UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE...
Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE...
-
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR
CENTRO DE HUMANIDADES
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LINGSTICA
LEITURA DE HIPERTEXTO: ESTRATGIAS METACOGNITIVAS
USADAS POR LEITORES PROFICIENTES
Regina Cludia Pinheiro
Fortaleza Cear
2005
-
1
REGINA CLUDIA PINHEIRO
LEITURA DE HIPERTEXTO: ESTRATGIAS METACOGNITIVAS
USADAS POR LEITORES PROFICIENTES
Fortaleza Cear
2005
Dissertao apresentada ao Programa de
Ps-graduao em Lingstica da
Universidade Federal do Cear, como
requisito parcial para a obteno do grau
de Mestre em Lingstica.
Orinetadora: Prof Dr Rosemeire Selma
Monteiro
-
2
Esta dissertao foi submetida ao Programa de Ps-Graduao em Lingstica como parte dos
requisitos necessrios para a obteno do grau de Mestre em Lingstica, outorgado pela
Universidade Federal do Cear, e encontra-se disposio dos interessados na Biblioteca de
Humanidades da referida Universidade.
A citao de qualquer trecho da dissertao permitida, desde que seja feita de acordo com as
normas cientficas.
_____________________________________
Regina Cludia Pinheiro
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Rosemeire Selma Monteiro UFC
(Orientadora)
_______________________________________________________________
Prof. Dr. 1 Examinador Instituio
(1 Examinador)
_______________________________________________________________
Prof. Dr. 2 Examinador - Instituio
(2 Examinador)
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Suplente Instituio
(Suplente)
Dissertao defendida e aprovada em ___/___/_____
-
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me dar a oportunidade de me tornar um dos poucos cidados privilegiados na vida;
minha me, por ser o que foi enquanto viveu e por tudo que sou (in memoriam);
minha orientadora Rosemeire Selma Monteiro, por me ajudar a trilhar os caminhos e descaminhos dessa jornada to
dolorosa e gratificante;
A toda minha famlia, pelo apoio, pacincia e compreenso nos momentos de estresse;
Ao Prof Elicio Cavalcante, por compreender que educao de qualidade se faz com professores qualificados;
Ao Ncleo Gestor das trs escolas estaduais que contriburam com esta pesquisa, por no terem medido esforos
para envolver os professores;
FUNCAP, que tornou parte da pesquisa mais tranqila; Ao Mrio Saldanha, por conseguir resolver todos os
problemas que as tecnologias nos causam no momento em que
mais precisamos delas;
Aos professores do Programa de Ps-graduao em Lingstica da UFC e prof Ita Lerche Vieira, do Programa de
Ps-graduao em Lingstica da Universidade Estadual do
Cear, que me fizeram compreender que o conhecimento to
extenso como as guas do mar;
Marilene Barbosa, pelas valiosas contribuies durante o processo de reviso;
A todos os meus amigos, que me fizeram relaxar com as conversas e as marimbas;
Com especial gratido, a todos os professores com os quais trabalhamos, por tornarem possvel a realizao desta
pesquisa.
-
4
A realidade no um caos
mas um labirinto, um cosmos
que se oculta e temos a tarefa
de descobri-lo.
Jorge Lus Borges
Caminhante, no h
caminhos, faz-se caminhos ao
caminhar.
Antonio Machado
-
5
RESUMO
O uso de tecnologias nas sociedades modernas possibilitou a democratizao do
conhecimento e mudanas nas formas de pensar, de agir e de se comunicar. Atravs dessas
tecnologias, tivemos tambm a oportunidade de interagir com um novo modo enunciativo, o
hipertexto. Este trabalho compara a leitura do texto impresso com a leitura do hipertexto com
relao s estratgias metacognitivas de leitores proficientes. Para fundamentar nossa
pesquisa, apresentamos teorias de leitura, sob uma perspectiva psicolingstica, e algumas
pesquisas realizadas sobre hipertextos. Os sujeitos com os quais trabalhamos, a fim de
testarmos nossos pressupostos, foram quinze professores do Ensino Mdio que demonstraram
ser leitores proficientes em texto impresso e que tinham experincia com leitura na Internet. A
tcnica utilizada para verificarmos as estratgias dos sujeitos ao ler hipertextos foi o protocolo
verbal, na qual os leitores verbalizaram seus pensamentos simultaneamente ao processo de
leitura. Os resultados da pesquisa nos mostraram que estratgias utilizadas para a
compreenso de textos impressos foram tambm usadas na leitura de hipertextos. Porm,
nesse novo modo de enunciao, algumas dessas estratgias possuem especificaes, devido
ao seu formato. Observamos ainda outras estratgias utilizadas pelos leitores ao ler os
hipertextos, tais como, fazer leitura previewing da pgina inicial, procurar textos mais
compactos, observar o tamanho do texto antes de l-lo, preferir textos com imagens e desistir
da leitura de alguns fragmentos dos hipertextos. Os resultados dessa pesquisa contribuem para
a criao de um modelo de leitura que contemple tambm a compreenso de hipertextos.
-
6
ABSTRACT
The use of technologies in modern society made possible the democratization of knowledge
and caused many changes in the ways we think, act, and communicate. Through these
technologies, we also had the opportunity to interact with a new way of enunciating: the
hypertext. This work compare the printed text reading with hypertext reading in relation to
metacognitive strategies from proficient readers. Our theoretical bases are psycholinguistic
theories, as well as some researches on the specific kind of texts we investigate. With the
purpose of testing our presupposition, we worked with fifteen teachers from Ensino Mdio,
who displayed to be proficient readers when read printed text and who had experience with
reading on the Internet. The technique used to verify the strategies the teachers carried out
was the verbal protocol: the readers verbalized their thoughts as they read. The results showed
that the strategies used for reading printed texts were the same used to understand hypertexts.
However, in the reading of the latter, some of those strategies have particular characteristics,
due to the format of the hypertext. Other strategies used by the subjects who took part in our
research were also observed, while they read hypertexts, like to read like previewing the
homepage, to look for smaller texts, to look at the text size before to read, to prefer text with
picture, to give up reading some hypertexts fragments. The results contribute to creation of a
reading model that contemplate the hypertext comprehension too.
-
7
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Distribuio dos sujeitos conforme a rea de atuao e o sexo ...................
66
Quadro 2 Distribuio dos sujeitos conforme a idade .................................................
67
Quadro 3 - Distribuio dos sujeitos conforme sua formao ........................................
67
Quadro 4 Hbitos de leitura dos participantes .............................................................
68
Quadro 5 Jornais e revistas lidos pelos participantes ...................................................
68
Quadro 6 Temas de maior interesse para os participantes ...........................................
69
Quadro 7 Nvel de conhecimento sobre programas de informtica .............................
69
Quadro 8 Freqncia de uso da Internet ......................................................................
70
Quadro 9 O que os participantes buscam na Internet ...................................................
70
Quadro 10 Distribuio do nvel de compreenso leitora no teste de proficincia ......
71
Quadro 11 Protocolos estabelecidos pelos sujeitos ......................................................
84
Quadro 12 Quantidade de vezes que cada propsito foi mencionado nos protocolos .
84
Quadro 13 Comentrios que evidenciam a modificao da leitura devido a
variaes em seu propsito ........................................................................
88
Quadro 14 Textos ou links importantes (ou no) identificados ou abandonados pelos
sujeitos ........................................................................................................
91
Quadro 15 Idias importantes identificadas pelos sujeitos nos textos selecionados.....
92
Quadro 16 Relatos que evidenciam a ativao do conhecimento prvio .....................
101
Quadro 17 Comentrios que evidenciam uma avaliao do leitor em relao
clareza, completude e consistncia do texto .........................................
108
Quadro 18 Comentrios que evidenciam uma avaliao do leitor em relao
clareza, completude e consistncia dos links ........................................
108
-
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Pgina inicial do site www.cienciaonline.org ................................................
76
Figura 2 Pgina inicial e os dois links principais do site www.recicloteca.org.br .......
77
Figura 3 Pgina inicial do site www.historianet.com.br ..............................................
78
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 Estratgias usadas na compreenso de textos impressos ...............................
136
Anexo 2 - Roteiro de sondagem .....................................................................................
137
Anexo 3 Instrumento de verificao do nvel de compreenso leitora ........................
138
http://www.cienciaonline.org/http://www.recicloteca.org.br/http://www.cienciaonline.org/
-
9
LISTA DE ABREVIATURAS E SMBOLOS
(Baseada em Ochs, 1979 e Gaskill, 1980, citados por Cavalcanti, 1989)
((FR)) fala rindo (em tom de ironia)
((LA)) l em voz alta
((LB)) l em voz baixa (audvel)
((LS)) l silenciosamente
Ps pausa (macropausa)
((RI)) ri
((RM)) resmunga (como se falasse consigo mesmo)
((VC)) fala com a pesquisadora em voz alta
( . ) pausa curta (micropausa)
(...) parte suprimida do texto ou do protocolo
(?) o pesquisador no compreende o que o sujeito falou
-
10
SUMRIO
RESUMO........................................................................................................................
ABSTRACT ...................................................................................................................
LISTA DE QUADROS ..................................................................................................
05
06
07
LISTA DE FIGURAS .................................................................................................... 08
LISTA DE ANEXOS ..................................................................................................... 08
LISTA DE ABREVIATURAS E SMBOLOS............................................................... 09
INTRODUO ............................................................................................................ 12
CAPTULO 1
1 FUNDAMENTAO TERICA .................................................................. 1. 1 Concepo de leitura .......................................................................................
1. 2 As estratgias metacognitivas de leitura .........................................................
1. 3 O ensino de estratgias de leitura ...................................................................
1. 4 A revoluo eletrnica e as formas de ler e escrever ......................................
1. 5 Histria, concepo e pesquisas em hipertexto ...............................................
1. 6 Hipertexto e texto impresso: um s concepo ...............................................
1. 7 Caractersticas do hipertexto e suas implicaes para o processamento da
leitura ..............................................................................................................
17
18
28
37
40
43
54
57 CAPTULO 2
2 METODOLOGIA ........................................................................................... 2. 1 A seleo dos sujeitos ......................................................................................
2. 2 O perfil dos sujeitos .........................................................................................
2. 3 Situao experimental .....................................................................................
2. 4 A escolha dos hipertextos ................................................................................
63
63
66
71
74
CAPTULO 3
3 IDENTIFICAO DAS ESTRATGIAS METACOGNITIVAS NA LEITURA DE HIPERTEXTOS ..................................................................
3. 1 Identificao das estratgias utilizadas pelos sujeitos na leitura de
hipertextos ....................................................................................................
3.1.1 Estabelecer os propsitos de leitura ............................................................. 3.1.1.1 Consideraes sobre a estratgia estabelecer os propsitos de leitura ........
3.1.2 Modificar a leitura devido a variaes no propsito ....................................
3.1.2.1 Consideraes sobre a estratgia modificar a leitura devido a variaes
no propsito ..................................................................................................
3.1.3 Identificar idias importantes ....................................................................... 3.1.3.1 Consideraes a respeito da estratgia identificar idias importantes .........
3.1.4 Usar a estrutura lgica .................................................................................. 3.1.4.1 Consideraes sobre a estratgia usar a estrutura lgica ............................
3.1.5 Ativar o conhecimento prvio ...................................................................... 3.1.5.1 Consideraes sobre a estratgia ativar o conhecimento prvio ..................
3.1.6 Avaliar o texto pela clareza, completude e consistncia .............................
3.1.6.1 Consideraes a respeito da estratgia avaliar o texto pela clareza,
completude e consistncia ............................................................................
79
81
81
84
85
88
88
92
92 97
98
104
104
108
-
11
3.2 Anlise de outras estratgias utilizadas pelos sujeitos para a compreenso
de hipertextos ...............................................................................................
3.2.1 Estratgias utilizadas pelos hiperleitores com o objetivo de no perder tempo ............................................................................................................
3.2.1.1 Consideraes sobre as estratgias utilizadas pelos hiperleitores com o
objetivo de no perder tempo .......................................................................
3.2.2 Utilizar-se de recursos no-verbais para facilitar a compreenso de
hipertextos ....................................................................................................
3.2.2.1 Consideraes sobre a estratgia utilizar-se de recursos no-verbais para
facilitar a compreenso de hipertextos ........................................................
3.2.3 Desistir da leitura de alguns sites ou links .................................................... 3.2.3.1 Consideraes sobre a estratgia desistir da leitura de alguns sites ou
links...............................................................................................................
109
109
115
115
119
119
122
CONSIDERAES FINAIS .......................................................................................
124
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .......................................................................
130
ANEXOS ....................................................................................................................... 135
-
12
INTRODUO
grande o nmero de pesquisas realizadas a respeito do processamento da leitura,
visto que o ato de ler pr-requisito para a aprendizagem em todas reas do conhecimento e
tambm fundamental para se viver numa sociedade letrada. Para que haja leitura, necessrio
o processamento de duas etapas: a decodificao e a compreenso do texto. O processo de
decodificao, ao qual se d maior nfase no incio da alfabetizao, consiste em reconhecer
os grafemas e suas relaes para decifrar palavras. Esse processo passa a ser automtico
proporo que os leitores vo se tornando mais maduros. A compreenso, por sua vez, a
internalizao que o leitor faz do texto, tendo como base os propsitos de sua leitura, seus
conhecimentos prvios e a informao que o texto apresenta.
As sociedades letradas cada vez mais exigem a necessidade de saber ler, tendo em
vista que o material escrito disponvel cerca todos os ambientes, gerando grandes dificuldades
para aqueles que no possuem esse conhecimento. Assim, para um analfabeto, pegar um
nibus ou sacar seu salrio em um caixa eletrnico pode ser uma tarefa que ele s pode
realizar com o auxlio de outra pessoa. Podemos comparar um analfabeto em um mundo
letrado a um deficiente visual que no consegue ver parte do mundo sua volta. Porm,
apesar de muitas pesquisas, materiais de divulgao e a preocupao por parte de alguns
governantes, a leitura e continua sendo um grande problema nas escolas brasileiras.
Com a insero das Novas Tecnologias de Informao e Comunicao (NTIC) nas
sociedades modernas, a exigncia da capacidade de compreender textos ainda maior. Faz-se
necessria, portanto, a urgncia do letramento digital, que consiste no uso de prticas sociais
mediadas pela leitura e/ou escrita, atravs da interao com o computador ou com outra
tecnologia eletrnica do mundo contemporneo. Essa interao possibilitou o surgimento de
-
13
uma srie de gneros textuais digitais, como o e-mail, o bate-papo virtual, o blog etc. Nesse
contexto, emergiu um novo formato de texto, o hipertexto, definido como uma organizao
enunciativa no-linear, veiculada via mdia digital, que congrega informaes verbais, visuais
e sonoras e que permite uma leitura totalmente singular e multissemitica, na qual o leitor
pode interagir com o autor e/ou modificar o texto (Landow, 2002; Xavier, 2002; Lvy, 2003
entre outros). Assim, surge a necessidade de descobrir como os leitores apreendem o sentido
nesse novo modo enunciativo.
Para tanto, esta pesquisa tem como objetivo geral investigar se as estratgias
metacognitivas de leitura analisadas por Baker & Brown (1984) para a compreenso de textos
impressos (ANEXO A) so tambm usadas por leitores proficientes para a compreenso de
hipertextos. Os objetivos especficos foram assim delimitados: verificar se o leitor de
hipertextos monitora suas estratgias para alcanar seus objetivos de leitura, investigar que
estratgias metacognitivas de leitura so mais exigidas para a compreenso de hipertextos e
observar se os recursos no-verbais (imagens, sons etc.) presentes no hipertexto facilitam a
compreenso durante o processo de leitura. Estamos considerando, neste trabalho, como
estratgias metacognitivas de leitura, as operaes realizadas conscientemente pelo leitor, a
fim de chegar compreenso do texto lido.
Recentemente, muitas pesquisas tm sido desenvolvidas a respeito de hipertextos,
sob duas principais perspectivas. A primeira, centrada no sistema, tem como foco a inveno
e implementao das tcnicas de criao do hipertexto. A segunda foca a interao entre o
sistema e o usurio, as habilidades requeridas para usar o sistema e os efeitos dos sistemas na
atividade de compreenso leitora das pessoas. Esta pesquisa, centrada na segunda perspectiva,
sustenta-se nas teorias psicolingsticas, tendo por base as pesquisas j existentes sobre leitura
de textos tradicionais impressos, a fim de compreender como se d o processamento do
hipertexto.
-
14
Acreditamos que este estudo venha a preencher algumas lacunas deixadas pelas
pesquisas realizadas e contribuir para que as instituies de ensino tenham parmetros, a fim
de conduzir o ensino da leitura do hipertexto, criando estratgias pedaggicas adequadas para
esse novo contexto, pois a questo atual relacionada aos estudos e pesquisas nessa rea no
mais a insero dessas tecnologias no ensino, tendo em vista a grande popularizao da
Internet e o acesso ao hipertexto, produto dessa tecnologia. As maiores reflexes referentes a
esse aspecto recaem no intuito de descobrir como se compreende o hipertexto, que estratgias
os leitores usam para processar suas informaes e em que essas estratgias se diferem das
usadas em textos impressos, questes que se constituem focos de nossa pesquisa.
Conforme mudam os suportes de escrita, mudam tambm os modos de
processamento da leitura e os comportamentos do leitor. Assim, por ter o hipertexto um
formato diferente do texto impresso e os diversos links possibilitarem uma leitura no-linear,
delimitamos como problematizao nesta pesquisa a necessidade de investigar se as
estratgias metacognitivas usadas para a compreenso do texto impresso (ANEXO A) so
utilizadas para a compreenso do hipertexto e se os objetivos de leitura definidos no incio ou
antes da leitura do hipertexto permanecem e so atingidos ou se modificam no decorrer da
leitura. ainda uma questo importante saber que contribuio os recursos no-verbais
(imagens animadas e inanimadas, sons, grficos etc.) do ao processamento do hipertexto.
Levando em considerao nossa prpria experincia como leitora de hipertextos,
temos os seguintes pressupostos para esta pesquisa:
As estratgias metacognitivas de leitura para a compreenso do hipertexto no so as
mesmas usadas para a compreenso do texto impresso tradicional;
possvel prever uma relao entre a manuteno dos propsitos do leitor e o nmero
de links contidos no hipertexto: quanto maior o nmero de links que o sujeito acessa,
mais o leitor muda seus objetivos;
-
15
Os recursos no-verbais (imagens-animadas e inanimadas-, sons, grficos, etc.)
facilitam a compreenso do hipertexto.
Assim, para apreendermos como se d o processamento da leitura do hipertexto e
sabermos que estratgias o hiperleitor usa para sua compreenso, escolhemos uma
metodologia que nos permitisse ter acesso ao pensamento do sujeito. Para tanto, utilizamos a
tcnica de protocolo verbal, que consiste na verbalizao dos pensamentos simultaneamente
ao processo da leitura, por acreditarmos que esta seja a metodologia mais direta para detectar
processos inconscientes da mente.
Os leitores proficientes selecionados para participar de nosso experimento foram
quinze professores do Ensino Mdio de escolas pblicas estaduais que tinham habilidades no
manuseio do computador e possuam o hbito de leitura na Internet. Para selecionar os
sujeitos com esse perfil, utilizamos um roteiro de sondagem (ANEXO B) e um teste de
proficincia leitora (ANEXO C), aplicados em trs escolas, situadas no Serto Central do
Estado do Cear.
Para nossa surpresa, os resultados da pesquisa comprovaram que algumas
estratgias usadas na leitura de textos impressos e selecionadas para verificao nesta
pesquisa foram tambm utilizadas pelos participantes para a compreenso de hipertextos.
Porm, verificamos que essas estratgias apresentam algumas especificaes devido ao
formato do hipertexto. Analisamos ainda outras estratgias utilizadas pelos sujeitos para
compreender os hipertextos.
Este trabalho est dividido em introduo, trs captulos, representados,
respectivamente, por fundamentao terica, metodologia e anlise de dados e as
consideraes finais.
No captulo 1, apresentamos algumas discusses tericas relacionadas s
concepes de leitura, pesquisas sobre estratgias usadas pelos leitores para a compreenso de
-
16
textos e um breve relato sobre as transformaes nas formas de ler e escrever com a insero
das novas tecnologias na sociedade. A seguir, mostramos como surgiu o hipertexto,
apresentando algumas pesquisas que abordam esse tema. Por fim, apresentamos as
caractersticas do hipertexto e suas implicaes para o processamento da leitura.
Em seguida, no captulo de metodologia, explicitamos os procedimentos
empregados para identificar as estratgias metacognitivas usadas para a compreenso de
hipertextos, descrevemos como se deu a seleo dos sujeitos participantes da pesquisa, o
perfil destes e como foram escolhidos os hipertextos utilizados na pesquisa.
No captulo 3, analisamos os dados coletados, observando, atravs de exemplos,
se as estratgias metacognitivas usadas para compreender o texto impresso (ANEXO A)
foram tambm utilizadas pelos leitores participantes da pesquisa para a compreenso de
hipertextos. Analisamos ainda outras estratgias que os hiperleitores utilizaram para a
compreenso de hipertextos.
Nas consideraes finais, resgatamos as descobertas realizadas na anlise de
dados, refletindo sobre suas implicaes no ensino.
-
17
1 FUNDAMENTAO TERICA
A insero das Novas Tecnologias de Informao e Comunicao (NTIC) nas
sociedades modernas tem acarretado muitas transformaes em seus diversos setores. Novas
formas de pensar, de comunicar, de acessar informaes e de perceber o conhecimento esto
se impondo. Essas tecnologias possibilitaram a criao da Internet, trazendo, para o homem
moderno, transformaes no seu modo de vida, inclusive nas formas de ler e escrever os
sistemas alfabticos. Em virtude disso, alguns gneros textuais, como home pages, chats e e-
mail, surgiram pela utilizao desse novo suporte, a tela do computador. Nesse novo contexto,
emergiu uma nova forma de enunciao discursiva, o hipertexto, propiciando, ao usurio da
Internet, novas maneiras de processar a leitura. No se trata de um gnero, mas de um modo
enunciativo que pode abranger inmeros gneros, como as home pages institucionais ou
pessoais, os contos escritos eletronicamente, entre outros.
Considerando a diversidade de textos que circulam na sociedade e os objetivos de
leitura de cada leitor, podemos afirmar que os leitores usam estratgias diferenciadas para
compreend-los. Neste caso, podemos citar como exemplos os diferentes conhecimentos
requeridos dos leitores para a leitura de uma carta a um amigo e a leitura de um artigo
cientfico, ou os diferentes processos exigidos na leitura de um texto impresso e de um texto
publicado na Internet em formato de hipertexto.
Neste trabalho, apresentaremos estudos relacionados leitura como processo e s
estratgias metacognitivas usadas para sua compreenso, considerando, para esse fim, teorias
de leitura, diversas pesquisas empreendidas e alguns aspectos de interveno pedaggica,
tendo em vista que a aprendizagem pode ocorrer atravs da interao com a mquina, sendo o
ensino formal o principal agente proponente dessa aprendizagem. Para abordar a questo da
concepo de leitura, tivemos como base as obras de Goodman (1976 e 1990), Smith (1989) e
-
18
DellIsola (2001). No que se relaciona ao aspecto das estratgias de leitura, nos baseamos em
Brown (1980), Baker & Brown (1984), Leffa (1996), Kleiman (1996, 2000), Kato (1999),
Olge (s/d) e Giasson (2000). Esse grupo aborda as estratgias metacognitivas de leitura
utilizadas em textos impressos, o que comprova a necessidade de pesquisas que retratam as
estratgias metacognitivas tambm utilizadas para a compreenso desta nova forma de
enunciao, que o hipertexto. Sob uma outra perspectiva, procuramos apresentar algumas
reflexes a respeito das transformaes ocorridas nos processos de ler e escrever. Para esta
reflexo, as obras de Smith (1999), Chartier (1999, 2002), Alvarez (2001), Ferreiro
(2001,2002) nos serviram de embasamento. Finalmente, buscamos alguma bibliografia
relacionada leitura e escritura envolvendo novas tecnologias, principalmente, o hipertexto.
Nesse grupo, encontramos algumas concepes diferentes, dentre as quais destacamos as de
Marcuschi (2000), Ramal (2000), Braga (2003), Costa (2000), Xavier e Santos (2000), Pereira
(2001), Xavier (2002), Landow (2002), Koch (2002), Possenti (2002), Lvy (2003) e Dias-da-
Silva & Paizan (2003).
1.1 Concepo de leitura
Apesar da compreenso de sentidos de textos mobilizar aspectos de diversas reas
do conhecimento, como cincias sociais, psicologia, filosofia etc., as pesquisas cientficas
fazem recortes para realizar seus estudos. Assim, este trabalho, sob a perspectiva das cincias
da cognio, se preocupa somente com as estratgias metacognitivas mobilizadas pelos
leitores de hipertextos, a fim de chegar sua compreenso.
Iniciaremos este subitem abordando a concepo de leitura que servir de base
terica para nossa pesquisa. Apresentaremos as teorias de Goodman (1976 e 1990) e Smith
-
19
(1989), na perspectiva da Psicolingstica, e, por fim, a pesquisa de DellIsola (2001), sob o
ponto de vista da Sociolingstica.
Goodman (1976, 1990) desenvolveu trabalhos sobre leitura quando a teoria
dominante nos Estados Unidos era uma concepo baseada no senso comum de que aprender
a ler era um processo preciso que envolve percepo seqencial, detalhada e exata, em que o
foco centrava-se na identificao de letras e palavras, soletrando modelos e longas unidades
de linguagem (1976: 491). Contrapondo-se a essa concepo, Goodman percebe a leitura
como um jogo psicolingstico de adivinhaes. Nesse jogo, o leitor seleciona, com base nas
suas expectativas, o menor nmero de pistas que devem ser o mais produtivas possveis. To
logo essa informao processada, ele toma decises para confirmar, rejeitar ou refinar o
progresso da leitura. A concepo de leitura de Goodman similar a de Smith, porm, aquele
discorda deste quando afirma que h um nico processo de leitura para ler qualquer tipo de
texto, independentemente de sua estrutura e do propsito que tenha o leitor no momento de
ler (Goodman:1990:14). Esse processo constitui-se de quatro ciclos: tico, perceptual,
gramatical e de significado. Porm, a ateno est focalizada no significado e tudo que estiver
alm disso s recebe ateno plena quando houver dificuldades no significado.
No ciclo tico, o crebro controla o olho e o dirige para que busque aquilo que
espera encontrar (Goodman, 1990:18).
O ciclo perceptual faz com que tenhamos a iluso de termos visto todos os detalhes
grficos do texto, uma vez que este compreendido.
O ciclo gramatical faz com que o leitor seja capaz de utilizar elementos-chave de
oraes, nexos, sufixos gramaticais e pontuao para predizer pautas sintticas e dos perodos
quando comea a process-los.
O ciclo semntico o mais importante de todo o processo e todos os outros funcionam
em funo dele.
-
20
Assim, as estratgias usadas nos ciclos acima so realizadas com o propsito de
encontrar significado no texto que construdo enquanto se l, mas tambm reconstrudo,
uma vez que devemos acomodar continuamente nova informao e adaptar nosso sentido de
significado em formao (Goodman,1990:19). No entanto, o que o leitor compreende da
leitura depende daquilo que ele j sabe. Por isso, seu propsito, sua cultura social, seu
conhecimento prvio, seu controle lingstico, suas atitudes e seus esquemas conceptuais so
muito importantes para o xito do processo. Por possuir todas essas informaes, os leitores
so capazes de antecipar o texto, utilizando estratgias de predio para adivinhar o que vir
no texto e qual ser seu significado. Alm de predizer, selecionam aquelas informaes que
so mais teis e fazem inferncias para compreender o que no est explcito no texto ou o
que poder vir posteriormente, utilizando os conhecimentos que j possuem. Assim, como a
seleo, as predies e as inferncias so estratgias bsicas de leitura. Os leitores esto
constantemente controlando sua prpria leitura para assegurar-se de que tenha sentido
(op.cit., 1990:17).
As pesquisas de Goodman (1976) revelam que os leitores usam a estratgia de
identificao de palavras, atravs da relao letra-som somente quando necessitam, devido ao
desconhecimento de algumas palavras. Outra revelao das pesquisas que o significado de
palavras que eles nunca ouviram pode ser conseguido com a ajuda do contexto. Assim,
diferentemente do ponto de vista do senso comum que considera o desvio como um erro, para
Goodman (op. cit.), um erro no indica que um leitor no sabe ou que seja desatento na
aplicao de seu conhecimento. Os leitores, muitas vezes, cometem desvios na leitura que no
modificam a construo do sentido e usam substituies com a mesma funo gramatical, por
isso, no h razes para corrigi-los. Insistir para que eles identifiquem cada palavra poder
faz-los desviar sua ateno do significado para preocupar-se com informaes gramaticais
desnecessrias que no fazem diferena para a compreenso da leitura.
-
21
A seguir, resumiremos o modelo de leitura de Goodman (1976) em que apresenta
os processos como um jogo psicolingstico de adivinhaes.
O leitor escaneia a pgina da direita para esquerda e para baixo linha a linha. Esse
processo de leitura chamado por outros autores, como Kato (1999) de top-down;
Ele fixa os olhos em um ponto, sendo que alguns sinais grficos ficaro no foco
central e outros na periferia do foco;
A partir disso, inicia o processo de seleo, baseando-se em pistas grficas, guiado
por seus conhecimentos anteriores e estratgias aprendidas;
Forma uma percepo, usando essas pistas e suas pistas anteriores que so
parcialmente, o que ele v e o que espera ver;
Procura na memria por pistas sintticas, semnticas e fonolgicas que estejam
relacionadas. Isso pode lev-lo a selecionar mais material grfico e reformular sua imagem
perceptual;
Nesse ponto, ele faz uma adivinhao ou uma tentativa de escolha consistente com
as pistas grficas. A anlise semntica o conduz a uma decodificao parcial que pode ser
possvel. Esse significado armazenado na memria de curto termo enquanto a informao
processada;
Se a adivinhao no se confirmar, ele checa a percepo de entrada e tenta
novamente. Se mais uma vez a adivinhao no se confirmar, volta ao texto para adquirir
mais pistas grficas;
Se ele pode fazer uma escolha decodificvel, ele testa se ela semntica e
gramaticalmente aceitvel no contexto desenvolvido por escolhas prvias e decodificao.
Se a tentativa de escolha no aceitvel semntica ou sintaticamente, ento ele volta
a escanear a pgina e localiza o ponto que ficou inconsistente semntica ou sintaticamente.
-
22
Quando esse ponto encontrado, reinicia a partir daquele ponto. Se nenhuma inconsistncia
identificada, ele l, buscando mais pistas para harmonizar a situao que no estava adequada;
Se a escolha aceitvel, a decodificao confirmada, o significado assimilado
com o significado anterior e o conhecimento acomodado. Se necessrio, expectativas so
formadas sobre grficos de entrada e significado que viro;
Ento o ciclo continua.
Nesse jogo psicolingstico de adivinhaes, a ordem das aes desenvolvidas
pelo leitor no segue a mesma seqncia mostrada anteriormente.
Smith (1989), que tem a mesma concepo de Goodman (1976, 1990), postula
que, assim como a identificao de palavras no requer a identificao prvia de letras,
tambm a compreenso no requer a identificao prvia das palavras, ou seja, a identificao
imediata do sentido to independente da identificao das palavras individuais quanto a
identificao imediata das palavras independente da identificao de letras individuais (p.
180). Se a seqncia de palavras for significativa, o significado que auxilia os leitores na
identificao de letras ou palavras individuais e no o contrrio. Para isto, os leitores utilizam
a sua informao no-visual, as informaes do contexto frasal (uma palavra ajuda na
identificao de outras) e a estratgia de eliminao prvia para reduzir as alternativas que
no caberiam naquele contexto. Esse tipo de leitura comprovado quando observamos
leitores experientes trocando palavras por outras totalmente diferentes daquelas que esto
impressas, mas com significados semelhantes, confirmando a prioridade do sentido sobre a
identificao individual de palavras. Porm, agindo desse modo, os leitores, em alguns casos,
podem usar palavras que estabeleam diferena de sentido. O bom leitor, percebendo o
engano, volta atrs e o corrige. Entretanto, existem ocasies em que a identificao mediada
do sentido pode ser tentada, envolvendo a identificao de palavras individuais antes da
compreenso de uma seqncia significativa de palavras como um todo (p. 195). Nesse caso,
-
23
em que a passagem compreensvel e somente uma palavra desconhecida, o significado do
todo pode ser usado para fornecer um possvel significado para essa palavra, pois extramos
um sentido para as palavras a partir do contexto em que esto inseridas, utilizando o que j
se conhece para compreender e aprender o que nos estranho (p. 196). Assim, as crianas
que lem lentamente e em voz alta, tentando identificar as palavras uma de cada vez, como se
cada palavra no tivesse nada a ver com as outras, sobrecarregam a memria de curto prazo e
colocam o significado como ltima preocupao. Por isso, quando se ensina na escola a
decodificar e no a adivinhar, est, na verdade, se ensinando o contrrio do que necessrio
para a compreenso.
Para Smith (op. cit.), o leitor lana-mo de questes implcitas sobre o significado
e no sobre as letras ou palavras, juntando aquilo que j sabe com o que o texto informa
explicitamente, tornando a leitura um processo ativo. O sentido construdo em um texto
depende ento do conhecimento anterior do leitor e daquilo que ele consegue perceber atravs
dos implcitos deixados pelo escritor. Essa informao no-visual utilizada no texto para que
o leitor possa tomar decises para construir o sentido. Assim, a informao no-visual pode
ser empregada para reduzir a incerteza do leitor com antecedncia e para limitar a
quantidade de informao visual que deve ser processada (p. 188).
O autor reconhece a dificuldade de se definir leitura, pois essa definio depende
do que ocorre durante o processo, visto que este se modifica dependendo do texto que se est
lendo e do objetivo do leitor. A compreenso relativa; depende de se obterem respostas
para as questes que esto sendo formuladas. Um significado particular a resposta que o
leitor obtm para determinada questo (p.201). Sendo assim, numa leitura significativa, no
necessrio perceber tudo o que se l. Alguns pequenos detalhes podem ser saltados porque so
irrelevantes ou desnecessrios para os interesses do leitor. Porm, reconhece que leitura
pensamento e afirma que esta no diferente do pensamento que realizamos em outras
-
24
atividades, como falar, compreender o que algum est dizendo ou extrair sentido do mundo.
Para ele, uma imensa vantagem da leitura sobre o pensamento em outras circunstncias o
controle que esta oferece sobre os eventos. Os leitores podem fazer pausa no meio de uma
experincia para reflexo. Os leitores podem reviver experincias to freqentemente quanto
desejarem, e examinarem-nas a partir de muitos pontos de vista (op. cit. p. 214).
Para o autor, a primeira compreenso que todo aprendiz deve ter a fim de se
tornar um leitor (ou um escritor) a de que a linguagem escrita, por si mesma, faz sentido
uma compreenso nem sempre fcil de ser alcanada nos ambientes educacionais (Smith,
1989:236). Assim, a compreenso da linguagem escrita est relacionada compreenso de
suas funes sociais. preciso levar em conta, principalmente, sua funo de representao.
Quando as crianas tentarem compreender a leitura em situaes significativas nas quais
possam gerar e testar hipteses, adquiriro cada vez mais informao no-visual e experincia
na utilizao desta e com muito mais eficincia. Este aprendizado inclui a compreenso das
finalidades e convenes do texto, porm no est baseado na instruo formal porque esta
habilidade no pode ser ensinada de modo explcito, mas pode ser demonstrada. Nesse
contexto, as previses so muito importantes para a compreenso. Smith (op.cit.) divide as
previses em globais e focais. As primeiras dizem respeito s expectativas sobre o contedo,
o tema ou o tratamento de um texto ou livro, a partir do ttulo ou da indicao dada por outra
pessoa. As previses focais surgem em um nvel mais baixo, relacionadas s palavras,
sentenas ou pargrafos e geralmente so demandadas pelas previses globais. Assim,
enquanto lemos um romance, por exemplo, podemos estar preocupados com um nmero de
previses bastante diferentes ao mesmo tempo, algumas globais, que podem persistir atravs
de toda a extenso do livro, e outras mais focais que podem surgir e serem descartadas em
uma nica fixao (p.203).
-
25
Com relao fluncia em leitura, Smith (1989) reconhece que, em alguns casos,
possvel um leitor iniciante ler algo com facilidade e tambm possvel encontrar algo que
um leitor proficiente tenha dificuldade em ler, existindo a possibilidade de leitura fluente e
difcil para ambos. O que os diferencia a familiaridade com diferentes espcies de texto.
Assim, quanto mais o leitor experienciar a leitura de diversos textos, maior ser sua
probabilidade de ser proficiente. Porm, aspectos como a informao no-visual inadequada
por parte do leitor, a maneira como o texto foi escrito e presses ou ansiedades durante a
leitura, podem causar dificuldades at mesmo para leitores experientes, fazendo com que estes
leiam como leitores iniciantes. Discordamos desta afirmao do autor, pois como confirmam
as pesquisas de Baker & Brown (1984), comentadas no prximo subitem, os leitores
experientes tendem a usar estratgias para superar lacunas de compreenso que no foram
detectadas em leitores iniciantes. Para Smith (1989:211), a leitura fluente est baseada em
uma especificao flexvel de intenes e expectativas, que mudam e se desenvolvem como
uma conseqncia da progresso do leitor ao longo do texto. Por isso, facilitar o uso da
informao no-visual tambm pode tornar a leitura compreensvel. Alm do mais, para que
as crianas aprendam a ler necessrio que elas compreendam que a escrita significativa e
diferente da fala. As crianas que no possuem esses conhecimentos tendem a achar que a
leitura absurda. Sobre o primeiro conhecimento, o autor se refere ao fato de as crianas
formarem um sentido para a informao impressa e afirma que elas esto imersas na
linguagem escrita ao se depararem com a riqueza de materiais escritos que podem ser
encontradas em diversos lugares. Para ele, a escola no apenas deixa de ensinar esses
conhecimentos, mas tende a inibi-los em alguns casos. Reproduzimos, a seguir, dois de alguns
aspectos fundamentalmente incompreensveis da instruo da leitura, apresentados por Smith
(1989:241), que podem existir na escola, tornando assim, o aprendizado mais difcil:
O relacionamento de letras a sons. Para uma criana que no tem idia sobre
leitura, ouvir que algumas formas peculiares chamadas de letras que no tm
-
26
funo aparente no mundo real ento relacionadas aos sons, que no tm
existncia independente no mundo real, pode ser a mais pura baboseira.
Exerccios e testes sem sentido. Existem tantos candidatos para esta categoria, indo
desde a deciso sobre qual dos trs patinhos est olhando para a direo errada at o
sublinhar de letras mudas em palavras, que no tentarei confeccionar uma lista. As
crianas podem aprender a ter notas altas em tarefas repetitivas e absurdas
(especialmente se so leitoras competentes), mas esta habilidade especializada no
as transformar em leitores. (SIC)
Com relao ao aspecto de que a leitura escrita diferente da fala, Smith (1989)
comenta que as crianas sem esse conhecimento tendem a ter dificuldades na previso e
compreenso das convenes da escrita e, conseqentemente, no aprendizado da leitura. Essa
percepo pode ser adquirida quando algum l para a criana ou ela mesma l em voz alta,
num processo de engajamento. Assim, medida que a linguagem escrita ouvida e
compreendida, [o leitor] desenvolver um entendimento sobre as convenes particulares da
linguagem escrita (p.243). O autor afirma ainda que a linguagem artificial dos livros escolares
tende a ser imprevisvel e incompreensvel para crianas que, conseqentemente, tero
dificuldades para aprender a ler a partir de tais textos. Sobre tais dificuldades, existem fatores
que tornam a leitura mais difcil, tais como a concentrao nos detalhes visuais, que causar a
viso em tnel; a sobrecarga da memria de curto prazo, pela ateno a fragmentos de texto
que fazem pouco sentido; confuses na memria de longo prazo, medida que a criana luta
para responder prontamente a questes, apresentadas posteriormente etc.
DellIsola (2001), numa viso mais voltada para a Sociolingstica, comprova que
o contexto sociocultural do leitor influencia no processamento de inferncias. Dependendo da
classe social a que o leitor pertence, suas inferncias so diferentes. As duas concepes
reunidas as que levam em considerao as inferncias e as que se baseiam no contexto
sociocultural do sua pesquisa um carter inovador, demonstrando que as interpretaes
nas leituras de texto so determinadas pelo contexto sociocultural do aluno, o que revela que o
processo ensino-aprendizagem da leitura deve passar por uma modificao. Para essa autora,
os professores devem conscientizar-se da heterogeneidade sociocultural dos alunos e repensar
o ensino de linguagem, principalmente da lngua padro que privilegiada na escola.
-
27
A percepo de que seus alunos apresentavam interpretaes consideravelmente
diferentes na leitura de textos, fruto da experincia da autora como professora na Repblica
Popular do Congo - frica - onde lecionava para alunos provenientes de vrias regies do
Brasil e de classes sociais diferentes, justifica a pesquisa da autora que se fundamenta nas
seguintes questes: em que medida a diversidade de compreenses acerca de um nico texto
se deve ao conhecimento de mundo e s experincias do leitor? H influncias das
experincias prvias do leitor na produo da leitura? E qual a interferncia do contexto
sociocultural no processo inferencial? (DellIsola, 2001:22)
O teste utilizado para verificar o que as pessoas de nveis culturais diferentes
inferem e avaliam a partir de um nico texto foi a pausa protocolada previamente marcada no
texto, que consiste na leitura em partes. Aps a leitura de cada parte a pesquisadora
estabeleceu possveis perguntas que se dividiam em objetivas, inferenciais e avaliativas. Para
a escolha do texto, foi considerada a legibilidade em seus aspectos fsico, lingstico e
interativo. Os sujeitos que se submeteram ao pr-teste e ao teste pertenciam a classes sociais
diferentes, tendo como indicativos dessa diferena, a escola em que estudavam, o perfil dos
mesmos e suas atividades extra-escolares. Participaram do pr-teste alunos da 5 srie e do
teste alunos da 7 srie do Ensino Fundamental de escolas pblicas e particulares. Quanto aos
estabelecimentos escolares, a autora os dividiu em escola A (instituio privada que atende
somente queles alunos que possuem recursos para pagar uma alta mensalidade) e escola B
(instituio pblica de ensino gratuito, que atende a uma clientela carente de recursos
financeiros).
A concluso mostrou que no h uma nica interpretao para cada texto lido. A
autora pde verificar que o contexto sociocultural do indivduo atua como fator condicionante
da variedade de interpretaes e que a produo da leitura varivel entre os indivduos
porque cada um gera suas inferncias de acordo com o seu conhecimento prvio social e
-
28
cultural (p. 221). Nesse sentido, imprescindvel que os professores valorizem as inferncias
dos alunos, promovendo intercmbio cultural entre eles.
A pesquisa apresenta consideraes que devem ser pensadas pelos educadores na
conduo de suas aulas, a fim de no criarem expectativas de que seus alunos tero as mesmas
inferncias e interpretaes dos textos apresentados. Sua aplicao na escola estimula o
repensar do ensino, principalmente o de leitura e instiga reflexes a respeito das diversas
manifestaes socioculturais provindas dos contextos em que os alunos esto inseridos e que
se evidenciam na escola.
No prximo subitem, apresentaremos algumas pesquisas que mostram as
estratgias metacognitivas de leitura usadas para a compreenso de textos impressos.
1. 2 As estratgias metacognitivas de leitura
Conforme explicamos no item anterior, a leitura um processo de interao entre
autor e leitor, via texto. Nessa concepo, Kleiman (2000) considera que o leitor faz o
mximo para recuperar o que o autor quis transmitir. Este, por sua vez, busca a adeso do
leitor, procurando produzir um texto informativo, claro e relevante, que fornea claramente as
pistas que permitem uma reconstruo do significado e da inteno comunicativa (op.cit.).
Assim, numa atividade de leitura significativa, o leitor faz uso de estratgias para
atingir os seus objetivos. As estratgias so aes que o leitor pratica antes, durante e aps a
leitura, a fim de apreender o sentido do texto. Para isso, o leitor utiliza a informao visual,
que se encontra no texto, e a informao no-visual, que est na sua mente e da qual lana
mo para integr-la informao que o texto fornece.
Muitas pesquisas tm sido realizadas para descobrir as estratgias que os leitores
utilizam no processamento da leitura. Essas estratgias podem ser classificadas em cognitivas
e metacognitivas. O que diferencia as estratgias cognitivas das metacognitivas o estado de
-
29
conscincia do leitor em relao s suas aes. Assim, estratgia cognitiva uma atividade
executada, mas que fica no nvel inconsciente do leitor. classificada como um processo de
desenvolvimento automtico. J na realizao das estratgias metacognitivas, o leitor tem
conscincia do conhecimento e busca um aumento gradual do controle desse conhecimento,
tornando o uso dessas estratgias cognitivas desautomatizadas em situaes de problema
(Kato, 1999). Assim, as estratgias metacognitivas seriam aquelas operaes (no regras),
realizadas com algum objetivo em mente, sobre as quais temos controle consciente, no
sentido de sermos capazes de dizer e explicar a nossa ao (Kleiman, 1996:50). O leitor
proficiente faz uso constante de estratgias metacognitivas e flexvel na sua leitura, usando
vrios procedimentos para atingir seus objetivos. Quando uma estratgia no funciona, ele faz
uso de outra. Por isso, o leitor proficiente apresenta duas caractersticas bsicas: ele tem
algum objetivo e compreende o que l (Kleiman, 1996).
Este trabalho concentrar-se- nas estratgias metacognitivas, tendo em vista que
nosso objetivo investigar se os leitores proficientes utilizam, para compreenso de
hipertextos, as mesmas estratgias metacognitivas de leitura usadas para compreender textos
impressos.
Segundo Leffa (1996:51), as pesquisas em metacognio tm se desenvolvido
fazendo o leitor meditar metacognitivamente sobre seu prprio conhecimento a
conscincia da prpria conscincia. Essas pesquisas se utilizam do protocolo verbal cujo
objetivo principal das anlises consiste em fazer o leitor pensar em voz alta sobre suas
prprias estratgias de leitura. Segundo o autor, h estratgias que so facilmente observveis
e outras que no so detectadas diretamente por se constiturem de processos mentais no
observveis. Podemos citar, como exemplo das primeiras, as palavras-chave sublinhadas pelo
leitor e, da segunda, a avaliao de sua prpria compreenso. Segundo Leffa (1996), as
concluses a que chegaram os estudos sobre metacognio so as seguintes: a metacognio
-
30
desenvolve-se com a idade; correlaciona-se com a proficincia em leitura; o comportamento
metacognitivo melhora com a instruo; a eficcia de uma determinada estratgia depende do
objetivo de uma determinada leitura. Assim, a capacidade que o leitor tem de refletir sobre o
que faz ajuda a desenvolver estratgias adequadas para a compreenso da leitura, pois o bom
leitor
deve saber quando est entendendo bem um texto, quando a compreenso
est sendo parcial ou quando o texto no faz sentido, [...] sabe tambm o que
fazer quando est tendo problemas com o texto. Sabe at que ponto est ou
no preparado para atender s exigncias encontradas, qual a tarefa
necessria para resolver o problema e, o que mais importante, se o esforo
a ser dispendido vale ou no a pena em funo dos possveis resultado.
(Leffa, 1996:45).
As pesquisas em metacognio tm se desenvolvido sob duas correntes. A
primeira centra-se no conhecimento dos processos cognitivos, no qual o leitor d-se conta do
domnio especfico desse conhecimento, detectando o problema ocorrido, analisando-o,
caracterizando-o e refletindo sobre o que sabe e o que no sabe sobre a soluo. Giasson
(2000) discute esses conhecimentos e os divide em:
Conhecimento sobre si prprio - no qual o leitor est consciente dos seus recursos e
dos seus limites;
Conhecimento sobre a atividade - o leitor deve ter conscincia das exigncias da
atividade;
Conhecimento das estratgias ter conscincia das estratgias que podem ser teis
para resolver um problema.
A segunda corrente, na qual nossa pesquisa est inserida, centra-se na gesto dos
processos cognitivos. Segundo essa corrente, o leitor tem conscincia de que possui
estratgias ou maneiras para proceder quando se depara com um problema na leitura e elabora
um plano para atacar esse problema.
Brown (1980), uma das principais representantes dessa corrente, apresenta
algumas aes gerais que permanecem na conscincia de leitores proficientes na gesto do
-
31
processamento da leitura. A primeira ao diz respeito ao conhecimento do leitor sobre o
momento em que ocorre uma falha na compreenso. Ao detectar essa falha, o leitor
proficiente inicia uma ao para super-la, o que no acontece com o leitor no proficiente.
As pesquisas da autora mostraram que essa necessidade no depreendida por crianas mais
jovens. Assim, aps a constatao do momento em que a falha ocorre, o leitor detecta qual
parte do texto no foi compreendida. Essa segunda ao da conscincia a iniciao de uma
forma mais complexa de metacognio. O bom estudante sabe o que no entende porque
checa constantemente sua aprendizagem e est consciente da diferena entre o que ele sabe e
o que no sabe. Uma outra ao metacognitiva relaciona-se necessidade do leitor de saber o
que que se precisa para que a compreenso ocorra. Essa conscincia desenvolvida
relativamente tarde, porm necessria para o planejamento de uma ao estratgica.
Somente os leitores eficientes sabem quando h uma informao essencial para completar a
tarefa eficientemente. Finalmente, a autora cita como ao estratgica para compreender um
texto a necessidade que o leitor tem de saber a utilidade de uma interveno. Em investigao
sobre as habilidades de crianas retardadas e normais, ela comprovou que as crianas normais
mais novas no apreciam a interveno dos outros, o que pode gerar uma falta de
compreenso na leitura.
Apresentaremos sucintamente uma pesquisa de Brown (1980) em que o foco de
ateno so as estratgias metacognitivas.
A primeira estratgia observada pela autora estava centrada na identificao das
idias principais. Segundo a autora, para selecionarmos as idias principais, necessrio que
saibamos quais so elas. Assim, os estudos comprovaram que abstramos a idia principal,
mesmo quando no somos instigados a fazer isso. Porm, embora lembremos o essencial de
uma mensagem, isso no exclui a possibilidade de usar as estratgias intencionais para
aumentar o entendimento. Uma outra revelao da pesquisa, relacionada a essa estratgia, diz
-
32
respeito maturidade. As crianas mais velhas recontam seus protocolos, incluindo os
elementos essenciais e algumas trivialidades, enquanto as mais novas, embora favoream as
idias mais importantes, perdem muitos desses elementos, pois no concentram sua ateno
neles por no saberem identific-los.
A segunda estratgia metacognitiva pesquisada foi a seleco da deixa recupervel
conveniente. Para a autora, selecionar uma deixa inclui saber que os elementos textuais
variam em importncia e a recordao de unidades importantes essencial para a coerncia.
Assim, os leitores devem concentrar seus esforos para recordar elementos que podem ser
esquecidos, mas que so essenciais para estabelecer a coerncia do texto. A pesquisa mostrou
que a habilidade de selecionar a deixa recupervel s desenvolvida mais tarde porque requer
um bom nvel de sensibilidade para as demandas da tarefa de lembrar o essencial.
A terceira estratgia centrava-se na avaliao da leitura para um teste. A fim de
investigar esse aspecto, a autora realizou dois estudos. O primeiro consistia em lembrar listas
de figuras. Essa experincia detectou que crianas mais jovens no eram capazes de lembrar
figuras que lhes foram dadas, mesmo dispensando todo o tempo necessrio tarefa. Segundo
a pesquisadora, isso pode ter acontecido porque elas no tendiam a introduzir estratgias de
memorizao que envolvessem elementos de auto-regulagem como ensaio e antecipao. O
segundo estudo consistia em retirar a idia principal de uma passagem em prosa e recontar o
essencial das idias com suas palavras. A tarefa proposta era a leitura e o entendimento de
doze estrias para serem lidas durante seis dias, a fim de lembrar o mximo que pudessem.
Quando estivessem certas de que poderiam contar tudo o que aconteceu com suas palavras,
tocavam um sino e tentariam contar a histria. Os sujeitos deste estudo foram divididos em
quatro grupos. Estavam no primeiro grupo aquelas crianas que haviam treinado com sucesso
o ensaio e antecipao em testes anteriores. O segundo fazia parte de um grupo de controle
original que no tinha aperfeioado sua habilidade de recontagem de leitura. O grupo seguinte
-
33
no tinha experincia prvia no teste, mas havia obtido um bom nvel em testes de leitura. O
ltimo grupo era formado por crianas que avaliados por seus professores semelhantemente
aos dos sujeitos da experincia. Os principais aspectos que os estudantes treinados deveriam
representar incluam: recontagem da quantidade total; desperdcio total de tempo para o
estudo; o reconto padro, no qual se favorecem os temas principais, comportamento tpico de
estudantes maduros e um ndice de estudo aberto, incluindo antecipao, ensaio, seleo de
releitura, sublinhar, circular palavras chaves etc. Nos ltimos dias do teste, os sujeitos foram
incitados a realizar, por conta prpria, hbitos como sublinhar, circular palavras-chave ou
frases, tomar notas. Como resultados, a autora apresentou as seguintes concluses:
As crianas que eram instrudas a realizar habilidades como sublinhar, circular
palavras-chave etc. no melhoraram sua performance no teste. As outras que faziam isso
espontaneamente tiveram um melhor desempenho.
As crianas que eram instrudas a sublinhar pontos importantes marcavam quase tudo.
A destinao de um tempo de estudo estratgico depende de uma variedade de
habilidades cognitiva e metacognitiva, no facilmente evidenciadas em crianas jovens.
A autora considera a falta que uma descrio detalhada do desenvolvimento dessas
habilidades representa uma lacuna nesses estudos e as tcnicas necessrias para inculcar as
tticas naqueles que no a desenvolveram espontaneamente no tm sido estabelecidas.
Segundo a autora, enquanto o processo flui tranqilamente, sua construo de sentido
muito rpida, mas quando uma falha de compreenso detectada ele [o leitor] deve diminuir
a velocidade e dividir uma capacidade de processo extra para a rea do problema (Brown,
1980:455).
Baker & Brown (1984) tambm defendem que a metacognio envolve dois
processos separados: a conscincia de habilidades, de estratgias e de recursos que so
requeridos para realizar uma tarefa efetivamente e a habilidade de usar mecanismos de auto-
-
34
regulagem para assegurar o sucesso completo da tarefa, tais como planejar uma ao para
resolver um problema, avaliar a efetivao de uma ao tentada, testar e revisar uma
estratgia de aprendizagem e remediar dificuldades encontradas pelo uso de estratgias
compensatrias. As autoras, realizando pesquisas sobre compreenso de leitura em textos
impressos, tambm na perspectiva da corrente centrada na gesto dos processos cognitivos,
demonstram a existncia de estratgias metacognitivas cruciais para uma boa compreenso,
algumas das quais apresentamos a seguir e as utilizamos, a fim de verificar se leitores
proficientes usam-nas para a compreenso de hipertextos:
Estabelecer os propsitos da leitura
Esta estratgia est diretamente relacionada significao do texto. O leitor, ao se
propor a ler algo, tem em sua mente um propsito que perseguido durante a leitura. Os
propsitos do leitor podem ser muito variados e so eles que definem o tipo de leitura a ser
realizada e as estratgias que sero executadas para a depreenso do sentido do texto. As
pesquisas de Baker & Brown (1984) demonstram que, para muitas crianas, o propsito a
decodificao e no uma atividade para obter sentido.
Modificar o tipo de leitura devido a variaes no seu propsito
O objetivo do leitor pode se modificar ao longo da leitura ou quando este muda o
gnero do texto, pois o tipo de leitura definido pelo propsito do leitor. Assim, o leitor
modifica o tipo de leitura devido a variaes no seu propsito. Se o propsito da leitura
for encontrar uma informao especfica ou descobrir de que trata o texto, o leitor praticar o
ato da leitura de modo diferente. Nesta pesquisa, consideramos a nomenclatura proposta por
Alliende e Condemarn (1987) quando afirmam que os leitores podem usar trs tipos de
leitura. O primeiro, a leitura previewing ou viso preliminar, serve para o leitor decidir se vai
ler o texto ou descobrir como este est organizado. Portanto, ele faz uma leitura superficial. O
segundo tipo, a leitura seletiva espontnea ou skimming, objetiva a busca das idias principais
-
35
e dos detalhes do texto. E, finalmente, atravs da leitura seletiva indagatria ou scanning, o
leitor encontra uma informao especfica no texto. Assim, dependendo do objetivo do leitor,
ele usar um tipo de leitura e se, durante a leitura, seu propsito se modificar, haver uma
alterao nesse tipo. A partir dos resultados das pesquisas de Baker & Brown (1984), as
autoras recomendam que, antes de as crianas modificarem sua razo de leitura
apropriadamente, elas devem saber como a modificao ir afetar o objetivo. Quando esto
procurando por uma informao especfica e quando encontram um ponto difcil, elas devem
saber que reduziram a velocidade porque o material difcil.
Identificar as idias importantes
Um leitor proficiente identifica em um texto aqueles segmentos que so
considerados mais relevantes para seu objetivo de leitura. Alm da relao com o objetivo do
leitor, esses segmentos esto tambm relacionados ao conhecimento prvio do leitor. Este
geralmente enfatiza no texto aquilo que sabe e que acredita. Aps identificar aquelas idias
que so mais relevantes para seu objetivo, o leitor capaz de apreender o significado global
do texto. Segundo Baker & Brown (1984), as crianas adquirem essa habilidade proporo
que vo crescendo, apesar de sempre saberem o que importante e o que no .
Usar a estrutura lgica
A estratgia acima refere-se habilidade do leitor de perceber a manuteno da
unidade temtica do texto, pois este precisa saber como e porque as idias esto
interconectadas. A continuidade e a articulao das idias no texto contribuem para a
manuteno temtica e o leitor usa esses fatores para perceber o texto como uma unidade
global coerente. Em relao continuidade, necessrio que o leitor perceba a permanncia
de elementos constantes no texto, a fim de manter a unidade temtica. A retomada desses
elementos possibilita ao autor dar continuidade s idias, introduzindo novas informaes. A
articulao refere-se ao encadeamento das idias e maneira como elas se organizam e se
-
36
relacionam umas com as outras. Assim, o leitor, ao usar a estrutura lgica do texto, percebe
que algumas ligaes entre as idias do texto podem ficar subjacentes ou o texto pode
estabelecer relaes inadequadas entre elas. As pesquisas de Baker & Brown (1984)
verificaram que as crianas mais jovens tm dificuldades em detectar violaes na estrutura
lgica do texto.
Ativar o conhecimento prvio
Ativar o conhecimento prvio uma habilidade que facilita a compreenso da
leitura, pois o confronto da informao que o leitor recebe do texto com a que ele j adquirira
desperta o interesse para aquela leitura. Considerando essa questo, podemos afirmar que o
texto pode suscitar vrias interpretaes, tendo em vista que o conhecimento prvio de cada
leitor diferente. Porm, se o leitor no possui conhecimento prvio sobre o assunto que est
lendo, a leitura pode se tornar enfadonha devido grande quantidade de informao que o
leitor deve armazenar. Muitas vezes, a estrutura lgica do texto compreendida atravs da
ativao do conhecimento prvio. Posteriormente, comentaremos a respeito do ensino dessa
estratgia como atividades de pr-leitura. As autoras comprovam que essa habilidade
adquirida com o amadurecimento, atravs da instruo formal e da experincia diria.
Avaliar o texto pela clareza, completude e consistncia
Uma compreenso adequada da leitura no depende somente do leitor.
necessrio que o texto seja claro, que suas idias sejam consistentes para fundamentar a tese.
Alm disso, se houver uma contradio nas idias, o texto deve apresentar um marcador
indicando que o autor o fez de propsito para obter uma melhor argumentao. Se tudo isso
no acontecer, o leitor poder ter problemas de compreenso. Porm, importante que ele
tenha sensibilidade para avaliar a inadequao de textos (ambigidade, falta de informao
suficiente, idias que se confundem com outras), a fim de que a compreenso seja efetivada.
-
37
Assim, avaliar o texto pela clareza, completude e consistncia uma estratgia que
confirma a proficincia em leitura.
As autoras concluram que leitores imaturos tm dificuldades de encarregar-se de
seu processo cognitivo durante a leitura. Eles no so flexveis em adaptar seu nvel de
processamento para tarefas que se diferem em graus de entendimento, assim como no
atentam para pontos importantes e s tardiamente conseguem captar a estrutura lgica do
texto. Tambm tm mais dificuldades em ativar o conhecimento prvio relevante, a fim de
alcanar uma melhor compreenso e no detectam inconsistncias no texto. Em geral, no
conhecem seu nvel de entendimento a cerca do que lem para arriscar-se em um teste e
tambm no tm habilidade para direcionar atividades de reforo, como auto-questionamento,
questionamento em outras fontes, releitura etc.. Assim, os leitores menos experientes no
realizam atividades de monitoramento cognitivo, caracterstica de leitores proficientes.
As autoras afirmam, ainda, que a maioria das pesquisas tem mostrado que a
ineficincia dos estudos est associada a uma compreenso inferior, mas elas sustentam que
esta no a nica causa. Para elas, a compreenso inferior reduz a habilidade de monitorar
atividades seguintes ou um conhecimento prvio insuficiente pode ser responsvel pelos
problemas.
1.3 O ensino de estratgias de leitura
Em relao ao ensino de estratgias de leitura, podemos mencionar Olge (s/d), que
desafiou professores para desenvolver uma pesquisa com alunos, na qual trabalhariam uma
forma ativa e pessoal de leitura e aprendizagem de texto expositivo. A autora afirma que os
mestres devem ensinar tcnicas eficientes de leitura para lecionar Cincias Sociais, Cincias
Exatas ou qualquer outra matria. Para este trabalho, foram considerados alguns critrios que
-
38
os docentes acharam importantes, a saber: o trabalho a ser desenvolvido deveria ser adaptvel
a toda classe e incluir formas que envolvessem todos os alunos; o uso do material desse
estudo deveria ser aquele que j vinha sendo utilizado pelos alunos, trabalhando com
flexibilidade para usar at mesmo textos pobremente estruturados; e o trabalho deveria
estabelecer como modelo um leitor ativo. Essa pesquisa de Olge (s/d) contribuiu para que a
escola oferecesse atividades orientadas para o desenvolvimento e a aplicao de estratgias
metacognitivas de leitura.
A estratgia utilizada na pesquisa, denominada Que sabemos, que queremos
saber, que aprendemos (Olge (s/d)), envolve os alunos antes, durante e aps a leitura do
texto. Consiste no registro em uma folha de papel dividida em trs colunas, na qual os
discentes escreviam o que pensavam que sabiam sobre determinado assunto, o que queriam
aprender e o que aprenderam com a leitura. Na busca de alternativas para ensinar estratgias,
tiveram preocupaes em investigar o conhecimento prvio dos alunos, por saberem da
importncia deste para a construo do significado.
Na atividade de pr-leitura, quatro etapas foram consideradas. Na primeira, a
tempestade de idias, o professor pedia aos alunos para que escrevessem tudo o que pensavam
que sabiam acerca do tema a ser estudado. Nessa etapa, geralmente, surgiam conflitos que
serviam para ajudar o grupo a formular perguntas para sua leitura. Essas perguntas iriam para
a coluna que queremos saber. A segunda fase, a categorizao, exigia que os alunos
categorizassem as idias fornecidas na fase anterior, encaixando essas idias umas com as
outras. A fase seguinte, chamada de predio, consiste em colocar os alunos na condio de
autor do texto, a fim de predizer as categorias bsicas que deveriam levar em conta nos
textos. Essa predio pode ser ativada fazendo as seguintes perguntas: Que temas ou
categorias de informao queramos explicar a nossos leitores? ou Que nossa audincia
necessitaria saber sobre determinado assunto?. A ltima fase consistia na formulao de
-
39
perguntas feitas ao texto que seria lido e era muito importante para guiar a busca do
conhecimento do leitor.
Aps a atividade de pr-leitura, os alunos passariam leitura do texto expositivo.
Sobre essa fase, a autora afirma que, dependendo da dificuldade do material e do grau de
familiaridade que os alunos tm com o tema, alguns fragmentos podiam ser lidos
integralmente, antes de discutir e ordenar as idias. Porm, pedaos maiores deveriam ser
lidos em unidades, intercalando as discusses para ir clareando a leitura. Nessa fase, a tarefa
dos alunos era ler ativamente, buscando informao nova e resposta para suas perguntas.
Aps a leitura do texto, os alunos passam a refletir sobre a aprendizagem. Depois
de algumas constataes e de preencher a coluna O que aprendemos, a professora poderia
comparar as respostas com a primeira coluna que se referia a O que alunos pensavam que
sabiam para checar se havia erros de concepes. Nessa etapa, h uma reacomodao do
conhecimento.
As atividades de pr-leitura so uma confirmao de que o processo de
aprendizagem que se inicia com a ativao do conhecimento prvio dos alunos pode
desequilibrar o prprio conhecimento e estimul-los a aprender. Em seguida, a busca de novas
informaes e de respostas para suas perguntas e as reflexes sobre alguns erros de
concepes so fundamentais para os esclarecimentos. Assim, confirmou-se que estes
procedimentos estimulam a aprendizagem, tornando-a independente. Constatou-se que, com o
ensino dessas estratgias, os alunos se tornariam mais autnomos ao ler e compreender textos
expositivos.
importante salientar que para a atividade de leitura ter sentido necessria a
satisfao de um propsito. Assim, concordamos com Kleiman (2000:35), quando afirma que
a leitura que no surge de uma necessidade para chegar a um propsito no propriamente
leitura; quando lemos p