UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Centro de … · “Ciência e Comportamento Humano” de...

550
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Psicologia FLORA MOURA LORENZO CARACTERÍSTICAS DAS CLASSES DE COMPORTAMENTOS REFERIDAS EM PROPOSIÇÕES ACERCA DO CONCEITO “EU” NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO COMO CONTRIBUIÇÃO PARA O CONHECIMENTO DE INTERAÇÕES HUMANAS EM APRENDIZAGEM, DESENVOLVIMENTO E ORGANIZAÇÕES FLORIANÓPOLIS 2013

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Centro de … · “Ciência e Comportamento Humano” de...

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

Centro de Filosofia e Cincias Humanas

Programa de Ps-Graduao em Psicologia

FLORA MOURA LORENZO

CARACTERSTICAS DAS CLASSES DE COMPORTAMENTOS

REFERIDAS EM PROPOSIES ACERCA DO CONCEITO

EU NA ANLISE DO COMPORTAMENTO COMO

CONTRIBUIO PARA O CONHECIMENTO DE

INTERAES HUMANAS EM APRENDIZAGEM,

DESENVOLVIMENTO E ORGANIZAES

FLORIANPOLIS

2013

i

FLORA MOURA LORENZO

CARACTERSTICAS DAS CLASSES DE COMPORTAMENTOS

REFERIDAS EM PROPOSIES ACERCA DO CONCEITO

EU NA ANLISE DO COMPORTAMENTO COMO

CONTRIBUIO PARA O CONHECIMENTO DE

INTERAES HUMANAS EM APRENDIZAGEM,

DESENVOLVIMENTO E ORGANIZAES

Dissertao apresentada como requisito

parcial obteno do ttulo de Mestre

em Psicologia, Programa de Ps-

Graduao em Psicologia, Centro de

Filosofia e Cincias Humanas da

Universidade Federal de Santa

Catarina. Orientao: Prof. Dr. Olga

Mitsue Kubo

FLORIANPOLIS

2013

ii

iii

iv

v

vi

vii

E quando nem uma lgua tinham andado, a sorte, que ia guiando suas coisas de bem a melhor, lhe deparou

a estrada, na qual descobriu uma estalagem, que a seu pesar e a gosto de D. Quixote havia de ser

castelo. Porfiava Sancho em que era estalagem, e seu

amo que no, e sim castelo; e tanto durou a porfia

que tiveram lugar de, sem acab-la, chegar a ela, onde Sancho entrou sem mais averiguaes com toda

sua rcua.

Miguel de Cervantes Saavedra

O engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha

viii

ix

AGRADECIMENTOS

Escrevi diversas verses de agradecimentos, mas nenhuma fez

jus ao sentimento que tenho por todos que foram mais que fundamentais

para que essa etapa da minha vida pudesse se concretizar. Muita gente

responsvel por esse trabalho... em incontveis aspectos. Por no

conseguir colocar em palavras tudo quanto gostaria, por no conseguir

expressar o tanto quanto precisaria dizer, vou deixar a promessa do meu

obrigada! pessoalmente, num abrao apertado a cada um.

x

xi

SUMRIO

Resumo.......................................................................... xxiv

Abstract.......................................................................... xxvi

1. CARACTERSTICAS DAS CLASSES DE

COMPORTAMENTOS REFERIDAS EM

PROPOSIES ACERCA DO CONCEITO EU

NA ANLISE DO COMPORTAMENTO: UMA

CONTRIBUIO PARA O CONHECIMENTO DE

INTERAES HUMANAS EM APRENDIZAGEM, DESENVOLVIMENTO E ORGANIZAES........... 28

1.1. Preciso, conciso e clareza conceitual em uma rea

de conhecimento: requisitos qualidade dos processos

envolvidos na produo de conhecimento da rea e em

intervenes nos fenmenos que consistem em seus objetos de estudo........................................................... 31

1.2. Noo de Comportamento como base para exame dos

graus de suficincia de definies e de coerncia entre

definies e descries de aspectos constituintes dos

processos aos quais o conceito Eu se refere e

superao da noo de entidades internas determinantes das aes dos organismos....................... 44

A- Desenvolvimento da noo de

Comportamento como recurso produo de conhecimento cientfico relacionado a conceitos........................................................... 44

B- Noo de comportamento como contribuio

para superar a atribuio de funo

determinante de aes dos organismos a entidades internas a eles.................................. 53

xii

1.3. O conceito de Contingncias de Reforo como recurso

para exame dos graus de suficincia de definies e de

coerncia entre definies e descries de aspectos

constituintes dos processos aos quais o conceito Eu se refere.......................................................................... 56

1.4. Noes de unidade, classe e sistema como

parmetros para delimitar a unidade de anlise de

fenmenos comportamentais a serem investigados,

especificamente aos referidos pelo conceito Eu na Anlise do Comportamento........................................... 63

1.5. Anlise Funcional como recurso para caracterizar

classes de comportamentos referidas em proposies

acerca do conceito Eu conceitos na literatura da

Anlise Experimental do Comportamento.................... 78

A- Conceitos divergentes em relao ao que

consiste o recurso da Anlise Funcional e a que fins pode servir.......................................... 78

B- Conhecimento produzido em Anlise

Experimental do Comportamento acerca de relaes de controle de estmulos como

complementao das possibilidades do recurso da Anlise Funcional.......................... 83

C- Recurso da Anlise Funcional de comportamentos com fins produo de

conhecimento cientfico acerca das caractersticas das classes de comportamentos referidas em proposies

acerca do conceito Eu na Anlise do Comportamento................................................ 91

1.6. Relao entre fenmenos atribudos tradicionalmente Subjetividade e o comportamento verbal................ 94

xiii

1.7. Conceito Eu em Anlise Experimental do

Comportamento: indcios de aspectos distintos, graus

de coerncia e complementaridade entre as

proposies apresentadas em diferentes obras da rea,

bem como de sua qualidade como subsdio a

processos de produo de conhecimento e de interveno nos fenmenos pelo termo referidos.......... 108

1.8. Investigar caractersticas das classes de

comportamentos referidas em proposies acerca do

conceito eu na Anlise do Comportamento como

um meio de tornar o conhecimento da rea acerca

desse conceito subsdio confivel e preciso a

modalidades de interveno do psiclogo..................... 125

2. Mtodo para observar caractersticas das classes

de comportamentos referidas em proposies

acerca do conceito Eu na Anlise do Comportamento........................................................... 128

I. Fontes de informao..................................................... 128

II. Instrumentos, materiais e equipamentos........................ 128

III. Situao e Ambiente...................................................... 129

IV. Procedimentos............................................................... 129

IV.1 Seleo das fontes de informao.................................. 129

IV.2 Procedimentos de coleta, anlise e tratamento de

dados.............................................................................. 130

2.1. Selecionar trechos das obras definidas como

fontes de informao que apresentem definies do conceito e caractersticas de componentes das classes de comportamentos

referidos por tal conceito................................. 133

xiv

2.2. Transcrever trechos selecionados das obras

definidas como fontes de informao que apresentem definies do conceito ou

caractersticas de componentes das classes de comportamentos referidos por tal conceito............................................................ 136

2.3. Fragmentar trechos das obras definidas como fontes de informao que apresentem

definies do conceito ou caractersticas de componentes das classes de comportamentos referidos por tal conceito em unidades de informao....................................................... 138

2.4. Identificar os componentes das sentenas das

unidades de informao que exercem as funes sujeito, verbo e complemento 142

2.5. Aperfeioar estrutura das sentenas das unidades de informao de modo que o indivduo envolvido nos fenmenos de interesse exera funo de sujeito .............. 145

2.6. Aperfeioar verbos das sentenas das

unidades de informao conforme o grau de clareza das aes ou comportamentos a que se referem......................................................... 149

2.7. Aperfeioar complementos das sentenas das

unidades de informao conforme o grau de clareza acerca dos estmulos a que se referem............................................................. 152

2.8. Avaliar e aperfeioar grau de generalidade das unidades de informao em relao

possibilidade de identificar classes de comportamentos a partir de seus componentes..................................................... 155

xv

2.9. Analisar funcionalmente informaes

apresentadas nas unidades de informao e identificar elementos que exercem funo de

classes de estmulos antecedentes, classes de respostas e classes de estmulos consequentes em classes de comportamentos 159

2.10. Avaliar e aperfeioar a redao dos componentes identificados e registrados

como classes de estmulos antecedentes, classes de respostas e classes de estmulos consequentes por meio do conceito de comportamento............................. 162

2.11. Identificar lacunas nas classes de

comportamentos cujas classes de estmulos antecedentes, classes de respostas e

classes de estmulos consequentes foram

identificadas e tiveram sua redao aperfeioada conforme o conceito comportamento e derivar componentes para complement-las, de modo a manter a

fidedignidade proposio da obra................ 165

2.12. Identificar equivalncia funcional entre as classes de comportamentos analisadas funcionalmente e agrup-las em classes mais

gerais................................................................ 168

2.13. Nomear as classes de comportamentos cujos

componentes foram identificadas conforme suas caractersticas e caractersticas das relaes que estabelecem entre si.................... 173

2.14. Identificar relaes de cadeia, pr-requisitos e abrangncia, entre as classes de comportamentos identificadas......................... 176

xvi

2.15. Organizar as classes de comportamentos

conforme as relaes de cadeia, pr-requisito e abrangncia que estabelecem entre si em um sistema comportamental............................. 177

2.16. Derivar classes de comportamentos a partir

da identificao de lacunas entre as classes

de comportamentos cujas relaes de pr-requisito, cadeia e abrangncia foram identificadas..................................................... 179

2.17. Analisar funcionalmente classes de

comportamentos derivadas.............................. 181

2.18. Identificar funo dos eventos identificados

como estmulos antecedentes e classific-los como contextuais, condicionais e discriminativos conforme a funo exercida... 183

3. Caractersticas das classes de comportamentos s

quais o conceito Eu se refere no captulo O Eu

da obra Cincia e Comportamento Humano de Skinner (1953/2003)..................................................... 187

1. Classes de comportamentos identificadas e derivadas

do captulo O Eu da obra Cincia e

Comportamento Humano de Skinner (1953/2003) como aquelas s quais o conceito Eu se refere.......... 189

2. Componentes das classes de comportamentos

identificadas e derivadas do captulo O Eu da obra

Cincia e Comportamento Humano de Skinner

(1953/2003) como aquelas s quais o conceito Eu se refere.............................................................................. 193

2.1. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes de comportamentos

da Categoria A Caractersticas de sistemas

de comportamentos e relaes entre sistemas de comportamentos........................................ 194

xvii

2.2. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes comportamentos da

Categoria B Caractersticas de

comportamentos favorecedores da concepo de um Eu iniciador....................................... 226

2.2.1. Caractersticas das classes de

componentes que constituem classes de comportamentos identificadas a

partir da obra, pertencentes Categoria B......................................... 226

2.2.2. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos derivadas a

partir da obra, pertencentes Categoria B......................................... 237

2.3. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes comportamentos da

Categoria C Caractersticas de

comportamentos alternativos concepo de um Eu iniciador........................................... 244

2.3.1. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos identificadas a

partir da obra, pertencentes Categoria C........................................ 244

2.3.2. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes

de comportamentos derivadas a

partir da obra, pertencentes Categoria C........................................ 255

xviii

3 Observar os aspectos que constituem as classes de

comportamentos referidas pelo conceito Eu no

captulo O Eu da obra Cincia e Comportamento

Humano (1953/2003) de Skinner possibilita ampliar suas possveis contribuies produo de

conhecimento cientfico e interveno profissional,

bem como confere obra parmetros de comparao

com outras proposies da rea da Anlise

Experimental do Comportamento relacionadas ao mesmo conceito............................................................. 264

3.1. Exame das Caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria A

Caractersticas de sistemas de

comportamentos e relaes entre sistemas de comportamentos............................................. 269

3.2.

Exame das Caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria B

Caractersticas de comportamentos

favorecedores da concepo de um Eu iniciador........................................................ 284

3.3. Exame das caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria C

Caractersticas de comportamentos

alternativos concepo de um Eu

iniciador........................................................ 295

4. Caractersticas das classes de comportamentos s

quais o conceito Eu se refere no captulo O

Self da obra FAP - Psicoterapia Analtico Funcional de Kohlenberg e Tsai (1991/2006).......... 306

1. Classes de comportamentos identificadas e derivadas

do captulo O Self da obra FAP Psicoterapia

Analtico Funcional de Kohlenberg e Tsai (2001) como aquelas s quais o conceito Eu se refere.......... 308

xix

2. Componentes das classes de comportamentos

identificadas e derivadas do captulo O Self da obra

FAP Psicoterapia Analtico Funcional de

Kohlenberg e Tsai (2001) como aquelas s quais o conceito Eu se refere.................................................. 311

2.1. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes de comportamentos

da Categoria A Caractersticas do

desenvolvimento da unidade funcional Eu e de tal unidade depois de desenvolvida........... 312

2.1.1. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos identificadas a

partir da obra, pertencentes Categoria A......................................... 313

2.1.2. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos derivadas a

partir da obra, pertencentes Categoria A......................................... 330

2.2. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes comportamentos da

Categoria B Caracterizao dos processos ou

eventos a que as unidades funcionais constitudas do termo eu se referem............ 339

2.2.1. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes

de comportamentos identificadas a

partir da obra, pertencentes Categoria B......................................... 340

xx

2.2.2. Caractersticas das classes de

componentes que constituem classes de comportamentos derivadas a

partir da obra, pertencentes Categoria B......................................... 358

2.3. Caractersticas das classes de componentes

que constituem as classes comportamentos da

Categoria C Caractersticas de

comportamentos favorecedores da concepo de um Eu iniciador....................................... 365

2.3.1. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos identificadas a

partir da obra, pertencentes Categoria C........................................ 366

2.3.2. Caractersticas das classes de componentes que constituem classes de comportamentos derivadas a

partir da obra, pertencentes Categoria C........................................ 374

3. Observar os aspectos que constituem as classes de

comportamentos referidas pelo conceito Eu na obra

FAP Psicoterapia Analtico Funcional (1991/2006)

de Kohlenberg e Tsai possibilita ampliar suas

possveis contribuies produo de conhecimento

cientfico e interveno profissional, bem como

confere obra parmetros de comparao com outras

proposies da rea da Anlise Experimental do Comportamento relacionadas ao mesmo conceito........ 376

3.1. Exame das caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria A

Caractersticas do desenvolvimento da

unidade funcional Eu e de tal unidade depois de desenvolvida................................... 380

xxi

3.2. Exame das caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria B

Caracterizao dos processos ou eventos a

que as unidades funcionais constitudas do termo Eu se referem..................................... 397

3.3. Exame das caractersticas das classes de

comportamentos da Categoria C

Caractersticas de comportamentos

favorecedores da concepo de um Eu iniciador........................................................ 411

5. Organizao das classes de comportamentos

identificadas e derivadas como aquelas referidas

em proposies acerca do conceito eu nos

captulos O Eu da obra Cincia e Comportamento

Humano de Skinner (1953/2003) e O Self da obra

FAP Psicoterapia Analtico Funcional de

Kohlenberg e Tsai (1991/2006) em sistemas comportamentais......................................................... 419

1. Organizao das classes de comportamentos

identificadas e derivadas como aquelas s quais o

conceito Eu se refere no captulo O Eu da obra

Cincia e Comportamento Humano de Skinner (1953/2003) em um sistema comportamental............... 422

2. Organizao das classes de comportamentos

identificadas e derivadas como aquelas s quais o

conceito Eu se refere no captulo O Self da obra

FAP Psicoterapia Analtico Funcional de Kohlenberg e Tsai (1991/2006) em um sistema comportamental............................................................. 440

xxii

3. Organizar classes de comportamentos identificadas e

derivadas como aquelas referidas em proposies

acerca do conceito Eu nos captulos O Eu da obra

Cincia e Comportamento Humano de Skinner (1953/2003) e O Self da obra FAP Psicoterapia Analtico Funcional de Kohlenberg e Tsai

(1991/2006) em sistemas comportamentais como

forma de prover subsdios a intervenes e processos

de produo de conhecimento acerca das

caractersticas das relaes estabelecidas entre as

classes............................................................................ 456

3.1. Contribuies dos sistemas comportamentais

propostos a partir das caractersticas das

classes de comportamentos identificadas e

derivadas do captulo O Eu da obra Cincia

e Comportamento Humano (1953/2003) de Skinner............................................................. 459

3.2. Contribuies dos sistemas comportamentais

propostos a partir das caractersticas das

classes de comportamentos identificadas e

derivadas do captulo O Self da obra FAP Psicoterapia Analtico Funcional (1991/2006) de Kohlenberg e Tsai................... 465

6. Identificar e derivar caractersticas das classes de

comportamentos referidas em proposies acerca

do conceito Eu nos captulos O Eu da obra

Cincia e Comportamento Humano de Skinner

(1953/2003) e O Self da obra FAP Psicoterapia

Analtico Funcional de Kohlenberg e Tsai

(1991/2006) denota alto grau de relevncia das

contingncias culturais ao desenvolvimento de

processos relacionados ao que denominado Eu.............................................................................. 472

xxiii

1. Possveis relaes entre as caractersticas das classes

de comportamentos identificadas e derivadas a partir

das informaes apresentadas nos captulos O Eu da

obra Cincia e Comportamento Humano (1953/2003) e O Self de FAP- Psicoterapia Analtico Funcional (1991/2006) e dos sistemas comportamentais propostos como constitudos de tais classes.................. 475

2. Algumas implicaes dos resultados obtidos e das

caractersticas dos processos identificados nas fontes

de informaes em relao aos conceitos Eu

apresentados em outras obras da Anlise Experimental do Comportamento........................................................ 497

3. Limitaes dos resultados obtidos por meio do

conjunto de procedimentos de coleta, anlise e

tratamento dos dados em relao s caractersticas das

classes de comportamentos referidas em proposies

acerca do conceito Eu na Anlise Experimental do

Comportamento e ao exame de seus graus de coerncia........................................................................ 505

Referncias................................................................... 508

Lista de Tabelas........................................................... 522

Lista de Figuras........................................................... 543

xxiv

RESUMO

Do conhecimento produzido por uma rea de conhecimento em relao

a seu fenmeno de estudo decorre a qualidade das intervenes de

profissionais que nela se embasam para fundamentar sua atuao. Uma

das variveis que constitui o processo de produo de conhecimento e

interfere em seus produtos e em sua utilizao como subsdio consiste

nos conceitos dos autores da rea em relao aos termos nela utilizados.

O termo Eu tradicionalmente concebido como uma instncia

responsvel pelas caractersticas de aes e sentimentos dos indivduos,

sendo tal interpretao perpetuada ao serem supervalorizados

fenmenos subjetivos em sistemas explicativos reunidos sob a rea de

conhecimento da Psicologia. Ao desenvolver o conceito

comportamento como um sistema multideterminado complexo de

relaes entre aes que um organismo apresenta e aspectos de seu

ambiente fsico ou social e o conjunto de procedimentos reunidos sob a

denominao anlise funcional, a Anlise Experimental do

Comportamento torna possvel identificar quais sejam os fenmenos

comportamentais envolvidos no que entendido como Eu, propor

interpretaes aos mesmos e possibilitar que tais sejam validadas

experimentalmente. Investigar as caractersticas de classes de

comportamentos referidas em proposies acerca do conceito Eu

nessa rea de conhecimento tem fins a estender o entendimento do que

seja tal conceito a partir de uma explicao comportamental, conferir

alto grau de mincia s caractersticas das classes de componentes das

classes de comportamentos referidas, possibilitar a identificao de

relaes entre tais classes e conferir parmetros comuns a proposies

de autorias distintas que possibilite contrast-las com alto grau de

preciso, avaliar a coerncia entre elas e identificar possveis

complementaridades. Foram examinadas as proposies de B. F.

Skinner no captulo O Eu da obra Cincia e Comportamento Humano e

de R. J. Kohlenberg e S. C. Tsai no captulo O Self da obra FAP Psicoterapia Analtico Funcional por meio de etapas de coleta, anlise e tratamento de dados reunidas sob seis classes gerais de procedimentos:

1. Identificar trechos das obras que contenham informaes relacionadas

a classes de comportamentos referidas pelo conceito; 2. Identificar

unidades de informao relacionadas a classes de comportamentos

referidas pelo conceito apresentadas nos trechos selecionados; 3.

Organizar informaes apresentadas nas unidades de informao de

xxv

modo a favorecer a identificao de classes de estmulos antecedentes,

classes de respostas e classes de estmulos consequentes constituintes de

classes de comportamentos; 4. Identificar caractersticas de classes de

comportamentos constitudos das classes de estmulos antecedentes,

classes de respostas e classes de estmulos consequentes identificadas na

obra; e 5. Propor sistema de relaes entre classes comportamentos

identificadas como aquelas referidas nas obras em proposies acerca do

conceito; 6. Especificar controle de estmulos exercido pelas classes de

eventos identificadas como classes de estmulos antecedentes. A partir

da obra de B. F. Skinner foram identificadas e derivadas 36 classes de

comportamentos agrupadas em trs categorias: A. Caractersticas de

sistemas de comportamentos e relaes entre sistemas de

comportamentos; B. Caractersticas de comportamentos favorecedores

da concepo de um eu iniciador; e C. Caractersticas de

comportamentos alternativos concepo de um eu iniciador. Da obra

de R. J. Kohlenberg e S. C. Tsai foram identificadas e derivadas 30

classes de comportamentos agrupadas em trs categorias: A.

Caractersticas do desenvolvimento da unidade funcional eu e de tal

unidade depois de desenvolvida; B. Caracterizao dos processos ou

eventos a que as unidades funcionais constitudas do termo eu se

referem; e C. Caractersticas de comportamentos favorecedores da

concepo de um eu iniciador. Com base nas propriedades das

classes, foram identificadas entre elas relaes de abrangncia e pr-

requisitos e propostos dois grandes sistemas comportamentais, ambos

organizados em 15 graus de abrangncia. Os resultados obtidos

possibilitaram identificar possveis relaes de complementaridade entre

os processos referidos nas obras e denotar alto grau de relevncia de

comportamentos verbais vocais de tato e da formao de classes de

estmulos contextuais no desenvolvimento do fenmeno a que os

indivduos se referem ao dizer Eu. Bem como, e principalmente,

especificar caractersticas dessas relaes. Tambm denotado o papel

das contingncias do nvel de seleo cultural ao longo dos processos referidos nas proposies.

Palavras-chave: Eu; Comportamento; Anlise funcional de

comportamentos; Anlise conceitual; Comportamento verbal.

xxvi

ABSTRACT

From the knowledge related to its study phenomenon produced by an

area derives the quality of interventions from professionals to support

their activities. One of the variants constituting the process of

production of knowledge interferes in its products and in their use as a

subsidy consists in the concepts proposed by the authors in the area to

the used terms. The term "Self" has been traditionally conceived as a

responsible instance for the characteristics of action and feeling of the

individuals. This is a perpetuated interpretation because of the

overvaluation of the subjective phenomena" in explanatory systems

gathered under Psychology. While developing the concept of "behavior"

as a multidetermined complex system of relations between the actions of

an organism, the aspects of its physical or social environment and the set

of proceedings grouped under the name "Functional Analysis", the

Experimental Analysis of Behavior enables to identify the behavioral

phenomena involved in what is understood as "Self", as well as to

propose interpretations to them and to allow them to be experimentally

validated. The investigation of the characteristics of behavioral classes

referred in the propositions of the concept "Self" in this area of

knowledge aims to expand the understanding from a behavioral

explanation; to provide details about to the characteristics of the classes

of components of the referred behavioral classes; to enable the

identification of relationships between these classes and to compare

ordinary parameters from propositions of different authorship which

enables to contrast them with high degree of accuracy, to evaluate the

coherence between them and to identify possible complementarities. We

examined the propositions of B. F. Skinner in the chapter "The Self" of

the work Science and Human Behavior and of R. J. Kohlenberg and S.

C. Tsai in the chapter "The Self" of the work FAP - Functional Analytic

Psychotherapy for the of phases of collection, analysis and data

processing gathered under six general classes of proceedings. They are:

1. To identify excerpts containing information related to the behavioral

classes referred by the concept; 2. To identify units of information

xxvii

related to the behavioral classes referred by the concept presented in the

excerpts; 3. To organize the information presented in the units of

information in order to facilitate the identification of antecedent stimuli

classes, response classes and consequent stimuli classes constituents of

behavioral classes; 4. To identify characteristics of behavioral classes

constituted of the antecedent stimuli classes, response classes and

consequent stimuli classes identified in the work; 5. To propose a

system of relations between the classes of behavior identified as those

referred in the works in propositions about the concept and 6. To specify

the stimulus control exerted by the classes of events identified as

antecedent stimuli. From the work of B. F. Skinner we identified and

extracted 36 classes of behavior grouped in three categories. They are:

A. Characteristics of behavior systems and relationship between

behavior systems; B. Characteristics of behaviors that favors the

conception of a "self-starter"; and C. Characteristics of behaviors that

are alternatives to the conception of a "self-starter". From the work of R.

J. Kohlenberg and S. C. Tsai we identified and extracted 30 classes of

behavior grouped in three categories. They are: A. Characteristics of the

development of the functional unit "Self" and of such unit after its

developing; B. To characterize the processes or events that the

functional units constituted of the word "Self" refers to and C.

Characteristics of behaviors that favor the conception of a "self-starter".

Based on the properties of the classes, we identified relations of

coverage between them and prerequisites and proposed two major

behavioral systems, both organized in 15 degrees of coverage. The

results enable to identify the possible complementary relations between

the procedures referred in the works and to indicate high degree of

relevance of tact vocal verbal behavior and the formation of contextual

stimuli classes on the development of the phenomenon that individuals

refer when saying "Self". As well, and mainly, to specify the

characteristics of these relations. The role of cultural selection level over

the procedures referred in the propositions is also indicated.

Keywords: Self, Behavior, Functional Analysis of Behavior,

Conceptual Analysis, Verbal Behavior

28

1.

CARACTERSTICAS DAS CLASSES DE COMPORTAMENTOS

REFERIDAS EM PROPOSIES ACERCA DO CONCEITO EU

NA ANLISE DO COMPORTAMENTO

Uma contribuio para o conhecimento de interaes humanas

em aprendizagem, desenvolvimento e organizaes

Eu consiste em conceito associado cotidianamente a processos

introspectivos realizados pelos indivduos, bem como a sua subjetividade.

concebido como um agente iniciador das prprias aes e por elas

responsvel (Skinner, 1953/2003). Em tal concepo h o pressuposto de

que as aes e emoes dos indivduos so determinadas pelas

caractersticas de uma entidade ou de atributos internos, cujo acesso e

controle so demasiado limitados ou inviveis, o que implica em considerar

verdadeiro o dualismo entre mente-corpo, sendo cada instncia considerada

de natureza ontolgica distinta. O que chamado de Eu a partir de uma

perspectiva de senso comum mas tambm compatvel com muitas

proposies na prpria rea de conhecimento da Psicologia seria dotado,

portanto, de caractersticas no fsicas, cuja origem independeria das

caractersticas do meio e a partir das quais seriam funo seus modos de

sentir e agir.

Os conceitos que constituem a rea de conhecimento denominada

Anlise Experimental do Comportamento, embasadas nos princpios do

Behaviorismo Radical, oferecem uma possibilidade de interpretao distinta

acerca do conceito Eu em exame, uma vez que o pressuposto de haver

uma entidade interna e de natureza distinta que exera controle sobre as

aes dos organismos veementemente refutada e demonstraes

experimentais de controle por aspectos do ambiente j foram fartamente

apresentadas (Skinner, 1953/2003; 1969/1980; 1974/2003; 1991; Botom,

1997; Keller e Schoenfeld, 1950/1971; Catania, 1999). Por meio do

conhecimento produzido a partir de tal perspectiva possvel no apenas

oferecer uma fundamentao oposta concepo de um Eu iniciador,

mas identificar se h processos referidos por tal termo alm de uma

confuso conceitual e, caso houver, caracteriz-los e apresentar uma

interpretao comportamental ao processo envolvido no que denominado

Eu, bem como procedimentos sua validao experimental.

29

Segundo Russell (1956), a funo da Cincia est relacionada

identificao de padres entre os eventos da natureza. Consiste em produzir

conhecimento acerca da ordenao existente entre eventos ou fenmenos

em diferentes graus de abrangncia desde eventos microscpicos a

fenmenos do maior nvel de abrangncia possvel (nvel estelar) e express-lo em leis que descrevam as relaes existentes entre eles, de

modo a possibilitar previso e controle dos mesmos. Se o conhecimento

produzido e expressado em asseres cientficas for fidedigno s

caractersticas dos fenmenos observados, profissionais que neles intervm

podem deduzir a pertinncia das leis aos fenmenos especficos com que

trabalham e, por conhecer suas variveis, intervir de maneira precisa e com

maior probabilidade de eficcia. Resultados satisfatrios de intervenes

orientadas ao atendimento de necessidades sociais (direta ou

indiretamente), portanto, dependem do desenvolvimento contnuo de

conhecimento cientfico acerca das caractersticas dos fenmenos

envolvidos na produo de tais necessidades.

A funo da Cincia de produzir conhecimento acerca das

caractersticas das relaes entre eventos e fenmenos da natureza se aplica

Anlise Experimental do Comportamento que, por si, pode ser

considerada uma rea de conhecimento. Trata-se de uma rea cujo objeto de

estudo o comportamento e so investigadas as variveis que o constituem

e das quais funo, em suas diversas possibilidades de ocorrncia. Ao

proverem processos de produo de conhecimento relacionados s

caractersticas do fenmeno comportamento e s leis nele envolvidas, a

rea de conhecimento em questo produz subsdios a (1) intervenes

profissionais com funes de previso e controle de comportamentos e (2) a

novos processos de produo de conhecimento relacionados a

comportamentos previamente investigados.

Considerando a relevncia das proposies da Anlise do

Comportamento em relao aos fenmenos que investiga, vlido

questionar que alternativas so oferecidas por produes cientficas da rea

que refutam a noo de um Eu iniciador. Se h comportamentos

envolvidos naquilo que recebe a denominao Eu no senso-comum e em

outros sistemas explicativos a respeito de interaes humanas, quais so

eles? A depender da relevncia de tais comportamentos em relao ao

desenvolvimento humano individual e coletivo, intervenes neles so

necessrias e requerem conhecimento de qualidade no qual se embasar. Do

mesmo modo como processos de produo de conhecimento a fim de tornar

30

o conhecimento acerca desses comportamentos mais minucioso e preciso e,

consequentemente, de maior utilidade.

A contribuio da produo de conhecimento cientfico da Anlise

Experimental do Comportamento em relao ao conceito Eu se d

tambm por outra razo. O tratamento dado ao conceito em questo na

Anlise Experimental do Comportamento (Skinner, 1953/2003; 1974/2003;

1991; Kohlenberg e Tsai, 1991/2006) consiste em um dos demarcadores

das distines dessa rea/tipo de conhecimento e outras perspectivas em

Psicologia, j que refutar uma entidade interna com status causal em relao

s aes e sentimentos dos organismos e propor simplesmente o controle

ambiental em seu lugar implica em questionamento e negao de uma

noo tradicional de subjetividade, pilar do conhecimento psicolgico.

Identificar a que analistas do comportamento se referem por meio do

conceito Eu, portanto, tambm um meio de tornar mais claras as

implicaes da fundamentao filosfica dessa rea de conhecimento.

Por fim, para que o conhecimento existente na rea relacionado ao

conceito Eu seja fidedigno s caractersticas do(s) fenmeno(s)

referido(s) pelo conceito e subsdio confivel para possibilitar (1)

intervenes nesse(s) fenmeno(s); (2) processos de produo de

conhecimento de alto grau de qualidade a seu respeito; e (3) exames

precisos das implicaes de processos de produo de conhecimento a

respeito das interaes humanas serem embasados nos princpios do

Behaviorismo Radical, necessrio ainda mais um critrio: coerncia

conceitual (Staats e Staats, 1963/1973). As proposies de autores de uma

mesma rea de conhecimento que investigam um mesmo fenmeno,

supostamente o caracterizam e definem de maneira coerente entre si, j que

se embasam nos mesmos princpios. Ou de maneira gradativamente mais

coerente, conforme o desenvolvimento da prpria rea. De outro modo, por

no apresentarem informaes precisas acerca das caractersticas dos

fenmenos que investigam, no consistiriam em fontes confiveis de

informaes que pudessem ser utilizadas como subsdios de intervenes

ou processos de produo de conhecimento sem que seus produtos fossem

comprometidos.

Novos aspectos de fenmenos podem ser descobertos a cada

processo de produo de conhecimento, assim como aspectos previamente

identificados podem ser refutados ou complementados, etapas que

caracterizam a permanente produo e aperfeioamento do conhecimento

cientfico. Uma vez que o conhecimento produzido consiste em substrato a

ser transformado em condutas profissionais (Botom e Kubo, 2002), no

31

entanto, isso requer constante avaliao das proposies derivadas dos

processos de produo de conhecimento de uma rea de conhecimento. J

que a perpetuao de proposies incoerentes e incompatveis entre si

interfere na qualidade das intervenes profissionais nelas embasadas. A

fim de avaliar se o critrio de coerncia conceitual contemplado pelas

obras da Anlise Experimental do Comportamento em que so apresentadas

alternativas de tratamento ao conceito Eu, cabe questionar se, por

fundamentarem-se nos princpios do Behaviorismo Radical, apresentam

proposies equivalentes ou complementares.

Uma anlise minuciosa de proposies de autores da Anlise

Experimental do Comportamento acerca do conceito Eu que investigue as

caractersticas dos comportamentos a que se referem e as relaes que tais

comportamentos estabelecem entre si pode consistir em relevante

contribuio ao avano da rea de conhecimento em questo de maneira

geral. Por prover uma sistematizao das proposies relacionadas a um

conceito que a distingue de outros tipos de conhecimento em Psicologia e

favorecer a identificao de aspectos a serem aprimorados nas proposies,

bem como de possveis aprimoramentos. De modo mais pontual, por

identificar e caracterizar comportamentos efetivamente relacionados ao

conceito, bem como relaes entre eles, tal anlise pode servir de subsdio

preciso a intervenes nesses fenmenos e a processos de produo de

conhecimento a seu respeito.

1.1. Preciso, conciso e clareza conceitual em uma rea de conhecimento: requisitos qualidade dos processos envolvidos na

produo de conhecimento da rea e em intervenes nos fenmenos

que consistem em seus objetos de estudo

soluo de necessidades sociais serve a produo de

conhecimento cientfico. Seja aquele que mais diretamente possibilita

identificar procedimentos de interveno em campos de atuao

profissional diversos, seja aquele cuja relao com as modalidades de

interveno direta nos fenmenos esto menos visveis, sem por isso serem

menos importantes a seu desenvolvimento (Botom e Kubo, 2002; 2004).

Considerando a finalidade da produo de conhecimento cientfico, um dos

parmetros avaliao do conhecimento produzido em uma rea de

conhecimento pode ser, portanto, sua utilidade a intervenes nos

fenmenos que consistem em seu objeto de estudo. Independentemente de

as relaes estudadas nos processos de produo de conhecimento

32

divergirem das que constituem efetivamente comportamentos profissionais

em interveno direta, j que o desenvolvimento de tais comportamentos

requer conhecimento produzido acerca de diversos outros fenmenos.

Ainda que no seja condio produo de conhecimento de determinada

rea que os fenmenos estudados consistam naqueles que os profissionais

que embasam sua atuao nessa rea intervm diretamente, h critrios que,

cumpridos, aumentam a probabilidade de que o conhecimento produzido

tenha utilidade s intervenes de tais profissionais. Bem como a demais

processos de produo de conhecimento. Cumprir tais critrios aumenta no

s a utilidade dos produtos desses processos de produo de conhecimento,

mas tambm de sua confiabilidade aspecto sem o qual a prpria utilidade

comprometida. Quais so eles? De que forma utiliz-los para avaliar a

confiabilidade e relevncia do conhecimento produzido?

Russell (1956) apresenta alguns princpios do conhecimento

cientfico a partir dos quais idealmente possvel organizar os eventos da

natureza conforme leis gerais de diferentes graus de generalidade de acordo

com os fenmenos que abrangem, at leis gerais que governam tudo no

universo (pg. 50). A funo da produo de conhecimento cientfico, para

o autor, portanto, seria propor leis com base nas caractersticas comuns

ocorrncia de diversos eventos. Primeiramente leis de ordem baixa que

categorizam uma parcela pequena dos eventos que ocorrem na natureza e,

gradativamente, na medida em que so comuns a mais conjuntos de

eventos, leis mais gerais. A partir da identificao dessas leis de diferentes

graus de generalidade, passa a ser possvel identificar sua ocorrncia em

fenmenos especficos e, dada a confiabilidade das leis identificadas,

conferir preciso e qualidade a intervenes realizadas em tais fenmenos.

A produo de conhecimento cientfico serve, portanto, como fonte de

informaes nas quais embasar intervenes.

Em conformidade com a funo e a relevncia destacadas por

Russell (1956) a respeito do processo de conhecer cientificamente, Botom

e cols. (2003) propuseram comportamentos bsicos como constituintes das

competncias profissionais do psiclogo, cujos produtos finais so

alteraes significativas e de valor ao indivduo e sociedade. Como base

s suas proposies, os autores examinaram as caractersticas dos eventos

na natureza e na sociedade com as quais o psiclogo se depara ao intervir

sobre fenmenos. A partir de tais caractersticas propuseram trabalhos a

serem realizados e produtos desses trabalhos que, de maneira mais ou

menos direta, contribuem s alteraes de valor nos fenmenos sob

interveno. Na primeira coluna esquerda da Tabela 1.1 esto

33

representados os seis conjuntos de eventos na natureza e na sociedade com

os quais consideraram que o profissional se depara ao intervir, na coluna

central esto representados os trabalhos a serem por ele apresentados em

relao a cada um dos conjuntos de eventos e na coluna direita, os

resultados importantes de serem obtidos.

A seta esquerda dos conjuntos de aspectos presentes na natureza

e na sociedade representa que todos os trabalhos referidos na coluna

central esto relacionados e constituem um continuum, sendo os resultados de um a condio para que novos conjuntos de eventos possam consistir em

caractersticas da natureza ou da sociedade com que o profissional se

depara ao intervir. Representa que a cada trabalho apresentado, seguido

de seus resultados, o conjunto de eventos da natureza alterado. Embora os

autores tenham caracterizado conjuntos de eventos com os quais

especificamente o psiclogo se depara ao intervir, o mesmo exame pode ser

realizado em relao a outros profissionais. As caractersticas dos

trabalhos a serem apresentados a cada conjunto de eventos e dos

resultados a serem obtidos a partir deles, nesses casos, seriam anlogas s

propostas.

Observar as caractersticas de cada conjunto de eventos da

natureza sob controle dos quais o profissional necessita realizar os

trabalhos propostos pelos autores, as caractersticas de tais trabalhos e

de seus resultados denota que para que o profissional tenha sua disposio

informaes acerca das caractersticas dos fenmenos psicolgicos que

consistem nos objetos de interveno do profissional, acerca das

possibilidades de acesso a eles e das que possibilitam seu controle,

necessria a ocorrncia dos processos referidos nas cinco primeiras linhas

da Tabela 1.1, que consistem em processos de produo de conhecimento.

34

TABELA 1.1

COMPONENTES DE CLASSES DE COMPORTAMENTOS RELACIONADOS A CONDIES

DE CONHECIMENTO E TECNOLOGIA EXISTENTES PARA LIDAR COM FENMENOS,

PROCESSOS OU PROBLEMAS PSICOLGICOS, ADAPTADO DE BOTOM E COLS. (2003)

CARACTERSTICAS DOS

EVENTOS NA NATUREZA E

NA SOCIEDADE

TRABALHOS

CORRESPONDENTES A

REALIZAR PELAS PESSOAS

RESULTADOS IMPORTANTES E

MBITOS DE ATUAO

Desconhecimento das

variveis envolvidas em fenmenos, processos ou

problemas psicolgicos

Conhecer variveis...

Produzir conhecimento sobre...

(Tornar conhecidas as variveis

envolvidas em...)

Conhecimento sobre as variveis

envolvidas em fenmenos, processos ou problemas psicolgicos

(Conhecimento ou pesquisa cientficos, pesquisa fundamental, pesquisa bsica)

Desconhecimento sobre as

interaes entre as variveis relacionadas a

fenmenos, processos ou problemas psicolgicos

Conhecer as interaes entre...

Produzir conhecimento sobre...

(Tornar conhecidas as interaes entre as variveis...)

Conhecimento sobre as interaes entre

as variveis envolvidas em...

(Conhecimento ou pesquisa cientficos,

pesquisa fundamental, pesquisa bsica, pesquisa de campo, pesquisa aplicada)

Dificuldade de acesso s

variveis relacionadas a fenmenos, processos ou

problemas psicolgicos

Produzir conhecimento e ou tecnologia

que possibilitem o acesso s variveis relacionadas a...

(Tornar vivel o acesso s variveis...)

Conhecimento sobre as formas ou

processos de acesso s variveis... ou disponibilidade de procedimentos de

acesso s variveis...

(Conhecimento, ou pesquisa cientfica e

pesquisa aplicada ao conhecimento tecnolgico bsico)

Dificuldade para controlar as variveis relacionadas a

fenmenos, processos ou

problemas psicolgicos

Produzir conhecimento e ou tecnologia que possibilitem o controle das variveis

relacionadas a...

(Tornar controlveis as variveis

relacionadas a... ou viabilizar intervenes sobre os fenmenos,

processos ou problemas psicolgicos)

Conhecimento tecnolgico sobre os

processos de controle de variveis

relacionadas a... ou procedimentos

tecnolgicos de controle das variveis...

(Pesquisa aplicada, tecnologia,

pesquisa-ao, integrao entre pesquisa cientfica e condies naturais

de ocorrncia dos fenmenos e processos)

Inexistncia de

procedimentos de interveno sobre as

variveis relacionadas a fenmenos, processos ou

problemas psicolgicos

Produzir conhecimento e ou tecnologia que possibilitem interveno profissional

sobre as variveis relacionadas a...

(Produzir procedimentos de interveno,

avaliar procedimentos de interveno, testar procedimentos de interveno

relacionados a...)

Conhecimento tecnolgico sobre os

processos de interveno nas variveis relacionadas a... ou procedimentos

tecnolgicos de interveno nas variveis...

(Pesquisa aplicada, tecnologia, pesquisa-ao, pesquisas avaliativas,

integrao entre pesquisa cientfica e condies naturais de ocorrncia dos

fenmenos e processos)

Variveis relacionadas a fenmenos, processos ou

problemas psicolgicos conhecidas, acessveis,

controlveis...

Intervir sobre as variveis relacionadas a

fenmenos, processo ou problemas psicolgicos

(Produzir mudanas ou resultados socialmente significativos ou

humanamente desejveis por meio de alteraes em variveis relacionadas a...)

Resultados, mudanas ou situaes socialmente significativos e

humanamente desejveis em relao a fenmenos, processos ou problemas

psicolgicos.

(Interveno profissional, tecnologia de

interveno, trabalho humano na sociedade, benefcios sociais do

trabalho do psiclogo)

35

Embora se possa discorrer acerca de todos os componentes

propostos pelos autores e suas implicaes s caractersticas das

competncias profissionais do psiclogo ou outros profissionais j que

implicam em conceber que sejam atribuies do psiclogo a produo

de conhecimento cientfico a respeito dos fenmenos em que necessita

intervir, quando tal no houver ou for insuficiente ao entendimento da

funo que conceitos utilizados em uma rea de conhecimento exercem

em relao a seus produtos e utilidades possveis so de especial

relevncia os componentes representados na primeira, segunda e ltima

linhas da Tabela 1.1, com destaque em cinza. Enquanto os componentes

das duas primeiras linhas se referem produo de conhecimento acerca

das variveis envolvidas em fenmenos, processos ou problemas

psicolgicos e das interaes entre tais variveis, os componentes da

ltima linha se referem interveno nelas.

Considerando ser cada conjunto de eventos antecedentes aos

trabalhos propostos pelos autores possibilitado pelos trabalhos

representados nas linhas anteriores, os processos de interveno nas

variveis de fenmenos, processos ou problemas psicolgicos depende

dos resultados obtidos pelos processos de produo de conhecimento a

respeito de suas variveis e da relao entre elas, representados nas duas

primeiras linhas. H caractersticas especficas de tais processos de

produo de conhecimento cientfico que, se conhecidas e controladas

aumentam a probabilidade de que seus produtos sejam conhecimentos

fidedignos s caractersticas do fenmeno investigado, de modo que

possam ser utilizados como subsdios a intervenes?

Identificar as variveis envolvidas em um fenmeno e relaes

entre tais variveis equivale aos padres comuns a diferentes eventos

referidos por Russell (1956), que podem ser expressos em leis. Para

tanto, requerida a utilizao apropriada de procedimentos que

confiram fidedignidade caracterizao e ao agrupamento de eventos

em relao a sua ocorrncia. Ainda que filosoficamente a

correspondncia entre o conhecimento produzido acerca de determinado

fenmeno e o prprio fenmeno seja objeto de discusso ainda ou

permanentemente insolvel (Abbagnano, 2007), caracterizar fenmenos

de maneira fidedigna sua ocorrncia consiste em um objetivo da

perspectiva cientfica. E embora somente possa ser atingido de maneira

aproximada em funo da grande quantidade de variveis que

constituem fenmenos e que constituem os processos de produzir

conhecimento a seu respeito (Botom e Kubo, 2008; Botom, 1997).

Para tanto, caracterizar cientificamente um processo comportamental

ou outro processo qualquer da natureza requer que as variveis

36

estudadas do processo em exame sejam controladas pelo pesquisador,

bem como seus prprios comportamentos profissionais, de modo a

diminuir sua interferncia e consequente produo de vieses nos dados

obtidos e em sua interpretao (Botom, 1997).

Especificamente no caso de pesquisas cujo objetivo

identificar caractersticas ainda desconhecidas de ou entre processos, e

cujos produtos subsidiam as demais pesquisas da rea, h aspectos

especficos que precisam ser controlados a fim de que seus produtos

sejam efetivamente os mais fidedignos possveis aos fenmenos

observados. A produo de conhecimento acerca de qualquer conjunto

de eventos unificados por caractersticas comuns que constituem

fenmenos implica na utilizao de procedimentos para sua

observao. Por isso, a qualidade e fidedignidade do conhecimento

produzido acerca de fenmenos observados so funo do grau de

desenvolvimento desses procedimentos e do controle de suas variveis

(Staats e Staats, 1963/1973; Botom, 1997). De que forma, no entanto,

possvel avaliar observaes realizadas por pesquisadores de

determinada rea e os instrumentos que utilizam para realiz-las? Que

variveis os constituem?

Conforme Staats e Staats (1963/1973), registrar observaes

de fenmenos de maneira simples consiste em um primeiro estgio no

desenvolvimento de conhecimento a seu respeito, enquanto a utilizao

de signos verbais em tais tipos de registro lhes confere status de

descries dos fenmenos observados. Para que observaes tenham

utilidade Cincia, requerido que sejam realizadas de maneira

pormenorizada e sistemtica de modo que possibilitem descries do

mesmo modo qualificadas. Observaes de fenmenos, portanto, podem

ser avaliadas por meio de exame das caractersticas das descries que

viabilizam. Ou por meio de um parmetro mais especfico: os signos

verbais conhecidos e consolidados por uma comunidade cientfica por

meio dos quais aspectos do fenmeno so registrados nas descries

derivadas de suas observaes. O modo como tais signos so utilizados

na rea de conhecimento expressa os conceitos referidos por cada termo

nessa rea.

Os graus de fidedignidade e qualidade do conhecimento

produzido em uma rea de conhecimento acerca dos fenmenos que

consistem em seus objetos de estudo dependem da qualidade dos

instrumentos de observao e descrio desenvolvidos pela rea, sendo

a qualidade desses procedimentos diretamente dependente dos conceitos

neles utilizados. Uma vez que intervenes em fenmenos dependem do

conhecimento produzido a seu respeito, possvel verificar que h uma

37

relao de dependncia entre os conceitos utilizados em descries de

fenmenos e processos de interveno neles, a qual interfere na

qualidade dos produtos da interveno. Na Figura 1.1 apresentada uma

representao das relaes entre alguns dos processos intermedirios

interveno em fenmenos e os conceitos utilizados por meio de signos

verbais. Os retngulos representam, respectivamente: (1) a interveno

em determinado fenmeno; (2) a produo de conhecimento a seu

respeito; (3) a descrio de suas caractersticas; (4) a observao de sua

ocorrncia; e (5) conceitos empregados na descrio e orientadores

observao. As setas da figura representam que o processo/evento

direita consiste em requisito ocorrncia do processo esquerda, sendo

a seta localizada na parte inferior da figura uma representao da relao

entre os conceitos utilizados por uma rea de conhecimento e as

intervenes embasadas no conhecimento produzido por essa rea. Tais

processos intermedirios tornam mais minuciosa a anlise dos processos

mencionados na primeira e segunda linhas da Tabela 1.1, tambm

relacionados produo de conhecimento sobre fenmenos, e de sua

relao com os processos de interveno nesses fenmenos. Tornam

mais ntida, especialmente, a funo dos conceitos empregados em sua

observao e descrio.

Figura 1.1. Representao das relaes entre conceitos utilizados em

descries de fenmenos e intervenes realizadas em fenmenos.

Os graus de controle das variveis com que um fenmeno

observado, bem como de adequao dos procedimentos de observao e

seus produtos, podem ser identificados, portanto, a partir das descries

dos fenmenos derivadas desses processos e, especificamente, das

proposies e definies acerca dos signos verbais utilizados em tais

descries, que expressam os conceitos utilizados na rea de

conhecimento em questo. Mas descries de fenmenos, alm de

consistirem em fontes que possibilitam o acesso ao grau de controle das

38

variveis do processo de produzir conhecimento cientfico e aos graus

de adequao dos procedimentos de observao utilizados nesse

processo, servem a funes especficas em relao finalidade geral da

Cincia descrita por Russel (1956). O que confere maior grau de

relevncia a seu exame. De acordo com Staats e Staats (1963/1973),

descries pormenorizadas e sistemticas de fenmenos envolvem o

registro dos eventos que os constituem e possibilitam a produo de

conhecimento acerca de: (1) novos aspectos de tais eventos; (2) aspectos

comuns entre diferentes eventos; e (3) relaes entre eles. Passam

tambm a ser passveis de identificao (4) conjuntos de eventos com

propriedades comuns; e, a partir dos padres observados entre tais

conjuntos, (5) so derivadas as leis da cincia em distintos graus de

generalidade a que Russel (1956) se refere. Ainda, alm de possibilitar a

identificao de conjuntos de eventos e de relaes entre tais conjuntos,

observ-los e descrev-los sistematicamente condio que possibilita

aumentar o conhecimento acerca de (6) aspectos do prprio evento; ou

(7) dos conjuntos de eventos.

Descrever fenmenos sistematicamente por meio de signos

verbais que expressam conceitos, a depender do modo como utilizados

ainda serve a mais uma funo especfica em acordo com a finalidade

geral da Cincia. Ao possibilitar a identificao de conjuntos mais gerais

de fenmenos, unificados por caractersticas comuns, criam condies

previso e ao controle dos fenmenos especficos que constituem um

conjunto previamente identificado e caracterizado (Staats e Staats,

1963/1973). Tais condies so derivadas do raciocnio dedutivo: uma

vez que h caractersticas comuns a determinado conjunto de

fenmenos, essas caracterizam cada um dos que constitui o conjunto

(Russel, 1956). Processos para identificar propriedades de fenmenos

especficos tornam-se desnecessrios uma vez que as mesmas podem ser

previstas com base nas caractersticas do conjunto, identificadas

previamente. Ao tornar possvel a previso de caractersticas de um

fenmeno especfico, o mesmo ocorre possibilidade de seu controle, j

que o conhecimento de suas variveis as torna passveis de manipulao.

Descrever fenmenos com os maiores graus de preciso e clareza

possveis , portanto, um comportamento profissional do qual dependem

as intervenes no fenmeno pertencente classe identificada por meio

de descries sistemticas.

Dado o alcance dos produtos do processo de registrar

fenmenos de maneira sistematizada e a fim de conferir confiabilidade e

fidedignidade aos fenmenos observados, tal tipo de processo de

produo de conhecimento requer alto grau de controle das variveis

39

que o constituem (Staats e Staats, 1963/1973; Botom, 1997). Que

aspectos de descries de fenmenos e de conjuntos de fenmenos

necessitam ser examinados a fim de verificar o grau de controle de suas

variveis e, consequentemente, seu grau de confiabilidade? Utiliz-las

como fundamento de processos de produo de conhecimento ou

intervenes requer que tais aspectos a serem examinados sejam

conhecidos.

Uma descrio tem sua confiabilidade e fidedignidade

limitadas quando, por exemplo, eventos presumivelmente mas no

comprovadamente existentes forem descritos e quando forem

utilizados termos que se referem a mais de um evento (Staats e Staats,

1963/1973), j que identificar a que processos descries se referem se

torna um processo invivel ou sujeito a erros se a prpria terminologia

empregada imprecisa e ambgua. Portanto, produzir conhecimento

seguro a partir de observaes implica na utilizao de termos cujo

significado suficientemente claro e preciso comunidade qual o

pesquisador pretende contribuir, uma vez que os produtos obtidos

fundamentaro intervenes em diferentes modalidades de atuao. Ou

seja, implica na utilizao de termos em relao aos quais os conceitos

dos profissionais da rea e do campo de atuao coincidem.

Os termos utilizados em uma rea de conhecimento no tm

sua utilizao justificvel somente por sua familiaridade ou

consolidao, mas h tambm critrios que os tornam fontes seguras de

conhecimento por evitarem ambiguidades ou referncias a eventos cuja

ocorrncia no comprovada cientificamente (Staats e Staats,

1963/1973), os quais devem servir de parmetro sua utilizao. Para

verificar se os termos utilizados em uma rea de conhecimento atendem

a tais critrios, necessrio examinar o modo como so utilizados, o

que envolve identificar sob controle de que variveis so apresentados e

com que finalidade. Fontes de informaes acerca dos conceitos

empregados em uma rea de conhecimento so definies das

terminologias utilizadas ou proposies a seu respeito, ou ainda

definies propostas por autores de outras reas nas quais os

pesquisadores se embasam. A terminologia e os conceitos empregados

em uma rea de conhecimento, portanto, consistem em variveis das

quais decorrem o grau de fidedignidade das descries dos fenmenos

s suas caractersticas e a decorrente confiabilidade dessas descries

fundamentao de intervenes ou a outros processos de produo de

conhecimento.

De proposies ambguas ou imprecisas acerca de termos

utilizados em uma rea de conhecimento possvel inferir decorrncias

40

relacionadas divergncia de conceitos. Em relao a tais divergncias,

Copi (1981) descreve trs tipos de conflitos: (1) casos em que os

contendores se referem ao mesmo processo por meio de uma palavra,

mas discordam em convico ou crena acerca de determinado aspecto

disputas obviamente genunas ; (2) outros em que por meio do

mesmo termo se referem a processos distintos, mas explicitar a

ambiguidade do termo demonstra que no divergem em opinio; (3) e

casos em que fazem referncia a processos distintos e divergem em

opinio, ainda que a ambiguidade do termo seja explicitada. Definies

ou proposies ambguas ou imprecisas de termos s no esto na base

do tipo de conflito conceitual obviamente genuno descrito por Copi

(1981), o que possibilita conjecturar acerca de suas implicaes,

especialmente a uma rea de conhecimento e a campos de atuao

profissional. Especificamente Psicologia. Que decorrncias proposies acerca da constituio de um

fenmeno respaldada em conceitos expressos imprecisa ou

ambiguamente podem acarretar na atuao de profissionais cuja

atribuio intervir nesse tipo de fenmeno? Que decorrncias podem

acarretar a qualquer processo de produo de conhecimento que utilize

tais proposies como fundamentao ou fonte de informaes para

coleta de dados? Observar cientificamente a ocorrncia de um fenmeno

implica na necessidade de o pesquisador dispor de termos apropriados

ao registro sistematizado (descrio) dos eventos que observa, conforme

afirmam Staats e Staats (1963/1973). Se proposies acerca dos termos

disponveis ao registro da observao forem incoerentes entre si, se

houver a tais termos mais de uma definio ou se a definio no

delimitar precisamente o evento ou a caracterstica dos eventos a que se

referem, a descrio produzida do fenmeno favorecer o manejo de

variveis inadequadas ou naquelas no crticas alterao necessria.

Favorecer, ainda, que processos de produo de

conhecimento que utilizem a descrio de fenmenos cujas definies

so imprecisas como fonte de informaes tenham confiabilidade

restrita e produzam conhecimento, se no equivocado, pouco ou nada

til ao avano do conhecimento cientfico, alm de induzir erros de

percepo e atuao profissional com variados graus de gravidade.

Como examinam Staats e Staats (1963/1973), portanto, toda a cadeia de

produo de conhecimento acerca de determinado fenmeno e

intervenes nele depende dos conceitos da rea de conhecimento. De

imprecises conceituais em Cincia decorrem desde pouca utilidade de

processos de produo de conhecimento at as diversas consequncias

41

de intervenes em variveis inadequadas ou irrelevantes dos

fenmenos.

O conceito Eu em Psicologia subsidia parcelas de

intervenes nos mais variados fenmenos psicolgicos e processos de

produo de conhecimento a seu respeito, uma vez que considerado

referncia a uma instncia iniciadora das aes e sentimentos dos

indivduos. Considerando a importncia dos termos utilizados em uma

rea de conhecimento em relao aos processos de observar fenmenos,

descrev-los, produzir conhecimento a seu respeito e intervir neles, ao

contrapor compreenso comum do termo Eu embasada nos

princpios do Behaviorismo Radical e ao propor um conceito coerente

com tais princpios, analistas do comportamento contribuem tambm

realizao desses processos em sua rea de conhecimento e campo de

atuao profissional. Se em suas proposies, se referem a

comportamentos que efetivamente ocorrem se concebem fenmenos

existentes referidos pelo conceito Eu, no apenas denunciam uma

confuso conceitual necessrio identific-los e caracteriz-los a fim

de subsidiar intervenes nesses fenmenos de modo efetivo, preciso e

coerente. Compreender a extenso da relevncia dos conceitos utilizados

em uma rea de conhecimento, no entanto, denota ainda mais

importncia anlise das proposies dos autores em Anlise do

Comportamento em relao ao conceito Eu, pois da preciso e clareza

de suas proposies dependem processos de produo de conhecimento

e interveno em outros fenmenos que abrangem os referidos pelo

conceito Eu ou estabelecem com eles relaes.

A coerncia de proposies de analistas do comportamento em

relao ao conceito Eu, portanto, interfere no s em processos de

produo de conhecimento a respeito dos comportamentos referidos

pelo conceito e em intervenes neles, mas em todos os processos a ele

relacionados que abranjam tais comportamentos ou estejam a eles

relacionados e utilizem o conceito Eu como base s suas observaes

e descries. O fato de as proposies fundamentarem-se nos mesmos

princpios do Behaviorismo Radical supostamente as tornaria

coerentes ou, conforme o avano do conhecimento, gradativamente mais

precisas (Copi, 1981). A fundamentao comum, no entanto, no

garante o controle das variveis necessrio a uma proposio cientfica

(Botom, 1997) e, por isso, no suficiente para que sejam coerentes

entre si ou consistam em complementaes umas das outras.

Uma vez que propriedades nucleares que caracterizam o

conhecimento produzido em Anlise Experimental do Comportamento

so seu rigor cientfico e sua nfase no controle exercido pelas variveis

42

ambientais em comportamentos, a fim de prev-los e control-los,

historicamente houve nessa rea maior produo de conhecimento

acerca de procedimentos capazes de alterar comportamentos do que

acerca dos processos ocorridos nos organismos em funo da aplicao

de tais procedimentos (Moskorz e cols., 2012). Essa nfase teve sua

importncia em funo de ser condio para a demonstrao da eficcia

de procedimentos bem desenvolvidos para alterao de condies

ambientais e, consequentemente, dos comportamentos. No entanto,

acarretou em lacunas especialmente a respeito de processos cujas

variveis mais crticas possuem baixo grau de observabilidade, em

funo das restries a seu acesso (Tourinho, 2009).

Embora processos cujas variveis crticas so encobertas

tenham de algum modo sido descritos e definidos na literatura da

Anlise do Comportamento (Pessotti, 2008; Tourinho, 2006; Tourinho,

2009; Kohlenberg e Tsai, 1991/2006; Skinner, 1974/2003; Skinner,

1953/2003; 1974/2003; 1991; Staats & Staats, 1963/1973), a

constatao de ter havido menor destaque histrico a tais processos

consiste em mais um aspecto que confere relevncia investigao das

proposies a respeito do conceito Eu considerando a possibilidade

de processos a tal conceito relacionados apresentarem caractersticas

inobservveis a terceiros e de seus graus de coerncia entre si.

Um meio de delimitar a compreenso de termos a somente um

conceito apresentar definies a seu respeito. O acesso a definies

fidedignas s caractersticas dos fenmenos a que se referem, possibilita

aos profissionais que intervm neles ou em fenmenos associados, ou

ainda que produzem conhecimento a seu respeito uma fonte confivel de

informaes. Mas que caractersticas definies devem apresentar a fim

de serem de qualidade, alm de fontes de informaes confiveis?

suficincia de definies, Botom (2001) discorre:

Uma das regras para definir um evento ou objeto de estudo

garantir, na definio, as caractersticas, propriedades ou atributos essenciais quilo que objeto de definio. Porm, conforme o

objetivo que tem a pessoa que constri a definio, ela tende a enfatizar uma ou outra das caractersticas, propriedades ou atributos

do objeto que alvo de definio. E isto uma das grandes armadilhas do processo de conhecimento: as tendncias das pessoas

ao definir um evento, fenmeno ou qualquer outro objeto de interesse (pg. 689).

De acordo com o autor, uma boa definio necessita

contemplar as propriedades nucleares daquilo que descrito, o que nem

43

sempre ocorre em funo do objetivo de quem define. O destaque de

aspectos nucleares, no entanto, requer a identificao dos aspectos que

constituem um fenmeno e critrios avaliao do grau de importncia

de cada um em relao aos demais. Se nas crticas de proposies da

Anlise do Comportamento que argumentam contra a concepo de um

Eu iniciador h a proposio de comportamentos relacionados ao

conceito Eu, suas caractersticas necessitam ser conhecidas a fim de

possibilitar a elaborao apropriada de uma definio do conceito Eu.

Ou a fim de avaliar as definies j existentes. Para tanto, serve tambm

o exame das proposies acerca desse conceito em obras da Anlise do

Comportamento que obtenha como produto a caracterizao dos

comportamentos referidos.

Mais que consistir em subsdio seguro a partir do qual

pesquisadores e profissionais de determinada rea de conhecimento

podem iniciar o processo de produo de conhecimento ou interveno

sem o risco de incorrer em conflitos conceituais fundados na

ambiguidade, vagueza ou impreciso dos termos (Copi, 1981),

definies servem tambm a funes especficas ao avano do

conhecimento cientfico e a intervenes profissionais nos fenmenos.

Considerando as relaes entre os processos de intervir em um

fenmeno, produzir conhecimento cientfico a seu respeito,

descrev-lo, observ-lo e os conceitos utilizados nos processos de

observao e descrio do fenmeno, a comunidades cientficas, definir

conceitos serve como forma de delimitar os conceitos da rea e

aumentar o grau de fidedignidade das observaes realizadas em relao

a seus objetos de estudo e de todos os processos que requerem tais

observaes (Staats e Staats, 1963/1973; Copi, 1981).

Em uma grande rea como a Psicologia, em que h vrios

tipos de conhecimento (Botom e Kubo, 2002) Anlise Experimental do Comportamento, Psicanlise, Psicologia Existencialista, Gestalt,

Psicologia Histrico-Cultural etc. , imprecises conceituais em cada

uma delas promove ainda maior discrepncia entre seus produtos e

diminui a probabilidade de que profissionais que embasem sua atuao

em sistemas explicativos distintos comuniquem-se sem o risco das

discusses meramente ou aparentemente verbais descritas por Copi

(1981). Examinar proposies da rea que viabilizem a caracterizao

dos fenmenos a que se referem, a identificao de suas variveis

crticas e que possibilitem a elaborao de definies concisas, precisas

e claras, portanto, serve no somente ao avano da prpria rea de

conhecimento na qual conceitos so formulados e utilizados. Mas a

atuaes profissionais que dependem desse conhecimento e

44

comunicao entre profissionais que se embasam em diferentes tipos de

conhecimento. Promover coerncia conceitual em cada um dos tipos de

conhecimento de uma grande rea aumenta a probabilidade, tambm, de

comunicao entre distintas reas de conhecimento. Examinar

proposies de reas e tipos de conhecimento referentes aos termos

neles utilizados, portanto, consiste em processo fundamental ao avano

do conhecimento cientfico e sua utilidade em relao s necessidades

de uma sociedade.

1.2. Noo de Comportamento como base para exame dos graus de

suficincia de definies e de coerncia entre definies e descries

de aspectos constituintes dos processos aos quais o conceito Eu se

refere e superao da noo de entidades internas determinantes

das aes dos organismos

A Desenvolvimento da noo de Comportamento como recurso

produo de conhecimento cientfico relacionado a conceitos

Considerar a relao entre as intervenes em fenmenos e o

conhecimento produzido acerca das caractersticas desses fenmenos

(Staats e Staats, 1963/1973; Botom e Kubo, 2002; Botom e cols.,

2003) implica em reconhecer o alto grau de relevncia do controle das

variveis que constituem o processo de produzir conhecimento

cientfico (Botom, 1997). Uma vez que a fidedignidade das

informaes que constituem seus produtos s caractersticas dos

fenmenos existentes na natureza o que possibilita o manejo das

variveis que efetivamente o constituem e determinam. Dada a

especificao conferida por Staats e Staats (1963/1973) acerca de os

conceitos utilizados em uma rea de conhecimento consistirem em uma

das variveis que interferem nos graus de fidedignidade e consequente

confiabilidade aos produtos de processos de investigar cientificamente,

que se torna relevante investir na caracterizao dos fenmenos

referidos em proposies de diferentes autores de uma mesma rea em

relao a um mesmo termo. Por tal consistir em uma forma de

identificar os conceitos dos autores em relao a um mesmo termo e

examinar se entre eles h coerncia.

Quaisquer exames, no entanto, dependem de parmetros que

orientem avaliaes acerca do que ou no apropriado, suficiente,

confivel, coeso, etc. Em processos de produo de conhecimento

45

realizados na rea da Anlise Experimental do Comportamento, um dos

conceitos instrumentais mais importantes o comportamento, cujo

conhecimento de sua constituio e determinao serve de critrio

orientador s decises necessrias em exames de informaes. As

caractersticas do conceito comportamento, portanto, podem servir

como principal critrio para analisar e avaliar as proposies de autores

cuja produo de conhecimento fundamentada nos princpios do

Behaviorismo Radical a respeito de definies de conceitos ou de

caractersticas constituintes ou determinantes dos processos pelos

conceitos referidos. Podem, especificamente, servir ao exame de

proposies relacionadas ao conceito Eu, bem como de indicaes de

caractersticas dos processos a que esse conceito se refere. Sendo as

caractersticas dos eventos ou relaes entre eventos circunscritos sob o

conceito comportamento informaes relevantes produo de

conhecimento cientfico relacionado a proposies acerca do conceito

Eu, necessrio especifica-las.

O conceito comportamento tal como proposto at a segunda

dcada do sculo XXI e cujas caractersticas so orientadoras

investigao das caractersticas de fenmenos comportamentais dentre

os quais os conceitos apresentados por autores de uma mesma rea de

conhecimento em relao a determinado termo produto de um longo

processo de produo de conhecimento, com contribuies de diversos

pesquisadores. O incio desse processo est relacionado ao estudo do

reflexo realizado por fisilogos, e, em especial, aos estudos de Pavlov

(1849-1936) acerca do reflexo condicionado (Pavlov, 1934/1980;

Keller e Schoenfeld, 1950/1971). A partir da delimitao de aspectos da

natureza e de aspectos das interaes dos organismos por meio dos

termos estmulo e resposta se tornou possvel observ-los como

parcelas diferenciadas dos demais eventos da natureza (como unidades

de anlise) e investigar relaes de determinao entre eles. Foram

descobertas, assim, relaes reflexas estmulo-resposta, quando a

ocorrncia de um estmulo elicia uma resposta do organismo (Keller e

Schoenfeld, 1950/1971).

A partir da descoberta desse tipo de relao ordenada entre

eventos da natureza, passaram a ser investigadas relaes estmulo-

resposta especficas, que explicassem as interaes dos organismos

com o ambiente. O acmulo de demonstraes de relaes dessa

qualidade, tanto no comportamento animal quanto humano, fez com que

John B. Watson (1878-1958) propusesse que a identificao de relaes

estmulo-resposta consistisse no principal objetivo da Psicologia como

rea de conhecimento (Keller e Schoenfeld, 1950/1971). Embora outras

46

descobertas tenham demonstrado existir parcelas das interaes dos

organismos que no so explicadas exclusivamente pelo tipo de relao

entre aspectos do ambiente e aes dos organismos investigadas

poca, sua identificao possibilitou superar concepes em que as

causas das aes dos organismos eram atribudas a foras

sobrenaturais ou poderes com sede nos prprios msculos.

Possibilitou propor, em seu lugar, sequncias de relaes estmulo-

resposta.

O desenvolvimento da possibilidade de analisar as interaes

dos organismos com aspectos do ambiente por meio do conceito

reflexo consistiu em condio identificao de outro tipo de relao

entre respostas dos organismos e estmulos do ambiente: a relao que

define o reflexo condicionado ou comportamento respondente,

descoberto por Pavlov (1927/1980; 1934/1980; Keller e Schoenfeld,

1950/1971). Ao investigar os reflexos salivares de ces, tal pesquisador

observou a ocorrncia de respostas de salivao dos animais a outros

estmulos que no apenas a comida presente, mas tambm diante do

aparecimento do responsvel por prover-lhes alimento. Salivar diante do

estmulo comida consistia em uma relao considerada inata ou

hereditria. O mesmo no se podia concluir em relao ocorrncia da

mesma resposta diante do outro estmulo, o que parecia consistir em

indcio da interferncia da experincia individual dos organismos no

desenvolvimento das caractersticas de suas interaes com o ambiente.

Pavlov desenvolveu, ento, um mtodo experimental a fim de investigar

as relaes de eliciao estmulo-resposta adquiridas (1927/1980; 1934/1980; Keller e Schoenfeld, 1950/1971) e, com base nas relaes

observadas, desenvolveu o conceito de reflexo condicionado.

O processo de condicionamento reflexo descoberto por Pavlov

consiste no desenvolvimento da funo eliciadora a um estmulo

anteriormente neutro ao organismo (1927/1980; 1934/1980; Keller e

Schoenfeld, 1950/1971; Todorov, 1991). Tal se d pelo pareamento

entre um estmulo incondicional, como a comida no experimento

realizado com ces acerca de seus reflexos salivares, e outro estmulo. A

apresentao aproximadamente simultnea do estmulo neutro junto do

estmulo incondicional sucessivas vezes possibilita que o estmulo primeiramente neutro passe a tambm eliciar a resposta. Por meio de um

processo de condicionamento reflexo, portanto, adquire funo de

estmulo e torna-se o que foi denominado de estmulo condicional. Conforme salienta Botom (2001) em um artigo de

sistematizao da evoluo do conceito de comportamento e

caracterizao do mesmo, a unidade de anlise utilizada por Pavlov para

47

investigar os reflexos j no consistia simplesmente na resposta

apresentada pelo organismo, como eram entendidos previamente a ele,

mas na relao entre o estmulo externo e a ao do organismo. Por denotar que qualquer dos eventos que constituem os reflexos variam

rapidamente, Skinner (1935, apud Botom, 2001; 1991) complementa a

definio desse tipo de relao ordenada entre eventos ao propor que o

que define um reflexo no seja a relao entre um estmulo particular e

uma resposta particular, mas entre classes de respostas e de estmulos.

Sendo o termo classe entendido como todos os eventos ou todas as

dimenses dos eventos que pudessem definir ou fazer existir a relao

(Botom, 2001, p. 691).

Aps o desenvolvimento de procedimentos experimentais das

variveis que constituem as interaes dos organismos com aspectos do

ambiente e a descoberta das relaes de eliciao entre classes de

estmulos e classes de respostas, outra categoria de relaes entre

estmulos do ambiente e respostas dos organismos pde ser descoberta.

Experimentos de laboratrio cujos resultados observados no podiam

ser explicados com base na relao entre estmulos eliciadores e

respostas do organismo consistiram na base para que Skinner propusesse

outros tipos de relao entre estmulos e respostas (Keller e Schoenfeld,

1950/1971). Alm das relaes entre estmulos que antecedem e eliciam

uma resposta do organismo, que caracterizavam os reflexos

condicionados e incondicionados, passou a ser investigada pelo autor

principalmente a relao entre as respostas dos organismos e os

estmulos apresentados posteriormente a elas (Skinner, 1991). Da

relao de funcionalidade identificada entre respostas e estmulos

consequentes, em que o organismo opera sobre o meio produzindo

consequncias que, por sua vez, interferem nas respostas do prprio

organismo, foi proposto pelo autor o conceito de comportamento

operante. Posteriormente, sua definio de operante foi integrada

tambm o papel dos estmulos antecedentes resposta, por ter sido

identificado o controle que tais tambm exercem no tipo de relao

operante (Skinner, 1991).

De sua proposio inicial de comportamento, em que o

definia como o que o organismo est fazendo (Skinner, 1938 apud

Botom, 2001), Skinner (1969/1980) passa a salientar ser tal fenmeno

constitudo de complexas relaes entre aquilo que um organismo faz e

aspectos do ambiente em que o faz. Mais especificamente, entre o

estmulo antecedente, a resposta e o estmulo consequente. Com

tal proposio, passa a abranger todas as interaes dos organismos com

o meio, no apenas as circunscritas como eliciadas pelos estmulos do

48

ambiente. Com isso, acrescenta ao conhecimento produzido acerca dos

comportamentos respondentes contribuies superao da nfase

histrica desde a Filosofia Antiga atualidade atribuda s emoes

e aos estados internos dos organismos como condio de compreender

suas aes. A partir da identificao de relaes entre aspectos do

ambiente e as aes dos organismos, deixa de ser necessrio utilizar o

recurso de referncia a uma entidade ou instncia interna que precise ser

conhecida para compreend-los e se torna possvel tanto desenvolver

quanto modificar seus comportamentos por meio do arranjo de aspectos

do meio em que esto inseridos. Na Figura 1.2 apresentado um

esquema simplificado das relaes bsicas estabelecidas entre

componentes de um comportamento.

COMPORTAMENTO

Situao

Antecedente Ao

Situao

Consequente

O que acontece antes

ou junto ao de

um organismo

Aquilo que o

organismo faz

O que acontece depois

da ao de um

organismo

Figura 1.2. Especificao dos trs componentes constituintes da

definio do comportamento como relao entre o que um organismo

faz e o ambiente (anterior e posterior ao) em que o faz. Reproduzido

de Botom (2001, p. 697).

Na sistematizao do conceito de comportamento apresentada

por Botom (2001) possvel identificar tanto as principais

contribuies que possibilitaram a formulao do conceito

comportamento como expresso na proposio de Skinner em

Contingncias de Reforo (1969/1980), como outras posteriores complementaes ao conceito que o tornaram gradativamente mais

complexo, por contemplar uma maior quantidade de variveis como