UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei...

98
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DO DOLO EVENTUAL NO HOMICÍDIO DE TRÂNSITO NERY SIRENA FILHO Itajaí, maio de 2006

Transcript of UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei...

Page 1: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DO DOLO EVENTUAL NO HOMICÍDIO DE TRÂNSITO

NERY SIRENA FILHO

Itajaí, maio de 2006

Page 2: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DO DOLO EVENTUAL NO HOMICÍDIO DE TRÂNSITO

NERY SIRENA FILHO

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor MSc. Clóvis Demarchi

Itajaí, maio de 2006

Page 3: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

AGRADECIMENTO

Meus agradecimentos: Primeiramente a Deus, pelo dom da vida. Aos meus pais Nery e Lourdes, pelo apoio incondicional durante toda a caminhada. Ao meu orientador, Clóvis Demarchi, por ter acreditado na minha proposta e me auxiliado a cada etapa. Aos demais professores da Univali pelos ensinamentos jurídicos que possibilitaram obter o conhecimento necessário para a realização deste trabalho. A todos os colegas e amigos pelos anos de convivência universitária, principalmente aos meus amigos Rodrigo e Nilson.

Page 4: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho: Aos meus pais, Nery e Lourdes pelo, carinho, compreensão e apoio desprendidos nesta caminhada. Aos meus avós paternos, Plínio e Maria; aos meus avós maternos, Orestes e Lúcia; a minha tia Maria (tia preta), pois tenho a convicção, que onde quer que estejam olham por mim. Aos meus irmãos, Sandra e Jerry, pelo incentivo nas adversidades. Aos meus amigos, José (Zeca) e Patrícia, pela amizade sincera e apoio desprendidos nos momentos de dificuldade.

Page 5: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, maio de 2006

Nery Sirena Filho Graduando

Page 6: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Nery Sirena Filho, sob o título

Análise da Possibilidade do Dolo Eventual no Homicídio de Trânsito, foi

submetida em 27 de junho de 2006 à banca examinadora composta pelos

seguintes professores: Prof. MSc. Clóvis Demarchi (Presidente e Orientador),

Prof. MSc. Rogério Ristow (Examinador), Prof. Esp. Fabiano Oldoni (Examinador),

e aprovada com a nota 9,80 (nove e oitenta).

Itajaí, junho de 2006

Professor MSc. Clovis Demarchi Orientador e Presidente da Banca

Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

Page 7: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Crime

“[...] é a conduta humana (ação ou omissão) contrária à lei penal”. Leal [1998,

p.164].

Crime doloso

“Diz-se o crime doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de

produzi-lo”. [CP, art. 18, I]

Crime culposo

“[...] quando o agente, violando o cuidado, a atenção ou a diligência a que estava

adstrito, causa o resultado que podia prever, ou que previu, supondo, no entanto,

levianamente, que não ocorreria”. Fragoso [2004, p.272].

Culpa consciente

“[...] é aquela em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de

praticar a conduta acreditando, sinceramente, que este resultado não venha a

ocorrer”. Greco [2003, p.223].

Culpa inconsciente

“Culpa inconsciente ocorre quando o agente nem sequer prevê (não representa) o

resultado lesivo, embora previsível”. Gomes [2004, v.III, p.170].

Dolo

“[...] é definido como a vontade manifestada com a consciência inequívoca de

realizar os elementos objetivos do tipo penal”. Leal [1998, p.212].

Dolo alternativo

Page 8: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

“[...] quando o agente visa produzir, com igual intensidade, um ou outro resultado”.

Monteiro de Barros [2001, p.193].

Dolo direto

“[...] quando o agente se propõe a realização da conduta típica. O dolo aqui se

confunde com a intenção. A vontade se dirige à realização do fato que configura o

delito”. Fragoso [2004, p.211].

Dolo eventual

“[...] quando agente, embora não querendo diretamente praticar a infração penal,

não se abstém de agir e, com isso, assume o risco de produzir o resultado que

por ele já havia sido previsto e aceito”. Greco [2003, p.206].

Dolo indireto

“[...] quando a vontade do agente não se dirige a um resultado certo, preciso,

determinado”. Teles [1996, v.I, p.223].

Homicídio

“[...] é a destruição da vida de um homem praticada por outro”. Jesus [2004, p.17].

Imperícia

“[...] é a incapacidade, a falta de conhecimentos técnicos no exercício da arte ou

profissão, não tomando o agente em consideração o que sabe ou deveria saber”.

Silva [2002, p.132].

Imprudência

“[...] é uma atitude em que o agente atua com precipitação, inconsideração, com

afoiteza, sem cautelas, não usando de poderes inibidores. Silva [2002, p.131].

Negligência

“[...] é um deixar de fazer aquilo que a diligência normal impunha. Greco [2003,

p.221].

Trânsito

Page 9: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

“Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais,

isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada,

estacionamento e operação de carga ou descarga. [Parágrafo 1º do art. 1º do

CTB].

Veículo automotor

[...] todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que

serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração

viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo

compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam

sobre trilhos (ônibus elétrico). [Anexo I, do CTB].

Page 10: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

SUMÁRIO

RESUMO ........................................................................................... XII

INTRODUÇÃO..................................................................................... 1

CAPÍTULO 1........................................................................................ 4

ACIDENTES DE TRÂNSITO............................................................... 4 1.1 HISTÓRICO ......................................................................................................4 1.1.1 DA LEGISLAÇÃO ...............................................................................................5 1.1.2 CONCEITO DE TRÂNSITO....................................................................................7 1.2 DO HOMICÍDIO ................................................................................................9 1.2.1 CONCEITO DE HOMICÍDIO .................................................................................11 1.2.2 CONCEITO DE MORTE ......................................................................................12 1.2.3 OBJETO MATERIAL..........................................................................................14 1.2.4 OBJETO JURÍDICO...........................................................................................15 1.2.5 CRIME MATERIAL ............................................................................................15 1.2.6 CRIME COMISSIVO...........................................................................................16 1.2.7 CRIME INSTANTÂNEO ......................................................................................17 1.2.8 SUJEITO ATIVO ...............................................................................................18 1.2.9 SUJEITO PASSIVO ...........................................................................................19 1.2.10 CONSUMAÇÃO..............................................................................................20 1.2.11 TENTATIVA ...................................................................................................21

CAPÍTULO 2...................................................................................... 22

A CONDUTA CRIMINOSA E SEUS ELEMENTOS SUBJETIVOS: O DOLO E A CULPA ............................................................................ 22 2.1 DO CRIME DOLOSO......................................................................................22 2.1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................22 2.1.2 TEORIAS DO DOLO ..........................................................................................25 2.1.3 TEORIA DA VONTADE.......................................................................................25 2.1.3.1 Teoria da representação.........................................................................26 2.1.3.2 Teoria do assentimento ..........................................................................27 2.1.4 DOLO NATURAL E DOLO NORMATIVO...............................................................28 2.1.5 ELEMENTOS DO DOLO.....................................................................................29 2.1.6 ESPÉCIES DE DOLO.........................................................................................30 2.1.6.1 Dolo direto ...............................................................................................30 2.1.6.2 Dolo indireto ............................................................................................32 2.1.6.2.1 Dolo eventual .........................................................................................32 2.1.6.2.2 Dolo alternativo ......................................................................................34 2.2 DO CRIME CULPOSO ...................................................................................34 2.2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS................................................................................34 2.2.2 ELEMENTOS DO FATO TÍPICO CULPOSO.............................................................37 2.2.2.1 Da conduta humana voluntária comissiva ou omissiva ......................37

Page 11: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

2.2.2.2 Da inobservância do dever objetivo de cuidado ..................................38 2.2.2.3 Do resultado lesivo não querido tampouco assumido pelo agente ...39 2.2.2.4 Do nexo de causalidade entre a conduta do agente que deixa de observar o seu dever de cuidado e o resultado lesivo dela advindo. ............40 2.2.2.5 Da previsibilidade ...................................................................................41 2.2.2.6 Da tipicidade............................................................................................42 2.2.3 MODALIDADES DE CULPA ................................................................................43 2.2.3.1 Imprudência.............................................................................................43 2.2.3.2 Negligência ..............................................................................................44 2.2.3.3 Imperícia ..................................................................................................44 2.2.4 ESPÉCIES DE CULPA .......................................................................................45 2.2.4.1 Culpa consciente ....................................................................................45 2.2.4.2 Culpa inconsciente .................................................................................46 2.2.5 DA CONCORRÊNCIA DE CULPAS .......................................................................47

CAPÍTULO 3...................................................................................... 48

ANÁLISE JURISPRUDENCIAL DO HOMICÍDIO PRATICADO NO TRÂNSITO......................................................................................... 48 3.1 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL DO CRIME DE HOMICÍDIO CULPOSO PRATICADO NO TRÂNSITO ...............................................................................48 3.1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................48 3.1.2 ACÓRDÃOS SOBRE CIRCUNSTÂNCIAS CONFIGURADORAS DA IMPRUDÊNCIA. ........50 3.1.3 ACÓRDÃOS SOBRE CIRCUNSTÂNCIAS CARACTERIZADORAS DA IMPERÍCIA. ..........53 3.1.4 ACÓRDÃOS SOBRE CIRCUNSTÂNCIAS CONFIGURADORAS DA NEGLIGÊNCIA..........55 3.2 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA ...............................................................56 3.2.1 NÃO POSSUIR PERMISSÃO PARA DIRIGIR OU CARTEIRA DE HABILITAÇÃO .............57 3.2.2 PRATICÁ-LO EM FAIXA DE PEDESTRES OU NA CALÇADA .....................................58 3.2.3 DEIXAR DE PRESTAR SOCORRO, QUANDO POSSÍVEL FAZÊ-LO SEM RISCO PESSOAL, À VÍTIMA DO ACIDENTE. ............................................................................................59 3.2.4 NO EXERCÍCIO DE SUA PROFISSÃO OU ATIVIDADE, ESTIVER CONDUZINDO VEÍCULO DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS............................................................................60 3.2.5 ESTIVER SOB A INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL OU SUBSTÂNCIA TÓXICA OU ENTORPECENTE DE EFEITOS ANÁLOGOS ....................................................................61 3.3 AÇÃO PENAL ................................................................................................61 3.4 RITO PROCESSUAL......................................................................................61 3.5 SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO............................................62 3.6 PERDÃO JUDICIAL .......................................................................................63 3.7 DOLO EVENTUAL .........................................................................................64

Page 12: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

3.7.1 ACÓRDÃOS CARACTERIZANDO O DOLO EVENTUAL PELA VELOCIDADE EXCESSIVA E EMBRIAGUEZ ...........................................................................................................68 3.7.2 ACÓRDÃOS CARACTERIZANDO O DOLO EVENTUAL PELO RACHA .........................72 3.7.3 PROCEDIMENTO..............................................................................................74

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................... 75

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS........................................... 78

Page 13: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

RESUMO

Esta monografia foi elaborada com o intuito de verificar se

existe a possibilidade de um agente – na modalidade de dolo eventual - ser

julgado pelo Tribunal do Júri em um homicídio praticado na direção de um veículo

automotor. A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de

Trânsito Brasileiro, declina no seu artigo 302, o crime de homicídio culposo no

trânsito e sua pena que varia entre dois e quatro anos de detenção. Ocorre que,

com o aumento do número de acidentes provocados por veículos automotores

com a conseqüente morte entre os envolvidos, ou de pedestres que se

encontravam no local no momento do acidente, os juízes e tribunais começaram a

entender que em determinadas circunstâncias objetivas, tais como a embriaguez

do motorista, velocidade excessiva ou ainda a prática de “racha” evidenciariam a

caracterização do dolo na modalidade de dolo eventual, previsto no artigo 18,

inciso I, do Código Penal Brasileiro, pronunciando o réu, e, conseqüentemente

sendo julgado pelo Tribunal Popular. Contudo questão tormentosa que divide os

operadores do direito é justamente a assunção do risco pelo agente neste tipo de

crime, pois, salvo confissão ou prova testemunhal em contrário, não há como

provar a assunção do risco pelo agente, vez que se trata de uma circunstância

subjetiva de difícil constatação, sendo que remetê-lo a julgamento pelo Tribunal

Popular devido a esta dúvida seria expô-lo a uma possível condenação injusta.

Assim, constata-se que é possível o agente assumir o risco do resultado gravoso,

contudo, a dificuldade em termos processuais práticos de produzir a prova

necessária, a fim de que este seja julgado pelo tribunal popular é deveras muito

difícil, razão pela qual, na prática, salvo prova em contrário, o agente mantêm-se

no patamar da culpa consciente, devendo ser julgado por homicídio culposo no

trânsito.

Page 14: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o homicídio

cometido na direção de um veículo automotor, registre-se, no entanto, que não

faz parte deste trabalho a análise do homicídio praticado no trânsito por dolo

direto, mas sim, àquele praticado por culpa ou dolo eventual, não havendo a

pretensão de esgotar o tema.

Tal estudo tem como objetivo institucional, produzir uma

monografia para obtenção do Título de Bacharel em Direito, pela Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI.

O seu objetivo é verificar as circunstâncias em que o agente

causador de um acidente de trânsito, e conseqüentemente da morte da vítima

poderá ser julgado pelo Tribunal do Júri, face a caracterização do dolo na

modalidade de dolo eventual.

A escolha do título tem sua justificativa no gigantesco

número de acidentes de trânsito com mortes, o que até já vem sendo chamado de

tragédia social; por conseguinte, devido às pressões de vários seguimentos da

sociedade, foi elaborada a Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 – Código de

Trânsito Brasileiro, a qual prevê uma reprimenda mais elevada para o homicídio

culposo no trânsito do que a prevista no Código Penal para o homicídio culposo

comum. Apesar dessa majoração da pena, este tipo de crime que era, a priori,

considerado sempre culposo, salvo raríssimas exceções, os tribunais começaram

a – com bastante freqüência e observando determinadas circunstâncias -, aceitar

a caracterização do dolo na modalidade de dolo eventual.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de um breve

histórico da origem do automóvel e da evolução da legislação de trânsito

brasileira. Ainda, discorreu-se sobre o crime de homicídio, abordando seu

conceito, características e natureza jurídica fazendo uma comparação com o

homicídio praticado na direção de um veículo automotor.

Page 15: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

2

No Capítulo 2, estudou-se sobre a teoria do dolo e da culpa,

iniciando-se com algumas considerações gerais sobre o crime e seu conceito,

ainda, discorreu-se sobre as teorias do dolo, os elementos subjetivos que o

compõe e as suas várias espécies. Sobre a culpa foi estudado o conceito do

crime culposo, os elementos subjetivos que o compõe, as modalidades de culpa –

imprudência, negligência e imperícia -, e as espécies de culpa – consciente e

inconsciente.

No Capítulo 3, realizou-se uma pesquisa jurisprudencial

sobre o homicídio culposo no trânsito, verificando-se quais as circunstâncias em

que se caracteriza a imprudência, negligencia e imperícia neste tipo de delito, e,

ainda, a incidência das causas de aumento de pena previstas nos incisos do

artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro. Ademais, constatou-se as

circunstâncias em que se caracteriza o dolo eventual nos tribunais.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre o tema abordado no presente trabalho científico.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

No homicídio causado na direção de veículo automotor o agente pode ser julgado pelo Tribunal do Júri face a caracterização do dolo eventual em determinadas circunstâncias.

Uma única circunstância objetiva como – embriaguez, excesso de

velocidade ou racha -, pode caracterizar o dolo eventual.

O uso de medicamentos - mesmo com acompanhamento médico -, que possa influenciar na capacidade de dirigir um veículo automotor pode caracterizar o dolo eventual no homicídio no trânsito.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados

Page 16: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

3

o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

Page 17: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

CAPÍTULO 1

ACIDENTES DE TRÂNSITO

1.1 HISTÓRICO

Em que pese a grande problemática na qual se vive hoje em

relação ao aglomerado de veículos automotores que circulam nas pequenas e

médias cidades e principalmente nas metrópoles espalhadas pelo mundo, assim

como as estradas Federais e Estaduais abarrotadas de veículos, necessitando

constantemente de ampliação e reformas, o automóvel como se conhece hoje é

invenção recente do ser humano, Vasconcelos [1985, p.7] diz que

[...] as primeiras restrições ao trânsito conhecidas parecem ser aquelas determinadas por Julio César, que proibiu o tráfego de veículos com rodas no centro de Roma durante certas horas do dia. Como se não bastasse, em Roma havia também ruas de “mão única” e estacionamentos fora da via, especialmente construídos para as carroças.

E segue o autor declinando que

No final do século passado, o invento do automóvel e o aumento da circulação nas cidades trouxeram os primeiros problemas modernos de trânsito e, conseqüentemente, a legislação a respeito.

Billian [1974, p.11] sobre o desenvolvimento do automóvel e

por via de conseqüência do início do trânsito e seus problemas, diz:

Com a invenção da máquina a vapor por James Watt em 1778 foi criada a possibilidade de substituir a força do cavalo para o transporte sobre rodas pela força mecânica. No entanto, somente depois de decorridos aproximadamente 100 anos, chegaram os inventores a tal conclusão. Em 1825, Stephensen construiu a primeira locomotiva e em 1830, trafegava na Inglaterra o primeiro veículo a vapor em forma de trem para a locomoção de

Page 18: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

5

passageiros. Entretanto, só em 1875, surgia pela primeira vez um pequeno carro de madeira com motor a combustão feito pelo construtor Siegfried Markus. Em 1885, Carl Benz construiu um carro a motor, que se encontra atualmente em exposição no Museu Alemão em Munique. Na França surgiu em 1892, o Panhard e em 1899, o primeiro Renaud.

Sobre o primeiro acidente e a primeira vítima a que se tem

notícias desta invenção que revolucionou o mundo moderno, o autor diz:

O primeiro acidente de veículo a motor ocorreu na cidade de New York em 30 de maio de 1896 e, em 13 de setembro de 1899 o Sr. Henry Bliss, de 68 anos de idade, um corretor em Wall Street, ao descer de um carro-troley foi atropelado por uma dessas novas invenções peculiares que não são puxadas a cavalo, na esquina da Rua 74 com a Oitava Avenida, em Manhattan, tornando-se, assim, a primeira vítima fatal na história.

Esta invenção do homem começa então a gerar um ônus

que, a final de contas, todo e qualquer progresso possui, mas, neste caso

específico é a multiplicação do número de veículos automotores, aliados a

estradas e ruas mal conservadas, e ainda, a imprudência humana na condução

desta máquina que vão ocasionar os milhares de acidentes de trânsito

diariamente. Alguns apenas com danos materiais, outros, no entanto, trazendo

além destes a morte entre os envolvidos e conseqüentemente danos irreparáveis

aos familiares da vítima.

1.1.1 Da legislação

A legislação brasileira que trata da problemática que envolve

o trânsito remonta aos idos de 1902, nesta época na cidade de São Paulo e do

Rio de Janeiro foram editados posturas municipais e decretos tratando do assunto

de forma esparsa.

Esta situação perdurou até o ano de 1928, quando foi

elaborado o primeiro Código Nacional de Trânsito; como esclarece Geraldo de

Farias Lemos citado por Araújo Junior [1980, p.28]

Page 19: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

6

Foi esse Decreto nº 18.323 de 1928, o primeiro estatuto sistematizado que tivemos em matéria de trânsito, englobando 93 artigos, e tal diploma perdurou até o primeiro Código Nacional de Trânsito – Decreto-Lei nº 2.994 de 28 de janeiro de 1941, logo revogado pelo Decreto-Lei nº 3.651 de 25 de setembro de 1941, que afinal foi substituído pela Lei nº 5.108 de 21 de setembro de 1966, o atual Código Nacional de Trânsito, cujo regulamento foi implantado pelo Decreto nº 62.127 de 16 de janeiro de 1968, registrando-se, até agora algumas modificações.

No entanto, este diploma legal, mesmo com algumas

alterações posteriores, nunca veio a disciplinar o crime de homicídio cometido no

trânsito. Explica José Frederico Marques citado por Araújo Junior [1980, p.28]

No que diz respeito aos delitos de trânsito, nunca tivemos uma lei específica, cuidando-lhes o Código Penal e a Lei das Contravenções Penais de maneira indireta e superficial. Fundamentalmente, os delitos de trânsito são reprimidos através de normas que descrevem condutas culposas.

Contudo o aumento do número de acidentes envolvendo

veículos automotores, inclusive com mortes, fazia crescer na população um

sentimento de impunidade que exigia mudanças. Explica Monteiro (1999, p.6)

A qualquer sorte, era no terreno da opinião pública que estavam construídas as condições do movimento de reforma – árduo, mas absolutamente inadiável: a imprensa, canalizando o inconformismo da sociedade, documentava, quase que todos os dias, a gravidade do problema, traduzido, hoje, em números que assumem dimensão catastrófica.

Assevera José Frederico Marques citado por Monteiro [1999,

p.5]

Crimes e infrações penais que se cometem graças ao automóvel ou tendo em vista o automóvel, estão exigindo, indeclinavelmente, uma regulamentação mais específica, em nossas leis, dos crimes do automóvel.

Não podemos continuar sob a débil tutela de preceitos apenas genéricos do Código Penal vigente. Urge que se adotem incriminações particulares sobre atentados que se perpetram com

Page 20: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

7

o automóvel, pondo em risco e perigo a incolumidade individual, como também a tranqüilidade pública.

Com o advento do Simpósio Nacional de Trânsito realizado

em 1973, pela Câmara dos Deputados o assunto volta à evidência, dando origem

a inúmeros projetos e emendas que ao final resultariam no surgimento do atual

Código de Trânsito Brasileiro. Afirma Monteiro [1999, p.1]

O Capítulo XIX do Código de Trânsito Brasileiro – a quarta tentativa abrangente de dispor sobre os delitos de trânsito – representa o desfecho de longo processo de elaboração legislativa, iniciado em 1973 – dificílimo e repleto de percalços.

Com isso, passam os crimes cometido no trânsito a serem

tipificados pela Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997, a qual instituiu o vigente

Código de Trânsito Brasileiro, ressaltando-se ademais, que o crime de homicídio

culposo passa a ter uma pena mais elevada do que o homicídio culposo tratado

pelo Código Penal.

1.1.2 Conceito de trânsito

O próprio Código de Transito Brasileiro, Lei nº 9.503 de 29

de Setembro de 1997, define trânsito no seu parágrafo primeiro do artigo primeiro.

Art. 1º [...]

Parágrafo 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.

O anexo I deste diploma legal, define trânsito como sendo a

“movimentação e imobilização de veículos, pessoas e animais nas vias

terrestres”.

Pela importância que tem para o desenvolvimento deste

trabalho necessário faz-se constar a definição de veículo automotor, presente

inclusive no anexo I supracitado

Page 21: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

8

Veículo Automotor todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico).

Explica Fukassawa [2003, p.139]

Elétrico relaciona-se à energia e não à movimentação mecânica, pelo que os denominados ônibus ou bondes elétricos são veículos automotores cujos motores, para movimentação, são alimentados por eletricidade. Será veículo “automotor”, e não veículo solar ou nuclear aquele que tiver motor que funciona através de energia solar ou nuclear.

Necessário ainda esclarecer o significado e abrangência da

categoria via, a qual extraí-se do próprio Código de Trânsito Brasileiro (CTB) no

seu artigo 2º

São vias terrestres urbanas e rurais as ruas, as avenidas, os logradouros, os caminhos, as passagens, as estradas e as rodovias, que terão seu uso regulamentado pelo órgão ou entidade com circunscrição sobre elas, de acordo com as peculiaridades locais e as circunstâncias especiais.

Parágrafo único – Para os efeitos deste Código, são consideradas vias terrestres as praias abertas à circulação pública e as vias internas pertencentes aos condomínios constituídos por unidades autônomas.

Explica Carneiro [1999, p.33] que o CTB “falando em veículo

automotor excluiria outros veículos não menos perigosos, como bicicletas,

carroça, charrete”.

E segue o mesmo autor dizendo que:

Também quanto às vias abertas ao trânsito (art. 1º do CTB), vias terrestres abertas à circulação, entende-se que mesmo em áreas particulares, mas afetadas pelo uso público, inclusive os condomínios (Lei nº 6.766/79), as estradas vicinais de fazendas. Assim o legislador manda aplicar em qualquer tipo de via, desde que sob a direção de veículo automotor.

Page 22: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

9

Diz Jesus [1999, p.77] que “o legislador não restringiu o local

da ocorrência. Pode ser, pois, em qualquer lugar. Ex.: homicídio culposo cometido

no ato de tirar o veículo da garagem”.

Nota-se também que além dos veículos acima descritos

como as bicicletas, carroças, etc., não serão penalizados pelo Código de Trânsito

Brasileiro as lanchas, barcos, jet skis. Como diz Araújo Junior [1980, p.22]

escapam “do seu âmbito os ilícitos relacionados com a circulação ferroviária, de

embarcações e aérea”. Em que pese serem veículos movidos a motor de

propulsão não circulam nas vias terrestres a que se refere a legislação de trânsito.

Neste caso ocorrendo o acidente com resultado morte da

vítima, o agente sofrerá a punição prevista no artigo 121, parágrafo 3º do Código

Penal Brasileiro.

Caso contrário sendo o fato típico ocasionado no trânsito

assim especificado pela Lei 9.503/97, este diploma legal será utilizado para

penalizar o agente.

Várias são as conseqüências jurídicas advindas da morte da

vítima, tanto na esfera civil – a título de indenização -, como na esfera penal.

Como esta é a responsabilidade que interessa neste trabalho, passa-se no tópico

seguinte a discorrer sobre uma das principais conseqüências jurídicas, ou seja, o

homicídio.

1.2 DO HOMICÍDIO

Ceifar a vida de outro ser humano é considerado um dos

crimes mais bárbaros praticados pelo homem. Por isso a sua tipificação pela

norma penal inclui não apenas o crime de homicídio doloso, mas também o

culposo. Veja o que diz o Código Penal Brasileiro em sua parte especial, art. 121

.

Matar alguém:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.

Page 23: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

10

Parágrafo 3º Se o homicídio é culposo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Portanto, aquele que atentar contra este bem jurídico sofrerá

uma das duas espécies de pena acima expostas. Contudo cabe ressaltar neste

início de trabalho que o homicídio ocasionado pelo agente que esteja na direção

de um veículo automotor, de forma culposa terá a incidência de uma pena mais

grave, cuja tipificação encontra-se no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, a

qual diz:

Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:

Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:

I – não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;

II – praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;

III – deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente;

IV – no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros;

V – estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou

entorpecentes de efeitos análogos.

Esclarece-se que até a entrada em vigência do Código de

Trânsito Brasileiro o acidente de trânsito que resultasse na morte da vítima, seria

tratado como um homicídio culposo comum de acordo com o Código Penal

Brasileiro.

Ressalta-se também que o homicídio praticado pelo agente

de forma dolosa, mesmo que esteja na direção de veículo automotor, ou seja,

Page 24: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

11

aquele agente que utiliza o veículo como arma para concluir o seu desiderato

criminoso, continua sendo enquadrado pelo Código Penal Brasileiro.

O bem jurídico vida é o maior de todos os bens do ser

humano, e por isso é tutelado pela norma penal com penas severas para os

agentes que atentam contra este bem. Inclusive cabe ressaltar que antes mesmo

do nascimento o ser humano já está tutelado pela norma, ou seja, o nascituro já

está amparado pela legislação penal brasileira.

Como declina Jesus [2004, p.13] “O legislador protege a

pessoa humana desde a sua formação. Assim, a tutela penal ocorre antes mesmo

do nascimento, por intermédio da descrição legal do crime de aborto.”

Por sua vez, Marques [2002, p.53] diz que “ a pessoa

humana, como centro do universo jurídico (hominun causa omnes jus constitutum

est), constitui objeto de preponderante relevo na tutela que o Estado exerce

através do Direito Penal”.

Assim não deixa dúvidas à importância do bem maior, que é

o bem da vida para o legislador pátrio, que impõe as penas mais elevadas ao

agente que atenta contra este sagrado bem jurídico.

1.2.1 Conceito de homicídio

Muitos autores trazem o conceito de homicídio, diz Mirabete

[2003, p.61].

O homicídio, punido desde a época dos direitos mais antigos, era definido por Carrara como a destruição do homem injustamente cometida por outro homem, por Carmignani como a ocisão violenta de um homem injustamente praticada por outro homem e por Antolesei como a morte de um homem ocasionada por outro homem com um comportamento doloso ou culposo e sem o concurso de causa de justificação.

Page 25: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

12

Para Jesus [2004, p.17] “homicídio é a destruição da vida de

um homem praticada por outro”.

Este autor por sua vez, critica os conceitos que incluem a

injustiça e a violência, explicando que

[...] a injustiça do comportamento do sujeito não integra o tipo penal, pertencendo ao segundo requisito do crime, à antijuridicidade. Não possuindo o tipo de homicídio qualquer elemento de natureza normativa, referente à ilicitude do comportamento, não devemos incluir no conceito a antijuridicidade. Esta é requisito do crime de homicídio. A violência também não faz parte do conceito, uma vez que é perfeitamente possível ao sujeito causar a morte da vítima sem emprego de força bruta, como é o caso do venefício.

Nesse mesmo sentido leciona Mirabete [2003, P.62]

Levando-se em conta, todavia, que a antijuridicidade e a culpa são ínsitas a todo crime e que nem sempre a morte da vítima é obtida por meio de violência (há envenenamento, meios morais etc.), essas definições contêm o supérfluo e não são precisas. A antijuridicidade e a culpabilidade não devem vir mencionadas, aliás, na definição, porque se pressupõe, sempre, ter havido um fato ilícito culpável.

Com isso, pode-se dizer que o homicídio é a destruição da

vida, praticada por um homem contra outro, sem a necessidade da presença da

injustiça e da violência no tipo legal, pois a justiça ou injustiça da ação do agente

faz parte da análise que envolve a questão da antijuridicidade. Já a violência,

também, não é absolutamente necessária, em que pese a grande maioria dos

homicídios ocorrerem desta forma.

1.2.2 Conceito de morte

No item anterior definiu-se o homicídio como sendo a

destruição da vida de um homem por outro, mas qual o momento específico em

que ocorre a morte da vítima?

Page 26: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

13

Segundo Delmanto [2002, p.245] “A morte ocorre com a

cessação do funcionamento cerebral, circulatório e respiratório.”

Ensina Almeida Junior [1979, p.233]

A nosso ver, dar-se-á (morte) não apenas quando houver silêncio cerebral, revelado pelo eletroencefalógrafo mas, também, quando ocorrer concomitantemente a parada circulatória e respiratória em caráter definitivo. Isso, entretanto, não significa permitir que num corpo humano, descerebrado funcionalmente, continue a circular o sangue e o ar unicamente por processo artificial, depois de inúteis e prolongadas tentativas, sem que haja reanimação espontânea. Essa situação admite, sem violência aos preceitos éticos, o aproveitamento de órgãos para transplante, quando se vislumbra uma esperança de sucesso, mas não tolera a especulação científica in anima nobili. Assim sendo, diagnosticar-se-á a morte após a cessação do funcionamento cerebral, circulatório e respiratório.

Explica Capez [2003, p.16] que “o critério legal proposto pela

medicina é a chamada morte encefálica, em razão da Lei 9.434/97, que regula a

retirada e transplante de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, com fins

terapêuticos e científicos”.

Prevê o art. 3º da citada lei:

A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.

Declina ainda o autor

É certo que há casos em que, mesmo após a morte cerebral, órgãos vitais continuam funcionando, havendo, inclusive, exemplo de gestante que chegou a dar à luz nessas condições. Entretanto este é o melhor critério; afinal, com a destruição irreversível das células e do tecido encefálico, não mais há a mínima condição de vida, embora possa o corpo vegetar por algum tempo ainda.

Page 27: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

14

Destarte entende-se que a morte do ser humano ocorre não

apenas com a cessação do funcionamento da atividade cerebral - a chamada

morte cerebral -, mas esta de forma concomitante com a parada respiratória e

circulatória. Contudo ocorrendo a morte cerebral e avaliada pelos especialistas a

sua irreversibilidade, decorre a possibilidade da realização de transplantes de

órgãos cujo regramento está descrito na Lei nº 9.434/97.

Ademais frisa Pedroso [1995, p.30]

Aguardar-se, para a confirmação do êxito letal, a cessação de todas as funções orgânicas projetaria para momento demasiada e exageradamente dilatado o da verificação da morte, fechando-se as portas para a retirada de órgãos de pessoas falecidas para transplantes.

Ressalta-se a importância deste entendimento para que seja

bem sucedida a realização de transplantes, haja vista o exíguo tempo existente

entre a chamada morte encefálica e a realização do procedimento cirúrgico, para

que o órgão transplantado possa ser aproveitado pelo receptor; inclusive nos

acidentes de trânsito onde o número de mortes é elevadíssimo.

A seguir passa-se a fazer um paralelo entre o homicídio

comum, ou seja, aquele praticado por qualquer meio e por qualquer pessoa, com

o homicídio decorrente de acidente de trânsito, no que toca a sua classificação

doutrinária.

1.2.3 Objeto material

O objeto material do crime de homicídio é a pessoa que

sofre a ação delituosa, explica Capez [2003, p.4]

Genericamente, objeto material de um crime é a pessoa ou coisa sobre as quais recai a conduta. É o objeto da ação. Não se deve confundi-lo com o objeto jurídico, que é o interesse protegido pela lei penal. Assim, o objeto material do homicídio é a pessoa quem recai a ação ou omissão.

Page 28: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

15

1.2.4 Objeto jurídico

O bem juridicamente tutelado no crime de homicídio - seja

qual for o meio empregado para se chegar ao resultado gravoso-, é a vida. Diz

Fukassawa [2003, p.144] “ No caso de homicídio, o bem jurídico tutelado pela

norma é a vida humana, o ‘supremo bem individual’ no dizer magistral de Nelson

Hungria”.

No mesmo sentido declina Costa Junior [1992, p.10] que a

objetividade jurídica no crime de homicídio é a “tutela da vida humana, sem

distinção de idade, sexo, raça ou condição social. O direito penal assegura um

direito à vida e não sobre a vida”.

Em se tratando de homicídio no trânsito, assim como os

demais crimes descritos na Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 – Código de

Trânsito Brasileiro -, alguns autores entendem que o bem jurídico vida e a

integridade física são tutelados de forma indireta. Assim ensina Jesus [1999, p

13]:

Nos delitos de trânsito, a objetividade jurídica principal pertence à coletividade (segurança do trânsito), sendo esse o seu traço marcante. Nada impede que se reconheça nesses delitos uma objetividade jurídica secundária, já que a norma penal, tutelando o interesse coletivo da segurança de trânsito, protege por via indireta interesses individuais, como a vida, a integridade física, a saúde etc.

Com isso pode-se dizer que o bem jurídico vida no caso de

homicídio causado em acidente de trânsito é tutelado de forma secundária, pois

em primeiro lugar a norma vislumbra proteger a segurança no trânsito.

1.2.5 Crime material

Para Monteiro de Barros [2001, p.117] os “delitos materiais

ou causais são os que alojam, no tipo legal, um resultado naturalístico cuja

ocorrência é necessária à sua consumação. Exemplos: homicídio, lesão corporal,

furto etc”.

Page 29: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

16

No mesmo sentido leciona Mirabete [2002, p.134]

No crime material há necessidade de um resultado externo à ação, descrito na lei, e que se destaca lógica e cronologicamente da conduta. Esse resultado deve ser considerado de acordo com o sentido naturalístico da palavra, e não com relação a seu conteúdo jurídico, pois todos os crimes provocam lesão ou perigo para o bem jurídico. Exemplos são o homicídio (morte), furto e roubo (subtração), dano (destruição, inutilização) etc.

A prova da materialidade do delito é feita através do exame

de corpo de delito, explica Capez [2003, p.9] que

Sua realização é imprescindível nas infrações penais que deixam vestígios. Realiza-se mediante a inspeção e autópsia do cadáver, na busca da causa mortis, sendo tal exame devidamente documentado por laudo necroscópico.

O homicídio decorrente do acidente de trânsito ou que tenha

sido cometido por qualquer forma exige para a sua configuração a lesão ao bem

jurídico tutelado, ou seja, a morte da vítima, e conseqüentemente o auto de

exame de corpo de delito, que neste caso é o auto de exame cadavérico para

comprovar a materialidade do crime. Pelas razões acima expostas este crime

também é classificado doutrinariamente como um crime de dano.

1.2.6 Crime comissivo

O homicídio é um crime que pode ser praticado por ação ou

omissão. Segundo Monteiro de Barros [2001, p.119] os “delitos comissivos ou de

ação são os cometidos com uma conduta positiva. Exemplo: homicídio”.

E segue o mesmo autor declinando que os “delitos

omissivos são os cometidos mediante inação. Exemplo: omissão de socorro”.

Contudo o homicídio também pode ser praticado por

omissão são os crimes chamados pela doutrina de omissivos impróprios ou

comissivos por omissão. Ensina Mirabete [2002, p.130]

Nos crimes omissivos impróprios a lei descreve uma conduta de fazer, mas o agente se nega a cumprir o dever de agir. Exemplos

Page 30: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

17

são o da mãe que deixa de amamentar ou cuidar do filho causando-lhe a morte; do médico ou da enfermeira que não ministra o medicamento necessário ao paciente, que vem a morrer.

Porém, em se tratando de homicídio no trânsito, uma

conduta omissiva não é possível. Explica Fukassawa [2003, p.144]

Tratando-se de crimes próprios ou especiais, cujos tipos restringem o âmbito da autoria, exige-se que o sujeito ativo tenha uma capacidade especial; no caso, é necessário que ocupe ele uma posição ou condição de fato, ou seja, esteja na direção de veículo automotor quando da realização típica e cause o resultado por imprudência, negligência ou imperícia que são as três modalidades informadoras da culpa lstricto sensu (art. 18, II, do Código Penal).

Com isso pode-se dizer que o homicídio comum pode ser

praticado de forma comissiva ou omissiva, mas o homicídio no trânsito somente

poderá ser praticado de forma comissiva, já que o tipo legal exige que o agente

esteja na direção de veículo automotor.

1.2.7 Crime instantâneo

O crime de homicídio é considerado instantâneo, pois

segundo leciona Monteiro de Barros [2001, p.118]

Delitos instantâneos ou de estado são os que se consumam num determinado momento, sem continuidade no tempo. Assim, “o fato estará consumado” e “acabado” com a verificação do resultado típico. Exemplos: homicídio, lesão corporal, furto etc.

No mesmo sentido leciona Mirabete [2002, p.129]

Crime instantâneo é aquele que, uma vez consumado, está encerrado, a consumação não se prolonga. Isso não quer dizer que a ação seja rápida, mas que a consumação ocorre em determinado momento e não mais prossegue.

Sob este aspecto, tanto o homicídio comum, como aqueles

praticado no trânsito são considerados delitos instantâneos, pois a consumação

Page 31: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

18

destes delitos ocorrerá sempre em determinado momento, qual seja a morte da

vítima.

1.2.8 Sujeito ativo

O homicídio pode ser praticado por qualquer pessoa, pois se

trata de crime comum, explica Monteiro de Barros [2001, p.120] “crimes comuns

ou gerais são os que podem ser executados por qualquer pessoa. A lei não exige

nenhum requisito especial para que alguém possa ser autor”.

Quanto ao homicídio pode-se dizer que qualquer pessoa

com força física ou capacidade intelectual para elaborar um plano que leve

outrem a morte pode ser o sujeito ativo deste delito. Contudo, no homicídio que

ocorre no trânsito não pode usufruir desta mesma classificação. Pois, como visto

no item 1.2.5 o delito de homicídio será considerado próprio e não comum,

justamente porque exige que o agente esteja na direção de um veículo automotor

no momento da ocorrência do fato típico.

Muitas vezes será necessário observar com cuidado o caso

concreto para verificar se o homicídio ali praticado trata-se de homicídio comum

ou homicídio de trânsito. Vejamos os exemplos declinados por Fukassawa [2003,

p.145]

o sujeito que estacionar o seu veículo automotor e dele sair para momentaneamente fazer algo, não freia-lo devidamente e com isso permitir que desça rua abaixo colhendo um pessoa;

aquele que estiver empurrando um automóvel e com isso causar ferimentos em alguém;

a pessoa que tiver seu veículo imobilizado na via pública por um defeito mecânico, negligentemente não sinalizar o local e assim dar ensejo a que outro veículo colida contra a traseira daquele, vitimando pessoas;

aquele que estiver ao volante de um veículo rebocado por outro e por uma razão qualquer propiciar a sua derivação atingindo uma pessoa.

Page 32: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

19

Nas hipóteses sub a, b e c, o sujeito não está na direção do veículo; na hipótese sub d não há direção porque sem controle de trajeto ou rumo pelo sujeito, além do quê perde a característica de automotor porque não movimentado pelo próprio motor e o veículo rebocado tem seu trajeto ou rumo dirigido. Serão crimes culposos comuns previstos no Código Penal.

Outro exemplo, declinado agora por Capez [1999, p.26]

Suponha-se que um pedestre desrespeite a sinalização e seja atropelado por um motociclista que esteja conduzindo corretamente o seu veículo, e este venha ao solo, sofrendo lesões corporais. A imprudência foi do pedestre e este deve ser responsabilizado criminalmente. Por qual crime (comum ou do Código de Trânsito)? Ora, o pedestre não estava na direção de veículo automotor e, assim, aplicável a legislação comum, não obstante o fato se tenha passado no trânsito. Se, entretanto, o autor da imprudência fosse o motociclista, seria aplicável o novo Código. Conclui-se, portanto, que as novas regras somente são cabíveis a quem esteja no comando dos mecanismos de controle e velocidade de um veículo automotor.

Destarte, pode-se dizer que nem todos os acidentes com a

morte da vítima ou mesmo aqueles que apenas resultem em lesões corporais

envolvendo veículos ou que de qualquer forma estejam na via pública serão

tipificados pelo Código de Trânsito Brasileiro, pois condição sine qua non para

este enquadramento legal será que o agente causador do acidente esteja na

direção de um veículo automotor.

1.2.9 Sujeito passivo

Ensina Capez [2003, p.588] que o sujeito passivo

É o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado. Pode ser direto ou imediato, quando for a pessoa que sofre diretamente a agressão (sujeito passivo material), ou indireto ou mediato, pois o Estado (sujeito passivo formal) é sempre atingido em seus interesses, qualquer que seja a infração praticada, visto que a ordem pública e a paz social são violadas. No caso do delito de homicídio, o sujeito passivo é qualquer pessoa com vida.

Page 33: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

20

Noronha [2003, p.17] diz que “Sujeito passivo são o Estado

e o indivíduo, como seus titulares. Particularmente, é o indivíduo o ser vivo,

nascido de mulher ou que está nascendo”.

Mirabete [2003, p.48] explica que “distingue-se o sujeito

passivo constante ou formal, que é sempre o Estado, do sujeito passivo eventual

ou material, o titular do interesse penalmente protegido”.

Assevera Fukassawa [2003, p.144]

Qualquer pessoa pode ser vítima de homicídio ou lesão corporal culposos. Por pessoa entende-se o ser vivo já nascido, razão porque se o condutor atropela uma pedestre grávida, provocando a morte do feto, haverá um só delito, contra aquela.

Assim sendo, no que tange ao sujeito passivo do homicídio

não há qualquer singularidade quanto ao crime ser ou não praticado na direção

de veículo automotor, haja vista que a vítima é aquela que terá o seu bem maior

ceifado seja qual for o meio empregado.

1.2.10 Consumação

A consumação do crime de homicídio se dá com a morte da

vítima. Capez [2003, p.15] explica que crime consumado

É aquele em que foram realizados todos os elementos constantes de sua definição legal (CP, art. 14, I). A consumação do delito nada mais é que a última fase das várias pelas quais passa o crime (é o chamado iter criminis). No caso dos crimes materiais, como o homicídio, a consumação se dá com a produção do resultado naturalístico morte.

No mesmo sentido Noronha [2003, p.20] diz que “o

homicídio é delito material que requer um evento – a morte da vítima – causada

pela ação (em sentido amplo) do sujeito ativo. O momento consumativo é o do

resultado, ou seja, da morte do sujeito passivo”.

Explica Fukassawa [2003, p.147]

Page 34: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

21

Nos crimes culposos providos de resultado material, a consumação ocorre com a produção do resultado naturalístico, morte no homicídio culposo e ofensa à integridade corporal ou à saúde do ofendido na lesão culposa, devidamente comprovados por exame de corpo de delito na forma do art. 158 do Código de Processo Penal.

Com isso pode-se dizer que o homicídio seja doloso, seja

culposo, ocasionado no trânsito ou por qualquer outro meio, sua consumação

será sempre com a morte da vítima.

1.2.11 Tentativa

A tentativa é perfeitamente possível no homicídio doloso, ou

seja, como explica Delmanto [2002, p.245] ”desde que seja inequívoca a intenção

de matar.” Pois do contrário, quando o agente não quer o resultado ensina

Noronha [2003, p.32] que “não é possível a tentativa de homicídio culposo: culpa

e tentativa são noções antitéticas: naquela o agente vai além do que queria, nesta

fica aquém do que desejava”.

No mesmo sentido Fukassawa [2003, p.148] diz que nos

crimes culposos “a tentativa é impensável e inadmissível, posto que não há

qualquer nexo entre a vontade e o resultado, mas apenas entre a vontade e a

ação”.

Arremata Leal (1998, p.233) dizendo que

Se o elemento subjetivo na tentativa, conforme vimos, é o dolo do crime que o agente quis consumar e não conseguiu, fica evidenciado que não há tentativa de crime culposo. Na tentativa o agente quer um resultado e não consegue concretizá-lo; no crime culposo, ao contrário, não quer o resultado que acaba produzindo por sua negligência. Portanto, tipo culposo e tentativa punível são conceitos juridicamente incompatíveis.

Destarte, pode-se dizer que em se tratando de homicídio

culposo, a tentativa, não existe, seja considerado crime de trânsito ou não, pois o

homem não pode ser condenado por tentar um resultado que não queria.

Page 35: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

22

CAPÍTULO 2

A CONDUTA CRIMINOSA E SEUS ELEMENTOS SUBJETIVOS: O DOLO E A CULPA

2.1 DO CRIME DOLOSO

2.1.1 Considerações gerais

Antes de iniciar especificamente o estudo sobre as teorias

do dolo e da culpa, e seus desdobramentos no mundo jurídico, faz-se necessário

definir o que é considerado uma conduta criminosa para que se possa entender o

estudo referente aos elementos subjetivos que compõe a categoria crime.

Destaca-se ainda, que as definições abaixo relacionadas são aquelas formais, ou

seja, como declina Jesus [1986, v.1, p.132] “sob o aspecto da técnica jurídica, do

ponto de vista da lei”.

O art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal assim define

crime

Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativamente ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

Teles [1996, v.1, p.182], por sua vez, critica a definição

legal, ao declinar que “trata-se, como se vê, de um conceito puramente formal,

que nada explica, a não ser quais penas correspondem ao crime e quais à

contravenção penal”.

E, nesta mesma obra, Teles [1996, v.1, p.188] passa a

definir o crime como sendo “um fato típico, ilícito e reprovável, censurável,

culpável”.

Page 36: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

23

Já para Leal [1998, p.164] crime é “a conduta humana (ação

ou omissão) contrária à lei penal”.

Para Noronha [1999, v.1, p. 97] o crime é “a conduta

humana que lesa ou expõe a perigo um bem jurídico protegido pela lei penal. Sua

essência é a ofensa ao bem jurídico, pois toda norma penal tem por finalidade sua

tutela”.

Para Jesus [1986, v.1, p.133] o “crime é um fato típico e

antijurídico. A culpabilidade, constitui pressuposto da pena”.

Com isso, pode-se dizer que o crime é um fato típico – está

descrito na lei como delito a ser punido-; antijurídico, ou seja, contraria a lei penal.

E modernamente a questão da culpabilidade, em que pese entendimentos

doutrinários divergentes, vem sendo enfrentada como mero pressuposto para

aplicação da pena, pois um fato pode ser típico e antijurídico, contudo não ser

culpável, haja vista, a questão da inimputabilidade do agente.

Feita estas primeiras considerações verifica-se que além dos

elementos objetivos do tipo penal, quais sejam àqueles descritos na lei como

crime, também fazem parte deste tipo os elementos subjetivos que são o dolo e a

culpa.

Conforme diz Teles [1996, v.1, p.207] “só é definida como

crime duas espécies de condutas voluntárias: aquelas em que o agente deseja

violar a norma e aquelas em que a viola por desatenção”.

Destarte, pode-se dizer que para o agente ser

responsabilizado em sede penal, obrigatoriamente, a sua conduta, deve ter sido

realizada por sua vontade – dolo -, ou por sua imprudência, negligência ou

imperícia – culpa.

O artigo 18 inciso I do Código Penal Brasileiro assim define

o crime doloso

Diz-se o crime doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

Page 37: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

24

Inúmeras críticas são feitas pela doutrina a essa definição

legal. Diz Monteiro de Barros [2001, v.1, p.187]

Verifica-se, de antemão, que, do ponto de vista naturalista, essa definição compreende apenas os delitos de conduta e evento, isto é, os crimes materiais e formais, pois só esses delitos alojam dentro do tipo um resultado naturalístico.

E continua o autor explicando que “no tocante aos crimes de

mera conduta, em que o tipo penal abstrai de seu interior qualquer evento físico, a

definição legal, sob o prisma naturalístico, mostra-se imprestável”.

No mesmo sentido aduz Teles [1996, v.1, p.223]

[...] a consciência do fato e a vontade de causar o resultado ou, em duas palavras, consciência e vontade, ou, simplesmente, vontade de causar o resultado – é insuficiente, pois somente se aplica aos tipos legais de crimes que descrevem, além da conduta, a produção de um resultado como no homicídio simples, do art. 121 caput, do CP, “matar alguém”.

E segue seu raciocínio dizendo que

É preciso ver, também, que muitos tipos legais de crime descrevem pura e simplesmente um comportamento humano, sem exigir a produção de qualquer conseqüência, como por exemplo, “deixar o médico de denunciar” doença de notificação compulsória.

Justamente por esta definição legal incompleta de crime

doloso é que vários autores o definem de forma diversa. Explica Jesus [1986, v.1,

p.243] que o dolo “integra a conduta, pelo que a ação e a omissão não constituem

simples formas naturalísticas de comportamento, mas ações ou omissões

dolosas”.

E segue o autor definindo dolo como sendo a “vontade de

concretizar as características objetivas do tipo”.

Page 38: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

25

No mesmo sentido Leal [1998, p.212] diz que “o dolo é

definido como a vontade manifestada com a consciência inequívoca de realizar os

elementos objetivos do tipo penal”.

Já Monteiro de Barros [2001, v.1, p.188] especifica dizendo

que se considera “crime doloso, quando o agente quis a conduta, ou o resultado,

ou assumiu o risco de produzi-los”.

Com isso, podemos dizer que o dolo não é apenas a

vontade de produzir o resultado gravoso ou de assumir o risco de produzi-lo, mas

também, a vontade de praticar àquela ação descrita no tipo penal, que não tem o

condão de produzir um resultado naturalístico, como ocorre nos crimes de mera

conduta do agente.

2.1.2 Teorias do dolo

Discutia-se muito na doutrina sobre quais elementos

subjetivos deveriam integrar o subjetivismo do agente para que restasse

caracterizado o dolo.

Explica Leal [1998, p.212]

Houve muita discussão para saber se o dolo é somente vontade de realizar o evento, ou somente a representação deste (sem a necessidade de querê-lo expressamente) ou, ainda, se é a simples anuência ao fato psiquicamente representado. Surgiram então as teorias da vontade, da representação e da anuência ou assentimento.

A seguir passa-se a definir qual o posicionamento adotado

por cada uma destas teorias.

2.1.3 Teoria da vontade

Para a teoria da vontade, segundo Prado [1999, p.188] “dolo

é vontade dirigida ao resultado (o autor deve ter consciência do fato, mas,

sobretudo, vontade de causá-lo)”.

Jesus [1986, v.1, p.243] diz que

Page 39: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

26

Para os partidários dessa teoria, o dolo exige os seguintes requisitos :

a) quem realiza o ato deve conhecer os atos e sua significação;

b) o autor deve estar disposto a produzir o resultado.

Assim, para a teoria da vontade, é preciso que o agente tenha a representação do fato (consciência do fato) e a vontade de causar o resultado.

No mesmo sentido entende Monteiro de Barros [2001, p.189]

[...] a teoria da vontade preconiza que, para a existência do dolo, não basta que o agente tenha previsto o resultado, urge ainda o desejo de realizá-lo. Segundo essa doutrina, o dolo pode ser definido como a vontade consciente de realizar o fato criminoso. A consciência exprime a idéia de previsão do resultado, e a vontade, o desejo de concretizá-lo.

Destarte, pode-se dizer que para teoria da vontade devem

estar presentes para a caracterização do dolo do agente, os seguintes elementos

subjetivos: a consciência do fato delituoso e ainda, a vontade de produzir o

resultado.

2.1.3.1 Teoria da representação

Sobre a teoria da representação explica Teles [1999, v.1,

p.218]

Não é necessário que o agente tenha vontade de alcançar o resultado, bastando que o preveja, que o represente. Se o agente antevê o resultado e não se detém, realizando uma conduta que dá causa ao resultado, mesmo não tendo desejado alcançá-lo, terá agido dolosamente, por tê-lo representado, porque o previu.

No mesmo sentido declina Silva [2002, p.122] “Para a

teoria da representação, dolo é a previsão do resultado. É suficiente para que o

resultado seja previsto pelo sujeito”.

Page 40: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

27

Bem explica Monteiro de Barros [2001, v.1, p.188]

“Privilegia-se o momento intelectual, de ter agido com previsão do evento,

deixando de lado o aspecto volitivo, de querer ou assumir o risco de produzi-lo”.

Assim, pode-se dizer que, para a teoria da representação

basta tão somente a previsão do resultado gravoso para a configuração do dolo

do agente.

2.1.3.2 Teoria do assentimento

A terceira teoria que trata desta questão, a teoria do

assentimento, também chamada pela doutrina de teoria do consentimento, difere

das demais, pois como leciona Teles [1996, v.1, p.220]

Esta teoria, tanto quanto a teoria da vontade, exige que o agente tenha consciência do fato, tenha previsão do resultado, mas não exige que ele queira alcançar o resultado, bastando que o aceite, consinta, caso ele aconteça.

Complementa Noronha [1999, vol.1, p.138] ”age

dolosamente não apenas o que quer livre e conscientemente um resultado, mas

também quem, embora não o querendo de modo principal, aceita-o ou a ele anui”.

No mesmo sentido declina Silva [2002, p.122] que esta

teoria “Requer a previsão ou representação do resultado como certo, provável ou

possível, não exigindo que o sujeito queira produzi-lo. É suficiente seu

assentimento”.

Assim, entende-se que para a teoria do assentimento ou

consentimento estando presente, na consciência do agente, a representação, ou

seja, a previsão do resultado gravoso e a aceitação deste, bastam para configurar

o dolo, não exigindo especificamente a vontade do agente em produzir o fato

criminoso.

Por fim, verifica-se que Código Penal Brasileiro no artigo 18,

inciso I, adotou não apenas a teoria da vontade, onde o agente quer produzir o

resultado, mas também a teoria do consentimento ou assentimento, onde o

Page 41: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

28

agente não quer especificamente o resultado, mas o prevê, e mesmo assim, anui

com a sua ocorrência.

2.1.4 Dolo Natural e Dolo Normativo

A doutrina tradicional adota o conceito de dolo normativo, ou

seja, aquele que exige a consciência da antijuridicidade do fato criminoso pelo

agente. Explica Leal [1998, p.212] que “Para os defensores de um conceito

psicológico-normativo de culpabilidade, o dolo é conceituado como representação

e vontade em referência a um fato punível, que o agente pratica sabendo ser o

mesmo ilícito”.

E segue o autor dizendo que “O que marca essa concepção

doutrinária é a afirmativa de que é inerente ao dolo a consciência da ilicitude do

fato”.

No mesmo sentido diz Jesus [1986, v.1, p.244] “Para a

doutrina tradicional, o dolo é normativo, i. e., contém a consciência da

antijuridicidade”.

A doutrina moderna, por sua vez, contrapõe-se a este

entendimento, adotando a teoria finalista da ação, a qual entende que o dolo é

natural. Este é definido por Leal [1998, p.212] como “um dolo desprovido da

consciência da antijuridicidade do fato”.

Jesus [1986, v.1, p.244] acompanha este entendimento

quando declina que o dolo natural “corresponde à simples vontade de concretizar

os elementos objetivos do tipo, não portando a consciência da ilicitude”.

Contudo adverte Leal [1998, p.212]

É importante estabelecer que, embora não se perquira neste momento sobre o conhecimento da ilicitude, o dolo deve abranger a vontade de realizar todos os requisitos previstos no tipo legal de crime. É preciso reconhecer, no entanto, que é uma operação teórica delicada e difícil distinguir o conhecimento da ilicitude do terreno subjetivo no qual o dolo deita suas raízes.

Page 42: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

29

Assim sendo, verifica-se que o dolo normativo é aquele que

exige o conhecimento da ilicitude da conduta praticada pelo agente, o que não

ocorre com o dolo natural; aliás esta é a teoria adotada pela doutrina clássica e

acolhida pelo Código Penal Brasileiro, pois a questão do conhecimento ou não da

antijuridicidade do fato, será analisada no campo da culpabilidade do agente,

onde verificar-se-á a exclusão ou diminuição da pena, conforme o erro sobre a

ilicitude do fato seja ou não escusável.

2.1.5 Elementos do Dolo

Para que o dolo reste plenamente caracterizado em uma

ação ou omissão do agente, faz-se necessário a presença de dois componentes:

um intelectivo ou intelectual e outro volitivo. Quanto ao primeiro elemento explica

Leal [1998, p.213] que este

[...] constitui a representação ou a consciência do fato: o agente deve ter conhecimento da conduta, do resultado (para os crimes de ação e resultado) e da relação causal entre uma e outro. Consciência da conduta típica significa conhecê-la em todos os elementos descritivos, normativos e subjetivos especiais contidos no tipo.

No mesmo sentido entende Silva [2002, p.122] que

É necessário que o agente tenha consciência do comportamento positivo ou negativo que está praticando e do resultado típico. Em segundo lugar, é preciso que a sua mente perceba que da conduta pode derivar o resultado, que há ligação de causa e efeito entre eles.

Quanto ao segundo elemento constitutivo do dolo, qual seja

o volitivo, Jesus [1986,vol.1,p.245] diz que “o dolo requer vontade de praticar o

comportamento e causar o resultado”.

Explica Leal [1998, p.213] que

Agir dolosamente significa também que o agente quer a conduta e o resultado daí decorrente. Esse querer exteriorizado de modo objetivo é que constitui o elemento volitivo do dolo. O tipo doloso,

Page 43: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

30

portanto, será sempre uma infração penal voluntária ou intencional.

Contudo adverte Jesus [1986, v.1, p.245] que “Nos crimes

de mera conduta é suficiente que o sujeito tenha a representação e a vontade de

realizá-la”.

Com isso pode-se dizer que para a caracterização do dolo

faz-se necessário a consciência da conduta e do resultado, assim como da

relação causal entre estes dois elementos; somados ainda, a vontade do agente

de produzir o resultado gravoso. Isso nos crimes materiais e formais, pois nos

crimes de mera conduta, basta a vontade de realizar a conduta típica, pois não há

resultado naturalístico neste tipo de crime.

2.1.6 Espécies de dolo

O Direito Penal moderno costuma distinguir duas espécies

de dolo: dolo direto, também chamado de determinado, e, dolo indireto ou

indeterminado.

2.1.6.1 Dolo direto

O dolo direto é aquele descrito no artigo 18, primeira parte

do Código Penal Brasileiro, onde o agente quer o resultado típico. Prado [1999,

p.187] explica que no “Dolo direto ou imediato o agente quer o resultado como fim

de sua ação e o considera unido a esta última, isto é, o resultado produz-se como

conseqüência de sua ação. A vontade se dirige à realização do fato típico, querido

pelo autor”.

No mesmo sentido leciona Fragoso [2004, p.211] “Há dolo

direto quando o agente se propõe a realização da conduta típica. O dolo aqui se

confunde com a intenção. A vontade se dirige à realização do fato que configura o

delito”.

E segue esclarecendo que “A dúvida quanto à possibilidade

de alcançar o resultado é irrelevante. Assim, não deixa de haver dolo direto se o

agente alveja a vítima sem saber se conseguirá atingi-la”.

Page 44: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

31

Silva [2002, p.124] prefere usar a denominação de dolo

determinado declinando que “é a forma mais interessante dentre as várias

modalidades existentes, em que o evento corresponde à previsão e à vontade”.

Importante salientar que alguns doutrinadores também

bipartem o dolo direto em dolo direto de primeiro grau e de segundo grau, onde

aquele é o dolo direto ou determinado propriamente dito, quanto a este explica

Feu Rosa [1996, p.317] que o

Dolo direto de segundo grau – Costuma ser conhecido, também, como “dolo das conseqüências necessárias”. Nele o agente prevê, admite e aceita os resultados que advirão, inseparáveis, do seu procedimento.

O autor, ainda, esclarece que “Este dolo não deixa de ser

considerado direto, [...] porque realmente em todo crime o agente pratica o ato,

considerando como certa a conseqüência que sobrevirá”.

No mesmo sentido explica e exemplifica Fragoso [2004, p.

211]

Há dolo direto também em relação ao meio e ao resultado que necessariamente estão ligados à realização da conduta típica, mesmo que não sejam desejados pelo agente. Se este sabe que a ação necessariamente acarreta resultado concomitante, e não obstante o pratica, quer, por certo, também, esse resultado, embora o lamente. É o caso de quem, visando eliminar seu inimigo, coloca engenho explosivo no avião que o transporta, sabendo que o mecanismo será acionado durante o vôo. É o dolo de conseqüências necessárias.

Destarte, verifica-se que o dolo direto ou determinado que é

a vontade do agente praticar a conduta típica, também pode ser doutrinariamente

subdividido em dolo direto de primeiro grau e de segundo grau, onde aquele é o

dolo propriamente dito em que o agente atinge diretamente o sujeito passivo, já

este, também chamado de dolo das conseqüência necessárias, o agente para

atingir o sujeito passivo, obtém um resultado mais gravoso, embora querido e

previsto, porém, necessário para conseguir seu objetivo criminoso primordial,

devido aos meios escolhidos.

Page 45: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

32

2.1.6.2 Dolo indireto

O dolo indireto ou indeterminado se subdivide em duas

outras figuras jurídicas: o dolo eventual e o dolo alternativo. O dolo indireto na

forma de dolo eventual foi recepcionado expressamente no artigo 18, inciso I,

parte final do Código Penal Brasileiro, na expressão “assumiu o risco de produzi-

lo”, já o dolo alternativo está consubstanciado na parte inicial na expressão “quis o

resultado”.

Leciona Leal [1998, p.214] “No dolo indireto ou

indeterminado, o agente atua sem que esteja definido claramente seu objetivo,

mas indiscutivelmente deseja ele a realização de um tipo penal: ferir ou matar,

furtar ou roubar, atentar contra o pudor ou estuprar”.

Para Teles [1996, v.I, p.223] “o dolo é indireto ou

indeterminado, quando a vontade do agente não se dirige a um resultado certo,

preciso, determinado”.

Acompanha este entendimento Noronha [1999, v.I, p.138]

quando diz que “É indireto quando, apesar de querer o resultado, a vontade não

se manifesta de modo único e seguro em direção a ele”.

Sendo assim, considera-se que o dolo indireto é aquele em

que o agente deseja o resultado, contudo, não há um direcionamento ou um

querer específico na sua conduta criminosa.

2.1.6.2.1 Dolo eventual

Uma das subespécies do dolo indireto é o dolo eventual;

Leal [1998, p.214] diz que

O dolo eventual ocorre quando o agente, embora não desejando diretamente o resultado, considera como seriamente provável que sua conduta poderá realizar o tipo penal previsto e concorda com sua possibilidade. Para utilizar a frase corrente, caracteriza-se o dolo eventual em assumir o risco de realizar o resultado. O agente não quer diretamente aquele resultado, mas prevendo-o, assume o risco de produzi-lo.

Page 46: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

33

Para Greco [2003, p.206] “Fala-se em dolo eventual quando

o agente, embora não querendo diretamente praticar a infração penal, não se

abstém de agir e, com isso, assume o risco de produzir o resultado que por ele já

havia sido previsto e aceito”.

Interessante a colocação de Feu Rosa [1996, p.318] quando

diz que o dolo eventual “Situa-se num grau intermediário, entre o dolo e a culpa.

Pode-se considerar como na linha de fronteira. Seria, digamos, o limite entre o

grau máximo de culpa e o grau mínimo de dolo”.

Continua o autor explicando que o agente

Colocado entre as duas opções: desistir do que vinha empreendendo ou assumir a responsabilidade de um crime, previsível e provável, decide, livre e conscientemente, pelo caminho do risco e da eventualidade de danos e lesões à vida de terceiros, muito embora não os deseje.

Por fim declina um interessante exemplo, para o presente

trabalho, sobre a incidência do dolo eventual

“A” e “B” resolvem disputar uma corrida de automóveis dentro do perímetro urbano. Sabem perfeitamente do risco de atropelarem os transeuntes, mas, mesmo correndo esse risco conscientemente, confiando em suas habilidades e na sorte, preferem sair em louca disparada através de ruas e avenidas. Se ferirem ou matarem alguém, praticarão um crime com dolo eventual.

Fragoso [2004, p.212] citando o penalista alemão Frank

leciona que

Deve-se a Frank a formulação de um princípio chamado de teoria positiva do consentimento, que é útil, como critério prático, para identificar o dolo eventual. Segundo tal princípio, há dolo eventual quando o agente diz a si mesmo: “seja assim ou de outra maneira, suceda isto ou aquilo, em qualquer caso, agirei”. Revela-se, assim, a indiferença do agente em relação ao resultado.

Assim sendo, o dolo eventual pode ser considerado aquele

em que o agente prevê o resultado, embora não o deseje, mas continua com a

Page 47: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

34

sua conduta, e, portanto, assume o risco de produzi-lo. Com esta atitude, vindo a

concretizar-se a ocorrência do resultado, este será tido como doloso pela

assunção do risco.

2.1.6.2.2 Dolo alternativo

O dolo alternativo evidencia-se quando o agente deseja

obter qualquer dos resultados possíveis para aquele tipo de ação típica. Explica

Teles [1996, v.1, p.223]

O dolo indireto pode ser alternativo, quando o sujeito quer um ou outro resultado, por exemplo, matar ou ferir seu desafeto. Sua vontade dirige-se a qualquer um dos resultados, não a um deles especificamente. Se acontecer o primeiro, estava na vontade do agente. Se acontecer o segundo, do mesmo modo, era resultado almejado.

No mesmo sentido Monteiro de Barros [2001, p.193] diz que

“Verifica-se o dolo alternativo quando o agente visa produzir, com igual

intensidade, um ou outro resultado”.

Para Silva [2002, p.124] “No dolo alternativo, o agente quer,

indiferentemente, um evento ou outro (matar ou ferir). Representa com

probabilidade o resultado (na representação do dolo direto, tem a certeza da

realização do evento)”.

Com isso, pode-se dizer que o dolo alternativo é aquele em

que o agente deseja não um resultado único e específico, mas, conscientemente,

aceita a probabilidade de ocorrer, não apenas o resultado pretendido a priori,

como também, um outro que poderá advir da conduta ilícita.

2.2 DO CRIME CULPOSO

2.2.1 Considerações Gerais

Antes de iniciar o estudo sobre o elemento subjetivo culpa

que integra, juntamente com o dolo, a parte subjetiva do fato típico, necessário

Page 48: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

35

faz-se esclarecer a diferença existente entre as categorias culpabilidade e culpa,

a fim de evitar entendimentos equivocados.

Ressalta Jacob [1998, 126]

A denominação “culpa stricto sensu”, ou culpa em sentido estrito, é imperfeita, porque pode levar a confundir esta especial modalidade de descuido com a culpabilidade, identificadora do terceiro requisito do crime.

Leciona Gomes Filho [1991, p.135] “São componentes do

conceito de culpabilidade a imputabilidade e um elemento psicológico-normativo;

que é denominado culpa em sentido lato, e que se divide, por sua vez, no dolo e

na culpa”.

Do mesmo modo explica Garcez [1972, p.164]

A culpabilidade pode apresentar-se sob forma de dolo ou culpa (em sentido estrito).

Lembre-se, porém, que a culpabilidade é antes de tudo um conceito unitário, acima da referida divisão: vínculo psicológico e juízo de reprovação pela violação de um dever.

Para Jesus [1986, v.I, p.137] “A culpabilidade é a reprovação

da ordem jurídica em face de estar ligado o homem a um fato típico e antijurídico.

No mesmo sentido define Leal [1998, p.219] como sendo “O

fundamento do juízo de censura, que incide sobre o comportamento culposo,

decorre do fato de que o resultado era perfeitamente previsível (previsibilidade

subjetiva) para o autor negligente”.

Com isso verifica-se que a culpabilidade é o juízo de

reprovação da conduta realizada pelo agente, e que, esta categoria abrange os

elementos subjetivos dolo e culpa, contudo, em que pese os entendimentos

diversos existentes na doutrina, sobre, se a culpabilidade integra a definição de

crime ou é mero pressuposto de aplicação da pena, viu-se que a tendência

moderna é optar por esta última.

Page 49: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

36

Já a culpa ou culpa em sentido estrito, está contida na

própria definição de crime culposo declinada pelo Código Penal Brasileiro no seu

artigo 18, inciso segundo

Diz-se o crime:

II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Fragoso [2004, p.272] diz que “Há crime culposo quando o

agente, violando o cuidado, a atenção ou a diligência a que estava adstrito, causa

o resultado que podia prever, ou que previu, supondo, no entanto, levianamente,

que não ocorreria”.

No mesmo sentido leciona Noronha [1999, v.I, p.142]

Para nós, diz-se o crime culposo quando o agente, deixando de empregar a atenção ou diligência de que era capaz em face das circunstâncias, não previu o caráter delituoso de sua ação ou o resultado desta, ou, tendo-o previsto, supôs levianamente que não se realizaria; bem como quando quis o resultado, militando, entretanto, em inescusável erro de fato.

Ademais, salienta Gomes Filho [1991, p.144] que

[...] a culpa consiste na inobservância da cautela para não lesionar bens jurídicos alheios, que todos devem observar. Seu elemento psicológico é a falta de cuidado para que não se decida o agente a executar ações ou omissões que possam danificar bens jurídicos alheios e seu elemento normativo é a desobediência ao dever jurídico que incumbe a todos os componentes da sociedade de adotar tal cautela.

Assim, pode-se dizer que o crime culposo é aquele em que o

agente, realiza uma conduta sem a devida cautela, ocasionando um resultado

lesivo previsível a um bem juridicamente tutelado pela norma penal.

Page 50: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

37

2.2.2 Elementos do fato típico culposo

Para a configuração do fato típico culposo necessário faz-se

a conjugação de vários elementos, sem os quais a antijuridicidade não configurar-

se-á. São eles:

a) conduta humana voluntária, comissiva ou omissiva;

b) inobservância de um dever objetivo de cuidado;

c) o resultado lesivo não querido, tampouco assumido, pelo

agente;

d) nexo de causalidade entre a conduta do agente que

deixa de observar o seu dever de cuidado e o resultado

lesivo dela advindo;

e) previsibilidade;

f) tipicidade.

A seguir passa-se a declinar sobre cada um destes

requisitos necessários a consumação do crime culposo.

2.2.2.1 Da conduta humana voluntária comissiva ou omissiva

Em qualquer tipo de delito, seja doloso ou culposo, por ação

ou omissão, está sempre presente a vontade do agente, o que difere são os fins

almejados.

Silva [2002, p.127] explica que

Enquanto nos crimes dolosos a vontade está dirigida à realização de resultados objetivos ilícitos, os tipos culposos ocupam-se não com o fim da conduta, mas com as conseqüências anti-sociais que a mesma vai produzir; no crime culposo, o que importa não é o fim do agente (que é normalmente lícito), mas o modo e a forma imprópria com que atua.

Page 51: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

38

No mesmo sentido esclarece Leal [1998, p.220] que “no

crime culposo, a ação é voluntária, embora a vontade não esteja dirigida para o

resultado ilícito, como ocorre na infração dolosa”.

E continua o autor exemplificando que “O motorista que

dirige seu veículo em velocidade acima do permitido e atropela um pedestre quis

indiscutivelmente aquele tipo de comportamento inicial indevido, embora não

tenha desejado o resultado”.

Com isso, o agente no crime culposo age por sua própria

vontade, com o intuito de atingir um objetivo que é lícito, contudo, a ilicitude da

conduta está consubstanciada na inadequação dos meios utilizados.

2.2.2.2 Da inobservância do dever objetivo de cuidado

Toda conduta humana deve ser conforme o direito, e mesmo

que não existe nenhuma norma escrita a ser observada, as pessoas tem que agir,

hoje em dia, principalmente, com bastante cautela, a fim de evitar danos materiais

e pessoais aos demais. Leciona Monteiro de Barros [2001, p.202]

A vida em comunidade social impõe, a cada pessoa, o dever de abster-se da prática de condutas perigosas, exigindo do homem as cautelas necessárias para evitar que de seus atos possam resultar dano a bens jurídicos alheios.

Greco [2003, p.215] declina que “Esse dever de cuidado

objetivo, dirigido a todos nós, faz com que atentemos para determinadas regras

de comportamento, mesmo que não escritas ou expressas, a fim de convivermos

harmoniosamente em sociedade”.

Leal [1998, p.220] fornece alguns exemplos da violação do

dever de cuidado

O motorista que imprime em seu veículo velocidade superior ao permitido por lei; que não pára o veículo ao adentrar na via preferencial ou diante do sinal vermelho; que ultrapassa outro veículo em local não permitido, está infringindo o dever de cautela exigível de todo o condutor de veículo automotor.

Page 52: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

39

E segue Leal explicando que

[...] nem sempre há uma norma jurídica específica desse dever de cuidado. O proprietário de uma casa tem a obrigação de empregar todo o cuidado necessário para impedir que a mesma venha a desabar e causar prejuízo material e/ou pessoal a terceiros. O possuidor de um revólver não pode negligenciar em seu manejo ou em sua guarda. Ambos estão sujeitos ao dever geral de cuidado, que obriga a todos os indivíduos.

Contudo, não basta que o agente tenha deixado de observar

o dever de cautela exigido para qualquer pessoa diante de uma circunstância

específica; explica Greco [2003, p.215] que mesmo diante de

[...] uma conduta extremamente imprudente, pode haver situações em que seu comportamento não cause danos aos bens juridicamente tutelados pelo Direito Penal. Em casos como tais, o agente não responderá pela prática de um delito culposo, uma vez que, para que reste caracterizada esta espécie de crime, é preciso que ocorra um resultado naturalístico, ou seja, aquele no qual haja uma modificação no mundo exterior.

Com isso, pode-se dizer que a inobservância do dever de

cuidado objetivo se consubstancia na ação ou omissão do agente que age de

forma perigosa, causando um prejuízo material ou pessoal a um bem

juridicamente tutelado.

2.2.2.3 Do resultado lesivo não querido tampouco assumido pelo agente

Como declinado no item anterior, para que haja um crime

culposo tem que ocorrer um resultado naturalístico, sob pena desta ação ser

considerada atípica, como ocorre com a pessoa que deixa um objeto na janela do

6º andar de um prédio, e nada acontece, contudo, vindo a cair este objeto e

lesionando alguém, a ação passa a ser típica, porém, chama-se a atenção que

este resultado não pode ser querido pelo agente, pois, do contrário estar-se-ia

diante de um crime doloso e não culposo.

Leciona Leal [1998, 223]

Page 53: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

40

Quem age culposamente não deseja o resultado efetivamente causado. Esse não deve ter sido desejado, nem previsto (salvo os casos de culpa consciente) pelo autor da conduta negligente. A involuntariedade do resultado é a marca identificadora do tipo culposo, em face do tipo doloso.

Ademais frisa Monteiro de Barros [2001, v.1, p.204] que “no

crime culposo o agente não quer o resultado nem assume o risco de produzi-lo.

Assim sendo, sabe-se que para a configuração do crime na

modalidade culposa é preciso que o agente não queira o resultado gravoso,

tampouco tenha assumido o risco de produzi-lo, pois caso isso ocorra o crime

será considerado doloso.

2.2.2.4 Do nexo de causalidade entre a conduta do agente que deixa de

observar o seu dever de cuidado e o resultado lesivo dela advindo.

Para que o agente seja responsabilizado pela sua conduta

culposa que ocasionou um resultado lesivo a um bem jurídico, obviamente tem

que existir uma relação de causalidade entre a ação ou omissão e o resultado

gravoso. Dispõe o Código Penal Brasileiro no seu artigo 13:

O resultado, de que dependa a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Mirabete [2002, v.I, p.147] diz que “Evidentemente, deve

haver no crime culposo, como em todo fato típico, a relação de causalidade entre

a ação e o resultado”.

Ademais, frisa Monteiro de Barros [2001, v.I, p.205] que

[...] os delitos culposos ingressam na categoria dos denominados crimes materiais, que são aqueles em que o tipo penal descreve a conduta e o resultado, exigindo, para a consumação, que este último se verifique.

Como nos demais crimes materiais, o nexo causal, consistente na relação de causa e efeito entre a conduta e o evento, torna-se imprescindível à tipicidade do fato.

Page 54: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

41

Destarte, pode-se dizer que o crime culposo exige um

resultado naturalístico, e com isso, como advém, inclusive, de expressa

disposição legal, obrigatoriamente deve existir o nexo causal entre a conduta e o

resultado criminoso para a configuração do delito culposo.

2.2.2.5 Da previsibilidade

Outro elemento necessário a configuração do crime culposo

é a previsibilidade do resultado lesivo. Leciona Jesus [1986, v.I, p.254]

É necessário que o sujeito não tenha previsto o resultado. [...] O resultado era previsível, mas não foi previsto pelo sujeito. Daí falar-se que a culpa é a imprevisão do previsível. Se um motorista dirige veículo em rua movimentada com excesso de velocidade e prevê que vai atropelar o transeunte, se continuar a marcha e feri-lo não irá responder por lesão corporal culposa, mas sim dolosa. É que o resultado era previsível e foi por ele previsto. E a previsão é elemento do dolo (salvo exceção).

Leal explica [1998, p.223] que a previsibilidade

É a possibilidade de ter o agente conhecimento do resultado a ser causado por sua conduta negligente. Se este não era previsível, sua ocorrência deve ser creditada na conta do caso fortuito e da força maior, desaparecendo a figura do crime culposo.

E segue o autor declinando que “Há duas formas de se aferir

a previsibilidade: a objetiva, que nos dá a medida da antijuridicidade e a subjetiva,

elemento da culpabilidade.

Explica Monteiro de Barros [2001, v.1, p.206] como deve ser

aferida a previsibilidade objetiva

Na análise do caso concreto, o magistrado substitui o agente pelo homo medius e verifica se este, nas circunstâncias em que aquele se encontrava, teria previsto o resultado. Se afirmativa a resposta, verifica-se a tipicidade do crime culposo, presumindo-se, por conseqüência, a antijuridicidade, devendo a previsibilidade subjetiva ser avaliada apenas por ocasião da culpabilidade.

Page 55: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

42

Segundo Leal [1998, p.224] “a previsibilidade subjetiva diz

respeito à culpabilidade e deve ser aferida com base nas condições pessoais do

agente, frente às circunstâncias em que ocorreu o fato ilícito”.

Assim sendo, verifica-se que no crime culposo o agente não

prevê o resultado gravoso, contudo, fazendo-se uma análise comparativa com a

capacidade intelectual do homem médio, e, verificando-se que este teria

condições de prever aquele resultado, estaria configurado a antijuridicidade, caso

contrário tal fato seria atípico, porém, a culpabilidade na conduta só poderá ser

aferida pelas condições pessoais do agente.

2.2.2.6 Da tipicidade

O último elemento necessário para a caracterização do

crime culposo é a tipicidade, ou seja, aquela conduta que não observou o dever

de cautela tem que estar descrita na lei penal. Dispõe o parágrafo único do artigo

18 do Código Penal Brasileiro

Diz-se o crime:

Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Explica Teles [1996, v.I, p.235]

Excepcionalmente, em situações muito próprias, o direito também proíbe e pune a causação de lesões a certos bens jurídicos, quando praticadas sem dolo, mas, com culpa, em sentido estrito. Por isso o fato culposo é excepcional, e só será punido quando houver expressa previsão legal.

Contudo, nos crimes culposos, a ação do agente não está

descrita no tipo legal. Leciona Silva [2002, p.131] que “São, normalmente, tipos

abertos que necessitam de complementação de uma norma de caráter geral, que

se encontra fora do tipo, e mesmo de elementos do tipo doloso correspondente”.

Page 56: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

43

Para Monteiro de Barros [2001, v.I, p.207] “Os crimes

culposos são tipos abertos, pois a complementação da definição da figura típica

depende de um juízo valorativo do magistrado”.

Destarte, entende-se que o crime culposo deve estar

expresso na lei penal, e, como se trata de um tipo aberto, terá que se valer das

normas do crime doloso referente àquela conduta, e ainda, das normas gerais

caracterizadoras do crime culposo, para incriminar o agente.

2.2.3 Modalidades de culpa

As formas pelas quais o agente deixa de observar o dever

de cautela a que estava obrigado estão descritas no artigo 18, inciso II do CP,

quais sejam: imprudência, negligência ou imperícia.

2.2.3.1 Imprudência

A primeira das modalidades de culpa é a imprudência, que

na definição de Fragoso [2004, p.275] “é a falta de prudência, de cautela, de

precaução, ou seja, a conduta arriscada”.

Garcez [1972, p.166] diz que “A imprudência consiste em

correr-se, sem necessidade, um perigo”.

Já Silva [2002, p.131] define e exemplifica esta modalidade

de culpa declinando que

A imprudência é uma atitude em que o agente atua com precipitação, inconsideração, com afoiteza, sem cautelas, não usando de poderes inibidores. Exemplos: manejar ou limpar arma próximo a outras pessoal; caçar em local de excursões; dirigir sem óculos quando há necessidade de correção da visão, fatigado, com sono, em velocidade incompatível com o local e as condições atmosféricas, etc.

Com isso, pode-se dizer que esta forma de inobservância do

cuidado objetivo, caracteriza-se por uma ação do agente, que não se acautela

perante um possível resultado gravoso previsível.

Page 57: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

44

2.2.3.2 Negligência

A segunda forma de inobservância do dever de cuidado é a

negligência, que na definição de Jesus [1986, v.I, p.255] “é a ausência de

precaução ou indiferença em relação ao ato realizado”.

Para Greco [2003, p.221] negligência “é um deixar de fazer

aquilo que a diligência normal impunha”.

Leal [1998, p.222] explica e exemplifica esta categoria,

declinando que negligência

[...] é conduta omissiva, sem a devida cautela, manifestada pela falta de atenção, pelo descuido, pelo esquecimento ou pela desídia no atuar perante a vida social. Negligente é o motorista que esquece de parar o veículo antes de ingressar na via preferencial; não vê o sinal vermelho; não substitui os pneus gastos pelo uso; é quem deixa a arma carregada ao alcance de uma criança.

Com isso, pode-se dizer que negligência é uma omissão, um

deixar de agir do agente, que por falta de atenção, desídia ou preguiça mental

deixa de tomar as devidas cautelas resultando em lesão a um bem jurídico de

outrem.

2.2.3.3 Imperícia

A última modalidade de culpa é a imperícia definida por

Fragoso [2004, 275] como sendo “a falta de aptidão técnica, de habilidade ou

destreza, no exercício de qualquer atividade”.

Já Greco [2003, p.221] explica que

Fala-se em imperícia quando ocorre uma inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte ou profissão. Diz-se que a imperícia está ligada, basicamente, à atividade profissional do agente. Um cirurgião plástico, v. g., durante um ato cirúrgico, pode praticar atos que, naquela situação específica, conduzam à imperícia.

Page 58: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

45

No mesmo sentido, leciona Silva [2002, p.132] que “A

imperícia é a incapacidade, a falta de conhecimentos técnicos no exercício da arte

ou profissão, não tomando o agente em consideração o que sabe ou deveria

saber”.

Contudo adverte Leal [1998, p.222] que

A distinção entre negligência, imprudência e imperícia é bastante discutível, pois conforme já assinalamos, a primeira engloba as duas últimas. Na verdade, tanto o motorista imprudente, quanto o médico imperito, não deixam de negligenciar no dever de cuidado a que estão obrigados.

Destarte, pode-se dizer que a imperícia é a falta de

habilidade ou de conhecimento técnico para o exercício de qualquer profissão,

arte ou ofício, salientando-se ainda, que para caracterização da imperícia não é

necessário que o agente (profissional) seja inabilitado, basta que falte com a

habilidade necessária a determinado procedimento, e desta situação ocorra o

resultado lesivo.

2.2.4 Espécies de culpa

Como visto o crime culposo pode ser praticado por

imprudência, negligência ou imperícia, contudo, anota a doutrina duas espécies

de culpa: a consciente e a inconsciente, que dizem respeito a previsibilidade do

resultado gravoso pelo agente.

2.2.4.1 Culpa consciente

A culpa consciente na lição de Greco [2003, p.223] “é aquela

em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta

acreditando, sinceramente, que este não resultado não venha a ocorrer”.

No mesmo sentido explica Gomes [2004, v.III, p.171] que a

culpa consciente

Ocorre quando o agente prevê o resultado ofensivo (representa o resultado como possível), porém, confia sinceramente que não vai acontecer. Confia em sua habilidade para evitar o resultado ou

Page 59: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

46

conta com sincera confiança de que nada vai ocorrer em razão das circunstâncias concretas do fato. Na culpa consciente o sujeito prevê o resultado mas não o deseja, não quer realizá-lo, nem sequer assume o risco de produzi-lo.

Ratifica este entendimento Silva [2002, p.133]

A culpa consciente ocorre quando o agente prevê o resultado, mas espera, sinceramente, que ele não ocorrerá. Há no agente a representação da possibilidade do resultado, mas ele afasta por emendar que o evitará, que sua habilidade impedirá o evento lesivo que está dentro de sua previsão.

Com isso, entende-se por culpa consciente, a previsão que o

agente faz do resultado gravoso que poderá advir da sua conduta, mas em

momento algum ele aceita ou assume o risco de produzi-lo, pois confia

sinceramente que o resultado não ocorrerá.

2.2.4.2 Culpa inconsciente

A culpa inconsciente explica Prado [1999, p.194]

É a culpa comum, que se verifica quando o autor não prevê o resultado que lhe é possível prever. Não prevê o resultado, embora possível, transgredindo, desse modo, sem saber, o cuidado objetivo exigível. O agente não conhece concretamente o dever objetivo de cuidado, apesar de lhe ser conhecível.

Na lição de Gomes [2004, v.3, p.170] “culpa inconsciente

ocorre quando o agente nem sequer prevê (não representa) o resultado lesivo,

embora previsível”.

Para Teles [1996, v.I, p.234] na culpa inconsciente

[...] sua conduta é culposa, mas ele não teve consciência de que o resultado ocorreria, porque não realizou a previsão, não representou o resultado que era, plenamente, previsível. Por isso agiu, e o fez sem a consciência de que poderia causar o resultado.

Page 60: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

47

Assim sendo, age com culpa inconsciente, o agente que

causa um resultado lesivo a um bem jurídico tutelado sem tê-lo previsto, contudo,

este resultado era previsível, tomando por base a diligência do homem médio.

2.2.5 Da concorrência de culpas

Ocorre a concorrência de culpas, segundo a lição de

Monteiro de Barros [2001, v.1, p.210] “quando dois ou mais agentes,

culposamente, contribuem para a eclosão do resultado naturalístico”.

No mesmo sentido leciona Silva [2002, p.135]

Há concorrência de culpas quando dois ou mais agentes (excetuada a co-autoria, em que deve haver um liame psicológico entre eles) causam resultado lesivo por imprudência, negligência ou imperícia.

Monteiro de Barros [2001, v.I, p.210] também frisa que

Não se confunde a co-autoria, em que diversos agentes realizam de comum acordo a conduta culposa, com a concorrência de culpas, em que diversos agentes realizam a conduta culposa sem que haja entre eles qualquer liame psicológico.

Assevera Greco [2003, p.229] que na concorrência de

culpas “Cada qual responderá pela sua conduta culposa, independentemente do

fato de ter a outra pessoa também contribuído para a produção desse mesmo

resultado”.

E segue o autor dizendo que “o comportamento do

agente/vítima será levado em consideração quando da análise das circunstâncias

judiciais, previstas no art. 59 do Código Penal”.

Destarte, pode-se dizer que, em se tratando de crime

culposo, dois ou mais agentes produzindo um resultado lesivo, e não existindo

liame psicológico entre eles, cada um responderá pela sua conduta culposa,

ademais, esta conduta será avaliada pelo juiz, na aplicação da pena base, de

acordo com o artigo 59 do Código Penal Brasileiro.

Page 61: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

48

CAPÍTULO 3

ANÁLISE JURISPRUDENCIAL DO HOMICÍDIO PRATICADO NO TRÂNSITO

3.1 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL DO CRIME DE HOMICÍDIO CULPOSO PRATICADO NO TRÂNSITO

3.1.1 Considerações gerais

Verificou-se nos capítulos anteriores, que o homicídio

culposo configura-se quando o agente causa a morte da vítima por imprudência,

negligência ou imperícia, sendo estas as três modalidades de culpa em sentido

estrito.

A fim de que reste configurada uma destas modalidades

caracterizadoras da culpa, faz-se necessário que o agente, tenha desobedecido a

uma norma de cuidado objetivo e que esta desobediência tenha causado um

resultado danoso previsível nas condições em que o agente se encontrava.

Há que se verificar se a conduta do agente se encontrava

neste contexto, e ainda, se há o nexo de causalidade entre a ação e o resultado

gravoso, que necessariamente deve ser típico, pois caso contrário não haverá

crime. A análise deverá ser realizada pelo magistrado sobre as circunstâncias

que permeiam cada caso concreto na verificação da existência ou não do crime,

pois, o homicídio culposo é um crime chamado de tipo aberto, ou seja, aquele em

que a ação típica não está pré-definida no tipo legal.

Fukassawa [2003, p.146] explica que

Nos crimes culposos, o legislador apenas refere serem aqueles cometidos por imprudência, negligência ou imperícia; porém a conduta em si não vem definida. De variegadas e inesgotáveis formas se poderia dar uma conduta culposa informada pelo tripé em que esta se assenta. A antijuridicidade ou ilicitude somente

Page 62: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

49

existe desde que haja uma inobservância do dever de cuidado objetivo pelo autor para evitar lesão a bem jurídico alheio.

Para Capez [1999, p.27] “o tipo penal continua sendo aberto,

devendo o juiz, no caso concreto, através de um juízo de valor, concluir se o

agente atuou ou não com imprudência, negligência ou imperícia”.

Com isso, verifica-se que inúmeras ações do agente podem

configurar a sua inobservância do cuidado objetivo tipificando a sua conduta; nos

crimes de homicídio culposo praticados no trânsito esta situação não se altera,

por isso, objetiva-se neste capítulo colher da jurisprudência as principais

circunstâncias caracterizadoras do homicídio praticado no trânsito nas suas três

modalidades: imprudência, imperícia e negligência; e, posteriormente o dolo na

forma de dolo eventual.

O homicídio culposo praticado na direção de um veículo

automotor, como já declinado alhures está previsto no artigo 302 do Código de

Trânsito Brasileiro – Lei nº 9.503/97:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:

Penas – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

A doutrina e a jurisprudência ainda divergem bastante sobre

quais circunstâncias caracterizam a culpa, seja consciente ou não, e o dolo, na

modalidade de dolo eventual, nos crimes praticados no trânsito.

Mirabete [2003, p.79] descreve algumas circunstâncias que

caracterizam a culpa nesta modalidade de crime, declinando que estas:

São regras que devem ser observadas e que, não obedecidas, podem revelar a existência de culpa: imprimir velocidade inadequada às condições do local e demais circunstâncias pertinentes ao trânsito; transitar na contramão de direção; ultrapassar outro veículo sem condições de visibilidade; não redobrar as atenções nos cruzamentos; dirigir alcoolizado; dirigir

Page 63: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

50

veiculo que apresenta falhas mecânicas ou não possui equipamentos indispensáveis; não manter razoável distância do veículo que segue à frente etc.

Capez [1999, p.28] também declina os seguintes exemplos:

Imprimir velocidade excessiva, dirigir embriagado, transitar na contramão, desrespeitar a preferência de outros veículos, efetuar conversão ou retorno em local proibido, avançar o sinal vermelho, ultrapassar em local proibido etc.

Contudo segue o autor advertindo que

Estas, entretanto, não constituem as únicas hipóteses de reconhecimento do crime culposo, pois o agente, ainda que não desrespeite as regras disciplinares do Código, pode agir com inobservância do cuidado necessário e, assim, responder pelo crime. A ultrapassagem, por exemplo, se feita em local permitido, não configura infração administrativa, mas, se for efetuada sem a necessária atenção, pode dar causa a acidente e implicar crime culposo.

Assim sendo, nota-se que pode existir uma infinidade de

circunstâncias caracterizadoras do crime de homicídio no trânsito, por isso, não

se deseja aqui esgotá-las, mas sim, exemplificar através da transcrição de alguns

acórdãos as circunstâncias mais comuns que ocorrem nesta modalidade de crime

culposo.

3.1.2 Acórdãos sobre circunstâncias configuradoras da imprudência.

A imprudência como visto no capítulo 2 deste trabalho

caracteriza-se por uma ação do agente, que inobservando o seu dever de cuidado

causa o resultado lesivo. A seguir alguns exemplos retirados da jurisprudência

desse comportamento típico:

APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO CULPOSO. ATROPELAMENTO DE CICLISTA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. ELEMENTOS DE PERSUASÃO HARMÔNICOS, QUE EVIDENCIAM O COMPORTAMENTO IMPRUDENTE DO RÉU. CULPA CARACTERIZADA. ALMEJADA ABSOLVIÇÃO. IMPOSSI BILIDADE. Pratica o delito capitulado no

Page 64: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

51

art. 302, caput, do Código de Trânsito Brasileiro o agente que conduz veículo automotor de maneira imprudente, invadindo o acostamento e provocando atropelamento de que resulta vítima fatal. (...) RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação criminal 2005.003901-3. Relator Sérgio Paladino. Disponível em: www. tj.sc.gov.br. Acesso em 07/12/2005).

Colhe-se do corpo do acórdão que neste caso específico:

A imprudência consistiu na invasão do acostamento pelo apelante, e conseqüente atropelamento da vítima, que foi apanhada por trás, quando trafegava tranqüilamente em sua bicicleta pela margem direita da via pública, mesmo sentido daquele.

Assim sendo, verifica-se que o agente neste caso específico

agiu com desatenção ao dirigir seu veículo quando invadiu o acostamento e

provocou o acidente que resultou na morte da vítima.

APELAÇÃO CRIMINAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA AO ARGUMENTO DE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA, QUE PILOTAVA MOTOCICLETA COM OS FARÓIS DESLIGADOS. ACIDENTE QUE OCORREU EM LOCAL COM BOA VISIBILIDADE. ARGUMENTO REPELIDO. APELANTE QUE REALIZOU MANOBRA DE CONVERSÃO À ESQUERDA, SEM TOMAR AS DEVIDAS CAUTELAS, CORTANDO BRUSCAMENTE A FRENTE DE OUTRA MOTOCICLETA QUE VINHA NA MÃO CONTRÁRIA. CULPA CARACTERIZADA NA MODALIDADE IMPRUDÊNCIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Resta configurada a culpa, na modalidade de imprudência, do acusado que pilotando motocicleta não toma os cuidados descritos nos arts. 34 e 37, ambos do CTB, ao proceder à manobra de conversão à esquerda, obstruindo o fluxo de veículos e vindo a colidir com motocicleta que vinha na mão contrária. O fato de a vítima, em local de boa visibilidade, pilotar sua motocicleta com os faróis desligados, por si só não é motivo para configurar a culpa exclusiva desta. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação criminal 2005.023441-7. Relator Torres Marques. Disponível em www.tj.sc.gov.br. Acesso em 07/12/2005).

Neste caso o agente interrompeu a trajetória da motocicleta

que vinha em sentido contrário, realizando, de inopino, manobra de conversão à

Page 65: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

52

esquerda, sem se certificar de que poderia fazer com segurança, o que

caracterizou a imprudência de sua ação.

Homicídio culposo decorrente de acidente automobilístico. Motorista que, trafegando em alta velocidade e sem manter a distância de segurança, colide na traseira de outro, que seguia à sua frente, atingindo, ainda, terceiro veículo, que vinha na outra pista, em sentido contrário, causando a morte de seu condutor. Culpa caracterizada na modalidade imprudência. Condenação mantida. Pena substitutiva de prestação de serviços à comunidade. Pretensão de vê-la alterada para doação de cestas básicas. Inviabilidade. (BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação criminal 2005.019267-6. Relator Maurílio Moreira Leite. Disponível em: www.tj.sc.gov.br. Acesso em 07/12/2005.

Quando se fala em alta velocidade, não é apenas àquela

velocidade exorbitante acima dos 110 Km/h permitidos em algumas estradas

federais, mas sim, a velocidade incompatível para àquele determinado local,

ademais, neste caso, o condutor não mantinha uma distância segura do veículo

que vinha a sua frente, desrespeitando assim mais uma regra do Código de

Trânsito Brasileiro configurando, em conjunto com alta velocidade a imprudência

da sua ação.

PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PROVA COERENTE E CONVINCENTE. IMPRUDÊNCIA CARACTERIZADA. CONDENAÇÃO MANTIDA. ADEQUAÇÃO DA PENA DE SUSPENSÃO DA CARTEIRA DE HABILITAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Age com manifesta imprudência condutor que, dirigindo embriagado e em excesso de velocidade, perde o controle do veículo, provocando o tombamento, resultando do acidente óbito. A pena de suspensão do direito de dirigir veículo automotor pode ser imposta a motorista profissional, devendo ser fixada de acordo com o artigo 68 do Código Repressivo, nos termos do artigo 291 do Código de Trânsito Brasileiro. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação criminal 2005.007693-2. Relator Amaral e Silva. Disponível em: www.tj.sc.gov.br. Acesso em: 07/12/2005.

Page 66: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

53

A embriaguez ao volante combinado com a alta velocidade

são as circunstâncias mais comuns encontradas nesta modalidade de crime, e,

que, por sua vez, vem configurar a culpa do agente no caso de ocorrer a morte da

vítima.

Assim sendo, nota-se que a imprudência nos crimes

cometidos no trânsito, se configura por qualquer tipo de atitude (ação) do agente,

que não observando o seu dever de cuidado vem a ocasionar o resultado lesivo

involuntário.

3.1.3 Acórdãos sobre circunstâncias caracterizadoras da imperícia.

A imperícia nos crimes de trânsito caracteriza-se, na lição de

Jesus [1999, p.80] pela “falta de aptidão para dirigir veículo automotor”.

E segue o autor explicando que:

O motorista necessita de aptidão teórica e prática para o exercício da direção. É possível que, em face de ausência de conhecimento técnico ou de prática, o condutor, no desempenho dessa atividade, venha a causar a morte de terceiro.

Exemplos desta modalidade de culpa na jurisprudência:

APELAÇÃO CRIME. RECURSO DEFENSIVO. DELITO DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. Age com culpa, nas modalidades de imperícia e imprudência, o motorista que, dirigindo veículo de grande porte, à noite, com chuva e pista escorregadia, aciona os freios, bruscamente, em face da proximidade de controlador de velocidade, fazendo com que a carreta forme um L em relação ao cavalo, obstruindo a pista contrária e a passagem de automóvel que naquela trafegava, provocando a morte de uma criança e lesões em seus pais, que o tripulavam. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70010553592, Terceira Câmara Criminal, Relator Danúbio Edon Franco. Disponível em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 09/12/2005.

Neste acórdão restou caracterizada a imperícia do motorista

quando este aciona de forma brusca os freios do caminhão provocando o

Page 67: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

54

acidente, pois, em que pese ser habilitado, foi além de imprudente, imperito na

sua ação, porquanto sendo um motorista profissional deveria saber que uma

freada brusca em pista molhada poderia dar ensejo ao chamado “L” da carreta

ocasionando o acidente e a morte da vítima.

APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. IMPERÍCIA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. Inconformismo defensivo quanto a decisão judicial que condenou o apelante pela prática do delito previsto no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro (homicídio culposo na direção de veículo automotor). Alegação de culpa exclusiva da vítima pelo acidente fatal, a qual teria surgido de inopino, caminhando em local inapropriado para pedestres. Improcedência. Provas suficientes para a condenação. Culpa do apelante demonstrada, o qual, diante da situação concreta posta, não procedeu com cuidado necessário que se lhe impunha, sendo ainda imperito e não habilitado para dirigir motos. Condenação mantida. (...) Apelo improvido. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70007690431, Segunda Câmara Criminal, Relator Antônio Carlos Netto de Mangabeira. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 09/12/2005.

Em que pese, a vítima estar caminhando na faixa lateral da

via pública, por falta de lugar apropriado para pedestres, o Egrégio TJRS,

entendeu que o agente não agiu com a diligencia necessária para evitar o

atropelamento da vítima, ademais foi considerado imperito por não possuir

habilitação para dirigir motos.

APELAÇÃO CRIME. RECURSO DEFENSIVO. DELITO DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. Age com culpa, nas modalidades de imperícia e imprudência, o motorista que, para evitar o choque com outro, em ultrapassagem, efetua manobra brusca, caindo no acostamento e vindo a perder o controle da direção e provocando capotagem, acarretando a morte do caroneiro. (...) (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70011401932, Terceira Câmara Criminal, Relator Danúbio Edon Franco. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 09/12/2005)

Aqui a culpa restou caracterizada por uma ultrapassagem

mal sucedida, porquanto o agente foi imprudente na escolha do local para efetuar

Page 68: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

55

a ultrapassagem, e ainda, imperito por assustar-se diante da situação, não

conseguindo controlar o veículo, que capotou ocasionando a morte da vítima.

Nota-se, dos exemplos acima, que a imperícia e a

imprudência necessariamente caminham juntas, pois esta representa sempre

uma ação culposa do agente, enquanto aquela além de representar uma ação,

também revela a falta de habilidade do agente para evitar o resultado lesivo.

Destarte, pode-se dizer que sempre que houver uma imperícia, haverá uma

imprudência, contudo, o contrário não será verdadeiro.

3.1.4 Acórdãos sobre circunstâncias configuradoras da negligência

A terceira das modalidades da culpa em sentido estrito é a

negligência que na definição de Capez [1999, p.28] “é a ausência de uma

precaução”.

No mesmo sentido Jesus [1999, p.80] define como sendo “a

ausência de precaução ou indiferença em relação ao ato realizado. Ex.:

estacionar o veículo sem acionar o freio manual”.

Nota-se que em se tratando de culpa na modalidade

negligência a inércia do agente é que vai ocasionar o resultado lesivo.

Colhe-se da jurisprudência:

APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO CULPOSO. NEGLIGÊNCIA. PENA. Age com culpa manifesta motorista que não adota as cautelas exigíveis de cuidado da conservação das peças fatigadas do reboque do veículo, manifesta a negligência, previsível que pudesse ser rompido o engate, somado ao fato de ter colocado peso demasiado no reboque. PROVIDO PARCIALMENTE O APELO DEFENSIVO TÃO-SÓ PARA REDUZIR A PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA PARA 05 SALÁRIOS MÍNIMOS, A SEREM PAGOS À FAMÍLIA DA VÍTIMA. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70011816188, Terceira Câmara Criminal, Relatora Elba Aparecida Nicolli Bastos. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 09/12/2005.

Page 69: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

56

HOMICÍDIO CULPOSO. Caracterização. Acidente de trânsito. Negligência e imprudência. Agente que tinha ciência do defeito no acelerador da motocicleta. Morte do passageiro que levava em sua garupa. Inteligência do art. 302 da Lei 9.503/97. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação 6.085/01, Quarta Câmara Criminal, Relatora Telma Musse Diuana. Acesso disponível em: www.tj.rj.gov.br Acesso em 09/12/2005).

As circunstâncias que caracterizam a negligência são

comumente àquelas onde o agente deixa de realizar ações de manutenção do

veículo, ocasionando uma falha mecânica pelo desgaste das peças, e, como

conseqüência, o acidente com o resultado morte.

Destarte, depois de trazer a baila, alguns exemplos de

circunstâncias caracterizadoras da culpa em suas três modalidades, verifica-se

que nos casos de homicídio culposo na direção de veículo automotor, as

modalidades da culpa se entrelaçam, não sendo possível a sua completa

individualização.

3.2 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

Com o advento da Lei nº 9.503/1997, o legislador pátrio,

além de impor penas mais severas ao crime de homicídio culposo praticado na

direção de veículo automotor, ainda, no parágrafo único do artigo 302, insere

quatro causas de aumento de pena. Registre-se também, que a Lei 11.275/06

incluiu mais um inciso a este artigo:

Art. 302. [...]

Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:

I – não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;

II – praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;

III – deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente;

Page 70: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

57

IV – no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros;

V – estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou

entorpecente de efeitos análogos.

3.2.1 Não possuir permissão para dirigir ou carteira de habilitação

A primeira das causas de aumento de pena no homicídio

culposo praticado na direção de veículo automotor é a falta de habilitação,

contudo, verifica-se que esta circunstância pertence também as agravantes

genéricas do artigo 298 do Código de Trânsito Brasileiro, e ainda, define um crime

autônomo previsto no artigo 309 deste diploma legal.

Por sua vez, explica Jesus [1999, p.86] que resta

Prejudicada a agravante genérica do art. 298, III, do CT. O crime de falta de habilitação ou permissão para dirigir veículo (art. 309) fica absorvido, funcionando como circunstância do crime material mais grave (princípio da subsidiariedade implícita no concurso aparente de normas incriminadoras).

Colhe-se da jurisprudência a caracterização desta

majorante:

CRIMES DOLOSOS E CULPOSOS CONTRA A PESSOA. HOMICÍDIO CULPOSO (art. 302, parágrafo único, inciso I da lei nº 9.503/97). O conjunto probatório permite concluir que o réu colaborou para o evento danoso com sua parcela de culpa, tornando possível sua condenação por infração a mencionado dispositivo legal, já que não há compensação de culpas em direito penal. Comprovadas a materialidade e autoria, assim como o agir imprudente, negligente e imperito do réu, que sem cercar-se do dever objetivo de cuidado e vigilância na direção de motocicleta, alcoolizado e sem possuir carteira de habilitação, atropelou e causou a morte da vítima, é de ser mantida a sentença condenatória. APELAÇÃO IMPROVIDA. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70007292337, Segunda Câmara Criminal. Relator José Antônio Cidade Pitrez. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 14/12/2005).

Page 71: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

58

Destarte, entende-se que, se o agente, mediante a

inobservância do dever de cuidado, ocasionar a morte da vítima, e, não possuir

habilitação para dirigir o veículo automotor, esta circunstância vai aumentar a

pena do homicídio culposo, deixando de ser uma agravante genérica ou um crime

autônomo, em face do principio do non bis in idem, onde ninguém pode ser

punido duas vezes pelo mesmo fato.

3.2.2 Praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada

Esclarece Fukassawa [2003, p.156] que “faixas de pedestres

ou calçadas, são lugares onde as pessoas pensam circular com maior segurança

e que deve ser observada pelo condutor do veículo”.

Capez [1999, p.33] explica que

[...] o aumento será aplicado tanto quando o agente estiver conduzindo o seu veículo pela via pública e perder o controle do automotor, vindo a adentrar na calçada e atingir a vítima, como quando estiver saindo de uma garagem ou efetuando qualquer outra manobra e, em razão de sua desatenção, acabar por colher o pedestre.

Está na jurisprudência:

APELAÇÃO-CRIME. ATROPELAMENTO. HOMICÍDIO CULPOSO. IMPRUDÊNCIA DA MOTORISTA QUE SAIU DA GARAGEM PARA INGRESSAR NA AVENIDA, COLHENDO A VÍTIMA SOBRE A CALÇADA. MANOBRA QUE EXIGIA CUIDADO EM DOBRO, EIS QUE A RÉ PRETENDIA CRUZAR A ÁREA DE PASSEIO PÚBLICO. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DO ART. 302, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO II, DO CTB. REDUÇÃO, PARA 06 MESES, DO PRAZO DA SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO AUTOMOTOR. APELO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70004481347, Primeira Câmara Criminal. Relator Manuel José Martinez Lucas. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 14/12/2005)

Por fim, esclarece Jesus [1999, p.86] que “não é necessário

que a vítima venha a falecer na faixa de pedestre ou na calçada. O Código

Page 72: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

59

pretende dizer que a conduta é realizada nesses locais. A morte pode ocorrer em

outro lugar”.

3.2.3 Deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente.

Nota-se neste terceiro inciso a preocupação do legislador

com a vítima do acidente que deve ser socorrida imediatamente. O artigo 304 do

CTB prevê o crime autônomo de omissão de socorro, contudo, aqui ocorre o

mesmo caso do item 3.2.1, ou seja, ocorrendo o homicídio culposo, com o agente

deixando de prestar socorro à vítima, o crime do artigo 304 do CTB restará

absorvido pelo homicídio culposo.

Explica Capez [1999, p.34]

O aumento terá aplicação quando o socorro for possível de ser efetivado sem risco pessoal para o condutor (ameaça de agressão, grande movimentação de veículos etc.) e quando o agente puder concretizá-lo, por possuir meios para tanto. Assim, se o agente não possui condições de efetuar o socorro ou quando também ficou lesionado no acidente de forma a não poder ajudar a vítima, não terá aplicação o dispositivo.

Colhe-se da jurisprudência:

APELAÇÃO-CRIME. ACIDENTE DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR, MAJORADO PELA OMISSÃO DE SOCORRO. Motorista que conduzia ônibus com avarias, em condições precárias de trafegabilidade, sem o funcionamento do farol dianteiro direito, em local desprovido de qualquer iluminação e em velocidade incompatível com as condições de tempo, vindo a atropelar a vítima. Possibilidade de prestar socorro ao acidentado, quando era possível ao acusado fazê-lo sem risco pessoal. (...) Manutenção do decreto condenatório pelo artigo 302, parágrafo único III, da Lei nº 9.503/97. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70008093767, Segunda Câmara Criminal. Relator Antônio Carlos Netto de Mangabeira. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 14/12/2005).

Page 73: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

60

Assim sendo, ocorrendo o acidente de trânsito se o agente

deixar de socorrer a vítima, imperiosa será a aplicação da majorante. Contudo,

esta não incidirá se para prestar o socorro, o agente tenha que expor a risco sua

integridade física ou mesmo sua vida, ou ainda, se a vítima for socorrida por

terceiros.

3.2.4 No exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros

Explica Capez [1999, p.35] que “Trata-se de hipótese cuja

finalidade é ressaltar a necessidade de cuidado e zelo por parte daqueles que têm

como seu ganha-pão a condução de veículo de transporte de passageiros”.

No mesmo sentido declina Fukassawa [2003, p.158]

Maior cuidado é exigido do condutor nessa situação, mesmo porque é sua profissão ou atividade. Não é ele eventual motorista e, sim, motorista que cotidianamente transporta passageiros. O aumento de pena está vinculado ao exercício da profissão ou atividade. Não incidirá se for um motorista comum que eventualmente esteja transportando passageiros.

Está na jurisprudência:

DELITO DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. CONDUTOR DE TRANSPORTE COLETIVO QUE SAI DA PARADA DE ÔNIBUS E EFETUA CURVA FECHADA PARA INGRESSAR À ESQUERDA, SEM GUARDAR DISTÂNCIA DE SEGURANÇA DA MOTOCICLETA QUE SEGUIA AO LADO E À ESQUERDA DO ÔNIBUS, A QUAL TINHA A PREFERÊNCIA, VINDO A OBSTRUIR-LHE A PASSAGEM, PROVOCANDO A QUEDA DA MOTOCICLETA E CAUSANDO A MORTE DO CARONEIRO DO VEÍCULO PEQUENO. IMPERÍCIA CARACTERIZADA. PREVISIBILIDADE DA OCORRÊNCIA. PRESENTE O NEXO CAUSAL. CAUSA DE AUMENTO DE PENA DECORRENTE DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE CONDUTOR DE VEÍCULO DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE APLICADA COM ADEQUAÇÃO À ESPÉCIE E SUBSTITUÍDA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. (...) APELO PROVIDO EM PARTE. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 70008246381, Primeira

Page 74: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

61

Câmara Criminal. Relator Ranolfo Vieira. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 14/12/2005).

Assim sendo, nota-se que sendo o condutor, profissional que

exerça a atividade de transporte de passageiros, e, cuja conduta no exercício de

seu mister venha a ser considerada culposa em uma de suas modalidades,

ocasionando a morte da vítima, incidirá a majorante em comento.

3.2.5 Estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos

A inclusão deste inciso como causa de aumento de pena é

certamente, mais uma tentativa do legislador em diminuir os acidentes de trânsito

repreendendo com maior rigor àqueles que causam o homicídio no trânsito e que

estejam sob efeitos de substâncias inebriantes, haja vista, estas – como

constatado no decorrer deste capítulo -, serem as grandes responsáveis pela

maioria dos acidentes, e consequentemente pelas mortes no trânsito.

3.3 AÇÃO PENAL

Não há divergência na doutrina sobre o tipo de ação penal

nos crimes de homicídio culposo cometidos no trânsito, ou seja, será sempre uma

ação penal pública incondicionada. Aliás, na lição de Mirabete [2002, p.372] “é

suficiente a ocorrência do ilícito penal para que seja instaurados o inquérito

policial e a conseqüente ação”.

3.4 RITO PROCESSUAL

O procedimento para apuração deste tipo de crime será o

sumário, ou seja, àqueles apenados com detenção previsto nos artigos 539 e

seguintes do Código de Processo Penal, pois, como explica Jesus [1999, p.90] a

“Lei nº 9.099/95 é inaplicável ao homicídio culposo no trânsito. Razão: quantidade

da pena (não é delito de pequeno potencial ofensivo)”.

Page 75: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

62

Como se sabe, a Lei 10.259/01 – que dispõe sobre a

instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal

– considera crime de menor potencial ofensivo àqueles com pena máxima de 2

anos. E, por analogia a este diploma legal, a Lei 9.099/95 também passou a

considerar de menor potencial ofensivo os crimes com pena máxima de 2 anos.

Assevera Capez [1999, p.4]

[...] para o crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, por ser a pena de detenção de dois a quatro anos, deve também ser seguido o rito sumário, vedadas, entretanto, a realização de audiência preliminar e a proposta de suspensão condicional do processo”.

Destarte, o homicídio culposo no trânsito tendo pena

máxima de 4 anos não pode ser considerado de menor potencial ofensivo nos

termos da Lei 9.099/95, sendo necessário adotar o procedimento sumário do

CPP, contudo, quanto a suspensão condicional do processo, há uma

excepcionalidade que vem sendo aceita por alguns doutrinadores, a qual será

objeto de análise no item subseqüente.

3.5 SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

Dispõe o artigo 89 da Lei 9.099/95 que nos crimes em que a

pena mínima seja igual ou inferior a 1 ano, o Ministério Público poderá propor a

suspensão condicional do processo.

Ocorre que a pena mínima no homicídio culposo no trânsito,

como já declinado é de 2 anos, portanto inadmissível o sursis processual.

Contudo, explica Capez [1999, p.30] que

[...] em relação ao homicídio culposo tem-se admitido a aplicação do instituto do arrependimento posterior previsto no art. 16 do Código Penal, que permite a redução da pena de um a dois terços nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça quando a reparação do dano é feita antes do recebimento da denúncia. Entende-se que no homicídio culposo, por ser involuntária a violência, não fica afastada a possibilidade de incidência dessa causa de diminuição de pena.

Page 76: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

63

No mesmo sentido declina Waléria Garcelan Loma Garcia

citada por Fukassawa [2003, p.153]

[...] forçoso concluir que presente o instituto do arrependimento posterior, previsto no art. 16 do Código Penal, causa de diminuição de pena de um terço a dois terços, é possível a aplicação da suspensão condicional do processo nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/1995, posto que considerada a diminuição máxima (2/3), a pena mínima passa a ser inferior a um ano (oito meses), o que viabiliza a proposta de transação procesual.

Com isso, verifica-se que parte da dos doutrinadores

consideram possível a suspensão condicional do processo no crime de homicídio

culposo no trânsito, desde que presente o instituto do arrependimento posterior, e,

como conseqüência, a diminuição da pena logre chegar ao patamar de 1 ano na

sua parte mínima.

3.6 PERDÃO JUDICIAL

Para Monteiro de Barros [2001, p.544] o “Perdão judicial é o

ato do juiz que, na sentença, deixa de aplicar a pena ao réu, tendo em vista certas

circunstâncias legais”.

E segue o autor declinando que este instituto “só pode ser

concedido nos casos previstos em lei (CP, 107, IX). É vedada a sua aplicação a

delito para o qual a lei não prevê a extensão do benefício”.

Contudo, explica Mirabete [2002, v.I, p.396]

Embora não mencionado expressamente, o perdão judicial é também cabível nos crimes de trânsito, de homicídio culposo e lesão corporal culposa, previstos nos arts. 302 e 303 do Código de Trânsito Brasileiro. O veto ao art. 300 do CTB, que o estabelecia, teve como fundamento a sua previsão nos arts. 121, § 5º, e 129, § 8º do CP”.

Page 77: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

64

No mesmo sentido declina Nucci [1999, p.31] que “o perdão

judicial previsto no Código Penal, deve-se aceitá-lo no contexto dos crimes de

trânsito”.

A jurisprudência tem aplicado:

APELAÇÃO-CRIME. HOMÍCIDIO CULPOSO. NEGLIGÊNCIA. PERDÃO JUDICIAL. Configurada a culpa por negligência e imprudência mantêm-se o perdão judicial por ter o delito causado conseqüências tão graves ao réu que perdeu a companheira com quem tem 04 filhos, que torna desnecessária a aplicação de sanção penal pelo Estado. NEGADO PROVIMENTO. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº 700112542635, Terceira Câmara Criminal. Relatora Elba Aparecida Nicolle Bastos. Disponível em: www.tj.rs.gov.br Acesso em 15/12/2005)

Assim sendo, verifica-se que se as conseqüências do crime

de homicídio culposo na direção de veículo automotor atingirem o próprio agente

de forma extremamente grave, poderá o juiz aplicar o perdão judicial.

3.7 DOLO EVENTUAL

O Código Penal Brasileiro prevê no seu artigo 18, inciso I, a

possibilidade de responsabilizar criminalmente o agente por crime doloso na

modalidade de dolo eventual, quando o agente assume o risco de produzir o

resultado lesivo, que, embora não diretamente desejado é aceito pelo agente.

O homicídio praticado na direção de veículo automotor, via

de regra, sempre foi caracterizado como homicídio culposo hoje previsto no artigo

302 do Código de Trânsito Brasileiro. Contudo, hodiernamente, os tribunais vêm

aceitando a caracterização deste delito, como sendo um crime doloso na

modalidade de dolo eventual, quando presentes determinadas circunstâncias

objetivas que o caracterizam.

O crescimento do número de acidentes de trânsito como

conseqüência lógica do aumento vertiginoso dos veículos que circulam nas

rodovias e cidades brasileiras, aliados a imprudência ou negligência,

Page 78: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

65

principalmente dos jovens motoristas vem aumentando substancialmente o

número de mortes nas estradas. Como exposto alhures o Código de Trânsito

Brasileiro foi elaborado com o escopo de diminuir as infrações cometidas no

trânsito, principalmente àquelas mais graves advindas de condutas imprudentes

que quase sempre resulta em lesão ou morte dos motoristas e pedestres, mas,

onze anos após sua entrada em vigor não se percebe mudanças substanciais no

que toca ao respeito a estas normas. O jornal “A Notícia” da cidade de Joinville

(SC), do dia 07/02/2006, traz como chamada de primeira folha a seguinte

manchete “Cresce o número de mortes nas rodovias federais de SC”. E, o corpo

da matéria veiculado na página A12 declina que

O número de mortos em acidente nas rodovias federais de Santa

Catarina aumentou 8% de 2004 para 2005, e a quantidade de

feridos cresceu 5%. O balanço foi divulgado ontem pela Polícia

Rodoviária Federal (PRF) e apresenta uma amostragem que inicia

no ano de 1995. Em 11 anos, 2005 foi o que apresentou maior

número de feridos em acidentes nas estradas federais, com um

total de 12.747. Janeiro de 2006 se destacou como o mais

violento dos últimos quatro anos, com 1.170 acidentes, 54 mortos

e 2.191 veículos envolvidos. Em janeiro de 2003 foram 45 mortes;

em 2004, 39; e, em 2005, 38.

Como se pode verificar o objetivo do Código de Trânsito

Brasileiro em diminuir os acidentes e, conseqüentemente o número de mortos e

feridos não vem sendo alcançado, e, esta situação de desrespeito as normas de

trânsito - principalmente as que levam a óbito a vítima do acidente -, tem gerado

no seio da população brasileira uma sensação de impunidade, clamando esta, por

penas mais severas a serem aplicadas ao delinqüente homicida nesta modalidade

de crime.

A insatisfação social com a atual penalização do homicida

no trânsito pode ser constatada diariamente nos noticiários da imprensa em geral;

é demonstrada a dor dos familiares da vítima que não se conformam com a perda

do ente querido e pugnam por uma reprimenda mais severa ao agente infrator. E,

este clamor social vem ganhando corpo dia-a-dia, pois, raramente pode-se ler um

Page 79: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

66

jornal ou assistir a um noticiário na televisão sem a notícia de mortes ocasionadas

no trânsito.

Explica Fukassawa [2003, p.119] que

[...] não tão raramente, alguns casos de homicídio no trânsito, posto identificado corretamente ou não o dolo eventual, são levados ao julgamento popular do júri, não sem antes ser decretada prisão preventiva, de um lado, amarga para o autor que não pode compreender um antecipado enclausuramento por causa de sua negligência e, de outro lado, necessária aos sentimentos e anseios do povo que não compadece com a aparente impunidade daquele que, sob certas e incomuns circunstâncias ou condições, à direção de um veículo vitima uma ou várias pessoas, quando haveria de ser exemplarmente punido.

Com isso, os tribunais – sintonizados com o anseio da

população -, de alguns anos para cá vem ampliando nas suas decisões a

aplicação do dolo eventual nos crimes de homicídios praticados no trânsito,

presentes determinadas circunstâncias que permeiam a ocorrência deste delito.

Aliás, vale transcrever decisão do Superior Tribunal de

Justiça:

CRIMINAL. RESP. DELITO DE TRÂNSITO. PRONÚNCIA. DOLO EVENTUAL. EXCLUSÃO PELO TRIBUNAL A QUO. GENERALIZAÇÃO. INADMISSÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I – É incabível a desclassificação do delito de trânsito para sua forma culposa, ao fundamento de que, nessa modalidade de crime, não se admite a hipótese de dolo eventual uma vez que o agente não assume o risco de produzir o resultado. II – Inadmissível a generalização no sentido de que os delitos decorrentes de acidentes de trânsito são sempre culposos. Precedentes. III – Recurso conhecido e provido, nos termos do voto do Relator. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 919477/MG, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro Gilson Dipp. Brasília, DF, 04 de agosto de 2005. Disponível em: www.stj.gov.br. Acesso em 25 de janeiro de 2006.

Page 80: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

67

Em outro julgado deste mesmo Tribunal Superior extrai-se a

seguinte lição:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIOS DOLOSOS. PRONÚNCIA. DESCLASSIFICAÇÃO. DOLO EVENTUAL E CULPA CONSCIENTE. QUAESTIO FACTI E QUAESTIO IURIS. REEXAME E REVALORAÇÃO DA PROVA. (...) IV – O dolo eventual na prática, não é extraído da mente do autor mas, isto sim, das circunstâncias. Nele, não se exige que resultado seja aceito como tal, o que seria adequado ao dolo direto, mas isto sim, que a aceitação se mostre no plano do possível, provável. (...) Recurso provido, restabelecendo-se a pronúncia de primeiro grau. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 247263/MG, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro Félix Fischer. Brasília, DF, 05 de abril de 2001. Disponível em: www.stj.gov.br. Acesso em 25 de janeiro de 2006).

Destarte, verifica-se que já se encontra pacificado pelo

Superior Tribunal de Justiça a possibilidade de aplicação do dolo eventual nos

crimes cometidos na direção de veículo automotor, declinando o Egrégio Tribunal

Superior que o dolo eventual não será extraído da mente do agente, mas sim,

constatado em determinadas circunstâncias objetivas, as quais serão objeto de

análise a seguir.

O elemento subjetivo neste tipo de delito é uma questão

bastante tormentosa enfrentada pelos togados, porquanto, no caso concreto fica

muito difícil distinguir quando o agente age com culpa consciente ou com dolo

eventual. Teoricamente a distinção não encontra dificuldades como viu-se no

capítulo 2 deste trabalho. Contudo, diante do caso concreto a questão não é de

fácil deslinde, pois, questão substancial e de difícil constatação é adentrar no

subjetivismo do agente para verificar se este assumiu ou não o risco pelo

resultado gravoso.

A obtenção deste tipo de prova é complicadíssima,

porquanto uma confissão do próprio agente parece pouco provável; a existência

de testemunha presente no automóvel que confirmasse a assunção do risco pelo

agente, como uma declaração deste do tipo: “haja o que houver não deixarei de

Page 81: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

68

agir” demonstrando sua indiferença e desvalor pela vida humana, também é muito

raro no caso concreto.

A solução encontrada pelos tribunais, e que se verificou no

julgado do STJ acima transcrito é que o dolo eventual não é extraído da mente do

autor, mas sim, de determinadas circunstâncias objetivas que viriam a

caracterizá-lo; este entendimento, contudo, vem gerando muitas discussões e

divergências no mundo jurídico, por estar desprezando-se um elemento

fundamental da estrutura do direito penal, que é a vontade do agente.

Fukassawa [2003, p.119] declina que

Menos dificuldade se terá para comprová-la em alguns casos, tais como o do condutor que desobedece consecutivamente vários sinais fechados, participa de “racha” ou corrida não autorizada ou, ainda, dirige o veículo em estado de embriaguez (e é nessas duas últimas hipóteses que os nossos tribunais têm reconhecido, várias vezes, o dolo eventual em acidentes de trânsito).

A seguir passa-se a transcrever alguns julgados

caracterizando o dolo eventual.

3.7.1 Acórdãos caracterizando o dolo eventual pela velocidade excessiva e embriaguez

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MAGISTRADO QUE NA FASE DA PRONÚNCIA OPERA A DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE CULPOSA DO HOMICÍDIO. ACUSADO SOB FORTE INFLUÊNCIA DO ÁLCOOL E QUE DIRIGIA EM EXCESSO DE VELOCIDADE. ANUÊNCIA AO RISCO DE MATAR ALGUÉM QUE NÃO SE MOSTRA DE TODO IMPLAUSÍVEL. TESE DO DOLO EVENTUAL POSSÍVEL. MATÉRIA CUJA SOLUÇÃO DEFINITIVA COMPETE AO TRIBUNAL DO JÚRI. Não se pode generalizar a exclusão do dolo eventual em delitos praticados no trânsito (STJ, RT 810/573). (...) RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Recurso Criminal 2005.022651-3, Relator José Carlos Carstens Kohler. Disponível em: www.tj.sc.gov.br Acesso em 25/01/2006)

Page 82: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

69

HOMICÍDIO. DOLO EVENTUAL. CARACTERIZAÇÃO. DIREÇÃO DE VEÍCULO COM EXCESSO DE VELOCIDADE. EXISTÊNCIA DE CRIANÇÃS BRINCANDO NO LOCAL. AGENTE QUE ADMITIU A POSSIBILIDADE DO EVENTO ACONTECER. PRONÚNCIA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. É tênue a linha divisória entre a culpa consciente e o dolo eventual. Em ambos o agente prevê a ocorrência do resultado, mas somente no dolo o agente admite a possibilidade do evento acontecer, dizendo para si mesmo: “se eu continuar dirigindo assim, posso vir a matar alguém; mas não importa, haja o que houver eu vou prosseguir”. (BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Recurso em Sentido Estrito nº 179.818-3 – Poá – 4º Câmara Criminal de Férias – Relator: Sinésio de Souza. Disponível em: www.tj.sp.gov.br Acesso em 25/01/2006).

HOMICÍDIO. DESCLASSIFICAÇÃO. FORMA CULPOSA. INADMISSIBILIDADE. Réu que dirigia veículo à noite, em local proibido, embriagado e em alta velocidade. Hipótese em que assumiu o risco de atropelar e matar. Dolo eventual caracterizado. Recurso não provido. O indivíduo que dirige veículo à noite, em local sabidamente proibido, embriagado e em alta velocidade, assume o risco de atropelar e matar, agindo, pois, com dolo eventual. (BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Recurso em Sentido Estrito nº 146.269-3, Itanhaém, Relator Denser de Sá. Disponível em: www.tj.sp.gov.br Acesso em 25/01/2006).

HOMICÍDIO. DOLOSO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA CULPOSO. INADMISSIBILIDADE. Motorista que, embriagado, atropela e mata. Conduta que evidencia dolo eventual. Recurso parcialmente provido. (BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Recurso em Sentido Estrito nº 189.655-3, Santo André, 2º Câmara Criminal, Relator Silva Pinto. Disponível em: www.tj.sp.gov.br Acesso em 25/01/2006)

O agente que empreende velocidade excessiva em seu

veículo de forma a criar um perigo real as pessoas quase sempre está sob a

influência de bebidas alcoólicas ou drogas, e, não raramente vem ocasionar o

acidente fatal, justamente devido ao efeito destas substâncias no comportamento

humano.

Page 83: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

70

Segundo Santos [2003, p.140] a “Embriaguez é o estado de

intoxicação aguda e passageira, provocada pelo álcool ou outras substâncias de

efeitos semelhantes, que reduz ou priva a capacidade de entendimento”.

França [2001, p.301] explica que

Há indivíduos que, trazendo uma taxa elevada de álcool no sangue, permanecem em condições psíquicas e neurológicas sem características de embriaguez, com comportamento correto, dada sua grande tolerância ao álcool. Há outros, no entanto, que , ao ingerirem pequenas quantidades, não deixam dúvidas quanto ao seu grau de embriaguez, através de manifestações somáticas, psíquicas, neurológicas e anti-sociais.

Contudo, esclarece o autor que o Código de Trânsito

Brasileiro “firmou o conceito de embriaguez a partir dos seis decigramas de álcool

por litro de sangue”.

Com isso, verifica-se que, apesar dos diferentes graus de

tolerância das pessoas ao álcool, este será considerado embriagado pela atual

legislação de trânsito caso seja constatada a quantidade de álcool acima

especificada.

Explica Paula [2001, p.109]

O álcool é metabolizado no organismo numa velocidade de 0,2g por quilo de peso por hora. Quando a quantidade de álcool ingerida é consideravelmente maior que a velocidade da sua metabolização, ocorre a embriaguez. O indivíduo neste estado apresenta a fala pastosa, a coordenação motora começa a diminuir (incoordenação dos movimentos ou ataxia, marcha cambaleante), as reações ficam retardadas, a visão e a audição sofrem um prejuízo progressivo de forma a interferir no desempenho de atividade que requerem eficiência física, ocorre um comprometimento da crítica e desinibições comportamentais.

Declina Schuckit [1991, p.85] que “Existem evidências

consistentes de que, mesmo em uma alcoolemia tão baixa quanto 15 mg/dl, isto

é, aproximadamente um drinque, a capacidade de operar um veículo a motor é

significativamente reduzida.

Page 84: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

71

Não há como dissociar esta mistura perigosa e explosiva –

álcool e direção-, que atormenta a sociedade moderna face ao grande número de

vítimas que perdem a vida em acidentes de trânsito, com isso o legislador – ao

elaborar o CTB -, houve por bem, praticamente proibir a ingestão de bebidas

alcoólicas pelos motoristas, a fim de diminuir o número de acidentes de trânsito.

ACIDENTE DE TRÂNSITO. HOMICÍDIOS DOLOSOS (DUAS VEZES). VELOCIDADE EXCESSIVA EMPREGADA. INDÍCIOS DE OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS QUE, SOMADAS, APONTAM PARA A CONFIGURAÇÃO DE DOLO EVENTUAL. DÚVIDA QUE DEVE SER DIRIMIDA PELO CONSELHO POPULAR. RECURSO PROVIDO. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Recurso Criminal 2005.002063-6, Florianópolis, Relator Irineu João da Silva. Disponível em: www.tj.sc.gov.br Acesso em 28/01/2005)

Este acórdão é muito interessante para o presente trabalho,

pois, vislumbra-se no caso concreto a presença de um elemento não muito

discutido e investigado durante o inquérito policial, e, posteriormente na fase

processual, mas que neste caso também foi determinante para a configuração do

dolo eventual. A embriaguez e a velocidade excessiva empreendida pelo agente,

como declinado anteriormente, são as circunstâncias mais comuns trazidas pelos

julgados que caracterizam o dolo eventual, contudo, neste caso, além destes dois

elementos o agente também ingeria um medicamento que em sua própria bula

desaconselhava a ação de dirigir veículos automotores, o que veio a auxiliar o

entendimento de que o agente ultrapassara o limite da culpa consciente.

Esta no corpo deste julgado:

Da mesma forma, não há dúvida de que o acusado, portador de síndrome de pânico, desde antes dos fatos, fazia uso do medicamento AROPAX, de cuja bula se extrai: “Não é aconselhável dirigir veículos motorizados, operar com máquinas de precisão e ingerir bebidas alcoólicas durante o tratamento com AROPAX (cloridrato de paroxetina) (...) Capacidade de dirigir/operar máquinas: Experiências clínicas têm demonstrado que a terapia com AROPAX (cloridrato de paroxetina) não está associada à deterioração das funções cognitiva e psicomotora. Contudo, como com todas as drogas psicoativas, os pacientes

Page 85: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

72

devem ser advertidos quanto à sua capacidade de dirigir veículos motorizados ou operar máquinas”.

Em que pese, neste caso o agente ter sido pronunciado por

dolo eventual, o uso deste medicamento “AROPAX” não foi a única circunstância

caracterizadora do dolo, pois, o agente também se encontrava embriagado e

dirigindo em alta velocidade. Não se encontrou na jurisprudência pátria um caso

de pronúncia unicamente embasado em medicamento usado com

acompanhamento médico, ou seja, uma droga lícita, mas que altera as condições

normais de consciência do indivíduo, podendo alterar seus reflexos ou mesmo

cercear seus movimentos corporais a ponto de provocar o acidente letal.

3.7.2 Acórdãos caracterizando o dolo eventual pelo racha

O “racha” – disputa automobilística em vias públicas -,

também é responsável por grande parte dos acidentes de trânsito com vítimas

fatais, vez que esta conduta necessariamente aliada a altas velocidades

empreendidas pelo agente em seu veículo, aumenta de forma substancial as

probabilidades de acidentes, inclusive com resultado morte.

Esta conduta esta tipificada no artigo 308 do Código de

Trânsito Brasileiro:

Art. 308. Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente, desde que resulte dano potencial à incolumidade pública ou privada:

Penas – detenção, de 6 meses a 2 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Este dispositivo legal, nas palavras de Nucci [1999, p.51] foi

“vulgarmente chamado de ‘participação em racha’, porque foi por causa dessa

disputa automobilística, ocorrida na via pública, que nasceu o tipo penal em

questão”.

Page 86: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

73

O ímpeto juvenil na busca de fortes emoções, com suas

máquinas velozes realizando “rachas” ou “pegas” como também é chamado, nas

vias públicas tem sido um dos grandes propulsores de tragédias que só fazem

aumentar as estatísticas de acidentes no trânsito. As conseqüências desta

“aventura perigosa” muitas vezes acaba em morte entre os envolvidos, ou

mesmo, de simples transeuntes que nada tem a ver com o fato.

Ademais, como conseqüência desta insensatez, ocorre a

desestruturação das famílias das vítimas e do próprio agente, pois, àquelas

passam a conviver com a dor insuportável da perda de um ente querido, enquanto

estas passam a vivenciar o drama do agente que, além do sentimento de culpa

pela morte de uma pessoa, ainda responderá a processos na área criminal e

cível, podendo ser condenado e preso. Por isso, a família do motorista

responsável também se encontra psicológica e financeiramente envolvida na

tragédia que vitimou uma vida humana.

Colhe-se da jurisprudência:

Recurso em sentido estrito. Inovação artificiosa de coisa, em caso de acidente automobilístico com vítima, com o fim de induzir a erro agente policial, perito ou juiz (art. 312, CTB). Ausência de indício de autoria. Impronúncia mantida. Homicídio (art. 121, caput, CP). Prática de “racha”. Dolo eventual. Caracterização. Pronúncia mantida. Havendo versão nos autos de que os réus praticavam “racha” na rodovia, empreendendo manobras arrojadas em alta velocidade, em virtude das quais veio a ocorrer o acidente causador da morte da vítima, a pronúncia é medida que se impõe, ante a ocorrência do dolo eventual. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Recurso criminal 2005.003096-7. Relator Maurílio Moreira Leite. Disponível em: www.tj.sc.gov.br Acesso em 29/01/2006)

Recurso em sentido estrito. Pronúncia. Acidente de trânsito. Homicídio simples e lesões corporais de natureza grave com incapacidade para ocupações habituais, em concurso formal. Pretendido em preliminar o trancamento da ação penal. Rejeição. Mérito. Despronúncia. Acusado sob forte influência do álcool. Prova, contudo, a conspirar contra o acusado. Apelante que imprimindo velocidade elevadíssima em seu veículo, participa de

Page 87: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

74

disputa automobilística (racha ou pega), ocasionando violento acidente do qual resultou gravemente lesado uma pessoa e morte em outra. Matéria cuja solução definitiva compete ao Tribunal do Júri. Recurso desprovido. (BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Recurso criminal 2004.022549-0, Primeira Câmara Criminal. Relator Souza Varella. Disponível em: www.tj.sc.gov.br Acesso em 29/01/2006).

Destarte, verifica-se que, se durante o processo criminal

aparecerem provas suficientes, de que o agente causador do homicídio estava

praticando o chamado racha ou pega em via pública, os tribunais têm entendido

que houve a assunção do risco pelo agente caracterizando-se o dolo eventual.

3.7.3 Procedimento

A ação penal será pública incondicionada, e, caso durante o

trâmite processual restar dúvidas quanto a culpabilidade do agente, ou seja, se

agiu com culpa consciente ou com dolo eventual assumindo o risco do resultado

gravoso, o Juiz singular, utilizando do procedimento estabelecido no Código de

Processo Penal, pronunciará o acusado, sendo que a partir deste momento;

explica Mirabete [2003, p.514] “o processo passa a ser disciplinado pelos arts.

406 a 497, que prevêem o rito para o julgamento pelo Tribunal Popular, incluindo

normas sobre a organização do Júri”.

Com isso, constata-se que num primeiro momento, tratando-

se de homicídio ocorrido no trânsito o procedimento adotado no Código de

Processo Penal Brasileiro será o sumário, por tratar-se de crime apenado com

detenção, contudo, se persistir a dúvida quanto a assunção do risco pelo agente,

este será pronunciado, e, posteriormente, julgado na forma dos artigos

supramencionados pelo Tribunal do Júri.

Page 88: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

75

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Iniciou-se este trabalho científico com um breve histórico da

evolução do automóvel e da legislação de trânsito brasileira, estudando depois, o

crime de homicídio, fazendo uma breve correlação entre o homicídio comum e o

praticado no trânsito nas suas características fundamentais e diferenciadas.

Abordou-se ainda, a teoria do dolo e da culpa por ser parte

fundamental da estrutura do direito penal. Por fim, realizou-se uma pesquisa

jurisprudencial sobre o homicídio culposo e o homicídio doloso na modalidade de

dolo eventual, ocorridos no trânsito.

O crescimento no número de acidentes de trânsito com

morte influenciou muito na elaboração da lei 9.503/97 – Código de Trânsito

Brasileiro -, que elevou a pena do homicídio culposo no trânsito. Contudo, apesar

desta majoração da reprimenda, os juizes e tribunais - sintonizados com o

sentimento de impunidade que se instaurou na população brasileira para com o

homicida no trânsito -, começaram a entender cabível – o que era muito raro de

ocorrer -, o dolo na modalidade de dolo eventual neste tipo de delito.

No desenvolver deste trabalho estudando a teoria do dolo

verificou-se que conforme o artigo 18, inciso I, do Código Penal, as teorias

adotadas pelo Direito Penal Brasileiro foram a teoria da vontade – na qual o

agente quer produzir o resultado -, e a teoria do assentimento ou consentimento –

pela qual o agente não quer o resultado gravoso, mas o prevê e anui com a sua

ocorrência.

No caso do homicídio praticado na direção de veículo

automotor o agente não deseja o resultado gravoso, portanto excluído está a

caracterização do dolo direto, situação particularizada que não foi objeto de

análise neste trabalho. Por conseguinte, paira a dúvida sobre a assunção do risco

pelo agente; no estudo realizado verificou-se que a coleta de provas para

caracterizar a assunção do risco pelo agente é muito difícil, porquanto impossível

Page 89: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

76

adentrar no subjetivismo do agente. Por isso, os juízes invocando o princípio do in

dúbio pro sociedade, em sede de pronúncia remetem a júri popular o agente.

Simplesmente desprezar o subjetivismo do agente por ser

complicada a coleta de provas no sentido de caracterizar a assunção do risco,

seria desvirtuar a estrutura adotada pelo Direito Penal Brasileiro, elegendo, como

conseqüência, não as teoria da vontade e do assentimento previstas em lei, mas

sim, a teoria da representação – na qual basta a previsão do resultado para a

caracterização do dolo.

Em que pese, entendimento já pacificado do Superior

Tribunal de Justiça, e que vem sendo seguido pelos demais Tribunais, no sentido

de que o dolo eventual deve ser extraído de circunstâncias objetivas do caso

concreto, entende-se que não é possível pronunciar o agente e remetê-lo a

julgamento pelo Tribunal do Júri embasado apenas nestas circunstâncias, pois,

sabe-se que é absolutamente necessário o elemento subjetivo vontade na

caracterização de qualquer crime doloso; o que não se diferencia em relação ao

homicídio de trânsito, porquanto, deve restar provada, pelo menos a assunção do

risco pelo agente, sob pena de – conforme mencionado no parágrafo anterior -,

contrariar toda a estrutura adotada pelo Direito Penal Brasileiro.

Ressalta-se, no entanto, que existe possibilidade do agente

ter realmente assumido o risco de produzir o resultado ilícito, e assim, este pode

vir a ser pronunciado e posteriormente julgado pelo Tribunal Popular,

confirmando-se assim, a primeira hipótese deste trabalho, contudo, salienta-se

que, na prática, salvo confissão do agente, impossível será a caracterização do

dolo eventual neste tipo de delito.

A segunda hipótese não foi confirmada, porquanto se

constatou que apenas os elementos objetivos não podem configurar o dolo

eventual, exigindo-se também a presença do elemento subjetivo.

Quanto a terceira hipótese, esta também foi confirmada, vez

que segue na mesma linha da primeira, ou seja, nada impede que o agente tendo

consciência da influência dos medicamentos sobre o seu corpo, assuma o risco

Page 90: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

77

do resultado gravoso, contudo, na prática, devido a dificuldade na produção deste

tipo de prova, e não havendo confissão do agente, este deve responder por crime

culposo.

Por fim, resta salientar que a pronúncia do agente, com o

conseqüente julgamento pelo Tribunal do Júri pode dar azo a injustiças, face a

possibilidade de uma condenação por dolo, quando na verdade deveria ser por

culpa, ou mesmo por uma absolvição errônea o que não é raro em se tratando de

tribunal do júri. Portanto, quando houver dúvidas sobre a assunção do risco pelo

agente, o crime deverá ser considerado sempre culposo.

Page 91: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

78

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

ALMEIDA JUNIOR, Antonio. Lições de medicina legal. 16. ed. São Paulo:

Nacional, 1979. 614p

ARAUJO JÚNIOR, João Marcelo. Delitos de trânsito. Rio de Janeiro: Forense,

1980. 280p

BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal, parte geral: ed. atual. e ampl.

São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1 e 2. 584p

BILLIAN, Otto. Domine o trânsito, uma ação mundial. São Paulo: Abril, 1974. 79p

BRASIL. Código de trânsito brasileiro: lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997.

São Paulo: Ltr, 1998. 373p

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Direito Processual Penal. Recurso Especial

919477/MG, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro

Gilson Dipp. Brasília, DF, 04 de agosto de 2005. Disponível em: www.stj.gov.br.

Acesso em 25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Direito Processual Penal. Recurso Especial

247263/MG, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Felix

Fischer. Brasília, DF, 05 de abril de 2001. Disponível em: www.stj.gov.br. Acesso em

25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Penal. Apelação Criminal nº

2005.023441-7/Itajaí, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa

Catarina. Relator Desembargador Torres Marques. Tribunal de Justiça de Santa

Catarina, Florianópolis, SC, 20 de setembro de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 10 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Processual Penal. Apelação

Criminal nº 2005.007693-2/Brusque, da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de

Page 92: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

79

Justiça de Santa Catarina. Relator Desembargador Amaral e Silva. Tribunal de

Justiça de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 05 de julho de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 10 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Processual Penal. Recurso

Criminal nº 2005.022651-3/Curitibanos, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina. Relator Desembargador José Carlos Carstens Kohler.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 30 de agosto de 2005.

Disponível em: www.tj.sc.gov.br. Acesso em 25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Processual Penal. Recurso

Criminal nº 2004.022549-0/Blumenau, da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina. Relator Desembargador Souza Varella. Tribunal de

Justiça de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 12 de abril de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 29 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Penal. Apelação Criminal nº

2005.003901-3/Timbó, da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa

Catarina. Relator Desembargador Sérgio Paladino. Tribunal de Justiça de Santa

Catarina, Florianópolis, SC, 27 de setembro de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 06 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Penal. Apelação Criminal nº

2005.019267-6/Joinville, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de

Santa Catarina. Relator Desembargador Maurílio Moreira Leite. Tribunal de Justiça

de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 02 de agosto de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 07 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Penal. Recurso Criminal nº

2005.002063-6/Imbituba, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de

Santa Catarina. Relator Desembargador Irineu João da Silva. Tribunal de Justiça de

Santa Catarina, Florianópolis, SC, 29 de março de 2005. Disponível em:

www.tj.sc.gov.br. Acesso em 28 de janeiro de 2006.

Page 93: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

80

BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Direito Processual Penal. Recurso

Criminal nº 2005.003096-7/Tubarão, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina. Relator Desembargador Maurílio Moreira Leite. Tribunal

de Justiça de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 07 de março de 2005. Disponível

em: www.tj.sc.gov.br. Acesso em 29 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Direito Processual Penal. Recurso em

Sentido Estrito nº 179.818-3/Poá, da Quarta Câmara Criminal de Férias do Tribunal

de Justiça de São Paulo. Relator Desembargador Sinésio de Souza. Tribunal de

Justiça de São Paulo, São Paulo, SP, 26 de julho de 1995. Disponível em:

www.tj.sp.gov.br. Acesso em 25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Direito Processual Penal. Recurso em

Sentido Estrito nº 146.269-3/Itanhaém, da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de

Justiça de São Paulo. Relator Desembargador Denser de Sá. Tribunal de Justiça de

São Paulo, São Paulo, SP, 15 de dezembro de 1994. Disponível em:

www.tj.sp.gov.br. Acesso em 25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Direito Processual Penal. Recurso em

Sentido Estrito nº 189.655-3/Santo André, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal

de Justiça de São Paulo. Relator Desembargador Silva Pinto. Tribunal de Justiça de

São Paulo, São Paulo, SP, 16 de outubro de 1995. Disponível em: www.tj.sp.gov.br.

Acesso em 25 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Direito Penal. Apelação Crime nº

6.085/01/São Gonçalo, da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de

Janeiro. Relator Desembargador Telma Musse Diuana. Tribunal de Justiça do Rio de

Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 23 de novembro de 2002. Disponível em:

www.tj.rj.gov.br. Acesso em 18 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime

nº 70010553592/Getúlio Vargas, da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça

do Rio Grande do Sul. Relator Desembargador Danúbio Edon Franco. Tribunal de

Page 94: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

81

Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 20 de outubro de 2005. Disponível

em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 18 de janeiro de 2006.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime

nº 70007292337/Caxias do Sul, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça

do Rio Grande do Sul. Relator Desembargador José Antônio Cidade Pitrez. Tribunal

de Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 24 de fevereiro de 2005.

Disponível em: www.tj.rs.govo.br. Acesso em 07 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime

nº 70004481347/Passo Fundo, da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça

do Rio Grande do Sul. Relator Desembargador Manuel José Martinez Lucas.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 14 de agosto de 2002.

Disponível em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 10 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime

nº 70008093767/Santana do Livramento, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal

de Justiça do Rio Grande do Sul. Relator Desembargador Antônio Carlos Netto de

Mangabeira. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 15 de

setembro de 2005. Disponível em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 12 de dezembro de

2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime

nº 70008246381/Parobé, da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul. Relator Desembargador Ranolfo Vieira. Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 28 de abril de 2004. Disponível em:

www.tj.rs.gov.br. Acesso em 12 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime nº

700111816188/Porto Alegre, da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do

Rio Grande do Sul. Relator Desembargador Elba Aparecida Nicolli Bastos. Tribunal

de Justiça do Rio grande do Sul, Porto Alegre, RS, 08 de setembro de 2005.

Disponível em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 20 de janeiro de 2006.

Page 95: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

82

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime nº

70007690431/Pelotas, da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul. Relator Desembargador Antônio Carlos Netto de Mangabeira.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 25 de outubro de 2005.

Disponível em: www.tj.rs.gov.br. Acesso em 07 de dezembro de 2005.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Direito Penal. Apelação Crime nº

70011401932/, da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande

do Sul. Relator Desembargador Danúbio Edon Franco. Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 23 de junho de 2005. Disponível em:

www.tj.rs.gov.br. Acesso em 07 de dezembro de 2005.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, parte especial: dos crimes contra a

pessoa, dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos. São

Paulo: Saraiva, 2003. V. 2, 588p

CAPEZ, Fernando; RIOS GONÇALVES, Victor Eduardo. Aspectos criminais do código de trânsito brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. 69p

CARNEIRO, Joseval. Comentários aos crimes de trânsito. Rio de Janeiro:

Esplanada, 1999. 138p

COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Curso de direito penal: parte especial: dos crimes

contra a pessoa dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos

mortos. 2. ed., atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 1992. v. 2, 517p

DELMANTO, Celso. Código penal comentado. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar,

2002. 1081p

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: parte geral. Atualizador:

Fernando Fragoso. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. 585p

FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara

Koogan, 2001. 579p

Page 96: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

83

FUKASSAWA, Fernando Y. Crimes de trânsito: de acordo com a Lei nº 9.503/1997

– Código de Trânsito Brasileiro. 2. ed. aum. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira,

2003. 259p

GARCEZ, Valter de Abreu. Curso básico de direito penal: parte geral com noções

de criminologia. São Paulo: Bushatsky, 1972. 308p

GOMES FILHO, Hugo Gonçalves. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Editora

Rio, 1991. 281p

GOMES, Luiz Flávio. (org.). Constituição federal, código penal, código de processo penal. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,

2004. 1183p

GOMES, Luiz Flávio. Direito penal: parte geral. Teoria constitucionalista do delito.

v.3. São Paulo: RT, 2004. 399p

GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro:

Impetus, 2003. 851p

JACOB, Elias Antonio. Direito penal: parte geral. Porto Alegre: Síntese, 1998. 323p

JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial. Dos crimes contra a pessoa e

dos crimes contra o patrimônio. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. V. 2, 517p

JESUS, Damásio E. de. Crimes de trânsito. Anotações à parte criminal do código

de trânsito (Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997). 3. ed. São Paulo: Saraiva,

1999. 228p

JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte geral. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1986.

V. 1, 656p

JORNAL A NOTÍCIA. Cresce o número de mortes nas rodovias federais de SC.

Joinville, 07 de fevereiro de 2006, p. A12.

Page 97: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

84

LEAL, João José. Direito penal geral: São Paulo: Atlas, 1998. 494p

MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Campinas: Millennium, 2002,

343p

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. parte geral. 18. ed. São Paulo:

Atlas, 2003. V. 1, 506p

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. parte especial, 20. ed. ver. e

atual. São Paulo: Atlas, 2002. V. 2, 453p

MONTEIRO, Ruy Carlos de Barros. Crimes de trânsito (e aplicação da Lei nº 9.099,

de 26.09.1995, e a responsabilidade civil): jurisprudência do STF e STJ, atualizada

até 29 de junho de 1998. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. 329p

NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. Dos crimes contra a pessoa; dos crimes

contra o patrimônio. Atualizado por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. 33.

ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. V. 2, 526p

NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: Introdução e parte geral. Atualizada por

Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. V. 1,

388p

NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes de trânsito: Lei n. 9.503/97. São Paulo: Juarez

de Oliveira, 1999. 66p

PAULO, Wilson Kraemer de. Drogas e dependência química. Noções elementares.

Florianópolis: Papa Livro, 2001. 126p

PEDROSO, Fernando de A. Homicídio, participação em suicídio, infanticídio e aborto. Rio de Janeiro: Aide, 1995. 320p

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 1999. 531p

Page 98: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Nery Sirena Filho.pdf · A Lei nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro,

85

ROSA, Antonio José Miguel Feu. Direito penal: parte geral. Doutrina e

jurisprudência atualizadas de acordo com a Constituição de 1988 e toda legislação

penal complementar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996. 591p

SANTOS, William Douglas Resinente dos; KRYMCHANTOWSKI, Abouch V;

DUQUE, Flávio Granado. Medicina legal à luz do direito penal e processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2003. 352p

SCHUCKIT, Marc. Abuso de álcool e drogas. Trad. de Ane Rose Bolner. Porto

Alegre: Artes Médicas, 1991. 356p

SILVA, Ronaldo. Direito penal, parte geral. Florianópolis: Atual, 2002. 196p

TELES, Ney Moura. Direito penal, parte geral. São Paulo: Direito, 1996. V. 1, 405p

VASCONCELOS, Eduardo A. O que é trânsito. São Paulo: Brasiliense, 1985. 92p