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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO Cícero Alcebíades Costa A Responsabilidade Civil do Estado por Omissão – Epidemia De Dengue FLORIANÓPOLIS 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

Cícero Alcebíades Costa

A Responsabilidade Civil do Estado por Omissão – Epidemia De Dengue

FLORIANÓPOLIS 2008

2

Cícero Alcebíades Costa

A Responsabilidade Civil do Estado por Omissão – Epidemia De Dengue

Monografia apresentada ao Curso

de Graduação em Direito da

Universidade Federal de Santa

Catarina, como requisito à obtenção

do grau de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: Professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo

3

FLORIANÓPOLIS 2008

Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Ciências Jurídicas Colegiado do Curso de Graduação em Direito

TERMO DE APROVAÇÃO

A presente monografia, intitulada A responsabilidade civil do Estado por omissão – epidemia de dengue, elaborada pelo acadêmico Cícero Alcebíades Costa e aprovada pela Banca Examinadora composta pelos membros abaixo assinados, obteve aprovação com nota __9,8_(nove vírgula oito), sendo julgada adequada para o cumprimento do requisito legal previsto no art. 9º da Portaria nº 1886/94/MEC, regulamentado pela Universidade Federal de Santa Catarina, através da Resolução n. 003/95/CEPE.

Florianópolis, 30/10/2008.

________________________________________ Luiz Carlos Cancellier de Olivo

________________________________________ Sérgio Urquhart de Cadermatori

4

________________________________________ Leilane Mendonça Zavarizi da Rosa

A aprovação desta presente monografia

não significará o endosso do Professor

Orientador, da Banca Examinadora e da

Universidade Federal de Santa Catarina à

ideologia que a fundamenta ou que nela é

exposta.

5

DEDICATÓRIA

A meus pais pela presença em todos os

momentos importantes da minha vida,

sempre com muito amor, sabedoria,

confiança e alegria.

A minha irmã Sara por sua inquietude

construtiva.

A Sueli pela companhia carinhosa e

instigante.

6

RESUMO

A responsabilidade civil do Estado por omissão é ainda fonte de muita controvérsia

tanto na doutrina como na jurisprudência, uns entendem ser de natureza objetiva,

outros subjetiva. A análise torna-se, ainda mais divergente quando a omissão

estatal vem ligada a fatos da natureza, como uma epidemia, em que fatores

naturais e humanos, sociais e estatais misturam-se, de forma a dificultar a

averiguação do responsável ou responsáveis pelo dano.

Palavras Chaves: Responsabilidade civil. Estado. Administração Pública. Omissão. Responsabilidade subjetiva, responsabilidade objetiva. COSTA, Cícero Alcebíades. A responsabilidade civil do Estado por omissão –

epidemia de dengue. Florianópolis, 2008.

7

RESUMEN

La responsabilidad civil del Estado por omisión es aún fuente de mucha

controversia tanto en la doctrina como en la jurisprudencia, unos entienden ser de

naturaleza objetiva,otros subjetiva. El análisi se vuelve, aún más divergente cuando

la omisión estatal viene unida a hechos de la naturaleza como una epidemia, en

que hechos naturales y humanos, sociales y estatales se mezclan, de forma a

dificultar la averiguación del responsable o de los responsables por el daño.

Palabras clave: responsabilidad civil. Estado. gobierno. omisión. responsabilidad subjetiva, responsabilidad objetiva.

8

ABSTRACT

The State's civil responsibility by omission is still source of a lot of controversy not

only the doctrine but also in the jurisprudence, some understand to be objective

natue others subjective nature. The analysis becomes, even more divergent when

the state's omission comes along with nature facts, as an epidemy, in which natural

and human factors, social and state factors blend thenselves, in such a way that

makes difficult to search for the responsible or responsibles for the damage.

Keywords: civil responsibility. State. government. omission. subjective responsibility, objective responsibility.

9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.........................................................................................................10

CAP. 1 – A RESPONSABILIDADE CIVL DO ESTADO.........................................12

1.1 Responsabilidade civil: origem, conceito, finalidade....................................12

1.2 Espécies de responsabilidade......................................................................16

1.3 Pressupostos da responsabilidade civil........................................................19

1.4 Responsabilidade Civil do Estado................................................................22

1.5 Evolução normativa da responsabilidade civil do Estado no Brasil..............31

1.6 Causas excludentes e atenuantes da responsabilidade civil do Estado......37

CAP. 2 A OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO GERADORA DE UM DEVER DE

INDENIZAR..............................................................................................................39

2.1 A conduta omissiva.......................................................................................39

2.2 Possibilidades de Omissão da administração pública..................................40

2.3 Responsabilidade Civil do Estado por omissão............................................48

CAP. 3 ANÁLISE DO CASO DA EPIDEMIA DE DENGUE....................................59

3.1 Breves apontamentos sobre a dengue.........................................................59

3.2 Omissões que ensejam a responsabilização da administração...................64

3.3 Responsabilidade civil por omissão estatal no combate e prevenção da

epidemia de dengue...........................................................................................66

CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................74

REFERÊNCIAS........................................................................................................76

10

INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva estudar a responsabilidade civil por danos

propiciados pela omissão do Estado, mais especificamente, o caso da dengue que

rotineiramente e com data marcada assolou diversas regiões brasileiras, com

drásticas conseqüências a população.

O direito a saúde é um direito fundamental dos cidadãos e cabe ao

Estado prover as condições necessárias para sua efetivação. O Poder Público não

deve economizar forças para sua ampla realização, deve por meio de políticas

econômicas e sociais buscar a redução de doenças.

A omissão do Estado em prover métodos de prevenção e combate

efetivo a doenças motiva sua responsabilização pelos danos provenientes de sua

inação, visto que tem o dever legal para tentar obstar possível evento lesivo.

Com a responsabilização do Estado e de seus agentes pelos danos que

causam a população em decorrência de sua inércia diante da epidemia, em tese,

propicia uma maior mobilização destes a combater e prevenir novos casos.

A escolha pelo tema se deu visto ser emergente, porém rotineiro e

insistente os casos de alastramento da dengue pelo país, aliado a grande

discussão doutrinária e jurisprudencial quanto a qual teoria se aplicar ante a danos

provenientes de omissões estatais.

Para elaboração deste trabalho foi utilizado o método dedutivo,

amparado em pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Para um melhor

desenvolvimento dividiu-se o presente trabalho em três capítulos.

O primeiro capítulo traz regras gerais sobre responsabilidade civil, seu

conceito, origem e finalidade, pressupostos. Elucida as espécies de

responsabilidade, primeiramente distinguindo a civil da administrativa e penal e

posteriormente as espécies de responsabilidade civil. Estuda a responsabilidade

11

civil do Estado, sua evolução doutrinária e normativa, e as causas excludentes da

responsabilidade.

O segundo capítulo trata da omissão do Estado que faz gerar um dever

de indenizar. Explana o conceito de omissão, exemplifica, com casos já analisados

pelo tribunais pátrios, algumas omissões estatais que ensejam sua

responsabilidade. Por fim, apresenta a divergência doutrinária quanto a que tipo de

teoria se adotar frente à responsabilidade da Administração Pública por seus atos

omissivos.

Derradeiramente, o terceiro capítulo analisa especificamente a

responsabilidade civil do Estado frente à epidemia da dengue. Relata os

acontecimentos decorrentes da epidemia, o histórico, forma de contágio e

prevenção da doença, bem como as omissões do Estado em seu combate e

prevenção. Ao final, traz a posição do autor quanto a que teoria se aplicar diante da

responsabilidade civil do estado decorrente de epidemia, assim como a

possibilidade de responsabilização do Estado quanto ao caso em análise.

12

CAPÍTULO 1 – A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

1.1 Responsabilidade civil: origem, conceito, finalidade.

1.1.1 Origem

Inicialmente, nas primeiras civilizações a responsabilidade civil estava

calcada na concepção de vingança coletiva, um grupo de pessoas se unia contra o

agressor, no intuito de reparar a ofensa a um dos seus membros. Num momento

posterior o instituto fundamentou-se na reação individual, baseado na premissa da

lei do Talião, “olho por olho, dente por dente”, os homens por iniciativa própria

faziam o que achavam justo diante da lesão sofrida, a autoridade central apenas

atribuía quando e como a vítima tinha direito a retaliação.

No entanto, cabe destacar que no Talião já se concebia a possibilidade

de composição entre a vítima e o ofensor, ao invés da punição semelhante ao dano

sofrido, poder-se-ia transacionar em uma importância em dinheiro ou bens. 1

Aos poucos se percebeu que certos delitos não afetavam apenas os

particulares, mas também a ordem social, dividindo-se, então, em delitos privados

e públicos. Os públicos eram de maior abrangência e intensidade, e por esta razão,

eram punidos pelo Estado. Nos delitos particulares o Estado apenas intervinha

para fixar a composição e evitar conflitos.

Numa etapa posterior, o Estado avoca a função de punir, a composição

econômica deixa de ser uma faculdade para ser a regra, ficando proibido ao lesado

1 GAGLIANO, Pablo. Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:

responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 10.

13

fazer justiça com suas próprias mãos. Passa a existir a ação de indenização e a

responsabilidade civil tomou lugar ao lado da responsabilidade penal.

Apenas na Lex Aquilia que se deu o princípio regulador da reparação do

dano, sedimentado na idéia de reparação pecuniária, em razão do valor da coisa

(res). Porém, não dá pra se afirmar se era ou não prevista a culpa como um dos

elementos necessários para a reparação.

A teoria da responsabilidade se consolidou graças a doutrina francesa,

esta é a responsável pelo princípio da responsabilidade civil e influenciou quase

todas as legislações fundadas na culpa. Estabeleceram alguns princípios: direito a

reparação sempre que houvesse culpa, ainda que leve; separação da

responsabilidade: civil, perante a vítima; e penal, perante o Estado; e, a existência

de culpa contratual das pessoas que descumprem as obrigações,

independentemente, de algum crime ou delito, mas originada da negligência ou

imprudência. 2

Com a revolução industrial e seus avanços, multiplicaram-se os danos,

em resposta a proliferação das atividades humanas que eram propícias à lesionar.

Surgiram novas teorias com o objetivo de propiciar maior proteção às vítimas, visto

que a teoria da culpa não era mais suficiente para uma solução justa de algumas

lides. Expoente destas teorias é a teoria do risco, em que a idéia do exercício de

atividade perigosa está compreendida como fundamento da responsabilidade civil.

O exercício de atividade perigosa representa um risco, que o agente assume, de

ser obrigado a ressarcir os danos que venham causar a terceiros dessa atividade.

1.1.2 Conceito

A ordem jurídica estabelece deveres a serem seguidos ou evitados pelas

pessoas por exigência da convivência social. A violação de um dever jurídico

configura o ilícito, que, geralmente acarreta um dano a outrem, de forma a gerar

um novo dever jurídico, o de reparar o dano. 3

2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. – 10.ed. São Paulo : Saraiva, 2007, p. 6.

3 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5.ed. Malheiros, 2006. p. 23-

24.

14

O termo responsabilidade deriva do verbo latino respondere, o qual

significa a obrigação que alguém tem de assumir as conseqüências jurídicas de

sua atividade. Tem raízes, também, na palavra latina spondeo, que no Direito

Romano significava, o devedor nos contratos verbais. 4

Para Rui Stoco a expressão responsabilidade pode apresentar vários

sentidos, pode ser sinônimo de diligência e cuidado, como pode revelar a

obrigação de todos pelos atos que praticam no plano jurídico. No entanto, para o

autor a idéia que mais se aproxima da definição da responsabilidade é a de

obrigação. 5

Aliás, segundo Gonçalves, o instituto da responsabilidade civil é parte

integrante do direito obrigacional, visto que a principal conseqüência da prática de

um ato ilícito é a obrigação que acarreta para o seu titular, de reparar o dano,

obrigação esta de natureza pessoal, que se resolve em perdas e danos. 6

Serpa Lopes, da mesma forma entende a responsabilidade como

obrigação: “... a responsabilidade é a obrigação de reparar um dano, seja por

decorrer de uma culpa ou de outra circunstância legal que a justifique, como a

culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva”. 7

Maria Helena Diniz assevera que:

(...) poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de

medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial

causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa

por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda

(responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal

(responsabilidade objetiva). Definição esta que guarda, em sua

estrutura, a idéia de culpa quando se cogita da existência de ilícito e

a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa. 8

4 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 1-2.

5 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 7.ed. São

Paulo : Revista dos Tribunais, 2007, p. 111. 6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 2.

7 LOPES, Miguel Maria Serpa. Curso de direito civil: fontes contratuais das obrigações -

responsabilidade civil. 5ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989, p. 160. 8 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil. 15 ed. São

Paulo: Saraiva, 2001, p. 34.

15

Caio Mário da Silva Pereira apresenta uma definição de responsabilidade

que vem ao encontro a todas as idéias até então discutidas sobre responsabilidade

civil, quando afirma que:

A responsabilidade civil consiste na efetivação da reparabilidade

abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica

que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o binômio da

responsabilidade civil, que então se enuncia como princípio que

subordina a reparação à sua incidência na pessoa do causador do

dano. Não importa se o fundamento é a culpa, ou se é

independentemente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a

subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de

ressarcimento, aí estará a responsabilidade civil. 9

1.1.3 Finalidade

Segundo Cavalieri “o anseio de obrigar o agente, causador do dano, a

repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça”. 10

Ante um dano e seu prejuízo causado por ato ilícito, há a necessidade de

se restabelecer o equilíbrio, cindido pelo dano, de forma a recolocar o lesado no

estado anterior em que se apresentava (status quo ante).

Destarte, a responsabilização civil tem por finalidade precípua o

restabelecimento do equilíbrio violado pelo dano. O princípio que sustenta a

responsabilidade civil é o da restitutio in integrum, isto é, no máximo repõe-se a

vítima ao estado anterior à lesão. A responsabilidade civil possui dupla função na

esfera jurídica do prejudicado: a) mantenedora da segurança jurídica em relação

ao lesado; b) sanção civil de natureza compensatória.

9 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.

11. 10

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 36.

16

A reparação civil, a principal finalidade da responsabilidade civil,

apresenta três funções: compensatória do dano à vítima, punitiva do ofensor e

desmotivação da conduta social. 11

1.2 Espécies de responsabilidade

Primeiramente, cabe distinguir a responsabilidade jurídica em algumas

de suas esferas: civil, penal e administrativa.

Apesar da responsabilidade civil e penal terem algumas funções em

comum, tais como a prevenção de condutas anti-sociais, satisfação da vítima,

punição do autor do dano e intervir para assegurar no respeito do direito, cabe

tecer algumas distinções entre elas: 1) na penal o agente infringe norma de direito

público, o interesse lesado é da sociedade, na civil, o interesse diretamente lesado

é particular; 2) A responsabilidade penal é pessoal, intransferível, enquanto a civil

é patrimonial, o patrimônio do causador do dano é que responde por suas

obrigações. 12 Os objetivos são distintos. O objeto direto da ação civil é a

indenização da vítima e o da ação penal é infligir uma sanção a qualquer que tenha

descumprido a Lei.

A responsabilidade penal é atribuída para ilícitos, cuja gravidade é

tamanha, que o Estado dispôs sanções penais para contê-las.

A responsabilidade civil cuida da reparação dos danos, visando a

reconstituição ao estado anterior, seja mediante a reparação do dano de modo

direto, ou indiretamente, por meio de uma indenização.

A responsabilidade administrativa muito se parece com a penal, no

entanto desta se difere ante a gravidade da falta cometida. Por opção política do

legislador atribui-se uma gradação de algumas condutas, sendo as mais graves,

previstas em tipos penais. Frente a um ilícito administrativo a Administração

11

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 21. 12

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 19-20.

17

Pública aplica uma sanção administrativa que pode ser multa, interdição de

atividades, embargos e destruição de coisas. 13

Não obstante a divisão, cabe enfatizar que em uma mesma conduta

pode incidir a responsabilidade penal, civil e administrativa a um mesmo fato. As

três esferas de responsabilidade são, em princípio, distintas e independentes,

aplicáveis simultânea e isoladamente, sem que da aplicação de uma decorra,

necessariamente a imposição das demais, ou a vedação a que outras sanções

sejam também aplicadas.

Feita a distinção entre responsabilidade civil, penal e administrativa,

relevante expor as espécies de responsabilidade civil. Segundo Gandini e Salomão

esta pode se dividir, dependendo da perspectiva analisada: a) quanto ao seu fato

gerador, divide-se em Responsabilidade contratual e extracontratual; b) quanto ao

agente em: Responsabilidade direta e indireta; c) quanto ao seu fundamento em:

Responsabilidade subjetiva e objetiva. 14

a) Responsabilidade contratual e extracontratual – a distinção entre elas

se faz quanto ao fato gerador. Na responsabilidade contratual uma pessoa causa

prejuízo a outra em decorrência de inadimplemento de uma obrigação contratual.

Já quando a responsabilidade não deriva de um contrato, ela é extracontratual,

também chamada de aquiliana. Na responsabilidade extracontratual, o agente

infringe uma norma jurídica. Inicialmente, não há nenhum vínculo entre a vítima e o

causador do dano, quando este pratica o ato ilícito. Na contratual há um

descumprimento de um pacto avençado entre as partes.

Há críticas na doutrina quanto a dualidade de tratamento, os adeptos da

teoria monista, entendem que não faz diferença esta distinção, pois os efeitos são

uniformes. Ocorre que tal distinção deve ser observada tendo em vista que,

dependendo da modalidade será tratada de maneira diversa uma da outra.

Exemplo disto, diz respeito ao ônus da prova, que na contratual caberá ao devedor

a prova de que cumpriu a obrigação ou de que não a cumpriu por alguma das

13

CORRÊA, Elizeu de Moraes, Responsabilidade civil do Estado no direito brasileiro: Há princípio único regulador? R. Fac. Direito, Curitiba, a.28, n.28, 1994/95, p. 214-215. 14

GANDINI, João Agnaldo Donizeti; SALOMÃO, Diana Paola da Silva. A responsabilidade civil do Estado por conduta omissiva. Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 106, 17 out. 2003. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4365>. Acesso em: 08 abr. 2004.

18

causas excludentes de responsabilidade. Já na extracontratual, o autor da ação é

quem fica com o ônus de provar que o fato se deu por culpa do agente. 15

b) Responsabilidade direta e indireta – nesta divisão a distinção se faz

em razão do agente que causou o dano. Será direta caso ação ou omissão seja

proveniente de ato do próprio responsável. Se a responsabilidade provier de ato de

terceiro, vinculado ao agente ou de fato de animal ou coisa inanimada sob sua

guarda será indireta. Está distinção tem importância, visto que a Constituição

estabelece uma responsabilidade indireta, ao imputar às pessoas jurídicas de

direito público a obrigação de responder pelos danos que seus agentes, nessa

qualidade, causarem a terceiros.

c) Responsabilidade subjetiva e objetiva – a distinção se dá na análise

ou não da culpa como fundamento da responsabilidade. A responsabilidade

quando se escora na idéia de culpa é subjetiva. Nesta a responsabilidade do

causador do dano só se estabelece caso tenha agido com dolo ou culpa. É

necessário que a vítima demonstre a culpa ou dolo do causador do dano para que

tenha êxito no pleito da indenização.

Há casos, porém, que por expressa disposição legal a responsabilidade

prescinde da culpa e se satisfaz, tão somente, com a conduta, o dano e o nexo de

causalidade, quando isto ocorre se está diante da responsabilidade objetiva. Esta

não exige prova da culpa do agente para que este seja obrigado a reparar o dano.

Uma das teorias que justifica a imputação objetiva da responsabilidade é a teoria

do risco. De acordo com os preceitos desta concepção, toda pessoa que exerce

determinada atividade cria um risco de dano para terceiros, e mesmo que sua

conduta esteja isenta de culpa, tem dever de reparar.

O parágrafo único do artigo 927 do Código Civil Brasileiro, afirma tal

entendimento ao estabelecer que:

Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,

nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente

desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco

para os direitos de outrem.

15

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 26-29.

19

Como se pode observar no Brasil vige uma regra geral dual de

responsabilidade civil, em que se tem a responsabilidade subjetiva, regra geral

inquestionável do sistema anterior, coexistindo com a responsabilidade objetiva,

especialmente em função da atividade de risco desenvolvida pelo autor do dano.

1.3 Pressupostos da responsabilidade civil

Prevê o art. 186, do Código Civil de 2002: “Aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Da exegese desse

dispositivo pode-se extrair três elementos essenciais da responsabilidade civil:

conduta, nexo de causalidade, dano e culpa ou dolo. Apesar de a culpa estar

expressa no dispositivo, não se pode considerá-la componente essencial da

responsabilidade civil, na verdade seria requisito, tão somente da responsabilidade

subjetiva.

Conduta – A conduta é condição indispensável para que haja a

responsabilidade civil, seja objetiva ou subjetiva. Noronha classifica este elemento

como fato gerador. 16 Trata-se de um fato antijurídico que deu ensejo a um evento

danoso, culposo ou não.

A conduta pode ser tanto positiva como negativa, na primeira há uma

ação, um comportamento ativo por parte do agente causador do dano, a segunda

decorre de uma não atuação, quando, em tese, dever-se ia agir. Trata-se de uma

abstenção de um agente, que tinha o dever de atuar, que por sua inércia gera dano

a terceiro. O agente não observa a maneira que deveria agir em determinada

situação, com o escopo de evitar a ocorrência do dano.

Nexo de causalidade – trata-se da relação de causa e efeito entre a

conduta e o resultado. É a relação causal que estabelece o vínculo entre um

determinado comportamento e um evento de forma a analisar se a conduta foi ou

não causa do dano. Por meio dele que se poderá averiguar quem foi o causador do

16

NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. Vol.1. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 467-477.

20

dano. Independe de que tipo de responsabilidade se tratar o nexo de causalidade é

elemento indispensável da responsabilidade civil. Para que se atribua a

responsabilidade de um fato a alguém se faz necessária à demonstração que sem

o fato alegado, o dano não teria se produzido. 17

Para o presente trabalho, que trata de estudo de caso, necessário trazer

as teorias que tentam explicar o nexo de causalidade para uma melhor elucidação

da futura análise. São três as principais teorias: a) equivalência das condições; b)

causalidade adequada e; c) causalidade direta.

a) Teoria da equivalência das condições – a teoria não diferencia os

antecedentes do resultado danoso, tudo que concorra para o resultado será

considerado causa. Todos os elementos que de certa forma contribuíram para um

evento são considerados causas, sem necessitar cogitar qual elemento de forma

imediata provocou o prejuízo. A aplicação dessa teoria leva a resultados

equívocos, visto que leva a responsabilidade ao infinito.

b) Teoria da causalidade adequada – nesta teoria somente se considera

como causadora do dano a condição por si só apta a produzi-lo. Na lição de

Cavalieri “causa, para ela, é o antecedente não só necessário, mas também,

adequado à produção do resultado. Logo, nem todas as condições serão causa,

mas apenas aquela que for a mais apropriada a produzir o evento”. 18

c) Teoria da causalidade direta - é necessário haver entre o fato e o dano

uma relação de causa e efeito direta e imediata. Segundo Gagliano e Pamplona

Filho, a causa, para esta teoria seria apenas o antecedente fático que, ligado por

um vínculo de necessariedade ao resultado danoso, determinasse este último

como uma conseqüência sua, direta e imediata. 19

Não se sabe ao certo qual teoria foi adotada no ordenamento brasileiro,

sabe-se apenas que a teoria da equivalência é inviável e não utilizada. No entanto,

quanto as outras duas restantes, doutrina e jurisprudência divergem em qual teria

melhor aplicação.

17

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 71. 18

Idem. Ibidem, p. 72-73. 19

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p.90.

21

Outro ponto importante a ser analisado ligado ao estudo do nexo causal

são as concausas e as causas concorrentes. A análise a ser feita sobre a dengue

pressupõe o entendimento sobre a temática.

Como se sabe a proliferação de mosquitos, transmissores da dengue,

decorre de inúmeros fatores como depósito de água, resistência da população em

mudar hábitos de higiene, clima tropical, falta de urbanização, falta de programa

efetivo de combate à doença. Destarte, mesmo podendo haver omissão estatal no

combate à doença percebe-se que concorrem atitudes de terceiros, da própria

vítima e fenômenos da natureza para causar o dano.

Causa concorrente ocorre quando a própria vítima atua na ocorrência do

dano, auxiliando o comportamento do agente. Em tais casos a indenização deverá

ser abatida conforme a contribuição da vítima para proporcionar evento danoso.

Cabe verificar, porém, se determinado ato do agente de fato foi relevante

para a produção do dano, deve-se indagar qual dos fatos foi decisivo para o evento

danoso, isto é qual dos atos imprudentes fez com que o outro, que não teria

conseqüências por si só determinasse o sinistro. 20

A concausa seria uma outra causa além da principal que concorre para o

resultado, são circunstâncias que concorrem para o agravamento do dano, porém

que não têm a virtude de excluir o nexo de causalidade gerado pela conduta

principal, nem de, por si sós, produzir o dano. 21

No entanto como dito acima, nas teorias do nexo de causalidade,

principalmente a da causalidade adequada e a direta, basta para obrigação de

indenizar que o autor seja responsável pela conduta, sempre que desta provenha o

dano.

Dano – é um prejuízo causado a alguém pela deterioração ou inutilização

de seus bens. Necessário a sua ocorrência e comprovação para que haja

responsabilidade, visto que indenização sem dano seria enriquecimento ilícito.

O dano pode ser patrimonial ou material, ou moral, este corresponde à

ofensa causada à pessoa, atingindo bens e valores de ordem interna, aquele

consiste em danos emergentes, naquilo que efetivamente se perdeu, e em lucros

20

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 82. 21

Idem. Ibidem, p. 84.

22

cessantes, aquilo que se deixou de ganhar. O dano material não sendo possível o

retorno ao status quo ante se resolve com o equivalente em pecúnia, o moral, por

não ter equivalência patrimonial se compensa com um valor convencionado. 22

1.4 Responsabilidade Civil do Estado

1.4. 1 Noção preliminar

Da mesma forma que qualquer outro sujeito de direito pode o Estado vir

a estar na situação de quem causou um dano a alguém, e assim sujeito à

obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de

comportamentos oriundos de seus agentes públicos.

A responsabilidade civil do Estado pode ser entendida como a obrigação

legal, imposta à Administração, de ressarcir os danos causados a terceiros por

suas atividades. 23

Utilizando-se da expressão responsabilidade civil da Administração,

Meirelles define-a como sendo “a que impõe a Fazenda Pública a obrigação de

compor o dano causado a terceiros por agentes públicos, no desempenho de suas

atribuições ou a pretexto de exercê-las”. 24

De forma delimitada e precisa conceitua sobre o tema Mello:

entende-se por responsabilidade extracontratual do Estado a

obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos

lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam

imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou

ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos. 25

22

STOCO, Rui. Op. cit., p. 128. 23

CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 13. 24

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 31. ed. Malheiros, 2005, p. 647. 25

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 957.

23

Como salienta Di Pietro, quando se fala de responsabilidade civil do

Estado, cogita-se a dos três tipos de funções em que se reparte o poder estatal: a

administrativa, a legislativa e a jurisdicional. Entretanto, dá se mais ênfase a

responsabilidade resultante de comportamentos da Administração Pública.

Segundo a doutrinadora, é errado falar em responsabilidade da Administração

Pública, já que esta não tem personalidade jurídica, não sendo titular de direitos e

obrigações na ordem civil. 26

A responsabilidade pode decorrer de atos jurídicos, de atos ilícitos ou

lícitos, de atos materiais ou de omissão do Poder Público. Essencial é que um

agente a serviço do Estado haja causado um dano a terceiro. Inclusive por atos

lícitos pode redundar a responsabilidade. 27

A responsabilidade civil do Estado tem princípios autônomos, de acordo

com a especialidade de sua posição jurídica, em razão disto é mais extensa que a

responsabilidade que pode incidir às pessoas privadas. Os danos que gera, em

sua maioria são mais intensos que os gerados por particulares, assim como as

condições em que são ocasionadas são distintas.

Os danos oriundos da atividade estatal resultam de comportamentos

provenientes, em tese, no intuito da Administração Pública, que é agir no interesse

de toda a sociedade, por isto não a razão de que apenas um arque com os danos

causados pelo Estado, visto que este age no proveito de todos. Diante disto, a

responsabilidade do Estado obedece a um regime próprio capaz de compatibilizar-

se com as particularidades de sua pessoa, com a espécie e origem de lesões

passíveis de serem causadas, e capaz de proteger os particulares de riscos de

suas condutas.

1.4.2 Evolução histórica da responsabilidade civil do Estado

Para se chegar até o atual momento, em que se é admitida a

responsabilidade objetiva, a teorização sobre a responsabilidade civil do Estado

teve uma árdua evolução.

26

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20. ed. São Paulo, Atlas, 2007, p. 617 27

Idem. Ibidem, p. 617.

24

Evolui-se, primeiramente, do conceito de irresponsabilidade para o da

responsabilidade com culpa, em seguida, deste para o da responsabilidade

civilística e deste para o que atualmente se encontra, a responsabilização

pública.28 Principal responsável nesse desenvolvimento fora o direito francês,

através da construção pretoriana do Conselho de Estado. 29

Apesar desta nítida evolução da teoria, alguns sistemas jurídicos tais

como o anglo-saxão, preponderam princípios do direito privado no tratamento do

tema. 30

Na época dos Estados absolutos, negava-se a responsabilidade do

Estado. Segundo pensamento preponderante a esse tempo, a autoridade do

Estado era incontestável perante o súdito, vigia os princípios de que o rei não pode

errar (the king can do no wrong, lê roi ne peau mal faire) e de que “aquilo que

agrada o príncipe tem força de lei” (quod principi placuit habet legis vigorem). A

atribuição de responsabilidade ao Estado, significaria colocá-lo ao mesmo nível de

seus súditos, desrespeitando sua soberania.31 Restava ao administrado, tão

somente, ação diretamente contra o funcionário causador do dano, caso este fosse

insolvente frustrada seria indenização. 32 A possibilidade de responsabilização a

cargo do patrimônio público era considerada uma ameaça à liberdade dos

serviços.33

A teoria da irresponsabilidade estatal fundava-se: 1) na soberania do

Estado, responsabilidade do soberano perante o súdito inexiste; 2) o Estado como

instituidor do Direito, não pode ser violador deste mesmo direito; 3) atos de

funcionários não podem ser considerados atos do Estado. 34

Amaro Cavalcanti apud Yussef Said Cahali sintetiza argumentos,

daqueles que defendiam a teoria da irresponsabilidade do Estado:

(...) a) quando o Estado exige obediência de seus súditos, não o faz

para fins próprios, mas justamente, para o bem dos mesmos, logo, de

28

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 647-648. 29

STOCO, Rui. Op. cit., p. 994. 30

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 618. 31

Idem. Ibidem, p. 619. 32

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 249. 33

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 21. 34

Idem. Ibidem, p. 20-21.

25

semelhante ato não lhe pode advir qualquer responsabilidade; b) não

se justifica a ficção de que os funcionários administrativos sejam órgãos

imediatos do Estado e que, em conseqüência, os atos destes devam

ser tidos como atos do Estado; este só é representado pelo chefe de

governo; c) as relações jurídicas do mandato não podem ser aplicadas

por analogia aos servidores do Estado, como se tem pretendido; d) a

obrigação de indenizar tira, em regra, a sua razão de ser de uma culpa;

ora, da escolha do funcionário só pode caber culpa ao Estado quando a

pessoa nomeada for, sabidamente, indigna ou incapaz; semelhante

culpa não pode ser absolutamente derivada do caráter representativo

que tem o funcionário em relação ao Estado; Estado e funcionário são

sujeitos diferentes, e por isso a culpa do funcionário não é culpa do

Estado; e) o funcionário, seja agindo fora dos limites de seus poderes,

ou sem forma legal imposta à sua ação, ou mesmo abusando dela, não

obriga com seu ato o Estado, porque não o representa; f) o Estado não

pode prestar contra a sua própria autoridade. 35

Frente aos avanços políticos ideológicos, tal teoria não resistiu por muito

tempo. Não obstante a resistência dos conservadores, doutrina e jurisprudência

gradativamente refutaram a doutrina da irresponsabilidade.

Cabe aqui colacionar posicionamento teórico de Sérgio Cavalieri Filho,

em que abomina e questiona a isenção do Estado frente a lesões que deu causa:

A teoria da irresponsabilidade era a própria negação do direito. De fato,

se no Estado de Direito o Poder Público também se submete à lei, a

responsabilidade estatal é simples corolário, conseqüência lógica e

inevitável dessa submissão. Como sujeito dotado de personalidade, o

Estado é capaz de direitos e obrigações como os demais entes,

inexistindo motivos que possam justificar a sua irresponsabilidade. Se o

Estado é o guardião do Direito, como deixar ao desamparo o cidadão

que sofreu prejuízos por ato próprio do Estado. 36

Marco inicial do reconhecimento da responsabilidade do Estado, mesmo

sem previsão legal, obra da jurisprudência francesa, apenas baseado em princípios

35

Idem. Ibidem, p. 20. 36

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 249.

26

de Direito Público, fora o famoso aresto Blanco, do Tribunal de Conflitos, proferido

em 1º de fevereiro de 1873, em que a menina Agnés Blanco, foi atropelada por

uma vagonete da Cia. Nacional de Fumo, frente a isto seu pai promoveu uma ação

indenizatória, com base no princípio de que o Estado é civilmente responsável por

prejuízos causados a terceiros, em decorrência de ação danosa de seus agentes.

Decidiu-se que o Estado é responsável quanto aos danos causados aos

particulares, por atos dos agentes de serviço público. 37

Atualmente, a doutrina da irresponsabilidade estatal resta totalmente

superada, os últimos países que aceitavam tal entendimento, Estados Unidos e

Inglaterra, passaram a admitir que demandas indenizatórias, provocadas por atos

de seus agentes, podem ser dirigidas diretamente contra a Administração. Os

países acima citados passaram a não mais aceitar a irresponsabilidade, através do

Federal Tort Claim Act, de 1946, e Crown Proceding Act de 1947, respectivamente.

38

Evolui-se da isenção de irresponsabilidade total do Estado para as

teorias civilistas. Admitida a responsabilidade do Estado, passou-se a adotar os

princípios do Direito Civil, baseado na idéia de culpa. Para inferir a

responsabilidade ao Estado, remetia-se aos princípios da responsabilidade por fato

de terceiro. 39

Começou-se a distinguir, para fins de responsabilidade, os atos de

império e de gestão. Os atos de império seriam os atos praticados pela

Administração com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade impostos

unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorização

judicial, sendo regidos por um direito especial, externo ao direito comum, visto que

os particulares não podem praticar atos semelhantes. Os atos de gestão seriam

aqueles praticados pela Administração em situação de igualdade com os

particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para a

gestão de seus serviços. 40

Destarte, o Estado, no exercício da sua soberania, na qualidade de

poder supremo, supra-individual, restaria isento a ter de indenizar, mesmo que, os

37

STOCO, Rui. Op. cit., p. 994. 38

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 648. 39

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 22. 40

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 619-620.

27

atos de império, tivessem sido lesivos a seus administrados. Ao contrário, na

prática de atos de gestão, poderia ter reconhecida sua responsabilidade civil, visto

que nesta ocasião estaria agindo como particular fosse, da mesma forma que uma

empresa privada responsabiliza-se por atos lesivos provocados por seus prepostos

a terceiros, deveria o estado responsabilizar-se por atos culposos de seus

funcionários, não comprovada a culpa não haveria ressarcimento do dano. 41

Para Di Pietro, a distinção entre atos de império e de gestão “foi

idealizada como meio de abrandar a teoria da irresponsabilidade do monarca por

prejuízos causados a terceiros. Distinguia-se a figura do rei que era insuscetível de

errar, que praticaria os atos de império, da pessoa do Estado, que praticaria atos

de gestão, através de seus súditos“. 42

Não obstante seu mérito de afastar a teoria da irresponsabilidade, a

teoria civilística baseada em atos de império e de gestão, continuou firmada na

figura do Estado soberano, onipotente que reina absoluto e de forma arbitrária.

Segundo Monteiro apud Cahali:

(...) só se pode tachar de arbitrária a distinção entre ato praticado jure

imperii ou jure gestionis. Realizando um ou outro, o Estado é sempre

Estado. Mesmo quando pratica simples ato de gestão o Poder Público

age, não como mero particular, mas para a consecução de seus fins.

Portanto, não de pode dizer que o Estado é responsável quando pratica

atos de gestão e não o é, quando realiza atos de império. Negar

indenização neste caso é subtrair-se o Poder Público à sua função

específica, qual seja, a tutela dos direitos. 43

Diante da impossibilidade de divisão da personalidade do Estado, bem

como a impossibilidade de enquadrar como atos de gestão todos aqueles

praticados pelo Estado na administração do patrimônio público e na prestação de

seus serviços abandonou-se essa teoria. 44

41

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 22-23. 42

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 620. 43

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 23. 44

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 620.

28

Eliminou-se a distinção entre os atos de império e de gestão e passou-se

a aceitar a responsabilidade do Estado desde que demonstrada a culpa. Começou

a se aplicar analogicamente princípios privatísticos da relação patrão/ empregado,

preponente/preposto, estava a se consolidar a teoria da culpa civil ou

responsabilidade subjetiva, que inspirou o Código Civil Brasileiro de 1916.

Produto da ciência jurídica alemã originou-se a teoria do órgão segundo

o qual o Estado é concebido como um organismo vivo, integrado por um conjunto

de órgãos que realizam sua função. Não se distingue Estado e agente, na forma

representante/representado, mas, pelo contrário são considerados um só. De

acordo com este entendimento, o dano causado ao particular por um agente da

Administração imputa-se diretamente a esta a responsabilidade, a atividade do

agente configura-se como atividade da própria Administração. 45

Alicerçado em princípios publicísticos, trazidos pela teoria do órgão,

evolui-se da culpa individual para a culpa anônima. Despersonalizou-se a culpa,

deixando no anonimato o agente, para se considerar falha do serviço.

Tornou-se obsoleta a noção civilista da culpa, adotando-se a teoria da

culpa do serviço ou falta do serviço, que se evidencia quando o serviço não

funciona, funciona mal ou funciona atrasado.

Segundo Di Pietro, a elaboração de teorias de responsabilidade civil do

Estado, sob o viés dos princípios de direito público deu-se pela jurisprudência

francesa, em 1873, no já citado caso Blanco. Neste decidiu o Tribunal que a

responsabilidade, que pode incumbir ao Estado pelos danos causados aos

particulares pelo fato das pessoas que ele emprega no serviço público, não pode

ser regida pelos principias que são estabelecidos no Código Civil, pelas relações

de particular perante particular; esta responsabilidade não é nem geral, nem

absoluta; ela tem suas regras especiais que variam segundo as necessidades do

serviço e a necessidade de conciliar os direitos do Estado com os interesses

privados. 46

Surgiram, então, as teorias publicistas são elas: culpa anônima/ falta do

serviço/culpa administrativa e teoria do risco, desmembrada por alguns autores,

45

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 250. 46

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 620.

29

como Hely Lopes Meirelles, Sérgio Cavalieri Filho, Rui Stoco, em teoria do risco

administrativo e teoria do risco integral, todas elas, com exceção da primeira que,

segundo alguns autores, ainda apresenta traços civilísticos, são descendentes da

responsabilidade objetiva, porém com variação de fundamento e aplicação.

A teoria da culpa anônima ou falta de serviço, ou ainda culpa

administrativa, foi a transição entre a doutrina subjetiva da culpa e a teoria objetiva

do risco administrativo. Alguns autores, como Celso Antônio Bandeira de Mello,

inserem-na, na responsabilidade subjetiva, visto que prescinde da prova de culpa.

47

Segundo esta concepção não é mais necessária a falta de algum agente

específico, necessita-se, tão somente, a constatação de uma má atuação geral,

anônima, impessoal, a que possa o dano ser imputado. 48 Não se questiona mais

da culpa subjetiva do agente administrativo, mas perquire-se a falta objetiva do

serviço em si mesmo, como gerador da obrigação de indenizar o dano causado a

terceiro. 49

Nesta teoria, exige-se, ainda, muito da vítima, esta além da lesão

sofrida, necessita comprovar a não prestação do serviço ou sua prestação tardia

ou má prestação, a fim de ficar configurada a culpa do serviço, e

consequentemente, a responsabilidade do Estado. Contudo, Cavalieri anota que

em vários casos de responsabilidade pela faute du service admite-se a presunção

de culpa face à extrema dificuldade de demonstração, por parte da vítima, de que o

serviço operou abaixo dos padrões devidos, casos em que é transferido o ônus da

prova ao Estado, necessitando este que demonstre que o serviço funcionou

regularmente, de forma normal e correta.50

A jurisprudência francesa grande norteadora, sem refutar essa teoria,

em determinadas situações, passou a adotar, a teoria do risco, base da

responsabilidade objetiva do Estado.

A adoção da teoria da responsabilidade objetiva baseia-se no princípio

da igualdade de ônus e encargos sociais: da mesma forma que os benefícios

47

BÜHRING, Márcia Andréa. Responsabilidade civil extracontratual do Estado. São Paulo: IOB Thomson, 2004, p. 99. 48

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 251. 49

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 649. 50

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 251.

30

decorrentes da atuação estatal são repartidos por todos, os ônus sofridos por

alguns membros, em decorrência da atuação estatal lesiva, devem ser repartidos.

A idéia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre o funcionamento

do serviço público e o prejuízo sofrido pelo administrado. Não se faz mais remissão

a análise da eficiência da prestação do serviço público, se funcionou bem mal, de

forma regular ou irregular. Parte-se da idéia de que a atuação estatal envolve um

risco de dano, que lhe é inerente, causado o dano o Estado responde. 51

Como falado acima, para alguns autores, entre eles Hely Lopes

Meirelles, esta teoria desdobrou-se em teoria do risco administrativo e do risco

integral.

A teoria do risco administrativo diferencia-se da teoria do risco integral,

visto que esta não admite as causas excludentes da responsabilidade do Estado,

tais como culpa da vítima, força maior ou culpa de terceiros, enquanto aquela

isenta o Estado de ter de indenizar se o caso sob análise apresentar alguma

excludente.

1.5 Evolução normativa da responsabilidade civil do Estado no Brasil

Apesar de inicialmente não se ter disposição específica no sistema

normativo pátrio, jamais se pôs em dúvida, a tese da responsabilidade do Estado.52

Mesmo na ausência de normas legais expressas, nossos tribunais e doutrinadores

sempre repudiaram a teoria da irresponsabilidade do Estado. 53 Segundo Cavalieri,

a tese da responsabilidade do poder público sempre foi aceita como principio geral

e fundamental de Direito. 54

Nos primórdios, influenciado pela doutrina do exterior, prevaleceu a idéia

centrada na culpa civil, respondia o Estado quando seu funcionário, no exercício da

função, procedia de maneira culposa, por negligência, imprudência ou imperícia.

51

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 621. 52

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 30. 53

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 622. 54

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 254.

31

Em seguida, veio a noção de falta de serviço para finalmente alcançar a

predominante responsabilidade objetiva. 55

As primeiras Constituições de 1824 e 1891, não apresentavam

dispositivos que previssem a responsabilidade do Estado, apenas continham a

responsabilidade do funcionário causada por abuso e omissão praticados no

exercício de suas funções. 56 Dispunha, ao tempo do Império, o art. 179, XXIX da

Constituição de 1824: “Os empregados públicos são estritamente responsáveis

pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções e por não

fazerem efetivamente responsáveis aos subalternos”. 57

Dispositivo semelhante era previsto na Constituição Republicana de

1891, em seu art. 82, apenas alterando as expressões empregados por

funcionários e funções por cargos. Não obstante, o não tratamento pelo constituinte

da época, havia leis ordinárias prevendo a responsabilidade do Estado, acolhida

pela jurisprudência como sendo solidária com a dos funcionários, como ocorria nos

danos causados por estrada de ferro, por colocação de linhas telegráficas, pelos

serviços de correio. 58

Do início do período republicano cabe destacar, a Lei 221, de 1894, que

em seu artigo 13 estabeleceu que: “os juízes e Tribunais Federais processarão e

julgarão as causas que se fundarem na lesão de direitos individuais por atos ou

decisões das autoridades administrativas da União”. 59

Na doutrina, no início da República, o tema já fora abordado com

exclusividade e atenção, prova disto é a obra clássica de Amaro Cavalcanti, cuja

primeira edição data de 1905, com o título Responsabilidade civil do Estado. 60

Promulgado o Código Civil de 1916 a responsabilidade estatal passou a

ser explícita, estabelecia o artigo 15:

55

MELL0, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 991. 56

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 622. 57

BRASIL. Constituição de 1824. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 58

Idem. Ibidem, p. 622. 59

BRASIL. Lei 221 de 1894. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 60

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 30.

32

As pessoas de direito público são civilmente responsáveis por atos de

seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros,

procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito

por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano. 61

No entendimento de Celso Antônio Bandeira Mello, o dispositivo indicava

claramente o caráter subjetivo da responsabilidade pública. 62 Segundo Di Pietro a

expressão procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito

por lei leva a entender que deveria ser demonstrada a culpa do funcionário para

que o Estado respondesse. Entretanto, devido a redação imprecisa do dispositivo,

intérpretes da época como Ruy Barbosa, Pedro Lessa e Amaro Cavalcanti,

inspirados nas idéias preponderantes na França e outros países europeus,

defendiam a responsabilidade civil objetiva, baseada na moderna teoria do risco,

possibilitando a responsabilidade civil sem culpa em determinados casos de

atuação lesiva do Estado.

O Decreto 24.216 de 1934, em contramão à evolução da teoria,

pretendeu restringir a responsabilidade do Estado excluindo-a nos casos em que o

ato do agente administrativo tivesse caráter criminoso, salvo se o poder público

competente o mantivesse no cargo após a verificação do fato. 63

No entanto, tal norma teve curta duração, visto que fora promulgada a

Constituição de 1934 que estabeleceu o princípio da responsabilidade solidária

entre Estado e funcionário. Estatuía o artigo 171, caput e § 1º e 2º:

Art. 171 Os funcionários públicos são responsáveis solidariamente com

a Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos

decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus

cargos.

§ 1º - Na ação proposta contra a Fazenda pública, e fundada em lesão

praticada por funcionário, este será sempre citado como litisconsorte.

61

BRASIL. Lei 3.071 de 1º de janeiro de 1916. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 62

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 992. 63

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 992.

33

§ 2º - Executada a sentença contra a Fazenda, esta promoverá

execução contra o funcionário culpado. 64

A Constituição outorgada de 1937, em seu artigo 158, repetiu a mesma

norma.

Com o advento da Constituição de 1946, adotou-se a teoria da

responsabilidade objetiva. Dispunha o artigo 194:

Art 194 - As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente

responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade,

causem a terceiros.

Parágrafo único - Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários

causadores do dano, quando tiver havido culpa destes. 65

No entendimento de Sérgio Cavalieiri Filho:

(...) a partir da Constituição de 1946, a responsabilidade civil do Estado

Brasileiro passou a ser objetiva, com base na teoria do risco

administrativo, onde não se cogita a culpa, mas, tão somente, da relação

de causalidade. Provado que o dano sofrido pelo particular é

conseqüência da atividade administrativa, desnecessário será perquirir a

ocorrência de culpa do funcionário ou, mesmo, de falta anônima do

serviço. 66

A Constituição de 1967 e a Emenda 1, de 1969, nos artigos 105 e 107

respectivamente, mantiveram as disposições das que a precederam,

acrescentando apenas, no parágrafo único, que a ação regressiva cabe em caso

de culpa ou dolo.

64

BRASIL. Constituição de 1934. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 65

BRASIL. Constituição de 1946. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 66

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 256.

34

Art. 105 - As pessoas jurídicas de direito público respondem pelos

danos que es seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.

Parágrafo único - Caberá ação regressiva contra o funcionário

responsável, nos casos de culpa ou dolo. 67

Atualmente vige o disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal de

1988:

A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos

Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,

publicidade e, também ao seguinte:

(...)

§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado

prestadores de serviços públicos responderão pelos danos que seus

agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito

de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. 68

O atual dispositivo constitucional manteve a linha traçada nas

Constituições anteriores, que desde a Constituição de 1946, consagrou a teoria da

responsabilidade objetiva do Estado. Segundo Di Pietro, conclui-se pela adoção de

tal teoria, visto que “se o dispositivo só exige culpa ou dolo para o direito de

regresso contra o funcionário, é porque não quis exigir a mesma coisa as pessoas

jurídicas”. 69

Mesmo entendimento apresenta Yussef Said Cahali:

(...) se o elemento culpa é previsto apenas para assegurar a ação

regressiva das pessoas jurídicas contra os funcionários causadores do

dano quando tiver havido dolo ou culpa deles, daí resulta, por exclusão,

67

BRASIL. Constituição de 1967. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 68

BRASIL. Constituição Federal 1988. Planalto. Disponivel em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 69

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p.623.

35

que, omitindo-se o corpo do artigo quanto a referir-se ao elemento

subjetivo, terá estabelecido que essas entidades devem reparar o dano

mesmo sem culpa, em qualquer caso; assim, a interpretação que se

extrai da ausência de referência ao elemento culpa do funcionário na

disposição principal só pode ser a de que prescinde desse elemento

subjetivo para a obrigação de indenizar nele estabelecida, de outra

forma não justificaria tal omissão, se sempre constou esse elemento da

legislação anterior.” 70

Destarte, na análise desse dispositivo pode-se concluir que o constituinte

estabeleceu que todas as entidades estatais e seus desmembramentos, estão

sujeitos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores,

independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. 71

Celso Antônio de Bandeira Mello, assevera que não há dúvida quanto ao

cabimento da aplicação da teoria da responsabilidade objetiva no caso de atos

ilícitos causadores de prejuízo ao administrado, bem como provenientes do

chamado “fato das coisas” que lesem os administrados. No entanto, ainda

vislumbra grande aplicação da responsabilidade subjetiva no caso de atos

omissivos, necessitando assim da determinação da responsabilidade pela teoria da

culpa ou falta de serviço, seja porque não funcionou, quando deveria funcionar,

seja porque funcionou mal ou funcionou tardiamente. 72

Para Di Pietro a regra responsabilidade objetiva do Estado, prevista na

Constituição vigente exige: 1) que se trate de pessoa jurídica de direito público ou

privado prestadora de serviços públicos; 2) que as entidades mencionadas prestem

serviços públicos; 3) que ocorra um dano a terceiros em decorrência da prestação

de serviço público,; 4) que o dano seja causa por agente de alguma das pessoas

jurídicas acima citadas; 5) que o agente, ao causar o dano, aja no exercício de

suas funções. 73

O Código Civil de 2002 em seu artigo 43 abandonou a teoria subjetiva da

culpa prevista no Código de 1916, e da mesma forma que a Constituição federal de

1988, estabeleceu o cabimento da responsabilidade civil objetiva da administração:

70

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 32. 71

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 653. 72

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit.,p. 996. 73

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 624.

36

Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente

responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem

danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores

do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo. 74

1.6 Causas excludentes e atenuantes da responsabilidade civil do Estado

Segundo entendimento predominante da doutrina entende-se que a

Constituição vigente adotou a teoria da responsabilidade objetiva. Para os que

defendem o desdobramento da teoria do risco em administrativo e integral

prevalece a opinião de que se adotou a do risco administrativo, cabendo a teoria do

risco integral só em casos pontuais, expressamente previstos em lei.

A teoria do risco administrativo, ou simplesmente teoria do risco isenta a

Administração quando presente alguma causa excludente que venha a romper o

nexo de causalidade entre a conduta estatal lesiva e o dano.

Assim, diante da responsabilidade objetiva, o Estado só se isenta de

responder se não existir o nexo de causalidade entre o seu agir e o dano

produzido. E esse nexo deixa de existir quando presente uma das causas

excludentes da responsabilidade do Estado. Em síntese, o Estado, tão somente, se

exime de ter de ressarcir terceiro se não foi o autor da lesão que lhe foi imputada,

ou se a situação de risco atribuída a ele inexistiu ou foi irrelevante ou sem relevo

decisivo para eclosão do dano. 75

Nas palavras de Maria Sylvia Zanella:

Sendo a existência do nexo de causalidade o fundamento da

responsabilidade civil do Estado, esta deixará de existir ou incidirá de

forma atenuada quando o serviço público não foi causa do dano ou

74

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Planalto. Disponivel em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 05 mai. 2008. 75

STOCO, Rui. Op. cit., p. 1014.

37

quando estiver aliado a outras circunstâncias, ou seja, quando não for a

causa única. 76

São causas excludentes da responsabilidade estatal: a força maior, caso

fortuito, a culpa da vítima, a culpa de terceiro, o agente estatal fora de suas

atividades.

Na concepção de Di Pietro força maior é o “acontecimento imprevisível,

inevitável e estranho à vontade das partes, como uma tempestade, um terremoto,

um raio”. Para a autora, diante da força maior não pode incidir a responsabilidade

do Estado, visto que rompe o nexo de causalidade entre o dano e o

comportamento da Administração. 77

Cabe destacar que a distinção utilizada pela autora baseia-se que o caso

fortuito refere-se aos casos ocorridos em conseqüência do homem, enquanto a

força maior refere-se aos casos ocorridos por motivos naturais. Já Cavalieri Filho

entende que caso fortuito é o evento imprevisível e por isso, inevitável e força

maior é previsível, porém inevitável, por estar acima das forças do agente. Para o

autor a imprevisibilidade é o elemento indispensável na caracterização do caso

fortuito, enquanto a inevitabilidade é o da força maior. 78

Assevera, entretanto, Di Pietro que há casos em que mesmo ocorrendo o

motivo de força maior, a responsabilidade do Estado poderá ocorrer, se aliada à

força maior, ocorrer omissão do Poder Público na prestação de um serviço.

Exemplifica: “quando as chuvas provocam enchentes na cidade, inundando casas

e destruindo objetos, o Estado responderá se ficar demonstrado que a realização

de determinados serviços de limpeza dos rios ou dos bueiros e galerias de águas

pluviais teria sido suficiente para impedir a enchente”. 79

Assim, tendo em vista a força maior ser um acontecimento estranho,

imprevisível, que rompe o nexo de causalidade, em regra exclui a responsabilidade

do Estado. No entanto, levando em consideração doutrina de Celso Antônio

Bandeira de Mello, se verificado que o evento danoso veio a ocorrer, em

76

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 624. 77

Idem. ibidem, p. 624. 78

CAVALIERI FILHO, Sergio. Op. cit., p. 91. 79

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 625.

38

decorrência de omissão da Administração Pública em deixar de tomar medidas

cabíveis para evitar os danos, o Estado deve ser responsabilizado. Entretanto,

segundo o autor, a responsabilidade não é objetiva, mas subjetiva, nos ditames da

teoria da faute du service, porque proveniente de uma má execução do serviço

público.

Outra causa excludente da responsabilidade é a culpa da vítima, nesta o

lesado concorre total ou parcialmente no evento danoso. Se a culpa é exclusiva da

vítima, não responde o Estado, caso a culpa seja concorrente, atenua-se a

responsabilidade.

No entanto, adverte Bühring:

a culpa do lesado, que é frequentemente invocada para elidi-la, não é

por si só causa excludente de responsabilidade, o que se deve

demonstrar é que quem causou o dano foi a vítima e não o Estado.

Nesse sentido, se o causador do dano foi a suposta vítima e não o

Estado, haverá faltado o nexo causal (...) 80

Quando ocorre algo em decorrência de um terceiro alheio ao lesado e a

Administração, em que esta não concorreu no dano à vítima, configura-se o

chamado fato de terceiro ou culpa de terceiro. Caso o Estado não tenha concorrido

de maneira nenhuma no fato lesivo, não há responsabilidade.

Os danos causados a terceiros por agente público fora de suas

atividades funcionais, não obriga o Estado responder por esses danos. O

dispositivo constitucional prevê que a Administração responderá pelos danos que

seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assim fora de sua função,

responderá ele pessoalmente pelos danos que causou.

Na hipótese de o dano ter tido uma pluralidade de causas, de maneira

que todas concorram para o resultado, devem ser consideradas na determinação

da obrigação de ressarcir do Estado. Na concorrência de causas, a

responsabilidade do Poder Público deverá ser atenuada ou excluída. 81

80

BÜHRING, Márcia Andréa. Op. cit., p. 162. 81

CAVALIERI FILHO, Sérgio Cavalieri. Op. cit., p. 258.

39

CAPÍTULO 2 – A OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO GERADORA DE UM DEVER

DE INDENIZAR

2.1 A conduta omissiva

A expressão omissão significa uma ausência de ação; inércia, não fazer

aquilo que moral ou juridicamente se devia fazer.82 No caso em análise, o termo

omissão engloba, de certa maneira, as expressões inerte, moroso, ineficiente,

solerte, inação.

O conceito da omissão pode ser compreendido como a relação de

existência ou não existência de qualquer coisa, a não realização de um

comportamento exigido que o sujeito tinha possibilidade de realizar, a ausência de

um fato.

A omissão pode ocorrer quando o agente não tenha acorrido para

impedir o dano ou por haver sido insuficiente, em razão de comportamento inferior

ao padrão legal exigido.

Não apenas ações geram danos. A conduta omissiva pode ser também

propiciadora de danos, quando alguém tem o dever de agir e não age e por sua

inação deixa de impedir um sinistro. Esse dever de agir pode advir de lei, contrato

ou uma conduta anterior do próprio omitente, que criou um risco de dano, devendo

agir para impedi-lo.

Na lição de Cretella Júnior:

Omitindo-se, o agente público também pode causar prejuízos ao

administrado e à própria administração. A omissão configura a culpa

in omittendo e a culpa in vigilando. São casos de ‘inércia’, casos de

‘não-atos’. Se cruza os braços ou se não vigia, quando deveria agir, o

agente público omite-se, empenhando a responsabilidade do Estado

por ‘inércia’ ou ‘incúria’ do agente. Devendo agir não agiu. Nem como

82

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1986, p. 1223.

40

o “bonus pater familiae”, nem como o “bonus administrator”. Foi

negligente, às vezes imprudente e até imperito. Negligente, se a

solércia o dominou; imprudente se confiou na sorte; imperito, se não

previu as possibilidades da concretização do evento. 83

Autores como Celso Antônio Bandeira de Mello vêem a omissão não

como causa, mas como condição para a ocorrência de um dano. Para o referido

autor não se pode dizer que a omissão causou um dano, visto que para ele “causa

é o fator que positivamente gera um resultado”. A omissão seria mera condição, já

que o evento não ocorreu, mas que se houvera ocorrido, teria impedido o

resultado. 84

Só pode ser atribuída a responsabilidade oriunda de omissão àquele que

tinha o dever de agiu e não agiu. Como dito acima esse dever de agir advêm de lei,

contrato ou uma conduta anterior do próprio omitente, que criou um risco de dano.

Quando provém de lei deve ser respeitado o princípio da juridicidade.

Este é considerado o princípio basilar que rege os atos administrativos, praticados

pelo Estado. Nele é posto que a Administração pública somente poderá fazer ou

deixar de fazer algo, desde que prescrito por lei.

Na responsabilidade do Estado por conduta omissiva, o agente tem o

dever de agir, estabelecido em lei, mas, desobedecendo à lei, não age. Por não ter

agido, propicia um dano ao particular. Portanto, trata-se de uma conduta ilícita, isto

é, contrária à lei, em desacordo com o princípio da legalidade.

2.2 Possibilidades de Omissão da Administração pública

Sendo inerte o Estado pode, também, causar prejuízos ao administrado

e a própria Administração. Muitos são os casos em que o Estado, mesmo não

agindo ativamente e os danos não serem, diretamente, causados pelos agentes

públicos, pode vir a ser responsabilizado civilmente.

83

CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo. v. 8. 1. ed. São Paulo: Forense, 1970, p. 210. 84

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 980

41

Aborda-se-á nesta seção algumas questões que por uma omissão da

Administração podem dar ensejo a um dever de indenizar. Alguns casos a título

exemplificativo:

1) Enchentes

O saneamento básico insere-se no âmbito do dever jurídico da

Administração Pública. Muitas enchentes são propiciadas e agravadas devido a

falta de limpeza de rios, bueiros e galerias de águas pluviais que com as chuvas se

entopem e propiciam o acúmulo de água. A omissão do Estado em não fazer um

serviço de escoamento eficaz, limpar bueiros, deixar acumular lixo, e desde que

isso seja relevante para o desencadear de uma enchente que lese particulares, o

Estado fica sujeito a responsabilidade civil, mesmo sendo a chuva um fenômeno da

natureza.

Este é o entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INUNDAÇÃO EM

RESIDÊNCIA VIZINHA A CEMITÉRIO MUNICIPAL. BUEIROS E

GALERIAS PLUVIAIS ENTUPIDOS E MURO DE CONTENÇÃO DA

PROPRIEDADE PÚBLICA MAL ESTRUTURADO.

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DEMONSTRAÇÃO DO

DANO E DO NEXO CAUSAL. OMISSÃO DAS AUTORIDADES DO

MUNICÍPIO EM ATENDER ÀS SOLICITAÇÕES DE PROVIDÊNCIAS

DOS MORADORES LOCAIS. PRESCINDIBILIDADE DA

COMPROVAÇÃO DE CULPA DA ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA

DE EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE. ADEQUAÇÃO DO

VALOR INDENIZATÓRIO. QUANTIA PROPORCIONAL AO

CONSIDERÁVEL PREJUÍZO SUPORTADO PELO AUTOR.

REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE ACORDO

COM CONSOLIDADO POSICIONAMENTO PRETORIANO.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. REMESSA PROVIDA

PARCIALMENTE. 85

(TJ/SC, Apelação cível 2004.006783-6, Relator:

Vanderlei Romer, Data da Decisão: 20/05/2004)

85

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 2004.006783-6. TJSC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 08 ago. 2008.

42

2) morte de detentos

O Estado ao confinar um detento em um presídio o mantém sob sua

guarda. Caso este venha a ser morto por colegas de carceragem, o Estado viola o

dever de guarda e deve ser responsabilizado por não manter a integridade física do

detento.

Este é o entendimento do Supremo Tribunal de Federal, que adota a

responsabilidade objetiva:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 2. MORTE DE DETENTO POR

COLEGAS DE CARCERAGEM. INDENIZAÇÃO POR DANOS

MORAIS E MATERIAIS. 3. DETENTO SOB A CUSTÓDIA DO

ESTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. 4. TEORIA DO RISCO

ADMINISTRATIVO. CONFIGURAÇÃO DO NEXO DE

CAUSALIDADE EM FUNÇÃO DO DEVER CONSTITUCIONAL DE

GUARDA (ART. 5º, XLX). RESPONSABILIDADE DE REPARAR O

DANO QUE PREVALECE AINDA QUE DEMONSTRADA A

AUSÊNCIA DE CULPA DOS AGENTES PÚBLICOS. 5. RECURSO

EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 86

(STF,

RE 272839 / MT, SEGUNDA TURMA, RELATOR MIN. GILMAR

MENDES, D.J. 08/04/2005)

3) dano provocado em estabelecimento público de ensino

O Poder Público ao receber estudante em estabelecimento da rede

oficial de ensino, assume o dever de zelar pela sua integridade física. Deve-se

empregar todos os meios necessários para uma completa proteção ao aluno sob

sua guarda, sob pena de incidir a responsabilidade civil pelos danos ocorridos no

aluno, em decorrência de um não agir por parte dos agentes públicos.

Neste sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PODER

PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO -

86

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 272839/MT. STF. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 09 ago. 2008.

43

PRESSUPOSTOS PRIMÁRIOS DE DETERMINAÇÃO DESSA

RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO CAUSADO A ALUNO POR

OUTRO ALUNO IGUALMENTE MATRICULADO NA REDE PÚBLICA

DE ENSINO - PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO - FATO

OCORRIDO NO RECINTO DE ESCOLA PÚBLICA MUNICIPAL -

CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO

MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO PATRIMONIAL DEVIDA - RE NÃO

CONHECIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER

PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. (...) 87

(STF, RE 109615

/ RJ, Primeira Turma, Relator Min. CELSO DE MELLO, DJ

02/08/1996)

4) ineficiência na atividade fiscalizatória

O poder de polícia próprio do Poder Público abarca a autorização e

fiscalização das atividades, dos serviços e das obras regulamentadas, em cuja

consecução ou desenvolvimento deve estar presente a figura do agente

administrativo, no intuito de preservar a integridade física e patrimonial da

população. A autoridade administrativa, no desempenho de seu poder de polícia,

deve estar atenta no desempenho de seus executores, para que não fique sujeita a

ter de responder civilmente pelos danos que serviço ou obras venham a causar a

terceiros.

Em análise a ação de danos decorrentes de acidente oriundo de queda

de arquibancada, em que o poder estatal foi omisso na fiscalização, decidiu o

Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RESPONSABILIDADE CIVIL - ATO ILÍCITO - EVENTO ESPORTIVO

- QUEDA DE ARQUIBANCADA - MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO -

DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E MATERIAIS - LUCROS

CESSANTES. (...)

No caso sub judice, a responsabilidade que se pretende atribuir ao

Município está vinculada a uma conduta omissiva, mais

precisamente, na falta de fiscalização e na ausência do efetivo

exercício do poder de polícia em impedir que o evento esportivo se

87

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 109615/RJ. STF. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 09 ago. 2008.

44

realizasse nas condições retratadas nos autos. 88

(Apelação Cível

2002.019376-9, Relator: Newton Trisotto, Data da Decisão:

29/09/2003)

5) dano provocado por omissão do Estado em não regredir regime

prisional

Ao Estado cabe fiscalizar e manter a segregação do detento. A aplicação

da regressão de regime prisional de condenado que, praticou por diversas vezes,

falta grave, faz com que o Estado tenha que indenizar vítima do crime cometido

pelo infrator.

O Supremo Tribunal Federal assim já decidiu:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FAUTE DU SERVICE PUBLIC

CARACTERIZADA. ESTUPRO COMETIDO POR PRESIDIÁRIO,

FUGITIVO CONTUMAZ, NÃO SUBMETIDO À REGRESSÃO DE

REGIME PRISIONAL COMO MANDA A LEI. CONFIGURAÇÃO DO

NEXO DE CAUSALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

DESPROVIDO. Impõe-se a responsabilização do Estado quando um

condenado submetido a regime prisional aberto pratica, em sete

ocasiões, falta grave de evasão, sem que as autoridades

responsáveis pela execução da pena lhe apliquem a medida de

regressão do regime prisional aplicável à espécie. Tal omissão do

Estado constituiu, na espécie, o fator determinante que propiciou ao

infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro contra menor

de 12 anos de idade, justamente no período em que deveria estar

recolhido à prisão. Está configurado o nexo de causalidade, uma vez

que se a lei de execução penal tivesse sido corretamente aplicada, o

condenado dificilmente teria continuado a cumprir a pena nas

mesmas condições (regime aberto), e, por conseguinte, não teria tido

a oportunidade de evadir-se pela oitava vez e cometer o bárbaro

crime de estupro. Recurso extraordinário desprovido. 89

(RE 409203/

RS, Segunda Turma, Relator Min Joaquim Barbosa, DJ 20/04/2007)

88

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2002.019376-9. TJSC. Disponível em: www.tj.sc.gov.br. Acesso em: 08 ago. 2008. 89

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 409203/ RS. STF. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 09 ago. 2008.

45

6) acidente automobilístico por falta de sinalização e má conservação

das vias

A conservação, sinalização e fiscalização das ruas, avenidas, estradas e

rodovias insere-se no âmbito dos deveres jurídicos da Administração

razoavelmente exigíveis, cabendo-lhe proporcionar as necessárias condições de

segurança e incolumidade às pessoas e aos veículos que transitam. A omissão do

Estado em seu dever legal, quando razoavelmente exigível, e identificada como

causa do dano sofrido pelo particular, gera, em tese, a responsabilidade civil do

Estado. 90

Neste sentido já decidiu o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RESPONSABILIDADE OBJETIVA - INDENIZAÇÃO POR DANOS

DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRÂNSITO - VALA ABERTA NA

PISTA DE ROLAMENTO SEM A DEVIDA SINALIZAÇÃO - NEXO

CAUSAL ENTRE A OMISSÃO ADMINISTRATIVA E O DANO

DEMONSTRADO - DEVER DE INDENIZAR - CULPA

CONCORRENTE OU EXCLUSIVA DO CONDUTOR DO VEÍCULO

NÃO COMPROVADA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS -

ADEQUAÇÃO DO QUANTUM - REMESSA PROVIDA EM PARTE.

91(Apelação Cível 00.019613-4, Relator: José Antonio Torres

Marques, Data da Decisão: 29/03/2001)

7) furto de veículos em Zona Azul 92

Tema polêmico de grande embate doutrinário e jurisprudencial a

responsabilização civil do Município por danos ocasionados a veículos

estacionados na Zona Azul. Entende-se que ao pagar para estacionar na área

acobertada pelo sistema, o proprietário que venha a ter seu veículo furtado terá

direito à indenização por parte do Poder Público prestador do serviço.

90

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 230. 91

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 00.019613-4. TJSC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 08 ago. 2008. 92

Zona Azul é um espécie estacionamento em que o condutor paga uma quantia para que possa estacionar seu veículo em ruas públicas. É utilizado pelas Prefeituras, principalmente, nas grandes cidades, com o intuito de incentivar a rotatividade de vagas, delimitando as vagas em ruas e avenidas movimentadas.

46

Dessa forma já decidiu o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RESPONSABILIDADE CIVIL - FURTO DE VEÍCULO

ESTACIONADO EM ZONA AZUL - NATUREZA DA

CONTRAPRESTAÇÃO - TAXA DE POLÍCIA - DEVER DE

FISCALIZAR - OMISSÃO ESPECÍFICA - RESPONSABILIDADE

OBJETIVA - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - NEXO

CAUSAL - BOLETIM DE OCORRÊNCIA - APELO PROVIDO.

Sendo o instituto da Zona Azul decorrência explícita do poder de

polícia do Município, vez que, por meio de tal programa, são impostas

medidas restritivas do direito individual em benefício do bem-estar

social, configurada está a cobrança de uma taxa de polícia, regulada

por regras de direito público.

Ao controlar a Zona Azul, o IPUF, integrante da administração

indireta, presta o serviço público oneroso, sendo aplicável à espécie a

responsabilidade objetiva decorrente do art. 37, §6º, da Constituição

Federal.

Ora, "Pela teoria do risco administrativo, integrante da

responsabilidade objetiva, o Estado deverá indenizar sempre que a

atividade administrativa provocar um dano, salvo se a vítima

concorreu para o evento danoso ou originou-o através de seu

comportamento. O Estado, neste caso, deverá provar a culpa do

lesado ou a ocorrência de caso fortuito ou força maior para obter a

exclusão ou atenuação da responsabilidade estatal. Inteligência do

art. 37, § 6º, da Constituição Federal" (Ap. Cív. n. 51.986, da Capital).

Quanto à prova do dano, "A alegação de que o Boletim de Ocorrência

não tem valor probatório, porque lavrado por funcionário que não

presenciou o evento, por si só, não é suficiente para ilidir a presunção

de veracidade de seu conteúdo, pois se trata de instrumento público,

impondo para contestá-lo a apresentação de prova em sentido

contrário" (Ap. Cív. 1999.022934-3, de Lages).93

(Apelação Cível n.

2007.033068-1, Relator: Des. Francisco Oliveira Filho, Data da

Decisão: 06/02/2008)

8) proliferação de insetos, surto de doenças

93

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2007.033068-1. TJSC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 10 ago. 2008.

47

De acordo com o texto constitucional, a saúde é dever do Estado, que

deve ser garantido por meio de políticas sociais e econômicas que visem à redução

do risco de doença, cabendo ao Poder Público ações de controle e fiscalização

para preveni-las. Desta forma a ausência de ações administrativas eficazes na

prevenção de doenças, por ser uma das variáveis que resultam na proliferação de

doenças epidêmicas, pode fazer com que a Administração com sua omissão seja

responsável pelos danos causados a população.

Assim, já decidiu o Tribunal Regional Federal da 5ª Região:

CONSTITUCIONAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA. EPIDEMIA DE CALAZAR. LEGITIMIDADE DO MPF ANTE

O DIREITO À SAÚDE (ART. 129, III, CF). RESPONSABILIDADE

ESTATAL CARACTERIZADA PELA FAUTE DE SERVICE (...)

2. A responsabilidade estatal por omissão, também chamada de faute

de service, é de caráter subjetivo, caracterizando-se quando a

Administração deixa de agir na forma da lei e como ela determina.

3. A ausência de ações administrativas eficazes de prevenção da

leishmaniose visceral ("calazar"), imprescindíveis em face das

condições sociais e sanitárias de diversos Municípios do Estado do

Rio Grande do Norte, resultaram na vertiginosa proliferação da

doença, inclusive com a ocorrência de óbitos.

4. Caracterizado o mau funcionamento do serviço público de saúde,

cuja prestação é atributo dos demandados (art. 198, §§ 1.º e 2.º,

CF/88), implicando na responsabilidade do poder público na forma do

art. 37, §6.º, da Lei Máxima. (...) 94

(TRF 5, Apelação Cível nº 388223-

RN, Quarta Turma, Relator: Marcelo Navarro, DJ 04/01/2008)

9) dano ocorrido em tumulto

Cabe ao Estado o dever de zelar pela ordem e garantir a segurança de

seus cidadãos. Danos a particulares oriundos de movimentos de aglomerados

humanos, quando estes provocam depredação à propriedade privada, caso haja

uma omissão estatal em seu dever ostensivo de segurança por inércia de seus 94

BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Apelação Cível nº 388223/RN. TRF5. Disponível em: <www.trf5.gov.br>. Acesso em: 10 ago. 2008.

48

agentes, apesar da lesividade do movimento ser anunciada e potencial, pode gerar

ao Poder Público a obrigação de indenizar terceiros lesados. No entanto, como já

dito, não pode a Administração Pública ser responsável por qualquer dano em

decorrência da violência urbana.

Em ação de reparação de danos causada em propriedade rural pelo

“Movimento dos Sem Terra” entendeu o Supremo Tribunal Federal que a

responsabilidade do Poder Público é objetiva, quando este se omite no

cumprimento de ordem judicial de envio de efetivo policial para que evite danos:

CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO.

ARTIGO 37, § 6.º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DANOS

CAUSADOS POR TERCEIROS EM IMÓVEL RURAL.

DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. INDENIZAÇÃO.

ILEGITIMIDADE DE PARTE. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. (...)

Caracteriza-se a responsabilidade civil objetiva do Poder Público em

decorrência de danos causados, por invasores, em propriedade

particular, quando o Estado se omite no cumprimento de ordem

judicial para envio de força policial ao imóvel invadido. Recursos

extraordinários não conhecidos. 95

(STF, RE 283989 / PR, Primeira

Turma Relator:Min.Ilmar Galvão, Julgamento: 28/05/2002)

10) Atividades de risco

Sujeita está a Administração Pública e as empresas concessionárias, a

responsabilidade objetiva pelo risco potencial de algumas de suas atividades.

Em análise a dano causado por concessionário de energia elétrica a

particular, assim decidiu o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO

MATERIAL, ESTÉTICO E MORAL - ELETROCUSSÃO - PESSOA

JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO PRESTADORA DE SERVIÇO

PÚBLICO - ENERGIA ELÉTRICA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA

95

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 283989/PR. STF. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 09 ago. 2008.

49

- ATIVIDADE DE RISCO - CONFIGURAÇÃO DE CULPA IN

VIGILANDO - DANOS ESTÉTICOS E MORAIS IRREPARÁVEIS -

DEVER DE INDENIZAR DEMONSTRADO - RECURSO

DESPROVIDO. (...)96

(Apelação Cível 2001.005526-0, Relator:

Marcus Túlio Sartorato, Data da Decisão: 30/05/2003)

2.3 Responsabilidade Civil do Estado por omissão

Grande divergência há na doutrina e jurisprudência quanto à aplicação

do artigo 37, § 6º da Constituição Federal, quando o dano tornou-se possível em

decorrência da omissão do Estado. Parte entende que a responsabilidade estatal é

sempre objetiva, independente de ter sido causada por conduta comissiva ou

omissiva da Administração. Outra que em casos em que ocorre uma omissão do

Estado, a responsabilidade é subjetiva, que exige dolo ou culpa da Administração,

cabendo a parte comprovar a falta do serviço.

Para os que defendem a responsabilidade objetiva, quando o Estado

deveria agir e não agiu e tinha plenas condições com sua atitude prevenir/evitar o

sinistro danoso, pode vir a ter que indenizar os lesados, apenas demonstrado o

nexo de causalidade entre a conduta e o dano. Para os que defendem a

responsabilidade subjetiva necessário, ainda seria que a vítima demonstrasse

comportamento ilícito, consubstanciado na culpa ou dolo da Administração, em

suas modalidades negligência, imperícia ou imprudência. Dizem que o fato

causador do dano é alheio e não é causado pela Administração, mas mera

condição que propicia sua ocorrência, sendo necessário um elemento a mais para

responsabilizá-lo.

A doutrina capitaneada por Celso Antônio Bandeira de Mello, que tem

outros adeptos como: Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Maria Helena Diniz, Lúcia

Valle Figueiredo, Pablo Stolze Gagliano, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello,

parcialmente Hely Lopes Meirelles, sustentam que se o dano decorrer de uma

omissão do Estado se aplica a responsabilidade subjetiva.

Segundo Mello:

96

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 2001.005526-0. TJSC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 10 ago. 2008.

50

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do

Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficazmente) é

de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o

Estado não agiu, não pode logicamente, ser ele o autor do dano. E,

se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a

impedir o dano. 97

De acordo com esse entendimento para configurar a responsabilidade do

Estado não é suficientemente apenas a relação entre o dano sofrido e a omissão

estatal. Caso haja obrigação legal ao Estado de impedir um certo evento danoso, e

este por desídia da Administração venha a ocorrer será necessário que a vítima

comprove culpa do Estado que consistiria em provar que se o serviço tivesse

funcionado normalmente nada ocorreria. Se o Estado, apesar da imposição da lei,

não agiu ou atuou de maneira deficitária, abaixo dos padrões, responderá pelos

danos que causar. Contudo, se atuou de forma prudente e eficiente e mesmo

assim não conseguiu impedir o dano, não é cabível a sua responsabilização.

Neste sentido, prossegue Mello:

(...) inexistindo obrigação legal de impedir um certo evento danoso

(obrigação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de

impedi-lo mediante atuação diligente), seria um absurdo imputar ao

Estado responsabilidade por um dano que não causou, pois isto

equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la

prescindido de qualquer fundamento racional ou jurídico. Cumpre que

haja algo mais: a culpa por negligência, imprudência ou imperícia no

serviço, ensejadoras do dano, ou então o dolo, intenção de omitir-se,

quando era obrigado para o Estado atuar e fazê-lo segundo um certo

padrão de eficiência capaz de obstar ao evento lesivo. Em uma

palavra: é necessário que o Estado haja incorrido em ilicitude, por

não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente

neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal

exigível. 98

97

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 976-977. 98

Idem. Ibidem, p. 977

51

Para esse padrão legal exigível exposto pelo autor não há resposta

contida num dispositivo legal. No entanto, deve se pautar na normalidade da

eficiência, em que leve em consideração o estágio de desenvolvimento

tecnológico, cultural econômico, sempre tendo em vista as reais possibilidades

médias dentro do ambiente em que ocorreu o evento danoso. Dentro destas

possibilidades leva-se em conta o procedimento do Estado em situações análogas,

o nível de expectativa da sociedade, assim como o nível de expectativa do próprio

Estado em relação ao serviço. O nível de expectativa do próprio Estado pode ser

caracterizado, pelos parâmetros da lei que o institui e regula, pelas normas internas

que o disciplinam e até mesmo por outras normas das quais se possa deduzir que

o Poder Público, por força delas, obrigou-se, indiretamente, a um padrão mínimo

de aptidão. Assim, não cabe responsabilizar o Estado caso não tenha conseguido

evitar o dano gerado por força alheia, se ele atuou de maneira compatível com as

possibilidades de um serviço normalmente organizado e eficiente. 99

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, quando o Estado não é o

autor do dano não se pode dizer que o causou. Para ele a omissão ou deficiência

haveria sido condição do dano e não causa. Prossegue: “causa é o fator que

positivamente gera um resultado. Condição é o evento que não ocorreu, mas que,

se houvera ocorrido, teria impedido o resultado”. 100

Em síntese, entende Mello que quando o evento lesivo é propiciado por

ato omissivo, os danos não são causados pelo Estado, mas por evento alheio a

ele. A omissão é condição do dano porque propicia sua ocorrência, mas não é sua

causa.

Para o supracitado autor o Estado apenas deve responder por danos

quando estiver por direito obrigado a impedi-los, Conclui exemplificando, que

conduziria a um equívoco solução diversa:

Ademais, solução diversa conduziria a absurdos. É que, em princípio,

cumpre ao Estado prover a todos os interesses da coletividade. Ante

qualquer evento lesivo causado por terceiro, como um assalto em via

99

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 977-978. 100

Idem. Ibidem, p. 978

52

pública, uma enchente qualquer, uma agressão sofrida em local

público, o lesado poderia sempre argüir que o “serviço não

funcionou”. Admitir-se responsabilidade objetiva nestas hipóteses, o

Estado estaria erigido em segurador universal! Razoável que

responda pela lesão patrimonial da vítima de um assalto se agentes

policiais relapsos assistiram à ocorrência inertes e desinteressados

ou se, alertados a tempo de evitá-lo, omitiram-se na adoção de

providências cautelares. Razoável que o Estado responda por danos

oriundos de uma enchente se as galerias pluviais e os bueiros de

escoamento das águas estavam entupidos ou sujos, propiciando o

acúmulo de água. 101

Explanando exemplo semelhante ao de Celso Antônio Bandeira de Mello

(enchente propiciada por falta de limpeza em bueiros de escoamento, assim como

dano provocado por ato de terceiros numa multidão), Di Pietro entende que a

omissão deve ser analisada sob a ótica da responsabilidade subjetiva:

(...) neste caso, entende-se que a responsabilidade não é objetiva

porque decorrente do mau funcionamento do serviço público; a

omissão na prestação do serviço tem levado à aplicação da teoria da

culpa do serviço público (faute du service); é a culpa anônima, não

individualizada; o dano não decorreu de atuação do agente público,

mas de omissão do poder público. 102

Não obstante Celso Antônio Bandeira de Mello ser seu principal

representante dessa corrente, ele atribui a Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, o

fundamento e norte para o desenvolvimento de seu posicionamento. Traz citação

do referido autor, segundo entendimento é que “a responsabilidade do Estado por

omissão só pode ocorrer na hipótese de culpa anônima, da organização e

funcionamento do serviço, que não funciona ou funciona mal ou em atraso, e

atinge os usuários do serviço ou os nele interessados”. 103

101

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 979. 102

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 625. 103

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 980

53

Adepta à corrente, Lúcia do Valle Figueiredo entende que a

responsabilidade só será atribuída ao Estado caso haja prova de culpa ou dolo do

funcionário, visto que apesar de que o texto constitucional tenha consagrado a

teoria objetiva não há como se averiguar a adequabilidade da imputação ao Estado

na hipótese de omissão, a não ser pela responsabilidade subjetiva, somente por

ela dá para se verificar se havia o dever estatal de agir. 104

Gagliano e Pamplona Filho, não descartam a aplicação da teoria

subjetiva: ”o ocaso da culpa como fundamento do dever de indenizar não foi

desprezado também na responsabilização do Estado”. 105

Há autores que não identificam dificuldade em conviver num mesmo

ordenamento os dois tipos de responsabilidade. Hely Lopes Meirelles 106 admite

tanto a responsabilidade subjetiva quanto a objetiva em danos decorrentes da

omissão estatal, para isto faz a distinção entre danos decorrentes de agentes da

Administração (servidores) e os ocasionados por atos de terceiro ou por

fenômenos da natureza. Adota a teoria objetiva quando o dano é causado pelos

agentes da Administração:

(...) incide a responsabilidade civil objetiva quando a Administração

Pública assume o compromisso de velar pela integridade física da

pessoa e esta vem a sofrer um dano decorrente da omissão do

agente público naquela vigilância. Assim, alunos da rede oficial de

ensino, pessoas internadas em hospitais públicos ou detentos, caso

sofram algum dano quando estejam sob a guarda imediata do Poder

Público, têm direito a indenização, salvo se ficar comprovada a

ocorrência de alguma causa excludente daquela responsabilidade

estatal. 107

Entretanto, entende tratar-se de responsabilidade subjetiva nos casos

de danos provocados por terceiros ou por fenômenos da natureza:

104

FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 260. 105

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 192. 106

A obra Curso de direito administrativo do autor mencionado, é atualizada desde de 1990, por outros autores. 107

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 654.

54

(...) o que a Constituição distingue é o dano causado pelos agentes

da Administração (servidores) dos danos ocasionados por atos de

terceiros ou por fenômenos da natureza. Observe-se que o art. 37, §

6º, só atribui responsabilidade objetiva à Administração pelos danos

que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros. Portanto, o

legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da atuação ou

inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a

Administração por atos predatórios de terceiros, nem por fenômenos

naturais que causem danos aos particulares. Nessas hipóteses, a

indenização pela Fazenda Pública só devida se se comprovar a culpa

da Administração. E na exigência do elemento subjetivo culpa não há

qualquer afronta ao princípio objetivo da responsabilidade sem culpa,

estabelecido no art. 37, § 6º, da CF, porque o dispositivo

constitucional só abrange a atuação funcional dos servidores

públicos, e não os atos de terceiros e os fatos da natureza. 108

Marçal Justen Filho dispõe que há duas formas de dano derivado de

omissão do Estado: a) os casos em que uma norma prevê o dever de atuação e a

omissão corresponde à infração direta ao dever jurídico (ilícito omissivo próprio); b)

os casos em que uma norma proscreve certo resultado danoso, o qual vem a se

consumar em virtude da ausência da adoção das cautelas necessárias a tanto

(ilícito omissivo impróprio). O autor sustenta a tese de que nos casos de ilícito

omissivo próprio – quando o Estado deixa de agir quando legalmente obrigado

para tanto – a omissão é equiparada aos atos comissivos, para efeito de

responsabilidade civil do Estado, admitindo assim, nesses casos, a

responsabilidade objetiva. Entretanto nos casos de ilícito omissivo impróprio, em

que o sujeito não está obrigado a agir de modo determinado e específico, o

tratamento não é o mesmo. 109

Em contrapartida, outra parte da doutrina e jurisprudência entendem que

a atividade administrativa prevista no dispositivo, engloba não só a conduta

comissiva como também a omissiva. Os adeptos desse entendimento entendem

108

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 655. 109

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 800.

55

que a teoria da responsabilidade objetiva é aplicada em todos os casos de dano

que decorram da atividade estatal.

Nesse tipo de responsabilidade, a noção de culpa é substituída pela de

nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o prejuízo sofrido

pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou

mal, de forma regular ou irregular. Neste tipo de responsabilidade não há

necessidade de apreciação do dolo ou culpa. São adeptos desta concepção com

algumas variações de entendimento nomes como: Yussef Said CahaIi, Odete

Medauar, Celso Ribeiro Bastos, Diógenes Gasparini, Toshio Mukai, Sérgio

Cavalieri Filho, Buhring.

Toshio Mukai entende que a responsabilidade seria sempre objetiva,

sendo desnecessária, em conseqüência, a prova da culpa. Ao contrário do que

leciona Mello, acredita que a omissão do agente é também causa, não mera

condição. A causa do dano poderia, então, ser, indistintamente, a conduta

comissiva, ou a omissiva, do agente estatal. 110

Da mesma forma, Álvaro Lazzarini diz que o Estado responde,

objetivamente, sempre que demonstrado o nexo de causalidade entre o dano e a

atividade funcional do agente estatal, só podendo haver discussão sobre culpa ou

dolo na ação regressiva do Estado contra o agente causador do dano,

acrescentando que não é somente a ação, mas também a omissão, que pode

causar dano suscetível de reparação por parte do Estado. 111

De maneira semelhante entende Diógenes Gasparini:

O texto constitucional em apreço exige para a indenização uma ação

do agente público, dada a utilização do verbo causar (“causarem”),

Isto não significa que se há de ter por pressuposto uma atuação do

agente público e que não haverá responsabilidade objetiva por atos

omissos. Os danos são causados por ação ou omissão do agente

público. “O essencial”, assegura Hely Lopes Meirelles (Direito

Administrativo, cit. 554), “é que o agente da Administração haja

praticado o ato ou omissão administrativa no exercício de suas

110

MUKAI, Toshio. Direito administrativo sistematizado. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 105. 111

LAZZARINI, Álvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 443.

56

atribuições ou a pretexto de exercê-las”. Dessa forma, não cremos

assistir razão aos que entendem haver responsabilidade objetiva

somente nos casos de ação do agente público. Para nós, a

responsabilidade objetiva tanto decorre de uma ação como de uma

omissão. 112

Para Buhring tem-se por derradeiro que “a regra do ordenamento jurídico

brasileiro é clara: responsabilidade objetiva do Estado, baseada no risco,

independente de dolo ou culpa do agente, mesmo para os casos de omissão,

levando-se em consideração esta culpa ou dolo somente para fins de ação

regressiva”. 113

Para Yussef Said Cahali basta que seja exigível a conduta da

Administração que pudesse evitar o dano para que tenha caracterizada a

responsabilidade objetiva, visto que no descumprimento do preceito normativo já

se faz presente a idéia de culpa:

(...) desde que exigível da Administração Pública a execução da obra

ou a prestação do serviço que teriam prevenido ou evitado o evento

danoso sofrido pelo particular, identifica-se na conduta omissiva

estatal a causa bastante para determinar a responsabilidade objetiva

do Estado por sua reparação: no simples conceito de

descumprimento de obrigação exigível já está embutida a idéia de

culpa, só elidível se não demonstrada a excludente da inexigibilidade

do ato omitido, posto como causa do dano, se demonstradas as

exceções convencionais do caso fortuito, da força maior ou do próprio

ato do ofendido. 114

Para o autor a questão desloca-se para o âmbito da exigibilidade da

conduta estatal omitida, invocada como dano reparável. Para este autor o dever

jurídico descumprido de executar ou de prestar o serviço devido, colocado como

causa primária da responsabilidade do Estado, é circunstancial, a ser examinado

em cada caso concreto. Só na análise concreta se permitirá identificar se seria

112

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 618. 113

BÜHRING, Márcia Andréa. Op. cit., p. 153. 114

CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 221.

57

razoável exigir a atuação estatal no sentido de execução da obra ou serviço cuja

ausência ou insuficiência teria sido causa do dano sofrido pelo administrado. 115

No entendimento de Cavalieri os danos causados por omissão do Estado

são, assim como na conduta comissiva, regulado pela teoria objetiva, segundo o

doutrinador “a atividade administrativa a que alude o art. 37, § 6º, da Constituição,

engloba não só a conduta comissiva como também a omissiva”. 116 Entretanto,

alicerçado em Guilherme Couto de Castro tem a precaução de fazer distinção entre

omissão genérica e específica, no intuito de evitar que o Poder Público seja um

segurador universal:

Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a

situação propícia para a ocorrência do evento e, situação em que

tinha o dever de agir para impedi-lo. Assim, por exemplo, se o

motorista embriagado atropela e mata pedestre que estava na beira

da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser

responsabilizada pelo fato de estar esse motorista ao volante sem

condições. Isso seria responsabilizar a Administração por omissão

genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma

patrulha rodoviária, teve o veículo parado, mas os policiais, por

alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, ai já haverá omissão

específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do

resultado. Nesse segundo caso haverá responsabilidade objetiva. 117

Cabe ressalvar que em situações tais como os exemplos supracitados

por Mello e Di Pietro, que envolviam danos decorrentes de fenômenos da natureza

e fato de terceiro, Sérgio Cavalieri Filho tem semelhante entendimento, ou seja, a

adoção da teoria da faute de service. 118. O autor conclui, em tópico específico

tratando da responsabilidade subjetiva do Estado, que esta não foi banida no todo

do nosso ordenamento jurídico. 119

Com o mesmo entendimento de que o Estado não pode ser um

segurador universal alerta Willeman que não se pode chegar ao absurdo de

115

Idem. Ibidem, p. 222. 116

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 261. 117

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 261. 118

Idem. Ibidem, p. 275-76 119

Idem. Ibidem, p. 277

58

imaginar que todas as situações que configurem omissão estatal serão passíveis

de fazer surgir o dever de indenizar das pessoas jurídicas de direito público, com

fundamento na sua responsabilidade objetiva. O Estado não pode ser concebido

como um segurador universal de todos os males ocorridos na sociedade, mais

especificamente do segmento regulado. Somente as omissões específicas é que

devem ser levadas em consideração para a deflagração do nexo de causalidade e,

assim, da conseqüente obrigação de indenizar. 120

Para Deborah Dionísio é pertinente a distinção entre a Omissão genérica

e específica, no entanto não é ela que estabelece o dever de indenizar, sendo

mera auxiliar, porque bastaria a aplicação da teoria objetiva simplesmente e a não

responsabilização quando houvesse excludente de responsabilidade. 121

Há ainda quem entenda que nossa legislação abarcou a teoria do risco

integral ou responsabilidade objetiva agravada. Odete Medauar, influenciada por

esta teoria, entende que a responsabilidade do Estado, fundamentada na Teoria do

Risco Administrativo, apresenta-se, hoje, na maioria dos ordenamentos jurídicos,

regida pela teoria da responsabilidade objetiva. Acredita a doutrinadora que a

adoção da responsabilidade objetiva do Estado aduz igualdade de todos ante os

ônus e encargos deste e o próprio sentido de justiça [equidade]. Como nem

sempre é possível identificar o agente causador do dano, nem demonstrar o dolo

ou culpa, melhor se asseguram os direitos da vítima através da aplicação da

responsabilidade objetiva ao Estado.122

Outros como Cavalieri entendem que tal teoria tem aplicação somente

em atividades estatais de alta periculosidade, em que a atuação do Estado cria

elevado risco e situação propícia ao dano. 123 Dispõe que quando o Estado possui

a guarda de coisas perigosas, que expõe a coletividade a riscos incomuns, como

exemplos: depósito de explosivos, usinas nucleares, presídios. Não seria justo que

apenas alguns tivessem de sofrer prejuízos decorrentes de tais atividades, visto

120

WILLEMAN, Flávio de Araújo, Responsabilidade civil das agências reguladoras. Rio de Janeiro, Lúmen Júris, 2005, p. 31-32. 121

DIONÍSIO, Deborah Rico. Responsabilidade civil do Estado por atos omissivos da administração pública. 65 f. Monografia (Gradução) – UFSC, Florianópolis, 2007, p. 47. 122

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 430. 123

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 273-274.

59

que estas atividades existem em prol de toda sociedade, logo natural que todos

sejam solidários aos possíveis danos.

Como visto no item 2.2, a jurisprudência apresenta inúmeras decisões no

sentido de acolher a responsabilidade objetiva proveniente de omissão estatal,

prescindindo a comprovação de culpa por parte do lesado. No entanto há julgados

entendendo que a responsabilidade civil do Estado por omissão da Administração

Pública é subjetiva, principalmente quando os danos causados são em decorrência

de fenômenos da natureza ou atos de terceiros e a omissão é genérica.

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DO CASO DA DENGUE NO RIO DE JANEIRO

3.1 Apontamentos sobre a dengue

A doença da dengue no Rio de Janeiro, elevou-se de tal forma a ser

chamada de epidemia. A proliferação dos casos de contaminação pelo vírus da

dengue é assombroso e superior aos índices toleráveis pela Organização Mundial

de Saúde.

No início do ano de 2008, a cidade do Rio de Janeiro, bem como boa

parte do Brasil foi assolada pela dengue. Só no Estado do Rio foram registrados

142 casos de morte por dengue, até 25 de junho, segundo o relatório semanal da

Secretaria Estadual de Saúde. Outros 130 óbitos estão sob investigação. O

número de notificações de casos da doença alcançou 195.217 pessoas. 124

A omissão do poder público com políticas preventivas e de combate

incisivo, aliado, muitas vezes, ao descaso de cidadãos, que apesar de campanhas

de conscientização mantém-se inertes, propiciaram a grande proliferação da

doença.

A dengue é um dos principais problemas de saúde pública no mundo. A

Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 50 milhões e 100 milhões

124

Governo do Rio confirma 142 mortes por dengue no Estado. Folha Online. São Paulo, 25 jun. 2008. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u416162.shtml>. Acesso em: 29 ago. 2008.

60

de pessoas se infectem anualmente, em mais de 100 países, de todos os

continentes, exceto a Europa. Cerca de 550 mil doentes necessitam de

hospitalização e 20 mil morrem em conseqüência da dengue. 125

O mosquito transmissor da dengue, o Aedes aegypti, encontrou no

mundo moderno condições muito favoráveis para uma rápida expansão, pela

urbanização acelerada que criou cidades com deficiências de abastecimento de

água e de limpeza urbana; pela intensa utilização de materiais não-biodegradáveis,

como recipientes descartáveis de plástico e vidro; e pelas mudanças climáticas. 126

Em países tropicais, com é o caso do Brasil, as condições sócio-

ambientais são favoráveis à expansão do Aedes aegypti, pois o mosquito

transmissor raramente ocorre em temperaturas abaixo de 16° C e prefere lugares

entre 30° a 32° C, que, em geral, são considerados as áreas endêmicas para esta

doença. As condições do meio ambiente e as características urbanas das nossas

cidades favorecem o desenvolvimento e a proliferação do vírus. 127

As condições sócio-ambientais favoráveis à expansão do Aedes aegypti

possibilitaram uma dispersão desse vetor, desde sua reintrodução em 1976, que

não conseguiu ser controlada com os métodos tradicionalmente empregados no

combate às doenças transmitidas por vetores, em nosso país e no continente.

Programas essencialmente centrados no combate químico, com baixíssima ou

mesmo nenhuma participação da comunidade, sem integração intersetorial e com

pequena utilização do instrumental epidemiológico mostraram-se incapazes de

conter um vetor com altíssima capacidade de adaptação ao novo ambiente criado

pela urbanização acelerada e pelos novos hábitos. 128

A dengue necessita de constante controle, não há definitivamente um

período certo para se combatê-la. As doenças vetoriais, como a dengue precisam

ser combatidas constantemente e por todos (organismos governamentais e

125

Sobre a dengue. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://www.combatadengue.com.br/sobreadengue/index.php>. Acesso em: 29 ago. 2008. 126

Plano Nacional de controle da dengue – 2002. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/pncd_2002.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2008. 127

Porquê essa doença existe no Brasil. Secretaria do Estado do Mato Grosso do Sul. Disponível em: <http://www.veraosemdengue.com.br/pergunta/ver/34/0/>. Acesso em: 30 ago. 2008. 128

Plano Nacional de controle da dengue – 2002. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/pncd_2002.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2008.

61

cidadãos), mas existem períodos de maior intensidade de observação, atenção e

combate aos fatores que promovem algumas doenças.

A dengue é uma doença infecciosa febril aguda causada por um vírus da

família Flaviridae. Em todo o mundo, existem quatro tipos de dengue, já que o vírus

causador da doença possui quatro sorotipos: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. No

Brasil, já foram encontrados dengue tipo 1, 2 e 3. 129

A transmissão da dengue se dá através da picada da fêmea do

mosquito Aedes aegypti, hospedeiro intermediário do vírus da dengue. Geralmente

ocorre no verão, após períodos de chuvas, em decorrência do acúmulo de água

parada, local ideal para o desenvolvimento dos ovos do vetor da doença. Deve-se

combater a proliferação do mosquito, eliminar as possibilidades de

desenvolvimento das larvas dele, visto que o eliminar completamente seria muito

difícil, sem conseqüências drásticas para o meio-ambiente e para o homem.

Para se evitar a dengue é preciso impedir o contato do mosquito com o

ser humano, mas, como é praticamente impossível eliminar o mosquito, e dadas as

condições ambientais do Brasil, deve-se preferir o combate à larva, antes que ela

vire mosquito, ou seja, deve-se preferir atuar na fase mais frágil do ciclo de vida do

inseto, quando se tem mais chances de sucesso para as estratégias de eliminação

do vetor biológico.

É importante lembrar que os ovos que carregam o embrião do mosquito

podem suportar até 3 anos depois que a água já baixou e o recipiente secou, mas

assim que ele entra novamente em contato com a água, o ciclo de

desenvolvimento da larva se completa. 130

Combater os focos do mosquito transmissor é a única maneira de

prevenir as epidemias de dengue, doença dinâmica que pode evoluir rapidamente

para formas de maior gravidade.

Como ainda, não há vacinas, a prevenção deve se focar no combate ao

mosquito vetor, principalmente na fase larval do inseto, medida esta que necessita

de cooperação mútua entre a população e o poder público.

129

Sobre a dengue. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://www.combatadengue.com.br/sobreadengue/index.php>. Acesso em: 29 ago. 2008. 130

Porquê é difícil combater o mosquito.Secretaria do Estado do Mato Grosso do Sul. Disponível em: <http://www.veraosemdengue.com.br/pergunta/ver/34/0/>. Acesso em: 30 ago. 2008.

62

A dengue, desde os tempos de colônia, é conhecida no Brasil. O

mosquito Aedes aegypti, de origem, africana chegou ao Brasil junto com os navios

negreiros, depois de uma longa viagem de seus ovos dentro dos depósitos de água

das embarcações. O primeiro caso da doença foi registrado em 1685, em Recife.

Em 1692 teve o primeiro surto da doença, que provocou 2 mil mortes em Salvador,

reaparecendo um novo surto em 1792. 131

O mosquito Aedes aegypti tornou-se conhecido quando uma epidemia de

dengue atingiu o Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador, em 1846. Outros surtos da

doença foram registrados em 1851 e 1853, em São Paulo e em 1923 em Niterói.

132

Oswaldo Cruz, no início do século passado, implantou um programa de

combate ao mosquito que alcançou seu auge em 1909. Em 1957, anunciou-se que

a doença estava erradicada no Brasil, embora os casos continuassem ocorrendo

até 1982, quando houve uma epidemia em Roraima.

No Rio de Janeiro ocorreram duas grandes epidemias. A primeira, em

1986-87, com cerca de 90 mil casos; e a segunda, em 1990-91, com

aproximadamente 100 mil casos confirmados. A partir de 1995, o dengue passou a

ser registrado em todas as regiões do país. Em 1998 ocorreram 570.148 casos de

dengue no Brasil; em 1999 foram registrados 204.210. Outra epidemia com

diversas vítimas inclusive fatais deu-se no ano de 2002. 133

Como visto, a única maneira de evitar a dengue é não deixar o mosquito,

vetor da doença, nascer. No site do Ministério da Saúde,134 há página exclusiva

sobre a dengue, neste é apresentado maneiras de como combatê-la, com simples

atitudes, entre elas podemos enumerar algumas:

- tampar bem tampadas barris e tonéis de água;

- lavar semanalmente com sabão tanques utilizados para

armazenamento de água;

131

Combate à dengue. Disponível em: <http://www.combatadengue.com.br/sobreadengue/ index.php>. Acesso em: 29 ago. 2008. 132

Idem. ibidem 133

Idem. ibidem 134

Como combater. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://www.combatadengue.com.br/sobreadengue/index.php>. Acesso em: 29 ago. 2008.

63

- encher de areia a borda dos pratos dos vasos de plantas;

- manter a caixa da água fechada com tampa adequada;

- manter o saco de lixo fechado, fora do alcance de animais até o

recolhimento pelo serviço de limpeza urbana;

- não deixar água da chuva acumulada sobre a laje, etc

Segundo estudo da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da

Saúde são determinantes da expansão de dengue no Brasil:

- aumento da densidade populacional – 81% da população em áreas

urbanas;

- heterogeneidade na oferta regular de água entre as regiões do país;

- aumento na produção de lixo;

- condições favoráveis para a rápida dispersão do vetor – transporte de

pessoas e cargas;

- aumento na mobilidade da população e fluxo de turistas.

De acordo com dados do mesmo estudo de 1996 à 2006, duplicou o

número de municípios infectados, saltou de 1753 para 3970.

Com a rotineira proliferação a cada verão e ao aumento da gravidade da

doença, tendo em vista a introdução em nosso país do vírus tipo 3 da doença

(dengue hemorrágica) o Conselho Nacional de Saúde em 2002 editou a Resolução

nº 317 que reconheceu a impossibilidade de erradicação em curto prazo e

recomendou ao Ministério da Saúde a elaboração de um programa para reduzir a

incidência, índice de infestação e letalidade. 135

Diante do desenvolvimento da dengue e a introdução do sorotipo 3 com

grande facilidade de dispersão, o governo Federal elaborou o Plano Nacional de

Controle da Dengue em 2002, contendo políticas de combate ao mosquito da

dengue e atribuição de cada ente federativo. 136

135

BRASIL. Resolução nº 317 do Conselho Nacional de Saúde, de 9 de maio de 2002. Disponível em: <http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2002/Reso317.doc>. Acesso em: 31 ago. 2008. 136

Plano Nacional de controle da dengue – 2002. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/pncd_2002.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2008.

64

Como visto, é necessária uma mudança real de atitude em relação a

todos os que manipulam os fatores que promovem as oportunidades para a

manifestação da dengue, Estado, Município, União, sociedade, cidadãos. Essa

mudança de atitude inclui todas as pessoas, pois o principal fator de multiplicação

do vetor responsável pela epidemia, o mosquito Aedes aegypti, é a existência de

focos de água parada. Todos fazem uso diário da água para diferentes fins,

precisa-se reaprender a conservá-la e armazená-la.

3.2 Omissões do Estado que propiciaram a proliferação da dengue

No item anterior foram apresentadas algumas características sobre a

dengue. Nele se pôde ver o que é a dengue, como ela é transmitida, formas de

prevenção, políticas públicas de combate e controle.

Como se pode observar inúmeras são as causas para a proliferação da

dengue, tanto Poder Público ausente com o serviço preventivo e repressivo no

combate aos focos do mosquito Aedes Aegypti, como a população com hábitos

descuidados e ocupação desordenada, além ainda do clima propício, todas

contribuíram para os elevados índices da doença.

Apesar dos conflitos entre as esferas de governo todas União, Estados e

Municípios são responsáveis pelo surto da doença, visto que não cumprem com as

obrigações decorrentes no âmbito da competência de cada um.

Segundo o epidemiologista Edmilson Migowski, professor da

Universidade Federal do Rio (UFRJ), a negligência do poder público é a principal

responsável pelas epidemias de dengue ocorridas no país. Segundo ele, isso

acontece em todos os níveis.

Não combatem eficientemente o mosquito [Aedes aegipty,

transmissor da doença], não dão explicações dos exames aos

65

pacientes, não distribuem água nem soro oral nos corredores do

hospitais. E a verba para pesquisa é insuficiente.137

Para o pesquisador, a dengue é uma das doenças mais bem estudadas,

mas a população ainda não é suficientemente informada sobre algumas questões

fundamentais: “Não existe um remédio antitérmico que tenha sido desenvolvido

para a doença. Por falta de apoio, a gente não realiza esse tipo de pesquisa com

segurança.” Migowski lembrou também que ainda não existe uma vacina para

combater a doença.138

Podem-se enumerar algumas omissões do estado que propiciam a

proliferação da dengue:

1) ineficiência de campanhas informativas e educativas;

Há campanhas de veiculação nacional, informativas e educativas sobre a

dengue. Atualmente, não se pode dizer que não seja de conhecimento da

população a forma de transmissão da doença, o modo de como evitá-la, a

necessidade de combater a fonte de proliferação do mosquito aedes aegypt , os

sintomas indicativos de contaminação e a recomendação para que sejam

procurados, de pronto, postos de saúde.

2) falta de combate efetivo ao transmissor Aedes aegypti;

3) omissão da União Federal em repassar os recursos necessários ao

combate do mosquito transmissor da dengue;

4) não operacionalização do Plano Diretor de Erradicação do Aedes

aegypt;

Como visto, o Ministério da Saúde propôs Plano Nacional de Controle da

Dengue. A não efetivação deste plano caracteriza omissão da União, que, a

despeito da existência de previsão orçamentária, insensível ao problema, ao invés

137 XAVIER, Débora. Epidemiologista atribui epidemias de dengue a omissão do Poder Público. Agência Brasil. Obrasileirinho. Disponível em: <http://www.obrasileirinho.com.br/2008/03/epidemiologista-atribui-epidemias-de.html>. Acesso em: 31 ago. 2008. 138

Idem. ibidem

66

de executar programa tendente a debelar a epidemia que se avizinha, persiste em

frear verbas destinadas para esse fim.

5) implementação de programas ineficazes ou intempestivos.

Pode-se, ainda, citar o caso que foi notícia na mídia que demonstra a

ausência de atuação estatal, que fora a não aplicação de R$ 5,5 milhões pela

Prefeitura do Rio de Janeiro destinados ao município para combate a doença e a

não utilização de agentes de saúde disponibilizados pelo governo federal. Além de

diversos carros para o combate ao vetor paralisados em depósitos da Prefeitura.

139

Não obstante as omissões do Poder Público em suas esferas aqui

transcritas, cabe destacar que o alastramento da epidemia da dengue ocorrida no

País não se sucedeu por ação positiva do Estado, mas por fatores como: clima

tropical favorável à proliferação do mosquito aedes aegypti; urbanização crescente

associada à deficiência de limpeza urbana; não-utilização de materiais

biodegradáveis, que se acumulam formando recipientes de água, nos quais o

mosquito transmissor prolifera-se; resistência da população em colaborar, deixando

de implementar em suas respectivas residências as recomendações do Ministério

da Saúde e de órgãos diversos, e tantos outros fatores.

3.3 Responsabilidade civil por omissão estatal no combate e prevenção da

epidemia de dengue.

Analisada a responsabilidade civil do Estado e mais especificamente a

responsabilidade do Estado por atos omissivos, visualizando omissões em que a

jurisprudência já entendeu se tratar de danos propiciados pela inércia do Poder

Público, cabe agora derradeiramente analisar a questão proposta para o presente

trabalho.

Como visto no primeiro capítulo a teoria da responsabilidade civil do

Estado passou por grande evolução. Sabe-se que atualmente não se admite mais

139

QUINTANILHA, Gabriel. A epidemia da dengue e a responsabilidade do Estado. Revista Jurídica Consulex. Ano XII, nº 271, p. 37, 30 abr 2008.

67

a teoria da irresponsabilidade, na qual se afastava a responsabilidade do Estado

por qualquer prejuízo que seus agentes causassem a terceiros. O art. 37, § 6º da

Constituição Federal, como visto, prevê a responsabilidade objetiva pela conduta

comissiva de seus agentes, no entanto quanto a condutas omissivas o texto

constitucional não é expresso, fato este que gera divergências na doutrina e

jurisprudência.

Parte entende que o poder constituinte quis que a responsabilidade civil

do Estado fosse objetiva, independentemente, de ser a conduta comissiva ou

omissiva. Neste caso, o encargo para caracterização do dever de indenizar ou não

ficaria ao nexo causal entre a conduta omissiva e o resultado danoso. Para os

adeptos desta concepção a omissão pode ser sim causa do dano, e não mera

condição propiciadora para sua ocorrência.

Há, no entanto, aqueles que diante da suposta lacuna, vislumbram a

aplicação da responsabilidade subjetiva para danos decorrentes de omissões do

Estado. Tal teoria se pauta no elemento culpa, que terá de ser comprovada pela

vítima para a obtenção da indenização. Doutrinadores deste entendimento

acreditam que o Estado não pode ser causador de um dano com uma omissão,

esta seria apenas uma condição do dano.

O avançar da teoria objetiva da responsabilidade civil ruma ao

reconhecimento de facilitação da ação do lesionado na obtenção da reparação do

dano. A evolução do instituto preocupa-se com a efetividade do direito de

ressarcimento, tendo em vista a condição menos favorável do lesado,

vulnerabilidade esta que é uma das motivações para a responsabilidade estatal ser

objetiva , sob pena de poder ser impossível o exercício do direito de reparação.

Entende-se que a Constituição adotou a teoria da responsabilidade

objetiva, por danos causados por seus agentes tanto por ação ou omissão do

Estado, prescindindo a comprovação do elemento culpa por parte da vítima.

O ônus de provar a culpa da Administração seria, em alguns casos, difícil

e até inacessível de se demonstrar, o cidadão e seu procurador teriam que saber

detalhes mínimos para provar a culpa. Neste sentido, inclusive corrobora

entendimento de Celso Antônio de Bandeira Mello que apesar de entender a

responsabilidade ser subjetiva, prevê a possibilidade do reconhecimento de uma

68

presunção juris tantum de culpa do Poder Público ante a dificuldade do lesado de

dispor de meios que comprovem a omissão do Poder Público:

(...) nos casos, de “falta de serviço” é de admitir-se uma presunção de

culpa do Poder Público, sem o quê o administrado ficaria em posição

extremamente frágil e desprotegido ante a dificuldade ou até mesmo

impossibilidade de demonstrar que o serviço não se desempenhou

como deveria. O administrado não pode conhecer toda a intimidade

do aparelho estatal, seus recursos, suas ordens internas de serviços,

os meios financeiros e técnicos que dispõe ou necessita dispor para

estar ajustado às possibilidades econômico-adminstrativas do

Estado. Ora quem quer os fins não pode negar os necessários meios.

Se a ordem jurídica quer a responsabilidade pública nos casos de

mau funcionamento do serviço, não pode negar as vias de direito

indispensáveis para a efetiva responsabilização do Estado – o que,

na verdade, só ocorrerá eficientemente com o reconhecimento de

uma presunção juris tantum de culpa do Poder Público, pois, como

regra, seria notavelmente difícil para o lesado dispor dos meios que

permitiriam colocá-la em jogo. Razoável, portanto, que nestas

hipóteses ocorra inversão do ônus da prova. 140

Ao Estado cabe a prevenção de doenças, neste sentido dispõe a

Constituição Federal:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido

mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do

risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e

igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e

recuperação.

No mesmo sentido dispõe a Lei nº 8.080/90, que estabelece as

condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, e a organização e

o funcionamento dos serviços correspondentes:

140

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit.,p.979-980.

69

Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o

Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e

execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de

riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de

condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e

aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

O direito à saúde constitui o direito mais elementar e essencial do ser

humano, razão de ser da própria criação do Estado, motivo pela qual merece

máxima prioridade. A atenção à saúde constitui um direito de todo cidadão e um

dever do Estado, devendo estar plenamente integrada às políticas públicas

governamentais.

Indiscutivelmente, o Estado tem o dever de fomentar ações que visem à

redução de riscos de doenças, sobretudo quando é emergente a possibilidade de

uma possível epidemia. Na verdade, sequer haveria necessidade de lei estabelecer

tal dever estatal, porquanto é intuitivo que a Administração pública esteja voltada

para a gestão de interesses coletivos, o mais diversificados quanto for exigido por

essa coletividade, propugnado pela ordem social, objeto esse que se veria alijado

se a saúde pública fosse preterida.

As alegações de que o direito à saúde é norma programática e, portanto,

incapaz de produzir direitos e deveres entre cidadãos, individual e coletivamente, e

ao Estado, não cabe, tal caráter não pode ser mera promessa constitucional, sob

pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela

coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu dever.

Não obstante o exposto, não se pode exigir do Estado uma atividade

onisciente e onipresente, de modo a conseguir eliminar por completo os focos de

dengue. Todavia, é inaceitável que o Estado não se utilize de todos os meios

possíveis para que se evite uma tragédia amplamente conhecida e anunciada.

Como já explanado, a proliferação de mosquitos, transmissores da

dengue, decorre de inúmeros fatores como depósito de água, resistência da

população em mudar hábitos de higiene, clima tropical, falta de urbanização, falta

70

de programa efetivo de combate à doença. Destarte, mesmo podendo haver

omissão estatal no combate à doença percebe-se que concorrem atitudes de

terceiros, da própria vítima e fenômenos da natureza para causar o dano, o que a

princípio pode levar ao observador a uma isenção da responsabilidade do Estado.

Foi o que a princípio decidiu o Tribunal fluminense, entendendo que o contágio da

dengue por parte da vítima deu-se ao acaso e que a omissão do Estado, por se

entender genérica deveria ser comprovada pela vítima.

Em análise a ação de indenização por danos morais, em que a autora

alegara que contraiu a dengue em decorrência de omissão do município de Niterói

em adotar medidas de combate ao mosquito transmissor da dengue, e que isto lhe

acarretou enorme sofrimento, visto que permaneceu internada durante uma

semana, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu que:

(...) verifica-se que não havia o dever individualizado de agir, sendo

suposta omissão do município réu de natureza genérica e não

específica. Logo, o caso dos autos não trata de hipótese de

responsabilidade objetiva do Poder Público, que se funda na teoria do

risco administrativo, mas sim da responsabilidade subjetiva, que tem

como fundamento a teoria da culpa anônima, consistente na falta do

serviço ou no seu funcionamento defeituoso ou tardio, o que não foi

provado pela autora. O simples noticiário jornalístico, não é suficiente

a comprovar a alegada omissão do município réu. 141

Ao final concluiu que, não obstante, o artigo 196 da Constituição Federal,

que atribuiu ao Estado o dever de promover medidas de combate a doenças e

epidemias, a Administração pública não pode ser responsabilizada, visto que seria

impossível garantir que nenhum cidadão fosse infectado. De acordo com o relator

impor ao Estado tal responsabilização estar-se-ia aplicando a teoria do risco

integral, não recepcionada pelo ordenamento jurídico. 142

Em outra ação de indenização por danos, cuja causa de pedir era o óbito

de filha em decorrência de ter contraído dengue hemorrágica, o Tribunal

141

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 2007.00123817. TJRJ. Disponível em: <www.tj.rj.gov.br>. Acesso em: 04 set. 2008. 142

Idem. Ibidem

71

fluminense entendeu o caso tratar-se, novamente, de responsabilidade subjetiva,

sendo necessário se apurar se houve conduta omissiva e violação do dever jurídico

de agir, propícios a provocar o dano. Em laudo constatou-se não haver qualquer

foco na residência da vítima. No entanto, foram encontrados diversos focos no

quarteirão onde moravam.

Diante do laudo o relator se convenceu ser incontroversa a omissão dos

entes públicos na tomada de providências que seriam exigíveis, de forma razoável

para evitar a fatalidade. Para o julgador com o laudo comprovando o foco da

doença perto da casa da vítima restou demonstrado a relação causal entre a

omissão culposa e o dano, não prestando afastá-la em decorrência de culpa de

terceiro. In fine, responsabilizou solidariamente o município de Campos e o estado

da Rio de Janeiro com fundamento nos artigos 6º e 196 da Constituição e na Lei

8.080/90.143

Em sede de ação civil pública o Superior Tribunal de Justiça já se

manifestou quanto a relativo dano coletivo ante a omissão estatal frente a epidemia

da dengue. O Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte pretendeu, com a

ação, a realização de planos já existentes de erradicação da doença tida por

dengue e a conseqüente indenização das vítimas por ela atingidas em razão do

atraso ocorrido quanto à efetivação de tais planos.

Nesta entendeu que a responsabilidade é subjetiva, uma vez que a

ilicitude no comportamento omissivo é aferida sob a hipótese de o Estado deixar de

agir na forma da lei e como ela determina. Segundo o acórdão a omissão pode

ocorrer, e gerar a responsabilidade civil do Estado, quando não são implementados

programas de prevenção e combate à dengue; quando apesar de existirem

programas de eficácia comprovada, mesmo que levados a efeito em países

estrangeiros, o Estado, em momento de alastramento de focos epidêmicos, decida

pela implementação experimental de outros; quando verificada a negligência ou

imperícia na condução dos programas.

O STJ julgou incabível a reparação de danos ocasionada pela faute du

service publique visto que não fora possível registrar o número de vítimas

143

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 3302/2008. TJRJ. Disponível em: <www.tj.rj.gov.br>. Acesso em: 04 set. 2008.

72

contaminadas em decorrência do atraso na implementação do programa de

combate à dengue, não tendo sido sequer comprovado o efetivo atraso ou se ele

teria provocado o alastramento do foco epidêmico.

Segundo o relator Ministro João Otávio de Noronha não houve ilicitude

na conduta do Estado, não se verificando a culpa por negligência, imprudência ou

imperícia, uma vez que o serviço prestado condizia com as possibilidades

existentes. “Tal serviço pode não ter correspondido às expectativas geradas em

torno do mencionado plano de combate, mas era o que podia ser feito e, repito,

não foi apresentada pelo autor alternativa que não a implementada pelo

Governo”.144

Não obstante, entendimentos dos eméritos tribunais, entende-se que o

presente caso deve ser analisado e julgado sob a ótica da responsabilidade

objetiva, baseada na teoria do risco administrativo. No simples conceito de

descumprimento da obrigação atribuída ao Estado, segundo Yussef Said Cahali

145, já está embutida a idéia de culpa, não necessitando que esta seja averiguada,

podendo apenas se possível ser afastada por meio das causas excludentes.

Reforça-se o entendimento da responsabilidade objetiva do Estado por

omissão, no presente caso valendo-se dos ensinamentos de Sérgio Cavalieri Filho

e Marçal Justen Filho quando referem-se, respectivamente, a omissão específica e

ilícito omissivo próprio. Pois adequando o caso da dengue a essas teorizações

observa-se que a omissão nitidamente é específica justamente pelo fato de a

dengue, ser uma doença sazonal, rotineira, amplamente conhecida e que por ato

omissivo do Estado criou-se situação propícia para a ocorrência do evento danoso,

tendo em vista que, não obstante a grande probabilidade de se alastrar novamente

a dengue, não se agiu efetivamente a evitar o sinistro.

Ante o entendimento de adequar o caso à responsabilidade objetiva,

baseada na teoria do risco administrativo, cabe tecer algumas considerações à

cerca das possíveis excludentes de responsabilidade que podem ser argüidas pelo

Estado em sua defesa.

144

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 703.471 – RN. STF. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 09 ago. 2008. 145CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 221.

73

O fato de terceiro se total ou decisivo para a ocorrência do resultado,

afasta a responsabilidade do Estado, todavia se este fato concorre junto à omissão

do Estado, ambos em tese deveriam suportar a responsabilidade pelo dano. No

entanto, diante da impossibilidade de determinação de quem seriam os terceiros,

torna-se inaplicável tal excludente e de certa forma possibilita o entendimento de

que a sociedade num todo causa danos a um ou alguns cidadãos, não sendo

possível determinar especificamente o responsável, cabendo ressarcimento a

estes vitimados, baseado no princípio da solidariedade social e no preceito da

igualdade de todos ante os ônus e encargos da Administração.

A culpa exclusiva da vítima é inaceitável como defesa do Estado no

presente caso. Ainda que seja observado um foco da doença na residência da

vítima, não se pode afirmar que este seja isolado e sem relação com outros tantos

focos espalhados por toda uma região, assim como não será possível identificar a

origem do mosquito que picou a pessoa vitimada.

O caso fortuito também não parece uma defesa que prospere, visto que

de fato não se pode, ante todo um histórico da dengue em países tropicais e no

próprio Brasil, dizer que a dengue é imprevisível. Fica difícil ao Estado defender a

inevitabilidade, diante de notórias evidências. O Estado tinha previsibilidade da

possível ocorrência do dano e podia através de políticas públicas combater e

prevenir o alastramento da dengue.

A melhor linha de defesa é a excludente de força maior. O Estado

poderia argüir a impossibilidade de se evitar o ocorrido mesmo que se tomassem

todas as precauções e procedimentos possíveis. Assim caberia a Administração

apresentar todos os seus feitos na prevenção e combate, bem como demonstrar

que os meios utilizados na tentativa de se evitar o dano foram os mais eficazes

conhecidos. Poderia argüir que a doença ainda não tem uma vacina e que

depende de condições sanitárias que muitas vezes não tem como Estado

eficientemente sem o auxílio da população prover.

Entretanto, dizer que o Estado agiu eficientemente para prevenir a

dengue é ser insensível às devastadores conseqüências que a epidemia causou.

Exemplo disto fora a não aplicação pela cidade do Rio de Janeiro de verbas,

previstas no orçamento, destinadas ao combate e prevenção da dengue. Segundo

74

Relatório do Tribunal de Contas do Município, de janeiro de 2007, a prefeitura

deixou de aplicar R$ 5,5 milhões. Reforçado com tais dados, resta ainda mais

presente a responsabilidade do Estado, e conseqüente obrigação de ter de

indenizar os danos causados a terceiros em decorrência da doença.

75

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A dengue, nesse ano de 2008, novamente, foi manchete por todo o

Brasil. Inúmeras foram as vítimas fatais, milhares foram os contagiados.

Anunciada, porém não combatida de maneira eficiente, a dengue alcançou grau de

epidemia gerando diversos danos aos cidadãos.

De fato a população tem boa parcela de culpa pela proliferação do

mosquito transmissor da doença. Contudo, o Estado ao deixar de cumprir com

suas obrigações básicas como saneamento básico, bem como não ser eficiente

com suas políticas públicas de prevenção e combate a doença torna-se o principal

agente causador e propiciador dos danos.

Notoriamente, o instituto da responsabilidade do Estado passou por uma

enorme evolução ao longo dos últimos tempos. Sustentada inicialmente na

soberania, supremacia e inviolabilidade, no qual imperava a irresponsabilidade,

chegou-se, a um estágio em que o Estado responde objetivamente pelos danos

causados aos cidadãos, independentemente da apuração de culpa ou dolo de seus

agentes.

Pacífico é o entendimento de que o Estado pode vir a ser responsável

por condutas, comissivas ou omissivas, que causarem danos a terceiros, no

entanto quanto as condutas omissivas grande celeuma ocorre quanto a qual teoria

se aplica.

Com base no artigo 37, § 6º da Constituição Federal pode-se afirmar que

nos atos comissivos o Estado responde objetivamente, cabendo apenas a ele

argüir em sua defesa as causas excludentes da responsabilidade, tais como: caso

fortuito, força maior, fato de terceiro e culpa exclusiva da vítima; que afastem o

nexo de causalidade entre a conduta estatal e o dano.

Entretanto, quanto às condutas omissivas, inerte fora o poder

constituinte, razão à qual se apresentam entendimentos divergentes. Basicamente,

duas são as correntes: uma em que se entende que a responsabilidade do Estado

tem natureza subjetiva, e outra que sustenta ser a responsabilidade objetiva.

76

Hà ainda correntes, em que classificam a omissão em espécies, e que

admitem os dois tipos de responsabilidade, conforme a espécie de omissão,

exemplo disso é a que divide a omissão em genérica e específica, admitindo-se a

responsabilidade objetiva nesta última hipótese. Específica seria a omissão em que

o Estado tem conhecimento da ocorrência do fato ou ato que deveria evitar,

enquanto genérica seria quando o Estado se omitiu quando, tão somente, tinha por

disposição legal dever de evitar.

A princípio, a responsabilidade do Estado pela epidemia da dengue é

omissão genérica, pois, apenas há um dever legal abstrato de propiciar políticas

sociais que visem à redução do risco de doença. Todavia, se é evidente a

iminência de um dano e que rotineiramente ocorre, caracterizada fica a omissão

específica, visto que a administração pública tinha prévia dimensão do problema e

deveria atuar da melhor maneira possível para se evitar o sinistro, sendo sua

negligência causa preponderante para a epidemia da dengue.

A questão da responsabilidade civil do Estado por omissão apresenta

mais dificuldades políticas que jurídicas, visto que o reconhecimento indiscriminado

de causas poderá colocar em óbice o funcionamento da Administração. Entretanto,

tal justificativa não pode servir de parâmetro para se deixar de responsabilizar o

Estado, inclusive, deve servir a responsabilização, como uma forma de forçar a

Administração Pública a ter uma verdadeira iniciativa para que se evite os danos.

Entende-se que o fato em análise por tratar de omissão específica vem a

reforçar a idéia de que o Estado deve responder civilmente com base na teoria

objetiva, a todos aqueles vitimados pela dengue, porém se genérica fosse omissão,

o entendimento seria o mesmo, cabendo ao Estado defender-se baseado nas

causas excludentes da responsabilidade, que afastem o nexo causal entre a

omissão do estado e os danos causados e na falta de dever de agir.

77

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78

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