UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE … · professora pelo método Suzuki. No primeiro dia...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE ESCOLA DE MÚSICA DA UFRN CURSO DE LICENCIATURA EM MÚSICA ROBERTO WAGNER DE MEDEIROS DAMASCENO O ensino de rabeca no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) Um relato de experiência. NATAL 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

ESCOLA DE MÚSICA DA UFRN

CURSO DE LICENCIATURA EM MÚSICA

ROBERTO WAGNER DE MEDEIROS DAMASCENO

O ensino de rabeca no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) –

Um relato de experiência.

NATAL

2014

ROBERTO WAGNER DE MEDEIROS DAMASCENO

O ensino de rabeca no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN)–

Um relato de experiência.

Monografia apresentada ao curso de Licenciatura em

Música da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial para a obtenção do título

de Graduado em Música.

Orientador: Prof. Dr. Agostinho Jorge de Lima

NATAL

2014

ROBERTO WAGNER DE MEDEIROS DAMASCENO

O ensino de rabeca no Instituto Federal do Rio Grande do Norte – Um relato

de experiência.

Monografia apresentada ao curso de Licenciatura em

Música da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial para a obtenção do título

de Graduado em Música.

Orientador: Prof. Dr. Agostinho Jorge de Lima

BANCA EXAMINADORA

____________________________

Prof. Dr. Agostinho Jorge de Lima

UFRN

____________________________

Prof. Dr. Jean Joubert Freitas Mendes

UFRN

____________________________

Profa. Dra. Valéria Lazaro de Carvalho

UFRN

Agradecimentos

Agradeço a Deus por me fazer sentir sua presença em todos os momentos alegres

e tristes da vida.

Agradeço a minha esposa Amanda que sempre esteve ao meu lado em todas as

dificuldades, e a minha família que me apoiou desde a infância quando toquei as

primeiras notas musicais.

Ao amigo Marcelo Othon, através do qual aprendi a conhecer e valorizar a rabeca

e a música nordestina; além de presentear-me com uma de suas rabecas.

A roque do Maracatu Leão da Cordilheiras e todos meus alunos que a cada

semana compartilham comigo o prazer de tocar.

Aos doutores da banca, Jean Joubert e Valéria de Carvalho, pelas contribuições e

observações de grande valor.

Ao nobre e querido professor Agostinho Jorge de Lima que tanto apoiou,

orientou, fundamentou e confiou neste trabalho.

SALMO 150

Aleluia!

Louvai a

Deus

em seu

templo,

louvai-o no seu poderoso firmamento,

louvai-o por suas façanhas,

louvai-o por sua grandeza imensa!

Louvai-o com toque de trombeta,

louvai-o com cítara e harpa; louvai-o com dança e tambor,

louvai-o com cordas e flauta;

louvai-o com címbalos sonoros,

louvai-o com címbalos retumbantes!

Todo ser que respira louve a Iahweh!

Aleluia!

Salmo de Davi, rei de todo o Israel, extraído da Bíblia de Jerusalém, Nova edição revista e

ampliada da Paulus Editora. (2002)

Lista de figuras

Figura 1 - Expansão Árabe no ano 733 depois de Cristo............................................................17

Figura 2 - Fachada do IFRN cidade alta......................................................................................22

Figura 3 - Sala de aula do IFRN Cidade Alta..............................................................................23

Figura 4- Tocando no evento Luzes da Cidade Alta...................................................................23

Figura5 - Evento comemorativo aos 160 anos de criação do Patrimônio da União....................24

Figura 6 - Rabecas recém-chegadas ao IFRN, feitas pelo Luthier Eloi......................................25

Figura 7 - Roda de rabeca com Dimattos da Bahia.....................................................................26

Figura 8 - À esquerda, rabeca feita pelo Alagoano Nelson, à direita, rabeca feita por

Damião........................................................................................................................................51

Figura 9 - Estátua do Rei Davi, Catedral de Vienne, França, Século 12.....................................52

Figura 10 - “Great Canterbury Psalter”, Biblioteca Nacional de Paris, 1180 – 1190.................53

Figura 11 - (Biblioteca Britânica, MS Royal 10.E.iv, fol.71) entre 1325-1350..........................53

Figura 12 - Rabequeiro esculpido por Bennedeto Antelami, Catedral de Parma, Itália,

1180.............................................................................................................................................54

Figura 13 - Maneira de pegar na rabeca e o local onde colocar o arco nas cordas (entre cavalete

e espelho).....................................................................................................................................56

Figura 14 - Braço da rabeca com pontuação azul........................................................................58

Figura 15 - À esquerda o rabequeiro Josenilson Moraes afinando sua rabeca para entrar na

roda..............................................................................................................................................59

Figura 16 - Digitação e nome de cada uma das notas no braço da rabeca..................................62

Figura 17 - Partitura elaborada com o objetivo de conhecer a dimensão de cada corda da

rabeca, bem como a representação numérica de cada dedo em cima das notas e um pequeno

exercício sem esta representação.................................................................................................63

Figura 18 - Partitura da música “Anunciação” de Alceu Valença..............................................64

Figura 19 - Foto tirada antes do evento luzes da cidade no IFRN cidade alta – Natal RN........ 65

Figura 20 - Alunos novatos tocando no evento comemorativo aos 160 anos de criação do

Patrimônio da união.....................................................................................................................66

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SUMÁRIO

RESUMO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

INTRODUÇÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

CAPITULO I – A RABECA E SUA MÚSICA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

1.1. As expansões dos povos e a difusão da rabeca no mundo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

1.2. A música de rabeca. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19

CAPITULO II – CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROJETO DE EXTENSÃO DO CURSO DE

RABECA NO IFRN. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

2.1. A estrutura do IFRN. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .22

2.2. Uma descrição sobre o curso de rabeca. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

CAPITULO III – O QUE SE FALA DE RABECA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

3.1. Os estudos sobre a rabeca. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

3.2. Os sites, blogs e grupos virtuais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

CAPITULO IV – O ENSINO DE RABECA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

4.1. Minha concepção de ensino aprendizagem. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

4.2. Outras experiências do ensino de rabeca. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

CAPITULO V – RELATO DAS PRÁTICAS DO ENSINO COLETIVO DE RABECA. . . . 45

5.1. Os alunos e seu aprendizado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

5.2. Demonstração das práticas de ensino – aulas por atividades e conteúdo. . . . . . . . . . . . . . .51

5.1. Aula 1 – Conhecendo os rabequeiros, suas formas de tocar e suas músicas. . . . . . . . . . . . 51

5.2. Aula 2 – Ritmo rabecado, o uso do arco e o seu treinamento. (Aula por imitação e

repetição) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

10

5.3. Aula 3 – Digitação, posições e escalas. (Aula por imitação e repetição). . . . . . . . . . . . . . 57

5.4. Aula 4 – Afinação e “roda de rabeca”. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

5.5. Aula 5 – Conhecendo as notas musicais através do braço da rabeca. . . . . . . . . . . . . . . . . 61

5.6. Aula 6 – Conhecendo a teoria musical associando o braço da rabeca a partitura. . . . . . . . 62

5.7. Aula 7 – Tocando em conjunto nos eventos, entre solos de rabecas e aboios com a voz....64

CONSIDERAÇÕES FINAIS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

REFERÊNCIAS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

APÊNDICE. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .72

11

RESUMO

Este trabalho relata a prática de ensino e aprendizagem do instrumento rabeca no projeto de

extensão do Instituto Federal de Ciências e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN),

situado em Natal na cidade alta, no ano de 2014, onde acontece semanalmente o curso deste

instrumento. Apresentando uma possibilidade para o desenvolvimento das aulas e que

contemple a musicalização do indivíduo através da rabeca, unido com o ensino de teoria

musical. Bem como trazer reflexões sobre as formas de ensino de outros mestres rabequeiros

que atuam como professores deste instrumento, feitas através de entrevistas. Apresentando os

resultados obtidos no ensino e aprendizado do instrumento, do mesmo modo foram feitas

entrevistas com os alunos de rabeca sobre suas reflexões deste ensino. O primeiro capítulo é

uma pesquisa de como se deu a chegada da rabeca no Brasil; o segundo capítulo versa sobre a

música de rabeca e a sua importância e suas finalidades sociais. No terceiro capítulo os detalhes

do projeto de extensão do IFRN são abordados; citados os pesquisadores que realizaram

trabalhos de suma importância sobre o assunto rabeca e rabequeiros; demonstrando o que se

fala de rabeca no mundo virtual, o ensino de rabeca pelo youtube, blogs e sites que apresentam

trabalhos artísticos de rabequeiros ou construtores de rabecas. O quarto capítulo comporta o

relato do que penso em relação ao ensino e aprendizagem e algumas reflexões sobre uma

entrevista feita com outros rabequeiros que também se aventuram a ensinar este instrumento.

Para concluir, o quinto capítulo contempla o pensamento dos alunos em torno da rabeca, sua

música e suas experiências. Finalmente, exponho como se dá os detalhes do ensino coletivo de

rabeca no projeto de extensão do IFRN, demarcando o detalhamento das aulas vivenciadas para

então chegar às considerações finais, onde discorro sobre os resultados musicais e sociais

alcançados pelos alunos, e refletindo que contribuições este ensino trouxe e como o mesmo

pode ser melhorado.

PALAVRAS-CHAVE

Ensino de rabeca, práticas musicais, rabequeiros.

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ABSTRACT

This paper reports the practice of teaching and learning the instrument fiddle at the Federal

Institute of the extension project of Science and Technology of Rio Grande do Norte (IFRN),

located in uptown Christmas, in 2014, where weekly happens the course of this instrument.

Introducing a possibility for the development of the classes and including the music education

of the individual through the fiddle, united with the teaching of music theory. As well as

bringing reflections on ways of teaching other fiddlers teachers who act as teachers of this

instrument, made through interviews. Presenting the results of the teaching and learning of the

instrument, made through interviews and photographs with students of fiddle. O first chapter is

as research took the arrival of the fiddle in Brazil; the second chapter deals with the fiddle

music and its importance and its social purposes. In the third chapter details IFRN extension

project are addressed; cited researchers who carried out work of great importance on the subject

fiddle and fiddlers; demonstrating the talk of fiddle in the virtual world, teaching fiddle at

youtube, blogs and websites that feature artwork from fiddlers or fiddles builders. The fourth

chapter carries the story of what I think in relation to teaching and learning and some thoughts

on an interview with other fiddlers also venture to teach this instrument. Finally, the fifth

chapter includes students' thinking around the fiddle, his music and his experiences. Finally,

how does expose the details of the collective teaching fiddle in IFRN the extension project,

marking the breakdown of classes for experienced then reach the final considerations, where I

discuss about the musical and social achievements of students, and reflecting that this

contribution brought teaching and how it can be improved.

KEYWORDS

Fiddle teaching, musical practices, fiddlers.

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INTRODUÇÃO

Antes de relatar minha vivência com a rabeca, falarei um pouco sobre a minha vida e

meu encontro com a música. A música encanta-me desde a infância, principalmente o violino;

o meu desejo em tocar esse instrumento deu-se através dos filmes épicos que eu assistia.

Quando aos treze anos de idade ganhei meu primeiro violino, comecei a ter aulas com uma

professora pelo método Suzuki. No primeiro dia ela apenas afinou meu violino e, deu-me um

CD com o método volume um do Suzuki. Não tivemos aula naquele dia; voltaríamos a nos

encontrar em sete dias.

Antes do próximo encontro com a professora, explorei o violino e as variações do

método no CD que iria ser meu guia. Assim após sete dias eu cheguei à aula de violino já

tocando todas as variações e mais as quatro primeiras músicas do método. É claro, que houve

um espanto inicial por parte da professora e dos outros alunos que sabiam que eu não tocava

nada há sete dias; no entanto, eu estava tocando à minha maneira e para realmente saber seria

preciso seguir uma série de procedimentos e regras universais de postura no violino.

Três meses depois, eu ministrava aulas básicas de violino na minha igreja para pessoas

de quinze a trinta anos, com idade bem mais avançada que a minha, visto que, contava apenas

treze anos de idade; eu me orgulhava muito por ser uma criança e interessei-me em estudar

sobre músicos como: Vivaldi, Bach, Haendel, Beethoven e Mozart.

Dos treze anos aos dezoito anos participei da Orquestra Filarmônica Genesis; orquestra

da Igreja Central da Assembleia de Deus em Natal. Escolhi cumprir dois anos no serviço

militar obrigatório no 16º Batalhão de Infantaria Motorizado, período de muitas aventuras e

aprendizado. Em seguida, pensei em buscar algum sentido nos estudos, cursar alguma

faculdade que realmente gostasse; a música ainda não era opção, pois eu não via muitas

oportunidades nesta área, então tentei por duas vezes o vestibular para história sem obter

sucesso de aprovação.

Com os dois anos que se passaram, tentei voltar para a orquestra, mas devido falta de

prática no violino, não consegui acompanhar o nível técnico em que a orquestra se encontrava e

apenas pensava em trabalhar e fazer concursos públicos.

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No ano de 2010, procurei seguir os conselhos de muitos amigos e amigas que tentavam

me convencer em prestar o vestibular para licenciatura em música, voltei a me motivar e a

estudar; Em 2011 fiz o vestibular para licenciatura em música obtendo êxito.

Na faculdade, ou seja, na escola de música da UFRN, conheci Marcelo Othon; mineiro,

violeiro e amante da cultura popular. Marcelo realizou um projeto de extensão sobre o ensino

de viola de dez cordas, no qual eu me inscrevi e participei de aulas e oficinas em torno deste

assunto. Aprendi um pouco de viola e logo que o mesmo tomou conhecimento que eu tocava

violino, me apresentou a rabeca.

A principio, eu julguei ser aquele instrumento muito mal construído, e me parecia que

quanto mais eu tentava afiná-lo, através daquelas toscas cravelhas, mais ele insistia em parecer

desafinado aos meus ouvidos, sempre acostumados com a perfeita micro afinação do violino.

Marcelo convidou-me a improvisar com a rabeca em cima dos acordes que ele produzia

na viola de dez cordas, isto para mim foi prazeroso, pois sempre gostei de criar solos e compor,

além da perspectiva de me sentir livre para tocar sem nenhuma regra e limites de postura ou

sonoridade. Através de três CDs indicados pelo instrutor, conheci um pouco da música de

rabeca, estes CDs eram dos Mestres: Luiz Paixão, Salustiano e Nelson da Rabeca.

A minha primeira apresentação no Instituto Federal de Ciências e Tecnologia do Rio

Grande do Norte (IFRN), que fica na cidade alta em Natal, batizou-me rabequeiro, como

costuma mencionar Marcelo Othon, que me presenteou com sua rabeca feita pelo Luthier

Damião. No primeiro semestre de 2013 aceitei o convite de Marcelo para participar de um

projeto de extensão no IFRN intitulado: Curso de Rabeca.

Com o ensino desse instrumento, que muito expressa nossa cultura nordestina, pude

concluir que não existe uma maneira ou um método especifico para o ensino de rabeca; logo

me debrucei em algumas formas de ensinar rabeca de acordo com a vivência que tive da mesma

e, buscando simplificar ao máximo os meus termos musicais, pois a maioria dos alunos nunca

tocou nenhum instrumento.

Depois de toda essa experiência com o ensino de rabeca, e por forte conselho do

professor Agostinho Jorge de Lima, que também é um pesquisador e amante de rabeca e sua

música, decidi fazer este relato de experiência.

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No inicio deste trabalho achei necessário fazer uma pesquisa de como se deu a chegada

da rabeca no Brasil; isso foi uma viagem que fiz no tempo passado, conhecendo os reinos e

impérios que surgiram no antigo oriente; as expansões dos povos em todo o mar mediterrâneo;

além de perceber que apesar das guerras existe uma troca de conhecimentos entre os povos.

Depois no segundo capítulo explorei um pouco sobre a música de rabeca e a sua

importância em diversos âmbitos, bem como suas finalidades sociais. No terceiro capítulo os

detalhes do projeto de extensão do IFRN foram abordados dando assim seguimento ao relato.

No terceiro capítulo, são citados os pesquisadores que realizaram trabalhos de suma

importância sobre o assunto rabeca e rabequeiros; demonstrando o que se fala de rabeca no

mundo virtual, levando em consideração as amizades feitas com rabequeiros de todo o Brasil

pelo facebook, o ensino de rabeca pelo youtube, blogs e sites que apresentam trabalhos

artísticos de rabequeiros ou construtores de rabecas.

O quarto capítulo comporta o relato do que penso em relação ao ensino e aprendizagem

e algumas reflexões sobre entrevista feita com outros rabequeiros que também se aventuram a

ensinar este instrumento.

E no quinto capítulo levo em consideração o que meus alunos pensam em torno da

rabeca e sua música, se o ensino que eles estão tendo pode ser melhorado de alguma forma, e

busco conhecer suas experiências musicais. Finalmente exponho como se dá os detalhes do

ensino de rabeca no projeto de extensão do IFRN, demarcando através de sete aulas os detalhes

que vivenciei no ensino coletivo de rabeca; para então chegar às considerações finais, onde

discorro sobre os resultados musicais e sociais alcançados pelos meus alunos, e refletindo em

que este ensino contribuiu e pode melhorar.

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CAPÍTULO 1 - A RABECA E SUA MÚSICA

1.1. As expansões dos povos e a difusão da rabeca no mundo

A rabeca provavelmente poderia estar presente desde tempos imemoriais no

instrumental do mundo antigo oriental, mas não há segurança sobre esta afirmação podendo

apenas nos ater a suposições. Pensando no contexto do mundo antigo, sabemos que muitas

expansões ocorreram naquela época e que muitos reinos e impérios se erguiam na mesma

medida em que eram substituídos por outros, como foi o caso dos Sumérios, Assírios, Egípcios,

Babilônios, Medo-Persas e os gregos através de Alexandre o grande no qual após a sua morte

seu império se dividiu entre seus generais nos quais em particular os mais importantes no

oriente foram Seleuco que lhe coube governar as regiões da Assíria, Síria, Babilônia e Pérsia; e

Ptolomeu que recriou uma nova dinastia de faraós gregos adotando a cultura local Egípcia e

governou o Egito, Judéia, Fenícia, e a ilha de Chipre. (CARDOSO, 1998)

Depois podemos observar a expansão romana pelo oriente, destroçando toda esta

organização imperial grega que dominava os povos orientais, e alguns séculos depois as

cruzadas cristãs, motivadas pela expansão Árabe no norte da África, com o objetivo de penetrar

na Europa, pelo sul da Espanha trazendo com eles o Islã, sobre esta grande expansão

muçulmana Robson Fantinato Caju esclarece que:

Depois da morte do profeta, que não deixou sucessores, ocorreram

divergências, mas o Islã continuou se expandindo. Conquistou a Pérsia,

Bizâncio, a Península Ibérica, o Norte da África, entre outras regiões. Por fim,

o Islã passou a controlar as principais rotas mediterrânicas. (CAJU, 2010,

p.25)

Provavelmente a rabeca poderia estar junto com esta expansão, e como podemos

observar que as rotas principais do mar mediterrâneo estavam sob o controle Islâmico, todos os

produtos de comércio sejam eles alimentos, artesanatos ou armamentos do povo árabe

circulavam pelas suas novas colônias, e principalmente o povo Islâmico se instalava nestas

colônias introduzindo assim entre os conquistados sua religião, cultura e ciência.

Para se ter uma ideia da dimensão da conquista Islâmica, e entender que esta conquista

não foi somente através da guerra bélica, mas também de uma guerra cultural e religiosa,

podemos observar a parte verde do mapa que representa o Islã, e a área roxa que representa os

16

Bizantinos que cairiam também algum tempo depois pelos Turcos também Islâmicos que,

tomaram a Cidade de Constantinopla, capital do Império Bizantino pela força dos canhões.

Figura 1 - Expansão Árabe no ano 733 depois de Cristo.

A expansão Árabe e Islâmica não só trouxe a guerra e a devastação para a Europa, mas

veio junto com eles a sua cultura, medicina e matemáticas, e junto a tudo isto seus instrumentos

musicais estavam em suas bagagens, e todas estas informações foram muito bem absorvidas

pelos Portugueses e Espanhóis que em parte da cultura musical ibérica, podemos observar forte

mescla e influência da música árabe, seja no ritmo ou nas escalas usadas em suas melodias, O

historiador Armando Alexandre dos Santos, nos dá uma demonstração de que realmente houve

uma influência Árabe na Europa, através da vida do francês Humberto que foi um ícone de

destaque nas batalhas das cruzadas cristãs, participante ativo da ordem dos pregadores e

conselheiro privado do rei São Luís IX, sobre Humberto se diz que:

[...] como superior de sua ordem, foi muito ativo. Reformou a liturgia

dominicana, estimulou os estudos teológicos e lingüísticos [...] mandou frades

para Barcelona para aprenderem o árabe, idioma que considerava de grande

importância para as missões no Oriente e entre os infiéis. (SANTOS, 2010,

p.12)

Isto ilustra que os árabes já estavam tão firmados na península ibérica que, os povos que

desejassem aprender o árabe ou outra ciência com eles, já tinham onde recorrer, pois existiam

cidades do sul da Espanha onde os cristãos e muçulmanos viviam em relativa paz, e assim não

17

só os algarismos arábicos se espalharam pela Europa, mas a rabeca provavelmente foi se

expandindo junto, mesmo que mais lentamente, e ganhando presença nas festas do povo,

conforme Agostinho Lima em sua pesquisa cita Remnant que diz:

Embora por muito tempo arcos não fossem plenamente aceitos nos altos

cículos sociais da Ásia, foram amplamente adotados na Europa depois do

estabelecimento do arco nos séculos X e XI. (LIMA apud REMNANT, 2001,

p. 6)

E sobre a presença da rabeca nas festas e eventos religiosos Lima ainda cita Remnant

que afirma:

Procissões sejam sacras ou seculares muitas vezes incluíam rebecas. [...] O

uso de rebecas em festas, danças e entretenimentos da aristocracia foram

amplamente documentados. (LIMA apud REMNANT, 2001, p. 6)

No decorrer da história surgem as descobertas de novas terras pelos ingleses,

portugueses e espanhóis, tratava-se das Américas. Junto a toda a colonização européia nestas

novas terras, a rabeca chegou por intermédio dos portugueses que aqui se instalaram e deu-se

inicio a formação de uma nova adaptação de ambiente e criação de uma nova cultura que com o

decorrer do tempo, e a mescla entre o branco e o índio e a chegada dos escravos africanos

também com suas contribuições culturais foi gerando uma identidade que em muito iria se

diferenciar da européia. Sobre a chegada da rabeca no Brasil Lima diz que:

[...] a rabeca foi trazida para o Brasil, provavelmente por portugueses e

espanhóis. Registros da presença deste instrumento em diversas manifestações

populares ou da corte foram realizados por viajantes ou cronistas de época

desde o inicio de nossa colonização. (LIMA, 2001, p.7)

Fica claro que a rabeca esteve presente em muitas manifestações e festividades da

sociedade brasileira, se estabelecendo e adquirindo também as influências e contribuições de

nosso povo mestiço, e no decorrer do tempo, foi possível exibir suas manifestações próprias e

originais, tendo como base, o conhecimento passado através da oralidade de seus praticantes a

seus aprendizes, formando assim uma cadeia do saber, onde cada estado do Brasil possuía sua

tradição e cultura próprias, demonstrando a complexidade cultural que nosso país possui em

seus diferentes territórios, e acrescentando a tradição da música de rabeca uma gama de

diversidade musical.

18

1.2. A música de rabeca

Discordo daqueles que pensam que a rabeca é possuidora de um som tristonho, pois

para mim a música da rabeca é de alta expressividade e pode caracterizar e interpretar muito

mais músicas além de lamentos e fados, a música de rabeca transmite energia, e leva muitas

vezes ao êxtase o indivíduo que se entrega a esta musicalidade. Sobre este sentimento Daniella

Gramani diz que “[...] atrás da sonoridade que ouvia dos rabequeiros tradicionais e daquela que

me agradava comecei a tocar rabeca, feliz!”. (GRAMANI, 2009, p.14).

A música de rabeca, assim como seu som, transmite a alegria e as festividades do

trabalhador do campo em seus momentos de repouso quando se toca o seu folclore, ou seu

forró de rabeca; mostra um cenário arquitetônico e brincante dos personagens de diversos

folguedos, dando também vida à dança, seja ela presente nos folguedos ou nos forrós do povo

das comunidades interioranas, a rabeca é portanto um instrumento onde não podemos chegar a

uma limitação característica de som tão resumida.

A rabeca acompanha a voz em repentes e romances como temos o exemplo de Fabião

das Queimadas que foi o único rabequeiro cantador de romances do qual se ouviu falar no

Estado do Rio Grande do Norte, semelhante ao cego Oliveira no estado do Ceará. (LIMA,

2001, p.9); o uso da voz acompanhada pela rabeca é algo que devemos atentar para fazer uma

distinção entre a rabeca e o violino, pois no violino se fica quase impossível ou muito difícil

tocar e cantar ao mesmo tempo, pelo fato de que o queixo do instrumentista se fixar na

queixeira para que o violino possa estar bem seguro para tocar.

Com a rabeca, o ato de tocar e cantar se torna natural, pois os rabequeiros geralmente

usam a posição da rabeca junto ao peito esquerdo, isso torna a prática de cantar e se

acompanhar com a rabeca possível em duas maneiras, a primeira é tocando a mesma melodia

ou fazendo uma segunda voz com a rabeca, e a segunda é fazendo uso de pequenos acordes de

dois sons, mas para isso o rabequeiro deve ter alguma noção de harmonia para administrar as

posições que irá usar na música e um bom controle de coordenação motora para manter um

ritmo no arco enquanto canta, isso exige um treinamento.

Nas zonas rurais de muitos estados e também nas zonas urbanas das principais cidades,

encontramos rabequeiros que fazem a música de rabeca ter uma maior repercussão do que em

tempos anteriores, são eles: Nelson da rabeca, Luiz Paixão, Salustiano, Dinda Salu, Seu

19

Oliveira, Cláudio Rabeca, Jeferson Leite, Siba, Dimattos da rabeca e Fabiano de Cristo dentre

muitos outros que, em todo o país não só perpetuam, mas inovam a música de rabeca; ora

fazendo composições para este instrumento, ora se integrando em grupos que se fazem

presentes na mídia, em apresentações na noite e até mesmo em viagens internacionais.

Sobre o andamento da música de rabeca Agostinho Lima diz que: “[...] atualmente, a

rabeca e sua música passam por um processo migratório de caráter não apenas geográfico, mas

de um contexto cultural para outro, de um segmento social para outro [...]” (LIMA, 2001, p. 13)

Em questão de música compartilhada, o que mais difere os rabequeiros contemporâneos

dos tradicionais, em questão de compartilhamento do saber musical, é que existe uma troca de

experiências e contribuições musicais em maior escala do que antigamente, sobre isto

Agostinho Lima reconhece que:

[...] se o atual isolamento dos rabequeiros tradicionais os impossibilita de

desenvolver o tipo de consciência que possuem os jovens – pois não tem como

fazer comparações entre si -, é justamente a possibilidade maior de contato

que têm estes novos rabequeiros com os outros que, também possibilita o

desenvolvimento desta consciência formal sobre o papel e os limites de

atuação criativa [...] (LIMA, 2001, p.110)

Devido à facilidade de comunicação através da internet e aplicativos de fácil acesso, os

rabequeiros estão unidos em grupos no facebook, blogs entre outros; eles compartilham seus

trabalhos musicais, postam dúvidas ou dicas, e de maneira descontraída criam laços de amizade

entre todos aqueles que não só tocam, mas que também admiram a rabeca e a pesquisam.

Por vezes, observamos que certos rabequeiros, se reúnem para tocar em conjunto

formando uma admirável harmonia, e criando de uma forma espontânea, acompanhamentos e

melodias que em muito contribui para a música de rabeca, a isto, chamo de “roda de rabeca”, o

ato de estar em um circulo musical onde cada um tem seu papel criativo de interpretação e

opinião, isto muito acrescenta a música de rabeca, e aqueles que estão a aprender o instrumento

e participam desta “roda” são incentivados a observar a prática, seja do professor ou dos outros

rabequeiros presentes, que estão ali para expor suas práticas e suas maneiras de lidar com este

instrumento.

Esta música é perpetuada e sempre será; não entre toda a população do país, mas

somente naqueles que a buscam e que se fazem presentes, em forma de vivência participativa

junto ao som e ao ritmo diversificado e empolgante que uma rabeca é capaz de fazer, estando

ou não acompanhada por outros instrumentos, a música de rabeca é uma ferramenta que

20

caracteriza e fundamenta a nossa música de tradição nordestina, esteja esta música presente nos

forrós, cocos ou folguedos.

21

CAPÍTULO 2

Contextualização do projeto de extensão do curso de rabeca no IFRN.

2.1. A estrutura do IFRN

O curso de extensão de rabeca acontece no Instituto Federal do Rio Grande do Norte

(IFRN) da Avenida Rio Branco, cidade alta, Natal, Rio Grande do Norte. O trabalho ocorre de

maneira voluntária, isto é, não há uma bolsa disponível.

Figura 2 - Fachada do IFRN cidade alta.

As aulas são todas as quartas-feiras das 14 horas às 16 horas, a sala conta com cadeiras,

quadro branco, projetor multimídia, computador, som e ar condicionado. Possuímos uma

reprografia que nos apoia quando fazemos pedidos de cópias por e-mail dos assuntos das aulas,

e uma coordenação de projeto de extensão, no qual possuímos uma estreita comunicação. Nesta

coordenação, também temos a liberdade de criar eventos para que a mesma possa publicar e

22

divulgar através dos diversos meios de comunicação, e eles também ajudam disponibilizando

camisetas promocionais do evento.

Figura 3 - Sala de aula do IFRN Cidade Alta.

Outros eventos de grupos musicais internos ou externos também acontecem

rotineiramente dentro do IFRN, e a turma de rabeca é motivada a participar com suas rabecas,

isto dá a todos um bom envolvimento musical e social, possibilitando uma vivência com a

criatividade musical.

Figura 4 - Tocando no evento Luzes da Cidade Alta.

23

Os alunos de rabeca são convidados a participar de forma ativa das apresentações dos

alunos de viola caipira desde que, procurem ensaiar as músicas com eles. Em cada apresentação

ou oficina oferecida aos alunos. É concedido um certificado que poderá servir para um futuro

currículo acadêmico, pois o certificado emitido pelo IFRN é composto de uma carga horária de

ensaios, e uma carga horária da apresentação realizada; isto muito tem incentivado os alunos a

se tornarem participativos em tudo o que acontece no âmbito deste ensino.

Figura 5 - Evento comemorativo aos 160 anos de criação do Patrimônio da União.

O curso de rabeca tem a duração de dois anos por turma; o objetivo principal do curso é

formar rabequeiros para fazer parte da orquestra de rabecas potiguar, juntamente com os alunos

do curso de viola caipira e também de futuramente dar ensinamento de rabeca a alunos novatos.

Estas idéias de integração dos alunos, no ensino e na orquestra, são veículos

motivacionais para o avanço e interesse destes em permanecerem unidos.

Mesmo após o termino do curso, os alunos podem ver que estarão incluídos em

participar do círculo de rabecas e também ajudando no ensino deste instrumento a outras

pessoas.

24

2.2. Uma descrição sobre o curso de rabeca

O IFRN apoia o curso de rabeca, disponibilizando o empréstimo de doze rabecas, para

os alunos que ainda não possuem seu próprio instrumento, participem da aula ativamente e

treinem em casa, criando desta forma um laço de confiança entre a instituição e a sociedade.

Os alunos assinam um termo de responsabilidade pelo instrumento que lhes é confiado

e no termo ele se responsabiliza por qualquer dano que possa ocorrer com o instrumento, desde

mau uso até furto ou roubo, contendo todas as orientações de ação cabíveis no termo assinado.

Figura 6 - Rabecas recém-chegadas ao IFRN, feitas pelo Luthier Eloi.

25

Os conteúdos abordados são inicialmente nesta ordem: teoria musical básica, percussão

corporal, o uso da voz em aboios espontâneos nas “rodas de rabeca”, para então podermos

passar esta prática na rabeca em grupo, na qual os alunos vão associando a leitura da partitura

com o braço da rabeca e fazendo improvisação rítmica e melódica em duplas, assim como

fazem com a percussão corporal e o uso da voz nos aboios.

Figura 7 - Roda de rabeca com Dimattos da Bahia.

Sempre que possível, convidamos outros rabequeiros para entrar na roda de rabeca e

fazer demonstrações de sua prática e contar aos alunos sobre suas experiências.

O Josenilson Moraes e o Dimattos da Rabeca já fizeram parte desse momento que

envolve a todos e que, contribui para fortalecer o convívio musical entre os alunos e outros

rabequeiros. Na roda de rabeca onde Dimattos da Bahia esteve presente como convidado, falou

sobre a afinação que ele usava em sua rabeca, tocou algumas composições suas e ainda

demonstrou a rabeca que ele mesmo construiu; isto foi muito satisfatório para todos os alunos e

serviu como um aprendizado de vivência.

É feita uma conscientização aos alunos de que a leitura musical é necessária por quatro

motivos principais: o primeiro é que a partitura serve para nos lembrar de como se executa

determinada música em caso de algum dia chegar a se esquecer de como tocá-la; o segundo

26

motivo é que todos possam tocar da mesma forma e no mesmo ritmo para que torne possível

fazer parte da orquestra potiguar de rabecas; o terceiro é a importância de registrar algo que

eles futuramente possam criar com sua imaginação própria, dando assim acesso desta criação a

outras pessoas interessadas; o quarto e último motivo, é que surgindo o interesse em prestar um

vestibular para o curso de licenciatura em música, eles já estarão familiarizados com a leitura

da partitura, tendo em vista que um dos requisitos básicos para aprovação é possuir um bom

conhecimento teórico musical.

Penso ser necessário que outros rabequeiros possam ter acesso ao ensino musical

superior, para que possam dar continuidade às pesquisas sobre a rabeca e os rabequeiros do

Brasil; sob o olhar deles mesmos que estão vivenciando de forma ativa, seja nos folguedos

populares, bailes de forró, cocos como também para que participem no ensino em escolas.

Valorizando nosso folclore e buscando ensinar e incentivar a crianças e adolescentes

potiguares a ter como base de seus conhecimentos musicais a nossa cultura e conhecimento

deste instrumento.

Concordando com esta ideia, Mavilda Aliverte em seu artigo sobre o ensino da rabeca

em Bragança no Pará diz que: “Nesse mundo de globalização, buscar algo que fale de nossas

origens é indispensável para preservar a nossa identidade, e buscar entendê-las e preservá-las é

garantir essa identidade para as gerações futuras.” (ALIVERTE, 2007, p.5)

Com isso, se cada rabequeiro criar um interesse em contribuir com o enriquecimento da

pesquisa em rabeca, logo muitos trabalhos poderão estar em discussão em todo o Brasil.

27

CAPÍTULO 3 - O QUE SE FALA DE RABECA

3.1. Os estudos sobre rabeca

A rabeca e os rabequeiros atualmente têm sido redescobertos e vistos com outros olhos

por pesquisadores de todo Brasil, tais como: Agostinho Lima, Mavilda Aliverte, Daniella

Gramani e Roderick Santos, entre outros que buscam ter uma visão seja esta dos rabequeiros e

suas reações às mudanças impostas pelo tempo, das rabecas e suas formas de construção ou o

ambiente social em que as rabecas e os rabequeiros atuam musicalmente.

Mavilda Aliverte que pesquisou a rabeca na região norte do Brasil nos fala um pouco

sobre todo este universo de pesquisa que muito precisa ser explorado, ela explica que:

Alguns trabalhos importantes se dedicaram ao estudo da rabeca no Brasil,

contextualizando o instrumento, descrevendo os processos de construção nas

diversas regiões, debatendo a origem do nome do instrumento, explicando a

forma de tocar e a sua função dentro das diversas manifestações da cultura

popular brasileira. Todos esses assuntos focando especificamente a região

norte do país serão abordados pela presente pesquisa, contudo ela apresenta

uma reflexão sobre as mudanças, musical e cultural, ocorridas a partir da

intervenção institucional dentro de uma manifestação popular tradicional.

(ALIVERTE, 2011, p.2)

O interesse de cada pesquisador, em explorar e conhecer o desenvolvimento cultural em

sua região, e analisar as mudanças sociais que acarretam através do valor daqueles que

preservam um fazer artístico e musical, deve ser encarado como um importante campo de

pesquisa; e aquele que se aventura em observar, registrar e comentar as informações deste

campo deve buscar uma visão ampla sobre o assunto e não apenas se ater aos detalhes; quanto a

isso Lima esclarece que:

O problema das notas passageiras sobre a rabeca, encontradas em diversos

autores, é que elas terminaram por se constituir numa formulação oficial de

identidade musical pautada em fragmentos dispersos e, sobretudo, focada

apenas no instrumento rabeca – ou, quando muito, numa suposta natureza

objetiva do fenômeno musical esboçada pelo pesquisador. Também

desconsideram um importante aspecto do fenômeno, que é a própria

capacidade de construção e representação de identidade musical por aqueles

que fazem a música de rabeca ou que a consomem, em cada um dos contextos

onde esta se faz presente. (LIMA, 2001, p.14,15)

Conhecer, vivenciar e relatar o universo da rabeca e dos rabequeiros não é algo simples,

deve-se buscar um entendimento da forma do pensamento daqueles que tocam, criam e brincam

com a música de rabeca.

28

Compreender suas funcionalidades musicais em determinados ambientes é fundamental

para que o pesquisador possa ilustrar aos futuros leitores uma verdadeira vivencia neste âmbito.

Roderick Santos que trata da organologia da rabeca no nordeste do Brasil, sente a

necessidade de organizar sua pesquisa através de seções por onde ele passa a discorrer sobre

outros assuntos relacionados à história e as pessoas que constroem e tocam rabeca para que

depois deste embasamento possam se aprofundar no interesse central de sua pesquisa.

Roderick Santos explana sua pesquisa dizendo:

A primeira seção traz breves referências históricas sobre a rabeca [...] Na

segunda seção considera-se que há um tipo de rabeca brasileira [...] A terceira

seção aborda o ensino coletivo de rabeca [...] a quarta seção descreve o

processo de construção de uma rabeca [...] o quinto e último aspecto abordado

na pesquisa envolve a percepção da sonoridade da rabeca [...] (SANTOS,

2011, p.12,13).

Com esta divisão organizada na pesquisa, se consegue fazer com que seus leitores

entendam a importância do foco do trabalho e a motivação que levou o pesquisador a este

campo, considerando os diversos ângulos de exploração do objeto estudado, e dando

sustentabilidade e credibilidade ao trabalho realizado, pois através de indagações e observações

pode-se chegar a um resultado eficiente.

Na pesquisa sobre o aprendizado e a prática de rabeca no Fandango Caiçara, de Daniella

Gramani, ela reconhece a necessidade de abordar o que se fala de rabeca em todo Brasil e diz

que “[...] é possível perceber que a rabeca realmente guarda características específicas em cada

região do país. Muitas vezes em uma mesma manifestação onde a rabeca é utilizada há

diferenças significativas [...]” (GRAMANI, 2009, p.57)

O que se difere nos contextos, e o que se concorda ou não, entre os pensamentos de

alguém que brinca ao som de rabeca em algum folguedo e o de alguém que toca rabeca em um

baile de forró, tudo deve ser levado em consideração e exposto diante de ideias e indagações de

quem pesquisa, desta forma, pode-se construir uma fundamentação para futuros trabalhos e

teses, e criar uma continuação de pesquisa em torno destes assuntos que são os rabequeiros, as

rabecas, sua música e suas áreas de atuação.

29

3.2. OS SITES, BLOGS E GRUPOS VIRTUAIS DE RABECA

Atualmente se encontra um número significativo de rabequeiros conectados na internet

através do grupo “Rabequeiros”, criado por Jeferson Leite1 no facebook, lá não estão somente

os rabequeiros do Brasil, mas o grupo também reúne vários artesãos de rabeca, pesquisadores,

admiradores de seu som, folcloristas e brincantes de folguedos.

Neste grupo existe uma troca de informações no tocante a afinações usadas por cada

um deles, marcas de encordoamentos, formas e posições de tocar, demonstração através de

vídeos de apresentações de grupos musicais onde a rabeca se faz presente, comentários sobre

dúvidas que surgem entre os membros do grupo, sempre são em grande quantidade; acredito

que lá é o lugar certo, para qualquer pessoa que deseje aprender e se aproximar mais das

pessoas e dos eventos que envolvem rabeca.

Na página do grupo “Rabequeiros”, no facebook existe um local onde suporta arquivos

para download, e todos os membros podem postar ou baixar arquivos em PDF, Word e até

MP3, isto poderia dar uma grande disponibilidade de material acadêmico para que todos os

interessados pudessem ter acesso a artigos, monografias, teses e dissertações em torno do

assunto rabeca, mas esta ideia ainda está sendo discutida.

No youtube.com encontramos vídeos também de Jeferson Leite, com o título de

“Toques de Rabeca” que expõem oito aulas de rabeca demonstrando os princípios básicos do

aprendizado nesta sequência: postura, afinação, arco, exercício I de digitação, exercício II de

digitação, exercício III de digitação, ensino da música “Juazeiro”, ensino da música “Assum

preto”.

Jeferson Leite também recomenda que aquele que aprende pelo vídeo deve buscar

conselho de alguém mais experiente; no mesmo site, também encontramos sobre os

construtores de rabeca de todo o país, demonstrando sua arte e sua maneira própria de fazer

rabeca; entre os construtores de rabeca mais visitados estão: Nelson da Rabeca de Alagoas, Zé

Pereira de São Paulo, Eloi de Natal, Aldo Macedo do Ceará entre muitos outros.

1 Jeferson Leite é um rabequeiro cearense que atualmente desenvolve um trabalho artístico com música de rabeca

em Goiânia.

30

O site rabeca.org também é muito visitado pelos rabequeiros que desejam conhecer os

locais e as variedades de rabecas que existem não só no Brasil e entre os indígenas Guaranis,

mas também nos Açores e em Portugal.

Trata-se de um banco de dados onde contém as referências bibliográficas de alguns

trabalhos sobre a rabeca até então conhecidos e a demonstração de rabequeiros e atividades

realizadas por eles ou por grupos de rabeca, através de fotos e localizações geográficas.

Também há um blog que nos faz conhecer um pouco sobre Valmir Roza, um construtor

e tocador de rabecas de São Paulo. Neste blog existe uma demonstração de rabecas e violas

construídas por ele, que geralmente está acompanhado pelo violeiro Bob Mendez.

No blog também demonstra detalhes fotográficos sobre suas viagens em busca de outras

culturas e divulga um CD com as composições deles intitulado “Violas & Rabecas”.2

Considero importante para as rabecas e os rabequeiros esta divulgação virtual que

alcança não só todo o país, mas o mundo inteiro, fazendo com que a música de rabeca seja

compartilhada com todos aqueles que a desejam conhecer.

2 http://rabecaseviolas.blogspot.com.br/.

31

CAPÍTULO 4 - O ENSINO DE RABECA

4.1. Minha concepção de ensino aprendizagem

Observando boa parte da atmosfera cultural dos Estados do Nordeste em relação ao

ensino de rabeca, percebi que poderia contribuir neste universo educacional no Estado do Rio

Grande do Norte, criando formas de ensino de rabeca em grupo com o objetivo de valorizar a

cultura tradicional de rabeca em nosso estado e incentivando na formação musical de novos

rabequeiros que em breve muitos deles irão ombrear na prática deste ensino para outros.

Valendo-se da importância da discussão sobre o ensino e aprendizagem da rabeca Lima

afirma que “[...] se revela como uma das formas por meio da qual é possível compreender-se o

processo de transmissão do conhecimento e de continuidade dessa tradição musical.” (LIMA,

2001, p. 112).

Penso que o ensino de rabeca é de alta importância na formação musical e cultural do

indivíduo que deseja preservar e passar adiante esta cultura musical incentivando uma

reconstrução de sua identidade regional e cultural através do toque de rabeca e das músicas

regionais nela executadas, que muitas vezes é minada ou até mesmo excluída pela mídia aberta,

fazendo que só aqueles que realmente busquem através de leitura ou acervos musicais

obtenham o conhecimento.

A rabeca é conhecida por ser uma parte fundamental nos folguedos populares em todo o

Brasil. Em particular no nosso estado temos o boi-de-reis que justamente por causa da

modernidade e globalização, chega a se enfraquecer e muitos desses grupos e rabequeiros ficam

sem atividade, como Lima em sua dissertação observa o modo que os rabequeiros vêem esta

situação explicando que:

Quando discorrem sobre as transformações culturais responsáveis por seu

declínio, eles sempre apontam o surgimento dos novos meios de comunicação

e de diversão como fatores que desestabilizam a manutenção dessa música.

(LIMA, 2001, p. 132)

Enfatizo também, que apesar de a rabeca ser um instrumento de cordas simples e com

uma dimensão de notas reduzidas, semelhante a uma flauta doce, desperta o interesse de muitas

pessoas para o seu aprendizado devido a esta aparente facilidade inicial; e também pela

32

ausência excessiva de regras de postura deixando a forma de pegar na rabeca mais livre para o

aluno. Sobre o grau de facilidade nesta questão, Santos sustenta que “A posição da mão do

aluno será sempre a mesma, ou seja, a primeira, já que os rabequeiros não costumam sair desta

posição.” (SANTOS, 2011, p. 48)

As músicas tradicionais e urbanas de caráter nordestino e músicas de folguedos e de

outras manifestações como o “coco” e o “forró de rabeca” dos mestres rabequeiros são os

assuntos centrais do meu ensino de rabeca, tendo em vista que meu objetivo é a preservação da

cultura local através do ensino e aprendizado de rabeca em grupo. Pois, não acho importante,

pelo menos neste momento inicial do aprendizado, ensinar músicas que não estejam dentro

deste contexto da raiz nordestina e Gramani reconhece que “[...] atualmente a rabeca tem

estado muito presente nas manifestações de arte do povo brasileiro.” (GRAMANI, 2009, p. 55)

Acredito ser necessário que a base inicial de ensino de rabeca esteja no contexto das

músicas regionais, para que a partir deste aprendizado, cada aluno possa buscar outros

horizontes musicais que deseje.

Outro importante objeto de meu ensino de rabeca é a criação espontânea, onde todos os

alunos são convidados a entrar em um circulo fechado de tocadores de rabeca, independente de

seus níveis técnicos no manuseio da rabeca, todos tocam em uníssono a mesma nota em ritmo

constante, e a cada um dos alunos é dado um pequeno espaço de tempo para que improvise, isto

é, criar música tocando nas notas da corda abaixo da que está sendo tocada por todos, pois o

acompanhamento fica em uma região sonora mais grave, enquanto a melodia improvisada se

destaca através da região mais aguda das cordas que estão abaixo.

Este improviso pode ser feito na própria rabeca de acordo com a capacidade de cada

aluno ou pode também ser feito com a voz em forma de aboio semelhante aos aboios dos

vaqueiros nordestinos e pode acontecer de este improviso vir em verso criado na hora por um

destes alunos, isso é o que chamo de “roda de rabeca” e fortalece a criatividade dos alunos.

Sobre este assunto Gramani enfatiza que:

[...] a criatividade é vista como um processo resultante da intersecção entre o

individuo, o domínio e o campo. O individuo criativo, com sua bagagem

genética e experiências pessoais, tem como características a curiosidade, o

entusiasmo, a motivação intrínseca, a abertura a experiências, a persistência e

a fluência e a flexibilidade de pensamento. (GRAMANI, 2009, p. 77).

33

Possuir um horário de inicio e término, e um dia estabelecido para o ensino coletivo de

rabeca, é um fator importante para a formação dos alunos, pois gera em todos eles um

compromisso de pontualidade, e uma idéia de continuidade do aprendizado que eles obtêm na

sala de aula, e também a visão de todos na seriedade da aula apesar de ser um curso não formal.

Também é feita uma chamada para controle de presença dos educandos.

Em nosso contexto de cidade, sempre possuímos uma rotina carregada de afazeres e

muitos compromissos com horários já pré-estabelecidos, seja no trabalho, faculdade e cursos

paralelos, portanto, diante desta realidade vimos ser necessário organizar nossas aulas dentro de

um horário e estabelecer um inicio e termino do curso com uma duração de dois anos.

Desta forma qualquer pessoa interessada pode assumir o compromisso de ter aulas de

rabeca, desde que esteja dentro da sua disponibilidade, e esta forma de ter um tempo específico

para a aula e uma duração da totalidade do curso funciona muito bem em nosso contexto

urbano, pois as pessoas já estão familiarizadas com este tipo de rotina.

Já o que acontece no ensino dos antigos tocadores que não possuem nem dia nem

horário pré-estabelecido para ensinar, por se encontrarem em uma realidade diferente da

urbana; isto é, na zona rural, onde o ensino de rabeca ocorre como algo mais familiar e

individualizado, dentro de qualquer momento do cotidiano.

Mesmo assim, não deixa também de ter seriedade neste ensino; entretanto, o rabequeiro

sempre está ali à disposição, para que o aluno interessado o busque e adquira a experiência

através do ver, ouvir e imitar.

Sendo esta forma de ensino uma forma saudável e até mesmo mais espontânea, levando

em consideração também que o aluno pode presenciar o seu mestre nos folguedos da

comunidade, ou em algum baile de forró de rabeca que participe. Sobre esta prática de ensino

dos rabequeiros tradicionais, Lima observa que:

A aprendizagem musical realizada na infância ou na pré-adolescência, numa

relação direta com a música na sua manifestação cotidiana, é um fato

importante entre as camadas populares que habitam as periferias dos centros

urbanos ou nos vilarejos de interior. No caso da música de rabeca, este é um

aspecto que tem importância na diferenciação entre a antiga forma de

transmissão deste conhecimento e os processos que envolvem a formação de

novos rabequeiros. (LIMA, 2001, p. 113)

34

Desta forma, esses dois processos de ensino são sem dúvida alguma eficazes; e esta

comprovado que no decorrer dos séculos obtém seu objetivo no aprendizado. A troca de

conhecimentos com os alunos, adquirida em cada aula coletiva me proporcionaram uma boa

experiência para que eu pudesse organizar de forma sistemática o ensino de rabeca.

Cada aluno possui uma dificuldade que é demonstrada nos exercícios práticos; então

em cima de cada exercício da rabeca, que pareça difícil ao aluno, solicito que faça uma pausa

por um momento na prática total do estudo e se concentre somente na parte em que sente

dificuldades, para que lentamente e por repetição, possa tornar possível a execução e assim

atingir o objetivo do exercício, que é sempre ultrapassar um obstáculo e aprender algo novo.

35

4.2. Outras experiências de ensino da rabeca

A forma mais antiga de aprender a tocar rabeca, segundo falam Lima e Carpegianne, é

através da oralidade no qual eles ressaltam que “Essas formas ou processos podem se efetivar

quase que indiretamente, através do escutar, ver e imitar os rabequeiros por parte da pessoa que

quer aprender tocar o instrumento.” (LIMA E CARPEGIANNE, 2010, p. 1). Assim sendo,

podemos refletir que o ensino tradicional de rabeca é algo bem particular de cada mestre

rabequeiro, que ao apresentar suas músicas a quem observa, ele também demonstra a sua

maneira de execução que difere da forma de qualquer outro rabequeiro, como é um fato, cada

rabequeiro assim como cada rabeca possui suas diferenças e nada é padronizado para todos

neste ambiente musical popular.

Agostinho Lima e Emerson Carpegianne comentam que o rabequeiro Josenilson Moraes

apesar de haver tido contato com o Seu Cícero rabequeiro do boi-de-reis do Mestre Manoel

Marinheiro, para obter um aprendizado tradicional, “[...] iniciou seus estudos de rabeca depois

de cinco anos de estudo de violino.” (LIMA E CARPEGIANNE, 2010, p. 4). Isto demonstra o

quanto é importante o contato pessoal com um mestre de rabeca que tenha aprendido de forma

antiga, mesmo que o rabequeiro novato já tenha alguma técnica de violino, pois desta forma

surge uma absorção de experiências idiomáticas da rabeca que em tudo se difere do violino –

seja na postura, timbre e principalmente na forma de tocar.

Aprender com algum mestre, no convívio, o idioma da rabeca, é uma boa experiência

para que se possa conhecer a originalidade sonora do toque da rabeca naquele âmbito onde o

rabequeiro tradicional se insere e também a sua postura. Pois, deve-se tocar rabeca pensando

em rabeca e não em outro instrumento; assim Daniella Gramani afirma quando ela se dispôs a

ter este contato com a rabeca do fandango dizendo que:

Acredito que o fato de eu me colocar como aluna, e uma aluna com

dificuldades já que normalmente toco rabeca na posição horizontal, apoiando

no ombro, e nas aulas me propus a tocar como Zé Pereira, na posição vertical

a apoiando no joelho, favoreceu minha inserção no grupo, desconstruindo a

idéia da “artista” e “organizadora de eventos”, e realçando minhas intenções

de pesquisa e aprendizado com os fandangueiros. (GRAMANI, 2009, p. 83)

Daniella Gramani assim como o Josenilson Moraes3, também teve aulas de violino bem

antes de possuir algum interesse pela rabeca e reconheceu ser necessário ter esta vivência para

3 Josenilson Moraes é um rabequeiro Potiguar, toca no boi-de-reis do Mestre Manoel Marinheiro em Felipe

Camarão, também ensinou rabeca e toca forró de rabeca no grupo candeeiro.

36

se sentir aceita no grupo tradicional de fandango e buscar ver em si mesma que estava a tocar

de acordo com as raízes tradicionais da oralidade que é passada de pessoa para pessoa no

decorrer de suas vidas em seu cotidiano cultural. Reforçando esta ideia, Lima afirma que:

Ora entre a rabeca e rabequeiro, o que há de culturalmente mais concreto é o

rabequeiro, nas suas formas de se representar e ser representado sócio-

musicalmente. Em termos de cultura, quem surge primeiro é o rabequeiro e

sua música, embora a sua perpetuação esteja relacionada ao

instrumento/objeto rabeca. (LIMA, 2001, p. 12)

Para se inserir no manuseio performático da rabeca, de forma que a sociedade que

observa possa sentir a particularidade do som e ritmo deste instrumento ao ser tocado, não basta

para o músico que se aventura na rabeca chegar apenas com a técnica clássica de violino e,

tentar reproduzir as músicas sem o embasamento do idioma fundamentado pelos mestres

rabequeiros tradicionais, seja escutando CDs ou presenciando as atuações destes.

E, também, sem a vivência obtida pela apreciação dos bailes de forró de rabeca,

folguedos e outras manifestações culturais, no qual este instrumento está presente, como

Agostinho Lima diz:

O diferencial, no caso da música de rabeca, reside no fato de quê o ensino

aprendizagem exige o envolvimento do sujeito-aprendiz com amplo espectro

da manifestação musical e não apenas com o instrumento ou técnicas

determinadas para tocá-lo. (LIMA, 2001, p. 120).

Os rabequeiros que procuram se embasar desta forma, isto é, sendo participantes dos

conhecimentos dos rabequeiros mais antigos e buscando escutar suas produções através dos

CDs, demonstrará uma autenticidade em seu som e na sua forma de tocar, tudo de acordo com

a maneira tradicional no manejo de rabeca, pois o que há de mais essencial quando se escuta

uma rabeca tocar, é o seu sotaque, sua particularidade sonora que se difere entre todas as outras

rabecas, pois cada rabeca é construída de forma diferente, e cada rabequeiro a toca com sua

técnica própria, seja ela adquirida com algum mestre tradicional ou ouvindo as músicas de

tradição de rabeca procurando se aproximar desta, ou o rabequeiro obtém seu desenvolvimento

técnico sozinho.

37

Buscando conhecer, assimilar e registrar aqui a experiência de ensino de outros

rabequeiros de diferentes regiões, uma entrevista foi feita via facebook e e-mail, com

rabequeiros: O potiguar Cláudio Rabeca, e os cearenses Jeferson Leite e Fabiano de Cristo.

Eles responderam as seguintes questões:

1- Como conheceu e se interessou pela rabeca?

2- Com quem aprendeu rabeca? Como foi este ensino? Tocava outro instrumento antes?

3- Após aprender a tocar rabeca, de que maneira ensinou e a quantos alunos?

4- Que tipo de músicas utilizou no ensino inicial? Foi por imitação? Utilizou partitura ou

memorização/ouvido?

Quando se pergunta a um rabequeiro como ele conheceu e chegou a criar um interesse

pela rabeca, é algo tocante em sua vida, pois se observa que este interesse se dá como se fosse

uma fome ou sede da cultura de raiz, que é saciada através de uma busca profunda do mundo

musical dos rabequeiros e da ânsia de ouvir o desenrolar do som de cada mestre rabequeiro.

Cláudio Rabeca explica que quando conheceu o som da banda Mestre Ambrósio,

posteriormente buscou ouvir outros trabalhos como: “[...] Chão e Chinelo, Quinteto Armorial e

o Mestre Luiz Paixão entre outros [...]” (CLÁUDIO RABECA, 2014, Entrevista), e a partir daí

que foi crescendo seu interesse em aprender o instrumento.

O cearense Jeferson Leite, conta como conheceu a rabeca dizendo que: “[...] Meu

primeiro contato com rabeca foi em Natal, durante a 1ª Quinzena Barroca do RN (2002), onde

assisti a apresentação do Grupo Candeeiro (Josenilson Morais), e conheci Seu André da Rabeca

tocando numa rua, no centro da cidade [...]” (JEFERSON LEITE, 2014, Entrevista)

Após esta experiência o Jeferson Leite também buscou conhecer não só sobre a música

de rabeca, mas também sobre a história da rabeca através do que se havia escrito até então, ele

disse na entrevista que: “... em Fortaleza tive a ajuda da folclorista Lourdes Macena em relação

aos estudos bibliográficos da rabeca [...] ” (JEFERSON LEITE, 2014, Entrevista)

O conhecimento das origens da rabeca bem como sua história na chegada ao Brasil é de

fundamental importância para os rabequeiros atuais que possuem o acesso a internet ou

bibliotecas e desejam pesquisar e conhecer melhor o instrumento, pois tendo como

embasamento os trabalhos bibliográficos sobre o instrumento, torna possível tirar dúvidas das

pessoas em relação à antiguidade da rabeca diante dos outros instrumentos de arco.

38

Com base na história, Lima enfatiza a antiguidade da rabeca afirmando que: “[...] o

instrumento trazido por portugueses [...] foi a rabeca, que aqui se popularizou, e não o violino –

este ainda sendo forjado na lutheria italiana do final do século XVI.” (LIMA, 2001, p.10)

No entanto outros instrumentistas chegam a se interessar pela rabeca através de

movimentos musicais que buscam unir a cultura regional, com os gêneros, estilos e

instrumentos ligados à cultura internacional; como o também cearense Fabiano de Cristo

explica sobre seu encontro com a rabeca e sobre as influências de estilos que misturavam o

regional com o internacional: “[...] Me interessei pela rabeca no mesmo momento em que a

conheci, ou pelo menos a percebi como instrumento singular. Hoje reconheço que certamente

já havia escutado o instrumento antes desse momento. Mas onde me pego ouvindo, vendo e

instantaneamente desejando possuir e aprender a tocar o instrumento, foi em Fortaleza por volta

do ano 2005. Na época tínhamos nacional e localmente a influência musical dos movimentos

Manguebeat (do Recife para o Brasil) e o Movimento Cabaçal no Ceará que vivia a mesma

opção estética e conceitual de unir a tradição local, a música dos anônimos da zona rural com o

referencial mundial da música pop, rock, jazz, MPB, etc [...]” (FABIANO DE CRISTO, 2014,

Entrevista) sobre este veiculo cultural chamado Manguebeat, Lima observa que:

[...] o movimento musical denominado Manguebeat, que teve início nos

primeiros anos da década de 90 em Recife, foi outro momento de estímulo a

uma busca das tradições musicais nordestinas por jovens que, em sua maioria,

tinham outras formações e informações musicais. Numa das vertentes deste

movimento a música de rabeca encontrou moradia certa ao lado de tambores,

bateria, guitarras, baixo elétrico, etc. É o caso de grupos como o Mestre

Ambrósio, Los Canalhas Insensibles, Chão e Chinelo, de trabalhos como o

realizado pelo DJ Dolores que utiliza rabeca, groove-box e sons sintetizados,

entre outros. São processos de migração, adoção e transformação de um saber

e fazer musical tradicional para o espaço urbano e de ação da indústria

cultural; espaço da urbanidade aparentemente massificada pelo consumo dos

produtos da moderna indústria de cultura [...] (LIMA, 2001, p.14).

Neste âmbito cultural em que ocorre a mistura e a troca de conhecimentos e fazeres

musicais, é que muitas pessoas são envolvidas e findam tendo acesso ao que era até então

antigo e desconhecido, como no caso da rabeca, que Fabiano de Cristo sabia que já tinha

ouvido seu som em algum lugar, mas ainda não tinha vivenciado a esfera eufórica

proporcionada por uma música de rabeca ao vivo, o que ocorrendo, fez surgir nele o interesse

por se tornar um rabequeiro.

Ao perguntar a estes rabequeiros com quem aprenderam a tocar rabeca, e como se deu

este ensino e se já tocavam outro instrumento antes, pode-se notar que todos eles antes de

39

conhecer a rabeca já eram musicalizados, isto é, já tocavam algum instrumento e também

estavam inseridos em grupos musicais; sobre como e com quem aprendeu Cláudio Rabeca

disse assim:

Aprendi com Mestre Salustiano, fiz 10 aulas com ele, por método de imitação,

onde ele primeiramente me falou onde colocar os dedos e a cada aula me

ensinava uma música, onde ele tocava e eu tinha que repetir. Antes eu tocava

Violão, Viola Caipira e Guitarra. (CLÁUDIO RABECA, 2014, Entrevista).

Podemos observar que a busca de Cláudio pelo toque de rabeca, o fez buscar um mestre

e um método tradicional de ensino, de forma que ele se sentisse mais próximo da rusticidade do

instrumento e de sua forma de tocar, e ao mesmo tempo sentisse a maneira de ensino deste

mestre tradicional.

Sobre a importância da simplicidade deste ensino tradicional Lima afirma que:

A aprendizagem da rabeca que se processa através do ver, ouvir e tentar tocar

sozinho diminui a importância de distinção entre as pessoas envolvidas, ao

passo que realça a importância do conhecimento em torno do qual o processo

se revela. (LIMA, 2001, p.114).

O rabequeiro Jeferson Leite que já possuía uma experiência musical com instrumento

de arco, explica como foi sua iniciação musical antes de ser rabequeiro dizendo:

Tive minha iniciação musical com ensino coletivo, no primeiro núcleo de

formação de instrumentistas de cordas do SESI/UFC (1997), em Fortaleza,

com o maestro Vazken Fermaniam. Lá comecei a estudar viola de arco –

instrumento que me dediquei durante minha formação e período em que

trabalhei em orquestras de Fortaleza e Goiânia, onde moro hoje.

(JEFERNSON LEITE, 2014, Entrevista).

Desta forma, podemos observar que aqueles que já dominam algum instrumento de

arco, possuem maior facilidade em criar uma adaptação da técnica que têm, para direcionar na

postura e no toque de rabeca.

E quanto ao ensino e aprendizado do instrumento, Jeferson Leite procurou seguir

inicialmente uma linha de pensamento mais autodidata que entrava de acordo com o

aprendizado de antigos mestres que por si só, descobriam as sonoridades, os toques e criava

suas composições sozinho, como o exemplo de Nelson da rabeca que fez sua própria rabeca e

aprendeu sozinho a tocar.

40

Jeferson Leite pensava desta forma:

Tendo visto tantos depoimentos de rabequeiros autodidatas, não pensava em

dar aulas, e acreditava eu, que não se cabia o ensino para o instrumento. Não

imaginava como poderia abordar um ensino sistemático num instrumento tão

“tosco” - na visão de quem tinha como referência a viola e os violistas.

(JEFERSON LEITE, 2014, Entrevista).

Mas algum tempo depois Jeferson Leite sentiu que havia pedidos de pessoas em

aprender o instrumento, e ele reavaliou seu pensamento no tocante ao ensino de rabeca, e

através de uma elaboração de aulas e do contato com Cláudio Rabeca ele criou oito vídeos

aulas.

Sobre como se iniciou a iniciativa em dar aulas de rabeca Jeferson Leite esclarece:

Só em 2011, vi a possibilidade de atender alguns pedidos e dar aulas. Usando

marcações semelhantes ao método Suzuki, marcando o 1º e o 3º dedo, e um

sistema de “formas” que vi o amigo Claudio Rabeca usar, tenho tido bons

resultados. “Depois, Claudio me esclareceu que foi uma adaptação de um

exercício que recebeu do mestre Salú”. (JEFERSON LEITE, 2014,

Entrevista).

Diante da troca de informações entre rabequeiros, fica claro que a ajuda mutua em

muito contribui para o ensino de rabeca, os vídeos intitulados “Toques de Rabeca” estão

disponíveis no youtube.com e são acessados por todos os novos rabequeiros que buscam os

fundamentos básicos do aprendizado de rabeca.

Jeferson Leite sempre recomenda que apenas o vídeo não é suficiente para o

aprendizado, mas que a busca por um professor de rabeca é importante para aperfeiçoar o

aprendizado e se aproximar mais do universo musical e da questão idiomática da rabeca, ou

seja, a assimilação de uma forma característica de tocar a rabeca é de muita importância para

quem toca ou para quem ouve.

Fabiano de Cristo fala sobre as diversas influências musicais que passou dos treze anos

de idade até o presente momento, para ele tudo deve acontecer de forma natural e espontânea,

tendo em vista que as primeiras músicas que ele tocou na rabeca foram na verdade

composições criadas por ele mesmo enquanto “brincava” com o instrumento.

41

Fabiano de Cristo explica como se deu sua jornada na música em direção a rabeca

dizendo:

Minha iniciação musical se deu cedo o bastante para que eu mesmo nem me

desse conta desse processo. Com 13 anos já estava tocando numa banda de

baile no Colégio Cearense Sagrado Coração (Irmãos Marista) e já fazia shows

e viagens com o grupo. Tocava percussão. Da percussão para a bateria, depois

violão, pife e a rabeca. Aprendi os primeiros toques sozinho. Fui aprendendo

brincando com o instrumento, é tanto que as primeiras músicas que toquei

foram composições minha que na verdade era resultado das combinações

melódicas que ia criando ao estudar o instrumento. Meu estudo continuou

dessa forma ainda por um bom tempo. Estudando sozinho, criando músicas e

executando essa criação. Com o tempo fui decodificando as escalas na rabeca,

as tonalidades, já havia desenvolvido o hábito de tocar e cantar, a execução de

acompanhamento harmônico (utilizando dicordes). Hoje tenho estudado

também a tradição de rabeca do Sertão dos Inhamuns, ligada aos Reisados de

Caretas, Danças de São Gonçalo e bailes da região. Novo aprendizado, nova

afinação, uma técnica de arco diferente do que havia me acostumado. Um

novo universo. (FABIANO, 2014, Entrevista).

Com toda a sua bagagem musical, Fabiano de Cristo se aprofundou na rabeca de forma

individual e ao mesmo tempo espontânea, visto que começa se divertindo, isto é, “brincando”.

A partir disso ele usava todas as suas vivências para explorar todo o potencial da

rabeca, até chegar ao ponto do uso da voz acompanhada pela rabeca, acompanhamento

chamado de “dicordes”, que se trata de um acompanhamento rítmico em que o tocador usa duas

cordas ao mesmo tempo, e procura fazer posições em que dê a sonoridade de um acorde.

Por exemplo, se o acorde for dó maior, ele pode usar dó+mi, ou dó+sol, ou mi+sol e

assim a cada “dicorde” dentro da música, basta ter o conhecimento da tríade que compõe um

acorde maior e menor para fazer uso desta técnica, acompanhando assim a voz ritmicamente.

A terceira e quarta perguntas tratam de que maneira estes rabequeiros ensinam, se é

ensino individual ou em grupo; que tipo de músicas costumam usar; se usam partitura ou outra

forma escrita ou, se ainda usam a forma de imitação e repetição proposta pelos antigos

rabequeiros.

Falando também das aulas individuais e em grupo, e sobre como se dá seu ensino,

Cláudio Rabeca diz que:

[...] dou aulas regularmente, tenho alunos que vão na minha casa onde fazem

aula individual e de vez em quando dou oficinas para grupos de 10 a 15

42

alunos. meu método é o de usar muita repetição, mostrando o local de cada

dedo e corda, passando bem lentamente cada parte da música, não uso

partitura. (CLÁUDIO RABECA, 2014, Entrevista).

Fica claro que o método de imitação e repetição que o Cláudio rabeca adotou é o

tradicional usado pelos antigos rabequeiros que, por séculos vem sendo usado e é comprovada

sua eficácia em resultados. Quanto ao uso de partitura ou algum tipo de escrita codificada, e o

tipo de música ou escalas usadas em suas aulas, Cláudio Rabeca informa abaixo:

[...] costumo iniciar as aulas com exercícios que mostram o local que cada

dedo pode tocar, depois ensino uma sequência de músicas, começando por

Asa Branca, depois Juazeiro, após isso passo algumas toadas de Cavalo

Marinho, e aí vai dependendo do nível e desejo do aluno, tudo isso usando

imitação e ouvido, nada de partitura. (CLÁUDIO RABECA, 2014, Entrevista)

Acredito ser muito importante que a forma tradicional de ensino da rabeca seja passada

para frente e não se permita que seja esquecida, pois tudo contribui para somar a um ensino de

qualidade, onde o aluno absorve a percepção do universo sonoro através da imitação e

posteriormente da criação espontânea.

Diferente do que Cláudio Rabeca faz, Fabiano de Cristo optou por fazer uso de uma

codificação numérica para auxiliar em seu ensino, e também está obtendo bons resultados, pois

segundo ele, é de fácil assimilação, Fabiano explica sua experiência dizendo assim:

Estou trabalhando com cinco alunos nessa proposta. Ela basicamente se

constitui de um procedimento de leitura e escrita baseada em números, onde

não há indicação de ritmo (o que requer que o aluno conheça antecipadamente

a música estudada), mas que tem se demonstrado de fácil compreensão,

facilitando a fluência para escrita e leitura dos alunos. Nesse método as notas

são indicadas em conjuntos de dois números escritos com tamanhos diferentes

tipo: 32, onde o primeiro número diz respeito à posição de digitação e o

segundo número à corda executada (posição 3 na corda 2). Esse método pode

ser aplicado a músicas instrumentais ou canções com letra. No caso de se

utilizar associado a uma letra de música, chamamos de cifra numérica. O

método ainda está sendo desenvolvido e requer aplicações em diferentes

realidades de ensino para poder aperfeiçoarmos algumas limitações do

mesmo. (FABIANO DE CRISTO, 2014, Entrevista).

O ato de um rabequeiro criar sua metodologia, seja tradicional ou não, é de grande valia

para o ensino da rabeca; como Fabiano de Cristo reconhece que não existe nenhum método ou

disciplina em conservatórios ou escolas de música para tal atividade, isto fez com que ele se

interessasse pelo ensino deste instrumento.

43

Fabiano explica que.

Apesar de muitos amigos terem me procurado para esse fim, não havia me

disponibilizado justificando não ter um método para tal e como a rabeca é um

instrumento sem trastes, que requer de que a toca um exercício de percepção,

ouvido, afinação, julgava muito difícil de ensinar alguém. De toda forma me

interessei pela questão do ensino de rabeca quando percebi que no Ceará

temos mais de uma centena de rabequeiros registrados no livro Rabecas do

Ceará (Gilmar de Carvalho) e no site rabeca.org [...] (FABIANO DE CRISTO,

2014, Entrevista).

Observa-se através do que Fabiano disse, que a ausência de músicas ou exercícios

escritos para o aprendizado de rabeca, muitas vezes chega a levar os rabequeiros a adiarem o

ensino, pois a rabeca apesar de ter uma pequena extensão no tocante às poucas notas que se usa

no braço dela, realmente exige do aluno uma percepção auditiva, uma ideia do movimento do

som, para que o aluno possa fazer as digitações no braço de forma consciente, isto exige

treinamento e vigilância por parte de ambos, professor e aluno.

Quanto ao uso de partitura, os rabequeiros entrevistados buscam ensinar através de

imitação, repetição ou no máximo uma cifra numérica para embasar seus alunos; eles se

fundamentam no ensino tradicional e oral dos antigos rabequeiros que, ao longo dos séculos

ensinam a seus alunos através do ver, ouvir e imitar, e confiam que esta metodologia é eficaz,

pois a prova disto pode ser vista na sobrevivência da rabeca e da forma diversificada de sua

música ao longo dos tempos.

Através dos esforços e da união de muitos rabequeiros que estão conectados através da

internet, e que divulgam suas atividades e compartilham seus conhecimentos e vivências

musicais uns com os outros, pode-se ter uma certeza de que a rabeca e sua música não serão

mais um assunto esquecido, pouco comentado, ou até mesmo ignorado, pois o objetivo desta

união virtual de rabequeiros é na verdade um convite que nos leva a fomentar a cultura da

rabeca em nosso país e, um convite ao ensino às pessoas que gostam deste instrumento, que

vem se tornando um meio de musicalizar, socializar e valorizar o indivíduo que escolhe ser e

estar entre os rabequeiros e sua música.

44

CAPITULO V- Relato das práticas do ensino coletivo de rabeca.

5.1. Os alunos e seu aprendizado

Visando investigar o que os alunos de rabeca pensam e sentem em relação ao ensino da

música de rabeca, e saber também o que eles mais gostam em questão de música, foi feita uma

entrevista em nosso grupo no facebook intitulado “Rabeca Potiguar”.

Foi importante ter a opinião deles a respeito de seus pensamentos em relação à rabeca,

sua música e anseios em relação ao ensino, pois assim pude descobrir outras maneiras de

instigar a sua sede pelo conhecimento de música, rabeca e teoria musical, bem como mantê-los

inseridos no entendimento das aulas.

Na entrevista, eles responderam as seguintes perguntas:

1 – O que pensam da rabeca?

2 – O que pensam da música de rabeca?

3 – Quais suas preferências de música em geral, gostos musicais?

4 – O que acham de meu ensino de rabeca? O que pode ser melhorado?

De todos os alunos apenas três se dispuseram a responder este questionário, foram eles:

Willian Cosme da Silva, Mariano da Silva e Marcos Alexandre; na primeira pergunta pude

observar a diversidade de opiniões sobre o que eles sentem e sabem de rabeca.

45

Sobre o que pensam de rabeca, cada um deles respondeu que:

A rabeca é um instrumento histórico e cultural, que representa a parte mais

simples da cultura nordestina de forma original e o melhor, pelas mãos dos

próprios nordestinos, assim como o coco, que existe em mais lugares além do

norte e nordeste e é nosso, a rabeca também é nossa! (WILLIAN, Entrevista,

2014)

Já Mariano, respondeu que ele pensa que a rabeca é: “Uma ferramenta que auxilia na

proclamação da liberdade que o coração almeja.” (MARIANO, Entrevista, 2014)

Para mim, que não a conhecia, mas que agora estou tendo a oportunidade de

fazê-lo. Está sendo uma experiência muito especial. A rabeca possui uma

sonoridade que me remete às minhas origens nordestinas e, pesquisando um

pouco, vi que é um instrumento bem antigo, o "pai" do violino moderno que

conhecemos. (MARCOS, Entrevista, 2014)

Podemos notar que apesar das diferentes respostas dos alunos rabequeiros no tocante ao

que pensam da rabeca, que existe um orgulho regional, de cultura local.

Quanto a Marcos e Willian podemos observar que, Willian já conhecia a rabeca, pois o

mesmo é neto de um rabequeiro interiorano já falecido e, sempre teve o desejo de seguir os

passos do avô, explorando esta musicalidade que ele considera singular de nossa região

nordeste. Marcos, que não conhecia a rabeca, buscou pesquisar materiais bibliográficos e de

internet para conhecer sua história, se sentindo de volta às raízes do nordeste, na medida em

que conhece e aprende mais sobre a rabeca.

A importância de saber o que cada aluno conhece ou pensa da rabeca, é poder

compartilhar este conhecimento e fazer considerações sobre o universo pensante de cada um

deles; isto serve como ferramenta auxiliadora, para incentivo de uma busca mais aprofundada

pela história da rabeca no mundo e no Brasil.

Sobre o que cada aluno rabequeiro pensa da música de rabeca, Willian afirma que: “A

música da rabeca é a parte mais regional do instrumento, é onde está à identidade do rabequeiro

ou da sua região.” (WILLIAN, Entrevista, 2014). Com isso pode-se notar que a música de

rabeca onde quer que esteja, garante uma identificação cultural da região onde se insere, sendo

assim, considera-se a caracterização da música de rabeca como algo de grande valor, pois onde

ali estiver um rabequeiro com seu instinto criativo e também espontâneo, lá se firmará a

identidade cultural local.

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Unir a questão religiosa com a música de rabeca, também não é algo estranho neste

universo; a isto temos os exemplos dos muitos folguedos existentes em nosso país que unem o

sagrado com o profano. Mariano responde o que pensa da música da rabeca dizendo que: “É

como um lamento, um grito, um gemido, é como se o som interpretasse a fonética do gemido

mesmo. Dom que Deus concede.” (MARIANO, Entrevista, 2014). Quando Mariano fala em

lamento, grito e gemido se referindo também que a música da rabeca, é um dom que Deus dá

àquele que produz este som e que interpreta estes sentimentos, visando de alguma forma com

este argumento encarar a arte, a música, a rabeca e o rabequeiro que cria esta música como algo

divino.

Sobre o que vem apreciando desde que iniciou o curso de rabeca, Marcos fala o que

pensa da música de rabeca explanando suas reflexões acerca; Marcos diz:

Eu estou passando a conhecer mais agora, mas a primeira impressão é que é

uma música bastante rica em sonoridades, que traz muito da cultura popular

do nosso Nordeste. Percebo também que tem muitas pessoas que tocam ou até

mesmo que a fabricam [...], apesar de pessoas muito simples, mas conseguem

com seu dom aprender o manuseio com a rabeca e criarem muitas músicas,

alimentando a história e a cultura em torno deste instrumento. (MARCOS,

Entrevista, 2014).

Ele observa a simplicidade das pessoas que tocam e fabricam a rabeca, e reconhece que

apesar desta simplicidade, existe uma gama de sonoridades e composições a partir da

espontaneidade daqueles que se aprofundam neste instrumento; fortalecendo também a cultura

local onde se insere e muito acrescenta na história da rabeca e sua música.

Os gostos musicais de todos os alunos rabequeiros são bem diversificados e ecléticos,

eu imaginava encontrar no curso de rabeca pessoas que só escutavam Luiz Gonzaga ou forró pé

de serra, mas quando pude conversar com cada um deles pude notar que eles consomem e

absorvem muito da música, tanto estrangeira quanto brasileira.

As preferências musicais de Willian foram as que mais se aproximaram do que eu

imaginava de todos os alunos na questão de música regional ou do Brasil, ele diz que escuta

“Bossa nova, indie, brega, regionais, alternativo, forró em geral, samba, coco, Maracatu,

frevo.” (WILLIAN, Entrevista, 2014).

Já Mariano, confessa que é mais aberto a tudo, ele afirma suas preferências com poucas

palavras dizendo assim: “Regionalizando e apaziguando na louvação as indiferenças. Vai do

Coco de roda ao Blues.” (MARIANO, Entrevista, 2014). Ele busca absorver toda e qualquer

cultura com um único fim, que é o que ele chama de “regionalizando” e “apaziguando”, ele

47

busca através de sua criatividade, assimilar conteúdos culturais diversificados e inserir nestes

conteúdos a nossa identidade nordestina, reconhecendo a música como uma ferramenta que une

e apazigua toda e qualquer diferença em uma sonoridade única.

Marcos demonstra essa união de gostos musicais que toma conta das preferências de

todos os alunos rabequeiros respondendo que aprecia: “Rock e pop rock, música católica, jazz e

soul music.” (MARCOS, Entrevista, 2014). Considero que me assustei no inicio, ao ver que os

alunos do curso de rabeca estavam tão dispersos entre tantas influências musicais, mas depois

de demonstrar o universo de conhecimento do mundo da rabeca, e apreciar com eles as músicas

e as diferentes sonoridades e formas de tocar de cada Mestre rabequeiro, pude notar que a

música da rabeca assim como pode ser mantida por eles, também pode entrar em um estado de

mutação devido à diversificação de influências que eles absorvem em seus gostos musicais.

O ensino da rabeca é o alvo principal desta entrevista, tendo em vista que de acordo

com as dificuldades de cada aluno, é possível criar melhorias para uma forma de ensinar

rabeca, demonstrando a eles novos caminhos para o aprendizado.

Quanto ao ensino de rabeca no IFRN Willian diz que:

Eu acredito que seja muito bom levando em consideração a quantidade de

alunos e a diversidade de níveis de aprendizagem de cada um, sem contar com

o tempo curto. O que pode melhorar são os termos, que pra mim e para alguns

ainda não estão em nosso vocabulário. (WILLIAN, Entrevista, 2014)

No ensino coletivo da rabeca, o professor não consegue dar uma atenção especial

ao aluno em todas as suas dúvidas; o tempo de duas horas de aula se torna bem pequeno

quando se esta em uma sala com vinte e dois alunos, cada um com sua rabeca fazendo seu som.

Para sanar esta questão dos termos teóricos musicais ou técnicos que, sempre são abordados na

sala de aula e que, devido ao curto espaço de tempo os alunos nem sempre conseguem tirar a

dúvida, criei um banco de dados em arquivos no grupo “Rabeca Potiguar” no facebook, no qual

os alunos podem fazer download dos conteúdos das aulas e imprimir o material caso desejem

ter em mãos para estudo em casa.

Como a maioria dos alunos não conhece a teoria musical, e os que tocam algum

instrumento, o fazem através de cifras, sempre existe um sentimento de gratidão por parte deles

no tocante ao ensino da rabeca, Mariano responde o que ele acha do ensino de rabeca

agradecendo:

48

Grato a Deus por esse auxilio que tu nos concede. Louvado sejam os dons que

o Senhor entrega aos homens para que os homens estejam alimentados do que

procede de Deus. Assim, é como um Pai que reparte o pão com os filhos.

(MARIANO, Entrevista, 2014)

Saber os detalhes de tudo o que acontece na aula de rabeca, de acordo com a visão dos

alunos, é muito gratificante para mim, pois observo que dinâmicas ou pequenas apreciações são

realizadas, embora inicialmente os alunos não demonstrem alguma reação positiva.

Fica claro que, conversando depois com eles, existiu realmente uma consideração do

que foi executado ou apreciado por eles, os alunos realmente acham importante cada momento

vivenciado na aula de rabeca, seja de forma apreciativa ou de execução; quanto aos detalhes

que se pode observar na visão de um aluno, Marcos agradece e explica que:

Queria inicialmente parabenizá-lo pela iniciativa e empenho, além do amor

que você tem pelo instrumento e pela propagação da cultura em torno da

rabeca. Acho bastante interessante os conhecimentos passados, pois pela

primeira vez em minha vida estou tendo a oportunidade de aprender um pouco

de partitura, além é claro da técnica em si da rabeca. O que poderia ser

melhorado que apenas pequenos ajustes no sentido da sistematização como

um todo do conteúdo da parte de teoria (partituras), pois como é muito novo,

pelo menos para mim, me perco um pouco, sendo necessário pegar bem do

início. Mas pretendo, assim que estiver com mais tempo livre, procurar

estudar mais em casa esta parte de teoria geral da música. No tocante ao

instrumento em si, acho bastante interessante a mescla que você faz horas

trazendo convidados para demonstrar a rabeca e horas você mesmo se

apresentando. Além disto, você sempre tem a preocupação de trazer algum

material impresso (partituras) ou fazer uso do quadro, além de toda parte

prática do instrumento. Gostei também da dinâmica da última aula, em que

fizemos uma técnica de improvisação vocal a partir de uma roda de saberes

que a turma foi organizada. Quanto à estrutura do IFRN, está de parabéns,

tanto pela sala climatizada, Outra coisa também é que estou achando bastante

interessante o convívio com pessoas de diversos grupos e idades, o que

enriquece nossa troca de experiências. Além disto, a turma é bem eclética,

tendo uma mistura de saberes muito diversificada. Quanto pela

disponibilidade em podermos ficar e levar para casa um instrumento

emprestado da instituição, de modo a potencializar nossos estudos e prática de

rabeca. No geral, está de parabéns!(MARCOS, ENTREVISTA, 2014)

As dúvidas, dificuldades, agradecimentos e considerações dos alunos rabequeiros, são

de grande importância para o melhoramento constante das aulas e dos conteúdos, bem como

das formas de abordar cada assunto e de elaboração de material.

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Um ensino democrático deve ser discutido e fortalecido com opiniões e críticas

construtivas, tanto do lado do professor como dos alunos, pois sem este alicerce da

comunicação, se torna impossível melhorar o ensino, seja ele qual for.

Saber onde cada aluno pode encontrar um obstáculo ou uma dúvida, e com paciência e

prática ensinar a superar e passar adiante vencendo a dificuldade, é o objetivo de todo educador

que preza pelo resultado chamado ensino-aprendizagem.

50

5.2. Demonstração das práticas de ensino – aulas por atividades e conteúdo.

5.2. Aula 1 – Conhecendo os rabequeiros, suas formas de tocar e suas músicas.

Esta aula se caracteriza como introdutória, e apesar de ser plenamente apreciativa e

resumida, causa um impacto na visão do aluno no tocante ao que ele pensa da rabeca e sua

música.

Demonstra através da vida e obras de alguns rabequeiros de todo o Brasil as diferenças

e similitudes em suas formas e posições de tocar rabeca, manejo do arco, as contrastantes

diferenças de construções de rabeca, as questões idiomáticas nos toques e sonoridades da

rabeca, a abordagem de um pouco de sua história e de como chegou à Europa e no Brasil, e

depois uma pequena demonstração de algumas músicas de caráter regional tocadas pelo próprio

professor.

Iniciamos demonstrando duas rabecas, seus formatos e suas sonoridades, uma feita por

Nelson da rabeca de Alagoas e outra feita por nosso conterrâneo, o potiguar Damião, e

recomendamos a leitura do livro de Roderick Santos “Isto não é um violino?” isto gera nos

alunos uma ideia de que a rabeca pode ser feita sem nenhum padrão de tamanho, e que cada

rabeca possui um timbre particular, no qual chamamos de “personalidade”.

Figura 8 - À esquerda, rabeca feita pelo Alagoano Nelson, à direita, rabeca feita por

Damião.

51

Em seguida, mostramos a trajetória da rabeca que vai do Oriente com a expansão Árabe

por todo norte da África, chegando ao sul da península ibérica através dos Mouros; e na Grécia,

ou melhor, no Império Bizantino através dos Turcos, sempre tendo por base a história das

guerras e conquistas seguidas de colonizações, que dá a entender a proximidade dos povos

europeus com alguns costumes e convivências dos povos árabes, bem como a assimilação de

parte de sua cultura, como a matemática, e comércio de alguns de seus produtos, tais como o

café, tapetes e outros.

Provas da presença da rabeca na Europa medieval são suas antigas pinturas e estátuas

conservadas ainda hoje em museus e bibliotecas e catedrais sendo possível visualizar algumas

destas em sites da internet4, como podemos ver algumas adiante.

Figura 9 - Estátua do Rei Davi, Catedral de Vienne, França, Século 12.

4 http://crab.rutgers.edu/~pbutler/rebec.html

52

Figura 10 - “Great Canterbury Psalter”, Biblioteca Nacional de Paris, 1180 - 1190

Figura 11 - (Biblioteca Britânica, MS Royal 10.E.iv, fol.71). Entre 1325-1350

53

Figura 12 - Rabequeiro esculpido por Bennedeto Antelami, Catedral de Parma,

Itália, 1180.

Em seguida iniciamos audições de músicas de alguns rabequeiros do Brasil que

possuem algum trabalho gravado, que são: Nelson da rabeca de Alagoas, Mestre Salustiano,

Mestre Luiz Paixão e Siba ambos de Pernambuco, e Cláudio Rabeca de Natal – Rio Grande do

Norte.

É enfatizada a sonoridade particular de cada um destes músicos, bem como o ritmo

característico que cada um deles, dando aos alunos o entendimento de que cada rabequeiro está

livre para criar a sua forma de tocar e o seu estilo; digo aos alunos rabequeiros que as regras de

postura e de toque que ensino são opcionais, mas que devem ser seguidas de inicio até que cada

um possa desenvolver a sua forma individual de tocar e seguir seu caminho.

54

Em seguida dou uma demonstração em minha própria rabeca de algumas músicas de

Luiz Gonzaga, como: Asa Branca, Nega Zefa, Sala de reboco, Pagode Russo; para que a partir

destas músicas que eles conhecem e apreciam na rabeca, possam criar um interesse maior para

a próxima aula.

Sigo mostrando que com a rabeca também é possível cantar e acompanhar com a voz,

dando uma demonstração de sequências de acordes feitos com cordas duplas em ritmo

sincopado, ou seja, um ritmo de resfolego, ritmo sanfonado. Os acordes são simples e

aproveitam apenas dois sons da tríade harmônica, por exemplo, no acorde de ré maior, os três

sons que o compõe são: Ré, Fá sustenido e Lá; explico que o rabequeiro apenas escolhe

qualquer combinação destes sons de acordo com a facilidade desejada nas posições no braço da

rabeca.

5.2. Aula 2 – Ritmo rabecado, o uso do arco e o seu treinamento. (Aula por imitação e

repetição)

O ensino de rabeca que abordo com os alunos rabequeiros tem influência do Método de

violino Suzuki, pois em cada aula eu levo uma sequência para que seja repetida continuamente

por todos os alunos, até que se atinja ao objetivo da execução plena do exercício; sobre o

método Suzuki, a professora de violino Thaynara Oliveira explica que:

Suzuki é um método desenvolvido no Japão no inicio do século XX pelo

pedagogo musical Shinichi Suzuki. Essa pedagogia é voltada para o

aprendizado inicial no instrumento e busca desenvolver as primeiras

habilidades dos alunos através da audição e repetição. Usando a “língua

materna” como base no seu processo de ensino, Shinichi incorpora à sua

metodologia de iniciação ao violino, fundamentando-se em seu principio de

aprendizado, que ele acredita ser o da repetição e do treinamento. Ele busca

através de seu método fazer com que as crianças aprendam a tocar violino da

maneira mais natural possível, assim como as mesmas aprendem a falar.

(OLIVEIRA, 2012, p.34)

Inicio a primeira aula prática ensinando a minha maneira de se pegar no arco e na

rabeca, fazendo com que os alunos explorem as cordas da rabeca com um ritmo

constante, antes disso os alunos são convidados a fazer um círculo onde todos batem

palma em uníssono e no mesmo ritmo, seguindo é claro meu ritmo e orientação; isto faz

com que eles entendam, quando se falar em ritmo e pulsação.

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Figura 13 - Maneira de pegar na rabeca e o local onde colocar o arco nas cordas (entre cavalete

e espelho)

A rabeca possui um arco pequeno em comparação ao violino, sendo muitas vezes a

metade do tamanho deste ou até menor, isto faz com que a nota mais longa, que seja possível

fazer confortavelmente na rabeca, seja uma nota de dois tempos, ou seja, a mínima, como meu

desejo é que os alunos além de criar uma coordenação motora, também saibam qual peso da

mão devem impor ao arco nas cordas, eu inicio este exercício com notas longas de forma que

possibilite o uso de todo o arco; depois que eles sobem e descem o arco em uma corda é que

podem direcionar o arco para a outra corda, passando assim de uma corda para outra somente

quando tocar duas vezes.

Quando o ensino da rabeca é coletivo, torna-se melhor colocar os alunos em duplas ou

trios, para que, ao invés de observar aluno por aluno, observo de grupo em grupo, e cada grupo

deve se esforçar em tocar no mesmo ritmo; no início essas duplas ou trios são agrupados por

uma questão de afinidade entre alguns alunos; depois quem já estava avançando melhor na

prática de rabeca, foi colocado junto com aqueles que tinham mais dificuldade, sendo

orientados que na aula deveria acontecer uma ajuda mútua e não uma execução individual.

A prática em grupo atingiu o seu objetivo, que era o de fazer com que os alunos

tocassem no mesmo ritmo; se a aula se desse individualmente, ou seja, cada aluno executando a

sua maneira, a prática em conjunto levaria mais tempo para se tornar possível.

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Para se trabalhar a coordenação motora dos alunos rabequeiros, na passagem do arco de

uma corda para outra, aumentei a velocidade para notas de um tempo, a semínima, seguidas

depois de algum tempo de exercício pelas colcheias, e assim continuamente praticando até ser

possível executar as semicolcheias, isto sempre mostrando no quadro e em material impresso as

figuras musicais correspondentes a cada ritmo executado, para que eles pudessem já ir

memorizando e aprendendo com a própria prática rítmica da rabeca.

5.3. Aula 3 – Digitação, posições e escalas. (Aula por imitação e repetição)

Por se tratar de um instrumento não temperado, ou seja, com ausência de trastes para

indicar as distâncias exatas dos semitons, coloco na rabeca dos alunos dois pontos azuis de

adesivo; indicando o primeiro dedo e o segundo dedo, e enfatizo que no inicio do aprendizado

do terceiro dedo sempre será posto junto ao segundo dedo, e mostro que nesta posição os

alunos podem fazer escalas musicais. Entretanto, antes das escalas, proponho o exercício da

corda solta com o primeiro dedo, nisso demonstro a forma correta de digitação, digo correta,

pois não prejudicará o aluno quando ele precisar fazer sons com cordas duplas, a digitação na

rabeca deve ser com a ponta da falange do dedo e não de outra forma.

O exercício da corda solta e do primeiro dedo consiste na união do exercício rítmico

anterior, ou seja, o aluno é convidado a variar os ritmos aprendidos na aula anterior com o uso

apenas das cordas soltas e do primeiro dedo das quatro cordas soltas, isto deixa os alunos com a

liberdade de criar e possibilita o espontâneo de cada um deles, pois a cada um é dado uma

oportunidade de se fazer ouvir por todos os presentes na sala e demonstrar de qual forma fez o

exercício e que dificuldades ou facilidades encontrou para compartilhar com os outros.

Tive um pouco de dificuldade com um aluno que já tocava sanfona, pois ele digitava o

braço da rabeca não com a falange dos dedos, mas com as próprias digitais, costume herdado

da sanfona, e que foi abandonado com um tempo a mais de treinamento.

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Figura 14 - Braço da rabeca com pontuação azul

Ao exercício do primeiro dedo, quando se observa que os alunos já estão conseguindo

certa locomoção entre ritmo, e a mudança entre corda solta e o primeiro dedo, acrescenta-se o

segundo dedo e depois de mais algum tempo variando e se acostumando com as posições

impostas pelas marcações, acrescenta-se finalmente o terceiro dedo, sempre procurando

obedecer à distância de tom, tom e semitom em todas as cordas de acordo com as marcações

azuis.

5.4. Aula 4 – Afinação e “roda de rabeca”

A roda de rabeca não é apenas um momento em que todos tocam juntos como alguns

pensam, mas é uma troca de conhecimentos e opiniões acerca de música e de rabeca, na qual

cada aluno esta lado a lado em um círculo onde todos compartilham e assimilam na prática tudo

o que é realizado em torno desta roda, tornando possível um aprendizado prazeroso onde todos

são mais do que ouvintes, são participantes ativos; e nas rodas de rabeca é sempre importante

quando se tem um visitante rabequeiro que possa demonstrar suas composições e falar um

pouco sobre sua história com a rabeca.

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Figura 15 - À esquerda o rabequeiro Josenilson Moraes afinando sua rabeca para entrar na roda.

Nesta primeira roda de rabeca, o assunto foi sobre a afinação usada nas rabecas e como

proceder para afinar, pesquisando sobre a afinação que os rabequeiros costumam usar Lima

conclui que: “Na afinação da rabeca o intervalo sonoro buscado entre as cordas é o de quinta

justa, mas este intervalo nem sempre é obtido, sendo possível observar pequenas alterações

microtonais.” (LIMA, 2001, p.18).

A maioria das rabecas não possui “micro afinadores” que, são pequenas peças de metal

que facilitam a afinação, e deixam as cravelhas da rabeca com a função de somente apertar a

corda, tanto eu quanto alguns alunos preferimos não usar micro afinação por uma questão de

caracterização da rabeca, mas tenho visto que, em certas apresentações ao público, a micro

afinação das cordas da rabeca seriam de grande ajuda na facilidade e velocidade de afinação,

pois afinar somente com as cravelhas perde-se muito tempo, tendo em vista que às vezes as

cravelhas travam, e quando isto acontece é necessário folgar a corda novamente para iniciar o

processo; as cordas usadas por nossas rabecas são de bandolim.

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Para afinar cerca de vinte e duas rabecas no ensino coletivo, levo cerca de trinta

minutos, pois dois fatores contribuem para que uma rabeca recém-afinada volte a desafinar, um

deles é a mudança de temperatura ocasionada o ar condicionado, por exemplo; o outro é a falta

de uso da própria rabeca pelo aluno durante a semana, ou seja, uma rabeca que está em

atividade diariamente, mesmo que seja tocada apenas uma hora por dia, segura mais a

afinação.

Nessa roda de rabeca que se trata do assunto afinação, é explicado que quando se trata

de afinação de rabecas, cada rabequeiro possui a sua própria afinação; sendo de quinta justa ou

não, as afinações de nossas rabecas deveriam ser padronizadas para que se tornasse possível

tocar em grupo; escolhi uma música que a maioria dos alunos conhece, e os que não conheciam

aprenderam, pois apenas cantamos uma pequena parte da música que demonstra o intervalo de

quinta justa, a música era “Anunciação” de Alceu Valença e esta música tem uma parte que se

canta: “Tu vens, tu vens, eu já escuto os teus sinais” e justamente a parte onde diz “Tu vens”

mostra melodicamente o intervalo de uma quinta justa, pedi para que um aluno tocasse da corda

sol para a corda ré, e depois da corda ré para a corda lá e finalmente da corda lá para a corda

mi, e ele percebeu que praticamente aquela parte da música demonstrava o intervalo que todas

as cordas da rabeca deveriam ter. Apesar de usar o nome das cordas da rabeca de sol, ré, lá e mi

como o violino, sempre uso a afinação de um ou dois tons abaixo da afinação do violino,

usando os nomes destas cordas desta maneira mais por uma questão de costume ao ler partitura,

e com o objetivo de que os alunos também possam ler partitura desta forma.

Quanto aos alunos que ainda não haviam entendido, por alguma falta de treinamento de

percepção auditiva, foi demonstrado que o terceiro dedo de cada corda reproduzia a mesma

nota da corda que está acima, com a distância de uma oitava acima, assim foi possibilitada uma

comparação de sons para afinar as cordas das rabecas com muita atenção para evitar romper as

cordas.

É importante que os rabequeiros que se aventuram a ensinar rabeca, inserirem em suas

aulas músicas regionais como exemplos práticos, onde o uso da voz com a rabeca aperfeiçoe a

percepção dos alunos em torno da música.

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5.5. Aula 5 – Conhecendo as notas musicais através do braço da rabeca.

Os alunos já dominando a digitação no braço da rabeca, com as variações de ritmos

ensinados na terceira aula, estão prontos para saber o nome de cada nota musical que faz parte

da rabeca.

Em minhas aulas o uso da voz é fundamental para que, eu tenha certeza de que o aluno

está aprendendo, e também com o objetivo de tornar algo normal para o aluno o uso da voz e da

rabeca simultaneamente.

Iniciando pela corda sol, o aluno deve tocar nesta sequência: corda sol solta, e dizer a

palavra sol na mesma medida em que toca, toca-se então o primeiro dedo e pronuncia cantando

a nota lá, ou seja, diz a palavra “lá” entoando a voz com o mesmo som produzido pela rabeca.

Ao se apertar o primeiro dedo da corda sol, e assim os alunos vão trabalhando os três

dedos na mesma medida em que aprendem a usar a voz junto ao toque de rabeca, adquirindo

assim um conhecimento duplo que se resume, a saber, o nome das notas de cada corda e a fazer

o uso da voz na medida em que se toca.

Enquanto aqueles que argumentam que não sabem cantar, e que não possuem boa

entonação na voz, mesmo assim exijo esta prática, mesmo que seja simplesmente falada, pois

acredito que aqueles que não conseguem cantar vão futuramente obter algum resultado com

este treinamento de rabeca e voz.

No grupo dos alunos rabequeiros que criei no facebook, postei uma imagem em

arquivos que mostra detalhes sobre as notas do braço da rabeca, os números indicam que o zero

é corda solta, e os números um, dois e três são respectivamente o primeiro, segundo e terceiro

dedo.

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Figura 16 - Digitação e nome de cada uma das notas no braço da rabeca

O rabequeiro que ensina, deve se valer do sonoro para as suas aulas, mas também

buscar material visual para fundamentar ou ilustrar seu ensinamento.

5.6. Aula 6 – Conhecendo a teoria musical associando o braço da rabeca a partitura.

Após os alunos conhecerem as notas no braço da rabeca, mostro a eles uma introdução

de teoria musical sem tantos detalhes técnicos, apresento o pentagrama que são as cinco linhas

da pauta musical, e explico que nas linhas e nos espaços entre as linhas podem ser colocadas as

notas, as figuras musicais que mais uso nas aulas de rabeca são as semínimas e a colcheias;

explico a função da clave de sol e demonstro como se faz seu desenho pedindo que os mesmos

repitam; demonstro as linhas suplementares inferiores que são apenas duas e a linha

suplementar superior que é apenas uma no caso da rabeca, tudo isto analisando a partitura por

62

mim elaborada com o fim de levar os alunos a sua primeira leitura musical, e explicando a

importância da partitura para eles.

Figura 17 - Partitura elaborada com o objetivo de conhecer a dimensão de cada corda da

rabeca, bem como a representação numérica de cada dedo em cima das notas e um pequeno

exercício sem esta representação.

Os alunos são desafiados a estudar compasso por compasso, até se sentirem seguros

para realizar o exercício das notas que estão sem numeração dos dedos (semelhante ao método

Suzuki), passando do exercício de uma corda, vai para a próxima e assim irá explorar todo o

braço da rabeca, tudo isso se dá não individualmente, mas em duplas ou trios, com o objetivo

63

de que se tenha uma vivência da prática em conjunto, e após algum tempo, cessam de tocar

suas rabecas para que ao tempo marcado pela zabumba todos os presentes na sala possam tocar

o exercício juntos e assim sentir o som e o ritmo na coletividade.

Como exercício para casa eu dou a cada um uma partitura com o titulo: “Descobrir qual

é a música”, gerando neles uma curiosidade e vontade em saber o que está escrito lá, é claro

que a música que coloquei é uma música simples, regional e fácil de tocar de acordo com as

posições de tom, tom e semitom aprendido e praticado em aulas anteriores.

Figura 18 - Partitura da música “Anunciação” de Alceu Valença

5.7. Aula 7 – Tocando em conjunto nos eventos, entre solos de rabecas e aboios com a voz.

Nunca algo é tão motivador para o aluno, do que tocar para o público, se sentir parte de

um grupo que depois de algumas aulas já se sentem em família, compartilhar o que aprendeu

com a rabeca e o convívio com os outros alunos rabequeiros e o professor, estar entre violas de

dez cordas e percussões em geral é algo de grande valor no coração de todo aluno que se

apresenta em algum recital ou evento comemorativo.

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Sempre digo aos alunos que em apresentações não se deve ficar parado, se não

consegue tocar na rabeca aquela ou outra música, que pegue em instrumentos percussivos

pequenos como clavas, ganzá, reco-reco, agogô entre outros e faça cada um seu barulho no

acompanhamento; o importante é fazer o som ficar cheio de vida e ritmos e se sentir dentro

deste universo espontâneo.

Figura 19 - Foto tirada antes do evento luzes da cidade no IFRN cidade alta – Natal RN

Aos que ainda não tocam as músicas, mas conseguem executar variações rítmicas

com três notas, eu crio um acompanhamento simples, com base na tríade harmônica dos

acordes, usando células rítmicas e em cada parte da música e a indicação de apenas uma nota

que deve ser tocada por vez dentro desta célula rítmica.

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Figura 20 - Alunos no evento comemorativo aos 160 anos de criação do Patrimônio da união.

Nas rodas de rabeca onde todos em certo momento executam um “ostinato”, ou seja, um

ritmo constante na nota ré ou lá, acontecem os aboios e os solos espontâneos de rabeca, e os

alunos dão lugar à criatividade e se sentem livres para executar solos, recitar versos, e o mais

empolgante no ato de usar a voz, é a criação de aboios espontâneos. Diante de toda aquela

atmosfera sonora, sobre a definição de aboio, Natã Vieira diz que:

O aboio tem a característica de ser um entoar lento e de poucos fonemas, que

compreende uma melodia simples e quase uníssona, contendo espaços entre

estes fonemas simples que são preenchidos por pequenas expressões cantadas

lentamente, como: Ô Boi; Ê boinho; Ê gado manso; Fasta pra lá Boi.

Necessitam de uma voz encorpada e alta para atingir o mais longe possível em

um campo aberto. (VIEIRA, 2007, p. 14)

E assim cada aluno rabequeiro, através da vivência musical ao público aberto, ou nas

rodas de rabeca, aprende a ter confiança no que faz e busca através desta experiência, um

melhoramento de sua prática instrumental, que futuramente poderá estar ensinando a outros.

66

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em questão da prática do ensino de rabeca, acredito que ainda é um vasto campo a ser

explorado, e que este assunto deve ser analisado tanto por pessoas que fazem parte deste

âmbito, isto é, os rabequeiros que se aventurarem a pesquisar; como também por pesquisadores

interessados em expor suas indagações, reflexões e vivências quando estão diante da atmosfera

da música de rabeca e do pensamento de institucionalização deste ensino.

A avaliação de meu trabalho como professor de rabeca, não se dá somente ao fato de

quantos alunos já estão tocando rabeca, mas que todos os alunos, independente de seu nível

musical, conheceram a música e sua teoria a partir da rabeca como um instrumento

musicalizador e que, agora fazem parte de um meio musical, em que a espontaneidade criativa

é o centro.

Usar como fundamentação para as aulas de rabeca e para este trabalho, todas as

experiências pessoais, vivenciadas pelos pesquisadores (Lima, Santos, Gramani e Aliverti) foi

de grande valia para obter ideias e encontrar respostas para os novos horizontes do ensino de

rabeca.

Com relação ao uso de teoria musical nas aulas de rabeca, acredito ser necessário no

contexto em que me encontro, pois o objetivo deste ensino é para se tocar coletivamente e

também pelo motivo de incentivar os alunos a uma busca pela vida acadêmica em música.

Observando os sentimentos dos alunos através das apresentações vivenciadas por eles,

pude notar que em suas visões, os alunos rabequeiros também consideram que tiveram um

grande avanço, seja na questão teórico-musical, na prática de rabeca ou de espontaneidade

criativa; todos compreenderam o ensino proposto e as dificuldades encontradas foram

superadas através do esforço e ajuda mútua e do treino individual de cada um no cotidiano.

Concluo com a importância de que além de fazer uma mescla do método de ensino

Suzuki com a prática de ensino tradicional, o uso das informações obtidas através dos

pesquisadores de rabeca, que investigam a vida dos rabequeiros e as manifestações na qual eles

fazem parte, foi imprescindível para o ensino deste instrumento, pois deve haver um respeito e

uma perpetuação da tradição e dos modos antigos dos rabequeiros tradicionais no tocante a

67

rabeca, é claro que se este for o desejo daquele que quer seguir fielmente o ensino deste

instrumento, adquirindo desta forma o domínio do original idioma rabecado.

Assim encerro este relato, almejando em futuramente dar continuidade a este trabalho

sobre o ensino de rabeca, e que a partir de todas as vivências realizadas em torno deste ensino,

possam surgir ideias que irão nortear o desenvolvimento de novas ideias em torno deste

instrumento tão singular chamado rabeca.

68

REFERÊNCIAS

ALIVERTI, Mavilda A. Raiol. A rabeca na Marujada de Bragança/PA: o impacto de uma

pesquisa institucional em uma prática musical. Tese (Doutorado em Música) Universidade

Federal da Bahia, Salvador, 2011.

ALIVERTI, Mavilda A. Raiol. O ensino da Rabeca em Bragança-Pará: Um resgate da tradição.

Artigo, XVI encontro anual da ABEM e Congresso regional da ISME na América Latina,

Universidade Federal do Pará. 2007.

CARDOSO, Ciro Flamarion. Sete olhares sobre a antiguidade – História das civilizações

antigas. 2ª Ed. – Brasília: Editora Universidade de Brasília. 224 p. 1998.

CAJU, Robinson Fantinato. A interligação da matemática com a história Árabe. Universidade

Estadual de mato grosso do Sul, Dourados, 2010.

GRAMANI, Daniella da Cunha. O aprendizado e a prática da rabeca no fandango caiçara:

estudo de caso com os rabequistas da família Pereira da comunidade do Ariri. 2009. 132 f.

Dissertação (Mestrado em Música) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.

LIMA. Agostinho Jorge de. Música tradicional e com tradição da rabeca. Dissertação

(Mestrado em Música), Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2001.

LIMA E CARPEGIANNE. Práticas de ensino da música de rabeca no Rio Grande do Norte.

Artigo, IX Encontro Regional da ABEM Nordeste – II fórum Norte-Rio-Grandense de

Educação Musical, Natal, 2010.

OLIVEIRA, Thaynara Cristina Santos. Ensino de violino no programa Sol Nascente – Um

relato de experiência em um programa social, Universidade Federal do Maranhão, São Luís,

2012.

SANTOS, Roderick Fonseca dos. Cinco abordagens sobre a identidade da rabeca. Dissertação

(Mestrado em Música), Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2011.

SANTOS, Armando Alexandre dos. No século XIII, debates sobre as cruzadas. Artigo, Centro

universitário Claretiano de Batatais, São Paulo, 2010.

69

VIEIRA, Natã Silva. Cultura de Vaqueiro: O sertão e a música dos vaqueiros nordestinos.

Artigo, III ENECULT – Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura, Faculdade de

Comunicação/ Universidade Federal da Bahia, Salvador 2007.

LINKS

Blog Violas e Rabecas. http://rabecaseviolas.blogspot.com.br/ Acessado em 25/Set/2014.

Sequência das Aulas no youtube de Jeferson Leite: Acessadas em 05/10/2014

Toques de Rabeca (1) - POSTURA (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=Xtb0plaBFvs&spfreload=10

Toques de Rabeca (2) - AFINAÇÃO (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=MzIXWtmpTqw&spfreload=10

Toques de Rabeca (3) - ARCO (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=q6BBHNg5yew&spfreload=10

Toques de Rabeca (4) - EXERCÍCIO I (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=5yhfmhgvFD4&spfreload=10

Toques de Rabeca (5) - EXERCÍCIO 2 (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=ej4JQCc2mck&spfreload=10

Toques de Rabeca (6) - EXERCÍCIO 3 (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=vonLo7WhTI0&spfreload=10

Toques de Rabeca (7) - JUAZEIRO (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=4B0MOlSw668&spfreload=10

Toques de Rabeca (8) - ASSUM PRETO (Jeferson Leite)

https://www.youtube.com/watch?v=3FP0IwzbZXU&feature=youtu.be

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ENTREVISTAS

CLAUDIO RABECA. Entrevista via Facebook – data 02/10/2014.

JEFERSON LEITE. Entrevista via Facebook – data 05/10/2014

FABIANO DE CRISTO. Entrevista via Email – data 18/10/2014

WILLIAM. Entrevista via Facebook – data 25/09/2014

MARIANO. Entrevista via Facebook – data 25/09/2014

MARCOS. Entrevista via Facebook – data 25/09/2014

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APÊNDICE

PERGUNTAS DA ENTREVISTA REALIZADA COM OS RABEQUEIROS VIA

FACEBOOK E EMAIL, EM OUTUBRO DE 2014.

1-Como conheceu e se interessou pela rabeca?

2-Com quem aprendeu rabeca? Como foi este ensino? Tocava outro instrumento antes?

3-Após aprender rabeca, de que maneira ensinou rabeca e quantos alunos teve?

4-Que tipo de músicas utilizou no ensino inicial? Foi por imitação? Utilizou partitura ou

memorização/ouvido?

PERGUNTAS DA ENTREVISTA REALIZADA COM OS ALUNOS VIA

FACEBOOK, EM OUTUBRO DE 2014.

1 – O que pensa de rabeca?

2 – O que pensa da música de rabeca?

3 – Quais suas preferências de música em geral, gostos musicais?

4 – O que acha de meu ensino de rabeca? O que pode ser melhorado?

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Entrevista exemplo com Fabiano de Cristo (Via email. Data 18/10/2014)

Olá Roberto...

Aí vão as respostas:

1-Como conheceu e se interessou pela rabeca?

R- Me interessei pela rabeca no mesmo momento em que a conheci, ou pelo menos a percebi

como instrumento singular. Hoje reconheço que certamente já havia escutado o instrumento

antes desse momento. Mas onde me pego ouvindo, vendo e instantaneamente desejando possuir

e aprender a tocar o instrumento; foi em Fortaleza por volta do ano 2005. Na época tínhamos

nacional e localmente a influência musical dos movimentos Manguebeat (do Recife para o

Brasil) e o Movimento Cabaçal no Ceará que vivia a mesma opção estética e conceitual de unir

a tradição local, a música dos anônimos da zona rural com o referencial mundial da música

pop, rock, jazz, mpb, etc. Lembro que vi os shows dos grupos Mestre Ambrósio, Dr. Raiz e

logo tratei de adquirir minha primeira rabeca (que foi construída pelo luthier Di Freitas que é de

Fortaleza mas mora em Juazeiro do Norte).

2-Com quem aprendeu rabeca? Como foi este ensino? Tocava outro instrumento antes?

R- Minha iniciação musical se deu cedo o bastante para que eu mesmo nem me desse conta

desse processo. Com 13 anos já estava tocando numa banda de baile no Colégio Cearense

Sagrado Coração (Irmãos Marista) e já fazia shows e viagens com o grupo. Tocava percussão.

Da percussão para a bateria, depois violão, pife e a rabeca. Aprendi os primeiros toques

sozinho. Fui aprendendo brincando com o instrumento, é tanto que as primeiras músicas que

toquei foram composições minhas que na verdade eram resultado das combinações melódicas

que ia criando ao estudar o instrumento. Meu estudo continuou dessa forma ainda por um bom

tempo. Estudando sozinho, criando músicas e executando essa criação. Com o tempo fui

decodificando as escalas na rabeca, as tonalidades, já havia desenvolvido o hábito de tocar e

cantar, a execução de acompanhamento harmônicos (utilizando dicordes). Hoje tenho estudado

também a tradição de rabeca do Sertão dos Inhamuns, ligada aos Reisados de Caretas, Danças

de São Gonçalo e bailes da região. Novo aprendizado, nova afinação, uma técnica de arco

diferente do que havia me acostumado. Um novo universo.

3-Após aprender rabeca, de que maneira ensinou rabeca e quantos alunos teve?

R- Só agora estou ensinando rabeca. Apesar de muitos amigos terem me procurado para esse

fim, não havia me disponibilizado justificando não ter um método para tal e como a rabeca é

um instrumento sem trastes, que requer de que a toca um exercício de percepção, ouvido,

afinação, julgava muito difícil de ensinar alguém. De toda forma me interessei pela questão do

73

ensino de rabeca quando percebi que no Ceará temos mais de uma centena de rabequeiros

registrados em no livro Rabecas do Ceará (Gilmar de Carvalho) e no site rabeca.org e mesmo

assim não temos sequer uma disciplina optativa nos cursos de música das universidades (nem

mesmo na Universidade Federal do Cariri, sediada em Juazeiro do Norte, terra do Cego

Oliveira, cantador que eternizou a ligação entre a rabeca e a cantoria), muito menos em

conservatórios ou na escola. Essa contradição me levou a pesquisar sobre as experiências de

ensino de rabeca em outros lugares e percebi que nosso cenário não é tão diferente do restante

do país. Dessa forma passei a pesquisar a música de rabeca da localidade de Cachoeira do Fogo

(Independência - CE) e aproveitei a existência de uma Orquestra de Rabecas no local para

experimentar uma proposta inicial de método que estou chamando de cifra numérica ou método

numérico. Estou trabalhando com cinco alunos nessa proposta. Ela basicamente se constitui de

um procedimento de leitura e escrita baseada em números, onde não há indicação de ritmo (o

que requer que o aluno conheça antecipadamente a música estudada), mas que tem se

demonstrado de fácil compreensão, facilitando a fluência para escrita e leitura dos alunos.

Nesse método as notas são indicadas em conjuntos de dois números escritos com tamanhos

diferentes tipo: 32, onde o primeiro número diz respeito à posição de digitação e o segundo

número à corda executada (posição 3 na corda 2). Esse método pode ser aplicado a músicas

instrumentais ou canções com letra. No caso de se utilizar associado a uma letra de música,

chamamos de cifra numérica. O método ainda está sendo desenvolvido e requer aplicações em

diferentes realidades de ensino para poder aperfeiçoarmos algumas limitações do mesmo. O

certo é que é de fácil repasse para quem ainda não tem conhecimento da leitura musical

tradicional.

4-Que tipo de músicas utilizou no ensino inicial? Foi por imitação? Utilizou partitura ou

memorização/ouvido?

R- Músicas tradicionais dos folguedos locais (aprendidas nos Reisados de Caretas, Danças de

São Gonçalo e no repertório de músicas tocadas nos bailes da região) e algumas consagradas no

repertório da música nordestina. Utilizamos o método numérico (ou cifra numérica quando vem

acompanhada de uma letra). Nesse método, apesar de trabalharmos a leitura, é necessário que

tenhamos um exercício da memorização também, uma vez que não temos indicações de ritmo

tão precisas quanto na partitura tradicional.