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N ão é de hoje que o mercado brasileiro sabe que o setor judiciário possui um número excessivo de processos, com crescimento anual da quantidade de ações que ficam sem decisão. De acordo com o relatório “Justiça em Números”, divulgado em setembro pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram mais de 79,7 milhões processos em tramitação indefinidos em 2016, um crescimento de 31% em relação a 2009 quando o número era de 60,7 milhões. Este resultado poderia ser justificado pela elevada quantidade de novos casos que surgem, porém neste mesmo período a entrada de processos judiciais apresentou um crescimento percentual menor que o de casos acumulados, com apenas 20% de alteração, saltando de 24,6 milhões em 2009 para 29,4 milhões em 2016. Ainda segundo o relatório, no Brasil 1,6 mil processos para cada juiz, quantidade notavelmente superior à maioria dos países vizinhos latino-americanos que apresentam uma média de 400 a 600 ações por magistrado. A taxa de congestionamento – índice de processos sem decisão – chegou a 73%. E considerando o indicador do prazo, uma execução fiscal na Justiça Estadual, por exemplo, demora em média 6 anos e 8 meses para ser finalizada; enquanto que na Justiça Federal prolonga-se por 7 anos e 6 meses. Neste cenário, encontram-se os processos de recuperação judicial e falência que exigem do juiz e da sua equipe uma especialização que vai além dos códigos de Direito e da auditoria documental. Para Manoel Justino Bezerra Filho, que atuou como desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo entre 2012 e 2015, o tempo é crucial na análise desse tipo de caso: “A matéria empresarial é bastante específica e, muitas vezes, exige decisões urgentes, sob a pena, em caso de atraso, de não atenderem mais à necessidade que havia se apresentado”. Em processos de recuperação judicial, a atuação do juízo vai além da simples homologação do plano, aprovado em assembleia pelos credores. É necessário também um alto conhecimento do Direito falimentar, tanto material quando processual, o que inclui o acompanhamento das atividades e apreciação da idoneidade das demonstrações financeiras do devedor. Em muitas ocorrências, ainda se faz necessária a realização de uma perícia prévia, para evitar fraudes ou irregularidades no ajuizamento do pedido de recuperação. E nesse caso, juízes que atuam em varas cíveis cumulativas ou em varas únicas ainda precisam dividir atenção com diversos casos de outras naturezas, como criminais, pensões alimentícias, mandados de segurança, penhoras, despejos, entre outros. No meio de tantos processos, o tempo torna- se muito curto para comandar e analisar um detalhado processo de recuperação judicial ou falência de maneira eficiente. Soma-se ainda, a carência de experiência técnica necessária para estes casos que exigem decisões de direito empresarial e falimentar, envolvendo circunstâncias de interesse coletivo, muitas vezes particulares e distintas entre elas. É preciso examinar o processo, considerando as alternativas e conveniências, analisando as condições de recuperação e o impacto social, trabalhista e econômico. Na busca por rapidez na solução de conflitos, muitos empresários submetiam e ainda submetem - suas demandas às câmaras de arbitragem sob o argumento de que estas, por serem especializadas, são mais céleres. “Entretanto, estas câmaras não se apresentaram tão rápidas quanto se pretendia e são dispendiosas para as partes, o que, de certa forma, traz alguma decepção”, alerta Manoel Justino. Para ele, se fossem resolvidos estes dois aspectos, estas câmaras poderiam ser um bom caminho para a solução das questões empresariais. Por outro lado, ao canalizar este tipo de demanda para as varas especializadas, seria aberto, provavelmente, um caminho para diminuir a necessidade das câmaras de arbitragem. Considerando todos estes pontos, fica fácil entender a importância da criação das varas especializadas em recuperação judicial e falências para o setor judiciário brasileiro. “Este movimento favorece principalmente os empresários, que necessitam ter segurança jurídica para gerir seus negócios. Caso ocorra algum imprevisto, há maior previsibilidade sobre qual e quando será a decisão judicial”, comenta Manoel Justino. Para ele, a experiência das câmaras que passaram a ser especializadas em direito empresarial foi, sem dúvida, percebida positivamente por juízes, empresários e advogados. Atualmente, o Brasil possui 32 varas especializadas em atender casos de recuperação judicial e falência – entre as empresarias e as exclusivas - distribuídas em 18 comarcas. As cidades campeãs são Rio de Janeiro com sete, todas empresariais, e São Paulo com três que atuam especificamente com casos de recuperação judicial e falências. O estado paulista inclusive inaugurou a 3ª vara de Falências, Recuperações Judiciais e Conflitos Relacionados à Arbitragem da Comarca de São Paulo no último mês de dezembro. Para ilustrar a importância da criação destas unidades especializadas e o atraso brasileiro neste processo, basta verificar que a nova vara instalada na capital paulista receberá processos que tramitam há mais de 15 anos nas mais de 40 varas cíveis centrais e que obedecem a já extinta Lei da Concordata. Entre eles estão, por exemplo, os casos do Mappin que teve a falência decretada em 1999, da Petroforte que entrou com processo em 2001, o do Consórcio Nacional Garavelo e das Fazendas Reunidas Boi Gordo que tiveram a falência decretada em 1997 e 2004 respectivamente. A quantidade é tão grande que esta unidade não receberá novas ações por pelo menos dois anos. Especialistas consideram que o número ainda é pequeno. O ideal é que o país dobre a quantidade atual de varas especializadas, alcançando 60 unidades, com pelo menos uma em cada estado. Desta forma, será possível colocar o Brasil no mesmo patamar dos países com um sistema de insolvência mais maduro, ao criar um cenário mais previsível para as decisões judiciais e, consequentemente, para os investimentos, contribuindo diretamente com o crescimento da economia brasileira. Ao regionalizá-las será possível trazer os processos de recuperação para próximo de um juiz mais familiarizado com a matéria e atividade local. “As varas empresariais são bem- vindas, principalmente, em grandes centros. “Entretanto, parece razoável instituir regiões para estas unidades jurídicas preparadas para atender o direito empresarial e falimentar, em locais adequados. No estado de São Paulo, há potencial para criar varas regionais especializadas em Santos, Campinas, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto". pág. 1 Nº 06 Jan/Fev de 2018 Varas especializadas se propagam pelo Brasil Atualmente são 32 unidades judiciais dedicadas ao direito empresarial e falimentar, que ajudam a desafogar as varas cíveis e colaboram com a retomada da economia empresarial A recente crise econômica que abalou o mercado brasileiro começa lenta- mente a ficar para trás. A primeira quinzena de 2018 já trouxe sinais que reforçam um cenário mais otimista por vir, com o mercado financeiro reavaliando as suas expectativas para cima, elevando a projeção do Produto Interno Bruto (PIB) de 2018 para 2,70%; o que significa a sétima semana consecutiva de melhora deste indicador. Em dezembro, estes analistas acreditavam que a produção industrial cresceria 3%, um mês depois o número subiu para 3,20%. Espera-se também que a taxa básica de juros ainda apresente leve queda, atingindo a marca de 6,75% ao ano. A inflação, ainda que esteja acima da apresentada em 2017, deve ficar próxima da meta de 4,5% ao ano determinada pelo Banco Central. E na balança comercial, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços acredita em superávit de US$ 50 bilhões, mesmo com a expectativa de crescimento das importações, impulsionada pela compra de insumos usados para a produção agrícola e industrial. Outra avaliação que pode movimentar o mercado exportador é a estimativa de crescimento da economia mundial em 3,9%, declarada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Em uma primeira análise, estes números parecem traçar um panorama econômico mais positivo, entretanto, o mercado ainda viverá ondas de turbulências com os reflexos da crise enfrentada pelo Brasil nos últimos cinco anos. Desde 2013, mais de 1100 empresas de grande porte, com faturamento anual superior a R$ 300 milhões, não cumpriram, de alguma forma, os seus compromissos. No total, 877 pediram recuperação judicial, reestruturando suas dívidas, e outras 289 fecharam suas portas, o que acaba lesando diretamente toda a cadeia de fornecedores e prestadores de serviços. Por isso, é possível prever que o buraco aberto ainda vai atingir muitas empresas de pequeno e médio porte, ligadas a estas companhias maiores. São diversos setores da economia nesta situação, como o de telefonia que continua sofrendo o impacto da recuperação judicial da Oi; o de construção civil com os processos da Viver, PDG, Galvão Engenharia, entre outras; o farmacêutico com a BR Pharma; o sucroalcooleiro com a Abengoa Bioenergia; o de infraestrutura com OAS e UTC, só para citar alguns. De uma hora para outra, muitas pequenas e médias empresas destes setores da economia viram a expectativa de faturamento, com serviços e entregas realizadas, ser alongada em anos para recebimento. E nem todas conseguirão se sustentar no mercado por tanto tempo, sem ter que fazer grandes ajustes estruturais e financeiros. Isso sem contar que empresas destes setores, que apresentam dificuldades de pagamento, dificilmente terão acesso a crédito em condições favoráveis. Este cenário exigirá do empresário um olhar atento aos indicadores e agilidade nas tomadas de decisão para conseguir chegar ao final de 2018 com uma saúde financeira confortável. E este comportamento será fundamental para a recuperação sustentável da economia brasileira, pois apenas com empresas bem geridas é que o País conseguirá diminuir o desemprego, aumentar a renda circulante e melhorar a arrecadação para os munícipios, os estados e o governo federal. Angelo Guerra Netto, sócio-fundador da EXM Partners Gestão empresarial será fundamental para definir o resultado da economia em 2018 “Há potencial para criar varas regionais especializadas em Santos, Campinas, Ribeirão Preto e Bauru” Manoel Justino Bezerra Filho, desembargador apo- sentado do TJSP e atuante na área de recuperação e falências, no campo de consultas e pareceres Para o advogado Guilherme Marcondes Machado, o deságio para a classe trabalhista é compatível com a legislação vigente. Pg. 3

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Page 1: Varas especializadas se propagam pelo Brasilexmpartners.com.br/pdf/news_reacao6.pdfEspera-se também que a taxa básica de juros ainda apresente leve queda, atingindo a marca de 6,75%

Não é de hoje que o mercado brasileiro sabe que o setor judiciário possui um número excessivo de processos, com crescimento

anual da quantidade de ações que ficam sem decisão. De acordo com o relatório “Justiça em Números”, divulgado em setembro pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram mais de 79,7 milhões processos em tramitação indefinidos em 2016, um crescimento de 31% em relação a 2009 quando o número era de 60,7 milhões. Este resultado poderia ser justificado pela elevada quantidade de novos casos que surgem, porém neste mesmo período a entrada de processos judiciais apresentou um crescimento percentual menor que o de casos acumulados, com apenas 20% de alteração, saltando de 24,6 milhões em 2009 para 29,4 milhões em 2016.Ainda segundo o relatório, no Brasil há 1,6 mil processos para cada juiz, quantidade notavelmente superior à maioria dos países vizinhos latino-americanos que apresentam uma média de 400 a 600 ações por magistrado. A taxa de congestionamento – índice de processos sem decisão – chegou a 73%. E considerando o indicador do prazo, uma execução fiscal na Justiça Estadual, por exemplo, demora em média 6 anos e 8 meses para ser finalizada; enquanto que na Justiça Federal prolonga-se por 7 anos e 6 meses. Neste cenário, encontram-se os processos de recuperação judicial e falência que exigem do juiz

e da sua equipe uma especialização que vai além dos códigos de Direito e da auditoria documental. Para Manoel Justino Bezerra Filho, que atuou como desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo entre 2012 e 2015, o tempo é crucial na análise desse tipo de caso: “A matéria empresarial é bastante específica e, muitas vezes, exige decisões urgentes, sob a pena, em caso de atraso, de não atenderem mais à necessidade que havia se apresentado”. Em processos de recuperação judicial, a atuação do juízo vai além da simples homologação do plano, aprovado em assembleia pelos credores. É necessário também um alto conhecimento do Direito falimentar, tanto material quando processual, o que inclui o acompanhamento das atividades e apreciação da idoneidade das demonstrações financeiras do devedor. Em muitas ocorrências, ainda se faz necessária a realização de uma perícia prévia, para evitar fraudes ou irregularidades no ajuizamento do

pedido de recuperação. E nesse caso, juízes que atuam em varas cíveis cumulativas ou em varas únicas ainda precisam dividir atenção com diversos casos de outras naturezas, como criminais, pensões alimentícias, mandados de segurança, penhoras, despejos, entre outros. No meio de tantos processos, o tempo torna-se muito curto para comandar e analisar um detalhado processo de recuperação judicial ou falência de maneira eficiente. Soma-se ainda, a carência de experiência técnica necessária para estes casos que exigem decisões de direito empresarial e falimentar, envolvendo circunstâncias de interesse coletivo, muitas vezes particulares e distintas entre elas. É preciso examinar o processo, considerando as alternativas e conveniências, analisando as condições de recuperação e o impacto social,

trabalhista e econômico.Na busca por rapidez na solução de conflitos, muitos empresários submetiam – e ainda submetem - suas demandas às câmaras de arbitragem sob o argumento de que estas, por serem especializadas, são mais céleres. “Entretanto, estas câmaras não se apresentaram tão rápidas quanto se pretendia e são dispendiosas para as partes, o que, de certa forma, traz alguma decepção”, alerta Manoel Justino. Para ele, se fossem resolvidos estes dois aspectos, estas câmaras poderiam ser um bom caminho para a solução das questões empresariais. Por outro lado, ao canalizar este tipo de demanda para as varas especializadas, seria aberto, provavelmente, um caminho para diminuir a necessidade das câmaras de arbitragem. Considerando todos estes pontos, fica fácil entender a importância da criação das varas especializadas em recuperação judicial e falências para o setor judiciário brasileiro. “Este movimento favorece principalmente os empresários, que necessitam ter segurança jurídica para gerir seus negócios. Caso ocorra algum imprevisto, há maior previsibilidade sobre qual e quando será a decisão judicial”, comenta Manoel Justino. Para ele, a experiência das câmaras que passaram a ser especializadas em direito empresarial foi, sem dúvida, percebida positivamente por juízes, empresários e advogados.Atualmente, o Brasil possui 32 varas especializadas em atender casos de recuperação judicial e falência – entre as empresarias e as exclusivas - distribuídas em 18 comarcas. As cidades campeãs são Rio de Janeiro com sete, todas empresariais, eSão Paulo com três que atuam especificamente com casos de recuperação judicial e falências. O estado paulista inclusive inaugurou a 3ª vara de Falências, Recuperações Judiciais e Conflitos Relacionados à Arbitragem da Comarca de São Paulo no último mês de dezembro.Para ilustrar a importância da criação destas unidades especializadas e o atraso brasileiro neste processo, basta verificar que a nova vara instalada na capital paulista receberá processos que tramitam há mais de 15 anos nas mais de 40 varas cíveis centrais e que obedecem a já extinta Lei da Concordata. Entre eles estão, por exemplo, os casos do Mappin que teve a falência decretada em 1999, da Petroforte que entrou com processo em 2001, o do Consórcio Nacional Garavelo e das Fazendas Reunidas Boi Gordo que tiveram a falência decretada em 1997 e 2004 respectivamente. A quantidade é tão grande que

esta unidade não receberá novas ações por pelo menos dois anos. Especialistas consideram que o número ainda é pequeno. O ideal é que o país dobre a quantidade atual de varas especializadas, alcançando 60 unidades, com pelo menos uma em cada estado. Desta forma, será possível colocar o Brasil no mesmo patamar dos países com um sistema de insolvência mais maduro, ao criar um cenário mais previsível para as decisões judiciais e, consequentemente, para os investimentos, contribuindo diretamente com o crescimento da economia brasileira.Ao regionalizá-las será possível trazer os processos de recuperação para próximo de um juiz mais familiarizado com a matéria e atividade local. “As varas empresariais são bem-vindas, principalmente, em grandes centros. “Entretanto, parece razoável instituir regiões para estas unidades jurídicas preparadas para atender o direito empresarial e falimentar, em locais adequados. No estado de São Paulo, há potencial para criar varas regionais especializadas em Santos, Campinas, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto".

pág. 1

Nº 06 Jan/Fev de 2018

Varas especializadas se propagam pelo Brasil Atualmente são 32 unidades judiciais dedicadas ao direito empresarial e falimentar, que ajudam a desafogar as varas cíveis e colaboram com a retomada da economia empresarial

A recente crise econômica que abalou o mercado brasileiro começa lenta-mente a ficar para trás. A primeira

quinzena de 2018 já trouxe sinais que reforçam um cenário mais otimista por vir, com o mercado financeiro reavaliando as suas expectativas para cima, elevando a projeção do Produto Interno Bruto (PIB) de 2018 para 2,70%; o que significa a sétima semana consecutiva de melhora deste indicador. Em dezembro, estes analistas acreditavam que a produção industrial cresceria 3%, um mês depois o número subiu para 3,20%. Espera-se também que a taxa básica de juros ainda apresente leve queda, atingindo a marca de 6,75% ao ano. A inflação, ainda que esteja acima da apresentada em 2017, deve ficar próxima da meta de 4,5% ao ano determinada pelo Banco Central. E na balança comercial, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços acredita em superávit de US$ 50 bilhões, mesmo com a expectativa de crescimento das importações, impulsionada pela compra de insumos usados para a produção

agrícola e industrial. Outra avaliação que pode movimentar o mercado exportador é a estimativa de crescimento da economia mundial em 3,9%, declarada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).Em uma primeira análise, estes números parecem traçar um panorama econômico mais positivo, entretanto, o mercado ainda viverá ondas de turbulências com os reflexos da crise enfrentada pelo Brasil nos últimos cinco anos. Desde 2013, mais de 1100 empresas de grande porte, com faturamento anual superior a R$ 300 milhões, não cumpriram, de alguma forma, os seus compromissos. No total, 877 pediram recuperação judicial, reestruturando suas dívidas, e outras 289 fecharam suas portas, o que acaba lesando diretamente toda a cadeia de fornecedores e prestadores de serviços.Por isso, é possível prever que o buraco aberto ainda vai atingir muitas empresas de pequeno e médio porte, ligadas a estas companhias maiores. São diversos setores da economia nesta situação, como o de telefonia que continua sofrendo o

impacto da recuperação judicial da Oi; o de construção civil com os processos da Viver, PDG, Galvão Engenharia, entre outras; o farmacêutico com a BR Pharma; o sucroalcooleiro com a Abengoa Bioenergia; o de infraestrutura com OAS e UTC, só para citar alguns. De uma hora para outra, muitas pequenas e médias empresas destes setores da economia viram a expectativa de faturamento, com serviços e entregas realizadas, ser alongada em anos para recebimento. E nem todas conseguirão se sustentar no mercado por tanto tempo, sem ter que fazer grandes ajustes estruturais e financeiros. Isso sem contar que empresas destes setores, que apresentam dificuldades de pagamento, dificilmente terão acesso a crédito em condições favoráveis.Este cenário exigirá do empresário um olhar atento aos indicadores e agilidade nas tomadas de decisão para conseguir chegar ao final de 2018 com uma saúde financeira confortável. E este comportamento será fundamental para a recuperação sustentável da economia brasileira, pois apenas com empresas bem geridas é que o País conseguirá

diminuir o desemprego, aumentar a renda circulante e melhorar a arrecadação para os munícipios, os estados e o governo federal.

Angelo Guerra Netto, sócio-fundador da EXM Partners

Gestão empresarial será fundamental para definir o resultado da economia em 2018

“Há potencial para criar varas regionais

especializadas em Santos, Campinas,

Ribeirão Pretoe Bauru”

Manoel Justino Bezerra Filho, desembargador apo-sentado do TJSP e atuante na área de recuperação e falências, no campo de consultas e pareceres

Para o advogado Guilherme Marcondes Machado, o deságio para a classe trabalhista é compatível com a legislação vigente. Pg. 3

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O ônus e o bônus da administração judicialResponsável por influenciar o ritmo do processo de recuperação judicial, o administrador judicial ganha notoriedade, mas também pode responder legalmente pelos prejuízos causados

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Fornecer informações aos credores, reunir os documentos, verificar sua credibilidade e garantir o

ritmo do andamento do processo de recuperação fornecendo relatórios constantes ao juiz são algumas funções do administrador judicial dentro do processo de recuperação. Uma pequena falta de atenção em qualquer análise de documentação pode gerar consideráveis prejuízos financeiros com capacidade de comprometer, inclusive, a recuperação judicial. As consequências de um deslize podem ser lesivas ao processo. Recentemente, o juiz da 7ª Vara Empresarial da Comarca da capital do Rio de Janeiro decidiu pela substituição, de ofício, da administradora judicial financeira do Grupo Oi, pois considerou que houve falha na composição da lista

de credores e duplicação dos créditos, o que aumentaria a dívida da empresa em R$ 2 bilhões. A saída do administrador judicial de um processo pode acontecer pela sua substituição, no caso de perda de confiança do magistrado, ou pela sua destituição, se o profissional for considerado desobediente, deixando de cumprir algum prazo ou ato que a lei lhe confere. “Entretanto, é necessário diferenciar as causas e consequências da retirada do administrador judicial de um processo”, explica Lara Nonino, gerente do departamento jurídico da EXM Partners.A advogada acrescenta que “a substituição

não é uma sanção e, portanto, o administrador judicial não fica impedido de exercer a sua função. Já a destituição é uma sanção, aplicada ao administrador que não cumpre seus deveres ou quando atua de forma claramente contrária aos interesses do processo, for desobediente aos preceitos da Lei, for omisso, negligente ou praticar atos lesivos”. A destituição pode ser declarada de ofício ou por requerimento de quaisquer partes, inclusive a pedido do Ministério Público. O administrador judicial que foi destituído sofre penalizações, entre elas

a de não poder exercer estas atividades pelo prazo de cinco anos e a exclusão do direito a remuneração. Caso já tenha recebido qualquer valor, neste caso, terá que devolver a quantia.“Caso o administrador judicial cause qualquer prejuízo, por culpa ou dolo, aos credores ou ao devedor, por não ter cumprido de maneira correta e idônea a sua função, será responsabilizado nos termos do artigo 32 da Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial e de Falência”, explica a advogada.Os crimes de administração judicial estão tipificados nos artigos 168 a 178 da Lei de Recuperação e Falências e são classificados como de ação pública incondicionada, embora se permita entre as ações penais privadas a subsidiária da pública (art. 184). A

competência para o conhecimento da ação penal pertence ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido ajuizada a recuperação ou decretada a falência. Para minimizar a possibilidade de erros, muitos juízes começaram a nomear empresas com equipes multidisciplinares para a função do administrador judicial. Até porque, essa não é uma tarefa fácil. A Lei 11.101/2005 determina que o administrador judicial deva agir com a competência e os deveres elencados nos artigos 22 e 23. São mais de 30 itens, com inúmeras atribuições e subdivisões. Isso sem considerar as diversas funções não previstas em lei, mas amplamente exigidas do administrador moderno, como por exemplo, a mediação de conflitos entre os credores e os devedores.

Falhas no processo - Pesquisa do Instituto Recupera Brasil (IRB) - realizada em 444 processos de recuperação judicial distribuídos nos estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo, entre 2014 e 2017 - aponta algumas falhas no desempenho do administrador judicial.Em 123 casos (27%) o juiz recebeu o relatório com atraso de um mês e em 34 dos processos (8%) os credores esperaram mais de um ano para receber informações. Houve ainda situações extremas em que o administrador não apresentou o relatório, mesmo depois da requisição judicial, e acabou destituído do processo. E nos casos em que os relatórios foram

apresentados, os levantamentos foram fracos. Segundo o estudo, 79% dos relatórios verificam apenas se houve lucro ou prejuízo líquido no período e o Ebitda é usado por apenas 8% dos administradores. Mais de 20% não informam se a companhia está ou não se recuperando. Desta forma, o relatório não permite uma avaliação criteriosa das empresas do polo ativo e sua potencial alavancagem.A pesquisa aponta a inexperiência como uma das causas de uma administração judicial temerária. Dos 136 profissionais avaliados, mais da metade (70) atuou em apenas um processo onde foi ajuizada a recuperação ou decretada a falência.

“A inexperiência é uma das causas

de uma administração

judicial temerária”

Lara Nonino, gerente do departamento jurídico da EXM Partners

Quando o empresário passa por uma situação de crise, todo o seu foco volta-se para a utilização de

meios que o ajudem a superar o momento difícil. E, justamente, a Lei de Recuperação Judicial (11.101/2005) tem se apresentado como alternativa ao priorizar, através do seu artigo 47, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.O que surpreende muitos empresários durante o processo é que a mesma Lei também protege excessivamente o crédito derivado da relação de trabalho ao limitar seu pagamento a um prazo máximo de 12 meses, conforme o artigo 54. Esta disposição pode ser considerada conflitante, principalmente para empresas em recuperação que possuem um passivo trabalhista que exige um parcelamento maior, sob a pena de se tornarem inviáveis. E como resolver esse impasse?Para o advogado Guilherme Camará Moreira Marcondes Machado, sócio do Marcondes Machado Advogados, uma alternativa seria a flexibilização do prazo em determinadas circunstâncias. Entretanto, a questão vai além da restrição legal de um ano para pagamento dos créditos trabalhistas. A limitação trazida pelo artigo 54 deveria ser considerada, sobretudo, pelo empresário, para saber o momento certo de requerer a recuperação judicial. “Esse é um problema recorrente na área, o empresário costuma buscar o auxílio de um especialista apenas quando a situação da empresa já está muito deteriorada, o que inclui um inchado crédito trabalhista”, acrescenta Marcondes Machado.Não raro, na própria Justiça do Trabalho

é comum nos depararmos com acordos que preveem parcelamento maior que 12 meses para o crédito trabalhista. Por isso, é compreensível entender que o mesmo deveria acontecer em um processo de recuperação judicial, desde que não configure abuso de poder econômico pelo devedor. “O instrumento da recuperação judicial não gera efeitos apenas entre as partes envolvidas, mas, beneficia a sociedade como um todo, pois a empresa viável que foi preservada continuará a gerar diversos benefícios decorrentes da atividade empresarial, como empregos, circulação de riquezas e recolhimento de tributos”, comenta o advogado.No início da vigência da Lei nº 11.101/2005,

algumas decisões pontuais - como nos casos do Moinho de Trigo Santo André S/A e do Grupo Gelre - permitiram um parcelamento acima do limite de um ano. Hoje, porém, os Tribunais não homologam planos que não observem o artigo 54, mesmo que um prazo maior tenha sido aprovado pelos credores na assembleia geral. “Nestes casos, a flexibilização do artigo 54 só foi possível com a concordância da forma de pagamento pelos sindicatos.

Hoje, contudo, ainda que haja a anuência destas associações de entidades, o entendimento é que o prazo de um ano para pagamento do passivo trabalhista não pode ser alterado pela vontade das partes”, relata Marcondes Machado.O advogado destaca ainda que, embora a Lei determine que as impugnações de créditos trabalhistas devam, a rigor, tramitar perante a Justiça do Trabalho, na prática elas têm sido apresentadas diretamente ao juízo da recuperação judicial. “Este procedimento se mostra correto, uma vez que a recuperação judicial é um processo que envolve inúmeros interesses conflitantes, razão pela qual as decisões devem ser tomadas de maneira equilibrada, levando-se em consideração o contexto no qual aquela empresa está inserida. É o juízo da recuperação que detém a maioria das informações para decidir de forma justa e ponderada acerca das propostas constantes no plano apresentado pelo devedor”, completa.

Deságio de crédito trabalhista? - Esse é outro ponto ainda muito controverso. O fato da legislação atual não determinar de forma clara a sua aplicação, faz com que toda decisão caiba aos tribunais, que, geralmente, têm entendido pela proteção ao crédito trabalhista e proibido a incidência de deságio.Porém, na visão do sócio do Marcondes Machado Advogados, o emprego do deságio para a Classe I é perfeitamente compatível com a legislação vigente. Ele explica que a Lei nº 11.101/2005 traz em seu artigo 50 um rol exemplificativo de meios de recuperação que podem

ser utilizados pela recuperanda para a superação da crise econômico-financeira. Dentre esses exemplos, a lei franqueia ao devedor a possibilidade de concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas, limitando, contudo, sua aplicação no que diz respeito aos créditos trabalhistas, que devem ser pagos em, no máximo, um ano. “Logo, pelo fato da limitação temporal do artigo 54 ser uma regra de exceção à regra geral contida no artigo 50, sua interpretação não pode ser feita de forma extensiva, razão pela qual a previsão de deságio é cabível”, conclui Marcondes Machado.

A contradição do crédito trabalhistaA Lei de Recuperação Judicial ainda gera dúvida com relação ao deságio sobre as dívidas derivadas da relação de trabalho

"O emprego do deságio para a

Classe I é perfeitamente

compatível com a legislação vigente”

Guilherme Camará Moreira Marcondes Machado , sócio do Marcondes Machado Advogados

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Situação excepcional permite “furar fila” de credores – Em recente decisão, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro permitiu que um consumidor da Oi passasse a frente de outros credores prioritários no caso de empresas em recuperação judicial. A dívida de R$ 17 mil é fruto de uma cobrança indevida realizada por meio do débito automático e assumido pela empresa como erro sistêmico. A companhia telefônica alegou que, por estar em recuperação judicial, as execuções e ações estariam suspensas; entretanto a 26ª Câmara Cível do Consumidor do TJ-RJ considerou que uma ação “excepcional merece igualmente um tratamento diferenciado”. Um dos argumentos que colocam o caso como excepcional é a apropriação indevida de recursos do credor, situação não contemplada pela Lei de Recuperação. É evidente que a Lei não pode servir de apoio para impedir os efeitos e penalidades de um ato ilegal.

Recuperação judicial chega aos fabricantes de peças automotivas - No

final de 2017, o plano de recuperação judicial da Metalúrgica DS, elaborado pela consultoria EXM Partners, em conjunto com a Vero Via Assessoria Empresarial e o escritório Mandel Advocacia, foi aprovado pelos credores em assembleia geral. A empresa catarinense é uma das maiores fabricantes de disco de freio do Brasil, com 38 anos de atividade e faturamento operacional bruto anual de 92 milhões de reais. A DS é considerada uma das principais marcas nacionais no mercado de reposição de peças automotivas, com forte representatividade no cenário internacional, atendendo mais de 1.700 modelos de veículos em mais de 20 países.

Blindagem na recuperação judicial – No final de 2017, durante o VIII Congresso Internacional de Direito Empresarial, a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, voltou a reforçar que o chamado prazo de blindagem deve ser contado em dias úteis, mesmo sem mudança na Lei 11.101/2005. Sua posição leva em conta o artigo 219 do atualizado Código de Processo Civil (lei 13.105/2015) que determina: “na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Parágrafo único: o disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos

processuais”. Ela avalia que o período de blindagem (stay period) foi criado para reunir vários prazos estabelecidos pela própria norma, todos eles de natureza processual. A blindagem na recuperação judicial começa assim que o processo é deferido pelo juiz, suspendendo as ações e execuções por 180 dias, que, de acordo com a legislação, são improrrogáveis. Neste período, a recuperanda tem a obrigação de apresentar o plano de recuperação nos autos e uma assembleia geral deve ser realizada casa haja qualquer objeção por parte dos credores.

Novo sistema para encontrar bens de devedores da União - O Sistema de Auxílio à Identificação e Localização de Pessoas e Patrimônio do Laboratório de Recuperação de Ativos (sisLABRA) é a nova arma da Advocacia-Geral da União para localizar bens de qualquer devedor da União, em especial de acusados de improbidade administrativa e de condenados a devolver algum valor para os cofres públicos. Trata-se de uma ferramenta desenhada para cruzar uma série de informações e bancos de dados com objetivo de identificar facilmente bens de pessoas e empresas, dando apoio às atividades de cobrança e recuperação de ativos.

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Há duas normas atuais - Leis 13.140/2015 e 9.307/1996 - que buscam regulamentar as

práticas de mediação judicial e extra-judicial e da arbitragem, assim como os seus procedimentos e as suas possibilidades de utilização em conflitos envolvendo a administração pública. Ambas configuram métodos de solução de conflitos que pressupõem a intervenção de um terceiro, entretanto existem diferenças entre os dois sistemas. Enquanto a arbitragem é uma modalidade em que terceiros ou árbitros indicados pelas partes ou pelo Estado resolvem o conflito por meio de uma solução impositiva, de direito ou de equidade, obrigando ao menos uma das partes a uma conduta ou pagamento que resolva a questão colocada sob sua análise; a mediação, regulada pela lei 13.140/2015 e com menções e previsão no CPC/2015, considera a atuação de um terceiro - o mediador - independente e imparcial, que tem a responsabilidade de viabilizar, melhorar ou reestabelecer a comunicação entre as partes, de modo que os próprios grupos envolvidos possam compor a questão. “Tanto a mediação quanto a arbitragem visam, principalmente, diminuir a demanda sobre o judiciário, gerando agilidade e reduzindo prolongamentos desne-cessários no processo”, ressalta o advogado Marcos Kawamura, sócio do Kawamura Advogados.Atualmente, a Lei de Recuperação Judicial não proíbe que uma empresa que entrou com pedido instaure um processo de mediação ou conciliação; e no mesmo contexto, a Lei de Mediação não excluiu do seu escopo casos de insolvência, implicando diretamente os planos de recuperação judicial. “Há diversas linhas de pensamento a respeito do assunto, mas todas reconhecem que o traço forte da mediação é a natureza do direito em discussão. Todo direito a ser submetido à mediação deverá ser transigível. Não deve haver proibição legal à negociação ou disposição (art. 3º da Lei de Mediação)”, comenta Kawamura.O advogado destaca que nesse caso, toda negociação de mediação deve considerar as diretrizes do artigo 47 da Lei 11.101/2005, que define o objetivo da

recuperação judicial em ajudar a empresa devedora a superar a crise econômico-financeira, mantendo produção e emprego, preservando sua função social e econômica. “Para que esta superação seja viável, no entanto, a empresa deverá negociar intensamente com seus credores, visando a confecção de uma estratégia que atenda os interesses de todos os envolvidos e possa ser aprovada em assembleia geral designada pelo juízo recuperacional”, completa.Há na recuperação judicial, portanto, ampla autonomia privada, sendo a

negociação uma característica natural e esperada do processo. De acordo com Kawamura, “a atuação do Estado deve-se conter à legalidade do processo vis-à-vis as disposições previstas na Lei 11.101/2005, ficando credores e devedor livres para transigirem sobre direitos suscetíveis de negociação, desde que sejam patrimoniais transigíveis e não afetem o direito de terceiros”.Entretanto, a própria Lei 13.140/2015 traz critérios que deverão ser observados no momento da estipulação de cláusula de mediação. Para aplicar este mecanismo num plano de recuperação judicial, deve-se considerar os princípios de imparcialidade do mediador, de isonomia e autonomia da vontade entre as partes, de oralidade e informalidade, de busca do consenso, de confidencialidade e de boa-fé.Tomando-se em conta esses princípios e demais disposições constantes da legislação e de normas aplicáveis, a cláusula que instituir a mediação no plano de recuperação judicial não poderá estabelecer limitações não negociadas ou não expressamente instituídas pela Lei; não deverá versar sobre direitos que, em virtude de sua natureza ou de determinação legal, não possam ser

objeto de transação; e, por fim, não poderá obrigar qualquer um dos participantes a permanecer no procedimento de mediação.A cláusula também deverá conter, ao menos, o local e os prazos mínimo e máximo para a realização da primeira reunião de mediação, os critérios para escolha do mediador ou equipe de mediação e a penalidade em caso de não comparecimento da parte convidada à primeira reunião de mediação, ou a indicação de um regulamento idôneo que estipule estas condições, conforme artigo 22 da Lei 13.140/2015.Um exemplo do uso da mediação na recuperação judicial pode ser visto no processo da maior companhia telefônica do Brasil que corre perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Nele, o juiz de primeiro grau autorizou a realização de mediação com pequenos credores da empresa, com créditos de até R$ 50 mil. A decisão foi levada à discussão no segundo grau e mantida pela 8ª Câmara Cível do Estado.A inserção de uma cláusula de mediação no plano de recuperação judicial, caso aprovada pelos credores e homologada em juízo, pode estimular as partes envolvidas a utilizar este expediente para dar maior agilidade na negociação e na almejada solução dos conflitos, sobretudo no que se refere ao reconhecimento ou não dos créditos a ele sujeitos, seus valores e a forma de sua liquidação, permitindo, assim, presteza no trâmite e significativa redução de investimentos necessários, inclusive com advogados.“Esta ação gera resultados positivos para todos os envolvidos, pois, em tese, o plano de recuperação judicial poderá ser aprovado mais facilmente e o seu cumprimento se iniciará mais rapidamente. A redução dos gastos, por sua vez, gera economia para a empresa que poderá reverter esses valores em suas atividades operacionais e em benefício dos credores que já têm créditos incontroversos”, enfatiza Kawamura.Outra vantagem é a confidencialidade, igualmente prevista na Lei de Mediação, que deverá ser mantida em favor das partes, exceto se convencionado diferentemente por elas ou se for exigida a revelação de informação por

lei ou para o cumprimento do acordo eventualmente obtido pela mediação.Porém, mesmo com todos os benefícios e amparos legais, atualmente, poucos planos de recuperação judicial incluem cláusulas de mediação. Para Kawamura, em qualquer legislação nova é necessário um período de adaptação. “Nem sempre, a Vacatio Legis - prazo legal, entre a publicação da lei e o início de sua vigência - é tempo suficiente para que as inovações sejam utilizadas em toda a sua extensão. A Lei de Mediação entrou em vigor, efetivamente, em dezembro de 2015, acompanhada pelo CPC/2015, em março de 2016, quando, de fato, iniciou-se uma difusão maior dos meios alternativos – ou adequados – de solução de conflitos. As inovações, sempre que chegam, demoram um tempo para serem incorporadas e utilizadas com fluidez e naturalidade”. “Com os novos casos-paradigma, como a recuperação judicial da Oi e a renovação do pensamento jurídico, a partir de iniciativas como a 1ª Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios que ocorreu em meados de agosto de 2016, é plausível que haja um incremento deste tipo de mecanismo, especialmente envolvendo questões incidentais, como as obje-ções, divergências, habilitações e impugnações de crédito”, conclui Kawamura.

Os benefícios das cláusulas de mediaçãoAo ser usado em processos de recuperação judicial, instrumento potencializa a resolução de conflitos, gera agilidade e reduz prolongamentos desnecessários, resultando em importantes ganhos financeiros

“Tanto a mediação quanto a

arbitragem visam, principalmente,

diminuir a demanda sobre o judiciário”

Marcos Kawamura, sócio do Kawamura Advogados

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Page 4: Varas especializadas se propagam pelo Brasilexmpartners.com.br/pdf/news_reacao6.pdfEspera-se também que a taxa básica de juros ainda apresente leve queda, atingindo a marca de 6,75%

A necessidade de se manter em dia com todos os encargos fiscais é um dos grandes desafios na vida

do empresário. Segundo o relatório do banco mundial Doing Business 2018, uma empresa brasileira necessita de 1.958 horas ao ano para quitar todas as suas obrigações tributárias. O tempo é seis vezes maior que a média registrada nos países da América Latina e Caribe, 332 horas, concedendo ao Brasil a 184ª posição entre os 190 países ranqueados com relação ao tempo gasto na burocracia tributária.O peso desses tributos fica ainda maior em momentos conturbados da economia, a ponto de muitos juristas defenderem a

criação de uma legislação específica para o tema, com intuito de que ela possa ser um instrumento tributário de auxílio à retomada das empresas em tempo de crises econômicas, como ressalta o advogado Fábio Calcini, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia.“O ideal é que a legislação não se resuma à Lei de Recuperação Judicial e, em matéria tributária, aos famosos parcelamentos popularmente chamados de Refis ou anistias. Acredito que é preciso ir muito além com a edição de leis modernas e que busquem, do ponto de vista fiscal, viabilizar a retomada econômica da empresa, numa relação de colaboração ética e lícita entre Fisco e contribuinte”. Exemplos de quem vivencia a dificuldade de uma tributação que não foi criada para um mercado em crise, as empresas que iniciam o processo de recuperação judicial no país descobrem em pouco tempo a importância do tema. De nada basta elaborar um plano, tê-lo aprovado por credores e colocá-lo em prática, se não calcularem corretamente os tributos inseridos em cada fase desse processo, que não são poucos e impactam o processo recuperacional. “Um dos caminhos do plano de recuperação judicial é o pagamento dos créditos com deságio. No caso do devedor, o valor do deságio, ou seja, a diferença entre o montante efetivamente devido e o ajustado com desconto, é considerado

um ganho tributável, na linha de uma redução de passivo. Sendo assim, haveria a tributação para fins do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), como regra, sobretudo, se o contribuinte deduziu no lucro real tal valor como despesa”, explica Calcini que, na perspectiva do credor, o deságio pode ser lançado como despesa, ou seja, perda no recebimento de créditos, o famoso PDD (Provisão para Devedores Duvidosos)".

Por outro lado, o jurista alerta que para esses mesmos deságios concedidos no plano não deveriam ocorrer tributação de PIS/PASEP e COFINS. “Tratam-se de contribuições exigidas sobre a receita do ponto de vista jurídico, sendo possível deixar de tributar, já que não configuraria tal hipótese. Apesar de eventual tributação, tudo depende do caso concreto, pois, se a empresa possui, por exemplo, prejuízo e créditos acumulados, pode até mesmo ter

tributação, mas não sofrerá impacto no caixa”.Caso a empresa reconheça a existência de efeitos tributários, sobretudo IRPJ e CSLL, um dos caminhos mais adequados para a tributação deste “ganho” acontece no momento da realização, ou seja, na medida do cumprimento do plano perante os credores, explica Calcini. “Antes disso, o que temos é uma expectativa de ganho, uma renda potencial, que não deve ser tributada, sob a pena de exigir tributo sobre patrimônio e não renda ou lucro efetivo, com nítido caráter de confisco e desrespeito ao princípio da capacidade contributiva, muito relevante em uma recuperação judicial”.A infinidade de tributos inseridos num processo, como o de recuperação judicial, é apenas um exemplo do complexo sistema tributário brasileiro. Enquanto não se cria uma legislação específica que ajude a desburocratizar o sistema, resta ao empresário ficar atento e buscar soluções que diminuam a carga inserida, ou ao menos, não a amplifique ainda mais, como conclui Calcini: “É preciso, portanto, planejamento. Quando da avaliação da busca pela recuperação judicial, já é necessário apreciar os impactos tributários e, principalmente, o que pode ser feito antes desta medida, de forma lícita, para impedir ou postergar pagamento de tributos, até mesmo para viabilizar a recuperação judicial de fato”.

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Aperda da capacidade do Estado brasileiro em financiar as atividades rurais na década de 90 obrigou

o governo a criar mecanismos que permitissem a mobilização de crédito e capital no setor do agronegócio, de forma a garantir a saúde da atividade. Nesse cenário, ganharam especial relevância os títulos derivados por legislações específicas, com destaque para a Cédula de Produto Rural (CPR)que se popularizou após a edição da Lei 8.929/94.Este título permite aos seus emissores - produtores rurais, cooperativas e suas associações - a pura e simples promessa de entrega de determinado produto rural com data, local, especificações e qualidades preestabelecidas. Uma vez emitida, a CPR transforma-se em um título líquido, certo e exigível pela quantidade e qualidade dos produtos nela previstos, podendo ser objeto de endosso para qualquer interessado.Na avaliação de Amanda Gabriela Gehlen, advogada do Antonio Luiz Ferreira Advogados Associados, a CPR revelou-se uma ferramenta extremamente versátil e eficiente no ambiente do agronegócio. “A simplicidade conferida ao título, com a possibilidade de vinculação de garantias reais para o cumprimento da obrigação de entregar e, ainda, a ampla circularização permitida pelo endosso, transformou este instrumento em um verdadeiro ativo financeiro. Isso atraiu, além dos produtores rurais, o interesse de diversos segmentos do mercado, como bancos, seguradoras, financiadores, bol-sas de mercadorias e de futuros, centrais de custódia e investidores”. Todo acesso ao crédito pelos produtores rurais, cooperativas e suas associações pode ser realizado em qualquer etapa do processo produtivo com baixos custos, permitindo

a concretização de operações de compra e venda, prestação de garantia, obtenção de financiamento junto a trading companies, bancos, fornecedores, operações de troca (barter), entre outros."Vale ressaltar que a CPR foi introduzida

em 1994, anterior à criação do Código Civil de 2002, e, por isso, obedece às disposições compreendidas da Lei Uniforme de Genebra, não estando submetida ao diploma civil. Entretanto, o art. 10 da lei no 8.929/94 trouxe regras específicas de direito cambiário a este título”, explica Amanda.A promessa do emitente em entregar os produtos rurais vinculados ao título pode ser garantido por penhor, hipoteca e alienação fiduciária dos bens de sua própria titularidade ou de terceiros. Para constituição destas garantias não é necessária a formalização em instrumento próprio, sendo suficiente a inserção de uma cláusula na própria cártula. Dessa maneira, dispensa-se, por exemplo, a outorga de uma hipoteca por meio de escritura, bastando apenas, para averbação do ato, a exibição da CPR no cartório em que o imóvel dado em garantia está identificado.“Para que a CPR tenha eficácia contra terceiros, o art. 12 da Lei 8.929 de 1994 determina que o instrumento deve ser

registrado no cartório de registro de imóveis do domicílio do seu emitente, com objetivo de garantir a sua publicidade. Da mesma forma, caso o emitente tenha prestado alguma garantia - penhor, hipoteca, alienação fiduciária - para cumprimento da obrigação constante do título, a CPR deverá ser averbada à margem das matrículas dos imóveis prestados em garantia”, esclarece Amanda.O credor que tem CPR como garantia pode estar sujeito aos efeitos de uma recuperação judicial, exceto em casos de alienação fiduciária. Mas sua classificação dependerá da existência, ou não, de garantias incorporadas na CPR, como alerta a advogada: “um credor que recebeu uma cédula em garantia de uma operação de venda de insumos agrícolas sem vincular qualquer espécie de garantia à CPR, por exemplo, estará sujeito à recuperação judicial eventualmente requerida pelo emitente do título na classe “quirografária”. Porém, se a CPR foi cedularmente garantida por penhor e hipoteca, o credor figurará na classe “garantia real” perante a recuperação judicial de seu emitente”.Amanda ressalta que o credor só não estará sujeito aos efeitos da recuperação judicial do seu emitente caso a CPR esteja garantida por alienação fiduciária, conforme prevê o artigo 49, §3º da Lei 11.101/2005, que permite ao credor a consolidação da propriedade fiduciária em seu favor.A CPR ainda pode ser convertida e liquidada em obrigação financeira, desde que observados os requisitos estabelecidos no art. 4º-A. “A legislação que antes admitia o adimplemento da CPR apenas com a entrega do produto nela discriminado, passou, em 2001, a permitir que o cumprimento da obrigação

ocorra em moeda, desde que a quantia expressa em reais seja auferida com base na cotação dos produtos agrícolas que estão vinculados ao crédito. Mesmo na sua versão financeira, a CPR nunca será emitida apenas com a obrigação pecuniária de pagar determinada quantia, mas sempre deverá constar do título a discriminação de um produto rural, como sua quantidade, qualidade e especificações; o que, para liquidação financeira, deverá ser utilizado para apuração dos valores de acordo com os preços praticados no mercado”, acrescenta Amanda.A advogada ainda relata que a permissão de liquidar o título em dinheiro deverá cumprir todos os requisitos exigidos pelo mencionado art. 4º-A da lei de regência, com destaque para a necessidade de contemplar a expressão “Financeira” em sua denominação “Cédula de Produto Rural".

A sujeição do crédito rural na recuperação judicialCredor que possui CPR como garantia pode estar sujeito às disposições da Lei mesmo se convertida em obrigação financeira

O peso dos tributos na retomada das empresasObrigações fiscais pesadas dificultam empresas brasileiras a saírem da crise. Quem passa pela recuperação judicial precisa contemplar impostos inseridos no deságio da proposta

“Um dos caminhos do plano de

recuperação judicial é o pagamento

dos créditos com deságio”

“A CPR ainda pode ser convertida

e liquidada em obrigação

financeira”

Amanda Gabriela Gehlen, advogada do Antonio Luiz Ferreira Advogados Associados

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Fábio Calcini, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia