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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ CIRLENE MACHADO O AUXÍLIO-RECLUSÃO NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO CURITIBA 2015

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

CIRLENE MACHADO

O AUXÍLIO-RECLUSÃO NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

BRASILEIRO

CURITIBA

2015

CIRLENE MACHADO

O AUXÍLIO-RECLUSÃO NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

BRASILEIRO

Monografia apresentada ao curso de direito da Faculdade de Ciências jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Oswaldo Pacheco Lacerda Neto.

CURITIBA

2015

TERMO DE APROVAÇÃO

CIRLENE MACHADO

O AUXÍLIO-RECLUSÃO NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

BRASILEIRO

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no

Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ____de________de 2015.

_______________________________________

Professor Doutor Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografias

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador:___________________________________

Prof. Oswaldo Pacheco Lacerda Neto

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Professor: ____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Professor:_____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

EPÍGRAFE

“O homem que não luta pelos seus direitos não merece viver” Rui Barbosa.

DEDICATÓRIA

À Deus, à minha família e a todos os meus amigos que me ajudaram nessa caminhada de cinco anos.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela saúde e força para enfrentar e vencer as dificuldades;

A minha família, pelo apoio e incentivo;

Ao meu orientador Oswaldo Pacheco Lacerda Neto, pela compreensão,

correções, dicas e paciência em me orientar.

A esta Universidade pela oportunidade de cursar Direito com um corpo

docente excelente.

A todos os funcionários e colaboradores da Universidade Tuiuti do Paraná,

pelo respeito e cordialidade.

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Art. - Artigo

CAP - Capítulo

CC - Código Civil

CFRB - Constituição Federal da República Federativa do Brasil

CP - Código Penal

MIN. - Ministro

RE - Recurso Extraordinário

REL. - Relator

RESP. - Recurso Especial

RT - Revista dos Tribunais

STF - Supremo Tribunal Federal

STJ - Superior Tribunal de Justiça

TJ – Tribunal de Justiça

TRF – Tribunal Regional Federal

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – DISTRIBUIÇÃO FEDERATIVA – AUXÍLIO RECLUSÃO (2012)

TABELA 2 – COBERTURA DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA COM O AUXÍLIO-

RECLUSÃO (2012)

TABELA 3 – ALTERAÇÃO NA CARÊNCIA DO AUXÍLIO-RECLUSÃO

RESUMO

O presente trabalho visa analisar o benefício do auxílio-reclusão oferecido pela Previdência Social aos dependentes do segurado privado de liberdade que se encontra privado de liberdade. A pesquisa do presente trabalho é de caráter bibliográfico, esta se concentrou na leitura, avaliação e interpretação de doutrina, legislação e periódicos relacionados a este benefício previdenciário. O material pesquisado foi criteriosamente submetido a uma análise para não tratar o assunto de forma periférica. Objetiva-se analisar o auxílio-reclusão no Direito Previdenciário Brasileiro e sua relevância social; conceitua-se o auxílio-reclusão; elencam-se os requisitos para sua obtenção; avalia-se o posicionamento da doutrina e jurisprudência sobre este benefício; argumenta-se sobre a concessão deste benefício a presos provisórios em detrimento da morosidade da Justiça Penal. Com o aumento da violência, do consumo de drogas e da organização do crime, cresceu de forma vertiginosa o número de pessoas envolvidas neste círculo vicioso. Entretanto, por trás do indivíduo que se envolve com o crime está uma família, pessoas que em sua maioria nunca se envolveram com o crime, mas foram prejudicas pela escolha de provedor da casa. Atualmente o auxílio-reclusão é um direito de poucos, a menos de dez por cento dos presos no Brasil é concedido este benefício, demonstra-se que a falta de informação sobre o benefício é um dos principais impedimentos. No entanto, a Medida Provisória n. 664/2014 tende a reduzir um pouco mais o percentual de concessão deste benefício previdenciário. Palavras-Chave: Direito Previdenciário. Previdência Social. Auxílio-Reclusão. Relevância social. Medida Provisória 664/2014.

ABSTRACT The present work analyzes the benefit of the aid-seclusion offered by Social Security to the dependents of insured deprived of freedom that is deprived of his liberty. The research of this paper is to bibliographic, this focused on reading, evaluation and interpretation of doctrine, legislation and journals related to this social security benefit. The studied material was carefully subjected to an analysis not to treat it peripherally. The objective is to analyze the aid-seclusion in the Brazilian Social Security Law and its social relevance; defines whether the aid-seclusion; we list up the requirements for obtaining them; evaluates the positioning of the doctrine and jurisprudence on this benefit; it is argued on the granting this benefit to provisional arrested over the slow pace of Criminal Justice. With the increase of violence, drug use and organization of crime, increased steeply the number of people involved in this vicious circle. However, behind the individual who gets involved with crime is a family, people who mostly have never been involved with the crime, but were you harm by choice provider of home. Currently the aid-seclusion is a right of a few, less than ten percent of prisoners in Brazil is granted this benefit, it is shown that the lack of information about the benefit is one of the main impediments. However, the Provisional Measure. 664/2014 tends to reduce a little the percentage of grant of social security benefits. Keywords: Social Security Law. Social Security. Aid-Solitude. Social relevance. Provisional Measure 664/2014.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11

2 DO AUXÍLIO-RECLUSÃO ..................................................................................... 13

2.1 CONCEITO ......................................................................................................... 13

2.2 BREVE HISTÓRICO ........................................................................................... 14

2.3 REQUISITOS PARA O RECEBIMENTO............................................................. 16

2.4 CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO .............................................................................. 17

3 O AUXÍLIO-RECLUSÃO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE SOCIAL .......... 18

3.1 A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98 ........................................................... 18

3.2 AUXÍLIO-RECLUSÃO: UM DIREITO RESTRITO ............................................... 19

3.3 O RISCO SOCIAL ............................................................................................... 22

4 A MP 664/2014 E AS ALTERAÇÕES NO AUXÍLIO-RECLUSÃO ........................ 24

4.1 A MUDANÇA DO REGRAMENTO PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ..... 24

4.2 A VACATIO LEGIS DA MEDIDA PROVISÓRIA 664/2014 .................................. 25

4.3 ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS............................................................... 26

4.4 AS PEC’s 304 E 304/2013 E O AUXÍLIO-RECLUSÃO ....................................... 28

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 30

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 32

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende analisar o benefício do auxílio-reclusão

fornecido aos dependentes do segurado que se encontra privado de liberdade,

oferecido pela previdência social.

É através da aplicação de uma pena que se pune o ilícito penal praticado por

um indivíduo. De acordo com Bitencourt (2004, p. 135) pena é: “um mal a que se

impõe por causa da prática de um crime: conceitualmente a pena é um castigo,

embora seu fim social não seja necessariamente retributivo”. A prisão é a forma mais

utilizada pelo Estado em que se faz valer a pena cabível.

Quando o indivíduo fica privado de sua liberdade ele encontra-se sob a

custódia do Estado, assim ele torna-se um segurado do Regime Geral da

Previdência Social ou do Regime Próprio. Assim, a prisão do indivíduo suspende ou

cessa a sua atividade laborativa até então desempenhada. Ao ter sua atividade

laborativa cessada em virtude da prisão preventiva ou definitiva, o Direito

Previdenciário presume que também cessam os meios de manutenção da família do

segurado.

Sem o auxílio do segurado preso, no caso de trabalhador de baixa renda,

seus dependentes (filhos, cônjuges, pais, irmãos etc.) podem passar sérias

dificuldades na sua subsistência. Em 1998 com o advento da Emenda Constitucional

n. 20 o auxílio-reclusão foi instituído para o dependente de baixa renda.

É pacífico o entendimento de que o auxílio-reclusão é um benefício dado aos

dependentes do segurado. Este benefício encontra-se previsto no artigo 201, inciso

IV, da Constituição Federal. Também existe previsão no artigo 80 da Lei 8.213/199;

nos artigos 116 a 119 do Decreto nº 3.048/99; no artigo 13 da Emenda constitucional

nº 20/98 e artigo 2º da Lei 10.666/2003 que tem por proteção a família de baixa

renda.

Os requisitos para o recebimento deste benefício são: a) condição de

presidiário; b) baixa renda familiar. No entanto, para se entender o que é condição

de presidiário, é necessário compreender o conceito de reclusão, de acordo com

Ferreira (2007, p. 34) reclusão tem sentido abrangente: “reclusão tem um sentido

amplo para a previdência social: a detenção, a prisão simples e a prisão provisória

também ensejam direito ao recebimento do benefício”.

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O auxílio-reclusão vem como um importante instrumento de preservação da

família e dependentes do segurado que se envolve com o crime. Observa-se que

com o aumento da violência, do consumo de drogas e da organização do crime,

cresceu de forma vertiginosa o número de pessoas envolvidas neste círculo vicioso.

Entretanto, por trás do indivíduo que se envolve com o crime está uma família,

pessoas que em sua maioria nunca se envolveram com o crime, mas foram

prejudicas pela escolha de provedor da casa.

Diante desse contexto, a sanção do Estado ao indivíduo acaba,

indiretamente, prejudicando a família do segurado preso. Assim, a relevância social

e o resgate que o auxílio-reclusão promove é um tema caro ao Direito

Previdenciário. No entanto, atualmente existe um desconhecimento sobre este

benefício por parte da população em geral: uns criticam o benefício e afirmam que

estão premiando o criminoso pela prática delituosa; por outro lado, a família do

preso desconhece os trâmites para o recebimento do benefício e acabam deixando

de lado. Fato é que este benefício, nos últimos anos, tem sido um direito de poucos.

Portanto, o auxílio-reclusão é um benefício importante que é concedido à

família do segurado privado de liberdade. No entanto, são necessárias algumas

medidas como: a) impor critérios mais taxativos para a concessão do benefício e; b)

combater a morosidade da Justiça nos julgamentos, para que esta demora não gere

um desfalque nos cofres da Previdência Social.

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2 DO AUXÍLIO-RECLUSÃO

2.1 CONCEITO

O auxílio-reclusão tem como objetivo garantir a subsistência digna dos

dependentes de baixa renda que se encontra privado de liberdade. Ao oferecer este

benefício a Previdência Social ameniza o risco social da perda da renda familiar. O

auxílio-reclusão é garantido da mesma forma que a pensão por morte. Neste

sentido, Sanchez e Xavier (2010, p. 221) afirmam:

Será devido igualmente o benefício de auxílio-reclusão nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência ao serviço.

O auxílio-reclusão encontra-se previsto no artigo 201, inciso IV, da

Constituição Federal. Este benefício foi motivado pelo entendimento de que a prisão

representa um risco social muito grande à família do segurado preso que deve ser

suavizado pela Previdência Social. De acordo com Correia e Correia (2011, p. 331-

332):

Também a exclusão da pessoa do convívio com os seus pares, em vista do cometimento de infração penal, foi tida como contingência para efeito de concessão de benefício previdenciário. Essa exclusão, obviamente, trará na vida dos dependentes dos segurados implicações financeiras que não foram desconsideradas pelo direito previdenciário. Daí a similitude de alguns dos pressupostos desse benefício com a pensão por morte. Se a morte causa dificuldades e transtornos na vida dos que dependem do segurado, o mesmo se dá com a sua exclusão em vista do cometimento de delito.

Diante do contexto brasileiro de enorme população carcerária o auxílio-

reclusão é um benefício que visa garantir a manutenção da família durante a prisão

do provedor. Segundo Gustavo Alves (2007, p. 139):

O auxílio-reclusão é um benefício que garante a proteção da família e dependentes, além da fundamental importância para o equilíbrio da economia do País, ou seja, proporciona aos recebedores uma qualidade de vida digna, servindo a renda mensal para sustentação às bases alimentar e educacional e à saúde.

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Este benefício está intimamente ligado com o princípio da Dignidade da

Pessoa Humana, segundo Ferreira (2007, p. 243): “o auxílio-reclusão é necessário

para que os dependentes não fiquem desamparados em situação de miserabilidade,

fato que fere todos os princípios ligados à dignidade da pessoa humana”. No

entendimento do conceito deste benefício, entende-se que este é de natureza

alimentar e é destinado de forma exclusiva aos dependentes do segurado preso.

2.2 BREVE HISTÓRICO

O surgimento do auxílio-reclusão ainda é incerto no ordenamento jurídico

brasileiro, mas é corrente o entendimento de que desde a década de 1930 houve um

interesse por parte dos governantes e também do legislador para que fosse criado

um meio para resguardar a família do segurado que se encontrasse preso. Neste

sentido, Russomano (1981, p. 214) relata:

O criminoso, recolhido à prisão, por mais deprimente e dolorosa que seja sua posição, fica sob a responsabilidade do Estado. Mas, seus familiares perdem o apoio econômico que o segurado lhes dava e, muitas vezes, como se fossem os verdadeiros culpados, sofrem a condenação injusta de gravíssimas dificuldades. Inspirado por essas ideias, desde o início da década de 1930, isto é, no dealbar da fase de criação, no Brasil, dos Institutos de Aposentadoria e Pensões, nosso legislador teve o cuidado de enfrentar o problema e atribuir ao sistema de Previdência Social o ônus de amparar, naquela contingência, os dependentes do segurado detento ou recluso.

Dito isso, aceitando-se o início do interesse legislativo a partir da década de

1930, nota-se que somente houve uma medida concreta a partir da entrada em vigor

da Lei n. 3.807/1960, conhecida como “LOPS” – Lei Orgânica da Previdência Social.

Inicialmente o intuito dessa Lei era resguardar os dependentes de presos políticos.

No entanto, o regramento foi modificado com o passar dos anos e ganhou uma

previsão constitucional, conforme aduz o artigo 201, inciso IV:

A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei: IV – Salário família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda.

Assim, foi estatuído pela Constituição que o auxílio-reclusão deveria ser

oferecido pela Previdência Social aos segurados de baixa renda. O regramento

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sobre o auxílio-reclusão sofreu alteração com a Lei n. 8.213/1991, que impunha ao

segurado preso em regime fechado ou semi-aberto a comprovação da condição de

segurado da Previdência.

Em 1998, com o advento da Emenda Constitucional n.20/98 foi incluído na

redação original do inciso IV do artigo 201 da CFRB: “segurados de baixa renda”.

Neste sentido, Pereira de Castro (2003, p. 540) relata:

O auxílio-reclusão previsto no inciso IV do artigo 201 da Constituição Federal de 1988 teve nova redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/98, para liminar a concessão a beneficiários de segurados que possuam baixa renda. Houve também o disciplinamento de quais segurados são considerados de baixa renda.

Na década de 2000 o valor do teto do auxílio-reclusão aumentou

aproximadamente um percentual de 25%. Além do aumento, neste período o

segurado preso poderia exercer atividade laborativa na prisão e contribuir como

segurado na modalidade de “contribuinte individual” para não retirar de seus

dependentes o direito ao benefício, conforma aduz a Lei n. 10.666/2003.

A Instrução Normativa INSS n. 45/2010 conceituou a pena privativa de

liberdade e fixou como fato gerador do benefício recolhimento à prisão do segurado.

O artigo 334 do presente diploma legal estatuía que o benefício era devido se o

beneficiário tivesse contribuído com salário base igual ou inferior a R$ 360,00

(trezentos e sessenta reais).

Atualmente o valor benefício teve seu piso ajustado em R$ 788,00

(setecentos e oitenta e oito reais). Conforme dispõe a alínea “a” do inciso I do artigo

3º da Portaria Interministerial MPS/MF n. 13 de 09.01.2015:

Art. 3º A partir de 1º de janeiro de 2015: I - não terão valores inferiores a R$ 788,00 (setecentos e oitenta e oito reais), os benefícios: a) de prestação continuada pagos pelo INSS correspondentes a aposentadorias, auxílio-doença, auxílio-reclusão (valor global) e pensão por morte (valor global).

Atualmente o regramento do auxílio-reclusão foi alterado pela MP 664/2014.

As mudanças no regramento para a concessão serão abordadas de forma mais

exaustiva em outro capítulo desse trabalho monográfico.

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2.3 REQUISITOS PARA O RECEBIMENTO

O principal requisito para o recebimento do auxílio-reclusão é pena privativa

de liberdade do segurado. A pena é o fato gerador do benefício. Neste sentido,

Pereira de Castro (2003, p. 541) argumenta:

O benefício é devido enquanto o segurado permanecer na condição de detento ou recluso. Sendo assim, para a manutenção do benefício deverá ser apresentada, trimestralmente, a declaração de que o segurado permanece cumprindo pena privativa de liberdade.

É importante pontuar que os dependentes do segurado preso em regime

fechado ou semi-aberto têm direito ao benefício, no entanto, os dependentes do

segurado em regime aberto não possuem qualquer direito ao recebimento. Pereira

de Castro (2003, p. 541) ratifica:

Conforme parecer exarado pela Consultoria Jurídica do então MPAS acerca da caracterização do direito em face do regime prisional, conclui-se que as famílias dos segurados presos sob regime fechado e semi-aberto fazem jus ao auxílio-reclusão, ainda que eles exerçam atividade remunerada e que as famílias dos segurados em cumprimento de pena sob regime aberto não têm direito ao recebimento do auxílio-reclusão.

Essa limitação aos dependentes do segurado preso em regime aberto há

porque, conforme aponta Aragonés Vianna (2011, p. 551): “pois os demais podem

trabalhar fora do presídio”. Quanto a data de início do recebimento do benefício

Aragonés Vianna (2011, p. 553) relata: “A data de início será o momento do efetivo

recolhimento do segurado à prisão, se requerido até 30 (trinta) dias depois deste, ou

na data do requerimento, se posterior”.

O valor do auxílio-reclusão observa o mesmo regramento da pensão por

morte. Esse benefício não pode ser inferior ao salário mínimo vigente e não pode ser

acumulado com a aposentadoria da Previdência Social. Segundo Aragonés Vianna

(2011, p. 554):

O benefício será devido nas mesmas condições da pensão por morte. Tendo em vista que o auxílio-reclusão não é acumulável com a aposentadoria, é preciso interpretar essa disposição com ressalvas, pois o valor do benefício não será, como pode ocorrer na pensão por morte, de 100% do valor da aposentadoria que o segurado recebia, mas sim de 100% do valor a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data da

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prisão, não podendo ser inferior ao valor do salário-mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição.

Assim, o benefício é oferecido aos dependentes enquanto durar a condição

de preso do segurado. O auxílio-reclusão independe de carência.

2.4 CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO

Assim como o fato gerador do benefício é a condição de preso do segurado, o

benefício será suspenso quando o mesmo fugir da prisão. De acordo com Pereira de

Castro (2003, p. 541):

No caso de fuga, o benefício será suspenso e, se houver recaptura do segurado, será restabelecido a contar da data em que esta ocorrer, desde que esteja ainda mantida a qualidade de segurado. Se houver exercício de atividade dentro do período de fuga, será o mesmo considerado para a verificação de perda ou não da qualidade de segurado.

Alguns doutrinadores argumentam que esse regramento de cessação do

benefício em caos de fuga, pois o risco social dos dependentes não é alterado com

a fuga do segurado, nesse sentido Feijó Coimbra (1997, p. 133) argumenta:

Não vemos justiça na disposição legal, parecendo-nos, ao revés, que se conflitam as duas disposições. Se a prestação é, induvidosamente, estabelecida Intuitu familiaeI, e se tem como elemento material da hipótese de incidência legal a ordem judicial de detenção ou de reclusão, o fato de ter-se evadido o segurado, de estar foragido, em nada altera os termos da questão, nem melhora a situação de seus dependentes, os titulares da prestação de que se cuida.

No entanto, do outro lado do debate, há doutrinadores que concordam com a

suspensão em caso de fuga. Como Pereira de Castro (2003, p. 542) que aduz:

Deve-se observar, contudo, que, não havendo a suspensão do benefício em caso de evasão, a família poderia ficar percebendo indefinidamente o benefício, supondo-se aí que o foragido jamais retornaria ao lar, nem proveria a subsistência dos seus. Acertou, a meu ver, o legislador nesse caso.

No caso de morte do segurado na prisão o benefício é suspenso e convertido

em pensão por morte.

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3 O AUXÍLIO-RECLUSÃO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE SOCIAL

3.1 A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98

A Emenda Constitucional n. 20/98 alterou o artigo 201 da Constituição

Federal, a partir desta emenda o artigo passou a ter a seguinte redação:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.

Anteriormente, este artigo não continha a expressão “para os dependentes

dos segurados de baixa renda” e agora o auxílio-recluso aparece ao lado do salário-

família. Observa-se que com o advento da EC 20/98 houve um aumento significativo

nas demandas judiciais, especialmente no sentido de arguir a inconstitucionalidade

da referida emenda. Neste sentido, Paiva (2014, p. 121) argumenta:

A restrição no acesso ao auxílio-reclusão foi desde a incorporação da EC n. 0/1998, alvo de diversas controvérsias jurídicas que resultaram em ações judiciais que buscavam declarar a inconstitucionalidade deste requisito, uma vez que o requisito de baixa renda é incompatível com os princípios norteadores da previdência social contributiva.

Além do requisito “baixa renda” a EC n. 20/98 também modificou o critério

para a adesão e cobertura pela previdência social, não sendo mais a renda auferida

e sim a contribuição anterior. De acordo com o entendimento de Raupp (2009, p.

24): “o critério para acesso é a privação de liberdade e a impossibilidade de manter

a renda de seus dependentes devido à prisão, fato que independe da situação de

renda anterior do segurado”.

Entre às críticas que se faz à EC n. 20/98 está a inexistência de uma

definição clara do termo “baixa renda”. A falta de um conceito abriu brecha para o

surgimento de inúmeras demandas judiciais. O Supremo Tribunal Federal teve que

firmar um entendimento fixando um limite a ser respeitado no auxílio-reclusão.

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Fato é que houve uma mudança no perfil do segurado beneficiado devido às

mudanças ocorridas na previdência social. Houve uma seletividade na concessão de

benefícios e supressão de alguns direitos sociais. Assim, o auxílio-reclusão foi

modificado, argumenta-se que este benefício perdeu a característica de seguro

social.

3.2 AUXÍLIO-RECLUSÃO: UM DIREITO RESTRITO

Não tendo mais a característica de um seguro social o auxílio-reclusão

tornou-se um direito restrito. Observa-se que no ano de 2012 a quantidade de

presos era assustadoramente enorme, passava de meio milhão de pessoas privadas

de liberdade. No entanto, um número ínfimo de famílias era auxiliado por este

benefício. Paiva (2014, p. 123) relata:

Em 2012, a população carcerária do Brasil era de 549.577 pessoas presas. Desse total, 527.778 estavam presas nos regimes fechado, semiaberto ou provisório ou cumpriam medida de segurança, sendo 493.344 (93%) homens e 34.434 (7%) mulheres de acordo com os informes do INFOPEN 2012. No mesmo ano, foram pagos 37.899 benefícios de auxílio-reclusão, o que representa o atendimento de aproximadamente 7% das pessoas presas no Brasil. Nos últimos dez anos, a cobertura variou entre 3% a 7%.

Indiretamente há uma política de segregação e de criminalização da pobreza.

De acordo com Paiva (2014, p. 126): “a política de criminalização da pobreza passa

a ser uma das respostas à falta de oportunidades de filiação via trabalho e possibilita

a imposição de trabalhos precarizados à população”.

No outro pólo da questão está o aumento do poder do sistema penal que a

cria e pune tipos e condutas penais. Neste sentido é importante observar o quadro

de oferecimento do benefício de auxílio-reclusão em comparação com a quantidade

de pessoas privadas de liberdade.

O nível de escolaridade tende a limitar um pouco mais o acesso das famílias

de baixa renda ao recebimento do auxílio-reclusão. Na tabela 1 abaixo se demonstra

a distribuição do auxílio-reclusão nos Estados federativos brasileiros. Depreende-se

dessa tabela que o nível de escolaridade dos presos influenciou na porcentagem da

concessão do auxílio, isso fica claro nos Estados com maior cobertura.

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TABELA 1 – DISTRIBUIÇÃO FEDERATIVA – AUXÍLIO RECLUSÃO (2012)

ESTADO BENEFÍCIOS PESSOAS PRESAS PERCENTUAL

BRASIL 37.899 527.778 7,2%

ACRE 304 3.812 8,0%

ALAGOAS 168 3.798 4,4%

AMAPÁ 37 1.821 2,0%

AMAZONAS 57 6.831 0,8%

BAHIA 592 14.930 4,0%

CEARÁ 838 15.234 5,5%

DISTRITO FEDERAL 748 11.452 6,5%

ESPÍRITO SANTO 1.646 14.671 11,2%

GOIÁS 508 11.967 4,2%

MARANHÃO 105 5.232 2,0%

MATO GROSSO 543 11.202 4,8%

MATO GROSSO DO SUL 761 11.390 6,7%

MINAS GERAIS 4.765 51.007 9,3%

PARÁ 163 12.496 1,3%

PARAÍBA 515 8.671 6,0%

PARANÁ 2.813 27.718 10,0%

PERNAMBUCO 2.233 25.475 8,8%

PIAUÍ 126 3.197 4,0%

RIO DE JANEIRO 1.706 33.192 5,1%

RIO GRANDE DO NORTE 524 6.169 8,5%

RIO GRANDE DO SUL 2.959 28.487 10,4%

RONDÔNIA 508 7.458 6,9%

RORAIMA 94 1.567 6,0%

RONDÔNIA 508 7.458 6,9%

SANTA CATARINA 2.114 15.153 14,0%

SÃO PAULO 11.820 190.818 6,2%

SERGIPE 261 3.756 7,0%

Fonte: INFOPEN (2012 apud PAIVA: 2014, p. 125).

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Fica demonstrado a diferença do percentual de concessão de auxílio-reclusão

entre os Estados do Sul e do Norte e Nordeste. Essa diferença pode ser

depreendida de outro dado, segundo dados do IBGE, “a média nacional, em 2011,

era de 7,3 anos de estudos, nos Estados da Região Norte, a média era de 6,6 anos

e, na Região Sul, de 7,7 anos” (PAIVA: 2014, p. 126). No panorama nacional a

concessão do auxílio-reclusão aumentou com o passar dos anos, mas ainda

continua como um direito de poucos.

TABELA 2 – COBERTURA DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA COM O AUXÍLIO-

RECLUSÃO (2012)

ANO PESSOAS PRESAS BENEFÍCIOS EMITIDOS %

2002 232.910 9.119 3,9%

2003 308.304 11.569 3,7%

2004 336.358 12.251 3,6%

2005 353.529 14.164 4,0%

2006 382.925 16.105 4,2%

2007 403.443 18.949 4,7%

2008 430.887 22.377 5,1%

2009 454.168 26.645 5,8%

2010 477.505 29.467 6,1%

2011 495.949 33.245 6,7%

2012 527.778 37.899 7,2%

Fonte: Paiva (2014, p. 126).

Os dados estatísticos apontam para uma realidade diferente da que é

apontada pelos críticos do benefício do auxílio-reclusão. Este benefício

previdenciário, mesmo aumentando o percentual de concessão a cada ano, ainda

pode ser considerado como um direito de poucos, pois menos de dez por cento das

famílias dos segurados privados de liberdade são cobertos por este benefício

previdenciário.

Na mesma toada, ao analisar os dados disponibilizados pela Dataprev e

Infopen citados por Paiva (2014) percebe-se que entre os Estados analisados, Santa

22

Catarina é o Estado com o maior percentual de recebimento do benefício do auxílio-

reclusão com 14% e o Estado do Amazonas é o último com 0,8%. Afora os fatores

determinantes sociais, pode-se argumentar que a desinformação ainda é um

empecilho para as famílias dos segurados.

3.3 O RISCO SOCIAL

O risco social presente no auxílio-reclusão e que a Previdência Social visa

sanar ou reduzir é a perda de rendimentos e sustento com a prisão do provedor ou

de um dos provedores da família de baixa renda. De acordo com Vianna (2011, p.

553):

O legislador constituinte originário houve por bem apontar a prisão do segurado como risco social a ser coberto pelo regime previdenciário. Note-se que a prisão decorre de ato do próprio segurado, o que pode levar à críticas, mas a verdade é que o benefício é dirigido aos dependentes do segurado, como já foi dito, e não a este. Assim, a prisão do segurado de baixa renda provoca uma necessidade social exatamente a falta de condições de subsistência dos dependentes por incapacidade laboral do recluso, o que será coberto por este benefício previdenciário.

Apesar do propósito social do auxílio-reclusão e da intenção de amenizar o

risco social sofrido pela família com a concessão deste benefício. O auxílio-reclusão

ainda é um direito de poucos devido a desinformação das famílias em sua maioria

de baixa instrução e às inúmeras alterações no regramento que ocorre na

Previdência Social devido à escassez de recursos e na tentativa de combater e

evitar fraudes.

Pontua-se que a utilidade do auxílio-reclusão funda-se na manutenção da

família do segurado que se encontra privado de liberdade. Frise-se que o auxílio não

é um benefício assistencial, uma vez que o dependente do segurado só tem

legitimidade para receber se o segurado tiver contribuído. Neste sentido, Dantas

(2009, p. 13) argumenta:

Se o trabalhador é contribuinte obrigatório do sistema de previdência e, independentemente do valor de sua remuneração, verte contribuições ao Regime, não há que se falar em benefício assistencial. Assim, sob a ótica do social, a seletividade é fomento de exclusão e, do ponto de vista previdenciário, contraria qualquer princípio estabelecido para um seguro. Melhor e mais justo que limitar o acesso somente aos segurados de baixa renda teria sido impor um teto específico para o auxílio-reclusão.

23

É importante avaliar o aspecto do custo social de um auxílio-reclusão seletivo.

Anteriormente, havia uma seletividade e rigor na concessão deste benefício e, por

outro lado, pouco rigor na concessão de outros benefícios sociais. Hoje, com o

problema do envelhecimento da população brasileira e aumento do número de

aposentadorias, aliado ao número de fraudes e problemas com a sustentabilidade

da Previdência Social que se mudou o regramento, colocando todos os benefícios

com rigor parecido. De acordo com Dantas (2009, p. 13):

O Estado como garantidor dos direitos precisa verificar a posição política dos personagens envolvidos. Curiosas distorções decorrentes da orientação política ou da condição social merecem ser revistas. O sucesso das políticas públicas está atrelado ao discernimento de quem aprova e devem sempre visar a legalidade, legitimidade e não somente à economicidade naquele instante. Desse modo, sugere-se a necessidade de uma análise aprofundada na questão do custo social gerado pela seletividade do auxílio-reclusão versus a sustentabilidade das contas da Previdência Social.

A utilidade e a validade social desse benefício foi maculada pelo acolhimento

da EC 20/98 que limitou o recebimento do benefício aos segurados de “baixa renda”

desvirtuando a característica do benefício.

24

4 A MP 664/2014 E AS ALTERAÇÕES NO AUXÍLIO-RECLUSÃO

4.1 A MUDANÇA DO REGRAMENTO PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO

Na Lei n. 8.213/1991 encontra-se uma previsão sobre os benefícios

concedidos pela Previdência Social independentemente de carência. O artigo 26,

inciso I dispõe: “pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-

acidente”. No entanto, com o advento da Medida Provisória n. 664/2014 que

promoveu inúmeras alterações na concessão de benefícios aos segurados, alterou-

se também a exigência de carência para a concessão do auxílio-reclusão. Na tabela

abaixo se mostra a alteração.

TABELA 3 – ALTERAÇÃO NA CARÊNCIA DO AUXÍLIO-RECLUSÃO

LEI N. 8213/1991 MP 664/2014

Artigo 25. A concessão das prestações

pecuniárias do Regime de Previdência

Social depende dos seguintes períodos

de carência, ressalvado o disposto no

artigo 26.

Artigo 26. Independe de carência a

concessão das seguintes prestações:

I – pensão por morte, auxílio-reclusão,

salário-família e auxílio-acidente.

Artigo 25. A concessão das prestações

pecuniárias do Regime de Previdência

Social depende dos seguintes períodos

de carência, ressalvado o disposto no

artigo 26.

Artigo 26. Independe de carência a

concessão das seguintes prestações:

I – salário-família e auxílio-acidente.

Fonte: O autor do presente texto (2015).

Depreende-se da leitura da tabela acima que foi alterada a redação do artigo

26 da Lei n. 8.213/1991 que não tinha carência na concessão do auxílio-reclusão.

Com o advento da Medida Provisória n. 664/2014 o auxílio-reclusão agora só será

concedido com o cumprimento de um período de carência de vinte e quatro meses.

Mas as mudanças no regramento da concessão do auxílio-reclusão não se limita

apenas à carência. O auxílio-reclusão foi removido dos dispositivos que tratavam

25

dele na legislação o que pode indicar um interesse do Líder do Executivo em, talvez,

retirá-lo do rol de benefícios da Previdência Social. Argumenta-se que o auxílio-

reclusão pode ser concedido como um benefício assistencial, mas esse argumento é

especulativo.

A relação existente entre o auxílio-reclusão e a pensão por morte também foi

alterada com a referida Medida Provisória, conforme aponta Tavares (2015, p. 6):

Foram incluídos dois parágrafos no art. 74 da Lei nº 8.213/1991: o primeiro veda a percepção da pensão pelo condenado pela prática de crime doloso de que tenha resultado a morte do segurado; o segundo introduz a exigência de dois anos de casamento ou de união estável como condição para recebimento de pensão por cônjuge ou companheiro. No que se refere ao §1º, andou bem a Medida Provisória, ao explicitar a exclusão da concessão da pensão por morte ao autor de fato do qual tenha resultado morte do segurado, desde que aja com dolo. A regra reproduz dispositivos previstos em leis de Regimes Próprios e decorre do princípio geral de Direito de que uma pessoa não possa se beneficiar da própria torpeza. Assim, mesmo antes da introdução do dispositivo na Lei nº 8.213/1991, já seria em tese possível negar o benefício.

Argumenta-se que essa nova previsão é vantajosa, pois deixa evidente o

impedimento à concessão.

4.2 A VACATIO LEGIS DA MEDIDA PROVISÓRIA 664/2014

A vacatio legis da Medida Provisória n. 664/2014 divide-se em três etapas. De

acordo com o inciso I do artigo 5º da referida Medida, algumas disposições entram

em vigor na data da publicação; outras medidas quinze dias após a publicação e; no

primeiro dia do terceiro mês subsequente a publicação da Medida Provisória todos

os dispositivos da Medida.

Assim, a regra que impõe ao cônjuge a convivência de dois anos com o

segurado privado de liberdade para persecução da pensão por morte, disposta no

artigo 74, § 2º da Lei n. 8.213/1991 entrou em vigor no dia catorze de janeiro de dois

mil e quinze.

Imediatamente após a publicação da Medida Provisória, entra em vigor o

disposto no § 1º do artigo 74 da Lei n. 8.213/1991 que proíbe que o condenado pela

prática de crime doloso que tenha como resultado morte do segurado tenha o direito

à pensão.

26

Por fim, no dia primeiro de março de dois mil e quinze entram em vigor os

demais dispositivos e alterações promovidas pela Medida Provisória. As alterações

no regramento para a concessão do auxílio-reclusão ainda são muito recentes.

Assim, é árido o solo jurisprudencial neste sentido. Dessa forma, cita-se algumas

orientações jurisprudenciais que demonstram o entendimento dos Tribunais pátrios

sobre a concessão do auxílio antes do advento da Medida Provisória 664/2014.

4.3 ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS

O entendimento dos Tribunais pátrios pode sofrer algumas alterações após a

entrada em vigor da Medida Provisória 664/2014. No entanto, outros

posicionamentos não sofrerão mudanças substanciais. Abaixo cita-se alguns

importantes julgados no que tange à concessão do auxílio-reclusão à família do

segurado privado de liberdade.

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. RENDA DO PRESO NO MOMENTO DO RECOLHIMENTO. CONDIÇÃO PARA CONCESSÃO. PRECEDENTES. 1. Nos termos do artigo 80 da Lei 8.213/91, o auxílio-reclusão é devido nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do segurado recolhido à prisão, desde que não receba remuneração da empresa nem auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço. 2. A expressão "nas mesmas condições da pensão por morte" quer significar que se aplicam as regras gerais da pensão por morte quanto à forma de cálculo, beneficiários e cessação dos benefícios. Em outros termos, as regras da pensão por morte são em tudo aplicáveis ao auxílio-reclusão, desde que haja compatibilidade e não exista disposição em sentido diverso. 3. A jurisprudência da Eg. Terceira Seção entende que a concessão da pensão por morte deve observar os requisitos previstos na legislação vigente ao tempo do evento morte, em obediência ao princípio tempus regit actum. 4. Agravo Regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1467228 SP 2014/0167363-0, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 23/09/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2014)

O Superior Tribunal de Justiça se posicionou no sentido de que o auxílio-

reclusão deve ser concedido nos mesmos termos da pensão por morte, quanto à

forma de cálculo, quem tem capacidade para receber o benefício e cessação do

benefício. No entanto, o egrégio tribunal pontua desde que não haja disposição em

sentido diverso. Assim, com o advento da MP 664/2014 talvez ocorra uma mudança

no precedente do Superior Tribunal de Justiça nessa matéria.

27

Outro importante julgado sobre a matéria é quanto ao critério econômico e o

momento da prisão. Nesse sentido, cita-se o julgado abaixo.

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. SEGURADO DESEMPREGADO OU SEM RENDA. CRITÉRIO ECONÔMICO. MOMENTO DA RECLUSÃO. ÚLTIMO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão jurídica controvertida consiste em definir o critério de rendimentos ao segurado recluso em situação de desemprego ou sem renda no momento do recolhimento à prisão. O acórdão recorrido e o INSS defendem que deve ser considerado o último salário de contribuição, enquanto os recorrentes apontam que a ausência de renda indica o atendimento ao critério econômico. 2. À luz dos arts. 201, IV, da Constituição Federal e 80 da Lei 8.213/1991 o benefício auxílio-reclusão consiste na prestação pecuniária previdenciária de amparo aos dependentes do segurado de baixa renda que se encontra em regime de reclusão prisional. 3. O Estado, através do Regime Geral de Previdência Social, no caso, entendeu por bem amparar os que dependem do segurado preso e definiu como critério para a concessão do benefício a "baixa renda". 4. Indubitavelmente que o critério econômico da renda deve ser constatado no momento da reclusão, pois nele é que os dependentes sofrem o baque da perda do seu provedor. 5. O art. 80 da Lei 8.213/1991 expressa que o auxílio-reclusão será devido quando o segurado recolhido à prisão "não receber remuneração da empresa". 6. Da mesma forma o § 1º do art. 116 do Decreto 3.048/1999 estipula que "é devido auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado", o que regula a situação fática ora deduzida, de forma que a ausência de renda deve ser considerada para o segurado que está em período de graça pela falta do exercício de atividade remunerada abrangida pela Previdência Social."(art. 15, II, da Lei 8.213/1991). 7. Aliada a esses argumentos por si sós suficientes ao provimento dos Recursos Especiais, a jurisprudência do STJ assentou posição de que os requisitos para a concessão do benefício devem ser verificados no momento do recolhimento à prisão, em observância ao princípio tempus regit actum. Nesse sentido: AgRg no REsp 831.251/RS, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Sexta Turma, DJe 23.5.2011; REsp 760.767/SC, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 24.10.2005, p. 377; e REsp 395.816/SP, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJ 2.9.2002, p. 260. 8. Recursos Especiais providos. (STJ - REsp: 1480461 SP 2014/0230747-3, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 23/09/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2014)

No caso do julgado supracitado o STJ entendeu que o auxílio-reclusão é

devido aos dependentes do segurado mesmo quando aquele se encontrar

desempregado no momento da prisão. Assim, o critério estabelecido pelo legislador:

“baixa renda” foi observado no presente caso e atendido pelo entendimento do

Superior Tribunal de Justiça.

Na mesma toada, cita-se outro julgado sobre o critério econômico na

concessão do benefício do auxílio-reclusão, mas no sentido de flexibilizar o valor

estabelecido em Lei.

28

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. POSSIBILIDADE DE FLEXIBILIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO ABSOLUTO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PREVALÊNCIA DA FINALIDADE DE PROTEÇÃO SOCIAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O benefício de auxílio-reclusão destina-se diretamente aos dependentes de segurado que contribuía para a Previdência Social no momento de sua reclusão, equiparável à pensão por morte; visa a prover o sustento dos dependentes, protegendo-os nesse estado de necessidade. 2. À semelhança do entendimento firmado por esta Corte, no julgamento do Recurso Especial 1.112.557/MG, Representativo da Controvérsia, onde se reconheceu a possibilidade de flexibilização do critério econômico definido legalmente para a concessão do Benefício Assistencial de Prestação Continuada, previsto na LOAS, é possível a concessão do auxílio-reclusão quando o caso concreto revela a necessidade de proteção social, permitindo ao Julgador a flexiblização do critério econômico para deferimento do benefício, ainda que o salário de contribuição do segurado supere o valor legalmente fixado como critério de baixa renda. 3. No caso dos autos, o limite de renda fixado pela Portaria Interministerial, vigente no momento de reclusão da segurada, para definir o Segurado de baixa-renda era de R$ 710,08, ao passo que, de acordo com os registros do CNIS, a renda mensal da segurada era de R$ 720,90, superior aquele limite. 4. Nestas condições, é possível a flexibilização da análise do requisito de renda do instituidor do benefício, devendo ser mantida a procedência do pedido, reconhecida nas instâncias ordinárias. 5. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (STJ - REsp: 1479564 SP 2014/0193771-0, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 06/11/2014, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/11/2014).

No julgado acima havia uma portaria interministerial que estipulava o valor do

segurando de baixa-renda em R$ 710,08, ou seja, se excedesse esse valor não era

verificado o critério de “baixa-renda”. No presente caso o Superior Tribunal de

Justiça entendeu que por exceder o valor do limite em pouca monta seria o caso de

se flexibilizar esse critério e conceder o benefício.

Além das alterações promovidas pela Medida Provisória n. 664/2014 houve

outras tentativas de se alterar o regramento do auxílio-reclusão e/ou criar outro

benefício assistencial. Como é o caso das PEC’s 304 e 368 de 2013.

4.4 AS PEC’s 304 E 304/2013 E O AUXÍLIO-RECLUSÃO

Tanto a PEC 304/2013 quanto a PEC 368/2013 tem como objetivo eliminar o

auxílio-reclusão e criar um benefício assistencialista para as vítimas ou famílias das

vítimas do crime praticado pelo segurado preso. É evidente, a incongruência dessas

medidas e afronta clara à Constitucional. De acordo com Pereira (2015, p. 1):

29

Sinteticamente, as PEC’s 368 e 304/2013 têm por escopo à criação de um benefício assistencial destinado àquela vítima de crime que, em conseqüência deste, fique impossibilitada de realizar as suas atividades laborais, seja de forma passageira ou permanente. Como dito alhures, tal benefício poderia abranger, também, a família da vítima.

A PEC 304/2013 propõe uma mudança no destino do benefício do auxílio-

reclusão, passando da família do segurado privado de liberdade para a família da

vítima. No entanto, demonstra-se a afronta ao princípio estabelecido no 5 º

da Constituição Federal, inciso XLV: “Nenhuma pena passará do condenado (...)”.

Ainda, não se pode considerar criminoso o cidadão sem trânsito em julgado da

sentença condenatória. No que diz respeito à criação de um novo benefício

assistencial Pereira (2015, p. 1) aduz:

Atente-se à PEC 368/2013, na qual tem por escopo o acréscimo do inciso VI e parágrafo único ao artigo 203 da Constituição Federal, que consiste na instituição de um benefício assistencial àquelas vítimas de crime, enquanto perdurar a incapacidade para o trabalho em decorrência do delito, ou às suas famílias, no caso de morte.

Aqui verifica-se a incongruência com a Constituição Federal que dispõe em

seu art. 195, § 5º: “nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser

criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”.

30

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário concedido à família do

segurado que se encontra privado de liberdade. O risco social que a Previdência

Social pretende aliviar é a perda financeira causada pela prisão do provedor da

família. Este benefício social encontra-se em frequentes debates sobre sua validade

social.

Alguns argumentam que esteve benefício deveria ser extinto porque não é

concebível que a sociedade deva pagar para a família do preso como se ele tivesse

morrido. O preso que deveria pagar a sociedade pela sua condição, pelo seu crime.

Concluem que da mesma forma como ocorre com o trabalhador que provoca o

acidente e não recebe indenização, assim deveria ocorrer com o segurado preso.

No entanto, por mais deplorável que seja a condição e os motivos que

levaram o segurado a prisão, a família do segurado perde o poder econômico que o

segurado garantia e é esse risco social que a Previdência Social busca amenizar

com o benefício. Assim, entende-se que o auxílio-reclusão não é um benefício dado

ao preso, mas aos seus familiares que perdem parte da condição de sobrevivência.

Afora as questões ideológicas envolvendo o auxílio-reclusão, este benefício

tem sofrido mudanças no seu regramento com o decorrer dos anos. Primeiramente,

em 1998 com a Emenda Constitucional 20/98 acrescentou o termo “baixa renda”,

limitando um pouco mais o alcance dos beneficiados. Com o advento da Medida

Provisória 664/2014 alterou-se a redação do artigo 26 da Lei n. 8.213/1991 que não

dispunha de carência para o auxílio-reclusão, agora acrescentou-se uma carência

de vinte e quatro meses.

O auxílio-reclusão após a MP 664/2014 foi removido dos dispositivos da

legislação que tratava dele o que indica o interesse do Poder Executivo de removê-

lo dos benefícios da Previdência Social. Após a vacatio legis, todos os dispositivos

da MP 664/2014 entraram em vigor, até o dispositivo que impunha a convivência do

cônjuge de dois anos com o segurado que for privado de liberdade.

Diante do quadro demonstrado por esta pesquisa, acredita-se que o auxílio-

reclusão é um benefício que caminha para a extinção, isso fica demonstrado com o

surgimento de PEC’s como a PEC 304/2013 e a PEC 368/2013 que objetivavam

31

eliminar o auxílio-reclusão ou criar um benefício assistencialista para as vítimas do

crime praticado pelo segurado.

A partir da entrada em vigor da MP 664/2014 a pensão por morte foi alterada

de vitalícia para temporária ou vitalícia, que depende da expectativa de vida do

dependente do segurado. Entende-se que esse mesmo regramento se aplica ao

dependente do segurado privado de liberdade para receber o auxílio-reclusão. Essa

expectativa de vida é computada de acordo com os dados oferecidos anualmente

pelo IBGE.

Assim, conclui-se que o auxílio-reclusão é um benefício previdenciário e não

assistencial como se argumenta. Mesmo não tendo a aceitação de alguns

doutrinadores, este benefício é um importante instrumento de resgate social às

famílias de baixa renda que sofrem o risco social de perda da possibilidade

econômica após a prisão do segurado.

32

REFERÊNCIAS

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