Vícios do projeto edilício e suas consequências jurídicas

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Vícios do projeto edilício e suas consequências jurídicas José Roberto Fernandes Castilho Vista da fachada da Catedral de Milão em 2011 Foto JakubHałun [WikimediaCommons] El proyectoespensamiento. Reflexiona sobre cada trazo que dibujas. Primeiro conselho de Alfonso Munõz Cosme aos estudantes que iniciam o “complexo caminho de aprendizagem do projeto”. A identificação dos vícios projetuais A partir da estrutura jurídica do contrato de prestação de serviço, trataremos, no presente texto, das falhas, defeitos ou vícios dos projetos edilícios. Portanto, em primeiro lugar, é preciso deixar claro que será enfocada apenas uma espécie de atuação do arquiteto, dentro do universo das amplas e diversas modalidades de autuação desse profissional. Porém, é talvez a mais significativa e perigosa delas: aquela de, mediante contrato de prestação de serviço, conceber a organização estética e funcional do espaço edificado. O estudo recairá, porém, especificamente no desvio dos deveres

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Vícios do projeto edilício e suas

consequências jurídicas

José Roberto Fernandes Castilho

Vista da fachada da Catedral de Milão em 2011

Foto JakubHałun [WikimediaCommons]

El proyectoespensamiento. Reflexiona sobre cada trazo que dibujas.

Primeiro conselho de Alfonso Munõz Cosme aos estudantes que iniciam o “complexo

caminho de aprendizagem do projeto”.

A identificação dos vícios projetuais

A partir da estrutura jurídica do contrato de prestação de serviço, trataremos, no

presente texto, das falhas, defeitos ou vícios dos projetos edilícios. Portanto, em

primeiro lugar, é preciso deixar claro que será enfocada apenas uma espécie de atuação

do arquiteto, dentro do universo das amplas e diversas modalidades de autuação desse

profissional. Porém, é talvez a mais significativa e perigosa delas: aquela de, mediante

contrato de prestação de serviço, conceber a organização estética e funcional do espaço

edificado. O estudo recairá, porém, especificamente no desvio dos deveres

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profissionais: materializando má prestação do serviço, vício é o oposto de qualidade

positiva, de perfeição, de idoneidade. Além das diversas obrigações formais do

profissional, a principal obrigação do arquiteto será a de satisfazer os interesses do

contratante – certo que dentro dos limites da lei – que os vícios eventualmente

encontrados na obra impedem e obstaculizam.

No mercado da construção civil, “defeito construtivo” expressa conceito amplo e

genérico que, em ordenamentos estrangeiros, costuma ser classificado em (i) defeitos ou

vícios de construção ou de execução do projeto, (ii) vícios de solo (ou, melhor, de

sondagem) ou (iii) vícios de fiscalização. O presente artigo abordará, entretanto, um

tema pouco explorado que é o dos vícios próprios do projeto arquitetônico edilício

(expressão que não é redundância), chamados vícios “de diseño o de concepción”

(Andrés Fuster). Não se constituindo de falhas de estrutura ou de sistemas, eles são

vícios de atribuição direta e exclusiva ao arquiteto urbanista, cuja atuação profissional é,

então, questionada em face de certos padrões pré-estabelecidos pelo estado da arte. No

século XIV, o arquiteto parisiense Jean Mignot, consultado a propósito da Catedral de

Milão, disse que arssinescientianihil est. A frase proclama a inconsistência do

empirismo em face do conhecimento técnico assentado em cada época histórica e que

deve ser necessariamente observado.

Se infringir este dever profissional – agindo, portanto, culposamente –, o arquiteto por

certo causará dano ou prejuízo ao contratante no que tange ao resultado de seu serviço

intelectual, fato que acarretará impacto patrimonial negativo por força do defeito

encontrado pelo proprietário, bem ao contrário do que seria de se esperar. Portanto, não

se tratam, aqui, de falhas estruturais ou de segurança da edificação (que podem implicar

de fissuras até eventual desabamento dela) porém de falhas técnicas na atuação do

projetista que acabam por causar incômodos, desvantagens e diminuição patrimonial ao

proprietário. Por suposto, este não se satisfez com o trabalho arquitetônico que

contratou e pagou – e pretenderá composição do dano sofrido. Como diz decisão do

Tribunal Supremo da Espanha (de 1995),

“alarquitectoleafectaresponsabilidadencuantole corresponde laideación de la obra,

suplanificación y superior inspección”.

A obra arquitetônica poderá, pois, gerar prejuízos e danos ao proprietário que a

contratou derivados de vícios, falhas ou defeitos projetuais, afastando-se das

necessidades e exigências previstas. Mas reitere-se: vício de projeto não é defeito da

construção. Isidoro de Sevilha, em suas famosas Etimologias (século VII), afirma que a

edificação pressupõe três momentos, a saber, dispositio, constructio, venustas(=

ordenação ou, por extensão, planejamento, construção e embelezamento). Os vícios de

projeto (design errors) são vícios de adequação que se originam no primeiro momento,

ou seja, bem antes da formação do canteiro que irá materializá-los por um período mais

ou menos longo de tempo (1).

Sem maior rigor classificatório – porquanto se busca apenas identificar situações

específicas para investigar suas consequências jurídicas –, pode-se falar em quatro tipos

de vícios dos projetos edilícios, afetando a qualidade não estrutural da obra, que são os

vícios de procedimento, de funcionalidade, de técnica, além dos vícios estéticos.

Os arquitetos e seu dever de competência

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Os vícios de projeto concernem não às obrigações formalmente assumidas pelo

arquiteto na prestação de serviço: concernem ao conteúdo dela, ao resultado material da

atividade do profissional: “to build well” (Wotton). Em outras palavras, ainda que o

contrato tenha sido executado regularmente, o produto final não atendeu àquilo que se

esperava do profissional da Arquitetura (teoria do resultado que implica culpa

presumida). Há parâmetros técnicos de competência para avaliar sua atuação, se correta

ou não. Como dizem Jean-Bernard Auby e outros,

“l‟architectedoitremplirsonrôleenrespectantlaréglementation, lesrègles de l‟art et

lesdesirs de sonclient” (2), ou seja, o arquiteto deve cumprir suas atribuições

respeitando a legislação, as regras da arte e os desejos de seu cliente. Nos casos

referidos, o conteúdo do trabalho não respeitou estes ordens de restrições à autonomia

do arquiteto, donde a ilicitude de seu comportamento negligente.

É clássica a definição de René Savatier segundo a qual a culpa é “a inexecução de um

dever que o agente podia conhecer e observar”. Exatamente a negligência na obediência

do dever é que gerou o vício e, por consequência, a obrigação de indenizar. O arquiteto

tem o dever de conhecer a regra (presunção absoluta); já o contratante, como leigo, tem

todo direito de desconhecê-la por completo, cumprindo ser alertado para cada decisão

tomada em referência à obra (3). Noutro giro, a violação do dever de competência é que

faz nascer a reponsabilidade profissional. O Estatuto da Ordem dos Arquitectos de

Portugal, de 1998, explicita este dever da seguinte forma: “O arquitecto deve exercer a

sua profissão com eficácia e lealdade, aplicando nela todo o seu saber, criatividade e

talento, tendo particularmente em atenção os interesses daqueles que lhe confiem tarefas

profissionais” (art. 49.1).

Não há norma semelhante na lei do CAU embora ela se extraia, implicitamente, de seus

comandos. Agir competente é o agir eficaz. O Código de Ética Profissional aprovado

pela Resolução nº 1.002/02 do Confea estabelece o princípio ético de “eficácia

profissional”. Segundo a norma, “a profissão realiza-se pelo cumprimento responsável

e competente dos compromissos profissionais, munindo-se de técnicas adequadas,

assegurando os resultados propostos e a qualidade satisfatória nos serviços e produtos e

observando a segurança nos seus procedimentos” (art. 8º/IV). Tal princípio não é

apenasmente de ordem ética: não se pode cogitar da existência de profissional, formado

e com registro no conselho, que não detenha as mínimas competências técnicas

necessárias para o exercício eficiente e eficaz de seu mister. E se existir, ele, por

prudência, não poderá atuar no mercado.

A questão central nos tipos de falhas antes relatados concerne às complexas e muitas

vezes tumultuosas relações do arquiteto com seu cliente. Até onde vai a

responsabilidade exclusiva do arquiteto, que é presumida? Em quais casos ela seria

dividida com o próprio contratante? Alfonso Muñoz Cosme, da Escola de Arquitetura

de Madri, afirma que o diálogo com o cliente é fundamental não só “para definir os

objetivos do projeto e elaborar o programa mas em todo os processo do projeto e na

construção posterior” (4). Do ponto de vista jurídico, tais relações, que precisam ser

permanentemente registradas e documentadas, são de enorme importância

determinando, eventualmente, o afastamento de qualquer responsabilidade profissional.

Assim, se o proprietário foi alertado para as consequências das pequenas aberturas no

conforto térmico e mesmo assim consentiu com o projeto, não poderá depois pretender

reparação. Haveria aqui a excludente de culpa exclusiva ou concorrente do prejudicado

(volenti non fit injuria). Porém, isto precisa ser comprovado.

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Palácio Capanema, escada helicoidal, Rio de Janeiro

Foto José Roberto Fernandes Castilho

Dado o crédito social (= confiança) de que dispõe o profissional, existirão tópicos de

natureza técnica que importam obrigação de indenizar mesmo com a assinatura do

proprietário no projeto – ressalvada, em certos casos apenas, expressa aquiescência

deste, aquiescência que se diria esclarecida, consciente (5). Todas as questões relativas

ao material escolhido pelo arquiteto entram aqui: o contratante não tem o dever de saber

que tal piso é derrapante ou fica escorregadio em contato com a água; ou, noutra

hipótese, que a inclinação do telhado, tal como projetado, pode lhe trazer problemas

futuros de vazamento, ou, ainda, que é proibida a aberturas de janelas que permitam a

visão direta do lindeiro a menos de 1,5 m. Isto são questões técnicas que se presume

sejam de conhecimento do arquiteto, tal como decorre do art. 2º da lei do CAU. Deste

dispositivo é que se extrai a presunção absoluta de que o profissional tenha a perícia

necessária para atuar em todas as matérias especificadas em seu registro, o que deriva

de sua formação superior (art. 3º).

O Código Civil de 2002 não prevê regra expressa a respeito da atividade do profissional

da Arquitetura, tal como faz com o empreiteiro de obra (art. 618) que se incumbirá da

execução dela. Assim, devem-se buscar os esquemas gerais. A regra geral da

responsabilidade civil está inserida no art. 927 do Código Civil, que diz: “Aquele que,

por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. A indenização, por sua

vez, “mede-se pela extensão do dano” (art. 944). O dano pode significar o custo do

refazimento de parte da obra e/ou valor referente ao tempo em que ela não pôde ser

utilizada adequadamente. E pode ser composto mediante a redução proporcional do

valor dos honorários profissionais contratados.

Prova do fato e do dano

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Como já ressaltado, a responsabilidade por vício projeto deriva do desrespeito culpável

à obrigação de resultado contratualmente assumida – que incorpora as regras da arte –,

gerando consequências danosas. Assim, a prova do fato e do dano incumbem a dois

agentes distintos: a primeira ao profissional da Arquitetura – que precisa demonstrar

que respeitou as regras de sua atividade – e a segunda ao proprietário, que deve

caracterizar o prejuízo experimentado.

Quanto ao arquiteto, cumpre reiterar que a sua responsabilidade é subjetiva mas

manifesta-se a culpa presumida diante dos deveres profissionais de competência e

eficácia que tem – do que resulta a inversão do ônus da prova que beneficia muito o

proprietário. Ocorre aquilo que se denomina “culpa contra a legalidade” (Sérgio

Cavalieri) porquanto a correta atuação dimana diretamente da lei e das normas que

regem a profissão. Numa demanda, é esta a prova que incumbe ao arquiteto fazer: que

agiu conforme os ditames fixados pela lei e pela corporação profissional. A propósito,

o Tribunal gaúcho já assentou: “O réu [o arquiteto] obrigou-se a prestar os serviços

arquitetônicos previstos no contrato, que certamente tinham uma finalidade específica:

deveriam gerar, por si só, o resultado pretendido pela contratante. E neste caso a culpa é

presumida, pelo que se imputa ao réu o ônus de comprovar que realizou o serviço de

forma satisfatória e que não foi o responsável pelas falhas observadas na obra, o que não

logrou demonstrar” (Ap. 70018927665).

Quanto ao dano, é importante registrar que ele, sendo material, precisa ser devidamente

comprovado ou demonstrado pelo proprietário, ônus este que lhe compete por completo

já que sua esfera patrimonial terá sido atingida: o dano é uma desvantagem que precisa

estar caracterizada porquanto a indenização de ato ilícito não pode se converter em

fonte de enriquecimento sem causa, fato que repugna ao Direito. Como observa, com

razão, Silvio Rodrigues, “não deve o prejudicado experimentar lucro na indenização”

(6). No que toca ao dano moral, porém, o próprio Superior Tribunal de Justiça entende

estar assentado na jurisprudência daquela corte que “não há falar em prova do dano

moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos

que o ensejam” (Resp 204.786-SP). A indenização do dano moral tem natureza de

substituição ou de compensação pelo padecimento da vítima, v.g., um valor monetário

pela expectativa frustrada de se iniciar a obra em certo tempo ou de concluí-la em

determinado período.

Num caso de ruína funcional derivada de perturbação sonora, a Justiça paulista

entendeu que a reparação moral era devida, fixando-a em 200 salários mínimos. As

decisões, de primeira e segunda instância, estão reproduzidas no apêndice de julgados

do livro Perturbações sonoras nas edificações urbanas, de Waldir de Arruda Miranda

Carneiro (7). O incorporador de um edifício de alto padrão em São Paulo foi acionado

pelos adquirentes das duas unidades de cobertura. Isto porque eles foram vitimados por

um erro no projeto arquitetônico que “alocou o elevador e a casa de máquinas junto à

parede da suíte principal de um dos imóveis e da sala de estar do outro. Conforme

restou minuciosamente apurado pelo perito do juízo [diz a sentença], a casa de

máquinas e o elevador emitem sons com componentes tonais (“elec, zan, fiu, tanc”)

audíveis em ambos os cômodos e perturbadores do sossego”. Assim, entendeu o julgado

que o incorporador “contratou arquiteto imperito para execução do projeto arquitetônico

do imóvel” e, pois, está “obrigada a eliminação do problema sonoro através da

contratação de empresa especializada”. Houve condenação da incorporadora tanto na

obrigação de fazer concernente à eliminação dos ruídos quanto em danos morais

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porquanto “é inaceitável ao ser humano ter seu repouso interrompido ou impedido por

ruídos constantes, perturbadores da tranquilidade” (Ap. 37.817.4/9).

Responsabilidade pelos vícios de procedimento

Uma vez firmado o contrato de prestação de serviço, deve saber o arquiteto qual o

trâmite processual até a conclusão de suas atividades. Como já dito, sua atividade

começa com os levantamentos seja do programa de necessidades, seja do lote;

estabelecimento de um pré-projeto (que pode se desdobrar em vários), fixação do

projeto, com o qual o proprietário deve concordar formalmente para obtenção da licença

edilícia. A partir daí, inicia-se outro procedimento, agora dentro de órgãos públicos de

controle da atividade edilícia (Prefeituras, Bombeiros), onde o arquiteto deve obter as

licenças necessárias no prazo do contrato. Somente após todo esse trâmite é que se

poderá passar para o projeto executivo, que exige outras licenças e autorizações (até

mesmo para a utilização de parte do passeio com o avanço dos tapumes). Mas, no

presente artigo, não cuidaremos da etapa executiva.

Se o arquiteto superou todas as etapas com o cliente mas o projeto não foi aprovado

pela Prefeitura por desobedecer a legislação urbanística, poderá se vislumbrar aqui uma

imperícia geradora, em tese, de punição civil. Com efeito, o arquiteto deverá reelaborar

o projeto, o que importa em retrocesso indevido, gerando perda de tempo e de dinheiro

(8). Nesta hipótese, penso que o proprietário poderá rescindir o contrato, sem qualquer

pagamento de honorários, como também poderá pretender indenização do arquiteto se

conseguir provar algum dano, seja material ou moral. A obrigação do arquiteto é de

resultado qualificado: fazer o projeto e aprová-lo perante os órgãos competentes. Se ele

não conseguiu adimplir tal obrigação fixada na avença foi, salvo situações anormais,

imperito.

Outra hipótese é a do arquiteto que faz o projeto, cumpridas as etapas anteriores, mas o

proprietário não se contenta ao final com ele. Neste caso, o proprietário deverá pagar

integralmente os honorários profissionais ainda que não se interesse pelo levantamento

da obra. Tratando-se a prestação de serviço de contrato bilateral, a culpa, exclusiva ou

concorrente, do proprietário se verificará sempre que este não tiver examinado com o

devido cuidado certa etapa do trabalho, o que permitiu o desenvolvimento da etapa

seguinte. O proprietário certo que é um leigo mas não se admite seja displicente na

análise e avaliação do projeto que lhe é submetido. Se o proprietário já tivesse

discordado logo com os estudos iniciais, poderia romper diretamente o contrato,

pagando apenas pelo trabalho feito pelo arquiteto até ali.

Em acórdão do TJSP discutiu-se exatamente a hipótese. O Tribunal, reproduzindo o

laudo pericial, fez constar no aresto: “em fase de projeto legal, as etapas anteriores

(estudos preliminares e projeto pré-executivo ou anteprojeto) já teriam sido concluídas e

aprovadas pelo Contratante-autor (...). Não aprovando a proposta dos estudos

preliminares, e, posteriormente, do anteprojeto, jamais os autores poderiam ter

concordado em assinar os desenhos do projeto legal e os relativos memoriais técnicos,

onde é descrita tecnicamente a construção”. (...) A assinatura de tal documento

representa a anuência por parte do Contratante-Autor da proposta apresentada de forma

que, nesse momento, voltar a discutir sobre o partido arquitetônico das fachadas seria

um retrocesso às primeiras etapas da construção que, com provam os mencionados

documentos anexos aos autos, estas já estariam concluídas”. Assim, o Tribunal não

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reconheceu o direito do proprietário em rever o projeto concluído sem nada acrescer no

valor da verba honorária (Ap. 927.185-00/3).

Num outro caso, porém, o atraso na entrega do projeto aprovado determinou resolução

do contrato, não valendo a alegação de entraves burocráticos. Veja-se: “O que se extrai

dos autos é que houve a elaboração e entrega pela ré [a arquiteta] de parte do projeto à

autora, porém isto se deu fora do prazo previsto contratualmente entre as partes [60

dias]. Evidente que entraves formais como a necessidade de aprovação do projeto nos

órgãos públicos, exigência de prazos e a morosidade de certos serviços municipais

constituem risco ínsito à sua atividade, não podendo ser repassado arbitrariamente aos

destinatários do serviço. Aliás, ninguém melhor do que a própria arquiteta, senhora de

seu mister, para avaliar com precisão qual o prazo mínimo necessário para o

cumprimento da prestação prometida. Nesse sentido, para poder cumprir o prazo

previsto no contrato, caberia à ré ser diligente e providenciar desde logo todos os

documentos necessários (...). Não é, porém, o que se extrai dos autos, reveladores da

inércia da arquiteta, que nem providenciou e nem solicitou à sua cliente os elementos

necessários à elaboração do projeto. Claro que, diante do atraso, posteriormente

convertido em inadimplemento absoluto, as parcelas da remuneração do serviço não

eram exigíveis, em atenção ao instituto da exceptio non adimpleticontractus (art. 476

CC). Lembre-se que o caso em exame versa sobre responsabilidade contratual, e a

obrigação é de resultado, e não de meio Disso decorre que a autora prova a existência

do contrato, e a ré prova a ocorrência do pagamento. Faltou à ré, todavia, demonstrar o

pontual e correto cumprimento da prestação, como era de seu mister”. Assim, o

Tribunal de São Paulo entendeu ser devida a restituição atualizada de todas as parcelas

pagas, assim como afirmou a impossibilidade do proprietário utilizar os estudos

preliminares produzidos pela arquiteta (Ap. 0018997-33.2007.8.26.0019).

Responsabilidade pelos vícios técnicos

Os vícios técnicos são aquele que mais tocam à prática arquitetônica. Diversos aspectos

da atividade edilícia são completamente desconhecidos pelo homem médio: só o

profissional é que tem o domínio deles. Vendo o desenho de uma escada ou de uma

rampa, o homem médio não consegue perceber se ela será causadora de acidentes

frequentes, pela inclinação, pelo material de revestimento, pela ausência de corrimão,

etc. Isto é do domínio técnico do arquiteto, bem como a adequada luminosidade

provinda das janelas ou a necessidade de armazenamento de água da chuva, saberes

profissionais por excelência.

Causando um defeito construtivo ou então, pelo menos, provocando uma desvantagem,

o vício técnico significa o “descumprimento da normativa técnica ou da lexartis” (9).

Porém, tal defeito é interno, equiparado aos vícios ocultos que desvalorizam ou fazem

com que a coisa objeto do contrato se torne imprestável ao uso. Daí porque só com após

a ocupação da edificação é que ele se manifestará. Aqui, “a responsabilidade do

arquiteto” (10) é manifesta porquanto ele poderia e deveria ter se utilizado da melhor

técnica. Se não o fez, atuou mal, por ação ou omissão, e por isso é justo que arque com

as consequências jurídicas, indenizando o proprietário. Na verdade, tal indenização

corresponderá ao valor dos ajustes e modificações que a obra deve sofrer: o valor do

corrimão, a troca do piso, etc. Não seria justo o proprietário arcar com tais valores

porque a causa reside na atuação deficiente do profissional, que deveria ter atuado com

perfeição, em benefício do projeto.

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São arrolados em seguida três casos bastante significativos de vícios técnicos de

Arquitetura. Um primeiro caso apreciado recentemente pelo TJSP tratou do projeto de

um grande centro comercial e de apoio aos romeiros de Aparecida (edificação anexa à

Basílica): a sociedade de arquitetura, que firmara contrato de prestação de serviço para

elaboração de projeto completo de arquitetura, coordenação dos projetos

complementares e fiscalização semanal, “descumpriu sua obrigação contratual

assumida, por falhas no projeto arquitetônico que permitia a entrada de água da chuva”,

além de não ter fiscalizado devidamente a obra. A ação foi proposta visando a

indenização ”correspondente às despesas para o refazimento do projeto arquitetônico”.

Registrou a perícia que o empreendimento tinha “concepção arquitetônica arrojada” mas

que, por falta de fechamento lateral específico, “as águas das chuvas chegam a atingir

não somente as lojas periféricas mas também aquelas localizadas na região central das

„asas‟, caracterizando-se assim como um problema ocasionado em decorrência da

concepção arquitetônica desenvolvida para o empreendimento”. O Tribunal entendeu

caracterizado o ilícito contratual e a consequente obrigação de indenizar a associação

autora da ação, no valor de mais de quinhentos mil reais (Ap. 990.10.342269-4, j. em 25

de abril de 2011).

Outro caso típico de vício técnico concernente à falta de vagas de garagem em edifício

foi julgado em 2008 pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo – com a condenação

solidária da arquiteta a indenizar o valor das vagas não executadas. Houve a

constituição de número menor de vagas em face do que constava do projeto, o que

deixou algumas unidades autônomas sem vaga de garagem com evidente prejuízo aos

adquirentes delas. O aresto tem a seguinte ementa:

“Apelação cível – contrato de construção de edifício – falha na elaboração do projeto

arquitetônico – número de vagas de garagem – indenização – falha na execução da obra

– defeitos – correção – prescrição – diferença entre número de vagas de garagem

projetadas e construídas – falha de projeto arquitetônico – responsabilidade solidária da

arquiteta – correlação entre causa de pedir e pedido – falha de projeto contratado pela

construtora – prova pericial não abalada por prova técnica produzida pela parte

interessada e pelo assistente técnico – indenização – cálculo do valor de cada vaga de

garagem – método não impugnado e variáveis não infirmadas documentalmente – falhas

de execução da obra – correção – exclusão dos itens em que o laudo pericial não foi

conclusivo – recursos parcialmente providos” (Ap. 35970110207, 4ª Câmara Cível).

Um terceiro caso de vício técnico apreciado pelo Tribunal paulista reconheceu a

responsabilidade do arquiteto em face do descompasso entre a área do lote e a área

constante do projeto de uma clínica médica em Araraquara. Tratou-se de um equívoco

elementar que gerou graves consequências. A área real do lote era menor do que aquela

inserida no Registro de Imóveis e o arquiteto, sem fazer nenhum levantamento (11),

elaborou o projeto baseando-se apenas no título de domínio – o que consubstancia

notória negligência. O projeto não pôde ser utilizado e o profissional propôs então

soluções outras, “no anseio de aproveitar o projeto”, como a rotação dele, soluções que

“retratam meios paliativos de postergar as conseqüências geradas pelo erro de metragem

do projeto, com prejuízo à própria obra”. A ementa do acórdão, que condenou o

arquiteto a devolver o valor que já recebera (sem reparação moral), diz:

“Prestação de serviços – inadimplemento – contratual – rescisão cumulada com

reparação de danos – réu contratado que elabora projeto arquitetônico em desacordo

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com a metragem real do terreno – prova carreada aos autos que corrobora o

descompasso entre projeto e área – projeto que não pode ser aproveitado – rescisão do

contrato com restituição dos valores adiantados pelo autor – caracterização – danos

morais – eventuais transtornos não se qualificam como danos de ordem imaterial –

recursos improvidos” (Ap 992.05.141378-6, j. em 2010).

Responsabilidade pelos vícios de funcionalidade

Em larga medida, o vício técnico poderia se confundir com o vício de funcionalidade na

medida em que este também desvaloriza o objeto do contrato. Porém, haverá uma

diferença significativa: o vício técnico pode não afetar a funcionalidade da edificação,

embora cause transtornos. O vazamento de água do telhado não impede a utilização do

bem, por suposto. O vício de funcionalidade significa que partes da edificação, ou ela

toda, não têm condições de cumprir adequadamente a função para a qual ela foi feita. O

caso típico é o da impossibilidade de acesso fácil do veículo à garagem, seja por causa

do perfil inadequado da rampa, seja porque as colunas entravam o estacionamento

perfeito, etc. Além da habitualidade, coloca-se a questão da segurança (art. 3º da lei

espanhola sobre ordenação da edificação): o edifício é comercial, portanto tem uso

público, mas a escadas não apresentam os elementos de segurança necessários (caso da

rampa interna do Palácio do Planalto).

Palácio do Planalto, rampa interna, Brasília

Foto Victor Hugo Mori

É evidente que nestes casos a falha de projeto é inquestionável. O proprietário contratou

o projeto de certa obra para cumprir o programa desejado, mas ela não faz isso, ou o faz

parcialmente. Considerando o dano, inequívoco, haverá a responsabilidade do arquiteto

em promover, às suas custas, a adaptação ou então, se não for possível, a obrigação de

reparar a desvantagem permanente experimentada pelo contratante, traduzida em dano

moral.

Um caso apreciado pelo TJSP tratou da rampa de acesso á garagem, com “inclinação

equivocada e íngreme” (dentre outros tópicos, notadamente a falta de vagas de garagens

que constavam no projeto, v. supra). O relator reproduz a perícia: “Independentemente

dos aspectos legais de cada Município, foi consagrada a inclinação de 20% (tolerância

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até 21%) para rampas de uso coletivo, e definida como aquela inclinação mais

confortável e segura para veículos” (12). No projeto arquitetônico questionado,

entretanto, a rampa estava projetada com inclinação de 30% e foi executada com

26,32%. O Tribunal reconheceu existência de dano moral porquanto o proprietário

“sofreu constrangimentos, intensos aborrecimentos, sentimentos e sensações negativas,

razão pela qual deve receber a correta e justa indenização que se eleva para R$

50.000,00 (cinquenta mil reais), respeitados os limites da razoabilidade e ponderação”.

A condenação atingiu, solidariamente, arquiteto, engenheiro e construtora (Ap.

0012535-07.2006.8.26.0533, 18ª Câmara de Direito Privado, j. em 11 de janeiro de

2012).

Palácio do Planalto, rampa externa, Brasília

Foto Victor Hugo Mori

Na Espanha, conforme Andrés Fuster, encontram-se abundantes exemplos nos quais as

garagens projetadas implicam dificultades de maniobrabilidad dos veículos, tornando-

as impróprias para seu destino, o que, segundo o autor, importa vício de projeto porque

a obra não é funcional “conforme a su natural destino”. Refere, dentre muitas, decisão

de 2003 do Tribunal Supremo segundo a qual o fato de que os veículos, ao circular

pelas rampas, sofram golpes em sua parte dianteira ou traseira e a existência de

importantes dificuldades para a realização de manobras visando o acesso às vagas,

“revela la envergadura de losdefectos, impedindo el normal disfrute conforme a su

destino, convirtiendosu uso enciertamente irritante y molesto, tratándose de um

supuesto de responsabilidade por vicios de proyección y de ejecución” (13).

Responsabilidade pelos vícios de estética

Os vícios de estética serão os mais discutíveis considerando a inexistência, no mais das

vezes, de dano material direto e imediato. Um mal-estar, um desprazer, um

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aborrecimento, não configuram prejuízo indenizável. Lembrando o provérbio medieval,

poderia se alegar que de gustibus non est disputandum. Entretanto, como bem mostra

Roger Scruton, “é claro que ninguém acredita realmente na máxima latina: são

precisamente as questões de gosto que os homens têm mais propensão a discutir” (14).

Pode ser discutido mas o tema dificilmente gerará uma questão jurídica, de vez que o

prazer ou o desprazer estético, por serem subjetivos, não geram perdas econômicas e

nem violam direitos da personalidade (imagem, honra, vida privada, etc) para implicar

em dano moral.

Em última instância, o juiz não é um crítico de Arte e nem poderia constituir – salvo,

talvez, o caso de violação de direito autoral (que analisa semelhanças e diferenças) –

algo como uma “Comissão de Estética” prevista no Código “Saboya”. Nem mesmo a

Pública Administração o poderia haja vista a liberdade de expressão da atividade

artística consagrada constitucionalmente (art. 5º/IX da CF). Como nossa Constituição

“inclui o artístico no cultural”, tal direito subjetivo fundamental também se denomina

“liberdade de expressão cultural”. Trata-se de um dos “direitos culturais”, expressão

densa de significado que aparece no art. 215 da CF (15).

Ainda assim, em situações extremas de ausência da voluptas (= prazer deivado do efeito

estético segundo o renascentista Leon Battista Alberti), pode-se imaginar alguma

responsabilidade do arquiteto em face de portentos desconhecidos pelo proprietário ou

que, ao menos, não estavam para ele suficientemente esclarecidos. Porém, o ato ilícito

do arquiteto será aqui muito mais o de não ter advertido com clareza o proprietário

daquilo que seria feito: tanto mais o projeto apresente singularidades, maior será a

exigência da plena ciência e consciência do proprietário a respeito dele e dos seus

desdobramentos possíveis.

O arquiteto sempre deve alertar o proprietário a respeito das consequências das escolhas

feitas (materiais, instalações, ordenação do espaço etc.). Sistema hidráulico externo

numa residência, além de vício estético, apresenta também agressão à privacidade em

função do barulho. Aberturas irregulares também podem apresentar o mesmo efeito em

razão de implicar um tipo de “postura” singular que pode repugnar ao proprietário,

desqualificando a obra. Porém é certo que o vício estético no projeto arquitetônico é o

de mais difícil caracterização isolada ou autônoma apresentando-se, em regra, acoplado

a algum outro, tal como acontece, aliás, com o dano moral. Respeitados os demais

parâmetros, o vício estético puro num projeto edilício dificilmente implicará

indenização, fato que a jurisprudência confirma.

Conclusão

Ao contrário do que ocorre em outros países, a responsabilidade civil do arquiteto por

vício do projeto não é tema difundido ou nem mesmo conhecido no Brasil.

Diferentemente ocorre com a questão estrutural, bastante trabalhada pela doutrina e

contemplada especificamente pela lei. Na jurisprudência brasileira, a responsabilidade

do arquiteto encontra-se entremisturada com a do construtor e do incorporador, agentes

da edificação com responsabilidade objetiva, ou seja, sem culpa (arts. 3º e 12 do Código

de Defesa do Consumidor). Porém, deve-se verificar, nos muitos casos e exemplos

trazidos acima, que a atividade profissional do arquiteto gerará vícios toda vez que ele

violar, no projeto, princípios e regras técnicas (e até estéticas) afetas à sua profissão. O

projeto não é um “cheque em branco” que o proprietário passa ao arquiteto, devendo

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este buscar níveis elevados de satisfação, eficiência e conforto. Se, ao final, resultar o

oposto disso, caracterizar-se-á o vício de projeto.

Veja-se: um telhado mal desenhado, uma rampa mal formatada desvalorizará o bem e

causará danos reparáveis, o que é inequívoco, não podendo ser atribuídos ao empreiteiro

ou ao construtor que são meros executores – o artigo 17.7 da lei espanhola de ordenação

da edificação permite que se atribua responsabilidade também ao profissional que

aceitar a fiscalização de projeto deficiente que não tenha elaborado (16). É falha ou

vício notório da técnica projetual que se deve atribuir, em princípio, exclusivamente ao

projetista – com a concorrência eventual de culpa do proprietário. A responsabilidade

civil do arquiteto insere-se no campo da responsabilidade civil profissional (do médico,

do advogado, etc), que se manifesta toda vez o exercente de um ofício liberal afasta-se

dos deveres básicos de sua profissão, hauridos na formação superior e na atualização

permanente de seus conhecimentos.

O arquiteto é responsável por tudo aquilo que consta do projeto que elaborou, ou seja,

pela qualidade do projeto (Auby), por sua idoneidade. Ele assume contratualmente

obrigação de resultado qualificada: projetar a obra, aprová-la perante as autoridades

competentes. No entanto, no campo material, a obra deve se ajustar ao efeito pretendido

pelo proprietário, produzindo o resultado esperado por ele, atendendo as suas

necessidades, certo que a partir das normas que regem a atividade profissional. Nesse

sentido, a caracterização da responsabilidade do arquiteto ocorrerá sempre que houver

um desvio culpável aos princípios e técnicas da milenar cultura da Arquitetura, “saber

de experiência feito”.

No entanto, em defesa dos profissionais e das especificidades de sua atuação, Charles

Garnier, célebre arquiteto francês que venceu o concurso de 1861 para projetar a Ópera

de Paris, lembra que os arquitetos são os únicos artistas que devem acertar logo na

primeira tentativa. “Para eles não cabe repetições e nem correções”. Os dramaturgos, os

pintores, os escritores, podem modificar suas obras à vontade, se insatisfeitos com elas.

Ademais, o mundo se faz com base em ensaios: provam-se os sapatos e as roupas, os

cozinheiros examinam a comida antes de servi-la, os atiradores muitas vezes erram o

alvo: “somente os arquitetos devem andar sem tentar antes e, sem vacilar, ao primeiro

disparo cumpre que acertem a bala no círculo central” (17). A tese levaria à

consideração de culpa levíssima pelo eventual defeito, o que de modo algum elide a

obrigação de reparação do dano sobretudo em razão do fato de se cuidar de manifesta

obrigação de resultado qualificada, gerada pelo contrato de prestação de serviço.

notas

1

Sobre estas questões, ver: PALLADIO, Andrea. Os quatro livros da arquitetura.

Tradução de Cesar Casella e Maria Augusta Mattos. São Paulo, Hucitec, 2009

2

AUBY, Jean-Bernard; et al. Droit de l'urbanismeet de laconstruction. 8ª edição. Paris,

Montchrestien, 2008, p. 656.

3

Vitrúvio estabelece a distinção entre o arquiteto e o leigo da seguinte forma: “o leigo

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não pode saber o que vai ser realizado, a não ser quando o vir concluído, ao passo que o

arquiteto já tem definido na sua mente, antes de iniciar a obra, como se construirá esta

em termos de beleza, funcionalidade e conveniência” (VI. VIII, 10).

4

COSME. Alfonso Muñoz. El proyecto de Arquitectura – concepto, proceso y

representación. Barcelona, Reverté, 2008, p. 70.

5

Se, alertado, o proprietário insistir na solução ou no material, inexistirá responsabilidade

do arquiteto. Aplica-se, aqui, por analogia, a solução do art. 613 do CC (o empreiteiro

de lavor pode de eximir da responsabilidade por defeitos dos materiais empregados

desde que avise ao dono, antes da utilização, sob sua má qualidade). O Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul registra num acórdão em que houve a condenação da

arquiteta “não há prova de que tenha a requerida alertado os demandantes acerca de

todos os percalços que pudessem vir a surgir se a escolha levada a efeito o fosse pelo

piso tabuão. Em veiculando a possibilidade de um ou de outro, nada impedia que os

demandantes optassem por quaisquer deles”. A polêmica girava em torno do piso

tabuão (que apresentou ondulações por causa do contrapiso irregular) ou laminado (Ap.

70015226665). Trata-se aqui de culpa por omissão.

6

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Vol. 2 (Parte geral das obrigações). 26ª edição. São

Paulo, Saraiva, 1996, p. 283.

7

CARNEIRO, Waldir de Arruda Miranda. Perturbações sonoras nas edificações

urbanas. São Paulo, RT, 2001.

8

Pode-se levantar hipótese de aproveitamento adequado compulsório, ou seja, a situação

do proprietário que, notificado pela Prefeitura para edificar no lote com base no art.

182/§4º/I da CF, contrata um arquiteto para desenvolver o projeto dentro do prazo de

um ano (art. 5º/§ 4º/I do EC). Passado este prazo, a Prefeitura não aprova o projeto em

razão das falhas nele existentes e o proprietário vê-se então obrigado a começar a pagar

o IPTU progressivo. A lesão, neste caso, mostra-se evidente.

9

FUSTER, Andrés Iñigo. La responsabilidad civil delarquitecto e

igenieroproyectistasenlaedificación. Barcelona, Bosch, 2007, p. 109.

10

Expressão que é título do seguinte livro: PIANO, Renzo. A responsabilidade do

arquiteto. Tradução de Maurício Santana Dias. São Paulo, Bei, 2011.

11

O art. 2º/Parágrafo único/VI da lei do CAU estatui a competência do arquiteto na

“elaboração e interpretação de levantamentos topográficos cadastrais para a realização

de projetos de Arquitetura”.

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12

No tocante à circulação de veículos dentro do lote, o Código de Obras e Edificações de

São Paulo, de 1992, estabelece a declividade máxima de 20% para as rampas, quando

destinadas à circulação de automóveis e utilitários (item 13.2.2). O percentual cai para

12% quando se destinar à circulação de caminhões e ônibus e amplia-se para 25% em

residências unifamiliares.

13

FUSTER, Andrés Iñigo. Op. cit., p. 141.

14

SCRUTON, Roger. Estética da arquitetura. Tradução de Maria Amélia Belo. Lisboa,

Edições 70, 1979, p. 107.

15

Ver: SILVA, José Afonso da.Ordenação constitucional da cultura. São Paulo,

Malheiros, 2001.

16

Traduzindo, o texto da norma diz o seguinte: “Quem aceitar a fiscalização de uma obra

cujo projeto não elaborou, assumirá as responsabilidades derivadas das omissões,

deficiências e imperfeições do projeto, sem prejuízo da ação regressiva contra o

projetista”.

17

GARNIER, Charles.Le nouvelopéra, vol. 2, 1881. Apud AUZELLE, Robert. El

arquitecto. Versión de Buenaventura Musté. Madrid, ETA, 1973, p. 34.

sobre o autor

José Roberto Fernandes Castilho é professor doutor do Departamento de Planejamento,

Urbanismo e Ambiente da FCT/Unesp. Procurador do Estado de São Paulo.