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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Geociências ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Instituto de Geociências

ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO

MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA

CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO

CAMPINAS

2017

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ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO

MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA

CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO

TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE

GEOCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE

CAMPINAS PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTOR

EM POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

ORIENTADORA: PROFA. DRA. FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO ALTAIR

APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO E ORIENTADO PELA

PROFA. DRA. FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO

CAMPINAS

2017

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES, 1407023

Ficha catalográficaUniversidade Estadual de CampinasBiblioteca do Instituto de Geociências

Marta dos Santos - CRB 8/5892

Oliveira Filho, Altair Aparecido de, 1986- OL4m OliMudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-de-

açúcar : o caso do etanol celulósico / Altair Aparecido de Oliveira Filho. –Campinas, SP : [s.n.], 2017.

OliOrientador: Flávia Luciane Consoni de Mello. OliTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Geociências.

Oli1. Sistema de Inovação. 2. Etanol - Política governamental - Brasil. 3. Etanol

- Indústria. 4. Etanol 2G. I. Consoni, Flávia Luciane, 1973-. II. UniversidadeEstadual de Campinas. Instituto de Geociências. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Changes and permanence in the Sugarcane Sectorial System ofInnovation : the case for cellulosic ethanolPalavras-chave em inglês:System of InnovationEthanol - Government policy - BrazilEthanol - IndustryEthanol 2GÁrea de concentração: Tecnologia e InovaçãoTitulação: Doutor em Política Científica e TecnológicaBanca examinadora:Flávia Luciane Consoni de Mello [Orientador]José Vitor Bomtempo MartinsAndré Tosi FurtadoJosé Maria Ferreira Jardim da SilveiraCarlos Eduardo Vaz RossellData de defesa: 31-08-2017Programa de Pós-Graduação: Política Científica e Tecnológica

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

AUTOR: ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO

MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA

CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO

ORIENTADORA: PROFA. DRA FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO

Aprovado em: 31 / 08 / 2017

EXAMINADORES:

Profa. Dra. Flávia Luciane Consoni de Mello - Presidente

Prof. Dr. José Vitor Bomtempo Martins

Prof. Dr. André Tosi Furtado

Prof. Dr. José Maria Ferreira Jardim da Silveira

Prof. Dr. Carlos Eduardo Vaz Rossell

A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora,

consta no processo de vida acadêmica do aluno.

Campinas, 31 de agosto de 2017.

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Aos meus pais!

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AGRADECIMENTOS

Este é o momento de reconhecer e recordar que nunca caminhei só. Ao longo dessa

jornada contei com a ajuda preciosa de muitas pessoas, as quais cederam um pouco do seu

tempo e da sua paciência para me ensinar, aconselhar e incentivar. Tenho muita gratidão por

todos com quem me relacionei nessa trajetória, todos contribuíram com o meu

desenvolvimento e com a construção deste trabalho. O período de doutoramento foi um

grande processo de transformação, onde os questionamentos transformaram-se em esforços de

pesquisa e as minhas aspirações passaram a ser trabalho, tudo isso me fez amadurecer e

crescer como indivíduo.

Quero agradecer especialmente a professora Flávia Consoni, que participou

ativamente de todas as etapas da pesquisa, orientando, corrigindo e ensinando. Soube cobrar e

dar liberdade, ao mesmo tempo em que me passava segurança para realizar a pesquisa – muito

obrigado.

Em especial, agradeço aos professores André Furtado, Maria Beatriz Bonacelli, José

Maria da Silveira, José Vitor Bomtempo e o Dr. Carlos Vaz Rossell pelas suas contribuições

valiosas no exame de qualificação e na avaliação final do trabalho (defesa). Apontaram

caminhos para o trabalho e deram insights preciosos para pesquisas futuras.

Também agradeço a todos os professores do DPCT com o quais cursei as disciplinas

ou fui PED. Agradeço a todos os funcionários do IG pela dedicação e suporte na realização

das atividades diárias, em particular, às servidoras Valdirene Pinotti, Maria Gorete Sousa,

Sonia Tilkian e Adriana Garutti.

Gostaria de reconhecer a importância da CAPES pelo apoio oferecido, concedendo

bolsa de estudos no período entre 2013 e 2017.

Meus agradecimentos se estendem aos companheiros de turma e de sala(s) de estudo.

Muito obrigado pelos debates e pelos “gorós” tão profícuos. Por ordem alfabética, assim

ninguém fica chateado: Adela; Ana; Carol; Diego; Dani; Edgar; Felipe; Fernando; Fernando

Mesquita; Irineu; Jeny; Lucas; Luis; Marco; Marcos Marques; Marcos Silbermann; Marina;

Nanci; Rodrigo; Sebá; Victo (obrigado pela leitura); Vinicius; Tati; Tildo. Uma lembrança e

um “salve” aos camaradas que nem sempre estão por perto, mas sempre que possível, nos

encontramos (molecada de Piracicaba/SP; República Zona da Mata; galera da

UNESP/Ourinhos).

Sou muito grato por ter a Bianca como minha companheira, sempre esteve comigo e

sempre me nutre de carinho, humanidade e amor. Obrigado San!

Agradeço aos meus familiares pelo cuidado, apoio e compreensão nas minhas

ausências. Valeu Everton, obrigado pai e obrigado mãe – Leila, você sempre me transmite

força para seguir em frente.

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RESUMO

O setor sucroenergético brasileiro figura como a principal alternativa nacional frente às

energias fósseis. Ademais, ao se utilizar da cana-de-açúcar para obtenção do etanol, matéria-

prima que não integra sua base alimentar, o Brasil passa a ocupar posição de destaque no

debate energético. Não obstante, tal trajetória tem sido confrontada com novos desafios

tecnológicos, especificamente com o desenvolvimento da tecnologia do etanol de segunda

geração. Trata-se de uma tecnologia em desenvolvimento que, ao aproveitar integralmente

toda a biomassa de uma diversidade de matérias-primas, mostra-se bastante promissora. A

presente pesquisa de doutorado expõe e analisa as características do setor sucroenergético

frente ao desafio tecnológico do etanol de segunda geração. Busca-se compreender como o

Brasil se posiciona em relação ao desenvolvimento desta rota tecnológica, e em que medida o

Brasil apresenta (ou não) protagonismo nessa corrida tecnológica. Pautando-se na abordagem

de Sistemas Setoriais de Inovação e utilizando-se de procedimentos metodológicos

específicos para compreender o processo de inovação (mapeamento de políticas publicas;

mapeamento de atores e suas funções; busca e análise de famílias de patentes e artigos

científicos; entrevistas com representantes das firmas), percebe-se que a reconfiguração do

Sistema Setorial de Inovação Brasileiro da cana-de-açúcar presenciada na última década

reafirma a sua condição histórica. Observou-se que o avanço tecnológico tem ocorrido de

maneira particularizada em poucas firmas e condicionado por um novo elemento de

dependência externa, o qual permite a alguns atores atuar na nova rota tecnológica e realizar

incrementos técnicos, ao passo que estabelece parcerias estratégicas com atores estrangeiros.

Palavras-chave: Sistemas Setoriais de Inovação; Políticas Públicas; Etanol Celulósico; Cana-

de-açúcar; Setor Sucroalcooleiro;

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ABSTRACT

The Brazilian sugarcane industry has been the main national alternative to fossil fuels . The

ethanol, produced from sugarcane, a kind of feedstock that is not essentially food, occupies an

important position in energy generation debate. However, this trajectory has been faced with

new technological challenges, specifically the development of the 2nd generation biofuel, the

ethanol 2G. The ethanol 2nd generation is a developing technology exploit from a variety of

materials, especially non-food biomass. This PhD research exposes and analyzes the

characteristics of the sugarcane industry in the face of the technological challenge for the

second generation ethanol. We try to understand how Brazil stands in relation to the

development of this technological route, to what extent Brazil has played a leading role in this

technological route. Based on the approach of Sectoral Systems of Innovation and using

specific methodological procedures to understand the innovation process (mapping of public

policy, mapping of actors and their functions, analysis of patent families and scientific

articles, interviews with representatives of firms), we recognized that sugarcane Sectoral

System of Innovation reconfiguration, specially in the last decade, reaffirms its historical

condition. Therefore, the technological advance have occurred in a few firms conditioned by a

new element of external dependence, that allows some actors to act in the new technological

route and to make technical increases, establishing strategic partnerships with foreign actors.

Keywords: Innovation; Public policy; Ethanol; Sugarcane; Sugar and alcohol industry;

Second Generation Ethanol

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Encadeamento entre as questões de pesquisa e os objetivos da tese................................. 29

Figura 1.1. Configurações tecnológicas do etanol celulósico – rota enzimática............................... 58

Figura 1.2. Estratégias de busca de patentes para etanol celulósico – Questel Orbit....................... 77

Figura 2.1. Evolução do arcabouço institucional do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-

açúcar do Brasil, entre 1875 a 2016................................................................................................... 86

Figura 2.2. Produção de cana-de-açúcar, etanol e açúcar no Brasil entre as safras de 1948/49 -

2015/2016.............................................................................................................................. .. 89

Figura 2.3. Evolução dos valores disponibilizados pelo BNDES ao setor sucroenergético, entre

2002 - 2016 (em reais - R$)...................................................................................................... 117

Figura 2.4. Evolução dos valores disponibilizados ao setor sucroenergético, entre 2002 - 2016

(em reais - R$) .................................................................................................................................... 118

Figura 2.5. Participação dos Estados na produção do etanol nas safras de 2000/01 e 2015/16 ........ 123

Figura 2.6. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil ........................................... 131

Figura 3.1. Número de projetos de pesquisas financiados com recursos dos Fundos Setoriais, pela

CNPq (1997 a 2015) e FINEP (1999 a 2015) – Diretamente relacionados ao setor

sucroenergético.................................................................................................................................... 146

Figura 3.2. Projetos de pesquisas contratados pela FAPESP no período de 1997 a 2016

relacionados ao setor sucroenergético................................................................................................. 153

Figura 4.1. Áreas do conhecimento que se dedicam a temática do etanol celulósico....................... 184

Figura 4.2. Campos tecnológicos do etanol celulósico - 2.937 famílias de patentes......................... 185

Figura 4.3. Evolução dos artigos científicos publicados em periódicos internacionais e os

principais países em publicação na temática do etanol celulósico. .................................................... 190

Figura 4.4. Evolução dos depósitos de patentes e os principais países/regiões de proteção das

invenções em etanol celulósico........................................................................................................... 193

Figura 4.5. Evolução dos depósitos de famílias de patentes no Brasil e a origem do P&D das

invenções protegidas no Brasil............................................................................................................ 198

Figura 4.6. Os principais assigners em etanol celulósico, no mundo e no Brasil............................. 200

Figura 4.7. As principais instituições em publicações vinculadas ao Brasil e os principais

conceitos abordados nas publicações. ................................................................................................ 206

Figura 4.8. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology

clusters – Brasil (564 famílias de patentes)....................................................................................... 209

Figura 4.9. Conceitos tecnológicos das invenções brasileiras (depósitos prioritários - 47 famílias

de patentes)......................................................................................................................................... 214

Figura 5.1. Iniciativas de desenvolvimento de projetos industriais de etanol celulósico no Brasil,

entre o período de 1980 a 2016. ......................................................................................................... 222

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1.1. Capacidade instalada de produção de etanol celulósico................................................. 51

Tabela 1.2. Resultados da evolução tecnológica - tecnologia disponível no setor industrial – 2011 53

Tabela 2.1. Origem da Cana-de-açúcar moída na usina, por Estados e safras selecionadas............. 106

Tabela 3.1. Detalhamento do aporte realizado pela FINEP em relação ao SSI da cana-de-açúcar

entre 1999-2015.............................................................................................................................. .... 147

Tabela 3.2. Carteira detalhada do PAISS em milhões de reais (2011 a 2014).................................. 162

Tabela 3.3. Projetos de PD&I integrantes do PAISS (2011-2014)................................................... 164

Tabela 3.4. Atores e valores aprovados por projeto no âmbito do PAISS Industrial (2011-2014)... 168

Tabela 3.5. Empresas e valor dos projetos contratados no âmbito do PAISS Agrícola (2014-

2018)............................................................................................................................. ...................... 177

Tabela 5.1. Projetos indústrias de etanol celulósico no Brasil (Iniciativas Estruturadas), aspectos

gerais (2016). ................................................................................................................................... 255

Tabela 5.2. Características técnicas dos projetos industriais de etanol celulósico no mundo e

custo de produção estimado no ano de 2016 (projetos em operação). ............................................. 282

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LISTA DE BOXES

Box 1.1. Bases da abordagem de Sistemas Setoriais de Inovação..................................................... 36

Box 3.1. Embrapa Agroenergia.......................................................................................................... 142

Box 3.2. O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE)........................... 145

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 2.1. Licenciamento de veículos novos a etanol no Brasil entre os anos 1975 – 2015 ......... 90

Gráfico 2.2. Participação de fornecedores e produtores próprios na

produção brasileira de cana-de-açúcar, 1948/49 -2014/15 ................................................................ 94

Gráfico 2.3. Distribuição do ATR por produto final (açúcar e etanol), entre as safras de 1948/49-

2015/16 ............................................................................................................................................ 101

Gráfico 2.4. Importação e exportação brasileira de etanol em metros cúbicos, entre 1989 a 2015. 107

Gráfico 2.5. Preço médio do petróleo importado - 2000-2015 (US$/b FOB) .................................. 110

Gráfico 2.6. Implantação e fechamentos de usinas no Brasil entre 2005 a 2015.............................. 119

Gráfico 2.7. Consumo de combustível no Brasil entre 2001 – 2015 (m³)......................................... 121

Gráfico 2.8. Histórico de licenciamentos de veículos por combustível (2004-2016) ...................... 122

Gráfico 2.9. Distribuição por Estado das usinas de cana-de-açúcar em 2016. ............................... 124

Gráfico 2.10. Número de fusões e aquisições ocorridas no setor sucroalcooleiro entre 1995 a

2009. ............................................................................................................................. ..................... 125

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LISTA DE QUADROS Quadro 1.1. Modos de inovação e padrões de inovação................................................................... 46

Quadro 1.2 Dificuldades tecnológicas ainda não superadas no etanol celulósico............................ 57

Quadro 1.3. Categoria e tipologia da abordagem de SSI.................................................................. 62

Quadro 1.4. Entrevistas e códigos................................................................................................... 64

Quadro 1.5. Eventos setoriais, visita técnica e códigos................................................................... 64

Quadro 1.6. Bases de dados mais relevantes utilizadas na pesquisa até out./ 2016. 65

Quadro 1.7. Equação de busca para Base da legislação Federal ............................................ 67

Quadro 1.8. Equação de busca para artigos científicos – Scopus ......................................... 74

Quadro 2.1. Medidas Federais que promovem o fortalecimento da capacidade produtiva e a

ampliação do consumo do etanol (2000-2016) ....................................................................... 111

Quadro 2.2. Presença estrangeira na produção de açúcar, etanol e bioeletricidade no Brasil 128

Quadro 3.1. Políticas Federais que promovem o fortalecimento das ações em Ciência e

Tecnologia no SSI da cana-de-açúcar................................................................................................ 139

Quadro 3.2. Projetos relacionados diretamente com o etanol celulósico financiados pela FINEP

anteriores ao PAISS Industrial........................................................................................................... 148

Quadro 3.3. Medidas no âmbito do Estado de São Paulo que fortalecem a Ciência e a Tecnologia

ligadas ao SSI da cana-de-açúcar....................................................................................................... 152

Quadro 3.4. Detalhes dos projetos desenvolvidos nos programas: PITE e PIPE relacionados ao

setor sucroenergético no período de 1997 a 2016.............................................................................. 153

Quadro 3.5. Linhas temáticas do PAISS Industrial.......................................................................... 160

Quadro 3.6. Empresas com planos de negócio selecionados no PAISS Industrial - 2011.............. 165

Quadro 3.7. Ações internacionais de estímulo ao desenvolvimento do etanol celulósico............ 173

Quadro 5.1. Os principais atores na trajetória do etanol celulósico – quem é quem? ..................... 223

Quadro 5.2. Ações de destaque do CTC em P&D ........................................................................... 257

Quadro 5.3. Parcerias estratégicas e cooperação do CTC por etapas da tecnologia de etanol

celulósico, entre 2007 - 2017. ............................................................................................................ 261

Quadro 5.4. Estrutura e áreas de atuação da GranBio. ..................................................................... 264

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANP Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis

ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

ABIMAQ Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos

ANFAVEA Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores

APL Arranjo Produtivo Local

APTA Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio

BEM Balanço Energético Nacional

BIOEN Programa de Pesquisa em Bioenergia da FAPESP

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BP British Petroleum

BTL Biomass To Liquid

C&T Ciência & Tecnologia

C5 Açúcar de 5 carbonos

C6 Açúcar de 6 carbonos

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBP Consolidated Bioprocessing

CENAL Comissão Executiva Nacional do Álcool

CEPAL Comissão Econômica para América Latina e Caribe

CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

CIDE Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico

CIDE Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico

CIMA Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool

CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas

CNAL Conselho Nacional do Álcool

CNDI Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial

CNPE Conselho Nacional de Política Energética

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

COP21 Conferência das Partes de Paris

CT&I Ciência, Tecnologia & Inovação

CTBE Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol

CTC Centro de Tecnologia Canavieira

CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

CTS Ciência, Tecnologia e Sociedade.

DHR Dedini Hidrólise Rápida

DUI Learning by Doing, Learning by Using e Learning by Interacting

E1G Etanol de primeira geração

E2G Etanol de segunda geração

EECC Estação Experimental de Cana de Campos

EECP Estação Experimental da Cana de Piracicaba

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EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

ENCTI Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação

EP European Patent Office

EPA Agência de Proteção Ambiental dos EUA

EPE Empresa de Planejamento Energético

ETECs Escola Técnica Estadual de São Paulo

F&A Fusões & Aquisições

FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais

FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FAPESPA Fundação Amazônia Paraense de Amparo à Pesquisa

FATEC Faculdade de Tecnologia de São Paulo

FINEP Financiadora de Estudos e Projetos

IAA Instituto do Açúcar e Álcool

IAC Instituto Agronômico de Campinas

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICTs Instituições de Ciência e Tecnologia

IDE Investimento Direto Estrangeiro

IEA International Energy Agency

INOVAs Programas de Apoio a Inovação em Cooperação BNDES-FINEP

INPI Instituto Nacional de Propriedade Industrial

IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change

IPCs Classificação Internacional de Patentes

IPI Imposto sobre Produtos Industrializados

IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo

MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MCTI Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação

MDCI Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

MDIC Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

OECD Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

OGM Organismos Geneticamente Modificados

P&D Pesquisa e Desenvolvimento

PACTI Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação

PAISS Plano BNDES-FINEP de Apoio à Inovação dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico

PCT Cooperação em Matéria de Patentes

PD&I. Pesqueisa, Desenvolvimento e Inovação

PDP Política de Desenvolvimento Produtivo

PED Plano Decenal de Expansão de Energia

PIB Produto Interno Bruto

PINTEC Pesquisa de Inovação Tecnológica

PINTEC Pesquisa de Inovação

PIPE Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas da FAPESP

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PITCE Política industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior

PITE Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica

PLANALSUCAR Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar

PNA Plano Nacional de Agroenergia

PPA O Plano Plurianual

PROALCOOL Programa Nacional do Álcool

PRORENOVA Programa Apoio à Renovação e Implantação de Novos Canaviais

RAIS Relação Anual de Informações Sociais

RIDESA Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do setor Sucroenergético

SECEX Secretaria de Comércio Exterior

SHCF Separate Hydrolysis and Co-Fermentation

SHF Separate Hydrolysis and Fermentation

SNI Sistema Nacional de Inovação

SSCF Simultaneous Saccharification and CoFermentation

SSF Simultaneous Saccharification and Fermentation

SSI Sistema Setorial de Inovação

STI Learning by Science, Technology and Innovation

TCD Toneladas de Cana por Dia

TICs Tecnologias de Informação e Comunicação

TPDP Technology-Push-Demand-Pull

TRL Technology readiness levels

UFAL Universidade Federal de Alagoas

UFPR Universidade Federal do Paraná

UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco

UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

UFSCAR Universidade Federal de São Carlos

UNB Universidade Federal de Brasília

UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development

UNESP Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"

UNICA União da Indústria de Cana-de-Açúcar

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

USP Universidade de São Paulo

VTI Valor de Transformação Industrial

WO World Intellectual Property Organization

1G Primeira Geração

2G Segunda Geração

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................... 19

CAPÍTULO 1. Abordagem teórica e metodológica para alinhamento da

tese: Sistema Setorial de Inovação e Modos de Inovação................................... 34

1.1. Sistema Setorial de Inovação e a heterogeneidade da estrutura econômica..... 35

1.1.1. O desenvolvimento setorial e o processo de inovação................................... 43

1.2. Definições do “desafio tecnológico”: o etanol celulósico ............................... 50

1.2.1. A tecnologia de produção do etanol (E1G) ................................................... 52

1.2.2. A tecnologia de produção do etanol (E2G) .................................................. 54

1.3. A abordagem metodológica subjacente à análise de Sistemas de Inovação..... 59

1.3.1. Procedimentos metodológicos e ações para estruturação da pesquisa .......... 63

1.3.1.1. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 2 ............... 66

1.3.1.2. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 3................ 71

1.3.1.3. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 4................. 72

1.3.1.4. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 5................. 79

1.4. Considerações finais do capítulo 1........................................................... 81

CAPÍTULO 2. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil:

evolução e transformações recentes ........................................................... 83

2.1. Gênese e evolução do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar no

Brasil .......................................................................................................... 84

2.1.1. Gênese e estruturação dos modos de inovação do SSI da cana-de-açúcar no

Brasil ........................................................................................................... 92

2.1.2. Expansão e estabelecimento da produção sucroalcooleira (1930-1990)...... 99

2.2. Mudanças no ambiente de seleção e busca do etanol brasileiro (2000-

2016) ........................................................................................................................ 108

2.2.1. Dimensões econômica e territorial do SSI da cana-de-açúcar .................... 122

2.2.2. Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores ........... 125

2.3. Considerações finais do capítulo 2 ............................................................. 129

CAPÍTULO 3. Políticas públicas e o desenvolvimento do etanol celulósico no

Brasil ...................................................................................................................... 132

3.1. Políticas públicas para o setor sucroenergético brasileiro: adensamento da

ciência e da tecnologia ligada ao etanol................................................................... 134

3.1.1. Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou do

aprendizado tecnológico........................................................................................... 141

3.1.2. Ações do Estado de São Paulo em relação ao estímulo à C&T e ao

aprendizado tecnológico do SSI da cana-de-açúcar (2000 – 2016)......................... 150

3.2. Políticas públicas para o etanol celulósico no Brasil: PAISS Industrial e

PAISS Agrícola........................................................................................................ 156

3.2.1. PAISS Industrial e o start do etanol celulósico no Brasil............................... 158

3.2.2. PAISS Agrícola adensamento das atividades voltadas à C&T e ao

aprendizado tecnológico do SSI da cana-de-açúcar................................................. 176

3.3. Considerações finais do capítulo 3.................................................................... 178

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CAPÍTULO 4. A dinâmica do conhecimento e da base tecnológica do etanol

celulósico: considerações a partir dos artigos científicos e das famílias de

patentes ................................................................................................................... 180

4.1. Domínio tecnológico do etanol celulósico...................................................... 182

4.2. A dinâmica do conhecimento e da tecnologia do etanol celulósico: evolução

e distribuição geográfica do esforço de desenvolvimento........................................

188

4.3. Os principais atores do etanol celulósico: firmas e instituições de ensino e

pesquisa.................................................................................................................... 199

4.3.1. Competências tecnológicas no Brasil e dos atores nacionais: um olhar

sobre os Clusters tecnológicos em formação (etanol celulósico)............................ 207

4.4. Considerações finais do capítulo 4.................................................................. 215

CAPÍTULO 5: Tecnologia do etanol celulósico no Brasil: as ações dos atores

e suas interações...................................................................................................... 218

5.1. Os principais atores do SSI da cana-de-açúcar na trajetória do etanol

celulósico: visão geral ............................................................................................ 221

5.2. A dinâmica dos projetos industriais de etanol celulósico no Brasil................. 228

5.2.1. Iniciativas Pioneiras na trajetória do etanol celulósico: anos 1980 ............... 228

5.2.2. Iniciativas Incipientes .................................................................................... 233

5.2.3. Iniciativas Exploratórias................................................................................ 238

5.2.3.1. A Iniciativa da Petrobras/Cenpes .............................................................. 249

5.2.4. Iniciativas Estruturadas: desenvolvimento e adoção da tecnologia de etanol

celulósico no Brasil ....................................................................................... 255

5.2.4.1. Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) ................................................... 255

5.2.4.2. GranBio ...................................................................................................... 262

5.2.4.3. Raízen ........................................................................................................ 274

5.3. Considerações finais do capítulo 5 ......................................................... 281

CONCLUSÕES .................................................................................................... 285

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 286

APÊNDICE 1 ....................................................................................................... 312

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19

INTRODUÇÃO

O setor sucroenergético1 brasileiro é um importante segmento econômico no plano

nacional, com alta capilaridade no território, presente em 1.040 municípios2 e responsável

pela geração de 567.690 vínculos formais de emprego direto em 20143. Desenvolveu-se ao

longo dos anos a partir de sistemáticas iniciativas dos produtores e, principalmente, por meio

da ação coordenadora do Estado brasileiro, configurando-se como uma importante fonte de

energia renovável alternativa para a dependência externa dos derivados dos combustíveis

fósseis e, na sequência, contribui com a redução das emissões dos gases de efeito estufa.

A produção sucroalcooleira do Brasil, além da sua evidente função econômica, figura

como opção técnica dentro do quadro analítico das Novas Fontes Renováveis (NFRs)4. Ou

melhor, a produção de combustível líquido e energia elétrica renovável por meio dos

potenciais da biomassa, proporciona ao setor um caráter mais amplo e estratégico, sendo

relevante para o setor agrícola e para o setor energético. A contribuição do setor

sucroalcooleiro para a matriz energética do Brasil foi de 49.232 10³ (tonelada equivalente de

petróleo) em 2014, o que representou 18,1 % da Produção de Energia Primária do país (EPE,

2015).

O advento da tecnologia de produção do etanol celulósico (etanol de segunda geração

ou E2G) maximiza o uso energético e econômico da cana-de-açúcar e inaugura uma nova fase

do desenvolvimento técnico da usina de cana-de-açúcar no Brasil. A tecnologia do etanol

celulósico proporciona a utilização quase completa da biomassa por intermédio de processos

físico-químicos que visam ter acesso aos açúcares contidos na celulose.

A técnica consiste em aproveitar os açúcares nas moléculas da sacarose que estão

protegidas por uma “espessa” camada de fibras. Para que este processo se complete, a técnica

1 Ao longo do trabalho utilizam-se os termos: açucareiro, sucroalcooleiro e sucroenergético como sinônimos para

agroindústria processadora de cana-de-açúcar do Brasil. Tais termos são ligados aos produtos provenientes desse

segmento econômico (açúcar, etanol e eletricidade). A denominação do setor se altera ao longo da história,

condizente com o papel que este assume no cenário nacional - exportador de commodities; oferta de

biocombustíveis e substituição da gasolina importada e; segmento constituinte da matriz energética nacional. 2 LEMOS et al., 2014

3 O número de vínculos formais de emprego formal atribuídos ao setor sucroalcooleiro foi obtido a partir de a

Relação Anual de Informações Sociais (RAIS/ MTE), a partir da soma da CNAE 2.0 Classes (Classificação

Nacional de Atividades Econômicas), a saber: (1130) Cultivo de cana-de-açúcar; (10.71-6) Fabricação de açúcar

em bruto; (10.72-4) Fabricação de açúcar refinado; e (19.31-4) Fabricação de álcool. 4 FORAY & GRUBLER (1996); ELLIOT (2000); UNRUH (2006); GOLDEMBERG (2006) WALZ et al

(2008); entre outros.

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20

baseada na hidrólise5 ou na gaseificação

6 deve quebrar as cadeias de polissacarídeos que

unem as moléculas da parede celular das plantas (LEITE & LEAL, 2007).

Ademais, os desdobramentos dessa tecnologia abrem espaço para o desenvolvimento

da química verde, visto que as unidades processadoras de biomassa podem ampliar suas

economias de escopo indo além da produção de açúcar, etanol e energia elétrica, podendo

também atuar na produção de outros compostos químicos substitutos dos hidrocarbonetos de

origem fóssil. O desenvolvimento da tecnologia de etanol de segunda geração se faz

necessário diante das limitações impostas pela produção de etanol de primeira geração, a qual

não é capaz de avançar na exploração completa de toda a biomassa, incluindo a palha e o

bagaço da cana-de-açúcar.

O etanol celulósico é puxado tanto pela oferta de tecnologia como pelas demandas do

século XXI, ou seja, o progresso técnico no beneficiamento dos materiais lignocelulósicos –

tecnologias oriundas da Engenharia Química, Bioquímica, Genética ou da Biologia Molecular

- possibilita explorar de maneira integral os potenciais da biomassa, dando origem a novos

processos, novos produtos e a criação de novos nichos econômicos. Do outro lado,

sustentando os esforços nessa nova trajetória tecnológica, está a “urgência” da construção de

uma nova economia, amigável ao meio ambiente e com maior racionalidade econômico-

ambiental, estruturas econômicas adaptadas às condições naturais e sociais dos territórios

(VASCONCELLOS & BAUTISTA VIDAL, 1998; MAYERHOFF et al. 2006; CARDONA

et al., 2010; DANTAS et al., 2013; MAZZUCATO, 2013; GUSTAFSSON et al., 2014).

Somam-se a isso, três outros motivadores que instam o desenvolvimento dessa

tecnologia no Brasil: 1) ampliar a produtividade e a produção da cadeia produtiva do etanol;

2) diminuir o exclusivismo dos derivados de petróleo no abastecimento da frota rodoviária e

ampliar a diversificação dos insumos para a cadeia produtiva da indústria química; e 3) criar

um destino rentável para parte dos “resíduos” da produção do etanol de primeira geração.

Na cultura da cana, a energia está distribuída da seguinte forma: 31,4% em sacarose,

34,7% no bagaço e 33,8% nas pontas e nas folhas (SAFATLE, 2011; GOLDEMBERG,

2006). Logo, o desenvolvimento de tecnologias que convertam materiais lignocelulósicos em

5 Hidrólise é uma reação orgânica e inorgânica em que água efetua uma dupla troca com outros compostos. A

palavra hidrólise significa decomposição pela água, mas geralmente a água por si só não atinge uma hidrólise

completa, para isso é necessário imprimir altas temperaturas e pressões elevadas e/ou a adição de agentes

aceleradores, tais como os ácidos e as enzimas (HIJAZIN et al., 2010). 6 O processo de gaseificação consiste em uma série de reações físico-químicas, transformando os sólidos em uma

mistura de gases, o gás de síntese (CORAL, 2009).

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biocombustíveis ou em outros produtos é de grande importância para a continuidade do

programa bioenergético brasileiro. Destaca-se que esta tecnologia tem o potencial de elevar a

produção do biocombustível sem aumentar a área plantada de cana-de-açúcar utilizando-se do

bagaço e folhas da planta. Com isso, possibilita diminuir a pressão para a expansão da área

plantada, amenizando em última instância os conflitos por terra.

O etanol de segunda geração prenuncia um novo desenvolvimento estrutural da

indústria sucroalcooleira, potencializando a sua relevância setorial. Esta nova realidade é

impulsionada pela mudança técnica da exploração do material lignocelulósico que compõe a

estrutura vegetal da cana-de-açúcar. Como desdobramento, o setor passa a ser ainda mais

decisivo no plano nacional, sobretudo, para o avanço das opções técnicas-econômicas-

ambientais alternativas às fontes tradicionais (fóssil e nuclear), posicionando-o justamente na

difícil tarefa de propor soluções aos desafios impostos pelo lock-in do carbono7 (UNRUH,

2000).

Em conformidade com este cenário, o setor sucroalcooleiro brasileiro vivencia, em

especial a partir dos anos 2000, um intenso processo de reestruturação técnico-econômica,

caracterizado por: 1) acelerada expansão geográfica para novas áreas de cultivo e

processamento da cana-de-açúcar; 2) concentração e centralização do capital no setor e; 3)

entrada de novos atores, principalmente do capital estrangeiro; 4) retomada da implementação

de medidas institucionais relacionadas ao setor; 5) esforço de aprendizagem em novas bases

de conhecimento atreladas ao E2G. Esses aspectos prenunciam alterações nas características

históricas na produção de etanol de primeira geração e do açúcar.

Destaca-se que ao longo da pesquisa que originou esta tese, foram mobilizados

esforços em caracterizar estes cinco aspectos da reestruturação técnico-econômica. Entretanto,

os três primeiros pontos aparecem apenas como sustentação da problemática central da

pesquisa, sendo que o processo de mudanças que converge para a consolidação da rota

tecnológica do etanol de segunda geração, assim como o processo social que é então

desvelado, constitui o recorte analítico da pesquisa.

7 Carbon lock-in refere-se à inércia criada e perpetuada pelo sistema sócio-técnico de energia baseada nos

hidrocarbonetos fósseis, o qual inibe esforços públicos e privados para introduzir tecnologias de energia

alternativa. Tal perspectiva é muito empregada para compreender as barreiras da mudança de infraestrutura e de

arcabouço institucional relacionadas ao setor energético..

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Diante deste quadro, a pergunta central da tese é: Quais são os atores/elementos do

Sistema Setorial de Inovação (SSI) da cana-de-açúcar do Brasil que promovem o progresso

técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia do etanol celulósico?

A partir desta indagação, desdobram-se diversos outros questionamentos tais como:

Quais são os drives que impulsionam a busca pelo etanol celulósico? Quais são as barreiras

que ainda devem ser superadas para o avanço deste mercado? Como o arcabouço

institucional contribui (ou não) para o desenvolvimento da rota do etanol celulósico? Quais

foram as adequações no campo de política pública para suportar/apoiar/impulsionar esta

nova tecnologia? Como interagem os diversos atores do SSI no que tange o etanol

celulósico? Quais são as diferenças entre os projetos industriais de etanol celulósico no

Brasil? Existe desenvolvimento endógeno de tecnologia para a produção de etanol

celulósico? Quais capacidades o SSI da cana-de-açúcar brasileiro desenvolve neste

processo?

Tais questões orientam a investigação feita nesta tese, a qual expõe e analisa as

características do avanço tecnológico do setor sucroalcooleiro do Brasil, dando ênfase ao

processo inovativo do etanol de segunda geração. Procura-se traçar um panorama atual do

setor, identificando sua configuração, seus principais atores e os processos de ruptura

advindos desta nova rota tecnológica. Com isso, busca-se compreender como o Brasil se

posiciona em relação ao desenvolvimento da rota tecnológica do etanol celulósico e em que

medida o Brasil apresenta (ou não) protagonismo nessa corrida tecnológica.

O argumento desenvolvido nesta tese indica que neste processo de introdução da

tecnologia do etanol celulósico, reside uma ruptura de rota tecnológica, exigindo alterações

nos padrões de aprendizagem das firmas, que tradicionalmente caracterizavam-se por

inovações incrementais (learning by doing, learning by using e learning by interacting)8. Esta

pesquisa argumenta que o setor sucroalcooleiro caminha rumo a uma descontinuidade que

implica um modelo de inovação mais forte e completo de learning by Science, Technology

and Innovation.

Entretanto, esse caminho não é fluido e exige esforços internos das organizações

ligados à transformação da biomassa, bem como, do arranjo institucional. É justamente esse

movimento que é investigado por esta pesquisa, pontuando as características deste processo

que é marcado por avanços e manutenção das suas contradições, pois ao passo que o SSI da

8 Trabalhos que identificam essas características: Varricho (2012); Andersen (2011), Furtado et al, (2011) Harari

(2010) e CGEE ( 2009).

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cana-de-açúcar adentra a rota tecnológica do etanol celulósico, este o faz incorporando

tecnologia estrangeira e de maneira pontual. Tal situação reflete sua fragilidade em relação às

inovações baseadas no conhecimento científico, mas, por outro lado, é um esboço de uma

reação, visto que a reboque destes esforços iniciais cria-se um conjunto de elementos, de

atores e de infraestrutura propícia ao desenvolvimento futuro. A tese analisa e evidencia essa

condição, tão própria de nações periféricas.

Como indicam os trabalhos de Joseph (2009), Furtado (2014), Ribeiro & Albuquerque

(2015), entre tantos outros, o principal desafio para o setor e para as nações periféricas

consiste em aproveitar as “janelas de oportunidades” a partir da produção endógena de

tecnologia. Assim, supera-se a condição estrutural de importadores e dependentes de

tecnologia estrangeira, com capacidade para promover o desenvolvimento tecnológico, social

e econômico.

Objetivos da pesquisa

É na transição da primeira geração para a segunda geração que se encontra o escopo

da pesquisa. O objetivo central deste estudo é identificar, caracterizar e analisar esse

processo, pois ao passo que o Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar evolui, este se

altera em termos de sua forma e do seu conteúdo. Com isso, o foco recai na compreensão da

reconfiguração do regime tecnológico, analisando a introdução da tecnologia de segunda

geração, de forma a compreender como esse esforço de desenvolvimento tecnológico rebate

na estrutura da indústria e reconfigura o Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar.

Os objetivos específicos relacionados abaixo foram estabelecidos com a intenção de

dar sustentação e esclarecimento à questão principal da pesquisa e conduzem a estruturação

dos capítulos da tese, a saber:

1. Apresentar a abordagem de Sistema Setorial de Inovação (focusing device),

atrelando-a com a compreensão da heterogeneidade estrutural dos países periféricos,

possibilitando a construção de uma base teórica e metodológica para o desenvolvimento da

tese (articulação entre o conceito de SSI e objeto de estudo);

2. Caracterizar o processo histórico de formação do SSI da cana-de-açúcar do

Brasil, pontuando as especificidades da atividade inovativa, proporcionando uma base

comparativa para a identificação das mudanças trazidas no bojo da introdução da tecnologia

do etanol celulósico;

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3. Identificar qual é o papel desempenhado pelas políticas públicas de promoção

da inovação no setor, e como estas ampliam (ou não) a possibilidade do desenvolvimento

tecnológico voltado ao aproveitamento total da biomassa da cana-de-açúcar;

4. Expor a dinâmica tecnológica do etanol celulósico, trabalhando as bases do

conhecimento e da tecnologia que sustentam o novo processo produtivo, bem como

identificando os atores que conduzem o processo de inovação (exercício de vigilância

tecnológica);

5. Compreender as ações das firmas envolvidas com o desenvolvimento e

adaptação da tecnologia do etanol celulósico no Brasil, evidenciando as relações que estas

estabelecem com outros atores do SSI da cana-de-açúcar;

Hipótese e relevância da pesquisa

A característica disruptiva do etanol celulósico induz de maneira imperativa uma

mudança no modo de inovação do setor sucroalcooleiro, principalmente na fase industrial9. O

etanol celulósico altera a base de conhecimento requerida para a inovação, ou seja, novas

informações e competências devem ser arregimentadas pelas firmas para transformar os seus

recursos internos, tornando-os capazes de ampliar a exploração da biomassa da cana-de-

açúcar.

A hipótese de pesquisa é que as mudanças exigidas pela tecnologia do etanol

celulósico alteram a base de conhecimento na fase industrial do setor sucroalcooleiro,

forçando um deslocamento do exclusivismo DUI-mode (learning by doing, learning by using

e learning by interacting) para um padrão intermediário, visando o STI-mode (learning by

Science, Technology and Innovation). Concomitantemente, este movimento resulta: HI) na

ampliação da dependência tecnológica do SSI da cana-de-açúcar e; HII) na redefinição dos

atores do SSI da cana-de-açúcar na fase industrial10

.

Os elementos necessários para estruturação da produção de etanol de segunda geração

estão em outro nível, diferenciando-se da trajetória traçada pelo etanol de primeira geração.

Portanto, as hipóteses são confirmadas ou refutadas por meio da análise das ações dos

9 Os Trabalhos do CGEE (2009), Varricho (2012), Valente et al. (2012) e Furtado (2014) fazem referência à

existência de duas grandes “etapas” no processo produtivo dos derivados da cana-de-açúcar. 10

A tese apresenta uma hipótese principal, a qual é auto-referenciada pela dinâmica tecnológica, assim, se

desdobra em duas sub afirmações, as quais são confirmadas/refutadas à medida que se responde a questão

principal da pesquisa: “Quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-açúcar que promovem o progresso

técnico em direção ao domínio da tecnologia do etanol celulósico”. Acrescenta-se que as hipóteses (HI e HII) não

são concorrentes, estas são consequência da dinâmica imposta pela tecnologia de conversão da biomassa.

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principais atores do SSI da cana-de-açúcar, os quais figuram como agentes catalisadores deste

processo em curso – o desenvolvimento e a introdução da tecnologia industrial do etanol

celulósico.

Esta nova realidade deriva da “necessidade” de superar o desafio tecnológico do

aproveitamento integral da biomassa da cana-de-açúcar11

, ou seja, desenvolver meios para

ampliar a exploração dos potenciais energéticos da biomassa. Segundo Ericsson et al. (2004);

Negro et al. (2007); Vieira (2008); Suurs & Hekkert (2009); CGEE (2009); Nyko et al.

(2010), Rosa et al. (2010) e Hellsmark & Jacobsson (2012) e, também, pautando-se nas

experiências de sucesso de alguns países europeus (Finlândia e Suécia12

), pode-se afirmar que

o desafio para o setor é o desenvolvimento de tecnologias e de processos que ampliem a

exploração do potencial existente nessa matéria-prima. E, ao fazer isso, reorienta a rota

tecnológica do setor, pois o conhecimento e as tecnologias que são a base da nova trajetória,

são de natureza distinta e mais complexas13

.

A direção do desenvolvimento da rota tecnológica aponta para a ampliação da

eficiência da transformação dos açúcares contidos na biomassa, tanto do caldo como do

material lignocelulósico. Para isso, novos conhecimentos e novas competências devem ser

empregados, tais como a engenharia genética, a biotecnologia, a química orgânica fina, a

química macromolecular e polímeros, a automação e outras. Estas se traduzem em novas

variedades de cana-de-açúcar e melhores práticas agrícolas e, principalmente, em novos e

melhorados processos de pré-tratamento, hidrólise e de fermentação, onde micro-organismos

são empregados como meios de produção.

O deslocamento do DUI-mode para o STI-mode se coloca como uma condição para o

desenvolvimento endógeno do etanol celulósico, pois as competências requeridas estão em

outro patamar, fora da rota normal construída pelo SSI da cana-de-açúcar ao longo dos

últimos 100 anos. Isso fica evidente com a contribuição de trabalhos recentes que,

especificamente, abordaram o papel das empresas de bens de capital do setor sucroalcooleiro

e da própria capacidade inovadora das usinas, a saber: Negri (2010); Liboni & Toneto Jr.

(2008); Valente (2012); Varricho (2012); Oliveira Filho (2013). Tais estudos indicam que as

11

Tal objetivo não é novo; essa pretensão sempre esteve no horizonte do setor, entretanto, só agora com o

avanço tecnológico proeminente dos combustíveis de segunda geração que essa fronteira fica mais próxima. 12

Finlândia e Suécia representam casos de sucesso de exploração energética da biomassa, com indústrias de base

florestal bem desenvolvidas, tanto no setor de papel e celulose como madeireira em geral. 13

O capítulo 4 e 5 demonstram este movimento de maneira mais clara pautando-se em dados de patentes e nas

informações obtidas nos trabalhos de campo.

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capacidades construídas por meio do DUI-mode estão aquém das necessárias para conduzir o

processo de desenvolvimento tecnológico desta nova fase de desenvolvimento da

agroindústria canavieira e da consolidação da biorrefinaria de cana-de-açúcar.

Historicamente, as alterações técnicas e a difusão de tecnologias na fase industrial da

produção sucroalcooleira foram dadas pela ação produtiva das empresas de bens de capital

ligadas ao setor. Mas, diante dos novos desafios tecnológicos, tem-se a impressão de que este

importante setor não apresenta as condições necessárias para imprimir esforços de

aprendizagem fora da sua base de conhecimento tradicional (VARRICHO, 2012; FURTADO,

2013), sendo necessário ampliar a escala de análise, para identificar os principais responsáveis

pelo progresso técnico do setor14

.

Nessas condições, se justifica a abordagem de Sistema Setoriais de Inovação, a qual

permite compreender as relações das firmas com outros atores (tradicionais e novos), relações

dadas tanto pela cooperação como pela concorrência, de mercado ou extra-mercado e,

principalmente, compreender qual é o papel do poder público nessa nova condição de

desenvolvimento setorial.

A forte alteração nos padrões da atividade inovativa reposiciona as dimensões de

busca e seleção do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil. Porque a base

de conhecimento é díspar da até então estabelecida. Esta requer mais intensidade em ciência e

tecnologia, por sua vez, demanda e estabelece como condição para o seu desenvolvimento

futuro maiores dispêndios em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), criação de projetos de

cooperação entre firmas e entre firmas e instituições pesquisa. Essa dinâmica já é percebida

no corolário do desenvolvimento inicial do etanol celulósico no Brasil.

Portanto, os esforços empreendidos nesta tese concentram-se em estudar a emergência

de um novo regime tecnológico, analisando essa transição, da tecnologia de primeira geração

14 Tal questão pode ser controvérsa e merece maior cuidado, pois há estudos sobre a indústria de bens de capital

do setor sucroalcooleiro que apontam que seu desenvolvimento tecnológico viria a reboque das

inovações/invenções do CTC e do IAC, os quais estavam à frente dos projetos mais significativos nos anos 1980,

projetos como do reaproveitamento da vinhaça (MARIOTONI, 2004). Outros estudos afirmam que estas

indústrias são conservadoras e apresentam baixo dinamismo (VARRICHO, 2012). Mas a controvérsia reside na

abordagem histórica; se observarmos em um período maior de tempo, no qual tais empresas foram de

fundamental importância para elevar o nível tecnológico do setor, precisamente na passagem dos engenhos de

“fogo morno” para as usinas (na primeira metade do século XX) certamente esse caráter dinâmico pode ser

redimensionado (NEGRI, 2010). E, ainda, se observamos um conjunto de inovações incrementais feitas nos

períodos de expansão da produção do etanol podemos chegar a outras conclusões. A introdução constante de

melhoramentos foi de fundamental importância para redimensionar o tamanho e a escala de processamento das

usinas, por exemplo, saindo das antigas e “minúsculas” destilarias de cobre de 5 mil litros/dia para as destilarias

com potencial de produção de 30 mil litros/dia de aço carbono, depois para as de 60 mil litros/dia, feitas de aço

inox, chegando até os dias de hoje, nas destilarias de 1.200 mil litros/dia de aço inox (OLIVEIRA FILHO, 2013).

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para a de segunda geração (ou, de uma nova rota tecnológica), fato que permite observar uma

mudança da estrutura da indústria da cana-de-açúcar em relação ao processo inovativo.

Esse esforço pode proporcionar uma contribuição à discussão da natureza

multissetorial da atividade econômica, ao passo que o desenvolvimento da nova tecnologia –

etanol 2G – busca desenvolver uma nova rota tecnológica a partir de conhecimentos e

competências que estão à margem dessa indústria. Identifica-se (pelo menos de início) uma

interação intersetorial e entre firmas de diferentes segmentos, logo, compreender a

reconfiguração tecnológica do setor sucroalcooleiro brasileiro pode mostrar pelo menos em

alguns aspectos essa dinâmica setorial. Tal perspectiva é colocada por Nelson (2007, p. 38)

como uma das áreas que se deve avançar na perspectiva dos estudos da economia

evolucionária. Malerba (2002, p. 248) coloca que a interação entre os setores constitui um

campo de interesse da perspectiva dos estudos da economia industrial, que pouco se tem feito

nessa direção; segundo este autor, é necessário discutir as interações entre os setores e os seus

limites, saindo da armadilha dos estudos estáticos da estrutura industrial15

.

Nesta perspectiva, a pesquisa desenvolveu-se na direção de caracterizar esse processo

e identificar como o processo de inovação nesses termos altera as condições históricas desse

setor e, a partir dessa situação, extrair informações e elementos para compreender a dinâmica

do progresso técnico nos países periféricos, ou identificar elementos que contribuam com a

compreensão do desenvolvimento de tecnologias na periferia do sistema.

A figura 1 ilustra esquematicamente o encadeamento das questões de pesquisa, dos

objetivos, da hipótese e a construção da própria pesquisa, já que cada objetivo específico dá

origem a um capítulo da tese, os quais trazem informações e análises capazes de responder às

questões levantadas nesta investigação.

Desta forma, a figura 1 pontua qual é o escopo do trabalho e posiciona-o em relação

ao amplo quadro da temática dos biocombustíveis de segunda geração, o qual envolve

diversas opções tecnológicas e feedstocks para a obtenção de energia e outros produtos16

.

Ademais, a figura 1 deixa claro que o recorte analítico é um alvo em movimento, pois foca

15

Malerba (2002; 2007) indica que é possível realizar estudos dinâmicos abordando apenas um setor. Para tal

considera fundamental abordar as reverberações intersetoriais, ou seja, as relações resultantes das interações

entre os atores e dos elementos que permeiam as fronteiras setoriais. Para o autor, são estas ações que promovem

a própria mudança setorial. 16

Cherubini et al. (2009) demonstra a existência concomitante de múltiplas configurações de biorrefinaria, desta

forma, é possível produzir uma variedade expressiva de produtos provenientes da exploração integral da

biomassa. Os principais produtos da biorrefinaria são: biodiesel, bioetanol, biometano, biocombustíveis

sintéticos, alimentos, alimentos animais, fertilizantes, glicerina, biomateriais, químicos (os building blocks),

polímeros e resinas, biohidrogênio. Esta característica fica evidente no capítulo 4.

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28

nas ações dos atores em relação à mudança de rota tecnológica para obtenção do bioetanol a

partir da cana-de-açúcar, sendo esta situação uma fração do conjunto maior do

desenvolvimento da bioenergia. De tal maneira, a pesquisa promove a identificação das

características recentes do desenvolvimento do SSI da cana-de-açúcar do Brasil e, ao mesmo

tempo, contribui com a discussão sobre o avanço da bioenergia no país a partir de uma base

agroindustrial já estabelecida. Tal base apresenta possibilidades de reconfiguração técnica e

estrutural, passando a ser mais decisiva no conjunto econômico do país, pois fortalece a

tendência sustentável da matriz energética nacional e abre novos mercados (química verde e

biocombustíveis avançados).

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Figura 1. Encadeamento entre as questões de pesquisa e os objetivos da tese.

Fonte: Elaboração própria.

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30

A importância de um estudo acerca do desenvolvimento tecnológico do setor

sucroenergético é de fundamental importância para a compreensão da estrutura energética do

país, diversificada e mais interiorizada - menos dependente dos combustíveis fósseis - e no

seu sucessivo desenvolvimento, possibilita elaborar novas pesquisas e planos políticos deste

setor. Ademais, compreende-se que o setor em questão proporciona desenvolvimento

econômico a algumas regiões do país, sendo que o seu crescimento e a modernização da sua

produção induz transformações na sociedade, já que fomenta no seu conjunto uma ampla

quantidade e variedade de atividades econômicas correlatas através das suas inter-relações

(MORAES et al., 2016).

Abordagem metodológica

O ferramental analítico se apoia na análise do Sistema Setorial de Inovação, pois

possibilita trabalhar a inovação como um processo interativo entre uma grande variedade de

atores, enfatizando que as empresas não inovam isoladamente. Em outros termos, trabalha a

inovação como um processo coletivo. Portanto, buscou compreender como as empresas

interagem com outras empresas, bem como, com organizações não-empresariais para fazer

avançar a tecnologia, tendo como norte a exploração integral da biomassa (GUENNIFA &

RAMANI, 2012; JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &

RASIIAH, 2009; FREEMAN, 2008; MALERBA, 2007; MALERBA, 2002; LUNDVALL et

al., 2002; CARLSSON et al., 2002; MALERBA, 2003).

Nesta perspectiva, o ferramental analítico do SSI vai além do agregado e foca nas

particularidades que compõem a estrutura produtiva de uma nação, a partir das características

que compõem o setor, da identificação e compreensão dos agentes e das suas relações. O

conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da heterogeneidade

estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações (MALERBA, 2002), organizar as

evidências históricas e estudar os processos de catching-up17

dos países retardatários no que

diz respeito à acumulação de capacidades industriais (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;

OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).

Metodologicamente, a abordagem de Sistema de Inovação - nacional/regional/setorial

- é compreendida como focusing device, tendo como objetivo analisar e compreender o

17

Este conceito é compreendido como efetivação e continuidade do esforço para superação do atraso econômico,

social ou tecnológico que um dado país/região/setor possa apresentar em relação aos países líderes ou em relação

à fronteira do conhecimento (FARIA, 2014).

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processo de inovação, para além da dinâmica de alocação dos recursos (LUNDVALL et al.,

2009). Desta forma, explica a relação entre os agentes de diferentes origens, os quais em

conjunto desenvolvem e transmitem conhecimento economicamente útil. É uma alternativa

para compreender como as firmas e outras organizações adquirem novas habilidades e

competências (IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al., 2012).

A revisão conceitual dos Sistemas Setoriais de Inovação indica ser possível trabalhar

com a dimensão real do objeto, por intermédio da análise do concreto, priorizando o trabalho

empírico para caracterizar e compreender o setor em questão. Com isso, a construção da tese

adotou três procedimentos metodológicos, os quais caminham pari passu ao longo de todo o

trabalho, sendo utilizados à medida que se faz necessário confirmar suposições ou apresentar

argumentos válidos para sustentar as afirmações da pesquisa. Estes foram:

1) pesquisa bibliográfica;

2) trabalho de campo e entrevistas;

3) coleta e tratamento dos dados secundários.

Um detalhamento destas três estratégias investigativas está presente no primeiro

capítulo, o qual consiste em um capítulo teórico-metodológico, apresentando as bases

fundamentais da pesquisa.

Estrutura da tese

A pesquisa está organizada em cinco capítulos, além da presente introdução e da

conclusão final do trabalho. O primeiro capítulo coloca em evidência a discussão sobre

Sistemas Setoriais de Inovação (SSI) e inter-relaciona os principais conceitos e os processos

metodológicos utilizados pela pesquisa em cada momento do processo investigativo,

buscando compor uma visão integrada entre o conceito de SSI e o objeto de estudo. Esta

discussão busca dar base e contexto teórico para os próximos capítulos da pesquisa e, com

isso, proporciona a integração do trabalho com discussões mais gerais do campo de estudos da

Ciência, Tecnologia e Sociedade18

.

18

O estudo sobre o desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil pode contribuir com discussões sobre: 1)

desenvolvimento e características dos Sistemas Setoriais de Inovação de países em desenvolvimento; 2) novas

tecnologias em países periféricos; 3) inovação em setores baseados em recursos naturais; 4) desenvolvimento da

economia de baixo carbono; 5) desenvolvimento da bioeconomia; 6) diversificação e adensamento de setores

tradicionais; entre outros temas.

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O segundo capítulo tem a função de expor a gênese e a evolução da realidade

produtiva e inovativa do segmento sucroalcooleiro do Brasil. Isto se dá por meio da

reconstrução da trajetória de formação do Sistema Setorial em questão, apontando suas

características históricas e, principalmente, indicando o start da mudança em análise, ou seja,

o esforço da passagem da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração.

Assim, introduz o arcabouço institucional ligado ao segmento, bem como demonstra a sua

evolução ao longo do tempo, possibilitando uma noção geral e expondo os pontos de inflexão

que influenciam o redesenho do setor, os quais criaram condições para a estruturação da

produção do etanol no Brasil.

O terceiro capítulo tem por objetivo demonstrar a relevância das políticas públicas

para o fomento e o progresso das tecnologias disruptivas e/ou energias renováveis, pois

aponta a correlação das iniciativas nacionais de desenvolvimento tecnológico do etanol

celulósico com as políticas públicas implementadas na década de 2000, sendo estas medidas

institucionais decisivas para o start da produção do etanol de segunda geração. Desta forma, o

capítulo três apresenta quais são os designs destas políticas voltadas para o etanol 2G e indica

como estas ações institucionalizadas movimentaram e influenciaram o conjunto diferenciado

e importante de atores do SSI da cana-de-açúcar.

O quarto capítulo apresenta a dinâmica tecnológica do etanol celulósico, trabalhando

as bases do conhecimento e da tecnologia que sustentam o “novo” processo produtivo do

bioetanol, dando ênfase ao domínio tecnológico e aos atores que conduzem o processo de

inovação. A estruturação do capítulo quatro se dá especialmente pela análise de famílias de

patentes e de artigos científicos publicados internacionalmente. Por meio destes dados é

possível captar a dinâmica da tecnologia e do conhecimento ligada à exploração do material

lignocelulósico, dando contornos materiais e numéricos aos esforços de desenvolvimento ao

longo do tempo.

O quinto capítulo objetiva compreender as ações desempenhadas pelas firmas

envolvidas no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico no

Brasil. Para tanto, descreve e analisa a dinâmica dos mais importante atores que estiveram

e/ou ainda estão diretamente envolvidos com o processo de desenvolvimento, disseminação e

adaptação da tecnologia de etanol celulósico no Brasil. Portanto, é o capítulo responsável por

apresentar as ações e as interrelações das firmas responsáveis pelos primeiros projetos de

etanol celulósico no Brasil, com destaque para Petrobrás, CTC, GranBio e Raízen. Assim,

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confrontam-se as principais variáveis do conceito de SSI (instituições, nova base de

conhecimento, atores e etc.) com os casos concretos existentes no setor sucroenergético.

.

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34

CAPÍTULO 1. ABORDAGEM TEÓRICA E METODOLÓGICA PARA

ALINHAMENTO DA TESE: SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO E MODOS DE

INOVAÇÃO

O estudo setorial realizado por esta pesquisa se apoia na base teórica e conceitual da

abordagem de Sistemas de Inovação (FRERRMAN, 1985; LUNDVALL, 1985; FREEMAN,

1988; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; MALERBA, 1999; MALERBA, 2002). Os

principais pontos dessa abordagem são aqui indicados, entretanto, outros elementos e

conceitos são trabalhados ao longo da tese, à medida que a análise sobre o setor

sucroenergético avança e se faz necessário dialogar com o plano teórico.

Nesta perspectiva, o primeiro capítulo apresenta função dupla: introduz a discussão

sobre Sistemas Setoriais de Inovação (SSI) e apresenta os conceitos e os processos

metodológicos utilizados por esta pesquisa. Esta discussão busca dar base e contexto teórico

para as próximas etapas da pesquisa. Portanto, coloca o SSI como focusing device19

,

atrelando-o como instrumento para a compreensão da heterogeneidade estrutural dos países

periféricos, possibilitando uma articulação entre o conceito de SSI e objeto de estudo, com

vista a responder a pergunta central da pesquisa, ou seja, quais são os atores/elementos do

Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar que promovem o progresso técnico do setor

em direção ao etanol celulósico?

Para isso, o capítulo 1 encontra-se dividido em quatro seções. A primeira (1.1.) busca

expor o arcabouço teórico e os principais conceitos na discussão de SSI e criar uma base

comum para apoiar os outros conceitos que aparecem no decorrer do trabalho. A segunda

seção (1.2.) apresenta as definições e as diferenças entre as tecnologias de produção do etanol

de primeira geração e de segunda geração, demarcando as particularidades das rotas e das

sub-rotas tecnológicas do etanol celulósico20

. A terceira seção (1.3.) versa sobre a abordagem

metodológica subjacente à análise de Sistemas de Inovação, ou seja, articula as categorias da

abordagem de SSI com os procedimentos metodológicos e ações para a estruturação da

pesquisa, assim, destina-se a mostrar como se deram as ações de pesquisa. A quarta e última

seção (1.4.) apresenta as considerações finais do capítulo, estabelecendo um link com o

segundo capítulo.

19

ROSENBERG (1969). 20

A intenção é demarcar a temática do etanol celulósico, dando um panorama da corrida tecnológica em curso –

“ambiente” tecnológico no qual os atores do SSI da cana-de-açúcar visam participar.

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1.1. SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO E A HETEROGENEIDADE DA

ESTRUTURA ECONÔMICA

Os estudos setoriais são realizados há muito tempo, principalmente, na Economia

Industrial21

e na Geografia Industrial22

. Estas abordagens evoluíram de uma ênfase exclusiva

na identificação das diferenças entre os setores, considerando os limites setoriais estáticos,

para uma perspectiva mais complexa, buscando compreender as relações e a interdependência

setorial e, como estes segmentos se transformam alterando a sua própria forma e o seu

conteúdo, dando origem a novos estágios do desenvolvimento.

Nesta direção, a concepção de setor empregada por esta pesquisa é diferente da noção

de setor industrial, no qual as firmas são homogêneas e os produtos são indiferenciados,

distintos somente pelo preço. Parte-se da abordagem de Sistemas de Inovação (SI), onde

firmas e outras organizações são, em essência, agentes socioeconômicos com racionalidade

limitada, os quais buscam constantemente a interação e a complementaridade por processos

de comunicação, intercâmbio, cooperação, concorrência e comando (FREEMAN, 1982;

LUNDVALL, 1992; OYELERAN-OYEYINKA & RASIAH, 2009).

Adotar essa abordagem implica excluir os preceitos do mainstream, portanto,

compreende-se que os agentes econômicos não apresentam racionalidade perfeita, suas ações

não são sempre conduzidas para a maximização da sua posição ou dos seus lucros, pois os

comportamentos dos agentes dependem diretamente do contexto no qual estão inseridos, visto

que estes apresentam experiências acumuladas, motivações, crenças, objetivos e

oportunidades distintas (LUNDVALL, 1992; MALERBA & MANI, 2009). Todas estas

características estão diretamente relacionadas à cultura e a história do “local” de origem.

Ademais, no seu desenvolvimento, estes criam rotinas23

, ou seja, padrões de

comportamento que passam a conduzir as ações das firmas e das organizações, assim

estabelecendo trajetórias (NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1984).

A tendência geral ao equilíbrio, dada pela ideia de que as transações ocorrem sempre

em mercados puros e as relações são anônimas entre compradores e vendedores são

21

Diversas referências podem ser apontadas como bases indiretas do conceito de Sistemas Setoriais de Inovação,

entre elas têm-se os trabalhos de Alfred Marshall (1892) com o estudo da economia industrial, conceito de firma

e de clusters; Joe S. Bain (1956) com o desenvolvimento do Modelo de Estrutura-Conduta-Desempenho; Josef

Steindl (1952) com trabalhos sobre o funcionamento dos oligopólios. 22

Pierre George (1947); R. Guglielmo (1950). 23

São características persistentes dos organismos (as firmas). Estas rotinas determinam seu comportamento

possível frente à produção, à comercialização, às estratégias de gastos em P&D e muito mais. Embora o

comportamento real também seja influenciado pelo meio ambiente, o modo como a firma interage com o

ambiente/estrutura são aproximadamente coordenados pelas rotinas da firma (NELSON & WINTER, 1982).

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suplantadas pela interpretação de Sistemas de Inovação. Estes princípios são relegados, visto

que a própria singularidade e comportamento particular dos agentes econômicos impede esta

situação no mundo real. Todos estes princípios são reposicionados pela Teoria Evolucionária

e abordagem de Sistemas de Inovações. Os elementos teóricos e conceituais expostos no box

1.1. compõem a base analítica desta pesquisa.

Box 1.1. Bases da abordagem de Sistemas Setoriais de Inovação. A concepção de Sistemas Setoriais de Inovação tem origem nos estudos sobre o desenvolvimento

econômico e a organização industrial, sendo influenciada concomitantemente por um conjunto amplo de

vertentes interpretativas, as quais podem ser agrupadas da seguinte forma: 1) estudos que buscam compreender o

processo de desenvolvimento, entendidos aqui como aqueles que abrangem a dinâmica da destruição criativa,

elemento que impõem uma transformação constante aos setores econômicos e a sociedade em geral, fato já

percebido e analisado pelos economistas clássicos, Smith (1776) e Marx (1867), posteriormente, é revisitada e

aprofundada por Schumpeter (1912), Dosi (1982) e outros; 2) pesquisas sobre a dinâmica industrial e distritos

industriais, os quais compreendem a importância das externalidades derivadas da trindade marshalliana (mão de

obra especializada, presença de fornecedores especializados e transbordamentos locais de conhecimento); 3)

Concepção que considera relevante a interação, a interdependência, o processo de aprendizado e a construção de

competências desempenhadas pelas firmas como fatores centrais da relação entre progresso técnico e

desenvolvimento econômico; principalmente, os trabalhos alinhados à abordagem da Teoria Evolucionaria; 4) a

abordagem de Sistemas Nacionais de Inovações, a qual remete aos trabalhos de Friedrich List (1841) e são

reposicionados pelas pesquisas de Christopher Freeman (1982) e Bengt-Åke Lundvall (1985); nesta linha de

interpretação, a inovação é resultado de um processo interativo entre uma grande variedade de atores, a firma

não inova sozinha, pois a inovação é um processo coletivo, um fenômeno que ocorre a partir da interações. Com

isso, a atenção passa a ser dada também para elementos que estão “fora” da firma (as instituições, as políticas

públicas, institutos de pesquisa, universidade etc.). (MALERBA, 2002, KIN, 2006, LUNDVALL, 2007;

MALERBA & MANI, 2009; MALERBA & NELSON, 2011).

Com isso, a concepção de Sistemas Setoriais de Inovação surge como uma alternativa para os modelos

de interpretações neoclássicas e, especificamente, no campo dos estudos da Ciência, Tecnologia e Sociedade

(CT&S), mostra-se como uma evolução à ideia de chain-linked model de Kline & Rosenberg (1986),

contribuindo com uma perspectiva histórica e interdisciplinar, integrando os processos de aprendizado e a

construção de competência como elementos analíticos na análise da dinâmica setorial (IIZUKA, 2013).

Em decorrência destes posicionamentos, utiliza-se o conceito/abordagem de Sistema

Setorial de Inovação (SSI), definido em linhas gerais como um conjunto de agentes

heterogênios que realizam interações intermediadas pelo mercado ou fora dele24

, com o

objetivo de gerar, adotar ou fazer uso de novas ou estabelecidas tecnologias visando à criação,

a produção e a utilização de novos ou já existentes produtos e processos pertencentes ao

segmento produtivo em questão (LUNDVALL, 1992; MALERBA, 1999; MALERBA, 2002;

MALERBA, 2003; JOSEPH, 2009). Com isso, o SSI apresenta uma base de conhecimento, de

insumos e uma demanda particular, própria da sua existência.

Os agentes são indivíduos e organizações, dispostos em vários níveis de agregação,

com processos de aprendizagem, competências e estrutura organizacional específica. Estes

24

Relações essencialmente não determinadas pelo preço, as quais podem ser observadas em diversas formas, por

exemplo, a cooperação na atividade de pesquisa ou o network pessoal dos trabalhadores e pesquisadores.

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agentes são: 1) firmas; 2) institutos de pesquisa; 3) universidades; 4) agências e órgãos

governamentais; 5) associações de classe e patronais; 6) segmentos da sociedade civil

(stakeholders). Por conseguinte, estes agentes apresentam crenças, objetivos e

comportamentos próprios, suas relações são permeadas pela história e pela cultura do local,

assim, os processos desempenhados por estes agentes são enraizados no local. A união destas

características confere singularidade e especificidades aos setores econômicos (MALERBA,

2002; IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al, 2012).

Setores específicos demandam o desenvolvimento e a difusão do conhecimento

especializado, pois a estrutura das relações e o network criado pelos atores que compõem o

SSI é particular ao setor, por causa da multiplicidade da base de conhecimento e dos

processos de aprendizado que conformam as tecnologias e as demandas setoriais (JOSEPH,

2009). Essa realidade complexa é resultado da ampliação e diversificação das forças

produtivas, ou seja, da base material da organização social (COHEN, 2013).

Os SSI são abertos e evoluem, tornando-se sistemas complexos que englobam relações

internas às organizações e entre as organizações, instituições e a estrutura socioeconômica, as

quais determinam a taxa e a direção da inovação e da construção de capacidades

(LUNDVALL et al, 2009). Na abordagem do SSI foca-se nas relações entre os atores e as

fronteiras dos setores que se alteram ao longo do tempo, justamente, pela ação destes atores. É

uma visão multidimensional, integrada e dinâmica dos setores, buscando acompanhar a

evolução dos setores.

Desta forma, a abordagem permite interpretar, analisar e propor intervenções no nível

meso, fazendo necessariamente uma ponte entre o macro - formação social e econômica do

país25

– e o nível micro - dinâmica das firmas (JOSEPH, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &

RASIIAH, 2009). Assim, supera o agregado e foca-se nas particularidades que compõem a

estrutura produtiva de uma nação, a partir das características que compõem o setor, da

identificação e compreensão dos agentes e das suas relações (MALERBA, 2002; JOSEPH,

2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).

O conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da

heterogeneidade estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações, organizar as

evidências históricas e estudar os processos de catch-up dos países retardatários no que diz

25

Quando nos referimos ao nível macro pensamos nas condições gerais que dizem respeito ao processo de

desenvolvimento das nações, com isso, o recorte está sobre a dinâmica do progresso técnico, ou seja,

incorporamos e identificamos características gerais do Sistema Nacional de Inovação.

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respeito à acumulação de capacidades produtivas (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;

OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009). O setor sucroenergético brasileiro (mesmo

com todas as suas limitações26

) é um exemplo de construção de trajetória virtuosa, segmento

que além de produzir alimento e energia para o mercado interno, participa da pauta de

exportações do Brasil (commodities).

Este corolário interpretativo é utilizado para se aproximar da realidade produtiva e

inovativa do setor sucroalcooleiro do Brasil, buscando compreender sua organização, a

alteração da sua base de conhecimento em curso e os processos de construção de

competências desempenhadas pelos seus agentes, os quais procuram introduzir e desenvolver

novas tecnologias de exploração da biomassa da cana. Estas ações resultam na ampliação das

suas fronteiras setoriais e reposiciona as suas firmas em relação a novas demandas, como por

exemplo, o mercado de biocombustível de maior valor energético e menos impactos

ambientais (etanol celulósico, butanol, biodiesel etc.).

Ao sair do plano teórico e buscar a realidade material, percebe-se que o

desenvolvimento da base de técnica e de conhecimento dos setores são próprias das suas

funções e das suas características produtivas27

. Assim, mesmo com os seus agentes,

tecnologias e produtos se sobrepondo/justapondo a outras indústrias, as suas

questões/problemas são idiossincráticas, porque a natureza do mercado, o caminho da

inovação e a transformação do seu conteúdo e da sua função diferenciam-se

consideravelmente dependendo da composição das instituições e dos agentes que lhe

sustentam (OYELERAN-OYEYINK & RASHAH, 2009).

Com isso, a dinâmica setorial é própria do setor; mesmo com semelhanças aparentes,

os reveses e as benesses promovidas pelo setor são resultantes dos elementos particulares que

se aglutinaram em torno de um conjunto de fatores que não se repetem e não podem ser

encontrados em outros lugares ou indústrias. Deste modo, faz-se necessário os estudos

setoriais e os estudos de caso, pois para compreender as particularidades e o que há de geral

26

Dentro dessa visão mais positiva em relação ao setor sucroenergético é notório algumas debilidades, as quais

derivam da sua base técnica e outras que fazem presentes no SNI do Brasil. Tais como: 1) a cultura da cana-de-

açúcar e o etanol são altamente concentradas no Brasil, assim, não é um setor que apresenta inserção

internacional como outras culturas (milho e soja); 2) o setor mesmo tendo desenvolvido capacidade tecnológica

realiza a importação de pacotes tecnológicos (maquinário agrícola e insumos ); 3) impacto ambiental e

precariedade dos trabalhos na fase agrícola. 27

Tal discussão é sumarizada em relação ao setor sucroalcooleiro no capítulo 3 e capítulo 4, pois nota-se

claramente que a partir da década de 2000 firmas de outros setores (petróleo, química, biotecnologia) passam

atuar juntamente com atores tradicionais da indústria sucroalcooleira, isto é comprovado pelos dados disponíveis

nas bases de projetos de pesquisas aprovados pela FINEP e na titularidade das patentes depositadas nos diversos

escritórios de propriedade industrial.

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nessas organizações socioespaciais, são necessários recortes analíticos que se aproximem da

dinâmica histórica e econômica das diversas “partes” que compõem o todo – o território

nacional/economia nacional.

Os setores não só variam em termos de natureza da inovação, de dinâmica e de

transformação setorial, mas também de contexto em que tais mudanças ocorrem. Desta

maneira, o SSI em países em desenvolvimento pode amplamente aderir/apresentar diferentes

dimensões (JOSEPH, 2009). Diferentes entre si e entre seus “pares” do exterior, a

heterogeneidade da estrutura produtiva das nações periféricas promove uma singularidade em

relação aos países centrais (FURTADO, 1969), conferindo características particulares ao SSI

destes países.

A heterogeneidade estrutural dos países periféricos modela as características do

processo de inovação, que por sua vez, determina certos predicados da forma e do conteúdo

do desenvolvimento, a saber: 1) forte heterogeneidade entre as firmas; 2) predomínio de

inovações incrementais; 3) processo de difusão tecnológica se sobressai à introdução de

inovações; 4) grande importância dos setores baseados em recursos naturais; 5) setor

produtivo fortemente orientado ao mercado interno; 6) interação entre os atores do SNI são

débeis; 7) empresas multinacionais figuram como atores relevantes na atividade de P&D; 8)

historicamente as firmas nacionais são importadoras de tecnologia; 9) existe um descompasso

entre a produção de conhecimento e a estrutura produtiva; 10) baixa coordenação entre os

atores e as ações para o desenvolvimento (LALL & TEUBAL, 1998; CHAMINADE et al.

2009; MALERBA & MANI, 2009; IISUKA, 2009; LUNDVALL; 2009; PACHECO &

CORDER, 2010).

Estes elementos são comuns aos países em desenvolvimento e inegavelmente

presentes no Brasil, mesmo desenvolvendo um SNI complexo, com a presença de diversos

atores28

, não escapa aos problemas supracitados, pois existe um desequilíbrio interno

estrutural, que resulta em falhas sistêmicas29

que se mostram nos gargalos da circulação do

conhecimento e na ausência de elos ou atores que devem promovem o progresso da ciência e

da tecnologia.

28

Os trabalhos de Morel (1979), Pacheco & Corder (2010) e Brito Cruz (2010) reconstroem a história de

formação do SNI brasileiro e promovem uma noção de suas dimensões básicas. Ficando evidente a existência de

esforços internos em desenvolver uma estrutura de C&T no país, a qual temporalmente acompanha as nações

desenvolvidas, mas que apresenta resultados aquém de seus pares internacionais. 29

É a inabilidade do Sistema de Inovação em suportar a criação, absorção, retenção, uso e a disseminação de um

conhecimento economicamente útil por meio de aprendizado interativo ou investimentos internos de P&D

(CHAMINADE et al., 2009).

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Com isso, o Estado exerce um papel determinante na etapa de formação ou na

mudança dos SSI, principalmente, por meio de ações sistematizadas que visem o

direcionamento de uma rota tecnológica e o estabelecimento de um ambiente para o seu

contínuo desenvolvimento. Estas ações passam pela criação de organizações e instituições

“orientadas para a missão”, as quais promovem uma coordenação no sistema e constituem

materialmente na infraestrutura e no fornecimento de recursos e execução de atividades de

PD&I.

Ao se aproximar do objeto de estudo - etanol celulósico no Brasil30

– é possível

identificar os traços latentes da heterogeneidade estrutural e ao mesmo tempo perceber a

importância do Estado na/para a “superação” dessas características, as quais em última

instância são entraves para o processo de catching up. O caso estudado mostra que o SSI da

cana-de-açúcar avança em uma nova rota tecnológica e adquire novas competências

(tecnológicas e institucionais), mas carrega indubitavelmente problemas históricos e

estruturais semelhantes a outros setores econômicos do país.

Realizar este tipo de estudo contribui para identificar pontos fortes e fracos dos

segmentos econômicos e de suas instituições, contribuído para a compreensão da realidade e

para a tomada de decisão futura – planejamento e políticas públicas.

Assim, ao assumir o caráter particular dos SSI compreende-se que os caminhos para o

desenvolvimento não são únicos, mas sim maleáveis, promovidos a partir de como e do

quanto os países e os seus setores realizam investimentos em aquisição de capacidades

tecnológicas, fator central da moderna economia (OYELERAN-OYEYINKA & RASIAH,

2009). Pois os processos de desenvolvimento não se limitam à compra de máquinas e

aumento das taxas de investimento em P&D, mas se dão por meio da criação de capacidades e

competências31

para influir nas rotas tecnológicas e influenciar as cadeias globais de valor.

Os Sistemas de Inovação são resultados das instituições e da estrutura socioeconômica

existente no território nacional – em permanente coevolução. Assim, “o que você faz vai

refletir no que você sabe e será refletido em que você aprende, e por sua vez, é refletido na

estrutura econômica, principalmente, no tecido industrial” 32

(LUNDVALL et al, 2009, p.

30

O capitulo 3 e 5 trazem elementos concretos para demonstrar essa ação. 31

O recurso mais importante na moderna economia é o conhecimento e o mais importante processo é o

aprendizado, assim, os setores econômicos devem desenvolver no interior das suas firmas e organizações os

micro-fundamentos do aprendizado, os quais Lundvall (2007) denomina de Know-What, Know-Why, Know-How

e Know-Who. 32

Tradução própria.

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41

12). É por isso que a inovação é enraizada tanto nos processos de aprendizagem baseados na

ciência como nos processos baseados na experiência tácita dos indivíduos (JENSEN et al.;

2007; LUNDVALL, 2007; FREEMAN & SOETE, 2008).

Isso abre a possibilidade de manipular o padrão de especialização, a taxa de

aprendizado e a construção de competências. Em outras palavras, possibilita influenciar as

trajetórias de desenvolvimento dos países, principalmente, por intermédio da estruturação dos

setores econômicos.

Os elementos trazidos pela pesquisa, em especial os capítulos 2, 3 e 5, referenciam

esta dinâmica no SSI da cana, pois evidenciam as ações feitas ao longo do tempo pelo Estado

e pelos principais atores do sistema na direção do estabelecimento da produção e da

exportação do açúcar e, na sequência, ações deliberadas em estruturar a função energética ao

setor (etanol e energia elétrica). Na última década, ocorre um movimento coordenado

objetivando seguir a tendência mundial do desenvolvimento do etanol celulósico e da

exploração da biomassa visando um conjunto amplo de outros produtos.

Estes esforços impõem mudanças ao setor e, consequentemente, contribuem com o

progresso de diversas localidades33

, criando condições para aumento das arrecadações, novos

postos de trabalho, encadeamentos produtivo ao longo da cadeia de valor e o desenvolvimento

de atividades correlatas. Além destes efeitos econômicos e produtivos, o SSI da cana-de-

açúcar introduz ações na direção da bioeconomia, como será pontuado ao longo desta tese, já

que faz esforços em desenvolver tecnologias de exploração integral dos potenciais energéticos

da biomassa canavieira.

E, nessa direção, o que se percebe é que a condição do subdesenvolvimento ou de

retardo tecnológico pode ser superada, considerando que as condições sociais e econômicas

não são imutáveis. É nessa construção teórica que se vislumbra o processo de catch-up dos

setores econômicos e, por sua vez, das nações. Portanto, a construção da capacidade para

inovar e a própria inovação são os drivers para o catch-up (OYELERAN-OYEYINK &

RASHAH, 2009; RIBEIRO & ALBUQUERQUE, 2015).

33

Para uma melhor compreensão das dimensões territoriais do setor vide gráfico 2.9. Acrescenta-se, que a

produção em larga escala de etanol no Brasil tem efeitos socioeconômicos positivos na região Centro-Sul,

principalmente, nos municípios menos industrializados, de forma que a atividade sucroalcooleira aumenta o PIB

municipal per capita, estas são conclusões do trabalho desenvolvido por MORAES et al. (2016). O trabalho de

Martinez et al. (2013) indica que a expansão da indústria canavieira pode trazer impactos econômicos positivos

para o Brasil, principalmente para a região nordeste. A pesquisa de Varricho (2012) destaca a importância

econômica da indústria da cana, em 2006, a cadeia sucroalcooleira apresentou R$18,18 bilhões de Valor de

Transformação Industrial (VTI), sendo que a petroquímica apresentou R$ 12,32 bilhões e a indústria aeronáutica

R$ 3,43 bilhões no mesmo ano.

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42

A abordagem de SSI propicia a aproximação com os fatores condicionantes do catch-

up dos setores econômicos dos países periféricos, à medida que trabalha a singularidade

setorial de maneira concomitante com os processos externos ao setor34

e, os processos

internos ao setor, direcionando parte do esforço investigativo para a compreensão da dinâmica

das firmas e das organizações. Nesse intento, vários pontos são considerados, os quais se

alteram de país para país e de setor para setor. Existem evidências que indicam que dentro do

mesmo país, os fatores para catch-up dos setores são/podem der distintos35

.

Isso é resultado das condições sui generis do Sistema Nacional de Inovação (SNI), ou

seja, os níveis e os diferentes graus de especialização produtiva ou a posição que as firmas

locais ocupam na cadeia global de valor, influenciam diretamente na natureza dos elementos

que devem ser estimulados para gerar o desenvolvimento setorial/regional. As condições

estruturais, no nível de país, condicionam, pelo menos no momento inicial, as características

produtivas e inovativas do setor (LUNDVALL et al, 2009; JOSEPH, 2009).

Portanto, a noção de path-dependent36

é crucial para a compreensão da realidade atual,

pois as decisões e ações de agora são correlacionadas com as trajetórias assumidas no

passado; tanto para mudança como para a continuidade, o processo histórico de formação dos

setores é relevante. Com isso, o capítulo 2 apresenta os contornos históricos que estruturaram

e conduziram o SSI da cana-de-açúcar.

As premissas conceituais e teóricas indicadas aqui serão confrontadas e identificadas

no setor sucroalcooleiro, visando traçar um panorama atual do segmento, além de contribuir

com a compreensão dos problemas característicos do desenvolvimento tecnológico das nações

periféricas. Isso por que o setor mostra-se representativo das contradições e dos acertos do

país, apresentando elementos contraditórios e articulados que faz conviver com certa

“estabilidade” elementos modernos e atrasados.

34

Aborda e/ou relaciona as características do setor estudado com as condições da economia nacional e

internacional, observa as relações existentes entre as políticas de nível nacional com as setoriais, dependendo do

enfoque da pesquisa. Relaciona os elementos históricos de grande envergadura que corroboram para mudanças

estruturais na economia (exemplo: choques do petróleo, fato histórico que inaugura o desenvolvimento de

energias renováveis). 35

Os elementos que fazem avançar o setor sucroalcooleiro certamente são distintos da indústria de óleo e gás no

Brasil, que fatalmente, diferencia-se da indústria farmacêutica. As categorias e os conceitos que propiciam a

observação e análise destes são pontuados no subtópico 1.1.1. 36

Path-dependent nos trabalhos de David (1985) e Arthur (1989) foi usado para explicar trajetórias tecnológicas,

mas esse conceito pode ser estendido para as trajetórias institucionais, como indicam os trabalhos de North (1990

e 1994). De maneira geral, o conceito estabelece a importância da trajetória histórica, sendo as escolhas no

presente influenciadas pela base material herdada e pela matriz institucional do passado, portanto, a

compreensão das escolhas atuais passa pelo entendimento do processo de evolução e desenvolvimento do objeto

de estudo.

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43

Um exemplo deste fato é que algumas firmas apresentam o desenvolvimento do etanol

celulósico e colheita mecanizada enquanto outras firmas/fazendas presencia-se trabalhos

análogos à escravidão37

. Trata-se de mais uma prova da singularidade setorial e da

heterogeneidade estrutural das sociedades periféricas. Castillo (2013, p. 75) afirma que

“nenhuma atividade agrícola é mais representativa das contradições entre o interno e o

externo, isto é, entre as necessidades internas ao território nacional e a origem externa das

formas mais ativas de seu dinamismo”. Compreende-se com o seu trabalho, que o setor

comunga características próprias da modernização (transformações na base técnica e

organizacional próximas ao standard internacional) ao mesmo tempo, em que conserva

estruturas de poder e de exploração do trabalho e dos recursos naturais análogas ao latifúndio

definido por Celso Furtado em “Formação Econômica do Brasil” em 1959.

1.1.1. O desenvolvimento setorial e o processo de inovação

Compreender o processo de inovação requer compreender como as ideias, as

habilidades e o conhecimento são transferidos, difundidos e adquiridos. A concretização de

uma nova ideia requer a priori o processo de aprendizagem e, isso é estimulado pela pesquisa

científica ou pela experiência daqueles que cotidianamente colocam o conhecimento em

prática. Portanto, a identificação das características do processo de aprendizagem é a chave

para entender como os setores mudam e reposicionam as suas firmas. Assim, parte desta

pesquisa destina-se a identificar quais são as ações desempenhadas pelos principais atores do

SSI da cana-de-açúcar na busca da efetivação da produção do etanol celulósico no Brasil (vide

os capítulos 4 e 5).

Com isso, deve-se ter claro que o conhecimento não é automaticamente transferido e

utilizado. Sua utilização na produção exige esforços na articulação das diferentes capacidades,

dadas por processos anteriores (já acumuladas) ou por meio da absorção de conhecimento

externo (fora do setor ou fora do país) (COHEN & LEVINTHAL, 1990).

No atual estágio de desenvolvimento do sistema capitalista, o conhecimento é ao

mesmo tempo localizado e globalizado, assim, os avanços no conhecimento geram impactos

nos países em desenvolvimento (IIZUKA, 2013). Desta forma, a infraestrutura para inovação

37

20 empresas ligadas ao setor apareceram em 2014 na “lista suja do trabalho escravo”, cadastro feito pelo

Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), contando com todos os empregadores que tenham submetido

funcionários a condições análogas a escravidão (NOVACANA, 04/02/2014).

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44

deve ser desenhada para melhorar o acesso ao conhecimento e estimular o processo de

aprendizagem.

Os esforços locais devem buscar a criação de estruturas de ensino e pesquisa, a

criação de canais de comunicação com a comunidade internacional e a implementação de

instituições que ampliem e consolidem o conhecimento no interior das firmas e de outras

organizações, tais como: consórcios de P&D, fomento a inovação; aquisição de tecnologia;

treinamentos. Os esforços do SSI da cana-de-açúcar nessa direção são discutidos e analisados

nos capítulos 3 e 5.

O emaranhado destas ações na realidade concreta é analisado e interpretado por meio

do conceito de modos de inovação, indicados por Lundvall (2007, 2009) e Jense et al. (2007),

os quais nesta pesquisa são complementados pelo conceito de padrões de inovação

trabalhados por Malerba & Orsenigo (1996) e Malerba (2002; 2003). Os modos de inovação

compreendem processos distintos de aprendizagem, os quais podem ser agrupados pelas

categorias de STI-mode (Science-Technology-Innovation) e de DUI-mode (Doing-Using-

Interacting). Estas categorias analíticas possibilitam aproximar-se da realidade inovativa dos

setores econômicos, principalmente, dos países periféricos, uma vez que, estes modelos de

inovação aparecem de maneira incompleta e desarticulada nessas realidades.

Assim, a busca pelo desenvolvimento econômico, social e tecnológico passa pela

efetivação destes modos de inovação. Portanto, a compreensão do processo de inovação do

setor sucroalcooleiro - na passagem da produção de etanol de primeira geração para o etanol

de segunda geração - é construída pela efetivação destes dois modos de inovação.

Esta pesquisa não só constrói a narrativa a partir destes conceitos, bem como,

demonstra que estes modos se desenvolvem no interior do SSI da cana-de-açúcar, como

elementos reais, os quais conduzem a transformação do setor e ampliam seu escopo,

realizando uma aproximação da agroindústria sucroalcooleira com a biorrefinaria e a

bioeconomia. Tal aproximação ocorre à medida que direciona os seus esforços para a

exploração da celulose, por meio do desenvolvimento de processo de aprendizagem ligados à

ciência e à tecnologias disruptivas (capítulos 3, 4 e 5).

Com isso, definem-se os modos de inovação como regimes de aprendizagem do setor,

caracterizados por um conjunto de atividades que se aglutinam em torno do processo de

aprendizado. A base do STI-mode, o qual por definição está em sintonia estreita com

definição de Sistema de Inovação, centra-se na inovação promovida pelos esforços em P&D.

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45

Este modo de inovação sugere que tal processo é dado pela experimentação tipicamente em

laboratórios, a formalização e a codificação do conhecimento identificado (JENSEN et al.,

2007; LUNDVALL et al., 2009).

O modo de inovação DUI-mode, dado especificamente pelo conhecimento tácito e

localizado, refere-se ao aprendizado proveniente dos trabalhadores, quando estes enfrentam

mudanças no curso da efetivação da sua função (produção, comercialização), sobretudo,

vindo das interações externas. Foca assim no aprendizado interativo por meio das estruturas e

das relações (JENSEN et al., 2007; LUNDVALL et al., 2009).

A intensidade da utilização dos modos de inovação ocorre segundo a natureza dos

setores, do contexto e das estratégias das firmas e/ou dos países. O ponto fulcral está na

capacidade de conciliar e combinar os dois modos de inovação. Jensen et al. (2007)

demonstra que as firmas que se utilizam concomitantemente destes modos são mais

inovadoras e apresentam melhor desempenho econômico, superando as empresas que

realizam maiores gastos em P&D38

.

O quadro 1.1. sintetiza e define a interconexão entre os modos de inovação e os

padrões de inovação (Schumpeter Mark I e Schumpeter Mark II)39

. Os padrões de inovação se

referem à estrutura setorial e suas mudanças. Os modos de inovação relacionam-se com a

dinâmica e com o desempenho dos atores que compõem o Sistema Setorial de Inovação,

assim, o modo de inovação é dado pela estratégia de produção e comercialização dos bens e

serviços, tanto quanto pelo tipo e a intensidade das interações e dos feedbacks estabelecidos

na atividade inovativa entre as firmas e entre os atores não-firmas.

38

Jensen et al. (2007) trabalha com a realidade dinamarquesa, que se diferencia grandemente da brasileira,

entretanto, o modelo analítico e conceitual pode ser utilizado, objetivando a aproximação do objeto de estudo,

uma vez que, a trajetória de desenvolvimento do setor sucroalcooleiro é baseada em tecnologia de domino

público e em inovações incrementais. A ruptura tecnológica proposta pelo etanol celulósico pressupõe não

apenas aproveitar as competências acumuladas, como também, aprender em nova base de conhecimento,

sobretudo, com novas fontes de informação e novas áreas do conhecimento. 39

Estes conceitos derivam da interpretação schumpeteriana da relação entre o crescimento econômico e o

progresso técnico, pautando sobretudo na natureza da inovação introduzida em cada padrão (Mark I inovações

radicais e Mark II inovações incrementais) (SCHUMPETER, 1982; MALERBA, 2002).

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46

Quadro 1.1. Modos de inovação e padrões de inovação. Schumpeter Mark I Schumpeter Mark II

STI-mode

- Destruição criativa;

- Inovações radicais;

- Novos entrantes;

- Papel importante das novas

firmas inovadoras,

- O regime tecnológico é

caracterizado por:

a) alta oportunidade;

b) baixa apropriabilidade;

c) baixa cumulatividade.

- Pesquisa realizada na fronteira

do conhecimento e/ou “fora” da

rota tecnológica dominante;

-predomínio do conhecimento

codificado;

- Cumulatividade criativa;

- Inovações incrementais com adições técnicas e/ou

funcionais (inovações intermediarias);

- Prevalência das firmas já estabelecidas;

- Fortes barreiras à entrada;

- Presença de poucas grandes firmas;

- O regime tecnológico é caracterizado por:

a) alta apropriabilidade; b) alta cumulatividade;

- Uma evolução para o design dominante;

- Forte controle dos ativos complementares;

- Relações constantes com o sistema de fomento a

P&D;

- A busca de estratégias equilibradas entre exploitation

e exploration;

- A busca pelo controle do conhecimento tácito e

codificado (retroalimentação);

-Combinação do conhecimento local e global;

DUI-mode -

- Cumulatividade criativa;

- Inovações incrementais;

- Prevalência das firmas já estabelecidas;

- Fortes barreiras à entrada;

- Presença de poucas grandes firmas;

- O regime tecnológico é caracterizado por:

a) alta apropriabilidade; b) alta cumulatividade;

- Sistema de proteção intelectual fraco ou

desnecessário;

- Forte controle dos ativos complementares;

-Forte tendência ao lock-in tecnológico e

organizacional;

- Predomínio do conhecimento tácito;

- Conhecimento local;

Fonte: Elaboração própria.

Na intersecção entre STI-mode e Schumpeter Mark I tem-se uma realidade produtiva

instável, onde o padrão tecnológico ainda não foi estabelecido, situação característica de

períodos pré-paradigmáticos. Este momento é marcado pela introdução de inovações radicais,

assim, oferece janelas de oportunidades e, consequentemente, a entrada nas novas rotas

tecnológicas é “facilitada”, tanto para os velhos como para os novos atores.

Neste contexto se recria ou se substitui o padrão ora estabelecido, criando novos

negócios ou novos setores, portanto, representa uma mudança drástica, na qual novas

competências são requeridas para inovar, o que torna o domínio do conhecimento de fronteira

um preditivo óbvio, já que o desenvolvimento dos novos produtos ou processo – desde a

segunda revolução industrial – passam necessariamente pela intensificação do uso da ciência

como uma força produtiva (BRAVERMAN, 1974; HOBSBAWN, 1995; CASTELL, 1999;

STOKES, 2005; FREEMAN & SOETE, 2008).

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47

No ponto de contato entre STI-mode e Schumpeter Mark II tem-se um momento de

relativa estabilidade, no qual as firmas já pertencentes ao setor promovem o desenvolvimento

da rota tecnológica por meio de inovações incrementais, consolidando o standard do setor.

Não é um período de pouca inovação ou de baixo uso da ciência e da tecnologia, pelo

contrário, as diversas dimensões do processo de aprendizagem são colocadas em

funcionamento pelos atores estabelecidos, mecanismos de aprendizado provenientes dos dois

modos de inovação são utilizados.

Na Intersecção entre DUI-mode e Schumpeter Mark II prevalece a estabilidade, a

partir da introdução apenas de inovações incrementais com pouca diferenciação em relação à

tecnologia anterior, tanto no que se refere ao design ou a natureza do artefato ou do processo.

Existe o predomínio das grandes firmas, o setor tende a ser fortemente concentrado, assim,

apresenta fortes barreiras à entrada. O controle dos ativos complementares não só são

estratégicos para a manutenção da posição no mercado (TEECE, 1986), como são a principal

estratégia econômica das firmas líderes, assim, a concorrência pelo domínio do conhecimento

de fronteira é pouco relevante.

O duplo par de conceitos definidos no quadro 1.1. indica os elementos e as

características centrais que um SSI deve reunir para desempenhar a sua mudança estrutural ou

de conteúdo, sempre dependendo do estágio de partida40

. A alteração dos seus limites

setoriais, a sua base tecnológica e a sua demanda alteram-se segundo a presença e o

desenvolvimento destes elementos, assim, o processo de inovação olhado a partir dessa

perspectiva possibilita identificar os micro fundamentos que compõem o processo de

aprendizagem - Know-what, Know-why, Know-how e Know-who -, estes desempenhados

pelos atores ao longo do tempo, fazem evoluir a indústria ou transformam-na radicalmente

(LUNDVALL, 2007; LUNDVALL, 2009).

Ao trabalhar com as características particulares do desenvolvimento do SSI da cana-

de-açúcar à luz destes conceitos, tem-se uma compreensão do processo de evolução da

economia setorial e do desenvolvimento da rota tecnológica do etanol celulósico, pois a

assimilação destes elementos na realidade proporciona um retrato da dinâmica do progresso

técnico do setor sucroalcooleiro brasileiro.

40

De um regime tecnológico de alta oportunidade, baixa apropriabilidade e baixa cumulatividade para um

regime tecnológico de alta apropriabilidade e alta cumulatividade ou vice-versa. Situação pode-se inverter ao

longo do tempo.

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48

Ademais, este exercício se relaciona com os aspectos gerais, ou seja, o progresso

técnico de setores baseados em recursos naturais com baixa emissão de carbono, circunscrito

em países periféricos, característica que apresenta rebatimentos tanto na interpretação setorial

como na construção contínua da abordagem teórica de SSI (LUNDVALL et al., 2009).

Vale destacar que o trabalho de Jensen et al. (2007), bem como os casos apresentados

no livro “Handbook of Innovation Systems and Developing Countries” comprovam a

importância do DUI-mode para o desenvolvimento econômico, chamando atenção para a

realidade dos países nórdicos e de alguns países periféricos que lograram desempenho

internacional por intermédio deste modelo, assim, suplantando a noção de exclusivismo das

inovações baseadas em ciência. No caso do SSI da cana-de-açúcar este aspecto é amplamente

considerado por Furtado et al. (2011;2014) e Varricho (2012) ao analisar a trajetória de

desenvolvimento do setor no etanol de primeira geração.

O diferencial desta pesquisa é justamente se apropriar desta interpretação observando

o caminho inverso, acrescentando um novo olhar a esta dinâmica. Busca-se compreender a

mudança setorial e a inovação em curso, o setor baseado no DUI-mode que realiza esforços

sistemáticos na última década para emular o STI-mode, visando entre outros avanços à rota

tecnológica do etanol celulósico, assim, amplia as fronteiras do sistema e introduz novos

conhecimentos a base tradicional. Compreender esse caminho é importante, pois ele não é

fluído e apresenta contradições e limitações, que impõem desafios novos ao segmento41

.

A articulação do DUI-mode e STI-mode no interior do SSI da cana-de-açúcar contribui

para a promoção do Sistema de Inovação, e as ações do Estado brasileiro pró-cana/etanol

confirmam este fato, que segundo Lundvall (2007) e Andersen (2011) consiste em um

elemento característico de Sistemas de Inovações em países periféricos, os quais necessitam

de estímulos e ações complementares para suprir o fraco desenvolvimento espontâneo. Este

olhar, por sua vez, remete à tradição inaugurada por List (1841) e delimitada por Freeman

(1982), a ação ativa das políticas públicas visando à proteção e/ou desenvolvimento futuro da

indústria nacional.

Aproximação do SSI da cana-de-açúcar com estes elementos conceituais são

realizadas ao longo da tese, em que se pretende evidenciar a passagem de um modo de

inovação calcado no fluxo DUI para uma “organização” da atividade inovativa mais próxima

41

A identificação e a compreensão destes novos desafios é um dos resultados dessa pesquisa, que complementa

o objetivo central.

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49

de STI-mode. A passagem do etanol de primeira geração para o de segunda geração força esse

deslocamento, sendo um vetor para a reestruturação do processo de inovação setorial42

.

A passagem para o etanol de segunda geração é um caminho na direção do STI-mode,

esforço este que contribui com a ampliação dos processos de densificação e diversificação43

,

necessidades inerentes das trajetórias de desenvolvimento de setores baseados em recurso

naturais (ERICSSON et al., 2004; HELLSMARK & JACOBSSON, 2012; VARRICHO,

2012; FURTADO, 2013; ANDERSEN et al., 2015). Os dados organizados e analisados nos

próximos capítulos evidenciam esta dinâmica, que sozinha não proporciona o catching up do

país, mas pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento regional, para a

sustentabilidade da matriz energética, para o equilíbrio da balança comercial e proporcionar

ao Brasil a oportunidade de desenvolvimento de novos setores ligados à bioeconomia.

Considera-se que o conhecimento é o recurso mais importante da economia moderna.

Assim, o processo mais relevante para o crescimento econômico e para a mudança técnica é o

processo de aprendizagem, a maneira pela qual as pessoas e as organizações aprendem a fazer

algo, este processo é social, localizado e ativo, exigindo esforços dos envolvidos. Este

processo consiste na interação e na troca consciente de conhecimentos e de capacidades entre

indivíduos e organizações (LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; NELSON, 2005;

LUNDVALL, 2007). Para tal, compreende-se que a inovação reflete o processo de

aprendizado tanto quanto dele deriva (aprendizagem/inovação e inovação/aprendizagem).

Os modos de inovação (DUI x STI) caracterizam o processo de aprendizagem do

setor, portanto, a estrutura das relações com as fontes de informações, conhecimento,

tecnologias, práticas, recursos humanos e financeiros são partes integrantes da conjuntura

setorial, e por isso, figuram como foco da análise desta pesquisa, tanto quanto a própria

inovação em curso no setor, o etanol celulósico. Porque a “maneira de fazer” é tão relevante

quanto o que se faz para compreender as transformações setoriais, porque é na produção que

reside às relações sociais que desempenham a condução da realidade social e econômica.

42

Os elementos mobilizados para identificação da passagem do exclusivismo DUI-mode para uma formação

intermediaria de STI-mode no SSI da cana-de-açúcar estão sumarizados na conclusão deste capítulo e são

trabalhados ao longo da tese, com mais detalhes no capítulo 5. . 43

A densificação e a diversificação do SSI requer ampliar as capacidades internas de inovação, transformando a

exploração tradicional dos recursos naturais em cadeias produtivas mais complexas e integradas à base de

conhecimento científico e tecnológico produzida internacionalmente, visando explorar a economia de escopo, ou

seja, com a mesma matéria-prima produzir uma ampla variedade de produtos e serviços. Tal dinâmica é

espelhada nas experiências de países como Noruega, Finlândia e Suécia (VARRICHO, 2012; FURTADO, 2014;

ANDERSEN et al, 2015).

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50

O SSI da cana-de-açúcar mesmo apresentando baixa atividade inovativa

historicamente (VARRICHO, 2012; BIN et al., 2015; SALES-FILHO; 2016), mostra-se como

um caso nacional relevante de desenvolvimento regional e técnico, pois demonstra

competência acumulada, criação de infraestrutura produtiva e de pesquisa ao longo de mais de

cem anos, construindo uma trajetória de aprendizado ascendente, baseadas fortemente no

DUI-mode (FURTADO et al, 2011; ANDERSEN, 2011). Situação que se tornam mais

complexas com as tentativas de densificação e diversificação cunhadas ao longo da década de

2000, vislumbrando desenvolver novas tecnologias para a exploração da biomassa.

Por conseguinte, sua análise contribui com a compreensão de problemas relacionados

à inovação e ao desenvolvimento industrial no nível do país, não se limitando apenas ao

enfoque da cana-de-açúcar. A dinâmica identificada neste setor pode em grande medida ser

estendida para outros segmentos, pelo menos como modelo explicativo, já que apresenta

contradições representativas da dinâmica e da formação territorial brasileira (CASTILLO,

2013). Como, por exemplo, a baixa capacidade de coordenação dos agentes e a ausência de

instituições de pesquisa especializadas, situação que recebeu forte atenção no período por

parte do Governo Federal e do Estado de São Paulo, assim, tal problemática no setor

sucroenergético conta com uma nova dinâmica, a qual pode ser comparada com segmentos

que não receberam a mesma atenção44

.

1.2. DEFINIÇÕES DO “DESAFIO TECNOLÓGICO”: O ETANOL CELULÓSICO

O empenho em substituir o carbono de origem fóssil pelo carbono renovável, a partir

da biomassa, estimula um conjunto amplo de firmas a desenvolverem estruturas produtivas

cada vez mais próximas da biorrefinaria. Este esforço tende a inaugurar um novo paradigma

tecnológico, em que os biocombustíveis, a bioenergia, os bioquímicos, os biomateriais, e a

alimentação humana e animal podem ser eficientemente co-produzidos.

Desta maneira, Cherubini et al. (2009) aponta que a produção dos biocombustíveis

avançados é vista como a força motriz do desenvolvimento futuro da biorrefinaria, uma vez

que incide diretamente no setor que mais emite CO2, o setor de transporte, sendo responsável

44

O capítulo 3 e 5 demonstram alguns dos efeitos proporcionados pela criação do CTBE e da Embrapa

Agroenergia, bem como das ações da FAPESP e do programa de apoio conjunto à inovação do BNDES-FINEP,

medidas que adicionam novas características ao SSI da cana-de-açúcar.

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51

por 23% da emissão de CO2 relacionadas as atividades energéticas, correspondendo a 6,7

GtCO2 (IPCC, 2014).

A produção do etanol celulósico encontra-se em fase pré-paradigmática, permeada por

incertezas, em que as rotas tecnológicas concorrem para estabelecer o standard da produção.

Ademais, os problemas tecnológicos e relacionados à logística da biomassa impõem barreiras

difíceis de serem superadas.

O que se observa de forma geral são iniciativas pontuais com plantas demonstrativas e

plantas comerciais ainda em fase de comissionamento45

. Entretanto, estas iniciativas estão

inseridas em um conjunto de ações de grandes empresas e de governos nacionais, os quais

buscam conformar um novo estágio de desenvolvimento do setor de biocombustíveis,

ampliando as possibilidades de evolução do segmento, com novas áreas de exploração de

matéria-prima e novos mercados consumidores46

.

As iniciativas em curso resultam em expectativas de desenvolvimento futuro e

inflexão das curvas de aprendizagens. Em 2005 a capacidade de produção instalada no mundo

era de 0,05 bilhões de litros de etanol celulósico, passando para 1,51 bilhões de litros em 2016

(GUNDRY, 2016). A tabela 1.1. indica a capacidade produtiva instalada por regiões do

planeta.

Tabela 1.1. Capacidade instalada de produção de etanol celulósico. Região Capacidade instalada

(milhões de litros)

Total no mundo

(em %)

EUA 490.37 34%

China 340.19 24%

Canadá 303.45 21%

Brasil 177.34 12%

EU 130.83 9%

Total 1 442.18 100%

Fonte: UNCTAD, 2016.

Segundo o relatório da UNCTAD (2016), é previsto um crescimento de 50% no

mercado de biocombustíveis de segunda geração entre 2014-2020 e o seu valor em 2020 será

de US$ 23,9 bilhões. Desta forma, a busca por figurar como um dos países postulante a

produtor e desenvolvedor da tecnologia do etanol celulósico é fator preponderante para

estabelecer posição de destaque no próximo estágio de desenvolvimento, da difusão

45

Comissionamento é o processo de assegurar que os sistemas e componentes de uma unidade industrial

estejam projetados, instalados, testados, operados e mantidos de acordo com as necessidades e requisitos

operacionais do proprietário. Na prática, o processo de comissionamento consiste na aplicação integrada de um

conjunto de técnicas e procedimentos de engenharia para verificar e testar cada componente físico do

empreendimento. 46

Os esforços do SSI da cana-de-açúcar são representativos desta dinâmica, vide capítulo 3 e capítulo 5.

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52

tecnológica. Em 2016 as barreiras à entrada ainda são permeáveis, sendo possível identificar

“janelas de oportunidades” a serem exploradas pelo setor sucroalcooleiro47

.

Em adição ao contexto internacional, existem outros motivadores para o

desenvolvimento da tecnologia de segunda geração, como a indispensável tarefa de resgatar a

atratividade econômica do etanol, cuja competitividade se reduziu nos últimos anos, entre

outros motivos, pelo amadurecimento de seu atual paradigma tecnológico (vide tabela 1.2.).

Ademais, o etanol celulósico pode significar um aumento na produtividade do setor de até

50% em relação ao nível atual (MILANEZ et al. 2015; CTBE, 2016).

1.2.1. A tecnologia de produção do etanol (E1G)

O conjunto tecnológico que sustenta a produção sucroalcooleira no Brasil é a

tecnologia de primeira geração, tecnologia já madura e de domínio público (vide tabela 1.2.).

Com isso, seus ganhos foram incrementais, dados a partir da ampliação da escala dos

equipamentos e do melhoramento da eficiência dos mesmos, conseguida, principalmente, pela

prática do seu uso e da sua produção – DUI-mode (LIBONI & TONETO JR, 2008; NEGRI,

2010; ONOYAMA, 2011; VALENTE et al., 2012; VARRICHO, 2012; OLIVEIRA FILHO

& SILVEIRA, 2013). A tabela 1.2. indica a maturidade dos principais processos

desempenhados na fase industrial.

47

Esta afirmação pode ser feita levando em consideração que o Brasil tem acompanhado o movimento em

relação ao etanol celulósico, entretanto, como será discutido nos capítulos 4 e 5, o domínio da tecnologia parece

figurar sobre o domínio de empresas estrangeiras e os projetos instalados em solo nacional são baseados em

aquisição de pacotes tecnológicos. Desta forma, o protagonismo do Brasil deve ser observado com certo

cuidado, em um cenário onde as oportunidades existem, mas as dificuldades impostas no momento ainda não são

enfrentadas pelas empresas brasileiras e nem pelo Estado nacional na proporção que estas demandam. A

observação dos dados de patentes e a não diversificação das políticas públicas pró etanol celulósico indicam essa

situação retardatária.

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Tabela 1.2. Resultados da evolução tecnológica - tecnologia disponível no setor industrial – 2011.

Processo e equipamentos

Início do

PROÁLCOOL

(1975)

2011

Capacidade de moagem (TCD)-6x78” 5.500 15.000

Tempo de fermentação (h) 24 6 - 8

Teor alcoólico do vinho (oGL) 6,5 até 16

48

Rendimento extração (% aç. cana)-6 ternos 93 Moenda=97;

Difusor = 98

Rendimento fermentativo (%) 80 92

Rendimento da destilação (%) 98 99.5

Rendimento Total (l bioetanol.hidr./t cana) 66 87

Consumo total de vapor (kg/t cana) 600 320

Consumo vapor-anidro (kg/l) 4,5 2,0

Caldeira-Eficiência (% PCI)

Pressão (bar) / Temperatura (ºC)

66 89

21 / 300 120/ 540

Bagaço excedente (%)-usina de bioetanol Até 8 até 78

Bioeletricidade excedente exportável p/ 12.000 TCD – Us. bioetanol

(só bagaço) (MW) - 50,7

Biometano a partir de vinhaça (Nm3/lbioet). - 0,1

Produção de vinhaça (l vinhaça/l bioetanol) 13 5.0/0,8

Consumo água captação (l água/l bioetanol) 262,5 (-) 3,7

Fonte: DEDINI, 2012; OLIVEIRA FILHO, 2013.

Antes do Proálcool, a produção de etanol no Brasil era obtida, essencialmente, do

chamado álcool residual, que tinha como matéria-prima o melaço, ou mel final, subproduto da

fabricação do açúcar. A partir de 1976, começaram a surgir as chamadas destilarias

autônomas, que produziam somente etanol a partir do caldo de cana. Em paralelo, foram

sendo instaladas destilarias anexas às fábricas de açúcar existentes. Com o crescimento das

exportações de açúcar, as destilarias autônomas foram, na sua maioria, convertidas em usinas

de açúcar e etanol.

Atualmente o processo de fabricação do etanol consiste na fermentação em batelada

alimentada com reciclo de fermento, que representa 80% do total (CGEE, 2009). Trata-se de

um processo que teve início no período do Proálcool, nos anos 1970, e que envolve: 1) a

recepção da matéria-prima na usina; 2) o preparo da cana (corta e retirada dos resíduos vindos

do campo); 3) a moagem da cana com o objetivo de extrair o caldo; 4) tratamento e

processamento do caldo, em que parte se destina a fábrica do açúcar (Evaporação, Cozimento,

Centrifugação e Secagem49

) e uma fração destinam-se à fabricação do etanol (fermentação e

destilação); 5) disposição de efluentes; 6) a estocagem dos produtos finais.

48

Segundo entrevista ENTREVISTA VI a media das destilarias conforme Registro do Controle do CTC o teor

alcoólico do vinho é de aproximadamente 8,5ºGL. 49

Evaporação - após o tratamento, obtemos um caldo de cana transparente, de cor levemente amarelada que

contem basicamente água, sais minerais e açúcares. A finalidade da evaporação é a retirada de pelo menos 75%

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No interior da usina, o processo ocorre da seguinte maneira: o caldo após estar

completamente puro, é levado a domas (tanques) no qual é misturado juntamente com um

fermento de leveduras (fungos, sendo mais comum a levedura de Saccharomyces cerevisia).

Esses micro-organismos se alimentam dos açúcares presentes no caldo. Nesse processo, as

leveduras quebram as moléculas de açúcar (C6 - Sacarose), transformando elas em duas

moléculas de etanol (2 C2H5OH) e mais duas moléculas de gás carbônico (2 CO2)50

(CGEE,

2009; CHAGAS, 2012).

Estando o etanol misturado ao vinho fermentado, o próximo passo é separá-lo da

mistura por meio da destilação. Nesse processo, o líquido é colocado em colunas de

destilação, nas quais é aquecido até se evaporar. Na evaporação, seguida da condensação

(transformação em líquido), é separado o vinho do etanol. Com isso, fica pronto o álcool

hidratado, usado como etanol combustível, com grau alcoólico em cerca de 96%. Para a

obtenção do álcool anidro têm-se a desidratação. Este processo consiste em retirar o restante

de água contido no álcool hidratado (CHAGAS, 2012).

1.2.2. A tecnologia de produção do etanol (E2G)

O objetivo da tecnologia de segunda geração é realizar a produção do etanol a partir da

biomassa, material vegetal que é formado pela celulose, pela hemicelulose e pela lignina. Esta

matéria-prima pode ser originada dos resíduos agroflorestais ou por cultivos energéticos, as

quais são especialmente cultivadas para este fim, como o caso da cana-de-açúcar, do sorgo

sacarídeo, do milho entre outros (LEITE & LEAL, 2007; DEMIRBAS, 2008; TAYLOR,

2008; MATHEWS et al., 2011). Ademais, esta tecnologia elevaria a produção do

biocombustível sem aumentar a área plantada de biomassa, já que utilizaria o material

lignocelulósico.

da água presente nesse caldo clarificado para transformá-lo em um xarope concentrado, com aproximadamente

65° brix (% de sólidos solúveis).

Cozimento – esta etapa visa a cristalização e recuperação de 80% a 85% da sacarose presente no xarope. O

sistema utilizado transforma o xarope em massa que posteriormente será centrifugada.

Centrifugação - após o cozimento, a massa passa por um processo de separação física (centrifugação). O açúcar é

centrifugado e lavado com água quente e vapor, tendo como subproduto o mel que poderá ser utilizado no

processo de fabricação de etanol.

Secagem – após a centrifugação, o açúcar é encaminhado aos secadores para a secagem e, posteriormente

peneirado. Na sequencia, é envasado em big-bags de 1200Kg e armazenado para comercialização. 50

O processo de fermentação dura diversas horas e como resultado produz o vinho, chamado também de vinho

fermentado, que possui leveduras, açúcar não fermentado e cerca de 10% de etanol.

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55

De maneira geral, a tecnologia de segunda geração visa ter acesso aos açúcares

contidos na celulose e na hemicelulose, ou seja, a técnica consiste em aproveitar os açúcares

nas moléculas da sacarose que estão protegidos por uma “espessa” camada de fibras. Para

isso, as técnicas de pré-tratamento da biomassa devem quebrar as cadeias de polissacarídeos,

que unem as moléculas da parede celular das plantas.

Esta tecnologia realiza o desmonte da parede celular, pois a estrutura dos vegetais

envolve a celulose em camadas compostas de uma combinação da lignina e da hemicelulose

(estrutura protetora da célula), que se desenvolveu ao longo de centenas de milhões de anos

exatamente para protegê-la de agentes externos (PERRONE et al., 2011; MAIO;

HENNESSY; BABCOCK, 2012; SCHUTZ, 2012; ZILBERMAN et al., 2013;

GUSTAFSSON et al., 2014; MURAKAMI, 2015);

A produção do etanol celulósico apresenta duas rotas tecnológicas distintas que

mostram-se em melhores condições para se estabelecerem como dominantes: a termoquímica

e a bioquímica. A rota termoquímica consiste em transformar a biomassa em biogás através

do processo de gaseificação, que posteriormente são transformados em etanol e/ou em outros

líquidos (Gás de Síntese). O processo denomina-se conversão, ou seja, passar a matéria do

estado sólido para o estado gasoso. O resultado desse processo são os gases CO2, H2, CO e o

vapor d’água51

.

A rota bioquímica se subdivide em duas alternativas tecnológicas distintas, pois

utilizam catalisadores de natureza diferente: a rota química ocorre através da hidrólise ácida,

já a rota biológica se dá pela hidrólise enzimática, a qual ocorre através da ação dos micro-

organismos (fungos e bactérias). A hidrólise é uma reação química que tem por objetivo

quebrar as cadeias de carbono. Ela ocorre a partir da ação dos micro-organismos (fungos e

bactérias) e possibilita a quebra das moléculas devido à adição de água; nesse caso a água tem

acesso às moléculas pela dissolução das fibras que compõem a hemicelulose e a lignina.

O processo de hidrólise ácida consiste em utilizar um ácido forte para atacar as

ligações glicosídicas entre os monossacarídeos de um polissacarídeo. Esse processo, de

desmonte das células, é feito de maneira rápida, por meio da adição de ácidos ao composto de

51 A gaseificação pode ser definida como o processo de conversão termoquímica de um material sólido ou líquido (que

contém carbono na sua composição) em um produto gasoso combustível (gás de síntese), através da oxidação parcial à

temperaturas elevadas (reações termoquímicas numa faixa de temperaturas de 800°C a 1100°C) e em pressões atmosféricas

ou maiores, até 33 bar. (CORAL, 2009, p. 32). Toda essa reação ocorre através da queima da biomassa. Enfim, os processos

da rota termoquímica que são conhecidos como processos BTL (Biomass To Liquid) são na verdade sistemas de gaseificação

que operam de forma a limitar a oxidação completa do hidrogênio pela água, e do monóxido de carbono para dióxido de

carbono, assim, obtêm o gás de síntese, gás que será sintetizado por uma reação catalítica, o que torna possível a obtenção de

hidrocarbonetos, dos álcoois, do hidrogênio, da amônia, e do gás natural sintético. (LORA et al., 2008).

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biomassa e, ao mesmo tempo, do controle da temperatura desta mistura, primeiramente

elevando a temperatura e na sequência (em poucos minutos) forçando a queda da temperatura.

Preservam-se assim intactos os monossacarídeos que serão usados para fermentação. De certa

forma, o composto recebe um “choque térmico” para que os ácidos não agridam os açucares.

A hidrólise enzimática é o processo tecnológico mais promissor como apontam os

trabalhos de Leal & Leite (2007); Nyko et al. (2010); Zilberman et al. (2013); Raele et al.

(2014); FAPESP (2015); Silveira et al. (2016); UNCTAD (2016) . As maiores expectativas

para a difusão da tecnologia de etanol celulósico ao longo prazo estão depositadas na

possibilidade de utilizar a “maquinaria bioquímica” de micro-organismos (fungos e bactérias)

para “desmontar” a parede celular. O problema é que, assim como os fungos desenvolveram

estratégias para invadir a parede celular, as plantas também co-evoluiram para sofisticar seus

mecanismos de defesa. Assim, embora haja fungos capazes de degradar a parede celular

vegetal, ela é bastante recalcitrante à degradação (BUCKERIDGE et al., 2010).

O desafio está em quebrar a estrutura da celulose que está organizada em grandes

estruturas chamadas polissacarídeos, que as leveduras não conseguem fermentar diretamente

para converter em etanol, mesmo após o processo de pré-tratamento. Com isso, a tecnologia

enzimática consiste em realizar a conversão bioquímica da celulose em açucares (glicose e

xilose) por intermédio das enzimas, proteínas produzidas por fungos, bactérias e plantas

capazes de causar reações químicas específicas, sem sofrer alteração em sua composição,

dessa maneira, sendo capazes de extrair açúcares da celulose para a produção de etanol

(FAPESP, 2010).

O quadro 1.2. pontua alguns problemas ainda não superados pelo arcabouço científico

e tecnológico do etanol de segunda geração, reforçando que se configura neste caso uma

corrida tecnológica a nível internacional em aberto. A produção do etanol celulósico ainda

encontra-se em uma fase pré-paradigmática permeada por incertezas, na qual as rotas

tecnológicas concorrem para estabelecer o standard da produção.

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Quadro 1.2 Dificuldades tecnológicas ainda não superadas no etanol celulósico. Rota ácida Rota enzimática Rota termoquímica

* Alto custo de

investimento,

principalmente em

maquinário (devido à

natureza do material

dos equipamentos);

* Material resistente a

reações químicas que

sejam compatíveis com

os preços praticados no

setor.

* Desenvolvimento de sistemas de pré-

tratamento adequados para diferentes tipos de

biomassas;

* Desenvolvimento de processos de

destoxificações do produto da hidrólise;

* Desenvolvimento de novos tipos de enzimas

(selecionar micro-organismos ou desenvolver

geneticamente);

* Desenvolvimento de novas cepas de leveduras

capazes de fermentar os compostos hidrolisados

(C5).

* Os mecanismos/reações relacionados à

hidrólise enzimática não são bem conhecidos,

necessitando de investimentos em pesquisa

básica.

* São requeridas plantas

de grande capacidade para

alcançar viabilidade

econômica (alto custo de

investimento inicial);

* São requeridas grandes

quantidades de matéria

primas (planta

termoquímica = 500 t/h de

biomassa seca).

Fonte: elaboração própria.

- Hidrólise enzimática

A evolução da tecnologia enzimática requer o desenvolvimento ou a seleção de

microrganismos capazes de hidrolisar52

a celulose, tendo como subproduto açúcares (Hexoses

e Pentose) que devem ser fermentados e posteriormente destilados. A direção do

desenvolvimento desta tecnologia é a junção de todas as etapas em apenas um reator, ou seja,

realizar o pré-tratamento, a hidrólise, a fermentação e a produção de enzimas no mesmo

equipamento, utilizando-se do mesmo “conjunto” de micro-organismos, os quais devem ser

tolerantes as altas concentrações de etanol e produzir exclusivamente o etanol.

Este processo produtivo integrado é denominado de Consolidated Bioprocessing

(CBP), considerado como o ponto final na evolução da tecnologia de conversão da biomassa

(HARUN et al.; 2011; DAL POZ et al., 2015).

Portanto, o que se apresenta em 2016 são esforços em melhorar e desenvolver os

processos, tornando-os mais eficientes e integrados. Estas ações traduzem-se em um variável

grupo de modelos tecnológicos, a saber:

Separate Hydrolysis and Fermentation (SHF),

Separate Hydrolysis and Co-Fermentation (SHCF),

Simultaneous Saccharification and Fermentation (SSF),

Simultaneous Saccharification and CoFermentation (SSCF),

Consolidated Bioprocessing (CBP)

52

Processo químico de decomposição ou alteração de uma substância que envolve a divisão de uma molécula

pela água. (MICHAELIS, 2016)

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De maneira geral, a tecnologia do etanol celulósico baseada na rota enzimática

apresenta as seguintes etapas53

: 1) pré-tratamento, 2) hidrólise; 3) fermentação e 4) destilação.

O nível de integração das etapas determina as características do modelo tecnológico do etanol

celulósico. Destaca-se, que a destilação ocorre igualmente ao etanol de primeira geração. A

figura 1.1. representa as diversas configurações que a tecnologia do etanol celulósico pode

assumir.

O pré-tratamento da biomassa consiste em uma degradação parcial da sua estrutura, no

qual o material lignocelulósico passa por um processo facilitador para a ação posterior dos

microrganismos. Os mais “comuns” são a explosão a vapor54

, a utilização de ácidos com

temperatura e pressão controladas55

, o hidrotérmico e o processo Organosolv; estas ações

abrem os caminhos para os agentes biológicos hidrolisarem as cadeias de polissacarídeos na

etapa seguinte, assim, o resultado do pré-tratamento é a separação da biomassa em celulose,

hemicelulose e lignina. As duas primeiras estruturas celulares serão hidrolisadas e a lignina56

será aproveitada para geração de energia elétrica, por meio da sua queima nas caldeiras

visando à geração de vapor.

Figura 1.1. Configurações tecnológicas do etanol celulósico – rota enzimática.

Fonte: elaboração a partir de BEVILAQUA, 2009.

53

Estas etapas ocorrem após o recolhimento, limpeza e secagem da matéria-prima. 54

A Iogen Corporation detém tecnologia baseada nesse processo, vale destacar que está presente na cooperação

tecnológica com a Raízen. 55

Uma das opções mais difundidas baseada nesse princípio é o Organosolv, pré-tratamento do material e

hidrólise são realizados simultaneamente num reator contínuo. A tecnologia desenvolvida pela Dedini Indústria

de Base é baseada nesse conceito 56

A lignina não é um hidrato de carbono e não pode ser hidrolisado e fermentado.

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O segundo processo é a hidrólise enzimática. Como foi dito anteriormente, visa à

quebra da estrutura celular da celulose para obtenção da glicose (C6) e da xilose (C5). Esta

ação não é trivial, visto que os compostos enzimáticos apresentam rendimentos heterogêneos,

dependendo do tipo da biomassa e do pré-tratamento desempenhado. Assim, é necessário

ampliar os desenvolvimentos em engenharia genética para desenvolver fungos ou bactérias

adequadas para cada tipo de material ou um conjunto biotecnológico capaz de atuar

igualmente independente das condições da biomassa.

O terceiro processo é a fermentação da glicose e da xilose. Esta etapa é complicada,

pois as leveduras tradicionais, tais como a Saccharomyces cerevisiae, não conseguem

fermentar estruturas compostas por cinco carbonos (a xilose), assim, é necessário separar esta

etapa em duas, com isso, aumentam-se os custos e desperdiça-se uma quantidade expressiva

de açucares para a produção de etanol. A outra opção é a utilização de Organismos

Geneticamente Modificados (OGM) para realizar este processo de maneira completa, de tal

modo, a busca do setor nessa etapa produtiva é por novas variedades de leveduras.

A configuração mais madura para a produção do etanol celulósico, que está agora na

fase de demonstração e comissionamento, é a realização de todas as etapas de hidrólise e

fermentação em reatores separados; este conjunto tecnológico é denominado de Separate

Hydrolysis and Fermentation (SHF). Portanto, os esforços de desenvolvimento caminham na

direção da superação dos pontos de estrangulamento do pré-tratamento, que é relativamente

caro e ineficiente. E, na busca por micro-organismos geneticamente modificados, com a

remoção e adição de características genéticas que permitam a redução do número de etapas do

processo de conversão. A evolução tecnológica caminha para a combinação e realização

conjunta desses processos em um mesmo reator (HARUN et al.; 2011; MAIO; HENNESSY;

BABCOCK, 2012; DAL POZ et al., 2015).

1.3. A ABORDAGEM METODOLÓGICA SUBJACENTE À ANÁLISE DE SISTEMAS

DE INOVAÇÃO

O ferramental analítico se apoia na análise do Sistema Setorial de Inovação, pois

possibilita trabalhar a inovação como um processo interativo entre uma grande variedade de

atores, enfatizando que as empresas não inovam isoladamente. Em outros termos, trabalha a

inovação como um processo coletivo. Portanto, buscou compreender como as empresas

interagem com outras empresas, bem como, com organizações não-empresas para fazer

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avançar a tecnologia, tendo como norte a exploração integral da biomassa (GUENNIFA &

RAMANI, 2012; JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &

RASIIAH, 2009; FREEMAN, 2008; MALERBA, 2007; MALERBA, 2002; LUNDVALL et

al., 2002; CARLSSON et al., 2002; MALERBA, 2003)57

.

A abordagem escolhida pela pesquisa deriva da condição histórica do setor58

e também

de premissas teóricas e conceituais ligadas ao conceito de Sistema Setorial de Inovação (SSI),

o qual permite interpretar, analisar e propor intervenções no nível meso, fazendo

necessariamente uma ponte entre o macro - formação social e econômica do país59

– e o nível

micro - dinâmica das firmas (JOSEPH, 2009; OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH,

2009).

Nesta perspectiva, o ferramental analítico do SSI vai além do agregado e foca nas

particularidades que compõem a estrutura produtiva de uma nação, a partir das características

que compõem o setor, da identificação e compreensão dos agentes e das suas relações. O

conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da heterogeneidade

estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações (MALERBA, 2002), organizar as

evidências históricas e estudar os processos de catching-up60

dos países retardatários no que

diz respeito à acumulação de capacidades industriais (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;

OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).

Metodologicamente, a abordagem de Sistema de Inovação - nacional/regional/setorial

- é compreendido como focusing device, tendo como objetivo analisar e compreender o

processo de inovação, para além da dinâmica de alocação recursos (LUNDVALL et al.,

2009). Desta forma, explica a relação entre os agentes de diferentes origens, os quais em

conjunto desenvolvem e transmitem conhecimento economicamente útil. É uma alternativa

57

A revisão conceitual dos Sistemas de Inovação nos permite trabalhar com a dimensão real do objeto, através

da análise do concreto, priorizando o trabalho empírico para caracterizar e compreender o setor sucroalcooleiro. 58

Seguindo de maneira aproximada as categorias de Pavitt (1984) o setor sucroalcooleiro pode ser caracterizado

como Supplier Dominated por apresentar tradicionalmente baixa capacidade em P&D e sua trajetória tecnológica

ser basicamente conduzida pela redução dos custos. Desta forma, trabalhar com outros agentes além das firmas

processadoras de cana-de-açúcar se faz imprescindível para compreender o processo de inovação. Elementos

mais precisos dessa dinâmica são demonstrados nos capítulos 2 e 4. 59

Quando nos referimos ao nível macro pensamos nas condições gerais que dizem respeito ao processo de

desenvolvimento das nações, com isso, o recorte está sobre a dinâmica do progresso técnico, ou seja,

incorporamos e identificamos características gerais do Sistema Nacional de Inovação. 60

Este conceito é compreendido como efetivação e continuidade do esforço para superação do atraso econômico,

social ou tecnológico que um dado país/região/setor possa apresentar em relação aos países líderes ou em relação

à fronteira do conhecimento (FARIA, 2014).

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61

para compreender como as firmas e outras organizações adquirirem novas habilidades e

competências (IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al., 2012).

Compreende-se que os agentes interagem e aprendem, em vez de fazerem simples

escolhas racionais61

. O SI descreve as interações entre as várias instituições, organizações e

firmas, que na maioria das vezes, funcionam sem depender uma das outras, abordando tanto

as relações daqueles que cooperam como daqueles que competem. O objetivo de se apropriar

deste constructo teórico é a possibilidade de identificar e caracterizar o driving force da

inovação do setor estudado, ou seja, realizar um contorno analítico das ações dos agentes que

circundam e influenciam o comportamento inovativo das firmas. Tal pretensão é fortemente

balizada por estudos anteriores que utilizaram esta abordagem para o segmento

sucroalcooleiro brasileiro, tais como: Andersen (2011); Furtado et al. (2011); Albuquerque et

al. (2012); Campos et al. (2015); SOUZA et al. (2016).

As categorias formadoras do conceito de SSI são referenciadas por Malerba (2002,

p.250) e estão expostas de maneira sumarizada no quadro 1.3. Ao longo desta pesquisa, estes

elementos conceituais são utilizados e relacionados com a realidade do SSI da cana-de-açúcar,

buscando compreender as características pertinentes às atividades inovativas do setor. Ao

trabalhar com estas categorias assume-se o formato metodológico da análise de Sistemas de

Inovação, visto que a identificação destas categorias na realidade produtiva proporciona o

entendimento das características atuais do setor sucroenergético do Brasil.

61

Nelson & Winter (2005).

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62

Quadro 1.3. Categoria e tipologia da abordagem de SSI. Categorias Definição

Produto Setorial Bens ou serviços comercializados pelas firmas em dado mercado.

Agentes/Atores

Dois “tipos” de agentes/atores: 1) as Firmas (produtores, fornecedores, consumidores),

juntamente, com as organizações que delas descendem, como os departamentos de

P&D ou consórcio de empresas; 2) as organizações não-empresa, tais como

universidades, institutos de pesquisa, instituições de fomento, agências e órgãos

governamentais.

Conhecimento e o

processo de

aprendizagem

Cada setor é caracterizado por uma base de conhecimento específica em relação aos

seus produtos, portanto, é a lucidez e o entendimento sobre o universo da produção que

se insere. O conhecimento exerce um papel central na inovação, afetando a forma de

aprendizagem e as capacidades requeridas para as firmas. O conhecimento é altamente

idiossincrático no nível da firma, não é difundido automaticamente e

proporcionalmente entre as firmas. A fonte do conhecimento afeta a forma, tamanho e

a desempenho da firma. Estes elementos são à base dos micros fundamentos do

processo de aprendizagem: know-how e know-who e know-what e know-why.

Base tecnológica

Base tecnológica ou tecnologias básicas são componentes técnicos ou conjuntos de

saberes que definem os setores e os subsetores produtivos. A matriz tecnológica é uma

fração das forças produtivas necessárias para o estabelecimento da produção em si.

Esta base técnica difere de setor para setor, podendo apresentar complementaridades ou

contradições.

Mecanismos de

interação dentro

das firmas e fora

delas

A interação é compreendida como formas de comunicação formais e informais

voltadas à inovação, assim, são associadas ao processo de aprendizagem, adoção de

ideias e de projetos específicos ou práticas coletivas de relevância econômica. Estas

interações podem ser intermediadas por transações de mercado ou extramercado. Suas

formas traduzem-se em redes de inovação; projetos de pesquisa com cooperação

interinstitucional; participação em eventos técnicos e científicos; mobilidade entre

trabalhadores e pesquisadores; estabelecimento de canais de comunicação entre

fornecedor-usuário e etc.

Processos de

competição e

seleção

São os processos concorrenciais desempenhados pelas firmas, com objetivo de

“sobreviver” ao longo prazo. O ambiente de mercado oferece uma definição de sucesso

para as firmas de dado setor, as quais segundo as suas habilidades, competências e

recursos buscam se posicionar em relação às demais, na liderança ou sendo seguidora.

Instituições

As instituições são/incluem: normas, rotinas, hábitos comuns, práticas estabelecidas,

regras, leis, padrões. Em suma, é um conjunto de regras que permeiam o setor e

estabelecem a “normalidade” do ambiente de interação e competição das firmas e dos

outros agentes. Essa realidade forma a cognição dos agentes e a ação dos mesmos, bem

como, direciona e interfere na interação entre eles, vincula e impõe aos agentes

dimensões das interações.

Fonte: elaboração a partir de MALERBA, 2002; MALERBA, 2003; NELSON & WINTER, 2005;

LUNDVALL, 2007; JOSEPH, 2009; MALERBA & MAIN, 2009; ALBUQUERQUE et al., 2012.

As análises e os conteúdos contidos nos capítulos da presente tese buscam dar

representatividade concreta às definições expostas pelo quadro 1.3, com isso, evidencia as

categorias de maneira articulada com a realidade do SSI da cana-de-açúcar. O constructo

teórico e metodológico é utilizado de maneira a aproximar o presente trabalho à abordagem

dos Sistemas Setoriais de Inovação, com isso, o objetivo dos capítulos é identificar e

relacionar as particularidades do setor com os elementos gerais que são fornecidos pela teoria.

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63

Assim, buscou compreender a dinâmica do setor sucroenergético brasileiro na transição do

etanol de primeira geração para a o etanol celulósico.

Nesse contexto, o SSI é considerado como um quadro analítico que facilita o

monitoramento e a compreensão da dinâmica econômica, capturando a estrutura do setor, pois

estabelece uma abordagem que foca nos links entre os artefatos e os agentes. Nessa dinâmica,

o processo de aprendizagem ganha importância central, pois a maneira como os atores

aprendem, determina a forma e a intensidade das relações entre as partes do sistema, e, é

nessa situação que se define as características do setor, seus limites e sua interdependência

setorial. Estes elementos são próprios para compreender as transformações estruturais do

setor, fato que evidência relação entre mudança tecnológica e o desenvolvimento econômico

setorial.

1.3.1. Procedimentos metodológicos e ações para estruturação da pesquisa

De maneira geral, a realização da pesquisa ocorreu por meio de três procedimentos

metodológicos: 1) pesquisa bibliográfica; 2) trabalho de campo e entrevistas, 3) coleta e

tratamento dos dados secundários. A revisão da literatura ocorreu por intermédio de buscas

coordenadas e planejadas nas bases de artigos científicos, tais como Scopus, Web of Science e

Jstor. As leituras versavam sobre: 1) o setor sucroalcooleiro; 2) desenvolvimento das energias

renováveis; 3) progresso técnico e desenvolvimento; 4) Teoria Evolucionaria; 5) Sistemas de

Inovação; 6) políticas públicas e inovação; 7) tecnologia do etanol celulósico; 8) biorrefinaria

e bioeconomia; 9) Catching up e os países periféricos; 10) inovação na agricultura.

As entrevistas foram realizadas junto a indivíduos que tinham relação significativa

com o objeto de estudo62

. A identificação destes “personagens” ocorreu por meio de buscas

nos site das empresas, instituições ligadas ao desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil

e pela participação em eventos ligados ao setor sucroenergético. Os quadros 1.4. e 1.5

destacam os atores entrevistados e a participação em eventos setoriais, bem como a visita

técnica feita na planta de etanol celulósico da Raízen, estas ações tiveram a função de

aproximar o pesquisador do objeto de estudo - trabalho de campo.

62

As entrevistas seguiram um questionário semiestruturado.

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64

Quadro 1.4. Entrevistas e códigos Entrevistas Presenciais

Instituição/Firma Posição Data Código

CTBE Gestor de Negócios abril/2015 Entrevista I

UNICA Diretor Executivo junho/2015 Entrevista II

UNICA Consultor de Emissões e Tecnologia junho/2015 Entrevista III

BioCelere Gerente de Inovação setembro/2015 Entrevista IV

FINEP Ex-Presidente fevereiro/2017 Entrevista V

CTC Gerente de Desenvolvimento Industrial fevereiro/2017 Entrevista VI

CTBE Diretor maio/2017 Entrevista VII

Raízen Diretor Executivo de Tecnologias e Projetos maio/2017 Entrevista

VIII

Cenpes/Petrobras Gerente de Biotecnologia maio/2017 Entrevista IX

BNDES Gerente do Departamento de Biocombustíveis junho/2017 Entrevista X

Fonte: elaboração própria.

Quadro 1.5. Eventos setoriais, visita técnica e códigos.

Trabalho de campo /Eventos Evento Cidade Data Código

Ethanol Summit São Paulo/SP junho/2015 Campo I

Vista técnica a planta de E2G da Raízen (promovido

pelo Programa Integrado de Doutorado em

Bioenergia, prof. Carlos Alberto Labate, Dep.

Genética da ESALQ/USP)

Piracicaba/SP Junho/2016 Campo II

III Seminário Internacional sobre Uso Eficiente do

Etanol Campinas/SP setembro/2016 Campo III

UNICA Fórum São Paulo/SP novembro/2016 Campo IV

Proálcool, universidades e empresas: 40 anos de

ciência e tecnologia para o etanol brasileiro São Paulo/SP novembro/2016 Campo V

Simpósio Inovações no Setor Sucroenergético

(PECEGE/ESALQ) Piracicaba/SP dezembro/2016 Campo VI

Ethanol Summit São Paulo/SP Junho/2017 Campo VII

Fonte: elaboração própria.

A coleta e o tratamento dos dados secundários foram feitos a partir de bases de dados

de instituições governamentais e privadas segundo as necessidades da construção da narrativa

da tese, assim, estas informações buscaram consolidar os argumentos da tese, demonstrando

os efeitos da reorganização dos modos de inovação do Sistema Setorial de Inovação da cana-

de-açúcar e, principalmente, fornecendo uma dimensão espacial e econômica do setor,

objetivo da análise destes dados. As bases mais importantes e os tipos de informações obtidas

em cada uma delas estão expostos no quadro 1.6.

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65

Quadro 1.6. Bases de dados mais relevantes utilizadas na pesquisa até out./ 2016. Instituição Tipo da informação

Ministério da

Agricultura, Pecuária

e Abastecimento

(MAPA)

Estatísticas e informações sobre agroenergia. Utilizando as séries históricas do setor

sucroalcooleiro e os dados atualizados das exportações, preços e produção do setor.

Com isso, a principal fonte foi o Anuário Estatístico da Agroenergia (2009, 2010 e

2012). Portanto, importante para caracterizar a dinâmica econômica do setor.

Instituto Brasileiro de

Geografia e

Estatística (IBGE)

Duas bases de dados, a saber: 1) Sistema IBGE de Recuperação Automática

(SIDRA), os dados coletados fornecem uma visão geral da produção de cana-de-

açúcar no Brasil, fornecendo área plantada, rendimento, produção, valor da produção

e outras variáveis ligadas a fase agrícola do setor. O importante é abrangência

temporal e espacial desta base, já que traz informações por municípios e desde 1940;

2) Pesquisa de Inovação (PINTEC), dados sobre atividade inovativa da indústria

processadora de cana-de-açúcar. Os dados ainda não foram processados. Importante

para caracterizar a dinâmica econômica do setor.

Empresa Brasileira

Energética (EPE)

Utiliza-se as informações provenientes dos Planos e Balanços realizados pela

instituição, que são: 1) Balanço Energético Nacional (BEM); 2) Plano Decenal de

Expansão de Energia; 3) Estudos da Demanda de Energia. Estas informações

apresentam um quadro geral da produção do etanol no Brasil e, principalmente, uma

visão de futuro do Estado em relação ao segmento. Ademais, estes relatórios são

fontes de orientação para os atores do SSI da cana-de-açúcar sobre o futuro da matriz

energética e qual o papel tem/terá o etanol em relação às outras fontes de energia. ,

importante para caracterizar a dinâmica econômica do setor e posiciona-lo no

conjunto da matriz energética nacional.

Revista Nova Cana

Empresa privada ligada a divulgação e a informações especializadas no setor

sucroenergético. O NOVACANA DATA reúne dados sobre o setor tais como:

exportações, importações, produção, consumo, dados internacionais, dados sobre a

indústria automobilística, dados sobre os desembolsos do BNDES, dados de produção

por usina entre outros. Os dados são provenientes das próprias usinas e de instituições

públicas; a grande vantagem é que estas encontram-se organizadas e de fácil acesso,

por tratar-se de uma plataforma digital. Importante para caracterizar a dinâmica

econômica do setor e detalhar informações por firma.

Questel Orbit

É uma plataforma que reúne dados de 96 escritórios de propriedade intelectual,

abrangendo os países mais relevantes no desenvolvimento tecnológico. Possui um

sistema de busca e análise de informações contidas em patentes e desenhos

industriais. Por meio dos dados de patentes foi possível identificar a base do

conhecimento da tecnologia de segunda geração, os principais atores que buscam

desenvolver a rota tecnológica, a evolução da tecnologia e os principais países onde

esta tecnologia é desenvolvida.

Scopus

A Scopus é a base referencial da Editora Elsevier, a qual indexa títulos acadêmicos

revisados por pares, títulos de acesso livre, anais de conferências, publicações

comerciais, séries de livros, páginas web de conteúdo científico e patentes de

escritórios. Cobre as áreas de Ciências Biológicas, Ciências da Saúde, Ciências

Físicas e Ciências Sociais. Sua base abrange acessos desde 1823 até o presente

RAIS/MTE

Informações sobre vínculos formais de trabalho elaboradas pelo MTE (Ministério do

Trabalho e Emprego), especificamente sobre o setor sucroalcooleiro. Com estas

informações pode-se perceber a evolução dos empregos formais no setor e qual a sua

relevância para o mercado nacional de trabalho. Informações relevantes para

complementar a caracterização do SSI da cana-de-açúcar.

Ministério de Ciência,

Tecnologia e Inovação

(MCTI)

- Foram utilizados os dados e informações disponíveis no site do ministério e,

principalmente, as informações trazidas nos planos nacionais (PACTI e ENCTI) e dos

relatórios de projetos contratados pela FINEP e pelo CNPq, estes relatórios remetam à

carteira de projetos financiados com recursos dos Fundos Setoriais. Em relação ao

FINEP os dados são de 1999 a 2015, totalizando 9.617 projetos contratados pela

instituição, no caso da CNPq, o banco de dados remete ao período entre 1997 a 2015,

com 33.057 projetos contratados (estes números referem-se ao total dos projetos, os

dados especificamente do SSI da cana-de-açúcar estão expostos no capítulo 3).

- Tais informações revelam o esforço nacional sistematizado para fazer avançar a

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66

C&T relacionada ao setor, com isso, identificam-se os atores, as áreas de pesquisa, os

temas mais relevantes para o progresso técnico do setor, as interações nas atividades

de pesquisa e apresenta-se uma noção do montante aportado para desenvolvimento de

novas tecnologias.

Portal da Legislação

Disponibiliza todas as leis, decretos, medidas provisórias, atos constitucionais e

outras ações do poder executivo. Com as informações disponíveis no repositório de

legislação é possível ter uma visão abrangente das ações do Estado brasileiro ao longo

do tempo em relação ao setor sucroalcooleiro. Portanto, identifica-se a criação do

arcabouço institucional relaciona a produção de açúcar e etanol no Brasil. Os dados

retirados dessa busca mostram ações do Estado nacional desde 1809 visando

estabelecer e desenvolver o segmento da cana-de-açúcar no território nacional.

Fundação de Amparo

à Pesquisa do Estado

de São Paulo

(FAPESP)

Por meio de buscas no site e nos principais programas de apoio a pesquisa e a

inovação implementado pela instituição ao longo dos anos 2000, foi possível

encontrar um grande volume de iniciativas com relação ao setor sucroenergético. As

principais fontes foram: 1) Projeto Sucest-FUN; 2) Programa para a Pesquisa em

Bioenergia (BIOEN); Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação

Tecnológica (PITE); Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).

Fonte: elaboração própria.

Os resultados destas estratégias de pesquisa aparecem em todos os capítulos da tese,

obviamente com “pesos” distintos. A seguir expõem-se por capítulos63

os procedimentos

metodológicos e as categorias de SSI que foram mobilizadas por meio dos dados obtidos e

das relações estabelecidas.

1.3.1.1. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 2

O capítulo 2 expõe o processo de formação do SSI da cana-de-açúcar, que se dá por

meio da reconstrução da trajetória de desenvolvimento do setor, apontando as características

históricas e, principalmente, indica o start da mudança atual, ou seja, o esforço da passagem

da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração. Para tal, se baseia na

revisão bibliográfica e na consulta da legislação federal, nos planos, nos programas e projetos

estabelecidos pelo Estado brasileiro em relação ao setor sucroalcooleiro (vide quadros 3 e 4,

apêndice A e capítulo 2).

Realiza-se o levantamento da construção do arcabouço institucional e a identificação

dos principais agentes/atores que compõem o SSI da cana-de-açúcar (vide figura 2.1. no

capítulo 2). A institucionalidade reconstruída ao longo do capítulo 2 é dada pela exposição e

análise das leis, planos e projetos implementados pelo governo federal ao longo do tempo.

Para isso utilizou-se do Portal da Legislação do Governo Federal, um banco de “dados”

63

Faz-se uma exceção para o presente capítulo, pois este tem objetivo de apresentar as bases teóricas e

conceituais da tese, além dos procedimentos metodológicos, facilitando a leitura dos próximos capítulos,

dedicados a expor os resultados e os rebatimentos destes para a abordagem de Sistemas de Inovação e para o

setor sucroalcooleiro brasileiro.

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público que disponibiliza todas as medidas emitidas pelos governos federais, do período do

império até o presente momento (vide quadro 1.7.).

Quadro 1.7. Equação de busca para Base da legislação Federal Data Termos da busca Número de documentos

recuperados

Documentos

efetivamente

trabalhados na tese

26/05/2016 cana-de-açúcar or açúcar or

álcool or álcool-motor or etanol

445 81

Fonte: Elaboração própria.

Deste modo, foi possível criar um banco de dados com todas as medidas institucionais

relacionadas ao setor, possibilitando o mapeamento das políticas públicas e evidenciando a

evolução do arcabouço institucional ao longo dos anos e dos diferentes governos, indicando

uma permanência das questões relacionadas à indústria canavieira na pauta nacional. A busca

ocorreu a partir da inserção de palavras-chaves no campo de pesquisa avançada da base; o

quadro 1.7. expõe a quantidade de documentos recuperados e a própria equação de busca.

Os documentos efetivamente trabalhados compõem a figura 2.1., ou seja, são as

medidas que foram analisadas e inseridas na construção da interpretação da formação do

arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar. Estas foram consideradas mais relevantes,

pois versam diretamente sobre o setor ou por desencadear ações no setor ou ainda, por criar

instituições que interagem com o segmento (exemplos o IAA, EPE, CNPE e etc.). A escolha é

arbitrária, entretanto, foi tomada a partir da leitura da descrição de cada uma das 445 medidas

e com atinência à história do setor (revisão bibliográfica64

).

A partir do levantamento das ações implementadas pelo Estado brasileiro, foi possível

construir um “retrato” do arcabouço institucional, não apenas das suas dimensões atuais, mas

também da sua evolução. Essa perspectiva buscou uma visão holística da realidade

abrangendo diversos tipos de instrumentos, ações que vão além da ótica da criação do

mercado ou correção deles. As informações levantadas possibilitam compreender como o país

desenvolveu o mercado e competências tecnológicas ligadas ao setor do açúcar/etanol,

fazendo o setor avançar no interior das suas fronteiras, bem como criam um ambiente para o

desenvolvimento do capital nacional neste segmento.

64

SAMPAIO, 1973; MELO & FONSECA, 1981; LEITE, 1990; OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003; LEÃO,

2005; VIEIRA; 2007; CGEE, 2009; NEGRI, 2010; NEME, 2010; ANDERSEN, 2011; SAFATLE, 2011.

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Outro ponto que diferencia o trabalho é a noção de continuidade e evolução do

arcabouço institucional. O trabalho mostra que o desempenho atual é fruto da construção de

uma trajetória em políticas públicas focalizadas no segmento sucroenergético, que

acompanhou a trajetória do açúcar e do etanol de primeira geração - mostra-se a coevolução

do SSI da cana-de-açúcar, o desenvolvimento de capacidades tecnológicas e produtivas não é

fruto de ações isoladas, mas sim, uma ação coletiva repleta de interações entre os atores do

SSI.

A análise e o mapeamento das medidas e ações institucionalizadas do Estado brasileiro

em relação ao SSI da cana-de-açúcar abrangem o período de 1875 a 2016, realiza-se por meio

de uma estrutura de categorias de políticas públicas derivadas dos conceitos de technology-

push65 e demand-pull66 (TPDP), par conceitual próprio da literatura destinada à relação entre

inovação e políticas públicas. Os tópicos a seguir delimitam os três grandes grupos de

políticas públicas:

1) Instrumentos que estimulam a criação, manutenção e expansão da

capacidade produtiva local (produção): consideram-se nesta categoria aqueles incentivos

que estão dirigidos às indústrias localizadas no país. Isto abarca desde incentivos monetários –

na forma de incentivos fiscais, subsídios ou subvenções para expandir a capacidade produtiva,

até a criação de condições favoráveis para as firmas se inserirem ou se desenvolverem numa

determinada região. Como exemplos, temos: metas de produção, controle dos preços do

açúcar ou da cana-de-açúcar; taxas diferenciadas para importação de equipamentos; linhas de

crédito para expansão/modernização da estrutura produtiva; criação de organizações que

regulamentam ou orientam o setor e etc.

2) Instrumentos que estimulam o consumo do etanol (Consumo): nesta

categoria são incluídos os instrumentos que favorecem o consumo do etanol, ou seja, aqueles

que criam ou mantém o mercado. Estes instrumentos se dão na forma de: i) mandados de

mistura do etanol à gasolina; ii) incentivos que criam condições para que o etanol torne-se

atrativo ao consumidor (controle do preço, taxas sobre o combustível concorrente, etc.); iii)

65

As políticas voltadas para o technology-push incluem ações conduzidas pelo governo que ampliam a oferta de

novos conhecimentos e/ou reduzem os custos para as empresas desenvolverem inovações. Com isso, incluem-se

nesta perspectiva os investimentos em educação e formação de mão de obra especializada, a concepção e

disponibilidade de subsídios e de créditos para o fomento das atividades de P&D e de projetos de demonstração. 66

As políticas de demand-pull são ações governamentais que aumentam as recompensas para investimentos em

inovações por meio de uma variedade de medidas, tais como a expansão do mercado. Assim, os instrumentos

que se encaixam nesse conceito são: subsídios ao consumidor final, mandatos de mistura entre etanol e gasolina;

a proteção da propriedade intelectual, isenção e reduções de taxas, contratos/compras públicas, estabelecimento

de padrões técnicos e outros.

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expansão da frota de veículos a etanol ou Flex Fuel (renovação da frota de veículos públicos,

redução do IPI, expansão do crédito etc.)

3) Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado

tecnológico: congrega os instrumentos que promovem o desenvolvimento e aprimoramento

dos distintos conhecimentos e/ou tecnologias que compõem a produção de cana-de-açúcar e

de etanol. Esse tipo de política é majoritariamente monetário, caracterizando-se pela criação

de programas de P&D e de infraestruturas voltadas à pesquisa e/ou ensino, portanto, são os

financiamentos de projetos executados por instituições de pesquisa, empresas, ou por

parcerias entre elas. Concentram-se nas ações da CNPq, FINEP, BNDES e FAPESP. Outro

exemplo destas ações são os projetos demonstrativos, os quais se caracterizam por serem um

teste “controlado” e serem fonte de informações para novas ações, tanto para a indústria como

para o Estado, como são os casos das plantas de etanol celulósico do Brasil. Estas medidas

serão analisadas com maior profundidade nos capítulos 3 e 5.

A definição das categorias para a análise de políticas foi inspirada nos trabalhos de

Mowery & Rosenberg (1979); Chindamber & Kon (1993); Waltz et al. (2008); Nemet (2009);

Camillo (2014); Zhang et al. (2014); Pereira et al. (2015) e Xu & Su (2016). O ponto de

contato entre estes trabalhos é a influência dos conceitos de Technology-push e Demand-pull

(TPDP) como guia teórico para a compreensão e/ou análise do processo de inovação em um

determinado setor/área. Este par conceitual revela uma visão geral da racionalidade das

políticas públicas, as quais contribuem com o processo de desenvolvimento, difusão e adoção

das novas tecnologias.

Tais conceitos são inspirados nas discussões neoshumpeterianas, tendo como foco a

relação entre inovação, progresso técnico e desenvolvimento. Portanto, o par conceitual

Technology-push e Demand-pull (TPDP) inter-relaciona-se com a busca pela compreensão da

dinâmica econômica e social que cerca uma nova tecnologia. Ao se utilizar deste conceito

cria-se um canal de comunicação entre a teoria e a pesquisa sobre a passagem do etanol de

primeira geração para o etanol celulósico.

Este par conceitual é utilizado para complementar e aprofundar a categoria de

instituição da abordagem de SSI, pois as mudanças institucionais influenciam a mudança

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técnica, uma vez que fornecem novos estímulos aos atores do Sistema de Inovação, podendo

desencadear novos processo de aprendizagem e/ou novas competências para inovar67

.

Os conceitos de Technology-push e Demand-pull (TPDP) trazem luz sobre a dinâmica

do setor, mas, a conformação do seu arcabouço institucional passa por um aprofundamento

desta realidade e, é justamente este diálogo que é construído por esta pesquisa,

principalmente, por meio do detalhamento das políticas públicas pró cana-de-açúcar (vide

capítulos 2, 3 e 5). Com isso, a pesquisa avança na compreensão da dinâmica do progresso

técnico, identificando elementos da introdução do etanol celulósico, situação que é em grande

medida forjada pelas políticas públicas proporcionando os primeiros impulsos para essa

mudança.

Por meio destes grupos ou subcategorias de políticas públicas – Produção, Consumo e

C&T - percebe-se a existência de vários tipos de instrumentos, os quais se destinam a

áreas/dimensões específicas do SSI, mostrando que a variedade faz parte da construção do

arcabouço institucional de uma indústria, já que para cada dimensão existe um conjunto de

medidas institucionais assumidas pelo Governo.

Portanto, para melhor compreender a racionalidade das políticas/medidas encontradas,

bem como trabalhar com as informações e com os desdobramentos destas ações, trabalha-se

em duas frentes de análise68

. No capítulo 2, juntamente com o processo histórico de formação

do SSI da cana-de-açúcar, aborda-se de maneira concomitante, os instrumentos que estimulam

a criação, manutenção e expansão da capacidade produtiva local e os instrumentos que

estimulam o consumo do etanol, pois entende-se que estas ações contribuíram decisivamente

para a formação e expansão do setor sucroalcooleiro. Esta opção metodológica articula-se

com elementos da abordagem de SSI, visto que trabalha com parte das instituições

desenvolvidas pelo sistema e com a evolução destas, fator primordial para o progresso técnico

(NELSON & WINTER, 2005; KIN, 2006; MALERBA & MAIN, 2009).

A segunda frente dedica-se exclusivamente aos instrumentos que estimulam o

desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico que é trabalhada apenas no capítulo

67

Esta dinâmica é aprofundada nos capítulos 3 e 5, momento que se utiliza desta estrutura conceitual para

analisar especificamente as políticas voltadas à C&T e ao aprendizado tecnológico do setor, identificando

esforços na direção do STI-mode. 68

Segundo Camillo (2014), uma análise deste tipo permite uma maior organização, mas não implica que essas

políticas devam ser estudadas de forma isolada, pois parte-se do princípio de que os instrumentos de incentivo

devem agir de forma coordenada e que a atuação numa esfera pode ter implicações em outras. Por exemplo, os

incentivos diretos ao consumo podem estimular, por consequência, a expansão da capacidade produtiva local e

também o desenvolvimento científico e tecnológico

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71

3. Tais medidas recebem maior atenção pelo fato de carregarem elementos importantes da

mudança de trajetória tecnológica, como por exemplo, o financiamento de pesquisas sobre

etanol celulósico, fator novo no segmento e crucial para a trajetória de aprendizado em nova

rota tecnológica.

Por fim, como coloca Nemet (2009), compreender a função e o propósito dos

instrumentos institucionais é fundamental para entender as transformações setoriais, pois o

mix de políticas públicas é capaz de estimular o desenvolvimento de setores, rotas

tecnológicas ou dar origem a um novo segmento. Assim, o capítulo 2 vai além de uma

simples retomada histórica por meio de revisão bibliográfica, retomando elementos da sua

própria formação e as ações institucionalizadas do Estado brasileiro para a formação da

indústria da cana-de-açúcar.

1.3.1.2. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 3

O terceiro capítulo é um desdobramento direto do capítulo anterior, pois centra

esforços em demonstrar como as políticas públicas implementadas pelo Governo Federal e

pelo Estado de São Paulo, na década de 2000, foram decisivas para a criação das primeiras

iniciativas do etanol celulósico em escala industrial. Desta forma, o capítulo 3 evidencia as

características e o conteúdo das ações relacionadas à C&T e ao aprendizado tecnológico do

setor sucroenergético, passando pelas ações da CNPq, FINEP, BNDES e FAPESP, dando

maior destaque aos planos PAISS Industrial e PAISS Agrícola.

Para isso, vale-se dos seguintes procedimentos metodológicos: a) revisão bibliográfica

específica de políticas públicas para energias renováveis; b) revisão bibliográfica sobre

políticas públicas e etanol celulósico; c) coleta de dados e informações relacionadas às

políticas públicas implementadas pelo Brasil na esfera do etanol celulósico (jornais, revistas e

sites); d) entrevistas com atores do SSI da cana-de-açúcar.

Para mobilizar estes elementos da abordagem de SSI trabalhou-se com o resultado do

mapeamento das ações institucionalizadas do Governo do Estado de São Paulo e do Governo

Federal, em relação à C&T e ao aprendizado tecnológico, para isso, foram realizadas buscas

nos sites, relatórios e editais lançados pelo BNDES, CNPq, FINEP, FAPESP objetivando

encontrar programas e projetos de pesquisa financiados ou coordenados por estas

organizações; as fontes aparecem descritas no quadro 3.

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72

A busca ocorreu por meio de palavras-chaves (cana-de-açúcar; sucroalcooleiro,

sucroenergético; etanol; bioetanol; álcool; biocombustíveis; biomassa; enzimas, enzimática;

etanol celulósico; etanol de segunda geração; material lignocelulósico). Foi encontrado um

conjunto amplo de ações, as quais compõem o banco de dados dessa pesquisa, algumas ações

mais relevantes estão expostas nominalmente no capítulo 3 e capítulo 5, sendo trabalhadas

qualitativamente ao longo da tese.

As informações provenientes do mapeamento das políticas públicas (C&T),

juntamente com as ações metodológicas já citadas, fornecem as seguintes informações: 1) o

período de maior esforço em pesquisa no setor; 2) o volume de projetos contratados; 3) o

valor aportado de cada projeto; 4) uma visão aproximada do montante gasto em P&D no setor

sucroenergético; 5) o tipo de tecnologia que mais recebeu atenção e aportes no período; 6)

detalhes “técnicos” das iniciativas; 7) identifica-se atores, percebendo quais firmas e quais

ICTs detém competências na área e quais são as responsáveis por conduzir os projetos de

pesquisa; 8) é possível identificar as parcerias estabelecidas dentro de cada projeto de

pesquisa; 9) identifica quais áreas do conhecimento formam as bases das novas tecnologias.

As informações organizadas possibilitam identificar elementos das categorias da

abordagem de SSI no plano real (atores, mecanismos de interação, instituições) Acrescenta-se

que esta dinâmica mostra-se distinta das características do período anterior, pois estas ações

se articulam ao processo de reestruturação do setor dos anos 2000, onde o esforço em

desenvolver o STI-mode se mostra mais palpável, uma vez que as ações em desenvolver novas

tecnologias e processo produtivos ligam-se a conhecimentos substanciados pela ciência ou por

capacidades obtidas de maneira sistematizada (universidades, empresas de

consultoria/engenharia, relação com empresas estrangeiras).

1.3.1.3. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 4

O quarto capítulo busca identificar quais são os atores envolvidos no processo de

desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico incluindo empresas, instituições e/ou

países que se destacam nessa trajetória. Faz isso a partir da análise das bases do conhecimento

e da tecnologia que sustentam esta “nova” forma de se produzir o bioetanol.

Ao posicionar o Brasil e os seus agentes neste segmento, obtêm-se informações

indispensáveis para a compreensão do desempenho do SSI da cana-de-açúcar no processo de

efetivação da produção do etanol de segunda geração em território nacional, explicitando suas

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73

qualidades e suas limitações na difícil tarefa de dominar a tecnologia de transformação da

biomassa em biocombustíveis avançados.

O capítulo quatro estrutura-se a partir da revisão de bibliografia (CHERUBINI, 2010;

CHERUBINI et al., 2012; MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012; ZILBERMAN et al.,

2013; GUSTAFSSON et al., 2014; LIMA, 2013; MAYERHOFF et al., 2006; MURAKAMI,

2015; PERRONE et al., 2011; SCHULTZ, 2012; SILVEIRA et al., 2016) e, especialmente, da

análise de patentes e de artigos científicos publicados internacionalmente. Por meio destes

dados é possível captar a dinâmica da tecnologia e do conhecimento do setor estudado, dando

contornos materiais e numéricos ao esforço de desenvolvimento desta nova tecnologia ao

longo do tempo. Esta abordagem permite quantificar a “evolução” das bases do conhecimento

e da tecnologia do SSI da cana-de-açúcar ao longo do tempo e em relação a outras realidades

(EUA, China ou Europa).

A análise dos artigos científicos publicados internacionalmente fornece uma visão do

desenvolvimento da ciência e do conhecimento sistematizado ligado ao etanol celulósico; já a

análise das patentes fornece uma visão objetiva do desenvolvimento potencial da tecnologia

na medida em que sinaliza o progresso atingido pelos processos, equipamentos e técnicas

atreladas à produção do etanol celulósico.

Para a busca de artigos científicos, trabalha-se com a base Scopus, a qual abrange um

conjunto amplo de revistas científicas internacionais; para a análise de famílias de patentes69

,

trabalha-se com a plataforma Questel Orbit, a qual é capaz de recuperar patentes depositadas

em diversos escritórios de propriedade intelectual ao redor do mundo. Desta maneira, realiza-

se um exercício de vigilância tecnológica70

, entendido como ação organizada e seletiva de

captar informações relacionadas à dinâmica tecnológica e que é capaz de recuperar dados

importantes para compreender aspectos gerais da corrida tecnológica em curso.

A pesquisa reconhece as limitações e os problemas existentes nesses tipos de dados71

,

entretanto, como aponta Barré (2001) ou Malerba (2007), as informações trazidas pelos

69

De um modo geral, uma família de patentes é um grupo de invenções que estão todas relacionadas entre si,

neste caso através da prioridade, ou prioridades, de um documento de patente específico. Na espacenet define-se

uma família de patentes como compreendendo todos os documentos possuindo exatamente a mesma prioridade

ou combinação de prioridades (ESPACENET, 2014). 70

Tal prática é comum no meio coorporativo, sendo utilizada para o planejamento estratégico e para a tomada de

decisões em relação a novos investimentos ou em P&D. Nesta pesquisa será incorporada por meio de um

exercício para compreender a disposição dos esforços em desenvolver a tecnologia do etanol celulósico no Brasil

e no mundo, ação que ocorre por meio da busca e análise de famílias de patentes e artigos científicos. 71

As limitações dos artigos científicos como indicadores de output reside no fato que a quantidade dos artigos

produzidos não se refere integralmente ao nível de impacto, pois a quantidade de citações do artigo por terceiros,

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74

documentos patentarios ou por artigos científicos remetem a uma medida aceitável dos

resultados obtidos pelos Sistemas de Inovação, ou seja, são úteis para demonstrar como os

Sistemas Setoriais ou Nacionais agem sobre determinada rota tecnológica - pelo menos no

campo do conhecimento sistematizado, foco da análise nesta etapa do trabalho (evidenciar a

construção do STI-mode no segmento bioenergético).

Quanto à análise dos artigos científicos disponíveis pela Scopus, a busca ocorreu por

intermédio do uso de palavras-chave fortemente relacionadas à temática do etanol celulósico,

organizadas por meio dos operadores booleanos e inseridas no sistema de recuperação de

dados disponibilizado pela plataforma, o Advanced Search, sistema que possibilita cruzar

diversos termos e delinear uma equação de busca que recupere dados pertinentes ao objeto de

estudo. A equação de busca elaborada para esta pesquisa encontra-se exposta no quadro 1.8.

Quadro 1.8. Equação de busca para artigos científicos – Scopus. Data da

busca Equação (Keywords) Resultado

26/04/2017

TITLE-ABS-KEY (ethanol OR bioethanol OR "cellulosic ethanol" OR

"second generation ethanol" OR "second generation bioethanol" ) AND

TITLE-ABS-KEY ("enzymatic hydrolysis" OR "Acid hydrolysis" OR

pyrolysis OR "Biomass to Liquid" OR saccharification OR enzym* OR

hydrol* OR "organosolv process" OR syngas OR "separate hydrolysis

and fermentation" OR "simultaneous saccharification and fermentation"

OR "consolidated bioprocessing") AND TITLE-ABS-KEY ( biomass OR

lignocellulosic OR cellulose OR hemicellulose OR "energy crops" OR

"sugar cane" OR sugarcane OR "corn starch" OR wood OR "sugar

cane bagasse" OR "sugar beet" OR "corn stover" ) AND PUBYEAR >

1926 AND PUBYEAR < 2018 AND ( EXCLUDE ( SUBJAREA ,

"MEDI " ) ) AND ( LIMIT-TO ( DOCTYPE , "ar" ) )

7.056

Fonte: elaboração própria.

pode ser dada não apenas pela qualidade inegável do trabalho, e, sim, pela suas redes de contatos. Outro aspecto,

é que a quantificação não demonstra o “peso” dos artigos, ou seja, não apontam quais são as pesquisas que

resultam em alterações do campo científico, não diferenciando a qualidade dos trabalhos; os trabalhos que

contribuem para a reorganização teórico-metodológica do pensamento de uma disciplina são computados

igualmente. As patentes caracterizam-se por ser um importante indicador de output na sociedade capitalista,

entretanto, deve-se fazer uma primeira ressalva, que a mesma se trata a priori de uma invenção, ou seja, é uma

ideia, um esboço de produto ou de processo, o qual ainda não se realizou comercialmente. Assim, a patente por

definição é um indicador parcial e impreciso enquanto ao desenvolvimento econômico e social, mas, não

desprezível. Um dos grandes problemas contido nas patentes são as enormes disparidades existentes entre as

instituições de patenteamento pelo mundo, pois cada formação social apresenta seu conjunto de regras e normas

para a concepção de patentes. Alguns países são conhecidos por serem mais flexíveis (China); outros, por

apresentar uma alta carga burocrática, são mais lentos e custosos, assim, emperrando o número de registro de

patentes concedidas (Brasil). Outros países apresentam grandes registros porque são importantes mercados

consumidores e produtores de produtos industrializados, atrativos para patenteadores externos, como é o caso

dos EUA (FREEMAM, 1969; BARRÉ, 2001).

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75

A equação é formada por termos que se relacionam com o produto (ethanol;

bioethanol; "cellulosic ethanol"; "second generation ethanol"; "second generation

bioethanol"), os quais foram condicionados a termos que remetem aos processos produtivos

do etanol celulósico ("enzymatic hydrolysis"; "Acid hydrolysis"; pyrolysis; "Biomass to

Liquid"; saccharification; enzym*; hydrol*; "organosolv process"; syngas; "separate

hydrolysis and fermentation"; "simultaneous saccharification and fermentation";

"consolidated bioprocessing"). Com isso, garante-se que os artigos encontrados tenham

relação com a temática do etanol celulósico. Outra medida para garantir consistência aos

dados foi aplicar os filtros que excluem outros documentos (livros; trabalhos apresentados em

congressos; etc.) e, ainda, excluíram-se artigos da área de medicina e ciências médicas, os

quais eram apenas 7,9% da amostra original.

Os dados provenientes da amostra de artigos científicos foram tratados e

sistematizados com o software VantagePoint72

, o qual permite criar gráficos e redes de

colaboração entre os países e as instituições. Com isso, foi possível traduzir a dinâmica da

atividade científica ligada ao segmento do etanol celulósico, podendo perceber como o Brasil

e suas instituições voltadas ao ensino e a pesquisa se posicionam no cenário global do etanol

de segunda geração.

Por sua vez, a análise de famílias de patentes traz um olhar sobre a base tecnológica do

etanol celulósico. Com isso, a determinação da amostra de patentes ocorreu por meio do

estabelecimento de duas estratégias de busca de patentes distintas, as quais ao final foram

somadas, resultando no conjunto de dados trabalhados no capítulo 4. Toda estratégia

encontra-se sistematizada na figura 1.2.

A grande diferença entre a primeira estratégia e a segunda estratégia de busca de

patentes é o fato que a primeira remete à um universo conhecido e a segunda não. Na primeira

investida sobre a base de patentes do Questel Orbit trabalha-se com a adição de códigos IPCs

(Classificação Internacional de Patentes) conhecidos e tradicionalmente atrelados ao etanol

celulósico; na segunda iniciativa, trabalha-se com a exclusão de códigos IPCs e de palavras-

chaves que são fortemente as associadas a outros setores (distantes do segmento

bioenergético).

72

É uma ferramenta de mineração e análise de dados, a qual auxilia o rápido entendimento e a navegação em

resultados de busca extensas, fornecendo uma melhor perspectiva a respeito das informações encontradas. A

perspectiva fornecida pelo Vantage Point permite investigar QUEM, O QUE, QUANDO e ONDE, esclarecendo

os relacionamentos e os padrões dentro de um todo – transformando informação textuais (ou numéricas) em

gráficos e tabelas compreensíveis.

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76

A primeira busca está balizada na revisão bibliográfica (GUSTAFSSON et al., 2014;

LIMA, 2013; MAYERHOFF et. al., 2006; MURAKAMI, 2015; PERRONE et al., 2011;

SCHULTZ, 2012) e, é considerada focalizada, ou seja, seu objetivo era mapear o conhecido,

visto que a partir das referências foram selecionados os códigos IPCs fortemente relacionados

à tecnologia do etanol celulósico e estes foram vinculados à palavras-chaves que remetem

diretamente ao produto (cellulosic ethanol; second generation ethanol; second generation

bioethanol). Estes termos foram organizados com os operadores booleanos e com símbolos de

trucagem no sistema de busca advanced search, recuperando famílias de patentes que

apresentavam concomitantemente os códigos “IPCs bons” (vide figura 1.1.) e as palavras-

chaves nos campos Title; Abstract; Claims; Description; Object of invention; Advantages

over prior art drawbacks; Independent Claims; Concepts.

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Figura 1.2. Estratégias de busca de patentes para etanol celulósico – Questel Orbit.

Fonte: elaboração própria.

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78

A segunda estratégia ocorreu por meio da elaboração de diversas equações de busca,

formadas a partir de palavras-chaves que remetem aos processos produtivos, às rotas

tecnológicas e às matérias-primas utilizadas na produção do etanol celulósico. Assim, foram

estabelecidas 18 equações de busca, abarcando diversos momentos e estágios da tecnologia,

sendo que as buscas orientaram-se para recuperar invenções ligadas ao etanol celulósico que

por ventura não estavam classificadas com os códigos estabelecidos na primeira estratégia.

Tal situação ocorreu já que apenas 320 famílias de patentes se sobrepuseram nas duas

estratégias.

Esta segunda estratégia de busca explorou um ambiente ainda não mapeado pela

primeira iniciativa, pois recuperou patentes por palavras-chaves relacionadas a diversos

“momentos” do universo tecnológico do etanol celulósico. Para diminuir a distorção dessas

buscas foram estabelecidos três níveis de controle, a saber:

i) Um filtro que delimita a busca no interior do campo dos combustíveis, com

isso, as patentes recuperadas deveriam apresentar no título, ou no resumo, ou na

reivindicação, as palavras: (Biofuel or Fuel) AND (Ethanol or Bioethanol);

ii) A segunda condição era dada pela exclusão de famílias de patentes que

apresentassem termos relacionados a outras áreas tecnológicas ou que após análise do

texto das patentes recuperadas nos primeiros testes mostrassem ligação com outras

tecnologias, fora do escopo do segmento bioenergético. As palavras excluídas (NOT)

estão expostas na figura 1.1..

iii) A terceira condição foi a exclusão de códigos IPCs não relacionados ao setor

do etanol celulósico, ou seja, os códigos “IPCs ruins” são aqueles que

tradicionalmente são utilizados pela indústria de cosméticos, saúde humana e animal,

alimentação e tantas outras áreas que foram recuperadas nos primeiros testes. Os

“códigos ruins” estão expostos na figura 1.2.

A determinação de filtros, a exclusão de palavras-chaves e de códigos IPC não

relacionados ao setor auxiliaram na formatação das buscas feitas no âmbito da segunda

estratégia. Assim, as famílias de patentes recuperadas nas buscas são atreladas ao universo da

bioenergia e estas somadas aos resultados da primeira estratégia de busca, a presente pesquisa

conta com uma amostra de patentes sobre o etanol celulósico de 2.890 famílias de patentes.

Esta amostra se mostra consistente, visto que o domínio tecnológico do conjunto de dados

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79

está atinente ao apontado pela bibliografia especializada (vide Perrone et al. (2011) e

Gustafsson et. al. (2015)).

A articulação entre os elementos conceituais e as informações provenientes da

vigilância tecnológica (patentes e artigos científicos) amplia e fortalece os argumentos que

respondem à pergunta de pesquisa, ou seja, quais são os atores/elementos que promovem o

progresso técnico no setor em direção ao etanol celulósico? O resultado ratifica e encontra

novas firmas e organizações que atuam nessa rota tecnológica, principalmente, no plano

internacional, portanto, complementa os resultados obtidos pelo mapeamento de políticas

públicas nos capítulos 2 e 3.

Outro ponto forte dessa estratégia metodológica é que levanta informações sobre a

tecnologia, demonstrando que a rota tecnológica do etanol celulósico diferencia-se

grandemente do etanol de primeira geração, assim, impondo a necessidade do deslocamento

do DUI-mode para o STI-mode, já que a base de conhecimento dessa tecnologia é fortemente

ligada à ciência (biotecnologia, engenharia genética, biologia, fisioquímica).

Acrescenta-se que a partir desta estratégia de pesquisa, cujos resultados encontram-se

dispostos no capítulo 4, torna-se possível ver a evolução da tecnologia e a sua direção73

, além

de fornecer uma noção de espacialização deste processo por meio do número de depósitos

prioritários por país. Tem-se assim uma noção geral dos esforços de P&D feitos pelas

diversas nações na rota tecnológica do etanol celulósico.

1.3.1.4. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 5

O quinto capítulo tem como objetivo compreender as ações desempenhadas pelas

firmas envolvidas no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do etanol

celulósico no Brasil. De tal modo, descreve e analisa os projetos industriais de etanol de

segunda geração em curso no país.

Diante do objetivo estabelecido busca compreender 1) quais são as iniciativas no país;

2) quais as características das tecnologias “propostas”; 3) como se dá o processo de adoção e

desenvolvimento da tecnologia celulósica no Brasil; 4) quais relações são estabelecidas pelas

73

Uma análise mais precisa da evolução da rota tecnológica demanda maiores esforços de pesquisa, uma

equação de busca mais completa e a utilização de ferramentas de mineração de dados. Por outro lado, algumas

informações retiradas desse exercício podem ser relacionados com os achados de Perrone et al. (2011);

Gustafsson et al. (2014) Murakami et al. (2015), Silveira et a. (2016), ao indicar que as principais firmas e a

dinâmica da evolução do patenteamento, ou seja, a intensificação dos esforços em desenvolver a tecnologia

ocorre na segunda metade da década de 2000.

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firmas na tarefa de desenvolver essa tecnologia; 5) quais são os desafios para a efetivação da

tecnologia de etanol celulósico no Brasil.

Para tal, parte-se dos achados reunidos nos capítulos anteriores, bem como das

informações e dados obtidos pela revisão bibliográfica e, principalmente, pelas entrevistas

feitas junto às empresas que apresentam projetos industriais no etanol celulósico no Brasil.

Acrescentam-se as informações conseguidas em jornais, sites e revistas especializadas.

A intenção é mostrar as ações das firmas em torno da tecnologia de transformação da

biomassa de cana-de-açúcar em etanol. As firmas analisadas com maior destaque são: CTC;

Petrobras/Cenpes; GranBio e Raízen. Este recorte implica trabalhar com os principais atores

do SSI da cana-de-açúcar em termos de esforços de desenvolvimento do etanol celulósico,

pois são as empresas que figuram como signatárias de projetos de pesquisa apoiados pelas

políticas públicas na dimensão de estímulo a C&T (PAISS Industrial). Ademais, aparecem

como detentoras de depósitos de patentes e/ou parceiras de empresas estrangeiras que detém

competências na tecnologia do etanol celulósico. Tais informações encontram-se expostas nos

capítulo 3 e 4, dando base para as análises estruturadas no capítulo 5.

Opta-se por estas firmas porque todos os fatores mencionados acima são encontrados

conjuntamente. Outro ponto que fortalece a escolha é o destaque dado a elas pela mídia74

e

pela literatura especializada75

. Assim, justifica-se o recorte analítico76

, considerando estas

firmas como catalisadores desse processo, representativas da mudança em curso (etanol de

primeira geração para o etanol de segunda geração).

74

Disponível em: < http://www.valor.com.br/agro/4753339/solucoes-caseiras-destravam-etanol-celulosico>

Acesso em 24 Outubro 2016; Disponível em: <http://www.valor.com.br/agro/4055282/areia-na-biomassa-da-

cana-e-desafio-para-producao-de-etanol-celulosico> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em: <

http://www.valor.com.br/agro/4055284/bioflex-consegue-aval-da-ctnbio-para-sua-nova-levedura-geneticamente-

modificada> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-

celulose/odebrecht-agro-usina-etanol-celulosico-2016-231014/> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em

<http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/09/1521775-brasil-comeca-a-produzir-etanol-de-segunda-

geracao.shtml> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em:

http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/12/1381674-autorizada-producao-de-etanol-de-celulose-no-

pais.shtml> Acesso em 23 Junho 2016. Estas são só algumas das referencias sobre estas firmas na mídia em

geral, a buscas na internet sempre remete a estes atores. 75

O trabalho de Correa (2014) e os relatórios produzidos pelo Projeto de Apoio aos Diálogos Setoriais UE-Brasil

(2012; 2013) e UNCTAD (2016) e mostram certo protagonismo destes atores, indicando que estas iniciativas

estão mais ativas do que outras. 76

Este recorte analítico pode ser alterado dependendo das sugestões da banca de qualificação, pois a presente

determinação visa dar um norte para as ações futuras.

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81

1.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 1

O presente capítulo expôs as bases teóricas e conceituais da pesquisa, bem como

estabeleceu definições preliminares da corrida tecnológica do etanol celulósico. De maneira

interligada revelou os procedimentos metodológicos implementados pela pesquisa, indicando

as ações, as ferramentas de análises, as bases de dados e as fontes das informações (primárias

e secundárias).

Reitera-se que a utilização de procedimentos metodológicos distintos77

é uma

condição para abarcar as dimensões do SSI da cana-de-açúcar, operacionalizando e

identificando na realidade os elementos teóricos que compõem a abordagem de SSI (vide

quando 1.3.). Com isso, estabelece um diálogo entre a teoria e a realidade, pois os resultados

destas “estratégias metodológicas” fornecem informações e fatos que corroboram com o

entendimento do processo de inovação desempenhado pelo setor sucroenergético brasileiro –

busca-se compreender as características do esforço nacional em desenvolver a tecnologia de

etanol celulósico.

As informações e as análises sistematizadas em cada capítulo da tese fornece conteúdo

real para as categorias básicas da abordagem de SSI. Com isso, o conjunto resultante formado

pelo conceito-metodologia-realidade responde à pergunta de pesquisa e possibilita validar a

hipótese do trabalho, ou seja, identifica quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-

açúcar que promovem o progresso técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia de

segunda geração e examina se neste processo ocorre um deslocamento do exclusivismo DUI-

mode para um padrão intermediário, visando o STI-mode, na fase industrial do SSI da cana-

de-açúcar.

Neste capítulo foi definido o que se endente por modos de inovação e apresentou as

estratégias metodológicas para identificar esse processo. Em resumo, isso se dá por meio da

estruturação dos capítulos da tese, já que em cada capítulo analisam-se as particularidades do

processo de inovação do SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol celulósico,

identificando como as ideias, as habilidades e os conhecimentos economicamente úteis são

transferidos e adquiridos pelos atores do SSI da cana-de-açúcar.

77

Ao longo da pesquisa trabalhou com a identificação dos atores do SSI; com o mapeamento e análise das

políticas públicas e seus instrumentos; busca e análise de patentes e de artigos científicos; entrevistas com os

atores/agentes do processo de desenvolvimento da tecnologia de E2G no Brasil

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82

Portanto, para verificar quem/quais são os responsáveis pelo processo e,

principalmente, se nessa ação influenciou a mudança dos modos de inovação na fase

industrial do SSI da cana-de-açúcar (DUI-mode – STI-mode) foi necessário mobilizar um

conjunto de elementos para identificar esta passagem, tais como:

Setor Firma

*Criação de novas instituições de pesquisa (cap.2,

cap.3);

*A entrada de novos atores com bases tecnológicas

distintas (cap. 2 e cap.5)

*Políticas públicas voltadas à Ciência &

Tecnologia e o aprendizado tecnológico do setor

(cap. 3);

*Criação de programas e instrumentos específicos

de apoia a P&D do setor (cap. 3.);

*Deposito de patentes (cap. 4);

*Publicações de artigos científicos em periódicos

internacionais (cap.4)

*Busca por conhecimento formalizado (cap. 5);

*Interação com universidades e institutos de

pesquisa (cap. 4 e cap. 5);

*Estabelecimento de parcerias estratégicas visando

a inovação (cap.5);

*Aquisição de ativos ligados à tecnologia (cap.5);

*Experimentos em laboratórios e escala piloto

(cap.5);

*Cooperação em projetos de pesquisa (cap. 5)

Cada um destes pontos é trabalhado no desenrolar da pesquisa e justamente por isso,

opta-se pela abordagem de SSI e a utilização de uma ampla estratégia metodológica, visando

dar conta de identificar as características da mudança setorial e/ou da introdução de novos

produtos/processos no setor sucroalcooleiro brasileiro.

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83

CAPÍTULO 2. SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR DO

BRASIL: EVOLUÇÃO E TRANSFORMAÇÕES RECENTES

O presente capítulo contribui com a compreensão da gênese e da evolução da

realidade produtiva e inovativa do segmento sucroenergético do Brasil. Isto se dá por meio da

reconstrução da trajetória de formação do Sistema Setorial em questão, apontando suas

características históricas e, principalmente, indicando o start da mudança em análise, ou seja,

o esforço da passagem da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração.

Argumenta-se que tal fato reorienta grande parte da atividade inovadora do setor, abrindo

espaço para exploração de novas rotas tecnológicas e a entrada de novos atores.

Assim, introduz o contexto histórico dos anos 2000 – 2016, no que se refere à

produção de etanol no Brasil, possibilitando uma noção geral e expondo os pontos de inflexão

que influenciam o redesenho do setor, criando condições para a estruturação da produção do

etanol celulósico no Brasil.

A proposta deste capítulo é obter uma compreensão geral da dinâmica de

transformação setorial que está no pano de fundo da mudança tecnológica (1G para 2G), com

vista a responder às seguintes questões: 1) Como foi o processo de formação do SSI da cana-

de-açúcar? 2) Quais categorias de atores compõem o SSI? 3) Qual a sua dimensão econômica

e territorial? 4) Quais são os fatores que compõem o contexto da mudança de rota

tecnológica?

O primeiro tópico (2.1.) realiza um preâmbulo histórico que antecede as mudanças da

década de 2000, assim, apresenta o processo de gênese do setor e da sua estruturação. O

segundo tópico (2.2.) descreve e analisa o contexto histórico dos anos 2000-2016,

apresentando as situações que influenciam a reestruturação do setor, igualmente, identifica as

categorias de atores que compõem o SSI da cana-de-açúcar. Já o último tópico (2.3.) realiza o

fechamento do capítulo, expondo os principais achados dessa primeira fase da pesquisa,

indicando o encadeamento das ideias e das análises para os próximos capítulos.

Do mesmo modo, estuda-se o setor sucroalcooleiro pela sua importância histórica e

atual, o qual passa a partir dos anos 2000 por um processo de reestruturação, caracterizado

pela: 1) retomada das políticas públicas relacionadas ao setor; 2) acelerada expansão

geográfica para novas áreas de cultivo e processamento da cana-de-açúcar; 3) concentração e

centralização do capital no setor; 4) entrada de novos atores, principalmente do capital

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84

estrangeiro e; 5) esforço de aprendizagem em novas bases de conhecimento, como na

bioquímica, na engenharia genética e outras áreas do conhecimento.

Esses aspectos prenunciam alterações nas características históricas na produção de

etanol de 1ª geração. Deste modo, o modelo explicativo de SSI contribui para o debate do

processo de catch-up e da construção de trajetórias de desenvolvimento dos

setores/regiões/países atrasados que buscam o emparelhamento com o padrão de excelência

ou internacional. Nesta abordagem, ao introduzir o processo de formação do SSI da cana-de-

açúcar busca-se contribuir com essa perspectiva, não somente como um estudo de caso, mas

sim em perceber características gerais e particulares que apresentam indicações para a

compreensão da dinâmica do progresso técnico na periferia do sistema capitalista.

2.1. GÊNESE E EVOLUÇÃO DO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA CANA-

DE-AÇÚCAR NO BRASIL

O cultivo da cana-de-açúcar no Brasil teve início no século XVI78

, passando por

intensas transformações quantitativas e qualitativas ao longo tempo. Alguns pontos de

inflexão impulsionaram o desenvolvimento desta atividade (vide figura 2.1.)79

. O quadro

histórico e normativo do setor sucroenergético é a porta de entrada da compreensão desta

realidade, bem como, a identificação das suas características e sua dimensão.

O SSI da cana-de-açúcar se configura como um elemento importante da conformação

territorial, política e social do país, com decisiva influência na formação de importantes

regiões, como do interior de São Paulo e da Zona da Mata nordestina. A figura 2.1. sintetiza a

construção contínua do arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar, fato que orienta as

respostas do setor em relação ao contexto nacional e internacional, igualmente, indica

referências para serem aprofundadas na compreensão desta realidade. A partir deste quadro

institucional, identifica-se a formação do SSI e reproduz-se a trajetória de evolução do setor

no Brasil.

A figura 2.1., ao classificar as políticas por categorias como Produção, Consumo e

C&T, demonstra a evolução das medidas institucionais promovidas pelo governo nacional ao

longo dos anos (142 anos). Estas ações foram coordenadas pelo Estado e pelos agentes

econômicos ligados ao segmento sucroalcooleiro. Assim, as medidas em conjunto buscam

78

A cana-de-açúcar é uma espécie de gramínea (Saccharum), seu centro de origem é a região Sul da Ásia,

portanto, se adapta com facilidade às regiões tropicais. 79

As informações de cada uma das medidas representadas pela figura 2.1. encontram-se dispostas nos apêndices

A, B, C e nas análises feitas ao longo dos capítulos 2 e 3.

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85

promover a expansão e o desenvolvimento contínuo do setor. Em alguns momentos

específicos as ações apresentam maior grau de controle do Estado, ou seja, indicação de

tecnologias, orientação à produção para o mercado externo ou a criação de um novo mercado

– o etanol hidratado. Mas, boa parte das ações são conduzidas na direção de estabilizar e

promover saídas para as crises de superprodução do setor, uma realidade persistente e

estrutural (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003;

KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016).

As políticas setoriais são ações do Estado buscando direcionar a economia

setorial/nacional e, ao mesmo tempo, ações que visam dar conta das demandas dos agentes

econômicos. Por exemplo, a criação de incentivos à exportação do açúcar no início da década

de 1960 era uma demanda do segmento, que passava novamente por uma crise de

superprodução de açúcar80

e, por outro lado, desejava adentrar ao mercado dos EUA que

estava temporariamente desabastecido, pois rompia suas relações comerciais com Cuba81

.

Ações semelhantes a esta são implementadas ao longo da história, portanto, criando uma

trajetória institucional e tecnológica para o SSI da cana-de-açúcar (ANDERSEN, 2011;

SHIKIDA & PEROSA, 2012; KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016).

80

A intensificação da tendência à superprodução de açúcar é promovida pela expansão da capacidade produtiva

do Estado de São Paulo no período entre guerras (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 199). 81

A revolução cubana de 1959 resultou em um conjunto de sanções econômicas ao país. Os EUA vivendo

intensamente o período da Guerra Fria cortam relações e impõem embargo econômico à ilha, uma tradicional

exportadora de açúcar. Tal situação abriu possibilidade para outros produtores ocuparem essa lacuna de

fornecimento.

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86

Fonte: Elaboração própria com base na Legislação Federal, 2016.

Figura 2.1. Evolução do arcabouço institucional do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil, entre 1875 a 2016.

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87

A figura 2.1. representa a evolução do arcabouço institucional brasileiro voltado ao

setor sucroenergético. As medidas institucionais mapeadas foram organizadas segundo três

categorias, a saber: 1) Instrumentos que estimulam a criação, manutenção e expansão da

capacidade produtiva local; 2) Instrumentos que estimulam o consumo; 3) Instrumentos que

estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico82

.

As categorias separam-se apenas de maneira arquetípica, sendo identificadas

individualmente por meio da racionalidade apresentada na sua composição, ou seja, nos

objetivos que devem ser buscados por ela. Na realidade, percebe-se uma interconexão entre

elas, nem sempre planejada, os efeitos promovidos por elas ocorrem à revelia da sua

formulação original dependendo do contexto e da resistência oferecida pelos atores do SSI,

portanto, a divisão apresentada na figura 2.1. é um quadro estanque, embora representativo

sobre as dimensões e as características básicas da institucionalidade do setor.

Deve-se observar que esta categorização envolve somente instrumentos de promoção

direta, ou seja, instrumentos que estimulam diretamente o setor sucroalcooleiro. A correlação

entre instrumentos é intensa e é difícil demarcar seus limites, visto que os incentivos diretos

ao consumo podem estimular, por consequência, a expansão da capacidade produtiva local e

também o desenvolvimento científico e tecnológico. Um exemplo notável de transbordamento

por intermédio da política pública setorial é a determinação do consumo de etanol hidratado

em 1979, pela segunda fase do Proálcool, que resultou em inovações no setor automobilístico

e na estrutura de produção do etanol (destilarias autônomas). Essas relações serão

consideradas à medida que se reconstrói a trajetória setorial nos próximos subtópicos.

É importante notar, mesmo com as contradições econômicas e sociais inerentes ao

desenvolvimento da cultura canavieira no Brasil, o arcabouço institucional setorial mostra-se

robusto e variado, com medidas de longa duração e ações que visam dar conta das diversas

dimensões do setor. De tal modo, as ações institucionais atacam os problemas ligados à

capacidade produtiva, o processo de aprendizagem e o consumo final concomitantemente por

um longo período de tempo. Característica importante para o desenvolvimento de novas

tecnologias e de produtos concorrentes a opções dominantes, caso da “disputa” entre

biocombustíveis e os derivados de petróleo.

(UNRUH, 2000; MOWERY et al., 2010).

82

A definição e o link com a teoria encontra-se no capítulo 1 deste trabalho.

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88

A categoria que congrega os estímulos à criação, manutenção e expansão da

capacidade produtiva pressupõem nas ações de caráter regulador e planejador do Estado sobre

o setor, assim, os programas, planos e nas leis vigentes visam garantir ou expandir a produção

por intermédio da coordenação das ações dos atores do SSI. Isso ocorre com o

estabelecimento dos preços dos produtos e da matéria-prima; estabelecimento de instrumentos

financeiros pró setor (aquisição de máquinas, equipamentos, expansão da lavoura ou da

produção).

Um ponto alto na criação do arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar é a

criação do Instituto do Açúcar e Álcool (IAA) em 1933, órgão governamental que era

responsável por regular, organizar e planejar a capacidade produtiva e os preços do setor.

Suas ações ocorriam por meio do planejamento regional da oferta de açúcar e do álcool,

assim, a principal atribuição do IAA era manter um equilíbrio entre as regiões produtoras

(Nordeste e Centro-Sul).

A política de preço praticada pelo IAA se baseava nos custos de produção e de

transporte dos usineiros do Nordeste, os quais segundo Szmrecsányi & Moreira (1991) eram,

mais do que satisfatórios para produtos localizados em outras áreas do território nacional.

Essa é a origem da distorção regional e da heterogeneidade estrutural da indústria canavieira,

pois a partir daí perpetua-se a tendência de superprodução e a coexistências de firmas maiores

e mais modernas e firmas menos produtivas, as quais são mantidas por meio de concessões

financeiras, com subsídios e tributação variada, prática fortemente utilizada até 1990.

Destaca-se, nessa dimensão, os estímulos e ações realizadas pelas organizações

púbicas e empresas estatais, nessa direção ocorreram a compra compulsória dos produtos do

açúcar excedente pelo IAA, objetivando regular os preços internos e, o etanol produzido na

época do Proálcool, era totalmente adquirido e distribuído pela Petrobras.

Tais ações coincidem com os momentos de expansão do setor; este “edifício”

institucional, mesmo sofrendo alterações de um período para o outro, é responsável pelo

desempenho do setor, uma vez que as medidas de estímulo à produção são mais frequentes e

ocorrem por todo o período estudado. A única exceção é a década de 1990, pois as políticas

de estímulo ao setor são diminuídas grandemente e transformadas em liberalização do

segmento. Este período é justamente a exceção que confirma a regra, pois é neste momento

histórico que o mercado de etanol hidratado se retrai e a produção de cana-de-açúcar passa a

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89

crescer em ritmo mais lento. E ainda, é um momento de instabilidade no setor. A análise da

figura 2.1. juntamente com a figura 2.2. e o gráfico 2.1. confirmam esse panorama.

Figura 2.2. Produção de cana-de-açúcar, etanol e açúcar no Brasil entre as safras de 1948/49 -

2015/2016.

Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; 2016.

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90

As políticas públicas voltadas para o consumo congregam as ações do governo que

objetivam garantir ou melhorar as condições de comercialização dos produtos do setor, ou

seja, são medidas que fortalecem o mercado. Estas se alternam enquanto a forma e a

intensidade, mas se mantém ao longo do tempo, principalmente aquelas voltadas ao consumo

do etanol, as quais permanecem vigentes desde 1933. Dentre as ações voltadas ao consumo

tem-se: 1) o estabelecimento da mistura do etanol à gasolina; 2) em alguns momentos

específicos, realiza-se a isenção ou a diminuição de impostos sobre os produtos ligados à

demanda do setor, como o próprio etanol e os veículos com motores flex; 3) a criação da

obrigatoriedade do estoque de etanol. Estas ações promovem segurança ao consumidor e

previsibilidade às firmas, condição sine qua non para a estruturação do SSI durador.

Gráfico 2.1. Licenciamento de veículos novos a etanol no Brasil entre os anos 1975 – 2015.

0

100.000

200.000

300.000

400.000

500.000

600.000

700.000

800.000

19

79

19

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19

81

19

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19

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19

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19

85

19

86

19

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19

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19

89

19

90

19

91

19

92

19

93

19

94

19

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96

19

97

19

98

19

99

20

00

20

01

20

02

20

03

20

04

20

05

20

06

20

07

20

08

20

09

20

10

20

11

20

12

20

13

20

14

20

15

14

698.563

Fonte: elaboração própria a partir de ANFAVEA, 2016.

A terceira categoria de políticas agrupa as medidas que criam ou ampliam as

condições para o aprendizado tecnológico; são ações que abordam o desenvolvimento do

conhecimento relacionado à produção da cana-de-açúcar, do açúcar e do etanol. Observa-se

que as ações em relação a essa categoria são constantes no tempo, apresentando, mesmo que

de maneira pontual, atos em diversos períodos, com a criação de instituições e programas de

pesquisa. Uma característica evidente deste SSI é que a maior parte das ações foi voltada para

o desenvolvimento técnico ligado a fase agrícola, situação que reforça o protagonismo do

setor agrícola nacional (uma característica do SNI do Brasil).

Entretanto, a fase industrial foi parcialmente deixada de lado, a cargo das ações

pontuais conduzidas pela indústria de bens de capital ligadas ao setor, fazendo aquisições e

cópias de tecnologias estrangeiras e pelos esforços de desenvolvimento do Centro de

Tecnologia Canavieira (CTC). Tal situação começa a se alterar, tornando-se mais complexa e

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91

completa a partir da década de 2000, com a criação de novas organizações públicas de

pesquisa, o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) e a Embrapa

Agroenergia e, ainda, com o estabelecimento de programas de apoio à P&D industrial do

setor, visando principalmente o desenvolvimento e comercialização de novas tecnologias (o

PAISS em 2011).

O setor estabeleceu e foi hábil em manter uma relação estreita com o Estado,

ampliando sua capacidade de articulação; de tal modo, as firmas atuam em concordância com

os interesses do Estado e de outras organizações privadas em prol de políticas públicas que

convirjam para a alavancagem de seus principais produtos (açúcar e etanol) no mercado

nacional e internacional (BAUTISTA VIDAL, 2003; CGEE, 2009; SAFATLE, 2011;

SHIKIDA & PEROSA, 2012). Os dados expostos na figura 2.2. exemplificam essa relação,

demonstrando uma produção sempre crescente, independentemente dos momentos de crise no

Brasil ou no setor.

Para melhor compreender a evolução do SSI da cana-de-açúcar e detalhar o processo

descrito na figura 2.1., é estabelecida uma divisão temporal (cinco períodos), que busca

aglutinar as medidas institucionais, o contexto histórico e as características persistentes do

sistema. Assim, é possível observar o processo de estruturação do SSI da cana-de-açúcar, bem

como, identificar elementos originários no passado que explicam as dimensões e as

competências atuais do setor. Portanto, os períodos compreendem os seguintes elementos:

1) Entre as décadas de 1870 e 1920 têm-se a “gênese” do SSI da cana-de-açúcar;

2) Entre as décadas de 1930 e 1960 mostra-se o período de estabelecimento do setor

sucroalcooleiro no Brasil e momento histórico de consolidação do núcleo dinâmico

do SSI da cana-de-açúcar, o interior do Estado de São Paulo;

3) Entre as décadas de 1970 e 1980 o setor passa por rápida e intensa expansão

produtiva, prescindida pela produção de etanol, assim, consolidando o

biocombustível como parte integrante da matriz energética nacional;

4) A década de 1990 é marcada pela desregulamentação do setor e crise da oferta de

etanol;

5) No último turno temporal (2000 – 2016), têm-se a retomada do consumo de etanol

e um novo ciclo de expansão do setor sucroalcooleiro acompanhado por forte

reestruturação do setor (capital, territorial e da base do conhecimento). Neste

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92

momento se multiplicam os projetos de cogeração e “exportação” de

bioeletricidade pelas usinas à rede de distribuição.

A orquestração dos interesses e das necessidades dos diversos atores do segmento

sucroalcooleiro ao longo do tempo conforma a trajetória tecnológica e institucional do setor.

As atitudes e as escolhas dos atores realizadas no passado influenciam fortemente as

possibilidades do futuro, condicionando as dimensões das relações atuais e suas

características, sendo que a junção destes elementos históricos configura o mecanismo de path

dependence. Com isso, a trajetória impõe certa rigidez tecnológica e institucional, a qual

limita a diversificação do setor, mas, por outro lado, é responsável pela manutenção do

próprio setor, ou seja, mantém o desenvolvimento da produção do açúcar e do etanol no

Brasil, fazendo-os “sobreviver” diante das transformações do ambiente de seleção. A figura

2.1 e figura 2.2. sustentam essa dinâmica, que se molda pelo estabelecimento de processos de

aprendizagem e de rotinas.

2.1.1. Gênese e estruturação dos modos de inovação do SSI da cana-de-açúcar no Brasil

O marco histórico da fundação do SSI da cana-de-açúcar é dado pelo decreto imperial

de 1875 (DIM 2.687/1875)83

, o qual visava estimular a modernização dos engenhos de açúcar,

transformando-os em engenhos centrais, uma estrutura produtiva mais moderna para a

produção de açúcar em relação aos engenhos de fogo morto84

. Na esteira desse processo têm-

se os decretos 10.393/1889 e o 819/1890, medidas estas que buscavam aprofundar o processo

de adoção de novas tecnologias, no caso, o método de difusão para a obtenção do caldo da

cana. Em um primeiro momento, condicionava os incentivos financeiros à adoção da nova

tecnologia.

Entretanto, como mostra Dunham et al. (2011), esta iniciativa não foi bem sucedida,

pois o governo enfrentou resistência, os donos de engenhos optaram pelo processo de

extração do caldo, por meio das moendas, padrão tecnológico dominante no setor até os dias

de hoje85

. Este esforço institucional é representativo não apenas por ser pioneiro, mas porque

indica a formação de uma tendência ao imobilismo em relação à alteração do padrão

83

Esta medida institucional garantia financiamento com juros de até 7% ao ano e prazos de 5 a 30 anos para os

“empresários” que desejassem estabelecer engenhos centrais (CARREADORE, 2001; DUNHAM et al., 2011). 84

Referência aos engenhos do fim do século XIX e início do século XX. Um relato literário que corrobora com a

identificação das dimensões econômicas e culturais dos engenhos de açúcar é a obra de José Lins do Rego em

“Fogo Morto” de 1943. 85

Na safra de 2004/2005, das 347 usinas em funcionamento no Brasil, apenas seis apresentava em

funcionamento o sistema de extração de caldo por difusão como mostra Oliveira Filho (2013).

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tecnológico na fase industrial e, também, dos próprios instrumentos de incentivos a “novas”

tecnologias.

A partir desse momento o setor só irá contar com instrumentos de incentivos

financeiros com missão dupla na década de 2000 (financiamento da expansão produtiva

juntamente com a exigência da evolução tecnológica). A criação de linhas de financiamento

do BNDES para o setor sucroalcooleiro exemplifica esta racionalidade dupla das políticas

públicas; os instrumentos estabeleciam vantagens para as firmas que adotassem certos padrões

técnicos, o financiamento de novas caldeiras de geração de vapor era condicionado ao

aumento da potência dos equipamentos e o Programa de renovação do canavial

(PRORENOVA) possibilitava melhores condições se os produtores adotasse novos

cultivares86

.

Mesmo as iniciativas do século XIX tendo pouca efetividade87

, estas ações

institucionais conduziram as diretrizes da estrutura produtiva da agroindústria canavieira, pois

os engenhos centrais tornaram-se a base técnica das usinas de açúcar e álcool. O mote dessa

passagem é dada pela ampliação da composição orgânica do capital das unidades

processadoras de cana, proporcionando a intensificação da força de trabalho e ampliação da

divisão do trabalho na firma e no setor.

A introdução de novos e maiores equipamentos para o processamento da cana-de-

açúcar ocorreu pela importação de equipamentos (França e Inglaterra); com o passar dos anos,

se tornou o padrão técnico e organizacional da indústria do açúcar no Brasil. Esta nova

realidade resultou no aumento do tamanho das unidades produtivas, e, como consequência

direta, criou uma nova categoria de ator no SSI, o fornecedor de cana-de-açúcar (VIAN et al.,

2008; NEGRI, 2010; VALENTE et al., 2012).

A característica fundamental na constituição dos engenhos centrais era a separação da

fase agrícola (a produção de cana) e a fase industrial (a produção do açúcar e, posteriormente,

etanol e energia elétrica). Os donos de engenhos que não se modernizaram tornaram-se

fornecedores de matéria prima ou saíram do setor. O modelo de modernização do século XIX

é um exemplo de como a adoção de uma inovação (o engenho central) é acompanhada de um

86

Uma discussão mais aprofundada da relação entre políticas públicas e inovação na fase industrial consta nos

capítulos 3 e 5. 87

Entre 1875 a 1892 foram autorizados 101 concessões de financiamento para a construção de engenhos

centrais, entretanto, apenas 37 foram construídos (DUNHAM et al. 2011).

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94

novo regime; no caso não se trata de um regime tecnológico, mas sim de um novo regime

sócio organizacional, envolvendo a divisão de poder e trabalho (DUNHAM et al., 2011).

A separação entre a fase agrícola e fase industrial é uma realidade atual do setor,

moldada na sua gênese. Pois nesta separação está na natureza do conhecimento e da

tecnologia que sustenta cada momento produtivo dos SSI de cana-de-açúcar, na natureza do

capital que controla os insumos básicos para cada momento produtivo. Essas dicotomias

latentes vem sendo diminuídas, no que se refere ao controle dos recursos e da produção em si,

visto que as firmas sucroalcooleiras buscam - pelo menos desde implementação do Proálcool -

a integração e a verticalização da produção como estratégia de crescimento. Os dados de

processamento de cana própria em comparação com o processamento de cana de terceiros

demonstra essa tendência, principalmente nas novas áreas de expansão da cultura canavieira

(ver gráfico 2.2. e tabela 2.1.).

Gráfico 2.2. Participação de fornecedores e produtores próprios na

produção brasileira de cana-de-açúcar, 1948/49 -2014/15.

0

50.000.000

100.000.000

150.000.000

200.000.000

250.000.000

300.000.000

350.000.000

400.000.000

Própria

Fornecedores

Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2012; MAPA, 2013.

Durante toda década de 1920 ocorrem diversos eventos que estruturam as bases do SSI

da cana-de-açúcar, sendo os mais importantes: 1) os primeiros esforços na produção de álcool

combustível; 2) a criação da Dedini, a primeira empresa de bens de capital ligada ao setor

sucroalcooleiro e; 3) o estabelecimento da pesquisa agrícola (OLIVER & SZMRECSÁNYI,

2003; NEGRI, 2010; DUNHAM et al. 2011). Estes elementos não só contribuem para a

formação do SSI, mas proporcionam características que perduram ao logo do tempo e,

sobretudo, dão origem a um novo conjunto de atores, os quais se relacionam intensamente

com as firmas responsáveis por processar a cana-de-açúcar (vide figura 2.1.). Assim, a cadeia

açucareira passa por um processo de “qualificação”, sendo sua produção e sua expansão

influenciada pelo desempenho de outras organizações e da intensidade das relações entre os

atores.

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95

Já neste primeiro período têm-se os primeiros esforços de diversificação do setor

açucareiro, principalmente na direção de desenvolver o etanol de cana-de-açúcar. Como

demonstra Szmrecsányi & Moreira (1991), a formação do mercado do álcool combustível

(etanol) é motivada pelas crises de superprodução de açúcar do final do século XIX e início

do século XX, que deprimiu os preços e as margens de lucro. Ao projecturar o

desenvolvimento do etanol carburante, busca-se absorver o excedente da produção de cana

(DUNHAM et al., 2011).

Essa característica é uma constante no setor, se alterando nos anos do Proálcool e a

partir de 2003 com a introdução dos veículos flex e com o estabelecimento de medidas

institucionais que recolocam o etanol como uma das opções técnicas para o enfrentamento dos

problemas ambientais e das mudanças climáticas (os acordos de controle de emissões é uma

representação disso).

Outro elemento importante da formação do SSI da cana-de-açúcar no Brasil é a

criação em 1920 da Dedini S/A Indústrias de Base88

, uma das principais empresas de bens de

capital ligada ao setor sucroalcooleiro. Seu desenvolvimento acompanha os ciclos de

expansão do setor canavieiro do interior paulista. O crescimento da produção do açúcar e do

álcool promoveu condições para o desenvolvimento da firma, assim, passou a realizar as

substituições de importações que os engenhos e usinas demandavam.

Atuava na realização de consertos e reparos de peças para a reposição, passando

posteriormente a fabricar e a desenvolver máquinas e equipamentos específicos para as

unidades processadoras da cana-de-açúcar89

(OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013). O

estabelecimento das firmas de bens de capital fora fundamentais para o estabelecimento do

processo de aprendizado do setor e a formação do modo de inovação na fase industrial,

caracteristicamente, baseado no DUI-mode (VALENTE et al., 2012; VARRICHO, 2012;

FURTADO, 2013; OLIVEIRA FILHO, 2013).

88

No cadastro da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ) constam 123

firmas relacionadas à produção de bens de capital ao setor sucroalcooleiro. Estas firmas são concentradas

geograficamente, principalmente no eixo Piracicaba-Sertãozinho-Ribeirão Preto. A Dedini é a empresas mais

antiga de setor, com capacidade para produzir e projetar uma usina de açúcar e álcool completa (turnkey). 89

Iniciativa era considerada de grande importância pelos proprietários de engenhos/usinas, uma vez que

propiciava a continuidade do processo produtivo; nesse caso, a substituição de peças era feitas rapidamente,

porque a alternativa era importar tais componentes mecânicos, por conseguinte, interrompendo a produção por

grande período de tempo (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013; VARRICHO, 2012; NEGRI, 2010).

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96

A Dedini juntamente com outras empresas, constituíram e, ainda são, um importante

elo na difusão de novas tecnologias no setor sucroalcooleiro, principalmente no que se refere

à rota tecnológica do etanol de primeira geração. No entanto, sua função na estruturação do

SSI da cana-de-açúcar não se limitou apenas às atividades de produção e de desenvolvimento

de novos equipamentos. Estas empresas imprimiram entre 1920 a 1980, uma estratégia

inovadora na comercialização e no financiamento dos novos equipamentos. Desta forma,

facilitavam e estimulavam a adoção de novas tecnologias por parte dos engenhos/usinas. A

inovação na comercialização ocorria de duas maneiras. A primeira por meio de acordos

comerciais especiais, no qual se aceitava como parte do abatimento dos custos de produção os

velhos equipamentos, os quais passavam por uma reforma para serem revendidos às unidades

menores.

A segunda vertente dessa estratégia era mais agressiva e proporcionavam-lhe maiores

ganhos, pois acabava por participar da cadeia produtiva do açúcar e do álcool de maneira

completa. Adotava-se a prática de “(...) participação como sócio dos novos empreendimentos,

quer seja na ampliação e modernização das instalações produtoras ou na instalação de

novas unidades” (NEGRI, p.45, 2012). De tal modo, amarrava-se por meio de relações

financeiras e jurídicas fontes de demandas futuras para sua metalúrgica. E, consequentemente,

acelerava-se a modernização do setor em cascata, à medida que se ampliava a capacidade

produtiva, até mesmo das grandes usinas - através de novos equipamentos, mais eficientes e

mais produtivos, que eram produzidos por meio de assimilação de tecnologia estrangeira

(cópias ou licenças). E na base deste processo também se possibilitava uma modernização

proporcional para os engenhos e para as pequenas usinas, por disponibilizar no mercado

equipamentos retificados e recondicionados (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013).

Este elemento histórico é particularmente importante para a compreensão do objeto de

estudo desta tese, pois a passagem da rota tecnológica do etanol de primeira geração para a

rota celulósica implica na intensificação das inovações na fase industrial do SSI da cana-de-

açúcar, o que levaria consequentemente à ampliação das relações e da importância das

empresas de bens de capital tradicionais do setor. Entretanto, como pode ser vistos nos

capítulo 4 e 5, este ator perde importância no desenvolvimento desta rota tecnológica,

alterando uma característica histórica do segmento, pois grande parte do desenvolvimento

tecnológico e do desempenho produtivo da produção do etanol de primeira geração advém de

inovações introduzidas via fornecedores de máquinas e equipamentos. O setor continua

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97

dependente de fornecedores, respeitando as características delineadas pela tipologia de setores

de Pavitt (1984). Informações dispostas nos próximos capítulos demonstram que os

fornecedores são outros, principalmente, por que referem-se a firmas ligadas às indústrias de

biotecnologia e bioquímica.

A base do modo de inovação na fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar ocorre por

meio do estabelecimento da pesquisa agrícola ligada ao enfrentamento da crise do Mosaico90

na década de 1920. O mosaico afetou principalmente o Estado de São Paulo, que teve a sua

produção reduzida a menos de ¼ entre 1922 a 1925. A praga alterou a conduta dos agentes

econômicos que passaram a buscar soluções técnicas para este problema específico (OLIVER

& SZMRECSÁNYI, 2003; ANDERSEN, 2011; DUNHAM et al. 2011).

Assim, a pesquisa agrícola conduzida principalmente pela Estação Experimental da

Cana de Piracicaba (EECP) procurou resolver o problema fitossanitário por intermédio da

técnica de seleção de novas variedades de cana-de-açúcar (nacionais ou estrangeiras). Em

paralelo a essa iniciativa, têm-se os esforços da Estação Experimental de Cana de Campos

(EECC), a qual se dedicava à técnica de desenvolvimento de novas variedades, entretanto, a

primeira opção se mostrou mais eficaz no curto prazo e acabou por conformar a trajetória da

pesquisa agrícola, pois o seu “modelo” foi adotado pelo Instituto Agronômico de Campinas

(IAC) e, posteriormente, pelo Centro de Tecnologia Canavieira (CTC).

A partir do programa de seleção de variedades da EECP, as canas suscetíveis ao

mosaico (canas pretas e rosas) foram substituídas pela cana javanesa, principalmente pelas

variedades POJ-36, POJ-213 e POJ-228. A substituição das variedades ocorreu rapidamente;

em 1929 estas representavam 85% da lavoura de cana no estado, chegando a alcançar 99% em

1932. Esse fato recuperou a competitividade do Estado de São Paulo, e iniciou a polarização

do interior paulista em relação ao setor, não somente na produção de açúcar, mas no

desenvolvimento de capacidades e competências técnicas, situação que se intensifica

continuamente.

Além da substituição das canas suscetíveis, a grande novidade para o setor foi o

próprio arranjo do programa de seleção desempenhado pela EECP. Tal programa trouxe

consigo relações de cooperação entre a estação experimental e as usinas. As atividades de

cooperação foram estabelecidas com oito usinas do Estado de São Paulo91

. Essa interação

90

O Mosaico é um vírus que causa o mosqueado ou necrose das folhas, raquitismo e esterilidade na planta,

resultando assim na redução da produção de sacarose (EMBRAPA, 2016). 91

Que representavam 55% da produção paulista de açúcar (OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003).

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98

ampliava os campos de experimentação da EECP, fato que dava uma grande vantagem para

usinas participantes e para a própria estação experimental, uma vez que podia trabalhar com

situações mais próximas da real. Com isso, ocorria a participação de técnicos e agrônomos

das/nas usinas, permitindo a rápida difusão de conhecimentos, visto que além de adotar novas

variedades de cana-de-açúcar, essa relação proporcionava a propagação de técnicas de manejo

agrícola.

Em 1935, a EECP foi incorporada pelo IAC e com isso, o modelo de rede de

cooperação entre usina–instituição de pesquisa foi incorporado, expandido e aperfeiçoado.

Nessa nova instituição, as técnicas e tecnologias provenientes do desenvolvimento e da

seleção de variedade de cana se intensificaram, entretanto, com outro objetivo, de aumentar a

produtividade agroindustrial por meio da maximização do rendimento agrícola, representando

um maior conteúdo de sacarose por hectares de cana e variedades com maior resistência a

pragas e a doenças.

Com o IAC, a usinas passaram a conhecer mais sobre o solo, clima, e técnicas de

manejo (melhores condições para o plantio, adubação, irrigação e controle de pragas). O IAC

desempenhou o papel de coordenador da rede de difusão do conhecimento. Em 1946 as usinas

parceiras do IAC eram 73% da produção paulista. Desde março de 2005 o IAC passou a

abrigar o Centro Avançado da Pesquisa Tecnológica do Agronegócio de Cana, por meio do

Centro Cana (IAC), organização que conta com pesquisadores localizados nas cidades de

Ribeirão Preto e Campinas e nos Pólos Regionais da Agência Paulista de Tecnologia do

Agronegócio (APTA), nas cidades de Assis, Adamantina, Jaú, Jundiaí, Mococa, Pindorama e

Piracicaba.

O Centro Avançado da Pesquisa Tecnológica do Agronegócio de Cana conduz

pesquisas nas áreas de melhoramento, biologia molecular, fitopatologia, entomologia,

pedologia, fertilidade, adubação, climatologia, matologia, mecanização e automação,

geoestatística e economia agrícola. Com isso, estabelece redes de cooperação, principalmente

com outras Estações Experimentais do IAC, empresas conveniadas (160 firmas), cooperativas

de fornecedores de cana, com a Copersucar, com Centro de Tecnologia Canavieira (CTC),

com a EMBRAPA e Universidades (UNESP, UNICAMP, USP).

Outro marco no estabelecimento da pesquisa agrícola ligada ao setor sucroalcooleiro

foi a criação do Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (Planalsucar) em

1971, política pública que se caracteriza como um Instrumento de estímulo ao

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99

desenvolvimento da C&T e aprendizado tecnológico do setor. Esta medida tinha como

objetivo principal o desenvolvimento em larga escala de novas variedades de cana-de-açúcar

por meio da experimentação e da manipulação genética. Um diferencial deste programa era

que desde seu design inicial considerava as diferenciações geográficas do território brasileiro,

assim, uma das metas era desenvolver variáveis adaptáveis às condições particulares das

regiões brasileiras. Este programa, juntamente com o IAC e o CTC, caracterizam os principais

traços do modo de inovação na fase agrícola do SSI da cana de açúcar.

O Planalsucar, que estava sediado no IAA, com o processo de desregulamentação do

setor, foi destituído. Entretanto, sua estrutura e corpo técnico foram incorporados pela Rede

Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético (RIDESA) formada em

1991. Sua estrutura é menos concisa do que a formação anterior, entretanto, sua área de

atuação se expandiu e seu corpo técnico é constantemente alimentado pela interação com as

universidades federais que a compõe. Seu caráter multi-regional foi expandido, passando a

contar com estações experimentais nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais,

Goiás, Mato Grosso, Paraná, Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Piauí.

Esta organização da pesquisa agrícola proporciona o desenvolvimento do

conhecimento tecnológico “soft”, que deriva do conhecimento formal (ciência básica), mas, é

traduzido em informações correlacionadas ao setor, que dá origem a boas práticas de

produção, compreensão dos problemas práticos e planos de ações específicos aos entraves do

mundo da produção. Segundo Hendry & Harbone (2011), este tipo de conhecimento

retroalimenta a base de conhecimento do SSI, proporcionando competitividade, ação não

intensiva em ciência, mas se mostram inovadores, inovações incrementais que fortalece a

trajetória tecnológica dominante, possibilitando a expansão do setor e a melhora no

desempenho da tecnologia.

2.1.2. Expansão e estabelecimento da produção sucroalcooleira (1930-1990)

Utilizando a figura 2.1. como referência, percebe-se que o período entre as décadas de

1930 – 1980 é caracterizado por forte ação do Estado na coordenação das atividades do setor,

visando, principalmente, estabilizar a oferta e a demanda do açúcar (SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991). As ações tinham por objetivo reverter a tendência de superprodução do

açúcar e, ainda, amenizar os efeitos de pelo menos três crises externas, sendo a primeira delas

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100

a crise de 1929 que provocou queda nos preços internacionais do açúcar, resultando nas

primeiras iniciativas em produção/consumo do etanol no Brasil.

A segunda situação externa que passa a influenciar o contexto do setor sucroalcooleiro

é a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que provoca a interrupção do transporte por

cabotagem no Brasil, assim, “corta” o país em duas partes: o Nordeste vendo-se

repentinamente à frente de uma grande superprodução de açúcar, e o Sudeste sofrendo com

uma escassez do mesmo produto92

. Tal fato possibilitou o deslocamento definitivo do eixo

produtivo sucroalcooleiro para o interior do Estado de São Paulo.

O terceiro drive externo foi a confluência das crises do petróleo de 1973 e 197993

, que

se somaram a mais uma manifestação da crise de superprodução da agroindústria canavieira,

fortemente alimentada durante as décadas de 1960/1970 pelos programas de estimulo

realizados pelo governo federal (vide figura 2.1.). Esta situação proporcionou um ambiente

favorável à intensificação da utilização do álcool, primeiro como aditivo à gasolina e,

posteriormente, como substituto integral.

Diante dos efeitos da superprodução e das crises externas, o etanol passa a ser

utilizado como regulador da balança comercial, haja vista que a maior parte da gasolina era

importada e, principalmente, como diversificação do escopo da agroindústria canavieira,

proporcionando um novo destino para a cana-de-açúcar, assim, aliviando a pressão sobre os

preços do açúcar que, estruturalmente, são empurrados para baixo (SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991; LEITE 1990). O gráfico 2.3. demonstra o manejo da cana-de-açúcar entre

os dois produtos coincidindo com os momentos de crise.

92

Os problemas de abastecimento dos mercados do Centro-Sul dados pelas dificuldades no transporte marítimo

por cabotagem são agravados, pois esse período é marcado pela forte expansão do processo de urbanização e

industrialização do Brasil, ponto de inflexão da transição da população rural para as cidades. Assim, o Centro-sul

“fica” temporariamente com falta de açúcar, uma vez que a produção era fortemente concentrada no Nordeste. 93

De acordo com Raele et al. (2014) em 1972 os gastos com importação eram US$469 milhões para em 1974

2.8 bilhões de dólares. Já a segunda crise do petróleo o barril passa de 24-26 dólares o barril para 40 dólares o

barril em 1981 Essa instabilidade no preço do barril de petróleo impacta diretamente na balança comercial

brasileira. Segundo Shikida & Bacha (1999) a importação do petróleo correspondeu ao dispêndio de US$8,6

bilhões no triênio 1974-1976, muito superior ao triênio anterior, no qual o dispêndio com a importação de

petróleo chegou a US$1,4 bilhão

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Gráfico 2.3. Distribuição do ATR por produto final (açúcar e etanol), entre as safras de

1948/49-2015/16.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

% ATR açúcar % ATR etanol

Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; MAPA, 2016.

O gargalo imposto pela tendência à superprodução e à variação “cíclica” dos preços

internacionais do petróleo gera duas ações do setor, as quais ainda persistem: 1) o aumento

das exportações do açúcar e/ou; 2) o aumento da produção e consumo do etanol. Estas

respostas são constantemente estimuladas pelo Estado.

As ações institucionais são direcionadas para dar base à expansão destas atividades,

assim, são formuladas políticas/planos que controlavam os preços, ampliava o

armazenamento dos produtos, realizava isenção de taxas para a exportação, subsídios à

produção de cana-de-açúcar, facilidade de créditos para ampliação da produção e aquisição de

novas máquinas e equipamentos. A figura 2.1. expõem estes instrumentos, sendo que a maior

parte deles estão contidos nas ações do IAA ou conjuntamente aos grandes planos de

expansão do setor, como o Plano de Expansão da Indústria Açucareira (1963) ou Programa

Nacional do Álcool (1975). Estas ações promovem fortes alterações na agroindústria no que

se refere à escala da produção e a territorialização da produção, como demonstra a figura 2.2.

A trajetória do etanol inicia-se em meio a esse contexto de restrição estrutural do

açúcar; já na década de 1930 o governo federal com o Decreto 19.717/1931 estabeleceu a

mistura compulsória de 5% de álcool anidro há gasolina importada. Esta ação tinha como

objetivo criar um novo mercado para o setor sucroalcooleiro, ao mesmo tempo, que visava

diminuir os impactos da importação de gasolina. Junto com essa medida também estabelece

incentivos para importação de equipamentos para a armazenagem e produção de etanol, dando

redução de impostos e taxas diferenciadas em relação ao frete (SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991; SAFLATE, 2011; SHIKIDA & PEROSA, 2012).

Em 1938 o etanol definitivamente se insere na composição da oferta de combustíveis

no Brasil; por meio do decreto lei 7.37/1938, torna-se obrigatório a sua adição à gasolina e,

desde então, mesmo em porcentagens variáveis, nunca mais foi retirado da composição da

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gasolina C e da legislação brasileira. Este fato corrobora com o desenvolvimento do setor,

pois estimula o consumo de etanol de maneira compulsória e possibilita uma previsibilidade

para as firmas atuarem, uma vez que, a previsibilidade é garantida por intermédio da análise

da demanda por combustível. Esta é uma característica muito importante para o

desenvolvimento do biocombustível e fator que diferencia a iniciativa brasileira das demais,

ou seja, a continuidade do “programa” do etanol ao longo dos anos, mesmo passando por

mudanças no cenário político nacional e por contextos internacionais que afetam diretamente

os preços do petróleo, este mercado foi preservado.

A institucionalidade desenvolvida entre as décadas de 1930 e 1940 demonstra uma

relação positiva entre regulação-produção-inovação (vide figura 2.1.), pois em 1933 existia

uma destilaria no Brasil, com produção de etanol aproximadamente de 100.000 litros/dia, já

em 1940 o país contava com 38 destilarias com produção de 53.473.533 litros/dia (DUNHAM

et al. 2011).

As décadas de 1950 e 1960 transcorreram sob o signo de uma forte expansão da

indústria açucareira do Brasil, levadas pela expansão do mercado interno (urbanização e

industrialização) e externo (pós-revolução cubana). Com a produção organizada por meio da

divisão entre regiões e seus mercados, o Estado de São Paulo cobrindo o mercado interno e o

Nordeste dedicava-se às exportações. Entretanto, em 1963 o Brasil implementa o Plano de

Expansão da Indústria Açucareira94

, o qual visava assumir a exportação não mais como

residual, mas, sim como parte da estratégia setorial de desenvolvimento. Com isso, detinha a

queda dos preços internos e, principalmente, ampliava a acumulação de capital por intermédio

das exportações. A estratégia de exportação de açúcar se mantém e é constantemente

estimulada, com uma breve amenização entre 1975-1985, período de grande desempenho do

Proálcool (vide figura 2.3.).

Na década de 1970, a sustentação das condições produtivas foram dadas por novos

incentivos e pelo estabelecimento de novos programas setoriais, a saber: o Programa

Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (Planalsucar) em 1971; o Programa de

Racionalização da Indústria Açucareira (1971); e o Programa de Apoio à Indústria

Açucareira (1973) e o Programa Nacional do Álcool (Proálcool). O propósito destas ações

94

Entre as safras de 1961/62 -1971/72 o volume de exportações de açúcar do Brasil aumentou aproximadamente

106%, contra um crescimento de aproximadamente 50% na produção de açúcar, e de apenas 38% no consumo

interno de produto, isso comprova o redirecionamento do setor para a exportação (SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991).

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institucionais residia na tentativa de promover o crescimento do setor, preferencialmente, nas

regiões e das unidades produtivas mais eficientes (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991;

VEIGA FILHO & RAMOS, 2006).

No início de 1974, os preços do açúcar alcançaram seu preço máximo nas bolsas

internacionais, de US$ 1.388,56 por tonelada; já em meados de 1975, os preços despencam

para US$ 336,12 por tonelada. O resultado é uma nova e forte crise de superprodução.

Somado a isso, tem-se a crise do petróleo de 1973, em que o setor se reorienta fortemente para

o mercado interno, visando agora o aumento da produção de etanol, como pode ser visto nos

gráficos 2.4. e 2.6. As racionalidades das políticas se alteram e o comportamento dos atores

também, buscando ampliar a produção do etanol e expandindo suas áreas em outras regiões.

Este novo tipo de dirigismo estatal jogava por terra todo o esforço anterior do IAA

para equilibrar os desempenhos das regiões e de promover a sobrevivência de firmas menos

modernas; na verdade o IAA abandonava parte das preocupações protecionistas em relação ao

Nordeste (VEIGA FILHO & RAMOS, 2006). Com exceção do Planalsucar os outros planos

apresentavam de maneira explícita o fortalecimento do setor por meio da concentração das

unidades industriais e das terras agrícolas, objetivando formar grandes estabelecimentos.

Assim, a capacidade produtiva do setor canavieiro foi aumentada e a modernização foi

seguida de concentração no setor (vide gráfico 2.2. e a tabela 2.1.).

No entanto, o divisor de águas na realidade do sistema setorial é o estabelecimento do

Proálcool, instituído pelo Decreto n° 76.593 de 14 de Novembro de 1975, o qual teve a

finalidade de expandir a produção do álcool anidro, viabilizando seu uso como matéria-prima

para a indústria química e como combustível adicionado à gasolina. Por meio desse programa,

o país pode substituir parte do combustível derivado do petróleo e, além disso, ampliar as

possibilidades do setor sucroalcooleiro explorar a economia de escopo, deslocando parte da

produção de cana-de-açúcar para a produção de etanol, utilizando parte da capacidade

produtiva ociosa das usinas e destilarias anexas (LEMOS et al., 2015; CGEE, 2009; HIRA &

OLIVEIRA, 2009).

A justificativa oficial para o aumento da produção de álcool era a necessidade da

substituição da gasolina automotiva, com o objetivo de aliviar as pressões sobre a balança

comercial ocasionadas pela elevação dos preços internacionais do petróleo, que era até então,

preponderantemente importado (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; LEITE, 1990).

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O programa foi pesadamente financiado pelo estado, tendo sido gastos

aproximadamente 7 bilhões de dólares entre 1975 a 1989 (RAELE et al., 2014). No plano

institucional, o governo criou a Comissão Nacional do Álcool, formada por representantes de

vários ministérios envolvidos na execução do programa. A Petrobrás era responsável por

absorver e distribuir a produção de etanol. Conjuntamente, foram criadas linhas de crédito

especiais95

para a instalação e ampliação de destilarias vinculadas a usinas de açúcar, as

chamadas destilarias anexas96

, da mesma maneira, para a construção de novas unidades

produtivas independentes e especializadas na produção de álcool, as destilarias autônomas

(SHIKIDA & PEROSA, 2012; SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; LEITE, 1990).

Com a segunda fase do Proálcool (1979) têm-se a criação de fato de um novo

mercado, o etanol hidratado. Com isso, um novo conjunto de relações foi estabelecido,

principalmente entre a agroindústria canavieira e a indústria automobilística. A indústria de

automóveis participa do programa em troca de incentivos fiscais para aquisição dos seus

produtos novos, os carros movidos a álcool. Dados da efetividade deste novo arranjo são

mostrados por Stattman et al., (2013): em 1979 o Brasil apresentava 0,46% das vendas de

automóveis movidos somente a etanol, em 1980, eram 26,8% das vendas e no ano de 1986 era

76,1%. O rápido crescimento das vendas de veículos a álcool é considerado como resultado

dos estímulos do governo, que implementou políticas públicas que favoreceram a expansão do

mercado, não só incentivos fiscais, mas também, campanhas de divulgação e conscientização

dos consumidores.

No bojo das mudanças institucionais promovidas pelo Proálcool teve-se a criação de

novas instituições, necessárias para fazer avançar o programa como exemplos dessa têm-se: o

Conselho Nacional do Álcool (CNAL) e a Comissão Executiva Nacional do Álcool

(CENAL), cujo papel era, respectivamente, de formular os instrumentos de ação política e

fixar as diretrizes do Proálcool e de propiciar apoio técnico/administrativo ao CNAL,

portanto, órgãos para ampliar a ação coordenadora do Estado (ANDERSEN, 2011; SOUSA et

al. 2016).

Em adição, outros incentivos ligados ao consumidor final foram estabelecidos, por

exemplo, os preços do etanol hidratado foram fixados num nível equivalente a 65% dos da

95

Segundo Saflate (2011) as condições para a concessão desses financiamentos, parcialmente custeados por

empréstimos externos, eram extremamente favoráveis para os usineiros, com taxas de juros subsidiadas e com

correção monetária, cujos níveis eram muito inferiores aos da inflação da época. 96

Detalhes sobre a tecnologia de destilarias serão abordados no capitulo 4.

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gasolina, apesar das diferenças de custos de produção. Ao mesmo tempo, no lado da própria

produção, a taxa de conversão do açúcar em álcool foi tornada ainda mais favorável (38 litros

por saco de açúcar de 60 quilos), enquanto que as linhas de crédito subsidiado continuaram a

ser mantidas, apesar da intensificação do processo inflacionário (SHIKIDA & PEROSA,

2012; SHIKIDA & BACHA, 1999).

Os efeitos do Proálcool são muitos, dentre os quais se pode destacar os que formaram

as características básicas do SSI da cana-de-açúcar. O Estado de São Paulo consolida-se

definitivamente como centro dinâmico do SSI e se distanciou em muito do resto do país em

relação à produção e produtividade97

. É no período do Proálcool que ocorre a expansão da

produção canavieira em outros estados da mesma região (Centro-Sul), estados até então sem

grande tradição na produção açucareira - como Paraná, Goiás e Mato Grosso — e que

expandem as plantações de cana-de-açúcar, principalmente, voltadas para produzir álcool,

contribuindo desta maneira para reduzir ainda mais a participação no mercado interno dos

produtores do Nordeste (SHIKIDA & PEROSA, 2012; SAFATLE, 2011).

A tendência de concentração da produção iniciada em 1960 se amplia com as novas

unidades processadoras de cana. Segundo Veiga Filho & Ramos (2006), as destilarias

autônomas instaladas entre 1975 e 1980 tiveram como fundamento a integração vertical (cana

própria), que chegou a 71,2% nesse último ano. Os autores ainda indicam que no caso das

usinas com destilarias anexas, o percentual de cana própria caiu 9,7%, o que se explica pela

intensidade com que foi estimulada a ampliação da cultura canavieira no Estado de São Paulo.

Nos primeiros cinco anos do Proálcool tiveram as suas áreas colhidas elevadas em 62,4%,

elevação quase totalmente acompanhada pelo incremento da área própria cortada pelas usinas

(52,1%). Este fato evidência da existência de reservas de terras dos “latifúndios dos usineiros”

e/ou de aquisições de imóveis rurais.

A integração vertical do setor ocorre como característica histórica, pois em momentos

de expansão acelerada (Proálcool e pós introdução do veículos flex) o processo

concentracionista se manifesta com maior intensidade. Um exemplo disto é o aumento do

processamento de cana proveniente de propriedades dos próprios usineiros (vide gráfico 2.2. e

tabela 2.1.); outro fato é o aumento da capacidade de processamento das usinas, a moagem no

97

Segundo SHIKIDA & PEROSA (2012) às vésperas do Proálcool o Estado de São Paulo já era responsável por

metade da produção brasileira de açúcar, sendo que após o início do programa passou a concentrar também dois

terços da produção de álcool.

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106

início do Proálcool era de 5.500 TCD98

, em 2016 a capacidade gira em torno de 15.000 TCD99

(OLIVEIRA FILHO, 2013).

Tabela 2.1. Origem da Cana-de-açúcar moída na usina, por Estados e safras selecionadas.

1975/1976 1983/1984 1999/2000 2009/2010

Própria Fornecedor Própria Fornecedor Própria Fornecedor Própria Fornecedor

GO 241.623 8.532 94.992 1.525 6.760.630 391.466 27.129.534 12.962.895

MT 49.071 16.855 203.798 68.719 7.546.401 2.584.491 11.575.615 2.470.017

PR 1.260.501 645.033 1.788.114 1.252.295 21.529.302 2.781.879 37.595.589 7.907.292

AL 4.518.765 5.219.326 7.298.570 7.604.530 - - 15.477.992 8.791.767

PE 3.988.530 8.761.344 6.031.445 11.862.076 - - 10.453.300 7.806.033

SP 20.016.297 10.401.155 27.229.981 23.215.569 127.689.253 69.316.781 191.654.761 170.989.994

Fonte: elaboração própria de MAPA, 2013; MAPA, 2016.

Nos primeiros dez anos de existência do Proálcool, a produção brasileira de álcool

aumentou a uma taxa média de 35% ao ano, sem que o setor deixasse de produzir volumosas

quantidades de açúcar, tanto para a exportação como para o mercado interno

(SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). A figura 3 demonstra a evolução da produção do

etanol no Brasil.

Esta rápida expansão foi possível à custa de grandes e graves distorções, as quais

ficaram aparentes com a queda dos preços do petróleo e com o aumento da autossuficiência

brasileira em petróleo, reduzindo as suas importações para menos que 40% dos seus níveis de

consumo corrente em 1990 (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). Soma-se a esse quadro a

crise fiscal do Estado brasileiro, que fez diminuir sobremaneira os financiamentos e os

subsídios aos antigos e novos empresários do setor Com isso, o Proálcool foi se tornando cada

vez mais caro e “menos” necessário para o país.

A política e a estrutura de preços arquitetada para o estabelecimento do programa

começaram a ruir no início dos anos 1980. Segundo SZMRECSÁNYI & MOREIRA (1991),

à medida que o álcool hidratado foi se apropriando de crescentes parcelas do mercado da

gasolina, aumentava o volume excedente da gasolina, que deveria ser exportado pela

98

TCD = Toneladas de cana-de-açúcar dia 99

Entretanto, o setor é muito heterogêneo, as grandes usinas apresentam capacidade de moagem muito superior,

por exemplo, a Usina São Martinho, no município de Pradópolis/SP apresenta a capacidade de 10.500.000 t

cana/safra, se considera a safra de Abril a Novembro (244 dias) tem-se 43.032 TCD.

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107

Petrobrás a preços muito inferiores aos do mercado interno. Estas exportações forçadas (ou,

em outros termos, prejuízo) foram uma das causas do encerramento do Proálcool.

De tal modo, a década de 1990 é caracterizada pelos preços favoráveis do açúcar no

mercado internacional100

, fim dos subsídios ao setor, desregulamentação; o aumento da

importação do etanol (vide gráfico 2.4.); baixa credibilidade do etanol hidratado como

substituto da gasolina101

. Estas expressões são reflexos da mudança da trajetória do setor, via

alteração da postura política e econômica do governo, que deixa de atuar como um

interventor, para passar a ser apenas um agente fiscalizador, sendo o protagonismo do Estado

fortemente diminuído. Com isso, o programa de diversificação da matriz energética via

biocombustível (etanol) é parcialmente abandonado (STATTMAN et al., 2013).

Gráfico 2.4. Importação e exportação brasileira de etanol em metros cúbicos, entre 1989 a

2015.

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

Exportação Importação

Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; MAPA, 2016.

Obviamente que o contexto externo, no que se refere às possibilidades de ampliar as

exportações do açúcar e queda/estabilização dos preços do petróleo, também impactam na

conduta das firmas, as quais reorientaram novamente seus esforços para produção do açúcar,

mais uma vez, demonstrando a capacidade do segmento trabalhar com a economia de escopo.

100

O preço médio da tonelada de açúcar na safra de 1989/90 US$319,00 por tonelada e na safra de 1995/96 de

US$ 305,62 por tonelada (MAPA, 2013). Situação muito semelhante de 1975, entretanto, os preços do etanol

sem subsídios e sem o apoio logístico/financeiro da Petrobras tornava o programa do etanol muito oneroso. 101

A escassez de etanol é resultado do desmanche institucional em torno do Proálcool e da própria

“racionalidade” dos agentes produtores, os quais passaram a direcionar suas produções para o açúcar ou para o

mercado clandestino de etanol (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). A baixa da oferta de etanol atingiu as

vendas de veículos novos a etanol, 1986 apresentou 698.563 licenciamentos de veículos novos movidos a etanol,

já em 1990 os licenciamentos despencaram para 82.001, mais dados dessa situação vide gráfico 2.1.

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108

O início do desmonte do arcabouço institucional, responsável por sustentar a expansão

da produção sucroalcooleira, se inicia com a promulgação do Art. 174 da Constituição Federal

de 1988, abrindo espaço para a destituição dos aparatos de controle do Estado sobre os setores

econômicos. Segundo SHIKIDA & PEROSA (2012), a roupagem neoliberal do governo

Collor promoveu a desregulamentação da maioria das cadeias agroindustriais brasileiras,

sendo que a principal alteração no SSI da cana-de-açúcar foi à extinção do IAA e de todos os

programas e medidas conduzidas por esta organização. Observa-se uma ruptura parcial da

orquestração dos interesses que havia se estabelecido em torno do Proálcool, encerrando o

paradigma subvencionista outrora existente na agroindústria canavieira.

A desregulamentação econômica forçou um ajuste setorial de mudanças

organizacionais e produtivas. A questão da relação unidade industrial e agrícola

aparentemente não mudou, fazendo com que se tenha mantida a integração vertical lavoura-

processamento de cana, reforçando o processo de concentração técnica/produtiva, reinterada

pela concentração fundiária do complexo, marcada pelo predomínio do esmagamento de cana

própria (VEIGA FILHO & RAMOS, 2006).

2.2. MUDANÇAS NO AMBIENTE DE SELEÇÃO E BUSCA DO ETANOL

BRASILEIRO (2000- 2016)

Os fatos, os acontecimentos e os processos pontuados no tópico anterior evoluíram de

maneira atrelada às condições históricas do setor agrícola nacional. À medida que o processo

de modernização da agricultura avançava no território nacional, ao longo da segunda metade

do século XX, o setor sucroalcooleiro também se modernizava e empregava ações no sentido

de fortalecer suas bases produtivas, conformando-se em um Complexo Agroindustrial102

. Isto

pressupõe a articulação entre os agentes produtivos e o sistema regulador e financeiro,

situação que fica demonstrada na análise da figura 2.1. e na narrativa do processo de

construção do SSI da cana-de-açúcar.

102

A modernização da agricultura brasileira é um processo de escala nacional, ocorre nas diversas culturas e na

maior parte das regiões do país. Compreende-se como Complexos Agroindustriais a articulação entre os agentes

produtivos e o sistema financeiro (regulação financeira através dos investimentos e das linhas de créditos

dispostas pelos bancos públicos), com isso, esta organização é composta pela indústria de insumos químicos

(fertilizantes, agrotóxicos, corretivos); produtor agrícola; agroindústria; indústria de máquinas agrícolas; e o

Estado (regulação, financiamento, investimento e custeio e Pesquisa científica e biotecnológica). Os trabalhos de

Elias (2007); Heredia et al. (2010) e Castillo (2013) detalham esse processo.

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109

O período mais recente é caracterizado pela intensificação desse modelo de

desenvolvimento, a produção é fortemente expandida e, conjuntamente, observa-se a

intensificação dos esforços em adicionar mais conhecimento e ampliar a composição orgânica

do capital nas atividades produtivas. Este padrão de desenvolvimento é uma realidade na

agroindústria brasileira e internacional, sendo que o setor sucroalcooleiro com suas

particularidades também busca seguir essa condição (BUAINAIN & GARCIA, 2015;

BONACELLI et al., 2015; KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016)

Essa dinâmica é permeada por um conjunto de fatores que caracterizam essa nova fase

de expansão da indústria canavieira, podendo ser sintetizados por meio da: 1) acelerada

expansão geográfica para novas áreas de cultivo e processamento da cana-de-açúcar; 2)

concentração e centralização do capital no setor; 3) entrada de novos atores, principalmente,

do capital estrangeiro; 4) retomada da implementação de medidas institucionais relacionadas

ao setor, tendo destaque a inovação setorial; 5) esforço de aprendizagem em novas bases de

conhecimento, como na bioquímica, na engenharia genética e outras áreas do conhecimento.

Os dois últimos elementos serão analisados nos capítulos 3, 4 e 5, à luz do desenvolvimento

da rota tecnológica do etanol de segunda geração.

A forte expansão da produção de açúcar, do etanol e da geração de energia elétrica

para a composição da oferta nacional de energia103

, é resultado de mudanças no cenário

internacional e na conjuntura nacional. O gráfico 2.5. identifica um dos principais drivers

desse período, ou seja, o aumento dos preços internacionais do petróleo, situação que

estimulou o Brasil a estimular o consumo do etanol. Outros elementos compõem este

contexto, o qual incide no Brasil e no mundo, proporcionando uma abertura às tecnologias de

baixo carbono: 1) segurança energética, dada pela dependência do petróleo e/ou por sua

instabilidade (preço e geopolítica); 2) o de fortalecimento das preocupações com o meio

ambiente; 3) discussões, ações e novas medidas institucionais calcadas na mitigação dos

efeitos das mudanças climáticas; 4) o desenvolvimento acelerado das tecnologias e projetos

de exploração das energias renováveis, que se correlacionam com os demais drives. No que se

refere ao açúcar104

, este se beneficia da evolução dos preços das commodities, que é puxada

pelo crescimento econômico dos países em desenvolvimento, em especial à China.

103

A figura 2.2. indica essa situação. Para se ter uma base dessa evolução basta dizer que a produção de etanol

parte de 10.517.535 m3 na safra 2000/01 para 30.478.607 m

3 na safra de 2015/16.

104 Os preços do açúcar passam de 157,91 US$/t em 1999 para 589,20 US$/t em 2011 (MAPA, 2016).

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110

Gráfico 2.5. Preço médio do petróleo importado - 2000-2015 (US$/b FOB)

29,72 26,07

24,48

30,38 39,98

55,85 68,57

74,72

108,68

63,88

81,98

116,51 117,80

112,83

110,40

62,40

41,98

-

20,00

40,00

60,00

80,00

100,00

120,00

140,00

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Média do Ano

Fonte: elaboração própria a partir de SECEX, 2016.

A alteração do cenário internacional é complementada por mudanças internas, tanto no

nível de comportamento do setor como na esfera de Governo Federal. Tem-se um período de

relativa estabilidade institucional, o Estado volta a dedicar ações e medidas no nível

setorial105

, sendo que algumas destas ações alcançaram o SSI da cana-de-açúcar, assim,

contrapondo-se a década anterior (vide figura 2.1. e quadro 2.1.). Estas medidas versam sobre

fortalecimento da capacidade produtiva, a ampliação do consumo do etanol, e a intensificação

dos esforços em ciência e tecnologia ligada ao segmento. Paralelo aos estímulos tinha-se a

política de preços praticada pela Petrobras, a qual gerava uma pressão artificial sobre os

preços do etanol, agravando problemas de produção - tais como a baixa produtividade do

canavial -, situação que gerou um descompasso entre as políticas, reduzindo os efeitos das

ações verticais106

.

Estas ações não tiveram efeitos homogêneos e nem sempre foram efetivas, mas é

inegável que estas medidas trouxeram avanços e reposicionaram o segmento em outro

patamar recuperando a confiança do consumidor no etanol e ampliando as possibilidades de

desenvolvimento futuro dos produtos derivados da biomassa de cana-de-açúcar107

.

Os instrumentos que estimulam a criação, manutenção e a expansão da capacidade

produtiva local na década de 2000, mesmo não sendo expressamente coercitivos como na

105

Suzigan & Furtado (2010) e Kupfer (2013) indicam a alteração das políticas industriais a partir de 2003 com a

criação de ações que visavam o desenvolvimento econômico, tais como a PITCE, PDP e o Brasil Maior; a

criação da CNDI e ABDI, estas e outras movimentações ao longo da última década ajudaram a inserir a inovação

no centro da agenda de desenvolvimento, mas estiveram longe do satisfatório e, sobretudo, do necessário, pois

não tiveram forças e nem recursos para se impor, por carência de suporte e legitimidade política para sua

execução. Destaca-se, que estas ações também ficam aprisionadas pela política macroeconômica, sugerindo a

necessidade de reforma das instituições e a urgente articulação entre os diversos tipos e níveis de políticas. 106

Este elemento deve ser mais bem estudado, buscando compreender como a incongruência entre as ações do

Governo podem ter afetado o desenvolvimento recente do setor. 107

As medidas implementadas referentes ao desenvolvimento da C&T são abordadas nos próximos capítulos de

maneira correlacionada ao desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil e complementa a discussão realizada

neste subtópico.

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111

década de 1960/70/80, são importantes impulsos ao segmento. Estes apresentam racionalidade

e objetivos distintos, mas de maneira geral visaram dar uma nova roupagem institucional para

o setor sucroalcooleiro, buscando sua expansão e conferindo-lhe importância como uma das

opções nacionais para a “superação” dos problemas ambientais e de balança de pagamentos

relacionados à importação de petróleo. Assim, o Governo Federal reafirma a relevância da

indústria canavieira no cenário nacional e lhe proporciona novos caminhos para o seu

desenvolvimento (janelas de oportunidades) como a cogeração, etanol celulósico,

biocombustíveis avançados, bioquímica e a exportação do etanol, além da ampliação da

exportação do açúcar.

Dentre as ações implementadas pelo Governo Federal na direção de ampliar a

capacidade produtiva do setor, tem-se as medidas que são gerais, ou seja, os planos nacionais.

Estes apresentam linhas gerais para serem seguidas pelos diversos atores, assim, estas

medidas impõem metas de produção, previsões da demanda e da oferta e apresentam

objetivos que devem ser perseguidos pelo governo e, também, pelas firmas e outras

instituições que atuam diretamente com a cultura da cana-de-açúcar. Estas ações podem ser

observadas no quadro 2.1. e na figura 2.1.

Quadro 2.1. Medidas Federais que promovem o fortalecimento da capacidade produtiva e a

ampliação do consumo do etanol (2000-2016) Ministérios Políticas

públicas

Objetivos/pontos relevantes

Ministério de

Minas e Energias

MME

Plano Nacional

de Energia 2030

(2007-2013);

Plano Nacional

de Energia 2050

(2014 - )

Fornecer os subsídios para a formulação de uma estratégia de expansão da

oferta de energia econômica e sustentável com vistas ao atendimento da

evolução da demanda, segundo uma perspectiva de longo prazo.

É o primeiro estudo de planejamento integrado dos recursos energéticos

realizado no âmbito do Governo Federal brasileiro;

Contribui de forma decisiva para a recuperação do processo de

planejamento energético nacional de longo prazo (incluindo o etanol).

Plano Decenal

de Expansão de

Energia - PED

2022 (2013) e

as versões

subsequentes

Têm a função de produzir e divulgar os dados sobre a produção/demanda

atual e futura do setor de energia;

Auxilia no planejamento energético em nível de Estado e no nível de

empresas, pois os Planos Decenais são publicados anualmente pela

Empresa de Pesquisa Energética (EPE) desde 2007.

Fornecem informações confiáveis os atores do SSI;

Um elemento institucionalizado que substância as decisões políticas e

econômicas dos atores do SSI da cana-de-açúcar.

Conselho

Nacional de

Política

Energética

(CNPE)

Regulação da

mistura

etanol/gasolina

Determina a % de mistura de etanol anidro a gasolina.

Tal ação visa não só manter uma demanda mínima estável para os

produtores de etanol como também controlar o mercado em momentos de

crise de produtividade do setor;

A mistura apresenta o mínimo de 18% e o máximo de 25% até 2014,

quando a mistura passa atingir 27% de etanol anidro na gasolina C (Lei nº

13.033/2014).

Medida Tem como meta estabelecer um novo padrão de concorrência entre o etanol

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112

Provisória no

613/2013 (DOU

08/05/2013)

e a gasolina, através da desoneração fiscal sobre o produto.

Os mecanismos adotados são: 1) o crédito presumido de PIS/Cofins ao

produtor de etanol, assim, zerando a alíquota de R$ 0,12 por litro; 2) novas

condições para o financiamento da estocagem do etanol. Com recursos de

R$ 2 bilhões, com juros de 7,7% a.a. (Resolução Banco Central no 4.216,

de 30 de abril de 2013).

Medida

Provisória no

615/2013 (DOU

20/5/2013)

Estabelecem incentivos e desonera a carga de impostos dos produtores

localizados na Região Nordeste, uma maneira de promover minimamente

condições mais favoráveis à produção regionalizada do etanol.

Os mecanismos adotados foram: 1) a subvenção aos fornecedores

independentes de cana-de-açúcar da região Nordeste, referente à safra

2011/2012, no valor de R$ 12,00 por tonelada de cana; 2) a subvenção às

unidades produtoras de etanol combustível da região Nordeste, referente à

safra 2011/2012, destinada ao mercado interno, no valor de R$ 0,20 por

litro de etanol efetivamente produzido e comercializado na safra

2011/2012.

Congresso

Nacional

Marco

regulatório do

etanol Lei

Federal

12.490/2011

Reduzir as incertezas e permitir melhor regulação do mercado, atuando no

sentido de aumentar a estabilidade do setor no que se refere aos níveis de:

preços, oferta e relação risco-retorno;

Estabelece definições legais aos termos referentes aos biocombustíveis,

bem como, de suas unidades produtivas.

Outro ponto de destaque é a ampliação das competências da Agência

Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para regular e

fiscalizar toda a cadeia de produção, movimentação e abastecimento do

etanol;

Criação da obrigatoriedade de estoques de etanol anidro no período

entresafra, medida valendo tanto para as empresas produtoras como para as

empresas distribuidoras do etanol anidro no Brasil.

Ministério do

Desenvolvimento,

Indústria e

Comércio

Exterior

MDIC

BNDES

Prorenova

Aumentar a produção de cana de açúcar no país, por meio do

financiamento à renovação e implantação de novos canaviais. Visando

ampliar a oferta de matéria prima para a produção de etanol.

Os recursos são destinados a pessoas jurídicas que exerçam atividade

produtiva relacionada ao plantio de cana-de-açúcar, inclusive usinas e

destilarias, cooperativas de produção, cooperativas de produtores e

entidades societárias.

No ano de 2012, 393.000 hectares de cana-de-açúcar foram financiados

pelo programa. Deste valor, 22% foram de novos canaviais e 78% foram de

renovação das áreas já plantadas.

Até Agosto de 2013 a segunda versão do programa teve um total de

projetos aprovados que somados equivalem a 1,3 bilhão de reais, o que já

supera o desempenho de 2012, que teve o desembolso final na casa de 1,2

bilhão de reais.

Programa de

Apoio ao Setor

Sucroalcooleiro

(2010)

Uma linha de crédito do BNDES destinada especificamente ao

financiamento da estocagem de etanol carburante. Objetivo disponibilizar

recursos de capital de giro destinados à estocagem de etanol pelas

empresas, usinas e cooperativas, em um total de R$2,4 bilhões de recursos

disponíveis.

FINAMEs e

outras linhas de

financiamento

Produto financeiro do BNDES, o qual faz parte dos desembolsos da Área

de Operações Indiretas (AOI), com foco no financiamento da produção e a

aquisição de máquinas e equipamentos novos de fabricação nacional

através do intermédio de instituições financeiras credenciadas ao banco

Com relação aos equipamentos para a produção de açúcar e álcool o

crescimento do desembolso foi muito significativo até a crise de 2008,

apresentando taxa de crescimento do volume desembolsado de 481 %,

entre o primeiro semestre de 2003 ao primeiro semestre de 2007;

O valor do desembolso em 2003 na linha de equipamentos industriais para

o setor era de 36,1 milhões de reais, chegando em 2007 ao valor de 209,5

milhões de reais;

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113

Projetos novos aprovados/financiados de novos Greenfields em 2004 (1),

em 2005 (3), em 2006 (6), em 2007 (16) e em 2008 (17)..

Ministério da

Agricultura,

Pecuária e

Abastecimento

MAPA

O Plano

Plurianual

(PPA) 2012-

2015

Fortalecer o processo de comoditização do etanol por meio da atuação

brasileira junto a foros e parceiros internacionais;

Promover projetos de cooperação técnica para estimular a implantação de

usinas produtoras de bioenergia e de frotas piloto de veículos flexfuel em

outros países.

Iniciativa com atuação limitada e pontual, destinada a complementar o

conjunto de ações de outros ministérios, como o Ministério de Minas e

Energia e o Ministério das Relações Exteriores.

Fonte: elaboração própria.

Os planos nacionais apresentam tópicos específicos para o etanol (mesmo abordando

outras fontes/setores como o biodiesel). Estes são de grande envergadura, pois consolidam as

bases de dados e reposicionam os alvos a serem “atingidos” pelo setor (pelo menos no plano

ideal). Portanto, funcionam como guias e fornecem uma unidade para os agentes econômicos,

visando dar coesão para as ações do SSI da cana-de-açúcar. Os principais exemplos são: O

Plano Nacional de Agroenergia (2006-2010); Plano Nacional de Energia 2030 (2007-2013);

Plano Nacional de Energia 2050 (2014).

O Plano Nacional de Agroenergia apresentava um conjunto de objetivos para o setor,

dentre estes se têm: 1) o estabelecimento de metas para o desenvolvimento do mercado dos

biocombustíveis, visando garantir a participação dessa fonte alternativa no Balanço

Energético Nacional (BEN); 2) a organização e desenvolvimento de propostas de P&D e de

transferência de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a competitividade das cadeias de

agroenergia (dentre elas o etanol); 3) estabelecimento de arranjos institucionais para

estruturação da pesquisa nacional; 4) criar fóruns e instituições para a comoditização do

etanol.

Além das bases para expansão da produção do etanol e da ampliação das discussões

internacionais sobre a comoditização do etanol, os grandes avanços deste plano foram a

ampliação da infraestrutura de pesquisa científica e tecnológica voltada ao setor. Em 2007

ocorre à criação da Embrapa Agroenergia, a qual por meio dos seus laboratórios (4 em

operação) desenvolve um conjunto de pesquisas ligadas a produção de matéria-prima para o

etanol108

. Esta estrutura de pesquisa amplia de maneira considerável o potencial investigativo

108

As linhas de pesquisa da Embrapa agroenergia voltadas para o etanol são: a) cana-de–açúcar tolerante à seca;

b) novas variedades de cana adequadas à produção de etanol lignocelulósico; c) novos híbridos de mandioca; d)

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114

ligado ao setor, pois esta instituição soma-se a organizações já estabelecidas, bem como além

de cria novas redes de pesquisa e cooperação. Mais informações e análises sobre este novo

ator do SSI da cana-de-açúcar serão apontados nos capítulos 3 e 5.

O objetivo do Plano Nacional de Energia 2030 e o Plano Nacional de Energia 2050 é

subsidiar a formulação da estratégia de expansão da oferta de energia do Brasil, com vistas ao

atendimento da evolução da demanda, segundo uma perspectiva de longo prazo. O Plano

Nacional de Energia 2030 foi o primeiro estudo de planejamento integrado dos recursos

energéticos realizado no âmbito do Governo Federal, desta forma, contribui de forma decisiva

para a recuperação do processo de planejamento energético nacional de longo prazo, e nesse

conjunto, o etanol figura como uma opção relevante na composição da matriz energética

nacional.

Estes planos de longo prazo são acompanhados dos planos decenais que abordam a

dinâmica da expansão do setor de energia, assim, monitorando e projetando as variações de

curto e médio prazo. Assim, todos têm a função de produzir e divulgar os dados sobre a

produção/demanda atual e futura do setor de energia, auxilia o planejamento energético em

nível de Estado e no nível de empresas, pois os planos decenais são publicados/revisados

anualmente pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) desde 2007. Portanto, sua principal

função para o SSI da cana-de-açúcar é fornecer informações confiáveis aos atores, sendo um

elemento institucionalizado que substância as decisões políticas e econômicas destes atores.

No interior desta categoria, ainda existem as medidas institucionais de caráter

regulador, que visam normatizar, organizar e tributar a produção ou os processos produtivos,

como exemplos tem-se: a CIDE (LEI 10.336/2001); as ações da EPE (Lei 10.847/200); o

Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar (6.961/2009); o Marco regulatório do etanol

(lei Federal 12.490/2011) e as diversas Medidas Provisórias que atuam em questões pontuais

e temporárias.

O zoneamento agroecológico regula e organiza a produção, indicando áreas que

podem receber a cultura da cana, assim, determina os limites territoriais, e por sua vez,

restringe a produção futura baseada apenas na ampliação extensiva da cana-de-açúcar. A

expansão baseada na ampliação da área plantada é incompatível com a preservação dos

variedades e cultivares de sorgo sacarino; e) capins e resíduos florestais para etanol lignocelulósico; f)

prospecção (metagenômica) de microrganismos e enzimas para etanol lignocelulósico.

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115

biomas (um dos objetivos do zoneamento) e da sustentabilidade ambiental requerida para o

avanço futuro do setor, visando aproximar-se da economia de baixo carbono.

Em 2011, a crise do setor sucroalcooleiro atinge seu ponto mais crítico109

, sobretudo

para os atores ligados diretamente à produção do etanol. O setor enfrenta problemas no

abastecimento interno de etanol: o mercado de açúcar continua sendo mais atraente e a

oscilação do preço do etanol na safra e na entresafra passa ser mais significativa (nível baixo

de estoque do combustível), resultando no aumento da importação do etanol (vide gráfico

2.4.). Como resposta a esse cenário, o Governo Federal estabelece o Marco regulatório do

etanol, ação legal que veio em resposta à crise para estabilizar a oferta do produto na escala

nacional.

Do ponto de vista legal, a grande implicação é que todas as etapas de produção e

distribuição do etanol estão agora sob o regime legal da Lei do Petróleo. Os requisitos

legais criados são os mesmos exigidos dos outros agentes do segmento dos combustíveis.

A ANP passa a exigir maior segurança na oferta dos combustíveis110

, e, desta forma, busca

estabilizar a oferta do produto no mercado.

O que se nota é que o Governo Federal buscou explicitar as definições técnicas e

comerciais dos agentes ligados a cadeia do etanol, pois neste marco regulatório ocorre a

determinação de definições pontuais para as etapas mais importantes do processo produtivo

do etanol. Além disso, passando a regulação para a ANP, o setor passa a contar com normas

mais claras e com um arcabouço de ações regulatórias mais exigentes, pois emprega padrões

de segurança, produção e de estoque semelhantes ao da gasolina, assim, forçando uma

adequação das unidades produtoras de etanol. Ainda, passa a concentrar toda a tarefa de

regulação e vigilância sobre uma única entidade, tarefa antes “dividida” com o MAPA. O

setor de etanol passa ser de incumbência do MME, de tal modo, diminuindo a sobreposição

de esforços e aumentando a eficiência do planejamento energético nacional.

Essa medida é uma ação que busca diminuir a distorção do mercado de etanol, uma

vez que cria definições para as etapas de produção e distribuição do produto, instituindo

instrumentos para garantir o fornecimento contínuo do produto no mercado nacional,

109

A produtividade dos canaviais brasileiros que em 2009 era de 84 toneladas por hectare reduz para 69

toneladas por hectare em 2011(MAPA, 2012). 110

Determinando que o distribuidor de combustíveis automotivos tenha em 1.º de março de cada ano, estoque de

etanol anidro em volume compatível com, no mínimo, 15 dias de sua comercialização média de gasolina C, no

período anterior de novembro a janeiro. E, que o produtor de etanol anidro tenha em 1.º de março de cada ano,

estoque em volume compatível com no mínimo 8% de sua produção de etanol anidro no período de abril, do ano

anterior, a fevereiro do ano corrente (ANP, 2013).

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116

amenizando a sazonalidade intrínseca do setor. E, nesta direção, percebe-se a interconexão

inerente entre as medidas institucionais, ao passo que esta atua sobre os padrões da produção

que incide também na dimensão do consumo, pois visa garantir a continuidade da oferta de

etanol na entre safra.

As ações dadas a partir da ANP e da EPE objetivam regulamentar aspectos

particulares do setor, por exemplo: normas de segurança, padrões técnicos das usinas, as cotas

de armazenamento da produção de etanol por safra, a distribuição, a definição de termos

técnicos e correlacionados ao segmento. Estes são instrumentos institucionais que buscam

homogeneizar os padrões de produção e uma regularidade da oferta do produto no mercado

nacional. Com isso, reduzem as incertezas e permitem melhor regulação do mercado, atuando

no sentido de aumentar a estabilidade do setor no que se refere aos níveis de: preços, oferta e

relação risco-retorno.

No interior da mesma dimensão - estímulo à capacidade produtiva local – apresentam-

se as medidas de tipo pontual ou focalizadas, as quais versam sobre elementos particulares do

ambiente da produção sucroalcooleira. Dentre estas têm-se a criação de linhas especiais de

financiamento e crédito para o setor sucroalcooleiro realizadas pelo BNDES, principalmente,

visando a cogeração, ampliação da capacidade produtiva e a estocagem do biocombustível

(vide figura 2.1. e as figuras 2.3. e 2.4.).

As figuras 2.3 e 2.4. apresentam uma visão geral da atuação do BNDES no setor

sucroalcooleiro; por meio das ações focalizadas o banco passa a contribuir decisivamente para

o processo de expansão do setor. Os dados demonstram a evolução do montante contratado

pelo setor e a distribuição deste dinheiro no interior do setor, ou seja, para quais etapas da

produção estes recursos foram destinados; estas informações refletem o caráter expansivo do

setor na última década.

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117

Figura 2.3. Evolução dos valores disponibilizados pelo BNDES ao setor sucroenergético,

entre 2002 - 2016 (em reais - R$).

Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016; BNDES, 2016.

A figura 2.3. confirma a evolução do dispêndio feito pelo BNDES para o setor ao

longo da década de 2000. É possível observar que existe uma oscilação entre os anos, mas

parece inegável uma tendência de evolução no montante contratado, onde o banco passa cada

ano a ser mais participativo no SSI da cana-de-açúcar. Em 2002, o valor total contratado era

superior a 105 milhões de reais, passando em 2005 para aproximadamente 543 milhões de

reais e chegando a atingir em 2010 mais de 4,5 bilhões de reais. Nesta mesma figura pode-se

perceber a existência de “três ciclos” de expansão do setor: o montante de recursos evoluiu de

maneira significativa entre um período e outro, de 2003-2006, depois entre 2007-2010 e

finalmente entre 2011-2014.

A distribuição destes recursos está exposta nas figuras 2.3. e 2.4., sendo possível

identificar quais atividades receberam os maiores investimentos entre 2002-2016. A

implantação de novas unidades capitaneou 37% dos recursos (R$ 10.966.593.756), seguida

pela atividade de expansão e modernização industrial que representou 25% dos recursos (R$

7.366.442.381). Em terceira posição tem-se o plantio de cana-de-açúcar com 13% dos

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118

recursos contratados (R$ 3.991.023.041). Estas atividades confirmam que o período é de

expansão e ainda, evidenciam a atuação do BNDES neste processo, uma vez que o maior

volume de recursos foi destinado para áreas/segmentos que ampliam a capacidade produtiva

local. A observação conjunta das figuras 2.2., 2.3. e 2.4. e do gráfico 2.6. possibilita

claramente perceber o momento de expansão da capacidade produtiva, pois de 2005 a 2013

tem-se registro de instalação de novas unidades processadoras de cana de açúcar.

Figura 2.4. Evolução dos valores disponibilizados ao setor sucroenergético, entre 2002 -

2016 (em reais - R$).

Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016; BNDES, 2016.

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119

Gráfico 2.6. Implantação e fechamentos de usinas no Brasil entre 2005 a 2015.

-20

-10

0

10

20

30

40

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

8

2426

34

21

13

52 32 2 2

7

-4 -5 -5

-19 -20-17

-15

-11

Implantação Reativação Fechamento

Fonte: elaboração própria a partir de EPE, 2016.

O BNDES passa nesse contexto ser o principal articulador das ações do Governo

Federal, não só por sustentar financeiramente a expansão e a modernização do setor, mas por

ter desenvolvido capacidade mínima de orientar as ações dos agentes do SSI da cana-de-

açúcar. Isso fica claro nos planos de financiamento da cogeração, onde o financiamento era

condicionado a um padrão mínimo da nova caldeira e/ou do sistema de geração de energia.

Nessa direção, tem-se a criação do Programa de apoio à renovação e implantação de

novos canaviais PRORENOVA (2011 - 2016), com o objetivo de aumentar a produção de

cana-de-açúcar no país, visando ampliar a oferta de matéria-prima para a produção de etanol.

Os recursos são destinados a pessoas jurídicas que exerçam atividade produtiva relacionada

ao plantio de cana-de-açúcar, inclusive usinas e destilarias, cooperativas de produção,

cooperativas de produtores e entidades societárias. No ano de 2012, 393.000 hectares de cana-

de-açúcar foram financiados pelo programa. Deste valor, 22% foram de novos canaviais e

78% foram de renovação das áreas já plantadas. Em Agosto de 2013, a segunda versão do

programa teve um total de projetos aprovados que somados equivaleram a 1,3 bilhão de reais,

o que superou o desempenho de 2012, que teve o desembolso final na casa de 1,2 bilhão de

reais.

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120

No caso do PRORENOVA, os valores financiados variam segundo o tamanho das

empresas participante e segundo a variedade de cana-de-açúcar que é escolhida para compor o

novo/renovado canavial, podendo o financiamento chegar a 90% se as empresas

comprovarem o uso de variedades protegidas ou de clones potenciais de cana-de-açúcar. Com

esse adendo, a respeito da utilização de novas variedades de cana-de-açúcar, o Governo busca

por meio de uma política pública fortalecer o mercado de insumos para o etanol em um novo

patamar, buscando estimular os principais produtores de cana-de-açúcar a elevar o padrão

tecnológico dos canaviais.

Muitas relações podem ser feitas a partir das informações trazidas nas figuras 2.3. e

2.4., como o caráter reativo das políticas públicas brasileira, os anos de 2011 e 2012 marcam

o momento mais agudo da crise de produtividade da cana-de-açúcar, assim, também é o

momento da implementação do PRORENOVA e do aumento dos desembolsos do banco na

área de plantio de cana-de-açúcar (vide figura 2.4.).

Essas ações, mesmo apresentando problemas, se mostram relevantes, principalmente

no caso dos planos de inovação. Isto por que toda a configuração do PAISS Industrial e do

PAISS Agrícola foi feita por meio do trabalho de pesquisa e coordenação conjunta entre o

BNDES e a FINEP, indicando desenvolvimento de capacidades de planejamento estratégico,

sendo possível direcionar o desenvolvimento de rotas tecnológicas especificas, caso da

hidrólise enzimática, processo industrial que compõe a produção do etanol celulósico111

. Os

contratos envolvendo inovação agrícola, projetos de etanol de segunda geração e bioquímicos

da cana representaram um pouco mais 970 milhões de reais, sendo apenas 3% do total

investido com recursos do BNDES no período de 2002-2016.

A respeito dos instrumentos desenhados especificamente para estimular o consumo do

etanol na década de 2000, o grande destaque é a permanência da mistura de etanol à gasolina,

ação inalterada mesmo no período de desregulamentação do setor (década de 1990). Com

isso, sua permanência assegura a continuidade do projeto de substituição parcial do consumo

de combustíveis fósseis no Brasil e mantém uma demanda mínima estável para os produtores

de etanol, permitindo a criação de reserva de mercado para o produto. Assegura a oferta ao

consumidor nos períodos de instabilidade, como por exemplo, problemas climáticos que

atingem a produção, alta dos preços internacionais do açúcar e queda nos preços nacionais da

gasolina.

111

Estas ações e outros aspectos do período relacionados à C&T do setor serão trabalhados no capítulo 3.

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121

A mistura ocorre entre o mínimo de 18% e o máximo de 27,5%, a adição de etanol

anidro é regulamentada por lei pelo Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA),

as alterações são feitas por meio de resoluções. Esta medida é muito importante, pois cria uma

situação mínima para a existência da produção do etanol no Brasil, fator que diferencia o

Brasil de outras nações onde a mistura é facultativa, fator que eleva as incertezas e fragilidade

do projeto de substituição dos combustíveis com alta emissão.

Esta medida garante a existência do etanol nos períodos de crise, principalmente do

etanol anidro, mas a inovação do motor flex fuel em 2003 é a grande responsável pela

retomada do consumo do etanol hidratado. Assim, em 2002, o consumo de hidratado que era

de 3,7 milhões de m3 passou para 17,8 milhões de m

3 em 2015, claramente acompanhando o

crescimento da frota de veículos flex.

Gráfico 2.7. Consumo de combustível no Brasil entre 2001 – 2015 (m³).

0,00

5.000.000,00

10.000.000,00

15.000.000,00

20.000.000,00

25.000.000,00

30.000.000,00

35.000.000,00

40.000.000,00

45.000.000,00

50.000.000,00

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Etanol Hidratado Etanol Anidro Etanol Total Gasolina C

Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016.

O arcabouço institucional formulado nos anos 2000 se sobrepõe às medidas

estabelecidas nos períodos anteriores (vide figura 2.1.), assim, esse conjunto passa a orientar e

ampliar as possibilidades de progresso da produção do etanol, açúcar, bioeletricidade e de

novos produtos a base da biomassa da cana, portanto, são produtos e tecnologias que por suas

características elementares, concorrem com o standard estabelecido (produtos de base fóssil).

A expressão desta oposição ao standard é observada no consumo do etanol versus o da

gasolina e dos veículos movidos à gasolina e os movidos a partir da tecnologia flex fuel. O

desempenho destas opções “alternativas” marca esse novo período de expansão do setor

sucroalcooleiro, sendo os gráficos 2.7 e 2.8. expressão dessa realidade.

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122

Gráfico 2.8. Histórico de licenciamentos de veículos por combustível (2004-2016)112

.

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.000

3.500.000

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Flex Gasolina Diesel Etanol Elétrico

Fonte: elaboração própria a partir de ANFAVEA, 2016.

2.2.1. Dimensões econômica e territorial do SSI da cana-de-açúcar

O resultado dessa articulação entre o contexto externo e ações internas pró SSI da

cana-de-açúcar possibilitou ao Brasil ser o maior produtor de cana-de-açúcar do mundo com

666.011.859 ton., o primeiro em produção de açúcar (33.497.668 ton.) e o segundo maior

produtor de etanol do mundo com 30.478.607.000 bilhões de litros na safra 2015/2016

(MAPA, 2016; EPE, 2016). Na safra de 2014/2015 o setor sucroalcooleiro movimentou cerca

de R$ 70 bilhões, com a produção de cana, açúcar, etanol e bioeletricidade, o que

correspondeu a 1,3% do PIB do Brasil. Em 2016, o setor é composto por 422 unidades113

processadoras de cana-de-açúcar e a área plantada de cana-de-açúcar representa cerca de 10

milhões de hectares, o que equivale a 4,5% da área agricultável do Brasil (ANUARIO DA

CANA, 2015).

As figuras 2.2., 2.3. e 2.4. mais os gráficos 2.3., 2.4., 2.6., 2.7. e 2.8. confirmam o

crescimento do setor, demonstrando que ao longo da última década o setor se fortaleceu. Uma

das características desse processo é o crescimento sustentado pelo aumento da área plantada,

saltando de 4,3 milhões de hectares, em 1990, para 10 milhões de hectares em 2015, um

aumento de mais de 132%114

.

A evolução da produção do etanol no Brasil entre as safras 1975/76 até a 1985/86,

evidencia uma taxa de crescimento médio de 34,7% ao ano, concomitante à implementação

112

Os dados do ano de 2016 foram atualizados em 06/07/2016. 113

Em 2016, 51 unidades encontram-se paradas vide gráfico 2.9. 114

No mesmo período, a Índia, segundo maior produtor mundial de cana, expandiu sua área em cerca de 50%,

passando de 3,4 milhões de hectares, em 1990, para 5,1 milhões, em 2008, tendo retrocedido desde então,

alcançando 4,2 milhões, em 2010. Com isso, a área de cana que no Brasil era pouco mais de 25% maior que a

área do segundo maior produtor, em 1990, passou para quase 120% a mais, em 2010 (CHAGAS, 2012).

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do Proálcool. Da safra 1986/87 até a 2002/03 houve uma fase de desaceleração e instabilidade

da produção sucroalcooleira, assim, o crescimento médio foi de 0,72% ao ano. Entretanto, a

partir das safras 2000/01, constata-se um segundo ciclo expansivo de com crescimento médio

de 7,9% ao ano. Para todo o período considerado (1975/76 a 2015/16), a taxa de crescimento

médio anual da produção de etanol do Brasil foi de 12,3%.

A territorialização da estrutura produtiva do SSI da cana-de-açúcar pode ser observada

na figura 2.5. e gráfico 2.9. Os dados definem os aspectos elementares das dimensões

produtivas do setor, que se concentra na região Centro-Sul e na região Nordeste.

Figura 2.5. Participação dos Estados na produção do etanol nas safras de 2000/01 e 2015/16.

Fonte:elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016.

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124

Gráfico 2.9. Distribuição por Estado das usinas de cana-de-açúcar em 2016.

Acre

Amazonas

Ceará

Pará

Piauí

Rio Grande do Sul

Rondônia

Tocantins

Rio Grande do Norte

Espírito Santo

Maranhão

Bahia

Sergipe

Rio de Janeiro

Paraíba

Mato Grosso

Pernambuco

Alagoas

Mato Grosso do Sul

Paraná

Goiás

Minas Gerais

São Paulo

1

1

1

1

1

1

1

1

3

4

4

5

6

7

8

12

22

24

25

32

39

42

181

5

5

10

17

20

22

30

36

37

157

Ativas em 2016 Total de Usinas

Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANADATA, 2016.

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125

2.2.2. Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores

A forte expansão produtiva da indústria canavieira ocorreu concomitantemente à com

uma mudança na composição do capital do setor. Intensificou-se um processo iniciado nos

anos 1990, em que as aquisições e as joint ventures entre as empresas pertencentes ao setor e

novos entrantes, passaram a controlar ativos, movimento este observado no gráfico 2.10. e no

quadro 2.2. É sabido que o segmento era composto majoritariamente pelo capital nacional

com a presença de famílias tradicionais no controle das agroindústrias; tal padrão se altera

significativamente, com a entrada de empresas estrangeiras ou de grandes grupos nacionais

originários de outros setores.

Gráfico 2.10. Número de fusões e aquisições ocorridas no setor sucroalcooleiro entre 1995 a

2009.

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

21 1

32

7

119

5 5

89

25

14

4

Fonte: : elaboração própria a partir de KPMG, 2009.

As fusões e aquisições (F&A) tornaram-se uma alternativa para a adequação do

tamanho e da estrutura organizacional das empresas frente às novas condições do mercado,

caracterizado por uma regulamentação parcial (pós anos 1990) e pela conjuntura econômica

mundial, distinta pela intensificação do processo de globalização, expansão das energias

renováveis e do boom dos preços das commodities. Este movimento é próprio da dinâmica de

crescimento das firmas115

; as pertencentes ao setor crescem por aquisição e reforçam sua core

competence, ampliando suas possibilidades de desenvolvimento na mesma rota tecnológica.

Por sua vez, as novas entrantes crescem pelo processo de diversificação. Assim,

multiplicam suas competências, sendo capazes de acompanhar novas tendências,

possibilitando a realização de novos negócios “fora” da rota tecnológica que sustenta a sua

atividade principal, tornam-se ou ampliam sua característica de empresas multi-produto e

muti-setorial (CHANDLER, 1998). O caso das empresas ligadas ao setor de petróleo (Shell,

115

Penrose (2006).

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126

BP e Petrobras) é ilustrativo deste movimento, as quais adquiriram ou construíram parcerias

com firmas produtoras de etanol, um combustível concorrente aos derivados do petróleo.

Este processo é proveniente de pessoas físicas, fundos de pensão, fundos private

equity, mas, principalmente de grandes firmas ligadas ao setor energético e alimentício (vide

quadro 2.2.). Tal situação promoveu uma reestruturação acionária no setor sucroalcooleiro do

Brasil e fortaleceu a tendência à concentração produtiva.

Em relação às novas entrantes, sobretudo as multinacionais, a opção pelas fusões,

aquisições ou formação de joint ventures foram preferidas com o objetivo de diminuir os

custos operacionais e os custos de aprendizagem. Tal estratégia implica adentrar no setor já

com participação de mercado e com ativos em pleno funcionamento (usinas). Assim,

adquirem informações e conhecimentos relevantes economicamente, os quais só poderiam ser

atingidos com a participação no cotidiano da produção, portanto, perpassa por

particularidades culturais e tecnológicas de maneira mais fluída, queimando etapas no

processo de aprendizagem, inclinando a curva de aprendizagem e adaptações. Com essa

dinâmica, as entrantes encurtam a distância relativa entre das empresas líderes,concorrendo de

maneira mais equitativa com as empresas já estabelecidas em um curto período de tempo.

A opção dos novos investidores pela aquisição ou joint venture também se explica

pela redução dos custos de expansão dos seus grupos empresariais, pois opera em um novo

setor desde o início a economia de escala. Outro fator importante é a remoção das barreiras à

entrada, visto que aquisição garante o domínio de ativos complementares, como as bases e os

canais de distribuição e comercialização já instalados. Especificamente no caso do açúcar e do

etanol, tratam-se de fatores muito importantes, uma vez que boa parte do açúcar é exportada e

o etanol é consumido por todo o território nacional.

Nesta seara é perfeitamente possível supor que haja aumento da concentração

econômica, com a junção de diferentes plantas sob a direção de uma mesma empresa ou

grupo econômico. Isso resulta, em última instância, na diminuição dos custos administrativos

e no aumento no poder de negociação de preços dos insumos e dos produtos e, portanto,

amplia a rentabilidade e a competitividade das grandes firmas sucroalcooleiras.

No primeiro momento, as aquisições se deram entre as firmas pertencentes ao setor,

intensificando o movimento de concentração, já estimulado pela política pública116

. Em

116

Programa de Racionalização da Indústria Açucareira (1971-1975); Estímulos à fusão/incorporação de

unidades industriais (DEL 1.186/1971 ); PROÁLCOOL (DEC 76.593/1975). A observação do gráfico 5 e da

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127

meados dos anos 1980, o Grupo Cosan incorporou três usinas (Usinas Santa Helena, Usina

São Francisco e Usina Ipaussu), todas no Estado de São Paulo; esta ação é o início de um

processo maior, o qual se torna sistemático a partir de meados dos anos 1990. Em 1995, a

trading Balli Group realizou um joint venture e incorporou parte das ações da Usina Santa

Elisa (Grupo Zanini), localizada em Sertãozinho/SP. Neste mesmo ano, um consórcio paulista

adquiriu a Usina Santa Lydia, no município de Ribeirão Preto/SP (BENI, 2012).

Entre 1995 a 2000, pelo menos nove processos de F&A ocorreram na agroindústria

canavieira. Entre 2000 a 2009 foram identificados 97 ações envolvendo fusões, aquisições e

joint ventures, as quais proporcionaram incorporações de unidades de processamento,

verticalização à montante da cadeia, ou seja, compras de terras para autofornecimento e,

também, resultou em verticalização a jusante, com a posse de usinas pelas tradings atacadistas

de açúcar. Por exemplo, a aquisição da Santelisa pela multinacional Louis Dreyfus, deu

origem a Louis Dreyfus Commodities Bioenergia, a qual opera 13 usinas e tem uma

capacidade de moagem de 40 milhões de toneladas (VARRICHO, 2012).

A verticalização dos elos de produção é uma das características do processo de

concentração em curso. Desta maneira, chega-se em 2011 com 20% da agroindústria

concentrada nas mãos de 12 grupos empresariais. Consequentemente, a territorialização

destes grupos conforma o próprio circuito espacial de produção canavieiro, materializando-se

enquanto sistemas de objetos e ações, assim, hegemonizam áreas regionais na hinterlândia de

suas unidades agroindustriais (BENI, 2012; SHIKIDA & PEROSA, 2012; CASTILLO,

2013).

Estes novos atores visam participar da cadeia produtiva sucroalcooleira, ação

impulsionada pelas estratégias das commodities trading firms. O interessante é que estas

novas firmas passam a participar diretamente da produção e do controle dos ativos, o qual

altera a característica histórica do setor. O quadro 2.2. identifica alguns destes novos atores:

tabela 1 indicam esse fenômeno no cultivo da cana-de-açúcar e no controle da matéria-prima, já que nas áreas

tradicionais e nas novas áreas de expansão a cana própria é superior a cana de fornecedores.

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128

Quadro 2.2. Presença estrangeira na produção de açúcar, etanol e bioeletricidade no Brasil.

Entrantes Origem de

Capital

Entrantes

Origem de

Capital

DOW Chemical EUA Epuron (grupo Conergy) França

Shell Anglo-holandesa Eridania Beghin Say França

Glencore Intl A.G. Angla-suíça Eridania Beghin Say (EBS) França

Adecoagro Argentina Evergreen França

Alcotra Bioenergy Bélgica FDA - Franco Bras. A.A. França

Global Energy Espanha Tereos França

ADM (Archier Daniels

Midland) EUA

Trading Sucden França

Amyris EUA Trading Noble Group Hong Kong

Bunge e Born EUA Sheree RenuKa Sugars Ltd. Índia

Cargill EUA Mitsubishi Corporation Japão

Coinbra/Dreyfus EUA Mitsui Japão

Globex EUA Sojitz Corporation Japão

Grupo Stanley Morgan EUA Toyota Tshusho Japão

RanchCapital Investment EUA Ventoria Limited Reino Unido

Truenergy EUA Biofuel AS Reino Unido

Wellington Management EUA BP (British Petroleum) Reino Unido

Infinity Bio-Energy EUA Balli Group Reino Unido

Monsanto EUA

Clean Energy Brazil Investidores

diferentes

Cluster França

Brazilian Renewable Energy Company Investidores

diferentes

Fonte: : elaboração própria a partir de BENETTI, 2009; KPMG, 2009; BORGES & COSTA, 2009; SIQUEIRA

& CASTRO JUNIOR, 2011; GARCIA et al., 2015.

Desde o início dos anos 2000 este setor vem recebendo investimentos de empresas

estrangeiras e advindas de outros setores econômicos, como: do agronegócio, da energia, da

biotecnologia, da química e da petroquímica. Como exemplo, destes novos atores pode-se

citar as empresas: Bunge, Cargill, Infinity Bioenergy, Abengoa, Louis Dreyfous, a Shell, BP,

Dow, Dupont, Amyris, Novozymes, Mascoma, Odebrecht, Petrobras, Noble Group, Sojitz e

outras que seguem expostas no quadro 2.2. (CORRÊA, 2014; BASTOS, 2012; BENETTI,

2009; GUEDES, 2009). Com isso, o IDE (Investimento Direto Estrangeiro) na indústria

canavieira em 2002, que era cerca de US$ 4 milhões, passa para mais de US$ 1 bilhão em

2007 (SHIKIDA & PEROSA, 2012).

A emergência de novas firmas, novas espécies de firmas, inicia novos sub-setores ou

requalifica o conteúdo e a forma dos setores tradicionais (OYELERAN-OYEYINK &

RASHAH, 2009). Este processo é percebido no SSI da cana-de-açúcar. Esta mudança

estrutural, juntamente com o crescimento e a expansão do setor para novas áreas, estimulou a

diversificação das atividades econômicas e a reorientação das atividades inovativas, por

exemplo: a difusão da cogeração com objetivo da venda da eletricidade, adaptação das

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variedades de cana para novos tipos de solo; novos sistemas operacionais, difusão da

automação nas plantas industriais e etc.

Este processo desencadeia o alargamento das fronteiras setoriais e nessa ação residem

os elementos da mudança setorial, pois as fronteiras setoriais são importantes “espaços” para

o processo de aprendizado, visto que são nessas áreas que localizam-se importantes fontes de

novos conhecimentos. Ou seja, a interação entre firmas de diferentes naturezas possibilita o

processo de aprendizagem, a aquisição de novas competências e/ou de novas tecnologias, as

quais são refuncionalizadas e utilizadas sob uma nova perspectiva, agregando ou

redirecionando a rota tecnológica anteriormente estabelecida (MALERBA, 2002;

MALERBA, 2007).

A apropriação de novos conhecimentos e as novas oportunidades derivadas dessa nova

dinâmica de crescimento impele os atores a buscarem novas tecnologias, conformando novas

rotas tecnológias, por exemplo, todos os projetos de etanol celulósico ou de química verde no

interior do SSI surgem nesse contexto, e apresentam relações ou são conduzidas por estas

“novas” empresas117

. Tal afirmação toma forma nos capítulos 3 e 5.

2.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 2

O presente capítulo teve como objetivo demonstrar e compreender a gênese e o

processo de evolução da realidade produtiva do SSI da cana-de-açúcar do Brasil. Desta forma,

foi reconstruída a trajetória de formação do SSI e destacada suas características históricas, os

elementos e momentos que lhe conferem unidade e o posiciona no plano nacional. Assim, é

possível perceber sua forma híbrida, de um setor que integra concomitantemente os

segmentos agrícola, energético e alimentício.

Tais dimensões aparecem de maneira atrelada às peculiaridades dos momentos

históricos, como foi demonstrado, tendo sido cada uma destas dimensões estimuladas de

acordo com contexto e com as ações promovidas pelo arcabouço institucional. Ou seja, em

alguns períodos amplia-se a produção do açúcar e em outro a do etanol e, assim, diante dos

117

Vale reiterar que os novos entrantes não são necessariamente os únicos a realizar esforços em desenvolver ou

implementar novas tecnologias (o caso CTC comprova isso) e muito menos todos os entrantes mostram-se pré

dispostos a realizar tal movimento. O fato é que alguns destes aparecem com grande relevância no mapeamento

das políticas para C&T, na busca de patentes e na execução de projetos industriais de etanol celulósico (Raízen,

Abengoa, Odebrecht Agroindustrial etc.).

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impulsos, as firmas manejam a economia de escopo. Esta dinâmica fica clara na releitura do

processo histórico de formação do SSI da cana feita até aqui.

A proposta deste capítulo é obter uma compreensão geral da dinâmica de

transformação do SSI da cana-de-açúcar, visando dar um panorama da base material que gesta

as inovações de segunda geração. Como isso, revela-se o contexto histórico com a intenção de

demarcar as dimensões, as fronteiras e as particularidades do setor que sofre mudanças

recentes, e pode ser fortemente reconfigurado com o desenvolvimento futuro do etanol

celulósico. Então, a construção deste plano visa dar lastro para as discussões futuras, pois

assim sabe-se que as projeções e a resolução das barreiras ao desenvolvimento do etanol 2G

passa por compreender o ponto de partida.

Como foi demonstrado, trata de um setor em constante transformação. As últimas duas

décadas, em especial, têm promovido novos impulsos para a reconfiguração da indústria

canavieira, desregulamentação, criação de um arcabouço institucional novo, a entrada de

novos atores, e um novo ciclo de expansão da cana-de-açúcar, elementos estes apontados ao

longo deste capítulo. Tal dinâmica deu origem a um SSI completo, com a presença de todas as

categorias de atores no segmento, conforme ilustra a figura 2.6.

A figura 2.6. esboça a dinâmica complexa do SSI, com os principais elementos que

compõem o SSI da cana-de-açúcar do Brasil e a direção dos fluxos de relações existentes

nesse ambiente. A principal categoria de atores deste sistema é a indústria de transformação

da cana-de-açúcar (usinas/destilarias), as quais apresentam o maior nível de interação por

concentrarem a atividade core deste segmento, ou seja, a produção do açúcar, do etanol e da

bioeletricidade. Vale destacar que os fluxos de conhecimento sempre apresentam uma via de

“mão dupla”, ao passo que, quando os atores interagem, ambos aprendem.

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Figura 2.6. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil

Fonte: elaboração própria.

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132

CAPÍTULO 3. POLÍTICAS PÚBLICAS E O DESENVOLVIMENTO DO ETANOL

CELULÓSICO NO BRASIL

O presente capítulo visa identificar qual é o papel desempenhado pelas políticas

públicas de promoção à inovação no setor e como estas ampliam (ou não) a possibilidade do

desenvolvimento tecnológico voltado ao aproveitamento total da biomassa da cana-de-açúcar.

Com isso, destaca-se a necessidade das medidas institucionalizadas para o fomento e a

condução do progresso das tecnologias disruptivas e/ou amigáveis ao meio ambiente, ou seja,

tecnologias que concorrem com padrões técnicos e econômicos já estabelecidos, como é o

caso do etanol celulósico. Soma-se a esta temática, disputas na dimensão de superação do

Carbon lock-in. Nessa direção, o esforço particular desta pesquisa também contribui com uma

problemática global e atual.

Neste estágio do trabalho é possível apontar a correlação das iniciativas nacionais de

desenvolvimento tecnológico do etanol de segunda geração com as políticas públicas

implementadas pelo Governo Federal e pelo Governo Estadual de São Paulo. Cada ação

resultou em um conjunto de desdobramentos - os quais conformam a realidade do setor em

relação a essa tecnologia-, delineados pelas limitações e pelas vantagens existentes nas

próprias políticas públicas. O capítulo expõe a relação entre implementação de políticas e o

start das atividades voltadas à CT&I ligadas ao etanol celulósico no Brasil.

Os achados/resultados deste capítulo estão organizados de maneira a responder três

questões, estas são: 1) Qual é o design das políticas públicas voltadas especificamente para o

etanol celulósico? 2) Como o conjunto de medidas institucionais voltadas ao etanol celulósico

influenciou os atores do SSI da cana-de-açúcar? 3) Quais foram as adequações no campo de

políticas públicas para suportar/apoiar/implementar esta nova tecnologia no Brasil?

Tais perguntas estão fundamentadas na premissa de que as políticas públicas devem

articular o mercado118

e o desenvolvimento tecnológico/científico (MOWERY et al, 2010),

ação que possibilita emular o processo social da inovação e amplia a possibilidade da

tecnologia ser difundida no interior do SSI. Este pressuposto é embasado constantemente por

118

O capítulo 2 demonstrou a existência e a continuidade de medidas institucionais, as quais criaram um

ambiente “estável” para o etanol de primeira geração, possibilitando sua sobrevivência mesmo em períodos de

crise econômica ou crises relacionadas a condições internas ao setor. Portanto, o Brasil foi hábil em desenvolver

um mercado nacional para o biocombustível. A discussão deste capítulo visa complementar a análise do

arcabouço institucional relacionado ao setor sucroenergético, sobretudo, visando demonstrar as medidas que

promovem o aumento da oferta de tecnologia e de conhecimento no setor, assim, abrindo um espaço para

inovações, tal como o etanol celulósico.

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intermédio de estudos de casos que mostram uma relação positiva entre políticas específicas

para o desenvolvimento das energias renováveis e o avanço do setor (LEWIS & WISER,

2007; BUEN, 2006; HENDRY & HARBORNE, 2011; e RU et al, 2012 sobre energia eólica,

e ERICSSON et al 2004; NEGRO et al, 2007; SUURS & HEKKERT, 2009; e HELLSMARK

& JACOBSSON, 2012, sobre o aproveitamento da biomassa na Europa)119

.

Ademais, uma diversidade de autores dedicados ao problema do desenvolvimento

tecnológico das energias renováveis [KEMP & SOETE (1992); JACOBSSON et al. (2000);

CARLSSON et al. (2002); WALZ (2008); CGEE, 2009; NEMET (2009); MOWERY et al

(2010); NYKO et al. (2010); CAMILO (2013); MAZZUCATO et al. (2015)] têm

argumentado que estas novas tecnologias necessitam de um conjunto amplo de medidas

regulatórias e instrumentos de incentivos para que avancem na trajetória de desenvolvimento

técnico e econômico; assim, identificar as características básicas das políticas implementadas

correlacionadas à produção e ao desenvolvimento do etanol no Brasil se torna relevante.

Por outro lado, ao responder a estas questões, aproxima-se da compreensão do papel

das políticas públicas120

no âmbito do Sistema Setorial de Inovação, de maneira conceitual e

concreta, pois avança no entendimento do setor sucroalcooleiro e retoma um elemento

importante do conceito desenvolvido por Malerba (2002, 2003) e Nelson & WINTER (1982).

Desta forma, as informações contidas nas subseções a seguir somam-se ao conteúdo

exposto no capítulo 2, complementando o quadro evolutivo da institucionalidade ligada ao

setor e evidencia o caráter singular dos anos 2000, momento em que ocorreu uma mudança

qualitativa do padrão de intervenção do Estado no setor sucroenergético – a inovação foi

posta na pauta de ações dos agentes públicos e privados.

O capítulo foca exclusivamente nas medidas de estímulo à C&T e de aprendizado

tecnológico, sendo possível evidenciar três características importantes: 1) a retomada das

ações do Governo Federal na direção de orientar (minimamente) os atores do setor

sucroenergético (depois de um hiato nos anos 1990); 2) a realização de esforços

sistematizados de aprendizagem tecnológica em uma nova base de conhecimento e; 3) a

119

Em comum, tais estudos abordam as problemáticas do desenvolvimento tecnológico de produtos e processos

novos, os quais necessariamente concorrem com sistemas técnicos já consolidados, dotados de uma

infraestrutura produtiva e institucional já estabelecida, as quais se contrapõem ao progresso da nova rota

tecnológica (renovável). 120

Endente-se por políticas públicas o conjunto de ações do governo que irão produzir efeitos específicos na

sociedade, na cultura, na economia e no território nacional. Estas ações partem diretamente dos órgãos

governamentais ou podem ser delegadas a outras organizações, públicas ou privadas (SOUZA, 2006). Logo, faz

uso do termo políticas públicas para referir à soma das atividades do governo que influenciam a vida dos atores

sociais, partindo sempre do que o governo escolhe fazer ou não fazer.

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134

entrada de novos atores, principalmente os estrangeiros, os quais passam a agir em território

nacional correlacionado ao setor sucroenergético por meio destas medidas de apoio à

inovação, e com o estabelecimento de parcerias estratégicas tais como Amirys, Novozaymes,

VTT do Brasil e outras.

As políticas de estímulo à C&T do setor sucroalcooleiro são aqui interpretadas como

de cunho agrícola-industrial-tecnológico, visto que buscam atender demandas específicas da

produção, ao passo que buscam agregar valor à cadeia produtiva e, ainda, fazem avançar a

fronteira do conhecimento por intermédio da busca por uma ruptura tecnológica (etanol de

segunda geração e novos produtos químicos a partir da biomassa da cana-de-açúcar).

No interior das medidas de estímulo à C&T (vide figura 2.1. e quadro 3.1.) foi

analisado o desenho das principais medidas, leis e programas ligados ao setor no período de

2000 a 2016. O recorte temporal justifica-se pelo fato que se objetivou traçar um quadro atual

do setor e, além do mais, este é o momento em que o Governo Federal intensifica suas

medidas e estratégias para o desenvolvimento dos combustíveis renováveis, pontuando sua

importância nos objetivos dos planos e projetos de ação do Estado; um exemplo é o Plano

Nacional de Agroenergia (PNA) em 2006.

Por fim, este capítulo apresenta três seções além desta introdução. A primeira seção

(3.1) aborda as políticas públicas voltadas ao estímulo da C&T e do aprendizado tecnológico

ligado ao setor sucroalcooleiro em geral, expõem as medidas/instrumentos encontrados no

processo de mapeamentos das iniciativas do Governo Federal e do Governo do Estado de São

Paulo no período de 2000 a 2016, em que destacam-se as principais características e os seus

efeitos mais perceptíveis no SSI da cana-de-açúcar. A segunda seção (3.2) dedica-se

exclusivamente ao Plano Conjunto BNDES-FINEP de Apoio à Inovação Tecnológica

Industrial dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico (PAISS Industrial e PAISS Agrícola).

A terceira seção (3.3.) é dedicada a expor as considerações finais do capítulo.

3.1. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O SETOR SUCROENERGÉTICO BRASILEIRO:

ADENSAMENTO DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA LIGADA AO ETANOL

O conjunto de ações e medidas que estimulam a C&T e/ou aprendizagem tecnológico

do setor sucroenergético são caracterizadas por proporcionar condições para os investimentos

em PD&I e, sobretudo, são ações diretas do Governo para o desenvolvimento da tecnologia;

na maioria dos casos o Governo é o financiador e, em outros é o responsável por executar os

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projetos de pesquisa por meio de instituições de ensino ou pesquisa. Destaca-se que cada

instrumento apresenta uma característica específica e efeitos variados.

As ações mapeadas no período entre 2000 a 2016 são formuladas e conduzidas pelo

Governo Federal por meio dos seus ministérios (MAPA, MDCI e MCTI) e órgãos de fomento

à inovação, como a FINEP e o BNDES. Nesse ínterim encontram-se ações na esfera estadual,

com destaque para o Estado de São Paulo121

. As discussões sobre estas ações se somam aos

destaques do capítulo anterior, desta forma, pode-se perceber que mesmo com as contradições

e deficiências existentes na realidade brasileira, o SSI da cana-de-açúcar foi hábil em

construir um arcabouço institucional completo para o seu desenvolvimento da trajetória do

açúcar e do etanol de primeira geração122

.

As medidas institucionais mapeadas ao longo da tese (vide figura 2.1. no capítulo 2 e

quadro 3.1.) apresentam certo sincronismo, pois agem em vários momentos da cadeia

produtiva do etanol e buscam co-evoluir com a tecnologia. Portanto, as ações institucionais,

no contexto dos anos 2000, buscam acompanhar e estimular as mudanças tecnológicas

vivenciadas no setor bioenergético123

. O esforço do arcabouço institucional no período recente

é de coevoluir com a base produtiva e, ao fazê-lo, conduzir e suportar as condições para a

inovação.

Inegavelmente este processo ocorre, entretanto, seu alcance e efetividade são limitados

como é demonstrado nos trabalhos de Varricho (2012); Bin et al. (2015) e Souza et al. (2016)

e, também, suportados pelos dados da PINTEC (2008 e 2011). Essa “baixa” atividade

inovativa é uma característica estrutural do segmento – heterogeneidade das firmas.

Medidas institucionais voltadas ao estímulo da CT&I buscam alterar este quadro e, tal

movimento/esforço é o objeto de análise deste capítulo, pois mesmo que estas ações não

tenham revolucionado a técnica e a organização do setor, estas são responsáveis por inaugurar

121

As medidas realizadas pelo Governo Estadual serão abordadas ao final desta seção, com um subtópico em

particular. 122

Como mostrado na figura 2.1. (capítulo 2), o arcabouço institucional do setor sucroenergético é completo

enquanto a forma, ou seja, apresenta temporalmente políticas e instrumentos de apoio ao setor que versão sobre

as três categorias de políticas públicas definidas por esta pesquisa: Instrumentos que estimulam a criação,

manutenção e expansão da capacidade produtiva local (produção); Instrumentos que estimulam o consumo do

etanol (Consumo); Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico –

(vide subseção 1.3.1.1.). 123

Os trabalhos Nyko et al. (2010); Bastos (2012); Bacovsky et al. (2013); Pereira et al. (2015); Pereira (2015) a

;

UNCTAD (2016) entre outros, demonstram que os esforços em desenvolver o etanol celulósico e outros

produtos por meio da biomassa é uma disputa global, com ações em diversos países, cada qual apostando em um

tipo de matéria-prima e em um processo produtivo, com certa ligeira predominância dos esforços na rota

bioquímica (o capítulo 4 apresenta elementos para suportar tal afirmação).

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novas estruturas de pesquisa (CTBE, Embrapa Agroenergia, Ph.D. Program in Bioenergy124

),

criar ou atrair “novas” empresas no setor (Alellyx; CanaVialis; GranBio; Amyris, Iogen

Energy; Abengoa, VTT, Novozymes, DSM; Butamax; LS9; Metso e outras) e promover avanço

tecnológicos verdadeiramente relevantes (novas variedades de cana, leveduras geneticamente

modificadas, ampliação da agricultura de precisão, plantas industriais de etanol celulósico).

Os atores estrangeiros atraídos pela nova política de inovação do setor são diferentes

das empresas estrangeiras e nacionais entrantes ao longo da primeira década de 2000 (vide

capítulo 2). Estas firmas e instituições visam explorar as oportunidades tecnológicas,

apresentam bases de conhecimento e técnicas ligadas à biotecnologia e a química fina,

portanto, almejam ser fornecedoras e desenvolvedoras de tecnologias e de insumos

tecnológicos para as unidades processadoras de biomassa. Por outro lado, os atores da

primeira década são grandes firmas ou grupos de investidores que objetivam participar ou

ampliar sua participação na produção mundial de commodities (açúcar) e aproveitar o boom

de consumo de etanol no mercado interno (carro flex – que durou até 2010 aproximadamente).

Estes novos fatores ampliam a dimensão do SSI da cana-de-açúcar, alterando suas

fronteiras setoriais, promovendo alterações nos padrões históricos da produção, forçando um

deslocamento em direção ao STI-mode, haja vista que o contínuo progresso técnico do setor

depende de uma articulação mais constante entre o conhecimento sistematizado e as

competências acumuladas ao longo da sua trajetória de desenvolvimento - calcada no DUI-

mode.

O esforço de aprendizagem em nova base de conhecimento e a entrada de novos atores

com competências distintas ampliam a quantidade e alteram a natureza das relações entre as

firmas e entre os atores não-firmas, assim, resultando em novos links, alterando as

interdependências e a complementaridade entre os indivíduos e as organizações. Esta

dinâmica é própria da transformação industrial, dada na sua essência pela contínua relação

entre tecnologia e sociedade ao longo do tempo, processo que ao final, manifesta-se como

mecanismo de desenvolvimento econômico e inovação (BRESCHI et al., 2003; MALERBA,

2003; MALERBA, 2007).

124

Programa de pós-graduação voltado à geração de conhecimento e à formação de recursos humanos de

excelência na temática da bioenergia. Este foi formado a partir de acordo de cooperação entre as três

universidades estaduais de São Paulo (USP, UNICAMP e UNESP).

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137

As medidas institucionais que ampliam a chance do progresso técnico do setor

consolidam o arcabouço institucional, tornando-o atuante nas diversas etapas da cadeia

produtiva. Nesse processo, fica evidente que nos anos 2000 o esforço em desenvolver novas

tecnologias, principalmente, o etanol celulósico, passa a ser foco de ações sistematizadas do

Estado (criação de planos de desenvolvimento, editais de pesquisa e linhas de financiamento à

inovação – vide quadro 3.1 e figura 3.1.), contrastando com a década anterior marcada pelo

encerramento das atividades “coordenativas” do Estado e ausência de iniciativas no campo da

C&T especificamente com etanol125

.

A corrida pelo etanol celulósico ainda está em curso como demonstram os trabalhos de

Nyko et al. (2010); Souza et al. (2015), Silveira et al. (2015); UNCTAD (2016), Silveira et

al. (2016). Portanto, o Brasil como um dos principais players em energias renováveis126

e o

segundo maior produtor de etanol do mundo, deve buscar assumir o desenvolvimento desta

tecnologia como parte da sua estratégia de desenvolvimento, pois a tecnologia do etanol

celulósico e os seus desdobramentos apresentam o potencial de revolucionar o segmento

bioenergético, assim, a continuidade da cadeia produtiva da cana-de-açúcar no Brasil

(completa e integrada) depende da reação dos atores e do Estado em relação à trajetória de

segunda geração.

Os saltos na produção do etanol e a participação na bioeconomia não se dão de

maneira automática, compreende-se que tais mudanças não se desenvolvem de maneira

espontânea, apenas com o setor privado ou mesmo com ações que visam corrigir distorções

do mercado, é necessário ir além de medidas que se caracterizam como um “empurrão” do

poder público (isenções fiscais e créditos). O progresso em áreas de fronteira e de tecnologias

que fazem frente ao Carbon lock-in necessita de políticas ativas, nas quais órgãos públicos

assumam os riscos e conduzam o processo (ou parte dele), dividindo responsabilidades e

competências, já que se tratam de soluções de enfrentamento a desafios socioambientais

abrangentes (MOWERY et al., 2010; FORAY et al. 2012; MAZZUCATO, 2013;

MAZZUCATO et al. 2015).

Os exemplos concretos nas tecnologias ligadas à fotovoltaica (SHUM &

WATANABE, 2009; WISER et al. 2011; PETERS et al., 2012), ao veículo elétrico

125

Deve-se fazer uma ressalva, pois nos anos 1990 o setor apresenta um importante programa de mapeamento do

genoma da cana-de-açúcar conduzido no âmbito da FAPESP (elementos dessa iniciativa aparecem no subtópico

destinado às ações no nível estadual). Mas na esfera federal não foi encontrada nenhuma iniciativa. 126

A Produção de Energia Primária no Brasil no ano de 2014 provenientes de fontes renováveis atingiu 43,5%,

sendo que produtos da cana-de-açúcar representaram 18,1% do total da energia primária.

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138

(AHMAN, 2006; ZHANG et al., 2013; MOCK & YANG, 2014; MAZUR et al, 2015;

LUTSEY, 2015; XU & SU; 2016) e, mesmo em relação ao etanol celulósico (NYKO et al.,

2010; NYKO et al., 2013; MILANEZ et al., 2015; PEREIRA et al., 2015; UNCTAD; 2016)

indicam que o caminho da superação passa pela ação do Estado, não apenas corrigindo as

distorções do mercado, mas imputando ao poder público a função de indutor e orientador do

desenvolvimento tecno-econômico do novo setor.

As experiências internacionais revelam que as ações são coordenadas e focalizadas em

trajetórias tecnológicas “portadoras de futuro”, assim, estas ações se traduzem em misson-

oriented R&D programs. Este tipo de ação, segundo Foray et al. (2012), é necessária para

induzir e desenvolver tecnologias relevantes na atualidade, sendo que as ações apresentadas

nos quadros 3.1.; 3.3. e 3.6. substanciam essa situação.

Este caminho é percorrido pelo SSI da cana-de-açúcar e os pontos fracos e fortes que

derivam deste esforço conformam as características atuais do sistema de inovação da cana,

sustentando uma das vertentes da reestruturação setorial, o aprendizado em uma nova base

tecnológica. As políticas destacadas a seguir tangenciam as características básicas de misson-

oriented programs, principalmente, os planos de cooperação entre FINEP-BNDES (PAISS

Industrial e PAISS Agrícola) e o programa BIOEN/FAPESP.

A execução do PAISS (Industrial e Agrícola) demonstra um encadeamento das

políticas federais realizadas para o SSI da cana-de-açúcar ao longo da última década, pois no

período entre 2000-2010 as políticas focaram-se mais no desenvolvimento da pesquisa básica

(linhas de pesquisa do PACTI e ENCTI) e na construção e ampliação da estrutura de pesquisa

(criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia). Já no período posterior, entre 2011-2014, as

políticas apresentam financiamento a projetos de demonstração e financiamento de projetos

de pesquisa ligados aos problemas produtivos. Com isso, ocorre uma passagem qualitativa no

interior das novas rotas tecnológicas ligadas à transformação da biomassa da cana-de-açúcar.

Este movimento mostra como o arranjo institucional ligado ao setor se adaptou para induzir e

apoiar o start do desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil.

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139

Quadro 3.1. Políticas Federais que promovem o fortalecimento das ações em Ciência e Tecnologia no SSI da cana-de-açúcar. Ministérios Políticas públicas Objetivos (relacionados ao SSI da cana-de-açúcar) Resultados/pontos relevantes

Ministério da

Agricultura, Pecuária

e Abastecimento

MAPA

Plano Nacional de

Agroenergia

2006-2011 (PNA)

*Organizar e desenvolver propostas de P&D e de transferência

de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a

competitividade das cadeias de agroenergia;

*Estabelecer metas para o desenvolvimento do mercado dos

bicombustíveis, visando garantir a participação dessas fontes

alternativas no Balanço Energético Nacional (BEN);

*Estabeleceu arranjos institucionais para estruturar a pesquisa

nacional;

*Comoditização do etanol;

*Criação da Embrapa Agroenergia em 2007, a qual através dos seus

laboratórios (4 em operação) desenvolve um conjunto de pesquisas

ligadas a produção de etanol como:

– Cana-de–açúcar tolerante à seca;

– Novas variedades de cana adequadas à produção de etanol

lignocelulósico (ELC);

– Novos híbridos de mandioca;

– Variedades e cultivares de sorgo sacarino;

– Capins e resíduos florestais para ELC;

– Prospecção (metagenômica) de microrganismos e enzimas para

ELC;

- Cooperação em projetos de P&D de firmas e outras instituições –

Ex:. Com o CTC e CTBE (vide capítulo 5).

Ministério de Ciência,

Tecnologia e Inovação

MCTI

Plano de Ação em

Ciência, Tecnologia e

Inovação 2007-2010

(PACTI)

*Fomentar a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação

aplicada ao setor sucroalcooleiro, visando tornar mais eficiente

a produção, o processamento e o uso de co-produtos da cana-

de-açúcar, em especial, o álcool combustível, por isso foca no

desenvolvimento de novas tecnologias e rotas para produção

de etanol;

*Direcionamento das linhas de pesquisa através do

estabelecimento de metas e objetivos dentro do setor;

*Recursos pré-determinados ao longo do período do plano de

ação em C,T&I

*A criação do Centro de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE),

com investimento inicial de 69 milhões de reais. Instituição de

pesquisa que além de desenvolver suas próprias pesquisas tem a

função de auxiliar as pesquisas feitas nas empresas, bem como,

abrigar espaços de comunicação entre os pesquisadores e os

produtores desta tecnologia;

*Investimento de 21 milhões de reais alocados na Rede

Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro

(Ridesa) para o desenvolvimento e para a identificação de variedades

de cana-de-açúcar.

*Gasto de 21,5 milhões de reais através de editais do CNPq para a

formação de recursos humanos – projetos de pesquisa.

Estratégia Nacional de

Ciência, Tecnologia e

Inovação 2011 – 2015

*Elege alguns programas prioritários, que envolvem as cadeias

importantes para impulsionar a economia brasileira, dentre os

vários segmentos apresenta um conjunto pontual de ações para

o etanol, visando ampliar os efeitos iniciados do PACTI, ou

seja, continuar o apoio a pesquisas na área de produção de

etanol.

*Fomento a pesquisa e inovação voltadas para a produção do etanol

de nova geração;

*Consolidação do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do

Bioetanol (CTBE) como centro de excelência na pesquisa

desenvolvimento e inovação em etanol de 2ª geração;

Ministério do

Desenvolvimento,

Indústria e Comércio

Exterior

MDIC

PAISS (BNDES e

FINEP)

*Fomentar projetos que visem o desenvolvimento, a produção

e a comercialização de novas tecnologias industriais destinadas

ao processamento da biomassa a partir da cana-de-açúcar;

*Busca a obtenção de produtos de maior valor agregado, que

podem ser obtidos a partir da biomassa da cana.

*O programa permitiu atração de novos atores para o setor, como as

empresas estrangeiras de biotecnologia;

*A criação de empresas brasileiras subsidiárias de grupos

internacionais com tecnologia de ponta;

*Promoveu a cooperação empresarial através de consócios: 7

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140

+

Ministério de Ciência,

Tecnologia e Inovação

MCTI

consórcios entre empresas e 10 parcerias entre ICTs e empresas,

* Construção e operação de 3 plantas industriais dedicadas ao etanol

2G, sendo 2 em escala comercial e 1 demonstrativa.

PAISS Agrícola

(BNDES e FINEP)

*Elevar a quantidade de investimento e de apoio a projetos de

risco tecnológico e fortalecer as relações entre empresas, ICTs

e o setor público;

*Os esforços de PD&I destinam-se a parte agrícola do

processo de produção de etanol.

*Os recursos do PAISS Agrícola são de R$ 1.480.000 bilhões (2014

a 2018);

*A FINEP com a modalidade de Financiamento Reembolsável e

Instrumentos de Renda Variável no montante de R$ 700.000 milhões,

e no instrumento de Subvenção Econômica no valor de R$ 40.000

milhões. O BNDES apresenta os mesmo R$ 700.000 milhões na

modalidade Financiamento Reembolsáveis e Instrumentos de Renda

Variável e no FUNTEC 40.000 milhões de reais.

Fonte: elaboração própria.

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141

3.1.1. Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou do aprendizado

tecnológico

O contexto de expansão da cultura canavieira127

, o aumento dos investimentos em

energias renováveis128

e, mais o aumento dos preços do petróleo129

na década de 2000,

abriram espaço para ações do Estado no direcionamento do setor. Instrumentos do tipo

tecnology-push (estímulo a CT&I) multiplicaram-se neste contexto, ampliaram a oferta de

recursos à tecnologia e ao conhecimento ligado a cana-de-açúcar, aproveitando uma

competência forjada ao longo dos anos, a qual não se dissipou completamente nos momentos

recessivos130

.

Na década de 2000 as principais ações federais ligadas ao estímulo a CT&I pró-cana-

de-açúcar foram: a manutenção e a expansão da RIDESA (2007 - 2010)131

; financiamento de

projetos de pesquisa pelo CNPq (1997 - 2015) e pela FINEP (1999 - 2015)132

; o Plano

Nacional de Agroenergia (2006-2010); o estabelecimento de Cooperação Tecnológica em

motores flex entre Brasil e Índia (2006 - ); o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e

Inovação (PACTI – 2007-2010); a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação

(ENCTI - 2012-2015); o PAISS Industrial (2011-2014) e o PAISS Agrícola (2014-2018).

O Plano Nacional de Agroenergia (2006-2011), concebido pelo Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), visava organizar e desenvolver propostas de

P&D e de transferência de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a competitividade das

cadeias de agroenergia. O plano buscou através do MAPA e da Embrapa estabelecer arranjos

institucionais para estruturar a pesquisa. Para isso, cria a Unidade Embrapa Agroenergia133

, o

principal instrumento na organização da pesquisa do setor de bicombustível. Outra função era

127

A produção de cana-de-açúcar na safra de 2000/01 era de 254.921.721 ton passando para 666.011.859 ton na

safra de 2015/16, com isso, apresentou um crescimento acumulado de 161%. A produção de etanol na safra de

2000/01 era de 10.517.535 m3 passando para 30.478.607 m

3 na safra 2015/16, tendo um crescimento acumulado

de 190% no período. 128

Segundo Mazzucato et. al. (2015) em 2014 foram gastos cerca de US$ 29 bilhões em P&D em tecnologias

verdes em nível mundial, destes, US$ 12 bilhões foram empregados na geração de energias renováveis e US$ 17

bilhões gastos em eficiência energética. 129

Vide gráfico 5 no capítulo 2. 130

Fator atribuído pela continuidade do consumo do etanol anidro, o qual mesmo com a desregulamentação do

setor nos anos 1990 e com fim do Proálcool, permaneceu sendo continuamente misturado à gasolina (ação

suportada por Lei Federal desde 1938 - DEL 737/1938). Tal situação não só manteve a estrutura produtiva e de

distribuição funcionando, como também, manteve atenção e esforços da atividade acadêmica e de pesquisa

ligada ao setor (HIRA & OLIVEIRA, 2009; LEITE et al., 2009). 131

A RIDESA é composta por uma rede de universidade federias e pela cooperação com diversas usina, não é

uma iniciativa puramente pública. 132

Projetos financiados pela carteira de recursos dos Fundos Setoriais, pela Finep e CNPq – vide figura 3.1. 133

Vide Box 3.1.

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142

indicar ações através das estruturas já dadas do Governo Federal para fomentar o mercado

internacional de biocombustíveis, buscando contribuir com a comoditização do etanol.

O plano apresenta um eixo específico para o aperfeiçoamento e o desenvolvimento do

PD&I da Agroenergia, o qual estava subdividido em quatro grandes áreas: o etanol, a co-

geração de energia provenientes da cana-de-açúcar, o biodiesel de fontes animais e vegetais, e

a biomassa (florestal, resíduos e dejetos). O direcionamento do PD&I da agroenergia esteve

focado no desenvolvimento de tecnologia para a matéria-prima e o desenvolvimento ou o

aprimoramento de processos de produção da matéria-prima, portanto, o esforço de pesquisa

desse plano é mais voltado para a área agrícola do processo de produção de biocombustíveis.

Assim, a grande função deste plano no que tange a questão de PD&I é direcionar os esforços

dos diversos atores “espalhados” no território nacional, no sentido de dar suporte à pesquisa

da agroenergia, principalmente, pesquisa de base e de processos de produção agrícola

(conhecimento soft)134

.

BOX 3.1. Embrapa Agroenergia. A Embrapa é uma empresa pública, criada em 1973, com o objetivo de gerar e difundir conhecimento

especializado e novas tecnologias para a agropecuária brasileira. A unidade de Agroenergia foi fundada em

2007, com determinação do Plano Nacional de Agroenergia (2006), sendo sua função principal a pesquisa, o

desenvolvimento e a inovação em biocombustíveis e em produtos que agregam valor às cadeias produtivas,

principalmente, do biodiesel e do etanol. A unidade também visa desenvolver estudos de genética e

biotecnologia com culturas agrícolas com potencial energético, culturas não estabelecidas atualmente no cenário

bioenergético nacional (sorgo, pinhão-manso, caroço de algodão, algas e outras).

A unidade originalmente foi concebida para: a) Coordenar as ações de pesquisa em agroenergia; b) Ser

um órgão de aglutinação de conhecimentos e competência específica (que estavam espalhadas nas diversas

Unidades da Embrapa); c) Captar especialistas com competência ainda não incorporada; d) Centro de referência

na Embrapa, a partir do qual a empresa se integrará a redes e consórcios multiinstitucionais que se formam para

a PD&I no assunto.

Em 2016, a unidade conta com quatro laboratórios (Química de Biomassa e Biocombustíveis; Genética

e Biotecnologia; Processo Bioquímicos; Processos Químicos), uma área de planta-piloto e um núcleo de apoio a

culturas energéticas.

Em pesquisa feita na base de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) da Embrapa, foram

recuperados 85 projetos relacionados diretamente com a cultura da cana-de-açúcar; apenas seis estão sobre a

liderança da Embrapa Agroenergia. Buscando por projetos estritamente sobre cana-de-açúcar e etanol celulósico

encontram-se sete projetos no total, dos quais apenas dois estão sob a condução da Embrapa Agroenergia. Por

outro lado, em busca mais abrangente, sobre etanol celulósico, encontram-se 15 projetos na Embrapa, dentre

estes oito são liderados pela Embrapa Agroenergia.

Uma das ações mais importante ligadas ao etanol celulósico ocorre no Laboratório de Processo

Bioquímicos, no qual desenvolve-se ações de P&D com foco na prospecção, seleção, caracterização e cultivo de

microrganismos para obtenção de produtos úteis ou correlacionados aos combustíveis de primeira geração

(fermentação de amiláceos) e de segunda geração (etanol lignocelulósico). Esta estratégia é abrangente e pode

dar base a diversos tipos de processo industriais e novos produtos, dentre essa miríade de caminhos, apresenta-se

o desenvolvimento de coquetéis de microrganismos ou de enzimas para utilização na desconstrução de biomassa,

ação primordial para o acesso ao açúcar (xylose) base do etanol celulósico.

134

Hendry & Harborne (2011), com base no caso dinamarquês, identificam que um importante fator para o

desenvolvimento das fontes de energia renováveis é o conhecimento tecnológico “soft”, que deriva do

conhecimento formal (da ciência básica). Estes estudos visam balizar práticas cotidianas da produção, como a

modelagem micrometeorológica, estudos de melhoramento das práticas agrícolas e etc.

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O Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI) elaborado

pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), constituiu um importante

instrumento de orientação das ações do Estado para as atividades de PD&I, na medida em que

delineou programas e direcionou aportes de recursos, por meio de uma estratégia pré-

determinada, indicando os setores econômicos mais relevantes para o desenvolvimento

nacional.

O PACTI destinou de maneira pontual um programa de CT&I para o etanol, contendo

objetivos, metas e recursos específicos para o setor (prioridade III do plano), ação que

repercute no aumento de projetos de pesquisas financiados pela CNPq e FINEP, os quais

estão expostos na figura 3.1.

Assim, o objetivo desse eixo em CT&I do etanol é fomentar a pesquisa, o

desenvolvimento e a inovação aplicada ao setor sucroalcooleiro, visando tornar mais eficiente

a produção, o processamento e o uso de co-produtos da cana-de-açúcar, em especial, o álcool

combustível. Por isso foca no desenvolvimento de novas tecnologias e rotas para produção de

etanol; esta ação soma-se às “tradicionais” ações do SSI - ações privadas de P&D vide

Furtado et al. (2011).

O design do PACTI cumpre com diversos pontos expostos pela teoria. Atende os

amplos argumentos das políticas de technology-push, visto que realiza gastos em P&D e

reforça a capacidade de troca de conhecimento entre os atores do SSI, pois os editais

pressupõem na sua maioria a integração entre as empresas que irão desenvolver a pesquisa

com as universidades ou/e instituições de pesquisa.

Nota-se grande convergência entre as metas do PACTI com os objetivos específicos

de PD&I para o etanol do Plano Nacional de Agroenergia. Esse fato é importante para

direcionar os outros atores do SSI da cana-de-açúcar, pois explicita as prioridades a serem

resolvidas, além de concentrar esforços e recursos sobre questões chaves. Destaca-se ainda, a

regularidade de um recurso específico destinado ao setor do etanol, fator importante para o

planejamento de projetos de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico, visto que amplia a

capacidade dos atores de prever situações futuras, o que diminui o paradoxo entre custos,

riscos e benefícios tão evidenciado por Kemp & Soete (1992).

Esta política aproxima-se do “receituário” teórico e empírico trazido por Nemet

(2009), sendo que os principais resultados do PACTI 2007/2010 para o segmento do etanol

demonstram essa relação. A criação do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do

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Bioetanol (CTBE) representa uma nova realidade para o SSI da cana-de-açúcar, ao cobrir uma

lacuna no SSI da cana.

O CTBE tem a função de congregar pesquisadores e iniciativas para o

desenvolvimento de tecnologias ainda não consolidadas no setor, as quais ainda se mostram

como oportunidades de novos negócios, com o estabelecimento de rotas tecnológicas ainda

não exploradas, com potencial para reposicionar as empresas brasileiras e o próprio Brasil na

concorrência pelo mercado de bioenergia, com possibilidades de não só figurar como um

produtor de combustíveis, mas, também, como produtor e exportador de tecnologia.

A criação do CTBE teve aporte inicial de 69 milhões de reais (em 2010) e figura como

importante instituição de pesquisa, que além de desenvolver suas próprias pesquisas tem a

função de auxiliar as pesquisas feitas nas empresas, bem como abrigar espaços de

comunicação entre os pesquisadores e os produtores desta tecnologia, por meio de workshops,

palestras, congressos e reuniões específicas para a troca de informações sobre rotas

tecnológicas em fase de desenvolvimento, como é o caso da produção do etanol de segunda

geração pela rota enzimática.

Um resultado expressivo atingido pelo PACTI é o investimento de 21 milhões de reais

alocados na Ridesa (Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor

Sucroalcooleiro) para o desenvolvimento e para a identificação de variedades de cana-de-

açúcar. Outro fato importante é o investimento de 21,5 milhões de reais através de editais do

CNPq para a formação de recursos humanos.

Esta ação junto a RIDESA é um fato novo, pois desde a sua criação o seu

financiamento é prioritariamente privado e os programas de melhoramentos são executados

em parcerias entre as universidades federais (que herdaram as estruturas e o corpo técnico do

PLANALSUCAR) e as usinas. As ações derivadas do PACTI foram as primeiras a realizar

aportes específicos à essa rede de melhoramento de cana-de-açúcar.

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Box 3.2. O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) inaugurado em 2010 faz parte do

Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), tal organização é suportada pelo Ministério da

Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e encontra-se localizada em Campinas/SP. O CTBE coloca à disposição

da comunidade científica e empresarial as suas instalações e serviços, tanto para brasileiros como para

estrangeiros, atuando na área de produção, caracterização e processamento da biomassa e seus derivados,

relacionando-se fortemente com a biofísica, fisiologia vegetal e biotecnologia. O CTBE também apresenta uma

agenda de pesquisa interna, abrangendo áreas relacionadas à cadeia produtiva do etanol (fase agrícola, fase

industrial, avaliação tecnológica, sustentabilidade, avaliação técnica/econômica/ambiental e pesquisas

exploratórias relacionadas à biomassa/bioprodutos).

O CTBE conta com duas estruturas principais de pesquisa, a Planta Piloto para Desenvolvimento de

Processos (PPDP) e o Laboratórios de Desenvolvimento de Processos (LDP). A planta-piloto construída em

2012 torna-se uma estrutura de pesquisa muito importante para o SSI da cana-de-açúcar permitindo e ampliando

as possibilidades de compreensão de processos industriais relacionados à conversão de biomassa em etanol

celulósico e em outros produtos derivados da biomassa; sua escala é semi-industrial com capacidade de 300

litros. Esta estrutura possibilita validar indicadores técnico-econômicos dos processos, minimizando os riscos e

otimizando as estimativas de investimento futuros na indústria. Já o PDL executa diversas caracterizações de

matérias-primas, bioprocessos e produtos, hospeda reatores capazes de transformar a biomassa lignocelulósica

em etanol, chemical building blocks e outros produtos, sendo uma organização de pesquisa complexa, aportando

diversos tipos de projetos de pesquisa.

O CTBE apresenta três eixos principais de pesquisa, os quais se dividem em diversos projetos de

pesquisa, próprios ou em parcerias. Estes eixos são: 1) Produção de Biomassa dedica-se a compreender a

evolução dos aspectos econômicos e ambientais da mecanização agrícola da cultura da cana-de-açúcar, com

ênfase nos custos de produção, conservação do solo e qualidade das matérias-primas. O principal projeto deste

eixo de pesquisa, a Estrutura de Tráfego Controlado (ETC), traz um novo conceito que visa reduzir em 80% a

incidência de tráfego no canavial. Esta nova máquina deve preservar os nutrientes do solo e economizar

combustível. Além disso, um processo de colheita alternativa promete reduzir o custo de operação por 50%; 2)

Processamento de biomassa é dedicada a atividades de pesquisas prospectivas e orientadas a um projeto

específico (demanda da empresa), atuando na área de conversão de cana-de-açúcar em bioprodutos. Estes

estudos envolvem os principais processos de produção de biocombustíveis, como os tratamentos físico-químicos,

obtenção de complexos enzimáticos, hidrólise enzimática e fermentação; 3) Avaliação Integrada das

biorrefinarias, desenvolvimento de uma ferramenta de simulação computacional, a Biorrefinaria Virtual de

Cana-de-açúcar (BVC), a qual avalia novas tecnologias e estratégias agrícolas no setor sucroalcooleiro por meio

da avaliação de três critérios da sustentabilidade (social, econômico e ambiental).

O CTBE em suas diversas ações de pesquisa estabelece parcerias com diversos atores do Sistema

Setorial da Inovação da cana-de-açúcar, com empresas (Zilor; Braskem; Lilly; São Martinho; ETH Bioenergia;

DSM; Petrobras; Raízen; DOW; Jacto; Rhodia; BP; Embrapa), universidades e institutos de pesquisa (Unicamp;

USP; UFG; IFGO; UFSCar; UFPE; USC; University of British Columbia; Max Planck Institutes; Jülich

Institutes), órgãos de fomento (BNDES; FINEP; FAPESP) e outras organizações tais como a UNICA e PNDU.

As ações desencadeadas pelos grandes programas/planos de C&T listados acima

ampliam as ações de pesquisas no SSI da cana-de-açúcar. Tal afirmação é confirmada com a

observação da figura 3.1, a qual ilustra os esforços de pesquisas realizadas por meio de

financiamento público. É possível perceber que a quantidade de eventos passa a aumentar no

decorrer da década, tendo o maior número de projetos de pesquisa contratados entre 2007 –

2013, coincidindo com a implementação do PACTI, do ENCTI e com as ações conjuntas do

BNDES-Finep por meio do PAISS Industrial.

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Figura 3.1. Número de projetos de pesquisas financiados com recursos dos Fundos Setoriais,

pela CNPq (1997 a 2015) e FINEP (1999 a 2015) – Diretamente relacionados ao setor

sucroenergético.

FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.

As iniciativas no âmbito federal relacionadas ao SSI da cana-de-açúcar respondem aos

estímulos dos planos supracitados. É possível observar uma relação dos temas dos projetos de

pesquisa financiados por estas instituições com as linhas de prioridades do PACTI, ENCTI e

do PAISS Industrial, demonstrando uma convergência/coordenação entre as diversas

iniciativas do Estado brasileiro (vide figura 2, quadro 3.1.). Por exemplo, o PACTI

estabeleceu metas e objetivos relacionados à produção da cana-de-açúcar e sobre novas

tecnologias na produção do etanol. A partir deste período, não só houve um aumento das

iniciativas como um direcionamento dos temas de pesquisa, pois só no período do programa

(2007-2010) o CNPq contou com 242 projetos voltados ao setor, destes 49 eram sobre etanol

celulósico, ligando-se ao segundo objetivo do plano para o setor (PACTI, 2007). Situação

semelhante se dá na FINEP, no período do PAISS Industrial (2011-2014), em que encontram-

se financiados pela agência 21 projetos ligados ao SSI da cana, destes apenas quatro não eram

vinculados ao PAISS Industrial.

Estas ações são importantes, pois aumentam a quantidade de pesquisas focadas nos

problemas cotidianos do setor (uso do solo, controle de pragas, seleção de variedades

genéticas, irrigação e etc.) e nos desafios “futuros” do setor (aproveitamento da biomassa,

novos produtos a partir da cana, composto enzimático etc.). Assim, ampliam o conhecimento

e as competências do setor, não só pelas pesquisas realizadas no interior de cada projeto, mas

pelas interações que derivam destas iniciativas, pois existem projetos desenvolvidos em

parcerias entre o setor produtivo e instituições de ensino e pesquisa. Tal realidade amplia os

canais de comunicação entre os atores, facilitando a difusão de conhecimento, condição de

existência do Sistema Setorial de Inovação (MALERBA, 2002; LUNDVALL, 2009).

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Com isso, cabe aprofundar-se em alguns detalhes fornecidos pelos dados expostos na

figura 3.1.. No que se refere às iniciativas do CNPq, entre os anos de 1997 a 2015, encontra-

se 398 projetos financiados com relação direta ao SSI da cana-de-açúcar, sendo que o

primeiro evento ocorre apenas em 2001. Dentre estes, 73 são explicitamente relacionados ao

etanol celulósico, estando à evolução destas ações expostas na figura 3.1.

Sobre a competência da FINEP (1999 – 2015) foram encontrados 97 projetos

diretamente ligados ao SSI da cana-de-açúcar, 25 explicitamente voltados ao etanol

celulósico. A tabela 3.1. detalha a categoria dos recursos aportados pela FINEP ao SSI da

cana-de-açúcar, indicando que as ações em termos de recursos alocados concentram-se

majoritariamente nas operações de créditos (88%), tendo início somente em 2010, com o

projeto da Amyris Brasil S.A135

. A categoria que mais financiou projetos foi a subvenção com

28 projetos, tendo início no ano de 2007 com o projeto da Usina Cerradinho Açúcar e Álcool

S.A. Todas as ações de subvenção somadas representam apenas 4 % do montante alocado.

Tabela 3.1. Detalhamento do aporte realizado pela FINEP em relação ao SSI da cana-de-

açúcar entre 1999-2015.

Categoria Número de projetos Valor Contratado

Eventos 1 30.000,00

P&D agropecuário e agroindustrial para inserção social 2 5.364.128,00

Tecnologia Industrial Básica – TIB 3 8.180.560,00

Apoio a projetos de Interação Universidade-Empresa e apoio à

inovação 16 19.931.156,46

Tecnologias Sociais 5 20.806.284,08

Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Áreas Estratégicas 14 53.651.361,33

Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica 8 56.579.095,19

Subvenção 28 81.321.890,91

Crédito 20 1.818.748.722,30

Total 97 2.064.613.198,27

FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.

135

O projeto tinha como mote a pesquisa e o desenvolvimento de processo de fermentação para a produção em

escala piloto de biocombustível diesel a partir da cana-de-açúcar, o valor contratado foi de 6.435.000 reais.

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Os projetos ou as iniciativas especificamente relacionadas ao etanol celulósico

anteriores ao PAISS Industrial (2011-2014) no âmbito da FINEP são apontadas no quadro

3.2.:

Quadro 3.2. Projetos relacionados diretamente com o etanol celulósicos financiados pela

FINEP - anteriores ao PAISS Industrial. Projetos Instituições / Empresas

2004 - ENZITEC 2004 6º seminário brasileiro de

tecnologia enzimática

Fundação Universitária José Bonifácio

2006 - implementação da Embrapa Agroenergia Embrapa / Fundação Arthur Bernardes / UFRJ

2006 - Produção de etanol por hidrólise enzimática

da biomassa da cana-de-açúcar

CTC / Faculdade de Engenharia Química de Lorena /

UNICAMP / UNB / UFCS / UEM / IPT / Instituto

Nacional de Tecnologia / Toyobo do Brasil LTDA. /

USP )

2008 - Cana-de-açúcar geneticamente modificada

para a produção de etanol celulósico

Alellyx S.A

2008 - Infraestrutura para o estudo de

biocombustíveis

UFRS / INMETRO

2009 - Consolidação do centro de ciência e

tecnologia do bioetanol

Laboratório Nacional de Luz Sincroton

2009 - Desenvolvimento de normalização, de

avaliação da conformidade e de métodos analíticos

aplicados ao setor sucroalcooleiro

Fundação Educacional Charles Darwin / INMETRO

2009 - Escalonamento da produção de enzimas

celulolíticas e acessórias e sua utilização na hidrólise

da biomassa da cana e outras biomassas pré-tratadas

BIOMM S/A / COPPETEC /UFRRJ / Instituto

Nacional de Tecnologia / UFSC / UFRJ

2009 - infraestrutura para a área de biotecnologia

estrutural voltada para o estudo de biocombustíveis

UFRGS / INMETRO

2009 - Obtenção de etanol via hidrólise ácida

assistida por microondas em injeção de fluxo

(haamif) de material celulósico e produção de

fertilizante via mineralização de vinhoto por

microondas

Quadex Technology Comércio E Desenvolvimento

De Equipamentos Científicos LTDA.

2009 - Pirolise para produção de etanol e energia

elétrica a partir do bagaço e da palha da cana-de-

açúcar

GASES E EQUIPAMENTOS SILTON LTDA. –

GASIL

2010 - Desenvolvimento de processo para a

obtenção industrial de misturas enzimáticas

celuloliticas destinadas a produção de

biocombustíveis a partir de biomassa

BIOMM S/A

FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.

Estes projetos apresentam características variadas, versando principalmente sobre a

rota tecnológica enzimática, sendo que alguns projetos se destacam por apresentar integração

entre empresa e outras instituições; o projeto liderado pelo CTC em 2006 e o projeto liderado

pela BIOMM em 2009 são exemplos dessa situação. A pesquisa do CTC teve aporte de R$

3.629.932,8, tendo como objetivo o desenvolvimento de tecnologia baseada na utilização da

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149

hidrólise enzimática para a transformação da biomassa (bagaço e palha) em álcool

combustível. O pano de fundo do projeto visava à intensificação da produção de álcool por

hectare, em contraste com a simples expansão da lavoura de cana, permitindo o aumento da

produção, a redução dos riscos econômicos e ambientais, a diminuição dos investimentos em

infraestrutura e em logística. Outras informações sobre as ações do CTC no E2G aparecem no

capítulo 5.

A BIOMM é uma empresa de biotecnologia sediada em Belo Horizonte/MG criada em

2001136

. O projeto de 2009 com parceria com outras instituições recebeu R$9.143.850,80 de

aporte, com o objetivo de desenvolver tecnologia para a produção de enzimas celulolíticas e

acessórias visando o seu uso para a produção de etanol celulósico. A pesquisa visava realizar

os experimentos em escala pré-piloto, atuando nos processos de pré-tratamento da biomassa,

sua hidrólise enzimática e fermentação alcoólica dos xaropes de biomassa, considerando a sua

interdependência.

Outro destaque é o projeto da Alellyx S.A de 2008, que recebeu R$ 9.451.328,39 na

categoria de subvenção. O projeto visava desenvolver uma variedade de cana-de-açúcar

geneticamente modificada para a produção de etanol celulósico, em que a cana deveria

apresentar menor conteúdo de lignina e/ou modificação na composição da lignina facilitando

o pré-tratamento do bagaço e aumentando a eficiência da conversão da celulose em

monossacarídeos pelo processo enzimático. Ademais, o projeto previa a introdução de

construções gênicas contendo enzimas celulolíticas, necessárias para a hidrólise da celulose.

O resultado esperado era obter uma tecnologia de expressão segura de celulases em plantas e,

em caráter experimental, uma cana que produza as enzimas celulolíticas em quantidade

suficiente para hidrolisar a celulose presente no bagaço.

Nota-se que no conjunto das ações apontadas no quadro 3.2. apresentam-se também

aportes para a efetivação de infraestruturas de pesquisa científica específicas ao etanol. Em

2006 a FINEP aportou R$9.832.000 para a Embrapa Agroenergia, na categoria de

Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica e, em 2008 o aporte foi de R$325.591

para a Universidade Federal do Rio Grande Sul (UFRGS) e para o Inmetro para a

consolidação do Programa de Biotecnologia do Inmetro. Em 2009 o aporte foi de

R$36.230.000 para o estabelecimento do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do

136

A BIOMM surge com a reestruturação da Biobrás, que em 2002 foi comprada pela empresa dinamarquesa

Novo Nordisk. A Biobrás foi criada em 1975 com objetivo de produzir enzimas extraídas de matérias-primas

animais e vegetais, atuando na indústria farmacêutica e alimentícia.

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Bioetanol (CTBE) por meio da categoria de Infraestrutura de Pesquisa Científica e

Tecnológica.

As ações que visam ampliar a infraestrutura da C&T são importantes e tratando-se do

SSI da cana-de-açúcar são inéditas, pois no atual estágio de desenvolvimento do sistema

capitalista, o conhecimento é ao mesmo tempo localizado e globalizado, assim, os avanços no

conhecimento geram impactos nos países em desenvolvimento. A dimensão e a qualidade

destes impactos dependem diretamente da estrutura local ser capaz de absorver e influenciar

essa dinâmica, assim, participando da difusão do conhecimento tanto na escala nacional como

internacional (IIZUKA, 2013). O CTBE e a Embrapa Agroenergia apresentam na origem essa

função.

Desta forma, a infraestrutura para inovação deve ser desenhada para melhorar o

acesso ao conhecimento e estimular o processo de aprendizagem. Os esforços locais devem

buscar a criação de estruturas de ensino e pesquisa, a criação de canais de comunicação com a

comunidade internacional e a implementação de instituições que ampliem e consolidem o

conhecimento no interior das firmas e de outras organizações, tais como: consórcios de P&D,

fomento à inovação; aquisição de tecnologia; treinamentos.

3.1.2. Ações do Estado de São Paulo em relação ao estímulo à C&T e ao aprendizado

tecnológico do SSI da cana-de-açúcar (2000 – 2016)

De modo paralelo, apresenta-se um conjunto de ações voltadas ao estímulo à C&T e

ao aprendizado tecnológico no setor proveniente do nível estadual. O Estado de São Paulo

imprime um conjunto de ações nessa direção, as quais se encontram sumarizadas no quadro

3.3.. Importante frisar que, nesta sessão, destacam-se apenas os grandes programas de

pesquisas e as ações ocorridas no interior do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para

Inovação Tecnológica (PITE) e a Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).

Entretanto, como apontam Oliver & Szmrecsányi (2003), Furtado et al. (2011), e

Andersen (2011), muitas outras ações são desempenhadas pelo governo estadual para a

consolidação do SSI da cana-de-açúcar, por exemplo, a criação do programa de erradicação

da queimada da cana-de-açúcar (Lei 11.241/2002), a APL do álcool em 2005, o programa de

doutorado e pós-doutorado em Bioenergia (USP/UNICAMP/UNESP) e tantas outras ações

específicas ao SSI da cana-de-açúcar.

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151

As ações do Estado de São Paulo confundem-se com a própria formação do setor

sucroenergético e de sua infraestrutura de pesquisa e de desenvolvimento técnico. Primeiro,

pela sua condição histórica de região mais desenvolvida do país (dotada de material humano,

infraestrutura produtiva e de serviços) e, em segundo, por ser a região tradicional do cultivo

da cana, a qual ao longo do último século construiu instituições e organizações que se

relacionam fortemente com o setor, como as universidades (USP, UNICAMP, UNESP,

UFSCar), institutos de pesquisa agronômicos (IAC e APTA) e cursos técnicos e tecnólogos

(FATECs e ETECs).

O quadro 3.3. expõe as principais medidas realizadas pelo Estado de São de Paulo pró

C&T do SSI da cana-de-açúcar; estas ocorrem por meio das ações de fomento à pesquisas da

FAPESP. A primeira ação relacionada ao SSI da cana é de 1968, iniciativa voltada à

consolidação de infraestrutura de pesquisa, a qual abre espaço ao desenvolvimento de

iniciativas no campo da biotecnologia; entretanto, as ações vão se intensificando ao longo dos

anos, ocupando espaço definitivo na agenda de pesquisa da Fundação nos anos 2000, com o

sucesso do programa FAPESP Sucest (1999-2002), desde então, sempre conta com projetos

ligados ao setor, ganhando ainda mais relevância com o programa BIOEN (2008-2012).

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Quadro 3.3. Medidas no âmbito do Estado de São Paulo que fortalecem a Ciência e a

Tecnologia ligadas ao SSI da cana-de-açúcar.

FAPESP

Apoio ao Laboratório de Biotecnologia Industrial da Escola Politécnica (1968) – os recursos

da Fapesp foram utilizados para a consolidação da infraestrutura e das atividades do laboratório.

Programa Bioq-FAPESP (1972) – Tinha como objetivo formar recursos humanos no campo da

biotecnologia, tal iniciativa abriu caminho para o sequenciamento genômico de vários

organismos, dentre eles o da cana-de-açúcar.

FAPESP Sucest (1999-2002) – Financiava atividades de pesquisa ligadas ao genoma da cana-de-

açúcar, com o objetivo de sequenciar o DNA da cana-de-açúcar e identificar genes com interesse

econômico (cerca de 50 mil), identificando características que favorecessem a resistência a

doenças e o metabolismo da sacarose. Uma das suas características era a forte interação entre o

setor privado e as instituições públicas de pesquisa e ensino. Ao final, o projeto mapeou 250 mil

fragmentos de genes funcionais da cana, reuniu 240 pesquisadores e teve financiamento da ordem

de US$ 4 milhões da FAPESP e outros US$ 400 mil da Copersucar. Este programa marca o

início das pesquisas relacionadas ao DNA e ao sequenciamento genético da cana-de-açúcar no

Brasil.

Projeto Sucest-FUN (2003) – Surge na sequência e relacionado ao Sucest, dedicando-se à análise

dos genes da cana. Apresentava a característica de cooperação entre setor privado e instituições

públicas de ensino e pesquisa (CTC, Usina Central de Álcool Lucélia, USP e Unicamp). Realizou

a identificação de 348 genes associados ao teor de sacarose e a identificação de marcadores

moleculares, processo este que acelera o melhoramento das variedades de cana-de-açúcar.

Programa para a Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) (2008-2012) – o objetivo do programa é

articular a P&D privada e pública, utilizando-se dos laboratórios industriais e acadêmicos para a

realização de pesquisas nas áreas relacionadas à produção de etanol. O orçamento previsto era de

US$ 130 milhões nos cinco primeiros anos do programa. A iniciativa conduzida pela FAPESP foi

organizada em cinco grandes áreas: 1) Pesquisa em biomassa, com o foco em cana-de-açúcar,

incluindo genômica, bioquímica, biologia celular, fisiologia e plantação de cana; 2) Pesquisa em

tecnologias de etanol, enfatizando o processamento e a engenharia para produção de etanol; 3)

Alcoolquímica e biorrefinarias, objetivando a integração na química do açúcar, alcoolquímica e

bioprodutos; 4) Engenharia, ênfase nos desenvolvimento de motores de veículos a etanol; 5)

Impactos: estudos sociais, econômicos e ambientais, como uso da terra e propriedade intelectual

associado à indústria sucroalcooleira.

Um desdobramento do Bioen foi a criação em 2010 do Centro Paulista de Pesquisa em

Bioenergia. Trata-se de um esforço para estimular a pesquisa interdisciplinar e ampliar o

contingente de pesquisadores envolvidos com o tema, mantido pela FAPESP, o Governo do

Estado de São Paulo e as três universidades estaduais paulistas (USP, UNICAMP, UNESP).

Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) (1994 -):

Objetiva financiar projetos de pesquisa em instituições acadêmicas ou institutos de pesquisa,

desenvolvidos em cooperação com pesquisadores de empresas localizadas no Brasil ou no

exterior. O financiamento se dá de maneira compartilhada, portanto, os projetos necessariamente

contam com recursos da agência de fomento e das empresas. Assim, o programa intensifica o

relacionamento entre universidades/institutos de pesquisa e empresas, por meio da realização de

pesquisas cooperativas. Os projetos PITE, na grande maioria envolvem grandes empresas e as

instituições públicas de ensino e pesquisa. Os projetos que se relacionam com o SSI da cana-de-

açúcar concentram-se nas áreas da microbiologia e engenharia química, destinando-se ao

desenvolvimento de processo de conversão energética dos materiais celulósicos.

Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) (1997 - ) – Apoia a execução de pesquisa

científica e/ou tecnológica em micro, pequenas e médias empresas no Estado de São Paulo, busca

aumentar a competitividade das pequenas empresas e induz o aumento do investimento privado

em pesquisa tecnológica. Outra característica importante é a criação de uma “ponte” entre estas

empresas e o ambiente cientifico/acadêmico, visando criar condições a inovação tecnológica. Os

projetos PIPE que se relacionam ao SSI da cana-de-açúcar concentram-se em áreas das ciências

agrárias, engenharia química e agrícola. Esses projetos produzem melhoramentos e inovações

tecnológicas incrementais em processos produtivos existentes para a produção do etanol de 1ª

geração.

Fonte: elaboração própria a partir de FAPESP, 2012; VARRICHO, 2012; FAPESP, 2016.

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A figura 3.2. e o quadro 3.4. apresentam detalhes da evolução dos esforços em

financiar pesquisas de inovação no segmento, estão detalhadas informações dos programas

PITE e PIPE da FAPESP. É possível perceber que ações junto às empresas ganham força na

década de 2000. Os programas anteriores e o BIOEN apresentam o foco mais nas

universidades e na pesquisa básica, situação que se desloca nos projetos do PITE e PIPE, pois

estão direcionados na sua formulação ao desenvolvimento de novos produtos ou processos

pela empresa demandante.

Figura 3.2. Projetos de pesquisas contratados pela FAPESP no período de 1997 a 2016

relacionados ao setor sucroenergético.

Fonte: elaboração própria a partir de FAPESP, 2016.

Quadro 3.4. Detalhes dos projetos desenvolvidos nos programas: PITE e PIPE relacionados

ao setor sucroenergético no período de 1997 a 2016.

PITE PIPE

ICTs USP, Unicamp, UFSCAR, UNESP,

CNPEM, IPT, APTA -

Firmas com

projetos 1G

ETH Energia (8); Vale(5);

COPERSUCAR (3); Braskem S/A (3);

Microsoft (1); SAMA (1); TORO (1);

EMBRAER (1); AgroBio (1); Peugeot

Citroën (1); Mahle Metal Leve (1).

Ao todo são 70 projetos destinados ao SSI da

cana-de-açúcar, abordando aspectos diversos

do sistema produtivo. As firmas demandantes

estão listadas no apêndice E.

Firmas com

projetos 2G

ETH Energia (1); Vale (1); Oxiteno

(2); Dedini (1);

Biocelere (1); RMT Tage Biaggio (1);

Fermentec (1); Algae Biotecnologia (1);

Verdartis Desenvolvimento Biotecnológico (1).

Áreas do

conhecimento

Engenharia Química (6); Bioquímica

(5); Química (3); Genética (3);

Engenharia Agrícola (3) e outras.

Agronomia (10); Química (10); Engenharia

Agrícola (9); Engenharia de Materiais e

Metalúrgica (5); Genética (5); Ciência da

Computação (5) e outras.

FONTE: elaboração própria a partir de FAPESP, 2016.

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154

Como demonstrado na figura 3.2. os projetos relacionados ao SSI da cana iniciam em

1997 (PITE e PIPE), sendo contratados 2 projetos por ano na média, ocorrendo um aumento

sensível em 2013 quando observa-se a contar com 10 projetos no PITE e 14 projetos no PIPE.

A quantidade total de iniciativas no PITE é de 35 projetos no período de 1994 a 2016, o que

equivale a 15,2% do total de projetos contratados pelo programa. Já no PIPE o total de

iniciativas chega a 75 projetos contratados no período de 1997 a 2016, sendo assim, o SSI da

cana é responsável por 4% do total de projetos nesse programa. Tais dados mostram a

relevância do segmento na agenda de pesquisa paulista.

Os projetos do PITE destinados ao SSI da cana-de-açúcar concentram-se nas áreas de

Engenharia Química e Bioquímica. Seus esforços são voltados para o desenvolvimento de

tecnologia e/ou conhecimento para a conversão energética do material celulósico (etanol de 2ª

ou bioeletricidade). Estes projetos funcionam por meio de um convênio, no qual cada uma das

partes concede 50% dos recursos (empresa – FAPESP), a partir daí consolida-se uma

chamada única de projetos relacionados às linhas de pesquisas determinadas pelas partes.

Os projetos no âmbito do PIPE são orientados por motivações diversas, mas na

maioria dos casos são ligados a serviços ou processo auxiliares da produção do açúcar e do

etanol, geralmente voltados para a fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar, por exemplo:

controle da produção, sistemas de mapeamento, controle automatizado, controle biológico e

técnicas de manejo e planejamento da lavoura. Assim as áreas do conhecimento que são mais

relevantes nessas iniciativas são a Agronomia, a Química e a Engenharia Agrícola.

Os projetos com relação direta com o etanol celulósico no programa PITE são

liderados pelas empresas: Dedini S/A (2002-2007); Oxiteno S/A (2008-2012); Oxiteno S/A

(2009 – 2012); Vale S/A (2011-2014); Vale S/A (2012-2016); ETH Energia S/A (2013-2015).

E no âmbito do PIPE, entre os 6 projetos ligados diretamente ao etanol celulósico, sendo o

mais relevante o projeto desenvolvido junto a Biocelere Agroindustrial Ltda. (2015-2016)137

.

Detalhes sobre os projetos do PITE – Dedini; Oxiteno e ETH Bioenergia – serão

abordados no capítulo 5, uma vez que estas ações somam-se a outros esforços sistematizados

137

A princípio este projeto sobre etanol celulósico, no âmbito do PIPE, é considerado mais relevante que os

outros da mesma categoria porque está sendo conduzido no interior de um projeto estratégico, ou seja, a

Biocelere é uma das empresas da GranBio, empresas que realiza esforços em diversas dimensões da tecnologia

do etanol celulósico, na parte industrial (Bioflex 1); desenvolvimento de leveduras geneticamente modificada e

na parte agrícola, com o desenvolvimento da cana-energia. Assim, este projeto soma-se ao conjunto de ações da

empresa que diversifica o desenvolvimento tecnológico, bem como as fontes de financiamento.

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de desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico no Brasil. Estes atores figuram como

agentes representativos do esforço nacional na trajetória tecnológica do E2G.

O projeto da Vale-FAPESP (2012) conta com a cooperação da FAPEMIG138

e da

FAPESPA139

, e visa articular o potencial da biodiversidade brasileira e a produção de etanol

de segunda geração. Portanto, versa sobre a produção de etanol de segunda geração a partir de

biomassa lignocelulósica, com o aproveitamento dos açúcares provenientes da hidrólise do

bagaço e da palha. Foca-se nos processos de hidrólise da biomassa por meio da rota

tecnológica constituída pelo pré-tratamento físico-químico seguido da hidrólise enzimática

para liberação de açúcares fermentecíveis140

. Para a constituição do composto enzimático e

para a obtenção de microrganismos, visa selecionar organismos provenientes do bioma

Amazônico.

O Projeto Vale – FAPESP (de 2011) também conta com a cooperação da FAPEMIG e

da FAPESPA, e visa a descoberta e/ou identificação de genes da via metabólica da xilose que

possam ser “extraídos” de leveduras selvagens fermentadoras de xilose, criando a

oportunidade de melhoramento genético da assimilação de xilose em Saccharomyces

cerevisiae141

. Assim, os principais objetivos deste projeto são: 1) Isolamento, caracterização e

identificação genética de leveduras xilolíticas que colonizam o trato intestinal de insetos que

parasitam a cana-de-açúcar; 2) Identificação genética de fungos presentes no trato intestinal

destes insetos a partir da confecção e sequenciamento do DNA de uma biblioteca de ITSs

("internal transcribed spacers"); 3) Clonagem e caracterização molecular dos genes

envolvidos no metabolismo de xilose a partir das leveduras isoladas; e 4) Introdução destes

genes em S. cerevisiae e verificação da eficiência de fermentação da xilose nestas cepas

recombinantes.

Em relação aos programas PIPE , vale mencionar o projeto da Biocelere que tem como

base os cruzamentos entre híbridos de cana-de-açúcar e Saccharum spontaneum142

para a

produção da cana-energia. Desta forma, o projeto dedicou-se à avaliação das respostas de

clones de cana-energia aos protocolos de transformação genética e prospecta genes para

138

Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais. 139

Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisa do Pará. 140

Este conjunto tecnológico é preferível, pois tem sido apontado como o mais promissor por operar em

condições brandas de hidrólise, minimizando a geração de resíduos, os gastos em energia e o desgaste de

equipamentos e maximizando os rendimentos de recuperação de carboidratos livres. 141

Este projeto visa à identificação de leveduras capazes de fermentar mais eficientemente a xilose a partir do

trato intestinal de insetos que interagem com a cana-de-açúcar. 142

É uma espécie de gramínea originária do continente asiático, encontrada com certa facilidade na índia.

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aumento e qualidade de biomassa lignocelulósica. Este projeto espera estabelecer as primeiras

ferramentas moleculares e biotecnológicas para auxiliar o programa de melhoramento

genético da cana-energia (da GranBio) e, em uma próxima fase vislumbrar a possibilidade da

obtenção de plantas geneticamente modificadas143

.

No conjunto dos projetos financiados pela FAPESP em relação à C&T do SSI da cana-

de-açúcar percebe-se que as ações são dedicadas ao melhoramento dos processos agrícolas e

às novas áreas do conhecimento e da tecnologia de produção da biomassa e do etanol. Com

isso, é possível vislumbrar novos processos produtivos e a geração de novos produtos no bojo

do desenvolvimento do etanol celulósico, apoiando a utilização da cana para novos produtos

em nichos específicos. Outra característica é que as empresas apoiadas pela FAPESP, nesse

caso, são majoritariamente nacionais e buscam implementar projetos com elevado conteúdo

tecnológico, uma característica de destaque tratando-se de um setor baseado em recursos

naturais.

3.2. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL: PAISS

INDUSTRIAL E PAISS AGRÍCOLA

Entre os principais instrumentos de políticas públicas que podem induzir o progresso

técnico no segmento do etanol celulósico, figuram os mandatos de mistura obrigatória,

incentivos fiscais e tributários, subvenções para P&D, créditos para pesquisas e para a

construção de projetos demonstrativos ou em escala comercial. A junção completa ou parcial

destes instrumentos pode dar origem a programas temáticos. A grande vantagem destas ações

é o foco tecnológico dado já na origem do programa, os quais devem abarcar aspectos

setoriais, regionais e tecnológicos; quanto maior o equilíbrio entre estas dimensões, maiores

as chances de sucesso (STEINMUELLER, 2010).

Os trabalhos de Mowery et al. (2010); Foray et al. (2012); Mazzucato (2013); e

Mazzucato et al. (2015) colocam em evidência a ação do Estado como indutor do processo de

desenvolvimento e difusão de novas tecnologias, em uma perspectiva que vai além da Market

Failure Theory (MFT).

A estruturação destes programas temáticos introduz ações que o mercado sozinho não

é capaz de induzir. Os investimentos em P&D nestes termos buscam promover soluções para

143

O caso da GranBio será novamente abordado no capítulo 5 – detalhando o conjunto de ações desse ator na

rota tecnológica do E2G.

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problemas sociais, ambientais, populacionais ou ampliar as possibilidades de

desenvolvimento econômico de uma determinada região/setor (FORAY et al., 2012;

MAZZUCATO, 2013). Assim, estes programas governamentais devem atuar no

desenvolvimento de tecnologias relevantes ou disruptivas, que são necessárias à superação de

problemas complexos.

Os desafios impostos pelas mudanças climáticas acionaram um conjunto recente de

propostas de apoio público a projetos de P&D deste tipo; estas ações são diversas e atuam

sobre um conjunto múltiplo de opções tecnológicas calcadas na sustentabilidade, das quais o

etanol celulósico é uma das opções. Estas ações consideram as características específicas do

desafio e o contexto em que serão desenvolvidas e implantadas, assim, devem ir além do

desenvolvimento de capacidade tecnológicas particulares144

, onde o sucesso está sujeito à

articulação de diversos tipos de competências e conhecimentos (KEMP & SOETE, 1992;

MOWERY et al., 2010; FORAY et al., 2012).

Em termos gerais, as ações conjuntas do BNDES-FINEP carregam algumas dessas

características, pois não só oferecem créditos subsidiados e subvenção econômica às

empresas, como também induzem o desenvolvimento dos projetos rota tecnológicas pré-

determinadas, direcionando assim o progresso técnico145

. Como indicam Milanez et al. (2015,

p. 246) “a característica principal desse tipo de política é a predefinição de temas, para os

quais os candidatos elegíveis são convidados a submeter propostas de programas de P&D”.

O fomento à tecnologia do etanol celulósico no Brasil se conecta a estas ações mais

gerais, por contribuir com o avanço das fontes alternativas de energia146

e, por movimentar

diversos tipos de competências no interior do SSI da cana-de-açúcar, inclusive forçando o

alargamento das fronteiras setoriais na medida em que os novos conhecimentos são

incorporados pela compra de tecnologia ou adquiridos por meio de processo de aprendizagem.

144

Postura típica dos projetos de desenvolvimento científico e tecnológico baseados no modelo linear de

inovação. Para Foray et al. (2012), característica dos grandes projetos de C&T, tais como o Projeto Manhattan e

o Programa Apollo. 145

Em uma comparação feita entre as ações brasileiras e as feitas nos EUA por Pereira (2013) e Pereira et al.

(2015) nota-se que as ações estadunidenses apresentam um nível de coordenação maior e os projetos são

conduzidos com um nível de detalhamento mais aprofundado. Por outro lado, essa não deixa de ser uma ação

inovadora, uma vez que esse tipo de ação é justamente inaugurada pelo SSI da cana-de-açúcar, um novo tipo de

esforço institucional no Brasil. 146

Este fato pode ser encarado dessa forma, pois tanto o Governo Federal quanto as empresas encaram essa ação

como a principal iniciativa do Brasil nesse contexto, um exemplo dessa constatação é que os estudos do CTBE

sobre etanol celulósico e, mais os projetos da Raízen e da GranBio, foram apresentados na COP21

(ENTREVISTA X). Esta ação motivou a criação da Biofuture Platform, organização compostas por 20 países

(Argentina; Brasil; Canadá; China; Dinamarca; Egito; Finlândia; França; Índia; Indonésia; Itália; Marrocos;

Moçambique; Holanda; Paraguai; Filipinas; Suécia; Reino Unido; Estados Unidos; Uruguai).

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158

Vale o destaque que ao longo dos anos 2000 o BNDES recuperou sua função de

indutor do desenvolvimento econômico (financiando atividades econômicas147

) e passou a

atuar, também, como agente coordenador, por meio da ação de uma equipe técnica148

,

influenciando a condução das atividades econômicas (ENTREVISTA V).

Neste contexto, o BNDES juntamente com a FINEP, colocou em prática uma “nova”

maneira de propor, conduzir e financiar projetos de inovação no Brasil. Os programas PAISS

Industrial (2011-2014), PAISS Agrícola (2014-2018), bem como, os planos INOVAs149

, são

exemplos dessa atitude, medidas institucionais que visaram desenvolver novos setores ou

modernizar elementos de cadeias produtivas já consolidadas no país.

A grande novidade foi à cooperação e o compartilhamento das competências técnicas

e dos recursos financeiros já existentes para conduzir a política, possibilitando uma melhor

coordenação dos esforços (firmas e governo) e aumentar os aportes financeiros por projetos

(dispêndios de recursos maiores em relação ao que vinha sendo feito).

3.2.1. PAISS Industrial e o start do etanol celulósico no Brasil

O Plano Conjunto de Apoio à Inovação Tecnológica Industrial dos Setores

Sucroenergético e Sucroquímico (PAISS Industrial) deve ser compreendido como uma

resposta nacional frente aos desafios tecnológicos impostos pela necessidade de exploração

integral da biomassa. Tal esforço, mesmo que marginal, abriu espaço para o desenvolvimento

da trajetória tecnológica do E2G no país.

A origem da ação é resultado dos diagnósticos realizados pela equipe de analistas do

BNDES e da FINEP, ao longo dos anos 2000. Resumidamente estes identificaram que: i) os

programas de apoio destinados ao setor sucroenergético caracterizavam-se pela baixa

coordenação das agências públicas nas atividades de fomento a P&D e os projetos

apresentavam pequeno volume de recursos alocados (NYKO et al. 2013; NYKO et al. 2010;

BASTOS, 2007); ii) o Brasil estava muito “atrás” em relação a fronteira tecnológica, uma vez

147

Vide capítulo 2, mostra-se a evolução do desembolso do BNDES para o setor sucroalcooleiro. 148

Nota-se que BNDES nesse período não só aumentou a quantidade de funcionários como passou a realizar

“pesquisas” no âmbito do agência, de maneira correlacionada, grande parte do corpo técnico desenvolve

pesquisas junto a Universidades, por meio de programas de mestrados e doutorados. Essa afirmação merece

maiores esclarecimentos, mas é inegável que as publicações do BNDES Setorial sejam feitas por alunos ou

recém-mestres e doutores com temas relacionados ou explicitamente interligados aos programas de apoio

desenvolvidos pelo próprio banco. 149

Como afirmam Nyko et al. (2013) e Pereira et al. (2015) o PAISS mostrou-se como base para outros panos de

fomento, ampliando a cooperação entre BNDES e Finep, dando origem ao Inova Petro, Inova Energia, Inova

Saúde, Inova Aerodefesa e Inova Agro.

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159

que outras nações já realizavam esforços sistematizados na rota tecnológica do etanol

celulósico, apresentando diversas plantas industrias na escala piloto ou demonstrativas

(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

Acrescenta-se que o diagnóstico, bem como a própria criação do PAISS Industrial,

descende da experiência nacional pela comoditização do etanol. Como já mencionado no

capítulo 2, a partir de 2006, o Governo Federal por meio do Itamaraty e de outras instâncias

da burocracia nacional buscaram o diálogo com a comunidade internacional para estabelecer a

comercialização e a produção do etanol em escala global, mas enfrentaram desconfianças e

resistências em relação ao etanol de primeira geração (desmatamento da Amazônia; relações

de trabalho nas lavouras; Food Vs. Fuel) (ENTREVISTAS V; ENTREVISTA X).

Neste processo identificou-se que havia grandes oportunidades para o Brasil e para o

diálogo internacional por intermédio do desenvolvimento do E2G. A nova tecnologia de

conversão da biomassa tornava o biocombustível “mais democrático” e possibilitava ao Brasil

realizar incrementos técnicos ao seu setor agroindustrial já estabelecido e, ainda, abria-se uma

janela de oportunidade para as firmas brasileiras figurarem como atores relevantes na nova

rota tecnológica (ENTREVISTA X). O plano ficou sob a supervisão e condução do MCTI

juntamente com o MDIC, por meio da FINEP e do BNDES, lançado em 2011.

O objetivo do PAISS Industrial consistiu em fomentar projetos direcionados ao

desenvolvimento, produção e comercialização de novas tecnologias industriais destinadas ao

processamento da biomassa a partir da cana-de-açúcar. O PAISS buscou a obtenção de

produtos de maior valor agregado, que podem ser obtidos a partir da biomassa da cana, como,

por exemplo, os combustíveis líquidos de maior conteúdo energético (diesel, gasolina, butanol

e querosene de aviação) ou mesmo intermediários químicos com aplicações industriais

diversas.

O programa estabeleceu três linhas temáticas, as quais orientaram os programas de

pesquisa das firmas e das instituições selecionadas. As linhas são: (1) Bioetanol de segunda

geração, (2) Novos produtos de cana-de-açúcar e (3) Gaseificação: tecnologias, equipamentos,

processos e catalisadores. Estas três linhas se dividiram em um conjunto de sublinhas de

pesquisa – vide quadro 3.5.

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160

Quadro 3.5. Linhas temáticas do PAISS Industrial Linhas de pesquisa Sub itens das linhas de pesquisa

(1) Bioetanol de 2ª geração

(1.1) Desenvolvimento de tecnologias de coleta e transporte de palha de

cana-de-açúcar

(1.2) Otimização de processos de pré-tratamento de biomassa de cana para

hidrólise

(1.3) Desenvolvimento dos processos de produção de enzimas e/ou de

processos de hidrólise de material lignocelulósico oriundo da biomassa da

cana-de-açúcar

(1.4) Desenvolvimento de microrganismos e/ou de processos de

fermentação de pentoses

(1.5) Integração e escalonamento de processos para produção de etanol

celulósico.

(2) Novos produtos de cana-de-

açúcar

(2.1) Desenvolvimento de novos produtos diretamente obtidos a partir da

biomassa da cana-de-açúcar por meio de processos biotecnológicos

(2.2) Integração e escalonamento de processos para produção de novos

produtos diretamente obtidos a partir da biomassa da cana-de-açúcar.

(3) Gaseificação

(3.1) Desenvolvimento de tecnologias de pré-tratamento de biomassas de

cana-de-açúcar para gaseificação

(3.2) Desenvolvimento de tecnologias de gaseificação de biomassas de

cana-de-açúcar, especialmente quanto à otimização dos parâmetros de

processos e/ou redução nos custos de capital dos equipamentos;

(3.3) Desenvolvimento de sistemas de purificação de gases

(3.4) Desenvolvimento de catalisadores associados à conversão de gás de

síntese em produtos

Fonte: FINEP, 2011.

Algumas características do PAISS Industrial em relação ao seu design devem ser

destacadas: i) escolhe previamente a biomassa – cana-de-açúcar; ii) coloca ênfase em um

produto, o etanol, mas abre possibilidade para os intermediários químicos; iii) não escolhe

uma rota tecnológica a priori, mas enfatiza as tecnologias ligadas a biotecnologia. O destaque

nos processos industriais envolvendo a biotecnologia foi dado deliberadamente pelos

formuladores da política, estes consideravam “a biotec como o negócio do futuro”

(ENTREVISTA X).

Esta interpretação deriva da observação da dinâmica do conhecimento científico

ligado a biotecnologia, a qual apresentou na última década um ritmo de crescimento acelerado

(os dados expostos no capítulo 4, artigos científicos e famílias de patentes cofirmam essa

suposição). Ademais, consideraram que mesmo estando concentradas nas mãos de empresas

estrangeiras as técnicas e os insumos tecnológicos necessários à conversão da biomassa

(enzimas e leveduras) são “janelas de oportunidades entreabertas”, visto que estas sempre

sofrerão atualizações, melhores micro-organismos podem surgir por meio de adaptações

genéticas ou por meio de seleção de organismos nativos. Estas possibilidades podem

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161

viabilizar a participação de atores nacionais no futuro (ENTREVISTA V; ENTREVISTA

X)150

.

Estas determinações são elementos novos na política de inovação ligada ao setor

sucroenergético, pois direcionam minimamente os esforços de P&D. Reforça a biomassa já

vencedora e elege tecnologias portadoras de futuro, as quais podem (a depender de novos

investimentos) fomentar a estruturação de novos mercados, por exemplo, os bioquímicos ou

outros biocombustíveis (butanol, querosene de avião, etc.).

Os projetos selecionados tiveram apoio das instituições, com base nas linhas de

financiamento, programas e fundos já existentes (vide tabela 3.2.). Desta forma, os

proponentes puderam obter financiamento dentro das diversas linhas e programas da FINEP e

do BNDES, de acordo com as características dos seus projetos. Isso caracteriza o PAISS

como um plano de fomento estruturado (financiamento temático), no qual as instituições

públicas de apoio à inovação determinam a direção central dos projetos e o tipo de

financiamento segundo o estágio e a necessidade do programa de PD&I (PEREIRA, 2013;

PEREIRA et al. 2015).

Com isso, o Estado, passa a ser um agente importante do SSI, dá um importante passo

na tentativa de direcionar a rota tecnológica do etanol. O pioneirismo deste plano de apoio à

inovação está no fato de mesclar e combinar tipos diferentes de mecanismos de financiamento

- crédito; subvenção; participação acionaria e financiamento a ICTs – segundo o risco

tecnológico e as dimensões do projeto (bancada, piloto, demonstração ou comercial)

(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

É importante destacar que as propostas que foram aprovadas estavam vinculadas aos

planos de negócios das empresas; portanto, os projetos aprovados apresentaram “programas

de execução” detalhados, prevendo a efetiva introdução das tecnologias e dos produtos no

mercado. Isso caracteriza a política como um esforço declarado de inovação, visando o

estabelecimento de novos produtos ou processos de produção.

Essa nova política de financiamento do Governo Federal mostra-se como um

importante passo à frente na corrida tecnológica, pois une instrumentos de financiamento do

BNDES e da FINEP, permitindo que a política de inovação atue em níveis distintos do

150

Na ENTREVISTA X os formuladores da política fizeram uma analogia com a dinâmica da indústria de

softwares, que passam constantemente por atualizações e acaba gerando oportunidades para novos entrantes,

mesmo que em nichos específicos, imaginava-se que algumas empresas brasileiras pudessem participar nesse

segmento – talvez o único caso próximo disso seja a GranBio, com o desenvolvimento de levedura própria.

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162

processo de inovação, facilitando inclusive as inovações radicais. Antes, apenas utilizava-se

das linhas de subvenção, um estágio muito preliminar do processo (pesquisa básica e plantas

de demonstração). Mas, com a disponibilização de uma variedade maior de instrumentos de

financiamento, como o crédito subsidiado e participação acionária, o PAISS passa para um

nível mais maduro do processo, o nível de planta de demonstração e das plantas industriais

em escalas comerciais.

Neste sentido, a política de inovação do governo federal aprendeu com os erros do

passado (FURTADO, 2014; PEREIRA et al., 2015), e posiciona-se na busca de melhorar sua

eficácia a partir de uma maior coordenação dos investimentos e de uma maior aproximação

das firmas e de suas necessidades.

O PAISS teve o orçamento inicial de 1 bilhão de reais, que seriam aplicados no

decorrer de 2011 a 2014. Entretanto, segundo Nyko et al. (2013), depois do processo de

seleção dos projetos de PD&I das empresas, o PAISS passou a contar com uma carteira de

negócios de 3,3 bilhões de reais, dos quais 2,4 bilhões foram aprovados151

(vide tabelas 3.2 e

3.3.). As atividades de inovação fomentadas foram prioritariamente aquelas com foco

comercial, desenvolvidas por empresas ou em cooperação com empresas.

Tabela 3.2. Carteira detalhada do PAISS em milhões de reais (2011 a 2014). Instrumentos Carteira Estimativa Total Contratado

Abril de 2010 Março de 2011 Fevereiro de 2014

FINEP 209.423 500.000 1.205.708

Crédito 63.399 200.000 1.120.155

Subvenção 88.898 200.000 75.286

Cooperação ICT-Empresa 57.126 100.000 10.267

BNDES 206.236 500.000 1.270.847

Crédito 110.405 300.000 645.373

Participação Acionária 45.000 100.000 600.000

FUNTEC 50.831 100.000 25.474

Total 415.659 1.000.000 2.476.555

Fonte: FINEP, 2014.

O plano apresentou um reforço no volume de verbas, visto que a carteira conjunta de

projetos de inovação ligados à cadeia de produção de etanol e derivados da FINEP e do

BNDES somavam 413,5 milhões de reais antes do PAISS, dos quais a FINEP era responsável

por 244,4 milhões de reais e o BNDES por 169,1 milhões de reais. Desse modo, a aprovação

151

No mapeamento das ações sobre o PAISS Industrial foi encontrado um total de 34 projetos, tento como

somatória dos valores contratados o montante de R$ 2.164.879.298. Ambos os números diferem dos divulgados

no trabalho de NYKO et al. (2013).

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do PAISS dota o setor sucroenergético com mais do que o dobro de recursos até então

disponibilizados (vide tabela 3.2.).

Outra mudança no design da política pública para a inovação envolve a centralização

da administração desses recursos, permitindo aos beneficiários negociar em um só guichê a

combinação de diferentes modalidades de financiamento, como por exemplo, verbas a fundo

perdido e a modalidade de participação acionária dos bancos em projetos relevantes de alto

risco (como foi o caso da primeira fábrica de etanol 2G do Brasil, a BioFlex 1).

- Resultados e destaques do PAISS Industrial

Há dois fatos importantes na constituição e na execução do PAISS. Primeiramente, ao

contrário do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI) e da

Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012–2015 (ENCTI), este programa é

voltado diretamente para o etanol (política direta). Outro elemento destoante é o fato de ser

voltado para o desenvolvimento de tecnologias através de projetos de demonstração, plantas-

pilotos e de projetos de escalonamento (vide tabela 3.3.). Assim, mostra-se um avanço

qualitativo no desenvolvimento da rota tecnológica do etanol, pois a grande quantidade de

conhecimento de base até agora gerado passa a ser materializado em projetos de

desenvolvimento, com o financiamento dos projetos de demonstração, significando uma

evolução em relação às políticas anteriores destinadas ao setor.

E, ainda, o PAISS possibilitou ao Brasil figurar como um dos atores desse processo

de desenvolvimento da tecnologia industrial, pois as empresas e instituições envolvidas

aprendem com informações/situações reais da exploração da biomassa e com problemas

impossíveis de serem detectados em laboratório. Trata-se de tecnologias que estão na

antessala do mercado e do processo de difusão. Portanto, o PAISS cumpre uma das

características elencada por Nemet (2009) com relação às políticas de technology-push,

contemplando o financiamento de projetos de demonstração.

O quadro 3.6. e a tabela 3.3. permite realizar um balanço geral das ações e dos efeitos

que PAISS Industrial promoveu no SSI da cana-de-açúcar. O programa selecionou 25

empresas lideres de projetos, estas proporcionaram 60 projetos de pesquisa/inovação. A área

que recebeu maior número de iniciativas foi a linha 2, novos produtos a partir da cana-de-

açúcar, com 22 projetos totalizando um investimento de R$ 1.605 bilhões. Os projetos

referentes a etanol de segunda geração (Linha 1 - rota biotecnológica) somou 16 iniciativas,

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164

gerando um investimento na ordem de R$ 1.446 bilhões. Por sua vez, a linha 3 (gaseificação)

contou com aprovação de apenas um projeto, entretanto, os recurso não foram contratados

pela Petrobras (empresa selecionada).

Tabela 3.3. Projetos de PD&I integrantes do PAISS (2011-2014) N

0

projetos

Etanol

2G

R$

milhões

N0 projetos

Bioquímicos

R$

milhões

N0 Projetos

Gaseificação

R$

milhões

N0

total

R$

milhões

(total)

Perspectiva 1 202 6 621 0 0 7 823

Análise 3 74 2 6 0 0 5 80

Aprovado 4 90 7 306 1 255 12 651

Contratado 8 1.080 7 672 0 0 15 1.752

Total 16 1.446 22 1.605 1 255 39 3.306

Fonte: NYKO et al, 2013.

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Quadro 3.6. Empresas com planos de negócio selecionados no PAISS Industrial - 2011.

Razão Social Capital Setor 2 G BioQ. Gaseif.

Famílias de

patentes no

Brasil152

Agacê Sucroquímica Brasil Bioenergia X 0

Barauna Comércio e Indústria Brasil Biotecnologia X 0

BioFlex / GranBio Brasil Bioenergia X 5

BIOMM Brasil Biotecnologia X 0

Centro de Tecnologia Canavieira Brasil Bioenergia X X 4

Odebrecht Agroindustrial Brasil Bioenergia X X 2

Ideom Tecnologia Ltda Brasil Química X 0

Methanum Engenharia Brasil Engenharia X 0

Petrobras Brasil Petróleo X X 5

PHB Industrial Brasil Bioquímica X 3

Novozymes Dinamarca Biotecnologia X 68

Abengoa Bioenergia Espanha Bioenergia X 2

Kemira Chemicals Brasil Finlândia Química X 1

Metso Paper South America Finlândia Bens de Capital X 3

VTT Finlândia Biotecnologia X X 0

DSM Holanda Biotecnologia X X 12

Amyris EUA Biotecnologia X 2

Bunge EUA Alimentos X 0

Butamax Biocombustíveis

Avançadados

EUA Bioenergia X 10

Dow EUA Química X X 6

Dupont EUA Química X 30

Eli Lilly do Brasil EUA Farmacêutica X 0

LS9 Brasil Biotecnologia EUA Biotecnologia X 0

Mascoma EUA Biotecnologia X 2

Solazyme Brasil Óleos Renovavéis

e Bioprodutos

EUA Bioenergia X 0

Fonte: elaboração própria a partir de BNDES, 2013; QUESTEL ORBIT, 2013.

Outras características desse programa temático podem ser levantadas, tais como153

:

1) Permitiu a atração de novos atores para o setor, como as empresas estrangeiras de

biotecnologia (Novozymes; DSM; Beta Renewables); do setor de papel e celulose (Metso

Paper; Pöyry); da industria química (Chemtex; Dow e DuPont);

2) Salienta-se a capacidade do PAISS em movimentar e integrar diversos tipos de firmas

em projetos de P&D, ligadas a setores industriais distintos (biotecnologia; química; start up

de base tecnológica; petróleo; bioenergia; papel e celulose);

3) Possibilitou a criação de empresas brasileiras subsidiárias de grupos internacionais

com fico em explorar novas tecnoogias ou comercializar novos produtos, tais como: a

152

Número de famílias de patentes referentes à tecnologia de produção de etanol celulósico. Os resultados e a

análise detalhada destas informações estão expostos no capítulo 4. 153

Informações disponíveis em Nyko et al. (2013) e Milanez et al. (2015). Complementos e ajustes são

provenientes da entrevista V e entrevista X.

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Butamax; VTT do Brasil; Solazyme Brasil Óleos Renovavéis e Bioprodutos; Mascoma Brasil

P&D; LS9 Brasil Biotecnologia; Eli Lilly do Brasi;.

4) Promoveu a cooperação empresarial através de consórcios (foram formados sete

consórcios entre empresas e 10 parcerias entre ICTs e empresas). Os principais projetos de

E2G em curso no Brasil apresentam esse tipo de relação, mas esse formato de parceria se

estende para os bioquímicos. Como exemplo desse formado de parceria tem-se as relações

entre: a) VTT, Metso e Odebrecht; b) CTBE, Dow e DSM; c) CTC e Novozymes; d) Raízen

e Novozymes; e) Biocelere e Rodhia; f) Solazyme e Bunge;

Um dos consórcios de P&D formados no âmbito do PAISS que merece destaque é a

cooperação entre a VTT Brasil, a Odebrecht e a Metso. O seu objetivo é desenvolver uma

solução tecnológica que viabilize a produção de etanol 2G integrada à produção de etanol de

primeira geração e de energia elétrica nas usinas brasileiras. A VTT possui experiência no

desenvolvimento de tecnologia para exploração de biomassa na Finlândia, visto que no país

de origem apresenta o formato original de instituto de pesquisa, atuando em diversos setores

industriais, entre estes, a indústria de papel e celulose e madeireira. O seu objetivo no Brasil é

adaptar sua tecnologia e seus processos produtivos para a biomassa da cana-de-açúcar.

5) O programa aprovou a implantação de 8 plantas industriais dedicadas ao E2G,

sendo três em escala comercial. Mas efetivou-se apenas 3 plantas, duas em escala comercial

(GranBio e Raízen) e uma em escala de demonstração (CTC). Ainda em curso, existe a

iniciativa conduzida pelo CTBE, a qual prevê a instalação da sua tecnologia em nível

comercial (o projeto se encerra no final de 2017).

Mesmo não atingindo a construção de 8 plantas industriais pode-se considerar que o

programa trouxe avanços para o SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol

celulósico, pois antes da sua implantação só havia no país uma única empresa em condições

de conduzir projetos relevantes na trajetória do E2G, a Petrobras, a qual conduzia pesquisas

no seu centro de P&D desde 2004 e em 2010 já tinha fechado uma parceria estratégica com

uma empresa americana (KL Energy) (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X). Assim, em 2017

além dos diversos projetos correlacionados a conversão da biomassa o programa logrou a

construção e a operação de 2 plantas comerciais.

É verdade que ambas as iniciativas sofrem com problemas tecnológicos, mas estas

novas estruturas estabeleceram em território nacional processos de aprendizagem que não

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eram possíveis de serem alcançados na escala laboratorial ou piloto. Estes casos serão

abordados com mais detalhes no capítulo 5.

O PAISS Industrial abriu “janelas de oportunidades” tanto para empresas estrangeiras

como para empresas nacionais (vide quadro 3.5.). As estrangeiras enxergaram no PAISS a

possibilidade de explorar um novo mercado (tecnologias e insumos tecnológicos para as

usinas de cana) e, principalmente, objetivaram utilizar o Brasil para escalonar os seus

processos industriais. O setor sucroenergético passou a ser uma plataforma de escalonamento,

melhoramento e adaptação das suas tecnologias de E2G e de intermediários bioquímicos

(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

A ideia geral foi aproveitar a biomassa brasileira e a escala de produção da mesma, ao

mesmo tempo, em que se aproveitavam os recursos financeiros disponíveis. Estes novos

atores entraram na fase industrial do SSI da cana-de-açúcar em substituição aos tradicionais

produtores/fornecedores de tecnologia de produção do etanol de primeira geração (Dedini,

Sermatec, TGM; Mausa; NG; etc.). Pois a conversão da biomassa em E2G e ou bioquímicos

exige outro “tipo/nível” de competência e de conhecimento, estes atores tradicionais não

atuam e nem apresentam capacidades para empreender processos de aprendizagem na

biotecnologia, química fina, engenharia genética, ou até mesmo, na parte metal-mecânica

ligada ao pré-tratamento da biomassa (ENTREVISTA V; ENTREVISTA VIII;

ENTREVISTA X).

No momento da formulação e da seleção dos projetos de pesquisa para o PAISS

Industrial os policy makers tinham a intenção de inserir estes atores tradicionais no programa,

mas, a estrutura tecnológica e, principalmente as condições financeiras desses atores os

impediu de participar, esta situação ocorreu com a Dedini Indústria de Base, que teve seu

projeto aprovado e na primeira fase da seleção (ENTREVISTA X).

Tal fato mostra-se sintomático, pois no atual estágio de desenvolvimento dos projetos

em funcionamento - 2017, é justamente na etapa do pré-tratamento que existe os maiores

desafios, processo industrial onde estes atores tradicionais poderiam agir, porque as

competências acumuladas na produção de equipamentos e máquinas para 1G, somadas aos

conhecimentos sobre a biomassa de cana-de-açúcar os colocam em uma posição privilegiada,

visto que os equipamentos importados da indústria de papel e celulose não apresentaram

desempenho satisfatório – precisamente por desconsiderarem as particularidades da

composição da cana-de-açúcar.

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Por outro lado, o PAISS também foi uma janela de oportunidade aproveitada pelos

atores nacionais, no sentido em que possibilitou de maneira direta (algumas firmas) a

participação na corrida tecnológica internacional e, como tal, imprime processos de

aprendizagem inéditos, tanto de maneira tácita como sistematizada. Esta situação resulta em

criação de novos produtos e a participação em novos segmentos econômicos, por exemplo, a

exportação de E2G para a Europa ou Califórnia /EUA154

.

O desempenho financeiro do PAISS Industrial pode ser observado pela tabela 3.4., a

qual mostra os valores dos desembolsos e a tipologia dos recursos (categorias de

financiamento). Percebe-se que a maior parte dos projetos contratados está na categoria de

crédito (15 projetos) ou de subvenção econômica (13 projetos). Mas, em relação ao montante

alocado, a equidade desaparece, pois os valores concentram-se na categoria de crédito,

aproximadamente 95% dos recursos, sendo que a subvenção econômica abarca apenas 3% dos

recursos.

Tabela 3.4. Atores e valores aprovados por projeto no âmbito do PAISS Industrial (2011-

2014)155

.

PAISS Industrial

Ano ICTs/Empresa Valor

Contratado Categoria Instituição

2011 BIO4 Soluções Biotecnológicas* 890.888,60 Subvenção FINEP

2011 DOW Agrosciences Industrial 34.587.179,54 Crédito FINEP

2013

Centro Nacional De Pesquisas em Energia e Materiais

(CNPEM – CTBE) -

Eli Lilly do Brasil 8.719.540,00

Interação

Universidade-

Empresa e

apoio à

inovação FINEP

2013 Methanum Engenharia Ambiental 4.872.000,03 Subvenção FINEP

2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 9.993.024,00 Subvenção FINEP

2013 Odebrecht Agroindustrial 8.309.076,00 Subvenção FINEP

2013 Braskem* 8.000.000,00 Subvenção FINEP

2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 3.277.000,00 Subvenção FINEP

2013

Baraúna Indústria e Comércio - UFSCAR

- USP/ESALQ 1.546.979,00

Tecnologias

Sociais FINEP

2013 VTT Brasil 9.985.657,08 Subvenção FINEP

2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 1.799.000,00 Subvenção FINEP

2013 Braskem* 8.000.000,00 Subvenção FINEP

154

O volume das exportações é baixo, mas todo o etanol celulósico já produzido pela Raízen foi exportado

(ENTREVISTA VIII; ENTREVISTA X). 155

Esta tabela encontra-se incompleta, pois nem todos os projetos contratados no âmbito do PAISS Industrial

estão disponíveis na base de dados do MCTI ou do BNDES, assim, mais esforços de pesquisa devem ser

empregados.

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169

2013 Braskem* 4.000.000,00

Tecnologias

Sociais FINEP

2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 9.701.136,00

Tecnologias

Sociais FINEP

2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 4.374.200,00 Subvenção FINEP

2013 Braskem* 2.000.000,00

Tecnologias

Sociais FINEP

2013 Geo Energética Participações* 161.709.300,00 Crédito FINEP

2013 GranBio Investimentos 126.063.128,96 Crédito FINEP

2013 Máquinas Agrícolas Jacto* 85.990.000,00 Crédito FINEP

2013 Braskem* 10.888.984,76 Crédito FINEP

2013 Raízen 207.762.000 Crédito BNDES

2013 Rhodia Poliamida e Especialidades 4.827.000 Crédito BNDES

2013 Centro De Tecnologia Canavieira (CTC) 71.100.000 Crédito BNDES

2013 Bioflex / GranBio 300.295.000 Crédito BNDES

2014

DOW Brasil Indústria E Comércio de Produtos

Químicos 2.877.571,62 Subvenção FINEP

2014 GranBio Investimentos 186.877.254,60 Crédito FINEP

2014 SJC bioenergia* 112.000.000,00 Crédito FINEP

2014

Edeniq Brasil Importação e Comércio de Produtos e

Serviços Ltda* 89.382.647,20 Crédito FINEP

2014 Abengoa Bioenergia 76.680.000,00 Crédito FINEP

2014 DSM south america 272.650.000,00 Crédito FINEP

2014 Abengoa Bioenergia / Unidade São Luiz 309.556.000 Crédito BNDES

2014

Fundação de Apoio a Pesquisa Cientifica e

Tecnológica 23.759.978 -

BNDES

2014

Fundação de Apoio a Pesquisa Cientifica e

Tecnológica 7.554.104

BNDES

FUNTEC BNDES

2014

Centro Nacional De Pesquisas em Energia e Materiais

(CNPEM /CTBE) 21.874.790

BNDES

FUNTEC BNDES

Fonte: elaboração própria a partir de MCTI, 2016; BNDES, 2016. * As firmas e as instituições marcadas com asterisco são atores que não constavam na lista divulgada pelo BNDES/FINEP de empresas aprovadas (vide

quadro 3.5.). Mas estes atores receberam aportes no período de vigência do programa (2011-2014) e os temas

dos seus projetos se relacionam fortemente com as linhas temáticas do PAISS Industrial.

Em relação aos projetos de subvenção econômica aprovados no âmbito do PAISS,

destacam-se os conduzidos pelas empresas VTT Brasil, a Dow, a Braskem, a Methanum e a

Baraúna/USP. A VTT Brasil recebeu cerca de R$10 milhões para o desenvolvimento de

diferentes tecnologias e etapas do processo de produção de etanol 2G. A Dow teve projeto

financiado em R$2,9 milhões para criar uma rota tecnológica para a obtenção do propanol e

do ácido propiônico a partir da cana. A Braskem teve três projetos aprovados, num total de

R$20 milhões, para rotas tecnológicas de produção de químicos "verdes". A Methanum

trabalha na metanização de vinhaça, com R$4,9 milhões financiados. Por fim, a Baraúna/USP

teve cerca de R$1,7 milhões para financiar um projeto de biofertilizantes.

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170

O resultado mais sensível destes encadeamentos são as duas plantas industriais de

etanol celulósico, da GranBio e da Raízen, ambas financiadas pelo PAISS, tendo produção

iniciada respectivamente em 2014 e 2015. Estes empreendimentos utilizam pacote

tecnológico estrangeiro, das empresas Beta Renewables e Iogen Energy (os casos serão

abordados no capítulo 5).

Um desdobramento do PAISS para a esfera da política pública para a inovação é que

sua experiência passa a consubstanciar a elaboração de novos programas de apoio à indústria

brasileira, os quais se espelham na sua estrutura regulatória, por exemplo, o Inova Petro,

Inova Energia, Inova Saúde, Inova Aerodefesa, Inova Agro e o PAISS Agrícola156

, todos

apoiados de maneira simultânea pela FINEP e pelo BNDES, e com grandes semelhanças ao

PAISS no que diz respeito às modalidades de financiamentos aos projetos de PD&I

(FURTADO, 2014; NYKO et al., 2013).

A implementação do PAISS também demonstra um encadeamento das políticas

federais realizadas para o SSI da cana-de-açúcar, pois no Governo Lula (2006-2010) as

políticas focaram-se mais no desenvolvimento da pesquisa básica e na construção e ampliação

da estrutura de pesquisa (criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia). Já no primeiro

mandato do Governo Dilma (2011-2014), as políticas apresentaram uma forte tendência de

financiar o desenvolvimento de projetos “mais próximos do mercado, como plantas de

demonstração. Com isso, aparentemente, ocorre uma passagem qualitativa no interior das

novas rotas tecnológicas ligadas à transformação da biomassa da cana-de-açúcar.

Tais dados evidenciam que este instrumento regulatório permite a movimentação do

SSI, pois induz um conjunto de indústrias distintas a atuarem sobre o “mesmo” regime

tecnológico, ou seja, a atuação de diversos segmentos industriais sobre a rota tecnológica do

etanol de segunda geração, com objetivo de produzi-lo diretamente ou com objetivo de

complementar sua cadeia.

Esta iniciativa impõe um novo regime de aprendizagem para o setor, forçando o seu

deslocamento do fluxo exclusivo baseado no DUI-mode, como foi detalhado na seção

anterior, para um modelo de inovação mais próximo do STI-mode ilustrado por Jensen et al.

156

O PAISS Agrícola (2014-2018) dá continuidade em outro nível ao desenvolvimento de competências para a

inovação no setor sucroenergético brasileiro. O programa tem como objetivo elevar a quantidade de investimento

e de apoio a projetos de risco tecnológico e fortalecer as relações entre empresas, ICTs e o setor público. Esta

iniciativa é fruto do diagnóstico setorial feito durante o PAISS, o qual indicou a necessidade de aumentar a

produtividade da cana-de-açúcar. o PAISS Agrícola contou inicialmente com cinco linhas de pesquisa, já

predeterminadas pelas agências governamentais. Os recursos são de 1.480.000 bilhões de reais, e devem ser

liberados entre 2014 a 2018.

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171

(2007)157

. Com isso, as firmas não só buscam aprender em bases de conhecimentos científicos

como a Química Orgânica, a Genética e de outras áreas do conhecimento de fronteira. As

empresas também são levadas a estabelecer interações e cooperações com diversas

universidades e institutos de pesquisa nacionais e internacionais, bem como, com outras

firmas com capacidades complementares.

Portanto, a janela de oportunidade contínua aberta para as nações periféricas ou não.

E, em se tratando de um setor em que o Brasil apresenta não somente grandes potenciais

naturais como também uma rota de aprendizagem ascendente com mais de trinta anos (desde

o Proálcool), passa a ser um segmento estratégico para o desenvolvimento da nação,

merecendo atenção (políticas de estímulo) e investimentos em novas tecnologias. Trata-se de

uma oportunidade para que o Brasil possa romper com a condição histórica de produtor de

insumos e possa figurar como líder na produção de tecnologias para os biocombustíveis e seus

derivados.

- Limitações do PAISS Industrial

Dentre as limitações do PAISS Industrial e pontos que devem ser buscados pelas

novas políticas públicas ligadas ao avanço do etanol celulósico no Brasil, deve-se destacar

quatro elementos:

i) Induzir ou criar empresas de base tecnológica para participar da cadeia produtiva do

E2G. Condição para o Brasil reduzir o controle quase absoluto das empresas estrangeiras

sobre os processos mais complexos da conversão da biomassa - a hidrólise enzimática e a

fermentação da C5.

Para ilustrar essa situação tem-se o caso da Biomn S.A.. A empresa foi selecionada

pelo PAISS e seu projeto de desenvolvimento e produção de enzimas foi contemplado com

recursos na modalidade de subvenção econômica. Mas a empresa antes mesmo de iniciar o

157

A definição dos modos de aprendizagem e inovação podem ser vistos em Jensen et al. (2007) e Lundvall

(2009). De maneira sintética, o DUI-mode (learning by doing, learning by using e learning by interacting ) é

baseado em experiência dos trabalhadores no nível da firma, refere-se ao Know-how, é um conhecimento tácito

e localizado, e o processo de aprendizado pode ocorre de maneira não intencional. O STI-mode (learning by

science, learning by innovation) é baseado em produção e uso de códigos científicos e conhecimento

tecnológicos , e por mais que parta de um problema local, faz uso do conhecimento global e de conhecimento

científico sistematizado.

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cronograma da pesquisa acabou desistindo de participar do PAISS158

. Este caso é interessante,

porque os formuladores da política buscaram agregar esse tipo de ator ao programa

(realizaram visitas e apresentações com estas firmas), mas não atingiram aderência qualitativa

suficiente. Atores que poderiam ser financiados e tinham competências não aderiram (caso da

Biomn) e outros que apareceram não tinham envergadura financeira ou conhecimento

tecnológico suficiente (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X). Tal situação mostrou uma

debilidade da política, bem como da própria estrutura produtiva brasileira.

ii) A necessidade de aprimorar a estratégia de cooperação com outros órgãos e

instâncias do governo. Este problema resume-se no fato que o BNDES e a FINEP não

conseguiram ampliar as cooperações com outros atores na mesma qualidade e intensidade que

o fez entre si (ENTREVISTA V). O engajamento de outros entes públicos foi quase nula no

PAISS Industrial.

Nos planos INOVAs ocorreram cooperações com outros atores governamentais, por

exemplo, no Inova Energia com ANEEL, no InovaPetro com a Petrobras, mas as sinergias

não foram as mesmas. A ENTREVISTA V relata problemas causados pela mudança de

estratégia da Petrobras com o programa em andamento, essa situação alterou a política interna

da empresa de aquisição de equipamentos (política de fornecedores locais), com isso

inviabilizou a iniciativa em curso de desenvolvimento e produção de equipamentos

específicos para a extração de petróleo feita por uma empresa nacional (o equipamento é

popularmente chamado de “arvore de natal”).

Portanto, é necessário criar canais de engajamento entre outras instituições do

governo, já na fase do diagnostico. Assim, consegue-se arregimentar maior volume de

recursos e ampliar a coordenação das ações, podendo atrair mais de um tipo de instrumento de

política pública, ampliando as chances do Governo trabalhar com as diversas dimensões de

políticas públicas (Produção; C&T e Consumo);

iii) Criar e implementar uma política pública voltada à demanda do E2G. Até o ano de

2016 as ações do Estado brasileiro se limitaram a ações na esfera do estímulo a C&T e do

aprendizado tecnológico, ações importantes, mas insuficientes para difusão da tecnologia.

Pois como indicam os trabalhos de Suurs & Hekkert (2009) e MAZZUCATO (2013), o

avanço de novas fontes renováveis demandam medidas em múltiplas dimensões.

158

A empresa atua no seguimento de produção de insulinas. Na época alegou que conduzir um grande projeto

em uma área diferente poderia tirar o foco e o fôlego das suas ações no core competece da firma (ENTREVISTA

X).

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173

A condição atual do arcabouço institucional apenas suporta o mercado do etanol de

primeira geração, sendo que o etanol celulósico, dado o seu estágio atual de desenvolvimento

tecnológico, demandaria ações em outras esferas, tais como: medidas de criação de um

mercado de nicho ou medidas que impulsionassem as exportações159

, ou ainda, a criação de

um arranjo regulatório suficientemente forte para este produto somar-se ao mercado de

biocombustível de primeira geração, proporcionando recompensa ao produtor (compensação

pelos benefícios ambientais)160

.

Tal situação é característica do atual estágio da tecnologia (2G), não se limitando à

realidade brasileira, pois o standard tecnológico não está estabelecido, assim, ações que visem

o desenvolvimento e a melhora da tecnologia são imprescindíveis para a tomada de posição

no setor; todos os países que desejam figurar como atores proeminentes nessa trajetória

estabelecem medidas nessa direção. Os EUA são uma exceção, pois além de estabelecer

medidas de estímulo a C&T e à aprendizagem tecnológica introduzem ações que incentivam a

produção e o desenvolvimento de capacidade produtiva local, tais como o estabelecimento de

metas de produção e mistura de etanol celulósico aos combustíveis fósseis, caso da Energy

Independence and Security Act. (MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012). Nos demais países

– como mostra o quadro 3.7. - as ações são apenas na dimensão da C&T, e mesmo no caso

americano, as mais relevantes encontram-se voltadas à C&T.

Quadro 3.7. Ações internacionais de estímulo ao desenvolvimento do etanol celulósico.

EUA

Biomass Research and Development Initiative (2000) – Por meio da parceria entre o

Department of Energy (DOE) e o United States Department of Agriculture (USDA) forma-se um

programa que oferece subvenções para projetos de PD&D em biocombustíveis. Esta iniciativa

apresenta três eixos principais: 1) desenvolvimento de matérias-primas; 2) desenvolvimento de

biocombustíveis e bioprodutos; e 3) análise do desenvolvimento dos biocombustíveis. O

programa conta com duas revisões, em 2008 e em 2014, a participação máxima do governo é de

80% do custo total do projeto.

Energy Independence and Security Act (2007) – No que tange os combustíveis renováveis

determina cotas progressivas de mistura entre biocombustíveis e combustíveis fósseis, com o

objetivo de atingir 36 bilhões de galões de biocombustíveis em 2022 (136 bilhões de litros).

Existe uma meta específica para combustíveis celulósicos, em 2022 deverão ser consumidos 16

bilhões de galões nos EUA (60 bilhões de litros).

Ações da Receita Federal Americana - concedeu crédito tributário para a produção de

biocombustíveis celulósicos, crédito de até US$ 1,01 por galão, produzidos nos EUA depois de

31 de dezembro de 2008. Soma-se a essa ação subsídio especial de 50% para as deduções com

159

Representantes da Raízen afirmam que o etanol de segunda geração tem nicho muito forte no mercado

exportador. Os principais destinos seriam EUA, Europa e Ásia (REUTERS BRASIL, 2015). Em entrevista

realizada na GranBio (09/09/2015) as exportações aparecem como um destino importante para a produção do

etanol celulósico, devido ao desenvolvimento do arcabouço regulatório dos países desenvolvidos, os quais

compreendem metas para emissões e indicativos de mistura de biocombustível aos derivados de petróleo.

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depreciação das plantas de biocombustíveis celulósicos que utilizassem a hidrólise enzimática

em seu processo produtivo. Ambas as ações se estenderam até 2013.

Biorefinery Assistance Program (2008) - O programa encontra-se no escopo da Farm Bill de

2008, seu objetivo era oferecer subvenções econômicas e garantias de empréstimos para a

construção de biorrefinarias de escala comercial e/ou modernização de biorrefinarias

demonstrativas transformando-as em comercial. Visava demonstrar a viabilidade comercial dos

processos de conversão de biomassa em biocombustíveis avançados.

Biorefinery, Renewable Chemical and Biobased Product Manufacturing Assistance

Program (2014) O programa encontra-se no escopo da Farm Bill de 2014, amplia a ação e o

escopo da versão anterior (Biorefinery Assistance Program), assim, adiciona as funções o apoio

aos produtos químicos provenentes da biomassa. Outra grande mudança foi o abandono do

apoio por meio de subvenção econômica.

Biomass Program (2008) – O programa apresenta orçamento acumulado de 3,3 bilhões de

dólares, suporta projetos de P&D em diferentes fases (bancada, piloto e demonstração). Seu

principal objetivo é o desenvolvimento de novas tecnologias indústrias no segmento de

biocombustíveis. Esta ação se dá no âmbito do Department of Energy (DOE) e é conduzida pelo

Office of Energy Efficiency and Renewable Energy (EERE). No seu desenvolvimento estabelece

parcerias público-privadas.

Demonstration and Market Transformation - O programa congrega todas as ações de

Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração (PD&D) do U.S. Department of Energy’s

Bioenergy Technologies Office (BETO) que envolve a conversão da biomassa, abrangendo toda

a sua cadeia produtiva. Com isso, o programa fomenta projetos tecnológicos de alto risco, nos

níveis de planta-piloto, demonstração e escalas industrial, buscado remover os obstáculos à

comercialização. As ações do BETO ocorrem por meio do estabelecimento de parcerias público-

privadas que atuam nas seguintes linhas/sub programas: 1) Biorrefinarias integradas; 2)

Biocombustível para aviação; 3) Infraestrutura para distribuição e uso final do Biocombustível;

4) Uso da biomassa para energia elétrica (Biopower); 5) Co-otimização do biocombustível e do

Motor a combustão.

Conversion Research and Development (R&D) – Conduzido pelo BETO, tem como objetivo

desenvolver tecnologias para a conversão da biomassa em combustíveis líquidos

comercialmente viáveis, bem como bioprodutos e bioenergia. As linhas de pesquisa são: 1)

Bioquímica e 2) termoquímica. Este programa é voltado à pesquisa básica e desenvolvimento

em escala laboratorial, agindo como complemento aos programas já existentes (pré-

competitivos).

Algae Program – É realizado no âmbito do BETO, apresenta uma visão de longo prazo,

objetivando aumentar os rendimentos e reduzir os custos de biocombustíveis de algas. Trabalha

com parceiros (públicos e privados) buscando integrar competências para o desenvolvimento de

tecnologias nos diversos estágios da à cadeia produtiva do biocombustível celulósico da alga.

União

Europeia

NER300 – Programa de financiamento de projetos demonstrativos ou em escala comercial em

energias de baixo carbono, com isso, estimula novas tecnologias em energias renováveis e

captura e armazenamento de carbono. Funciona com apoio direto aos projetos via subvenção

econômica, com o orçamento estimado de 2 bilhão de euros. Esta ação ocorre no âmbito do

Climate Energy Package da União Europeia, as articulações das duas medidas visam cumprir

com os mandatos de uso de biocombustíveis, como medida para redução das emissões de GEEs.

China

12th Five Year Plan (2011-2015) – A bioenergia é vista na China como uma indústria

emergente, sendo estratégica ao país. No interior do plano quinquenal de desenvolvimento

define metas para o aumento da biomassa e dos biocombustíveis, visando o desenvolvimento de

etanol celulósico e do biodiesel. O National Energy Administration (NEA), é a instituição

responsável pela condução da matriz energética, com isso, é a responsável pela elaboração de

leis, regulamentação, regulamentos e padrões tecnológicos e fornece orientações para a atividade

de investigação científica e tecnológica.

Fonte: elaboração própria a partir de PEREIRA, 2013; USDA, 2014; PEREIRA et al., 2015; MILANEZ et al.,

2015; EERE, 2016.

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O BNDES/FINEP formulará uma proposta de ação do lado da demanda, mas esta não

foi levada a diante justamente pelo problema indicado no ponto anterior, o engajamento de

outras dimensões do Estado.

A proposta para estimular a demanda do etanol celulósico no Brasil consistia em

determinar uma mistura mínima de etanol anidro 2G a gasolina, seria destinado 1% da mistura

atual do anidro ao etanol celulósico. A ideia é que dos 10 bilhões de litros de anidro

misturados a gasolina, seria destinado 1 bilhão de litros de E2G, o que daria um volume 10

vezes maior do que as usinas de E2G no Brasil estão produzindo (ENTREVISTA X).

Segundo os cálculos da equipe técnica do BNDES, isso deveria ser complementado com um

instrumento que garantisse o pagamento de um premio de R$ 1 por litro de E2G ao produtor,

que ao final não daria mais que 0,5 centavos ao consumidor que enchesse um tanque de 40

litros de gasolina (ENTREVISTA X).

Um mandato de mistura específico ao E2G e uma política de bonificação ao produtor

possibilitaria a expansão da produção do etanol celulósico, o que aceleraria o processo de

aprendizagem e de adensamento da cadeia produtiva no território nacional. Estima-se que a

instalação de mais 3 plantas industriais de E2G com capacidade 40 milhões de litro/ano

(iguais da Raízen), a Novozymes instalaria uma planta de enzimas no Brasil para suprir a

demanda por insumos tecnológicos (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

iv) Por fim, a continuidade das iniciativas de fomento a tecnologias disruptivas é

condição necessária para o Brasil continuar perseguindo o desenvolvimento tecnológico, pois

momentos de hiato (iguais da década de 1990) ampliam o gap tecnológico entre o Brasil e as

nações que atuam na fronteira do conhecimento. Segundo o que foi levantado nas entrevistas,

o etanol e a inovação ainda estão no radar do BNDES e da FINEP, mas não há previsão para o

lançamento de um novo programa que abarque o etanol celulósico. A continuidade e a

correção de esforços ampliam as chances de evolução da tecnologia, bem como das próprias

instituições.

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3.2.2. PAISS Agrícola adensamento das atividades voltadas à C&T e ao aprendizado

tecnológico do SSI da cana-de-açúcar

O PAISS Agrícola foi lançado em 2014 dando continuidade em outro nível ao

desenvolvimento de competências para a inovação no setor sucroenergético brasileiro. Esta

iniciativa é fruto do diagnóstico setorial feito durante o PAISS, que indicava a necessidade de

aumentar a produtividade da cana-de-açúcar, ou seja, ampliar a produtividade dos canaviais,

fato que ficou latente com a crise de 2011 e 2012 no setor.

Ademais, percebeu-se que o setor necessitava desenvolver variedades de cana-de-

açúcar mais adaptadas às condições geográficas atuais do setor e, ainda, procurar desenvolver

variedades com maior capacidade energética.

O diagnóstico também pontuou a urgência em desenvolver equipamentos adequados

para plantio e colheita, já que o maquinário agrícola atual são adaptações de outras culturas,

os quais têm provocado alguns problemas na produção, como a compactação do solo e a

perda de material no transporte (palha da cana). Por último, busca através de novos

investimentos em PD&I alongar a produção do etanol para além do período da safra de cana,

para diminuir os efeitos do fluxo de caixa das unidades processadoras de cana-de-açúcar na

entre safra (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

Com isso, o PAISS Agrícola conta com cinco linhas de pesquisa, já predeterminadas

pelas agências governamentais, a saber: 1) Desenvolvimento de novas Variedades; 2)

Máquinas e Implementos; 3) Sistemas integrados de manejo e planejamento da produção; 4)

Novas técnicas de propagação de mudas; 5) Adaptação de sistemas industriais para outras

culturas (sorgo e o milho).

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177

Tabela 3.5. Empresas e valor dos projetos contratados no âmbito do PAISS Agrícola (2014-

2018)161

.

PAISS Agrícola

ANO Instituições/Empresa Valor

Contratado Categoria Instituição

2014 Tracan Máquinas e Sistemas para Agricultura LTDA 11.133.900,00 Crédito FINEP

2014 AGN Agroindustrial e Biocombustiveis LTDA 37.198.047,20 Crédito FINEP

2014 Raizen Energia S/A 4.473.000,00 Crédito BNDES

2015 Cerradinho Bioenergia S.A. 36.529.808,00 Crédito FINEP

2015 Biocelere Agroindustrial LTDA 2.509.090,40 Crédito FINEP

2015 Biocelere Agroindustrial LTDA 1.090.909,09 Crédito FINEP

2015 Grupo Zilor (Copersucar) 12.678.000 Crédito BNDES

Fonte: elaboração própria a partir de MCTI, 2016; BNDES, 2016.

No interior desse novo programa estruturado apresentam-se dois importantes break

thru tecnológicos ligados à fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar, que diferentemente das

inovações mais complexas e disruptivas da fase industrial emuladas pelo PAISS Industrial são

conduzidas por atores nacionais, os quais empregam elementos fortes do STI-mode. Assim,

intensificando os processos de aprendizagem já presentes nessa fase da produção do etanol e

do açúcar (CORTEZ et al., 2016). Os destaques são:

i) Cana-energia: nova variedade de cana-de-açúcar que em 2017 apresenta cerca de

30 mil hectares plantados, não estando mais em uma escala experimental. Esse novo canavial

é composto por variedades das empresas GranBio e, principalmente, da Vignis. Esta segunda

firma apresenta mais de 10 anos de experiência neste tipo de melhoramento, pois os

proprietários e pesquisadores da empresa são os mesmos que fundaram a Allelixy e

Canavialis. Destaca-se, que ambas participam do PAISS Agrícola.

Existe uma dinâmica interessante dessa nova variedade, que além de ser um trunfo

futuro para o etanol celulósico (MILANEZ et al. 2015; ENTREVISTA VII), hoje está se

mostrando independente do E2G, tendo vida própria. A cana-energia esta sendo testada e já

usada por algumas usinas para estender a safra da cana-de-açúcar (período de funcionamento

da usina), sendo processada no início e no fim da safra. Essa variedade tem dificuldade para

cristalizar o açúcar, mas com o seu caldo é possível fazer etanol e como o início da safra

brasileira é basicamente produção de etanol, então o seu uso cabe. Ademias, seu bagaço esta

sendo utilizado para ampliar o estoque de biomassa para a cogeração de energia, ampliando a

161

Os projetos referidos foram encontrados na carteira de projetos financiados com recursos dos Fundos

Setoriais e no repositório do BNDES. Mas estas bases não foram atualizadas depois do início de 2015, assim,

não foi possível encontrar informações sobre outros projetos ou até mesmo do andamento destes.

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disponibilidade de energia elétrica a ser exportada a rede elétrica (ENTREVISTA VII;

ENTREVISTA X).

ii) Cana-de-açúcar transgênica: as pesquisas e o desenvolvimento conduzido pelo

CTC ao longo da última década resultou no registro da primeira cana transgênica do mundo

(em junho de 2017), saindo à frente das grandes sementeiras transnacionais (Monsanto e

Syngenta). A nova variedade de cana foi desenvolvida pelo CTC, mas uma parte considerável

dos recursos advêm do BNDES e da FINEP, tanto por meio de projetos de pesquisa, como por

meio dos aportes feitos pelo BNDESPar que é acionista da empresa.

Esta nova variedade de cana foi criada a partir da introdução do gene BT, assim, se

aproveitou de um gene de domínio público – estratégia da empresa para não pagar royalties e

se apropriar da maior parte dos rendimentos da inovação (ENTREVISTA VI; ENTREVISTA

X). Com esse gene a nova variedade da cana fica imune a pragas, tais como a broca de cana-

de-açúcar. Esta nova situação permite os produtores reduzirem custos de operação, como uso

de pesticidas e manejos preventivos.

3.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 3

O presente capítulo preocupou-se em expor o quadro evolutivo da institucionalidade

ligada ao setor sucroalcooleiro, destacando as ações ligadas a C&T e ao aprendizado

tecnológico. Assim, conseguiu evidenciar o caráter singular dos anos 2000, momento em que

ocorre uma mudança qualitativa do padrão de intervenção do Estado no setor sucroenergético.

A inovação foi posta na pauta de ações dos agentes públicos e privados.

Esta nova política pública é distinta do padrão de intervenção estabelecido pelo

Proálcool (1975-1990), que se preocupava com a expansão do setor e a regulação dos

mercados regionais. Sua implementação desencadeou o crescimento extensivo do setor

(ampliação da área plantada, aumento da capacidade instalada – ampliação dos equipamentos

– vide capítulo 2). Basicamente, a política da década de 1970/1980 se preocupava com o

crescimento do setor, buscando dar conta da demanda interna por combustível e, também,

criar uma forma de contornar as crises de superprodução ligadas à produção do açúcar

(variações nos mercados internacionais).

As novas ações do Estado em relação ao setor sucroenergético nos anos 2000

mostram-se diferentes; existe uma mudança qualitativa, onde o componente inovativo é

valorizado já no desenho da política. Se a inovação realmente ocorre na realidade econômica,

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179

esta depende de outros fatores (vide capítulo 5), embora o design da política considera esse

elemento como central.

O PAISS Industrial possibilitou pela primeira vez ao SSI da cana-de-açúcar

vislumbrar a possibilidade de realizar incrementos técnicos na fase industrial (financiamento e

direção) e, ainda, a possibilidade de explorar outros nichos de mercado: bioquímicos, energia

elétrica; biofertilizantes; pellets; biocombustíveis avançados. Então, a nova política buscou

ampliação do setor sucroenergético não apenas pela expansão, como as ações da década de

1970/80, mas também pela via de intensificar a economia de escopo e a diversificação de

produtos das usinas.

A nova política implementada pelo Estado brasileiro consegue (mesmo com as

limitações) introduzir a consciência que o Brasil podia ser inovador, pois até então a

estratégia/pensamento dominante é de continuidade na primeira geração (na rota tecnológica

conhecida); assim, o Brasil apostou na formação de uma nova dinâmica para a produção de

biocombustíveis.

Com esta perspectiva, no período de 2006 a 2015 o Brasil apresentou um conjunto

amplo de políticas, do tipo technology-push e de demand-pull, voltadas para o etanol. Em

destaque temos o PAISS (de 2011) e o PAISS Agrícola (de 2014). Tais iniciativas estimulam

os atores inseridos no SSI a agirem sobre a tecnologia, com o intuito de desenvolvê-la. Estes

são programas de fomento estruturados, com linhas mais definidas possibilitando um

direcionamento das pesquisas e dos atores. Trata-se de ações que visam um estágio diferente

do PD&I, objetivando tecnologias industriais e tecnologias agrícolas em um estágio mais

maduro do conhecimento, já na antessala da inovação tecnológica, com linhas de

financiamento para projetos de demonstração e em escala industrial.

O PAISS Industrial colocou o SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol

celulósico de fato, figurando como uma das principais regiões desenvolvedoras/produtoras do

etanol 2G no mundo, com 12% da capacidade industrial mundial instalada (vide tabela 1.1. no

capítulo 1).

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CAPÍTULO 4. A DINÂMICA DO CONHECIMENTO E DA BASE TECNOLÓGICA

DO ETANOL CELULÓSICO: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DOS ARTIGOS

CIENTÍFICOS E DAS FAMÍLIAS DE PATENTES

O presente capítulo tem como objetivo evidenciar a dinâmica tecnológica do etanol

celulósico, trabalhando as bases do conhecimento e da tecnologia que sustentam o “novo”

processo produtivo do bioetanol, dando ênfase à base tecnológica e aos atores que conduzem

o processo de inovação. Tal esforço torna-se relevante diante da composição variada dos

projetos de etanol celulósico no mundo162

, evidenciando o caráter pré-paradigmático que

sustenta essa nova tecnologia (LIMA, 2013; ZILBERMAN et al., 2013; FAPESP, 2015;

MURAKAMI, 2015; GUSTAFSSON et al., 2014; MURAKAMI et al. 2015; SILVEIRA et al.

2015; SILVEIRA et al. 2016).

Destaca-se que esta investigação possibilita compreender as características do

conjunto tecnológico e, principalmente, identificar os atores envolvidos no processo de

desenvolvimento desta tecnologia, percebendo quais são as empresas, as instituições e/ou os

países que se destacam nessa trajetória.

De maneira exploratória, realiza-se um exercício de vigilância tecnológica para

demonstrar a evolução dos esforços em desenvolver o etanol celulósico no Brasil e no mundo

sendo que os detalhes metodológicos e as informações sobre as escolhas realizadas

encontram-se justificadas no capítulo 1 (subtópico 1.3.1.3.). Por meio dos dados de patentes e

de artigos científicos publicados internacionalmente, identificam-se os principais detentores

da tecnologia no Brasil e no mundo, a base de conhecimento que sustenta estas iniciativas e,

ainda, pode-se ter uma clara noção do papel desempenhado pelo SSI da cana-de-açúcar do

Brasil na tecnologia de etanol 2G.

Este olhar exploratório sobre a tecnologia do etanol celulósico serve para identificar a

dinâmica da produção de conhecimento sistematizado e das novas técnicas e processos

relacionados à temática no Brasil e no mundo. Assim, dando contornos concretos aos esforços

das instituições de ensino e pesquisa, das firmas e de outros atores que se dispõem a

desenvolver o etanol celulósico.

162

O relatório apresentado pela UNCTAD (2016) indica a existência de muitos projetos de etanol celulósico no

mundo. Os EUA lideram, com 27 plantas instaladas e 13 em processo de instalação ou planejadas, a União

Europeia conta com 18 plantas instaladas e mais 10 planejadas, o Canadá possui 9 plantas instaladas, e a China

apresenta 12 plantas instaladas. Estas unidades apresentam níveis distintos de integração entre o processo de pré-

tratamento e a hidrólise, diferenciam-se em relação ao tipo de projeto (piloto, demonstrativo, comercial). As

iniciativas em território Brasileiro serão analisadas no capítulo 5.

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A discussão conduzida neste Capítulo é norteada por três questões: 1) quais são os

conjuntos técnicos e de saberes sistematizados que compõem as invenções em etanol de

segunda geração?; 2) quais são os atores mais relevantes no desenvolvimento da tecnologia do

etanol celulósico a partir dos depósitos de patentes e da publicação de artigos científicos?; 3)

por meio da análise dos dados de patentes e de artigos científicos, quais são as capacidades

desenvolvidas pelo SSI da cana-de-açúcar? As respostas a tais questionamentos se interligam

com o quarto objetivo específico da tese, “expor a dinâmica tecnológica do etanol celulósico,

trabalhando as bases do conhecimento e da tecnologia”, por conseguinte, suportando

elementos da resposta da Pergunta de Pesquisa, “quais são os atores/elementos do SSI da

cana-de-açúcar que promovem o progresso técnico do setor na direção do etanol celulósico”

(vide figura 1).

O capítulo encontra-se estruturado em quatro tópicos além da presente introdução. O

primeiro tópico (4.1.) traz as definições a respeito da tecnologia do etanol celulósico,

portanto, trabalha-se com o domínio tecnológico, delimitando as bases do conhecimento e da

tecnologia que compõe o universo do etanol de segunda geração, oferecendo contornos

concretos aos saberes que sustentam as invenções nessa trajetória.

O segundo tópico (4.2.) expõe a dinâmica evolutiva do esforço de desenvolvimento do

etanol celulósico, identificando os períodos de maior atividade no setor e as localidades que se

colocam como lócus da inovação no segmento, determinando quais países e regiões tem se

dedicado ao setor de segunda geração.

O terceiro tópico (4.3.) identifica os principais atores que sustentam este processo,

pontuando quais são as firmas e as instituições de ensino e pesquisa que figuram como

proeminentes nessa atividade. Desta forma, comprova a presença de novos atores no processo

de inovação do setor sucroenergético, os quais demonstram esforço de aprendizado em novas

bases de conhecimento, distinta da trajetória do etanol 1G. Já o quarto tópico (4.4.) sumariza

os principais achados dessa parte da pesquisa, posicionando o Brasil neste debate, além de

construir um link com a discussão teórica que permeia a estruturação da pesquisa, ou seja, a

abordagem de SSI.

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182

4.1. DOMÍNIO TECNOLÓGICO DO ETANOL CELULÓSICO

Os setores econômicos se diferenciam grandemente em termos de conhecimento e

processos de aprendizagem, formando distintos domínios tecnológicos, ou seja, conjuntos de

saberes técnico-científicos específicos às atividades de inovação de cada setor (MALEBA &

ORSENIGO, 1996; NELSON & WINTER, 2005; DOSI, 2006; MALERBA, 2007). Desta

maneira, a agregação destes saberes/conhecimentos economicamente úteis resulta na

estruturação da produção, bem como delimita as fronteiras dos setores e os regimes de

acessibilidade e apropriabilidade da indústria.

Portanto, torna-se imperativo compreender quais são as características do domínio

tecnológico do etanol celulósico, pois este universo é ponto de partida das instituições e das

firmas para atuarem na trajetória tecnológica. A base de conhecimento e a base técnica “dá o

tom” do processo inovativo; igualmente, dita o ritmo das sucessivas interações entre os atores

sociais durante e após a introdução da nova tecnologia (MALERBA, 2002; JENSEN et al.,

2007; LUNDVALL, 2007; GONZALEZ-PERNÍA et al. 2014). Este movimento traz ao

cotidiano da produção novas firmas, novos fornecedores de insumos e de tecnologias e,

principalmente, novos arranjos tecnológicos, baseados em novos conhecimentos e processos

de aprendizagem (MALERBA, 2002; DOSI, 2006).

Essa dinâmica é um reflexo eminente do esforço inovativo, tendo como implicação a

transformação estrutural dos setores econômicos. E, quanto mais radical é a nova tecnologia,

maior será a mudança setorial, podendo este se modernizar ou desaparecer163

(MALERBA,

2002; ROSENBERG, 2006; FREEMAN & SOETE, 2008).

A tecnologia de produção do etanol celulósico tem por definição a capacidade de

extrair os açúcares contidos na estrutura celular das plantas, logo, realiza a “quebra” das

ligações glicosídicas que em suma formam a parede celular (celulose-hemecelulose-lignina).

Este desmonte da estrutura microcelular, libera os açucares, tais como a glicose e a xilose.

Estes açúcares são utilizados como insumos para diversos processos industriais, dando origem

aos biocombustíveis de segunda geração e os bioquímicos.

Como já sumarizado no capítulo 1 (seção 1.2.) esse processo de conversão da

biomassa só é possível pela introdução de um novo arranjo técnico-científico, que apresenta

um caráter disruptivo em relação à tecnologia estabelecida (1G). Este fato alterar toda a

163

Toda a discussão teórica e estudos de caso que descendem do conceito de “destruição criadora” cunhado

por Schumpeter (1912) dão base para refletir sobre essa dinâmica.

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dinâmica de produção do etanol ora estabelecida, pois introduz conhecimentos científicos e

técnicos que estão à margem das competências tradicionais do setor sucroalcooleiro (vide

figura 4.1. e 4.2.).

A apreciação dessa dinâmica - desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico –

alimenta o entendimento sobre as mudanças exigidas pela própria tecnologia, a qual só pode

se efetivar com a alteração da base de conhecimento na fase industrial do setor

sucroalcooleiro, pois se supõem que a tecnologia força um deslocamento do exclusivismo

DUI-mode para um padrão intermediário, visando o STI-mode, pois os elementos necessários

para estruturação da produção de segunda geração estão em outro nível, diferenciando-se da

trajetória traçada pelo etanol de primeira geração.

Ao trabalhar as bases do domínio tecnológico do etanol celulósico percebe-se as

diferenças e o que realmente muda entre as trajetórias de 1G para a de 2G. Além disso,

caracterizar as bases da nova tecnologia e toda a sua dinâmica (evolução, distribuição

geográfica e os principais atores164

), possibilita identificar o que há de novo nessa fase do

processamento da biomassa. Essa postura justifica-se como parte integrante do objetivo

central da pesquisa “identificar, caracterizar e analisar o desenvolvimento e a introdução da

tecnologia de segunda geração no SSI da cana-de-açúcar”. Desta forma, operacionaliza-se

elementos do real com as categorias analíticas da abordagem de Sistemas Setoriais de

Inovação (building blocks), tais como o knowledge base / basic Technologies indicadas por

Malerba (2002).

Para identificar as características básicas do domínio tecnológico do etanol celulósico

recorre-se à análise dos artigos científicos publicados internacionalmente, utilizados como

proxy dos conhecimentos científicos ligados a esta tecnologia. Por outro lado, trabalha-se

conjuntamente com os depósitos de famílias de patentes, visando dar contornos reais as

invenções tecnológicas já “disponíveis”, expondo os principais conceitos que circundam essa

tecnologia e, ainda, quais são os grupos de tecnologias mais relevantes (clusters), os micro-

organismos e os feedstocks que recebem maior atenção e, os processos produtivos que

angariaram maiores investimentos ao longo da última década165

.

164

Todos estes elementos são trabalhados em detalhes nos próximos subtópicos, respectivamente 4.2 e 4.3. 165

O material levantado e o conjunto de dados reunidos nesta etapa de pesquisa são apenas parcialmente

explorados nesse capítulo, buscando utilizar somente as informações relevantes para dar conta do que foi

proposto na tese, mas, destaca-se que o banco de dados formado por esta pesquisa possibilita outras tantas

análises sobre a dinâmica do conhecimento e da tecnologia ligada ao etanol celulósico, assim, aventa-se

desenvolver novas pesquisas com base nesta sistematização inicial.

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A figura 4.1. indica as áreas do conhecimento científico que ao longo do tempo

dedicaram maior atenção aos problemas e potenciais do etanol celulósico. Observando tanto a

amostra como um todo (7.056 artigos) ou somente os artigos publicados por instituições e

firmas brasileiras (509 artigos) percebe-se um grande peso da Bioquímica, da Genética, da

Biologia Molecular, da Imunologia e da Microbiologia, áreas do conhecimento que juntas

representaram 33% do total dos artigos científicos publicados no plano internacional.

Figura 4.1. Áreas do conhecimento que se dedicam a temática do etanol celulósico.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.

É importante notar na figura 4.1. que existe uma coincidência entre as áreas de

pesquisas no mundo e no Brasil, mostrando uma sintonia entre as temáticas que estão

relacionadas ao SSI da cana-de-açúcar e as conduzidas por instituições internacionais. Esse

quadro também indica um esforço da estrutura nacional em acompanhar a dinâmica mundial,

dado que proporções de importância entre as áreas se mantém na escala nacional semelhante a

internacional.

Nota-se que os campos de estudo são ligados às pesquisas desenvolvidas na fronteira

do conhecimento, disciplinas que cresceram impressionantemente a partir da segunda metade

do século XX e continuam em franca expansão (ZILBERMAN et al, 2013). Estas quando se

ligam ao mundo da produção, sempre demandam altos dispêndios em P&D e mão-de-obra

altamente qualificada, fato que desenvolve segmentos econômicos e/ou firmas intensivas em

conhecimento.

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Ainda observando a figura 4.1. percebe-se outras áreas do conhecimento que se não

estão na dianteira do conhecimento, são áreas tradicionais do desenvolvimento técnico e

apresentam historicamente igual importância, demandando esforços significativos em P&D

(adaptação, escalonamento e etc.), estas são: engenharia química (18%); química (6%) e

engenharias (4%) e ciências dos materiais (3%).

A figura 4.2. identifica os campos tecnológicos do etanol celulósico, obtidos por meio

da análise das famílias de patentes (2.937); logo de início é possível perceber forte relação

com as áreas do conhecimento expostas pela figura 4.1. (artigos científicos). A Biotecnologia

abarca 69,1% das tecnologias protegidas, mostrando que os conhecimentos provenientes desta

área, que incluem Bioquímica, Genética, Biologia Molecular e Microbiologia, estão presentes

na sustentação dos esforços de desenvolvimento do etanol celulósico.

Figura 4.2. Campos tecnológicos do etanol celulósico - 2.937 famílias de patentes.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.

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As Figuras 4.1. e 4.2. indicam que as tecnologias dominantes estão correlacionadas

aos setores de intensa atividade em P&D e com forte relação com a ciência. Isso sugere que a

base de conhecimento vem se alterando, estabelecendo relações com áreas do conhecimento e

setores econômicos que dialogam diretamente com a Genética e a Biologia Molecular,

ocupando os lugares da Metalurgia e da Mecânica, então conhecimentos chaves no processo

de expansão da produção de etanol de primeira geração ao longo de todo o século XX. Este

fator é totalmente novo se levarmos em consideração o histórico de desenvolvimento do setor

sucroenergético, o qual introduz suas inovações na fase industrial do processo produtivo por

meio do DUI-mode166

, principalmente a partir de melhorias incrementais dos equipamentos

industriais (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013).

Percebe-se que a biotecnologia tem sido a base da tecnologia do etanol celulósico e

este arcabouço de conhecimento amplia consideravelmente a variabilidade disponível de

métodos para a produção do etanol, não em relação à destilação que continua basicamente a

mesma, mas na forma e na quantidade de obtenção de açúcares provenientes da biomassa que

são colocados à disposição da fermentação, bem como a própria fermentação que pode contar

com leveduras geneticamente modificadas.

Assim, a fase industrial do setor sucroalcooleiro passa por uma reestruturação na sua

base de conhecimento, que possibilita, em última instância, ampliar sua capacidade produtiva

por intermédio da utilização de novos métodos de pré-tratamento, hidrólise e fermentação,

dados pela engenharia genética, pela química orgânica fina e por outras subáreas do

conhecimento das ciências naturais.

Com isso, adverte-se que a proeminência no setor, pelo menos no que diz respeito à

tecnologia, depende da apropriação destes conhecimentos e precisamente nesse quesito que os

países periféricos apresentam maiores dificuldades (vide figura 4.4 e 4.5.). As firmas

brasileiras envolvidas no setor sucroenergético, tanto de bens de capital como as

processadoras de cana, não figuram como players globais nesses segmentos, nem ao menos

apresentam estruturas técnicas para conduzir P&D nessas áreas do conhecimento.

Isso em parte é dado pelo processo de desenvolvimento do setor, baseado em

tecnologias de domínio público e processos de aprendizagem calcados no DUI-mode, mas,

166

Os trabalhos já citados de Negri (1981); Liboni & Toledo Jr (2008); Negri (2010); Valente (2012); Varricho

(2012); Oliveira Filho (2013) e Salles-Filho (2015) ilustram o processo de aprendizagem das firmas de bens de

capital do setor sucroenergético e apresentam contornos ao processo de introdução de inovações no SSI da cana-

de-açúcar na fase industrial, fortemente ligadas ao DUI-mode.

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por outro lado, evidencia o caráter atrasado da indústria nacional, que não acompanha o

desenvolvimento tecnológico próximo à fronteira. Assim, as firmas nacionais posicionam-se

como incorporadoras de tecnologias estrangeiras e, ao adquirir pacotes tecnológicos

“fechados”, acabam por vivenciar diversos problemas167

(CEPAL, 2002; CGEE, 2006).

A crítica também deve abrir espaços para as exceções, pois o Brasil apresenta esforços

nesse campo tecnológico, tanto no que diz respeito às firmas, como das instituições de ensino

e pesquisa (vide figuras 4.3, 4.4 e 4.5.). O grande problema é a envergadura e a profundidade

dessas iniciativas, que geralmente seguem trajetórias já iniciadas pelos atores estrangeiros ou

ações adaptativas, ocorrência perfeitamente compreensível e importante para os países

periféricos, mas insuficiente para engendrar processos de desenvolvimento de longo prazo e

autônomos.

Pensando na liderança tecnológica e nos desdobramentos positivos que existem no

desenvolvimento das tecnologias endógenas, as iniciativas que se configuram como exceções

deveriam ser intensificadas e multiplicadas, visto que:

i) O desenvolvimento externo não se preocupa com as questões específicas do setor,

assim, não possibilita expansões e modernizações adequadas às realidades geográficas e

sociais dos países periféricos (Brasil);

ii) A geração de tecnologias domésticas adensa os setores econômicos, pois gera

empregos de maior qualidade, novos negócios e aumenta o processo de acumulação

capitalista, o qual bem alinhavado com um sistema justo de redistribuição e

“retroalimentação” dos novos ciclos virtuosos pode gerar desenvolvimento econômico e

social de proporções regionais e nacionais (MAZZUCATO, 2013).

Ações como as do CTBE; CTC e GranBio apresentam caminhos “alternativos” para a

superação dessa condição subalterna na dinâmica da inovação, pois estes atores buscam saídas

para os problemas locais, com esforços de P&D voltados às especificidades do setor, tanto no

que diz respeito à pesquisa básica, como nos projetos de desenvolvimento tecnológico em

parcerias com as firmas do SSI da cana-de-açúcar168

.

167

Esta discussão é retomada no capítulo 5 por meio do exame dos projetos industriais de etanol celulósico no

Brasil. 168

Estes atores apresentam diversas iniciativas que qualificam as ações do SSI da cana-de-açúcar na trajetória do

etanol celulósico, tais como: pesquisas para desenvolvimento de coquetel enzimático; elaboração de

métodos/processos para a produção de enzimas onsight; desenvolvimento de leveduras transgênicas;

desenvolvimento de cana-energia; construção e operação de plantas industriais de etanol celulósico (escala

piloto, demonstração e comercial); estabelecem diversas parcerias em etanol celulósico e química verde, tanto

com empresas como outras instituições. Estes e outros elementos serão abordados no capítulo 5.

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4.2. A DINÂMICA DO CONHECIMENTO E DA TECNOLOGIA DO ETANOL

CELULÓSICO: EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO ESFORÇO DE

DESENVOLVIMENTO

O desenvolvimento de um novo conjunto tecnológico demanda múltiplas ações de

diversos atores, os quais realizam iniciativas individuais e ações colaborativas, tanto em

direções convergentes como divergentes. A incerteza e os riscos fazem parte desse processo,

assim, os arranjos entre os atores e a intensidade dos esforços são variados entre os países e as

regiões, sendo que a robusteza das políticas públicas é fundamental para ditar o ritmo dessa

dinâmica - como já mostrado no capítulo 3. Desta forma, nota-se que os picos de “esforços”

dessa trajetória tecnológica coincidem com a implementação de ações institucionalizadas na

temática dos biocombustíveis e com a alta dos preços do barril do petróleo no mercado

internacional (vide figuras 4.3. e 4.4.).

Os dados da dinâmica do conhecimento são traduzidos pela evolução e pela

distribuição espacial dos artigos científicos publicados internacionalmente; a figura 4.3.

apresenta contornos concretos dessa atividade. A outra face do progresso técnico é dada pela

evolução dos depósitos de famílias de patentes, conforme figura 4.4. Tanto do lado do

conhecimento científico como do lado das invenções tecnológicas percebe-se que o progresso

da trajetória tecnológica do etanol celulósico ocorre em escala global e é um fator novo no

cenário das energias renováveis, pois acelerações das publicações e dos depósitos ocorrem na

segunda metade da década de 2000.

A figura 4.3. faz uma síntese da dinâmica dos artigos científicos relacionados à

temática do etanol celulósico. A amostra analisada é de 7.056 artigos, sendo que destes 509

artigos são de origem brasileira, ou seja, provenientes de instituições ou firmas brasileiras. A

distribuição espacial do conhecimento científico do etanol celulósico segue principalmente

três características:

i) A produção científica concentra-se em países que tradicionalmente lideraram a

produção científica mundial, tais como EUA (1.764), China (1.015), Japão (454) e

Coréia do Sul (335);

ii) Existe produção científica expressiva em países que se dedicam a produção de

bioenergia ou em países que apresentam tradição no processamento da biomassa,

mesmo que para outros setores (alimentício, papel e celulose), estes são: Índia (512),

Brasil (509), Suécia (330), Canadá (291), Austrália (100) e Finlândia (95);

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iii) Países em desenvolvimento figuram como importantes localidades de produção

de conhecimento científico sobre o segmento: China, Índia e Brasil; não obstante,

outros países em desenvolvimento também acompanham essa discussão, mesmo com

certa “distância”, Malásia (93), Tailândia (93), Irã (88), África do Sul (85) e México

(81).

É importante notar que os EUA e o Brasil se encaixam em mais de uma racionalidade,

pois além de apresentarem estruturas científicas desenvolvidas, mesmo que obviamente não

equiparáveis, são os maiores produtores de etanol do planeta. Assim, o interesse de pesquisa

segue uma relação com a base produtiva, neste caso, uma produção de conhecimento que vai

além da base produtiva atual (etanol de primeira geração), conhecimentos desenvolvidos na

fronteira do conhecimento e que de maneira correlacionada abrem espaços para novos

negócios.

Esta relação não é linear e nem sempre verdadeira, mas mesmo no Brasil, encontram-

se alguns casos exitosos, os quais descendem diretamente dessa produção do conhecimento,

por exemplo, a Vignis ou a GranBio, ambas empresas de base tecnológica que atuam no

segmento de etanol celulósico.

Outra característica notável na distribuição espacial do conhecimento científico

relacionado ao etanol celulósico é a grande relevância dos países em desenvolvimento, pois

entre os cinco primeiros países, três são países periféricos (China, Índia e Brasil) e outros

tantos estão muito próximos de países desenvolvidos, com estruturas científicas superiores -

França (178) e Alemanha (157). Esta constatação indica que a temática da bioenergia é uma

oportunidade e uma rota possível para as nações em desenvolvimento não só participarem do

desenvolvimento científico e tecnológico, mas, também desenvolverem tecnologias e setores

econômicos adaptados às suas condições naturais (economias baseadas em recursos naturais).

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Figura 4.3. Evolução dos artigos científicos publicados em periódicos internacionais e os

principais países em publicação na temática do etanol celulósico.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.

Por outro lado, a expressividade da produção de conhecimento não se reflete

diretamente na produção de novas tecnologias (patentes), que continuam fortemente

concentradas no centro do sistema capitalista169

, como fica nítido nas figuras 4.4. e 4.5. Tais

dados mostram, mais uma vez, que a geração de conhecimento de qualidade não é condição

suficiente para gerar desenvolvimento tecnológico relevante, sendo necessários outros

elementos, tais como as políticas públicas de sustentação dos novos setores e de adensamento

do Sistema Setorial de Inovação, situação que é analisada ao longo desta pesquisa.

O caso brasileiro mostra-se inserido nessa situação; mesmo aparecendo como grande

produtor de biocombustível, o país não figura como um proeminente desenvolvedor de

tecnologia de segunda geração. Entretanto, os dados que se seguem e toda a discussão do

capítulo 5 indicam que nem tudo é terra “arrasada”, pois o Brasil não lidera em artigos

científicos e muito menos em depósitos de patentes, mas apresenta algumas ações

contundentes na trajetória do etanol celulósico, que o colocam em situação de pelo menos

acompanhar a trajetória tecnológica e concorrer no segmento bioenergético.

A figura 4.3. indica que mesmo o Brasil não liderando a produção de artigos

científicos, sua proeminência não deve ser desvalorizada. Os trabalhos de Perrone et al.

169

Com exceção da China.

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(2011) e Souza et al. (2015) corroboram com essa visão, ao indicar que a produção científica

brasileira ocupa a terceira posição em número de publicações de artigos científicos. Tal

situação torna-se relevante se considerando o desempenho em outros segmentos ou da ciência

brasileira como um todo, como apontam os trabalhos de Brito Cruz & Pacheco (2004) e Brito

Cruz (2010).

A dinâmica temporal da produção de conhecimento científico sobre etanol celulósico

tem seu início em 1950170

, a partir de um artigo sobre a separação da lignina. Entretanto, a

quantidade de artigos até a década de 1970 permanece abaixo de uma dezena por ano, só

passando a figurar na agenda de pesquisa mundial após os choques do petróleo (1973 e 1979).

Mesmo com o aumento absoluto das publicações, o seu crescimento é modesto, só

apresentando um novo salto no ano de 2006, quando as publicações finalmente alcançam as

centenas por ano, a partir daí a curva se eleva de maneira significativa, saindo de 130 artigos

em 2006 para 713 em 2016, uma elevação de quase 6 vezes o valor atingido uma década atrás

(artigos por ano).

O caso brasileiro segue a mesma tendência, apresentando crescimento expressivo em

meados da década de 2000, com a curva se acentuando a partir de 2006; neste ano o Brasil

apresentou 6 artigos publicados contra os 91 artigos publicados no ano de 2016, um número

quase 15 vezes maior que o atingido no início da década (artigos por ano). Esses dados

reforçam o caráter de novidade da temática e sua origem recente na agenda de pesquisa

nacional (última década).

Obviamente iniciativas pontuais já existiam antes de 2006, mas o crescimento do

esforço nacional na última década sugere que a criação dos programas de pesquisa e o planos

nacionais de CT&I imprimiram um novo fôlego às iniciativa já em curso. De positivo,

criaram consensos em relação aos biocombustíveis e determinaram linhas de pesquisas e/ou

chamadas específicas para o segmento, fato que ampliou a produção científica nacional ligada

ao setor sucroalcooleiro, adensando a cooperação entre as instituições nacionais e criando

conexões com instituições estrangeiras.

Uma interpretação possível é analisar conjuntamente os dados de evolução do

financiamento público para projetos de pesquisa (vide figuras 3.1 e 3.2. no capítulo 3) com os

dados de publicações de artigos científicos publicados internacionalmente (vide figura 4.3).

Esta sobreposição analítica corrobora com a identificação da evolução quantitativa e

170

Artigo publicado no Journal of the American Chemical Society, com o título “Experiments on the

fractionation of isolated wood lignins”. Os artigos da amostra iniciam-se em 1950 .

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192

qualitativa dos resultados dos projetos de pesquisa na temática do etanol celulósico. É

possível identificar a elevação dos números de artigos acompanhando o número de iniciativas

de fomento, situação apenas presente nos anos 2000, gerando sinergias importantes para o SSI

da cana-de-açúcar. Os exemplos abaixo ilustram este fato:

i) Nei Pereira Junior (UFRJ) aparece como autor/coautor de 18 artigos

publicados internacionalmente (ocupando a primeira posição na amostra). E,

entre 2006 e 2012, foi coordenador de dois projetos financiados pela CNPq, na

temática do etanol celulósico, totalizando R$ 701.860, 73;

ii) Rubens Maciel Filho (Unicamp) apresenta 14 artigos e entre 2002 e 2015

apresentou como coordenador de projetos de pesquisa 10 projetos financiados

pela FINEP e CNPq, dos quais 2 eram voltados a temática do etanol celulósico,

totalizando R$750.000;

iii) Igor Polikarpov (USP) conta com 12 artigos publicados internacionalmente na

temática do etanol celulósico e entre os anos de 2004 e 2015 coordenou 7

projetos financiados pela FINEP e CNPq, no entanto, apenas 4 eram ligados ao

etanol celulósico, o que totaliza R$ 4.355.898.

Estes exemplos poderiam ser desdobrados em mais exemplos, detalhando os efeitos

das políticas públicas em relação ao desenvolvimento de conhecimento e capacidades

tecnológicas para o SSI da cana-de-açúcar, pois existe uma convergência temporal e temática

entre os projetos financiados e os artigos publicados (vide figura 3.1. e 4.3.). É por meio do

estabelecimento de políticas e instrumentos de aporte ao conhecimento científico e ao

desenvolvimento tecnológico que um país pode lograr ganhos de competências, visando dar

conta dos seus problemas específicos.

Quanto à dinâmica da tecnologia, a figura 4.2. evidencia o caráter recente e inovador

contido nos projetos de produção do etanol celulósico, pois comparando os números da

década de 1990 com os anos 2000, vê-se que o esforço sistematizado de desenvolvimento

dessa trajetória acelera-se apenas na última década. Tal situação vale igualmente para o Brasil

(vide figura 4.5.).

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193

O interesse pela ciência e pela tecnologia do etanol celulósico é um fenômeno dos

anos 2000, motivado pelas oportunidades do contexto – discussões sobre as mudanças

climáticas; controle das emissões; elevação dos preços internacionais do petróleo; bem como

pela “recente” disponibilidade de novas tecnologias (GUSTAFSSON et al., 2014).

Figura 4.4. Evolução dos depósitos de patentes e os principais países/regiões de proteção das

invenções em etanol celulósico.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.

A figura 4.4. resume a dinâmica dos esforços tecnológicos voltados ao etanol

celulósico, proporcionando contornos reais ao aumento das tecnologias no mercado. Assim,

destaca a evolução dos depósitos de famílias de patentes, as quais ganham proeminência a

partir da segunda metade dos anos 2000, atingindo o seu pico de depósitos de famílias de

patentes no ano de 2013, com 568 famílias de patentes depositadas no mundo (priority years).

De certa maneira, a realidade do desenvolvimento tecnológico segue uma tendência evolutiva

semelhante aos artigos científicos, pois no ano de 2005 apresentou o depósito de 59 famílias

de patentes e no ano de 2006 apresentou 148, quase triplicando o valor.

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194

Os depósitos aumentaram significativamente, ano após ano, até se estabilizar em 2011

com 548 depósitos de famílias de patentes, estabelecendo um crescimento vegetativo até

2013. Já nos anos subsequentes, ocorre um movimento regressivo, atingindo em 2016 apenas

197 famílias de patentes depositadas (vide figura 4.4.). Tal situação mostra-se diferente da

dinâmica dos artigos científicos, os quais sempre são crescentes (vide figura 4.3.).

A dinâmica atual dos depósitos de patentes indica uma estabilização na corrida

tecnológica do etanol celulósico, dados estes que corroboram as informações e impressões

obtidas em campo (ENTREVISTA VII; CAMPO V), pois o presente momento é

caracterizado pela aprendizagem, pela adaptação e pelo melhoramento das tecnologias

recentemente colocadas em uso em escala industrial. Assim, a euforia característica do início

dos anos 2000, deu lugar a um processo de reavaliação das metas de produção, de expansão e

de novos investimentos. Portanto, compreende-se que este momento em compasso lento (de

espera) é resultado dos entraves técnicos171

encontrados nas primeiras iniciativas de produção

do etanol celulósico172

.

Este hiato é característico de momentos subsequentes à introdução de novas

tecnologias ou novos produtos, nos quais as instituições e, principalmente, as firmas

aguardam melhoramentos futuros para realizarem novos investimentos. Rosenberg (2006)

compreende que esta característica é própria da natureza descontínua da inovação tecnológica;

a incerteza não é apenas gerada pelas inovações tecnológicas em outros pontos da economia

ou por situações dos contextos, “mas pelo aperfeiçoamento ulterior da tecnologia cuja

introdução está no momento sendo considerada” (ROSENBERG, p.167, 2006).

Este fato não autoriza dizer que a dinâmica tecnológica cessou, pelo contrário,

encontra-se em um estágio de ajuste e de escalonamento, que pode e deve resultar em novos

processos de aprendizagem. De tal modo, se os novos gargalos práticos e operacionais forem

compreendidos e equacionados novos dados e demandas do cotidiano da produção devem

retroalimentar à dinâmica da pesquisa e do desenvolvimento do setor bioenergético de

segunda geração173

.

171

Os problemas com as tecnologias em uso no Brasil serão explorados com maiores detalhes no capítulo5. 172

Situação que se soma as condições de incertezas dos mercados, provocadas pela crise política brasileira e/ou

pelo efeito Trump nos EUA. 173

Rosenberg (2006) destaca que gargalos na produção podem influenciar e ditar novas agendas de pesquisa, que

inauguram novos campos do conhecimento humano, retroalimentado o desenvolvimento tecnológico. Segundo o

autor, a história da tecnologia – a máquina a vapor ou o processo de fermentação para a produção de vinhos –

percebe-se que nestes “...um conhecimento científico de grande generalidade originou-se de um problema

particular num contexto limitado.” (ROSENBERG, p. 217, 2006).

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195

O decréscimo do número de depósitos indica que o avanço na fronteira tecnológica se

estabilizou, pois as expectativas iniciais de domínio tecnológico não se concretizaram e os

problemas encontrados hoje não são os problemas que estavam no planejamento inicial

(ENTREVISTA VII; ENTREVISTA VIII; ENTREVISTA X). Mesmo isso sendo uma

tautologia por definição, os principais problemas que estão ocorrendo não são em áreas mais

sensíveis à ciência (como a hidrolise enzimática ou a fermentação das pentoses), mas estão

nos equipamentos e no processo produtivo, situações tidas como superadas, uma vez que tais

processos eram utilizados na indústria de papel e celulose.

A figura 4.4. indica também a distribuição geográfica do esforço tecnológico na

trajetória do etanol celulósico, os principais locais de patenteamento são: i) os centros que se

relacionam com a produção e/ou consumo do etanol de primeira geração; ii) locais que

apresentam empresas multinacionais fortemente ligadas aos conjuntos tecnológicos que se

destinam a compor a rota tecnológica de segunda geração (biotecnologia e bens de capital

voltados a papel e celulose); iii) centros tradicionais de comercialização de novas tecnologias,

os quais normalmente aparecem nas buscas, independentemente do tipo de tecnologia que se

aborda [World Intellectual Property Organization (WO); Japão (JP); Coréia do Sul (KR) e

EUA (US)].

A análise da figura 4.4. complementada pela figura 4.5. é possível enxergar a

discrepância entre os países no que diz respeito à execução da P&D e a “simples” proteção

intelectual da invenção estrangeira. Na parte inferior da figura 4.4. apresenta-se a distribuição

dos depósitos das famílias de patentes levando em conta o país prioritário, isto é a localidade

que recebeu o primeiro depósito (priority coautry)174

e a expansão geográfica da proteção, ou

seja, novas áreas onde a mesma invenção encontra-se protegida (publication country). Com

isso, constata-se que as atividades de P&D relacionadas à tecnologia do etanol celulósico

concentram-se nos EUA (1.343), China (1.007) e no European Patent Office (173), sendo que

estas três localidades juntas representam 85,9% da “origem” das famílias de patentes do

universo amostral de 2.937 famílias de patentes.

Sem dúvida o caso chinês deve ser olhado com maior atenção, pois se trata de um país

em desenvolvimento e que tradicionalmente não se relaciona ao segmento bioenergético. É

importante tomar nota de algumas particularidades sobre as patentes depositadas

174

A localização da P&D é dada pelo número de depósitos no país prioritário, pois a literatura sugere que este

tipo de informação é uma proxy desta atividade vide OECD Patent Statistics Manual (2009).

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prioritariamente na China: a) os maiores depositantes são as universidades e as instituições de

pesquisa chinesas; b) existe uma firma chinesa que aparece com grande protagonismo, a

China Petroleum & Chemical (Sinopec), com 113 famílias de patentes175

; quantitativamente

fica atrás apenas da Novozymes que apresenta 165 famílias de patentes. Mas é digno de nota

que destas 113 famílias de patentes da Sinopec apenas duas estão protegidas fora da China,

uma no escritório norte americano e uma no World Intellectual Property Organization – este

fato se repete com outros atores chineses, indicando que estas invenções são novidades apenas

para China, ou são de “baixa” qualidade ou específicas para a realidade chinesa.

Tanto os EUA como a Europa são tradicionais áreas de desenvolvimento tecnológico,

assim, é de se esperar protagonismo destes país/região. Além disso muitas das multinacionais

que passaram a atuar no segmento bioenergético nos anos 2000 têm sua origem ou localizam

os seus centros de P&D nos EUA ou em países europeus176

, como a Novozymes, DSM, e

Dupont exemplificam essa concentração.

Com exceção óbvia da China, os países em desenvolvimento e subdesenvolvidos

apresentam pouca expressividade como localidades de P&D no segmento de etanol

celulósico, mas, já no que se refere à expansão da proteção intelectual das invenções, a

situação se altera, ficando nítida na análise das figuras 4.4 e 4.5.. Estes países são

compreendidos como áreas de interesse, nas quais as multinacionais desejam explorar a

tecnologia comercialmente, tornando-se mercados futuros para as novas tecnologias.

O caso brasileiro encaixa-se perfeitamente nessa dinâmica. O país apresenta 47

depósitos prioritários de famílias de patentes, contra 517 depósitos não prioritários, os quais

em tese têm origem em outras localidades (tecnologia estrangeira). Isso equivale a dizer que

apenas 1,6% das famílias de patentes da amostra foram depositadas prioritariamente no

Brasil, ou seja, menos de 2% de todo o esforço tecnológico sistematizado (P&D) em etanol

celulósico no mundo foi feito no Brasil; o mesmo não ocorre com as publicações científicas,

em que o Brasil responde por 7% da produção de conhecimento sistematizado177

.

Tal situação não ocorre apenas no Brasil; Índia, México e Canadá apresentaram este

mesmo comportamento (vide figura 4.4.). A princípio, era de se esperar que o Brasil, sendo o

segundo maior produtor de etanol do mundo e com mais de 40 anos de experiência na

175

Certamente essa dinâmica merece maior reflexão, a qual foge do escopo dessa pesquisa. 176

No capítulo 2 e no subtópico 4.3 desse capítulo apresentam-se dados e informações sobre a participação

destes novos atores. 177

Em Perrone et al. (2011) o Brasil é responsável por 10% das publicações.

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197

produção de biocombustíveis, revelasse um desempenho mais significativo na atividade

inovativa. Estes dados traduzem parte do atraso tecnológico e do baixo protagonismo

brasileiro no cenário mundial.

Analisando as figuras 4.4. e 4.5. percebe-se que o Brasil comporta-se muito mais

como mercado para as novas tecnologias do etanol celulósico do que lócus de

desenvolvimento tecnológico. O país é uma das principais localidades de interesse em

proteger a tecnologia de segunda geração, sendo o 3ª no ranking de patenteamento

(publication country), atrás apenas dos EUA e da China (os maiores desenvolvedores). Esta

posição secundária na dinâmica de desenvolvimento é uma constante na análise do

desempenho do Sistema Nacional de Inovação brasileiro, que nesse caso em particular

descende resumidamente de dois fatores:

a) O SNI brasileiro, bem como, dos países periféricos sofrem com as Falhas

Sistêmicas (KATZ, 1993; LALL & TEUBAL, 1998; CHAMINADE et al., 2009), isso

decorre da carência de organização entre os atores (firmas-ICTs-Universidades); da

ausência de setores dinâmicos ou de pesquisa em rotas tecnológicas inovadoras

(deficiência de competências); baixa interatividade entre os atores e entre o plano

nacional e o internacional e; ausência de atores, situação comum em áreas específicas

e/ou que são intensivas em conhecimento, por exemplo, o Brasil não apresenta um

conjunto de firmas no segmento de biotecnologia – fato já pontuado no capítulo 3, por

meio da dificuldade de encontrar firmas nacionais para desenvolver projetos de

inovação no PAISS Industrial (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X) – situação que

atrapalha a interiorização do desenvolvimento tecnológico na rota do etanol celulósico;

b) Ademais, as competências acumuladas ao longo dos últimos quarenta anos

concentram-se em uma rota tecnologia distinta do etanol celulósico (vide figuras 4.1. e

4.2.). Toda a produção de etanol no Brasil é feita por meio do processo de extração do

caldo da cana-de-açúcar (beneficiamento da sacarose), padrão secular de produção do

açúcar e de seus derivados. O E2G está assentado em uma rota tecnológica

completamente diferente, beneficiamento da glicose e da xilose, açúcares que só podem

ser acessados por meio do desmonte da estrutura celular que evoluiu ao longo de

centenas de milhares de ano justamente para protegê-las.

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Figura 4.5. Evolução dos depósitos de famílias de patentes no Brasil e a origem do P&D das

invenções protegidas no Brasil.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbiti, 2017.

A figura 4.5. expõe nominalmente a origem da P&D das tecnologias salvaguardadas

pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial); dentre estas, os EUA concentram

grande parte desta atividade, com 73,9% da origem da P&D. Vale destacar que muitas das

patentes presentes no Brasil vêm por meio do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes

(PCT), um acordo multilateral que permite requerer a proteção patentária de uma invenção

simultaneamente, em um grande número de países, por intermédio do depósito de um único

pedido internacional de patente; esta forma de proteção representa 90% do total de famílias de

patentes depositadas no Brasil. Assim, abrangendo boa parte das patentes depositadas

prioritariamente nos EUA e nos países europeus.

Analisando a figura 4.5. percebe-se que a dinâmica evolutiva dos depósitos no Brasil

acompanham a tendência geral, se intensificando a partir da segunda metade dos anos 2000,

movimento que ocorre em parte pela forte presença de famílias de patentes via PCT. Por outro

lado, em uma escala mais modesta, têm-se o aumento (proporcional) de depósitos de famílias

de patentes prioritárias no Brasil, as quais se ligam não apenas ao contexto, mas, também ao

estabelecimento das novas políticas públicas pró setor sucroenergético. Tal afirmação não é só

baseada na coincidência temporal do depósito e da execução das políticas, visto que as

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detentoras das patentes são as mesmas instituições e firmas que foram alvos dessas ações

institucionais.

Como exemplos dessa sinergia, destacam-se os casos da Biocelere Agroindustrial e da

Braskem, as quais foram contempladas em mais de um tipo de iniciativa, recebendo recursos

tanto da FINEP e como da FAPESP/PITE/PIPE e, hoje contam, respectivamente, com 4 e 3

famílias de patentes em etanol celulósico.

Os novos investimentos em tecnologias no setor sucroalcooleiro, principalmente no

que tange a realidade do etanol 2G, tiveram como prelúdio as ações desencadeadas pelas

políticas públicas, tais como o Plano Nacional de Agroenergia; os Programas de Pesquisa da

FAPESP ou PAISS Industrial, sendo verdadeiros enforcement na construção de janelas de

oportunidades para os atores brasileiros, direcionando o desenvolvimento de uma nova

trajetória tecnológica para produção do etanol, bem como ações em bioquímicos a partir da

biomassa de cana-de-açúcar.

Desta forma, o entorno da produção do etanol vêm se transformando, assim como se

transforma a sua base de conhecimento, os agentes envolvidos no processo de

desenvolvimento e introdução da tecnologia, as redes de relacionamentos entre as instituições

e/ou as firmas e, principalmente, o arcabouço institucional setorial, conforme visto nos

capítulos 2 e 3 (coevolução do SSI), em que a temática da inovação e o adensamento do

conhecimento científico passaram a fazer parte da realidade do setor.

Esse cenário sugere, conforme a abordagem desenvolvida por Malerba (2002; 2003),

que as fronteiras do SSI da cana-de-açúcar estão em processo de evolução. Todos os dados e

informações organizados por essa pesquisa buscam demonstrar essa dinâmica, mas em

particular, o presente capítulo oferece contornos reais à nova base de conhecimento e aos

atores que detém competência técnicas e científicas nessa nova trajetória.

4.3. OS PRINCIPAIS ATORES DO ETANOL CELULÓSICO: FIRMAS E

INSTITUIÇÕES DE ENSINO E PESQUISA

Nesta seção identificam-se quais são os atores mais relevantes no desenvolvimento da

tecnologia do etanol celulósico, tomando como base os depósitos de famílias de patentes e as

publicações de artigos científicos internacionais. Com isso, apresentam-se os atores sociais

responsáveis pela estruturação da nova rota(s) tecnológica(s), tanto na escala global como no

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território nacional, diferenciando as origens e as diferentes nacionalidades destas firmas e

instituições.

É importante notar que este mapeamento de atores complementa e finaliza a

identificação dos novos atores do SSI da cana-de-açúcar iniciada no capítulo 2 (subtópico

2.2.). O segmento da bioenergia aparece com pouca expressão na amostra de atores detentores

de famílias de patentes, os destaques são oriundos de outras indústrias como: petróleo;

química; biotecnologia e pequenas empresas de base tecnológica (start up). A figura

4.6.expõe os principais atores e dá uma noção da relevância de cada ator na corrida

tecnológica do etanol celulósico.

Figura 4.6. Os principais assigners em etanol celulósico, no mundo e no Brasil.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.

A figura 4.6. permite identificar quais são os principais detentores de competências

tecnológicas no universo do etanol celulósico, os quais podem ser organizadas segundo a

indústria/segmento de origem, levando em consideração os 100 primeiros assigners e os

assigners de patentes depositadas prioritariamente no Brasil, a saber:

i) Bioenergia: há um conjunto “pequeno” de firmas ligadas diretamente ao processamento

da biomassa, ou seja, agroindústrias que beneficiam cana-de-açúcar ou milho com a

intenção de obter etanol. No plano mundial têm-se a POET (EUA); a Greenfield

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(Canadá) e a Abengoa (Espanha); no Brasil foi encontrado a Odebrecht Agroindustrial e

a Bioenergia do Brasil (a antiga Central de Álcool Lucélia). Outro destaque é a Raízen,

mesmo não apresentando depósitos de patentes, figura como um ator relevante no nível

nacional/internacional, pois apresenta projeto em escala industrial de etanol 2G em

andamento, e ainda é detentora de 50% da Iogen Energy, empresa canadense que

apresenta competência em etanol celulósico (24 famílias de patentes).

ii) Tradings de commodities: a China National Cereals, Oils and Foodstuffs Corporation

(COFCO) foi a única empresa ligada à comercialização de commodities encontrada na

busca de famílias de patentes – levando em conta apenas os 100 maiores assigners.

iii) Sementeras: aparecem duas firmas ligadas ao universo tecnológico do etanol

celulósico, a Syngenta (China) e a Ceres (EUA), com desenvolvimento visando

modificação genética das plantas (milho e sorgo).

iv) Petróleo: firmas oriundas da indústria do petróleo têm figurado como atores de grande

relevância na amostra, com destaque para grandes corporações de atuação global como

a Companhia Petroquímica da China (Sinopec); BP (Reino Unido); Shell (anglo-

holandesa); SK Energy (Coréia do Sul); Neste Oil (Finlândia); Exxon Mobil (EUA) e

Petrobras (Brasil).

v) Químico: a indústria química aparece com grande importância na amostra e no contexto

de aproveitamento dos materiais lignocelulósicos, com destaque para Du pont (EUA);

Veritchem (Canada); Phillips 66 (EUA) e Arkema (França); já no nível de Brasil,

sobressai a Braskem (Brasil).

vi) Biotecnologia: é o segmento industrial com maior destaque na amostra de 2.937

famílias de patentes, apresentando dois “tipos” de firmas: i) Firmas multinacionais e

multi-produtos, como a Novozymes (Dinamarca); a DSM (Holanda) e a Lallemand

(Canada) e; ii) Pequenas firmas de base tecnológica e/ou start up (fortemente ligadas

a universidade), como a Xyleco (EUA); Iogen (Canadá); Inbicon (Dinamarca); Qteros

(EUA); Edniq (EUA); Wisconsin Alumni Research (EUA); Coolplanet (EUA);

TerraVia (EUA); Furanix Technologies (Holanda); Deinove (França); Codexis (EUA);

Joule Unlimited (EUA). Todas estas estão entre os 100 principais assigners no nível

mundial, já no plano nacional destaca-se a Biocelere Agroindustrial (Brasil).

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vii) Órgãos governamentais / Institutos ou empresas de pesquisa: os principais

representantes desse grupo são a US Department of Agriculture (EUA); IFP Energies

Novelles (França); Purdue Research Foudation (Indiana/EUA); Ut-Battelle (EUA);

Centre National de La Recherche Scientifique (França); Georgia Tech Reserch (EUA).

Na escala Brasil, o Centro de Tecnologia Canavieira – CTC (Brasil) e o Laboratório

Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol – CTBE (Brasil) se destacam.

viii) Universidades: Na amostra existe um grande número de universidades, muitas

figurando como os principais assingners do universo tecnológico mapeado: os

destaques ficam com a TianJin University (China); University of California (EUA);

Chinese Academy Science (China); Michigan State University (EUA); University of

Illinois (EUA); e tantas outras. As universidades chinesas, norte americanas e sul

coreanas aparecem com grande destaque entre os assigners sendo desnecessário nomear

cada uma delas. No plano nacional, as universidades que se destacam são: Universidade

Estadual de Campinas (4); Universidade Federal de Brasília (2); Universidade Federal

do Rio de Janeiro (2); Universidade de São Paulo (1); Universidade Estadual Paulista

(1); Universidade Federal de São Carlos (1); Universidade Federal de Santa Catarina (1)

e Universidade Federal do Espírito Santo (1).

O levantamento dos principais assigners (vide figura 4.6.) sugere que o

estabelecimento do etanol celulósico depende da articulação (ou da apropriação) entre os

atores tradicionais no processamento da biomassa com os “novos” atores, os quais estão

inseridos em bases de conhecimentos e tecnológicas distintas da produção do E1G e é

justamente esse movimento que propicia a mudança setorial (MALERBA & ORSENIGO,

1999; MALERBA, 2002; MALERBA, 2007). A interação ou a entrada destes novos atores no

SSI da cana-de-açúcar pode/deve ampliar a fronteira do setor, visto que novos conhecimentos,

novos processos de produção e novos produtos são somados a base já estabelecida, gerando

novas maneiras de interações entre os atores e, principalmente, alterando o cotidiano da

produção.

Sabe-se que o conhecimento define os limites das firmas e das indústrias (PAVITT,

1984; METCALFE, 1995; NELSON & WINTER, 2005), principalmente porque o

conhecimento difere em termos de fontes (fornecedores, universidades, usuários, etc.); de seus

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domínios (campos científicos e tecnológicos específicos à base de atividades inovadoras) e

das suas aplicações no mundo da produção (ADAMS et al. 2011).

O conhecimento pode ser mais ou menos cumulativo (o grau em que a geração de

novos conhecimentos se baseia no conhecimento atual) e pode ter diferentes graus de

acessibilidade (oportunidades de conhecimento que são internos/externos às empresas ou

internos/externo ao setor) (ADAMS et al. 2011). Estes elementos somados ao quadro

expostos pelas figuras 4.3., 4.4. e 4.6. deixam claro que a inserção da tecnologia de etanol

celulósico promove mudanças significativas no SSI da cana-de-açúcar, porque as firmas

nacionais não figuram como as maiores detentoras de tecnologias nesse segmento e por outro

lado, os maiores assigners são de outras indústrias. Assim, o conhecimento útil para

consolidar e estabelecer um standard tecnológico em etanol celulósico está externo as firmas

e externo a indústria processadora de cana-de-açúcar.

Ao buscar acessar os conhecimentos e as tecnologias necessárias ao E2G realiza-se a

expansão das fronteiras setoriais - o prelúdio da mudança setorial (MALERBA, 2002). Estes

efeitos são perceptíveis no esforço da introdução da nova tecnologia (E2G), a qual além de

fazer avançar o processo de aprendizagem na nova rota tecnológica geram efeitos nos

processos já estabelecidos, por exemplo: a Raízen ao cooperar com outros atores (Iogen,

Novozymes) para o desenvolvimento do etanol celulósico, “apreende” novas maneiras de

manejar e acompanhar o processo de fermentação de primeira geração178

, resultando em

ganhos de produtividade por meio da redução de custos com leveduras179

.

Portanto, este novo contexto apresenta um quadro de agentes muito mais complexo e

envolvendo empresas multinacionais de várias áreas do conhecimento, com destaque para as

biotecnológicas, mas também pequenas empresas de base tecnológica com competências nas

áreas da química orgânica, nanotecnologia, genética, software, entre outras. Também estão

envolvidas nessa realidade, de forma mais intensiva, as universidades e seus Núcleos de

Inovação Tecnológica (NIT). Há ainda a presença de órgãos públicos (internacionais,

178

Outros exemplos serão dados no capítulo 5. 179

Isso dá base para ver que o DUI-mode não desaparece, pelo contrário, este se reforça a medida que as firmas

produtoras de etanol celulósico incorporam novas tecnologias, mas elevam esse processos de aprendizagem em

outro nível (conhecimentos ligados a biotecnologia), pois continuam apreendendo pelo uso e pela produção, mas

suas ações não se limitam a isso, é necessário paralelamente estabelecer e realizar outras ações, por exemplo,

testes em laboratórios; interação com a universidade; busca de conhecimento formal (caracterização da

composição da biomassa); entre outros (ENTREVISTAS VIII; ENTREVISTA IV).

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nacionais e estaduais) cujo foco é o desenvolvimento tecnológico (JOÃO et al., 2011; LIMA

et al., 2013).

No que se refere à produção de conhecimento científico tem-se uma dinâmica

interessante (publicações de artigos). Mesmo as universidades e as organizações públicas

norte americanas, chinesas e da União Europeia figurando como os principais “nós” das redes

de pesquisa internacionais, as instituições brasileiras rivalizam numericamente com os

principais atores internacionais (vide figura 4.7). Destacam-se no continente europeu a Lunds

Universitet (Suécia) com 175 artigos; a Chalmers University of Technology (Suécia) com 79;

Danmarks Tekniske Universitet (Dinamarca) com 124 artigos. Estes dados indicam forte

relação entre a produção acadêmica e a base produtiva, pois os países nórdicos apresentam

grandes firmas processadoras de biomassa (papel e celulose e bioenergia).

Nos EUA os destaques são o National Renewable Energy Laboratory (143); USDA

Agricultural Research Service (131); a United States Department of Agriculture (118); a

Michigan State University (92); University of Florida (80); Iowa State University (69). No

continente asiático, a China apresenta a Chinese Academy of Sciences (135); Ministry of

Education China (92); South China University of Technology (87); Beijing Forestry

University (73). Ainda aparecem com destaque o Japão com a Kyoto University (53) e a

Coréia do Sul com a Korea University (57).

Na escala nacional a figura 4.7. indica quais instituições aparecem como lócus do

conhecimento sistematizado do etanol celulósico. O destaque está na Universidade de São

Pulo (144); Universidade Estadual de Campinas (81); o Laboratório Nacional de Ciência e

Tecnologia do Bioetanol (67); a Universidade Federal do Rio de Janeiro (41) e a Universidade

Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (32). Na amostra ainda aparecem atores que não

são universidades e também contribuem para o avanço do conhecimento na rota tecnológica

do etanol celulósico, estes são: a Embrapa (28); a Petrobras (13); o CTC (9); o IAC (4) e

outros menos expressivos.

Vale o destaque ao CTBE, instituição pública de pesquisa criada em 2010, por meio

do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI), o qual figura

como a terceira instituição em produção de conhecimento científico ligado ao etanol

celulósico. Sua criação é mais um efeito positivo e sinérgico das ações promovidas pelo

arcabouço institucional a partir dos anos 2000. Um elemento que marca uma nova maneira de

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desenhar a política de inovação do setor, a criação de instituição capaz de articular atores e

também de conduzir pesquisas ligadas à temática produtiva (vide figura 4.7.).

A figura 4.7. apresenta as principais temáticas de pesquisa dos atores brasileiros. A

produção do etanol e a caracterização da biomassa são as grandes preocupações da pesquisa

nacional. Temas como a hidrólise e a fermentação da C6 também figuram entre os temas de

destaque da agenda de pesquisa do Brasil (ocupando os primeiros lugares). Por outro lado,

conceitos ligados ao pré-tratamento e à fermentação da xilose (C5) ocupam posição

secundária na produção científica nacional, situação que demanda atenção do SSI, pois é

justamente nessas etapas do processo industrial que as firmas pioneiras estão enfrentando

problemas. É importante redirecionar os esforços de pesquisa, atendendo às necessidades

atuais do mundo da produção. Isso não significa que não há produção nessas áreas, mas os

conceitos que se ligam diretamente a estas temáticas aparecem com menos destaque (após os

15 primeiros).

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Figura 4.7. As principais instituições em publicações vinculadas ao Brasil e os principais conceitos abordados nas publicações.

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.

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4.3.1. Competências tecnológicas no Brasil e dos atores nacionais: um olhar sobre os

Clusters tecnológicos em formação (etanol celulósico)

Esta subseção mostra a tradução do domínio tecnológico do etanol celulósico em

grupos de tecnologias específicas, as quais visam prover respostas particulares a uma miríade

de problemas e potenciais dessa nova trajetória(s) tecnológica(s). As tecnologias são

agrupadas por semelhanças180

, constituindo clusters tecnológicos, os quais se voltam a

momentos particulares do processo produtivo do biocombustível. Alguns destes clusters

dedicam-se a questões ligadas ao pré-tratamento da biomassa, outros à fermentação e, ainda,

há cluster destinados à própria engenharia genética dos micro-organismos ou das plantas.

Estas tecnologias, além de serem voltadas a estágios distintos da produção do etanol,

relacionam-se com os variados tipos de feedstocks. Esta redistribuição e materialização dos

conhecimentos/saberes estão expostas nas figuras 4.8.

O cenário do etanol celulósico é múltiplo, com opções variadas para cada estágio da

produção, portanto, as figuras 4.8. e o apêndice1. apresentam um retrato atual da paisagem

tecnológica oriunda dos esforços sistematizados na temática do etanol de segunda geração.

Igualmente, oferecem uma noção das competências já estabelecidas e das convergências

atingidas pelo segmento de processamento do material lignocelulósico.

Portanto, os dados expostos nessa subseção complementam os tópicos trabalhados

anteriormente, uma vez que, demonstram em quais processos, técnicas ou produtos

específicos às bases do conhecimento e da tecnologia “deságuam”, ou seja, mostram quais são

os consensos gerais em relação à tecnologia do etanol celulósico e quais são atores

proeminentes por tecnologia, dando uma noção das competências tecnológicas das firmas e

instituições.

A figura 4.8. foca nas tecnologias protegidas exclusivamente no Brasil, oferecendo um

olhar mais particularizado da realidade nacional, portanto, o landscape by technology foi

gerado com 564 famílias de patentes que podem ser hoje exploradas em território nacional,

dando uma noção das competências tecnológicas que podem ser apropriadas pelo SSI da

cana-de-açúcar, bem como, apresenta uma análise do ambiente tecnológico do Brasil181

.

180

As figuras 4.8 e o apêndice 1 foram geradas pela plataforma Questel Orbit. 181

Aborda-se especificamente as famílias de patentes depositadas no Brasil para poder dar conta dos objetivos da

tese, entretanto, o apêndice 1 dedica-se ao setor como um todo, olhando o geral, pois a landscape by technology

foi gerada com todas as famílias de patentes da amostra (2.937). Estes dados merecem ser analisados com maior

atenção, pois se configuram como informações importantes para compreensão da dinâmica tecnológica do E2G,

tal esforço investigativo deve ser feito em trabalhos futuros.

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A figura 4.8. e o apêndice 1 são “mapas” tecnológicos, ou seja, representações das

tendências e uma síntese do processo evolutivo pelo qual passou o conjunto de tecnologias do

universo do etanol celulósico182

. Estas devem ser lidas como “mapas tridimensionais”, onde

suas topografias são formadas por meio das palavra/conceitos presentes nos pedidos de

proteção intelectual das invenções. Estas são agrupadas por similaridade, isto é, a plataforma

Questel Orbit realiza automatizadamente uma análise lexicográfica dos termos tecnológicos

presentes nos documentos integrantes da amostra.

A leitura do “mapa tecnológico” deve ser feita de maneira similar a leitura de mapas

geomorfológicos183

. De tal modo, os “vales” são resultados de termos/conceitos tecnológicos

menos frequentes (representados pelo azul claro) e os “picos” congregam os termos/conceitos

mais frequentes (representados pela variação do verde e por cores quentes, tais como marrom

e vermelho). Os pontos referem-se ás patentes, cada ponto é uma família de patente, as cores

dos pontos são apenas para facilitar a leitura.

A figura 4.8. representa o mapa tecnológico do Brasil, indicando quais competências

estão mais “disponíveis” no território nacional. Com a leitura da figura 4.8. percebe-se a

existência de 8 clusters tecnológicos. Outro detalhe é que não existe uma convergência muito

significativa no interior dos clusters, com exceção do cluster C. Deste modo, o mapa

tecnológico brasileiro é caracterizado pelas “planícies”, áreas menos elevadas, indicando uma

grande variedade de tecnologias semelhantes e um esforço ainda exploratório, sugerindo a

existência de janelas de oportunidades.

182

Exercício semelhante foi feito por Dal poz & Silveira (2015). 183

São utilizados para representar as características do relevo de uma região/área.

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Figura 4.8. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology clusters – Brasil (564 famílias de patentes).

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.

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O cluster A é formado por 99 famílias de patentes, agrupando tecnologias voltadas aos

processos de pré-tratamento da biomassa propriamente dito ou da hidrólise, nesse segundo

caso, as tecnologias visam melhorar as condições para ação dos coquetéis enzimáticos. Assim,

a maior parte das patentes tratam de equipamentos ou métodos novos ou otimizados que

objetivam melhorar a fração do material lignocelulósico ou a remoção de compostos

inibidores, gerando um composto lignocelulósico de melhor qualidade para as etapas

seguintes (hidrólise e fermentação).

Os atores que mais se destacam no cluster A são: o IFP Energies Nouvelles (França)

com 11 famílias de patentes; a Inbicon (Dinamarca) com 8; a Du Pont (EUA) com 4 e a

Greenfield Ethanol (Canadá) com 4 famílias de patentes. No plano nacional as firmas que

demonstram desenvolvimento endógeno de competências tecnológicas nessa fase do processo

produtivo são: a Brazilian Expertise Research Group (BRAERG); o CTC e a Braskem todas

com uma família de patente cada. Neste cluster ainda se encontra a Universidade Estadual de

Campinas, com uma família de patente.

Vale ressaltar que as empresas parceiras da GranBio e da Raízen também estão

presentes nesse cluster, respectivamente, a Beta Renewable (Itália) e Andritz (Áustria) com

uma família de patente cada e a Iogen (Canadá) com 2 famílias de patentes.

O cluster B é formado por 90 famílias de patentes, tendo como escopo a engenharia

genética e a transgenia dos microrganismos para ampliar e maximizar os processos de

hidrólise enzimática e o processo de fermentação – com especial atenção a fermentação da C

5 (xilose). Os principais atores nesse cluster são: a DSM (Holanda com 6 famílias de

patentes; a Deinova (França) com 4; a BP (Reino Unido) 4; a Codexis (EUA) e a Du Pont

(EUA) com 3 família de patentes cada. No que tange os atores brasileiros aparece com

relevância a Biocelere Agroindustrial com 2 famílias de patentes e a Embrapa com 1 família

de patente, este segundo caso é interessante, pois a patente foi desenvolvida em parceria com

a Universidade Federal de Brasília e com a Universidade Católica de Brasília.

Sobre o desenvolvimento da Biocelere pode-se dizer que a tecnologia é baseada na

modificação genética de microrganismos visando possibilitar o consumo eficiente da xilose,

portanto, é uma biotecnologia para a produção de etanol celulósico por meio da fermentação

da C5.

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O cluster C é constituído por 66 famílias de patentes, apresentando apenas 2

assigners, são estes: Novozymes (Dinamarca) com 62 famílias de patentes e a Du Pont (EUA)

com 4 famílias de patentes. As invenções deste grupo estão inseridas na produção, seleção e

melhoria das enzimas visando a criação de compostos enzimáticos. Com isso, atuam na fase

da hidrólise enzimática.

O cluster D é composto por 28 famílias de patentes. Mesmo sendo organizado por

semelhança dos conceitos tecnológicos, resultou em um pequeno grupo não coeso de

tecnologias, ou seja, apresenta tecnologias tanto da rota bioquímica como da termoquímica. O

que fica claro é que as tecnologias deste grupo estão focadas na conversão da biomassa e, o

ponto de união entre elas é que são “propostas completas” de processos produtivos. Figuram

neste grupo as seguintes firmas: POET (EUA); Iogen (Canáda); Xyleco (EUA); Neste Oil

(Finlândia); Inbicon (Dinamarca). O Brasil apresenta apenas a Petrobras neste cluster, com

um método para produzir açúcares fermentáveis de alta concentração a partir de material

lignocelulósico.

O cluster E é formado a partir de 92 famílias de patentes, dedicando-se principalmente

ao processo de fermentação da C6 (glicose). Para tal, apresentam-se tecnologias focadas no

método de produção (equipamentos ou melhoramentos no processo) e, também,

biotecnologias que atuam principalmente na seleção ou melhoramento genético das enzimas e

de outros micro-organismos visando à inativação da celulase184

. Os principais assigners deste

cluster são: Dupont (EUA) com 9 famílias de patentes; Iogen (Canáda) 9 famílias de patentes;

a POET (EUA) com 6; Xyleco (EUA) 4; a BP (Reino Unido) 3 famílias de patentes. No caso

brasileiro tem-se a Petrobras com 3 famílias de patentes; o CTC com uma família de patente e

a Universidade Federal do Rio e Janeiro com 2 famílias de patentes .

O cluster F estrutura-se a partir de 28 famílias de patentes. O grupo esta inserido na

química verde, principalmente, na produção de subprodutos da biomassa que não o etanol,

tais como: a glicerina purificada; o biodiesel, lubrificantes; plastificantes, solventes e outros

bioprodutos. Assim, as tecnologias envolvem métodos e processo de produção destes novos

produtos. Os principais atores desse cluster são a Novozymes (Dinamarca) com 3 famílias de

patentes; a University of California (EUA) com 3 famílias patentes; a Battelle Memorial

Institute ( EUA) com 2 patentes, a POET (EUA) com 2 e a Solenis Technologies Cayman

184

Esta “melhoria” é fundamental para o processo de hidrólise, que visa desmontar as cadeias de polissacarídeos

sem consumir os açúcares resultantes desse processo (atingir o grau ótimo da digestibilidade da parede celular).

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(EUA) com 2 famílias de patentes. As empresas nacionais que demonstraram alguma

iniciativa nessa direção foi a Fibria e Brasil Biofuel, ambas com uma família de patente cada.

O cluster G é formado por 73 famílias de patentes e, as tecnologias que lhe dão

contornos se inserem no campo da alcoolquímica. O conjunto não é coeso no que diz respeito

aos produtos gerados pelos métodos e processos produtivos deste cluster, pois as tecnologias

dão origem a produtos distintos, tais como o etileno, isopropanol, etanol e outros bioprodutos.

A diferença deste cluster para o cluster F está no fato de abordar conjuntamente com outros

produtos o etanol e, ainda, boa parte das tecnologias aqui fazem uso da engenharia genética

para adaptar ou melhorar a ação dos microrganismos, ao passo, que o grupo tecnológico

anterior se limitava aos processos industriais “já estabelecidos”, ou seja, não pautavam-se em

novos micro-organismos.

Os assigners mais significantes nesse campo são: a Terravia (EUA) com 6 famílias de

patentes; University of California (EUA) com 4 famílias de patente; a BP (Reino unido) com

3 famílias de patentes; a Lallemand (Canadá) com 3 famílias de patentes e a Colorado State

University (EUA) com 2 famílias de patentes. Na escala nacional tem-se a Braskem e a

Suzano, ambas aparecem com apenas uma família de patente. É interessante notar que a

tecnologia desenvolvida pela Braskem além de ser fruto do seu esforço inovativo é uma

trajetória financiada pelo Estado brasileiro, no levantamento de políticas públicas pró-etanol,

no capítulo 3, foi possível perceber que esta área na firma recebeu aportes da FAPESP e da

Finep ao longo dos anos 2000.

O cluster H é composto por 73 famílias de patentes, as quais se destinam aos

processos de pré-tratamento e preparação do composto lignocelulósico. Uma das

características mais relevantes desse grupo de tecnologia é o fato de estar presente o conceito

de biorrefinaria. Nesta mesma direção, percebe-se que as tecnologias agrupadas neste cluster

exibem também a noção de integração de processos, como pré-tratamento-hidrólise-

fermentação ou as fermentações da C6 e da C5 de maneira combinada. A maioria das

tecnologias tem por objetivo realizar o tratamento e a fragmentação da biomassa; a filtragem e

a separação dos sólidos; a redução da viscosidade do composto que será hidrolisado e o

estabelecimento de processos de hidrólise contínua.

Os atores que mais se sobressaem nesse grupo de tecnologias são: a IPI Intellectual

Property (EUA) com 17 famílias de patentes; a Shell (Anglo-holandesa) com 5 famílias de

patentes; a Iogen (Canadá) com 4 famílias de patentes; a BP (Reino Unido) com 3 famílias de

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patentes; a DuPont (EUA) com 2 famílias de patentes. A única empresa brasileira encontrada

no levantamento foi a Villares com um processo industrial para obtenção de etanol de

materiais celulósicos por meio da hidrólise ácida contínua.

Para sumarizar a descrição das competências nacionais no universo tecnológico do

etanol celulósico apresenta-se a figura 4.9., a qual complementa o que foi visto na landscape

by technology do Brasil. A Figura 4.9 indica os principais conceitos/temas das tecnologias

prioritariamente depositadas no Brasil, ou seja, mais particularizada das 47 famílias de

patentes depositas primeiramente no Brasil (uma proxy da P&D local). Assim, percebe-se de

maneira mais clara quais foram as ações técnicas e tecnológicas perseguida pelos atores do

SSI da cana-de-açúcar ao longo da última década.

As competências nacionais, bem como os esforços de desenvolvimento dos atores do

SSI da cana-de-açúcar estão assentadas nas seguintes áreas:

i) Hidrólise enzimática – o conceito é autoexplicativo, entretanto, as tecnologias aqui

apresentam processos e sistemas para a produção integrada de E1G e E2G como a

tecnologia desenvolvida pelo CTC, ou processos de fermentação integrados a produção de

E2G a partir das pentoses, um exemplo é a tecnologia proposta pela UNICAMP.

ii) Bioquímicos caracterizados – tecnologias que se baseiam nos processos químicos que

ocorrem dentro ou relacionados aos organismos vivos, assim, ao controlar ou potencializar

estes processos aperfeiçoa-se a hidrólise, a fermentação ou dá origem a building block

verdes que podem ser a base de outros produtos. Um exemplo é a tecnologia desenvolvida

pela Biocelere, ao controlar características de células eucarióticas possibilita produzir

diversos bioprodutos.

iii) Saccharomyces cerevisiae – reúne as tecnologias atreladas a esse micro-organismo,

uma levedura altamente difundida na produção de E1G. Assim, as tecnologias visão

melhorar o processo de fermentação, sobretudo, por meio da melhoria das leveduras ou pela

inserção de novos códigos genéticos na própria Saccharomyces cerevisiae.

iv) Demanda energética das plantas – as tecnologias aqui não estão relacionadas ao

manejo no campo e, sim, com o tratamento da biomassa que será hidrolisada, as tecnologias

versão sobre o pré-tratamento da biomassa.

v) Fermentação – o conceito também é autoexplicativo, mas as tecnologia ligadas a esse

termo visão aperfeiçoar o processo já conhecido na primeira geração ou integra-lo a

realidade dos novos processo de etanol 2G. Igualmente, as invenções objetivam o processo

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fermentativo da biomassa liginocelulósica; nova/adaptada composição enzimática a partir de

micro-organismos selecionados (Trichoderma Reesei ou Aspergillus Awamori); processo

para desmulsificação e esterificação de ácidos e seus derivados; entre outras técnicas.

Figura 4.9. Conceitos tecnológicos das invenções brasileiras (depósitos prioritários - 47

famílias de patentes).

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.

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4.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 4

O presente capítulo expôs a dinâmica e as principais características do conhecimento e

da tecnologia que sustentam o universo do etanol celulósico. Identificou os principais atores

envolvidos no processo de desenvolvimento da rota(s) tecnológica(s), tanto no plano

internacional como no nacional, nomeando as firmas e as instituições responsáveis pelos

avanços alcançados na última década. De maneira correlacionada, posicionou os

países/regiões segundo seus desempenhos nas atividades de patenteamento e publicações de

artigos científicos.

É fato que o desenvolvimento do etanol de segunda geração carrega muitas incertezas,

não havendo tecnologias estabelecidas ou trajetória(s) dominante(s). Entretanto, por meio dos

dados de patentes e de artigos científicos observa-se uma convergência na rota enzimática.

O problema é que a rota enzimática carrega no seu interior diversas configurações

industriais e “biotecnológicas”, as quais variam entre a separação das “etapas” de conversão

da biomassa até a junção de todas elas de uma só vez (pré-tratamento, hidrólise, fermentação).

Acrescenta-se que estas opções podem ainda carregar variações nos equipamentos; na

“natureza” dos micro-organismos; e nos métodos e nos processo correlacionados a cada

“momento” do processamento da biomassa185

.

Outro destaque sobre a dinâmica tecnológica é observar que o ritmo de patenteamento

desacelerou nos últimos anos (a partir de 2011). Esta situação pode marcar um estágio

estacionário do ciclo de desenvolvimento do E2G, novos esforços investigativos devem ser

realizados para comprovar esse fato. Mas o que se sabe, é que a euforia pelo etanol celulósico

diminuiu (vide figura 4.4.). Os problemas advindos das primeiras plantas em escala

comercial, o contexto político mundial (questionamento às mudanças climáticas) e,

principalmente, os efeitos que outras inovações exercem sobre a opção pelos biocombustíveis

(gás de xisto, a energia fotovoltaica, a energia eólica, etc.) diminui o apetite dos investidores e

dos órgãos públicos que puxavam os investimentos iniciais.

O capítulo também oferece um retrato sobre a atuação do SSI da cana-de-açúcar no

universo do etanol celulósico. Na dimensão do conhecimento científico, as universidades

brasileiras apresentam desempenho similar aos atingidos pelas unidades dos EUA, da Ásia ou

da Europa. Na somatória, o Brasil ocupa a terceira posição em número de artigos científicos

185

Por ouro lado, não é plausível afirmar que os desenvolvimentos cessaram nas outras rotas tecnológicas (ácida

e termoquímica), haja vista, a existência de depósitos de patentes na última década.

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publicados internacionalmente, sendo que a Universidade de São Paulo figura entre as cinco

instituições com mais publicações.

Outro elemento relevante nas informações provenientes do levantamento de artigos

científicos é o desempenho do CTBE, o qual figura como a terceira unidade mais importante

do Brasil em relação ao conhecimento científico do E2G e, em uma comparação

internacional, posiciona-se entre as 30 maiores instituições, feito extraordinário se

considerarmos que a instituição tem apenas 7 anos de existência.

Uma análise “fria” dos dados reunidos sobre a dinâmica tecnológica (famílias de

patentes) pode proporcionar uma visão desalentadora do desempenho do SSI da cana-de-

açúcar (o que é verdade), visto que nenhuma das firmas processadoras de cana-de-açúcar

figura entre os principais assigners. Isso é um problema estrutural, o setor historicamente

caracteriza-se por baixa capacidade inovativa.

Por outro lado, como indica a literatura de SSI, as firmas não inovam sozinhas e os

setores econômicos apresentam padrões de inovações bem definidos segundo as bases do

conhecimento. Portanto, tal situação já era esperada, sendo uma confirmação das

particularidades do setor sucroenergético (inovações introduzidas por fornecedores de bens e

de insumos).

Mas o interessante é destacar as exceções. Os mesmos dados (famílias de patentes)

possibilita perceber que outros agentes/atores, igualmente presentes no SSI da cana-de-açúcar,

apresentam competências tecnológicas acumuladas não desprezíveis, fato que não só justifica

a estratégia metodológica, como também abre espaço para compreender o real processo de

desenvolvimento e introdução da nova tecnologia na realidade brasileira. Demonstra também

que a nova trajetória impõe mudanças históricas no padrão estabelecido e traz à cena

produtiva outros tipos de atores e de relações.

Os pontos fortes do Brasil percebidos pela análise da dinâmica da tecnologia do E2G

são: a) As firmas e instituições que receberam aportes advindos da nova política de inovação

para o setor figuram como depositantes de patentes na trajetória do etanol celulósico – CTC;

GranBio; Odebrecht Agroindustrial; CTBE; Brasken; Petrobras; b) A qualidade das invenções

é difícil de avaliar por intermédio da estratégia escolhida, mas as invenções protegidas pelos

atores brasileiros não se limitaram apenas ao INPI, fato que indica uma certa qualidade das

patentes ou pelo menos mostra que seus proprietários acreditam no seu potencial comercial; c)

Mesmo tratando-se de poucas patentes depositadas, estas aparecem em etapas distintas do

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processo de conversão da biomassa, mostrando que o esforço tecnológico do SSI é variado e

abarca diversos momentos da produção do E2G, tais como: as leveduras geneticamente

modificadas; design industrial visando a integração de unidades produtivas (1G – 2G);

seleção e melhoramento de micro-organismos; melhoramentos no processo de hidrólise

enzimática; propostas de pré-tratamento específicos para a biomassa de cana-de-açúcar; novas

variedades de cana-de-açúcar.

Como foi mostrado nesse capítulo, o esforço do Brasil em estabelecer tecnologia

endógena de maneira sistematizada (patentes) representa pouco no esforço geral, o que mostra

que o deslocamento para o STI-mode não é fluído e ocorre de maneira particularizada. Mas

olhando com mais detalhes os dados de patentes por assigners, percebe-se que a propriedade

das invenções em etanol celulósico encontra-se pulverizadas, o que quer dizer que a maioria

dos atores proprietários de tecnologia tem sobre sua posse poucas patentes. O nível de

concentração é baixo: os 5 maiores assigners representam juntos apenas 12,6% da amostra.

Isso sugere que atores nacionais que apresentam duas ou quatro famílias de patentes não

podem ser sumariamente desconsiderados. O grande desafio é difundir essa prática/esforço

para outros atores do SSI da cana-de-açúcar e ampliar os esforços já em curso, buscando

intensificar as potencialidades já desenvolvidas.

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CAPÍTULO 5: TECNOLOGIA DO ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL: AS

AÇÕES DOS ATORES E SUAS INTERAÇÕES

O presente capítulo tem como objetivo compreender as ações desempenhadas pelos

principais atores envolvidos no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do

etanol celulósico no Brasil, com especial atenção para as ações das firmas. De tal modo,

descreve e analisa os projetos industriais186

de etanol de segunda geração em curso no país,

destacando as relações estabelecidas por eles para tornar os projetos reais.

Tal esforço investigativo visa fechar o arco analítico da pesquisa, posicionando as

firmas no centro da interpretação, com isso, abarcando o fenômeno da inovação tecnológica

(1G para 2G) no seu conjunto. As informações/análises levantadas neste capítulo completam

as apreciações tecidas nos capítulos anteriores, pois ao longo da tese percorre-se a trajetória

de desenvolvimento do SSI da cana-de-açúcar, da formação até as primeiras iniciativas

sistematizadas de desenvolvimento de uma nova base tecnológica para a produção de etanol.

Este exercício traz uma noção evolutiva do segmento, bem como uma chave interpretativa de

como os setores/indústria mudam e evoluem em países periféricos187

.

Este foco justifica-se em razão da própria natureza das firmas188

, as quais se

comportam como catalisadoras desse processo, não só por introduzirem o etanol celulósico no

mercado de combustíveis, mas por representarem um fenômeno em gestação no país. Ao

passo que constroem plantas industriais baseadas na rota celulósica, estas congregam outros

elementos da estruturação do STI-mode, pois se beneficiam sistematicamente das interelações

promovidas pelo SSI da cana-de-açúcar, ou seja, são alvos de políticas públicas para inovação

(PAISS Industrial e PAISS Agrícola), recebem aportes diretamente voltados ao P&D

186

Projetos Indústrias de etanol celulósico consistem nas iniciativas desempenhadas pelos atores (firmas e

instituições de pesquisa), as quais visam em um dado momento realizar a prova de conceito por meio de

prototipagem em pequena escala e/ou a construção de plantas industriais - escala piloto, demonstrativa e

comercial. Com base na classificação adotada pela metodologia Technology readiness levels (TRL), seleciona-se

os projetos que se encaixam entre as fases TRL5 - TRL7 e TRL8 – TRL9. Adota-se as definições feitas por

Stafford et al. (2017). 187

Os setores econômicos em economias subdesenvolvidas carregam características comuns, tais como: a) a

forte heterogeneidade das firmas - diferentes níveis tecnológicos convivem ao mesmo tempo no mesmo setor; b)

inovações intensivas em conhecimento advêm do exterior; c) os investimentos e a condução do Estado é fator

central para avançar o nível tecnológico das firmas. Estes elementos estão presentes na tentativa de introduzir a

produção do etanol celulósico na realidade do setor sucroalcooleiro. 188

A firma, principal elemento do SSI, é responsável pela transformação dos inputs em outputs. Ela é

caracterizada por processos específicos de aprendizagem, competências e organizações (rotinas) os quais

conduzem suas ações, suas expectativas e os seus objetivos. A partir destes princípios, as firmas interagem com

os demais agentes do SSI, tais como universidades, institutos de pesquisa, agências regulatórias, consumidores,

fornecedores entre outros. Os agentes interagem por meio de processos de comunicação, troca, cooperação,

competição e comando, e assim estabelecem networks (redes de inter-relação) que criam canais e mecanismos de

aprendizado interativo, elemento essencial para o processo de inovação (LUNDVALL, 2009; JOSEPH, 2009).

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219

(FAPESP e FINEP), são firmas que estabelecem relações com agentes externos com a

intenção de incorporar novas tecnologias (Joint Venture, cooperação tecnológica e aquisição

de empresas estrangeiras), criam relações com atores não-empresas do SSI (universidades e

ICTs). E, por fim, elaboram rotinas voltadas ao desenvolvimento destas novas tecnologias,

baseadas em processos de aprendizagem não restritos ao DUI-mode.

As firmas que conduzem e conduziram os principais projetos industriais em etanol

celulósico são189

: CTC; GranBio e Raízen. Estes três casos possuem plantas instaladas e em

funcionamento, consolidam-se no cenário nacional à medida que absorvem novos

conhecimentos e aprendem com o próprio uso da nova tecnologia. E, ademais, são os atores

brasileiros que melhor acompanham a corrida tecnológica em curso no plano internacional.

Acrescenta-se que no processo de mapeamento dos atores do SSI da cana-de-açúcar

identificaram-se outras firmas com projetos industriais em etanol celulósico, entretanto, estas

apresentam suas iniciativas descontinuadas ou envoltas em incertezas promovidas tanto pelo

contexto socioeconômico como por novas estratégias empresariais, a saber: Villares Metals

S.A; Dedini Indústria de Base; Jaraguá Equipamentos Industriais; Petrobras; Oxiteno;

Odebrecht Agroindustrial; Bioenergia do Brasil S/A; Abengoa Bioenergia; Clariant;

British Petroleum Biocombustíveis (BP).

Estes casos serão “chamados” à narrativa para demonstrar elementos próprios da

dinâmica da evolução da tecnologia, justamente em um momento pré-paradigmático, onde a

incerteza, a entrada/saída de atores e a disputa de designs tecnológicos distintos compõem o

quadro histórico deste contexto.

De maneira correlacionada e independente, apresentam-se também atores não-firmas

que conduzem ações na trajetória do etanol celulósico na fase industrial do SSI da cana-de-

açúcar, tendo como expoentes: o CTBE, IPT e a Escola de Engenharia de Lorena-USP. Os

atores não-firmas são relevantes no processo de interação e cooperação no interior do SSI da

cana-de-açúcar, mas não apenas, visto que o CTBE apresenta uma planta-piloto de E2G e

projetos industriais completos em fase de testes, os quais devem ser disponibilizados ao

mercado em 2018.

189

Levantamento que ocorreu até 2017, ano de conclusão desta tese de doutoramento.

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220

Portanto, os atores não-firma além de colaborar e funcionar como fontes de

conhecimentos sistematizados, conduzem desenvolvimentos tecnológicos particulares que se

somam às iniciativas em curso, dinamizando o processo de aprendizado do SSI (o caso do

CTBE reúne estes elementos e recebe especial atenção neste capítulo).

Destaca-se que os atores “aparecem” como resultado do mapeamento de políticas

públicas e de todo levantamento de dados sobre o setor feito ao longo da pesquisa (artigos

científicos; família de patentes; levantamento bibliográfico; mídia especializada; e pelas

entrevistas realizadas em campo). Estes atores, firmas e não-firmas, são verdadeiros

catalisadores desse processo e representativos da mudança em curso, situação que aprofunda a

heterogeneidade setorial, ao passo que faz avançar a base técnica da indústria da cana-de-

açúcar.

Em tempo, a apresentação e a caracterização dos casos/iniciativas de desenvolvimento

da tecnologia do E2G estão pautadas principalmente nas informações coletadas em trabalho

de campo (eventos setoriais e visitas) e entrevistas semiestruturadas junto aos representantes

das principais instituições e firmas do SSI da cana-de-açúcar, vide quadros 1.3 e 1.4. no

capítulo 1. Informações complementares são provenientes de fontes secundárias

disponibilizadas pela mídia especializada (vide quadro 1.5.).

Este capítulo estrutura-se por meio de questões, as quais orientam a exposição das

informações e das análises construídas por esta etapa da pesquisa, estas são: 1) Quais são e

como estes atores introduzem a tecnologia industrial do etanol celulósico no Brasil? 2) Quais

as diferenças entre os projetos tecnológicos de etanol celulósico em curso no Brasil? 3) Quais

são as relações estabelecidas entre estas firmas e outros atores do SSI da cana-de-açúcar no

que tange o etanol celulósico? 4) Como as políticas públicas incidem sobre estas iniciativas?

Com as respostas pode-se ter uma noção, mesmo que aproximada, do quão perto/longe

está a tecnologia de etanol celulósico de ser uma opção complementar a produção de 1G no

Brasil. E, ainda, identificar o esforço do SSI da cana-de-açúcar em introduzir uma inovação

disruptiva.

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221

5.1. OS PRINCIPAIS ATORES DO SSI DA CANA-DE-AÇÚCAR NA TRAJETÓRIA

DO ETANOL CELULÓSICO: VISÃO GERAL

A indústria do etanol celulósico está em construção e como tal encontra-se sem

definições estruturais claras, contando com a presença de diversos “tipos” de firmas, tais

como as grandes firmas processadoras de biomassa, as startups de base tecnológica, firmas

tradicionais de exploração de recursos naturais (agrícolas e petróleo) e grandes firmas do setor

químico.

A figura 5.1. e o quadro 5.1. expõem estas ações de maneira esquemática, indicando

os principais atores, que são de diferentes “naturezas”, deste processo em território nacional.

Vale enfatizar que a identificação dos atores foi o resultado do mapeamento de atores do SSI

da cana-de-açúcar e das políticas públicas de fomento à inovação, bem como aparecem na

amostra de famílias de patentes.

O Brasil conta com diversas iniciativas voltadas ao desenvolvimento da tecnologia

industrial do etanol celulósico, as primeiras ações remontam à década de 1980 (vide figura

5.1.). Atualmente (ano de 2017), o Brasil conta com três plantas de etanol 2G em operação,

sendo duas em escala comercial (GranBio e Raízen) e uma em escala demonstrativa (Centro

de Tecnologia Canavieira – CTC).

A figura 5.1. representa esquematicamente a evolução dos esforços brasileiros em

desenvolver a tecnologia de segunda geração, reforçando o fato das primeiras iniciativas

serem concomitantes com o auge do Proálcool e a retomada das iniciativas só ocorrer nos

anos 2000, principalmente, após 2010. Desta forma, a figura resume a trajetória brasileira no

etanol celulósico e indica os esforços temporalmente, sendo possível perceber a distribuição

dos atores por rota tecnológica e o “grau” deste esforço (pesquisas em laboratório, planta-

piloto, escala de demonstração ou planta comercial).

Estas ações somadas representam o esforço do SSI da cana-de-açúcar em desenvolver

competências internas na nova rota tecnológica. Trata-se de ações que foram fortemente

suportadas pelo poder público e conduzidas a partir de parcerias estratégicas com firmas

estrangeiras, detentoras de tecnologia – estas informações estão expostas no tópico a seguir

(5.2.).

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Figura 5.1. Iniciativas de desenvolvimento de projetos industriais de etanol celulósico no Brasil, entre o período de 1980 a 2016.

Fonte: elaboração própria.

Legenda

E = Elaboração; preparação ajustes

com os parceiros.

PL = Pesquisa Laboratório.

PsP = Planta Semi-Piloto.

PP = Planta-Piloto.

PD = Planta Demonstração.

PD.e = Planta Demonstração no

exterior.

PC = Planta Comercial.

X = Projeto encerrado.

? = Projeto interrompido/ indefinição.

= Continuidade do projeto.

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223

Quadro 5.1. Os principais atores na trajetória do etanol celulósico – quem é quem?

Fundação Ator País Origem Setor Relação / Interesse no setor sucroenergético

1899 IPT Brasil Público Instituição de

Pesquisa

Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços (análise de materiais; análise da

composição da biomassa).

1920 Dedini Brasil Privado Bens de Capital Fabricação de máquinas e equipamentos para a produção de açúcar, etanol e eletricidade a partir

da cana-de-açúcar;

1953 Petrobras Brasil Público Petróleo Distribuição e logística do etanol; Com PBIO produzia açúcar, etanol e eletricidade.

1969 CTC Brasil Privado P&D Pesquisa & Desenvolvimento; Variedades de cana-de-açúcar.

1969 FTI Lorena/SP Brasil Público Instituição de

Pesquisa

Pesquisa & Desenvolvimento; Como integrante da USP exercer a função de desenvolvimento e

disseminação de conhecimento sistematizado e de formação de mão de obra.

1957** Clariant Alemanha- Suíça Privado Química Interesse na produção de bioquímicos a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa & Desenvolvimento

– ações exploratórias realizadas na Europa em E2G.

1957 Jaraguá Equip. Brasil Privado Bens de Capital Fabricação de máquinas e equipamentos para setor sucroenergético e de papel e celulose.

1970 Oxiteno Brasil Privado Química Produção de bioquímicos (solventes verdes).

1976 CODETEC Brasil Público Universidade –

empresa

Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços e assessoria a pequenas empresas de base

tecnológica ligada à Unicamp.

1979 Brasil

Bioenergia Brasil Bioenergia

Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Produção de

Bioagentes (Biovespa, Biorrizium e Biovéria) - controle de pragas.

1979 COALBRA Brasil Público Bioenergia Produção de etanol, coque e furfural.

2007*** Abengoa

Bioenergia Espanha Privado Bioenergia

Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa &

Desenvolvimento – ações exploratórias realizadas na Europa e nos EUA em E2G.

2007 Odebrecht

Agro. Brasil Privado Bioenergia Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar;

2008* BP Reino Unido Privado Petróleo Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa &

Desenvolvimento – ações exploratórias realizadas nos EUA em E2G.

2010 CTBE Brasil Público Instituição de

Pesquisa Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços;

2010 Raízen Brasil –Holanda –

Reino Unido Privado Bioenergia Produção, distribuição e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar;

2011 GranBio Brasil Privado Biotecnologia Pesquisa & Desenvolvimento; Cana-energia; bioquímicos; Produção de E2G.

Fonte: elaboração própria. *Abengoa bioenergy é de 1980, mas chega ao Brasil em 2007. **A criação da BP é de 1909, mas sua atuação no setor sucroenergético é de 2008.

***As atividades da Clariant no Brasil herdaram as estruturas da Hoechst (que chegou ao Brasil 1957), firma alemã que se incorporou a Clariant em 1997. Outro destaque é

que Clariant, Jaraguá Equipamentos e Bioenergia do Brasil não aparecem na figura 5.1., pois estes casos apresentaram apenas interesse em desenvolver projetos de P&D na

rota do E2G - ficando apenas na especulação (submeteram propostas ao PAISS Industrial).

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224

As informações dispostas na figura 5.1. e complementadas pelo quadro 5.1. revela a

“posição” de cada firma ou instituição que realizou esforços nessa trajetória e indica a sua

origem e sua relação com o setor sucroenergético. Com isso, coloca em relevo um conjunto de

evidências e informações que substanciam a resposta da pergunta de pesquisa deste trabalho,

isto é, “Quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-açúcar que promovem o progresso

técnico em direção ao domínio do etanol celulósico?”, visto que nomeia e identifica cada ator

que liderou iniciativas de desenvolvimento, aquisição ou adaptação da tecnologia de E2G no

Brasil ao longo do tempo.

Observando a figura 5.1. percebe-se a existência de 13 iniciativas concretas em

desenvolver a tecnologia industrial de segunda geração no Brasil, conduzidas por atores

distintos, sendo que há 10 firmas e 3 atores não-firmas (CTBE, IPT e FTI Lorena)

conduzindo/liderando as iniciativas de P&D. Para melhor compreender as características do

esforço nacional no universo da tecnologia do etanol celulósico, bem como, para identificar as

relações estabelecidas pelos atores no SSI da cana-de-açúcar, separa-se e classificam-se as

iniciativas em quadro grandes grupos:

i) Iniciativas Pioneiras - FTI Lorena/SP; COALBRA; CODETEC e Dedini;

ii) Iniciativas Incipientes - Brasil Bioenergia; Jaraguá Equipamentos; Abengoa;

Clariant e BP;

iii) Iniciativas Exploratórias - IPT; CTBE; Petrobras; Oxiteno; Odebrecht

Agroindustrial;

iv) Iniciativas Estruturadas – CTC; GranBio e Raízen (portadoras de futuro).

Esta estrutura tem a intenção de facilitar a exposição dos detalhes sobre o esforço

nacional e ir além do mapeamento de atores, mostrando os avanços, os problemas e as

particularidades do SSI da cana-de-açúcar na(s) rota(s) do etanol celulósico - com particular

atenção aos casos dos anos 2000 (Iniciativas Estruturadas).

As Iniciativas Pioneiras correspondem aos projetos industriais implementados no

Brasil na década de 1980, ações que iniciaram as pesquisas e estabeleceram os primeiros

passos nacionais nesta tecnologia. Distinguem-se das outras iniciativas pelo time e

principalmente, pela opção tecnológica (rota ácida).

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225

As Iniciativas Incipientes são os projetos e as ações que não atingiram maturidade, ou

seja, não foram capazes de sair do nível da especulação, da elaboração dos projetos, ou

ainda, não atingiram os objetivos propostos pela própria iniciativa, sendo interrompidos de

maneira abrupta (forças do contexto e/ou reformulação da estratégia da firma).

As Iniciativas Exploratórias são basicamente as ações de pesquisa no nível

laboratorial ou em escalas-reduzidas (bancada e polito). Estas iniciativas caracterizam-se

por não atingirem o estágio de early commercial deployment (STAFFORD et al, 2017), ou

seja, não estabelecerem concretamente unidades de processamento de biomassa, sendo

incapazes de estudar/resolver de maneira direta questões relacionadas à fabricação, manuseio

e processamento da matéria-prima, eficiência energética e resíduos.

Por outro lado, as Iniciativas Estruturadas são aquelas que atingiram “maturidade” e

materializaram-se na realidade do SSI da cana-de-açúcar – estando em um nível à frente das

Iniciativas Exploratórias. São capazes de produzir etanol celulósico, mesmo que por um curto

período de tempo e sem atingir a sua capacidade projetada. Entretanto, são ações que

municiam o SSI com novas informações estratégicas, já que presenciam na execução dos seus

projetos situações e problemas que até então não tinham sido sequer aventados pelo setor

sucroalcooleiro.

Desta forma, as ações estruturadas imprimem um ritmo mais acelerado e

territorializado no processo de aprendizagem do SSI da cana em relação à tecnologia de

conversão da biomassa, visto que os experimentos e os problemas vivenciados por meio das

estruturas em funcionamento promovem conhecimentos impossíveis de serem obtidos em

escala laboratorial ou no nível da teoria científica. Estes projetos/ações serão analisados com

maior atenção no subtópico 5.2.2.

Os destaques expostos a seguir derivam das principais características do conjunto das

iniciativas desempenhadas em território nacional. Os casos presentes na figura 5.1. dão

origem a estes destaques, os quais serão detalhados (na medida da sua relevância) na seção

seguinte (5.2.). Mas os highlights a seguir dão uma noção geral do esforço nacional e

levantam pontos que devem ser levados em consideração no momento da leitura dos casos em

particular. Os destaques são:

No decorrer da trajetória brasileira tem-se uma mudança de rota tecnológica: as

Iniciativas Pioneiras eram calcadas na hidrólise ácida, já as iniciativas realizadas nos anos

2000 pautam-se na sua maioria na hidrólise enzimática e na busca pela exploração da C5

(Xilose e Pentose) por meio de leveduras adaptadas geneticamente (OGMs) - fermentação

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226

de alto rendimento. A exceção fica por conta do caso do IPT, que baseia a sua tecnologia

no processo de gaseificação da biomassa;

As iniciativas brasileiras apresentam o mesmo time das ações que ocorreram em outros

países (no primeiro momento final dos anos 1970 e início dos anos 1980 e no segundo

momento início da segunda década de 2000). O Brasil segue a tendência mundial; a

figura 5.1., a tabela 5.2. e os dados de depósitos de patentes e publicações de artigos

científicos trabalhados no capítulo 4 indicam essa condição.

Todas as Iniciativas Pioneiras foram motivadas pelo contexto do Proálcool;

Com exceção do caso da Dedini, as iniciativas pioneiras não permaneceram ativas ao

longo do tempo, encerrando-se ou mudando de função com o fim do Proálcool e início

dos anos 1990;

As Iniciativas Pioneiras (com exceção do caso Dedini) tinham como princípio a

diversificação da biomassa para a produção de etanol, haja vista, realizaram testes com

biomassas distintas da cana-de-açúcar;

A iniciativa da Dedini é a mais duradoura do Brasil (23 anos) e antecipa a estratégia de

estabelecer parcerias. Diferentemente dos casos dos anos 2000, suas relações de

cooperação são estabelecidas com atores nacionais;

Todas as iniciativas dos anos 2000 estabeleceram parcerias estratégicas190

com firmas

estrangeiras. Este fato é o modus operandi para acessar tecnologias ligadas ao processo

de pré-tratamento, hidrólise e fermentação da C5.

O estabelecimento de parcerias com atores estrangeiros visa ter acesso a conhecimentos

específicos, adquirir novas competências, adquirir insumos tecnológicos e utilizar

estruturas de processamento de biomassa já em funcionamento para realização de testes

(plantas-pilotos e plantas de demonstração). As parcerias com atores nacionais visam

adquirir matéria-prima e compartilhar infraestrutura;

Todas as Iniciativas Exploratórias e todas as Iniciativas Estruturadas receberam aportes

diretos das agencias e órgãos de fomento para as atividades de P&D. Com grande

destaque ao programa PAISS Industrial, que sustentou financeiramente a construção das

plantas industriais em escala comercial. O mapeamento de políticas públicas e análise dos

casos demonstram que o esforço nacional foi estimulado e sustentado financeiramente

pela ação do Estado Brasileiro (vide capítulo 3 e a caracterização das iniciativas nos

subtópicos 5.2).

Quando os recursos eram negados ou descontinuados, o projeto não avançava – fato que

fica claro com o projeto de gaseificação do IPT, que não teve aportes do BNDES/FINEP,

assim, não saiu da escala laboratorial/piloto;

190

Segundo os trabalhos Hagedoorn (1993) e Vonortas & Safioleas (1997) define-se as parcerias estratégicas que

visam o desenvolvimento de novas tecnologias ou a obtenção de competências tecnológicas como acordos

cooperativos entre firmas independentes que compartilham objetivos tecnológicos comuns, tal ação afeta o

posicionamento de mercado no longo prazo de pelo menos um dos parceiros. Dependendo do conteúdo

tecnológico ou da base de conhecimento da firma/setor, os parceiros das empresas podem ser institutos de

pesquisa e universidades.

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227

As ações da FAPESP aparecem com maior importância na categoria de Iniciativas

Exploratórias. Firmas estabelecem convênios para cooperação em pesquisa (Dedini; BP;

Oxiteno; Odebrecht Agroindustrial) – Programa PITE.

Na categoria de Iniciativas Estruturadas o BNDES e a FINEP são os principais agentes

financiadores dos projetos, tanto das plantas comerciais como de ações em P&D

correlatas à nova unidade;

A ação do governo não se limitou ao financiamento “tradicional” de atividades de P&D,

pois em alguns casos - Petrobras; GranBio; CTC e Odebrecht agroindustrial - existe a

“mão” nada invisível do poder público participando diretamente da composição acionária

das empresas que conduzem os principais projetos em etanol celulósico. As ações do

BNDESPar ilustram esse fato;

As iniciativas dos anos 2000 são conduzidas por atores distintos, principalmente, por

firmas de diferentes “naturezas”. Este fato indica que o SSI da cana-de-açúcar passa por

um movimento de ampliação das suas fronteiras setoriais – atores que agem sobre uma

nova base tecnológica e de conhecimento;

Os casos dos anos 2000 são conduzidos por novos atores do SSI da cana-de-açúcar

(firmas e instituições criadas na última década), com exceção do CTC – vide quadro 5.1.

Alguns projetos apresentam o “pacote” tecnológico próprio como o cerne da iniciativa

(Dedini; CTC; Odebrecht Agroindustrial; Petrobras); outros incorporam tecnologias

estrangeiras e passam a adaptar equipamentos/componentes e “padrões” técnicos segundo

os problemas enfrentados (Raízen e GranBio);

As Iniciativas Incipientes não colocaram em prática seus projetos de P&D sobre etanol

celulósico no Brasil;

As Iniciativas Incipientes advêm de atores ligados ao segmento de bioenergias. Estes

casos podem ser encarados como uma proxy do desenvolvimento futuro/novos entrantes /

demanda por novas políticas para inovação / um potencial a ser explorado;

Na categoria de Iniciativas Exploratória, os institutos de pesquisa pública figuram como

atores relevantes - CTBE, IPT e Cenpes/Petrobras;

O estabelecimento de parcerias com universidades nacionais (relação universidade-

empresa) ocorrem nas Iniciativas Exploratórias e Iniciativas Estruturadas;

Nas Iniciativas Exploratórias e nas Iniciativas Estruturadas é que se tem o

desenvolvimento de competências nacionais na rota de E2G, pois firmas e instituições de

pesquisa destinam recursos para apreender e desenvolver conhecimento economicamente

útil na rota 2G. Ademais, os projetos de P&D são pensados e conduzidos para dar conta

dos problemas do setor sucroenergético. Estas competências surgem como consequência

de pesquisas e melhoramentos tecnológicos ocorrendo em território nacional e por meio

do trabalho de pesquisadores, engenheiros e técnicos “brasileiros”;

Os esforços na rota do etanol celulósico geraram patentes depositadas por atores

nacionais – Petrobras, GranBio, CTC, Odebrecht agroindustrial e CTBE;

As Iniciativas Estruturadas geraram expectativas muito acima da realidade. Hoje

enfrentam problemas não previstos no início do projeto, passando por momentos de

menor credibilidade e de desenvolvimento menos acelerado. Com isso, contingenciam

novos investimentos para novas plantas de E2G.

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5.2. A DINÂMICA DOS PROJETOS INDUSTRIAIS DE ETANOL CELULÓSICO NO

BRASIL

A análise a seguir complementa o levantamento de dados feitos nas etapas de pesquisa

anteriores, não apenas por identificar e caracterizar as ações dos atores que participaram da

rota tecnológica em território nacional, mas por “passar a limpo” o que foi feito, mostrando as

especificidades desse processo recente, que se não foi suficiente para colocar o Brasil na

dianteira do desenvolvimento tecnológico da conversão da biomassa em bioprodutos, foi

capaz de proporcionar condições de seguir a rota tecnológica, com possibilidades – a

depender das novas ações – de alcançar posição proeminente na atividade produtiva do etanol,

biocombustíveis avançados, bioquímicos e bioeletricidade.

Segue abaixo a caracterização dos esforços realizados ao longo dos últimos 35 anos do

SSI da cana-de-açúcar na(s) rota(s) do etanol celulósico, ademais, aprofunda-se na

identificação dos atores já apresentados na figura 5.1. e no quadro 5.1.. Assim, indica-se a

natureza dos projetos e as relações estabelecidas por estes atores com outros elementos e

agentes do SSI da cana-de-açúcar, para tal, segue a divisão esquemática dos grupos de

iniciativas/projetos em E2G: (1) as Iniciativas Pioneiras; (2) as Iniciativas Incipientes; (3) as

Iniciativas Exploratórias; (4) as Iniciativas Estruturadas.

5.2.1. As Iniciativas Pioneiras na trajetória do etanol celulósico: anos 1980

As primeiras iniciativas declaradas em desenvolver o etanol celulósico no Brasil

ocorreram nos anos 1980, contanto com quatro projetos: FTI Lorena/SP; CODETEC;

COALBRA; e Dedini. Tais projetos lograram resultados importantes, como: a caracterização

da biomassa de cana-de-açúcar; os primeiros testes e caracterização de outras biomassas

(eucalipto; palha de arroz e madeira); experimentos em escala piloto, demonstrativa e

comercial; conceito de integração de plantas industriais (E1G e E2G)191

.

A Fundação de Tecnologia Industrial - FTI de Lorena/SP foi a responsável pela

primeira iniciativa sistematizada de desenvolver a tecnologia de produção do etanol celulósico

no Brasil. Era uma instituição de pesquisa que foi originada a partir da Faculdade Municipal

de Engenharia Química – FAMENQUIL, na cidade de Lorena/SP em 1969. Em 1978 a

faculdade é incorporada pelo órgão Federal, a FTI – Fundação de Tecnologia Industrial e

191

Vale destacar que os processos enzimáticos não estavam maduros, de tal modo, a hidrólise ácida era a única

opção tecnológica disponível.

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229

passa a ter seu foco na pesquisa científica. Já como instituição federal conduz dois grandes

projetos tecnológicos da década de 1970, o desenvolvimento da tecnologia de beneficiamento

do nióbio e a tecnologia de produção de álcool combustível192

.

O projeto da FTI-Lorena consistia na construção de uma planta-piloto de etanol

celulósico com capacidade de produzir 500 litros por dia de etanol 2G. Usava como matéria-

prima o eucalyptus panicutata e o processo era a hidrólise ácida, dada por meio da ação do

ácido sulfúrico concentrado. As ações na unidade passaram por estudos em laboratórios e

bancadas até chegar à planta na escala-piloto que começou a funcionar em 1981 (MAIA,

2010; CALDAS, 2011; CORREA, 2014). O projeto se inseria na ideia do Estado brasileiro

em buscar alternativas à biomassa da cana-de-açúcar, por isso, utilizava resíduos agro

florestais.

De maneira concomitante às ações referidas acima, está o Projeto HIDROCON,

conduzido pela CODETEC (Companhia de Desenvolvimento Tecnológico), com parceria da

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e tendo como “cliente” a Firma Aços

Villares (LEITE, 2008). O projeto HIDROCON teve início em 1979, com o objetivo de

desenvolver o processo de hidrólise ácida em território nacional, sendo utilizada como

matéria-prima o bagaço da cana-de-açúcar e a palha de arroz. Os testes na escala de planta-

piloto correram entre 1981 a 1983, atingindo rendimentos de sacarificação na faixa de 57% a

60% em massa (CALDAS, 2011).

O processo compreende diversas etapas193

. Basicamente, o composto lignocelulósico

era aquecido com pressão controlada e na sequência era adicionado ácido concentrado sobre

esse composto, para no momento subsequente, a “pasta” ser exposta a uma queda de pressão

abrupta e um resfriamento. Os açúcares resultantes eram direcionados para a fermentação,

para dar origem ao etanol.

192

Em 1991, a FTI, até então responsável pela FAENQUIL, foi extinta e a Faculdade foi incorporada ao Sistema

Estadual de Ensino Superior do Estado de São Paulo. Com a estadualização a instituição passou apresentar

missão tripla: a pesquisa, o ensino e a extensão, sendo absorvida pela Universidade de São Paulo (USP) em

2006. 193

Tecnologia da Villares: i) formação de uma polpa aquosa homogeneizada de material celulósico com 3 a 30%

em peso de sólidos; ii) bombeamento desta pasta de material celulósico, de forma contínua, ao interior; iii)

aquecimento da pasta de material celulósico pressurizado até a temperatura de cerca de 160 (grau) a 250 (grau)

C. antes da sua introdução no reator; iv) adiciona de forma contínua uma dada dose de um ácido concentrado

“sobre” a pasta de material celulósico pressurizado e aquecido, que será diluída continuamente no reator, para

proporcionar a reação de hidrólise da referida pasta; v) submeter a polpa de material celulósico hidrolisado a

uma queda de pressão abrupta e arrefecer imediatamente após sair do reator; vi) neutralizando e fermentando a

solução aquosa resultante para se obter etanol; viii) e recuperando os subprodutos resultantes que são metanol,

furfural, ácido acético e lignina (BR 8102802).

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Segundo Leite (2008, p.487) “o sucesso da planta-piloto de hidrólise ácida motivou a

COPERSUCAR a contratar a CODETEC para a produção de equipamentos de hidrólise por

explosão a vapor (Steam Explosion)”. Por meio de um novo contrato tecnológico, foram

produzidos e instalados em várias usinas o sistema Steam Explosion com a finalidade de

melhorar o aproveitamento do bagaço para alimentação animal (gado).

A Codetec era uma companhia privada, com forte ligação com a Unicamp, voltada

para apoiar o estabelecimento de pequenas empresas surgidas na universidade, as quais

deveriam ser capazes de gerar tecnologia apropriada às condições brasileiras. Alguns autores

consideram como a primeira incubadora de empresas do país, criada em 1976. A experiência

resultou em dezenas de pequenas firmas de base tecnológica e voltadas a segmentos distintos,

dentre elas tem-se a Termoquip, que atua na área de fabricação de máquinas e equipamentos

para produção de energia a partir da biomassa194

.

A terceira iniciativa brasileira de desenvolvimento e introdução da tecnologia do

etanol celulósico se dá por meio da criação da Coque e Álcool de Madeira S/A (COALBRA),

foi criada por meio da Lei nº 6.768, de 20 de dezembro de 1979 com a finalidade de

incentivar a produção e a utilização de combustíveis líquidos derivados da madeira e,

também, com a função de produzir e comercializar diretamente os combustíveis e

subprodutos. Outra missão era de prestar assistência técnica às firmas interessadas na pesquisa

e produção de combustíveis líquidos.

Sua fábrica foi implementada em 1981 na cidade de Uberlândia/MG, a tecnologia de

produção do etanol celulósico era baseada em tecnologia estrangeira, o processo Scholler-

Madison, tecnologia que estava em funcionamento na União Soviética em escala industrial.

Com a importação da tecnologia, construiu-se uma fábrica com capacidade de produção de

30.000 l/dia de etanol. Segundo Caldas (2011, p. 20) a planta “não chegou a atingir a sua

plena capacidade operacional, devido a fatores econômicos desfavoráveis, tendo suas

atividades encerradas em meados de 1986”, quando se dedicava à produção de um composto

orgânico heterocíclico aromático – o furfural.

O processo em teste pela COALBRA era baseado em pré-tratamento com ácido

sulfúrico (H2SO4) diluído, devido ao seu menor preço e poucos problemas com a corrosão se

comparado ao ácido clorídrico (HCl). O uso de concentrações baixas de ácido (<1%)

demanda o uso de altas temperaturas (180-230 ºC), com isso, obtêm altos rendimentos de

194

A firma atua também no segmento de saneamento básico e ambiental, peças e acessórios.

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glicose. Por outro lado, as temperaturas elevadas degradam rapidamente as pentoses e as

hexoses da hemicelulose, com isso, inibe a fermentação, o próprio processo que dá origem ao

etanol. Situação semelhante enfrentado por outros processos baseados na rota ácida.

A COALBRA foi extinta pelo Decreto no

93.603, de 21 de novembro de 1986.

Portanto, sendo o único dos casos que não se desdobrou em novos esforços de aprendizagem,

se reformulando para continuar atuante no setor sucroenergético. A sua experiência se encerra

juntamente com o “início” da crise do Proálcool, situação que indica forte relação entre o

programa (política pública) e as iniciativas em desenvolver a tecnologia do etanol celulósico.

As ações sistematizadas do Estado brasileiro por meio do Proálcool e de todos os

outros instrumentos que o circundavam, sustentavam a demanda e a oferta do biocombustível

na realidade nacional, situação que proporcionava perspectiva de futuro e estimulou as

primeiras ações de desenvolvimento do E2G. Ao ser abandonado e posteriormente desativado,

acaba por eliminar o estímulo à inovação na trajetória do etanol celulósico, bem como,

diminuir a introdução de novos métodos, processo e tecnologias na fase industrial da

produção sucroalcooleira. Tanto que grande parte das usinas em funcionamento nos dias de

hoje (2017) apresentam os mesmos padrões tecnológicos introduzidos na década de 1970195

(um dos elementos da alta heterogeneidade do SSI da cana-de-açúcar).

A quarta iniciativa ocorre em 1982 pelas ações da Dedini Indústria de Base (antes

denominada de Codistil S.A.). A Dedini é uma firma tradicional de bens de capital do setor

sucroalcooleiro, fundada em 1920 no município de Piracicaba/SP, uma das grandes

responsáveis pelo processo de modernização e expansão da capacidade produtiva do setor ao

longo do século XX (NEGRI, 2010; OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013). É a única

firma nacional com capacidade de realizar projetos turnkey para o segmento sucroenergético

(usinas de E1G completas).

A iniciativa da Dedini deve ser considerada como o principal esforço brasileiro de

desenvolvimento do etanol celulósico por meio da rota ácida. Tal projeto remonta um

processo de aprendizagem que se inicia em 1982 com estudos laboratoriais e de bancada,

chegando em 2002 a projetar e construir uma Unidade de Desenvolvimento de Processo

(UDP), a qual funcionou até 2007 (OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013). No

195

Estes argumentos baseiam-se nos trabalhos de Varricho (2012); Valente et al. (2012); Oliveira Filho (2013) e

Bin et al.(2015). E, principalmente, nos dados apresentados por José Luiz Oliverio (Dedini Indústria de Base

S.A.) no evento “Proálcool, universidades e empresas: 40 anos de ciência e tecnologia para o etanol brasileiro”

realizado na FAPESP no dia 30 de Novembro de 2016.

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desenvolvimento do projeto, a Dedini estabeleceu relações com outros atores do SSI da cana-

de-açúcar, tais como USP/Esalq; Rhodia; CTC; Coopersucar; FAPESP.

A tecnologia desenvolvida pela Dedini foi o processo Dedini Hidrólise Rápida -

DHR196

que combina o processo organosolv197

com a hidrólise ácida diluída (ácido sulfúrico).

Na tecnologia DHR, o pré-tratamento e a hidrólise ocorrem em estágio único, no mesmo

reator. Segundo Silva (2013, p.55) “o processo organosolv realiza o pré-tratamento, o qual

dissolve a lignina, através da combinação de um solvente em meio aquoso, com

aproximadamente 75% de etanol e 25% de água. O pré-tratamento deixa a celulose e

hemicelulose expostas para a reação da hidrólise”. Essa reação ocorre em um reator com

pressão (25/28 bar) e temperatura (180/200°C) controladas.

Após a hidrólise, o composto passa por um resfriamento através da evaporação flash

para que não haja a degradação dos açúcares obtidos, já que o meio da reação é ácido. Em

seguida, o licor hidrolisado (o composto) é encaminhado à destilação, processo igual ao de

primeira geração (OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013).

O ponto de inflexão do projeto DHR é a cooperação entre a Dedini, Copersucar e a

FAPESP em 2002. Por intermédio do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para

Inovação Tecnológica (PITE) deu origem a construção de uma planta semi-industrial de

etanol celulósico acoplada à Usina São Luiz, em Pirassununga/SP. A capacidade da planta de

demonstração era de 2 mil quilos de bagaço por hora e produção de 5.000 litros de etanol por

dia.

Esta nova organização do projeto de P&D da Dedini deu condições à firma realizar o

scale up do projeto inicial de 1982198

e compreender de maneira mais aprofundada elementos

importantes do processo de produção de etanol de segunda geração, os quais estavam ausentes

ou mostravam-se superados no nível de bancada e da planta-piloto.

Os trabalhos de Oliveira Filho (2013) e Silva (2013) elencam alguns avanços

tecnológicos e conceituais atingidos nesta fase do projeto: i) a seleção de materiais

compatíveis para ambientes corrosivos; ii) desenvolvimento de sistema de alimentação

contínua do bagaço em reatores, sob pressão elevada; iii) automação e controle dos

equipamentos de pré-tratamento e hidrólise; iv) a identificação da necessidade da limpeza da

196

A base da tecnologia era o processo Organosolv combinado com hidrólise ácida (ácido sulfúrico)

(OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013). 197

Organosolv é uma técnica que usa solvente orgânico para solubilizar lignina e hemicelulose, muito utilizada

na indústria de papel e celulose. 198

Para acompanhar detalhadamente a evolução histórica do processo DHR vide Silva (2013).

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biomassa; v) implantação de um sistema de limpeza da biomassa antes do pré-tratamento; vi)

desenvolvimento de um conceito de integração da primeira geração com a segunda geração199

,

ou seja, anexar o processo de hidrólise às usinas existentes - obtendo vantagens econômicas,

tais como o compartilhamento da Infraestrutura; de alguns equipamentos (colunas de

destilação); logística da biomassa e de distribuição do produto final.

Outra ação que descendeu deste projeto foi o estabelecimento de um convênio entre a

FAPESP e a Dedini visando apoiar projetos de pesquisa científica e tecnológica cooperativos,

entre pesquisadores de instituições de pesquisa e de ensino superior no Estado de São Paulo, e

da Dedini (formação de equipes mistas). Os projetos deveriam versar sobre o conhecimento e

a tecnologia na área de processos industriais para a fabricação de etanol de cana-de-açúcar200

.

O acordo foi firmado em 2007 e previa o aporte financeiro de R$100 milhões com

desembolsos ao longo de 5 anos. Mas o convênio ao longo do seu período de vigência

realizou apenas uma chamada com aportes de até R$ 20 milhões. O resultado ficou muito

abaixo do esperado, pois nesta única chamada só foi contratado um projeto de pesquisa,

coordenado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos, que abordava o

processo de destilação, sob o titulo “aplicações de técnicas de CFD na melhoria e eficiência

de estágio em colunas de destilação para produção de etanol”, portanto, voltado

principalmente ao etanol de primeira geração.

5.2.2. Iniciativas Incipientes

Todas as iniciativas a seguir têm em comum o fato de não ter colocado em prática seus

projetos de P&D relacionados à tecnologia do etanol celulósico no Brasil. Portanto, são ações

que ficaram no plano das especulações e das intenções, os casos que se encaixam nesta

categoria são: Jaraguá Equipamentos; Brasil Bioenergia; BP; Abengoa; Clariant.

Os casos da Jaraguá Equipamentos Industriais e da Bioenergia do Brasil S/A se

enquadram no tipo de ações incipientes especulativas, com poucas informações divulgadas

199

O conceito de integração de plantas da Dedini DHR foi absorvido pelo CTC. 200

O acordo de cooperação entre a Dedini e FAPESP era realizado por meio do Programa de Apoio à Pesquisa

em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) (vide capítulo 3). Os projetos contratados deveriam ser voltados

à pesquisa básica e ao desenvolvimento de tecnologia e visavam o desenvolvimento de técnicas de conversão do

bagaço de cana em etanol. Os temas do projeto eram: a) Pesquisa científica ou tecnológica aplicada ao

desenvolvimento de tecnologia para o sistema Dedini Hidrólise Rápida (DHR)200

; b) Pesquisa científica sobre

hidrólise utilizando rotas químicas e/ou enzimáticas ou sobre rotas que produzem combustíveis líquidos por

gaseificação, produção de gás de síntese e devidas conversões catalíticas; c) Produção de energia; d) Consumo

de energia; e) Rendimento e eficiência de processos.

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pelas firmas. O que há de concreto é que ambas participaram da chamada do PAISS

Industrial, tendo projetos aprovados somente na primeira fase do programa. Seus projetos

eram na linha temática 2 (Bioetanol de 2ª Geração) no eixo de Integração e escalonamento de

processos para produção de etanol celulósico. No entanto, na “Lista de empresas com Planos

de Negócio Selecionados” estas duas iniciativas não estão presentes, significando que seus

projetos de pesquisas não fazem parte do PAISS Industrial. Em buscas pela internet e na

revisão da literatura, estas iniciativas não aparecem com grande destaque.

A Bioenergia do Brasil S/A, antes chamada de Central de Álcool Lucéia Ltda., mostra-

se atuante nas atividades de P&D, mas não como empresa líder e sem realizar as atividades de

pesquisa internamente. Sua atuação ocorre por meio da participação em projetos de pesquisa

com outros atores, como no Programa Sugarcane EST Project – Sucest (1999 – 2003) da

FAPESP, em parceria com o CTC, USP e Unicamp. Um dos resultados desse projeto foi a

identificação de 200 genes da cana.

Outro resultado encontrado para esta firma foi o depósito de uma família de patente

“capturada” pelo recorte analítico da pesquisa, que ocorreu no ano de 2010 em pareceria com

pesquisadores da USP. A invenção não é diretamente ligada à tecnologia de produção do

etanol celulósico, mas pode abrir espaço para mudanças de características genéticas da cana,

as quais podem em teoria ser uteis ao E2G. Assim, a invenção provê sequências de ácidos

nucleicos isolados de promotores de genes de cana-de-açúcar; insere-se no campo da

engenharia genética, buscando regulação das expressões genéticas da planta201

.

Dentre as ações que não progrediam até o estabelecimento de plantas industriais

ligadas ao capital estrangeiro, tem-se o projeto da British Petroleum Biocombustíveis (PB), a

qual não passou de uma sondagem, não saindo do plano. Mas as especulações são

fundamentadas, visto que a BP no Brasil opera três usinas, duas em Goiás e uma em Minas

Gerais, em que juntas somam capacidade de moagem de 9,7 milhões de toneladas de cana-de-

açúcar e produção anual de 640 milhões de litros de etanol202

.

Outro elemento que condiz com a especulação é o fato da empresa ter adquirido em

2010 uma planta demonstrativa de etanol celulósico e um centro de tecnologia em

201

O título da patente é “promotores de cana-de-açúcar, cassetes de expressão, vetores e seu uso na expressão

de transgenes” (patente - BRPI1003751). 202

Desde janeiro de 2013, a BP realiza aumentos de capital, resultando na injeção R$ 1,218 bilhão nas usinas.

Em julho de 2016, a unidade Tropical, em Edéia/GO, passou a ter a maior capacidade produtiva de etanol do

Brasil (3,7 milhões de litros por dia de etanol)Disponível em: <

https://www.novacana.com/n/industria/usinas/usina-goiana-maior-pais-capacidade-producao-etanol-220716/>

Acesso em: 05 Novembro 2016.

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biocombustíveis em Jennings (Louisiana/EUA), da empresa de tecnologia Verenium, que

atuava principalmente no segmento de desenvolvimento de enzimas. Este negócio

movimentou U$ 98,3 milhões.

Estes fatos somam-se à existência de um joint venture entre a BP e Dupont que visam

produzir Bio-butanol, a Butamax203

, a qual no início de 2017 adquiriu uma firma americana,

Nesika Energy, que possui uma planta de etanol nos Estados Unidos. O objetivo dessa

estratégia é transformar a unidade em uma produtora de bio-isobutanol, molécula produzida a

partir de fontes renováveis que pode ser usada na indústria química e em combustíveis

(adicionado à gasolina)204

.

Entretanto, estas condições não foram suficientes para a implantação do projeto no

Brasil. Ademais, em 2015 a BP decidiu descontinuar o projeto de etanol celulósico nos EUA

(Jennings/Louisiana), situação que acentua as incertezas em relação ao seu posicionamento

no segmento de etanol de segunda geração205

.

Mesmo não estabelecendo o projeto de E2G no Brasil, a BP demonstrou ao longo da

década de 2000 outras iniciativas em P&D, tanto por meio da Butamax como pela atuação da

BP Biocombustíveis. A Butamax possui em Paulínia/SP, desde 2010, um laboratório de

fermentação para obtenção de informações preliminares para dar apoio à produção futura de

bio­isobutanol a partir da cana­de­açúcar. Em 2011 apresentou projeto na chamada do PAISS

Industrial (Linha 2 – Novos produtos de cana-de-açúcar), foi selecionada, mas, não contratou

os recursos.

No que se refere às ações da BP Biocombustíveis na atividade de P&D, tem-se a

criação de uma equipe de pesquisadores para conduzir experimentos e investigações no

universo da produção do etanol a partir da cana-de-açúcar206

(12 ao todo). Em 2012 BP

203

A Butamax foi formada pela BP e pela DuPont em 2009, com 50% de participação cada. A joint venture

possuiu plantas de demonstração de bio­isobutanol no Reino Unido e nos Estados Unidos. 204

Disponível em: http://www.valor.com.br/agro/4925434/butamax-de-bp-e-dupont-adquire-empresa-de-etanol-

nos-eua Acesso em: 03 de Julho de 2017. 205

Este movimento parece ser mais uma tentativa de reestruturação da estratégia global da empresa do que um

abandono das tecnologias renováveis baseadas na biomassa, pois o fechamento da estrutura em Louisiana vem

acompanhada do estabelecimento de um centro de pesquisas em biociências em San Diego (Califórnia/EUA), o

qual deve centralizar os recursos e capacidades desenvolvidas nos últimos anos (Disponível em: <

https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/bp-vender-ativos-etanol-celulosico-fecha-usina-centro-

pesquisa-150515/> Acesso em: 20 Outubro de 2016. 206

Segundo a reportagem da Revista PESQUISA FAPESP 202 – dezembro de 2012, a equipe de pesquisadores

no Brasil era composta por engenheiros e biólogos e estabelece interação com os pesquisadores do laboratório da

BP nos Estados Unidos, San Diego. A intenção é trocar informações e experiências no segmento de produção de

biocombustíveis. No mesmo, ano a BP anunciou investimentos de US$ 500 milhões durante 10 anos em

pesquisas feitas pelo Energy Biosciences Institute (EBI) para desenvolvimento de energias renováveis a partir da

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Biocombustíveis assinou um acordo de cooperação científica e tecnológica com a FAPESP,

visando apoiar um programa de pesquisa colaborativo, que tinha a intenção de promover

projetos de pesquisa entre pesquisadores vinculados a instituições de ensino e pesquisa, do

Estado de São Paulo, e pesquisadores da BP.

O aporte financeiro era de no máximo US$ 25 milhões a serem desembolsados pela

FAPESP e de até US$ 25 milhões a ser desembolsada pela BP, com duração de dez anos. O

acordo ainda está em vigência, entretanto, na busca feita na base de dados da FAPESP não foi

encontrado nenhum projeto financiado no âmbito do acordo BP Biocombustíveis/FAPESP.

Outro caso ligado ao capital estrangeiro que se limitou a especulação foi a Abengoa

Bioenergy, multinacional com sede na cidade de Sevilha, Espanha207

. Possui e opera 16

unidades de produção de etanol localizadas nos Estados Unidos, Europa e Brasil, com uma

capacidade total de produção de 3,187 bilhões de litros por ano. Chegou ao Brasil em 2007 ao

adquirir o controle da Dedini Agro por R$ 1,3 bilhão.

No segmento do etanol celulósico, instalou uma planta-piloto em York (EUA) no ano

de 2007, visando processar a palha de trigo e resíduos de milho, com capacidade de 75.708,2

litros por ano. Para sustentar esse projeto, participou de uma linha de fomento à pesquisa do

U.S. Department of Energy (DoE) americano, a cost share Grant, recebendo US$ 97 milhões.

Em 2009 instala outra planta-piloto na região de Salamanca (Espanha), com capacidade de 1,3

milhões de litros de etanol ano, processando palha de trigo e de cevada. Já em 2011 constrói

uma planta industrial comercial de E2G na cidade de Hugoton (Kansas- EUA), para tal é

beneficiada com o empréstimo de US$ 133 milhões por meio do Energy Policy Act.

O projeto industrial da Abengoa no Brasil vem a reboque das ações realizadas nas

unidades no exterior, com tecnologia desenvolvida pela própria matriz. O objetivo era

construir uma plana de E2G em escala comercial na cidade Pirassununga/SP. O projeto foi

enviado e avaliado pelo PAISS Industrial sendo aprovado e concedido o aporte de R$

309.556.000 pelo BNDES na modalidade crédito. Mas a empresa desistiu de contratar os

recursos, alegando que os problemas financeiros existentes na companhia dificultavam a

tomada de créditos (ENTREVISTA X).

biotecnologia – iniciativa liderada pela Universidade de Berkeley, na Califórnia, em parceria com a

Universidade de Illinois, ambas nos Estados Unidos (FAPESP, 2012). 207

Tal firma pertence à Abengoa S.A., grupo industrial que atua no segmento de energia (biocombustíveis; solar,

eólica e transmissão elétrica) e presta serviços de engenharia nas áreas de energia e meio ambiente.

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Em 2015 a Abengoa (matriz) iniciou um processo de reestruturação financeira que

abriu a possibilidade de venda de algumas das suas unidades produtoras de biocombustíveis.

Nos Estados Unidos, vendeu 5 plantas de etanol208

, mas até o presente momento, apesar das

especulações, continua atuando no Brasil, embora seu projeto de etanol celulósico continue

parado.

A Clariant é um firma multinacional do setor químico, com atuação no mercado

brasileiro, e planta industrial na cidade de Suzano/SP209

. Como tal, seu interesse no segmento

sucroenergético é o desenvolvimento da química verde, utilizando-se da biomassa de cana-de-

açúcar como matéria-prima para compostos químicos que possam integrar sua cadeia de

insumos ou de produtos finais.

O caso da Clariant até o momento é uma ação de especulação e de espera do deslace

do contexto, pois não apresentou em território nacional nenhuma proposta de P&D. Por outro

lado, vêm sistematicamente participando dos eventos da União da Indústria de Cana-de-

açúcar (UNICA), tanto como patrocinador como colaborador/palestrante210

indicando seu

interesse em explorar os potencias do segmento sucroenergético, haja vista, o

desenvolvimento da tecnologia Sunliquid, processo completo de produção de etanol

celulósico desenvolvido por ela.

A tecnologia de produção de etanol celulósico da Clariant está em testes em uma

planta pré-comercial (demo), localizada em Straubing (Bavieria/Alemanha)211

. Sua

capacidade é de 1 milhão de litros/ano de etanol celulósico, alimentada com 4,5 mil toneladas

de palha de trigo. O processo Sunliquid baseia-se na hidrólise enzimática e processo de

fermentação com micro-organismos geneticamente modificados desenvolvidos pela própria

Clariant. Com isso, projeta-se converter 90% da celulose e hemicelulose presentes no material

208

Disponível em: <http://www.canalbioenergia.com.br/etanol-2g-primeiras-plantas-comerciais-em-plena-

producao/> Acesso em : 10 Outubro 2016. 209

A Clariant no Brasil emprega 1.260 trabalhadores. Na cidade de Suzano/SP, funciona o maior parque fabril da

companhia na América Latina, concentra-se o maior número de pessoas, 823. A sede administrativa e o Centro

Regional de Desenvolvimento e Assistência Técnica, na capital paulista (276). 210

Em 2017 participou do Ethanol Summit como patrocinador e apresentou a tecnologia Sunliquid no painel

“Perspectivas para 2030: O Papel do Etanol Celulósico” (CAMPO VI). 211

Disponível em: < http://www.petroleoenergia.com.br/clariant-investe-no-etanol-celulosico/>. Acessado em:

25 de março de 2017.

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fibroso em etanol212

. Um diferencial é que a planta integra a produção das enzimas no mesmo

local, o que proporciona a redução dos custos213

.

Até o presente momento (primeiro semestre de 2017) a Clariant não estabeleceu

nenhuma parceria com atores nacionais ou licenciou a sua tecnologia de produção do E2G em

território brasileiro. As únicas ações concretas foram: i) testes de conversão do bagaço de

cana-de-açúcar na sua planta demonstrativa, 40 contêineres de bagaço de cana do Brasil

foram enviados a Europa, a experiência demonstrou um rendimento de 300 litros de etanol

por tonelada de biomassa (bagaço); ii) Em 2016 a Clariant em cooperação com a Scania do

Brasil iniciou um teste/divulgação do etanol de segunda geração produzido pela companhia na

Alemanha, colocou em operação três caminhões Ecotrucks214

movidos a etanol nas operações

cotidianas da sua fábrica em Suzano/SP.

5.2.3. Iniciativas Exploratórias

Dentre as Iniciativas Exploratórias, as quais atingiram status e dimensões de execução

de projetos de P&D e desenvolvimento de competências em território nacional, têm-se os

casos da Oxiteno, Odebrecht Agroindustrial; Petrobras; Instituto de Pesquisas Tecnológicas

(IPT) e o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE). Todos estes

atores se caracterizam por implementar atividades de P&D na temática do etanol celulósico,

sendo realizadas internamente e/ou por meio de parcerias estratégicas.

A Oxiteno é uma multinacional brasileira, pertencente ao segmento petroquímico que

foi fundada em 1970, sendo a primeira firma brasileira a produzir óxido de eteno e derivados

no Brasil. A Oxiteno pertence ao grupo Ultra215

.

É líder nacional em tensoativos e em especialidades químicas, atuando no

desenvolvimento e fornecimento de insumos para indústrias, incluindo cosméticos, cuidados

212

Isso equivale em teoria uma razão de 4,5 toneladas de bagaço de cana para 1.000 litros de etanol celulósico

(CLARIANT, 2017). Estes números são super interessantes uma vez que 1 tonelada de cana-de-açúcar produz

entre 85 - 90 litros de etanol (CGEE, 2009). 213

Este design é semelhante com o modelo em desenvolvimento pelo CTBE – produção de enzimas “on site”. 214

Estes veículos são capazes de reduzir em até 92% a emissão de CO2 em comparação a veículos similares a

diesel. Os caminhões dispõem de uma tecnologia/adaptação do motor a diesel, assim, funcionam com uma

mistura de 95% de etanol e 5% de um aditivo especial – no caso o Master Batch ED 95, produzido pela Clariant

no Brasil. Disponível em: <http://www.unica.com.br/noticia/caminhoes-a-etanol-adquiridos-pela-clariant-

entram-em-operacao/>.Acessado em: 25 de março de 2017. 215

Uma companhia multinegócios que está entre os cinco maiores grupos empresariais do Brasil, teve início no

ano de 1937 com a distribuição de gás domiciliar. Atua nos seguintes segmentos econômicos: a) Distribuição e

varejo especializado, por meio da Ipiranga, no setor de combustíveis; da Ultragaz, no segmento de Gás

Liquefeito de Petróleo (GLP); e Extrafarma, no varejo farmacêutico; b) Indústria de especialidades químicas, por

intermédio da Oxiteno; c) Armazenagem de granéis líquidos, por meio da Ultracargo.

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239

pessoais, limpeza doméstica e industrial, agroquímicos, tintas e vernizes. Os dois grandes

nichos de mercado da Oxiteno são os derivados de óxido de eteno e os solventes oxigenados.

Com a possibilidade do desenvolvimento da química verde alguns dos seus produtos podem

ser produzidos a partir do etanol e, é desta possibilidade que nasce seu interesse em

desenvolver a tecnologia e a produção do E2G e de bioquímicos216

.

A iniciativa de pesquisa da Oxiteno começou em 2004 com o estabelecimento de uma

equipe de trabalho da própria firma para realizar o levantamento do “estado da arte” da

tecnologia de conversão da biomassa – basicamente pesquisa bibliográfica.

Em 2006 por meio da cooperação entre Oxiteno, FAPESP e BNDES, abriu-se uma

chamada pública para recebimento de propostas de projetos de pesquisa na área de novas

tecnologias visando à produção de açúcares, álcool e derivados. A chamada pública previa o

investimento de R$ 6 milhões, sendo metade custeada pela Oxiteno e a outra metade pela

FAPESP e BNDES (JOÃO et al., 2012; VARRICHO, 2013). Os projetos que foram

aprovados seguiam as normas e os padrões do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria

para Inovação Tecnológica (PITE/FAPESP).

A chamada pública da Oxiteno apresentava 16 linhas temáticas, que versavam sobre a

metodologia analítica; hidrólise ácida; hidrólise enzimática; caracterização de bioprodutos e

estudos sobre a lignina. A chamada pública da Oxiteno foi uma maneira que a firma

encontrou para perseguir a nova(s) rota(s) tecnológica(s) sem desempenhar as atividades de

P&D internamente217

. Trata-se de uma estratégia da firma, a conversão da biomassa em

bioprodutos era uma área nova para a firma, na qual não apresentava competências internas e,

segundo Pedro Wongstchowski, Presidente do Grupo Ultra “montar uma equipe de pesquisa

nesses assuntos levaria cinco anos para começar a trabalhar eficientemente. Teríamos de

contratar e treinar gente, definir métodos...” 218

.

Outro ponto da ação é que por intermédio da chamada pública foi possível diversificar

os esforços, abarcando elementos das diversas rotas tecnológicas, já que os diferentes grupos

de pesquisa atuam em áreas distintas e complementares.

216

Na linha do óxido de eteno é possível obter o etilenoglicol (líquidos de arrefecimento) por uma rota verde

com etanol e na linha de solventes oxigenados a Oxiteno já comercializa Solventes Verdes obtidos a partir da

cana-de-açúcar, que dão origem a uma série de derivados e substituem os solventes sintéticos. 217

Disponível em: < http://www.bv.fapesp.br/namidia/noticia/7008/pesquisa_desenvolvimento_etanol/>

Acessado em: 10 Fevereiro de 2016. 218

Disponível em: < http://www.bv.fapesp.br/namidia/noticia/7008/pesquisa_desenvolvimento_etanol/>.

Acessado em: 10 Fevereiro de 2016

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O convênio entre Oxiteno-FAPESP realizou uma chamada, em duas fases: na primeira

fase pré-aprovou 23 projetos, destes aprovou e financiou 4 auxílios à pesquisa e uma bolsas

no país, executados entre 2007-2012. As instituições que participaram e relacionaram-se neste

programa foram: o IPT com projeto sobre hidrólise enzimática; o IQSC/USP com o

desenvolvimento de metodologia analítica e deslignificação com o processo organossolve; o

Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) com projetos de hidrogenólise e

Catalisadores; e por fim, a ESALQ/USP com a fermentação industrial tendo fungos como

agentes. Todos tangenciam o universo da tecnologia do etanol celulósico.

A Odebrecht Agroindustrial219

atua na produção e comercialização de etanol, açúcar e

energia elétrica a partir da biomassa. Fundada em 2007, a Odebrecht Agroindustrial

(primeiramente chamada de ETH Bioenergia) é uma firma subsidiária do Grupo Odebrecht220

.

A Odebrecht Agro é a segunda maior produtora de etanol do Brasil e o terceiro maior

grupo do setor sucroenergético em termos de capacidade instalada, composta por 9 usinas.

Todas somadas apresenta a capacidade instalada de 36 milhões de toneladas de cana-de-

açúcar, com isso emprega 12 mil trabalhadores e é capaz de produzir 700 mil toneladas de

açúcar, 3,7 mil m3 de etanol e gerar 3,1 GWh de energia elétrica a partir da queima da

biomassa restante (ANUARIO DA CANA, 2015). Na safra 2015/2016, atingiu a moagem de

29,2 milhões de toneladas de cana, o que representa um crescimento de 20% em relação à

safra anterior.

A Odebrecht Agroindustrial passa a realizar esforços na trajetória do etanol celulósico

a partir da implementação do PAISS Industrial. No contexto do programa ela estabelece dois

projetos, o primeiro visa à construção de uma planta em escala comercial de etanol celulósico

a partir do bagaço e da palha de cana-de-açúcar. O segundo projeto objetiva realizar

desenvolvimento proprietário da tecnologia de etanol celulósico. Ambas às ações contam com

parcerias estratégicas e com o financiamento púbico via PAISS Industrial (vide capítulo 3)

219

A composição acionaria da empresa em 2014 era XX do Grupo Odebrecht, 14,4% do BNDESPar, 13,1% do

Ashmore e 2,4% da Tarpon Investimentos.

Disponível em: <http://www.novacana.com/n/industria/financeiro/odebrecht-agroindustrial-injecao-capital-ceo-

060814/> Acessado em: 10 de abril de 2017. 220

A Organização Odebrecht é um conglomerado brasileiro de capital fechado que atua em diversas partes do

mundo (24 países) nas áreas de construção e engenharia, químicos e petroquímicos, energia, indústria,

desenvolvimento e operação de projetos de Infraestrutura e saneamento. Tem sua origem no setor da Construção

Civil em 1923, Salvador/BA.

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241

O projeto de construção da planta comercial de E2G conta com o acordo de

licenciamento da tecnologia desenvolvida pela Inbicon (Dinamarca), contrato estabelecido em

2013. O objetivo da parceria é comprovar/validar o potencial da tecnologia da Inbicon – que

só operou em escala demonstrativa. Por outro lado, a execução do projeto possibilita a

Odebrecht Agro entrar na rota tecnológica do etanol celulósico e acompanhar os concorrentes.

A Inbicon é uma subsidiária da DONG Energy, a maior companhia dinamarquesa de

energia, com mais de 6.000 funcionários e receita na ordem de US$ 9,8 bilhões (2011). A

Inbicon apresenta testes com a tecnologia de conversão de biomassa já no fim dos anos 90.

Sua tecnologia baseada na rota enzimática realiza a transformação dos materiais

lignocelulósicos leves (palha de trigo, caules de milho, gramíneas) em etanol celulósico e

melaço de açúcar industrial.

Em 2009 realizou a instalação de uma planta na escala de demonstração na cidade de

Kalundborg (Dinamarca), utilizando como matéria-prima a palha de trigo. A capacidade da

unidade é de 1,5 milhões de galões por ano de etanol celulósico, 11.400 toneladas métricas de

pellets combustíveis de lignina e 13.900 toneladas métricas de melaços de açúcar industriais.

Esta planta se integra a uma estação de energia adjacente, realizando a produção de energia

elétrica.

Desta forma a empresa dinamarquesa oferece um pacote tecnológico com soluções

integradas para a produção do biocombustível, visando realizar as adaptações à realidade

brasileira. Por isso, em julho de 2013, amostras do bagaço de cana das usinas da Odebrecht

foram enviadas para Kalundborg, para serem testadas na planta de demonstração da parceira.

A tecnologia oferecida pela Inbicon engloba um processo de pré-tratamento diferente,

realizado em duas etapas, o pré-tratamento mecânico e o pré-tratamento hidrotérmico. Após

estes dois momentos produtivos, o composto resultante passa pela hidrólise enzimática e a

solução de açucares passa para o processo de fermentação, a qual é feita pelo uso de leveduras

geneticamente modificadas, possibilitando a co-fermentação dos açúcares C5 e C6. Na

sequencia realiza-se a destilação convencional com o objetivo de separar a água do etanol.

A formação deste arranjo para execução de atividade de inovação, mais a tradição

tecnológica da Inbicon, gerou uma expectativa de desenvolvimento bem otimista do projeto,

tais como, o início das operações em escala industrial em 2015. Mas como se sabe até o

primeiro semestre de 2017 a planta não foi sequer construída.

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242

O projeto original da Odebrecht-Inbicon apresentavam três fase distintas que deveriam

ser executadas em 3 anos (2013-2016), a saber: a) comprovação de viabilidade tecnológica

(testes na planta de demonstração e aprimoramentos); b) planejamento da planta comercial e;

c) construção e operação da planta comercial. O projeto foi “interrompido” no segundo

momento quando a Odebrecht comprovou a viabilidade da tecnologia escolhida (em 2014).

Esta comprovação pode ser considerada como um dos resultados positivos do projeto

até o momento. Os testes feitos na planta demo, na Dinamarca, obtiveram resultados de custo

de produção do E2G abaixo do patamar estimado pela pesquisa conduzida pelo BNDES-

CTBE (MILANEZ et al. 2015). O custo de produção do biocombustível alcançado pela

Odebrecht-Inbicon foi de aproximadamente R$1/litro, quanto à estimativa da pesquisa era de

proximamente R$ 1,50/litro. Fato que indica a viabilidade técnica do projeto.

O acordo de licenciamento da tecnologia foi além da utilização, pois na busca de

família de patentes sobre E2G no Brasil foi possível encontrar 2 patentes da Odebrecht

Agroindustrial com cotitularidade com a Inbicon, que ao todo realizou 10 depósitos de

famílias de patentes no Brasil. Estas duas patentes foram depositadas na vigência do projeto

(2014) e abordam processo para a produção de um ou mais alcoóis a partir de matérias-primas

lignocelulósicas (BR102014023091; BR102014011796).

Na outra iniciativa de P&D impulsionada pelo PAISS Industrial teve-se o

estabelecimento do acordo de cooperação entre Odebrecht, VTT Brasil e Metso. Esta relação

gerou um consórcio de P&D, para a viabilização do desenvolvimento proprietário da

tecnologia de etanol 2G. Neste caso, a tecnologia é desenvolvida em conjunto entre os

parceiros.

A VTT Brasil221

é uma subsidiaria de um instituto de pesquisa finlandês especializado

em tecnologias de biorrefinaria e a Metso é uma empresa de bens de capital / engenharia com

tradição no segmento de papel e celulose, com origem na Finlândia.

A VTT Brasil também foi contemplada pelo PAISS Industrial de maneira “separada”

ao consórcio com a Odebrecht, assim, fechou um contrato de R$ 13,7 milhões com a FINEP,

sendo que quase R$ 10 milhões deste aporte são na modalidade recursos não-reembolsáveis e

o restante será a contrapartida da empresa.

221

A VTT Brasil era a única subsidiaria fora da Finlândia e foi inaugurada em 2011 na cidade de Barueri/SP, de

maneira concomitante ao estabelecimento do projeto com financiamento do PAISS Industrial. Um ponto

adicional é que esta empresa encerrou suas atividades no fim de 2016, situação que merece novos esforços de

investigação.

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243

O objetivo fundamental do consórcio entre Odebrecht-VTT-Metso é o

desenvolvimento de uma solução tecnológica que viabilize a produção de etanol de segunda

geração integrada à produção de etanol de primeira geração e de energia elétrica no Brasil. O

escopo é desenvolver esses processos para a biomassa da cana-de-açúcar. Assim, o acordo

prevê transferência tecnológica e customização dos processos pensando a cana-de-açúcar (já

que as empresas parceiras já realizaram projetos semelhantes na Finlândia com resíduos de

madeiras).

De maneira paralela a Odebrecht Agroindustrial estabeleceu um acordo de cooperação

com a FAPESP em 2011, por meio do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para

Inovação Tecnológica (PITE). O objetivo da chamada era promover projetos de pesquisa que

almejassem soluções novas e de relevância imediata para a construção de competências

científicas e tecnológicas na área de bioenergia, buscando também as aplicações com valor de

mercado222

. O edital completo da FAPESP-Odebrecht Agroindustrial previa o dispêndio de

R$20 milhões.

Em 2012 a primeira chamada recebeu um total de 29 propostas de pesquisa, das quais

11 foram selecionadas. O aporte financeiro para viabilizar estes projetos aprovados foi de R$

10 milhões, sendo que cada parte participou com 50% dos recursos. Estes projetos tiveram

duração de 60 meses (aproximadamente até 2016/2017 dependendo do início do cronograma).

Os projetos versam sobre a utilização de ferramentas modernas de bioinformática,

genética, expressão heteróloga de alta produtividade e Bioquímica Molecular Estrutural para

identificar, clonar e expressar em larga escala as xilose isomerases (Xls) que sejam novas e

potencialmente patenteáveis. Outros projetos abrangeram o desenvolvimento de pré-

tratamento do bagaço da cana para obter um hidrolisado hemicelulósico e, conduz testes de

isomerização e fermentação simultâneos de C5 usando leveduras comerciais e industriais em

condições reacionais próximas às encontradas nas usinas do país.

Dentre as Iniciativas Exploratórias há ainda os projetos conduzidos por instituições

públicas de pesquisa, que além de avançar o conhecimento do SSI da cana-de-açúcar na(s)

rota(s) do etanol celulósico gera competências locais (pesquisas votadas às características do

setor sucroenergético e conduzidas por pesquisadores brasileiros). Os destaque aqui ficam por

conta do IPT e do CTBE.

222

Disponível em: < http://agencia.fapesp.br/fapesp_e_eth_bioenergia_anunciam_resultado_de_chamada/16218/

> Acessado em 24 de julho de 2017.

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244

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) tem como

objetivo prover apoio e soluções tecnológicas que visam aumentar a competitividade dos

setores econômicos e promover a qualidade de vida223

, tanto para o setor público como

privado. A ligação com o setor sucroenergético ocorre pela prestação de serviços (análise de

materiais; análise da composição da biomassa e etc.) e pela participação ou condução de

projetos de pesquisas relacionados à cana-de-açúcar ou um dos seus produtos.

Em 2010 iniciou um processo de elaboração e desenvolvimento de competências para

implantação de uma planta-piloto de gaseificação de biomassa da cana-de-açúcar. O objetivo

do projeto era desenvolver um processo completo de gaseificação da biomassa em escala

piloto, visando à produção de gás de síntese. Entre as metas da proposta estava o

estabelecimento de um Centro de Gaseificação224

na cidade de Piracicaba/SP, nas instalações

da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz - USP. Cada módulo tecnológico (pré‐

tratamento, gaseificação e limpeza de gases) seria desenvolvido pelo IPT e por outros

participantes da iniciativa em cooperação 225

.

O projeto do Centro de Gaseificação da biomassa era conduzido pelo IPT com

parcerias da Petrobrás, Oxiteno e Vale/VSE, os quais criaram um consórcio - o Biosyngas. A

ESALQ/USP e a Prefeitura da cidade de Piracicaba/SP participaram com concessões de

terreno e de infraestruturas para a instalação da planta-piloto (que não ocorreu). A iniciativa

contava ainda com o apoio tecnológico do CTC e CTBE. O orçamento total do projeto em

2012 era estimado em R$83 milhões, cada empresa parceira deveria aportar R$ 2 milhões,

durante toda a execução do projeto.

223

O instituto de pesquisas é vinculado a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e

Inovação do Estado de São Paulo, com sede na cidade de São Paulo e com dois centros tecnológicos no interior,

Franca/SP e São José dos Campos/SP. Foi fundado em 1899, como instituição ligada ao Gabinete de Resistência

dos Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. O instituto possui 37 Laboratórios e Seções

Técnicas, atuando em diversas áreas do conhecimento e segmentos econômicos, as quais se reúnem por meio de

quatro eixos: a) PD&I (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação); b) Serviços tecnológicos; c) Apoio metrológico;

d) Informação e educação em tecnologia. Apresenta aproximadamente 800 empregados e no ano de 2015 emitiu

22.661 documentos técnicos. 224

O Centro de Gaseificação deveria oferecer suas instalações para projetos de pesquisa em escala laboratorial,

tanto para pesquisadores de universidades como de outras instituições Disponível em: <

http://agencia.fapesp.br/ipt_tera_planta_piloto_para_gaseificacao_de_biomassa_/15944/>. Acessado em 12 de

fevereiro de 2016. 225

O projeto previa a comprovação de conceito de uma planta industrial com capacidade de processar 400 mil

toneladas anuais de bagaço e palha de cana­de­açúcar. Isso equivale aproximadamente à metade do bagaço e

palha gerados por uma usina, que faz a moagem de 4 milhões de toneladas de cana. Disponível em:

http://www.usp.br/espacoaberto/?materia=esalq-ipt-e-apla-juntos-no-estudo-do-bagaco-de-cana-de-acucar>.

Acessado em: 12 de fevereiro de 2016.

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Com se sabe a planta-piloto não foi construída e o Centro de Gaseificação ainda

encontra-se em estágio de preparação226

, pois uma das condições para a efetivação do projeto,

o financiamento da planta-piloto, não aconteceu. O projeto pleiteou financiamento da FINEP

e do BNDES, mas ambas as organizações, após um período de negociação (em 2013)

desistiram de realizar aportes. A justificativa foi devido à conjuntura internacional

desfavorável, os preços do etanol e do petróleo e as perspectivas de desenvolvimento do gás

de xisto. Assim, o projeto da planta de gaseificação em Piracicaba/SP foi interrompido.

Além destes elementos que certamente pesaram contra o financiamento do projeto,

tem-se o fato que a FINEP e o BNDES fizeram escolhas, ou seja, decidiram apostar na rota

biotecnológica para a produção do E2G, mais especificamente, em tecnologias baseadas no

processo de hidrólise enzimática (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).

Mesmo com a não concretização da planta-piloto, a iniciativa promoveu avanços e o

desenvolvimento de competências locais, pois durante este período (2010 – 2017) o IPT

contou com “projetos satélites”, ou seja, pesquisas próprias do IPT que ocorrem paralelas e

relacionadas à temática da gaseificação da biomassa de cana-de-açúcar, fato que manteve a

discussão na agenda de pesquisa e os pesquisadores mobilizados.

Os avanços em pesquisa e o estabelecimento de competências locais ocorreram nas

seguintes áreas da tecnologia da gaseificação: i) análise das cinzas liberadas no processo de

queima da biomassa, ou seja, compreende-se melhor o comportamento das cinzas em relação

à biomassa - a composição química das cinzas, o ponto de fusão, a temperatura de liquefação

da biomassa, quanto de cinza é gerado por tonelada de biomassa processada; ii) Como as

cinzas são afetadas por características agrícolas, se variam com a região em que a cana é

plantada ou com a época do ano em que é colhida (influências da sazonalidade da cultura);

iii) Identificação dos aspectos físico-químicos da biomassa, reconhecimento dos genótipos da

cana que proporcionam um melhor processo de gaseificação (ações conduzidas pela

ESALQ/USP).

Os conhecimentos originados dessa iniciativa podem ajudar no processo de adaptação

e redimensionamento das máquinas e os equipamentos para a gaseificação, visto que a

iniciativa do IPT gerou informações e know-how sobre a biomassa da cana-de-açúcar, fato

226

Em apresentação feita na 3ª International Conferences Industry of the Future – Green Chemistry, em maio de

2017, o pesquisador do IPT Gerhard Ett indica que a ideia geral do projeto continua em andamento, mas ainda

não atingiu o estágio previsto no programa inicial.

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novo na rota termoquímica, já que a literatura internacional e projetos demonstrativos ao

redor do mundo baseiam-se em outros tipos de biomassas.

Assim, estes avanços são relevantes, não apenas pelo “ineditismo”, mas porque a

interação meio-biomassa-equipamentos é sempre particularizada, dependentes das

especificidades locais, fato que pode condicionar o sucesso ou o malogro da produção dos

bioprodutos.

As pesquisas do IPT na rota termoquímica continuam – não apenas por ser parte da

estrutura de pesquisa do instituto (Laboratório de Engenharia Térmica - LET ), mas também

por que em janeiro de 2017 passou a integrar o projeto “BioValue: Valorizing the

Decentralized Biomass Production Chain for Advanced Biofuel Production: Development

and Evaluation of Thermochemical Routes Integrated with Biomass Production”227

, aprovado

no âmbito do convenio de cooperação entre a União Europeia, a FAPESP, o Ministério de

Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) e do Conselho Nacional das

Fundações Estaduais Amparo à Pesquisa (CONFAP).

O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), em função

da sua constituição, tem como objetivo contribuir para o avanço do conhecimento científico e

tecnológico do setor sucroenergético, atuando tanto nas áreas de produção e manejo da

biomassa quanto na conversão de biomassas em energia e materiais. Isso ocorre por meio de

atividades de P,D&I e capacitação de pessoas. Nesse processo visa estabelecer relações de

colaboração com outros atores do SSI da cana-de-açúcar – função já prevista e demandada

desde sua concepção228

.

227

Disponível em:

<http://agencia.fapesp.br/brazil_and_eu_to_conduct_joint_research_on_advanced_biofuels/24602/> Acessado

em: 04 de julho de 2017. Destaca-se que o O projeto atenderá às regras do Programa de Parceria para Inovação

Tecnológica da FAPESP (PITE). 228

Em 2005, o Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (NIPE/Unicamp), por meio de encomenda do

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), inicia um projeto de pesquisa exploratória para

identificar os fatores que limitam a expansão da produção brasileira de etanol, esta ação ficou conhecida como o

“Projeto Etanol”, sob a coordenação de Rogério Cezar de Cerqueira Leite (deu origem a relatório da CGEE –

“Energias renováveis: etanol de cana” de 2009). Dentre as conclusões do projeto tem-se a ideia que o Brasil teria

recursos naturais e financeiros, competência técnica e infraestrutura para substituir 10% da gasolina consumida

no mundo por etanol de cana em 2025. Para isso ser factível seria necessário superar importantes gargalos

tecnológicos, dentre eles a necessidade de aprofundar o conhecimento científico e tecnológico em todo ciclo

cana/etanol. Tais resultados consubstanciaram a criação de um instituição específica para sofisticar o ambiente

de C&T do segmento e, é nesse contexto que se insere o CTBE.

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Suas atividades iniciaram em 2010 e sua criação é fruto das novas políticas públicas

implementadas a partir de 2006 (vide capítulo 3). É um importante ator do sistema, o qual

figura entre as três maiores instituições em publicações de artigos científicos sobre a temática

do etanol celulósico no Brasil (67 artigos - vide capítulo 4).

O CTBE devido a sua “natureza” e ao seu propósito, conduz e participa de diversas

iniciativas de P&D ligadas ao etanol celulósico. Desta forma, opta-se por expor apenas três

ações, as quais se destacam pela importância estratégica e por estabelecerem relações de

cooperação com outros atores do SSI da cana-de-açúcar. Estas são: i) Planta Piloto para

Desenvolvimento de Processos (PPDP) de etanol celulósico; ii) coquetéis enzimáticos e; iii) o

projeto de produção da tecnologia do etanol celulósico em parceria com a indústria.

A iniciativa de construir, operar e disponibilizar para estudos uma planta-piloto de

etanol celulósico trouxe uma mudança importante na qualidade da infraestrutura de C&T do

SSI da cana. A planta encontra-se disponível a pesquisadores de outras instituições e de

empresas, para realizarem testes e experimentos laboratoriais em escalas mais próxima das

condições operacionais reais da indústria.

Esta nova estrutura amplia as competências do SSI no campo das pesquisas relevantes,

tanto no que diz respeito à fronteira do conhecimento como em projetos antenados às

necessidades do setor produtivo (ENTREVISTA I; ENTREVISTA VII). Portanto, a planta-

piloto é um elemento importante para o desenvolvimento científico e tecnológico, visto que a

estrutura dá condições de realizar a ampliação de escala de processos relacionados ao ciclo

cana-de-açúcar/etanol e da química verde até a escala semi-industrial.

A segunda iniciativa se destaca pelo esforço de desenvolvimento de um coquetel

enzimático nacional para a produção do E2G, visto que em todos os casos existentes de

“produção” do novo biocombustível em território brasileiro, são empregados insumos

tecnológicos (as enzimas) desenvolvidos no exterior e controlados por grandes multinacionais

estrangeiras.

O projeto é conduzido por meio de uma parceria entre CTBE, Embrapa e a

Universidade de Caxias do Sul (UCS). O objetivo central é criar um coquetel enzimático a

partir de micro-organismos presentes nos biomas brasileiros. Para tal, utiliza-se de técnicas de

melhoramento genético clássico ou via engenharia genética e pela suplementação do coquetel

com proteínas auxiliares. Com isso, seleciona-se e isolam-se características desejáveis dos

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microrganismos capazes de degradar as ligações dos polissacarídeos presentes nas fibras da

biomassa de cana-de-açúcar (ENTREVISTA VII).

O coquetel atualmente (em 2017) em teste foi obtido a partir da seleção e do

isolamento de aproximadamente 5 mil linhagens e clones de microrganismos. As enzimas

produzidas nesse projeto partem dos fungos da espécie Trichoderma harzianum (P49P11) e

Penicillium echinulatum (ENTREVISTA VII).

Os custos das enzimas do coquetel criado pelo CTBE ainda estão em um valor não

competitivo, na casa de US$ 0,10 por litro de etanol, quando o ideal é chegar em US$ 0,05

por litro de etanol, conforme objetivo do projeto (ENTREVISTA VII). Uma das formas de

acelerar a redução dos custos de produção das enzimas é criar um sistema de produção de

enzimas acoplado à unidade de produção do etanol 2G. Este sistema também vem sendo

desenvolvido pelo CTBE e denomina-se produção de enzimas “on site”.

Com este sistema de reprodução das enzimas é possível utilizar a própria matéria-

prima e os insumos disponíveis na usina para sustentar a produção dos micro-organismos,

assim, reduze-se o custo final do etanol, pois suprime os gastos com transporte e

armazenamento e, ainda, dependendo da configuração adotada pela unidade, pode eliminar

completamente os fornecedores de insumos tecnológicos (reduz os custos de transação).

A terceira iniciativa em destaque é o projeto de desenvolvimento da tecnologia de

produção do E2G. O projeto de P&D conjunta é conduzido pelo acordo de cooperação entre

CTBE, Dow, DSM e BNDES. O projeto contempla todas as etapas de produção do etanol 2G,

assim, visa estabelecer uma rota de conversão de biomassa proveniente de cana-de-açúcar em

etanol, para tal parte-se da rota enzimática.

Segundo Di Giorgio (2016), o valor do projeto é de R$24,3 milhões, com duração de 3

anos e 3 meses (abril de 2014 - julho de 2017). O pacote tecnológico desenvolvido nessa

parceria seria/será utilizado pela Dow em conjunto com sua parceira, a trading japonesa

Mitsui & Co. Ltda, para produzir plástico verde (polietileno) a partir do etanol de cana-de-

açúcar, em uma fábrica em Santa Vitória/MG (a unidade provável é a Usina Santa Vitória

Açúcar e Álcool que pertence a Dow).

A DSM responsabiliza-se por comercializar o processo de produção de etanol 2G

resultante desta iniciativa para outros empreendimentos. E, assim, incluiria as suas enzimas e

leveduras de fabricação própria. A participação do CTBE ocorre por meio da disponibilização

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249

dos recursos humanos e infraestrutura laboratorial necessários ao projeto229

. O BNDES

participa com o aporte financeiro de 90% do seu valor total, por meio do instrumento Funtec.

A Dow e a DSM aportam apenas 5% cada uma.

5.2.3.1. A Iniciativa da Petrobras/Cenpes230

A Petrobras é uma empresa brasileira de capital aberto, cujo acionista majoritário é o

Governo do Brasil (a União), portanto, uma empresa estatal de economia mista231

. Opera no

segmento de energia, principalmente, nas áreas de exploração, produção, refino,

comercialização e transporte de petróleo, gás natural e seus derivados232

.

Em relação ao setor sucroenergético, além da sua atuação na distribuição e logística do

etanol, que remonta o início do Proálcool (SZMRECSÁNYI, 1979; SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991), criou em 2008 a subsidiaria Petrobras Biocombustível S.A. (PBIO), tendo

por finalidade a produção de etanol e biodiesel, bem como quaisquer outros produtos e

atividades correlatas. Esta nova empresa possuía participações societárias na Guarani S.A.;

Nova Fronteira Bioenergia S.A. e Bambuí Bioenergia S.A, somando a capacidade total de

moagem de 31,2 milhões de t/ano de cana-de-açúcar.

A condução do desenvolvimento de competências tecnológicas e de novas tecnologias

ocorre na Petrobras por meio das ações do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo

Américo Miguez de Mello (CENPES)233

. O Cenpes atua no desenvolvimento de tecnologias

fundamentais para o desenvolvimento da produção de óleo e gás e em outras áreas

estratégicas da companhia, tais como o pré-sal e as energias renováveis.

Em 2015, os gastos em P&D totalizaram R$ 2 bilhões, sendo que R$ 44,4 milhões

foram dedicados à área de Energia Renovável, destes 60% foram empregados somente em

229

Vale destacar que dada à existência da planta-piloto do CTBE, a tecnologia esta sendo desenvolvida no

próprio laboratório (DI GIORGIO, 2016) 230

A Petrobras merece um destaque dentro da categoria de Iniciativas Exploratórias porque é uma ação

sistematizada e de longa duração promovida por um ator nacional, o qual respondeu as motivações nacionais em

desenvolver tecnologia na rota do etanol celulósico (projeto com 12 anos de duração, 2004 – 2016). A iniciativa

também se torna relevante porque apresentou patenteamento de tecnologias (5 famílias de patentes na rota do

etanol celulósico), estabeleceu parcerias estratégicas na rota do E2G antes mesmo da implementação do PAISS

Industrial. 231

A Petrobras foi criada no Governo Vargas em 1953 e deixou de monopolizar a indústria petroleira no Brasil

em 1997. 232

Disponível em: < http://www.petrobras.com.br/pt/quem-somos/>. Acessado em 10 de junho de 2017. 233

Esta unidade foi criada em 1963. É a responsável pela coordenação das atividades de pesquisa,

desenvolvimento e engenharia básica da Petrobras e também pela articulação com instituições e firmas parceiras

em projetos de desenvolvimento tecnológico. o Cenpes contava em 2014 com um efetivo de 1.950 profissionais,

onde 1.336 tem nível superior, sendo 626 bacharéis, 466 mestres e 244 doutores e pós‐doutores. Dentre esses

profissionais, 677, onde 60% são mestres, doutores e pós‐doutores (Petrobras, 2014).

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biocombustíveis. Estes gastos foram subdivididos entre as seguintes subáreas de pesquisa: a)

Biocombustíveis avançados (R$ 18,5 milhões); b) Biocombustíveis de primeira geração (R$

9,7 milhões); c) Energia de resíduos urbanos e de vinhaça (R$ 6,8 milhões); d) Solar (R$ 6,8

milhões); e) Eólica (R$ 2,6 milhões). Vale destacar que este montante investido representou

uma diminuição de 49,8% em relação a 2014 (no total de gastos em energias renováveis).

O Cenpes conduz um conjunto amplo de projetos de pesquisa ligados ao setor

sucroenergético e aos biocombustíveis em geral. Esta unidade de P&D tem um caráter

estratégico, não apenas para a Petrobras, mas ao Brasil, pois desenvolve competências locais

em segmentos econômicos em que o país apresenta potenciais naturais e tradição produtiva

(petróleo e biocombustíveis).

Ademais, as suas pesquisas subsidiam políticas públicas. Um exemplo importante e ao

mesmo tempo ligado ao SSI da cana-de-açúcar é o estudo conduzido entre os meses de julho a

outubro de 2014, sobre os possíveis impactos no aumento da mistura de etanol à gasolina

(mais 2,5%). Esta pesquisa avaliou as variáveis emissões, consumo e desempenho veicular,

associada a análises físico-químicas da gasolina com diferentes teores de etanol (22%, 25%,

27,5% e 30%) em diferentes veículos e motos, tendo demonstrado ser tecnicamente viável a

mudança do teto para 27,5%. Este estudo foi uma requisição direta do Governo Federal234

,

que alterou em 16 de março de 2015 a mistura entre etanol e gasolina para 27%235

.

No que tange o etanol celulósico, as ações de pesquisa industriais visando os

biocombustíveis avançados tiveram início em 2004, antes mesmo da criação da Petrobras

BIO. O desejo de dominar o processo de produção do etanol celulósico motivou a estatal a

estabelecer ações sistemáticas de P&D nessa perspectiva, pois considerava estratégico liderar

e ter o controle sobre uma inovação que poderia afetar o segmento de combustíveis líquidos

(ENTREVISTA IX).

Assim, optou-se desde o início realizar o desenvolvimento próprio da tecnologia e

buscar parcerias em algumas etapas específicas, as quais não detinha familiaridade ou seria

muito dispendioso desenvolver sozinha – como a seleção, desenvolvimento e produção de

enzimas, que envolveu a parceria com a Novozymes em 2010.

234

Informações disponíveis no Relatório de Tecnologias da Petrobras de 2014. Disponível em:

<http://www.petrobras.com.br/pt/nossas-atividades/tecnologia-e-inovacao/relatorio-de-tecnologia/>. Acessado

em: 25 de março de 2017. 235

Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/03/aumento-do-etanol-na-gasolina-foi-

precedido-por-um-estudo-entenda > Acessado em: 25 de março de 2017. Disponível em: <

http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/03/adicao-de-27-de-etanol-na-gasolina-e-estabelecida-pelo-

governo> Acessado em: 25 de março de 2017.

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251

Ente os anos de 2004 – 2006 Cenpes/Petrobras estabeleceu parcerias com instituições

de ensino e pesquisa nacionais visando aprofundar e adquirir conhecimento sistematizado

sobre a tecnologia de etanol celulósico. Dessa relação, resultaram projetos exploratórios com

a Universidade Federal o Rio de Janeiro (UFRJ), com a Universidade Federal de Brasília

(UNB) e com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) (ENTREVISTA IX).

Neste período inicial realizou o estudo e a seleção das rotas tecnológicas e dos

processos de produção do E2G. Estabeleceu testes em laboratório e o aprofundamento da

pesquisa, tais como o screening de microrganismos produtores de enzimas, ou seja, uma

triagem das características, dos potenciais e das funcionalidades dos micro-organismos no que

se refere à produção de enzimas capazes de quebrar as ligações das moléculas de açúcar

(ENTREVISTA IX).

Outros avanços conseguidos nesta etapa do projeto foi o estabelecimento da produção

de etanol celulósico em laboratório, atingindo os resultados de 220 litros de etanol /t de

bagaço seco, com o depósito de 2 patentes relacionadas ao processo de produção do etanol de

segunda geração (ENTREVISTA IX).

Entre 2006 – 2008 o Cenpes construiu e operou uma planta-piloto de etanol celulósico,

processando bagaço de cana-de-açúcar e a torta da mamona, período em que foram realizados

cerca de 90 ensaios com o bagaço, reproduzindo os mesmos resultados de laboratório (220

litros de etanol/t de bagaço). O design tecnológico da plata-piloto da Petrobras era baseado na

rota enzimática com Sacarificação e Fermentação Simultânea (Glicose - C6) e fermentação da

Xilose (C5) em um reator separado (ENTREVISTA IX).

E é nesta fase do projeto que se inicia o processo de avaliação e escolha de novas

parcerias, visando acelerar o processo de aprendizagem e estabelecer o processo em escala

comercial. Deste modo, no ano de 2010 a Petrobras firmou contrato de desenvolvimento

conjunto com a KL Energy Corporation (KLE)236

visando desenvolver a tecnologia de

produção do E2G237

. Com isso, a Petrobras é a primeira empresa a estabelecer parceria

estratégica com firmas estrangeiras visando a construção de uma planta industrial – antes

mesmo do lançamento do PAISS Industrial.

236

Que em 2011 passa a ser denominada Blue Sugars Corporation (Blue Sugars). Disponível em:

http://www.biofuelsdigest.com/bdigest/2013/05/17/ciao-western-biomass-energy-formerly-blue-sugars-

formerly-kl-energy/. Acessado em 07 de julho de 2016. 237

Disponível em: < http://fatosedados.blogspetrobras.com.br/2010/08/24/petrobras-e-kl-energy-assinam-

contrato-para-desenvolver-tecnologia-de-etanol-celulosico/> Acesso em: 05 Novembro 2016.

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A KLE é uma firma americana que atua no segmento de produtos energéticos à base

da celulose238

, seus testes para a produção do etanol celulósico a partir dos resíduos de

madeira iniciaram-se em 2008, chegando a construir e a operar uma planta industrial em

escala demonstrativa239

.

Por meio do projeto de P&D em cooperação, a Petrobras investiu US$ 11 milhões para

adaptar as instalações da unidade de demonstração da KLE, para permitir o processamento de

bagaço de cana-de-açúcar como matéria-prima (ENTREVISTA IX). Segundo Correa (2014,

p. 86) este “acordo firmado garantia, inicialmente, a exclusividade mútua por 18 meses

(Acordo de Licenciamento Cruzado) e o desenvolvimento (otimização) conjunto da tecnologia

(Acordo de P&D) para a produção de etanol celulósico da empresa”. Acrescenta-se que o

acordo permitia a Petrobras obter a licença de uso da tecnologia KLE.

De maneira paralela e relacionada à parceria com a KLE, a Petrobras estabeleceu em

2010 um acordo de cooperação com a Novozymes, visando à redução de custos e aumento da

eficiência do processo de fabricação do etanol celulósico a partir da otimização de enzimas

(ENTREVISTA IX). A parceria Petrobras­Novozymes foi vigente entre 2010-2013 e era

baseada em contratos de fornecimento de insumos tecnológicos, sendo que as melhorias de

processo ou métodos novos que viessem a sair dos testes realizados no Cenpes seriam de

propriedade da Petrobras (ENTREVISTA IX).

O objetivo final do projeto Petrobras-KLE era o desenvolvimento de uma usina de

etanol celulósico em escala industrial (capacidade de 40 milhões de litros/ano), que deveria

ser totalmente integrada a uma usina de cana-de-açúcar pertencente ao Grupo Petrobras, no

Brasil. Estava prevista para entrar em funcionamento em 2013, depois se alterou a meta para o

start em 2015.

O projeto não atingiu seu último estágio, a implantação e a produção de etanol

celulósico no Brasil. Segundo a ENTREVISTA IX, isso se deu pelo estabelecimento de uma

“conjuntura desfavorável” em relação aos custos de produção do E2G e da própria condução

238

Os produtos energéticos de segunda geração fabricados pela KLE eram o etanol, a bio­lignina e produtos

químicos intermediários. No seu portfólio ainda oferece serviços de engenharia, de otimização e técnicos para as

instalações. Disponível em: < http://www.ethanolproducer.com/articles/7485/gearingupforbagasse> Acessado

em 21 de maio de 2017. 239

A planta de demonstração da KLE localiza-se na cidade de Upton, no Estado de Wyoming - EUA. O design

tecnológico da planta é composto por um processo de pré-tratamento termo­mecânico e um sistema de hidrólise

enzimática, feitos em momentos distintos e em reatores separados.

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de novos investimentos que deveriam ser feitos pela Petrobras e pelas usinas parceiras. Os

elementos expostos a seguir elencam os motivos da interrupção do projeto:

i) os resultados dos testes feitos no âmbito do projeto Petrobras-KLE indicavam que o

processo desenvolvido funcionava e estava no limiar da economicidade, ou seja, a produção

do E2G era tecnicamente e economicamente viável, entretanto, o valor pago pela venda de

energia elétrica no mercado spot deveria se manter no patamar de 100 R$/MWh, pois a nova

unidade de produção de etanol celulósico iria se utilizar do bagaço restante da produção de

energia elétrica já estabelecida pelas usinas.

As usinas nas quais a Petrobras detinha participação acionária já tinham contratos de

“longo prazo” firmados com a venda do excedente de energia elétrica, portanto, apresentavam

estrutura de cogeração em funcionamento. Como no segundo semestre de 2014 e no primeiro

semestre de 2015 o preço pago pela energia no mercado spot subiu, tendo o seu pico em

novembro de 2014 (804,54 R$/MWh)240

, as usinas parceiras optaram por destinar esse bagaço

“extra” para mais geração de energia elétrica, aproveitando a estrutura produtiva já instalada

ao invés de realizar novos investimentos. As oportunidades de retorno com a venda de energia

elétrica eram melhores que a venda de mais etanol;

ii) Nesse mesmo período a Petrobras passou a sentir os efeitos econômicos e políticos

de duas situações que afetavam diretamente o “caixa” da companhia - a queda dos preços

internacionais do barril de petróleo e a políticas de preços da gasolina praticada no mercado

interno. Tal situação impôs uma restrição dos recursos para a área de biocombustíveis,

limitando os novos investimentos e a tomada de novos empréstimos para a condução do

projeto. É por isso que a Petrobras desistiu de contratar os recursos disponíveis pelo PAISS

Industrial;

iii) A crise institucional também afetou o “animo” da companhia para

empreendimentos de alto risco241

. Mesmo com os testes e a pesquisa comprovando a

viabilidade técnica do conjunto tecnológico desenvolvido pela Petrobras, existia um alto risco

tecnológico que a companhia não estava mais disposta a correr (situação crível diante dos

problemas enfrentados pelas outras unidades em funcionamento).

240

Informações obtidas na ENTREVISTA IX. Mas também podem ser vistas nos dados da Câmara de

Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), disponíveis em: <

https://www.ccee.org.br/portal/faces/pages> Acessado em 16 de julho de 2017. 241

Segundo ENTREVISTA IX “a primeira planta seria para ganhar experiência e não ganhar dinheiro”

acreditava-se que ajustes e a superação de entraves tecnológicos seriam necessários, demandando novos esforços

em pesquisa e, principalmente, melhoramento da tecnologia de processo.

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Mesmo com a sua interrupção, o projeto conduzido pela Petrobras apresentou alguns

resultados tais como: i) atualizou/adaptação de planta de demonstração em Upton/EUA, sendo

capaz de processar tipos diferentes de biomassa (resíduos de madeira e bagaço de cana),

atingindo a produção de 80 mil litros de etanol celulósico em 2012; ii) desenvolveu

capacidades de produção de leveduras in loco; iii) validações do processo de produção

desenvolvido no Cenpes; iv) em 2012 a Petrobras movimentou 40 minivans durante a Rio+20,

com etanol celulósico da sua planta de E2G em escala-piloto, transportando 8 mil

conferencistas242

; v) a KLE consegui obter créditos do programa Renewable Identification

Numbers (RIN)243

por intermédio da produção do etanol celulósico da sua planta de

demonstração com bagaço de cana-de-açúcar.

A iniciativa do etanol celulósico com bagaço de cana deu origem a outros projetos de

pesquisa “menores”, que ocorriam paralelamente, como de avaliação de outras matérias-

primas. Foram feito testes entre 2014-2015 com o cacho vazio de palma (dendê), resíduo da

extração do óleo do fruto. A solução Cenpes identificou que o cacho possui em sua

composição 40% de celulose e 20% de hemicelulose (indicativos da concentração de

açúcares), teores bem similares ao do bagaço e propícios para produção de etanol.

Para dizer o mínimo, as ações da Petrobras/Cenpes encontram-se descontinuadas e

imersas a grandes incertezas, pois o novo Plano de Negócios e Gestão (2017-2021)244

da

companhia prevê a retirada da estatal dos setores de biocombustíveis, distribuição de GLP

(gás de cozinha), produção de fertilizante e das participações na petroquímica, ação esta que

implicará a venda dos ativos da empresa. O argumento principal dessa nova racionalidade da

empresa é preservar competências tecnológicas em áreas com maior potencial de

desenvolvimento, mais próximas do core competence da firma.

242

Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/projeto-usina-etanol-celulosico-

pbio-parado-270315/> Acesso em: 05 Novembro 2016. 243

É um número de identificação para os combustíveis renováveis, estes são atribuídos a um “lote” de

biocombustíveis com o objetivo de rastrear sua produção, o uso e a comercialização conforme os padrões

estabelecidos pela U.S. Environmental Protection Agency (EPA), os quais passam a vigorar com a

implementação do programa Renewable Fuel Standard (RFS) – criado a partir da Energy Policy Act of 2005. 244

O plano de negócios da Petrobras foi anunciado em 20/09/2016.

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5.2.4. As iniciativas Estruturadas: desenvolvimento e adoção da tecnologia de etanol

celulósico no Brasil

As Iniciativas Estruturadas são os projetos que atingiram o status de plantas de

demonstração e plantas comerciais, sendo capazes de trabalhar em condições reais,

explorando o cotidiano e vivenciando os problemas da produção industrial do E2G. Os casos

que se encaixam nessa categoria são: CTC; GranBio e Raízen.

A tabela 5.1. indica os detalhes dos projetos indústrias em curso no Brasil, sinalizando

para a capacidade produtiva instalada, aspectos técnicos das plantas, início das atividades e as

relações estabelecidas no âmbito do projeto. Outros dados serão adicionados a esta “síntese

preliminar”, nas próximas subseções, abarcando outras dimensões que envolvem os esforços

de adoção e de desenvolvimento da tecnologia de segunda geração no Brasil.

Tabela 5.1. Projetos indústrias de etanol celulósico no Brasil (Iniciativas Estruturadas),

aspectos gerais (2016).

Fonte: elaboração própria

5.2.4.1. Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)

O CTC é considerado o maior centro de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em cana-

de-açúcar do mundo, com atuação em toda a cadeia produtiva do setor canavieiro (cana-de-

açúcar, etanol, açúcar e bioenergia). Foi criado em 1969, por meio da iniciativa da

Cooperativa de Produtores de Cana-de-Açúcar, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo

(COOPERSUCAR), um grupo de usinas da região de Piracicaba/SP245

.

245

Em 2004, passa por um processo de reestruturação e torna-se uma instituição de pesquisa sem fins lucrativos

“independente” da COOPERSUCAR. As suas receitas eram provenientes, substancialmente, das contribuições

associativas das firmas cooperadas pela COOPERSUCAR e, por outras firmas do setor fora da chancela da

cooperativa (“concorrentes”).

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Em 2011, torna-se uma Sociedade Anônima (S.A.) por ações de capital fechado,

passando a buscar o lucro e a remuneração de seus acionistas246

. Em junho de 2016 a

composição acionária do CTC era a seguinte: 19,93% da Raízen Energia S.A.; 17,68% da

Copersucar S.A.; 15.03% do BNDES Participações S.A.(BNESPAR) e demais acionista

ficavam com 47,37% das ações247

.

Seu objetivo é a pesquisa, o desenvolvimento e a comercialização de tecnologias para

o setor sucroenergético, com destaque para o desenvolvimento de novas variedades de cana-

de-açúcar, por meio do melhoramento genético. Assim, a atuação do CTC ocorre por

intermédio de 4 linhas de P&D, a saber: i) Melhoramento Genético - envolve o

desenvolvimento de novas variedades de cana-de-açúcar (melhoramento genético tradicional;

uso de marcadores moleculares; engenharia genética); ii) Novos sistemas de plantio - criação

de sementes artificiais de cana-de-açúcar e novos processos de plantio; iii) Biomassa -

processamento e peletização do bagaço e da palha da cana para gerar energia; iv)

Modernização das usinas - redesenho do conceito de usinas, com a adoção de melhores

práticas em engenharia e biotecnologia indústria (etanol celulósico; butanol e upgrade na

produção do E1G).

A sede do CTC está localizada no município de Piracicaba/SP, onde também se

encontram uma planta-piloto de etanol celulósico e um complexo de Laboratórios de

Biotecnologia Agrícola. Somam-se ainda outras estruturas do CTC como os polos de

melhoramento genético em sete cidades diferentes (Maringá/PR; Qurinópolis/GO;

Goianésia/GO; Camamu/BA; Piracicaba/SP; Ribeirão Preto/SP; Araçatuba/SP) e 10

escritórios de vendas (Dourados/MS; Maringá/PR; Goiânia/GO; Uberaba/MG;

Uberlândia/MG; Piracicaba/SP; Ribeirão Preto/SP; São José do Rio Preto/SP; Assis/SP e

Araçatuba/SP).

A relevância do CTC no setor é dada pela abrangência das suas variedades de cana-de-

açúcar, as quais respondem por um de cada três hectares do canavial brasileiro

(aproximadamente 3,33 milhões de hectares) (ENTREVISTA VI). Ademais, o CTC realizou

e realiza um conjunto amplo de ações em P&D voltadas ao setor sucroalcooleiro que vão além

246

Segundo Correia (2014) em 2011 a Copersucar era a maior acionista com 25% da participação, seguida da

Raízen, com 20%; além da Bunge, Tereos International, Grupo São Martinho e Usina Coruripe. 247

No ano de 2016 o CTC enviou um pedido para registro de companhia aberta junto à Comissão de Valores

Mobiliários (CVM), bem como autorizar a adesão da Companhia ao segmento de listagem Bovespa Mais da

BM&FBovespa. O registro como companhia aberta e a listagem no Bovespa Mais integram o acordo feito em

março de 2014 com o BNDES. Disponível em:

<http://ri.ctc.com.br/upload/files/0049_DFs_CTC_30.06.2016.pdf> Acessado em 14 de julho de 2017.

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do desenvolvimento e introdução de novas variedades de cana-de-açúcar. O quadro 5.2. visa

dar uma visão geral de outras atividades ligadas a inovação do centro de pesquisa, as quais

tangenciam o universo do E2G.

Quadro 5.2. Ações de destaque do CTC em P&D Ação/Estrutura Informação / Destaque

Banco de

germoplasma

# Início em 1969;

# O maior banco de germoplasma do mundo;

# 4.000 variedades;

# Cruzamentos dirigidos para cada uma das regiões canavieiras do País;

CaneBioFuels

# European Union's Research and Innovation funding programme (FP7);

# Início em 2009;

# Financiado de cerca de 1,6 milhões de euros;

# Projeto de pesquisa em cooperação com outras instituições;

# Objetivo criar uma plataforma científica e tecnológica para o desenvolvimento, em

escala comercial, de um processo de conversão da biomassa de cana-de-açúcar em açúcar

fermentáveis;

# Parceiros – Novozymes; USP, Unicamp, UFPR, CTBE, IPT e Embrapa;

Leveduras

# Início em 2013;

# Projeto de pesquisa que visa compreender e desenvolver leveduras com características

especiais para a produção de etanol;

# Parceria - USP/ESALQ.

Projeto

CTC/Embrapa

# Início em 2012;

# Parceria estratégica para atuar em três frentes de pesquisa. 1) Melhoramento Genético; 2)

Biotecnologia Agrícola; 3) Biotecnologia Industrial – desenvolvimento de enzimas;

# Aproximadamente 15 pessoas do CTC estão envolvidas no projeto;

# Investimento na ordem de R$ 7 milhões - 90% do BNDES e 10% do CTC;

Laboratório de

Biotecnologia

Agrícola

# Inaugurado em 2015;

# Investimentos de aproximadamente R$ 40 milhões;

# 75% dos aportes nos laboratórios vieram do PAISS Industrial (BNDES/FINEP);

# Reorganiza e potencializa as linhas de pesquisas já desenvolvidas pelo CTC – nova

infraestrutura e equipamentos;

#Pesquisa em marcadores moleculares tem o objetivo de identificar e selecionar

características desejáveis na cana;

# Pesquisas em novas variedades de cana por meio de melhoramento genético –

objetivo é novas variedades mais produtivas, com maior teor de açúcar, tolerantes à

seca e resistente às pragas;

# Pesquisa em Biotecnologia é basicamente voltada ao desenvolvimento de

microrganismos para produzir enzimas (objetivo hidrolisar material

lignocelulósico);

# Pesquisa em biotecnologia apresenta um grupo de 30 pesquisadores,

aproximadamente 30% são estrangeiros;

# Pesquisa em sementes artificiais visa substituir o processo de plantio de cana com

"toletes" (pedaços de cana);

# O potencial das sementes artificiais - "Para cada hectare de cana é necessário de

15 a 18 toneladas de cana em tolete, mas com as sementes, são necessárias apenas

meia tonelada de sementes” – redução de custos na renovação do canavial.

Cana-de-açúcar

transgênica

# Lançamento 2017;

# Resistente à broca (Diatraea saccharalis);

# A infestação da broca e representa perda estimada de R$ 370 por ha/ano, um valor alto,

considerando os 9,5 milhões de hectares cultivados com cana no país;

Fonte: Elaboração própria.

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A iniciativa do CTC para obter competências na tecnologia do etanol celulósico inicia

em 2007248

. Entre os anos de 2007 - 2008 ocorreram pesquisas exploratórias e experimentos

em escala laboratorial. De maneira concatenada, em 2007, o CTC estabeleceu uma parceria

com a Novozymes visando testar e desenvolver tecnologia de processo em hidrólise

enzimática – essa parceria ocorreu no âmbito do convênio de pesquisa financiado pela União

Europeia (FP7 2020).

A iniciativa deu origem a uma planta semi-piloto de E2G, ou seja, uma unidade de

desenvolvimento de processo com equipamentos não conectados. Esta estrutura ficava/fica

localizada na sede do CTC, na cidade de Piracicaba/SP. A capacidade da planta era de 1 mil

litros de etanol/dia. Assim, entre 2009 - 2010 foram realizados diversos testes na escala semi-

piloto em Piracicaba/SP (ENTREVISTA VI). Este projeto era conduzido com recursos

próprios e provenientes do convênio com a União Europeia (FP7 2020).

Em 2011 o CTC aluga as instalações da empresa sueca SEKAB, proprietária de uma

planta-piloto de E2G localizada no norte da Suécia, com o objetivo de fazer testes com o

bagaço de cana, buscando validar e observar a viabilidade econômica e técnica da matéria-

prima. Mas segundo ENTREVISTA VI, os testes não foram conclusivos. Ainda que o

entrevistado não estivesse à frente desse processo no período, sua opinião é que a

parametrização da planta-piloto feita para operar com resíduos de madeira influenciou nos

testes com bagaço de cana, devido à fisiologia vegetal ser distinta.

Como desdobramento direto das iniciativas anteriores, o CTC participa do PAISS

Industrial (2011). Seu objetivo é instalar e operar uma planta de produção de E2G em escala

demonstrativa (TRL8 - Early commercial deployment), com isso, demonstrar a eficácia das

tecnologias desenvolvidas pela empresa, comprovando os rendimentos dos processos

industriais atingidos no nível laboratorial e semi-piloto.

Esta iniciativa se diferencia das outras ações em curso no Brasil (GranBio e Raízen),

pois o CTC se preocupa mais com a comprovação do seu “pacote tecnológico”, enquanto as

outras firmas querem em última instância atingir a produção industrial do E2G, almejando se

beneficiar com as vantagens de serem as primeiras a produzir etanol celulósico - aumento da

248

É só no ano de 2006 que o CTC passa a liderar projetos de pesquisa voltados a tecnologia de produção do

etanol celulósico; até então tinha participado de outras iniciativas, cooperando e compartilhando conhecimentos

e instalações, como no caso do projeto Dedini Hidrólise Rápida, que conta com a participação do CTC a partir de

2002. Disponível em <

https://www.jornalcana.com.br/entrevista­com­oswaldo­godoy­gerente­de­engenharia­do­ctc/>

Acessado em: 07 de junho de 2016.

Page 259: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de ... · altair aparecido de oliveira filho mudanÇas e permanÊncias no sistema setorial de inovaÇÃo da cana-de-aÇÚcar: o caso do

259

produtividade por tonelada de cana; créditos de carbonos; exportações para a Califórnia e

Europa, e etc..

Por isso que tanto GranBio como Raízen optaram pelo licenciamento de tecnologia

estrangeira. E o CTC – que é uma empresa de pesquisa – visa aprimorar suas competências

tecnológicas e gerar um conjunto de tecnologias que possa ser vendido em um futuro

próximo249

.

A construção da unidade de produção do etanol celulósico em escala demo inicia-se

em 2013 na cidade de São Manoel/SP - na Usina São Manoel250

. A localização da unidade

está relacionada com a proximidade da sede do CTC (125 km), onde ficam os laboratórios da

empresa (ENTREVISTA VI). O início das operações ocorreu em julho de 2014 e a

expectativa de realizar um scaleup na planta é apenas em 2018 (planta na escala comercial).

Destaca-se que o projeto do CTC apresenta um diferencial em relação aos projetos em

andamento, que é o fato da unidade de produção de E2G ser totalmente integrada à usina de

primeira geração. Este design possibilita um melhor aproveitamento da infraestrutura

existente (ENTREVISTA VI). As outras plantas compartilham apenas as infraestruturas

“externas”, por exemplo, a Bioflex 1 compartilha do sistema de co-geração com a Usina

Caeté e a unidade de 2G da Raízen compartilha apenas o espaço físico da usina Costa Pinto

(terreno).

A planta demonstração possui capacidade de processamento de 100 toneladas de

biomassa por dia, podendo produzir 3 milhões de litros. Segundo entrevista no CTC, o

potencial da tecnologia desenvolvida pelo CTC é de 120 litros de etanol por tonelada de cana,

isso frente aos atuais 85-90 litros de etanol por tonelada, ou seja, a tecnologia pode aumentar

cerca de 40% a produção de etanol de uma usina de primeira geração251

.

A tecnologia utilizada no projeto da usina São Manoel é proprietária do CTC, com

patente depositada em 2008. A unidade do CTC enquadra-se na rota bioquímica, as etapas

produtivas são estabelecidas pelo: i) o design do sistema industrial é o Separate Hydrolysis &

Fermentation (SHF); ii) com pré-tratamento a partir do uso de vapor juntamente com

catalisadores, processo que foi desenvolvido especificamente para a cana-de-açúcar; iii)

249

Discussão e percepções feitas a partir das entrevistas: Entrevista V; Entrevista VI; Entrevista VIII e Entrevista

X. 250

Disponível em: <https://oglobo.globo.com/economia/ctc-coloca-em-operacao-planta-de-demonstracao-de-

etanol-celulosico-13409950 > Acessado em: 24 de julho de 2017. 251

Até o encerramento da pesquisa (julho de 2017) a planta do CTC ainda não havia operado de maneira plena,

enfrentava problemas no sistema de alimentação de bagaço ao pré-tratamento (ENTREVISTA VI).

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260

hidrólise enzimática (as enzimas são da Novozymes); iv) o conjunto tecnológico de produção

do E2G é integrado a plantas de 1G, conceito que descende da experiência com o projeto da

Dedini (2002-2007).

O investido feito no projeto da planta de demonstração foi de R$ 71,1 milhões,

recursos aportados por meio do PAISS Industrial – na modalidade crédito252

. De maneira

articulada, o CTC recebeu em 2014 cerca de R$ 350 milhões através da participação acionária

do BNDESPar (empresa de participações acionárias do BNDES), subscrevendo novas ações

em P&D do CTC em etanol celulósico, mas, principalmente, abarcando outros elementos,

como a aquisição de equipamentos para pesquisa, infraestrutura e implementação de novos

projetos/ações de P&D para a cadeia sucroenergética como um todo.

Em resumo, os aportes feitos pelo BNDESPar estão sendo destinados principalmente

nas ações do Laboratório de Biotecnologia Agrícola (que envolve um conjunto amplo de

projetos – vide quadro 5.2.) e na continuidade e expansão das pesquisas e comercialização da

cana transgênica.

O desenvolvimento e a implementação da planta demo do CTC contou com o

estabelecimento de parcerias estratégicas, principalmente, com atores internacionais. Os

parceiros do projeto de demonstração são: a) a Usina São Manoel, integrante da Copersucar

(Brasil), com o fornecimento da biomassa e compartilhamento da infraestrutura; b) a Pöyry

(Finlândia) realizou o detalhamento da engenharia do projeto; c) Andritz (Áustria) realizou a

seleção, o desenvolvimento e a produção dos principais equipamentos da planta; d)

Novozymes (Dinamarca) faz o fornecimento das enzimas.

Por intermédio das parcerias, o CTC compartilha competências e infraestruturas e

obtém o fornecimento de insumos tecnológicos (enzimas; leveduras). Estas novas

informações agregam-se às competências em processos industriais que não faziam parte do

seu portfólio de negócios ou agenda de pesquisa até os anos 2000.

O quadro 5.3. expõe todas as relações estabelecidas pelo CTC em etanol celulósico

entre os anos 2007-2017, portanto, indica nominalmente com quais atores o CTC se

relacionou no universo das tecnologias do etanol celulósico. Os atores em destaque (negrito)

são aqueles que cooperam efetivamente no projeto da planta demo no âmbito do PAISS

Industrial. Os outros atores são aqueles que apresentaram parcerias em outros projetos de

252

No âmbito do PAISS Industrial o CTC recebeu ainda R$ 15,8 milhões da FINEP para realizar pesquisas sobre

etanol celulósico e novos produtos a partir da cana-de-açúcar (bioquímico; biocombustíveis avançados) – vide

capítulo 3.

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261

pesquisa ou apenas se relacionaram por meio de apoio tecnológico (consultoria técnica e

tecnológica) tanto no sentido de suportar as ações do CTC ou quando o CTC é chamado a dar

apoio em projetos de terceiros.

Quadro 5.3. Parcerias estratégicas e cooperação do CTC por etapas da tecnologia de etanol

celulósico, entre 2007 - 2017.

EPC* Suprimento da

Biomassa Pré-tratamento Hidrólise, Fermentação e Processo

Pöyry (Finlândia)

Andritz (Áustria)

Metso (Finlândia)

Abeinsa (Espanha)

Technip (França)

CNH (EUA/Itália)

AGCO (EUA)

Jonh Deere (EUA)

Claaas (Alemanha)

Andritz (Áustria)

Metso (Finlândia)

DSM (Holanda)

Nozymes (Dinamarca)

Beta Renewables (Itália)

DuPont (EUA)

Clariant (Suíça)

Life Technologies (EUA)

Leaf Technologies (EUA)

Dyadic (EUA)

Abengoa (Espanha)

BP (Reino Unido)

Ouro Fino (Brasil)

Petrobras (Brasil)

CTBE (Brasil)

Embrapa (Brasil)

UFRJ (Brasil)

USP (Brasil)

UFSC (Brasil)

UFPR (Brasil)

Fonte: ENTREVISTA VI; CAMPO I; * Engenharia, Suprimentos e Construção

O projeto do CTC apresenta algumas características que se destacam em relação às

outras iniciativas em curso no Brasil, estas são253

:

i) ter sido desenvolvida especificamente para a biomassa da cana-de-açúcar (bagaço e

palha);

ii) ser totalmente integrado com a produção de etanol de primeira geração – resultando

em investimentos iniciais menores e menores custos de produção do E2G por compartilhar

etapas do processo de 1G;

iii) o design do projeto proporciona a redução da taxa de ociosidade da planta de 1G

nas etapas de fermentação e destilação, ampliando e flexibilizando o período de produção do

etanol para além da safra e, também, podendo alterar o mix de produção entre açúcar e etanol;

253

Considerações a partir das entrevistas: Entrevistas III; Entrevistas VI e Entrevistas X.

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262

iv) o estabelecimento do conceito da planta e os sucessíveis ajustes técnicos em nível

de projeto industrial foram feitos em território nacional - O projeto contou com 50 pessoas,

formando uma equipe de P&D dedicada para tal fim 254

.

v) A parceria entre CTC e Novozymes teve como um dos resultados a redução das

“doses” enzimáticas no processo de hidrólise (quatro vezes) na escala semi-piloto;

vi) No decorrer das iniciativas do CTC na tecnologia do E2G pode-se afirmar que a

firma adquiriu conhecimentos sobre o desempenho da tecnologia de hidrólise enzimática –

fato novo na trajetória da firma. Essas competências são sobre o processo industrial de

conversão da biomassa e não na produção e desenvolvimento de enzimas;

vi) Outro resultado do esforço do CTC em desenvolver tecnologia proprietária reflete-

se nos quatro depósitos de patentes realizados na área de etanol celulósico entre 2008 a 2012.

Talvez a patente mais relevante seja a WO 2013142934 que protege o processo integrado para

produção de E1G e E2G, o qual pode ser também utilizado para produtos afins (química

verde). Esta mesma invenção prevê a utilização de outras matérias-primas como o milho,

cereal, trigo, sorgo, e beterraba.

Diante da estratégia adotada pelo CTC, a expectativa é estabelecer condições para

fornecer uma planta de E2G “turn key flex” integrada ao E1G, combinando suas

competências em outros estágios da produção de cana-de-açúcar e seus derivados. Com isso,

prevê entregar um pacote tecnológico completo, contando com o recolhimento da palha;

novas variedades de cana (apropriadas ao E2G); engenharia conceitual e de processo e

programa de desenvolvimento contínuo e otimização da Tecnologia E2G255

.

As parcerias estratégicas e o estabelecimento de relações expostas no quadro 5.3. vêm

nesse sentido, ampliando as competências internas e diversificando o portfólio de tecnologias

desenvolvidas pelo CTC, buscando cobrir todas as etapas do ciclo produtivo do etanol

celulósico.

5.2.4.2. GranBio

A GranBio é uma firma de biotecnologia industrial 100% nacional que atua na

transformação da biomassa em produtos renováveis, tais como os biocombustíveis,

bioquímicos e bioeletricidade. A GranBio é controlada pela GranInvestimentos S.A., holding

254

Dado apresentado por José Gustavo Teixeira Leite - Diretor-superintendente do CTC no Ethanol Summit que

ocorreu entre os dias 06 e 07 de julho de 2015 em São Paulo/SP. 255

Entrevista VI.

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263

da família Gradin e pela BNDESPar, braço de participações do BNDES (com 15% das ações).

Um diferencial deste ator é a sua atuação em mais de uma fase do processo produtivo do E2G

(vide quadro 5.3.)

A GranBio, criada em 2011, opera a primeira planta industrial em escala comercial de

etanol celulósico do Brasil. A fábrica Bioflex 1, localizada na cidade de São Miguel dos

Campos/AL, iniciou a produção em 2014. Outras instalações da GranBio são: o Centro de

Pesquisas em Biologia Sintética (BioCelere) e a Estação Experimental (BioVertis) para

desenvolvimento de novas fontes de biomassa (vide Quadro 5.4.).

A Estrutura da GranBio e os segmentos de atuação estão representados no quadro 5.4.

Nota-se que as suas ações estão voltadas ou interconectadas com a produção do etanol

celulósico, sendo o único caso no Brasil com dedicação exclusiva à produção do E2G. Todos

os outros atores que empenharam esforços em desenvolver ou adotar a tecnologia do E2G

apresentam ligações históricas com o segmento sucroenergético ou são oriundos de setores

que se relacionam na fronteira do setor, como a indústria química, petróleo, bens de capital e

etc. A GranBio pode ser considerada uma outsider.

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264

Quadro 5.4. Estrutura e áreas de atuação da GranBio. Ano Estrutura Atividade Parcerias

2013 BioCelere

# Centro de Pesquisas em Biologia Sintética;

# Localizada no complexo do Techno Park, em Campinas/SP;

# P&D em melhoramento genético de microrganismos,

processamento de biomassa, desenvolvimento de processos de

fermentação e de hidrólise enzimática.

# Seu corpo cientifico/técnico é formado por mais de 20

cientistas, sendo 11 PhDs.

# Além de tecnologias próprias, atua no co-desenvolvimento de

tecnologias de parceiros.

# Desenvolvimento de levedura transgênica – Celere-2L

# Unicamp

#American

Process

2014 Bioflex

# Unidade industrial da GranBio;

# A primeira fábrica de etanol celulósico em escala comercial do

Hemisfério Sul;.

# Matéria-prima é a palha de cana;

# Localizada no município de São Miguel dos Campos/AL;

# Capacidade para produzir 82 milhões de litros de E2G por ano;

# Rota bioquímica – Separate Hydrolysis & Fermentation – SHF

(C5 e C6 no mesmo reator)

# Usina Caeté –

Grupo Carlos

Lyra

# Beta Renewables

#Novozymes

#Chemtex

#DSM

2013 BioVertis

# Estação Experimental localizada no município da Barra de São

Miguel/AL.

# Foco no desenvolvimento de cana-energia (a CanaVertix®).

Esta variedade é desenvolvida por meio de cruzamentos de

espécies ancestrais e híbridos comerciais de cana-de-açúcar;

# A cana-energia é uma cana mais robusta, com maior teor de

fibra e apresenta potencial produtivo para a fabricação de

biocombustíveis e bioquímicos de segunda geração e para ampliar

a geração e/ou cogeração de energia elétrica;

# Vantagens: a) plantada em áreas com baixa aptidão agrícola; b)

aumento da produtividade por hectare (pode chegar a ser 3

vezes); c) a planta exige menos água;.

# Projeto de Colheita de Palha - um sistema de recolhimento,

armazenamento e processamento de palha de cana-de-açúcar.

Com capacidade de 400 mil toneladas por ano.

# P&D conjunto na cana-energia – Biovertis-IAC-Ridesa

# IAC;

# Ridesa;

# West Indies

Cane Breeding

Station (Barbados)

# CNH;

# Valtra;

#Implanor

2014 SGBio

# É uma joint venture (50% - 50%);

# Produção de químicos de fonte renovável;

# Objetivo é construir no Brasil uma planta industrial para o bio

n-butanol - composto químico para a produção de tintas e

solventes;

# Testam tecnologias de parceiros para a conversão de biomassa

em bioquímicos.

# Rhodia – Grupo

Solvay

Fonte: elaboração própria a partir de GRANBIO, 2017.

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265

A principal iniciativa da GranBio na rota tecnológica do etanol celulósico consiste em

instalar e operar uma planta industrial em escala comercial de E2G. Conjuntamente com esse

projeto, busca desenvolver produtos e processos correlatos a essa unidade e/ou para novos

nichos de mercado, todos se relacionando com a conversão da biomassa (vide quadro 5.3. – a

criação da SGBio é um exemplo).

A escolha da localização das instalações das unidades de produção de E2G e da

estrutura para o melhoramento da cana-energia ocorreu devido às vantagens comparativas

existentes na região de São Miguel dos Campos/AL, tais como: a proximidade e

disponibilidade da matéria-prima (palha); clima favorável à produção de biomassa (muito sol

e regimes pluviométricos bem definidos); proximidade com o Porto de Maceió, uma distância

de 55 Km, situação que facilita o escoamento da produção (exportações ou cabotagem); e os

incentivos fiscais haja vista os incentivos a empreendimentos industriais oferecidos pela

região nordeste (ENTREVISTA IV).

O design da planta foi definido pelo acordo de licenciamento da tecnologia PROESA

da empresa Beta Renewables. Com isso, adquiriu-se um pacote tecnológico completo, com

todas as etapas e os processos. A planta começou a ser instalada em 2013 e sua operação

ocorreu em 2014 (segundo semestre). A estrutura apresenta a capacidade de produção de 82

milhões de litros de etanol anidro por ano e gerar 61 MW/hora de energia.

O financiamento do projeto e de outras ações de pesquisas da GranBio se deram por

intermédio dos aportes feitos pelo poder público, na figura das suas agências e órgãos de

fomento, informações que encontram-se sistematizadas no capítulo 3. Apenas no Programa

PAISS Industrial, as unidades da GranBio contaram com o aporte de R$ 300,2 milhões do

BNDES (crédito) para a implantação da BioFlex 1 e mais R$ 312,9 milhões vindos da FINEP

(crédito) para outras atividades de P&D. De maneira paralela, mas concatenada, tem-se o

aporte feito pelo BNDESPar256

, disponibilizando recursos na ordem de R$ 600 milhões ao

longo da vigência do Plano de Negócios submetido ao PAISS Industrial.

A constituição material do projeto ocorreu com o estabelecimento de parcerias

estratégicas, ou seja, a GranBio estabeleceu relações para viabilizar a tecnologia e a operação

da planta industrial, buscando competências, tecnologias de processos e insumos tecnológicos

256

Os recursos financeiros feitos pelo BNDESPar proporcionou a participação acionária na empresa (15%) e

adquiriu o direito de indicar um membro do Conselho de Administração. Dessa maneira, o BNDES acompanha o

desenvolvimento da firma e pode exercer alguma influência sobre as direções estratégicas. Ademais, pode se

beneficiar (novas receitas) caso as inovações da GranBio tragam retorno econômico (ENTREVISTA V;

ENTREVISTA X).

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que já estavam disponíveis no mercado internacional. As parcerias na constituição da BioFlex

1 são257

:

- Usina Caeté (Brasil): usina de cana-de-açúcar produtora de etanol de primeira

geração e açúcar, pertence ao Grupo Carlos Lyra. Sua função no projeto é fornecer o

abastecimento de matéria-prima para a Bioflex 1. O acordo entre as partes baseia-se em um

contrato de fornecimento de palha de cana de longo prazo (10 anos) com benefícios mútuos,

ou seja, caso a retirada da palha afete o desempenho do canavial da usina de 1G o contrato

pode ser readequado ou desfeito.

A relação entre estes dois atores resultou na construção de uma unidade de cogeração

junto a BioFlex 1. O sistema é alimentado com bagaço de cana-de-açúcar e lignina –

subproduto gerado no processo de produção do E2G. Esta solução é inédita no Brasil e o uso

da lignina traz vantagens ao processo de geração de vapor, pois é um material com alto

potencial calorífico e com menor umidade em relação ao bagaço de cana, portanto, em teoria

é uma biomassa mais eficiência (ENTREVISTA IV).

O sistema de cogeração foi projetado para permanecer em operação durante onze

meses ao ano, o equivalente a oito mil horas. Com isso, é capaz de atender às necessidades

das duas fábricas (Bioflex e Caeté) e, ainda, gerar um excedente de energia elétrica da ordem

de 135 mil MWh/ano, energia que deve ser exportada à rede nacional de abastecimento de

energia elétrica. Este excedente é suficiente para abastecer uma cidade de 300 mil habitantes.

Mas como a usina de etanol celulósico ainda não atingiu sua capacidade instalada, o sistema

funciona basicamente com bagaço e abaixo do seu potencial (ENTREVISTA IV).

Tanto os investimentos como a “administração” desse sistema de cogeração é feito em

conjunto entre os parceiros, os quais criaram uma joint venture para operar esta

estrutura/negócio – a Companhia Energética São Miguel dos Campos.

- Beta Renewables (Itália)258

: é o parceiro que detém a propriedade sobre a tecnologia

PROESA. Assim, a relação entre GranBio e Beta no projeto ocorre por meio de um contrato

baseado em licenciamento da tecnologia (firmado em maio de 2012). Destaca-se que nessa

relação não existe acordo/contrato para realizar pesquisa conjunta, co-desenvolvimento ou

comercialização da tecnologia melhorada pelo uso na Bioflex 1.

257

Informações retiradas da ENTREVISTA IV. 258

A Beta Renewables é uma joint venture entre a Biochemtex, uma empresa do Grupo Mossi Ghisolfi, e o fundo

americano TPG (Texas Pacific Group). No final de 2012, a Novozymes tornou-se acionista da empresa, com a

aquisição de 10% das ações, no valor de 90 milhões de euros.

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O acordo de licenciamento tecnológico prevê a garantia de desempenho. Com isso, a

Beta Renewables deve realizar a manutenção das condições dos processos/etapas que foram

testados no projeto PROESA na planta original na Itália (CORREA, 2014). Ademais, este

acordo gerou relações com outros atores, incluindo os fornecedores de insumos tecnológicos e

de tecnologias complementares, como a tecnologia enzimática e as leveduras transgênicas,

proporcionando novas ramificações contratuais.

- Biochemtex (Itália): é fornecedora de equipamentos e realiza a engenharia e a

assistência técnica para a BioFlex.

- Novozymes (Dinamarca): é a fornecedora de enzimas e dos compostos enzimáticos,

por meio de contratos de fornecimento de insumos tecnológicos para a etapa de hidrólise

enzimática.

- DSM (Holanda): é a fornecedora de leveduras geneticamente modificadas (OGM),

as quais realizam a fermentação da glucose (C6) e da xilose (C5) de maneira simultânea. Estas

leveduras são de propriedade da DSM. Assim, para a etapa de fermentação, firmou-se dois

contratos entre GranBio e DSM, o primeiro de licenciamento para a utilização da levedura

RN1016 para P&D da BioCelere e o outro contrato de fornecimento de insumos tecnológicos,

as leveduras, para serem utilizadas na unidade de produção do E2G.

A levedura da linhagem RN1016 se destaca pela capacidade de fermentar a xilose,

açúcar de cinco carbonos. Esta capacidade foi obtida por meio da “introdução” do gene XylA,

codificador da enzima xilose isômeras.

- Universidade Estadual de Campinas (Brasil): existe um acordo de cooperação entre

a BioCelere e Unicamp, o qual é operacionalizado por meio de projetos de pesquisa. Na

abrangência da relação universidade-empresa, incentiva-se a participação dos estudantes em

projetos de pesquisa da GranBio.

Este convênio prevê que os resultados das pesquisas (teses e dissertações)

desenvolvidas na circunscrição do acordo, estão assegurados pelo convênio, assim, estabelece

uma co-titularidade de uso exclusivo com a repartição de recursos entre as partes, com uma

cláusula que indica que quaisquer desenvolvimentos a partir do acordo estabelecido

pertencem aos parceiros (CORREA, 2014).

Este arranjo institucional permite que estudantes de graduação e pós-graduação sejam

financiados pela empresa e desenvolvam projetos em conjunto. Segundo as ENTREVISTA

IV e ENTREVISTA VII, os ex-alunos da universidade tornam-se pesquisadores da GranBio.

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Para além dos acordos de cooperação, fornecimento e licenciamento de tecnologias, a

GranBio estabelece outras estratégias para ampliar suas capacidades tecnológicas e atuar em

nicho que não detém competências internas, tais como a formação de joint ventures e a

aquisição de empresa de base tecnológica (ENTREVISTA IV).

Em 2013 adquiriu parte da empresa American Process Inc., que é dedicada à

tecnologias limpas (15% de participação acionária). Em 2014, na área de bioquímicos,

realizou uma joint venture com a Rhodia (grupo Solvay), dando origem a SGBio Renováveis,

com composição acionaria de 50% para cada uma das firmas. O foco dessa nova organização

é a pesquisa e a produção de químicos a partir da celulose contida na biomassa da cana-de-

açúcar (etanol e n-butanol).

Com a compra de ações da American Process, a GranBio passou a ter acesso a uma

plataforma tecnológica proprietária de pré-tratamento de biomassa. Pode ainda adquirir

conhecimentos desenvolvidos por esta empresa, a qual possui uma planta-piloto de E2G

funcionando desde 2013 e mais participação em dois projetos em escala de demonstração em

Thomaston (Geórgia) e Alpena (Michigan) nos EUA.

Por meio da criação da SGBio Renováveis, realizou-se a aquisição dos ativos da

Cobalt Technologies, empresa norte-americana de biotecnologia, que apresentava experiência

no desenvolvimento de tecnologia para a produção de n-butanol, acetona, etanol e buteno, a

partir de biomassa (ENTREVISTA IV). Nesse movimento de compra, a SGBio adquiriu o

banco de micro-organismos e ativos de propriedade intelectual da Colbalt Technologies como

patentes, marcas, processos e métodos.

- A tecnologia PROESA

A tecnologia utilizada na planta de E2G da GranBio em Alagoas é conhecida como

PROESA, que compreende um conjunto tecnológico protegido por quatorze famílias de

patentes (CORREA, 2014; SOUTINHO, 2016). Trata-se de uma tecnologia completa que

abarca todos os componentes de engenharia e etapas do processo de produção - do pré-

tratamento da biomassa que chega à unidade até o produto final. Exige apenas a compra de

insumos: matéria-prima, enzimas e as leveduras.

A tecnologia PROESA é formada basicamente por três etapas distintas que ocorrem

em reatores separados. A primeira etapa é o processo de pré-tratamento, baseia-se na

aplicação de altas temperaturas e pressão sobre a biomassa (Steam Explosion), assim, a

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estrutura rígida da biomassa (lignina) é quebrada, permitindo que a celulose e a hemicelulose

fiquem acessíveis para a etapa seguinte.

Na segunda etapa, um composto formado pelos polissacarídeos (celulose e

hemicelulose) é tradado por enzimas, com isso ocorre a “quebra” das ligações moleculares e

libera-se os açúcares “menores”, os monossacarídeos C5 e C6. Esse processo é chamado de

hidrólise enzimática.

A terceira etapa é a fermentação dos açucares C5 (xilose) e C6 (glucose), que são

digeridos por micro-organismos geneticamente modificados (as leveduras). Como resultado

desse processo tem-se o etanol, que é destinado à destilação, dando origem ao etanol anidro

(retirar água do etanol). A destilação ocorre igualmente ao processo já utilizado na produção

do 1G.

É importante notar que a hidrólise enzimática e a fermentação são feitas em reatores

distintos, assim, o design da tecnologia é pautada no modelo Separate Hydrolysis &

Fermentation (SHF). Acrescenta-se que o processo de fermentação da C5 e da C6 ocorrem no

mesmo reator, conceito que difere do modelo da Raízen – que faz uma espécie de reciclo de

fermento, separando a etapa de fermentação em dois estágios (VISITA I).

- Expectativas e problemas

Devido a esse novo arranjo (GranBio e parceiras) e aos dados de desempenho

apresentados pela tecnologia em laboratório/piloto, criou-se uma expectativa muito positiva

do desenvolvimento do projeto da Bioflex, “fugindo prá longe” do que realmente está

ocorrendo. Por exemplo, em 2012/2013 acreditava-se que a Bioflex iria operar em plena carga

a partir de 2015, produzindo os 82 milhões de litros de E2G anidro e 50% iria para a

exportação. Assim, a Bioflex deveria atingir o faturamento de R$ 150 milhões em 2015.

Projetava-se que o Grupo GranBio juntamente com os novos parceiros iria construir

mais 10 plantas de etanol celulósico até 2022, movimentando um investimento de R$ 4

bilhões. Com estas novas plantas imaginava-se chegar à produção de 1 bilhão de litros de

E2G em 2022 , para tal, a segunda planta do Grupo GranBio estava pensada para iniciar sua

construção em 2016.

Mas a dinâmica da inovação é incerta e repleta de entraves que derivam das condições

objetivas da realidade, tais como as tecnologias não atingem o desempenho desejado devido

às interações não “imagináveis” no momento do desenho do artefato. Problemas de cunho

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270

institucional se acumulam frente às necessidades do processo de produção ou da circulação do

capital e, principalmente, a compreensão e o aprendizado tecnológico leva tempo e necessita

de esforços sistemáticos para atingir maturidade.

Os problemas listados abaixo ilustram os entraves enfrentados pela GranBio que,

ademais, não são específicos desta empresa visto que também estão presentes nos casos da

Raízen e das iniciativas internacionais.

A Bioflex apresentou e apresenta baixa produção, de outubro de 2014 a maio de 2015

produziu um total de 2 milhões de litros de etanol celulósico. Em 2016 a empresa informou

que produziu 4 milhões de litros de etanol celulósico, sendo que o melhor mês de trabalho

gerou 1,5 milhão de litros do combustível. Esses números estão muito aquém da capacidade

produtiva instalada de 82 milhões de litros/ano. Esse baixo desempenho se deve

principalmente aos problemas mecânicos e da dinâmica de sólidos - os problemas no pré-

tratamento forçam a Bioflex 1 interromper sua produção por meses259

.

De maneira oficial, a Bioflex interrompeu sua produção em dois momentos: no final

de 2015, a unidade ficou parada por dois meses e em 2016 suspendeu a produção entre os

meses de abril a outubro. Situação que impediu sequer chegar próximo das expectativas

criadas no momento de elaboração e implementação260

. A causa das interrupções advém de

problemas no processo de pré-tratamento da biomassa, fase que fica sujeita a uma forte

corrosão dos equipamentos de aço261

. A biomassa que chega até o reator onde ocorre a

deslignificação (pré-tratamento) carrega muitas impurezas, ou seja, a terra que entra na

fábrica junto com a palha da cana, quando submetida à pressão e temperatura elevadas, corrói

com agressividade as estruturas de aços da planta (ENTREVISTA VII).

O problema é que os equipamentos não foram testados para um elevado teor de

minerais, isto é, os testes feitos com palha e bagaço de cana na Itália tinham um nível de

“pureza” maior. Ademais, as propriedades fisiológicas da cana são distintas das biomassas

utilizadas nos projetos originais, resultando em dimensões e qualidades de equipamentos

distintos e não adequados à realidade brasileira (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA X).

259

Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/granbio-paralisa-usina-etanol-

celulosico-050416/>. Acessado em 16 de junho de 2017. 260

Disponível em: < https://www.biomassabioenergia.com.br/imprensa/areia-na-biomassa-da-cana-e-desafio-

para-a-producao-de-etanol-celulosico/20150521-094419-H386>. Acessado em 16 de junho de 2017. 261

Com isso, danifica as válvulas, as bombas e as tubulações. Tal situação se mostrou constante na Bioflex 1,

mas não é apenas exclusividade desse projeto. A Raízen e outras iniciativas internacionais têm sofrido com estes

problemas (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA).

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271

A palha que chega a Bioflex 1 carrega um teor de impureza em média de 8% e estima-

se (pelo fabricante) que os equipamentos deveriam suportar a presença de “areia” por tonelada

de matéria-prima de até aproximadamente 4% (ENTREVISTAS IV; ENTREVISTAS VII).

Esse problema também é sentido no projeto da Raízen, embora esta firma sofra

"menos" com a com corrosão das estruturas metálicas de sua unidade, pois usa apenas o

bagaço da cana, que é uma matéria-prima um pouco mais “limpa” do ponto de vista de

impurezas minerais em relação à palha (ENTREVISTAS VIII).

Outra questão desconsiderada pelos desenvolvedores da tecnologia PROESA é a

interação entre a tecnologia e meio físico, já que a morfologia dos solos afeta de maneira

decisiva o nível de impureza da biomassa. O solo da região de São Miguel/AL é basicamente

arenoso com maior teor de sílica, que é mais abrasiva que os minerais encontrados em outras

regiões canavieiras, por exemplo, o Latossolo Vermelho, um solo mais argiloso característico

da região de Piracicaba/SP onde se localiza a unidade da Raízen.

Outro problema que não é de cunho tecnológico foi o atraso no start da planta devido

à demora e aos entraves burocráticos impostos pelo processo de regularização e aprovação do

uso da levedura geneticamente modificada da DSM (ENTREVISTA IV). O processo todo de

aprovação da levedura demorou ao todo um ano e meio até que a CTNBio concluísse que o

micro-organismo tinha os mesmos efeitos sobre a saúde humana, animal e ao ambiente do que

a levedura convencional já usada no país (Saccharomyces cerevisiae) e, portanto, autorizasse

o seu uso para a produção de etanol celulósico.

Estes problemas acabaram por alterar todo o cronograma de investimentos e de metas

da GranBio em relação à produção do Etanol celulósico. Segundo notícias divulgadas na

mídia262

a GranBio alterou o seu cronograma de investimentos e de metas de produção do

combustível por conta dos problemas “tecnológicos” e pela crise econômica, mas espera ter,

em 2019, um etanol 2G competitivo como o de primeira geração.

- Esforço local e resultados

Um olhar diferente também é possível sobre a experiência da GranBio no Etanol

celulósico, pois a curta trajetória trouxe alguns resultados positivos e a obtenção de

competências importantes para o desenvolvimento da tecnologia em território nacional –

adensando os esforços de inovação do SSI da cana-de-açúcar.

262

Disponível em: < http://istoe.com.br/granbio-admite-atraso-em-usina-mas-espera-alcool-2g-competitivo-em-

2019/> Acessado em 10 de julho de 2017.

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272

A Bioflex implementou ajustes e alterações visando solucionar o problema do pré-

tratamento, tais como o revestimento com cerâmica das estruturas danificadas e o

redimensionamento do raio de algumas válvulas (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA X).

Mas as ações mais significativas são os avanços na área de biotecnologia da firma – Biocelere

– e na área de produção da biomassa – BioVertis. As conquistas tecnológicas importantes

seguem listadas abaixo:

- O desenvolvimento de uma levedura geneticamente modificada: A nova cepa263

desenvolvido pela GranBio é resultado de engenharia genética sobre a levedura

Saccharomyces cerevisae, micro-organismo amplamente utilizado na indústria de 1G. Por

meio da inserção homóloga do gene xylA, codificador da enzima Xilose isomerase, criou-se

um novo micro-organismo capaz de consumir o monossacarídeo com cinco carbonos (C5)

presente na hemicelulose, ou seja, a Xilose.

Em outras palavras a equipe de pesquisadores da GranBio/Unicamp desenvolveu uma

linhagem geneticamente modificada da Saccharomyces cerevisae com um gene de outro

microrganismo – não revelado – e alguns genes modificados da própria Saccharomyces

tornado esse novo micro-organismo apto a processar a xilose. Esta linha de leveduras foi

denominada de Celere-2L, a qual tem como a “única” característica diferente do seu parental

a capacidade de consumir o açúcar xilose (ENTREVISTA IV; ENTREVISTA VII).

Na produção do etanol 1G, as leveduras industriais da espécie Saccharomyces

cerevisiae consome a sacarose e a frutose existentes na forma solúvel no caldo da cana. O

resultado é a produção do etanol como um subproduto das reações provocadas pela

“alimentação” destes micro-organismos. Na indústria de E2G os açúcares das fibras da palha

e do bagaço da cana são compostos pelos açucares glicose (40%), xilose (25% ) e a pentose

(35%). Os dois últimos são de cinco carbonos e apresentam-se em estado não solúvel,

portanto, as leveduras “normais” não os reconhecem. Mas com a modificação genética

introduzida pelo gene xylA, estes novos micro-organismos passam a reconhecer estes açucares

não solúveis e, assim, ampliam a sua “dieta”, passando a consumir a Xilose tendo como

subproduto mais etanol (ENTREVISTA IV).

O organismo já foi aprovado para uso comercial pela coordenação-geral da Comissão

Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e seu uso é protegido por uma patente

depositada no Brasil e no acordo PCT.

263

Um grupo de descendentes com um ancestral comum.

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273

Em teoria o uso deste novo micro-organismo tem o potencial de ampliar a produção do

E2G e, ainda, reduzir custos de produção da Bioflex. Segundo ENTREVISTA IV e

ENTREVISTA VII esta inovação deve trazer um ganho de cerca de R$ 50 milhões anuais

para a empresa se ela conseguir processar 400 mil toneladas de biomassa por ano (isso com

base no projeto inicial).

A levedura da GranBio se destaca por ser a primeira a ser desenvolvida no Brasil

voltada exclusivamente para o E2G. Outro destaque é que em testes laboratoriais atingiu

desempenho melhor que as leveduras desenvolvidas pela DSM (RN1016), no quesito

agilidade do processo de fermentação que leva em média 72 horas.

- Cana-energia: por meio da cooperação entre GranBio, IAC e Ridesa, a empresa

conseguiu desenvolver uma variedade nova de cana-de-açúcar, não transgênica, criada a partir

de cruzamentos tradicionais entre vários cultivares. O processo de cruzamento envolveu um

exercício de melhoramento ao contrário da rota estabelecida nos últimos 90 anos

(ENTREVISTA IV). Isto significa que os cruzamentos feitos para a cana-energia foram feitos

com espécies “mais antigas”, buscando obter genótipos que favorecessem a robustez e a

ampliação da massa da planta.

Ao longo de todo o projeto de etanol celulósico da GranBio – que se confunde com

própria história e com os propósitos da empresa – pode-se destacar que a atividades de P&D

fazem parte da “rotina” da GranBio, onde os investimento giram em torno de R$ 75 milhões

por ano (CORREA, 2014).

Especificamente no que se refere à absorção da tecnologia e do aprendizado na

produção do E2G tem-se as relações estabelecidas no desdobrar do processo de implantação

da planta industrial, como as atividades de treinamento e transmissão de conhecimentos feitos

no interior da parceria (GranBio – Beta Renewables), tanto de maneira tácita como de

maneira sistemática e consciente.

Os conhecimentos tácitos referentes à tecnologia de produção são transmitidos e

absorvidos pelo convívio sistemático com os novos artefatos e, principalmente, com os

especialistas das empresas estrangeiras que passaram a trabalhar em conjunto com os

engenheiros e trabalhadores da GranBio. Situação que ficou mais constante com os problemas

enfrentados no cotidiano da produção – pré-tratamento e alimentação dos reatores para a

hidrólise enzimática.

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274

Mas os conhecimentos também foram transmitidos e adquiridos de maneira

sistematizada, pois o acordo entre a GranBio e a Beta Renewables, contemplou treinamento e

ambientação com um grupo de 16 engenheiros de processos da GranBio na unidade de

Crescentino (Itália). O objetivo dessa ação, ao acompanhar a operação da planta de etanol

celulósico in loco, foi capacitar à equipe acerca dos processos e procedimentos que deveriam

ser gerenciados no Brasil.

5.2.4.3. Raízen

A Raízen foi criada em 2010 a partir da joint venture entre a Shell e a Cosan, com

composição acionária de 50% para cada. A sua atuação ocorre nos seguintes segmentos

econômicos: a) distribuição de combustíveis; b) cogeração de energia; c) produção de açúcar

e, d) produção de etanol. A Raízen detém 24 usinas, localizadas nos Estados de São Paulo,

Goiás e Mato Grosso do Sul, e emprega cerca de 30 mil funcionários.

Na safra 2014/2015 suas unidades somadas processaram 57 milhões de toneladas de

cana-de-açúcar, produziu 4 milhões de toneladas de açúcar e 2 milhões de m3 de etanol, sendo

o maior grupo do setor sucroenergético nestes três critérios. Sua receita líquida no ano fiscal

de 2015 foi de R$ 74 bilhões.

O projeto de etanol celulósico da Raízen, mesmo que não declaradamente, pode ser

considerar como parte e derivação da estratégia mundial da Shell, empresa tradicionalmente

voltada aos combustíveis fósseis que visa diversificar e, principalmente, acompanhar

possíveis trajetórias tecnológicas que interferem diretamente no seu core business - a

tendência imposta pela sustentabilidade, resultante dos problemas ambientais, dos

movimentos socioambientais e das inovações na área de energias renováveis.

A iniciativa da Raízen consistiu na construção e operação de uma planta em escala

comercial de etanol celulósico. O projeto teve início no ano de 2011 e a instalação, em 2014,

ocorreu no município de Piracicaba/SP, ao lado da Usina Costa Pinto, unidade pertence ao

grupo Raízen. A capacidade instalada da planta é de 40 milhões de litros por ano. Vale

destacar que a capacidade instalada da Bioflex 1 é de 80 milhões de litros por ano, mostrando

que mesmo na escala comercial existe diferenças significativas entre as iniciativas (a tabela

5.1. e 5.2. apresentam outros detalhes sobre as diferenças entre os projetos brasileiros e

internacionais).

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A elaboração, o desenvolvimento e a construção da usina de E2G é fruto das ações da

Raízen junto aos seus parceiros estratégicos (firmas estrangeiras). No entanto, a viabilidade

econômica do projeto é dada por meio dos aportes realizados pelo programa de apoia à

inovação do BNDES-FINEP (PAISS Industrial). A construção da unidade de E2G e a

instalação dos equipamentos necessários demandaram investimentos na ordem de R$ 237

milhões, sendo que 85% deste montante foram realizados pelo BNDES (PAISS Industrial –

crédito).

O projeto submetido ao PAISS Industrial em 2011 previa o estabelecimento de

parcerias para a condução do projeto de P&D e a introdução da inovação (E2G). Assim, em

2012 a Raízen estabeleceu parceria com a Iogen Corporation, empresa canadense de

biotecnologia, que desde 2002 mantinha uma joint venture com a Shell, resultando na criação

da Iogen Energy. Esta por sua vez, passa a ser parcialmente controlada pela Raízen em 2012

reconfigurando a joint venture - Raízen 50% e Iogen Corporation 50%.

A Iogen Corporation é uma empresa criada em 1974 que se utilizava do processo

steam explosion para melhorar a digestibilidade da celulose – alimentação animal. Já em 1982

constrói uma planta-piloto de etanol celulósico e passa também a desenvolver pesquisas com

enzimas. Em 1999 constrói uma planta em escala demonstrativa na cidade de Ottawa com o

objetivo de adquirir a expertise e comprovar o conceito tecnológico. Desta forma, é um ator

com “tradição” na tecnologia do etanol celulósico264

.

Na amostra de famílias de patentes analisadas no capítulo 4, a Iogen Energy detém 16

famílias de patentes na temática do E2G. Vale enfatizar que tais tecnologias podem ser

acessadas pela Raízen, que é um dos acionistas da firma.

A parceria entre Raízen e Iogen Energy é um acordo tecnológico, no qual a Iogen

entrou com a tecnologia de processo, o design da planta e seu start-up, bem como serviços

operacionais. Neste acordo a Raízen tornou-se licenciada com direito de uso exclusivo das

tecnologias. O diferencial é que a Raízen tem a propriedade integral sobre todos os novos

desenvolvimentos tecnológicos resultantes do projeto em conjunto.

Diante das competências e da estrutura já instalada no Canadá, os testes com a

biomassa da cana-de-açúcar foram feitos nas instalações da Iogen, processo este que envolveu

o envio de mais de 1.000 toneladas de bagaço de cana ao Canadá. A intenção era realizar o

aprimoramento das técnicas de produção de etanol celulósico (ENTREVISTA VIII).

264

Disponível em: http://www.iogen.ca/about-iogen/history.html Acessado em: 08 de julho de 2016.

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276

Outra parceria estratégica estabelecida no projeto da planta comercial foi com a

Novozymes, um contrato de fornecimento exclusivo de enzimas e micro-organismos

geneticamente modificados (OGM) – leveduras para a fermentação dos açucares de cinco

carbonos (C5 - Xilose). Este contrato de fornecimento de insumos tecnológicos pode ser

resumido em dois objetivos: a) o fornecimento das enzimas para a produção imediata do E2G;

b) a realização do aprimoramento da tecnologia enzimática, “novos” compostos enzimáticos

para melhorar a conversão do material celulósico em açúcares, visando às características da

cana-de-açúcar. E, o desenvolvimento e fornecimento de leveduras para a fermentação da C5

– segunda fase do projeto que se iniciou em 2016 (ENTREVISTA VIII).

A tecnologia desenvolvida pela Iogen Energy caracteriza-se pelo uso da rota

bioquímica: pré-tratamento (processo de explosão a vapor), hidrólise enzimática (conversão

da celulose em glicose), separação do produto da hidrólise em porções sólida e líquida,

fermentação (microrganismos avançados que fermentam os açúcares C5 e C6) e destilação

(CORREA, 2014).

- Expectativas e problemas

A curta trajetória da planta de E2G da Raízen (start em 2015)265

é representativa das

características e das dificuldades em introduzir inovações disruptivas. A estratégia inicial da

empresa era construir 8 plantas de etanol celulósico até 2024. Estas teriam capacidade de

produção de 1 bilhão de litros por ano, com isso, aumentaria em 50% a produção do Grupo

Raízen sem ampliar a área plantada266

.

Entretanto, já em 2015/16, com a planta funcionando, as projeções foram revistas267

-

onde novos investimentos em construções industriais deveriam aguardar novos resultados da

planta já em funcionamento. O prognóstico muito positivo era resquício da euforia desmedida

da primeira fase do etanol celulósico no Brasil – e no mundo (entre 2010 – 2012)

(ENTREVISTA VII; ENTREVISTA VIII).

265

Em novembro de 2014 a Raízen iniciou as operações da planta E2G, mas a inauguração oficial - contando

com a presença da Presidenta da República Dilma Rousseff – se deu no dia 22 de julho de 2015 (ENTREVISTA

VIII). 266

As expectativas eram altas, tanto que ainda em 2014 previa-se que a segunda usina de E2G iria ser construída

em junho de 2016 com uma capacidade três vezes maior que a primeira unidade, alcançando 120 milhões de

litros/ano. 267

Disponível em: <https://www.novacana.com/n/etanol/2­geracao>. Acessado em 08 de Julho de 2016.

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277

Os desempenhos e os problemas enfrentados no mundo real da produção fez arrefecer

a “pressa” da Raízen e de outros atores envolvidos nesse processo. Os problemas enfrentados

pela iniciativa da Raízen foram em grande medida semelhantes aos enfrentados pela GranBio,

POET/DSM, DuPont e Beta Renewenble. Tais entraves podem ser sumarizados da seguinte

forma:

- Baixo volume de produção: a produção atual da planta está muito abaixo da

capacidade instalada268

. O aumento contínuo da produção de etanol 2G vem ocorrendo (os

números são expostos a seguir), mas não na velocidade imaginada no início da proposta, fato

que impôs um represamento nos novos projetos.

- Dificuldades mecânicas: o grande problema esta relacionado à natureza da matéria-

prima processada, ou seja, desenvolver um regime contínuo de alimentação dos reatores –

material pré-tratado para o reator onde ocorre a hidrólise enzimática.

- “Baixa” eficiência do composto enzimático: os primeiros micro-organismos e as

enzimas liberadas por eles não eram fortes o bastante para "quebrar" as moléculas da

biomassa da cana com alta eficiência, assim, liberando menos açúcares para serem

fermentados (ENTREVIATA VIII). Este problema parece estar superado ou ter melhorado o

desempenho dos novos compostos, introduzidos em 2016, mas não foi revelado detalhes

(ENTREVISTA VIII).

- separação da lignina: os equipamentos utilizados para separar a lignina não

apresentaram bons resultados, o que resultou na alta presença da lignina no estágio da

fermentação, assim, diminuindo a eficácia do processo (as leveduras não degradam a lignina).

Essa situação também atrapalha o uso comercial da lignina, material com alto potencial

calorífico; a ideia é utilizar esse “resíduo” nas caldeiras para gerar vapor e, consequentemente,

energia elétrica para planta ou exportada a rede. O entrave é o desenvolvimento de um filtro

eficiente para separar a lignina (ENTREVISTAVI; ENTREVISTA VIII).

- Logística: um fato que atrasou o start da planta da Raízen foi dificuldade e o

encarecimento do transporte de maquinário específico, os quais eram importados

(ENTREVISTA VIII). Por exemplo, uma máquina de pré-tratamento importada do Canadá

precisou ser trazida por avião, porque não foi possível aproveitar o “frete” marítimo – vindo

pelo Canal do Panamá (essa operação gerou um custo de R$ 1 milhão a mais).

268

<http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,raizen-avanca-no-etanol-de-2-geracao,10000089302>

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278

Problemas com a importação e o armazenamento das enzimas também são frequentes.

As enzimas são trazidas de uma planta industrial da Novozymes localizada nos Estados

Unidos (Franklinton – Carolina do Norte) e quando chega pelo porto de Santos/SP é

transportada de caminhão até Piracicaba/SP, permanecendo armazenadas em contêineres

refrigerados.

- Esforço local e resultados

Mesmo frente a estes problemas a parceria Raízen-Iogen-Raízen-Novozymes tem

logrado alguns resultados positivos e, principalmente, a Raízen tem adquirido competências

nesse processo.

Uma das situações que animam os entusiastas do projeto é o fato da produção de E2G

da Raízen não ter sido interrompida, o que igualmente ocorreu com a produção da GranBio

ou da Abengoa (Hugoton – EUA). Estas unidades enfrentaram problemas sérios no pré-

tratamento da biomassa, sendo necessária a manutenção/substituição dos maquinários, com

isso, comprometendo o processo contínuo.

Embora o volume ainda esteja distante do que as instalações permitem (40 milhões de

litros), a perspectiva é de aumento contínuo, visto que na safra de 2015/2016, chamada de

“fase de análise”, a planta produziu 1,4 milhão de litros de E2G, frente à produção que

ocorreu entre os meses de abril a outubro de 2016, produção de 4,5 milhões de litros de

etanol. E se levarmos em consideração a safra 2016/2017 como um todo (abril – abril) a

produção ficou na casa dos 7,1 milhões de litros de E2G. Essa produção equivale a 17,7% da

capacidade instalada.

Na mesma direção, a expectativa para a safra de 2017/18 é alcançar a produção de 15 a

20 milhões de litros. Os mesmos números olhados de maneira relativa (safra-safra) são

possíveis ver que a produção de E2G da Raízen teve um “salto” de 507% entre a safra de

2015/2016 e a safra 2016/2017.

Outra informação importante sobre o desempenho da tecnologia Raízen-Iogen é a

relação de E2G por tonelada de bagaço de cana – a eficiência do processo. O target da planta

industrial é de 289 litros/tonelada, na safra 2015/2016 atingiu 91 litros/tonelada e na safra

seguinte (2016/2017) consegui atingir a relação de 211 litros/tonelada, estabelecendo uma

média de 167 litros de etanol/tonelada (ENTREVISTA VIII). Os valores mais atuais superam

a relação do etanol de primeira geração (85-90 litros/tonelada).

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Vale destacar que os ganhos de eficiência e o aumento da produção do etanol da safra

2015/16 para a 2016/17 foi resultado da introdução do processo de fermentação dos açúcares

de cinco carbonos (C5 – xiloses). Este fato é muito relevante, pois este processo era tido como

um entrave à expansão da produção de segunda geração (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA

X). Este novo estágio do projeto incidiu diretamente no aumento da produção e no aumento

da eficiência do processo produtivo como um todo.

Para a efetivação do processo de fermentação da Xilose, a Raízen passou a empregar

leveduras geneticamente modificadas, as quais foram desenvolvidas e produzidas pela

Novozymes – especificamente para o projeto Raízen-Iogen. A capacidade da planta de etanol

celulósico realizando apenas a fermentação da C6 (glucose) é de 26 milhões de litros por ano,

mas com o novo processo de fermentação passa para os 40 milhões de litros anuais.

Estes destaques de aumento da produção devem ser relativizados, pois os custos de

produção do E2G da planta da Raízen ficam acima do patamar do E1G269

. A empresa projeta

que vai conseguir equiparar os custos em 2018. Em matéria divulgada pelo Valor Econômico

de 24 de outubro de 2016:

“se a planta utilizasse toda a capacidade mantendo o atual nível de eficiência, o

custo de produção seria 50% maior que o etanol de primeira geração. Por mais que

esse número não pareça competitivo, ele é animador na comparação com os

resultados do ano passado, quando a diferença era de 300%” (VALOR

ECONÔMICO, 2016) 270

.

Para ter uma noção mais dos avanços desempenhados pela Raízen, recupera-se os

dados de custos e projeções feitos por Milanez et al. (2015): o custo de produção do litro de

etanol 1G no Brasil é de aproximadamente R$ 1,10, enquanto o de 2G estaria próximo de R$

1,50 por litro. A expectativa, no entanto, é de que esses valores fiquem entre R$ 0,90 e R$

0,70 e entre R$ 0,70 e R$ 0,50, respectivamente, por volta de 2020.

Outro destaque é que parte do etanol produzido na planta da Raízen foi destinada à

exportação. Segundo informe da Reuters Brasil de 22 de julho de 2015, a Raízen fechou tarifa

para exportação de etanol de segunda geração para a Europa, com um prêmio de 300 reais por

metro cúbico sobre o produto convencional271

.

269

Disponível em: < http://br.reuters.com/article/domesticNews/idBRKCN0PW20M20150722> Acessado em:

08 de julho de 2016. 270

Disponível em:

<http://www.valor.com.br/search/apachesolr_search/%22RA%C3%8DZEN%22?page=8&solrsort=created%20d

esc> Acessado em: 01 de julho de 2017. 271

Disponível em: < http://br.reuters.com/article/domesticNews/idBRKCN0PW20M20150722> Acessado em:

08 de julho de 2016.

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280

O mais interessante para o SSI da cana-de-açúcar é o desenvolvimento de

competências nacionais na trajetória de E2G e o adensamento do próprio SSI – novos atores;

políticas e instrumentos institucionais voltados à inovação; ampliação dos esforços em

desenvolvimento científico e tecnológico; e o estabelecimento de novas competências na

produção. Estes elementos estão presentes no desenvolvimento da trajetória do etanol

celulósico do Brasil com intensidades distintas.

A iniciativa da Raízen certamente contribui de maneira mais relevante à formação de

competências locais ligadas ao ambiente da produção e organização da fabricação do E2G –

já que a tecnologia de “ponta” é acessada por meio das parcerias e da sua “subsidiaria”, a

Iogen Energy.

As competências desenvolvidas pela Raízen envolvem basicamente as soluções

técnicas encontradas internamente para contornar os problemas do cotidiano da produção. É a

solução de problemas nas diversas etapas do processo de conversão do material

lignocelulósico que estabelece uma “ponte” com processos de aprendizagem mais

sistematizados, a saber272

:

i) Troca e substituição de peças e componentes devido à forte corrosão provocada

pelas impurezas minerais da biomassa e/ou pela ação dos ácidos usados para quebra da

celulose. Devido aos problemas no pré-tratamento, a Raízen tomou a decisão por conduzir

essas ações internamente, visto que os bens importados demorariam em média 6 meses para

chegar e isso poderia interromper o processo produtivo. Com essas ações, desenvolveu novos

materiais e ligas de aços mais resistentes para os novos componentes, “novas” bombas e

válvulas – que estão suportando as condições reais do processo produtivo.

ii) Desenvolvimento de uma nova máquina para auxiliar a limpeza da biomassa, uma

espécie de "lavadora" de impurezas da biomassa. Com este dispositivo a parcela de

impureza na celulose caiu de 11% para 4%.

iii) Construção e operação de um laboratório isolado para a manipulação de

micro-organismos geneticamente modificados (OGM). Nesta estrutura manipula-se as

leveduras capazes de fermentar os açúcares de cinco carbonos. Estes OGM foram

desenvolvidos pela Novozymes, mas como não foi aprovado pela Comissão Técnica Nacional

de Biossegurança (CTNBio) para uso comercial, os micro-organismo devem ser manipulados

em uma área restrita e controlada, a qual foi construída junto à planta de E2G.

272

As informações a seguir foram obtidas junto a representantes da Raízen – ENTREVISTA VIII e CAMPO VI

e VISITA I.

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281

Esta três frentes de competências contou com a mobilização dos engenheiros, técnicos

e mecânicos da própria Raízen para resolver os problemas, por meio dos recursos e dos

conhecimentos disponíveis na própria firma. Estas inovações incrementais não deram retorno

financeiro, mas certamente foram responsáveis por destravar os gargalos e passaram a

alimentar projeções mais otimistas sobre o futuro desse mercado273

.

5.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 5

A dinâmica dos projetos de desenvolvimento da tecnologia industrial no Brasil

refletem elementos da corrida tecnológica internacional, na qual atores heterogêneos buscam

estabelecer um standard para a tecnologia de transformação da biomassa em etanol e em

outros bioprodutos. A tabela 5.2. indica algumas das faces desse contexto, bem como, mostra

o posicionamento das empresas brasileiras ante aos principais players internacionais, sendo os

dois casos mais avançados GranBio e Raízen.

O etanol celulósico no Brasil apresenta algumas vantagens “de partida”, ou seja, uma

situação favorável devido a sua base de recursos naturais e pela trajetória de aprendizagem

desenvolvida no etanol de primeira geração (domínio das técnicas agrícolas, logística e

infraestrutura para o consumo). Concomitante a estas vantagens, tem-se o fato que os novos

processos de produção de etanol (2G) são baseados em resíduos agroindustriais que não

competem com o uso da água ou com a produção de alimentos. Ademais, a cana-de-açúcar

apresenta o melhor custo de matéria-prima, como fica evidente na observação da tabela 5.2.

273

Em 22 março de 2017 o portal NovaCana divulgou que a Raízen pode decidir, ainda no ano de 2017, ampliar

a capacidade instalada de sua unidade de etanol celulósico ou construir uma nova usina voltada para a segunda

geração, a depender da continuidade dos bons resultados atingidos na Usina Costa Pinto – Piracicaba/SP.

Disponível em: https://www.novacana.com/n/etanol/2­geracao-celulose/raizen-ampliar-­producao­etanol-

celulosico­construir-nova­usina­220317/ Acessado em: 08 junho de 2017.

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282

Tabela 5.2. Características técnicas dos projetos industriais de etanol celulósico no mundo e

custo de produção estimado no ano de 2016 (projetos em operação).

Características Raízen GranBio Poet-DMS

Beta

Renewables DuPont Abengoa

País Brasil Brasil EUA Itália EUA EUA

Capacidade (milhões de l/ano) 40 83 94 75 113 94

Custo de capital (milhões de dólares) 100 265 275 210 225 500

Matéria-prima

Bagaço de

cana

Palha de

cana

Palha de

milho

Palha de

Trigo

Palha de

Trigo

Palha de

milho

Custo da matéria-prima (US$/ton) 38 40 90 75 52 90

Pré-tratamento

Ácido

diluído

Explosão

a vapor

Ácido

diluído

Explosão a

vapor Alcalino

Ácido

diluído

Potencial de geração de energia (MW) 7 16 17 13 N/A 21

Custos de produção (US$/l) 0,26 0,3 0,52 0,53 0,54 0,63

Preço mínimo de venda do etanol

celulósico (US$/l) 0,57 0,7 0,8 0,87 0,88 1,2

Fonte: elaboração própria a partir de LUX RESEARCH (2016) 274

.

O relatório “Uncovering the Cost of Cellulosic Ethanol Production” da Lux Research

(2016) indica que os custos com a matéria-prima é o fator mais importante para determinar os

custos de produção do etanol celulósico, correspondendo a 40% do total. Assim, a Raízen e a

GranBio apresentam os menores custos de produção de etanol celulósico no mundo em 2016,

vide tabela 5.2.

Os esforços de pesquisa desenvolvidos pelos atores brasileiros e por aqueles que aqui

estão, pelo menos na sua formulação, predispõem-se ao desenvolvimento de competências

para dominar a tecnologia de segunda geração. Visam assim aproveitar as condições

vantajosas da base natural para ir além, com isso, explorar novos mercados por meio de novas

tecnologias de transformação da biomassa em biocombustíveis, bioquímicos e biomateriais

(este direcionamento é visto nos programas de P&D e nas políticas públicas expostas no

capítulo 3, bem como na análise dos casos neste capítulo).

Portanto, o presente capítulo trouxe elementos para compreender essa dinâmica,

identificando quais são as ações nessa direção, ou seja, compreender como ocorre o

movimento pela densificação e diversificação do SSI da cana-de-açúcar, condição sine qua

non para o desenvolvimento de setores econômicos baseados em recursos naturais

(ANDERSEN, 2011; FURTADO, 2014; ANDERSEN et al. 2015).

274

As informações foram obtidas no resumo executivo do relatório e em reportagem especial do portal Nova

Cana, o qual está disponível em: <https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/custo-producao-

etanol-celulosico-usinas-mundo-150316/ > Acesso 10 Outubro 2016.

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283

Essa discussão liga-se diretamente com a postura teórica e metodológica adotada no

capítulo 1, pois a análise dos projetos industriais de etanol celulósico fornecem elementos

para compreender a mudança setorial e identificar ações na direção do adensamento e

diversificação do SSI da cana-de-açúcar, que ao fazê-lo, desloca as suas fronteiras setoriais,

mediante a busca de novos conhecimentos e novas tecnologias. De maneira correlata, traz

novos atores para o SSI, os quais somados aos já estabelecidos introduzem novos processos

produtivos e novos produtos.

Essa dinâmica é retratada e compreendida na tese, que só se fecha com a conclusão de

todos os capítulos. Pois a chave interpretativa é compreender a direção do desenvolvimento

do setor, mas, principalmente a maneira e a intensidade de como ocorre, já que entender a

dinâmica do desenvolvimento é identificar as características particulares desse processo, que

em essência é permeado por dificuldades (técnicas e institucionais) e de incertezas promovida

pela própria natureza do processo inovativo.

Tais dificuldades residem na própria tecnologia de segunda geração, a qual exige uma

transição qualitativa do modo de inovação do setor (mais ciência e tecnologia), mas, a grande

questão é como se faz isso? Ao passo que o Brasil tem plantas de etanol celulósico em

operação (com custos melhores do que as concorrentes internacionais), estas são baseadas em

tecnologias estrangeiras (equipamento e insumos). Por outro lado, mesmo com tecnologias

incorporadas estabelecem-se processos de adaptação e desenvolvimento endógeno, ações da

GranBio, da Raízen, do CTC e do CTBE indicam essa posição.

As iniciativas levantadas pela pesquisa indicam a ocorrência de ganhos de

experiências e o desenvolvimento de competências locais, as quais foram conduzidas nas

Iniciativas Exploratórias (Oxiteno; Odebrecht Agroindustrial; IPT; CTBE;

Petrobras/Cenpes) e nas Iniciativas Estruturadas (CTC; GranBio e Raízen). Estas são frutos

das novas políticas públicas implementadas ao longo dos anos 2000 e dos esforços e recursos

empregados na rota tecnológica do etanol celulósico advindos de diversos tipos de atores

(firmas; ICTs e agências públicas – BNDES, FINEP, FAPESP).

Como exemplo destes ganhos tem-se: 1) o desenvolvimento de pesquisa junto a

universidades (Oxiteno, Odebrecht, GranBio e CTC); 2) aquisição de competências em

processos industriais não utilizados na produção do 1G, tais como a limpeza da biomassa;

pré-tratamento; hidrólise enzimática e fermentação da C5.

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Por mais que estes processos não estejam funcionando próximos das definições

conceituais, pode-se afirmar que o SSI da cana-de-açúcar se aproxima muito mais da rota

tecnológica do E2G em 2017 do que anteriormente, pois para cada etapa do processo de

produção os atores (diferentes) têm implementado ações para solucionar ou aperfeiçoar esses

processos: o CTC desenvolveu um “pacote” tecnológico com a possibilidade de integração de

plantas industriais de E1G e E2G; a Raízen (por adaptação) criou um equipamento para

limpar a biomassa; a GranBio criou uma nova cepa de leveduras capazes de fermentar C5; o

CTBE desenvolve um “sistema” de produção de enzimas; a Petrobras/Cenpes também

apresenta a competência tecnológica capaz de implementar uma planta de E2G, igualmente,

Iogen Energy e Beta Renewables (engenharia e projeto), só lhe faltando os insumos

tecnológicos.

Os casos que não atingiram a escala TRL8/TRL9 (Early commercial deployment)

sinalizam as incertezas que pairam sobre esta rota tecnológica, bem como as barreiras que

interferem na concretização de iniciativas inovadoras como um todo. Os esforços resultam em

ganhos de experiência, mas nem sempre avanços de maneira concreta.

As maiores dificuldades encontradas pelas iniciativas brasileiras foram/são: a)

entraves institucionais, os quais vão da demora em regular um OGM até a ausência de

instrumentos de política pública que fortaleçam a demanda do E2G; b) baixo desempenho da

tecnologia importada (muitos problemas técnicos que derivam da interação com a realidade

brasileira – biomassa e solo); c) contexto nacional e internacional permeado por incertezas de

várias naturezas (crise política; questionamento crescente das políticas/ações pró-mudanças

climáticas; “concorrência” com outras alternativas tecnológicas).

O cenário ainda é incerto, mas as vertentes da transição do SSI estão postas e,

aparentemente, não será uma via única, pois até o momento o setor apresenta ações que

fortalecem a transição em uma ótica de dependência (incorporando pacotes tecnológicos e

insumos biotecnológicos) e ora apresenta soluções endógenas que visam contrapor esta

tendência. O que foi exposto até o momento fornece um panorama geral dessa dinâmica, que

certamente moldará o futuro da bioenergia no Brasil.

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285

CONCLUSÕES

A pesquisa caracterizou o esforço nacional na trajetória tecnológica do etanol

celulósico, com a identificação dos atores sociais, das particularidades das iniciativas e do

contexto histórico em que se inserem tais ações. A partir deste esforço, a presente tese foi

capaz de mostrar o “quando”, “como” e “quem” são os responsáveis pela participação

brasileira na corrida tecnológica do etanol de segunda geração.

Estes esforços ocorreram por meio e no entorno do SSI da cana-de-açúcar, segmento

agroindustrial que ao longo do tempo sofreu mudanças institucionais e técnicas que

favoreceram ações na direção do desenvolvimento da tecnologia e da produção do etanol

celulósico. As primeiras ações ocorreram no início dos anos de 1980 (Iniciativas Pioneiras),

caracterizadas pela opção da hidrólise ácida.

A segunda “onda” de ações sistematizadas na rota do etanol celulósico no Brasil

ocorre a partir dos anos de 2000 - superando o período de hiato dos anos de 1990. Os atores

pertencentes ao SSI da cana-de-açúcar e aqueles que atuavam próximos às fronteiras setoriais

deste segmento foram os responsáveis por um conjunto de iniciativas que visavam

desenvolver competências e implementar unidades industriais de E2G, as quais tendiam tanto

para a realização de testes como para a produção do etanol de fato. Os eventos e as ações

ocorridas nesse interin foram objeto das análises da pesquisa, configurando o recorte analítico

e temporal da tese.

As ações realizadas nos anos de 2000 compõem o quadro de fatos e indícios que

deram o “tom” das mudanças e das permanências ocorridas no SSI da cana-de-açúcar ao

longo dos últimos 17 anos. As alterações no interior do SSI têm sido promovidas por

intermédio da busca por novas competências e do estabelecimento de processos de

aprendizagem voltados à tarefa de desenvolver as tecnologias de produção do etanol

celulósico em território nacional.

Isso resultou na reconfiguração dos atores, das relações e dos conteúdos do próprio

SSI, sobretudo, no que diz respeito à inovação na Fase Industrial do setor sucroenergético.

Porque até então, a introdução de novos equipamentos, máquinas e métodos de produção

nesta fase visavam apenas à ampliação da eficiência e da capacidade produtiva das usinas na

transformação do caldo de cana-de-açúcar em etanol (Sacarose C12; Glicose C6; Frutose C6).

No novo contexto, a inovação passa a ter outro sentido e direção: busca-se o aproveitamento

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286

integral da biomassa, ou seja, a extração e beneficiamento do açucares contidos na estrutura

fibrosa da planta (Glicose C6; Xilose C5 e Pentoses C5).

A inovação para a produção de etanol ou de intermediários bioquímicos neste novo

contexto já não é mais alcançada apenas em função do melhoramento incremental das

estruturas técnicas já estabelecidas. Neste novo contexto, passa a ser imperativo introduzir um

novo conjunto tecnológico capaz de ampliar a exploração da biomassa, aproveitando

economicamente “hoje” o que era resíduo “ontem”.

Este novo direcionamento relegou atores tradicionais (as firmas de bens de capital

nacionais) ao mesmo tempo em que recebeu novos atores, os quais dominam bases de

conhecimento e técnicas distintas. Trata-se de firmas e instituições de pesquisa concatenadas

aos avanços na fronteira do conhecimento científico, pertencentes aos segmentos da

biotecnologia, da química fina, da biologia molecular e da genética.

A identificação, a caracterização e a sistematização desta nova dinâmica no setor

sucroenergético são os produtos desta pesquisa de doutoramento. Cada capítulo da tese

trabalhou com elementos particulares ligados às iniciativas brasileiras em direção ao domínio

do etanol celulósico, operacionalizando as categorias conceituais da abordagem de Sistemas

Setoriais de Inovação com seus correspondentes na realidade. Assim, os achados da tese – que

na verdade são sistematizações dos episódios reais conduzidos pelos atores do SSI da cana-

de-açúcar - podem ser sumarizados a partir das respostas às perguntas de pesquisa (vide figura

1 – Introdução).

O principal questionamento que direcionou toda a pesquisa foi: Quais são os

atores/elementos do Sistema Setorial de Inovação (SSI) da cana-de-açúcar do Brasil que

promovem o progresso técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia do etanol

celulósico? Para responder esta questão, foi realizado o mapeamento dos atores e a

identificação das suas ações perante o desafio tecnológico do E2G275

. Essa investigação

permite afirmar que o Estado brasileiro, por meio dos ministérios, agências e órgãos públicos

de diferentes naturezas, foi o principal ator desse processo, não apenas porque destinou

recursos financeiros a todos os projetos de P&D realizados nos anos de 2000, mas porque

introduziu inovações institucionais que possibilitaram implementar projetos industriais de

E2G, colocando o Brasil em pouco tempo no cenário mundial do E2G.

275

Busca, seleção e análise de políticas públicas e seus instrumentos; famílias de patentes; artigos científicos

publicados internacionalmente; entrevistas com representantes das firmas e instituições.

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287

Esses acertos do lado da oferta (technology push) infelizmente casou-se com uma total

ausência de instrumentos institucionais do lado da demanda (demand pull) e ainda com

políticas de outras naturezas que foram desencontradas com a estabilidade do setor de

biocombustíveis. A política de controle dos preços da gasolina é um dos exemplos. Mas,

mesmo assim, o Estado foi hábil em estabelecer medidas institucionais que possibilitaram

avançar nessa trajetória tecnológica, onde a FINEP e o BNDES sustentaram os

investimentos, bem como direcionaram as ações pró-inovação do setor – sendo estes os dois

entes públicos mais representativos desse novo papel do Estado brasileiro.

Como não podia deixar de ser, existem outros atores relevantes nessa trajetória, sem os

quais seria impossível e inútil implementar políticas públicas, já que tais atores foram os alvos

dos estímulos e os responsáveis por conduzir de fato os projetos de P&D. Trata-se das firmas

e das ICTs presentes no SSI da cana-de-açúcar. Estes atores são verdadeiros catalisadores dos

estímulos provenientes do Estado brasileiro e do contexto promovido pela corrida

internacional pela tecnologia do E2G. Ademais, são estes os atores que executam as

atividades de P&D, desenvolvem competências e constroem novas relações e estruturas

relacionadas à tecnologia do etanol celulósico em território nacional.

As ações mais significativas foram dadas pelo IPT; CTBE; Petrobras; Oxiteno;

Odebrecht Agroindustrial, denominadas de Iniciativas Exploratórias, e pelo CTC; GranBio

e Raízen, classificadas como Iniciativas Estruturadas. O primeiro grupo apresenta ações de

pesquisa no nível laboratorial ou em escalas reduzidas (bancada e polito). Estas iniciativas

caracterizam-se por não atingirem o estágio de early commercial deployment. Já as ações

estruturadas são aquelas que materializaram plantas industriais na realidade do SSI da cana-

de-açúcar (Demo e Comercial) – estando em um nível à frente das Iniciativas Exploratórias.

São capazes de produzir etanol celulósico e municiar o SSI com novas informações, já que

estão presentes na execução dos projetos, situações e problemas que até então não tinham sido

sequer aventadas pelo setor sucroenergético.

Nas Iniciativas Exploratórias e nas Iniciativas Estruturadas se tem o desenvolvimento

de competências nacionais na rota de E2G, pois firmas e instituições de pesquisa destinam

recursos para apreender e desenvolver conhecimento economicamente útil na rota 2G276

.

Estes atores em conjunto modificaram elementos históricos do SSI da cana-de-açúcar (fase

276

Ademais, os projetos de P&D são pensados e conduzidos para dar conta dos problemas do setor

sucroenergético. Estas competências surgem como consequência de pesquisas e melhoramentos tecnológicos

ocorrendo em território nacional e por meio do trabalho de pesquisadores, engenheiros e técnicos “brasileiros”.

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288

industrial), porque imprimiram diferentes tipos de esforços na atividade de P&D, que ao final

convergem na busca pela ampliação da exploração da biomassa.

É interessante notar que a disposição destes atores em empreender ações sistemáticas

na rota do etanol celulósico são provenientes de uma confluência de fatores, tanto internos

como externos ao Brasil. Os drives que influenciaram as ações no etanol 2G foram: a) alta

nos preços do petróleo (em 2012 o preço médio do petróleo importado chegou a US$117,80

por barril); b) desenvolvimento tecnológico no campo da biotecnologia e da engenharia

genética (vide capítulo 4); c) movimentações políticas e sociais em torno das questões

ambientais, principalmente, a partir das ações de mitigação e adaptação às mudanças

climáticas.

Estas situações acionaram um conjunto de investimentos públicos e privados nos

EUA e na Europa, na busca por fontes alternativas de energia. Assim, as Novas Fontes de

Energia Renovável passaram a figurar na pauta de ações dos Estados nacionais e dos atores

econômicos que de alguma maneira se aproximam destas novas tecnologias de baixo carbono.

No plano nacional, o Brasil volta a realizar crescimento econômico nos anos de 2000 e

uma das relações derivadas disso é o aumento expressivo do consumo de etanol, que veio a

reboque da introdução do carro flex em 2003277

. De maneira correlacionada, a outra grande

mudança foi o fato do Estado brasileiro colocar o etanol (novamente) como ativo/setor

estratégico, sendo alvo de ações institucionais: planos, programas e campanhas

internacionais278

foram implementadas. Estas ações geraram discussões e investimentos no

setor sucroenergético e um dos desdobramentos refere-se às iniciativas no E2G279

.

Um dos destaques da tese é mostrar como o arcabouço institucional contribui para o

desenvolvimento da rota do etanol celulósico no Brasil. As contribuições do novo arranjo

institucional foram centrais para o desenvolvimento das atividades na rota do E2G, porque

todas as iniciativas mapeadas na década de 2000 foram financiadas em algum momento pelo

277

Esta situação é intensificada devido a uma política de estímulo ao mercado interno (expansão do crédito,

redução do IPI e etc.). 278

As ações no plano internacional retratam também elementos da coevolução do SSI da cana-de-açúcar. Por

exemplo, no início da década de 2000, a empreitada brasileira por meio do Itamaraty era pelo etanol 1G como

commodity global, mas depois da COP21 e do estabelecimento da plataforma biofuturo, as ações passaram a

visar os estímulo ao E2G. 279

A realidade é que estas novas diretrizes, mesmo com os problemas de coordenação institucional do Brasil,

estimularam os atores do SSI, os quais passaram a movimentar-se em diversas frentes: expansão da área

cultivada; instalação de novas usinas; expansão da cogeração; investimentos em agricultura de precisão;

mecanização da lavoura; ações em P&D (de maneira concentrada, em poucas firmas); e outras. Todas estas

ações fizeram novamente o setor e o consumo dos produtos derivados da cana crescer.

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poder público e na maioria dos casos sendo contempladas em programas e linhas de

financiamentos distintas. Por exemplo, a Odebrecht Agroindustrial teve projetos financiados

pelo PAISS Industrial e pelo PITE da FAPESP.

O Estado suportou boa parte dos custos para a execução das atividades de P&D, tanto

aquelas realizadas nas estruturas públicas, como aquelas conduzidas internamente nas firmas.

Essa dinâmica é interessante, pois programas como o PAISS Industrial ou o BIOEN/FAPESP,

ao disponibilizar recursos, também conduziram parcialmente a direção dos esforços em P&D,

pois determinaram a priori as rotas (ou sub-rotas) tecnológicas que seriam elegíveis para

receber os recursos.

Esse fato concentrou os esforços nacionais, evitou sobreposições e aumentou a

envergadura dos aportes, ao passo que elegeu “campeões nacionais”, pois os atores

selecionados se beneficiaram de recursos estratégicos não disponíveis anteriormente.

A nova política também criou canais institucionais e canais informais para as trocas de

informações e experiências entre os diversos tipos de atores que visavam desenvolver a

tecnologia do E2G. Destes canais derivaram-se as parcerias estratégicas entre firmas e ICTs

nacionais com os agentes estrangeiros de diferentes naturezas tecnológicas.

Outra ação que derivou desta mudança no arcabouço institucional foi a criação de

novos atores públicos voltados especificamente para conduzir pesquisas e cooperar em

projetos de P&D no SSI da cana-de-açúcar. A criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia

contribuem com o adensamento da atividade inovadora no setor.

A partir de 2006, nota-se que o arcabouço institucional ligado ao setor sucroenergético

recebeu adequações no campo de política pública, as quais passaram a suportar e apoiar

ações na nova rota tecnológica. As mudanças foram dadas, principalmente, por trazer à cena

setorial a ideia e o conceito de inovação ao setor. Houve no período de 2006-2016 uma

mudança qualitativa no padrão de intervenção do Estado em relação ao etanol. As ações, que

no passado visavam regular a expansão do setor e os mercados regionais (como no Proálcool),

passaram a ter como meta o adensamento da atividade inovadora, com destaque à fase

industrial – situação inédita.

Com isso, foram criados planos/programas com metas e objetivos para a CT&I do

setor sucroenergético (Plano Nacional de Agroenergia; PACIT; ENCIT; PAISS Industrial;

PAISS Agrícola). Destas ações, descendem os aportes das agências de fomento. Como

exemplo, tem-se a FINEP que entre os anos de 1999 a 2015 financiou 9.617 projetos com

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290

recursos dos Fundos Setoriais, dentre os quais 97 eram ligados ao setor sucroenergético280

,

sendo que 25 deles eram declaradamente relacionados à tecnologia do E2G.

Outro avanço foi a criação de um programa específico ao etanol celulósico, o qual

gerou “novas modalidades” de ação do Estado em relação ao SSI da cana-de-açúcar, tais

como: a) as participações acionárias em empresas que buscam realizar inovação (GranBio;

CTC); b) financiamento por meio de recurso não-reembolsáveis; c) créditos para projetos de

inovação (condições especiais); d) recursos para ICTs realizarem projetos de P&D em

cooperação com as firmas na fase industrial do SSI.

Os novos direcionamentos e o contexto histórico possibilitaram ao SSI da cana-de-

açúcar presenciar novas interações entre os distintos atores que compõem o sistema. Estas

novas relações se realizam por meio dos projetos e P&D em etanol celulósico, que por sua

vez, se sustentam operacionalmente a partir das parcerias estratégicas entre firmas ou entre

firmas e ICTs. Todas as iniciativas dos anos 2000 realizam algum tipo de parceria. Estas

ocorrem por meio de joint ventures, cooperação no P&D; consórcios para a realização de

P&D; licenciamento de tecnologia estrangeira; contratos de fornecimento de insumos

tecnológicos específicos; dentre outras.

Este novo tipo de interação ocorre na medida em que os atores visam complementar

suas competências tecnológicas. As empresas líderes dos projetos de P&D adquiriram ou

cooperaram nos “momentos produtivos” do E2G onde não apresentam competências, ou que

seria muito dispendioso realizar investimentos. Por tais razões, uma mesma empresa

estabeleceu relações com vários atores distintos.

Um exemplo característico deste novo contexto é a GranBio. Para a construção e

operação da sua planta de etanol celulósico, estabeleceu a aquisição do pacote tecnológico da

Beta Renewables (Itália); para obter os insumos tecnológicos necessários ao funcionamento

dos processos chaves, realizou acordos com a Novozymes (Dinamarca) e DSM (Holanda),

respectivamente fornecedores de enzimas e de leveduras; para obter a biomassa, realizou

acordo de fornecimento de matéria-prima com a Usina Caeté (Brasil); para acessar

competências em fermentação de alto desempenho de maneira proprietária, realizou parcerias

com a Unicamp (Brasil); para estabelecer alternativas tecnológicas na etapa do pré-

tratamento, adquiriu parte da empresa American process (EUA); para desenvolver cana-

280

O primeiro aporte só foi feito no ano de 2000. Os recursos gastos pela FINEP no setor sucroenergético

somam R$ 2.064.613.198,27, sendo que aproximadamente metade deste valor foi investida no âmbito do PAISS

Industrial.

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291

energia estabeleceu parcerias com IAC (Brasil) e RIDESA (Brasil). Por fim, para implementar

e melhorar seu sistema de recolhimento de palha de cana, fechou acordos com CNH (EUA),

Valtra (Finlândia) e Implanor (Brasil).

É imperativo reconhecer que o braço do Estado brasileiro participa ativamente dessas

relações; apenas no Programa PAISS Industrial, as unidades da GranBio contaram com o

aporte de R$ 300,2 milhões do BNDES (crédito) para a implantação da BioFlex 1 e mais R$

312,9 milhões vindos da FINEP (crédito) para outras atividades de P&D. De maneira paralela,

mas concatenada, tem-se o aporte feito pelo BNDESPar, disponibilizando recursos na ordem

de R$ 600 milhões ao longo da vigência do Plano de Negócios submetido ao PAISS Industrial

– situação que permite ao banco público controlar 15% das ações da empresa e o direito de

indicar um membro para o Conselho de Administração.

É importante notar que esta nova dinâmica deu origem a projetos industriais em E2G

distintos. As diferenças são de capacidade instalada, mas, principalmente, de propósitos. Por

exemplo: o CTC, a Odebrecht e o CTBE visaram uma escala reduzida, com plantas industriais

para a realização de testes e comprovação do conceito tecnológico e da viabilidade

econômica, e como tal objetivaram o desenvolvimento proprietário da tecnologia. Já os

projetos da Raízen, da GranBio e o da Petrobras eram voltados para a escala comercial,

buscando explorar as vantagens de serem os pioneiros em produzir etanol celulósico.

Uma ressalva deve ser feita em relação à iniciativa da Petrobras, que além de buscar os

ganhos do pioneirismo, também desenvolvia proprietariamente a tecnologia, com o objetivo

futuro de explorar economicamente a tecnologia. Diferentemente da GranBio e da Raízen,

que importaram tecnologia com o propósito de atuar de fato na produção de biocombustíveis

e bioquímicos.

Na esteira desse processo, foi possível identificar a existência de “focos” de

desenvolvimento endógeno da tecnologia de E2G. Este desenvolvimento local pode ser visto

de duas maneiras:

1) Os depósitos de famílias de patentes, sendo que os principais atores nacionais nessa

trajetória depositaram patentes nos anos 2000. A GranBio (5); a Petrobras (5); o CTC (4); a

Odebrecht (2); o CTBE (2) e as universidades também participaram dessa ação, sendo que a

Unicamp é proprietária de 4 famílias de patentes281

. Estas invenções são furto de esforços em

281

Estes esforços não podem ser desprezados, mas é notória a desproporcionalidade existente entre os atores

nacionais e os estrangeiros, como exemplo: a Novozymes (165); DuPont (40); POET (33); DSM (31); BP (25);

Iogen (24); Inbicon (15) e outras.

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292

pesquisa e desenvolvimentos feitos em projetos de pesquisa formalizados, configurando ações

que se aproximam do STI-mode. O caso da GranBio, com a levedura transgênica, ou do

CTBE, com o desenvolvimento de coquetéis enzimáticos, são destaques dessa dinâmica.

2) Existe o desenvolvimento endógeno pela via de aprendizagem baseada na

adaptação e no melhoramento da tecnologia importada, fato este que reorienta o

desenvolvimento pelo DUI-mode. Esta situação se dá nas duas plantas em escala comercial.

Assim, estas firmas realizam a substituição de materiais e de equipamentos, bem como o

desenvolvimento de “novos” equipamentos – como é o caso da máquina de limpar biomassa

da Raízen.

Diante do desafio tecnológico e dos esforços sistemáticos realizados pelos principais

atores do SSI da cana-de-açúcar, a pesquisa formulou a seguinte hipótese: as mudanças

exigidas pela tecnologia do etanol celulósico alteram a base de conhecimento na fase

industrial do setor sucroalcooleiro, forçando um deslocamento do exclusivismo DUI-mode

(learning by doing, learning by using e learning by interacting) para um padrão

intermediário, visando o STI-mode (learning by Science, Technology and Innovation).

Essa situação se daria pela exigência da própria tecnologia, ou seja, as tecnologias que

suportam a produção do E2G pertencem a outro regime tecnológico. Assim, obrigariam os

atores do SSI da cana a buscarem processos de aprendizagem mais próximos da ciência; do

conhecimento formal; dos experimentos em laboratórios; e com o estabelecimento de

cooperações com universidades e/ou ICTs.

Esse movimento aconteceu/acontece de maneira particularizada em poucos atores que

conduzem ou conduziram projetos de P&D nos anos 2000. Alguns destes têm origem

nacional, tais como a GranBio; CTC; Cenpes/Petrobras; CTBE. Estes buscaram competências

ligadas ao conhecimento formalizado, tentando emular o STI-mode. Até por isso, figuram

como depositantes de famílias de patentes.

Vale destacar que estes atores não são firmas processadoras de biomassa (usina). O

único ator que atua no beneficiamento da cana-de-açúcar e que atingiu maturidade no seu

projeto de P&D foi a Raízen. E seus esforços de inovação ocorrem a partir da aquisição da

tecnologia estrangeira e, em seguida, diante dos problemas enfrentados no cotidiano da

produção, passou a imprimir inovações incrementais. Foi a partir do uso, da produção e da

interação com outras experiências que a Raízen realizou melhoramentos e adaptações.

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293

Assim, pode-se supor que as usinas/firmas processadoras de biomassa irão se manter

no DUI-mode, atreladas aos fornecedores. As usinas são tradicionalmente supplier dominated

firms e como tal permanecem nessa situação mesmo após a introdução do E2G – pelo menos

nesse primeiro momento.

As inovações na fase industrial do SSI da cana-de-açúcar continuam sendo

introduzidas pelos fornecedores de insumos e desenvolvedores de tecnologias, mas a grande

diferença é que no E2G ocorre uma substituição dos atores nacionais pelos estrangeiros, os

quais apresentam base tecnológica e de conhecimento distintas das principais firmas que

compunham as iniciativas de inovação no setor sucroalcooleiro até então.

Na trajetória tecnológica do etanol de primeira geração, as inovações vivenciadas

pelas usinas foram introduzidas pelas empresas de bens de capital nacional, as quais se

baseiam no DUI-mode. Mas no contexto do E2G, as inovações demandam conhecimentos

sistematizados ligados à ciência, situação que inviabilizou a participação destes atores

tradicionais. Como consequência, atraiu ao setor as empresas de base tecnológicas ligadas à

química e à biotecnologia (na grande maioria estrangeiras).

Portanto, com exceção dos poucos atores nacionais já referenciados, o deslocamento

para o STI-mode no nível de SSI é conduzido por empresas estrangeiras, uma vez que o Brasil

não domina as tecnologias mais relevantes. O desenvolvimento para o STI-mode deve ocorrer

inevitavelmente devido à natureza do desafio tecnológico; mas, como não poderia deixar de

ser, mudam-se os tradicionais fornecedores de insumos e de tecnologias por novos atores.

O que se viu até o ano de 2017 foi uma dinâmica aparentemente paradoxal, em que os

atores brasileiros adentraram a rota tecnológica do E2G em patamares semelhantes aos atores

internacionais (vide tabela 5.2.), mas ao mesmo tempo, o SSI da cana-de-açúcar aumentou sua

dependência tecnológica externa, porque as etapas mais complexas da tecnologia são

controladas por empresas estrangeiras. E, o mais interessante, é que este movimento foi

impulsionado para produzir um produto já de domínio no Brasil, com mecanismos de

aprendizagem já dominados, e uma cadeia produtiva totalmente internalizada no país.

As estratégias até aqui são acertadas - parcerias estratégicas com o capital estrangeiro.

Mas a próxima barreira a ser superada pelo SSI da cana-de-açúcar deve ser a internalização

dessas ações e das competências ligadas ao STI-mode, para desenvolver tecnologias

proprietárias e desencadear sucessivos desdobramentos pelo setor produtivo (produção do

etanol 2G e bioquímicos; máquinas e equipamentos e insumos tecnológicos nacionais).

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Acrescenta-se a essa dinâmica a existência de outras barreiras a serem superadas

para o avanço do etanol celulósico. A principal delas, sem dúvida, é a barreira tecnológica;

na situação atual, os diversos processos industriais da “usina de 2G” ainda não funcionam

como deveriam e os custos de produção ainda são maiores do que o E1G (vide capítulo 5).

De maneira correlacionada a esta barreira existe a necessidade de continuar

implementando políticas pró-etanol celulósico, mesmo diante de um cenário incerto e

desconfiado em relação aos avanços futuros da tecnologia. A tecnologia não funciona de

maneira satisfatória, mas pode vir a funcionar com novos esforços em P&D, então é

necessário investir. Encontra-se aqui um paradoxo pois, como indica Mazzucato (2013), os

investidores privados só irão investir se a tecnologia funcionar.

Isso indica que o Estado novamente deverá mostrar apetite para inovação e desenhar

novos instrumentos de políticas que sustentem as próximas etapas da evolução da tecnologia

do etanol celulósico. Além da incerteza com a tecnologia, o etanol celulósico sofre uma

pressão a partir de outras opções tecnológicas, as quais visam descarbonizar o setor de

transportes 282

.

Estas inovações, em outros ramos da economia, podem em médio/longo prazo

eliminar as possibilidades da expansão do etanol 2G como combustível para veículos de

passageiros. Então, existe um time que deve ser aproveitado pelos atores do SSI da cana-de-

açúcar, mas para serem aproveitadas, essas soluções no curto e médio prazo devem ser

elaboradas visando resolver os problemas atuais e difundir a tecnologia no setor

sucroenergético.

Estes novos estímulos devem superar as limitações atuais do arcabouço institucional

do SSI da cana-de-açúcar, que conseguiu avançar pelo lado da oferta, mas ficou estagnado no

lado da demanda. Hoje só existem instrumentos voltados à demanda do etanol de primeira

geração e, como a segunda geração origina-se de um domínio tecnológico distinto, deve-se

implantar ações sistemáticas que favoreçam a compra e a produção do E2G, tais como os

mandatos de misturas ou as bonificações aos produtores.

282

O etanol celulósico sofre pressão de outras “tecnologias verdes” na medida em que é utilizado apenas como

substituto direto da gasolina, mas o seu uso e seu potencial devem perseguir o horizonte da alcoolquímica e o

abastecimento de outros modais (veículos pesados, por exemplo). Ainda, a sua tecnologia abre espaço para o

desenvolvimento de outros produtos que podem complementar o segmento de combustíveis e químicos.

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295

O desafio para as políticas públicas do setor sucroenergético está na continuidade da

promoção do avanço tecnológico do E2G paralelamente ao avanço do seu mercado,

contornando as incertezas e as pressões existentes no cenário internacional em relação à

continuidade dos biocombustíveis. Com isso, a superação destas barreiras deve resultar na

promoção do crescimento setorial puxado pela inovação (difusão da tecnologia de segunda

geração), realizando o adensamento e a diversificação das atividades do SSI da cana-de-

açúcar.

É nessa difícil tarefa que reside a maior contribuição da tese, pois ao longo do trabalho

mostrou-se os papéis do setor público e do setor privado no processo de inovação do E2G.

Expôs-se as particularidades desse processo, identificando que o setor público não se limitou

apenas a incentivos complementares às ações conduzidas pelo setor privado; pelo contrário, o

Estado brasileiro em certa medida assumiu riscos ao investir recursos financeiros na rota do

etanol celulósico e os complementou com um conjunto de ações.

Com isso, o trabalho evidenciou o caráter coletivo da inovação, mostrando a divisão

do trabalho inovador entre os diferentes atores do SSI da cana-e-açúcar, com especial atenção

ao comprometimento de cada ator frente ao contexto que abarca o etanol celulósico.

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APÊNDICE 1

Figura. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology

clusters –Geral ( famílias de patentes).

Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.