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10 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA CAROLINA MARIA SANTANA COSTA RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA CATÓLICA E O ESTADO DURANTE O SEGUNDO REINADO (1848-1873) São Luís 2007

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA

CAROLINA MARIA SANTANA COSTA

RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA CATÓLICA E O ESTADO DURANTE O SEGUNDO REINADO (1848-1873)

São Luís 2007

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CAROLINA MARIA SANTANA COSTA

RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA CATÓLICA E O ESTADO DURANTE O SEGUNDO REINADO (1848-1873)

Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão para obtenção do grau de Licenciatura Plena em História. Orientadora: Prof.ª Ms. Maria de Lourdes Lauande Lacroix.

São Luís 2007

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Costa, Carolina Maria Santana Relações desarmônicas entre a Igreja Católica e o Estado durante o Segundo Reinado (1848-1873) / Carolina Maria Santana Costa. - São Luís, 2007. 70 f. Orientador: Prof. Msc. Maria de Lourdes Lauande Lacroix. Monografia (Graduação em História) – Curso de História, Universidade Estadual do Maranhão, 2007. 1. Igreja Católica 2. Estado 3. Conservadorismo 4. Liberalismo I.Título CDU: 94(81).053:282

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CAROLINA MARIA SANTANA COSTA

RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA CATÓLICA E O ESTADO DURANTE O SEGUNDO REINADO (1848-1873)

Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão para obtenção do grau de Licenciatura em História.

Aprovada em: ___/____/_____

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________ Profª. Maria de Lourdes Lauande Lacroix

Mestre pela Fundação Getúlio Vargas Orientadora

_______________________________________________ Prof. José Henrique de Paula Boralho

Doutor pela Universidade Federal Fluminense

__________________________________________________ Prof. Yuri Michel Pereira Costa

Mestre pela Universidade Federal do Maranhão

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A Jesus Cristo

A toda minha família

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AGRADECIMENTOS

À Deus por ter me iluminado na elaboração desta monografia e me dado força

para não desistir nos momentos difíceis.

À minha mãe Maria da Graça e a minha tia Francisca Tinoco por terem me

educado e serem um exemplo de vida para mim, minha irmã Camila, minha avó Esmeralda e

Vanessa Souza, por me incentivarem e acreditarem em meu potencial.

Ao meu namorado André Cantanhede, grande amigo e companheiro, sempre ao

meu lado, grande exemplo de força e determinação, obrigada por tudo, inclusive pelo apoio

técnico.

À minha querida professora e orientadora, Prof.ª Maria de Lourdes Lauande

Lacroix, por sua paciência, não medindo esforços para realizar de forma criteriosa todo

processo de orientação científica, sempre enfatizando a importância dos estudos na construção

de uma vida com sucesso e dignidade.

À bibliotecária Giselle Frazão, pela colaboração na normalização desta

monografia.

Aos meus grandes amigos uemianos Cleidmar Avelar e Thiago Pereira.

A todo corpo docente do Curso de História da Universidade Estadual do

Maranhão.

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“Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Mc12: 17

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RESUMO

No século XIX, instaurou-se uma nova conjuntura sócio-econômica na Europa, na qual a

Igreja Católica não conseguiria acompanhar já que seu ascetismo não correspondia às

necessidades econômicas do capitalismo. Com o processo de laicização do Estado, com a

separação dos dois âmbitos: civil e religioso, o Estado reclamará para si, funções antes que

eram reservadas a Igreja, surgindo conflito entre essas duas esferas que no Brasil terá seu

ápice na Questão Religiosa. Seu poderio esta abalado com a presença de inimigos que se

constituíram em uma extensão do liberalismo: a maçonaria e o protestantismo. O ascetismo

deste último, consoante Max Weber, teve pressupostos relevantes que contribuíram

sobremaneira no desenvolvimento do sistema capitalista. Os periódicos religiosos A Fé e O

Ecclesiastico irão retratar a imagem da Igreja Maranhense que assim como a brasileira

encontrava-se em declínio, qualificando-se perseguida por todos os lados por seus inimigos.

Palavras-chave: Igreja Católica. Estado.Conservadorismo. Liberalismo.

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RÉSUMÉ

Au XIXème siècle, une nouvelle conjecture socio-économique s’établit en Europe, que

l’Eglise catholique n’a pas réussi à accompagner vu que son ascétisme ne cor-respondait pas

aux nécessités économiques du capitalisme. Um processus de laicization de l’Etat s’établit

avec séparation des deux sphères: civile et religieuse. L’Etat s’est approprié des fonctions

antérieurement réservées à l’Eglise, faisant surgir um conflit entre ces deux sphères qui aura

comme sommet, au Brésil, la question religieuse. Sa puissance est ébranlée par la présence

d’ennemis qui surgiront lors de l’expansion du libéralisme: la maconnerie et le

protestantisme. L’ascétisme de ce dernier, selon Max Weber, a eu des présupposés puissants

qui ont contribué de façon importante au développement du système capitaliste. Les

périodiques religieux A Fé et O Ecclesiastico donneront un portrait de l’Eglise du Maranhão

qui, comme l’Eglise brésilienne, était en déclin se disant persécutée de tous côtés par ses

ennemis.

Parocles clés: Eglise catholique. Etat. Esprit Conservateur. Liberalizem.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................... 10

2 UMA NOVA ORDEM UMA NOVA RELIGIÃO............................. 15

3 RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA

BRASILEIRA E O ESTADO...............................................................

24

4 O DECLÍNIO DE UMA INSTITUIÇÃO RELIGIOSA EM SÃO

LUÍS: daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus...............

46

4.1 A ameaça de uma nova religião........................................................... 52

4.2 Como se encontrava o episcopado maranhense em meados do

século XIX..............................................................................................

60

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................... 66

REFERÊNCIAS...................................................................................... 68

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1 INTRODUÇÃO

Em fins do século XV, a posição da Igreja Católica já estava profundamente

dominada pelo Estado Português. Com o intuito de legitimar a propriedade portuguesa das

terras brasileiras, os juristas ibéricos, em especial os espanhóis, elaboraram o regalismo e

recorreram a antigos simbolismos feudais (HOORNAERT, 1991, p.67). Durante o período

colonial, a Coroa portuguesa e a Igreja Católica estabeleceram relações entre si um tanto

quanto amigáveis, sendo que esta última mostrou-se indispensável como elemento ideológico

na efetivação do processo colonizador (HOORNAERT, 1991, p.69).

Conforme nos mostra Hoornaert (1991, p.69), os bispos foram um dos grandes

privilegiados economicamente durante o processo colonizador:

O bispo ganhava sete vezes mais que o deão da Sé, doze vezes mais que um cônego, trinta vezes mais que um vigário e cento e dezesseis vezes mais que um simples coadjutor. Além do mais, a ‘folha eclesiástica’ gastava vinte e seis vezes mais com a Sé, cabido de cônegos e ‘relação’ do que com as missões entre os índios no sertão [...].

O catolicismo patriarcal constitui-se na sacralização da sociedade implantada no

Brasil pelos portugueses com o objetivo de impedir o nascimento de uma consciência de

comunidade. Seria um sincretismo do catolicismo patriarcal com a religião católica ibérica e o

ambiente escravocrata que existia no Brasil naquele momento. Este catolicismo patriarcal

inseriu-se no modelo de religião do Estado, com o intuito de sacralizar e perpetuar seu poder,

já que o regalismo baseava-se na religião (HOORNAERT, 1991, p.75).

O padroado tem como base a imagem portuguesa do césaro-papismo. Este

organizou as primeiras missões no Brasil confiando-as aos franciscanos e posteriormente aos

jesuítas, que foram os responsáveis pelo estabelecimento da hierarquia no país, a fundação de

freguesias, prelazias, bispados, impedindo assim, a intervenção de Roma em assuntos

eclesiásticos relativos ao Brasil. O patriarca local aplicou concretamente o padroado ao

pequeno mundo do engenho, o sacerdote lhe era obediente assim como as autoridades

coloniais obedeciam ao rei. Um clero livre e independente só ocorreu com a Companhia de

Jesus, entre aqueles que se interessaram no trabalho dos aldeamentos (HOORNAERT, 1991,

p.77). Nem o bispo, nem Roma interferiam na religião doméstica colonial. A influência

romana no catolicismo irá se manifestar tardiamente, somente a partir da Questão Religiosa e

do início da primeira república. A clericalização da Igreja Católica, que após o Concílio de

Trento constituiu-se em um fator máximo do catolicismo, veio a influenciar o Brasil

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recentemente. Antes da Questão Religiosa não existiu no Brasil o clericalismo propriamente

dito (HOONAERT, 1991, p.78). Anteriormente a religião era vivida em localidades restritas,

distanciadas uma das outras, onde não era percebida a influência do bispo, nem tão pouco da

Sé Romana. A grande extensão territorial fazia das visitas pastorais algo difícil de ser

realizado (HOONAERT, 1991, p.78). Os únicos religiosos que não se submeteram ao sistema

patriarcal foram os jesuítas. Podemos destacar como fato de relevância histórica da Igreja

Católica brasileira nos dois primeiros séculos, o embate travado entre o patriarca e o jesuíta

pelo controle do catolicismo. Sendo assim, no momento em que é expulso, o clero secular não

possuía força suficiente, passando a se mostrar mais dócil, renovando sua hierarquia por

impulso direto da coroa, podendo ser moldado segundo os interesses desta (HOONAERT,

1991, p.78).

O catolicismo colonial brasileiro possuía uma estrutura hierárquica frágil: “Entre

1551 e 1676, o Brasil contava com um bispado só, nos 213 anos subseqüentes (1676-1889)

com um só arcebispado, seis bispados e duas prelazias” (HOORNAERT, 1991, p.75). O

senhor local era quem realmente mostrava-se interessado na religião oficial modelando a

religiosidade dos escravos segundo seus próprios interesses, estabelecendo alianças com o

padre local, utilizando a religião como elemento escravizador retirando deste, seu caráter

transformador, fazendo com que a religião católica deixasse de desempenhar seu papel de

força conscientizadora no âmbito social (HOORNAERT, 1991, p.75).

O catolicismo patriarcal seria um sincretismo entre a religião católica ibérica e o

ambiente escravocrata no Brasil, sendo menos cristão do que nos parece ser à primeira vista,

já que não liberta o rico de seu paternalismo nem o pobre de seu conformismo. Caracterizou-

se também pela presença de desobrigações religiosas, ou seja, os ritos do catolicismo eram

realizados apenas por obrigação, a liturgia não trazia nenhuma mensagem nova para o povo,

sendo que o sagrado era algo incompreendido por ele. Por ter perdido o seu significado

cristão, a desobrigação passou a significar: privilégio social, vaidade e posição de destaque na

sociedade. Como exemplo temos os sacramentos ministrados em domicílios, nos quais

somente as famílias mais abastadas possuíam tal privilégio (HOONAERT, 1991, p.80).

A escolha da temática desta pesquisa relaciona-se ao fato de considerarmos o

catolicismo como um elemento unificador presente na formação da nossa nacionalidade,

tendo considerável participação na modelação de elementos presentes na cultura brasileira,

bem como na utilização de modelos doutrinários que justificam as relações de explícita

dominação que perpassam até nossos dias, a semelhança de autores como Hoonaert e

Holanda, porém não deixando de existir pontos de divergência, que depois de passarem por

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uma aparente dormência, revelaram de forma clara as relações desarmônicas entre Igreja

Católica e Estado Português no segundo reinado, isto é, seu lado contraditório. A hierarquia

católica, o clero secular, as ordens religiosas e as corporações leigas foram responsáveis pela

educação, cultura, catequese e assistência social. Estas corporações religiosas enquadraram os

leigos na Igreja não somente através da devoção, mas também da ação social, chegando a

apresentar um caráter corporativista, constituindo-se até mesmo em uma expressão classista

ou social. As irmandades de pretos e mulatos, em especial as primeiras, que desfrutaram de

grandes regalias, tiveram papel relevante na fixação dos negros nos quadros da Igreja, devido

ao respeito que obtiveram em relação às suas peculiaridades religiosas e culturais.

Indiretamente, através dos mais variados serviços sociais prestados pelas irmandades

religiosas, o Estado irá tomar as suas primeiras medidas neste setor. No setor de assistência

hospitalar, as Irmandades de Misericórdia, possuíam uma série de regalias e isenções, tendo

importância no setor de assistência hospitalar e assistência aos presos, atendimentos os quais

foram de grande relevância no ambiente social daquela época (HOONAERT, 1991, p.75).

Porém nem tudo pareceu ser tão cômodo para a Igreja Católica. É bem verdade

que esta instituição religiosa foi uma grande aliada do Estado português no processo

colonizador, mas o que nos remete a atual pesquisa são os motivos que levaram essa relação

um tanto quanto harmônica entre Igreja Católica e Estado Português a tornar-se desarmônica.

Afinal, porque este último passou a considerar a ingerência da Igreja em certos setores da

sociedade como prejudiciais? Quais conjunturas sócio-econômicas foram decisivas na

constituição de uma nova relação entre os âmbitos civil e religioso?

Não foi um clero estrangeiro que moldou a mentalidade católica, porém uma

classe de proprietários locais. Sendo assim, o catolicismo brasileiro foi de caráter autônomo.

O padre correspondeu nada mais do que um desdobramento do proprietário local, sendo que

aquele possuía a função religiosa e educativa. A persistência de elementos do catolicismo

patriarcal deve-se à sua funcionalidade e aliança que estabeleceu com a religiosidade popular.

Tanto o negro como o índio podiam expressar livremente suas tradições religiosas sem a

interferência de uma legislação clerical que os coibissem. O catolicismo patriarcal também

relacionou-se com o sistema econômico da procriação, a medida que transformou o

catolicismo europeu puritano e celibatário em um catolicismo sensual que possuía

libertinagens como a poligamia e namoros arranjados nos largos das igrejas, o que

demonstrava a sua adequação naquele momento à realidade da cultura patriarcal e

escravocrata. Porém, com o fim do Império, esse catolicismo patriarcalista entrou em crise, já

que não correspondia às necessidades do novo momento econômico e social que se instaurava

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na sociedade. No campo da moral, o catolicismo patriarcal possuía uma dupla moral, uma

para os proprietários, e outra utilizada pelos escravos. Para os senhores, seria a sacralização

do assistencialismo e para os pobres, o conformismo. A crítica a esmola elaborada pelo

calvinismo não obteve repercussão no patriarcalismo brasileiro. Através da proibição da

mendicância e da ociosidade, além do estímulo a autodisciplina, o calvinismo trará novos

elementos para a elaboração de uma nova moral cristã no ocidente, mostrando a eficácia no

dinamismo do progresso da sociedade. Porém essa reforma moral não teve alcance na

civilização portuguesa, que não pensou a sua colonização em termos comerciais e burgueses,

mas utilizou-se de pressupostos feudais (HOONAERT, 1991, p.84).

Portugal foi um dos raros países a aceitar as decisões do Concílio de Trento, a

formação de seu Estado unificado e centralizado levou o monarca a adentrar em muitos

pontos do setor eclesiástico. No reinado de D. Manoel, a monarquia portuguesa conseguiu

obter de Roma o direito de escolha dos novos bispados do padroado real, como também dos

religiosos dos antigos bispados. A ação dos bispos no Brasil encontrou três tipos de

obstáculos. O primeiro deles foi o do poder civil, que através de sua legislação contraditória,

impunha entraves a ação fiscalizadora e disciplinar dos ordinários, retirando da Igreja toda

direção de sua disciplina. Este conflito irá assumir um dos seus grandes expoentes no século

XVIII, no embate entre Pombal e jesuítas. A liberdade de gerenciamento interno da Igreja foi

conseguida de forma contraditória em regimes que não se proclamavam fiéis à Igreja

Católica, confirmando o papel do âmbito secular que mais atrapalhou o cumprimento de sua

missão, sendo em raros momentos, um mero ponto de apoio. A segunda foi o conflito com os

regulares, agravado pelo espírito regalista que os poderes do Estado estimulavam. O terceiro

seria a presença de instituições obsoletas como o cabido, além do esfriamento do espírito

religioso do povo e a dificuldade na realização das atividades missionárias da Igreja. No final

do período colonial, o estado das ordens religiosas será preocupante. O Estado Português

utilizando-se do pretexto de reformar as ordens religiosas acabará intervindo de forma

negativa com a suspensão no recebimento de noviços. Acentuando ainda mais a situação de

crise, durante o regime pombalino houve uma medida de ordem geral em 1763, a qual foi

repetida em 1789, sendo a opção na disciplina interna das ordens terem ficado

comprometidas. Será criada a Junta de Melhoramentos das Ordens Regulares no reinado de D.

Maria I, porém esta teve pouco efeito. Somente no século XX, quando será instaurado um

regime de liberdade, haverá condições dessas ordens reerguerem-se (HOONAERT, 1991,

p.75).

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No primeiro capítulo do nosso trabalho trataremos da nova conjuntura européia,

atrelada as novas exigências do capitalismo, as quais contribuíram para o desenvolvimento do

protestantismo, cujos preceitos religiosos estavam de acordo com este novo momento sócio-

econômico. Faremos a exposição da linha teórica weberiana utilizada nesta pesquisa, na qual

o autor Max Weber relaciona em sua célebre obra A ética protestante e o espírito do

capitalismo o ascetismo protestante às novas exigências do capitalismo. No segundo capítulo,

abordaremos as contradições presentes na Constituição de 1824, que se manifestaram de

forma latente na Questão Religiosa, bem como a ameaça dos inimigos do catolicismo: o

liberalismo, a maçonaria e o protestantismo. No terceiro capítulo, enfocaremos a reação da

Igreja Maranhense diante de seus inimigos que constituíam uma ameaça à sua soberania

religiosa. Com o intuito de elaborar uma visão sobre a problemática religiosa aqui no

Maranhão, utilizar-se-á como base a visão religiosa presente em dois periódicos religiosos do

século XIX: A FÉ e O ECCLESIASTICO, nos quais atentar-se-á para os argumentos

contraditórios presente no discurso católico, bem como para o significado do discurso de

combate aos seus inimigos naquele momento. Estes questionamentos guiou-nos na busca de

indícios que elucidem o porquê de naquele momento a Igreja Maranhense qualificar-se tão

perseguida pelos seus inimigos. Ressalta-se ainda, que trataremos do fato religioso enquanto

fenômeno social à semelhança do objeto de estudo presente em Rémond (1974, p.164), e não

a consciência religiosa pessoal em si mesma.

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2 UMA NOVA ORDEM UMA NOVA RELIGIÃO

A Igreja Católica, considerada a maior organização religiosa do Cristianismo,

durante o medievo utilizou da sua hierofonia para estender os seus tentáculos a todas as

esferas da sociedade, como a política e a economia. O ascetismo católico baseava-se na

meditação, oração e mortificação. Havia uma preocupação excessiva com o pós-morte e a

posição social do cristão estava relacionada “a sua admissão à comunhão”, sendo que a

disciplina da Igreja e a pregação exerciam uma forte influência na vida social das pessoas.

Naquele momento a formação do caráter nacional foi influenciada pelas “forças religiosas que

se expressavam por esses canais” (WEBER, 2006, p.117).

A instituição católica atravessou momentos decisivos nos quais seus dogmas

passaram a ser questionados pelo cientificismo, que tomara o lugar da filosofia Escolástica,

fazendo com que esta instituição secular perdesse o posto de “Mestra da Verdade”. Este

processo no entanto, não aconteceu de maneira harmônica, havendo tensões e conflitos entre a

Igreja Católica, que não queria perder seus privilégios, e o Estado Moderno, que não queria

mais a intervenção católica nos diferentes assuntos da sociedade. A crença religiosa irá

influenciar de forma espontânea o comportamento dos indivíduos em sociedade, modificando

suas atitudes políticas e sociais. Habitualmente, o fato religioso é vivido numa comunidade,

possuindo portanto, uma dimensão social. O termo cristão era sinônimo de “camponês” ou

simplesmente “homem”. Esse duplo papel de cidadão e fiel, posteriormente resultará no

conflito entre Igreja e Estado. Antes de estarem inseridos no micro (Igreja), os fiéis estão

inseridos dentro do macro (Estado). Dessa forma, inevitavelmente é de se pressupor a

existência de relações de dicotomia contraditórias entre essas duas esferas (HOBSBAWN,

1979, p.239).

No Antigo Regime europeu, as relações entre Igreja e Estado estiveram

imbricadas de tal forma que refletia em todas as esferas sociais. Porém essa relação amigável

não durou por muito tempo. Cinco grandes fatos históricos desencadearam o processo de

desarticulação entre o Estado e a Igreja, que se sucederam desde o século XVI e romperam

com a maneira de pensar e com a organização social da Idade Média: a Reforma, o

movimento das idéias nos séculos XVII e XVIII e a Revolução Francesa (RÉMOND, 1974,

p.165).

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Com o movimento das idéias, tem-se a tolerância religiosa, resultante da

instauração da liberdade de crença e da igualdade de todos os cultos diante da lei,

ocasionando um afrouxamento dos laços tradicionais entre o Estado e a Igreja Católica.

Apesar das conseqüências do movimento da Reforma e das idéias surgidas nos séculos XVII e

XVIII terem sido compatíveis com a religião reformada, elas trazem em si um gérmem mental

diferente. A Reforma teve como motivação a volta ao revigoramento religioso, enquanto que

o movimento das idéias teve como base, a utilização da razão para regulamentar toda a

existência do homem. Sendo assim, esse movimento filosófico entrou em conflito com a

Igreja Católica, contestando a autoridade religiosa que queria controlar, tanto o domínio do

conhecimento como o da política. Essa oposição não significa tratar-se de um movimento

anti-religioso ou anticristão, porém mostra-se contrário à tutela da Igreja sobre assuntos da

sociedade civil, dando início ao processo de laicização do Estado com a separação das duas

ordens: civil e a religiosa (RÉMOND, 1974, p.168).

Com a Revolução Francesa, o movimento filosófico passou a ter um caráter

prático. Instituições que antes estavam sob a tutela da Igreja passam a pertencer à esfera

pública, como foi o caso da assistência social e dos registros civis, dentre outras atribuições

do âmbito, agora das municipalidades. É concedida a igualdade dos direitos civis e políticos

às minorias religiosas, protestantes e judias. Por outro lado, as assembléias revolucionárias

não vão assimilar com êxito a questão da laicidade, já que viam como inviável uma nação sem

uma religião comum. Porém, a partir de 1790, o catolicismo passou a ser rejeitado pelos

revolucionários (RÉMOND, 1974, p.169).

Na França, a separação entre Igreja e Estado não ocorreu de forma gradual, e sim,

em meio a um clima de guerra religiosa, revestindo-se de um caráter ideológico. Já em países

que não foram influenciados pelos ânimos revolucionários, como foi o caso dos Estados

Unidos, a separação entre Igreja e Estado não ocorreu de forma violenta. As questões

religiosas em países dominados pela Reforma tiveram caráter diferente do que ocorreu nos

países católicos. Princípios como o da liberdade de consciência foram relativamente aceitos

pela Reforma. No século XIX, nas Igrejas protestantes vão prevalecer as tendências liberais,

enquanto que no catolicismo ocorre o contrário (RÉMOND, 1974, p.169-170).

Devido ao avanço do perigo revolucionário, as tendências autoritárias acirraram-

se, o que levou ao progresso do ultramontanismo, da centralização romana e da soberania

absoluta do Papa, o que irá provocar atritos entre as novas formas de pensar da sociedade e da

fé tradicional. Diante dessa conjuntura tensa, as tentativas de aproximação entre a Igreja e a

sociedade burguesa mostraram-se inviáveis, devido a intransigência dos dois lados. A Igreja

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passa a condenar todo tipo de “erro” da nova sociedade e das chamadas “novidades” que se

realizavam em todos os domínios públicos. Conforme Rémond (1974, p. 170), ela se mostra

severamente contra os “sistemas filosóficos, teorias científicas, regimes políticos, forças

sociais, instituições de toda espécie”. A ruptura definitiva entre Igreja Católica e Estado

Moderno vai ocorrer de forma definitiva na segunda metade do século XIX. Eram duas

mentalidades distintas, a vitória do Estado burguês será a derrota do conservadorismo e o

triunfo da liberdade, do progresso.

A Descristianização foi outro fator que restringiu a influência do religioso e da

Igreja, não devendo, contudo, ser confundida com a laicização do Estado, que pretendia

apenas quebrar os laços que uniam o poder público à Igreja, não tomando partido em relação

às crenças individuais. Trata-se de um processo no qual a sociedade moderna irá se

desinteressar por qualquer tipo de crença religiosa, isto é, exprime desinteresse e indiferença

em relação aos assuntos religiosos. Medidas de laicização do Estado contribuíram para afastar

certo segmentos da sociedade de seus hábitos religiosos. Porém a causa da descristianização

não se reduz a guerra que dois âmbitos antagônicos travavam entre si. Existem outros fatores

camuflados nessas questões (RÉMOND, 1974, p.171).

A descristianização da elite intelectual remete-se ao final do século XVII ou dos

princípios do século XVIII, porém em princípios deste último, ainda não havia afetado as

camadas populares que continuavam devotas e adeptas dos signos religiosos (HOBSBAWM,

1979, p.240-241). Corresponde à tradução de uma defasagem no tempo das instituições

eclesiásticas, que não souberam acompanhar os avanços do progresso que se instaurava. Em

primeiro lugar, o clero não procurou qualificar-se, buscando adequar-se aos novos tempos, ao

contrário do puritanismo, que buscou adequar seus preceitos à cultura renascentista. Até

mesmo os sermões dos oradores puritanos, possuíam citações de autores clássicos. Países

onde a reforma foi bem atuante, como o caso da Nova Inglaterra, possuíam um grande

número de graduados, sendo que este grau de intelectualidade será muitas vezes criticado

pelos católicos (WEBER, 2006, p.126).

Em segundo lugar, a Igreja Católica não se deu conta da amplitude dos novos

movimentos sociais, como a formação da classe operária. Seria inadequada a utilização do

termo descristianização da classe operária. Essa expressão deixa a entender que, em um

período anterior, a classe operária tivesse sido cristã e que gradativamente a Igreja Católica

deixou que ela se afastasse do seio religioso. Porém a classe operária era fruto de uma nova

realidade social. Como poderia ter sido evangelizada anteriormente se ainda nem existia?

Seria mais sensato dizer que a Igreja Católica não se dera conta em tempo oportuno do

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aparecimento da classe operária, que naquele período, iria recorrer a outras filosofias, a fim de

inspirar as suas ações coletivas (RÉMOND, 1974, p.172).

A desintegração dos quadros tradicionais que davam sustentação às práticas

religiosas foi ocasionada por uma nova conjuntura social relacionada à industrialização e a

urbanização. No passado havia uma fidelidade a religião e a tradição das disciplinas

eclesiásticas, fazendo com que existissem um maior número de pessoas em consonância com

os costumes e submissão as regras de conduta. A secularização alimentou a descristianização,

ocasionando efeitos recíprocos (RÉMOND, 1974, p.172).

A concepção medieval do trabalho era vista apenas como algo necessário para a

manutenção do indivíduo na comunidade, sendo que a mais alta forma de produtividade

monástica consistia no aumento dos tesouros eclesiásticos através das orações e cânticos. A

concepção de trabalho físico ou mental no puritanismo era visto como algo duro e constante,

passando ser a própria finalidade da vida. O trabalho seria uma técnica ascética e também

uma defesa específica contra todas as tentações impuras. Sendo assim, a concepção de

trabalho puritano se adequaria às pretensões econômicas do Estado burguês em ascensão, cujo

interesse não era mais acumular tesouros no ceú e sim na terra (WEBER, 2006, p.119 e120).

As classes médias instruídas acreditavam na existência de Deus, porém não na sua

intervenção nas diferentes atividades humanas como ocorria na Idade Média. Em relação à

religião católica tradicional, demonstravam hostilidade, era preferível ser ateu do que ser

católico. No final do século XVIII, o que estava em voga entre a elite intelectual era a

maçonaria racionalista, iluminista e anticlerical (HOBSBAWN, 1979, p.240).

O progresso instaurava-se e com ele uma nova concepção de sociedade pautada

no avanço da ciência. Muitas vezes a filosofia se subordinou a ciência, como foi o caso do

positivismo francês de Augusto Comte, o empirismo inglês de John Stuart Mill e a

significativa influência de Hebert Spencer (1820-1903). Novas teorias científicas surgiram, e

provocaram o descrédito das concepções religiosas à medida que rompiam com o paradigma

cristalizado da criação do homem, relatado no livro de Gênesis. O maior impacto científico

ocorrido em meados do século XIX que causou mal-estar dentro do catolicismo, sobretudo na

ala conservadora, foi a teoria da evolução das espécies, fazendo de Charles Darwin (1809-

1882), a maior imagem pública da ciência naquele momento. Os novos estudos da ciência,

oriundos da teoria da evolução, se confrontavam com as forças da tradição, o

conservadorismo e especialmente a religião, abolindo o status quo anterior, no qual a religião

explicava tudo. Diante dessa nova concepção de visão do mundo, a violência ideológica

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estava instaurava: “como conceber que o homem, criado a imagem de Deus, não fosse nada

mais além que um macaco modificado? [...]” (HOBSBAWM, 1997, p.360).

As incertezas da religião não tinham mais espaço, passando agora a crença a ser

baseada na infalibilidade do método científico. A ciência encontrava-se em crescente conflito

com as Escrituras, já que apresentava como novo modelo de criação do homem a teoria da

evolução. A Bíblia, a partir da década de 1830, passou a ser estudada em especial pelos

professores de Tubingen, de forma histórica, mostrando todos os possíveis erros de

documentação humana. Obras emblemáticas surgiram sobre esse assunto, como foi o caso do

Novu Testamentum (1842-1852), de Lachamann, que negava a idéia cristalizada de que o

Evangelho fosse composto por testemunhas que presenciaram de forma efetiva os

acontecimentos ali relatados, bem como a intenção de Jesus Cristo de fundar uma nova

religião, e A vida de Jesus (1835), de David Strauss, que negava o caráter sobrenatural de

Jesus Cristo. Dessa forma, em 1848, a Europa já se encontrava amadurecida para absorver as

idéias de Charles Darwin. Esse ataque intelectual foi reforçado por ataques na esfera política,

pois os novos regimes políticos estavam atacando diretamente a propriedade e os privilégios

legais do clero e de suas igrejas estabelecidas. Havia também, uma forte tendência dos

governos dos países católicos romanos tomarem para si as funções, especialmente as de

educação e beneficiência social, desempenhadas pelas ordens religiosas. Muitos monastérios

foram dissolvidos e suas propriedades vendidas entre 1789 e 1848 (HOBSBAWM, 1979,

p.244).

Apesar da resistência católica ainda se mostrar forte e se organizar entre os

grupos mais cultos da sociedade, o evolucionismo se adequou perfeitamente à nova ordem

econômica e social, já que relacionava de forma audaciosa, o modelo da seleção natural com

os conceitos da economia liberal e de competição, fazendo com que o chamado social-

darwinismo obtivesse êxito rapidamente. Ciência e religião portanto, passam a contribuir para

a sustentação do sistema capitalista, visto que o protestantismo utilizou-se de elementos da

teoria da seleção natural para tornar consistentes seus argumentos em relação a desigualdade

social, bem como a máxima de sobrevivência econômica do mais apto. O ascetismo

calvinista, através de seu arcabouço religioso, também irá justificar com sucesso vários

elementos da ordem capitalista vigente, fornecendo uma justificativa ética para a moderna

Divisão do Trabalho em especialidades, que devia ser reconhecido pelos seus frutos: “[...]

uma vez que possibilita o desenvolvimento das habilidades, a especialização das ocupações

leva a uma melhora qualitativa e quantitativa da produção, servindo assim ao bem comum

[...]” (WEBER, 2006, p.121). Com o puritanismo, a Divisão do Trabalho irá ganhar uma

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justificativa racional, impulsionando o desenvolvimento econômico da sociedade capitalista,

pois não era mais possível aceitar uma religião que via o trabalho como castigo divino e a

usura como pecado. A mentalidade puritana se adequaria melhor a esse novo tempo no qual

ser abençoado por Deus significava acumular tesouros paupáveis aqui nessa vida e não em um

além do pós-morte.

O puritanismo em si não era contra a aquisição de bens, porém contra seu mau

uso, como o gozo inconseqüente da riqueza, do ócio, das tentações da carne, considerados

desvios na busca de uma vida em retidão. Um dos mais nocivos dos pecados seria a perda de

tempo em atividades ociosas, “pois que cada hora perdida é perdida para o trabalho de

glorificação a Deus” (WEBER, 2006, p.119).

A discussão acerca da união entre Igreja e Estado será objeto de profundas

tensões, havendo choques entre os liberais e os ultramontanos. A problemática residia na

dificuldade de harmonizar uma Igreja conservadora que desejava um retorno às origens, com

um Estado burguês, comprometido com a ordem capitalista vigente. Um novo espaço estava

sendo definido e a luta desse novo Estado era contra a Igreja católica, a sua grande rival na

disputa pelo controle do âmbito político-administrativo, agora considerado de âmbito estatal.

Se por um lado a Igreja Católica foi uma instituição poderosa, por outro ela foi palco das mais

acirradas lutas públicas e privadas (PERROT, 1991, p.32).

De início, os liberais revolucionários franceses esperavam fundar um regime

sobre a égide da tolerância religiosa universal, porém diante da crescente necessidade

financeira optou-se pelo confisco dos bens eclesiásticos e a instauração da Constituição Civil

do Clero. Os bispos passaram a ser nomeados por eleição, como ocorriam com a maioria dos

representantes públicos. As assembléias revolucionárias passaram a exigir que o clero

prestasse juramento e proibiu até mesmo o uso das vestimentas eclesiásticas (PERROT, 1991,

p.32).

Tendo como base a análise weberiana, inferimos que a nova concepção do

trabalho e do desenvolvimento econômico na modernidade estiveram relacionados à formação

de uma nova concepção religiosa. A doutrina católica não atendia ao sistema capitalista que se

configurava na Europa, no qual o trabalho necessitava ser exercido pelos eleitos da forma

mais metódica possível, com maior grau de racionalização, não buscando um reconhecimento

neste mundo, porém de realizar o que é agradável a Deus. O homem passava a ter o dever de

administrar bem as suas posses, tendo a obrigação moral de fazer o fruto do seu trabalho

multiplicar. Sendo assim, a sua luta não era contra os prazeres carnais e sim em ser próspero:

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Quanto maior a posse, desde que a atitude ascética para com a vida esteja dominando, mais pesado o sentimento de responsabilidade em mantê-la intacta para a glória de Deus e em fazê-la crescer em um esforço contínuo [...]. Seu significado para o desenvolvimento do capitalismo é óbvio (WEBER, 2006, p.127).

O puritanismo não era contra a aquisição de bens e sim contra o uso irracional da

riqueza. O conforto burguês passou a ser cultuado, sendo que os votos de pobreza praticados

pelos monges estavam em desuso. Na mentalidade medieval todas as manifestações de luxo

eram consideradas idolatrias da carne, por outro lado com o puritanismo, foi aprovado o uso

racional e utilitário da riqueza, o que consistia no desejo de Deus. Eles não queriam impor

mortificações como ocorria no ascetismo católico, mas sim canalizar o trabalho para fins

práticos e necessários:

Quanto à produção da riqueza privada, o ascetismo condenava tanto a desonestidade como a avareza compulsiva. O que condenava como ganância, [...] era a busca da riqueza por si mesma, pois a riqueza é em si uma tentação. Mas aí o ascetismo tinha o poder de ‘sempre quer o bem, embora crie o mal’; o mal, neste sentido, era a posse e suas tentações. E em conformidade com o Antigo Testamento, e em analogia com a avaliação ética das boas obras, o ascetismo tinha busca das riquezas como um fim em si mesmo por altamente repreensível, embora sua manutenção como fruto do trabalho na vocação fosse um sinal da benção de Deus. E mesmo mais importante que isso: a avaliação religiosa do trabalho sistemático, incansável e contínuo na vocação secular como o mais elevado meio de ascetismo e , ao mesmo tempo, a mais segura e evidente prova de redenção e de genuína fé deve ter sido a mais poderosa alavanca concebível para a expansão dessa atitude diante da vida, que chamamos aqui de espírito do capitalismo (WEBER, 2006, p. 128-129).

O ascetismo católico não se adequava à formação do capitalismo, uma vez que

esperava uma recompensa na vida após a morte, já os puritanos que se consideravam eleitos,

buscavam viver seu processo de santificação na vida diária. Características peculiares do

puritanismo que não estavam presentes no catolicismo contribuíram para o desenvolvimento

do etnos moderno. A primeira delas foi a nova concepção de trabalho elaborada por ele, a

qual estava relacionada à idéia de vocação. Segundo Weber (2006, p.123): “fora da vocação

bem definida, as realizações do homem são apenas casuais e irregulares, e ele gasta mais

tempo no ócio que no trabalho”. Não era o caso de ser apenas adepto de uma Igreja, mas uma

busca constante como vocacionado que acreditava piamente em ser, dedicando-se ao

aprimoramento constante e simultâneo em três vias essenciais: ético, intelectual e profissional.

A segunda foi a predestinação, que gerou uma atitude interior formadora da convicção de

serem eles o povo escolhido por Deus. O chamado ascetismo intramundano e o racionalismo

dos calvinistas, não desenvolvido pelos católicos, vão contribuir sobremaneira na formação de

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protótipos de trabalhadores ideais para justificação e a consolidação de uma nova ordem

social burguesa, já que eram ativos e cientes que seu trabalho era desejado como propósito de

vida por Deus (WEBER, 2006, p.127).

O cerne econômico do homem moderno esteve atrelado ao puritanismo,

favorecendo o desenvolvimento e amadurecimento econômico da burguesia, encorajando-a ao

consumo racional, ocasionando um novo tipo de vida. O trabalhador burguês sentia-se

abençoado por Deus, permanecendo dentro de padrões morais, sendo um dever seu perante

Deus, perseguir seus interesses pecuniários. A distribuição desigual da riqueza e também das

funções de trabalho eram vistas como a vontade de Deus. Segundo o calvinismo, os

trabalhadores só seriam obedientes a Deus sendo pobres, pois a classe operária só trabalharia

se a necessidade lhe exigisse assim, relacionando posteriormente a produtividade do trabalho

com os salários baixos. A vocação através do trabalho seria também, o único meio de obter a

graça divina. Essa nova mentalidade irá contribuir de forma decisiva no perfil do trabalhador

moderno, bem como a atitude de enriquecimento burguês (WEBER, 2006, p.50).

Na França as sementes do liberalismo estiveram primeiramente presentes na

resistência dos franceses ao domínio da Igreja sobre o Estado, o que será denominado de

galicanismo. Corrente que predominou no clero francês a partir do século XIV, sendo que

mesmo estando fiel ao dogma e autoridade romana, a Igreja da França deveria conservar sua

liberdade e estrutura particular. O galicanismo irá triunfar em 1516, com a assinatura de uma

Concordata entre a monarquia francesa e o papa Leão X, mantendo-se firme apenas até a

Assembléia Constituinte da Revolução Francesa em 1789. Os galicanos irão começar a perder

expressão durante o processo revolucionário dando lugar ao ultramontanismo, opositor e

defensor incondicional da autonomia papal. Aquele teria sua vitória com a proclamação do

dogma da infalibilidade do papa, em 1870.

Com o desaparecimento de Napoleão do cenário político, inicia-se o período da

restauração. Era necessário restaurar a Europa e a Igreja de antes de 1789. De fato, o século

XIX passa por incontestável renovação religiosa, que deixará suas marcas até nossos dias.

Para defender sua identidade, a Igreja Católica freqüentemente acredita estar obrigada a lutar

contra o liberalismo ameaçador que se insinua até mesmo entre os próprios católicos. A fim

de encontrar uma alternativa que contornasse essa situação, o papa Pio IX irá convocar o

Concílio do Vaticano em 1869.

A Igreja do período da Restauração se propõe a recristianizar as massas populares

cuja identidade e prática religiosa teria sido abalada nos anos da Revolução. Porém uma nova

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fase inevitavelmente instaurava-se, sendo que o liberalismo também terá papel significativo

na formação dessa Nova Ordem. É o que nos elucida Costa (1999, p.132-133):

Na Europa, o liberalismo foi originalmente uma ideologia burguesa, vinculada ao desenvolvimento do capitalismo e à crise do mundo senhorial. As noções liberais surgiram das lutas da burguesia contra os abusos da autoridade real, os privilégios do clero e da nobreza, os monopólios que inibiam a produção, a circulação, o comércio e o trabalho livre. Na luta contra o absolutismo, os liberais defenderam a teoria do contrato social, afirmaram a soberania do povo e a supremacia da lei, e lutaram pela divisão de poderes e pelas formas representativas de governo. Para destruir os privilégios corporativos, converteram em direitos universais a liberdade, a igualdade perante a lei e o direito de propriedade. Aos regulamentos que inibiam o comércio e a produção opuseram a liberdade de comércio e de trabalho.

Outra manifestação do laicismo foi o anticlericalismo, um sentimento que esteve

presente no Iluminismo e na Revolução Francesa, que pretendia fazer da religião um setor

essencialmente privado, porém essa iniciativa não estava relacionada a não crença em Deus, e

sim ao desenvolvimento do Estado Liberal em todas as suas facetas, buscando cada vez mais

excluir do seu campo de ação administrativa e política organizações privadas como a Igreja.

Esse movimento histórico condenava a influência dominante da Igreja Católica sobre aspectos

sociais e políticos. Seria uma crítica a instituição eclesiástica e a hierarquia católica em geral.

Essa corrente defende a separação e a não interferência da esfera religiosa no âmbito civil. A

Igreja Católica romana, do ponto de vista sociológico e político, era considerada uma

instituição bastante conservadora, mostrando uma latente ojeriza a todas as filosofias e

paradigmas do século XIX que desmoronaram os alicerces da tradição. Muitas seitas,

minorias religiosas heterodoxas, mostravam-se liberais e até mesmo revolucionárias, sendo

que a ortodoxia católica combatia de forma arrefecida essas novas ideologias (HOBSBAWM,

1997, p.377).

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3 RELAÇÕES DESARMÔNICAS ENTRE A IGREJA BRASILEIRA E O ESTADO

No período de formação do Estado liberal, a Igreja no Brasil irá se tornar mais

romana que nacional. Será instaurado um período de reforma na Igreja brasileira que terá

como características principais a vinculação e a sujeição a Sé Romana:

É igualmente uma característica deste período ser a Igreja mais ‘intransigente quanto à ortodoxia’. A autoconsciência de ‘Mestra da Verdade’culminará com a proclamação da infalibilidade, defendida ardorosamente pelo episcopado brasileiro. Nesta autoconsciência, exacerbada pela contestação dos liberais e dos protestantes que paulatinamente se vão inserindo em nosso contexto nacional, o episcopado brasileiro sustenta que só a Verdade (católica) e não o Erro (liberal ou protestante) tem direito de existência e de divulgação (FRAGOSO et al, 1992, p.143).

O liberalismo que da França e da Itália é transplantado para o Brasil, será

combatido de forma ardorosa pelos bispos que o viam como uma espécie de conspiração

contra a Igreja de Cristo. Em sua militância contra o Estado, ela passa a ser a mantenedora da

verdade perseguida por seus inimigos. Em vários momentos esse combate será envolvido em

um caráter místico de luta do bem contra o mal:

Sabeis perfeitamente, veneraveis irmãos, que a guerra tão implacavel declarárão contra o catholicismo inteiro esses homens inimigos da cruz de Christo, e que não podendo supportar a santa doutrina, unem por meio de laços culpaveis, blasphemando do que ignorão, e esforçando-se por todos os meios mais perversos para destruir os fundamentos da nossa santissima religião e os da sociedade humana; e não contentes com isto, esforção-se por levar aos espíritos e aos corações os mais perniciosos erros, procurando corrompel-os e separal-os da religião catholica (SILVEIRA, 1855, paginação irregular).

A Igreja era a favor de um governo forte e centralizante, estando convencida da

união sagrada entre altar e trono, porém se recusava a continuar na sua posição de

subserviência face ao Estado. Características do Episcopado brasileiro nesse momento

merecem destaque, como a busca de uma união mais íntima com a ortodoxia do papado. Esse

retorno estaria ligado, em primeira instância, ao fato do clero brasileiro tomar consciência de

seu papel como Igreja universal, bem como da importância de Roma como vínculo e centro

de unidade e ortodoxia. Para tal foram enviados muitas vezes, de várias dioceses brasileiras,

seminaristas para estudarem em Roma e dentre estes, alguns foram mais tarde, os futuros

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Bispos, mostrando a preocupação do clero brasileiro com a moralização de seus membros,

atitude bastante elogiada pelo papa Pio IX (FRAGOSO et al, 1992, p.151):

Effectivamente, não se envergonhão de assegurar, que a sciencia das cousas philososhicas e a dos costumes, assim como as leis civis, podem e devem ser separadas da revelação divina e da authoridade da igreja; que a igreja não é uma sociedade verdadeira, perfeita, realmente livre; que a igreja não goza dos direitos proprios inabalaveis, com que a dotou o seu divino fundador, mas que pertence ao poder civil o declarar, quaes são os direitos da igreja, e os limites em que póde exercer esses mesmos direitos. Daqui pretendem falsamente, que o poder civil pode intrometter-se nas cousas que pertencem á religião, nos costumes e no governo espiritual das almas, e até impedir os bispos e os fieis de communicarem livre e reciprocamente com o Pontífice romano, estabelecido por Deos, soberano pastor de toda a igreja, e tento isto o fim de dissolverem completamente essa união necessaria e estreita, que deve existir entre os membros do corpo mystico de Christo, e aquelle a quem Jesus Cristo instituio divinamente como cabeça visível. Não temem também, valendo-se de toda a classe de embustes e de fraudes, espalhar, que os ministros sagrados da igreja, e o Pontífice romano devem ser excluídos, sem reserva, do exercicio de todo o poder e de todo domínio temporal. Além disto, não escrupulizão affirmar com a maior imprudencia, que não só a divina religião não serve de nada, mas ainda, que prejudica a perfeição do homem, e que esta divina revelação é em si mesma imperfeita, e por conseqüência que esta sujeita ao progresso continuo e indefinido, que corresponde ao desenvolvimento progressivo da razão humana (SILVEIRA, 1855, paginação irregular).

Outra causa da união com Roma foi o estímulo de Pio IX a uma maior vinculação

dos bispos católicos com o Sumo Pontífice. Reflexos desse incentivo foram as grandes

concentrações de bispos do mundo inteiro por ocasião do Dogma da Imaculada Conceição

(1854), do 19º Centenário da Morte dos apóstolos Pedro e Paulo (1867) e o Concílio Vaticano

I1 (1869-1870). Com destaque para esse último, no qual Pio IX tomou uma posição especial

em relação ao episcopado brasileiro, defendendo de forma rigorosa, a Infabilidade Pontífica e

a autoridade da Igreja, combatendo todo erro liberal que venha a desestruturar esses alicerces

podendo contaminar os bispos brasileiros.

Um terceiro fator seria a invasão dos territórios pontifícios e a conseqüente

espoliação do papa de seus territórios. Por todo o Brasil, eram feitas orações e campanhas de

arrecadação para ajudar ao papa Pio IX, considerado vítima de injustiças (FRAGOSO et al,

1992, p.183).

1 O Concílio Vaticano I deu-se de 8 de Dezembro de 1869 a 18 de Dezembro de 1870. Foi proclamado por Pio

IX (1846 a 1878). A principal decisão do Concílio foi conceber uma Constituição dogmática intitulada "Dei Filius", sobre a Fé católica, e a Constituição Dogmática "Pastor Aeternus", sobre o primado e infalibilidade do Papa, em assuntos de fé e de moral, entre outras questões doutrinárias.

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Dessa união mais íntima com Roma, Fragoso (1992 et al, p.183) destaca duas

conseqüências: “[...] primeiramente, da parte da igreja. Ela se tornava mais ‘romana’ e menos

‘nacional’. Da parte dos liberais em luta contra o ultramontanismo, a Igreja do Brasil era vista

com hostilidade por causa dessa maior aproximação com a Sé Romana”.

Todo esse movimento de independência da Igreja em face do Estado visava

afirmar que éramos católicos romanos e não católicos do Conselho de Estado. Nesta busca

pela restauração, é desenvolvido entre os bispos um senso de comunhão e solidariedade,

apesar de haver ainda a existência do padroado régio que continua vinculando os bispos

brasileiros à coroa, o que acaba gerando atritos entre os dois centros de influência: Roma e a

Corte Imperial (FRAGOSO et al, 1992, p.184).

A atuação da Igreja brasileira no Segundo Império é marcada principalmente por

um profundo sentimento de reforma, a partir da aplicação na Igreja do Brasil dos princípios

do Concílio de Trento. Essa tensão entre Estado e Igreja Católica vinha desenrolando-se há

várias décadas. Podemos destacar os seguintes nomes de bispos que estiveram em defesa da

Igreja no Brasil: na Bahia, D. Romualdo Seixas, em Mariana, D. Antônio Viçoso e no Pará,

D. Macedo Costa. Este último há uns dez anos antes da Questão Religiosa, já sustentava a luta

entre o pensamento liberal e o regalismo imperial (FRAGOSO et al, 1992, p.186).

O poderio da Igreja também se encontrava desgastado em outras circunstâncias

que contribuíram para a desagregação da monarquia. A primeira delas será a formação do

partido republicano que lançara o seu manifesto em 1870 e se constituiria no maior desafio da

monarquia, já que irá contestar as bases de sua legitimidade. A segunda será o fim da Guerra

do Paraguai e suas conseqüências, como o sentimento de unidade nacional que passa agora a

estar presente entre as camadas populares, bem como o desenvolvimento da consciência de

brasilidade envolvendo os negros, os quais teriam lutado juntamente com os brancos ao lado

da nação. Esta consciência irá desencadear a onda abolicionista. A Lei do Ventre Livre (1871)

representou a declaração efetiva de brasilidade dos negros, além da concessão da liberdade

aos escravos negros da Nação, que se encontravam em condições de servir ao exército (1866)

e a emancipação total dos mesmos na Nação (1871). Essa consciência da brasilidade dos

negros vai interferir inclusive na maneira de pensar da Igreja, a qual dará aos negros o título

de Povo de Deus. Outra conseqüência será o aumento da valorização dos militares na vida

política e nas decisões do governo. Os ideais republicanos eram vistos pela Igreja Católica

como um elemento de desagregação do regime monárquico. Para aquela instituição, a

monarquia era sinônimo de ordem e autoridade, sendo que os ideais republicanos eram vistos

como prejudiciais, tornando-se os responsáveis pela contaminação da sociedade e tendo como

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agenciadores a maçonaria, o liberalismo e o protestantismo. A união entre Igreja e Estado que

se constituía em um campo de muitas polêmicas será objeto de ataques mais diretos e

incisivos, reflexo da dificuldade de conciliar uma Igreja conservadora com um Estado Liberal.

A situação irá se agravar com a chegada de imigrantes, uma vez que estes professavam outro

tipo de religião, passando a reivindicar a igualdade com os membros do catolicismo

(FRAGOSO et al, 1992, p.152-153).

A formação sacerdotal no começo do Segundo Império era vista como deficiente.

Em 1872, o ministro do Império alegou em seu relatório, que a instrução que se oferecia aos

aspirantes ao sacerdócio nos diversos seminários era deficiente, visto que alguns professores

não possuíam nem mesmo as habilitações desejáveis, já por defeitos de sistemas. A causa

apontada seria o fato de o próprio Governo Imperial interferir de forma abusiva na Igreja, em

razão da sua negligência em relação aos assuntos eclesiásticos, “ora reduzindo o ensino nos

Seminários, ora tomando mediadas em ordem a limitar o mais possível o número dos

sacerdotes” (FRAGOSO et al, 1992, p.196).

Apesar desta deficiência, o período em estudo (1840-1875), caracteriza-se como

sendo de esforço, a fim de melhorar a formação sacerdotal, considerado o ponto prioritário na

obra de renovação da Igreja Católica. Neste grande empreendimento de reforma religiosa,

destacaram-se os nomes dos seguintes Bispos: D. Antônio Viçoso, D. Romualdo Seixas, D.

Macedo Costa, D. Luís Antônio dos Santos, D. Joaquim de Melo, entre outros, sendo que os

lazaristas2 foram os grandes cooperadores desta ação reformadora dos Bispos (FRAGOSO et

al, 1992). Não só estes religiosos tiveram contribuição na reforma dos seminários, mas o

Governo também deu a sua contribuição, pois a manutenção dos seminários dependia da

ajuda financeira estatal, bem como do pagamento dos professores que também era feito pelo

mesmo Governo. Nos relatórios oficiais do Ministério do Império, sempre era destacado o

desejo em elevar a “instrução” do nível do clero. Ressaltamos ainda, o apoio aos Bispos em

relação a uma reforma espiritual. Porém este apoio veio em um contexto regalista e galicano,

o que dificultou muitas vezes a reforma nos seminários. A intervenção excessiva no âmbito

religioso chegou “ao ponto de o Governo imperial determinar os manuais dos seminários ou

que matérias deviam ter prioridade” (FRAGOSO et al, 1992, p.197). 2 Termo utilizado para denominar os clérigos integrantes da Congregação dos Padres da Missão, que foi fundada

em 1625, por São Vicente de Paula. A origem do seu nome esta relacionada ao ano de 1632, quando a congregação irá se estabelecer no Colégio de São Lázaro em Paris. Eles também são chamados de vicentinos, religiosos regulares que possuem missões e seminários em quase todo mundo. No Brasil, chegaram em 1820 com dois sacerdotes portugueses que se encarregaram da fundação em Minas Gerais, do Colégio de Caraça, que servirá de modelo na qualidade de ensino e disciplina. Maiores detalhes a respeito podem ser encontrados em Azevedo (1999, p. 273).

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Fragoso et al (1992, p.197) também nos informa dados quantitativos acerca do

ensino nos seminários:

Em 1872 já estavam funcionando seminários em todas as dioceses, estando em fase de conclusão o do Rio Grande do Sul, que prometia ser um dos maiores do Brasil. Em todo o império havia então 1.277 seminaristas, sendo que 977 eram dos cursos preparatórios e 300 dos seminários maiores. No ano de 1871, 45 alunos concluíram os estudos teológicos.

Na reforma dos seminários, o elemento mais enfatizado era a formação espiritual

dos alunos. O objetivo dos lazaristas, dos capuchinos franceses e dos diretores espirituais do

nosso clero diocesano, era fornecer aos seminaristas uma sólida formação espiritual. As

principais características da teologia da Igreja Católica no Brasil eram as seguintes: ela não se

constituía como ciência nos moldes europeu, porém iria apresentar neste período algumas

características peculiares. A primeira delas é que estava a serviço da formação do clero, tendo

uma preocupação na sistematização dos dados teológicos ou do ensino do magistério

eclesiástico, no entanto, no que diz respeito aos seminários sob a direção dos lazaristas, o

ensino teológico nesses estabelecimentos não se mostrava inferior em relação aos da França

(FRAGOSO et al, 1992, p.197-198). O segundo elemento seria em estar a serviço da

ortodoxia romana. Este será o período de desenvolvimento da consciência romana da Igreja

brasileira, tendo seu ponto de apoio no aprimoramento do magistério eclesiástico. Os

professores de teologia dos seminários que foram estudar em Roma ou na França voltavam

influenciados pelo magistério europeu e também pelo ultramontanismo3. A terceira

característica era a de estar em defesa da Igreja, constituindo-se numa ferramenta em prol da

ortodoxia, expressando-se muitas vezes de forma apologética (FRAGOSO et al, 1992, p.198).

No Segundo Império existiam dois tipos de ordens religiosas: as tradicionais, e as

novas ordens ou congregações que vão sendo, com a ajuda do Estado, paulatinamente

introduzidas no Brasil. As primeiras na sua totalidade eram brasileiras, com exceção dos

capuchinhos italianos. Comparando os religiosos tradicionais com os novos religiosos (com

exceção dos capuchinhos), podemos observar uma considerável diferença quanto ao modo de

vida religiosa, sendo que as diferenças acentuam-se no que diz respeito ao tratamento desigual

oferecido pelo Governo Imperial a essas novas ordens. O perfil das ordens tradicionais era

3 Corrente que atribui à primazia papal no direcionamento da fé e nas regras de conduta do homem. Opõe-se ao

galicanismo, apresentando suas origens no conflito entre França e Igreja Católica no século XIV, na ocasião do reinado de Felipe, o Belo. O ultramontanismo pregou naquele momento que o rei ficasse subordinado ao papa, além da negação da independência da Igreja Francesa. Ele irá sair fortalecido em 1870, devido à proclamação da infabilidade papal no Concílio Vaticano I e na sua totalidade saindo consolidado com a separação entre o Estado Francês e a Igreja a partir do século XX. Maiores informações sobre este assunto, ver também Azevedo (1999, p. 445-446).

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reflexo do momento histórico que atravessavam, no qual sua rotina mostrava-se quase

totalmente voltada para dentro dos mosteiros, característica que se estende às ordens

femininas tradicionais. Com relação à atividade apostólica, esta era restrita aos moldes

tradicionais aplicados de forma constante. Essas características serviram de motivos para que

nas Assembléias Legislativas, qualificassem essas ordens religiosas tradicionais de ociosas.

Esses elementos vão colocar estas em segundo plano, passando a serem focadas as novas

ordens e congregações que virão para o Brasil imbuídas do ideal missionário e apostólico,

apresentando inovações em relação às exigências do momento, como também da realidade

brasileira dedicando-se a atividades filantrópicas (FRAGOSO et al, 1992, p.200).

Outra problemática que irá arrefecer os ânimos será em relação à tutela dos bens

das ordens religiosas tradicionais. A proposta de Concordata do Governo Imperial com Roma,

em 1870, terá a finalidade de extinção das ordens monásticas, sendo que os bens dos

conventos que fossem extintos aqui no Brasil seriam aplicados na reforma e no melhoramento

dos seminários. No jornal católico Chronica Religiosa (apud FRAGOSO et al, 1992, p.201)

da Bahia, foi frisado que “os bens das ordens religiosas são o El-Dorado do Governo do

Brasil”. Era alegado que apesar de ser relevante o atrito entre o Governo e as ordens

religiosas, o cerne geral da problemática centralizava-se nos bens eclesiásticos. Estes se

constituíram sobremaneira na causa da decadência material e até mesmo moral dos religiosos

no Segundo Império. A problemática agravava-se, pois o Direito Canônico dava o caráter de

sacralidade a esses bens, além das dificuldades jurídicas de se desfazerem deles. Esta última

agrava-se devido ao interesse que o Governo tinha nesses bens. Exemplificando essa questão,

tem-se os obstáculos colocados pelos beneditinos em liberar as terras desocupadas para

distribuir entre os escravos, proposta que não obteve sensível repercussão perante os homens

atrelados ao Governo. Outro aspecto dentro dessa problemática foi a dos escravos

pertencentes aos religiosos constituírem-se juridicamente como bens eclesiásticos, fator que

dificultava a sua libertação por ocasião do Direito Canônico, que impunha objeções em

relação à alienação desses bens (FRAGOSO et al, 1992, p.201-202).

Outra questão em debate naquele momento será a ineficácia dos religiosos das

ordens tradicionais. Não restava nenhum tipo de dúvida do desgaste da disciplina interna das

ordens religiosas. O Governo Imperial e as Assembléias Legislativas atacavam de forma

veemente essas corporações religiosas, sendo que o próprio Governo constituía-se em um dos

causadores das condições impróprias dos religiosos, já que era o responsável pelo emprego de

medidas restritivas, interferências ilimitadas no seu funcionamento interno e empecilhos à

realização de uma verdadeira reforma. As próprias ordens regulares teriam contribuído para

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sua própria decadência, quando aceitaram serem “protegidas” pelo governo. Em 1864, Frei

Manuel de S. Agostinho enumera como causas da decadência dos religiosos, aspectos

corriqueiros presentes nos conventos, como: a falta de interesse dos superiores em relação aos

desrespeitos dos seus súditos, as desavenças presentes nas comunidades, a falta de zelo nos

estudos e formação dos novos sacerdotes, além da falta de critério na aceitação dos candidatos

à vida regular (FRAGOSO et al,1992, p.202).

Diante desse quadro de fragilidade, ocorrerá a tentativa de realização de reformas.

Elas vão partir do âmbito interno dessas corporações, em especial das Assembléias de

eclesiásticos e tentativas da Nunciatura Apostólica. Porém estas irão de encontro com a

perspectiva regalista do Governo, tornando-as práticas inviáveis, já que o Governo tinha seu

próprio plano de reforma relacionado à difícil situação em torno dos bens eclesiásticos, bem

como a assinatura de uma Concordata com Roma. Esses planos de ambas as partes na verdade

nunca chegaram na prática a serem aplicados de forma categórica, a ponto da renovação das

ordens tradicionais durante o Segundo Império não ter se efetivado na prática (FRAGOSO et

al, 1992, p.202-203).

A tutela do Governo sobre os religiosos, como já assinalamos, vem de longas

datas. Na época colonial, o Estado beneficiou-se dos serviços da Igreja na catequização dos

índios, porém os religiosos eram vistos de forma proveitosa apenas para a execução dessa

função. Desde essa época, estes eram relegados a uma situação jurídica de inferioridade. A

legislação colonial e do primeiro Império possuíam uma série de medidas restritivas que

embargavam a aceitação de novos membros nas ordens religiosas, além de decretos que

interferiam excessivamente no âmbito interno dessas instituições. Já no Segundo Reinado, o

que irá prevalecer será a mentalidade de inutilidade das ordens religiosas para o momento

nacional que se atravessava. Em meio a essas circunstâncias, em 1855 surge o aviso do

ministro da justiça proibindo a realização do aprendizado em ordens religiosas, antes que se

realizasse uma reforma nestas, sendo determinado através da assinatura de uma concordata

com Roma. Esta medida irá representar a morte e a decadência de fato do poderio da Igreja

Católica. É o que Fragoso et al (1992, p.203) denomina de “decreto de morte lenta das ordens

religiosas”, sendo inicialmente aceito pelo Igreja Católica de forma passiva, já que parecia ser

mais uma medida provisória, uma vez que medidas dessa espécie já faziam parte da rotina

legislativa. Os religiosos só vão perceber a gravidade da medida restritiva de 1855 quando

todas as tentativas de concretização da realização de um tratado entre o Estado e a Igreja, bem

como o de uma reforma aprovada pelo Governo forem frustradas, ocasionando a reação dos

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mesmos, que destacavam a importância de suas corporações religiosas, o que provocou a

indignação dos religiosos das ordens tradicionais:

Mas essas corporações que tudo tem sacrificado pelo paiz, não merecem infelizmente a menor attenção do governo, e se achão ameaçadas do tremendo golpe de extinção com a prohibição de novas profissões, ou admissão de noviços![...]. Só beneficios tem o Brasil recebido d’essas instituições tão uteis. Na peste, e na guerra ainda seus filhos não recuzarão os seus bons benefícios, penetrão os aridos e agrestes certoes, correm ao campo de batalha á administrarem os soccorros espirituaes, não tendo em vista senão o cumprimento dos deveres de sua santa missão.Empenhado o Brasil na justa defesa dos brios e soberania de uma nação livre e independente, acaba de receber uma prova cabal do patriotismo, amor e caridade dos religiosos no imperio, que acompanhão os seus irmãos ao theatro da guerra sem o menor onus para o Estado. Nós alludimos ao grande exemplo de patriotismo que acaba de dar o Prefeito dos Capuchinhos n’este imperio pela causa dos brazileiros. O Governo precisava de capellães que accompanhassem as tropas ao theatro da guerra. Elle dirigio-se ao Prefeito Frei Caetano, e este immediatamente poz a sua disposição dois religiosos que devião acompanhar as tropas brasileiras ao campo da batalha. Mas quaes as condições postas pelo respeitavel Prefeito? Qual a retribuição pedido por tão grande sacrifício?[...] Admirem acções d’essa ordem os degenerados e pretendidos philosophos que perdem o seu tempo em accusações futeis e pueris á tão pias e sanctas instituições. Attenda o paiz para tão sublimes virtudes e reconhecerá a necessidade das casas religiosas entre nós. A sua extinção será sem duvida um passo em regresso, será um prejuiso á família, e á sociedade; um mal á instrução e á pobresa; será uma affronta é Religião Catholica Apostólica Romana (SARAIVA, 1865, paginação irregular).

Em 1870, os beneditinos do Rio de Janeiro enviaram três jovens brasileiros para

fazerem o aprendizado em ordens religiosas em Roma, gerando o aviso de 27 de outubro de

1870 ao abade geral da Ordem Beneditina no Brasil, através do qual os brasileiros não

poderiam mais voltar ao Império para exercerem as suas respectivas funções religiosas. Este

aviso foi estendido a todos os eclesiásticos das outras ordens religiosas brasileiras. Vale

ressaltar que essas medidas contra os clérigos brasileiros ocorrem concomitantemente ao

momento que o Governo Imperial viabilizou a vinda dos capuchinhos e franciscanos italianos

ou dos lazaristas franceses para o Brasil, intercedendo junto ao Governo da Itália para facilitar

a vinda de missionários italianos para o Brasil, sendo que sua atitude estaria imbuída de teor

econômico e político. A economia consistia em fazer com que os bens das ordens religiosas

passassem para as mãos do Governo em razão da lei de mão morta, que implicava na

transferência para âmbito estatal, dos bens das corporações religiosas, em caso de morte do

último membro. Neste ínterim, os religiosos estrangeiros dirigiam-se para o Brasil sob o

estrito controle jurídico e numérico do Governo, que se utilizaria de todos os meios para que

estes religiosos não acumulassem patrimônios vultosos à semelhança dos antigos religiosos

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brasileiros. A razão política seria a linha de europeização tida como modelo pelo Governo

Imperial (FRAGOSO et al, 1992, p.204).

Os religiosos iriam defender-se novamente, porém agora dentro dos trâmites da

lei, na pessoa de Fr. João do Amor Divino Costa, provincial dos franciscanos da Província da

Imaculada Conceição. Ele irá dirigir um requerimento em 1871 à Câmara dos Deputados,

solicitando o consentimento de poder readmitir noviços à sua Ordem. Alegava-se que o aviso

de 19 de maio de 1855 interrompia bruscamente o exercício dos sagrados direitos da liberdade

de consciência dos cidadãos brasileiros. A resposta da Comissão de Negócios Eclesiásticos

mostrou-se favorável ao requerimento de Fr. João do Amor Divino Costa. Inicialmente

argumenta que o aviso de 1855 foi inconstitucional, envolveu o conceito incompreensível de

uma religião nacional, a tomada da liberdade da Igreja em matéria espiritual, constituindo-se

na desobediência à liberdade de consciência, de associação, dentre outras liberdades. Dizia

respeito ao âmbito religioso e não ao civil e à espiritualidade e a disciplina religiosa interna

das ordens. Apesar de todas essas tentativas já mencionadas de preservar as ordens religiosas

brasileiras, vigorará até o fim do Império o decreto de “morte lenta”, sendo que o processo de

desnacionalização dos religiosos substituídos por ordens européias será uma conseqüência

que se perpetuará por muito tempo. Este fato fica explícito de forma incisiva na resposta do

Governo Imperial à solicitação de Fr. João do Amor Divino em seu requerimento, no qual

pedia o direito dos franciscanos brasileiros trabalharem na catequese dos índios, sendo

necessário para tal fim, reabrir os noviciados, todavia, tal direito foi negado. Enquanto isso, o

Governo Imperial incentivava sempre a vinda de religiosos da França e da Itália (FRAGOSO

et al, 1992, p.205).

Com a Constituição de 25 de março de 1824, o Estado tentou regulamentar suas

relações com a Igreja, o que acabou gerando pontos de atritos entre os dois poderes. Em

relação a essa problemática, existem questões que merecem ser pontuadas:

O art. 5ª dizia que: “A Religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a

religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico, ou

particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo”. Apesar de

neste artigo ser instituída a liberdade religiosa, o Estado dava a regalia de religião oficial para

o catolicismo. As prerrogativas deste artigo são reforçadas pelo §5ª do art.179 da mesma

carta: “Ninguém pode ser perseguido por motivo de religião, uma vez que respeite a do

Estado, e não ofenda a moral pública” (grifo nosso). No entanto, no §14ª do art. 102, a carta

mostra-se ainda fiel à tradição regalista, destacando a importância dos beneplácitos:

“Conceder ou negar o beneplácito aos decretos dos concílios e letras apostólicas, e quaisquer

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outras constituições eclesiásticas, que se não opuserem à Constituição, e precedendo

aprovação da Assembléia se contiverem disposição geral.”

Esta foi uma das tentativas do Estado de limitação da jurisdição espiritual sobre a

temporal, com o intuito de fazer com que a da Igreja não interferisse nos assuntos do Estado,

porém na prática, ela não impediu os conflitos. No Brasil, em meados do século XIX, o fato

de a maior parte da população não ser católica, tornará possível conciliar as relações entre

Igreja e Estado, amenizando o conflito entre essas duas esferas. Na Constituição do país, o

cidadão declarava-se católico, porém na prática, mostrava-se desvinculado da fé romana. Esse

quadro começava a se manifestar na alta hierarquia expandindo-se até as camadas populares

(HOLANDA, 1977, p.318-321).

O clero nacional, avesso à ortodoxia desde os tempos pombalinos até as vésperas

da Questão Religiosa, encontrava-se bastante influenciado pelos ideais iluministas,

democráticos e liberais da Revolução Francesa. Ilustrando esse quadro, temos o caso de

Minas, onde são encontrados clássicos como Rousseau, Voltaire, entre outros, na livraria do

cônego Luiz Vieira da Silva (HOLANDA, 1977, p.321). Já em Pernambuco, no Seminário de

Olinda, abundavam idéias iluministas, sendo que o clero teve significativa participação nos

movimentos revolucionários de 1817 e 1824, cuja participação foi de teor liberal e

republicano. Além dos ideais iluministas, esse clero também, no que diz respeito às relações

entre a Igreja e o Estado, mostrava-se adepto do regalismo, vinculado à tradição lusitana, em

especial, a pombalina. De 1826 a 1829, muitos eclesiásticos, membros da Assembléia

Legislativa, defendiam a primazia do poder civil. Vale destacar, a marcante atuação de Feijó

na campanha em defesa da abolição do celibato religioso. Na verdade, essa medida não teve

como preocupação real o dogma católico em si, mas a necessidade dos adeptos do

galicanismo restringirem ao máximo a autoridade papal aqui no Brasil. Esse posicionamento

ficou bem explanado por Feijó no seu ensaio intitulado: Demonstração da necessidade da

abolição do celibato clerical. Para Feijó, a lei do celibato só tem produzido a imoralidade

entre os clérigos, considerados o espelho da boa moral para a sociedade (HOLANDA, 1977,

p.322). O problema instaurava-se quando havia choque entre o poder espiritual, que queria

excomungar os padres que transgredissem o celibato, sendo que o poder temporal buscava

através da Assembléia Geral, anular o impedimento da Ordem. Dessa forma, o que o poder

civil estava buscando, seriam prerrogativas para intervir nos assuntos internos da Igreja.

Reflexo dessa atitude foi o fato de em 30 de maio de 1827, a Assembléia Geral ter rejeitado a

bula Praeclara Portugaliae. Este documento foi solicitado pela própria Coroa brasileira,

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alegando que o documento papal seria inútil, já que a Carta de 1824 já confirmava para o

Imperador, todos os direitos que Roma queria para si (HOLANDA, 1997, p.322).

Um conflito direto entre a Igreja e o Estado seria inviável, uma vez que os

representantes daquela, eram os primeiros a defender os pressupostos deste. No Brasil, o

único conflito possível seria entre a Monarquia e Roma, tendo como conseqüência a criação

de uma Igreja Nacional. A Santa Sé Romana ficava na defensiva, afinal sua imagem

encontrava-se desgastada em toda a Europa. Dessa forma, ela evitava um choque direto com a

Coroa, que não lhe traria nenhum resultado satisfatório, restando-lhe como única alternativa,

aceitar temporariamente o falso catolicismo do Brasil (HOLANDA, 1977, p.322).

O chamado falso cientificismo não possuía reflexos somente entre o clero

independente da ortodoxia religiosa de Roma, convicto, no entanto, de seguir todos os

preceitos de sua religião. Este falso catolicismo ficou conhecido também como

“protestantismo” inconsciente do clero, que também foi propalado entre a elite intelectual. O

catolicismo brasileiro, em meados do século XIX, mostrava-se fragmentado e sem identidade

própria, sendo que se considerava católico tanto o maçon como o anticlerical. Eles andavam

muito distantes do catolicismo, estando mais próximos da autoridade do Império, até em

assuntos considerados estritamente religiosos. Preferiam a verdade de suas opiniões às

doutrinas eclesiásticas. Com a aproximação do ano de 1868, houve um acirramento no Brasil

do radicalismo liberal e republicanismo, além do cientificismo. O falso catolicismo fica

abalado de forma explícita, já que suas relações de dependência com o Império são estreitas.

Os falsos católicos não tinham nenhuma pretensão em defender a primazia da Igreja sobre o

poder civil e, embora defendessem a supremacia do Estado, não tinham a intenção de

modificar a situação vigente. O objetivo era manter as relações harmônicas entre o

catolicismo e o Império (HOLANDA, 1977, p.333).

A religiosidade das camadas populares nesse período era marcada pelo

sincretismo religioso. Barbosa (apud HOLANDA, 1977, p.324) em sua obra O Papa e o

Concílio, relata que no Brasil não havia “educação religiosa, instituição cristã, privada ou

comum [...] o que vale [...] tanto para as classes cultas como para as iletradas: é sempre o

aspecto exterior, a superstição grosseira ou polida indiferença o que as marca religiosamente

[...]”. Se as camadas populares pouco se preocupavam com a doutrina católica, ainda menos

com os problemas das relações entre o catolicismo e o Estado, não se posicionando de forma

doutrinária. Houve uma pseudo paz entre Estado e Igreja. Nem as camadas populares, nem o

clero, nem os intelectuais e até mesmo os dois imperadores, não poderiam se definir católicos

na acepção do termo, embora todos eles assim se declarassem. Essa contradição entre a lei e a

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realidade, impedia o conflito efetivo entre a Igreja e o Estado. Porém essa frágil estabilidade

das relações entre a Igreja e o Estado, iriam ser rompidas no momento que adeptos do

catolicismo estivessem dispostos a fazer vigorar no Brasil o catolicismo na sua totalidade,

amparado no art. 5ª da Constituição. Outra questão seria condenar as limitações que o poder

civil impunha a Igreja, classificando o §14 do art.102 dessa constituição como herético e

contraditório. Faltavam no Brasil os defensores diretos da Igreja, existiam, é verdade,

católicos ortodoxos e até mesmo ultramontanos, porém eram em número bastante reduzido e

sem iniciativa. A Questão Religiosa será um reflexo de um longo processo relacionado à linha

ultramontana do pontificado de Pio IX e os seus reflexos serão tanto no meio da minoria fiel à

ortodoxia católica, como no seio da opinião liberal brasileira. Sendo assim, a Questão

Religiosa foi nada mais que a versão brasileira da oposição universal entre o liberalismo e o

ultramontanismo conservador (HOLANDA, 1977, p.324).

D. Vital e D.Antônio de Macedo Costa serão representantes da minoria católica

intransigente que fará vir à tona as contradições entre a lei e a realidade brasileira. A Questão

Religiosa não foi fruto de uma ocasião momentânea, porém resultado de um longo processo

relacionado à linha ultamontana de Pio IX, bem como de seus desdobramentos no Brasil,

tanto na minoria que se demonstrava fiel à Santa Sé, como na camada liberal, se revelando

como a expressão brasileira da problemática européia entre o liberalismo e o ultramontanismo

conservador (HOLANDA, 1977, p.325).

O retorno à tradição teve início no pontificado de Gregório XVI (1831-1846), que

condenou as chamadas liberdades de consciência e de imprensa, entre outras liberdades

modernas, combatendo de forma categórica o liberalismo católico de Lammenais, que tinha o

intuito de adequar o catolicismo às exigências do novo século. Na encíclica Mirari Vos de

1832, defendia de forma incisiva, a doutrina católica, bem como o celibato. Porém o ponto

mais importante dessa encíclica foi o fato de conclamar os príncipes como defensores da

religião romana nos embates das relações entre a Igreja e o Estado. Era a antiga idéia de que o

poder temporal imbuído da fé católica, se utilizaria de todos os fins para a propagação e

expansão da religião católica. Essas idéias serão utilizadas de forma arrefecida no pontificado

de Pio IX4, sob inspiração do setor mais radical ultramontano da Companhia de Jesus. A

4 Podemos destacar como realizações do pontificado de Pio IX: o restabelecimento da hierarquia católica na

Inglaterra, Holanda e Escócia; a condenação das doutrinas galicanas; a definição, a 8 de Dezembro de 1854, do dogma da Imaculada Conceição; o envio de missionários ao Polo norte, à Índia, à Birmânia, à China e ao Japão; a criação de um Dicastério para as questões relativas aos orientais; a promulgação do "Syllabus errorum", no qual condenou os erros do modernismo; a celebração do XVIII, centenário do martírio dos Apóstolos Pedro e Paulo; a celebração do Concílio Ecumênico Vaticano I - ápice do seu pontificado - que teve início em 1869 e se concluiu a 18 de Julho de 1870.

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potencialização máxima dessa doutrina será a encíclica Quanta Cura (1864-introdução da

Syllabus errorum), e o Syllabus, o seu conteúdo central foi o Concílio do Vaticano e a

proclamação do dogma da infabilidade. Através do Syllabus, o papa Pio IX irá retomar a

preponderância da autoridade espiritual da Igreja sobre a sociedade civil, além de condenar as

sociedades secretas, a maçonaria e o comunismo. A sua tese versava que toda a sociedade

devia estar envolta pelo catolicismo, a educação submetida à Igreja, além dos clérigos estarem

de fora da jurisdição de Estado, sendo submetidos apenas ao foro eclesiástico para suas causas

temporais, civis ou criminais. Devido às circunstâncias políticas derivadas da unificação da

Itália, da perda dos Estados pontifícios e ao fato de Pio IX torna-se prisioneiro do Vaticano,

sendo destituído do seu poder temporal, é instaurado o dogma da infalibilidade, dando mais

suporte ainda à doutrina ultramontana. Esse “neocatolicismo” se sobrepõe sobre o “velho

catolicismo”, que sustentava a supremacia do Concílio do Vaticano. As idéias ultramontanas

encontraram eco no Brasil antes mesmo da atuação de D.Vital e de D. Antônio Macedo Costa.

Na Memória Histórica (1868), da Faculdade de Direito de Recife, através do depoimento de

Tarquínio Bráulio de Souza Amaranto, que irá se destacar posteriormente em seu papel de

defesa dos bispos, seus escritos abundam de citações de caráter ultramontano como o Sumário

do Direito Natural Privado e Público de Benza, A Igreja e o Estado de Liberatori, além das

obras de direito natural de Taparelli d’Azeglio. A partir de Tarquínio de Souza, pode-se

inferir que o ultramontanismo já tinha o seu lugar no ensino superior antes mesmo do

aparecimento de D. Vital. A Religião do Estado e a Liberdade de Culto publicado em 1867 no

Recife, de autoria de José Soriano de Souza, irmão de Tarquínio de Souza, será outro

documento que possuía as idéias ultramontanas. Soriano de Souza qualifica um Estado laico

como um absurdo, porém ele é categórico ao dizer que não é qualquer religião que o Estado

deve professar, e sim a religião católica (HOLANDA, 1977, p.326-327).

Como corolário de suas teses, Soriano de Souza chega a defender a negação do

direito à liberdade dos cultos religiosos, exceto a do católico. No máximo eles chegariam a ser

tolerados e a liberdade de pensamento também seria condenada. Vale ressaltar ainda, que

Soriano enfatiza a necessidade de fundação de um partido católico que será apregoado no

auge da Questão Religiosa. A idéia seria identificar a religião católica com a concepção de

sentimento nacional (HOLANDA, 1977, p.328).

Essa corrente ultramontana no Brasil teve seus adversários. Reações já existiam

antes mesmo antes da publicação do Syllabus, quando já era evidente a orientação do

pontificado de Pio IX, caracterizado pela emissão de uma série de bulas e alocações

condenatórias das idéias modernas. Entre um dos mais emblemáticos exemplos do

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antiultramontanismo, tem-se o projeto de liberdade de ensino, apresentado ao Senado em 25

de maio de 1869, por Antônio Luiz Dantas de Barros Leite, um conhecido liberal de Alagoas.

A liberdade de ensino era algo bastante discutido também na França daquele momento,

fazendo com que fossem conquistadas importantes posições em 1850 através da decretação da

lei Falloux (lei de 15 de março). Dantas de Barros Leite reivindicava a liberdade de ensino

para a efetiva preponderância dos ideais liberais. Ele se mostra temeroso que bispos fiéis à

Santa Sé perturbem a tranqüilidade do Império. Pode-se observar que no Brasil existia um

clima propício à tomada de posições conflitantes que acabaria desembocando na oposição

entre Igreja e o Estado amparado pela Carta de 1824 (HOLANDA, 1977, p.328-329).

As reivindicações do liberalismo radical serão responsáveis pela relação da

Questão Religiosa com outros problemas, sejam eles de ordem política, social, econômica ou

cultural da sociedade naquele momento. Dessa forma, a Questão não se constituiria em um

acontecimento de expressão limitada, porém se configurou em um dos grandes

acontecimentos de relevância do Império (HOLANDA, 1997, p.329).

Todo tipo de liberalismo tem seu sistema de reivindicações baseado

primordialmente nos princípios práticos da liberdade de consciência. As reivindicações dos

liberais radicais fundamentavam-se nas contradições presentes na Constituição de 1824.

Apesar da liberdade de consciência estar expressa no art. 179, tinha seu efeito anulado pelo

art.5ª, que designava a religião Católica Apostólica Romana como a religião do Império,

levando as outras religiões a limitarem-se apenas ao culto doméstico; pelo §3ª do art. 95,

através do qual os que não professam a religião do Estado, não estão aptos a serem nomeados

deputados, além de serem limitados também pelo Código Criminal e pelos Estatutos das

Faculdades (HOLANDA, 1977, p.329).

O ponto de conflito residia na plena liberdade de consciência que se mostrava

inconciliável com a junção entre Igreja e Estado. Este último limitava os direitos do cidadão, a

medida que impedia a livre manifestação de pensamento que não fosse sustentada pela

religião católica. Os mais significativos setores públicos possuíam influência direta do

conservadorismo católico.

O liberalismo no Brasil irá aproveitar todos os momentos da Questão Religiosa,

agindo de forma a conturbar as suas repercussões. Ele vai aproveitar a ocasião de conciliar os

seus ideais no combate do ultramontanismo. Silveira Martins, em discurso na Câmara dos

Deputados em 31 de julho de 1873, analisando a Questão dos Bispos, chegou a conclusão de

que era necessário mudar as leis, já que elas não ofereciam uma solução para o conflito entre

a Igreja e o Estado. É o que desejavam os liberais, transformando a Questão Religiosa em

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uma apresentação explícita contra a situação conflitante que envolvia a Igreja e Império. A

atuação dos liberais irá se concretizar no vasto programa reformista que irá afetar até mesmo

o futuro nacional (HOLANDA, 1977, p.331-332).

A nossa análise não irá se centralizar na perspectiva reducionista de enumerar

fatos, reduzindo a Questão Religiosa apenas a um caso momentâneo, ocasionado

exclusivamente pela atitude precipitada de dois bispos, ou ainda pela persistência da

maçonaria brasileira. Utilizaremos a Questão Religiosa como um instrumento elucidativo que

revele pontos relevantes à problemática entre Igreja Católica e Estado. Sendo assim, aquela

não será o nosso foco neste trabalho, pois o que realmente nos interessa, são as circunstâncias

que a transcenderam, em especial aquelas antes do Cisma, à semelhança do que nos elucida

Holanda (1977, p.319):

Esta, na verdade, é um longo entrechocar-se de ideologias, ora patente ora latente, que derivando-se do regime de união entre a Igreja e o Estado, da situação geral das crenças religiosas no País, liberalismo e do cientificismo nacionais no ‘ocaso do Império’, eclode finalmente de forma espetaculosa e dramática no episódio dos bispos, sem que a anistia de 1875 tivesse o condão de eliminá-la, apesar da calmaria aparente.

Em A Igreja e o Estado (1873), Saldanha Marinho discursa sobre a problemática

da Questão Religiosa, passando a ser defendida então, a liberdade de crença. Uma religião não

pode ser utilizada como padrão de uma organização política numa sociedade em que não há

uma unidade de crença. Sendo assim, não pode existir uma religião privilegiada que se diga

de Estado. A religião é vista como algo íntimo, pessoal, não podendo existir, portanto, uma

que seja privilegiada em relação às demais (HOLANDA, 1977, p.333).

O cerne da problemática político-religiosa no Brasil não consistiu em ser

concernente ao regime de religião de Estado. Pelo contrário, era necessário perceber que a

relação simbiótica entre Igreja e Estado não respondia mais a realidade política, econômica e

social pela qual o Brasil passava, sendo que a sua perpetuação levaria indubitavelmente a

conflitos nos quais não se chegaria a um consenso. No Brasil, assim como já havia ocorrido

na Europa, o pensamento moderno, liberal, positivista ou cientificista seguia a linha de

separação entre Igreja e Estado. Em todos os cantos era apregoada a liberdade de consciência

e a liberdade espiritual (HOLANDA, 1977, p.334).

O pensamento moderno não saiu do plano teórico das discussões, já que não

detinha o poder necessário para a execução prática de suas teses. As máximas do liberalismo

eram vetadas pelo Estado, visto que o Imperador mostrava-se fiel ao célebre regime de união

e com ele se agrupava a antiga geração. Nomes como Nabuco de Araújo, apesar de ter se

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mostrado anteriormente em discurso no Senado teoricamente favorável a separação entre a

Igreja e o Estado, argumentava que no Brasil tal processo era inviável, uma vez que

ocasionaria a polarização de dois extremos um: no qual a Igreja seria anulada, e o outro no

qual sairia fortalecida, dominando toda a sociedade. Se não era função do Imperador e da

Monarquia fazer a efetiva separação, restaria à Questão Religiosa a realização de tal proeza

(HOLANDA, 1997, p.334).

Merece ser analisado de forma criteriosa, o discurso do laicato católico

esclarecido, e compreender o princípio no qual se alicerçava. D.Vital em sua obra O Bispo de

Olinda e os seus acusadores perante o Tribunal do Bom Senso, pois a mesma ataca de forma

implacável, a separação entre os dois poderes. Sendo assim, o ateísmo legal não pode ser

aceito. O discurso de D. Macedo Costa seguirá a mesma linha em sua obra Direito Contra o

Direito, onde qualifica a defesa da separação entre Igreja e Estado como a “Revolução” que

corrói as bases da sociedade humana (HOLANDA, 1977, p.334).

D. Vital chega a considerar que melhor seria a separação, do que a tutela da Igreja

pelo Estado, porém em nenhum momento da epopéia católica para o fim dessa tutela existirá

apoio à tese da separação, mesmo após a Questão Religiosa. É o exemplo das Apóstrofes do

padre Júlio Maria, que dá continuidade aos pressupostos anteriores de D. Vital e D.Macedo

Costa, defendendo a união da Igreja e do Estado. Vale ressaltar que em momento algum em

seus escritos D.Macedo defende a separação. Na verdade, o seu argumento era o de que a

“união” no sentido da Igreja estar sob a tutela do Estado era considerada inadmissível para a

primeira, pois esta perderia toda sua individualidade. Dessa forma, nessa “situação concreta”,

a separação seria a solução mais aplausível, resgatando a peculiaridade jesuítica de La Civitá

Cattolica. A separação seria uma “hipótese” a ser empregada, caso as circunstâncias assim

exigissem, jamais uma “tese”, um princípio propalado de forma aleatória. Este também

esbarrava na questão doutrinária da Igreja Católica, confirmada ardorosamente por Gregório

XVI, Pio IX e Leão XIII, com destaque para a encíclica Immortale Dei (1885), deste último.

O episcopado brasileiro não irá distinguir-se da linha de Leão XIII. Em sua obra Da

propaganda à Presidência Sales, evidencia que a Igreja Brasileira sentia-se melhor com as

instituições republicanas, do que com o regime monárquico, uma vez que este se encontrava

decaído. Evidentemente ele não era partidário da separação, na verdade ele fazia alusão à

“‘hipótese’, isto é, a situação de fato, não à ‘tese’, isto é, à situação de direito” (HOLANDA,

1977, p.336).

A Questão Religiosa aqui no Brasil constituirar-se em um ícone que demonstrava

a necessidade da separação entre Igreja e Estado, porém os participantes diretos desse conflito

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não compreenderam a dimensão dessa necessidade. Pouco importava a resistência católica. O

avanço liberal estava sendo evidente, ganhando reforço nos positivistas (ortodoxos ou

heterodoxos), que reivindicavam a reforma nas instituições e o fim dos privilégios católicos.

A trama para a derrubada da supremacia católica é oriunda da Constituição de 1824, sendo

reforçada posteriormente no decreto de 19 de abril de 1879, que estabeleceu o ensino livre

pelo ministro Leôncio de Carvalho, quando dispensou no art.25, o juramento católico não só

aos alunos, mas também a todo corpo docente e administrativo das escolas primárias e

secundárias. Em 1881, a Lei Saraiva de 9 de janeiro referente à reforma eleitoral, permitiu que

aqueles que não professavam a religião católica pudessem eleger-se (HOLANDA, 1977,

p.336).

Pode-se inferir que a Questão Religiosa está inserida em um sistema mais amplo

de declínio do sistema imperial. Ela descortinou as contradições de um sistema,

proporcionando a evolução dos ideais democráticos e republicanos, contribuindo ainda mais

para o desgate da imagem das instituições monárquicas, demonstrando a sua impotência.

Porém a sua importância não reside apenas nesse âmbito, na verdade a reação não foi contra o

Império diretamente, pois contribuiu para desnudar o anacronismo de um sistema caduco que

não correspondia mais a nova realidade social que se instalava no seio da sociedade brasileira,

reforçando as condições para que as idéias reformistas que desejavam a mudança do regime

político da nação se fortalecessem (HOLANDA, 1977, p.336-337).

D. Vital e D. Macedo Costa serão os ícones do ultramontanismo no Brasil.

Estudaram em seminários da Europa, tendo contato com as doutrinas ultramontadas. Quando

retornaram ao Brasil, passaram a defender a causa do catolicismo de forma ardorosa. Esta

defesa aconteceu antes mesmo do início do conflito, no discurso de D.Antonio de Macedo

contra os inimigos do catolicismo romano, onde combateu de forma ardorosa, tanto

protestantes como liberais, e defendeu Pio IX, denominado pontífice e rei. Para esses

religiosos, era inadmissível a aliança ilegal entre a Maçonaria e a Igreja e entre o catolicismo

e o liberalismo. A suspensão do Padre Almeida Martins pelo bispo do Rio de Janeiro, D.

Pedro Maria de Lacerda, foi o marco inicial que levou ao início do conflito entre os bispos:

Católico e maçom, o Padre Martins fora o orador oficial de uma festa comemorativa da promulgação da lei de 28 de setembro, realizada no Grande Oriente do Lavradio, em homenagem ao Visconde de Rio Branco, presidente do Conselho e grão-mestre da maçonaria brasileira [...]. (HOLANDA, 1977, p.338).

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Essa deposição foi amparada pela doutrina eclesiástica, sendo contrária a suposta

relação harmônica entre a maçonaria e a Igreja brasileira, existindo uma série de documentos

pontifícios que condenavam, de forma expressa, a união entre Igreja e Maçonaria:

[...] a Constituição In Eminenti, de Clemente XII, de 29 de abril de 1738, a Constituição Providas, de Bento XIV, de 18 de maio de 1751, a Constituição Ecclesiam a Jesu Christo, de Pio VII, de 13 de setembro de 1821, a Constituição Quo Gaviora, de Leão XII, de 13 de março de 1825, a encíclica Qui pluribus, de Pio IV, de 9 de novembro de 1846, e, do mesmo pontífice, a alocução Quibus quantisque, de 20 de abril de 1849, a encíclica Noscitis et Nobiscum, de 8 de dezembro do mesmo ano, a alocução Singulari quadam, de 9 de dezembro de 1854, a encíclica Quanto conficiamur moerore, de 10 de agosto de 1863 e a Constituição Apostolicae Sedis, de 12 de outubro de 1869 [...]. (HOLANDA, 1977, p.339).

Era um anseio comum da Igreja Católica e do poder Imperial, a realização de uma

reforma concebida de forma diferente por essas duas esferas, ocasionou um conflito que se

manifestará em diversos pontos de atrito. A necessidade de reforma remete-se à situação

desgastada na qual se encontrava a vida sacerdotal, a obediência aos preceitos religiosos, a

insuficiência na formação sacerdotal, além da falta de evangelização do povo. Essa crise geral

nos mais variados setores agrava-se com a situação de dependência da Igreja em face do

Estado. D. Macedo Costa, em 1866, será um dos grandes ícones, juntamente com D.Vital, que

se empenhará na busca da autonomia espiritual da Igreja, face ao poder civil que ele chegou a

denominar de escravidão:

Escravidão, e escravidão ignominiosa, é o que quereis impor com vossas teorias do Estado pagão, do Estado sem Deus, do Estado fonte e critério de todos os direitos, absorvendo o cidadão todo inteiro[...]. Escravidão, dura e ignominiosa escravidão, é esse Estado civil de mitra e báculo, governando a Igreja [...]. Macedo (apud HOLANDA, 1992, p.185).

Os objetivos desses dois bispos se concentravam de forma particular no

estreitamento de relações com Roma, na instrução religiosa das camadas populares e em

especial, na formação sacerdotal do clero.

A resposta da maçonaria veio em 27 de abril de 1872 no Rio de Janeiro, através

do Manifesto aprovado pela Assembléia geral do Povo Maçônico, no qual é expressa a

compatibilidade entre o chamado catolicismo liberal e a maçonaria, bem como a total

incompatibilidade do tradicionalismo do jesuitismo ultramontano, representante de um

passado de atraso, que não tinha nada de produtivo a oferecer às novas condições sociais que

se delineavam. Esse manifesto faz ainda, a distinção entre a Maçonaria na Europa, que teria se

desvinculado da essência da sua missão, e a Maçonaria Brasileira, pois esta, apesar do

respeito às tradições, está longe de ser considerada uma sociedade secreta, já que seus

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trâmites e eventos internos, bem como livros, são divulgados para a comunidade nas livrarias

e na imprensa. E outra questão de suma importância, é a de que os candidatos a fazerem parte

dessa irmandade não teriam obrigatoriamente que negar a religião e as leis que compunham o

corpo jurídico do Estado. Durante todo o desencadear da Questão Religiosa, as autoridades

maçônicas destacaram sempre que a sua incompatibilidade não era contra o catolicismo

verdadeiro, porém contra o “neocatolicismo”. A contradição residia no fato deste último

confundir-se com o “velho catolicismo”, sendo os dois considerados representantes do

“catolicismo da tradição”. Sendo assim, a Maçonaria brasileira não era diferente da européia,

revelando a sua incompatibilidade com o catolicismo ortodoxo (HOLANDA, 1977, p.339).

Primeiramente no Pará, D. Vital pela primeira vez vai declarar guerra ao livre-

exame das escrituras e o desrespeito aos costumes católicos, em Carta Pastoral de 17 de

março de 1872. Ele estava disposto a restabelecer a ortodoxia católica atuando de forma

enérgica contra os católicos – maçons que deveriam optar entre a Igreja ou a Maçonaria, caso

não se retratassem sofreriam pena de excomunhão. Atrás das atitudes de D. Vital estariam

esboçados problemas sérios e fundamentais: “se ser católico não fosse condição para o

exercício de inúmeros direitos fundamentais, na esfera civil, a exclusão de uma Irmandade

religiosa ou a própria excomunhão seria um assunto interno da Igreja, sem qualquer efeito

civil” (HOLANDA, 1977, p.341).Como vimos a Igreja sempre exerceu um estrito controle

sobre a vida do indivíduo: no registro civil, no casamento, nos cemitérios secularizados, no

grau de bacharel e no ensino nas escolas superiores, para desempenhar funções em cargos

públicos e até mesmo para fazer parte da representação nacional. Sendo assim toda a

problemática que estava instaurando-se na sociedade excedia os muros internos da Igreja,

tendo repercussões no domínio temporal. Esses efeitos civis não teriam validade caso o

Estado não tomasse conhecimento das penas de exclusão ou de excomunhão, porém a falsa

idéia cristalizada da falsa religião católica se manifestaria em toda a sua plenitude, passando o

Estado a reconhecer como católicos cidadãos que a Igreja Católica não reconhecia como seus

legítimos seguidores.

Essa situação ocasionaria conseqüências para o Estado e todos os cidadãos à

Igreja atrelados, que se fazendo passar por católicos genuínos ou acreditando mesmo ser,

viam de uma hora pra outra, a possibilidade de serem expulsos de sua Igreja e caso quisessem

permanecer, teriam que negar seus princípios liberais que eram ao mesmo tempo preceitos

presentes na maçonaria. O segundo fator residia no fato de as Irmandades serem associações

mistas, instituídas concomitantemente pelo Estado, com a parte civil e a Igreja com a parte

espiritual. Porém essa suposta harmonia foi quebrada quando foi necessário delimitar onde

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ficava o limite entre o poder temporal e o espiritual. O Estado não poderia aceitar a atitude da

Igreja de fazer alcançar a sua primazia até o ponto que seus interesses exigissem, e muito

menos a Igreja, estava interessada em ceder, deixando que o Estado aplicasse toda a sua

supremacia a seu bel-prazer. Por detrás dos polêmicos interditos desnudavam-se a secular luta

entre a Igreja e o Império, ou seja, era a própria doutrina do beneplácito régio que estava

sendo colocado em questão. As bulas, encíclicas e constituições apostólicas que atacavam a

maçonaria, não teriam recebido o placet imperial, sendo assim, não teriam, no ponto de vista

civil, qualquer valor no País (HOLANDA, 1977, p.342).

Discursos de ataque eram elaborados. D. Vital alegava que tomara suas decisões

alicerçadas nos decretos referentes ao âmbito espiritual e não no âmbito civil. Para o poder

Imperial esse argumento constituía-se em uma ameaça já que caso as determinações de

D.Vital fossem acatadas os defensores das prerrogativas do Estado seriam desmoralizados,

passando a serem submetidos à Sé Romana. Para o bispo o placet imperial, era inadmissível,

além do que as decisões papais tinham valor integral independente de qualquer decisão do

poder civil. Ele vai elaborar a sua defesa em fins de 1873, considerada como de todos

ultramontanos, na obra O Bispo de Olinda e os seus julgadores perante o tribunal do Bom

Senso. D. Vital utilizará, como referencial teórico, o próprio modelo imperial para explicar a

supremacia da Igreja Católica. Segundo ele, o Estado teria coroado o próprio catolicismo

como religião oficial na Carta de 1824, sendo assim ao empregar o beneplácito, que a religião

católica condena, o Estado entraria em contradição: “E desde que a sustente cai

necessariamente em contradição admitindo ao mesmo tempo a infalibilidade e a falibilidade

do Papa, a fabilidade e a infabilidade do Imperador” (HOLANDA, 1977, p.342).

Segundo D. Vital, a interpretação regalista tinha inúmeras contradições:

Se supõe o Papa Infalível, porque assim o ensina a crença Católica, e se supõe ao mesmo tempo falível, pois se conhece a possibilidade de êrro em suas Constituições Apostólicas; se supõe o Imperador falível, porque assim o exige a fé Católica, e infalível porque se lhe atribui o direito julgar, sem apelo nem agravo, as Constituições Pontifícias (HOLANDA, 1997, p.342).

Os liberais vão se defender das afrontas através da exposição teórica de

parlamentares, intelectuais e publicistas. Em 19 de maio de 1873, Pinheiro de Guimarães, em

discurso na Câmara dos Deputados, enfatiza a importância de que a soberania do Estado

permaneça intacta. A intolerância seria um elemento inerente a religião católica e seu objetivo

seria o de dominar a razão. Porém ele chama a atenção para o fato de que isso apenas se

concretiza, quando o catolicismo não for a religião do Estado e seus integrantes negarem-se a

cumprir suas obrigações em relação ao Estado. Seria quando se instauraria uma verdadeira

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teocracia, foi o que Vieira da Silva em 13 de junho de 1874 qualificou no Senado de

soberania nominal, já que na prática o Estado teria seus direitos tolhidos pelo poder temporal.

Tavares Bastos em A Província diz que o beneplácito não pode ser admitido em um país cujo

catolicismo é a religião oficial do Estado, caso contrário o poderio da Igreja será estabelecido

subordinando ao poder civil que ficara obrigado a acatar qualquer decisão católica, mesmo

que esta venha de encontro às leis do Estado. Rui Barbosa em O Papa e o Concílio busca

defender a plena liberdade religiosa ainda inexistente no Brasil. O regalismo, segundo ele,

seria o reflexo objetivo do próprio regime constitucional, desrespeitando o Estado, teria seu

poder anulado pela Igreja, passando a ser submisso suas imposições teocráticas do Syllabus

(HOLANDA, 1997, p.343).

O fato das Irmandades possuírem também um caráter civil permitiu que elas

buscassem recurso junto ao poder civil contra as arbitrariedades de D.Vital, amparados no

decreto nº. 1.911, de 28 de março de 1857, no seu art.1. º, §§1º e 3º: Art. 1º-Dá-se recurso à

Coroa: “§1.º-Por usurpação de jurisdição e poder temporal. §3.º-Por notória violência no

exercício da jurisdição e poder espiritual ritual, postergando-se o direito natural, ou dos

cânones recebidos na Igreja Brasileira” (HOLANDA, 1997, p.344).

O recurso elaborado pelas Irmandades foi encaminhado ao Presidente da

Província, Dr. Henrique Pereira de Lucena, que comunicou o seu recebimento a Vital,

pedindo maiores explicações. Este irá replicar que semelhante recurso é condenado por várias

disposições da Igreja. Ele não apenas condenava o beneplácito, mas argumentava que ainda

assim se constituiriam um ato sem justificativa. Dando continuidade a sua réplica, D. Vital

continua argumentando através de premissas que o beneplácito não tem força nenhuma de

livrar os membros da maçonaria de serem penalizados:

2.º Porque as Bulas In Eminenti de Clement XII e Providas de Bento XIV foram aceitas e publicadas em todo o Reino de Portugal e suas colônias, no tempo em que o placet havia sido extinto. 3º-Porque ainda mesmo que fosse admitido pela Igreja, de nada lhes valeria no caso vertente; porquanto os próprios defensores do beneplácito reconhecem e confessam que a ação dele não atinge às censuras, por serem penas espirituais e eclesiásticas, estabelecidas no intento de conter os fieis e conservar os bons costumes D.Vital (apud HOLANDA, 1977, p.344).

D. Vital e seus partidários replicavam alegando o beneplácito anulado por D.João

II em 1487, passando a vigorar somente no reinado de D.José I com Pombal em 1765, sendo

que as Bulas In Eminenti de 1738 e Providas de 1751 confirmavam que o beneplácito

inexistente não poderia afeta-las. Os defensores do regalismo treplicavam, de um lado,

negando a suspensão do beneplácito régio no período que foi destacado e de outro, alegavam

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que o silêncio do poder civil sobre as bulas pontifícias não significava que ele as aprovava.

Além do mais, se as bulas e encíclicas posteriores a 1765 nunca tinham sido emitidas pelo

governo, evidentemente que nenhum valor poderiam ter as bulas anteriores que o D. Vital

havia apontado. Por outro lado, essas Bulas não possuíam nenhum valor constitucional já que

contrariava o §5º do art. 179, que proibia a perseguição religiosa desde que essa não ferisse os

preceitos do Estado e não ofendesse a moral pública. A maçonaria estava fora de qualquer

suspeita do Estado, pois segundo o parecer da Seção do Conselho de Estado ela não possuía

nem direta nem indiretamente natureza religiosa, sendo portanto desvinculada da jurisdição

eclesiástica (HOLANDA, 1977, p.345).

Enquanto as ações de D. Vital circulavam nos trâmites do âmbito civil, D.Macedo

Costa vai ainda mais longe: não reivindicando a simples excomunhão dos maçons como fizera

D.Vital, mas proibindo aqueles de participarem das irmandades e confrarias religiosas. Caso

os bispos deixem de participar da maçonaria, caso haja resistência por parte das irmandades,

ele ordena que sejam suspensas de todas as suas funções religiosas, excluindo da absolvição

sacramental e do direito a sepultura eclesiástica todo religioso maçom que resistir em

abandonar essa seita denominada de perdição. A resposta da maçonaria aos desmandos de D.

Macedo não tardariam a aparecer, a 13 de maio o Presidente da Província encaminhava ao

Governo Imperial o recurso à Coroa pelas Irmandades da Ordem 3.º de Nossa Senhora do

Monte do Carmo, do Senhor Bom Jesus dos Passos e da Ordem 3.º de S.Francisco

(HOLANDA, 1977, p.345).

A tentativa da Igreja Católica de se impor como instituição, refletirá na tentativa

de D. Vital buscar demonstrar a total incongruência do beneplácito imperial uma vez que o

argumento defendido pelo Governo Imperial que se dizia católico possuía o mesmo conteúdo

da sociedade protestante, que reconhece como regra que toda a autoridade tanto civil como

religiosa, tem sua origem na Coroa. O pensamento do Imperador tendo em vista o aspecto

religioso mostrava-se resistente, estando convencido do regime de união entre Estado e Igreja,

bem como da culpabilidade dos Bispos cujos atos comprometiam a imponência imperial, no

entanto este não desejava a separação efetiva entre Estado e Igreja (HOLANDA, 1977, p.328-

354).

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4 O DECLÍNIO DE UMA INSTITUIÇÃO RELIGIOSA EM SÃO LUÍS: dai a César o

que é de César e a Deus o que é de Deus

Inicialmente o Maranhão não passou de uma simples prelatura subordinada à de

Pernambuco, sendo criada no reinado de Felipe III de Espanha, e governada pelo prelado de

Pernambuco. O bispado do Maranhão foi criado em 1677 através da bula Super universas

orbis ecclesias do Papa Inocêncio XI (HOLANDA, 1991, p.67). Em meados do século XIX, a

Igreja Maranhense irá se sentir perseguida por todos os lados:

Mil injurias nos tem sido irrogadas; mil suspeitas tem, desgraçadamente, recahido sobre alguns sacerdotes de conivencia n’essa aberração da sociedade, tudo affeito da immoralidade da imprensa, tudo parte da surda perseguição, que se move, e se tem levantado contra o clero! (SARAIVA, 1866, paginação irregular).

Classificamos a impressa católica em três fases. A primeira compreende ao início

da imprensa até o começo do Segundo Império. Nesta fase o pensamento católico encontra-se

em um período de desenvolvimento. Em seus primórdios esta imprensa constituir-se-ia em

uma combinação de lutas políticas e idéias liberais. Paulatinamente, em especial no final da

Regência, observa-se o aparecimento de periódicos religiosos com o objetivo de refutar as

agressões à Igreja Católica, buscando defender o catolicismo dos seus inimigos liberais que,

segundo interpretação clerical estariam personificados na maçonaria e no protestantismo

(FRAGOSO et al, 1992, p.214).

A segunda fase compreende o período que vai desde o início do Segundo Império

até por volta dos anos 70, fase inserida dentro de um movimento de reforma da Igreja que

passou a utilizar os meios de comunicação como instrumento pastoral. Os jornais que surgem

nessa fase conclamam os fiéis à inteira e absoluta adesão a Igreja Católica Apostólica

Romana, vista como a verdadeira Igreja de Jesus Cristo. Colocou-se também como

instrumento para doutrinar e evangelizar o povo com base nas máximas católicas. Nesta fase,

vale destacar que a luta contra o liberalismo e protestantismo ainda continua, mas juntamente

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a este combate é acrescida a exposição da doutrina da Igreja e missão pastoral. Para a

imprensa católica sua principal função era pastorear o seu rebanho em virtude do momento

ser de desinteresse religioso e de perseguição aos preceitos da Igreja. Vale destacar que a

Igreja proprunha através da imprensa ultramontana salvar seus fiéis da influência negativa da

inteligência prejudicial que se propagava através de uma imprensa atéia (FRAGOSO et al,

1992, p.214).

A terceira fase inicia-se por volta de 1870 e se caracteriza antes de tudo pela

polêmica, revelada na luta contra a maçonaria e em defesa da verdade católica. Estava

havendo uma preocupação em defender a autoridade eclesiástica em razão das ingerências do

poder civil, bem como a infalibilidade pontifícia e dos dogmas católicos. A imprensa irá se

colocar do lado das ordens religiosas em face dos ataques dos liberais. O ponto clímax dessa

fase encontra-se na Questão Religiosa, que passou a ocupar praticamente toda a imprensa

religiosa naquele momento (FRAGOSO et al, 1992, p.214). Vale ressaltar que possuíam

jornais católicos no Brasil, apenas no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Bahia, Pará e

Maranhão (PACHECO, 1969, p.318).

Adotar-se-á como divisão da História da Igreja no Maranhão, as seguintes fases: o

1º período, denominado de colonial, de 1801 a 1823; o 2º período, monárquico, de 1823 a

1889 e o 3º período, republicano, de 1889 a 1900 (PACHECO, 1969, p.104). O 1º período é o

de transição, entre a vida de colônia e a vida de país independente, tendo reflexos sobre a

própria Igreja. No 2º período, cronologia na qual está inserido o objetivo primordial da nossa

pesquisa, a Igreja em todo Brasil encontra-se no domínio do Regalismo, mostrando-se mais

autoritária e contraditória na Monarquia, do que no regime colonial. Já no 3º período com a

separação entre Igreja e Estado partem-se os grilhões que impediam a autonomia da Igreja.

Este estudioso também qualifica o século XIX como o “Século das Contradições” para a

Diocese do Maranhão. Nos 2º e 3º quartéis do aludido século, a Igreja Maranhense vivenciará

o auge dessas contradições. A estagnação espiritual que a Igreja Maranhense estava vivendo

naquele momento, atrelada ao crescimento da população católica em paróquias, a redução do

número de religiosos, bem como o desenvolvimento de novas capelas ocasionaram a

necessidade de aplicação de outras estratégias de comunicação da Igreja Maranhense com

seus fiéis. Para tal os Bispos D. Manoel Joaquim da Silveira e D. Luís da Conceição Saraiva

elaboraram periódicos religiosos tais como, O Ecclesiastico e A Fé sob a responsabilidade

destas duas autoridades eclesiásticas respectivamente. Utilizaremos o discurso desses dois

Bispos registrados em seus periódicos, como parâmetro na análise da maneira como a Igreja

Maranhense reagirá diante da nova conjuntura imposta pelo Estado Liberal. Esses dois Bispos

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não se constituem apenas em casos isolados, porém refletem a tentativa da Igreja Maranhense

de se erguer em meio a tantas turbulências pelas quais atravessava. Eles se empenharam na

criação de seminários, na publicação semanal de seus periódicos, cartas pastorais, além de

percorrerem as Dioceses no intuito de disseminar e fortificar a doutrina católica. Os dois

periódicos religiosos que utilizamos como documentação nesta pesquisa, foram trabalhados

tendo como base a classificação acima descrita.

A Igreja maranhense atravessava grave crise, quando em 5 de outubro de 1851, o

Papa Pio IX confirmou o decreto imperial de 5 de maio do mesmo ano , nomeando como

novo Bispo do Maranhão, o Cônego Manoel Joaquim da Silveira. Este 17º titular da diocese

maranhense nasceu em S. Rita, no Rio de Janeiro, a 11 de maio de 1807, onde exerceu as

funções de Monsenhor da Capela Imperial e Capelão de Sua Majestade, a Imperatriz.

Formou-se pelo Seminário de S. José, em sua província natal, onde exerceu as funções de

professor e reitor, já tendo exercido as funções de Promotor do Juízo Eclesiástico, de

Examinador Sinodal e Fabriqueiro da Catedral. Ele chegou a ser agraciado pelo rei das Duas

Sicílias com a Ordem de Francisco I, na ocasião em que esteve em Nápoles como capelão da

embaixada que fora buscar a Princesa D. Tereza Cristina, noiva do Imperador. Posteriormente

Pedro II também irá contemplá-lo com as Ordens do Cruzeiro e de Cristo, fazendo-o ainda

Arcebispo da Bahia, Conselheiro do Império e Conde de S. Salvador (MEIRELES, 1977,

p.240).

. D. Manoel julgou ser de grande importância a criação de um órgão de

divulgação dos assuntos referentes à Igreja Católica estabelecendo uma via de comunicação

com os membros das diferentes dioceses. Com o objetivo de pôr em prática suas idéias, criou

o periódico O Ecclesiastico, cujo conteúdo dizia respeito ao ensinamento da moral religiosa,

presente nas sagradas escrituras, tratando a Religião como o principal elemento constitutivo

da civilização, sendo um instrumento de grande auxílio no processo de evangelização, tirando

os povos do abismo para o qual caminhavam, influenciados pelo protestantismo e pela

maçonaria:

Periódico dedicado aos interesses da Religião - quinzenário de 30 por 20 ctms. de formato, geralmente de 8, por vezes até de 16 páginas, aparecendo a 1º e 15 de cada mês .- Instrutivo, variado e com farto noticiário - o órgão da Diocese- em bom papel e com ótima revisão e impressão, tinha por lema o pensamento de Sto.Atanásio, em sua ‘História do Arianismo’, art.67: ‘Religionis proprium est non cógere, sed persuadere’.- O que em vernáculo diz: ‘É próprio da Religião não forçar, mas convencer’. Eram seus redatores o Cônego Raimundo Alves dos Santos e o Beneficiado Francisco José dos Reis.Assinatura anual: 6$000 (PACHECO, 1969, p.183).

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Esse periódico religioso teve sua primeira circulação no dia 1 de outubro de

1852. Posteriormente, após dois anos, este periódico será substituído por outro de publicação

semanal O Cristianismo o qual teve sua primeira publicação no dia 1 de maio de 1854, tendo

a direção do Cônego Manuel Tavares da Silva e de Frei Vicente de Jesus, Guardião do

Convento de S. Antônio, tendo a finalidade de “lembrar ao povo adormecido os santos

preceitos do Senhor” (MEIRELES, 1977, p.233).

D. Manoel deparou-se com uma igreja em estado de verdadeiro descaso. A

catedral de São Luís que havia sido atingida por um raio, fazia 3 anos, estava com sua torre

ainda desmoronada, tendo sido transferidos os atos litúrgicos para a capela vizinha de N. S. do

Rosário. Em relatório de 1852, o Presidente do Piauí, Dr. José Antônio Saraiva, caracterizava

o estado de muitas matrizes do Nosso Estado, de completo abandono, lembrando mais um

abrigo de animais, sendo muitas vezes uma espécie de palco destinado apenas à periódica

realização das sessões eleitorais, caracterizadas por cenas de violência através das chamadas

eleições do cacete (MEIRELES, 1977, p.240).

Em muitas igrejas, os adornos encontravam-se aos farrapos e os ministros do

evangelho mostravam-se insuficientes, em grande parte qualitativamente deficientes, sendo

que os melhores entre eles apresentavam-se em estado de mendicância, devido à

impontualidade no pagamento das suas côngruas. Em relação aos conventos não era muito

diferente, tanto em São Luís quanto em Alcântara, estavam em deplorável estado de

decadência, inclusive no que diz respeito à disciplina que sempre fora o ponto alto do clero

regular. Enfim tudo contribuía para o desprestígio da Igreja, necessitando que fossem tomadas

providências urgentes, ainda mais diante das investidas da Maçonaria, bem como do

Protestantismo que começava cada vez mais a afastar os fiéis do seio católico (MEIRELES,

1977, 240).

Respondendo ao pedido de esclarecimento recebido da parte do Ministro da

Justiça e Negócios Eclesiásticos, Conselheiro José Thomaz Nabuco de Araújo, D. Manoel

daria sobre as novas ordens religiosas do Maranhão, as piores informações, em seu expediente

de 6 de fevereiro de 1854. Os Franciscanos embora fossem observantes fervorosos no culto de

Deus e sua Igreja a mais freqüentada da cidade, estavam em difícil situação: sem quaisquer

recursos, não conseguiam nem acabar a construção da própria Igreja e o Convento em sua

maior parte cedido ao Seminário Diocesano estava em total penúria. A Ordem dos Carmelitas

também não ia bem, estando a sua contabilidade atrasada desde 1840, o culto Divino perdido

seu fervor e os dois conventos, com suas igrejas e o Hospício do Bonfim, em péssimo estado.

O convento de São Luís, onde funcionavam o Liceu Maranhense a Biblioteca Pública, e o

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Hospício, estava servindo de isolamento para doentes com varíola, chegando ao ponto de

terem sido praticamente entregues ao governo. Os Mercedários viviam sob péssima

administração, com seus muitos bens rendendo muito pouco, seus dois conventos e igrejas

próximas, muito arruinadas e suas fazendas e sítios, onde viviam sessenta escravos, no mais

completo abandono. Esta situação de penúria na qual se encontravam as Ordens Religiosas

fizeram com que D. Manoel as qualificasse, em especial a do Carmo e a dos Mercedários, de

precárias e de proceder escandaloso, sendo a sua administração marcada pelo completo

desleixo (MEIRELES, 1977, p.241).

Como já ressaltamos, o declínio das Ordens Religiosas era um processo que

estava ocorrendo em várias Dioceses brasileiras. Em relatório de 1856, o ministro Nabuco de

Araújo fez um alerta sobre o benefício da educação do clero para as gerações futuras, fazendo

a sugestão da criação de seminários, já que sem essas espécies de internato, cujos muros

tinham a função de separar o clero atual do clero futuro, a regeneração das Ordens religiosas

seria algo tentado em vão, sem resultados satisfatórios, sendo a vocação sacerdotal, encarada

de forma hipócrita, como um mero meio de vida. O ensino nos seminários mostrava-se fora da

realidade da Igreja, preocupando-se mais com o ensino da ciência sagrada ao invés do ensino

das virtudes espirituais que um sacerdote necessitava ter. Sendo assim, com raríssimas

exceções, acabavam sendo formados mercenários e não apóstolos a serviço da doutrina

católica (MEIRELES, 1977, p.241).

O Bispo D. Manoel Joaquim da Silveira realizou seis viagens pastorais ao interior

das Dioceses de modo a visitar todas as freguesias subordinadas, chegando inclusive a

Teresina e a Oeiras, antiga metrópole dessa província. Foi quando pode ver a real necessidade

da busca de recursos para a restauração dos templos, conseguindo ajuda para a realização de

tal empreitada junto tanto do Tesouro Imperial, quanto do Provincial e muitas vezes até de

particulares. O primeiro a ser reconstruído, foi a Catedral, por está em completa ruína

(MEIRELES, 1977, 242).

D. Manoel não demorou a adotar medidas que eram necessárias ao

restabelecimento da disciplina, respeito e dignidade. O sincretismo religioso e antigos

costumes pagãos, além de elementos do culto africano que estavam sendo empregados nas

cerimônias católicas foram combatidos por este Bispo:

E, pessoalmente presente, mais de uma vez teve que interromper a cerimônia das Trevas e mandar evacuar o templo porque, ao bater das matracas, entravam não poucos fiéis a acompanhá-las batendo, com o que tivessem à mão, em tudo – no chão, nas paredes, nos bancos, na mesa dos altares – que lhe estivesse ao alcance, estabelecendo a mais desrespeitosa e infernal barulheira (MEIRELES, 1977, 232).

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Consoante Aviso de 25 de abril de 1853 do Ministério da Justiça e Negócios

Eclesiásticos, D. Manoel conseguiu junto ao Governo Imperial, em razão da difícil situação

financeira a qual se encontrava o clero, o aumento na remuneração eclesiástica e rendimentos

extras das paróquias, sendo que a Assembléia Provincial concedeu um subsídio para oito

vigários ajudantes que foram distribuídos entre a maioria das freguesias. Para a reforma e

ampliação do Seminário lhe foi destinada uma verba especifica de Rs. 7: 000$000. Através do

decreto imperial nº 1.221, de 24 de agosto de 1853, foram criadas e mantidas pelo dinheiro

público, dez cadeiras de novas disciplinas. Essas medidas fizeram com que o ensino

melhorasse bastante, chegando ao ponto do Seminário ter mais de cem alunos, sendo a metade

de internos. Ele também baixou uma circular na qual os candidatos a vida religiosa que não

tivessem concluído o curso no Seminário Maior, estariam impossibilitados de receberem as

ordens sacerdotais. Outra realização de sua administração foi a reforma do Estatuto do

Cabido, atualizando-o segundo a nova realidade espiritual que procurou implantar na Diocese.

Criou também uma Biblioteca Eclesiástica, uma vez que o desinteresse das Ordens havia

praticamente extinto as Bibliotecas dos conventos do Carmo e das Mercês, além de indicar as

Irmandades de S. Pedro dos Clérigos, como comissão para instituição de uma sociedade

previdenciária para o clero (MEIRELES, 1977, p. 233).

A administração de D. Manoel caracterizou-se pela mais evidente transformação

vista no clero. O que é explicado em parte por ele ter se restringindo exclusivamente a seus

cargos e compromissos religiosos, recusou o cargo o qual o Imperador havia lhe nomeado de

1ª Vice-Presidente da Província e não aceitou a sua eleição para Deputado à Assembléia

Provincial. Um dos seus maiores atos de relevância foi à constituição, em 16 de abril de 1861,

de uma dupla comissão, composta de eclesiásticos e leigos, com a finalidade de arrecadar

recursos, atendendo ao apelo dirigido, a todas as dioceses pelo Cardeal Secretário de Estado

do Vaticano, em prol do Óbulo de São Pedro, já que o Tesouro da Santa Sé encontrava-se

esgotado devido às grandes despesas feitas no período difícil pela qual a Igreja atravessava. O

prestígio de D. Manuel foi tão notável que ele chegou a ser promovido a Arcebispo Primaz do

Brasil, na capital baiana (MEIRELES, 1977, p.243).

D. Fr. Luiz da Conceição Saraiva, 18º Bispo do Maranhão, foi o responsável pela

criação do periódico religioso A Fé: “periódico religioso que chegou a sair três vezes por mês

sendo reduzido a apenas um exemplar mensal. Seu preço era de 6$000 por assinatura anual

[...] teve como Redator-Chefe o cônego Dr. Manuel Tavares da Silva” (PACHECO, 1969,

p.318). No qual enfatizava a regeneração do clero no Maranhão, onde alguns comprometiam-

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se com os preceitos da Igreja, enquanto outros eram indisciplinados e causadores de prejuízos

de toda ordem. Segundo D. Fr. Luiz da Conceição, seria em vão esperar do Governo algum

posicionamento, devido ao seu desinteresse, sendo que este processo de regeneração teria que

partir do próprio clero. Este Bispo conclamava o clero a unir-se, moralizar-se, ocupando

dignamente as suas funções sacerdotais, assim como a imprensa propunha a disseminar as

santas doutrinas.

Por volta de 1870, quando iniciou-se a terceira fase da imprensa católica,

percebemos o combate da Igreja Católica contra a maçonaria, buscando defender a sua

primazia de possuidora da verdade. Outra preocupação desta instituição foi o objetivo de

defender o domínio temporal das ingerências do poder civil, tendo como destaques a defesa

da infalibilidade papal e dos dogmas católicos. Em meados do século XIX as Ordens

Religiosas no Maranhão encontravam-se em verdadeiro desgaste sendo necessário a

implementação de uma reforma. Medidas enérgicas foram buscadas a fim de restaurar nos

conventos a santidade primitiva. O dilema estava instaurado: ou as ordens eram extintas e os

bens paravam nas mãos do Governo ou se buscavam uma restauração dessas ordens com

elementos oriundos da Europa. A formação nos seminários estava incompleta, pois eram

ensinados somente aspectos científicos, esquecendo as virtudes sacerdotais, resultando na

decadência das Dioceses do Maranhão. Aliado a esta situação de emergência espiritual, a

Igreja também sofria as investidas de dois expoentes oriundos do erro liberal: o

protestantismo e a maçonaria (PACHECO, 1969, 183-184). Sendo assim, os clérigos ficaram

do lado das ordens religiosas em virtude das investidas dos liberais que possuem seu ápice na

Questão Religiosa, ocupando destaque em quase toda a imprensa católica neste momento,

tornando-se primordialmente geradora de debates. A Igreja Maranhense buscava em Roma o

auxílio para lutar contra seus inimigos: “Julgamos o poder temporal do Papa necessario hoje

mais do que nunca, que a revolução mina e derriba as antigas dynastias catholicas, e ameaça

todas as dynastias modernas ou protestantes, que tendem a approximar-se do catholicismo”

(SARAIVA, 1866, paginação irregular).

Ao contrário de D. Manoel, D. Luís da Conceição, não cumpriu de forma efetiva

com suas obrigações sacerdotais, em especial a que versava no Código de Direito

Eclesiástico, em seu cânon 343, § 1º, que exige dos Bispos visitas anuais às freguesias,

delegando esta atribuição ao capuchinho Frei Doroteu de Dronero que era mal recebido pelos

párocos ou ainda por visitadores que nenhuma correção fazia sendo subornados de toda forma

através de banquetes e festas (MEIRELES, 1977, p.239).

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4.1 As investidas de uma nova religião

Destacaremos características relevantes do protestantismo brasileiro até 1870. O

primeiro surgimento do protestantismo no cenário brasileiro não se revelou de forma

agressiva ou com grandes polêmicas, devido à mentalidade de tolerância que existia naquele

momento. Para os imigrantes evangélicos a sua religião era um veículo de identidade cultural,

sem o objetivo de propaganda. As sociedades bíblicas aproveitaram-se do prestígio da

civilização anglo-saxônica, tida como superior à dos países latinos e também do desejo de

uma cultura religiosa liberal, não autoritária, que se manifestava em setores relevantes da

sociedade brasileira, porém essas sociedades acreditavam inicialmente na possibilidade de

uma regeneração espontânea do catolicismo através da propagação da bíblia. Kalley, uma das

mais importantes influências naquele momento, evitou cautelosamente toda a atuação que

causasse danos às suas relações com as autoridades estabelecidas (FRAGOSO et al, 1992,

p.246-247).

Nessa fase inicial o protestantismo brasileiro já apresentava diversos elementos

relevantes. Na fé dos imigrantes ainda se encontrava os moldes de uma religião de Estado, na

qual existiam manifestações características e obrigatórias nas cerimônias de batismo,

casamento e enterro, sendo que até mesmo na ausência de pastores, um ministério

improvisado revelava-se. A fé dos imigrantes era uma fé de cunho pessoal, baseada no

relacionamento direto do crente com Deus e na compreensão imediata da Bíblia, em especial,

do Novo Testamento. Outro aspecto do protestantismo nessa fase inicial de sua expansão foi

que este irá inserir-se paulatinamente no sistema jurídico brasileiro. Foi concedida aos

protestantes a posse de lugares de culto sem forma exterior de templo, desde a época do

Tratado de Comércio e Navegação, excluindo comumente o uso de torres e sinos. Porém os

protestantes recorriam muitas vezes a outros símbolos exteriores, por exemplo, a Igreja

franco-alemã do Rio de Janeiro que foi inaugurada em 1845, bem como a Igreja Alemã de

Petrópolis (1863) demonstravam em sua fachada uma Bíblia paralela a dois cálices. Irá

ocorrer a instalação de sinos em Igrejas evangélicas no final do Império, porém este fato não

se efetivou como um estímulo para que as autoridades civis se julgassem motivadas a intervir.

Outra questão que se mostrou ainda mais problemática foi a legalização do matrimônio entre

pessoas evangélicas, pois apesar da pretensa liberdade recomendada na constituição brasileira

de 1824, continuava apenas o casamento canônico tendo efeitos legais. Somente com a Lei

1.144 de 11 de setembro de 1863, complementada pelo Decreto 3.069 de 17 de abril de 1863,

prologando-se aos ministros formalmente reconhecidos das religiões não católicas o direito de

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celebrar o casamento legalmente. Paralelamente também foi regulamentado o registro civil

dos filhos protestantes, bem como o registro de óbitos e o sepultamento de protestantes em

lugar apropriado. Essas medidas apesar de serem introdutórias, deixando ainda problemas a

serem resolvidos, apresentaram grande relevância, já que indicavam o progressivo

reconhecimento legal do protestantismo no Brasil (FRAGOSO et al, 1992, p.248).

O fato de o protestantismo ter sido de fácil aceitação no Brasil, como também no

Maranhão durante o século XIX, não é explicado pela qualidade dos propagandistas e os

métodos de evangelização que utilizavam, uma vez que eram iguais em todo continente,

porém a sua resposta está relacionada às próprias condições religiosas do Brasil, naquele

momento. Como condições negativas podemos apontar, o desenvolvimento específico na

época do Brasil colonial, tornando inviável qualquer intervenção de Roma nos assuntos

referentes à Igreja brasileira. Para que as vontades da Igreja fossem atendidas era necessário

estarem em estrita concordância com os da Coroa e caso contrário seus pedidos não seriam

concedidos. Nesse cenário regalista é que foram pela primeira vez consentidos os cultos a

outras denominações religiosas no Brasil (FRAGOSO et al, 1992, p.237).

Considerável importância também teve o Tratado de Comércio e Navegação de

1810, o qual foi realizado com a Inglaterra, e que determinava em seu artigo 12, a liberdade

religiosa aos britânicos que se encontravam em territórios português, facilitando nos anos

subseqüentes a vinda de religiosos anglicanos ao Brasil, proporcionando a inauguração do

primeiro templo protestante em 1820 no Rio de Janeiro. Na estrutura interna do clero católico

existiam elementos que se revelavam acentuadamente liberais. Logo após a proclamação da

independência, Francisco Muniz Tavares, bispo de Pernambuco, defendeu o princípio da

liberdade religiosa na Assembléia Constituinte, sofrendo represálias como a do leigo e

economista José Silva Lisboa. Posteriormente, como já assinalamos, a liberdade religiosa será

estendida a todos os brasileiros através do artigo 5º da Carta de 1824.

A atuação do regalismo irá se efetuar de forma cada vez mais autoritária durante

todo o Segundo Reinado, chegando a ser levado até as últimas conseqüências, tratando de

forma enérgica as ordens religiosas. A Igreja Católica, como já foi mencionado, mostrava-se

totalmente desgastada internamente, estando suscetível a ação das chamadas idéias heréticas.

Afinal o número de sacerdotes estava escasso, além de possuírem uma imagem desgastada

diante do povo, tendo no celibato religioso um dos seus expoentes mais contraditórios.

Podemos observar essa deficiência também na Igreja Maranhense onde as camadas populares

viviam em profunda ignorância religiosa, como nos informa o Bispo do Maranhão D. Fr. Luiz

da Conceição Saraiva:

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[...] cumpre-nos assignalar aqui que de todas as ignorancias a mais fatal e perigosa é sem duvida a ignorancia profunda e radical em que vivem o povo acerca da santa religião, apostolica, catholica, romana [...]. Essa falta de conhecimentos de nossa religião procede directamente da falta de educação moral do povo em geral; e dos altos poderes do paiz procede a culpa semelhante estado de cousas. (SARAIVA, 1866, paginação irregular).

As consecutivas transformações regalistas no Brasil, de âmbito meramente

administrativo, não produziram nenhuma renovação de conteúdo, conseqüentemente as

camadas populares ficavam cada vez mais desiludidas com a Igreja Oficial. Os Bispos

Maranhenses também estavam utilizando os periódicos religiosos na tentativa de corrigir a

imagem negativa que a Igreja Católica possuía no seio da população:

[...] não só para terem conhecimento os nossos leitores do grande zelo, que alimenta o egregio Episcopado brazileiro pela educação conveniente do clero, como para mostrar que não ha tanto ultramontanismo, espirito retrogado, e rudeza no ensino dado por padres estrangeiros, que alguns liberalissimos consideram verdadeiros despotas [...] (SARAIVA, 1866, paginação irregular).

Existiam também fatores positivos que proporcionaram o sucesso da empreitada

protestante no Brasil. Em primeiro lugar foi cultivada a mentalidade espontânea de tolerância

religiosa já que o Brasil era um país que em sua grande maioria não possuía a necessidade de

se defender contra as investidas de outras religiões. Em segundo lugar o desenvolvimento de

determinados tipos de devoção popular semelhante ao sacerdócio universal presente no

protestantismo, foi desenvolvendo-se devido à escassez de religiosos, associado ao desejo

presente nas camadas populares de se expressarem espiritualmente. Um terceiro ponto a ser

destacado seria o jansenismo5, utilizado no Brasil como apoio ao regalismo, proporcionando

certo desenvolvimento de uma austera piedade, além de um acentuado interesse pela leitura

da Bíblia. Fato curioso residia no fato de no Rio de Janeiro, o colégio Pedro II ter adicionado

em seu conteúdo programático o estudo da Bíblia que contrastava com a pouca difusão desses

livros religiosos no âmbito social. Sendo assim os propagadores de evangelhos encontravam

aqui no Brasil leitores em potencial das escrituras sagradas. Diante do que foi exposto,

chegamos ao seguinte questionamento: o protestantismo teria sido fruto apenas da propaganda

dos missionários estrangeiros ou esta apenas estimulou um processo que já estava em

andamento entrelaçado em tantas contradições presentes na sociedade? Em sua obra O

5 Teologia cristã que surgiu na França e na Bélgica, no século XVII e se desenvolveu no século XVIII. Baseia-se

na teoria de Agostinho de Hipona, em sua versão pouca crítica. Neste aspecto, irá apresentar um nítido parentesco com as doutrinas de cunho protestante, em especial as calvinistas, em relação à graça, natureza humana e a predestinação. O pecado original teria sido a corrupção da natureza humana. A partir deste momento, o homem tornou-se incapaz de boas obras, inclinando-se inexoravelmente para o mal.

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Protestantismo Brasileiro, Leonard (1963 apud FRAGOSO et al, 1992, p.238) defende a

última assertiva. Relacionando as condições religiosas no Segundo Reinado com as da Europa

às vésperas da Reforma. Existiam no Brasil situações sociais que contribuíram para que fosse

aceito calorosamente o evangelho protestante pregado de forma simples e direta.

As necessidades sócio-econômicas no início do Segundo Reinado impulsionaram

a entrada de imigrantes que tiveram relação com a formação das primeiras comunidades

religiosas protestantes no Brasil. A política de D. Pedro I estimulou a vinda de mão-de-obra

da Europa para explorar áreas de escasso povoamento no país onde seriam colonos livres, já

que a importação de escravos estava tornando-se cada vez mais inviável. A imigração alemã é

a que irá trazer para o Brasil o maior número de protestantes, girando em torno de 4800 de

imigrantes até 1830, passou por um breve período de estagnação, continuando posteriormente

durante todo o século XIX com cerca de 1700 pessoas por ano. Inicialmente esses imigrantes

constituíam-se em agricultores e artesãos, porém após o fracasso da revolução liberal na

Alemanha depois de 1848, surgiram também segmentos das profissões liberais. Em 1824 em

Nova Friburgo (RJ) e São Leopoldo (RS), foram os lugares onde foram fundados os primeiros

templos protestantes e os pastores dessas igrejas chegavam a receber ajuda de custo do

governo imperial. Os religiosos anglicanos também recebiam um salário advindo dos cofres

do governo imperial que contratou ministros protestantes que vieram junto com os primeiros

imigrantes ou promovidos pelas sociedades particulares, como foi o caso do Conselho

Eclesiástico Superior da Igreja Prussiana que se responsabilizou pelo pastorado da

comunidade alemã do Rio de Janeiro. Outra sociedade financiadora foi a Sociedade

Missionária de Basiléia, que apresentou relevante função no acompanhamento de emigrantes

e pastores evangélicos que começavam a ser enviados em 1861 para as províncias de Santa

Catarina, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A Sociedade Missionária da Renânia

proporcionou a formação da Comissão para os Alemães Protestantes no Brasil Meridional em

1864 e exerceu as suas atividades iniciais na Província do Rio Grande do Sul.

Todos os esforços descritos tiveram sua importância no processo de imigração,

porém existiam outras condições favoráveis que se associaram a estas. Onde não existiam

pastores ordenados, desenvolvia-se um ministério espontâneo, composto de leigos religiosos

que exerciam os mesmos ofícios dos pastores evangélicos. Muitos destes eram aventureiros

que utilizavam a religião como um meio para ganhar a vida, porém outros demonstravam

dedicado zelo para com a comunidade, sendo verdadeiros evangelistas. Outra questão

referente ao contexto brasileiro foi a autonomia das igrejas locais, não compatível com a

tradição do protestantismo alemão. Diferente dos anglo-saxônicos, os evangélicos da Europa

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continental não consideravam a igreja local no sentido pleno da palavra. Porém o

protestantismo não deixou de constituir-se em religião do povo, não deixando de estar

presente na mistura de raças e culturas que se formavam na nação brasileira (FRAGOSO et al,

1992, p.240).

A missão evangélica no Brasil irá começar de forma efetiva em 1835 com a

iniciativa da Conferência Geral da Igreja Metodista Episcopal dos Estados Unidos que

enviaria para a América do Sul o jovem ministro Fountain E.Pitts, a fim de analisar a

possibilidade da realização de um trabalho evangelístico naquela região, chegando no Rio de

Janeiro por volta de agosto de 1835. Este missionário, através da organização de elementos da

linguagem inglesa, buscou organizar, naquela cidade, um núcleo eclesial no qual os

metodistas denominaram de Sociedade. A Conferência ficara extremamente satisfeita com os

relatórios de Pitts, enviando logo em seguida Justian R. Spaulding, com a finalidade de

realizar trabalhos, agora permanentes no Rio de Janeiro. Desenvolvendo a sociedade que Pitts

havia fundado, já em julho de 1836 havia organizado na corte uma escola dominical e diária

na qual faziam parte alunos brasileiros, incluindo filhos de escravos. Logo no ano seguinte,

novos missionários chegariam, entre eles, Daniel P.Kidder, missionário da Igreja Metodista

Episcopal que tinha como missão da Sociedade Bíblica Americana divulgar no Brasil a Bíblia

na única tradução presente naquele momento, a de Figueiredo. Durante dois anos ele viajou

para Rio de Janeiro, Santos, São Paulo, para o Norte até as províncias do Maranhão e Pará.

Posteriormente as suas impressões acerca das terras brasileiras, serão registradas em um livro

que contendo boas impressões da sociedade e da disposição do povo brasileiro em aceitação

do evangelho. Diante de tal simpatia o missionário Kidder chegou a argumentar de que em

nenhum país católico a tolerância religiosa era maior para com os protestantes como aqui no

Brasil, chegando ao ponto de sacerdotes e autoridades civis apoiarem a missão Kidder, além

de oferecerem apoio na propagação da Bíblia. Ele irá propor na Assembléia Legislativa em

São Paulo a distribuição do Novo Testamento em todas as escolas da cidade. O bom

acolhimento dessa medida pelo âmbito civil foi tanto que Martin Francisco, presidente da

assembléia, ficou lisonjeado pelo fato de aquela ser a primeira província a dar o exemplo a

todas as restantes de propagar o evangelho nas escolas públicas, porém, apesar desse apoio, a

comissão encarregada de estudar essa proposta acabou dando um parecer desfavorável. Nas

cidades pela quais passava este missionário, ele aproveitava para contestar o vício do

alcoolismo, além de ser promotor da organização de Sociedades de Temperança, buscando de

forma especial a adesão dos marinheiros (FRAGOSO et al, 1992, p.241).

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A atuação dos protestantes teve reações polêmicas principalmente da parte dos

eclesiásticos. O Padre Luís Gonçalves dos Santos em seu tratado O Catholico e o Methodista

(1838) faz alusão a uma possível trama revolucionária dos protestantes, camuflada, na

promoção dos pretos nas escolas de Spaulding, conclamando as autoridades civis para

intervirem nas ações desse inimigo da sociedade (FRAGOSO et al, 1992, p.242). Atestando-o

também D. Luiz, alega que o protestantismo não se constitui apenas em uma nova religião,

mas carrega em si o próprio gérmen revolucionário contra todo tipo de autoridade seja ela

religiosa ou política, era necessário então extirpá-lo, antes que o caos fosse instalado dentro

da sociedade:

O protestantismo é todo revolucionário. Note-se; eu não digo os protestantes todos, mas sim todo o protestantismo [...]. O protestantismo ou a revolta contra a autoridade religiosa contem em suas entranhas o gérmen da revolta contra toda a autoridade política.A história do protestantismo dá um claro testemunho desta verdade. Por toda parte, onde foi proclamada, o seu primeiro chamamento dos christãos á revolta contra o Papa se traduzio immediatamente em chamamento dos povos á revolta contra os reis.As mesmas linguas dos chefes da reforma, que pronunciaram as mais atrozes blasfemias contra a cabeça da Egreja, lançaram os mais torpes insultos contra os chefes dos Estados. Si para esses genios da desordem, o Papa não foi mais que um tyrano, os principes não passarão de monstros, e as guerras de religião, que nessa epoca calamitosa, innundaram de sangue a Allemanha, a Inglaterra e a França, não foram verdadeiramente senão guerras de revolução, as quaes felizmente Hespanha e Portugal escaparam, não consentindo que essa revolta religiosa transpozesse as suas fronteiras. Desde então o protestantismo, sempre e por toda parte, sympatisou com todas as revoluções e todas as revoluções têm dado ao protestantismo os maiores e mais inequívocos signaes de sympathias; o protestantismo tem sido sempre essencialmente revolucionário, assim como também as revoluções tem sido sempre essencialmente protestantes. Foi do seio dos povos protestantes que sahio o espirito de revolta, que, nestes últimos tempos, tem dominado certos paizes catholicos; foi depois que a reforma se propoz destruir o altar, que todos os thronos se sentiram abalados. [...] (SARAIVA, 1867, paginação irregular).

Apesar das primeiras investidas das missões protestantes não terem sido

duradouras elas tiveram a função primordial de confirmar a tese de que havia receptividade a

propaganda evangélica. Porém a Sociedade Bíblica Americana que continuou, apesar de

modestamente, a distribuir bíblias foi à responsável pela efetivação de uma nova missão

protestante. Alguns ajudantes serão requisitados para servirem no Brasil pelo pastor

presbiteriano James C. Fletcher, agente da Sociedade Bíblica e secretário da sede de

representação dos Estados Unidos. Ele facilitara a vinda do médico escocês Robert R. Kalley

para o Brasil. Kalley que já tinha passado por outras experiências evangelizadoras na ilha da

Madeira, desde 1838, auxiliado pela Comissão Colonial da Igreja Livre da Escócia. Devido às

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perseguições tiveram a necessidade de dissipar a comunidade presbiteriana que se formou

naquela ilha (FRAGOSO et al, 1992, p.242). A atuação de Kalley teve repercussões na Igreja

Maranhense:

A falta de uma educação religiosa, o desprezo das famílias, da sociedade e do governo ás sanctas doutrinas do catholicismo, esse erro, esse crime, proprio de filhos degenerados ja offerecerão infelizmente á Igreja de Deos no Brasil um triste e lamentavel.O Brasil já não lamenta somente o progresso do protestantismo em seu seio, elle deplora as ameaças, ou violencias exercidas contra os christãos, sem mais crime senão o de quererem conservar intacto o deposito sagrado da crença e da fé dos seus antepassados.A Constituição do imperio, o nosso codigo forão violados em manifesta proteção ao erro, e ignorança contra a religião de Jesus Christo! Os verdadeiros filhos do christianismo forão arrastados as prizões publicas sem mais forma de processo para deixar livre a praça os protestante que pregava contra os dogmas da religião catholica.As Sagradas imagens forão despedaçadas, por alguns d’aquelles que tiverão a infelicidade de ouvir a palavra venenosa do protestante, que affrontava um povo catholico!Estamos, entretanto em um paiz, cuja religião do Estado é a Catholica Apostolica Romana! E temos uma Constituição, um codigo penal, que não admittem liberdade de culto! Crime horroroso! Idea triste que dá o Brasil na administração da justiça ao mundo civilisado!Nós alludimos ao facto da propagação de doutrinas erroneas, pregadas pelo emissário protestante Kelli, na capital da província do Rio de Janeiro.Esse attentado contra as leis do paiz, e sentimentos religiosos de um povo christão excitou os animos, levantou a população, dando lugar á uma seria discussão na assembléa legislativa daquella povincia [...] (SARAIVA, 1865, paginação irregular).

Devido às perseguições religiosas, em 1846, a comunidade presbiteriana

desmembrou-se, sendo que Kalley passou a viver uma vida ambulante. Em estadia temporária

em Springfield (Illinois, EUA), onde numerosos membros de sua antiga comunidade nas ilhas

madeiras passaram a se instalar, neste momento ele chega a ler sobre as experiências de

Kidder no Brasil. A partir de suas leituras e recebendo o pedido de Fletcher de mandar

ajudantes de língua portuguesa, ele desembarca no Brasil em 1855 (FRAGOSO et al, 1992,

p.242-243).

Os planos de Kalley de evangelização eram bastante arquitetados. Enquanto

comitiva de Kalley ficou encarregada da colportagem6 no Rio de Janeiro. Ele também irá

alugar uma casa em Petrópolis, nas proximidades do palácio imperial, tentando uma

infiltração cuidadosa nos círculos do Governo e da aristrocacia brasileira. Fletcher na sua

condição de diplomata também teve acesso a esses círculos e influiu na atitude de Kalley que

acreditava que uma política de boas relações impediria que se repetisse no Brasil o que havia

6 Era uma atividade exercida por pessoas preparadas espiritualmente, buscando através desse método de

evangelização, mais adeptos para sua fé, sendo colportor, o nome atribuído pelas Igrejas Evangélica aos seus membros que vendiam a literatura religiosa, na maioria das vezes, de porta em porta, realizando concomitantemente suas pregações.

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ocorrido nas ilhas das Madeiras. Inicialmente o seu programa de evangelização limitou-se a

reuniões domésticas, porém em 1858 surgiu uma pequena comunidade eclesial sobre a

proteção de Kalley. Posteriormente duas damas da corte irão aderir a esta comunidade, o que

provocou o protesto dos representantes de Roma, mas a diplomacia de Kalley mostrou-se

altamente eficaz. Joaquim Nabuco, um dos mais famosos juristas do país, ficou a favor do

médico, alegando que este não teria transgredido a legislação vigente. O governo também não

tomou nenhuma medida para impedir a sua atuação. Kalley não conseguiu proteção apenas

para si, mas também para seus ajudantes no Rio de Janeiro onde os pontos de culto haviam

sido agredidos de maneira violenta. A estratégia de Kalley em denunciar à opinião pública

internacional a falta de tolerância religiosa no Brasil surtiu efeito neste sentido. O casamento

dos não-católicos reconhecia civilmente o matrimônio realizado em igreja evangélica, sendo

assim para obter o reconhecimento do Governo, levou a necessidade do grupo de Kalley

constituir-se formalmente como Igreja, para obter o reconhecimento do Governo (FRAGOSO

et al, 1992, p.243).

Apesar de Kalley valorizar as relações públicas como garantia de segurança

externa, porém pouco valorizou a segurança interna do grupo. Ele acreditava que quanto

menos organizada fosse à vida religiosa do grupo, melhor esta se desenvolveria. Sendo assim,

Kalley vai acabar se distanciando da linha rígida presbiteriana a qual pertencia, introduzindo

uma constituição de tipo congregacionalista. Porém enquanto Kalley foi passar um período de

repouso na Europa, por volta de 1862 cerca de 50 integrantes da comunidade religiosa

elegeram quatro presbíteros para assumir a direção daquele ministério que posteriormente

teria o nome de Igreja Evangélica Fluminense. Em 1863 Kalley foi eleito pastor assim que

voltou ao Brasil, exercendo suas atividades religiosas até 1876 quando retornou de forma

definitiva para a Escócia. Neste período ele teve uma significativa produção literária,

destacando artigos de caráter religioso e polêmicos que eram divulgados na imprensa diária

ou publicados sob os cuidados da Sociedade de Tratados Religiosos de Londres. Terá bastante

divulgação também os versos dele e da sua esposa Sarah Poulton Kalley, publicados em 1861

na coleção Salmos e Hinos, fazendo parte efetivamente da hinologia evangélica brasileira.

4.2 Como se encontrava o episcopado maranhense em meados do século XIX

Vejamos agora como a Igreja maranhense comportava-se em meados do século

XIX, diante desses desafios que se impunham a sua hegemonia. Teremos como base o

discurso dois bispos, D. Fr. Luiz da Conceição Saraiva e D. Manoel da Silveira, os quais

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através de seus periódicos religiosos refletiram naquele momento toda uma conjuntura de

crise pela qual a Igreja Católica atravessava.

Toda esta atuação de Kalley, que como vimos tiveram reflexos importantes na

sociedade brasileira, também repercutiram na Igreja maranhense, que não vislumbrou com

bons olhos a atuação desse missionário, vendo seu ministério como uma ameaça a religião do

Estado:

A população da cidade de Nitheroy acaba de ser violentada não se lhe permitindo ouvir, e nem repellir um protestante Kelly que ali pregava heresias [...]. Admira como um paiz, em que não ha liberdade de culto como em o nosso, se permite que um estrangeiro, um fuso doutor, e impostor tenha o apoio, de pregar doutrinas contra a nossa religião, a religião do Estado! Em Nytheroy, entretanto um tal Kelly, ministro protestante fallando em grandes assembléas contra a virgindade M.SS. e outros dogmas, cujo acto produzio na corte do império e naquella capital grande escandalo com violencias praticadas com os christãos catholicos!As autoridades, como o chefe de policia protegendo esse Kelly, esse especulador commetteu inauditas arbitrariedades contra os christãos! [...] (SARAIVA, 1865, paginação irregular).

A Igreja maranhense assim como a brasileira nesse período primava pela

restauração e o conservadorismo:

Ha quais tres annos que, com dôr o dizemos, tem a Igreja Maranhense sofrido muito na pessoa daquelles padres que tem, como lhes compria, seguido a marcha da administração de nosso illustre e venerável Prelado, sendo victimas de toda sorte de caluminias e afrontas, que a má fé pode aventar. Nós ministros da Religião do Crucificado já uma vez protestamos contra semelhante deslocação da harmonia social, que revoltando os espíritos catholicos, compugne o sacerdote, que sabe cumprir com a sua missão, com o seu dever (SARAIVA, 1865, paginação irregular).

O periódico maranhense A Fé esteve sob os cuidados de D. Luís da Conceição

Saraiva, monge beneditino originário de Bom Jardim, em Passo Fundo na Bahia onde nasceu

em 25 de dezembro de 1824. Ordenado pelo Convento de S. Bento em Salvador, recebeu o

grau de Mestre em Teologia pelo Convento de S. Bento no Rio de Janeiro, do qual

posteriormente foi professor e reitor. Depois foi superior do mosteiro de sua Ordem, professor

e vice-reitor do Colégio Pedro II, na Corte. Diante de suas realizações, foi convocado para

investidura episcopal. Sendo provido por decreto de 14 de julho de 1861 e confirmado pelo

papa em 24 de julho de 1861, assumindo o cargo de Bispo do Maranhão em 21 de março de

1862. Ele era visto por muitos como idealista, trabalhador, dotado de espírito progressista,

possuindo todos os requisitos para realizar uma boa administração, não somente pelo fato de

ter recebido o Bispado na melhor paz, mas também por possuir recursos que não eram

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pequenos, porém este não obteve o êxito esperado tanto na administração material como na

moral (MEIRELES, 1977, p.240).

O jornal A Imprensa de 2 de agosto de 1861 mostra-nos que não existia a devida

paz esperada naquele momento no Bispado, cuja a causa constituía-se em grande parte ao

comportamento de muitos sacerdotes que preocupavam-se com atividades políticas,

meramente mundanas ao invés de exercerem suas obrigações religiosas, deixando de unir-se

em torno dos inimigos da religião para tornarem-se rivais entre si. Essas conjecturas não eram

somente de um juízo de valor feito pelos anticlericais, inimigos da Igreja ou até mesmo

adversários políticos, já que o próprio D. Luís da Conceição Saraiva em ofício de 16 de

fevereiro de 1864, dirigido ao Arcediago Antônio Araújo Lobato, relacionava a motivos

políticos, o cerne da perturbação existente no Bispado maranhense daquele momento

(MEIRELES, 1977, p.240).

D. Luís da Conceição Saraiva através de documentos expedidos pelo próprio

bispado, em oficio de 20 de fevereiro de 1863, endereçado ao Governo Imperial reclama

contra a ordem superior de ficar sob a competência dos presidentes de Província a demissão

dos páracos, tratando o clero como meros funcionários públicos da Coroa. Ele contestava as

ingerências do poder civil em assuntos religiosos, fazendo com que muitas divisões

administrativas ficassem sem chefia, inclusive pelo atraso com que Roma recebia informações

sobre a deficiência na quantidade numérica do clero. Esse Bispo baixou uma portaria em 3 de

julho de 1863, padronizando para toda a Diocese, uma tabela de vantagens e taxas com a

intenção de reprimir os abusos na cobrança dos serviços eclesiásticos, antecipando às

recomendações do Decreto Imperial nº 3.073 de 22 de abril de 1863 que uniformizou no país

o ensino religioso, criando em 4 de fevereiro de 1863 o Seminário das Mercês, colocando para

funcionar o convento desse mesmo nome, com o curso aberto de Humanidades, deixando o de

Santo Antônio, como Seminário Maior de preparação exclusiva do clero, além de empenhar-

se na tarefa de recuperação do Paço Episcopal o qual se encontrava em ruínas, estimulando as

diversas Irmandades a empenharem-se na conservação dos demais templos da capital a fim de

que fossem reconstruídas as igrejas de S. Antônio e do Desterro, restaurando as do Carmo, de

S. João, dos Remédios, de S. Pantaleão, do Rosário e as capelas de Bom Jesus dos

Navegantes e do Senhor dos Passos. Foi criado o periódico A Fé, com o desaparecimento de

O Ecclesiastico e de O Cristianismo, tendo assim D. Luís grande contribuição na

disseminação do pensamento católico naquele momento. Este periódico constitui-se em órgão

oficial da Igreja, cujo primeiro número teve sua circulação em 5 de junho de 1864,tendo como

redator-chefe o próprio Bispo. Este também, em 7 de janeiro de 1865, dará nova organização

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ao antigo Recolhimento de N.S da Anunciação e Remédios para transformá-lo em um colégio,

incorporando a este o Asilo de Santa Tereza, com nova sede inaugurada no dia 21 de março

de 1871 (MEIRELES, 1977, p.241).

A maioria dos Bispos que vieram para o Maranhão a mando de Portugal

caracterizou-se por ser em grande parte ignorante em matéria religiosa, interesseiro,

ganancioso, distanciado por completo dos seus mais sagrados deveres, sendo que D. Luís não

fugia a essa caracterização (MEIRELES, 1977, p.242-243). Assim como o projeto de

restauração da Igreja brasileira não obteve seu êxito desejado, a Igreja Maranhense passava

por momentos difíceis não conseguindo obter sucesso na busca da renovação de seus

preceitos tradicionais, sendo que o próprio Bispo D. Luís representava, naquele momento,

toda a imagem contraditória de uma Igreja que se julgava perseguida por seus inimigos, quer

sejam eles liberais quer sejam maçons. Todavia, este não se empenhava de forma efetiva na

reformulação espiritual de seus preceitos tradicionais, o que ficou evidenciado na indisciplina

reinante no clero. Caridade, sabedoria, entre outras virtudes, que levaram D. Luís ser

nomeado Bispo do Maranhão logo dissiparam-se, já que assim como todo o clero do

episcopado, D. Luís mostrava-se despreparado e indisciplinado, não possuindo, portanto os

requisitos para realizar com êxito seus compromissos. Filho de família importante, rica,

influente politicamente, levava consigo o orgulho e a vaidade de sua origem, aproveitando-se

muitas vezes de seu posto de Bispo para demonstração de status, tendo mais compromisso

com valores mundanos deixando suas obrigações eclesiásticas para o segundo plano. Seu

caráter profano e ostentatório ficou evidenciado na ocasião do seu segundo aniversário de

consagração de Bispo, festejado com uma festa farta que fugia dos padrões religiosos da

época, além de perder toda a compostura que devia ter como Bispo, saindo a noite usando

trajes não religiosos (MEIRELES, 1977, p.243).

Em meio a esse ambiente de indisciplina, a Igreja maranhense dava motivos

significativos para o ataque de seus inimigos. Como foi o caso da Maçonaria que encontrava

adeptos até mesmo entre o clero e também na imprensa que se encontrando nas mãos de

jovens, agrediam a Igreja em todos seus alicerces. Em 22 maio de 1863, diante da situação

calamitosa na qual se encontrava a Igreja Maranhense, o Cabido irá dispensar a sua

solidariedade a imprensa, lamentando o fato daquele veículo de comunicação, atacar em todos

os âmbitos a autoridade eclesiástica, inclusive com a cumplicidade de alguns clérigos. Em 29

de julho de 1868, D. Luís recebeu do núncio no Rio de Janeiro, uma cópia da Bula Aeterni

Patris Unigenitus na qual o Papa Pio IX convocava-o para Concílio Vaticano I. No entanto

por motivo de doença o Bispo ficou impossibilitado de atender este pedido da Santa Sé, dando

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autorização aos Bispo de Olinda e de Recife, D. Francisco Cardoso Aires para representá-lo.

Durante o andamento do Concílio Vaticano I, D. Luís deu grande contribuição ao prestar

solidariedade à ocupação de Roma pelas tropas italianas em 20 de setembro de 1870. No

comunicado aos fiéis que estavam sob os cuidados de sua jurisdição, será feito apelo em prol

da angariação de recursos do Óbulo de São Pedro, com o intuito de ajudar as dificuldades

financeiras do Sumo Pontífice que havia sido privado do seu poder temporal resultando no

desaparecimento dos Estados Pontifícios (MEIRELES, 1977, p.243).

A Questão Religiosa por ter sido um acontecimento que teve repercussão em todo

o Brasil e até mesmo internacionalmente, não deixaria de ter influências significativas

também no cenário maranhense. Destacamos a atuação de dois maranhenses de grande

prestígio social naquele momento. O primeiro será o jurista Cândido Mendes de Almeida que

irá defender, de forma gratuita, os bispos que estavam sendo perseguidos, sendo o segundo

defensor o Visconde de Vieira da Silva que, juntamente com Cândido Mendes, debateram esta

problemática parlamentar já que ambos eram senadores. Assim como a maioria do clero

brasileiro D. Luís manteve-se em uma posição de prudência. A Bula Quamquam Dolores,

pela qual o Papa Pio IX declarava a excomunhão dos bispos maçons, bem como a dissolução

das irmandades que desobedecessem aos decretos de Roma, foi publicada com um ano de

atraso em uma Pastoral, demonstrando o pouco interesse de D. Luís em divulgar no

episcopado brasileiro as determinações da Santa Sé, mesmo sendo assuntos importantes,

referentes aos desafios da Igreja naquele momento, como era o caso específico naquele

momento da Questão Religiosa e a maçonaria (MEIRELES, 1977, p.245).

Até mesmo o Papa Pio IX, em relato de carta de 25 de maio de 1874, reconheceu

o quanto estava infrutífero o Bispado de D. Luís:

[...] desde muito tempo chegam até Nós, a teu respeito, queixas que dificilmente podem ser acreditadas de um Bispo. Como, porém, cada dia sejam elas confirmadas pela autoridade de novas testemunhas, não queremos por mais tempo faltar a nosso dever em defesa da Igreja e da salvação das almas confiadas a teu zelo. De fato. Devo repreender muito severamente o Bispo que, há doze anos já à frente do Rebanho, nunca o visitou e cuidou de suas necessidades (MEIRELES, 1977, p.246).

O Papa Pio IX condenou todas as arbitrariedades cometidas por D. Luís, as quais

se estendiam também as cometidas pelas autoridades eclesiásticas do resto do episcopado. D.

Luís confiou aos Seminários professores corrompidos e despreparados, que prejudicavam

sobremaneira a formação religiosa do clero, distorcendo os preceitos da doutrina católica. A

situação agravou-se quando D. Luís no período em que esteve de licença por motivo de

doença ter entregue provisoriamente o governo da sua Diocese ao cônego Manuel Tavares da

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Silva o qual possuía filiação com a maçonaria, além de educadores do clero como o cônego

Raimundo da Purificação dos Santos, reitor das Mercês que também eram adeptos da

maçonaria. Devido a sua infeliz escolha, D. Luís foi acusado de trabalhar juntamente com a

maçonaria no projeto de destruição da Igreja Católica (MEIRELES, 1977, p.247).

D. Luís buscava defender-se das acusações e das alcunhas da Santa Sé que

acusava seu governo espiritual de ter sido inútil e defasado, rebatendo e justificando que a

culpa da situação espiritual calamitosa, na qual encontrava-se o episcopado, residia no fato do

governo não colocar em prática medidas que constituíam-se em suas obrigações:

Ao corpo legislativo, e ao Governo compete curar dos interesses de seus comittentes, da instrucção de seus governados.Não cruzem os Srs. do governo os braços, entregues a indiferença, e uma certa inercia mais que muito reparavel, e estendão suas vistas e seus cuidados sobre a instrucção do clero, sobre a educação do povo, e não teremos de lamentar os males que nos flagellão (SARAIVA, 1866, paginação irregular).

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A situação da religião no Brasil em meados do século XIX encontra-se em um

contexto de perda de identidade. O regime do padroado mostrou-se como uma problemática já

que enfraqueceu a unidade episcopal brasileira. A presença do representante do papa no

Brasil, os chamados núncios apostólicos, não corresponderam a uma análise da situação

religiosa no Brasil, sendo ter sido inútil esperar qualquer influência deles nesse sentido. Eles

não se comportavam exatamente como pastores, mas como representantes de uma instituição,

a Sé Romana, e embaixadores de uma organização política, os estados pontifícios. Sua

identificação com a realidade brasileira foi muito menor que a de outros estrangeiros que

estiveram em territórios brasileiros. A característica de obrigação e não de propagação e

difusão do evangelho deixou claro a repugnância que esses representantes de Roma, tinham a

tudo que se referia ao Brasil, considerando sua pseudo missão como um enorme sacrifício de

que esperavam ficar livres o mais rápido possível.

Sendo assim o fato do clero estrangeiro não ter moldado a mentalidade do

catolicismo brasileiro, mas sim os representantes do mandonismo local, propiciou o

desenvolvimento do caráter autônomo presente do catolicismo brasileiro, tendo influências

decisivas, em toda a sua trajetória até os dias atuais. Um bom cristão não poderia ser um mau

cidadão, porém seria um mau cidadão aquele que não conformado com os preceitos da

religião católica, desse ouvidos à inquieta e turbulenta, voz de outra religião alheia a sua.

Apesar de suas desvantagens, essa realidade tão peculiar da Igreja brasileira não deixou de

apresentar as suas vantagens, sendo um fator de relativa importância para o atual programa de

reforma da Igreja. Já que a linguagem libertadora do evangelho mostra a necessidade de que

ela seja independente do domínio de leigos que nada sabem sobre a sua doutrina, seria vital

também, sair das mãos de sacerdotes que se diziam religiosos portadores da libertação, no

entanto tornam-se igualmente opressores do povo, a figura do padre foi um desdobramento da

figura do proprietário local, imbuído de funções religiosas e educativas. A falta do

clericalismo nos primeiros séculos da tradição católica no Brasil não deixou de apresentar o

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seu aspecto positivo, apresentando a possibilidade de ser de grande relevância para o atual

projeto de reforma da Igreja. Apesar da igreja européia nem sempre ter conseguido evitar os

abusos do clericalismo, atualmente deparamo-nos com o empenho da igreja latino-americana

na formação de pequenas comunidades de base, experiência que gera a possibilidade dela se

libertar tanto do patriarcalismo, como do clericalismo, dois abusos, que prejudicaram

sobremaneira a Igreja brasileira.

O patriarcalismo deixará marcas expressivas em vários âmbitos de nossa

sociedade, mesmo após a desagregação do sistema colonial, responsáveis pela passividade da

religião católica presente no seio das camadas populares. Sendo assim, o modelo europeu do

liberalismo encontrou entraves para o seu desenvolvimento na sociedade brasileira, já que

aqui ainda coexistiam naquele momento práticas arcaicas, como o tradicionalismo católico e o

escravismo, que não correspondiam aos pressupostos liberais.

D. Manoel Joaquim da Silveira representou a possibilidade de êxito do projeto de

Restauração da Igreja Maranhense, já o Bispado de D. Luís da Conceição Saraiva, mostrou de

forma prática, o quanto os pilares do prestígio e dos bons costumes que a sustentavam,

estavam sendo corroídos. Ressaltamos ainda, que a Igreja Maranhense devido à problemas

internos já relatados, encontrava-se enfraquecida no momento em que sofreu as investidas de

seus inimigos liberais, em especial a maçonaria e o protestantismo.

Chegado o fim do Império, as ordens religiosas encontravam-se mais do que

nunca em profundo estado de marasmo. Em razão da Lei de 1855, que versava sobre o ensino

religioso no país, proibindo as ordens a admissão de candidatos ao sacerdócio, propiciou que

as três ordens masculinas sediadas na Diocese se encontrassem estagnadas e impossibilitadas

de qualquer desenvolvimento. A única ordem feminina ainda existente, a das Agostinianas,

continuava em sua penosa luta ante as inúmeras dificuldades frente ao Recolhimento de N. S.

da Anunciação e Remédios.

Ao fim do Império, o episcopado maranhense encontrava-se em estado de

ignorância religiosa em relação aos dogmas católicos, através da difusão de práticas

supersticiosas, sendo que os ritos fundamentais do catolicismo estavam sendo cada vez mais

raros nas práticas cristãs cotidianas das camadas populares. Estava preparado o cenário para o

desenvolvimento do protestantismo que se consolidará com o advento da República.

Não foram somente o liberalismo, maçonaria e protestantismo, os únicos que

contribuíram para o desgaste do clero católico. O padroado dificultou sobremaneira o

desenvolvimento de uma Igreja autônoma, sendo que esta instituição era tolhida em suas

decisões, tendo muitas vezes que se deparar com a ingerência estatal. A soma de outros

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fatores tais como: o número insuficiente de religiosos, a pouca erudição especialmente no

âmbito teológico, maior preocupação com fatores materiais que espirituais, o abandono da

função catequética, o desgaste moral, contribuíram para o declínio do poderio desta

instituição. No momento em que sofre as investidas de seus inimigos, ela já se encontra

enfraquecida internamente, não possuindo pressupostos consistentes para realizar um contra-

ataque de forma eficaz.

REFERÊNCIAS

FONTES PRIMÁRIAS:

JORNAIS:

SILVEIRA, D. Manoel Joaquim da. O ECCLESIASTICO, São Luís, n. 1-240, out. 1852 – set. 1862. Paginação irregular. SARAIVA, D. Luís da Conceição. A FÉ, São Luís, n.1-128, set. 1864 – jun. 1868. Paginação irregular.

BIBLIOGRAFIA:

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