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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA XIV CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA JULIANY LUZ PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990 a 2010 FLORIANÓPOLIS (SC) 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA

XIV CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA

JULIANY LUZ

PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO

PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990 a 2010

FLORIANÓPOLIS (SC)

2012

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JULIANY LUZ

PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO

PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990 a 2010

Monografia apresentada ao XIV Curso

de Especialização em Saúde Pública da

Universidade Federal de Santa Catarina,

como requisito parcial para obtenção do

título de Especialista em Saúde Pública.

Orientador: Prof. Dr. Charles Dalcanale Tesser

FLORIANÓPOLIS (SC)

2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA

XII CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA

PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO

PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990 a 2010

JULIANY LUZ

Essa monografia foi analisada pelos professores e julgada e aprovada para obtenção do

grau de Especialista em Saúde Pública no Departamento de Saúde Pública da

Universidade Federal de Santa Catarina

Florianópolis, 13 de abril de 2012.

Profª Dra. Jane Maria de Souza Philippi

Coordenadora do Curso

Prof. Dr. Charles Dalcanale Tesser

Orientador do trabalho

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Dedico o presente estudo aos amigos que fiz durante o XIV Curso de Especialização em

Saúde Pública. Eles fizeram renascer em mim a chama de esperança no SUS, na

atenção primária e no atendimento de qualidade, público, universal, equânime e gratuito

no Brasil.

E a todos que acreditam que o SUS é um sonho possível.

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"Derrota após derrota até a vitória final."

Che Guevara

“Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.”

Antoine de Saint Exupéry

“Há homens que lutam um dia, e são bons;

Há outros que lutam um ano, e são melhores;

Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;

Porém há os que lutam toda a vida

Estes são os imprescindíveis.”

Bertold Brecht

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, como sempre, meu amigo, meu companheiro, meu guia.

Deus Pai e Filho, que sempre esteve do meu lado, quando caí e quando me reergui,

dando-me forças para continuar contra o óbvio, em busca de algo mais. Deus que guia

minhas mãos todos os dias no ato de ser médica.

Aos meus pais, Gilberto e Vera, que mesmo sem entender minhas escolhas, me

apoiaram incondicionalmente; que aprenderam comigo o amor pela saúde pública e me

ensinaram a retidão de caráter e a persistência nos meus sonhos, propiciando a mim um

caminho mais feliz até aqui.

À minha equipe do Centro de Saúde de Cachoeiras, Biguaçu. Foi meu maior

desafio e minha maior conquista. Nossas reuniões, discussões, problemas e vitórias

foram o combustível nessa caminhada. Vocês são responsáveis pelo meu entusiasmo,

mesmo que às vezes eu me sinta desanimada, vocês são meu motivo de voltar a

acreditar que podemos fazer diferente e melhor, sempre.

Também meu obrigada aos meus pacientes, que dividindo comigo seus

problemas e angústias me levaram a buscar, cada dia, mais conhecimento e mais

recursos para melhorar o atendimento no SUS (em nossa microesfera) e, na medida do

possível, sim, promover saúde.

Ao meu grande amigo, companheiro, e amor da minha vida, João Iran. Sem

você, teria sido mais difícil, menos emocionante e com certeza, com menos ondas e

areia. Sei que muitas vezes eu falei e você não entendeu, mas esteve lá, ouvindo e, de

alguma forma sabia, que estaria fomentando a minha vontade de ser sanitarista. Acima

de tudo, obrigada por ter dado um novo sentido na minha vida: “sorte no jogo e no

amor”, então.

À minha filha, Maria Julia, que veio alegrar minha vida em meio a tanto papel,

livro e artigos dessa monografia. Filha, eu sei que ainda não podes entender mas, tenho

certeza que as 34 semanas que você passou aqui dentro foram suficientes para sentir o

quanto esse trabalho foi, e é, importante na minha vida. Vou guardar para sempre na

memória as noites que passamos juntas, você dividindo o colo com o computador; você

me ensinou que posso ser mãe e médica.

Ao meu orientador, Prof. Charles Dalcanale Tesser, que pela segunda vez

aceitou o desafio de me orientar sem perder a paciência, intelectualidade e o humor;

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muito obrigada mestre; pessoas como você fazem pensar que a Saúde Pública vale a

pena. Suas ideias são sempre válidas, possíveis, aplicáveis e inspiradoras. Vou carregar

sempre comigo as lembranças das nossas conversas como um amuleto, para nunca

perder as esperanças e nem desistir de seguir trazendo mudanças para o processo de

trabalho na APS.

Muito obrigada a todos, vocês são imprescindíveis na minha vida.

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Luz, Juliany.

PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS

SERVIÇOS DE ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO

BRASIL: uma análise qualitativa de 1990 a 2010

61 p.

Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso) – Universidade

Federal de Santa Catarina – Curso de Especialização em Saúde

Pública.

1. Acolhimento 2. Atenção Primária à Saúde 3. Acesso aos

serviços de saúde.

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LUZ, Juliany. PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE

ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990

a 2010. 2012. 61f. Trabalho de conclusão (Especialização em Saúde Pública) – XIV

Curso de Especialização em Saúde Pública, Departamento de Saúde Pública, Centro de

Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis/SC.

RESUMO

A dificuldade de acesso aos serviços de saúde leva à necessidade da criação de

estratégias que facilitem e/ou possibilitem a utilização dos serviços de saúde. O sistema

assistencial vigente tem-se mostrado excludente e incapaz de criar estratégias capazes

de garantir o acesso dos usuários aos serviços de saúde; o acolhimento teoricamente

teria a função contrária às estratégias tradicionais, sendo uma prática includente, de

garantia da universalidade e promotora de equidade, no entanto, historicamente vem

desempenhando a função de funil, selecionando os indivíduos que irão se beneficiar da

atenção. O acolhimento é uma estratégia para: reorganização do modelo técnico-

assistencial, mudança do foco de trabalho da doença para o doente, destaque na

importância do trabalho de uma equipe multiprofissional, garantia do acesso universal

aos serviços de saúde, alcance de resolubilidade, humanização na assistência e estímulo

à postura acolhedora da equipe como um todo.

A seguinte revisão busca reunir as estratégias de acesso e acolhimento durante

1990 até 2010 com o objetivo de descrever e analisar os processos de acesso e

acolhimento dos usuários nos centros de saúde da atenção primária brasileira e fazer

uma análise qualitativa do tema assim como avaliar a resolubilidade que elas

proporcionaram, a partir da literatura sobre o tema.

Foram selecionados e lidos cento e vinte e seis (126) artigos que traziam a

temática do acesso aos serviços de APS e/ou estratégias de acolhimento na APS. Destes,

oitenta e três (83) foram selecionados para confecção do presente trabalho, sendo

referenciados ou simplesmente utilizados para sedimentação do conhecimento acerca do

tema. Quarenta e um (41) foram excluídos, por não se adequarem à metodologia.

De acordo com a literatura revisada, as experiências que abordaram práticas de

acesso e acolhimento que se mostraram mais eficazes fizeram a virada do modelo

técnico-assistencial com foco anteriormente voltado à doença para, então focar o

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doente; assim sendo, não é o paciente que deve se moldar ao modelo assistencial

vigente e sim as práticas do processo vivo do trabalho que devem se adequar às

necessidades dos usuários.

Palavras Chave: acolhimento; acesso/acessibilidade; atenção primária à

saúde/atenção básica à saúde.

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LUZ, Juliany. PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO E ACESSO AOS SERVIÇOS DE

ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: uma análise qualitativa de 1990

a 2010. 2012. 61f. Trabalho de conclusão (Especialização em Saúde Pública) – XIV

Curso de Especialização em Saúde Pública, Departamento de Saúde Pública, Centro de

Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis/SC.

ABSTRACT

Difficult access to health services leads to the necessity of developing strategies that

facilitate and/or allow using health care services. The current health care system has

proven to be exclusionary and unable for creating able strategies to guarantee user’s

access to its system; the host would, theoretically, has the function against traditional

strategies, being an inclusive practice, ensuring the universality and promoting fairness,

however, historically has played funnel function, selecting individuals who will benefit

from attention. Host is an strategy to: reorganizate technical-assistance model, changing

focus from disease to patient, emphasis on the important work of a multidisciplinary

team, ensuring universal access to health services, humanized assistance and encourage

the welcoming attitude of the team as a hole.

The following review looks for collecting access and host strategies from 1990 to 2010,

with the purpose of describing and analyzing the users access and hosting process on

Brazilian centers of primary health care and doing a qualitative analysis of the topic as

well as evaluating the resolvability they provided, form the literature about the topic.

Were selected and read one hundred and twenty six (126) articles that brought the issue

of access to APS services and/or APS host strategy. In this, eighty-three (83) were

selected for this research, being referenced or simply used for consolidate the

knowledge about the topic. Forty-one (41) were excluded because they do not fit the

methodology.

According to the literature reviewed, the experiments that have addressed access and

host practices which showed more effective made technical-assistance model,

previously focused on disease, focus on patient; therefore, it is not the patient who must

conform to the current health care model, but the living process of work practices that

must fit to users need.

Key Words: user embracement, access, primary health care.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

APS Atenção Primária em Saúde

BVS/BIREME Biblioteca Virtual em Saúde

ESF Estratégia Saúde da Família

GORD Grupo de Organização da Demanda

OMS Organização Mundial da Saúde

PNAB Política Nacional de Atenção Básica

PNH Política Nacional de Humanização

SF Saúde da Família

SUS Sistema Único de Saúde

UBS Unidade Básica de Saúde

ULS Unidade Local de Saúde

UPA Unidade de Pronto Atendimento

USF Unidade de Saúde da Família

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................14

OBJETIVOS .................................................................................................................18

MÉTODOS ....................................................................................................................19

RESULTADOS E ANÁLISE .......................................................................................21

CONCLUSÕES .............................................................................................................53

REFERÊNCIAS ............................................................................................................56

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INTRODUÇÃO

O conceito de saúde assegurado na legislação brasileira constitui-se como um

direito da cidadania a ser garantido pelo Estado e a universalidade da atenção implica,

necessariamente, a formulação de um modelo social ético e equânime norteado pela

inclusão social e solidariedade humana. Nesse sentido, o impasse vivenciado com a

concretização do acesso universal aos serviços de saúde requer uma luta constante pelo

fortalecimento da saúde como um bem público, e da edificação de uma utopia social

igualitária, tendo a saúde como direito individual e coletivo1 que deve ser fortalecido,

com o redimensionamento de novas práticas profissionais e gerenciais construídas a

partir de uma gestão democrática e participativa2. A saúde e o cuidado à saúde podem

ser considerados como resultado do confronto entre poder (dinheiro) e solidariedade. Ou

seja, como resultado do sistema econômico, mas também como fruto da vontade e da

solidariedade dos cidadãos3, 4

.

No Brasil, a saúde é direito de cidadania garantido em Constituição Federal

desde 19881. Na década de 90, com o intuito de tornar realidade os preceitos do sistema

de saúde descritos na Constituição Federal, ainda que com grandes dificuldades e

ambiguidades, inicia-se a implantação efetiva do Sistema Único de Saúde (SUS). Se os

legados da trajetória da política de saúde limitam a universalização da assistência

pública, não são suficientes para impedir que o sistema público venha se

institucionalizando. A predominância do SUS e seu impacto na população são

substanciais: o sistema público possui o maior número de estabelecimentos de saúde, é

responsável pela maior parte dos procedimentos e pela cobertura de três quartos da

população5.

O acesso à saúde, objeto de estudo do presente trabalho, é um conceito

complexo e polissêmico. Enquanto Donabedian acredita que o acesso pode ser sinônimo

de acessibilidade – ou seja, estratégias para facilitar o acesso aos serviços de saúde6 – o

sentido trazido pelo dicionário Houaiss7 fala de acesso como sinônimo de “entrada”,

correlacionando-se assim, tão intimamente à Atenção Primária à Saúde (APS), a qual

responde como “porta de entrada”8 do Sistema Único de Saúde. Subentende-se que a

acessibilidade figure a possibilidade de resposta a necessidades de saúde de uma

determinada população e acesso à utilização dos serviços de saúde. Donabedian trata o

acesso como características dos serviços que permitem que os mesmos sejam mais

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facilmente utilizados pelos usuários; é uma característica adicional à mera presença ou

disponibilidade de um serviço em um lugar e em um determinado momento. Para

sistematizar tal conceito, sugere-se a observação de duas dimensões que estão em

contínua interação: (a) a acessibilidade sócio-organizacional, na qual estão listados

todos os aspectos de funcionamento dos serviços que interferem na relação usuário x

serviços, tendo em vista à plena utilização, como horários de funcionamento das

unidades e o tempo de espera para o atendimento; (b) a acessibilidade geográfica que

diz respeito à distribuição espacial dos recursos, à existência de transporte e à

localização das unidades.6

Já Starfield8 distingue acesso de acessibilidade. O primeiro seria a forma de

percepção da acessibilidade, e esta seria a característica de oferta do acesso. Assim,

acesso seria a própria utilização do serviço enquanto que acessibilidade seria a

facilidade para se utilizar o serviço. Por fim, Goddard & Smith9 alegam que nem

sempre a acessibilidade garante o acesso, já que nem todas as populações podem ter a

mesma percepção das dificuldades e facilidades para a utilização dos serviços; as

experiências prévias com os serviços permeiam a forma como o usuário interpreta essas

facilidades e dificuldades e interferem na utilização dos mesmos.

Acesso e acolhimento articulam-se e se complementam na implementação de

práticas em serviços de saúde, na perspectiva da integralidade do cuidado. Com a

expansão e estruturação da oferta de serviços, durante o processo de construção do

Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, em que os municípios têm assumido a

responsabilidade pela atenção à saúde de seus munícipes, sobretudo, da rede de Atenção

Básica, o debate sobre o acesso a essas ações e serviços ganhou nuances qualitativas10

.

Teixeira identificou, em revisão da literatura, estudos com diferentes enfoques

e sentidos de acolhimento, destacando os relacionados à Saúde Mental, Enfermagem e

Organização dos Serviços11

. Pereira & Ayres, em análise da produção bibliográfica

sobre acolhimento relacionado à organização e planejamento nos serviços de saúde,

identificaram que o acolhimento como diretriz operacional passou a ser implantado, na

década de 1990, em alguns sistemas municipais de saúde, como experiências pioneiras

em municípios brasileiros que buscavam implementar mudanças técnico-assistenciais

com base no modelo “em defesa da vida12

.

Segundo Franco et al., o acolhimento propõe inverter a lógica de organização e

o funcionamento do serviço de saúde, partindo de três princípios: (a) atender a todas as

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pessoas que buscam os serviços de saúde, garantindo a acessibilidade universal; (b)

reorganizar o processo de trabalho, deslocando seu eixo central do médico para uma

equipe multiprofissional; (c) qualificar a relação trabalhador-usuário a partir de

parâmetros humanitários de solidariedade e de cidadania13

.

O acolhimento deve ser visto, portanto, como um dispositivo potente para

atender a exigência de acesso, propiciar vínculo entre equipe e população, trabalhador e

usuário, questionar o processo de trabalho, desencadear cuidado integral e modificar a

clínica. Dessa maneira, é preciso qualificar os trabalhadores para recepcionar, atender,

escutar, dialogar, tomar decisão, amparar, orientar, negociar16

. É um processo no qual

trabalhadores e instituições tomam para si a responsabilidade de intervir em uma dada

realidade, em seu território de atuação, a partir das principais necessidades de saúde,

buscando uma relação acolhedora e humanizada para prover saúde nos níveis individual

e coletivo14

. Esse processo exige metodologias participativas, que considerem a

negociação permanente de conflitos na convivência diária dos serviços de saúde10

.

O acolhimento como tecnologia leve do processo de trabalho, segundo

Merhy15

, vem colaborar com a mudança efetiva do modelo técnico-assistencial de

saúde, visando o usuário como centro das atenções prestadas. Atuando como uma

tecnologia para reorganização dos serviços, com vistas à garantia do acesso universal,

resolubilidade e humanização do atendimento13

. Quando utilizado sob a forma de

garantir a universalidade do acesso aos serviços de saúde, ele ainda é também

mecanismo que permite a equidade da assistência, garantindo os direitos do cidadão à

saúde. É pensar no acolhimento como uma materialização do direito do cidadão à

saúde16

.

Os usuários procuram as instituições buscando a resolução de seus problemas

de saúde, porém frequentemente não encontram valorização das suas queixas. Alguns

profissionais mantêm suas posturas de “detentores do saber”, desmerecendo o indivíduo

e o conhecimento sobre sua própria saúde e desestimulando-o a alcançar um elevado

coeficiente de autonomia16

.

Acolher, num dos sentidos adotados nesse trabalho, significa a postura do

profissional de saúde, e não apenas mais uma forma de atendimento existente no menu

de serviços prestados nos serviços. Acolhimento como forma de receber a população,

ouvi-la, sensibilizar-se com suas demandas e se corresponsabilizar por suas

necessidades de saúde, criando uma ponte entre usuário-funcionário, através do vínculo.

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A atenção primária, como porta de entrada e primeiro contato dos usuários com

os serviços de saúde deve ter no acolhimento um suporte ao início e continuidade do

trabalho prestado ao público, utilizando-o como ferramenta nas relações interpessoais,

facilitando o vínculo entre equipes e usuários e formando cidadãos mais pró-ativos em

seus processos saúde doença. Essa é uma realidade facilitada quando se trabalha em

centros de saúde com populações adscritas a equipes, próximo às residências desses

usuários, conhecendo a realidade local, estando dentro dos seus contextos cotidianos de

sofrimentos e dificuldades.

Assim como o SUS está em construção, o processo de acolhimento também

está se desenvolvendo. Por isso a dedicação de cada profissional, a valorização do

trabalho em equipe e a capacitação de todos é imprescindível para a implementação

dessa proposta, fazendo com que esta alcance seus objetivos e resultados satisfatórios16

.

Assim, umas das questões norteadoras do estudo foi a tentativa de responder

como as estratégias de trabalho podem ser adequadas de forma a garantia de acesso

universal. Como realizar o acolhimento de maneira eficaz a ponto de não sobrecarregar

a equipe e ainda assim não fechar o acesso ao usuário? Descrever quais as estratégias

operacionais e os significados envolvidos nas práticas de facilitação de acesso e de

acolhimento na atenção primária à saúde brasileira nas últimas duas décadas descritas

na literatura.

Ao avaliar as experiências de acolhimento descritas em artigos na literatura

brasileira no período de 1990 até 2010 nas principais revistas de Saúde Coletiva do país

foi possível elencar pontos positivos e negativos dos processos de trabalho para a

garantia do acesso na atenção primária brasileira e, com base nesses relatos, associados

a uma revisão bibliográfica sobre o tema, a autora propõe ao final diretrizes para a

organização de práticas de acolhimento eficaz como ferramentas que facilitam e

almejam viabilizar o acesso aos serviços de saúde, de maneira universal, equânime e

integral.

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OBJETIVOS

Objetivo principal:

Descrever e analisar os processos de acesso e acolhimento dos usuários nos

centros de saúde da atenção primária brasileira e fazer uma análise qualitativa das

estratégias de acolhimento criadas pelas equipes, assim como a resolubilidade que elas

proporcionaram, a partir da literatura sobre o tema.

Objetivos secundários:

- Avaliar qualitativamente o impacto das diferentes estratégias de processo

de trabalho voltadas ao acolhimento da demanda da APS;

- Descrever as estratégias de acesso ao cuidado e acolhimento nos serviços

de APS;

- Avaliar a influência das práticas humanizadas como forma de facilitação

do acesso na APS.

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MÉTODOS

O presente estudo foi baseado em revisão sistemática das experiências de

organização do acolhimento dos usuários, conforme diretrizes instituídas pela Política

Nacional de Humanização17

e das estratégias de acesso aos serviços de saúde na atenção

primária brasileira, entre os anos de 1990 e 2010.

É um estudo qualitativo, estruturado a partir da análise das publicações

disponíveis na base de dados online BVS/BIREME, através da pesquisa através de três

palavras-chave: acolhimento, acesso/acessibilidade e atenção primária à saúde/atenção

básica.

Também foram pesquisados manualmente arquivos relacionados ao tema nos

periódicos: Cadernos de Saúde Pública, Ciência e Saúde Coletiva, Interface

Comunicação Saúde Educação, Phisys e Saúde em Debate. A pesquisa se deu com a

análise dos índices remissivos dos citados periódicos, um a um, entre os anos de 1990 e

2010, em busca de fundamentação teórica e conceituação da temática do acolhimento e

de registros/análises de experiências acerca das práticas de acesso e acolhimento à

clientela na atenção primária à saúde.

Foram selecionados e lidos cento e vinte e seis (126) artigos que traziam a

temática do acesso aos serviços de APS e/ou estratégias de acolhimento na APS. Destes,

oitenta e três (83) foram selecionados para confecção do presente trabalho, sendo

referenciados ou simplesmente utilizados para sedimentação do conhecimento acerca do

tema. Quarenta e um (41) foram excluídos, por não se adequarem ao foco de interesse

adotado. Após a seleção dos artigos, os mesmos foram inicialmente divididos em dois

grupos: no primeiro estavam os artigos que tratavam da conceituação e do significado

acerca de acesso e/ou acolhimento, em número de cinquenta e oito (58) textos. No

segundo grupo ficaram os artigos que tratavam de experiências de acolhimento e acesso

na APS, em que ficaram os vinte e cinco (25) artigos restantes. Estes últimos - os vinte e

cinco (25) artigos que tratavam de relatos de experiências - foram analisados, resumidos

e classificados em estratificação criada pela autora de acordo com o tipo de experiência

descrita, conforme descrito mais adiante. Com base nesses achados se deu a

problematização e análise dos dados os quais são o objetivo maior do presente trabalho.

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Foi possível observar que cada artigo tentava fazer uma conceituação acerca

dos termos acesso e acolhimento nos serviços de atenção básica, para então

contextualizar o seu cenário de vivências no atendimento aos usuários na APS.

Durante a leitura e releitura dos textos do segundo grupo, os artigos foram

então reagrupados em três categorias, de acordo com a abordagem dos dados acerca da

descrição das experiências vivenciadas:

1. Experiência tangencial: quando o artigo teoriza sobre os temas,

no caso acolhimento, acesso à APS e estratégias de acesso à APS, mas não é

capaz de descrever claramente as experiências vivenciadas, impossibilitando a

análise crítica do trabalho, assim como a reprodutibilidade (parcial ou adaptada

que seja) ou a comparabilidade da experiência. Nessa categoria se enquadraram

quatro dos vinte e cinco artigos;

2. Experiência tradicional (tipo triagem): quando o artigo traz

experiências de acesso e acolhimento que relatam práticas que centralizam a

responsabilidade de atendimento e/ou resolubilidade em um único profissional,

de nível superior, em geral o médico; esse tipo de relato em geral traz menção a

processos de trabalho intermeados de ruídos, filas para o acesso e, acolhimento

como sinônimo de triagem. Nessa categoria foram incluídos quinze dos vinte e

cinco artigos;

3. Experiência Inovadora: quando o artigo traz experiências

inovadoras na forma de acolher o usuário no centro de saúde, seja através de

grupos de acolhimento, equipes próprias para o acolhimento da livre demanda,

ou sob a forma de uma postura acolhedora de uma forma em geral. Nessa

categoria se enquadram apenas seis dos vinte e cinco artigos, mostrando que

ainda são pouco divulgadas, ou mesmo, realizadas, estratégias inovadoras para a

facilitação do acesso aos serviços de APS no Brasil.

Os demais artigos encontrados, cinquenta e oito (58), que não tratavam de

experiências, foram utilizados para embasamento teórico da discussão a seguir. A autora

também contou com a sua experiência própria como médica da atenção primária,

utilizando as vivências da sua equipe de saúde da família com a demanda espontânea e

acolhimento para enriquecer a análise e discussão dos dados coletados.

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RESULTADOS E ANÁLISE

O desenvolvimento do texto a seguir trará os achados descritos na literatura

publicada segundo a metodologia anteriormente descrita. Estão descritos os achados

relativos às experiências com acolhimento e acesso à atenção primária à saúde que virão

separados em dois grupos temáticos: Tradicionais (tipo triagem) e Experiências

Inovadoras; ainda estarão brevemente descritas aqui as experiências que foram descritas

apenas tangencialmente, impossibilitando uma análise crítica da sua prática.

EXPERIÊNCIAS PRA ACESSO TRADICIONAIS:

Cunha18

, buscou avaliar a implantação de ações voltadas para a melhoria da

acessibilidade à atenção básica, através de um estudo de caso em um município onde a

descentralização da gestão da atenção à saúde encontrava-se em estágio avançado de

organização. A análise foi precedida da elaboração de um modelo teórico-lógico,

incorporando dimensões e critérios relacionados à acessibilidade a serviços de saúde.

Esse modelo corresponde a uma “imagem-objetivo”, que funciona como referência para

apreciação do grau de implantação da organização dos serviços e do componente

“acessibilidade”. Foram avaliadas três dimensões da acessibilidade – geográfica,

organização do sistema e organização dos serviços. Dentro de cada uma das dimensões

foram analisados subespecificações, que teriam o objetivo de qualificar a acessibilidade

por pontuações; quanto mais requisitos fossem preenchidos, mais fácil seria a utilização

dos serviços de saúde prestados, segundo o artigo em questão.

A dimensão organização dos serviços foi caracterizada por Campos como

aspectos relacionados à acessibilidade organizacional e geográfica, como características

do atendimento que facilitam o contato dos usuários com os serviços, a saber: (a)

horário de funcionamento das unidades: sendo que aquelas que apresentam trabalho em

3 turnos ou em 2 turnos ininterruptos são mais acessíveis do que as que fazem pausa

entre os turnos, ou trabalham apenas 1 turno; (b) sistema de marcação de consultas:

marcações que se realizam diariamente, sem horário marcado, sob livre demanda e/ou

demanda via ACS constituem, segundo o autor, o modelo mais satisfatório de marcação.

Essa também é afirmação de Souza19

, que traz o relato de uma experiência bastante

positiva em uma unidade com saúde da família ampliada, onde o acolhimento não só é

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realizado multidisciplinarmente como também não tem hora para acontecer; assim

mostrando que a postura acolhedora da equipe associada à ideia de priorização de riscos

na demanda facilitam o trabalho e geram equidade. Modelos de marcação com dias

fixos, como também citados por Barros e Sá20

são os piores modelos, e a marcação

diária com horário fixo se constitui um modelo intermediário para a acessibilidade; (c)

sistema de marcação de consultas por telefone: a unidades que trabalham com marcação

para qualquer procedimento via telefone são consideradas mais acessíveis que aquelas

que não possuem essa opção, e as que utilizam esse serviço para alguns tipos de

marcação constituem-se acesso do tipo intermediário. Aqui vale a pena lembrar que esse

tipo de “porta” pode dicotomizar o acesso, pois nem todos os usuários possuem essa

ferramenta (telefone) para seu benefício. Ainda assim, é válido colocar na balança as

melhorias que ela pode trazer, como por exemplo, trazer mais proximidade de acesso

aqueles que não podem ir até à unidade para agendar uma consulta, bem como evitar

consultas desnecessárias e deslocamentos desnecessários aos usuários através de

orientações que podem ser dadas pelo telefone – além disso, o uso de telefone celular ou

fixo está cada vez mais democratizado na nossa população, podendo-se prever pouco

efeito discriminatório indesejável de seu uso, talvez pelo contrário: os benefícios

superam amplamente os riscos e/ou discriminações; (d) sistema de marcação de

consultas e exames especializados: a melhor opção seria o agendamento assim que

solicitado, o usuário iria marcar e já sairia com a data para realização, sendo que existe

priorização para os casos mais urgentes; em casos de qualidade intermediária de acesso,

o usuário seguiria o mesmo protocolo já citado, só que precisaria voltar em outro

momento para saber para quando ficou agendado e por fim, em pior caso, existem dias

reservados para as marcações, e após marcado, é preciso vir à unidade para saber o dia

da realização do exame e/ou consulta; (e) existência de lista de espera: esse é um

sistema para preenchimento das vagas dos pacientes faltosos, que pode ser inexistente,

ocorrer sistematicamente ou de maneira informal; (f) existência de práticas de

acolhimento: foi correlacionado como pior índice quando o centro de saúde não possuía

qualquer forma de escuta ou priorização nos atendimentos, descrito nos trabalhos de

Assis21

, índice intermediário quando há acolhimento por profissional do nível médio

que faz a triagem dos pacientes que receberão atendimento de profissionais de nível

superior e por fim, o acolhimento eleito como satisfatório, aquele em que a livre

demanda e é acolhida por profissional de nível superior, elegendo-se as prioridades para

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atendimento e encaminhando quando necessário – descrito também nos trabalhos de

Takemoto e Silva22

e Nery23

. As colocações feitas quanto ao acolhimento realizado são

mais próprias à classificação de triagem de risco do que propriamente ao acolhimento,

já que é nítida a preocupação que se tem em atrelar o acolhimento ao atendimento

individual por profissional de nível superior, tanto que o acolhimento considerado

satisfatório é aquele em que o profissional de nível superior faz a classificação de risco

e atende os pacientes da demanda espontânea, conforme priorização de risco. A questão

que paira sob esse cenário é: será que é necessário que o acolhimento, para ser

satisfatório, tenha de ser realizado por profissionais de nível superior? Existem relatos

de experiência com acolhimentos realizados com profissionais de nível médio que

traziam certa insegurança por parte dos usuários, talvez pelo fato de precisarem passar

por uma escala de exposição do problema progressiva – primeiro conversam com o

auxiliar de enfermagem, que encaminha para a enfermeira, que encaminha para o

médico19

. Também fica o questionamento sobre até que ponto vai a perícia e capacidade

de atendimento dos técnicos de enfermagem para o acolhimento/atendimento dos

usuários que surgem na demanda espontânea; alguns autores comentam que o

acolhimento se mantém médico centrado devido às restrições de atendimento impostas a

estes profissionais, no entanto, talvez, com satisfatória capacitação, utilização de

protocolos clínicos e educação permanente, talvez pudesse ocorrer uma otimização das

atividades com aumento da resolubilidade dos acolhimentos realizados pelos

profissionais de nível médio. Outra evidência é que a prática deixa de ser restrita apenas

ao atendimento individual, fragmentado, e os auxiliares passam a enxergar mais

nitidamente o produto do seu trabalho. E, por isso mesmo, sentem-se e são mais

reconhecidos e valorizados (pela equipe e pelos usuários). O trabalhador desaliena-se

em alguma medida e, juntamente com o usuário-cidadão, atua como sujeito responsável

pela interação de ambos22

. Outra consideração diz respeito à disjunção entre marcação

de consulta e acolhimento: Tesser, Poli Neto e Campos24

e Norman e Tesser25

defendem, baseados em experiências empíricas, que o acolhimento deve ser realizado

pela própria equipe de referência (equipes de Saúde da Família) e atrelado à marcação,

de modo a evitar “agendamentos cegos”: aqueles realizados sem escuta qualificada

sobre o motivo da procura, e que pode gerar e comumente gera atendimentos médicos

agendados desnecessários. Isso demanda organização do trabalho e compartilhamento

interdisciplinar constante do acolhimento e da gestão agendamento dentro da própria

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equipe de referencia (de saúde da família); (g) encaminhamento para outro serviço

através do sistema de referência: quando há garantia do atendimento após

encaminhamento é considerado satisfatório o acesso; (h) retorno para o serviço de

origem com a contra-referência: se a contra-referência vem por escrito para a equipe de

origem ela é satisfatória, pois assim existe uma corresponsabilização pelo cuidado do

paciente, que mesmo tendo atendimento complementado por um profissional

especialista, continua em cuidado com a equipe da sua unidade de saúde; se a contra-

referência vem através de relato do paciente, ela pode se perder na memória do paciente,

ou vir distorcida,a través da interpretação dele, sendo assim de caráter intermediário, e

quando ela não existe, então é acesso insuficiente. Avaliação das barreiras

organizacionais: (a) tempo de espera para marcar consulta: foi considerado ideal o

tempo menor que 1h e insatisfatório quando mais que 2h; (b) tempo de espera entre a

marcação da consulta e o atendimento, também avaliado por Souza10

, Nery23

e Lima26

:

foi eleito como ideal quando entre a marcação e a realização da consulta em APS

decorrem no máximo cinco dias, e insatisfatório quando se passam mais de quatorze

dias; (c) tempo de espera para ser atendido na realização da consulta: satisfatório para

menos de uma hora e meia e insatisfatório como mais de três horas. Vale lembrar que a

população procura os pronto atendimentos em emergências de hospitais mesmo sabendo

da demora para o atendimento, isso porque, segundo Cecílio, existe a certeza do

atendimento. Algumas unidades de saúde, na busca pelo “atender a todos que chegam

ao sistema” acabam não conseguindo manter a qualidade do atendimento, correndo

contra o tempo e realizando consultas centradas na queixa-conduta, sem manter o foco

na integralidade e longitudinalidade que norteiam o atendimento da APS, perdendo a

legitimidade do atendimento, não realizando bem nem serviço de PA nem serviço de

APS27

; (d) existência de filas para marcação de consultas – esse ruído28

é com certeza

um dos principais efeitos colaterais de um acesso dificultado, provavelmente gerador de

demanda reprimida. As filas são sinal de que o usuário não confia na certeza do

atendimento, de sua existência diante da baixa oferta revelaram-se falácias diante da

efetividade das medidas adotadas em alguns estudos que adotaram acolhimento, que não

só foram capazes de extinguir as filas, dignificando a espera, como reduziram o tempo

para a marcação da consulta29

. Os ruídos devem ser percebidos como possibilidades de

reinterpretação a respeito do modelo instituído. É preciso saber interpretá-los e não os

abafar30

. Começa a delinear-se aquilo que Merhy28

classifica como a manipulação

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dessas tecnologias leves, que nada mais são do que nossas sabedorias, experiências,

atitudes, compromissos, responsabilidades para produzir saúde, acreditando ser

possível, como afirma Moraes31

operar na realidade e na frustração daí gerada.

Na acessibilidade geográfica, foram avaliadas: (a) distância entre a residência e

a unidade de saúde: aqui foi avaliado o tempo de marcha entre a casa do usuário e a

unidade de saúde, sendo considerado satisfatório quando menor de 15 minutos e

insatisfatório quando maior de 15 minutos, no entanto pode-se fazer a crítica, como já

citada por outros autores que a proximidade geográfica entre a moradia do cliente e o

serviço de saúde não se constitui no elemento central determinante de sua escolha, já

que esse fator pode não significar garantia de atendimento. Portanto, o acesso ultrapassa

a presença física dos recursos, dependendo muito mais da coerência do padrão

tecnológico com o tipo de demandas da comunidade32

. (b) distância entre a residência e

o Centro de Atenção Especializada (CAE) e laboratório: sendo considerados um tempo

de marcha superior a 60 minutos como insatisfatório e ideal menor que 30 minutos; (c)

existência de transporte: foi considerado ideal é que exista transporte tanto para o

laboratório quanto para as unidades de saúde especializada.

As características da gestão municipal e organização do sistema foram

descritas em relação à implantação das ações voltadas para acessibilidade aos serviços;

o critério 1 indagava sobre a garantia do acesso como diretriz do sistema, sendo

considerado satisfatório quando o acesso se traduz não só em diretriz, mas como ações

concretas descritas nos relatórios de gestão; o critério 2 indaga sobre a rede básica como

porta de entrada dos serviços de saúde, sendo considerado satisfatório quando a APS

serve de estratégia para reorientação do sistema de saúde e referenciamento para os

diversos sistemas, e intermediário quando a APS é alocada em locais onde exista maior

necessidade da população, como áreas rurais e periféricas, levando-se em conta o

critério de equidade sob a ótica de presença de saúde próxima à população necessitada.

Fica aqui a crítica à necessidade de se avaliar não apenas a localização dos serviços

como ferramenta para a garantia da equidade e sim a garantia para a utilização dos

mesmos e reorganização de fatores diversos que são determinantes sociais da saúde.

Pois, segundo Travassos33

, a equidade em saúde difere da equidade na utilização dos

serviços de saúde; a primeira tem relação aos processos de adoecimento e sua

correlação com as condições sociais dos indivíduos; e a segunda é importante, mas não

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suficiente para diminuir as desigualdades no adoecer e morrer dos diferentes grupos

sociais33

.

De um modo geral, Cunha18

afirma que as unidades onde existe Saúde da

Família implantado tiveram melhor desempenho na avaliação do acesso aos serviços de

saúde, no entanto, ficou claro que o acolhimento implantado no processo de trabalho era

basicamente relacionado à triagem da demanda espontânea, para avaliação daqueles que

seriam ou não atendidos pelo médico; importante lembrar que essa triagem só era

considerada satisfatória, se realizada por profissional de nível superior – em geral,

enfermeiro – perpetuando a cultura da subutilização da capacidade desse profissional,

que poderia ser mais resolutivo na sua abordagem, em vez de apenas triar a demanda.

Outro aspecto importante a ser relatado é a marcação das agendas médicas, onde alguns

cenários estavam instalados: 1. Marcação unicamente via ACS; 2. Marcação via triagem

(que era nomeado acolhimento); 3. Marcação diária em qualquer horário enquanto

existissem vagas; 4. Marcação diária, no início de cada turno; 5. Marcação em dias

específicos, no caso da unidade em questão, era feita 3 vezes durante a semana. É

preciso observar que a marcação sob livre demanda a qualquer hora, cuja existência foi

considerada um critério de qualidade, em geral padece de efeitos colaterais importantes

já mencionados acima: a presença de consultas desnecessárias, ou por que foram

solicitados por motivos outros que não um problema de saúde (motivos burocráticos,

repetição de receita, 2ª via de encaminhamentos, etc), ou porque os motivos eram

agudos o prazo de atendimento foi superior ao tempo de resolução natural do quadro,

etc, essa prática não é inaceitável desde que se tenha em mente que o objetivo da

atenção diária da livre demanda não tenho o caráter de pronto atendimento, as consultas

individuais devem ser realizadas diante de casos de real necessidade para não assumir

um caráter medicalizante no processo de trabalho da unidade.

A existência de práticas voltadas para o acolhimento só foram referidas pelos

profissionais das unidades com Saúde da Família, e ainda assim, fortemente

relacionadas ao processo de triagem administrativa, utilizada para priorizar os usuários

oriundos da demanda espontânea; esse fenômeno também é descrito nos trabalhos de

Souza19

, Takemoto e Silva22

, Schimith e Lima5, Maciel Lima

44, Coelho e Jorge

9, Trad e

Esperidião12

e Lima14

. Em uma das unidades, os usuários confundiram tal atividade com

a marcação de consultas, pois, ao não serem atendidos no dia, suas consultas eram

marcadas para outro dia. Ou seja, o espaço de marcação de consultas foi substituído

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pelo restrito horário da triagem da demanda espontânea. Esse fato pode significar

rechaço à demanda nas USFs para aqueles que não conseguirem o atendimento, assim

como para aqueles que procuraram a unidade em outros horários. Segundo Paim34

, o

modo de organização dos serviços, com base na oferta organizada de ações, tende a

superar as formas tradicionais de reorganização da produção de ações de saúde, cabendo

às unidades atender tanto indivíduos em busca de consultas e pronto atendimento

(demanda espontânea) quanto desenvolver ações visando ao controle de agravos e ao

atendimento de grupos populacionais específicos (oferta organizada). A marcação de

consultas por ACS ou apenas para grupos de risco oriundos de atividades coletivas,

assim como o restrito horário da triagem, deve ser vista com cautela. Se, por um lado,

ajuda a programar a oferta das unidades, por outro, gera frustração nos usuários que

desejam que os “privilégios” dos grupos sejam estendidos a todos10

. Embora haja

tradição sanitária no Brasil instituída a respeito, notadamente devido a grande influência

americana na construção técnica, social e simbólica da rede de Centros de Saúde

brasileira, atrelados à educação sanitária e ações de vigilância e saúde pública para

populações pobres periféricas e de baixa renda35,36

, desconectadas do cuidado clínico

como direito de cidadania e valorizando atividades preventivas e priorização de usuários

e grupos com maior risco de adoecimento e complicações, cabe um breve olhar crítico

para tal tradição, frente às modificações nas práticas preventivas ocorridas nas últimas

décadas. Estas se medicalizaram sobremaneira (através da medicalização dos fatores de

risco e do cuidado preventivo através de fármacos) e invadiram o cuidado clínico,

borrando a distinção prevenção-clínica, criando uma demanda excessiva por cuidado

desvinculado do sofrimento, fazendo aparecer uma nova potencial iniquidade possível

de ser questionada eticamente: teriam pacientes, relativamente saudáveis, com maior

risco, prioridade em relação aos pacientes doentes e sofrendo? Mereceriam os

hipertensos leves prioridade em relação ao cidadão comum adoecido? Isso não é uma

questão abstrata ou teórica ou filosófica, pois estudos mostram que cerca de metade dos

atendimentos médicos do EUA são consultas de check up, e estudos de demanda da

APS brasileira indicam ser esses pacientes hipertensos a maior demanda isolada dos

serviços de saúde da família37

.

Ramos e Lima2, descrevem o processo de trabalho de uma unidade trabalha nos

moldes tradicionais de organização, centrada na consulta médica, através da distribuição

de fichas o que também foi descrito por Souza19

e Schimith5, Assis

21, Schwartz

38, Trad e

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Esperidião39

, Souza10

e Lima26

. Não se conseguiu eliminar a fila e por isso, muitos

usuários ainda deixam a unidade sem ter seu problema resolvido. No entanto, há uma

preocupação forte com o atendimento humanizado e os entrevistados, em sua maioria,

referiram-se a isso como algo concreto no cotidiano do serviço.

Ramos e Lima2, trazem como definição de acolhimento a postura dos

trabalhadores para o atendimento das necessidades de saúde dos usuários; os usuários

consideram os fatores identificados como os que denotam qualidade do atendimento:

boa recepção, respeito ao usuário, relação humanizada e bom desempenho profissional.

Apesar de ser sabido a importância de se priorizar a humanização do atendimento, a

experiência descrita pelos autores não soube transcender a teoria e colocar em prática

essa humanização para além das relações burocraticamente agendadas, ou seja, não

conseguiu instituir um trabalho diário, contínuo e efetivo trabalhador-usuário em busca

da priorização dos atendimentos e resolução dos problemas dos usuários através desse

próprio encontro, relativizando a necessidade de uma consulta individual em si.

Foram também referidas condições inadequadas de espera até o início do

atendimento às 7 horas da manhã e feitas algumas sugestões, entre as quais a abertura

do prédio mais cedo aos clientes que passam a madrugada na fila. Essa questão estaria

resolvida se fosse abolido o sistema de distribuição de fichas no início da manhã, caso

essa atividade pudesse ser diluída ao longo do dia. Para isso, o autor cita como

resolução a maior disponibilização de consultas, que não precisariam ser

exclusivamente médicas. No entanto, pensando sob esta ótica, supõe-se que o

atendimento individual resolveria os problemas de acesso, no entanto isso acarretaria

numa centralização da responsabilidade sobre toda a demanda apenas sobre médicos e

enfermeiros, que são os responsáveis pelas consultas individuais, ocasionando, em

geral, sobrecarga do trabalho desses profissionais, como já descrito em literatura40

.

Uma possibilidade seria o empoderamento dos técnicos de enfermagem,

munidos do uso de protocolos, afim de não apenas recepcionar o usuário e triá-lo, mas

sim acolhê-lo e ouvi-lo, com escuta qualificada; utilizando protocolos que auxiliem a

resolver ou processar o problema do usuário. Para isso ele se utilizaria do vínculo com o

paciente e a corresponsabilização pelo desfecho favorável à queixa do usuário. Esse

profissional, desde que munido de saberes técnicos, postura acolhedora, humanizada e

integrado numa equipe de referência (a própria equipe de SF, no caso da ESF), e assim

supervisionado pelos profissionais médico e enfermeiro da equipe, pode tornar o

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acolhimento resolutivo e eficaz, sabendo que, se necessário, poderia discutir o caso com

demais membros da equipe, a fim de buscar ainda mais resolubilidade para o

acolhimento. Para isso, é mister que cada equipe de referência acolha como rotina

apenas os seus usuários adscritos, fazendo da longitudinalidade, atributo básico e

essencial da APS8, do vínculo daí decorrente e do conhecimento progressivo da coorte

de usuários acompanhada um instrumento de facilitação do acesso e do acolhimento, já

que a maioria dos usuários com o tempo serão pessoas conhecidas, o eu facilita

sobremaneira a avaliação de vulnerabilidades e riscos clínico-epidemiológicos e

psicossociais24

.

Souza10

, teve como objetivo avaliar o acesso e os processos de acolhimento em

três unidades de atenção primária; uma delas com Saúde da Família, outra uma unidade

de atenção básica tradicional e a terceira uma unidade com saúde da família ampliada.

O artigo traz a realidade do descontentamento da população em não ter o atendimento

imediato, mesmo com a equipe (ESF) tendo uma maior consciência da necessidade de

saúde do usuário. Os profissionais se sentem pressionados e relacionam a impaciência

da clientela com a cultura do Pronto-Atendimento e também com a relação médico-

centrada, já que alguns pacientes mostram-se descontentes em ter de passar por

atendimento de enfermagem antes do atendimento médico. Ainda é relatada forte

correlação ou mesmo identificação de significado entre acolhimento e triagem pré-

consulta. No entanto, em algumas unidades avaliadas, esse acolhimento-triagem deixa

de ser realizado apenas pela enfermagem, e passa a ser trabalho da equipe como um

todo, e todos os funcionários, inclusive agentes comunitários de saúde (ACS) ajudam na

recepção dos usuários, nos primeiros momentos da manhã. Nesta unidade existe o

esquema de distribuição de fichas para agendamento das consultas e assim Os ACS

chegam à unidade e vão triando os usuários, pensando, medindo e anotando nos

prontuários, ajudando a enfermagem com a demanda.

Existem evidências positivas quanto à humanização da equipe, a forma como

são acolhedores em sua postura; usuários referem que são bem atendidos, com educação

pela equipe e isso os faz ter vontade de continuar utilizando o serviço. Isso corrobora o

que é trazido na literatura quando se fala que a postura acolhedora é um acolhimento em

si14

. Existe uma preocupação por parte dos usuários que não fazem parte das ações

programáticas, pois eles não têm privilégios para a marcação das consultas e continuam

enfrentando filas de agendamento pela madrugada e convivem ainda com a incerteza do

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atendimento. Alguns reclamam que com o esquema de adscrição geográfica da clientela

diminuiu a oferta de serviços, e se antes eles tinham a liberdade de procurar em outras

unidades por atendimento, agora eles ficam presos a uma unidade que não atende a suas

necessidades, sem a certeza do atendimento nem a tranquilidade de que podem contar

com uma equipe resolutiva o suficiente, que se corresponsabilize com suas necessidades

de saúde e lhe fomente autonomia para resolver parte de suas questões por si mesmos41

.

Na unidade básica de saúde a ideia do acolhimento como uma “escada”, onde o

usuário inicia conversando com o técnico de enfermagem, que encaminha para o

enfermeiro se necessário e este, por fim, decide se o paciente precisa de atendimento

médico revolta alguns usuários, que se sentem invadidos e exaustos pela técnica de

enfermagem, e acreditam que eles próprios são capazes de decidir que tipo de

atendimento merecem receber. A falta de confiança na equipe é mais uma vez

exemplificada, e isso mostra que o trabalho continua médico-centrado e o modelo

queixa-conduta perdura a prática de pronto-atendimento na APS, deslegitimando a

função da unidade básica através do atendimento longitudinal, integral e vinculado,

indicando fragilidade da equipe enquanto tal em trabalhar junta. O artigo traz a cruel

realidade de algumas unidades em que além de não se realiza acolhimento de forma

alguma, ainda não é realizada a priorização dos casos para atendimento; e o cenário de

usuários com queixas agudas tendo atenção negada é diário. Traz também, como

contraste, por fim, uma experiência bastante positiva em uma unidade com saúde da

família ampliada, onde o acolhimento não só é realizado multidisciplinarmente como

também não tem hora para acontecer; assim mostrando que a postura acolhedora da

equipe associada à ideia de priorização de riscos na demanda facilitam o trabalho e

geram equidade, também descrito por Cunha18

.

Takemoto e Silva22

, escrevem sobre a concepção da utilização do acolhimento

como ferramenta de garantia do acesso do usuário aos serviços de saúde, para tanto as

equipes de Saúde da Família de cinco unidades organizaram seu processo de trabalho de

maneiras distintas em torno dessa nova prática. Algumas delas consideravam o

acolhimento como consulta médica eventual, sem agendamento, para os casos de

urgências ou quando havia vaga para médico e demanda de consulta; ou seja, o

atendimento médico era o acolhimento. Em outras unidades a triagem da enfermeira,

garantindo atendimento de enfermagem ou encaminhamento ao atendimento médico

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sem agendamento era o acolhimento. Assim, a avaliação de risco e atividade de apoio à

consulta do médico é que consistia a concepção de acolhimento dessas unidades.

Basicamente houve um aumento no trabalho dos técnicos em enfermagem, pois

estes, supervisionados pelo enfermeiro, iniciavam o primeiro contato com o usuário e

acolhiam a demanda espontânea: assim nenhum usuário saía das unidades sem alguma

forma de acolhimento. Apesar desse aumento de demanda à enfermagem, parece não ter

havido um rearranjo conjunto do trabalho da equipe toda no acolhimento, em que o

técnico passou a ser mais resolutivo e mais pró-ativo no processo saúde doença do

usuário, o que também foi facilitado por sua maior proximidade do usuário

historicamente desenhada como o técnico sendo o profissional que acolhe o paciente

desde sua entrada na unidade até a pós consulta. Esse vínculo pré-existente acabou

facilitando a relação acolhedora entre funcionário-usuário. Os auxiliares passam a

enxergar mais nitidamente o produto do seu trabalho. E, por isso mesmo, sentem-se e

são mais reconhecidos e valorizados (pela equipe e pelos usuários). O trabalhador

desaliena-se em alguma medida e, juntamente com o usuário-cidadão, atua como sujeito

responsável pela interação de ambos.

Takemoto e Silva22

, ainda fazem outra reflexão, agora centrada na necessidade

de implantação de protocolos de atendimento; a própria normalização de que as

auxiliares de enfermagem não poderiam estabelecer conduta nenhuma sozinhas, ou de

que auxiliares e enfermeiras não poderiam dispensar usuários com queixa sem avaliação

médica, acabou restringindo a possibilidade de atuação da equipe de enfermagem e

manteve uma lógica centrada nos saberes e práticas médicos. O acolhimento aparece

como uma outra atividade de apoio ao trabalho médico, que facilita esse trabalho,

organiza, e que acaba, talvez, por reproduzir e agilizar a lógica hegemônica, não

chegando a transformá-la mais substancialmente. Falam ainda sobre a experiência do

Centro de Saúde Joaquim Egídio que demonstra predominantemente ter a concepção de

que o acolhimento pode ser um momento de interação entre trabalhadores e usuários

com a finalidade específica de lidar mais com a necessidade dos usuários de estabelecer

vínculo com o trabalhador e equipe: necessidade de conversar, desabafar, falar dos

problemas. Mesmo quando não há um “problema de saúde” instalado, no sentido mais

restrito da expressão, como uma doença ou uma questão de ordem física que justifique a

procura pelo serviço.

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Observou-se que a escuta no Centro de Saúde Joaquim Egídio diferencia-se das

demais unidades, pois o trabalhador não escuta o que o usuário diz com o entendimento

de que ele precisa apenas falar, como se a escuta, pura e simples, fosse a resposta

necessária. A partir dessa escuta inicial, se a equipe julga necessário, um trabalho de

acompanhamento é desencadeado. O Centro de Saúde Joaquim Egídio tem uma equipe

que compõe o Núcleo de Saúde Mental da unidade, que tem como objetivo justamente

acompanhar esses casos, fazendo o que eles chamam de aconselhamento e também

avaliando a necessidade de encaminhamento para consulta de psicologia ou psiquiatria,

quando é o caso. Essa equipe é formada por uma enfermeira, uma auxiliar de

enfermagem, uma agente comunitária de saúde e uma médica clínica geral e conta com

o apoio matricial de uma psicóloga de um centro de saúde próximo. Assim, o

acolhimento é organizado por uma equipe que é qualificada, mas não é realizado por

toda a equipe, o que gera outra reflexão importante: o fato de haver um espaço

específico e uma equipe específica para o acolhimento pode desresponsabilizar o

restante da equipe por estabelecer relações acolhedoras e de investigação das

necessidades de saúde e comprometimento com sua satisfação nos demais espaços de

encontro e de atenção à saúde.

Tem-se, então, até aqui duas possibilidades de entendimento do acolhimento,

que podem estar mais ou menos juntas ou separadas: uma como postura diante do

usuário e suas necessidades, de contínua investigação e negociação das necessidades de

saúde e modos de satisfazê-las em todos os momentos do processo de produção de

serviços de saúde. E outra, como dispositivo capaz de reorganizar o trabalho na unidade,

uma etapa do processo de trabalho que tem como objetivo atender à demanda

espontânea, aumentando o acesso e humanizando as ações receptoras dos usuários no

serviço.

Schimith e Lima42

, escrevem uma análise qualitativa sobre o trabalho de uma

ESF quanto o acolhimento, acesso e vínculo. Na unidade de saúde em avaliação,

existem alguns entraves no acolhimento, que tem relação ao trabalho da enfermagem.

Na ESF a enfermeira é responsável pelo trabalho burocrático e de educação coletiva. A

enfermeira escolhe desenvolver atividades de prevenção e promoção, em detrimento de

ações clínicas, justificada pela dificuldade em garantir à população seu direito à

assistência. Cecilio27

diz que essa percepção faz parte de uma visão “purista” da

realidade baseada na vigilância da saúde. O artigo defende que a unidade básica deve ter

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suas funções ampliadas para atender integralmente os problemas de saúde de uma

população, realizando, além da prevenção e promoção, atendimento clínico ampliado,

garantindo os meios necessários à manutenção da vida. Franco13

afirma que a

responsabilização clínica e sanitária e a ação resolutiva, com o objetivo de defender a

vida das pessoas, só são possíveis quando se acolhe e vincula.

As atividades de recepção nessa equipe são feitas, via de regra, pelas auxiliares

de enfermagem, que seguem um cardápio preestabelecido de opções de

encaminhamento, limitado pela capacidade tecnológica da unidade. Constatou-se que a

auxiliar de enfermagem utiliza o critério “não tem febre” ou “não tem vaga” para negar

o acesso. Observou-se o encaminhamento de usuários para o serviço de pronto-

atendimento, ditado pela organização do trabalho e não pela necessidade do usuário.

Esta conduta corresponde ao que Campos43

e Cecílio27

apontam como elementos que

contribuem para a cristalização do imaginário popular, no qual o pronto- socorro é o

local que resolve todos os problemas agudos.

Schimith e Lima42

, trazem indícios, em vários momentos, de que a equipe não

se envolve com o sofrimento do usuário, não se corresponsabiliza pelas suas dores, seu

processo de adoecimento e resguarda-se apenas a sua atividade assistencial básica,

centrada no biologicismo, sem contextualizar o adoecer e as condições de vida da

população atendida. Sem o estabelecimento do vínculo real, não há troca, não há

acolhimento, não há resolubilidade duradoura. Cenário ilustrado dessa realidade são os

pacientes que “batem ponto” na unidade; muito provavelmente esses indivíduos não

estão sendo ouvidos, e assim, retornam muitas vezes, na tentativa de resolver seus

problemas. Muitas vezes, apenas ouvir é a resposta que o usuário espera. Considerando

que a atividade clínica aumenta a possibilidade de vínculo, assim como a

responsabilização com as necessidades do paciente, a sugestão é a aproximação da

enfermeira a essas atividades, a fim de que suas ações tenham mais impacto na saúde da

população, produzindo cuidados resolutivos e descentralizando as ações de saúde.

A pouca movimentação nesta unidade quando o médico não se encontra

confirma o modelo médico hegemônico instalado. A organização do processo de

trabalho da equipe de PSF mantém o sistema de fornecimento de senhas para o acesso à

consulta médica. A falta de acesso remete às várias discussões acerca da demanda

reprimida. Enquanto quem está de frente para os problemas, os trabalhadores, não

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sentirem a saúde como direito da população e o trouxerem à tona junto às instâncias do

poder, será difícil incluir alguma estratégia que reverta esse quadro.

Maciel Lima44

, trata da informatização do sistema de APS em Curitiba, com

objetivo de aumentar o acesso com base nos números da produtividade da equipe.

Nessa experiência as pessoas são avaliadas pelos técnicos de enfermagem e tem sua

consulta agendada numa fila virtual, informatizada. Os técnicos reclamam que são

pressionados pela chefia para evitar a formação de filas; eles dizem que as filas virtuais

são enormes, já que agora os pacientes são agendados no sistema informatizado de

marcação. De uma forma geral, os profissionais concordam que ainda há “burocracia”

no atendimento. O “acolhimento solidário” e a informatização do sistema de

atendimento implementaram algumas exigências para o acesso do usuário ao

atendimento nas Unidades. Exigências como cadastro atualizado do usuário, bloqueio

de área, presença do paciente para marcar consulta, são utilizadas como formas de

regulamentar o atendimento, organizá-lo para que se possa ter um melhor controle

“gerencial” do processo, portanto, maior eficiência e eficácia.

No entanto, essas exigências burocráticas, na prática tornam-se entraves ao

acesso do usuário ao serviço, o que leva ao questionamento a respeito do quanto a

burocratização pode tornar o serviço mais ou menos universal.

Outra questão importante levantada por Maciel Lima44

, é a insatisfação dos

trabalhadores da unidade, que se sentem pressionados não só pela demanda, mas

também pelas constantes exigências de “produtividade” pela chefia do serviço. Um

outro trabalho, de Feliciano et AL40

. Também é evidenciada a temática do Burnout que

ocorre com os profissionais da APS, em virtude desse cenário criado pela gestão, por

assim dizer - “Os médicos revelam enorme discrepância entre expectativas e realidade

do trabalho. Rejeitam a priorização institucional da consulta e cobrança de

produtividade. Sobretudo entre aqueles com maiores expectativas na conversão do

modelo, existe descrédito quanto às mudanças e há o desejo de desistir. Observa-se

amplo conjunto de elementos que favorecem o desenvolvimento simultâneo de

esgotamento e ineficácia profissional, e que provocam atitudes negativas40

.

Fica evidente, em Maciel Lima44

, pela descrição dos funcionários, que o

sistema não permite atender às pessoas com necessidades imediatas, e a informatização

acabou gerando ainda mais impessoalidade no atendimento, e não singularidade, como

se esperava. Os usuários passaram a ser vistos como números e pelo computador fica

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35

difícil saber quem precisa mais do atendimento. Esse esquema não acolhe o usuário de

forma humanizada, no máximo ele “tria e despacha” a demanda mecanicamente, sem

escuta qualificada, sem corresponsabilização ou troca entre a equipe e o usuário.

Assis2, descreve em estudo qualitativo sobre o acesso dos usuários às unidades

básicas de Feira de Santana (BA), com o objetivo de analisar a percepção dos usuários

quanto às características dos serviços utilizados no sistema local de saúde.

Segundo Assis2, o acesso é focalizado, ao restringir o atendimento público a

determinados serviços ou programas, e a universalização da atenção se traduz em um

sistema segmentado e desarticulado no âmbito interno do sistema público e na cadeia

organizativa do sistema como um todo.

A universalização não é contrária ao estabelecimento de critérios de

seletividade ou focalização, desde que esteja subordinada a uma política geral

universalizadora. Assim, mesmo a seletividade pode ser utilizada como um instrumento

de política social, mas não pode converter-se na política social, porque nesse caso

estaria quebrando o princípio da universalização45

.

Assis2

descreve dois cenários em seu trabalho, sendo o primeiro um ambiente

com reflexos médico centrados, com orientação dos usuários para a busca de consultas

médicas. Agendamento feito apenas uma vez na semana, para os dois dias seguintes

próximos, sem agendamento de uma semana para a outra. Existem muitas reclamações

por parte dos usuários, já que nem sempre conseguem o atendimento; aqueles que não

chegam de madrugada, não terão direito ao atendimento. Apesar de a enfermagem

exercer o direito da consulta de enfermagem, essa prática não tem a mesma divulgação

que a prática médica e odontológica, que merecem cartazes de indicação na porta do

serviço.

Presença de dois especialistas na unidade, que atendem por ordem de chegada,

sem esquema de priorização dos atendimentos. Não há prática de matriciamento, não há

consultas em conjunto com o médico generalista ou demais profissionais da equipe. É

importante assumir que nenhum profissional possui todas as ferramentas necessárias

para exercer o cuidado. É necessário trabalho em equipe mas este somente pode ser

exercido na perspectiva sob compartilhamento e matriciamento. Merhy15

considera vital

compreender que o conjunto dos trabalhadores de saúde apresenta potenciais de

intervenção nos processos de produção do cuidado. Esses potenciais estão marcados

pelos núcleos específicos de competência de cada profissão ou ocupação profissional. A

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perda dessa dimensão cuidadora pode ser apontada como outra causa da grave crise

atual do modelo médico-hegemônico46

.

Outra questão, que vale a pena ser relembrada, novamente, é a “necessidade”

que o usuário cria para consumo de consultas médicas individuais; a alternativa para

solucionar essa questão pode vir do processo de politização do sujeito, que pressupõe o

rompimento com o modelo de saúde centrado na cura individual e nos interesses

particulares construídos historicamente pela sociedade. Para (des)construir essa lógica

de atenção individual e privatizada, na tentativa de vislumbrar um sistema de saúde

público, coletivo, universal e igualitário, é preciso envolver governo, trabalhadores de

saúde e usuários, por meio da participação social consciente na gestão e no controle

social do sistema.

O segundo cenário descrito por Assis2

trata-se de um centro de especialidades,

onde os usuários vão em busca de consultas médicas com filas para distribuição de

fichas de atendimento sem priorização dos casos associada a uma demanda excessiva

refletida em grande filas desde a madrugada. A recepção dos usuários é feita por

recepcionista que distribui senhas de atendimento e o agendamento é para até 8 dias; os

que chegam bem cedo consegue atendimento, os demais terão de voltar na próxima

ocasião.

A prática do acolhimento como tecnologia para atender a livre demanda não é

utilizada no artigo em questão, impossibilitando a concretização do princípio da

universalidade, tão almejado na construção do SUS. O cenário da realidade é que o

princípio da universalidade, garantido em lei, é reinterpretado na prática social não

como um universalismo inclusivo, como direito de cidadania, mas como um

universalismo excludente, expressado em oferta de serviços limitantes e de baixa

resolubilidade.

A proposta de Acolhimento no Brasil sugere formas de atenção à demanda

espontânea que não impliquem simplesmente maior acesso à consulta médica, mas

propõe-se a servir de elo entre necessidades dos usuários e várias possibilidades de

cuidado. A ideia seria retirar do médico o papel de único protagonista do cuidado,

ampliar a clínica realizada pelos outros profissionais e incluir outras abordagens e

explicações possíveis (que não somente as biomédicas) para os adoecimentos e

demandas47

.

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37

Nesse trabalho o processo de acolhimento fica a cargo dos auxiliares de

enfermagem; eles mencionam que a implantação do acolhimento como estratégia de

acesso à demanda espontânea levou ao aumento da procura dos serviços por parte dos

usuários, sem a consequente ampliação de trabalhadores de saúde e de espaço físico,

ocasionando desgaste no cotidiano da equipe, repercutindo na qualidade dos serviços

prestados e também diretamente na sobrecarga de trabalho e na demora pelo

atendimento. O texto refere que o funcionário que se sente pressionado a atender mais

rápido, pode trabalhar de maneira mecânica e não realizar acolhimento efetivo, sem

fazer escuta qualificada, sem humanização; diminuindo, na verdade, a qualidade do

atendimento prestado.

Nery23

, enfoca a questão da organização das agendas, que ainda é um assunto

delicado. Seu estudo demonstra que ainda existem dificuldades internas e externas para

o agendamento de consultas por horário e a incorporação destas alternativas em função

do atraso do médico e do usuário quanto ao horário agendado, gerando conflitos entre a

equipe e a população.

Outro agravante é o entendimento de alguns funcionários de que o usuário do

SUS pode esperar pelo seu atendimento; ou seja, eles não veem a prestação universal de

serviços do sistema como um direito, mas como um “favor”. Com esse tipo de

mentalidade, fica difícil pôr em prática a universalidade de forma plena. As concepções

dos profissionais, sua subjetividade, sua compreensão sobre direitos, cidadania, podem

influenciar no atendimento prestado, como neste caso em que o trabalhador entende o

sistema de saúde apenas como uma benesse aos menos favorecidos e não um direito

constitucional.

Coelho e Jorge48

, escrevem sobre como os usuários e trabalhadores percebem o

acesso, acolhimento e vínculo como tecnologia leve na atenção básica do município de

Fortaleza (CE). Como recursos tecnológicos, acesso, acolhimento e vínculo representam

uma relação estabelecida entre trabalhadores e usuários, para que as ações de saúde

sejam mais acolhedoras, ágeis e resolutivas.

Segundo Coelho e Jorge48

, há evidências de que a falta de comunicação entre

os integrantes da equipe dificulta o processo de acolhimento ao usuário; assim como a

definição errônea do que é o acolhimento impossibilita boa prática de atendimento na

UBS. Alguns trabalhadores acreditam que o acolhimento se restringe às informações

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38

dadas aos usuários dentro da unidade, assim como ajudá-los a se localizar espacialmente

dentro das instalações da UBS resumem o que é acolhimento.

Conforme afirmam Coelho e Jorge48

os funcionários veem a agilidade no

atendimento como sinônimo de qualidade, assim como não deixar nenhum usuário sem

atendimento. É realizado priorização dos atendimentos pelo critério de riscos. Fica claro

que o acolhimento está sendo mecanizado, sem troca de saberes, sem escuta qualificada;

constituindo-se em pura triagem de risco.

Quanto mais flexíveis e versáteis os profissionais, quanto mais diversificadas e

pouco ritualizadas suas ações, quanto mais misturadas e trabalhando juntas as pessoas,

quanto mais aberto e acessível o serviço a todos os tipos de demanda, maior a

possibilidade de a equipe imergir no mundo sociocultural de sua área de abrangência, de

trocar saberes pessoais e profissionais, de realizar melhor o Acolhimento e garantir o

acesso24

.

No entanto, a escuta, a avaliação de risco/vulnerabilidade, a orientação, a

resolução de problemas e o cuidado fazem parte do “campo de competência” de todos

os profissionais. Discutir os casos conjuntamente em vez de simplesmente basear-se em

protocolos e fluxogramas também facilita uma abordagem ampliada dos problemas. O

encaminhamento excessivo para outros profissionais, que começam todo o cuidado de

novo, tende ao reforço da lógica hegemônica e à fragmentação do cuidado24

.

Barros e Sá20

, examinam o processo de trabalho de uma unidade de saúde da

família (USF), em um município de pequeno porte, no interior do Estado do Rio de

Janeiro. Partem da pergunta sobre o que estaria levando a população adscrita a uma

USF ao serviço de emergência (SE) de um hospital geral. Entender o porquê da

demanda na porta do serviço de urgência/emergência poderá subsidiar a reorganização

do sistema de saúde local.

Se, por um lado, a literatura do Ministério da Saúde sobre saúde da família

relata que, em média, 85% das demandas e ações por serviços de saúde podem ser

resolvidos no primeiro nível de atenção, por outro lado, a maior parte dos atendimentos

realizados nos serviços de urgência/emergência é de situações ambulatoriais passíveis

de serem atendidas nas unidades primárias de saúde.

Para entender o porquê do fluxo pró-serviços de emergência, Barros e Sá20

avaliaram o sistema de agendamento da unidade local de saúde, que seguia o esquema

de abertura uma vez por mês e ficando aberta até esgotarem as vagas; não havendo

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39

priorização dos agendamentos por avaliação de risco. Outros autores já trouxeram

resultados semelhantes, os usuários se referem à organização dos serviços básicos de

saúde com o significado de barreiras ao acesso e demonstram ter em relação às UBS

uma imagem de grande limitação de recursos humanos e materiais. A partir de sua

necessidade de acesso, os usuários apreendem determinadas “regras sociais” vigentes

nos serviços de saúde e constroem diversas estratégias que visam lhe abrir as portas do

sistema41

.

A USF estudada dificilmente viabiliza atendimento ao usuário quando ele não

está agendado e tampouco garante seu acompanhamento quando orientado a buscar

assistência em outros serviços de saúde. Os serviços de emergência acabam por atender

a demanda do usuário como também a USF não conseguiu fazer a virada do modelo

assistencial na direção de uma maior articulação entre promoção e assistência, ações

individuais e coletivas, procedimentos e cuidado. Ou seja, enquanto se espera que o

serviço de emergência se destine a casos realmente urgentes, ele, por fim, acaba sendo

responsável pelo atendimento dos casos em que o nível local não abrange na sua

demanda diária; esse acontecimento também foi relatado por outros autores, como

Schimith e Lima42

e Schwartz38

.

Barros e Sá20

também abordam ao tempo de espera para a realização de exames

diagnósticos; é importante evidenciar, como foi pelos autores, que o tempo é subjetivo

quando se trata de um quadro de sofrimento associado. Para o profissional de saúde, não

há motivo para a pressa do usuário em fazer um exame de rotina, mas para o usuário,

que está sofrendo, por assim dizer, a espera parece muito maior do que na verdade é, em

geral.

Talvez, uma interação mais aberta entre profissional e usuário, uma construção

em conjunto acerca do processo do adoecimento que levasse ao usuário um

conhecimento maior sobre suas condições de saúde poderia diminuir a ansiedade da

espera, assim como também autonomizar esse indivíduo e responsabilizá-lo como um

agente ativo do seu processo de cura; oferecendo apoio e continuidade do cuidado

sempre que necessário.

A confiabilidade, ou seja, ou grau de confiança que o usuário deposita em um

serviço de saúde, aparece muito vinculada à estrutura do serviço no que diz respeito aos

seus recursos tecnológicos e à capacidade técnico-científica de seus profissionais,

destacando-se os médicos41

. Portanto, faz crucial a implantação de tecnologias de

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40

serviços nas unidades, visando maior resolubilidade na prestação da assistência; isso

fica evidente através da implantação de processos de acolhimento, por exemplo, como

tecnologia leve15

.

Há a associação de uma imagem de maior competência à figura do especialista

em contraposição ao generalista. A falta de especialistas e a baixa disponibilidade de

recursos tecnológicos nas UBS, aliadas à percepção do usuário sobre a importância

desses recursos na obtenção de alívio para o seu sofrimento, são componentes

significativos da imagem de menor qualidade que o usuário tem sobre o cuidado de

saúde a ser recebido no nível primário. Prevalece entre os usuários a imagem da UBS

como “postinho” e como “quebra-galho”. Assim, a segurança em relação à obtenção do

atendimento no pronto-socorro ou hospital se contrapõe à sensação de contingência ou

de incerteza referida à unidade básica de saúde do bairro41

.

Talvez o modelo assistencial ideal seja aquele que não se coloque de fato como

um modelo, mas sim como algo capaz de se amoldar continuadamente à realidade de

modo crítico e reflexivo, buscando assistir ao usuário por meio da prestação de cuidado

integral de saúde. É o sistema de saúde que deve se amoldar ao usuário e não o

contrário41

.

Schwartz38

, 2010 avalia o acesso dos usuários à Unidade Saúde da Família

(USF) de Resistência (ES), e os problemas locais enfrentados. É um estudo exploratório

qualitativo, desenvolvido na USF Resistência em São Pedro, localizada no município de

Vitória (ES).

Na USF acima citada ainda perpetua a lógica da distribuição de fichas para

atendimento médico e da fila da madrugada – prioridade de atendimento por ordem de

chegada, por isso, alguns usuários não chegam cedo “o suficiente” e ficam sem

atendimento. Para os que são atendidos, ainda existe o problema da baixa resolubilidade

da atenção prestada, que gera muitos encaminhamentos para serviços de referência,

como policlínicas. Somados à estes, devido a impossibilidade da USF em atender toda a

sua demanda de serviços como consultas clínicas de rotina e ginecologia; ou seja, se

cria uma demanda para serviços de referência que na verdade, não precisam de

referenciamento, e são referenciados única e exclusivamente por impossibilidade de

atendimento no serviço local42

. Talvez se o centro do cuidado fosse desviado da figura

do médico para a equipe multiprofissional, isso ajudaria a “desafogar essa demanda

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41

reprimida”; pois questões de puericultura, ginecologia e outros grupos de atendimento

preferencial podem e devem ser atendidos também pela enfermeira.

Nota-se que essa unidade contribui para a estatística de burocratização e

dificuldade de acesso aos serviços de saúde, e que essa realidade poderia ser amenizada

desde que se implantassem alterações no processo local de trabalho, centrado no

acolhimento segundo recomendação da PNH1.

Trad e Esperidião39

, desenvolvem uma análise do processo de humanização em

saúde no âmbito da Estratégia de Saúde da Família (ESF). Ele faz um paradoxo entre as

expectativas das práticas de humanização, desenvolvimento do vínculo entre

profissional e o usuário e a notória manutenção de antigas formas de organizar o acesso

à APS (filas, senhas). No caso do PSF, adota-se um formato que se combina com a

oferta organizada, a qual prioriza o acesso aos grupos de riscos (como os hipertensos,

diabéticos e gestantes) e visa a garantir o atendimento dos episódios agudos (febres,

diarreias e tosses nas crianças) ou agudização de casos crônicos (mal estar e tonturas

dos adultos/idosos).

O acolhimento, conforme Trad e Esperidião39

, se apresenta ainda como uma

confusão conceitual com a triagem feita pelos profissionais não médicos; que indica

quem será e quem não será atendido pelo médico. Em vez de ser uma prática acolhedora

e includente, transforma-se num procedimento tipo “peneira” que decide que não

receberá atendimento.

Segundo Trad e Esperidião39

, o agendamento vem instituído através da

distribuição de fichas, sem adequada priorização de casos agudos e os usuários

enfrentam filas e acordam bastante cedo para pegar as fichas ainda para a mesma

semana. Existe demanda com data fixa para grupos programáticos, por exemplo, quarta

feira do HAS/DM, terça da gestante, assim por diante. A população continua

acreditando que as filas se devem ao fato de haver um só médico atendendo, ou seja,

ainda existe um pensamento médico centrado com relação ao que deve ou não ser

atendido.

Souza19

, descreve basicamente um processo de trabalho onde o atendimento é

organizado por acesso com distribuição de fichas por ordem de chegada; os usuários

reclamam da dificuldade de conseguir atendimento, precisam acordar cedo para encarar

filas, e como ponto positivo, referem a existência de medicações para distribuição

gratuita na UBS, que no entanto fica ofuscada pela dificuldade de acesso na UBS.

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42

Enquanto houver a perpetuação do modelo de acesso aos serviços de APS,

continuará sendo perpetuada a insatisfação do usuário perante os serviços do SUS. As

queixas acerca da precariedade dos serviços vinham justificadas não apenas por

problemas na área física, mas especialmente à falta de cordialidade nos atendimentos e

ao acesso dificultado devido às formas burocráticas de agendamento perpetuadas nessa

unidade.

Lima26

fala sobre a opinião dos usuários acerca do acesso ao atendimento e a

prestação do serviço oferecido, quanto à forma como são acolhidos em unidades de

saúde de Porto Alegre.

Segundo Lima26

, a dificuldade de acesso foi referida pelos usuários como o

principal fator que dificulta a assistência à saúde. Entre as dificuldades de acesso

funcional, o tempo de espera prolongado para atendimento foi bastante referido pelos

usuários. Os usuários disputam as vagas para atendimento sob sistema de fichas, em

geral, eles têm de chegar de madrugada à porta da unidade e ficam em filas, sob ordem

de chegada, para garantir o atendimento. Apesar de toda dificuldade do acesso, muitos

deles acreditam que esse fato não chega a ser um problema, mas sim uma característica

do sistema público de saúde, e que é preciso paciência e perseverança para conseguir o

atendimento. Acreditam também que, se houvesse maior número de profissionais

médicos, o problema de acesso seria resolvido.

Os usuários solicitam uma área coberta para que possam ficar aguardando a

abertura da unidade, nas filas de marcação, em dias de chuva ou frio.

O questionamento que surge acerca dos comentários dos usuários não poderia

ser outro: não seria melhor a mudança do modelo de assistência à saúde? Talvez se não

fosse priorizada a ordem de chegada ao serviço, o usuário poderia se dirigir à unidade

no momento em que sentisse a necessidade, onde seria acolhido, escutado, e teria seu

problema avaliado por profissional competente, que criaria um vínculo de

corresponsabilização com esse usuário, e então juntos poderia criar um projeto

terapêutico adequado a cada caso. Se a necessidade em questão fosse uma consulta

individual, essa necessidade deveria ser válida e possível, e não seria necessário longas

esperas em filas desumanas, madrugada afora. O paciente já sairia da unidade com uma

resposta ao seu problema, o que não é sinônimo dizer que ele seria atendido pelo

médico, mas essa seria também uma possibilidade, já que o acolhimento é uma

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atividade de toda a equipe de atenção básica, e é a partir dele que surgem fluxos

assistenciais para resolução da demanda espontânea.

Lima26

não trouxe estratégias de facilitação do acesso, e considerou,

conceitualmente o acolhimento como postura perante o usuário no momento de triagem

pré-consulta agenda e no momento de orientações pós consultas. Ignoram o

acolhimento como responsável pela recepção da demanda espontânea ou do

agendamento das consultas.

Por fim, Lima26

, conclui que o vínculo, sob a forma de responsabilização do

profissional para com o estado de saúde do usuário se constitui em um dos elementos

essenciais de um efetivo acolhimento. Além disso, desperta no usuário um sentimento

de confiança em relação ao profissional que presta a assistência.

Dalmaso49

faz uma avaliação da relação entre a “cesta básica de saúde em São

Paulo” com a configuração do tipo de atendimento oferecidos, em comparação com o

atendimento da livre demanda em uma centro de saúde-escola Samuel B. Pessoa,

Faculdade de Medicina, USP.

Dalmaso49

afirma que a característica do usuário dos centros de saúde em São

Paulo deixa de ser as mulheres grávidas e crianças, advindas das ações programáticas da

saúde materno-infantil dos anos 70 e passa a ser adultos jovens e idosos com problemas

agudos, ou agudizados, de pequena gravidade que podem ser resolvidos com as

tecnologias leves, que são utilizadas nas unidades50

.

Segundo Dalmaso49

, há preferência, por parte dos usuários, a serviços mais

ágeis e que dão certa garantia de atendimento, como os do tipo pronto atendimento.

A proposta do Centro de Saúde escola, descrita por Dalmaso49

, é de dar

atenção a demanda espontânea do paciente e buscar outros indicadores nesse paciente,

através do trabalho conjunto do médico, enfermeiro e técnico de enfermagem, para se

fazer um diagnóstico situacional de saúde, por assim dizer, do indivíduo e orientá-lo

quanto a mudanças e tratamentos para a melhoria da sua condição de vida.

EXPERIÊNCIAS INOVADORAS:

Segundo Rocha51

, em pesquisa à respeito da acessibilidade, as consultas e os

encaminhamentos na APS mantêm-se médico-centrados, com distribuição de fichas de

atendimento por ordem de chegada além de grande demanda para atendimento, com

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permanência de filas nas próprias unidades de saúde da família. Para muitos usuários o

agendamento de grupos prioritários introduz segmentação com repressão de demanda

para os não incluídos nos agrupamentos. A adoção de protocolos assistenciais mostrou-

se incipiente – perpetuando a visão do atendimento individual por profissional de nível

superior como forma de resolução dos problemas. Novamente é abordada a necessidade

de abertura da unidade à livre demanda, e não apenas acolhimento da demanda

programada, pois assim, a demanda reprimida pode passar a usufruir dos equipamentos

de saúde com propriedade e qualidade, assim como os grupos de risco.

Rocha51

, descreve ainda, formas criativas de implementação do acolhimento

com destaque para as rodas de conversa (espaços de reuniões coletivas envolvendo

profissionais e usuários) e institucionalização do monitoramento e avaliação pela gestão

municipal; as iniciativas descritas mostram-se muito positivas especialmente por tentar

fazer uma assistência que não vise o atendimento individual,

Conforme descreve Rocha51

, a maioria das unidades de saúde da família

funciona em dois turnos e não dispõe de horário especial (noturno, final de semana ou

feriado); em um dos municípios estudados, algumas unidades de saúde da família

funcionavam até 19 horas. Foi descrita também certa inflexibilidade no acesso ao

atendimento à clientela quando esta se vinculava a outra equipe, denotando insatisfações

por parte dos usuários. A adscrição da clientela tem por objetivo a vinculação desta à

equipe, no entanto, quando não há garantia de atendimento universal, essa adscrição

pode se tornar mais uma barreira ao acesso; portanto, é importante que a adscrição não

seja um fator burocrático enrijecido, e sim mais um instrumento que venha colaborar

para a melhoria da qualidade da assistência na APS.

Alguns estudos, como Carret52

, analisam que os indivíduos que possuem

assistência regular, através da APS, utilizam de melhor maneira os serviços de

emergência. Outros estudos que mostraram maior utilização das emergências mesmo na

vigência de APS, relacionam esse achado a problemas de acesso da APS, como: demora

para conseguir atendimento, unidade fechada, difícil agendamento pelo telefone, horário

inacessível de acesso à unidade, pouco compromisso da unidade com o paciente.

Talvez se o acesso fosse facilitado através de um acolhimento humanizado e

eficaz e a qualidade do atendimento fosse boa, as pessoas procurassem menos os pronto

atendimento. Não adianta apenas realizar um trabalho de educação e conscientização da

população sobre o uso dos serviços de emergência, para que os casos urgentes possam

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ser identificados em meio a demanda que não é realmente uma emergência, pois como

afirma Cecílio, o povo não é mal educado por ir nos PAs, ele é “reeducado” a procurar

dentro das opções que têm, aquela que melhor atende aos seus anseios de saúde27

.

Franco13

em descreve a experiência de Betim e cria um divisor de águas quanto

à mudança dos processos de trabalho na APS brasileira. O autor relata a inversão do

modelo técnico-assistencial para a saúde, tendo como base a diretriz operacional do

acolhimento. No caso de Betim, a técnica de enfermagem, a auxiliar de enfermagem, a

enfermeira e a assistente social montaram uma equipe de acolhimento para a escuta da

população, e os médicos atendem os pacientes encaminhados pela equipe de

acolhimento; assim acabaram-se as filas da madrugada e a distribuição de fichas. A

enfermeira, além de acolher também fica na retaguarda do atendimento dos técnicos. As

discussões permanentes entre a equipe para avaliar e reprocessar o acolhimento foram

fundamentais para garantir o sucesso da estratégia.

A equipe foi capacitada através do uso de protocolos de atendimento, o que

aumentou a resolubilidade da enfermagem como um todo, além de, é claro, a

capacitação gradual que a prática do acolhimento foi gerando em cada profissional. A

constante discussão acerca do acolhimento funciona como ferramenta para a constante

adequação e melhoria das técnicas. O atendimento em conjunto, proporcionado pela

presença do médico ou enfermeiro na retaguarda dos atendimentos faz com que a

assistência perca a lógica biologicista e médico centrada e tome proporções

multiprofissionais, valorizando sobretudo o trabalho em equipe.

Franco13

evidencia como pontos negativos: pequena inserção do profissional

médico; ainda é crítica a questão do agendamento para consultas médicas e a

conciliação do atendimento dentro e fora da unidade. Outra característica problemática

é a ausência de longitudinalidade personalizada: todos os usuários eram acolhidos pela

equipe de acolhimento e não fica claro se havia uma equipe de referência responsável

pelo cuidado longitudinal do usuários; e se havia, porque ela não era a responsável pelo

acolhimento.

O processo de gestão da Unidade de Saúde é compatível com o modelo

técnico-assistencial. Assim, o acolhimento só é possível se a gestão for participativa,

baseada em princípios democráticos e de interação entre a equipe. Isto se dá porque a

inversão do modelo técnico-assistencial, com mudanças estruturais no processo de

trabalho, pressupõe a adesão dos trabalhadores à nova diretriz. Este compromisso com a

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mudança, com a construção do devir, só é possível quando os profissionais discutem e

efetivamente podem decidir sobre a organização dos serviços na Unidade de Saúde13

.

Dalmaso e Senna53

descrevem experiência singular com a criação do GORDs –

grupos de organização e resolução da demanda, para atender a uma demanda

espontânea que busca atendimento médico em um momento de recursos escassos.O

esquema caracteriza-se por um grupo de triagem, onde o médico avalia a queixa do

paciente e o encaminha ao serviço de emergência, ou ao agendamento de consultas ou

para a unidade de referência; também nesses grupos eram discutidos assuntos de saúde e

orientações válidas para problemas comuns, como resfriados, diarreia, etc.

Segundo Dalmaso e Senna53

, os GORDs vieram com o objetivo de acabar com

a fila da madrugada, mas com a mudança de governo local, a antiga lógica de

atendimento por ordem de chegava voltou a acontecer.

Foram realizados grupos de recepção, que duravam de 30 a 40 minutos, onde

havia discussão do funcionamento da unidade, e depois disso, o usuário solicitava o tipo

de atendimento que desejava – atendimento individual com médico ou enfermeiro,

atendimento em grupo, outro tipo de atendimento; e isso demonstrou que muitos

usuários não demandavam atendimento individual, desde que existissem outras

possibilidades no menu de serviços da UBS53

.

O ponto positivo explorado por Dalmaso e Senna53

foi a orientação da clientela

quanto ao funcionamento da UBS, oferecendo um menu de serviços e não apenas

centrando as necessidades à consulta individual. Como ponto negativo dessa atividade

se destaca a sua longa duração (30-40 minutos), o que excluiria uma parte da clientela

que não tem esse tempo livre para participar da atividade.

Fracolli e Zoboli54

trazem relato de experiência acerca de como o acolhimento

nas unidades de saúde foi operacionalizado sob a forma de um atendimento específico,

direcionado às pessoas que procuravam a USF e não tinham agendamento prévio. Era

organizado para possibilitar a escuta dos motivos que levaram o indivíduo a procurar o

serviço de saúde naquele momento e dar uma resposta à sua necessidade. Era realizado

em uma sala ou um local específico e os profissionais de saúde tinham uma escala para

se revezarem no desenvolvimento dessa atividade. O acolhimento era realizado por toda

a equipe da ESF, inclusive os ACS, em escala de revezamento; sendo majoritariamente

realizado pelas enfermeiras e técnicos de enfermagem, com o médico na retaguarda do

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atendimento; ou seja, o médico não faz acolhimento. Não foi identificado uso de

protocolos como guias para o atendimento no acolhimento nas USF estudadas.

Os resultados de Fracolli e Zoboli54

consideram o acolhimento como uma

estratégia para ampliar o acesso da população ao serviço de saúde. Segundos os autores,

a organização do trabalho, ainda está centrada na consulta médica, operando com o

conhecimento clínico-biológico de cunho fisiopatológico, no qual as tecnologias leves,

ou seja as tecnologias de relações, assumem um papel secundário em relação às

tecnologias leve-dura, ou seja os saberes instituídos28

.

Da forma como está sendo implementado, o acolhimento não se constitui em

um instrumento para autonomizar o usuário a enfrentar seu processo saúde-doença

como protagonista e corresponsável (em parceria com o trabalhador de saúde) do

mesmo.

Scholze55

trata da descrição a implantação do acolhimento como forma de

organização do trabalho em saúde no PSF. A proposta de acolhimento desenvolvida

inicialmente pelas equipes levou ao estabelecimento de um horário de uma hora e meia

no início da manhã para atendimento de livre demanda, a ser realizado pelos médicos e

enfermeiras das duas equipes paralelamente, por ordem de chegada, sem distinção de

área de atuação das equipes. Nesse momento inicial de acolhimento, sem a pretensão de

estabelecer quaisquer intervenções terapêuticas, seriam geradas consultas de urgência,

encaminhamentos médicos para especialistas ou o agendamento de consultas na própria

unidade. O objetivo principal era ouvir o usuário e identificar suas necessidades, a fim

de oferecer-lhe as possibilidades de atendimento mais adequadas conforme suas

demandas. Durante o restante do horário de funcionamento da unidade, após aquele

período dedicado exclusivamente ao acolhimento, a livre demanda era acolhida pelas

auxiliares de enfermagem e/ou enfermeiras e, quando estas definissem a necessidade de

atendimento médico, este poderia ser estabelecido como: consulta médica imediata;

agendamento para uma data posterior ou comparecimento no horário de acolhimento do

dia seguinte.

Scholze55

descreve ainda que o processo de acolhimento utiliza, em geral, o

profissional de nível médio, sob a forma de triagem de risco, avaliando casos onde há

necessidade de encaixes de consultas do tipo, queixa-conduta. Percebe-se que é clara a

conceituação de acolhimento como sinônimo de triagem para o menu de serviços da

unidade de saúde, e também, é claro, considerado um momento para estabelecimento de

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vínculo entre o usuário e a equipe de saúde. Porém, o grande número de pessoas

identificadas com tendo necessidade de atenção médica, nessa fase da implantação do

acolhimento, levou a uma modificação no processo, pela qual os médicos passaram a

realizar exclusivamente o acolhimento limitado a vinte (20) pessoas, no horário

previamente definido, com o apoio das auxiliares de enfermagem. Enquanto isso, as

enfermeiras acolhiam o excedente da demanda espontânea.

Scholze55

especifica que é evitado delegar às enfermeiras, atribuições que

considera de caráter exclusivamente médico, como a prescrição de medicamentos e

solicitação de exames durante o acolhimento; o que leva a um questionamento: por que

não aproveitar essas profissionais para a efetuação de protocolos clínicos pré-definidos,

onde existe a prescrição segura de medicamentos? Isso poderia ser bem mais seguro do

que uma consulta médica apressada, com pouco recurso de tempo, sobrecarregando um

único profissional – o médico – enquanto que a consulta com a enfermeira poderia

dividir o trabalho do médico, aproveitando uma profissional qualificada com nível

superior, capaz de fazer um exame físico e avaliação clínica capacitada melhorada pelo

uso dos protocolos, executando um atendimento efetivo e, ao mesmo tempo, resolutivo

num único encontro do usuário com a equipe24

.

Cavalcante Filho46

relata a experiência ocorrida no Nordeste Brasileiro

chamada Saúde Todo Dia; a estratégia de gestão do setor da saúde em implementação

no município de Aracaju está em construção desde 2001. Em seu modelo teórico

orientador, o Saúde Todo Dia tem, por objeto de suas políticas, as necessidades de

saúde dos indivíduos e coletividades; e considera o trabalho em saúde como um

encontro entre usuários e trabalhadores onde há o reconhecimento, pelo trabalhador, das

necessidades dos usuários, como direito à saúde. A natureza do encontro entre usuários

que têm necessidades de saúde e trabalhadores que reconhecem estas necessidades é o

da produção de um processo onde há o acolhimento do outro, compreensão e

significação de suas singularidades e oferta dos saberes em saúde que venham permitir

ao profissional intervenções continuadas (vínculo) e responsabilização pelo resultado

destas intervenções.

Segundo Cavalcanti Filho46

colocar o potencial cuidador, o saber e o fazer de

cada profissional que compõe a equipe de saúde em um espaço de acolhimento de

necessidades de saúde, com o objetivo de integrar este trabalho, é um dos desafios do

acolhimento coletivo. Desalienar o papel de cada um na produção do cuidado, fazendo

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emergir projetos terapêuticos entre-disciplinares, circulando olhares e desejos, é um

modo de tornar o nosso trabalho obra criativa cotidiana. Neste movimento de

integração, integrando também os usuários, estamos nos aproximando do espaço onde o

acolhimento coletivo ocorre.

Cavalcante Filho46

descreve que os usuários historicamente deviam chegar bem

cedo às unidades para garantir seu acesso, e isso reflete no hábito mantido atualmente,

pois mesmo quando se abre as portas das unidades, os usuários chegam logo que o

estabelecimento abre as portas. Refere que há uma roda na sala de reuniões da unidade,

todos os trabalhadores da equipe (médico, enfermeira, auxiliar de enfermagem e agentes

comunitários de saúde) e usuários, sentam-se, os olhares e expectativas se cruzam;

conversam sobre problemas de saúde locais, se roteiros e buscar entrar em harmonia.

Após um debate que dura entre trinta e 45 minutos, dependendo da quantidade e

participação dos usuários, a abordagem passa então a ser individual, ali mesmo naquela

sala. Cada profissional acolhe uma pessoa por vez. A equipe toda vai lidando com estes

casos e aprendendo a cada dia, pois com as conversações abertas, um profissional tira

dúvidas e propõe resposta junto a outro, profissional ou usuário. Os mais variados

problemas são conversados, as mais variadas intervenções e as mais variadas

articulações entre os trabalhos de cada profissional são propostas. Nem sempre a

resposta ou o caminho proposto para o “andar a vida” do usuário está previsto em

protocolos. Os casos considerados mais graves recebem atenção imediata na sala de

observação da unidade (por vezes, antes mesmo de iniciar o diálogo), onde estão

presentes recursos para atendimento de emergência.

Os casos considerados agudos são aqueles que passarão por uma consulta

médica ou de enfermagem naquele mesmo turno, pois sem uma atenção em 24 horas

podem se tornar mais graves. Orientações são dadas para as mais variadas dúvidas e

podem representar um resto do dia mais tranquilo ou uma intervenção imediata. É

garantido o espaço para quem quiser uma conversa fora da sala de reuniões, em uma das

salas da unidade.

As agendas da equipe, com suas ofertas estruturadas, são de livre acesso para

qualquer de seus profissionais. Cada usuário tem o início de seu projeto terapêutico

singular no acolhimento, podendo ser incluído em qualquer das ofertas, sejam elas

consultas dos profissionais de nível superior, visitas domiciliares, ações programáticas.

No decorrer de aproximadamente uma hora, com todos os profissionais acolhendo, os

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usuários já estão com seus projetos iniciados ou em continuidade. Inicia-se, então, o

atendimento, pelo médico e enfermeira, de casos agudos e, posteriormente, dos casos

agendados.

Cavalcanti Filho46

ainda deixa claro que as necessidades em saúde da

população atendida é que vão determinando o agir da equipe. Movimento e vida a serem

defendidos na construção de projetos terapêuticos cuidadores, integradores, construindo

autonomia. É a busca de um Sistema de Saúde includente e de um processo de trabalho

que traga também a realização profissional dos membros da equipe de saúde.

O acolhimento coletivo como proposta de organização do processo de trabalho da

equipe de saúde se faz inovador, por ser um espaço de integração do outro, usuários e

trabalhadores, além dos saberes. O diálogo horizontal com os usuários e a relevância

dada às suas opiniões e desejos trazem à unidade um perfil de espaço terapêutico e

cuidado integral à saúde, proporcionando, também, maior aproximação do profissional

ao modo de viver e sentir as necessidades trazidas ao espaço pela população.

EXPERIÊNCIA DE RELATO TANGENCIAL:

Oliveira56

trata da realidade de uma ESF que instituiu trabalho de acolhimento

na APS em 2007, e tem tido dificuldades de entrosamento da nova técnica com a

comunidade. A ESF é responsável por atender mais de 6 mil pessoas, e está aguardando

redivisão de área; enquanto isso vive com a realidade de uma demanda excessiva. O

acolhimento é feito pelos ACS. Cada dia um deles é responsável por acolher os usuários

que buscam a unidade e esse acolhimento consiste na escuta qualificada e busca pela

resolução do problema do indivíduo. A enfermagem não é responsável pelo

acolhimento.

Tal contexto de dificuldade de entrosamento, seja com a equipe e/ou com a

comunidade assistida também foi relatado em Nascimento57

que relata ainda que quando

da implantação do acolhimento como forma de recepção da demanda espontânea na

APS, a entrada da demanda que antes não possuía acesso e o aumento da

responsabilidade dos profissionais não médicos gerou não só conflitos entre os

membros da equipe como resistência diante da mudança. Por outro lado, os usuários

elogiaram principalmente a facilitação e a humanização para a obtenção de atendimento.

Observou-se também que com o passar dos meses o aumento da demanda e a

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quantidade insuficiente de consultas ofertadas, devido ao número insuficiente de

profissionais disponibilizados para a empreitada, comprometeram parcialmente o acesso

proporcionado, dificultando ainda mais o manejo da demanda espontânea58

. A maneira

de organizar o atendimento da demanda espontânea é um fator que tem sido desafiador

para os membros da equipe. A maioria demonstra despreparo e referem a necessidade

de se estabelecerem momentos de trocas para discutirem a questão de maneira

específica; assim, apesar de se prestarem à escuta, muitas vezes não são capazes de

produzir um acolhimento resolutivo56

.

Medeiros58

refere que a qualidade da atenção prestada pelos serviços de saúde

está diretamente ligada ao acolhimento e à satisfação do usuário, fundamentais no

processo de mudança do trabalho em saúde. Seu estudo objetivou avaliar o acolhimento

em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) na perspectiva do usuário, analisando também

a satisfação dos usuários e a participação destes no controle social. As práticas de

acolhimento não são citadas como estratégias do processo de trabalho nesse artigo;

apenas identificadas como condições físicas do estabelecimento e quantidade de

profissionais disponíveis para oferecer atendimento ao público57

. Corroborando ideia

semelhante, Pinafo59

considera no seu estudo que o atendimento com respeito, a

corresponsabilização da equipe pela saúde dos usuários, o trabalho dos ACS e o bom

atendimento dos médicos são ações que aumentam o vínculo, e com isso, são

acolhedoras. Pinafo59

foi realizado em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do

município de Londrina, PR e teve por objetivo analisar o acolhimento em uma Unidade

de Saúde da Família abordando as concepções dos auxiliares de enfermagem sobre o

acolhimento ofertado na unidade estudada e a percepção dos usuários de como são

acolhidos neste serviço de saúde59

.

Para os auxiliares de enfermagem pesquisados, o significado de acolhimento é

recepcionar bem o usuário, cumprimentar o paciente, ser educado, gentil, oferecer uma

boa assistência, dar uma atenção especial ao usuário buscando atendê-lo como um todo,

desenvolvendo um cuidado integral e se responsabilizando com a saúde da pessoa que

está sendo atendida59

.

O artigo não evidencia como o acolhimento é utilizado para a organização do

acesso e da demanda espontânea; mas demonstra como o vínculo entre usuário e equipe

pode fortalecer o acolhimento na APS59

.

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52

Nascimento57

relata ainda que durante o novo processo de trabalho houve a

flexibilização das funções, descentralizando a responsabilidade do atendimento para o

restante da equipe, principalmente para a enfermagem que teve um aumento de mais de

270% de rendimento na primeira semana após a implantação, o qual praticamente se

manteve constante ao longo do período observado em contraste com a realidade trazida

Oliveira56

em que a enfermagem se isenta da prática do acolhimento.

Por fim, ao término da revisão, é possível se observar que, apesar das muitas

controvérsias a respeito das práticas de acolhimento, dificuldades encontradas em se

fazer um consenso acerca dos diversos conceitos da palavra “acolhimento” assim como

se lidar com as dificuldades diárias em se fazer o acesso aos serviços de saúde, o

sistema assistencial de saúde brasileiro vem evoluindo positivamente. As vitórias

calcadas pela reforma sanitária não devem ser ofuscadas frente às dificuldades que se

encontram no caminho dos processos de trabalho rumo às mudanças.

Espera-se que o modelo médico-centrado seja, aos poucos, derrubado pelas

mudanças positivas trazidas pelo trabalho multidisciplinar e interprofissional em saúde

e com base nesse pensamento, se faça acolhimento adequado e eficaz à demanda dos

serviços de atenção primária à saúde.

A adequada criação de diretrizes norteadoras para o acesso/acolhimento

associadas à conscientização de prestadores de serviço e usuários quanto ao direito do

cidadão à saúde construirão, por fim, alicerces para a prática assistencial. E que seja

baseada na humanização, escuta qualificada, corresponsabilização pelo cuidado e

respeito à saúde.

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53

CONCLUSÃO

1. A maioria das experiências com implantação de acolhimento como tecnologia de

recepção da demanda espontânea na APS mostraram-se médico-centradas;

2. A simples presença regional de serviços de APS não é suficiente para garantir o

acesso dos usuários aos serviços de saúde. É preciso que existam estratégias

inclusivas que sejam capazes de acolher os usuários nas suas demandas

espontâneas e resolver, em conjunto seus problemas de saúde;

3. A realização do acolhimento com escuta qualificada e como prática

multiprofissional, apesar de ser um objetivo almejado, ainda não é uma

realidade. O acolhimento, na maioria das experiências descritas, fica restrito à

equipe de enfermagem e delineia-se como triagem que decide os casos que irão

e os que não irão receber atendimento médico. Assim, torna-se uma prática

excludente ao invés de ser um procedimento com objetivo de ampliar o acesso

aos serviços de saúde;

4. Apesar da falácia de que as filas para atendimento são “cultura” instalada entre

os usuários da APS, algumas experiências inovadoras mostraram que, com boas

práticas de acolhimento à demanda espontânea, é possível acabar com as filas da

madrugada e não sobrecarregar a equipe com excesso de demanda. Para isso, é

preciso dividir adequadamente as competências entre os profissionais e

empoderar a equipe para maior resolubilidade da assistência ao usuário;

5. As experiências revelam que os enfermeiros tem se utilizado muito pobremente

da consulta de enfermagem como seu dispositivo de ação acolhedora, pois além

de resolutivo, empodera esse profissional como mais uma força de trabalho

assistencial, desfocando essa responsabilidade unicamente do profissional

médico. Em geral, os enfermeiros ficam responsáveis pelo trabalho burocrático

das unidades e não se envolvem nas práticas de acolhimento e/ou assistência da

demanda;

6. Os técnicos de enfermagem, na maioria das experiências descritas, sentem-se

sobrecarregados com a demanda espontânea, e transformam o acolhimento numa

ação mecanizada e rápida, pois precisam lidar com o pouco tempo disponível e a

grande quantidade de pessoas a atender. Eles deixam de lado a escuta

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qualificada e isso desqualifica a atenção prestada ao usuário, que acaba voltando

muitas vezes à unidade sem ter seu problema resolvido;

7. Ainda é pouco difundida a utilização de protocolos de atendimento nas unidades

de saúde, o que diminui a resolubilidade dos profissionais não médicos que

realizam acolhimento, focando na figura do médico a responsabilidade pela

resolução dos problemas de saúde que levam os usuários à unidade;

8. Com a dificuldade de acesso à APS imposta aos usuários devido aos problemas

de acolher toda a demanda espontânea nas unidades, a ideia de que os serviços

de pronto atendimento são mais resolutivos fica ainda mais reforçada, o que gera

um ciclo de atendimentos desumanizados, sem integralidade e de baixa

qualidade que acarretarão em cronificação de problemas de saúde que poderiam

ser melhor resolvidos se houvesse uma escuta qualificada, o cuidado

longitudinal e a corresponsabilização do cuidado entre o usuário e uma equipe

de saúde multiprofissional responsável, a qual conheceria a individualidade dos

usuários com a qual tem responsabilidades;

9. O acolhimento pode ser utilizado para a organização do acesso e da demanda

espontânea e o vínculo entre usuário e equipe pode favorecer a resolubilidade e a

relação de confiança no acolhimento na APS;

10. Reduzir o Acolhimento a uma triagem não favorece suficientemente a melhoria

assistencial, conforme se espera desse dispositivo;

11. Não é função do acolhimento resultar em um atendimento médico, de

enfermagem ou outro – em conjunto – mas sim, um fluxo a ser deliberado a

partir do mesmo. Dessa forma, muitos acolhimentos se convertem em pronto

atendimento;

12. Quando se prioriza apenas o tempo, como sinônimo de qualidade de

atendimento fica claro que o acolhimento fica mecanizado, sem troca de saberes,

sem escuta qualificada. É preciso escutar o usuário, e ajudá-lo a encontrar as

respostas que procura, e para isso, nem sempre é preciso um atendimento

médico;

13. Por fim, acolhimento no seu sentido polissêmico e abstrato, pode ser utilizado

como tecnologia de trabalho para garantia do direito constitucional à saúde e

mais, pode garantir qualidade de atendimento e de trabalho, preservando a

integridade do paciente e a prática do profissional de saúde, que passa a ver o

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acolhimento como um aliado para a prática diária do trabalho e não mais um

obstáculo a ser ultrapassado.

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