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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ EDNA MARIA JUCÁ COUTO REDEFINIÇÕES ESPACIAIS DO COMÉRCIO DE MOSSORÓ – RN FORTALEZA – CEARÁ 2011

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

EDNA MARIA JUCÁ COUTO

REDEFINIÇÕES ESPACIAIS DO COMÉRCIO DE

MOSSORÓ – RN

FORTALEZA – CEARÁ 2011

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EDNA MARIA JUCÁ COUTO

REDEFINIÇÕES ESPACIAIS DO COMÉRCIO DE MOSSORÓ – RN

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual do Ceará como requisito parcial para obtenção do grau de mestre em Geografia. Área de concentração: Análise Geoambiental e Ordenamento de Territórios de Regiões Semi-Áridas e Litorâneas. Orientadora: Profª. Drª. Denise Elias

FORTALEZA – CEARÁ 2011

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C871r Couto, Edna Maria Jucá

Redefinições espaciais do comércio de Mossoró-RN / Edna Maria Jucá Couto. — Fortaleza, 2011.

222 p. ; il. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Denise Elias. Monografia (Programa de Pós-) – Universidade

Estadual do Ceará, Centro de Ciências e Tecnologia. Área de Concentração: Análise Geoambiental e Ordenamento de Territórios de Regiões Semi-Áridas e Litorâneas.

1. Reestruturação espacial – Mossoró – Rio Grande do Norte. 2. Comércio – Mossoró – Rio Grande do Norte. 3. Mossoró – Rio Grande do Norte. I. Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências e Tecnologia.

CDD: 711.40981

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À minha família, pelo amor, compreensão e apoio em

todos os momentos.

Ao Wagner, que em meio aos clicks tem me dedicado

tanto amor, carinho e paciência.

Aos amigos que se foram tão cedo, mas que distribuíram

muitos sorrisos por onde passaram, Juliana Farias Forte e

Paulo Eduardo Morais da Silva (in memoriam).

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, a Deus por todas as bênçãos concedidas.

À minha família, fundamental para a realização deste trabalho. À minha orientadora, Denise Elias, por tamanha dedicação, seriedade e companheirismo durante toda minha jornada acadêmica, bem como nos diversos momentos de descontração. Aos professores Eustógio Dantas (Universidade Federal do Ceará), Vitor Ribeiro Filho (Universidade Federal de Uberlândia) e Cláudio Castilho (Universidade Federal de Pernambuco), pelas importantes contribuições para o aprimoramento do trabalho, durante as bancas de qualificação e de defesa da dissertação. Aos colegas do Laboratório de Estudos Agrários, hoje, Grupo de Pesquisa Globalização, Agricultura e Urbanização, especialmente à Priscila Romcy e ao Rodrigo Queiroz, amigos que sempre compartilharam momentos de alegrias, angústias e tantas outras “emoções”. Aos amigos, Luciana Maciel, Gerardo Facundo e Thatiane Araújo, que me acompanharam desde o início da graduação e, juntos comigo, alcançaram mais esta vitória: a conclusão do mestrado; e àqueles que também contribuíram bastante para esta conquista: Tadeu Soares Jr., Tereza Vasconcelos, Rosilene Aires e Deusimar Alencar. Aos amigos doutorandos mais maravilhosos e inteligentes que eu conheço, Cíntia Lins, Juscelino Eudâmidas e Iara Gomes. Ao Programa de Pós-Graduação em Geografia, no seu corpo docente e funcionários, principalmente à Júlia Oliveira, à Lúcia Silva e ao Sr. Francisco, sempre tão atenciosos e dispostos a ajudar. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo apoio financeiro. À Rede de Pesquisadores de Cidades Médias, pelo intercâmbio na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, em Presidente Prudente – SP. A todos que, direta e indiretamente, me ajudaram na realização da pesquisa. Ao meu noivo e maior incentivador, Wagner Amorim, o melhor presente que Deus me deu.

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RESUMO

Teve-se como objetivo principal estudar a evolução espacial do comércio em Mossoró-RN, sobretudo a partir da década de 1980. A cidade, cujo desenvolvimento da atividade comercial é de grande relevância histórica, detém intenso dinamismo econômico e passa por significativas reestruturações que repercutiram na expansão das atividades comerciais e de serviços. Estas reestruturações estão diretamente associadas a processos ocorridos em nível mundial, como a dispersão espacial da produção, a difusão do comércio e dos serviços e a nova divisão internacional e interregional do trabalho, discussões presentes na dissertação e basilares para as reflexões teóricas inerentes à questão estudada. Nas últimas décadas, o desenvolvimento da atividade comercial vem desempenhando papel essencial no processo de urbanização de Mossoró, favorecendo a chegada de novos agentes econômicos e a instalação de equipamentos comerciais modernos. Para compreender todas estas transformações, o percurso metodológico adotado baseou-se em algumas questões norteadoras associadas aos objetivos específicos, respondidas no decorrer da pesquisa. Como variáveis de estudo selecionou-se aquelas relacionadas especialmente às atividades comerciais tradicionais e modernas, permitindo identificar relações de concorrência e complementaridade entre elas. Neste sentido, os trabalhos de campo foram fundamentais, particularmente por possibilitarem a observação e reflexão do comércio mossoroense e sua relevância na economia local e regional. Conforme o estudo revelou, na última década intensificou-se a instalação de equipamentos comerciais modernos em Mossoró, preferencialmente em áreas mais valorizadas afastadas do Centro, porém próximas aos principais eixos viários que cortam a cidade e nos bairros onde se concentra população de maior poder aquisitivo. Entretanto, o comércio tradicional ainda é bastante relevante e concentra-se sobremodo nas áreas centrais, adotando também novas estratégias de vendas, como o crédito. Além disso, como ficou evidente, a implantação de novos padrões de produção e de consumo trouxe uma remodelação dos modos de vida urbana e uma redefinição do papel regional exercido pela cidade. Palavras-chave: Comércio. Reestruturação espacial. Mossoró-Rio Grande do Norte.

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RÉSUMÉ

L’objectif principal de ce mémoire de maîtrise, c’est d’étudier l’évolution spatiale du commerce à Mossoró (capitale de l’Ètat du Rio Grande do Norte, dans le Nord-Est brésilien), surtout à partir de la décennie 1980. Le développement de l’activité commerciale de cette ville présente une grande importance historique; elle a un dynamisme économique intense et elle subit des restructurations importantes qui se sont répercutées sur l’expansion des activités commerciales et du secteur des services. Ces restructurations sont directement associées à des processus qui se sont passés au niveau national, comme la dispersion spatiale de la production, la diffusion du commerce et des services et la nouvelle division internationale et interrégionale du travail; c’est des discussions présentes au travail qui sont fondamentales pour les réflexions théoriques propres à cette étude. Dans les dernières décennies, le développement de l’activité commerciale joue un rôle essentiel au processus d’urbanisation de Mossoró qui favorise l’arrivée de nouveaux agents économiques et l’installation des équipements commerciaux modernes. Pour comprendre toutes ces transformations, la méthodologie adoptée s’est basée sur des questions guidantes associées aux objectifs spécifiques; ces questions ont été répondues au cours de cette recherche. On a sélectionné comme variable d’étude celles qui ont rapports principalement aux activités commerciales traditionnelles et modernes, en permettant d’identifier les relations de concurrence et de complémentarité entre elles. Dans ce sens, les travaux de champ ont eté fondamentaux rendant possibles l’observation et la réflexion sur le commerce de Mossoró et son importance pour l’économie locale et régionale. Cette étude a montré que, dans la dernière décennie, on avait intensifié l’installation d’équipements commerciaux modernes à Mossoró, dont les localisations sont plutôt dans des zones plus valorisées, éloignées du centre-ville, mais elles sont près des principaux axes routiers qui coupent la ville; ces équipements se localisent aussi dans des quartiers qui concentrent la population qui a le pouvoir d’achat le plus élévé. Par contre, le commerce traditionnel est encore assez important et se concentre surtout dans des zones centrales, en adoptant de nouvelles stratégies de ventes, comme les ventes à crédit. En plus, il est évident que l’implantation de nouveaux standards de production et de consommation ont apporté un remodelage des modes de vie urbains et une redéfinition du rôle régional joué par la ville. Mots clé: Commerce. Restructuration spatiale. Mossoró-Rio Grande do Norte.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Brasil. Estrutura ocupacional da população ativa (percentuais e absolutos, em milhares). 1925 a 1970 ............................................................. 44 Tabela 2: Brasil. População Economicamente Ativa (em milhares), por setor econômico. 1925 a 1970 .................................................................................. 46 Tabela 3: Brasil. Variação absoluta (em milhares) da PEA, por setor econômico. 1925 a 1970 .................................................................................. 46 Tabela 4: Brasil. Variação relativa (%) da PEA, por setor econômico. 1925 a 1970 ................................................................................................................. 47 Tabela 5: Brasil. População residente, por regiões. 1970 a 2010 .................... 49 Tabela 6: Brasil. População residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010 ................................................................................................................. 51 Tabela 7: Brasil. Participação da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010 ........................................................................................ 51 Tabela 8: Brasil. Variações absolutas da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010 ................................................................................. 52 Tabela 9: Brasil. Variações relativas da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010 ................................................................................. 52 Tabela 10: Nordeste. Distribuição da força de trabalho por setores. 1970 a 2000 ................................................................................................................. 57 Tabela 11: Brasil. População Economicamente Ativa Ocupada (em 1.000) , segundo classificação do IBGE por setor de atividade. 1960 a 1980 ............... 59 Tabela 12: Brasil. Participação percentual da População Economicamente Ativa Ocupada (em 1.000), segundo classificação do IBGE por setor de atividade. 1960 a 1980 ..................................................................................... 59 Tabela 13: Brasil. Número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE. 1985 a 2005 ................................................................ 61 Tabela 14: Brasil. Variações absolutas e relativas do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE. 1985 a 2005 ................................................................................................................. 61 Tabela 15: Brasil. Participação do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE. 1985 a 2005 ............................ 61 Tabela 16: Brasil. Número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões. 1985 a 2005 ............................................ 67 Tabela 17: Brasil. Participação do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões (%). 1985 a 2005 .. 68 Tabela 18: Brasil. Variação absoluta do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões. 1985 a 2005 ........ 69 Tabela 19: Brasil. Variação relativa do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões (%). 1985 a 2005 .. 70 Tabela 20: Mossoró. População residente total. 1970 a 2010 ......................... 90 Tabela 21: Mossoró. Variações absolutas e relativas da população residente total. 1970 a 2010 ............................................................................................. 90 Tabela 22: Mossoró. População urbana e rural na população residente total. 1970 a 2010 ..................................................................................................... 91 Tabela 23: Mossoró. Variação absoluta da população urbana e rural. 1970 a 2010 ................................................................................................................. 91 Tabela 24: Mossoró. Variação relativa da população urbana e rural. 1970 a 2010 ................................................................................................................. 91

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Tabela 25: Mossoró. Participação percentual da população urbana e rural na população residente total. 1970 a 2010 ........................................................... 91 Tabela 26: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA). 1960 a 2000 . 93 Tabela 27: Mossoró. Variações absolutas e relativas da População Economicamente Ativa (PEA). 1960 a 2000 .................................................... 93 Tabela 28: Mossoró. Participação da População Economicamente Ativa (PEA) no total da população residente. 1960 a 2000 ....................................... 93 Tabela 29: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991 ................................................... 95 Tabela 30: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991 ................................................... 96 Tabela 31: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991 ................................................... 96 Tabela 32: Mossoró. Número de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005 ................................................... 107 Tabela 33: Mossoró. Participação percentual no número total de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005 ............................................................................................................ 108 Tabela 34: Mossoró. Número de empregados formais, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005 ................................................... 111 Tabela 35: Mossoró. Participação percentual no número total de empregados formais, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005 ................................................................................................... 112 Tabela 36: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista. 1985 a 2005. ............................................................................. 120 Tabela 37: Mossoró. Variações absolutas e relativas da quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista. 1985 a 2005 ............... 121 Tabela 38: Mossoró. Participação do comércio varejista e atacadista no número total de estabelecimentos. 1985 a 2005 ............................................ 121 Tabela 39: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005 ............................................... 123 Tabela 40: Mossoró. Variações absolutas e relativas da quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005 ............................................................................................................... 123 Tabela 41: Mossoró. Participação dos estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005 .............................................. 124

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Brasil. Evolução da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010. ....................................................................................... 53 Gráfico 2: Mossoró. Número de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005. .................................................. 109 Gráfico 3: Mossoró. Número de empregados formais, segundo os principais setores econômicos do IBGE.1985 a 2005. ................................................... 113 Gráfico 4: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista.1985 a 2005. ................................................................................. 122 Gráfico 5: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005. .............................................. 125

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Mossoró. Hotel Thermas & Resort .................................................. 143 Figura 2: Mossoró. Hotel Sabino Palace ........................................................ 143 Figura 3: Mossoró. Hotel Villa Oeste .............................................................. 143 Figura 4: Mossoró. Hotel Valley ..................................................................... 143 Figura 5: Mossoró. Vitória Palace Hotel ......................................................... 144 Figura 6: Mossoró. Garbos Trade Hotel ......................................................... 144 Figura 7: Mossoró. Mercado Público no ano de 1897 .................................... 151 Figura 8: Mossoró. Mercado Público no ano de 1961 .................................... 151 Figura 9: Mossoró. Mercado Público .............................................................. 152 Figura 10: Mossoró. Boxe no Mercado Público .............................................. 152 Figura 11: Mossoró. Ambulantes no entorno do Mercado Público ................. 155 Figura 12: Mossoró. Ambulantes no entorno do Mercado Público ................. 155 Figura 13: Mossoró. Mercado do Vuco-Vuco (parte externa) ......................... 156 Figura 14: Mossoró. Mercado do Vuco-Vuco (parte interna) .......................... 156 Figura 15: Mossoró. Bens duráveis comercializados no Mercado do Vuco-Vuco ............................................................................................................... 156 Figura 16: Mossoró. Bens duráveis comercializados no Mercado do Vuco-Vuco ............................................................................................................... 156 Figura 17: Mossoró. Comércio ambulante nos arredores do Mercado do Vuco-Vuco ...................................................................................................... 158 Figura 18: Mossoró. Comércio ambulante nos arredores do Mercado do Vuco-Vuco ...................................................................................................... 158 Figura 19: Mossoró. Supermercado Queiroz Belo Horizonte ......................... 169 Figura 20: Mossoró. Supermercado Queiroz Santa Delmira .......................... 169 Figura 21: Mossoró. Supermercado Queiroz Boa Vista ................................. 169 Figura 22: Mossoró. Supermercado Queiroz Abolição ................................... 169 Figura 23: Mossoró. Supermercado Queiroz Alto do São Manoel ................. 169 Figura 24: Mossoró. Supermercado Queiroz Dom Jaime Câmara ................. 169 Figura 25: Mossoró. Supermercado Queiroz Barrocas .................................. 170 Figura 26: Mossoró. Stock Frios Distribuidora................................................ 170 Figura 27: Mossoró. Hiper Queiroz Mossoró West Shopping ........................ 170 Figura 28: Mossoró. Hiper Queiroz Centro ..................................................... 170 Figura 29: Mossoró. Supermercado Queiroz Alto da Conceição.................... 170 Figura 30: Mossoró. Supermercado Queiroz Santo Antônio .......................... 170 Figura 31: Mossoró. Supermercado Rebouças Santo Antônio....................... 171 Figura 32: Mossoró. Supermercado Rebouças Belo Horizonte...................... 171 Figura 33: Mossoró. Supermercado Rebouças Centro (antes da reforma) .... 172 Figura 34: Mossoró. Hipermercado Rebouças Centro (após a reforma) ........ 172 Figura 35: Mossoró. Mossoró West Shopping ................................................ 183 Figura 36: Rota da van do Mossoró West Shopping ...................................... 184 Figura 37: Mossoró. Shopping Oásis ............................................................. 186 Figura 38: Mossoró. Galeria Boulevard Central ............................................. 186

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LISTA DE MAPAS

Mapa 1: Mossoró. Localização ......................................................................... 24 Mapa 2: Mossoró. Subdivisão por bairros e zonas ........................................... 87 Mapa 3: Mossoró. Localização das agências bancárias, postos de autoatendimento, pontos Caixa Aqui, bancos integrados, banco popular e lotéricas .......................................................................................................... 139 Mapa 4: Mossoró. Localização dos hotéis ..................................................... 147 Mapa 5: Mossoró. Localização dos mercados populares ............................... 159 Mapa 6: Mossoró. Localização dos supermercados, hipermercados e atacadistas, por ano de instalação ................................................................. 177 Mapa 7: Mossoró. Localização do Mossoró West Shopping e dos centros comerciais ...................................................................................................... 191 Mapa 8: Mossoró. Localização dos estabelecimentos comerciais de acordo com perfil socioeconômico da população ....................................................... 206

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Objetivos específicos e questões norteadoras ................................ 21 Quadro 2: Mossoró. Rede bancária ............................................................... 138 Quadro 3: Mossoró. Localização das agências bancárias, postos de autoatendimento, pontos Caixa Aqui e lotéricas ............................................ 138 Quadro 4: Mossoró. Rede hoteleira ............................................................... 146 Quadro 5: Mossoró. Supermercados, hipermercados e atacadistas .............. 176 Quadro 6: Classificação dos shopping centers por tipo de empreendimento . 179 Quadro 7: Mossoró. Mossoró West Shopping e centros comerciais .............. 187 Quadro 8: Mossoró. Filiais de redes de venda de eletrodomésticos e eletrônicos ...................................................................................................... 194 Quadro 9: Mossoró. Localização do Mossoró West Shopping e dos centros comerciais ...................................................................................................... 196 Quadro 10: Características dos dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos ............................................................................... 200

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABF Associação Brasileira de Franchising ABL Área Bruta Locável ABRAS Associação Brasileira de Supermercados ABRASC Associação Brasileira de Shopping Centers ABRH Associação Brasileira de Recursos Humanos ACIM Associação Industrial e Comercial de Mossoró AMEC Associação dos Comerciantes do Mercado Central ANPEGE Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia APA Área de Proteção Ambiental ASUPERQ Associação dos Supermercados da Rede Queiroz BB Banco do Brasil BNB Banco do Nordeste do Brasil BRADESCO Banco Bradesco S.A. CAERN Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CDI Companhia de Desenvolvimento Industrial CDL Câmara dos Dirigentes Lojistas CDM/RN Companhia de Desenvolvimento de Recursos Minerais do Rio

Grande do Norte CEF Caixa Econômica Federal CID Coleta de Informações e Dados CIDA Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas CNPJ Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COBAL Central de Abastecimento de Mossoró COFINS Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social COSERN Companhia Energética do Rio Grande do Norte CSLL Contribuição Social sobre o Lucro Líquido DER/RN Departamento de Estradas de Rodagem do Rio Grande do Norte EXPOFRUIT Feira Internacional da Fruticultura Tropical Irrigada FACED Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará FCDL/RN Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do

Norte FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FGV-RJ Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro FICRO Feira Industrial e Comercial da Região Oeste FIERN Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte FIES Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior FIRJAN Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro FUNCAP Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e

Tecnológico FUNGER Fundação de Apoio à Geração de Emprego e Renda GEH Grupo de Estudos em Habitação GLOBAU Grupo de Pesquisa Globalização, Agricultura e Urbanização HSBC HSBC Bank Brasil S.A. IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IES Instituição de Ensino Superior

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IPI Imposto Sobre Produtos Industrializados

IR Imposto de Renda LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MA Estado do Maranhão MAG Mestrado Acadêmico em Geografia MTE Ministério do Trabalho e Emprego MWS Mossoró West Shopping PB Estado da Paraíba PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais Petrobras Empresa Petróleo Brasileiro S.A. PI Estado do Piauí PIB Produto Interno Bruto PIS Programa de Integração Social PMM Prefeitura Municipal de Mossoró PPPs Parcerias Público-Privadas PROCAD Programa Nacional de Cooperação Acadêmica PRODEM Programa de Desenvolvimento Econômico PROMIC Programa Municipal de Microcrédito PROPGEO Programa de Pós-Graduação em Geografia RAIS Relação Anual de Informações Sociais ReCiMe Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias RH Recursos Humanos REGIC Regiões de Influência das Cidades RN Rio Grande do Norte SBF Sociedade Brasileira de Franchising SBPE Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo SC Shopping Center SE Estado do Sergipe SEBRAE Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SEDETEMA Secretaria de Desenvolvimento Territorial e do Meio Ambiente SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SIMPLES Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte SINDIVAREJO Sindicato do Comércio Varejista SINE Sistema Nacional de Emprego SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste TC Trabalho de Campo TELERN Telecomunicações do Rio Grande do Norte UECE Universidade Estadual do Ceará UERN Universidade Estadual do Rio Grande do Norte UFC Universidade Federal do Ceará UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFU Universidade Federal de Uberlândia UNESP/PP Universidade Estadual Paulista, campus de Presidente Prudente UNIBANCO Itaú Unibanco Holding S.A.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 15 1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E “URBANIZAÇÃO TERCIÁRIA” BRASILEIRA ................................................................................................... 25 1.1 O FENÔMENO URBANO E AS REDEFINIÇÕES DO TERCIÁRIO ........... 25 1.2 A NOVA DIVISÃO INTERREGIONAL DO TRABALHO E A TERCIARIZAÇÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA ............................................ 40 1.3 MOSSORÓ EM CONTEXTO: NOTAS INTRODUTÓRIAS ......................... 73 2 REORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES COMERCIAIS EM MOSSORÓ – RN .................................................................................................................... 88 2.1 O CONTEXTO DAS MUDANÇAS .............................................................. 88 2.2. A EXPANSÃO DO CONSUMO E O CRESCIMENTO ECONÔMICO ..... 102 2.3. O PANORAMA DO COMÉRCIO CONTEMPORÂNEO ........................... 119 3 O MODERNO E O TRADICIONAL: NOVAS DINÂMICAS SOCIOESPACIAIS ........................................................................................ 149 3.1 OS MERCADOS POPULARES ................................................................ 149 3.1.1 Mercado Municipal Manoel Teobaldo dos Santos ............................ 150 3.1.2 Mercado Comercial do Vuco-Vuco .................................................... 155 3.2 OS NOVOS ESPAÇOS DE CONSUMO .................................................. 160 3.2.1 Supermercados, hipermercados e atacadistas ................................ 160 3.2.2 Shopping center e centros comerciais .............................................. 178 3.2.3 Redes e filiais de venda de eletrodomésticos e lojas de departamentos .............................................................................................. 192 CONCLUSÃO ................................................................................................ 207 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 212

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INTRODUÇÃO

A pesquisa de mestrado ora apresentada seguiu como objetivo

principal analisar a evolução das atividades comerciais em Mossoró – RN. Para

isto, tivemos de estudar, embora sucintamente, o terciário econômico, o que

para nós foi um grande desafio, dada a complexidade e os muitos

questionamentos e polêmicas gerados pela temática.

A heterogeneidade atingida pelo terciário exige uma superação do

enfoque rígido no estudo das atividades econômicas, proposto por Colin Clark

em seu livro The conditions of economic progress (1940), no qual o setor

primário incluiria atividades ligadas à agricultura; o setor secundário estaria

relacionado às atividades de manufatura; e o terciário abrangeria o comércio,

os serviços e as demais atividades não “encaixadas” nos outros dois setores.

Conforme sabemos, superar estes conceitos não é uma tarefa fácil,

mas é fundamental uma abordagem do terciário, e da atividade comercial, que

considere as mudanças no sistema produtivo, no intuito de avançar na

elaboração de um arcabouço teórico-conceitual e metodológico coerente com a

conjuntura da sociedade atual.

Para tal, foi indispensável a compreensão do processo de

reestruturação produtiva, que impôs os padrões capitalistas de produção,

distribuição, circulação e consumo às economias nacionais e regionais e, de

acordo com Harvey (2007), desencadeou profundas transformações sociais,

culturais, econômicas, políticas e ideológicas em escala global. As propostas

do autor supracitado foram importantes para nosso estudo por fornecer

elementos para a compreensão dos diferentes padrões da circulação e do

consumo hodiernos, os quais redefiniram as relações engendradas na

atividade comercial mossoroense, com maior destaque nas três últimas

décadas.

Assim, partimos da concepção de que as novas formas de produção

advindas da reestruturação ocorrida na década de 1970 deram início a um

novo processo de divisão internacional do trabalho, em nível mundial, e,

consequentemente, a uma divisão interregional do trabalho, em nível nacional.

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Dessa maneira, favoreceu-se a dispersão espacial da produção e a difusão do

comércio e dos serviços para diferentes regiões do país nos anos 1980.

As consequências da reestruturação produtiva no comércio foram

evidenciadas com o advento do meio técnico-científico-informacional, o qual

privilegiou o desenvolvimento dos sistemas de transportes e das

comunicações, integrando o território nacional; induziu à modernização

tecnológica, dinamizando o terciário de modo geral e incitando o surgimento de

novas atividades no setor; e difundiu o consumo, alterando os hábitos e o perfil

do consumidor, e também as formas comerciais associadas ao consumo

moderno. Estes fatores, em conjunto, contribuíram para a modernização e a

expansão das atividades comerciais e de serviços, e, ao mesmo tempo,

estimularam os fluxos de modo geral, possibilitando a instalação de novos

sistemas de objetos e sistemas de ações (SANTOS, 2008b) em diversas

regiões do país.

Como afirma Oliveira (1980, p.148), “[...] por sobre o antigo Terciário

destinado a sustentar as funções de circulação e distribuição dos bens

exportadores, cria-se agora um Terciário cuja função é sustentar a expressão

urbana dos processos de industrialização”. Em paralelo à terciarização da

economia brasileira houve uma aceleração do processo de urbanização,

denominada por Santos (1981) de urbanização terciária, indicando a intrínseca

relação entre o terciário e uma das dimensões do urbano: a cidade.

Na nossa ótica, as atividades terciárias, em particular a comercial, têm

desempenhado um papel essencial no processo de urbanização, ao

proporcionar o surgimento de novos agentes econômicos, remodelar os modos

de vida urbano mediante implantação de diferentes padrões de produção e de

consumo, bem como interferindo na reestruturação espacial. Estes processos

são percebidos tanto em metrópoles quanto em espaços urbanos não

metropolitanos, fato que nas últimas décadas tem despertado interesse de

vários pesquisadores.

Desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da

Universidade Estadual do Ceará entre os anos 2009 e 2011, a pesquisa em

tela surgiu como um aprofundamento do trabalho realizado na iniciação

científica, entre 2006 e 2008, junto ao Grupo de Pesquisa (registrado no

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CNPq) Globalização, Agricultura e Urbanização1. Nossa pesquisa representou

um recorte da pesquisa maior, realizada em rede nacional, da qual

participaram professores e alunos de várias outras instituições de ensino

superior2, que nos possibilitou uma análise particular de Mossoró.

A cidade situa-se no Nordeste brasileiro, a noroeste do Estado do Rio

Grande Norte, entre duas capitais nordestinas, a 277 km de Natal – RN e a

260 km de Fortaleza – CE3. É o segundo município mais populoso do Estado

do Rio Grande do Norte, com 259.886 habitantes, dos quais 91% vivem na

área urbana, de acordo com o último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE, 2010)4.

Num primeiro momento, a busca de informações se deu

coletivamente5, e cada membro do grupo foi responsável por determinadas

variáveis6, comuns ao projeto nacional. Ao longo do processo, os participantes

foram delineando suas pesquisas individuais, e, no nosso caso, optamos pelo

estudo da economia urbana mossoroense, particularmente do comércio.

A escolha justifica-se pela relevância histórica da atividade, juntamente

com os serviços, no contexto local e regional. Como outras cidades do país,

1 Sob coordenação da profa.dra. Denise Elias (UECE) e do prof. dr. Renato Pequeno (UFC). 2 O projeto maior intitula-se Cidades médias brasileiras: agentes econômicos, reestruturação urbana e regional e foi coordenado por Denise Elias (UECE) e Maria Encarnação Sposito (UNESP / PP), entre 2006 e 2009, e por Doralice Satyro (UFPB) e Maria Encarnação Sposito entre 2009 e 2011, e contou com o apoio financeiro do CNPq. Para mais informações sobre o projeto e seus resultados ver SPOSITO, Maria Encarnação; ELIAS, Denise; SOARES, Beatriz Ribeiro. Uma rede de pesquisadores, sua pesquisa e o caminho compartilhado. In: SPOSITO, Maria Encarnação; ELIAS, Denise; SOARES, Beatriz Ribeiro (Orgs.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional. Passo Fundo e Mossoró. SP: Expressão Popular, 2010 (p.7-27). No projeto coletivo, foram estudadas várias cidades em diferentes partes do Brasil, além de duas cidades no Chile e uma na Argentina. Mossoró – RN estava entre as cidades brasileiras consideradas para análise. A pesquisa sobre a cidade de Mossoró ficou sob a responsabilidade dos profs. Denise Elias e Renato Pequeno. Eu, assim como outros colegas do Curso de Graduação e da Pós-Graduação em Geografia da UECE, bem como alunos de Arquitetura da UFC, compusemos a equipe de estudos dessa cidade. 3 Informações obtidas no site da Prefeitura Municipal de Mossoró. Acesso em: 5/6/10. Disponível em: http://www.prefeiturademossoro.com.br/2008/geografia.php. 4 Censo Demográfico 2010, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br/primeiros_dados_divulgados/index.php?uf=24. Acesso em: 23/1/11. 5 A pesquisa coletiva foi realizada pelo Grupo de Pesquisa Globalização, Agricultura e Urbanização, coordenado pela profa. dra. Denise Elias (UECE) e prof. dr. Renato Pequeno, e pelo Grupo de Estudos em Habitação, liderado pelo prof. dr. Renato Pequeno. Os membros dos grupos são: Camila Dutra, Edna Couto, Fábio Carvalho, Henrique Alves, Priscila Romcy, Rodrigo Queiroz e Iara Gomes. 6 Entre as variáveis do projeto estudamos: supermercados e hipermercados; redes e filiais de venda de eletrodomésticos e eletrônicos; empresas de consultoria; shopping centers; hotéis de redes nacionais e internacionais.

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Mossoró teve sua origem no desenvolvimento de atividades comerciais,

principalmente em virtude da sua localização estratégica, entre a economia do

litoral (espaço de consumo e escoamento) e a economia do sertão (espaço de

produção) (FELIPE, 1988). Tal condição favoreceu a consolidação da cidade

como centro regional polarizador de atividades comerciais e de serviços, com

influência sobre cidades do oeste potiguar e também de outros Estados, como

Ceará e Paraíba7.

Estas atividades foram e continuam sendo fundamentais para a

economia mossoroense, porém desde a década de 1980 (marco inicial da

nossa periodização), têm passado por intensa modernização e expansão,

sobretudo com a introdução de inovações tecnológicas e o estabelecimento de

novos parâmetros de consumo. O comércio adquiriu diferentes feições,

integrando-se aos outros setores e ramos de atividades, à medida que subsidia

as demais atividades que sustentam a economia da cidade (atividade

petrolífera, atividade salineira e agronegócio de frutas tropicais), e, em parte, é

sustentado por elas.

Como é visível, as interações espaciais mantidas em escala

intraurbana e regional beneficiaram o estabelecimento do comércio e dos

serviços modernos, ajustando as atividades preexistentes ao sistema flexível e

às novas formas de consumo. Estes ajustes tiveram repercussões espaciais,

sobremodo por modificarem as relações entre escalas geográficas, redefinirem

as centralidades urbanas e disseminarem novos fixos e fluxos (SANTOS,

2008a).

Durante a realização da pesquisa, consoante observamos, em Mossoró

o comércio destacava-se em número de estabelecimentos e foi este setor

modificado notadamente com a chegada de novos agentes econômicos à

cidade. Portanto, delimitamos nosso enfoque às atividades comerciais, a partir

das quais percebemos novas relações econômicas, sociais, políticas, culturais

e espaciais em Mossoró.

Entre as mudanças no comércio local identificamos dois processos

interessantes a serem examinados: a difusão de equipamentos comerciais

modernos e a formação de novas centralidades, os quais estão

7 No capítulo 1 falaremos sobre a influência regional de Mossoró.

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correlacionados e não podem ser compreendidos sem uma sólida

fundamentação teórica. Todavia, entendê-los só foi possível quando

analisamos a totalidade dos processos ocorridos nas diversas instâncias da

sociedade (política, econômica, espacial, tecnológica etc.).

Uma discussão bastante pertinente ao nosso trabalho foi sobre a

urbanização brasileira, especialmente a partir de Santos (1981, 1982, 1992,

1996, 2004, 2005, 2008a, 2008b). Um dos principais pontos expostos pelo

autor e que nos despertou muito interesse foi a questão da urbanização

terciária (SANTOS,1981, 1982), um dos pilares para a discussão feita durante

todo o trabalho8. Como afirma o autor em suas argumentações sobre o tema,

os países menos favorecidos na divisão internacional do trabalho tiveram seu

processo de urbanização associado ao desenvolvimento de atividades

artesanais, comerciais e também agrícolas (SANTOS, 1982), diferentemente

de países cuja urbanização foi diretamente associada à industrialização.

Assim, a urbanização terciária revelou-se um processo notório na maior

parte do Nordeste brasileiro, levando-nos a uma análise particular do fenômeno

na região. Neste sentido, os estudos de Furtado (1980), Oliveira (1981) e

Araújo (2000) nos ajudaram a apreender a situação social, política e econômica

nordestina, no contexto da divisão interregional do trabalho, relacionando-a ao

processo de urbanização.

Importante destacar também os debates inerentes às transformações

atuais decorrentes da reestruturação produtiva nos espaços urbanos não

metropolitanos, assim como nas cidades médias brasileiras, promovidos por

Sposito (2001b, 2001c, 2004, 2006, 2007a), Sposito, Elias et al. (2006, 2007b),

Corrêa (2007) etc. Por ser uma temática relativamente nova e ainda em fase de

amadurecimento teórico e metodológico, as contribuições destes, e de outros

autores, sobre a reestruturação econômica, urbana e regional em espaços não

metropolitanos foram essenciais para a compreensão do cenário

contemporâneo da cidade estudada.

Como fontes de pesquisa específicas de Mossoró, nos fundamentamos

nos trabalhos de Elias e Pequeno (2010) e Santos (2010), e em pesquisas

realizadas em âmbito local e regional referentes ao processo de urbanização, à

8 Nossa compreensão sobre urbanização terciária está fundamentada em Santos (1981,1982). Para mais informações, consultar as referidas obras do autor.

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política e à economia da cidade, entre os quais mencionamos Brito (1982),

Cascudo (1982), Silva (1982), Felipe (1980, 1982, 1988, 2001), Rocha (2005) e

Pinheiro (2006).

Na tentativa de entender as novas dinâmicas estabelecidas nas

atividades comerciais, assim como as consequências das redefinições do setor

no espaço urbano de Mossoró, baseamo-nos principalmente em Santos (1977,

1979, 1996, 1998, 2003, 2004, 2005, 2008b), Sposito (1991, 1998, 2001b,

2001c, 2001d, 2006b, 2007a), Pintaudi (1981, 1984, 1989, 1992, 2002, 2009),

Salgueiro (2001, 2009), Ribeiro Filho (2004), Diniz e Castilho (2009), Ortigoza

(2008) e Whitacker (2007). A análise dos dados investigados em campo

alicerçados em reflexões teóricas consolidadas nos permitiu identificar

processos locais que são resultado de reestruturações ocorridas

mundialmente, exigindo a ampliação do nosso estudo para níveis escalares

além do intraurbano ou interregional.

Mediante os pressupostos teóricos apresentados, produzimos nossa

dissertação tendo como metodologia a escolha de eixos e variáveis

significativos para a compreensão do comércio em Mossoró, sobretudo com a

chegada de novos atores econômicos associados a atividades modernas. Tal

procedimento nos ajudou na elaboração de um panorama contemporâneo do

setor, mostrando suas principais redefinições no tocante à intensificação dos

fluxos e ao desenvolvimento de novas atividades, à instalação de

equipamentos modernos de consumo e à coexistência entre estas atividades

modernas e as tradicionais, revelando transformações econômicas e

socioespaciais.

Com vistas a orientar o foco da nossa investigação, estabelecemos

alguns objetivos específicos, para os quais propomos questões norteadoras,

conforme quadro a seguir.

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Quadro 1: Objetivos específicos e questões norteadoras

Objetivos específicos Questões norteadoras

a) Identificar o momento de maiores mudanças na atividade comercial.

� Qual a relevância da atividade comercial para a economia mossoroense?

� Como evolui o comércio nas últimas décadas, segundo número de estabelecimentos e número de empregados?

� É possível identificar um marco, uma década, um período a partir do qual a atividade comercial cresce de forma diferenciada do que ocorria historicamente?

b) Identificar as principais atividades que compõem o comércio e suas formas espaciais.

� É possível verificar algum tipo de especialização no comércio de Mossoró?

� Quais atividades compõem o comércio tradicional? E quais compõem o comércio moderno?

� Existem relações entre as atividades comerciais modernas e tradicionais?

� Há vestígios de antigas relações comerciais que coexistem com formas modernas, a exemplo dos shoppings ou supermercados?

c) Assinalar os principais agentes econômicos associados à atividade em discussão.

� Em quais atividades os capitais locais e não locais investem preferencialmente?

� As estratégias de investimentos dos capitais externos no comércio da cidade têm alguma semelhança com os investimentos feitos pelos capitais locais?

� Observa-se a entrada significativa de grupos econômicos maiores (redes de hotéis, de fast foods, franquias etc.) alterando as lógicas de estruturação dos espaços urbanos da cidade em estudo?

� Qual a relação entre a chegada de novos atores econômicos na cidade e o papel do crédito para as atividades modernas?

d) Apontar diferenças de acesso ao consumo a partir dos níveis de renda da população e da localização espacial dos equipamentos comerciais.

� Em que áreas da cidade a expansão do comércio formal é mais visível? E o comércio informal, onde predomina?

� Pode-se pensar a constituição de dois circuitos econômicos (SANTOS, 2004) em Mossoró?

� Quais os bairros da cidade onde as atividades relacionadas ao circuito superior se instalam? E as atividades do circuito inferior?

Estes questionamentos nos ajudaram a pensar a atividade comercial

em Mossoró nas últimas décadas, compreendendo o conjunto de

transformações ocorridas recentemente na atividade dentro de um contexto

mundial. Sob o pressuposto de que “a ordem trazida pelos vetores da

hegemonia cria, localmente, desordem [...]” (SANTOS, 2008b, p.334),

estruturamos a dissertação em três capítulos. Começamos com discussões

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mais gerais até chegar às especificidades do fenômeno de concentração

econômica da atividade comercial em Mossoró.

O primeiro capítulo apresenta o contexto das transformações

verificadas em escala global que tiveram rebatimentos nas economias

nacionais, a exemplo do Brasil. Nesta etapa do trabalho, trazemos à discussão

o fenômeno da urbanização brasileira pautada numa terciarização da

economia, culminando no que Santos (1981) definiu como urbanização

terciária. Contudo, esta urbanização deu-se sob uma divisão interregional do

trabalho não ocorrida homogeneamente sobre o território nacional, o que nos

levou a uma observação atenta às particularidades do fenômeno em cada

região, em especial no Nordeste. Findamos o capítulo com uma breve

introdução à cidade estudada, contextualizando Mossoró com base em uma

periodização da economia, sobretudo das atividades terciárias. Isto nos indicou

pontos essenciais a serem discutidos no capítulo seguinte.

Em continuidade à apresentação da cidade, o segundo capítulo se

inicia com a evolução demográfica e econômica mossoroense nas últimas

décadas, com um aprofundamento das informações acerca da atividade

comercial, com predomínio do varejo, a partir dos dados do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística e da Relação Anual de Informações Sociais.

Outra reflexão importante neste capítulo é a do consumo, produtivo e

consuntivo, que envolve desde a ampliação do número de estabelecimentos e

de trabalhadores formais no comércio até a reorganização espacial da cidade e

da região sob sua influência. Destacamos também a chegada de novos

agentes econômicos na cidade, dos quais citamos a rede hoteleira, a rede

bancária e financeira, serviços que se adaptam à nova realidade mundial e

mostram o perfil do terciário contemporâneo, marcado pela modernização e

diversificação econômica e pela expansão urbana, contribuindo direta e

indiretamente para a expansão das atividades comerciais.

No terceiro e último capítulo do trabalho, nos debruçamos sobre a

análise das atividades comerciais modernas e tradicionais, a saber: mercados

populares; supermercados, hipermercados e atacadistas; shopping center e

centros comerciais; e redes e filiais de venda de eletrodomésticos e lojas de

departamentos. Caracterizamos cada variável e como resultado elaboramos

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mapas de localização, os quais nos possibilitaram uma análise espacial da

atividade comercial.

À luz das reflexões teóricas promovidas por Santos (2004), finalizamos

nossa dissertação tentando estabelecer relações entre o perfil hodierno das

atividades comerciais e a constituição de dois circuitos na economia urbana da

cidade, um superior e outro inferior. Ao examinar a coexistência de atividades

modernas e tradicionais e os desníveis de renda da população, vislumbramos a

localização espacial dos equipamentos comerciais a partir da modernização

das atividades e do acesso ao consumo, gerando o aprofundamento das

desigualdades sociais, econômicas e espaciais.

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Mapa 1: Mossoró. Localização

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1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E “URBANIZAÇÃO

TERCIÁRIA” BRASILEIRA

Antes de concebermos uma análise da evolução das atividades

comerciais e de serviços em Mossoró – RN é necessária a compreensão de

processos históricos ocorridos em escala mundial que influenciaram

diretamente na conformação atual destas atividades. Este capítulo é

fundamental na nossa construção teórico-metodológica, pois nos fornece

elementos para as questões propostas no decorrer de todo o trabalho.

Inicialmente, traremos à discussão a reestruturação produtiva do

capital, processo que desencadeou profundas mudanças na economia mundial.

A compreensão deste processo e das transformações dele decorrentes nos

ajudará no debate acerca do terciário econômico, o qual atualmente suscita

divergências teóricas, pois embora enriqueça a discussão, dificulta um

consenso sobre sua definição. Consideraremos uma abordagem do terciário

que contemple suas mudanças, chamando a atenção para a necessidade de

um estudo que atente para a complexidade e as proporções atingidas pelo

setor. Abordaremos ainda a urbanização, brasileira e nordestina, a partir da sua

relação com o desenvolvimento do terciário. Deste modo, esperamos contribuir

para a ciência geográfica, e despertar o interesse pelas questões discutidas a

seguir, tão importantes para a apreensão da realidade em que vivemos,

auxiliando, inclusive, em estudos posteriores sobre a urbanização e sua

vinculação ao setor econômico estudado. Por fim, faremos uma breve

apresentação do nosso objeto de estudo, a cidade de Mossoró – RN, de forma

a propiciar ao leitor compreender os fatos e os fatores que, associados,

convergiram para a dinâmica hodierna da cidade.

1.1 O FENÔMENO URBANO E AS REDEFINIÇÕES DO TERCIÁRIO

Para entendermos o momento atual da economia mundial, observando

as recentes tendências da urbanização brasileira e do Nordeste e as

transformações em curso no terciário, devemos atentar para as modificações

no processo produtivo, especialmente a partir dos anos 1970, década marcada

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pela ruptura com diversos padrões produtivos, sociais, culturais, econômicos,

trabalhistas, espaciais e ideológicos.

Harvey (2007) questiona se essas mudanças assinalam o nascimento

de um novo regime de acumulação ou se indicam um momento crítico de

transição na configuração do capitalismo do final do século XX. Não nos

propomos neste trabalho a elucidar esta complexa questão, mas, a nosso ver,

uma análise sobre este momento histórico de profundas transformações

mundiais pode nos auxiliar na compreensão da expansão das atividades

comerciais e de serviços.

De acordo com Harvey (2007), na década de 1960 o fordismo já dava

indícios de sérios problemas em sua estrutura, em virtude da rigidez dos

investimentos de capital, dos mercados, na alocação e nos contratos de

trabalho. Todavia, a política monetária flexível dos Estados Unidos e da

Inglaterra, que inundou o mundo capitalista de fundos, e a crise do petróleo em

1973, que desencadeou forte deflação na economia mundial, obrigaram as

empresas a entrarem num período de racionalização e reestruturação,

organizacional e trabalhista. Elas começaram a buscar estratégias de

sobrevivência em meio à crise enfrentada pelo capital, num período de

reestruturação econômica e remodelamento social e político que eclode em

nível mundial na década de 1970.

A transição do paradigma fordista para o toyotismo, baseado num

sistema de acumulação flexível, foi a forma encontrada pelo capitalismo para

resistir às tensões e incertezas então enfrentadas. Este sistema flexível,

paulatinamente, sobrepõe-se aos moldes do sistema fordista e é acompanhado

de profundas transformações em escala global. Segundo Harvey (2007, p.140),

ele está apoiado

[...] na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores da produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional.

Salientamos, porém: embora desponte num momento de crise, este

modelo de acumulação flexível continua sendo uma forma capitalista,

porquanto é orientado para o crescimento; está baseado numa relação de

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classe entre capital e trabalho; e mantém uma dinâmica de inovações

organizacionais e tecnológicas (HARVEY, 2007).

Diante deste sistema flexível, identificamos inúmeras mudanças

capazes de caracterizá-lo como o motor impulsionador de um processo de

reestruturação. Soja (1993) pensa a reestruturação não como um processo

mecânico ou automático, sendo seus resultados e possibilidades potenciais

indeterminados. A reestruturação produtiva, segundo o autor, seria um

processo espacial, temporal e social, determinante para a aceleração da

produção, distribuição e circulação, ao acentuar o consumo de bens e serviços,

ajustando a produção às oscilações do mercado, cada vez mais desregulado e

competitivo; aumentando a inovação e a diferenciação do produto, com a

utilização de atividade de pesquisa e desenvolvimento (PeD) e da publicidade;

implantando um novo ambiente financeiro e de distribuição do produto;

promovendo o aumento da capacidade e da complexidade de técnicas

administrativas e gerenciais, entre outros aspectos, que, conjugados,

possibilitam ao grande capital “[...] elevados ganhos de produtividade, maior

eficiência administrativa e menores custos” (COSTA, 2008, p.113).

O terciário é um importante setor econômico que se ajusta a esta nova

realidade, pois reúne atividades na esfera da circulação, da distribuição e do

consumo. Evidentemente, algumas das características intrínsecas à

reestruturação produtiva estão associadas, direta ou indiretamente, ao setor

em discussão. Por exemplo:

� O aumento do consumo de bens e serviços induziu ao aparecimento de

espaços modernos de consumo e favoreceu a expansão da propaganda

e do marketing, estimulando o aparecimento de um novo perfil de

consumidor;

� A introdução das inovações tecnológicas no processo produtivo

proporcionou a modernização de setores como o de serviços

financeiros, telecomunicações, transportes e armazenagem, e comércio

atacadista e varejista;

� A adoção de novos modelos organizacionais e gerenciais nas empresas,

que incorporaram o sistema flexível, alteraram a organização do trabalho

e aderiram às terceirizações, reduziu os níveis hierárquicos e as funções

administrativas (KON, 2004).

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O processo de produção flexível traz consigo novos paradigmas, como

a substituição das economias de escala pelas economias de escopo, a

diversificação de produtos e sua “descartabilidade”, novos padrões de

consumo, entre outros. Além disso, instiga o desenvolvimento e modernização

do setor de transportes e das comunicações, os quais aceleram a distribuição e

comercialização de mercadorias e serviços, intensificando os fluxos de modo

geral e favorecendo diretamente a expansão das atividades terciárias, isto é, a

terciarização.

Na definição de Kon (1992, p.47), a terciarização é “o processo de

crescimento relativo acelerado das atividades terciárias, que resulta num

incremento considerável de seu produto em relação ao crescimento do produto

dos demais setores”. Sob uma perspectiva econômica, esta autora relaciona a

terciarização à urbanização9 e aponta três fatores que teriam influenciado na

associação do processo de terciarização ao desenvolvimento econômico

global:

[...] o processo de concentração e centralização do capital exigiu uma reestruturação na administração e no controle das empresas, implicando a necessidade da criação de uma rede de empresas de serviços auxiliares que fundamentassem novas formas de organização. Em segundo lugar, a internacionalização do capital por meio da multinacionalização das empresas aumentou a demanda por serviços externos às empresas (atividades financeiras, de contabilidade, de informações, assessoria jurídica etc.), de apoio a seu funcionamento, tanto nos países de origem quanto nos países hospedeiros. Finalmente, com o desenvolvimento de alta tecnologia seguido da criação de empresas multidivisionais e a crescente complexidade dos sistemas organizacionais nas grandes empresas, estas empresas têm recorrido à terciarização dos serviços, o que leva ao crescimento da terciarização da economia (KON, 1992, p.74).

Kon (1992, 1997, 2004) enfatiza o papel das inovações tecnológicas na

modernização e evolução das atividades terciárias, em especial dos serviços.

Este é um ponto de destaque também em nossa abordagem, qual seja, a

incorporação de ciência, tecnologia e informação à produção, caracterizado por

Santos (1996, 1999, 2005, 2008) como meio técnico-científico-informacional,

que contribuiu diretamente para a modernização dos sistemas técnicos e a

expansão terciária durante o processo de reestruturação.

9 Kon (1992, p.48) pensa a urbanização a partir da “[...] concentração geográfica da população e da atividade econômica nas cidades, seja essa concentração acompanhada ou não de urbanismo, isto é, do fornecimento de um mínimo de serviços públicos, equipamentos e materiais característico [sic] das cidades evoluídas”.

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Elias (2003) assinala o período técnico-científico-informacional pela

presença dos novos signos que o caracterizam e que, combinados, redefinem

o espaço geográfico. Tais signos seriam a multinacionalização das firmas e a

internacionalização da produção e do produto; os novos papéis do Estado; a

grande revolução da transmissão da informação; a generalização do crédito; e

a circulação como fator essencial da acumulação [fator diretamente relacionado

às atividades terciárias, no tocante à circulação de bens, serviços e capital

financeiro]10. A autora discorre ainda sobre o dinamismo da construção do

espaço. Conforme acredita,

[...] pela modernização da produção agrícola e industrial, pela expansão do comércio e dos serviços, pelas novas localizações da indústria, pelas novas fontes de energia; pelas migrações, pela dispersão espacial da produção, pela especialização regional das atividades e pela urbanização hierárquica (ELIAS, 2003, p.35).

No entanto, convém ressaltar o seguinte: existem as diferenças entre

os espaços. Consoante Santos (2004, p.20) alerta, “os componentes do espaço

são os mesmos em todo o mundo e formam um continuum no tempo, mas

variam quantitativa e qualitativamente segundo o lugar, do mesmo modo que

variam as combinações entre eles e seu processo de fusão”.

Neste contexto, uma variável é fundamental em nossa análise: o papel

do Estado capitalista. Segundo Harvey (2005, p.83) o Estado deve,

necessariamente, “[...] amparar e aplicar um sistema legal que abrange

conceitos de propriedade, indivíduo, igualdade, liberdade e direito,

correspondente às relações sociais de troca sob o capitalismo”.

Santos (2008a, p.108) estabelece esta relação entre o Estado e o

mercado ao caracterizá-los como um par dialético, no qual “ambos são

mediadores entre o externo e o interno, entre o novo e o velho”. Para o autor,

“[...] o Estado aparece como um fator por excelência de elaboração do espaço

e deve, pois, ser considerado como o elemento fundamental de seu estudo”

(SANTOS, 2002, p.227). Portanto, o Estado torna-se um grande agente

reestruturador do espaço, principalmente nos países menos favorecidos na

divisão internacional do trabalho.

10 [Destaque nosso].

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30

Vejamos o caso brasileiro. Entre as décadas de 1950 e 1970, o Estado

foi o principal responsável pela remodelação e integração do território nacional,

no intuito de dotá-lo de condições favoráveis às produções hegemônicas

mundiais. No Brasil, o início da difusão do meio técnico-científico-informacional

foi marcado por grandes investimentos estatais em infraestrutura, mormente

nos transportes, nas telecomunicações e na produção de energia.

A expansão dos modernos sistemas de engenharia dos transportes e das comunicações, equipando o território nacional para a modernização agrícola e industrial, assim como para a intensificação das trocas comerciais, possibilitou a integração territorial da nação, interligando áreas até então sem nenhum tipo de acesso entre si. O resultado foi uma dispersão espacial da produção e do consumo, com conseqüente processo de especialização da produção, estreitando as relações entre as diferentes regiões do país [...] (ELIAS, 2003, p.43-44).

O setor terciário, que envolve atividades comerciais e de serviços,

beneficiou-se bastante desta conjuntura nacional e passou então por um

processo de modernização e expansão. Segundo Proni, Silva e Oliveira (2005),

a modernização do terciário deveu-se a investimentos de capitais estrangeiros

e nacionais: o capital estrangeiro impulsionou os segmentos potencialmente

mais rentáveis do setor, como o de exportação, e o capital nacional teve

participação em privatizações, fusões, aquisições, comunicações e logística,

colaborando para a reconfiguração de segmentos dinâmicos do setor terciário

brasileiro, como atividades financeiras, telecomunicações e transportes. Nesse

caso, parte dos investimentos foi feita pelo Estado, e parte pelas empresas

privadas.

Logo, com a modernização, especialmente dos transportes e das

telecomunicações, estimulou-se o crescimento dos fluxos, quer de pessoas, de

capital, de mercadorias ou de serviços, intensificando e diversificando as trocas

em geral e possibilitando a instalação de novos fixos em diversas regiões do

país.

Os anos de 1970 foram de radicais transformações para inúmeras atividades terciárias, com a instalação de muitos novos fixos e, conseqüentemente, a constituição de muitos novos fluxos, de matéria e de informação, seja intra-urbanos, interurbanos ou entre campo e cidade. A intensificação e a especialização da produção aumentam as trocas, da mesma forma que as possibilidades de fluxos. Isso promove maior integração do território nacional (ELIAS, 2006a, p.61).

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O Estado teve um papel pujante neste processo. Sposito (2001c)

reforça uma característica da intervenção estatal, que juntamente com a

iniciativa privada é marcada pela força dos interesses fundiários e imobiliários

no processo de produção de novos espaços, aumentando a segregação

socioespacial e as disparidades regionais. Além disso, tais transformações

asseguraram a internacionalização do capital, a reorganização das empresas e

sua maior rentabilidade, motivaram uma especialização territorial,

aprofundaram a divisão regional do trabalho e aceleraram o processo de

urbanização brasileira.

Mediante a modernização tecnológica da produção, a possibilidade de

fluidez do espaço e os novos papéis assumidos pelo Estado, além da

urbanização, houve também a incorporação de novos espaços agrícolas à

produção e ao consumo agropecuários globalizados, promovendo uma

reestruturação no setor (ELIAS, 2002a, 2002b, 2003, 2006a, 2006b). Esta

reestruturação da agropecuária, segundo Elias (2006a, p.60), não só ampliou e

reorganizou a produção material, agrícola e industrial, como “[...] foi

determinante para a expansão quantitativa e qualitativa da produção não-

material, aumentando a terciarização das economias próximas às áreas de

realização do agronegócio [...]”.

À medida que há uma modernização agrícola, cresce a demanda por

bens e serviços necessários à produção, expandindo o consumo produtivo. Isto

representa “[...] uma parcela importante das trocas entre os lugares de

produção agrícola e as localidades urbanas” (SANTOS, 2005, p.54),

estabelecendo novas relações entre o campo e a cidade. Deste modo, “uma

das conseqüências da reestruturação produtiva da agropecuária no Brasil é o

processo acelerado de urbanização e crescimento urbano” (ELIAS, 2006a,

p.59), em virtude da crescente integração entre as atividades agropecuárias

modernas e os circuitos da economia urbana, em especial aos das cidades

próximas às produções, que se tornam o “[...] lócus da regulação do que se faz

no campo” (SANTOS, 2005, p.56).

A partir desta reflexão acerca da reestruturação produtiva do capital e

de algumas das suas consequências econômicas, políticas e espaciais,

verificamos que a compreensão deste processo é decisiva para observarmos

as transformações ocorridas na cidade, no campo e nas atividades

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econômicas, em especial nas atividades comerciais e de serviços, hoje

detentoras de bastante força. Em fins da década de 1970, Santos (1979, p.58)

já atribui grande relevância ao setor terciário. Como afirma:

O terciário, hoje, permeia outras instâncias (primário e secundário) cuja definição tradicional esmigalha e, sob formas particulares em cada caso, constitui o elemento explicativo da possibilidade de existência com êxito de inúmeras atividades, sobretudo daquelas mais importantes. Referimo-nos, em particular, às atividades terciárias que precedem a produção material propriamente dita e sem as quais ela não pode realizar-se eficazmente11.

Nesta fase de reestruturação, o terciário foi muito afetado, pois foi

extremamente impulsionado pela modernização tecnológica; pelas inovações

organizacionais e gerenciais, assumindo novos contornos e revelando novas

atividades; pela difusão do consumo, produtivo e consumptivo; e pela

integração direta ao setor agropecuário e industrial, fornecendo-lhes subsídios

para suas respectivas produções.

Conforme destacam Proni, Silva e Oliveira (2005, p.107), a

conformação de uma nova ordem econômica mundial e a reestruturação

produtiva exigiram uma “[...] maior sinergia entre os diferentes setores e ramos

econômicos”. Com a “flexibilidade” na produção, que mecaniza e moderniza a

agricultura e a indústria, o terciário, particularmente os serviços, ganham cada

vez mais relevância, e a estrutura tripartite torna-se descabida neste novo

cenário econômico. Na percepção de Lima e Rocha (2002, p.220-221):

A divisão tradicional de setores econômicos já não tem a mesma aplicabilidade na época em que vivemos. A inserção de novas técnicas e procedimentos organizacionais aglutinaram tarefas de um setor da economia em outros. O terciário foi sensivelmente ampliado, absorvendo múltiplas funções tanto do primário quanto do secundário. Na nova maneira de produzir, o bem final agrega uma gama de serviços (atendimento ao consumidor, pesquisa, assistência técnica, dentre outros). Num único produto podemos encontrar uma imbricação dos vários setores econômicos.

Sobre o assunto, Santos (1979) exprime-se em termos claros ao

salientar que, para identificar os níveis quantitativos e qualitativos da atividade

terciária, devemos atentar para a forma particular da divisão do trabalho

internacional e interno de cada país. Como assevera:

11 Destaque nosso.

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A divisão internacional do trabalho explica a seletividade espacial na realização de funções, mediante critérios como a necessidade, a rentabilidade e a segurança de uma dada produção. A divisão interna do trabalho nos mostra o movimento da sociedade, a criação e os reclamos de novas funções e a maneira como essas funções são abrigadas pelas formas preexistentes ou novas (SANTOS, 1979, p.41).

De acordo com Santos (1999), ao tratar da questão sobre o

alargamento e aprofundamento da lógica capitalista, por exemplo, que se

tornou um modo de produção único, a ação desse modo de produção sobre os

territórios passa pela mediação das formações sociais de cada Estado

nacional.

Como o autor afirma, “a definição qualitativa e quantitativa do terciário

correspondente a cada país depende, de um lado, das formas de realização da

vida coletiva e, de outro lado, das formas de inserção do país no âmbito da

economia mundial” (SANTOS, 1979, p.58-59). Ademais, por estes dados, é

possível a compreensão da importância global da atividade terciária e da sua

distribuição no espaço nacional. À medida que estes fatores são determinados,

em grande parte, pelos ditames do capital, requerem condições favoráveis para

poderem se desenvolver e é neste contexto que as atividades terciárias

ganham destaque na economia mundial pela sua dinamicidade e sua relação

com os demais setores econômicos.

No intuito de desvendar as mudanças verificados no setor, sobretudo a

partir da reestruturação produtiva, a nosso ver, além da análise do contexto

histórico de desenvolvimento das atividades terciárias, faz-se necessária

também uma reflexão teórica e conceitual sobre o tema.

Alvo de intensas discussões e controvérsias conceituais, o setor

terciário da economia exige um esforço de teorização que extrapole a categoria

econômica, considerando uma perspectiva mais ampla, na tentativa de

elaborar argumentações adequadas à realidade contemporânea, tendo em

vista a complexidade e as proporções atingidas pelo setor. Deste modo,

apresentaremos a seguir considerações de alguns estudiosos do terciário,

demonstrando a variedade de abordagens, em diferentes momentos, e a

urgência latente de uma releitura dos conceitos expostos.

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Como mencionado por Kon (2004), o termo terciário foi introduzido por

Fischer em 193512, para respaldar um terceiro grupo de atividades econômicas,

além dos dois tradicionalmente analisados pelos economistas, o primário (setor

agropecuário) e o secundário (setor manufatureiro). Na época, as atividades

terciárias13 eram consideradas de menor relevância econômica ou de terceiro

grau de importância. Consoante Vargas (2001, p.32):

[...] a origem do nome terciário é decorrência do seu posicionamento com relação à terra, onde a agricultura Açume o primeiro lugar (primário). A transformação do produto da terra realizada pela indústria vem em segundo lugar (secundário), deixando para as demais atividades, o terceiro lugar (terciário).

Embora a divisão em três setores econômicos tenha delimitado

devidamente as atividades pertencentes ao primário e ao secundário, o mesmo

não ocorreu no terciário. Colin Clark14 estabeleceu em seu livro The

conditions of economic progress “[...] uma espécie de lei evolutiva da divisão

social do trabalho ao nível dos três grandes setores” (OLIVEIRA, 1980, p.140).

Em 1940, ele associa os serviços (aqui equivalente ao terciário) a toda e

qualquer atividade econômica além da agricultura e da manufatura. Diante

desta associação, este setor passou a abarcar uma série de atividades não

possível de ser inseridas numa mesma categoria, conferindo-lhe extrema

diversidade e complexidade. Neste momento é adotado o caráter residual que

permaneceu na microeconomia como a descrição mais usual de serviços e

que, atualmente, provoca muitas objeções.

A concepção residual dos serviços vem sendo contestada por diversos

autores os quais alegam ser este um conceito ambíguo e inadequado às

transformações em curso no setor, sobretudo nas últimas quatro décadas.

12 “O termo ‘terciário’ foi introduzido por Fisher em 1935, em paralelo à construção dos termos ‘primário’ e ‘secundário’ então utilizados na Austrália e na Nova Zelândia para se referir, respectivamente, aos setores agropecuário e manufatureiro. [...] Todavia, conforme destacado por Fisher, havia um terceiro grupo de atividades econômicas além dos dois tradicionalmente analisados pelos economistas” (KON, 2004, p.26). Fisher utiliza pela primeira vez esta nomenclatura em FISHER, A.G. The clash of progress and serenity. London, 1935. 13 Atividades comerciais e de serviços. 14 “O conceito de residual foi adotado quando Colin Clarck escreveu em 1940 que permanece um importante resíduo, o qual pode ser descrito por conveniência como indústria de serviços, com o mesmo significado dado por Fisher, ou seja, outras atividades econômicas além da agricultura e da manufatura. Sua terminologia permaneceu [...] como resíduo após a mensuração da produção da agricultura, da mineração e da manufatura” (KON, 2004, p.27). Colin Clarck utiliza essa terminologia em CLARCK, C. The conditions of economic progress. Macmillan and Co, London, 1940.

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Para George (1975, p.81), a referência de serviços é muito vaga, pois é

utilizada para atividades muito heterogêneas e responde a estratificações de

necessidades e usos muito diferentes. De acordo com o autor, a noção de

terciário nasce da “[...] necessidade de classificar e definir a contrário15

atividades provenientes da evolução tecnológica da sociedade industrial”

(p.82). Ele apresenta um ensaio de classificação funcional a partir da

distribuição espacial das atividades terciárias16.

Com base na heterogeneidade adquirida pelas atividades econômicas,

para Santos (1979), a existência de novas atividades terciárias, que escapam

às classificações tradicionais, e a diversidade de atividades do setor como

definido atualmente, mascarada pelas estatísticas oficiais, devem ser

consideradas na reflexão teórica sobre o setor. Assim, o autor tece uma crítica

à utilização de dados estatísticos sem nenhum critério, ou seja, sem um

enfoque teórico pautado na própria realidade, reforçando a necessidade de

uma definição apropriada ao setor.

Segundo Oliveira (1980), o problema estaria no fato de a proposição de

Clark ter assumido gradualmente o estatuto de uma espécie de “lei” e ter sido

utilizada de maneira errônea, desconsiderando as determinantes históricas da

divisão social do trabalho, as relações técnicas surgidas concomitantes à

configuração de certos modos de produção e as relações intersetoriais.

Consoante assegura, o terciário deve ser entendido pelas relações mantidas:

a) com o processo de acumulação de capital em condições históricas

concretas; e b) com o setor primário e secundário, por intermédio das esferas

de circulação, distribuição e consumo.

A ótica de Mandel (1985) acerca dos serviços parte do pressuposto de

que eles representariam funções intermediárias entre atividades produtivas

anteriormente unificadas, quais sejam, a agricultura e a indústria. Nos serviços

estariam condensadas as principais contradições do modo capitalista, refletindo

15 [Destaque do autor citado]. 16 A classificação é feita entre uma função econômica e uma função social. Nesse caso, o terciário econômico estaria subdivido em quatro níveis: gestão dos negócios, transmissão e distribuição das mercadorias, transportes de pessoas e prestação de serviços diretamente remunerados. O terciário social seria composto pelo conjunto de serviços assegurados pela coletividade pública e pelo subsetor da informação e da cultura. Estas atividades apresentadas no plano funcional se efetuam conforme a dimensão dos organismos que as assumem e conforme sua qualificação profissional, sendo reagrupadas em atividades de grandes organismos e atividades de contato e troca (GEORGE, 1975).

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a expansão das forças produtivas sócio-técnicas e científicas, bem como o

crescimento correspondente das necessidades culturais e civilizadoras dos

produtores, caracterizando, assim, o capitalismo tardio.

De modo bastante incisivo, Lipietz (1988) critica a representação

econômica proposta por Clark, atribuindo-lhe um caráter idílico e apologético. O

autor questiona a definição por diferença17 do terciário, tendo em vista que,

segundo afirma, ela comportaria “[...] uma dupla zona de confusão ligada à

dupla definição daquilo que se distingue (processo de trabalho e processo de

valorização do capital)” (p.178-179). Assim, Lipietz propõe uma delimitação em

dois grupos das atividades terciárias: aquelas designadas como arcaicas,

associadas a formas “herdadas” do feudalismo, e aquelas consideradas

modernas, associadas ao próprio desenvolvimento do capitalismo.

Ao analisar a literatura sobre o terciário, Offe (1989) reforça que o

conceito de trabalho em serviços é muito mal definido, pois é usado como uma

categoria residual que abrange todos os tipos de empregos contratuais ou de

organizações de trabalho não classificadas nem como primárias (extrativas)

nem como secundárias (produtivas). Além disso, segundo o autor, quando as

características dos serviços são expressas explicitamente, predominam

atributos negativos, tais como a não materialidade e a não produtividade.

Castells (2005) ratifica a amplitude e ambiguidade do conceito de

serviços, principalmente a partir das tentativas de definição tomando por base

características intrínsecas, como sua “intangibilidade” em oposição à

“materialidade” (p.269). Conforme sugere, os conceitos usados para

categorizar as atividades econômicas devem ser diversificados à medida que

as economias se tornem mais complexas e a compreensão do novo tipo de

economia e da estrutura social se daria a partir da caracterização dos

diferentes tipos de “serviços”.

Por isso, em sua análise das atividades do setor de serviços, Castells

(2005) adota categorias utilizadas por Browning e Singelmann (1978)18, as

quais classificam consoante a participação da atividade na cadeia do processo

17 [Destaque do autor]. “Se excetuarmos as atividades agrícolas, o terciário se define apenas pela diferença: o que não é produção de mercadorias em um processo de valorização do capital” (LIPIETZ, 1988, p.178). 18 BROWNING, Harley L.; SINGELMANN, Joachim. The transformation of the U.S. labor force: the interaction of industry and occupation. Politics and Society, 8 (3-4), p.481-509, 1978.

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produtivo, relacionando-as ao avanço tecnológico e organizacional. Seriam

elas:

� Serviços de distribuição – associados às atividades de comunicações e

de transportes, bem como às redes de distribuição comercial (atacado e

varejo);

� Serviços relacionados à produção – referem-se mais diretamente

àqueles serviços que parecem ser insumos cruciais na economia,

embora também incluam serviços empresariais auxiliares que podem

não ter necessidade de alta qualificação;

� Serviços sociais – abrangem atividades públicas e empregos relativos ao

consumo coletivo, como saúde, educação, defesa, governo etc.;

� Serviços pessoais – relacionados ao consumo individual, de

entretenimento até a bares, restaurantes e similares.

Em sua análise, o autor admite a amplitude destas categorias, mas,

acredita, elas permitem um estudo diferenciado sobre a evolução do mercado

de trabalho nos países, dando maior profundidade analítica e fugindo das

estatísticas habituais.

Outro aspecto a dificultar a definição das atividades terciárias é sua

característica básica de “[...] simultaneidade entre fornecimento do serviço e

consumo” (KON, 1992, p.17), contribuindo para que o produto destas

atividades não apresente um caráter aparentemente durável. Isto, segundo a

referida autora, “[...] conduz a concepções diferentes sobre seu caráter

produtivo ou não, ou ainda sobre o produto assim gerado e sua valoração”

(KON, 1992, p.17)19. Entretanto, essa concepção das atividades terciárias

como geradoras diretas de produtos, e indiretas de riqueza, foi evoluindo à

medida que ganhavam relevância no contexto da estrutura econômica de

determinada nação (KON, 1992, 2004).

19 Em virtude da nossa proposta principal de estudo, não pretendemos esgotar todas as discussões teóricas sobre o setor terciário, nem tampouco trazer ao debate questões como o caráter produtivo ou improdutivo das atividades terciárias, sua materialidade ou imaterialidade, entre outras polêmicas inerentes às discussões acerca da temática.

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Nas discussões mais recentes, o terciário, também denominado setor

de serviços20, pode ser definido com base em quatro linhas principais de

conceitos, conforme esclarece Kon (2004):

� Indústria de serviços, como sendo uma indústria que produz serviços no

lugar de bens, como as indústrias de transportes, comércio atacadista e

varejista, seguros etc.;

� Serviços são bens de consumo ou intermediários intangíveis e em geral

consumidos ao mesmo tempo em que são produzidos. São usualmente

intensivos em trabalho;

� Os serviços são o componente do Produto Nacional Bruto que mede o

produto de itens intangíveis;

� Os serviços referem-se certas vezes a bens intangíveis, sendo uma de

suas características o fato de serem consumidos na maioria das vezes

no ponto da sua produção.

Todavia, a autora apresenta uma série de propostas de classificações

dos serviços elaboradas por diversos autores e instituições, tendo em vista a

variedade de abordagens sobre os serviços de acordo com o contexto de

análise, seja o da produção, da função ou do consumo. Segundo Kon (2004,

p.31-32), “[...] as tipologias desenvolvidas com bases [sic] nesses diferentes

enfoques apresentam diversidades básicas que continuam sendo motivo de

polêmicas encontradas na literatura mais recente sobre o tema”. Entre algumas

dessas propostas, podemos citar: Fisher-Clark (1935/40); Fuchs (1968); Sabolo

(1975); Browning e Singelmann (1975); Banco Mundial (1980); Walker (1985);

ONU (1968); Murdock (1993) etc21.

Como advertem Proni, Silva e Oliveira (2005, p.98), as tipologias de

modo geral “[...] não devem ser aplicadas de maneira estanque nem podem

fornecer indicações a priori sobre as propriedades e as características das

atividades encontradas em cada grupo”. Reconhecem também as limitações

20 Na literatura econômica o setor terciário é denominado setor de serviços, termo também utilizado pela autora citada. “No contexto da industrialização, os rótulos mais comuns encontrados sobre o setor de serviços são de setor ‘terciário’, ‘residual’ ou ‘pós-industrial’ ” (KON, 2004, p.26). 21 Para mais detalhamentos ver Kon (2004).

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das tipologias, porquanto são basicamente descritivas e apenas ajudam na

análise do setor; portanto, não contemplam sua totalidade.

Além de uma perspectiva econômica, nosso estudo busca

compreender as atividades terciárias do ponto de vista socioespacial. Em face

das grandes mudanças nas áreas tecnológicas e na reorganização do sistema

produtivo, Lima e Rocha (2009, p.87) acreditam que para entender o terciário

do mundo moderno torna-se imprescindível “a abordagem do processo de

reprodução do capital e o desenvolvimento da feição urbana que toma a

sociedade com o advento do atual modo de acumulação capitalista”.

Assim, consideramos fundamental a análise da relação do terciário

com uma das dimensões do urbano, a cidade, tendo em vista ser ela condição

para a reprodução do setor (DANTAS, 2007). Ao assumirem o caráter de

centros da produção, da distribuição, da circulação e do consumo, as cidades

favorecem a difusão generalizada da informação e das práticas consumistas,

oferecendo maior mobilidade ao capital e, consequentemente, dinamizando o

comércio e os serviços. De acordo com Sposito (2001a), é na cidade que as

melhores condições para o desenvolvimento capitalista estão reunidas,

qualitativa e quantitativamente, atribuindo-lhe o papel de comando na divisão

do trabalho.

Logo, para entendermos a relação entre a cidade e o terciário é

fundamental estabelecer a relação entre a urbanização e a terciarização, que

irá implicar diretamente a divisão social do trabalho e a diferenciação espacial

característica do novo padrão de acumulação flexível, especialmente nos

países menos favorecidos pela expansão capitalista, com o aumento das

disparidades regionais e de renda entre os indivíduos.

Para Santos (1979, p.60), a conjugação destes fatores constitui “[...] um

fator locacional importante para as atividades terciárias, sobretudo as

‘espontâneas’, isto é, aquelas cuja localização se deve ao movimento

‘espontâneo’ da economia”. Deste modo, a ampliação do terciário nas cidades

promove inúmeras transformações, entre as quais diversas modificações

espaciais, com a dispersão das atividades comerciais e de serviços para outras

áreas, valorizando-as e contribuindo para a expansão territorial da cidade.

Além disso, há outro aspecto que colabora para a vinculação entre o

terciário e a urbanização nos países considerados “subdesenvolvidos”:

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diferentemente dos países “desenvolvidos”, não houve uma passagem da

população do setor primário para o secundário e posteriormente para o

terciário. Nestes países a urbanização se deu de maneira distinta, com um

conteúdo próprio, sendo caracterizada por uma urbanização terciária

(SANTOS, 1981, p.11).

Ao estudar a particularidade do fenômeno urbano em diversos países,

Santos (1982) apresenta diferenças quanto ao processo de urbanização em

países privilegiados na divisão do trabalho, e em países explorados em

decorrência desta divisão. Como afirma, enquanto as cidades dos países ditos

“desenvolvidos” têm seu surgimento ou são inseridas em um contexto de

urbanização industrial, as cidades dos países “subdesenvolvidos” estariam

vinculadas principalmente “[...] ao desenvolvimento de atividades artesanais,

comerciais e, por vezes, agrícolas” (SANTOS, 1982, p.58).

Este é apenas um dos aspectos que influenciaram na urbanização

terciária brasileira. Fatores como o tipo de estrutura das atividades, das

empresas, do emprego e do consumo são determinantes para a conformação

deste tipo de urbanização, sobretudo em regiões mais “pobres” do país, como

é o caso do Nordeste.

Em continuidade a esta discussão, exporemos a seguir o exemplo da

urbanização brasileira e nordestina, na tentativa de esclarecer como este tipo

de urbanização terciária se estabelece. Feita esta contextualização, poderemos

perceber a especificidade do fenômeno urbano do país e apontar algumas das

suas características que levaram à escolha do nosso objeto de estudo: a

cidade de Mossoró, localizada no Estado do Rio Grande do Norte, Nordeste do

Brasil.

1.2 A NOVA DIVISÃO INTERREGIONAL DO TRABALHO E A

TERCIARIZAÇÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA

Conforme ressaltamos, na percepção de Santos (1981, 1982), a

urbanização brasileira está predominantemente relacionada ao

desenvolvimento de atividades terciárias, caracterizando-a como uma

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urbanização terciária. Ao qualificar a urbanização como sendo “[...]

simultaneamente um resultado e uma condição do processo de difusão do

capital” (SANTOS, 2003, p.23), ele associa o processo de urbanização ao

avanço capitalista e, consequentemente, à sua necessidade de acumulação.

Este raciocínio nos ajuda a entender a relação da reestruturação produtiva com

a expansão da capacidade de produção e a renovação das condições de

acumulação.

Ao se referir ao assunto, Harvey (2005) sugere alguns aspectos que,

combinados, foram capazes de criar essa nova oportunidade para a

acumulação: 1) a penetração do capital em novas esferas de atividade; 2) a

criação de novos desejos e novas necessidades; 3) a facilitação e o estímulo

para o crescimento populacional; e 4) a expansão geográfica para novas

regiões. O autor relaciona os três primeiros fatores à “[...] intensificação da

atividade social, dos mercados e das pessoas numa específica estrutura

espacial” (p.48). Já o último fator estaria atrelado à organização espacial e à

expansão geográfica, necessárias ao processo de acumulação. É neste

contexto que estudaremos a urbanização brasileira, mediante uma explanação

de como ocorreu este processo e relacionando-o com o desenvolvimento das

atividades terciárias.

Partiremos da concepção segundo a qual a urbanização da sociedade

não compreende apenas as formas concretas que expressam ou determinam

as dinâmicas econômicas ou demográficas, mas leva em conta também seu

conteúdo social e cultural (SPOSITO, 2001c, p.84), em particular, nas cidades

brasileiras.

A cidade dos países subdesenvolvidos não é senão um elo intermediário entre os países dominantes e as zonas rurais duplamente dominadas. Assim, ela é muito mais um lugar de passagem de homens, mercadorias e capitais do que um lugar de produção (SANTOS, 1982, p.94).

Em sua origem, a cidade é considerada como o lugar da dominação e

não da produção (SPOSITO, 2001a, p.17). Assim, no Brasil Colônia a “cidade”

representava a emanação de um poder longínquo, uma forma da metrópole

demarcar seu território. Até o final do período colonial o processo de criação

urbana “tratava-se muito mais da geração de cidades, que mesmo de um

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processo de urbanização” (SANTOS, 2005, p.22), porquanto não havia

integração entre os lugares e as atividades econômicas principais eram

desenvolvidas no campo, associadas diretamente ao setor primário.

Segundo destaca Santos (2005), as atividades extrativistas e agrícolas

no período colonial foram fundamentais para o povoamento e para a

acumulação de riquezas, favorecendo o estabelecimento de cidades no litoral e

no interior. Outro fator mencionado pelo autor também decisivo para a posterior

urbanização foi a mecanização do território e da produção, por trazer “[...] novo

impulso e nova lógica ao processo” (p.22), intensificado no século XIX e,

principalmente, no século XX.

Na primeira metade do século XX houve um acréscimo significativo no

número de cidades e, por conseguinte, dos seus contingentes populacionais.

Até a década de 1930 o Brasil ainda era considerado um país agrário-

exportador, com a maior parte da população concentrada nas áreas rurais.

Contudo, a Revolução de 1930 enfraqueceu a hegemonia agrário-exportadora

brasileira e favoreceu o nascimento de uma estrutura produtiva de base

urbano-industrial, a se concretizar nas décadas posteriores (OLIVEIRA, 1988).

Esta conjuntura propiciou a incorporação do Brasil a uma nova divisão

internacional do trabalho, possível graças às condições políticas e

organizacionais que permitiram uma nova lógica econômica e territorial, com

base no impulso da industrialização e no papel crescente do mercado interno

(SANTOS, 2005). Destarte, essa passagem de uma economia agrário-

exportadora para uma economia urbano-industrial foi centrada na substituição

de importações para o mercado interno, redefinindo a cidade industrial como

“[...] pólo de dinamização e de transformações seletivas no espaço e na

sociedade brasileiras” (MONTE-MÓR, 2006, p.11).

Como salienta Santos (2005, p.30), esta lógica de industrialização

prevaleceu nas décadas de 1940 e 1950, mas o termo industrialização não

deve ser tomado apenas como a criação de atividades industriais em

determinado lugar. Consoante afirma, o termo deve ser adotado como “[...]

processo social complexo, que tanto inclui a formação de um mercado

nacional, quanto os esforços de equipamento do território para torná-lo

integrado [...]”. Outro ponto destacado pelo autor é a expansão do consumo em

diversas formas decorrente da industrialização, a qual impulsionou as relações,

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ou seja, a terciarização, e ativou, inclusive, a própria urbanização nacional,

permitindo o crescimento demográfico das cidades, embora neste momento o

fenômeno da industrialização ainda se concentrasse na região Sudeste do

país.

Este período marcou um momento de mudanças no país, onde grande

parte da população começou a migrar para áreas urbanas, quadro acentuado

mundialmente após a Segunda Guerra Mundial, e impulsionado no Brasil nas

décadas de 1960 e 197022. Fatores como o forte crescimento demográfico, em

virtude da elevação das taxas de natalidade e da diminuição das taxas de

mortalidade devido às melhorias sanitárias, entre outros, favoreceram a

aceleração da urbanização brasileira, apesar de este processo não ter se dado

homogeneamente, por causa das diferentes formações socioespaciais das

diversas regiões do país. Segundo enfatiza Singer (1998, p.36), “a criação de

desigualdades regionais pode ser encarada como o motor principal das

migrações internas que acompanham a industrialização nos moldes

capitalistas”.

Santos (1981) confere ao setor terciário um papel decisivo no processo

geral de desenvolvimento urbano dos países subdesenvolvidos, a exemplo do

Brasil. Ao longo deste processo, a evolução do terciário se deu acompanhada

do aumento expressivo da população ativa no setor. Podemos verificar isto

pelas informações apresentadas por Santos (2005), ao demonstrar o peso

adquirido pelo terciário no período de 1925 a 1970, sobretudo entre as décadas

de 1950 e 1960, quando a participação da população ativa no setor passa de

25,9% para 33,2%. Kon (1992, p.96) atribui este crescimento ao caráter

complementar do setor terciário em relação à indústria e às atividades

agropecuárias, e explica:

No Brasil como um todo, na década de 1950 a forte concentração do produto no terciário evidencia não só que a economia urbana visava o atendimento do escoamento e comercialização de produtos primários, desenvolvendo nessa primeira etapa serviços de infra-estrutura como de transportes e financeiros, mas também que o capital acumulado na agropecuária não era reinvestido consideravelmente no setor ou aplicado na indústria, mas ainda se destinava grandemente ao

22 Para não fugirmos do foco do nosso estudo, não nos deteremos nas análises quantitativas do processo de urbanização brasileira, apresentado detalhadamente por Milton Santos em seu livro A urbanização brasileira (2005). Todos os dados associados a este tema estão disponíveis no referido livro.

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consumo de bens de luxo importados aqui comercializados, como herança de uma mentalidade da era colonial.

Como evidenciado, houve uma diminuição progressiva da participação

do setor primário, de 68% para 44,6%, embora ele ainda detivesse as maiores

participações no total da população ativa. O setor secundário apresenta

algumas oscilações na participação, com picos nas décadas de 1950 (14,2%) e

1970 (18%), momentos marcados por fortes arrancadas industriais. Por seu

turno, o terciário ganha cada vez mais força, e absorve cada vez mais mão-de-

obra, chegando a uma participação de 37,4% do total da população ativa.

Desse modo, corrobora a afirmação de Oliveira (1988, p.31) segundo a qual o

terciário configura-se como o setor “[...] que mais absorveu os incrementos da

força de trabalho”.

Tabela 1: Brasil. Estrutura ocupacional da população ativa (percentuais23 e absolutos, em milhares). 1925 a 1970

Setor

econômico 1925 1940 1950 1960 1970

Primário 68% 64% 59,9% 53,7% 44,6%

7.011 9.446 10.253 12.164 13.183

Secundário 12% 10,1% 14,2% 13,1% 18%

1.237 1.491 2.431 2.697 5.320

Terciário 20% 25,9% 25,9% 33,2% 37,4%

2.062 3.823 4.433 7.529 11.054

Total 10.310 14.759 17.117 22.651 29.557 Fonte: Oliven, 1980, p.71, tabela 4 apud Santos (2005, p.26).

A nosso ver, a análise pormenorizada dos dados ora expostos denota a

importância do terciário no quadro de urbanização brasileira ao longo do século

XX. Deste modo, a partir dos valores absolutos da tabela 1, elaboramos outras

três tabelas, a evolução da População Economicamente Ativa e a variação

absoluta e relativa para cada setor, no período de 1925 a 1970.

Conforme percebemos ao analisar os números absolutos, o setor

primário permaneceu como o que mais empregou mão-de-obra durante todo o

período analisado. Tal fato se explica pela própria natureza das suas atividades

componentes, com maior demanda de trabalhadores, e pela expansão das

atividades agropecuárias (SANTOS, 2005). No entanto, entre as décadas de

23 As participações percentuais são referentes ao total de cada ano analisado.

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1960 e 1970, o setor foi o que apresentou a menor variação relativa, com um

crescimento de apenas 8%. Neste momento iniciou-se o processo de

reestruturação produtiva da agropecuária brasileira (ELIAS, 2002a, 2002b,

2003, 2006a, 2006b), caracterizado por Elias (2003, p.64) “[...] pela substituição

da economia natural por atividades agrícolas integradas à indústria, pela

intensificação da divisão do trabalho e das trocas intersetoriais e pela

especialização crescente da produção agrícola”. Assim, a produção

agropecuária moderna passou a utilizar mais ciência e tecnologia, e reduziu o

número de trabalhadores.

Quanto ao setor secundário, verificaram-se algumas variações, com

momentos de maior e menor crescimento. Evidentemente, entre as décadas de

1940 e 1950 e de 1960 e 1970, houve grandes surtos ascendentes da atividade

industrial. No referente ao primeiro período (1940-1950), cujo crescimento de

trabalhadores formais na indústria foi de 63%, nas palavras de Oliveira (1981,

p.74), “[...] do impulso da continuada expansão do café [...] emerge o modo de

produção de mercadorias em todo o seu vigor, na direção da diferenciação da

divisão social do trabalho marcada pela indústria”. Furtado (1980, p.199)

aponta duas condições favoráveis ao desenvolvimento industrial: “o

crescimento da procura de bens de capital, reflexo da expansão da produção

para o mercado interno, e a forte elevação dos preços de importação desses

bens, acarretada pela depreciação cambial”.

No segundo período (1960-1970), este crescimento foi ainda maior,

97%, resultado do aumento e da diversificação da produção, sobretudo dos

bens de consumo, requerendo uma expansão do setor. Em decorrência disto,

outro acontecimento marca o setor industrial neste momento: o início do

processo de desconcentração industrial, caracterizado “pela transferência de

segmentos tradicionais da indústria para lugares onde não se tinham

constituído plenamente em condições necessárias de desenvolvimento

capitalista” (PEREIRA JÚNIOR, 2005, p.34), repercutindo no aumento do

mercado de trabalho formal industrial.

Ambos estes períodos ganham relevância no estudo de Santos (2005)

sobre a urbanização brasileira. Como afirma o autor, “após os anos 1940-1950,

os nexos econômicos ganham enorme relevo, e impõem-se as dinâmicas

urbanas na totalidade do território” (p.27), enquanto os anos 1960 “[...] marcam

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um significativo ponto de inflexão” (p.32), com intervenção estatal direta, regida

por um governo militar.

Apesar do notório crescimento industrial, é o terciário que demonstra

maior expressividade no tocante à evolução da PEA. De 1925 a 1970, este

setor revelou um crescimento 436%, superior ao setor industrial (330%) e ao

total da população (187%), a evidenciar o peso das atividades terciárias na

economia nacional. Os momentos de maior relevância da PEA no terciário

ocorreram entre as décadas de 1925 e 1940 (85%), quando as atividades

comerciais eram voltadas fortemente para a exportação de matéria-prima e

trocas internas para subsistência, e a partir dos anos 1950 (70%), quando

houve a expansão dos serviços em geral.

Dedecca e Montagner (1992) apresentam um duplo movimento nos

serviços. De um lado, houve um crescimento acelerado dos serviços

predominantemente voltados para a produção, em especial depois de 1956,

com o avanço da industrialização. De outro, houve mudanças no perfil das

atividades de serviços de consumo individual e coletivo, com a criação de

novas necessidades, oriundas da rápida modernização das atividades

agrícolas e do intenso processo de urbanização. É neste momento que o setor

terciário adquire seu caráter complexo e dinâmico.

Tabela 2: Brasil. População Economicamente Ativa (em milhares), por setor econômico. 1925 a 1970

Setor

econômico 1925 1940 1950 1960 1970

Primário 7.011 9.446 10.253 12.164 13.183

Secundário 1.237 1.491 2.431 2.697 5.320

Terciário 2.062 3.823 4.433 7.529 11.054

Total 10.310 14.759 17.117 22.651 29.557 Fonte: Oliven, 1980, p.71, tabela 4 apud Santos (2005, p.26). Elaboração da autora (2011).

Tabela 3: Brasil. Variação absoluta (em milhares) da PEA, por setor econômico. 1925 a 1970

Setor

econômico 1925-1940

1940-1950

1950-1960

1960-1970

1925-1970

Primário 2.435 807 1.911 1.019 6.172

Secundário 254 940 266 2.623 4.083

Terciário 1.761 610 3.096 3.525 8.992

Total 4.449 2.358 5.534 6.906 19.247 Fonte: Oliven, 1980, p.71, tabela 4 apud Santos (2005, p.26). Elaboração da autora (2011).

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Tabela 4: Brasil. Variação relativa (%) da PEA, por setor econômico. 1925 a 1970

Setor econômico

1925-1940

1940-1950

1950-1960

1960-1970

1925-1970

Primário 35 9 19 8 88

Secundário 21 63 11 97 330

Terciário 85 16 70 47 436

Total 43 16 32 30 187 Fonte: Oliven, 1980, p.71, tabela 4 apud Santos (2005, p.26). Elaboração da autora (2011).

Como assegura Elias (2003, p.187), no Brasil, a terciarização e a

urbanização “são fenômenos ocorrentes em uníssono [...], culminando com a

expansão do meio técnico-científico-informacional”. De acordo com Santos

(1996, 1999, 2005, 2008), o meio técnico-científico-informacional vem se

implantando desde o fim da Segunda Guerra Mundial e tornou-se característico

do meio geográfico do período atual, no qual

[...] os objetos mais proeminentes são elaborados a partir dos mandamentos da ciência e se servem de uma técnica informacional da qual lhes vem o alto coeficiente de intencionalidade com que servem às diversas modalidades e às diversas etapas da produção (SANTOS, 2008, p.235).

Ainda conforme Santos (1996, 1999), o período técnico-científico-

informacional produziu uma requalificação dos espaços e das relações sociais,

os quais agora atendem aos interesses hegemônicos da economia, da cultura

e da política, inserindo o país em uma economia globalizada. Como resultado

desta inserção, podemos apontar algumas mudanças que vão influir no

desenvolvimento do terciário: a) a dispersão espacial da produção, na qual o

capitalismo estende seus sistemas produtivos para áreas agrícolas,

expandindo a agricultura científica e o agronegócio em novas regiões do país

(ELIAS, 2002a, 2002b, 2006a, 2006b); b) um maior número de investimentos

em infraestruturas, integrando as regiões nacionais e dotando o território de

fluidez, a partir da implantação dos sistemas técnicos (SANTOS, 2008); c) a

ampliação do consumo, tanto produtivo como consumptivo, de acordo com as

demandas dos subespaços e dos estratos de renda, respectivamente

(SANTOS, 1996); e d) o acirramento da divisão social e territorial do trabalho,

arraigando ainda mais as desigualdades no país e incitando a criação ou a

manutenção de dois circuitos da produção, distribuição e consumo de bens e

serviços (SANTOS, 1977, 2003, 2004).

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Com suporte nestes aspectos, poderemos compreender o papel do

terciário no processo de urbanização brasileira, especialmente a partir da

década de 1970. Na ótica de Santos (2007, p.18), as atividades terciárias “[...]

converteram-se na fonte essencial de dominação e de acumulação”, graças ao

papel maior da ciência e da tecnologia. A introdução de novas formas de

produção é motivada pela “[...] ideologia do crescimento, no nível da nação e

do estado, e a ideologia do consumo, no nível dos indivíduos” (p.21).

No âmbito de tantas transformações, é importante lembrar que “a

complexa organização territorial e urbana do Brasil guarda profundas

diferenças entre suas regiões” (SANTOS, 2005, p.63). Isto nos leva ao esforço

de uma análise que contemple as especificidades do fenômeno urbano no

Nordeste brasileiro, assim como a dimensão das atividades terciárias na

região.

Berço da primeira grande atividade econômica da Colônia “recém-

descoberta”, a monocultura açucareira, o Nordeste manteve esta atividade

como base da sua economia até o século XX. Foi também nesta região onde

se estabeleceram os primeiros povoamentos, o que leva Santos (2005, p.19) a

reconhecer que “o Recôncavo da Bahia e a Zona da Mata do Nordeste

ensaiaram, antes do restante do território, um processo então notável de

urbanização e, de Salvador, pode-se mesmo dizer que comandou a primeira

rede urbana das Américas”.

Segundo o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística do

ano de 2010, 28% da população brasileira encontra-se na região Nordeste24,

dos quais 73% constituem-se de população urbana e 27%, de população

rural25. Estes índices correspondem à menor participação de população urbana

no Brasil e, por conseguinte, à maior no tocante à população rural. Eles estão

diretamente relacionados à formação histórica, social, política e econômica da

região, que por muito tempo ofereceu grande resistência à urbanização, e

foram determinantes para o estabelecimento das diferenças regionais de forma

e de conteúdo da urbanização (SANTOS, 2005, p.67). Como explica Santos

24 O que corresponde a uma população absoluta de 52.981.950 habitantes, do total nacional de 190.299.321. 25 O índice nacional é de 84% de população urbana e 16%, rural. Os índices das demais regiões são: Região Centro-Oeste, 89% urbana e 11% rural; Região Norte, 74% urbana e 26% rural; Região Sul, 85% urbana e 15% rural; Região Sudeste, 93% urbana e 7% rural.

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(2005, p.69), “um antigo povoamento, assentado sobre estruturas sociais

arcaicas, atua como freio às mudanças sociais e econômicas, acarreta retardo

na evolução técnica e material e desacelera o processo de urbanização”.

Em virtude da profunda mudança nos conteúdos da urbanização a

partir de meados do século XX, quando se iniciou uma inversão populacional

para as cidades, em nosso estudo destacamos a evolução demográfica urbana

e rural na região Nordeste no período de 1970 até 2010. Para isso,

estabelecemos uma análise comparativa com o crescimento das demais

regiões brasileiras e também com o total nacional, a cada década, observando

os dados absolutos e de participação reunidos nas tabelas a seguir26.

Consoante verificamos, a região Sudeste responde pelos maiores

índices demográficos, com mais de 40% do total para todos os anos. Isto se

deve em grande parte à aceleração econômica da região, ainda no século XIX,

com a economia cafeeira, e no começo do século XX, com a industrialização,

favorecidas pela concentração de capitais na região. No entanto, a população

nordestina corresponde, em todos os anos analisados, ao segundo maior

contingente demográfico do país.

Tabela 5: Brasil. População residente, por regiões. 1970 a 2010

Região População residente

1970 1980 1991 2000 2010

Centro-Oeste 4.551.391 6.806.720 9.427.601 11.636.728 14.050.340

Norte 4.124.818 6.619.755 10.030.556 12.900.704 15.865.678

Nordeste 28.111.551 34.815.439 42.497.540 47.741.711 53.078.137

Sul 16.496.322 19.031.990 22.129.377 25.107.616 27.384.815

Sudeste 39.850.764 51.737.148 62.740.401 72.412.411 80.353.724

Total - Brasil 93.134.846 119.011.052 146.825.475 169.799.170 190.732.694 Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

Embora o aumento demográfico em termos absolutos na região

Nordeste, assim como em todo o país, seja inegável, devemos atentar para as

diferenças regionais quanto ao crescimento demográfico urbano. No Nordeste,

este crescimento vinha ocorrendo desde os anos 1970, porém só se

concretizou na década seguinte, quando os números de população urbana

26 Em todas as tabelas desta dissertação, os valores equivalentes às participações e às variações relativas foram arredondados (sem nenhuma casa decimal) conforme a própria formatação do Excel.

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ultrapassaram sensivelmente o da população rural, não somente no Nordeste,

mas também em todas as regiões do país. Mesmo assim, no ano de 2010 a

população total nordestina ainda representava a menor participação urbana do

país (73%) e a maior participação rural (27%), como podemos ver na tabela 7.

Ao analisarmos as variações absolutas e relativas, segundo

observamos, entre os anos 1970 e 1980 houve o maior crescimento

demográfico urbano do Nordeste, com 49%, enquanto o maior decréscimo da

população rural na região ocorreu entre 1991 e 2000 (-12%) (tabela 9). Em

todo o período analisado, o Nordeste foi a terceira região brasileira com o maior

índice de crescimento demográfico urbano, 230%, inferior apenas ao índice da

região Norte (564%) e da região Centro-Oeste (440%). Portanto, o processo de

urbanização nordestino se deu de forma bastante lenta, pois, num período de

profundas inovações materiais e sociais no país, houve grande resistência à

urbanização mais expressiva (em termos de quantitativos demográficos) devido

“ao passado cristalizado na sociedade e no espaço” (SANTOS, 2005, p.69).

O referido autor relaciona este fator à estrutura fundiária da região, “[...]

hostil desde cedo à maior distribuição de renda, ao maior consumo e à maior

terciarização27” (SANTOS, 2005, p.69), uma vez que as atividades primárias

ainda têm intensa expressividade na economia nordestina.

Podemos perceber a evolução da população no Brasil por regiões no

gráfico 1, onde fica bem claro o predomínio da população urbana em todas as

regiões a partir dos anos 1990.

27 A questão da terciarização no Nordeste será discutida ainda nesta seção.

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Tabela 6: Brasil. População residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010

Região

População residente

1970 1980 1991 2000 2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Centro-Oeste 2.309.365 2.242.026 4.821.314 1.985.406 7.663.122 1.764.479 10.092.976 1.543.752 12.479.872 1.570.468

Norte 1.755.862 2.368.956 3.329.439 3.290.316 5.922.574 4.107.982 9.014.365 3.886.339 11.663.184 4.202.494

Nordeste 11.756.451 16.355.100 17.568.001 17.247.438 25.776.279 16.721.261 32.975.425 14.766.286 38.816.895 14.261.242

Sul 7.305.650 9.190.672 11.876.780 7.155.210 16.403.032 5.726.345 20.321.999 4.785.617 23.257.880 4.126.935

Sudeste 28.969.932 10.880.832 42.841.793 8.895.355 55.225.983 7.514.418 65.549.194 6.863.217 74.661.877 5.691.847

Total - Brasil 52.097.260 41.037.586 80.437.327 38.573.725 110.990.990 35.834.485 137.953.959 31.845.211 160.879.708 29.852.986 Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

Tabela 7: Brasil. Participação da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010

Região

Participação (%)

1970 1980 1991 2000 2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Centro-Oeste 51 49 71 29 81 19 87 13 89 11

Norte 43 57 50 50 59 41 70 30 74 26

Nordeste 42 58 50 50 61 39 69 31 73 27

Sul 44 56 62 38 74 26 81 19 85 15

Sudeste 73 27 83 17 88 12 91 9 93 7

Total - Brasil 56 44 68 32 76 24 81 19 84 16 Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

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Tabela 8: Brasil. Variações absolutas da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010

Região

Variação absoluta

1970-1980 1980-1991 1991-2000 2000-2010 1970-2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Centro-Oeste 2.511.949 -256.620 2.841.808 -220.927 2.429.854 -220.727 2.386.896 26.716 10.170.507 -671.558

Norte 1.573.577 921.360 2.593.135 817.666 3.091.791 -221.643 2.648.819 316.155 9.907.322 1.833.538

Nordeste 5.811.550 892.338 8.208.278 -526.177 7.199.146 -1.954.975 5.841.470 -505.044 27.060.444 -2.093.858

Sul 4.571.130 -2.035.462 4.526.252 -1.428.865 3.918.967 -940.728 2.935.881 -658.682 15.952.230 -5.063.737

Sudeste 13.871.861 -1.985.477 12.384.190 -1.380.937 10.323.211 -651.201 9.112.683 -1.171.370 45.691.945 -5.188.985

Total - Brasil 28.340.067 -2.463.861 30.553.663 -2.739.240 26.962.969 -3.989.274 22.925.749 -1.992.225 108.782.448 -11.184.600 Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

Tabela 9: Brasil. Variações relativas da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010

Região

Variação relativa (%)

1970-1980 1980-1991 1991-2000 2000-2010 1970-2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Centro-Oeste 109 -11 59 -11 32 -13 24 2 440 -30

Norte 90 39 78 25 52 -5 29 8 564 77

Nordeste 49 5 47 -3 28 -12 18 -3 230 -13

Sul 63 -22 38 -20 24 -16 14 -14 218 -55

Sudeste 48 -18 29 -16 19 -9 14 -17 158 -48

Total - Brasil 54 -6 38 -7 24 -11 17 -6 209 -27 Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

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Gráfico 1: Brasil. Evolução da população residente urbana e rural, por regiões. 1970 a 2010

Fonte: IPEA. Elaboração da autora (2011).

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Outro fator decisivo apontado por Santos (2005) para a explicação da

lenta evolução urbana no Nordeste é a divisão interregional do trabalho,

porquanto “a diferença entre as taxas de urbanização das várias regiões está

intimamente ligada à [...] maneira diferente como, a cada momento histórico,

foram afetadas pela divisão interregional do trabalho” (p.67).

Na tentativa de compreender a realidade brasileira e a do Nordeste,

mediante uma interpretação da história econômica, social e política, Oliveira

(1981) também traz contribuições à discussão sobre a inserção nacional e

regional na divisão internacional do trabalho, ao afirmar:

Tratando-se de espaços econômicos que nasceram ou foram insertados na divisão internacional do trabalho do capitalismo mercantil como reservas e produtores de acumulação primitiva e que, posteriormente, continuaram subjugados à divisão internacional do trabalho do capitalismo imperialista, a existência de “regiões” 28 [...] é de uma evidência histórica irrefutável. Tais regiões assim se constituíram ligadas ao comércio internacional de mercadorias29, sendo essa sua lei de reprodução ao nível mais geral, mas, ao mesmo tempo et pour cause, mantendo ou criando formas de reprodução do valor bastante diferenciadas [...] (OLIVEIRA, 1981, p.28).

Esta perspectiva confirma nosso estudo, enfocando a importância das

atividades comerciais para a urbanização brasileira e, particularmente, regional,

no contexto da divisão internacional do trabalho. Aqui, chamamos atenção para

a questão das especificidades intrarregionais: nas palavras de Oliveira (1981,

p.32), “o Nordeste como ‘região’ [...] somente é reconhecível a partir de

meados do século XIX, e sobretudo neste século [referindo-se ao século XX]30.

Há, pois, na história regional e nacional, vários ‘nordestes’.”.

Ele coloca a questão de maneira exemplar ao explicar que havia o

Nordeste açucareiro, composto basicamente pelos atuais Estados de

Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Rio Grande do Norte; o Nordeste mercantil,

correspondente aos atuais Estados da Bahia e Sergipe, os quais mantinham

relações diretas com o capitalismo europeu, assim como a região do atual

28 De acordo com os estudos de Oliveira (1981, p.29), uma “região” seria “[...] o espaço onde se imbricam dialeticamente uma forma especial de reprodução do capital, e por conseqüência uma forma especial de luta de classes, onde o econômico e o político se fusionam e assumem uma forma especial de aparecer no produto social e nos pressupostos da reposição”. 29 Destaque nosso. Como mostraremos mais adiante, a consolidação de Mossoró como centro comercial regional também se dá nestes moldes, voltado inicialmente para o comércio internacional (importação e exportação). 30 [Destaque nosso].

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Maranhão, que regulava a produção de riqueza dos espaços mais ao leste; e o

Nordeste algodoeiro e pecuarista, formado pelo que hoje corresponde ao

Ceará e ao Piauí (OLIVEIRA, 1981). Em todas estas atividades, em seus

diferentes momentos históricos, fica evidente a inserção da região na divisão

territorial do trabalho.

É ela que nos permite estudar o Nordeste e a organização do seu

espaço urbano, pois, como propõe Felipe (1988, p.11), este urbano “[...]

manifestou-se no momento em que a economia açucareira induziu o

surgimento e a expansão da pecuária no sertão”. O desenvolvimento da

atividade pecuária foi determinante para a penetração e ocupação territorial no

país, bem como para a fixação populacional no interior nordestino, promovendo

em muitos casos a origem de cidades (FURTADO, 1980; CARDOSO, MAIA,

2007).

Lembremos, no entanto: a consolidação de muitos núcleos de

povoamento no Nordeste só foi possível graças ao estabelecimento das trocas

comerciais realizadas nas feiras de gado. Como registram Cardoso e Maia

(2007, p.518), os “[...] caminhos, que deram passagem ao gado, propiciaram o

surgimento de vilas e povoados. [...] algumas dessas nascentes cidades

situadas em posições favoráveis, ‘tornavam-se ativos centros de comércio de

gado’.”. Complementarmente afirmam: “[...] as feiras de gado de maior

destaque se encontravam na região semi-árida, caracterizada pela produção

pecuária, ou nas ‘regiões de transição’ entre o litoral e o sertão31” (p.523).

Além de beneficiarem as atividades comerciais nas cidades, as feiras

de gado também favoreciam a constituição de centros de serviços, conforme

podemos perceber neste trecho

[...] os vaqueiros, os sertanejos, ou mesmo os fazendeiros, ao se dirigirem às feiras de gado, aproveitavam para se abastecerem dos mais diversos artigos, nas feiras das cidades, como também para “fazer uma consulta médica, comprar algo na farmácia, ou mesmo se consultar com o ‘farmacêutico’.” [...] (VIEIRA, 1986, p.1632 apud CARDOSO; MAIA, 2007, p.523).

31 Que é o caso de Mossoró – RN. 32 VIEIRA, Sulamita. Feira: espaço de liberdade ou de ilusões? Série Estudos e Pesquisas. n.7. Fortaleza: Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais/ Departamento de Ciências Sociais e Filosofia/ Universidade Federal do Ceará, novembro de 1986.

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Desse modo, em um primeiro momento da divisão territorial do

trabalho, os centros urbanos nordestinos tornam-se cidades comerciais, pela

sua localização estratégica entre o litoral (espaço de consumo e escoamento) e

o sertão (espaço de produção). Em um segundo momento, estes centros

urbanos já consolidados como repassadores da produção agrícola regional e

para exportação seriam “[...] produzidos e organizados pelos capitais

acumulados através das atividades comerciais que criam um aparelho político,

sempre dentro dos níveis de interesses da burguesia comercial” (FELIPE,

1988, p.11).

Como facilmente presumível, a gênese dos centros urbanos

nordestinos, sobretudo dos centros regionais, está diretamente vinculada à

expansão das atividades terciárias. Felipe (1988, p.16) reconhece este fato ao

afirmar:

O terciário, portanto, surge como uma especialização necessária e vital para as cidades chamadas de “centro regional”, a ponto de ser essa atividade a força regionalizadora dos atuais “centros regionais”, no momento em que o centro prestador de serviços conjuga em torno de si outros espaços, outras cidades. [...] Nos países subdesenvolvidos e, especificamente, no nordeste brasileiro, o processo de urbanização das médias cidades e dos centros regionais pouco tem a ver com a implantação de novas indústrias, mas com uma estrutura de serviços, fazendo com que em algumas regiões o elemento de maior mobilidade é o homem à procura desses serviços e não as mercadorias.

As atividades terciárias, além de serem motivadoras do crescimento de

cidades e da urbanização no Nordeste, também foram ganhando notoriedade

no tocante ao mercado de trabalho. Conforme pondera Santos (1982, p.96),

“[...] a urbanização, a princípio demográfica, contribui para a mudança da

estrutura do emprego depois de haver impulsionado uma especialização das

atividades [...]”.

Assim, a especialização das atividades econômicas no país, em

especial após a década de 1970, provocou um aumento da participação do

número de pessoas empregadas no setor terciário no Nordeste, como

podemos verificar na tabela a seguir.

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Tabela 10: Nordeste. Distribuição da força de trabalho por setores33. 1970 a 2000

Ano Participação (%)

Setores Agropecuário Industrial Serviços

1970 62,54 10,63 26,83

1980 49,85 16,08 34,06

1990 37,56 15,89 46,55

2000 31,7 15,47 52,83 Fonte: IBGE. Santos; Moreira (2006)34. Adaptação da autora (2011).

Diante disto, percebemos a relevância das atividades terciárias para o

surgimento e consolidação das cidades nordestinas e, em muitos casos,

brasileiras, corroborando a proposta de uma urbanização terciária (SANTOS,

1981). Esta discussão torna-se mais evidente na realidade nacional à medida

que a divisão internacional e interregional do trabalho se acirra, sobremaneira

em meados do século XX, quando a reestruturação produtiva se estabelece e

muda profundamente os parâmetros sociais, culturais, políticos e econômicos

globais.

Entrementes à expansão urbana brasileira, as atividades terciárias

foram se especializando e ganhando relevância. Deixam de ser apenas de

subsistência e tornam-se extremamente importantes para a economia nacional,

a ponto de Sposito (2007a, p.237) afirmar que “as atividades terciárias

especializadas passam a ter mais importância que a capacidade de produção

industrial e/ou agrícola”.

Destarte, o estudo da urbanização brasileira demanda a compreensão

do processo de terciarização pelo qual passou o país, mais intensamente a

partir da década de 1960. Para Oliveira (1988, p.31) “[...] o crescimento do

terciário, na forma em que se dá, absorvendo crescentemente a força de

trabalho, tanto em termos absolutos como relativos, faz parte do modo de

acumulação urbano adequado à expansão do sistema capitalista no Brasil [...]”.

Embora já tenhamos apresentado a evolução da População

Economicamente Ativa (tabelas 2, 3 e 4), referente ao período de 1925 a 1970,

33 O título é igual ao original. 34 SANTOS, Loraine Menêses dos; MOREIRA, Ivan Targino. Condições do mercado de trabalho no setor de serviços nordestino. In: XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, Caxambu, MG, 2006. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_781.pdf. Acesso em: 21/1/2011.

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optamos por reforçar estes dados, estendendo nossa análise até a década de

1980 e expondo uma classificação mais detalhada dos setores econômicos35.

Por este motivo, mostramos a seguir dados referentes à evolução da

PEA para as décadas de 1960, 1970 e 198036, quando a população brasileira

passa a migrar mais intensamente para as áreas urbanas. Estas informações

legitimam a intrínseca relação existente entre a urbanização e a terciarização

no Brasil.

Segundo observamos, nas décadas de 1960 e 1970, o país ainda tinha

a maioria da sua PEA nas atividades agropecuárias e extrativas, o equivalente

a 54% e 45% do total, respectivamente. Neste mesmo período entre as

décadas de 1960 e 1970, houve um suave aumento nos setores de indústrias

de transformação, de 13% para 15%, no setor de construção, de 3% para 6%,

e principalmente no setor de comércio e serviços, os quais, juntos, passam de

22% para 28% da PEA para estes anos, respectivamente (ver tabela 12).

Já na década de 1980, verificou-se uma diminuição da participação da

PEA associada às atividades agropecuárias, que respondem por 30%. Em

contrapartida, o setor de comércio e serviços passa a deter maior percentual da

PEA do país, com 36% do total. Destacamos ainda o aumento da PEA nas

indústrias de transformação, com 20%, e nas atividades de construção, que de

6% passam a 8% do total.

Como podemos comprovar com estas informações, entre as décadas

de 1960 e 1980 houve um aumento considerável de trabalhadores no setor

terciário, quando estes passaram de 5.043 no primeiro ano considerado para

análise, para 15.036, no último ano estudado, conforme mostra a tabela 11. Tal

situação se alia às novas formas de organização espacial das atividades

econômicas associadas ao comércio e aos serviços, que passa por um

processo de concentração em redes de múltiplas filiais em diversas cidades do

país, como as redes de supermercados e hipermercados, por exemplo.

35 Nas análises anteriores observamos a evolução das atividades no âmbito mais geral, isto é, com base na classificação econômica em setor primário, secundário e terciário. Para este momento, utilizaremos as categorias adotadas pelo IBGE por setor de atividade. 36 Escolhemos para análise os anos de 1960, 1970 e 1980 para apresentar justamente o período de maiores mudanças. Além disso, as informações estavam disponíveis apenas para estes anos na seguinte publicação: IBGE, Fundação. Estatísticas históricas do Brasil: séries econômicas. 2.ed. Rio de Janeiro, 1990.

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Tabela 11: Brasil. População Economicamente Ativa Ocupada (em 1.000) 37 , segundo classificação do IBGE por setor de atividade. 1960 a 1980

Setor econômico 1960 1970 1980

Agricultura, pecuária, extração vegetal, caça e pesca

12.277 13.130 12.745

Extração mineral 131 175 251

Indústrias de transformação 2.948 4.269 8.460

Construção 781 1.720 3.171

Serviços industriais de utilidade pública 146 287 411

Transportes e comunicações 1.047 1.227 1.902

Comércio e serviços 5.043 8.076 15.036

Atividades mal definidas 376 454 295

Total 22.749 29.338 42.271 Fonte: IBGE. Elaboração da autora (2010). Tabela 12: Brasil. Participação percentual da População Economicamente Ativa Ocupada (em

1.000), segundo classificação do IBGE por setor de atividade. 1960 a 1980

Setor econômico Participação no total (%)

1960 1970 1980 Agricultura, pecuária, extração vegetal, caça e pesca

54 45 30

Extração mineral 1 1 1

Indústrias de transformação 13 15 20

Construção 3 6 8

Serviços industriais de utilidade pública 1 1 1

Transportes e comunicações 5 4 4

Comércio e serviços 22 28 36

Atividades mal definidas 2 2 1

Total 100 100 100 Fonte: IBGE. Elaboração da autora (2010).

Em sequência à nossa análise e observando como evoluiu a

quantidade de trabalhadores formais em cada setor, elaboramos algumas

tabelas com informações referentes aos anos de 1985, 1995 e 2005, a partir da

Relação Anual de Informações Sociais, base de dados do Ministério do

Trabalho e Emprego.

37 Os valores representados nas tabelas 11 e 12 são multiplicados por mil.

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Consoante verificamos, na década de 1980 houve uma retração do

mercado de trabalho formal em todos os setores, provavelmente em

decorrência da reestruturação pela qual passava o Brasil, com a modernização

do processo produtivo, e também pela crise econômica e política prolongada

até meados dos anos 1990. A única exceção foi o setor agropecuário, com

crescimento positivo de 61% entre os anos de 1985 e 1995. Dos setores com

menores quedas, destacaram-se o comércio, com decréscimo de 18%, e os

serviços, com um índice de 6% negativo.

No decênio seguinte, observamos uma elevação expressiva de

trabalhadores no comércio, a maior de 1995 a 2005, com 171%, acompanhado

do setor agropecuário e da construção civil, com crescimento de 168% e 131%,

respectivamente. Assim, ficaram bem acima da média nacional, de

aproximadamente 100% no período (tabela 14).

Nas duas décadas estudadas, as atividades associadas ao setor

primário da economia, principalmente o agropecuário moderno, tiveram o maior

crescimento, equivalente a 77%. Em suas discussões acerca da reestruturação

produtiva da agropecuária, Elias (2002a,b; 2003; 2006a,b) tenta compreender

as mudanças ocorridas no setor agropecuário com base em algumas variáveis,

das quais uma é o estudo do mercado agrícola formal, pois segundo ela “o

surgimento de uma classe de trabalhadores assalariados no campo representa

a materialização do capital” (ELIAS, 2006a, p.47). Sob esta perspectiva, a

autora concluiu que, com a expansão do agronegócio e a difusão de novos

modelos de produção, houve incremento no mercado de trabalho agrícola

formal especialmente a partir da década de 1990.

Os setores de comércio e de serviços apresentaram saldos positivos

de 55% e 44%, respectivamente, para todo o período avaliado. Quanto à

participação destes setores componentes do terciário no total de trabalhadores

formais do país, juntos responderam por 62% em 1985, 67% em 1995 e 69%

em 2005, demonstrando o intenso processo de terciarização da economia

brasileira38 (tabela 15).

38 Para mais informações sobre a evolução do emprego no setor terciário, ver DIEESE; CESIT (orgs.). O trabalho no setor terciário: emprego e desenvolvimento tecnológico. São Paulo: DIEESE; Campinas: CESIT, 2005.

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Tabela 13: Brasil. Número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE. 1985 a 2005

Setor econômico Trabalhadores formais

1985 1995 2005

Indústria 7.869.621 5.384.691 9.504.477

Construção civil 1.920.584 1.077.516 2.484.775

Comércio 4.054.405 3.339.975 9.053.080

Serviços 13.429.350 12.686.906 23.920.810 Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca 623.028 1.005.524 2.693.957

Outros/ignorado 175.003 251.174 -

Total 28.071.991 23.745.786 47.657.099 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Tabela 14: Brasil. Variações absolutas e relativas do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE. 1985 a 2005

Setor econômico Variação absoluta Variação relativa (%)

1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995

1995-2005

1985-2005

Indústria -2.484.930 4.119.786 1.634.856 -32 77 17

Construção civil -843.068 1.407.259 564.191 -44 131 23

Comércio -714.430 5.713.105 4.998.675 -18 171 55

Serviços -742.444 11.233.904 10.491.460 -6 89 44 Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca

382.496 1.688.433 2.070.929 61 168 77

Outros/ignorado 76.171 - - 44 - -

Total -4.326.205 23.911.313 19.585.108 -15 101 41 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010). Tabela 15: Brasil. Participação do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de

atividades do IBGE. 1985 a 2005

Setor econômico Participação (%)

1985 1995 2005

Indústria 28 23 20

Construção civil 7 5 5

Comércio 14 14 19

Serviços 48 53 50 Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca 2 4 6

Outros/ignorado 1 1 -

Total 100 100 100 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Além do panorama do mercado de trabalho formal no país, é

necessário compreender suas dinâmicas distintas em cada região, porquanto

“embora se apresente um conjunto de indicadores de dimensão nacional sobre

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o comportamento do emprego, sabe-se que tem pesado cada vez mais a

temática regional e local do mercado de trabalho” (POCHMANN, 2007, p.65).

Considerando as particularidades regionais, observaremos a evolução

do terciário e das demais atividades econômicas no Nordeste, sob a

perspectiva do número de trabalhadores formais. Apresentaremos os dados

por região, setor econômico e para os anos de 1985, 1995 e 200539, com base

nas informações da RAIS.

A princípio, não podemos estudar as regiões brasileiras sem antes

entender a atuação direta e indireta do Estado, por meio de políticas de

planejamento e desenvolvimento regionais implementadas a partir da década

de 195040. Como adverte Santos (1992, p.76), cabe ao Estado a criação de

fixos, quer a serviço da produção ou do homem, “mas, os fixos atraem e criam

fluxos. Desse modo, o subsetor governamental orienta os fluxos econômicos e

humanos e determina sua viabilidade e direção”. Complementarmente, afirma

Porto (2006, p.84):

Com a mundialização da economia, modificaram-se os processos produtivos, são modificados os procedimentos de atuação dos Estados em potencializar o desenvolvimento e tudo isso altera as políticas regionais em seus métodos e em suas capacidades de intervenção.

Portanto, pensando a evolução do mercado de trabalho da região

Nordeste como respostas às políticas estatais, percebemos ter havido forte

incremento das atividades agropecuárias. Este, entre todos os setores, foi o

que apresentou as variações mais representativas. De 1985 a 2005, o

crescimento da mão-de-obra no setor foi de 84%, o maior entre todos os

setores, inclusive maior até do que o crescimento total, de 47% (tabela 19).

Elias (2006a, p.30-31), enfatiza:

Se até a década de 1980 o conjunto da agropecuária nordestina permaneceu quase inalterado, a partir de então se vislumbra a ocupação de novas fronteiras pelo agronegócio globalizado em alguns lugares específicos dessa região. Estes passam a receber vultuosos [sic] investimentos de algumas importantes empresas do setor, difundindo-se a agricultura científica e o agronegócio.

39 Optamos por este recorte temporal em virtude da disponibilidade de informações em bancos de dados secundários e por se caracterizar pelo período de maiores transformações no país. 40 Sobre estas políticas ver Porto (2006).

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Como mostram os dados, o maior crescimento do setor foi identificado

na década de 1995 a 2005, equivalente a 165% (tabela 19). Neste período, a

participação da mão-de-obra nestas atividades relacionada ao total da região

passa de 4% para 6%, incremento de aproximadamente 280 mil trabalhadores

formais (tabelas 17 e 18).

Sobre o terciário na região, consoante verificamos em todos os anos

estudados, as atividades comerciais e de serviços sempre tiveram maior

participação no total de trabalhadores formais, com 68% em 1985, 73% em

1995 e 72% em 2005, a evidenciar a importância destas atividades para a

economia regional (tabela 17). Destaque para o setor de serviços, o qual entre

1985 e 2005 aumentou seu contingente de trabalhadores formais em mais de 2

milhões de pessoas, o equivalente a um crescimento de 47%. O setor

comercial também obteve crescimento significativo, de 59% nas duas décadas

analisadas, ou seja, um aumento da participação dos trabalhadores formais no

comércio de 13% em 1985 para 17% em 2005.

Cabe enfatizar: este crescimento veio acompanhado de mudanças

estruturais no setor. De acordo com Araújo (2000, p.186), na década de 1980

“o Nordeste surge, portanto, predominantemente como ‘região-mercado’

(sobretudo para o Sudeste), quando visto no contexto nacional”. No entanto,

como alerta Araújo (2000), as articulações comerciais na região adotam uma

nova característica, seguindo uma tendência geral da economia brasileira: “as

relações comerciais do Nordeste com o resto do mundo se dão cada vez

menos através da venda dos produtos básicos [...] e cada vez mais pela oferta

de produtos semimanufaturados e manufaturados” (p.185).

Ora, ainda que as atividades agropecuárias prevaleçam na economia

nordestina, as atividades terciárias vêm se tornando pujantes, sobretudo a

partir da década de 1980, quando o setor passou por intensa modernização e

tornou-se interdependente no tocante às demais atividades produtivas, dada a

maior integração entre os setores da economia nacional.

Quanto à indústria nordestina, como evidenciado, sofreu grande

reestruturação ao assumir um novo papel no contexto da divisão interregional

do trabalho. Nas palavras de Araújo (2000, p.170), “de tradicional região

produtora de bens de consumo não-duráveis (têxtil e alimentar,

principalmente), vai-se transformando, nos anos pós-60, numa região industrial

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mais especializada em bens intermediários”, refletindo em uma mudança do

mercado de trabalho no setor.

Entre 1985 e 1995 houve uma diminuição de 23% no número de

empregados, equivalente a pouco mais de 182 mil trabalhadores que perderam

seus postos no ramo industrial. Entretanto, no decênio seguinte, o setor

experimentou uma retomada do crescimento, atingindo um percentual de 96%,

quando quase 600 mil trabalhadores adentraram no mercado de trabalho no

secundário. No período das duas décadas estudadas, o setor manteve um

crescimento de 34%, e participação no total de trabalhadores formais na região

em 16%.

Por esta análise sobre o mercado de trabalho formal no Nordeste

pudemos perceber as repercussões dos movimentos da economia nacional na

região. Na afirmação de Araújo (2000, p.173):

Tendências da acumulação privada reforçadas pela ação estatal, quando não comandadas pelo Estado brasileiro, fizeram surgir e se desenvolver no Nordeste diversos subespaços dotados de estruturas econômicas modernas e ativas, focos de dinamismo, em grande parte responsáveis pelo desempenho relativamente positivo apresentado pelas atividades econômicas na região.

Todavia, não adianta pensarmos o Nordeste fora do contexto nacional

e das demais regiões do país, tendo em vista a participação conjunta, embora

diferenciada, na divisão internacional do trabalho. A este propósito, Oliveira

(1981, p.29) alega que

a especificidade de cada “região” completa-se, pois, num quadro de referências que inclua outras “regiões”, com níveis distintos de reprodução do capital e relações de produção; pelo menos quando se está em presença de uma “economia nacional”, que globalmente se reproduz sob os esquemas de reprodução ampliada do capital, é que o enfoque [...] de diferenças na divisão regional do trabalho

41, pode encontrar terreno propício para o entendimento das relações inter-regionais e abandonar a abordagem dos “desequilíbrios regionais” por uma formulação que centre suas atenções nas contradições postas e repostas exatamente pelas formas diferenciadas de reprodução do capital e das relações de produção.

Neste sentido, para o contexto nacional, os dados referentes ao

período de 1985 a 1995 revelaram uma diminuição na quantidade de

trabalhadores em todos os setores, exceto o relacionado às atividades 41 Destaque do autor referido.

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primárias, que tiveram crescimento em todas as regiões, principalmente no

Centro-Oeste, com 135% (tabela 19).

Neste âmbito, a atividade agropecuária, maior representante deste

setor, obteve resultados ainda melhores na década seguinte, com valores de

até 464% na região Norte e 349% no Centro-Oeste. Nestas, de acordo com

Santos (2005, p.67-68), “a modernidade [...] implantava-se quase sobre o vazio

e, desse modo, quase não encontra o obstáculo das heranças”, diferentemente

de outras regiões do país, como o Nordeste ou o Sul, de estruturas mais

rígidas. Ele complementa sua análise e afirma que “com a redescoberta do

cerrado, graças à revolução científico-técnica, criam-se as condições locais

para uma agricultura moderna, um consumo diversificado e, paralelamente,

uma nova etapa da urbanização” (SANTOS, 2005, p.69).

A aceleração do consumo, possível após uma profunda mudança

ideológica durante o processo de reestruturação produtiva, induz ao aumento

do número de estabelecimentos comerciais no país e justifica grande parte dos

altos índices exibidos pelo setor comercial e de serviços. Então, no tocante ao

setor comercial, este ganhou maior contingente de trabalhadores formais entre

os anos de 1995 e 2005, fato verificado em todas as regiões brasileiras.

Segundo se observou, este crescimento chegou a ser de 308% na região Norte

e a 270% na região Centro-Oeste, zonas de expansão econômica do Brasil

(tabela 19).

Não obstante, o setor de serviços foi o que agregou os maiores

contingentes de trabalhadores formais em todo o país, demonstrando o peso

destas atividades nas duas décadas analisadas. Em todas as regiões, os

serviços atingiram participações iguais ou superiores à metade dos

trabalhadores formais brasileiros, inclusive em meados da década de 1980.

Prova disto são os índices de crescimento do setor expostos na tabela 19,

negativos apenas entre 1985 e 1995, no Sudeste (-11%) e no Sul (-10%).

O grande contingente de mão-de-obra no setor de serviços é explicado

por Kon (2004) 42 como uma consequência da “expansão dos serviços de apoio

às atividades industriais e agropecuárias” (p.99); do “aumento médio dos

rendimentos dos assalariados nas demais atividades, que se expressavam pela

42 A autora citada traz muitas contribuições a respeito dos serviços, inclusive sobre a questão da informalidade no setor. Para mais detalhamentos ver Kon (1992, 2004).

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elevação do consumo de serviços pessoais” (p.147); da complexidade

adquirida pelo setor nas últimas décadas, com “a mudança na classificação de

certos serviços, anteriormente considerados ocupações manufatureiras, antes

das mudanças tecnológicas e organizacionais” (p.66), o que acabou

concentrando mão-de-obra oriunda dos demais setores econômicos, entre

outros fatores.

Ao prosseguirmos na nossa análise setorial por regiões, a indústria e a

construção civil foram os setores que perderam mais trabalhadores entre 1985

e 1995, com decréscimos de 35% e 65%, respectivamente. Kon (2004, p.66)

atribui este declínio “[...] a certas formas de reorganização da produção que

afetam os níveis de emprego: a intensificação do trabalho; a racionalização da

produção e do investimento e a mudança técnica”, as quais atingiram ambos os

setores, principalmente o industrial.

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Tabela 16: Brasil. Número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões. 1985 a 2005

Setor econômico Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005

Indústria 214.531 152.663 395.310 807.386 624.662 1.221.320 5.022.540 3.255.403 4.843.136 1.648.102 1.183.938 2.523.706 177.062 168.025 521.005

Construção civil 97.452 33.743 134.454 417.348 162.469 478.138 1.040.119 641.630 1.301.321 234.887 161.384 361.431 130.778 78.290 209.431

Comércio 122.240 103.900 424.226 520.157 464.696 1.282.660 2.336.696 1.931.617 4.819.752 836.146 632.623 1.761.034 239.166 207.139 765.408

Serviços 500.754 583.160 1.209.260 2.234.020 2.364.241 4.249.568 7.555.940 6.749.570 12.696.520 2.129.269 1.914.908 3.679.168 1.009.367 1.075.027 2.086.294

Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca

12.928 19.069 107.576 72.590 168.715 446.872 400.353 552.999 1.375.262 101.585 181.267 389.542 35.572 83.474 374.705

Outros/ignorado 6.505 17.617 - 16.208 69.287 - 118.139 122.040 - 23.731 26.277 - 10.420 15.953 -

Total 954.410 910.152 2.270.826 4.067.709 3.854.070 7.678.558 16.473.787 13.253.259 25.035.991 4.973.720 4.100.397 8.714.881 1.602.365 1.627.908 3.956.843

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 17: Brasil. Participação do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões (%). 1985 a 2005

Setor econômico Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005 1985 1995 2005

Indústria 22 17 17 20 16 16 30 25 19 33 29 29 11 10 13

Construção civil 10 4 6 10 4 6 6 5 5 5 4 4 8 5 5

Comércio 13 11 19 13 12 17 14 15 19 17 15 20 15 13 19

Serviços 52 64 53 55 61 55 46 51 51 43 47 42 63 66 53 Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca

1 2 5 2 4 6 2 4 5 2 4 4 2 5 9

Outros/ignorado 1 2 - 0 2 - 1 1 - 0 1 - 1 1 -

Total 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 18: Brasil. Variação absoluta do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões. 1985 a 2005

Setor econômico

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005

Indústria -61.868 242.647 180.779 -182.724 596.658 413.934 -1.767.137 1.587.733 -179.404 -464.164 1.339.768 875.604 -9.037 352.980 343.943

Construção civil -63.709 100.711 37.002 -254.879 315.669 60.790 -398.489 659.691 261.202 -73.503 200.047 126.544 -52.488 131.141 78.653

Comércio -18.340 320.326 301.986 -55.461 817.964 762.503 -405.079 2.888.135 2.483.056 -203.523 1.128.411 924.888 -32.027 558.269 526.242

Serviços 82.406 626.100 708.506 130.221 1.885.327 2.015.548 -806.370 5.946.950 5.140.580 -214.361 1.764.260 1.549.899 65.660 1.011.267 1.076.927

Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca

6.141 88.507 94.648 96.125 278.157 374.282 152.646 822.263 974.909 79.682 208.275 287.957 47.902 291.231 339.133

Outros/ignorado 11.112 - - 53.079 - - 3.901 - - 2.546 - - 5.533 - -

Total -44.258 1.360.674 1.316.416 -213.639 3.824.488 3.610.849 -3.220.528 11.782.732 8.562.204 -873.323 4.614.484 3.741.161 25.543 2.328.935 2.354.478

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 19: Brasil. Variação relativa do número de trabalhadores formais, segundo grande setor de atividades do IBGE, por regiões (%). 1985 a 2005

Setor econômico

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005 1985-1995 1995-2005 1985-2005

Indústria -29 159 46 -23 96 34 -35 49 -4 -28 113 35 -5 210 66

Construção civil -65 298 28 -61 194 13 -38 103 20 -31 124 35 -40 168 38

Comércio -15 308 71 -11 176 59 -17 150 52 -24 178 53 -13 270 69

Serviços 16 107 59 6 80 47 -11 88 40 -10 92 42 7 94 52

Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca

48 464 88 132 165 84 38 149 71 78 115 74 135 349 91

Outros/ignorado 171 - - 327 - - 3 - - 11 - - 53 - -

Total -5 149 58 -5 99 47 -20 89 34 -18 113 43 2 143 60

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Trazer ao debate todas as questões ora apresentadas nos ajudou a

pensar sobre a urbanização brasileira do ponto de vista da terciarização,

demonstrando o quanto estes processos estão interligados. Consoante esta

elucubração nos mostrou, fatores como a modernização e a maior “integração”

do território, a dispersão espacial da produção e a difusão de comércios e

serviços por todas as regiões do país foram fundamentais para a ampliação da

escala da urbanização. Desse modo, aumentaram a importância dos centros

urbanos, fortalecendo-os e tornando complexa a divisão do trabalho entre

cidades e regiões.

Juntos, estes foram determinantes na configuração de um novo

panorama urbano brasileiro, no qual, paralelamente, há um fenômeno de

metropolização e de desmetropolização (SANTOS, 2005), que se intensificou

na década de 1980 e ocasionou a emergência de centros urbanos de porte

médio e o aumento de seus níveis populacionais.

A expansão e diversificação do consumo, a elevação dos níveis de renda e a difusão dos transportes modernos, junto à divisão do trabalho mais acentuada, fazem com que as funções de centro regional passem a exigir maiores níveis de concentração demográfica e de atividades (SANTOS, 2005, p.82).

Tal fenômeno estimula as discussões teóricas acerca do tema “cidades

médias”43, demandando a elaboração de um conceito preciso que não se

vincule apenas a classificações demográficas, mas que esteja relacionado,

notadamente, ao papel desempenhado por estas cidades na rede urbana

regional, nacional e internacional (SPOSITO; ELIAS, 2006; SPOSITO,

2007a,b), contemplando as articulações espaciais e temporais estabelecidas

nestes níveis interescalares.

Neste sentido, diversos autores estudiosos da temática nos expõem

elementos a serem observados para definição e classificação de uma cidade

média44. Em nosso trabalho, nos basearemos sobretudo nas ideias propostas

43 Para mais informações acerca dos estudos sobre cidades médias consultar AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno. Origens, evolução e perspectivas dos estudos sobre cidades médias. In: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. (org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p.69-87. Para este trabalho, adotaremos a perspectiva defendida por Sposito e Elias (2006) e Sposito (2007a,b). 44 Para mais informações sobre os recentes estudos elaborados acerca das cidades médias ver Sposito, Sposito, Sobarzo (2006) e Sposito (2007).

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por Sposito e Elias et al. (2006, 2007b) que, na tentativa de delinear um

conceito de cidade média, utilizam algumas dinâmicas e agentes estruturantes

que vêm alterando os papéis dessas cidades: a) difusão da agricultura

científica e do agronegócio; b) desconcentração da produção industrial; c)

difusão do comércio e dos serviços especializados; e d) aprofundamento das

desigualdades socioespaciais.

Aqui ressaltamos: tais elementos só podem ser entendidos a partir da

análise das relações entre o espaço intraurbano e o interurbano de cada cidade

(SPOSITO, 2001b, 2007a). Essa articulação entre escalas deve considerar as

disparidades entre os lugares e a sobreposição de fluxos estabelecidos em

diferentes escalas, porque as relações, sobreposições e articulações com

outros espaços poderão nos ajudar a compreender os novos conteúdos das

cidades médias, em suas várias dimensões.

Eis a conjuntura urbana que se organiza no Brasil, especialmente nas

três últimas décadas, consoante a necessidade de geração de novas

oportunidades para a acumulação capitalista. Conforme expusemos

inicialmente, quatro elementos, isolados ou combinados, contribuem para esta

acumulação: a) a penetração do capital em novas esferas de atividade; b) a

criação de novos desejos e novas necessidades; c) a facilitação e o estímulo

para o crescimento populacional; e d) a expansão geográfica para novas

regiões (HARVEY, 2005). Todos estes elementos foram identificados em nossa

análise sobre urbanização brasileira e com base neles podemos perceber a

lógica de expansão e de reprodução do capital, desigual e combinado.

Em virtude da sua expansão geográfica, o capital incorpora os mais

diversos países e regiões; o Brasil e o Nordeste não escaparam a este

processo, repercutindo, entre outros aspectos, na forma e no conteúdo da

urbanização. Como verifica Pontes (2006, p.328) ao fazer uma leitura da

produção do espaço urbano nordestino nas últimas décadas, na região

[...] observou-se uma estratégia urbana que visou o crescimento das atividades produtivas e a melhoria da infra-estrutura funcional e no equipamento social das capitais dos Estados e dos pólos secundários regionais, e a dinamização dos núcleos urbanos regionais que exerceriam funções de polarização do desenvolvimento regional através de apoio às atividades produtivas e dos investimentos em infra-estrutura urbana e equipamento social. A esses núcleos caberia

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importante função na contenção do processo migratório e no apoio às atividades agropecuárias e agroindustriais.

A inserção de um número cada vez maior de cidades nordestinas nesta

lógica fundamenta e justifica nossa área de estudo, a cidade de Mossoró – RN.

Com uma ampla região de influência e uma economia bastante peculiar,

Mossoró foi uma das áreas “recentemente incorporadas aos circuitos

produtivos globalizados de grandes empresas, nacionais e multinacionais,

hegemônicas em diferentes ramos da economia” (ELIAS; PEQUENO, 2010,

p.103). Isto levou a cidade a assumir novos papéis na divisão territorial do

trabalho e a passar por profundas transformações socioespaciais.

Nossa análise de Mossoró foi feita com base nas dimensões política,

econômica e espacial, levando em conta as articulações interescalares, cujo

objetivo é compreender a evolução do comércio na cidade, considerando o

cenário de terciarização da economia. Pretendemos observar as diferentes

representações do setor comercial ao longo da história mossoroense e dessa

forma estudar os novos agentes econômicos nele atuantes, à luz das novas

tendências da urbanização brasileira.

1.3 MOSSORÓ EM CONTEXTO: NOTAS INTRODUTÓRIAS

Localizada no noroeste do Rio Grande do Norte, no Nordeste brasileiro,

Mossoró é a segunda cidade mais importante do Estado. De acordo com o

IBGE (1982), caracteriza-se por ser historicamente uma cidade comercial e um

dos fatores determinantes para isto é sua localização geográfica em uma área

estratégica de transição entre a economia do litoral e do sertão. Tal condição

favoreceu a inserção da cidade na divisão territorial do trabalho durante sua

história, com reflexos diretamente na constituição das atividades econômicas e

nas suas reestruturações espaciais.

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Assim, um traço marcante da cidade é sua influência regional em todo

o oeste potiguar45, assim como em alguns municípios do Ceará e da Paraíba46.

Esta influência não é apenas econômica, pela centralidade no tocante às

atividades comerciais e de serviços, mas também do ponto de vista social, pois

em Mossoró encontram-se hospitais regionais de baixa e média complexidade

que atendem toda a região, entre outros tipos de serviços.

Portanto, torna-se imprescindível uma abordagem espaço-temporal de

Mossoró, pois “a reconstrução dos sucessivos sistemas temporais e dos

sistemas espaciais sucessivos é um dado fundamental quando se busca uma

explicação para as situações atuais” (SANTOS, 2002, p.255). Além disso,

serão contempladas em nosso estudo as articulações entre as múltiplas

escalas, intraurbana e interurbana, aliadas a relações transversais, conforme

propôs Sposito (2007a, p.237).

Elas podem ser assim chamadas porque extrapolam a própria rede em que se inserem, visto que muitas, para comandar exportações de produção agropecuária e industrial regional, passam a ter que se

45 De acordo com o IBGE, a mesorregião do oeste potiguar é formada de 62 municípios agrupados em sete microrregiões. São elas: microrregião de Mossoró, composta pelos municípios de Areia Branca, Baraúna, Grossos, Mossoró, Serra do Mel e Tibau; microrregião de Chapada do Apodi, composta pelos municípios de Apodi, Caraúbas, Felipe Guerra e Governador Dix-Sept Rosado; microrregião do Médio Oeste, pelos municípios de Augusto Severo, Janduís, Messias Targino, Paraú, Triunfo Potiguar e Upanema; microrregião de Pau dos Ferros, pelos municípios de Alexandria, Francisco Dantas, Itaú, José da Penha, Marcelino Vieira, Paraná, Pau dos Ferros, Pilões, Portalegre, Rafael Fernandes, Riacho da Cruz, Rodolfo Fernandes, São Francisco do Oeste, Severiano Melo, Taboleiro Grande, Tenente Ananias, Viçosa; microrregião da Serra de São Miguel, pelos municípios de Água Nova, Coronel João Pessoa, Doutor Severiano, Encanto, Luís Gomes, Major Sales, Riacho de Santana, São Miguel, Venha-Ver; microrregião de Umarizal, pelos municípios de Almino Afonso, Antônio Martins, Frutuoso Gomes, João Dias, Lucrécia, Martins, Olho-d'Água do Borges, Patu, Rafael Godeiro, Serrinha dos Pintos, Umarizal; e microrregião do Vale do Açu, composta pelos municípios de Açu, Alto do Rodrigues, Carnaubais, Ipanguaçu, Itajá, Jucurutu, Pendências, Porto do Mangue, São Rafael. Outra classificação do IBGE, as Regiões de Influência das Cidades, também possui determinados municípios que estão sob influência de Mossoró, direta ou indiretamente. Os de influência direta são: Açu, Apodi, Areia Branca, Augusto Severo, Baraúna, Caraúbas, Felipe Guerra, Frutuoso Gomes, Governador Dix-Sept Rosado, Grossos, Itaú, Janduís, Martins, Messias Targino, Olho-d'Água do Borges, Patu, Tibau, Serra do Mel, Umarizal, Upanema. Os de influência indireta são: Rodolfo Fernandes, Severiano Melo, Almino Afonso, Antônio Martins, Rafael Godeiro, Viçosa, Afonso Bezerra, Alto do Rodrigues, Angicos, Carnaubais, Fernando Pedroza, Ipanguaçu, Itajá, Lajes, Paraú, Pendências, Porto do Mangue, São Rafael, Triunfo Potiguar. Contudo, neste trabalho, consideraremos principalmente a região de influência da cidade composta pelos municípios das microrregiões de Mossoró, Chapada do Apodi e Vale do Açu, além dos municípios cearenses e paraibanos. Optamos por este recorte pois foram os municípios mais citados em trabalhos de campo. 46 Nas entrevistas realizadas durante os trabalhos de campo os comerciantes mencionaram alguns municípios dos quais provêm os consumidores. Os mais citados foram: Aracati, Icapuí, Limoeiro do Norte, Jaguaruana e Russas, no Estado do Ceará, e Catolé do Rocha e São Bento, na Paraíba.

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relacionar diretamente com cidades de outros países e de importâncias diferentes.

Atualmente, a economia mossoroense é caracterizada por uma

dinâmica bastante heterogênea, constituída pela forte polarização da atividade

terciária, pela atividade salineira, pela atividade petrolífera e pelo agronegócio

de frutas tropicais. Como declaram Elias e Pequeno (2010, p.115), “o

crescimento e a diversificação das atividades econômicas, cada vez mais

presentes nos espaços organizados por Mossoró, reforçam sua condição como

cidade média”. Este quadro é resultado da atuação de agentes históricos e

sociais, os quais, mediante suas relações, produziram seu espaço, criaram sua

cultura, suas instituições, suas ideologias e suas próprias relações de classe e

de propriedade.

Nosso ponto de partida para a análise da evolução das atividades

comerciais relacionando-as com o processo de urbanização mossoroense

serão as recentes dinâmicas da urbanização brasileira que vêm alterando os

papéis das cidades médias. Segundo Sposito e Elias et al. (2006, 2007b), estas

dinâmicas são: a) difusão da agricultura científica e do agronegócio; b) a

desconcentração da produção industrial; c) a difusão do comércio e dos

serviços especializados; e d) o aprofundamento das desigualdades

socioespaciais. Elas nortearão nosso estudo e nos auxiliarão na compreensão

dos processos engendrados na atual configuração do terciário mossoroense,

revelando suas especificidades, suas mudanças e permanências, e também

suas resistências.

Entretanto, como toda mudança se processa dentro de um contexto de

divisão territorial do trabalho, é importante relevar que “a atual repartição

territorial do trabalho repousa sobre as divisões territoriais do trabalho

anteriores” (SANTOS, 2008b, p.141). Consoante se verifica ao observar a

história de Mossoró, desde o início do seu povoamento, em 1772, até hoje, a

cidade tem passado por diversas especializações econômicas que

dinamizaram a economia regional, acompanhando o movimento das divisões

territoriais do trabalho que se estabeleceram em nível mundial, nacional e

dentro da própria região.

Com base neste pressuposto, mostraremos alguns aspectos históricos

indicativos dos processos e agentes na cidade, com vistas a compreender a

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evolução do setor comercial e as transformações espaciais. Apresentaremos

os principais momentos de inflexão na economia mossoroense, propondo a

princípio uma periodização marcada por três grandes períodos: a) de meados

do século XVIII até início do século XX; b) do início dos anos 1930 até fins da

década de 1970; e c) da década de 1980 aos dias atuais47.

O primeiro momento começou no ano de 1772, quando Mossoró ainda

era um pequeno povoado e tinha suas relações econômicas associadas ao

comércio de sal e às atividades agropecuárias tradicionais (CASCUDO, 1982;

FELIPE, 1980, 1982, 1988, 2001; ROCHA, 2005; PINHEIRO, 2006), ganhando

notoriedade com o desenvolvimento de atividades comerciais em meados do

século XIX.

Com a diminuição da hegemonia da atividade pecuária na região, a

cidade ascendeu como centro comercial. Para Felipe (1980, 1982), esta

consolidação do comércio estaria relacionada a três fatores principais: o

primeiro seria o aspecto locacional privilegiado, pois Mossoró situa-se em uma

área de transição entre a economia do litoral e a economia do sertão,

favorecendo sua inserção na divisão territorial do trabalho; o segundo seria a

seca de 1877, a qual atraiu grande contingente populacional (posteriormente

utilizada como mão-de-obra barata e consumidora para os comerciantes), e

também concentrou recursos governamentais na cidade para ajudar aos

“flagelados” da seca; e o terceiro seria a entrada de firmas e capitais extra-

locais, que dinamizariam o comércio e implantariam ideias mercantilistas.

Como cita Felipe (2001), o promissor centro comercial atraiu diversos

comerciantes de praças comerciais em declínio (Aracati e Sobral, no Ceará, e

Pombal, na Paraíba), além de comerciantes europeus, que instalaram casas

comerciais voltadas para a importação e exportação de produtos, permitindo a

acumulação de capitais e sendo responsáveis pelo surgimento de

[...] uma burguesia mercantil, relativamente dinâmica, que impunha uma nova organização do espaço urbano, no intuito de consolidar a

47 Esta periodização está baseada na proposta de Pinheiro (2006, p.6), que estudou os momentos de expansão urbana de Mossoró com base em cinco especializações econômicas, a saber: a especialização pecuarista, entre 1772 e 1857; a especialização empório comercial, entre 1857 e 1930; a especialização salicultora e agroindustrial exportadora dentro de uma política estatal desenvolvimentista, entre 1930 e 1970; a especialização prestadora de serviços dentro de uma política estatal intervencionista, na década de 1970; e a especialização prestadora de serviços dentro de uma política estatal neoliberal, de 1980 aos dias atuais.

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função de entreposto comercial de uma significativa região, a qual envolvia grande parte do sertão do Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará. É nesse momento que surgem os primeiros arranjos no espaço da cidade, seja através de políticas públicas, por iniciativa privada ou por ambas associadas (FELIPE, 2001, p.17). [...] Esses comerciantes, a partir da segunda metade do século XIX, foram os grandes animadores do desenvolvimento de Mossoró e de sua região de relações comerciais. Isso é peculiar em uma região até então dominada pela pecuária e pelos fazendeiros (FELIPE, 2001, p.35).

Percebemos desde muito cedo a intrínseca relação entre as atividades

terciárias e o início do processo de urbanização de Mossoró, tendo em vista o

seguinte: “As atividades de importação e exportação de mercadorias [...]

induziram o crescimento da vila [...] e de sua área urbana, aumentando a

influência da cidade” (FELIPE, 2001, p.33-34).

Um fato revela-se interessante, qual seja, os comerciantes estrangeiros

e locais aliaram-se a profissionais liberais e políticos da cidade e formaram

uma elite política dividida entre lideranças de dois partidos, o Conservador e o

Liberal. “Esta elite preocupa-se com a organização do espaço urbano e

regional, preparando a geografia da cidade de forma a viabilizar o empório

comercial e, posteriormente, as salinas e as agro-indústrias” (FELIPE, 2001,

p.39).

Assim, fica clara a integração econômica à política na cidade, que

beneficiou a burguesia mercantil e, por conseguinte, as atividades comerciais,

propiciando várias transformações espaciais, como investimentos no porto de

Areia Branca (coloquialmente chamado de “porto de Mossoró”); modificações

nas vias de circulação e transporte das mercadorias; elaboração do projeto da

estrada de ferro; e também transformações sociais, ao utilizar os flagelados da

seca de 1877 como força de trabalho na “ampliação das salinas já existentes e

na criação de novas áreas de produção do sal” (FELIPE, 2001, p.39), setor no

qual os comerciantes já investiam, ampliando sua acumulação de capital.

Entretanto, nas primeiras décadas do século XX houve um

enfraquecimento das atividades comerciais, levando à saída de capitais e

empresas de Mossoró e à perda da sua função comercial. Alguns fatores

estavam associados ao declínio da atividade tais como a guerra de 1914 a

1918 e a seca de 1915 (CASCUDO, 1982); o fortalecimento comercial de

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outras praças nordestinas, como Campina Grande, na Paraíba (FELIPE, 1980,

1982); e, principalmente, a demora na construção da via férrea, dificultando o

escoamento das mercadorias (FREIRE, 1982), o que impediu a entrada da

cidade na divisão territorial do trabalho. Esta, em nível regional, “manifestou-se

pela chegada de forças produtivas novas, como a estrada de ferro e o caixeiro

viajante, que desbarataram o método antiquado de fazer comércio” (FELIPE,

2001, p.19).

Com a decadência da função de entreposto comercial, por volta da

década de 1920, o comércio local tentou se amparar com o estabelecimento de

firmas estaduais vinculadas a produtos locais de exportação como algodão, sal,

açúcar e cera de carnaúba. Tais circunstâncias davam os primeiros indícios do

momento seguinte pelo qual a economia da cidade passaria: a especialização

industrial. Tal especialização, de acordo com Felipe (2001, p.63),

[...] marca o fim do empório comercial, integrado dentro de uma divisão internacional do trabalho, e sinaliza para a inserção em uma divisão interregional do trabalho, onde sua função agora é produzir matéria-prima que recebe um ligeiro beneficiamento local para as indústrias do Centro-Sul do país.

Este se caracteriza como o segundo momento da nossa periodização.

À medida que Mossoró adentrou na lógica industrial, ainda na década de 1930,

a economia da cidade desenvolveu-se no ritmo da industrialização na região

Centro-Sul. Assim, Mossoró se estabeleceu como centro repassador de

matérias-primas, fomentando o aparecimento das primeiras indústrias de gesso

e de beneficiamento como as “[...] agroindústrias algodoeiras, fábricas de óleo

de caroço de algodão, de óleo de oiticica, de beneficiamento de cera de

carnaúba e as moedeiras (refinadoras) do sal” (FELIPE, 1982, p.64).

Esta nova especialização econômica mossoroense, formada pelas

agroindústrias48 e pela atividade salineira, criava um mercado de trabalho

sazonal, pois o término das safras agrícolas e a chegada das chuvas nas

salinas prejudicavam a produção nas indústrias, e geravam graves problemas

sociais e econômicos, como o desemprego, o aumento das desigualdades e a

construção de moradias em áreas irregulares. Além disso, transformações

48 Agroindústria é um ramo industrial cuja matéria-prima é proveniente da produção agropecuária ou do extrativismo.

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espaciais foram visíveis, com a localização das unidades industriais nas

proximidades da linha férrea ou do rio e com o surgimento de vários bairros

operários.

No entanto, além das agroindústrias de origem no capital comercial,

cujas produções voltavam-se predominantemente para o Centro-Sul, havia

também pequenas e médias indústrias detentoras de grande importância na

economia da cidade: o abastecimento do mercado regional (FELIPE, 1982).

Concomitante ao surto industrial na cidade manteve-se sua função de

“centro de prestação de serviços”, fortalecida com o surgimento dos primeiros

estabelecimentos de crédito na cidade, como o Banco do Brasil (1918), o

Banco de Mossoró S.A.49 (1937), O Banco do Nordeste (1958), entre outros.

Na opinião de Felipe (1982, p.80)

Estas atividades econômicas revitalizaram o comércio de Mossoró, agora sem as funções específicas que exercem [sic] no período do “empório comercial”, mas, com forças suficientes para manter juntamente com os serviços de saúde, educação, transportes e crédito bancário, a força regionalizadora de Mossoró.

Neste momento, as atividades terciárias foram reforçadas e

concentradas na cidade, e assumiram a função de “sustentar a expressão

urbana dos processos de industrialização” (FELIPE, 1988, p.22). Entre os

novos conteúdos do terciário mossoroense podemos apontar a perda da

função atacadista do comércio, característica do setor até início do século XX,

por diversos fatores. Entre estes: a “integração nacional” (FELIPE, 1982, p.80),

a qual substituiu o comércio atacadista tradicional por formas modernas de

comercialização (SANTOS, 2003); o crescimento das instituições de serviços,

públicas e privadas, que gerou condições para expansão das atividades

comerciais, graças ao aumento da massa e dos níveis salariais (FELIPE, 1988,

p.15); o setor terciário, ao englobar “atividades que estão nas esferas da

circulação, da distribuição e do consumo” (OLIVEIRA, 1980, p.144-145); e,

principalmente, iniciou-se a terciarização da economia, atribuindo uma nova

feição à urbanização de Mossoró, processo mais bem definido adiante.

A década de 1970 marcou a chegada de novas forças produtivas,

decorrentes do advento do meio técnico-científico-informacional, 49 Este banco era de capital local.

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desencadeando uma crise nas agroindústrias, a passagem de uma produção

salineira artesanal para uma produção extremamente mecanizada e o

estrangulamento do mercado de trabalho, gerando muitas tensões sociais.

As consequências desta mecanização para os produtores locais foram

fatais, pois levaram à falência de várias pequenas e médias salinas da região

de Mossoró, Areia Branca e Macau50 (FELIPE, 1982) e à demissão de uma

grande quantidade de mão-de-obra das indústrias. Estes desempregados

passaram a buscar trabalho, formal ou informalmente, em atividades atreladas

ao comércio e aos serviços como forma de manter ou complementar a renda

familiar, acompanhando o fenômeno nacional do crescimento da PEA no setor

terciário, sobretudo a partir da década de 197051.

Segundo Elias e Pequeno (2010), estas mudanças na economia

acabaram repercutindo espacialmente na cidade que, ao final dos anos 1960,

passou por uma ampliação urbana, orientada para um novo vetor de expansão:

a margem direita do rio Mossoró. Mesmo assim, houve uma aceleração no

ritmo de crescimento desordenado da cidade, e espontâneo, de seu sistema

viário, com o surgimento de bairros carentes de infraestrutura na periferia e os

primeiros sinais da “presença de espaços de segregação residencial e

segmentação social, concentrados no centro tradicional” (ELIAS; PEQUENO,

2010, p.111).

Outro fato influenciou no desenvolvimento econômico da cidade em

meados da década de 1960, quando se iniciou no Brasil uma política agrícola

com vistas a intensificar a interação entre a agricultura e a indústria, na qual,

posteriormente, Mossoró foi inserida52. Desenvolveram-se no Nordeste vários

projetos agrícolas voltados principalmente para a exportação de frutas

tropicais, estabelecendo “[...] uma nova organização econômica e social da

agropecuária, que acompanha a unificação da economia pelo movimento do

capital industrial e financeiro” (ELIAS, 2002b, p.282).

Consoante a autora reforça, neste momento “coube ao Estado

brasileiro adequar a produção e o território à reprodução ampliada do capital na 50 Areia Branca localiza-se a 45 km de Mossoró, e Macau, a 140 km. Ambos têm grande parte da sua economia voltada para a exploração de sal. 51 No capítulo seguinte apresentaremos as informações referentes à evolução da PEA em Mossoró. 52 Os projetos agrícolas se iniciam no país na década de 1960, mas Mossoró só será inserida neste processo cerca de uma década depois.

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agricultura do país” (ELIAS, 2003, p.65), mediante criação de inúmeras

medidas públicas que viabilizaram a modernização da agricultura, como

“orientações econômicas gerais e de estratégias de crescimento agrícola”,

“políticas explicitas de fomento agrícola” (p.65), e políticas financeiras e fiscais.

Com todos estes incentivos, verificou-se a organização de circuitos

espaciais de produção e círculos de cooperação globalizados no setor, a

expansão dos fixos no campo e a construção de novos sistemas de fluxos. A

modernização da agricultura gerou redefinições no consumo, nas relações

cidade-campo, e ampliou a escala da urbanização.

Ao ser incorporada a este processo, por volta da década de 1970,

Mossoró passa a produzir frutas tropicais utilizando novas técnicas de

produção, como a irrigação. Posteriormente, transforma-se num grande

exportador de frutas tropicais, com destaque para o melão. Este processo

iniciado na década de 1970 é acelerado com a modernização da agricultura

nas décadas seguintes, quando adquire características do agronegócio

globalizado. Para Elias e Pequeno (2010, p.147), “o agronegócio globalizado

representa um papel fundamental para a intensificação da urbanização e para

o crescimento de cidades locais e médias, fortalecendo-as em termos

demográficos e econômicos”. Os autores evidenciam alguns aspectos

diretamente relacionados à expansão do agronegócio da fruticultura em

Mossoró:

Associada à difusão do agronegócio de frutas, dá-se uma série de transformações na economia urbana de Mossoró, que passa a crescer de forma bem distinta do até então ocorrido, com grande destaque para o crescimento dos setores inerentes ao consumo produtivo, ou seja, o consumo associado às demandas do agronegócio, que impõe seus padrões de consumo, que serão, em parte, atendidos localmente. Ao mesmo tempo, dinamizam o terciário e, consequentemente, a economia urbana, e evidenciam que é na cidade que se realiza a regulação, a gestão e a normatização das transformações verificadas nos pontos luminosos do espaço agrícola, sendo um importante propulsor da urbanização (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.149).

Já é possível verificar a importância das atividades terciárias ainda na

década de 1970, diante deste momento de inflexão na economia da cidade, o

qual vai manifestar suas consequências mais marcantes a partir da década

seguinte.

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À dinâmica econômica mossoroense, conduzida pela salinicultura e a

agropecuária, se junta uma nova atividade econômica, a petrolífera, com a

instalação do escritório da Empresa Petróleo Brasileiro S.A. em 1975, para

gerenciar áreas adjacentes à cidade onde se extraía petróleo. Esta atividade

acabou atraindo várias empresas prestadoras de serviços no ramo petrolífero,

e, assim, promoveu a especulação imobiliária, expandiu o setor terciário na

cidade e ampliou o processo de terceirização, tanto de empresas quanto da

mão-de-obra (RÊGO, 2002), sobretudo a partir da década de 1980.

Todas estas atividades intensificaram as transformações

socioespaciais. Diante desta realidade, no ano de 1975 a cidade elaborou seu

primeiro Plano Diretor, na tentativa de solucionar problemas gerados pelo

crescimento desordenado e criar alternativas para o desenvolvimento

mossoroense. Entre suas principais características destacavam-se:

A identificação de zonas homogêneas quanto ao uso do solo; a indicação de eixos de expansão urbana associados ao desenvolvimento econômico; a proposição de um conjunto de intervenções urbanísticas; a formulação de diretrizes setoriais norteadoras das políticas municipais de saúde, entre outras (ELIAS; PEQUENO, 2010, p. 112).

No final da década de 1970 surgiram também vários projetos federais

de melhoria do espaço urbano mossoroense. Entre estes, a construção de

conjuntos habitacionais, a pavimentação e asfaltamento de ruas e avenidas,

como o “Programa de Cidades de Porte Médio”. Estas seriam formas de conter

o problema do desemprego, e já sinalizavam estratégias de preparação da

cidade para desempenhar novas funções, pois, de acordo com Felipe (1982), a

criação de conjuntos habitacionais e de mansões financiadas pela Caixa

Econômica geraria “[...] um mercado de trabalho na construção civil que

objetivava empregar a força de trabalho desempregada [...]” (p.85), enquanto a

pavimentação e asfaltamento da cidade serviriam “[...] para que a mesma

exerça as novas funções, qual seja, a de vender serviços à sua população

urbana e regional” (p.85).

Logo, com a mecanização das salinas, com os incentivos à atividade

agropecuária moderna e a chegada da Petrobras, ocorreram profundas

modificações na estrutura econômica, política e socioespacial de Mossoró, com

uma diversificação do aparelho produtivo. Conforme Elias e Pequeno (2010,

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p.113) enfatizam, “o surgimento de novas atividades produtivas [...] na área de

influência direta da cidade trouxe um novo alento para a economia

mossoroense”, no qual as atividades terciárias mantiveram seu papel

historicamente importante de prestação de serviços na região.

Assim, adentraríamos no terceiro grande momento da periodização

proposta, o qual se estende desde a década de 1980 até hoje e constitui-se

como nosso recorte temporal. O avanço do meio técnico-científico-

informacional, favorecido pela modernização dos transportes e das

comunicações, possibilita a circulação do capital e a conquista de novas áreas

geográficas, e favorece a emergência ou a consolidação de diversos centros

urbanos não metropolitanos, sobretudo na década de 1980, a exemplo de

Mossoró.

A difusão do meio técnico-científico-informacional na cidade promoveu

a ampliação da sua estrutura urbana e regional e o crescimento das suas

atividades econômicas, particularmente do comércio. Este experimenta da

expansão das suas atividades, cada vez mais especializadas, principalmente

com o aumento do consumo de bens e serviços modernos, à instalação de

novos fixos associados às formas modernas de distribuição de mercadorias,

como os supermercados e o shopping center e o estabelecimento de novos

fluxos urbanos e regionais.

Com a reestruturação produtiva ocorrida em décadas anteriores, a

atividade salineira passou por intensa modernização e concentração

econômica. Embora tenha desencadeado um aumento da produtividade, esta

modernização provocou um quadro de desemprego e de grandes

desigualdades socioespaciais.

Nos anos 1980, a atividade petrolífera e seus vários ramos associados

se estabeleceram como verdadeiro marco na economia da cidade, promovendo

impactos socioeconômicos, espaciais e estabelecendo inúmeras

horizontalidades e verticalidades, dada a realização da atividade (ELIAS;

PEQUENO, 2010).

No caso da expansão do agronegócio da fruticultura, as mudanças são

ainda mais profundas, porque, de acordo com Elias e Pequeno (2010, p.135),

esta atividade

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[...] encontra-se no âmago das transformações em curso, não só no espaço agrícola de parte da região polarizada pela cidade de Mossoró. Isto explica parte das mudanças que se processam e já se refletem no uso e ocupação da terra; nos sistemas técnicos agrícolas; na estrutura fundiária; nas relações sociais de produção; no crescimento da urbanização, entre outros.

Além das transformações econômicas acirraram-se as desigualdades

socioespaciais, com a implantação de políticas habitacionais que levaram à

consolidação de áreas de exclusão social e ocupação irregular, gerando na

cidade “[...] novos setores marcados pelo acesso desigual às redes de

infraestrutura urbana, diretamente associados à distribuição de equipamentos

sociais” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.244). Em contrapartida, o processo de

concentração econômica trouxe novas estratégias locacionais, nas quais

surgiram áreas de extrema valorização fundiária e imobiliária, orientando os

vetores de expansão urbana, inclusive relacionados às atividades terciárias.

Tais aspectos, isolados ou articulados entre si, justificam a escolha

destas três últimas décadas para nosso estudo, em especial do comércio. Fator

fundamental a contribuir para a configuração deste cenário econômico e

socioespacial é a questão política, marcada pela forte interferência das elites

locais, não apenas no período enfocado em nosso estudo, mas em toda a

história de Mossoró. Com exceção de uma parte do primeiro momento

econômico (1ª periodização), em todos os períodos estudados a intervenção

das elites políticas locais foi determinante para a conformação econômica,

social e, sobretudo, espacial da cidade. Conforme assevera Felipe (1988, p.15)

Essa burguesia-latifundiária-industrial, tão bem caracterizada em Mossoró, aproveitou as políticas públicas, principalmente aquelas dirigidas para os centros urbanos, e ajeitou a sua máquina de dominação, criando o curral-eleitoral-urbano, sustentado e dominado pelo emprego que essas políticas fizeram chegar aos “centros regionais nordestinos”.

A própria terciarização da economia mossoroense foi, em parte, fruto

da dominação dessas elites e da manipulação, em nível local-regional, da

divisão territorial do trabalho. Além do domínio econômico e político mantido há

aproximadamente um século, estas elites detêm ainda forte influência cultural.

No caso de Mossoró, Felipe (2001, p.25) destaca os Rosados, que

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[...] se colocam como os guardiões da memória da cidade, os “animadores culturais” que, através das festas cívicas, solenidades e outros rituais mantêm o culto aos heróis do passado e ajudam no nascimento dos novos mitos que fazem a luta do tempo presente.

É assim que eles utilizam a memória como instrumento político e

mantêm o controle de grande parte das instituições e do aparelho estatal local

e estadual, optando por novas estratégias de acesso ao poder “através da

força das instituições e das alianças com as oligarquias [...], que polarizam o

Estado” (FELIPE, 2001, p.166).

Para concluir esta primeira etapa, valemo-nos das importantes

contribuições de Corrêa (2007), ao discutir sobre a questão das cidades

médias. Ele enumera três elementos essenciais para a construção de um

quadro teórico sobre cidades médias: a) a presença de uma elite

empreendedora, que “estabelece relativa autonomia econômica e política numa

cidade, criando interesses locais e regionais” (p.29); b) a localização relativa,

por ser a cidade “um lugar central na hierarquia regional, [...] constituindo-se

em foco de vias de circulação e efetivo nó de tráfego, envolvendo pessoas,

capitais, informações e expressiva variedade e quantidade de mercadorias e

serviços” (p.30); e c) as interações espaciais, por meio das quais “[...] a cidade

média conecta-se à rede global de cidades e interações, ainda que outras

interações sejam controladas por grupos externos” (p.30), considerando estas

interações na escala regional e na escala extrarregional (nacional ou

internacional).

Estes elementos são claramente identificados em Mossoró, mas seria

pretensão e imprudência da nossa parte defini-la como uma cidade média com

base apenas nestes três elementos. Ademais, embora intensos debates

estejam sendo promovidos atualmente acerca desta temática urbana de um

modo geral, por pesquisadores que há muito tempo estudam a cidade e o

urbano, ainda não se chegou a um consenso sobre sua definição.

Por uma questão metodológica, passaremos a nos reportar a Mossoró

como sendo um “espaço urbano não metropolitano”, conforme a terminologia

utilizada por Elias e Pequeno (2010). Destes autores, também utilizaremos a

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subdivisão espacial da cidade em cinco grandes zonas53, estabelecida com

base na proximidade com a área central. Segundo os referidos autores, não se

trata de “uma definição de áreas político-administrativas utilizada pelos órgãos

públicos locais, mas o reconhecimento dos bairros que compõem o atual

espaço intraurbano de Mossoró, agrupados segundo sua localização” (ELIAS;

PEQUENO, 2010, p.121).

53 A subdivisão está delimitada da seguinte forma: Zona Central, formada pelos Bairros Centro, Alto da Conceição, Boa Vista, Doze Anos, Bom Jardim, Paredões e Ilha de Santa Luzia; Zona Norte, composta pelos Bairros Santo Antônio, Barrocas, Abolição, Santa Delmira e Redenção; Zona Leste, formada pelo Alto de São Manoel, Pintos, Costa e Silva, Dom Jaime Câmara e Rincão; Zona Sul, com os Bairros de Alagados, Planalto Treze de Maio, Alto do Sumaré, Bom Jesus, Belo Horizonte, Itapetinga e Lagoa do Mato; e Zona Oeste, composta pelos Bairros Aeroporto, Dix-Sept Rosado e Nova Betânia.

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Mapa 2: Mossoró. Subdivisão por bairros e zonas

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88

2 REORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES COMERCIAIS EM

MOSSORÓ – RN

Após uma análise do cenário mundial que permitiu a incorporação do

Brasil na nova divisão internacional do trabalho, pudemos compreender o

contexto no qual se deu a urbanização do país, com o surgimento de grandes

metrópoles e, mais recentemente, com a incorporação de espaços urbanos não

metropolitanos à divisão interregional do trabalho. Tais mudanças despertaram

a necessidade de entendermos os novos processos urbanos nas diversas

regiões do Brasil, considerando que cada lugar responde de uma forma

diferente a esta divisão.

No capítulo anterior delineamos a evolução da economia de Mossoró,

na tentativa de informar ao leitor um panorama do desenvolvimento histórico da

cidade. Neste momento, faremos uma apresentação mais pormenorizada do

nosso objeto de estudo, com destaque para o período após a década de 1980,

nosso recorte temporal, mediante exposição e análise de dados referentes à

evolução do terciário na cidade, tanto no número de estabelecimentos quanto

no número de trabalhadores formais.

Porém, para percebermos como se deu a evolução destes quadros na

cidade, iniciaremos nossa análise acerca das informações demográficas e

econômicas mossoroenses tomando como referência o período desde a

década de 1970 até meados dos anos 2000, no intuito de verificar a evolução

dos dados para a cidade, apontando suas principais características, assim

como sua relevância regional. Desta forma, com base em dados estatísticos e

qualitativos, descobriremos um novo perfil no terciário mossoroense, com a

atuação de agentes econômicos nacionais e internacionais que se instalam na

cidade e alteram a dinâmica do consumo consuntivo54.

2.1 O CONTEXTO DAS MUDANÇAS

Conforme o estudado, Mossoró possui uma região de influência bem

ampla e historicamente é definida pela intensa atividade comercial e de

serviços. A cidade inserira-se na divisão interregional do trabalho, sobretudo a

54 Também pode ser chamado de consumo consumptivo.

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partir da década de 1930, à medida que a região Centro-Sul do país se

industrializava e necessitava de matérias-primas para sua produção. Nas

décadas de 1970 e 1980 o Brasil, e particularmente Mossoró, vivenciaram

profundas transformações como, por exemplo: a população deixou de morar

majoritariamente no campo e passou a residir nas cidades; grande quantidade

de pessoas passou a trabalhar, formal e informalmente, em atividades

associadas ao comércio e aos serviços; tecnologias foram cada vez mais

inseridas no processo produtivo; surgiram novas formas comerciais e houve

uma mudança dos padrões de consumo, entre outras.

Todos estes fatores são importantes para a compreensão do cenário

econômico atual de Mossoró no tocante às atividades terciárias, em especial as

comerciais, pois a associação desses concorreu para dinamizá-las

diretamente. Além disso, a diversificação da economia mossoroense também

contribuiu para o cenário de mudanças, pois com a extração e beneficiamento

do sal, o agronegócio da fruticultura tropical e a exploração do petróleo e do

gás natural, as atividades comerciais e de serviços ganharam ainda mais

relevância, com a aceleração do consumo produtivo55. Nas palavras de Santos

(2005, p.55), existe uma

[...] superposição dos efeitos do consumo consuntivo e do consumo produtivo, contribuindo para ampliar a escala da urbanização e para aumentar a importância dos centros urbanos, fortalecendo-os, tanto do ponto de vista demográfico quanto do ponto de vista econômico, enquanto a divisão do trabalho entre cidades se torna mais complexa.

Deste modo, apresentaremos sucintamente o cenário mossoroense a

partir da década de 197056, por meio de informações gerais sobre a cidade e

sobre sua economia, cujos dados estão dispostos para o período entre 1970 e

201057.

55 Sobre o consumo produtivo inerente à agropecuária, ver Elias (2003). Sobre o consumo produtivo em Mossoró podem ser vistos os seguintes trabalhos: Elias; Pequeno (2010) e SANTOS, Camila Dutra dos. Difusão do consumo produtivo: reflexos na economia urbana de Mossoró (RN). Fortaleza, 2010. 265p. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Geografia) – Universidade Estadual do Ceará, sob orientação da profa. dra. Denise Elias. 56 Na tentativa de ratificar o momento de inflexão econômica e demográfica de Mossoró após a década de 1980, optamos por incluir na análise um período anterior (1970). Assim, esperamos demonstrar mais claramente as grandes mudanças verificadas na cidade. 57 A escolha dos anos de 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010 justifica-se pela realização do censo demográfico nestes anos, facilitando a disponibilidade das informações.

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Conforme percebemos, da década de 1970 até o ano de 2010 houve

um expressivo crescimento populacional em Mossoró, equivalente a 167%

(tabela 21). Tal fato vem acompanhando a tendência demográfica nacional,

embora esta venha crescendo em ritmo desacelerado, devido a fatores como a

redução das taxas de natalidade em virtude da popularização do uso de

métodos contraceptivos; a entrada da mulher no mercado de trabalho e sua

busca por estabilidade profissional, com reflexos na estrutura familiar e no

próprio crescimento vegetativo; migrações, entre outros aspectos.

Aliado às novas formas de produção e de consumo, o aumento da

população repercute diretamente na economia e nas demais dimensões da

sociedade, sendo um fator decisivo para o desenvolvimento das atividades

comerciais.

Tabela 20: Mossoró. População residente total. 1970 a 2010

Unidade Espacial

População residente

1970 1980 1991 2000 2010 Mossoró 97.245 145.981 192.267 213.841 259.886

Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 21: Mossoró. Variações absolutas e relativas da população residente total. 1970 a 2010

Unidade Espacial

Variação absoluta Variação relativa (%)

1970-1980

1980-1991

1991-2000

2000-2010

1970-2010

1970-1980

1980-1991

1991-2000

2000-2010

1970-2010

Mossoró 48.736 46.286 21.574 46.045 162.641 50 32 11 22 167 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Consoante revela a análise da distribuição da população mossoroense

na área urbana e rural, o contingente demográfico urbano tornou-se maior a

cada década (tabelas 22, 23, 24 e 25). Em especial, as mudanças econômicas

ocorridas nas décadas de 1970, 1980 e 1990 constituíram poderoso fator de

atração populacional para a cidade, em face do crescimento por esta

apresentado, e da maior possibilidade das pessoas conseguirem trabalho.

Além disso, o período de seca prolongado de fins da década de 1970 até início

dos anos 1980, juntamente com a modernização das atividades e o

crescimento econômico nas décadas de 1990 e 2000 estimularam o êxodo

rural.

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Tabela 22: Mossoró. População urbana e rural na população residente total. 1970 a 2010

Unidade Espacial

População residente

1970 1980 1991 2000 2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Mossoró 79.302 17.943 122.936 23.045 177.331 14.936 199.081 14.760 237.281 22.605 Total 97.245 145.981 192.267 213.841 259.886 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 23: Mossoró. Variação absoluta da população urbana e rural. 1970 a 2010

Unidade Espacial

Variação absoluta

1970-1980 1980-1991 1991-2000 2000-2010 1970-2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Mossoró 43.634 5.102 54.395 -8.109 21.750 -176 38.200 7.845 157.979 4.662 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 24: Mossoró. Variação relativa da população urbana e rural. 1970 a 2010

Unidade Espacial

Variação relativa (%)

1970-1980 1980-1991 1991-2000 2000-2010 1970-2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural

Mossoró 55 28 44 -35 12 -1 19 53 199 26 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 25: Mossoró. Participação percentual da população urbana e rural na população

residente total. 1970 a 2010

Unidade Espacial

Participação (%) 1970 1980 1991 2000 2010

Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Mossoró 82 18 84 16 92 8 93 7 91 9 Total 100 100 100 100 100 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Todavia, “reconhecer uma parcela do território como urbana porque

nela se observam determinados níveis de densidade habitacional, pode ser um

ponto de partida, mas nunca o ponto de chegada para a análise” (SPOSITO,

2006a, p.113). Portanto, gostaríamos de destacar uma questão essencial a ser

considerada também nas análises sobre este aumento da população urbana:

as relações cidade-campo58. Ainda conforme a autora, ao refletir sobre o tema,

“a urbanização é um processo muito mais complexo e não pode ser reduzido à

58 Para mais informações sobre o tema, ver: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; WHITACKER, Arthur Magon (orgs.). Cidade e campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006.

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sua dimensão populacional, razão pela qual a questão cidade-campo merece

ser vista à luz de outras perspectivas” (SPOSITO, 2006a, p.114).

Sposito (2006a) estuda as relações campo-cidade com base em

atributos associados à cidade, quais sejam, a concentração demográfica, a

diferenciação social e a unidade espacial e a partir deles aponta alguns fatos

que reforçam as articulações entre cidade e campo. São eles: a extensão do

perímetro urbano para áreas até então consideradas rurais, “transformando

terras rurais em terras urbanas” (p.124); o papel dos transportes e das

tecnologias de comunicação na redefinição de morfologias espaciais (p.125); e

a dimensão temporal das dinâmicas em pauta (p.126). Deste modo, a autora

apresenta uma perspectiva interessante para a análise da urbanização e do

aumento populacional urbano nas cidades brasileiras.

Elias e Pequeno (2010) também abordam as relações entre cidade-

campo, tomando como exemplo a cidade de Mossoró a partir da difusão do

agronegócio globalizado, o qual, segundo os autores,

[...] explica, em parte, também a mudança dos conteúdos do urbano, ou seja, mudaram os papéis desempenhados pelas cidades, complexificando-os e isso, por sua vez, muda os valores sociais e culturais que orientam a vida urbana de Mossoró e área sob sua influência (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.148).

No contexto de mudanças nas atividades comerciais, observaremos a

evolução da População Economicamente Ativa em Mossoró (tabelas 26, 27 e

28), por meio da qual poderemos identificar o desenvolvimento da economia,

partindo de dados mais gerais e chegando a um detalhamento por setor de

atividade, segundo classificação do IBGE59.

Em Mossoró, consoante verificamos, a PEA vem numa crescente

desde a década de 1960 até os anos 2000: passou de 14.948 pessoas em

1960, para 88.590, em 2000, o equivalente a um crescimento de 493% em

quatro décadas.

De todo o período analisado, destacamos os momentos de 1970 a

1980 e de 1980 a 1991, pois foi justamente nestas duas décadas que Mossoró

experimentou dos maiores índices de crescimento, tanto absolutos quanto

relativos. De acordo com os dados, no primeiro decênio analisado houve um 59 Os dados sobre a PEA de Mossoró só estavam disponíveis no IPEA/DATA até o ano de 2000, motivo pelo qual não incluímos o ano de 2010.

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aumento de 108% na PEA mossoroense, acumulando no período subsequente

um saldo positivo de 55% (tabela 27).

Quanto à participação da PEA no total da população residente do

município, no ano de 1960 era de 26% e no período seguinte caiu para 23%.

Fatores como a diminuição das taxas de natalidade, a mecanização das salinas

e a modernização na agricultura irrigada podem indicar processos que

possivelmente corroboraram para este decréscimo. Contudo, a partir da

década de 1970 houve uma retomada do seu crescimento, passando a

representar 32%, 37% e 41% do total da população, respectivamente, para os

anos de 1980, 1991 e 2000 (tabela 28).

Tabela 26: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA). 1960 a 2000

Mossoró 1960 1970 1980 1991 2000

PEA 14.948 22.180 46.064 71.385 88.590

Total 57.690 97.245 145.981 192.267 213.841 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 27: Mossoró. Variações absolutas e relativas da População Economicamente Ativa

(PEA). 1960 a 2000

Mossoró Variação absoluta Variação relativa (%)

1960-1970

1970-1980

1980-1991

1991-2000

1960-2000

1960-1970

1970-1980

1980-1991

1991-2000

1960-2000

PEA 7.232 23.884 25.321 17.205 73.642 48 108 55 24 493 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Tabela 28: Mossoró. Participação da População Economicamente Ativa (PEA) no total da

população residente. 1960 a 2000

Mossoró Participação no total (%)

1960 1970 1980 1991 2000

PEA 26 23 32 37 41

Total 100 100 100 100 100 Fonte: IPEA/DATA. Elaboração da autora (2010).

Diante da evolução da PEA, buscamos identificar esse crescimento por

setores de atividades, segundo a classificação do IBGE e, conforme

constatamos, esta parte da população concentrou-se nas atividades

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associadas ao terciário econômico. Apresentaremos a seguir os dados para os

anos de 1970, 1980 e 199160, dispostos nas tabelas 29, 30 e 31.

Para cada uma das décadas estudadas verificamos o predomínio de

determinado setor de atividade: em 1970, a PEA nas atividades associadas ao

setor primário da economia como agricultura, pecuária etc. predominava em

Mossoró, com 5.690 pessoas, passando a 8.600 em 1980 e 4.943, em 1991

(tabela 29). Como notamos, entre 1970 e 1980 houve um aumento da PEA no

setor de 51%, enquanto no período seguinte, de 1980 a 1991, houve uma

queda de 43% (tabela 30). Assim, a participação da PEA do setor no total era

mais representativa em 1970, com 26%, cai consideravelmente após duas

décadas, e chega a apenas 7% do total em Mossoró (tabela 31).

Este efeito pode ser explicado pelas mudanças econômicas verificadas

na cidade e sua região de influência na época, com a implantação de vários

projetos agrícolas e a modernização da agricultura, na qual a intervenção

estatal caracterizou-se como o “principal agente produtor do espaço agrícola da

região sob influência de Mossoró” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.139). Como os

autores afirmam,

[...] a partir da década de 1980, quando a produção intensiva de frutas tropicais passou a ocupar alguns dos espaços agrícolas de reserva no Nordeste, o baixo curso do rio Açu passou a receber investimentos produtivos, dinamizando a agricultura comercial, corroborando para o avanço do capitalismo no campo (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.135).

Já no setor industrial, a PEA é de 5.203 pessoas em 1970, 11.682, em

1980 e 16.055 pessoas no ano de 1991. Tais dados revelam um aumento de

125% no primeiro decênio estudado, e de 209% em todo o período

considerado para análise. Ou seja, a participação da PEA deste setor

permanece relativamente estável, entre 22% e 25% do total, de 1970 a 1991.

Em sua maioria, as atividades industriais em Mossoró estiveram

associadas ao aproveitamento e beneficiamento de recursos naturais regionais,

tendo “na atividade agropecuária ou extrativa sua principal fonte de matéria-

prima, ou antes, surge exatamente visando à exploração e beneficiamento

desses recursos” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.171).

60 Os dados para os anos de 1960 e 2000 não estavam disponíveis nas bases de dados do IBGE nem nas do IPEA.

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Entre os demais setores, destacamos o de comércio de mercadorias e

prestação de serviços, os quais, juntos, respondem pela maior parte da PEA.

Em 1970, estes setores foram responsáveis por 5.848 pessoas, em 1980 por

13.605, e em 1991 por 25.442 pessoas, correspondendo, somente neste ano, a

35% do total. Esta participação mantém um crescimento constante, com 27% e

30% do total, para os anos de 1970 e 1980, respectivamente.

Com o incremento na produção em virtude do desenvolvimento

industrial no país, consequentemente expandiram-se o comércio e os serviços

da cidade, num momento em que o consumo cresce mundialmente. O

dinamismo proporcionado pelo desenvolvimento das atividades salineira, do

agronegócio e do ramo de petrolíferos, levando em conta suas densidades

históricas diferenciadas, contribuiu para a elevação da média salarial e,

somado ao crescimento populacional, “acabaram por propiciar o surgimento de

um número de casas de comércio e de estabelecimentos que oferecem

serviços especializados, alguns bastante modernos, antes restritos às

principais capitais do país” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.195).

Tabela 29: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991

Setores de atividades 1970 1980 1991

Agricultura, pecuária, silvicultura, extração vegetal, caça e pesca 5.690 8.600 4.943

Atividades industriais 5.203 11.682 16.055

Comércio de mercadorias 2.820 6.313 10.823

Prestação de serviços 3.028 7.292 14.619

Transportes, comunicações e armazenagem 1.940 2.019 3.219

Atividades sociais 1.147 5.201 10.757

Administração pública 832 1.460 2.394

Outras atividades 1.520 577 943 População economicamente inativa/Procurando trabalho - 2.920 7.632

Total 22.180 46.064 71.385 Fonte: IBGE. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 30: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991

Setores de atividades

Variação absoluta Variação relativa (%) 1970-1980

1980-1991

1970-1991

1970-1980

1980-1991

1970-1991

Agricultura, pecuária, silvicultura, extração vegetal, caça e pesca

2.910 -3.657 -747 51 -43 -13

Atividades industriais 6.479 4.373 10.852 125 37 209

Comércio de mercadorias 3.493 4.510 8.003 124 71 284

Prestação de serviços 4.264 7.327 11.591 141 100 383 Transportes, comunicações e armazenagem

79 1.200 1.279 4 59 66

Atividades sociais 4.054 5.556 9.610 353 107 838

Administração pública 628 934 1.562 75 64 188

Outras atividades -943 366 -577 -62 63 -38 População economicamente inativa/Procurando trabalho

- 4.712 - - 161 -

Total 23.884 25.321 49.205 108 55 222 Fonte: IBGE. Elaboração da autora (2010).

Tabela 31: Mossoró. População Economicamente Ativa (PEA), por setores de atividades segundo o IBGE. 1970 a 1991

Setores de atividades Participação da PEA no total

(%) 1970 1980 1991

Agricultura, pecuária, silvicultura, extração vegetal, caça e pesca

26 19 7

Atividades industriais 23 25 22

Comércio de mercadorias 13 14 15

Prestação de serviços 14 16 20 Transportes, comunicações e armazenagem

9 4 5

Atividades sociais 5 11 15

Administração pública 4 3 3

Outras atividades 7 1 1 População economicamente inativa/Procurando trabalho

- 6 11

Total 100 100 100 Fonte: IBGE. Elaboração da autora (2010).

De posse destas informações, suscitamos uma discussão inerente ao

contexto das mudanças no terciário em Mossoró, em especial nas atividades

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de serviços. Devemos estabelecer as relações imbuídas no desenvolvimento

destas atividades entendendo os fatores que contribuíram para as

transformações da cidade e da sua economia, cujas respostas são encontradas

em processos ocorridos fora da cidade, associados à expansão capitalista e à

globalização.

A função histórica da cidade como centro de serviços e mercadorias foi

facilitada, segundo Felipe (1982), pela sua forte influência regional, pela

deficiência na estrutura de serviços das cidades circunvizinhas e pela

dependência comercial a que estas cidades estavam submetidas, confirmando

a hipótese segundo a qual “a função dessas cidades, qualitativas e

quantitativamente intermediárias, é a de proporcionar serviços de nível médio e

produtos mais diversificados do que podem vender as cidades locais”

(SANTOS, 1979, p.50).

Entretanto, com a reestruturação produtiva, as novas tendências da

urbanização, o estabelecimento de novas hierarquias urbanas, o advento do

meio técnico-científico-informacional, a modernização das atividades

produtivas, a maior interdependência entre os setores econômicos etc., as

funções e o conteúdo das atividades terciárias e das cidades foram redefinidos,

levando ao estabelecimento do definido por Kon (2004, p. xiv) como “economia

de serviços”, pois, na ótica da autora, este termo “[...] abre o caminho para a

percepção sobre o relevante papel dessas atividades na geração da renda e

riqueza das economias na modernidade”.

Em todo seu trabalho a autora discute as transformações verificadas no

setor de serviços, desde sua modernização tecnológica, os novos modelos

administrativos e organizacionais das empresas, os processos de terceirização,

a internacionalização dos serviços, até a questão do desenvolvimento desta

atividade e do seu caráter indutor [do] ou induzido [pelo] desenvolvimento

econômico. Todavia, Kon (2004, p.64) atenta para as diferenças dos impactos

do crescimento do setor e das suas implicações sobre as estruturas produtivas,

que dependem

[d]o nível de desenvolvimento econômico das economias e [d]a capacidade de aumentar os investimentos na modernização tecnológica e na qualificação da força de trabalho, a fim de enfrentar as necessidades de novas tarefas técnicas dos processos modernos de produção e organizacionais.

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Especificamente no Brasil, como sugerem Proni, Silva e Oliveira (2005,

p.95), a economia “foi conduzida pela trilha da modernização acelerada por

intermédio da abertura comercial, da valorização cambial e da pressão da

concorrência estrangeira”, e esta estratégia alcançou todos os setores

econômicos.

Na tentativa de aumentarem a competitividade interna e internacional,

adequando-se ao acelerado progresso tecnológico e de globalização

econômica, as empresas iniciaram um processo de reestruturação tecnológica

e organizacional, com a introdução da informática e a eliminação de níveis

hierárquicos gerenciais, resultando numa diminuição considerável de

empregos, sobretudo nas atividades industriais.

Em contrapartida, a estrutura empresarial contemporânea também

criou novas demandas de consumo e de serviços complementares, ao

estimular setores exigentes de intensa modernização e especialização

profissional, bem como setores nos quais se utilizam tecnologias menos

avançadas e com menor qualificação, fortalecendo as atividades terciárias de

modo geral e desencadeando a “economia de serviços” (KON, 2004). No

entanto, não podemos esquecer: o crescimento dos serviços é parte integrante

do modo de produção capitalista e está diretamente relacionado à divisão

internacional, territorial e social do trabalho (JIMÉNEZ; UTRILLA, 1992).

Neste âmbito, a introdução de inovações tecnológicas, organizacionais

e gerenciais nas atividades terciárias gerou um maior número de trabalhadores

intelectuais, isto é, associados a funções técnicas e administrativas, com maior

qualificação profissional. Santos (1992, p.38) declara:

Graças ao trabalho intelectual, conhecemos a expansão e transformação qualitativa do fenômeno da terciarização da economia e do emprego, que conduz, entre outros resultados, a uma urbanização galopante, tanto mais concentrada quanto os capitais, na forma de instrumentos de trabalho, são fixos e volumosos.

Grande parte destes trabalhadores contribuiu para a composição da

crescente classe média nacional, cada vez mais presente nos espaços urbanos

não metropolitanos, sendo “indispensáveis a uma produção material, industrial

e agrícola, que se intelectualiza” (SANTOS, 2005, p.60). À medida que essa

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classe intelectual cresce, intensifica-se o aparecimento de sistemas de objetos

e sistemas de ações (SANTOS, 2008b), os quais interagem, dinamizam e

transformam o espaço. Conforme explica Santos (2008b, p.63), “de um lado, os

sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de outro

lado, o sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se realiza sobre

objetos preexistentes”.

É desta forma que o capital se territorializa nas mais diversas regiões

do país e promove uma diferenciação espacial, caracterizada pela “diferente

capacidade de oferecer rentabilidade aos investimentos” (SANTOS, 2008b,

p.247), maior ou menor de acordo com as condições técnicas e organizacionais

de cada lugar.

Tais diferenças acabam gerando uma competitividade espacial,

denominada por Santos e Silveira (2002) de guerra dos lugares, onde há uma

especialização das áreas produtivas com vistas à maior atração de capitais,

que conduz ao acirramento da divisão do trabalho e à intensificação das

relações dos lugares com sua hinterlândia e com o mundo globalizado.

Na afirmação de Harvey (2007, p.266), “a produção ativa de lugares

dotados de qualidades especiais se torna um importante trunfo na competição

espacial entre localidades, cidades, regiões e nações”. Este fato estimula a

internacionalização econômica, cultural, política e, sobretudo, do capital,

levando à concentração de mercados, à consolidação de oligopólios. Desse

modo, acelera o processo de difusão das inovações, da informação e do

consumo e, por conseguinte, as redefinições socioespaciais.

Inegavelmente, as redefinições das divisões do trabalho, regionais ou

internacionais, tiveram consequências distintas em cada lugar, em particular

nas cidades médias. Conforme Sposito (2007a, p.239-240) esclarece

As cidades médias têm seus papéis alterados nesse processo e têm, em função de situações geográficas mais ou menos favoráveis e atraentes aos investimentos externos e de iniciativas de atores locais e regionais, maior ou menor capacidade de se integrarem de forma mais ampla às novas formas de configuração de relações em múltiplas escalas.

Em Mossoró, percebemos estas mudanças no terciário com mais

clareza ao observarmos as atividades de serviços associadas ao agronegócio e

às empresas que prestam serviços à Petrobras, pois agregam maiores

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investimentos e inovações tecnológicas, e têm seus centros de controle e

decisão em outras localidades, do país e do mundo.

No entanto, a modernização tecnológica não promoveu transformações

no terciário apenas em atividades vinculadas aos grandes setores modernos ou

ao mercado de trabalho formal. Expressiva parcela da população ficou à

margem deste processo, cuja sobrevivência se encontra em atividades

comerciais e de serviços de baixa remuneração e baixo progresso tecnológico,

mas foram fortemente responsáveis pelos ajustamentos do mercado de

trabalho nos serviços, através dos trabalhadores informais e da crescente

precariedade nas condições de trabalho (KON, 2004).

Portanto, além de redefinições tecnológicas, organizacionais e

espaciais, verifica-se um quadro de desigualdades socioeconômicas, onde uma

minoria possui rendas bem elevadas e a grande massa da população tem

rendas baixas, ou até mesmo, nenhuma renda fixa. Logo, o acesso ao

consumo é quantitativa e qualitativamente diferenciado, causa e efeito da

conformação de dois circuitos de produção, distribuição e consumo dos bens e

serviços (SANTOS, 1977, 2003, 2004).

Um dos circuitos é o resultado direto da modernização tecnológica. Consiste nas atividades criadas em função dos progressos tecnológicos e das pessoas que se beneficiam deles. O outro é igualmente um resultado da mesma modernização, mas um resultado indireto, que se dirige aos indivíduos que só se beneficiam parcialmente ou não se beneficiam dos progressos técnicos recentes e das atividades a ele ligadas (SANTOS, 2004, p.38).

Inicialmente, esta teoria dos dois circuitos, um superior e um inferior, foi

formulada para compreender o funcionamento das cidades e das suas relações

interurbanas nos países subdesenvolvidos a partir da modernização

tecnológica. No entanto, com o intenso ritmo da modernização e a redefinição

de atividades antes associadas ao campo, a exemplo do agronegócio,

poderíamos fazer uma releitura desta teoria para tentar explicar os novos

processos econômicos, políticos e socioespaciais engendrados nas relações

cidade-campo. Esta é uma questão a ser pensada, contudo, não é o propósito

deste trabalho. Retomemos, pois, a questão da modernização tecnológica e a

“economia de serviços”.

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Neste sentido, conforme percebemos, a evolução das atividades

terciárias está bastante ligada à modernização tecnológica, embora este não

seja o único fator relevante no processo. Foi ela que, de certo modo, facilitou a

ampliação do terciário, à medida que: promoveu melhorias nos sistemas de

transportes e comunicações pelo país, ao favorecer a difusão da informação e

do consumo; proporcionou a utilização de inovações tecnológicas nas

atividades produtivas, ao aumentar sua produtividade e diminuir, em muitos

casos, a mão-de-obra empregada; modernizou o próprio terciário, ao alargar

sua integração com os outros setores econômicos; aumentou as disparidades

socioeconômicas, pois a modernização é bastante seletiva e marginaliza parte

da população, gerando uma grande massa de trabalhadores com renda mínima

e diferenciando o acesso ao consumo etc.

Como revela a inserção de Mossoró nesta conjuntura, sobretudo a

partir da década de 1980, “essa economia de serviços passa a preponderar no

contexto econômico de Mossoró, não só pela dinamização do comércio e pela

criação e fortalecimento de uma estrutura de serviços, mas também pela

fragilidade do setor secundário [...]” (FELIPE, 1982, p.106), já que este não

acompanhou os processos de modernizações.

Tal fato implica o aumento das desigualdades sociais, econômicas e

espaciais, particularmente no terciário. Embora existam atividades modernas

neste setor, várias delas ainda estão muito aquém no quesito modernização,

pois como mostram nossas inúmeras entrevistas e trabalhos de campo, e

consoante constatamos, grande parte dos trabalhadores em atividades

comerciais e de serviços em Mossoró não tem acesso às inovações

tecnológicas. Isto se explica pela falta de qualificação profissional, bem como

pela dificuldade de obtenção de capital, pois muitos trabalhadores são

procedentes de áreas rurais do município e de outros, e em face das precárias

condições de trabalho e de sobrevivência em suas localidades de origem,

foram atraídos pelo desenvolvimento econômico da cidade.

Em virtude de em cidades menores as atividades comerciais e de

serviços terem maior expressividade, muitos migrantes já dominavam

habilidades nas atividades do setor, facilitando sua inserção no mercado de

trabalho mossoroense, embora na informalidade. Esta atividade possibilita

também certo nível de promoção social, pois os trabalhadores têm a

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expectativa de ampliarem seus negócios e melhorarem suas condições de

vida.

Outro ponto a frisar nesta análise da expansão dos serviços é o

consumo. Como afirmam Jiménez e Utrilla (1992, p.43), “un factor

imprescindible para el crecimiento de los servicios es la ampliación del tiempo

libre para su consumo; de ello se encarga la tecnologia”. Destarte, a difusão do

consumo e sua força ideológica e material (SANTOS, 1998) foram

fundamentais para o crescimento dos serviços, por proporcionar a geração

contínua de necessidades, muitas vezes supérfluas, e se transformar, inclusive,

em exigência constante de diferenciação social (RETONDAR, 2007).

Em continuação, apresentaremos o panorama no qual as atividades

comerciais passaram a ter maior destaque na economia da cidade, sobretudo

nas três últimas décadas. Nosso enfoque se dará mediante informações sobre

a evolução do número de estabelecimentos e de trabalhadores formais no

contexto dos demais setores econômicos, sem desconsiderar as características

de cada um deles, partindo da ótica de expansão do consumo.

2.2 A EXPANSÃO DO CONSUMO E O CRESCIMENTO ECONÔMICO

A compreensão espacial perpassa as várias instâncias da produção,

sendo o consumo uma destas dimensões (SANTOS, 1992), indispensável em

nossa análise sobre o comércio. Nas últimas décadas, a expansão do consumo

propiciou o surgimento de um novo perfil de consumidor no país e alavancou

as atividades terciárias de modo geral. Fatores como o aumento da renda, do

emprego e do crédito são apontados como fomentadores deste fenômeno

“consumista” no país61.

No entanto, no entendimento de Padilha (2006, p.85), o consumo não

pode ser visto como um momento autônomo: ele é determinado pelo complexo

processo constitutivo dos desejos humanos ou pela lógica da produção, isto é,

61 STEFANO, Fabiane. Consumo, a força que move a economia. Revista EXAME, ano 44, n.13, edição 972, p.20-29, 28/7/2010. Disponível em: http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0972/noticias/consumo-a-forca-que-move-a-economia. Acesso em: 7/12/2010.

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do lucro, no qual a publicidade atua diretamente sobre os indivíduos como

consumidores, manipulando-os comercialmente e culturalmente.

Santos (1998), ao discutir sobre a questão do consumo, salienta o

papel perverso deste na vida coletiva e na formação do caráter das pessoas.

Neste sentido, caracteriza-o pela sua capacidade de alienação, por fomentar o

individualismo e por aniquilar a personalidade do indivíduo perante a

coletividade, homogeneizando bens, serviços e gostos, mediante imposições

da moda, descrita pelo autor como a “manivela do consumo”.

Deste modo, esta questão tornou-se interessante para a compreensão

do movimento da sociedade, revelando os novos padrões de produção,

circulação, distribuição e, obviamente, do próprio consumo. De acordo com

Retondar (2007), a expansão do consumismo serviria de base simbólica para a

expansão do capitalismo e da sociedade de consumo de massa, que durante o

século XX, se tornou o epicentro do desenvolvimento mercantil.

Sendo o consumo uma das etapas do processo produtivo, ele é

imediatamente produção (MARX, 2008). No momento em que as cidades se

constituíram como centros da produção, da distribuição, da circulação e do

consumo, favoreceram a difusão generalizada da informação e das práticas

consumistas e ofereceram maior mobilidade ao capital, dinamizando o

comércio e os serviços. Logo, o consumo ajudou a redefinir os papéis

desempenhados pelas cidades e a transformar profundamente as relações

sociais, em virtude de possuir poder ideológico contagiante e sua “[...]

capacidade de alienação é tão forte que a sua exclusão atribui às pessoas a

condição de alienados. Daí a sua força e o seu papel perversamente motor na

sociedade atual” (SANTOS, 1998, p.34).

Assim, a difusão do consumo acabou tornando-se um ponto de

interseção entre as diversas escalas geográficas, e assume as mais variadas

formas: mediante o acirramento da divisão social e territorial do trabalho; o

surgimento de novos agentes econômicos; redefinições de antigas práticas

comerciais, que agora coexistem com novas formas de comércio; o aumento

das desigualdades socioespaciais etc. Este quadro é generalizado, e atinge

não somente as metrópoles, mas também os espaços urbanos não

metropolitanos, a exemplo de Mossoró.

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De modo geral, o crescimento do consumo implica diretamente o

aumento do número de estabelecimentos e de trabalhadores nas atividades

comerciais e de serviços das cidades. Vejamos, pois, a evolução do setor

comercial em Mossoró a partir de uma análise dos dados relativos à

quantidade de estabelecimentos, tomando como referência os anos de 1985,

1995 e 200562.

Na tentativa de destacar a relevância desta atividade, mostraremos os

dados para cada setor econômico da cidade, segundo a classificação do IBGE,

a saber: agropecuária, indústria, construção civil, comércio e serviços. Com

base nestes dados, podemos entender o momento de transição da economia

mossoroense, com transformações em cada setor econômico, que culminam

no fortalecimento e expansão do setor terciário na cidade, especialmente do

comércio.

A agricultura, cuja modernização iniciou-se no país na década de 1960,

e no Nordeste nas décadas de 1970 e 1980, passa por um momento de

grandes reestruturações na década de 1980. Diversas políticas

governamentais implementadas em Mossoró ajudaram a disseminar e

consolidar o agronegócio no município, que recebera incentivos privados na

década de 1990 e fora inserido num “novo modelo de irrigação”, voltado para o

agronegócio globalizado (ELIAS, 2002a, 2002b, 2003, 2006a, 2006b; ELIAS;

PEQUENO, 2010). Para os autores, ainda na década de 1980,

se intensifica o processo de territorialização do capital no campo, com a chegada de grandes capitais, nacionais e multinacionais, implantando a fruticultura em moldes empresariais. Desde então, promovem, com grande velocidade, a reorganização produtiva do território (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.139).

Os estabelecimentos comerciais e de serviços voltados ao consumo

produtivo da atividade localizam-se sobremodo no Centro e na BR-304,

principal rodovia de acesso à cidade, e têm abrangência de mercado não

apenas em Mossoró, mas também em toda região produtiva sob sua influência.

Os maiores serviços são de consultorias para pesquisa agropecuária, sistema

62 Os dados foram obtidos na Relação Anual de Informações Sociais, base de dados do Ministério do Trabalho e Emprego. Selecionamos estes anos para análise em virtude da disponibilidade dos dados pela RAIS e a possibilidade de percepção da evolução da atividade nas últimas décadas.

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de irrigação e comércio exterior, importação e exportação (ELIAS; PEQUENO,

2010).

Incentivado nos anos 1960 e 1970, o setor industrial continuou

crescendo nas décadas seguintes. Nos primeiros anos de 1980 o governo do

Estado do Rio Grande do Norte priorizou o setor secundário da economia em

suas estratégias de crescimento para aproveitar o potencial de matérias-primas

locais. Assim, em 1982, a Companhia de Desenvolvimento Industrial, órgão

vinculado à Secretaria da Indústria e Comércio, implantou o Programa de

Áreas Industriais e Desconcentração Espacial, o qual consolidou os Distritos

Industriais de Natal, de São Gonçalo do Amarante e de Mossoró, promovendo

uma expansão do setor com a instalação de várias indústrias na cidade

(PINHEIRO, 2006).

De 1985 a 2005 o número de estabelecimentos aumentou em 486%

(tabela 32). Ainda na década de 1980, a maioria destas indústrias era de

pequeno e médio porte, associadas ao desenvolvimento do setor terciário, tais

como alimentícia, construção civil e metalurgia, localizadas, particularmente,

nas áreas centrais da cidade (PINHEIRO, 2006). Atualmente, os principais

ramos industriais na cidade estão associados à indústria de transformação

(beneficiamento de caju, produção de óleos vegetais e industriais, farinha de

milho e derivados, sucos de frutas etc.) e à indústria de extração mineral

(ELIAS; PEQUENO, 2010).

O setor da construção civil foi bastante beneficiado pelo processo de

expansão urbana da cidade, através de obras públicas e privadas desde a

década de 1970 e, sobretudo, nos anos 2000, com vistas a adaptar a cidade à

nova e intensa dinâmica econômica adquirida nas últimas décadas. Este ramo

experimentou elevado crescimento a partir da década de 1980, como podemos

verificar nas tabelas 32 e 33.

Entretanto, o avanço mais significativo se deu entre os anos de 1995 e

2005, com a presença de 370 estabelecimentos na construção civil (tabela 32).

Tal quadro pode ser explicado pelas inúmeras obras realizadas pela

administração pública, especialmente de infraestrutura, equipamentos urbanos,

construção de unidades habitacionais etc.; e também pela iniciativa privada,

com a construção de edifícios residenciais e comerciais e de condomínios

fechados, verticais e horizontais (PINHEIRO, 2006; ELIAS; PEQUENO, 2010).

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O crescimento da atividade da construção civil demonstra a expansão das infraestruturas, de muitos novos fixos artificiais, que estão sendo construídos em espaços antes menos rugosos, diminuindo o meio natural e aumentando o percentual do meio técnico e mesmo do meio técnico-científico-informacional (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.271).

No tocante às atividades componentes do terciário, setor que se

expande vertiginosamente e chega fortalecido à década de 1980, como

verificamos em todos os anos selecionados para análise, o comércio e os

serviços detêm as maiores quantidades de estabelecimentos em números

absolutos na cidade: dos 713 estabelecimentos de Mossoró em 1985, 351

estão no comércio e 215 nos serviços; dez anos depois, os estabelecimentos

comerciais somam 737 unidades e os dos serviços, 342, de um total de 1.419;

em 2005, de 6.940 estabelecimentos em todos os setores econômicos, temos

3.656 e 1.987 no comércio e nos serviços, respectivamente (tabela 32).

Como podemos perceber se observarmos atentamente as variações

absolutas e relativas, foi justamente nestes dois setores que houve um

aumento mais expressivo em todos os anos, principalmente se considerarmos

o período de 1985 a 2005, com um acréscimo de 5.077 estabelecimentos.

Porém é na década de 1990 que ocorre maior incremento nas atividades

terciárias: entre os anos de 1995 e 2005 o número de estabelecimentos

comerciais aumenta em 2.919 unidades, e os estabelecimentos dos serviços,

em 1.645, novamente representando as maiores taxas absolutas de

crescimento no total dos estabelecimentos de todos os setores do IBGE.

Estes dados confirmam o caráter comercial da cidade, exposto em

outro momento. Portanto, o comércio continua bastante forte, superando

inclusive os serviços, em número de estabelecimentos, característica

associada à forte centralidade de Mossoró sob sua região de influência.

Contudo, ao examinarmos as variações relativas, o setor da

agropecuária e da construção civil são os que mais crescem na cidade, com

percentuais de desenvolvimento de 3.750% e 3.264%, respectivamente. O

comércio e os serviços vêm logo em seguida, com 942% e 824%, e a indústria

fica em último lugar, com 486% (tabela 32).

Destarte, podemos verificar intensa dinamização da economia

mossoroense, com o aquecimento de todos os seus setores componentes.

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Notadamente o período de maior crescimento foi entre meados da década de

1990 e meados dos anos 2000, quando houve um aumento total de 5.521

estabelecimentos, ou seja, um incremento de 389%, enquanto no período

anterior são apenas 706 estabelecimentos a mais, isto é, 99%. Contudo,

verificamos um grande salto na economia da cidade, pois em duas décadas

houve um crescimento total de 873% no número de estabelecimentos,

percentual bastante relevante para o período de apenas duas décadas.

Tabela 32: Mossoró. Número de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005

Setores econômicos

Estabelecimentos Variação absoluta Variação relativa (%)

1985 1995 2005 1985-1995

1995-2005

1985-2005

1985-1995

1995-2005

1985-2005

Agropecuária 4 32 154 28 122 150 700 381 3.750

Indústria 132 210 773 78 563 641 59 268 486

Construção Civil 11 98 370 87 272 359 791 278 3.264

Comércio 351 737 3.656 386 2.919 3.305 110 396 942

Serviços 215 342 1.987 127 1.645 1.772 59 481 824

Total 713 1.419 6.940 706 5.521 6.227 99 389 873 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Este incremento do terciário demonstra a importância de Mossoró

como centro comercial e de serviços, concentrando grande número de

estabelecimentos em ambos os setores, principalmente no comércio. Elias e

Pequeno (2010) associam este crescimento à expansão do consumo de bens e

serviços modernos e sofisticados, que modificam a cidade de Mossoró,

reforçam-na como cidade polarizadora e alteram o modo de realização das

atividades terciárias, com o aparecimento de algumas atividades, a instalação

de novos equipamentos comerciais e a chegada de novos agentes

econômicos.

Pela participação percentual de cada atividade no número total de

estabelecimentos na cidade, como podemos observar na tabela seguinte, para

todos os anos analisados o comércio detém as maiores taxas de participação,

atingindo mais de 50% do total de estabelecimentos da cidade no ano de 2005

(52,68%). Se considerarmos o terciário de modo geral (comércio e serviços), os

dados ficam ainda mais latentes, pois, juntos, estes dois setores respondem

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por mais de 75% do total de estabelecimentos. Em 1985 são 79%, em 1995,

76%, e em 2005, 81%.

Tabela 33: Mossoró. Participação percentual no número total de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005

Setores econômicos

Participação no total (%)

1985 1995 2005

Agropecuária 0,56 2,26 2,22

Indústria 18,51 14,80 11,14

Construção Civil 1,54 6,91 5,33

Comércio 49,23 51,94 52,68

Serviços 30,15 24,10 28,63

Total 100 100 100 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Além disso, o crescimento das atividades terciárias também se deve à

intensificação do processo de terceirização na cidade, com a instalação de

inúmeras empresas prestadoras de serviços às demais atividades econômicas

(atividade salineira, atividade petrolífera e o agronegócio de frutas tropicais),

que estimulam o consumo produtivo63.

Mas o que é a terceirização? Kon (2004, p.125) a define como sendo o

“[...] processo de transferência de funções ou atividades de uma empresa de

origem para uma empresa ou trabalhador (subcontratação)”. Estas funções

transferidas podem compor tanto etapas do processo produtivo quanto serviços

de apoio, como publicidade, contabilidade, transportes, entre outros.

Consoante o discurso das empresas, a terceirização dos serviços gera

maior produtividade, qualidade e agilidade empresarial, sendo considerada

como uma técnica moderna de administração baseada em processos de

gestão com critérios de aplicação (início, meio e fim), de visão temporal (curto,

médio, ou longo prazo) e ótica estratégica, voltada a alcançar objetivos

determinados e reconhecidos pela organização (KON, 2004).

Entretanto, a terceirização foi um componente fundamental para o

processo de reestruturação produtiva, estimulando a vantagem competitiva das

empresas no intuito de reduzir custos e simplificar o processo produtivo. Nestas

63 Para mais informações sobre o consumo produtivo na cidade de Mossoró, indicamos o trabalho de Santos (2010).

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condições, segundo constatamos, o processo de terceirização pode ser visto

como um fenômeno geral, embora sua evolução seja peculiar a cada país e

região. Como ressalta a citação,

Na prática, a terceirização tem se transformado em mais um instrumento de ampliação das taxas de lucro das empresas. O que se tem observado é que a terceirização tem sido uma forma de reduzir despesas, cortar pessoal, diminuir salários e precarizar as condições de trabalho [...] (COSTA, 2008, p.139).

Em Mossoró, este processo influenciou diretamente na expansão da

quantidade de empresas prestadoras de serviços, principalmente à Petrobras,

pois parte da sua produção na cidade é totalmente terceirizada para empresas

nacionais e multinacionais, aquecendo o setor comercial. Ademais, estabelece

uma série de novas sociabilidades e requer uma mão-de-obra especializada, a

qual, em sua maioria, não existe na cidade e acaba migrando para a região

petrolífera sob influência de Mossoró (ELIAS; PEQUENO, 2010).

Diante deste panorama, podemos visualizar claramente a evolução da

quantidade de estabelecimentos em cada setor, por ano, através do gráfico a

seguir. Notadamente, o comércio sobressai em comparação aos demais

setores, disparando particularmente nos anos 2000. Os outros setores

apresentam diferentes ritmos de crescimento, embora também significativos, se

vistos isoladamente.

Gráfico 2: Mossoró. Número de estabelecimentos, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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O aumento na quantidade de estabelecimentos em todos os setores da

economia de Mossoró vai refletir diretamente no número de empregos, pois

este também cresce, e não apenas no mercado de trabalho formal, mas

também na informalidade, cujo peso histórico não pode ser minimizado na

sociedade brasileira. Este fenômeno se verifica principalmente no terciário,

porquanto a maioria dos migrantes, vindos de cidades bem menores, não

possui qualificação para exercerem atividades com alto nível de inovações

tecnológicas, e encontram no comércio e nos serviços sua fonte de renda ou

de subsistência64, como exposto:

Isto evidencia que, apesar do setor terciário ser o mais expressivo em relação à participação da mão-de-obra no quadro de empregos da cidade, algumas de suas atividades concentram grande contingente de subempregados e desempregados “disfarçados” no emprego informal. E o “setor informal”, considerado sub-setor marginal do emprego urbano, constitui, de fato, uma problemática urbana geradora de várias tensões sociais (PINHEIRO, 2006, p.130).

Reconhecemos a importância do estudo da dimensão do mercado de

trabalho formal e informal para nossa análise de Mossoró, no entanto, em

virtude da dificuldade de mensuração do mercado de trabalho informal e pela

disponibilidade dos dados para o mercado formal, nos deteremos a seguir

apenas na análise das informações referentes ao segundo grupo65.

Diferentemente do ocorrido no número de estabelecimentos, no qual o

comércio tem maior peso, foram os serviços que reuniram a maior quantidade

de trabalhadores formais, permanecendo em destaque ao longo de todos os

anos estudados. Esta situação explica-se pelo crescente número de empresas

prestadoras de serviços que a cada ano se instalaram na cidade e, por

conseguinte, agregaram mais pessoas ao mercado de trabalho formal.

Em 1985, o setor de serviços tinha 4.570 empregados, o equivalente a

35% do total. Já o comércio, contava com 2.847 trabalhadores, isto é, 22%.

Analisadas em conjunto e comparadas com os demais setores, as atividades

comerciais e de serviços concentravam em 1985 57% dos trabalhadores

formais mossoroenses (tabelas 34 e 35).

64 Sobre a informalidade nos serviços ver Kon (2004). 65 O mercado de trabalho na região de Mossoró foi estudado por Priscila de Oliveira Romcy, membro do GLOBAU e mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará, sob orientação da profa. dra. Denise Elias.

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111

Dez anos após, os serviços continuaram empregando o maior número

de trabalhadores, 8.906 pessoas, ou seja, 31% do total. O comércio também

aumentou a quantidade de empregados formais, contando com 3.786

trabalhadores em 1995. Juntos, representavam 44% dos trabalhadores formais

da cidade, diminuição provocada pelo crescimento do mercado formal em

outros setores como a agropecuária e a construção civil.

Consoante notamos, no período entre 1985 e 1995 o crescimento do

número de trabalhadores nos serviços foi de 95% e o do comércio, de 33%,

bem modestos se comparados ao dos setores da agropecuária (336%) e da

construção civil (228%) (tabela 35). Isto se deveu à incorporação de novas

tecnologias ao processo produtivo da agropecuária, apresentada

anteriormente, e à realização de muitas obras na cidade, públicas e privadas,

que exigiu do mercado um maior número de trabalhadores para atender às

demandas.

Foi entre as décadas de 1995 e 2005 que o setor comercial teve seu

período de maior crescimento, 260%, de acordo com informações da tabela 34.

Em 2005 eram 13.647 pessoas ocupadas no setor, número inferior apenas ao

de trabalhadores formais nos serviços, 17.727 trabalhadores. Em 2005, 55% do

mercado de trabalho formal de Mossoró estava relacionado às atividades

terciárias, sendo 24% deste associados diretamente ao comércio.

Ao analisar o período total de vinte anos, conforme veremos, as

atividades que mais cresceram em números absolutos foram exatamente

aquelas associadas ao terciário; são 13.157 postos de trabalho a mais nos

serviços e 10.800, no comércio. No mesmo intervalo, o número de

trabalhadores no comércio e nos serviços aumentou, respectivamente, 379% e

288%. No total de todas as atividades, o mercado de trabalho formal em

Mossoró cresceu de 1985 a 2005 343%, com a entrada de 44.330 pessoas.

Tabela 34: Mossoró. Número de empregados formais, segundo os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005

Setores econômicos

Empregados formais Variação absoluta Variação relativa (%)

1985 1995 2005 1985-1995

1995-2005

1985-2005

1985-1995

1995-2005

1985-2005

Agropecuária 1.765 7.702 8.341 5.937 639 6.576 336 8 373

Indústria 3.403 6.945 12.211 3.542 5.266 8.808 104 76 259

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Construção Civil 343 1.126 5.332 783 4.206 4.989 228 374 1.455

Comércio 2.847 3.786 13.647 939 9.861 10.800 33 260 379

Serviços 4.570 8.906 17.727 4.336 8.821 13.157 95 99 288

Total 12.928 28.465 57.258 15.537 28.793 44.330 120 101 343 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Tabela 35: Mossoró. Participação percentual no número total de empregados formais, segundo

os principais setores econômicos do IBGE. 1985 a 2005

Setores econômicos

Participação no total (%)

1985 1995 2005

Agropecuária 14 27 15

Indústria 26 24 21

Construção Civil 3 4 9

Comércio 22 13 24

Serviços 35 31 31

Total 100 100 100 Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Na sequência, acompanhamos a evolução do número de empregados

formais por setor em Mossoró, com a supremacia dos serviços em todos os

anos, mais destacadamente no último ano analisado. Entre outros fatores,

Oliveira (1980, p.161) atribui o aumento de trabalhadores no setor, tanto os

assalariados como os por conta própria, ao estilo de expansão capitalista “[...]

que levou a um processo de concentração da renda altamente exacerbado seja

pela modificação oligopolística seja pela política de repressão salarial [...]”,

dando margem à expansão dos serviços de consumo individual, assim como às

atividades comerciais. Estas, no período de 1995 a 2005, cresceram

substancialmente em número de empregados no mercado formal.

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Gráfico 3: Mossoró. Número de empregados formais, segundo os principais setores econômicos do IBGE.1985 a 2005

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

A partir desta exposição do panorama do comércio desde a década de

1980 até os dias atuais, do ponto de vista do crescimento do número de

estabelecimentos e do mercado de trabalho formal, esperamos ter

demonstrado como ocorreu o desenvolvimento deste setor. Contudo, não

podemos avaliar este crescimento apenas do ponto de vista estatístico. É

fundamental estudar suas causas determinantes, por meio de uma leitura

totalizante, porquanto “cada lugar é, ao mesmo tempo, objeto de uma razão

global e de uma razão local, convivendo dialeticamente” (SANTOS, 2008b,

p.339).

Em Mossoró, as atividades comerciais foram dinamizadas pela nova

divisão interregional do trabalho, que as redefiniu e lhes atribuiu novos papéis

na economia local e regional. Uma cidade essencialmente comercial tornou-se

um centro regional polarizador de comércio e serviços e esta mudança foi

resultado de duas tendências poderosas no desenvolvimento do consumo: a

mobilização da moda em mercados de massa e a passagem do consumo de

bens para o consumo de serviços (HARVEY, 2007).

O comércio, presente desde os primórdios de Mossoró, passou por

profundas transformações, principalmente no final dos anos 1990 e início dos

anos 2000: o que antes era uma simples atividade de troca (nas primeiras

feiras de gado) tornou-se, com a chegada de novos agentes econômicos, uma

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atividade extremamente moderna e espacialmente bastante seletiva. Conforme

Sposito (2007a, p.242) ressalta,

Estruturas urbanas organizadas por um centro principal e único são sobrepostas por lógicas espaciais mais complexas e decididas fora da escala de poder econômico e político local, em função de interesses comerciais e imobiliários que implantam shoppings centers, que expandem redes de comércio de múltiplas filiais ou de franquias que associam atores econômicos locais a atores econômicos nacionais.

Outrora marcada pelo seu tino comercial, a cidade fortaleceu-se

também como centro regional de serviços, atendendo demandas locais e até

internacionais. Os serviços conhecidos em especializações anteriores mudam

de conteúdo e de função, tendo agora de desempenhar a sustentação da

expressão urbana dos processos de reestruturação produtiva. Para tanto, os

serviços tiveram de incorporar redefinições tecnológicas e organizacionais,

reestruturando o mercado de trabalho com as terceirizações, tanto na esfera

privada como na pública, por exemplo.

Ante este quadro de profundas mudanças, a cidade adquire uma nova

feição por meio do seu processo de expansão urbana, beneficiado pela maior

utilização de técnicas que avançam via desenvolvimento tecnológico e

informacional. Em função disto, constitui-se na cidade o meio técnico-científico-

informacional, que incorpora tecnologia, ciência e informação ao território e

gera uma maior integração ao restante do país. Santos (2005, p.67) explica

como funciona a lógica de incorporação de regiões e declara,

A partir do momento em que o território brasileiro se torna efetivamente integrado e constitui-se como mercado único, o que à primeira vista aparece como evolução divergente é, na realidade, um momento convergente. Há uma lógica comum aos diversos subespaços. Essa lógica é dada pela divisão territorial do trabalho em escala nacional, que privilegia diferentemente cada fração do território em um dado momento de sua evolução. É dessa maneira que, em cada período, entendem-se as particularidades e o movimento próprio de cada subespaço e as formas de articulação no todo.

Esta lógica foi introduzida no país nas décadas de 1960 e 1970 e

permanece ao longo dos anos, adentrando outros níveis escalares. Mediante

todas as informações expostas, entendemos como Mossoró foi sendo inserida

nas diversas divisões do trabalho verificadas em nível nacional e internacional.

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Portanto, a cidade foi completamente absorvida pela dinâmica capitalista

dominante, a qual se expande geograficamente em busca de criar novas

oportunidades de acumulação.

Já na década de 1980 podiam ser percebidos os primeiros sinais dos

impactos causados pela reestruturação produtiva. Entre eles, a intensificação

dos fluxos de mercadorias e de informações, através dos avanços nos

sistemas de transportes e de comunicações; e a internacionalização da

economia, que permite maior acesso ao crédito e introduz capitais estrangeiros

no comércio e nos serviços de forma mais intensa, trazendo consigo a

instalação de grandes equipamentos modernos.

Tais aspectos vão afetar diretamente a conformação do comércio

mossoroense. Este, além de ser impulsionado pela dinâmica das atividades

salineira, da agricultura moderna de frutas tropicais e a petrolífera, também foi

condicionado pelos novos padrões de consumo impostos pelo capital,

aumentando ainda mais as disparidades regionais, interurbanas e intra-

urbanas.

Esta realidade de Mossoró insere-se num conjunto de transformações

mais amplas. Lançamos agora alguns elementos que nos permitiram entender

o desenvolvimento das atividades comerciais após a década de 1980. Afinal, “o

processo social está sempre deixando heranças que acabam constituindo uma

condição para as novas etapas” (SANTOS, 2008b, p.140). Para isto, nos

baseamos em eventos que, segundo Sposito (2001b), colaboraram para a

disseminação do consumo nas cidades médias e de porte médio:

a) “A tendência recente de concentração econômica das empresas industriais,

associada aos meios técnico-informacionais atuais, que possibilitam

comunicação imediata, viabiliza a dissociação territorial entre o lugar das

decisões e o da produção industrial” (p.630).

Neste âmbito, a desconcentração industrial das áreas metropolitanas

para cidades menores, principalmente aquelas com índices razoáveis de

qualidade de vida e com boas condições geográficas em relação aos meios de

comunicação materiais e imateriais, possibilitou o recebimento de capitais

industriais nacionais e estrangeiros por parte dos espaços urbanos não

metropolitanos. Tais qualidades ampliaram as ofertas de emprego, sobretudo

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116

os de maior qualificação, com melhor formação intelectual e profissional, e, por

conseguinte, alargaram a capacidade de consumo do mercado local.

Porém, como afirmam Elias e Pequeno (2010), durante o processo de

descentralização industrial no Brasil, a indústria mossoroense não sofreu tantos

impactos da reestruturação produtiva como outras cidades do país. Em

decorrência da estreita relação entre a agropecuária e o extrativismo vegetal e

mineral com a indústria em Mossoró, atualmente suas principais indústrias

continuam sendo as dos ramos de beneficiamento de matérias-primas locais,

havendo também indústrias de construção civil (Conterra), fabricação de

cimento (Itapetininga) e produtos farmacêuticos (Indufal).

b) “O declínio progressivo dos custos e a melhoria e diversificação dos

sistemas de transportes e de telecomunicações [...] e a decorrente diminuição

da participação relativa desse custo no preço das mercadorias” (SPOSITO,

2001b, p.631).

Além de tornar viável a deslocalização industrial, a modernização dos

transportes e das comunicações estimulou os deslocamentos de vários

segmentos sociais para o consumo de bens e serviços mais sofisticados. A

ampliação da oferta desses bens e serviços motiva a concentração em torno de

espaços de maior densidade e dos mais sofisticados equipamentos comerciais

e de serviços, os quais podem ser encontrados em cidades de porte médio.

Neste contexto, elas atraem consumidores de outras cidades e tornam-se

centros polarizadores regionais, com raio de alcance de acordo com as

infraestruturas disponíveis que articulam as cidades aos sistemas de

circulação.

Em Mossoró, tomemos o exemplo do Mossoró West Shopping,

localizado a aproximadamente 1 km da rodovia BR-304, que liga Fortaleza –

CE a Natal – RN, passando pela cidade estudada, e que dá acesso a várias

outras cidades do oeste potiguar, sob influência de Mossoró. Esta localização

estratégica, aliada às obras de melhoramento das rodovias, facilita os fluxos

comerciais e promove a disseminação de estruturas comerciais e de serviços

modernos e, por conseguinte, do consumo.

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c) “As formas contemporâneas de organização espacial das atividades

econômicas ligadas ao comércio de bens e serviços” (SPOSITO, 2001b,

p.632).

O intenso processo de concentração econômica do comércio em curso

no Brasil nas últimas décadas permitiu a estruturação de redes de múltiplas

filiais, de supermercados e hipermercados, de shopping centers etc. Com a

elevação da renda de uma parcela dos consumidores, houve deslocalização

destes equipamentos para outras cidades que não as metrópoles, processo

estimulado pela entrada de capitais estrangeiros e pela adoção de estratégias

de fusão e concentração econômica, acirrando a competitividade entre

empresas e exigindo investimentos maiores em marketing.

Como destacam Salgueiro e Cachinho (2009, p.20-21), “mais do que

bens e serviços, [...] um grande número de estabelecimentos está empenhado

em oferecer aos consumidores verdadeiras experiências de vida”. Isto muda a

forma e o conteúdo das atividades comerciais e de serviços. No caso

mossoroense, consoante percebemos, a partir da década de 1990, e

notadamente nos anos 2000, estas novas formas comerciais “invadem” a

cidade e disseminam-se velozmente, transformando os hábitos de consumo

locais e o modo de “fazer comércio”.

d) “É no campo do consumo de bens e serviços especializados ligados à

modernização do setor agropecuário, que se tem visto um avanço significativo

do papel comercial e de serviços das cidades de porte médio” (SPOSITO,

2001b, p.634).

Neste aspecto do consumo produtivo (SANTOS, 1988) há a

sobreposição de dois tipos de consumo: um de escala local e microrregional,

onde se verifica maior proximidade entre comprador e vendedor; e outro de

escala mesorregional e nacional, cujos fluxos resultam das modernas formas

de comunicação, como a internet.

O consumo produtivo em Mossoró não está presente apenas no

tocante à modernização do setor agropecuário, mas também da atividade

petrolífera e salineira, com maior ou menor intensidade de acordo com a

demanda de cada setor. Tais demandas, comerciais e de serviços,

movimentam a economia da cidade, promovem mudanças no mercado de

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trabalho e nas relações trabalhistas e redefinem o espaço urbano

mossoroense.

Em sua pesquisa, Santos (2010) identificou que o consumo produtivo

da atividade salineira é o menos expressivo, demandando serviços de pouca

complexidade, embora haja destaque quanto aos serviços de frete, os quais

consolidaram Mossoró como “[...] entreposto comercial de todo o sal produzido

e transportado não só na sua região de influência, mas também na região

Nordeste como em todo” (p.219).

Em contrapartida, as demandas da atividade petrolífera são bastante

heterogêneas; vão desde serviços complexos a produtos de baixo valor

tecnológico, impulsionando o comércio e outros setores de atividades na

cidade, como o de hospedagem, alimentação e eventos.

Já as atividades associadas ao agronegócio de frutas tropicais

movimentam o comércio por meio da compra de insumos, principalmente pelos

produtores locais, pois as grandes empresas internacionais adquirem seus

produtos no atacado em outras regiões do país. Outra característica do

consumo produtivo neste setor são os serviços de assistência técnica, logística,

entre outros.

Portanto, a partir destes quatro episódios apontados por Sposito

(2001b) como colaboradores da difusão do consumo, podemos identificar duas

formas da sua realização, nomeados por Santos (1996) de consumo produtivo

e consumo consumptivo. Enquanto o primeiro “[...] cria uma demanda

heterogênea segundo os subespaços” (SANTOS, 1996, p.147), o segundo “[...]

cria uma demanda heterogênea segundo os estratos de renda, mas

comparável segundo as mesmas possibilidades de demanda” (SANTOS, 1996,

p.147). Ambos têm bastante força em Mossoró, pois as atividades extrativas e

agropecuárias (a extração de sal, a prospecção de petróleo e o agronegócio de

frutas tropicais) atendem à primeira demanda e as atividades comerciais e de

serviços, à segunda.

O percurso investigativo realizado até aqui mostrou a relevância do

comércio na economia mossoroense, revelando, sobretudo, seu caráter

essencialmente urbano. Esta atividade estimula diretamente as complexas

relações de consumo que dão conteúdo à dinâmica das cidades, contribuindo

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119

para explicar sua organização interna e os inúmeros movimentos que se

desenvolvem no seu interior (ORTIGOZA, 2008).

Todavia, antes de estudarmos as repercussões sociais, políticas,

econômicas e espaciais das redefinições da atividade comercial e da atuação

de novos atores econômicos no setor, apresentaremos um quadro geral do

comércio atualmente, porquanto “os modos e as relações de produção, assim

como as necessidades de ordem técnica, exigem formas particulares de

comércio” (GEORGE, 1965, p.277). Esta atividade, que se constitui como um

elemento de integração de relações sociais do cotidiano, se ajustou às novas

estratégias de expansão do capital e vem se remodelando no último quartel do

século XX.

2.3 O PANORAMA DO COMÉRCIO CONTEMPORÂNEO

Como vimos, a década de 1980 foi o marco para as redefinições da

atividade comercial mossoroense, notadamente com a expansão do consumo

e, por conseguinte, o aumento do número de estabelecimentos e de

trabalhadores formais no setor. Na década ulterior, a difusão de novas formas

de organização das atividades comerciais, associada à modernização

tecnológica e ao desenvolvimento das telecomunicações e dos transportes,

interferiu diretamente na dinâmica política, econômica, social, demográfica e,

também, espacial, particularmente em Mossoró, cuja expansão urbana foi

intrinsecamente relacionada ao desenvolvimento de atividades comerciais e de

serviços.

Com vistas a aprofundar nossa análise do comércio, nos deteremos em

sua evolução a partir de duas atividades que, segundo Angelo (1994), o

compõem: o varejo e o atacado. O primeiro é caracterizado pela venda em

menores quantidades, por ser uma “atividade de distribuição direta de

mercadorias para consumidores finais” (CORRÊA, 2000, p.1), sendo parte

integrante da organização espacial através de fixos e fluxos. O segundo tem

como característica principal a venda em maiores quantidades, e conforme

Santos (2004, p.229) “[...] são responsáveis pela ligação entre os produtores

urbanos ou rurais e comerciantes da cidade”.

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Atualmente a maioria dos estabelecimentos comerciais em Mossoró

está associada ao varejo. Tal segmento, na ótica de Angelo (1994, p.14) “[...] é

um campo no qual existem muitas possibilidades de melhorias na

produtividade. Essas melhorias são um dos requisitos para que se instale no

país um verdadeiro mercado de consumo de massas”.

No início do século XX o comércio atacadista era o segmento mais

relevante na economia, quando as grandes casas comerciais ainda se

destacavam na cidade. Com a reestruturação produtiva e o incremento do meio

técnico-científico-informacional ocorrido desde a década de 1980, intensificou-

se o processo de terciarização da economia mossoroense, com a

modernização de atividades e a chegada de novos agentes econômicos. Foi

neste momento que a atividade varejista da cidade expandiu-se e passou a

complementar o comércio de Fortaleza e Natal em termos regionais (FELIPE,

1982; PINHEIRO, 2006), havendo desde então a difusão de equipamentos

comerciais modernos e voltados sobretudo ao consumo consumptivo.

Como mostram as tabelas 36, 37 e 38, o comércio varejista teve

expressivo aumento em apenas duas décadas: em 1985 eram 286

estabelecimentos e em 2005 este número passa a ser de 3.154, crescimento

aproximado de 1000%. Em todo o período analisado, o varejo representou

mais de 80% do total de estabelecimentos no comércio mossoroense.

Apesar dos índices de crescimento bem menores em relação ao varejo,

o comércio atacadista também teve saldo positivo no período de vinte anos: de

65 estabelecimentos em 1985 o setor passou a contar com 502

estabelecimentos em 2005, o equivalente a um aumento de 672%. O momento

de maior inflexão foi entre 1995 e 2005, quando o crescimento do setor foi de

484%.

Tabela 36: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista. 1985 a 2005

Tipo de

comércio Estabelecimentos

1985 1995 2005 Varejista 286 651 3.154 Atacadista 65 86 502 Total 351 737 3.656

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 37: Mossoró. Variações absolutas e relativas da quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista. 1985 a 2005

Tipo de comércio

Variação absoluta Variação relativa (%) 1985-1995

1995-2005

1985-2005

1985-1995

1995-2005

1985-2005

Varejista 365 2.503 2.868 128 384 1.003 Atacadista 21 416 437 32 484 672 Total 386 2.919 3.305 110 396 942

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Tabela 38: Mossoró. Participação do comércio varejista e atacadista no número total de estabelecimentos. 1985 a 2005

Tipo de

comércio Participação (%)

1985 1995 2005 Varejista 81 88 86 Atacadista 19 12 14 Total 100 100 100

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

No gráfico 4, a seguir, podemos observar a evolução do comércio

varejista e atacadista em Mossoró, deixando claro o crescimento de ambos os

segmentos, sobretudo o varejista. Lembremos, porém: este fenômeno está

relacionado ao processo de internacionalização do capital e de modernização

das atividades comerciais, especialmente com a introdução do autosserviço.

Esta nova técnica de venda favoreceu a concentração no setor, “alterou a

organização dos estabelecimentos, franqueando o contacto directo das

mercadorias e permitiu aumentar a dimensão dos pontos de venda”

(SALGUEIRO; CACHINHO, 2009, p.15).

De modo geral, a modernização tecnológica promoveu diversas

mudanças no comércio. No segmento varejista as principais foram as

reestruturações patrimoniais das redes de supermercados nacionais, as novas

relações com os fornecedores e a expansão de equipamentos modernos de

consumo como os shopping centers, demonstrando alterações nos hábitos de

consumo e no perfil do consumidor (PRONI; SILVA; OLIVEIRA, 2005, p.109).

No comércio atacadista, as transformações foram, em sua maioria, de

caráter operacional, com a maior integração entre elos da cadeia de

abastecimento, a concentração de capital nas grandes redes regionais de

distribuição, nas novas tecnologias de controle e gerenciamento de estoques e

nas relações entre fornecedores, distribuidores e varejistas, as quais

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garantiram maior poder às grandes redes atacadistas (PRONI; SILVA;

OLIVEIRA, 2005, p.108).

Gráfico 4: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio varejista e atacadista. 1985 a 2005

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Em sua maior parte, os estabelecimentos comerciais em Mossoró são

de pequeno e médio porte66, fato comprovado após algumas visitas à cidade,

que ratificaram as informações coletadas na RAIS, indicando a quantidade de

trabalhadores formais por estabelecimento. De acordo com as informações das

tabelas 39, 40 e 41, os estabelecimentos com até quatro empregados

prevalecem no comércio mossoroense no primeiro decênio analisado: em 1985

eram 186 estabelecimentos (53% do total) e em 1995, 452 (61% do total).

Todavia, no ano de 2005 os estabelecimentos com nenhum trabalhador

formal passaram a predominar no comércio, com 2.252 unidades (62% do

total), seguidos pelos estabelecimentos com até quatro empregados, que

tinham 904 unidades (25% do total). Estes dados dão indícios da ampliação do

número de comerciantes autônomos e de estabelecimentos de porte médio e

pequeno na cidade.

66 Para classificação do tamanho dos estabelecimentos comerciais em Mossoró utilizamos o número de empregados formais: pequeno (de zero a nove trabalhadores); médio (de dez a quarenta e nove funcionários) e grande (mais de cinquenta trabalhadores).

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Tabela 39: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005

Número de

empregados formais

Estabelecimentos

1985 1995 2005

0 42 85 2.252 Ate 4 186 452 904 De 5 a 9 59 106 258 De 10 a 19 30 59 157 De 20 a 49 27 26 64 De 50 a 99 6 8 14 De 100 a 249 - 1 7 De 250 a 499 1 - - Total 351 737 3.656

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

Pelas variações absolutas e relativas, o período entre 1995 e 2005 foi o

que apresentou as maiores mudanças, no qual o número de estabelecimentos

sem empregados formais cresceu 2.549% em relação ao período anterior. Se

considerarmos a análise do período total (1985-2005), este crescimento foi

exorbitante, com uma variação relativa de 5.262%, porquanto o número

aumentou de 42 estabelecimentos sem trabalhadores formais em 1985 para

2.252, em 2005.

O número de estabelecimentos com até quatro empregados também

se ampliou consideravelmente, pois de 1985 a 2005 surgiram 718 unidades,

um acréscimo total de 386% nesta categoria. Ao observar apenas as variações

relativas, conforme notamos, este tipo de estabelecimento foi o que mais

cresceu entre 1985 e 1995, com 143%.

Tabela 40: Mossoró. Variações absolutas e relativas da quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005

Número de

empregados formais

Variação absoluta Variação relativa (%) 1985-1995

1995-2005

1985-2005

1985-1995

1995-2005

1985-2005

0 43 2.167 2.210 102 2.549 5.262 Ate 4 266 452 718 143 100 386 De 5 a 9 47 152 199 80 143 337 De 10 a 19 29 98 127 97 166 423 De 20 a 49 -1 38 37 -4 146 137 De 50 a 99 2 6 8 33 75 133 De 100 a 249 - 6 - - 600 - De 250 a 499 - - - - - - Total 386 2.919 3.305 110 396 942

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

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Tabela 41: Mossoró. Participação dos estabelecimentos no comércio, por número de

empregados formais. 1985 a 2005

Número de empregados

formais

Participação (%)

1985 1995 2005

0 12 12 62 Ate 4 53 61 25 De 5 a 9 17 14 7 De 10 a 19 9 8 4 De 20 a 49 8 4 2 De 50 a 99 2 1,1 0,4 De 100 a 249 - 0,1 0,2 De 250 a 499 0 - - Total 100 100 100

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

No gráfico 5, a seguir, distinguimos melhor estas variações da evolução

dos estabelecimentos pelo número de empregados formais. É realmente no

ano de 2005 que disparam os estabelecimentos sem nenhum trabalhador

formal, seguidos por aqueles com até quatro empregados. Ou seja, os

estabelecimentos na atividade comercial são de pequeno porte, e compostos

muitas vezes por trabalhadores autônomos. Para Santos (2004), este fato está

associado à modernização, geradora de duas tendências: concentração da

economia e aumento do êxodo rural. Assim, “com a oferta de empregos em

baixa relativa, a instalação em atividades de tamanho reduzido, por conta

própria, torna-se uma solução” (SANTOS, 2004, p.221).

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Gráfico 5: Mossoró. Quantidade de estabelecimentos no comércio, por número de empregados formais. 1985 a 2005

Fonte: RAIS. Elaboração da autora (2010).

De acordo com matéria publicada em um dos principais jornais diários

de Mossoró67, o superintendente do SEBRAE garante que grande parte dos

empregos no Brasil são gerados por empresas com no máximo cinco

funcionários, demonstrando a importância desse setor para a economia

nacional e mundial. As micro e pequenas empresas, segundo ele, estão

ajudando muito o país a enfrentar a crise econômica mundial.

O gerente do Banco do Nordeste do Brasil também aponta alguns

fatores passíveis de influenciar esse crescimento ao longo dos anos:

lançamentos de novos produtos e diversidade de oferta, mudanças de

estratégias dos bancos, flexibilização das taxas de juros, ampliação do acesso

ao crédito etc68.

Leis como o Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e

Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte –

SIMPLES69 (Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996), o “Estatuto da

67 Abertura oficial confirma expectativas de sucesso. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 21/8/09. 68 Acesso a financiamentos auxilia expansão de atividades comerciais. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 7/8/09. 69 De acordo com o SIMPLES, a microempresa é considerada como aquela na qual a pessoa jurídica auferiu, no ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$120.000,00. Já a empresa de pequeno porte é considerada como aquela na qual a pessoa jurídica auferiu, no ano-calendário, receita bruta superior a R$120.000,00 e igual ou inferior a R$1.200.000,00.

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Microempresa e Empresa de Pequeno Porte” (Lei nº 9.841, de 5 de outubro de

1999) e o Decreto nº 3.474, de 19 de maio de 2000, por exemplo,

regulamentam as micro e pequenas empresas e podem ter contribuído

diretamente para estes resultados. O SIMPLES estabelece tratamento

diferenciado nos campos dos impostos e contribuições da microempresa e da

empresa de pequeno porte, enquanto o Estatuto tem por objetivo facilitar a

constituição e o funcionamento destas, assegurando o fortalecimento da sua

participação no processo de desenvolvimento econômico e social. Existe

também a Lei Complementar nº 128, de 19/12/2008, ou Lei do Empreendedor

Individual, vigente desde julho de 2009 em todo o país, e que favorece os

trabalhadores informais que pretendem regularizar suas micro e pequenas

empresas70.

Além das parcerias entre as empresas e os órgãos públicos, a

Prefeitura Municipal de Mossoró possui um Programa Municipal de

Microcrédito71, destinado a pessoas físicas interessadas em abrir micro ou

pequena empresa nas zonas urbana e rural, incluídas no mercado informal e

que encontram dificuldades burocráticas no mercado creditício formal à

obtenção de capital de giro ou recursos para pequenos investimentos. Este

programa configura-se num importante instrumento de estímulo ao surgimento

de novos empreendimentos em Mossoró, com reflexos imediatos na economia

do município, e contribui diretamente para a elevação do número de

estabelecimentos em todos os setores, principalmente relacionados ao

comércio e aos serviços.

70 Esta lei beneficia empresários que ganham até R$ 36.000,00 por ano, isto é, R$ 3.000,00 por mês, criando condições especiais para que o trabalhador conhecido como informal possa se tornar um “empreendedor” individual legalizado. Entre as vantagens oferecidas por ela estão: o registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, que facilita a abertura de conta bancária, o pedido de empréstimos e a emissão de notas fiscais; o Empreendedor Individual é enquadrado no SIMPLES Nacional e fica isento dos impostos federais (Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL), pagando apenas o valor fixo mensal de R$ 52,15 (comércio ou indústria) ou R$ 56,15 (prestação de serviços), que será destinado à Previdência Social e ao ICMS ou ao ISS. Essas quantias serão atualizadas anualmente, de acordo com o salário mínimo e através dessas contribuições, o Empreendedor Individual terá acesso a benefícios como auxílio-maternidade, auxílio-doença, aposentadoria, entre outros. Esta lei já está em vigor no Rio Grande do Norte e beneficiou muitos trabalhadores, como os do Mercado Comercial do Vuco-Vuco, um dos espaços de realização do comércio tradicional local. 71 O PROMIC funciona da seguinte maneira: o valor liberado para o microcrédito é de R$1.000,00 e depois que os microempresários constituem o negócio, o pagamento é feito ao órgão municipal responsável pela geração de emprego e renda. Os recursos disponibilizados são provenientes de uma rotatividade da verba, ou seja, do capital de giro constante.

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No tocante ao perfil dos trabalhadores em ambos os segmentos

comerciais (varejista e atacadista), a maior parte deles está concentrada no

comércio varejista, o mais representativo em Mossoró, e predominantemente

são homens com idade entre 18 e 29 anos e com o ensino médio completo. No

comércio atacadista a faixa etária dos trabalhadores estende-se de 18 até a

idade de 39 anos.

Importante destacar a questão da especialização profissional: cada vez

mais se exige dos trabalhadores maiores níveis de qualificação, fato

evidenciado pela crescente demanda por profissionais com ensino superior e

com pós-graduação. Contudo, ainda faltam trabalhadores qualificados para a

maioria das vagas disponíveis. De acordo com órgãos responsáveis pela

intermediação de profissionais no mercado de trabalho na cidade, a

desqualificação dos candidatos a um emprego é um grande problema.

No caso de Mossoró, conforme uma funcionária do setor de

intermediação empresarial da Fundação de Apoio à Geração de Emprego e

Renda72, diariamente surgem vagas de emprego, notadamente no setor de

comércio, construção civil (pedreiro e servente) e para motorista73. Mas em

consequência da desqualificação, muitas pessoas permanecem

desempregadas ou adentram temporariamente no mercado de trabalho,

sobretudo no comércio, durante as datas de maior índice de vendas: o natal e o

dia das mães.

Mediante parcerias entre as empresas e a Câmara dos Dirigentes

Lojistas de Mossoró, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, o

Sindicato do Comércio Varejista, a FUNGER e o Serviço de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas, as pessoas podem ser incluídas no mercado de trabalho,

além de realizarem cursos preparatórios para candidatos a empregos

temporários, focados em conteúdos como relações humanas no trabalho, ética

profissional, postura, conceito de venda e atendimento ao cliente.

Uma parte dos empregos temporários acaba criando oportunidades de

efetivação na empresa. Na estimativa do presidente da CDL local, pelo menos

72 A FUNGER é o órgão da Prefeitura Municipal de Mossoró responsável pela geração de emprego e renda na cidade. Além de qualificar e selecionar trabalhadores, este órgão também faz a intermediação entre eles e as empresas. 73 Faltam candidatos qualificados para a maioria das vagas. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 29/9/09.

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de 30% a 40% desses candidatos conseguem empregos efetivos após o

período de final de ano. Estes números são superiores aos da média nacional,

os quais indicam a efetivação entre 10% e 25% das pessoas contratadas

provisoriamente, de acordo com a Associação Brasileira de Recursos

Humanos74.

Desta maneira, na nossa ótica, a tendência de expansão do comércio

segue o ritmo do avanço capitalista, mas, embora seja um sistema hegemônico

que acelera a homogeneização, identificam-se especificidades nos atores, nos

lugares e nos contextos regionais, principalmente com os novos papéis

desempenhados pelas cidades e as transformações ocorridas no comércio.

Sobre o assunto, Ortigoza (2008) aponta dois problemas conceituais de suma

importância à compreensão dos novos conteúdos das atividades comerciais: o

comércio tradicional e o comércio moderno.

Para a autora, o comércio tradicional seria caracterizado pela não

utilização do livre-serviço, onde a relação direta entre o comprador e o

vendedor é privilegiada, havendo um contato mais próximo, mais independente

e menos especializado entre eles. Em contrapartida, o comércio moderno seria

caracterizado pela introdução de novas técnicas de venda, como o livre-

serviço, e de novas estratégias de gestão empresariais nas relações

comerciais (ORTIGOZA, 2008).

Apoiada em estudos do Observatório do Comércio da Universidade de

Lisboa/ Portugal, Ortigoza (2008) apresenta uma distinção entre os dois

modelos de comércio, configurando e sustentando novas paisagens

comerciais. Com base em seis aspectos integrados aos vetores de mudança

da atividade comercial, a autora distingue o comércio tradicional do moderno:

1) os formatos dos estabelecimentos; 2) as formas de venda; 3) o perfil dos

comerciantes; 4) as estratégias de gestão das empresas; 5) os padrões de

localização; e 6) o significado dos espaços comerciais.

Outro fator de diferenciação entre os estabelecimentos comerciais está

na capacidade dos espaços modernos deixarem de ser apenas um lugar de

comércio para se tornar um “lugar de consumo”, despertando novas

necessidades e induzindo a novos desejos no imaginário das pessoas. O

74 Entidades capacitam trabalhadores para assumirem vagas temporárias. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 14/10/09.

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comércio se assume como atividade estruturante da organização

socioespacial, através dos seus novos conteúdos e suas novas funções. É

considerado de “[...] importância significativa para a vida nas cidades, fora do

estrito domínio econômico; o comércio prolonga-se a outros níveis tais como a

sociabilidade, a segurança e a coesão social” (ORTIGOZA, 2008, p.6).

Em resposta à lógica de acumulação capitalista, os próprios espaços

comerciais tornam-se também mercadorias e são consumidos, à medida que

substituem antigos padrões comerciais; concentram uma variedade de serviços

e de atividades de lazer; adquirem forte dimensão simbólica; e legitimam a

segregação social e espacial, como, por exemplo, o shopping center.

Isto implica profunda mudança da atividade comercial, que assume

funções econômicas e sociais, com alterações nas técnicas de vendas, a

ampliação do número de mercadorias, a assimilação de novos hábitos de

consumo e, nomeadamente, com as redefinições espaciais (CLEPS, 2004). No

intuito de compreendê-las, analisaremos as principais transformações

espaciais, a partir das mudanças no comércio mossoroense, sob a perspectiva

de três eixos de observação: as modificações nas relações entre escalas

geográficas; as redefinições das centralidades urbanas; e a implantação de

novos fixos e fluxos na cidade.

Pensar Mossoró pressupõe falar da sua região de influência. E neste

sentido é necessário aludir à questão das escalas geográficas, pois através

delas temos a dimensão das transformações espaciais e também do comércio.

Abalizaremos nossa discussão em Santos (2008b, p.151), para quem a escala

caracteriza-se como “[...] um limite e um conteúdo, que estão sempre

mudando, ao sabor das variáveis dinâmicas que decidem sobre o acontecer

regional ou local”.

Com as mudanças no processo produtivo e de acumulação do capital,

e a reestruturação do espaço urbano, no qual as cidades passaram a

desempenhar novos papéis e adquiriram novos conteúdos, tornou-se

indispensável uma redefinição das hierarquias urbanas estabelecidas até

então. Consoante afirma Santos (2008b, p.285), atualmente “a hierarquia se

realiza através de ordens técnicas, financeiras, políticas [...]”, baseadas

principalmente na informação a serviço das forças econômicas hegemônicas e

do Estado.

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Portanto, relações hierárquicas urbanas antes instituídas apenas pelo

comando de cidades maiores sobre menores tornaram-se mais complexas com

a manifestação do meio técnico-científico-informacional e exigem maior esforço

de análise na qual se considerem as sobreposições e as articulações

escalares, bem como as relações cidade-campo. Segundo Sposito (2006b,

p.148)

[...] ainda que se considere a manutenção, ainda forte, de relações e fluxos interurbanos de natureza hierárquica, é crescente a presença de relações do tipo complementares ou do tipo competitivas, entre cidades de mesmo nível ou de níveis diferentes no âmbito da mesma rede urbana ou entre redes urbanas diferentes, superando-se a tradição de organização piramidal das redes urbanas [...].

Neste sentido, Sposito (2007a) destaca duas dimensões importantes

para o estudo das novas funções das cidades, particularmente as médias: a do

espaço intraurbano e a do espaço interurbano. Parte-se da relação entre estas

duas escalas geográficas, que permite compreender a evolução espacial da

atividade comercial num contexto local, regional, nacional e até mundial,

convergindo no que Santos (1992, p.64) denominou de “totalidade do espaço”.

A necessidade de maior concentração e centralização do capital levou

ao acirramento da divisão territorial do trabalho, a qual promoveu e exigiu “a

expansão territorial das empresas comerciais de grande porte, nacionais e

internacionais, alterando as relações espaciais entre essas escalas”

(SPOSITO, 2007a, p.238). Este foi um dos fatores a intensificar a terciarização

da economia, facilitado pela difusão das inovações na produção, nos sistemas

de transportes e de comunicações.

No entanto, como esse processo não é homogêneo, Mossoró adentra

mais fortemente nesta lógica com a modernização da agricultura, apontada

como “[...] um dos vetores de redefinição das relações entre escala intra e

interurbana” (SPOSITO, 2007a, p.238), articulado também à escala

internacional.

Consoante Elias e Pequeno (2010), a forte integração desta atividade

ao circuito econômico urbano desencadeia novas relações que estimulam a

urbanização, o crescimento de setores no consumo produtivo, a expansão do

terciário. Ademais, repercutem espacialmente na fragmentação dos espaços

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agrícolas sob influência de Mossoró, na distribuição seletiva de políticas

públicas, dos sistemas de objetos e dos investimentos produtivos etc.

Destacamos também a localização espacial das empresas de comércio

e serviços associadas à agropecuária, no Centro da cidade, e mais

recentemente na BR-304, principal rodovia de acesso a Mossoró. De acordo

com Santos (2010), a localização dos estabelecimentos é estratégica, pois

representa redução dos custos em transporte, possibilita maiores áreas para

estacionamento de clientes e fornecedores e estimula o consumo consuntivo

na cidade.

A concentração de estabelecimentos comerciais e de serviços

agropecuários modernos em Mossoró reforça e redefine sua centralidade, pois

as empresas ali instaladas atendem desde o mercado de toda a região

produtiva agrícola sob sua influência, até cidades de outros Estados, como

Petrolina, em Pernambuco. Assim, a definição da centralidade não se limita

apenas à dinâmica de fluxos intraurbanos, mas envolve as relações no âmbito

da rede regional, podendo haver articulações e sobreposições entre escalas

(WHITACKER, 2007).

A redefinição das centralidades é estudada por Sposito (2001b,c,d,

2004, 2006b, 2007a) a partir da relação centro-periferia nas escalas

intraurbana, regional, nacional e internacional. Conforme acredita a autora, esta

ferramenta metodológica ajuda na compreensão das realidades espaciais,

sobremodo do ponto de vista social e econômico.

Neste contexto, a dinâmica econômica do capital determina as novas

localizações dos equipamentos comerciais e de serviços concentrados e de

grande porte. Estes, segundo Sposito (2001c, p.91),

[...] não respondem, apenas, aos interesses econômicos de comercialização de bens e serviços. Em primeiro plano, estão os interesses de natureza fundiária e imobiliária, pois a construção de grandes equipamentos potencializa fluxos para áreas da cidade, anteriormente pouco valorizadas, constituindo-se uma forma através da qual se otimizam os preços das novas localizações produzidas.

Ocorre então uma descentralização do capital produtivo e do terciário,

amparada pelo Estado, mediante investimentos em infraestrutura, serviços e

concessão de benefícios fiscais, com impactos diretamente no papel e na

estrutura do centro principal ou tradicional, induzindo à formação de novas

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centralidades na cidade, apreendidas a partir das relações entre a localização

dos fixos e os fluxos que elas geram e que a sustentam (SPOSITO, 2001d).

Em Mossoró, constitui-se a formação de uma nova centralidade

urbana, localizada a noroeste da cidade, no Bairro Nova Betânia75. Ao longo

das três últimas décadas nele vêm se concentrando vários investimentos

públicos e privados e hoje se configura como um eixo de autossegregação

residencial e uma nova centralidade em Mossoró. No bairro encontram-se

vários estabelecimentos associados ao consumo produtivo do agronegócio de

frutas; estabelecimentos comerciais modernos voltados ao consumo

consuntivo, como o único shopping center da cidade e hipermercados de redes

internacionais; restaurante fast food; condomínios residenciais verticais e

horizontais; loteamentos fechados; uma instituição privada de ensino superior;

serviços especializados etc.

Não obstante, a área central da cidade ainda reúne grande parte dos

fluxos urbanos e regionais, resultado do processo histórico de centralização, e

a concentração de atividades, cuja estrutura interna é definida pelo valor da

terra, intensidade comercial, verticalização e fluxo de pedestres e veículos. Na

última década, ela tem recebido numerosos investimentos governamentais

para obras de embelezamento de espaços públicos, com a recuperação de

alguns equipamentos socioculturais e a construção de novos locais para

realização de eventos, representando “[...] a maximização de externalidades,

seja de acessibilidade, seja de aglomeração” (CORRÊA, 1997, p.124).

Ribeiro Filho (2004) adverte, porém: o modelo de área central definido

em meados do século XX não corresponde à realidade atual, pois suas funções

foram “[...] modificadas pela consolidação do processo de descentralização e

pelo avanço dos sistemas de informações que afetaram o gerenciamento das

funções de controle e decisão” (p.157).

É necessário observar as mudanças ocorridas nas últimas décadas,

em face do surgimento de novos espaços comerciais nas cidades e dos novos 75 Esta área recebeu os investimentos públicos iniciais em meados da década de 1970, quando o primeiro Plano Diretor (1975) da cidade estabeleceu eixos de expansão urbana associados ao desenvolvimento econômico, orientados para as direções noroeste (saída para Fortaleza) e sudeste (saída para Natal). Estes eixos também foram beneficiados por políticas habitacionais públicas, que além da implantação de infraestrutura básica e serviços, também foram responsáveis por financiamentos voltados a classes de renda média, com taxas de juros abaixo do valor de mercado e longos prazos para pagamento (ELIAS; PEQUENO, 2010).

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contextos sociais adquiridos por elas. Salgueiro e Cachinho (2009, p.17)

apontam algumas mudanças que vão implicar estas transformações num

contexto global:

Com a continuada descentralização da actividade comercial, a multiplicação das formas de comércio, o aparecimento de novos centros de comércio e serviços especializados, tanto na cidade como na periferia, e a perda de importância do Centro de comércio tradicional, o esquema “clássico” de organização urbana da actividade começa a ser desafiado na sua dupla vertente da estrutura hierárquica e da proeminência do centro único. Assiste-se à substituição progressiva deste modelo de organização por outro, mais complexo, constituído por vários pólos, uns mais generalistas outros mais especializados, no seio do qual se desenvolvem complementaridades e concorrência entre diferentes tipos de centros, formas de comércio e formato de estabelecimentos. Entre as novas centralidades e as antigas, como mercados e “velhos” centros, se partilham os fluxos dos consumidores determinados agora por um complexo de factores e não apenas pelo simples princípio da proximidade e da centralidade.

Com a desconcentração das atividades comerciais, resultado das

novas estratégias econômicas que dependem de uma economia de escala e da

conquista de maiores mercados (SPOSITO, 2001b), surgem novos espaços de

consumo e novas centralidades que ajudam a entender a evolução e as

transformações da atividade em Mossoró. Neste sentido, conforme Elias e

Pequeno (2010, p.254), Mossoró está passando por uma situação de

bipolarização de centralidades principais da cidade, na qual

[...] por um lado, o centro tradicional foi complementado com investimentos públicos nesses novos equipamentos e, por outro, a nova centralidade se consolida a cada novo empreendimento imobiliário residencial ou inerente ao terciário. A facilidade de acesso através de vias regionais, como a BR-304, também confirma essa hipótese, visto que as duas centralidades, quando associadas, assumem um caráter regional, atendendo a demandas de outros vários municípios vizinhos.

Portanto, consoante verificamos, o processo de concentração

econômica de grandes grupos atuantes no setor comercial e de serviços e no

setor da produção imobiliária provoca alterações nas estratégias econômicas e

locacionais, expressas nas relações entre o centro e a periferia na estrutura

urbana (SPOSITO, 1998), e acrescentaríamos, ainda, nas articulações

regionais.

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As novas centralidades promovem uma reestruturação interna das cidades, as centralidades intra-urbanas e inter-urbanas, pois os novos fluxos comerciais atuam não somente nas cidades receptoras de novas formas comerciais, mas também na área de influência e polarização destas (CLEPS, 2004, p.129).

No contexto das cidades médias, Oliveira Júnior (2008, p.218) salienta

que os novos papéis desempenhados por estas cidades perante a divisão

territorial do trabalho impelem “a necessidade de criar novas áreas centrais,

tornando as cidades médias atrativas à localização de novos artefatos ou

equipamentos comerciais e de serviços pautados em novos fluxos [...]”.

Como mostraram a revisão bibliográfica feita durante toda esta

pesquisa e os vários trabalhos de campo realizados, o comércio mossoroense

está bastante associado à difusão do consumo produtivo e consuntivo. A

expansão e diversificação econômica, aliada à modernização das atividades,

em especial das comerciais, acompanharam as mudanças no setor,

favorecendo a chegada de novos agentes econômicos na cidade.

Estes agentes dinamizaram o comércio ao introduzir novas técnicas de

distribuição e comercialização de bens e serviços; difundindo ramos de

atividades modernas e sofisticadas, tais como supermercados, hipermercados,

shopping centers etc.; e tudo isso “[...] multiplicou e tornou mais complexos os

fixos e os fluxos na cidade de Mossoró e região, que vem reorganizando sua

estruturação urbana e regional” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.196). São os

novos fixos e fluxos urbanos que indicam a velocidade e intensidade do

processo de mudanças no comércio em Mossoró, sobretudo na última década.

Entretanto, a reorganização do comércio vai muito além da difusão de

equipamentos de consumo modernos, da redefinição dos conteúdos da área

central, da formação de uma nova centralidade etc. Ela está diretamente

relacionada a um processo de reestruturação mossoroense, que envolve as

novas funções da cidade, a dinamização econômica, a ampliação dos fluxos

financeiros, entre outros aspectos.

A nosso ver, o estudo das atividades comerciais deve considerar o

contexto no qual elas estão inseridas, marcado nas últimas décadas pela

financeirização das relações econômicas e sociais. Ao ser incorporada à nova

divisão interregional do trabalho, a cidade assimilou novos modelos de

produção e de consumo, favorecendo o desenvolvimento de atividades

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modernas, direta ou indiretamente, associadas às transformações no comércio.

Poderíamos citar como exemplo a expansão de um dos setores que primeiro

se adaptaram às transformações ocasionadas pela reestruturação produtiva e

pela modernização da produção em nível mundial: o sistema bancário e

financeiro.

Grande parte da flexibilidade geográfica e temporal da acumulação

capitalista foi possível graças à concentração de poder das instituições

financeiras e ao surgimento de novos instrumentos e mercados financeiros

(HARVEY, 2007). Para o autor, a ampliação do sistema internacional de crédito

é fator essencial para a criação de um mercado mundial e a formação da sua

estrutura (HARVEY, 2005).

Em decorrência da dinamização em curso em todo o setor comercial e

de serviços no país e em Mossoró, os grandes bancos têm aumentado o

volume da sua economia de escala e das suas carteiras de empréstimos mais

ativamente desde 2003, ampliando sua base de clientes e se posicionando em

mercados com elevado potencial de crescimento. De acordo com os analistas

financeiros Berenholc, Zaniboni e Araújo (2005, p. 1):

Após um período dinâmico de fusões e aquisições, os grandes bancos têm concentrado seus esforços no crescimento orgânico e nos acordos com grandes redes de varejo e com bancos de pequeno e médio porte para adquirir toda ou parte da carteira de financiamento ao consumo dessas entidades.

A razão desses acordos, afirmam os autores, está na capacidade dos

bancos de menor porte e das redes de varejo “[...] em atender e oferecer

financiamento às pessoas físicas de menor renda, utilizando de uma ampla

rede de correspondentes bancários ou de suas estratégias de lojas, no caso da

rede de varejos”, que vai desde as operações de crédito ao consumo e a

pequenas e médias empresas, aos empréstimos consignados em folha de

pagamento (BERENHOLC; ZANIBONI; ARAUJO 2005, p. 1).

Na última década, houve um aumento no número de instituições

bancárias públicas e privadas em todo o país. Enquanto as primeiras foram

responsáveis pelo financiamento de obras de infraestrutura, habitação e

modernização de atividades produtivas agrícolas e industriais, as segundas se

deslocaram para áreas propícias à reestruturação econômica (ELIAS;

PEQUENO, 2010).

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Mossoró participa desta lógica desde o início do século XX, com a

chegada das primeiras instituições de crédito, mas em virtude do índice de

desenvolvimento econômico nos últimos anos em todos os setores da

economia (de acordo com a mídia local), atualmente a cidade possui grande

potencial financeiro, e sobressai por se tratar de uma cidade polo, segundo

declaração do presidente da Associação Industrial e Comercial de Mossoró.

Esses fluxos são incrementados pela intensa circulação de pessoas de

várias cidades do Estado do Rio Grande do Norte, e até mesmo de Estados

vizinhos, contribuindo, desse modo, para que as instituições financeiras

acreditem e invistam na cidade. Em contrapartida, como declara Felipe (1980),

esta expansão financeira e bancária elimina setores tradicionais, provoca

desequilíbrios nas economias regionais e manipula a penetração do capital

nacional e internacional na cidade e região.

Na percepção de Elias e Pequeno (2010), a difusão de serviços

associados à monetarização da vida social e a disseminação do crédito em

Mossoró são condição e consequência da reestruturação econômica pela qual

passa a cidade, principalmente após a década de 1990, e estão associadas à

produção e ao consumo. De acordo com estes autores, a expansão e o

funcionamento do sistema financeiro na cidade podem ser entendidos a partir

Da reorganização econômica de Mossoró e região; suas rendas monetárias; o desenvolvimento das atividades assalariadas; a difusão do crédito como instrumento de viabilização da inserção da cidade na lógica da produção e das trocas globalizadas; a construção das infraestruturas econômicas urbanas, na qual o Banco Nacional da Habitação teve papel destacado etc. [...] (ELIAS E PEQUENO, 2010, p.206).

Como evidenciamos, a rede bancária da cidade é composta por

instituições públicas (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Banco do

Nordeste) e privadas (Bradesco, Unibanco, Itaú e HSBC), cujas agências estão

localizadas no Centro e em bairros adjacentes, demonstrando a forte

concentração do setor na área central da cidade. No Centro existe também

uma agência dos Correios, onde é possível a realização de determinados

serviços, tais como pagamento de contas, além dos comumente prestados pela

instituição.

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No caso dos postos de autoatendimento, estes estão dispersos pela

cidade, instalados nas próprias agências e em supermercados, universidades,

instituições públicas, no shopping center, entre outros. Para Sposito (2007a,

p.238), “o aumento do número de caixas eletrônicos altera de forma

significativa as dinâmicas de estruturação do espaço urbano”. Nos quadros a

seguir é possível verificar a quantidade de agências, postos de

autoatendimento, entre outros serviços, assim como observar a localização e a

concentração espacial de cada equipamento na cidade, conforme o mapa 3.

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Quadro 2: Mossoró. Rede bancária

Bancos Agências Postos de

Auto-atendimento

Banco do Brasil* 3 17 Caixa Econômica** 4 7

Bradesco 2 9 Unibanco 1 3 Itaú 1 3 Banco do Nordeste 1 -

HSBC 1 - Banco Postal 1 - Total 13 39

* Além das três agências mencionadas e dos dezessete caixas eletrônicos espalhados pela cidade, o Banco do Brasil também oferece a modalidade Banco Popular com quatro postos de serviço na cidade. **Além das quatro agências mencionadas, a Caixa Econômica atua na cidade também por meio de quatro agências lotéricas, outros seis pontos Caixa Aqui (que levam os serviços e produtos da empresa até os locais de difícil acesso, onde não existem agências bancárias. Os pontos de atendimento são conectados em tempo real com a Caixa, estão, em regra, instalados em estabelecimentos comerciais de atendimento ao público), e está integrada a nove bancos. Fonte: Trabalho de campo76. Elaboração da autora. (2010).

Quadro 3: Mossoró. Localização das agências bancárias, postos de autoatendimento, pontos Caixa Aqui e lotéricas

Bairros Agências Auto-

atendimento Caixa Aqui*

Bancos integrados*

Banco Popular**

Lotéricas da Caixa

Centro 9 16 1 2 2 4 Doze Anos 3 - - - 2 - Ilha de Santa Luzia 1 1 - - - -

Abolição - 4 - 2 1 - Aeroporto - 4 - 1 - Barrocas - 1 2 1 1 - Alto São Manoel - 2 1 1 - -

Bom Jardim - 3 1 - - - Belo Horizonte - 2 1 - 1 - Outros - 6 - - 2 - Total 13 39 6 7 9 4 *Vinculados à Caixa Econômica. ** Vinculados ao Banco do Brasil. Fonte: Trabalho de campo. Elaboração da autora (2010).

76 As informações sobre a rede bancária da cidade foram coletadas e conferidas por Priscila Romcy, membro do GLOBAU.

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Mapa 3: Mossoró. Localização das agências bancárias, postos de autoatendimento, pontos Caixa Aqui, bancos integrados, banco popular e lotéricas

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Sobre a expansão do crédito, na opinião do presidente da Câmara de

Dirigentes Lojistas de Mossoró, "o lojista prioriza o cartão para não ter

prejuízo”, apesar de ter um custo com esse serviço. No caso mossoroense, o

uso do cartão de crédito cresceu entre “as classes C e D para aquisição de

alimentos, eletrodomésticos, equipamentos de informática, celulares, móveis e

serviços”, refletindo o aumento de 14% no número total de cartões de crédito e

débito em circulação no Brasil em 2008 em relação ao ano anterior77.

Além de favorecer os clientes particulares, a expansão da rede

bancária mossoroense também oferta linhas de crédito associadas às

atividades econômicas da cidade, via financiamentos para empresas. Portanto,

a disseminação do crédito foi fundamental para a modernização da produção

regional e a expansão da economia mossoroense, corroborando Santos (2004,

p.229) ao afirmar:

O crédito é indispensável, tanto para os agentes como para os consumidores. Para os primeiros, em geral, é a única possibilidade de ingressar ou de se manter em atividade. Para os segundos, o crédito representa a possibilidade de acesso ao consumo, mesmo que não tenham renda fixa.

Em Mossoró, as instituições bancárias dispõem de crédito para

empresas de pequeno, médio e grande porte, assim como para pessoa física,

mediante normas diferenciadas conforme o tipo de cliente e de financiamento.

Nesta âmbito, as linhas de crédito do Banco do Nordeste78 oferecem crédito

para aplicações em indústria, comércio, serviços, agricultura familiar,

agroindústria, rural, crédito fundiário e de combate à pobreza rural, turismo,

tecnologia etc.

Já a Caixa Econômica79 garante crédito para financiamento imobiliário,

com recursos oriundos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço ou

Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo para aquisição de um imóvel

residencial, podendo financiá-lo integralmente. Existem também outras linhas

77 “Compras pagas com cartão de crédito aumentam”. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 8/2/09. 78 Para mais informações sobre cada linha de financiamento, consultar site do Banco do Nordeste do Brasil. http://www.bnb.gov.br/Content/Aplicacao/Grupo_Principal/Home/Conteudo/PortalBN.asp. 79 Para mais informações sobre cada linha de financiamento, consultar site da Caixa Econômica Federal. http://www.caixa.gov.br/.

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de financiamento tais como: Família CDC80, Crédito Pessoal, Cartão de

Crédito, Consignação Caixa, Empréstimo para aposentados do INSS, Cheque

Especial Penhor, Construcard Caixa81, PROGER, FIES, Antecipação do 13º

Salário, Antecipação da Restituição do IR e Crédito Pós-Graduação Caixa.

O Banco do Brasil82 concentra seus financiamentos em vários setores.

Entre estes, salientamos o Convênio BB Agro, mediante parceria entre o Banco

do Brasil e as empresas que fabricam e/ou comercializam máquinas e

equipamentos agropecuários, fornecedores de insumos e agroindústrias.

Portanto, a regulação financeira foi “primordial para a reorganização da

produção e do espaço de Mossoró” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.207),

sobretudo com a utilização da ciência, das inovações tecnológicas e da

informação, que estimulou a instalação de equipamentos comerciais e de

serviços modernos e intensificou os fluxos na cidade, dinamizando inclusive

outros setores, como, por exemplo, o de hotelaria.

Nos últimos anos, a expansão e diversificação econômica da cidade

têm atraído um número de visitantes cada vez maior, demandando uma

ampliação do setor. Como enfatizam Elias e Pequeno (2010, p.220), os

empreendimentos no ramo hoteleiro estão fortemente “associados ao consumo

produtivo, inerente aos principais setores econômicos da cidade,

especialmente, da extração de petróleo e da fruticultura”.

De acordo com o guia de endereços da cidade83 e com os trabalhos de

campo realizados para conferência de endereços dos hotéis, atualmente a

cidade possui 21 estabelecimentos hoteleiros84. Para nosso estudo,

selecionamos os estabelecimentos com características da modernização no

setor, com fortes investimentos em treinamentos de funcionários e

infraestrutura, que atendem um público cada vez mais associado às atividades

80 Empréstimo pessoal realizado pela CEF. São diversos tipos de CDC com valor máximo de R$ 15.000,00, a ser pago em até 36 meses. 81 O Construcard Caixa é uma linha de crédito destinada à compra de materiais de construção e similares, que pode ser feita por meio de cartão magnético em estabelecimentos comerciais do ramo, credenciados pela Caixa. 82 Para mais informações sobre cada linha de financiamento, consultar site do Banco do Brasil. http://www.bb.com.br/portalbb/home23,116,116,1,1,1,1.bb. 83 Disponível em: http://www.telelistas.net/1/30_RN/84049_mossoro/227/387/44466/hoteis.htm. Acesso em: 12/6/10. 84 Contudo, a maioria dos estabelecimentos constitui-se de pousadas, com ambiente simples.

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econômicas85, chegando a Mossoró por meio do chamado “turismo de

negócios”.

O primeiro grande hotel construído na cidade foi o Thermas, em

197986. Somente no ano de 1990, outro estabelecimento hoteleiro foi

inaugurado, o Hotel Sabino Palace, o primeiro de uma rede que atualmente

possui outros quatro empreendimentos em todo o Estado87. Mas a partir dos

anos 2000, houve a instalação de vários empreendimentos em Mossoró,

marcando um momento de mudança expressiva no perfil dos hotéis da cidade,

cada vez mais modernizados e atendendo a padrões internacionais, a saber: o

Hotel Villa Oeste (2003)88, o Hotel Valley (2005)89, o Vitória Palace Hotel

(2007)90 e o Garbos Trade Hotel (2008)91.

85Atividade salineira, petrolífera e da fruticultura. 86 Hoje, chamado de Hotel Thermas & Resort, foi erguido sobre uma rica província mineral e sua história está literalmente associada à descoberta de petróleo na cidade de Mossoró, ocorrida durante o abastecimento das piscinas do estabelecimento. Desde então iniciou-se a exploração de petróleo em terra no Estado. Foi inaugurado através de um projeto do governo do Estado para interiorizar o turismo aproveitando as potencialidades das águas termais. Diante de dificuldades de gerência do gigantesco empreendimento, feita até então por órgãos públicos, a administração do hotel foi entregue ao grupo hoteleiro francês Novotel, permanecendo na direção até o ano de 1991, quando foi privatizado. Atualmente o Hotel Thermas & Resort possui 200 mil m² de área e disponibiliza diversos serviços aos hóspedes como áreas de lazer, prática de esportes, salões para realização de eventos (quatro salões que têm de 80m² a 400m²), parque aquático, apartamentos com TV a cabo e circuito interno de TV, entre outros. Para mais informações ver http://www.hotelthermas.com.br/ 87 Além do hotel localizado em Mossoró, a rede conta com o Hotel Natal Praia, em Natal; o Hotel Costa Atlântico, em Areia Branca; o Hotel Lajedo, em Apodi; e o Hotel Serrano, em Martins. Segundo a gerente operacional da rede, todos os hotéis são de categoria três estrelas e além da rede de hotéis, o grupo tem o projeto de lançamento de um empreendimento no ramo gastronômico (um café). 88 O hotel possui internet wi-fi em todas as áreas sociais e nos apartamentos; estacionamento coberto e privativo; salão de jogos e biblioteca, serviços de organização de passeios e aluguel de carros etc. Para os hóspedes que estão a trabalho na cidade, o hotel oferece ainda um business center, isto é, uma central de trabalho equipada com toda estrutura necessária para um escritório temporário, com microcomputadores e impressoras em duas workstations, serviços de fax, xerox e correio. Além deste escritório, o hotel possui três salões climatizados e equipados e um espaço para realização de feiras, exposições, lançamento de produtos, shows e formaturas, com capacidade para até 30 mil pessoas, o “Espaço Villa”. Para mais informações acessar http://www.villaoeste.com.br/eventos.html. Acesso em 5/1/10. Além do hotel, o proprietário possui outro empreendimento, uma concessionária de carros (Potiran). 89 O hotel disponibiliza em todos os apartamentos serviço de internet sem fio 24 horas, TV a cabo, frigobar e ar condicionado e também conta com serviço de mensageiro. 90O hotel dispõe de piscina aquecida a energia solar, salão de eventos, business center etc. e todos os apartamentos possuem internet wi-fi. Todas as informações sobre o hotel foram obtidas no site: http://www.vitoriapalacehotel.com.br. Acesso em: 5/1/10. 91 O empreendimento é considerado de padrão “superior”, o equivalente a 4 estrelas. É de capital local em parceria com o Banco do Nordeste do Brasil e recebeu um financiamento de R$ 1,8 milhão do BNB para se instalar em Mossoró, recursos advindos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste. Fonte: Banco do Nordeste empresta R$ 1,8 milhão para instalar o Garbos Hotel. Jornal De Fato, Mossoró, 28/10/2008. O público alvo são as pessoas que realizam turismo de negócios, sendo seu melhor cliente a Petrobras, de acordo

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Figura 1: Mossoró. Hotel Thermas & Resort

Fonte: Hotel Thermas & Resort92 (2010).

Figura 2: Mossoró. Hotel Sabino Palace

Fonte: Hotel Sabino Palace93 (2010).

Figura 3: Mossoró. Hotel Villa Oeste

Fonte: Hotel Villa Oeste94 (2010).

Figura 4: Mossoró. Hotel Valley

Fonte: Hotel Valley95 (2010).

com o gerente de vendas. Em 2009, o Hotel Garbos foi escolhido pela organização da 8ª Edição da Expofruit como o hotel oficial do evento, hospedando os diversos expositores e palestrantes nacionais e internacionais da área da fruticultura, além de representantes de associações de frutas de todo Brasil. Para mais informações sobre o hotel ver http://www.hotelgarbos.com.br/ 92 Disponível em: http://www.hotelthermas.com.br/_imgs/fotos/localizacao01g.jpg. Acesso em 12/6/10. 93 Disponível em: http://www.hoteissabinopalace.com.br/hotelsabino.htm. Acesso em: 12/6/10. 94 Disponível em: http://www.villaoeste.com.br/galeria.aspx. Acesso em: 12/6/10. 95Disponível em: http://www.hotelvalley.com.br/. Acesso em 12/6/10.

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Figura 5: Mossoró. Vitória Palace Hotel

Fonte: Vitória Palace Hotel96 (2010).

Figura 6: Mossoró. Garbos Trade Hotel

Fonte: Internet97 (2010).

De acordo com notícia de jornal local98, está sendo construído um

empreendimento de grande porte na cidade, o Íbis Hotel, com previsão de

inauguração até final de 2011. Isto reforça o crescimento e o potencial do setor

da cidade99.

Para a prefeitura municipal, a ampliação da rede hoteleira faz parte da

política de expansão das atividades turísticas no município, também estimulada

pelo calendário de eventos da cidade, ocorridas praticamente durante todo o

ano e responsáveis por estimular a economia mossoroense.

96 Disponível em: http://www.vitoriapalacehotel.com.br/novosite/. Acesso em 12/6/10. 97 Disponível em: http://www.liegebarbalho.com/coluna/imagens/garbos.jpg. Acesso em 12/6/10. 98 Rede internacional Accor começará a construir hotel em Mossoró. Jornal Correio da Tarde, Mossoró, 19/6/2009. 99 O grupo francês Accor, responsável pela construção do Íbis Hotel, tem apoio da Prefeitura Municipal de Mossoró e já deu início às obras, sendo considerado um dos maiores empreendimentos dos últimos anos. O secretário municipal do Desenvolvimento Econômico afirmou que o hotel terá dez andares e 123 apartamentos e um custo avaliado em R$ 12 milhões, com um padrão executivo. Uma obra desse porte implicaria a geração de muitos empregos diretos e ampliaria as possibilidades turísticas do município, tanto no Brasil como no exterior. Segundo informações da Prefeitura Municipal de Mossoró, um grupo hoteleiro paraibano, que atualmente detém o controle da franquia do Íbis Hotel de João Pessoa, irá investir R$10 milhões na construção a ser feita no Bairro Ilha de Santa Luzia. O terreno foi doado pela prefeitura via Programa de Desenvolvimento Econômico.

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Entre os principais eventos, destacamos o Mossoró Cidade Junina100 e

Chuva de Bala no país de Mossoró101, no mês de junho; Festa do Bode102,

Mossoró Moto City103 e Air Fest Mossoró104, em julho; a Feira Internacional da

Fruticultura Tropical Irrigada105 e a Feira Industrial e Comercial da Região

Nordeste106, em agosto; Auto da Liberdade107, em setembro; Mossoró, Terra de

Santa Luzia108, no mês de dezembro.

É no período de realização destas festas populares e dos eventos de

negócios associados às atividades econômicas que a rede hoteleira fica lotada.

Nesta época a demanda por leitos supera a oferta. Apesar do notório

crescimento do setor, o ex-presidente do Sindicato de Hotéis, Bares,

Restaurantes e Similares de Mossoró afirma não ser possível avaliar o ramo

hoteleiro num curto período de tempo, pois há momentos de altos e baixos no

setor109. Ele acredita que em Mossoró a circulação de executivos de empresas

100 Evento junino que acontece anualmente na Estação das Artes Elizeu Ventania, em Mossoró. Reúne mais de 1 milhão de pessoas durante os dias de festa, sendo considerado a terceira maior festa de São João do país. Disponível em: http://odia.terra.com.br/portal/diversaoetv/html/2010/6/festa_de_sao_joao_agita_a_cidade_de_mossoro_no_rio_grande_do_norte_88892.html. Acesso em: 31/8/10. 101 O evento compõe o Projeto “Teatro a Céu Aberto”. Trata-se de uma ode à liberdade, comemorando a resistência de Mossoró ao bando de Lampião, fato ocorrido há 75 anos. Cerca de 75 artistas encenam a maior derrota de Lampião. 102 A Festa do Bode faz parte do Circuito Estadual de Eventos do Agronegócio, integra a categoria dos grandes acontecimentos da agropecuária do Estado e ocorre anualmente durante o mês de agosto. Consiste na exposição de caprinos e ovinos de várias raças, premiação para os melhores expositores, feira de animais, inclusive com financiamento de Bancos oficiais, Torneio Leiteiro, com premiação dos vencedores, Seminário sobre a cadeia produtiva da caprinovinocultura, com técnicos e pesquisadores de várias instituições de pesquisa, exposição e feira de produtos e serviços ligados à área da agricultura e pecuária, entre outras atividades. 103 Evento que reúne amantes do motociclismo de todo o país (cerca de 1.000 motociclistas em 2002) com exposição de motos, estandes de acessórios, gincanas, enduro de regularidade, shows musicais, acrobacias sobre motos, motocross e premiações. 104 Evento aéreo que reúne no Aeroporto Dix-Sept Rosado aeronaves oriundas de várias partes do país, com apresentação de paraquedistas e da Esquadrilha da Fumaça. 105 Evento da fruticultura irrigada, com destaque para a produção de frutas tropicais: melão, caju e banana. A feira atrai expositores do Brasil e Exterior, incluindo produtores e negociadores de safra, e conta com o patrocínio do Governo do Estado e da Prefeitura Municipal de Mossoró. 106 É uma feira da indústria, comércio e serviços do Rio Grande do Norte. Reúne expositores de todo o Nordeste. 107 Ópera popular que celebra, em quatro atos, a diversidade cultural do município: a abolição da escravatura antes da Lei Áurea (1883), o Motim das Mulheres (1875), o primeiro voto feminino da América Latina (1927). O evento acontece num palco de 2.500 m² ao ar livre, envolvendo 2.205 atores. 108 Festa da padroeira da cidade. A festa consta de um espetáculo teatral que conta a trajetória da santa. 109 Rede hoteleira comemora bons resultados em meio à crise. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 2/6/09.

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terceirizadas da rede petroleira na cidade é o que mais contribui para a

estabilidade no segmento.

Interessante destacar a distribuição espacial dos hotéis na cidade.

Estes, em sua maioria, localizam-se nas proximidades de eixos viários, e no

caso dos hotéis selecionados para análise, todos estão situados em

importantes eixos rodoviários de acesso à cidade, como a BR-304, a BR-110 e

a RN-117.

Em ambos os casos fica clara a questão da acessibilidade como fator

relevante para a localização dos empreendimentos da hotelaria. Como afirma

Harvey (2005, p.222), “o capitalista comercial e hoteleiro se dispõem a pagar

um ágio pelo terreno, por causa de sua acessibilidade”, embora, em alguns

casos, a própria prefeitura tenha cedido terreno aos empresários do setor por

conta de programas governamentais de incentivo ao desenvolvimento

econômico.

Quadro 4: Mossoró. Rede hoteleira

Nome do estabelecimento

Ano de inauguração

Número de apartamentos

Número de leitos

Maior diária110

Menor diária Localização

Hotel Thermas & Resort 1979 145 350 R$ 900,00 R$ 350,00 Santo Antônio

Hotel Sabino Palace 1990 97 320 R$ 227,00 R$ 95,00 Alto de São

Manoel

Hotel Villa Oeste 2003 84 191 R$ 629,00 R$ 108,00 Ilha de Santa Luzia

Hotel Valley 2005 57 121 R$ 105,00 R$ 69,90 Ilha de Santa Luzia

Vitória Palace Hotel 2007 41 80 R$ 430,00 R$ 125,00 Nova Betânia

Garbos Trade Hotel

111

2008 110 250 R$ 540,00 R$ 198,00 Santo Antônio

Fonte: Trabalho de campo. Elaboração da autora (2010).

110 As informações sobre as tarifas de todos os hotéis foram coletadas em janeiro de 2010, quando o valor do salário mínimo brasileiro era de R$510,00. 111 O pagamento da tarifa também pode ser efetuado em dólares (U$). Neste caso, o interessado tem de contatar o hotel via telefone ou email.

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Mapa 4: Mossoró. Localização dos hotéis

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Atualmente, a rede hoteleira mossoroense é composta em sua maioria

por estabelecimentos de capitais locais e regionais. Com as novas articulações

espaciais de Mossoró, a redefinição das suas funções e da sua centralidade, o

setor vem atentando para os novos fluxos que se intensificam na cidade e em

sua região de influência, incitando a adequação dos empreendimentos ao novo

perfil dos clientes (empresários, profissionais especializados etc.). Esta

mudança implica a qualificação do quadro de funcionários, maiores

investimentos nas infraestruturas dos estabelecimentos, na modernização e

diversificação dos serviços de atendimento aos hóspedes etc.

A internacionalização das atividades econômicas modernas, o

crescimento da demanda por serviços e o city marketing de Mossoró (mediante

eventos e infraestruturas socioculturais) alavancaram a atividade hoteleira na

cidade, especializada cada vez mais. Outro fator a contribuir para a expansão

do setor são ações da prefeitura que interferem nos ambientes urbanos

construídos e numa espetacularização de festas tradicionais112 para

legitimação do poder de determinada oligarquia local113, presente há décadas

no cenário político da cidade.

Desta maneira, as recentes dinâmicas do comércio, com a chegada de

novos equipamentos modernos, e dos serviços, a exemplo do crescimento da

rede bancária e hoteleira, demonstram as novas racionalidades implementadas

no cotidiano e na economia local e regional, nos levando a entender que a

expansão da atividade comercial não pode ser estudada isoladamente de

outros fatores que também contribuem para o crescimento econômico

mossoroense de modo geral.

No próximo capítulo continuaremos aprofundando a análise acerca das

transformações no comércio de Mossoró, a partir do perfil hodierno das

atividades modernas e tradicionais e das suas correlações com o espaço

urbano, porquanto este se constitui como condição e baluarte ao

desenvolvimento de atividades comerciais.

112 Sobre a espetacularização de festas tradicionais ver Bezerra (2007). 113 Sobre oligarquia local ver Felipe (2001).

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3 O MODERNO E O TRADICIONAL: NOVAS DINÂMICAS

SOCIOESPACIAIS

Nos capítulos anteriores pudemos compreender o processo de

consolidação de Mossoró como centro regional no Nordeste brasileiro,

observando a evolução e diversificação de sua economia, com destaque para

as atividades comerciais e de serviços, além das transformações espaciais,

políticas e sociais ocorridas ao longo da sua história.

Vimos também o conjunto de mudanças que engendraram a

reorganização do comércio da cidade, sobretudo após os anos 1980, as quais

contribuíram decisivamente para reestruturações espaciais. A dinâmica

econômica estabelecida pelo capital, que intensificou os fluxos, também

determinou mudanças no espaço urbano e regional, por meio de novas

relações entre as escalas geográficas, pela redefinição das centralidades e

pelas estratégias locacionais de novos fixos.

Neste último capítulo traremos à discussão os novos fixos e fluxos

estabelecidos diante do perfil atual da atividade comercial, no tocante à

instalação de equipamentos modernos de consumo; à intensificação dos fluxos

e ao desenvolvimento de novas atividades; e à coexistência entre estas

atividades modernas e o comércio tradicional. Por se tratar de estudo abalizado

em reflexões teóricas consolidadas em pesquisadores do tema, poderemos

compreender o processo de desconcentração das atividades comerciais e suas

implicações para o espaço urbano, observando a atuação de antigos e novos

agentes econômicos, as relações entre segmentos tradicionais e modernos no

setor e as principais transformações econômicas e espaciais.

3.1 OS MERCADOS POPULARES

Desde seus primórdios, a atividade comercial desempenha forte função

social e econômica, associada a trocas de excedentes da produção, a

questões de abastecimento da população e, portanto, a necessidades básicas

de sobrevivência. Tal necessidade acabou gerando encontros, fluxos de

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pessoas, os quais, por sua vez, deram origem ao lugar do mercado.

Posteriormente, os mercados e as feiras deixaram de ser apenas espaços de

trocas para se tornarem locais de distração e divertimento, acompanhando as

mudanças nos espaços varejistas e submetidos às exigências das novas

formas de produção (VARGAS, 2001).

Nas últimas décadas, os espaços comerciais tradicionais em Mossoró

sofreram diversas mudanças em seus conteúdos, embora ainda preservem

antigas relações sociais. Na afirmação de Ortigoza (2008), a existência e a

permanência dos mercados nas cidades mostram as relações contraditórias

articuladas na atualidade: cultura, consumo, imagem, tradição. Logo, “[...]

muitas das ‘antigas’ formas comerciais conseguem sobreviver no decorrer do

tempo, pois permitem relações de confiança, sociabilidade, solidariedade” (p.6),

associadas a uma imagem de “tradição”.

No mercado, um local que poderia ser considerado desprovido do conforto moderno que é oferecido por outros empreendimentos de comércio de alimentos, o ato de comprar e vender os produtos da terra, faz com que as pessoas se sintam mais próximas a ela e se sintam identificadas com o lugar, já que ele ali está há algum tempo (PINTAUDI, 1999, p.77,78114 apud ORTIGOZA, 2008, p.6).

Em Mossoró poderíamos, portanto, identificar alguns estabelecimentos

comerciais detentores de uma imagem tradicional. Entre estes, destacamos o

Mercado Municipal Manoel Teobaldo dos Santos e o Mercado Comercial do

Vuco-Vuco.

3.1.1 Mercado Municipal Manoel Teobaldo dos Santos

O Mercado Municipal Manoel Teobaldo dos Santos, popularmente

conhecido como Mercado Central, foi inaugurado em 1877. Em 1948 passou

por uma grande reforma e até a década de 1980 era caracterizado pela

comercialização de artigos alimentícios como carnes, frutas e verduras.

114 PINTAUDI, S.M.Public Market Survival: culture and consumption. In: SALGUEIRO, T.B. (org.). The globalization of consumption and retail places. Lisboa: UGI/GECIC, 1999. p.69-80 (Trade and Society Collection, 20).

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Figura 7: Mossoró. Mercado Público no ano de 1897

Fonte: Internet.115

Figura 8: Mossoró. Mercado Público no ano de 1961

Fonte: Internet.

A partir de 1988, o mercado efetuou uma mudança nos produtos

comercializados; deixou de vender carnes para abrigar o comércio de roupas,

calçados, aviamentos, redes etc., o qual atualmente é abastecido

principalmente por Fortaleza – CE e Caruaru – PE116. Após muitos anos sem

nenhuma reforma, o Mercado Central teve sua estrutura melhorada no ano de

2007, com reparos na instalação elétrica, no retelhamento, com construção de

um bicicletário e com uma nova pintura117.

Hoje, o mercado possui uma área aproximada de 2.700 m² e abriga em

torno de 100 comerciantes, cujos boxes118 pertencem à prefeitura, além dos

que trabalham nas imediações do prédio, estimulando o comércio ambulante

fora do mercado. A prefeitura municipal cobra, mensalmente, o aluguel de cada

ponto, de acordo com a metragem do boxe, assim como a água e a energia

elétrica consumidas119.

115 As fotografias do Mercado Público (figuras 7 e 8) foram obtidas no site: http://telescope.zip.net/arch2010-02-01_2010-02-28.html. Acesso em: 8/6/10. Pela observação das fotografias e de acordo com informações do site, houve um aumento da área construída da edificação, tanto na largura quanto no comprimento, e, também, uma modificação total das suas linhas arquitetônicas. 116 Atualmente existem aproximadamente 100 boxes no mercado. 117 O custo da reforma foi estimado em R$ 67.000,00. Informações obtidas na notícia Mercado Municipal dá salto qualitativo após reforma. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 3/8/07. 118 Nome dado a cada loja, a cada espaço ocupado na área do Mercado Central. 119 Como alternativa para minimizar os gastos com despesas mantendo reduzidos os preços dos produtos comercializados e poderem, deste modo, concorrer com os demais, a maioria dos comerciantes não possui funcionários legalizados, isto é, ou trabalham sozinhos ou contam com “ajuda” de parentes ou amigos, evitando assim o pagamento de um salário mínimo e encargos sociais. Os comerciantes do local não têm um público alvo específico, visto a variedade dos frequentadores do mercado, indo desde turistas a pessoas de diversos níveis de poder aquisitivo, embora a maior parte dos compradores seja de Mossoró.

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Figura 9: Mossoró. Mercado Público

Fonte: Edna Couto, 2007.

Figura 10: Mossoró. Boxe no Mercado Público

Fonte: Edna Couto, 2007.

O intenso fluxo de pessoas e mercadorias no local atrai grande

quantidade de ambulantes para os arredores do mercado, dinamizando o

“mercado informal” existente há pelo menos trinta anos. Contudo, a

comercialização de produtos no entorno do Mercado Central é maior aos

sábados, quando caravanas de municípios potiguares e até mesmo de outros

Estados chegam à cidade para realizarem suas compras, preferencialmente

com os comerciantes ambulantes, pelo baixo custo dos produtos ofertados120.

Todavia, muitos dos ambulantes reclamam da falta de condições de trabalho,

pois não existe um local apropriado para eles trabalharem, e da falta de

informações sobre os procedimentos para legalização do comércio.

Em entrevista concedida a jornal local121, um dos ambulantes afirmou

que em março de 2010 eram quinze trabalhadores “fixos” na Praça da

Independência122, localizada no Centro da cidade e conhecida por ser ponto de

comercialização de feirantes antes da remoção destes para o Mercado Central,

na década de 1980. Como se explicaria, então, um ambulante “fixo”? Neste

sentido, Pintaudi (2002, p.149-150) adverte

120 Os comerciantes ambulantes oferecem preços menores aos clientes, pois não pagam impostos à prefeitura e não têm outras despesas como água ou energia elétrica. Em entrevistas durante trabalho de campo, segundo afirmaram os proprietários de boxes do Mercado Central, estas transações comerciais não afetam as vendas do mercado e nem do shopping center, visto a diferença entre as demandas e os tipos de consumidores. Trabalho de campo realizado de 6 a 8 de outubro de 2007. 121 Ambulantes buscam inserção no mercado. Jornal De fato, Mossoró, 28/3/10. 122 Este número aumenta em datas sazonais, como Natal e Ano Novo.

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Há uma enorme variação entre esses comerciantes, que se diferenciam não só pela forma de propriedade das mercadorias e do ramo de comércio, [...] como também pela “propriedade do ponto”, na rua em que se estabelecem, o que os diferencia de uma parte dos ambulantes que efetivamente deambulam, carreando nos braços os produtos que oferecem. Trata-se de uma atividade extremamente hierarquizada e que, numa sociedade em que grande número de pessoas não encontra emprego, se torna um meio de garantir a sobrevivência, esta também muito diferenciada entre eles.

De acordo com o gerente de Desenvolvimento Urbanístico da PMM, há

um projeto para o Centro da cidade, no qual uma das etapas será de

realocação dos ambulantes do entorno do Mercado Central e de outros

espaços ociosos da cidade123. Conforme matéria publicada pelo jornal De Fato,

e segundo o gerente afirma, os primeiros passos já foram dados com a fixação

de estacionamentos para carros e vans vindas do interior nestes locais124.

Este processo é coerente com a dinâmica do modo de produção

capitalista, no qual “o amplo leque das práticas de classe, em associação com

a circulação do capital, a reprodução da força de trabalho e das relações de

classe, e a necessidade de controlar a força de trabalho permanecem

hegemônicos” (HARVEY, 2005, p.170). Assim, poderíamos associar esta

remoção dos ambulantes do entorno do Mercado Central de Mossoró ao

processo de requalificação das áreas centrais das cidades, voltado a garantir

condições de competitividade no mercado capitalista, em territórios cada vez

mais especializados (e requalificados).

De modo geral, as áreas centrais têm recebido muitos investimentos e

iniciativas de revitalização ou requalificação urbana, numa tentativa de

“adequá-las aos novos tempos, dar novos usos aos espaços e propor novos

hábitos aos citadinos, valorizando a dimensão estética da área” (MAIA, 2006,

p.68). Em sua discussão sobre as políticas urbanas de requalificação,

reordenamento e controle social no Rio de Janeiro, a autora mencionada afirma

que as áreas centrais da cidade tornaram-se alvo de intervenções físicas e de

controle social ou “ordem urbana”125, entre as quais ela cita: “medidas de

segurança, ordenação do comércio ambulante – com a criação de

123 Como os Mercados Públicos do Bom Jardim e do Alto da Conceição, além de áreas na Central de Abastecimento (antiga COBAL). 124 Entrevista concedida ao Jornal De Fato e publicada na notícia Ambulantes buscam inserção no mercado. Jornal De fato, Mossoró, 28/3/10. 125 Segundo Maia (2006, p.70), este termo é utilizado pelo prefeito da cidade do Rio de Janeiro.

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“camelódromos” –, definição de locais para estacionamento [...]” (MAIA, 2006,

p.70) etc.

Embora seja um estudo realizado em uma metrópole, reconhecemos

traços comuns com a realidade de Mossoró, cuja área central tem recebido

importantes investimentos na reestruturação urbana. Intervenções em

equipamentos urbanos e socioculturais trouxeram novos significados a esta

área da cidade, configurando-se no que Elias e Pequeno (2010, p.224)

denominaram de “embelezamento” dos espaços públicos.

Esta corresponde a uma estratégia de empreendedorismo urbano, na

qual “a região urbana pode buscar melhorar sua posição competitiva com

respeito à divisão espacial de consumo” (HARVEY, 2005, p.175). Ainda

conforme esta fonte, isto implica a valorização de áreas urbanas degradadas, a

inovação cultural e melhoria física do ambiente urbano, atrações para o

consumo e entretenimento etc. (p.176).

A administração pública de Mossoró adotou esta estratégia e, como

resultado, houve uma organização fragmentada do espaço, com investimentos

seletivos e a ampliação das desigualdades socioespaciais. Nas palavras de

Gomes (2006, p.219), o mercado de trabalho é apenas uma das dimensões do

processo de reestruturação da cidade, na qual “as formas tradicionais do setor

informal são recriadas, assumindo características específicas”. Segundo a

autora, a informalidade se redefiniu a partir da coexistência de atividades

tradicionais e modernas126.

Em prosseguimento à nossa análise sobre o Mercado Central de

Mossoró, desde o ano de 2009 existe a Associação dos Comerciantes do

Mercado Central, que conta com apoio do SEBRAE e da PMM, através da

Gerência da Indústria, Comércio e Turismo. O principal objetivo da associação

é coordenar ações no intuito de obter melhorias para os lojistas do

estabelecimento. Com esta finalidade, eles promovem treinamentos

126 No entendimento de Gomes (2006, p.219), “a informalidade engloba não apenas os aspectos associados ao mercado de trabalho – como subemprego, por exemplo, mas todo um conjunto de situações relacionadas à ausência de regularização e/ou, em última instância, ausência de Estado. Situações que contribuem para a proliferação e consolidação de relações sociais desprotegidas e, sobretudo, destituídas de marco legal. Nessa categoria se inserem desde os vendedores de serviços dos mais tradicionais e precários até os mais sofisticados como profissionais liberais bem qualificados que desenvolvem um trabalho de caráter imaterial. Estes também podem exercer uma forma de trabalho ambulante”.

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ministrados pelo SEBRAE, principalmente voltados para melhorias no

atendimento aos clientes.

De acordo com notícia publicada na mídia local127, há um projeto da

PMM de revitalização e modernização do mercado, transformando-o em um

shopping popular. Consoante informações da secretária de Desenvolvimento

Territorial e do Meio Ambiente, já foi desenvolvido um anteprojeto do novo

mercado, que prevê, entre outras inovações, a construção de um piso superior

para acomodar novos comerciantes, em especial, os localizados nas calçadas,

em virtude da falta de espaço no prédio atual. Além disso, se criarão

corredores livres na parte interna do mercado e também uma praça de

alimentação, ampliando assim a capacidade e a higiene do local. A secretária

complementa e diz que o projeto depende da dotação orçamentária128 e não

tem previsão para início das obras129.

Figuras 11 e 12: Mossoró. Ambulantes no entorno do Mercado Público

Figura 11: Mossoró. Ambulantes no entorno do Mercado Público

Fonte: Edna Couto, 2007.

Figura 12: Mossoró. Ambulantes no entorno do Mercado Público

Fonte: Edna Couto, 2007.

3.1.2 Mercado Comercial do Vuco-Vuco

Outro exemplo de um mercado popular em Mossoró é o Mercado

Comercial do Vuco-Vuco, conhecido como “feira do vuco-vuvo”. Neste mercado

há grande circulação de pessoas e pode-se encontrar uma infinidade de

127 Mercado pode ser transformado num shopping popular. Jornal Gazeta do Oeste, Mossoró, 10/3/09. 128 Que segundo a secretária ficará em torno de R$1,9 milhão. 129 Até a conclusão deste trabalho o projeto ainda não tinha sido iniciado.

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produtos, desde um simples pente a bens de consumo duráveis, além da

realização de vendas, trocas e aluguel de motos e carros.

Figura 13: Mossoró. Mercado do Vuco-Vuco (parte externa)

Fonte: Edna Couto, 2007.

Figura 14: Mossoró. Mercado do Vuco-Vuco (parte interna)

Fonte: Edna Couto, 2010.

Figuras 15 e 16: Mossoró. Bens duráveis comercializados no Mercado do Vuco-Vuco

Figura 15: Mossoró. Bens duráveis comercializados no Mercado do Vuco-Vuc

Fonte: Edna Couto, 2010.

Figura 16: Mossoró. Bens duráveis comercializados no Mercado do Vuco-Vuco

Fonte: Edna Couto, 2007.

Assim, o mercado caracteriza-se pela sua grande importância

econômica e sociocultural, pois faz parte da história da cidade e representa

fortes relações sociais. Na opinião do diretor da Biblioteca Municipal de

Mossoró, o mercado é um dos símbolos da cultura popular no município, pois

lá se reúnem pessoas de todas as classes sociais, desde pequenos

comerciantes e ambulantes até médicos, advogados e professores, para

comercialização dos mais variados produtos.

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De acordo com registros históricos130 o mercado teve sua origem em

1960, num local chamado “Buraco do Tatu”, nas imediações da estação

ferroviária, cujo dono era Antônio Mota da Silva. Este senhor teve a ideia de

montar uma barraca de comércio em sua propriedade e o negócio foi se

expandindo à medida que pequenos comerciantes instalavam seus quiosques

para negociar diversos produtos, tornando-se numa feira livre.

Em seguida, a “feira” foi realocada para a Praça Ulrick Graff, na

Avenida Rio Branco, vizinha à Estação das Artes Eliseu Ventania. Depois,

mudou-se em definitivo para o Largo do Chaveiro em homenagem a Manoel

Chaveiro, na Avenida Rio Branco, onde o mercado está localizado até hoje,

sob administração da Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Gerência

da Indústria, Comércio e Turismo, da Prefeitura Municipal de Mossoró, órgão

responsável pela segurança e pela limpeza da área.

Atualmente, o Mercado do Vuco-Vuco possui 65 boxes cadastrados

junto à prefeitura e tem uma área de aproximadamente 6.000m², atendendo de

segunda a sábado de 7 horas às 17 horas e aos domingos e feriados de 7

horas às 13 horas, ao público mossoroense e de toda sua região de influência.

O fluxo médio no local varia conforme o dia da semana: a segunda-feira é o dia

de menor movimento; terças, quartas e quintas ficam em torno de 1.000

pessoas; nos fins de semana (sextas, sábados e domingos) circulam cerca de

3.000 pessoas131.

São aproximadamente 100 comerciantes trabalhando no local, em sua

maioria, regularizados através do Programa Empreendedor Individual do

SEBRAE132. Consoante o administrador do mercado nos informou, houve um

treinamento para os vendedores e a maior parte deles é fixa, ou seja, está

trabalhando há muito tempo nos mesmos boxes. Os vendedores cadastrados

pagam aluguel pelo ponto comercial133; pagam também a energia

consumida134, conforme cada estabelecimento.

130 Informações disponíveis em: http://blogcastelomorais.blogspot.com/2010/07/vuco-vuco-de-mossoro-uma-historia-de.html. e em http://www.enciclopedianordeste.com.br/0140.php. Acesso em: 15/2/2011. 131 Informações obtidas em trabalho de campo realizado de 8 a 10 de junho de 2009. 132 Mais informações em http://www.agenciasebrae.com.br/noticias/empreendedor-individual/ e http://www.agenciasebrae.com.br/noticia/10160651/empreendedor-individual/mossoro-abre-postos-para-formalizar-empreendedores/?indice=10. 133 O aluguel custa R$11,00 por mês. 134 O consumo fica em torno de R$30,00 a R$40,00 por mês.

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Quanto à relação entre administração/vendedores, se dá com base em

reuniões mensais135, que contam com a participação maciça dos vendedores,

cerca de 70%. Nestas reuniões as principais pautas discutidas são questões

estruturais e de convivência, estratégias de concorrência e propaganda,

qualidade dos serviços prestados etc.

Segundo informações do próprio administrador, existem propostas de

eleição de um líder e um vice-líder para os comerciantes do local, na tentativa

de estreitar a relação entre administração e comerciantes; elaboração de

promoções e divulgação da feira na mídia, tendo em vista que atualmente esta

divulgação é feita somente pela propaganda pessoal (popularmente conhecida

como “boca a boca”); e a criação de uma associação de vendedores do local.

Além disso, o entrevistado afirmou que está havendo melhorias na estrutura

administrativa do local136.

A grande movimentação de pessoas no Vuco-Vuco acabou atraindo

muitos ambulantes137, a ponto de terem sido estabelecidas “regras” entre eles e

a administração do mercado, no tocante à delimitação do espaço a ser

ocupado nas calçadas do equipamento comercial.

Figuras 17 e 18: Mossoró. Comércio ambulante nos arredores do Mercado do Vuco-Vuco Figura 17: Mossoró. Comércio ambulante nos arredores do Mercado do Vuco-Vuco

Fonte: Edna Couto, 2010.

Figura 18: Mossoró. Comércio ambulante nos arredores do Mercado do Vuco-Vuco

Fonte: Edna Couto, 2010.

Apesar do lucro pequeno e das condições limitadas de trabalho, os

comerciantes preferem permanecer no local, pois este reúne grande fluxo de

135 As reuniões ocorrem na primeira terça-feira de cada mês. 136 Entre essas melhorias o entrevistado citou: a compra de computador, mesas, cortinas, cadeiras, realização de pintura etc. 137 Estes ambulantes não pagam os impostos e comercializam produtos diversificados, especialmente DVDs que, segundo o entrevistado, seriam legalizados.

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pessoas. Isto corrobora o fato de que a concentração do comércio tradicional

na área central da cidade ainda é muito forte, pois as condições históricas de

centralidade e acessibilidade permitem que estas atividades continuem se

desenvolvendo. A área central, que não necessariamente coincide com o

centro geográfico, se revela então pela “[...] concentração localizável e

localizada na cidade” (WHITACKER, 2007, p.4).

Mapa 5: Mossoró. Localização dos mercados populares

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3.2 OS NOVOS ESPAÇOS DE CONSUMO

A incorporação do meio técnico-científico-informacional possibilita a

urbanização do território, no qual há uma difusão mais ampla no espaço das

variáveis e dos nexos modernos (SANTOS, 2005). Como evidenciado, a

expansão do consumo proporcionou a concentração econômica e territorial das

atividades no setor comercial, assim como a ampliação da área dos

equipamentos comerciais modernos, desencadeando um processo de

desconcentração do comércio (CLEPS, 2004). Destarte, as transformações na

produção, distribuição, circulação e consumo de mercadorias e as

modernizações tecnológicas afetaram profundamente o desenvolvimento das

atividades comerciais e também a reestruturação espacial de Mossoró.

Na última década, a implantação de equipamentos modernos de

consumo na cidade tornou-se mais forte, e contou com incentivos públicos e

privados. Isto demonstra sua incorporação a um mercado mundial que oferece

produtos cada vez mais modernos e que utiliza a propaganda e o marketing

como ferramentas de vendas, em resposta à introdução de padrões

comportamentais hegemônicos, no referente ao consumo. Vejamos a seguir

exemplos de novos espaços de consumo que promovem intensas redefinições

socioespaciais e econômicas na cidade.

3.2.1 Supermercados, hipermercados e atacadistas

Em resposta à crise de 1929, os Estados Unidos criaram novas

técnicas de vendas e de administração varejista, introduzindo um sistema

revolucionário, o self-service, ou seja, o autosserviço, e, também, um novo

espaço de consumo, o supermercado, que “[...] reuniu os aspectos social,

econômico e tecnológico e revolucionou o negócio de vender. Foi uma

revolução de processo e não de produto, portanto muito mais impactante”

(VARGAS, 2001, p.241). O hipermercado seria uma evolução europeia para o

supermercado e constitui-se de uma grande loja dedicada à venda de

mercadorias de conveniência.

De acordo com a Associação Brasileira de Supermercados, o

supermercado caracteriza-se por possuir seções de vendas constituídas de

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mercearia, bazar e perecíveis; disponibilizar cerca de 1.500 a 5 mil itens em

exposição; possuir de três a quarenta check-outs e ter mais de 300m² de área

de vendas. Como principais seções de vendas, o hipermercado tem mercearia,

bazar, perecíveis, têxteis e eletrodomésticos; possui mais de 5 mil itens em

exposição; mais de quarenta check-outs e mais de 5.000m² de área de vendas

e uma “área de influência” superior a 5km.

No Brasil, o primeiro supermercado foi instalado em 1953, na cidade de

São Paulo (PINTAUDI, 1981, 1984; ROJO, 1998; FUNDAÇÃO ABRAS, 2002).

Mas este tipo de estabelecimento só foi regulamentado em 1968, ao se instituir

a ABRAS. Inicialmente, estes estabelecimentos estavam associados a uma

imagem de luxo, mas com o passar dos anos foram se disseminando pelo país

e passaram a fazer parte do cotidiano dos brasileiros.

Como assevera Pintaudi (1981, 1984), o supermercado foi uma forma

encontrada pelo capitalismo para atender às necessidades da produção e do

próprio comércio, pois reduzia significativamente os custos no sistema de

vendas, através do autosserviço, e aumentava o lucro para os capitalistas.

Segundo afirma a autora, o supermercado “[...] surge no processo de

concentração e centralização do capital, como resposta às necessidades de

lucro, e, no seu desenvolvimento histórico, tende também aos processos de

concentração e centralização” (PINTAUDI, 1989, p.28).

Paulatinamente os supermercados ganharam espaço no comércio

varejista e foram substituindo formas de comércio tradicionais, como feiras-

livres, quitandas, mercearias etc. A difusão da geladeira, que permitiu o

armazenamento de produtos alimentícios perecíveis por períodos mais longos,

e a disseminação do uso do automóvel, que proporcionou uma ampliação dos

deslocamentos espaciais em menos tempo, favoreceram a expansão deste tipo

de estabelecimento pelo país (PINTAUDI, 2002).

Para garantir a ampliação do capital e a concentração financeira e

territorial do setor, houve uma desconcentração das atividades comerciais na

década de 1980, na qual se difundiram novas formas de comercialização para

outras cidades do país, além das metrópoles. Este processo foi um fator

determinante para a redefinição dos papéis e dos conteúdos das cidades,

principalmente aquelas com características de centros regionais. Sposito

(2001d, p.237) assinala algumas destas mudanças:

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- Entrada nessas cidades de capitais comerciais de grande porte, com novas lógicas locacionais; - aumento do interesse dos capitais imobiliários na construção de novos equipamentos comerciais e de serviços, de forma associada ou não a esses capitais comerciais; - acelerada expansão territorial urbana, gerando tecidos descontínuos e fragmentados; - ampliação da diferenciação sócio-espacial, refletindo-se, muitas vezes, em exclusão sócio-espacial; - melhoria das formas de transporte, com destaque para o aumento do uso do transporte individual.

Embora a desconcentração desta atividade para espaços urbanos não

metropolitanos tenha começado nos anos 1980, Mossoró só foi inserida nesta

lógica no início da década seguinte, ao inaugurar seu primeiro supermercado.

É somente a partir de meados da década de 1990 que este tipo de

estabelecimento começa seu processo de expansão territorial, incorporando

técnicas modernas de atendimento com inclusão de novas tecnologias e

disponibilizando mais produtos e comodidade aos clientes. No entanto, a

consolidação do setor na cidade ocorre efetivamente na última década, com a

instalação de estabelecimentos de capital internacional no segmento varejista e

atacadista.

Conforme pudemos observar na análise dos dados sobre o comércio,

foi justamente a partir de meados da década de 1990 que houve uma

expansão do número de estabelecimentos no setor em geral, entre eles, os

supermercados. Contudo, existe uma grande dificuldade em definir o que

realmente se caracteriza como um supermercado em Mossoró, por causa das

diferentes perspectivas sob as quais este tipo de estabelecimento pode ser

analisado.

Ao fazermos uma busca pelos guias de endereços locais disponíveis,

foram apontados mais de quarenta supermercados na cidade. Todavia, a partir

de trabalhos de campo, verificamos que a maior parte deles não se enquadrava

no perfil dos supermercados instituído pela ABRAS, mas se constituíam de

pequenas mercearias e minimercados, responsáveis, até década de 1990, pelo

abastecimento do mercado interno e regional.

Assim, escolhemos para análise apenas os estabelecimentos que

atendem aos parâmetros oficiais de classificação. Atualmente existem na

cidade dezoito estabelecimentos entre supermercados, hipermercados e

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atacadistas138, dos quais quinze são de capital local e três de capital não local.

Dos estabelecimentos instalados em Mossoró oriundos de investimentos

externos à cidade, existem dois pertencentes a duas grandes redes

internacionais e um pertencente a uma rede estadual potiguar. Com vistas a

uma melhor organização do trabalho, apresentaremos primeiro os

estabelecimentos de capital não local, e em seguida, examinaremos as duas

redes locais.

O Atacadão Auto Serviços pertence ao grupo Carrefour139 e localiza-se

no Bairro Nova Betânia, ao lado do Mossoró West Shopping e do residencial

Alphaville. Instalado no local em 2008, o estabelecimento visa

preferencialmente o segmento atacadista, embora também realize transações

no varejo. Mesmo sem o serviço de entrega em domicílio, a loja atende a

clientela mossoroense e de municípios situados em sua região de influência,

com abrangência em cidades de outros Estados, como do leste cearense e do

oeste paraibano140.

Enquanto a seleção dos funcionários foi feita através da FUNGER141,

do SINE e de uma “casa de seleção”, que seria uma espécie de RH da

empresa, a triagem das pessoas foi feita pelo próprio Atacadão, assim como o

treinamento, realizado em Natal142. Atualmente, o quadro de funcionários da

empresa é composto de 254 contratados diretos143, mas nenhum dos cargos

de gerência é ocupado por um mossoroense144.

138 Além destes estabelecimentos, existem outras seis empresas com mais de um estabelecimento no setor. São eles: A & C Supermercado Ltda.; Supermercado Chico das Redes; Supermercado Cortez; Supermercado Dagente; Supermercado São Francisco; Supermercado São Lourenço; Supermercado Central (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.216-217). 139 A rede Atacadão conta atualmente com 52 lojas em todo o país, sendo três delas no Rio Grande do Norte: duas em Natal e uma em Mossoró. A empresa almeja duplicar o número de lojas no país em apenas dois anos, estando em pleno processo de expansão no Nordeste, com a possibilidade de instalar uma loja em Fortaleza - CE. 140 De acordo com o supervisor operacional da loja, os clientes vão desde comerciantes de redes de supermercados locais até consumidores “particulares”. A média de compras por cliente (cupom médio) fica entre R$150,00 e R$200,00 e o pagamento é somente à vista (cartão de crédito ou dinheiro), havendo um cadastro de cheques para clientes. 141 Estas informações foram obtidas em noticia de jornal local: Funger realiza seleção de candidatos para o Atacadão. Jornal Gazeta do Oeste, Mossoró, 23/5/08. 142 Interessante destacar que a empresa ofereceu vagas para pessoas com idade acima de 50 anos, as quais, em geral, têm experiência profissional mas por conta da faixa etária estão fora do mercado de trabalho. 143 Os funcionários passaram por um treinamento em São Paulo, com duração de um ano. 144 Entrevista realizada em julho de 2009 durante trabalho de campo.

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164

O outro grande empreendimento internacional na cidade no ramo de

supermercados pertence ao grupo americano Wal-Mart145, que investiu R$36

milhões146 para a construção e instalação do Hiper Bompreço em Mossoró.

Desde o anúncio do empreendimento até sua inauguração, o grupo teve de

enfrentar alguns entraves jurídicos, como, por exemplo, a concessão do

licenciamento ambiental.

Inicialmente, a vinda do empreendimento teve boa aceitação pelos

órgãos governamentais e a população em geral, pois se tratava de um

incentivo para a economia local. Todavia, o local da construção do

hipermercado gerou uma grande polêmica na cidade147 por se tratar de uma

Área de Proteção Ambiental148, localizada em uma das principais rodovias da

cidade próxima ao Bairro Nova Betânia, área que cada vez mais se valoriza na

cidade e se estabelece como uma nova centralidade.

Após muitos debates, notificações e vistorias por parte dos órgãos

governamentais de defesa do Meio Ambiente, o Hiper Bompreço foi inaugurado

no ano de 2009, como a primeira loja ecoeficiente do Nordeste, a quinta em

todo o Brasil149 e a primeira loja da rede no interior do Estado. Com uma área

construída de cerca de 7.000 m², o estabelecimento funciona das 8 horas às 23

145 A empresa no Brasil conta com 345 unidades espalhadas pelo país, operando com nove formatos de lojas: os hipermercados Big, Wal-Mart Supercenter e o Hiper Bompreço; os supermercados: Nacional, Mercadorama, Bompreço e Todo Dia; o clube de compras SAM'S Club; e o Maxxi Atacado. No Nordeste, a empresa possui hoje 139 lojas, sendo cinco delas no Rio Grande do Norte (dois hipermercados, dois supermercados e um SAM´S Club). De acordo com notícia local, a empresa planejaria inaugurar mais noventa unidades em 2009, um investimento de R$ 1,6 bilhão e a geração de 10 mil empregos diretos. Para o Nordeste, a meta do grupo seria a inauguração de pelo menos trinta unidades, representando um investimento de R$ 450 milhões e a criação de 2,5 mil postos de trabalho. 146 Mais uma rede de hipermercado se instala em Mossoró. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 3/12/09. 147 O local escolhido para instalação do hipermercado foi um terreno pertencente à Diocese de Santa Luzia e arrendado ao grupo às margens da Lagoa do Bispo, no Bairro Doze Anos. 148 Estabelecida pelo Código Florestal Brasileiro, Lei n.º 4.771, art. 2º, "Consideram-se Áreas de Preservação Permanente (APP’s), pelo efeito desta lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo de faixas dos rios ou de outro qualquer curso d´água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1) de 30 (trinta) metros para os cursos d´água de menos de 10 (dez) metros de largura". 149Multinacional inaugura primeira unidade ecoeficiente do Nordeste. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 4/12/09. A loja atende a vários itens de sustentabilidade tais como utilização de lâmpadas que economizam energia; sistema de gerenciamento do consumo de energia, refrigeração, ar-condicionado e água; sistema de tratamento de água, reduzindo nível de resíduos para rede pública; plantio de mudas para aumentar áreas sombreadas e ajardinadas; materiais permeáveis que revestem as calçadas, permitindo que a água da chuva retorne para o lençol freático etc. O estabelecimento construiu ainda uma central de coleta de material reciclável para receber vidro, plástico, papel, papelão, jornal, latas e outras embalagens.

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horas, trazendo à cidade uma nova lógica temporal, estabelecida pela

necessidade de maior rotatividade do capital.

Entre as seções da loja, destacamos uma adega com mais de 300

rótulos de vinho e um Foto Center (serviço de revelação de fotos analógicas e

digitais)150. Ademais, os clientes também dispõem de serviços financeiros,

como o pagamento de contas de água, luz, telefone e boleto bancário, recarga

de celular, venda de vale-gás, hipergarantia eletro (uma garantia estendida do

produto ao consumidor) etc. De acordo com a mídia local, a loja já emitiu mais

de 10 mil cartões com a marca do hipermercado151 e a direção do

empreendimento avalia que a intensa movimentação seja um termômetro do

mercado local.

Conforme o diretor de assuntos corporativos do Wal-Mart152, novos

investimentos na cidade não estariam descartados: ele alerta para a

possibilidade de investimentos do grupo nos próximos anos em lojas menores

de bairro, de atacado, o SAM’S Club. Por enquanto, consoante ele afirma, o

Hiper Bompreço será fundamental para a observação do mercado regional

estabelecido em Mossoró.

Outra rede de supermercados instalada em Mossoró é a Uvifrios Food

Services153, integrante de uma rede estadual. A unidade de Mossoró foi

instalada em 1999 e atende principalmente o segmento atacadista. Embora a

maioria dos clientes seja da própria cidade e região, segundo o gerente,

existem clientes em outros Estados, como o Ceará. O estabelecimento não

trabalha com serviço de entrega e o pagamento é realizado somente à vista,

exceto para clientes cadastrados, os quais podem utilizar o cheque como forma

de pagamento154.

150 Entre os produtos comercializados, destacamos também os artigos eletroeletrônicos, que há bem pouco tempo eram encontrados apenas no centro na cidade. De acordo com representante do Wal-Mart, o grupo pretende firmar laços com produtores e fornecedores locais de produtos da região, onde pelo menos 30% dos produtos colocados à venda serão de Mossoró e região. 151 Multinacional inaugura primeira unidade ecoeficiente do Nordeste. Jornal O Mossoroense, cotidiano, 4/12/09. 152 Entrevista concedida ao Jornal Gazeta do Oeste, Mossoró e publicada em 1º/5/09. “Hiper Bompreço será inaugurado em dezembro deste ano”. 153 A empresa tem abrangência estadual e possui estabelecimentos em Natal, Parnamirim e Mossoró, atuando no segmento varejista e atacadista. Para mais informações sobre a Rede Uvifrios ver http://www.uvifrios.com.br/. Acesso em: 11/2/2011. 154 Entrevista realizada em fevereiro/2008.

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Entre os estabelecimentos de capital local, destacamos duas redes: a

Queiroz e a Rebouças155. Ambas possuem lojas em Mossoró e em municípios

vizinhos, e estão em funcionamento desde o início da década de 1990.

- REDE QUEIROZ

A Rede de Supermercados Queiroz constitui-se na maior do oeste

potiguar, com dezesseis lojas, doze em Mossoró e quatro em municípios

vizinhos (Baraúna, Apodi, Açu e Pau dos Ferros), tendo sua primeira loja

inaugurada em Mossoró no Bairro Santa Delmira, em 1991156.

Durante a década de 1990 a rede instalou outras três lojas em

Mossoró, nos Bairros Belo Horizonte (1994), Boa Vista (1996) e Alto do São

Manoel (1998). Na década seguinte, houve uma ampliação da rede por

diversos bairros da cidade, com a inauguração de lojas no Abolição IV (2000),

Barrocas (2001), Dom Jaime Câmara (2006), Alto da Conceição (2008) e Santo

Antônio (2009).

A última década marcou também a instalação de filiais da rede em

outras cidades do Estado, próximas a Mossoró, como Baraúna (2003), Apodi

(2004), Açu (2006) e Pau dos Ferros (2009). Por fim, em meados dos anos

2000 a Rede Queiroz foi precursora no segmento de hipermercados, com a

inauguração do primeiro estabelecimento “Hiper” da cidade no ano de 2005, o

Hiper Queiroz, localizado no Centro, e mais recentemente, do Hiper Queiroz do

Mossoró West Shopping, em 2009.

O primeiro hipermercado da rede, e da cidade, localizado no Centro,

disponibiliza aos clientes estacionamento privativo de 600 vagas, com controle

de fluxo de carros157. Na loja podem ser encontrados serviços de lanchonete,

cafeteria, rotisseria, confeitaria, seção exclusiva de vinhos, seção de produtos

de informática e de livros, setores de cesta básica, higiene, limpeza etc., além

155 Como nosso trabalho tem como foco o terciário de Mossoró, apresentaremos as informações referentes às lojas instaladas na cidade, sem desconsiderar a influência regional exercida pela cidade sobre municípios próximos. As informações sobre as redes de supermercados locais foram obtidas durante trabalho de campo realizado de 10 a 15 de fevereiro de 2008, no qual foi feita a conferência de endereços previamente coletados em pesquisa de gabinete realizada em 2007. 156 Este supermercado foi o primeiro da cidade. 157 As informações sobre o Hiper foram obtidas durante trabalho de campo realizado em fevereiro de 2008.

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de serviços de atendimento ao consumidor, cadeiras de rodas para clientes

deficientes e também serviço de entrega aos clientes 158.

Além disso, o Hiper possui caixa de serviços para pagamentos como

boletos bancários e contas de água e luz que estejam dentro do prazo de

vencimento, postos de autoatendimento bancário dentro e fora do

estabelecimento. No pátio interno da loja existem pequenos estabelecimentos

alugados, como uma locadora de DVD, drogaria, clínica de beleza e estética

corporal e facial, revendedoras de operadoras celulares159.

O segundo hipermercado da Rede Queiroz, no Mossoró West

Shopping, possui 2.400m² e uma variedade de 21 mil itens comercializados,

tendo como diferencial dos outros estabelecimentos da rede o horário de

funcionamento, diariamente de 8 horas às 22 horas. No total, foram investidos

mais de R$ 7 milhões na loja, que gerou cerca de 500 empregos diretos e

indiretos160.

Afora supermercados e hipermercados a Rede Queiroz dispõe de um

estabelecimento no segmento atacadista e de distribuição161, a Stock Frios

Distribuidora162. Inaugurada em 2007, a loja atende a demanda mossoroense,

de municípios da região, oferecendo um preço diferenciado para o atacado e

para o varejo163 e realizando serviços de entrega164.

Segundo informações da página eletrônica da Rede Queiroz165, em

2010 foi criada a Associação dos Supermercados da Rede Queiroz, que

158 As entregas são feitas para compras a partir de R$50, inclusive para outros municípios da região. Para isso, a loja conta com uma frota de carros, entre eles Kombi, F4000, caminhão (usado nos dias de maior movimento). No caso de entregas para outros municípios, só são feitas mediante um mínimo de quatro clientes por localidade. 159 Por cada ponto comercial é cobrada uma quantia em torno de R$500,00. No entanto, de acordo com o responsável pelo Hiper, estas lojinhas não estariam dando muito certo, em virtude da demanda insuficiente, resultando no fechamento de algumas delas. 160 Mais de 150 empregos no novo Hiper. Jornal De fato, Mossoró, 29/10/09. 161 Informação obtida em trabalho de campo realizado em fevereiro/2008. 162 Esta loja funciona como a central de abastecimento da rede, voltada ao mercado atacadista e cerealista. Os principais produtos comercializados são os do açougue e da cesta básica, com destaque para os laticínios. A maioria dos produtos é oriunda de produtores do próprio Estado e as carnes vêm do Estado de Goiás. 163 Até o ano de 2008 os pagamentos poderiam ser feitos somente à vista e após a implantação do sistema de crédito na loja, seria cobrada uma taxa de 3% sobre o valor da compra, devido à margem pequena de lucro da loja. 164 O valor mínimo de compras para entrega é de R$500,00 (para Mossoró) e de R$1.000,00 (para outros municípios). 165 http://www.redesuperq.com.br/. Acesso em: 11/2/2011.

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disponibiliza aos associados soluções em administração por processos166. Está

sendo instalado também o Centro de Distribuição da Rede, que possui cerca

de 10.000 m² e abastecerá todas as lojas da rede.

Como evidenciado, as lojas da rede têm tamanhos bem diferenciados,

de 330 m² a 4.600 m², variando conforme o tipo de estabelecimento, sua

localização e o público alvo. De modo geral, as vendas são voltadas para o

mercado varejista, pequenos comerciantes e parte das lojas dispõem de

serviços de entregas167. Em algumas lojas existem setores exclusivos como de

bebidas, lanchonete, caixa de serviços, postos de autoatendimento bancário de

bancos públicos e privados e estacionamento168.

Em Mossoró, a difusão deste tipo de empreendimento, sobretudo na

última década, acompanha uma tendência global de concentração financeira e

territorial das redes de supermercados e dos equipamentos comerciais

modernos, na qual o crédito tem papel fundamental169. Entretanto, a

racionalidade capitalista que introduz novas técnicas e tecnologias às

atividades comerciais encontra ainda algumas resistências, enquanto sistemas

tradicionais de comercialização subsistem na cidade170.

Exemplo disto foi um fato presenciado em atividade de campo, quando

uma consumidora realizou suas compras em uma das lojas da rede e ao invés

de efetuar o pagamento, à vista ou no crédito, dirigiu-se ao gerente e

acrescentou os itens à sua “conta”. Assim, o gerente anotou as compras da

cliente em uma espécie de “caderneta eletrônica”, na qual havia vários outros

clientes do estabelecimento, demonstrando a permanência de técnicas

tradicionais em meio ao moderno. 166 Entre os departamentos da associação, alguns já estão em funcionamento: gerência Comercial, gerência de Recursos Humanos, gerência de Relacionamento e Marketing, Diretoria Executiva, gerência Financeira, Gerência de Categorias e Queiroz Premium. 167 Em alguns supermercados, o serviço de entrega em domicílio é feito somente a partir de um valor mínimo de compras, que varia de R$50,00 a R$150,00, e na maioria dos estabelecimentos da rede este serviço é gratuito. As lojas dispõem de bicicletas, motos, carros, kombis, caminhonetes e até caminhões para as entregas. 168 Informações obtidas em trabalhos de campo realizados entre 2008 e 2009. 169 Para mais informações sobre a importância do crédito para as atividades comerciais modernas ver Santos (2005). No caso da Rede Queiroz, ela trabalha com cartão Hiperclube e com o cartão de crédito próprio, o Hiper Queiroz, que oferece até quarenta dias para efetuar o pagamento. Neste, a cada R$1 em compras o cliente ganha bônus e pode trocá-lo em compras na própria loja. 170 Ao ser questionado sobre o impacto do uso do cartão de crédito no estabelecimento sobre as vendas dos pequenos comerciantes locais que não trabalham com sistema de crédito moderno, o encarregado de salão do Hiper Queiroz nos informou que estes comerciantes já possuem sua clientela e utilizam métodos de crédito tradicionais, como o fiado e a caderneta.

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Figura 19: Mossoró. Supermercado Queiroz Belo Horizonte

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 20: Mossoró. Supermercado Queiroz Santa Delmira

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 21: Mossoró. Supermercado Queiroz Boa Vista

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 22: Mossoró. Supermercado Queiroz Abolição

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 23: Mossoró. Supermercado Queiroz Alto do São Manoel

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 24: Mossoró. Supermercado Queiroz Dom Jaime Câmara

Fonte: Edna Couto, 2008.

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Figura 25: Mossoró. Supermercado Queiroz Barrocas

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 26: Mossoró. Stock Frios Distribuidora

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 27: Mossoró. Hiper Queiroz Mossoró

West Shopping

Fonte: Internet171(2010).

Figura 28: Mossoró. Hiper Queiroz Centro

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 29: Mossoró. Supermercado Queiroz

Alto da Conceição

Fonte: Internet172(2011).

Figura 30: Mossoró. Supermercado Queiroz Santo Antônio

Fonte: Internet173 (2011).

171 Disponível em: http://quixotecomunicacao.blogspot.com/2010/10/aniversario-1-ano-hiper-queiroz-west.html. Acesso em 10/2/11. 172 Disponível em: http://www.redesuperq.com.br/lojas.php. Acesso em 10/2/11. 173 Disponível em: http://www.redesuperq.com.br/lojas.php. Acesso em 10/2/11.

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- REDE REBOUÇAS

Atualmente, a Rede Rebouças Supermercados conta com quatro lojas,

sendo três em Mossoró e uma em Açu. A primeira loja da rede foi instalada no

Bairro Santo Antônio, no ano de 1992, e a segunda, em 1995, no Bairro Belo

Horizonte. O terceiro estabelecimento foi inaugurado no Centro em 1997. Este,

a partir do ano 2000, passou a ser a matriz da rede. Já o primeiro

hipermercado da rede foi inaugurado em 2009 no Centro e possui área

climatizada, teto com energia solar e um mix maior de variedades174.

De modo geral, as vendas da rede são voltadas para o mercado

varejista175, e as seções mais procuradas são as dos cereais (linha seca), de

açougue, padaria, higiene pessoal e limpeza. Existem ainda serviços de

entrega176. A rede mantém parcerias com os fornecedores e conta com cartão

de crédito próprio, com pagamento em até quarenta dias, além de trabalhar

com cheques para clientes cadastrados, reforçando a financeirização das

relações comerciais na cidade através destes equipamentos modernos.

Figura 31: Mossoró. Supermercado Rebouças Santo Antônio

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 32: Mossoró. Supermercado Rebouças Belo Horizonte

Fonte: Edna Couto, 2008.

174 Entre 2008 e 2009, a loja do Centro passou por reformas cujas despesas totalizaram cerca de R$ 15 milhões, de acordo com o proprietário dos supermercados, tornando o empreendimento o primeiro hipermercado da rede Rebouças. 175 Inclusive para pequenos comerciantes que aproveitam os dias de ofertas para realizar compras em maior quantidade, embora não tenha nenhum diferencial de preços. 176 O serviço de entregas em Mossoró é feito em bicicletas, motos e carros, sem valor mínimo de compra. Para entregas em outros municípios, as lojas dispõem de caminhonetes, kombis e um caminhão pequeno (Mercedes) e elas só são efetuadas caso haja pelo menos quatro clientes da mesma cidade.

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Figura 33: Mossoró. Supermercado Rebouças Centro (antes da reforma)

Fonte: Edna Couto, 2008.

Figura 34: Mossoró. Hipermercado Rebouças Centro (após a reforma)

Fonte: Edna Couto, 2010.

Em entrevista a um jornal local177, um economista professor da

Universidade Estadual do Rio Grande do Norte atribuiu o crescimento do setor

supermercadista em Mossoró a vários aspectos macro e microeconômicos. Um

dos fatores seria a elevação do poder de compra do salário-mínimo nos últimos

anos combinado à relativa estabilidade de preços dos itens da cesta básica e,

em alguns casos, com queda real de preços.

Outro ponto ressaltado pelo economista é que os supermercados

operam com a venda de produtos de primeira necessidade, principais itens de

consumo de assalariados, sendo, portanto, a primeira categoria de bens de

consumo a ser procurada pelas pessoas que passam a ter renda (poder de

compra) ou que têm sua renda elevada. Na ótica do entrevistado, o setor é

promissor e ainda há muito a ser feito para dinamizar este segmento na cidade,

atraindo mais investimentos por parte dos concorrentes locais e chamando a

atenção de outros grupos regionais e nacionais para a cidade.

Esta afirmação só evidencia o potencial de compra do mercado

regional mossoroense, formado notadamente por uma classe média emergente

que busca espaços modernos de consumo e é responsável pelo aumento da

segregação e das desigualdades socioespaciais.

A expansão dos supermercados foi resultado direto do processo de

concentração econômica e territorial do capital comercial, associado a

mudanças de hábitos de consumo alimentar e à modernização do comércio

varejista e atacadista. Para Elias (2003, p.203), os supermercados se tornaram

177 Do tamanho que o cliente preferir. Jornal De fato, Economia, 1º/11/09.

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os “mais importantes centros de comercialização dos produtos alimentares

industrializados, ajudando a popularizar novos hábitos de consumo agregados

ao novo sistema de produção de alimentos”.

A chegada deste tipo de estabelecimento à cidade promoveu uma

reorganização da atividade comercial regional e dos fluxos engendrados no

processo; favoreceu a monopolização e oligopolização do setor; estimulou

novos padrões de consumo de massa, alterando hábitos e costumes locais; e,

sobretudo, redefiniu as centralidades urbanas, desencadeando novas relações

socioespaciais.

Estas relações são compreendidas a partir dos padrões locacionais

destes equipamentos na cidade, os quais, segundo Pintaudi (1981, 1984),

estão atrelados a dois fatores principais: a presença de mercado consumidor

com maiores rendimentos e a proximidade de importantes eixos de circulação.

Consoante a localização espacial dos supermercados, hipermercados

e atacadistas no espaço urbano de Mossoró nos permite afirmar, alguns

estabelecimentos obedecem aos padrões apresentados por Pintaudi (1981,

1984), em especial aqueles instalados na última década: em sua maioria, estão

situados em bairros de densidade habitacional significativa, alguns deles

redutos de classes economicamente mais favorecidas, e próximos a vias de

acesso e circulação na cidade.

Entretanto, é necessário fazermos algumas observações no tocante à

implantação deste tipo de estabelecimento na cidade e suas repercussões no

espaço urbano. Existem casos em que a instalação de supermercados em

determinadas áreas da cidade vai de encontro às tendências locacionais

estabelecidas pelos padrões hegemônicos.

Na tentativa de compreendermos a expansão dos supermercados, e as

particularidades deste fenômeno em Mossoró, estabelecemos uma

periodização com base nos anos de instalação dos equipamentos, na qual

enumeramos quatro períodos quinqüenais (exceto último período, de apenas

quatro anos, por conta da realização da pesquisa). Esta periodização nos

permitirá perceber a evolução do setor nos últimos vinte anos, por meio dos

tipos de estabelecimentos e espacialização da atividade na cidade.

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Nota-se que os primeiros supermercados localizavam-se na zona mais

ao norte da cidade178, nos Bairros Santa Delmira e Santo Antônio. Esta área

caracteriza-se como a zona mais populosa da cidade, por se tratar “de um

conjunto de bairros cuja implantação foi orientada na direção da antiga estrada

que interligava Mossoró a Aracati, no Ceará” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.122)

e também por se concentrarem nesta área “bairros onde predominam os

conjuntos habitacionais de maior porte, implantados pela Cohab/RN nas

décadas de 1970 e 1980” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.122).

Considerando a presença de mercado consumidor e a proximidade a

um importante eixo de circulação, justifica-se a escolha desta área da cidade

para instalação dos primeiros supermercados. Neste sentido devemos atentar

para as especificidades do fenômeno de expansão dos supermercados em

Mossoró, pois os primeiros estabelecimentos instalados na cidade não são

oriundos da concentração de grupos externos; pelo contrário, são

estabelecimentos de capitais locais, que alguns anos mais tarde se

consolidariam como redes de abrangência regional.

A chegada destas novas formas comerciais à cidade marca o início de

mudanças no comércio local e regional, acirrando a concentração no setor

supermercadista e a competitividade entre empresas, características inerentes

ao capitalismo. Assim, como podemos observar, nos dois primeiros períodos

estudados (1991-1995 e 1996-2000) a expansão do setor ocorre em ambas as

redes locais, que se difundem pela cidade quase simultaneamente.

No segundo momento da nossa periodização, a área no entorno da

região central é a que recebe maior número de estabelecimentos, situados nos

Bairros do Centro, Boa Vista e Alto do São Manoel, este último na zona leste

da cidade. A concentração de atividades terciárias e institucionais, a presença

de população com razoável poder de compra e os intensos fluxos urbanos e

regionais que caracterizam a principal centralidade da cidade foram fatores

determinantes da instalação dos estabelecimentos na zona central da cidade.

Quanto ao Alto de São Manoel, a concentração populacional no conjunto

habitacional Walfredo Gurgel e a proximidade com a Avenida Presidente Dutra

e a rodovia federal BR-110 podem ter sido fatores de atração do

178 Utilizamos a subdivisão em zonas adotada por Elias e Pequeno (2010).

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supermercado, instalado no bairro no ano de 1998. Ao final deste segundo

período se instala também o primeiro estabelecimento no setor atacadista da

cidade, pertencente à rede estadual.

No começo dos anos 2000 houve uma diminuição no ritmo de

expansão do setor, período no qual apenas dois novos estabelecimentos são

inaugurados na cidade, entre eles o primeiro hipermercado. Salientamos: até

meados da década de 2000 não havia nenhum estabelecimento de capital

nacional ou internacional.

Porém, o quarto e último estágio da nossa periodização marca um

momento de inflexão no setor, quando ocorreu acelerada difusão de

supermercados, hipermercados e atacadistas na cidade, inclusive de portes

internacionais. É neste período que se inicia o processo de consolidação de

uma nova centralidade em Mossoró, favorecida pela urbanização e pela

instalação de novas formas comerciais na cidade.

Contudo, a expansão de grandes redes de supermercados,

hipermercados e atacadistas, representantes do grande capital, não consegue

eliminar antigas formas de realização do comércio, como feiras-livres,

pequenas mercearias etc. Tal situação ocorre por causa dos desníveis de

renda e de acesso ao consumo, dificultando o acesso de uma parte da

população a estes estabelecimentos comerciais modernos e fomentando a

informalidade.

Pintaudi (1981) cita outros aspectos que também interferem na escolha

do consumidor quanto ao local de compras, levando-o a não optar pelos

supermercados: o preço de determinados produtos pode ser negociado com o

comerciante local, o que dificilmente acontece em supermercados; a

flexibilidade nas formas de pagamento, o qual, em estabelecimentos

comerciais tradicionais, pode ser feito semanalmente, quinzenalmente ou

mensalmente, de acordo com as possibilidades do consumidor e com os níveis

de confiança entre ele e o comerciante; a localização espacial dos

estabelecimentos; estes, no caso de Mossoró, ainda se concentram nos bairros

mais centrais e mais nobres da cidade.

Portanto, embora as lojas das redes de supermercados utilizem

sistemas informatizados, e, mais recentemente, algumas delas estejam sendo

instaladas em bairros considerados nobres, os estabelecimentos atendem

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também um público de classes mais populares, principalmente se estiverem

localizados em áreas mais periféricas da cidade.

Quadro 5: Mossoró. Supermercados, hipermercados e atacadistas

Nome Localização

(bairro)

Área bruta

locável

Ano de instalação

Número de

caixas

Vagas no estacionamento

Queiroz Santa Delmira 800m² 1991 8 50

Rebouças Santo Antônio 1.000m² 1992 9 60

Queiroz Belo Horizonte 450m² 1994 4 0

Rebouças Belo Horizonte 1.200 m² 1995 7 150

Queiroz Boa Vista 1.200 m² 1996 10 50

Rebouças Centro 3.200m² 1997 18 300

Queiroz Alto de São Manoel 850 m² 1998 10 40

Uvifrios Food Services Centro 600 m² 1999 7 16

Queiroz Abolição IV 500 m² 2000 4 30

Queiroz Barrocas 1.700 m² 2001 6 25

Hiper Queiroz Centro 4.600m² 2005 27 600

Queiroz Dom Jaime Câmara 330m² 2006 6 50

Stock Frios Centro * 2007 4 -

Queiroz** Alto da Conceição - 2008 - - Atacadão Auto Serviços Nova Betânia 22.000m² 2008 26 499

Queiroz** Santo Antônio - 2009 - - Hiper Queiroz (MWS) Nova Betânia 2.400m² 2009 24 -

Hiper Bompreço Doze Anos 18.000m² 2009 26 240 * Dados não informados. ** Não conseguimos obter informações sobre estas lojas. Fonte: Organização da autora a partir de dados pesquisados na internet e conferidos em trabalho de campo em 2008, 2009 e 2010.

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Mapa 6: Mossoró. Localização dos supermercados, hipermercados e atacadistas, por ano de instalação

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178

3.2.2 Shopping center e centros comerciais

O primeiro shopping center inaugurado no Brasil, em 1966, foi

o Iguatemi, em São Paulo. Desde então, o setor brasileiro de shopping centers

apresenta notável crescimento em termos de área bruta locável, faturamento e

empregos gerados. De acordo com informações da Associação Brasileira de

Shopping Centers, o setor brasileiro está em plena expansão, haja vista que

fechou o ano de 2010 com um faturamento aproximado de R$ 87 milhões179,

ante os R$ 74 milhões verificados em 2009, um aumento de quase 15% no

período. Em 2010, o mercado foi responsável por 18,3% do varejo nacional e

por 2% do Produto Interno Bruto180.

Ao se referir a shopping center, Pintaudi (1992, p.15-16) o define como

sendo

Um empreendimento imobiliário de iniciativa privada que reúne, em um ou mais edifícios contíguos, lojas alugadas para comércio varejista ou serviços. Distinguem-se umas das outras não somente pelo tipo de mercadorias que vendem [...], como também por sua natureza distinta (lojas âncora e lojas de comércio especializado e serviços – que podem ou não pertencer a redes). A estrutura e funcionamento do empreendimento são controlados por um setor administrativo, necessário para o funcionamento eficaz do SC, o que significa dizer que é o setor cuja responsabilidade é zelar pela reprodução do capital da empresa. Além disso, está a presença do parque de estacionamento, cujo tamanho depende do porte do empreendimento e da sua localização.

Segundo classificação da ABRASCE existem vários tipos de shopping

centers, tradicionais e especializados, definidos pelo tamanho da sua área

bruta locável. A seguir, as características de cada tipo de estabelecimento.

179 Desempenho da indústria de shopping centers no Brasil. ABRASCE. Estes valores são preliminares e estimados de acordo com o monitoramento do setor de novembro da TNS Research. Informações disponíveis em: http://www.portaldoshopping.com.br/sobreosetor.asp?codAreaMae=10&codArea=51&codConteudo=1&NomArea=. Acesso em: 14/2/2011. 180 http://www.portaldoshopping.com.br/sobreosetor.asp?codAreaMae=10&codArea=13&codConteudo=1 Acesso em:14/2/11.

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Quadro 6: Classificação dos shopping centers por tipo de empreendimento

Tipo Porte ABL Estilo

Tradicional

Mega Acima de 60.000 m² -

Regional De 30.000 a 59.999 m² -

Médios De 20.000 a 29.999 m² -

Pequenos Até 19.999 m² -

Especializado

Grandes Acima de 20.000 m² Outlet

Médios De 10.000 a 19.999 m² Temáticos

Pequenos Até 9.999 m² Life Style

Fonte: ABRASCE, 2009. Elaboração da autora (2009).

Foi na década de 1980 que os shoppings centers se constituíram como

um fenômeno característico das grandes cidades (PINTAUDI, 1989, 1992,

2002), e mais recentemente, durante as décadas de 1990 e, sobretudo, 2000,

em espaços urbanos não metropolitanos, como Mossoró.

De acordo com a classificação da ABRASCE, a cidade possui um único

empreendimento, enquadrado como do tipo tradicional de porte médio, com

uma ABL de 21.532 m². O Mossoró West Shopping foi inaugurado em 2007 e

localiza-se no Bairro Nova Betânia, área mais valorizada na cidade e

considerada uma nova centralidade181.

Segundo Pintaudi (1989, 1992), a localização é um fator fundamental

para a instalação de um shopping center, pois o investimento imobiliário é

muito grande e a localização deve ser “[...] estratégica para a reprodução de

um capital imobilizado numa construção de grande dimensão e que, se não der

certo, fica difícil, para não dizer impossível, destiná-lo a outra atividade que

permita o retorno de capital de forma ampliada” (PINTAUDI, 1989, p.10). Além

disso, ele deve estar próximo ao consumidor, portanto, deve ser um mercado

metropolitano e/ou regional.

Aliado à presença do mercado consumidor, Pintaudi (1989) expõe

outros fatores que interferem na decisão locacional de um empreendimento

como um shopping center: as características e o preço do terreno, a

acessibilidade ao local e a viabilidade econômica também concorrem para a

escolha.

181 Este bairro já vinha passando por um processo de valorização desde meados da década de 1980, mas a intensificação da valorização da área começou no momento de divulgação da construção do shopping center.

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180

O projeto de construção do shopping center em Mossoró foi lançado

em fevereiro de 2007. Na ocasião, apresentaram-se as plantas da construção e

fizeram-se as pesquisas para definição da cidade receptora do

empreendimento e as razões para a escolha de Mossoró.

Primeiramente, destacamos sua localização espacial estratégica,

aspecto fundamental para atração do empreendimento. O terreno no qual foi

construído o shopping center situa-se a aproximadamente 1 km da BR-304,

rodovia que faz a ligação entre Fortaleza – CE e Natal – RN, e também dá

acesso a outros municípios potiguares e cearenses, garantindo a

acessibilidade ao empreendimento, cujo estacionamento tem capacidade para

1.074 vagas.

Outro fator decisivo é a característica polarizadora de Mossoró, que é a

segunda cidade mais importante do Estado do Rio Grande do Norte e, de

acordo com IBGE (2008), possui uma área de influência de aproximadamente

640 mil habitantes, composta por quarenta municípios do oeste potiguar

(ELIAS; PEQUENO, 2010). No entanto, “não é suficiente ter um número

elevado de habitantes, mas também é necessário constituir-se num mercado

com certo poder aquisitivo” (PINTAUDI, 1989, p.63).

Durante a apresentação do projeto de construção do MWS, conforme o

responsável pela empresa Tecno Realty182 afirmou, uma das motivações para

a escolha de Mossoró foi a renda per capita da cidade, equivalente a R$ 5.978,

considerada naquele momento superior à de Fortaleza e similar à da capital do

Rio Grande do Norte e à brasileira.

Desde a divulgação da instalação do shopping, começaram as

discussões e as expectativas para a chegada do primeiro empreendimento

deste porte na cidade e na região. O prof. Jamilson Azevedo183, da UERN, em

entrevista ao Jornal O Mossoroense, fez uma análise dos impactos que a

chegada de um empreendimento de grande porte, como é o caso do Mossoró

West Shopping, tem no cenário urbano da cidade184. Para o estudioso,

inicialmente haveria uma valorização dos terrenos nas suas proximidades, pois

182 Empresa gerenciadora do projeto. 183 Professor de Geografia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. 184 Professor da UERN analisa os impactos da chegada de um shopping de grande porte a Mossoró. Jornal O Mossoroense, 7/3/2007.

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“O shopping simboliza a descentralização das atividades terciárias. Só que ele ainda tem uma simbologia de exclusividade, de sofisticação. É natural que aquela área onde ele se localiza sofra um processo de valorização e que ele atraia uma gama de serviços ao redor. Aquela região vai sofrer um processo de dinamização bastante interessante", afirma Jamilson.

De fato, esta valorização ocorreu. Com a divulgação da instalação do

shopping center no Bairro Nova Betânia, toda a área do seu entorno teve

grande valorização, configurando-se numa nova frente de expansão urbana e

do mercado imobiliário. Devemos ressaltar a participação do Estado neste

processo, pois além das obras de infraestrutura (pavimentação, energia

elétrica, abastecimento de água etc.), a prefeitura municipal doou o terreno

para a instalação do empreendimento, como parte de uma política de geração

de emprego e renda da administração municipal na época185.

Outra questão levantada pelo geógrafo foi a dos impactos da instalação

do estabelecimento comercial sobre o comércio do Centro da cidade. Na época

da entrevista ao jornal local, ele acreditava que o shopping iria provocar uma

queda parcial na circulação de pessoas no Centro, porquanto o público alvo do

shopping não era exatamente o mesmo do mercado de vendas populares. Para

ele, algum tempo depois da inauguração, cerca de 20% a 30% dos prédios

comerciais do Centro seriam vendidos ou alugados, pois parte do comércio iria

fechar ou migrar para o shopping.

Contudo, em contraposição às expectativas do mencionado professor,

e consoante o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Mossoró

afirmou, na semana de inauguração do MWS o comércio da cidade como um

todo foi aquecido, ou seja, houve uma reação positiva do consumidor.

Segundo Pintaudi (1989, 2002), um empreendimento como um shopping acaba

atraindo maior fluxo de consumidores, inclusive para o comércio tradicional de

rua, embora também estabeleça com ele certa concorrência, o que levou a

uma reorganização das atividades comerciais186.

Para um empresário local, em entrevista ao Jornal Gazeta do Oeste, a

vinda do MWS traz uma nova metodologia de vendas, “na qual a vitrine impera

185 Apoiado pela prefeitura, Mossoró West Shopping será lançado nesta quarta-feira. Prefeitura Municipal de Mossoró. 2/5/2006. Disponível em: http://www.prefeiturademossoro.com.br/2008/02052006_05.php. Acesso em: 15/2/2011. 186 As das mudanças no comércio tradicional serão apresentadas mais adiante neste capítulo.

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182

e os olhos são os anunciantes”187. Esta afirmação corrobora a ideia de Carlos

(2001, p. 68) ao afirmar que “lugares cada vez mais visuais, que invadem a

vida das pessoas através do marketing, tornam-se lugares de desejo [...] onde

o privado se reafirma e se impõe em detrimento ao público”.

A inauguração do Mossoró West Shopping ocorreu em julho de 2007 e,

na época, a expectativa de faturamento bruto era da ordem de R$ 10 milhões,

com credenciais para garantir a segunda colocação entre os empreendimentos

do setor no Rio Grande do Norte188. De acordo com informações de jornais

locais e do próprio MWS189, o empreendimento foi orçado em R$ 55 milhões

pelo Grupo 5V190 Brasil, sendo R$ 28 milhões de recursos próprios, R$ 15

milhões de lojas-âncora e R$ 12 milhões dos demais empreendedores.

Atualmente, o empreendimento possui uma área total de 80.000m², com pouco

mais de 33.000m² de área construída.

Segundo classificação da ABRASCE, existem quatro grandes grupos

de lojas que devem integrar um shopping: lojas-âncora, megalojas, lojas-

satélite e conveniência e serviços191. No MWS estão instaladas 95 lojas: cinco

lojas-âncora (Lojas Americanas, Lojas Riachuelo, Lojas Marisa, Hiper Queiroz

e Jacaúna Decorações), seis megalojas (Lojas Maia, Miranda Computação,

Lojas Emmanuelle, Comercial Rabelo, Atacadão dos Eletros e Sport Master),

61 lojas-satélite, quatorze lojas de alimentação, além de cinco salas de cinema,

inauguradas em 2010192, e diversos tipos de serviços. A maioria das lojas em

funcionamento são franquias de redes regionais, nacionais e internacionais,

evidenciando um dos fenômenos que, de acordo com Costa (2008), está se

187 Inauguração do shopping está confirmada para julho. Jornal Gazeta do Oeste, 17/6/2007. 188 O Midway Mall é primeiro empreendimento do setor de shopping centers no Rio Grande do Norte, e está localizado na capital do Estado, Natal. Com investimento de R$ 150 milhões, possui 227.000 m² com três pavimentos destinados a lojas e serviços diversos e outros seis pavimentos destinados ao estacionamento coberto para 3.500 veículos. A primeira fase foi inaugurada no dia 27 de abril de 2005, com a ocupação dos dois primeiros pavimentos. O terceiro pavimento foi inaugurado em 27 de abril de 2009. Disponível em: http://www.midwaymall.com.br/ 189 http://www.mossorowestshopping.com.br. 190 O Grupo 5V é controlado pela família Vacis, há 25 anos no setor de pré-fabricados industriais e empreendimentos industriais na Itália. Em 1998 o grupo iniciou o “Projeto Brasil” com a constituição da Holding 5V S.p.A., que atua no segmento da construção civil, esportes e gestão imobiliária. No ano de 2000 inaugurou no Distrito Industrial de Maracanaú – CE a Concretopolis (Concreto Pré-Moldado Industrial do Nordeste Ltda.), que hoje é a empresa de pré-moldados de maior capacidade produtiva instalada no Brasil. 191 Informações obtidas no site da ABRASCE (2010). 192 Informações disponíveis em http://www.mossorowestshopping.com.br/. Acesso em 15/2/2011.

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generalizando nas economias capitalistas centrais e periféricas: o franchising,

ou licenciamento de franquias, considerada uma forma de relações

hierarquizadas do capital.

Figura 35: Mossoró. Mossoró West Shopping

Foto: Edna Couto. Trabalho de campo (2008).

O shopping tem alcance interestadual193 e a estimativa de público

mensal é de 270 mil pessoas, com perfil socioeconômico dos mais variados,

indo desde o público de classes mais abastardas ao público composto por

pessoas de classe média. Todavia, considerando que no âmbito do consumo

de mercadorias “[...] o shopping center é a expressão da desigualdade social e

de sua reprodução” (PINTAUDI, 1989, p.6), existe uma segregação entre os

tipos de clientes que visitam o shopping center, porquanto este novo espaço de

consumo simboliza a diferenciação entre pessoas e classes sociais. Este tipo

de empreendimento, segundo Padilha (2006, p.30), “[...] é hoje o mais

capitalista templo do consumo, onde os desejos, os projetos, as paixões e as

relações pessoais materializam-se em objetos – e seus signos – a serem

consumidos”.

Exemplo disso é a dificuldade de acesso ao MWS por parte da

população desprovida de automóvel. Em virtude da sua distância em relação

ao Centro, na época da inauguração havia a intenção de disponibilizar um

ônibus padronizado para deslocamento dos consumidores do Centro ao

193 O MWS recebe clientes de todo oeste potiguar e de cidades cearenses como Aracati, Icapuí e do Baixo Jaguaribe, no Ceará, assim como, Natal – RN, Catolé do Rocha – PB, São Bento – PB, entre outras.

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shopping, que seria gratuito e faria o percurso passando por alguns pontos da

cidade como a Catedral e o Hotel Thermas194.

No entanto, este serviço só começou a funcionar efetivamente em julho

de 2009. De acordo com o assistente de marketing do MWS195, uma van

exclusiva realiza o percurso do Centro ao shopping, de segunda a sábado das

10 horas às 22 horas. Embora não seja cobrada nenhuma taxa pelo traslado, o

cliente precisará fazer uma compra no valor mínimo de R$10,00 no

estabelecimento comercial para utilizar o serviço na volta, do shopping para o

Centro. O veículo sai do shopping de hora em hora, conforme a seguinte

rota196:

Figura 36: Rota da van do Mossoró West Shopping

Fonte: Mossoró West Shopping (2010).

Como podemos notar pela rota traçada, este transporte para clientes é

bastante seletivo, pois os locais por onde passa, assim como seus limites,

demarcam uma área da cidade cuja população possui rendimentos médios ou

altos.

194 Horários do West Shopping são definidos. Jornal Gazeta do Oeste, 21/6/2007. 195 Entrevista realizada em maio de 2008, durante trabalho de campo. 196 Disponível em: http://www.mossorowestshopping.com.br/v02/images/roteiro.jpg.

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Além do Mossoró West Shopping, a cidade conta com centros

comerciais de porte bem menor, chamados pela população mossoroense de

“shoppings”. Eles funcionam como centros de serviços e comércio para os

bairros mais próximos, e atendem um público considerado popular; servem

como locais de encontros, principalmente para os jovens; e possuem algumas

lojas de serviços especializados, como escritórios de advocacia e de

consultorias.

No âmbito das trocas comerciais este equipamento, assim como os

shopping centers, “[...] é fruto das transformações ocorridas no processo de

desenvolvimento do comércio varejista e, no seu desenvolvimento particular,

apresenta-se em diferentes versões, ainda que na aparência semelhante”

(PINTAUDI, 1989, p.5-6).

Em Mossoró, destacamos dois pequenos centros comerciais: o

Shopping Oásis e a Galeria Boulevard Central197. Ambos estão localizados nas

proximidades do Centro da cidade e foram instalados na década de 1990,

quando a cidade ainda não tinha um shopping center.

O Shopping Oásis dispõe de uma área bruta locável de

aproximadamente 3.000m², com 102 lojas, das quais algumas estão fechadas.

Possui uma pequena praça de alimentação, lan house e estacionamento

rotativo com pouco mais de vinte vagas. Segundo a entrevistada, houve uma

diminuição sutil no fluxo de vendas e de pessoas desde a instalação do MWS,

embora o público local seja diferenciado daquele que frequenta o shopping. A

clientela é formada por pessoas de classes mais populares, por outras que

moram nos bairros próximos e por transeuntes do Centro da cidade. O fluxo de

frequentadores diário gira em torno de 200 a 300 pessoas.

A Galeria Boulevard Central funciona desde 1996, com ABL de

aproximadamente 6.000 m². Possui praça de alimentação, estacionamento

próprio para mais de 100 carros e 63 lojas, das quais a maioria já foi vendida

aos proprietários das empresas198. O centro comercial disponibiliza algumas

lojas de serviços como, por exemplo, uma agência de viagens e turismo, um

197 Entrevistas realizadas em fevereiro de 2008, durante trabalho de campo. Além destes centros comerciais, existem outros três de porte bem menor e que não foram considerados para esta pesquisa. São eles: Blitz, no Centro; Salinas, no Bairro Santo Antônio; e Porcino, no Bairro Nova Betânia. 198 Apenas cerca de 20% dos estabelecimentos ainda pertence ao dono do centro comercial.

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posto da TAM viagens, uma farmácia (Pague Menos) e uma autoescola (Ideal).

Quanto ao fluxo estimado de pessoas, fica em torno de 500 ao dia, com

predomínio da classe mais popular, moradores da circunvizinhança ou pessoas

que transitam pela área do Centro de Mossoró. A Galeria também possui

clientes de outros municípios como Baraúnas, Açu, Caraúbas etc., fazendo

com que algumas lojas atacadistas no setor de vestuário ofereçam serviço de

pronta entrega sem exigência de valor mínimo de compras.

Consoante afirma o administrador da Galeria Boulevard Central, com a

instalação do MWS, houve um declínio razoável nas vendas e no fluxo de

pessoas. Ele destaca como uma vantagem do Boulevard sua proximidade do

Centro e as novidades que oferece aos seus clientes.

Figura 37: Mossoró. Shopping Oásis

Foto: Edna Couto. Trabalho de campo (2008).

Figura 38: Mossoró. Galeria Boulevard Central

Foto: Edna Couto. Trabalho de campo (2008).

A imagem proposta pelos shoppings e centros comerciais, como lugar

que proporciona segurança e facilidade de encontrar tudo no mesmo espaço,

aliada à ideia de modernidade e progresso, são os maiores atrativos para os

brasileiros elegerem esses empreendimentos como lugar privilegiado para

compras e lazer. Esta associação entre consumo e lazer expressa os novos

hábitos de consumo e a reificação dos espaços comerciais e do espaço urbano

(PADILHA, 2006).

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Quadro 7: Mossoró. Mossoró West Shopping e centros comerciais

Nome do estabelecimento

Ano de instalação

Área bruta locável

Total de lojas

Vagas no estacionamento

Mossoró West Shopping 2007 21.532m² 95 1.074

Shopping Oásis - 3.000m² 102 20

Galeria Boulevard Central 1996 5.872 m² 63 100

Fonte: Trabalho de campo. Elaboração da autora (2009). Segundo destaca Ribeiro Filho (2004), o advento do shopping center

contribuiu bastante para as modificações na estrutura espacial das atividades

comerciais e de serviços, pois “ele passa a ser a nova forma de organização

das atividades terciárias descentralizadas” (p.164).

Conforme já comentamos, a instalação deste tipo de equipamento

pressupõe uma localização estratégica que facilite a acessibilidade do mercado

consumidor, especialmente o de maior poder aquisitivo. Na ótica de Corrêa

(2000), a distribuição espacial dos shopping centers reflete também a

distribuição espacial da renda, tendo impactos no comércio da área central, no

pequeno comerciante, no preço da terra, afetando nos fixos e nos fluxos.

Assim, este tipo de equipamento comercial moderno está instalado

bem próximo a importantes vias de acesso: o MWS na rodovia federal BR-304;

e os centros comerciais na Avenida Alberto Maranhão, via urbana que se

transforma em rodovia estadual (RN-117) fora do perímetro urbano

mossoroense.

No tocante ao público alvo, ambos os tipos de equipamentos localizam-

se em bairros considerados de classe média e, no caso do Mossoró West

Shopping, está instalado no Bairro Nova Betânia, que cada vez mais se

constitui como uma nova centralidade da cidade, concentrando uma variedade

de comércios e serviços especializados e a população de maior poder

aquisitivo.

Outra consideração a ser feita é quanto às mudanças na sociabilidade

local e regional. Elias e Pequeno (2010) apontam algumas dessas mudanças

como o horário possível de compras, que se estendeu das 18 horas para as 22

horas; transformações na atividade comercial, com a aceleração do consumo

de bens duráveis; e o incremento da alimentação fora de casa, associado às

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mudanças nos hábitos alimentares (fast food). Esta dinâmica de restaurantes

fast food é tão avassaladora que em Mossoró já existe uma rede local de

estabelecimentos do gênero em plena fase de expansão para outras cidades

do Nordeste.

É a rede de restaurantes Xerife’s Fast Food, cuja primeira loja foi

inaugurada em 2007, na Avenida João da Escóssia199, bem próxima ao

shopping center. No ano seguinte, a empresa instalou um quiosque na Praça

de Convivência na Avenida Rio Branco200, Corredor Cultural da cidade, e

atualmente possui quatro lojas. Segundo informou notícia publicada em jornal

local201, ao participar da 1ª Edição da Franchising Nordeste, o Xerife’s teve

grande destaque, em virtude da fase de expansão da empresa potiguar, que já

havia dado início ao cadastramento de franqueados em todo o Nordeste, tanto

nas capitais quanto nas cidades de porte médio e pequeno.

A expansão desta rede mossoroense de restaurantes para a região

Nordeste deixa clara a força adquirida pelo sistema de franquias na cidade,

atrelada aos novos métodos organizacionais e gerenciais das empresas, que

almejam maior flexibilidade dos processos produtivos e de distribuição,

menores custos e maiores lucros, principalmente com as mudanças trazidas

pela incorporação do meio técnico-científico-informacional. Ao se referir a este

sistema, Bernard (1992, p.24) o define como sendo

Uma oportunidade de negócios na qual o proprietário, seja ele produtor ou distribuidor, de um serviço ou de um produto que possua uma marca registrada, concede direitos exclusivos a um indivíduo ou, em alguns casos, uma pessoa jurídica, para distribuir/vender, em determinada área, determinado serviço ou produto, que em troca recebe uma taxa inicial e/ou royalties, além de uma conformidade à padronização da qualidade por ele proposta.

199 Principal eixo viário de acesso ao Bairro Nova Betânia, uma nova centralidade em formação na cidade e que concentra moradias de alto padrão. 200 Na Avenida Rio Branco, uma das principais da cidade, está localizado o Corredor Cultural, que é composto por três equipamentos: o Parque da Criança (local de lazer infantil), a Praça de Convivência (que concentra estabelecimentos gastronômicos) e a Praça do Esporte (local de práticas esportivas). Além destes equipamentos, neste corredor encontram-se também a Estação das Artes (local de realização de eventos como Mossoró Cidade Junina), o Teatro Municipal Dix-Huit Rosado e o Memorial da Resistência (onde é possível conhecer um pouco da história da cidade). 201 Xerife´s se destaca na primeira “Franchising Nordeste”. Jornal O Mossoroense, Cotidiano, 3/5/09.

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Neste sistema, a pessoa que concede os direitos é o franqueador, e o

indivíduo a quem é concedido o direito é o franqueado. De acordo com a

Associação Brasileira de Franchising, o sistema de franquias teve maior

crescimento na economia nacional a partir da década de 1990, ao se distribuir

nos mais diversos segmentos do comércio, nos serviços pessoais,

empresariais, produtivos etc., tornando-se bastante heterogêneo e complexo.

Segundo Kon (2004), o desenvolvimento do sistema de franquias no país tem

impulsionado bastante as atividades de serviços no Brasil, gerando produtos e

postos de trabalho.

Para Salgueiro (2001), este tipo de estabelecimento contribui para a

criação de paisagens homogêneas, por potencializar o acesso a bens e formas

de estar e consumir, aumentando a diversidade de escolha do consumidor, e,

simultaneamente, empobrece as opções de comparação entre os lugares, pois

oferece os mesmos produtos, serviços, atendimento e preços, seguindo

determinada padronização202.

Em Mossoró, é possível encontrar inúmeras franquias, nos mais

diversos ramos (alimentício, aluguel de veículos, educação, comunicações

etc.), os quais, em sua maioria, estão concentrados no Centro da cidade, no

Mossoró West Shopping e nos eixos de ligação entre estas duas centralidades,

confirmando a importância da localização espacial que facilite o acesso e que

atenda demanda e público alvo específicos. Consoante afirmou o gerente da

Unidade de Acesso a Mercado do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas

Empresas do Rio Grande do Norte,

"Mossoró é hoje uma ilha de desenvolvimento, de oportunidade e isso se reflete na expansão dos negócios e principalmente das franquias. É uma nova demanda que surge. A cidade está em evidência nacionalmente pelas suas características econômicas da fruticultura, do petróleo e gás e isso atrai investidores" (SEBRAE/RN).

Assim como o shopping center, as redes de franquias contribuem para

as transformações espaciais, com a descentralização da atividade comercial e

a formação de novas centralidades no espaço urbano e regional. Segundo

202 No caso da rede Xerife’s, segundo informações do próprio site da empresa, a rede atua diferentemente de outros tipos de franquias, pois não impõe um modelo para o franqueado investir, tendo em vista a possibilidade de adaptação de cada filial quanto ao mix de produtos, aos investimentos, conforme a necessidade de cada mercado e do tamanho da cidade etc. Disponível em: http://www.xerifes.com.br/. Acesso em: 12/6/10.

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Cleps (2004), estes dois processos possibilitaram a valorização de áreas

consideradas periféricas, despertando os interesses do capital imobiliário.

Nestas novas centralidades concentram-se cada vez mais fluxos de veículos e

pessoas de outras áreas da cidade, principalmente com a implantação de

loteamentos e condomínios residenciais fechados de alto padrão.

No caso do shopping center, Pintaudi (1989, 1992) defende que este

tipo de empreendimento caracteriza-se como uma forma expressiva da

produção monopolista do espaço. Ele não resulta do prolongamento ou

expansão comercial de determinado lugar, mas é fruto de uma ruptura com o

possível lugar de implantação do empreendimento. De modo geral, não se

instalam em locais tradicionalmente comerciais, a não ser eventualmente,

quando as condições permitem e a localização não é condição necessária.

De acordo com Elias e Pequeno (2010, p.229), a chegada do shopping

center em Mossoró reorganizou a atividade comercial da cidade e da região e

introduziu novos hábitos e costumes relacionados aos padrões do consumo de

massa, equiparando o consumo local e regional ao das grandes metrópoles.

Segundo os referidos autores afirmam, o MWS “está funcionando como um

verdadeiro extensor urbano” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p.270), pois desde o

anúncio do empreendimento outros equipamentos urbanos começaram a se

instalar nas imediações do local, provocando intenso processo de especulação

imobiliária.

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Mapa 7: Mossoró. Localização do Mossoró West Shopping e dos centros comerciais

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3.2.3 Redes e filiais de venda de eletrodomésticos e lojas de

departamentos

Além dos supermercados, hipermercados e do shopping, outro tipo de

estabelecimento comercial vem se consolidando na cidade: as redes de vendas

de eletrodomésticos, artigos eletrônicos, magazines e lojas de departamentos,

que cada vez mais têm se instalado no comércio mossoroense, tanto no Centro

como no MWS. Estes empreendimentos em redes são decorrentes do

processo de centralização do capital, assim como os supermercados,

hipermercados e shopping centers, e surgiram durante o processo de

urbanização da economia e da população (PINTAUDI, 1989).

De acordo com informações coletadas em pesquisa na internet e

durante os trabalhos de campo, em 2007 eram 73 estabelecimentos,

pertencentes ou não a redes de lojas, em Mossoró203. Para esta pesquisa,

selecionamos os estabelecimentos mais representativos, integrantes das

principais redes regionais e nacionais. Optamos por dividi-los segundo os

produtos comercializados: redes de venda de eletrodomésticos e eletrônicos e

lojas de departamentos e redes de venda de cama, mesa, banho e vestuário,

apresentando o ano de instalação, a área bruta locável, o número de

empregados e localização da matriz das empresas.

A localização dos estabelecimentos é determinada pela dinâmica

econômica, cujas atividades comerciais ainda se concentram principalmente no

Centro e no Mossoró West Shopping, corroborando as centralidades que se

constituem na cidade. Algumas destas filiais de redes estão instaladas na

cidade desde a década de 1980, momento de descentralização do setor no

país, e, atualmente, são lojas-âncora ou megalojas no MWS.

A) REDES DE VENDA DE ELETRODOMÉSTICOS E ELETRÔNICOS

O final da década de 1980 é o marco inicial da chegada de redes de

lojas que vendem eletrodomésticos e produtos eletrônicos em Mossoró, mas é

a partir dos anos 2000 que a instalação de filiais ocorre com mais intensidade, 203 Pesquisa feita nos sites da Tele lista (http://www.telelistas.net/) e da Lista online (http://www.listaonline.com.br/). As lojas incluídas na pesquisa comercializavam artigos eletrodomésticos, eletrônicos, magazines e lojas de departamentos.

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sobretudo após a inauguração do MWS. Como podemos notar, a maior parte

das redes tem suas matrizes em Estados nordestinos; portanto, as redes deste

segmento são predominantemente regionais.

Quanto à procedência, os clientes vêm de toda a região oeste potiguar,

e também de outras cidades como Aracati, Icapuí, Limoeiro do Norte e Russas,

no Ceará. Durante o ano, os meses com os maiores movimentos de vendas

são janeiro, maio, novembro e dezembro, e o mês de vendas mais fracas é

fevereiro. Na semana, o sábado é o dia de mais destaque de vendas, a

demonstrar a importância regional de Mossoró, tendo em vista que uma parte

do mercado consumidor é proveniente de outras cidades e de outros Estados.

Geralmente, o quadro de funcionários da empresas é formado por

mossoroenses, exceto alguns cargos de gerência, e em sua maior parte foram

selecionados pelo Sistema Nacional de Emprego, pela FUNGER e pela própria

empresa.

A primeira loja de redes de venda de eletrodomésticos e artigos

eletrônicos em Mossoró foi instalada em 1989, pertencente às Lojas Maia204,

reinaugurada em 1996. Atualmente, a rede tem duas lojas no Centro da cidade

e uma no MWS.

Outra rede de lojas presente no comércio mossoroense é a

Insinuante205. Esta empresa possui duas filiais em Mossoró, ambas no Centro.

A primeira loja foi instalada no ano de 1996 e a segunda, em 2006. Segundo o

gerente de uma das filiais, as duas lojas pertencentes à rede em Mossoró

representam entre 30% e 40% das vendas do Estado.

Também instalada na cidade, a Comercial Rabelo Som & Imagem

Ltda.206 teve sua primeira loja inaugurada em Mossoró em 2002. Ainda no

204 A empresa é propriedade do grupo F.S Vasconcelos & CIA. LTDA., cujo fundador foi Francisco Severiano Vasconcelos (Seu Chico), com o auxílio do seu filho mais velho, Arnaldo Dantas Maia. A matriz e o centro de distribuição da empresa ficam em João Pessoa, na Paraíba, e a rede possui aproximadamente 140 filiais em todos os Estados do Nordeste brasileiro. Na capital potiguar são aproximadamente dez lojas e em Mossoró existem duas lojas. As Lojas Maia dispõem de duas Centrais de Distribuição: uma no município de Cabedelo – PB, a 4 km de João Pessoa, e a outra em Simões Filho – BA, a 15 km de Salvador, totalizando 30.000 m². Possui também uma frota de 35 caminhões para transporte de mercadorias. 205 Com sede em Salvador, na Bahia, a empresa conta com mais de 250 lojas espalhadas pelo Norte e Nordeste do país, e uma loja no Rio de Janeiro. Em Mossoró são duas filiais, ambas no Centro da cidade. 206 A empresa possui 35 lojas e sua matriz é sediada em Fortaleza – CE. Dispõe de duas Centrais de Distribuição que ficam em Natal – RN e Fortaleza – CE.

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mesmo ano, mais uma filial foi implantada na cidade, ambas localizadas no

Centro. No total, são três unidades da rede: duas lojas no Centro e uma no

Mossoró West Shopping, inaugurada em 2008.

Também compondo o comércio de Mossoró a Laser Eletro207 possui

duas lojas na cidade208, assim como o Atacadão dos Eletros209, com duas filiais

em Mossoró, sendo uma no Centro e outra no Mossoró West Shopping.

Quadro 8: Mossoró. Filiais de redes de venda de eletrodomésticos e eletrônicos

Nome da empresa Ano de

instalação Número de

empregados Localização na

cidade

Lojas Maia 1989 21 Centro

Lojas Insinuante Ltda. 1996 17 Centro

Comercial Rabelo Som & Imagem Ltda. 2002 22 Centro

Comercial Rabelo Som & Imagem Ltda. 2002 23 Centro

Laser Eletro 2004 14 Centro

Atacadão dos Eletros 2005 18 Centro

Lojas Insinuante Ltda. 2006 14 Centro

Lojas Maia 2007 10 Centro

Comercial Rabelo Som & Imagem Ltda. 2008 20 MWS

Atacadão dos Eletros 2008 20 MWS

Lojas Maia - - MWS

Fonte: Trabalho de campo. Elaboração da autora (2009). B) LOJAS DE DEPARTAMENTOS E REDES DE VENDA DE CAMA, MESA,

BANHO E VESTUÁRIO

De acordo com a definição da ABRASCE, as lojas de departamentos

“são lojas que operam diversas linhas, tanto de semi-duráveis (vestuário e

acessórios, cama, mesa e banho, etc.), como duráveis (eletroeletrônicos,

207 A matriz e o centro de distribuição da empresa ficam em Recife – PE e a rede tem 74 lojas pelo Nordeste, de Salvador – BA a Sobral – CE. Em Natal – RN são quatro lojas e em Mossoró são duas lojas no Centro. 208 Só dispomos de informações de uma das lojas da rede. 209 A matriz da rede está localizada em João Pessoa, na Paraíba. A empresa conta com 38 lojas, sendo duas delas em Mossoró.

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decoração, brinquedos, móveis, CDs, perfumes etc.). Possuem normalmente

área bruta locável superior a 1.000 m²”.210

Este tipo de loja expande-se cada vez mais no país. A primeira rede de

lojas do segmento a se instalar na cidade de Mossoró foi a pertencente ao

grupo Deib Otoch, mais conhecida como Esplanada/ Otoch211. Sua filial na

cidade foi inaugurada em 1982, no Centro, e atualmente conta com uma área

de 4.000m², distribuída em dois pisos, com mais de 80 mil itens212. A sede da

empresa fica em Fortaleza, cidade de origem dos gerentes da loja.

Outra rede a se instalar em Mossoró é a Riachuelo213, também no ano

de 1982, no Centro da cidade. Atualmente, esta rede possui duas lojas na

cidade: a do Centro e uma no MWS214, inaugurada no ano de 2007. Neste

mesmo ano, foram instaladas filiais de outras redes no MWS: a Loja Marisa215

e as Lojas Emmanuelle216. Em Mossoró existem também duas filiais das Lojas

Americanas217, sendo uma no shopping center, desde 2007, e outra no Centro,

inaugurada recentemente, em 2010 .

210 Informações disponíveis em: http://www.portaldoshopping.com.br/sobreosetor.asp?codAreaMae=10&codArea=60&codConteudo=1. 211 A matriz desta rede fica em Fortaleza – CE e ao todo são dezenove lojas. No Rio Grande do Norte, existem três lojas em Natal e uma em Mossoró. 212 De acordo com o entrevistado, a loja responde por cerca de 40% das vendas do Rio Grande do Norte, e o faturamento mensal gira em torno de R$800.000,00, alcançando R$1.200.000,00 no mês de dezembro. 213 A Loja Riachuelo é uma das empresas participantes do grupo Guararapes, que possui três centros de distribuição: um em Natal – RN, um em Belém – PA e um em Guarulhos – SP. Além da Riachuelo, o grupo é composto por três outras empresas: Transportadora Casa Verde, Centros de Distribuição e Midway Mall, que atua no segmento de shopping centers. Em breve seria inaugurada mais uma empresa no grupo: uma Financeira, a Midway. Esta financeira é nacional e estaria em parceria com a IBI/ C&A. 214 Respondendo a algumas informações de que a Loja Riachuelo estaria interessada em comprar o MWS, o entrevistado comentou que na realidade o grupo Guararapes, particularmente a Midway Mall, teria esta intenção, mas que já foi descartada. Segundo o gerente da loja, quando o grupo decide investir em uma determinada empresa, todas as outras “unem forças” para isso. Conforme ele comentou, realmente havia o interesse de compra do shopping, mas até o momento, o grupo estava investindo nas Lojas Riachuelo (o que não descartaria investimentos futuros no segmento de shopping centers na cidade pelo Midway Mall, que já possui um shopping em Natal). 215 A empresa tem seu centro de distribuição em São Paulo – SP, e a base distribuidora para o Nordeste é em Recife – PE. 216 A matriz da loja é em Recife, mas existem filiais da rede em Recife, João Pessoa, Natal, somando ao todo quarenta lojas. Os produtos da rede vêm de São Paulo – SP ou Recife – PE através de vários fornecedores. Não possui um centro de distribuição e quem faz a compra é a central em Recife. Eles apenas informam as peças mais vendidas e que estão em falta. 217 A entrevistada não concedeu informações sobre a loja.

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Quadro 9: Mossoró. Localização do Mossoró West Shopping e dos centros comerciais

Nome da empresa Ano de

instalação ABL

Número de empregados

Localização na cidade

Origem dos ocupantes dos

cargos de gerência

Lojas Esplanada/Otoch 1982 4.000m² 86 Centro Fortaleza – CE

Lojas Riachuelo S.A. 1982 3.200m² 100 Centro

Teresina – PI São Paulo – SP

Natal – RN Mossoró – RN

Lojas Marisa 2007 1.134m² 37 MWS Fortaleza – C

Lojas Riachuelo S.A. 2007 1.600m² 60 MWS

Teresina – PI São Paulo –SP

Natal – RN Mossoró – RN

Lojas Emmanuelle 2007 - 12 MWS João Pessoa – PB

Lojas Americanas S.A. 2007 - - MWS -

Lojas Americanas S.A. 2010 1.180 m² - Centro -

Fonte: Trabalho de campo. Elaboração da autora (2011).

É interessante destacar o seguinte: as vendas no comércio são

aquecidas durante uma das campanhas comerciais ocorridas na cidade, a

“Liquida Mossoró”. Vista como a segunda melhor data de vendas para o

comércio lojista, perde somente para o período natalino. Promovida

anualmente pela Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande

do Norte, em 2010 atingiu sua 9ª edição em Mossoró. A campanha do Liquida

já atua em mais de 150 cidades em todo o país e é considerada a maior

campanha do varejo brasileiro e caminha para se tornar a segunda melhor data

promocional do ano218.

Além das campanhas realizadas pela CDL, as atividades comerciais

modernas possuem outra ferramenta para estimular o consumo: a propaganda.

O efeito demonstração, isto é, “a inclinação dos pobres no sentido de consumir

da mesma maneira que os ricos [...]” (SANTOS, 1981, p.11), é provocado pelo

crescimento da publicidade e do marketing utilizado pelas grandes empresas,

que fazem a captação de clientes nas cidades circunvizinhas a Mossoró e de

outros Estados, através de mídia televisiva e impressa. Na percepção de

Padilha (2006, p.117), o profissional atuante nestas duas atividades é “aliado

218 FCDL e CDL Mossoró lançam Liquida Mossoró e Interior. Portal Nominuto. Informações disponíveis em: http://www.nominuto.com/noticias/economia/fcdl-e-cdl-mossoro-lancam-liquida-mossoro-e-interior/35521/. Acesso em: 8/6/10.

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direto e fundamental do capital, uma vez que é ele quem cria a demanda

necessária para sua manutenção”.

Recentemente, verificou-se um aumento do número de empresas e de

profissionais atuando nesta atividade em Mossoró, pois de acordo com dados

da RAIS houve um crescimento de 150% no setor: em 1995 eram apenas duas

empresas no ramo de publicidade na cidade e uma década depois esse

número passa a ser de cinco empresas, quantidade bastante representativa

para uma cidade do porte de Mossoró.

Este panorama geral de atividades comerciais modernas em Mossoró

comprova as intensas mudanças em curso na cidade e em sua região de

influência, sobretudo a partir da década de 1990. Embora as formas modernas

de comércio, como supermercados ou redes regionais de lojas, avancem cada

vez mais, as formas comerciais tradicionais continuam existindo e ainda

estabelecem importantes relações sociais.

Na ótica de Ribeiro Filho (2004, p.165), o entendimento do processo de

descentralização da atividade comercial pode contribuir para o estudo da

dinâmica na área central, pois “a intensidade e as formas resultantes

impactaram nas mudanças e permanências das atividades terciárias na Área

Central”.

Até bem pouco tempo, o Centro da cidade se caracterizava como único

ponto a reunir as atividades terciárias e os fluxos urbanos. Em estudos

realizados há duas décadas, Sposito (1991) atribuiu ao Centro o caráter

integrador e dispersor, afirmando que

Ele é antes de tudo ponto de convergência/divergência, é o nó do sistema de circulação, é o lugar para onde todos se dirigem para algumas atividades e, em contrapartida, é o ponto de onde todos se deslocam para interação dessas atividades aí localizadas com as outras que se realizam no interior da cidade ou fora dela (SPOSITO, 1991, p.6).

Porém, com a difusão dos transportes e das comunicações e a divisão

interna do trabalho, houve uma especialização dos lugares e uma maior

circulação. Isto, segundo Arroyo (2006, p.75), “acarreta a desvalorização de

certas áreas em favor das que acolhem o desenvolvimento de novas atividades

ou a modernização de outras já instaladas”.

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Tais redefinições contribuíram para o enfraquecimento do Centro

monopolizador do comércio tradicional em relação ao comércio moderno

desenvolvido nas novas centralidades. Pintaudi (1992, 2002) explica a

fragilidade das atividades comerciais desenvolvidas no Centro pelo rompimento

de antigos laços entre pessoas e relações, que passaram a ser estabelecidos

nas novas centralidades, e também ao referencial simbólico atribuído ao

Centro, que o distingue dos novos centros.

No entanto, a autora citada aponta um jogo de forças entre as

atividades comerciais modernas e tradicionais, que envolve concorrência e

complementaridade, no qual a ideologia da mercadoria sujeita a ambos e

determina “a nova paisagem urbana e as novas relações sociais” (PINTAUDI,

2002, p.158).

Deste modo, como acredita Cleps (2004), o comércio seria um dos

fatores de valorização e desvalorização de áreas. Quando a atividade

comercial começou a migrar para as áreas mais periféricas, concentrou ao

redor diversos serviços especializados, e, assim, atribuiu novos valores a essas

áreas. Então, as formas contemporâneas de realização da atividade comercial

se instalaram na periferia e, com isso, isolaram-se das cidades, adquiriram uma

especialização funcional e contribuíram para a formação de novas

centralidades nas cidades.

A formação destas centralidades implica a redefinição dos conteúdos

da área central, processo resultante da divisão técnica, social e territorial do

trabalho, estabelecendo novas articulações entre a localização dos

equipamentos comerciais e consequentemente engendrando novas relações

espaciais, de concentração e dispersão. Whitacker (2007, p.4) afirma

A dinâmica de concentração e dispersão cria e recria centralidades que irão ocupar e valorar diferentemente e diferencialmente territórios no tecido urbano e na dimensão da rede urbana e se traduzem em segmentação de usos e não usos e na fragmentação socioespacial.

Este processo foi estimulado pela incorporação de estratégias de fusão

e concentração econômica oriundas da chegada de capitais estrangeiros à

economia nacional (SPOSITO, 2001b). No entanto, a modernização da

atividade comercial não contempla o espaço, particularmente o espaço urbano,

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de forma homogênea, pois há uma apropriação e valorização de determinadas

áreas em detrimento de outras, nas quais existem sucessões e coexistências

(SANTOS, 2008b).

Ao discutirem a questão da coexistência de atividades comerciais

modernas e tradicionais, Diniz e Castilho (2009, p.41) afirmam ser este um

fenômeno decorrente das “[...] inovações e mudanças ocorridas no espaço

comercial urbano na atualidade, especialmente em cidades de países de

economia subdesenvolvida”, que revela desigualdades na organização espacial

das atividades comerciais.

O avanço do meio técnico-científico-informacional contribuiu para as

reestruturações no comércio, porquanto as modernizações tecnológicas e

organizacionais são bastante seletivas e respondem a interesses hegemônicos

externos. Logo, o espaço comercial é construído a partir das relações entre as

verticalidades, que tendem a homogeneizar os espaços, e as horizontalidades,

que suscitam a permanência e expansão de atividades tradicionais (DINIZ;

CASTILHO, 2009).

Em contrapartida, como assevera Santos (2004), a noção de oposição

entre o moderno e o tradicional é incoerente no momento atual de difusão das

inovações. Ele acredita que, na realidade, este fenômeno caracteriza-se por

[...] formas diferentes de combinação entre um novo modelo de produção, distribuição e consumo, e a situação preexistente, e isso em função das condições históricas da introdução das modernizações. Em outros termos, trata-se de uma aceitação dos elementos de modernização em diferentes graus (SANTOS, 2004, p.55).

Ao invés da utilização dos termos moderno e tradicional, o autor adota

em sua análise outro aspecto, o qual, segundo ele, seria mais importante para

entender a relação entre atividades. Diante da nova organização socioespacial,

marcada pela seletividade das atividades modernas e pelo acirramento das

desigualdades sociais, conformam-se acessos diferenciados ao consumo de

bens e serviços, determinando a formação de dois circuitos econômicos, um

superior e outro inferior, cuja diferença fundamental está baseada nas

diferenças de tecnologia e organização das atividades que compõem cada um

deles (SANTOS, 1977, 2004).

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200

Segundo o autor, como resultado da seletividade espacial das

inovações tecnológicas haveria uma dependência do circuito inferior em

relação ao circuito superior. Para auxiliar na identificação de cada circuito,

Santos (2004) elaborou um quadro com as principais características de cada

um deles, com vistas a compreender a organização do espaço através da

teoria dos dois circuitos, como exposto.

Quadro 10: Características dos dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos

Circuito superior Circuito inferior

Tecnologia Capital intensivo Trabalho intensivo Organização Burocrática Primitiva Capitais Importantes Reduzidos Emprego Reduzido Volumoso Assalariado Dominante Não obrigatório

Estoques Grande quantidade Alta qualidade

Pequena quantidade Qualidade inferior

Preços Fixos (em geral) Submetidos à discussão entre comprador e vendedor (haggling)219

Crédito Bancário institucional Pessoal não institucional

Margem de lucro Reduzida por unidade, mas importante pelo volume de negócios (exceção produtos de luxo)

Elevada por unidade, mas pequena em relação ao volume de negócios

Relações com a clientela Impessoais e/ou com papéis Diretas, personalizadas

Custos fixos Importantes Desprezíveis Publicidade Necessária Nula Reutilização dos bens Nula Frequente

Overhead capital Indispensável Dispensável Ajuda governamental Importante Nula ou quase nula

Dependência direta do exterior

Grande, atividade voltada para o exterior Reduzida ou nula

Fonte: Santos (2004, p.44).

Embora apresentem características bem distintas, os dois circuitos não

se constituem de sistemas isolados e antagônicos, mas, pelo contrário, são

complementares e interagem permanentemente. Isso não exclui as relações de

concorrência entre os comércios dos dois circuitos, levando Santos (2004) a

indicar algumas variáveis determinantes para o aumento ou diminuição do

consumo num circuito ou noutro, estabelecendo relações de

complementaridade ou concorrência.

219 Pechinchar.

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Trata-se da distribuição da renda e das possibilidades de crédito, do grau de abertura da população aos consumos modernos, da importância do emprego governamental e das migrações regionais, do tipo e do ritmo das atividades da região, da organização dos transportes na cidade (SANTOS, 2004, p.263).

De acordo com Santos (2004, p.56) “os dois circuitos têm a mesma

origem, o mesmo conjunto de causas e são interligados”, consequência do

atual momento de modernização tecnológica. Conforme estudamos no primeiro

capítulo, a modernização tecnológica gerou profundas transformações

econômicas, políticas, culturais e espaciais, acelerando a urbanização e

expandindo as atividades terciárias. Do mesmo modo, possibilitou a integração

territorial e econômica do país, mediante intervenções do Estado, e agravou os

desníveis de renda e de acesso ao consumo da população, que levaram à

formação dos dois circuitos econômicos.

Do ponto de vista da modernização tecnológica, fica clara a relação

entre a organização espacial e a conformação dos dois circuitos, porquanto

esta teoria, consoante Santos (2004, p.38), “não é apenas útil para se

compreender o funcionamento da cidade [...], mas também para explicar, sob

uma nova luz, as relações externas da cidade, seja com sua região de

influência, seja com outras cidades”.

Assim, na nossa ótica, ela pode auxiliar na compreensão das

redefinições espaciais e do comércio mossoroense, conscientes de que esta é

uma análise que requer bastante cautela, pois a mera “aplicação” de uma

teoria a determinada realidade pode incorrer em graves erros teórico-

metodológicos.

Para o autor, distante de uma falsa perspectiva dualista, os dois

circuitos cultivam relações de interdependência, sustentando articulações

horizontais e verticais. As primeiras representam a coerência interna de cada

circuito, enquanto as segundas se realizam pela comunicação entre atividades

dos dois circuitos, por meio de relações de complementaridade e concorrência.

É assim que as atividades do circuito inferior se mantêm ativas e criam a “maior

parte das economias externas de que tem necessidade” (SANTOS, 2004,

p.262), adaptando-se às mudanças ocorridas nas atividades do circuito

superior e reinventando suas formas de negociação.

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202

Na tentativa de identificar a constituição de dois circuitos na economia

urbana de Mossoró, precisamos saber qual o conjunto de atividades que

compõe cada um deles. Para Santos (2004), o circuito superior seria

constituído pelos bancos, comércio e indústria de exportação, indústria urbana

moderna, comércio varejista moderno, serviços modernos, atacadistas e

transportadores. O circuito inferior seria composto “por formas de fabricação

não-‘capital intensivo’, pelos serviços não-modernos fornecidos ‘a varejo’ e pelo

comércio não-moderno e de pequena dimensão” (SANTOS, 2004, p.40). Como

afirma o autor,

O comportamento e a evolução de cada circuito estão ligados, de um lado, a variáveis que lhes são próprias e que modificam sua importância, como a chegada incessante de pobres na cidade, que incha o circuito inferior, ou a existência de infra-estruturas e de ajuda do Estado que atraem as atividades do circuito superior. De outro lado, outras variáveis comuns aos dois circuitos, como a estrutura da produção e do consumo (distribuição das rendas, papel do crédito, perfil do consumo) modificam as relações de força entre os dois circuitos, favorecendo um ou outro (SANTOS, 2004, p.262).

Uma das variáveis apresentadas por Santos (2004) para a

compreensão das relações entre os dois circuitos é a distribuição das rendas.

Neste sentido, passamos agora à análise espacial das atividades comerciais a

partir dos diferentes níveis de renda da população de Mossoró220, aspecto que

também indicará as diferenças quantitativas e qualitativas de acesso ao

consumo.

À primeira vista, como é possível verificar, a população com maiores

rendimentos mensais está concentrada no Bairro Nova Betânia, a noroeste, e

numa parte do Bairro Presidente Costa e Silva, a sudeste. Justamente nestes

setores da cidade (noroeste e sudeste) foram implantadas políticas públicas

habitacionais de interesse social nas décadas de 1970 e 1980, e

posteriormente, tornaram-se locais de investimentos do setor imobiliário.

Assim, a maioria dos equipamentos comerciais está situada em áreas

onde a renda da população é superior a três salários mínimos221. No caso dos

supermercados, hipermercados, atacadistas e do shopping center, instalados 220 O mapa 7 contém todos os equipamentos comerciais citados no decorrer do trabalho, exceto as lojas pertencentes a redes de filiais de venda de eletrodomésticos e lojas de departamentos, tendo em vista que sua maior concentração é no Centro e no MWS. 221 Em 2000, ano base das informações do IBGE para a elaboração deste mapa, o valor do salário mínimo era de R$151,00.

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na cidade na última década, a localização espacial privilegia um público com

renda entre cinco e doze salários mínimos. Isto revela que “as formas

comerciais são, antes de mais nada, formas sociais; são as relações sociais

que produzem as formas que, ao mesmo tempo, ensejam relações sociais [...]”

e, coletivamente, “as formas comerciais dão ensejo à análise das diferenças”

(PINTAUDI, 2002, p.145).

Estas diferenças são constatadas com a existência de equipamentos

comerciais modernos em áreas com rendas menores, como os supermercados

nos Bairros Belo Horizonte e Barrocas, e pequenos centros comerciais no

Bairro Alto da Conceição. Os equipamentos nestas áreas surgiram em outro

momento econômico da cidade, ainda na década de 1990, quando a presença

de formas comerciais modernas não era tão significativa em Mossoró. Para

Pintaudi (2002, p.147), os diferentes tipos de estabelecimentos comerciais “são

representativos das transformações que [...] ocorreram na produção dessa

sociedade e, particularmente, na produção de mercadorias”, repercutindo no

aparecimento de novas formas do comércio varejista.

De modo geral, segundo percebemos, os fixos e fluxos associados às

atividades comerciais modernas encontram-se predominantemente na

centralidade em formação na cidade e em suas adjacências, enquanto o

comércio mais tradicional ainda prevalece nas áreas centrais, beneficiando-se

da localização espacial que concentra os maiores fluxos urbanos e regionais.

Assim, como é possível observar,

As atividades comerciais estão constituindo novas centralidades em áreas profundamente marcadas por eixos viários de várias escalas, com duas características básicas: a localização nos eixos rodoviários e a localização nos eixos viários intra-urbanos, geralmente com conexão entre si. Isso denota algumas dinâmicas possíveis: uma cidade que organiza seu consumo em função dos deslocamentos das pessoas pelos automóveis, ao mesmo tempo em que os deslocamentos são possíveis e necessários tanto pelos eixos como pelas distinções no plano do território da cidade dos espaços distintos e diferenciados e diferentes e segmentados (WHITACKER, 2007, p.14-15).

Santos (2008b) ajuda a compreender os lugares a partir da relação

entre antigos e novos sistemas de objetos e de ações, utilizando o que ele

chama de eixo das sucessões e eixo das coexistências. Nesta abordagem, ele

consegue identificar “de um lado, uma assincronia na seqüência temporal dos

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diversos vetores e, de outro lado, a sincronia de sua existência comum, num

dado momento” (SANTOS, 2008b, p.159). Desta maneira, podemos perceber a

evolução do comércio do ponto de vista das funções e dos processos,

observando a permanência de determinadas relações sociais em meio à

modernização da atividade em Mossoró e das suas redefinições espaciais.

Conforme evidenciado, as atividades comerciais do circuito superior em

bairros de menor poder aquisitivo adotaram estratégias peculiares para

captação de clientes. Neste âmbito, adaptaram algumas características de

circuito superior à realidade local, principalmente no tocante às relações

interpessoais, no acesso ao crédito pessoal e no tipo de produto

comercializado, voltado para demandas específicas. Foi assim que estes

estabelecimentos se consolidaram em áreas de população menos abastarda,

substituindo, em muitos casos, pequenos comerciantes e mercados populares.

Por falar em mercados, destacamos também a localização espacial dos

mercados públicos, em especial o Mercado Central e o Mercado do Vuco-Vuco.

Instalados há mais de quatro décadas na área central, juntamente com a

grande quantidade de ambulantes espalhados por toda a cidade, estes dois

mercados denotam a presença de um circuito inferior em Mossoró. Na visão de

Santos (2004, p.360), pelo alcance local do circuito inferior, este estaria “em

estado de interação simétrica com as atividades tradicionais da zona de

influência urbana”.

A localização destas atividades nas áreas centrais da cidade explica-se

pelo fato do Centro ser “o terminal de carga dos transportes e o lugar em que

as diferentes camadas sociais se encontram” (SANTOS, 2004, p.350). Tais

características sustentam as atividades do circuito inferior, que assumem

formas complexas e reforçam sua dependência em relação ao circuito superior.

O efeito-demonstração tem papel determinante neste processo, pois ele acaba

deformando a demanda de consumo das populações mais pobres, que buscam

atender suas novas “necessidades” no circuito inferior, aquecendo-o.

Neste universo, uma variável com expressivo peso são as migrações.

Para Santos (2004, p.302), elas são “uma expressão espacial dos mecanismos

de modernização”, e estão vinculadas diretamente à organização econômica e

espacial. No caso de Mossoró, a maioria dos migrantes é oriunda de

localidades menores próximas ao município, e são atraídas pelo desempenho

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econômico atual. Contudo, grande parte dessas pessoas não possui

qualificação suficiente para desempenharem atividades modernas e acabam

encontrando no circuito inferior sua fonte de renda e o suprimento das suas

necessidades básicas, sobretudo na alimentação. Não obstante, esses

migrantes tendem a residir em áreas mais distantes do Centro, de menor valor

fundiário, configurando “um arco de pobreza e precariedade habitacional na

faixa de transição urbano-rural inserida no perímetro urbano” (ELIAS;

PEQUENO, 2010, p.237).

Diante do exposto, a nosso ver, em Mossoró existem dois circuitos

econômicos, particularmente no comércio contemporâneo. Santos (2004,

p.363) defende que “a difusão das atividades ou dos bens modernos, e a

permanência das atividades não-modernas, está estreitamente ligada à

organização do espaço pelos transportes e à distribuição geográfica das

rendas”.

Assim, os dois circuitos mantêm uma dialética que atua na dinâmica

espacial das atividades comerciais, que tendem a se localizar em pontos

privilegiados do espaço, com vistas a manterem as melhores condições de

rentabilidade e, até mesmo, de sobrevivência.

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Mapa 8: Mossoró. Localização dos estabelecimentos comerciais de acordo com perfil socioeconômico da população

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CONCLUSÃO

A princípio, o que parecia apenas um estudo econômico do comércio

de Mossoró se revelou para nós um campo de investigação desafiador e com

diversas possibilidades de análise. Um setor associado por séculos somente à

polarização exercida pela cidade sobre sua região de influência em apenas três

décadas passou por profundas redefinições e adquiriu novos contornos,

assumidos com a incorporação de inovações tecnológicas associadas à

difusão da informação e das novas formas de consumo.

Estes aspectos foram conferidos à economia mossoroense em virtude

da nova divisão internacional e interregional do trabalho, atendendo à demanda

capitalista de expansão da capacidade produtiva e de renovação das

condições de acumulação. Deste modo, a penetração do capital em novas

esferas de atividade, a criação de novos desejos e novas necessidades, a

facilitação e o estímulo para o crescimento populacional, e a expansão

geográfica para novas regiões desencadearam um processo de reestruturação

em nível global (HARVEY, 2007).

Estes quatro fatores abalizaram nossa pesquisa e nos ajudaram a

compreender a reorganização das atividades comerciais sob diferentes pontos

de vista. Enquanto a penetração do capital em novas esferas de atividade

estimulou a modernização tecnológica e a integração setorial, a criação de

novos desejos e novas necessidades teve relação estreita com a ampliação do

consumo e as mudanças nos hábitos dos consumidores. Já a facilitação e o

estímulo para o crescimento populacional incitaram ao processo de

urbanização. E, por fim, a expansão geográfica para novas regiões agregou

cada vez mais lugares à divisão internacional do trabalho, como, por exemplo,

Mossoró.

No decorrer das suas diversas especializações econômicas,

apresentadas no primeiro capítulo, vimos que a cidade sempre esteve

intrinsecamente relacionada ao comércio e à prestação de serviços, porquanto

estas atividades pressupõem condições de concentração, centralidade e

acessibilidade. Assim como inúmeras cidades brasileiras e nordestinas,

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Mossoró teve nas atividades terciárias suporte e condição para seu

desenvolvimento urbano e regional.

De empório comercial no século XIX, a cidade se consolidou como

importante centro regional no Nordeste brasileiro, com articulações que

ultrapassam os limites territoriais político-administrativos. Esta característica

não somente afetou a constituição das atividades econômicas como também

provocou intensas reestruturações espaciais.

Ao longo de todo o trabalho, ficou clara a relação entre o comércio e o

espaço urbano e regional, cuja reestruturação espacial é determinada pela

dinâmica econômica estabelecida pelo capital que intensifica os fluxos, pelas

relações entre as escalas geográficas, pela redefinição das centralidades e

pelas estratégias locacionais de novos fixos. Estas são questões relevantes

não somente no estudo das atividades comerciais, mas no terciário como um

todo, porque este setor tem em sua essência o caráter urbano.

O espaço, “um verdadeiro campo de forças cuja aceleração é desigual”

(SANTOS, 2002, p.153), tornou-se também mercadoria e como tal vem sendo

apropriado pelo capital imobiliário, o qual assinala as áreas de valorização na

cidade e com isso promove um grande abismo social no espaço urbano

mossoroense. Neste contexto, o comércio tem peso decisivo, mormente a partir

das alterações em suas formas e conteúdos, em virtude da modernização

tecnológica e das novas formas de consumo.

As atividades comerciais adotaram novas estratégias organizacionais,

tecnológicas e territoriais que dependem de uma economia de escala e da

ampliação dos seus mercados (SPOSITO, 2001b). Assim, grandes

equipamentos de consumo moderno deixam de se instalar em áreas centrais,

densamente ocupadas, e passam a migrar para áreas periféricas, mais fáceis

de absorverem as modernizações, criando assim novos fluxos. Contudo,

continuam demandando condições espaciais favoráveis como acessibilidade e

proximidade com mercado consumidor, preferencialmente o de maior poder

aquisitivo.

À medida que houve a desconcentração comercial, as atividades

preexistentes no setor resistiram e adaptaram-se a este novo quadro

econômico mundial. Apesar de se realizarem com certa fragilidade, o comércio

popular tradicional ainda é bastante presente nas áreas centrais da cidade, por

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ser este um local de concentração das principais atividades econômicas e dos

fluxos urbanos e regionais, pelo significado histórico-cultural que possui e,

principalmente, pela manutenção de fortes relações de confiança, sociabilidade

e solidariedade, inerentes às atividades comerciais tradicionais (ORTIGOZA,

2008).

Destarte, ocorreram alterações no tocante às organizações

hierárquicas entre centro e periferia, entre o moderno e o tradicional: um novo

modelo, muito mais complexo, se arranja na cidade, “composto de

complementaridades e concorrências entre diferentes tipos de centros,

formatos de estabelecimentos e formas de comércio” (ORTIGOZA, 2008, p.7).

Neste sentido, é inequívoca a coexistência de atividades modernas e

tradicionais que reorganizam o espaço urbano mossoroense. O exemplo de

cidade cuja área central polarizava todo o município e região vem cedendo

lugar a uma nova centralidade, localizada no Bairro Nova Betânia, zona oeste

da cidade, cuja apreensão se dá pela relação entre a localização das

atividades comerciais e de serviços e os fluxos gerados por ela e que a

sustentam.

A configuração desta nova centralidade impactou não apenas na

reorganização espacial ou econômica, mas, sobretudo, socialmente, pois

engendrou forças de concentração e dispersão que implicaram a seletividade

espacial dos progressos tecnológicos. Estes, por sua vez, promoveram

desigualdades quantitativas e qualitativas no consumo e desencadearam a

constituição de dois circuitos econômicos, um superior e outro inferior

(SANTOS, 1977, 2003, 2004).

Mediante a localização dos estabelecimentos comerciais segundo o

perfil socioeconômico da população, percebemos relações inerentes a ambos

os circuitos, espacialmente disseminados na cidade e nas atividades

comerciais, os quais nos possibilitaram identificar uma dialética entre eles, a

partir da dependência do circuito inferior em relação ao circuito superior.

O Mercado Comercial do Vuco-Vuco é um excelente exemplo disto.

Predominantemente, o mercado possui características relacionadas ao circuito

inferior como trabalho intensivo, pequenas quantidades de estoque e de

mercadorias, negociação de preços dos produtos, a manutenção da atividade

depende mais da demanda que do capital intensivo, articulação na cidade e

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região etc. Entretanto, o comércio no local vem se tornando cada vez mais

dependente da comercialização de produtos vinculados ao circuito superior,

como artigos de informática, telefonia celular e bens de consumo duráveis.

Em contrapartida, a seletividade das modernizações no espaço é

impelida pela própria ação do Estado, que investe em infraestruturas urbanas e

aparece “[...] como uma condição fundamental da criação e do fortalecimento

das atividades modernas e das formas monopolísticas de atividade” (SANTOS,

2004, p.280).

A instalação de equipamentos comerciais modernos em Mossoró está

fortemente ligada a intervenções estatais. Um exemplo é o Mossoró West

Shopping, construído em um terreno doado pela prefeitura municipal e

inaugurado em 2007, no Bairro Nova Betânia. Com a implantação do

empreendimento, a prefeitura iniciou obras de pavimentação, iluminação e

embelezamento da principal avenida de acesso ao shopping center, além de

realizar obras de saneamento nas adjacências. Estes investimentos foram

determinantes para a instalação e a concentração de outros equipamentos

modernos na área, como um hipermercado no segmento atacadista, uma

universidade particular, condomínios residenciais verticais e horizontais, entre

outros.

A atração de atividades comerciais associadas ao circuito superior está

relacionada, entre outros fatores, ao crescimento da classe média na cidade,

que tende a adotar determinados hábitos de consumo das classes com maior

poder aquisitivo. Porém, em virtude das diferentes demandas de consumo e

das facilidades de crédito institucional ou pessoal, a classe média utiliza tanto o

circuito superior quanto o inferior, sendo público comum aos dois circuitos.

Assim, outras atividades modernas, como os bancos e as redes de

franquias, chegam à cidade e estabelecem novas dinâmicas socioespaciais,

beneficiados pela financeirização da economia e das relações sociais (ELIAS;

PEQUENO, 2010), pela espetacularização das festas populares (BEZERRA,

2007) e, principalmente, pela reestruturação econômica, urbana e regional,

pela qual Mossoró vem passando nas últimas décadas, refletindo diretamente

no comércio.

Tais fatos evidenciam que a evolução deste setor, sobretudo após os

anos 1980, compõe o quadro da nova divisão internacional e interregional do

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trabalho, atendendo às novas formas de realização do consumo e do

capitalismo mercantil, agora associado ao capital imobiliário. Evidentemente,

neste processo o Estado teve papel fundamental, ao implantar infraestruturas

urbanas e contribuir para a adaptação da cidade aos moldes exigidos pelas

grandes empresas do setor comercial, baseados na concentração financeira e

espacial.

Em suas contribuições à ciência geográfica, Santos (2008b, p.63)

definiu o espaço como sendo um “conjunto indissociável, solidário e também

contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados

isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá”. A interação

entre os sistemas é responsável pela dinâmica e transformação espacial, à

medida que ações e objetos dotados de intencionalidade são incorporados ao

espaço através do meio técnico-científico-informacional.

Assim, em resposta às novas exigências do processo produtivo e do

avanço tecnológico, ocorreu uma redefinição da economia de Mossoró, não

apenas nas atividades comerciais. Consoante notamos, os serviços também

estão em plena expansão na cidade, e não são apenas os serviços privados de

assistência pessoal ou empresarial: devemos destacar o crescimento dos

serviços públicos como educação e saúde, que atendem toda a região sob

influência da cidade, e, até mesmo, de outros Estados do Nordeste.

Como pesquisadores, ressaltamos que o estudo da atividade comercial

contemporânea não pode se restringir somente aos dados sobre a evolução da

População Economicamente Ativa ou à quantidade de estabelecimentos no

setor. Quanto a isto, Santos (1979) já afirmara que a utilização correta das

estatísticas só seria possível mediante uma reflexão teórica pautada na

realidade, opinião da qual somos partidários.

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