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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO, CURRÍCULO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS IRIS CAMPOS DE ANDRADE A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO ESCOLAR: CAMINHOS E DESCAMINHOS NA CONSTRUÇÃO DE UMA PROPOSTA CURRICULAR PARA A EDUCAÇÃO D CAMPO NATAL 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO, CURRÍCULO E PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS

IRIS CAMPOS DE ANDRADE

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL

PONTA DO TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO ESCOLAR:

CAMINHOS E DESCAMINHOS NA CONSTRUÇÃO DE UMA

PROPOSTA CURRICULAR PARA A EDUCAÇÃO D CAMPO

NATAL

2016

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IRIS CAMPOS DE ANDRADE

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO

TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO ESCOLAR: caminhos e descaminhos na

construção de uma proposta curricular para a educação do campo

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Educação da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, como

requisito parcial para a obtenção do grau de

Mestre em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Alessandro Augusto de

Azevêdo

NATAL

2016

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Catalogação da Publicação na Fonte

UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA

Andrade, Iris Campos de.

A reserva de desenvolvimento sustentável estadual ponta do tubarão (RDSEPT) e o currículo

escolar: caminhos e descaminhos na construção de uma proposta curricular para a educação do

campo/ Iris Campos de Andrade. - Natal, 2016.

119f: il.

Orientador: Prof. Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo.

Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de

Educação. Programa de Pós-graduação em Educação.

1. Educação do campo – Dissertação. 2. Currículo escolar – Dissertação. 3. Saberes e experiências

- Dissertação. I. Azevêdo, Alessandro Augusto de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

III. Título.

RN/BS/CCSA CDU 37.018.51

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IRIS CAMPOS DE ANDRADE

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO

TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO ESCOLAR: caminhos e descaminhos na

construção de uma proposta curricular para a educação do campo

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em

Educação.

Aprovada em: ______/_______/_______

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________________

Prof. Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo – UFRN

Orientador

________________________________________________________________

Professora Dra. Márcia Maria Gurgel Ribeiro – UFRN

Examinadora Interna (titular)

________________________________________________________________

Professora Dra. Denise Maria de Carvalho Lopes – UFRN

Examinadora Interna (Suplente)

_______________________________________________________________

Professor Dr. José Mateus do Nascimento - IFRN

Examinador Externo (Titular)

_____________________________________________________________

Professora Dra. Edneide da Conceição Bezerra

Examinadora Externa (Suplente)

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Dedico este trabalho de investigação aos

educadores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, em

particular, ao Grupo de Elaboração do Projeto

Político Pedagógico da Escola Municipal

Alferes Cassiano Martins, Colaborador desta

pesquisa, por ter se disponibilizado a repensar o

campo em que estão imersos para, então,

ressignificá-lo em sua prática educativa.

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AGRADECIMENTOS

Agradecimento é o ato de reconhecer o apoio daqueles/as que nos ajudaram a alcançar

nossos objetivos, por isso não se constitui tarefa fácil, pois a memória pode nos pregar uma

peça e esquecer-se de mencionar alguém importante em nossa caminhada, no entanto arrisco-

me a realizar tal exercício, neste momento ímpar em minha vida.

Primeiramente eu agradeço a Deus, por ter me fortalecido em mais uma caminhada

acadêmica, e nunca ter permitido que eu desacreditasse de mim mesma, apesar das dores da

caminhada. À Ele toda honra e toda glória!

Ao meu querido orientador Prof. Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo que acreditou em

meu potencial, ajudando-me a percorrer os trilhos desta investigação, com paciência e respeito,

sempre buscando minha superação. Nossas construções estão sendo edificadas, numa nova

relação com o saber.

Ao Grupo Colaborador desta investigação, pela abertura e exposição, ao compartilhar

comigo momentos valiosos de estudo e discussão, partilhando decisões e reflexões que ora se

materializa nesta produção escrita. Sempre serão lembrados em minha jornada acadêmica.

Ao meu esposo, Antônio Marcos, que muito me apoiou nesta investidura, conduzindo-

me todas às vezes, à comunidade na qual se localizava a escola investigada, além de

compreender-me em meus projetos, fazendo-me relaxar nos momentos de cansaço. Seu amor

me faz bem!

Ao meu filho, Ivys Bryam, por compreender minhas ausências, e se responsabilizar a

cuidar do nosso lar, as vezes que se fizeram necessárias durante esta caminhada. Sei que

também tens uma relação muito singular com o saber.

À minha mãe, Socorro Campos, por todas as vezes que se preocupou com minha

formação, com meus projetos, acompanhando-me em minhas viagens para estudo através de

suas ligações. Saiba que tenho orgulho de ser sua filha.

Às minhas irmãs, Deuzanira, Iara e Erineide, por torcerem pelo êxito dos meus projetos,

além de cuidar do meu filho, direcionando-o em minhas ausências necessárias. Sem o apoio de

vocês eu não teria chegado até aqui.

À amiga Maria da Conceição Costa da Rocha, por me apresentar a temática da Educação

do Campo, bem como pelo apoio e companheirismo nas tarefas cotidianas de nosso trabalho,

pela força e pelas palavras de incentivo. Saiba que tenho profunda admiração por ti.

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Às colegas de trabalho da Secretaria Municipal de Educação de Macau, por

compreenderem a importância dessa trajetória em minha vida e me apoiar na realização de

minhas atividades profissionais, suavizando o peso de minhas responsabilidades diárias.

À colega de trabalho Edivânia Inácio, por ter disponibilizado material bibliográfico já

produzido acerca da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão.

Aos colegas, Eduardo Pereira, Jucyana Mirna e Israel Sharon, que durante as orientações

coletivas dedicaram atenção à minha investigação, além de compartilharmos momentos de

estudos em algumas disciplinas comuns. Aprendi muito com a singularidade de cada um.

Às Professoras Doutoras, Érika Gusmão de Andrade, Karine Coutinho, Denise Maria

de Carvalho Lopes, Rosália de Fátima e Silva e Crislane Azevedo pelas ricas contribuições a

minha investigação, durante os Seminários da Linha de Pesquisa. O meu muito obrigada a

todas!

À Secretaria Municipal de Educação de Pendências por ter me disponibilizado tempo

para dedicar-me aos meus estudos acadêmicos, liberando-me de minhas atividades docentes.

Obrigada à compreensão e presteza!

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RESUMO

Dissertação que apresenta como objeto de estudo a articulação dos saberes e das

experiências emanadas da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão

(RDSEPT) na proposta curricular da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, localizada na

comunidade de Barreiras, município de Macau, Estado do Rio Grande do Norte – RN. Por meio

desta pesquisa objetivamos compreender de que forma o Grupo de Elaboração do currículo da

escola, articula os saberes e as experiências dos sujeitos da RDSEPT, na construção de uma

proposta curricular para a Educação do Campo. Para tanto, discutimos Educação do Campo

(FERNANDES, 2006, 2012; CALDART, 2000, 2004; ARROYO, 1999), evidenciando a

RDSEPT (NOBRE, 2011) na diversidade do campo brasileiro, adentrando nas proposições

sobre currículo escolar (SACRISTÁN, 2002; SILVA 2000; SAVIANI, 2010), como elemento

organizador do saber escolar (CHARLOT, 2000), lugar de integração das experiências e do

saber da experiência (BONDÍA, 2002) à proposta pedagógica da escola. Nesse sentido, o estudo

se configurou enquanto Pesquisa Qualitativa (MINAYO, 2008, 2009), de caráter

interpretativo/reflexivo (FERREIRA, 2007; IBIAPINA, 2008), em que fizemos uso da

entrevista semiestruturada, da observação participante, da aplicação de questionário e das

sessões reflexivas, enquanto procedimentos metodológicos que constituiu a pesquisa enquanto

espaço de formação entre a pesquisadora e o grupo co-partícipe, num processo de reflexão e de

autoformação. Assim, ao mergulhar nas singularidades do campo da Reserva de

Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, concluímos que a escola locus desta

pesquisa está em processo de construção de sua identidade enquanto escola do campo, dado o

tratamento pedagógico que vem orientando as práticas curriculares na escola numa perspectiva

urbanocêntrica, onde predomina o saber objeto materializado no livro didático, fato que tem

dificultado a inserção, de forma efetiva, dos saberes e das experiências dos sujeitos educandos

da Reserva, no currículo escolar, haja vista que a instituição apenas articula em seu currículo a

história da RDSEPT tematizando algumas questões ambientais.

Palavras- chaves: Educação do campo. Currículo escolar. Saberes e experiências

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RESUMEN

Disertación que tiene como objeto de estudio la articulación de conocimientos y

experiencias que emanan de la Reserva de Desarrollo Sostenible Ponta do Tubarão Estado

(RDSEPT) en la propuesta curricular de la Escuela Alferes Cassiano Martins, que se encuentra

en la comunidad de Barreiras, distrito de Macao, Estado de Río Grande do Norte - RN. A través

de esta investigación tuvo como objetivo comprender cómo el programa de estudios Grupo de

Colaboración, articula los conocimientos y experiencias de los sujetos RDSEPT, en la

construcción de una propuesta curricular para la Educación Rural. Por lo tanto, hablamos de la

Educación Rural (Fernandes, 2006, 2012; CALDART, 2000, 2004, ARROYO, 1999), que

muestra el RDSEPT (Noble, 2011) en la diversidad del campo brasileño, entrando en las

proposiciones en el plan de estudios (Sacristán, 2002; SILVA 2000; Saviani, 2010), como

organizador de la escuela elemento (Charlot, 2000), el lugar de la integración de experiencias

y el conocimiento de la experiencia (Bondia, 2002) a la propuesta pedagógica de la escuela. En

este sentido, el estudio se estableció como la investigación cualitativa (MINAYO, 2008, 2009),

el carácter interpretativo / reflectante (Ferreira, 2007; Ibiapina, 2008), hicimos uso de

entrevistas semiestructuradas, observación participante, y un cuestionario las sesiones de

reflexión, mientras que los procedimientos metodológicos que constituían la investigación

como un espacio de aprendizaje entre el investigador y el grupo co-participante, en un proceso

de reflexión y autoformación. Por lo tanto, mientras que el buceo en las singularidades del

campo del Desarrollo Sostenible Reserva Estatal de Ponta do Tubarão, llegamos a la conclusión

de que la escuela locus de esta investigación se encuentra en el proceso de construcción de su

identidad como una escuela de campo, dado el tratamiento pedagógico que ha guiado las

prácticas curriculares en la escuela una perspectiva urbanocêntrica, el conocimiento materializó

objeto en el libro de texto, un hecho que ha hecho que sea difícil de insertar, de manera efectiva,

el conocimiento y las experiencias de los estudiantes de los sujetos de la Reserva, en el

programa escolar, dado que la única institución depende de su hoja de vida la historia de

RDSEPT tematizar algunos problemas ambientales.

Palabras clave: La educación rural. Curriculum. Conocimientos y experiencia

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Unidades de Conservação do Estado do Rio Grande do Norte .......................... 46

Figura 2 – Mapa contendo os limites da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual

Ponta o Tubarão ................................................................................................. 47

Figura 3 – Imagem aérea da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do

Tubarão .............................................................................................................. 52

Figura 4 – Imagem gráfica do representando as comunidades da Reserva, de autoria de

Emanoel Amaral ............................................................................................. capa

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Caracterização do Grupo Colaborador .................................................................. 22

Quadro 2 – Sessões Reflexivas: temáticas e objetivos ............................................................. 37

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LISTA DE SIGLAS

ADECOB Associação de Desenvolvimento Comunitário de Barreiras

ADECODIL Associação de Desenvolvimento Comunitário de Diogo Lopes

CEIMH- Centro de Educação Integrada Monsenhor Honório

CIPAM Companhia Independente de Proteção Ambiental

CONEMA Conselho Estadual do Meio Ambiente

CNBB Confederação Nacional dos Bispos do Brasil

EJA Educação de Jovens e Adultos

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IDEMA Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande

do Norte

GJLPV Grupo Jovens Lutando Para Vencer

GRPU Gerência do Patrimônio da União –

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais SemTerra

PDDE Programa Dinheiro Direto na Escola

PDDE CAMPO Programa Dinheiro Direto na Escola do Campo

PJMP Pastoral da Juventude do Meio Popular

PPP Projeto Político Pedagógico

PNAE Programa Nacional de Alimentação Escolar

PNAIC Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa

PNBE Programa Nacional Biblioteca Escolar

PRONERA Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

RDSEPT- Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão

RN Rio Grande do Norte

UnB Universidade de Brasília

UC Unidades de Conservação

UNESCO Organização das Nações Unidas

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

UUS Unidades de Uso Sustentável

SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza

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SUMÁRIO

1 PRINCIPIANDO ....................................................................................................... 12

2 UM MERGULHO NAS INVESTIGAÇÕES: TRAÇANDO AS TRILHAS

PARA A PESQUISA ............................................................................................... 18

2.1 CONHECENDO O LÓCUS DA PESQUISA ............................................................. 19

2.1.1 Caracterizando os Sujeitos da Pesquisa ....................................................................... 21

2.2 PESQUISA QUALITATIVA NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: ADENTRANDO NO

CAMPO DA RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL

PONTA DO TUBARÃO .............................................................................................. 24

2.3 PROCEDIMENTOS DA PESQUISA .......................................................................... 30

2.3.1 Observação Participante ............................................................................................... 31

2.3.2 As Sessões Reflexivas: contribuições à pesquisa ......................................................... 35

2.3.3 A Entrevista: apreendendo o sentido dos sujeitos na pesquisa ..................................... 39

3 EMBARCANDO NOS MARES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: um olhar para a

RDSEPT ...................................................................................................................... 43

3.1 CONTEXTUALIZANDO A TEMÁTICA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NA

PESQUISA .................................................................................................................. 44

3.2 RDSEPT: UM MERGULHO NA DIVERSIDADE DO CAMPO .............................. 52

3.3 O OLHAR DA ESCOLA SOBRE A RDSEPT: UMA IDENTIDADE EM

CONSTRUÇÃO ........................................................................................................... 62

4 RETORNANDO À SUPERFÍCIE AQUÁTICA: OS ACHADOS

DA PESQUISA ............................................................................................................ 69

4.1 CURRÍCULO ESCOLAR E RDSEPT: UMA CONSTRUÇÃO EM

MOVIMENTO .............................................................................................................. 70

4.2 EXPERIÊNCIA E O SABER DA EXPERIÊNCIA NO CURRÍCULO ESCOLAR:

UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA ............................................................................. 86

5 LANÇANDO A ÂNCORA: TECENDO AS IMPRESSÕES FINAIS

DA PESQUISA ............................................................................................................. 95

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 103

APÊNDICES ............................................................................................................... 107

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1 PRINCIPIANDO

A Educação do Campo vem sendo construída nacionalmente, desde o final dos anos de

1990, ganhando destaque na agenda das políticas públicas do país, a partir da I Conferência

Nacional Por uma Educação Básica do Campo, realizada em Luziânia – GO, em 1998. “Tem

um significado que incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura,

mas os ultrapassa ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas”

(BRASIL, 2001, p. 4-5). É um fenômeno social da realidade brasileira, que busca contrapor-se

à burguesia agrária, através de um projeto educativo articulado aos movimentos sociais que a

originaram.

Nesse contexto, são consideradas escolas do campo aquelas que têm sua sede no espaço

geográfico classificado pelo IBGE como rural, bem como as identificadas com o campo, mesmo

tendo sua sede em áreas consideradas urbanas. Essas últimas são assim consideradas porque

atendem a populações de municípios cuja produção econômica, social e cultural está

majoritariamente vinculada ao campo.

Para essa classificação, toma-se como referência o disposto nas Diretrizes Operacionais

para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução CNEB, n. 1/2002), ao estabelecer

que a identidade da escola do campo se define pela sua vinculação às questões inerentes à sua

realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória

coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos

movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões

à qualidade social coletiva no país.

Nessa perspectiva, a Educação do Campo lança mão de alguns instrumentos políticos e

pedagógicos, presentes no interior das escolas, que possam contribuir na constituição de um

novo projeto educativo, como por exemplo, o Projeto Político Pedagógico, que traça as

diretrizes para a definição e consolidação dos planos de vida dos sujeitos educandos do campo,

e o currículo escolar que deve ter sua base na consideração do modo de vida das populações do

campo, nas necessidades de transformações sociais, das suas lutas organizadas, no modo como

se produzem.

É sobre este último instrumento, o currículo escolar na Educação do Campo, que

discutimos, se constituindo enquanto tema central desta investigação de mestrado e articula-se

a tematização dos saberes e experiências dos sujeitos educandos da Reserva de

Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão (RDSEPT) pelo Grupo de elaboração

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do Projeto Político Pedagógico da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins situada na

comunidade de Barreiras, no município de Macau/RN.

Esta Reserva foi criada através da Lei Estadual n° 8.349 de 18 de julho de 2003, como

resultado dos esforços das comunidades de Barreiras, Diogo Lopes e Sertãozinho, iniciados no

ano de 1995 para proteger a cultura da pesca artesanal das investiduras da indústria imobiliária

e dos projetos de carcinicultura, ramos econômicos que têm despontado na região litorânea

potiguar. Dada a sua localização litorânea, a RDSEPT, torna-se singular, em relação às reservas

de desenvolvimento sustentáveis que se estabeleceram fora da Amazônia, fator que, segundo

pesquisadores potiguares, tem dificultado a elaboração do Plano de Manejo da área.

A problemática desta investigação decorre das dificuldades dos docentes em tematizar

as questões socioculturais, econômicas e políticas, no currículo escolar, de modo a articular os

saberes e experiências locais com os conhecimentos gerais, também necessários ao homem e a

mulher do campo. Nesse caso, propusemos uma discussão em torno da tematização dos saberes

e experiências advindas da constituição da RDSEPT, pelos docentes do campo, entendidos em

nossa pesquisa, enquanto agentes mediadores da formação escolar crítica e emancipadora.

Nessa discussão consideramos a relação que esses professores estabelecem com o saber docente

para definir o currículo da escola, que está implicada numa comunidade pesqueira que, junto a

outras comunidades, formam a Unidade de Conservação denominada de Reserva de

Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão.

A nossa condição de pessoa de origem humilde, filha de gari e neta de um agricultor,

bem como o trilhar das primeiras vivências da docência que iniciou na escola pesquisada

anterior à criação da Reserva, foram aspectos decisivos para a construção deste trabalho

investigativo acerca da tematização dos saberes e das experiências dos sujeitos educandos da

RDSEPT no currículo escolar. Em virtude dessa trajetória pessoal e profissional, fomos

compreendendo o cenário de exclusão social em que vivíamos principalmente no que se refere

aos direitos à educação que muitas vezes nos foram negados por pertencermos às classes sociais

desfavorecidas, oportunizando a construção de nosso entendimento de que o compromisso

social em torno de uma educação crítica, deveria se constituir numa questão primordial em

nossas vidas.

Compreendendo as características físicas, políticas, sociais, econômicas e culturais que

envolveram a constituição da RDSEPT, identificado como campo pesqueiro e considerando a

implicação da escola nesse contexto, propomos inserir nossa investigação nas discussões sobre

Educação do Campo, contribuindo com o debate das construções curriculares dentro desse

paradigma. Entendemos que a escola incide diretamente no modo como os sujeitos devem se

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comportar frente às problemáticas sociais que os envolvem, em face do projeto educativo que

desenvolvem. Por isso, consideramos a importância da nossa investigação qualitativa em torno

da realidade curricular que permeia a atual proposta pedagógica da escola, e reforçarmos a

necessidade de entendermos a implicação do processo de sua construção no contexto do

movimento social que originou a RDSEPT.

A compreensão que temos acerca da complexidade que envolve a questão curricular na

Educação do Campo, deu origem ao nosso objeto de estudo, que se constitui na articulação dos

saberes e experiências da RDSEPT no processo de construção da proposta curricular do Ensino

Fundamental da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, lugar de reflexão e diálogo, da

prática educativa. Nessa ótica definimos o nosso problema de investigação a partir da seguinte

questão de partida: Quais saberes e experiências dos sujeitos da RDSEPT são tematizadas no

currículo do Ensino Fundamental, da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins?

O nosso estudo está inscrito na Linha de Pesquisa Educação, Currículo e Práticas

Pedagógicas, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED), do Centro de Educação

(CE), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e tem como objetivo Compreender de que forma o Grupo de Elaboração do currículo da escola, articula os saberes

e as experiências dos sujeitos da RDSEPT, na construção de uma proposta curricular para a

Educação do Campo; identificar nos instrumentos teórico-metodológicos utilizados por esse

grupo as concepções que fundamentam a proposta curricular da escola.

A pesquisa aconteceu na Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, localizada no

distrito de Barreiras, município de Macau – RN, e contou com a relevante contribuição do

Grupo Colaborador, composto por sete pessoas que desempenham atribuições diferentes na

escola, dentre as quais, 1(uma) gestora, 2 (duas) supervisoras, 2 (dois) professores, 1 (um) pais

dos alunos, e 1 (uma) auxiliar de secretaria. A nossa escolha por esta instituição escolar se deu

em virtude da nossa implicação como docente da escola, no período de 1999 a 2003, onde

pudemos vivenciar algumas atividades organizadas pelas comunidades que precederam a

constituição da Reserva, participando da realização dos dois primeiros Encontros Ecológicos.

Esse período de atividade docente na escola foi o bastante para desenvolvermos uma estreita

relação de pertença com a instituição, e com a comunidade na qual estava inserida. Esses

aspectos reforçam nosso envolvimento nas questões que atravessam a Educação do Campo.

A relevância dessa pesquisa consiste na oportunidade de repensarmos as nossas visões

e concepções, como educadores que cuidam da formação escolar de crianças, adolescentes,

jovens e adultos, de uma comunidade pesqueira, que se insere num contexto de lutas, de

exclusão e de negação social.

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Compreendendo o currículo enquanto identidade e trajetória dos sujeitos do campo, o

percurso investigativo do nosso trabalho fundamentou-se numa abordagem qualitativa que nos

ajudou a explicar o processo de elaboração curricular protagonizado pela equipe da escola

pesquisada, a partir da reflexão que fizeram acerca de suas práticas educativas. Assim

norteamos nosso percurso teórico-metodológico nas orientações de Lüdke e André (2013),

Ibiapina (2008), Ferreira (2007), Minayo (2008, 2009), Córdova (2009), fazendo uso de

observação participante, de aplicação de questionário, de entrevistas semiestruturadas e de

sessões reflexivas. Esses procedimentos asseguraram o alcance de nossos objetivos, nos

aproximando ainda mais da realidade investigada.

Entendendo a relevância da escola do campo enquanto lugar de direito, de partilha de

saberes, fundada na diversidade humana, na empatia, na capacidade dos seus sujeitos de

ressignificar o processo de construção do seu projeto educativo, ampliamos nossas discussões

acerca da Educação do Campo, pautando-nos em Caldart (2000, 2004) e Fernandes (2006,

2012), enfatizando o Campo da RDSEPT, a partir de Nobre (2011), reconhecendo sua

importância enquanto constructo social que resultou de um longo processo de luta social,

envidada pelas comunidades de Barreiras, Diogo Lopes e Sertãozinho.

Numa abordagem ideológica de escola no paradigma da Educação do Campo, refletimos

sobre o currículo escolar, nos reportamos a Arroyo (1999), que nos fornece elementos para se

compreender as matrizes curriculares para a Educação do Campo, dialogando com as questões

de identidade e de trajetórias que permeiam o currículo escolar como defende Silva (2010),

Saviani (2010) e Sacristán (2002). Para tanto discutimos os saberes e as experiências

tematizadas pelo Grupo Colaborador durante o processo de elaboração do currículo da escola

pesquisada, a partir de Charlot (2000) e Bondía (2002), que nos forneceram fundamentação

epistemológica para compreendermos as relações de saber presentes nesse processo.

Dessa forma estruturamos este trabalho em três capítulos, que foram emergindo das

produções junto ao Grupo Colaborador. Para defini-los utilizamos uma analogia aos elementos

presentes no entorno da escola pesquisada, cujas características o identificaram como campo

pesqueiro, assim cada capítulo remete a etapas da atividade pesqueira.

No segundo capítulo, intitulado “Um Mergulho nas Investigações: traçando as trilhas

para a pesquisa”, fizemos analogia ao momento em que os pescadores se preparam para entrar

no mar para pescar, tendo que lançar mão de todos os conhecimentos adquiridos na sua vivência

para lidar com as intempéries que os esperam, e com o manejo do seu equipamento, e

transformar a sua atividade numa arte. Assim, esse capítulo apresenta a metodologia que foi

utilizada em nosso trabalho, articulada às nossas observações interpretativas acerca das

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perspectivas e dos procedimentos assumidos para a construção dos dados desta pesquisa

educacional que se caracteriza enquanto pesquisa qualitativa. O referencial teórico-

metodológico que nos orientou nesse caminhar investigativo, nos possibilitou uma maior

aproximação com o objeto de estudo, como por exemplo, as sessões reflexivas e as entrevistas

semiestruturadas, que possibilitou redimensionar nossos objetivos, e ampliar nossa discussão

acerca da relevância das questões que nos conduziram a essa investigação reflexiva e

interpretativa.

No capítulo 3, intitulado “Embarcando nos Mares da Educação do Campo: um olhar

para a RDSEPT”, fizemos uma analogia ao momento em que o pescador entra no mar com sua

embarcação para buscar o seu sustento, na (in)certeza do que os aguarda, dada a diversidade de

criaturas viventes que ali habitam. Aqui são abordadas as questões políticas e epistemológicas

que fundam o paradigma da Educação do Campo, tecendo uma contextualização da temática

da pesquisa, apresentando o campo da RDSEPT como uma configuração da diversidade do

campo brasileiro, caracterizado nesta pesquisa como campo pesqueiro. Para tanto utilizamos

Diegues (1983), Pires (2012) e Ramalho (2004), para dialogar conosco acerca das

características da pesca artesanal, modelo de pesca predominante na comunidade. Para

podermos compreender o contexto de criação da RDSEPT e sua articulação com a Educação

do Campo, nos apoiamos em Fernandes (2006) para introduzirmos as discussões acerca do

movimento Por uma Educação do Campo, destacando as questões de territorialidade que

atravessam a construção da educação do campo, situando as discussões atuais acerca desta

temática. Ao ressaltar o processo de criação da RDSEPT, abordamos a questão do

desenvolvimento sustentável na Educação do Campo, dialogando com documentos oficiais

como a Lei Federal n. 9.985, de 18 de julho de 2000, que cria as Unidades de Conservação do

Ministério do Meio Ambiente, as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas

do Campo (BRASIL, MEC/CNE/CEB, 2002) e o Decreto n. 7.352/2010, que trata do Programa

Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA).

No capítulo 4 intitulado “Retornando à Superfície Aquática: os achados da pesquisa”,

fizemos uma analogia ao resultado da pesca, ao que foi possível encontrar em alto-mar, ao que

conseguiram achar em sua busca. Aqui trazemos nossas análises acerca dos resultados da

pesquisa, que se apresentam articuladas às falas do Grupo colaborador, que tratam das

concepções que possuem acerca do currículo escolar, bem como dos saberes e das experiências

dos sujeitos da RDSEPT tematizados no currículo escolar. Nossa elaboração sobre currículo

escolar fundamenta-se nas concepções de Silva (2010), Saviani (2010) e Sacristán (2002), que

compreendem o currículo como experiência, que permite construir a subjetividade e a

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identidade humana. Nos apoiamos em Charlot (2000) para discutir a relação de saber que

fundamenta o currículo escolar elaborado pelo grupo colaborador, trazendo para este debate

curricular as proposições epistemológicas de Bondía (2002) acerca da experiência e do saber

da experiência.

Por fim, tecemos as impressões finais da pesquisa, lançando a âncora, em analogia ao

momento de chegada dos pescadores à beira-mar, com suas conclusões acerca da investidura

daqueles dias de pesca. Aqui destacamos nossas análises finais do processo da pesquisa, do que

ela oportunizou.

Entendemos que vivenciar essa experiência investigativa nos permitiu compreender o

contexto sócio educacional em que estão sendo pensados e vivenciados os referenciais

curriculares que orientam as práticas educativas na Educação do Campo, além de nos

possibilitar argumentar, refletir e construir uma interpretação significativa acerca do nosso

objeto de estudo.

Investigamos uma situação local acerca do pensamento e da elaboração do currículo

escolar na educação do campo. No entanto, sabemos que o contexto aqui investigado se trata

de uma realidade presente na maioria das escolas do campo brasileiro, em particular das escolas

da RDSEPT. Por isso, reconhecemos como uma tarefa complexa traduzir todos os aspectos que

envolvem a problemática da articulação dos saberes locais aos saberes gerais no currículo

escolar, dada os limites dessa investigação. Portanto, a entendemos enquanto inacabada e

inconclusa, por não dar conta de todas as questões suscitadas, em virtude dos limites do objetivo

proposto, além do fato de estarmos inseridos no contexto da diversidade do campo brasileiro e

dos movimentos sociais organizados. Essa consciência exige do pesquisador humildade frente

aos desafios encontrados e disposição para dar continuidade à questão que abraçou no universo

da pesquisa científica. Assim sendo, reconhecemos a relevância do nosso trabalho, o qual nos

oportunizou adentrar numa discussão necessária às práticas curriculares na educação do campo,

num viés crítico e reflexivo que ora discorremos.

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2 UM MERGULHO NAS INVESTIGAÇÕES: TRAÇANDO AS TRILHAS PARA A

PESQUISA

Tão belo sol brilha no horizonte

Pintando no céu novo dia

Um pincel colorindo aquarela

Que o bom pescador principia

Hora de partir para o mar

Enfrentar com certeza o remanso

Depois de um mero descanso

Na rede que aprendeu navegar

Tainheira em sua persistência

Com tantas linhas a arte lhe deu

Sua imagem está retratada

Nas histórias que o tempo escreveu

(CORINGA, Zelito; SOUZA, Élio)

Neste capítulo abordaremos os aspectos metodológicos vivenciados nesta pesquisa, que

se configura enquanto pesquisa qualitativa, cuja organização do trabalho para a construção dos

dados se deu através de ações formativas que auxiliaram no processo de co-produção do

conhecimento entre a pesquisadora e um grupo de professores, denominado aqui de Grupo

Colaborador, co-partícipe deste trabalho, na medida em que assumiram a participação nas

sessões reflexivas, espaços de diálogo gestados na condução do processo de investigação,

referenciadas na abordagem da pesquisa colaborativa, proposta por Ibiapina (2008) e Ferreira

(2007).

Vale destacar que o Grupo Colaborador desta pesquisa, composto por dois professores,

duas supervisoras, uma gestora, um pai dos alunos e uma auxiliar de secretaria, foi formado

pela escola, anteriormente ao desenvolvimento desta pesquisa, através de assembleia, para

orientar as discussões sobre a elaboração do Projeto Político Pedagógico – PPP e do currículo

escolar da instituição. Ou seja, quando nos referimos ao Grupo Colaborador de nossa pesquisa,

estamos fazendo referência, também, ao Grupo de Trabalho do PPP da escola onde

desenvolvemos o trabalho. A seguir, caracterizaremos o locus do campo da pesquisa,

destacando, as estratégias e procedimentos utilizados que permitiram a produção dos dados aqui

apresentados, articulando-os às nossas observações interpretativas, cuja ênfase desvela a

realidade histórico-social em que estão imersos a escola, os sujeitos, o campo investigativo e o

objeto de estudo.

Durante nosso trilhar metodológico pactuamos com os co-partícipes, colaboradores

desta pesquisa, um compromisso coletivo para a realização das sessões reflexivas, que se

constituíram em espaços sistematicamente organizados para a reflexão e discussão de algumas

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temáticas consideradas relevantes no processo de elaboração do currículo da escola, auxiliando

os professores a analisarem suas práticas e seus objetivos.

A realização destas sessões possibilitou que se revelassem as potencialidades e as

dificuldades que o Grupo Colaborador, encarregado de elaboração do PPP da Escola Municipal

Alferes Cassiano Martins possuía no tocante a elaborar e implementar um projeto educativo

sintonizado com as demandas e problemáticas vividas pelos sujeitos que vivem na/da Reserva,

possibilitando discutirmos acerca dos limites, possibilidades e desafios enfrentados na

construção de um Projeto Político Pedagógico pensado pelo e para o povo do campo, mais

particularmente o campo da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do

Tubarão (RDSEPT).

Para aprofundar algumas questões suscitadas durante as sessões reflexivas utilizamos

também como procedimento metodológico nesta pesquisa a entrevista, organizada por eixos

temáticos, cujas palavras recolhidas no gravador tornaram-se elemento central no processo de

apreensão das significações dos interlocutores. Paralelo a esse procedimento,

complementarmente, buscamos nos aproximar dos interesses dos estudantes para confrontá-los

com as discussões produzidas no Grupo Colaborador acerca dos saberes e das experiências

advindos da RDSEPT, que são tematizadas no currículo da escola. Para isso, utilizamos

questionários aplicados junto a uma mostra de quinze alunos do Ensino Fundamental (4º, 8º e

9º anos), intencionando mapear alguns dados considerados relevantes às análises da pesquisa,

como os interesses deles em relação à escola, o olhar que possuem sobre esta e seu currículo,

como também sobre os conhecimentos que tinham acerca da Reserva da qual fazem parte.

Questionários também foram aplicados junto ao Grupo Colaborador com o objetivo de

identificar eventuais necessidades formativas a serem contempladas nas sessões reflexivas

durante a pesquisa. Assim, pudemos analisar de que forma o Grupo de Trabalho do PPP da

Escola Alferes Cassiano Martins, em particular os professores, concebe e considera os aspectos

pedagógicos, históricos, políticos, culturais, econômicos e sociais da Reserva em seu Projeto

Político Pedagógico, ressaltando os saberes e as experiências dos educandos que são

tematizados durante o processo de elaboração do currículo escolar.

2.1 CONHECENDO O LOCUS DA PESQUISA

A pesquisa, de abordagem qualitativa, foi realizada no período de junho de 2014 a

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julho de 2015, tendo como locus a Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, localizada no

distrito de Barreiras, município de Macau, estado do Rio Grande do Norte, a 23 quilômetros da

sede do município. Há 56 (cinquenta e seis) anos que essa instituição presta serviços educativos

à comunidade, através da Lei Municipal nº 177, de 22 de março de 1959, que cria a referida

escola. Desde 2003 está inserida na área de Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual

Ponta do Tubarão, participando, das ações promovidas pelo Instituto de Desenvolvimento

Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (IDEMA) e pelo Conselho Gestor Local

da referida reserva.

Apesar de ser uma entidade mantida pelo poder público municipal, gerenciada pela

Secretaria Municipal de Educação, os recursos financeiros destinados à escola são todos

provenientes de Programas Federais tais como: Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE),

Programa Dinheiro Direto na Escola do Campo (PDDE CAMPO) e Programa Mais Educação,

tornando-se essenciais ao funcionamento da instituição. É contemplada também com o

Programa Nacional Biblioteca Escolar (PNBE), Programa Nacional de Alimentação Escolar

(PNAE) e Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC).

Ao iniciarmos a pesquisa a escola possuía 294 (duzentos e noventa e quatro) educandos,

distribuídos em três turnos (matutino, vespertino e noturno), nas seguintes etapas e modalidades

de ensino: Educação Infantil (Pré- escola), Ensino Fundamental do 1º ao 9º ano e Educação de

Jovens e Adultos (EJA) (do 3º ao 5º períodos). Ao término da pesquisa a escola possuía 300

(trezentos) estudantes, divididos nos três turnos (matutino, vespertino e noturno), entre as

mesmas etapas e modalidade já referenciadas, porém a oferta da EJA ficou limitada ao 3º e 4º

período, no turno vespertino, numa turma multianual, em virtude da distorção idade-ano dos

estudantes do 4° e 5º ano, funcionando de forma sutil como uma sala de correção de fluxo.

Os demais alunos que estudavam na EJA foram remanejados para os anos finais do Ens.

Fundamental, onde convivem em turmas bem heterogêneas quanto às idades, cuja ampliação

das turmas possibilitou a oferta desta etapa do ensino no turno noturno, pois segundo a gestão,

esta foi a melhor solução encontrada pela instituição para fugir dos altos índices de evasão da

EJA, sem deixar de ofertar as etapas de ensino na qual correspondia os períodos, antes

ofertados.

Estas modificações resultam não somente de uma decisão de gestão, mas da fragilidade

das práticas pedagógicas desenvolvidas na escola, uma vez que a rotatividade no quadro de

contratados era constante, gerando uma descontinuidade natural nos processos educativos da

escola, pois, ao iniciarmos a pesquisa, a escola possuía em seu quadro de pessoal uma diretora,

uma vice-diretora (cargos comissionados), cinco auxiliares de secretaria (efetivos), duas

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supervisoras (uma professora efetiva, pedagoga, em desvio de função e uma contratada,

graduada em Ciências Biológicas), uma merendeira, sete ASG, dois vigias e 24 (vinte e quatro)

professores, destes somente 06 (seis) eram do quadro efetivo, os demais eram professores

contratados através de processo seletivo realizado pela Secretaria Municipal de Educação. No

transcurso da pesquisa este quadro funcional sofreu alterações, no que se refere a origem da

contratação docente, pois das dezoito vagas ocupadas no ano anterior pelos professores

celetistas, dezesseis, foram preenchidas com docentes oriundos do concurso público realizado

em 2014 pelo município, e apenas dois professores foram contratados, para suprir as aulas dos

componentes curriculares de Inglês e Arte. Vale destacar que desse quadro somente quatro

docentes residem na comunidade, a maioria mora em outros municípios e desconhece a área de

campo na qual estão inseridos.

Fisicamente a escola é composta por: uma sala da diretoria, outra de secretaria, seis salas

de aula, uma sala de informática, uma cozinha, uma sala de vídeo/sala de leitura, sete banheiros

com sanitários, dois depósitos e uma dispensa, que ainda são insuficientes para atender

dignamente a demanda apresentada pela escola. É considerada uma escola de médio porte

dentro da organização educacional do município.

2.1.1 Caracterizando os Sujeitos da Pesquisa

Na Ciência, a pesquisa se constitui em uma atividade nuclear que possibilita uma

aproximação e uma compreensão maior da realidade a ser investigada, podendo fornecer

subsídios para uma intervenção nessa realidade. Ela pode ser desenvolvida numa abordagem

quantitativa, que busca representar a realidade pesquisada através da linguagem matemática

com dados mensuráveis, garantindo a precisão dos resultados, ou numa abordagem qualitativa

preocupando-se com o significado dos fenômenos e processos sociais, salientando os aspectos

dinâmicos, holísticos e individuais da experiência humana, aprofundando em sua compreensão.

Dessa forma, no intuito de compreender a articulação entre os saberes e experiências dos

sujeitos habitantes da RDSEPT e o processo de elaboração do currículo escolar, da Escola

Municipal Alferes Cassiano Martins, situada numa área de campo, caracterizado como

pesqueiro, optamos por adotar em nossa pesquisa uma abordagem qualitativa, cujo trilhar

metodológico se ocupou de atividades de estudo e reflexão, junto aos sujeitos que compõem o

Grupo de Trabalho do Projeto Político Pedagógico da referida escola, já instituído

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anteriormente, denominado de Grupo Colaborador, para fins e objetivos desta investigação, por

coproduzirem os conhecimentos desta pesquisa, e buscarem apreender os significados

produzidos pelos sujeitos do próprio grupo, durante este processo da pesquisa.

A escolha de centrar a pesquisa nas atividades desenvolvidas por este grupo deveu-se

ao fato de ele agregar pessoas que pertencem à comunidade e outras que apenas trabalham nela,

oportunizando a presença de diferentes olhares no processo de tematização dos saberes e

experiências dos sujeitos da Reserva processo de elaboração do currículo da instituição, objeto

de investigação desta pesquisa. Sabemos que as abordagens qualitativas na pesquisa fazem

suscitar questões éticas acerca da identidade dos sujeitos pesquisados, por isso, em nossa

pesquisa consideramos o que propõe Lüdke e André (2013, p. 59) “Uma medida geralmente

tomada para manter o anonimato dos respondentes é o uso de nomes fictícios no relato, além,

evidentemente, do cuidado para não revelar informações que possam identificá-los”.

Assim, para preservar a identidade do Grupo Colaborador desta pesquisa, os co-

partícipes receberam nomes de espécies que compõem a fauna local da Reserva, conforme

quadro a seguir, que aparecerão após os registros de suas falas produzidas durante as

interlocuções, e transcritas para análise neste trabalho, este foi um dos compromissos assumidos

com os componentes do grupo durante a apresentação da proposta desta pesquisa na escola.

Quadro 1 – Caracterização do grupo colaborador

COLABORADOR/A IDADE SEXO OCUPAÇÃO

TEMPO

DE

SERVIÇO

FORMAÇÃO SEGMENTO QUE

REPRESENTA

Garça-branca 43 F Gestora

escolar 25 Lic. Pedagogia Gestão da escola

Gavião 42 F Professora 16

Lic. Pedagogia

(especialista em

Supervisão Escolar)

Supervisão Escolar

Canário do Mangue 32 F Professora 12 Lic. Pedagogia Professor – anos

iniciais

Tamatião 47 F Aux. de

Secretaria 17 Ens. Médio Funcionários

Dentão 36 M Professor 12 Lic. História Professor dos anos

finais do Ens.

Fundamental

Muriongo 45 M Vigilante 17

Ens. Médio

(cursando

Pedagogia)

Pais

Galinha do Mangue 30 F Professora 05 Lic. Ciências

Biológicas Supervisão Escolar

Fonte: A autora

Percebe-se, por esta composição, que a maioria dos colaboradores pertencia ao sexo

feminino, fato que evidencia o predomínio das mulheres na área da educação, cuja faixa etária

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variava entre trinta e quarenta e sete anos, e que todos possuíam entre cinco e vinte anos de

experiência na educação, quer em funções docentes ou não.

Com exceção de uma das supervisoras, os demais colaboradores desta pesquisa moram

na comunidade de Barreiras, mas o colaborador Dentão e a colaboradora Canário do Mangue

não são da comunidade, ele reside há 12 anos e ela há cerca de cinco anos, porém esta última

vivenciou o processo de luta das comunidades pela Reserva, pelo fato de morar em uma delas.

O professor e a professora que participaram do grupo de trabalho do PPP da escola,

estão há mais de 5 (cinco) anos na instituição e demonstraram interesse em participar desse

processo, mas apontaram as dificuldades em conciliar os seus horários de trabalho, a jornada

dupla com os encontros do grupo para estudo e discussão. Essa dificuldade também se refletiu

no cumprimento dos combinados da pesquisa, pois as sessões reflexivas que haviam sido

programadas para acontecerem quinzenalmente, alternando os dias da semana, para que

pudéssemos concluir ainda no ano de 2014, não foi possível, o que nos fez adentrar 2015 com

essas sessões pendentes, concluindo-as em julho desse mesmo ano.

Com a realização de concurso público no município de Macau–RN, a escola somente

conseguiu se reestruturar quanto à alocação de professores, a partir do mês de julho do ano de

2015, fato que fez nossa pesquisa ficar vulnerável, exigindo de nós um contato mais próximo

com alguns destes docentes, porém informal, para nos inteirarmos sobre suas expectativas

profissionais, bem como seus (des)conhecimento sobre a Reserva, o contexto de campo no qual

estão se inserindo profissionalmente. Suas falas foram consideradas para que pudéssemos

compreender o atual contexto vivido pela escola, porém não serão referenciadas nas análises

desta pesquisa.

Estes contatos aconteceram através de observação feita durante um planejamento

realizado pela colaboradora Galinha do Mangue, no dia 31 de julho de 2015, com os professores

da Educação Infantil e Ensino Fundamental e durante a realização de uma palestra na escola

pela equipe do IDEMA no dia 24 do mesmo mês, destinada aos estudantes e professores, para

tratar dos doze anos da constituição da RDSEPT.

O Grupo Colaborador, ao longo da pesquisa, demonstrou interesse, liberdade para se

expressar, desejo de aprofundar o conhecimento, e acima de tudo, vontade em elaborar uma

proposta pedagógica que correspondesse às reais necessidades da comunidade na qual estão

inseridos e que contemplasse os saberes produzidos no entorno da Reserva.

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2.2 PESQUISA QUALITATIVA NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: ADENTRANDO NO

CAMPO DA RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL

PONTA DO TUBARÃO

Ao longo dos anos o currículo escolar, vem ganhando notoriedade, em face das políticas

oficiais de currículo no país, das pesquisas e das produções teóricas que abordam novos temas

que reflete influências nesse campo, tornando-o objeto privilegiado de investigação, debates e

análises, dada sua vinculação ao projeto de sociedade que se pretende formar. Essa questão do

currículo como núcleo para o desenvolvimento das práticas intencionais na formação humana

no seio das escolas, tem se constituído em tema para debates e proposições na Educação do

Campo.

Os estudos nessa área além de teorizar o currículo, possibilitam a compreensão do

impacto das recentes transformações culturais no currículo escolar, na forma de organizá-lo e

concebê-lo. Esta pesquisa se insere nessa discussão, ao propor investigar o processo de

elaboração do PPP e da proposta curricular da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins,

caracterizada geograficamente como escola do campo, destacando sua articulação com os

saberes e as experiências dos habitantes da RDSEPT.

Nesse sentido, reconhecendo a especificidade do objeto ao qual nos propomos a

investigar, nos apoiamos metodologicamente dentro de uma abordagem qualitativa da pesquisa,

que para Minayo (2008, p. 57):

O método qualitativo é o mais adequado aos estudos da história, das representações e

crenças das relações, das percepções e opiniões, ou seja, dos produtos das

interpretações que os humanos fazem durante suas vidas, da forma como constroem

seus artefatos materiais e a si mesmos, sentem e pensam.

É no âmbito do estudo das relações, das crenças, dos valores, das motivações e das

atitudes dos sujeitos, que a Pesquisa Qualitativa se insere nas ciências sociais, ocupando-se com

o universo dos significados, compreendendo esses fenômenos como parte da realidade social,

onde o ser humano distingue-se não somente por suas ações, mas por pensar sobre si, sobre o

que faz, refletir e interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com

seus semelhantes.

As abordagens qualitativas têm sido recorrentes nas investigações científicas de grupos,

de histórias sociais, de relações, bem como para análise de discursos e documentos, por suas

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características e natureza, pois buscam explicar os fenômenos sociais, considerando o ambiente

como fonte direta para a construção dos dados. Vem se configurando numa forma de pensar e

fazer pesquisa que parte do fundamento de que as relações entre indivíduo e sociedade são

dinâmicas, havendo uma interdependência entre sujeito e objeto de estudo, portanto uma

indissociabilidade entre o mundo objetivo e subjetivo do sujeito. A esse respeito Silveira e

Córdova (2009, p. 32) enfatizam que:

As características da pesquisa qualitativa são: objetivação do fenômeno;

hierarquização das ações de descrever, compreender, explicar, precisão das relações

entre o global e o local em determinado fenômeno; observância das diferenças entre

o mundo social e o mundo natural; respeito ao caráter interativo entre os objetivos

buscados pelos investigadores, suas orientações teóricas e seus dados empíricos;

busca de resultados os mais fidedignos possíveis; oposição ao pressuposto que

defende um modelo único de pesquisa para todas as ciências.

Entendemos que os elementos da investigação qualitativa se constituem na interação

entre o pesquisador e o objeto de estudo, no registro dos dados construídos e na interpretação

do pesquisador. Assim, optamos por desenvolver essa investigação numa abordagem

qualitativa buscando compreender e explicar a dinâmica do processo de elaboração da proposta

curricular da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, identificando os fatores que

direcionaram e/ou contribuiu para esse processo, à luz dos elementos curriculares propostos

dentro do paradigma da Educação do Campo.

Entretanto, para ajudar na construção e na análise dos dados buscamos referência nos

aportes conceituais da pesquisa colaborativa, propostos por Ibiapina (2008) e por Ferreira

(2007), por considerarmos funcionais ao desenrolar metodológico da pesquisa, em particular as

sessões reflexivas, sobre as quais trataremos mais adiante.

Para Ibiapina (2008, p. 34) o processo colaborativo, no contexto da investigação

científica significa:

Tomada de decisões democráticas, ação comum e comunicação entre investigadores

e agentes sociais que levem à construção de um acordo quanto às suas percepções e

princípios. Nessa perspectiva, a colaboração se efetiva a partir da interação entre pares

com diferentes níveis de competência, isto é, colaboração significa a ajuda que um

par mais experiente, no caso o pesquisador, dá a um outro menos experiente no

momento de realização de determinada atividade, no caso a pesquisa, é também ação

formativa desenvolvida conjuntamente que faz o desenvolvimento pessoal e

profissional de professores.

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Dessa forma, sabendo do processo de elaboração do Projeto Político Pedagógico e da

proposta curricular que ora se realizava na escola pesquisada, pensamos em desenvolver um

percurso metodológico que constituísse esta pesquisa enquanto espaço de reflexão coletiva

sobre aquele processo em andamento, numa perspectiva interativa e colaborativa, assumindo

somente um procedimento dessa abordagem, a Sessão Reflexiva, por considerarmos a

contribuição desse procedimento à produção dos dados nessa investigação, sem com isso

caracterizá-la como pesquisa colaborativa, pois reconhecemos os limites metodológicos

impostos pelo tempo dessa investigação, fato que não nos permitiu realizar os procedimentos

necessários que a qualificasse enquanto pesquisa colaborativa.

Vale destacar que o termo Sessão Reflexiva adotado nessa pesquisa está de acordo com

o que propõe Ferreira (2007), para designar o espaço de formação, autoformação, colaboração

entre os sujeitos envolvidos na pesquisa, pois para a Ibiapina (2008) a construção desse espaço

na Pesquisa Colaborativa constituem sessões de estudo. São terminologias diferentes para

designar o mesmo procedimento.

Este processo de reflexão se deu numa abordagem qualitativa, onde o estudo das

experiências humanas deve ser feito entendendo que as pessoas interagem, interpretam e

constroem sentidos, assim a pesquisa qualitativa busca compreender o fenômeno a partir dos

símbolos ou significados atribuídos a eles, elemento fundamental na construção dos dados desta

investigação.

O objetivo de optarmos por inserir, parcialmente, em nossa orientação teórico-

metodológica, alguns aspectos da pesquisa colaborativa, resulta de nossa proposição de

condução desta pesquisa como espaço de reflexão e autoformação, onde os sujeitos envolvidos

– reconhecidos como Grupo Colaborador – pudessem se perceber como investigadores de sua

própria prática e realidade.

Essa percepção se deu ao mesmo tempo em que se reconheciam como objeto de

investigação, co-produtores de conhecimento, de formação, de reflexão e de desenvolvimento

profissional, de forma interativa entre a pesquisadora e o Grupo Colaborador, possibilitando

mecanismos para a transformação da realidade educativa, vivenciada pelos próprios sujeitos.

É neste cenário de investigações que a Educação do Campo tem ganhado destaque no

âmbito das pesquisas sociais1, em face da demanda de ordem política, epistemológica,

1MOLINA (2006) destaca que nos últimos dez anos, os debates sobre da Educação do Campo

possibilitaram aglutinar um conjunto representativo de pesquisadores, por estar em permanente

associação com as questões do desenvolvimento e do território no qual ela se enraíza, acolhendo

investigações sobre a diversidade dos sujeitos do campo.

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pedagógica, curricular, cultural e social que atravessam sua construção enquanto modalidade

de ensino, cujas produções têm apontado a necessidade de compreendermos o campo como

espaço de vida diverso, que está em constante movimento, que é plural, mas que também possui

singularidades e especificidades.

Esta pesquisa se insere no contexto desses estudos sobre a diversidade do campo, de

suas formas de existência e resistência, tematizando a Reserva de Desenvolvimento Sustentável

Estadual Ponta do Tubarão (RDSEPT), pela importância adquirida a partir de sua constituição

enquanto Unidade de conservação (a primeira do nosso Estado), para as comunidades

abrangidas por ela.

A importância desta Reserva enquanto Unidade de Conservação não deve ser vista

somente nos aspectos ambientais, culturais, econômicos e sociais, mas também nos aspectos

educacionais, uma vez que as relações estabelecidas com esta área demandam dos seus sujeitos

novos conhecimentos, que agregados aos saberes e as experiências produzidas na comunidade

possibilitam a preservação dos seus costumes, mas também a construção de novos

comportamentos indispensáveis ao manejo da área, à utilização de suas potencialidades.

A Resolução do CNE/CEB n° 01 de 03 de abril de 2002, ao instituir as Diretrizes

Operacionais para a Educação Básica para as Escolas do Campo, estabelece em seu Art. 2º, que

respeitadas estas diretrizes, visam adequar o projeto institucional das escolas do campo às

demais diretrizes que orientam todas as etapas e modalidades da educação.

Assim, na perspectiva de compreendermos a articulação entre o currículo escolar e os

saberes e as experiências advindas da RDSEPT, é que nos propomos a investigar o processo de

elaboração do currículo da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, locus desta pesquisa,

por entendermos que a escola ocupa um lugar estratégico no processo de formação dos sujeitos

educandos da RDSEPT, cuja ação educativa tanto pode ameaçar a manutenção dos

conhecimentos tradicionais2 da Reserva, como pode possibilitar a construção de uma nova

relação desse sujeito com o seu lugar, fortalecer sua cultura, sua identidade e contribuir para a

construção do “ser sujeito da Reserva”.

Assim, o início de nossa pesquisa na Escola Municipal Alferes Cassiano Martins que

compartilha com a RDSEPT, o espaço social, cultural, político e econômico, da comunidade de

Barreiras, no município de Macau, significou andarmos na direção do que se propõe no âmbito

das investigações na Educação do Campo, evidenciar as múltiplas relações que tecem a

2 Diegues e Arruda (2001, p.31) definem como conhecimento tradicional o “conjunto de saberes e saber-

fazer a respeito do mundo natural e sobrenatural, transmitido oralmente, de geração em geração”, o que

constitui uma ligação orgânica entre natureza, cultura e organização social.

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diversidade do campo brasileiro, e de como estas relações se fazem presentes no currículo

escolar.

Fernandes (2006, p.31) propõe que as pesquisas nesta área sejam desenvolvidas nos

parâmetros da compreensão do campo como espaço e território, para além dos limites

territoriais geográficos, o campo se constitui, também, num espaço político, que não possui

áreas, mas dimensões, que são tecidas e transformadas continuamente no espaço das relações

sociais, que por sua vez estão contidas no espaço geográfico, e expressam assim a materialidade

da existência humana. Para ele essa compreensão é fundamental para que se supere a lógica do

campo como setor da economia, e afirma:

O campo pode ser pensado como território ou como setor da economia. O significado

territorial é mais amplo que o significado setorial que entende o campo simplesmente

como espaço de produção de mercadorias. Pensar o campo como território significa

compreendê-lo como espaço de vida, ou como um tipo de espaço geográfico onde se

realizam todas as dimensões da existência humana. O conceito de campo como espaço

de vida é multidimensional e nos possibilita leituras e políticas mais amplas do que o

conceito de campo ou de rural somente como espaço de produção de mercadorias

(FERNANDES, 2006, p. 28-29).

Esta pesquisa, ao discutir a articulação entre a proposta curricular da escola e os saberes

e as experiências advindas dos habitantes da RDSEPT, compreende que a educação se constitui

em uma das dimensões deste território construído socialmente. Para Fernandes (2006, p.37) “as

pesquisas em Educação do Campo são processos de construção de conhecimentos (territórios

imateriais) que procuram contribuir com o desenvolvimento dos territórios materiais – campo

como espaço de vida”.

Como já anunciado anteriormente, na tentativa de caminharmos em direção a esta

construção, adotamos nesta pesquisa, como princípio básico no processo de colaboração, a

busca pelo conhecimento co-construído através da criação de espaços de formação entre

pesquisadora e colaboradores, cujos interesses partilhados, o da pesquisa e o da formação,

puderam se enriquecer mutuamente.

Apesar de ser um dos princípios da Pesquisa Colaborativa, para fins e objetivos dessa

investigação, o processo de colaboração foi utilizado para orientar a construção dos dados, pois

reconhecemos que não utilizamos os procedimentos necessários para qualificar esta pesquisa

enquanto colaborativa, que para Ferreira (2007, p. 21):

Sem renegar todas as contribuições com as quais a pesquisa-ação permitiu uma

melhor compreensão da realidade do currículo e do ensino, seus limites e suas

possíveis derivações levaram à proposta de uma interação mais equilibrada entre

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29

pesquisa e formação: esse é o pressuposto da pesquisa colaborativa. A fundamentação

epistemológica e sociológica permanece a mesma: incorporar a competência prática e

reflexiva do ator em seu contexto natural.

Ibiapina (2008, p. 25) também destaca a importância do trabalho colaborativo no

processo de desenvolvimento profissional, ao afirmar que se trata de uma “atividade de co-

produção de conhecimentos e de formação em que os pares colaboram entre si com o objetivo

de resolver conjuntamente problemas que afligem a educação”.

Esses espaços de colaboração vivenciados durante a pesquisa possibilitam uma nova

relação de desconstrução e construção entre os partícipes, das teorias apreendidas em cursos de

formação e nas experiências vividas ao longo de sua prática profissional, como pudemos

identificar na fala da professora Canário do Mangue, em uma de nossas sessões reflexivas, ao

dizer, com surpresa: “Eu não sabia que o Alferes era uma Escola do Campo! Fiz o PNAIC

(Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa), o pessoal de Diogo3 ficava na outra turma

que era com as escolas do campo, mas nunca ninguém disse que a gente também era escola do

campo”.

A reflexão crítica sobre sua prática, naquele momento das sessões reflexivas em que se

discutiam as características de uma escola do campo, permitiu à professora localizar-se em um

novo contexto social, político e educacional, confrontando-o com o contexto de tradição da

cultura organizacional das escolas no município de Macau que não reconhecia a sua escola

como sendo Escola do Campo.

No nosso entender, momentos como esses, se constituíram numa das grandes

contribuições da adoção de alguns conceitos da Pesquisa Colaborativa neste trabalho, cuja

participação dos colaboradores com a reflexão como ato coletivo, a autorreflexão e o

autoconhecimento sobre sua prática no processo de elaboração do currículo da escola, subsidiou

a fundamentação epistemológica desta pesquisa.

Sendo assim, buscamos apreender, em cada sessão reflexiva realizada, a cada gravação,

o sentido que a RDSEPT possuía para o Grupo Colaborador, seu envolvimento com esta área,

tentando compreender as múltiplas relações que estabeleciam entre a Reserva, os saberes por

ela emanados, e o Projeto Político Pedagógico que ora discutiam e elaboravam para a Escola

Municipal Alferes Cassiano Martins, em Macau – RN..

3 Referindo-se à Diogo Lopes, comunidade vizinha a Barreiras, que também faz parte da RDSEPT.

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30

2.3 PROCEDIMENTOS DA PESQUISA

Na abordagem qualitativa, o pesquisador objetiva aprofundar-se na compreensão dos

fenômenos que estuda, das ações dos indivíduos, dos grupos, em seu contexto social,

interpretando-os, de acordo com as perspectivas dos próprios sujeitos que participam da

situação. Para Minayo (2008), os instrumentos de trabalho de campo na pesquisa qualitativa

permitem uma mediação entre o marco teórico-metodológico e a realidade empírica.

Neste sentido, no caminhar desta pesquisa, tivemos nosso primeiro contato com a equipe

gestora da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, no mês de maio do ano de 2014, para

informarmos sobre a pesquisa, seus objetivos e interesse, bem como a possibilidade de sua

realização com a referida instituição. No momento percebemos a satisfação da equipe em nos

acolher, ao mesmo instante em que Garça-Branca, gestora da escola, afirmava verbalmente:

“ainda bem que agora vamos ganhar uma ajuda para a construção do Projeto Político

Pedagógico da escola. Nesse momento toda ajuda é bem vinda”.

Esta fala nos evidenciou, em princípio, que a gestão escolar estava tendo dificuldades

em conduzir o processo de elaboração do Projeto Político Pedagógico – PPP, ao mesmo tempo

em que viu em nosso trabalho de investigação acadêmica a possibilidade de interação e

colaboração entre academia e escola, aceitando, assim, a proposta, e nos colocando em

articulação com o Grupo de Trabalho do PPP da instituição, já constituído sob a orientação da

Secretaria Municipal de Educação, no contexto de um trabalho de acompanhamento e

orientação ao processo de (re) elaboração do PPP das escolas de sua rede.

Nesse sentido, Ferreira (2007, p. 24) afirma que pesquisar colaborativamente em

educação, “além de desenvolver o sentido social da aproximação entre os pesquisadores

acadêmicos e as carências da prática de ensino dos professores, abre os caminhos para a

autoformação de ambos”. Este processo acontece numa relação complexa em virtude de sua

dupla função: formativa e de produção do conhecimento, fato que requer atenção para o

cumprimento das exigências formais da academia, no tocante ao processo de construção do

conhecimento, sem menosprezar o ponto de vista dos colaboradores no que se refere à reflexão

e compreensão de sua prática.

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31

Assim, nosso primeiro contato com o campo4 pesquisado e com o Grupo Colaborador

aconteceu em junho de 2014, para apresentar a proposta de investigação, bem como definir os

caminhos metodológicos a serem trilhados no processo de construção dos dados, iniciando

posteriormente com a observação participante.

2.3.1 Observação Participante

Definimos como observação participante o processo pelo qual vivenciamos na escola

pesquisada, a relação direta com os interlocutores, participando, na medida do possível de sua

vida social, no seu cenário cultural, observando uma determinada realidade social, cuja

finalidade era compreender o contexto da pesquisa, ao mesmo instante em que construíamos os

dados da investigação, buscando apreender os sentidos acerca daquela realidade. A respeito

dessa nossa escolha para a construção dos dados na pesquisa, Minayo (2009, p. 35) destaca:

A filosofia que fundamenta a observação participante é a necessidade que todo

pesquisador social tem de relativizar o espaço social de provém, aprendendo a se

colocar no lugar do outro. Como já dissemos anteriormente, no trabalho qualitativo, a

proximidade com os interlocutores, longe de ser um inconveniente, é uma virtude e

uma necessidade.

A observação pode ser usada como procedimento principal de uma investigação ou

associada a outras técnicas. Para Lüdke e André (2013, p. 30):

A observação possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador com o

fenômeno pesquisado, o que apresenta uma série de vantagens. Em primeiro lugar, a

experiência direta é sem dúvida o melhor teste de verificação da ocorrência de

determinado fenômeno.

No intuito de nos aproximar da realidade cotidiana da escola pesquisada, no período de

junho a setembro do ano de 2014, realizamos três5 períodos de observações na escola, duas no

turno vespertino e uma no turno noturno, para apreender sua cultura organizacional, seu

4 O termo campo aqui está sendo utilizado para designar o recorte espacial, no que se refere a

abrangência empírica ao objeto de investigação. 5 O número de observações realizadas ficou comprometido em razão do momento crítico vivido pela

escola com a falta de professor.

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32

cotidiano, aproveitando o espaço para a realização de entrevistas exploratórias com a equipe

gestora e pedagógica da escola, a fim de diagnosticar na visão destas, as necessidades

formativas dos profissionais da escola, particularmente dos professores.

Nesse momento notamos que pairava na escola um clima amistoso entre os alunos e os

funcionários, nas salas de aula havia a presença constante dos professores e dos alunos, estes

no intervalo usavam uma área pequena sem cobertura que separa a direção, as salas de aula e a

cozinha da escola, para brincarem, correrem, conversarem. Com frequência, no intervalo,

procuravam a equipe gestora e pedagógica solicitando jogos e bolas para utilizarem em suas

atividades recreativas.

A presença da pesquisadora no ambiente escolar, a princípio, gerou curiosidades por

parte dos alunos e funcionários, que foram sanadas com a explicação do porquê de sua presença

na instituição, que se tratava de uma pesquisa acadêmica. Acerca dessa situação na pesquisa

qualitativa, Lüdke e André (2013, p. 34) explica:

O observador como participante é um papel em que a identidade do pesquisador e os

objetivos do estudo são revelados ao grupo pesquisado desde o início. Nessa posição,

o pesquisador pode ter acesso a uma gama variada de informações, até mesmo

confidenciais, pedindo cooperação ao grupo. Contudo, terá em geral que aceitar o

controle do grupo sobre o que será ou não tornado público pela pesquisa.

Assim, retomamos a observação em 2015, procurando dialogar com os alunos, com os

docentes recém-convocados em concurso público para trabalhar na escola, e demais

funcionários com o objetivo de torna-los cientes da pesquisa, além de conhecer suas

expectativas em relação à escola, a comunidade, seus interesses (ou não) sobre a RDSEPT.

Em virtude da convocação dos docentes, observando os critérios legais e prazos

estabelecidos, a escola somente conseguiu vislumbrar o seu quadro docente organizado da

Educação Infantil ao 9º ano e EJA, a partir de julho do ano de 2015. O Ensino Fundamental foi

a etapa mais comprometida com a falta de professores por quase um semestre letivo, tanto nos

anos finais quanto nos anos iniciais.

Dessa forma, no mês de julho, do referido ano, retomamos as observações, realizando-

a em dois momentos, uma durante o planejamento entre a supervisora e o grupo de professores

dos anos iniciais do Ensino Fundamental e da Educação Infantil, realizado no turno matutino,

onde participamos de um momento solicitado pela supervisora para que falássemos da pesquisa

e de sua temática, e a outra durante uma palestra realizada pelo IDEMA, turno noturno, para

alunos e funcionários, cuja temática em pauta era a RDSEPT. Totalizando cinco momentos

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33

distintos de observação na escola, passando pelos três turnos de funcionamento da instituição,

cada observação com duração de quatro horas.

Durante a observação participante no planejamento com os docentes dos anos iniciais e

da Educação Infantil, identificamos um grupo formado por sete docentes quase exclusivamente

por mulheres, havia somente um docente do sexo masculino, destes, somente duas professoras

residiam na comunidade as demais eram de outros municípios e até de outro Estado, mas

demonstravam preocupação com a aprendizagem dos alunos e com sua participação no projeto

Meio Ambiente, que estavam trabalhando. Participamos da palestra sobre a RDSEPT, realizada

pelo IDEMA, no turno noturno, para professores, alunos e funcionários. No momento foram

apresentados aos alunos a história da RDSEPT, e a proposta de uma trilha ecológica para coleta

de lixo às margens do rio, a ser realizada no dia seguinte, pela manhã. Observamos que somente

o turno noturno se fez presente, apesar de terem sido convidados os alunos e os professores do

diurno, fato que poderia comprometer a proposta da equipe. Os alunos ficaram atentos à

apresentação, porém notamos que dos quatro docentes com aulas previstas para esse momento,

somente dois estavam presentes, os demais haviam faltado e justificado sua ausência à

instituição.

O registro dessas observações foi realizado em diário de campo, no qual destacamos o

clima de tranquilidade que permeava as atividades escolares, o envolvimento da equipe gestora

e pedagógica nas atividades cotidianas, a presença dos professores, e preocupação da equipe

pedagógica no que se refere ao apoio material ao docente.

A cada observação participante, tentávamos desvendar as contradições entre as normas

e as regras do cotidiano da escola pesquisada, identificando os possíveis conflitos

organizacionais ali existentes, identificando que ações pedagógicas desenvolvidas pelas

equipes, fragmentavam-se entre os turnos, fragilizando a unidade do projeto educativo da

escola.

Percebemos que os/as alunos/as ficavam à vontade na escola, no que se refere aos

relacionamentos com os funcionários, criavam uma grande expectativa em relação à merenda

escolar, lanchavam nas salas de aulas, haja vista que na escola não há refeitório onde possam

se acomodar. Aproveitamos esses momentos também para aplicar um questionário com esses

alunos/as para apoiar complementarmente nossas inferências em relação aos aspectos

observados.

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34

O questionário6 foi organizado por dois eixos que buscavam apreender a forma de

convivência dos educandos na escola e na RDSEPT, totalizando 10 (dez) questões, com

perguntas de múltipla escolha, aplicado com uma mostra de 15 (quinze) alunos do Ensino

Fundamental, 5 (cinco) do 4º ano, 5 (cinco) do 8º ano e 5 (cinco) do 9º ano, sendo 10 (dez)

deles, dos anos finais do Ensino Fundamental, selecionados através dos seguintes critérios:

cursar os dois últimos anos do Ensino Fundamental anos iniciais (4º e 5º) e finais (8º e 9º);

possuir entre 10 (dez) a 16 (dezesseis) anos de idade; ser morador(a) da comunidade; ser filho/a

de pescador e/ou ter algum vínculo com pessoas ligadas à pesca na comunidade.

O questionário apontou que a renda familiar desses alunos varia entre um e dois salários

mínimos, dentre os pesquisados 6 (seis) são filhos de pescadores, 1 (um) de salineiro, 4 (quatro)

de funcionários públicos contratados e 5 (cinco) disseram que seus pais trabalham em empresas

que prestam serviço para a Petrobras. Percebe-se que as atividades econômicas disponibilizadas

na comunidade são provenientes da pesca e da prestação de serviços públicos, isso explica

porque tem crescido, na comunidade, o número de pessoas que buscam outras alternativas de

emprego fora do município, como por exemplo nas firmas no polo de Guamaré.

Dentre os pesquisados, apontou-se as aulas e o bom relacionamento com os docentes,

como motivos pelos quais frequentam a escola. Ao serem questionados acerca do que mais

gostavam na escola, 12 (doze) alunos apontaram as aulas, e apenas 3 (três) disseram gostar mais

dos amigos e do recreio. 9 (nove) alunos disseram que há uma relação entre o conteúdo

trabalhado na escola e seu cotidiano fora da escola, e 10 (dez) deles afirmaram que a escola

relaciona no conteúdo escolar as problemáticas ambientais da RDSEPT. Curiosamente, apenas

os alunos dos anos iniciais disseram não haver relação do conteúdo da sala de aula e a Reserva.

Acreditamos que esse fato esteja atrelado aos problemas de rotatividade docente e

descontinuidade das práticas pedagógicas da escola durante, fato que tem comprometido a

contextualização dos saberes escolares.

Dos quinze alunos que participaram do questionário, 10 (dez) disseram ter participado

de algum Encontro Ecológico, e sinalizaram para a necessidade de se falar mais sobre a Reserva

durante o ano letivo, de sua importância para a comunidade, quando perguntados sobre o porquê

dessa importância, responderam que era por causa das atividades que se desenvolviam na escola

durante os Encontros Ecológicos e pelos momentos que iam para seu entorno realizar algumas

tarefas. Percebemos que a Reserva faz, de alguma forma, movimentar o cotidiano escolar dos

alunos, e liga-los a uma realidade que está fora da escola.

6 Ver apêndice F.

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35

Durante o período de observação participante, em negociação com a escola, e

respeitando o tempo e os espaços disponíveis pelo locus da pesquisa, a pesquisadora e a gestão

da escola se articularam para a realização do primeiro encontro com o grupo de trabalho do PPP

da instituição para possível colaboração dos mesmos com a investigação.

Assim, a pesquisadora e a equipe gestora organizaram no mês de outubro do ano de

2014, um encontro para apresentação da pesquisa, objetivos e metodologia para o Grupo de

Trabalho do PPP da escola, ocasião em que foi proposta o desenvolvimento da investigação

numa perspectiva colaborativa, através de sessões reflexivas, para a co-produção do

conhecimento, que de imediato foi aceita pelos participantes do grupo presentes, os quais

assinaram o Termo de Livre Consentimento Esclarecido, assumindo um novo compromisso

com os trabalhos da escola e com a pesquisa.

Dessa forma, o primeiro contato com o Grupo Colaborador, que germinou das

observações participantes, foi muito importante para que pudéssemos estabelecer os passos

seguintes da pesquisa, momento em que definimos a utilização das sessões reflexivas e das

entrevistas, como dispositivos a serem realizados com o Grupo Colaborador.

2.3.2 As Sessões Reflexivas: contribuições à pesquisa

Denominamos de Sessões Reflexivas7 os espaços organizados pelo grupo de

colaboração para a realização dos estudos, análise e discussões, das práticas curriculares

desenvolvidas na escola, dentro do processo de elaboração do Projeto Político Pedagógico da

escola. Ibiapina (2008, p. 97) as conceituam “como o contexto, o ambiente propício à reflexão,

locus de promoção da reflexibilidade, como espaço colaborativo que motiva a reflexão

intencional e ajuda a mobilizar o saber necessário à condução da pesquisa colaborativa”. O

termo “Reflexivo” está aqui compreendido conforme o que discute a autora:

7 As Sessões Reflexivas se constituem em espaços de formação e autoformação entre pesquisador e co-

partícipes, diferindo-se do Grupo Focal que para Kitzinger (2000), é uma forma de entrevistas com

grupos, baseada na comunicação e na interação, cujo objetivo principal é reunir informações detalhadas

sobre um tópico específico a partir de um grupo de participantes selecionados, buscando colher

informações que possam proporcionar a compreensão de percepções, crenças, atitudes sobre um tema,

produto ou serviços.

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36

Refletir significa extrair significados decorrentes das experiências advindas da ação

concreta. O ato de pensar, característico do exercício reflexivo. Esse modelo reflexivo

está atrelado à experiência pessoal e ao modo de agir do professor, antecipando as

consequências que podem ocorrer diante das opções realizadas na prática. Nessa

direção, reflexão é o mergulho consciente no mundo da experiência e das inter-

relações pessoais com o objetivo de desvelar valores, crenças, símbolos, relações

afetivas, interesses pessoais e sociais construídos ao longo do percurso pessoal e

profissional (IBIAPINA, 2008, p. 65).

A utilização deste procedimento dentro da pesquisa deve-se ao fato de objetivarmos a

criação de espaços que possibilitasse ao Grupo Colaborador a análise de seus objetivos e de

suas práticas, no processo de elaboração do PPP que ora vivenciavam, bem como da construção

da proposta curricular para a Educação do Campo, numa perspectiva de mediação, onde

pudéssemos confrontar conceitos, ampliar conhecimentos, co-produzir saberes, como nos

indica Ibiapina (2008, p. 96):

Indico as sessões reflexivas como procedimento que motiva os professores a focalizar

a atenção na prática docente e nas intenções de ensino e incentiva a criação de espaços

de reflexão crítica que auxiliem no desenvolvimento da consciência do trabalho

docente, levando os professores a desenvolver sua profissionalidade à medida que

compartilham problemas, discutem e contrastam pontos de vistas teóricos, analisam

os fatores que condicionam sua atividade, observam os significados e os sentidos

emitidos pelos pares. Assim reconstroem a gênese do próprio significar a partir da

linguagem discursiva do outro.

Podemos confirmar esta importância da sessão reflexiva no processo de colaboração

através da fala da Colaboradora Galinha do Mangue que ao discutir sobre o momento de

formação acerca do PPP, argumenta:

Pra mim esse é um momento novo, pois de todo esse tempo que eu tenho vivido na

escola, para mim é um desafio, pois eu não sou formada em Pedagogia e alguns

conceitos e conhecimentos são novos, então vou agarrando, tentando, abraçando e

aprendendo, para que eu possa contribuir com esse processo de construção do PPP e

do currículo da escola8.

Neste momento de reflexão, a Colaboradora se posicionava a favor da realização e da

importância desse espaço para a discussão de conceitos que não foram abordados em sua

graduação. Remete-se ao curso de Pedagogia como área que domina os estudos sobre PPP e

proposta curricular, demonstrando a necessidade de a escola inserir em sua organização

momentos reservados para estudo e formação continuada com sua equipe. Assim, entendemos

8 Galinha do Mangue, em sessão reflexiva realizada em 10/10/2014

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37

que esse procedimento oportunizou ao Grupo Colaborador repensar sua prática, suas definições,

abrindo espaço para as discussões acerca do PPP na Educação do Campo.

Nesse sentido, para construção dos dados da pesquisa realizamos 4 (quatro) sessões

reflexivas cada uma com duração de três horas, cujas temáticas abordadas, expressas no quadro

a seguir, foram importantes para introduzir as reflexões acerca do trabalho educativo

desenvolvido pela escola e sua relação com o contexto social, político, cultural e ambiental que

a cerca, ressaltando a relevância destes espaços no processo de elaboração do Projeto Político

Pedagógico e do currículo escolar, pois ambos precisam ser pensados a partir da realidade

vivida na comunidade.

Quadro 2 - Sessões reflexivas: temáticas e objetivos DATA TEMÁTICA DURAÇÃO OBJETIVO REFERÊNCIAS

10/10/2014

Pesquisa

Qualitativa na Educação do

Campo:

colaborar para

estreitar os laços entre academia e

a escola.

3h

Discutir acerca da Pesquisa

Qualitativa no contexto da

Educação do Campo,

destacando o conceito de colaboração que permeia a

pesquisa colaborativa, e que

será utilizado na condução das

sessões com o grupo co-partícipe, discutindo seus

objetivos e a importância dos

colaboradores no processo de

co-construção do conhecimento.

FERREIRA, Adir Luiz.

Possibilidades e realismo crítico

da Pesquisa e da Formação: a

colaboração entre pesquisadores e professores. In: ______. Pesquisa

em Educação: múltiplos olhares.

Brasília: Líber Livro Editora,

2007, p. 13-27.

26/11/2014

Projeto Político

Pedagógico e Democratização

do ensino –

possibilidades

para a escola do

campo

3h

Relacionar o processo de

democratização do ensino com a construção do Projeto Político

Pedagógico da escola,

reconhecendo sua importância

no processo de construção da

identidade da escola.

LIBÂNEO, José Carlos.

Organização e Gestão da Escola: Teoria e Prática. 6 ed. São Paulo:

Hecus Editora.

21/07/2015

Educação do

Campo e a

Reserva de Desenvolvimento

Sustentável

Estadual Ponta

do Tubarão

3h

Discutir sobre a política nacional de Educação do

Campo, localizando neste

contexto o campo da RDSEPT.

RAMOS, Marise Nogueira; MOREIRA Telma Maria,

SANTOS, Clarice Aparecida dos.

(coord.) REFERÊNCIAS PARA

UMA POLÍTICA NACIONAL

DE EDUCAÇÃO DO CAMPO: CADERNO DE SUBSÍDIOS.

Brasília: Secretaria de Educação

Média e Tecnológica, Grupo Permanente de Trabalho de

Educação do Campo, 2004.

22/07/2015

Currículo escolar

na Educação do Campo: o que a

escola da

RDSEPT tem

(re) produzido?

3h

Analisar as concepções de

currículo que fundamentam a

prática dos professores, refletindo sobre a presença (ou

não) dos saberes e das

experiências que atravessam os

sujeitos da RDSEPT, no currículo da escola.

LIBÂNEO, José Carlos.

Organização e Gestão da Escola:

Teoria e Prática. 6 ed. São Paulo: Hecus Editora.

BRASIL. Resolução CNE/CEB

n. 1/2002. Diretrizes operacionais

para a educação básica nas escolas do campo. Brasília: MEC/CNE,

2002.

Fonte: A autora

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38

Os temas9 trabalhados nestas sessões surgiram das necessidades formativas dos

professores e da equipe pedagógica da escola, identificadas durante a observação participante,

onde mantivemos com eles os nossos primeiros contatos. Em todas as sessões realizamos

estudos norteados por textos impressos e sintetizados em slides, que possibilitaram a reflexão

interpessoal e intrapessoal do grupo, bem como a análise das práticas curriculares

desenvolvidas na escola.

Iniciamos as Sessões Reflexivas discutindo sobre Pesquisa Colaborativa e o papel de

pesquisador e grupo co-partícipe na construção dos dados. Esse encontro aconteceu à noite, na

escola pesquisada, precisamente, na sala do Programa Mais Educação e contou com a

participação de seis colaboradores e quatro professores do turno. Em todas as Sessões

iniciávamos as discussões com questões problematizadoras, discutíamos os textos e

sintetizávamos as discussões com a apresentação de slides.

As demais Sessões aconteceram no turno vespertino, por exigência do Grupo

Colaborador, todas no laboratório de informática. Utilizamos o roteiro das entrevistas como

questões para nortear as discussões nas Sessões Reflexivas, onde pudemos discutir sobre a

estrutura do Projeto Político Pedagógico, do que é Educação do Campo, e como a RDSEPT se

insere no contexto desse novo paradigma, como também sobre currículo escolar e sua estrutura.

Todas as Sessões foram muito ricas para a construção dos dados da pesquisa, oportunizando

diálogos acerca da educação que a escola oferta aos sujeitos da RDSEPT, além de tematizar, na

instituição, a Educação do Campo.

Esta estratégia permitiu a negociação e a co-construção do conhecimento por parte dos

colaboradores, aproximando os interesses formativos da equipe da escola e atendendo também

aos interesses de investigação da pesquisadora. Para Ibiapina (2008, p. 98):

As sessões de estudo precisam partir de problemas advindos da prática ou de lacunas

formativas que representem demandas do professor por formação, por

desenvolvimento de práticas profissionais. (...) Nesse processo, recomendo o uso de

textos didáticos como ferramenta de estudo e de discussão teórica que sustenta a

reflexão crítica, já que a reflexão realizada com base em uma materialidade, nesse

caso, os conhecimentos sistematizados na produção textual, amplia as possibilidades

de desenvolvimento do professor. A estrutura dos textos depende do objetivo da

pesquisa, mas deve conter informações sistematizadas que ajudem na compreensão

do objeto de estudo anunciado pelo pesquisador.

9 Ver apêndice C.

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39

Com exceção da primeira sessão reflexiva que foi realizada à noite, todas as outras

aconteceram no turno vespertino, por ser o horário que melhor acomodava os colaboradores,

mesmo assim, ainda houve oscilação na participação dos professores, nestas sessões, por

questões de solicitação de licença-prêmio por uma das colaboradoras, e pela dupla jornada de

trabalho de outro professor.

Estes colaboradores docentes participaram alternadamente, cada um de duas sessões

reflexivas, sendo que em todas as sessões realizadas obtivemos a presença de um docente, seja

dos anos iniciais do Ensino Fundamental, ou dos anos finais. Buscávamos recuperar em linhas

gerais as discussões da sessão anterior para situá-los, nos debates, de modo que obtivéssemos

uma maior participação e envolvimento desse segmento nas produções.

A participação do representante dos pais dos alunos no grupo de elaboração do PPP da

escola se limitou a apenas uma sessão, pelo fato deste trabalhar e estudar, na sede do município,

sem poder conciliar com os tempos dos estudos criados na pesquisa. Dentre os colaboradores,

obtivemos a constância da participação da gestão e da supervisão da escola, em todas estas

sessões, razão pela qual utilizamos outros dispositivos como estratégia para nos aprofundarmos

nas questões suscitadas por eles, durantes estas sessões, bem como para abstrairmos o sentido

de suas significações aos saberes e as experiências dos sujeitos educandos da RDSEPT no

currículo da escola.

2.3.3 As Entrevistas: apreendendo o sentido dos sujeitos na pesquisa

Para muitos pesquisadores, a utilização da entrevista nas pesquisas em ciências sociais

é recorrente por se tratar de um método de fácil acesso, econômico e que permite maior

aprofundamento das informações obtidas, apontando novos aspectos da realidade pesquisada.

Para nós, o uso da entrevista como procedimento metodológico nesta pesquisa qualitativa deve-

se ao fato de a compreendermos em sua dimensão social, como uma produção da linguagem,

cuja construção dialógica, dada na relação entre os interlocutores, permitiu a espontaneidade, a

aceitação e a interação destes na pesquisa, com os assuntos abordados. A esse respeito,

Bourdieu (1997, p. 693) destaca:

[...] eu creio que não há maneira mais realista de explorar a relação de comunicação

na sua generalidade que a de se ater aos problemas inseparavelmente práticos e

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40

teóricos, o que decorre do caso particular de interação entre o pesquisador e aquele ou

aquela que interroga.

Considerando as interlocuções como espaço de significações, realizamos as entrevistas

reflexivas individualmente com alguns colaboradores, na escola, no período de agosto de 2014

a agosto de 2015, organizando-as nos seguintes eixos norteadores, que também orientaram as

Sessões Reflexivas: (1) RDSEPT e o Currículo escolar, (2) Projeto Político Pedagógico na

Educação do campo e (3) Práticas Pedagógicas na educação do campo, para que pudéssemos

compreender melhor a realidade pesquisada e seus sujeitos e algumas de suas proposições

acerca da RDSEPT, da educação do campo e do currículo escolar. Para Minayo (2009, p. 65-

66):

Uma entrevista como forma privilegiada de interação social, está sujeita à mesma

dinâmica das relações existentes na própria sociedade. Quando se trata de uma

sociedade ou de um grupo, marcado por muitos conflitos, cada entrevista expressa a

forma diferenciada à luz e à sombra da realidade, tanto no ato de realiza-la como nos

dados que aí são produzidos. Além disso, pelo fato de captar formalmente a fala sobre

determinado tema, a entrevista quando analisada, precisa incorporar o contexto de sua

produção e, sempre que possível, ser acompanhada e complementada por informações

provenientes da observação participante.

Através das entrevistas podemos identificar relações, práticas, cumplicidades, omissões,

dentre outros elementos que estão presentes no contexto pesquisado, além das vozes carregadas

pelos interlocutores, sua produção de sentido acerca da realidade pesquisada. Para Ibiapina

(2008, p. 77):

No desenrolar da interlocução, os sentidos são criados e dependem da situação

vivenciada e dos horizontes espaciais ocupados pelo pesquisador e o entrevistado. Os

indivíduos, ao se expressarem carregam o tom de outras vozes, o que reflete a

realidade do grupo, gênero, etnia, classe a qual ele pertence.

Essa interação entre pesquisador e o Grupo Colaborador foi fundamental para que

pudéssemos perceber o outro como “sujeito do sentido”, tal como nos indica Augé (1994, p. 9),

para quem “o sentido dos outros nos confronta com a evidência do sentido que os outros,

indivíduos ou coletividade, elaboram”. É um sentido social, que para ele é “o conjunto das

relações simbolizadas, instituídas e vividas entre uns e outros no seio de uma coletividade que

esse conjunto permite identificar como tal”. O autor ainda acrescenta que esse sentido social se

ordena em torno de dois eixos o dos pertencimentos ou identidade e o da relação ou alteridade.

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Nesse sentido, a entrevista é aqui compreendida enquanto suporte de exploração, que

possibilita a produção de material a partir da relação entre o pesquisador/entrevistador e o

pesquisado/entrevistado.

Sobre essa relação presente na pesquisa, Bourdieu (1997, p. 694) diz que se trata de

uma relação social, que exerce efeitos sobre os resultados, podendo gerar distorções, que devem

ser reconhecidas e dominadas para excluir qualquer forma de violência simbólica. Para o autor

“Só a reflexividade, que é sinônimo de método, mas uma reflexividade reflexa, baseada num

“trabalho”, num “olho” sociológico, permite perceber e controlar no campo, na própria

condução da entrevista, os efeitos da estrutura social na qual ela se realiza”.

Assim, para abstrair o sentido que o Grupo Colaborador expressava acerca da RDSEPT

durante o processo de elaboração do PPP da escola, e identificar as articulações entre a proposta

curricular que se propunham a elaborar e os saberes e experiências dos sujeitos habitantes da

Reserva, durante a elaboração do currículo, priorizou-se inicialmente o eixo “RDSEPT e o

Currículo escolar”, por considerarmos que naquele momento esse eixo era emergente, dado o

trabalho já iniciado pelo Grupo Colaborador, refletindo sobre a forma como os professores

concebem o currículo da escola, das possibilidades e limitações dessa concepção ao currículo

das escolas do campo. Durante as entrevistas ficamos atentos aos gestos, ao tom da fala, e as

hesitações, expressas pelos colaboradores, por compreendermos que a construção dos sentidos

não se dá fora do conjunto das expressões.

Nos eixos “Projeto Político Pedagógico na Educação do Campo” e “Práticas

Pedagógicas na Educação do Campo”, buscamos compreender o sentido que o Grupo

Colaborador atribui ao processo de construção do PPP na escola, sua concepção sobre educação

do campo, quais práticas pedagógicas reconhecem ser necessárias ao trabalho na escola, bem

como sua relação com o campo da RDSEPT.

Realizamos a entrevista com 4 (quatro) colaboradores, dentre os quais, uma gestora,

duas supervisoras e um docente, que aconteceram na escola, em momento reservado somente a

essa atividade, isto é, fora do contexto das observações e das Sessões Reflexivas. Duas

entrevistas aconteceram à noite e duas à tarde.

Todas as entrevistas aconteceram numa relação harmoniosa, receptiva, aberta, e de

confiança entre pesquisador e pesquisado, a partir de um diálogo, flexível e reflexível, que

possibilitou ainda mais a aproximação dos colaboradores com o nosso objeto de estudo, como

podemos observar na fala do Colaborador Dentão:

Uma de nossas dificuldades em participar desses momentos é a questão da falta de

tempo, mas sei que isso também depende da força de vontade de cada profissional, já

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que nós temos um objetivo comum que é o aluno. Não tenho muito conhecimento

sobre o PPP, mas me disponho a contribuir com a pesquisa e com a escola10.

Podemos inferir na fala do Colaborador, que a pesquisa oportunizou ao Grupo refletir

acerca de sua responsabilidade com o projeto educativo da escola, sobre sua responsabilidade

com os alunos, além de demonstrar suas necessidades formativas, e a vontade de superá-las a

partir de um pequeno esforço coletivo, haja vista que durante a entrevista ficou claro que

somente a gestora e uma das supervisoras já haviam estudado sobre PPP e currículo.

Dessa forma, o roteiro das entrevistas11 foi elaborado pensando nas questões suscitadas

pelo objeto de estudo da pesquisa, dentre as quais, o conhecimento do grupo sobre a educação

do campo, as dificuldades que possuem no processo de elaboração de uma proposta curricular

que considere o campo em que estão inseridos, seus sujeitos e sua relação de pertencimento

com o campo da RDSEPT.

Em síntese este dispositivo metodológico da entrevista, norteada pelos eixos já

discutidos nos possibilitou retomar o objeto de estudo da pesquisa, numa perspectiva

compreensiva e dialógica a cerca do que nos propomos nesta investigação.

10 Colaborador Dentão em entrevista realizada em 25/08/2014 11 Ver apêndice D.

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3 EMBARCANDO NOS MARES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM OLHAR PARA

A RDSEPT

[...] Diogo Lopes, Barreiras, Sertãozinho

Chico Martins a comunidade

Segue a força da unidade

E desenhada no mesmo pergaminho

O rio na união da Reserva

Faz mais forte, mais fértil esse chão

O estuário que a mãe natureza

Fez juntar litoral com o sertão

Entre campos de dunas leveza

Do vento nas flores da caatinga

Enseada que acolhe a restinga

Com seu povo pleno de gentileza

(CORINGA, Zelito; SOUZA , Élio)

A Resolução CNE/CEB nº 1, de 28 de abril de 2008, que estabelece as diretrizes

complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de

atendimento da Educação Básica do Campo, define em seu Art. 1º, quais são os povos

compreendidos no paradigma da Educação do Campo, a saber: agricultores familiares,

extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da Reforma Agrária,

quilombolas, caiçaras, indígenas e outros, considerando o atendimento educacional a essas

populações suas variadas formas de produção da vida. As Diretrizes Operacionais para a

Educação Básica nas escolas do campo, pretende reconhecer o direito das pessoas que vivem

no campo, a uma educação diferenciada daquela oferecida a quem vive na cidade, que busque

atender as especificidades dessas pessoas, através de uma educação de qualidade, cujo projeto

educativo a ser desenvolvido nas escolas adeque-se ao modo de viver, pensar e produzir das

populações identificadas como campo.

O campo que trataremos neste capítulo refere-se a Reserva de Desenvolvimento

Sustentável Estadual Ponta do Tubarão (RDSEPT), criada através da Lei Estadual n° 8.349 de

18 de julho de 2003, na região compreendida pelo sistema estuarino do Rio Tubarão, a Ponta

do Tubarão, as dunas e as restingas vizinhas dos distritos de Diogo Lopes, Barreiras, município

de Macau e Mangue Seco, município de Guamaré, por meio de abaixo-assinado e de uma

organização sistematizada para proteger o modo de vida local. Esta área é ocupada por um

pouco mais de quatro mil habitantes, os moradores vivem basicamente da pesca e da

mariscagem, no entanto, encontram-se nas comunidades criação de gado em pequena escala e

prestações de serviços.

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Ao realizarmos esta pesquisa na única escola de Ensino Fundamental da comunidade de

Barreiras, pudemos perceber o quanto a diversidade do campo brasileiro precisa ser discutida,

debatida e disseminada entre os professores para que não reduzamos a Educação do Campo às

questões agrárias, sem desmerecê-las, pois não podemos negar que este se constitui o cenário

de uma das maiores organizações de lutas em prol de uma Educação do Campo.

Assim, nos propomos neste capítulo, a realizar uma discussão mais aprofundada da

maneira pela qual a Educação do Campo se estrutura como paradigma e sua funcionalidade,

sob as lentes desta investigação, adentrando na especificidade do Campo brasileiro através da

RDSEPT, destacando a singularidade do campo das águas, das dunas, da restinga e do

manguezal, no cenário da diversidade do campo no país, cuja forma de produção de existência

humana, revela um cenário de lutas pela manutenção das práticas tradicionais, da pesca

artesanal, bem como dos modos de vida das comunidades da Reserva.

Inicialmente contextualizamos a temática da educação do campo na pesquisa, aqui

identificado como campo pesqueiro, discutindo a concepção de desenvolvimento e

sustentabilidade que atravessa esta modalidade de ensino, bem como a que está presente na

legislação que cria a RDSEPT.

Em seguida tratamos da constituição da Reserva, como resultado de uma ideologia dos

modos de vida tradicionais das comunidades que se beneficiam da área, cujo processo de

mobilização resultou na construção da RDSEPT enquanto Unidade de Conservação.

Por fim, analisamos o olhar da escola pesquisada sobre a RDSEPT e sobre a Educação do

Campo, identificando que a mesma está em processo de construção de sua identidade enquanto

escola do campo, dada a compreensão de campo que o Grupo Colaborador possui, estritamente

ligado às questões agrárias, sem perceber que suas práticas estão situadas na diversidade e

singularidades do campo brasileiro.

3.1 CONTEXTUALIZANDO A TEMÁTICA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NA

PESQUISA

A Educação do Campo vem se constituindo num novo paradigma para a população do

campo, uma vez que carrega em si a identidade desses sujeitos, forjadas na organização das

lutas e resistências, nas relações humanas que produzem sua diversidade cultural, contrapondo-

se a lógica do capital que fundamenta o Paradigma da Educação Rural. A Educação do Campo

tem um significado que incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura,

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mas os ultrapassa ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas

(BRASIL, 2002, p. 4-5).

A Educação do Campo volta-se à formação dos sujeitos do campo, no movimento que

os constitui enquanto povo do campo, na medida em que considera os signos do seu território,

para por eles serem significados. Assim, a Educação do Campo só pode ser compreendida a

partir de uma totalidade que contemple, concomitantemente, a teoria e a ação política.

Esta pesquisa considera em sua análise o contexto sociocultural no qual a Escola

Municipal Alferes Cassiano Martins está inserida, pois não há como dissociar as práticas de

produção da existência humana, produzidas na comunidade, das práticas culturais disseminadas

na escola através de sua proposta pedagógica curricular.

Assim, as sessões reflexivas realizadas no processo de construção dos dados desta

pesquisa, para discutir a Educação do Campo no âmbito do município de Macau, mais

precisamente no distrito de Barreiras, possibilitou a tematização de algumas questões acerca

desta modalidade, no chão da escola, com o Grupo Colaborador que demonstrou que esse

procedimento da pesquisa se constituiu no primeiro espaço de vivência formativa a respeito

desta temática, conforme justifica a colaboradora Canário do Mangue.

Porque pra mim é novidade saber que o Alferes é escola do campo. A gente sempre

recebeu material urbano, porque é o mesmo material que vem pra Macau. Sempre nos

encontros do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), a gente via

que, por exemplo, o pessoal da Salete e da Luzia12 já recebia material diferente, que

era voltado para o campo, mas a gente não.

A fala da colaboradora evidencia que a pesquisa se constituiu num momento

privilegiado para a descoberta de si, da escola que de repente se descobre pertencente ao campo,

mas que nem na formação referenciada foi reconhecida como tal.

O campo a que nos referimos nesta pesquisa trata-se da Reserva de Desenvolvimento

Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, doravante RDSEPT, criada pela Lei Estadual nº 8.349,

de 18 de julho de 2003, na gestão da então governadora Wilma de Faria, tem como objetivos

resguardar o modo de vida tradicional, assegurar atividades baseadas em sistema sustentável de

exploração de recursos naturais, estas desenvolvidas tradicionalmente ao longo de gerações e

adaptadas às condições ecológicas locais e que desempenham papel fundamental na proteção

da natureza e na manutenção da diversidade biológica.

12 Está a se referir às Escolas Municipais Professoras Maria da Salete Martins e Luzia Bonifácio de

Souza, localizadas no distrito de Diogo Lopes.

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A criação dessa Reserva, observou a recomendação do Ministério do Meio Ambiente

ao criar o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) para agregar

nacionalmente as Unidades de Conservação (UC) instituídas em qualquer uma das três esferas

administrativas (federal, estadual e municipal), através da Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho

de 2000, que normatiza a criação, implementação e gestão dessas Unidades. Nesta Lei, UC é

um:

Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com

características naturais relevantes, legalmente, instituída pelo Poder Público, com

objetivo de conservação e limites definidos, sob o regime especial de administração,

ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção. (SISTEMAS, 2003, p. 9).

Assim, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão se

constitui em uma categoria da UC do Estado, conforme mapa a seguir, e que compõe o grupo

das Unidades de Uso Sustentável (UUS), cujo objetivo maior é tornar compatível a conservação

da natureza e o manejo humano no uso da natureza, ou seja, equilibrar o relacionamento entre

o homem e o meio ambiente.

Figura 1 – Unidades de Conservação do Estado do Rio Grande do Norte.

Disponível em: http://www.idema.rn.gov.br Acesso em: 12 mar. 2016.

Para o SNUC a RDS foi criada para prever o uso sustentável e a exploração do ambiente

de maneira a garantir a sobrevivência dos recursos ambientais renováveis e dos processos

ecológicos, mantendo a biodiversidade e os demais atributos ecológicos.

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Por isso, ao falarmos em RDS estamos nos referindo a uma área natural que obriga

populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de

exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às

condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção e

que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção

da diversidade biológica. (SNUC, 2008, p. 21).

Para Nobre (2011, p.86):

Essas Reservas são consideradas como UC porque, conforme a Lei também visa

valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo de todo e

qualquer procedimento que vise assegurar a conservação, a diversidade biológica e

dos ecossistemas do ambiente, desenvolvidas por estas populações, sendo de domínio

público.

Esta Reserva está localizada entre os municípios de Macau e Guamaré-RN, abrangendo

uma área de quase 13.000 (treze mil) hectares, que compreende uma parte terrestre e outra

marítima, como podemos observar no mapa a seguir.

Figura 2 – Mapa contendo os limites da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual da Ponta

do Tubarão.

Disponível em: http://nupeufrn.wordpress.com. Acesso em: 20 abr. 2016

Constituída por um ecossistema formado por mar, estuário, manguezal, dunas, restingas

e caatinga, possui uma população estimada em um pouco mais de 9.000 (nove mil) habitantes,

cuja maior parte se concentra nas comunidades de Barreiras, Diogo Lopes e Sertãozinho, em

Macau, e uma menor quantidade na comunidade de Mangue Seco, em Guamaré, como podemos

observar no mapa a seguir.

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Esta Reserva, tem atraído vários olhares de pesquisadores de áreas diversas como:

turismo, biologia, geografia, economia, dentre outras, por possibilitar estudos dos diferentes

aspectos (sociais, políticos, econômicos, culturais e ambientais), que ocorreram durante e pós

sua constituição enquanto Unidade de Conservação. Essa investigação considera essa teia de

relações que se estabelecem nesse espaço, que ao analisar suas características socioculturais,

ambientais, políticas e econômicas, em particular do distrito de Barreiras, identifica o campo

em que está situada a escola locus desta pesquisa como campo pesqueiro formado por

marisqueiras e pescadores artesanais. Para a definição de “pescador artesanal”, Pires (2012, p.

53) aponta que:

Pescador (a) artesanal é aquele (a) que, individualmente ou em regime de economia

familiar, faz da pesca sua profissão habitual ou meio principal de vida. Esses (as)

pescadores (as) capturam toda classe de espécies aquáticas, trabalham sozinhos (as)

e/ou utilizam membros da família ou trabalhadores (as) não assalariados (das),

explorando ambientes ecológicos localizados próximos à costa, tendo em vista que a

embarcação e a aparelhagem utilizadas por eles (as) possuem pouca autonomia.

Já para Diegues (1983, p. 193), o ponto definidor dele(a) não se resume ao ato de viver

da pescaria, mas dominar, plenamente, os meios de produção da pesca: “o controle de como

pescar e do que pescar, em suma, o controle da arte de pesca”, porque sem isso não se faz

pescador(a). Para que isto ocorra não é necessário que o(a) pescador(a) seja o(a) proprietário(a)

de embarcações e de redes. Ao comparar a arte da pesca com outros trabalhos artesanais, o autor

argumenta:

Podemos dizer que no caso da pesca, o domínio da arte exige um período de

experiência mais longo que nas outras formas de artesanato. Se compararmos o

pescador artesanal a um artesão de móveis, constatamos algumas diferenças

importantes. Este adapta seus instrumentos de trabalho a uma matéria-prima

relativamente homogênea: a madeira. Já o pescador artesanal é obrigado a dominar o

manejo de diferentes instrumentos de capturas utilizados para diferentes espécies,

num meio em contínua mudança (DIEGUES, 1983, p. 198).

Para Ramalho (2004) a pesca artesanal sempre se caracterizou como uma atividade não

subordinada à sociedade canavieira nem à sociedade urbana de consumo, fato que interferiu no

modo de vida dos(as) pescadores(as), possibilitando o surgimento da arte da pesca. Esta arte

resulta de sua criatividade, de seu sentimento de liberdade e resistência, pois a pesca artesanal

sempre se caracterizou como uma atividade livre para seus profissionais.

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Esta caracterização da pesca e dos(as) que dela buscam sua subsistência, reforça a

relevância da temática desta pesquisa acerca dos saberes e experiências dos sujeitos da

RDSEPT tematizados no currículo da escola, visto a especificidade deste campo, dentro das

discussões atuais sobre a Educação do Campo, dialogando com as questões territoriais,

econômicas, de sustentabilidade e desenvolvimento social, que atravessam a construção da

Educação do Campo enquanto modalidade de ensino. Esse cenário de campo tem uma relação

estreita com a população ribeirinha no que se refere à produção de vida entre água, terra e

mangues.

A pesquisa nos desvelou a (des)informação da escola no tocante as questões territoriais,

sociais e culturais presentes na construção do paradigma da Educação do Campo, cujo Grupo

Colaborador demonstrou não fazer nenhuma relação do espaço da produção material da

comunidade com o campo reconhecendo, inicialmente como campo, apenas, as áreas que se

assemelham as questões agrárias como, por exemplo, os assentamentos, através do Movimento

dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) . Nesse sentido Fernandes (2012, p. 15), explica

que:

A Educação do Campo ainda se confunde com o Movimento dos Trabalhadores

Rurais Sem Terra – MST e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

(PRONERA), o que é natural, afinal foram esses os espaços de gênese das políticas

que começaram a construir a Educação do Campo.

Acreditamos que esta visão, que se apresentava entre todos os membros do Grupo

Colaborador se deva ao fato de a Educação do Campo ter se originado no seio dos movimentos

camponeses na busca pela construção de uma política educacional para os assentamentos da

Reforma Agrária. No entanto, a educação empreendida nesses territórios é parte da Educação

do Campo, não sua totalidade, em face da diversidade que atravessa o campo brasileiro em suas

diferentes formas de existir e produzir vida. Para Fernandes (2006, p. 28):

A Educação na Reforma Agrária refere-se às políticas educacionais voltadas para o

desenvolvimento dos assentamentos rurais. Neste sentido, a Educação na Reforma

Agrária é parte da Educação do Campo, compreendida como um processo em

construção que contempla em sua lógica a política que pensa a educação como parte

para o desenvolvimento no campo.

Nesse sentido, não há como dissociar a educação desenvolvida no distrito de Barreiras,

neste caso, através da Escola Municipal Alferes Cassiano Martins, das questões que atravessam

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a RDSEPT, como por exemplo, o “Desenvolvimento” da comunidade e sua “Sustentabilidade”,

uma vez que não podemos pensar a formação dos seus sujeitos numa perspectiva de

desenvolvimento social que considere apenas os aspectos econômicos, desconsiderando os

históricos, os políticos e os culturais, ignorando a sustentabilidade no território para as gerações

futuras. Tampouco podemos vislumbrar uma formação pautando-se somente na

sustentabilidade, cujo desenvolvimento social seja impossível. É preciso compreender as

relações que estes sujeitos estabelecem entre si, e com o território por eles produzido.

As discussões em torno da concepção do “desenvolvimento” e da “sustentabilidade” no

âmbito da Educação do Campo não são recentes. Elas atravessam toda a construção histórica

da modalidade, colocando em xeque o predomínio da lógica econômica exclusiva como

paradigma do desenvolvimento, desencadeando uma espécie de consenso no que se refere à

necessidade de substituir o padrão de desenvolvimento ora adotado, fazendo emergir o conceito

de ecodesenvolvimento, concebido por Maurice Strong em 1973, que propõe um novo estilo de

desenvolvimento ao terceiro mundo, baseado na utilização criteriosa dos recursos locais sem

comprometer o esgotamento da natureza.

O desenvolvimento sustentável também foi abordado pelas Nações Unidas, definido no

Relatório de Brundtland como aquele que satisfaz as necessidades do presente sem

comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades,

através da superação da pobreza e do respeito aos limites ecológicos (BRÜSEKE, 1998).

Este conceito de desenvolvimento sustentável incorpora a multiplicidade das dimensões

que são necessárias para o desenvolvimento humano, como: a social, a cultural, a econômica,

a política e a ambiental, indo de encontro a um leque de questões que perpassam a efetividade

deste desenvolvimento no campo, a saber: o direito a educação, a saúde, a habitação, a nutrição

e a igualdade às oportunidades, extrapolando os enfoques setoriais. É uma proposta de

desenvolvimento pautado nas relações das pessoas, para elas e por elas.

Assim, tratar das questões do desenvolvimento sustentável no contexto da Educação do

Campo, no âmbito da RDSEPT, requer considerarmos as múltiplas relações que se estabelecem

nesse território, suas potencialidades, de modo a conceber esta modalidade de ensino como

política educacional que se volta para o desenvolvimento deste território como parte do campo

brasileiro.

Essa é uma questão importante a ser debatida com a comunidade, para que se ultrapasse

a denotação capitalista das relações econômicas nos termos “desenvolvimento” e

“sustentabilidade”, utilizados oficialmente nos documentos que tratam das Reservas de

Desenvolvimento Sustentáveis-RDS e das Unidades de Conservação-UC, que se não forem

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bem observados, sutilmente descaracterizam o atual debate do significado destes termos no

contexto da Educação do Campo.

Significa trazer as discussões para o conjunto das relações sociais, fortalecendo o campo

democrático, haja vista que o desenvolvimento sustentável encontra-se respaldado na legislação

brasileira, relativa aos povos do campo, como propõe as Diretrizes Operacionais para a

Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, MEC/CNE/CEB, 2002, Resolução nº 1,

Artigos 3º, 4º, 8º e 13º) ao referenciar que a educação escolar é necessária e importante para o

“[...] o desenvolvimento de um país cujo paradigma tenha como referência a justiça social, a

solidariedade e o diálogo entre todos [...]”, e que deve ser “economicamente justo e

ecologicamente sustentável”, além das parcerias nas escolas observarem o “direcionamento das

atividades curriculares e pedagógicas para um projeto de desenvolvimento sustentável”, cujos

jovens, crianças e adultos contribuam como protagonistas “na construção da qualidade social,

da vida individual e coletiva, da região, do país e do mundo”.

O Decreto nº 7.352/2010, que dispõe sobre a Política de Educação do Campo e o

Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), no seu Art. 2º, inciso II,

regulamenta como um dos princípios da Educação do Campo:

O incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos para as escolas do campo

estimulando o desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de

investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o

desenvolvimento social, economicamente justo e ambientalmente sustentável, em

articulação com o mundo do trabalho. (BRASIL, 2010, p. 1).

Neste Decreto fica evidente à vinculação da organização das intencionalidades

pedagógicas da escola em seu Projeto Político Pedagógico (PPP) com as questões sociais que

a cercam, fator considerado para o desenvolvimento desta pesquisa, haja vista que o Grupo

Colaborador estava vivenciando, no momento desta investigação, o processo de (re)elaboração

do PPP da instituição, espaço propício para a tematização da Educação do Campo na RDSEPT,

dos saberes e experiências dos seus sujeitos e do currículo escolar.

Durante a pesquisa, observamos que as discussões que atravessam a construção da

educação do campo nas questões agrárias, nos movimentos camponeses e no MST,

assemelham-se nos aspectos de lutas e organização das comunidades da RDSEPT, sociedade

em prol de um objetivo comum: defender o seu território dos interesses avassaladores dos

grandes empresários. Este foi o motor que fez deslanchar as comunidades de Barreiras, Diogo

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Lopes e Sertãozinho rumo à criação da Reserva, a primeira do Estado do Rio Grande do Norte,

e garantir suas águas, seus mangues e dunas.

3.2 RDSEPT: UM MERGULHO NA DIVERSIDADE DO CAMPO

A construção da RDSEPT se deu no âmbito da luta por uma ideologia dos modos de

vida tradicionais nas comunidades que dela se beneficiam, consoante com o compromisso da

sobrevivência entre os moradores. Seu ecossistema formado por dunas, mar, estuário,

manguezal, restingas e caatinga, gera uma beleza natural bem singular na região salineira, como

pode ser observado na imagem a seguir, atraindo vários pesquisadores, estudiosos, turista e

empreendedores.

Figura 3: imagem aérea das comunidades de Barreiras e Diogo Lopes localizadas na RDSEPT.

Disponível em https://www.google.com.br/search?q=IMAGENS+DA+RDSEPT&rlz=1C1CHZL_pt-

BRBR706BR706. Acesso em: 10 de março de 2014.

Os conflitos de ocupação dessa região litorânea envolvem desde as questões de limites

e das formas de crescimento das comunidades, às regularizações fundiárias, haja vista que no

litoral potiguar a maioria dos empreendedores busca lucro rápido, sem demonstrar muito

respeito à população nativa.

Sua constituição enquanto Unidade de Conservação-UC deu-se através de um longo

processo de luta social, iniciada no ano de 1995, reavivada em 2000 e efetivada em 2003. Foi

uma grande empreitada das comunidades de Barreiras e Diogo Lopes, para afastar os

estrangeiros e os carcinicultores da Ilha dos Cavalos, que se mobilizaram contra a ocupação da

área de 1.300 hectares, localizada na restinga Ponta do Tubarão, após a disseminação de uma

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notícia entre as comunidades, de que essas terras haviam sido compradas por italianos à família

Miranda de Guamaré–RN, e que já tinha sido solicitado o aforamento ao Delegado do

Patrimônio da União, em 05 de janeiro de 1995, pela empresa PPE Participações e

Administração Ltda., com sede no Rio de Janeiro. A respeito desse processo de luta com vistas

à criação da RDSEPT, Nobre (2011, p. 45) enfatiza:

Como a Reserva de Desenvolvimento Sustentável é resultado de lutas sociais travadas

nos anos de 1995, 2000 e 2003, incluindo os intervalos dessas datas, a história da sua

criação mostra que a empreitada para o afastamento dos estrangeiros e dos

carcinicultores da Ilha dos Cavalos uniu a população em torno da problemática e

possibilitou a conquista e a implantação institucional desta como uma Unidade de

Conservação.

Percebe-se que a luta em prol da RDSEPT, se inscreve no mesmo período das grandes

lutas dos movimentos sociais em busca de garantias dos seus direitos, e de serviços públicos

que lhes possibilitassem melhores condições de vida, dentre os quais o direito a educação.

Em 1996, os ranchos de pescaria que existiam na “costinha”, feitos por pescadores para

a prática de suas atividades profissionais e de lazer familiar nos finais de semana, foram

queimados por ordem de um italiano, cuja ação foi denunciada no Jornal de Macau, em maio

do mesmo ano, que divulgou uma nota em protesto contra o ato, e em favor da população das

comunidades.

Desde então a população começou a se posicionar contra a ocupação da área, das

queimadas e da presença de vigias ao longo da restinga, iniciando a mobilização através de

representantes de entidades comunitárias e lideranças da paróquia, que se deslocaram à capital

do Estado, Natal, com a finalidade de denunciar a ocupação aos órgãos públicos competentes

pela proteção e conservação natural do Estado, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Gerência do Patrimônio da União (GRPU) e a

imprensa, objetivando frear a ocupação e proteger o patrimônio da comunidade.

O grupo também sensibilizou a Câmara Municipal de Macau, na sede do município, que

no dia 10 de abril de 1996 realizou uma audiência pública para tratar do assunto, e que no dia

seguinte se deslocou ao distrito de Diogo Lopes para debater com a comunidade o pedido de

aforamento da restinga em nome da empresa PPE Participações e Administração Ltda.

A partir daí o movimento foi ganhando novas dimensões com a adesão de moradores

locais, que promoveram pichações nas paredes com frases do tipo, “fora italianos”, bem como

a disseminação de cartazes que demonstravam negação à presença dos intrusos.

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Houve também uma adesão geral dos pescadores das comunidades de Barreiras e Diogo

Lopes que se recusaram a transportar os predadores, através do estuário até a estinga, negando

o aluguel de seus barcos, fato que dificultou, mas não impediu o reconhecimento dos

estrangeiros sobre o local, que contaram com automóveis e guias oriundos da sede do município

de Macau, porém não persistiram no empreendimento.

No ano de 2000, quando a carcinicultura desponta em nossa região como um

empreendimento promissor, com a geração de empregos, houve um novo atentado predatório a

mando de empresários desse ramo econômico que promoveram a devastação e a queima de uma

área de manguezal, 60.000 m2 aproximadamente, na Ilha dos Cavalos, objetivando a

implantação de projetos para a criação de camarão, fato que chegou ao conhecimento da

comunidade somente no dia 27 de dezembro do mesmo ano, que prontamente se posicionou

contra a ação, se locomovendo em grupos de canoas, em direção ao local.

No dia seguinte a mobilização continua através dos representantes da Colônia de

Pescadores de Diogo Lopes Z-41 e da Associação de Desenvolvimento Comunitário de Diogo

Lopes (ADECODIL), que denunciaram a ação à Promotoria Publica, à Secretaria Municipal de

Meio Ambiente e ao IDEMA.

Findo ano 2000 e iniciando o ano de 2001, no dia 10 de janeiro, a população se reúne e

forma um grupo de representação composta por 20 (vinte) membros, que denuncia o fato à

imprensa, ao IBAMA e ao IDEMA solicitando deste, através de abaixo-assinado contendo 522

(quinhentos e vinte e duas) assinaturas, a transformação da região em Área de Preservação

Ambiental. Neste mesmo dia esse grupo foi à Delegacia do Patrimônio da União para se

informar acerca da legalidade da área devastada, onde apresentou ao órgão uma denúncia.

Após essa mobilização a comunidade recebeu a visita do então Prefeito de Macau José

Antônio de Menezes, de representantes da Câmara Municipal de Macau e do Senador Júlio

Alves, do Partido Verde do Acre, no dia 13 de janeiro, a fim de presenciarem a devastação e a

gravidade do problema.

Reiniciava-se uma luta, já travada em 1995, que ora se fazia emergente dado o crescente

desejo de ocupação da área por pessoas de interesses alheios aos das comunidades. Desde então,

várias organizações comunitárias do município de Macau – RN e instituições se organizaram

para realizar o I Encontro Ecológico de Diogo Lopes e Barreiras, em maio de 2001, evento

capaz de chamar a atenção das comunidades envolvidas na problemática, de ambientalistas, da

imprensa e das autoridades governamentais.

Dentre as organizações e instituições envolvidas no evento podemos destacar: a

Associação e Desenvolvimento Comunitário de Diogo Lopes (ADECODIL), Associação de

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Desenvolvimento Comunitário de Barreiras (ADECOB), Colônia de Pescadores Z – 41,

Paróquia de Macau, Centro de Educação Integrada Monsenhor Honório (CEIMH), Centro

Social Pio XI, Associação de Mulheres Luzia Gomes, Escolas Municipais de Barreiras e Diogo

Lopes, Pastoral da Juventude, Grupo Jovens Lutando Para Vencer (JLPV), Pastoral da

Juventude do Meio Popular (PJMP) e Fundação Ama-Goa. Também buscaram apoio na

comunidade científica, de órgãos governamentais e não governamentais, poder judiciário,

Procuradoria do Direito do Cidadão, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para qualificar

as discussões acerca dessa área de preservação.

O resultado do evento foi bastante positivo, culminando na elaboração de uma moção e

um abaixo-assinado contendo 1.336 (mil trezentos e trinta e seis) assinaturas, cujo objeto se

tratava da solicitação ao IDEMA da efetiva criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável

Ilha do Tubarão.

Era apenas o início de uma grande luta em prol da criação da Reserva, pois no ano

seguinte, no período de 5 a 9 de junho de 2002, foi realizado o II Encontro Ecológico de Diogo

Lopes e Barreiras, cujo objetivo era fortalecer o movimento e a luta pela proteção e preservação

daquela área, resultando na elaboração de uma moção e uma recomendação, encaminhadas ao

IDEMA, ao IBAMA e ao GRPU, reforçando a solicitação anterior, e pedindo agilidade ao

processo de criação e implantação da Reserva. Esse encontro contou com a participação da

empresa Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras), da Prefeitura de Macau e de 17 entidades da

sociedade civil e instituições.

Após esse evento foram organizadas várias reuniões com o propósito de elaborar um

Decreto-Lei para a criação da Reserva e delimitação de sua área. Em abril de 2003 essa proposta

foi encaminhada ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONEMA), sendo aprovada pelo

referido conselho no dia 30 do mesmo mês e ano, e que contou com a presença de mais de 100

(cem) pessoas das comunidades de Barreiras, Diogo Lopes e Sertãozinho, das cidades de Macau

e Guamaré, que manifestava seu desejo em prol da criação da Reserva diante da sede do Centro

Administrativo, na capital do Estado – Natal.

Prosseguindo com as atividades do movimento de luta pela Reserva no período de 05 a

08 de junho do mesmo ano, foi realizado o III Encontro Ecológico de Diogo Lopes e Barreiras,

que contou com a participação de 23 entidades da sociedade civil e instituições de Macau,

resultando na assinatura do Projeto de Lei de criação da Reserva de Desenvolvimento

Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, pela então governadora Wilma de Faria. Na ocasião foi

elaborada uma moção endereçada à Assembleia Legislativa, solicitando em caráter de urgência

a análise e aprovação, na íntegra, do Projeto de Lei aprovado pelo CONEMA, bem como uma

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recomendação composta de 14 itens que enfatizava a participação das comunidades no processo

de criação do Conselho Gestor da Reserva.

O referido Projeto de Lei foi para votação na Assembleia Legislativa no dia 26 de junho

de 2003, sendo aprovada por unanimidade. Novamente mais de 100 pessoas das comunidades

envolvidas na Reserva participaram do processo de votação. A Lei Estadual N.º 8.349, que cria

a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, foi sancionada no dia

18 de julho do mesmo ano, pela governadora Wilma de Faria, sendo publicada no dia seguinte

no Diário Oficial do Estado. Desde então, ocorreram várias reuniões para definir os membros

do Conselho Gestor da Reserva, formado por 10 entidades não governamentais e nove entidades

governamentais.

A Lei Estadual n. 8.394, de 18 de julho de 2003, que cria a RDSEPT, propõe como

objetivo:

Preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e os meios

necessários para a reprodução, a melhoria dos modos e da qualidade de vida e

exploração dos recursos naturais pelas populações tradicionais, bem como valorizar,

conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente

desenvolvido por estas populações. (RIO GRANDE DO NORTE, 2003, p. 1).

Mesmo a Reserva já tendo sido criada oficialmente, o Deputado Estadual do Partido

Socialista Brasileiro (PSB/RN) Cláudio Porpino, pressionado pelos empresários da

carcinicultura propôs uma Emenda à Lei, sugerindo uma alteração em seu Art. 5º, que versa

sobre a proibição de novos empreendimentos de carcinicultura na área, bem como a ampliação

de empreendimentos já existentes. Ao tomar conhecimento do fato, os representantes da

Reserva, também pressionaram o deputado para suspender sua proposta de alteração da Lei.

Essa proposta foi assumida pelo deputado estadual Ricardo Motta, denominando-a de

Projeto de Lei 2021/03, objetivando a permissão para o licenciamento e implantação de novos

projetos de criação de camarões na Reserva. A proposta não seguiu adiante porque ao chegar

ao conhecimento da comunidade, esta acionou seus representantes para pressionar o deputado

que também retirou sua proposta da pauta de votação.

O Conselho Gestor da Reserva realizou várias reuniões para definir o regimento interno

da RDSEPT, cuja versão final foi posta em votação no dia 19 de abril de 2004, sendo publicado

no Diário Oficial do Estado no dia 20 de setembro de 2005.

Depois de oficialmente criada a RDSEPT, as comunidades continuaram com os

encontros ecológicos, com uma nova denominação, realizando em 2004 o VI Encontro

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Ecológico da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão, que

resultou na elaboração de uma moção e uma recomendação ao IDEMA e ao Conselho Gestor

solicitando que fosse implantada uma agenda ambiental em todas as escolas da RDSEPT, bem

como a consolidação da sustentabilidade social e econômica das comunidades, o levantamento

fundiário da área da Reserva e a preservação das áreas que integram o patrimônio da União

para usufruto da população tradicional, proibindo o repasse dessas áreas para uso em ocupações

privadas.

Junto com Diogo Lopes e Sertãozinho, Barreiras se constitui em um dos distritos de

maior significância no cenário social, político, econômico, cultural e educacional no município

de Macau–RN. Unidas, essas comunidades são possuidoras de uma notável capacidade de

mobilização social entre seus pares, como já relatado. A colaboradora Garça-Branca, ao se

referir ao processo de constituição da RDSEPT, nos permite inferir sobre essa capacidade de

organização e mobilização social, que essas comunidades denotam:

Eu participei bastante da luta pela Reserva, fui para reuniões... Teve reunião que foi

em Natal, e a gente foi pra realmente conseguir que esta Reserva fosse criada... Porque

assim, na verdade, a Reserva foi criada pela necessidade das comunidades preservar

o que era nosso, as comunidades de Barreiras, Diogo Lopes e Sertãozinho tiveram que

se unir pra evitar que pessoas de fora tomassem de conta da nossa costa, que é o que

realmente eles queriam...construir hotéis...destruir os manguezais..., como de fato

iniciaram com queimadas e tudo13.

Podemos situar este movimento de constituição da RDSEPT dentro do paradigma da

Educação do Campo pela lógica de sua organização que compreendeu a relação de

interdependência entre campo – cidade, que mesmo possuindo contradições profundas, busca

soluções para suas questões, que deve acontecer por meio da organização dos movimentos

socioterritoriais desses dois espaços.

Entendemos que a relação de sobrevivência e lazer estabelecida com a comunidade e a

área que hoje se situa a Reserva, foi o principal motivo para os distritos se unirem em prol da

defesa de seu território, constituindo um dos movimentos sociais14 mais reconhecidos no

13 Colaboradora Garça-Branca, em sessão refleviva realizada no dia 27/7/2015 14 O termo movimentos sociais adotados nesta pesquisa refere-se aos “grupos de pessoas com

posicionamentos políticos e cognitivos similares, que se sentem parte de um conjunto, além de se

perceberem como força social capaz de formar interesses frente a posicionamentos contrários de outros

grupos. Pessoas que agem, afirmam posições e se sentem vinculadas. Expressam-se como correntes de

opiniões sobre diversos campos da existência individual e coletiva, sobretudo dos segmentos sociais

explorados, oprimidos e subordinados que passam a competir no mercado das ideias e do sentimento de

pertenças (...) são força social atuante que se manifesta através de organizações e grupos de diversas e

divergentes naturezas, amplitude e vigor.” (SOUZA, 1999, p. 9).

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município, com organizações de atividades de mobilização comunitária que acontece até os

dias atuais com os Encontros Ecológicos.

Durante a pesquisa observamos nos posicionamentos do Grupo Colaborador que os seus

membros consideram que a criação da Reserva foi exclusivamente para beneficiar a

comunidade pesqueira como afirma a colaboradora Gavião, com foco na dimensão econômica

das comunidades:

Eu acho assim, de que a Reserva foi mais criada pensando no benefício da

comunidade, mas eu acho que não foi pensando tanto na escola. Foi pensando somente

em benefício da comunidade, principalmente a comunidade pesqueira. É tanto que a

escola só é chamada a participar da Reserva quando tem os movimentos do Encontro

Ecológico15.

A comunidade de Barreiras é conhecida por sua beleza exuberante, situada entre dunas

e mar. Encontramos na comunidade lençóis e dunas que se formam na região, além de um

manguezal formado ao longo do Rio Tubarão. Sua população foi formada por colonos que

viviam diretamente da atividade pesqueira, que se constituía na economia local. Atribuímos a

esse último aspecto a razão pela qual evidenciamos na fala da colaboradora o porquê da

comunidade pesqueira está, a princípio, no centro dos objetivos da luta em favor da constituição

da RDSEPT, mas compreendemos que a escola pertence à comunidade e que, portanto, não está

dissociada dessa luta, dos seus resultados.

Ao lutar por melhorias em sua condição de vida, os movimentos sociais ligados às

questões agrárias, reivindicam a sua dignidade enquanto sujeitos de direitos não somente à

saúde, à educação, mas a participação nas decisões no modelo de desenvolvimento econômico

que julgam necessário às suas produções materiais. Entendemos que a luta pela Reserva, se

insere nessa busca pela defesa da forma de como as comunidades se produziam, para além de

um viés econômico, a defesa era pelo modo de vida das comunidades, do seu lazer, da sua fonte

de renda, da sua dignidade.

Com a RDSEPT observamos que independente do espaço em que se dê a luta pelo

direito a terra, neste caso, às águas, sempre estão em conflitos os interesses das comunidades a

uma condição de vida que os dignifique em seus territórios e os dos grandes empresários pela

riqueza da produção material desses territórios. Decorre disto, a necessidade da elaboração do

Plano de Manejo da RDSEPT, que vem se arrastando desde sua constituição, para orientar as

práticas sociais, políticas e econômicas das comunidades, observando os limites, as

15 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada em 21/7/2015

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possibilidades e as potencialidades da Reserva. Assim, a luta precisa ser fomentada e

reinventada no espaço de formação do próprio movimento e na escola, ao orientar sua prática

considerando os princípios do movimento.

Para tanto, devem se nortear, dentre outras bases legais, do Decreto nº 6.040/2007, que

institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades

Tradicionais, em seu Art. 3º, inciso III, concebe o desenvolvimento sustentável como “o uso

equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente

geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras”.

É a necessidade e a busca pela elaboração e implementação desse novo projeto para

as comunidades atravessadas pela RDSEPT, que a luta por uma escola engajada no

movimento se deu paralelamente, uma vez que essa instituição foi, e ainda é,

convidada a participar de todo esse processo, estreitando laços com as famílias através

de um trabalho educativo que evidencie a luta, os seus resultados e a necessidade de

não deixa-la adormecer, apesar dos embates políticos que se colocam às comunidades,

em particular ao Comitê Gestor Local da Reserva, para articular essas instituições,

como podemos observar na falada colaboradora Garça-Branca. No último ano que

eles (Conselho Gestor da Reserva) vieram entregar um cartãozinho dizendo que ia

haver reunião, eles diziam assim se não participar da próxima reunião a instituição

não vai ser nem mais chamada. Eles falaram que já fazia três reuniões que eu não ia,

então eu me justifiquei, dizendo que eles só fazem reunião em Diogo Lopes e à noite,

neste horário eu não posso ir, não vou que não sou louca de pegar minha moto e ir

sozinha pra Diogo Lopes à noite... Aí tentaram contornar a situação16.

Notamos que ao longo das mobilizações para a constituição da Reserva, as escolas se

tornaram espaços estratégicos de sensibilização e mobilização das comunidades, disseminando

entre as crianças, jovens e adolescentes, os interesses, a importância e a responsabilidade de

todos com a criação e manutenção de uma RDS, por isso o Conselho Gestor Local, insere estes

espaços em suas estratégias de ação, para que essas instituições venham a contemplar em seu

projeto educativo os sujeitos e a sociedade na qual estão inseridas.

Para tanto, faz-se necessário que a escola se organize em seu interior, com sua equipe

vendo a disponibilidade e a possibilidade de se fazer presente nesses espaços de discussão e

articulação que se constitui com o Conselho Gestor Local da Reserva, para que sejam superados

esses embates no que se refere à agenda de reuniões e deliberações que envolvem as escolas e

suas participações nos Encontros Ecológicos. O Conselho Gestor, por sua vez, deve repensar

os espaços e os horários das reuniões para que possa atingir o maior número possível de

representantes das escolas para as deliberações acerca desses Encontros.

16 Colaboradora Garça-Branca durante sessão reflexiva realizada em: 1/4/2015

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Consideramos que as escolas localizadas na Reserva tiveram, e ainda têm papel

relevante na constituição da Reserva, uma vez que possuem condições de desenvolver um

trabalho intencional e sistematizado no processo de formação dos sujeitos que habitam a

RDSEPT, se assim inserirem essa temática em seus Projetos Políticos Pedagógicos, em suas

propostas curriculares, motivo pelo qual são convidadas constantemente a participarem das

atividades dos Encontros Ecológicos, movimento pensado e organizado para envolver a

população em prol da importância da RDSEPT e das questões socioeconômicas, políticas e

culturais que a atravessa, bem como das reuniões do Conselho Gestor, como foi afirmado pela

colaboradora Garça-Branca.

Apesar de oficialmente ainda não ter vinculado ao seu PPP a temática da Reserva, a

escola pesquisada realiza todos os anos projetos de ensino voltados para o meio ambiente,

contemplando as questões históricas e ambientais que envolvem a RDSEPT, e inclui em suas

atividades as ações que o IDEMA desenvolve nas escolas, no período próximo ao aniversário

da Reserva, constituindo-se em ação sistematizada já prevista na organização pedagógica anual

da instituição.

Contudo, identificamos durante as sessões reflexivas e as entrevistas, nas falas dos

membros do Grupo Colaborador que, em decorrência da rotatividade do quadro docente da

escola, sua atual equipe pedagógica, embora reconheça a singularidade do contexto

sociocultural no qual estão imersos, ainda não conseguiu perceber a importância da articulação

do projeto educativo da instituição com os saberes e as experiências emanadas da RDSEPT,

bem como a relação da formação dos sujeitos da comunidade e o projeto de emancipação

humana, fatores que consideramos negativo ao fomento do movimento pró-Reserva, e ao

fortalecimento da identidade dos sujeitos que ali habitam.

Isso evidencia a necessidade de fortalecimento do processo de condução pedagógica da

equipe gestora e pedagógica da escola, e a não consolidação de um projeto educativo que

dialogue com as questões sociais, políticas, ambientais que se fortaleça nesse diálogo, apesar

da realização pontual dos projetos de ensino, já mencionados, que enfatiza a RDSEPT.

No entanto compreendemos que a escola possui uma grande capacidade de mobilização

que precisa ser potencializado, pois no ano de 2015, por falta de apoio financeiro, o Conselho

Gestor se articulou com as escolas inseridas na RDSEPT, e juntos deliberaram que cada

instituição de ensino iria se comprometer em mobilizar a sua comunidade escolar e local para

participar do Encontro Ecológico que aconteceria na própria comunidade com programação

definida pela instituição. Assim em outubro do referido ano, a escola pesquisada organizou e

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realizou o Encontro nas suas dependências com uma programação local, contribuindo para o

fomento do movimento.

Mesmo ocorrendo divergências na agenda da escola e do Conselho Gestor da Reserva,

no tocante as reuniões para a articulação das atividades a serem desenvolvidas nos Encontros

Ecológicos, em virtude de possíveis privilégios em relação à gestão da Reserva, a escola

pesquisada participou da realização de todos eles, tendo como representante da instituição a

gestora, moradora da comunidade de Barreiras, que sempre esteve à frente da articulação entre

os membros de sua equipe para participar das oficinas, além de colaborar na organização de

eventos, mobilizando os alunos e os seus pais a participarem das oficinas destinadas para

ambos, durante os Encontros Ecológicos.

Notamos que é importante para o Conselho Gestor da Reserva manter o elo entre suas

ações e o processo formativo das escolas, em virtude da vinculação da escola com a vida, à

formação e à preparação para o trabalho, no caso da RDSEPT, significa a possibilidade dessas

instituições considerar as práticas necessárias ao manejo desta área por aqueles que nela e dela

vivem, atribuir um novo significado ao que é de todos e para todos, convidando a sua

comunidade a pensar uns nos outros, com os outros, isto é, ser uma escola arraigada no

solo/água de seu povo, dessa forma cumprirá sua maior missão, educar no contexto da vida,

vinculando suas práticas educativas a vivência dos/as educandos/as.

A nosso ver, a RDSEPT possui grande relevância não só nos aspectos ecológicos e

culturais, mas também, educacional, por agregar saberes e experiências que se traduzidos

pedagogicamente no ambiente escolar possibilitará o fortalecimento da identidade de seus

povos, cuja reflexão sobre o modo como se pratica a agricultura, a pesca, a caça, bem como se

gerenciam os empreendimentos locais, se faz necessária à adoção de práticas cotidianas que

preservem o meio ao qual pertencem, bem como nos aspectos culturais e nas tradições da

comunidade.

Nesse contexto, as lutas ambientais, antes de se configurarem em ações

preservacionistas, são ideológicas, políticas, sociais, econômicas e pedagógicas, uma vez que

desvelam as diferentes manifestações acerca da relação homem–natureza, dentro de um sistema

capitalista hegemônico, onde a dominação dos meios de produção por alguns, provoca a

privação de bens exclusivamente usufruídos por esses dominantes, sejam na forma de uso ou

de lucro. Vale salientar que na luta social envidada pelas comunidades em prol da RDSEPT foi

usada a arma da sensatez, cuja existência sociocultural articulada às condições de vida nas

mesmas foram as principais munições contra a invasão de empresários estrangeiros.

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A criação da RDSEPT trouxe novas responsabilidades para as comunidades por ela

atravessadas, emanadas das novas relações requeridas, fato que exige do Conselho Gestor da

Reserva uma articulação constante com os seus moradores e suas instituições, numa perspectiva

dialógica para que se redimensionem as relações políticas, econômicas e culturais com a área,

o que pode desencadear novos embates, tanto de ordem interna (interesses individuais e

coletivos dos moradores, comunidades, organizações) quanto de ordem externa (interesses

contínuos para novos empreendimentos, falta de apoio dos órgãos competentes), dentre outros.

Para o IDEMA, trouxe a responsabilidade e o desafio de fazer presente nas questões

ambientais de interesses locais, acadêmicos, econômicos, culturais e sociais. Pensando nessas

questões foi construída uma sede conhecida como Ecoposto, formado por um conjunto de três

prédios, em uma mesma área, cada um com finalidades diferentes: uma sede administrativa,

uma casa do pesquisador e uma casa para alojamento da Companhia Independente de Proteção

Ambiental (CIPAM). Está localizado no quilômetro 10 da RN 403, entre as comunidades de

Barreiras e Diogo Lopes, no Município de Macau/RN. Este espaço tem sido utilizado para as

reuniões do Conselho Gestor, para a realização de oficinas de meio ambiente, estando

disponível para visitação do público, bem como para as instituições de ensino e pesquisa.

Compreendemos que o maior desafio posto para as escolas do campo, em particular para

as escolas da RDSEPT, consiste em situar dentro de suas práticas educativas (na realidade local,

territorial, nacional e mundial) o desenvolvimento sustentável, tendo como referência a

solidariedade, o diálogo e a justiça social, considerando um desenvolvimento economicamente

justo e ecologicamente sustentável, contribuindo para o conhecimento, o aprofundamento, a

discussão e a análise crítica da dimensão econômica do campo brasileiro, com a atual e as

futuras gerações de educandos/as, a partir do campo ao qual pertencem, inserir-se na dinâmica

do movimento social, ampliando os horizontes e as perspectivas da população da RDSEPT,

fortalecendo sua identidade.

3.3 O OLHAR DA ESCOLA SOBRE A RDSEPT: UMA IDENTIDADE EM

CONSTRUÇÃO

A forma da escola se perceber diante dos movimentos em torno da RDSEPT é fator

relevante para o fortalecimento, ou não, das práticas de mobilização desenvolvidas na

comunidade, para a disseminação das potencialidades da RDSEPT, dos cuidados com o seu

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manejo, bem como para o processo de construção da autonomia dos/as seus/suas educandos/as,

pois como espaço privilegiado para formação de pessoas, o contexto histórico, político, cultural,

econômico e social da comunidade não deve ficar a deriva de suas práticas educativas, já

sinalizadas pela colaboradora Tamatião que diz “É preciso explorar mais a história e as

potencialidades da Reserva na escola.” A esse respeito à colaboradora Galinha do Mangue

ressalta:

Com relação à história, tem alunos que realmente não conhece a história da Reserva,

uns é porque são mais novos, outros é porque estão morando aqui agora. Às vezes eles

não sabem de que aqui é uma Reserva, e que fazem parte dela. Eu acredito que assim,

em relação a Reserva mesmo, só se ouve falar naquele período que já está próximo do

Encontro Ecológico, que a gente faz aquele trabalho, aquela mobilização, faz

caminhada, aí alguns já conhecem a trajetória, já tá ciente daquilo que realmente está

se falando (referindo-se as palestras do Encontro Ecológico)17.

A história da luta pela RDSEPT, já relatada anteriormente, evidencia a resistência do

povo do campo aos projetos de desenvolvimento econômico desvinculado do projeto de

sociedade que emana nas comunidades, ao mesmo instante em que lançam um olhar futuro para

o projeto de vida nas comunidades nela envolvidas. Toda essa trajetória, como já vimos,

envolve diretamente as escolas no processo de mobilização social em prol da constituição da

Reserva, pelo fato destas lidarem com a comunidade de forma diferente, é ponto de encontro

dos diversos olhares sobre a Reserva. Segundo Nobre (2011, p. 131):

A história da criação da RDS Ponta do Tubarão, ao nosso ver, significa a história de

um movimento de ações comunitárias em defesa da preservação do território e dos

seus modos de vida tradicionais. Foi tecida em momentos de conflitos, de encontros

e discussões entre lideranças, conversas informais na rua, nas esquinas, em casa,

durante as refeições, nos ambientes de trabalho, nos momentos de lazer. Essa sua

história parece ter se incorporado à vida daqueles moradores em decorrência das lutas

implementadas para a efetiva proteção daquela área.

O fenômeno da RDSEPT modificou o modo de vida das comunidades de Barreiras,

Diogo Lopes e Sertãozinho, não somente nas relações interpessoais, mas principalmente com o

meio natural. Essa mudança de relação produzida pela RDSEPT não ficou, pelo menos não

deveria, ficar à margem da escola, já que esta se constitui em parte integrante da comunidade,

local de diferentes relações, construtor e promotor de encontro entre saberes e experiências

diversos, de culturas.

17 Colaboradora Galinha do Mangue durante sessão reflexiva realizada em: 1/4/2015

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Essas relações foram discutidas durante as sessões de reflexão propostas nesta pesquisa,

ocasião em que se evidenciaram as angústias do Grupo Colaborador quanto a existência de

divergências internas entre os espaços assumidos por cada comunidade em relação à RDSEPT,

o reconhecimento de se aprofundarem nos estudos e formação sobre Educação do Campo, bem

como a necessidade de se repensar as suas práticas educativas, em face das questões

geográficas, sociais, econômicas, ambientais, políticas e culturais advindas na comunidade com

a criação da Reserva. A esse respeito a colaboradora Gavião ressalta:

Assim, nós não temos um conhecimento mais aprofundado da Educação do Campo,

mas acho que uma das questões que a gente pode tá pensando em aprofundar é a

questão da sustentabilidade, já que a gente vive numa reserva, acho que é uma das

questões que a gente pode pensar em discutir e implantar também no PPP18.

Apesar de a colaboradora dizer não ter conhecimento aprofundado da Educação do

Campo, sua fala revela que o princípio da sustentabilidade que fundamenta esta modalidade é

facilmente apreendido pelo grupo em virtude de a escola situar-se numa área de reserva. Isso

demonstra que a escola reconhece a especificidade do seu lugar, e a importância deste estar

presente em seu PPP, o que pode sinalizar o início de um processo de construção de uma nova

identidade, enquanto escola do campo. No entanto, se faz necessário refletirmos: de que projeto

educativo as escolas da RDSEPT, e particularmente a Escola Municipal Alferes Cassiano

Martins, precisam construir?

Para Caldart (2000) esse projeto passa pela mudança da postura dos professores, e o

jeito de ser da escola como um todo, sensibilizando-os para que entrem no movimento da luta,

da história, no caso da RDSEPT, da manutenção e do manejo da Reserva, dos Encontros

Ecológicos, dos projetos como: o Barco solidário, as trilhas ecológicas, para acolher seus

sujeitos, em suas perspectivas, seus objetivos. Para a autora:

Um mexe com o outro, num movimento pedagógico que mistura identidades, sonhos,

pedagogias... E isto só pode fazer muito bem a todos, inclusive aos educadores e às

educadoras que assumem esta postura. E também à escola, que ao se fechar e

burocratizar em uma estrutura e em um jeito de ser, costuma levar os educadores a

esquecer, ou a ignorar, que seu trabalho é, afinal, com seres humanos, que merecem

respeito, cuidado, todos eles. (CALDART, 2000, p. 27).

18 Colaboradora Gavião em entrevista realizada em: 25/8/2014

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Para sensibilizar sua equipe a entrar nesse movimento, a equipe gestora, precisa

empreitar uma nova luta no âmbito da gestão de seus profissionais para garantir, junto a

Secretaria Municipal de Educação, pelo menos, o direito de ter um corpo docente que complete

sua carga horária, ou maior parte desta, na própria escola, de modo que cada professor possa

sentir a comunidade em que trabalha, viver seu cotidiano, compartilhar saberes entre seus pares

e seus discentes, possibilitando um maior tempo de convívio com a comunidade, e assim

possam desenvolver o sentimento de pertença em relação a escola onde trabalham, haja vista a

atual situação dos docentes dos anos finais do Ensino Fundamental, como destaca a

colaboradora Gavião, com tom de indignação:

Tem cabimento um professor dar uma aula aqui e correr pra dar aula em outra escola,

noutra comunidade, quando não existe nem intervalo entre essas aulas? O professor

sai daqui de 13h50min pra dar aula às 13h50min em outra comunidade. Tem

condições de ele sair daqui de 13h50min pra chegar lá e dar a segunda aula? Me diga,

essa pessoa vai ter condições de sentar com outro professor? Não é questão dele não

querer, é questão dele não poder. Ele não pode. Ele pode até ter a boa vontade de

participar, ele tem a vontade de participar, até porque ele está chegando agora19, mas

ele não tem condições pra isso20.

Notamos que a organização e distribuição da carga horária dos docentes do Ensino

Fundamental – anos finais, dificulta o envolvimento destes com a escola, com seu cotidiano,

pois a correria para ir de uma comunidade para outra para dar aula impossibilita-os de

efetivamente se envolverem com a escola.

A fala da colaboradora também nos revela o quanto se faz necessário a implementação

da educação da Reserva na agenda da Secretaria de Educação do município, em suas

organizações e diretrizes, bem como da importância dessas questões na composição das pautas

do Conselho Gestor, uma vez que as escolas localizadas na área da RDSEPT, já existiam antes

mesmo de sua constituição, enquanto tal, fato que deve ser considerado no processo de

formação dos sujeitos que nela habitam.

A criação da Reserva trouxe novos desafios e conflitos para as comunidades, no tocante

a sua gestão e a de programas e projetos destinados a ela, como nos revela a colaboradora

Galinha do Mangue em sessão reflexiva: “A verdade é que Diogo Lopes está sendo beneficiada

até hoje, tudo que vem, todos os programas, tudo é pra lá. Não sei se é por falta de alguém de

19 A colaboradora está se referindo ao concurso público realizado em 2014 no município, e a recém-

convocação de professores para a escola. 20 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada em: 21/07/2015

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Barreiras que vá, nos represente, que assuma...”. Durante a mesma sessão reflexiva a

colaboradora Garça-Branca reafirmou:

Tudo aconteceu com as queimadas dos ranchos na Ponta do Tubarão que fica aqui, de

frente a Barreiras, mas lá existia[sic] barracos que eram do povo de Diogo Lopes e

começaram o movimento por lá, mas para que conseguissem que se tornasse reserva

eles tinham e precisavam da gente, sozinhos eles não conseguiriam.(...) O maior grupo

de pessoas era de Diogo Lopes e Barreiras, que eram as comunidades mais próximas.

No primeiro e no segundo ano você via um grande número de pessoas de Barreiras

integradas aos movimentos da Reserva, mas com um tempo essas pessoas foram se

afastando, ficando revoltadas, com raiva... Por que é que só Diogo Lopes é a Reserva?

(...) Já existiu pessoas que foram, que brigaram, que exigiram que as cotas fossem

divididas por igual, mas isso nunca existiu. Então as pessoas desistiram. A gente tinha

pessoas dentro desse movimento, que hoje em dia, não querem mais21.

Desde o início da mobilização das comunidades em prol da RDSEPT que a comunidade

de Diogo Lopes liderou a articulação com as demais comunidades, além de reunir um maior

número de pessoas que usam a pesca como atividade principal e se constituir na maior

comunidade da Reserva. Os critérios que definiram Diogo Lopes como sede da gestão local da

Reserva são pontos de divergências internas entre as comunidades, como já observado na fala

das colaboradoras Galinha do Mangue e Garça-Branca, e estão diretamente ligados aos

interesses econômicos individuais, e não das necessidades dos pescadores locais.

Nota-se que há uma clara ausência de outras instituições da comunidade de Barreiras

para negociar essas e outras questões, o que tem fragilizado a organização da comunidade, e

sobrecarregado a escola que se vê diretamente ligada ao movimento através do Conselho Gestor

Local, e tem assumido essa responsabilidade junto à comunidade. Nesse sentido, Caldart (2000,

p. 30) ressalta:

A luta social educa para a capacidade de pressionar as circunstâncias para que fiquem

diferentes do que são. É a experiência de que quem conquista algo com luta não

precisa ficar a vida toda agradecendo favor. Que em vez de anunciar a desordem

provocada pela exclusão, como a ordem estabelecida, e educar para a domesticação,

é possível subverter a desordem e reinventar a ordem, a partir de valores verdadeira e

radicalmente humanistas, que tenham a vida como um bem muito mais importante do

que qualquer propriedade.

Mais do que garantir um espaço natural que já era das comunidades, a luta pela RDSEPT

pode ser considerada como uma luta de resistência contra-hegemônica, mesmo que em pequena

escala, pois, como já foi discutido anteriormente, se constituiu num movimento de iniciativa

21 Colaboradora Garça-Branca durante sessão reflexiva realizada em: 21/07/2015

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comunitária, promovida por populares, que foi ganhando força e o apoio de entidades

defensoras do meio ambiente, comunidade acadêmica, instituições locais e de trabalhadores da

pesca, no momento em que o processo de globalização econômica apontava em nosso Estado,

a ilusão da carcinicultura e da rede hoteleira como progresso para a região.

Dizemos “ilusão de progresso”, não porque sejamos contrários aos avanços

tecnológicos, mas por considerarmos que o método do cultivo de camarão que ora vem se

desenvolvendo em nosso Estado, o qual consiste na construção de viveiros nas proximidades

de manguezal para serem abastecidos com as águas das marés, tem provocado a devastação de

mais de 444 hectares de mangues potiguares, contrapondo-se ao método local que se dá pela

utilização dos tresmalhos, pelos pescadores, para realizar o arrastão na praia, para pescar o

crustáceo. A implantação desses empreendimentos, ou a ampliação dos já existentes na restinga,

provocaria uma desordem na estrutura natural deste complexo socionatural, como também no

modo de vida tradicional das comunidades.

Assim, na contramão do avanço capitalista, os movimentos de lutas ecológicas têm

ganhado novas dimensões no cenário mundial, através de intervenções diretas realizadas por

meio de denúncias utilizando a Rede Mundial de computadores – a internet, fomentando e

fortalecendo ações de Organizações Não Governamentais como, por exemplo, o Greenpeace22.

As ações de tais órgãos buscam, não somente evitar uma crise ecológica, mas também garantir

a existência de diversas espécies, dentre as quais a humana. Busca-se frear a ação depredatória

dos seres humanos, cuja história remonta fatos sombrios.

Esses movimentos intencionam e tencionam o despertar de uma consciência ecológica

mundial, que começou a ganhar corpo na década de 1970 com a Conferência das Nações Unidas

sobre Meio Ambiente em Estocolmo (1972). Este foi o início de uma discussão que tem

atravessado décadas, quanto aos problemas de degradação do meio ambiente provocado pelo

crescimento econômico. Passa-se então, a ser percebido como um problema global que supera

amplamente diversas questões pontuais que eram arroladas nas décadas de 1950 e 1960 pelas

agências estatais de meio ambiente dos países desenvolvidos.

Entendemos que independente das dimensões alcançadas pelos movimentos ecológicos,

estes propõem um novo sistema de valores sustentado no equilíbrio ecológico, na justiça social

e na solidariedade com as gerações futuras. É neste contexto que situamos a RDSEPT como

resultado dos movimentos locais com reflexos positivos no cenário municipal e estadual das

22 O Greenpeace é uma organização global cuja missão é proteger o meio ambiente, promover a paz e

inspirar mudanças de atitudes que garantam um futuro mais verde e limpo para esta e para as futuras

gerações.

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lutas ambientais, aderindo aos movimentos nacionais pela defesa do meio ambiente, ao tornar-

se uma Unidade de Conservação.

Nesse contexto de lutas e conquistas, já discorridas nesta pesquisa, compreendemos que

para a escola construir uma nova identidade enquanto escola do campo (visão de si em relação

a outras instituições, autoconsciência de quem é, a que lugar pertence) é necessário, que

desenvolva seu projeto educativo na perspectiva da “Pedagogia do Movimento”23, se arrisque

ao novo, enfrente uma batalha interna, se reorganize, deseje ser diferente, mude seu currículo,

inserindo os saberes e as experiências de lutas da comunidade, fortalecendo-se enquanto locus

de formação, comprometida com a comunidade de Barreiras e com as lutas por ela empreitadas.

Como afirma Caldart (2004, p. 23):

Não se trata de propor algum modelo pedagógico para as escolas do campo, mas sim

de construir coletivamente algumas referências para processos pedagógicos a serem

desenvolvidos pela escola e que permitam que ela seja obra e identidade dos sujeitos

que ajuda a formar, com traços que a identifiquem com o projeto político e pedagógico

da Educação do Campo.

Essas referências são construídas no interior de cada escola, na introdução de elementos

que constituem a RDSEPT no cotidiano escolar, no modo como seus sujeitos significam o

espaço em que vivem, de como se veem na cultura local que se destaca na escola, nos modos

de organização dos tempos e dos espaços escolares, na forma de como a escola valoriza seus

hábitos singulares.

Para tanto, pode-se inserir em seu projeto educativo o estudo das potencialidades da

Reserva, nos aspectos econômicos, geográficos, turísticos e políticos, dentre outras

possibilidades, o uso das trilhas ecológicas, que tem seu percurso iniciado na própria

comunidade, utilizar o barco-escola para embarcar no coração da Reserva, desvendando-a de

um novo jeito, ressignificar o campo da RDSEPT, junto com os educandos, num processo de

ação-reflexão-ação.

Enfim, sintonizar-se com os processos sociais vivenciados por seus educandos (as) e

suas famílias, onde a escola se constitua num processo social capaz de fortalecer as identidades

dos sujeitos da Reserva e sua própria identidade enquanto escola do campo.

23 No processo de humanização dos sem-terra, e da construção da identidade sem terra, o MST vem

produzindo um jeito de fazer educação que pode ser chamado de Pedagogia do Movimento. É do

Movimento por ter o sem terra como sujeito educativo e ter o MST como sujeito da intencionalidade

pedagógica sobre esta tarefa de fazer educação. E é também do Movimento porque se desafia a perceber

o movimento do Movimento, a transformar-se transformando. (CALDART, 2000, p. 30).

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4 RETORNANDO À SUPERFÍCIE AQUÁTICA: OS ACHADOS DA PESQUISA

Sempre firme nessa caminhada

Sustentando a luta com atitude

Pra ensinar a nossa juventude

Preservar essa terra sagrada

[...] O facheiro brota no cristalino

Traz o cheiro da preta jurema

O caranguejo correndo ligeiro

Menino cata como um poema

Lição do mestre carpinteiro

Que constrói barco da quixabeira

Vai subindo a maré pesqueira

E motivando cada companheiro

Qualidade de vida que move

Respeitando o mangue sapateiro

Pra tirar dele vosso sustento

Tem nas mãos o bravo canoeiro

O boto vez em quando aparece

E enaltece o cavalo marinho

O milagre de cada peixinho

Faz a vela se erguer numa prece

(CORINGA, Zelito; SOUZA, Élio)

Ao longo dos anos a escola vem se constituindo como espaço de excelência no processo

de formação humana, introduzindo os conhecimentos e os modos de condutas requeridas pela

vida adulta, contribuindo para a internalização das normas e dos valores no processo de

socialização dos sujeitos. Tem sido considerada local de encontro das diversas vivências

coletivas dos diferentes sujeitos sociais, fato que pode incidir sobre sua organização, ao acolher

as nuances da atuação desses mesmos sujeitos, em seu currículo.

Nesse processo, as subjetividades podem, ou não, serem aguçadas, os poderes pode ser

impostos ou delegados, os comportamentos podem ser moldados ou construídos, de acordo com

as intencionalidades que predominam na estrutura organizacional e curricular da escola, visto

que geralmente, são reproduzidos através de um currículo escolar que historicamente tem

atendido aos interesses de determinados dos grupos sociais, em detrimento dos demais,

excluindo e silenciando, na maioria das vezes, os saberes e as experiências dos sujeitos que nela

buscam formação.

Os estudos sobre currículo escolar nos apontam que não há neutralidade política na ação

pedagógica, pois ela sempre revela uma intencionalidade, uma forma de conceber o mundo e

seus sujeitos, que fundamenta a elaboração do currículo escolar, lugar de diferentes interesses,

território de poder.

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A educação escolar tornou-se parte da existência humana ao ser requisitada no processo

de vivência e formação social, fato que tem tornado a escola um lugar fértil no processo de

investigação do seu cotidiano, de sua dinâmica organizacional, dos saberes dos educandos e

educadores, das práticas pedagógicas, do currículo escolar, dentre outros.

Neste capítulo nos propomos a dialogar sobre as noções de currículo que permeiam as

discussões e construções da proposta curricular do Ensino Fundamental, na escola pesquisada,

compreendendo-o como instância representativa de poder, que atravessam as vivências dos

sujeitos educandos e a prática docente.

Fundamentamos nossa elaboração sobre currículo escolar à luz das concepções de Silva

(2010), Saviani (2010) e Sacristán (2002) que veem o currículo como experiência, local de

interrogação da experiência, que permite construir a subjetividade e a identidade humana,

conectando o individual ao social, através do conhecimento escolar, da história de vida dos

sujeitos educandos, lugar de transformação do próprio eu, trazendo para este diálogo a análise

das relações com o saber proposta por Charlot (2000) para tentarmos compreender as relações

que os professores estabelecem com o saber, durante a elaboração do currículo na escola

pesquisada.

Por fim, reportamo-nos a Bondía (2002), que ao fazer uma análise epistemológica sobre

a experiência e o saber da experiência, nos fornece elementos substanciais para refletirmos

sobre a importância da experiência e do saber da experiência no currículo escolar, nas escolas

do campo, pelo fato de ser o currículo território do conhecimento oficialmente disseminado na

escola, no qual alunos e professores estabelecem relações diferentes e singulares com os saberes

e as experiências que atravessam a comunidade de Barreiras, em particular com a construção

da RDSEPT.

4.1 CURRÍCULO ESCOLAR E RDSEPT: UMA CONSTRUÇÃO EM MOVIMENTO

Apesar de não se constituir num objeto de estudo novo em nosso país, desde a década

de 1980 que as discussões e os questionamentos acerca do currículo escolar têm ganhado

destaque nacional, em virtude do que ele representa na escola, das relações de poder que o

envolvem, ampliando-se consideravelmente o número de equipes que se dedicam a investiga-

lo, que conforme dados do CNPq passam de 147 equipes somente na área da Educação.

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No que tange a Educação do Campo este debate tem-se feito presente desde o início do

movimento “Por uma educação Básica no Campo”, no ano de 1998, em Luziânia – GO, a partir

da I Conferência Nacional de Educação do Campo, evento organizado pelo MST, CNBB,

UNICEF, UNESCO e UnB, com o objetivo de recolocar o campo e a educação que se vincula

a ele, na agenda política do país, e repensar sobre: Qual educação os sujeitos do campo

necessitam? A qual projeto de desenvolvimento de campo deve estar articulada? Esta

Conferência constitui um marco histórico acerca da educação para a população do campo no

país, por nos apresentar um novo jeito coletivo de pensar e lutar por educação no país.

Repensar a educação no contexto do campo brasileiro significa colocar na pauta do

projeto educativo das escolas os saberes e as experiências dos sujeitos do campo para que sejam

reconhecidos por sua equipe enquanto saberes válidos, necessários ao seu desenvolvimento no

campo bem como ao desenvolvimento das comunidades em que estão imersos, inserindo esses

saberes e essas experiências no currículo Escolar. A esse respeito Pacheco (2005, p.82-83)

aponta a necessidade de o currículo do campo “incorporar os saberes que preparam para a

produção e o trabalho, os saberes que preparam para a emancipação, para a justiça, os saberes

que preparam para a realização plena do ser humano como humano”.

A Resolução nº 1/2002, do Conselho Nacional de Educação, que versa sobre as

Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas escolas do Campo, nos Artigos 4º e 5º,

destaca que os temas a serem trabalhados nas escolas devem ligar-se ao mundo do trabalho e

ao desenvolvimento no campo, inseridos numa parte específica do currículo, devendo resgatar

os conhecimentos que germinam das experiências e das lutas das comunidades, transformando-

as num espaço de conhecimento que deve ser investigado e potencializado. A defesa dessa

perspectiva tem se constituído em uma das lutas e reivindicações dos movimentos sociais, que

buscam o direito a uma educação que esteja pautada em projetos interdisciplinares que se

articulem à diversidade cultural; preconizando uma atenção particular a públicos escolares

específicos; fato que exige um forte protagonismo dos coletivos docentes na formulação e

implementação do currículo na escola.

Esta pesquisa se inseriu nessa discussão, com o objetivo de Compreender de que forma

o Grupo de Elaboração do currículo da escola, articula os saberes e as experiências dos sujeitos

da RDSEPT, na construção de uma proposta curricular para a Educação do Campo, no momento

em que repensam o Projeto Político Pedagógico (PPP) e a proposta curricular da escola. Os

dados aqui analisados foram construídos dentro das interlocuções com os colaboradores durante

as sessões reflexivas e as entrevistas, onde destacamos a concepção dos colaboradores acerca

do currículo escolar, a compreensão de disciplina escolar como elemento curricular, e a relação

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que estabelecem com a articulação dos saberes e das experiências dos sujeitos moradores da

RDSEPT, durante o processo de elaboração da proposta curricular da escola.

Durante a pesquisa observamos, nas sessões reflexivas, que o grupo colaborador

compreende comumente o currículo como a listagem de disciplinas que compõem um curso,

com suas respectivas cargas horárias anuais, constituída de um conjunto ordenado de conteúdos,

cuja definição nos remete ao termo programa e/ou estrutura curricular, como pode ser sinalizado

na fala da colaboradora Tamatião que destaca “Currículo é a disciplina, com os conteúdos e os

dados dos alunos”24.

Logo em seguida o colaborador Dentão arrisca-se em dizer o que entende por currículo,

“Então, na minha concepção o currículo seria justamente isso, o que é oferecido aos alunos nas

áreas que competem às aprendizagens, com os conteúdos trabalhados”25.

Esse entendimento de currículo pela colaboradora Tamatião nos remete às primeiras

ideias do termo, ligadas ao registro da vida estudantil de cada educando, uma espécie de carreira

do estudante, sendo utilizado para certificar a conclusão de um curso, contendo a avaliação dos

resultados de cada aluno. Essa compreensão de currículo nos faz pensar, hoje, no histórico

escolar do aluno, cujo objetivo seria informar sobre o percurso do educando em uma

determinada etapa de ensino, localizar no tempo as ordenações de seus estudos na escola,

indicando a estrutura que orientou a organização disciplinar da instituição.

Isso se deve ao fato de que desde sua gênese podemos identificar alguns elementos

presentes na ideia que elaboramos sobre currículo escolar, como por exemplo, ao de referir-se

ao conjunto de disciplinas que organizam o conhecimento na forma de conteúdos que devem

ser construídos com os alunos dentro de um determinado curso, voltando-se à formação do

sujeito que se pretende para a sociedade, evidenciado na fala do colaborador Dentão. Sobre

esses elementos que nos permitem generalizações acerca do currículo, Saviani (2010, p. 30-31),

em estudo sobre o processo histórico do currículo escolar destaca:

A contribuição dos historiadores, nesse campo – mesmo quando da análise de

processos específicos em períodos determinados e em contextos particularmente

localizados (uma cidade, um país ou um conjunto de países) – está no fato de que,

pela descrição e interpretação de acontecimentos e fenômenos, revelam certas

regularidades que permitem o estabelecimento de algumas generalizações.

Dessa forma podemos compreender que quando os colaboradores Tamatião e Dentão

referem-se ao currículo como conjunto de disciplinas que organizam o conhecimento escolar

24 Sessão reflexiva realizada em: 22/7/2015 25 Colaborador Dentão em sessão reflexiva realizada em: 22/7/2015.

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necessário à formação dos sujeitos educandos da Reserva, recorrem a uma das generalizações

do currículo que é a de que a elaboração do currículo escolar obedece a prioridades de acordo

com as finalidades da educação que se pretende para a sociedade a qual se destina. Concebem

o currículo como um aglomerado de conteúdos, “elementos provenientes de campos

especializados do saber mais elaborado (...) restringem-se aos clássicos componentes derivados

das disciplinas ou materiais” (SACRISTÁN, 2002, p. 55).

Para o autor, ao se tratar de escolaridade obrigatória, é importante que se pense um

currículo onde se reflita um projeto educativo globalizador, que agrupe a multiplicidade

cultural, do desenvolvimento pessoal e social dos educandos, de necessidades vitais para o seu

desempenho individual em sociedade, do desenvolvimento de competências e habilidades

consideradas fundamentais ao seu convívio em sociedade, compreendendo por conteúdos algo

mais que uma seleção de conhecimentos pertencentes a diversos âmbitos do saber elaborado.

Para Charlot (2000, p. 60):

Adquirir saber permite assegurar-se um certo domínio do mundo, no qual se vive,

comunicar-se com outros seres e partilhar o mundo com eles, viver certas experiências

e, assim, tornar-se maior, mais seguro de si, mais independente. Existem outras

maneiras, entretanto, para alcançar os mesmos objetivos. Procurar o saber é instalar-

se num certo tipo de relação com o mundo; mas existem outros. Assim, a definição

do homem enquanto sujeito de saber se confronta à pluralidade das relações que ele

mantém com o mundo.

Podemos dizer que o currículo escolar se constitui em uma das formas de se relacionar

com o saber, carregando em si tantas outras relações, nas quais professores e alunos se engajam

de forma singular. A compreensão de currículo enquanto locus do saber cultamente elaborado

pode conduzir à marginalização dos saberes que os sujeitos do campo elaboram em suas

relações, no modo pelo qual, lutam, resistem se afirmam como sujeitos de direitos. Acerca dessa

questão, Ramos; Moreira e Santos (2004, p. 37) ressaltam que:

A educação do campo deve compreender que os sujeitos possuem história, participam

de lutas sociais, sonham, têm nomes e rostos, lembranças, gêneros, raças e etnias

diferenciadas. Cada sujeito individual e coletivamente se forma na relação de pertença

à terra e nas formas de organização solidária. Portanto, os currículos precisam se

desenvolver a partir das formas mais variadas de construção e reconstrução do espaço

físico e simbólico, do território, dos sujeitos, do meio ambiente. O currículo precisa

incorporar essa diversidade, assim como precisa tratar dos antagonismos que

envolvem os modelos de agricultura, especialmente no que se refere ao patenteamento

das matrizes tecnológicas e à produção de sementes.

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Pode-se inferir que no paradigma da Educação do Campo a definição do currículo

escolar pelas escolas do campo é basilar no processo de formação dos sujeitos, pois possibilita

o fortalecimento dos povos do campo através da incorporação dos signos de seu cotidiano, das

suas resistências, da sua cultura, oportunizando-o novas formas de se relacionar e significar a

sua realidade. Nessa perspectiva Arroyo (1999, p. 25) nos alerta:

A escola rural é muito pobre em saberes e conhecimentos. Só ler, escrever, contar,

pronto? A escola tem que ser mais rica, tem que incorporar o saber, a cultura, o

conhecimento socialmente construído, mas cuidado! A pergunta que vamos ter que

nos fazer é esta: Que saberes sociais foram construídos historicamente? Alerto a vocês

para uma coisa: nem todos os saberes sociais estão no saber escolar, nem tudo que

está no currículo urbano, é saber social, logo não tem que chegar à escola do campo.

Cuidado, há muitos saberes escolares nos programas que são inúteis! Totalmente

inúteis, alienantes, que não acrescentam nada em termos de democratizar os saberes

socialmente construídos.

Percebemos que o autor nos chama a atenção para a inserção de saberes que estão para

além de seu utilitarismo na sociedade, mas que se articule com as formas de os sujeitos do

campo significar sua existência com tantas outras. Assim Ramos; Moreira e Santos (2004, p.

38) destacam os elementos que devem transversalizar a construção curricular nas escolas do

campo.

Os elementos que transversalizam os currículos nas escolas do campo são a terra, o

meio ambiente e sua relação com o cosmo, a democracia, a resistência e a renovação

das lutas e dos espaços físicos, assim como as questões sociais, políticas, culturais,

econômicas, científicas e tecnológicas.

Dos elementos citados podemos destacar a temática do meio ambiente e da história da

RDSEPT, já inseridas no currículo da escola através de projetos de ensino. Outra análise que

podemos fazer do modo como é concebido o currículo na escola pesquisada, diz respeito ao

currículo como construção social que resulta de processos conflituosos e de decisões

negociadas, como pode se observar na fala da colaboradora Gavião:

Quando elaboramos os projetos definimos o que é que vai ser trabalhado em cada

área, por exemplo, no projeto meio ambiente o que é que pode ser trabalhado na

disciplina de História? É a história da Reserva, então esse ponto já não é mais com as

outras disciplinas, assim... procuramos ver o que combina mais com a disciplina26.

26 Colaboradora Gavião, em sessão reflexiva realizada em: 22/7/2015.

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Durante a mesma sessão reflexiva, o colaborador Dentão enfatiza que “nesse processo

a gente define os conteúdos, mas cada um acaba que puxando para sua área, sem fugir do

objetivo geral que é proposto no projeto”. Assim, podemos compreender que a elaboração do

currículo expressa um modo particular dos docentes se relacionarem com a realidade,

pressupondo diversos níveis de negociação entre o grupo frente ao que se pretende produzir e

reproduzir. Silva (2010, p. 148) nos aponta que:

O currículo é uma invenção social como qualquer outra: o Estado, a nação, a religião,

o futebol... Ele é o resultado de um processo histórico. Em determinado momento,

através de processos de disputa e conflito social, certas formas curriculares – e não

outras – tornaram-se consolidadas como currículo.

Dessa forma, compreendemos que o currículo da escola organizado por projetos27 de

ensino, cujas temáticas abordadas visam organizar o saber em forma de conteúdo, resulta de

debates e embates internos, de contendas, de disputas, em vários níveis: no programa da

disciplina, na definição do que é importante ser considerado, nas discussões com a equipe

docente, para poder se desenhar uma possível articulação entre os componentes curriculares no

tratamento da temática, nos recursos didáticos que serão utilizados para operacionalizar os

conteúdos a serem tematizados, na organização do ensino em si. Para Goodson (1995), no

âmbito do currículo escrito, esses conflitos se constituem em prova visível das lutas que

envolvem as aspirações e objetivos de escolarização, e ainda destaca:

Entretanto, como se tem observado, o conflito em torno do currículo escrito tem, ao

mesmo tempo, um “significado simbólico” e um significado prático, quando

publicamente indica quais aspirações e intenções devidamente inseridas nos critérios

do currículo escrito servem para a avaliação e análise pública de uma escolarização.

(GOODSON, 1995, p. 17).

Significa dizer que na hora de definir oficialmente as temáticas e os conteúdos que serão

tratados no currículo da escola pesquisada, os trabalhos direcionados pelos docentes pautam-se

nas intencionalidades particulares das disciplinas que lecionam, no valor que atribuem a cada

27 Fernando Hernández (1998) define os projetos de trabalho não como uma metodologia, mas como

uma concepção de ensino, uma maneira diferente de suscitar a compreensão dos alunos sobre os

conhecimentos que circulam fora da escola e de ajudá-los a construir sua própria identidade. Os Projetos

de Trabalho traduzem, portanto, uma visão diferente do que seja conhecimento e currículo e representam

uma outra maneira de organizar o trabalho na escola. Caracterizam-se pela forma de abordar um

determinado tema ou conhecimento, permitindo uma aproximação da identidade e das experiências dos

alunos, e um vínculo dos conteúdos escolares entre si e com os conhecimentos e saberes produzidos no

contexto social e cultural, assim como com problemas que dele emergem

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uma delas em relação às outras, predominando a visão particular do que é educação e do que

significa a escolarização no processo de formação dos sujeitos, que nem sempre é

compartilhada entre os membros do grupo.

São essas prioridades realizadas pela escola que podem limitar a base curricular a

processos históricos de negação dos saberes dos povos do campo, vinculando-se a tradições

curriculares pautados no controle social, em que o currículo inevitavelmente está determinado

por interesses de reprodução socioeconômicos. Para Arroyo (1999, p. 26):

Partindo dessa visão teremos que responder a questões concretas e incorporar no

currículo do campo os saberes que preparam para a produção e o trabalho, os saberes

que preparam para a emancipação, para a justiça, os saberes que preparam para a

realização plena do ser humano como humano. (...) Não podemos separar tempo de

cultura e tempo de conhecimento. O que estou propondo é que os próprios saberes

escolares têm que estar redefinidos, têm que vincular-se às matrizes culturais do

campo aos novos sujeitos culturais que o movimento social recria. É por aí que a gente

avança.

Dessa forma, no processo de negociação dos conflitos no âmbito do currículo escolar,

identificados na escola pesquisada, devem situar a educação, a cultura, a tecnologia, a ciência

e o conhecimento como direitos dos sujeitos educandos, vinculando as matrizes curriculares ao

modo de produção da vida na RDSEPT.

Outro aspecto a ser observado no modo como a escola concebe o currículo é a

importância que é dada às disciplinas, como elemento do currículo escolar. Na visão dos

colaboradores todo o conhecimento deve partir de uma disciplina, esta tem sido o eixo

estruturante para se definir o conteúdo discutido na escola, dentro dos projetos de ensino. Para

Saviani (2010, p. 37):

Como parte integrante de currículos, as disciplinas escolares estão sujeitas às

contingências de sua elaboração e implementação. Mas, ao mesmo tempo, têm suas

próprias particularidades, chegando mesmo em alguns casos a interferir na história do

currículo.

Sobre esse aspecto, Silva (2010, p.148) aponta que isso decorre das formas curriculares

que foram se consolidando como currículo, e enfatiza que:

É apenas uma contingência social e histórica que faz com que o currículo seja dividido

em matérias ou disciplinas, que o currículo se distribua sequencialmente, em

intervalos de tempo determinados, que o currículo esteja organizado

hierarquicamente... é também através de um processo de invenção social que certos

conhecimentos acabam fazendo parte do currículo e outros não.

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Isso porque o termo “disciplina escolar”, com exceção da referência que se faz às regras

e normas e aos mecanismos de punição dentro do sistema de ensino, está associado à ideia de

matéria e/ou conteúdo a ser ensinado, compreendido como componente curricular, sendo

considerada relevante na elaboração do currículo das escolas.

Assim, as disciplinas constituem em referência para a organização do processo de

ensino e aprendizagem, uma vez que articulam os saberes epistêmicos, selecionados pelos

docentes para que, no momento da relação pedagógica os alunos se apropriem de tais saberes.

Esta é uma forma reducionista de compreender e organizar o currículo escolar, e sinaliza a

percepção dos docentes acerca do aprender. Sobre esta relação com o saber, presente entre o

grupo colaborador, identificada no momento de elaboração da proposta curricular na escola,

durante a pesquisa, Charlot (2000, p. 68), nos explica que:

Do ponto de vista epistêmico, aprender pode ser apropriar-se de um objeto virtual (o

“saber”), encarnado em objetos empíricos (por exemplo, os livros), abrigados em

locais (a escola...), possuído por pessoas que já percorreram o caminho (os

docentes...). Aprender, então, é “colocar coisas na cabeça”, tomar posse de saberes-

objeto, de conteúdos intelectuais que podem ser designados de maneira precisa (o

teorema de Pitágoras, os galos-romanos...), ou imprecisa (“na escola, se aprende um

montão de coisas”).Aprender é uma atividade de apropriação de um saber que não se

possui, mas cuja existência é depositada em objetos, locais, pessoas.

Ao tematizar os saberes que julgam necessários aos sujeitos educandos da Reserva, o

grupo colaborador identifica o saber virtual que precisa ser realmente apropriado pelos alunos,

onde aprender é passar da não-posse à posse, como afirma Charlot (2000).

À luz da Educação do Campo, podemos inferir que as questões até aqui analisadas, a

forma de conceber o currículo escolar, nas escolas do campo pode limitar ou ampliar o que os

professores “oferecem” aos alunos, uma vez que costumeiramente nesse conjunto de conteúdos

o que prevalece, na maioria das vezes, é o conteúdo (saber virtual) que é trazido pelo livro

didático, como destaca o colaborador Dentão ao tratar sobre a mudança de carga horária da

disciplina de História, na nova estrutura curricular do 6º ao 9º ano, na qual as turmas do 6º e do

7º ano possuem quatro aulas semanais da disciplina, enquanto o 8º e o 9º ano possuem apenas

duas aulas semanais.

Eu, particularmente, discordo de quatro aulas de História numa turma de 6º ano.

Praticamente já estou terminando o livro. Aí no 9° ano, que eu precisaria de mais aulas

dessa, eu só tenho duas. Havia um equilíbrio, aí agora é muito conteúdo de História

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pro 6º ano. O 9º ano que está indo embora, vamos dizer assim, praticamente não tem

conteúdo28.

A escola pesquisada segue orientação da Secretaria Municipal de Educação, que por sua

vez, segue as orientações da rede estadual de ensino, no tocante a distribuição da carga horária

das disciplinas escolares. Percebe-se, na fala do colaborador, que atualmente no currículo da

escola, o conhecimento valorizado é o que é disseminado pelo livro didático, cujo conteúdo é

concebido como o “resumo do saber culto”, um saber-objeto.

É nítida a falta de autonomia da escola a esse respeito, além observarmos a estranheza

do colaborador em “bater” o livro em uma turma, isto é, concluir em um ano letivo os estudos

acerca dos conteúdos que o livro didático prevê para determinado ano escolar, e faltar tempo

para “repassar” o conteúdo para outra, o que lhe tem causado preocupação.

Esta preocupação das escolas com o conteúdo trazido pelo livro didático constitui um

dos pontos para a discussão atual acerca do currículo escolar que se desenvolve nas escolas do

campo, uma vez que este material não tem dialogado com a realidade desses sujeitos, em

particular com os dos sujeitos da RDSEPT, o que faz com que as questões locais não se façam

presentes, como deveriam, no currículo escolar, como aponta, ainda, o colaborador Dentão

“Como antes a gente tinha a disciplina Cultura do RN na grade curricular eu sentia que a gente

tinha uma abertura maior para trabalhar a nossa realidade”29.

Como já dito anteriormente essa visão da escola em possuir disciplinas que deem maior

abertura para o trabalho com temáticas locais é algo bem presente entre os colaboradores, visto

que se relacionam com o conjunto de conhecimentos de certo domínio ou área do saber, fato

que revela um modo de se pensar o conhecimento local à parte o conhecimento geral, criando

uma fronteira entre os conhecimentos locais e os gerais, fragmentando-os ainda mais. Para a

colaboradora Garça-Branca: “Acho que hoje deveria ter uma disciplina que contemplasse o

meio ambiente. Aqui em nossa Reserva tem uma época que a gente aflora mais essa questão

que é quando temos os Encontros Ecológicos”30.

Essa forma de significar a disciplina escolar no currículo da escola evidencia não só o

quanto os colaboradores desconhecem as questões de currículo na Educação do Campo, pois

demonstra a dificuldade da escola em inserir no seu cotidiano elementos que fazem parte da

vivência dos sujeitos educandos na comunidade, reservando um momento específico para tratar

28 Colaborador Dentão em sessão reflexiva realizada em: 22/7/2015. 29 Colaborador Dentão em sessão reflexiva realizada em: 22/7/2015. 30 Colaboradora Garça-Branca em entrevista realizada no dia 25/8/2014.

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das questões ambientais que envolvem a comunidade, como revela a urgência em se tratar desta

temática neste momento tão importante que tem sido vivido pela escola, que é a elaboração do

seu PPP e de sua proposta curricular. Para Saviani (2010, p. 40-41):

As disciplinas escolares também sofrem alterações à medida da

renovação/estabilidade do corpo docente e das exigências e pleitos que as carreiras

profissionais passam a apresentar. Mas as mudanças mais determinantes advêm,

inegavelmente, da transformação social e cultural, dos públicos escolares, que, mesmo

com a permanência das finalidades educacionais, determina alterações no conteúdo

do ensino, interferindo na evolução das disciplinas escolares.

É necessário que os docentes, as escolas e sistemas de ensino compreendam a que parte

diversificada do currículo se refere à LDB nº 9.394/96 em seu Art. nº 26 ao tratar que os

currículos das etapas da Educação Básica devem ter uma base nacional comum, a ser

complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte

diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da

economia e dos seus educandos, visto que no momento, em nosso Estado, constitui parte

diversificada na estrutura curricular da rede pública estadual, para fins de efeito e registro da

vida escolar dos alunos, apenas o componente curricular de Língua Inglesa.

Entendemos que o grupo colaborador está tendo a oportunidade de ressignificar as

disciplinas no currículo da escola, superando a fragmentação e a desarticulação entre os saberes

que as disciplinas se propõem a discutir e os saberes e as experiências locais.

Essa concepção do grupo colaborador acerca das disciplinas como elemento do

currículo escolar revela, também, as relações que estabeleceram, e estabelecem com os saberes

construídos nas escolas, nas academias, ao longo de suas experiências formativas, cujo

conhecimento válido e necessário é encontrado no livro didático.

As falas dos colaboradores Tamatião, Dentão e Garça-Branca demonstram a dificuldade

que a escola possui em articular em seu currículo os saberes e as experiências emanadas da

Reserva, aos conteúdos clássicos propostos pelo livro didático, deixando subtendido que o

ponto definidor para a tematização dos saberes locais no processo de elaboração do currículo

da escola tem sido os projetos de ensino com temáticas locais. Esses projetos geralmente são

elaborados no início do ano letivo, sendo dada maior ênfase no período dos Encontros

Ecológicos, e exploram atitudes de conservação à natureza, que devem ser desenvolvidas pelos

moradores e visitantes da Reserva.

Acreditamos que apesar da escola pesquisada já tratar em seu currículo de alguns

saberes e experiências locais, faz-se necessário que a equipe docente da escola, se aproprie das

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questões que fundamentam a Educação do Campo, das Diretrizes Operacionais para a Educação

Básica nas Escolas do Campo, para que possam redimensionar sua organização curricular, haja

vista que:

A identidade da escola do campo se define pela sua vinculação às questões inerentes

à sua realidade ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na

memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na

sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções

exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva do país. (Resolução

CEB/CNE nº 1/02).

O Art. 5º das mesmas Diretrizes ressalta que as propostas pedagógicas das escolas do

campo devem contemplar sua diversidade em todos os aspectos: culturais, sociais, econômicos,

políticos, de gênero, geração e etnia. A instituição de tais Diretrizes, complementada mais tarde

pela Resolução CEB/CNE nº 2/08, demarcam um novo olhar acerca da Educação do Campo,

reconhecendo a importância dos projetos e de práticas educativas que ressignifiquem o campo

brasileiro.

Essa é uma discussão que também precisa ganhar destaque, na escola, visto que

atualmente muito se têm falado de competências e habilidades necessárias aos educandos em

cada ano escolar e etapa da Educação Básica, que definirá oficialmente os conhecimentos

válidos a cada estudante do país, fato que pode impactar negativamente no fortalecimento das

identidades dos coletivos diversos que singulariza e identifica nossa Pátria, caso não seja bem

compreendido por aqueles que, de fato, pensam e elaboram o currículo nas escolas. Para Silva

(2010, p. 16):

Nas discussões cotidianas quando pensamos em currículo pensamos apenas em

conhecimento, esquecendo-nos de que o conhecimento que constitui o currículo está

inextricavelmente, centralmente, vitalmente, envolvido naquilo que somos, naquilo

que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. Talvez possamos dizer

que, além de uma questão de conhecimento, o currículo é também uma questão de

identidade.

Considerando que o currículo é um planejamento que projeta o futuro face às propostas

do momento, e que se constitui como recurso futuro no qual, provavelmente, a criança, o jovem,

o adolescente e o adulto do campo atuarão, faz-se necessário que as questões que permeiam a

RDSEPT, campo específico para análise desta pesquisa, seja elemento deste projeto, uma vez

que sua constituição enquanto Reserva requer dos seus sujeitos uma nova forma de relação com

o meio em que vivem a construção e o fortalecimento de sua identidade enquanto Reserva.

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Esse é um desafio que ora se impõe à escola pesquisada, mesmo que inserindo as

temáticas ambientais em seu currículo, não faz com ações sistematizadas, fato que pode

contribuir para as limitações dos horizontes da RDSEPT, pois apesar de já contemplar questões

comportamentais necessários aos sujeitos da comunidade em relação ao meio ambiente, em

particular a Reserva, além do resgate histórico dos processos políticos e sociais que resultaram

na constituição da Reserva, e integrar-se ás ações educativas propostas pelo IDEMA, ainda não

consegue pensar um projeto educativo sistematicamente articulado as múltiplas dimensões do

contexto social em que está implicada, como podemos observar, durante entrevista, na fala da

colaboradora Gavião:

A escola ainda não tinha pensado nesse tema da Reserva dentro do PPP, é um pecado,

mas nós não tínhamos pensado. Mas, é um fato importante a ser contemplado no PPP

já que aqui é uma Reserva. Acho que podemos pensar em elaborar projetos

pedagógicos para serem trabalhados pelo menos uma vez por ano, direcionando-os à

Reserva, já que a gente trabalha mais de um projeto por ano, um deles poderia estar

relacionado à história da Reserva31.

Isso significa que os saberes e as experiências dos sujeitos moradores da RDSEPT

precisam ser tematizados, articulados e considerados relevantes no currículo escolar, não

somente como forma de valorização dos conhecimentos e da cultura produzidos na

comunidade, mas como elemento problematizador do cotidiano desses sujeitos, cuja reflexão

possibilite aos educandos percebê-la de uma forma diferente, identificando suas possibilidades,

suas limitações, seu potencial enquanto área ecológica, econômica, cultural e política. Nesse

processo de elaboração do currículo, não podemos ignorar e deixar à margem da educação

formal, desenvolvida na comunidade, os saberes por ela produzidos, como propõe as Diretrizes

Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, já mencionadas anteriormente.

Passados doze anos de sua constituição, a RDSEPT ainda não foi pensada no currículo

da escola, como algo importante a ser trabalhado com os sujeitos que nela residem, fator que

pode refletir negativamente na relação de pertença dos sujeitos da comunidade com o campo

em que vivem, uma vez que a partir da criação da RDSEPT, esta deveria ter-se tornado em

referência maior para seus moradores. Antes de ser da comunidade, eles são (ou deveriam ser)

reserva.

Identificamos que a história da RDSEPT tem momentos específicos para serem

tematizados na escola, como conteúdo curricular, durante os Encontros Ecológicos, fato que

31 Colaboradora Gavião em entrevista realizada no dia 25/8/2014

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revela que as questões do cotidiano dos sujeitos moradores da Reserva, o manejo com a área e

tudo que ela proporciona à comunidade, não são considerados importantes de serem

compartilhadas no dia-a-dia da escola.

Observamos que na escola pesquisada predomina uma educação pautada nos

conhecimentos materializados nos livros didáticos, onde não se reflete os saberes e as

experiências coletivas da comunidade. É um projeto de educação deslocado da realidade dos/as

alunos/as, de sua cultura, como podemos observar na fala da colaboradora Gavião ao se referir

ao currículo da escola e a RDSEPT:

No momento a gente só tem as informações que tem nos livrinhos do Encontro

Ecológico, e a gente foca mais esse tema da Reserva quando a gente trabalha projeto

sobre o meio ambiente, aí a gente direciona ao ambiente no qual estamos inseridos,

mas nosso currículo mesmo não tem nada que se refira especificamente à Reserva32.

Essa é uma importante questão que precisa ser refletida pelo grupo colaborador, uma

vez que ao tematizar os saberes que serão articulados no currículo escolar podem oportunizar,

ou não uma relação de identidade entre os educandos e esses saberes. Sobre essa questão,

Charlot (2000, p. 72), nos afirma:

Toda relação com o saber, enquanto relação de um sujeito com seu mundo, é uma

relação com o mundo e com uma forma de apropriação do mundo: toda relação com

o saber apresenta uma relação epistêmica. Mas qualquer relação com o saber comporta

também uma dimensão de identidade: aprender faz sentido por referência à história

do sujeito, às suas expectativas, às suas referências, à sua concepção de vida, às suas

relações com os outros, à imagem que tem de si e a que quer dar a si e aos outros.

A constituição da RDSEPT revela os diferentes modos de ser, de pensar e de existir das

comunidades por ela atravessadas. São essas diferenças que precisam dialogar com os saberes

considerados válidos pela escola no processo de formação dos sujeitos educandos que habitam

na comunidade, pois o que está em jogo não é somente a apropriação de um saber-objeto, por

esses educandos, mas a construção de si mesmos, sua identidade. Sobre esta questão, Caldart

(2004, p. 21) destaca que:

A cultura também forma o ser humano e dá as referências para o modo de educá-lo;

são os processos culturais que ao mesmo tempo expressam e garantem a própria ação

educativa do trabalho, das relações sociais, das lutas sociais. A Educação do Campo

precisa recuperar a tradição pedagógica que nos ajuda a pensar a cultura como matriz

formadora, que nos ensina que a educação é uma dimensão da cultura, que a cultura é

32 Colaboradora Gavião em entrevista realizada no dia 25/8/2014

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uma dimensão do processo histórico, e que processos pedagógicos são constituídos

desde uma cultura e participam de sua reprodução e transformação simultaneamente.

Sobre esse aspecto, Sacristán (2000, p. 34) nos afirma que:

O currículo é uma opção cultural, o projeto que quer tornar-se na cultura-conteúdo do

sistema educativo para um nível escolar ou para uma escola de forma concreta. A

análise desse projeto, sua representatividade, descobrir os valores que o orientam e as

opções implícitas no mesmo, esclarecer o campo em que se desenvolve condicionado

por múltiplos tipos de práticas, etc. exige uma análise crítica que o pensamento

pedagógico dominante tem evitado.

Essa é uma questão importante, pois o currículo pode assim ser definido como um

projeto seletivo de cultura, que encontra na escola tal como ela é, as condições necessárias para

conduzir o modelo de sociedade, de política e de cultura que se pretende. Dessa forma a

elaboração do currículo consiste na seleção de elementos da cultura passíveis de serem

ensinados e aprendidos na educação escolar.

Por isso é importante que a escola pesquisada reflita sobre que cultura-conteúdo se faz

necessária no processo de formação dos sujeitos educandos da RDSEPT, uma vez que não há

como dotar os educandos dos instrumentos necessários a uma efetiva participação social, sem

considerar o contexto da luta e da manutenção da RDSEPT, sem contemplar as condições de

produção de existência dos seus sujeitos.

Entretanto, observamos que, nessa direção, a escola adota de forma não sistematizada,

algumas práticas que valorizam a autonomia dos discentes, na organização e decisão do que vai

ser trabalhado pela instituição em eventos escolares, como por exemplo, o desfile cívico, que

geralmente possui como tema o meio ambiente, nas festas promovidas pela escola para a

comunidade, inserindo-os num processo de partilha de negociações entre os mesmos, para o

alcance de um objetivo comum, como destaca a colaboradora Gavião.

Os meninos do 9º ano já me perguntaram: Qual é o tema que vamos trabalhar para o

7 de setembro? Que é o Meio Ambiente. Eles estão querendo fazer uma camisa e

querem colocar o tema do projeto na camisa. Muitas de nossas apresentações são

organizadas por eles. Até mesmo para a festa das mães... Basta dar o tema, eles

procuram a música, fazem a coreografia33.

33 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada no dia 22/7/2015.

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Entendemos que alguns educandos, culturalmente, já adotam uma postura de

participação, procurando se envolver de forma ativa na programação da escola, atitude que deve

ser potencializada por toda a equipe no currículo escolar, não apenas em um momento

específico, mas durante todo o ano letivo, em sua programação. Dar vez e voz aos estudantes é

uma forma de valorizar e potencializar sua autonomia, vivenciando e compartilhando situações

de decisões coletivas.

Para que isso aconteça é necessário expandir essas discussões para além do grupo de

elaboração do PPP da escola, mas entre a equipe, abrindo-se para ouvir os seus sujeitos

educandos, os pais, a comunidade e que juntos, discutam quais saberes são necessários ao

processo de formação dos sujeitos moradores da RDSEPT, que escola será necessária ao

atendimento das necessidades formativas destes indivíduos, no contexto das relações

estabelecidas com a RDSEPT.

Durante a pesquisa observamos que se faz necessário à equipe da escola debruçar-se

mais sobre os estudos acerca de currículo na Educação do Campo, uma vez que foi a abordagem

metodológica adotada nesta investigação que possibilitou um primeiro contato do grupo com

esta temática, cujo tempo foi insuficiente para que se consolidassem algumas questões acerca

do currículo entre os colaboradores, como podemos identificar na falado colaborador Dentão.

É por isso que hoje em dia existem diversas formas da gente repassar o conhecimento.

O aluno não vai ter que aprender só aquele conteúdo puro e batido. É por isso que se

tem falado em trabalhar os conhecimentos prévios, o que ele traz pra sala de aula, tudo

isso é importante. Assim, pode-se dizer que o currículo está muito mais além do que

a concepção que a gente focou. Ele dá conta da porta da escola ao final da escola34.

É compreensível a confusão do colaborador, ao se dar conta que o currículo escolar deve

ser pensado para além do que comumente vem sendo praticado pela escola, através do livro

didático, no entanto o currículo possui um lugar definido no fazer escolar, porque se assim não

o fosse não o tinha razão de ser, e não daria conta de nada. Refere-se ao que se faz e para que

se faz, está no plano das relações de saber que de acordo com Charlot (2000, p.85) se define

como as relações sociais consideradas sob o ponto de vista do aprender, fundada sobre as

diferenças de saber. e das experiências consideradas pela escola no processo de formação dos

sujeitos. Para Silva (2010):

34 Colaborador Dentão em sessão reflexiva realizada no dia 22/7/2015.

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O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é

trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae:

no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso, documento. O

currículo é documento de identidade (SILVA, 2010, p. 150).

O currículo carrega em si, construções e representações de outras pessoas, de suas

histórias, de suas caminhadas, que são confrontadas com o sujeito educando, que pode ou não

se reconhecer, ou reconhecer os outros com os quais convive, durante a relação que estabelece

com o saber ora apresentado.

É na especificidade social, cultural, territorial e econômica, que estão imersos os sujeitos

educandos da RDSEPT, no modo como se inscrevem nesse contexto, que vão construindo sua

identidade individual ao mesmo tempo em que fortalecem a identidade coletiva da comunidade

a que pertencem , produzindo sentidos para sua existência, em relação a outras formas de existir,

a partir de uma rede de sentidos que os constituem enquanto moradores de uma Reserva de

Desenvolvimento Sustentável.

Quando nos referimos aos sujeitos educandos da RDSEPT, os consideramos a princípio,

como indivíduos ou coletivos de indivíduos identificados de modo singular, em relação aos

aspectos sociais, econômicos, políticos, naturais e culturais, no qual estão imersos, associados

a uma narrativa e um determinado grau de valoração, em detrimento da forma de organização

social da comunidade em defesa do seu modo de produção vida, em comparação com outros

sujeitos. São constituídos e históricos, estão imersos numa complexa relação de negociação de

conflitos entre eles, em relações de poder, além de dialogar com as tradições culturais,

intelectuais, com a natureza, e com suas heranças genéticas.

Nesse sentido, compreendemos que o olhar e a concepção que se vem tendo sobre este

território – o currículo escolar, na escola pesquisada, concebendo-o como um aglomerado de

conhecimentos provenientes do livro didático, é resultado de uma prática histórica, das relações

epistêmicas que a equipe docente estabelece com o saber encarnado em objetos e que tais

objetos , por não dialogar com a realidade local, têm negado as especificidades dos sujeitos

educandos da RDSEPT, desenvolvendo uma prática que não reflete o contexto no qual a escola

está inserida.

Assim, faz-se necessário que a instituição fortaleça internamente o processo de

elaboração de seu currículo, numa perspectiva dialógica e coletiva, como aponta as Diretrizes

Operacionais para a Educação Básica nas escolas do campo e as Diretrizes nacionais para a

Educação Básica, considerando as particularidades do meio em que estão inseridos os

educandos, na parte diversificada, de forma consciente e sistematizada.

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Não podemos esquecer que discutir com as escolas do campo de que forma será essa

inserção dos saberes, locais e regionais, na parte diversificada do currículo, é fator relevante no

atual contexto educacional, para que não seja gerada uma situação de retrocesso nessas escolas,

haja vista que o princípio do respeito à diversidade, do direito à educação, dentro da educação

do campo é fundamento das investiduras dos movimentos sociais como já foi mencionado neste

trabalho, onde as situações de vida dos educandos precisa se fazer presente no currículo da

escola.

No entanto, evidenciamos que, mesmo compreendendo o currículo como programa, os

docentes reconhecem a importância de implementar os conhecimentos prévios dos alunos, seus

saberes e suas habilidades no currículo escolar, ainda que inconscientes e de forma não

sistematizada.

Quando destacam os aspectos históricos e ambientais da RDSEPT na escola, através de

projetos didáticos que envolvem toda a comunidade escolar, estabelecem uma valoração desse

processo, na construção do conhecimento com os educandos. Assim quando participam das

atividades promovidas pelo IDEMA, bem como dos Encontros Ecológicos articulados pelo

Comitê Gestor da RDSEPT e junto com este realiza tal evento, demonstra o quanto é importante

que se reavive o movimento de luta social nas comunidades, no processo de ensino e

aprendizagem.

Assim, reconhecemos que ao organizar junto com os alunos trabalhos que ressaltem

seus talentos, deixando-os decidirem sobre formas de apresentações de suas produções

artísticas e culturais na escola, a equipe sinaliza uma abertura para a inserção dos saberes locais

no currículo da escola, ainda que por meio de eventos pontuais, além de fortalecer o processo

de partilha de decisões coletivas entre os alunos.

4.2 EXPERIÊNCIA E O SABER DA EXPERIÊNCIA NO CURRÍCULO ESCOLAR: UMA

DISCUSSÃO NECESSÁRIA

Ao longo dos anos o saber escolar, na forma de conteúdos, tem sido uma questão central

a ser debatida pelos professores durante o processo de elaboração da proposta curricular, isso

porque “selecionar” os conhecimentos válidos e necessários de serem abordados e expandidos

para um determinado grupo, em um determinado ano escolar, na área de conhecimento e na

disciplina, não constitui tarefa fácil, e deve estar em consonância com um projeto educativo

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maior, o Projeto Político Pedagógico – PPP, da instituição. Esta pesquisa nos apontou algumas

situações cruciais ao grupo colaborador, quando da tematização e da articulação dos saberes e

das experiências dos sujeitos da RDSEPT, no currículo da escola.

Estamos imersos cotidianamente em acontecimentos que apesar de vividos por várias

pessoas ao mesmo tempo, não são significados da mesma forma por elas, ou seja, cada um de

nós estabelece uma relação diferente com os acontecimentos e as marcas por eles deixados em

nós, vão se constituindo nas experiências, nos ensinamentos, nas aprendizagens, em nossos

conhecimentos.

Essa é a concepção de experiência que assumimos em nosso trabalho, ancorados em

Bondía (2002, p. 25) que ao discorrer etimologicamente sobre a palavra experiência nos ressalta

que nos ressalta que:

A experiência é em primeiro lugar um encontro ou uma relação com algo que se

experimenta, que se prova. O radical é periri, que se encontra também em periculum,

perigo. A raiz indo-europeia é per, com a qual se relaciona antes de tudo a ideia de

travessia, e secundariamente a ideia de prova. Em grego há numerosos derivados

dessa raiz que marcam a travessia, o percorrido, a passagem: peirô, atravessar; pera,

mais além; peraô, passar através, perainô, ir até o fim; peras, limite. Em nossas

línguas há uma bela palavra que tem esse per grego de travessia: a palavra peiratês.(...)

A palavra experiência tem o ex de exterior, de estrangeiro, de exílio, de estranho e

também o ex de existência. A experiência é a passagem da existência, a passagem de

um ser que não tem essência ou razão ou fundamento, mas que simplesmente “ex-

iste” de uma forma sempre singular, finita, imanente, contingente.

O autor ainda destaca que o modo pelo qual vamos respondendo a esses acontecimentos,

os sentidos que vamos produzindo sobre eles se constitui em um saber específico da

experiência, propício a ela. Ele afirma:

Durante séculos, o saber humano havia sido entendido como um pátheimáthos, como

uma aprendizagem no e pelo padecer, no e por aquilo que nos acontece. Este é o saber

da experiência: o que se adquire no modo como alguém vai respondendo ao que vai

lhe acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer

do que nos acontece. No saber da experiência não se trata da verdade do que são as

coisas, mas do sentido ou do sem-sentido do que nos acontece (BONDÍA, 2002, p.

27).

Esse é o conceito de saber como uma relação, produção de sentidos e de experiência que

assumimos em nossa questão de partida: “Quais saberes e experiências dos sujeitos da RDSEPT

são articulados no currículo do Ensino Fundamental da Escola Municipal Alferes Cassiano

Martins?”, por compreendermos que o contexto sociocultural da RDSEPT, que envolve a

comunidade de Barreiras, se faz concreto e singular, coletivo, cuja forma de existência parte da

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subjetividade e da relação estabelecida entre os sujeitos com ela, nas comunidades por ela

atravessadas.

O processo de constituição da RDSEPT deixou marcas históricas de lutas, organização

social e resistências, nas comunidades que abrange, requerendo dos moradores um novo modo

de se relacionar com o meio ambiente, no desenvolvimento das atividades pesqueiras, nos

cuidados com o saneamento básico, nas formas de manejar os recursos naturais ali existentes,

trazendo novas responsabilidades para os moradores, para que de fato se tornem comunidades

sustentáveis.

Tal acontecimento fez mudar, de alguma forma, o cotidiano daquelas pessoas, as

necessidades de se discutir com a comunidade novas relações a serem estabelecidas com a área,

a realização de cursos para pescadores sobre meio ambiente, a iniciativa ao turismo de base

comunitária, a instalação de uma rádio local na Reserva, a realização de curso de especialização,

dentre outros aspectos, além de, se tornarem objetos e locus de pesquisa nas mais diversas áreas,

turísticas, econômicas, ambientais, biológicas, geográficas, educacionais, tornando-se

referência de investigação científica naquelas comunidades.

A relação dos pescadores artesanais, das marisqueiras, dos pequenos agricultores, dos

caçadores, com esse espaço de produção da subsistência dos sujeitos que nela/dela vivem,

demandou do Conselho Gestor e dos órgãos competentes um diálogo constante com a

comunidade e o compartilhamento de decisões coletivas, que incidem sobre o modo de vida nas

comunidades. Tais diálogos realizam-se nos espaços organizados para esse fim, nas reuniões

do Conselho Gestor, nos Encontros Ecológicos, para garantir junto a comunidade um novo

modo de viver e ser Reserva, sem com isso, descaracterizar as comunidades já existentes.

São as novas formas de significar as relações entre os moradores das comunidades e a

Reserva, a partir dos acontecimentos históricos já mencionados nesse trabalho, o

desenvolvimento de habilidades e competências35 que possibilitem a sustentabilidade dessas

relações que precisam ser repensados, discutidos no território do currículo escolar, sem ignorar

a rede de conhecimento advinda com a construção da Reserva. Mais do que uma área ambiental,

ela constitui um lugar específico nessas comunidades, com suas trilhas ecológicas, dunas,

restingas, manguezais..., abrigando a vida na diversidade de sua existência.

35 Segundo Perrenoud (1999), as competências são traduzidas em domínios práticos das situações

cotidianas que necessariamente passam compreensão da ação empreendida e do uso a que essa ação se

destina. Já as habilidades são representadas pelas ações em si, ou seja, pelas ações determinadas pelas

competências de forma concreta (como escovar o cabelo, pintar, escrever, montar e desmontar, tocar

instrumentos musicais etc.)

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Esta é a importância e o desafio da Educação do Campo, não só para Macau, mas para

todo o país, reconhecer as diferentes formas da existência humana em sua relação com a terra,

as águas, com as florestas, dentre outros campos, no currículo escolar. Inserir os saberes

tradicionalmente produzidos na comunidade, conectando-os às perspectivas futuras, ao

desenvolvimento, à sustentabilidade, tarefa que deve ser construída no diálogo, nos consensos.

Entendemos que nesse momento em que se repensa o currículo escolar o grupo

colaborador também lança mão de saberes e de experiências docentes para materializar a

proposta curricular da escola, num documento vivo, ativo, orientador das práticas pedagógicas,

sendo necessário levantarmos alguns questionamentos que puderam ser utilizados pela equipe

para nortear a reflexão: O que aconteceu (acontece) na comunidade que nos tocou/a? O que tem

atravessado os nossos educandos? Que experiências trazem consigo? Onde essas experiências

se desenvolvem (na família, nas relações sociais na comunidade, nos movimentos)? Quais

saberes são necessários aos sujeitos da Reserva? De quais comportamentos econômicos,

socioculturais a Reserva necessita para se manter sustentável? Qual é o papel da escola diante

da Reserva? O que podemos ensinar e aprender com o movimento Pró- reserva? Qual é o

significado dos Encontros Ecológicos para comunidade (escolar e local)? O que deve ser

considerado e inserido no currículo da escola? De que forma? Quais saberes escolares precisa

dialogar com os saberes produzidos na Reserva?

Estes questionamentos longe de buscarem, ou terem uma única resposta, oportunizaram

o Grupo Colaborador refletir sobre a escola, sua função social, seu papel, seus sujeitos, seu

entorno, sua forma de existir na comunidade.

Vale ressaltar que no contexto da Educação do Campo, esse diálogo entre os saberes da

experiência no currículo escolar, compreendido como vivenciar o conjunto de experiências,

tornando-as próprias, subentende-se a possibilidade do encontro, da interação e do deixar-se

permear pelo outro, ao mesmo tempo diferenciar-se dele. Este encontro com o outro nos remete

a nós mesmos, à construção de nossa própria identidade, ou da nossa identidade coletiva, o que

nos é próprio, singular em relação a outros grupos, outros campos. Nessa direção, Sacristán

(2000, p. 41) destaca:

Partindo do pressuposto de que os aspectos intelectuais, físicos, emocionais e sociais

são importantes no desenvolvimento e na vida do indivíduo, levando em conta, além

disso, que terão de ser objeto de tratamentos coerentes para que se consigam

finalidades tão diversas, ter-se-á que ponderar, como consequência inevitável, os

aspectos metodológicos do ensino, já que destes depende a consecução de muitas

dessas finalidades e não de conteúdos estritos de ensino. Desde então, a metodologia

e a importância da experiência estão ligadas indissoluvelmente ao conceito de

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currículo. O importante do currículo é a experiência, a recriação da cultura em termos

de vivências, a provocação de situações problemáticas.

Ou seja, o currículo escolar deve voltar sua atenção, não só para os saberes-objeto, mas

para os processos educativos, tendo em vista o desenvolvimento do educando e sua relação com

a sociedade. Nesse sentido, faz-se necessário refletir qual o lugar que a experiência ocupa no

currículo da escola pesquisada, tendo em vista as discussões já apresentadas neste trabalho

acerca do pensamento do grupo colaborador sobre o currículo escolar, atualmente definido pelo

que propõe o livro didático. Não se trata de privilegiar um saber, em detrimento do outro, mas

de como articular as experiências dos educandos, com os conhecimentos e com a cultura

elaborada, numa complexidade necessária à atual sociedade, em seus mais variados aspectos.

Retomamos o pensamento de Bondía (2002, p. 19) quando este nos chama a atenção

para a formação do sujeito da experiência, que para ele, “seria algo como um território de

passagem, algo como uma superfície sensível que aquilo que acontece afeta de algum modo,

produz alguns afetos, inscreve algumas marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos”, ou seja,

um sujeito disponível, receptível, aberto, perene, é território onde os acontecimentos têm lugar.

Este sujeito se expõe e se arrisca, protagoniza as transformações sociais, sem temê-las porque

sua formação foi forjada no encontro das experiências, nas travessias.

Garantir no currículo escolar a experiência e o saber da experiência requer compromisso

não somente com a formação desse sujeito, mas com a formação docente, uma vez que a prática

destes profissionais também exige vivências formativas. Nessa perspectiva, para que a escola

se constitua numa fonte de pensamento, deve reconfigurar o seu espaço de formação docente,

fazendo uma interrupção entre a pressa de seu fazer cotidiano e os acontecimentos, sentindo-os

com mais lentidão, indo devagar nas formulações dos juízos e opiniões. Ter tempo, fazer bom

uso deste.

O autor, ainda faz ressalvas com relação ao uso da palavra "experiência" no campo da

ciência moderna, nos convidando à reflexão para o fato desta palavra remeter comumente à

compreensão de um conhecimento inferior, menosprezada e tratada como linguagem menor, no

âmbito da ciência moderna, porque para a ciência, a experiência é sempre subjetiva, contextual,

finita, liga-se à fugacidade do tempo, a situações concretas e particulares, impossível de ser

objetivada e universalizada.

No entanto, compreendemos que a experiência está para além de um método, de um

caminho seguro, de um experimento, porque ela é singular, de acordo com o modo pelo qual os

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sujeitos constroem os sentidos, ela vai se diferenciando de tantas outras experiências. Sobre

essa questão da experiência, no âmbito do currículo escolar, Sacristán (2000, p. 44) alerta:

O enfoque experiencial costuma se referir, geralmente, aos níveis mais básicos do

sistema educativo. A “psicopedagogização” do pensamento e da prática educativa, se

assim pode ser denominada, afeta os primeiros níveis do sistema educativo, a

formação de seus professores e a própria concepção da profissionalização docente. À

medida que ascendemos de nível, o peso dos conteúdos especializados,

correspondentes a diversas parcelas do saber científico, social, humanístico, técnico,

etc., adquire o valor de referenciais para pensar e organizar o currículo. Um problema

iminente nas sociedades mais desenvolvidas, colocadas pelo próprio prolongamento

da escolaridade obrigatória.

Podemos inferir que este aspecto experiencial apontado pelo autor tem predominado nas

etapas da Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, o que pode se

constituírem um dos motivos para a dificuldade que alguns professores e escolas, apresentam

ao tentar inserir os saberes e as experiências dos educandos no currículo escolar, principalmente

nos anos finais do Ensino Fundamental, como aponta o colaborador Dentão:

As meninas (ao referir-se aos docentes dos anos iniciais) estão com todas as

disciplinas nas mãos delas, os meninos (alunos) estão todos os dias, por isso fica mais

fácil delas trabalharem de uma forma diferente, mais articulada com as questões da

comunidade, de forma interdisciplinar. O que se quer dizer é que do 6º ao 9º vai puxar

cada um pra sua área (sobre os projetos da escola), não fugindo do objetivo geral, mas

acaba que a disciplina direcionando pra sua área. Quer queira, ou não, a gente ainda

está muito acostumada a trabalhar dessa forma36.

O colaborador entende que a mudança dos anos iniciais para os anos finais, não é

impactada somente pela maturação biológica do educando, mas pela própria forma de

organização escolar, onde a fragmentação do saber se acentua na medida em que se avança nas

etapas de escolarização, cujo ensino desconecta-se de uma realidade onde há um professor

organizando e articulando os saberes entre as disciplinas que leciona, num processo que busca

a interdisciplinaridade, para uma realidade onde os saberes estão compartimentalizados entre

as disciplinas e seus professores.

Diante da pesquisa identificamos que esse germinar do trabalho escolar de forma mais

sistematizado, planejado e reflexivo, quanto ao trabalho pedagógico, acontece apenas nos anos

iniciais do Ensino Fundamental, como nos aponta a colaboradora Gavião, reforçando o aspecto

fragmentado das práticas curriculares nos anos finais do Ensino Fundamental, como já havia

apontado o colaborador Dentão.

36 Colaborador Dentão em Sessão reflexiva realizada em 22/7/2015.

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Trabalhamos com o projeto Meio Ambiente com todas as etapas e modalidades, só

que geralmente ele é mais acentuado no Ensino Fundamental anos iniciais, ele tem

um enfoque maior. Quando a gente (referindo-se aos professores do 6º ao 9º ano)

chega no 2º semestre é que a gente começa a trabalhar esse projeto que já foi elaborado

lá, no início do ano letivo, devido a esses entraves maiores, do tipo: falta de professor,

de aula, questão de não reunir todo mundo para o planejamento [...]37

A perpetuação de algumas situações como a rotatividade no quadro docente da escola e

a falta de professor, típicas da falta de atenção ao longo dos anos às escolas do campo, tem

agravado a observação de Sacristán (2000) quanto ao desenvolvimento da presença do nível

experiencial do currículo das escolas, nas primeiras etapas de escolarização.

Podemos perceber que a mudança nas etapas de escolarização traz novos desafios à

organização escolar e ao currículo da escola. Da Educação Infantil aos anos iniciais do Ensino

Fundamental, o educando convive numa realidade, onde há um único docente pensando e

organizando as situações de aprendizagem, os saberes e as experiências necessárias ao

desenvolvimento do educando, nestas etapas, ao passo que, a partir dos anos finais do Ensino

Fundamental são vários professores que precisam de tempo e disponibilidade para se articular

entre si, de maneira que pensem de forma mais inteira as necessidades formativas dos educando,

e de que maneira contemplá-las, de como torna-las menos fragmentadas no currículo escolar.

A fragmentação da prática curricular desenvolvida na escola pesquisada pode

corroborar para a marginalização dos saberes locais, no cotidiano da escola e provocar o

descrédito dos alunos sobre o modo de vida local, ignorando as possibilidades de

desenvolvimento socioeconômico da comunidade, como podemos observar na fala da

colaboradora Garça-Branca:

Eu não sei lá (referindo-se a Diogo Lopes), mas aqui os pais não querem que seus

filhos sejam pescadores, porque é uma vida sofrida que têm. Eles dizem que não

querem que seus filhos sejam iguais a eles. Apesar de que em alguns momentos na

nossa conversa com os alunos, em quererem uma coisa melhor para eles, dizem assim:

Ah! Qualquer coisa eu vou pescar38.

Assim como os pais, a escola também considera a pesca uma atividade profissional sem

muito retorno econômico, que não é digna de ser seguida pelos educandos, como se pode

observar na fala da colaboradora, refletindo nas respostas dos educandos. Isso evidencia que os

saberes advindos da pesca artesanal não são valorizados no currículo da escola, tampouco esta

37 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada no dia 22/7/2015 38 Colaboradora Garça-Branca em sessão reflexiva realizada em 21/7/2015.

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profissão, o que pode provocar a extinção de pescadores in loco, como nos aponta as

colaboradoras, Galinha do Mangue e Gavião “Aqui, agora, a maioria da nossa comunidade não

são mais filhos de pescadores. Aqui os pais trabalham mais nas empresas do polo de Guamaré,

em Recife, como Pedreiro [...]”39

Hoje o número de pescadores se concentra mais em Diogo Lopes, mas há dez anos

aqui havia um número bom de pescadores. Hoje em dia os rapazinhos não querem

mais ser pescador. Os filhos dos pescadores também não querem porque tão vendo a

dificuldade. Têm pessoas que saem para pescar e voltam quase sem nada. Na própria

comunidade você mal consegue peixe. Os pescadores vão para alto-mar e quando

voltam já deixam o pescado no machante para ser repassado para as pessoas de fora.

Não tem ficado quase nada na comunidade.40

As marcas das experiências da pesca artesanal como atividade econômica, forma de

subsistência, parece ter deixado marcado negativamente a comunidade. Entendemos que ao

longo dos anos essa prática não foi sendo ressignificada, nem valorizada pelos moradores da

comunidade, em virtude dos riscos, do sofrimento e do pouco retorno financeiro. Sem um olhar

mais sensível, sem investimentos e sem conhecimentos mais elaborados, a característica maior

da Reserva, o desenvolvimento e a sustentabilidade, parece estar em risco. Sobre essa questão

a colaboradora Gavião reflete que:

Se as pessoas da comunidade estão migrando para outras áreas de trabalho que não

têm nada a ver com a Reserva e o que ela pode possibilitar economicamente, então

não está sendo sustentável. Acho que isso é pra ser pensado em nosso currículo41.

A reflexão da colaboradora evidencia que se faz necessário inserir no currículo da escola

as questões que problematizam o desenvolvimento sustentável nas escolas do campo, refletindo

com os educandos as possibilidades de desenvolvimento local, constituindo-se em espaço de

difusão de valores e conhecimentos que viabilizem a sustentabilidade dos ecossistemas e a

manutenção dos recursos naturais considerados a base para a reprodução social dos coletivos

que ali habitam.

Para a colaboradora Tamatião, essa questão da sustentabilidade e desenvolvimento

econômico já começou a ser repensado na comunidade vizinha pelo setor da economia

pesqueira ao afirmar que:

39 Colaboradora Galinha do Mangue em sessão reflexiva realizada no dia 21/07/2015 40 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada em 21/7/2015 41 Colaboradora Gavião em sessão reflexiva realizada em 21/7/2015

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Em Diogo Lopes fizeram um frigorífico, fizeram um rancho de pesca de sardinha e

agora está sendo feito um de Peixe-voador. Lá eles estão buscando alternativas, só

não sei dizer se tem tido articulação com os pescadores daqui42.

Estas questões revelam a importância de se considerar no currículo da escola

pesquisada, os saberes tradicionais da pesca artesanal articulado as possibilidades coletivas de

organização econômica, oportunizando novas formas dos sujeitos educandos se relacionar com

os acontecimentos de sua comunidade, criando oportunidades para que se exponham, deixem

suas marcas, construam novos saberes acerca desta atividade na comunidade.

Nesse sentido, podemos dizer que o espaço de formação do currículo na escola

pesquisada, não tem servido para os alunos produzirem sentido, acerca da realidade local, isto

é, compreender e significar o processo de constituição da RDSEPT, como locus de saber,

observando a equivalência entre identidade e diferença, visto que mais se aproxima da

disseminação de saberes-objeto, encarnados nos livros didáticos.

Sabemos que os processos educativos passam pelo conjunto de experiências, de

vivências que o ser humano tem ao longo de sua vida. Essas experiências que marcam a todos

são as produções de sentido, isto é, nas relações e nas valorações que consideramos pertinentes,

no modo como nos produzimos como pessoas. Ao produzir seu alimento, suas roupas, suas

ferramentas, seu conhecimento, o ser humano se produz como pessoa. É esta atividade que dá

sentido à vida. É esse o cultivo do ser humano, como sujeito cultural que não deve ser separado

do currículo da escola.

42 Colaboradora Tamatião em sessão reflexiva realizada em 21/7/2015

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5 LANÇANDO A ÂNCORA: TECENDO AS IMPRESSÕES FINAIS DA PESQUISA

O trabalho investigativo ora apresentado trata de quais saberes e experiências dos

sujeitos da RDSEPT são tematizadas no currículo do Ensino Fundamental, da Escola Municipal

Alferes Cassiano Martins, Macau – RN. A relevância desse constructo investigativo

interpretativo consiste na análise das concepções curriculares que permearam o processo de

discussão para a elaboração da proposta curricular da referida escola, localizada numa área de

campo, para ser desenvolvida formalmente com os sujeitos educandos da RDSEPT.

Para tanto, desenvolvemos nossa pesquisa numa abordagem qualitativa, de caráter

interpretativo, nos guiando por um processo de reflexão acerca da construção da proposta

curricular da escola pesquisada, que nos possibilitou repensar os nossos objetivos na pesquisa,

e nos aproximarmos ainda mais do nosso objeto de estudo e das construções dos dados, a partir

dos procedimentos adotados na pesquisa, com a colaboração do grupo de elaboração do Projeto

Político Pedagógico (PPP) da escola.

Assim, mergulhados numa perspectiva reflexiva e dialógica, realizamos observações,

entrevistas semiestruturadas e sessões reflexivas, que ao destacar o campo da Reserva de

Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão (RDSEPT) nos permitiu constatar,

dentre outros aspectos, que a escola pesquisada, por estar situada numa área pesqueira, de mar,

restinga e duna, tem dificuldades de se reconhecer enquanto escola do campo, uma vez que sua

concepção acerca desta modalidade ainda está limitada ao campo agricultor / campesino /

assentamento. Compreendemos que esta percepção da escola sobre si em relação as demais

escolas do campo, decorre do fato de o movimento por uma educação do campo ter nascido no

seio do MST.

Constatamos, também, que a metodologia adotada oportunizou o primeiro espaço

formativo acerca da educação do campo para o Grupo Colaborador, onde os questionamentos

levantados possibilitaram a equipe a repensar no processo de reelaboração do currículo e do seu

Projeto Político Pedagógico, a sistematização de sua ação educativa de forma que venha a

contemplar os saberes e as experiências dos seus sujeitos educandos, sinalizando a entrada da

escola num processo de reconstrução de sua identidade enquanto escola do campo, para

construir uma nova forma de existência e pertença com os seus sujeitos na comunidade em que

está inserida.

Construímos essa análise conclusiva a partir de eixos de análise, tomados como ponto

reflexivo entre as questões identitárias da educação do campo, em particular da RDSEPT, as

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concepções sobre o currículo escolar a partir do paradigma da educação do campo,

identificando alguns elementos necessários à construção da proposta curricular para a Educação

do Campo, tais como os saberes e experiências que nele se inserem. Nessa ótica, analisamos as

elaborações do grupo colaborador acerca do currículo na escola, como o concebem, quais

saberes e experiências são consideradas válidas e articuladas na proposta curricular da

instituição, pelo mesmo.

Sabemos que em uma investigação os dados e os fatos não se revelam direta e

gratuitamente aos olhos do pesquisador, mas a partir das interrogações que fazemos sobre eles,

pautado no que conhecemos e pressupomos sobre a realidade investigada, dessa forma o nosso

primeiro eixo de análise refere-se à construção da identidade da escola do campo, tomando

como referência a escola pesquisada, ao adentrarmos nos mares da Educação do Campo,

desvelando sua diversidade com as lentes da RDSEPT.

Compreendemos que por desconhecimento das questões territoriais, sociais, históricas,

culturais e econômicas que cerceiam a construção da Educação do Campo, a equipe da escola

não tem legitimado no processo de construção do seu PPP e de sua proposta curricular os

princípios da construção identitária da Educação do Campo, que é a vinculação da prática

educativa com a realidade dos sujeitos educandos, pois percebemos que o diálogo entre a prática

educativa da escola e as questões socioeconômicas, culturais, políticas e geográficas, nas quais

os sujeitos educandos da RDSEPT estão imersos, acontece numa perspectiva acrítica por parte

da equipe, com organização de momentos específicos para tratar dessas questões. Essa

problemática foi tematizada durante as sessões reflexivas e as entrevistas onde pudemos

repensar com o Grupo Colaborador quais características identificam a escola pesquisada

enquanto escola do campo.

Notamos, também, que a rotatividade no quadro docente da escola, ao longo dos anos,

constituiu em fator relevante para o desenvolvimento de uma prática curricular desenraizada

dos signos locais, das trajetórias de vida da comunidade, nutrindo o pensamento de que era

preciso que o ensino local se desse da mesma forma que na sede do município, para que os

alunos da Reserva possam alçar novos voos. Há que se ressaltar que a própria organização da

escola, por turmas anuais, difere comumente das salas multisseriadas presente nas escolas do

campo, fato que contribui para a compreensão de uma visão urbana nos modos de fazer escola,

uma vez que no município a multisseriação está presente nas escolas do Centro Municipal de

Ensino Rural.

Nesse sentido, identificamos que há a necessidade dos profissionais da escola se

perceberem e se reconhecerem como pertencentes ao campo, e que a organização das práticas

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educativas da escola, longe de se constituir numa extensão do modelo urbano de se pensar e

fazer escola, deve se inscrever num projeto educativo para a sua realidade, para as formas de

organização social da comunidade, fomentando e fortalecendo o debate local acerca da

constituição e manutenção da RDSEPT. Portanto, faz-se necessário o desenvolvimento de

formação continuada, que oportunize aos docentes a problematização de suas práticas no

contexto da Educação do Campo, de modo a contribuir com a implementação desse debate na

escola.

Entendemos que esse desconhecimento resulta, também, da tensão que existe na

organização escolar em lidar com a diversidade, com a articulação dos conhecimentos locais e

o conhecimento geral, com outros coletivos, no reconhecimento das diferentes vozes, na

compreensão de que há múltiplas formas e espaços em que acontece o ensino e a aprendizagem.

Constatamos que as concepções curriculares da escola encontram-se enraizadas nos

modelos tradicionais, onde prevalecem as adaptações dos conteúdos dos livros didáticos, como

forma de instrumentalizar o educando, onde a cultura livresca indica uma forma de representar

o campo como local de atraso, pois fica subtendido que o aluno da RDSEPT tem que ter o

mesmo conteúdo que os alunos da sede do município.

No entanto observamos que na prática a escola tem se desprendido, em alguns

momentos específicos, desse modelo, para inserir as questões ambientais locais, no currículo

da escola, ao adotar em seus projetos de ensino o tema da RDSEPT. Esta é uma questão

importante, pois esta abertura da escola para inserir elementos do contexto do aluno no currículo

da escola, mudando o seu conteúdo, toca num aspecto fundamental da cultura, onde serão

insinuados outros comportamentos culturais, fato que pode contribuir para o fortalecimento da

identidade dos sujeitos da RDSEPT, dos seus sentimentos de pertença.

Essas percepções foram elaboradas no desenrolar dos procedimentos metodológicos da

pesquisa, pois notamos que mesmo de forma acrítica, o Grupo Colaborador evidenciou a

importância de a escola explorar mais o contexto sociocultural que envolve os educandos na

sua proposta pedagógica, o que nos faz inferir que esta questão emerge da participação da escola

nos Encontros Ecológicos. Consideramos que esses Encontros se constituem em espaços de

mobilização das comunidades em prol da ação contínua de refletir o modo de vida nas

comunidades numa perspectiva da sustentabilidade, onde saberes são compartilhados e

negociados.

Outro fator a ser considerado acerca da organização curricular da escola, diz respeito a

importância dada pela equipe às disciplinas enquanto campos de articulação entre saberes

necessários aos educandos. Apesar de no paradigma da Educação, a criação de novas disciplinas

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ser algo possível, entendemos que no contexto da escola pesquisada, para além desta questão,

é denunciado o abismo que separa no currículo, os conhecimentos locais dos conhecimentos

gerais. As falas dos co-partícipes revelaram a dificuldade da escola lidar com os saberes que

não estão prescritos, que não estão enquadrados no saber escolar, gerando, portanto, uma

indefinição na elaboração do currículo escolar.

Dessa forma consideramos que no tocante a elaboração da proposta curricular para a

escola, a luz do paradigma da educação há uma prática curricular cambiante, em que a oscilação

entre o pensamento crítico e acrítico reflete na fragilidade da articulação dos saberes e das

experiências dos sujeitos educandos no processo de elaboração da proposta curricular da escola

pelo Grupo Colaborador, constituindo-se num entrave para a construção de uma proposta

curricular que respalde um projeto educativo emancipador para os sujeitos da Reserva.

Analisando a composição do Grupo de Trabalho do PPP da escola pesquisada,

reconhecemos que houve uma tentativa da escola em representar os vários segmentos que a

compõem, mas também identificamos que apesar de a maioria dos representantes possuírem

formação acadêmica, aspectos conceituais e operacionais acerca da elaboração do PPP e da

proposta curricular são desconhecidos pelo grupo, fato que fragiliza a condução dos trabalhos

para repensar esses instrumentos na escola, podendo comprometer a autonomia da escola, ao

mesmo tempo em que revela as fragilidades na formação inicial de tais profissionais.

Contudo, vimos no Grupo Colaborador, o desejo de se apropriarem dessas questões para

materializarem as suas proposições través da elaboração do PPP e da proposta curricular da

escola, compromisso que aconteceu no desenrolar dessa investigação, onde pudemos

acompanhar parte desse processo, que se constituiu em objeto de análise nessa pesquisa,

considerando o PPP que já existia na escola, elaborado em 2002, com o apoio da equipe técnica

da Secretaria de Educação do município. O grupo reconheceu a necessidade de reelaborar o

PPP da escola, porque sua proposta não mais correspondia à realidade da escola no contexto da

Reserva.

Durante as sessões reflexivas pudemos observar que o atual momento de construção

coletiva do PPP no qual o Grupo Colaborador vivenciava, se diferia do processo de elaboração

ocorrido em 2002, por possibilitar a participação da comunidade escolar através de

representações, possibilitando a construção de um projeto educativo pensado pelos seus

sujeitos, fato que não ocorreu em 2002, pois tiveram um PPP elaborado pela equipe técnica da

Secretaria Municipal de Educação.

No tocante aos saberes e as experiências dos sujeitos educandos da Reserva, notamos

que a escola consegue articular o processo histórico que constituiu a RDSEPT no currículo

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escolar por considerar que este saber dialoga com os conteúdos da disciplina de História,

demonstrando o pensamento do grupo de que os saberes presentes nas salas de aula precisam

se enquadrar em um determinado componente curricular, o que dá certo status no grau de

importância das disciplinas pela equipe da escola. Essa questão revela que a escola apesar de

tratar o saber local enquanto saber-objeto busca construir referências para os educandos,

trazendo elementos da trajetória coletiva da comunidade para serem discutidos no seu interior,

o que oportuniza aos educandos a construção de novas relações com o saber.

No que se refere às questões de conservação do espaço físico da Reserva, a escola

problematiza temáticas ambientais locais através dos materiais produzidos para os Encontros

Ecológicos, relacionando-as com outras situações presentes nos livros didáticos, engajando as

turmas nas atividades propostas pelo IDEMA. No entanto, a escola não amplia as questões de

conservação para além do espaço físico, uma vez que notamos nas falas dos colaboradores a

relação entre conservação e recursos extraídos das águas e dos mangues, por exemplo, questão

central no tocante a sustentabilidade das comunidades, uma vez que é preciso aprender a

equalizar a exploração de tais recursos.

Consideramos a importância dos Encontros Ecológicos no processo de mobilização das

comunidades, no engajamento da escola nas questões que atravessam a Reserva, mas sentimos

ausência de atividades que integrem outros espaços de formação constituídos após a RDSEPT,

como o “Rancho” espaço voltado para a integração das comunidades através de eventos

culturais, da capacitação de pessoal e da formação de grupos teatrais locais, o Projeto Rede

Cidadã no Barco Solidário, constitui-se em alternativa para o desenvolvimento econômico em

face das dificuldades advindas da pesca artesanal, buscando potencializar a comunidade para

outras perspectivas econômicas, a partir da pesca e das belezas naturais das comunidades, além

de oferecer aulas de campo em trilhas de barco ou terrestre, e o Ecoposto espaço destinado às

atividades do Conselho Gestor, além de preservar a memória coletiva da constituição da

Reserva através de registros bibliográficos e fotográficos.

As ausências desses espaços na organização da prática educativa da escola foram

refletidas em nossas sessões reflexivas, onde o Grupo Colaborador pode reconhecer a

importância de se somar estes espaços nas estratégias de formação propostos pela escola, o que

demonstra certa consciência acerca da função social da escola, oportunizando a negociação em

se compreender diferentes espaços formativos na Educação do Campo. Com isso, visamos

desenvolver a capacidade de criticidade do Grupo Colaborador, frente às questões de Educação

do Campo na escola, em face da RSDEPT. Para isso retomamos como ponto de reflexão a

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tematização dos saberes e das experiências dos sujeitos da Reserva nas discussões propostas

pelo grupo para a construção da proposta curricular da instituição.

O Grupo Colaborador considerou que a inserção dos saberes e das experiências dos

sujeitos da RDSEPT no currículo escolar significa modificar a relação do ensino com a tradição

escolar aceita por todos da atual equipe da escola pesquisada, e que isso introduzirá uma

problemática política contrária ao modelo cultural da seleção de conteúdos prescritos nos livros

didáticos dos alunos e professores. Essa reflexão emergiu das discussões propostas na pesquisa

revelando que uma nova forma de compreender os saberes e as experiências locais no currículo

escolar oportuniza uma nova forma de professores e alunos se relacionarem com o saber no

paradigma da educação do campo.

Outro fator relevante das reflexões coletivas propostas nessa investigação foi

constatarmos que o Grupo Colaborador compartilha da ideia de se rever a articulação entre os

componentes curriculares na organização curricular da escola, que se dá por projetos de ensino.

Identificaram que em sua proposta o diálogo entre as disciplinas estava sendo comprometida

pela forma de como compreendiam o projeto na escola. Com isso, a equipe demonstrou a

possibilidade de realização de uma prática educativa numa perspectiva interdisciplinar, o que

vem sendo discutido na Educação do Campo.

Defendemos que o currículo escolar da escola do campo se expressa enquanto

identidade e trajetória dos sujeitos envolvidos no processo de formação escolar, ao passo em

que compreende os elementos da realidade que circunda esses sujeitos, por isso a importância

do Grupo Colaborador se apropriar das questões conceituais que fundamentam a elaboração do

currículo escolar no campo. Essa compreensão pressupõe um processo de conscientização que

se funda numa permanente autorreflexão instalada sobre a prática educativa da escola crítica e

emancipadora.

Ao referenciarmos o aspecto cultural do currículo, nos reportamos aos saberes

tematizados pelos professores durante o processo de elaboração da proposta curricular para a

escola, sobretudo, na legitimidade da identidade coletiva dos sujeitos da Reserva, uma vez que

a questão central que serve de pano de fundo para a elaboração e implementação do currículo

na escola é a de saber qual conhecimento deve ser ensinado. Dessa assertiva, advém a

concepção de que o currículo na educação deve valorizar a dimensão cultural dos sujeitos do

campo, além de considerar os aspectos socioeconômicos que envolvem os educandos e suas

famílias.

Comprovamos que a tematização, dos saberes e experiências da RDSEPT no currículo

escolar, revela uma forma dos professores se relacionarem, também, com o saber, onde a

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compreensão do saber-objeto, materializado nos livros didáticos tem se constituído em

referência na elaboração da proposta curricular. Entendemos que esse aspecto na definição do

currículo escolar precisa ser redimensionado, pois os livros didáticos, em particular os do 6º ao

9º ano, não dialogam com as questões políticas, sociais, culturais e econômicas que implicaram

na constituição e na manutenção da Reserva.

Acreditamos que esse posicionamento que o Grupo Colaborador demonstra em relação

aos saberes e experiências emanadas da constituição da Reserva tenciona a relação

escola/sociedade, fazendo emergir reflexões em torno do papel da escola na sociedade, bem

como das implicações da organização dos movimentos sociais para a estruturação do saber

escolar, para superar a dicotomia entre saber científico e saber escolar, em que o currículo em

sua organicidade dos diversos conhecimentos linguísticos, matemáticos, tecnológicos,

científicos, artísticos e humanísticos, possa expressar a luta pela compreensão e apreensão dos

processos socioeconômicos, culturais e políticos que influenciam e delimitam a formação do

ser humano, capaz de intervir nos direcionamentos individuais e coletivos, na história.

Percebemos nessa relação, marcas da ausência de formação continuada para os

professores da escola na temática da educação do campo, o que revela o silenciamento das

políticas públicas educacionais no chão dos municípios, no que tange a essa temática e suas

implicações na organização do sistema de ensino da rede.

Nessa realidade poderíamos indagar: Há uma política educacional no município de

Macau que trata da Educação do Campo? As instituições de estudo e pesquisa que se instala na

RDSEPT a tem compreendido em sua dimensão educativa? Qual a importância da RDSEPT no

contexto do campo brasileiros? O que podemos apreender no contexto da Educação do Campo

com a organização social em torno da RDSEPT? Essas indagações não têm o objetivo de

receber respostas prontas e acabadas, mas tão somente instigar um processo de autorreflexão

coletiva, que se faz necessário no atual contexto pesquisado, por reconhecermos a importância

de se debater essas questões no processo de elaboração da proposta curricular da escola, para

que redimensionem seu olhar acerca do campo em que estão imersos.

Essa experiência de pesquisa nos possibilitou concluir que a cultura livresca do currículo

tende a reforçar o campo como local de atraso, pois fica subtendido que a necessidade formativa

do sujeito da RDSEPT é igual aos dos alunos da sede, e que portanto deve acompanhar os

mesmos conteúdos. Essa forma de pensar e fazer escola cria uma falsa ilusão de que nas

comunidades o aluno tem o mesmo tratamento que na cidade, e compreendemos que isso seja

um risco pois só reforça as diferenças e a dicotomia ente campo e cidade, além de ignorar a

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realidade local do aluno como elemento basilar na construção do currículo da escola, bem como

fragiliza a construção coletiva da identidade da comunidade enquanto Reserva.

Constatamos que o currículo da escola pesquisada não parte das questões que emergem

do contexto sociocultural dos educandos, uma vez que sua estrutura se caracteriza pela

organização formal, linear e fragmentada de disciplinas convencionais e por uma excessiva

carga horária de disciplinas obrigatórias com grandes vínculos de pré-requisitos.

Esta realidade redimensiona a relevância desta investigação para a comunidade, para a

escola e em especial para o Grupo Colaborador, bem como para as produções acadêmicas

acerca da RDSEPT, em face aos achados que oportunizou, porém somos conscientes da

incompletude e do inacabamento nas pesquisas científicas, por isso nos comprometemos a

retomar as questões aqui suscitadas numa perspectiva de continuidade a partir de nossa prática

investigativa, bem como de outros parâmetros de análise.

Ao finalizar nossa investigação, esperamos que o estudo ora realizado possa colaborar

com as discussões que envolvem o currículo na Educação do Campo, e que venha a dialogar

com os debates acerca da importância em se tematizar no currículo das escolas do campo os

saberes e experiências que atravessam a diversidade do campo brasileiro, em que se pese a

especificidade da RDSEPT, nessas proposições.

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107

APÊNDICES

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Apêndice A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –

TCLE

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA

CENTRO DE EDUCAÇÃO

Esclarecimentos

Este é um convite para você participar da pesquisa: A RESERVA DE

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO TUBARÃO (RDSEPT)

E O CURRÍCULO ESCOLAR: caminhos e descaminhos na construção de uma proposta

curricular para a educação do campo, que tem como pesquisadora responsável, IRIS CAMPOS

DE ANDRADE.

Esta pesquisa pretende compreender a articulação dos saberes e das experiências dos

sujeitos da RDSEPT no Currículo escolar pelo Grupo de Elaboração do Projeto Político

Pedagógico - PPP da escola.

O motivo que nos leva a fazer este estudo é a necessidade de se compreender de que

forma a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Ponta do Tubarão se faz presente no currículo

da escola, considerando os atuais debates sobre Educação do Campo. Para isso, serão feitas

entrevistas, aplicação de questionários e sessões de estudos reflexivos com o Grupo de Trabalho

acerca do PPP na escola, composto por professores, supervisor, pais dos alunos e gestor escolar,

colaboradores desta pesquisa, que deverão ser registradas em áudio para posterior edição e

publicação.

Caso você decida participar, você deverá ter sua voz gravada e, para isso, solicitamos

sua autorização. O áudio produzido será analisado pela pesquisadora, para fins de se fazer

artigos e para a produção da Dissertação de Mestrado. Com isso, esperamos poder contribuir

para que a comunidade escolar reflita sobre a articulação entre os saberes produzidos na escola

e os que são produzidos no seu entorno, e repense seu currículo.

Durante a realização da entrevista, serão feitas perguntas sobre a vida profissional e

prática docente na escola (no caso dos professores, gestora e supervisores) e você poderá não

responder a (s) pergunta (s) que considerar inadequada (s). Poderá, também, sugerir perguntas

ou abordagens que considerar mais pertinentes. As entrevistas podem ser realizadas na escola

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109

onde você trabalha ou em qualquer outro espaço que você considerar mais confortável e/ou

adequado.

Em caso de algum problema que você possa ter, relacionado com a pesquisa, você terá

direito a assistência gratuita que será prestada pela própria pesquisadora, na pessoa da

professora IRIS CAMPOS DE ANDRADE.

Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando para IRIS

CAMPOS DE ANDRADE, cujo telefone de contato é (84) 9945-4718.

Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer

fase da pesquisa, sem nenhum prejuízo para você.

Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas em

congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de nenhum dado que possa lhe

identificar.

O gestor da escola poderá consentir, ou não, o uso do nome da instituição pesquisada na

Dissertação de Mestrado da pesquisadora e em eventos científicos cuja pesquisadora vier

participar.

Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa em local

seguro e por um período de 05 (cinco) anos.

Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com a

pesquisadora responsável, professora IRIS CAMPOS DE ANDRADE.

Consentimento Livre e Esclarecido

Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os

dados serão coletados nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios

que ela trará para mim e ter ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar da

pesquisa A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA

DO TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO ESCOLAR: caminhos e descaminhos na

construção de uma proposta curricular para a educação do campo, e autorizo a divulgação das

informações por mim fornecidas em congressos e/ou publicações científicas desde que nenhum

dado possa me identificar.

Macau - RN, _______ de ________________ de 2014.

________________________________________________________

Assinatura do participante da pesquisa

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Apêndice B - DECLARAÇÃO DO PESQUISADOR RESPONSÁVEL

Como pesquisador responsável pelo estudo A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO TUBARÃO (RDSEPT) E O CURRÍCULO

ESCOLAR: caminhos e descaminhos na construção de uma proposta curricular para a educação

do campo, declaro que assumo a inteira responsabilidade de cumprir fielmente os

procedimentos metodologicamente e direitos que foram esclarecidos e assegurados ao

participante desse estudo, assim como manter sigilo e confidencialidade sobre a identidade do

mesmo.

Declaro ainda estar ciente que na inobservância do compromisso ora assumido estarei

infringindo as normas e diretrizes propostas pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de

Saúde – CNS, que regulamenta as pesquisas envolvendo o ser humano.

Macau - RN, ________de _____________ de 2014.

___________________________________________

Iris Campos de Andrade

Pesquisadora

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Apêndice C - PLANO DE TRABALHO PARA AS SESSÕES REFLEXIVAS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Mestranda: Iris Campos de Andrade

Orientador: Professor Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo

1ª SESSÃO DE ESTUDOS REFLEXIVA

DATA/HORÁRIO 10/10/2014 às 19h LOCAL: Sala do Programa Mais

Educação/EMACM

EIXO

TEMÁTICO

Pesquisa Qualitativa na Educação do Campo: colaborar para estreitar

os laços entre academia e a escola.

OBJETIVO Discutir acerca da Pesquisa Qualitativa no contexto da Educação do

Campo, destacando o conceito de colaboração que permeia a pesquisa

colaborativa, e que será utilizado na condução das sessões com o grupo

co-partícipe, discutindo seus objetivos e a importância dos

colaboradores no processo de co-construção do conhecimento.

2ª SESSÃO DE ESTUDOS REFLEXIVA

DATA/HORÁRIO 26/11/2014 às 14h LOCAL: Laboratório de Informática/EMACM

EIXO

TEMÁTICO

Projeto Político Pedagógico e Democratização do ensino –

possibilidades para a escola do campo.

OBJETIVO Relacionar o processo de democratização do ensino com a construção

do Projeto Político Pedagógico da escola, reconhecendo sua

importância no processo de construção da identidade da escola.

3ª SESSÃO DE ESTUDOS REFLEXIVA

DATA/HORÁRIO 21/07/2015 às 14h LOCAL: Laboratório de Informática/EMACM

EIXO

TEMÁTICO

Educação do Campo e a Reserva de Desenvolvimento Sustentável

Estadual Ponta do Tubarão.

OBJETIVO Discutir sobre a política nacional de Educação do Campo, localizando

neste contexto o campo da RDSEPT.

4ª SESSÃO DE ESTUDOS REFLEXIVA

DATA/HORÁRIO 22/07/2015 às 14h LOCAL: LOCAL: Laboratório de

Informática/EMACM

EIXO

TEMÁTICO

Currículo escolar na Educação do Campo: o que a escola da RDSEPT

tem (re) produzido?

OBJETIVO Analisar as concepções de currículo que fundamentam a prática dos

professores, refletindo sobre a presença (ou não) dos saberes e das

experiências que atravessam os sujeitos da RDSEPT, no currículo da

escola.

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Apêndice D - QUESTÕES NORTEADORAS DA PESQUISA PARA A REALIZAÇÃO

DA ENTREVISTA COM O GRUPO DE TRABALHO DE REELABORAÇÃO DO PPP

DA ESCOLA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Mestranda: Iris Campos de Andrade

Orientador: Professor Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo

1 IDENTIFICAÇÃO

1.1 Qual é o seu nome?

1.2 Possui quantos anos?

1.3 Há quanto tempo exerce esta função na escola?

1.4 Desse tempo, há quantos anos está na supervisão da EJA?

1.5 Mora na comunidade? Há quanto tempo?

1.6 Qual é a sua formação?

2 RDSEPT E O CURRÍCULO ESCOLAR

2.1 A escola possui uma Proposta pedagógica? Quando e como foi elaborada?

2.2 O que tem sido ensinado/vivenciado aqui na escola pelos alunos e professores? De que

forma?

2.3 Já há algum estudo pedagógico previsto para discussão desta questão no PPP? Como

pretende realizar?

2.4 Você conhece bem a história da RDSEPT? O que sabe sobre ela?

2.5 Você participou deste processo histórico? De que forma?

2.6 A escola tem contemplado conteúdos relacionados à Reserva? Quais?

2.7 Qual é a importância da Reserva para a comunidade na qual a escola está inserida?

2.8 A seu ver, de que forma a escola pode abordar em seu currículo às questões pertinentes à

reserva?

3 PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO

3.1 O que aconteceu que fez surgir à necessidade de reelaboração do PPP?

3.2 Quando iniciou as atividades de reorganização/reelaboração da referida proposta?

3.3 De que forma a escola tem conduzido este processo?

3.4 Quais as dificuldades encontradas?

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113

3.5 Todos os professores se integram nesse trabalho?

3.6 Quais são as questões que a supervisão considera ser importante para refletir com os

docentes durante este momento vivido pela escola?

4 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO

4.1 Você se sente seguros no que se refere aos conteúdos de sua disciplina? Por quê?

4.2 Você conhece o Paradigma da Educação do Campo?

4.3 Como a escola organiza seu trabalho pedagógico?

4.4 Quais saberes consideram relevantes ao processo de ensino e aprendizagem vivenciados na

escola?

4.5 Como são desenvolvidas as aulas?

4.6 De que forma a escola organiza os tempos e os espaços pedagógicos?

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114

Apêndice E - QUESTIONÁRIO DE PESQUISA APLICADO AO GRUPO DE

TRABALHO PARA REELABORAÇÃO DO PPP DA ESCOLA MUNICIPAL

ALFERES CASSIANO MARTINS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Mestranda: Iris Campos de Andrade

Orientador: Professor Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo

DADOS PESSOAIS:

Idade:__________ sexo: ( ) m ( )f cor: _____________________________

Profissão: ___________________________________________________________

Segmento que representa no grupo de trabalho do PPP:

( ) pais ( )alunos ( )comunidade ( )funcionários ( ) professor ( ) supervisão ( ) gestão

SOBRE A METODOLOGIA DE TRABALHO DO GRUPO:

( ) Promove encontro com os seus pares para discutir ideias e trazer para o grupo

( ) Promove estudo para os demais membros da escola

( ) Promove encontro para estudo entre o próprio grupo de elaboração do PPP

( ) Realiza momento coletivo para discussão e elaboração da proposta com o grande grupo

( ) Realiza momento coletivo para discussão e elaboração da proposta com o grupo de trabalho

( ) Socializam o material produzido com o grande grupo

( ) Realizam palestra/oficina com os professores e funcionários sobre a RDSEPT

SOBRE A REALIZAÇÃO DOS ENCONTROS:

Já realizaram: ______________ encontros/ ( )nenhum encontro realizado

Destes: ( ) foi/foram para estudo ( ) para discussão e escrita da proposta ( ) para formação

do grupo de trabalho ( ) para socialização do material já produzido

Definiram cronograma de encontro para o grupo:

( ) quinzenal ( ) semanal ( ) mensal ( ) bimestral ( ) outro

Definem pauta anteriormente ao encontro:

( ) com a participação do grupo ( )somente com a equipe gestora ( )supervisora

SUA PARTRICIPAÇÃO:

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Por que participa do grupo de trabalho do PPP da escola? De quantos encontros do grupo você

já participou?________________________________________________________

Tem colaborado na definição da pauta dos encontros: ( ) sim ( )não

Pesquisa assunto de interesse coletivo para discutir com o grupo: ( )sim ( )não

Melhor horário que facilita sua participação nos encontros: __________________

Há obstáculos que impedem sua participação nos encontros do grupo? Qual (is)?

___________________________________________________________________________

_________________________________________________________________

Para que tenha uma participação maior nos encontros promovidos pelo grupo, você sugere que:

____________________________________________________________

TEMÁTICAS DISCUTIDAS DURANTE A ELABORAÇÃO DO PPP:

( ) RDSEPT ( )Educação do Campo ( ) Currículo ( ) Avaliação da aprendizagem

( ) Processo de ensino e aprendizagem ( ) EJA ( ) Ed. Infantil ( ) alfabetização

( ) disciplina/indisciplina na escola ( )indicadores escolares ( ) outros:______________

Os assuntos discutidos no grupo de trabalho são sugeridos:

( ) pela gestora ( ) pela supervisora ( ) pelos professores ( ) pela secretaria de educação

( ) pelos alunos ( ) pelos pais ( ) pelos funcionários ( ) outros

SOBRE A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL PONTA DO

TUBARÃO:

( ) Não foi realizada nenhuma discussão no grupo sobre a RDSEPT

( ) O grupo só discutiu aspectos históricos da criação da RDSEPT

( ) O grupo não considera a RDSEPT importante para ser considerada na proposta curricular

da escola

( ) O grupo já discutiu aspectos econômicos, geográficos, políticos, sociais e turísticos da

RDSEPT

( ) O grupo não sabe como abordar a RDSEPT na proposta curricular da escola

( ) As pessoas do grupo desconhece a RDSEPT

( ) Você desconhece a RDSEPT

( ) outros: ___________________________________________________________

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Apêndice F - QUESTIONÁRIO DE PESQUISA APLICADO AOS ALUNOS (AS) DA

ESCOLA MUNICIPAL ALFERES CASSIANO MARTINS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Mestranda: Iris Campos de Andrade

Orientador: Professor Dr. Alessandro Augusto de Azevêdo

DADOS PESSOAIS:

Idade:______________ Sexo: ( )M ( )F Ano Escolar/Período: __________

SITUAÇÃO ECONÔMICA DA FAMÍLIA:

Renda mensal: ( ) até 1 salário mínimo ( ) 1-2 salário ( )2-3 salário ( ) 3-4 salário

Fonte de renda: ( ) emprego público efetivo ( ) emprego público contratado ( ) pesca

artesanal ( ) empresa privada ( ) outros: _______________________________

VIVÊNCIA NA ESCOLA:

Você está na escola há:

( ) 1-5 anos ( ) 6-10 anos ( ) 10-15 ( ) 16-20

O que lhe motiva a vir para a escola?

( ) o lanche ( ) encontrar com os amigos/as ( ) as aulas ( ) a relação com os professores (

) o desejo em construir conhecimento/ novos saberes ( ) passear ( ) a relação que a escola

estabelece entre os conteúdos e a sua comunidade ( ) o horário das atividades ( ) não tenho

motivação

Na escola, eu mais gosto:

( ) de brincar ( ) de conversar com os amigos/as ( ) das aulas ( ) do lanche ( ) do intervalo

( ) dos professores ( ) dos assuntos trabalhados

Os conteúdos que são trabalhados na escola:

( ) têm sentido com minha realidade ( ) utilizo em minha vivência fora da escola ( )aplico-

os em casa, ajudando meus irmãos/meus pais ( ) não faz sentido para minha vida

Os professores, em suas aulas, relacionam suas atividades com os seguintes aspectos da

RDSEPT:

( )Históricos ( )ambientais ( )econômicos ( )políticos ( )culturais ( ) geográficos ( ) turísticos

( ) os professores não estabelecem relação entre as atividades e a RDSEPT

Gostaria que na escola:

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( ) mudasse a forma de como os professores desenvolvem as aulas

( ) os conteúdos tivessem ligação com minha vida fora da escola

( ) os problemas de interesse coletivo da minha comunidade fossem discutidos na escola

( ) discutíssemos e estudássemos mais sobre nossa RDSEPT.

VIVÊNCIA NA RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL

PONTA DO TUBARÃO:

Mora na RDSEPT há:

( ) 1-5 anos ( ) 6-10 anos ( ) 11-15 anos ( ) 16-20 anos ( ) mais de 20 anos

Conheço bem a história da RDSEPT: ( ) sim ( ) não ( ) um pouco

Considero a RDSEPT:

( ) muito importante para nossa comunidade.

( ) pouco importante para a nossa comunidade.

( ) importante para a nossa comunidade.

A RDSEPT é importante para mim por que:

( ) é o resultado de uma luta da comunidade.

( ) é através dela que a minha família garante o sustento.

( ) é parte integrante da minha comunidade que tem importância histórica, cultural, econômica,

política e social em nossa formação.

( ) é ponto turístico e através dela estabelecemos novas relações.

Envolvimento com RDSEPT:

( ) me engajei no processo de luta das comunidades pela criação da Reserva.

( ) meus pais se engajaram no processo de luta das comunidades pela criação da Reserva.

( ) meus avós se engajaram no processo de luta das comunidades pela criação da RDSEPT.

( ) meus tios/tias se engajaram no processo de luta das comunidades pela criação da RDSEPT.

( ) participo das atividades comunitárias para fortalecimento da RDSEPT.

( ) minha família participa das atividades comunitárias para fortalecimento da RDSEPT.

( ) participo de grupos que defendem a RDSEPT.

( ) não participo de nenhum grupo, mas me interesso pelas questões da RDSEPT.

( ) participo dos encontros ecológicos desenvolvidos na comunidade.

Pesquiso/estudo sobre a RDSEPT: ( ) sim ( ) não ( ) às vezes