UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE LETRAS DEPARTAMENTO DE LETRAS VERNÁCULAS OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS EM SALA DE AULA Profª. Dra. Nóris Eunice Wiener Pureza Duarte Resumo Partindo do pressuposto de que o professor de língua materna nos ensinos fundamental e médio reconhece o valor de trabalhar os gêneros discursivos (BAKHTIN, 2000) em sala de aula – considerando-os fenômenos históricos, estreitamente vinculados à vida cultural e social de uma determinada comunidade –, mas sente-se inseguro em direcionar sua prática a partir dessa perspectiva, pretende-se, com este artigo, apresentar uma proposta de transposição, para a realidade escolar, das orientações teóricas emanadas pelos PCNs quanto a essa abordagem no ensino de língua portuguesa. Além disso, não é recente a dificuldade dos docentes – expressa por eles em encontros e seminários – de compatibilizar a teoria apreendida nos cursos de licenciatura com a experiência vivida no dia-a-dia da escola, caracterizada por um hiato entre o que se diz e o que se faz. Palavras-chave: gêneros discursivos em sala de aula; jornal na aula de língua materna; gênero jornalístico. Introdução O ensino de língua portuguesa na escola deve, precipuamente, oportunizar o exercício da cidadania, e uma forma de colocar em prática esse exercício é possibilitar ao aluno o contato permanente com os textos que circulam nas diferentes esferas sociais pelas quais transita no seu cotidiano. O jornal, além de veicular o que acontece no momento, possibilita trabalhar diferentes gêneros discursivos, oferecendo, ao leitor, uma pluralidade de discursos capaz de representar a linguagem na sua forma mais legítima de interação. Através do jornal, tem-se um ensino significativo e interessante, uma vez que nele estão consubstanciados textos autênticos e de acordo com a realidade em que a escola está inserida. Neste trabalho, apresento sugestões de atividades que abrangem diferentes gêneros textuais identificados em um exemplar de Zero Hora, um dos jornais de maior circulação no Rio Grande do Sul. Cabe, ao professor, fazer a devida adequação desta proposta à classe que ministra a disciplina língua portuguesa, estabelecendo um cronograma que contemple diferentes graus de complexidade, para a formação de um conjunto homogêneo de conteúdos em torno de uma idéia central – o jornal. O percurso metodológico que dá início à proposta baseia-se em Faria (1991), e prevê as seguintes atividades: Trabalhando com a oralidade:

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS

FACULDADE DE LETRAS DEPARTAMENTO DE LETRAS VERNÁCULAS

OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS EM SALA DE AULA

Profª. Dra. Nóris Eunice Wiener Pureza Duarte Resumo Partindo do pressuposto de que o professor de língua materna nos ensinos fundamental e médio reconhece o valor de trabalhar os gêneros discursivos (BAKHTIN, 2000) em sala de aula – considerando-os fenômenos históricos, estreitamente vinculados à vida cultural e social de uma determinada comunidade –, mas sente-se inseguro em direcionar sua prática a partir dessa perspectiva, pretende-se, com este artigo, apresentar uma proposta de transposição, para a realidade escolar, das orientações teóricas emanadas pelos PCNs quanto a essa abordagem no ensino de língua portuguesa. Além disso, não é recente a dificuldade dos docentes – expressa por eles em encontros e seminários – de compatibilizar a teoria apreendida nos cursos de licenciatura com a experiência vivida no dia-a-dia da escola, caracterizada por um hiato entre o que se diz e o que se faz. Palavras-chave: gêneros discursivos em sala de aula; jornal na aula de língua materna; gênero jornalístico. Introdução O ensino de língua portuguesa na escola deve, precipuamente, oportunizar o exercício da cidadania, e uma forma de colocar em prática esse exercício é possibilitar ao aluno o contato permanente com os textos que circulam nas diferentes esferas sociais pelas quais transita no seu cotidiano. O jornal, além de veicular o que acontece no momento, possibilita trabalhar diferentes gêneros discursivos, oferecendo, ao leitor, uma pluralidade de discursos capaz de representar a linguagem na sua forma mais legítima de interação. Através do jornal, tem-se um ensino significativo e interessante, uma vez que nele estão consubstanciados textos autênticos e de acordo com a realidade em que a escola está inserida. Neste trabalho, apresento sugestões de atividades que abrangem diferentes gêneros textuais identificados em um exemplar de Zero Hora, um dos jornais de maior circulação no Rio Grande do Sul. Cabe, ao professor, fazer a devida adequação desta proposta à classe que ministra a disciplina língua portuguesa, estabelecendo um cronograma que contemple diferentes graus de complexidade, para a formação de um conjunto homogêneo de conteúdos em torno de uma idéia central – o jornal. O percurso metodológico que dá início à proposta baseia-se em Faria (1991), e prevê as seguintes atividades: Trabalhando com a oralidade:

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Iniciar a aula com uma conversa informal sobre a leitura de jornais (se os alunos leem, se não leem, se conhecem os jornais da cidade e os da capital, etc.). Dividir a turma em grupos de até quatro alunos e entregar um jornal a cada grupo ou a cada aluno. Solicitar que observem a estrutura do jornal, comparando-o com um livro (dimensões; qualidade do papel; numeração das páginas; espaços em branco – no jornal não há espaços em branco porque o espaço é caro, é preciso aproveitar ao máximo, pois o número de informações é grande). Enfatizar a apresentação do texto (no jornal, o texto é apresentado em colunas para facilitar a leitura rápida). Chamar atenção para o fato de que no mundo ocidental escrevemos da esquerda para a direita, horizontalmente. Há povos que o fazem da direita para a esquerda, como os árabes. Ou em linhas verticais, como os japoneses. Observar os assuntos tratados (geralmente o livro trata de um único assunto; o jornal aborda muitos, pois procura atingir um público amplo e variado). Salientar a importância da primeira página do jornal (ela deve prender a atenção do leitor). Discutir o valor atribuído ao jornal e ao livro (o jornal é “consumido”, isto é, suas informações são válidas para o dia, pois os fatos mudam, se transformam, e, no dia seguinte, já existem novas ocorrências). O livro tem um conteúdo mais estável. Identificar as diferentes seções do jornal: editorial, página de economia, classificados, página de esportes, política, etc.

Propor aos alunos um projeto de elaboração de um jornal mural com os textos produzidos por eles durante o tempo estipulado para o desenvolvimento desta proposta (pode ser um bimestre, ou mais, a critério do professor e na dependência do desempenho da turma). Após o reconhecimento do objeto de estudo e a concordância por parte da turma de desenvolver o projeto, enfocar a reportagem e a notícia como os primeiros gêneros a serem trabalhados. Proposta para trabalhar reportagem e notícia Perguntar aos alunos se conseguem estabelecer um paralelo entre reportagem e notícia. A partir das respostas da turma, mostrar as características desses gêneros, enfatizando a abrangência da reportagem e o aspecto pontual da notícia. A seguir, apresentar as seguintes propostas de atividades: 1. Escolher uma manchete do jornal, ler a notícia correspondente para depois relatá-la ao grupo (ou ao grande grupo). 2. Dessa notícia, tentar responder às seguintes perguntas: Quem? Onde? O quê? Como? Quando? Por quê? 3. Recortar diversas manchetes do jornal e colá-las em uma cartolina a fim de verificar a variedade dos diferentes caracteres tipográficos, tentando achar um motivo para a diversidade (importância da notícia; localização espacial, etc.). 4. Criar novas notícias para essas manchetes. Criar novas manchetes para algumas notícias. 5. Solicitar que cada aluno recorte uma notícia do jornal cujo assunto lhe tenha interessado e faça um comentário livre a respeito. Na apresentação escrita, a notícia comentada deve estar colada no papel em que foi redigido o comentário. O aluno apresentará seu ponto de vista ao grupo que poderá, ou não, concordar com as idéias do comentarista.

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6. Lançar um desafio para que a classe assuma fazer uma reportagem sobre um tema escolhido. (Texto adaptado de FARIA, Maria Alice. O jornal na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1991). Proposta para trabalhar enquete e entrevista Segundo Faria (1991), as enquetes e entrevistas são uma das formas mais correntes de se levantarem dados para notícias e reportagens. Por outro lado, elas dão ao professor de língua portuguesa uma série de oportunidades de trabalhar com a língua, atendendo a alguns conceitos contemporâneos sobre a linguagem e ensino de língua materna. Inicialmente é preciso distinguir enquete de entrevista. A enquete é a entrevista de grupo (reunião de testemunhos sobre determinado assunto da atualidade, geralmente promovida por um jornal, uma emissora de rádio, com a finalidade de se registrarem as diferentes opiniões do público ou do grupo de entrevistados e de se avaliar uma média de opiniões). A entrevista é a matéria jornalística apresentada sob a forma de pergunta e resposta. Segundo os especialistas, pode-se ter: a) entrevista noticiosa: a que procura extrair do entrevistado informações sobre fatos que resultarão em notícias; b) entrevista de opinião: a que levanta a opinião do entrevistado sobre o assunto pesquisado; c) entrevista de “ilustração”: aquela que levanta aspectos biográficos do entrevistado; que registra suas idéias, gostos, trajes, seu modo de falar, o ambiente em que vive, etc.; d) entrevista coletiva: aquela em que o entrevistado responde a perguntas de diversos repórteres de diferentes veículos de comunicação. A entrevista deve ser marcada com antecedência, informando-se o entrevistado sobre o assunto e a duração do encontro. O entrevistador deve primeiro levantar algumas informações sobre o entrevistado e o tema da entrevista. As entrevistas podem ser gravadas ou anotadas. Do ponto de vista do ensino, as anotações levam os alunos a praticarem a tomada de notas, atividade abandonada na escola e tão importante para o estudante. A gravação da entrevista dará ao professor um importante ponto de partida para o trabalho com a língua portuguesa, além de facilitar o levantamento de informações e de dados. Formas de entrevista: a) as palavras do entrevistado não são transcritas, mas integram-se as informações e dados em notícias ou reportagens. Quando for necessário apoiar-se no testemunho direto é que se transcrevem palavras do entrevistado, entre aspas; b) faz-se a transcrição das palavras do entrevistado. Neste caso pode-se apresentá-la exatamente como foi falada ou fazer alterações de linguagem, passando-se da expressão oral para a escrita, cortando-se repetições, apoios de fala, mas sem alterar-lhe o sentido; c) a entrevista é transformada num texto corrido, em que se reúnem as idéias, as informações, etc., emitidas pelo entrevistado.

As entrevistas gravadas, além de auxiliarem no levantamento de dados e informações para notícias e reportagens, podem dar ao professor um importante material

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para trabalhar alguns aspectos da língua portuguesa. Para tanto é preciso, inicialmente, fazer-se a transcrição escrita do material gravado. Embora este trabalho não precise revestir-se de todo rigor científico requerido em pesquisas específicas, não podemos abrir mão do uso de normas de transcrição previamente estabelecidas pela classe. Estas envolvem dois aspectos da fala: a pronúncia do entrevistado e as pausas e silêncio de sua emissão.

Feita a transcrição, passamos para a fase principal do trabalho: a passagem da modalidade oral para a modalidade escrita. Trata-se de um dos mais fecundos exercícios a ser feito hoje, uma vez que as formas orais de expressão estão cada vez mais usuais.

Outro exercício que se pode fazer com a transcrição de entrevistas diz respeito ao registro de elementos que evidenciam classes sociais, níveis de escolaridade, pronúncias regionais, etc. O professor pode trabalhar com um levantamento das semelhanças e diferenças da língua do entrevistado em relação à norma culta do português veiculada pela escola, como por exemplo:

- diferenças fonéticas (plantar/prantá); - diferenças morfológicas (concordâncias em geral); - diferenças semânticas (vocabulário ou emprego de palavras diferentes para a

mesma coisa); - diferenças sintáticas (as pessoa sai pra diverti/ as pessoas saem para se

divertir). Essa atividade será de grande proveito para o professor discutir com os alunos os

diferentes dialetos do português brasileiro. Ele poderá entrar na discussão da valorização de todos os dialetos do país, que é a tendência atual da linguística, influenciada pela expansão da sociolinguística E poderá ainda desenvolver com os alunos uma mudança nos conceitos tradicionais de certo-errado, substituídos pelo de linguagem adequada-inadequada ao contexto, ao falante, etc.

Os diferentes assuntos que se prestam a essa atividade são inesgotáveis, entretanto, algumas situações poderão dar oportunidade para enquetes e entrevistas, como é o caso das eleições, de leis recentemente implantadas, de decisões governamentais ou mesmo tomadas por dirigentes próximos aos estudantes, como direção de escola, por exemplo. As entrevistas poderão ser realizadas com pessoas da família dos alunos, com figuras da comunidade, como o carteiro, o jornaleiro, ou com personalidades que se destacam na região em que a escola se insere (prefeito; vereadores; secretários de governo, etc.). Exemplos de perguntas a serem formuladas em entrevista com um carteiro: 1.Quantos quarteirões você precisa andar para fazer sua distribuição das cartas? Em quantas horas termina? 2. Quanto pesa o volume de correspondência antes de começar a distribuição? 3. Além de entregar a correspondência a domicílio, que outras tarefas você faz? 4. Qual é o salário de um carteiro? Além do salário, fornecem roupa e calçado? 5. O trabalho é executado da mesma maneira independentemente do clima? Como é feita a distribuição nos dias de chuva? Há algum modo de locomoção? 6. Por que, às vezes, as cartas se perdem? 7. Por quais motivos os carteiros podem sofrer sanções no exercício de sua profissão? 8. Do que é que você mais gosta em sua profissão? O que o aborrece? 9. O que mais teme? Você gostaria de relatar alguma experiência interessante? 10. Você está contente com o seu trabalho? Como você acha que ele poderia se tornar menos cansativo?

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Terminada a entrevista, o professor discutirá com os alunos se era essa a idéia que tinham sobre essa profissão. (Texto adaptado de FARIA, Maria Alice. O jornal em sala de aula. São Paulo: Contexto, 1991). Proposta para trabalhar texto publicitário Em jornais e revistas, outdoors, televisão, cinema, rádio, observamos a presença maciça de textos que procuram nos vender alguma coisa: um produto, uma idéia, uma causa social. São os textos publicitários. Embora variem muito na forma e no conteúdo, mantêm sempre um mesmo objetivo: persuadir o leitor por meio da publicidade. Os textos publicitários se definem por procurarem despertar no interlocutor o desejo de comprar algo, são, por essa razão, considerados persuasivos. Estabelecem uma interlocução direta e valem-se de diferentes recursos da linguagem para conseguir a adesão do leitor àquilo que vendem ou sugerem. Diferentes gêneros discursivos exemplificam essa estrutura: anúncios (em revistas, jornais e outdoors, televisivos e radiofônicos), panfletos, folhetos, fôlderes, etc. (Texto adaptado de ABAURRE, Maria Luiza M. e ABAURRE, Maria Bernadete M. Produção de texto: interlocução e gêneros. São Paulo: Editora Moderna, 2007).

Ao responder às seguintes questões, o aluno deverá ficar com a percepção do que são textos publicitários: 1. Em que contexto os textos publicitários circulam e qual é o perfil de seus leitores? 2. Quais são as suas características estruturais? (texto verbal/não verbal) 3. Qual é a sua finalidade? 4. Qual é a importância do título em um texto publicitário? 5. Como é a linguagem utilizada na sua elaboração? 6. Por que a interlocução com o público-alvo deve ser claramente estabelecida? 7. Qual é a importância do modo imperativo para a persuasão? Classificado O anúncio classificado é um pequeno texto (para anunciar a venda, compra, troca ou contratação de um serviço) de responsabilidade do leitor ou do anunciante. É um texto enunciativo (de anúncio), ao lado de outros, agrupados em informativos, de opinião, literários e de entretenimento. O professor pode pedir que os alunos escolham um anúncio classificado do jornal em que estão trabalhando, ou distribuir entre os grupos anúncios previamente selecionados. Após a leitura dos textos (explicar que, apesar do tamanho, um anúncio classificado é um texto autêntico, pois circula nos meios de comunicação e tem uma função definida), propor as seguintes questões:

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1. De onde foi retirado o texto? 2. Quem o redigiu? 3. Qual o objetivo do redator? 4. Que objeto está sendo anunciado? 5. Esse objeto está sendo anunciado para compra ou venda? Justifique sua resposta. 6. Por que você acha que o anunciante quer comprar (ou vender) esse objeto? 7. Você compraria o que está sendo ofertado? O que faria com ele? 8. Você teria condições de vender aquilo de que o anunciante necessita? Por que venderia? 9. Quais as características desse objeto explicitadas no anúncio? 10. Redija um texto anunciando esse produto, mas de forma detalhada. 11. Imagine um objeto e crie um classificado para o jornal, tentando convencer o leitor a comprá-lo. Proposta para trabalhar a página do clima de Zero Hora Mais um texto a ser trabalhado em sala de aula, a página do clima de Zero Hora possibilita desenvolver no aluno a capacidade de observação para, a partir daí, conseguir estabelecer relações, inferências, analogias, com vistas a interpretar os dados constitutivos das informações ali apresentadas. Primeiramente o professor deverá pedir que os alunos localizem a página da meteorologia e solicitar que façam um levantamento das informações nela explicitadas. Pedir que elaborem uma listagem das informações (Ex: temperatura, fuso horário, precipitação de chuvas, horário do sol, fases da lua, etc.). Depois, poderá apresentar as seguintes perguntas: 1. Qual o objetivo do texto? 2. Quem é o autor? 3. Para quem é dirigido? 4. Qual a utilidade dessa página? 5. De que região são prestadas as informações? 6. Quais os estados que constituem essa região? 7. Que outros países são referidos no texto? 8. Identifique as legendas explicando seu significado. 9. Qual o critério utilizado na listagem das cidades gaúchas, brasileiras e estrangeiras? 10. Que informações são apresentadas sobre a lua? 11. Qual a informação que você considerou mais interessante? Por quê? 12. Qual a condição do tempo ideal para você? (vento, chuva, sol, calor, frio...). Por quê?

Depois dessas questões, o professor poderá criar problemas para que os alunos tentem resolvê-los. Por exemplo: se em Pelotas são 13horas, que horas serão em Orlando? Qual a cidade mais fria no estado durante o dia de hoje? E no Uruguai? E em Santa Catarina? E a mais quente? Além das imagens, o professor poderá enfocar o texto verbal que também está presente na página. Para isso, uma boa sugestão é trabalhar o vocabulário, por exemplo. As expressões entrar em declínio; entrar em elevação; o calor é amenizado; aumento

de nebulosidade podem ser usadas para produções textuais que pretendam falar sobre as

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condições do tempo. Também é interessante verificar o significado de determinadas palavras, como meteorologia. Cada grupo poderá criar novas páginas meteorológicas ou pesquisar na internet sobre as previsões para os próximos dias. Proposta para trabalhar aspectos linguísticos do texto sobre o clima

Os aspectos lingüísticos a serem explorados devem visar, prioritariamente, à compreensão do texto. Não há sentido trabalhar classes gramaticais e funções sintáticas apenas com o objetivo de identificar essas categorias, sem que se reconheça a função por elas desempenhada. À luz da lingüística textual, é importante que o leitor perceba a tessitura do texto e os elementos que concorrem para o estabelecimento da coerência e da coesão. Assim, poderá entender o projeto do autor e cooperar na construção do sentido do texto. Fenômenos como a anáfora, a catáfora, a substituição devem ser compreendidos pelo aluno de forma que ele possa recuperar as informações fornecidas ao longo da leitura para a compreensão global e específica da mensagem. Como propostas práticas, o professor deve: 1. Fazer, primeiramente, a leitura oral do texto. 2. Enfatizar as palavras-chave do texto. 3. Solicitar que os alunos expliquem o sentido de algumas palavras ou expressões, como por exemplo: predomina; propagação; áreas de instabilidade; precipitações.

4. Explicar subentendidos e pressupostos pedindo que explicitem o sentido de determinadas palavras ou expressões, tais como: o tempo continua seco; as máximas voltam a subir; as máximas superam 30 graus; ainda ocorre nebulosidade. Chamar atenção para as palavras continua, voltam, superam e ainda. 5. Solicitar que elaborem pequenos parágrafos usando esse recurso lingüístico. 6. Assinalar no texto determinadas palavras e pedir que indiquem o que está sendo referido. Por exemplo: Com isso, as temperaturas diminuem um pouco na quinta-feira... (O aluno deverá explicar a expressão com isso dizendo que se refere à propagação de uma frente fria ); Assim, o sol aparece entre muitas nuvens... (Assim se refere ao afastamento de uma frente fria que causou chuva no estado); ... por conta disso, as máximas não sobem muito nessa área. (disso se refere à maior nebulosidade). 7. Solicitar que especifiquem a relação estabelecida por determinados conectores, como por exemplo: mas na sexta-feira o calor volta a predominar; e as máximas voltam a subir; e, por conta disso, as máximas não sobem muito; No entanto, ainda deixa muitas nuvens... 8. Pedir que os alunos digam quem são os agentes de determinados verbos, como: continua seco; predomina; se elevam; causa aumento; diminuem; volta a predominar. 9. Mostrar a função desempenhada pelo relativo que (... com máximas que superam...; A frente fria que causou chuva....). 10. Selecionar expressões que indicam temporalidade e/ou localização e solicitar que os alunos as identifiquem, como por exemplo: no Rio Grande do Sul; no Interior; no sul;

no leste; a partir de amanhã; na quinta-feira; na sexta-feira; nos últimos dias; entre

muitas nuvens; a partir do oeste; amanhã; no domingo; No nordeste do estado; no começo da próxima semana.

Proposta para trabalhar receita culinária

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Por constituírem um dos gêneros discursivos presentes no cotidiano de todos nós, as receitas culinárias se apresentam como um instrumento muito útil para trabalhar a língua portuguesa de forma interativa em sala de aula. Com elas o professor pode ir além do texto impresso, solicitando do aluno outras atividades que muito contribuirão na construção do conhecimento. A cópia, por exemplo, é uma atividade extremamente eficaz para fixar aspectos ortográficos, desenvolver o senso estético e estimular a curiosidade sobre outras culturas. A confecção de um livro de receitas fará com que os alunos busquem sugestões em seu ambiente familiar para socializá-las com os colegas. Essa atividade requer pesquisa de propostas interessantes e viáveis, assim como vai exigir uma reprodução cuidadosa e detalhada do texto para sua efetiva consecução. Para a realização dessa atividade, o professor deve, primeiramente, pedir que os alunos verifiquem se há a seção de gastronomia no exemplar do jornal que lhes foi entregue (isso porque há dias específicos da semana em que aparecem assuntos sobre culinária). A partir da identificação do texto, propor as seguintes questões: 1. De onde foram tirados os textos? 2. Para que público se destinam? 3. É receita de doce ou de salgado? Que elementos do texto justificam essa resposta? 4. Alguma marca permite identificar a origem do prato proposto? (se é português, italiano, árabe...) 5. Os ingredientes são comuns ou sofisticados? Exemplifique. 6. Para quantas pessoas está prevista a receita? 7. Há paralelismo na “maneira de fazer”? (as orientações mantêm a mesma estrutura; todos os verbos estão no mesmo tempo – imperativo ou infinitivo; ou na mesma pessoa – tu ou você?) 8. Reescreva a “maneira de fazer”, mudando o tempo (ou a pessoa verbal). 9.Como você classificaria a maneira de fazer esse prato? Fácil, difícil... 10. Você gostaria de saboreá-lo? Por quê? Outra proposta para trabalhar com a produção textual é pedir que os alunos descrevam uma receita que conhecem, ou, ainda, que criem um prato novo. Também se pode sugerir que os alunos façam uma receita de “gente”. Escolham ingredientes pertinentes (bondade, lealdade, companheirismo, amor, amizade, etc.) e criem uma pessoa. Por fim, pode ser proposta uma pesquisa a respeito de pratos de diferentes culturas, com as respectivas características do povo, ou uma entrevista com algum “chef” conhecido. Caso a escola tenha condições, os alunos poderão, com a orientação do professor, colocar em prática alguma receita interessante, anotando, para tal, todos os passos percorridos (uma maneira prática de trabalhar a descrição de processo). Proposta para trabalhar tira humorística As tiras humorísticas são representações através de imagens em que se pretende fazer uma crítica engraçada a alguma idéia, situação ou pessoa. Para entender o humor, é preciso reconhecer aquilo que está sendo criticado e o porquê da crítica, portanto, é necessário conhecimento de mundo e, principalmente, conhecimento compartilhado sobre a sociedade em que se vive. As tiras são textos autênticos, ricos em subentendidos, inferências, ironias, implícitos, ambiguidades que exigem, quase

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sempre, uma leitura nas entrelinhas, isto é, uma percepção daquilo que, muitas vezes, não está dito, mas sugerido. Estes recursos usados pelos humoristas requerem uma prontidão do leitor para criar o significado do texto, portanto são extremamente úteis nas aulas em que o professor deseja estimular o raciocínio crítico e reflexivo do aluno.

As tiras jamais devem ser usadas para trabalhar fatos linguísticos da perspectiva meramente gramatical, com nomenclatura e classificações. Percurso metodológico: 1. Explicar o que são tiras humorísticas e onde podem ser encontradas – jornais, revistas ou até mesmo em edições especiais compostas por esse tipo de texto (enfatizando que o Diário Popular e a Zero Hora mantêm diariamente um espaço para humoristas, como André Macedo, Iotti e outros). Perguntar se a turma gosta de trabalhar com o humor e se costuma ter contato com o lúdico, o engraçado, o divertido... 2. Distribuir as tiras individualmente e propor as seguintes questões: a) Identifique seu texto dizendo o nome da tira e o nome do humorista (autor). b) Quem são os personagens? c) Qual é o fato engraçado que acontece na tira e provoca o humor? d) Esse fato tem relação com alguma idéia, situação ou pessoa que não aparece na tira? e) Copie as palavras do balão que define o humor (nem sempre isso é possível, pois muitas vezes o humor é expresso por uma atitude, sem palavras). f) Conte para o colega com quem faz dupla um fato engraçado ocorrido com você ou que você tenha presenciado. (Os fatos mais engraçados podem ser lidos para o grande grupo). AMBIGUIDADE

A ambiguidade é um tema recorrente nas tiras humorísticas, dada a pluralidade de sentidos de grande número de palavras, permitindo, assim, a duplicidade de interpretação. Desse modo, o professor pode aproveitá-las para trabalhar o vocabulário, a polissemia (com a exploração das metáforas e das metonímias), os jogos de sentido (“deslizamentos” de sentido), a homonímia, as substituições, tornando o ensino de língua portuguesa significativo e interessante. Para trabalhar com a ambiguidade, pode-se propor ao aluno as seguintes questões:

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1. Pela leitura da tira, pode-se perceber que existe uma palavra (ou expressão) responsável pelo humor. Que palavra é essa? 2. Por que essa palavra causou humor? 3. Quando ela foi pronunciada, qual a intenção do emissor? 4. Como ela foi compreendida pelo interlocutor? 5. De que forma poderia ser eliminada essa ambiguidade? 6. Dê exemplos de outras ocorrências de ambiguidade. IMPLÍCITOS Embora alguns teóricos distingam, no estudo com os implícitos, as noções de pressupostos e subentendidos, para fins didáticos não há necessidade dessa distinção. Os implícitos são elementos que, apesar de estarem subentendidos no texto, podem ser percebidos através de uma leitura atenta e de um raciocínio crítico. Esse recurso é muito explorado nas tiras, uma vez que permite ao autor “dizer sem ter dito”, ou seja, fica na capacidade do leitor a compreensão do texto. Exemplos de questões para trabalhar com os implícitos: 1.Leia a tira abaixo e, levando em conta que ela traz implícita uma crítica, responda: a) Que resposta estaria de acordo com a expectativa? b) Que crítica está implícita na tira?

2. Em textos humorísticos, é muito comum que o significado implícito seja mais expressivo do que o explícito. Após lê-la atentamente, explique a crítica implícita que a tira contém.

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3. O humor da tira abaixo está no inusitado da resposta que, além de ir de encontro à expectativa provável, traz implícita uma opinião.

a) Que resposta estaria de acordo com essa expectativa? b) Que opinião está implícita no texto? 4. Para compreender o humor na tira abaixo, é necessário inferir algo que não está explícito no texto. Identifique aquilo que exige essa inferência. Explicite o que deve ser entendido nas entrelinhas.

Proposta para trabalhar piada Dentro da concepção de ensino significativo, o trabalho com os textos humorísticos propicia a depreensão de aspectos que subjazem à superfície textual. Dessa forma, a interpretação de uma piada desenvolve a capacidade de compreender o que não está explícito no texto, oportunizando a reflexão sobre problemas sociais, preconceitos, aspectos culturais que, muitas vezes, servem de material para a construção do humor. O professor pode solicitar que os alunos, ao localizarem o texto humorístico na seção “Almanaque Gaúcho”, da Zero Hora, leiam-no e, depois, contem aos colegas do grupo, ou, ainda, que o grupo eleja a piada mais engraçada para relatar à classe. Tomando como exemplo a piada reproduzida a seguir, o professor poderá explorar o preconceito de que as mulheres não são tão inteligentes quanto os homens, conduzindo a reflexão no sentido de os alunos perceberem o material constitutivo do humor.

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Celular

O marido estava intrigado com o comportamento da mulher depois que ela trocara de celular. Todos os dias, ela chegava em casa e colocava o aparelho sobre a máquina de lavar, nos fundos da residência. Depois de alguns dias, não se conteve e quis saber por quê. – Ora, querido – responde a mulher com a autoridade de quem sabe o que faz – é que eu não gosto de deixar o celular fora da área de serviço!

(Zero Hora, 20/04/2009) Como já foi visto na proposta para trabalhar com tiras humorísticas, esses textos podem ser úteis, também, na compreensão da língua e de seu funcionamento. Nesse sentido, diferentes aspectos linguísticos podem ser explorados de forma lúdica e significativa, tais como a variação linguística, a ambiguidade, os implícitos, os referentes, a polissemia, as marcas discursivas e outros recursos oferecidos pela língua na tessitura do humor. Questões do tipo: O que produz o efeito de humor no texto? ou Em que o autor se baseou para construir o humor no texto? cabem como proposta para um trabalho com textos humorísticos. Proposta para trabalhar horóscopo Iniciar a aula com uma conversa informal, perguntando aos alunos se acreditam em horóscopos; se leem as previsões; se conhecem outras formas de prever o futuro; se gostariam de conhecer seu futuro e o porquê; o que fariam no presente se fosse possível prever os próximos dias, etc. Conduzir o assunto para as crendices e superstições. Pedir que localizem no jornal a parte referente ao horóscopo e escolham um signo. A seguir, propor as seguintes questões: 1. De onde foi tirado esse texto? 2. Quem é o autor? 3. A que período do ano corresponde o signo escolhido? 4. A que estação do ano está relacionado esse signo? 5. As previsões que ele apresenta são boas ou ruins? 6. Há algum conselho explicitado nessas previsões? Qual? 7. Redija uma previsão para um colega de quem você gosta. Exponha oralmente. 8. O que significa a palavra astrologia? E astronomia? Há alguma relação entre elas? 9. Pergunte o signo de um colega e verifique se as previsões estão de acordo com as características que você conhece dessa pessoa. 10. Compare as previsões para o signo escolhido nos dois horóscopos apresentados no jornal. Liste as semelhanças e as diferenças.

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11. Você é supersticioso? Cite algumas superstições que você conhece. Proposta para trabalhar carta Após os alunos identificarem a seção “Palavra do leitor”, o professor oportunizará a compreensão de que ali estão as cartas enviadas à redação do jornal expondo o ponto de vista dos leitores sobre determinados assuntos abordados em edições anteriores. Pela exiguidade de espaço, apenas foi reproduzido o assunto abordado pelo missivista, excluindo os demais elementos constitutivos do gênero carta (data, vocativo, introdução e fechamento). Como proposta de trabalho, pode-se pedir que os alunos escolham uma daquelas manifestações para responderem às seguintes perguntas: 1. Identifique o autor da carta, sua profissão e a cidade de onde se origina. 2. Explicite o assunto que é abordado e o ponto de vista do leitor. 3. Você concorda com esse ponto de vista? Justifique.

Outra possibilidade é a turma escolher um destinatário real (diretor da escola, prefeito, governador ou outra autoridade) e escrever-lhe, abordando determinado problema comum a todos. O professor pode, também, estabelecer um intercâmbio de correspondência com uma turma na própria escola. O importante é criar um interlocutor real e providenciar o encaminhamento das mensagens. Para isso, deverá ser trabalhado o endereçamento e o envio da correspondência. Uma visita a uma agência dos Correios viria a enriquecer a experiência.

A proposta a seguir também oportuniza a escritura de dois textos. Vejamos: Primeiramente o professor distribui aos alunos (em grupos) uma carta com conteúdo semelhante ao sugerido abaixo: Pelotas, 03 de novembro de 2008 Prezado Doutor Mendonça Depois de um longo tempo estudando no estrangeiro, ao retornar a esta cidade encontro minha família enfrentando sério problema de relacionamento com um de seus membros. Imagine o Sr. que meu (minha) _____________________ , nos últimos meses, vem tendo, sistematicamente, o mesmo sonho todas as noite, causando estranheza entre aqueles que com ele(a) convivem.

Conhecendo sua capacidade profissional e a amizade que nos une, gostaria que fizesse uma interpretação do sonho enviado em anexo e nos enviasse uma orientação de como agir diante desta inusitada situação.

Certo(a) de contar com a especial atenção de um especialista em distúrbios comportamentais, agradeço antecipadamente sua colaboração para tentarmos resolver esse impasse com que estamos nos defrontando. Atenciosamente

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Fulano de tal

A seguir, pede que os grupos redijam um texto relatando o sonho da pessoa para quem se está buscando ajuda. Após, troca os relatos entre os grupos e pede, novamente, outro texto, contendo a orientação do médico.

Como se pode perceber, a habilidade de escrita será exercitada mais de uma vez na mesma proposta, possibilitando desenvolver a criatividade dos alunos através de uma atividade lúdica. Proposta para trabalhar crônica Segundo Brait, Negrini e Lourenço (Aulas de redação, 1991, p.121/2), a crônica, como gênero discursivo, é definida, tradicionalmente, como “o relato no qual os fatos são registrados na ordem de sua sucessão, sem interpretação de suas causas e conseqüências; gênero histórico cultivado durante a Idade Média e o Renascimento, na Europa”. No sentido atual, é um “novo tipo de relato que se desenvolveu no Brasil, em meados do século XIX, com o Romantismo e o desenvolvimento da imprensa.” Também pode ser considerada como uma “seção de comentários dos fatos marcantes da semana, importando menos o fato em si do que as considerações do cronista – em geral, um escritor que também se dedicava ao jornalismo; gênero híbrido que oscila entre o jornalismo e a literatura; gênero híbrido situado na tensão entre a função referencial e a função poética”. Ainda conforme os mesmos autores, a crônica apresenta as seguintes características:

a) “Características jornalísticas: - apoio num fato; - produção apressada, sujeita até mesmo às exigências de tamanho, em virtude

da diagramação. O cronista tem um determinado espaço a preencher (sua coluna), durante alguns dias da semana;

- produção detalhada, sem compromissos com a posteridade. b) Características literárias:

- fato como pretexto, ponto de partida de uma reflexão; - enfoque pessoal do cotidiano, filtrado pelas emoções do cronista; - artesanato da palavra, preocupação com a invenção; - descompromisso com a lógica e a estrutura rígida dos textos jornalísticos.” “A classificação das crônicas tem valor bastante reduzido; sua finalidade é meramente didática:

a) Crônica-comentário: - elaborada em 1ª pessoa; - ausência de uma forma fixa de composição;

- linguagem direta, denotativa, próxima da jornalística, despojada de artesanato, visando à compreensão imediata; - tom irônico, sarcástico, bem ou mal humorado; - acontecimentos em 1º plano, acompanhados de reflexão.

b) Crônica lírica:

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- elaborada em 1ª pessoa; - ausência de uma forma fixa de composição; - assuntos diferentes, ligados por associação livre; - organização pouco rígida pela ausência de um eixo centralizador dos assuntos; - tradução emotiva da realidade exterior e interior; - linguagem sentimental, e coloquial, próxima do leitor.

c) Crônica-narrativa:

- elaborada em 1ª ou 3ª pessoa; - presença da narração (exposição e diálogo) como forma de composição

predominante; - presença de um eixo: o fato que gera a história, desenvolvido em uma ou mais

situações; - predomínio de uma história leve, divertida, de ritmo rápido, com personagens

do cotidiano; - final inesperado; - humor, ironia, crítica aos costumes.”

Para que o trabalho com a crônica tenha, realmente, uma abordagem linguística, o professor deve explorar não só os aspectos sócio-históricos e culturais do texto, tentando conduzir a reflexão com vistas à construção do significado, mas também os aspectos linguísticos, como por exemplo, os mecanismos de coerência e coesão, os recursos apresentados pelo autor na estrutura do texto e alguma particularidade gramatical importante para a compreensão da mensagem. As características da linguagem, como marcas de oralidade, expressões próprias de determinada esfera social ou região são muito interessantes de serem abordadas. Pode-se retirar do texto alguma passagem que possibilite o trabalho com os conteúdos determinados pela escola, tais como concordância verbal e nominal, regência, etc. O que o professor não pode fazer é restringir o trabalho apenas ao conteúdo temático do texto, desprezando sua construção composicional e seu estilo.

Também aqui os alunos devem identificar uma crônica no jornal em que estão trabalhando, ler o texto em voz baixa e relatá-lo ao grupo. De comum acordo, escolhem a mais interessante e relatam à classe. Após comentar os diversos assuntos tratados e oportunizar uma reflexão sobre eles (tendo em vista que geralmente tratam de assuntos do cotidiano), o professor poderá reproduzir um texto em xérox para facilitar o trabalho com os aspectos linguísticos.

Da crônica abaixo, retirada do jornal Zero Hora, o professor pode propor as seguintes questões: 1. Qual o assunto abordado no texto? 2. Como o cronista se coloca em relação a esse assunto? 3. O título permite alguma antecipação do que vai ser abordado no texto? Justifique sua resposta. 4. Cite três argumentos usados por Sant’Ana para defender seu ponto de vista. 5. A quem se refere a expressão “como um Dom Quixote” usada pelo cronista e por que a comparação? 6. Por que foram usadas exclamações nos 2º e 3º parágrafos? 7. Justifique as aspas empregadas no texto.

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8. O que significa a expressão “conversa fiada”? 9. A quem se referem os termos: seguinte fato”; “essa exploração”; “Isso me orgulha...”. 10. O que pode ser depreendido da expressão Outra conversa fiada...? 11. Qual a ideia expressa pelos seguintes nexos: se estes preços (...) fossem cobrados nos EUA...; E o presidente da Petrobras veio com a conversa fiada...; ... portanto um metro cúbico, ...; ... enquanto que mil litros de gasolina...; ... para se ressarcir do tempo...”. Agora tem confissão Paulo Sant’Ana (Zero Hora, 17/04/2009) Quero compartilhar com meus leitores a minha imensa alegria ao ver estampada no jornal O Globo de ontem a seguinte manchete: “Governo avalia baratear diesel e depois gasolina”. Por quantos dias consecutivos, como um Dom Quixote, esta coluna se bateu pela redução dos preços dos combustíveis! Por quantos dias suportei o recebimento de inúmeros e-mails, sei lá de onde partidos, criticando minha posição de defesa dos consumidores e da economia brasileira ao classificar de espoliativos os preços cobrados pela Petrobras da sociedade brasileira! Pois agora, na confissão de que os preços são exagerados, vem a notícia redentora, exposta nos jornais: “Ciente de que o preço do diesel está elevado, com impactos sobre o frete e os custos do setor produtivo, o governo formou uma comissão de técnicos da Petrobras e dos ministérios da Fazenda e Minas e Energia para avaliar uma redução dos valores do diesel e da gasolina”. Com que alegria e com que orgulho esta coluna recebe esta notícia. Não sei como pude ter a felicidade de perceber que os consumidores brasileiros estavam sendo vítimas de uma espoliação nos preços dos combustíveis. O que mais me alarmou é que o diesel está custando cerca de 45% mais no Brasil que nos EUA. Notem bem, são 45% a mais que pagamos do que os norte-americanos, em dólar. E pagamos mais que os norte-americanos, em dólar, 57% na gasolina. Aí é preciso alertar os leitores para o seguinte fato: o salário mínimo nos EUA é cerca de 10 vezes maior que o nosso salário mínimo. O que quer dizer que os preços dos combustíveis para nós são pesadíssimos, insuportáveis, se estes preços que cobramos aqui no Brasil fossem cobrados nos EUA, viria abaixo a economia norte-americana e lá se instalaria um caos econômico-financeiro maior que o da atual crise mundial. São indefensáveis os preços que a Petrobras está cobrando dos brasileiros. E o presidente da Petrobras veio com a conversa fiada de que a gasolina custa mais barato que a água engarrafada. Conversa fiada, escondendo que mil litros de água do Dmae, portanto um metro cúbico, custam menos de R$ 3, enquanto que mil litros de gasolina saída da refinaria custam mais de R$ 1 mil. Outra conversa fiada, pura conversa fiada, é de que a Petrobras tem de manter estes preços altos de agora nos combustíveis para se ressarcir do tempo em que o barril de petróleo andou custando até US$ 140 e ela não corrigiu os preços aqui no Brasil. Conversa fiada, quando o barril petróleo custava até US$ 140 (agora está custando menos de US$ 50), a Petrobras não comprou nenhum barril de petróleo àquele preço, pelo simples fato de que o Brasil não importa petróleo.

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Então não há justificativa para essa exploração do consumidor brasileiro. O que a Petrobras tem de fazer é cobrar preços justos pelos combustíveis. E repassar para os brasileiros os benefícios do Brasil ser autossuficiente em petróleo. E não castigar os brasileiros em plenos festejos dessa autossuficiência. Folgo em saber que o governo reconhece que está cobrando demais pelos combustíveis. E que vai baixar os preços. Tem de baixar. De qualquer forma, gostaria agora de saber onde estão os que me xingaram por e-mails por ter dado este flagrante de apropriação indébita na Petrobras. Esta coluna foi sozinha no Brasil a perceber que a Petrobras estava se locupletando à custa dos consumidores e da retração da atividade econômica nacional. Isso me orgulha muito. E me dá cada vez mais crédito perante meus leitores. Proposta para trabalhar artigo O artigo é um texto assinado que expressa a opinião do articulista sobre um assunto atual e/ou polêmico, tendo como objetivo convencer o interlocutor de suas idéias, de seus valores, na tentativa de inculcar nele seu ponto de vista sobre a questão em foco. Identificados os textos nos jornais, o professor pode propor que os grupos escolham aquele artigo cujo assunto interessa à maioria dos alunos e, daí, tomar a mesma iniciativa em relação à turma. Essa proposta justifica-se pela dificuldade em trabalhar os diferentes assuntos abordados, ao mesmo tempo. Após a leitura do texto, em voz alta, pelo professor, poderão ser propostas as seguintes questões com o objetivo de identificar e caracterizar este novo gênero em estudo. 1. Cite duas diferenças entre o texto lido e aqueles trabalhados anteriormente (notícia, crônica, tira humorística, classificados...). 2. Escolha, das palavras abaixo, uma que caracterize o artigo lido pela professora: ( ) informativo ( ) apelativo ( ) literário ( ) de opinião (opinativo) ( ) de entretenimento 3. Explicite duas idéias que podem ser depreendidas do texto. 4. Diga se o produtor do texto conseguiu convencê-lo de seu ponto de vista. Justifique sua resposta.

Com essas questões, o professor poderá estabelecer as características discursivas desse gênero que o diferenciam de outros. Em se tratando de aula de língua materna, o trabalho não pode ficar restrito à sociologia do texto, isto é, ao assunto abordado e suas implicações. Após a reflexão inicial, o professor deve partir para a análise linguística, mostrando as relações estabelecidas entre os enunciados, as marcas características do gênero em estudo e os recursos utilizados pelo autor na produção textual. Para isso é necessária a distribuição de cópias xerografadas aos alunos.

Questões propostas: 1. Qual a pessoa do discurso utilizada pelo autor do artigo? 2. Qual o tempo verbal predominante? 3. O título permite antecipar o assunto do texto? Justifique.

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4. Que relação entre os enunciados é estabelecida pelas expressões sublinhadas? (aqui o professor deve sublinhar alguns nexos a serem trabalhados naquele momento, de forma que os alunos percebam a tessitura do texto). 5. A quem se referem os termos ou expressões seguintes? (o professor deverá mostrar o valor da referência no encadeamento discursivo, chamando a atenção para os anafóricos e catafóricos).

Pelas respostas dos alunos, o professor poderá, juntamente com a classe, sistematizar esse conhecimento, isto é, organizar lembretes importantes para uma futura produção textual do gênero e o consequente domínio daquele aspecto lingüístico (também entram nessa observação aspectos relativos à pontuação, ortografia, concordância e regência).

Para o trabalho com a produção textual, o professor pode elencar uma série de assuntos do interesse da turma e escolher aquele que obtiver maior número de votos. Nesse sentido, é imprescindível que os alunos dominem o assunto escolhido ou que pesquisem a respeito antes do planejamento da escrita. A atividade de escrita prevê etapas anteriores, como por exemplo:

1. proceder a delimitação do assunto; 2. determinar o objetivo a ser alcançado com o texto (o que eu quero com o meu texto? mostrar, classificar, denunciar, refletir, relatar, comentar, comparar, explicar...); 3. listar um número razoável de argumentos que sustentem o ponto de vista exposto; 4. redigir uma primeira versão do trabalho; 5. proceder a reescritura do texto, dando-lhe o acabamento final. Proposta para trabalhar editorial Como último gênero a ser trabalhado, dentro dos textos de opinião o editorial é um texto que expressa o ponto de vista do jornal sobre determinado assunto. Através dele é revelada a linha político-ideológica da instituição jornalística. Assim, pode ser abordado na mesma perspectiva com que foi visto o artigo. Conclusão Estas sugestões não têm a pretensão de ter trazido alguma novidade que outros pesquisadores já não tenham referido. O que se pretende com este trabalho é mostrar como é possível transformar as aulas de língua materna em um espaço no qual o aluno se sinta capaz de encontrar significado para sua aprendizagem. Para tal, são apresentados exemplos de atividades que têm o texto como suporte básico para o desenvolvimento da competência comunicativa do aluno. Além disso, não foram preparados com o rigor científico de algum modelo teórico, mas procurando uma forma de oportunizar o uso efetivo da língua, em situações reais de interação.

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