofotómetro Genesys 5 UV-VIS [Adaptado de (120)].
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6.6. Cromatografia Gasosa/Espectrometria de Massa (GC/MS)
A cromatografia gasosa é um método que separa as substâncias voláteis arrastadas
por um gás, através de uma fase estacionária. A fase estacionária pode ser sólida ou
líquida, permitindo a distribuição dos componentes da mistura entre as duas fases, por
meio de processos físicos e químicos como a adsorção, partição, permuta iónica, exclusão
ou afinidade. A fase móvel é um gás (geralmente hidrogénio, azoto, hélio ou árgon), que
transporta a amostra desde a coluna até ao detetor (121).
A espectrometria de massa é um método que estuda as massas de átomos ou
moléculas após a formação de iões na fase gasosa e separação de acordo com a razão
massa/carga (m/z). Com isto, obtém-se um espectro de massa, um gráfico que mostra a
abundância relativa de fragmentos que atingiram o detetor (Figura 47).
A Cromatografia Gasosa acoplada à Espectrofotometria de Massa é um método
analítico que combina as características de cromatografia gasosa e da espectrofotometria
de massa para identificar substâncias diferentes dentro de uma amostra. O equipamento
Shimadzu GCMS QP2010 (Figura 47) utiliza esta técnica para determinar substâncias no
soro e na urina tais como a cocaína, o LSD, os opiáceos, as anfetaminas e os canabinóides.
Teste Respiratório do Helicobacter pylori
A técnica de espectrometria de massa é ainda utilizada no Teste Respiratório do
H. pylori (kit Pylobactell) para determinar a atividade da ureia, que é indicativa da
Figura 47. Determinação de substâncias por GC/MS. À esquerda, equipamento Shimadzu GCMS QP2010. À direita, espetros de GC
(acima) e MS (abaixo) da cocaína na urina [Adaptado de (122,123)].
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presença de Helicobacter pylori. A 13C-ureia, na presença da enzima urease, sofre
hidrólise e o CO2 libertado, marcado isotopicamente, é detetado na amostra de ar
expirado. O teste é constituído por duas colheitas, uma realizada no tempo zero (basal) e
outra realizada 30 minutos após a ingestão de uma solução com 13C-ureia (positivo). Caso
o Helicobacter pylori esteja presente e ativo no estômago, fará a decomposição da 13C-
ureia, sendo detetado no CO2 expirado. O equipamento HeliFAN lê as duas amostras e
determina a diferença de forma automática, se for superior a 3,25 o resultado é positivo
(124).
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7. MICROBIOLOGIA
A Microbiologia é uma área que realiza o estudo laboratorial das doenças
infeciosas de etiologia bacteriana, micológica e parasitológica, através do exame
morfológico direto, do isolamento, identificação e determinação da resistência aos
agentes antimicrobianos e dos microrganismos presentes em diferentes amostras
biológicas. Complementarmente também realiza testes para a monitorização da eficácia
da terapêutica antibiótica.
De seguida são descritos os procedimentos realizados nesta área do LJC, por
produto biológico (14).
7.1. Hemocultura
A hemocultura é uma análise cujo objetivo é pesquisar bactérias no sangue, sendo
útil para ajudar no diagnóstico de infeção sistémica. De forma a aumentar a probabilidade
de detetar as bactérias, por norma são pedidas duas ou mais hemoculturas e colhidas como
amostras consecutivas. Para complementar o estudo, podem ser feitos exames culturas
da urina, expetoração ou LCR para identificar a origem da infeção inicial, quando a
pessoa tem sintomas associados a infeção urinária, pneumonia ou meningite. O
procedimento difere consoante a pesquisa seja direcionada para bactérias aeróbias ou
anaeróbias, conforme descrito abaixo.
7.1.1. Aerobiose
- Amostra: frasco para hemocultura em aerobiose. Conservação até 12h à
temperatura ambiente.
- Equipamento: BacT/ALERT (Figura 48)
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
Quando o resultado do sistema BacT/ALERT é positivo prossegue-se para o
exame cultural. Nestes casos, homogeneíza-se o conteúdo do frasco, desinfeta-se a tampa
de borracha com álcool a 70º e punciona-se com agulha e seringa. Retira-se 1 ml de
sangue e deita-se duas gotas no meio de Columbia. Incuba-se 24h a 35±2°C e observa-se
as colónias.
O frasco deve ser colocado na estufa e o processo deve ser repetido às 24h, 48h e
até ao 7º dia ao passo que não existe desenvolvimento de microrganismos. O resultado
negativo deverá ser expresso como “estéril”.
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Resultados positivos podem ser bacteriemias em geral, endocardites e sepses. No
entanto, estes resultados devem ser interpretados com cautela, devido à possibilidade de
contaminação. Resultados negativos não implicam necessariamente ausência de
bacteriemia, devido à possibilidade de presença de fatores inibidores como antibióticos.
7.1.2. Anaerobiose
- Amostra: frasco para hemocultura em anaerobiose (tampa laranja). Conservação
até 12h à temperatura ambiente.
- Equipamento: BacT/ALERT
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
Quando o resultado do sistema BacT/ALERT é positivo prossegue-se para o
exame cultural. Nestes casos, procede-se da mesma forma que em 7.1.1. Aerobiose, no
entanto, as placas são colocadas no GenBag ANAER (bioMérieux®). Incuba-se 48h a 72h
a 35±2°C e compara-se com frasco de aerobiose ou sementeira em aerobiose em meio
Columbia.
O processo também deve ser repetido às 24h, 48h e até ao 7º dia ao passo que não
existe desenvolvimento de microrganismos. O resultado negativo deve ser expresso como
“estéril”. Resultados positivos devem-se na maioria dos casos a bactérias anaeróbias
facultativas, nomeadamente Staphylococcus spp..
7.2. Urina Assética
A urina assética (ou urocultura, ou exame microbiológico da urina) é examinada
quando se suspeita de infeção urinária, de forma a detetar o microrganismo que está a
Figura 48. Equipamento BacT/ALERT [Adaptado de (125)].
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provocar a infeção. Os microrganismos mais frequentemente responsáveis por infeções
urinarias são os seguintes:
- E. coli
- Proteus spp.
- Klebsiella spp.
- Enterococcus spp.
- Staphylococcus spp.
- Candida spp.
Exame citobacteriológico (citometria de fluxo)
Na análise da urina assética, a primeira fase diz respeito ao exame
citobacteriológico, por citometria de fluxo, recorrendo ao equipamento Sysmex UF-
1000iTM (Figura 49). O citómetro aspira 800 μl de amostra, sendo que em amostras com
pouca quantidade não deve ser realizado o exame citobacteriológico, apenas o exame
cultural, referenciando este facto nas observações do boletim.
A lista de trabalho obtida a partir do equipamento apresenta os seguintes
parâmetros:
- Número de glóbulos vermelhos
- Número de leucócitos
- Número de células epiteliais
- Número de bactérias
A lista indica também a presença de cristais, células epiteliais tubulares, leveduras
e espermatozoides.
O equipamento fornece os seguintes alertas:
- “REV” e “UTI” (>20 WBC/μl e >30 bact/μl)
Figura 49. Equipamento Sysmex UF-1000iTM [Adaptado de (126)].
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90
Todas as amostras com os alertas “REV” ou “UTI”, bem como aquelas com >500
bact/μl, amostras de crianças até aos 6 anos ou urgências devem ser semeadas.
Exame do sedimento urinário (microscopia ótica)
Deve ser realizado o exame do sedimento por microscopia ótica sempre que no
exame citobacteriológico surgem os seguintes alertas:
- Muitas células epiteliais e muitos leucócitos
- Células epiteliais tubulares
- Cristais e presença de eritrócitos
- Leveduras
- “(*)” em todos os parâmetros
Nestes casos, a partir do balão inicial verte-se 10 ml de urina para um tubo de
plástico e centrifuga-se 5 min a 1500 rpm. De seguida, decanta-se o sobrenadante e
monta-se o sedimento entre lâmina e lamela após a homogeneização da amostra. Observa-
se então ao microscópio ótico com ampliação de 400x e faz-se a quantificação por campo.
Para obter o resultado final em μl, deve-se multiplicar pelo fator 5.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meio de cultura: CLED
Com ansa descartável semeia-se fazendo um inóculo vertical e espalmando-o
perpendicularmente a esse. Incuba-se na estufa durante 18-48h (35±2°C). Observa-se as
placas e efetua-se a valorização clínica das amostras de acordo com o número de células
epiteliais, de leucócitos e com a contagem de colónias:
10 Colónias – 1000 UFC/ml (103)
100 Colónias – 10000 UFC/ml (104)
1000 Colónias – 100000 UFC/ml (105)
Considera-se significativo um crescimento >105 UFC/ml (colónias incontáveis).
Em crianças ou diabéticos, sempre que a informação clínica justifique, podem ser
valorizados crescimentos >104 UFC/ml.
De forma conseguir uma identificação inequívoca da bactéria em causa, seguem-
se vários procedimentos, conforme exemplificado de seguida:
Exemplo 1(ver Figura 50 e Anexos):
→ Meio CLED: Bactérias Lac+ (Colónias pequenas e brilhantes)
→ Gram: Gram+
→ Reisolamento em Meio CNA: colónias brancas acizentadas
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91
→ Teste da Coagulase: Coagulase+
Identificação: Staphylococcus aureus
Exemplo 2 (Ver Figura 51 e Anexos):
→ Meio CLED: Bactérias Lac+
→ Gram: Gram-
→ Reisolamento em Meio MCK: Lac+
→ Meio CPSE: Colónias castanhas
Identificação: Echerichia coli
Exemplo 3 (Ver Figura 52):
→ Meio CLED: Bactérias Lac- (Aspeto mucoide)
→ Gram: Gram-
→ Reisolamento em Meio MCK: Lac-
a) b
)
c)
Figura 50. Meios de cultura utilizados para identificação e TSA da bactéria Staphylococcus aureus em
amostra de urina. a) Meio CLED b) Meio CNA c) TSA em meio MHE [Adaptado de (127)].
a) b)
c)
Figura 51. Meios de cultura utilizados para identificação e TSA da bactéria Echerichia coli em amostra de urina. a) Meio CLED b) Meio MCK c) Meio CPSE [Adaptado de (127)].
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→ VITEK: Carta Gram-
Identificação: Klebsiella pneumoniae
Em culturas mistas, a avaliação deve ser feita de acordo com o número células
epiteliais, leucócitos e bactérias e com os dados clínicos disponíveis.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
A identificação e TSA pode ser feita em placa, conforme a Figura 50c (Ver
Anexos) ou diretamente no VITEK. Em ambos os casos é referida a lista de antibióticos
para os quais foi detetada suscetibilidade ou resistência.
7.3. Exsudado Vaginal
O exame do exsudado vaginal serve como auxiliar ao diagnóstico nas infeções
genitais. Na grávida, efetua-se o despiste da colonização por Streptococcus do grupo B
para prevenção da sepsis neonatal precoce.
A pesquisa é orientada para a deteção de:
- Neisseria gonorrhoeae
- Gardnerella vaginalis
- Streptococcus beta-hemolíticos do grupo B (com exsudado perianal)
- Listeria monocytogenes
- Candida spp.
- Trichomonas vaginalis
- Candida albicans
Em situações particulares poderão ser pesquisados outros microrganismos de
acordo com a informação clínica disponível. As bactérias de infeção vaginal com
Figura 52. Amostras de urina em: a) Meio CLED: à esquerda, Klebsiella
pneumoniae; à direita, E. coli b) Meio MCK: Pseudomonas aeruginosa [Adaptado de (127)].
a) b)
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93
exigência de meios específicos de desenvolvimento, que não são despistadas neste ensaio,
devem ser alvo de prescrição específica e orientada (por exemplo Chlamydia e
Mycoplasmas genitais).
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia ANC, Chocolate polyVitex VCAT3 (M4), Gelose
Gardnerella (se sugestivo), Sabouraud (com Gentamicina e Cloranfenicol) (M13), Meio
de Granada/Gelose Strep. B1.
Seleciona-se os meios, faz-se as sementeiras e incuba-se durante 24-48h a 35±2°C
em estufa, sendo que o meio M4 é colocado em estufa de CO2.
Quando não existe desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas”. Quando o
exame direto é sugestivo de vaginose (muitos cocobacilos Gram negativo e o meio de
Gardnerella apresenta hemólise sugestiva – Figura 53a), apresenta-se o resultado como
Gardnerella vaginalis. Caso exista predomínio de outro microrganismo valorizável, é
feita a identificação e respetivo antibiograma.
Exame citológico (microscopia ótica)
Coloca-se um pouco de exsudado entre lâmina e lamela e pesquisa-se ao
microscópio ótico a presença de leucócitos, eritrócitos, parasitas (Trichomonas
vaginalis), formas leveduriformes e filamentosas de fungos. Faz-se a semi-quantificação
da seguinte forma:
- 0 a 5/campo com ampliação 400x – raros
- 6 a 29/campo com ampliação de 400x – alguns
- 30 ou mais/campo com ampliação de 400x – muitos
Exame direto (com coloração de Gram)
Efetua-se a coloração e pesquisa-se ao microscópio ótico a presença e morfologia
de bactérias (Gram positivo ou Gram negativo), bem como formas leveduriformes e
filamentosas de fungos. Refere-se também a presença ou ausência de bacilos de
Döderlein ou Lactobacillus spp. (Figura 53b) e ainda a presença de flora mista sem
predomínio ou flora escassa. Faz-se a semi-quantificação da seguinte forma:
- 0 a 5/campo com ampliação de 1000x – raros
- 6 a 29/campo com ampliação de 1000x – alguns
- 30 ou mais/campo com ampliação de 1000x – muitos
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Exame micológico
Quando não existe desenvolvimento de fungos no meio de Sabouraud, o resultado
é dado como negativo. Quando existe desenvolvimento, é feita a sementeira em meio
Candida ID (CAN2) e o resultado é dado como Candida albicans (se as colónias
apresentam cor azul) ou Candida spp. (se as colónias apresentam cor branca). Caso seja
pedida a identificação específica da levedura, efetua-se o ID-YST.
Exame parasitológico
Quando não se observam Trichomonas, o resultado é dado como negativo.
Quando se observam Trichomonas no exame citológico (Figura 54), é referida a sua semi-
quantificação.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência (apenas realizado se explicitamente requisitado).
a) b)
Figura 53. Exame direto com coloração Gram do exsudado vaginal. a) Células epiteliais rodeadas de cocobacilos gram-, sugestivo de vaginose provocada por Gardnerella vaginallis b) Células epiteliais e bacilos
de Döderlein (Lactobacillus spp.) (1000x) [Adaptado de (128, 129)].
Figura 54. Trichomonas vaginallis em exame citológico vaginal (400x) [Adaptado de (130)].
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95
7.4. Exsudado Faríngeo
O exsudado faríngeo serve de auxiliar de diagnóstico nas infeções bacterianas do
trato respiratório superior. A pesquisa é orientada para o Streptococcus β-hemolítico dos
grupos A, C e G de Lancefield.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1), meio de Todd Hewitt/ Sangue de
carneiro/cavalo (M11), Columbia ANC (M14).
Após semear o meio de Columbia com a zaragatoa, incuba-se o mesmo na estufa
a 35±2ºC durante 24-48h. De seguida, coloca-se a zaragatoa no meio de Todd-Hewitt
com sangue e incuba-se a 35±2ºC durante 18-24h. Depois deste tempo, repica-se então a
partir do meio Todd-Hewitt para uma placa de meio Columbia ANC, que incuba a 35±2ºC
durante 18-24h. Por fim, observam-se as placas e procura-se colónias sugestivas de β-
hemólise.
Caso não exista desenvolvimento de bactérias patogénicas no exame cultural, o
resultado é expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas”
nos meios usuais. No caso de o exame cultural ser positivo, deve ser identificado o
microrganismo com base no procedimento de testes de identificação.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.5. Exsudado Nasal
O exsudado nasal serve de auxiliar de diagnóstico nas infeções do trato
respiratório superior. A pesquisa é orientada para:
- Staphylococcus aureus
- Streptococcus β-hemolítico do grupo A de Lancefield*
- Streptococcus pneumoniae*
- Morexella (Branhamella) catarrhalis*
(*) valoriza-se apenas em casos de culturas puras ou quando a informação
clínica justifica.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1) e Gelose de Chapman (M5).
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96
Em câmara de fluxo laminar semeiam-se os meios com as zaragatoas e incubam-
se em estufa a 35±2°C durante 24-48h. Depois observam-se as colónias.
Quando não existe desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas” nos meios
usuais. No caso de o exame ser positivo, deve ser identificado o microrganismo com base
nos testes.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.6. Expetoração
A expetoração serve de auxiliar de diagnóstico nas infeções bactéricas que causam
pneumonia, já que corresponde à secreção (muco) produzida pelos pulmões e que são
expelidas com a tosse profunda. Os microrganismos mais frequentemente valorizados são
os seguintes:
- Staphylococcus aureus
- Haemophylus influenza
- Streptococcus pneumoniae
- Moraxella catarrhalis
- Klebsiella pneumoniae
- Pseudomonas aeruginosa
- Acinectobacter ou Acinobacter baumannii
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1), MacConkey (M2) e Chocolate Haemophilus
(M3).
Em câmara de fluxo laminar, retira-se do frasco estéril um pouco da amostra, de
preferência com pus ou sangue, com uma ansa descartável, e semeiam-se os meios de
cultura. Preparam-se também duas lâminas. Incubam-se as placas M1 e M2 em estufa a
35±2°C até 48h e a placa M3 em estufa de CO2 a 35±2°C até 48h.
Quando não se verifica desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas”. Caso o
exame seja positivo, é feita a identificação do microrganismo e respetivo antibiograma.
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97
Exame direto (com coloração de Gram)
Depois de secas, fixa-se as lâminas à chama e efetua-se a coloração de Gram.
Observa-se então as lâminas no microscópio ótico com ampliação de 100x para
quantificar as células epiteliais e leucócitos e com ampliação de 1000x para analisar o
predomínio de bactérias da amostra. Faz-se a semi-quantificação (raros, alguns ou
muitos) de células e leucócitos, referindo o predomínio da flora encontrada ou “flora
saprófita habitual”. Paralelamente observa-se as placas com colónias com morfologia
sugestiva.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.7. Exsudado Auricular
O exsudado auricular serve de auxiliar de diagnóstico nas infeções do ouvido. Os
microrganismos mais frequentes são os seguintes:
- Haemophilus influenzae
- Streptococcus pneumoniae
- Streptococcus β-hemolíticos
- Moraxella catarrhalis
- Pseudomonas aeruginosa
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1), MacConkey (M2), Chocolate Haemophilus
(M3) e Gelose de Chapman (M5).
Semeia-se os respetivos meios de cultura com o exsudado e incuba-se as placas
em estufa a 35±2 °C durante 24-48h, tendo em conta que o meio M3 (Chocolate
Haemophilus) incuba na estufa de CO2. Depois observa-se as placas.
Quando não se verifica desenvolvimento de bactérias patogénicas no exame
cultural, o resultado é expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente
patogénicas”. Caso o exame seja positivo, é feita a identificação do microrganismo e
respetivo antibiograma.
Exame direto (coloração de Gram)
Com o exsudado prepara-se duas lâminas, efetua-se a coloração de Gram e
observa-se ao microscópio ótico para pesquisa de bactérias e de formas leveduriformes e
filamentosas de fungos. É feita a semi-quantificação da seguinte forma:
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- 0 a 5/campo de 1000x – raros
- 6 a 29/campo de 1000x – alguns
- 30 ou mais/campo de 1000x – muitos
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.8. Espermocultura
A espermocultura é auxiliar de diagnóstico de infeção do trato genital masculino.
Os microrganismos mais frequentes são os seguintes:
- Neisseria gonorrhoeae
- Enterococcus spp.
- Staphylococcus aureus
- Enterobacteriaceae
Bactérias de cultura difícil como a Chlamydia e Mycoplasma só são estudadas
com pesquisa orientada.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1), Chocolate polyVitex VCAT3 (M4) e
Sabouraud (com Gentamicina e Cloranfenicol) (M13).
Semeia-se os respetivos meios de cultura com a amostra e incuba-se as placas em
estufa a 35±2 °C durante 24-48h, tendo em conta que o meio M4 (Chocolate polyVitex
VCAT3) incuba na estufa de CO2. Depois observa-se as placas.
Quando não existe desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas”. Caso exista
predomínio de outro microrganismo valorizável, é feita a identificação e respetivo
antibiograma.
Exame direto (com coloração de Gram)
Com o exsudado prepara-se duas lâminas, efetua-se a coloração de Gram e
observa-se ao microscópio ótico para pesquisa de bactérias e de formas leveduriformes e
filamentosas de fungos. É feita a semi-quantificação da seguinte forma:
- 0 a 5/campo de 1000x – raros
- 6 a 29/campo de 1000x – alguns
- 30 ou mais/campo de 1000x – muitos
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Quando não se observam microrganismos dar o resultado como “ausência de
microrganismos”.
Exame citológico (microscopia ótica)
Coloca-se um pouco de exsudado entre lâmina e lamela e pesquisa-se ao
microscópio ótico a presença de leucócitos, eritrócitos, parasitas, formas leveduriformes
e filamentosas de fungos. Faz-se a semi-quantificação da seguinte forma:
- 0 a 5/campo com ampliação 400x – raros
- 6 a 29/campo com ampliação de 400x – alguns
- 30 ou mais/campo com ampliação de 400x – muitos
Exame micológico
Quando não existe desenvolvimento de fungos no meio de Sabouraud, o resultado
é dado como negativo. Quando existe desenvolvimento, é feita a sementeira em meio
Candida ID (CAN2) e o resultado é dado como Candida albicans (se as colónias
apresentam cor azul) ou Candida spp. (se as colónias apresentam cor branca). Caso seja
pedida a identificação específica da levedura, efetua-se o ID-YST.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.9. Coprocultura
A coprocultura serve de auxiliar de diagnóstico nas infeções do aparelho
digestivo, nomeadamente as gastroenterites. Os microrganismos mais frequentes são os
seguintes:
- Salmonella sp.
- Shigella sp.
- Campylobacter spp.
- E. coli enteropatogénica (EPEC, crianças)
- Yersinia sp. (se solicitada)
- Candida sp. (se solicitado o exame micológico)
Exame cultural
- Meios de cultura: Gelose Hektoen (M9), Gelose Yersinia [(M10), se pedido],
Selenito F Broth (M12), Sabouraud (com Gentamicina e Cloranfenicol) (M13) e
Campylosel (M15).
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100
Em câmara de fluxo laminar, retira-se uma pequena porção de amostra com o
auxílio de ansa descartável e semeia-se nos meios de cultura selecionados. Incuba-se em
estufa a 35±2ºC durante 24-48h e o meio M15 deve ser colocado numa saqueta GenBag
ANAER na estufa a 42±2ºC durante cerca de 48h. Repica-se o meio líquido de Selenito
para um segundo meio M9 após cerca de 12h, com o auxílio de uma ansa. Observa-se por
fim as placas.
Quando não existe desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “negativo” nos meios usuais para cada uma das bactérias pesquisadas no
exame cultural. Quando o exame é positivo prossegue-se para a identificação e teste de
suscetibilidade aos antibióticos.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência.
7.10. Exame Micológico
O exame micológico serve de auxiliar de diagnóstico em infeções fúngicas
nomeadamente naquelas provocadas por Candida e Aspergillus.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meio de cultura: Sabouraud (com Gentamicina e Cloranfenicol) (M13)
Em câmara e fluxo laminar retira-se a zaragatoa do meio de Stuart ou uma pequena
porção da amostra com o auxílio de uma ansa descartável e semeia-se no meio M13.
Incuba-se a 35±2°C durante 24-48h. Observa-se então a placa do meio seletivo e quando
existe desenvolvimento de colónias esbranquiçadas e cremosas, efetua-se o exame a
“fresco”, colocando com uma ansa uma colónia entre lâmina e lamela, com uma gota de
água.
Caso se observem estruturas redondas ou ligeiramente ovaladas ao microscópio
ótico, prossegue-se com a identificação, fazendo uma repicagem de uma colónia para o
meio de Candida ID2. Incuba-se em estufa a 35±2°C durante 24h. Se for pedido pesquisa
de Aspergillus spp. incuba-se mais 24-48h à temperatura ambiente.
Se existe desenvolvimento de colónias filamentosas, observa-se novamente a
“fresco” e identifica-se as estruturas microscópicas para verificar se correspondem a
Aspergillus.
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101
Quando não existe desenvolvimento de colónias, apresenta-se o resultado como
negativo. Quando se verifica crescimento no meio de Candida ID2, os resultados são
apresentados de acordo com o seguinte:
- Colónias de cor azul-turquesa: exame positivo para Candida albicans
- Colónias rosadas ou acastanhadas: exame positivo para Candida
tropicalis
- Colónias brancas: exame positivo para Candida spp.
Quando é pedida expressamente a identificação do fungo, usa-se as cartas ID-YST
do VITEK2 e o teste de suscetibilidade.
Nos casos em que o exame é positivo para Aspergillus, apresenta-se o resultado
indicando a espécie (em amostras de expetoração e exsudado auricular).
7.11. Exame Uretral
O exame do exsudado uretral auxilia o diagnóstico das infeções genitais e a
pesquisa é orientada para a deteção dos seguintes microganismos:
- Neisseria gonorrhoeae
- Candida spp.
- Trichomonas vaginalis
Em situações particulares poderão ser pesquisados outros microrganismos de
acordo com a informação clínica disponível. As bactérias de infeção genital com
exigência de meios específicos de desenvolvimento, como Chlamydia e Mycoplasma, que
não são despistadas neste ensaio, devem ser alvo de prescrição específica e orientada.
Exame cultural (em câmara de fluxo laminar)
- Meios de cultura: Columbia (M1), Chocolate polyVitex VCAT3 (M4) e
Sabouraud (com Gentamicina e Cloranfenicol) (M13).
Seleciona-se os meios, faz-se as sementeiras e incuba-se durante 24-48h a 35±2°C
em estufa, sendo que o meio M4 é colocado em estufa de CO2.
Quando não existe desenvolvimento de bactérias patogénicas, o resultado é
expresso por “não se desenvolveram bactérias potencialmente patogénicas”. Caso exista
predomínio de outro microrganismo valorizável, é feita a identificação e respetivo
antibiograma.
Exame citológico (microscopia ótica)
Coloca-se um pouco de exsudado entre lâmina e lamela e pesquisa-se ao
microscópio ótico a presença de leucócitos, eritrócitos, parasitas (Trichomonas
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102
vaginalis), formas leveduriformes e filamentosas de fungos. Faz-se a semi-quantificação
da seguinte forma:
- 0 a 5/campo com ampliação 400x – raros
- 6 a 29/campo com ampliação de 400x – alguns
- 30 ou mais/campo com ampliação de 400x – muitos
Exame direto (com coloração de Gram)
Efetua-se a coloração e pesquisa-se ao microscópio ótico a presença e morfologia
de bactérias (Gram positivo ou Gram negativo), bem como formas leveduriformes e
filamentosas de fungos. Faz-se a semi-quantificação da seguinte forma:
- 0 a 5/campo com ampliação de 1000x – raros
- 6 a 29/campo com ampliação de 1000x – alguns
- 30 ou mais/campo com ampliação de 1000x – muitos
Quando se observam diplococcos Gram negativo no exame direto corado pelo
Gram, com morfologia sugestiva de Neisseria gonorrhoeae (Figura 55), e não existe
desenvolvimento no exame cultural, é reportado como “morfologia sugestiva de
Neisseria gonorrhoeae no exame direto sem desenvolvimento no exame cultural”.
Exame micológico
Quando não existe desenvolvimento de fungos no meio de Sabouraud, o resultado
é dado como negativo. Quando existe desenvolvimento, é feita a sementeira em meio
Candida ID (CAN2) e o resultado é dado como Candida albicans (se as colónias
apresentam cor azul) ou Candida spp. (se as colónias apresentam cor branca). Caso seja
pedida a identificação específica da levedura, efetua-se o ID-YST.
Figura 55. Diplococcos GN no exame direto corado pelo Gram, com morfologia sugestiva de Neisseria gonorrhoeae (1000x) [Adaptado de (131)].
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103
Exame parasitológico
Quando não se observam Trichomonas, o resultado é dado como negativo.
Quando se observam Trichomonas no exame citológico, é referida a sua semi-
quantificação.
Identificação e teste de suscetibilidade aos antimicrobianos (TSA)
É referida a lista de antibióticos para os quais foi detetada suscetibilidade ou
resistência (apenas realizado se explicitamente requisitado).
Tabela 8a. Produtos Biológicos e respetivos meios de cultura [Adaptado de (14)]
Hem
ocu
ltu
ra
aero
bio
se p
osi
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a
Hem
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mic
oló
gic
o
Columbia (M1) X x X x x x x x x
MacConkey (M2)
x x
Chocolate
Haemophilus
(M3) X x x
Chocolate
polyVitex
VCAT3 (M4) X x x x
Gelose de
Chapman (M5) x x
Gelose
Gardnerella (M6) X
Schaedler (M7) x
CLED (M8) x
Gelose Hektoen
(M9) x
(2)Gelose
Yersinia (M10) x
*Meio de Todd
Hewitt (M11) x
Selenito F
(M12) x x
Sabouraud
(com
Gentamicina e
Cloranfenicol) (M13)
X x x x x
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Tabela 8b. Produtos Biológicos e respetivos meios de cultura [Adaptado de (14)]
7.12. Pesquisa de Ovos, Quistos e Parasitas
A pesquisa de ovos, quistos e parasitas é feita através da técnica de concentração
pelo formol etil-acetato em tubo com solução conservante e baseia-se na diferença de
solubilidade e de densidade dos diferentes componentes das fezes. A solução de
formaldeído simultaneamente conserva os parasitas e solubiliza os componentes
hidrófilos. A solução de acetato de etilo solubiliza os componentes lipófilos como as
gorduras. A solução de iodo cora diferencialmente as estruturas. Estes meios quando
misturados criam uma suspensão imiscível que após filtração é centrifugada e exibe três
camadas distintas:
- superficial de componente lipófilos
- intermédia formada por detritos de densidade intermédia
- profunda composta por elementos hidrófilos e no fundo do tubo um
sedimento de componentes de alta densidade que inclui os ovos e quistos e larvas
de parasitas.
Realiza-se o ensaio em ambiente com exaustão forçada e com máscara por causa
da utilização de acetato de etilo.
Abre-se o tubo de transporte e adiciona-se 1,25 ml de acetato de etilo e 0,25 ml
de solução de iodo. Acopla-se o tubo de processamento e faz-se uma inversão de 180º ao
conjunto dos dois tubos. Agita-se no vortex durante 10-15s. Filtra-se a suspensão durante
5-10min a 1500-2000G e rejeita-se o sobrenadante. Por fim, junta-se algumas gotas de
solução de iodo e com uma pipeta de plástico ressuspende-se o concentrado de parasitas.
Coloca-se uma gota da suspensão entre lâmina e lamela e observa-se ao
microscópio ótico.
Columbia ANC (M14)
x
Campylosel (M15) x
Meio de
Grabada/Gelose
Strep. B1 (M16) x
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105
- Resultados:
Positivo - Observação de ovos, quistos ou larvas de parasitas corados pelo
iodo. A visualização de um único elemento parasitário por lâmina é suficiente para
afirmar o diagnóstico.
Negativo - ausência de estruturas parasitárias. Os detritos fecais devem
estar sempre presentes.
7.13. Pesquisa de Sangue Oculto nas Fezes (PSOF)
A pesquisa de sangue oculto nas fezes tem o objetivo, como o nome indica, de
detetar a presença de quantidades mínimas de sangue nas fezes, pequenas o suficiente
para não poderem ser vistas a olho nu. É uma análise pedida também para investigar
anemias de causa desconhecida, mas o seu maior intuito é o rastreio do cancro do colon.
As amostras são introduzidas no aparelho OC-Sensor Diana® (Eiken) e lidas
automaticamente. O princípio do método baseia-se na utilização de medição ótica através
de um analisador automático e uma reação de aglutinação em látex. O reagente é
preparado por sensibilização de anticorpos anti-HbAO em partículas de poliestireno em
látex. Quando o reagente é misturado com a amostra, vai reagir com a Hb que esteja
presente por ligação ao anticorpo anti-HbAO, resultando uma reação de aglutinação. O
analisador vai depois detetar a variação na densidade ótica e por correlação com uma
curva de calibração, apresenta resultados quantitativos.
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106
8. BIOLOGIA MOLECULAR
Associada à área da Microbiologia, o LJC dispõe da área das Doenças Infeciosas,
que recorrendo à Biologia Molecular, realiza o estudo qualitativo e quantitativo de
sequências genómicas de ácidos nucleicos específicas de microrganismos potencialmente
patogénicos.
A realização das técnicas nesta área implica um fluxo direcional de marcha em
frente das amostras, sendo que estas circulam da sala 1 (sala de pré-PCR – câmaras de
fluxo vertical classe II-A para manipulação das amostras e outra para manipulação dos
reagentes) para a sala 2 (sala de PCR – termocicladores clássicos de PCR) e desta para a
sala 3 (sala de pós-PCR - equipamentos de deteção dos produtos amplificados). Existe
ainda a área comum onde se encontram os equipamentos fechados, nomeadamente para
PCR-RT e os extratores. As técnicas realizadas seguem, de modo geral, as seguintes fases:
1º Extração
2º Amplificação
3º Deteção do amplificado
De seguida são descritos vários procedimentos e equipamentos utilizados ao longo
das três fases mencionadas. Para além de técnicas de Biologia Molecular, nesta área são
realizados outros testes que serão igualmente descritos.
8.1. Extração de Ácidos Nucleicos
A extração de ácidos nucleicos purificados (DNA e RNA) de amostras de soro,
plasma ou sangue total é feita através do equipamento MagNA Pure LC 2.0 Instrument
(Figura 56). Este equipamento utiliza esferas magnéticas para o isolamento e purificação
dos ácidos nucleicos, escolhendo-se o protocolo, volume de amostra e eluído. No caso
das amostras de soro ou plasma, o volume a pipetar são 200 l e o volume final extraído
é de 100 l. O produto obtido pode ser utilizado para PCR ou RT-PCR (132).
Figura 56. Aparelho MagNA Pure LC 2.0 Instrument [Adaptado de (133)].
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107
8.2. Amplificação e Deteção - PCR
A amplificação dos ácidos nucleicos é conseguida através da técnica de PCR
(Polymerase Chain Reaction) ou q-PCR. Estas técnicas compreendem 3 passos:
Desnaturação, Hibridação e Extensão ou polimerização. Faz-se a amplificação de regiões
específicas do genoma do agente patológico utilizando primers específicos e na q-PCR o
produto amplificado é detetado utilizando corantes fluorescentes. Estes corantes estão
ligados a sondas do oligonucleotídeos que se ligam especificamente ao produto
amplificado durante a amplificação. A monitorização em tempo real das intensidades de
fluorescência durante a q-PCR permite a deteção de produto em acumulação sem reabrir
os tubos de reação após a realização da PCR (Figura 57). Alguns protocolos (p.e. para
deteção de H. pylori) utilizam o “hot-start”, que reduz bastante a frequência de reações
inespecíficas dos primers. O “hot-start” é garantido pela separação dos nucleótidos e da
Taq-polimerase, utilizando uma polimerase modificada quimicamente (TaqF). Esta é
ativada através do aquecimento a 95ºC durante 15 min. Para os diversos Kits de PCR,
existem controlo positivo, controlo negativo e padrão interno. O padrão interno é
normalmente constituído por um fragmento de DNA de uma proteína ubíqua endógena,
como a β-globina, que permita garantir a eficácia do processo de replicação em amostras
negativas para as pesquisas em causa, observando-se sempre a presença do padrão interno
nessas mesmas amostras (134).
Quando se aplicam técnicas em Tempo Real, existem pelo menos 2 comprimentos
de onda distintos para as leituras, sendo um para ler amostras, controlos e calibradores e
o outro para ler os padrões internos. Para avaliar o ciclo de q-PCR, também se deve
observar a temperatura de melting dos controlos positivos, uma vez que esta é especifica
de cada “amplicon”.
O equipamento cobas 4800 System da Roche (Figura 58) combina a técnica de
q-PCR para amplificação e deteção dos ácidos nucleicos. Este aparelho é utilizado para a
Figura 57. Componentes necessários para a realização da RT-PCR e respetivo produto [Adaptado de (135)].
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108
deteção qualitativa da Chlamydia trachomatis e/ou Neisseria gonorrhoeae, HPV, HIV,
entre outros.
O equipamento LigthtCycler 2.0 da Roche (Figura 59) é um equipamento
totalmente automatizado para PCR em tempo real, com determinação da curva de
dissociação (melting) ou quantificação do alvo de ácidos nucleicos (amplicon). Os
resultados são tratados de forma diferente quer se trate de ensaio qualitativo por curva de
dissociação ou ensaio quantitativo por curva de calibração (137).
8.3. Microarrays de baixa intensidade – CLART-Strip
O dispositivo CLART é baseado na amplificação de fragmentos específicos do
genoma viral e sua hibridação com sondas específicas para cada serotipo. A deteção do
produto amplificado por PCR é efetuada através de uma plataforma tecnológica baseada
Figura 58. Equipamento cobas 4800 System da Roche [Adaptado de (136)].
Figura 59. Equipamento LigthtCycler 2.0 da Roche [Adaptado de (137)].
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109
em microarrays de baixa densidade a plataforma consiste em incluir um microarray no
fundo de um poço de placa microtitulada (CLART-Strip- CS).
A hibridação do produto amplificado por PCR é detetada pela formação de um
precipitado insolúvel nas zonas do microarray onde os produtos amplificados foram
capturados pelas sondas. Durante o PCR, os produtos amplificados são marcados com
biotina. Estes produtos hibridizam com as respetivas sondas específicas que se encontram
imobilizadas na superfície do microarray. Depois de incubar com o conjugado
estreptavidina-peroxidase. Na presença de o-Dianisidina, a atividade da peroxidase
metaboliza este composto, formando um precipitado insolúvel nos locais onde ocorreu a
hibridação (Figura 60) (138).
Este teste é utilizado para realizar a Genotipagem de HPV por identificação
genómica, bem como de outras infeções sexualmente transmissíveis.
8.4. Sondas em linha - DNA STRIP
Os testes GenoType baseam-se na tecnologia de DNA STRIP da HAIN
LIFESCIENCE em que o DNA ou RNA é isolado da amostra, amplificado e detetado
através de uma hibridação e reação de fosfatase alcalina numa tira de membrana. Após o
isolamento do DNA, os ácidos nucleicos são replicados seletivamente numa reação de
amplificação. No próximo passo, os amplicons são quimicamente desnaturados, uma vez
que a deteção na DNASTRIP é feita usando DNA de cadeia simples. Durante a reação
Figura 60. Esquema do método de visualização das sondas
CLART-Strip [Adaptado de (138)].
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110
conjugada, o produto especificamente ligado é marcado com a enzima fosfatase alcalina
e é então tornado visível numa reação de deteção colorimétrica. Desta forma, um padrão
de bandas específicas desenvolve-se na DNA STRIP (Figura 61). Usando um modelo de
avaliação específico do teste, o resultado do teste pode ser lido de forma rápida e clara.
Ao usar este ensaio, é possível determinar o genótipo do microorganismo presente, bem
como suas resistências (139).
8.5. ELISA
O teste ELISA da MP Diagnostics é uma prova imunoenzimática para a deteção
de Acs IgG para vírus no soro ou plasma humanos (p.e. HEV). Neste teste, os poços das
tiras de poliestireno da microplaca são revestidos com Ags específicos do vírus. As
amostras diluídas na solução-tampão são incubadas nos poços revestidos. Os Acs anti-
“vírus”, caso presentes, unem-se ao Ags da fase sólida. Após lavagem completa dos poços
adiciona-se aos mesmos anti-IgG humana purificada por afinidade e marcada com
peroxidase do rábano. Este Ac marcado vai ligar-se a todos os complexos Ag-Ac
anteriormente formados e o excesso de Acs não ligados é removido por lavagens. Uma
solução de subtrato com TMB (140).
8.6. ImmunoCAP ISAC sIgE 112
O ImmunoCAP ISAC sIgE 112 é um teste in vitro para a determinação semi-
quantitativa de anticorpos IgE específicos, em soro ou plasma humanos. Destina-se ao
diagnóstico in vitro, como ajuda na identificação de distúrbios alérgicos mediados por
IgE em conjunto com outros resultados clínicos. Este é um teste imunológico de fase
Figura 61. Padrão específico de bandas nas DNA-STRIP para vários genótipos do Mycobacterium [Adaptado de (139)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
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111
sólida em que os componentes alergénicos imobilizados num substrato sólido em formato
de microarray reagem com os IgE específicos na amostra do doente. Após lavagem dos
anticorpos IgE não específicos, é acrescentado o Ac IgE anti-humano marcado com
fluorescência para formar um complexo. Após a incubação, os Acs IgE anti-humanos não
ligados marcados com fluorescência são removidos com uma lavagem. O procedimento
é seguido por uma medição da fluorescência utilizando um scanner de microarrays.
Quanto maior for o valor de resposta, mais Acs IgE específicos estão presentes na
amostra. Os resultados dos testes são analisados e são calculados unidades padronizadas
ISAC para IgE específicos (ISU-E) (141).
8.7. Testes rápidos - Imunocromatografia
Os testes rápidos imunocromatográficos da NADAL são ensaios qualitativos
para a deteção de antigénios específicos de vírus. Existe o teste do vírus Influenza, do
Rotavírus, do Adenovírus, entre outros. Durante a realização do teste, a amostra reage
com a partícula revestida com Acs anti-“vírus”. Os complexos Ag-Ac migram por ação
capilar ao longo da membrana que está pré-revestida com Acs monoclonais direcionados
contra os Ags do vírus da região da linha de teste. No caso de um resultado positivo, ao
fim de 10 min. Surgem duas linhas coloridas (linha controlo e linha teste). No caso de um
resultado negativo surge apenas uma linha colorida (linha controlo). O aparecimento da
linha teste isolada indica um resultado inválido (142).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Higiene e Segurança
112
9. HIGIENE E SEGURANÇA
O LJC segue as normas definidas na legislação, quanto à higiene e segurança. No
que diz respeito ao tratamento dos resíduos existe uma clara organização e gestão de
resíduos hospitalares. Os resíduos hospitalares são diferenciados, segundo o Despacho
N.º 242/96 do Ministério da Saúde, em quatro grupos da seguinte forma (143):
Resíduos não perigosos (Não necessitam de tratamento especial):
Grupo I (Residuos equiparados a urbanos – Ecopontos e lixo comum):
• Resíduos provenientes de serviços gerais como gabinetes, salas de reunião
e de convívio, instalações sanitárias, higiene pessoal, vestiários, etc.
• Embalagens e invólucros comuns
• Resíduos provenientes de atividades de alimentação, resultantes da sua
aquisição, confeção e consumo incluindo restos alimentares não incluídos
no grupo III
• Resíduos provenientes de serviços de apoio como oficinas, jardins,
armazéns, etc.
Grupo II (Resíduos hospitalares não perigosos – Lixo comum):
• Embalagens vazias de medicamentos ou de outros produtos de uso clínico
ou comum, com exceção dos incluídos no grupo II ou no grupo IV
• Fraldas e resguardos descartáveis, papeis protetores de marquesa não
contaminados e sem vestígios de sangue
• Frascos de soro não contaminados, com exceção do grupo IV
Resíduos perigosos:
Grupo III (Resíduos hospitalares de risco biológico – contaminados ou
suspeitos de contaminação):
• Resíduos de provenientes da administração de sangue e seus derivados
• Sacos coletores de fluidos orgânicos e respetivos sistemas
• Material de proteção individual utilizado em cuidados de saúde e serviços
de apoio geral em que exista contato com os produtos contaminados
• Fraldas e resguardos descartáveis contaminados ou com vestígios de
sangue
Os contentores que contêm resíduos perigosos do Grupo III, pretos com tampa
amarela, estão devidamente sinalizados com o símbolo de risco biológico e são usados
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Higiene e Segurança
113
sacos brancos. Estes resíduos poderão ser sujeitos a incineração ou outro pré-tratamento
que permita a posterior eliminação como resíduo urbano.
Grupo IV (Resíduos hospitalares específicos – de inceneração obrigatória):
• Materiais cortantes e perfurantes: agulhas, cateteres e todo o material
invasivo
Materiais cortantes considerados resíduos do Grupo IV são acondicionados em
contentores amarelos pequenos imperfuráveis e também assinalados com símbolo de
risco biológico. Estes resíduos são encaminhados para incineração.
Existe uma empresa externa que se encarrega da recolha e transporte dos resíduos
específicos do laboratório.
Formações de higiene e segurança são organizadas periodicamente para todos os
funcionários, de forma a garantir que todos cumpram as normas estabelecidas.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Controlo de Qualidade
114
10. CONTROLO DA QUALIDADE
O Laboratório Dr. Joaquim Chaves apresenta um sistema de gestão da qualidade
com o objetivo de prestar um melhor serviço ao utente, tendo implementado uma política
de qualidade que defende orientações tão importantes tais como a focalização no serviço
prestado ao utente, a monitorização de funções críticas, a aposta na formação e
qualificação das equipas, o desenvolvimento de relações de parceria, a organização
preventiva e a otimização dos recursos para uma Boa Prática e Conformidade Legal (144).
Neste sentido, o LJC implementou Programas de Controlo Interno e Avaliação
Externa da Qualidade, com auditorias internas e externas, com o fim de monitorizarem e
fazerem a aferição do seu desempenho analítico. Atualmente, o Laboratório está
certificado com base na Norma ISO 9001.
Ao nível do Controlo da Qualidade Interno (CQI), o Laboratório seleciona para
cada sistema analítico o procedimento de CQ mais adequado, seguindo as diretrizes
descritas abaixo. O Controlo da Qualidade Estatístico é uma técnica quantitativa que
serve para comparar o desempenho atual de um ensaio com aquele que é esperado quando
está a funcionar em condições estáveis. O seu principal objetivo é assegurar a qualidade
dos resultados laboratoriais, detetando precocemente, os erros, ou seja, a existência de
algum problema com o seu desempenho, antes que os resultados comecem a sofrer
variações clinicamente significativas (145).
Definir os objetivos da Qualidade
Primariamente são definidos os objetivos da qualidade, nomeadamente o erro
máximo tolerado (ETa%, imprecisão e inexatidão máximas admissíveis) para cada
ensaio, tendo por base especificações da qualidade analítica recomendados
hierarquicamente:
• Modelo Clínico e Biológico: requisitos definidos de forma a que os resultados
não tenham impactos negativos nas decisões clínicas.
• Recomendações Profissionais (Guidelines)
• Recomendações de entidades reguladoras (P.e. CLIA e RCPA)
• Modelo baseado no Estado da Arte: extraído dos 20% melhores laboratórios
participantes na AEQ ou de publicações recentes. Reflete o que é alcançável
em vez do que é desejável.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Controlo de Qualidade
115
Selecionar os materiais de Controlo
Seguidamente são selecionados os materiais de controlo, que podem ter origem
comercial (líquidos ou liofilizados) ou preparados no próprio laboratório a partir de uma
amostra biológica específica ou de um conjunto de amostras representativas. Para a
escolha dos controlos são considerados os seguintes fatores:
- Devem ser estáveis, ter uma matriz homogénea e um comportamento analítico
semelhante ao das amostras biológicas.
- Devem ser de fabricantes diferentes dos fabricantes dos calibradores e dos
reagentes
- A escolha do número de níveis de controlo e sua concentração deve permitir
monitorizar o desempenho do sistema analítico.
Determinar o desempenho do ensaio
O passo seguinte é determinar as características de desempenho do ensaio
(caracterização do estado da arte interno do laboratório):
• Precisão e exatidão. Comparar com:
o Precisão interlaboratorial
o Exatidão (BIAS%)
o EQA requeridas
• Erros (caracterização da instabilidade esperada para o ensaio):
o Natureza: persistentes e intermitentes
o Tipo: sistemáticos/fortuitos ou aleatórios (Tabela d)
o Amplitude ou magnitude
o Frequência com que ocorrem
Imprecisão analítica (CV% ou SD):
A imprecisão é definida como a discordância de valores medidos, obtidos por
medições repetidas no mesmo objeto ou objetos semelhantes em condições específicas,
sendo que na área laboratorial mais propriamente na fase analítica, é definida como a
nível de discordância nos resultados medidos repetidamente no mesmo lote da amostra.
Trata-se do parâmetro crítico mais importante e deve refletir os efeitos de
variabilidade relacionados com:
- Calibrações
- Mudança de reagentes e calibradores
- Manutenção de equipamentos
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Controlo de Qualidade
116
- Diferentes operadores
- Variáveis ambientais (p.e. temperatura e humidade)
A imprecisão analítica é expressa de forma numérica através do desvio padrão (s)
e coeficiente de variação (CV):
Inexatidão analítica (BIAS%):
A inexatidão é a diferença numérica entre o valor medido e o valor verdadeiro.
Trata-se de um parâmetro que exige comutabilidade entre as amostras usadas nos ensaios
de comparação e as biológicas. É importante que os valores “alvo” sejam atribuídos por
um método de referência. Este valor é avaliado por comparação com o valor obtido em
eventos de referência (locais e nacionais ou internacionais).
É recomendável que o laboratório assuma um valor BIAS de zero. Caso se
verifiquem alterações neste valor, deve-se recorrer a:
- Ações corretivas (p.e. calibração)
- Implementação de uma função de correção ou de ajustamento
O BIAS é o parâmetro que avalia o desvio do valor obtido pelo laboratório em
relação ao valor alvo e calcula-se da seguinte forma:
Erro total analítico (Et%):
O erro total analítico representa o erro total máximo que pode ocorrer num
resultado, devido à imprecisão (erro aleatório) e à inexatidão (erro sistemático) do
processo de medição (Figura 62). O erro total é calculado da seguinte forma:
Z - Multiplicador definido com base na distribuição normal reduzida, que varia consoante o nível de
significância escolhido. Normalmente, o erro total é calculado com um nível de significância de 10%
(incluindo 90% da distribuição), o que significa que o valor de Z é de 1,65.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte II
Stefanie Baptista Controlo de Qualidade
117
Determinar o desempenho esperado para o ensaio e os erros críticos As cartas de controlo mostram se um processo está ou não sob controlo estatístico,
mas também é necessário saber se o processo tem capacidade de produzir de acordo com
as especificações estabelecidas para os diferentes métodos.
Métrica sigma (σ):
A métrica sigma permite determinar a instabilidade esperada para o ensaio com
base nos valores da precisão e exatidão próprias do ensaio em função do erro total
máximo admissível adotado. Apresenta as seguintes características:
- Caracteriza o desempenho esperado do método
- Reflete o número de erros inaceitáveis esperados
- Mostra se o desempenho estável do método é adequado para atingir as
metas requeridas
A métrica sigma é calculada da seguinte forma:
σ =(Eta%−BIAS%)
𝐶𝑉% ou σ =
ETa%
𝐶𝑉%
(Na prática assume-se que BIAS=0)
Estratégia de CQI
A estratégia de CQI é definida por:
• Tipo de materiais de controlo (número de níveis e as concentrações –
recomendável 2 níveis no mínimo)
• Número de determinações realizadas nas amostras CQ (recomendável 2
determinações para 2 níveis e 3 para 3 níveis)
Figura 62. Representação esquemática do erro total [Adaptado de (146)].
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Stefanie Baptista Controlo de Qualidade
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• Localização e frequência dos eventos de CQ (devem anteceder a análise das
amostras dos pacientes)
• Regras e limites de CQ (critério de decisão estatístico)
É importante delinear a estratégia de CQI para cada ensaio, equilibrando os
componentes estatísticos e não estatísticos. Inclui-se nos componentes não estatísticos os
seguintes:
• Boas práticas laboratoriais
• Cumprir as instruções dos fabricantes
• Formação dos operadores
• Manutenção dos equipamentos.
Avaliação Externa da Qualidade (AEQ)
A AEQ avalia o desempenho dos sistemas analíticos de um laboratório, por meio
de programas interlaboratoriais realizados por uma entidade externa. Ao participar nestes
programas, o laboratório pretende assegurar que os resultados que obtém para os diversos
parâmetros analisados se aproximam do valor real, através de comparação entre os
laboratórios e promove a confiança nos resultados por parte de todas as partes
interessadas, nomeadamente pessoal do laboratório, utentes e clínicos.
O LJC participa em programas de AEQ, nomeadamente o PNAEQ (Programa
Nacional de Avaliação Externa da Qualidade), promovido pelo INSA (Instituto Nacional
de Saúde Dr. Ricardo Jorge), e o programa do Serviço Nacional de Avaliação Externa da
Qualidade do Reino Unido (UK-NEQAS, do inglês, United Kingdom National External
Quality Assessment Service). Similarmente ao que sucede para o CQI, também no caso
da AEQ existe um plano que descreve o desempenho de cada área analítica para cada
parâmetro.
A execução dos ensaios é feita, sempre que possível, logo após receção das
amostras de modo a cumprir os requisitos de estabilidade e está sujeita aos mesmos
critérios de execução das amostras de rotina. Normalmente os resultados obtidos são
enviados por e-mail ou submetidos no site. Qualquer resultado inaceitável deve ser
investigado e as medições corretivas documentadas.
Todos os resultados do CQI e AEQ são compilados pelo coordenador de controlo
de qualidade, que elabora um relatório mensal a ser avaliado pela Direção Técnica do
LJC, com conhecimento da Administração.
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Parte III
Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
O ESTUDO DA COINFECÇÃO LEISHMANIOSE-HIV EM MULHERES
GRÁVIDAS: PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL E INFEÇÃO
CONGÉNITA
Stefanie Paixão Baptista
Monografia orientada pela Professora Doutora Quirina dos Santos Costa
Mestrado em Análises Clínicas
2018
130
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Resumo
131
Resumo
O estudo da coinfecção Leishmaniose-HIV em mulheres grávidas: prevenção da
transmissão vertical e infeção congénita.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a coinfecção Leishmaniose-HIV
já foi reportada em mais de 35 países, sendo particularmente importante a Este de África,
no Sudeste da Ásia e na América Latina. Esta coinfecção pode manifestar-se na forma
visceral, cutânea e mucocutânea, sendo a segunda a mais comum. No que diz respeito à
mulher grávida, a infeção por HIV torna-a mais suscetível a complicações,
nomeadamente, parto prematuro, limitação do crescimento uterino, desenvolvimento de
anemia severa, aborto e taxa de mortalidade materna e neonatal superiores.
Adicionalmente, a Leishmaniose manifesta-se através de hepatoesplenomegalia marcada,
perda de peso significativa, adinamia, anemia acentuada e hemorragia.
A coinfecção induz um défice nas respostas humorais e celulares do hospedeiro,
limitando o valor de diagnóstico dos testes serológicos nos indivíduos coinfetados. Ainda
assim, o Teste de Aglutinação Direto, o Western Blot e o Teste de aglutinação de látex
podem ser utilizados no diagnóstico destes casos. Todas as terapêuticas para a
Leishmaniose são menos eficazes em indivíduos seropositivos para HIV. Existe uma alta
taxa de mortalidade devido à coexistência das doenças, a complicações e à toxicidade dos
fármacos. De forma a prevenir a infeção congénita, deve ser combinada a Terapêutica
Antirretroviral com a terapêutica para Leishmaniose na mulher grávida.
Nesta monografia, é feita uma revisão acerca dos desafios atuais da coinfecção
Leishmaniose-HIV, com foco principal nas manifestações clínicas, diagnóstico e
tratamento da Leishmaniose.
Palavras-chave: Leishmaniose, HIV, Coinfecção, Epidemiologia, Manifestações
Clínicas, Diagnóstico, Tratamento
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Abstract
132
Abstract
The study of Leishmaniasis-HIV coinfection in pregnant women: prevention of
vertical transmission and congenital infection.
According to the World Health Organization, Leishmaniasis-HIV coinfection has
been reported in more than 35 countries, particularly in East Africa, Southeast Asia and
Latin America. This coinfection may manifest in the visceral, cutaneous and
mucocutaneous forms, the second being the most common. To pregnant women, HIV
infection makes them more susceptible to complications, such as premature birth, delay
in the intrauterine growth, development of severe anemia, miscarriage, and higher
maternal and neonatal mortality rates. In addition, Leishmaniasis manifests through
marked hepatosplenomegaly, significant weight loss, adynamia, marked anemia and
hemorrhage.
This coinfection induces a deficit in the host's humoral and cellular responses,
limiting the diagnostic value of serological tests in coinfected patients. However, Directo
Agglutination Test, Western Blot and Latex Agglutination Test can be used in the
diagnosis of these cases. All therapies for Leishmaniasis are less effective in HIV positive
patients and there is a high mortality rate due to the coexistence of diseases, complications
and drugs toxicity. In order to prevent congenital infection, Antiretroviral Therapy should
be combined with Leishmaniasis therapy in pregnant women.
In this monography, a review is made from the current challenges of
Leishmaniasis–HIV coinfection, focusing mainly on the clinical manifestations, diagnosis
and treatment of Leishmaniasis.
Keywords: Leishmaniasis, HIV, Coinfection, Epidemiology, Clinical Manifestations,
Diagnosis, Treatment
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Objetivos
133
Objetivos
O objetivo da presente monografia passa por analisar a situação da coinfecção por
Leishamania sp e Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV, do inglês, Human
Immunodeficiency Virus), nomeadamente no contexto da mulher grávida, e compreender
o efeito da infeção pelo parasita na transmissão vertical do vírus. Pretende-se ainda
enunciar de que formas a infeção congénita pode ser prevenida, revendo o tratamento
utilizado presentemente para esta coinfeção.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Material e Métodos
134
Material e Métodos
Para a execução desta monografia foram consultadas várias páginas na internet
para a análise e interpretação de vários artigos científicos originais e de revisão,
publicados entre 1991 e 2017.
A pesquisa bibliográfica foi realizada no período compreendido entre fevereiro e
dezembro de 2017. Como fontes de pesquisa foram utilizadas a plataforma Pubmed
(www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/) e as páginas de internet do Centro de Controlo e
Prevenção de Doenças (CDC, do inglês, Centers for Disease Control and Prevention)
(www.cdc.gov) e Organização Mundial de Saúde (WHO, do inglês, World Health
Organization) (http://www.who.int/en/). Para iniciar a procura bibliográfica utilizaram-
se as seguintes palavras-chave: Leishmania sp, HIV, Coinfecção, Gravidez, Revisão.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Introdução
135
INTRODUÇÃO
A Leishmaniose continua a ser uma das mais negligenciadas doenças do mundo,
afetando os mais pobres, maioritariamente nos países em desenvolvimento (1). Trata-se
de uma doença causada por um parasita protozoário do género Leishmania (Figura 1),
que pertence à família Trypanosomatidae e que apresenta mais de 20 espécies. Este
parasita é transmitido aos humanos através da picada de fêmeas de pequenos insetos do
género Phlebotomus (Figura 2) e do género Lutzomyia (mais de 90 espécies conhecidas
transmitem o parasita) (2–5).
Existem três principais manifestações clínicas de Leishmaniose: Leishmaniose
Visceral (LV) também conhecida como Kala-azar; Leishmaniose Cutânea (LC), a forma
mais comum de Leishmaniose, que causa lesões cutâneas; e Leishmaniose Mucocutânea
(LM), levando à destruição parcial ou total das mucosas do nariz, boca e garganta (2).
Para além da transmissão por vetor, a infeção pode ainda ser transmitida através
de seringas partilhadas por toxicodependentes, transfusão sanguínea, infeções venéreas e
através de infeção congénita, ainda que estas mostrem ser muito raras em comparação
com a transmissão por vetor (3).
A infeção por Leishmania sp durante a gravidez é rara, mas merece especial
atenção, uma vez que os casos tornam-se cada vez mais frequentes nas zonas endémicas
e ainda existe pouca informação disponível (6). O potencial fisiopatológico da infeção
por Leishmania sp durante a gravidez tem sido desconsiderado comparativamente a
outros parasitas. Contudo, evidências recentes da pesquisa de doenças infeciosas,
obstétricas e imunológicas aumentaram a compreensão da distribuição anatómica do
Figura 1. Formas promastigotas de Leishmania sp em cultura (1000x). [Adaptado de (4)].
Figura 2. Phlebotomus papatasi, flebótomo responsável pela transmissão do parasita Leishmania
[Adaptado de (5)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Introdução
136
parasita, bem como a resposta imune do hospedeiro em relação a esta população
específica. Estes recentes avanços são paradigmas quanto ao impacto da resposta
imunológica materna à infeção na saúde do feto (7).
O Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV, do Inglês, Human Immunodeficiency
Virus) continua a ser um grande problema de saúde pública global. Trata-se de um
retrovírus direcionado para o sistema imunológico e que enfraquece os sistemas de defesa
contra infeções e alguns tipos de cancro (Figura 3). À medida que o vírus destrói e
prejudica a função das células de defesa, os indivíduos infetados tornam-se gradualmente
imunodeficientes, sendo a função imunológica medida pela contagem de células T CD4+
(8,9). A imunodeficiência resulta no aumento da suscetibilidade a uma grande panóplia
de infeções, nomeadamente a Leishmaniose, cancro e outras doenças que pessoas
saudáveis podem combater (8). O estágio mais avançado da infeção por HIV é a Síndrome
da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), que pode demorar 2 a 15 anos a desenvolver-se,
dependendo do indivíduo. A SIDA é definida pelo desenvolvimento de certos tipos de
cancro, infeções ou outras manifestações clínicas severas (8).
Os sintomas da infeção por HIV variam dependendo do estágio da infeção, sendo
que nas primeiras semanas após a mesma, os indivíduos infetados podem ser
assintomáticos ou demonstrar febre, dores de cabeça, erupção cutânea ou dor de garganta.
Com o progresso da infeção, outros sinais e sintomas surgem, tal como aumento dos
nódulos linfáticos, perda de peso, febre, diarreia e tosse. Sem tratamento, estes doentes
Figura 3. Estrutura do HIV. É possível ver o antigénio gp120, a bicamada lipídica, a matriz
proteica, as proteínas do core, o RNA e a
transcriptase reversa. [Adaptado de (9)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Introdução
137
podem desenvolver doenças graves como tuberculose, meningite criptocócica, infeções
bacterianas graves, linfoma, Sarcoma de Kaposi, entre outras (8).
O HIV pode ser transmitido através da troca de fluidos corporais de indivíduos
infetados, tais como sangue, leite materno, sémen e secreções vaginais. Não existe
transmissão através do contato comum como beijar, abraçar, apertar as mãos ou
compartilhar objetos pessoais, alimentos ou água (8).
No caso da mulher grávida, existe uma relação diretamente proporcional entre
maiores cargas virais e um maior risco de transmissão. Assim, a carga viral materna é o
melhor fator preditivo de transmissão perinatal do HIV. As mulheres grávidas
seropositivas para HIV estão mais suscetíveis a complicações, nomeadamente, partos
prematuros, limitação do crescimento uterino, desenvolvimento de anemia severa, aborto
e taxa de mortalidade materna e neonatal superiores, em comparação com mulheres não
infetadas com o vírus (10,11).
A coinfecção entre Leishmania sp e HIV é prevalente em zonas de sobreposição
de ambas as infeções, sendo particularmente importante a Este de África, no Sudeste da
Ásia e na América Latina (12,13). A maioria dos estudos sobre a coinfecção está
relacionada com a LV e o HIV, pouco se sabe sobre a situação atual da coinfecção LC-
HIV (ou outras manifestações clínicas da Leishmaniose). De facto, o HIV acabou por
afetar a ocorrência de Leishmaniose, nomeadamente a LV, já que aumenta o risco de
desenvolver LV em 100 a 2320 vezes em áreas endémicas, reduz a probabilidade de uma
resposta terapêutica e aumenta consideravelmente a probabilidade de recaída. Ao mesmo
tempo, a LV promove a progressão clínica da doença por HIV e desenvolvimento de
SIDA. Existem alguns fatores relacionados com o hospedeiro e com o ambiente que
podem influenciar a prevalência de LV-HIV. Ambas as doenças exercem um efeito
prejudicial sinérgico na resposta imunológica celular porque atingem células
semelhantes. Este facto contribui para a replicação de ambos os patogénicos, acelerando
a progressão da LV e do HIV. Assim, a imunossupressão é também um importante fator
para o desenvolvimento da LV em indivíduos com HIV que vivem em zonas endémicas
para a doença. Outro fator importante está associado à migração, quando indivíduos se
tornam infetadas em áreas urbanas e posteriormente retornam às áreas rurais onde a LV
é prevalente (12,13).
J. Lauletta et al. assumiram que a maioria dos casos de Leishmaniose ocorrem em
indivíduos seropositivos para HIV porque algumas manifestações clínicas podem ser
confundidas com as de outras infeções oportunistas em indivíduos imunossuprimidos
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Introdução
138
com lesões viscerais ou cutâneas (13). Em geral, é aceite que a incidência global da
coinfecção é subestimada, em parte porque a LV ocorre em populações negligenciadas e
ainda porque não consta na lista de infeções oportunistas do Centro de Controlo e
Prevenção de Doenças (CDC, do inglês, Centers for Disease Control and Prevention) de
modo que raramente é relatada em sistema de notificação de SIDA. Contudo existem
ainda muitas questões por esclarecer relacionadas com a coinfecção Leishmania-HIV e
indiscutivelmente no que diz respeito à coinfecção na mulher grávida.
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
139
1. EPIDEMIOLOGIA
A Organização Mundial de Saúde (WHO, do Inglês, World Health Organization)
estima que 700 000 a 1 milhão de novos casos de Leishmaniose e 20 000 a 30 000 mortes
provocadas pela mesma ocorrem anualmente. De todos os indivíduos infetados com
Leishmania sp, apenas uma pequena fração desenvolverá eventualmente a doença (2).
Segundo os dados de 2016 do Observatório Global de Saúde (GHO, do Inglês Global
Health Observatory data), a Leishmaniose é endémica em 97 países e territórios (14). A
doença afeta maioritariamente pessoas pobres em África, Ásia e América Latina, estando
associada a malnutrição, deslocação populacional, habitação pobre, sistema imunológico
fraco e falta de recursos. A disseminação da doença está associada a mudanças ambientais
tais como a desflorestação, a construção de barragens, a canais de irrigação e a
urbanização (2).
A LV é fatal em 95% dos casos não tratados e fortemente endémica na Índia e a
Este de África, com uma estimativa de 50 000 a 90 000 novos casos por ano, no mundo
inteiro. Em 2015, mais de 90% dos novos casos de LV reportados à WHO ocorreram em
7 países: Brasil, Etiópia, Índia, Quénia, Somália, Sul do Sudão e Sudão (Figura 4) (2,15).
Relativamente à LC, 95% dos casos ocorrem na América, Mediterrâneo, Médio
Oriente e Ásia Central. Mais de dois terços dos novos casos de LC ocorrem em 6 países:
Figura 4. Endemicidade da LV no mundo em 2015, segundo a WHO. [Adaptado de (2)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
140
Afeganistão, Argélia, Brasil, Colômbia, Irão e Síria. A estimativa é de 0,6 a 1 milhão de
novos casos por ano, no mundo todo. No que diz respeito à Leishmaniose Mucocutânea,
mais de 90% dos casos ocorrem na Bolívia, Brasil, Etiópia e Peru (2,15).
O HIV já tirou mais de 35 milhões de vidas até ao momento. Segundo a WHO,
estima-se que mundialmente 0,8% das pessoas entre os 15 e 49 anos são seropositivos
para HIV (Figura 6). Em 2016, 1 milhão de pessoas morreram por causas relacionadas
com o HIV, aproximadamente 36,7 milhões de pessoas viviam com o mesmo e 1,8
milhões de novos casos de infeção surgiram nesse ano. De todas as pessoas que vivem
com HIV, 54% dos adultos e 43% das crianças estão a receber Terapêutica Antirretroviral
(ART, do Inglês, Antiretroviral Therapy) ao longo da vida, sendo que 76% de mulheres
grávidas e a amamentar recebem ART. A região mais afetada pela infeção, com 25,6
milhões de pessoas infetadas em 2016, é África (8).
A transmissão vertical do HIV pode ocorrer em qualquer altura na gravidez,
durante o parto ou amamentação. Todavia, se a mulher fizer ART na fase inicial na
gravidez, o risco de transmissão vertical pode ser reduzido para 1% ou menos. Segundo
uma estimativa do CDC em 2006, aproximadamente 8 500 mulheres infetadas com o HIV
dão à luz anualmente e, entre 1994 e 2010, foram prevenidos cerca de 21 956 casos de
transmissão vertical (16).
Figura 5. Endemicidade da LC no mundo em 2015, segundo a WHO [Adaptado de (2)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
141
Claramente, analisando as Figuras 4,5 e 6 é possível observar uma sobreposição
entre as áreas de transmissão de HIV e Leishmania sp. O primeiro caso de coinfecção foi
reportado em 1985, tendo posteriormente aumentado rapidamente o número de casos no
sul da Europa. Até ao momento, 35 países já reportaram casos de coinfecção. Após a
introdução da ART, o número de casos coinfetados em países europeus onde a doença é
endémica desceu acentuadamente. No entanto, o problema expandiu-se para outros focos
importantes de Leishmaniose no mundo, devido à sobreposição das duas doenças (12,13).
1.1. Europa
Na Europa, na região mediterrânea, a Leishmaniose é causada pelo protozoário
Leishmania infantum e transmitida pelo inseto do género Phlebotomus. Adicionalmente,
L. donovani foi recentemente identificada como agente etiológico em casos de LV no
Chipre e Turquia. A LV é a principal forma de doença e ocorre em áreas rurais, aldeias
em regiões montanhosas e também em algumas zonas de periferia da cidade, onde os
parasitas vivem principalmente em cães (2).
Curiosamente, foi demonstrado que a deteção de parasitemia por PCR em
amostras de sangue periférico é muito mais frequente nos indivíduos coinfetados com
Leishmania-HIV do que naqueles com Leishmania sp não infetados com HIV (17). Desde
que a WHO descontinuou a sua base de dados em 2006, já não existe acompanhamento
Figura 6. Prevalência do HIV nos adultos de idades compreendidas entre os 15 e os 49 anos, em 2016,
segundo a WHO [Adaptado de (8)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
142
dos dados da coinfecção. Desde então, a WHO tem feito esforços para estabelecer um
programa em áreas selecionadas da Europa (17).
Um estudo da WHO que envolveu 16 instituições, monitorizou a coinfecção
Leishmania-HIV no Sul da Europa, desde 1994. Os casos reportados mostraram que 4
países estavam maioritariamente envolvidos: França, Itália, Portugal e Espanha. A grande
maioria dos cados foram detetados em Espanha, podendo este facto estar relacionado com
a reativação de infeções assintomáticas, juntamente com o facto de apresentar uma maior
área geográfica de sobreposição entre as duas infeções, quando comparada com outros
países do sul da Europa. Para além disso, foi também demonstrado que novas infeções
ocorreram em toxicodependentes que partilhavam seringas infetadas com Leishmania sp.
Em 2001, de todos os casos reportados, 57% eram provenientes de Espanha. A análise de
todos os casos por localização geográfica mostrou que 75% dos indivíduos viviam em
áreas de costa urbana com alta densidade populacional relativa, tendo sugerido
posteriormente uma distribuição progressiva dos casos das áreas urbanas para as rurais
(12).
Um claro decréscimo na incidência da coinfecção foi observado no fim dos anos
90, cuja causa pode ser atribuída à utilização de ART na maior parte do sul da Europa,
desde 1997. No período de 2001 a 2006, foram reportados 241 novos casos provenientes
de Espanha (n=95), Portugal (n=64), Itália (n=52) e França (n=30). Outros países como
a Suíça, a Alemanha, o Reino Unido e a Grécia reportaram esporadicamente casos
importados. A diminuição da incidência devido à ART não se verificou em Portugal,
onde, por causas desconhecidas, 107 casos de coinfecção e 173 casos de LV foram
reportados no período de 2000 a 2009 (12,17).
LV e LC adquiridas na região mediterrânea, em países como a Grécia, França,
Espanha, Itália, Portugal, Turquia e Croácia, que são considerados destinos turísticos,
foram importadas para países do norte da Europa. Para além disso, foram descritos casos
importados para a região mediterrânea, maioritariamente LC adquiridos por viajantes da
América Central e do Sul (17).
A média das idades dos indivíduos coinfetados foi de 38,6 anos (n=965), de 1990
a 1998, e 38,9 anos, de 2001 a 2006. A distribuição por género foi similar em ambos os
períodos, sendo a prevalência nos homens superior à das mulheres (83,2% e 88,5
respetivamente). Quanto aos fatores de risco, verificou-se uma diminuição relativa dos
casos de coinfecção relacionada com a utilização de drogas intravenosas um aumento
relativo entre a população heterossexual na Europa Ocidental. Quanto à
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
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143
homossexualidade, os valores são similares em ambos os períodos. No que diz respeito a
fatores imunológicos, ainda que os indivíduos fossem severamente imunodeprimidos em
ambos os períodos, o número de células CD4+ era inferior de 1990 a 1998 (12).
1.2. Ásia
Na Ásia, a Leishmaniose é causada pelo protozoário Leishmania donovani e
transmitida pelo inseto do género Phlebotomus. Adicionalmente, L. tropica é também
identificada como agente etiológico na Índia. No Sudeste Asiático, a LV é a principal
forma da doença. A transmissão geralmente ocorre em áreas rurais com chuvas anuais
fortes, humidade média acima dos 70%, temperatura de 15-38ºC, vegetação abundante,
águas de subsolo e com solo aluvial. A doença é mais comum em aldeias agrícolas onde
as casas são frequentemente construídas com paredes e pisos de barro e o gado vive perto
das pessoas. O humano é considerado o único reservatório dos parasitas nesta região (2).
A Ásia é o maior foco de LV do mundo, mais propriamente o Sul da Ásia, com
67% do total dos casos de Leishmaniose. Segundo a WHO, em 2016, o Bangladesh, a
Índia e o Nepal reportaram 6 558 casos no total (12,18–21). Apesar destes números, os
casos de LV diminuíram bastante nos últimos anos. No Bangladesh, diminuíram de 9 379
em 2006 para apenas 159 em 2016 e a mortalidade permaneceu em torno de 1% ou abaixo,
indicando que o país está perto de eliminar a doença como um problema de saúde pública.
Na Índia, diminuíram de 39 173 em 2006 para 6 249 em 2016. No Nepal, os casos
diminuíram de 1 531 em 2006 para 150 em 2016. Esta impressionante conquista é o
resultado de uma combinação de fatores que incluem a disposição da população para
apoiar atividades e monitorização de vigilância, crucial para o sucesso do Programa
Nacional de Eliminação de Kala-Azar (NKEP, do inglês, National Kala-Azar Elimination
Program) desde o seu lançamento em 2005 (18–20,22).
A reemergência da doença nos anos de 1970 deveu-se à existência de indivíduos
com Leishmaniose Dérmica Pós Kala-Azar (LDPK) residual, protegendo assim os
parasitas na pele. Adicionalmente, uma diminuição da imunidade adquirida pode explicar
a periodicidade dos picos de incidência de LV a cada 10 a 15 anos. No passado, a maioria
dos casos verificavam-se em adultos, mas agora são reportados muitos mais casos em
crianças e adolescentes afetados, isto é, em indivíduos imunocomprometidos.
Quanto à infeção por HIV, 3,5 milhões de pessoas vivem com a mesma no Sudeste
da Ásia, segundo uma estimativa da WHO em 2016 (23).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
144
Vários casos de coinfecção Leishmania-HIV têm sido reportados desde 1999,
sendo que indivíduos com LDPK podem representar um importante reservatório de
parasitas com um alto potencial de ser transmitidos através do vetor e causar infeção a
nível da comunidade. Contudo, apesar da extensão da sobreposição entre ambas as
infeções continuar a ser limitada, o potencial para a coinfecção nestes focos é muito alta,
especialmente porque os infectados nesta zona apresentam uma alta taxa de resistência à
terapêutica para Leishmaniose (12).
1.2.1. Índia
Curiosamente, nenhum caso de coinfecção de Leishmania-HIV foi reportado na
Índia até 1999. Muito provavelmente porque a epidemia do HIV permaneceu localizada
a Oeste e Sul do país, onde a Leishmaniose não se verifica. O primeiro caso de LV-HIV
foi publicado em 1999 e tratava-se de um paciente que tinha sido diagnosticado com
tuberculose já que nunca se suspeitou de kala-azar naquela área não endémica para
Leishmaniose. É interessante notar que os coinfetados na Índia apresentaram
manifestações atípicas, tais como Leishmaniose Pós Kala-Azar Mucocutânea (PKML),
LV-HIV com úlceras orais ou casos com linfoadenopatia cervical (24).
Até 2014, um total de 89 casos de LV-HIV foram publicados, tendo sido
provenientes dos estados de Bihar, Bombai e Uttarakhand. Destes, 28 foram relatados nos
primeiros 10 anos (1997 a 2006) após o primeiro caso diagnosticado em 1997, e de 2007
até 2014, foram adicionados 61 novos casos. Nos segundos 9 anos de relatórios desta
coinfecção (2007 a 2013), 197 332 casos de VL e 2,1 milhões de casos de HIV foram
reportados ao Governo da Índia. Foram ainda reportados 5 casos de LC-HIV e 5 casos de
LC difusa (LCD)-HIV, provenientes da zona endémica de Rajasthan, de Kerala e de
Karnataka (24).
Assim, a taxa de coinfecção nestes anos é estimada em apenas 0,029%. Apesar de
ter aumentado nos últimos anos, esta taxa permanece muito baixa em comparação com
outras regiões co endémicas de LV e HIV, como o Sul da Europa (20-40%) e alguns
países africanos (até 70%). Mesmo calculando a taxa de casos de HIV e LV apenas para
os estados endémicos de LV, Bihar e Jharkhand, isso representa apenas 6,86% por ano
(24).
Poderão existir vários motivos para esta baixa taxa de coinfecção na Índia. O mais
importante diz respeito à baixa taxa de uso de drogas intravenosas em áreas endémicas
de LV e a predominância de populações ortodoxas no norte da Índia, que justifica uma
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
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145
disseminação lenta do HIV em comparação com o Oeste e Sul do país. Nos estados
endémicos de LV, a taxa de incidência do HIV permaneceu <0,3%, enquanto nos estados
do Sul da Índia e Maharashtra, manteve-se entre 0,5% e 1,2% (24).
1.3. América
Na América, a Leishmaniose é causada pelos protozoários L. guyanensis, L.
amazonensis, L. braziliensis, L. infantum, L. lainsoni, L. shawi, L. naiffi, L. lindenbergi,
L. panamensis, L. colombiensis, L. mexicana e L. peruviana e transmitida pelo inseto do
género Lutzomyia. A LV é similar à encontrada na zona mediterrânea, já que o hábito de
ter cães e outros animais domésticos dentro de casa promove a infeção humana (2).
A Leishmaniose Cutânea e Mucocutânea ocorre em 20 países, sendo endémica
em 18 deles, com diferentes intensidades de transmissão: baixa, média, alta, intensa e
muito intensa. No período de 2001 a 2015 foram reportados à Organização Pan-
Americana da Saúde (PAHO, do Inglês, Pan American Health Organization)/WHO, 843
931 novos casos de LC e LM com uma média anual de 56 262 casos, distribuídos em 17
dos 18 países endémicos. Observa-se uma redução dos casos nos últimos 5 anos, sendo
que em 2015 foi registado o menor número para todo o período analisado, com um
decréscimo de 10% em relação a 2014. Em 2015, 17 dos 18 países endémicos reportaram
46 082 casos de LC e LM. Do total de casos da região, 70% foram reportados pelo Brasil
(19 395), Colômbia (7 541) e Peru (5 459). A taxa de incidência da América foi de 18,35
casos por 100 000 habitantes, e as maiores incidências foram registadas no Suriname
(218,48/100 000 habitantes) e em Nicarágua (76,64/100 000 habitantes). A população
primariamente afetada são os homens (61,7%) e 36% são crianças com menos de 5 anos
(25,26).
A SIDA é considerada uma doença emergente na América devido à sua
distribuição geográfica e extensão de população afetada (25). De acordo com os dados de
2016 da WHO, 3,3 milhões de pessoas vivem com HIV neste continente (23).
A disseminação do HIV para as áreas rurais e a urbanização da transmissão da L.
infantum pode ter influenciado a história natural das doenças causadas por estas infeções,
incluindo o aceleramento da progressão de ambas (25).
O primeiro caso de coinfecção Leishmania-HIV na América foi reportado no
Brasil, em 1990. Diferentemente do que acontece na Europa, no continente Americano a
via sexual é o principal meio de transmissão de HIV entre os indivíduos coinfetados com
LV-HIV (25).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
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146
Apesar da coinfecção LV-HIV ser um problema na América, este tem sido
ignorado e pouco reportado (25).
1.3.1. Brasil
Segundo a WHO, foram reportados 3 336 casos de LV e 12 886 casos de LV em
2016, no Brasil (21). A LC é amplamente distribuída, enquanto que a LV é endémica nas
regiões a Norte, contando com 87% de todos os casos. Ainda assim, a LV está a expandir-
se para o Centro Oeste, Norte e Sul do país. Preocupante é verificar-se o processo de
urbanização da transmissão do parasita, estando a doença a expandir-se para cidades
importantes como o Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Santarém, Teresina, Natal e Fortaleza
(12).
O Brasil é o epicentro da epidemia de HIV na América do Sul, onde um terço de
todas as pessoas com HIV desta região vive (25). O primeiro caso foi reportado em 1983
e, segundo os dados de 2016 da WHO, é estimado que 830 000 pessoas vivem com HIV
(27).
De 2001 a 2005, 16 210 casos de LV foram reportados no Brasil e destes, 315
(2%) estavam coinfetados com HIV. Dos indivíduos coinfetados, 78% eram homens e a
média das idades era 38 anos; 56,3% das infeções foram atribuídas a transmissão
heterossexual. Quanto às manifestações clinicas, 43% são LMC, 37% LV e 20% LC.
Verificaram-se 8% de casos com manifestações atípicas e 24% de casos fatais por
ausência de tratamento ART (12).
Quanto à LC, 150 000 casos foram reportados de 2001 a 2005, sendo que 150
(0,1%) eram HIV positivos. É interessante que a LMC é frequentemente observada em
indivíduos coinfetados com HIV (43%), algo que acontece raramente no Sul da Europa
(12).
1.4. África
Em África, a Leishmaniose é causada pelo protozoário Leishmania donovani e
transmitida pelo inseto do género Phlebotomus, sendo o humano o principal reservatório
do parasita. Existem surtos frequentes de LV na África Oriental, nas savanas do Norte e
nas savanas e florestas do Sul, onde os flebótomos vivem junto às térmitas. A LC ocorre
nas terras altas da Etiópia e em outros locais onde o aumento do contato
humano/flebótomo ocorre em aldeias construídas à beira-rio (2).
Segundo os dados da WHO de 2016, 25,6 milhões de pessoas vivem com HIV em
África, sendo a maior região afetada do mundo, especialmente entre mulheres jovens. De
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
147
todas as mulheres grávidas que vivem com HIV, 75% recebem fármacos para prevenir a
transmissão de mãe para filho (8).
1.4.1. Burkina Faso
Casos esporádicos de LC têm sido reportados em Burkina Faso desde 1953 a
1984, mas a incidência aumentou nos anos recentes:1 194 em 2003, 901 em 2004, 827
casos em 2005 e 947 em 2013 (12,21). O aumento de casos desde 2000 em consequência
do desenvolvimento de um novo distrito numa área rural perto da capital Ougadougou
ficou conhecido como “Ouaga 2000”. O pico de incidência ocorre entre agosto e
setembro, sobrepondo-se com o pico sazonal da malária, e verifica-se a ocorrência de
casos em todas as faixas etárias, sendo a prevalência igual entre homens e mulheres (12).
Quanto à infeção por HIV, segundo a estimativa da WHO de 2016, a prevalência
é de 95 000 em Burkina Faso (27).
Dos 70 casos “Ouaga 2000”, 10 eram coinfetados com HIV. Num estudo
prospetivo de 32 coinfetados foram encontradas várias manifestações atípicas de LC,
incluindo a forma tipo lepra e difusa (n=15), ulcerativa (n=14), infiltrativa (n=12),
papulonodular (n=9), tipo psoríase (n=5), tipo sarcoma de Kaposi (n=1), queloied (n=1)
e histiode (n=1) (12).
Observou-se que após tratamento para a Leishmaniose, os indivíduos coinfetados
tiveram recaídas clínicas, requerendo tratamentos repetidos (12).
1.4.2. Etiópia
Apesar da incompleta informação epidemiológica da Leishmaniose na Etiópia,
existem casos reportados desde a década de 1940. A doença é maioritariamente
prevalente em zonas baixas e áridas e a incidência em 2015 foi de 2 080 casos (21). As
seis áreas endémicas identificadas são o Noroeste (Metema, Humera, Wolkayit e
Libo/Fogera), Nordeste (Awash Valley e fronteira Ethio-Djibouti) Sul e Sudoeste (Dawa,
Genale, Gelana, Segen, Woito, Konso e Omo River Valley), a fronteira do Kenuanr e a
fronteira Gambela-Sudão.
O primeiro caso HIV-positivo foi reportado em 1984 e, segundo os dados de 2016,
a WHO estima que 710 000 pessoas vivem com o vírus na Etiópia (12,27).
Em Humera (Noroeste da Etiópia), a proporção de coinfetados aumentou de
18,5% em 1998-1999 para 40% em 2006. Numa revisão de 791 casos em Tigray,
observou-se que o número de casos fatais em coinfetados LV-HIV foi quatro vezes
superior ao referente a indivíduos com LV não infetados com HIV. Na Libo, 15 a 18%
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
148
de todos os casos de LV são seropositivos para HIV. Os grupos de alto risco para a
coinfecção são os trabalhadores que migram sazonalmente, trabalhadores de sexo, jovens
adultos em áreas de realojamento, condutores de transportes públicos e militares nas
fronteiras (12).
1.4.3. Somália
Em 2016 foram reportados à WHO 781 casos de LV na Somália (21). A guerra
civil promoveu a emergência de Leishmaniose nos estados do Sul, Bakool, Gedo e Bay.
Bakool é particularmente conhecido como região altamente endémica para LV e já teve
vários surtos da doença. Sabe-se que houve um importante surto de LV, tendo sido
reportados pelos Médicos Sem Fronteiras da Bélgica (MSF-Bélgica) 263 casos em 2005
e 1 300 casos em 2006. Contudo, ainda não foram reportados casos de coinfecção LV-
HIV (12,28).
1.4.4. Uganda
Em 2016, foram reportados à WHO 29 casos de LC e 692 casos de LV no Uganda
(21). A única área documentada onde a LV é endémica é Pokot County, no distrito de
Nakapiripirit, a Nordeste da região do Karamoja. Trata-se de uma extensão do foco de
endemicidade de distritos do Quénia. Não existe programa de controlo nacional, sendo
os casos monitorizados pelos Médicos Sem Fronteiras da Suíça (MSF-Suíça), que
trataram mais de 2 500 doentes no Hospital Amudat de 2000 a 2006. Aproximadamente
70% destes doentes eram provenientes do Quénia. A proporção de homens/mulheres
infetados era de 3:1 e mais de 60% tinham menos de 15 anos de idade. Foram confirmados
8 casos de LV-HIV pelos MSF-Suíça, sem outros dados até à data. Porém, os conflitos
locais podem ter exacerbado a situação e elevado o potencial de coinfecção no país (12).
1.4.5. Quénia
O Quénia apresenta um historial de Leishmaniose, com vários focos reportados:
Oeste de Pakot, Baringo, Mandera, Garissa e Mwingi. Houve um surto em 2006, a Norte
do Quénia, em Wajir e Issiolo, que afetou muitas crianças (n=48; 95% com idade <5
anos). Em 2016, foram reportados a WHO 29 casos de LC e 692 casos de LV (12,21).
Em 2006, 15 casos de coinfecção LV-HIV foram reportados e o risco de
coinfecção está a aumentar (12).
1.4.6. Sudão
A maior área endémica de Leishmaniose no Sudão localiza-se a Sudeste do país,
na fronteira com a Etiópia. Verificaram-se episódios recorrentes de epidemias com taxas
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Epidemiologia
149
elevadas de mortalidade, como em 1989 (12). Segundo a WHO, em 2016 houve 2 011
casos de LC reportados e 3 810 casos de LV. É interessante notar que apesar de a infeção
ser maioritariamente causada por L. donovani, também ocorre por L. infantum. A
transmissão é feita basicamente por vetor, com a presença de LDPK em 50% dos casos
de LV, formando assim um importante reservatório humano.
A prevalência do HIV no Sudão em 2016 foi de 56 000, segundo a WHO. A
transmissão é maioritariamente heterossexual e a transmissão vertical é também
importante (12,21).
Desde 1998, foram identificados 3 casos de coinfecção Leishmania-HIV. Desde
então, a prevalência baseada em estudos de hospitais foi de 5% (3/60) em Khartoum,
entre 1998 e 1999, 9,4% (5/53) em Khartoum, em 2002, e 8,1% (3/37) e 3,6% (3/84) em
2002 e 2003, respetivamente, no Estado de Gedaref (12).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
150
2. Aspetos Clínicos
Após a transmissão da Leishmania sp por picada de inseto ou agulha
contaminada, o parasita entra nos macrófagos ou noutras células fagocitárias. Após a
multiplicação de amastigotas, existe uma rutura destas células e os parasitas infetam
outras células. Dependendo das espécies de Leishmania envolvidas na infeção, pode
causar LV ou LC. Após o inseto tomar uma refeição de sangue, ingerindo os macrófagos
infetados (na forma amastigota), os parasitas transformam-se na forma promastigota, no
tubo digestivo dos vetores. Quando precisam de alimentar-se novamente, as fêmeas
infetadas têm a capacidade de transmitir os promastigotas (forma infeciosa) ao hospedeiro
vertebrado (Figura 7) (29).
As variadas formas de apresentação clínica da Leishmaniose dependem de vários
fatores tais como a complexa interação entre a espécie infetante, o vetor, o estado
imunológico e nutricional do hospedeiro, a idade, a herança genética do hospedeiro, o
local de inoculação e a carga parasitária. A forma visceral, a cutânea e a mucocutânea
são, sem dúvida, as principais manifestações clínicas da doença (13).
Figura 7. Ciclo de Vida da Leishmania sp no ser humano [Adaptado de (29)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
151
2.1. Coinfecção Assintomática
O papel da coinfecção assintomática continua a ser pouco reconhecido. A sua
proporção é 5 a 10 vezes superior nos hospedeiros imunocompetentes quando
comparados com o número de casos de LV, tal como demonstrado por evidência
serológica de anticorpos anti-Leishmania, por deteção de DNA de parasitas em amostras
de sangue ou por uma reação positiva ao teste de pele para a Leishmania sp. A
epidemiologia da infeção assintomática no ciclo do parasita ainda é desconhecida (13).
Relativamente aos indivíduos infetados pelo HIV, o número de portadores
assintomáticos também parece ser maior do que o número de indivíduos com LV
clinicamente evidentes. A associação de uma maior carga parasitária em pessoas com
cargas virais de HIV mais altas já foi demonstrada e parece estar relacionada com um
maior risco para desenvolver a doença clínica (13).
2.2. Coinfecção Leishmaniose Visceral/HIV
A apresentação da LV causada por L. infantum ou L. donovani nos indivíduos
seropositivos para HIV é equivalente à observada nos indivíduos que não estão
coinfetados (12,13). As formas típicas da doença apresentam inicialmente febre
intermitente seguida por um padrão contínuo; hepatoesplenomegalia; pancitopenia,
principalmente por causa dos parasitas que invadem a medula óssea, causando sinais e
sintomas relacionados com cada citopenia e consequentemente anemia, hemorragias e
infeções concomitantes. A perda de peso e a anorexia podem ser mal diagnosticadas com
outras infeções oportunistas ou com caquexia consequente da própria SIDA (13).
As manifestações clínicas de LV em indivíduos coinfetados que recidivaram são
comparáveis aos episódios iniciais de LV e não apresentam mudanças desde a introdução
da ART, exceto o fato de que as infeções oportunistas diminuem. Por outro lado,
seropositivos que recebem ART apresentam frequências significativamente mais baixas
de trombocitopenia e leucopenia, para além de uma menor frequência de níveis
aumentados de enzimas hepáticas, relativamente aos que não receberam a terapêutica
durante os episódios de LV (12).
Em contraste com as manifestações clínicas, o progresso clínico e o prognóstico
da LV diferem. A coinfecção LV-HIV é caracterizada por taxas de cura
significativamente menores, maior toxicidade aos fármacos, maiores taxas de recaída e
maiores taxas de mortalidade do que a LV em indivíduos não coinfetados (12).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
152
Ademais, a LV atípica permanece não diagnosticada em contexto clínico ou é
diagnosticada com um atraso considerável, quando o reconhecimento precoce e o
tratamento são extremamente necessários. A maioria das manifestações clínicas
incomuns ocorre em indivíduos com HIV cuja contagem de células T CD4+ é muito baixa.
Estes indivíduos também podem ser afetados por outras infeções oportunistas, o que
dificulta o diagnóstico etiológico oportuno (13).
A equipa de Diro E. et al., realizou um estudo sobre a profilaxia secundária para
recidivas de LV, onde 8 (15%) dos 54 coinfetados LV-HIV selecionados durante 14
meses apresentaram manifestações atípicas de Leishmaniose. Três deles apresentaram
lesões cutâneas (um paciente com lesões nodulares e dois com lesões do tipo
Leishmaniose Dérmica Pós Kala-Azar), 2 tiveram lesões orais, 2 tiveram envolvimento
dos nódulos linfáticos (um com envolvimento do nódulo linfático intra-abdominal), e 1
paciente teve lesões retais (13).
Contudo, as principais diferenças clínicas entre indivíduos coinfetados pelo HIV
e os não coinfetados parecem ser uma grande variedade de manifestações clínicas atípicas
e sobrepostas, com parasitas de Leishmania sp isolados de locais incomuns (mucosa
gastrointestinal e oral, pele, pleura, pericárdio, nódulos linfáticos, lesões de sarcoma de
Kaposi e trato respiratório). Além disso, é importante salientar que a menor taxa de
resposta ao tratamento e a maior taxa de recaída podem ser reduzidas pela ART, mas não
inteiramente evitadas (13).
2.2.1. Coinfecção Leishmaniose Dérmica Pós Kala-Azar
(LDPK)/HIV
A LDPK é comum em indivíduos seronegativos para HIV, aparecendo pouco
depois ou durante o tratamento em 50% dos casos de LV no Sudão e, após um período
mais longo, em 5 a 10% dos casos de LV na Índia. A LDPK manifesta-se com lesões
maculopapulares ou nodulares na face, tronco e membros. Foram reportados apenas
alguns casos de LDPK em seropositivos para HIV. Todavia, na Etiópia, numa
monitorização de 6 meses, a LDPK L grave foi mais comum em coinfetados com HIV
(27,3%) do que em indivíduos seronegativos para HIV (13,3%) (12).
Os casos reportados de indivíduos coinfetados com LV-HIV descreveram lesões
cutâneas que precedem e acompanham a LV após o tratamento. Não está claro se estas
são formas de LDPK ou lesões cutâneas parasitadas formadas durante o decurso da LV.
Além disso, uma associação entre a LDPK e a Doença de Reconstituição Imunológica
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Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
153
(DRI) logo após o início da ART foi descrita. Curiosamente, a LDPK-DRI também ocorre
após LV causada por L. chagasi e L. infantum, que geralmente não estão associadas à
LDPK (12).
2.2.2. Coinfecção Leishmaniose Visceral/HIV em Mulheres
Grávidas
No que diz respeito à mulher grávida, as manifestações clínicas da LV não variam
de forma evidente relativamente à forma clássica da doença. Na maioria dos casos, a febre
é o primeiro sintoma, acompanhado de adinamia, perda de peso e hemorragia, sendo este
último sintoma confundido com condições hemorrágicas relacionadas com gravidez
propriamente dita. Quanto à característica hepatoesplenomegalia, a sua observação pode
ser prejudicada devido ao aumento do tamanho do útero (6).
Uma vez que os sintomas são inespecíficos e facilmente confundidos com outras
situações clínicas, a análise dos dados epidemiológicos e laboratoriais é fundamental.
Desta forma, o diagnóstico clínico torna-se mais fácil à medida que os sinais e sintomas
clássicos da LV se tornam mais exuberantes, incluindo manifestações como
hepatoesplenomegalia marcada, perda de peso significativa, adinamia, anemia acentuada
e hemorragia (6).
2.3. Coinfecção Leishmaniose Cutânea/HIV
Após a picada do inseto e o período de incubação de 2 semanas a 3 meses, surge
uma pequena lesão eritematosa, papular ou nodular, que causa prurido e que por vezes
precede ou é seguida pelo aumento da drenagem dos nódulos linfáticos. Esta lesão inicial
pode curar-se espontaneamente ou evoluir para uma forma específica da doença clínica,
meses mais tarde (Figura 8) (13).
É importante realçar que as manifestações descritas parecem ser semelhantes nos
indivíduos coinfetados com HIV e nos não coinfetados, mas podem estar presentes em
formas incomuns. Por exemplo, foram descritas diferentes formas de lesões mucosas,
como infiltração disseminada difusa da superfície mucosa do palato e lesões genitais
(presentes em 27% dos coinfetados com HIV) (13).
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154
2.3.1. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Localizada/HIV
A Leishmaniose Cutânea Localizada (LCL) é a mais frequente forma causada por
espécies dermotrópicas. Muitas vezes, as lesões aparecem numa área exposta da
superfície do corpo (uma a dez). A lesão típica é uma úlcera redonda, bem delimitada e
indolor com uma crosta central, que às vezes pode ser hemorrágica. A lesão pode curar-
se espontaneamente, originando uma cicatriz hipopigmentada, lisa e fina. A LCL é
causada por L. major, L. aethiopica, L. tropica, L. mexicana, L. amazonensis, L. (V.)
braziliensis, L. (V.) guyanensis, L. (V.) shawi, L. (V.) lainsoni, e L. (V.) naiffi (13).
2.3.2. Coinfecção Leishmaniose Recidiva Cutis/HIV
A Leishmaniose Recidiva Cutis é mais comum nos Países em Desenvolvimento.
É responsável pelo aparecimento de lesões papulares/vesiculares no interior ou nas
imediações de cicatrizes de lesões já curadas, num período de tempo que pode variar de
meses a anos. É causada principalmente por L. (L.) aethiopica e L. (V.) braziliensis (13).
2.3.3. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Disseminada/HIV
A Leishmaniose Cutânea Disseminada (LCDS) causa múltiplas lesões
pleomórficas (10-300), muitas vezes acneiformes e papulares, em duas ou mais áreas da
Figura 8. Lesões de Leishmaniose Cutânea. (A) Lesão típica de Leishmaniose Cutânea Localizada, (B) Manifestação atípica de Leishmaniose Cutânea, caracterizada por grandes ulcerações cutâneas, (C) e (D)
Leishmaniose Mucocutânea [Adaptado de (13)].
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Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
155
superfície do corpo, mas não contíguas. Até ao momento, L. (V.) braziliensis é a única
espécie encontrada (13).
2.3.4. Coinfecção Leishmaniose Cutânea Difusa/HIV
A Leishmaniose Cutânea Difusa (LCD) é uma forma rara da doença que apresenta
lesões nodulares que não evoluem para ulcerações. Tipicamente, as lesões são ricas em
parasitas e as espécies envolvidas são L. (L.) mexicana e L. (L.) amazonensis na América
e L. (L.) aethiopica nos Países em Desenvolvimento (13).
2.3.5. Coinfecção Leishmaniose Mucocutânea/HIV em
Mulheres Grávidas
A Leishmaniose Mucocutânea ocorre anos após o início da LC e é caracterizada
pela destruição das cavidades oral-nasal e faríngea, podendo evoluir para lesões
desfigurantes. As manifestações clínicas podem começar com uma inflamação nasal leve
e congestionamento, seguidos de ulcerações e perfurações do septo, que se estendem ao
palato mole, faringe ou laringe. É causada principalmente por L. (V.) braziliensis e L. (V.)
guyanensis (13). Até ao período final de consulta de bibliografia não existem dados
descritos para esta lesão cutânea em mulheres grávidas e coinfetadas com HIV.
2.4. Coinfecção Doença de Reconstituição Imunológica (DRI)/HIV
A ART levou a uma diminuição significativa da morbilidade e mortalidade
associadas à SIDA, em parte devido à recuperação parcial do sistema imunológico.
Contudo, alguns indivíduos sob o efeito da ART podem apresentar agravamento da
situação clínica, apesar do aumento da contagem de linfócitos CD4+ e diminuição da
carga viral de HIV-1 no plasma. Este facto é o resultado de uma resposta inflamatória ou
“desregulação” do sistema imunológico tanto aos agentes patogénicos subclínicos
intactos como aos antigénios residuais. Consequentemente, verificam-se diferentes
manifestações clínicas, conforme os agentes infeciosos ou não infeciosos envolvidos.
No caso da infeção por Leishmania sp, a DRI pode resultar numa nova doença ou
em progressão da doença latente. Já foram reportadas três variações clínicas da
Leishmaniose com comprometimento dermatológico: Leishmaniose Mucocutânea
Difusa, Leishmaniose Dérmica Pós ou Para-Kala-Azar (LDPK) e nódulos cutâneos
esporotricoides e subcutâneos. Até ao momento, foram reportados apenas alguns casos
de Leishmaniose Cutânea associada a DRI em indivíduos em fase de SIDA. De forma
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Aspetos Clínicos
156
geral, foram notificadas lesões cutâneas disseminadas (nos braços, pernas e pés) e lesões
na mucosa nasal, orofaríngea e genital (13).
Relativamente à LV, embora esta pareça ser rara no contexto de DRI, deve ser
considerada como causa da febre repentina de origem desconhecida após o início de ART
em indivíduos seropositivos para HIV de áreas endémicas (ou com histórico de viagem
para essas mesmas áreas) (13).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Imunopatogénese
157
3. Imunopatogénese
Ao longo dos anos, vários esforços foram feitos para determinar o mecanismo por
trás da patogénese da coinfecção Leishmania-HIV e também confirmar se existem
interações entre os dois agentes patogénicos a nível celular e molecular.
A presença do parasita e do vírus na mesma célula mostrou influenciar a
multiplicação e expressão de um ou de ambos os organismos. Acredita-se que, em
coinfetados, existe uma relação simbiótica entre os parasitas de Leishmania sp e o HIV.
Segundo Bentwich Z, et al. (2003), os parasitas estimulam a ativação imunológica
crónica, levando a um aumento da carga viral do HIV com progressão mais rápida para
SIDA. No entanto, Santos-Oliveira JR, et al. (2010) mostraram que o sistema
imunológico pode ser fortemente ativado sem um aumento concomitante da carga viral
do HIV em indivíduos coinfetados. Adicionalmente, a imunossupressão causada pelo
vírus é particularmente favorável à multiplicação descontrolada do parasita Leishmania
sp (30,31).
As formas amastigotas de Leishmania e o HIV infetam e interagem com as células
dendríticas (DCs, do Inglês, Dendritic Cells) e com os macrófagos. As consequências
desta interação ainda não foram totalmente determinadas. No entanto, sugeriu-se que
estes parasitas e o HIV-1 podem tirar partido das DCs através de modulação de várias
moléculas de superfície celular, inibição da função das DCs, produção de fatores solúveis
e atraso na fusão lisossomal e nas atividades de morte intracelular. Quando as DCs e os
macrófagos encontram antigénios, processam e exibem os seus péptidos de superfície e
migram para os órgãos linfoides de drenagem mais próximos, onde apresentam estes
mesmos péptidos às células T naïve (Figura 9) (30,31).
É interessante que a infeção de DCs e macrófagos com Leishmania sp e HIV
mostrou alterar as funções fisiológicas dessas células, particularmente a sua capacidade
de processamento e apresentação de antígenos. A infeção por HIV-1 também mostrou
afetar a fagocitose e a replicação de Leishmania sp por macrófagos, bem como a resposta
fisiológica que leva à produção de moléculas imunomoduladoras. Por exemplo, Tat do
HIV-1 aumenta a expressão de PGE2, Ciclooxigenase 2 e do TGF-ß por macrófagos e
DCs, e isso pode ser a causa do aumento da replicação de parasitas nestas células (30,31).
No que diz respeito à superfície do parasita Leishmania sp, o LPG é o principal
glicofosfato expresso na forma promastigota. Após a fagocitose, os promastigotas são
envolvidos pelos fagolisossomas nas Células Apresentadoras de Antígenos (APCs, do
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Stefanie Baptista Imunopatogénese
158
Inglês, Antigen-Presenting Cells), especialmente macrófagos, onde se transformam nas
formas intracelulares (amastigotas). No fagolisossoma, a molécula de LPG é desintegrada
deixando apenas a âncora de fosfatidil inositol. Pensa-se que o LPG é fundamental para
a sobrevivência e o estabelecimento do parasita nos macrófagos e desempenha um papel
importante na modulação das suas funções, podendo aumentar a expressão do HIV.
Estudos in vitro mostram que os amastigotas de Leishmania infantum nas DCs ligadas a
células T causam maior produção de vírus HIV-1, e isto devido à produção de citocinas
pró-inflamatórias pelas DCs infetadas. De acordo com isto, estudos sugerem que a
Leishmania pode modular diretamente o ciclo de vida do vírus pela da indução do NF
dependente do TNF- e IL-1. Conjuntamente, estas descobertas sugerem que a
coinfecção com Leishmania sp pode aumentar a progressão SIDA (32).
Por outro lado, a infeção por HIV também afeta negativamente o resultado da
infeção por Leishmania sp, aumentando a replicação dos parasitas nas células coinfetadas.
A causa disto foi atribuída ao comprometimento das funções dos macrófagos.
Adicionalmente, isto também pode explicar o aumento da recorrência e reativação da
doença em indivíduos com esta coinfecção HIV-Leishmania sp. Além disso, os
coinfetados com LC e HIV e com imunodepressão moderada têm maior taxa de reinfeção,
maior número de lesões e fraca resposta ao tratamento em comparação com os indivíduos
seronegativos para HIV. Curiosamente, além da imunossupressão causada pelo HIV, a
LV também leva à imunossupressão por si só, o que foi atribuído ao papel
imunorregulador da IL-10, geralmente observada em níveis elevados nos soros de
indivíduos infetados. Este facto sugere que pode haver imunossupressão mais acentuada
em indivíduos coinfetados com HIV (32).
A resolução de LC e LV geralmente está associada a uma resposta Th1 forte
porque esta garante a produção de citocinas ativadoras de macrófagos, especialmente
IFN-, que impedem a replicação parasitária. Concretamente, a suscetibilidade foi
atribuída à sobreprodução de citocinas associadas às células Th2 (incluindo IL-4, IL-5 e
IL-10), que inibem as citocinas Th1 e desativam os macrófagos, levando à proliferação e
sobrevivência parasitárias. No entanto, na LV, o papel das citocinas de Th1 ou Th2 na
resistência e suscetibilidade, respetivamente, não é muito óbvio porque as citocinas de
Th1 e Th2 foram detetadas em doentes com LV que apresentam diferentes manifestações
da doença clínica.
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Stefanie Baptista Imunopatogénese
159
Estudos sugerem que a infeção pelo HIV pode alterar a capacidade de resposta
das células T à Leishmania sp, o que inclui a capacidade de resposta das CMSPs aos
antígenos de Leishmania sp. Além disso, a estimulação de CMSPs com antigénios de
Leishmania sp em indivíduos infetados com HIV resulta na produção de baixos níveis de
IFN-, mas níveis elevados de IL-10. Da mesma forma, a produção de IL-12 e/ou IL-18
(citocinas-chave para induzir resposta Th1 robusta) por CMSPs é menor em indivíduos
com LV-HIV. De acordo com isso, Nigro et al. mostraram que os indivíduos infetados
com HIV produziram mais IL-10 e IL-4 do que indivíduos infetados com LV-HIV.
Adicionalmente, a citocina IL-15, que promove a resposta das células T CD8+ e a
produção de citocinas que aumentam a resposta protetora aos parasitas intracelulares, está
diminuída nos indivíduos seropositivos para HIV, tendo um papel importante na resposta
à terapêutica.
Citocinas pró-inflamatórias, tais como o TNF- estão aumentadas em indivíduos
coinfetados com LV-HIV em relação aos indivíduos seronegativos para HIV, associado
assim ao aumento da replicação viral. Olivier et al. sugeriram que as infeções oportunistas
durante a infeção pelo HIV poderiam levar à produção de citocinas pró-inflamatórias
durante o estágio da imunodeficiência, acelerando assim a progressão da doença.
No que diz respeito à mulher grávida, o ambiente imunológico materno durante a
gravidez coexistente com a infeção por Leishmania sp também é uma fonte potencial de
fisiopatologia. Na resposta imunológica à gravidez normal existe um ajuste no qual o
Figura 9. Representação esquemática dos mecanismos de sinalização envolvidos na expressão da Leishmania sp-Lipofosfoglicano-mediada pelo HIV-1 através dos monócitos/macrófagos e linfócitos T [Adaptado de
(31)].
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Stefanie Baptista Imunopatogénese
160
sistema imunológico materno se adapta para permitir a presença de antigénios estranhos
inerentes à gestação, ao mesmo tempo que mantém a defesa da mãe e da criança contra
microrganismos infeciosos. Isto implica respostas imunológicas pró-inflamatórias
reduzidas com respostas humorais mantidas, especialmente ao nível da placenta, que
demonstrou atuar como um regulador deste estado imunológico tão particular. Como tal,
no caso da infeção por Leishmania sp durante a gravidez, o resultado clínico da mãe e do
feto é um reflexo do compromisso resultante entre a gravidez saudável e a resposta efetiva
ao parasita invasor (7).
A gravidez saudável tem sido associada a equilíbrios específicos de células T,
nomeadamente a predominância de Th2 sobre as Th1 e a prevalência de células T
reguladoras sobre as Th17 (Figura 10). Embora existam certas exceções a esta tendência
anti-inflamatória na gravidez normal, o aborto, o parto prematuro e outras complicações
da gravidez estão associadas a desvios destes padrões. Até à data, o aspeto mais estudado
deste equilíbrio na infeção por Leishmania sp durante a gravidez foi a diferenciação
Th1/Th2 e os padrões de citocinas resultantes. Segundo Robinson, D.P. et al. (2012), uma
resposta predominante de Th1 está associada tanto à rejeição da gravidez quanto ao
controlo de infeções intracelulares de Leishmania sp, enquanto que uma resposta
predominante de Th2 está associada a um estado imunológico tolerante a antigénios
estranhos (incluindo antigénios alogénicos do feto), preservação da gravidez e controlo
fraco de infeção (7).
Figura 10. Resposta Imunológica de células T maternas e os seus efeitos durante a gravidez coexistente com infeção por Leishmania sp [Adaptado de (7)].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Diagnóstico
161
4. Diagnóstico
Nos indivíduos coinfetados com Leishmania-HIV, o diagnóstico de Leishmaniose
pode ser difícil porque as manifestações clínicas típicas da doença nem sempre estão
presentes e/ou os indivíduos podem apresentar sinais clínicos inespecíficos. Além disso,
a esplenomegalia é menos frequente em indivíduos coinfetados e uma boa parte desses
indivíduos apresentam outras infeções oportunistas associadas com sintomas
semelhantes, o que complica ainda mais o diagnóstico clínico.
A WHO recomendou um algoritmo para o diagnóstico de Leishmaniose em
indivíduos infetados com HIV (WHO, Quinta Reunião Consultiva sobre Coinfecção
Leishmania-HIV, Addis Abeba, Etiópia, março de 2007 [OMS / CDS / NTD / IDM /
2007-7]), conforme a Figura 11 (12).
4.1. Parasitológico
A deteção de parasitas de Leishmania sp por microscopia ou em diferentes
amostras de tecido é considerado o método-padrão para o diagnóstico de Leishmaniose
em indivíduos coinfetados com HIV e pode ser uma forma útil de detetar falhas de
tratamento.
4.1.1. Microscopia
Os nódulos linfáticos, a medula óssea e o baço são os principais tecidos utilizados
para a demonstração de formas amastigotas em preparações com coloração de Giemsa,
Leishman ou Wright (Figura 11), devendo ser observadas pelo menos durante 1 hora.
Tanto em indivíduos infetados com HIV como em não infetados com HIV, as amostras
de tecido do baço têm a melhor sensibilidade, seguidas pelas de medula óssea e nódulos
linfáticos. No entanto, a aspiração da medula óssea é o exame mais utilizado devido à sua
boa sensibilidade (67-94%) e menor risco de complicações em comparação com a
aspiração do baço. Adicionalmente, o exame microscópico pode ser realizado em biópsias
hepáticas com uma sensibilidade de 87% e os amastigotas também podem ser encontrados
em locais incomuns, como pulmões, laringe, amígdalas, tubo digestivo, reto, LCR e
outros (12,13).
4.1.2. Cultura
A cultura de aspirados esplénicos mostrou uma alta sensibilidade (63-100%) em
indivíduos coinfetados com Leishmania-HIV. No entanto, devido ao risco de hemorragia
interna, recomenda-se aspiração da medula óssea por ser mais seguro e por ter uma
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Diagnóstico
162
sensibilidade similar (50-100%). A cultura das CMSPs obtém uma sensibilidade de 64 a
67%, sendo esta uma boa opção por ser menos invasiva. As culturas devem ser
examinadas todas as semanas por microscopia de luz, procurando formas de
promastigotas, e cultivadas em meio fresco. As culturas são consideradas negativas se
nenhum parasita flagelado for observado após 4 semanas (12,13).
Apesar deste método ter uma ótima sensibilidade, necessita de um meio especial
(meio Novy-MacNeal-Nicolle), e geralmente não está disponível na maioria das regiões
endémicas (13).
4.2. Serológico
O diagnóstico serológico específico é baseado na presença de uma resposta
humoral específica. Os testes serológicos atuais são baseados em quatro formatos:
Anticorpo Fluorescente Indireto (IFA), Ensaio de Imunoabsorção Enzimática (ELISA),
Western Blot e Teste de Aglutinação Direta (DAT). Um Teste Rápido de Diagnóstico
muito utilizado é o rK39, um imunoensaio qualitativo para deteção de anticorpos contra
a Leishmania sp, que está facilmente acessível e com resultados disponíveis dentro de 10-
20 min (3).
Quanto ao diagnóstico serológico em indivíduos infetados com HIV, há
evidências limitadas do desempenho dos testes, segundo vários estudos. Os testes
serológicos são claramente menos confiáveis nestes indivíduos e há dúvidas sobre que
Figura 11. Microscopia ótica de formas amastigotas de Leishmania spp. num aspirado de medula óssea (1000X). Observam-se numerosas formas amastigotas (setas pequenas) no citoplasma de dois macrófagos infectados (setas maiores).
N: núcleo. Foi utilizada a coloração de Wright. A barra no canto inferior representa 20 milímetros [Adaptado de T. Pothirat, 2014].
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Diagnóstico
163
técnica é superior às outras, neste contexto. Cota et al. realizaram uma revisão, incluindo
33 estudos e 1 489 indivíduos, e mostraram uma sensibilidade total limitada dos testes
serológicos. Observaram ainda que a DAT e o Western Blot tiveram melhor desempenho
em comparação com o teste de ELISA e IFA. Num estudo que incluiu 113 indivíduos
sintomáticos infetados com HIV, o DAT apresentou bom desempenho geral
(sensibilidade de 89%), sem diferenças estatísticas em comparação com o diagnóstico
molecular; o teste IFA apresentou menor sensibilidade (45,6%) (13).
4.3. Antigénico
O teste de aglutinação de látex (KAtex; Kalon Biological, Reino Unido) foi
projetado para detetar antígenos de Leishmania sp na urina. Teoricamente, os métodos
para detetar antígenos funcionariam melhor no diagnóstico de Leishmaniose ativa em
indivíduos coinfetados com HIV, porque os resultados estariam relacionados com carga
de parasitas. Apesar deste conceito, o kit de Katex mostrou sensibilidade e especificidade
satisfatória em indivíduos com LV imunocompetentes, mas menor sensibilidade em
indivíduos coinfetados com HIV. E num estudo que incluía uma pequena amostra de 13
indivíduos com coinfecção Leishmania-HIV na América Latina, apenas cinco eram Katex
positivos, enquanto a sensibilidade do DAT foi 100% (3,12,13).
4.4. Molecular
A PCR é uma técnica útil que foi usada para deteção de diferentes espécies de
Leishmania sp. Os protocolos de PCR podem ser aplicados em numerosas amostras
clínicas, com um melhor desempenho do que os métodos parasitológicos clássicos, com
uma sensibilidade analítica de cerca de 0,01 parasita por reação. Os ensaios de PCR com
amostras de medula óssea e sangue periférico provaram ser uma ferramenta confiável
para o diagnóstico de VL em indivíduos seropositivos para HIV, com uma sensibilidade
de 93 a 100% e 83 a 98%, respetivamente. A PCR é uma técnica útil para monitorizar a
eficácia do tratamento a longo prazo e para calcular o valor preditivo de recidivas devido
ao seu alto desempenho em amostras não invasivas (12,13).
É importante notar que existem vários métodos de PCR, mas, provavelmente, o
teste de PCR baseado na amplificação do cinetoplasto é o método mais sensível para
detetar o DNA de Leishmania sp.
Embora este método seja considerado uma ferramenta útil para o diagnóstico de
indivíduos coinfetados, é de salientar que indivíduos assintomáticos podem apresentar
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Diagnóstico
164
resultados positivos, o que limita seu uso ao diagnóstico de doença ativa em áreas de
elevada transmissão de LV (12,13).
4.5. Estratégia de Diagnóstico nos Serviços de Saúde de Áreas
Endémicas
De forma a controlar a infeção por Leishmania sp, principalmente em áreas
endémicas, deve ser elaborada uma política de diagnóstico específica para o serviço de
saúde, uma vez que as técnicas laboratoriais disponíveis dependem fortemente do nível
do sistema de saúde (Tabela 1). Segundo a WHO, nos cuidados de saúde primários e nos
hospitais de distrito rural em áreas altamente endémicas, deve ser utilizado o teste
imunocromatográfico rK39. Indivíduos clinicamente suspeitos com um teste positivo de
rK39 e sem história de Leishmaniose Visceral devem ser tratados. Em áreas onde a
sensibilidade do teste rK39 é inferior a 90%, um teste serológico adicional (por exemplo,
DAT) pode ser necessário se os resultados do teste rK39 forem negativos. O diagnóstico
parasitológico, que também é necessário para diagnosticar uma recaída da Leishmaniose
Visceral, deve ser realizado ao nível de instituições de saúde distrital ou superior. Em
áreas de baixa endemicidade, como a região do Mediterrâneo, são necessários algoritmos
de diagnóstico mais específicos que incluam PCR e exame parasitológico no sangue e na
medula óssea (1).
Tabela 1. Técnicas predefinidas para o diagnóstico de Leishmaniose Visceral em áreas altamente endémicas, por nível de sistema de saúde, segundo a estratégia da WHO [Adaptado de (1)]
Nível de Sistema de Saúde Testes de Diagnóstico
Cuidados de Saúde Primários Teste rK39
Hospital Distrital
Teste rK39, DAT
Microscopia em aspirado de medula
óssea, baço ou nódulo linfático
Cuidados de Saúde Terciários
Serologia: Teste rK39, DAT, outros (p.e.
IFA, ELISA)
Microscopia em amostras de pele, medula
óssea, baço ou nódulo linfático
Cultura ou PCR
Nota: O teste de aglutinação direta deve ser usado somente se a supervisão adequada e a garantia de qualidade estiverem
disponíveis a nível distrital. A aspiração do baço deve ser realizada apenas por pessoal médico experiente e se as
instalações para tratar complicações hemorrágicas estiverem disponíveis.
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165
O algoritmo de diagnóstico da Figura 12 indica sucintamente qual a estratégia que
deve ser adotada quando existe suspeita clínica de LV. Primariamente é realizado um
teste rápido ou testes de microscopia menos invasivos e só numa segunda fase se realizam
testes mais invasivos, a nível hospitalar.
É possível verificar que ao longo de todo o algoritmo da Figura 12 existe a
necessidade de realizar paralelamente o Teste HIV, se desconhecida a situação do
indivíduo, dada a prevalência da coinfecção. Desta forma, torna-se essencial efetuar testes
sensíveis e específicos e que ao mesmo tempo estejam disponíveis nas áreas endémicas.
São indicados os testes serológicos de 4ª geração (onde se pesquisam em
simultâneo os anticorpos anti-HIV 1 e anti-HIV 2 e o antigénio p24 e que detetam o HIV
Figura 12. Algoritmo para o diagnóstico de LV em indivíduos infetados com HIV [Adaptado de (12)].
Suspeita clínica de LV
Teste Imunocromatográfico Rápido Testes de microscopia menos invasivos
Encaminhar utente para
ambiente hospitalar
Repetir testes serológicos (pelo
menos 2 testes diferentes)
PCR no sangue e/ou microscopia/cultura utilizando
amostras mais invasivas (medula óssea e baço)
Tratamento
+ Teste HIV, se desconhecido
Tratamento
+
Teste HIV, se desconhecido
Teste HIV, se desconhecido
Tratamento
+
Teste HIV, se desconhecido
Colher sangue, raspados de pele ou
aspirado de nódulo linfático
Positivo Negativo
Negativo
Negativo
Positivo
Positivo
Excluir outro possível diagnóstico diferencial e
considerar o tratamento de acordo com a avaliação
clínica
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Stefanie Baptista Diagnóstico
166
1 do grupo 0) para a determinação inicial de infeção por HIV, já que estes métodos
apresentam uma excelente sensibilidade (99,78%-100%) e especificidade (99,5%-
99,93%). A amostra preferencial para o estudo laboratorial de infeção por HIV é o sangue
venoso (32).
Sem dúvida, este tipo de testes apresenta inúmeras vantagens, designadamente o
tempo de resposta ser mais curto do que com o WB (Western Blot), o custo ser mais baixo,
a sensibilidade para a deteção de infeções agudas ser maior e ainda conseguir manter a
capacidade para a deteção das infeções estabelecidas. É importante o facto de que a maior
parte dos diagnósticos se realiza apenas recorrendo a dois testes laboratoriais bem como
a redução ou eliminação da possibilidade de classificação errada das infeções HIV-2.
Nestes procedimentos, só são necessários testes RNA para as amostras sem Acs que
corresponderão a infeções agudas. Importa realçar também que estes testes de 4ª geração
facilitam imenso a entrada nos cuidados de saúde especializados (retentionin care) (33).
O CDC e a DGS apresentam um novo algoritmo para o diagnóstico da infeção por
HIV (Figura 13). Se, pelo menos um destes for reativo, deve ser efetuado teste rápido
serológico de discriminação HIV-1/HIV-2. Caso se apresente teste HIV-1 não reativo e
teste HIV-2 não reativo ou inconclusivo, deve ser efetuado TAN (Técnica dos Ácidos
Nucleicos RT-PCR) para RNA do HIV-1 e HIV-2. Se nenhum deles for reativo, deve ser
feita a pesquisa de DNA integrado por PCR (DNA Proviral) (32,33).
Caso estes testes serológicos não estejam disponíveis numa primeira fase,
nomeadamente em determinadas zonas endémicas, pode-se recorrer a testes rápidos em
situações de point of care (POC). No entanto, é necessário ter em atenção que o uso deste
tipo de testes rápidos apresenta menor sensibilidade, no caso de utilização de um teste de
3ª geração, já que, por não pesquisarem o antigénio p24, podem dar origem a um número
superior de falsos resultados negativos. Para além disso, os locais onde estes tipos de
testes são realizados devem ser supervisionados por um laboratório certificado e devem
ser alvo de um programa robusto de controlo da qualidade (32).
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Figura 13. Algoritmo para o diagnóstico de HIV [Adaptado de (32,33)].
Interessa notar que durante os primeiros 18 meses de vida, os métodos
moleculares para o diagnóstico da infeção por HIV são os adequados para o diagnóstico
precoce, não devendo ser prescritos os métodos de pesquisa de anticorpos (32).
Reportar como HIV-1 ou HIV-2 positivo
TAN para RNA do HIV-1 e HIV-2
DNA Pro-viral Pesquisa de DNA integrado - PCR
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Stefanie Baptista Terapêutica
168
5. Terapêutica
A introdução da ART na Europa levou à diminuição significativa do número de
novas infeções de LV em indivíduos seropositivos para HIV, conforme mencionado
anteriormente. Reduziu ainda o risco de recaída nos indivíduos coinfetados, bem como a
morbilidade e mortalidade (12). Existem cinco categorias de ART: inibidores da
transcriptase reversa análogos de nucleótidos (NRTIs, do inglês, nucleoside reverse
transcriptase inhibitors), inibidores da transcriptase reversa não análogos de nucleótidos
(NNRTIs, do inglês, non-nucleoside reverse transcriptase inhibitors), inibidores de
protease viral (PIs, do inglês, protease inhibitors), inibidores da integrasse e inibidores
de entrada (enfuvirtide, antagonistas do co-recetor CCR5). O tratamento padrão consiste
numa combinação de pelo menos três fármacos (muitas vezes chamados de "terapêutica
anti-retroviral altamente ativa" ou HAART) que reprimem a replicação do HIV (34).
Como tratamento de primeira linha em mulheres grávidas e a amamentar,
incluindo mulheres grávidas no primeiro trimestre de gravidez e mulheres em idade fértil,
a ART deve conter um NNRTI (Nevirapina ou Efavirenz) e dois NRTIs, um dos quais
deve ser Lamivudina ou Emtricitabina e o outro Zidovudina ou TDF (Tenofovir
Disoproxil Fumarato). A WHO recomenda uma combinação diária de dose fixa de TDF
+ 3TC (Lamivudina) + EFV A (Efavirenz A). Aplica-se tanto ao tratamento ao longo da
vida quanto à ART iniciada para a prevenção da transmissão congénita e depois
interrompida. Os PIs estão incluídos em terapêuticas de segunda linha (35).
O tratamento da Leishmaniose em indivíduos com HIV caracteriza-se por um
número reduzido de opções terapêuticas. Os fármacos são inacessíveis devido ao seu
preço, falta de registo, toxicidade ou ineficácia ou porque ainda não foram testados nestes
indivíduos. Para além disso, existem poucos ensaios clínicos a analisar a eficácia dos
diferentes tratamentos para indivíduos coinfetados com Leishmania-HIV. Em geral, estes
indivíduos têm taxas de cura mais baixas, maiores taxas de toxicidade e maiores taxas de
mortalidade por Leishmaniose do que os indivíduos imunocompetentes. Isto verifica-se
porque a baixa contagem de células CD4+ pode impedir uma recuperação completa e
também porque as múltiplas recidivas muitas vezes não respondem aos fármacos usados
anteriormente. Um outro problema tem haver com o facto de se extrapolar os dados e o
tratamento da L. donovani na África ou na Ásia para os casos na Europa, onde a L.
infantum provavelmente tem diferentes suscetibilidades para os fármacos, menos
virulência e parece ocorrer em indivíduos com menor contagem de células CD4+. De
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
169
facto, ainda não foram estabelecidos protocolos de tratamento para qualquer região. É
importante notar que uma resposta parasitológica ao tratamento não é indicativa de
ausência de recidivas futuras, enquanto que uma resposta clínica não indica
necessariamente a inexistência de parasitas (12).
5.1. Leishmaniose
5.1.1. Antimoniais Pentavalentes (AP) – Sb5+
Os Antimoniais Pentavalentes injetáveis (Estibogluconato de sódio e Antimoniato
de meglumina) foram extensivamente utilizados e o principal tratamento para LV durante
várias décadas, sendo ainda altamente efetivos, exceto em regiões da Índia (Bihar) e do
Nepal, onde apresentam uma grande resistência (12).
Um tratamento com Antimoniais, segundo o procedimento recomendado pela
WHO de 20 mg/kg de peso corporal/dia durante 28 a 30 dias, levou a uma resposta clínica
e/ou parasitológica em 33 a 82% de indivíduos coinfetados europeus, sendo as recaídas
comuns. As taxas de sucesso em estudos publicados variam muito devido a altos níveis
de abandono e morte precoce. A pancreatite induzida por fármacos foi a causa mais
comum de descontinuação do tratamento e morte. Também foram relatadas alterações
graves no padrão cardíaco. Na Etiópia, um terço dos indivíduos coinfetados morreram
durante o tratamento com Antimoniais. A mortalidade está claramente associada a este
tipo de terapêutica, bem como uma maior incidência de vómitos graves (12).
A causa do aumento da pancreatite clínica com Antimoniais em indivíduos
coinfetados não é clara, é possível que a toxicidade antimonial afete seletivamente estes
indivíduos porque o Antimonial Pentavalente é reduzido ao Antimonial Trivalente tóxico
em maior percentagem. A toxicidade e alta mortalidade durante o tratamento tornam os
Antimoniais inadequados como tratamento de primeira linha para indivíduos coinfetados.
Uma desvantagem adicional destes fármacos é que eles demonstraram estimular a
replicação do HIV-1 in vitro (12).
Paumgartten et al. descreveram que a administração experimental repetida de
Antimoniato de meglumina em mulheres grávidas era letal para o embrião e teratogénica
em ratos, mas nenhuma toxicidade materna e nenhuma redução de peso fetal foram
observadas nos grupos tratados. Também foi relatado que os compostos deste fármaco
atravessam a barreira placentária e podem impregnar o tecido nervoso fetal, levando a
síndromes graves de atraso mental. Durante o período de amamentação, se a mãe está a
ser tratada com compostos de Sb5+, o recém-nascido deve ser amamentado 5 a 6 horas
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
170
após a administração do fármaco na mãe, quando os níveis de Antimoniais no leite
tornam-se insignificantes (6).
Conforme indicado pelo CDC, doses intravenosas/intramusculares de 20 mg/kg
de Antimoniais durante 28 dias mostraram excelentes resultados no tratamento de LC e
LMC em indivíduos coinfetados com HIV (13).
5.1.2. Desoxicolato de Anfotericina B (ANB)
O Desoxicolato de Anfotericina B tem sido amplamente utilizado para o
tratamento da LV, principalmente na Índia, onde ainda é altamente efetiva após 10 anos
de uso extensivo. O risco de nefrotoxicidade e hipocalemia requer hospitalização e, de
preferência, monitorização bioquímica durante o tratamento, o que é difícil de alcançar
em locais com poucos recursos. A ANB já foi abandonada nos países ocidentais e
substituída pela Anfotericina Lipídica, mais segura e eficaz (12).
Curiosamente, in vitro, a ANB é um fármaco mais potente do que os Antimoniais
no combate à Leishmaniose, pois a sua atividade não depende da resposta imunológica
do paciente. No entanto, em indivíduos coinfetados, a sua superioridade em relação aos
Antimoniais não foi demonstrada. As taxas iniciais de cura variaram de 58 a 82%, com
recaídas regulares. As taxas de toxicidade de ambos os medicamentos mostraram ser
semelhantes, com a ANB a causar toxicidade renal em 18 a 36% dos indivíduos. Tal como
acontece com os Antimoniais, os efeitos adversos da ANB em indivíduos coinfetados são
mais graves do que aqueles em indivíduos seronegativos para HIV (12).
A ANB atravessa a barreira placentária, mas as concentrações plasmáticas no feto
não excedem um terço das observadas no plasma materno. Com base nas altas taxas de
cura de LV (95 a 100%), o uso de ANB foi ampliado e relatado o seu uso seguro em
mulheres grávidas sem repercussões no feto (6).
5.1.3. Anfotericina B Lipídica (ANB-L)
Foram desenvolvidas várias formas lipídicas de ANB e todas elas apresentam
maior segurança do que a de ANB, com a ANB-L considerada superior às outras. A ANB-
L possui o índice terapêutico mais elevado de todos os fármacos para a Leishmaniose,
incluindo as demais formas lipídicas de ANB. É, portanto, indicado para o tratamento de
indivíduos coinfetados. Os limitados dados sobre o uso deste fármaco em indivíduos
coinfetados são provenientes principalmente da Europa. Infelizmente, a ANB-L é muito
dispendiosa, embora já esteja disponível por um custo sem fins lucrativos nos Países em
Desenvolvimento. Nos indivíduos imunocompetentes, não foram observadas falhas no
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
171
tratamento com a dose total recomendada de 20 mg/kg, exceto no Sudão. Os indivíduos
sudaneses sem HIV eram menos sensíveis à ANB-L do que os europeus ou índios: as
taxas de cura para doses totais de 15 mg/kg, 16 a 20 mg/kg e 20 mg/kg eram 50%, 64%
e 88%, respetivamente. Noutro estudo, 10 dos 64 indivíduos sudaneses não responderam
ao tratamento com ANB-L de 20 mg/kg. Pensa-se que isto pode estar relacionado com as
altas cargas parasitárias iniciais e com doenças imunossupressoras (infeção por HIV e
tuberculose), e sugeriu-se que doses mais elevadas deveriam ter sido usadas. Na Europa,
doses totais de até 30 a 40 mg/kg foram avaliadas num pequeno número de indivíduos
coinfetados e foram bem toleradas, mas não preveniram recaídas (12).
Os relatórios de tratamento da LMC associada ao HIV são escassos, no entanto
foi descrita a cura de um indivíduo coinfetado após o tratamento com ANB-L, cujo
tratamento inicial com Antimoniais tinha falhado. Recomenda-se profilaxia secundária
com ANB-L (3-4 mg/kg) a cada 2-4 semanas para prevenir recaídas de LV em indivíduos
coinfetados pelo HIV, uma vez que apresentam uma alta taxa de recorrência anual (12).
Conforme indicado pelo CDC, doses intravenosas/intramusculares de 20-40
mg/kg de ANB-L durante 28 dias mostraram excelentes resultados no tratamento de LC
e LMC em indivíduos coinfetados com HIV (13).
5.1.4. Miltefosina
O tratamento com Miltefosina tem demonstrado ser seguro e eficaz. É comum
verificar-se efeitos adversos gastrointestinais relativamente moderados. Um estudo de
299 indivíduos indianos mostrou que o vómito ocorreu em 38% e a diarreia ocorreu em
20% dos indivíduos e geralmente durou 1 a 2 dias. Nenhum destes indivíduos estava
coinfetado. Uma grande desvantagem deste fármaco é o seu potencial efeito teratogénico,
impedindo o seu uso em mulheres grávidas ou em lactação e em mulheres em idade fértil
que não tomam contracetivos (12).
Na Etiópia, os efeitos adversos com a Miltefosina são piores em indivíduos HIV-
positivos. Ocorreram vómitos em 65% dos indivíduos coinfetados, em comparação com
45% dos indivíduos não coinfetados. A Miltefosina foi utilizada em 39 indivíduos
coinfetados da Europa que apresentaram recaídas após os tratamentos. A cura foi
alcançada em 64% dos indivíduos, mas quase todos tiveram recaídas e retomaram o
tratamento, com sucesso moderado. Verificou-se que o tratamento prolongado é seguro,
já que um paciente recebeu tratamento durante 2 anos. Na Etiópia, a Miltefosina mostrou-
se menos eficaz do que os Antimoniais em indivíduos coinfetados, com 18% e 2% dos
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
172
indivíduos cujo tratamento inicial falhou e 25% e 11% com recidivas, respetivamente,
em 6 meses. No entanto, no geral, a mortalidade da Miltefosina (6%) foi inferior à dos
Antimoniais (12%). A Miltefosina tem uma semivida de 1 semana e especialmente nos
indivíduos coinfetados recorrentes existe o risco de desenvolver parasitas resistentes. Na
Índia, onde a distribuição de Miltefosfina em larga escala é planeada no contexto de um
programa de eliminação, o seu uso controlado e o conhecimento do estado de HIV dos
indivíduos são de importância crucial. Na Europa e em outras zonas onde a transmissão
de LV é zoonótica, o uso de Miltefosina (e outros fármacos de primeira linha) não deve
ser permitido em cães para evitar o desenvolvimento de resistências (12).
A Miltefosina também tem sido utilizada para o tratamento de LDPK em
indivíduos coinfetados com HIV (13).
5.1.5. Sulfato de Paramomicina ou Aminosidina
O Sulfato de Paromomicina foi licenciado mais recentemente, mas mostrou-se tão
eficaz quanto a ANB e foi muito bem tolerado. Os principais efeitos secundários foram
uma elevação reversível das enzimas hepáticas, em aproximadamente 1% dos indivíduos
e dor no local da injeção. A Paromomicina é a opção terapêutica mais barata, tem um
bom perfil de segurança e é um antibiótico de amplo espectro, eficaz contra bactérias
gram-positivas e gram-negativas, muitos protozoários e Mycobacterium tuberculosis.
Podem desenvolver-se facilmente resistências adquiridas, contudo, a atividade do
fármaco em indivíduos coinfetados ainda não foi estabelecida (12).
5.1.6. Isotionato de Pentamidina
O Isotionato de Pentamidina foi usado para tratar LV principalmente na Índia,
mas foi abandonado devido à gravidade dos seus efeitos adversos e à fraca eficácia. Uma
complicação séria é a Diabetes mellitus irreversível, ocorrendo em 4 a 12% dos casos.
Dada a falta de segurança ao tratar indivíduos coinfetados, devido à sua toxicidade, estes
fármacos não devem ser utilizados para profilaxia secundária, mas reservados para o
tratamento de casos agudos. Ainda assim, a Pentamidina pode ser utilizada em profilaxia
secundária com doses baixas (12). A recomendação é de doses de 4 mg/kg, mensalmente
(13).
É notável que na sequência de um acordo entre a WHO e o fabricante (Sanofi-
Aventis), a Pentamidina esteja disponível gratuitamente para o tratamento de todas as
doenças negligenciadas, incluindo a Leishmaniose (12).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
173
5.1.7. Outros Fármacos
Lauletta et al. sugeriram que um ponto importante a ser explorado no tratamento
da Leishmaniose, tanto a Visceral como a Cutânea, é a investigação de novos fármacos
ativos contra todas as espécies de Leishmania sp, com foco no mecanismo de ação para
eliminar o parasita. Esta é, sem dúvida, uma boa opção terapêutica porque, após a cura
clínica, os parasitas continuam presentes em alguns órgãos ou lesões, e se a
imunossupressão ainda está presente, podem ocorrer reações ou recidivas de
Leishmaniose (13).
5.1.8. Combinações
A terapêutica de combinação para LV deve ser introduzida com urgência para
minimizar o desenvolvimento de resistências. Isto é especialmente importante para
indivíduos coinfetados, uma vez que a exposição repetida a fármacos para Leishmaniose
gera, inevitavelmente, resistência. Para além disso, indivíduos com LV incurável ou
indivíduos com LDPK podem transmitir parasitas resistentes a fármacos. Combinações
de Miltefosina e Paromomicina e Antimoniais Pentavalentes e ANB foram estudadas in
vivo e in vitro. Em indivíduos coinfetados, mesmo se estas combinações não impedirem
a recaída, podem preservar a sensibilidade ao fármaco e, portanto, prolongar a
sobrevivência (12). Adicionalmente, uma combinação de ANB-L (30 mg/kg) e
Miltefosina (100 mg/dia durante 14 dias) também foi utilizada para o tratamento de co
infeções na Índia com ótimos resultados, conforme relatado por Mahajan et al. (13).
5.2. Outras Abordagens Terapêuticas
Como abordagens terapêuticas alternativas, sugeriu-se que, na ausência de uma
resposta imunológica adequada, a adição de IFN- ou a terapêutica recombinante com
IL-2 pode ser útil na LV. No entanto, ainda nenhum estudo demonstrou benefícios
adicionais. Uma outra abordagem interessante é a esplenectomia seletiva, que foi avaliada
em indivíduos coinfetados. No entanto, apesar de ser eficaz na restauração de parâmetros
hematológicos e na redução da necessidade de transfusões de sangue, não evitou novas
recaídas. Além disso, este procedimento deve ser evitado devido ao risco de sepsis e
malária grave (12).
5.3. Prevenção
A prevenção da infeção por Leishmania sp consiste, inicialmente, em reduzir a
exposição ao vetor: utilização de inseticidas e mosquiteiros e remoção dos pequenos
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Terapêutica
174
reservatórios de água (p.e. proteção de contentores com água e remoção de pratos de
vasos). Não é indicada a profilaxia primária, ou seja, profilaxia antes de ocorrer a infecção
e, infelizmente, não existem vacinas disponíveis para o ser humano. Assim, no caso dos
UDI, os programas de troca de seringas podem contribuir para reduzir a transmissão nesta
subpopulação.
No entanto, após o primeiro caso de LV, é recomendada a profilaxia secundária
nos indivíduos coinfetados com uma contagem de linfócitos CD4+ <200 células/L, ou
seja, profilaxia com o objetivo de evitar recaída e manifestação clínica de Leishmaniose.
De todos os fármacos já estudados, aqueles que apresentaram eficácia foram a L-AmB, a
CL-AmB, a Pentamidina e os Antimoniais Pentavalentes. Destes, deve-se considerar
terapêutica de primeira linha a CL-AmB ou L-AmB. Por outro lado, o Alopurinol não é
recomendado devido à sua baixa eficácia.
Na profilaxia secundária com CL-AmB, um estudo demonstra que 78% dos
indivíduos não teve recorrências em 12 meses. Todavia, existe controvérsia quanto à
duração deste tipo de terapêutica. Alguns autores defendem que a profilaxia secundária
deve ser suspensa quando a contagem de linfócitos CD4+ aumenta para 200-350
células/L, enquanto outros aceitam que deve ser continuada indefinidamente (12).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Conclusão
175
CONCLUSÃO
A disseminação e sobreposição de Leishmaniose e infeção por HIV nas principais
áreas endémicas de Leishmaniose, Índia, Brasil e África Oriental, tornam a coinfecção
LV-HIV uma preocupação mundial. Os programas de prevenção de HIV e LV devem
desenvolver atividades de intervenção integradas e bem coordenadas, particularmente em
áreas onde a LV é endémica. Existe a necessidade de desenvolver estratégias localmente
aplicáveis para a intervenção adequada nas comunidades de migrantes já que a
mobilidade das pessoas de áreas onde a doença é não endémica para aquelas em que é
endémica, e a presença de refugiados bem como deslocações internas da população
devido a guerras e conflitos constituem importantes fatores para a propagação de ambas
as doenças (12).
São necessárias mais pesquisas para determinar claramente o impacto da interação
entre Leishmania sp e o HIV, a fim de compreender melhor a imunopatogénese da doença
em indivíduos coinfetados. Isso permitiria melhores estratégias de tratamento e
monitorização de ambas as doenças nestes indivíduos. Apesar disto, é bem compreendido
que a coinfecção Leishmania-HIV induz um défice nas respostas humorais e celulares do
hospedeiro, limitando o valor de diagnóstico dos testes serológicos nos indivíduos
coinfetados. Apenas 40 a 50% dos indivíduos com LV-HIV têm níveis detetáveis de
anticorpos específicos contra Leishmania sp. Existe assim a necessidade de estudos de
análise comparativa de diferentes áreas geográficas, utilizando diferentes técnicas
serológicas, incluindo a contagem de células CD4+, para caracterizar as amostras de soro
(3,12).
Quanto ao diagnostico da coinfecção, tem sido verificado um extraordinário
progresso, nos últimos anos. Na realidade, o principal desafio nos ensaios foi encontrar
um teste padrão, a fim de estabelecer programas estratégicos eficazes para controlar e
erradicar a Leishmaniose. Para além deste aspeto, na coinfecção, a Leishmaniose pode
aparecer sem os sinais clínicos típicos, o que dificulta o diagnóstico, devido à ação
imunossupressora presente. No entanto, a DAT, o Western Blot e o teste de aglutinação
de látex (KAtex) demonstraram ser superiores no diagnóstico destes casos de coinfecção.
Pode ainda ser necessário um teste molecular ou outro exame serológico ou parasitológico
adicional para alcançar um diagnóstico preciso se os resultados dos testes serológicos
forem negativos (3).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Conclusão
176
Todas as terapêuticas para a Leishmaniose são menos eficazes em indivíduos
seropositivos para HIV. Existe uma alta taxa de mortalidade devido a doença coexistente,
complicações e toxicidade dos fármacos. Os Antimoniais Pentavalentes e a ANB são mais
tóxicos para os indivíduos com HIV, que exigem monitorização devido ao risco de
pancreatite, cardiotoxicidade e nefrotoxicidade. Estes fármacos devem ser evitados se
estiver disponível ANB-L. Ao considerar a terapêutica de combinação, os fármacos
devem ser administrados sequencialmente. A Miltefosina é o fármaco mais seguro para
indivíduos coinfetados, embora ainda haja problemas de teratogenicidade a considerar.
Em geral, os indivíduos que não conseguem eliminar o parasita apresentam recaídas,
independentemente do fármaco utilizado. Estas devem ser tratadas adequadamente, e a
terapêutica combinada pode representar a melhor abordagem para evitar a resistência aos
medicamentos, ao mesmo tempo que equilibra os benefícios com a toxicidade dos
mesmos. Os fármacos utilizados no tratamento de recaídas devem ser evitados na
profilaxia secundária (12).
De forma a prevenir a infeção congénita, no caso da mulher grávida deve ser
combinada a ART com a terapêutica para Leishmaniose e, de acordo com Kumar et al. e
Caldas et al., é recomendada a ANB como fármaco de primeira linha por apresentar
menos efeitos adversos materno-fetais (6).
Futuramente, a prioridade na investigação de tratamentos em indivíduos
coinfetados deverá incluir a avaliação da eficácia e tolerância de fármacos alternativos,
bem como combinações com fármacos atualmente disponíveis. Os possíveis benefícios a
serem alcançados deverão incluir uma duração limitada do tratamento, eficácia
melhorada, redução de custos e proteção da resistência a fármacos (12).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte III
Stefanie Baptista Bibliografia
177
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Parte IV
IX Mestrado Análises Clínicas Parte IV
Stefanie Baptista Conclusões e Perspetivas Futuras
183
Conclusões e Perspetivas Futuras
O estágio realizado no Laboratório Dr. Joaquim Chaves permitiu-me adquirir
conhecimentos acerca das condições de colheitas exigidas para obter os diferentes
produtos biológicos, o seu transporte e armazenamento. Aprendi a identificar quais os
produtos necessários à execução de cada parâmetro analítico, bem como executar as
metodologias aplicadas aos mesmos. Para além disso, aprendi a interpretar o Controlo de
Qualidade Interno e Avaliação Externa da Qualidade.
Considero que os objetivos da realização do estágio, que passam por adquirir a
capacidade de trabalhar em equipas multidisciplinares, bem como promover a integração
no meio profissional, aplicando os conhecimentos adquiridos ao longo do mestrado,
foram cumpridos. Estes conhecimentos foram também úteis no desenvolvimento da
monografia apresentada neste trabalho. A realização e duração total deste estágio
possibilitou-me colocar em prática os conhecimentos obtidos nas unidades curriculares
do mestrado e ainda obter novas ferramentas para a prática profissional, nomeadamente
a organização das atividades diárias do laboratório, tendo sido muito benéfica para a
minha formação pessoal e para o meu futuro na profissão.
Parte V
IX Mestrado Análises Clínicas Parte V
Stefanie Baptista Anexos
187
ANEXOS
Anexo 1 - Testes de Identificação Microbiológica
a) Coloração de Gram
- Objetivo: serve de diagnóstico presuntivo do agente infecioso, avalia a qualidade
da amostra e orienta a identificação definitiva.
- Reagentes: solução de cristal violeta, solução de lugol, solução de safranina,
metanol, acetona, água reagente Grau I e soro fisiológico estéril.
- Equipamento: aparelho de coloração, bico de bunsen e vortex.
O aparelho realiza a coloração de forma automática, mergulhando as lâminas nos
4 poços, na seguinte ordem:
- Solução de cristal violeta 90 seg;
- Lavagem com água 5 seg;
- Solução de Lugol 90 seg;
- Descoloração com solução metanol/acetona 30 seg;
- Lavagem com água 45 seg;
- Solução de safrina 30 seg;
- Secagem das lâminas 4 min.
De forma a garantir a qualidade da coloração, é efetuado um controlo com duas
estirpes ATCC: E. coli 25922 e S. aureus 25923.
Retiram-se 5 colónias, aproximadamente, de cada estirpe e faz-se uma suspensão
das mesmas em soro fisiológico (2 ml), num tubo de polistireno. Agita-se em vortex e
preparam-se 50 lâminas com a ajuda de uma ansa. Deixa-se secar e fixa-se à chama.
Diariamente, uma destas lâminas é usada como coloração controlo.
- Resultados: as bactérias são classificadas como Gram positivo e Gram negativo.
Nas amostras, podem ser observados leucócitos (coram como Gram negativo), células e
formas parasitárias e leveduriformes, que devem ser referenciados no resultado final.
Caso não se observem microorganismos, é mencionado no boletim “Ausência de
microorganismos”.
b) Teste da Catalase
- Amostra: colónias com 18 a 24h de incubação.
- Objetivo: distinguir Staphylococcus spp. (catalase positiva) de Streptococcus
spp. (catalase negativa).
IX Mestrado Análises Clínicas Parte V
Stefanie Baptista Anexos
188
Para realizar este teste, retiram-se algumas colónias do meio de cultura, com uma
ansa ou bastonete, para uma lâmina. Juntam-se 1-2 gotas de peróxido de hidrogénio 3%
e mistura-se com a ansa ou bastonete. Verifica-se se há libertação de oxigénio (pequenas
bolhas).
- Resultados: catalase positiva – libertação de O2
catalase negativa – ausência de libertação de O2
c) Teste para Identificação de Staphylococcus aureus
- Amostra: colónias de uma cultura suspeita de S. aureus em meio Columbia ou
meio Chapman/Manitol.
- Objetivo: deteção simultânea da afinidade para o antigénio do fibrinogénio (fator
de aglutinação), da proteína A, e os polissacáridos capsulares de Staphylococcus aureus.
O kit PastorexTM STAPH-PLUS trata-se de um teste de aglutinação rápida,
englobando partículas de latex azul sensibilizadas com fibrinogénio humano e com
anticorpos monoclonais.
- Resultados: positivo – aglutinação da amostra com o reagente ao fim de 30 s e
ausência de aglutinação do controlo negativo
negativo – ausência de aglutinação da amostra e do controlo
negativo
d) Teste da Oxidase
- Amostra: colónias com morfologia sugestiva, com 18-24h de incubação.
- Objetivo: separar as bactérias Pseudomonadaceae (oxidase positiva) das
Enterobacteriaceae (oxidase negativa). As Neisseriaceae são também oxidase positiva.
Este teste baseia-se na produção intracelular da enzima citocromo oxidase pela
bactéria. Deita-se 1-2 gotas do reagente da oxidase sobre discos de papel não impregnados
e coloca-se sobre o disco a colónia.
- Resultados: oxidase positiva – cor de violeta a púrpura em 10-30 s.
oxidase negativa – reação tardia ou ausência de cor.
e) Teste da Bacitracina
- Amostra: colónias com β-hemólise sugestiva.
- Objetivo: detetar Streptococcus β-hemolíticos do Grupo A de Lancefield.
Coloca-se um disco impregnado com bacitracina na superfície do meio de
Columbia semeado com o microorganismo em estudo, tendo em conta que os
Streptococcus β-hemolíticos do Grupo A de Lancefield são geralmente sensíveis a uma
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pequena quantidade de Bacitracina. Pelo contrário, os Streptococcus β-hemolíticos de
outros grupos são geralmente resistentes.
- Resultados: positivo – Streptococcus β-hemolíticos do Grupo A – inibição à
volta do disco 15 mm
negativo – Streptococcus β-hemolíticos de outros grupos –
resistência à bacitracina e crescimento à volta do disco
f) Teste da Optoquina
- Amostra: colónias com α-hemólise.
- Objetivo: testar a sensibilidade dos Streptococcus à optoquina.
Coloca-se um disco impregnado com optoquina na superfície do meio de
Columbia semeado com o microorganismo em estudo, tendo em conta que o
Streptococcus pneumoniae é geralmente sensível, ao contrário dos outros Streptococcus.
- Resultados: halo de inibição 15 mm – Eventualmente Streptococcus
pneumoniae.
g) Teste de Grupagem para Identificação de Streptococcus β-
hemolíticos
- Amostra: colónias com β-hemólise.
Este teste baseia-se no facto de os Streptococcus β-hemolíticos possuírem
antigénios específicos de grupo, que podem ser extraídos e identificados através de anti-
soros. O reagente é constituído por partículas de latex sensibilizadas por anticorpos
dirigidos, que quando se ligam aos respetivos antigénios formam uma aglutinação visível
das partículas de latex. Os testes são específicos para Streptococcus β-hemolíticos do
grupo A, B, C, D, F e G.
Prepara-se um extrato com 0,4 ml de enzima, num tubo, e junta-se 2-3 colónias
do meio. Agita-se no vortex e incuba-se 10-15 min a 35ºC. Ao chegar à temperatura
ambiente, homogeniza-se o tubo no vortex e coloca-se numa placa 1 gota de latex e 1
gota de extrato. Por fim, mistura-se com uma ansa durante 2 min.
- Resultados: positivo – Aglutinação em 2 min
negativo – Ausência de aglutinação
h) Galeria de identificação de Neisseria, Haemophilus e Moraxella
catarrhalis
- Amostra: cultura em gelose de sangue com colónias suspeitas de Moraxella
catarrhalis ou gelose de chocolate com suspeita de Neisseria e Haemophilus.
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- Reagente: API NH
Prepara-se o inócuo com várias colónias (Padrão 4 de McFarland) e aplica-se na
galeria de identificação API NH, que é um sistema padronizado que engloba mini testes.
Após uma incubação de 2 h a 35-37ºC, as reações são lidas visualmente e a identificação
do microorganismo é obtida consultando o manual com a lista de perfis.
i) Identificação serológica de E. coli enteropatogénica
- Amostra: colónia suspeita de E.coli enteropatogénica.
- Reagente: soro aglutinante anti-E. coli nonavalente.
Coloca-se 1 gota de reagente numa placa ou lâmina. Retira-se 1 colóna suspeita
da cultura e faz-se a suspensão diretamente no reagente, com uma ansa, e mistura-se.
- Resultado: positivo – aglutinação imediata (em 5 seg)
negativo – ausência de aglutinação ou aglutinação tardia
j) Identificação de Bactérias anaeróbias (ANC Test Kit)
- Amostra: colónias em cultura pura com 24-48h de incubação. Caso a cultura não
seja pura, fazer um pré-isolamento antes da identificação. Placas em meio de Columbia
ou meio de Schaedler.
- Objetivo: identificação de bactérias anaeróbias e Corynebacterium de relevância
clínica.
- Equipamento: VITEK2 (bioMérieux®).
k) Identificação de Cocos Gram positivo
- Amostra: colónia em cultura pura com 12-48h de incubação. Caso a cultura não
seja pura, faz-se um reisolamento antes do antibiograma. Retira-se uma colónia com a
ansa e semeia-se numa placa de Columbia CNA, que incuba 18-24h a 35±2°C.
- Equipamento: VITEK2
A carta de GP (Gram positivo) tem como objetivo identificar a maior parte dos
cocos Gram positivo de interesse clinico. Cada carta é cheia e selada e colocada no
incubador/leitor, automaticamente, sendo cada uma constituída por 43 teste bioquímicos.
O VITEK2 fornece a identificação em cerca de 8h, baseando-se nas reações químicas e
nos dados do próprio equipamento.
l) Identificação de Bacilos Gram negativo
- Amostra: colónia em cultura pura com 18-24h de incubação. Se não for pura,
faz-se reisolamento antes da identificação. Retira-se uma colónia com a ansa e semeia-se
numa placa de MacConkey, que incuba 24h a 35±2°C.
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- Equipamento: VITEK2
A carta GN (Gram negativo) tem como objetivo identificar a maior parte dos
bacilos Gram negativo fermentadores e não fermentadores. Cada carta é constituída por
47 testes bioquímicos. O VITEK2 fornece a identificação em cerca de 10h, baseando-se
nas reações químicas e nos dados do equipamento.
m) Identificação de Leveduras
- Amostra: colónias em cultura pura com 18-24h de incubação. Se não for pura,
faz-se reisolamento antes da identificação. Retira-se uma colónia com a ansa e semeia-se
numa placa de Sabouraud (com gentamicina e cloranfenicol), que incuba 18-24h.
- Equipamento: VITEK2
A carta ID-YST tem como objetivo identificar a maioria dos fungos com interesse
clínico. Cada carta é constituída por 46 testes bioquímicos. O VITEK2 fornece a
identificação em cerca de 15h.
n) Identificação Serológica de Salmonella spp.
- Amostra: colónias de Salmonella identificadas bioquimicamente.
Após a identificação da Salmonella através de testes bioquímicos, esta deve ser
confirmada serologicamente com um soro polivalente para as aglutininas somáticas,
incluindo também o antigénio capsular.
o) Identificação de Neisseria, Haemophilus, Campylobacter spp. E
Gardnerella vaginalis
- Amostra: colónias em cultura pura com 18-24h de incubação em meio de
Chocolate Haemophylus, Campylosel ou Chocolate VCAT. Se não for pura, faz-se
reisolamento antes da identificação.
- Equipamento: VITEK2
A carta IDNH tem como objetivo identificar Neisseria spp., Haemophilus spp.,
Campylobacter spp. e Gardnerella vaginalis. Cada carta é constituída por 30 testes
bioquímicos. O VITEK2 fornece a identificação em cerca de 6h.
Anexo 2 - Testes de Sensibilidade/Antibiograma
a) Antibiograma em placa (método de difusão Kirby-Bauer)
- Amostra: 4 a 5 colónias retiradas de um meio com 18-24h de incubação.
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- Material: placas de Mueller-Hinton simples, Mueller-Hinton com 5% de sangue
de carneiro ou chocolate com Polyvitex. Estufa de CO2 para o Haemophilus spp. e
Neisseria gonorrhoeae. Discos impregnados de antibiótico.
Método de primeira linha para Neisseria e Streptococcus β-hemolítico. Método
alternativo ou confirmatório para Enterobacteriaceae, Pseudomonas spp. e outros Gram
negativo não fermentadores, Staphylococcus spp., Enterococcus spp. e Haemophilus spp..
b) Antibiograma em galeria (fungos)
- Amostra: 2 colónias de uma cultura pura em meio de Sabouraud.
- Objetivo: estudar o crescimento dos fungos na presença de 6 antifúngicos.
O Fungitest utiliza o meio RPMI 1640 modificado e os antifúngicos Anfotericina
B, 5-Fluorocitosina, Miconazol, Cetoconazol, Itraconazol e Fluconazol, a duas
concentrações diferentes.
c) Antibiograma em galeria para Haemophilus e Branhamella
- Amostra: algumas colónias de uma cultura pura com 18-24h de incubação.
- Objetivo: determinar a sensibilidade de Haemophilus e Moraxella em meio
semissólido em condições próximas das técnicas de referência de diluição em gelose ou
microdiluição.
Os antimicrobianos testados são a Ampicilina, Amoxicilina/Ácido clavulânico,
Cefalotina, Tetraciclina, Ofloxacina, Cotrimoxazol, Rifampicina, Cloranfenicol,
Cefuroxima, Cefotaxima e são reportados segundo as recomendações do CLSI.
d) Antibiograma automatizado para bacilos Gram negativo
- Amostra: colónias em cultura pura com 18-24h de incubação. Se não for pura,
faz-se reisolamento antes do antibiograma. Retira-se uma colónia com a ansa e semeia-
se numa placa de MacConkey, que incuba 24h a 35±2°C.
- Material: placas em meio de meio de MacConkey, meio de Cled e meio de
Columbia.
- Equipamento: VITEK2
O antibiograma do VITEK2 é um sistema automatizado que se baseia na
concentração mínima inibitória (CMI).
A carta AST tem como objetivo avaliar a sensibilidade de bacilos gram negativo
aeróbios (clinicamente significativos) aos antimicrobianos e pode ser utilizada
juntamente com a carta de identificação correspondente.
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Cada carta é constituída por 64 micropoços, incluindo um poço controlo com uma
suspensão bacteriana a estudar. Cada poço contém uma determinada quantidade de um
agente antimicrobiano associado ao meio de cultura. O VITEK2 monitoriza o
crescimento em cada poço e ao fim de 18h é calculado a CMI para cada antimicrobiano.
e) Antibiograma automatizado para cocos Gram positivo
- Amostra: colónias em cultura pura com 18-24h de incubação. Se não for pura,
faz-se reisolamento antes do antibiograma. Retira-se uma colónia com a ansa e semeia-
se numa placa de Columbia, que incuba 18-24h.
- Material: placas em meio de meio de MacConkey, meio de Cled e meio de
Columbia.
- Equipamento: VITEK2
A carta AST tem também como objetivo avaliar a sensibilidade de cocos gram
positivo (clinicamente significativos).
Ver alínea d).
f) Antibiograma automatizado para Fungos Leveduriformes
- Amostra: colónias em cultura pura com 18-24h de incubação. Placas em meio
de Sabouraud.
Cada carta é constituída por 64 micropoços, incluindo um poço controlo com uma
suspensão fúngica a estudar. Cada poço contém uma determinada quantidade de um
agente antimicrobiano associado ao meio de cultura. O VITEK2 monitoriza o
crescimento em cada poço e ao fim de 18h é calculado a CMI para cada antimicrobiano.