UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA … · Primeiramente, o objetivo deste estudo foi...

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA PATRÍCIA JUNDI PENHA Prevalência de escoliose idiopática do adolescente em cidades do estado de São Paulo SÃO PAULO 2016

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE MEDICINA

    PATRCIA JUNDI PENHA

    Prevalncia de escoliose idioptica do adolescente em cidades do estado de So Paulo

    SO PAULO

    2016

  • PATRCIA JUNDI PENHA

    Prevalncia de escoliose idioptica do adolescente em cidades do estado de So Paulo

    Tese apresentada Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo

    para obteno do ttulo de Doutor em Cincias

    Programa de Cincias da Reabilitao

    Orientadora: Profa. Dra. Slvia Maria Amado Joo

    SO PAULO

    2016

  • DEDICATRIA

    Ao meu amado filho Tho, porque, assim

    como aprendi com meus pais, quero

    perpetuar que o saber a nica herana

    verdadeira que pode ser deixada aos filhos.

    Ao meu marido Mauricio, com amor e

    gratido por sua compreenso e apoio

    durante o perodo de realizao desse

    trabalho.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus.

    Profa. Dra. Slvia Maria Amado Joo, por todo ensinamento, orientao e amizade

    que contriburam para o meu crescimento cientfico e intelectual.

    Ao meu amado marido, Jose Mauricio Geraldino, por me apoiar, me ouvir nos

    momentos mais difceis e por me auxiliar em tudo o que eu precisei. Obrigada pela pacincia!

    Ao meu filho, Tho Penha Geraldino, por trazer momentos de grande alegria e amor.

    minha irm e parceira de pesquisa, Nrima Lvia Jundi Penha Ramos, por estar

    sempre ao meu lado e, com sua dedicao e brilhantssimo, me ajudar na execuo deste

    projeto.

    Aos meus pais, Claudia e Eduardo, pela dedicao e amor a mim e a todos da nossa

    famlia. Um agradecimento especial minha me que cuidou do Tho com muito amor e

    carinho sempre que eu precisava me ausentar...

    minha irm Ndia, aos meus cunhados e meus sobrinhos por serem to especiais e

    parceiros.

    Aos meus queridos amigos, Rodrigo Mantelatto Andrade e Brbarah Kelly Gonalves

    de Carvalho, que tambm colaboraram muito para que esta pesquisa fosse exequvel.

    profa. Dra. Ana Carolina Basso Schmitt, por me ensinar, com muita pacincia,

    competncia e delicadeza, a fazer e interpretar a anlise estatstica deste projeto.

    A todos os meus pacientes, por terem sido compreensveis com as mudanas de

    horrios na agenda e minha secretria, Flvia A. Serafim Dariolli, por fazer todas as

    mudanas solicitadas.

  • Luzia Donisete Verssimo por tambm cuidar do meu filho Tho com muito carinho

    todas as vezes que precisei me ausentar.

    s Prefeituras Municipais de Amparo e Pedreira, bem como s respectivas Secretarias

    Municipais de Sade, por terem autorizado e financiado realizao dos exames

    radiogrficos.

    Diretoria Regional de Ensino de Mogi Mirim, por ter autorizado a realizao deste

    projeto de pesquisa nas escolas estaduais das cidades de Amparo, Pedreira e Mogi Mirim.

    Aos diretores, coordenadores pedaggicos, professores e demais funcionrios das

    escolas estaduais por terem auxiliado o trabalho de toda a equipe de pesquisa.

    Aos adolescentes e aos pais/responsveis, por terem aceitado participar desta pesquisa.

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP), pelos recursos cedidos

    como auxlio para capacitao docente.

    Fundao de Amparo Pesquisa do estado de So Paulo (FAPESP), pelo auxlio

    financeiro cedido a este projeto de pesquisa.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Fluxograma do nmero de adolescentes aptos a participarem do estudo, avaliados e

    os que no participaram do estudo........................................................................ 35

    Figura 2 Escolimetro de Bunnell ..................................................................................... 36

    Figura 3 Foto ilustrativa do uso do escolimetro

    para mensurao do ngulo de rotao do

    tronco, conforme descrito por Bunnell65

    . Nessa foto, o ngulo de rotao de tronco

    (ART) de 10 graus ............................................................................................. 38

    Figura 4 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    frontal (vista anterior): alinhamento horizontal da cabea (A), alinhamento

    horizontal dos acrmios (B), ngulo frontal do membro inferior (C) e alinhamento

    horizontal das espinhas ilacas anterossuperiores (D) .......................................... 42

    Figura 5 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    frontal (vista posterior): alinhamento horizontal das escpulas (A) e ngulo

    perna/retrop (B) ................................................................................................... 42

    Figura 6 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    sagital: alinhamento horizontal da cabea (C7) (A), alinhamento sagital do ombro

    (B), alinhamento horizontal da pelve (C), ngulo do joelho (D), ngulo vertical do

    tronco (E) e ngulo vertical do corpo (F) ............................................................. 43

    Figura 7 Prevalncia da escoliose idioptica do adolescente de acordo com a idade e sexo.

    Cidades do Estado de So Paulo, 2015 ................................................................. 48

    Figura 8 - Caractersticas dos adolescentes com escoliose idioptica segundo tipo, regio e

    lateralidade da curva e sexo. Cidades do Estado de So Paulo, 2015 .................. 49

    Figura 9 Distribuio dos adolescentes com escoliose quanto aos valores do ngulo de Cobb

    da curva escolitica primria (Cobb 1) e da secundria (Cobb 2) ........................ 50

  • Figura 10 - Distribuio dos adolescentes com escoliose quanto aos valores do fator de

    progresso da curva escolitica .......................................................................... 51

    Figura 11 Esquema corporal da postura no plano frontal para os grupos com escoliose e com

    suspeita de escoliose ........................................................................................... 54

    Figura 12 - Esquema corporal da postura no plano sagital para os grupos com escoliose e com

    suspeita de escoliose ........................................................................................... 55

    Figura 13 - Esquema corporal da postura no plano frontal para adolescentes com escoliose

    (Cobb 10o): curva simples (A) e curva dupla (B) ........................................... 56

    Figura 14 - Esquema corporal da postura no plano sagital para adolescentes com escoliose

    (Cobb 10o): curva simples (A) e curva dupla (B) ........................................... 57

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Quadro comparativo das caractersticas dos estudos sobre programas de

    rastreamento para escoliose idioptica do adolescente realizados em diferentes

    pases .................................................................................................................. 26

    Tabela 2 Quadro comparativo das caractersticas dos estudos sobre programas de

    rastreamento para escoliose idioptica do adolescente realizados no Brasil ..... 27

    Tabela 3 Caracterizao das cidades participantes deste estudo quanto rea territorial,

    ndice de desenvolvimento humano e populao ............................................... 33

    Tabela 4 Quantidade de escolas pblicas estaduais por cidade .......................................... 34

    Tabela 5 Descrio, por segmento, das variveis posturais avaliadas.................................. 41

    Tabela 6 Distribuio absoluta e relativa dos adolescentes com escoliose idioptica e da

    amostra estudada segundo caractersticas demogrficas e clnicas. Cidades do

    Estado de So Paulo, 2015 ................................................................................. 47

    Tabela 7 Caractersticas dos adolescentes com escoliose idioptica e da amostra estudada,

    segundo variveis antropomtricas e clnicas. Cidades do Estado de So Paulo,

    2015 .................................................................................................................... 48

    Tabela 8 Modelos de regresso logstica dos fatores associados escoliose idioptica do

    adolescente em cidades do Estado de So Paulo, 2015 ...................................... 52

    Tabela 9 Sensibilidade, especificidade e valores preditivos positivo e negativo do

    escolimetro para ART de 7 e ngulo de Cobb maior ou igual a 10 ............. 53

  • RESUMO

    Penha PJ. Prevalncia de escoliose idioptica do adolescente em cidades do estado de So

    Paulo [tese]. So Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo; 2016.

    A escoliose idioptica do adolescente (EIA) uma deformidade tridimensional da coluna

    vertebral. Dados epidemiolgicos sobre sua prevalncia nas regies do hemisfrio sul no so

    suficientes. Primeiramente, o objetivo deste estudo foi estimar a prevalncia da EIA em

    cidades do interior do estado de So Paulo; secundariamente, identificar fatores demogrficos,

    clnicos e relacionados ao estilo de vida e postura associados ocorrncia da escoliose e

    avaliar a validade e capacidade preditiva do escolimetro. Foram avaliados 2.562

    adolescentes (1.490 meninas e 1.072 meninos), entre 10 e 14 anos. Os adolescentes eram

    estudantes de escolas pblicas estaduais pertencentes Diretoria Regional de Ensino de Mogi

    Mirim/SP. O rastreamento para EIA foi feito pela mensurao do ngulo de rotao de tronco

    (ART) no teste de Adams por meio do escolimetro e pelo exame radiogrfico. Adolescentes

    com ART 7 foram encaminhados para radiografia e diagnosticou-se a escoliose quando o

    ngulo de Cobb foi maior ou igual a 10. A avaliao postural foi realizada por fotografias

    analisadas no Software de Avaliao Postural (SAPO) dos adolescentes com suspeita (ART

    7 e Cobb < 10) e com escoliose (ART 7 e Cobb 10). Os resultados mostraram

    prevalncia de 1,5% (IC95%: 1 - 1,9%), sendo maior para o sexo feminino (2,2%; IC95%: 1,4 -

    2,9%) do que masculino (0,5%; IC95%: 0,1 - 0,9%). Os fatores associados ocorrncia da

    escoliose foram o sexo feminino (odds ratio: 4,7; IC95%: 1,8 - 12,2; p=0,001), as idades de 13

    e 14 anos (odds ratio: 2,2; IC95%: 1 - 4,8; p=0,035) e o desnivelamento dos ombros (odds

    ratio: 1,4; IC95%: 1,1 - 1,8; p=0,011). Houve predomnio de curvas duplas (59,4%) e de

    lateralidade direita (56,8%), porm de baixa magnitude (75% com ngulo de Cobb at 22) e

    fator de progresso (75% com fator de at 1,2). As curvas direita apresentaram maior

    magnitude (ngulo de Cobb: 20,8 (7,3)) do que aquelas esquerda (13,8 (4,1)) (p=0,003).

    O encaminhamento ao exame radiogrfico foi de 5%. O escolimetro apresentou melhor

    sensibilidade aos 45 de flexo anterior de tronco (53,8% (IC95%: 43,7 64)) e melhores

    especificidade e valor preditivo positivo aos 60 (75% (IC95%: 66,2 83,9%) e 78,4% (IC95%:

    70 86,8%), respectivamente). Concluiu-se, portanto, que a prevalncia da EIA em cidades

    do estado de So Paulo (1,5%) foi semelhante descrita na literatura (2%), sendo tambm

  • mais prevalente no sexo feminino e nas idades mais prximas puberdade (13 e 14 anos).

    Considerando que a puberdade ocorre em momentos distintos entre os sexos, sendo mais

    tardio para o masculino, a recomendao de se realizar programas de rastreamento escolar

    para escoliose na mesma faixa etria (10-14 anos) para ambos os sexos deve ser repensada. A

    validade e capacidade preditiva do escolimetro foram melhores aos 60 de flexo de tronco.

    Em relao aos aspectos posturais, o alinhamento horizontal dos acrmios, que avalia o

    desnivelamento dos ombros, est associado presena de escoliose idioptica do adolescente

    e deve ser considerado na rotina de avaliao dos adolescentes seja no ambiente clnico ou

    escolar.

    Descritores: escoliose, adolescente, prevalncia, programas de rastreamento.

  • SUMMARY

    Penha PJ. Adolescent idiopathic scoliosis prevalence in So Paulo, Brazil. [thesis]. So Paulo:

    Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo; 2016.

    Adolescent idiopathic scoliosis is a common three-dimensional spinal deformity.

    Epidemiological data about the condition in South Hemisphere are insufficient. First, the

    objective of this study was to estimate the adolescent idiopathic scoliosis prevalence rate in

    cities of So Paulo, Brazil. Second to identify demographic, clinical, lifestyle and body

    posture factors associated with adolescent idiopathic scoliosis, and to assess the Scoliometer

    accuracy. We assessed 2,562 adolescents (1,490 girls and 1,072 boys), between 10 and 14

    years of age. The adolescents studied in public schools belong to Education Regional Board

    of Mogi Mirim/SP. The screening procedure included the measurement of Angle of Trunk

    Rotation (ATR) using a Scoliometer in the Adams test and the radiographic examination. The

    adolescents with ATR 7o were referral to radiographic examination and body photographic.

    A Cobb angle 10o on standing radiographs were classified as adolescent idiopathic scoliosis.

    We used Postural Assessment Software (PAS) to analyze posture and we divided into

    adolescents with scoliosis suspicion (ATR 7o and Cobb angle < 10

    o) and with scoliosis

    (ATR 7o and Cobb angle 10

    o). The adolescent idiopathic scoliosis prevalence rate was

    1.5% (95% CI: 1 1.9%), higher to females (2.2%; 95% CI: 1.4 2.9%) than males (0.5%;

    95% CI: 0.1 0.9%). The following factors were associated with adolescent idiopathic

    scoliosis: female gender (odds ratio, 4.7; 95% CI: 1.8 12.2; p=0.001), the 13 and 14-year

    age group (odds ratio, 2.2; 95% CI: 1 4.8; p=0.035) and shoulder imbalance (odds ratio, 1.4;

    95% CI: 1.1 1.8; p=0.011). The double curves and right laterality were more frequent

    (59.4% and 56.8%, respectively), but with low magnitude (75% with Cobb angle until 22o)

    and progression factor (75% with progression factor until 1.2). The right curves (20.8 (7.3))

    showed high magnitude than the left ones (13.8 (4.1)) (p=0.003). The referral to

    radiography was 5%. Scoliometer sensitivity was better at 45o forward bending test (53,8%

    (95% CI: 43,7 64)), and the specificity and positive predictive value were better at 60o (75%

    (95% CI: 66.2 83.9%) and 78.4% (95% CI: 70 86.8%), respectively). We concluded that

    the prevalence of adolescent idiopathic scoliosis in cities of So Paulo (1.5%) was similar to

  • the literature (2%) and was also more prevalent in females and in puberty ages (13 and 14

    years). Whereas puberty occurs at different times between gender, and later for males, the

    recommendation to screen the same age group (10-14 years) for both genders must be

    rethought. Scoliometer accuracy was better at 60o forward bending test. The shoulder

    imbalance assessed by horizontal alignment of acromion was associated with the presence of

    adolescent idiopathic scoliosis and should be considered as an assessment routine for

    adolescents in clinical or school environment.

    Descriptors: scoliosis, adolescent, prevalence, mass screening

  • NORMALIZAO ADOTADA

    Esta tese est de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta publicao:

    Referncias: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver).

    Universidade de So Paulo. Faculdade de Medicina. Servio de Biblioteca e Documentao.

    Guia de apresentao de dissertaes, teses e monografias. Elaborado por Anneliese

    Carneiro da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza

    Arago, Suely Campos Cardoso, Valria Vilhena. 3a ed. So Paulo: Diviso de Biblioteca e

    Documentao; 2011.

    Abreviaturas dos ttulos dos peridicos de acordo com List of Journals Indexed in Index

    Medicus.

  • SUMRIO

    Lista de figuras

    Lista de tabelas

    Resumo

    Summary

    1. INTRODUO .................................................................................................................. 16

    2. OBJETIVOS ........................................................................................................................ 21

    2.1. Objetivo principal ...................................................................................................... 21

    2.2. Objetivos secundrios ................................................................................................ 21

    3. REVISO DE LITERATURA ........................................................................................... 22

    3.1. Escoliose idioptica do adolescente .......................................................................... 22

    3.2. Histrico dos programas escolares de rastreamento para escoliose .......................... 24

    3.3. Mtodos de avaliao da escoliose idioptica do adolescente .................................. 29

    4. CASUSTICA E MTODOS ............................................................................................. 33

    4.1. Local, populao de estudo e amostra ....................................................................... 33

    4.2. tica ........................................................................................................................... 35

    4.3. Materiais .................................................................................................................... 36

    4.4. Procedimentos ........................................................................................................... 36

    4.4.1. Ficha de avaliao .............................................................................................. 37

    4.4.2. Avaliao da coluna vertebral ........................................................................... 37

    4.4.3. Avaliao da postura .......................................................................................... 39

    4.5. Anlise dos dados ...................................................................................................... 43

    4.5.1. Anlise de risco .................................................................................................. 44

    4.5.2. Confiabilidade .................................................................................................... 44

    4.5.3. Anlise estatstica .............................................................................................. 44

    5. RESULTADOS ................................................................................................................... 46

    5.1. Rastreamento ........................................................................................................ 46

    5.2. Postura .................................................................................................................. 53

    6. DISCUSSO ...................................................................................................................... 58

    6.1. Rastreamento ........................................................................................................ 58

    6.2. Validade do escolimetro ................................................................................... 63

    6.3. Postura .................................................................................................................. 64

    6.4. Implicaes clnicas .............................................................................................. 66

  • 6.5. Limitaes do estudo ............................................................................................ 67

    7. CONCLUSO .................................................................................................................... 68

    8. ANEXOS ............................................................................................................................ 69

    9. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................................... 83

    Apndice

  • 16

    1. INTRODUO

    A escoliose idioptica uma deformidade tridimensional da coluna caracterizada pela

    inclinao lateral e rotao axial das vrtebras, com angulaes maiores que 10o (Mtodo de

    Cobb), e pela reduo das curvaturas da coluna no plano sagital1-4

    .

    Os principais fatores da fisiopatologia da escoliose idioptica so: dficit do controle

    da postura corporal pelo sistema nervoso central1, alterao do esquema corporal

    5, interaes

    anmalas entre hormnios envolvidos no processo do crescimento (melatonina)6,7

    , herana

    polignica8, deficincia de estrognio

    8, determinados defeitos genticos da membrana celular

    associados s anormalidades do colgeno e dos msculos esquelticos9,10

    e distrbios

    biomecnicos da coluna como estmulos e sobrecargas assimtricas11

    .

    A escoliose idioptica pode ser classificada em trs tipos: infantil, juvenil e do

    adolescente. A escoliose infantil ocorre em crianas menores de trs anos de idade, benigna

    em sua maioria e apresenta resolutividade espontnea em 90% dos casos12,13

    . A escoliose

    juvenil detectada entre os quatro e 10 anos de idade e ocorre em 12 a 21% de todos os

    pacientes com escoliose idioptica13,14

    . A escoliose idioptica do adolescente ocorre entre os

    10 anos e a maturidade do sistema esqueltico e a forma encontrada em 90% dos casos de

    escoliose idioptica13-16

    .

    A escoliose idioptica do adolescente mais prevalente quando comparada aos demais

    tipos de escoliose12

    . Segundo dados da literatura, sua prevalncia varia de 0,13% a 13%,

    sendo diferente de acordo com o sexo4. Morais et al

    17 avaliaram 29.195 crianas entre 8 e 15

    anos em Quebec e verificaram que a prevalncia de escoliose idioptica maior nas meninas

    (51,9/1000) do que nos meninos (32/1000). A progresso da escoliose idioptica do

    adolescente tambm mais frequente nas meninas. Lee et al18

    avaliaram 115.178 estudantes

    em Hong Kong e verificaram que, para curvaturas maiores que 20o, h maior prevalncia nas

    meninas do que nos meninos (4,5:1). Para curvaturas com ngulo de Cobb entre 10o

    e 20o, a

    proporo de meninas e meninos afetados muito prxima (1,3:1); porm, essa proporo

    aumenta para 5,4:1 para ngulos entre 20o e 30

    o; e, 7:1 para ngulos acima de 30

    o19-21.

    As complicaes da escoliose incluem comprometimento pulmonar, dor crnica e

    deformidade, incapacidade funcional, constante acompanhamento de servios de sade, alm

    de implicaes psicossociais (isolamento social e oportunidades limitadas de trabalho devido

    dor e comprometimentos funcionais), que so prevenidas com diagnstico e tratamento

    precoces4,15,22,23

    . Estudos mostram que indivduos portadores de escoliose idioptica do

  • 17

    adolescente possuem maior prevalncia de problemas na coluna quando adultos, com

    consequente dor e incapacidade, do que no portadores24-27

    . H, tambm, outros estudos que

    mostram que tanto a escoliose quanto seu tratamento apresentam grande impacto na qualidade

    de vida e no aspecto da autoimagem22,23,28-30

    .

    A determinao do desenvolvimento e da maturidade do sistema esqueltico

    importante para a avaliao do prognstico da escoliose12

    . Estudos mostram que h uma

    estreita relao entre a severidade do prognstico e a capacidade de crescimento do

    indivduo31

    . Sabe-se que a escoliose idioptica geralmente se desenvolve nas fases em que o

    crescimento mais acelerado: antes dos trs anos de idade e durante o estiro de

    crescimento1,2

    . O risco de progresso da curva escolitica no incio da puberdade 20% em

    escolioses de 10o, 60% em 20

    o e 90% em 30

    o19,32,33. J, no final, o risco consideravelmente

    menor 2% em 10o, 20% em 20

    o e 30% em escolioses de 30

    o19,32,33. Por essa razo, segundo a

    literatura, o grupo etrio de 10 a 14 anos indicado para ser submetido aos programas de

    rastreamento para a escoliose, por ser aquele em que o tratamento conservador, tal como o

    colete, pode controlar a progresso da curva escolitica e, consequentemente, reduzir a

    necessidade de cirurgia34

    .

    Os programas de rastreamento so altamente recomendados e deveriam ser rotinas do

    exame fsico escolar para a deteco precoce e definio do estgio da escoliose idioptica,

    evitar e minimizar deformidades severas, indicao de tratamento que pode alterar

    favoravelmente o curso da doena, diminuio do nmero de adolescentes que necessitam de

    cirurgia e, consequentemente, menor custo ao final do tratamento17,18,35-39

    . Alm disso,

    inmeros autores acreditam que o programa de rastreamento escolar uma ferramenta valiosa

    para a pesquisa e compreenso da etiologia da escoliose22,38,40-49

    e que sua prtica justificada

    porque a deteco de curvaturas moderadas e reversveis, bem como o tratamento conservador

    das mesmas, evita o desenvolvimento de deformidades vertebrais que potencialmente causam

    sintomatologia dolorosa por toda a vida50

    .

    O programa de rastreamento escolar para escoliose realizado por meio de testes e

    instrumentos que permitem a observao do corpo e a anlise da simetria da coluna bem como

    de sua superfcie topogrfica38

    . Mtodos no invasivos de mensurao da coluna vertebral so

    importantes para o planejamento do tratamento e avaliao da progresso da curva

    escolitica51

    .

    O teste de flexo anterior do tronco, ou teste de Adams, o mais usado nos programas

    escolares de rastreamento para deteco de escoliose17,18,35,48,52-58

    . O teste de Adams um

    exame clssico, descrito em 1865, no qual o indivduo flexiona seu tronco anteriormente, com

  • 18

    os membros inferiores estendidos, braos soltos e estendidos e as mos juntas52,59

    . Essa flexo

    anterior do tronco produz uma acentuao da deformidade da superfcie das costas que

    associada deformidade da coluna vertebral em pacientes com escoliose60

    .

    Contudo, a efetividade do teste de flexo anterior do tronco depende da experincia e

    habilidade dos examinadores18

    . De fato, uma recente meta-anlise demonstrou que programas

    de rastreamento, que usam isoladamente este teste, apresentam maiores ndices de

    encaminhamento para acompanhamento mdico sistemtico e menores valores preditivos61

    .

    Existem diversas tcnicas que fornecem uma descrio completa e quantitativa da

    superfcie topogrfica da coluna estereofotogrametria, ultrassom, flexicurva, termografia,

    topografia de Moir e sistemas computadorizados de mapeamento da superfcie (ISIS).

    Porm, o tempo de aplicao e o custo tornam essas metodologias impraticveis para

    programas de rastreamento da populao38,62

    .

    O escolimetro

    um instrumento desenvolvido por Bunnell60

    e amplamente usado

    nos rastreamentos escolares devido a sua simplicidade de aplicao, rapidez, baixo custo e

    boa confiabilidade33,37,38,46,51,60,63,64-66

    . Este instrumento permite a mensurao objetiva do

    ngulo de rotao de tronco (ART) na flexo anterior, oferecendo uma documentao

    quantitativa da curva escolitica18,37,60

    . Murrell et al51

    avaliaram a confiabilidade intra-

    avaliador e inter-avaliador do escolimetro

    para a mensurao do ART e encontraram boa

    confiabilidade tanto para a regio lombar quanto torcica (intra-avaliador: ICC = 0,995 e ICC

    = 0,998 para torcica e lombar, respectivamente; e, inter-avaliador: ICC = 0,81 e ICC = 0,82

    para torcica e lombar, respectivamente). Amendt et al37

    verificaram, em seu estudo, que o

    escolimetro

    apresentou boa especificidade, sensibilidade, capacidade preditiva e

    reprodutibilidade, com altos coeficientes de confiabilidade intra- e inter-avaliador, o que torna

    esse instrumento til nos exames de rastreamento para escoliose. Segundo Korovessis e

    Stamatakis46

    , o escolimetro reduz o custo dos programas de rastreamento, o excesso de

    encaminhamento de adolescentes para o exame radiogrfico e a exposio desnecessria

    irradiao de uma populao jovem.

    Tradicionalmente, o exame radiogrfico, em uma incidncia anteroposterior, o

    mtodo de avaliao mais conhecido e utilizado na prtica clnica, sendo considerado uma

    metodologia padro que estabelece o diagnstico, a etiologia e a severidade da deformidade

    da coluna vertebral38,67

    . O Mtodo de Cobb tem sido utilizado para documentar a progresso

    da curva, para selecionar o tipo de tratamento e avaliar a efetividade do mesmo39,67

    . Esse

    mtodo consiste em se traar uma linha paralela placa cortical superior da vrtebra do

    extremo proximal e placa cortical inferior da vrtebra do extremo inferior15,68

    . Uma linha

  • 19

    perpendicular traada sobre cada uma destas linhas e o ngulo de interseco das linhas

    perpendiculares o ngulo de curvatura espinhal resultante da escoliose15,68

    .

    Contudo, alm de ser uma metodologia cara, a literatura ressalta que o exame

    radiolgico deve ser evitado devido ao dano causado sade, em especial de crianas e

    adolescentes65,69,70

    . Estudos afirmam que meninas adolescentes submetidas a tratamento de

    longo prazo para escoliose precisam de especial ateno quanto ao risco latente de

    carcinognese (em especial, na mama)4,70-73

    .

    Estudos nacionais avaliaram qualitativamente e quantitativamente, por meio da

    fotogrametria, a postura de crianas e encontraram elevadas prevalncias para o desvio lateral

    da coluna74,75

    . Dentre esses estudos, o qualitativo encontrou valor mximo de 52% de desvio

    lateral da coluna para idade de 9 anos, enquanto que o quantitativo encontrou 88,7% ao

    avaliar crianas de 7 e 8 anos74,75

    . Entretanto, o desvio lateral da coluna avaliado nesses

    estudos no pode ser considerado sinnimo de escoliose j que o mtodo de avaliao no foi

    radiogrfico e no se mensurou o ngulo de Cobb.

    O programa escolar de rastreamento para escoliose usado em muitas regies do

    mundo38

    . No Brasil, h alguns estudos de prevalncia de escoliose53,55,57,58,76,77

    . Nery et al57

    avaliaram, em uma cidade do Rio Grande do Sul, 1.402 crianas, entre 10 e 14 anos de ambos

    os sexos, obtendo prevalncia de 1,4%. Ferriani et al55

    avaliaram qualitativamente, por meio

    do Teste de Adams, 378 escolares em Ribeiro Preto e encontraram 5 casos com confirmao

    radiolgica de escoliose (1,3%). Martini Filho e Ortiz76

    analisaram 4.037 adolescentes das

    escolas pblicas e municipais da cidade de Indaiatuba/SP, porm apenas 63 adolescentes

    foram radiografados e, destes, 1,8% apresentaram escoliose. Elias e Teixeira53

    , no Rio de

    Janeiro, avaliaram 4.750 adolescentes assintomticos e encontraram 85 sujeitos com achados

    clnicos positivos para escoliose. Esses autores realizaram a radiografia de 56 sujeitos e a

    prevalncia de escoliose encontrada na amostra total foi de 1,03%53

    . J Santo et al58

    , em

    Cuiab, verificaram 3.105 escolares e radiografaram 142 dos 382 escolares que apresentaram

    Teste de Adams positivo. Segundo esses mesmos autores, a prevalncia de escoliose

    encontrada radiograficamente foi de 5,3% para curvas maiores ou iguais a 5 graus e 2,2% para

    as maiores ou iguais a 10 graus58

    .

    No entanto, a metodologia dos estudos nacionais citados53,55,57,58,76

    bastante

    divergente no s quanto avaliao, mas tambm quanto amostragem e faixa etria

    avaliada, alm de no seguir os padres descritos no consenso sobre programas de

    rastreamento para escoliose38

    . Em nenhum estudo nacional, foi utilizado o escolimetro

    como metodologia de avaliao da curvatura escolitica.

  • 20

    Alm disso, segundo a literatura, os dados epidemiolgicos para a prevalncia de

    escoliose idioptica do adolescente nas regies do hemisfrio sul so insuficientes, o que

    contribui para a falta de informaes sobre a etiologia e histria natural desse tipo de

    escoliose nestas regies38,78

    .

  • 21

    2. OBJETIVOS

    2.1. Objetivo Principal

    O objetivo principal deste estudo foi estimar a prevalncia da escoliose

    idioptica do adolescente em cidades do interior do estado de So Paulo de 2012 a 2015.

    2.2. Objetivos Secundrios

    a) Identificar os possveis fatores demogrficos, clnicos e relacionados ao

    estilo de vida e postura associados ocorrncia da escoliose idioptica do adolescente.

    b) Verificar a validade e capacidade preditiva do escolimetro em um

    programa de rastreamento escolar.

    c) Descrever a postura dos indivduos com escoliose idioptica do

    adolescente (ngulo de Cobb 10o) e com suspeita de escoliose (ART 7 e ngulo de Cobb

    10o).

  • 22

    3. REVISO DE LITERATURA

    Nesta reviso de literatura, so apresentados tpicos referentes escoliose idioptica

    do adolescente (definio e fisiopatologia), histrico dos programas escolares de rastreamento

    para escoliose e mtodos de avaliao da escoliose idioptica do adolescente.

    As bases de dados Medline/Pubmed, Lilacs, Scielo foram consultadas, abrangendo o

    perodo de 1974 a 2016, utilizando-se as seguintes palavras-chave: escoliose, adolescente,

    prevalncia, programas de rastreamento, avaliao postural e postura e seus correspondentes

    em ingls.

    3.1. Escoliose idioptica do adolescente

    A escoliose uma deformao morfolgica tridimensional da coluna vertebral que se

    caracteriza pela inclinao das vrtebras (plano frontal), bem como sua rotao (plano

    horizontal) e sua pstero-flexo (plano sagital)1,14,64,79

    .

    Segundo a Sociedade de Pesquisa em Escoliose (Scoliosis Research Society SRS),

    denominada de escoliose a curvatura lateral da coluna com ngulo de Cobb, medido em uma

    radiografia anteroposterior do paciente em ortostatismo, maior que 10 15

    .

    De um modo geral, as escolioses podem ter diversas causas: (1) desordens do tecido

    conectivo (Sndrome de Ehlers-Danlos e Sndrome de Marfan); (2) desordens neurolgicas e

    neuromusculares (paralisia cerebral, poliomielite, distrofia muscular, neurofibromatose); (3)

    musculoesquelticas (displasia do quadril, discrepncia do comprimento dos membros

    inferiores, osteognese imperfeita); (4) congnita (defeito da forma e do segmento vertebral,

    hemivrtebra); e, (5) idioptica (sem uma causa definida)15

    .

    A etiologia da escoliose idioptica do adolescente ainda desconhecida. Existem

    diversas teorias - neurolgica, hormonal, biomecnica e gentica8. No entanto, algumas esto

    mais relacionadas progresso da curva do que ao seu incio; e, por essas caractersticas que

    a escoliose idioptica do adolescente considerada uma doena multifatorial com fatores de

    predisposio gentica80,81

    .

    Quanto aos mecanismos neurolgicos envolvidos na escoliose idioptica do

    adolescente, discutem-se achados alterados de eletromiografia e potenciais evocados

  • 23

    corticossensoriais em pacientes submetidos cirurgia81

    . Esses achados mostram latncias

    anormais e assimtricas que se correlacionam com lado e progresso da curva escolitica81

    .

    H, tambm, estudos experimentais que verificaram que pinealectomia, destruio

    estereotxica do tronco cerebral ou hipotlamo e dano direto do corno posterior da medula

    produzem escoliose81

    .

    Na hiptese hormonal, discute-se o papel do estrognio e da melatonina no

    desenvolvimento da escoliose idioptica8,82,83

    . O estrognio modula o crescimento e

    remodelamento sseo e pode influenciar a progresso da deformidade espinhal8. Kulis et al

    8

    avaliaram 200 meninas e subdividiram-nas em quatro grupos: pr-menarca com e sem

    escoliose e ps-menarca com e sem escoliose. De acordo com os resultados de Kulis et al8, as

    meninas com escoliose apresentaram menores nveis de hormnios sexuais, dentre eles o

    estrognio, quando comparadas com o grupo sem escoliose. Neste mesmo estudo8, foram

    observados altos nveis de marcadores do processo de formao/reabsoro ssea (RANKL,

    osteocalcina e fosfatase alcalina) nas meninas com escoliose.

    O estrognio tambm atua como um modulador da atividade do receptor da

    melatonina, inibe a sntese de melatonina e interage com protenas que controlam a

    contratilidade muscular8. Alguns estudos, realizados em frangos, mostraram que a melatonina

    previne o surgimento da escoliose82,83

    . Sabe-se que a melatonina liga-se calmodulina e que

    esta tem relao com a atividade dos osteoclastos e osteoblastos84

    e que regula as

    propriedades contrteis dos msculos7, o que poderia causar assimetria no desenvolvimento e

    crescimento dos msculos paravertebrais85

    . No entanto, estudos realizados em humanos no

    encontraram diferenas significativas na concentrao de melatonina entre indivduos com

    escoliose idioptica e sem escoliose6,86,87

    . Segundo Grivas e Savvidou7, ainda no est claro o

    papel da melatonina na fisiopatologia da escoliose idioptica em humanos.

    A estabilidade biomecnica da coluna depende de seus discos intervertebrais,

    ligamentos e msculos. Mannion et al10

    compararam, atravs de bipsia muscular, o tamanho

    e distribuio do tipo de fibra muscular da musculatura paravertebral torcica entre pacientes

    com escoliose e indivduos saudveis. Esses autores concluram que o lado cncavo da curva

    escolitica o mais prejudicado, apresentando adaptaes musculares resultantes de desuso

    localizado. Essa adaptao muscular verificada pela transformao gradual de fibras do tipo

    lenta (tipo I) para fibras rpidas (tipo IIb)10,88

    . Outro resultado encontrado foi o aumento no

    nmero de fibras musculares do tipo IIc no grupo escolitico quando comparado ao

    controle10

    . Esse aumento de fibras do tipo IIc, que apresentam caractersticas intermedirias

    entre as fibras lentas e rpidas, reflete a transformao do tipo de fibra89,90

    .

  • 24

    Quanto s alteraes de ligamentos e dos discos intervertebrais em adolescentes com

    escoliose idioptica, discute-se a existncia de anormalidades da fibra elstica e de propores

    anormais de glicosaminoglicanas e colgeno no ncleo pulposo do disco intervertebral81

    .

    Acredita-se tambm em uma toro mecnica da coluna causada por condrcitos hipertrficos

    e proliferativos na regio anterior do corpo vertebral que so mais ativos do que os da regio

    posterior em pacientes com escoliose idioptica do adolescente; dessa forma, as estruturas

    anteriores crescem mais rapidamente do que as posteriores81,91

    .

    Estudos buscaram verificar a existncia de alteraes nos genes do colgeno tipo I e II

    e da elastina e sua relao com o fentipo da escoliose9,22,33

    . Estes estudos no encontraram

    segregao dos genes descritos acima com o fentipo da escoliose. Segundo esses mesmos

    autores, a variabilidade do grau da curva escolitica sugere a existncia de uma

    heterogeneidade gentica9,22,332

    . Embora o envolvimento gentico no patomecanismo da

    escoliose idioptica do adolescente ainda no esteja esclarecido, acredita-se que o

    desenvolvimento da escoliose possa estar associado a uma herana multifatorial ou polignica

    (tanto cromossomos autossmicos quanto cromossomo X)8.

    O crescimento tem papel definitivo sobre o aparecimento da escoliose, sendo que a

    incidncia, bem como a progresso da curva escolitica, maior durante as fases em que o

    crescimento mais acelerado: antes dos trs anos de idade e durante o estiro da puberdade1,2

    .

    Estudos afirmam que se a escoliose no for tratada adequadamente, ela pode levar a

    importantes deformidades que implicam em comprometimento pulmonar e dor, alm de

    implicaes psicossociais15,22,23,69,92

    .

    Embora os tratamentos conservador e cirrgico tenham se aprimorado

    consideravelmente devido a melhor compreenso da histria natural da escoliose e da

    instrumentao cirrgica, o tratamento mais efetivo ainda a deteco precoce, que ajuda a

    reduzir o nmero de adolescentes que necessitam de interveno cirrgica69

    .

    3.2. Histrico dos programas escolares de rastreamento para escoliose

    Programa de rastreamento definido como a identificao de uma doena ou defeito

    irreconhecveis pela aplicao de testes, exames ou outros procedimentos que podem ser

    aplicados rapidamente para classificar pessoas que provavelmente tm a doena daquelas que

  • 25

    no tm93

    . Assim, o programa escolar de rastreamento para escoliose um programa de

    avaliao da curvatura da coluna de crianas e/ou adolescentes em idade escolar.

    O objetivo inicial do programa escolar de rastreamento era detectar a escoliose

    idioptica em um estgio to inicial que a deformidade ainda no era perceptvel33,94

    .

    Contudo, a Sociedade Internacional de Tratamento Ortopdico e Reabilitao para Escoliose

    (SOSORT) recomendou como novos objetivos do programa escolar de rastreamento, alm da

    deteco precoce, a identificao de adolescentes com risco de desenvolver escoliose e

    aqueles com curvas que necessitam de tratamento conservador38,39,94

    .

    H relatos na literatura de programas de rastreamento para avaliao de deformidades

    da coluna vertebral desde 1947, sendo que o primeiro programa realizado em escolares

    ocorreu em 1963 em Aitken, cidade do Estado de Minnesota (EUA)76

    .

    Contudo, somente em 1972, num congresso realizado em Minnesota, reconheceu-se a

    importncia do rastreamento da escoliose em crianas em idade escolar e, desde ento, este se

    tornou obrigatrio em vrios Estados americanos e outros pases95,96

    .

    A Tabela 1 mostra um quadro comparativo quanto metodologia e aos resultados de

    estudos sobre programas de rastreamento para escoliose idioptica do adolescente realizados

    em diferentes pases.

  • 26

    Tabela 1 Quadro comparativo das caractersticas dos estudos sobre programas de rastreamento para escoliose idioptica do adolescente

    realizados em diferentes pases.

    Estudo Amostragem Procedimento Resultados Detalhes

    Smyrnis et al35

    Local: Atenas

    n: 3.494

    Faixa etria: 11- 12 anos

    Teste de Adams

    Questionrio (avaliao

    fsica e puberdade)

    Radiografia

    362 com anormalidade no Teste de Adams

    6,4% de 362 com radiografia normal

    Prevalncia: 4,6% meninas e 1,1%

    meninos (Cobb10o)

    Dickson et al97

    Local: Oxford

    n: 1.764 de 5 escolas

    Faixa etria: 13 14 anos

    Teste de Adams

    Radiografia

    Reavaliao aps 1 ano

    (quando Cobb 10o)

    8,3% com assimetria corporal

    2,5% com assimetria apresentaram Cobb

    10o

    Progresso das curvas

    escoliticas em 14% dos

    casos de escoliose no

    congnita

    Morais et al17

    Local: Quebec

    n: 29.195

    Faixa etria: 8- 15 anos

    Teste de Adams

    Radiografia

    Prevalncia: 42/1.000 (meninas:

    51,9/1.000; meninos: 32/1.000)

    (Cobb 5o)

    3.336 com assimetria no

    Teste de Adams

    2.868 radiografados

    1.227 com escoliose

    Soucacos et al48

    Local: Grcia

    n: 82.901

    Faixa etria: 9-14 anos

    Teste de Adams

    Radiografia

    Prevalncia: 1,7% (Cobb10o)

    Razo meninos:meninas: 1:2,1

    Rgua e nvel para

    medida quantitativa da

    escoliose

    Wong et al92

    Local: Cingapura

    n: 72.699

    Faixa etria: 6-14 anos

    Escolimetro

    (ATR5o)

    Radiografia

    Prevalncia: 0,93% meninas e 0,25%

    meninos (Cobb10o)

    Razo meninos:meninas: 1:6,4 (11-12

    anos) e 1:3,3 (13-14 anos)

    Avaliao de todas as

    crianas de cada escola

    selecionada

    Ueno et al69

    Local: Tokyo

    n: 255.875

    Faixa etria: 11-14 anos

    Topografia de Moir

    Radiografia

    Prevalncia: 0,87% (Cobb10o)

    Razo meninos:meninas: 1:11

    Avaliao de todas as

    crianas de cada escola

    selecionada

  • 27

    No Brasil, os programas de rastreamento escolar da escoliose no so to difundidos e pouco se sabe sobre o real estado em que se

    encontram as colunas vertebrais dos escolares brasileiros56

    . A Tabela 2 mostra um quadro comparativo quanto metodologia e aos resultados de

    estudos sobre esses programas realizados no Brasil.

    Tabela 2 Quadro comparativo das caractersticas dos estudos sobre programas de rastreamento para escoliose idioptica do adolescente

    realizados no Brasil.

    Estudo Amostragem Procedimento Resultados Detalhes

    Elias e Teixeira53

    Local: Rio de Janeiro (RJ)

    n: 4.750

    Faixa etria: 10 19 anos

    Teste de Adams

    Rgua milimetrada

    (> 5 mm)

    Radiografia

    85 (1,78%) com assimetria de

    tronco

    56 radiografados e 49 (1,03%) com

    escoliose idioptica (Cobb 5o)

    Maior prevalncia dos 10

    aos 14 anos

    Martini Filho e Ortiz76

    Local: Indaiatuba (SP)

    n: 4.037

    Faixa etria: 8 a 12 anos

    Cartaz educativo

    sobre Teste de

    Adams

    Radiografia

    19,8% com escoliose pelos

    professores e 2,4% pelos mdicos;

    63 do grupo dos mdicos

    radiografadas e 46 (1,8%) com

    escoliose

    Avaliaes realizadas por

    professores de educao

    fsica e mdicos

    Leal et al54

    Local: Belo Horizonte

    (MG)

    n: 358

    Faixa etria: NI*

    Teste de Adams

    Radiografia

    87 com teste de Adams positivo

    81 radiografados

    Prevalncia: 4,8%

    Excluso: diferena de

    membros inferiores > 0,5

    cm

    Idade mdia: 13,3 anos

    (escola pblica) e 12,9

    (escola particular)

    Ferriani et al55

    Local: Ribeiro Preto (SP)

    n: 378

    Faixa etria: 6 a 14 anos

    Avaliao

    antropomtrica e

    postural

    Teste de Adams

    Radiografia

    269 sem alteraes (72,2%)

    89 casos de escoliose (23,5%)

    54 dos 89 avaliao com ortopedista

    e, destes, 5 com escoliose (1,3%)

    10% das escolas avaliadas

    10% dos escolares de cada

    classe avaliados

    50,5% de desistncia dos

    casos suspeitos Continua

  • 28

    Continuao

    Estudo Amostragem Procedimento Resultados Detalhes

    Ferreira et al56

    Local: Presidente Prudente

    (SP)

    n: 104

    Faixa etria: 11 a 17 anos

    Teste de Adams

    Rgua (torcica 8 mm

    e/ou lombar 5 mm)

    Radiografia

    46 com gibosidade

    18 radiografados e, 6,7% com

    escoliose (Cobb 10o)

    1 escola avaliada

    Nery et al57

    Local: Carlos Barbosa

    (RS)

    n: 1.340 (total de 1.402

    crianas da 5 a 8 sries)

    Faixa etria: 10-14 anos

    Avaliao postural

    Avaliao

    antropomtrica

    Teste de Adams

    Prevalncia de escoliose: 1,4%

    Santo et al58

    Local: Cuiab (MT)

    n: 3.105 (total de 3.793

    matriculadas nas 3 e 4

    sries em 50% das escolas

    da cidade)

    Faixa etria: NI*

    Teste de Adams

    Avaliao

    antropomtrica, postural

    Radiografia

    382 com Teste de Adams positivo

    210 realizaram avaliao

    antropomtrica e postural

    142 radiografados

    38 dos 210 (18,1%) com escoliose

    91 (43,3%) com curvas 5o

    Prevalncia: 2,2% (Cobb 10o)

    Excluso: diferena

    de membros

    inferiores 1,5 cm

    Souza et al77

    Local: Goinia (GO)

    n: 418

    Faixa etria: 10-14 anos

    Teste de Adams

    Avaliao postural

    Radiografia

    Prevalncia: 4,3%

    *NI: no informado. Concluso

    Nenhum dos estudos brasileiros pesquisados utilizou o escolimetro como ferramenta de avaliao quantitativa da rotao do tronco e da

    gibosidade, apesar deste instrumento ser recomendado pela Sociedade Internacional de Tratamento Ortopdico e Reabilitao para Escoliose

    (SOSORT).

    Segundo o ltimo consenso sobre a importncia dos programas escolares de rastreamento para a escoliose, no h dados epidemiolgicos

    suficientes para a prevalncia de escoliose idioptica do adolescente nas regies do hemisfrio sul38

    .

  • 29

    3.3. Mtodos de avaliao da escoliose idioptica do adolescente

    Avaliar fisicamente um indivduo importante para que se possa identificar a

    existncia e o porqu de um determinado problema, acompanhar sua evoluo clnica,

    escolher um tratamento e verificar sua eficcia96

    .

    Em relao avaliao da escoliose, a radiografia da coluna, em uma incidncia

    anteroposterior, considerada o mtodo mais preciso para avaliar o grau de deformidade tanto

    no diagnstico como no tratamento da escoliose idioptica do adolescente61,70

    . Contudo, a

    literatura ressalta que o exame radiolgico deve ser evitado devido ao dano causado sade,

    em especial de crianas e adolescentes65,69,70

    .

    Nash Jr et al70

    mensuraram a quantidade de radiao nos seguintes rgos de

    adolescentes com escoliose idioptica: medula ssea, trato gastrointestinal superior, pulmes,

    tecido mamrio e gnadas; e, verificaram que o aumento do risco de carcinognese foi de

    1,3% para cnceres do trato gastrointestinal superior, 7,5% para cncer de pulmo e de 110%

    para cncer de mama.

    Doddy et al73

    analisaram retrospectivamente 5.573 mulheres com escoliose e

    verificaram risco de mortalidade por cncer de mama 70% maior nessas mulheres do que na

    populao em geral. Segundo esses autores, o risco de mortalidade por cncer de mama

    aumenta significativamente com o aumento do nmero de exames radiogrficos e do acmulo

    da dose de radiao73

    . Outro fator de risco associado ao aumento da mortalidade a idade da

    paciente no primeiro exame radiogrfico, sendo que o risco 3,4 vezes maior quando o

    primeiro exame feito aos 10-11 anos de idade73

    . Segundo Korenman98

    , o tecido mamrio

    mais susceptvel a um dano carcinognico durante o seu desenvolvimento antes da menarca.

    Existem diversas tcnicas no invasivas de mensurao quantitativa da superfcie

    topogrfica da coluna: sistema de imagem Quantec, sistema de imagem integrado (ISIS) e

    estereofotogrametria14,38

    .

    O sistema de imagem Quantec produz uma representao tridimensional da superfcie

    topogrfica da coluna por meio de uma reconstruo computadorizada da coluna14

    . Thometz

    et al99

    avaliaram a correlao entre o ngulo Q medido no plano frontal pelo sistema Quantec

    e o ngulo de Cobb de 149 pacientes com escoliose idioptica e verificaram correlaes

    significativas para a regio torcica (r=0,65), lombar (r=0,63) e toracolombar (r=0,70). Esses

    mesmos autores tambm verificaram que quanto maior a magnitude da curva escolitica

    (maior ngulo de Cobb) maior o erro do sistema Quantec, sendo esse erro menor para a

  • 30

    regio toracolombar99

    . Portanto, Thometz et al99

    concluram que o Sistema Quantec um

    mtodo confivel para avaliar apenas curvaturas leves a moderadas na regio toracolombar.

    Assim como o sistema Quantec, o sistema de imagem integrado (ISIS) se prope a

    avaliar tridimensionalmente a superfcie topogrfica da coluna100

    . Theologis et al100

    compararam a confiabilidade do sistema ISIS com o mtodo de Cobb quanto a avaliao da

    progresso da curva escolitica e verificaram que o mtodo ISIS mostrou-se confivel.

    Stokes et al101

    , por sua vez, realizaram a comparao entre a radiografia e a

    estereofotogrametria e verificaram que as magnitudes das curvas escoliticas diferiram

    significativamente, concluindo que esse sistema no preciso para aplicaes clnicas.

    Percebe-se, portanto, que a literatura ainda divergente quanto correlao entre

    medidas radiogrficas tradicionais e as medidas angulares da escoliose provenientes da

    topografia do tronco. Isso porque, alguns estudos, que utilizaram estereofotogrametria e

    pantografias digitalizadas102-104

    , afirmaram boa preciso de seus instrumentos em relao s

    medidas radiogrficas; enquanto outros, que utilizaram rasterestereofotogrametria e escneres

    de tronco99,105-107

    , observaram apenas moderada correlao entre as medidas torcicas e

    lombares de seu instrumento e o ngulo de Cobb radiogrfico.

    Contudo, essas metodologias de avaliao mais modernas e sofisticadas, apesar de

    fornecerem uma descrio mais completa da superfcie topogrfica dos indivduos com

    escoliose idioptica, so impraticveis para os programas de rastreamento devido ao alto custo

    e ao elevado tempo gasto para anlise38

    .

    De acordo com a literatura, a viabilidade dos programas escolares de rastreamento

    para escoliose est em encontrar testes ou exames adequados que sejam aceitveis para a

    populao, que detectem importantes precursores da escoliose (assimetria de tronco, rotao

    da coluna e gibosidade), que apresentem baixo custo e simplicidade no manuseio e que

    estejam baseados nos conceitos cientficos de validade, confiabilidade, sensibilidade e

    especificidade4,33,37,38,51,60,63,64-66,96

    . Seguindo esses critrios, os mtodos mais usados em

    programas de rastreamento para escoliose so o teste de Adams, o escolimetro e a

    topografia de Moir60,96

    .

    O teste de Adams, tambm denominado de teste de flexo anterior ou teste de 1

    minuto, tem se tornado a posio padro do paciente para a deteco da escoliose52

    . O

    movimento de flexo anterior do tronco produz uma acentuao da deformidade da superfcie

    das costas que associada deformidade da coluna vertebral em pacientes com escoliose60

    .

    O teste de Adams o exame mais usado nos programas escolares de rastreamento para

    escoliose devido seu baixo custo e simplicidade de manuseio17,18,35,48,52-58,97

    . De acordo com

  • 31

    uma recente meta-anlise realizada sobre a efetividade desses programas, 64% dos estudos

    selecionados usaram apenas o Teste de Adams como exame de rastreamento61

    . Contudo, esses

    mesmos estudos apresentaram valor de encaminhamento para radiografia muito elevado (odds

    ratio = 2,91) e baixos valores preditivos positivos, ou seja, baixa preciso para curvas 10o

    e

    20o

    (51% e 66%, respectivamente), o que torna insuficiente o uso deste teste como nica

    ferramenta de avaliao61

    .

    A Topografia de Moir um mtodo que fornece imagens dos contornos da superfcie

    do tronco e avalia quantitativamente a assimetria dessa regio em pacientes com escoliose52

    .

    Essa tcnica tambm utilizada em alguns estudos para rastreamento da escoliose e para

    acompanhamento dos adolescentes examinados52,60,69

    . Contudo, apesar de ser um teste com

    boa sensibilidade, todo o equipamento para sua realizao caro e requer amplo espao para

    sua permanncia durante a avaliao, bem como habilidade do indivduo que o manuseia,

    computador para anlise e armazenamento dos dados coletados60

    . Alm disso, estudos

    afirmam que a topografia de Moir usada isoladamente no capaz de determinar

    precisamente, para propsitos clnicos, a magnitude da curva escolitica e que esse mtodo

    identifica um nmero de casos falso-positivos maior do que outros procedimentos

    avaliativos69,92,102

    .

    O escolimetro um inclinmetro desenvolvido por Bunnel que mensura

    quantitativamente a rotao do tronco durante sua flexo anterior, sendo esta uma

    anormalidade topogrfica frequentemente associada com a escoliose14,63,60

    . Essa deformidade

    rotacional do tronco denominada de ngulo de rotao do tronco (ART) e definida pelo

    ngulo formado entre o plano horizontal e o plano do ponto de maior deformidade do aspecto

    posterior do tronco60

    .

    As principais vantagens do escolimetro

    so o baixo custo, a simplicidade de

    manuseio, a ausncia de morbidade associada ao seu uso, sua alta reprodutibilidade e sua boa

    confiabilidade tanto intra como inter-avaliador14,37,46,51,64

    . Murrell et al51

    verificaram que o

    escolimetro apresentou um erro inter-avaliador de 2,0

    o na regio torcica e de 2,2

    o na

    lombar; e, um erro intra-avaliador de 1,2o

    na torcica e 1,5o na lombar. Esses achados foram

    comparados de maneira favorvel com a tcnica da mensurao do ngulo de Cobb em

    radiografias que, por sua vez, apresentou um erro inter-avaliador de 2,5o

    e intra-avaliador de

    1,9o 51,108

    .

    Korovessis e Stamatakis46

    estudaram a correlao entre o ngulo de Cobb e o valor

    obtido pelo escolimetro e observaram que os valores obtidos pelo escolimetro

    podem

  • 32

    predizer o ngulo de Cobb. Esses mesmos autores verificaram uma sensibilidade de 1,0 e um

    valor diagnstico de 0,95 para o escolimetro 46

    .

    Outros estudos mais recentes demonstraram que o escolimetro to preciso quanto

    a Topografia de Moir e a radiografia64,109,110

    , que pode ser usado para a documentao de

    medidas clnicas no acompanhamento da progresso das curvas escoliticas60

    e que seu uso

    pode melhorar a especificidade e o custo dos programas de rastreamento devido reduo

    significativa (por volta de 50%) do nmero de encaminhamentos para os exames

    radiogrficos de pacientes com curvas que no requerem tratamento60

    .

    Grossman et al63

    , por sua vez, afirmam que o escolimetro deve ser usado para triar

    todas as crianas em um programa de rastreamento e no somente aquelas que apresentam

    positividade no teste de Adams. Isso porque, esses autores verificaram, em seu estudo, a

    existncia de um nmero considervel de crianas com teste de Adams negativo que, quando

    avaliadas pelo escolimetro, apresentam anormalidades significativas de rotao de tronco

    63.

    De acordo com a meta-anlise realizada por Fong et al61

    , a combinao do teste de

    Adams com o escolimetro (mensurao do ngulo de rotao do tronco) ou com a

    topografia de Moir ou com o exame radiogrfico melhora a acurcia do encaminhamento dos

    adolescentes com escoliose idioptica para tratamento.

    Pearsall et al4 compararam trs tcnicas no invasivas de mensurao da escoliose

    escolimetro, dispositivo de contorno das costas e topografia de Moir com o ngulo de

    Cobb e verificaram que essas tcnicas podem ser utilizadas como parte de um programa de

    avaliao para deteco precoce da escoliose por serem sensveis a deformidades da coluna,

    em especial na regio torcica.

    Segundo o ltimo consenso sobre os programas de rastreamento escolar para

    escoliose38

    , 65,71% dos 35 centros entrevistados (representantes de 13 pases) afirmaram usar

    o escolimetro

    de Bunnell como instrumento durante os exames de rastreamento, o que fez a

    Sociedade Internacional de Tratamento Ortopdico e Reabilitao para Escoliose (SOSORT)

    recomendar o uso desse instrumento.

  • 33

    4. CASUSTICA E MTODOS

    4.1. Local, populao de estudo e amostra

    Os dados desta pesquisa foram coletados nas escolas pblicas estaduais de trs cidades

    pertencentes Diretoria de Ensino da Regio de Mogi Mirim Amparo, Pedreira e Mogi

    Mirim (Tabela 3). Essas cidades localizam-se, no interior do estado de So Paulo, em uma

    regio limite entre este estado e o de Minas Gerais, junto Serra da Mantiqueira111

    .

    Tabela 3 Caracterizao das cidades participantes deste estudo quanto rea territorial,

    ndice de desenvolvimento humano e populao.

    Cidade rea

    territorial

    (km2)

    ndice de

    desenvolvimento

    Humano

    Municipal

    (IDHM)*

    Populao*

    (habitantes)

    Populao de 10 a

    14 anos

    (habitantes)

    Proporo de

    municpios

    brasileiros com

    mesmo perfil

    populacional**

    Meninos Meninas

    Mogi

    Mirim

    497,708 0,784 86.505 3.255 3.156 5,4%

    Amparo 445,323 0,785 65.829 2.369 2.332 5,4%

    Pedreira 108,817 0,769 41.558 1.521 1.572 17,3%

    *Dados do Censo Demogrfico de 2010111. **Total de municpios brasileiros: 5.561.

    A populao de estudo constituiu-se de adolescentes, tanto do sexo masculino quanto

    feminino, de 10 a 14 anos, que estudavam nas escolas pblicas estaduais de trs cidades

    pertencentes Diretoria de Ensino da Regio de Mogi Mirim.

    A escolha das escolas pblicas estaduais se deu devido facilidade de

    operacionalizao da pesquisa, uma vez que todas as escolas pblicas estaduais so

    vinculadas a uma nica diretoria de ensino, no caso a Diretoria de Ensino da Regio de Mogi

    Mirim.

    Segundo dados da Diretoria Regional de Ensino de Mogi Mirim, as trs cidades,

    pertencentes a essa diretoria, possuem um total de 26 escolas (Tabela 4).

  • 34

    Tabela 4 Quantidade de escolas pblicas estaduais por cidade.

    Cidade Quantidade de Escolas Pblicas

    Pedreira 05

    Mogi Mirim 09

    Amparo 12

    Total 26

    O clculo do tamanho da amostra levou em considerao que, em mdia, a prevalncia

    de escoliose idioptica do adolescente descrita na literatura de 2%92,112

    . Desta forma, para

    um erro mximo de 3% em 95% das possveis amostras, foi necessrio incluir 2.096

    adolescentes no estudo. Considerando possveis perdas, o tamanho final da amostra foi

    estimado em 2.516 adolescentes.

    n = p x q x z2

    (0,2 x d)2

    n = 0,02 x 0,98 x (1,962)2

    (0,20 x 0,03)2

    n ~ 2096 --- 0,20 n ~ 2.516 adolescentes

    Os critrios de excluso deste estudo foram a presena de diferena no comprimento

    dos membros inferiores maior ou igual a 1,5 cm54,58

    e de qualquer condio que impedisse a

    realizao da flexo anterior do tronco37

    (Figura 1). A diferena do comprimento dos

    membros inferiores foi avaliada pelo teste de discrepncia aparente, medindo-se a distncia da

    cicatriz umbilical ao malolo medial113

    .

  • 35

    * aparente MMII: diferena no comprimento aparente dos membros inferiores

    Figura 1 Fluxograma do nmero de adolescentes aptos a participar do estudo, avaliados e os

    que no participaram do estudo.

    4.2. tica

    Os participantes, bem como seus representantes legais, foram previamente informados

    sobre o objetivo do estudo bem como seus procedimentos e assinaram o termo de

    consentimento de participao do protocolo (Apndice). Este estudo foi aprovado pelo

    Comit de tica em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo -

    Protocolo No 254/12 (Apndice).

    Adolescentes aptos a participar

    2.711 (meninos)

    2.591 (meninas)

    Avaliados

    1.072 (meninos)

    1.490 (meninas)

    aparente MMII* 1,5 cm

    16

    No conseguiram realizar o teste

    3

    Desistiram de participar 5

    Pais no autorizaram 5

    Faltas consecutivas

    28

  • 36

    4.3. Materiais

    - Escolimetro de Bunnell Orthopaedics Systems Incorporation

    (Figura 2);

    Figura 2 Escolimetro

    de Bunnell.

    - Gonimetro marca Carci;

    - Fita mtrica;

    - Balana digital (Mallory

    );

    - Uma cmera fotogrfica digital Sony Cyber-shot DSC-WX100 (18.2 MP);

    - Um trip da marca VF modelo WT3710;

    - Marcas passivas feitas com bolas de isopor de 15 mm e fita adesiva dupla face;

    - Tapete de borracha 70 x 74 cm;

    - Giz branco;

    - Um fio de prumo demarcado com quatro pequenas bolas de isopor distanciadas 50 cm entre

    si;

    - Software para anlise postural (SAPO).

    4.4. Procedimentos

    Inicialmente, fez-se o contato com o (a) diretor (a) e coordenador (a) pedaggico (a)

    de cada escola. Agendou-se o Dia da Postura para o Horrio de Trabalho Pedaggico

    Coletivo (HTPC) dos professores. Posteriormente, agendou-se o Dia da Postura para os

  • 37

    alunos dos 5 ao 9 anos das escolas. No Dia da Postura explicou-se o projeto e distribuiu-se

    o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

    Os procedimentos de avaliao foram realizados por trs fisioterapeutas previamente

    treinados.

    4.4.1. Ficha de avaliao

    Cada estudante possua uma ficha de avaliao na qual eram anotados: sexo, idade

    (anos), estatura (kg), massa corporal (m), ndice de Massa Corporal (IMC) (kg/m2), raa,

    dominncia (destro ou canhoto), tempo e idade da menarca (anos), presena de caracteres

    secundrios masculinos, realizao de atividade fsica (na escola e fora do ambiente escolar)

    (minutos/semana), presena de discrepncia aparente de membros inferiores113

    e presena de

    alteraes neuromusculares, ortopdicas e cardiorrespiratrias (Anexo A).

    4.4.2. Avaliao da coluna vertebral

    Para a avaliao quantitativa da curva escolitica, foi utilizado o escolimetro de

    Bunnell (Figura 2)37,38,60

    . O estudante foi instrudo a flexionar seu tronco anteriormente

    olhando para baixo, mantendo os ps afastados aproximadamente 15 cm, joelhos estendidos,

    ombros relaxados, cotovelos estendidos e palmas das mos encostadas e posicionadas na

    frente dos joelhos4,38

    . Primeiramente, o estudante fez uma flexo de tronco a 45o, usando

    metodologia descrita por Marques113

    , para a verificao do maior ngulo de rotao do tronco

    da coluna torcica; em seguida, o adolescente continuou a flexo de tronco a 60o

    e a 90 (ou

    at o mximo que conseguisse) para a verificao das maiores angulaes de rotao do

    tronco das regies toracolombar e lombar, respectivamente. O marco zero do escolimetro

    foi posicionado em cima do topo do processo espinhoso de cada vrtebra da coluna torcica,

    toracolombar e lombar, e o maior valor encontrado do ngulo de rotao de tronco foi

    registrado60

    (Figura 3). Para facilitar a localizao das regies da coluna vertebral, foram

    marcados com etiquetas autoadesivas, os processos espinhosos das quarta, oitava e dcima

    segunda vrtebras torcicas e das primeira, terceira e quinta vrtebras lombares. Para leitura

  • 38

    do escolimetro, o examinador ficou atrs do sujeito com os olhos na mesma altura do

    instrumento4. Essa medida foi realizada por trs vezes com o estudante retornando a posio

    ereta entre cada teste37

    , sendo considerada a mdia dos dois valores mais prximos. Em todas

    as mensuraes foi usado o mesmo escolimetro 37

    .

    Figura 3 Foto ilustrativa do uso do escolimetro

    para mensurao do ngulo de rotao do

    tronco, conforme descrito por Bunnell65

    . Nessa foto, o ngulo de rotao de tronco (ART)

    de 10 graus.

    Quando o ngulo de Rotao de Tronco (ART) era maior ou igual a 7 graus em

    qualquer uma das regies (torcica, toracolombar e lombar), o adolescente era encaminhado

    para a realizao da radiografia ortosttica da coluna vertebral no padro anteroposterior.

    A radiografia foi utilizada para a mensurao do ngulo de Cobb e avaliao do sinal

    de Risser. Para se medir o ngulo de Cobb, os seguintes passos foram seguidos: (1) traou-se

    uma linha vertical passando pelo centro do sacro e, com base nela, encontrou-se a vrtebra

    apical de cada curva, sendo esta a vrtebra mais distante lateralmente da linha vertical traada;

    (2) As vrtebras finais superior e inferior da curva escolitica foram encontradas. A vrtebra

    final superior a primeira vrtebra na direo ceflica do pice da curva cujo plat superior

  • 39

    mais se inclina para a concavidade da curva. J a vrtebra final superior a primeira vrtebra

    na direo caudal do pice da curva cujo plat superior mais se inclina para a concavidade da

    curva; (3) Mediu-se o ngulo de Cobb, que o ngulo formado pelas linhas paralelas traadas

    nos plats superior e inferior das vrtebras finais superior e inferior, respectivamente68

    .

    Considerou-se como curva primria aquela com maior magnitude.

    O sinal de Risser indica a maturidade do sistema esqueltico pelo grau de ossificao

    da crista ilaca e um indicador usado para o clculo do fator de progresso da curva

    escolitica68,114

    . A classificao do sinal de Risser consiste em zero (sem ossificao), um (1-

    25%), dois (26-50%), trs (51-75%), quatro (76-100% de ossificao) e cinco (completa fuso

    da crista ilaca)68

    .

    O clculo do fator de progresso consiste na subtrao de trs vezes o valor do sinal de

    Risser do ngulo de Cobb e o resultado dessa subtrao dividido pela idade cronolgica

    (fator de progresso = (ngulo de Cobb (3*sinal de Risser))/idade cronolgica)114

    . A

    literatura indica apenas observao do adolescente com escoliose quando a porcentagem da

    incidncia de progresso de 40%, tratamento fisioterpico quando de 40 a 60% e colete

    para 60% ou mais114

    . Os valores dos fatores de progresso correspondentes a essas

    porcentagens de incidncia de progresso so at 1,4, de 1,4 a 1,65 e acima de 1,65,

    respectivamente114

    .

    As regies das curvas escoliticas foram classificadas de acordo com a localizao da

    vrtebra apical, da seguinte forma: torcica (vrtebra apical entre T2 e T11), toracolombar

    (entre T12 e L1) e lombar (entre L2 a L4)68

    .

    O agendamento do exame radiogrfico foi feito pela pesquisadora junto ao Hospital

    Municipal. O pedido do exame mdico foi entregue para o adolescente e, por duas vezes, fez-

    se contato telefnico com os pais ou responsveis para avisar sobre a data, horrio e local do

    exame.

    4.4.3. Avaliao postural

    A avaliao postural dos adolescentes que apresentaram ART maior ou igual a 7 graus

    foi realizada.

    Para a tomada fotogrfica utilizaram-se as metodologias de Ferreira115

    adaptada e de

    Penha et al75

    . A cmera foi colocada em um trip com altura de 1,00 m e permaneceu a 2,52

  • 40

    m do local onde o sujeito foi fotografado75,115

    . A calibrao da foto foi realizada por meio do

    fio de prumo demarcado com trs bolas de isopor distanciadas a 50 cm entre si115

    .

    Para garantir a mesma base de sustentao nas quatro fotografias foi utilizado um

    tapete de borracha preto no qual o indivduo posicionou-se livremente para a primeira tomada

    de fotografias115

    . Foi desenhado com giz o contorno dos ps direito e esquerdo do sujeito115

    .

    Aps a primeira tomada das fotos, o sujeito foi orientado a sair de cima do tapete e o mesmo

    foi rodado a 90o da posio anterior

    115. O sujeito foi orientado a se posicionar novamente em

    cima do tapete com os ps em cima do desenho feito com giz115

    .

    Os sujeitos foram fotografados nos planos frontal (anterior e posterior) e sagital aps a

    demarcao dos seguintes pontos anatmicos: lbulos da orelha, acrmios, espinhas ilacas

    anterossuperiores, bordo superior das patelas, tuberosidade das tbias, ngulos inferiores da

    escpula, espinhas ilacas pstero-superiores, processo espinhoso da stima vrtebra cervical,

    trocnter maior do fmur, cabea das fbulas, linha mdia das pernas na altura da fbula,

    malolos laterais, ponto mdio dos calcneos e insero do tendo de Aquiles nos

    calcneros75,115

    .

    As variveis posturais avaliadas esto descritas na tabela 5 e ilustradas nas figuras 4, 5

    e 6. A maioria das variveis posturais foi mensurada pelo protocolo do SAPO. Contudo, as

    variveis do alinhamento sagital do ombro, do alinhamento horizontal das escpulas, do

    ngulo frontal de membro inferior, do ngulo do joelho e do ngulo perna/retrop foram

    mensuradas pela marcao livre de pontos do SAPO.

  • 41

    Tabela 5 Descrio, por segmento, das variveis posturais avaliadas.

    Segmento Plano Medida Nome da medida

    Cabea Frontal ngulo entre os lbulos da orelha e a horizontal115

    Alinhamento horizontal da cabea115

    Sagital ngulo entre o processo espinhoso da stima vrtebra cervical, o meato

    auditivo externo e a horizontal75

    Alinhamento horizontal da cabea (C7)115

    Ombro Frontal ngulo entre os dois acrmios e a horizontal115

    Alinhamento horizontal dos acrmios115

    Sagital Distncia do processo espinhoso da stima vrtebra cervical e o acrmio

    (mtodo descrito por Peterson et al116

    modificado)

    Alinhamento sagital do ombro

    Escpula Frontal ngulo entre os dois ngulos inferiores da escpula e a horizontal115

    Alinhamento horizontal das escpulas115

    Tronco Sagital ngulo entre o acrmio, trocnter maior do fmur e a vertical115

    ngulo entre o acrmio, malolo lateral e a vertical115

    ngulo vertical do tronco115

    ngulo vertical do corpo115

    Pelve Frontal ngulo entre as duas espinhas ilacas anterossuperiores e a horizontal115

    Alinhamento horizontal das espinhas

    ilacas anterossuperiores115

    Sagital ngulo entre a espinha ilaca anterossuperior, a pstero-superior e a

    horizontal75

    Alinhamento horizontal da pelve115

    Joelho Frontal ngulo entre a espinha ilaca anterossuperior, bordo superior da patela e

    tuberosidade da tbia115

    ngulo frontal do membro inferior115

    Sagital ngulo entre o trocnter maior do fmur, a cabea da fbula e o malolo

    lateral117

    ngulo do joelho115

    Tornozelo Frontal ngulo entre uma linha vertical que passa pelo tendo de Aquiles e a linha

    vertical mdia da perna ao ponto mdio do calcneo118

    ngulo perna/retrop115

  • 42

    Figura 4 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    frontal (vista anterior): alinhamento horizontal da cabea (A), alinhamento horizontal dos

    acrmios (B), ngulo frontal do membro inferior (C) e alinhamento horizontal das espinhas

    ilacas anterossuperiores (D).

    Figura 5 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    frontal (vista posterior): alinhamento horizontal das escpulas (A) e ngulo perna/retrop (B).

    4,3o

    4,5o

    2,2o

    1,3o

    4,4o

    7o

  • 43

    Figura 6 Ilustrao das medidas realizadas no SAPO para as variveis posturais do plano

    sagital: alinhamento horizontal da cabea (C7) (A), alinhamento sagital do ombro (B),

    alinhamento horizontal da pelve (C), ngulo do joelho (D), ngulo vertical do tronco (E) e

    ngulo vertical do corpo (F).

    4.5. Anlise dos dados

    Os adolescentes que apresentaram ART 7 e ngulo de Cobb < 10 foram alocados

    no grupo com suspeita de escoliose e os que apresentaram ngulo de Cobb 10o no grupo

    com escoliose.

    51,3o

    6,0 cm

    19,8o

    185,3o

    2,1o

    3,2o

  • 44

    4.5.1. Anlise de risco

    Os adolescentes com escoliose idioptica so submetidos a avaliaes radiogrficas

    a cada 3, 6 ou 12 meses, de acordo com a Society on Scoliosis Orthopaedic and Rehabilitation

    Treatment (Guideline Committee of 2005)38

    . Os demais procedimentos realizados nesta

    pesquisa no foram invasivos e no causaram danos sade fsica e mental dos indivduos

    participantes desta pesquisa. Dessa forma, os procedimentos realizados neste estudo no

    fugiram rotina de acompanhamento desses indivduos e, por isso, o risco desta pesquisa foi

    mnimo. Seguiu-se a Resoluo CNS n01/88 aprovada pelo Conselho Nacional de Sade.

    4.5.2. Confiabilidade

    Avaliou-se a confiabilidade inter-avaliadores para o uso do escolimetro. Duas

    fisioterapeutas avaliaram dez adolescentes em duas ocasies diferentes com intervalo de

    quinze dias entre cada avaliao. Para o clculo do modelo 3 do Coeficiente de Correlao

    Intraclasse (CCI), utilizou-se o software R v. 2.15.1 e o pacote irr v. 0.84.

    Observou-se confiabilidade aceitvel para ART de 60 de flexo de tronco (0,78),

    muito boa para ART de 90 (0,88) e inaceitvel para ART de 45 (0,49)119

    . (Anexo B)

    4.5.3. Anlise estatstica

    Inicialmente, foi realizada anlise descritiva dos dados. As associaes das variveis

    sexo, idade, raa, menarca, caracteres sexuais masculinos, histria familiar, atividade fsica na

    escola e fora da escola e dominncia com escoliose, lateralidade e tipo da curva escolitica

    foram verificadas pelo teste qui-quadrado. O teste t de student foi utilizado para testar as

    diferenas entre mdias de toda a amostra e do grupo com escoliose para as variveis: idade,

    massa corporal, estatura, ndice de massa corporal, idade da menarca, tempo desde a menarca,

    durao de atividade fsica na escola e fora da escola.

  • 45

    Foram estimadas as prevalncias, por ponto e por intervalo de confiana de 95%, para

    a escoliose, estratificando por sexo, por idade e para ngulo de Cobb maior e igual a 20o.

    Verificou-se tambm a frequncia do tipo, regio e lateralidade da curva escolitica por sexo

    e por idade.

    Anlises bivariadas foram conduzidas para identificar possveis associaes entre a

    escoliose e as variveis independentes (sexo, idade, estatura, tempo de menarca, caracteres

    sexuais masculinos e avaliao postural). Quatro modelos de regresso logstica mltipla

    foram construdos para estimar a influncia de cada varivel independente (aps o ajuste para

    as outras variveis do modelo e possveis fatores de confuso).

    Foram calculados a sensibilidade, a especificidade e os valores preditivos do teste

    diagnstico (ART 7o) em relao escoliose idioptica do adolescente (ngulo de Cobb

    10).

    Em relao anlise dos dados posturais, a diferena entre as mdias das variveis

    quantitativas foram testadas pelo t de student e as qualitativas pelo qui-quadrado. Para

    comparao das variveis posturais, que possuam lados direito e esquerdo, utilizou-se o teste

    t-pareado supondo varincias iguais. As comparaes foram feitas entre o grupo com

    escoliose (Cobb 10o) e com suspeita de escoliose (ART 7

    o e Cobb < 10

    o), entre os sexos e

    entre tipo de curva simples e dupla no grupo com escoliose.

    Todos os testes de hipteses desenvolvidos consideraram uma significncia estatstica

    de 5%. A anlise estatstica foi processada pelos programas Stata

    v. 13.0 e Microsoft Excel

    2010.

  • 46

    5. RESULTADOS

    5.1. Rastreamento

    As tabelas 6 e 7 apresentam os resultados da caracterizao dos adolescentes com

    escoliose idioptica e da amostra estudada quanto aos dados demogrficos, antropomtricos e

    clnicos coletados pela ficha de avaliao (sexo, idade, raa, menarca, presena de caracteres

    secundrios masculinos, histria familiar de escoliose, prtica de educao fsica dentro e fora

    da escola e dominncia).

  • 47

    Tabela 6 Distribuio absoluta e relativa dos adolescentes com escoliose idioptica e da

    amostra estudada segundo caractersticas demogrficas e clnicas. Cidades do Estado de So

    Paulo, 2015.

    Caractersticas Amostra total

    n (%)

    Grupo com escoliose

    n (%)

    p

    Sexo

    Feminino

    Masculino

    1.490 (51,2)

    1.072 (41,8)

    32 (86,5)

    5 (13,5)

  • 48

    Tabela 7 Caractersticas dos adolescentes com escoliose idioptica e da amostra estudada,

    segundo variveis antropomtricas e clnicas. Cidades do Estado de So Paulo, 2015.

    Varivel Amostra total

    (n=2.562)

    x (DP)

    Grupo com

    escoliose (n=37)

    x (DP)

    p

    Idade (anos) 12,2 (1,2) 12,8 (1) 0,002*

    Massa Corporal (kg) 50,1 (13,2) 50,4 (9,1) 0,876

    Estatura (m) 1,6 (0,1) 1,6 (0,1) 0,024*

    ndice de Massa Corporal (kg/m2) 20,2 (4,1) 19,7 (3,6) 0,441

    Idade da menarca (anos) 11,6 (1,1) 11,6 (1,4) 0,947

    Tempo desde menarca (anos) 0,9 (1) 1,3 (1,4) 0,011*

    Atividade fsica na escola

    (minutos/semana)

    95,4 (22,8) 91,9 (27,7) 0,339

    Atividade fsica fora da escola

    (minutos/semana)

    90,3 (180,7) 60,8 (105) 0,320

    *Diferena estatisticamente significante. Teste t de student para as mdias.

    A prevalncia de escoliose idioptica do adolescente encontrada na amostra estudada

    foi de 1,5% (IC95%: 1 - 1,9%). De um modo geral, a prevalncia da escoliose idioptica do

    adolescente para o sexo feminino foi maior estatisticamente, quando comparada ao masculino

    (os intervalos de confiana para cada sexo no esto contidos) (Figura 7).

    Figura 7 Prevalncia da escoliose idioptica do adolescente de acordo com a idade e sexo.

    Cidades do Estado de So Paulo, 2015.

  • 49

    De acordo com anlise da figura 7, os casos de escoliose idioptica do adolescente no

    sexo feminino ocorreram a partir dos 11 anos e essa prevalncia aumentou at os 14 anos. J,

    os casos de escoliose idioptica no sexo masculino foram observados a partir dos 12 anos e,

    tambm, aumentaram com a idade.

    Neste estudo, as curvas duplas foram mais frequentes do que as simples (59,5% e

    40,5%, respectivamente). No sexo feminino, 62,5% das curvas escoliticas foram duplas,

    enquanto que no masculino, 60% foram simples. No houve diferena estatstica entre os

    sexos para o tipo de curva (dupla ou simples) (p=0,341); porm, para a localizao das curvas

    duplas, houve diferena estatstica entre masculino e feminino (Figura 8).

    * Diferena estatisticamente significante (p=0,005). Chi2 para as propores. D: direita, E: esquerda.

    Figura 8 - Caractersticas dos adolescentes com escoliose idioptica segundo tipo, regio e

    lateralidade da curva e sexo. Cidades do Estado de So Paulo, 2015.

    Como a prevalncia de curvas duplas nessa amostra foi maior, para a anlise do

    ngulo de Cobb e da lateralidade da curva escolitica, consideramos os dados da curva

    primria (maior magnitude). Dessa forma, 56,8% das curvas apresentaram lateralidade

    direita e 37,8% esquerda. Em 5,4% das curvas duplas, no foi possvel decidir pela

    lateralidade porque as curvas tinham a mesma magnitude.

    Em relao ao ngulo de Cobb, 75% dos adolescentes com escoliose apresentaram

    curvas menores ou iguais a 22 (Cobb 1) e a maioria dos adolescentes apresentaram ngulos

  • 50

    menores do que a primeira curva para Cobb 2 (Figura 9). A prevalncia para curvas maiores

    ou iguais a 20 foi de 0,6% (IC95%: 0,3 0,9%), sendo maior para o sexo feminino (0,9% -

    IC95%: 0,4-1,4%) do que para o masculino (0,1% - IC95%: -0,1-0,3%). As curvas direita

    apresentaram maior magnitude do ngulo de Cobb (20,8 (7,3)) do que aquelas esquerda

    (13,8 (4,1)) (p=0,003).

    010

    20

    30

    40

    ng

    ulo

    Cobb 1 Cobb 2

    Figura 9 Distribuio dos adolescentes com escoliose quanto aos valores do ngulo de Cobb

    da curva escolitica primria (Cobb 1) e da secundria (Cobb 2).

    De acordo com a figura 10, 75% dos adolescentes com escoliose desta amostra

    possuram fator de progresso da curva escolitica menor ou igual a 1,2, indicando

    necessidade de observao, mas no de tratamento fisioteraputico e/ou colete.

    13o

    15o

    22o

    8,5o

    11,5o

    17o

  • 51

    0.5

    11.5

    2

    Fa

    tor

    de p

    rogre

    sso

    Figura 10 - Distribuio dos adolescentes com escoliose quanto aos valores do fator de

    progresso da curva escolitica.

    Na tabela 8 esto representados os quatro modelos de regresso logstica dos fatores

    associados escoliose idioptica do adolescente. No modelo um, verificou-se a influncia de

    cada um dos fatores para todo o grupo de adolescentes rastreados; no dois, apenas para os

    adolescentes com suspeita de escoliose (ART 7 e Cobb < 10); no trs, apenas para o sexo

    masculino (por incluir caracteres sexuais masculinos) e; no quatro, apenas para o feminino

    (por incluir tempo de menarca). No foi possvel fazer a anlise de associao para o modelo

    masculino porque todos os meninos com escoliose possuam caracteres sexuais, gerando uma

    casela zero (adolescentes com escoliose sem caracteres sexuais) e impedindo o clculo do

    odds ratio.

    De acordo com a tabela 8, observou-se que, para os modelos 1 (adolescentes) e 2

    (suspeita de escoliose), o sexo (feminino) e a idade (13 e 14 anos) influenciaram na chance de

    ter escoliose. Para o modelo 1, o sexo feminino aumentou em 4,7 vezes a chance de ter

    escoliose e as idades de 13 e 14 anos aumentaram em 2,2 vezes. J para o modelo 2, o sexo

    feminino aumentou em 3,6 vezes e as idades de 13 e 14 anos aumentaram em 2,6 vezes a

    0,8

    1,2

    * Anlise com base no sinal de Risser de 31 indivduos com escoliose.

  • 52

    chance de ter escoliose. Para o modelo feminino, no se encontrou associao entre o tempo de menarca e a presena de escoliose.

    Tabela 8 Modelos de regresso logstica dos fatores associados escoliose idioptica do adolescente em cidades do Estado de So Paulo, 2015.

    Escoliose OR (IC 95%) p

    Modelo 1

    Adolescentes

    (n=2.546)

    Modelo 2

    Suspeita de escoliose

    (n=113)

    Modelo 3

    Masculino

    (n=5)

    Modelo 4

    Feminino

    (n=32)

    Sexo Feminino 4,7 (1,8 12,2) 0,001* 3,6 (1,2 10,6) 0,019*

    Idade 13 e 14 anos 2,2 (1 4,8) 0,035* 2,6 (1 6,5) 0,038* - - 1,7 (0,7 4,2) 0,219

    Estatura >1,56 1,7 (0,8 3,7) 0,171 1 (0,4 2,7) 0,964 - - 1,6 (0,7 3,6) 0,278

    Tempo de menarca 1,2 (0,9 1,7) 0,295

    Caracteres sexuais masculinos - -

    * Diferena estatstica (p

  • 53

    Tabela 9 Sensibilidade, especificidade e valores preditivos positivo e negativo do escolimetro para ART de 7 e ngulo de Cobb maior ou

    igual a 10.

    Ponto de corte ART 45o

    % (IC95%)

    ART 60o

    % (IC95%)

    ART 90o

    % (IC95%)

    Curva primria

    (Cobb 1 )

    ART 7o

    S 53,8 (43,7 - 64) 48,3 (38,1 - 58,4) 40 (30 - 50)

    E 65,2 (55,4 - 74,9) 75 (66,2 - 83,9) 59,7 (49,7 - 69,7)

    VPP 37,8 (27,9 - 47,8) 78,4 (70 - 86,8) 21,6 (13,2 - 30)

    VPN 78,2 (69,7 - 86,6) 43,6 (33,5 - 53,8) 78,2 (69,7 - 86,6)

    S: sensibilidade, E: especificidade, VPP: valor preditivo positivo, VPN: valor preditivo negativo

    Em relao realizao do exame radiogrfico, 5% (129/2562) dos adolescentes avaliados foram encaminhados ao exame (adotando-se

    ART 7o) e, destes, 12,4% (16/129) no o fizeram.

    5.2. Postura

    Como na comparao entre os sexos poucas foram as variveis que apresentaram diferena estatstica e, tambm, por haver p