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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS GABRIELLE TAVER DE JESUS ACESSO A ATENÇÃO BÁSICA À SAÚDE E CUIDADO COMPARTILHADO NA PERSPECTIVA DE USUÁRIOS DE CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DE CAMPINAS - SP CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

GABRIELLE TAVER DE JESUS

ACESSO A ATENÇÃO BÁSICA À SAÚDE E CUIDADO COMPARTILHADO NA

PERSPECTIVA DE USUÁRIOS DE CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DE

CAMPINAS - SP

CAMPINAS

2017

GABRIELLE TAVER DE JESUS

ACESSO A ATENÇÃO BÁSICA À SAÚDE E CUIDADO COMPARTILHADO NA

PERSPECTIVA DE USUÁRIOS DE CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DE

CAMPINAS - SP

Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da

Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos

exigidos para a obtenção do título de mestra em Saúde Coletiva:

Políticas e Gestão em Saúde, na Área de Concentração Política,

Gestão e Planejamento

ORIENTADORA: MARIANA DORSA FIGUEIREDO

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA

ALUNA GABRIELLE TAVER DE JESUS, E ORIENTADA

PELA PROFA. DRA. MARIANA DORSA FIGUEIREDO

CAMPINAS

2017

BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE MESTRADO

GABRIELLE TAVER DE JESUS

ORIENTADOR: MARIANA DORSA FIGUEIREDO

MEMBROS:

1. PROF. DR. GUSTAVO TENÓRIO CUNHA

2. PROFA. DRA. LUCIANA TOGNI DE LIMA E SILVA SURJUS

3. PROFA. DRA. MÁRCIA DO NASCIMENTO VIEIRA

Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva: Políticas e Gestão em Saúde da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora

encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

Data: 21 de Fevereiro de 2017

À minha irmã Caroline,

pois a travessia nem sempre é fácil

e nisso reside o encanto da vida!

“O segredo da Verdade é o seguinte:

não existem fatos, só existem histórias.”

(João Ubaldo Ribeiro)

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à minha família, e, sobretudo, aos meus pais, Jackson e Miriam.

Sem eles, definitivamente, nada disso seria possível. Obrigada pelo apoio, por sempre

acreditarem em mim e por vibrarem junto com cada conquista. Não há distância no

mundo que me afaste de vocês.

À minha orientadora, Mariana Dorsa, por me guiar tão sábia e pacientemente

por essa travessia turbulenta e essa árdua tarefa de transformar um pedaço do

universo em palavras. Obrigada pelos ensinamentos, pela disponibilidade, pelo

acolhimento, pelo exemplo.

À minha banca de qualificação, Luciana Surjus, Gustavo Tenório e Daniele

Sacardo, pelos apontamentos tão sensíveis e enriquecedores.

À minha banca de defesa, Luciana Surjus, Márcia Vieira e Gustavo Tenório, por

aceitarem estar comigo em um momento de celebração e de construção de

conhecimento.

Aos CAPS de Campinas “David Capistrano da Costa Filho” e “Novo Tempo”,

pela disponibilidade e parceria.

À Vivian, concentrada e animada, pela imprescindível parceria nas alegrias e

aflições deste mestrado. Você está em cada fala dos grupos focais. Obrigada pela

força e por deixar tudo mais leve.

À Cristiane, pelo apoio incondicional e espera paciente. Por sofrer junto e por

se dispor a conhecer um pedaço tão importante de mim. Obrigada por caminhar

comigo.

À Patrícia, pela amizade e pelos ensinamentos do (con)viver.

À Fabiana, por acolher as incontáveis perguntas e pela disposição constante

em ajudar.

A Camila, Eduardo, Fernanda e Marcela, por vibrarem juntos e serem os

melhores encontros da vida.

Ao Yan, pela potência das trocas.

À Monique, pela acolhida estrangeira em terras itapetininganas.

À Tamara, que entendeu e apoiou este processo, tornando as coisas possíveis.

Aos amigos do CASA Esperança, que foram mais do que colegas.

À diversidade de encontros que a Unicamp e essa pesquisa proporcionaram.

Aos amigos e bons encontros, que, embora não foram citados, fazem parte da

pessoa que eu pude me tornar com essa encantadora e única experiência.

RESUMO

Esta pesquisa buscou identificar e analisar a percepção dos usuários de dois

Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de Campinas - SP sobre acesso à Atenção

Básica à Saúde e acompanhamento compartilhado. Para tanto, utilizou dados

qualitativos obtidos por meio de dois grupos focais realizados nos Centros de Atenção

Psicossociais (CAPS) da região sudoeste da cidade de Campinas – SP, “David

Capistrano da Costa Filho” e “Novo Tempo”. A análise destes dados se deu por meio

da construção de narrativas, destacando as diferentes percepções dos sujeitos.A

narrativa nos revelou uma série de dificuldades de acesso dos pacientes com

transtornos mentais na Atenção Básica. O acolhimento foi categoria central nesta

análise, influenciando diretamente no acesso às ofertas de cuidado. Enquanto as

consultas médicas foram valorizadas, sobretudo pela capacidade de escuta e

acolhimento dos profissionais, houve relatos de descaso e discriminação por parte de

outros profissionais, sobretudo na recepção dos Centros de Saúde. Há uma demora

excessiva para que algumas demandas se efetivem, como retirada de exames, o que

faz com que os usuários pensem que a Atenção Básica não é capaz de comportar a

demanda existente e, ao falhar em demandas consideradas simples, há a percepção

de impossibilidade de lidar com demandas complexas. Os CAPS são suficientes aos

usuários e são lugares onde não há discriminação por parte dos profissionais. Os

usuários percebem uma relação entre o CAPS e os centros de saúde e relatam que a

mediação dos profissionais do CAPS faz com que certas ofertas de cuidado da

Atenção Básica se efetivem, o que nos mostra a eficácia do apoio matricial. As

dificuldades de acesso nos revelam a importância de fortalecimentos nos Núcleos de

Apoio à Saúde da Família (NASF), política pública do Ministério da Saúde que garante

o núcleo da saúde mental na Atenção Básica. Por fim, importa reconhecermos as

especificidades da experiência de Campinas, pois, apesar de singular, nos revela

caminhos a serem percorridos. Além da rede de atenção psicossocial substitutiva ao

modelo asilar que a cidade logrou implementar, a parceria existente com as

universidades neste município nos mostra a importância de investimento em espaços

de formação continuada.

Palavras-chave: Atenção Básica à Saúde; Saúde Mental; Integralidade em Saúde;

Apoio Matricial.

ABSTRACT

This master’s research aimwas to identify and analyze the users’ of two

Psychosocial Attention Centers in Campinas - SP perceptions about access to primary

health care and shared care. To this purpose, qualitative data were used and were

obtained through two focal groups conducted in the Psychosocial Attention Centers

from the southeast region of Campinas, “David Capistrano da Costa Filho” and “Novo

Tempo”. The data were analyzed through the construction of narratives, highlighting

the users’ different perceptions. The narrative showed a series of difficulties in the

mental health patients’ acess to Primary Health Care. The user embracement was a

central category in this analysis, because it influences directly in the health care offers’

acess. In the one hand, the doctors’ appointments were valued due to these

professionals’ capacities for hearing and embracing the users’ needs. In the other

hand, the users expressed discrimination and negligence by other professionals,

mainly in the Health Centers’ reception. There’s an excessive wait in certain demands,

such as to obtain exam results, which makes the users think that the Primary Care

cannot deal with its demands. There is the perception that it is impossible for the

Primary Care to deal with complexes demands, as it has difficulties to deal with simple

demands. The Psychosocial Attention Centerscarewere considered satisfatory and

they were seen as places where the professionals do not discriminate the users. They

notice the existence of a relation between the Psychosocial Attention Centers and the

Primary Care and they narrate that the Psychosocial Attention Centers professionals’

mediation guarantees the access to certain Primary Health Care offers, which show us

the Matrix Support efficacy. The acess difficulties show us the importance of

strengthening the Family Health Support Nucleus, which is the Ministry of Health public

policy that guarantees Mental Health care in Primary Health. At last, it is important that

we recognise the particularities of the city of Campinas’ experiences, because, in

despite of its singularities, leads us to paths that we can follow. Besides the satisfatory

mental health psychosocial net that the city implemented, the partnership with

universities show us the importance to invest in continuous education.

Keywords: Primary Health Care; Mental Health; Integrality in Health; Matrix Support.

Lista de abreviaturas e siglas

ACS – Agentes Comunitários de Saúde

CAPS – Centro de Atenção Psicossocial

CS – Centro de Saúde

ESF – Estratégia Saúde da Família

MS – Ministério de Saúde

NASF – Núcleo de Apoio à Saúde da Família

OMS – Organização Mundial da Saúde

RAPS – Rede de Atenção Psicossocial

SRT – Serviço Residencial Terapêutico

SUS – Sistema Único de Saúde

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .........................................................................................................................................13

2. CUIDADO COMPARTILHADO EM SAÚDE MENTAL: ATENÇÃO BÁSICA E CENTROS DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL .................................................................................................................................................17

2.1 A ATENÇÃO BÁSICA .........................................................................................................................17 2.2 A ATENÇÃO ÀS PESSOAS EM SOFRIMENTO MENTAL E A REFORMA PSIQUIÁTRICA ..........................19 2.3 SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO BÁSICA .............................................................................................21 2.4 CUIDADO COMPARTILHADO............................................................................................................27 2.5 APOIO MATRICIAL ...........................................................................................................................28

3. METODOLOGIA.......................................................................................................................................33

3.1 OBJETIVOS ......................................................................................................................................33 3.2 ABORDAGEM QUALITATIVA ............................................................................................................33 3.3 HERMENÊUTICA ..............................................................................................................................35 3.4 O CAMPO DA PESQUISA ..................................................................................................................37 3.5 A COLETA DE DADOS: O GRUPO FOCAL ............................................................................................41 3.6 ANÁLISE DOS DADOS: A CONSTRUÇÃO DE NARRATIVAS ...................................................................44

4. NARRATIVA ............................................................................................................................................47

5. DISCUSSÃO .............................................................................................................................................48

5.1 OFERTAS DE CUIDADO ACESSADAS NA ATENÇÃO BÁSICA .................................................................48 5.2 SAÚDE MENTAL ..............................................................................................................................53 5.3 CUIDADO COMPARTILHADO E APOIO MATRICIAL ............................................................................54 5.4 OUTROS SERVIÇOS ACESSADOS PARA ALÉM DOS CAPS E DA ATENÇÃO BÁSICA .................................56

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................................................................58

7. REFERÊNCIAS ..........................................................................................................................................61

8. ANEXOS ..................................................................................................................................................70

13

1. INTRODUÇÃO

Acredito que um trabalho de mestrado tem início anterior à entrada no

programa acadêmico e, assim, importa pensar, como aponta Minayo, “os motivos

vivenciais e teóricos que impulsionaram a escolha do objeto” (1). Ao início deste

programa acadêmico, disseram-me que era necessário ter vivo em nós um

questionamento que nos movia, uma indagação forte o suficiente para impulsionar-

nos no trabalho que realizaríamos. Ao olhar para trás a fim de identificar o início desta

indagação, percebi que durante a graduação nada havia estudado sobre saúde

coletiva. Em consonância com a maior parte dos programas de psicologia, minha

formação voltou-se para a clínica. A única disciplina que propunha pensar o cuidado

psicossocial no SUS, ministrada pelo prof. Dr. Silvio Yasui, eu não assisti, pois estava

em intercâmbio pela Universidade de Évora, em Portugal. Foi só no fim da graduação

que tive os primeiros contatos com a Atenção Básica, a nível teórico, com o objetivo

de estudar para um concurso. Daí nasceu o encantamento pela história da atenção

básica e pela saúde da família, pela potência presente nas políticas públicas e pelos

relatos de experiências exitosas. Afinal a atenção básica é arranjo assistencial de

suma importância para os países que buscam um sistema cujo cuidado em saúde seja

qualificado e entendido como direito de cidadania (2) e, segundo a Política Nacional

de Atenção Básica (3), deveria ser reconhecida como contato preferencial pelos

usuários do sistema de saúde. Através de conceitos como longitudinalidade, clínica

ampliada, territorialidade e vínculo, parecia-me algo infalível. No mais, a existência

dos Agentes Comunitários de Saúde tinha ares de inovação, trazendo uma nova

profissão capaz de ligar a equipe multidisciplinar de trabalhadores com a família e a

comunidade.

Em seguida, ao passar no concurso, se deu o contato com a prática, enquanto

psicóloga do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) da cidade do interior mineiro

de Poços de Caldas, e, com essa, começou a borbulhar uma série de reflexões,

indagações e indignações. No início nasceu a dúvida, a falta de orientações ou

diretrizes claras a serem seguidas. Na tentativa de sanar as primeiras inquietações, a

busca por material teórico capaz de subsidiar a prática. No encontro deste, mais

inquietações e frustrações. Como veremos adiante, há um hiato entre o que é política

14

pública e o que se dá no dia-a-dia dos serviços. A forma como a atenção básica se

organiza, enquanto processo de trabalho, permanece um tanto confuso tanto para os

usuários quanto para o restante do sistema (2). Acrescentaria que esta confusão

reverbera entre os profissionais da própria atenção básica.

Em contato teórico com o dispositivo do apoio matricial e com a ajuda de uma

enfermeira que havia tido a experiência do apoio quando trabalhara em Belo

Horizonte, além dos colegas, sempre implicados com práticas potentes em saúde,

implantamos o apoio matricial em Poços de Caldas, inexorável na própria criação dos

NASFs, estes tidos como responsáveis por constituírem redes de apoio (2). Campos

et al (2) ressaltam a prerrogativa de que a atenção básica deve, necessariamente,

ligar-se e ser apoiada por outras redes, pois só assim é possível garantir a

integralidade do cuidado e a responsabilização pela saúde de uma parcela adscrita

da população. Para eles, o impacto da atenção básica na saúde dos usuários depende

de sua capacidade de integração com o restante do sistema.

Era um tanto angustiante ser recém-formada e apoiadora em saúde mental

para nove equipes da Estratégia Saúde da Família, já que incontáveis vezes me sentia

em busca de um apoio especializado inexistente. Na prática, observei que, via de

regra, há o encaminhamento de pacientes aos diversos serviços na rede de saúde,

de forma a transferir a responsabilidade e a garantir o não-envolvimento com a

problemática em questão. Houve o contato com uma rede de saúde fragmentada, fria,

com diálogo incipiente e poucos recursos a oferecer às pessoas em sofrimento mental.

Embora o trabalho em rede e o apoio matricial sejam diretrizes consolidadas enquanto

políticas públicas, na prática observamos que a tendência existente no mundo

contemporâneo industrializado da fragmentação e especialização se fazem presentes

no cuidado à saúde, dificultando a transformação das diretrizes em práticas

cotidianas.

Diante desta conjuntura dei início ao mestrado profissional. Para dar conta das

angústias suscitadas, do incômodo com o distanciamento entre teoria e prática, da

descrença com o trabalho em saúde. Houve, assim, uma possibilidade de pensar o

fazer, de uma práxis consciente, potente e resiliente. Um mestrado com característica

profissionalizante, ou seja, uma proposta intrínseca de um diálogo entre a política

pública e o cotidiano do serviço, que valoriza os aprendizados obtidos de onde de fato

15

pulsam os afetos e as tramas das singularidades dos sujeitos se traduzem em

encontros e significados. Importa pensarmos que ter políticas públicas com diretrizes

avançadas e modernas não assegura sua implementação, mas facilita a escolha por

caminhos capazes de transformar o virtual em real (4). Aos poucos pude perceber a

inexorabilidade do hiato entre teoria e prática, uma vez que a primeira aponta os

caminhos a serem seguidos, enquanto a última é atravessada por uma infinidade de

variáveis, com características singulares que dependem do contexto no qual se efetua

e dos sujeitos envolvidos.

Esta pesquisa de mestrado versa sobre os usuários com transtorno mental

grave em acompanhamento no CAPS e suas percepções a respeito das inúmeras

problemáticas que os envolvem quando buscam sanar suas demandas de saúde,

sobretudo no nível da atenção básica. Embora os sujeitos envolvidos não estejam

apropriados das diretrizes do apoio matricial e do cuidado integral em seu caráter

conceitual, experienciam cotidianamente em que medida estes se traduzem em

práticas dos serviços. Suas percepções são, assim, tema deste estudo, que tem como

prerrogativa ser capaz de fornecer aos trabalhadores e gestores uma análise da forma

como as ofertas preconizadas são recebidas e significadas pela população que delas

faz uso. A presente pesquisa filia-se a um grupo significativo de estudos qualitativos

que tem optado por escutar e valorizar a voz dos usuários em saúde mental,

diferenciando-se da vasta quantidade de pesquisas que buscam as percepções dos

trabalhadores em saúde. É, desta forma, um instrumento no combate aos estigmas,

todavia existentes e à inclusão social dos usuários em sofrimento mental.

Este texto de mestrado profissional está organizado de forma a traçarmos, na

primeira parte, um panorama que parte das especificidades da atenção básica e da

saúde mental para pensarmos uma integração entre estes dois campos de cuidado

em saúde, a partir do compartilhamento dos casos e do dispositivo do apoio matricial.

Na segunda parte, ao adentramos a metodologia, explicitarei a escolha por uma

abordagem hermenêutica e qualitativa, que utilizou os grupos focais como técnica de

coleta de dados e a construção de narrativas para a análise destes.

Em uma primeira análise da pesquisa é possível traçarmos alguns

apontamentos e indagações. Primeiramente, ao pensar o tema em questão e diante

de minha trajetória, considerava oportuno que a atenção básica tivesse ofertas de

16

saúde do núcleo da saúde mental, como, por exemplo, grupos de convivência e/ou

terapêutico. Desta forma os usuários teriam um espaço estabelecido de acolhimento

de seu sofrimento, um espaço para além do CAPS, onde pudessem falar a respeito

de suas angústias. Poderiam, também, participar de outras modalidades de grupo ou

demais ações que promovessem a integração destes com o restante da população,

de forma a ter sua cidadania legitimada, com inclusão no território. Todavia, ao olhar

para os dados colhidos nos grupos focais, vemos um consenso de que a atenção

especializada cuida dos transtornos mentais, enquanto a atenção básica dos demais

agravos à saúde. Teriam os CAPS centralizado o cuidado em saúde mental e a

atenção básica se eximido desta função? Seria isso positivo para os usuários?

Ainda que a atenção básica cuide dos demais agravos à saúde, parece-me que

há uma dificuldade de acesso pelos usuários dos CAPS, que relatam diversas

insatisfações. Como garantir esse acesso? Como garantir que eles se sintam tão bem

acolhidos quanto se sentem no serviço estratégico? Seria isso uma questão de

melhorar tecnologias leves, como o acolhimento e a escuta, ou seria esta uma

problemática que atinge a população em geral? No mais, como os profissionais dos

CAPS poderiam contribuir para a melhoria do acesso e do vínculo dos usuários aos

centros de saúde? Seria o dispositivo do apoio matricial necessário e suficiente para

esta função?

Estas são algumas das indagações que seguem me impulsionando na

realização desta pesquisa e que serão retomadas ao longo do texto.

17

2. CUIDADO COMPARTILHADO EM SAÚDE MENTAL: ATENÇÃO BÁSICA E

CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

2.1 A ATENÇÃO BÁSICA

Com a declaração de Alma Ata, no ano de 1978, ficou definido que a Atenção

Básica se configuraria como estratégia fundamental e porta de entrada do sistema de

saúde (5). Com o programa “Saúde para todos no ano 2000”, lançado pela

Organização Mundial de Saúde (OMS) nesta conferência, propõe-se uma

reorientação dos serviços de saúde, com ênfase nos cuidados primários, na

prevenção das doenças e promoção da saúde (6). Com a prerrogativa de resolução

de 80% dos problemas de saúde da população (7), a Atenção Básica teria a função

de integrar os serviços especializados de uma rede de saúde reorganizada para atuar

de forma hierarquizada e regionalizada.

Há atualmente estudos que provam a eficácia da atenção básica, pois quando

atua de forma adequada os indicadores de saúde melhoram e os custos do sistema

diminuem. Isso se evidencia ainda mais quando é entendida como porta de entrada

de todo o sistema, ao invés de um recurso destinado sobretudo à população carente

(5). Nas últimas três décadas a proposta de investimento na atenção básica para

melhoria dos sistemas de saúde foi proposta de praticamente todos os movimentos

de reforma sanitária existentes no ocidente (6).

No Brasil, a Estratégia Saúde da Família (ESF) vem se fortalecendo enquanto

proposta de efetivação das ações na atenção básica, sendo responsável pela

prevenção e promoção à saúde, bem como por ações curativas e de reabilitação, de

forma integrada, resolutiva, longitudinal e centrada nos pacientes de uma área

adscrita. Os espaços nos quais essas ações ocorrem são as Unidades de Estratégia

Saúde da Família e as casas das pessoas. A ESF é considerada eixo central pois é

através dela que se busca a reorganização da prática assistencial, com uma atenção

territorializada e centrada na família, possibilitando uma visão ampliada do processo

saúde/doença.

18

Ao olharmos para a história da saúde, constatamos que o hospital ocupou,

durante o século XX, papel central nos sistemas de saúde ocidentais (6). Inicialmente

era lugar de exclusão de pessoas que viviam à margem da sociedade e, com a

evolução dos estudos médicos, passou a ser local imprescindível para as práticas em

saúde. A salvação da alma dá lugar à cura do corpo e as doenças passam a ser

detectadas e reconhecidas através de microscópios, deixando de ser entendidas

através da organização da sociedade, como fora na era miasmática. As doenças

ficam, assim, fora do corpo dos indivíduos e de todo o contexto que os atravessa. A

proposta por um cuidado de base territorial visa entender o tema saúde/doença de

forma ampliada, levando em consideração atravessamentos como precariedade do

social, organização da sociedade, dinâmicas familiares e singularidades do desejo e

das formas de existência. A questão do território é levada em consideração também

por Starfield (5), que coloca como uma das cinco características de uma atenção

básica eficaz “a medida na qual os profissionais e instalações de saúde estavam

regulados de modo que estivessem geograficamente distribuídos aproximadamente

de acordo com o grau de necessidade”.

Há, desta forma, uma proposta por uma atenção à saúde que coloca em xeque

as práticas vigentes, uma vez que propõe uma mudança no paradigma do cuidado em

saúde. As mudanças propostas encontram variadas resistências, desde sua

implementação até os dias atuais. A eficácia da Atenção Básica depende de conceitos

como a universalidade, o acesso e a regionalização, bem como de sua articulação

com os serviços especializados.

O conceito de acesso, supracitado, é imprescindível para pensarmos uma

atenção básica eficaz, uma vez que esta se constitui enquanto uma das principais

portas de entrada no sistema de saúde. Além deste caráter, interroga-se, sobretudo,

a qualidade deste acesso, pois dele depende o uso oportuno e satisfatório das ofertas

de cuidado, de forma a alcançar os melhores resultados. A questão não está pautada

simplesmente na busca do usuário pela atenção básica, mas como experimenta as

ofertas de cuidado (8). Importa, assim, pensarmos de que forma o acesso se efetiva

na prática dos serviços e na vida das pessoas.

19

2.2 A ATENÇÃO ÀS PESSOAS EM SOFRIMENTO MENTAL E A REFORMA

PSIQUIÁTRICA

Ao pensarmos o acesso à atenção básica e nos propormos a investigar em que

medida este se dá da forma como é preconizado, não podemos deixar de considerar

as diversas dificuldades para que isso ocorra. Há uma parcela da população que se

constitui enquanto uma categoria excluída dos diversos dispositivos acessados pelos

cidadãos, dentre os quais se encontram os serviços de saúde. Trata-se das pessoas

em sofrimento mental.

Historicamente, a loucura ocupa um lugar de exclusão, uma “distância

sacramentada” da sociedade que fora instituída aos pacientes acometidos pela lepra.

A exclusão era inicialmente vista a partir de um prisma religioso, justificada pela

salvação dos doentes (9). Através do exílio e, posteriormente, do confinamento em

instituições asilares, o doente mental deveria buscar a expiação de seus pecados.

A loucura ascende à categoria de doença mental somente no início do século

passado, quando a ideologia psiquiátrica substitui a da teologia cristã, onde o louco

não mais é visto como pecador, mas como doente. A lógica da exclusão, todavia, se

mantem, e as pessoas em sofrimento mental, que antes se disseminavam entre

hospitais gerais, casas de detenção e de caridade, depósitos de mendigos e prisões

familiares, passam a ter um lugar só deles, o hospício (10). Nesta nova instituição

reina o saber médico, que se diz capaz de atingir a loucura e recuperá-la através de

um processo terapêutico que separa o louco das causas da loucura, inscritas na

sociedade e, sobretudo, na família (10).

Entretanto, nesta nova instituição também vigoram violações aos direitos

humanos. Prova disso é que no ano de 2014 a Comissão Nacional de Direitos

Humanos do Conselho Federal de Psicologia e do Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil encontrou, em inspeção nacional realizada nos hospitais

psiquiátricos brasileiros, condições subumanas em 28 unidades (11).

É somente a partir do movimento da Reforma Psiquiátrica que se começa a

questionar o status quo. A defesa dos direitos humanos se faz presente desde os

primórdios do movimento antimanicomial no Brasil e no mundo (12). A loucura é

20

historicamente construída e é somente através da dinâmica das comunidades e da

relação com o território que podemos desconstruí-la (13). Relação esta que prevê uma

mudança nos modos de cuidado, de forma a haver uma ressignificação do lugar do

“louco”, para que este possa circular livremente pelo território, acessando os

dispositivos que nele existem e não mais sendo excluído do convívio sociofamiliar.

Ainda hoje a superação dos modos asilares de cuidado se faz um desafio. O

movimento da luta antimanicomial, principal responsável pelos avanços em direção a

práticas territorializadas, está enfraquecido. Vemos atualmente um embate de forças

antagônicas no campo da saúde mental e a necessidade de revivermos este

movimento (14).

O movimento de questionamento das práticas psiquiátricas vigentes,

influenciado principalmente pela psiquiatria democrática italiana, por volta do final da

década de 70, levou à valorização do sujeito em sofrimento mental (15). Neste novo

paradigma psicossocial, que entende o sujeito enquanto protagonista de sua própria

história, aparece o conceito de integralidade da atenção, considerando a circulação

dos usuários nos serviços e na comunidade e a territorialização do cuidado como

modos de intervenção (15).

Conceito central para o SUS, a integralidade traduz a identificação do sujeito

em sua globalidade e, em saúde mental, norteia práticas antimanicomiais que

dependem em grande escala do modo de funcionamento dos serviços (15). A

demandas complexas há que corresponder diversas ofertas de forma integrada, com

as diferentes unidades funcionando como um sistema indissociável (15).

Propõe-se, assim, que as pessoas em sofrimento mental não mais ocupem um

lugar de exclusão, mas que possam habitar o território e, nele, exercer sua cidadania,

que possam ter suas demandas se saúde cuidadas de forma integral e territorializada.

Essa mudança de foco impactou no aumento dos tipos de aparelhos e arranjos de

cuidado em saúde mental, deixando a resposta monotemática da internação e

destinando-se, sobretudo, aos CAPS, além de outros serviços (16).

21

Substitutivos ao modelo asilar,

“Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) nas suas diferentes

modalidades são pontos de atenção estratégicos da RAPS1: serviços

de saúde de caráter aberto e comunitário constituídos por equipe

multiprofissional que atua sob a ótica interdisciplinar e realiza

prioritariamente atendimento às pessoas com sofrimento ou transtorno

mental, em sua área territorial, seja em situações de crise ou nos

processos de reabilitação psicossocial” (17).

Estes serviços tem papel estratégico, pois além das ações oferecidas ao

usuário, tem a prerrogativa de ordenar o cuidado, trabalhando em parceria com a

atenção básica, de forma a articular e ativar os recursos presentes no território e em

outras redes, o que deve ser feito através de matriciamento, que supõe apoio

presencial sistemático que garanta suporte técnico aos casos de saúde mental,

através de ações como discussão de casos, atendimento compartilhado e ações

territoriais que tenham como objetivo a corresponsabilização do cuidado (18).

2.3 SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO BÁSICA

A demanda de saúde mental na atenção básica é grande e variada (19).

Aproximadamente uma em cada quatro pessoas que buscam a atenção básica tem,

segundo a CID-10, algum transtorno mental. Se incluídos os chamados casos

subclínicos, nos quais o sofrimento mental está abaixo do limiar diagnóstico, a

proporção é de uma pessoa a cada duas que procuram a atenção básica (20). Há

ainda os transtornos mentais graves, que requerem cuidado contínuo, cuja proporção

é cerca de dois a cada cem adultos (20).

Nos anos 1970 e 1980 a OMS já reconhecia a magnitude dos problemas de

saúde mental e entendia que estes não poderiam ficar sob responsabilidade somente

da atenção especializada (21). No Brasil, a ideia de descentralização e de integração

1 A instituição da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) tem como finalidade “a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)”. (17)

22

dos serviços foi veiculada pelo movimento da reforma psiquiátrica brasileira, cujo

nascimento está atrelado ao movimento da reforma sanitária, o que fez com que

compartilhassem princípios e diretrizes. Houve, porém, um distanciamento entre estes

dois movimentos, com esforços mais ou menos dirigidos para que o sentido original,

principalmente no que concerne à rede integrada de serviços, fosse recuperado (22).

Por suas características específicas, a área da saúde mental desenvolveu

teorias, métodos e técnicas de compreensão e de abordagem do sujeito, sobretudo

dos fenômenos da ordem da alteridade, que raramente foram incorporados pelas

demais clínicas. Pelo contrário, houve uma estigmatização que incidiu sobre os

portadores de transtornos mentais que teve o reforço frequente de profissionais de

saúde de outras áreas disciplinares. Isso se evidencia pelo exílio do campo da saúde

mental nas instituições de saúde, exemplificado pela construção de hospitais e

ambulatórios psiquiátricos separados dos hospitais e ambulatórios gerais (22).

Observamos que os conceitos de integralidade da atenção e de territorialização

são princípios norteadores da Reforma Psiquiátrica que são compartilhados pela ESF,

além da ampliação do conceito de saúde-doença, central para as mudanças nas

práticas da atenção básica e nos cuidados em saúde mental (19). Com o início das

ESF as questões de proximidade e vínculo, inerentes ao conceito de território,

começaram a ser entendidas como potentes agenciadores para um melhor cuidado

em saúde (19). O vínculo e a territorialidade supostamente garantiriam a facilidade de

acesso dos usuários ao sistema, bem como potencializariam o cuidado em saúde

mental.

O território é entendido como conceito central nesse movimento, uma vez que

carrega a prerrogativa de que as pessoas em sofrimento mental habitem cada vez

mais a comunidade, saindo dos espaços de reclusão e de marginalização real e

simbólica. O território é “ espaço geográfico habitado, instituído de significados, afeto,

o espaço de laços sociais e de garantia de qualidade de vida, de manutenção

econômica e de exercício político dos cidadãos. ” (23).

Gama (19) sustenta a ideia de que o território não é algo exterior ao sujeito e

tampouco se resume à materialidade que nele se encontra. Outrossim, é sustentáculo

de identidade, carrega em si a história dos sujeitos, as relações que vivem e os afetos

que os atravessam. É campo de força no qual se inscrevem relações complexas entre

23

processos sociais e espaço material. Por seu caráter relacional, o território não é

estático, mas fluido, muda constantemente.

A ordem global busca impor ao mundo uma racionalidade única, mas que os

mundos respondem de diversas e variadas formas (23). Importa, então, conhecer

estes mundos, aceder às singularidades do território e dos signos que nele habitam.

O lugar que o sujeito ocupa na estrutura institucional, determinado por relações de

poder, determina sua condição de liberdade ou aprisionamento (25), ou, no nosso

caso, saúde ou doença.

Ao pensar o território a partir de suas relações de trocas, Saraceno (26), citando

Franco Basaglia, coloca o manicômio como lugar onde não há troca. Assim, é

necessário investir um espaço de sentido para que ele possa se tornar um lugar. Nos

pacientes em sofrimento mental é possível observar espaços empobrecidos e a

necessidade de um investimento de sentido, pois, caso contrário, eles permanecem

“desterrados em sua própria terra” (27).

A preconizada inserção da ESF no território proporcionaria, a priori, um

conhecimento mais aprofundado a respeito da população que utiliza o serviço de

saúde. Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) são peças fundamentais desta

equação, uma vez que habitam este território e assim, estão imbricados na mesma

trama que os usuários por eles acompanhados. Os ACS normalmente residem no

território há algum tempo, conhecendo as histórias das famílias que o compõem (19).

A inserção dos agentes comunitários de saúde seria capaz de ampliar a escuta e o

acolhimento nas Unidades de Estratégia Saúde da Família e contribuir no

fortalecimento do vínculo com os usuários (28). No mais, as unidades de ESF tem

uma vantagem sobre os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), serviço estratégico

em saúde mental, devido a sua maior inserção territorial (14).

A entrada dos ACS nas ofertas de cuidado da atenção básica tem caráter

revolucionário, pois com a inserção destes criou-se uma ponte entre os profissionais

de nível superior, supostos detentores dos saberes de saúde, e o saber comum dos

usuários, e, assim, contribuiu para que as diferentes classes sociais pudessem ter

uma maior aproximação (19). Sua presença no território e as informações que trazem

para as equipes proporcionam um novo modo de entender os casos.

24

Em estudo de Nunes et al, verificou-se que, dentre as categorias profissionais,

os ACS se destacaram pelo contato com casos de pessoas em sofrimento mental,

demonstrando conhecer essa problemática em sua realidade e alegando capacidade

de identificação dos mesmos, embora nem sempre tenham sido capazes de oferecer

soluções adequadas (22).

Embora a proximidade física entre profissionais e usuários seja considerado

potente e esteja pautada por política pública, há que se ressaltar que esta nem sempre

garante uma boa qualidade de vínculo do profissional, que precisa estabelecê-lo.

Alguns profissionais se sentem invadidos pelas demandas dos usuários, revelando

dificuldade em lidar com o excesso de demandas que lhe são colocadas,

frequentemente em horários e locais pessoais (19).

O estabelecimento de vínculo remete a boas práticas na área da saúde mental

e é um dos indicadores de mudança das práticas tradicionais, funcionando também

como um dos dispositivos capazes de combater a lógica do encaminhamento, que

pressupõe uma desresponsabilização dos casos (19).

Segundo Merhy,

“ Criar vínculos implica ter relações tão próximas e tão claras, que nos

sensibilizamos com todo o sofrimento daquele outro, sentindo-se

responsável pela vida e morte do paciente, possibilitando uma

intervenção nem burocrática e nem impessoal. ” (29)

Para além do cuidado familiar e dos transtornos mentais comuns, a atenção

básica tem importante papel no diagnóstico e acompanhamento dos transtornos

mentais graves. Estes são problemas que incapacitam ou diminuem a autonomia do

usuário, como as psicoses e neuroses graves (30), enquanto os transtornos mentais

comuns trazem incapacidades, mas não preenchem os critérios para diagnóstico de

ansiedade e depressão (31). Embora compartilhem dos mesmos princípios

norteadores, ideias e práticas em saúde mental na atenção básica muitas vezes não

condizem com o que é esperado por parte dos que formularam a Reforma Psiquiátrica

Brasileira, gerando questionamentos relativos às reais possibilidades de reinserção

social da pessoa em sofrimento mental (22).

25

Houve, historicamente, pouco investimento para que a atenção básica em

saúde acompanhasse os avanços da área da saúde mental (13), o que resulta na

dificuldade de acolhimento e acompanhamento deste nível do sistema, com prejuízo

à integralidade do cuidado. É na atenção básica que normalmente chegam inúmeras

queixas relativas aos transtornos mentais (32) e, apesar disto, as ações de saúde

mental na ESF ainda não conseguem se efetivar, revelando distanciamento entre os

discursos e as práticas cotidianas (33).

Os próprios profissionais da atenção básica reconhecem que faltam recursos

operacionais e teóricos na ESF para lidar com a saúde mental, fazendo com que esta

não se beneficie dos diversos avanços técnico-metodológicos que essa estratégia

vem alcançando (22).

Há um distanciamento entre o que é política pública e a prática dos serviços

(19). O modelo biomédico ainda se faz presente e dominante, fruto de uma formação

pautada pela queixa-conduta, que gera profissionais despreparados para entender o

universo da Saúde Mental. Na ESF as práticas de Saúde Mental são, todavia,

incipientes, e há um desconhecimento dos profissionais da atenção básica sobre a

Reforma Psiquiátrica (19). Grande parte dos médicos brasileiros, e frequentemente

em outros países, tem sua formação prática realizada em ambulatórios psiquiátricos,

nos quais os problemas de saúde encontrados diferem totalmente daqueles que

aparecerão, posteriormente, no dia-a-dia de um centro de saúde (19).

Esta formação pode acarretar uma série de consequências indesejadas, como

ações normatizadoras, hospitalocêntricas, discriminatórias, moralistas e repressivas.

Os profissionais podem ainda recorrer a infantilização, medicalização do sofrimento

psíquico e expectativas de comportamento agressivo. Para além do núcleo da saúde

mental, há as dificuldades em tratar os problemas físicos destes pacientes e o fato de

a própria comunidade não identificar a Atenção Básica como local para o cuidado de

problemas mentais (19). A discriminação existente por parte de alguns profissionais

pode ser observada pela recusa de tratamento físico, e não psíquico (22). Não

podemos também negligenciar a possibilidade de posturas moralistas e autoritárias

dos profissionais da atenção básica, uma vez que tem acesso quase irrestrito às casas

e vidas das pessoas.

26

Outro desafio a ser transposto é a organização dos serviços de atenção básica

em formato de pronto-atendimento, pautados pela queixa-conduta ao invés da

integralidade do cuidado e em favor da coletivização da vida (14). O modelo biomédico

de produção de cuidados, ainda vigente nas práticas e imaginários de profissionais,

pacientes e familiares, dificulta o cuidado integral, pois o aspecto biológico se

sobrepõe aos demais. Os serviços são fortemente marcados pela alienação e falta de

compromisso com a saúde, o que tem corroborado também para custos crescentes

ao Sistema (13).

Encontramos ainda a resistência dos profissionais em atendar essa clientela,

práticas clínicas biomédicas pautadas pela medicamentalização e transferências e

encaminhamentos em demasia (34). Muitas vezes os profissionais da atenção básica

não se sentem capazes de acolher a demanda de saúde mental dos usuários, e, por

sua vez, necessitam de acolhimento (35). A nível pessoal, o tema saúde-doença

suscita questões emocionais nos profissionais. Mecanismos de defesa contra

identificações e angústias relacionadas ao trabalho podem ser responsáveis por uma

conduta demasiado técnica, um diagnóstico precipitado, a medicalização de toda

queixa e a dificuldade do contato (19). É possível também que ocorra o oposto, ou

seja, que o profissional seja invadido pelo problema do usuário, de forma que não

consiga manter a distância necessária para ter discernimento da situação, fazendo

com que sua intervenção perca potência. Em virtude destes problemas, há equipes

que trabalham cindidas, uma parte cuidando do núcleo da saúde mental, e outra do

núcleo físico, e traz. Há, ainda, o fato de que muitas vezes os profissionais que mais

são capazes de se aproximar dos usuários em sofrimento são os ACS que seriam,

teoricamente, os menos capacitados para esta função (19).

O comprometimento dos serviços de atenção básica e especializada em saúde

mental é de suma importância, uma vez que os usuários, no geral, mostram pouca

autonomia e dificuldade em explicitar suas demandas aos serviços (34).

A falta de responsabilização dos profissionais em saúde mental a um cuidado

integral resulta, segundo relatos de usuários, em dificuldade de acesso destes às

Unidades Básicas de Saúde (34). Estes usuários trazem como problemática o acesso

negado, assistência precária e medicação como forma única de oferta terapêutica

(34).

27

2.4 CUIDADO COMPARTILHADO

Ao pensar na rede de cuidados em saúde mental e na prerrogativa da

integralidade das ações de saúde, vemos que os CAPS ocupam lugar de destaque e

grande responsabilidade (13). Segundo a PORTARIA/GM Nº 336 - DE 19 DE

FEVEREIRO DE 2002 (36), os CAPS devem responsabilizar-se pela organização da

demanda e da rede de cuidados em saúde mental no seu território, regular a porta de

entrada da rede assistencial e supervisionar e capacitar equipes de atenção básica.

A articulação entre os serviços de atenção básica e os de saúde mental é

proposição de políticas públicas que visam territorializar o cuidado. Esta relação é

considerada potente, uma vez que ambos os espaços compartilham princípios de

multiprofissionalidade, integralidade, vínculo e construção de redes (35).

A nova forma de cuidado em saúde mental, pautada por seu caráter

antimanicomial, reordenou a rede de forma que os casos considerados graves,

acompanhados pelos CAPS, começou a circular de forma mais incisiva no território,

gerando demandas para a Atenção Básica (19).

Em documentos oficiais do Ministério da Saúde (MS), está consolidada a

prerrogativa do trabalho em rede no cuidado ao transtorno mental. Ainda que o usuário

esteja em tratamento em serviço estratégico, a Atenção Básica deve acompanhá-lo

cuidando dos agravos clínicos, para além de suas demandas de sofrimento mental

(20). Faz-se necessária a corresponsabilização dos casos acompanhados, de forma

que tanto os serviços da atenção básica quanto os da atenção especializada se sintam

responsáveis pelos usuários que os utilizam.

Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) (37) são uma modalidade de

serviço que vem ao encontro da proposta da integralidade, com atribuições como

reforçar o trabalho em rede, fazendo conexões e ativando serviços necessários para

o cuidado integral. A portaria que os institui (37) expressa a recomendação de que

haja ao menos um profissional de saúde mental em cada Núcleo para realizar apoio

matricial. Assim, vemos uma mudança recente na atenção básica, onde a saúde

mental passa a se consolidar enquanto núcleo de intervenção (35).

28

Todavia, é frágil a articulação entre atenção básica e especializada, o que é

capaz de produzir dificuldades de comunicação e de efetivação de um trabalho em

rede. Dalla Vecchia e Martins, ao realizar análise de alguns estudos e experiências,

destacam a disputa entre generalistas da atenção básica e especialistas em saúde

mental como um entrave à corresponsabilização (28). Os autores apontam a

discussão de casos com profissionais do núcleo de saúde mental como recurso capaz

de superar posturas medicalizantes da atenção básica.

Bezerra e Dimenstein encontraram, em estudo realizado em Natal, o

desconhecimento do CAPS acerca das problemáticas específicas das ESF (14). Não

havia, neste município, interface alguma entre os serviços. Esta situação se vê ainda

mais agravada quando se trata de aparecimento de transtornos mentais e crises

psicóticas. O CAPS se mostra grande centralizador da demanda, com pouca inserção

no território, revelando que esta organização pouco contribui para uma resolubilidade

e integralidade aos cuidados em saúde mental.

Profissionais da saúde apontam que a incipiência das práticas de saúde mental

na atenção básica tem, entre suas causas, a inexistência de uma rede em saúde

mental e a falta de integração com serviços estratégicos que funcionem como

retaguarda e possibilitem a referência rápida em caso de necessidade. (22)

2.5 APOIO MATRICIAL

O apoio matricial se insere como possibilidade de melhoria das práticas em

saúde mental na Atenção Básica, propondo um olhar sobre os desafios encontrados

e a possibilidade de superação destes, através de construção coletiva. O apoio é visto

como eixo estruturante da relação entre CAPS e os serviços de atenção básica e é

um dos dispositivos que se constituem enquanto uma nova estratégia para se

trabalhar a saúde mental (18). Ainda que se reconheça sua potência e instituição

enquanto política pública, impasses e desafios são recorrentes, uma vez que sua

implantação é, todavia, inicial.

Os conceitos de apoio matricial e equipe de referência tiveram suas primeiras

aplicações no SUS de Campinas a partir de 1989 como um novo arranjo

29

organizacional, mas também uma nova metodologia para a gestão do trabalho em

saúde (38), de forma a aumentar as possibilidades de efetivação da clínica ampliada

e ter uma maior horizontalidade e diálogo dentro dos serviços interdisciplinares de

saúde (39). Propõe-se, assim, uma abertura das equipes de saúde à reflexão e

construção coletiva, a núcleos de saberes especializados que se somam em favor de

um campo comum de saberes e práticas (38), a fim de buscar, racionalmente, ações

e serviços com potência para modificar positivamente os problemas de saúde, dentro

das possibilidades de recursos disponíveis (40).

Funcionar a partir do apoio matricial significa uma mudança no funcionamento

e na organização dos serviços de saúde, de modo a promover um espaço de

comunicação ativa, no qual o conhecimento é compartilhado entre profissionais da

Atenção Básica e apoiadores, deslocando o poder dos especialistas. A relação se

sustenta em procedimentos dialogados, o que diminui a fragmentação inerente à

especialização crescente em quase todas as áreas de conhecimento e à autoridade

de certas especialidades (41).

Na lógica do apoio matricial, as equipes de referência realizam

acompanhamento contínuo do usuário, sendo responsáveis pela condução dos casos

e apoiadas pelas equipes matriciais, o que resultaria em uma corresponsabilização no

que concerne as intervenções julgadas necessárias (35). Esta corresponsabilização

pode se efetivar através de discussões de casos, intervenções realizadas em

conjunto, além de supervisão e capacitação (42).

O apoio matricial facilita o direcionamento do fluxo de usuários na rede de

saúde e a articulação entre os níveis de assistência (14). O matriciamento tem como

função facilitar o contato e o fluxo de informações entre os diversos níveis do sistema

e componentes da rede de cuidados de um município (19). Seria, então, um dispositivo

capaz de fazer conexões, articulando a rede de cuidados para que funcione de forma

integrada e potente, ao invés de isolada e fragmentada. Para isto, é fundamental a

existência de profissionais com uma visão complexa da saúde, para, assim, contribuir

com a ampliação do olhar da Atenção Básica (19). Pretende-se qualificar as equipes

de ESF para uma atenção ampliada, de forma a ver o sujeito enquanto totalidade e

não somente enquanto problemas de saúde. O apoio também objetiva distinguir os

casos que podem ser acolhidos pela Atenção Básica, os que podem ser resolvidos

30

através dos recursos existentes na comunidade e os que necessitam de cuidado

especializado em saúde mental (41).

Além dos saberes e práticas que embasam o trabalho, o apoio é um dispositivo

que utiliza as tecnologias relacionais em saúde, como acolhimento, vínculo e

corresponsabilização, com o objetivo de atingir a integralidade do cuidado. Estas

tecnologias são essenciais à atenção básica. O ACS, enquanto ponte entre os

usuários e os profissionais e, supostamente, o profissional com maior vínculo com a

comunidade, é indispensável para que o apoio se efetive e deve ser reconhecido como

elemento essencial da ESF. Todavia, muitas vezes estes profissionais se sentem

excluídos do processo de trabalho e engolidos pelas burocracias do sistema, o que

lhes causa sofrimento (41).

Há que se ressaltar que o apoio só é funcional e resolutivo quando seu papel é

claro e disseminado nas instituições (35). Caso contrário, o matriciamento pode

realizar o contrário do que se deseja, fortalecendo o poder do especialista e

respondendo às demandas em saúde com respostas unicamente medicamentosas.

O apoio é agenciamento, é construção, não é dado a priori, e o trabalho em saúde é

necessariamente complexo, uma vez que as demandas se inscrevem em inúmeras

dimensões da vida (35). É, também, construção coletiva que facilita a

corresponsabilização e a contínua avaliação do tratamento do usuário (13). É

necessário um trabalho de saúde mais solidário, capaz de ultrapassar eventuais

disputas de poder entre profissionais e mudar o foco destas relações entre pares para

o cuidado do usuário e suas necessidades de saúde. Valorizar o saber do outro, saber

escutá-lo e relacionar-se são imprescindíveis para e efetivação do cuidado

integralizado (14). “É necessário que o apoio matricial seja parte de um processo de

reinvenção de novas organizações e relações, e não uma ferramenta isolada num

contexto extremamente hierarquizado” (43).

Segundo o Ministério da Saúde (2010),

“Apoiar equipes é intervir com elas em processos de trabalho, não

transmitindo supostos saberes prontos, mas em uma relação de

solidariedade e cumplicidade com os agentes das práticas. Apoiar é

produzir analisadores sociais e modos de lidar com a emergência de

situações problemáticas das equipes para sair da culpa e da impotência

31

frente à complexidade dos desafios do cotidiano da saúde. Apoiar é

construir rodas para o exercício da análise, cujo efeito primeiro é a

ampliação da grupalidade entre aqueles que estão em situação de

trabalho” (43).

A efetiva assistência e apoio do CAPS à atenção básica resolveriam impasses

encontrados atualmente nesse nível de atenção à saúde. Os próprios profissionais da

Atenção Básica valorizam esta aproximação com os CAPS, pois os entendem como

apoiadores para os casos que são considerados graves, e se sentem desamparados

quando o apoio não acontece (19).

O apoio matricial em saúde mental se coloca como um dispositivo capaz de

fornecer suporte à atenção básica, amparando os profissionais e fornecendo-lhes

retaguarda especializada às ações de cuidado com pacientes em sofrimento mental.

Sua efetivação se traduz em uma atenção básica mais capacitada para acolher os

usuários e em dar um encaminhamento satisfatório a suas queixas de saúde, sejam

elas do núcleo da saúde mental ou não. Para se atingir uma atenção integral faz-se

necessária uma corresponsabilização dos casos nos quais a atenção especializada

se faz necessária, ou seja, é imprescindível que estes dois níveis do sistema tenham

diálogo e compartilhem informações a respeito dos usuários acompanhados. Apesar

das políticas antimanicomiais e dos avanças obtidos com as diversas iniciativas de

desinstitucionalização e efetivação da reforma psiquiátrica, os usuários em sofrimento

mental mostram-se mais alheios a certos serviços quando comparado com o restante

da população.

A mediação dos profissionais dos CAPS pode facilitar o acesso dos usuários

com transtornos mentais graves à atenção básica. Estes, inseridos em uma cultura

medicalizante, buscam sobretudo remédios e consultas médicas, apesar da atenção

básica fornecer práticas alternativas integrativas e complementares, como Lian Gong,

grupos de caminhada ou artesanato. Esta demanda dos usuários vai influenciar

diretamente em suas percepções sobre a qualidade do acesso na atenção básica.

Este trabalho visa, assim, identificar como se dá o acesso por estes usuários à

atenção básica em saúde e em que medida eles têm a percepção de um trabalho em

rede capaz de cuidar de suas demandas de saúde de forma integral. Quais são as

ofertas de cuidado disponíveis e se essas são, de fato, possíveis de serem utilizadas

32

e de resolver as demandas dos usuários, são alguns dos questionamentos que

permeiam esta pesquisa. Através dos grupos focais, buscou-se ouvir as percepções

dos usuários dos serviços de saúde a respeito da qualidade do acesso nos centros de

saúde, das dificuldades e facilidades para que este se efetive, bem como do papel

dos CAPS em um suposto trabalho em rede, através sobretudo do apoio matricial.

33

3. METODOLOGIA

3.1 OBJETIVOS

Objetivo Geral

Identificar e analisar a percepção dos usuários de Centros de Atenção

Psicossocial de Campinas sobre acesso à Atenção Básica à Saúde e

acompanhamento compartilhado.

Objetivos Específicos

1. Identificar que ofertas de cuidado da Atenção Básica os usuários dos Centros de

Atenção Psicossocial acessam;

2. Analisar como se dá o acesso e o uso das ofertas de cuidado da Atenção Básica,

na perspectiva dos usuários;

3. Investigar a existência de cuidado compartilhado entre CAPS e Atenção Básica,

a partir da perspectiva do usuário do Centro de Atenção Psicossocial.

3.2 ABORDAGEM QUALITATIVA

Para responder aos objetivos desta pesquisa utilizei uma abordagem

qualitativa. O tema pesquisado faz parte de um grupo de indagações complexas em

saúde coletiva, o que faz com que os objetos de pesquisa sejam pouco definidos, de

forma que não são passíveis de medição quantitativa ou estatística. Pelo contrário,

34

são objetos complexos com grande número de variáveis que se relacionam com temas

das ciências naturais, sociais e humanas (44).

Ao pensarmos no método cartesiano de investigação, nos aproximamos de

uma tradição em pesquisa que supõe que um conjunto de técnicas indica o modo

correto para atingir um objetivo, poupando-nos dos erros (45). Entretanto, a pesquisa

qualitativa não busca uma verdade inquestionável, mas se configura enquanto um

conjunto de práticas interpretativas (46), ou seja, busca desvelar o sentido que o

sujeito atribui aos fenômenos pesquisados. Como o conhecimento é produzido

através da relação entre pesquisador e pesquisado, a pesquisa qualitativa é dotada

de singularidade, afastando-se das investigações cartesianas, que supõem que as

mesmas técnicas proporcionariam o mesmo resultado. Isto, todavia, não é um erro,

mas a própria natureza da metodologia qualitativa (47).

A pesquisa qualitativa não se supõe neutra, uma vez que o objeto é também

modificado pelo pesquisador, seja por suas ações ou por seus preconceitos, que são,

segundo Gadamer, “muito mais que seus juízos, a realidade histórica de seu ser.”

(45). Além disso, a pesquisa qualitativa é definida por seu caráter descritivo, por ter

como fonte de dados o ambiente natural, se voltar muito mais para o entendimento do

processo do que para os resultados propriamente ditos, por utilizar a indução e ter a

preocupação com o significado (47).

Ainda sobre o distanciamento das formas tradicionais de pesquisa e o saber

dos sujeitos envolvidos nos fenômenos estudados, há o rompimento com o binarismo

saber e não saber, e o fato de que esta configuração favorece o acesso do

pesquisador a áreas que não seriam acessadas pelo pesquisador tradicional, pois

facilita o diálogo e a profundidade do conhecimento (19).

Esta pesquisa foi buscar seus dados junto aos usuários pois, ao consultar

bases de dados científicas, é nítida a esmagadora maioria de estudos cujos

participantes são profissionais da saúde, em detrimento dos usuários. Parece-me

bastante paradoxal e antagônico termos o controle social enquanto diretriz do SUS e

a escassez de pesquisas que versam sobre a população. É como se,

academicamente, não colocássemos em prática a prerrogativa da participação

popular. Importa ressaltar que, embora minoria, existem atualmente estudos que

valorizam a percepção dos usuários (48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60,

35

61, 62, 63). Esta pesquisa filia-se a este grupo de estudos, que busca uma validação

das experiências, valorizando a percepção do usuário enquanto saber popular

imprescindível no entendimento e avaliação das práticas em saúde.

A partir desta reflexão e da exclusão histórica dos usuários em sofrimento

mental, optamos por garantir que estes tenham suas falas garantidas e legitimadas

nesta pesquisa, uma vez que supostamente são os mais interessados na eficácia do

bom funcionamento das políticas públicas a eles destinadas. Assim, foram realizados

dois grupos focais com usuários dos dois CAPS III do distrito sanitário sudoeste da

cidade de Campinas, “David Capistrano da Costa Filho” e “Novo Tempo”, conforme

será explicitado mais à frente.

3.3 HERMENÊUTICA

Esta pesquisa olha para seu objeto utilizando as lentes da abordagem

hermenêutica. Esta é entendida como uma postura interpretativa, uma atitude

filosófica na busca de compreensão de um texto, ou, de forma mais geral, de um

fenômeno humano (47). Gadamer (45) coloca a hermenêutica não como um método,

mas como atitude filosófica que sustenta os processos cognitivos de forma geral.

A possibilidade de uma hermenêutica surge a partir do século XIX, com Freud,

Marx e Nietzsche, que veem a interpretação como uma tarefa inacabada e infinita.

Não há uma coisa pura a ser descoberta ou revelada, mas há a interpretação, que é

sempre interpretação de uma interpretação, portanto sempre infinita, e referente a

quem interpreta (47).

Gadamer propõe uma postura que devemos assumir perante o texto e a

alteridade que este nos provoca. Para tanto, é necessário reconhecer, antes de tudo,

nossos preconceitos. O autor resgata o aspecto positivo deste termo, entendendo-o

não como um falso juízo, mas como a realidade histórica do sujeito. Para a

hermenêutica de Gadamer este tema é central e inexorável, constituindo-se enquanto

ponto de partida para qualquer interpretação. Para ele, nossos pensamentos e ações

baseiam-se em nossos preconceitos, sobre os quais não tecemos reflexões prévias.

36

Como então nos abriríamos à alteridade do texto se nossos pensamentos estão

impregnados de preconceitos? Para Gadamer é necessário suspender a validez

destes, transformando-os em questionamentos, interrogando-nos continuamente.

Assim, abrir-nos à compreensão de um texto não pressupõe uma neutralidade aos

signos que serão descobertos, mas um reconhecimento de nossas opiniões e

conceitos prévios. Diferenciando-se da corrente de pensamento característica do

período iluminista, que defendia a ideia de que somente a razão poderia aceder à

verdade, a hermenêutica supõe que a compreensão jamais chegará a uma verdade

absoluta. Outrossim, compreender implica lidar com nossas expectativas de sentido e

confrontá-las com os dados à medida que vamos nos aprofundando em seu sentido,

num movimento de constante revisão, a fim de avaliar se nossos preconceitos serão

adequados aos dados.

Desta forma, os preconceitos são entendidos como prejudiciais somente

quando não é possível acessá-los, quando permitimos que operem sem serem

reconhecidos. Quando colocados sob análise, podemos compreender a partir dos

determinantes históricos que influenciam a pesquisa. Ao reconhecer nossos

preconceitos, é possível discernir o que nos pertence enquanto pesquisador, e o que

nos é alheio, para assim, compreender o que se coloca como diverso, como

alteridade.

A hermenêutica entende a aplicação do conhecimento como inerente à

compreensão, pois consiste em relacionar algo geral e prévio a uma situação

particular. Ou seja, é necessário relacionar o texto à situação concreta e atual de quem

pretende compreendê-lo. O pesquisador formula uma questão de pesquisa ao ser

interpelado por questões não compreendidas a respeito de uma determinada situação

ou realidade. Estas dizem respeito à sua singularidade, à sua história e seus

interesses, fazendo com que o pesquisador olhe para seu passado. Este encontro

entre passado e presente é chamado por Gadamer de “história efeitual”, pois marca o

momento em que a história faz efeito no pesquisador, permitindo-lhe formular seu

problema de pesquisa. Desta forma, são somente as histórias cujos efeitos se fazem

presentes no pesquisador que se transformarão em objetos de pesquisa. A aplicação

do conhecimento, assim, é intrínseca ao início da pesquisa, pois é só através dela que

o problema a ser respondido se faz possível (47).

37

3.4 O CAMPO DA PESQUISA

O município de Campinas, no qual foram colhidos os dados desta pesquisa, é

pioneiro em diversas ações em saúde. Desde 1976 iniciou a implantação da Atenção

Básica como modelo de organização de serviços públicos e, através de parcerias com

universidades (Unicamp e PUCC), teve os serviços de saúde mental oferecidos na

rede de atenção básica, contando com a atuação de psicólogos, assistentes sociais e

psiquiatras (64). Dois anos depois, Campinas já contava com 16 postos de saúde e

um ambulatório municipal de saúde mental (64).

Em 1990 o serviço de saúde “Dr. Cândido Ferreira” inicia uma parceria com a

prefeitura de Campinas, de forma a integrar a rede de saúde e a cogerir as ações em

saúde mental. Tem, então, início uma discussão a respeito da inserção dos CAPS

nesta rede, culminando com a implantação dos primeiros serviços em abril e maio de

1993 como equipamento intermediário (64).

O pioneirismo do município é reconhecido também por ter logrado implantar

uma razoável rede de saúde mental substitutiva ao modelo hospitalocêntrico, com

uma suposta articulação com a atenção básica e propostas de ações intersetoriais

(19).

Sobre a assistência em saúde mental, e, mais especificamente, sobre os

CAPS, o município de Campinas entende que

“(...) são unidades de referência secundária (intermediárias) de saúde

mental, com equipe multiprofissional e tem como missão tratar de forma

intensiva os portadores de transtorno mental grave com idade superior

a 14 anos, na sua comunidade, junto às suas famílias, evitando a

internação psiquiátrica integral e promovendo a reabilitação

psicossocial dos cronicamente comprometidos. Busca a construção de

discurso e prática contra-hegemônicos, que relativizem a loucura, em

que o usuário se reconheça como sujeito com direitos e deveres,

construindo sua cidadania, inserindo-se na comunidade, usando seu

potencial produtivo, participando de suas atividades, seja

informalmente, seja através de associações de amigos de bairro, de

usuários de serviço de saúde ou conselhos locais de saúde” (65).

38

Hoje a cidade de Campinas gere plenamente seu sistema de saúde e tem cinco

Distritos Sanitários, responsáveis por ações de planejamento e gestão em saúde de

regiões com aproximadamente 200.000 habitantes, envolvendo, cada um em sua área

de abrangência, atenção básica e especializada, pronto-atendimento e vigilância

sanitária (66). Desde 2001 a rede de Atenção Básica funciona segundo as diretrizes

da Estratégia Saúde da Família, porém num modelo ampliado em relação ao proposto

pelo Ministério da Saúde, em decorrência de uma saída criativa para incluir o recurso

humano já existente na rede de saúde para atuar segundo princípios de

territorialização, vínculo e equipes de referência (67), incorporando o referencial

teórico do Apoio Paideia (38, 68).

Aproximadamente um terço das equipes de SF de Campinas possui profissionais

da saúde mental. A cidade conta com 63 centros de saúde e seis CAPS III, além de

CAPS AD e infantil, que se organizam segundo a lógica de equipes de referência e

apoio matricial, isto é, o núcleo da saúde mental dos CAPS oferece, por meio do apoio

matricial, retaguarda especializada às equipes de Saúde da Família. É diretriz da

Secretaria Municipal de Saúde de Campinas o fortalecimento da Atenção Básica e

maior integração com a Saúde Mental (66).

O município de Campinas possui especificidades que dificilmente são

encontradas no cenário nacional, como a existência de profissionais da área da saúde

mental nas equipes de Atenção Básica, a parceria com importantes Universidades e

uma rede de atenção psicossocial bastante organizada e satisfatória. Apesar de

singulares, as ações de saúde do município têm influenciado políticas públicas, como

a criação dos NASF, cujo trabalho é sustentado pelos conceitos de apoio matricial e

equipe de referência, que tiveram suas primeiras aplicações no SUS de Campinas, a

partir de 1989.

A região Sudoeste, campo desta pesquisa, juntamente com a região Sul,

caracteriza-se por apresentar as piores condições socioeconômicas e de

infraestrutura de Campinas. Estas regiões têm maior densidade populacional, maior

concentração de crianças e jovens e menor escolaridade da população, além de

concentrarem, junto com o distrito Noroeste, as maiores favelas da cidade (68).

A violência exacerbada é também uma característica do Distrito Sudoeste, que

apresenta as maiores proporções de mortes por causas externas, atingindo 25%. Ou

39

seja, um em cada quatro óbitos é causado por violência (70). Embora haja uma boa

distribuição de centros de saúde no município, mesmo nas áreas com piores

condições de vida, este cenário marcado pela violência pode impactar na oferta dos

serviços de saúde, pois a localização de um CS em áreas mais vulneráveis e violentas

pode significar uma dificuldade maior na manutenção do quadro de funcionários. Uma

alta rotatividade de profissionais poderia, então, dificultar o estabelecimento de

vínculos, tão caro à ESF.

Apesar da acentuada vulnerabilidade do distrito, importa ressaltar o histórico

de militância e implicação deste, que passou por uma grande transformação desde a

década passada, saindo do lugar de “terra arrasada”, onde a Universidade não queria

estar e os trabalhadores não se fixavam, para ocupar um lugar de prestígio entre as

Universidades de Campinas, lugar de militância e formação (71).

Este processo teve início em 2001, quando o Dr. Gastão Wagner de Souza

Campos assumiu a secretaria de saúde de Campinas, cujo prefeito era Antônio da

Costa Santos, do Partido dos Trabalhadores (PT). Foi então que o Modelo em Defesa

da Vida, que nasceu na década de 80 a partir de atividades acadêmicas de um grupo

do Departamento de Medicina Preventiva e Social, da Faculdade de Ciências Médicas

da Unicamp, e de trabalhadores da saúde, influenciou o modelo tecno-assistencial

adotado na cidade, chamado de Programa Paideia (72). Este programa foi alvo de

divergências, pois por um lado havia trabalhadores e gestores que militaram pela

causa, enquanto outros se mostravam alheios e desinteressados ao processo. O

Distrito Sudoeste se alinhou ao primeiro grupo de forma significativa (71).

Além da conjuntura política de Campinas, houve, na mesma época, o início da

parceria do Distrito com a Unicamp, facilitada pelo fato dos coordenadores deste

Distrito, o Secretário e a Diretora de Saúde serem docentes. A região sudoeste

começa, assim, a ser um lugar de formação, de educação permanente. Havia um

“devir” docente entre muitos trabalhadores e gestores, que apostavam na força do

coletivo.

Anteriormente as instituições de ensino não assumiam a região pela distância

e adversidades do território. A PUCCAMP já havia estabelecido a região Noroeste

enquanto campo de estágio. Houve, então, uma aposta no Distrito Sudoeste. Era o

início do desafio de formar profissionais mais humanos, éticos e solidários, mais

40

sensíveis e responsáveis pelo sistema de saúde (71). A partir de 2002 o Distrito

Sudoeste começa a receber alunos das Universidades, sobretudo do curso de

Medicina do DMPS/FCM/UNICAMP, e os trabalhadores e gestores eram convidados

a ministrar aulas sobre o território na Unicamp.

Fora então uma confluência entre a vontade política do gestor municipal em

potencializar essas parcerias, aliada a dimensão docente dos gestores municipal,

distrital e local, que fez com o Dr. Gastão priorizasse o Distrito Sudoeste, que até

então não tinha alunos do ensino superior, para a inserção dos estagiários da Unicamp

(71).

Neste contexto inserem-se os dois CAPS III pertencentes ao Distrito Sanitário

Sudoeste, nos quais a pesquisa foi realizada: o Centro de Atenção Psicossocial

(CAPS) “David Capistrano da Costa Filho” e o CAPS “Novo Tempo”. Devido a

impossibilidade de abrangência de todos os CAPS da cidade diante das limitações de

tempo que o mestrado profissional carrega, foi feita a opção de ter como campo o

distrito Sudoeste, pois assim teríamos acesso a dois serviços de referência em saúde

mental, caracterizados por um histórico de militância, implicação e formação, apesar

das inúmeras vulnerabilidades características do território.

Estes CAPS tem a prerrogativa de oferecer retaguarda especializada aos 12

centros de saúde existentes neste distrito. Ambos contam com os serviços de

atendimento psicossocial e serviço residencial terapêutico (SRT). A configuração das

equipes, todavia, difere. O CAPS “David Capistrano da Costa Filho” conta com um

gerente de serviços em saúde, seis enfermeiros, cinco terapeutas ocupacionais, dois

médicos clínicos, um médico psiquiatra, cinco psicólogos clínicos, um assistente

social, dezenove técnicos de enfermagem, um auxiliar de enfermagem, dois auxiliares

técnicos em laboratório, dois assistentes administrativos, onze cuidadores em saúde

e seis vigias. Destes funcionários, cinco cuidadores e três técnicos de enfermagem

trabalham no SRT. Já o CAPS “Novo Tempo” conta com um gerente de serviços de

saúde, três médicos residentes, um farmacêutico, seis enfermeiros, seis terapeutas

ocupacionais, dois médicos psiquiatras, sete psicólogos clínicos, três agentes de

higiene e segurança, dezenove técnicos de enfermagem, um auxiliar de enfermagem,

um auxiliar técnico em laboratório, dois assistentes administrativo, um faxineiro, cinco

cuidadores em saúde e três vigias. Os SRT vinculados a este CAPS comportam três

41

cuidadores e três agentes de higiene, além de haver rodízio dos demais profissionais

para o cuidado aos usuários que vivem nestes SRT (73, 74).

3.5 A COLETA DE DADOS: O GRUPO FOCAL

A escolha pelos grupos focais como instrumento para a coleta de dados se deu

pois, através deles, é possível acessar as experiências vivenciadas por cada um, bem

como suas opiniões, conhecimentos, representações, atitudes e valores, durante um

processo de interação em que as falas de alguns suscitam a opinião de outros,

sobretudo de forma a concordar ou discordar do que fora dito. A técnica do grupo focal

permite atingir um grande número de pessoas em um curto espaço de tempo, com um

certo aprofundamento sobre o tema (75). Além de proporcionar o conhecimento do

que pensam os participantes, é possível apreender suas motivações, proporcionando

a percepção ao pesquisador de discordâncias e resoluções de problemas por parte

dos grupos (76). Esta configuração se assemelha à vida real e permite, assim,

apreender a dinâmica social e analisar como se dão as relações em face do tema

proposto (75).

O grupo focal é uma técnica que supõe certa homogeneidade entre os

participantes dos encontros grupais nos quais serão coletados os dados, a fim de

facilitar a interação e proporcionar resultados mais ricos e aprofundados (77). A

composição dos grupos teve como fator de homogeneidade o local do

acompanhamento especializado em saúde mental, ou seja, cada grupo continha

participantes que frequentavam o mesmo CAPS. Houve, assim, uma identidade de

cada serviço, atrelada ao fator territorialidade. Havia o compartilhamento de ofertas

de cuidado acessadas nos CAPS, centros de saúde ou outros pontos da rede, o que

permitiu que a discussão se aprofundasse sobre certos assuntos de interesse.

Após a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências

Médicas (FCM) da Unicamp (anexo I) e pela Secretaria Municipal de Saúde de

Campinas (anexo II), o trabalho de campo teve início. Apresentamos a pesquisa nos

42

dois CAPS, locais nos quais realizamos os grupos, de forma a favorecer o acesso e

garantir a participação.

Foram selecionados usuários que realizam acompanhamento concomitante na

Atenção Básica há pelo menos seis meses, e que foram indicados pelos profissionais

dos CAPS. O acompanhamento terapêutico na Atenção Básica poderia se tratar de

atividades de prevenção, promoção à saúde, assistência e/ou reabilitação para

questões relativas à saúde mental ou à saúde em geral. Foi também critério de

inclusão que o usuário aceitasse participar da pesquisa. Foram excluídos os

participantes que não preenchiam os requisitos expostos acima e os que se

recusassem a participar da pesquisa após conhecimento da mesma.

Realizamos dois grupos focais, sendo que o primeiro aconteceu no dia 20 de

junho de 2016 pela manhã, no CAPS “David Capistrano da Costa Filho”, com oito

participantes e duração de 73 minutos, gerando 25 páginas de transcrição. O segundo

grupo, realizado no mesmo dia no período da tarde, no CAPS “Novo Tempo”, contou

com sete participantes e teve duração de 69 minutos, gerando 28 páginas de

transcrição. As transcrições preservaram a veracidade e originalidade das falas, além

do sigilo da identificação dos participantes. Avaliamos que a unicidade do contato com

os participantes deste estudo e o fato dos grupos focais terem sido realizados no

mesmo dia podem ser vistos como limitações da pesquisa. Todavia, essa

configuração se deu em virtude da disponibilidade das equipes dos CAPS e da

logística da pesquisadora. No mais, não foi feita uma restituição ao grupo de forma a

validar a narrativa construída, o que configura outra limitação, mas os dados obtidos

através desta pesquisa serão devolvidos aos usuários e aos serviços participantes.

Conforme preconizado pela literatura, os participantes formaram um círculo e

receberam um crachá com um número, de forma a identificá-los no momento das

transcrições e de preservar a confidencialidade de sua identidade (75). Foi oferecido

um lanche, no intuito de criar um ambiente agradável e garantir uma maior

participação, evitando possíveis saídas do processo de discussão.

É fundamental para a técnica do grupo focal o papel do moderador, devendo

este conduzir as discussões de forma permissiva e encorajadora, apontando

eventuais argumentos discordantes que o grupo tente ignorar. Deve, ainda, devolver

ao grupo, resumidamente, as ideias básicas resultantes das discussões (75), sem

43

todavia fechar alguma questão ou emitir juízo de valor. Como a unidade de análise é

o próprio grupo, todas as ideias são a ele atribuídas, apesar de possíveis

discordâncias de alguns membros (78). Os grupos focais desta pesquisa foram

conduzidos por um único moderador, a fim de garantir certa homogeneidade na

condução, que foi a própria pesquisadora. Embora a literatura aponte para a

coordenação dos grupos por pessoas não envolvidas com a pesquisa, a fim de evitar

interferências, pesquisas recentes (71, 79, 80, 81) têm mostrado que o pesquisador

tem maior potência para focar as questões de interesse da pesquisa, avaliando a

pertinência de suas concepções e construções junto aos participantes e diferenciando

temas importantes dos interessantes, dificuldade apontada por Morgan (82). Houve

também uma anotadora, a fim de auxiliar no processo de transcrição das gravações,

anotando as falas dos participantes. Esta não interferiu, em momento algum, na

condução das discussões, exceto ao final destas, quando lhe foi questionado, pela

moderadora, se havia algo a acrescentar ou algum tópico que julgava não ter sido

suficientemente debatido.

Para a condução dos grupos foi utilizado um roteiro (anexo III) que indicava os

tópicos a serem abordados, de forma que estes contemplassem os objetivos da

pesquisa. Foi entregue a cada participante um termo de consentimento livre e

esclarecido (TCLE, anexo IV), o qual continha os objetivos da pesquisa e explicitava

de que forma ocorreria o grupo focal, a garantia de confidencialidade dos dados

pessoais dos participantes na divulgação dos resultados e a possibilidade de retirar

sua participação da pesquisa a qualquer momento e sem nenhum ônus. O termo foi

lido pela moderadora, e, após terem suas dúvidas esclarecidas, os sujeitos assinaram-

no. Foi entregue uma cópia aos participantes e esclarecido que poderiam entrar em

contato com a pesquisadora ou com a universidade a qualquer momento, a fim de

sanar dúvidas ou manifestar descontentamento, e uma cópia ficou em posse da

pesquisadora. Assim como fora explicitado no TCLE, os grupos focais foram gravados

em áudio.

O tempo médio dos grupos desta pesquisa foi menor em relação ao indicado

pela literatura, que é entre uma hora e meia e duas horas, o que se deve à dificuldade

dos usuários em sofrimento mental em suportar um longo processo de discussão em

grupo. Era difícil também que mantivessem o foco, pois facilmente se dispersavam,

44

sobretudo no primeiro grupo, e frequentemente respondiam os questionamentos à

moderadora, ao invés de discutir entre eles. Em ambos os grupos houve um usuário

que concordou em participar, mas ausentou-se ao início das discussões. Apesar

destas ausências, os grupos tiveram um número de participantes condizente com o

recomendado pela literatura, que é de seis a doze pessoas (75). Também como

apontado na literatura, houve uma dificuldade na convocação dos sujeitos (82), uma

vez que foram convidados em torno de 15 sujeitos para os grupos e a adesão foi de

praticamente metade. Entretanto, isso não prejudicou o estudo.

3.6 ANÁLISE DOS DADOS: A CONSTRUÇÃO DE NARRATIVAS

O material produzido foi trabalhado por meio da construção de narrativas, tal

como propõe Ricoeur (83). Para o autor, as narrativas são construções de histórias

sobre o agir humano, isto é, a composição de um enredo que dá sentido e coerência

aos acontecimentos. Se uma ação pode ser narrada é porque ela já está articulada

em signos e normas, ou seja, já está inserida no mundo pelo agir social e está

simbolicamente mediatizada. “O que é ressignificado pela narrativa é o que já foi pré-

significado no nível do agir humano” (83). Assim, contar uma história, ou escrever uma

narrativa, significa pré-compreender o que ocorre com o agir humano.

Ricoeur, na busca por uma dialética entre a teoria hermenêutica, que leva em

consideração a historicidade dos sujeitos e dos fatos, e a teoria crítica, propõe a

hermenêutica crítica. O texto traz consigo o caráter fundamental da historicidade

humana e, ao mesmo tempo, a fixação do discurso na escrita produz o distanciamento

necessário à compreensão (71). Através da escrita, há uma distância em relação ao

escritor e ao leitor, tornando o texto relativamente autônomo à intenção do primeiro,

possibilitando releituras conforme diferentes contextos socioculturais. Nisso reside a

instância crítica da interpretação.

Para Onocko Campos e Furtado (84), a narrativa é um recurso interpretativo

potente para processar o material produzido em pesquisas, já que se trata de uma

abordagem construtiva, que não busca somente compreender, mas também

45

transformar, propor alternativas, buscar soluções. Retomando a interpretação em

Freud (85) a autora aponta que a interpretação deve ser composta por dois

movimentos: a análise e a construção. A análise seria o movimento da fragmentação,

o trabalho de esmiuçar os fenômenos e as informações para poder compreendê-los.

E a construção seria a dimensão necessária para alinhavar os fragmentos, organizar

o material para elaborar linhas de sentido que possam contribuir como saídas para os

impasses encontrados. Este processo construtivo caracteriza a construção narrativa

e corresponde ao agenciamento dos fatos.

A transposição do campo prático por meio da narrativa evidencia sua função

de ligação, de construção. Compor uma narrativa é, para Ricoeur, operar um

agenciamento dos fatos, encadear os acontecimentos com certa coerência e com uma

causalidade possível, “(...) é fazer surgir o inteligível do acidental, o universal do

singular, o necessário ou verossímil do episódico” (83). Assim, além da função de

ruptura que pressupõe uma análise, a narrativa opera construções, o que é

fundamental nas pesquisas em saúde e, sobretudo, nas vinculadas à área de políticas,

planejamento e gestão, da qual esta pesquisa faz parte. Onocko Campos (86) destaca

o interesse desta área em contribuir para a melhoria dos serviços de saúde prestados

à população brasileira. No mais, por ter como sujeitos da pesquisa pacientes em

sofrimento mental em acompanhamento no CAPS, esta pesquisa se coloca enquanto

ferramenta de combate à discriminação, pois ao narrar suas histórias, promove sua

inclusão. Como esta pesquisa se alinha às ideias de Ricouer e este, por sua vez,

entende que a narrativa só tem sentido se logra voltar ao mundo da ação, os

resultados aqui encontrados serão restituídos aos serviços e sujeitos que nos

forneceram os dados da pesquisa.

O tempo é outro conceito importante para as construções narrativas, pois estas

revelam, necessariamente, o caráter temporal da experiência humana. Para Ricouer,

o tempo é representação, é experiência temporal, pois podemos pensar (e narrar)

somente a partir de nossas experiências passadas ou nossas expectativas futuras. O

tempo da narrativa não deve ser necessariamente cronológico, pois a experiência

psicológica do tempo não corresponde a sua representação linear. Ao invés da

cronologia, a lógica, pautada pela experiência humana. A experiência psicológica e o

consequente encadeamento lógico dos fatos representam a temporalidade da ação.

46

Não buscamos uma “coleta de dados”, no sentido de que estes não estão

prontos a serem “extraídos”, mas se produzem na relação (86). Toda história é

contada a alguém, que deve se dispor a acolher e registrar a narrativa de alguma

forma. Quando nos colocamos numa posição de disponibilidade, uma escuta sensível

é possível, “que nos capacite a construir narrativas agenciadoras daquele fluxo de

ideias, descrições de acontecimentos e afetos apresentados durante a entrevista”

(86). Partimos do pressuposto de que não há um sentido latente a ser descoberto nas

narrativas, mas um texto a vir ao mundo. Ao invés da dúvida, o convite à palavra.

Ricouer (83) recomenda colocar um mundo na frente do texto, e, segundo Onocko

Campos (86), este mundo é trazido pelas perguntas das pesquisas. Desta forma, o

material é incessantemente interrogado para que nele possamos identificar as

respostas aos nossos questionamentos. Importa, para a hermenêutica, o tipo de

mundo que o texto traz, o que lhe possibilita uma crítica do real. Assim, recuperamos

a perspectiva da práxis humana, uma vez que é este mundo que o texto abre.

Foram, portanto, construídas narrativas a partir da transcrição dos grupos

focais. Estas narrativas permitiram fazer emergir um sentido para o emaranhado das

discussões dos grupos, a partir das quais foi feito um estudo por eixos temáticos com

os principais conceitos estudados neste trabalho, permitindo destacar as diferentes

percepções. As narrativas trazem o discurso do grupo organizado pela pesquisadora.

Não seguem uma linearidade, mas a lógica das experiências psicológicas trazidas

pelos sujeitos, às quais procurei ser o mais fiel possível, trazendo as percepções, os

consensos e dissensos, tal qual aparecem nas transcrições, na tentativa de compor

com os argumentos apresentados e com às questões de interesse da pesquisa,

revelando o tipo de mundo dos discursos.

O material está organizado a partir da identificação dos núcleos argumentais,

que são conjuntos de frases que vão além da referência a um tema, procurando

explicá-lo. “Os núcleos argumentais não são os temas levantados, porém a “tessitura

da intriga” sobre esses temas” (86).

47

4. NARRATIVA

Os dados coletados nos dois grupos focais foram organizados em grandes

eixos temáticos, e, posteriormente, buscou-se identificar os núcleos argumentais das

falas, de forma que pudéssemos construir uma narrativa que evidenciasse e

procurasse responder aos nossos questionamentos.

No CAPS “David Capistrano da Costa Filho” as falas ficaram centralizadas em

menos pessoas, enquanto no CAPS “Novo Tempo” houve uma participação mais

uniforme, na qual todos se colocavam. No primeiro CAPS os usuários se dispersavam

com maior facilidade, fugindo bastante do tema. Era nítido que os usuários do Novo

Tempo tinham ocupavam lugares sociais diferentes dos usuários do primeiro CAPS,

relatando inserção no mercado de trabalho, por exemplo.

Apesar dessas diferenças observadas, optamos por fazer uma só narrativa,

pois não tínhamos como objetivo a comparação entre os serviços e, além disso,

entendemos que as percepções de ambos os grupos somaram para proporcionar um

entendimento a respeito dos nossos questionamentos. A narrativa construída se

encontra nos anexos (anexo V).

48

5. DISCUSSÃO

De forma a tecer algumas considerações a respeito do texto que nos foi

revelado através da construção da narrativa, optei por dividir a discussão em temas

que nos remetem ao objetivo desta pesquisa, ou seja, as percepções por parte dos

usuários sobre as ofertas de cuidado acessadas na atenção básica e as implicações

que atravessam este acesso, e as percepções sobre a existência de um cuidado

compartilhado, levando em consideração o dispositivo do apoio matricial. Há também

dois outros temas nesta discussão. O primeiro inexoravelmente se faria presente, pois

diz respeito às especificidades dos usuários em sofrimento mental, sujeitos desta

pesquisa. O último, que diz respeito aos demais serviços da rede acessados pelos

usuários, traz questões como a articulação da atenção básica com outros níveis do

sistema e a parceria com as universidades.

5.1 OFERTAS DE CUIDADO ACESSADAS NA ATENÇÃO BÁSICA

Ao ler a narrativa construída podemos ver que a demanda dos usuários é,

principalmente, por consultas médicas e exames. Nós vamos no postinho só pra

consultar e fazer exames de rotina, só essas coisinhas. A frase “só essas coisinhas”,

usada para expressar o que os usuários realizam na atenção básica, demarca que o

que é feito é visto como de menor valor, ou que são ações pontuais, sobretudo quando

colocamos em comparação com as ações realizadas nos CAPS, as quais veremos

mais à frente.

As demandas de saúde colocadas aos médicos tiveram os devidos

encaminhamentos realizados, o que traz a percepção de um atendimento satisfatório.

Tecnologias leves, como a escuta e o acolhimento por parte destes profissionais,

também foram valorizadas.

“ Nós gostamos bastante dos médicos, eles são educados e nos

recebem bem, escutam as nossas queixas e fazem os

encaminhamentos que nós precisamos. ”

49

A importância dada às tecnologias leves de cuidado também se evidencia no

fato dos usuários trazerem o incômodo com um profissional que, por falar uma língua

estrangeira e não se mostrar disposto a uma postura acolhedora, não é capaz de

sanar as demandas de saúde, “ outro profissional, da mesma nacionalidade (cubana), fala

de uma forma que ninguém entende e, além do mais, é mal-educado com os pacientes. Aí

não dá, pois você sai de lá do mesmo jeito que chegou. ”

Embora em um primeiro momento os usuários tenham enfatizado bastante as

consultas médicas enquanto ofertas de cuidado acessadas e valorizadas na Atenção

Básica, em um momento posterior reconhecem que há outras ações utilizadas, como

o atendimento do dentista. A fala “O serviço do dentista nós achamos que é algo

importante, porque afeta diretamente na autoestima da pessoa” nos revela a

importância que os usuários dão à saúde bucal. Assim, importa pensarmos nesta área

enquanto política pública que deve ser valorizada e fortalecida. Todavia, esta oferta

da Atenção Básica trouxe percepções negativas por parte dos usuários, como mau

atendimento, falta de clareza e insatisfação com o resultado de um procedimento.

“ Os auxiliares do dentista ficam conversando e parece que isso

influencia para que o profissional não consiga fazer o trabalho muito

bem. (...) teve gente que desistiu de fazer o tratamento, pois não

entendeu como seria o procedimento, afinal disseram que precisava

tirar chapa dos dentes e, depois, falaram que não precisava mais. Teve,

ainda, quem fizesse uma simples obturação dentária e agora sofre de

sensibilidade nos dentes. ”

Pergunto-me se essas insatisfações atingem a população de modo geral ou se

são queixas específicas da área da saúde mental, devidas a uma dificuldade de

entendimento por parte dos usuários. Neste caso, acredito que não tenham sido

consideradas as especificidades da área da saúde mental, ou seja, os aspectos

singulares do caso não foram observados da forma como deveriam, resultando na

percepção de uma oferta de cuidado importante, porém de difícil acesso. No mais,

“ Pra ter acesso ao serviço do dentista também é complicado, pois

precisa acordar muito cedo. (...) e ainda corremos o risco de chegar na

nossa vez e nos falarem que acabou a senha para o atendimento com

o dentista. Nós temos dificuldade em acordar muito cedo, por conta dos

remédios psiquiátricos que nós usamos ”,

50

O que deixa claro as dificuldades específicas dos usuários com transtorno

mental.

Dispensação de medicamento foi outra oferta de cuidado citada. Na Atenção

Básica encontra-se remédio tanto para condições físicas, quanto para algumas

condições mentais, que foi citado como “remédio pra dormir”, bastante utilizado pela

população em geral e, sobretudo, pela população idosa brasileira (85). Apesar da

importância que o usuário configura ao medicamento, por vezes este encontra-se em

falta, o que nos revela outra dificuldade de acesso.

“ O problema é que nem sempre tem medicamento lá, às vezes tá em

falta. Aí tem que ficar indo um monte de vezes no posto atrás do

remédio, a gente fica passando de besta, é um sofrimento isso. ”

Ou seja, é necessário ir muitas vezes ao Centro de Saúde para realizar algo que

poderia ser simples. Assim, é preciso recorrer a outro serviço, que é a farmácia

popular, onde por vezes também faltam medicamentos. “ Um simples AAS, que custa

sete reais, por vezes falta. ” Então o usuário tem um problema, pois é uma oferta de

saúde que por vezes não se efetiva. Os usuários citaram ainda a vacinação, alegando

que é uma oferta de saúde que facilmente se concretiza, embora não seja tão

valorizada, pois pouco se falou a respeito. “ Também tem vacina no postinho, pra

vacina é facinho lá. ”

Na busca pelas consultas médicas, os usuários queixaram-se do processo

necessário para obtê-las, alegando dificuldades na recepção dos centros de saúde.

“ Na recepção do posto é meio embolado, poderia melhorar. Embora

alguns tenham sido bem atendidos mesmo no acolhimento, com outros

acontece de chegar na recepção e os profissionais nem olharem na

cara. Simplesmente perguntam o nosso nome, procuram no prontuário

e mandam sentar. ”

Vemos, assim, a falta de uma postura acolhedora na recepção, pois há

profissionais que nem sequer olham para o usuário. Isso é prejudicial não somente

para os usuários da saúde mental, mas para a população de forma geral, cujo

acolhimento é atribuição de todos os profissionais da Atenção Básica.

51

Posturas discriminatórias estão presentes, pois há a percepção de que existe

um prejulgamento por parte dos profissionais, o que dificulta o acesso às ofertas de

cuidado, uma vez que o atendimento é negado.

“ Há profissionais que não conhecem nossa história e o fato de termos

problemas de saúde mental, e isso faz com que neguem atendimento.

Nós sentimos que algumas pessoas tem preconceito. Uns não aceitam

bem as pessoas que fazem tratamento psiquiátrico. Nós notamos que

eles não tem a gente como igual a eles ”.

A narrativa aponta, mais uma vez, a importância dada ao acolhimento

“Tem gente que trata a gente bem, mas tem gente que não serve nem

pra trabalhar em pet shop, quanto mais com pessoas. Nós achamos que

tem que olhar pra cara da pessoa, tem que conversar, porque nós já

estamos com problema de saúde, aí vamos lá pra sermos mal tratados,

vamos ficar mais mal ainda”.

Vemos que algumas posturas de alguns profissionais chegam ao extremo da

falta de acolhimento, pois a narrativa traz a percepção de que certas pessoas não

poderiam, de forma alguma, exercer a profissão da forma como o fazem. Na tentativa

de resolver este impasse, chegaram a sugerir a troca de funcionários por máquinas.

Ou seja, para os usuários, características tão caras e específicas ao humano, como a

capacidade de empatia e de valorizar as características individuais, não são postas

em prática.

“Nós pensamos, inclusive, que um processo mecânico poderia substituir

algumas funções exercidas por alguns profissionais. Por exemplo, pra

retirar medicamento poderia ter uma máquina que nós colocássemos

aquele cartão do SUS e ela nos fornecesse o remédio. Seria bom, né?”

Ainda sobre a dificuldade em conseguir consulta médica, para além do

problema da recepção, os usuários relataram que devem esperar no Centro de Saúde

mesmo sem a garantia de serem contemplados com a consulta. Ou seja, eles

consideram que muitas vezes é uma perda de tempo.

“Aí nós temos que ficar lá esperando, às vezes atende na hora e às

vezes não atende, depende do dia. (...) Diante dessa dificuldade de

52

conseguir consulta médica, muitas vezes temos que tentar encaixe ou

voltar pra casa”.

Houve muita reclamação a respeito de demora para ações como agendar ou

pegar resultados de exames, o que acarreta a percepção de que o posto não é capaz

de resolver demandas complexas, uma vez que falha em demandas consideradas

simples. “Se pra coisa simples é assim, e se for coisa grave? Se tiver uma doença

grave, tá ferrado, vai morrer mesmo”.

Os usuários procuraram uma resposta para as dificuldades encontradas na

Atenção Básica e, para eles, a quantidade de profissionais não é proporcional à

quantidade de pessoas a serem atendidas, ou seja, há uma demanda que o Centro

de Saúde não consegue comportar. “O postinho tá lotado de doente e tem poucos

funcionários. Por isso é que as coisas são demoradas.” Como visto anteriormente, o

Distrito de Saúde Sudoeste de Campinas é caracterizado por grandes

vulnerabilidades, e, assim, deveria ter um número menor de famílias cadastradas,

para ser capaz de trabalhar de forma mais efetiva com a complexidade dos problemas

encontrados.

Os dados obtidos nesta pesquisa nos remetem ao que Starfield (5) coloca como

uma das cinco características de uma atenção básica eficaz, “a medida na qual os

profissionais e instalações de saúde estavam regulados de modo que estivessem

geograficamente distribuídos aproximadamente de acordo com o grau de

necessidade”. Esta questão foi trazida pelos usuários, “Nós pensamos que a estrutura

do postinho é boa e que o fato de ele ser tão perto da nossa casa é algo muito

positivo.” Ou seja, não houve queixa alguma a respeito dos Centros de Saúde serem

fisicamente inacessíveis, mostrando que, de fato, embora o Distrito Sudoeste possua

acentuadas dificuldades e vulnerabilidades, a distribuição territorial dos Centros de

Saúde é satisfatória.

53

5.2 SAÚDE MENTAL

Diferentemente dos Centros de Saúde, cujo acesso às ofertas de cuidado

mostraram uma série de dificuldades, os CAPS foram considerados suficientes pelos

usuários, sendo capaz de contemplar todas as demandas deles, “aqui no CAPS tem

tudo o que nós precisamos”. Houve comparação com a Atenção Básica, no sentido

de valorizar o cuidado da área da saúde mental que recebem. “No posto não tem tudo

que tem aqui no CAPS. Aqui tem enfermeiro, psiquiatra, psicólogo, é excelente”.

Segundo os usuários, não há problemas na forma de acolhimento, diferentemente dos

Centros de Saúde. “Nós sentimos que todos os profissionais (...) nos respeitam. Eles

tratam a gente bem, sabe?” O CAPS é visto como local de acolhimento e segurança,

ao contrário dos demais locais, onde os usuários sentem que eles não são sempre

tratados como o restante da população.

Enquanto o cuidado asilar dos usuários com transtornos mentais se propunha

a separar o louco da família e da sociedade, o cuidado territorial se propõe a entender

a loucura dentro das dinâmicas da sociedade e da família, tencionando para que o

louco possa ocupar outro lugar na sociedade. Lugar este de cidadania e legitimação

de direitos, de inclusão social. Acredito que a narrativa tenha mostrado esse novo

lugar, uma vez que os usuários relatam circular pelo território de forma mais livre,

apropriando-se deste, frequentando os serviços de saúde, além de sentirem-se parte

da sociedade, através da inserção no mercado de trabalho. Há investimentos de

sentido nos espaços que os usuários habitam, fazendo deles lugares propriamente

ditos.

“Além do CAPS ser importante pra nossa saúde mental, é importante

na inclusão social também, pois foi este serviço que fez com que alguns

de nós tivesse vontade de trabalhar e fosse inserido no mercado de

trabalho, ao invés de ficarmos deprimidos em uma cama, sem querer

ver ninguém. Além de ser uma boa terapia, o trabalho faz com que a

gente fique na sociedade, em meio às pessoas de classe alta, média e

baixa. A gente se sente bem porque acha que tá sendo tratado de igual

pra igual.”

54

Além de ter tudo o que precisam, os usuários consideram que o CAPS é um

lugar de respeito, onde eles não se sentem excluídos ou segregados, onde podem

exercer sua cidadania. Segundo eles, os médicos são bons e o CAPS é um lugar de

livre circulação. A não ser em momentos de crise, nos quais é necessário utilizar os

leitos por alguns dias.

“Diferente dos manicômios de antigamente, nos quais você fica igual

preso e fica pior do que chegou, nos CAPS nós temos a liberdade de ir

e vir, exceto, claro, nos momentos de crise, nos quais nós temos que

dormir aqui por uns dias, mas são pouquinhos dias”.

Diferentemente do Centro de Saúde, onde são ressaltadas, sobretudo, as

consultas médicas, no CAPS são ressaltadas principalmente as diferentes atividades

em grupo, embora ações como o tratamento medicamentoso também sejam

valorizadas. Há uma boa adesão ao serviço, com participação das ofertas de cuidado

e desejo em participar de mais ações, pois são consideradas positivas. “nós gostamos

bastante de ficar aqui. Alguns de nós ficamos o dia todo. Isso porque o CAPS tem muitas

coisas a oferecer, tem grupos, como o de música e o do sabonete, tem oficina de dança, de

música, de teatro, de leitura, tem ateliê...”

Fica demarcado que o CAPS se destina a ações de saúde mental e é

considerado como muito bom, enquanto a Atenção Básica cuida de outros agravos à

saúde, “Mas nós percebemos que cada serviço de saúde tem uma especialidade”,

com uma única oferta na área da saúde mental, que é a consulta com psiquiatra. “Tem

o médico psiquiatra, que, dependendo, nós podemos consultar”. Como há a

percepção de que os Centros de Saúde tem uma sobrecarga de trabalho, os usuários

relatam que não é possível que ofertem ações da área da saúde mental. “Aqui é só

mental, enquanto no postinho é tudo, então eles não podem pegar tudo, só um pouco”.

5.3 CUIDADO COMPARTILHADO E APOIO MATRICIAL

Embora a Política Nacional de Atenção Básica (3) coloque que este nível do

sistema deveria ser reconhecido como contato preferencial pelos usuários do sistema

de saúde, na narrativa pudemos observar que na prática nem sempre isto ocorre,

55

devido à percepção do mau atendimento e da demora excessiva. “é melhor vir aqui

(CAPS), que é longe, do que no postinho que é perto e não ser bem atendido”. Os

usuários relataram também que por vezes preferem buscar as unidades de pronto

atendimento, por entenderam que estas são mais resolutivas e rápidas. “Alguns de

nós pensamos que é melhor já ir direto pro pronto socorro, pois lá nos colocam como

prioridade e nós somos atendidos bem e rapidinho.”

Apesar das dificuldades colocadas a respeito da Atenção Básica, há a

percepção de que os usuários não ficam desassistidos, pois, quando o caso não é

para o cuidado especializado em saúde mental, a Atenção Básica se responsabiliza.

“Nós percebemos que sempre há um acompanhamento, pois quando não pode ser

feito aqui, aí é feito lá.” Estes parecem ser casos menos graves, que de fato competem

à Atenção Básica acompanhar.

Sobre os usuários acompanhados pelos CAPS, embora nem todos tenham esta

percepção, parece haver um compartilhamento do cuidado. Quando há alguma queixa

de saúde, os profissionais dos CAPS fazem contato com os Centros de Saúde, de

modo que os usuários possam ser assistidos.

“Por vezes nós precisamos de alguma consulta ou de algum

tratamento do postinho, e os profissionais do CAPS fazem contato por

telefone ou nos acompanham até lá. Os funcionários não dispensam e

simplesmente falam “ah, vocês resolvem lá, vê lá””.

Vemos, assim, que não há uma lógica de referência e contrarreferência, mas

uma responsabilização pelo caso.

A mediação do CAPS parece sanar as dificuldades de acesso à Atenção Básica

relatadas pelos usuários. “Nós percebemos que, por conta deste acompanhamento,

nos atendem rapidinho, como se o caminho fosse aberto mais rápido”. Há também a

percepção de um compartilhamento de informações entre a Atenção Básica e a

Especializada. “O posto fica sabendo dos atendimentos que acontecem no CAPS e

nós temos que trazer pra cá tudo que é feito lá no postinho.”

Não foi relatada nenhuma ação conjunta de profissionais do CAPS e da

Atenção Básica, embora a assistência da atenção especializada pressuponha ações,

como consultas e visitas, em conjunto. Outrossim, houve relatos de percepções de

56

encontros presenciais, nos quais os profissionais dos CAPS se deslocam aos centros

de saúde para reuniões, possivelmente de matriciamento. “Os profissionais daqui vão

até o postinho pra fazer reunião”.

Segundo os usuários, os profissionais dos CAPS os incentivam a procurarem

os Centros de Saúde, havendo então um conhecimento a respeito das ofertas da

Atenção Básica. “Os profissionais daqui também nos orientam para que procuremos

o posto, caso tenhamos alguma demanda de saúde, e nos incentivam para participar

dos grupos que tem lá.”

5.4 OUTROS SERVIÇOS ACESSADOS PARA ALÉM DOS CAPS E DA ATENÇÃO

BÁSICA

O impacto da atenção básica na saúde dos usuários depende de sua

capacidade de integração com o restante do sistema. Além da parceria com os CAPS,

a Atenção Básica de Campinas é capaz de se articular com os demais níveis do

sistema, uma vez que os usuários relataram uma série de encaminhamentos

realizados. Acompanhamentos e consultas são realizadas no nível secundário do

Sistema Único de Saúde, evidenciando uma referência da Atenção Básica.

“Normalmente, quando nós temos algum problema de saúde que não

conseguimos resolver no CAPS, nós procuramos o posto de saúde, e

vice-versa. Mas nem tudo dá pra ser resolvido nestes dois lugares.

Então, além do postinho e do CAPS, tem outros lugares que nós vamos.

Quando não tem certas coisas no postinho, somos encaminhados pra

outros lugares.”

Todavia, nem todas as demandas de saúde dos usuários são contempladas

pelo SUS, uma vez que houve relato de que algumas pessoas usam a saúde

suplementar, e outras que pagam consulta particular. “Alguns de nós tem plano de

saúde e tem gente que prefere pagar uma consulta particular.” Há, ainda, as ofertas

de saúde das universidades de Campinas, o que é importante mas é uma

especificidade deste município, não encontrada na maioria das cidades brasileiras.

57

“Tem também as faculdades da cidade. Tem a Faculdade São Leopoldo, que oferece

tratamento dentário, tem a PUC e a Unicamp.”

Sabemos que os CAPS e os Centros de Saúde não contemplam a totalidade

das demandas dos usuários e há outros serviços aos quais eles devem recorrer.

Todavia, o fato de buscarem a saúde suplementar e a preferência por pagar consultas

médicas revela que o SUS ainda apresenta dificuldades em cuidar integralmente do

sujeito.

58

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao pensarmos no acesso dos pacientes com transtornos mentais na Atenção

Básica, vemos que há uma série de dificuldades encontradas. O acolhimento é

categoria central nesta análise, pois influencia diretamente no acesso às ofertas de

cuidado. Segundo os usuários, a recepção dos Centros de Saúde nem sempre é

acolhedora e alguns profissionais os tratam com descaso e discriminação, resultando,

muitas vezes, na negação do atendimento. Os médicos, por sua vez, foram

profissionais valorizados por sua capacidade de escuta e acolhimento. Cuidado à

saúde bucal, retirada de medicamento e exames foram mencionados enquanto ofertas

da Atenção Básica com dificuldade de acesso. Há uma demora excessiva para que

algumas demandas sejam efetivas, o que faz com que os usuários pensem que a

Atenção Básica não é capaz de comportar a demanda existente. Pergunto-me se a

Atenção Básica de Campinas é capaz de resolução de 80% dos problemas de saúde

da população, tal como é preconizado. Além do mais, por falhar em demandas

simples, há a percepção de que a Atenção Básica não é capaz de lidar com demandas

complexas.

Embora os usuários demandem da Atenção Básica especialmente consultas e

exames, estes valorizam as atividades terapêuticas e grupais oferecidas pelos CAPS,

indicando-nos a necessidade de consolidação deste núcleo de ações em saúde na

Atenção Básica. É evidente que não podemos nos esquecer das especificidades de

cada serviço. Há, de fato, que se dar importância à qualidade do atendimento médico

ofertado. Em estudo de Starfield (5), várias questões vinculadas ao profissional

médico, como o tipo e a quantidade destes profissionais na Atenção Básica, seus

honorários e a relação médico-paciente, se constituíram enquanto critério de

avaliação e comparação da qualidade da Atenção Básica. Talvez devamos pensar em

termos de clínica ampliada, medicina da família e comunidade, enfim, estratégias e

dispositivos que sejam capazes de suprir as demandas de saúde dos usuários sem

esquecer das singularidades de cada sujeito.

Embora eu tivesse a impressão de que a forma como a atenção básica se

organiza, enquanto processo de trabalho, permanecesse um tanto confuso tanto para

os usuários quanto para o restante do sistema (2), a narrativa não corrobora com este

59

fato. Pelo contrário, os usuários parecem ter bastante claro a forma como a atenção

básica se organiza, suas potencialidades e seus pontos fracos. Talvez isso seja

explicado pelo fato da rede de saúde de Campinas estar mais bem estruturada quando

comparado a outros municípios, visto o pioneirismo de Campinas em tantas ações em

saúde. Ou, talvez, ainda, uma certa confusão dentre os profissionais faça com que a

Atenção Básica apresente alguns pontos fracos. Se há dúvida a respeito das

tecnologias leves, como vínculo e acolhimento, isso certamente afetará as ofertas de

cuidado oferecidas.

Considerada por mim e por inúmeras pesquisas como algo inovador e potente,

a questão dos agentes comunitários de saúde não foi citada. Os usuários não

trouxeram relatos de que estes profissionais os tenham aproximado à Atenção Básica,

fazendo a ponte entre comunidade e serviço de saúde, como fora destacado na parte

introdutória desta pesquisa. Aparentemente esta mediação é realizada pelos

profissionais do CAPS.

O apoio matricial é algo que ocorre na cidade de Campinas e tem facilitado o

acesso dos usuários às ofertas da Atenção Básica, como demonstra a narrativa dos

usuários. É, assim, dispositivo potente para que a Atenção Básica possa avançar e

qualificar o cuidado à saúde mental. Embora tenhamos avançado no sentido de um

novo lugar para os usuários em sofrimento mental, com um cuidado de base territorial,

os CAPS são, talvez, o único local onde os usuários não sentem nenhuma forma de

exclusão. Importa ainda pensarmos em formas de combatermos os estigmas

existentes, com a garantia de um espaço nos serviços de Atenção Básica para análise

das práticas, atravessadas pelas dúvidas e angústias suscitadas nos profissionais ao

se depararem com problemas de Saúde Mental. O apoio matricial tem justamente esta

função, pois carrega em si a possibilidade e prerrogativa de problematizar e dar lugar

a estes receios e angústias, fornecendo retaguarda especializada aos profissionais da

Atenção Básica. Seja através do fortalecimento dos NASF ou da relação entre CAPS

e Atenção Básica, é evidente a importância do apoio especializado em saúde mental.

Importa destacar a experiência de Campinas e a rede substitutiva ao modelo

asilar que a cidade logrou implementar. Embora sejam recorrentes relatos de redes

de atenção psicossocial fragmentadas e de baixa adesão dos usuários aos serviços

especializados em saúde mental (88), os usuários participantes desta pesquisa

60

demonstraram ótima adesão e satisfação para com estes serviços. Claro que é

importante destacar o viés de que os participantes foram indicados pelos profissionais

dos CAPS, sendo, possivelmente, usuários com maior vínculo com o serviço. Além

disso, os grupos focais foram realizados nos próprios CAPS, o que pode também

representar um viés da pesquisa. De toda forma, vejo uma diferença ao comparar com

o que encontrava em meu campo de atuação anterior, no qual era evidente que a

adesão ao CAPS era baixa e restrita a usuários com maiores dificuldades de

socialização.

As parcerias existentes com as universidades, tão presentes e intrínsecas nas

malhas da rede de Campinas, favorecem a formação continuada e uma práxis potente

e consciente. Desta forma, incentivar as parcerias com as universidades e os espaços

de formação seria uma forma de potencializar os serviços e aproximá-los das

diretrizes. Os CAPS do distrito Sudoeste são conhecidos por serem espaço de

formação, atualmente comportando estagiários da residência multiprofissional em

saúde mental da Unicamp, e foram serviços muito bem avaliados pelos usuários.

Embora o município de Campinas tenha suas especificidades que o

diferenciam da maioria das cidades brasileiras, acredito que nos dá pistas de

caminhos que podem ser percorridos. O apoio matricial se mostrou política pública

importante e geradora de avanços no sentido de um cuidado integral ao usuário em

sofrimento mental, e enquanto tal, merece ser valorizado. A Atenção Básica, por sua

vez, carrega dificuldades percebidas pelos usuários, como uma demanda excessiva

de trabalho, falta de recursos, e uma necessidade de maior valorização das

tecnologias leves de cuidado. Estas dificuldades potencialmente afetam toda a

população, ou seja, não são queixas restritas aos usuários em sofrimento mental. Uma

sugestão para futuros estudos é que seja feita uma comparação dos resultados aqui

encontrados com a percepção de usuários da Atenção Básica de forma geral.

Apesar de algumas conclusões as quais pudemos chegar, esperamos que,

mais que o fechamento de algumas indagações, que esta pesquisa possa fomentar

novas questões a serem respondidas e novos movimentos por parte de trabalhadores,

gestores e usuários. Que estes sejam ouvidos e valorizados e que, cada vez mais,

possamos nos abrir às alteridades que o outro nos provoca.

61

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Tempo [acesso em 12 set 2016]. Disponível em:

www.campinas.sp.gov.br/saude.

68

75. Westphal MF. Participação popular e políticas municipais de saúde: Cotia e

Vargem Grande paulista [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo,

Faculdade de Saúde Pública; 1992.

76. Westphal MF, Bógus CM, Faria MM. Grupos Focais: experiências precursoras

em programas educativos em saúde no Brasil. Boletim da Oficina Sanitária do

Panamá. 1996;120(6):472-482.

77. Worthen BR, Sanders JR, Fitzpatrick, JL. Avaliação de programas –

Concepções e Práticas. São Paulo: Ed. Gente; 2004.

78. Gondim SMG. Grupos Focais como Técnica de Investigação Qualitativa:

Desafios Metodológicos. Revista Paidéia Cadernos de Psicologia e Educação.

2002;12(24):149-162.

79. Furtado JP. Avaliação como dispositivo [tese]. Campinas: Universidade

Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas, Departamento de

Medicina Preventiva e Social; 2001.

80. Ferrer AL. Sofrimento psíquico dos trabalhadores inseridos nos Centros de

Atenção Psicossocial: entre o prazer e a dor de lidar com a loucura

[dissertação]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de

Ciências Médicas, Departamento de Medicina Preventiva e Social; 2007.

81. Miranda L, Onocko Campos R. Os novos tratamentos em Saúde Mental e o

desafio da associação entre organização do serviço e clínica. In: IV Congresso

Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, X Congresso da

Associação Latino Americano de Medicina Social e XIV Congresso da

Associação Internacional de Política de Saúde – Eqüidade, Ética e Direito à

Saúde: desafios à Saúde Coletiva na mundialização. 2007 jul 13-18, Salvador

(BA).

82. Morgan DL. Focus groups as qualitative research. Thousand Oaks, CA: Sage

Publications, 1997.

83. Ricoeur P. Tempo e narrativa. Tomo I. Tradução de Constança Marcondes.

Martins Fontes. 1997.

69

84. Onocko Campos R, Furtado JP. Narrativas: utilização na pesquisa qualitativa

em saúde. Rev. Saúde Pública. 2008; 42(6): 1090-1096.

85. Freud S. Construções em Análise. In: Edição eletrônica brasileira das obras

psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: 1997.

86. Onocko Campos R. Fale com Eles! O trabalho interpretativo e a produção de

consenso na pesquisa qualitativa em saúde: inovações a partir de desenhos

participativos. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro. 2011;21(4):

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87. Alvarenga JM, Loyola Filho AI, Giacomini KC, Uchoa E, Firmo JOA. Uso de

benzodiazepínicos entre idosos: o alívio de “jogar água no fogo”, não pensar e

dormir. Rev. Bras. Geriatr. Gerontol., Rio de Janeiro. 2015; 18(2):249-258.

88. Furlan PCM, MacFadden R. Equipe frente à recusa do usuário: perspectivas

de tratamento CAPS. Estudos Contemporâneos da Subjetividade. 2015; 6(1).

70

8. ANEXOS

Anexo I – Autorização Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp

71

72

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Anexo II – Autorização Secretaria Municipal de Campinas

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Anexo III – Roteiro do grupo focal

1. Vocês utilizam o posto de saúde?

2. O que vocês fazem no posto de saúde?

- Que serviços vocês usam?

- Vocês passam por consultas?

- Vocês retiram medicamentos?

- Vocês participam de algum grupo?

3. Como vocês são recebidos no posto de saúde?

- Quando vocês vão ao posto de saúde, se sentem bem recebidos? Sim ou não?

Mais ou menos?

- O que vocês pensam sobre o acolhimento/recepção?

4. Os problemas que vocês tratam no CAPS vocês podem tratar também no CS?

- Sua angústia, seus problemas de relação, de sofrimento mental.... Vocês

conseguem falar dessas coisas no posto?

5. O que vocês gostam no CS e que gostariam de manter?

- O que vocês não gostam no CS e gostariam de mudar?

- O que vocês gostam no CAPS e que gostariam de manter?

- O que vocês não gostam no CAPS e gostariam de mudar?

80

6. Quando vocês precisam de alguma coisa e não tem no CAPS, vocês procuram o

CS?

- E quando não tem no CS, vocês procuram o CAPS?

- Tem coisas que precisam e não encontram em nenhum desses dois serviços?

- Tem coisas que você faz nos dois serviços? (Que você sente que fez a mesma

coisa duas vezes?)

7. Vocês acreditam que há algum tipo de parceria entre o CAPS e o posto de

saúde?

- Vocês sabem se o CAPS e o CS conversam entre si?

- Quando vocês têm algum problema eles vão discutir para tentar resolverem juntos?

- Você acha que o CAPS sabe o que acontece no CS e vice-versa?

8. Tem coisas que vocês precisariam fazer no CS e não conseguem?

- Como vocês lidam com isso? Procuram outro lugar?

9. Fora tudo o que eu já perguntei, vocês gostariam de me dizer alguma outra coisa

sobre a relação entre o CS e o CAPS, sobre a relação entre os profissionais dos dois

serviços?

81

Anexo IV – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Acesso à Atenção Básica em Saúde e cuidado compartilhado na perspectiva dos

usuários dos Centros de Atenção Psicossocial de Campinas - SP

Responsável: Gabrielle Taver de Jesus

Departamento de Saúde Coletiva/ FCM/ Unicamp

Número do CAAE: 52947115.8.0000.540

Você está sendo convidado a participar como voluntário de uma pesquisa. Este

documento, chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar seus

direitos como participante e é elaborado em duas vias, uma que deverá ficar com você e outra

com o pesquisador.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se

houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com o

pesquisador. Se preferir, pode levar este Termo para casa e consultar seus familiares ou

outras pessoas antes de decidir participar. Se você não quiser participar ou retirar sua

autorização, a qualquer momento, não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo.

Justificativa e objetivos:

Este estudo tem como objetivo conhecer a opinião dos usuários dos Centros de

Atenção Psicossocial (CAPS) de Campinas sobre o acesso e o tratamento na Atenção Básica

e o compartilhamento do cuidado entre o CAPS e a Atenção Básica.

Espera-se que este estudo possa contribuir para a melhoria da assistência em saúde

mental oferecida pela Atenção Básica e pelos CAPS.

Procedimentos:

Participando do estudo você está sendo convidado a participar de um grupo de

discussão com outros usuários do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) que você

frequenta, sobre temas relacionados ao acesso e o tratamento na Atenção Básica e o

compartilhamento do cuidado entre o CAPS e a Atenção Básica.

Este grupo de discussão será realizado no CAPS que você frequenta, terá duração de

cerca de uma hora e meia, e será coordenado pela pesquisadora. Durante o grupo de

discussão será utilizado um gravador de áudio para garantir a recuperação das informações

e para que estas possam ser analisadas posteriormente.

82

Desconfortos e riscos:

A pesquisa não oferece nenhum risco ou desconforto direto à saúde, além de possíveis

constrangimentos decorrentes da exposição de opiniões ou eventuais perdas pessoais pelo

tempo despendido nas atividades da pesquisa.

Benefícios:

A pesquisa não oferece nenhum benefício direto ao participante, além da possibilidade

de melhora na assistência à saúde mental nos serviços da rede de Campinas – SP.

Sigilo e privacidade:

Você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo e nenhuma

informação será dada a outras pessoas que não façam parte da equipe de pesquisadores. Na

divulgação dos resultados desse estudo, seu nome não será citado.

Ressarcimento:

Não haverá ressarcimento financeiro ou custo ao participante.

Contato:

Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com Gabrielle Taver

de Jesus, cel: (19) 998866426, email: [email protected].

Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação e sobre questões éticas

do estudo, você pode entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa

(CEP) da UNICAMP das 08:30hs às 13:30hs e das 13:00hs as 17:00hs na Rua: Tessália

Vieira de Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19)

3521-7187; e-mail: [email protected]

Consentimento livre e esclarecido:

Após ter recebido esclarecimentos sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos,

métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito

participar:

Nome do(a) participante:

____________________________________________________Data: ____/_____/______.

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do seu responsável LEGAL)

83

Responsabilidade do Pesquisador:

Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e

complementares na elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido. Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento

ao participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi

apresentado. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa

exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento

dado pelo participante.

____________________________________________________Data: ____/_____/______.

(Assinatura do pesquisador)

84

Anexo V – Narrativa

“Apesar de alguns de nós acharmos difícil, todos nós usamos o posto de saúde. Nós vamos

no postinho só pra consultar e fazer exames de rotina, só essas coisinhas. Nós passamos

com o clínico geral, com o ginecologista, com o neurologista, com o oftalmologista, e com o

dermatologista. A maioria de nós gostamos bastante dos médicos, eles são educados e nos

recebem bem, escutam as nossas queixas e fazem os encaminhamentos que nós

precisamos. Alguns de nós gostamos tanto do acompanhamento médico oferecido no

postinho que torcem pra que o médico de lá nunca mude.

Apesar disso, nós não conseguimos chegar a um acordo sobre os médicos da rede de

Campinas. Isso porque alguns tiveram experiências positivas e outros não. Teve uma

profissional que conseguiu descobrir um problema de saúde que ninguém resolvia, enquanto

outro profissional fala de uma forma que ninguém entende e, além do mais, é mal-educado

com os pacientes. Aí não dá, pois você sai de lá do mesmo jeito que chegou. A gente fica,

assim, sem entender. Seria melhor se mudassem esse profissional.

Ah, nós fazemos outras coisas no postinho também. Fazemos o exame do Papanicolau

quando precisa, pegamos remédio e usamos também o serviço do dentista. O serviço do

dentista nós achamos que é algo importante, porque afeta diretamente na autoestima da

pessoa. Só que neste ponto também não conseguimos chegar a um acordo. Enquanto uns

consideram que o dentista é uma das coisas boas que o posto tem pra oferecer, outros não

gostaram do serviço e tiveram que procurar outro profissional. Os auxiliares do dentista ficam

conversando e parece que isso influencia para que o profissional não consiga fazer o trabalho

muito bem. E não foi só uma pessoa que teve problema, não. Teve gente que desistiu de fazer

o tratamento, pois não entendeu como seria o procedimento, afinal disseram que precisava

tirar chapa dos dentes e, depois, falaram que não precisava mais. Teve, ainda, quem fizesse

uma simples obturação dentária e agora sofre de sensibilidade nos dentes. Pra ter acesso ao

serviço do dentista também é complicado, pois precisa acordar muito cedo. Pode tá frio, pode

tá calor, tem que acordar às cinco e meia da manhã, e ainda corremos o risco de chegar na

nossa vez e nos falarem que acabou a senha para o atendimento com o dentista. Nós temos

dificuldade em acordar muito cedo, por conta dos remédios psiquiátricos que nós usamos.

Falando em remédio, a possibilidade de retirar medicamento no postinho é algo bom. Lá tem

esses mais comuns, que nós usamos no dia a dia, como Omeprazol, Dipirona, remédio pra

pressão alta, a bombinha pra quem tem bronquite. Lá tem remédio pra dormir também. O

problema é que nem sempre tem medicamento lá, às vezes tá em falta. Aí tem que ficar indo

um monte de vezes no posto atrás do remédio, a gente fica passando de besta, é um

sofrimento isso. Pra pegar remédio tem também a farmácia popular, que dá remédio de graça

ou a um preço bem baixo, só que por vezes falta medicamento lá também. Um simples AAS,

que custa sete reais, por vezes falta. Já a farmácia de alto custo é de tirar o chapéu, pois

fornece medicamentos caros, alguns chegam a custar até cinco mil reais. Lá no alto custo tem

bastante funcionário e eles trabalham de boa vontade. Também tem vacina no postinho, pra

vacina é facinho lá.

Embora nós tenhamos valorizado o atendimento médico que nós recebemos no postinho, até

chegarmos a ter este atendimento é um pouco dificultado. Isso porque na recepção do posto

é meio embolado, poderia melhorar. Embora alguns tenham sido bem atendidos mesmo no

acolhimento, com outros acontece de chegar na recepção e os profissionais nem olharem na

cara. Simplesmente perguntam o nosso nome, procuram no prontuário e mandam sentar. Aí

85

nós temos que ficar lá esperando, às vezes atende na hora e às vezes não atende, depende

do dia. Às vezes é o médico que não vem. Diante dessa dificuldade de conseguir consulta

médica, muitas vezes temos que tentar encaixe ou voltar pra casa.

Nós consideramos que esta questão do acolhimento na recepção varia muito conforme o

profissional que você encontra, pois há profissionais que não conhecem nossa história e o

fato de termos problemas de saúde mental, e isso faz com que neguem atendimento. Nós

sentimos que algumas pessoas tem preconceito. Uns não aceitam bem as pessoas que fazem

tratamento psiquiátrico. Nós notamos que eles não tem a gente como igual a eles. Tem gente

que trata a gente bem, mas tem gente que não serve nem pra trabalhar em pet shop, quanto

mais com pessoas. Nós achamos que tem que olhar pra cara da pessoa, tem que conversar,

porque nós já estamos com problema de saúde, aí vamos lá pra sermos mal tratados, vamos

ficar mais mal ainda. A população carente sofre muito quando vai nos hospitais, nas UBSs,

na UPA... Nós pensamos, inclusive, que um processo mecânico poderia substituir algumas

funções exercidas por alguns profissionais. Por exemplo, pra retirar medicamento poderia ter

uma máquina que nós colocássemos aquele cartão do SUS e ela nos fornecesse o remédio.

Seria bom, né?

Nós achamos que tem coisas no postinho que demoram demais. Pra marcar ou pra vir

resultado de exame, por exemplo. É tudo demorado. Acontece de ficarmos meses esperando

pro médico ver nossos exames, ou de fazermos os exames e os resultados não virem. Por

vezes fazemos exames no postinho e temos que repetir os mesmos exames no CAPS. Se

pra coisa simples é assim, e se for coisa grave? Se tiver uma doença grave, tá ferrado, vai

morrer mesmo. Tá pior do que a linha vermelha no Rio de Janeiro. Nós achamos que a

questão é que faltam coisas no postinho. Precisaria de mais profissionais da saúde, não só

médicos, mas também enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem. O

postinho tá lotado de doente e tem poucos funcionários. Por isso é que as coisas são

demoradas. Nós pensamos que a estrutura do postinho é boa e que o fato de ele ser tão perto

da nossa casa é algo muito positivo, mas pensamos também que de nada adianta essas

coisas quando faltam médicos e, na hora que mais precisamos, temos que recorrer ao

hospital.

Já aqui no CAPS tem tudo o que nós precisamos, não tem que mudar nada, é a melhor coisa

que existiu, nota dez, mais que dez. No posto não tem tudo que tem aqui no CAPS. Aqui tem

enfermeiro, psiquiatra, psicólogo, é excelente. Nós sentimos que todos os profissionais, além

de fazerem tudo certinho, nos respeitam. Eles tratam a gente bem, sabe? O CAPS é um lugar

onde nós não nos sentimos sozinhos, nós nos sentimos seguros. É um lugar onde pudemos

fazer amizades e onde o remédio que nós tomamos nos deixa legais, não sentimos crise.

Além do CAPS ser importante pra nossa saúde mental, é importante na inclusão social

também, pois foi este serviço que fez com que alguns de nós tivesse vontade de trabalhar e

fosse inserido no mercado de trabalho, ao invés de ficarmos deprimidos em uma cama, sem

querer ver ninguém. Além de ser uma boa terapia, o trabalho faz com que a gente fique na

sociedade, em meio às pessoas de classe alta, média e baixa. A gente se sente bem porque

acha que tá sendo tratado de igual pra igual. Diferente dos manicômios de antigamente, nos

quais você fica igual preso e fica pior do que chegou, nos CAPS nós temos a liberdade de ir

e vir, exceto, claro, nos momentos de crise, nos quais nós temos que dormir aqui por uns dias,

mas são pouquinhos dias. Mesmo com essa liberdade de ir e vir, nós gostamos bastante de

ficar aqui. Alguns de nós ficamos o dia todo. Isso porque o CAPS tem muitas coisas a oferecer,

tem grupos, como o de música e o do sabonete, tem oficina de dança, de música, de teatro,

de leitura, tem ateliê... Nós queríamos que o governo valorizasse mais os CAPS e os

profissionais, que tinham que ganhar mais, pois trabalham muito. Os atendimentos são bons,

eles fazem as receitas tudo certinho.

86

Nós achamos que o problema do CAPS na verdade tá fora do CAPS. É o Cândido Ferreira.

O Cândido Ferreira tomou conta do CAPS e tirou muita coisa daqui. Tirou, por exemplo, o

almoço. Não tem mais almoço, nem lanche e nem café. Antes nós chegávamos, esperávamos

o almoço, comíamos, ficávamos um pouco, era bom. Agora tem que chegar, tomar o remédio

e já ir embora. Antes tinha grupo de família e grupo de paciente, agora não tem mais. O

Cândido foi cortando tudo. Tiraram também o transporte, e o responsável por isso é a

prefeitura. Nós não precisamos deste transporte mas nós falamos pelas pessoas que

precisam, e por isso gostaríamos que ele voltasse. Já teve passeios pelo CAPS também, mas

hoje não tem mais. Mas legal que nem o CAPS, só o CAPS mesmo.

Tanto que alguns de nós não gostariam de fazer o acompanhamento pra saúde mental lá no

postinho, pois gostam daqui. Afinal, é melhor vir aqui, que é longe, do que no postinho que é

perto e não ser bem atendido. Outros já gostariam, porque o postinho é mais perto da nossa

casa. Mas nós percebemos que cada serviço de saúde tem uma especialidade, e o tratamento

de saúde mental é aqui mesmo. Aqui é só mental, enquanto no postinho é tudo, então eles

não podem pegar tudo, só um pouco. No mais, lá já tá cheio de gente e coisas normais, se

juntar a parte da saúde mental também, vai complicar.

Apesar disso, nós percebemos que tem algumas ações da área da saúde mental no postinho.

Tem o médico psiquiatra, que, dependendo, nós podemos consultar. Você pode tratar no

CAPS, mas caso você passe mal ou o CAPS fique longe da sua casa, você marca consulta

com psiquiatra do posto. Fica mais fácil de ir e você vai acompanhando lá também. Vem aqui

no CAPS poucas vezes mas tem o acompanhamento do posto também. Mas muita coisa

depende de sermos encaminhados. Quando isso acontece, podemos também retirar alguns

medicamentos no posto.

Nós percebemos quesempre há um acompanhamento, pois quando não pode ser feito aqui,

aí é feito lá. Alguns de nós acham que existe uma parceria entre o CAPS e o postinho, embora

nem todos tenham percebido isso e alguns achem que é muito pouco ou que seria melhor

que não tivesse essa parceria. Por vezes nós precisamos de alguma consulta ou de algum

tratamento do postinho, e os profissionais do CAPS fazem contato por telefone ou nos

acompanham até lá. Os funcionários não dispensam e simplesmente falam “ah, vocês

resolvem lá, vê lá”. Nós percebemos que, por conta deste acompanhamento, nos atendem

rapidinho, como se o caminho fosse aberto mais rápido. Daí nós vemos que os profissionais

de lá tem parceria com os profissionais daqui. Existe uma ligação, uma união. Não tem o

termo intersetorialidade? Nós não sabemos se é pela proximidade, mas vemos que os dois

serviços trabalham em conjunto. O posto fica sabendo dos atendimentos que acontecem no

CAPS e nós temos que trazer pra cá tudo que é feito lá no postinho. Os profissionais daqui

vão até o postinho pra fazer reunião, nós já ouvimos algumas pessoas daqui do CAPS falando

disso, apesar de nunca termos ido a estas reuniões. Os profissionais daqui também nos

orientam para que procuremos o posto, caso tenhamos alguma demanda de saúde, e nos

incentivam para participar dos grupos que tem lá.

Outra parceria que nós achamos que existe é do CAPS com o pronto socorro do Ouro Verde.

O postinho também tem parceria com o Ouro Verde. Lá no pronto socorro do Ouro Verde trata

mental também e nós ouvimos dizer que lá é melhor que todos os lugares, pois tem bastante

médico. Alguns de nós ia pra lá quando sentia crise. Lá atende outras coisas também, até

urologista mandam pra lá. Normalmente, quando nós temos algum problema de saúde que

não conseguimos resolver no CAPS, nós procuramos o posto de saúde, e vice-versa. Mas

nem tudo dá pra ser resolvido nestes dois lugares. Então, além do postinho e do CAPS, tem

outros lugares que nós vamos. Quando não tem certas coisas no postinho, somos

encaminhados pra outros lugares. Tem a policlínica, o Mário Gatti, o hospital São José. Alguns

87

de nós tem plano de saúde e tem gente que prefere pagar uma consulta particular. Quando o

problema é sério nós procuramos o pronto socorro. Alguns de nós pensamos que é melhor já

ir direto pro pronto socorro, pois lá nos colocam como prioridade e nós somos atendidos bem

e rapidinho. Tem também as faculdades da cidade. Tem a Faculdade São Leopoldo, que

oferece tratamento dentário, tem a PUC e a Unicamp. Nós achamos que a Unicamp atende

bem e resolve nossos problemas. É isso. No mais, o que temos a dizer é que gostamos de

conversar com vocês.”