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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ RUTE JONÇÃO NEVES O DUMPING SOCIAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E AS DIVERGÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

RUTE JONÇÃO NEVES

O DUMPING SOCIAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E AS DIVERGÊNCIAS

JURISPRUDENCIAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

CURITIBA

2014

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RUTE JONÇÃO NEVES

O DUMPING SOCIAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E AS DIVERGÊNCIAS

JURISPRUDENCIAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do titulo de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª Msc. Mariana Gusso Krieger.

CURITIBA

2014

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TERMO DE APROVAÇÃO

RUTE JONÇÃO NEVES

O DUMPING SOCIAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E AS DIVERGÊNCIAS

JURISPRUDENCIAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do titulo de Bacharel do

Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 03 de outubro de 2014.

_______________________________________ Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografia Universidade Tuiuti do Paraná

Bacharelado em Direito Universidade Tuiuti do Paraná

Orientadora: ____________________________________ Profª Msc. Mariana Gusso Krieger.

Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Prof.:____________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

Prof.:_____________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais Lenira e Germano Neves, por toda uma

vida de dedicação e amor por mim, sempre me apoiando em todos os momentos,

me dando o sustento, educação, saúde e principalmente me ensinando o verdadeiro

caminho em que eu devo andar (Prov. 22.6), valores estes que me levaram a viver

uma vida digna de paz e sucesso.

Aos meus irmãos, sobrinhos e cunhados, pelo apoio, amor e amizade que

sempre devotaram a mim, tornando a minha vida mais feliz e completa. Amo minha

família, meu porto seguro!

Aos meus amigos, que não são muitos, mas os poucos que tenho são

verdadeiros, amigos de longa data e outros que conheci há pouco tempo, mas que

me honram com a sua amizade.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, autor e consumador da minha fé, por proporcionar

esta tão grande vitória em minha vida. Jamais pensei que pudesse voar tão alto,

mas Ele me conduziu em todos os momentos, tanto nos grandes, quanto nos

pequenos. Toda honra e glória sejam dadas Àquele que vive eternamente!

À minha família, pelo amor, paciência, incentivo e colaboração direta ou

indireta neste trabalho.

À minha orientadora Profª Mariana Gusso Krieger, pelo apoio e dedicação.

Aos meus professores, que me inspiraram e me conduziram à vitória.

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“Mas os que esperam no senhor, renovarão as suas forças, subirão com asas como águias, correrão e não se cansarão, caminharão e não se fatigarão.” Isaias 40.31

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso tem por objetivo salientar uma questão pouco discutida atualmente na sociedade, mas de fundamental importância e relevância na seara trabalhista e comercial: o dumping social. Visando a obtenção de lucro rápido e fácil em detrimento do trabalho humano, o empregador deixa de cumprir com suas obrigações trabalhistas. A importância do tema proposto é divulgar com massividade a prática do dumping social, como forma de coibi-la, e alertar a sociedade do risco econômico e social para o desenvolvimento do país, bem como destacar o entendimento do judiciário, considerando que este é um assunto que não está pacificado na jurisprudência. Abordaremos o assunto buscando um referencial bibliográfico que seja capaz de transmitir ao leitor uma base de entendimento profícuo e eficaz ao deslinde do estudo. Em suma procuraremos demonstrar os efeitos desta prática abusiva, como forma de buscar alternativas para a sua inibição através de medidas punitivas, com o objetivo de promover a justiça social.

Palavras chave: Dumping social, relações trabalhistas, sociedade, empregador,

trabalhador.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANAMATRA Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CC Código Civil

CDC Código de Defesa do Consumidor

CF Constituição Federal

CLT Consolidação das Leis do Trabalho

FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

GATT General Agreement on Tariffs and Trade

MPT Ministério Público do Trabalho

OMC Organização Mundial do Comércio

STJ Superior Tribunal de Justiça

STF Supremo Tribunal Federal

TRT Tribunal Regional do Trabalho

TST Tribunal Superior do Trabalho

USP Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 10

2 A GLOBALIZAÇÃO E SEUS EFEITOS NA ECONOMIA E NO DIRE ITO

COMERCIAL .......................................................................................................................................12

2.1. O IMPACTO DA GLOBALIZAÇÃO NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS ........................... 13

3 CONCEITO DE DUMPING ....................................................................................................... 16

3.1 TIPOS DE DUMPING ................................................................................................................ 18

3.2 O DUMPING NO COMÉRCIO INTERNACIONAL ............................................................... 19

3.2.1O surgimento da Organização Mundial do Comércio e sua função no Direito

Internacional. ....................................................................................................................................... 19

4 A PRÁTICA DO DUMPING NAS RELAÇÕES DE TRABALHO ....................................... 22

4.1 A MIGRAÇÃO DE EMPRESAS AOS PAÍSES SUBDESENVOLVIDOS .......................... 23

5 DOS DIREITOS SOCIAIS E SUA NECESSARIA APLICABILIDAD E ............................. 25

5.1 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO TRABALHADOR E SUA APLICAÇÃO NAS

RELAÇOES TRABALHISTAS .......................................................................................................... 27

5.2 A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO E A TERCEIRIZAÇÃO .................... 29

6 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL COM RELAÇÃO AO DANO SO CIAL ............. 33

6.1 A RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO SOCIAL .......................................................... 33

6.2 ENUNCIADO Nº 4 DA ANAMATRA – 1ª JORNADA DE DIREITO MATERIAL E

PROCESSUAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ............................................................................ 34

6.3 A CONDENAÇÃO À INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR – DIVERGENCIAS ..................... 36

6.3.1Entendimento de condenação a indenização suplementar – decisão ex ofício .............. 36

6.3.2 Entendimento de condenação a indenização suplementar – legitimidade das partes. 39

6.3.3 Entendimento condenação a indenização suplementar – a quem se destina. .............. 41

7 REFLEXÕES FINAIS ACERCA DO DUMPING SOCIAL ................................................... 43

8 CONCLUSÃO ............................................................................................................................. 44

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 46

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1 INTRODUÇÃO

Desde a era mais remota, o ser humano vive numa incessante busca pela

sobrevivência. Busca essa que poderá ser maior ou menor dependendo dos

recursos que possui, mas sempre pelo desejo e necessidade de uma vida mais

digna e que o leve a persistir com seus objetivos, mesmo que para isso, veja muitas

vezes sua saúde e intelecto comprometidos.

Em um mundo globalizado em que as inovações tecnológicas e as

oportunidades profissionais estão cada vez mais competitivas, o indivíduo se vê

obrigado a aprimorar seus conhecimentos para obter melhores condições de vida. E

é no trabalho que ele alcança sua satisfação e motivação para alcançar seus

objetivos.

Todavia o que acontece quando estes objetivos são frustrados e sua

perspectiva de um futuro digno desvanece?

A questão dos direitos dos trabalhadores, fulcrado no interesse maior, qual

seja, a dignidade da pessoa humana, princípio este constitucionalmente consagrado,

tem sido corrompido pelo interesse de uns poucos em detrimento da maioria. O que

se constata são trabalhadores insatisfeitos com seus empregadores, devido o fato

destes últimos não cumprirem com suas obrigações trabalhistas, gerando um ciclo

de inconformismo e indignação na classe trabalhadora.

Quando o empregador não cumpre com suas obrigações trabalhistas, uma

reação em cadeia se forma, começando pelo trabalhador e alcançando a sociedade

como um todo. Com efeito, depreende-se que não somente uma parte sofre com o

descumprimento das obrigações trabalhistas, mas todo um contingente de pessoas

será atingido por este fenômeno identificado como dano social causado pelo

dumping.

O dumping é um tema pouco discutido na sociedade, mas de extrema

relevância. Trata-se de uma prática abusiva que originariamente surgiu nas relações

comerciais, em que produtos são inseridos no mercado com preço inferior ou ínfimo,

visando desbancar a concorrência e atingir maiores lucros.

Procuraremos demonstrar nesse trabalho os diversos tipos de dumping.

Porém nosso foco maior será o dumping social, que dentre outros motivos que serão

elucidados, se evidencia quando o empregador deixa de pagar os direitos

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trabalhistas para incrementar seu negócio, com isso obtendo maior lucro e

vantagens frente aos concorrentes.

No primeiro capítulo, abordaremos o contexto histórico da prática do

dumping, com o início da globalização até seu atingimento e influência na esfera

trabalhista.

Já no segundo capítulo, conceituaremos o tema e faremos uma conexão do

dumping com relação ao direito internacional, bem como sua influência e seus

efeitos nas relações trabalhistas.

No último capítulo, ilustraremos o entendimento dos tribunais com relação à

prática do dumping social. Abordaremos as divergências no que tange às

indenizações suplementares, visto que como não há legislação específica, muitos

juízes e desembargadores, não reconhecem a indenização. Contudo existem juízes

que tem lançado mão de outros dispositivos legais que permitem a interpretação, no

sentido de condenar as empresas que praticam reiteradas vezes o dumping social

nas relações trabalhistas.

Essa divergência jurisprudencial será demonstrada em pontos específicos

em que serão tratados: a legitimidade para propor a ação, o valor da condenação,

sobretudo da indenização suplementar, e a possibilidade da condenação ex oficio.

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2 A GLOBALIZAÇÃO E SEUS EFEITOS NA ECONOMIA E NO DI REITO

COMERCIAL

A globalização é o fenômeno que constitui a integração dos países no

âmbito econômico, político e social na esfera mundial, possibilitando a abertura do

mercado internacional que proporcionou a expansão de novos negócios, sobretudo

nas áreas de tecnologia e transportes, possibilitando a comercialização de produtos

e prestação de serviços entre as comunidades. Sua origem é incerta. Muitos crêem

que seu início se deu nos séculos XV ou XVIII, quando da exploração dos países

europeus em terras desconhecidas. Com a chegada dos exploradores,

estabeleceram-se as relações comerciais e culturais, introduzindo no cenário

mundial uma nova perspectiva de desenvolvimento.

Há quem afirme que a globalização surgiu paralelamente com a Revolução

Industrial nos séculos XVIII e XIX. Contudo o termo globalização teve maior

repercussão entre as décadas de 80 e 90 do século XX, após a queda do

socialismo, na antiga União Soviética.

Com o advento da globalização no cenário mundial, mais especificamente

no segundo milênio, as mudanças em torno da política e economia foram

relativamente um marco na história dos povos em proporções globais. Houve a

eclosão de uma nova cultura no quadro das transformações do capitalismo liberal.

Os países desenvolvidos buscavam oportunidades de se estabelecer em

mercados onde não mais existia o socialismo, para ali criar uma nova possibilidade

de crescimento, posto que seus mercados internos estivessem saturados.

Com suas novidades tecnológicas, invadiam os mercados, levando o

progresso e o conhecimento para povos que até então desconheciam suas

inovações, como o advento da internet que viabilizou a integração rápida e eficaz.

Mas o trunfo da globalização se deu no processo produtivo, em que a

tecnologia avançada tornou o custo com a produção mais vantajoso, facilitando a

produção em massa, para baratear o produto e tornar mais rentável sua

comercialização.

Segundo Anthony Giddens, a globalização pode ser conceituada como a

“intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam comunidades

distantes, de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos

ocorrendo a muitas milhas e vice-versa”. (GIDDENS, 1991, p.69).

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Formada pelo neoliberalismo, privatizações, multinacionais, dentre outros

elementos que constituem esse instituto, a globalização provocou profundas

mudanças nas relações mundiais, causando uma nova tendência nas áreas da

tecnologia, telecomunicações e transportes, provocando a diminuição da distância

entre os países e facilitando a comunicação entre as nações.

Flavia Piovesan define a globalização como:

O processo de globalização econômica, inspirado na agenda do chamado “Consenso de Washington”, de 1991, passou a ser sinônimo das medidas econômicas neoliberais voltadas para a reforma e a estabilização das denominadas “economias emergentes”. Tem por plataforma o neoliberalismo, a redução das despesas públicas, a privatização, a flexibilização das relações de trabalho, a disciplina fiscal para a eliminação do déficit público, a reforma tributaria e a abertura do mercado ao comércio exterior. (PIOVESAN, 2002, p. 62).

Tem-se que a globalização é marcada pelo avanço tecnológico, econômico,

político, social e cultural, posto que procura harmonizar as relações entre países

desenvolvidos e emergentes ou em desenvolvimento.

Com o crescimento da indústria e a implantação do livre comércio, surge a

necessidade de ampliação e maior organização na infraestrutura das cidades,

modernizando os transportes para viabilizar as exportações e importações, e

consequentemente produzir um crescimento econômico significativo.

Com isso, o capital econômico circula numa amplitude mais rápida e

eficiente, tornando os mercados mais competitivos.

2.1. O IMPACTO DA GLOBALIZAÇÃO NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS

A despeito dos benefícios que advieram da globalização, surgiram também

aspectos negativos, sobretudo nas relações trabalhistas. Na ânsia de lucro imediato

e maior competitividade, as empresas passaram a burlar o sistema, ignorando

princípios adquiridos para fomentar seu empreendimento.

Conforme Vólia Bonfim Cassar:

O mercado de trabalho passou por uma profunda modificação em face da forte volatilidade do mercado, do aumento da competição, do estreitamento das margens de lucro, da necessidade de maior produção, da divisão internacional do trabalho e da subordinação dos países mais pobres aos mais ricos. (CASSAR, 2008, p. 24).

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A partir daí, estabelece-se uma divisão entre o poder do maior em

detrimento da necessidade do menor, formando certa hierarquia de poder e riqueza,

em que o mais rico detém o poder em detrimento do menos favorecido.

Aryon Sayão Romita ensina que:

A globalização é um processo irreversível que permite o deslocamento rápido, barato e maciço de mercadorias, serviços capitais e trabalhadores, podendo-se pensar no surgimento de um único mercado planetário de bens e trabalho. Sendo então, conceituada, como um conjunto de fatores que determinam a mudança dos padrões de produção, criando uma nova divisão internacional do trabalho. Já que a economia passa a se desenvolver numa escala mundial, tornando obsoleta a clássica noção de fronteira geográfica. (ROMITA, 1997, p. 28-29).

Nesse sentido, a globalização é produto do sistema capitalista que visa à

obtenção de lucro e acúmulo de riquezas, em que o empregador utiliza mão de obra

barata, viabilizando a competitividade no mercado para enriquecimento rápido e

assim, obtendo o que Marx denominava “mais valia”.

Dentre os efeitos decorrentes da globalização nas relações de trabalho,

Amauri Mascaro Nascimento destacou:

A migração de indústrias dos países desenvolvidos para os emergentes, a descentralização das atividades da empresa (terceirização) por meio de subcontratações e a informalização do trabalho. (NASCIMENTO, 2007, p. 59).

Em suma, as multinacionais se deslocam para os países subdesenvolvidos,

onde o custo da produção se torna mais acessível, e onde inexiste a proteção ao

trabalhador, possibilitando desta forma, o pagamento de salários ínfimos sem

nenhum benefício ou garantias para os operários, inclusive por meio de

subcontratações, ou seja, descentralizando as atividades da empresa, para se

esquivar das obrigações trabalhistas.

No tocante as terceirizações, insta destacar a precarização desse instituto.

Embora seja uma prática prevista na súmula 331 do TST, este instituto quando

utilizado de forma abusiva, segundo Vólia Bomfim Cassar:

Isto se explica porque a intermediação de mão-de-obra fere de morte os princípios da proteção ao empregado; da norma mais favorável; da condição mais benéfica; do tratamento isonômico dos trabalhadores que prestam serviço a uma empresa; do único enquadramento sindical; do único empregador; do mesmo enquadramento legal, etc. isso porque os empregados terceirizados possuem direitos inferiores e diversos dos empregados do tomador de serviços. (CASSAR, 2008, p. 495).

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Sem falar dos constantes acidentes de trabalho, muitas vezes levando o

trabalhador a óbito, nessas fábricas geridas pelas multinacionais, em que não são

garantidos os direitos mínimos dos trabalhadores.

Considerando esses flagrantes casos de desrespeito ao trabalhador, faz-se

necessária uma explanação maior acerca do tema, objeto do presente estudo, o

qual passaremos a abordar nessa sequencia.

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3 CONCEITO DE DUMPING

Mas o que vem a ser o dumping, sua terminologia e função nas relações

trabalhistas?

Dumping é uma palavra inglesa que deriva do termo “dump”, que significa

despejar, descarregar ou esvaziar. O dumping possui natureza predominantemente

comercial. Nas relações comerciais, o dumping é normalmente utilizado para inserir

(despejar, descarregar ou esvaziar) no mercado produtos abaixo do preço, com o

intuito de eliminar a concorrência e consequentemente obter maiores vantagens e

lucro. (SIGNIFICADOS, 2014).

Muitos doutrinadores aduzem que o dumping em si, não é uma prática

abusiva, visto que deverá ser adaptado em cada caso concreto.

Um desses doutrinadores é Welber Oliveira Barral, que afirma esta teoria.

Quanto à terminologia destaca que:

[...] o conceito de dumping é utilizado, por vezes, como implicando situações jurídico-econômicas distintas, não compatíveis com a definição normativa. Entretanto, três particularidades acompanham o conceito: a) o fato de estar sempre relacionado à idéia de prática desleal do comércio; b) não ter sido traduzido para qualquer idioma, sendo sempre utilizada o vocábulo em inglês; c) envolver uma conotação pejorativa, induzindo ao sentido de comportamento negativo ou condenável. (BARRAL, 2000, p.8).

O autor defende a tese encontrada no artigo VI, do GATT, o qual dispõe que

existem dois tipos de dumping: o condenável e o não condenável. O não condenável

se verifica da necessidade da empresa baixar seus preços para se estabelecer no

mercado interno, ou para efeitos de liquidação ou queima de estoque. Já o

condenável ou predatório é aquele que introduz no mercado importador preços

abaixo do praticado em seu mercado de origem, a fim de desbaratar os concorrentes

nacionais. A partir do instante em que o produtor estrangeiro conquista o mercado

interno, e se sobrepõe perante o prejudicado, majoraria seus preços para recuperar

os prejuízos e se firmar como monopolista. (BARRAL, 2000).

O surgimento do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) em 1º de

janeiro de 1948, no Brasil conhecido como Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e

Comércio, tratado que regulamentou as relações internacionais e vigorou até 1955

com a criação da OMC (Organização Mundial do Comércio), teve como escopo

“conduzir acordos multilaterais destinados a reduzir obstáculos ao intercambio

internacional e fomentar relações comerciais mutuamente vantajosas a todos os

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seus membros”, conforme bem explicitou Roberto Di Sena Junior. E acrescenta que,

“a disciplina do dumping pelo artigo VI do GATT 1947 tem a finalidade de evitar que

medidas antidumping sejam adotadas de forma tão discricionária que findem por

inviabilizar o livre comércio entre as nações.” (DI SENA JUNIOR, 2000).

Essa prática fulmina todo o desenvolvimento comercial, desde o

empreendedor prejudicado, a classe trabalhadora e a sociedade como um todo.

Nesse sentido, verifica-se que uma grande parte de pessoas será

prejudicada por esta prática abusiva, tanto os concorrentes, como os consumidores

e os trabalhadores, enfim toda uma comunidade.

Corroborando com tal assertiva, Fábio Ulhoa Coelho assim se posiciona:

No sistema capitalista, a liberdade de iniciativa e a de competição se relacionam com aspectos fundamentais da estrutura econômica. O direito, no contexto, deve coibir as infrações contra a ordem econômica, com vistas a garantir o funcionamento do livre mercado. Claro que, ao zelar pelas estruturas fundamentais do sistema econômico de liberdade de mercado, o direito de concorrência acaba refletindo não apenas sobre os interesses dos empresários vitimados pelas práticas lesivas à constituição econômica, como também sobre os consumidores, trabalhadores e, através da geração de riqueza e aumento dos tributos, os interesses da própria sociedade em geral. (COELHO, 2012, p.5).

A prática de dumping é considerada ilícita no âmbito comercial, haja vista

que indica concorrência desleal, quando a empresa introduz seus produtos com

preços abaixo do mercado ou até mesmo preços ínfimos, fazendo com que seus

lucros aumentem e consequentemente levando vantagem em detrimento dos

demais concorrentes.

Tal ilicitude econômica está tipificada no art. 36, § 3º, XV da Lei nº

12.529/2011 que diz:

Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: [...] § 3º As seguintes condutas, alem de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica: [...] XV – vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo; [...] (BRASIL, 2011).

O CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica – autarquia

federal vinculada ao Ministério da justiça, criada pela Lei 12.529/2011, que é

responsável por tutelar a livre concorrência do mercado, e no âmbito do Poder

Executivo, investigar e decidir em última instância questões relativas à proteção do

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comércio, já se pronunciou a respeito do dumping, no informativo numero 13 de

março de 2008:

A prática do dumping (venda no país importador a preço discriminatório, ou seja, inferior ao preço praticado no mercado doméstico do exportador) prejudica não somente o produtor doméstico, mas também exportadores de terceiros países, não envolvidos na prática desleal. (FURLAN, 2008).

Nesse mesmo sentido, Amauri Mascaro do Nascimento preleciona:

A figura do dumping caracteriza-se pela prática da concorrência desleal, podendo causar prejuízos de ordem patrimonial ou imaterial à coletividade como um todo. (NASCIMENTO, 2011).

Como se vê, a prática do dumping lesiona toda uma coletividade, ou seja, a

economia como um todo se desestabiliza, para que o individuo possa ser

privilegiado em detrimento do coletivo.

3.1 TIPOS DE DUMPING

Além do dumping comercial, ou seja, originariamente conceituado através

das relações comerciais, verifica-se a ocorrência do dumping em outras áreas, quais

sejam: a priori, vislumbram-se a prática do dumping ambiental e dumping social, mas

para Weber Oliveira Barral, existe também a prática do dumping cambial, que o

descreve da seguinte forma:

O “dumping cambial” se efetivaria a partir da manutenção artificial, pelos governos nacionais, de baixas taxas de cambio, reforçando a competitividade dos preços de exportação e tornando proibitivas as importações. (BARRAL, 2000, p. 14).

De modo geral, com baixas taxas de câmbio, o Estado lucraria com as

exportações, ao passo que não haveria campo para as importações, pois o lucro

seria praticamente zero. Cumpre ressaltar que o dumping cambial não foi objeto de

discussão da OMC.

Em um artigo publicado pelo site IG, o jornalista Nivaldo Souza, relatou que

o Ministro da Fazenda Guido Mantega, levantou a possibilidade da criação de um

mecanismo de dumping cambial, pois segundo o Ministro:

Bancos centrais de países desenvolvidos, incluindo o Japão e Estados Unidos, estariam desvalorizando suas moedas para pressionar a valorização em economia em desenvolvimentos, gerando uma maior abertura para a importação de objetos industrializados. “É preciso criar na OMC, um mecanismo de dumping cambial”. [...] (2012, apud SOUZA, 2012).

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Conforme se constata, o dumping causa efeitos nocivos em todas as áreas

da economia não importando a sua terminologia, mas sim o fim a que se destina.

Welber Barral também destaca o dumping ambiental, que se dá quando uma

empresa elege um determinado país que não possui uma legislação específica e

protetiva, ou possui uma legislação mais branda, normalmente indústrias poluentes,

para instalar suas atividades neste local, com o intuito de desonerar-se das

obrigações e exigências de proteção ao meio ambiente, com isso adquirir lucro.

(BARRAL, 2000).

Os países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos aceitam o ingresso de

tais empresas, devido à pobreza e falta de empregos, sem considerar os efeitos

danosos que acarretarão no meio ambiente.

Nesse sentido destaca Jorge Luiz Souto Maior:

Quanto ao dumping social, trata-se da prática abusiva de determinadas empresas, que fraudam a legislação trabalhista para incrementar sua atividade comercial, lesando não somente o trabalhador, como também os concorrentes que cumprem a legislação. (SOUTO MAIOR, 2012).

Conforme já demonstrado, o dumping não se limita a sua terminologia. O

que realmente importa são os danos causados por essa prática nociva.

Convém destacar que o dumping social, tema deste trabalho, será

amplamente esclarecido nos próximos tópicos.

3.2 O DUMPING NO COMÉRCIO INTERNACIONAL

3.2.1 O surgimento da Organização Mundial do Comércio e sua função no Direito

Internacional.

A partir da expansão do fenômeno da globalização, pós II Guerra Mundial,

iniciando na Europa e abrangendo os Estados Unidos, a economia se tornara

capitalista e internacionalizada, fazendo com que surgisse troca de bens e serviços

pelos países nas regiões fronteiriças. Até então não havia leis escritas que

regulamentassem as operações comerciais entre esses países. As atividades

comerciais eram regidas pelos costumes.

Nesse sentido, destaca Jete Jane Fiorati:

Tradicionalmente o Direito Econômico, considerado um ramo do Direito Publico disciplina a chamada “intervenção do Estado em matéria econômica”, seja ela de caráter regulatório ou diretamente realizada na

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esfera produtiva. No cenário internacional, contrariamente ao liberalismo econômico presenciado no século XIX, o mundo viveu uma fase de mudança com o surgimento do intervencionismo após a 2ª Guerra Mundial, ou seja, época em que os Estados atuavam diretamente no cenário econômico e criavam regras protecionistas que prejudicavam o comercio internacional. Para evitar muitas disputas foi necessário criar uma ordem jurídico-economica internacional que zelasse por um equilíbrio entre o liberalismo econômico das empresas e o intervencionismo estatal na esfera produtiva, visando diminuir as conseqüências danosas ao comercio global. (FIORATI, 2006, p. 51-52).

Surge então a OMC – Organização Mundial do Comércio (1995), oriunda do

GATT – General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral sobre Tarifas e

Comércio), organização multilateral que estabelece normas para gerir o comercio

internacional. Criada em 1994 na Rodada Uruguai, a OMC é o órgão responsável

pelas medidas restritivas que controlam e fiscalizam relações comerciais

internacionais. Segundo Sebastião Jose Roque, Mestre e Doutor da USP:

A OMC é, porém, um código de normas e, às vezes, um foro em que os países podem discutir e resolver seus problemas comerciais e negociar com o objetivo de ampliar as oportunidades de comércio no mundo. O fato de ter crescido o volume do comércio internacional, até multiplicar-se por dez, desde o fim da última guerra mundial, constitui demonstração de êxito da OMC em sua dupla função. (ROQUE, 2014).

Uma das regras basilares da OMC são as medidas antidumping. No código

antidumping elaborado em 1967, e regulamentado no Brasil através do Decreto

93.941/1987, em seu art. 2º inc. I traz a descrição sobre a existência do dumping nas

relações comerciais com a seguinte redação:

Para os fins deste Código, um produto é objeto de dumping, isto é, introduzido no mercado de outro país a preço inferior aos seu valor normal, se o preço de exportação do produto, quando exportado de um país para outro, for inferior ao preço comparável, praticado no curso de operações comerciais normais, de um produto similar destinado ao consumo no país exterior. (BRASIL, 1987).

Vale ressaltar que o dumping, quando possui caráter manifestamente

predatório, se mostra uma prática lesiva. Prova disso que há tempos tem trazido

preocupação no cenário internacional, ao ponto de serem criadas normas

regulamentadoras para inibir sua realização.

Entretanto, conforme já explicitado anteriormente, nem todo o tipo de

dumping se configura lesivo.

Segundo Jete Jane Fiorati, existem regras estipuladas pela OMC, que

disciplinam a forma como cada Estado deve agir quando da identificação da prática

do dumping. Ou seja, o próprio órgão estabelece essa diferenciação. Exemplo disso

é quando uma regra prevê a possibilidade de uma determinada empresa que

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comete o dumping, se defender em juízo. E mais, há regras que aplicam sanção aos

Estados que fixarem medidas antidumping irregularmente. (FIORATI, 2004).

Em verdade, esse regramento traz certa proteção jurídica, no sentido de

fiscalizar e organizar as relações comerciais, para que práticas lesivas como as do

dumping sejam punidas, bem como evitar que o rigor da norma impeça a liberdade

de comércio.

Feitas essas considerações, abre-se ensejo para a prática do dumping social

nas relações de trabalho, conforme exposto em tópicos anteriores, prática esta que

lesiona desde o trabalhador até a sociedade em geral, desrespeitando direitos

fundamentais instituídos em nossa Constituição Federal.

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4 A PRÁTICA DO DUMPING NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

Conforme destacado acima, existem modalidades de dumping, tais como: o

dumping comercial, mais explícito devido a sua natureza originária; o dumping

cambial; o dumping ambiental e a partir deste ponto inicia-se a explanação do tema,

objeto deste trabalho.

O dumping pode ser identificado também nas relações de trabalho, quando o

empregador comete fraude na legislação trabalhista, ou seja, deixa de cumprir com

suas obrigações para com o empregado, tendo em vista o lucro da produção.

Em decorrência dessa prática abusiva, valores sociais e econômicos são

prejudicados, posto que o trabalhador se torna um mero objeto de obtenção de

vantagens, enquanto que o empregador percebe todos os lucros do negócio. Surge

então a expressão dumping social.

Amauri Mascaro do Nascimento explica que:

No campo laboral, o dumping social caracteriza-se pela ocorrência de transgressão deliberada, consciente e reiterada dos direitos sociais dos trabalhadores, provocando danos não só aos interesses individuais, como também aos interesses metaindividuais, isto é, aqueles pertencentes a toda a sociedade, pois tais práticas visam favorecer as empresas que delas lançam mão, em acintoso desrespeito à ordem jurídica trabalhista, afrontando os princípios da livre concorrência e da busca do pleno emprego, em detrimento das empresas cumpridoras da lei. (NASCIMENTO, 2011).

Os reflexos disso são constatados na economia como um todo. A empresa

que pratica o dumping social é vista como fraudadora dos direitos dos trabalhadores,

bem como da dignidade humana do trabalhador, princípio constitucional. Uma vez

lesando os direitos do trabalhador, reduz o custo de preços e serviços, prejudicando

outros empregadores que cumprem seus deveres trabalhistas e que ao final acabam

sofrendo perdas decorrentes dessa prática desleal. Segundo Jorge Luiz Souto

Maior:

Constituem uma minoria dentre os empregadores e, por isso mesmo, perpetram uma concorrência desleal que não prejudica apenas aos trabalhadores que contratam, mas também as empresas com as quais concorrem no mercado. Alem disso, passam a funcionar como indesejável paradigma de impunidade, influenciando negativamente todos aqueles que respeitam ou pretendem respeitar a legislação trabalhista. (SOUTO MAIOR, 2012, p. 9).

Não obstante não ser muito raro verificar que determinadas empresas são

demandadas todos os dias nas varas trabalhistas, e sempre pelos mesmos motivos,

ou seja, por reiteradas vezes, Jorge Luiz Souto Maior acrescenta que:

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A Justiça do Trabalho é pródiga em manter “clientes especiais”, que estão praticamente todos os dias nas salas de audiências, representadas por “prepostos oficiais”, contratados para a exclusiva tarefa de “montar” e acompanhar processos trabalhistas. São empresas que optam pelo não pagamento de horas extras, pelo pagamento de salário “por fora”, pela contratação de trabalhadores sem reconhecimento de vinculo de emprego ou mesmo por tolerar e incentivar condutas de flagrante assédio moral no ambiente de trabalho. (SOUTO MAIOR, 2012, p. 9).

Com vistas ao lucro fácil e rápido, as empresas que praticam o dumping

social burlam as legislações trabalhistas, eliminando assim os direitos fundamentais

do trabalhador.

Os pagamentos com mão de obra do trabalhador sem dúvida encarecem os

custos finais de produção, sendo esta a razão de muitos empregadores imporem

suas próprias normas em detrimento da hipossuficiência do empregado.

Devido a essa supressão dos direitos do empregado, o preço final do

produto se torna indubitavelmente mais atrativo do que o preço praticado pelas

empresas que respeitam as normas trabalhistas, ocorrendo então à concorrência

desleal, ou seja, o dumping social.

Um dos motivos ensejadores a prática do dumping social é a lentidão e

morosidade do judiciário, bem como a possibilidade de interposição de inúmeros

recursos, além da impunidade que encoraja certos empregadores a suprimir os

direitos trabalhistas, visto que é uma forma de obtenção de lucro rápido se

comparado à demora para que uma demanda processual seja concluída.

4.1 A MIGRAÇÃO DE EMPRESAS AOS PAÍSES SUBDESENVOLVIDOS

Outra forma de dumping social se caracteriza quando, uma empresa procura

instalar suas atividades em países onde seja precária, ou mesmo, inexista uma

legislação de proteção aos direitos trabalhistas, utilizando da mão de obra barata

para intensificar o valor dos produtos visando à concorrência desleal.

Isso acontece muito em países subdesenvolvidos e (ou) em

desenvolvimento, onde as pessoas são carentes de subsídios para o próprio

sustento e de sua família. No afã de adquirir tais subsídios, o indivíduo se submete a

trabalhos exaustivos, sem condições mínimas de segurança de trabalho, e sem a

devida remuneração, muitas vezes em condições análogas a de escravo, dando ao

empregador o lucro almejado e a alta competitividade no mercado.

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Esse foi um dos efeitos da globalização. Através da internacionalização da

economia, as grandes multinacionais transferem suas atividades a países que não

possuem condições mínimas financeiras nem instrução necessária, fazendo com

que tais empresas explorem a mão de obra operária, visto que se torna um mercado

atrativo para que as empresas lá se instalem.

Em janeiro deste ano a jornalista Eleonora de Lucena publicou um artigo

pela Folha de São Paulo, em que casos de evidente desrespeito a dignidade da

pessoa humana foram identificados. Os casos mais alarmantes foram vistos na

China, onde produtos eletrônicos de uma multinacional de grande importância no

ramo tecnológico são fabricados a mercê de jornadas exaustivas de trabalho,

envolvendo crianças, sem nenhuma segurança de trabalho, expostas a todo o tipo

de periculosidade, poluição e falta de higiene. A jornalista relata ainda, que no Brasil

houve o caso de uma importante rede da indústria têxtil, que ao contrário, contratava

bolivianos para trabalharem em sua confecção em condições análogas a de

escravo, com ambientes sem nenhuma ventilação ou iluminação natural, com o

compartilhamento de banheiros e objetos de uso pessoal desprovidos de condições

mínimas de higiene, acomodações coletivas onde crianças dormiam em colchões no

chão, e muitas delas dormiam sem os colchões. Situações estas que denotam

flagrante prática do dumping social no trabalho. (LUCENA, 2014).

Tais flagrantes demonstram a fragilidade dos governos e dos órgãos

fiscalizadores que não se empenham, ou muitas vezes, não se interessam pelos

problemas sociais que envolvem as comunidades.

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5 DOS DIREITOS SOCIAIS E SUA NECESSARIA APLICABILID ADE

Em suma, o dumping social se caracteriza pelas agressões constantes aos

direitos do trabalhador, quando não observados direitos mínimos através da

obtenção desenfreada de lucro.

Uma das críticas mais veementes dos doutrinadores com relação ao

dumping social, é que devido ao sistema capitalista vigente em todo o globo

terrestre, o próprio Estado é responsável pelo incentivo indireto as práticas de

dumping social.

Jorge Luiz Souto Maior, um dos principais combatentes das práticas do

dumping social, argumenta que:

Em muitas situações, assiste-se a participação do próprio Estado nesta exploração, utilizando-se de táticas de redução de custo: Contratação de pessoas sem concurso público, utilização da “terceirização” para prestação de serviços e licitações pelo menor custo para construção de obras. Com resultado, o Estado reduz seu custo, as empresas ganhadoras das licitações adquirem seus ganhos e os trabalhadores executam os seus serviços, mas não recebem, integralmente, seus direitos. As pontes, as ruas, as estradas, os túneis, são construídos a custas do sacrifício dos Direitos Sociais. (SOUTO MAIOR, 2012, p. 23).

Em que consistem esses “direitos sociais” mencionados por Souto Maior?

Dados históricos afirmam que após a 2ª Guerra Mundial, o mundo se

transformou em uma desolação total devido aos horrores desse trágico episodio.

Fez-se necessária a intervenção dos Estados para a elaboração de um novo

instituto que projetasse em níveis globais uma homogeneização nos direitos da

sociedade.

Nesse sentido é o entendimento de Pedro Lenza:

Assim, os direitos sociais, direitos de segunda dimensão, apresentam-se como prestações positivas a serem implementadas pelo Estado (Social de Direito) e tendem a concretizar a perspectiva de uma isonomia substancial e social na busca de melhores condições de vida, estando, ainda, consagrados como fundamentos da Republica Federativa do Brasil (art. 1º, IV, da CF/88). (LENZA, 2010).

Por se tratarem de direitos fundamentais indisponíveis, é que não podem ser

objeto de ofensa aos direitos ali constituídos, como se opera nos casos de dumping

social em que são praticadas condutas ilícitas, lesando o patrimônio e a dignidade

do trabalhador.

Alexandre de Moraes, afirma que:

Sociais são os direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado

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Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida dos hipossuficientes, visando a concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal. (MORAES, 2012, p. 202).

No ordenamento jurídico brasileiro, a primeira constituição a tratar dos

direitos sociais foi a de 1934, mas foi a de 1988, que abarcou uma extensão maior a

respeito do tema. A partir do art. 6º até o art. 11º, a Constituição prevê sobre os

direitos sociais dos trabalhadores.

No artigo 6º está contido o objetivo principal dos direitos sociais, conforme

se vê:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção a maternidade e a infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988).

No entendimento de Mauricio Godinho Delgado, os direitos sociais têm em

sua essência normas de indisponibilidade absoluta e relativa, ou seja, as normas de

indisponibilidade absoluta são de interesse público, que estabelecem um padrão

mínimo de dignidade do trabalhador. Não podendo, portanto ser violados para o

objetivo escuso do empregador. Já as normas de indisponibilidade relativa, não

possuem caráter de essencialidade, portanto, podem ser flexibilizadas de acordo

com as necessidades econômicas e políticas da sociedade. (DELGADO, 2012).

Esse é o mesmo entendimento de Jorge Luiz Souto Maior:

Não é por razão diversa que a Constituição de 1988 inicia seus artigos estabelecendo os fundamentos da República e, dentre eles, faz constar “os valores sociais de trabalho” e da livre iniciativa. [...] Os valores do trabalho são sociais na ordem constitucional vigente porque não interessam apenas a quem trabalha, importando a toda a sociedade, que se pretende saudável e justa. (SOUTO MAIOR, 2012, p. 21).

Nesse diapasão, o artigo 170 da Constituição Federal previu a livre

concorrência, um dos princípios da atividade econômica:

A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observando os seguintes princípios: [...] (BRASIL, 1988).

Não menos importante é o entendimento de José Afonso da Silva que

conceitua os direitos sociais como “normas constitucionais, que possibilitem

melhores condições de vida aos mais fracos.” E acrescenta que:

As normas que os definem, com eficácia imediata ou não, importam em obrigações estatais no sentido de proporcionar aos trabalhadores os direitos

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assegurados e programados. Toda atuação em outro sentido infringe-as. (SILVA, 2002, p. 285).

Saliente-se que os direitos sociais, sobretudo os direitos dos trabalhadores

que propulsionam a máquina econômica do país, são direitos constitucionais

invioláveis, e, portanto não podem ser mitigados para enriquecimento ilícito

decorrente dos abusos cometidos por parte do empregador.

5.1 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO TRABALHADOR E SUA APLICAÇÃO

NAS RELAÇOES TRABALHISTAS

Os direitos fundamentais estão previstos na Constituição brasileira a partir

do Título II, como forma de se estabelecer um limite a ser respeitado e cumprido

pelo homem e instituído pelo poder de soberania do Estado. Insta ressaltar que os

direitos fundamentais já estavam previstos desde a Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão (1789) em seu art. 16, tendo em vista a necessidade de

regular as relações trabalhistas, objetivando a harmonia entre os elementos dessas

relações.

Os direitos fundamentais são dotados de peculiaridades objetivas e

subjetivas, ou seja, transcendem a esfera constitucional formal para que produzam

efeitos materiais no ordenamento jurídico positivista. Assim, entende Ingo Wolfgang

Sarlet:

[...] aqueles que por seu conteúdo e importância (fundamentalidade material), integradas ao texto da Constituição e, portanto, retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos (fundamentalidade formal), bem como, as que pelo seu objeto e significado possam lhes ser equiparadas, tendo ou não assento na constituição formal. (SARLET, 2011).

Nessa esteira, José Joaquim Gomes Canotilho descreve os direitos

fundamentais como “direitos institucionalmente garantidos em uma ordem jurídica

concreta, logo, limitados pelo espaço e pelo tempo.” (CANOTILHO, 2003, p. 393).

Necessários ao desenvolvimento econômico, os direitos fundamentais são

estabelecidos para garantir condições de igualdade, convivência digna e liberdade

para todas as pessoas, bem como garantir meios para uma sociedade livre, justa e

solidária.

Segundo Jose Afonso da Silva, os direitos fundamentais referem-se a

“princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de

cada ordenamento jurídico”, e arremata seu raciocínio, aduzindo que, “no

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qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas

sem as quais a pessoa humana não realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo

sobrevive.” (SILVA, 2003, p.178).

Para que haja harmonia e a boa convivência entre as pessoas, faz-se

necessário estabelecer critérios de proteção às mudanças no campo econômico,

financeiro, político e cultural do Estado.

Os direitos fundamentais possuem as seguintes características, segundo

Pedro Lenza:

• Historicidade: surge com as revoluções, e evoluem com o tempo dependendo das mudanças que ocorrem no cenário mundial

• Inalienabilidade: não são negociáveis por não possuírem conteúdo econômico-patrimonial. São direitos conferidos (erga omnes), leia-se, para todos e, portanto indisponíveis.

• Irrenunciabilidade: não podem ser renunciados, apenas pode ocorrer o seu não exercício.

• Imprescritibilidade: seu exercício é de cunho personalíssimo, e não patrimonial, portanto não ocorre a sua prescrição.

• Universalidade: Destinam-se de maneira indiscriminada a todos os seres humanos. • Limitabilidade: Os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), quando

aplicado ao caso concreto pode haver conflito de interesses. • Concorrência: Podem ser exercidos cumulativamente. (LENZA, 2010)

O artigo 6º da Constituição Federal compõe o trabalho como um direito

social fundamental e no artigo 170 do mesmo diploma legal, a valorização do

trabalho é fundamento da ordem econômica. (BRASIL, 1988).

Nas relações trabalhistas, justifica-se a necessidade de adequação de suas

normas, visto que a globalização, enquanto necessária ao desenvolvimento

econômico e social, tende a violar os direitos fundamentais do trabalhador.

Conforme já demonstrado no tópico 2 deste trabalho, a globalização trouxe

para o mundo benefícios que geraram o progresso. Contudo, em contrapartida,

instigou a busca desenfreada pelo lucro e pela livre concorrência, que fez com que o

empregador reduzisse os custos de produção com a mão de obra, mitigando e até

mesmo excluindo direitos fundamentais do trabalhador, fatores que determinaram as

práticas do dumping social.

Dentro do contexto de direitos fundamentais, há que se considerar um dos

princípios basilares da nossa Constituição Federal, qual seja: a dignidade da pessoa

humana. Em seu artigo 1º inciso III, a Constituição de 1988, destaca a dignidade da

pessoa humana como fundamento ao Estado Democrático de Direito. (BRASIL,

1988).

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Por Estado Democrático de Direito, entende-se ser um Estado livre com

dignidade e valorização à pessoa humana. Não cabe, portanto, em um Estado

Democrático de Direito, práticas que incitem a violação de direitos e garantias ao

trabalhador. Para Ingo Wolfgang Sarlet, “a dignidade reclama a atuação estatal

positiva que não se efetiva se os direitos sociais são desconsiderados.” (SARLET,

2002, p. 333).

Quando o empregador reduz os custos de produção de mão de obra, pelo

não pagamento dos direitos do trabalhador, como, horas extras, folgas

remuneradas, jornadas de trabalho ininterruptas, férias, entre outros, ele fere

direitos, que em tese deveriam ser invioláveis para garantir o verdadeiro Estado

Democrático de Direito.

Tais direitos, conforme exposto anteriormente, não podem ser mitigados,

posto que indisponíveis, inalienáveis, irrenunciáveis e imprescritíveis. Contudo,

existe a possibilidade de se flexibilizar as normas trabalhistas, conforme veremos a

seguir.

5.2 A FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO E A TERCEIRIZAÇÃO

Diante da migração de empresas para locais onde a mão de obra é farta e

legislação trabalhista precária e a descentralização das atividades da empresa

(terceirização) - atrativos ensejadores para a prática do dumping social - alguns

países buscaram meios de garantir a permanência de tais empresas, através da

flexibilização das normas trabalhistas.

Uma prática que tem sido muito comum em diversos ramos trabalhistas é a

subcontratação de empregados, ou a terceirização, que não encontra amparo na

legislação brasileira quando se destina a atividades finalísticas de um

empreendimento.

A terceirização se identifica quando uma empresa (tomadora de serviços)

contrata por interposta pessoa (prestadora de serviços), empregados para

trabalharem em suas dependências, porém, sem que haja uma relação de trabalho

direta, posto que esta se identifique na relação prestador de serviços x trabalhador.

Ou seja, o contrato de trabalho em tese, deve ser firmado entre a prestadora de

serviços e o empregado, quando a atividade da tomadora de serviços, não tiver

como conseqüência atividade fim, e sim meio.

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Para alguns empregadores (tomadores de serviços), essa prática viabiliza o

negócio, visto que não há o contrato de trabalho firmado com o empregado, logo,

não há que se configurar relação trabalhista, exonerando-os de futuras demandas

judiciais.

Ocorre que em muitos casos o que se constata são relações que

aparentemente deveriam ser tidas como terceirizadas, entretanto, na prática não

funciona dessa forma. Os empregados terceirizados são verdadeiros empregados

efetivos da tomadora, camuflados por contratos simulados com cooperativas,

associações ou empresas oportunistas, que recebem menos e possuem menos

segurança no trabalho.

Arnaldo Sussekind, afirma que:

Ainda que os contratos previstos no Código Civil hajam sido celebrados para tarefas estranhas as atividades normais da empresa contratante, caberá verificar-se, em cada caso, se os empregados da firma contratada trabalham, de fato, subordinados ao poder de comando da referida empresa. Em caso afirmativo, haverá nítida simulação em fraude a lei trabalhista (art. 9º da CLT), configurando-se o contrato realidade de trabalho entre a empresa contratante e os trabalhadores formalmente vinculados a firma contratada (art. 442, combinado com os arts. 2º e 3º da CLT). (SUSSEKIND, 2003).

A saída neste caso deveria ser a redução na carga tributária como forma de

incentivar o empregador a investir no negócio, sem que este viesse a lesar o

patrimônio do trabalhador que é a parte hipossuficiente da relação, retirando deste

um mínimo existencial de vida digna.

Entretanto, a solução para que condutas como estas não mais ferissem o

ordenamento jurídico, foi a chamada flexibilização das normas trabalhistas.

No Brasil, houve elaboração do artigo 7º da Constituição Federal em seus

incisos VI, XIII e XIV, que estabeleceu normas de indisponibilidade relativa, ou seja,

normas que não possuem caráter de essencialidade, tais como: a redução do salário

através de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, compensação ou

redução na carga horária de trabalho mediante convenção ou acordo coletivo e

aumento da jornada de trabalho nos turnos ininterruptos e de revezamento para

mais de 6 horas diárias, também através de negociação coletiva.

Conforme bem destacado por Vólia Cassar:

A flexibilização é possível e necessária, desde que as normas por ela estabelecidas, através da convenção ou acordo coletivo, como previsto na Constituição, ou na forma que a lei determinar, sejam analisadas sob duplo aspecto: respeito à dignidade do ser humano que trabalha para a manutenção do emprego e redução de direitos apenas em casos de

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comprovada necessidade econômica, quando destinada a sobrevivência da empresa. (CASSAR, 2008, p. 45).

Considerando que a rigidez das normas trabalhistas, tende a provocar o

aumento no custo da produção, alguns doutrinadores entendem que medidas

secundarias poderiam ser estabelecidas para moldar o direito à economia. Sergio

Pinto Martins, entende que não há que falar em flexibilização do Direito do Trabalho,

mas sim flexibilização das condições de trabalho, que permitam se adequar a

situações em que possa beneficiar um grupo maior de pessoas, ou seja, a

coletividade ou sociedade com relação ao trabalho. Em suas palavras:

Prefiro dizer que a flexibilização das condições de trabalho, é o conjunto de regras que tem por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica, política e social existentes na relação entre capital e trabalho. (MARTINS, 2002).

Para Amauri Mascaro do Nascimento, a flexibilização do direito do trabalho

“é o afastamento da rigidez de algumas leis para permitir, diante de situações que o

exijam, maior dispositividade das partes para alterar ou reduzir os seus comandos.”

(NASCIMENTO, 2003, p. 67).

Contudo, frise-se que tal medida só poderá ser estabelecida observando

padrões mínimos que garantam a dignidade da pessoa humana. Em outras

palavras, esse instituto deve ser cuidadosamente fiscalizado pelos Sindicatos e

Justiça do Trabalho, para que não haja abusos por parte do empregador, que

utilizando desse recurso para diminuir custos, viole os direitos sociais estabelecidos

constitucionalmente.

Nesse sentido aduz Eneida Melo Correio de Araújo:

Podemos, assim, afirmar que o aspecto da globalização, que enseja a flexibilização do Direito do Trabalho, não pode ser conciliado com a quebra dos direitos sociais, com o afastamento dos princípios construtores desse ramo e o desprezo ao conjunto de prescrições jurídicas de natureza protetora contidas no sistema. (ARAUJO, 2003).

Ressalte-se que a flexibilização das normas trabalhistas devem ser

encaradas como medida de incentivo a permanência das empresas no país, para

fortalecimento da economia e geração de mais empregos. Destarte não se deve

confundir com o desrespeito a legislação trabalhista, pelo contrario, foi uma forma

que o legislador encontrou de evitar a prática do dumping social.

Isto posto já se observam no ordenamento jurídico, a posição da justiça do

trabalho com relação ao dumping social e as conseqüentes punições às empresas

que praticam tal conduta. Considere-se, contudo, que os entendimentos são

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diversos, porquanto não está pacificado, ou melhor, está longe de se pacificar o

entendimento dos magistrados, devido à ausência de dispositivo legal que oriente e

discipline as práticas abusivas do dumping social. É o que se verá no próximo

tópico.

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6 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL COM RELAÇÃO AO DANO SOCIAL

6.1 A RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO SOCIAL

O dano social é espécie de dano relativamente novo na esfera jurídica em

comparação com o dano moral que há tempos tem repercutido no cenário mundial.

Tal instituto é constatado quando as empresas praticam condutas

reprováveis no âmbito da sociedade, nas searas ambiental, consumeirista e

trabalhista.

Há vários posicionamentos com relação à legitimidade das partes para

pleitear uma demanda com vistas à condenação pelo dumping social. Conforme

pontuam alguns juízes e doutrinadores, não há que falar em direitos individuais, pois

o dano social abarca a coletividade. Dentre esses doutrinadores, destaca-se o

posicionamento de Antonio Junqueira de Azevedo:

[...] os danos sociais, por sua vez, são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida. (AZEVEDO, 2009).

Nesse sentido, a legitimidade para postular em uma demanda não cabe ao

indivíduo, visto que muitos juízes entendem que o dano social atinge a toda a

sociedade. Entendimento de Jorge Luiz Souto Maior no RO de nº 0049300-51-

2009-5-15-0137- TRT 15ª Região:

Diante do dano social identificado, condeno a reclamada a pagar multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais), revertida conforme manifestação dos demais membros da Turma, ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), nos termos da Lei n. 7.347/85. (BRASIL, TRT 15ª Região, 2012).

E acrescenta que, por esse motivo as indenizações são direcionadas a

entidades como: o fundo de proteção ao consumidor, criado pela Lei 7.347/1985,

e previsto no art. 100, § único do CDC; FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador),

instituições de caridade, hospitais entre outros a critério do juiz, conforme o §

único do art. 883 do CC/2002. Porém, há controvérsias que serão melhor

explanadas no capítulo seguinte. (BRASIL, TRT 15ª Região, 2012).

O dano social encontra correspondência na previsão dos arts. 186 e 187 do

Código Civil de 2002.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntaria, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. (BRASIL, 2002).

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O judiciário já tem se posicionado pela condenação por dano social. É o

caso relatado pela Folha de São Paulo em fevereiro deste ano. Segundo a Folha,

uma consumidora pleiteou a condenação de um banco pela cobrança indevida de

valores relativos a um cartão de crédito que ela nem sequer pediu. O juiz

condenou o banco por dano à cliente e à sociedade. A sentença foi proferida pelo

juiz Reinaldo Dutra do Estado de Goiás, que dentre outros argumentos arguiu que

“a atitude omissiva acarreta prejuízos à sociedade, visto que o judiciário é utilizado

como balcão de reclamações. Casos importantes recebem prestação atrasada,

visto que a força de trabalho estará concentrada em resolução desses conflitos. O

dano social é evidente.” O processo ainda pende de recursos, mas se o STJ for

favorável à sentença de 1º grau, as indenizações por dano social serão

viabilizadas através da jurisprudência. (COUTINHO, 2014).

Jorge Luiz Souto Maior, já havia se manifestado nesse sentido:

O desrespeito deliberado e inescusável da ordem jurídica trabalhista, portanto, representa inegável dano a sociedade, inclusive no que tange aos custos públicos para a manutenção do Judiciário Trabalhista que se vê obrigado a decidir dezenas e até centenas de vezes sobre as mesmas violações sobre as mesmas empresas. (SOUTO MAIOR, 2012, p. 23).

Com efeito, o empregador que comete infrações reincidentes a ponto de

ser demandado várias vezes pelos mesmos motivos, e se ficar demonstrado ser

uma atitude premeditada com intenção de desrespeito a ordem jurídica, configura-

se dano social, e, portanto, passível de condenação a indenização suplementar,

inclusive ex officio. (SOUTO MAIOR, 2012).

6.2 ENUNCIADO Nº 4 DA ANAMATRA – 1ª JORNADA DE DIREITO MATERIAL

E PROCESSUAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO.

Paira uma preocupação crescente entre os juízes e profissionais do Direito

do Trabalho com relação à proteção aos direitos sociais dos trabalhadores, visando

a estabelecer formas de coibir a prática do dumping social, mas que não encontram

previsão em lei.

Com o advento da globalização, o avanço da tecnologia e a implantação de

novos modelos de produção, provocaram intensas mudanças nas relações de

trabalho. Contudo, não foram feitas as devidas mudanças necessárias na principal

lei que vige em nosso ordenamento jurídico no âmbito trabalhista que é a CLT

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(Consolidação das Leis do Trabalho). Criada em 1943, que em nada se compara ao

avanço ocorrido nestes 70 anos de sua criação.

Partindo desse pressuposto, alguns juízes têm lançado mão dessas

previsões com o intuito de proteger a sociedade das práticas abusivas e reiteradas

do dumping social.

Em 2007 acontecia a 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça

do Trabalho, evento ocorrido no TST, que estabeleceu novos paradigmas para

tentar dirimir as controvérsias no âmbito trabalhista, e que deu origem ao Enunciado

nº 4 da ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho),

utilizado atualmente como um dos principais dispositivos para fundamento na

condenação a indenização suplementar pela prática do dumping social, que dispõe:

As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano a sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido “dumping social”, motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano a sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, alias, já previam os artigos 652, “d”, e 832, § 1º da CLT.

Conforme demonstrado no Enunciado nº 4 da ANAMATRA, faz-se

necessário uma reação do judiciário trabalhista, com vistas à proteção dos direitos

do trabalhador, no que concerne o dumping social. E mais, abre-se a possibilidade

da condenação de ofício, ou seja, sem pedido da parte, pois o que os magistrados

entendem é que o dano social causado pelo dumping atinge não somente quem

pleiteou a demanda, mas também aos empregadores concorrentes que respeitam as

leis trabalhistas, bem como a sociedade.

Como fundamento para essa decisão ex ofício, os adeptos dessa teoria

utilizam as seguintes previsões legais disponíveis na CLT:

Art. 8º. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais do direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. Art. 652. Compete as Juntas de Conciliação e Julgamento: [...] d) impor multas e demais penalidades relativas aos atos de sua competência.

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Art. 765. Os juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligencia necessária ao esclarecimento delas. (BRASIL, 1943).

Nessa toada, muitos doutrinadores e juristas vêm aplicando uma

“interpretação sistemática” do contido na legislação para embasar suas decisões à

condenação a indenização suplementar pelo dano social advindo do dumping, para

que condutas ilícitas como estas sejam desestimuladas, e para compensar o

beneficio econômico atingido. Muito embora boa parte das decisões tenha sido

reformada pelos Tribunais Superiores.

Essa interpretação sistemática é defendida por Jorge Luiz Souto Maior que

defende que, mesmo diante da ausência de disposição legal, o operador do direito

deve realizar uma análise sistemática de outros mecanismos disponíveis no sistema

jurídico brasileiro, como forma de embasamento positivo de suas decisões. (SOUTO

MAIOR, 2012).

Nesse diapasão, abre-se ensejo para uma nova modalidade de

indenização nas lides processuais, sobretudo nas trabalhistas, que será vista a

seguir.

6.3 A CONDENAÇÃO À INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR – DIVERGENCIAS

Tendo em vista o disposto no Enunciado nº 4 da ANAMATRA, o dumping

social se configura como agressão reincidente aos direitos mínimos do trabalhador

com o intuito de persecução de lucro e vantagem indevida. Ao proferir uma sentença

condenatória com relação ao dumping social, o juiz deve aplicar uma sanção como

forma de inibir tal prática e ressarcir a sociedade o valor correspondente ao dano

sofrido. Nesse viés, a indenização suplementar torna-se uma sanção imposta às

empresas que por reiteradas vezes são demandadas na Justiça do Trabalho, pelos

mesmos motivos, configurando o dano a sociedade.

6.3.1 Entendimento de condenação a indenização suplementar – decisão ex ofício

A condenação ao dumping social entende-se como um tipo de punição às

condutas reiteradas das empresas que constantemente vêm lesando a sociedade.

Essa corrente é defendida por alguns juristas que têm entendido que não há que

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falar em pedido extra petita, porquanto a punição se configura às condutas

reiteradas e não ocasionais. Portanto, não será necessário o pedido expresso da

parte. (SOUTO MAIOR, 2012).

Nesse sentido, a juíza Ana Júlia Fazenda Nunes, da 4ª Vara do Trabalho de

Caxias do sul, prolatou a seguinte decisão:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO POR DANO SOCIAL COLETIVO. Restando comprovada a ocorrência reiterada de acidentes do trabalho nas dependências da reclamada, em virtude da insegurança do meio ambiente de trabalho, não há óbice para que o juízo imponha penalidade sobre a empresa demandada, ainda que não haja pedido especifico, em virtude de seu compromisso ético com a proteção da dignidade da pessoa humana e do trabalho. (BRASIL, TRT 4ª Região, 2012).

Combinado com os artigos 652 e 765 da CLT, o parágrafo único do artigo

404 do Código Civil Brasileiro de 2002 dispõe que:

Art. 404. [...] Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar. (BRASIL, 2002).

Nessa esteira, verifica-se que é possível a condenação de ofício por parte

dos juízes para o alcance da justiça social e da busca pela igualdade entre as

partes.

Entretanto nem todos os magistrados têm acolhido essa teoria. Há quem

defenda o contido no art. 460 do CPC que dispõe que o juiz não pode decidir sobre

questões que não foram objeto de pedido ou condenar o réu em quantidade superior

ao que lhe foi demandado. (BRASIL, 1973).

Esses juízes entendem que não há previsão legal tanto na CLT quanto na

CF/88, que ensejem à condenação a indenização suplementar, e, portanto não pode

ser arbitrada, sob pena de se configurar decisão extra petita, proibida no

ordenamento jurídico pátrio.

O Desembargador Manuel Candido do TRT da 3ª Região utilizou como base

para reforma da decisão de 1º grau, o art. 5º inc. II da CF/88, que aduz que:

Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude

de lei.

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. Entende-se inaplicável a indenização por dumping social, por ausência de amparo legal. Alias, reza o disposto no artigo 5º, inciso II da Constituição do Brasil, que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei.” (BRASIL, TRT 3ª Região, 2009).

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No mesmo sentido o Ministro Ives Gandra do TST, reformou a decisão do

TRT 4ª região, que condenou uma empresa pela prática de dumping social, embora

o reclamante não tivesse pleiteado na exordial. Segundo artigo publicado na página

do TST:

O ministro explicou que apesar de haver expressa previsão legal de reparação de danos patrimoniais e extrapatrimoniais causados a qualquer interesse difuso ou coletivo, o CPC determina a vinculação do juiz aos pedidos do autor. Portanto, o julgador deverá decidir a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe proibido conhecer de questões não suscitadas pela parte. (TUNHOLI, 2013).

Em entendimento contrário, o Desembargador Ricardo Carvalho Fraga do

TRT da 4ª Região manteve a condenação na sentença proferida pela juíza de 1º

grau Valdete Souto Severo, que condenou uma empresa de telefonia ao pagamento

de R$ 700.000,00. No entendimento da Magistrada a violação constante de direitos

trabalhistas levou à condenação da empresa como forma de punir às organizações

que possuem diversas ações trabalhistas contra si, violando reiteradamente os

mesmos direitos dos seus empregados.

Conforme destacou a juíza de primeiro grau em sua sentença:

A empresa de call center possui mais de 1.5 mil processos ativos no Foro Trabalhista de Porto Alegre. Praticamente todas as ações envolvem o não-pagamento de horas extras e distorções salariais significativas entre os empregados. “Todas as semanas, para não dizer todos os dias de pauta, são instruídos processos, envolvendo o mesmo grupo, com as mesmas pretensões”, cita a decisão. Para a juíza, como nada fazer para alterar a situação, as empresas estão lesando não apenas seus empregados, mas também a sociedade. “quem não paga horas extras e comete distorções salariais para um grande numero de empregados aufere com isso vantagens financeiras que lhe permitem competir em condições de desigualdade no mercado. (BRASIL TRT 4ª Região, 2011).

O Magistrado entendeu que a condenação deveria ser mantida, mas o valor

da condenação reduzido para R$ 100.000,00 e revertido ao Fundo de Direitos

Difusos, criado pela Lei 7.437/85, que promove a reparação de bens lesados.

Segundo o Relator Desembargador Ricardo Carvalho Fraga, “não há falar

em julgamento extra petita, diante dos fundamentos retro expendidos”. E acrescenta

que “a condenação solidária das reclamadas se justifica como forma de se coibir o

agir do qual resulte em outras violações.” (BRASIL, TRT 4ª Região, 2011).

Conforme se verificam dos julgados supra, as divergências são variadas e

denotam que não há um entendimento uniforme dos juízes com relação à

condenação a prática do dumping social.

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6.3.2 Entendimento de condenação a indenização suplementar – legitimidade das

partes.

Contudo, as divergências não se restringem à condenação a indenização

suplementar ex ofício. Alguns juízes foram incisivos quanto à legitimidade das partes

e a extensão do dano, posto que entendem que, pela extensão do dano, a ação

cabível seria a ação coletiva, postulada pelo Ministério Público do Trabalho ou pelos

Sindicatos. De outro vértice, há juízes que defendem a indenização à própria parte

que pleiteou a demanda, por entenderem que o dumping social atingiu

objetivamente o autor.

Para os que defendem a natureza coletiva do dumping social, propõe que a

medida cabível para pleitear a condenação a indenização seria a Ação Civil Pública,

cujo rol de legitimados para propor a ação encontra-se no art. 5º da Lei nº

7347/1985, conforme se lê:

Art. 5º. Tem legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I – o Ministério Público; II – a Defensoria Pública; III – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV – a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V – a associação que, concomitantemente: [...] (BRASIL, 1985).

Entre os adeptos dessa corrente, está o Desembargador Paulo Pimenta do

TRT 18ª Região, que reformou a sentença do juízo a quo, para excluir a condenação

do dumping social, por entender que o reclamante não era parte legitima para

postular a indenização, cabendo neste caso ao MPT.

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. MINISTÉRIO PÚBLICO. Considerando que o dano social é aquele que repercute amplamente na sociedade, podendo gerar prejuízos de ordem patrimonial ou imaterial aos membros da coletividade, somente esta, por meio daqueles legitimados para tanto, dentre os quais o Ministerio Público – a quem a Constituição Federal, em seu artigo 129, inciso III, atribui como funções institucionais promover o inquérito civil e a ação pública, para a proteção do patrimonio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos – pode pleitear a indenização dele decorrente. Reconhecida a ilegitimidade ativa ad causam do reclamante, sendo extinto o feito sem resolução de mérito, no particular. (TRT-18 1284201119118004 GO 01284-2011-191-18-00-4, Relator: PAULO PIMENTA, Data da Publicação: DEJT Nº 1015/2012, de 06.07.2012, pág. 07). (BRASIL, TRT18, 2012).

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Compartilhando desse entendimento, temos a decisão do Desembargador

Vulmar de Araujo Coelho Junior do TRT 14ª Região, que reformou a decisão de 1º

Grau, argüindo no Acórdão que somente o MPT poderá pleitear a ação, tendo em

vista o caráter social da demanda. Senão vejamos:

DANO SOCIAL. LEGITIMIDADE PARA PLEITEAR A INDENIZAÇÃO RESPECTIVA. Considerando que a doutrina conceitua o dano social como sendo aquele que repercute em toda a sociedade, podendo gerar prejuízos de ordem patrimonial ou imaterial aos membros da coletividade, somente esta, por meio do Ministério Público, tem legitimidade para pleitear a indenização por dano social, nos termos do que dispõe a Carta Magna (art. 129, III) e a lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85 – art. 1º, IV). (TRT-14 – RO: 36000 RO 0036000, Relator: DESEMBARGADOR VULMAR DE ARAUJO COELHO JUNIOR, Data de Julgamento: 12/02/2010, PRIMEIRA TURMA, Data da Publicação: DETRT14 n. 033, de 23/02/2010). (BRASIL, TRT 14, 2010).

Contrariando esse entendimento, o Desembargador Mário Macedo

Fernandes Caron do TRT 10ª Região, defende a ideia de que o reclamante é parte

legítima para pleitear a indenização por dumping social.

BANCO. CORRESPONDENTE BANCARIO. TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE FIM. ILICITUDE. DOP VINCULO EMPREGATICIO DO AUTOR. Verificado que a 2ª reclamada, atuando na venda de produtos tipicamente financeiros, atendia interesses finalisticos do banco, prestando o reclamante seu labor na atividade fim da 1ª empresa ré, BANCO IBI, e que as lojas da IBI PROMOTORA, 2ª ré, serviam de agencias daquele e tinha seus funcionários considerados, de fato, como empregados do banco réu, não o sendo de direito apenas por questões trabalhistas, conclui-se pela incidência ao caso do teor da Sumula nº 331, I, do TST, segundo a qual a contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vinculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). DA INDENIZAÇÃO EM RAZAO DE DUMPING SOCIAL. Restaram constatadas as irregularidades trabalhistas praticadas pelas recorrentes, que, com tal procedimento, logicamente, pagaram um preço menor pela força de trabalho dos seus empregados e tiveram um custo mais baixo para os seus produtos, o que lhes possibilita inclusive oferece-los no mercado a um preço menor que aquele praticado por empregadores não adeptos ao dumping social e que cumprem a legislação do trabalho, o que, ao fim e ao cabo, pode resultar em dano para toda sociedade, que verá, entre outras conseqüências prejudiciais, empresas fechandop e trabalhadores perdendo seus postos de trabalho diante da concorrencia desleal. Tal prática deve ser repudiada por meio de atos concretos, como bem fez o juízo de origem ao deferir o pleito obreiro de indenização em razão do dumping social. [...] Recurso conhecido e parcialmente provido. (TRT-10 – RO: 87220111111006 DF 00872-2011-111-10-00-6 RO, Relator: Desembargador Mário Macedo Fernandes Caron, Data de Julgamento: 08/08/2012, 2ª Turma, Data de Publicação: 24/08/2012 no DEJT). (BRASIL, TRT 10, 2012).

Nesse mesmo sentido é o entendimento do Relator Luiz Cosmo da Silva

Júnior, que manteve a sentença de 1º grau, para condenar a empresa pela prática

do dumping social, onde ficou configurada a terceirização ilícita.

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DUMPING SOCIAL – INDENIZAÇÃO – O constante descumprimento da ordem jurídica trabalhista acaba atingindo uma grande quantidade de pessoas, disso se valendo o empregador para obter vantagem na concorrência econômica com outros empregadores, o que implica dano aqueles que cumprem a legislação. Essa prática traduz-se em dumping social, pois prejudica toda a sociedade e configura ato ilícito, por exercício abusivo de DIREITO, já que extrapola os limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. O art. 404, parágrafo único, do Código Civil, da guarida ao fundamento de punir o agressor contumaz com uma indenização suplementar, revertendo-se esta indenização a um fundo público. COOPERATIVISMO. INEXISTENCIA. RECONHECIMENTO DO VINCULO DE EMPREGO. A simples existência da cooperativa não legitima a terceirização de serviços, sejam eles inerentes, ou não, as funções finalísticas do empreendimento. Isto porque, como o contrato de trabalho é um contrato-realidade, faz-se imprescindível perquirir se os chamados “cooperados” atuaram como verdadeiros co-participantes, tendo sido, simultaneamente, beneficiários ou usuários dos serviços prestados pela cooperativa, ou se, em sentido inverso, laboraram em condições tradicionais de subordinação e dependência. Nesta segunda hipótese, a relação jurídica revelara uma forma camuflada de um verdadeiro contrato de trabalho. DAS ASTREINTES – As astreintes previstas no artigo 461, § 4º do CPC surgiram com a finalidade de viabilizar a efetividade da prestação jurisdicional, compelindo o devedor a cumprir o comando da sentença, sendo, por isso, perfeitamente aplicáveis ao PROCESSO laboral, eis que compatível com a principiologia que norteia este ramo jurídico especial. Recurso conhecido e não provido. (TRT-16 180200601516005 MA 00180-2006-015-16-00-5, Relator LUIZ COSMO DA SILVA JUNIOR, Data de Julgamento: 04/03/2009, Data de Publicação: 25/03/2009). (BRASIL TRT 16, 2009).

Conforme relatado no tópico 5.2, com relação à terceirização, os tribunais

tem mostrado certa tendência em qualificar tal prática como mais uma forma de

dumping social.

6.3.3 Entendimento condenação a indenização suplementar – a quem se destina.

Como fundamento de que o dumping social atinge a coletividade, muitos

juízes entendem que o valor auferido da condenação, deverá ser destinado à

sociedade. Outros, porém entendem que o reclamante foi a parte mais lesada da

situação, e conferem à este os valores decorrentes da indenização suplementar.

Esse foi o entendimento do juiz Alexandre Chibante Martins do TRT de

Minas Gerais que na condenação ao dumping social, privilegiou o reclamante que

havia proposto a demanda.

RESPONSABILIDADE SOCIAL – DUMPING SOCIAL – O valor da indenização será fixado tendo em vista os seguintes parâmetros já adotados pela doutrina e jurisprudência pátrias: extensão do dano; culpa do agente; potencial econômico do ofensor; observação do caráter pedagógico da sanção (punição com intuito de evitar-se a reincidência na prática lesiva e

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surgimento de novos casos, para que ocorra a adequação do ofensor ao comportamento estabelecido no ordenamento jurídico pátrio); uso da equidade; indenização com o objetivo de servir de compensação ao reclamante, sem que haja enriquecimento sem causa deste, levando-se em consideração o caso em tela e a gravidade do dano e a repercussão pessoal e social. [...] Pelo acima exposto, e pelo que dos autos consta (jornada extraordinária alem da 10ª hora diária em empresa enquadrada no risco três – INSS – em termos de riscos econômicos para os trabalhadores e o risco de acidentes), fixo uma sanção pecuniária, a favor da reclamante, a ser paga pelo reclamado, no importe de R$ 500,00 (quinhentos reais), em parcela única, com espeque nos arts. 186, 187, Parágrafo único do art. 404, 927 e 1553 todos do Código Civil; arts. 8º caput; 652, “d”, 769 e 832, § 1º todos da CLT. (BRASIL, TRT 3ª Região, 2009).

Todavia, Jorge Luiz Souto Maior, entende que como se trata de um dano

social que visa lesar a sociedade em geral e não somente ao indivíduo, os valores

devem ser revertidos a um fundo social, como por exemplo, o descrito anteriormente

FAT.

Diante do dano social identificado, condeno a reclamada a pagar multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais), revertida, conforme manifestação dos demais membros da Turma, ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Nos termos da Lei n. 7.347/85. (BRASIL, TRT 15ª Região, 2012).

Para Ranúlio Mendes Moreira do TRT 18ª Região, as indenizações devem

ser dirigidas às instituições de caridade, conforme transcrição da sentença proferida

pelo D. Magistrado:

DA RESPONSABILIDADE SOCIAL – “DUMPING SOCIAL” – Havendo, pois, ofensa ao patrimônio jurídico da comunidade, com fulcro nos artigos supramencionados e nos argumentos acima expendidos, condeno as reclamadas, de forma solidaria, ao pagamento de reparação por danos sociais, no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), reversíveis a entidade filantrópica VILA SÃO JOSE BENTO COTTOLENGO, que presta serviços relevantes a pessoas doentes e carentes há muitos anos, e, mesmo sem recursos tenta dar dignidade ao ser humano, ao contrario das rés, que apenas buscam o lucro, em detrimento da sacralidade indelével da dignidade humana. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2011).

Em suma, independentemente da destinação dada, o que realmente importa

é que as condenações sejam proferidas de maneira razoável, sem enriquecimento

ilícito de nenhum interessado, como forma de disciplinamento das condutas

negativas do dumping social.

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7 REFLEXÕES FINAIS ACERCA DO DUMPING SOCIAL

Por todo o exposto, constata-se que a prática do dumping social, surge de

forma a influenciar negativamente toda uma coletividade, contaminando a economia

e banalizando a importância do trabalho digno e do desenvolvimento nacional.

Em que pese as providências que já têm sido tomadas com relação à

condenação a indenização suplementar, ainda faltam medidas que venham a

impedir que a prática do dumping social seja intentada, pois devido à falta de

previsão legal muitos questionamentos têm sido levantados, tanto na doutrina

quanto na jurisprudência.

O capitalismo advindo da globalização, em muito beneficiou a economia e a

vida das pessoas. Ocorre que dentro dessa perspectiva de progresso e bem estar

social, deu ensejo a situações de total desrespeito aos princípios da dignidade da

pessoa humana e da valorização do trabalho humano, previstos na Constituição

brasileira. Tais situações que sem dúvida, merecem ser rechaçadas de plano, para

que possa assegurar a todos a tão almejada existência digna.

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8 CONCLUSÃO

Em se tratando de evolução comercial e econômica dos últimos séculos,

percebe-se que o processo de globalização introduziu no sistema econômico

vantagens e desvantagens percebidas em praticamente todas as áreas do

desenvolvimento mundial. Porquanto, assim como a globalização abriu portas para o

desenvolvimento econômico e social da civilização, permitiu que práticas desleais

fossem cometidas sem a devida fiscalização ou punição pelo Estado.

Por intermédio da prática do dumping, que se verificou inicialmente nas

relações comerciais, constata-se que a ganância e a busca pelo lucro fácil e rápido

fizeram com que valores e direitos fundamentais fossem colocados em segundo

plano, sobretudo nas relações trabalhistas, que trata da hipossuficiência do

trabalhador e a idoneidade dos concorrentes que cumprem com suas obrigações

trabalhistas.

O dumping social na seara trabalhista tende a prejudicar não somente

àqueles que são diretamente atingidos por essa prática danosa, mas sim, por toda a

sociedade que preza e luta por um país mais justo e sem corrupção.

Quando o indivíduo permite pequenas infrações em seus direitos

fundamentais, está dando legalidade para que infrações maiores sejam cometidas.

O objetivo maior desse trabalho de pesquisa teve por finalidade procurar

demonstrar as práticas abusivas do dumping social, de forma que possibilite uma

repercussão mais intensa na sociedade, a fim de que mais pessoas venham a

conhecê-las e identificá-las.

Se tais práticas forem identificadas e pleiteadas em juízo, entende-se que

num futuro próximo, estas serão coibidas através de medidas que possam reduzir

em proporções consideráveis, e o maior beneficiário dessa conseqüência será a

própria sociedade, que não terá mais que suportar as desigualdades econômicas e

sociais, podendo inclusive projetar um desenvolvimento mais concreto e promissor

para o país.

As dificuldades para elaborar este trabalho de pesquisa foram muitas,

principalmente por se tratar de um tema que ainda não dispõe de previsão legal, ou

mesmo divulgação, ainda que mínima, nos meios de comunicação, nem tampouco

na doutrina, onde o assunto ainda carece de discussão entre os operadores de

direito e interessados no assunto.

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A presente pesquisa se baseou principalmente na jurisprudência, onde a

ocorrência da prática do dumping social se constata nos recentes julgados em que

são proferidos quase que diariamente na Justiça do Trabalho. Procurou-se

demonstrar os diversos posicionamentos dos juízes, a qual foram verificadas

divergências e apurados os casos de maior repercussão.

Em face do exposto, espera-se que leis possam ser criadas, no sentido de

combater a prática do dumping social, para que o Estado seja mais rigoroso em

suas medidas de prevenção e disciplinamento pedagógico àqueles que provocam

danos na sociedade em geral, principalmente na esfera trabalhista, que é a mola

propulsora no desenvolvimento da economia de um verdadeiro Estado de direito.

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