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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CAMPUS SOROCABA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA LÍVIA MACIEL HERINGER UMA VISÃO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL FRENTE AOS RELATÓRIOS DO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO Sorocaba 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CAMPUS SOROCABA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

LÍVIA MACIEL HERINGER

UMA VISÃO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL FRENTE AOS RELATÓRIOS DO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO

Sorocaba

2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CAMPUS SOROCABA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

LÍVIA MACIEL HERINGER

UMA VISÃO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL FRENTE AOS RELATÓRIOS DO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Economia, para obtenção do título de mestre em economia aplicada.

Orientação: Prof. Dr. Mariusa Momenti Pitelli

Sorocaba

2016

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AGRADECIMENTO

Agradeço a Deus pelo sustento em todas as áreas de minha vida.

Agradeço a minha família - meus pais, minha irmã, meus avós, tios, tias,

primos e primas - pois sempre me incentivaram a buscar por mais, a ir

além. Agradeço à minha família sorocabana - Léia, Binho e Mateus - pois

me acolheram como filha e me acompanharam em cada passo do caminho.

Agradeço a meus amigos, que mesmo de longe, estiveram sempre

presentes. Agradeço a cada colega de turma, pois juntos superamos os

desafios do mestrado. Agradeço aos professores pois se dispuseram a

compartilhar conosco o precioso bem do conhecimento. Agradeço a minha

orientadora, professora Mariusa, e co-orientador, professor Rodrigo, pela

paciência e dedicação com o meu trabalho. Por fim, agradeço a UFSCar por

tornar possível mais essa conquista e ao programa CAPES pela bolsa

concedida.

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RESUMO

HERINGER, Lívia. Uma visão do desenvolvimento humano no Brasil frente

aos relatórios do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

2016. 136f. Dissertação (Mestrado em economia aplicada) – Universidade

Federal de São Carlos, Sorocaba, 2016.

A ONU é uma organização internacional e, como tal, está inserida em

um contexto institucional. Ao promover a ideia de sucesso do paradigma do

desenvolvimento humano, em um momento internacional propício (fim da

guerra fria), e à medida que tal ideia se alastra mundialmente, a ação da ONU

ganha importância em termos institucionais. É principalmente no âmbito do

PNUD que a ONU trata do tema de desenvolvimento. O PNUD atua por meio

de suas publicações, podendo destacar os relatórios de desenvolvimento

humano (que incluem o IDH), bem como da aplicação de projetos de

desenvolvimento. O presente trabalho tem como objetivo verificar a adesão

entre os relatórios do PNUD Brasil e as ações governamentais brasileiras.

Foram analisados os relatórios de desenvolvimento humano produzidos pelo

PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o

paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares propostos por Haq

(1995), e foram apresentadas as principais políticas públicas implementadas

pelo governo brasileiro que podem estar relacionadas aos temas discutidos

pelos relatórios nacionais. É possível perceber que os temas de destaque de

cada um dos relatórios nacionais tiveram espaço na formulação de políticas

públicas. Porém, o pilar do empoderamento, muito destacado nos relatórios,

não ganhou ênfase nas ações governamentais. Ainda que o alcance real dos

projetos no Brasil não seja facilmente caracterizado, a disponibilização de

informação através dos relatórios de desenvolvimento humano nacionais e da

plataforma Atlas Brasil é importante ferramenta para se compreender a

sociedade, passo essencial para a conquista do desenvolvimento humano.

Palavras-chave: ONU. Instituições. Desenvolvimento humano. PNUD.

PNUD Brasil.

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ABSTRACT

The UN is an international organization and, as such, is embedded in an

institutional context. As the UN promote the successful idea of the human

development paradigm, during a propitious international period (end of the Cold

War), and spread this idea worldwide, its actions gain importance in institutional

terms. The UNDP is the most important organ in the UN that deals with the

development theme. The UNDP operates through its publications, as the

human development reports (that contains the HDI), and through the

implementation of development projects. This paper aims to verify the adhesion

between the brazilian human development reports and the brazilian government

actions. The human development reports produced by UNDP Brazil, the Atlas

Brazil and UNDP Brazil's projects were analyzed according to the paradigm of

human development, in light of the approach of Mahbub ul Haq; and the main

public policies implemented by the Brazilian government that can be related to

the topics discussed by the national reports were presented. It was detected

that the prominent themes of each of the national reports have room in public

policy formulation. However, the concept of empowerment, very prominent in

the reports, is not emphasized on governmental actions. Although the actual

range of the UNDP projects in Brazil is not easily characterized, the supplying of

information through the national human development reports and the Atlas

Brazil platform is an important tool for understanding society, an essential step

in the achievement of human development.

Keywords: UN. Institutions. Human development. UNDP. UNDP in Brazil.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Evolução do número de projetos administrados pelo PNUD no Brasil 15

Figura 2: A casa do sistema de desenvolvimento da ONU ................................ 20

Figura 3: Abordagens sobre desenvolvimento ................................................... 48

Figura 4: Processo cíclico de planejamento, definição, execução e avaliação de

programa ou projeto ........................................................................................... 69

Figura 5: Canais de financiamento do PNUD ..................................................... 72

Figura 6: Divisão do Brasil de acordo com o IDH estadual em 1996 ................. 79

Figura 7: Resultados da consulta Brasil Ponto a Ponto ..................................... 91

Figura 8: Modelo completo de valores a comportamentos ................................. 92

Figura 9: Principais valores internacionais e brasileiros ..................................... 93

Figura 10: Faixas de desenvolvimento humano municipal ................................ 103

Figura 11: Projetos administrados pelo PNUD Brasil de acordo com seus temas

entre 2012 e 2014 ............................................................................................. 106

Figura 12: Financiamento dos projetos administrados pelo PNUD Brasil entre

2012 e 2014 ...................................................................................................... 107

Figura 13: Enquadramento dos projetos administrados pelo PNUD Brasil entre

2012 e 2014 nos pilares do desenvolvimento humano de Haq. ........................ 110

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Maiores doadores de recursos regulares no ano de 2014 (em milhões

de dólares) ......................................................................................................... 70

Tabela 2: Projetos de 2014 dividido entre os temas ........................................... 73

Tabela 3: Projetos no Brasil em 2014 dividido entre os temas .......................... 108

Tabela 4: Relatórios de Desenvolvimento Humano 1990-2015 ........................ 128

Tabela 5: Dimensões do IDH ............................................................................ 129

Tabela 6: Enquadramento dos projetos da amostra aos pilares de Haq (1995) 131

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABC Agência Brasileira de Cooperação

CGU Controladoria Geral da União

EPTA Expanded Programme for Technical Assistance

FMI Fundo Monetário Internacional

Fundeb Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de

Valorização dos Profissionais da Educação

Fundef Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

de Valorização do Magistério

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

IDG Índice de Desigualdade de Gênero

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IDHAD Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado

IDH-M Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

IDHM-CP Índice de Desenvolvimento Humano Municipal de Curto Prazo

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

IPM Índice de Pobreza Multidimensional

ISI Índice de Realização de Saúde Infantil

IVH Índice de Valores Humanos

MESC Midle East Supply Centre

MPTF Multi-Partner Trust Fund Office

ONU Organização das Nações Unidas

PAC Project Appraisal Committee

PNE Plano Nacional da Educação

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

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QCPR Quadrennial Comprehensive Policy Review

SP Special Found

TPR Tripartite de Revisão do Projeto

UN United Nations

UNDAF United Nations Development Assistance Framework

UNDG United Nations Development Group

UNDP United Nations Development Program

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SUMÁRIO

Introdução ........................................................................................................ 11

1. A ONU, o PNUD e o paradígma do desenvolvimento humano .................. 19

1.1. A ONU como agente institucional e a ideia de desenvolvimento .............. 22

1.2. Da criação do PNUD ao paradigma do desenvolvimento humano ............ 34

2. Metodologia ............................................................................................... 39

2.1. Referencial Teórico ................................................................................... 39

2.1.1. As teorias de desenvolvimento econômico ............................................ 39

2.1.2. Mahbub ul Haq e o desenvolvimento humano ....................................... 50

2.1.2.1. Os quatro pilares de Haq ..................................................................... 55

2.2. Referencial Analítico ................................................................................. 57

2.2.1. Os Relatórios de Desenvolvimento Humano .......................................... 58

2.2.1.1. O Índice de Desenvolvimento Humano ............................................... 65

2.2.2.O PNUD e seus Projetos ......................................................................... 68

3. Resultados ................................................................................................. 76

3.1.Análise dos relatórios de desenvolvimento humano do PNUD Brasil ........ 76

3.1.1. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil de 1996 ................... 77

3.1.2. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil - Racismo, pobreza e

violência ........................................................................................................... 83

3.1.3. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil - Valores e

desenvolvimento humano ................................................................................ 89

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3.1.4. Políticas Públicas no Brasil e os relatórios de desenvolvimento humano

......................................................................................................................... 98

3.2. Análise do Sistema Atlas Brasil ............................................................... 102

3.3. Análise dos projetos do PNUD Brasil ...................................................... 104

3.3.1. Os projetos do PNUD Brasil e os quatro pilares de Haq ...................... 109

Conclusões..................................................................................................... 113

Referências Bibliográficas .............................................................................. 118

Anexo 1 .......................................................................................................... 128

Anexo 2 .......................................................................................................... 129

Anexo 3 .......................................................................................................... 131

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INTRODUÇÃO

A Organização das Nações Unidas (ONU) nasceu em 1945 com a

finalidade principal de manter a paz internacional no pós Segunda Guerra. A

percepção de que o desenvolvimento é importante para assegurar a paz está

presente desde seu documento de fundação, a Carta da ONU, onde já em seu

preâmbulo se especifica como objetivo "empregar um mecanismo internacional

para promover o progresso econômico e social de todos os povos"

(ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1945, p.3).

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) é a

principal agência da ONU que trata do tema de desenvolvimento. É no âmbito

de tal organismo que a questão do desenvolvimento se refina e evolui,

chegando ao que se conhece hoje como o paradigma do desenvolvimento

humano.

Cabe ressaltar que com o final da Guerra Fria, o novo contexto

multipolar dá sentido à criação de novas instituições internacionais e o

processo de globalização traz às organizações internacionais maior espaço

para atuar de forma decisiva na formulação de políticas públicas. A ONU se

enquadra nesse processo ao promover a ideia do paradigma do

desenvolvimento humano. Conforme esse paradigma se consolida na

efetivação de políticas, a ONU consegue expandir sua influência em termos

institucionais.

Quando uma ideia formada no interior de uma organização ganha força

no discurso internacional, ela passa também a moldar políticas nacionais e

internacionais. Isso ocorre, pois, de acordo com Weiss e Carayannis (2005),

ideias são a força motriz do progresso humano. Ao se considerar que ideias

podem mudar a natureza do discurso internacional, sua importância se destaca

(WEISS; CARAYANNIS, 2005). Dessa forma, é possível que o discurso

internacional modifique a percepção dada a certo assunto, de forma que

mudanças sejam incorporadas ao conjunto de regras que regem a sociedade,

conhecidas também por instituições.

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Historicamente, é possível perceber que a ideia do desenvolvimento não

foi sempre percebida sob o mesmo parâmetro no âmbito da ONU. Vista

inicialmente, logo após o fim da segunda guerra mundial, por uma perspectiva

fortemente keynesiana onde o pleno emprego ocupava papel central, a

importância dada pela ONU a essa questão variou com o passar dos anos. Foi

somente em 1965 que a Assembleia Geral estabeleceu um órgão específico

que colocaria o desenvolvimento como prioridade: o PNUD (JOLLY, 2014;

MACHADO; PAMPLONA, 2008). Ainda assim, após a ONU declarar o

compromisso às duas "décadas do desenvolvimento" (1960 e 1970), e passar

por uma "década perdida para o desenvolvimento" (1980)1, somente em 1990

que a organização promove uma ideia de sucesso2: a ideia do paradigma do

desenvolvimento humano disseminada pelo PNUD.

O desenvolvimento humano pode ser entendido como a expansão das

possibilidades de escolha das pessoas. Dessa maneira, é uma questão

presente não só em países pobres mas também em países ricos (STREETEN,

1995). De acordo com Streeten (1995, p. ix, tradução nossa),

"[desenvolvimento humano] é um fim em si mesmo, de modo que não são

necessárias maiores justificativas"3. Ao colocar as pessoas como elemento

central, esse paradigma abrange não somente a esfera econômica, mas

também a política e a social.

O PNUD tem atuado na área de desenvolvimento por meio de suas

publicações, podendo destacar os Relatórios de Desenvolvimento Humano,

bem como a aplicação de projetos de desenvolvimento. Enquanto estas

publicações agem na frente de ação da formação de ideias, os projetos

constituem a contribuição prática do PNUD.

1 Ver Machado e Pamplona (2008) e Jolly (2014).

2 O termo "ideia de sucesso" está ligado a concepção de McNeill (2007) onde uma ideia de sucesso é aquela que influencia fortemente a agenda de desenvolvimento. Para que uma ideia possa atingir esse patamar, é necessário ela esteja fundamentada institucionalmente (MCNEILL, 2007) 3 Original: "[human development] it is an end in itself that needs no further justification" (STREETEN, 1995, p, ix).

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A discussão da ideia de desenvolvimento humano se concentra,

principalmente, no âmbito global (indo além dos escritórios nacionais do

PNUD), mas a política de trabalho do PNUD reconhece a necessidade de que

as nações liderem seus próprios projetos de desenvolvimento. Dessa forma,

garante-se o alinhamento das políticas do PNUD com as políticas do Estado,

levando a melhores resultados finais. Ademais, esse processo concede

flexibilidade para que cada nação coloque em pauta suas prioridades (UNITED

NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2011). Assim, estratégias e políticas

de desenvolvimento devem ser específicas de cada país (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2003).

De acordo com Celso Furtado (1974, 1999, 2000), o Brasil está entre o

grupo de países classificados como subdesenvolvidos. Países com esse perfil

sofrem do que o autor considera como dualismo: a convivência de formas

distintas de produção em uma mesma sociedade. Segundo o autor, isso é

resultado de um movimento histórico direcionado pelo contexto na qual um país

passou pelo processo de industrialização.

Para Furtado (1994), só se é possível superar a condição de

subdesenvolvimento através da execução de política públicas direcionadas

apoiadas por consenso social. Dessa maneira, Furtado (1999) afirma que se

não houver um projeto autônomo que priorize o bem-estar social, a

concentração de renda em direção aos países desenvolvidos é inevitável,

resultando, no longo prazo, em uma civilização fundada em desigualdades

sociais crescentes.

À medida que o PNUD examina a condição brasileira, propostas

específicas para a realidade nacional são desenvolvidas. Analisar a ação do

PNUD no Brasil torna-se ferramenta para compreender a influência que tal

organização tem no país. Ou seja, ao examinar tanto os projetos executados

pelo PNUD no Brasil quanto a publicação de relatórios de desenvolvimento

humano nacionais, é possível explorar se o conceito de desenvolvimento

humano ganha importância, expandindo-se além do âmbito interno da

organização.

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Presente no Brasil desde o início da década de 1960, o PNUD procura

responder aos desafios e as demandas específicas do país através de uma

visão integrada de desenvolvimento. Segundo sua descrição oficial4, o PNUD

Brasil tem como objetivo contribuir para o combate à pobreza e à desigualdade,

o fortalecimento da governança democrática, o crescimento econômico e o

desenvolvimento humano e sustentável. A fim de alinhar seu trabalho às

necessidades de um país dinâmico, complexo, multifacetado e diversificado,

seus projetos são realizados em parceria com o Governo Brasileiro, instituições

financeiras internacionais, setor privado e sociedade civil (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2015b; 2015c)

Nesse sentido, em 2011 foi publicada a primeira avaliação da

contribuição do PNUD Brasil para os resultados de desenvolvimento

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2011).

Esse relatório5 teve como objetivo examinar o alcance dos resultados do PNUD

Brasil no período de 2002 a 2010 e analisar o posicionamento estratégico do

programa de acordo com as demandas nacionais e as mudanças no contexto

nacional de desenvolvimento, apresentando recomendações capazes de

subsidiar possíveis ajustes na estratégia vigente. Foi utilizada uma amostra de

36 projetos e não projetos6 examinada através de entrevistas semiestruturadas

de diferentes atores envolvidos na implantação dos mesmos, além da

documentação e/ou avaliações dos projetos em si, avaliações e estudos

realizados por consultores independentes e material de imprensa.

O relatório elogia o posicionamento do PNUD como parceiro do governo

brasileiro, destacando-se o auxílio em projetos, sobretudo nas áreas sociais, de

modernização do Estado, e de meio ambiente. Assim, o relatório destaca que o

PNUD proveu contribuições positivas para as estratégias nacionais de

desenvolvimento, incluindo contribuições relevantes para as estratégias de

ajuste fiscal, redução das desigualdades sociais e estruturação organizacional

4 Ver Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2015b, 2015c).

5 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2011).

6 Atividades realizadas pelo PNUD Brasil que estão fora do âmbito dos projetos, tais como advocacy e diálogo político.

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das novas áreas de segurança pública, direitos humanos e cooperação sul

Segundo o relatório, durante o período de 2002 a 2010 ocorreu o

equacionamento de vários desafios macroeconômicos

capacidades institucionais em áreas temáticas apoiadas pelo PNUD, com a

ampliação da administração pública e

públicos, sobretudo para as políticas sociais

UNIDAS PARA O DESENV

afetou o modo de atuação do programa, acarretando

sua carteira de projetos, como pode ser

DAS NAÇÕES UNIDAS PA

Deve-se ressaltar que esta análise da ação do PNUD vem de dentro

própria organização. Desta forma, é possível que contenha algum tipo de viés

na emissão de opiniões ao apresentar o diagnóstico da atuação do PNUD no

país.

Figura 1: Evolução do número de projetos administrados pelo PNUD

Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2011)

O PNUD produz um grande número d

índice de desenvolvimento humano (IDH)

como parâmetro para pesquisas

explorado em pesquisas que perpassam a questão do desenvolvimento

humano, encontra-se produções da academia

das novas áreas de segurança pública, direitos humanos e cooperação sul

undo o relatório, durante o período de 2002 a 2010 ocorreu o

equacionamento de vários desafios macroeconômicos e o aumento das

capacidades institucionais em áreas temáticas apoiadas pelo PNUD, com a

ampliação da administração pública e maior disponibilidade de recursos

públicos, sobretudo para as políticas sociais (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2011). Esse contexto de mudanças

afetou o modo de atuação do programa, acarretando acentuada redução da

sua carteira de projetos, como pode ser observado na figura 1 (PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2011).

se ressaltar que esta análise da ação do PNUD vem de dentro

própria organização. Desta forma, é possível que contenha algum tipo de viés

na emissão de opiniões ao apresentar o diagnóstico da atuação do PNUD no

Evolução do número de projetos administrados pelo PNUD no Brasil

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2011)

O PNUD produz um grande número de indicadores, destacando

índice de desenvolvimento humano (IDH), que são amplamente utilizados

pesquisas. Apesar do IDH ser o principal objeto

explorado em pesquisas que perpassam a questão do desenvolvimento

produções da academia brasileira em consideração ao

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das novas áreas de segurança pública, direitos humanos e cooperação sul-sul.

undo o relatório, durante o período de 2002 a 2010 ocorreu o

o aumento das

capacidades institucionais em áreas temáticas apoiadas pelo PNUD, com a

e de recursos

(PROGRAMA DAS NAÇÕES

o de mudanças

acentuada redução da

(PROGRAMA

se ressaltar que esta análise da ação do PNUD vem de dentro da

própria organização. Desta forma, é possível que contenha algum tipo de viés

na emissão de opiniões ao apresentar o diagnóstico da atuação do PNUD no

no Brasil

e indicadores, destacando-se o

, que são amplamente utilizados

Apesar do IDH ser o principal objeto

explorado em pesquisas que perpassam a questão do desenvolvimento

brasileira em consideração ao

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trabalho do PNUD indo além da análise de tal índice, tais como em Shishito

(2012), Cano (2006) e Machado (2007)7.

O trabalho de Shishito (2012) discute os relatórios de desenvolvimento

humano publicados pelo PNUD entre 1990 e 2010. Estes documentos foram

examinados destacando que o padrão de organização social e política,

presente nos relatórios, é um entre diversas propostas de desenvolvimento

existentes. O autor utiliza o conceito de subdesenvolvimento, que é um

parâmetro analítico dinâmico utilizado para a investigação de projetos de

desenvolvimento nas regiões periféricas, como forma de construir eixos de

exame dos relatórios de desenvolvimento humano. Dessa forma, a noção de

desenvolvimento humano, base da ação do PNUD, enfrenta desafios ao ser

aplicado em estruturas particulares. Ou seja, para Shishito (2012), a influência

dos relatórios de desenvolvimento humano na dinâmica política de países

como o Brasil pode não ser tão abrangente como, por exemplo, o

estruturalismo cepalino, que trata de um processo de desenvolvimento social e

inclusivo.

O trabalho de Cano (2006) põe em foco o primeiro relatório de

desenvolvimento humano, elaborado em 1990. As origens e os

desdobramentos do conceito de desenvolvimento humano são discutidos,

levando em conta o contexto pós-guerra fria e as teorias sobre

desenvolvimento que vinham sendo analisadas desde a década de 1940.

Cano (2006) considera que as relações de poder da sociedade

internacional são refletidas no conceito de desenvolvimento humano. Relata

que ao colocar na agenda internacional que certos valores, apresentados como

"unanimidades" pelas grandes potências, devem ser adotados como qualidade

de vida, forma-se um modelo de conduta para os demais países do que é

7A Fundação Alexandre Gusmão publicou, através do Instituto de Pesquisa de Relações

Internacionais, uma lista com o banco de teses publicadas no Brasil sobre a ONU entre 1982 e 2015. Os autores citados destacam-se pois trabalham com o PNUD como ponto focal e tem material disponível por meio digital. A lista completa pode ser consultada em <http://funag.gov.br/ipri/index.php/component/content/article/2-uncategorised/528-banco-de-teses-onu#>.

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considerado importante. Para a autora, o Índice de Desenvolvimento Humano

(IDH) exemplifica essa questão ao apontar padrões mínimos satisfatórios de

qualidade de vida.

Já o tratamento dado por Machado (2007) à análise do PNUD foi o

paradigma do desenvolvimento humano, baseado na abordagem de Amartya

Sen. Essa abordagem é conveniente, pois coloca o indivíduo no centro da

discussão de modo que a ordem econômica vigente não seja o ponto mais

importante. Assim, a atuação do PNUD ocorre em uma série de países com

especificidades distintas em diversas áreas diferentes (MACHADO, 2007).

O autor analisa também a ação do PNUD no Brasil por meio de um

estudo de caso. Ele conclui que, apesar da ação dos projetos ocorrer dentro do

mandato do PNUD, a organização não oferece contribuições fundamentais

para a sua execução, uma vez que o paradigma do desenvolvimento humano é

muito abrangente. Para Machado (2007), a fundamentação do projeto estava

muito mais ligada à equipe executora - formada por consultores contratados

especificamente para esse projeto e não de funcionários do PNUD - do que ao

PNUD em si. Dessa maneira, apesar do PNUD apresentar uma profusão de

ideias e conceitos inovadores, os projetos realizados parecem não se alimentar

deles (MACHADO, 2007).

Uma vez que o PNUD trabalha tanto através da publicação de relatórios

como da execução de projetos, é possível utilizar desses produtos como meio

de exploração das ações de tal organização. O PNUD Brasil conta também

com o sistema Atlas Brasil 2013, que consiste em uma plataforma de índices

sobre a realidade brasileira com abrangência municipal co-criada pelo PNUD

Brasil.

Ademais, tendo em vista que o crescimento econômico não é o ponto

fundamental do paradigma do desenvolvimento humano, os temas específicos

discutidos em cada um dos relatórios de desenvolvimento humano nacionais

destacam questões que o PNUD Brasil considera como prioridades para a

realidade local. Dessa forma, ao perceber se ações do governo nacional

colocam em foco os temas destacados pelos relatórios nacionais, é possível

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averiguar a coesão entre PNUD Brasil e governo brasileiro. Assim, o presente

trabalho tem como objetivo verificar a adesão entre os relatórios do PNUD

Brasil e as ações governamentais brasileiras. Para isso, pretende-se: analisar

os relatórios de desenvolvimento humano produzidos pelo PNUD Brasil, o Atlas

Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do

desenvolvimento humano à luz dos pilares propostos por Haq (1995); e

apresentar as principais políticas públicas implementadas pelo governo

brasileiro que podem ser relacionadas aos temas discutidos pelos relatórios

nacionais.

Dessa maneira, o primeiro capítulo consiste na contextualização da ONU

como um agente institucional e como o PNUD se inclui nesse cenário, não se

esquecendo do trabalho do PNUD especificamente no Brasil. Discute-se o

refinamento da ideia de desenvolvimento humano através de uma perspectiva

histórica, destacando aspectos que trazem ao paradigma do desenvolvimento

humano um foco diferenciado.

O segundo capítulo traz uma breve descrição das teorias de

desenvolvimento, partindo da concepção clássica e culminando no trabalho de

Mahbub ul Haq. Assim, o paradigma do desenvolvimento humano é explorado

mais a fundo e, utilizando dos meios de ação do PNUD em termos globais (os

relatórios de desenvolvimento humano e os projetos do PNUD), encontra-se

uma base de análise para o trabalho do PNUD no Brasil.

Em seguida, o terceiro capítulo dedica-se às ações do PNUD no Brasil:

os três relatórios nacionais de desenvolvimento humano, o Atlas Brasil e os

projetos do PNUD Brasil. Utilizando os quatro pilares do desenvolvimento

humano destacados por Haq (1995) como parâmetro, investiga-se como o

paradigma do desenvolvimento humano pode ser percebido nas atividades do

PNUD no Brasil.

Por fim, apresenta-se uma breve conclusão, destacando-se os principais

pontos discutidos no decorrer do trabalho.

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19

1. A ONU, O PNUD E O PARADÍGMA DO DESENVOLVIMENTO

HUMANO

A Carta da ONU8 estabeleceu em 1945 as principais obrigações e

direitos dos membros e também o funcionamento e composição de cada

órgão da organização. Segundo essa Carta, a estrutura da ONU é formada

de seis órgãos principais, a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança, o

Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela, a Corte Internacional

de Justiça e o Secretariado. Além desses seis órgãos, o sistema da ONU

também abarca atualmente agências especializadas, fundos, programas,

comissões, departamentos e escritórios. Todos os organismos têm uma

área específica de atuação e prestam assistência técnica e humanitária nas

mais diversas áreas e, apesar de vinculados a ONU de diversas formas,

tem seus próprios orçamentos e estabelecerem suas próprias regras e

metas (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2016).

Em termos de organismos da ONU ligados ao tema de

desenvolvimento, Mahn e Wennubst (2013) propõem a apresentação em

termos de uma casa do sistema de desenvolvimento da ONU,

representada na figura 2. De acordo com os autores, esta casa estaria

fundamentada nos países, ou como se inicia a Carta da ONU, "nós, os

povos das nações unidas" (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1945,

não paginado)9. O UNDAF (United Nations Development Assistance

Framework), uma base conjunta de prioridades que as agências nacionais

delimitam, forma o piso para que os demais organismos trabalhem. Assim,

tanto os coordenadores residentes quanto os mecanismos de

financiamento e até mesmo parecerias e programas como o PNUD e a

UNICEF utilizam-se do UNDAF para definir suas metas individuais. Essas

ações no âmbito nacional estão sujeitas à administração global dos

8 Ver Organização das Nações Unidas (1945)

9 Disponível em: <https://nacoesunidas.org/carta/>

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programas e, acima de tudo, ao Conselho Econômico e Social e a

Assembleia Geral. O QCPR (

revê a cada quatro anos as políticas do Conselho Econômico e Social e da

Assembleia Geral, de forma a avaliar a

ações da ONU. Os fóruns políticos formam o teto da casa, ou

encobre todo o sistema

Figura 2: A casa do sistema de desenvolvimento da ONU

Fonte: Tradução livre de

Ainda que a ONU possua toda uma casa para lidar com a temática

do desenvolvimento, pode

PNUD se coloca como "co

desenvolvimento (UNITED NA

Ademais, salienta-se o fato de que o

programas e, acima de tudo, ao Conselho Econômico e Social e a

Geral. O QCPR (Quadrennial Comprehensive Policy

quatro anos as políticas do Conselho Econômico e Social e da

Geral, de forma a avaliar a eficiência, coerência e impacto das

ações da ONU. Os fóruns políticos formam o teto da casa, ou

encobre todo o sistema (MAHN; WENNUBST, 2013) .

casa do sistema de desenvolvimento da ONU

Fonte: Tradução livre de Mahn e Wennubst (2013)

Ainda que a ONU possua toda uma casa para lidar com a temática

volvimento, pode-se destacar o papel chave do PNUD.

oca como "coluna dorsal" da ONU na busca pelo

(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2016

o fato de que o administrador do PNUD possui o

20

programas e, acima de tudo, ao Conselho Econômico e Social e a

Policy Review)

quatro anos as políticas do Conselho Econômico e Social e da

eficiência, coerência e impacto das

ações da ONU. Os fóruns políticos formam o teto da casa, ou o que

Ainda que a ONU possua toda uma casa para lidar com a temática

O próprio

busca pelo

TIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2016).

dministrador do PNUD possui o

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21

terceiro cargo mais alto dentro da ONU como um todo, ficando somente

sujeito ao Secretário Geral e ao Vice-secretário Geral. Foi no âmbito do

PNUD que os relatórios de desenvolvimento humano foram criados e são

até hoje desenvolvidos. O PNUD é também responsável pelo

gerenciamento de diversos projetos sendo esses desenvolvidos a nível

global, regional e, principalmente, nacional.

Tendo como alvo principal o desenvolvimento, o PNUD está

presente atualmente em quase 170 países e territórios, trabalhando

juntamente com os governos a fim de alcançar a erradicação da pobreza e

a redução da desigualdade e exclusão (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2016).

Nós ajudamos os países a desenvolver políticas, capacidade

de liderança, habilidades de parceria, capacidades

institucionais e em construção de resiliência, a fim de sustentar

os resultados do desenvolvimento10 (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2016, não paginado,

tradução nossa).

Ainda assim, de acordo com Klingebiel (2002), os países devem ser

responsáveis pela implementação dos programas, sempre que possível; e

o papel do PNUD é de aconselhamento aos governos, além de

gerenciamento dos projetos e programas. Desta maneira, o PNUD age

formulando e elaborando os objetivos e conceitos relevantes às políticas de

desenvolvimento e coordenando os meios de financiamento dos projetos

(KLINGEBIEL, 2002). Ou como explicitado pelo próprio programa:

"trabalhando com eles [países] em suas próprias soluções para os desafios

no desenvolvimento global e nacional"11 (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2011, p. 4, tradução nossa).

10 Original: “We help countries to develop policies, leadership skills, partnering abilities,

institutional capabilities and build resilience in order to sustain development results” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2016). 11 Original: “working with them on their own solutions to global and national development challenges” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2011, p. 4).

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22

As ações do PNUD se iniciaram no Brasil ainda durante a década de

1960. Trabalhando em parceria principalmente com o setor público, mas não

excluindo o setor privado, o PNUD atua como catalisador na busca pelo

desenvolvimento.

Tendo como alvo o desenvolvimento humano, o PNUD Brasil concentra

seus esforços em duas frentes: a execução de projetos e a publicação de

relatórios de desenvolvimento humano nacionais. Além disso, destaca-se a

iniciativa do Atlas Brasil, um sistema que disponibiliza mais de 200 indicadores

socioeconômicos dos municípios brasileiros.

Vale lembrar que o PNUD Brasil faz parte do PNUD global que, por sua

vez, é um organismo da ONU. O Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento no Brasil (2016) destaca que as experiências acumuladas e

as lições aprendidas em cada projeto fornecem ao PNUD insumos a serem

repassados a outros projetos e iniciativas de desenvolvimento humano, no

Brasil e no mundo. Além disso, é informado que erros e acertos são

compartilhados entre a rede mundial de escritório do PNUD e os parceiros

específicos do PNUD Brasil. Paralelamente, são realizadas auditorias anuais

pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo departamento competente da

sede do PNUD em Nova York utilizando um conjunto representativo de projetos

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2016)

1.1. A ONU COMO AGENTE INSTITUCIONAL E A IDEIA DE

DESENVOLVIMENTO

Após a Segunda Guerra, percebeu-se a necessidade de construir

instituições internacionais para regulamentar as finanças e o comércio global e

promover a paz. Dessa forma, nascem organizações como o Fundo Monetário

Internacional (FMI) e o Banco Mundial, assim como a Organização das Nações

Unidas (ONU), estruturas capazes de elaborar novas práticas, teorias e

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23

estratégias para lidar com questões de escala mundial, produzindo novas

formas de conhecimento e poder (OLIVEIRA, 2010).

Para North (1990), instituições são as 'regras do jogo' na sociedade. São

elas que demarcam os limites do conjunto de escolhas que os indivíduos têm.

As instituições podem ser formais (como as leis) ou informais (como fatores

culturais). Podem também ser criadas (como a constituição) ou simplesmente

evoluir com o passar do tempo (como as leis mais comuns). Dessa forma, as

instituições são o palco onde os indivíduos interagem (NORTH, 1990).

Conforme Hodgson, "podemos definir instituições como sistemas de

regras sociais estabelecidas e dominantes que estruturam as interações

sociais"12 (HODGSON, 2006, p.2, tradução nossa). Dessa maneira, segundo o

autor, as instituições são como o meio social se organiza, tendendo a criar

padrões de comportamento social duradouros e rotinizados. Assim, ainda que

cada indivíduo seja livre para agir como quiser, suas ações são filtradas por

seus hábitos e rotinas e permeadas pela cultura e estrutura do sistema. “As

instituições são a substância, mais do que simplesmente as fronteiras, da vida

social” (HODGSON, 1994, p. 136).

Na visão de North, é crucial distinguir organizações de instituições uma

vez que as organizações devem ser incluídas no time dos 'jogadores'. Assim,

as organizações são consideradas por ele como “grupos de indivíduos unidos

por um propósito comum de atingir certos objetivos”13 (NORTH, 1990, p.5,

tradução nossa). Segundo o autor, as organizações, como as instituições, são

uma estrutura de interação humana. Mas enquanto as instituições determinam

as oportunidades em uma sociedade, as organizações foram criadas para tirar

vantagem dessas oportunidades. Para North (1990), as organizações também

são agentes que dão forma e direcionam as mudanças institucionais, uma vez

que cada organização, ao buscar seus objetivos (sejam eles a maximização do

lucro, a obtenção de riqueza ou de desenvolvimento), altera a estrutura

12 Original: “we may define institutions as systems of established and prevalent social rules that

structure social interactions” (HODGSON, 2006, p.2). 13 Original: “groups of individuals bound by some common purpose to achieve objectives” (NORTH, 1990, p.5)

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institucional. Por outro lado, as organizações e seus objetivos são concebidas

dentro dos próprios limites institucionais (NORTH, 1990).

Hodgson (2006) diverge deste ponto de vista ao considerar as

organizações como um tipo especial de instituição – as quais possuem um

mecanismo que distingue membros e não membros, um princípio de liderança

e cadeias de comando delineando responsabilidades. Relata que como as

organizações são formadas por indivíduos que podem ter objetivos conflitantes,

elas não podem ser tratadas como uma unidade, ou um jogador. Ademais, o

autor considera que North propõe a visão de organizações como jogadores

somente como uma abstração analítica e não como um princípio. Dessa forma,

as organizações podem ser tratadas como atores somente em algumas

circunstâncias mas geralmente devem ser encaradas como instituições

(HODGSON, 2006).

Toyoshima (1999) considera que a corrente institucionalista pode ser

dividida em dois grandes grupos sendo que Hodgson e North estariam em

grupos distintos. Apesar de apresentar críticas ao pensamento neoclássico,

North é considerado por Toyoshima (1999) como representante do grupo de

institucionalistas neoclássicos ou da nova economia institucional. Isso ocorre,

pois mantém em sua análise os pressupostos neoclássicos básicos de

equilíbrio e maximização. Pessali e Dalto (2010) afirmam que North utiliza-se

de uma abordagem conhecida como individualismo metodológico onde as

preferências individuais seriam as principais responsáveis em dar forma as

instituições14.

Hodgson, por outro lado, estaria no grupo dos chamados velhos

institucionalistas (TOYOSHIMA, 1999). O autor descarta os princípios

neoclássicos e defende a expansão da teoria keynesiana por vias institucionais

ao englobar uma teoria da inclusão da formação endógena das expectativas

(HODGSON, 1994). Para o autor, “o individualista metodológico não segue

uma linha defensiva satisfatória, ao admitir uma certa dose de influência social

14 Ver também Zulian, Marin e Feistel (2013).

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e institucional na formação ou moldagem dos propósitos individuais”

(HODGSON, 1994, p. 55). Como forma de contornar o “individualismo

metodológico”, Pessali e Dalto (2010) alegam que Hodgson “parte das

instituições para explicar outras instituições” (PESSALI; DALTO, 2010, p.16).

No artigo “Institutional economics in to the twenty-first century”, Hodgson

(2009) considera que existe a possibilidade de diálogo e até mesmo

convergência entre os velhos institucionalistas e os novos institucionalistas. O

autor relata que uma vez que as preferências individuais são modificadas pelas

instituições (e as instituições modificam as preferências individuais), elas se

tornam endógenas. Ao considerarem que a formação das preferências é

endógena, dependente do contexto em que se encontra, os novos

institucionalistas (como North) se aproximam dos velhos institucionalistas,

conectando-se a uma abordagem evolutiva e mais aberta. Outra questão

fundamental, de acordo com o autor, são os custos da construção das

instituições, em termos de tempo, recursos humanos e esforços. Ao

considerarem esses custos, os velhos institucionalistas acrescentam a sua

análise o princípio de escassez relativa, presente nos estudos dos novos

institucionalistas. Dessa forma, para o autor, a economia institucional que vem

sendo desenvolvida carrega traços tanto dos velhos institucionalistas quanto

dos novos institucionalistas (HODGSON, 2009).

Ainda assim, o presente estudo destaca a perspectiva de North,

considerando a ONU como um agente no meio internacional que expressa um

propósito único no tratar com a questão do desenvolvimento - a busca pelo

desenvolvimento humano.

Outro fator de extrema importância destacado por North é o elemento

histórico. North (1990) trata a influência do passado na definição do presente

através de dois mecanismos básicos: 'lock in' e 'path dependence'. Partindo do

estudo de Arthur (1988 apud NORTH, 1990, p.93), admite-se que existem

mecanismos auto reforçantes que permitem que uma tecnologia inferior

sobreviva enquanto uma tecnologia superior desapareça. Segundo Arthur

(1988 apud NORTH, 1990, p.94), isso acontece, pois (1) existem custos fixos –

ao aumentarmos a produção, o custo por unidade se reduz – (2) existem

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26

efeitos de aprendizado que reduzem custos e aumentam a produção, (3)

existem efeitos de coordenação que conferem benefícios a atores econômicos

que agem de maneira similar e (4) as expectativas são adaptativas, elevando a

crença de que o mercado se auto afirmará. Estes mecanismos auto reforçantes

também podem ser percebidos nas instituições, segundo North (1990). “Uma

vez criadas as instituições, os mecanismos auto reforçantes fazem com que as

economias fiquem 'locked in' em determinadas estruturas institucionais, mesmo

que essas reforcem atividades improdutivas” (TOYOSHIMA, 1999, p.105). O

mecanismo de 'path dependence' considera que os acontecimentos históricos

passados forjam a presente estrutura institucional. Ou seja, as mudanças

institucionais são dependentes dos arranjos institucionais já constituídos e a

história é responsável pela ligação entre passado, presente e futuro (NORTH,

1990).

Emmerij, Jolly e Weiss (2001) consideram que a abordagem

institucionalista permite a relação entre organizações internacionais e

instituições na formulação de ideias.

Os institucionalistas estão geralmente preocupados com a

forma como as organizações moldam as preferências políticas

dos seus membros. [...] A abordagem institucionalista nos

ajuda a compreender a dinâmica entre ideias, instituições

multilaterais e políticas nacionais15 (EMMERIJ; JOLLY; WEISS,

2001, p.7, tradução nossa).

McNeill (2007) define “ideia” como um conceito que consegue operar

tanto no meio acadêmico como no meio político e que influencia fortemente a

política de desenvolvimento. De forma complementar, Emmerij, Jolly e Weiss

(2001) trazem uma definição mais focada ao contexto da ONU: “Para nós,

"ideias" são definidas como as crenças dos indivíduos que influenciam suas

atitudes e ações para o desenvolvimento econômico e social, as quais [...], são

15 Original: “Institutionalists are generally concerned with how organizations shape the policy

preferences of their members. […] The institutionalist approach helps us to understand the dynamics among ideas, multilateral institutions, and national policies.” (EMMERIJ; JOLLY; WEISS, 2001, p.7).

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27

analisadas quando se cruzam com a ONU"16 ( EMMERIJ; JOLLY; WEISS, 2001,

p.11, tradução nossa).

Usando da mesma concepção de Emmerij, Jolly e Weiss (2001), Jenks e

Jones (2013) se aprofundam ao afirmar que ideias podem ser normativas –

conceitos amplos e gerais sobre como o mundo deveria ser – ou causais –

noções operacionais, mais específicas, de como atingir um certo resultado.

Assim, “ideias fornecem um roteiro conceitual que pode ser usado para nos

ajudar a compreender mudanças nas preferências e definições dos interesses

vitais de atores estatais e não-estatais17 (WEISS; CARAYANNIS, 2005, p.8,

tradução nossa).

Segundo Emmerij, Jolly e Weiss (2001) e Weiss e Carayannis (2005),

ideias podem impactar a política de quatro formas distintas. Primeiramente,

elas podem mudar a natureza do discurso da política pública internacional e

auxiliar na definição ou redefinição dos interesses dos estados, de forma a

incluir conceitos comuns. Um exemplo deste tipo de influência é a preocupação

com direitos humanos. Em segundo lugar, ideias podem servir como guia para

elaboração de políticas e sua execução quando há conflito entre normas ou

quando há problemas de sequenciamento ou de priorização. Em terceiro lugar,

ideias podem modificar as perspectivas para a formação de novas coalizões de

forças políticas ou institucionais. Finalmente, ideias podem ser incorporadas às

instituições e, então, modificar não só seus principais fundamentos como

também influenciar nos seus objetivos. Assim, uma vez que uma ideia

possibilite mudanças políticas, ela se torna meio de repercussão institucional.

De acordo com Jenks e Jones (2013), quatro ideias poderosas se

firmaram com o final da Segunda Guerra: (1) Paz – substituir a agressão militar

por negociações e segurança coletiva; (2) Independência – os países têm

direito à soberania e à escolha nos acordos nacionais e internacionais; (3)

16 Original: “For us, ‘ideas’ are defined as beliefs held by individuals that influence their attitudes and actions toward economic and social development, which, […], are analyzed when they intersect with the UN" (EMMERIJ; JOLLY; WEISS, 2001, p.11). 17

Original: “ideas provide a conceptual road map that can be used to help us understand changing preferences and definitions of vital interests of state and non-state actors alike" (WEISS; CARAYANNIS, 2005, p.8).

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Direitos Humanos – todo indivíduo em todos os países tem direitos civis e

políticos como vida, liberdade e a busca da felicidade; (4) Desenvolvimento –

todos os países tem o direito a escolha de políticas econômicas e sociais com

a finalidade de melhorar o bem-estar e o padrão de vida da população. Assim,

em 1945 é fundada a Organização das Nações Unidas, englobando essas

ideias em sua carta de formação. O presente trabalho foca na ideia de

desenvolvimento e como ela evoluiu com o passar dos anos.

Jenks e Jones (2013) sugerem que a busca pelo desenvolvimento, no

âmbito da ONU, passou por três fases diferentes. Utilizando o triângulo

estratégico de Mark Moore (1995), a evolução histórica dessas fases é

apresentada em três dimensões: o ambiente – authorizing enviroment circle –

as missões e valores da ONU – missions circle – e a capacidade de terminar

uma missão iniciada – capacity circle.

De acordo com Jenks e Jones (2013), a primeira fase ocorreu no

contexto do fim da Segunda Guerra onde as nações decidiram se unir a fim de

combater problemas compartilhados. Problemas técnicos superavam

problemas políticos e constitucionais. Essa necessidade dá forma a

cooperação internacional criando uma 'unidade além da política'. Assim, os

autores afirmam que a ONU se utiliza de uma estrutura funcionalista e

descentralizada, criando 'blocos para a paz' através da busca de objetivos

comuns. Dessa maneira, foram criadas agências distintas para cada campo:

trabalho, alimentos, saúde, etc. Jenks e Jones (2013) destacam que cada

agência tinha sua própria forma de conduta, independente do país em que

estava agindo. Esta independência foi deliberadamente incorporada de forma

funcional, uma vez que, com o fim da guerra, as suspeitas de tensões políticas

ainda eram muito altas. A transferência de conhecimento era feita através de

especialistas e relatórios que procuravam 'preencher as lacunas'. Assim, em

1949 foi iniciado o Expanded Programme for Technical Assistance (EPTA)

(JENKS; JONES, 2013).

Então, inicialmente, o pleno emprego ocupava papel central, em uma

visão fortemente keynesiana. Utilizando-se deste ponto de vista, foram

elaborados três relatórios pioneiros sobre desenvolvimento: National and

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29

International Measures for Full Employment (1949), Measures for the Economic

Development of Under-Developed Countries (1951) e Measures for

International Economic Stability (1951). É importante notar a influência do

pensamento de Hans Singer e Raul Prebisch, principalmente no que se refere

aos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. A visão de que os termos

de troca penalizam os exportadores de matérias-primas, em detrimento dos

exportadores de bens manufaturados, foi essencial para a cooperação técnica

internacional, uma vez que a industrialização é vista como ferramenta para o

desenvolvimento (EMMERIJ; JOLLY; WEISS, 2001; JOLLY, 2005; MACHADO;

PAMPLONA, 2008). A primeira fase de Jenks e Jones (2013) contextualiza

esse entendimento, de forma que a transferência de conhecimento,

principalmente através do EPTA, se mostra como meio de “preencher as

lacunas” para alcançar o desenvolvimento.

Segundo Jenks e Jones (2013), um novo contexto começa a se

estabelecer com o processo de descolonização, as crescentes necessidades

dos países em desenvolvimento e a Guerra Fria. Assim, a forma de ação da

ONU vai se modificando – segunda fase. Ao dividir o mundo em dois blocos, a

Guerra Fria faz com que o 'meio termo' e os interesses comuns sejam vistos de

forma suspeita e hostil. Ao mesmo tempo, descolonização torna necessário um

maior foco no processo de desenvolvimento nacional. Dessa forma, os autores

destacam que a visão de liderança internacional é substituída pelo serviço aos

países membros, concentrando esforços na construção da capacidade de

planejamento dos Estados. De acordo com Jenks e Jones (2013), não é mais

uma questão de oferecer serviços ou transferir tecnologia, mas sim de unir

esforços para que os países possam se desenvolver e exercer sua função de

Estado através de instituições fortes. Os próprios países deveriam estabelecer

as prioridades e as agências da ONU buscariam responder a essas

necessidades (JENKS; JONES, 2013).

Segundo Jolly (2005, 2014) e Machado e Pamplona (2008), a

importância do desenvolvimento econômico ganha maior peso na agenda das

Nações Unidas, incentivado pela descolonização. Segundo Machado e

Pamplona (2008) e Jolly (2005), a década de 1960 foi declarada como a

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'Década do Desenvolvimento'. Com uma meta de crescimento econômico

anual mínimo de 5% para os países subdesenvolvidos, pretendia-se reduzir a

diferença entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Ainda de acordo

com os autores, a aceleração do crescimento econômico mostra-se como foco

no entendimento do que é desenvolvimento. Sinais de uma ideia mais

abrangente de desenvolvimento já começam a aparecer, como se pode

perceber na declaração do Secretário Geral U Thant no ‘blue book’18:

"Desenvolvimento não é somente crescimento econômico, é crescimento mais

mudança"19 (UNITED NATIONS, 1962, p.v, tradução nossa), porém, pouco foi

feito a esse respeito em termos de metas e ações práticas (JOLLY, 2005, 2014;

MACHADO; PAMPLONA, 2008).

É nessa conjuntura que o Programa da Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD) é estabelecido em 1966 pela Assembleia Geral.

Resultado da união do EPTA e do Special Found (SF) – criado em 1958 para

cuidar da maior parte dos projetos de desenvolvimento – o PNUD nasceu com

o objetivo de reduzir duplicidades e concentrar recursos financeiros

(KLINGEBIEL, 2002). Segundo Jenks e Jones (2013), uma vez que o PNUD

não foca em campos específicos, a sua criação é um marco na evolução de um

sistema funcionalista baseado nas agências para um sistema fundamentado

nos países e em suas necessidades individuais. De acordo com os autores,

esse movimento modifica até mesmo o sistema de financiamento uma vez que

os recursos passam a ser direcionados diretamente aos países. Assim, em um

contexto de Guerra Fria, o financiamento passa a ser visto como um

instrumento político, um prêmio aos países membros da aliança – países que

saíram vencedores da Segunda Guerra Mundial. Esse sistema não é baseado

em performance, mas sim na quantidade de recursos transferidos (JENKS;

JONES, 2013).

18 The development decade: proposals for action, conhecido também como ‘blue book’, foi uma tentativa unificar as contribuições dos planos e programas das agências e fundos especializados da ONU, coordenando, em certa medida, os mecanismos da organização (UNITED NATIONS, 1962, p.v) 19 Original: “Development is not just economic growth, its growth plus change” (UNITED NATIONS, 1962, p.v),

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Ainda de acordo com Jenks e Jones (2013) a terceira fase se inicia com

o fim da Guerra Fria e a aceleração da globalização. O papel político do

financiamento que é fornecido através da ONU e seus programas se

enfraquece com o fim da Guerra Fria, diminuindo radicalmente sua

disponibilidade. Assim, segundo os autores, performance e impacto

mensurável passam a ser essenciais para captar recursos – grande parte dos

recursos passam a ser concebidos de forma específica para cada projeto, não

mais para a organização como um todo. A necessidade da nação liderar o

próprio desenvolvimento aumenta e o desenvolvimento de capacidades torna-

se cada vez mais importante (JENKS; JONES, 2013).

Um marco importante que ocorreu durante a terceira fase foi o

estabelecimento do Grupo de Desenvolvimento da ONU (United Nations

Development Group – UNDG) pelo Secretário Geral em 1997. O UNDG tem

como objetivo delinear um sistema amplo que coordene, harmonize e alie todas

as atividades ligadas ao desenvolvimento executadas no âmbito da ONU, e o

PNUD se destaca nesse sistema à medida que o Administrador do PNUD

(terceiro cargo mais alto dentro da ONU como um todo, ficando somente sujeito

ao Secretário Geral e ao Vice-secretário Geral) também é o principal líder do

UNDG (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2011).

Uma série de conferências globais nos anos de 1990 culminaram na

Cúpula do Milênio em 2000, onde foi estabelecida a nova agenda comum de

desenvolvimento20.

O contexto internacional durante terceira fase de Jenks e Jones (2013) -

pós Guerra Fria - faz-se cada vez mais favorável para que as organizações

internacionais se firmem como atores influentes no cenário global. Em um

20 Foram determinadas oito metas (sendo 2015 o prazo para alcançá-las) a fim de reduzir a

pobreza extrema, conhecidas como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Esses objetivos são: (1) Acabar com a Fome e a Miséria (2) Educação Básica de Qualidade para todos (3) Igualdade entre Sexos e Valorização da Mulher (4) Reduzir a Mortalidade Infantil (5) Melhorar a Saúde das Gestantes (6) Combater a Aids, a Malária e outras doenças (7) Qualidade de Vida e Respeito ao Meio Ambiente (8) Todo Mundo trabalhando pelo Desenvolvimento (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2014)

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mundo globalizado, onde o liberalismo ganha força, organizações

internacionais e organizações não governamentais passam a entremear cada

vez mais a ação dos Estados. É importante notar que a globalização não

significa que os Estados não são mais capazes de promover desenvolvimento,

ou que não tem mais papel em busca desse objetivo (SACHS, 1997). Como

destacam Jenks e Jones (2013), o trabalho da ONU coloca as prioridades de

cada país em perspectiva de forma que a construção da capacidade de

planejamento dos Estados seja o centro dos esforços da organização.

Para Oliveira (2010), ao considerar que antes da Segunda Guerra a

ordem internacional estava atrelada a um consenso intersubjetivo de

mecanismos de balança de poder entre as grandes potências e a política de

alianças, e que durante a Guerra Fria o mundo bipolar dominava o pensamento

político, há a necessidade de uma nova ontologia e de novos paradigmas que

sejam úteis para compreender as bases fundamentais da política mundial após

a Guerra Fria. Nesse contexto, afirma Oliveira (2010), o discurso do

desenvolvimento torna-se crucial na construção da ordem global atual e está

relacionado a um eficiente aparato de produção de conhecimento.

Dessa forma, a publicação dos relatórios de desenvolvimento humano a

partir de 1990, assim como as diversas conferências da ONU da década de

1990 que abordaram o tema do desenvolvimento, delinearam o posicionamento

da organização no cenário mundial. Ou seja, a medida que a ideia do

paradigma do desenvolvimento humano se firma como princípio na efetivação

de políticas, a ONU expande sua influência em termos institucionais. Ou como

afirma Oliveira (2010), "o sistema ONU pode ser considerado como uma das

fontes de poder/conhecimento através da qual certos discursos ganham

legitimidade e iluminam as práticas de ordenamento do sistema internacional"

(OLIVEIRA, 2010, p.15).

Lopes (2007) acredita que a ONU possui autoridade política, firmada em

quatro pontos: (1) a pretensão de universalidade, de onde pode-se destacar a

defesa aos direitos humanos; (2) a pretensão de imparcialidade, destacando-se

as intervenções em zonas de conflito após a Guerra Fria; (3) a vantagem

cognitiva em certas áreas temáticas (expertise), percebidas na grande

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quantidade de emissões de relatórios sobre diversas áreas temáticas e sua

aceitação global; e (4) a formatação inclusiva da organização, uma vez que dá

voz tanto a Estados como a atores não-estatais. Dessa maneira:

se há uma entidade autorizada a conceber padrões de

comportamento, parâmetros, metas, regras, estratégias de

longo alcance etc. sobre “temas globais” no mundo de hoje,

essa é a Organização das Nações Unidas (LOPES, 2007,

p.63).

É importante notar que a ONU não é a única organização internacional a

tratar do tema do desenvolvimento. O Banco Mundial, por exemplo, tem como

objetivos acabar com a pobreza extrema e promover a prosperidade (WORLD

BANK, 2016).

De acordo com Jolly (2014), tanto o Fundo Monetário Internacional (FMI)

quanto o Banco Mundial foram inicialmente idealizados para ser parte

integrante do sistema da ONU, porém acabaram iniciando suas operações - e

assim permanecendo - como organizações independentes. Com o final da

Segunda Guerra, enquanto o FMI e o Banco Mundial focavam seus esforços na

reconstrução da Europa, a ONU concentrou seus trabalhos na resolução de

problemas e desenvolvimento de políticas em países em desenvolvimento

(JOLLY, 2014). Esse comportamento retrata diferentes abordagens em relação

ao problema comum: a busca pelo desenvolvimento.

Jolly (2005) afirma que as contribuições da ONU continuaram a divergir

das contribuições do Banco Mundial e do FMI com o passar dos anos.

Apresentadas por um ponto de vista altamente ligado à administração da

ONU21, as diferenças históricas de perspectiva entre as organizações são

discutidas por Jolly (2005), que afirma que, enquanto a ONU "lead the way"

para a construção do que hoje se conhece como desenvolvimento humano, o

Banco Mundial e o FMI apostavam em medidas mais ortodoxas, visando a

21 Richard Jolly trabalhou na ONU durante vários anos, ocupando cargos na UNICEF e no

PNUD - onde foi coordenador principal dos relatórios de desenvolvimento humano entre 1996 e 2000.

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estabilização. Porém, o autor destaca que a partir do final da década de 1990 a

abordagem do Banco Mundial se expandiu e passou a incluir tanto a redução

da pobreza como até mesmo a busca pelos Objetivos de Desenvolvimento do

Milênio propostos pela ONU como alvos. Já o FMI, apesar de declarar-se

comprometido com a ideia de desenvolvimento humano, ainda mantém suas

ações focadas em termos de ajustes que garantam condições para os Estados

possam atingir estabilidade de longo prazo (SACHS, 1997).

Assim, a ONU se apresenta como uma organização internacional que se

aproveitou das mudanças institucionais no cenário mundial do pós Guerra Fria

- como a mudanças na balança de poder - assim como de sua autoridade

política para promover a ideia de sucesso, apresentada na abordagem de

McNeill (2007), do paradigma do desenvolvimento humano, ideia essa que se

consolida como princípio na efetivação de diversas políticas públicas,

possibilitando à ONU maior influência em termos institucionais.

1.2. DA CRIAÇÃO DO PNUD AO PARADIGMA DO

DESENVOLVIMENTO HUMANO

Durante os primeiros anos do PNUD, o programa trabalhou juntamente

com o Banco Mundial através de uma série de medidas coordenadas visando o

crescimento econômico acelerado. Mas já em 1969, foi publicado Study of the

Capacity of the UN Development System (conhecido também como Jackson

Report), relatório encomendado por Paul Hoffman (primeiro administrador do

PNUD) que criticou a forma de ação do PNUD, afirmando que o

desenvolvimento é multifacetado, envolvendo, além da economia, fatores

políticos, culturais e sociais (MURPHY, 2006).

Assim, a década de 1970 foi considerada como a Segunda Década do

Desenvolvimento. Palco de diversas conferências, houve uma mudança

significativa no que era considerado como prioridade no desenvolvimento

internacional. Como destaca Murphy (2006, p.139), foi durante esse período

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que o PNUD ficou conhecido como “o programa de desenvolvimento para

países em desenvolvimento”. Segundo Jolly (2014) e Machado e Pamplona

(2008), além de aumentar a meta de crescimento para 6%, foram também

incorporadas metas com relação a emprego, educação, saúde e o fluxo de

auxílio internacional. Assim, o conceito de desenvolvimento se expande

também na prática, uma vez que as necessidades humanas básicas, a geração

de empregos e a redução da pobreza ganham espaço na agenda (JOLLY,

2014).

Segundo Jolly (2005) e Machado e Pamplona (2008), a década de 1980

é considerada como 'a década perdida para o desenvolvimento' uma vez que o

crescimento da dívida pública dos países e a recessão mundial, além do

enfraquecimento da Guerra Fria, geram um contexto em que a prioridade

mundial passa a ser a estabilização e o ajuste estrutural. As ideias neoliberais

ganham espaço com o Consenso de Washington e o crescimento de curto

prazo, a redução da inflação e a correção dos déficits passam a ser o principal

objetivo dos países. Esse movimento foi liderado, principalmente, pelo Fundo

Monetário Internacional e o Banco Mundial enquanto a ONU, passa a ter um

papel marginal apontando as consequências negativas tanto em termos sociais

quanto de crescimento deste posicionamento (JOLLY, 2005; MACHADO;

PAMPLONA, 2008). Dessa forma, inicia-se a terceira fase de Jenks e Jones

(2013).

Como afirma Jolly (2014), a crescente insatisfação no campo do

desenvolvimento no final dos anos de 1980 abriu caminho para que o conceito

de desenvolvimento humano se firmasse. Em 1989, Mahbud ul Haq22 sugeriu

ao então Administrador do PNUD, William Draper III, a elaboração de um

relatório anual sobre desenvolvimento. Assim, liderado por Haq com o auxílio

de colegas como Amartya Sen e Paul Streeten, o primeiro Relatório de

Desenvolvimento Humano foi publicado em 1990 (MCNEILL, 2007).

22 A contribuição de Haq para como o paradigma do desenvolvimento humano será abordado de forma mais extensiva no ponto 2.1.2.

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McNeill (2007) enfatiza que o sucesso do conceito de desenvolvimento

humano deu-se através do PNUD, pois Haq conseguiu construir uma ponte

entre política e pesquisa, enquanto outros autores, como Sen, o deram

autoridade acadêmica. Ou como afirma Jolly (2014), o conceito de

desenvolvimento humano apresenta uma metodologia robusta baseada em

uma filosofia sofisticada.

Como definido no primeiro Relatório de Desenvolvimento Humano:

O desenvolvimento humano é um processo de aumentar as

possibilidades das escolhas das pessoas. O mais crítico para

essa ampliação das escolhas é viver uma vida longa e

saudável, receber educação e ter acesso aos recursos

necessários para um padrão de vida decente. Outras escolhas

incluem a liberdade política, a garantia de direitos humanos e

autoestima pessoal23 (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 1990, p.1, tradução nossa).

Dessa forma, a riqueza não é o ponto central do desenvolvimento, mas

sim os próprios indivíduos. Como afirma Haq: “Após muitas décadas de

desenvolvimentos, estamos redescobrindo o óbvio – que as pessoas são tanto

o meio como a finalidade do desenvolvimento24” (HAQ, 1995, p.3, tradução

nossa).

A abordagem das capacidades de Sen é fundamental para a base

teórica do paradigma de desenvolvimento humano. Para Sen (1999, 2006),

uma visão centrada na renda não é suficiente para determinar o bem-estar da

população. É necessário levar em conta a habilidade que o indivíduo tem para

atingir seus objetivos – sua capacidade – refletindo a liberdade que ele tem

para escolher o tipo de vida que ele quer levar (MABOLOC, 2008). Assim, os

23 Original: “Human development is a process of enlarging people's choices. The most critical of

these wide-ranging choices are to live a long and healthy life, to be educated and to have access to resources needed for a decent standard of living. Additional choices include political freedom, guaranteed human rights and personal self-respect” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 1990, p.1). 24 Original: “After many decades of development, we are rediscovering the obvious – that people are both the means and the end of development” (HAQ, 1995, p.3).

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obstáculos que as pessoas enfrentam, de forma individual ou conjunta, são a

base da perspectiva do desenvolvimento humano (SEN, 2006). Ou seja,

"Desenvolvimento pode ser visto [...] como o processo de expandir as

liberdades reais que a população desfruta"25 (SEN, 1999, p.1, tradução nossa).

A concepção de Sen oferece aos formuladores de políticas públicas uma

estrutura de análise flexível perante os diferentes desafios enfrentados pelos

países pobres, contrapondo-se uma ortodoxia rígida de prescrições políticas

(FUKUDA-PARR, 2003).

Edewor (2014) põe em perspectiva quatro aspectos principais

considerados como base dos trabalhos pioneiros sobre o paradigma do

desenvolvimento humano: (1) a ênfase do indivíduo como uma finalidade e não

simplesmente um meio; (2) o objetivo do desenvolvimento é a ampliação das

escolhas humanas, indo além da renda e priorizando a liberdade dessas

escolhas; (3) é preciso levar em conta tanto a construção das capacidades

humanas (investimento nas pessoas e na aquisição de habilidades) quanto a

utilização dessas capacidades (através de uma estrutura que permita

crescimento e empoderamento); assim, os indivíduos são também um recurso

importante para alcançar o desenvolvimento; (4) existem vários meios para que

se possa alcançar o desenvolvimento humano.

Assim, como colocado por Murphy (2006), a ideia de desenvolvimento

humano torna-se a espinha dorsal do PNUD. Quando James Gustave Speth

substitui Draper como Administrador do PNUD em 1993, a necessidade que o

desenvolvimento humano seja sustentável passa a integrar, e ao mesmo tempo

aguçar a missão do programa (MURPHY, 2006). Essa decisão reflete o

momento vivido pela ONU, destacando-se a Conferência das Nações Unidas

sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, conhecida também como Rio 92.

Assim, Machado (2007) aponta que a dimensão de sustentabilidade

complementou o paradigma do desenvolvimento humano mas foi formulada no

âmbito da ONU, exteriormente ao PNUD, e posteriormente incorporada ao

25 Original: “Development can be seen […] as a process of expanding the real freedoms that people enjoy” (SEN, 1999, p.1).

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programa. Foi com esse pano de fundo que o UNDG (United Nations

Development Group) foi criado e os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

foram discutidos. Vale a pena ressaltar que Haq – idealizador dos relatórios de

desenvolvimento humano – considera a sustentabilidade como um dos quatro

pilares do desenvolvimento humano26. Dessa forma, a utilização do termo

desenvolvimento humano sustentável passa a ser um tanto quanto redundante.

Ou, nas palavras de Haq (1995):

Pouco importa se o paradigma é rotulado de "desenvolvimento

humano sustentável" ou "desenvolvimento sustentável", ou

simplesmente "desenvolvimento humano". O que é importante

é compreender que a essência do paradigma de

desenvolvimento humano é que todos devem ter igual acesso a

oportunidades de desenvolvimento agora e no futuro27 (HAQ,

1995, p.19, tradução nossa).

Segundo Haq (1995) sustentabilidade é, então, atender as necessidades

do presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras de atenderem

suas próprias necessidades. Para o autor, essa questão vai além do ambiente.

Ela inclui instituições, economias e sociedades que tem a capacidade de se

adaptar a fim de sobreviver no longo prazo. De acordo com Evans (2012), é

garantir a preparação para o futuro de forma que não se torne vítima do

sucesso alcançado no presente.

Ao englobar eficiência, liberdade, empoderamento, equidade e

sustentabilidade, o desenvolvimento humano é pró-crescimento e produtividade

(uma vez que incentiva o uso eficiente de recursos assim como sua maior

disponibilidade), considera a possibilidade da escolha (assim como seu reflexo

nas gerações futuras) e a justiça distributiva (especialmente de oportunidades)

(EDEWOR, 2014).

26 Ver Haq (1995). Os quatro pilares são: equidade, sustentabilidade, produtividade e empoderamento. Essa questão é revista com maior detalhamento no ponto 2.1.2.1. 27

Original: “It matters little whether the paradigm is labelled "sustainable human development" or "sustainable development" or simply "human development". What is important is to understand that the essence of the human development paradigm is that everyone should have equal access to development opportunities—now and in the future” (Haq, 1995, p.19).

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2. METODOLOGIA

2.1. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1.1. As teorias de desenvolvimento econômico

Existem diversas teorias que tratam sobre a ideia de desenvolvimento.

Estas teorias divergem desde seus diagnósticos das economias capitalistas até

mesmo à própria concepção de desenvolvimento. Ainda que o comportamento

para alcançar o desenvolvimento seja distinto de acordo com a compreensão

do que é esse conceito, ele é alvo do esforço das nações.

Como coloca Bresser-Pereira (2006), uma nação não é formada,

simplesmente, pelo governo. O autor afirma que apesar da liderança da

estratégia nacional na busca por um padrão de vida mais elevado ser do

governo, ele age conjuntamente com os cidadãos a fim de definir políticas e

formar instituições que promovam o desenvolvimento. É nesse ponto que a

utilidade das teorias de desenvolvimento se destaca, à medida que essas

teorias trazem explicações e estratégias que se distinguem entre si.

Para Souza (2012), uma vez que não existe uma definição de

desenvolvimento que é universalmente aceita, é possível perceber duas

correntes distintas de economistas que tratam da questão do desenvolvimento.

A primeira corrente considera crescimento como sinônimo de desenvolvimento.

Assim, o motivo de um país ser subdesenvolvido é porque cresce menos que o

país desenvolvido. A acumulação de capital ganha destaque nessas teorias e

considera-se que a renda seria distribuída de forma direta (independente de

políticas públicas), uma vez que haja crescimento econômico. Souza (2012)

destaca como pertencentes a esse grupo modelos de tradição clássica e

neoclássica, assim como alguns modelos de inspiração keynesiana.

A segunda corrente explicitada por Souza (2012) acredita que, apesar

do crescimento ser indispensável para o desenvolvimento, não é condição

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suficiente. Ou seja, segundo o autor, o desenvolvimento requer melhorias nos

fatores sociais uma vez que os frutos da expansão econômica podem não

beneficiar o conjunto da população. É necessário que se modifique a estrutura

do país, de forma que se alcance maior estabilidade e diversificação

econômica. Dessa forma, enquanto o crescimento reflete variações

quantitativas do produto, o desenvolvimento envolve também mudanças

qualitativas. Souza (2012) enquadra nessa corrente economistas como

Prebisch (1949) e Furtado (1986).

Souza (2012) destaca que os economistas clássicos reconhecem um

círculo virtuoso entre poupança, acumulação, inovações tecnológicas,

crescimento, distribuição e desenvolvimento. Assim, a eficiência da firma se

reproduz no agregado e o Estado deveria, simplesmente, preservar a harmonia

do mercado e a estabilidade social, garantindo o direito de propriedade e a

liberdade individual (SOUZA, 2012).

Já no século XVIII, inserido no contexto da primeira fase da Revolução

Industrial, Adam Smith indaga como a riqueza nacional de um país cresce.

Para o autor, a resposta está no trabalho produtivo. A teoria do valor-trabalho

de Smith afirma que "o volume de produto obtido por trabalhador, em um dado

período de tempo, depende da intensidade do capital, da tecnologia e da

divisão do trabalho, possibilitada pelo aumento da dimensão dos mercados"

(SOUZA, 2012, p.58). Ao gerar economias de escala e rendimentos

crescentes, é possível reduzir os custos médios de produção e gerar lucro nas

indústrias. Assim, se o mercado opera livremente, o empresário, agindo em

interesse próprio, produz o bem comum, aumentando a renda e o emprego. No

longo prazo, a renda entre capitalistas e trabalhadores é redistribuída (SOUZA,

2012).

Outro autor de destaque é David Ricardo que, no início do século XIX,

apresentou o conceito de vantagens comparativas28 decorrentes das diferenças

28 Se, ao produzir um produto, um país apresenta custo de oportunidade (medido em relação à

produção de outros produtos) menor do que em outros países, esse país tem vantagens comparativas nessa produção (KRUGMAN; OBSTFELD, 2010).

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de produtividade entre os países. Se cada país se especializar na produção

daquilo no qual possui vantagens comparativas, e adquirir os demais produtos

utilizando o excedente de sua produção, o comércio internacional levará a

ganhos de comércio e todos se beneficiarão (KRUGMAN; OBSTFELD, 2010).

Enquanto os estudos de Adam Smith se contextualizam na Revolução

Industrial, o trabalho de John Maynard Keynes ganha notabilidade com a

grande depressão. Feijó (2007) e Souza (2012) relatam que, para Keynes, em

tempos de crise, o governo deveria gerar déficit a fim de manter o pleno

emprego. Isso acontece porque a demanda é a responsável pelos níveis de

mercado, e não a oferta. Assim, o mercado não é suficiente para garantir os

níveis de emprego, já que o emprego depende da renda que, por sua vez,

depende do investimento e da propensão a poupar. A fim de formar um círculo

virtuoso de desenvolvimento, é preciso expandir os mercados, nem que seja de

forma forçada através da interferência estatal (FEIJÓ, 2007; SOUZA, 2012).

Hunt e Sherman (2010) afirmam que os economistas neoclássicos dão

vigor às doutrinas econômicas liberais clássicas ao elaborarem um arcabouço

de cálculo e álgebra. Ainda assim, a visão da maximização da utilidade

mantém a conclusão de que a busca pelo bem individual leva ao bem comum.

Segundo os autores, a partir de uma distribuição de renda e riqueza dada, os

consumidores distribuem renda ao adquirirem mercadorias. Assim, os

neoclássicos defendem a liberdade de mercado como a melhor forma de atingir

o crescimento e, consequentemente, o desenvolvimento (HUNT; SHERMAN,

2010)

Solow, considerado por Souza (2012) como um economista neoclássico,

coloca o progresso técnico como fator central de seu modelo econômico.

Segundo Souza (2012), para Solow, o aumento da propensão a poupar não

altera a taxa de crescimento de longo prazo porque o aumento da renda per

capita via acumulação de capital é limitada. Essa situação se modifica ao

introduzir no modelo o progresso técnico. Nesse novo cenário, o crescimento

do produto per capita (e consequentemente, da renda) será a soma da taxa de

crescimento da população (dada) mais a taxa do progresso técnico. Dessa

forma, não há limite para o crescimento do produto uma vez que não há limite

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para o progresso técnico e o progresso técnico determina o crescimento da

renda per capita no longo prazo (BLANCHARD, 2010; SOUZA, 2012).

Schumpeter (1961, 1982) acredita que o motor do desenvolvimento é a

inovação. Para ele, somente as condições prévias de uma economia não

explicam a mudança econômica. O produto per capita não se altera quando

não há mudança estrutural mas, uma vez que a inovação - fonte das mudanças

- é um fenômeno endógeno ao sistema, é o processo de destruição criativa que

garante o desenvolvimento. Ainda segundo o autor, o caráter evolutivo,

embebido no contexto da concorrência imperfeita, do processo da destruição

criativa reduz o efeito de longo prazo já que tanto empresas quanto produtos

necessitam de melhoramentos a todo momento para não se tornarem

obsoletos. Dessa forma, a economia é dinamizada, gerando efeitos de

encadeamento na produção e no emprego (SCHUMPETER, 1961, 1982;

SOUZA, 2012).

A Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL),

também ligada à ONU, originou uma escola de pensamento, baseada nos

preceitos de Raúl Prebisch. Para Prebisch (1949), a grande questão é a

deterioração dos termos de troca, onde os países subdesenvolvidos,

fornecedores de produtos primários, sofrem com a defasagem de resposta da

oferta. Essa teoria, de acordo com Souza (2012), se contrasta à teoria de

Ricardo ao afirmar que um país que tem vantagens na produção de produtos

primários acaba transferindo renda para países que produzem bens

industrializados. Isso acontece pois é mais difícil aumentar ou diminuir a

produção de produtos primários, afetando os preços e elevando custos

(SOUZA, 2012).

Prebisch (2000) afirma que os países que têm economias embasadas na

produção de produtos primários sofrem com três grandes problemas: (1) a

questão dos preços, que são relativamente mais baixos para produtos

primários devido à tendência da oferta crescer mais rapidamente do que a

demanda; (2) o acesso aos mercados dos países industrializados, já que

regulamentações nos seus mercados nacionais influenciam a maior parte das

transações de produtos básicos; e (3) os excedentes agrícolas, uma vez que

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preços artificialmente mais altos, devido à regulamentações no comércio,

estimulam a produção de forma a gerar excedentes ainda maiores do que o

natural desequilíbrio entre oferta e demanda.

Dessa forma, enquanto autores clássicos e neoclássicos defendem a

liberalização dos mercados, Prebisch (1949, 2000) aponta como o comércio

internacional livre pode ser prejudicial para os países subdesenvolvidos. A

substituição de importações torna-se uma ferramenta para superar a pobreza e

crescer de forma auto-sustentada. Nesse sentido, o autor alerta sobre os

perigos de generalizações dogmáticas. A tentativa de países subdesenvolvidos

de incorporar de forma rápida um estilo de vida (e de produção), enquanto os

países desenvolvidos chegaram a esse patamar de forma mais gradual, leva a

um conflito, principalmente devido ao problema da escassez de capital. É

preciso escolher em que se deve investir, tendo em vista que, se o objetivo é

aumentar o bem-estar da população, a industrialização sem discernimento

pode levar à queda de produtividade (PREBISCH, 1949).

Segundo Souza (2012), Prebisch propõe uma estratégia em quatro

pontos para o desenvolvimento latino-americano: (1) estabelecimento de tarifas

elevadas e quotas de importação para os produtos de consumo supérfluo; (2)

incentivo à capitais externos a fim de aumentar investimentos, sobretudo na

implantação de infraestrutura básica; (3) realização da reforma agrária -

aumenta a oferta agrícola e a demanda de produtos industriais, expandindo o

mercado interno; (4) maior participação do Estado na captação de recursos e

na implantação de infraestrutura.

Outro autor importante ligado à CEPAL é Celso Furtado. Furtado (2000)

argumenta que teorias de desenvolvimento que têm como objetivo a taxa de

crescimento econômico são falhas pois desconsideram um fator fundamental, a

dimensão histórica. Como afirma Furtado (1983, p.78): "o conceito de

desenvolvimento compreende a ideia de crescimento, superando-a".

A importância histórica pode ser percebida partindo-se da revolução

industrial. Para Furtado (2000), tal revolução resultou em técnicas de produção

que modificaram todo o sistema econômico. Os aumentos das taxas de

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produtividade e lucratividade, a forte queda nos preços de certas mercadorias

de uso geral e a crescente oferta de mão de obra erodiram as velhas estruturas

econômicas de base artesanal. Para o autor, a modificação estrutural do

aparelho produtivo trouxe consigo mudanças na distribuição de renda de forma

que os lucros cresceram mais que os salários. Porém, quando essa primeira

etapa do desenvolvimento industrial caminha para sua conclusão com a

absorção do excedente estrutural de mão de obra, os salários começam a subir

e começam a aparecer problemas para absorver grandes quantidades de

capital. É nesse período que passa a ser incentivada a liberalização do

comércio e a exportação de capitais e que as pressões dos salários começam

a redistribuir renda em favor dos trabalhadores (FURTADO, 2000).

Segundo Furtado (2000), técnicas mais avançadas de produção (com

maior densidade de capital por pessoa ocupada) ganham espaço nesse

cenário e são mais favoráveis na produção de bens de capital. A medida que

se aumenta a produção de bens de capital, o custo de equipamentos para a

indústria de consumo cai, levando a uma tendência de aumentar o grau de

mecanização. Esse lento processo de decantação mostra, historicamente,

como se formou a interdependência da evolução tecnológica e o processo de

desenvolvimento dos países industrializados (FURTADO, 2000).

Furtado (1974) considera um mito a noção segundo a qual é possível a

universalização do desenvolvimento econômico da mesma forma como é

praticado pelos países que lideraram a revolução industrial. Para o autor

(FURTADO, 1974, 1983, 2000), os países não apresentam as mesmas

características e não passam pelas mesmas fases de desenvolvimento. É

importante notar que subdesenvolvimento não está ligada à idade de um país

ou sociedade. A característica fundamental do subdesenvolvimento, segundo

Furtado (1983), é o caráter dualista das sociedades, que combinam um setor

moderno, de atividades exportadoras, e um setor atrasado, em que o grau de

subdesenvolvimento é definido pela divisão da população entre esses dois

setores. Assim, se existe manufatura, o país se encontra em um grau superior

de desenvolvimento. Ou seja, "o subdesenvolvimento é, portanto, um processo

histórico autônomo, e não uma etapa pela qual tenham, necessariamente,

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passado as economias que já alcançaram grau superior de desenvolvimento"

(FURTADO, 1983, p.142).

De acordo com Furtado (1974), o contexto em que um país se

industrializou, de acordo com o grau de acumulação dos países que lideraram

o processo, moldam o esforço necessário para que um novo país possa iniciar

tal caminhada. Quanto mais tardia a industrialização, mais difícil ela é, à

medida que o processo de industrialização é acometido de modificações

qualitativas importantes. Assim, o processo trata da integração do país ao

sistema econômico internacional e não mais, simplesmente, da criação de um

sistema econômico nacional (FURTADO, 1974).

Para Furtado (2000), o Brasil é um caso especial. No século XIX, a

grande quantidade de terras e a disponibilidade de mão de obra

proporcionaram um cenário no qual não se encontravam limitações pelo lado

da oferta de fatores para as inversões na produção cafeeira, gerando um caso

crônico de excesso de oferta. Assim, os lucros da cafeicultura tendiam a se

manter nesse setor. Foi a necessidade de manufaturas de artigos de consumo

geral que motivou, posteriormente, um núcleo industrial e possibilitou, com o

tempo, uma mudança estrutural da economia. Dessa forma, o fator dinâmico

está no lado da demanda, inicialmente suprida por importações, gerando um

desenvolvimento induzido de fora para dentro (FURTADO 2000).

Assim, para Furtado (2000), no Brasil passam a coexistir um setor de

subsistência, um segundo setor ligado a atividades de exportação e um terceiro

setor manufatureiro (direcionado para o mercado interno) caracterizando uma

estrutura econômica subdesenvolvida mais complexa. É importante notar que

os equipamentos utilizados para a produção de manufaturas internamente

precisam ser importados. A medida que o núcleo industrial se diversifica a

ponto de poder produzir parte dos bens de capital, alcança-se uma etapa

superior de desenvolvimento. Isso não significa que o elemento dinâmico da

economia passe a ser a manufatura, uma vez que a substituição de

importações são o incentivo desses investimentos e não as inovações no

processo produtivo, como acontece em economias industriais desenvolvidas

(FURTADO 2000).

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46

Segundo Furtado (1983), é interessante destacar o desemprego

estrutural observado na sociedade subdesenvolvida. A técnica moderna gerada

em países desenvolvidos é intensiva em capital e poupadora de mão de obra,

indo contra a dotação de fatores dos países subdesenvolvidos, causando

desemprego e concentração de renda. Ou seja, de acordo com o autor, a

própria utilização da técnica cria obstáculos ao desenvolvimento incentivando o

dualismo. Dessa maneira, o autor afirma que para que ocorra o

desenvolvimento é necessário, no mínimo, que: (1) ocorra crescimento mais

que proporcional do setor avançado (manufatura) e (2) a estabilidade ou

aumento da proporção da mão de obra empregada no setor avançado

(FURTADO, 1983). Assim, para o autor, é preciso ter cuidado com a

industrialização indiscriminada:

Favorecer as tecnologias de ponta pode ser racional se o

objetivo estratégico é abrir espaço no mercado externo. Mas se

o objetivo principal é alcançar o bem-estar social, não tem

fundamento investir em técnicas intensivas de capital e

poupadoras de mão-de-obra, como se vem fazendo atualmente

no Brasil (FURTADO, 1999, p.23).

Considerando que a importação não se limita aos bens de capital, a

indústria de uma economia subdesenvolvida precisa competir com os produtos

produzidos externamente. Furtado (1992) destaca que a assimilação dos

avanços tecnológicos é mais lenta do que a absorção de inovações no padrão

de consumo. A desarticulação desses dois processos torna inevitável o

dualismo, levando a desarticulação social e a acúmulos de riqueza e renda.

Isso ocorre pois somente os setores que ganham em produtividade, de acordo

com as vantagens comparativas do comércio internacional, desfrutam dos

benefícios da modernização (FURTADO 1992).

Furtado (1994) discute três formas de superar o subdesenvolvimento. O

primeiro modelo está alicerçado no controle coletivo das atividades produtivas

de maior peso, seja através da autogestão - uma forma de incluir a população

nos benefícios do esforço acumulativo - como através da planificação

centralizada estatal (ou uma combinação dessas duas formas). O segundo

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47

modelo prevê a priorização da satisfação de necessidades básicas, exigindo

que parte do excedente seja direcionado para modificar o perfil de distribuição

de renda. Esse modelo exige grande vontade política para que seja

implementado. O terceiro modelo consiste em assumir uma postura mais

ofensiva no mercado internacional, orientando investimentos para setores com

maior capacidade competitiva externa. Esse modelo exige produtos de

vanguarda, ganhando flexibilidade e adaptabilidade nos mercados. Segundo o

autor, qualquer um desses modelos tem o objetivo de dar autonomia as

atividades econômicas de um país, de forma a reduzir as desigualdades sociais

(FURTADO, 1994).

Com relação às medidas específicas para o Brasil, Furtado (1999)

propõe três objetivos específicos: (1) priorizar o combate a fome e

subalimentação da população mais pobre; (2) investir em capital humano,

elevando o nível cultural da massa da população; e (3) privilegiar o mercado

interno ao direcionar investimentos, conciliando globalização e criação de

empregos. Através de tais ações o autor acredita que o bem-estar social seria

colocado como prioridade.

Murphy (2006) denota três abordagens que englobam a maior parte das

teorias sobre desenvolvimento: desenvolvimento como crescimento,

desenvolvimento como eficiência e desenvolvimento como liberdade. Para o

autor, a maior parte das teorias pode ser localizada em algum lugar entre esses

três pontos. Geralmente, uma combinação das três abordagens é considerada

como a melhor opção. A figura 3 apresenta essa configuração:

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Figura 3: Abordagens sobr

Fonte: Tradução livre de Murphy

Ao considerar desenvolvimento como crescimento, Murphy (2006)

assume que a igualdade é alcançad

oportunidade de receber uma renda igual à dos mais afortunados.

abundância de bens, ninguém é destituído, acabando com a raiz da

desigualdade. Essa visão se aproxima com a abordagem adotada pelo Banco

Mundial (ao menos historicamente). Assim

desenvolvimento é considerada um produ

metodologia considerada como ‘a melhor’ que é, de certa forma, vendida,

apontando as vantagens desse curso de ação particular (o país que cresce

mais possui o melhor modelo de desenvolvimento e esse modelo deve ser

seguido em todos os aspectos). A habilidade (e não simplesmente o desejo) de

se desenvolver é condicionada aos países através de mudanças que chegam a

níveis culturais de forma a garantir uma economia de mercados

2006).

Para Murphy (2006), quando se considera desenvolvimento como

eficiência, o alvo é fornecer aos países a oportunidade de se igualar, de forma

técnica e sistemática, aos países mais poderosos no mundo. Essa era a visão

inicial do PNUD, podendo ser observada no trabalho do MESC (

: Abordagens sobre desenvolvimento.

Murphy (2006).

Ao considerar desenvolvimento como crescimento, Murphy (2006)

assume que a igualdade é alcançada quando os menos afortunados tê

oportunidade de receber uma renda igual à dos mais afortunados.

abundância de bens, ninguém é destituído, acabando com a raiz da

desigualdade. Essa visão se aproxima com a abordagem adotada pelo Banco

Mundial (ao menos historicamente). Assim, para o autor, a assistência para o

desenvolvimento é considerada um produto, uma vez que se escolhe uma

metodologia considerada como ‘a melhor’ que é, de certa forma, vendida,

apontando as vantagens desse curso de ação particular (o país que cresce

mais possui o melhor modelo de desenvolvimento e esse modelo deve ser

todos os aspectos). A habilidade (e não simplesmente o desejo) de

se desenvolver é condicionada aos países através de mudanças que chegam a

níveis culturais de forma a garantir uma economia de mercados (MURPHY,

Para Murphy (2006), quando se considera desenvolvimento como

eficiência, o alvo é fornecer aos países a oportunidade de se igualar, de forma

técnica e sistemática, aos países mais poderosos no mundo. Essa era a visão

UD, podendo ser observada no trabalho do MESC (Midle

48

Ao considerar desenvolvimento como crescimento, Murphy (2006)

afortunados têm a

oportunidade de receber uma renda igual à dos mais afortunados. Na

abundância de bens, ninguém é destituído, acabando com a raiz da

desigualdade. Essa visão se aproxima com a abordagem adotada pelo Banco

a assistência para o

se escolhe uma

metodologia considerada como ‘a melhor’ que é, de certa forma, vendida,

apontando as vantagens desse curso de ação particular (o país que cresce

mais possui o melhor modelo de desenvolvimento e esse modelo deve ser

todos os aspectos). A habilidade (e não simplesmente o desejo) de

se desenvolver é condicionada aos países através de mudanças que chegam a

MURPHY,

Para Murphy (2006), quando se considera desenvolvimento como

eficiência, o alvo é fornecer aos países a oportunidade de se igualar, de forma

técnica e sistemática, aos países mais poderosos no mundo. Essa era a visão

Midle East

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Supply Centre). Procedimentos e habilidades adotados com sucesso em um

país podem ser transferidos diretamente para outro (MURPHY, 2006).

Ao pensar em desenvolvimento como liberdade, Murphy (2006) afirma

que o ponto principal é assegurar que todos tenham a mesma oportunidade –

liberdade – para buscar os seus objetivos individuais. Se desenvolvimento é o

que a população deseja, é necessário que ela tenha voz. Assim, democracias

são essenciais no processo de tomada de decisão. Segundo o autor, esse é o

ponto de vista de Mahbub ul Haq e de Amartya Sen, e consequentemente, dos

Relatórios de Desenvolvimento Humano29. O conhecimento pode (e deve) ser

passado de um país para o outro mas, para que seja efetivo, é necessário que

haja contextualização e incorporação da realidade local (MURPHY, 2006).

A abordagem das capacidades de Sen (1993, 1999) se concentra na

habilidade dos indivíduos de alcançarem o que consideram necessário para

terem qualidade de vida. As diferenças individuais ganham destaque nessa

análise à medida que o que é considerado como indispensável para uma

pessoa pode não ser importante para outra. Dessa maneira, Sen evidencia

como indispensável o papel da liberdade de escolha do tipo de vida que cada

um quer levar, e da oportunidade de perseguir esse objetivo. Ou seja, o

desenvolvimento consiste em expandir as liberdades individuais (SEN, 1993,

1999).

A forma como a ONU e suas agências avaliam a questão do

desenvolvimento nem sempre foi a mesma. Como exposto no item 1.1, a ONU,

como uma organização internacional, está inserida em um ambiente

institucional o qual influencia suas ações. Ao mesmo tempo que as instituições

progridem, as organizações se adaptam às novas regras do meio em que estão

inseridas. Porém, as organizações também são agentes na determinação do

ambiente institucional em si. Ou seja, a percepção que a ONU e suas agências

têm do que é desenvolvimento e como elas agem no sentido de propagar essa

ideia é importante para compreender sua posição no cenário institucional.

29 Essa questão será discutida com maiores detalhes no ponto 2.1.2.

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50

Assim, a evolução histórica da ideia de desenvolvimento dentro do contexto da

ONU e dos seus demais organismos determina como o PNUD, por exemplo,

trabalha.

Segundo Murphy (2006), o posicionamento do PNUD se desloca

gradualmente da visão de desenvolvimento como eficiência em direção a de

desenvolvimento como liberdade. O autor considera que o início dessa

mudança é contextualizado durante a década de 197030. Pode-se considerar a

influência exercida por Mahbub ul Haq para que essa transição se consolidasse

durante a década de 1990. A publicação dos relatórios de desenvolvimento

humano incita a discussão dessa nova forma de pensar a ideia do

desenvolvimento.

Partindo do conceito geral de desenvolvimento como liberdade abordado

por Murphy (2006), torna-se essencial aprofundar-se no trabalho de Mahbub ul

Haq, idealizador dos relatórios de desenvolvimento humano, para compreender

a visão de desenvolvimento adotada pelo PNUD.

2.1.2. Mahbub ul Haq e o desenvolvimento humano

Mahbub ul Haq (1934-1998) foi um importante economista paquistanês

que enriqueceu a ideia de desenvolvimento ao introduzir e promover um

paradigma centrado nos indivíduos. O autor foi importante na fundamentação

do paradigma do desenvolvimento humano.

Segundo Gasper (2011), as deliberações de Haq ganham destaque pois

ele nunca trabalhou como acadêmico – apesar de estar em contato constante

com acadêmicos – e nunca foi, puramente, um empreendedor social. De

30‘The Concensus Resolution’ foi adotada em 1970 pela Assembléia Geral. Baseada no Estudo

de Capacidades – ou ‘A study of the capacity of the united nations development system’ – relatório produzido sob a orientação de Robert Jackson que apontava diversos problemas estruturais, organizacionais e financeiros no sistema de desenvolvimento da ONU; ‘The Concensus Resolution’ atribuiu quais seriam as responsabilidades do PNUD, colocando o programa como ‘cérebro’ dos esforços da ONU para o desenvolvimento (KLINGEBIEL, 2002). O relatório considerava desenvolvimento como um problema multifacetado que envolvia fatores que iam além dos econômicos, sendo eles também políticos, culturais e sociais (MURPHY, 2006).

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acordo com o autor, Haq apresentava a habilidade de construir pontes entre

divisões disciplinares; seu trabalho era valorizado por políticos, administradores

internacionais, profissionais do desenvolvimento e ativistas, tanto do Norte

quanto do Sul. Dessa forma, Haq se destaca como importante líder no trabalho

para o desenvolvimento internacional, com propostas práticas, facilmente

comunicadas, que traduzem e transmitem uma visão inspiradora (GASPER,

2011).

De acordo com Haq (2011), ao trabalhar como economista chefe da

Comissão de Planejamento do Paquistão durante a década de 1960, Haq

presenciou um cenário em que crescimento econômico não se traduziu em

bem-estar para a população. O alto crescimento de 7% nos anos 60 foi

confrontado por um estudo que mostrou empiricamente que esse crescimento

criou o monopólio de vinte grupos familiares apoiados pelo governo. Essa

situação foi essencial para que Haq percebesse que a filosofia do crescimento

precisava ser revisada (HAQ, 2011).

Ou seja, a abundância gerada pelo crescimento econômico não

acarretou em desenvolvimento uma vez que a distribuição direta da renda não

se verificou empiricamente. Assim, a situação vivenciada por Haq evidenciou

que as teorias enquadradas na primeira corrente destacada por Souza (2012)

assim como aquelas que se aproximam da abordagem de desenvolvimento

como crescimento de Murphy (2006) são insuficientes para direcionar políticas

públicas que levem a melhores condições de vida para a população como um

todo.

Foi durante a década de 1970 que o Banco Mundial trouxe pela primeira

vez a diminuição da pobreza para o foco de suas políticas, período no qual Haq

foi assessor chefe de políticas do órgão, porém, o que mais se destaca é que

foi nessa época que Haq levantou a questão de que o PIB seria uma forma

falha para medir o crescimento econômico real (HAQ, 2011).

No ínterim de seu tempo no PNUD (1989-1995), Mahbub ul Haq propôs

a elaboração dos relatórios de desenvolvimento humano, iniciados em 1990.

Tais publicações exploram o que Murphy (2006) concebe como

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desenvolvimento como liberdade. Haq (1995) afirmou que esses relatórios

caracterizavam o principal meio de difusão das mais recentes elaborações do

paradigma do desenvolvimento humano.

Murphy (2006) salienta que a conduta do PNUD está mais ligada à

‘cérebros e livros’ do que a ‘tijolos tábuas’. É nesse contexto que a importância

da formulação da ideia de desenvolvimento humano ganha peso, uma vez que

designa o sentido em que os esforços devem ser direcionados. Como afirmou o

ex-Secretário Geral da ONU, Kofi Annan:

nós definimos que o desenvolvimento significa para o indivíduo

através dos nossos Relatórios de Desenvolvimento Humano. ...

Então, nós demos uma definição funcional e significativa à

pobreza e desenvolvimento, que não estava lá previamente31

(citado por WEISS; CARAYANNIS, 2005, p. 255, tradução

nossa).

Em 1995 Haq publicou o livro ‘Reflections in human development’ onde

ele discute a mudança de foco que o paradigma do desenvolvimento humano

proporcionou – se distanciando da renda nacional e se aproximando de

políticas centradas nos indivíduos (HAQ, 1995).

Haq (1995) acredita que, julgando que as pessoas são não somente o

meio, mas a finalidade do desenvolvimento, o planejamento econômico dos

países deixa de se focar unicamente na produção. Assim, segundo o autor,

para que esse planejamento resulte em desenvolvimento humano, é

necessário que ele contenha cinco elementos. Em primeiro lugar, não é

possível que se planeje sem conhecimento do contexto atual da população.

Dessa maneira, o planejamento deve se iniciar com um balanço estatístico da

situação humana. Em segunda instância são expressos alvos em termos das

necessidades humanas e somente então, são traçados objetivos físicos para

produção e consumo (HAQ, 1995).

31 Original: “we have defined what development means for the individual through our Human

Development Reports.…So we have given a functional and meaningful definition to poverty and development, which wasn’t there before” (citado por WEISS; CARAYANNIS, 2005, p. 255).

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Em terceiro lugar, Haq (1995) considera que ao se planejar para o

desenvolvimento, é fundamental que não só a produção seja especificada, mas

também como ela deverá ser distribuída. Dessa forma é essencial que as

políticas concretas que serão utilizadas pelo governo garantam que a produção

nacional seja distribuída com equidade. O quarto elemento a ser considerado

pelo autor é a participação da sociedade. Uma vez que a população é tanto o

meio quanto o foco do desenvolvimento humano, suas estratégias devem ser

descentralizadas, envolvendo a cooperação da comunidade e sua

independência. Em última instância, Haq (1995) afirma que é necessária uma

estrutura que possibilite a análise dos resultados nos planos para o

desenvolvimento. Essa é a função de indicadores de performance – como é o

caso do IDH.

É interessante notar que, apesar de constituir um 'esqueleto' para os

planos de desenvolvimento dos países, essa estrutura abre espaço para que

as especificidades de cada nação sejam levadas em consideração. Além disso,

Haq julga de fundamental importância que as organizações internacionais –

como o PNUD – estejam envolvidas nesse processo juntamente com os

países. Para o autor, através de revisões anuais e conselhos políticos é

possível fortalecer a ligação entre recomendações e performance. Ademais,

pode-se condicionar auxílios financeiros à modificações que incentivem o

desenvolvimento humano como manutenção mínima dos níveis de emprego ou

pisos mínimos de gastos em educação e saúde (HAQ, 1995).

Para que as políticas públicas se traduzam em desenvolvimento

humano, Haq (1995) crê ser necessária uma reestruturação econômica e de

poder político. Ou seja, o simples planejamento econômico (mesmo que este

compreenda o esqueleto descrito previamente) não é suficiente se não

houverem mudanças a um nível mais profundo, modificando, se necessário,

até mesmo questões institucionais, de forma a possibilitar que o

desenvolvimento humano seja alcançado (HAQ, 1995).

Assim, apesar de variarem de país para país de acordo com suas

especificidades, Haq (1995) considera cinco características comuns

necessárias a todos os países. Em primeiro lugar, as pessoas precisam ser o

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centro. O desenvolvimento humano é entendido e analisado em termos de

indivíduos. Já em segundo lugar, existem dois lados do desenvolvimento

humano: a formação de capacidades32 e o uso que os indivíduos fazem das

capacidades que adquiriram. Esses dois lados são complementares. É

necessário que os indivíduos consigam desenvolver suas habilidades e que o

acesso à oportunidades seja assegurado (HAQ, 1995).

A terceira característica que Haq (1995) considera necessária a todos os

países é a clara distinção entre os meios para se atingir o desenvolvimento

humano e a sua finalidade. Enquanto a expansão da renda é um meio, a

finalidade sempre é o indivíduo. Outra questão essencial é reconhecer que,

ainda que as pessoas sejam a finalidade do desenvolvimento, elas também são

um meio para a sua obtenção33 (HAQ, 1995). Para o autor, a diferença principal

dessa visão é que os indivíduos não são mais percebidos como simples

instrumentos de produção, como concebido em outros modelos de

desenvolvimento, mas o objetivo final do desenvolvimento humano. Por fim, o

autor salienta que o paradigma do desenvolvimento humano embarca não só o

campo econômico, mas reflete em todas as facetas da sociedade. Dessa

maneira, fatores políticos, culturais e sociais não podem ser deixados de lado,

uma vez que são parte integrante da vida de cada pessoa (HAQ, 1995).

Ou seja, passando por uma reestruturação econômica e política que

compreenda estas cinco características comuns, o país constrói um

alicerce institucional que possibilita que o planejamento econômico (o qual

deve ir além do espectro da produção) seja uma ferramenta para que se

atinja o desenvolvimento humano.

32Capacidades aqui tem o mesmo sentido que em Sen (2006): habilidade que o indivíduo tem para atingir seus objetivos, refletindo a liberdade que ele tem para escolher o tipo de vida que ele quer levar. 33

O fato que essa perspectiva – as pessoas tanto como meio como finalidade do desenvolvimento – é tratada repetitivamente durante todo o trabalho de Haq mostra quão importante essa noção para a real compreensão do paradigma do desenvolvimento humano.

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2.1.2.1. Os quatro pilares de Haq

De acordo com Haq (1995), o paradigma do desenvolvimento humano

tem quatro pilares essenciais: equidade, sustentabilidade, produtividade e

empoderamento. São esses pilares que distinguem o paradigma do

desenvolvimento humano de modelos tradicionais de crescimento econômico

(HAQ, 1995).

O pilar da equidade afirma que as pessoas devem ter acesso a

oportunidades de forma equitativa. No caso de desenvolvimento sem equidade

as oportunidades de escolha são limitadas para vários indivíduos de uma

sociedade, indo contra o princípio fundamental do desenvolvimento humano –

a expansão das capacidades de cada indivíduo (HAQ, 1995).

Vale lembrar que a equidade está ligada a oportunidades e não a

resultados. Mesmas oportunidades podem converter-se a escolhas distintas e

resultados diferentes. A liberdade para realizar essa escolha é considerada

como um princípio humano básico. Haq (1995) destaca que, em muitas

sociedades, é necessário que haja uma reestruturação dos mecanismos de

poder para que a equidade seja possível. Essas mudanças devem garantir o

acesso aos meios de produção, à renda, ao crédito e à voz política. Assim, de

acordo com o autor, mudanças como a implantação de um mecanismo fiscal

que corrija a distribuição de renda e reformas políticas que garantam a voz de

todas as parcelas da população são exemplos de ações que promovem a

equidade.

A sustentabilidade de todas as formas de capital – físico, humano,

financeiro e ambiental – deve ser garantida não só para a sociedade de hoje,

mas também para gerações futuras. Ou seja, as próximas gerações não devem

ser expropriadas de oportunidades que a geração atual possui (HAQ, 1995).

Porém, Haq (1995) salienta que, sustentabilidade não requer a

preservação de todos os recursos naturais em sua forma corrente. O que

precisa ser preservado é a capacidade de se produzir os mesmos níveis de

bem-estar para a população. Assim, segundo o autor, com a evolução

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tecnológica, mesmo que hajam níveis diferentes de capital físico, humano,

financeiro e ambiental, deve ser possível recombinar esses fatores de forma

que as capacidades não sejam comprometidas.

A produtividade é o pilar ligado ao crescimento econômico. Dessa

maneira, Haq (1995) reafirma que o crescimento é uma parte essencial do

desenvolvimento humano, ainda que não seja suficiente para essa finalidade.

Ou seja, as teorias que colocam a abundância de bens como propósito final

estão incompletas.

Ademais, Haq (1995) reforça que a produtividade é tão importante

quanto qualquer um dos demais pilares, dando ao crescimento econômico a

mesma importância que tem, por exemplo, a distribuição da renda gerada, a

preservação da capacidade de produção e a participação da população no

processo de desenvolvimento. Assim, de acordo com o autor, para que o

potencial máximo da população seja alcançado, é preciso que ocorra

investimento nas pessoas como também no ambiente (macroeconômico) no

qual elas estão inseridas. Por fim, Haq (1995) realça a necessidade de criar

estratégias que aumentem a produtividade, principalmente, da parcela mais

pobre da população.

O pilar do empoderamento, para Haq (1995), salienta que a população

precisa participar do processo de desenvolvimento humano. O paradigma do

desenvolvimento humano não é, segundo o autor, de forma alguma,

paternalista. Cada indivíduo deve escolher, de forma livre, como sua vida

tomará forma. Dessa maneira, o autor relata que é indispensável um sistema

político em que a sociedade civil tenha voz. A descentralização de poder

possibilita a participação tanto na hora de tomar decisões como no momento

de implementá-las. Além disso, Haq (1995) destaca que o liberalismo

econômico é uma necessidade à medida que controles e regulamentações

econômicas excessivas limitam as escolhas dos indivíduos.

Como colocado pelo autor:

O empoderamento da população requer ações em várias

frentes. Ele exige o investimento na educação e na saúde das

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pessoas, para que todos possam aproveitar as oportunidades

de mercado. Exige a garantia de um ambiente propício que dá

a todos o acesso ao crédito e a ativos produtivos de modo que

as escolhas no jogo da vida sejam mais igualitárias. Isso

implica o empoderamento de mulheres e homens para que

todos possam competir em pé de igualdade34 (HAQ, 1995,

p.20, tradução nossa).

Assim, o paradigma do desenvolvimento humano é um conceito holístico

que cobre todos os aspectos do desenvolvimento, baseado em quatro pilares

essenciais que se complementam, podendo até mesmo se sobrepor, levando

ao alargamento das capacidades da população.

2.2. REFERENCIAL ANALÍTICO

O PNUD tem duas frentes de ação que, supostamente, se contrapõe e

se completam: a formação de ideias e a execução de projetos. Para considerar

a ideia de desenvolvimento humano como a "espinha dorsal do PNUD", assim

como afirma Murphy (2006), é importante que essa ideia permeie todas as

ações do programa. Dessa forma, os produtos do PNUD precisam conter

características que assegurem que a busca ao desenvolvimento humano é a

finalidade principal das atividades do programa. Somente a partir desse ponto é

possível analisar como um país (no caso, o Brasil), é influenciado pela ação do

PNUD.

Ao analisar tanto os relatórios de desenvolvimento humano quanto os

projetos do PNUD à luz dos quatro pilares de Haq é possível explorar a

adequação entre a ideia defendida pela organização - desenvolvimento

34 Original: “The empowerment of people requires action on several fronts. It requires investing

in the education and health of people so that they can take advantage of market opportunities. It requires ensuring an enabling environment that gives everyone access to credit and productive assets so that the playing fields of life are more even. It implies empowering both women and men so that they can compete on an equal footing” (Haq, 1995, p.20).

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humano - que é, de certa maneira, intangível, e suas ações, que são tangíveis.

Dessa forma, cada pilar - equidade, sustentabilidade, produtividade e

empoderamento - pode ser considerado como uma característica definida que

pode ser identificada na análise de relatórios e projetos.

A compreensão do que são os relatórios de desenvolvimento humano,

sua contribuição no estabelecimento de uma alternativa de como compreender

o que é desenvolvimento e até mesmo mensurá-lo (como é o caso do Índice de

Desenvolvimento Humano), e a verificação do peso desse produto na

disseminação da ideia do desenvolvimento humano além dos limites da

organização, apresentam um parâmetro global que pode, posteriormente, ser

aplicado e aprofundado na análise da ação do PNUD a nível nacional.

Ademais, destaca-se o entendimento de como os projetos do PNUD são

idealizados, financiados e executados, uma vez que também constituem um

importante produto através do qual o programa oferece suporte técnico e

político aos países. Assim, ganha-se uma perspectiva da ação global dos

projetos do PNUD, útil para interpretação e delineamento da ação dos projetos

executados especificamente pelo PNUD no Brasil.

2.2.1. Os Relatórios de Desenvolvimento Humano

Os relatórios de desenvolvimento humano são uma aplicação da ideia

de desenvolvimento humano de forma a identificar problemas e defender a

execução de certas políticas públicas. Publicados basicamente todos os anos35

desde seu lançamento por Haq em 1990, são reproduzidos pelo PNUD, apesar

de não representarem, necessariamente, a visão institucional do programa e

suas políticas. Ou seja, mesmo sendo publicado pelo PNUD, os relatórios são

independentes, não refletindo, obrigatoriamente, a visão do PNUD em suas

análises e recomendações. Essa independência foi observada como parte de

uma resolução da Assembleia Geral em 1994, à medida que a produção do

relatório não está ligada ao exercício intelectual separado e distinto das demais

35 O relatório de 2007 e 2008 foi conjunto e não foi publicado relatório no ano de 2012.

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atividades do PNUD (ALKIRE, 2010; INDEPENDENT EVALUATION OFFICE,

2015; MACHADO; PAMPLONA, 2008).

Tais relatórios tiveram um papel importante ao afirmarem e reafirmarem

o conceito de desenvolvimento humano no cenário político internacional,

apresentando diagnósticos baseados em dados e análises estatísticas

(SHISHITO, 2012). Como destaca Fukada-Parr (2003):

O relatório não é apenas qualquer relatório que o PNUD pode

encomendar em um determinado tema de desenvolvimento,

nem é um relatório de status para monitorar o

desenvolvimento. Ele tem uma ambição muito mais ampla,

nominalmente definindo uma abordagem compreensível para o

desenvolvimento, incluindo uma agenda de prioridades

políticas, ferramentas de análise e de medição, e uma estrutura

conceitual coerente36 (FUKUDA-PARR, 2003, p.302, tradução

nossa).

Dessa forma, cada relatório se centra em um tema e discute, através

deste tema, a questão do desenvolvimento humano de forma multifacetada.

Essa forma de discussão está evidenciada ao se verificar os títulos dos

relatórios publicados entre 1990 e 2015, apresentados no anexo 1. Vale

perceber que, a partir de 2000, os relatórios contam também com versões em

português.

É interessante notar que na maioria dos casos os relatórios não expõem

uma solução prática para os desafios do desenvolvimento humano. Eles são,

meramente, discussões. Apesar dessa visão ter sido uma estratégia

deliberada, pode ser considerada como uma fraqueza dos relatórios

(INDEPENDENT EVALUATION OFFICE, 2015).

36 Original: “The report is not just any report that the UNDP might commission on a given

development theme, nor is it a status report for monitoring development. It has a much broader ambition, namely setting out a comprehensive approach to development, including an agenda of policy priorities, tools of analysis and measurement, and a coherent conceptual framework” (FUKUDA-PARR, 2003, p.302).

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60

Em certa instância, o próprio conceito de desenvolvimento humano

evoluiu nos relatórios com o passar dos anos. Alkire (2010) trabalha essa

questão ao analisar os relatórios de 1990 a 2009. De acordo com a autora, o

relatório de 1990 foi o único relatório a se focar no conceito de

desenvolvimento humano em si, uma vez que os demais relatórios trabalhavam

esse conceito, refinando-o através de temas mais específicos.

O desenvolvimento humano é um processo de alargamento

das escolhas das pessoas. Em princípio, estas escolhas

podem ser infinitas e mudar ao longo do tempo. Mas em todos

os níveis de desenvolvimento, as três escolhas fundamentais

são para as pessoas a levarem uma vida longa e saudável,

adquirir conhecimento e ter acesso aos recursos necessários

para um padrão de vida decente. Se essas escolhas essenciais

não estiverem disponíveis, quaisquer outras oportunidades

permanecem inacessíveis. Mas o desenvolvimento humano

não termina aí. As escolhas adicionais, altamente valorizadas

por muitas pessoas, variam da liberdade política, econômica e

social às oportunidades de serem criativas e produtivas,

desfrutando de respeito pessoal e de direitos humanos

garantidos. O Desenvolvimento Humano tem dois lados: a

formação de capacidades humanas, tais como a melhoria da

saúde, conhecimento e habilidades - e o uso que as pessoas

fazem de suas capacidades adquiridas - para o lazer, a

produtividade ou ação em assuntos culturais, sociais e

políticos. Se as escalas do desenvolvimento humanos não

equilibrarem, finamente, os dois lados, pode-se resultar em

considerável frustração humana. De acordo com este conceito

de desenvolvimento humano, a renda é claramente apenas

uma opção que as pessoas gostariam de ter, embora seja uma

opção importante. Mas não é a soma total de suas vidas. O

desenvolvimento deve, portanto, ser mais do que apenas uma

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61

extensão de renda e riqueza. Seu foco deve ser as pessoas37

(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 1990, p.10,

tradução nossa).

A definição de desenvolvimento humano nos relatórios subsequentes

seguiu a de 1990, sempre trazendo palavras chave como escolha, capacidades

e liberdade. Alkire (2010) destaca que nem sempre foram trabalhadas as

mesmas dimensões em cada relatório. Categorias como saúde, educação e

padrão de vida estão sempre presentes, mas tanto questões ambientais quanto

direitos humanos, por exemplo, apesar de importantes, não são tratadas em

todos os relatórios (ALKIRE, 2010).

Shishito (2012) vai um pouco além ao afirmar que os relatórios de

desenvolvimento humano resultaram de um confronto entre valores políticos

dentro da própria ONU, tornando-se parte de um processo de redefinição

conceitual da ideia de desenvolvimento humano. Para o autor, existe sim, um

'núcleo duro'38 que dá suporte aos estudos e que se mantém intacto, porém há

grande margem para modificação na abordagem com o passar do tempo. O

autor destaca que até mesmo dentro de um próprio relatório há embates

quanto a melhor forma de resolver problemas políticos, econômicos e sociais.

Um exemplo utilizado pelo autor é o relatório de 1994, que apresenta certa

37 Original: “Human development is a process of enlarging people's choices. In principle, these choice can be infinite and change over time. But at all levels of development, the three essential ones are for people to lead a long and healthy life, to acquire knowledge and to have access to resources needed for a decent standard of living. If these essential choices are not available, any other opportunities remain inaccessible. But human development does not end there. Additional choices, highly valued by many people, range from political, economic and social freedom to opportunities for being creative and productive, and enjoying personal self-respect and guaranteed human rights. Human Development has two sides: the formation of human capabilities such as improved health, knowledge and skills- and the use people make of their acquired capabilities - for leisure, productive purposes or being active in cultural, social and political affairs. If the scales of human development do not finely balanced the two cents, considerable human frustration may result. According to this concept of human development, income is clearly only one option that people would like to have, albeit an important one. But it is not the sum total of their lives. Development must, therefore, be more than just the expansion of income and wealth. Its focus must be people” (UNITED NATIONSDEVELOPMENTPROGRAM, 1990, p.10) 38

Nota-se que esse núcleo duro centra-se na igualdade das capacidades abordadas por Amartya Sen e no trabalho de Mahbub ul Haq que foram apresentadas tanto no relatório de 1990 quanto em estudos específicos de cada autor tais como Haq (1995) e Sen (1993, 1999).

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62

oscilação teórica no processo argumentativo a respeito do desarmamento e o

direcionamento da verba de gastos militares ante a questões sociais.

Em termos de distinções entre relatórios, Shishito (2012) separa as

publicações em décadas, destacando a Cúpula do Milênio de 2000 como

marco. Vale ressaltar que muitos dos elementos que tiveram uma maior

delimitação com a Declaração do Milênio – juntamente com os Objetivos do

Milênio – já vinham sendo tratados nos relatórios da década de 1990. Muitas

áreas se beneficiaram do amadurecimento gradativo dos lançamentos anuais

dos relatórios e suas subsequentes críticas pelo meio político e acadêmico

(SHISHITO, 2012).

Um exemplo da diferenciação feita por Shishito (2012) pode ser

percebida quando se considera o esforço contra a desigualdade entre os

países. Os relatórios publicados na primeira década, em linhas gerais,

sugerem, segundo o autor, uma maior colaboração internacional através do

estreitamento de laços e cooperação técnica, a construção de uma entidade

financeira que pudesse auxiliar os países pobres na luta contra a dívida

externa, e uma maior liberalização das economias. Porém, para Shishito

(2012), os relatórios não alcançam uma explicação consistente sobre os

motivos das disparidades socioeconômicas entre os países. Já nos relatórios

da segunda década, o conceito de interdependência entre os países ganha

força e os desequilíbrios de poder entre as nações passam a figurar como

motivadores das disparidades. Ademais, Shishito (2012) destaca que a

organização política preferencial passa a ser vista como um processo de

tomada de decisão mais horizontal, que leva em consideração agentes como a

sociedade civil, as agências internacionais, as ONG’s, etc., de forma que o

Estado trabalha ao lado, e não acima dos demais agentes.

Ainda assim, Shishito (2012) acredita que é possível perceber distinções

entre relatórios da mesma década. A visão do papel do Estado, por exemplo,

no relatório de 1990 é de catalizador do desenvolvimento humano através de

investimentos em capital humano, como em saúde e nutrição. Já o relatório de

1994 trabalha a má gestão social por parte do Estado, incentivando o corte de

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63

gastos em projetos de desenvolvimento de baixa prioridade e privatização de

empresas estatais (SHISHITO, 2012).

O Independent Evaluation Office realizou em 2015 uma análise da

contribuição dos relatórios publicados entre 2004 a 201339. De acordo com a

pesquisa40, os relatórios foram muito utilizados a nível nacional no processo da

formação de políticas públicas e a nível global em debates públicos. O

processo de formação de política públicas, de acordo com Independent

Evaluation Office (2015), foi influenciado de cinco formas: (1) ao aplicar a

perspectiva de desenvolvimento humano nos tópicos dos relatórios (forma mais

comum de influência), (2) trazendo à atenção assuntos previamente não muito

enfatizados, (3) aumentando a relevância da perspectiva do desenvolvimento

humano em discussões sobre desenvolvimento, (4) trazendo informação aos

debates sobre cooperação internacional, e (5) levantando informações a

respeito dos problemas a serem debatidos globalmente. Porém, de acordo com

o Independent Evaluation Office (2015), o PNUD não tem um mecanismo que

converta as ideias mencionadas nos relatórios em ações. Além disso, os

relatórios de desenvolvimento humano estão perdendo sua relevância à

medida que, no lugar de se gerar um debate sobre desenvolvimento humano,

têm-se desviado cada vez mais para a análise de índices, que apresentam,

muitas vezes, valor limitado (INDEPENDENT EVALUATION OFFICE, 2015).

O PNUD também publica relatórios de desenvolvimento humano nos

âmbitos regionais e nacionais. Publicados desde 1994, hoje já somam 33

relatórios. Estes relatórios não são anuais, como os relatórios globais, mas

apresentam discussões mais focadas nos desafios locais. Como afirma o

Independent Evaluation Office (2015), esse tipo de relatório chega a ser mais

útil do que os relatórios globais, à medida que se aproxima mais do que pode

ser realizado na prática.

39 As contribuições dos relatórios entre 1990 e 2003, apesar de não serem o foco de tal análise,

foram consideradas na pesquisa. 40

Independent Evaluation Office (2015).

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64

Os relatórios de Desenvolvimento Humano globais têm

influência limitada sobre as estratégias e programas do PNUD.

Como não havia nenhuma expectativa de que os relatórios

globais deveriam informar os programas do PNUD, não se

tinha uma abordagem sistemática para utilizá-los. Quando os

escritórios dos países investiram tempo e recursos para

assimilar as informações apresentadas nos relatórios, eles

foram considerados úteis para esclarecer conceitos e fornecer

exemplos de melhores práticas em países de todas as

regiões41 (INDEPENDENT EVALUATION OFFICE, 2015,

p.8, tradução nossa).

O Brasil publicou três relatórios nacionais, todos disponíveis em versão

digital no site do PNUD Brasil, sendo datados de 1996, 2005 e 2009/2010.

Cada relatório será examinado separadamente de modo a compreender as

discussões dos desafios locais enfrentados pela organização. Será observado

o tema principal tratado em cada relatório, e como a ideia do desenvolvimento

humano é discutida a seu redor. Serão destacados alguns dos índices

analisados, não somente o IDH mas também índices específicos de cada

relatório, de forma a abranger o tema de destaque trabalhado em cada edição.

Ademais, leva-se em consideração como os relatórios tratam da questão das

políticas públicas realizadas pelo governo brasileiro.

Procura-se perceber se os relatórios publicados pelo PNUD Brasil

trabalham a ideia de desenvolvimento humano assim como Alkire (2010)

constatou nos relatórios globais, ou seja, se há refinamento de tal conceito

através dos anos e dos temas discutidos, mas mantendo o cerne publicado em

1990 como definição de desenvolvimento humano. Dessa maneira, o que

Shishito (2012) considera como 'núcleo duro' dos relatórios deve estar presente

41 Original: “Global HDRs had limited influence on UNDP strategies and programmes. As there was no expectation that global HDRs should inform UNDP programmes, a systematic approach to using the global HDRs was lacking. When Country Offices invested time and resources to assimilate the information presented in the reports, they found them to be useful in clarifying concepts and providing examples of best practices from countries across regions” (INDEPENDENT EVALUATION OFFICE, 2015, p.8).

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65

em cada uma das edições nacionais, ainda que a apresentação feita e os

temas discutidos sejam distintos.

Ademais, a diferenciação feita por Shishito (2012) dos relatórios globais

entre a primeira e a segunda década de publicação também será levada em

consideração ao comparar a apresentação feita pelos três relatórios.

2.2.1.1. O Índice de Desenvolvimento Humano

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é publicado nos Relatórios

de Desenvolvimento Humano desde sua primeira edição em 1990 e é, até hoje,

o conteúdo dos relatórios mais utilizado (INDEPENDENT EVALUATION

OFFICE, 2015). Esse índice foi criado como resposta a insatisfação em se

utilizar o PIB per capita ou os salários reais como medida de desenvolvimento,

uma vez que prosperidade econômica não é o único fator importante ao se

tratar de desenvolvimento humano.

Como abordado, o desenvolvimento humano é multifacetado. Dessa

forma, para conseguir captá-lo em um único índice, deveriam ser utilizados

vários indicadores de forma a captar várias destas diferentes faces. Porém, a

utilização indiscriminada de indicadores torna-o ineficiente uma vez que se

perde o foco criando um índice de difícil uso e interpretação. Partindo-se deste

trade-off, Haq e Sen esquematizaram o IDH de forma a captar as três principais

dimensões do desenvolvimento humano: saúde, conhecimento e padrão de

vida. Ou seja, o índice de desenvolvimento humano tenta delimitar se o

indivíduo goza de uma vida longa e saudável, tem acesso ao conhecimento e a

um padrão de vida decente.

Dessa forma, o relatório de 199042 explicita o processo de construção do

IDH como a combinação de índices das três dimensões básicas escolhidas

(saúde, conhecimento e padrão de vida). Já em 1991, o relatório de

desenvolvimento humano apresentou pequenas modificações no cálculo do

42 United Nations Development Program (1990).

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66

IDH43 a fim de aprimorá-lo. Uma reformulação do índice foi apresentada no

relatório de desenvolvimento humano em 201444.

Observou-se ao longo dessas alterações que as três dimensões

permaneceram as mesmas, porém a sua forma de agregação e os indicadores

de conhecimento e padrão de vida foram modificados com o passar dos anos.

Esta formulação do cálculo do IDH encontra-se no anexo 2.

Desde a sua criação, o IDH foi alvo de diversas críticas. Os trabalhos de

Hou, Walsh e Zhang (2014) e Nayak (2013) compilam uma série dessas

críticas e subsequentes adaptações de forma a torná-lo mais representativo.

Como descrito por Nayak (2013), o IDH é criticado principalmente pelo número,

natureza e escolha das dimensões trabalhadas e seus pesos, não levando em

conta fatores importantes como a justiça distributiva, liberdades políticas,

sustentabilidade ambiental, entre outras questões. A falta de dados adequados

tem sido um grande desafio para captar tais dimensões. Nayak (2013) também

destaca a não justificação teórica da fórmula.

Vale ressaltar que o paradigma do desenvolvimento humano não pode e

nem deve ser reduzido à análise do IDH, que é a simplificação de uma ideia

muito mais complexa. Como afirma Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento no Brasil (2010), existem dois lados que devem ser

considerados na análise do desenvolvimento humano: a formação das

capacidades humanas (como saúde e educação) e como as pessoas usam as

capacidades adquiridas (para atividades produtivas, questões políticas ou até

mesmo lazer). O IDH não é suficiente para cobrir essas duas esferas. Ou como

afirma Sen (2006):

A utilidade do IDH dependente da compreensão do seu

propósito e seus limites. Ele é destinado a ampliar a estreiteza

informacional do PNB ou do PIB. Nisso ele é bem-sucedido,

mas não consegue capturar a amplitude da abordagem do

43 Modificações no IDH também podem ser percebidas nos relatórios de 1992, 1994, 1995 e 2010 ( PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010b; UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 1992, 1994, 1995). 44

Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (2014).

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67

desenvolvimento humano em geral. Nenhum número pode, não

importa o quanto nós tentamos embalar em tal número45 (SEN,

2006, p.260, tradução nossa).

Alguns outros indicadores importantes que os relatórios de

desenvolvimento humano apresentam são: o IDH Ajustado (IDHAD) - ajusta o

IDH à desigualdade na distribuição de cada dimensão pela população,

“descontando” o valor médio de cada dimensão segundo o seu nível de

desigualdade; o Índice de Desigualdade de Gênero (IDG) - revela disparidades

de gênero na saúde reprodutiva, na capacitação e na participação no mercado

de trabalho; e o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM) - identifica as

privações sobrepostas ao nível da família nas mesmas três dimensões do IDH,

indicando os números médios das pessoas pobres e as privações que as

famílias pobres sofrem (intensidade da pobreza) (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2014).

Os próprios relatórios de desenvolvimento regionais e nacionais trazem

novas formas de medir o desenvolvimento humano. No Brasil, o relatório

nacional de 2009/201046 trouxe uma série de críticas ao IDH e ofereceu uma

proposta analítica para a formulação de novos índices de desenvolvimento

humano para o país tais como Índice de desenvolvimento humano municipal de

curto prazo (IDHM-CP) e o Índice de Valores Humanos (IVH).

Além disso, o PNUD Brasil se destaca pela iniciativa do Atlas Brasil 2013

(ATLAS BRASIL, 2016). O Atlas Brasil é um site lançado pelo PNUD em

parceria com o Ipea e a Fundação João Pinheiro que disponibiliza mais de 200

indicadores socioeconômicos dos municípios, entre eles o Índice de

desenvolvimento humano municipal (IDH-M).

45 Original: “The usefulness of the HDI is dependent on understanding its purpose and limits. It is aimed at broadening the informational narrowness of the GNP or GDP [Gross Domestic Product]. This it does, but it cannot capture the breadth of the human development approach in general. No one number can, no matter how much we try to pack into that number” (SEN, 2006, p.260) 46

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento ( 2010a).

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68

2.2.2.O PNUD e seus Projetos

De acordo com Emmerij, Jolly e Weiss (2005), ideias devem ser

acompanhadas de alvos para que elas se traduzam em algo concreto.

Como afirma o Development Effectiveness Report 2003 (UNITED

NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2003), a efetividade dos programas de

desenvolvimento deve consistir em fatores e condições que fazem a diferença

de forma positiva e sustentável na vida das pessoas, e não simplesmente na

maximização do valor dos recursos investidos. A pergunta principal feita pelo

relatório é: as políticas implementadas ampliaram as capacidades e liberdades

dos indivíduos?

Na maioria dos países, é comum encontrar projetos "bem-

sucedidos". Mas eles nem sempre fazem uma diferença

substancial nos resultados nacionais de desenvolvimento. [...]

Uma forma de avaliar a eficácia do desenvolvimento é através

da compreensão de fatores-chave que influenciam mudanças

favoráveis47 (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 2003, p.7, tradução nossa).

Segundo com as informações presentes em United Nations

Development Program (2011), o PNUD planeja, executa e monitora o suporte

técnico e político que oferece em três níveis: (1) através do programa nacional

da ONU em cada país, (2) através do programa nacional do PNUD em cada

país e (3) através dos projetos do PNUD. Esses níveis se intercalam e se

conectam como pode ser percebido na figura 4. As agências da ONU analisam

a situação de cada país e delimitam um conjunto de prioridades, formando uma

base do trabalho conjunto a ser utilizada nacionalmente, conhecida como

United Nations Development Assistance Framework (UNDAF). O PNUD de

cada país utiliza do UNDAF para definir um número limitado de alvos e as

estratégias a serem utilizadas para alcançá-los. Dessa forma, o PNUD em cada

47 Original: “In most countries, it is common to find “successful” projects. But they do not always

make a substantial difference for national development outcomes. […] One way of assessing development effectiveness is by understanding key factors that influence favorable changes” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2003, p.7).

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país forma um programa detalhado que deve ser submetido ao corpo executivo

do PNUD (o seu nível mais alto). Os projetos são o meio em que se alcança

os resultados que o PNUD em cada país definiu em seu plano de ação

(UNITED NATIONS DEVELOPME

Figura 4: Processo cíclico de planejamento, definição, execução e avaliação de programa ou projeto

Fonte: United Nations Development Program

Dessa forma, apesar de ser centrado no país, existe

termos de direcionamento de projetos no que se refere ao PNUD, assim como

a ONU como um todo.

O PNUD é responsável por cerca de um quinto de todos os recursos do

UNDG. Oriundos tanto de governos (autoridades nacionais e subnacionais)

responsáveis por cerca de 66% das contribuições totais do PNUD

instituições multilaterais internacionais (como a União Europeia e o Banco

Mundial) – responsáveis por cerca de 33% das contribuições

privado (incluindo doações individuais,

os fundos do PNUD provém de contribuições voluntárias

DEVELOPMENT PROGRAM

Segundo o United Nations Development Program

divide esses recursos entre recursos centrais

recursos não centrais. Os recursos centrais são contribuições não

um objetivo específico no momento da doação e s

funcionamento do PNUD em geral, a fim de garantir a universalidade,

neutralidade e independência de ações. São o pilar central do amparo aos

país forma um programa detalhado que deve ser submetido ao corpo executivo

do PNUD (o seu nível mais alto). Os projetos são o meio em que se alcança

os resultados que o PNUD em cada país definiu em seu plano de ação

ED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2011).

: Processo cíclico de planejamento, definição, execução e avaliação de

United Nations Development Program (2011).

Dessa forma, apesar de ser centrado no país, existe certa unidade em

termos de direcionamento de projetos no que se refere ao PNUD, assim como

O PNUD é responsável por cerca de um quinto de todos os recursos do

UNDG. Oriundos tanto de governos (autoridades nacionais e subnacionais)

sponsáveis por cerca de 66% das contribuições totais do PNUD–

instituições multilaterais internacionais (como a União Europeia e o Banco

responsáveis por cerca de 33% das contribuições – e do setor

privado (incluindo doações individuais, fundações, ONG’s, entre outros), todos

os fundos do PNUD provém de contribuições voluntárias (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2015c).

United Nations Development Program (2015c), o

divide esses recursos entre recursos centrais – ou recursos regulares

recursos não centrais. Os recursos centrais são contribuições não vinculadas a

específico no momento da doação e são utilizados

funcionamento do PNUD em geral, a fim de garantir a universalidade,

neutralidade e independência de ações. São o pilar central do amparo aos

69

país forma um programa detalhado que deve ser submetido ao corpo executivo

do PNUD (o seu nível mais alto). Os projetos são o meio em que se alcançam

os resultados que o PNUD em cada país definiu em seu plano de ação

: Processo cíclico de planejamento, definição, execução e avaliação de

certa unidade em

termos de direcionamento de projetos no que se refere ao PNUD, assim como

O PNUD é responsável por cerca de um quinto de todos os recursos do

UNDG. Oriundos tanto de governos (autoridades nacionais e subnacionais) –

como de

instituições multilaterais internacionais (como a União Europeia e o Banco

e do setor

fundações, ONG’s, entre outros), todos

(UNITED NATIONS

Programa

ou recursos regulares – e

vinculadas a

ão utilizados para o

funcionamento do PNUD em geral, a fim de garantir a universalidade,

neutralidade e independência de ações. São o pilar central do amparo aos

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70

países mais pobres (destino de 90% desse tipo de recurso), e garantem

rapidez e flexibilidade na resposta da organização em tempos de crise (como

ocorreu no caso do Ebola no oeste africano em 2014) (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2011, 2015c). A tabela 1 apresenta os cinco

maiores doadores de recursos regulares durante o exercício de 2014.

Tabela 1: Maiores doadores de recursos regulares no ano de 2014 (em milhões de

dólares)

Noruega $112,21

Reino Unido $90,32

Estados Unidos da América $80,98

Japão $80,47

Suécia $72,90

Fonte: United Nations Development Program (2015d).

Conforme United Nations Development Program (2015a), existem quatro

formas de recursos não centrais: (1) fundos temáticos, (2) fundos com destino

certo, (3) fundos conjuntos da ONU, e (4) fundos verticais. Os fundos temáticos

são fundos conjuntos que auxiliam o PNUD a alcançar os alvos definidos no

seu plano estratégico. Esse tipo de fundo contém mecanismos de

monitoramento e prestação de contas, facilitando o planejamento de longo

prazo e a sustentabilidade dos projetos não deixando de proporcionar

flexibilidade para responder com maior efetividade as necessidades dos países

(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015a).

Os fundos com destino certo são aqueles que já são doados para um

programa ou projeto específico, podendo ser atribuídos nos âmbitos global,

regional ou – como é mais comum – nacional. Os próprios governos podem

realizar doações para o escritório nacional do PNUD. Assim, o país canaliza

recursos através do PNUD a fim de sustentar suas próprias prioridades em

termos de desenvolvimento; esse processo é conhecido como Government

Cost-Sharing (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015a).

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71

Os fundos conjuntos da ONU vão desde recursos administrados pelo

Secretariado da ONU até programas conjuntos. O PNUD é responsável por

criar mecanismos para administrar e implementar esses recursos e, para que

não haja conflito de interesses, utiliza de um escritório específico só para essa

função – o Multi-Partner Trust Fund Office (MPTF). O PNUD fica, em média,

com um terço da verba administrada pelo MPFT (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2015a).

Os fundos verticais são utilizados entre campanhas de alta visibilidade

compartilhadas entre diversas organizações internacionais. Geralmente

administrados pelo Banco Mundial, são alocados de acordo com seus

conselhos específicos ou comitês de direção e assistidos por secretariados

independentes. Os três principais fundos verticais do qual o PNUD participa

são: Global Fund to Fight AIDS, Tuberculosis and Malaria, Global Enviromental

Facilitye Multilateral Fund for the Implementation of the Montreal Protocol

(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015a).

A figura 5 apresenta os canais de financiamento da ONU no ano de

2014. É interessante notar que a maior parte dos recursos não está em total

controle da direção do PNUD, uma vez que os fundos com destino certo não

podem ser realocados. Outra questão que se destaca é a prevalência dos

fundos provenientes de Government Cost-Sharing em relação aos recursos

regulares. Assim, existem mais recursos nacionais canalizados para os

programas do PNUD dentro de um próprio país do que no pilar do programa

para o amparo aos países mais pobres.

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72

Figura 5: Canais de financiamento do PNUD

Fonte: Traduzido de United Nations Development Program (2015a).

De acordo com o sistema Open UNDP48, no ano de 2014, o PNUD

realizou 5.374 projetos financiados por 1.087 fontes diferentes chegando a uma

despesa de $3.492,23 milhões (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 2015f). Através desse sistema é possível acessar mais de 6.000

projetos administrados pelo PNUD em 177 países e territórios a partir de 2012,

seus orçamentos e despesas, localização e fontes de financiamento. Essa

iniciativa faz parte de um esforço da organização de se tornar mais

transparente, aumentando a efetividade e o valor da cooperação ao

desenvolvimento, uma vez que incentiva a prestação de contas, a eficiência e a

confiança nos programas. Em 2014, o PNUD foi considerado como a

organização com maior transparência pelo International Aid Transparency

Index.

De acordo com o PNUD (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 2015f), em 2014 a quantidade de programas nacionais que

receberam auxílio do PNUD foi de 161. Os projetos de 2014 levaram a uma

melhoria no padrão de vida de 11,2 milhões de pessoas (5,7 milhões de

mulheres) em 94 países. Dessa maneira, o programa buscou traçar uma via de

desenvolvimento sustentável, que incentive uma governança democrática

48 Ver United Nations Development Program (2015f)

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73

inclusiva e eficaz, e aumente a resiliência dos países (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2015d).

O sistema Open UNDP divide os projetos em oito temas49: instituições

responsivas, crescimento inclusivo e sustentável, governança democrática,

prevenção e recuperação de crises, mudança climática e resiliência contra

desastres, impacto e efetividade do desenvolvimento, relação sul-sul e

equidade de gênero. A tabela 2 apresenta a divisão dos 5.374 projetos de 2014

entre os oito temas, especificando suas parcelas no orçamento total do PNUD.

Tabela 2: Projetos de 2014 dividido entre os temas

Tema Número de

projetos Porcentagem do total de projetos

Porcentagem do orçamento

Instituições Responsivas 646 12% 33%

Crescimento Inclusivo e Sustentável

1663 31% 26%

Governança Democrática 950 18% 15%

Prevenção e Recuperação de Crises

199 4% 7%

Mudança Climática e Resiliência Contra Desastres

400 7% 7%

Impacto e Efetividade do Desenvolvimento

238 4% 6%

Relação Sul-Sul 323 6% 5%

Equidade de Gênero 102 2% 1%

Fonte: United Nations Development Program (2015f)

Assim, pode-se perceber que o tamanho do financiamento não

acompanha, necessariamente, a quantidade de projetos de cada tema.

49 Estes temas não têm conceitos definidos pelo programa. São simplesmente a forma com que

os projetos estão apresentados no sistema Open UNDP. Ademais, existem alguns projetos que não estão alocados em nenhum dos oito temas. Em 2014 o total de projetos não alocados em nenhum dos oito temas chegou a 853, basicamente 16% do total (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f).

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74

Enquanto os projetos de crescimento inclusivo e sustentável representam a

maior parcela, são os projetos de instituições responsivas que recebem a maior

quantidade de fundos.

Analisando os dados apresentados pelo sistema Open UNDP, é

interessante notar que, entre 2012 e 2014, tanto número de projetos quanto o

orçamento apresentaram quedas (8% e 6%, respectivamente). Porém,

enquanto as doações para países e projetos específicos se mantiveram, foram

os recursos regulares que apresentaram cortes significativos (UNITED

NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015d; 2015e).

De acordo com o sistema Open UNPD, em termos geográficos, os

escritórios da África e da América Latina e Caribe são os que mais realizaram

projetos em 2014 (1500 e 1205 projetos, respectivamente). Nessas regiões

destacam-se o escritório da república Democrática do Congo com 61 projetos

na África e os escritórios do Brasil e da Argentina com 119 e 118 projetos,

respectivamente, na América Latina. Ainda assim, a maior parte dos recursos

foi destinada ao escritório da Ásia e Pacífico (32% dos fundos e 994 projetos

em 2014), devido, principalmente, ao escritório do PNUD no Afeganistão. O

Afeganistão foi o país que mais recebeu recursos em 2014, $685,65 milhões,

provindos principalmente do Japão, Estados Unidos e Comissão Europeia.

68% dos projetos estão na categoria de instituições responsivas e 20% na

categoria de governança democrática, mostrando o empenho do PNUD em um

momento que o Estado está sendo reconstruído (UNITED NATIONS

DEVELOPMENT PROGRAM, 2015d; 2015e; 2015f).

Assim, utilizando dos dados do sistema Open UNDP, é possível acessar

os projetos administrados pelo PNUD no Brasil a partir de 2012, seus

orçamentos e despesas, localização e fontes de financiamento. O período

considerado no presente trabalho será de 2012 a 2014.

É possível consultar também, através do sistema Open UNDP, uma

parcela da documentação dos projetos. Não são todos os projetos que

possuem documentação disponível e nem todos os documentos disponíveis

são claros em relação ao seu conteúdo. Ademais, a documentação de alguns

Page 78: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

75

projetos não confere com os anos analisados, apesar dos projetos aparecerem

como ativos no sistema. Ou seja, é possível que um projeto conste como ativo

no ano de 2014, mas toda a documentação disponível no sistema Open UNDP

atesta que o projeto já deveria ter sido encerrado nesse período50.

Dessa maneira, ao selecionar todos os projetos que possuam algum tipo

de documentação que discuta pontos chave do projeto em questão51, e que

apresente datas onde a documentação é compatível com seu status no

sistema, têm-se um total de 62 projetos. Esses são os projetos analisados mais

a fundo, de acordo com os pilares de Haq no presente estudo.

50 Não há nenhuma explicação no sistema do porquê desse tipo de ocorrência.

51 Projetos que disponibilizam os seus objetivos.

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76

3. RESULTADOS

3.1. ANÁLISE DOS RELATÓRIOS DE DESENVOLVIMENTO

HUMANO DO PNUD BRASIL

Como ressalta o Independent Evaluation Office (2015), os relatórios de

desenvolvimento humano são publicações que tentam englobar a discussão de

problemas de forma muito ampla, apresentando, portanto, influência limitada

sobre estratégias e programas. Quando se publica um relatório de

desenvolvimento humano no âmbito nacional, é possível realizar discussões

mais focadas nos desafios locais, esclarecendo conceitos e fornecendo

exemplos (INDEPENDENT EVALUATION OFFICE, 2015).

O PNUD Brasil publicou três relatórios nacionais: Relatório de

desenvolvimento humano no Brasil de 1996; Relatório de desenvolvimento

humano no Brasil - Racismo, pobreza e violência - de 2005; e Relatório de

desenvolvimento humano no Brasil - Valores e desenvolvimento humano -

datado de 2009/2010. Assim, é feita a análise de cada um destes relatórios de

forma individual.

A forma como cada tema é discutido nos relatórios corrobora

nacionalmente o que Alkire (2010) e Shishito (2012) observaram nos relatórios

globais: ainda que se possa perceber certo refinamento no tratamento dado à

ideia de desenvolvimento humano com o amadurecimento gradativo das

publicações, o cerne, ou núcleo duro, se mantém o mesmo.

O relatório de 1996, como primeiro relatório nacional, é mais abrangente

em termos de definição do conceito de desenvolvimento humano, incluindo os

quatro pilares discutidos por Haq (1995). Já os relatórios de 2005 e 2009/2010

são mais sucintos nesse quesito e definem desenvolvimento humano de forma

mais direta, enfatizando a importância das escolhas individuais. Ainda assim

nota-se a presença de tal ideia no decorrer de toda discussão feita ao redor

dos temas definidos em cada um dos relatórios nacionais.

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77

Vale notar que o relatório de 1996 propõe um conjunto de áreas chave

para políticas públicas, incentivando a liberalização de mercados, como

Shishito (2012) afirma acontecer nos relatórios globais da década de 1990. Ao

mesmo tempo, o relatório de 2005 tem como um de seus destaques a pobreza,

um dos aspectos evidenciados nos objetivos do milênio, e a necessidade de

incluir toda a sociedade no processo de decisão, o que, segundo Shishito

(2012), é característica dos relatórios globais da segunda década de

publicações.

3.1.1. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil de

199652

Escrito em parceria com o IPEA, o relatório utiliza, em sua maior parte,

de dados no período de 1991-95 e foca na diversidade e contrastes que o

Brasil apresenta. É interessante notar que, assim como os relatórios de

desenvolvimento humano no âmbito global, é apresentada ressalva das

análises e opiniões publicadas como de inteira responsabilidade dos autores do

relatório. Esse tipo de medida isenta a organização de possíveis críticas a

respeito de abordagens específicas utilizadas, sem reduzir o crédito recebido

pela realização do estudo.

Ao tratar do conceito de desenvolvimento humano, observa-se que o

relatório – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil

(1996) - ressalta os mesmos quatro pilares de Haq - equidade,

sustentabilidade, produtividade e empoderamento (que aparece no relatório

como 'participação na decisão') - como os componentes essenciais do

paradigma do desenvolvimento humano. Assim, há compatibilidade no que se

entende como desenvolvimento humano tanto nos relatórios globais, como no

relatório específico do Brasil, seguindo os preceitos de Mahbub ul Haq.

Ademais, o relatório nacional de 1996 (PROGRAMA DAS NAÇÕES

52 Este tópico é baseado em Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil

(1996).

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78

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996) destaca a

conexão entre os relatórios de desenvolvimento humano (globais) e o ciclo de

conferências da década de 1990, de forma que tanto os indicadores quanto o

próprio conceito de desenvolvimento humano dialogam com as agendas

decorrentes das conferências internacionais. Dessa maneira, pode-se inferir

que existe uma via de mão dupla onde os relatórios de desenvolvimento

humano são utilizados como ferramentas nas conferencias internacionais e as

discussões de tais conferências refletem no que se é tratado em relatórios

posteriores. Além disso, tanto o contexto no qual o ONU como um todo está

inserida como suas ações enquanto organização interferem nas ações do

PNUD em termos globais que, por sua vez, moldam a atuação do programa no

Brasil.

O relatório de 1996 – Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento no Brasil (1996) - destaca que a identificação das diferenças

locais e regionais em um país de grandes proporções como o Brasil são

importantes, uma vez que os resultados nacionais que os relatórios globais

apresentam não são suficientes para focalizar intervenções de

desenvolvimento com objetivos específicos. Dessa forma, ao disponibilizar

informações comparáveis (das regiões e unidades da federação) e integradas

por diversas variáveis socioeconômicas, o relatório de desenvolvimento

humano no Brasil confere ao governo novas ferramentas para orientar suas

atividades.

Já em seu princípio, o relatório apresenta uma divisão do mapa

brasileiro em três “Brasis” de acordo com o IDH dos estados - figura 6. O

primeiro - formado pelos estados do Rio Grande do Sul, Distrito Federal, São

Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Paraná, Mato Grosso do Sul e Espírito

Santo - apresenta elevado nível de desenvolvimento humano (IDH >0,8),

superior ao IDH médio da América Latina e próximo ao IDH médio relativo dos

países de alto desenvolvimento humano e dos países industrializados. O

segundo - uma faixa que se estende na direção noroeste, a partir de Minas

Gerais, compreendendo os estados de Goiás, Mato Grosso, Rondônia,

Amazonas e Roraima, e também o Amapá - situa-se na camada superior do

Page 82: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

estrato de desenvolvimento hum

terceiro - reunindo o Pará, o A

nível mais reduzido de desenvolvim

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996)

Figura 6: Divisão do Brasil de acordo com o IDH estadual em 1996

Fonte: Programa das Na

À medida que cada estado possui seu próprio IDH, é possível realizar

comparações entre os níveis estaduais e o IDH de países. Por exemplo, o Rio

Grande do Sul, que possui

nível do IDH da República Checa

sua vez, a Paraíba, menor IDH do Brasil (0,466), se aproxim

Lesoto, que ocupa a 131° colocação internacional

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996)

de desenvolvimento humano médio (IDH no intervalo de 0,7 a 0,8).

reunindo o Pará, o Acre e os estados da região Nordeste - apresenta

reduzido de desenvolvimento humano (IDH < 0,7) (PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996)

Divisão do Brasil de acordo com o IDH estadual em 1996

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (1996)

medida que cada estado possui seu próprio IDH, é possível realizar

comparações entre os níveis estaduais e o IDH de países. Por exemplo, o Rio

Grande do Sul, que possuiu o maior IDH do Brasil (0,871), estava próx

nível do IDH da República Checa que tem o 40° maior IDH internacional; p

a Paraíba, menor IDH do Brasil (0,466), se aproximou do

Lesoto, que ocupa a 131° colocação internacional (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996).

79

0,7 a 0,8). O

apresenta

(PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996).

ções Unidas para o Desenvolvimento (1996)

medida que cada estado possui seu próprio IDH, é possível realizar

comparações entre os níveis estaduais e o IDH de países. Por exemplo, o Rio

próximo ao

internacional; por

do IDH de

(PROGRAMA DAS NAÇÕES

Page 83: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

80

A fim de examinar mais profundamente as disparidades

socioeconômicas do Brasil, o relatório de 1996 sugere um conjunto de

indicadores de forma a analisar melhor os três componentes do IDH (renda,

educação e saúde). Alguns indicadores que podem ser destacados são a renda

média, a escolaridade média, e a taxa de mortalidade.

O Brasil se apresenta como um dos países mais desiguais do mundo,

sendo que os extratos superiores da distribuição de renda são os principais

responsáveis por essa colocação. "A renda média dos 10% mais ricos é quase

trinta vezes maior do que a renda média dos 40% mais pobres" (PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996, p.

17). A questão da desigualdade é tratada no relatório com detalhe,

considerando fatores históricos desde a década de 1960, ressaltando que o

crescimento econômico não foi acompanhado pela distribuição. O fator regional

também é considerado na análise.

A dimensão pobreza é trabalhada em termos de extratos de renda e

regiões de forma que se identificou, entre outros fatores, a metropolização da

pobreza. O relatório esquematiza fatores determinantes da insuficiência de

renda tais como o mercado de trabalho e até mesmo a produtividade do

trabalhador (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996). Dessa forma, analisa-se o Brasil no

mundo e os estados brasileiros entre si.

Ao traçar o perfil da educação no Brasil, percebe-se, de acordo com o

relatório de 1996, melhorias significativas em índices importantes tais como a

taxa de analfabetismo e escolaridade média. Ainda assim, a situação da

educação é considerada como insatisfatória, principalmente ao comparar o

Brasil com países com o mesmo nível de renda. No relatório consta que a

educação, assim como a distribuição de renda, não acompanhou o crescimento

econômico (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996). Ademais, é clara a diferenciação do

nível educacional, não somente em divisões regionais, mas também por

estratificação de gênero e cor.

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81

A análise do acesso à educação feita pelo relatório vai além do

investimento governamental, abarcando também o investimento familiar,

altamente influenciado por questões como o acesso ao crédito e, até mesmo, o

nível de pobreza do país. A qualidade do ensino também é questionada de

forma que está mais relacionada fortemente a má distribuição dos recursos do

que a disponibilidade dos mesmos, em si (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996).

O perfil da saúde do Brasil é apresentado no relatório através de uma

série de índices como os de mortalidade e nutrição. A perspectiva histórica de

oferta dos serviços de saúde, diferenciada por regiões, apresenta reflexões

referentes tanto ao mercado de trabalho ligado ao setor, quanto aos gastos

públicos com saúde.

O relatório passa então a uma seção de análise da gestão

governamental e suas políticas públicas. O sistema brasileiro, de acordo com o

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil (1996), é

considerado como: (1) altamente centralizado; (2) com clara divisão entre os

setores público e privado de prestação de serviço - setor público é responsável

pelos serviços mais caros e à população mais pobre enquanto o setor privado

ficam com os serviços de maior rentabilidade; (3) profundamente

discriminatório e injusto; (4) distante da realidade da maior parte da população;

(5) distorcido em suas formas de financiamento; (6) desarticulado e

segmentado; e (7) impermeável ao controle público - a população não tem voz.

Dessa maneira, conclui-se que os gastos públicos têm baixos efeitos

distributivos (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996). Além disso, são discutidas pelo

relatório políticas e programas de combate à pobreza, considerados como

esforço embrionário na época.

Por outro lado, o relatório propõe um conjunto de áreas chave de

atuação para que o Brasil entre em um novo modelo de desenvolvimento.

Assim, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

no Brasil (1996): deve-se buscar um modelo de economia mais liberalizada

conjuntamente com uma reestruturação produtiva, principalmente a nível

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82

industrial; pretende-se alcançar o crescimento sustentado, com a manutenção

e criação de vantagens comparativas que, além de assegurar o mercado

nacional (foco principal), ensejem também o mercado internacional; deve-se

voltar à melhor distribuição da renda e redução da pobreza crítica a fim de

alcançar melhores padrões de vida; as práticas democráticas também

necessitam de ser revistas e as instituições aperfeiçoadas, de forma que a

população possa melhor exercer a cidadania e ocorra maior convergência entre

as esferas públicas e privadas. Deve-se, ainda, preocupar-se com a questão da

sustentabilidade para que as gerações atuais e futuras possam melhor

desfrutar de nossos recursos ambientais (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996).

Em termos estratégicos, questões como a necessidade de estabilidade

econômica para que se possibilite melhor distribuição e a formação de recursos

humanos são levadas em conta e, baseando-se na potencialidade de

crescimento econômico brasileiro, o relatório discute cinco possíveis trajetórias-

cenários para um período de 15 anos com crescimento do PIB entre 3% e 7%

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 1996). São colocadas sugestões, tais quais expansão dos empregos,

mas ainda assim, o relatório não apresenta medidas pontuais, tais como uma

quantia de investimento que deveria ser feito em educação superior para se

adquirir certo padrão de formação profissional no país, por exemplo. Dessa

forma, o relatório de 1996 mostra-se efetivo ao apontar questões importantes

que necessitam de atenção governamental, e até exemplos de ações bem

sucedidas tais como a criação do IBAMA, importante na esfera ambiental, e

mecanismos como incentivos de prêmios ou de preços como instrumentos

econômicos, mas não se propõe a ser uma cartilha com ações específicas e

pré-determinadas.

Ademais, o relatório destaca algumas questões importantes em relação

a busca pelo desenvolvimento humano: a governabilidade (eficácia decisória e

administrativa), a governança (boa governança, accountability), a reconstrução

institucional (estabilidade política). Novamente, volta-se a percepções

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83

históricas ao tratar de reforma estatal, destacando o processo de abertura

política e consolidação da democracia depois de 1985.

Vale ressaltar o destaque que o relatório de 1996 dá ao aspecto gênero,

discutindo a situação da mulher no processo de desenvolvimento humano. Em

cada seção, o relatório procurou ressaltar esta questão, através de quadros

explicativos e observações53.

Por fim, há um anexo estatístico com um conjunto de 17 tabelas, cada

uma referente a um indicador específico em termos regionais e estaduais.

O relatório também aponta a falta de estatísticas atualizadas em muitas

das áreas estudadas, de forma que se mostra indispensável o fortalecimento

dos organismos produtores de informações estatísticas no país, uma vez que o

conhecimento da realidade constitui em requisito para sua transformação

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 1996).

3.1.2. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil -

Racismo, pobreza e violência54

O segundo relatório do desenvolvimento humano no Brasil,

publicado em 2005, se diferencia do relatório de 1996 por ter um tema de

destaque: racismo, pobreza e violência. Ainda que o tópico do racismo se

ressalte no relatório, constituindo "uma barreira que trava o

desenvolvimento humano de parte significativa de sua população"

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2005, p.9), os problemas da pobreza e da violência inteiram-se ao

problema do racismo de forma que devem ser confrontados conjuntamente.

53 O quadro 2.1 do relatório de 1996, por exemplo, trata sobre 'gênero e diferenciais de renda'.

Outro exemplo é o quadro 2.10, intitulado 'a mulher e a atividade acadêmica' (ver PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 1996). 54 Este tópico é baseado em Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil (2005).

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84

De acordo com esse relatório de 2005 - Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento no Brasil (2005) - não só os negros são

vítimas do racismo no Brasil, porém estão entre as principais vítimas da

desigualdade em diversos níveis - saúde, educação, emprego, habitação e,

principalmente, renda. Além disso, há desigualdade no que se refere aos

números sobre a violência (a população negra está mais exposta) que, por

sua vez, dificulta o exercício da cidadania, representando não só pobreza

de renda, mas também pobreza política e de direitos. Assim, para o

relatório:

É imprescindível que o Estado lance mão de duas formas de

políticas públicas: universais, que são aplicadas sem distinção

ou privilégio para o grupo beneficiário, e focalizadas, que têm

como objetivo incluir os mais diversos grupos que compõem a

sociedade brasileira (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005, p.15).

O caráter histórico do racismo no Brasil é discutido no relatório de 2005 -

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil (2005) -,

partindo-se do período escravocrata. Discorre sobre diversas questões: a

influência cultural da afluência africana no Brasil que, como meio de

preservação, precisou apropriar-se de linguagens e rituais da cultura dominante

europeia; a não compensação à contribuição dos escravos a produção

econômica e cultural do Brasil, mesmo após a abolição e instauração da

república; incorporação de mecanismos informais e simbólicos de

discriminação, concretizados nas políticas de atração de imigrantes europeus e

nas barreiras aos negros para atuar no mercado de trabalho urbano;

apropriação do conceito de raça pela ciência social como meio de explicar

diferenças - o racismo científico. O relatório aponta também a democracia

racial (idealização teórica de que a miscigenação viabilizou a convivência

pacífica e harmoniosa entre diferentes raças, formando a nacionalidade

brasileira) que figurou a partir de 1930 e não passa de uma forma de evitar

questionamentos; um mito que levou à naturalização da desigualdade, da

subordinação política e marginalização socioeconômica dos negros

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85

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2005).

Ao tratar de pobreza, o relatório de 2005 - Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento no Brasil (2005) - destaca que a pobreza é um

fenômeno multidimensional e que, muitas vezes, se esquece da dimensão

política, onde figuram os processos históricos de destituição de poder. Aborda

que não são somente os bens materiais que implicam em desigualdade, mas

também em disputas de poder e dimensões correlatas, como prestígio,

oportunidades, vantagens, liderança. É nesse âmbito que os principais

aspectos da desigualdade social e, no caso brasileiro, a desigualdade racial,

residem (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO

NO BRASIL, 2005).

O relatório de 2005 afirma mostrar-se necessário que a sociedade saiba

negociar oportunidades, de forma que a ideia democrática de igualdade seja

aquela em que as pessoas possam ser iguais, e ao mesmo tempo diferentes.

Assim, de acordo com o relatório, "as estratégias de combate à pobreza devem

estimular as pessoas pobres a tornar-se o sujeito da alternativa. Do contrário,

estarão à mercê de forças políticas que não dominam e muitas vezes

desconhecem" (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005, p.44). Porém, o relatório destaca

que a própria miscigenação, assim como a não legalização (como ocorreu em

alguns países) ou não formalização do racismo dificultou a emergência da

mobilização racial no Brasil. Dessa maneira, o relatório inclui à discussão a

necessidade do fator empoderamento (presente no paradigma do

desenvolvimento humano) à discussão do racismo.

O relatório de 2005, Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento no Brasil (2005), afirma ainda que pode ser observada a sub-

representação de negros em todas as posições de poder do Estado. Esse fato

evidencia pobreza política nos processos de decisão. Além disso, o relatório

destaca que é possível perceber também a sub-representação dos negros na

economia e no mercado de trabalho. Enquanto estão sobre representados nos

nichos de mercado menos valorizados (como construção civil, por exemplo),

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86

nos cargos de gerência de grandes empresas não são encontrados muitos

negros (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO

NO BRASIL, 2005). O relatório aponta a educação como o principal meio para

efetivar a mobilidade social, porém, dentro do própria escola ocorre a

estigmatização do negro, distanciando-o daqueles de situação socioeconômica

semelhante.

Como forma de analisar desigualdades de desenvolvimento humano, o

relatório propõe a utilização do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

(IDH-M)55 desagregado por grupos étnicos e raciais.

Em 2000, a população branca do Brasil apresentava um IDH-M

de 0,814, enquanto o IDH-M da população negra era de 0,703.

Caso formassem uma nação à parte, os brancos, com um nível

de desenvolvimento humano alto (acima de 0,800), ficariam na

44ª posição no ranking do IDH das nações, entre Costa Rica e

Kuwait, segundo o RDH [relatório de desenvolvimento

humano]global de 2002. A população negra, com um nível de

desenvolvimento humano médio (entre 0,500 e 0,799), teria

IDH-M compatível com a 105ª posição – entre El Salvador e

Moldávia. A distância entre brancos e negros, portanto, seria

enorme: 61 posições no ranking do IDH mundial (PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2005, p.58).

Ao se refinar os dados, o relatório de 2005 declara que há uma

combinação de fatores raciais e regionais nos resultados do IDH-M. O

nordeste, por exemplo, possui valores mais baixos de IDH-M tanto para

brancos quanto para negros, além de uma maior concentração de negros

em sua população (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005). Consta nesse relatório que a

discrepância do IDH-M entre brancos e negros mostra-se persistente ao

comparar-se os resultados de 2000 com os de 1990 e 1991. Ao analisar a

55 O IDH-M é uma adaptação do IDH calculado para países, que permite captar a situação de desenvolvimento humano de estados e municípios.

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87

composição do índice, percebe-se que a diferença está ligada sobretudo à

renda, mas a sua evolução (e melhora nos indicadores) se deve

principalmente à educação, entre os negros, e à longevidade, entre os

brancos (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005). De acordo com o relatório:

Entre 1992 e 2001, o número absoluto de brasileiros de baixa

renda se reduziu em quase 5 milhões de pessoas, mas essa

queda ocorreu entre brancos e outras categorias raciais. O

número absoluto de negros em situação de pobreza de renda,

ao contrário, cresceu em quase 500 mil indivíduos

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005, p.62).

Dessa maneira, o relatório apresenta uma série de indicadores que

exemplificam as diferenças socioeconômicas entre negros e brancos

(englobando também o fator gênero), incluindo as dimensões renda (integrando

questões habitacionais), educação e saúde, demonstrando que o

desenvolvimento humano no Brasil não é uniforme.

O direito a segurar a vida também faz parte do desenvolvimento

humano. Porém, a violência não atinge a todos com a mesma intensidade. De

acordo com o relatório, "os negros são os principais alvos da violência letal"

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2005, p.86). Esse ponto é caracterizado no relatório ao discutir

números como o das vítimas de homicídio e crimes violentos, que mostram

diferenças expressivas no Brasil.

Como observou o relatório de 2005 - Programa das Nações Unidas para

o Desenvolvimento no Brasil (2005) - a participação do movimento negro na

política brasileira é recente, datando do final da década de 1970 (ainda período

da ditadura militar). Após a ditadura, os partidos aderem à percepção de que é

necessário incluir o racismo nos debates. O relatório destaca a ação do

movimento negro através da intelectualidade negra (como na literatura,

produção acadêmica, imprensa, letras de música), e até mesmo da

religiosidade, contribuindo, assim para a luta contra o racismo. Contudo, ainda

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88

são muitos os desafios e obstáculos enfrentados como a necessidade da

adesão das massas ao movimento negro (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005).

Assim, de acordo com o relatório - Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento no Brasil (2005) - o racismo leva à cidadania

incompleta da população negra e que é imprescindível a utilização de

políticas públicas para romper os padrões de desigualdade. Ainda ressalta

que para se alcançar uma sociedade que garanta direitos universais a

todos, geralmente é necessário lançar mão de políticas focalizadas, uma

vez que 'tratar desiguais de forma igual pode ampliar as desigualdades'.

Dessa maneira, o relatório aponta dois pontos essenciais para elaboração

de políticas públicas: (1) se o tema da iniquidade é sensível aos

formuladores e (2) se existe interesse real em políticas que afetem os

grupos excluídos de forma positiva. Ademais, políticas afirmativas se

mostram como o principal mecanismo das políticas focalizadas, uma vez

que buscam a minimização do tempo de duração da desigualdade

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2005).

Por fim, são colocadas em perspectiva no relatório o papel do

Estado e de outros agentes sociais, da sociedade civil, do empresariado, e

dos meios de comunicação, de forma que a luta contra o racismo, a

violência e a pobreza deve abarcar toda sociedade.

Os índices e indicadores do relatório de 2005 foram disponibilizados

à parte em um CD, que contém o banco de dados do Atlas racial brasileiro.

Page 92: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

89

3.1.3. O relatório de desenvolvimento humano no Brasil -

Valores e desenvolvimento humano56

O terceiro, e mais recente, relatório de desenvolvimento humano no

Brasil é referente ao biênio 2009/2010. O relatório traz a inédita metodologia de

uma consulta pública - campanha Ponto a Ponto - para determinar o que a

população brasileira considera como necessário para qualidade de vida. Foi

dessa forma que foi definido o tema do relatório, que dividido em quatro partes,

procura utilizar da concepção de valores como fundamentais para o

desenvolvimento humano.

A primeira parte do relatório consiste na consulta pública Brasil Ponto a

Ponto. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (2010a), como forma de estimular o debate sobre mudanças

no país, a pergunta "o que precisa mudar no Brasil para a sua vida melhorar de

verdade?" foi proposta para aproximadamente 100 milhões de brasileiros,

segunda estimativa do PNUD,57 de todas as classes sociais e de todas as

regiões do país. A consulta ocorreu em duas etapas, sendo primeiramente

direcionada aos municípios de pior IDH, à academia, a representantes do

governo e a sete capitais, durante um período de três meses, e posteriormente

aberta e divulgada amplamente ao público durante seis semanas. É

interessante notar o alcance de tal pesquisa. Por exemplo, foi utilizada a

opinião de consultoras da Natura (parceira do projeto), espalhadas em 95% do

território brasileiro, durante a segunda fase.

Em termos de resultados da primeira fase, o relatório destaca, entre

outros, o tema da educação, que aparece como uma das principais

preocupações tanto nas capitais como nas cidades pequenas e também na

visão dos acadêmicos e questionários respondidos pela internet. Porém, a

visão que o relatório traz ao tema da educação não é simplista, mas sim de

que, como um resultado de políticas públicas mais eficazes e de uma gestão

56 Este tópico é baseado em Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a).

57 Quantidade de pessoas que tiveram acesso à essa questão, durante as duas fases da pesquisa, de acordo com estimativas do PNUD.

Page 93: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

90

pública mais ética, através da educação é possível trabalhar valores éticos,

morais e humanistas - como a violência, a desigualdade e a corrupção

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a).

Os resultados da segunda fase são apresentados pelo relatório de

2009/2010 em dois grupos: (1) os principais temas substantivos escolhidos -

educação, políticas públicas, meio ambiente, violência, emprego, saúde,

judiciário, infraestrutura, impostos, pobreza e outros - (2) temas transversais

que são uma combinação de temas substantivos - valores (inclui discriminação,

por exemplo), corrupção, desigualdade (renda social) e juventude. Ou seja, um

tema transversal recebe essa nomenclatura pois ganha amplitude ao ser

estudado como parte de outros temas substantivos e não nele mesmo. Assim,

ao analisar os resultados da pesquisa, percebe-se uma grande preocupação

em relação ao tema dos valores ligados à provisão de bens públicos,

destacando-se problemas com a educação e a violência. A figura 7 apresenta

os resultados finais agregados das duas fases da consulta. A educação foi o

tema substantivo mais citado na pesquisa, representado a opinião de 21% dos

entrevistados. Já quanto aos temas substantivos, a preocupação com os

valores se destacou com 11% das respostas.

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Figura 7: Resultados da consulta Brasil Ponto a Ponto

Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

Assim, com o resultado da consulta, foi formulado um relatório de

desenvolvimento humano no

educação e da violência.

A segunda parte do relatório trata sobre

desenvolvimento humano’.

informam sobre como agir melhor na vida

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a

dentro das culturas (sendo parte das instituições)

destaca os valores de vida

discurso - e os valores públicos

principais funções dos valores

estabelecer padrões e critérios sociais

guia da conduta dos indivíduos

entender diferentemente situações

a autoestima (natureza psicológica dos valores)

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a)

Resultados da consulta Brasil Ponto a Ponto

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

resultado da consulta, foi formulado um relatório de

desenvolvimento humano no Brasil sobre valores, com ênfase nos pontos da

A segunda parte do relatório trata sobre ‘valores de vida e

. "Valores são crenças, guias, metas gerais que

informam sobre como agir melhor na vida" (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a, p.88). Assim, são construídos

dentro das culturas (sendo parte das instituições) de forma que o relatório

valores de vida - aqueles vividos e não apenas parte de um

valores públicos - aqueles que são coletivos. São três as

principais funções dos valores explicitadas pelo relatório de 2009/2010

padrões e critérios sociais sobre o que é desejável, (2) servir

guia da conduta dos indivíduos e (3) ajudar os indivíduos a racionalizar, a

situações que vivem, ajudando a melhorar e a manter

a autoestima (natureza psicológica dos valores) (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a) . A figura 8 exibe

91

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

resultado da consulta, foi formulado um relatório de

Brasil sobre valores, com ênfase nos pontos da

valores de vida e

crenças, guias, metas gerais que nos

(PROGRAMA DAS NAÇÕES

construídos

forma que o relatório

aqueles vividos e não apenas parte de um

São três as

explicitadas pelo relatório de 2009/2010: (1)

servir como

a racionalizar, a

e a manter

(PROGRAMA DAS NAÇÕES

o modelo

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em que os valores se relacionam com os comportamentos, normas

tanto de indivíduos quanto do coletivo.

Figura 8: Modelo completo de valores a comportamentos

Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

O relatório apresenta 1

entendidos em termos de tipos motivacionais e

e similaridades: (1) autodeterminação (valores como interdependência,

liberdade e criatividade); (2) universalismo (valores como tolerâ

igualdade); (3) benevolência (valores que visam o

honestidade e lealdade); (

culturas como os de vida espiritual); (

obediência); (6) segurança (valores como ordem social e saúde); (

(valores como autoridade e riqueza); (8) realização (valores de sucesso

pessoal, como ambição e inteligência); (9) hedonismo (valores que

representam prazer e gratificação pessoal); e (10) estimulaçã

entusiasmo e audácia) (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010

família como principal responsável

Os valores não são características fixas e pre

as instituições, eles evoluem

e relacionam com os comportamentos, normas e atitudes,

quanto do coletivo.

Modelo completo de valores a comportamentos

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

O relatório apresenta 10 grupos de valores que são universais,

s de tipos motivacionais e estruturados a partir de conflitos

: (1) autodeterminação (valores como interdependência,

liberdade e criatividade); (2) universalismo (valores como tolerâ

igualdade); (3) benevolência (valores que visam o bem-estar do próximo, como

honestidade e lealdade); (4) tradição (valores que respeitam os costumes e

culturas como os de vida espiritual); (5) conformidade (valores como respeito e

segurança (valores como ordem social e saúde); (

como autoridade e riqueza); (8) realização (valores de sucesso

pessoal, como ambição e inteligência); (9) hedonismo (valores que

representam prazer e gratificação pessoal); e (10) estimulação (valores como

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a). Ademais, o relatório destaca a

família como principal responsável no ensino de valores, seguido pela escola

são características fixas e predeterminadas. Assim como

as instituições, eles evoluem e estão ligados a realidade local. O relatório

92

e atitudes,

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

0 grupos de valores que são universais,

a partir de conflitos

: (1) autodeterminação (valores como interdependência,

liberdade e criatividade); (2) universalismo (valores como tolerância e

do próximo, como

) tradição (valores que respeitam os costumes e

) conformidade (valores como respeito e

segurança (valores como ordem social e saúde); (7) poder

como autoridade e riqueza); (8) realização (valores de sucesso

pessoal, como ambição e inteligência); (9) hedonismo (valores que

o (valores como

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

. Ademais, o relatório destaca a

no ensino de valores, seguido pela escola.

s. Assim como

estão ligados a realidade local. O relatório

Page 96: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

evidencia então, como pode ser percebido na figura

brasileiros nos anos de 2007 e 2010, comparando

internacionais de 2001. O relatório também identifica diferenças entre os

valores em termos regionais, de gênero, de idade, de escolaridade, de renda e

até mesmo de opções de trabalho; entretanto

religiosidade não afetam o valores dos brasileiros

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRAS

Figura 9: Principais valores internacionais e brasileiros

Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

Em seguida, o relatório relaciona a problemática dos valores aos dois

problemas escolhidos através da pesquisa Ponto a

violência.

A educação é promovida tanto pelo sistema informal

comunidade (aprender 'vivendo a vida')

e universidades. A relação entre estas duas esferas é complementar, porém,

"se as famílias e comunidades são incapazes

comportamento de que a sociedade necessita para o seu bom

então volta-se às escolas para a

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a

evidencia então, como pode ser percebido na figura 9, os dez principais valores

brasileiros nos anos de 2007 e 2010, comparando-os aos principais valores

O relatório também identifica diferenças entre os

valores em termos regionais, de gênero, de idade, de escolaridade, de renda e

pções de trabalho; entretanto, foi constatado que estado civil e

iosidade não afetam o valores dos brasileiros (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a)

internacionais e brasileiros

das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

Em seguida, o relatório relaciona a problemática dos valores aos dois

escolhidos através da pesquisa Ponto a Ponto: educação e

é promovida tanto pelo sistema informal -

comunidade (aprender 'vivendo a vida') - quanto pelo sistema formal

e universidades. A relação entre estas duas esferas é complementar, porém,

lias e comunidades são incapazes de cultivar os valores e os

de que a sociedade necessita para o seu bom funcionamento,

se às escolas para a reparação dessa falha" (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a, p.146).

93

ncipais valores

os aos principais valores

O relatório também identifica diferenças entre os

valores em termos regionais, de gênero, de idade, de escolaridade, de renda e

foi constatado que estado civil e

(PROGRAMA DAS NAÇÕES

das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2010a)

Em seguida, o relatório relaciona a problemática dos valores aos dois

Ponto: educação e

- família,

quanto pelo sistema formal - escolas

e universidades. A relação entre estas duas esferas é complementar, porém,

de cultivar os valores e os

funcionamento,

(PROGRAMA DAS

Assim, o

Page 97: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

94

relatório afirma que a escola atua no esclarecimento, coerção e exemplificação

de valores.

De acordo com o relatório 2009/2010 - Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento (2010a) - o foco da análise da educação no Brasil se

modificou, uma vez que o acesso ao ensino fundamental é considerado

universalizado no país. A discussão deixa de ser sobre a oferta e passa a

questões sobre a qualidade. O valor da educação traz dois significados como

proeminentes: (1) educação como formação para o mercado de trabalho e (2)

educação como formação para a vida. Dessa maneira, a educação não é

importante somente como instrumento, mas também em si própria, elevando

sua relevância no desenvolvimento humano (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a).

Um dos problemas que o relatório levanta está na atribuição de

responsabilidades e expectativas entre pais, professores e gestores da

educação. De acordo com o relatório, Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (2010a), o papel de ensinar valores é colocado pelos pais

brasileiros como sua principal função, seguida por assegurar uma educação de

qualidade para seus filhos. Porém esses números variam de acordo com as

características do entrevistado (como gênero) e quais os valores ele considera

como mais importantes. Por exemplo, a pesquisa aponta que "quanto mais as

pessoas são abertas a mudança, menos elas valorizam a religião como a

principal instituição para transmitir valores" (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a, p.157).

Observa-se que a preocupação do relatório com violência vai além dos

crimes violentos e é apontada pela campanha Ponto a Ponto principalmente

como a deterioração das relações sociais, manifesta na falta de respeito ao

outro e no crescimento das incivilidades cotidianas. Assim, o relatório destaca

que não é só o crime organizado e o sistema de justiça que devem ser

colocados em foco, mas também a violência cotidiana na relação com o outro

(que está inserida em contextos culturais e históricos) (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a).

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95

O Brasil apresentou grande crescimento nos índices de criminalidade

nas duas últimas décadas do século XX. Isso se modificou em certa medida na

história recente, mas o sentimento de medo e insegurança continua presente

de forma significativa apesar de indícios de queda em algumas taxas de

criminalidade (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a). De acordo com o relatório:

O medo e a insegurança encorajam as pessoas a levantarem

barreiras físicas para proteção e, consequentemente, pode

reduzir as possibilidades de contato entre os vizinhos, as

oportunidades para trocas de informação e aumentar a

desconfiança entre as pessoas (PROGRAMA DAS NAÇÕES

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a, p165).

O relatório destaca também a violência doméstica, como são os casos

de violência contra a mulher, como o segundo tipo de violência que mais

incomoda os brasileiros. Esse tipo de violência, segundo o relatório 2009/2010,

tem um impacto muito profundo na formação de valores e se alastra para

outras esferas trazendo impactos para a dinâmica da violência na comunidade.

O processo de dessensibilização, alimenta o ciclo da violência e faz com que a

população se desligue do outro e de seu sofrimento (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a).

A terceira parte do relatório se inicia ao afirmar que as políticas públicas

vão além das políticas governamentais, incluindo também as políticas do

cidadão. Assim, de acordo com o relatório de 2009/2010, somente com o

envolvimento dos indivíduos é possível tratar de políticas públicas como

políticas de valor, de forma que a transformação social, que é seu objetivo final,

seja mais qualitativa do que simplesmente quantitativa. Ou seja, o relatório

defende que se deve conferir um papel mais ativo ao cidadão na formulação

das políticas públicas, o que pode ser entendido como empoderamento.

A chave para este processo, segundo o relatório 2009/2010, está no

momento da implementação. Se o governo buscar a ajuda do cidadão, adquire-

se verdadeiro conhecimento dos obstáculos a serem enfrentados,

conhecimento esse que vai além do técnico, dando maior clareza aos objetivos,

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96

respeitando as diversidades e incluindo o diálogo, aumentando assim a

sinergia entre governo e população (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a). Ademais, de acordo com esse

relatório, o envolvimento das pessoas tem efeitos na luta contra a corrupção

uma vez que pode evitar com que tomadores de decisão sucumbam a tentação

de expressar seus interesses particulares na formulação das políticas. Um fator

importante que o relatório destaca para que a população se envolva é a

necessidade de que as políticas sejam elaboradas de forma simples:

Como podemos separar o mundo “privado” do mundo “público”,

quando o que acontece nas famílias molda tanto a sociedade

na qual vivemos quanto a agenda nacional de prioridades?

Uma abordagem que focaliza os valores resgata a importância

de uma visão sistêmica para a solução de problemas

complexos, destacando não somente sua integração, mas a

simplicidade das ações que os compõe (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a,

p.211).

Além do ambiente familiar, a escola aparece como cenário importante,

uma vez que é de grande influência na formação de valores. O relatório oferece

um grupo de sugestões que incluem medidas simples como fazer a chamada

dos alunos pelo nome (uma demonstração de respeito e afeto pelas crianças e

jovens como indivíduos) e utilização de jogos cooperativos.

Assim, o relatório 2009/2010 observa que são diversos os meios onde é

possível a implementação de políticas de valor, como por exemplo na

implantação de espaços públicos (físicos ou não) de forma de incentivar o

convívio, ou até mesmo no trabalho, onde práticas de gestão e de qualidade de

vida podem acarretar em vivências positivas ou negativas (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a).

A quarta, e última, parte do relatório foca em indicadores, mais

especificamente na formulação do Índice de Desenvolvimento Humano

Municipal de Curto Prazo (IDHM-CP). É apresentada uma breve revisão dos

vinte anos de críticas ao IDH, enfatizando a evolução do índice com o passar

Page 100: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

97

dos anos, os desafios enfrentados e os que ainda permanecem. A partir de

então, o relatório apresenta o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

(IDH-M) calculado inicialmente em 2003 e que representa uma adaptação do

IDH internacional às esferas municipais e metropolitanas. O IDH tradicional tem

natureza de longo prazo (utiliza-se de 'estoques' para o seu cálculo, não

fluxos). Esse fator impede a captura das rápidas mudanças de países que

avançam como o Brasil, somente a renda (variável de fluxo) determina a

movimentação do IDH no curto prazo (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS

PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a).

O IDHM-CP se destaca pois utiliza indicadores relativamente diferentes

em sua formação. Para a dimensão saúde, utiliza-se do Índice de Realização

de Saúde Infantil (ISI) - que é baseado na taxa de mortalidade infantil58. O

objetivo da dimensão educação é incluir a qualidade. Dessa maneira, é

utilizado um indicador baseado no Índice de Desenvolvimento da Educação

Básica (IDEB)59. A dimensão renda utiliza o PIB per capita dos municípios.

Assim, são definidos valores de IDHM-CP de acordo com faixas de

desenvolvimento: muito elevado (0,9865 a 0,7237), elevado (0,7245 a 0,6516),

médio (0,6524 a 0,5837) e baixo (0,5843 a 0,1944) (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2010a).

Em termos de resultados, a média dos dados Brasileiros para o IDHM-

CP registrou um valor de 0,648 para o biênio 2006/2007 (PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a). O

relatório 2009/2010 considera esse resultado como um bom sinal que o IDHM-

CP opera dentro de uma escala similar da utilizada pelo IDH global. Além

disso, o relatório também apresenta uma variação do índice corrigido em

função da desigualdade distributiva.

58��� = 1 (���� �� ����������� �������� 1000⁄ ) (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA

O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a, p.291). 59

(n° de matrículas de 1ª a 4ª séries das escolas que atingiram a meta + n° de matrículas de 5a a 8a séries das escolas que atingiram a meta) / (n° de matrículas de 1a a 4a séries das escolas que possuem IDEB para anos iniciais + n° de matrículas de 5a a 8a séries das escolas que possuem IDEB para anos finais) (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2010a, p.292).

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98

Por fim, o relatório apresenta uma proposta metodológica de um índice

de valores humanos (IVH). A formulação de tal índice é uma difícil tarefa à

medida que a quantificação de valores não é fácil de ser alcançada

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO

BRASIL, 2010a).

Dessa maneira, o relatório de desenvolvimento humano no Brasil de

2009/2010 apresenta, através de uma maneira mais didática que os demais

relatórios, a importância da inclusão da comunidade, de forma participativa, na

busca pelo desenvolvimento.

3.1.4. Políticas Públicas no Brasil e os relatórios de

desenvolvimento humano

Ainda que a publicação de relatórios de desenvolvimento humano no

âmbito nacional proporcione a oportunidade de trazer discussões mais focadas

nos desafios locais, é importante reforçar que seu objetivo não é fornecer

qualquer tipo de manual com ações específicas e pré-determinadas, mas

simplesmente discutir questões importantes que necessitam de atenção

governamental.

Assim como o Independent Evaluation Office (2015) afirmou sobre a

influência dos relatórios de desenvolvimento humano globais na formação de

políticas públicas, o mesmo pode ser aplicado ao caso dos relatórios brasileiros

e as políticas públicas nacionais. Dessa maneira, cada um dos três relatórios

levantou temas significativos a serem levados em consideração na elaboração

dessas políticas.

O tema da educação foi abordado pelos três relatórios de

desenvolvimento humano nacionais. Vale destacar que o investimento em

capital humano foi uma das propostas de Furtado (1999) para colocar o bem-

estar social como prioridade no Brasil. Haq (1995) também ressalta que uma

das ações para o empoderamento da população é o investimento na educação.

Em relação a esse tema, o governo brasileiro instituiu a lei n° 9.394 de 1996,

que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (BRASIL,1996).

Em termos de recursos para a educação, vigora no Brasil, desde 2007, o

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99

Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de

Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) - substituiu o Fundo de

Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do

Magistério (Fundef) que vigorou entre 1998 e 2006. O Fundeb visa garantir a

educação básica pública, redistribuindo recursos nacionalmente e contribuindo

para a redução das desigualdades educacionais. Ainda, o fundo favoreceu a

elevação do patamar de investimentos no setor à medida que aumentou a

participação federal no aporte de recursos financeiros (FUNDO NACIONAL DE

DESENVOLVIMENTO A EDUCAÇÃO, 2016).

Destaca-se também o Plano Nacional da Educação (PNE) que,

conforme proposto pela Constituição Federal (BRASIL, 1988), tem vigência de

10 anos e propõe metas e estratégias como forma de articular o sistema

nacional de educação e assegurar a manutenção do ensino. O PNE em

vigência atualmente foi aprovado pela lei nº 13.005 de 2014 (BRASIL, 2014).

O relatório de 1996, ao tratar de uma grande quantidade de assuntos ao

mesmo tempo, acaba por tornar-se um pouco confuso e disperso. Dessa

forma, ainda que destaque questões gerais como o regionalismo e a

desigualdade, traz sugestões de políticas públicas amplas e, até certo ponto,

desconexas umas das outras.

Um ponto que pode ser destacado no relatório de 1996 e que perpassa

todo o seu conteúdo é a questão do gênero. Ao realçar no texto problemas

como a diferença de renda, no mercado de trabalho, na educação, nos

mecanismos de poder e na violência, o relatório abrange diversos desafios

enfrentados pelas mulheres brasileiras.

É importante perceber que o relatório de 1996 contextualiza-se à

Convenção para a eliminação, prevenção, punição e erradicação da violência

contra a mulher, conhecida como Convenção de Belém de Pará. Publicada

pela Organização dos Estados Americanos em 1994, define como condição

indispensável a eliminação da violência contra a mulher (ORGANIZAÇÃO DOS

ESTADOS AMERICANOS, 1994).

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100

Desde 1996, podem-se destacar duas iniciativas que tratam sobre a

questão de gênero e que se traduziram em leis no Brasil. A principal delas é a

lei n° 11.340 de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha. Com o objetivo de

criar mecanismos a fim de refrear a violência doméstica e familiar contra a

mulher, a lei Maria da Penha teve grande repercussão não só nos movimentos

feministas mas na sociedade civil como um todo. De acordo com o § 1o do

Artigo 3º dessa lei:

§ 1o O poder público desenvolverá políticas que visem garantir

os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações

domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda

forma de negligência, discriminação, exploração, violência,

crueldade e opressão (BRASIL, 2006, não paginado).

Outra iniciativa foi a lei n° 12.605 de 2012, que "determina o emprego

obrigatório da flexão de gênero para nomear profissão ou grau em diplomas"

(BRASIL, 2012, não paginado). Na forma de política de afirmação, tal lei

procura valorizar a condição feminina na sociedade.

O relatório de 2005 é mais focado do que o relatório de 1996, trazendo

um assunto de destaque: o racismo. Pode ser considerado como o grande

avanço brasileiro com relação a esse tema a criação do Estatuto da Igualdade

Racial, através da lei n° 12.288 de 2010. De acordo com o Artigo 1º, o Estatuto

visa "garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a

defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à

discriminação e às demais formas de intolerância étnica" (BRASIL, 2010, não

paginado).

É interessante notar que o Estatuto da Igualdade Racial utiliza-se da

mesma noção do relatório nacional de 2005 onde tratar desiguais de forma

igual pode ampliar as desigualdades. Dessa maneira, políticas focalizadas e

afirmativas tornam-se o instrumento através do qual o governo brasileiro

procura promover a igualdade racial, como pode ser percebido através do

trecho:

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101

Parágrafo único. Os programas de ação afirmativa constituir-

se-ão em políticas públicas destinadas a reparar as distorções

e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias

adotadas, nas esferas pública e privada, durante o processo de

formação social do País (BRASIL, 2010, não paginado).

Já o relatório de 2009/2010 destaca a necessidade de incluir às políticas

governamentais as políticas do cidadão. De acordo com a Constituição Federal

(BRASIL, 1988), pode-se apresentar à Câmara dos Deputados um projeto de

lei de iniciativa popular à medida que esteja subscrito por, no mínimo, 1% do

eleitorado nacional, além da adesão de 0,3% do eleitorado de pelo menos

cinco estados da federação. Com um número tão alto de assinaturas, até hoje

somente quatro propostas de iniciativa popular viraram lei, sendo somente uma

delas após a publicação do relatório de 2009/2010 (AGÊNCIA SENADO, 2016).

A lei complementar n° 135, Ficha Limpa como é conhecida, tem o

objetivo de combater a corrupção eleitoral e foi sancionada em 2010, tendo 1,3

milhão de assinaturas de cidadãos de todos os estados brasileiros e do Distrito

Federal (TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, 2016). Ela torna inelegível

qualquer pessoa com condenação por crime de natureza eleitoral, ou seja,

suspeito de crime ou infração relacionada a seu mandato (BRASIL, 2010).

Essa lei representou um importante passo da participação da sociedade civil no

mecanismo de tomada de decisão, à medida que influencia todo o processo

eleitoral.

Dessa forma, apesar de ser possível perceber avanços tanto em

questões de gênero quanto em questões raciais no Brasil, o processo de

construção de políticas governamentais não incentiva a participação popular

direta e, consequentemente, o empoderamento da população. Ou seja, ainda

que o governo brasileiro leve em consideração alguns dos temas tratados

através dos relatórios nacionais de desenvolvimento humano, o

empoderamento, um dos pilares do desenvolvimento sugeridos por Haq, sendo

este o principal pilar a ser destacado por tais relatórios, parece não ser

considerado como uma prioridade na formulação de políticas públicas.

Page 105: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

102

3.2. ANÁLISE DO SISTEMA ATLAS BRASIL

O Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil (ou Atlas Brasil) é uma

plataforma que engloba o Atlas do Desenvolvimento Humano nos Municípios e

o Atlas do Desenvolvimento Humano nas Regiões Metropolitanas. São mais de

200 indicadores de demografia, educação, renda, trabalho, habitação e

vulnerabilidade de 5.565 municípios brasileiros, 27 Unidades da Federação, 20

Regiões Metropolitanas e suas respectivas Unidades de Desenvolvimento

Humano; os dados utilizados são extraídos dos Censos Demográficos de 1991,

2000 e 2010 (ATLAS BRASIL, 2016).

A colaboração entre o Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento no Brasil (PNUD), o Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (IPEA), a Fundação João Pinheiro e o Instituto Brasileiro de Geografia

e Estatística (IBGE) gerou em 1998 o IDH-M. A partir desse ponto, foi

publicado em 2003 o primeiro Atlas de Desenvolvimento Humano Municipal,

onde o índice foi apresentado utilizando as informações do Censo de 2000,

tanto para municípios quanto para edições específicas feitas para grandes

metrópoles brasileiras (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2005, 2010a).

De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

no Brasil (2016), três softwares executáveis que funcionavam como bancos de

dados foram desenvolvidos pelo PNUD até 2004. Eles compreendiam

indicadores socioeconômicos e questões temáticas. Porém, a partir de 2013, a

plataforma virtual do Atlas Brasil, lançada pelo PNUD, em parceria com o Ipea

e a Fundação João Pinheiro, serviu como divisor de águas, à medida que, ao

democratizar a informação e trazê-la para unidade político-administrativa mais

próxima do cotidiano dos cidadãos (o município), tornou-se ferramenta para

o fortalecimento das capacidades locais, o aprimoramento da gestão pública e

o empoderamento dos cidadãos (ATLAS BRASIL, 2016; PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2016).

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O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH

considerado como o principal índice disponível no Atlas Brasil. Ele

adaptação à realidade brasileira

captar a situação de desenvolvimento humano de estados e municípios

(ATLAS BRASIL, 2016). De acor

utilizado como indicador o

expectativa de vida ao nascer, calculada por método indireto, a partir dos

dados dos censos demográficos do IBGE. Na dimensão conhecimento são

utilizados dois indicadores para formar o

população adulta, medida pelo percentual de pessoas de 18 anos ou mais de

idade com ensino fundamental completo (peso 1 no

escolar da população jovem, med

crianças de 5 a 6 anos frequentando a escola, do percentual de jovens de 11 a

13 anos frequentando os anos finais do ensino fundamental, do percentual de

jovens de 15 a 17 anos com ensino fundamental completo e do

jovens de 18 a 20 anos com ensino médio completo (peso 2 no

educação). Já o IDH-M renda, indicador de padrão de vida, nada mais é que a

renda per capita municipal. É realizada então uma média geométrica desses

três indicadores (ATLAS BRASIL, 2016)

desenvolvimento humano municipal.

Figura 10: Faixas de desenvolvimento humano municipal

Fonte: Atlas Brasil (2016)

O IDH-M possibilita a comparação entre os municípios ao longo do

tempo, estimulando a melhoria de formuladores e implementadores de políticas

públicas no nível municipal

Dessa maneira, o Atlas Brasil

internacionalmente - o IDH

desenvolvimento humano na sociedade brasileira. É um meio

de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M)

considerado como o principal índice disponível no Atlas Brasil. Ele

asileira do IDH calculado para países, permitindo

captar a situação de desenvolvimento humano de estados e municípios

De acordo com a plataforma, na dimensão saúde é

utilizado como indicador o IDH-M Longevidade, que nada mais é do que a

expectativa de vida ao nascer, calculada por método indireto, a partir dos

dados dos censos demográficos do IBGE. Na dimensão conhecimento são

dois indicadores para formar o IDH-M educação: a escolaridade da

população adulta, medida pelo percentual de pessoas de 18 anos ou mais de

idade com ensino fundamental completo (peso 1 no IDH-M educação), e o fluxo

escolar da população jovem, medido pela média aritmética do percentual de

crianças de 5 a 6 anos frequentando a escola, do percentual de jovens de 11 a

13 anos frequentando os anos finais do ensino fundamental, do percentual de

jovens de 15 a 17 anos com ensino fundamental completo e do percentual de

jovens de 18 a 20 anos com ensino médio completo (peso 2 no

renda, indicador de padrão de vida, nada mais é que a

municipal. É realizada então uma média geométrica desses

(ATLAS BRASIL, 2016). A figura 10 apresenta as faixas de

desenvolvimento humano municipal.

Faixas de desenvolvimento humano municipal

possibilita a comparação entre os municípios ao longo do

tempo, estimulando a melhoria de formuladores e implementadores de políticas

(ATLAS BRASIL, 2016).

o Atlas Brasil utiliza de uma referência empregada

o IDH - de forma a estimular o diálogo sobre

desenvolvimento humano na sociedade brasileira. É um meio de encorajar que

103

pode ser

considerado como o principal índice disponível no Atlas Brasil. Ele é uma

do IDH calculado para países, permitindo

captar a situação de desenvolvimento humano de estados e municípios

na dimensão saúde é

Longevidade, que nada mais é do que a

expectativa de vida ao nascer, calculada por método indireto, a partir dos

dados dos censos demográficos do IBGE. Na dimensão conhecimento são

educação: a escolaridade da

população adulta, medida pelo percentual de pessoas de 18 anos ou mais de

educação), e o fluxo

ido pela média aritmética do percentual de

crianças de 5 a 6 anos frequentando a escola, do percentual de jovens de 11 a

13 anos frequentando os anos finais do ensino fundamental, do percentual de

percentual de

jovens de 18 a 20 anos com ensino médio completo (peso 2 no IDH-M

renda, indicador de padrão de vida, nada mais é que a

municipal. É realizada então uma média geométrica desses

. A figura 10 apresenta as faixas de

possibilita a comparação entre os municípios ao longo do

tempo, estimulando a melhoria de formuladores e implementadores de políticas

empregada

de forma a estimular o diálogo sobre

de encorajar que

Page 107: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

104

dados socioeconômicos sejam utilizados na análise da realidade por gestores

estaduais e federais, atores municipais, pesquisadores, a sociedade civil, o

setor privado e cidadãos, de forma que haja orientação e transparência no

processo de tomada de decisão.

3.3. ANÁLISE DOS PROJETOS DO PNUD BRASIL

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no

Brasil (2015a), o primeiro passo para se executar um projeto é a identificação

do problema, avaliação e assinatura do PRODOC60. Quando um problema é

identificado e um projeto é solicitado por uma instituição brasileira, são

organizados encontros entre as equipes do PNUD, da Agência Brasileira de

Cooperação (ABC) e da instituição requisitante (Agência Executora),

determinando o problema específico a ser resolvido, a estratégia a ser adotada

e a efetiva possibilidade de contribuição ao desenvolvimento humano. Após

esses encontros, ainda segundo o Segundo o Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento no Brasil (2015a), o documento do projeto é preparado

pelo PNUD conjuntamente com a instituição requisitante, seguindo as

Diretrizes de Formulação de Projeto do PNUD. O documento do projeto é,

então, analisado pela ABC, levando em consideração as prioridades nacionais

de desenvolvimento. A instituição requisitante faz uma apresentação à ABC,

PNUD e demais parceiros em uma reunião formal do Comitê de Avaliação de

Projeto (Project Appraisal Committee - PAC), tratando dos elementos mais

relevantes do projeto, permitindo avaliar seus méritos e vulnerabilidades, riscos

e problemas esperados durante a implementação. Assim, o PRODOC é

assinado pela instituição requisitante, pela ABC e pelo PNUD (PROGRAMA

DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2015a).

60 O PRODOC é o documento que viabiliza a parceria PNUD/governo brasileiro, descrevendo a

mudança desejada em termos de produtos, resultados específicos e atividades, com seus respectivos orçamentos e cronogramas. O PRODOC é revisado e ajustado sempre que necessário, uma vez que é um instrumento vivo e de expressão de mudanças (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2015d).

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105

O segundo passo é a implementação e monitoramento do projeto.

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil

(2015a), uma vez que o PRODOC foi assinado, o projeto se inicia e passa a

ser continuamente monitorado pela Unidade de Programa do PNUD Brasil, que

aloca uma equipe para tratar diretamente com a Agência Executora,

assegurando a efetiva implementação do documento, com base na

metodologia de gerenciamento de resultados. São utilizadas ferramentas

modernas de acompanhamento e gerenciamento financeiro a fim de assegurar

o fluxo adequado de informação sobre a utilização dos recursos do projeto

durante seu ciclo de vida (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O

DESENVOLVIMENTO NO BRASIL, 2015a).

Finalmente, é realizada a revisão do projeto, e sua avaliação por

resultados e de impacto. Assim, de acordo com o Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento no Brasil (2015a), durante a reunião tripartite

de revisão do projeto (TPR), realizada periodicamente entre as Agências

Nacionais de Execução, a ABC e o PNUD são discutidas alterações no

PRODOC. São avaliados o progresso do projeto, a relevância continuada do

seu desenho, a adequação de estratégias, podendo ser proposta uma

reorientação, garantindo a flexibilidade à implementação de projetos de longo

prazo. Uma revisão final para encerramento legal é realizada ao término das

atividades. Uma avaliação por vários cortes de análise, como resultados, áreas

temáticas ou avaliação de impacto também pode fazer parte do ciclo do

projeto, conforme acordado entre as partes signatárias do documento do

projeto (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO

NO BRASIL, 2015a).

Utilizando o sistema Open UNDP (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 2015f), é possível listar todos os projetos realizados pelo PNUD

Brasil no período entre 2012 e 2014. Estes projetos somam um total de 128

sendo que somente 75 deles estavam em funcionamento durante todo o

período.

É interessante notar que, quando se consulta o número total de projetos

do PNUD Brasil, tem-se um decréscimo de 113 projetos em 2012 para 105

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106

projetos em 2013, seguido de um ligeiro acréscimo para 119 em 2014. Porém,

ao se considerar somente os projetos classificados entre os oito temas pré-

determinados pelo sistema Open UNDP, nota-se que os projetos aumentaram

de 92 em 2012 para 103 em 2013 e 116 em 2014. A figura 11 apresenta essa

relação. A linha de total representa todos os projetos realizados no período

todo para cada tema, sejam eles ativos durante todos os anos ou somente

durante um ou dois61. Os projetos não contemplam os oito temas na mesma

proporção, sendo que os projetos ligados ao crescimento inclusivo e

sustentável detêm a maior parcela (UNITED NATIONS DEVELOPMENT

PROGRAM, 2015f).

Figura 11: Projetos administrados pelo PNUD Brasil de acordo com seus temas entre 2012 e 2014

Fonte: Elaboração da autora com base nos dados do sistema Open UNDP (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f)

Quando se analisa o financiamento dos projetos, é possível perceber

que tanto o valor do orçamento quanto das despesas diminuiu durante o

61 Quando se considera o total geral de 128 projetos está descontada a duplicata de dois

projetos que foram classificados como presentes em dois temas diferentes. Todos os demais projetos só estão classificados em um dos oito temas.

0 10 20 30 40 50 60

Equidade de gênero

Mudança climática e resiliência contra desastres

Prevenção e recuperação de crises

Relação sul-sul

Governança democrática

Impacto e efetividade do desenvolvimento

Instituições responsivas

Crescimento inclusivo e sustentável

2012 2013 2014 Total

Page 110: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

107

período analisado. Essa queda chegou a 50% entre os orçamentos de 2012 e

2014. Também fica claro que o número de fontes que financiam os projetos no

PNUD Brasil não é constante, sendo que o ano de 2013 foi aquele que

apresentou o maior número de fontes diferentes, chegando a 79 (UNITED

NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f). A figura 12 apresenta essas

relações.

Figura 12: Financiamento dos projetos administrados pelo PNUD Brasil entre 2012 e 2014

Fonte: Elaboração da autora com base nos dados do sistema Open UNDP (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f)

Segundo United Nations Development Program (2015c), no que se trata

de financiamento, o Brasil se destaca como doador e receptor de recursos.

Relata que no ranking dos maiores doadores de recursos, o país ocupa a

décima segunda colocação, doando unicamente recursos não centrais que

chegaram a $59,84 milhões em 2014. Esses recursos são utilizados

localmente, fazendo com que o Brasil ocupe a terceira colocação entre as

maiores contribuições locais, ficando atrás somente da Argentina e do Peru.

Ademais, o Brasil é um grande receptor de recursos não locais, ocupando a

nona colocação em 2014 (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM,

2015c). Dessa forma, as despesas de 2014 chegaram ao valor de $78,6

milhões, provenientes de 48 fontes diferentes (entre locais – somam

aproximadamente 76% do total dos recursos – e não locais) (UNITED

NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f).

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

0

50

100

150

200

250

2012 2013 2014

Fo

nte

s d

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ina

nci

am

en

to

Em

milh

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óla

res

Orçamento Despesa Fontes de financiamento

Page 111: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

108

Dos 119 projetos administrados pelo PNUD Brasil em 2014, 15 não têm

informação geográfica; os projetos 104 restantes possuem no total 123

localizações subnacionais (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM,

2015e). Ou seja, um projeto pode não ter um marco geográfico fixo mas pode

também estar presente em mais de uma localidade.

Somente três62 dos 119 projetos não foram classificados entre os oito

temas no sistema Open UNDP. A tabela 3 apresenta os 116 projetos de 2014

que foram classificados.

Tabela 3: Projetos no Brasil em 2014 dividido entre os temas

Tema Número de

projetos Porcentagem do total de projetos

Porcentagem do orçamento

Instituições Responsivas 31 26% 18%

Crescimento Inclusivo e Sustentável

45 38% 26%

Governança Democrática 14 12% 9%

Prevenção e Recuperação de Crises

0 0% 0%

Mudança Climática e Resiliência Contra Desastres

1 1% 1%

Impacto e Efetividade do Desenvolvimento

18 15% 25%

Relação Sul-Sul 6 5% 20%

Equidade de Gênero 1 1% 0%

Fonte: Elaborada pela autora com dados de United Nations Development

Program (2015f)

62 Os projetos não classificados são: BRA/04/008 – Projeto de Modernização e Fortalecimento

Institucional da Comissão de Valores Mobiliários PRO CVM; Projeto de Apoio a Implementação Estratégica do PNUD 2013-2014; e um dos sete outputs do projeto BRA/11/015 - Sigob Umbrella (o projeto também apresenta outputs classificados como instituições responsivas e impacto e efetividade do desenvolvimento)

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109

Assim, o foco do PNUD Brasil está dividido, principalmente, entre três

temas: crescimento inclusivo e sustentável, instituições responsivas, e impacto

e efetividade do desenvolvimento; responsáveis por 79% do total de projetos e

69% dos recursos.

Vale notar que, ao comparar tanto a porcentagem de projetos em cada

um dos oito temas quanto o tamanho do financiamento que esses temas

recebem, existem diferenças entre as prioridades do Brasil e do mundo durante

o período analisado. Ainda que a maior parte dos projetos brasileiros se

concentre nos temas crescimento inclusivo e sustentável, instituições

responsivas, e impacto e efetividade do desenvolvimento, a maior parcela dos

recursos (71% do total de recursos brasileiros em 2014) estão destinados à

projetos dos temas instituições responsivas, impacto e efetividade do

desenvolvimento e relação sul-sul. Esses mesmo três temas somam somente

44% do total de recursos utilizados pelo PNUD em termos mundiais. Os

principais temas a receber recursos a nível mundial são instituições

responsivas, crescimento inclusivo e sustentável e governança democrática,

somando 74% do total de dispêndio em projetos em 2014.

3.3.1. Os projetos do PNUD Brasil e os quatro pilares de Haq

Ao considerar que cada um dos quatro pilares de Haq - equidade,

sustentabilidade, produtividade, empoderamento - cobre um fator essencial do

que é desenvolvimento humano, para que um projeto do PNUD reflita esse

conceito ele deve, imprescindivelmente, enfatizar no mínimo um dos quatro

pilares entre seus objetivos.

Dessa maneira, analisa-se a amostra de 62 projetos gerenciados pelo

PNUD Brasil no período de 2012 a 2014. Através da verificação da

documentação de cada um desses projetos, examinando sua descrição, seus

objetivos e estratégias procurou-se entender o que os formuladores previam

em termos de medidas e a sua justificação para tal. Ao mesmo tempo, os

pilares de Haq se apresentam como aspectos que deveriam estar presentes

nos projetos para que eles reflitam a ideia de desenvolvimento humano. Ou

seja, a partir do entendimento do que é pretendido atingir com cada um dos

Page 113: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS LÍVIA MACIEL … · PNUD Brasil, o Atlas Brasil e os projetos do PNUD Brasil, de acordo com o paradigma do desenvolvimento humano à luz dos pilares

110

projetos, foi feita a tentativa de enxergar os pilares de Haq dentro de cada um

deles.

Admite-se que tal processo está longe de ser ideal mas, tendo em vista

a falta de dados dos projetos (como indicadores de resultado, por exemplo) e a

abrangência da ideia de desenvolvimento humano, pode ser considerado como

apropriado. A figura 13 apresenta o enquadramento dos projetos nos quatro

pilares de Haq63.

Figura 13: Enquadramento dos projetos administrados pelo PNUD Brasil entre 2012 e 2014 nos pilares do desenvolvimento humano de Haq.

Fonte: Elaboração da autora utilizando informações do sistema Open UNDP (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f)

Todos os projetos da amostra se enquadraram em, no mínimo, um dos

quatro pilares de Haq. Esse resultado é um forte indicador de que os projetos

do PNUD Brasil refletem o conceito de desenvolvimento humano. Ainda assim,

somente dois dos projetos analisados apresentaram características que se

enquadram nos quatro pilares ao mesmo tempo: o projeto “5 Phase of Small

Grants Programe in Brazil64” e o projeto “Apoio ao desenvolvimento sustentável

63 No anexo 3 encontra-se a descrição dos 62 projetos da amostra e o seu enquadramento nos

pilares de Haq (1995). 64

Projeto número BRA/12/g32 no sistema do PNUD.

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50

Mudança climática e resiliência contra desastres

Prevenção e recuperação de crises

Relação sul-sul

Governança democrática

Impacto e efetividade do desenvolvimento

Instituições responsivas

Crescimento inclusivo e sustentável

Total

Empoderamento Produtividade Sustentabilidade Equidade

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111

dos povos e comunidades negras tradicionais”65, ambos incluídos no tema

Crescimento inclusivo e sustentável.

A descrição do projeto “5 Phase of Small Grants Programe in Brazil”, por

exemplo, atesta que seu objetivo principal é de assegurar a conservação dos

biomas do Cerrado e da Caatinga através de iniciativas comunitárias. O projeto

prevê, além da administração dos recursos naturais, a utilização de estoques

de carbono que poderão ser utilizados para melhorar o bem-estar da população

local. Dessa forma, será possível o uso mais eficiente dos recursos disponíveis,

assegurando a novos mercados à uma população antes excluída e garantindo

maior equidade. Também é esperado que as capacidades institucionais se

elevem à medida que há a necessidade de implementação, monitoramento e

avaliação das políticas utilizadas.

Dessa maneira, pode-se considerar que o projeto abrange o pilar da

sustentabilidade, uma vez busca garantir que não só para a sociedade de hoje,

mas também para gerações futuras, possam desfrutar do capital ambiental dos

biomas do Cerrado e da Caatinga. Ao colocar as iniciativas comunitárias como

agente, o projeto também se torna fonte de empoderamento.

O projeto propõe ainda o treinamento e suporte de mais de 800 famílias

e o estabelecimento e fortalecimento de redes comerciais para produtos do

cerrado e da caatinga, antecipando, como resultado, benefícios econômicos

significativos. Ademais, a utilização de estoques de carbono também eleva a

produtividade da região, uma vez que provê uma renda antes não existente.

Em última instancia, é esperada uma maior equidade, tanto decorrente do uso

mais eficiente dos recursos naturais e econômicos quanto das melhorias que o

projeto prevê às oportunidades de negócios as famílias participantes, abrindo

novas possibilidades e garantindo o acesso ao mercado.

Uma ressalva deste tipo de análise está no fato de que, muitas vezes, ao

redigir um documento, é possível utilizar-se de palavras-chave para se passar

uma noção pré-fabricada que, às vezes, não representa de fato o que o projeto

65 Projeto número BRA/10/020 no sistema do PNUD.

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112

tem como objetivo. Assim, termos como 'acesso' e 'participação' podem ser

utilizados de forma genérica para enquadrar forçosamente o projeto ao

paradigma do desenvolvimento humano. O fato de não haver documentação

disponível suficiente que apresente, continuamente, os resultados de cada

projeto impedem que se aprofunde essa questão além do que se vê na sua

descrição inicial.

Dessa maneira, ainda que o PRODOC do projeto “5 Phase of Small

Grants Programe in Brazil” perpasse pelos quatro pilares do desenvolvimento

humano propostos por Haq (1995), não é possível concluir se tal projeto

resultou em avanços concretos na busca do desenvolvimento humano. O

mesmo pode ser considerado para qualquer um dos 62 projetos analisados -

mesmo que o projeto em questão só se encaixe em um dos pilares

considerados como parâmetro. Sem a disponibilização dos processos

implementados e suas consequências econômicas, sociais, políticas e

ambientais, não se pode concluir se o projeto consiste em um esforço real ou

se é, simplesmente, um exercício de retórica.

Ainda assim, é interessante notar que, se fossem considerados somente

os projetos que promovem o crescimento econômico, ou seja, somente àqueles

projetos apoiados no princípio da produtividade, apenas 25% do total analisado

seria considerado compatível. Essa é a visão de vários modelos que se

distanciam do paradigma do desenvolvimento humano ao considerar que a

finalidade é a renda, não as pessoas. Esse fato demonstra como o paradigma

do desenvolvimento humano é mais abrangente do que a suas alternativas.

Essa abrangência se traduz em flexibilidade do conceito, tornando-o melhor

adaptável as diferenças entre culturas, formas políticas e realidades

econômicas.

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113

CONCLUSÕES

A ONU é uma organização internacional e, como tal, está inserida em

um contexto institucional. Como exposto, as instituições são o conjunto de

regras que regem a sociedade e tanto influenciam quanto são influenciadas

pelas ações de indivíduos e organizações. Dessa maneira, ao promover a ideia

de sucesso66 do paradigma do desenvolvimento humano, em um momento

internacional propício (fim da guerra fria), a ONU ganha influência na forma

com que diversas políticas públicas passam a ser efetivadas. Ou seja, a

medida que a ideia de desenvolvimento humano se alastra mundialmente, a

ação da ONU ganha importância em termos institucionais.

O PNUD é o principal organismo a lidar com a questão do

desenvolvimento dentro da ONU. Foi através do PNUD que Mahbub ul Haq

apresentou a ideia de desenvolvimento humano por meio dos relatórios de

desenvolvimento humano publicados a partir de 1990, e é através do PNUD

que um grande número de projetos de desenvolvimento são implementados

nos países membros.

É importante considerar que a própria visão do PNUD do que é

desenvolvimento se modificou durante os seus 50 anos de atividade, partindo

da concepção de desenvolvimento como eficiência - onde a técnica é o

caminho - em direção à percepção de desenvolvimento como liberdade - onde

o principal é assegurar que todos tenham a mesma habilidade para buscar os

seus objetivos individuais.

Ao analisar as diferentes formas que o programa tratou a ideia de

desenvolvimento com o passar dos anos, é possível perceber o quanto o

contexto institucional foi importante nessa concepção. Porém, com a ideia de

desenvolvimento humano, o PNUD dá um passo à frente, à medida que essa

66 Como abordado anteriormente, ideia de sucesso refere-se à concepção de McNeill

(2007).

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114

ideia passa a ser parte integrante do diálogo internacional. Ou seja, as ações

PNUD não são simplesmente moldadas pelas instituições, mas passam

também a ter função ativa para sua evolução.

A noção de desenvolvimento como centrado no indivíduo, abrangendo

dimensões que vão além da econômica traz ao desenvolvimento humano

características únicas. Essa percepção de desenvolvimento como um processo

multifacetado dificulta a determinação do que são ações que realmente

refletem para tal finalidade. A abrangência do desenvolvimento humano pode

então causar certo impasse a medida que não se consegue determinar de

forma explicita os limites que definam as ações prioritárias. É nesse sentido

que a determinação de pilares do desenvolvimento humano na concepção de

Haq (1995) (equidade, sustentabilidade, produtividade, empoderamento) torna-

se também alicerce para a análise de programas e sua identificação com tal

paradigma.

Da mesma forma, o IDH é uma tentativa de acomodar em um índice

único as três principais dimensões do desenvolvimento humano: saúde,

conhecimento e padrão de vida. Ainda que não esse índice não consiga captar

como as capacidades são adquiridas, ele consiste em um avanço à utilização

simplista do PIB como indicador de desenvolvimento (só reflete o efeito

econômico do desenvolvimento).

Porém, os relatórios de desenvolvimento humano vão além do IDH. Eles

são uma a aplicação da ideia de desenvolvimento humano centrada em

discussões sobre temas específicos. Assim, procura-se explorar mais

profundamente, uma de cada vez, as muitas faces do desenvolvimento

humano. Vale lembrar que os relatórios não expõem uma solução prática para

os desafios do desenvolvimento humano. Esse tipo de ação determinista iria

contra a abrangência global do relatório, visto que as individualidades de cada

população é de extrema importância na determinação dos resultados de

políticas públicas.

É partindo desse mesmo princípio que o PNUD salienta a necessidade

de que as nações liderem seus próprios projetos de desenvolvimento. Apesar

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de haverem diretrizes em termos globais do que é desenvolvimento humano e

alvos de alguns dos resultados finais esperados (como é o caso dos objetivos

de desenvolvimento do milênio e dos objetivos de desenvolvimento

sustentável) é através da ação individual de cada país - incluindo não só os

governos mas também a sociedade civil - que se torna possível alcançar esse

objetivo. Ademais, o alinhamento das políticas do PNUD com as políticas do

Estado garante a coordenação de ações.

Ao voltar-se para as ações do PNUD no Brasil é possível perceber, até

certa medida, o esforço de aproximar a ideia de desenvolvimento humano à

realidade do país. Com esse intuito, os três relatórios de desenvolvimento

humano no Brasil representam uma espécie de diagnóstico tanto do perfil

brasileiro quanto de seus problemas, abrindo espaço para a formulação de

políticas públicas que se enquadrem na ideia de desenvolvimento humano.

A característica adaptativa do PNUD é visível ao comparar os três

relatórios nacionais. Enquanto o primeiro relatório (publicado em 1996)

apresenta o conceito de desenvolvimento humano e tenta aplicá-lo às diversas

áreas no Brasil, os demais tentam focar-se em temas mais específicos e

trabalhar a ideia de desenvolvimento humano a seu redor. O relatório de 1996

tem um aspecto mais estatístico que os demais - atributo enfatizado pela

parceria com o IPEA em sua elaboração. Mesmo destacando questões gerais

como o regionalismo e a desigualdade, o relatório chega a ser um pouco

confuso por conter informações de diversas áreas e sugestões de políticas

públicas amplas e, até certo ponto, desconexas umas das outras.

O relatório de 2005 é mais focado. Ele apresenta o tema do racismo e

trabalha as questões de pobreza e violência de forma transversal a esse tema.

Em consequência, ao tratar de políticas públicas, o relatório é mais direto,

chegando a definir pontos essenciais para sua elaboração.

Já o relatório de 2009/2010 levanta a questão da necessidade de criar

algo que 'não fique preso à prateleira'. Ou seja, é preciso que o relatório seja

algo acessível, não só àqueles que integram os sistemas de governo mas

também a população em geral. Assim, o relatório de 2009/2010 apresenta uma

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estrutura muito mais didática do que as duas versões anteriores como meio

para aproximação da população. Em termos de políticas públicas, trata-se mais

da relação da comunidade e sua influência nas políticas de valor do que mais

precisamente a própria ação do Estado.

Enquanto é possível perceber os quatro pilares de Haq nos relatórios

nacionais de desenvolvimento humano, sendo inclusive ponto de discussão no

relatório de 1996, é interessante notar como os três relatórios expressam a

noção de empoderamento. A necessidade de participação da população no

processo de desenvolvimento humano reflete o conceito de desenvolvimento

para as pessoas e por meio das pessoas. Dessa forma, a iniciativa do relatório

de 2009/2010 de colocar até mesmo a decisão do tema 'nas mãos da

população' por meio da consulta Ponto a Ponto reflete dedicação do PNUD

Brasil a esse quesito.

Ainda assim, a necessidade de empoderamento não é refletida na

construção de políticas públicas pelo governo brasileiro. Ao analisar como os

principais temas debatidos nos relatórios nacionais foram tratados em termos

de políticas de Estado, ressalta-se que a educação foi abordada pelos três

relatórios de desenvolvimento humano nacionais. Nesse sentido, destaca-se

tanto a lei das diretrizes e bases da educação nacional de 1998 como a

instituição do Fundeb. Ademais, verifica-se avanços significativos tanto em

questões de gênero quanto sobre o racismo. Porém, a relação da iniciativa

popular na formulação de leis não se modifica no Brasil desde sua implantação

pela Constituição de 1988. Dessa maneira, ainda que o governo brasileiro

trabalhe em parceria com o PNUD em diversos projetos, o empoderamento não

é considerado como uma prioridade na formulação de políticas públicas.

Ao mesmo tempo, a disponibilização de um banco de dados à população

através do Atlas Brasil auxilia na democratização da informação. A deferência a

diversidade do Brasil, país de proporções continentais, propiciou a criação do

IDH-M, índice que adapta a metodologia do IDH, utilizado universalmente, à

realidade brasileira.

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Ademais, não se pode perceber o mesmo zelo quanto a aproximação da

população em relação aos projetos administrados pelo PNUD Brasil. Enquanto

o sistema Open UNDP lista todos os projetos realizados pelo PNUD Brasil no

período entre 2012 e 2014, parte significativa da documentação não está

disponível. Não é possível a análise dos resultados dos projetos, restando

como meio de observação somente os seus objetivos iniciais (quando há

documentação disponível).

Ao averiguar os objetivos dos projetos da amostra, observa-se o

enquadramento em, no mínimo, um dos quatro pilares do desenvolvimento

humano. Esse resultado é um forte indicio de que os projetos do PNUD Brasil

refletem o conceito de desenvolvimento humano. Ainda assim, é preciso ter

cuidado com o efeito da utilização de palavras chave como forma de forçar tal

enquadramento. Mais uma vez, uma verificação mais aprofundada não é

possível devido à falta de documentação.

É válido apontar como a amplitude do paradigma do desenvolvimento

humano se reflete nos objetivos dos projetos. Se somente crescimento

econômico fosse considerado como desenvolvimento, apenas 25% do total

analisado seria considerado compatível. Assim, a ideia de desenvolvimento

que abranja não só fatores econômicos, mas também políticos, culturais e

sociais.

Assim, o PNUD Brasil atua de forma a incentivar não só a discussão

mas também a busca do desenvolvimento humano no país. Ainda que não se

possa determinar o real alcance de seus projetos, a disponibilização de

informação através dos relatórios de desenvolvimento humano nacionais e da

plataforma Atlas Brasil é importante ferramenta para se compreender a

sociedade, passo essencial para a conquista do desenvolvimento humano.

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128

ANEXO 1

Tabela 4: Relatórios de Desenvolvimento Humano 1990-2015

Ano Relatório

1990 Concept and Measurement of Human Development

1991 Financing Human Development

1992 Global Dimensions of Human Development

1993 People's Participation

1994 New Dimensions of Human Security

1995 Gender and Human Development

1996 Economic Growth and Human Development

1997 Human Development to Eradicate Poverty

1998 Consumption for Human Development

1999 Globalization with a Human Face

2000 Direitos humanos e desenvolvimento humano - pela liberdade e solidariedade

2001 Fazendo as novas tecnologias trabalhar para o desenvolvimento humano

2002 Aprofundar a democracia num mundo fragmentado

2003 Um pacto entre nações para eliminar a pobreza humana

2004 Liberdade Cultural num Mundo Diversificado

2005 Cooperação Internacional Numa Encruzilhada

2006 Além da escassez: poder, pobreza e a crise mundial da água

2007/2008 Combater a mudança do clima: Solidariedade Humana em um mundo dividido

2009 Ultrapassar Barreiras: Mobilidade e desenvolvimento humanos

2010 A Verdadeira Riqueza das Nações: Vias para o Desenvolvimento Humano

2011 Sustentabilidade e equidade: Um futuro melhor para todo

2013 A Ascensão do Sul: Progresso Humano num Mundo Diversificado

2014 Sustentando o Progresso Humano: Redução da Vulnerabilidade e Construção da Resiliência

2015 O Trabalho como Motor do Desenvolvimento Humano

Fonte: Elaborado pela autora com base em United Nations Development Program

(2015b)

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ANEXO 2

O cálculo do IDH de acordo com a nota técnica do relatório de 2014

(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2014) é feito em duas

etapas. Primeiramente são criados indicadores de dimensão. São estipulados

valores máximos e mínimos para cada indicador de forma a normaliza-los. A

tabela abaixo apresenta os valores para cada dimensão:

Tabela 5: Dimensões do IDH

Dimensão Indicador Mínimo Máximo

Saúde Expectativa de vida (anos) 20 85

Conhecimento

Anos esperados de estudo 0 18

Anos médios de estudo 0 15

Padrão de vida RNB per capita (PPP67) 100 75.000

Fonte: United Nations Development Program (2014)

Com os valores máximos e mínimos são calculados indicadores de

dimensão:

��������� �� ������ã� =����� ����� ����� �í����

����� ���� ����� ����

O indicador de conhecimento é a média aritmética dos dois indicadores

individuais da dimensão. O IDH é formado pela média geométrica dos

indicadores normalizados de cada uma das dimensões. Assim, não é verificada

a perfeita substituibilidade entre as três dimensões de forma que que uma

performance ruim em alguma dimensão afetará diretamente todo o índice

(PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2014).

67 Renda Nacional Bruta per capita ajustada pela paridade de poder de compra.

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130

��� = ������

���

���

���

������

���

O valor máximo do índice corresponde a 1 (mais desenvolvido) e o

mínimo corresponde a 0 (menos desenvolvido). Os países estão divididos em

quartis: Grupo que registra um desenvolvimento humano muito elevado – IDH

superior ou igual a 0,800; Grupo que registra um desenvolvimento humano

elevado – Valores de IDH entre 0,700 e 0,799; Grupo que registra um

desenvolvimento humano médio - Valores de IDH entre 0,550 e 0,699; e Grupo

que registra um desenvolvimento humano baixo – Valores de IDH inferiores a

0,550 (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO,

2014).

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131

ANEXO 3

Tabela 6: Enquadramento dos projetos da amostra aos pilares de Haq (1995)

Tema Projeto

Eq

uid

ad

e

Su

ste

nta

bil

ida

de

Pro

du

tivid

ad

e

Em

po

dera

me

nto

Mudança climática e resiliência contra desastres

BRA/12/017 - Gestão De Riscos De Desastres Naturais

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/06/016 - Public & Private Parthnership

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/11/006 Por Uma Agenda Nacional De Esporte

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/11/015 - Sigob Umbrella

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/11/018 - Css Fort. Programa Alimentação Escolar

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/12/001 - Sust. Dev. Innovation Promotion

x x x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/12/008 Centro Antigo Salvador

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/12/009 - Apoio Aos Programas E Proj Prioritários Gov

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/12/015 Repactuação Dos Odm No Estado De Minas Gerais

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/13/003 - Apoio Organização Da Copa Das Confederações

x x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/13/011 - Fortalecimento Da Cnv

x

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/13/012-Universidade Corporativa

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/13/014 Sbpci

x

Impacto e efetividade do desenvolvimento

BRA/99/g32 - Hydrogen Fuel Cell Buses

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/05/018 - Avaliação E Aprimoramento Política Social

x

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/06/017 - Equity's Observatory x

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/07/018 - Rural Communities of São Francisco River

x

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132

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/07/g32 - Pims 3280 - Mangrove Ecosystems in Brazil

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/08/012 - Support for Traditional Communities

x x

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/08/023 - Biodiversity Conservation

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/08/g32 - Brazil Establishment of Pcb

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/09/g31 - Energy Efficiency in Buildings

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/10/g31 - Sucre - Sugarcane Renewable Electricity

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/10/g32 - Third National Communication to the Unfccc

x x

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/11/001 - Support to Biodiversity Convention

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/12/006 - Apoio à Gestão Descentralizada Do Suas

x

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/12/g32 5th Phase of Small Grants Programe in Brazil

x x x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/12/g71 - Institutional Strengthening (Phase VII)

x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/12/g76 - Hcfc Phase Out National Programme

x x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/12/g77 Integrated Management for the Chillers Sector

x x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/13/019 - Pngati Implementation

x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/13/020-Sust Dev Peoples&traditional Black Communitie

x x x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/13/g41 - Pims 4659 - Biodiversity Conservation

x x x

Crescimento inclusivo e sustentável

BRA/13/g42-Pims 3066-Sustainable Land Use Semi-Arid Reg

x x

Relação sul-sul BRA/10/005 – Projeto Sul-Sul De Fortalecimento Do Mspp

x

x

Relação sul-sul BRA/12/002 - Apoio Ao Desenv Do Setor Algodoeiro

x

Relação sul-sul BRA/13/008 cons.da Cooperação Técnica Sul-Sul Brasileira

x

x

Instituições responsivas BRA/03/034 - Revitalization Co National Supply

x

x

Instituições responsivas BRA/04/029 - Security for Citizenship

x

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133

Instituições responsivas BRA/04/049 - Educação Do Século Xxi

x

x

Instituições responsivas BRA/06/024 - Monitoring of Investment Projects

x

Instituições responsivas BRA/06/032 - Brazil "3 Tempos" x

x

Instituições responsivas BRA/07/004 - Discussion of New Legislation

x

Instituições responsivas BRA/10/006 – Projeto De Estruturação Da Governança Na Re

x

Instituições responsivas BRA/10/008 – Projeto De Estruturação Do Sistema De Vigil

x

Instituições responsivas BRA/11/019 - Política Migratória Brasileira

x

x

Instituições responsivas BRA/12/013 - Fortalecimento Do Acesso à Justiça

x

Instituições responsivas BRA/13/006–apoio Impl Da Estrat “A Juventude Quer Viver"

x

Instituições responsivas BRA/13/010 Strengthening State & Municipal Gov Capacit

x

Instituições responsivas BRA/13/016 Populações Estratégicas E/ou Vulneráveis Sus

x

Instituições responsivas BRA/13/017 Proteção Dos Direitos Crianças E Adol Fortale

x

Instituições responsivas BRA/13/018 Capacities: Alliance for Local Development

x

x x

Instituições responsivas BRA/14/005 - Arenanetmundial

x

Governança democrática BRA/08/021 - Transitional Justice x

x

Governança democrática BRA/09/g32 - Indigenous Lands x x

Governança democrática BRA/11/003 - Human Rights Indicators

x

x

Governança democrática BRA/11/005 - Consolidação E Expansão Do Programa Neojiba

x

Governança democrática BRA/11/008 - Economic and Consumer Rights

x x

x

Governança democrática BRA/12/018 - Promoção Da Democracia Participativa

x

x

Governança democrática BRA/14/011-Fortalecimento Do Sistema Prisional

x

Governança democrática Security With Citizenship: Brazil x

x

Prevenção e recuperação de crises

BRA/12/010 - Fortalecimento Defensoria Publica Da União

x x

Fonte: Elaboração da autora utilizando informações do sistema Open UNDP (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM, 2015f)