Volume 1: Um Quadro de Referência...

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1 Volume 1: Um Quadro de Referência Conceitual O Volume 1 do Livro-guia apresenta uma visão panorâmica conceitual dos elementos que compõem a análise institucional, política e social realizada no âmbito da Análise de Impactos Sociais e na Pobreza – AISP (PSIA, na sigla em inglês). O Volume 1 está organizado como se segue. A Parte 1 apresenta o Livro-guia, concebido para preencher uma falha reconhecida entre os profissionais que orientam trabalhos de análise institucional, política e social, e destina-se a complementar a orientação fornecida pelo atual conjunto de ferramentas econômicas do Banco Mundial (Bourgignon e da Silva, 2003). A Parte 2 apresenta a AISP e seus principais objetivos, e revê brevemente o Guia do Usuário para AISP, do Banco Mundial (World Bank User’s Guide to PSIA (World Bank, 2003a) ). São enfatizados três aspectos importantes para uma AISP sólida: 1) o estabelecimento do contrafactual (ou seja, de cenários e resultados alternativos não ocorridos, ou cenários de referência) 2) a identificação de canais de transmissão e 3) a identificação dos impactos diretos e indiretos de reformas de políticas. Em acréscimo aos cinco canais de transmissão identificados no Guia do Usuário, este Livro-guia introduz um sexto canal para os casos em que a autoridade – compreendendo poder, estruturas e processos – é diretamente alterada através de reformas de políticas, especialmente reformas do serviço público, descentralização e reformas institucionais semelhantes. O restante do Livro-guia apresenta orientações técnicas relativas a três níveis de análise, como ilustrado no Gráfico 1.1 . A Parte 3 apresenta ferramentas para análises de nível macro do país e do contexto da reforma. A Parte 4 descreve ferramentas adequadas à análise de processos de nível intermediário relativos à implementação de políticas, e a Parte 5 traz ferramentas para analisar os impactos de nível intermediário e micro da reforma de políticas. A Parte 6 mostra como usar essa análise para definir os fatores de risco envolvidos nas reformas de políticas. A Parte 7 contém uma breve conclusão. Agrega-se ainda uma bibliografia com material de referência útil.

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Volume 1: Um Quadro de Referncia Conceitual

O Volume 1 do Livro-guia apresenta uma viso panormica conceitual dos elementos que compem a anlise institucional, poltica e social realizada no mbito da Anlise de Impactos Sociais e na Pobreza AISP (PSIA, na sigla em ingls). O Volume 1 est organizado como se segue. A Parte 1 apresenta o Livro-guia, concebido para preencher uma falha reconhecida entre os profissionais que orientam trabalhos de anlise institucional, poltica e social, e destina-se a complementar a orientao fornecida pelo atual conjunto de ferramentas econmicas do Banco Mundial (Bourgignon e da Silva, 2003). A Parte 2 apresenta a AISP e seus principais objetivos, e rev brevemente o Guia do Usurio para AISP, do Banco Mundial (World Bank Users Guide to PSIA (World Bank, 2003a)). So enfatizados trs aspectos importantes para uma AISP slida: 1) o estabelecimento do contrafactual (ou seja, de cenrios e resultados alternativos no ocorridos, ou cenrios de referncia) 2) a identificao de canais de transmisso e 3) a identificao dos impactos diretos e indiretos de reformas de polticas. Em acrscimo aos cinco canais de transmisso identificados no Guia do Usurio, este Livro-guia introduz um sexto canal para os casos em que a autoridade compreendendo poder, estruturas e processos diretamente alterada atravs de reformas de polticas, especialmente reformas do servio pblico, descentralizao e reformas institucionais semelhantes. O restante do Livro-guia apresenta orientaes tcnicas relativas a trs nveis de anlise, como ilustrado no Grfico 1.1. A Parte 3 apresenta ferramentas para anlises de nvel macro do pas e do contexto da reforma. A Parte 4 descreve ferramentas adequadas anlise de processos de nvel intermedirio relativos implementao de polticas, e a Parte 5 traz ferramentas para analisar os impactos de nvel intermedirio e micro da reforma de polticas. A Parte 6 mostra como usar essa anlise para definir os fatores de risco envolvidos nas reformas de polticas. A Parte 7 contm uma breve concluso. Agrega-se ainda uma bibliografia com material de referncia til.

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/PSIA_Guide.pdf

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1. Introduo ao Livro-guia: Ferramentas para a Anlise Institucional, Poltica e Social FIPS1 no mbito da AISP

A Anlise de Impactos Sociais e na Pobreza (AISP) refere-se anlise do impacto distributivo de reformas de polticas2 sobre o bem-estar ou o nvel de vida de diferentes grupos de participantes interessados, com uma nfase particular nos pobres e vulnerveis. Uma parte interessada (stakeholder) definida como um indivduo, uma comunidade, um grupo ou uma organizao interessados no resultado de uma interveno, seja por serem afetados por ela positiva ou negativamente, ou por poderem exercer alguma influncia sobre ela, positiva ou negativa (DFID, 2003, 2.1). Este Livro-guia parte de uma resposta crescente e colaborativa de agncias internacionais e parceiros nacionais a trs questes importantes para os que analisam impactos de reformas de polticas: como encorajar e prover anlises mais sistemticas dos impactos sociais e na pobreza; como criar competncias no pas; e como transferir dos doadores para outros atores a atribuio de realizar a anlise dos impactos de polticas especficas. Mais concretamente, destina-se a preencher uma lacuna nas orientaes relativas anlise institucional, poltica e social, e pretende complementar a orientao fornecida no documento do Banco Mundial PSIA Users Guide (World Bank, 2003a, (arquivo pdf de 664 kb)) (Guia do Usurio para AISP, cujas tradues em francs, espanhol e russo esto disponveis na pgina World Bank PSIA na Internet). O Guia do Usurio advoga uma abordagem multidisciplinar AISP e apresenta instrumentos e mtodos tanto econmicos quanto sociais, complementando o World Banks Economic Toolkit (Bourgignon e da Silva, 2003. Este Livro-guia tambm pode ser usado para complementar as notas produzidas pelo Banco Mundial relativas aos componentes de anlise econmica nas AISPs j realizadas. Num sentido genrico, o termo anlise social abrange o que est descrito abaixo como anlise institucional, poltica e social - trs reas sobrepostas de anlise derivadas de diferentes disciplinas. Essas anlises centram-se nas regras e relaes que sustentam e influenciam os resultados das reformas de polticas: A anlise institucional examina as regras do jogo criadas pelas pessoas para comandar os

comportamentos e as interaes grupais nas esferas poltica, econmica e social. Essa anlise baseia-se na compreenso de que tais regras, sejam formalmente construdas ou informalmente inseridas na prtica cultural, intervm no processo da reforma de polticas e distorcem, por vezes at de uma forma fundamental, os impactos esperados.

A anlise poltica examina a estrutura das relaes de poder e os interesses muitas vezes

firmemente estabelecidos de diferentes participantes, bem como a forma como afetam o processo decisrio e a distribuio dos resultados. A elaborao da anlise poltica parte do reconhecimento da existncia de interesses na base do debate de polticas e reformas econmicas, desafiando, assim, os pressupostos sobre a natureza tcnica da formulao de polticas.

A anlise social examina as relaes que comandam a interao em diferentes nveis

organizacionais, tais como famlias, comunidades e grupos sociais. Essa anlise parte da compreenso de que as normas sociais e culturais definem as relaes dentro de cada grupo de atores sociais e entre os grupos, tendo, portanto, impactos sobre o nvel de incluso e de empowermentNT de grupos sociais especficos.

1 Em ingls, TIPS Tools for Institutional, Political and Social Analysis. 2 Embora a AISP tenha se centrado em polticas, a abordagem e as ferramentas documentadas aqui podem ser igualmente bem aplicadas para a avaliao de planos, programas e megaprojetos. NT A palavra empowerment, sem traduo direta para o portugus, ser mantida no original, significando o processo pelo qual indivduos e grupos apropriam-se de suas potencialidades para conquistar espao pblico e social na comunidade, em particular o poder de participar de deliberaes e decises que lhes digam respeito.(NT)

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/PSIA-Guide.pdfhttp://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/PSIA-Guide.pdfhttp://www1.worldbank.org/prem/poverty/psia/tools.htm

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Este Livro-guia introduz ferramentas para compreender como as dimenses institucionais, polticas e sociais envolvidas na elaborao e na implementao de polticas afetam a pobreza e a eqidade distributiva. Essas ferramentas so apresentadas para uso na AISP, mas podem ser tambm utilizadas para anlises de polticas num sentido mais amplo. Os mtodos e as abordagens usados na AISP no so novos, como tambm no novidade o enfoque nas questes distributivas das intervenes. A primeira anlise de impacto usando o ttulo AISP foi conduzida atravs de uma srie de estudos-piloto realizados pelo Banco Mundial e o Departamento de Desenvolvimento Internacional da Gr-Bretanha (DFID) durante 2002. A disseminao da abordagem foi relativamente rpida: em trs anos, mais de 125 AISPs haviam sido iniciadas em mais de 60 pases. O Livro-guia destina-se, principalmente, aos que esto trabalhando diretamente com AISPs em pases em desenvolvimento. No se procura fazer prescries aos profissionais envolvidos, mas prover orientaes ilustrativas a respeito de uma variedade de ferramentas e sobre como aplic-las. Ferramentas derivadas de diferentes disciplinas so teis para a AISP, particularmente quando utilizam dados slidos e so complementados por uma anlise de boa qualidade e pela compreenso do contexto. A AISP constitui uma oportunidade para um uso muito eficaz de mtodos mistos, como ilustrados pelos estudos de caso apresentados neste Livro-guia. O Livro-guia est organizado em dois volumes. O Volume 1 fornece uma viso geral dos elementos que compem a anlise institucional, poltica e social para a AISP, introduzindo quadros de referncia e ferramentas com base em ilustraes e estudos de caso. O Volume 2 traz um nvel mais detalhado de orientao e exemplificao do uso de ferramentas concretas ou de reas especficas de boas prticas. A verso do Livro-guia em CD-ROM integra os Anexos ao corpo principal do Livro atravs do uso de hiperlinks e oferece links adicionais para publicaes pertinentes citadas no texto. (Para as verses pdf dos dois volumes, clique nos links seguintes: Volume 1(pdf 616kb) Volume 2(pdf 8.8mb).) A Parte 2 do Volume 1 introduz a AISP e seus principais objetivos e rev de uma forma resumida os dez elementos de boa prtica apresentados no Guia do Usurio para AISP do Banco Mundial (World Bank, 2003a). O restante do Livro-guia pauta-se por esses elementos e apresenta uma orientao tcnica em trs nveis de anlise, conforme ilustrado no Grfico 1.1. A Parte 3 introduz ferramentas para anlises de nvel macro do pas e do contexto da reforma. A Parte 4 descreve ferramentas para analisar os processos de nvel intermedirio envolvidos na implementao de polticas, e a Parte 5 introduz ferramentas para analisar os nveis intermedirio e micro dos impactos decorrentes da reforma de polticas. A Parte 6 mostra formas de usar essa anlise para determinar os riscos que podem afetar a reforma de uma poltica. A Parte 7 contm uma breve concluso.

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/Volume201Tools-Sourcebook.pdfhttp://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/Volume2Sourcebook.pdf

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2. Uma introduo Anlise de Impactos Sociais e na Pobreza A Anlise de Impactos Sociais e na Pobreza (AISP) busca apoiar a reduo da pobreza atravs de melhores polticas, particularmente, mas no exclusivamente, em pases de baixa renda. A AISP cada vez mais reconhecida como um elemento importante dos processos de definio de estratgias nacionais de luta contra a pobreza, e tambm dos programas de emprstimo do FMI e do Banco Mundial. Nesta seo sero detalhados os objetivos da AISP e introduzidos os elementos centrais da metodologia de anlise utilizada.

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2.1. Objetivos da AISP

O principal objetivo da AISP avaliar os efeitos distributivos da reforma de polticas, analisando os impactos sobre o bem-estar de diferentes grupos sociais e grupos de meios de subsistncia distintos. O surgimento da AISP foi motivado por preocupaes a respeito da lentido na reduo da pobreza, por reaes aos impactos sociais dos Programas de Ajuste Estrutural e pelo reconhecimento de que a pobreza e os aspectos distributivos so influenciados por uma ampla gama de polticas mesmo pelas que no esto diretamente voltadas para a reduo da pobreza. Evidncias geradas pela AISP podem ser integradas aos ciclos das polticas, caso se trate de uma anlise prvia do provvel impacto de reformas especficas, de anlises feitas durante o processo de reforma ou de anlises aps as reformas terem sido completadas. A AISP anterior reforma pode orientar a escolha entre polticas alternativas, bem como a respectiva elaborao e a seqncia das etapas. Durante a implementao, a monitorizao de uma reforma e de seus impactos pode levar ao refinamento da reforma, reconsiderao do ritmo/seqncia dos arranjos institucionais da reforma e introduo ou consolidao de medidas de mitigao. Finalmente, a AISP realizada aps a reforma de uma poltica avalia os impactos distributivos reais da reforma completada, o que ajuda os analistas a compreender os provveis impactos de futuras reformas. A AISP pode ser aplicada reforma de polticas em inmeras reas e setores (ver Quadro 2.1). Alguns tipos de reforma, como a descentralizao ou a reforma do setor pblico, tm maior probabilidade de ter impactos diretos que se prestam mais obviamente anlise institucional, poltica e social. Ainda assim, ferramentas para a anlise institucional, poltica e social podem ser aplicadas a impactos que tenham tanto natureza de mercado quanto de no-mercado. Isso se deve s caractersticas dos impactos indiretos da reforma de polticas e tambm ao fato de que reformas de mercado tm seus impactos mediados pelas respostas comportamentais de atores institucionais e de pessoas afetadas. A AISP uma entre muitas formas existentes de anlises de impacto que considera o impacto provvel de uma mudana de poltica ou de uma mudana regulatria. A avaliao de impacto ambiental, em particular, h muito tem sido prtica padro entre doadores e agncias governamentais no mbito de projetos. A Avaliao Ambiental Estratgica (ver Quadro 2.2) transfere a anlise para o nvel estratgico (polticas, planos e programas) focalizando, de incio, o ambiente natural, mas crescentemente englobando tambm os ambientes sociais e econmicos. Embora cada tipo de anlise possa centrar-se em questes diferentes, todas elas partilham um conjunto comum de pressupostos a respeito de nossa habilidade de explicar, compreender, predizer e controlar o meio ambiente. A AISP usa um conjunto de competncias comuns anlise padro de impactos, mas est concentrada no bem-estar comparativo de diferentes grupos, particularmente aqueles com risco mais elevado de serem afetados pelos impactos de polticas. Uma AISP bem-sucedida tende a ter trs caractersticas: i) Ajuda a promover o uso de uma maior variedade de evidncias no processo de formulao de

polticas; ii) Complementando o trabalho analtico correspondente, aumenta o grau em que a eqidade

distributiva levada em conta no processo da poltica, ao:

garantir que as polticas no sejam julgadas puramente em termos de eficincia econmica agregada; e

esclarecer os pressupostos ou as teorias subjacentes s ligaes entre a pobreza e as

decises sobre reforma de polticas. iii) Apia processos inclusivos de formulao de polticas ao produzir evidncias capazes de informar

o debate entre formuladores das polticas e outros interessados, de um lado, e uma ampla variedade de atores. Isso feito atravs de processos existentes ou emergentes de formulao

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de polticas, tais como os contidos nos Documentos de Estratgia de Reduo da Pobreza (Poverty Reduction Strategy Papers - PRSPs). Atravs de bons processos, as evidncias fornecidas pela AISP infiltram-se num amplo e transparente debate sobre polticas entre os interessados locais.

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2.1.1. Formulao de polticas baseada em evidncias: desafiando polticas baseadas em grupos de interesse

Novas abordagens ao gerenciamento de polticas enfatizam a importncia de que evidncias slidas, uma avaliao adequada e uma boa anlise estejam no cerne da formulao de polticas. Evidncias slidas ajudam a promover melhores decises e elevam a qualidade dos resultados obtidos nos processos de reforma poltica. No nvel nacional, uma poltica baseada em evidncias alimentada por fluxos de informao oportunos e relevantes. Sem tal informao, os formuladores de polticas trabalham no escuro. Ainda assim, a anlise da pobreza e dos impactos sociais de polticas no deve ser promovida de forma ingnua, como se conduzisse automaticamente a uma formulao de poltica neutra, baseada em evidncias. Evidncia algo que rapidamente se torna politizado nas mos de formuladores de polticas e de outros grupos de interesse. As evidncias usadas para a AISP podem incluir a anlise transparente das polticas e estruturas de poder existentes, ajudando a evitar que sejam capturadas por grupos de interesse e levando formulao de polticas mais inclusivas e a instituies mais responsabilizveis.

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2.1.2. Reduo da pobreza na formulao de polticas: o papel da eqidade e

da eficincia O abandono de prescries universais para reformas de polticas e a adoo de abordagens que respondam ao contexto especfico de cada poltica fortalecem os esforos contnuos para garantir que as etapas de formulao e implementao sejam motivadas por preocupaes com a reduo da pobreza e a eqidade distributiva. Parceiros do desenvolvimento esto comprometidos com a anlise dos antecedentes da pobreza (das condies iniciais, anteriores deciso por uma determinada poltica) e com as implicaes sociais de reformas polticas. O Banco Mundial, por exemplo, espera que documentos de programa relativos s operaes de polticas de desenvolvimento especifiquem, dentre as polticas apoiadas pela operao, quais podem ter conseqncias significativas em termos sociais e sobre a pobreza, e resumam seus principais efeitos. Os documentos tambm devem descrever como lacunas analticas ou limitaes dos devedores seriam tratadas antes ou durante a implementao. (OP8.60 Development Policy Lending). Uma orientao tcnica sobre como realizar esse trabalho fornecida em Good Practice Note on PSIA (pdf 184kb) A preocupao da AISP com os impactos distributivos de polticas proporciona um esquema analtico para promover o crescimento com eqidade, e isso feito tomando em conta as concesses mtuas envolvidas e identificando ganhadores e perdedores das reforma de polticas. Para examinar essa relao atravs da AISP, a avaliao econmica, institucional, poltica e social necessita ser combinada de forma eficaz para que se possa compreender da melhor maneira possvel os impactos distributivos, provveis ou reais, de iniciativas de polticas. As avaliaes econmicas utilizam vrias ferramentas para estimar os custos e benefcios de uma iniciativa (ver Quadro 5.2). A anlise institucional, poltica e social complementa a anlise econmica ao usar ferramentas predominantemente qualitativas e analiticamente slidas para compreender a natureza das relaes sociais, polticas e institucionais subjacentes implementao e ao impacto de polticas.

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/WB_PSIA_Good_Practice.pdf

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2.1.3. Formulao inclusiva de polticas: apoiando a participao e o senso

de propriedade dos interessados

A transio para reformas de polticas baseadas em evidncias oferece uma oportunidade para o uso de quadros de referncia na formulao de polticas, tais como os Documentos de Estratgia de Reduo da Pobreza (PRSPs), de modo a ampliar a incluso e a participao no ciclo das polticas. Isso conseguido atravs do recurso a evidncias da AISP durante o processo de engajamento transparente com uma ampla gama de atores estatais e no-estatais. Existe uma dimenso tica na coleta de informao, interpretao da informao e elaborao de polticas. Mecanismos de transparncia e responsabilizao (accountability) podem incluir preferencialmente os pobres, para que tenham mais poder no confronto com interesses concorrentes e perante potenciais aliados. A AISP, tomada como um corpo de evidncias, no ser efetiva a menos que inserida num processo transparente de poltica (World Bank Good Practice Guide on Participation (pdf 532kb); DFID Good Practice Principles Note (pdf 56kb)). Atravs de boas prticas na AISP, a anlise de polticas pode ser ancorada na formulao e implementao de estratgias nacionais de reduo da pobreza capazes de criar nos interessados a noo de propriedade, ao incluir, de forma transparente, um grupo o mais abrangente possvel de interessados, entre os quais a sociedade civil e grupos diretamente afetados. Para os interessados nacionais e os doadores, a AISP fornece as evidncias que possibilitam repensar a reforma com profundidade e decidir sobre mudanas destinadas a mitigar impactos negativos ou fortalecer os positivos, seja alterando o timing ou a seqncia da poltica, seja introduzindo medidas compensatrias ou complementares. Com freqncia, o prprio processo de gerar evidncias (da AISP), atravs da reunio de vrias partes, em nveis diferentes, para realizao de workshops de anlise de interessados e outras formas de avaliao em grupo, que permite criar espaos institucionais adicionais para a discusso de mudanas numa poltica. Em algumas instncias, no entanto quando, por exemplo, a anlise da poltica antes da reforma uma questo muito sensvel , uma nfase em processos, tal como previsto para a realizao da AISP, ser menos adequada, ou precisar ser cuidadosamente gerenciada.

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/GPN_Participation.pdfhttp://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/DFID_PSIA_Good_Practice2.pdfhttp://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/DFID_PSIA_Good_Practice2.pdf

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2.2. Elementos da metodologia da AISP O Guia do Usurio para AISP (Users Guide to PSIA (World Bank, 2003a)(pdf 884kb)) introduz os dez elementos de uma boa AISP (ver Quadro 2.3). Este Livro-guia faz uso desses elementos ao propor ferramentas para a anlise institucional, poltica e social. Aqui a nfase est posta em trs reas importantes para uma slida AISP: o estabelecimento do cenrio de referncia (ou o contrafactual), a identificao de canais de transmisso, e a identificao de impactos diretos e indiretos da reforma de polticas.

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/PSIA_Guide.pdf

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2.2.1. Estabelecer o cenrio de referncia (ou o caso de base) A fim de estimar a dimenso e a natureza do impacto de uma interveno, em comparao com outros cenrios de poltica ou com no fazer absolutamente nada (cenrio de referncia), deve-se comear com a comparao entre os impactos de uma mudana de poltica e as provveis tendncias que ocorrero caso no haja nenhuma mudana na poltica. Em muitos casos, essa comparao pode ser estabelecida atravs de uma ampla pesquisa da literatura sobre o caso de base e as tendncias no pas, ou a partir de contextos semelhantes em outros locais. Se, no entanto, o quadro comparativo resultante da literatura secundria no for suficientemente claro, pode-se fazer uma pesquisa primria, construda sobre slidos protocolos de amostragem e modelagem, de modo a permitir uma comparao do impacto com o cenrio do caso de base (ver Quadro 2.4). No contexto da pesquisa experimental, a amostragem para o caso de base freqentemente envolve mtodos que utilizam um grupo-controle aleatrio (randomized control trial method). Claramente, esse processo de randomizao , muitas vezes, impossvel de ser seguido ou altamente inadequado, especialmente se envolver a negao de benefcios vitais a uma parcela da populao. Em alguns casos, pode ser vivel identificar reas geogrficas cujas populaes seriam grupos de controle adequados, mas que permanecero no-afetadas pela implementao da reforma (ver Quadro 2.5).

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2.2.2. Como identificar canais de transmisso O Guia do Usurio (Users Guide to AISP (World Bank, 2003a) do Banco Mundial esquematiza um quadro de referncia para os canais de transmisso atravs dos quais as polticas podem causar impactos distributivos. Delinear canais dessa maneira torna transparentes os pressupostos implcitos na AISP da reforma de polticas, i.e., as expectativas quanto maneira como uma mudana de poltica produzir impactos. So identificados cinco canais no Guia do Usurio. Durante a elaborao das FIPS, e com base na experincia adquirida desde que foi produzido o Guia, deu-se uma cuidadosa ateno adicional compreenso desses canais. Alguns pequenos acrscimos aos cinco j existentes foram feitos, por exemplo: expandindo o conceito de emprego para incluir outras fontes de renda e ampliando a compreenso de preos para serem mais que apenas o preo pago em dinheiro. Um importante princpio operativo na base da elaborao e do aperfeioamento do Guia do Usurio era que, medida que amadurecia a experincia com a AISP, quaisquer impactos imediatos da reforma de polticas que no pudessem ser explicados por um dos canais existentes exigiriam o acrscimo de um ou mais canais de transmisso. Atravs de discusses com os profissionais de AISP durante a elaborao deste Livro-guia, ficou claro que esse era, de fato, o caso dos impactos como aqueles listados no Quadro 2.6, relativos a mudanas formais na governana do setor pblico ou a relaes de poder. A tentativa de espremer essas reformas nos canais existentes foi considerada pouco vlida: o canal tornou-se to amplo que sua validade analtica ficou comprometida, e, mesmo assim, o encaixe ainda era precrio. Embora a anlise ex-ante seja possvel para algumas dessas reformas, os impactos de outras, tais como as de nmero 4 e 6 no Quadro 2.6, prestam-se melhor a anlises ex-post. Tendo em mente esses tipos de reforma, estamos introduzindo aqui um sexto canal de transmisso para casos nos quais a autoridade compreendendo poder, estruturas e processos diretamente mudada atravs de reformas de polticas, especialmente atravs da reforma do servio pblico, da descentralizao e de outras reformas institucionais semelhantes. Esses tipos de reformas freqentemente resultam em mudanas no processo decisrio e em novas formulaes de direitos, obrigaes, incentivos e sanes que, por sua vez, influenciaro o comportamento de atores governamentais e cidados. Na esfera poltica, por exemplo, a reforma institucional nos pases do sul da sia garantiu um tero das cadeiras do governo local para mulheres, enquanto iniciativas de governana no Brasil encorajam a participao na preparao e execuo do oramento local. Na esfera social, relaes de poder mudam quando mulheres na Etipia conseguem, atravs de mudana no sistema judicirio, que os homens sejam legalmente responsabilizveis, ou quando grupos minoritrios na Romnia alcanam maior acesso a informaes sobre seus direitos legais. A reforma do servio pblico um bom exemplo da operao do sexto canal porque ele muda diretamente as regras que regem as operaes dos funcionrios. Por exemplo, a criao de um servio pblico profissional ajudar a separar o nvel pessoal do nvel poltico, criando incentivos para uma governana baseada em regras e dando aos funcionrios maior autonomia perante os polticos. Sistemas de gerenciamento de desempenho podem introduzir a aplicao de sanes aos funcionrios que prestam servios pblicos ruins. Isso pode criar processos decisrios que melhorem o desempenho por exemplo, tendo em mente as necessidades dos pobres ou de grupos excludos e reduzam a prtica de rent seeking e outras atividades prejudiciais. O canal pode ser complementado por outros que, por exemplo, reduzam o custo efetivo do servio pblico em conseqncia da diminuio dos subornos (canal de preo) ou melhorem a prestao e a abrangncia dos servios (canal de acesso). Assim tambm, num outro exemplo, a reforma judiciria destinada a estender aos indgenas e aos pobres da Amrica Latina o direito a um documento de identidade muda a autoridade ao lidar com um dos aspectos da excluso social. Trata-se de mais que apenas acesso a bens e servios: a reforma muda toda a estrutura de direitos (entitlements)1 desses grupos sociais e atua como um dos meios,

1 Ainda no existe uma traduo estabelecida para a palavra entitlement. Dentre outras aproximaes, tem sido traduzida como direito, direito de acesso, dotao de capacidades, habilitao, titulamento, capacidade de ter acesso aos bens de que uma pessoa necessita. (NT)

http://siteresources.worldbank.org/INTTOPPSISOU/Resources/222_PSIA_Guide.pdf

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dentre outros, para reduzir o preconceito contra eles. Como portadores de um documento de identidade, ganham status e reconhecimento que anteriormente no tinham. Eles agora tm o direito de solicitar certos tipos de assistncia do estado, crdito, etc., e a obrigao de atender a vrias exigncias legais, como declarar renda e pagar impostos (quando vo abrir um negcio, por exemplo). Alm disso, uma das motivaes da reforma judiciria o reconhecimento de que a independncia do Judicirio (estruturas) e a transparncia (processo) so essenciais tanto para o funcionamento de mercados quanto para o acesso dos pobres justia. importante enfatizar aqui que, ao introduzir um novo canal, NO estamos sugerindo que os cinco j existentes sejam de natureza econmica e que o sexto seja social. Ao contrrio, o sexto canal complementa e enriquece a atual lista de mecanismos de transmisso. Embora alguns desses canais prestem-se mais anlise econmica que social, os impactos de cada canal podem ser analisados recorrendo-se a vrias ferramentas para a anlise institucional, poltica e social. O impacto de uma poltica como uma pedra atirada numa lagoa. H um efeito direto inicial a gua salta , mas as ondulaes resultantes causaro conseqncias menos previsveis medida que se espalham. De forma muito semelhante, o impacto direto inicial de uma poltica pode gerar uma reao em cadeia de impactos secundrios e subseqentes que sero passveis de reforar, distorcer ou reduzir o efeito original da mudana na poltica. A escolha dos canais mais relevantes para analisar tanto os impactos diretos iniciais quanto os secundrios e subseqentes invariavelmente depender de cada situao especfica, ou seja, da natureza da reforma e do contexto social, econmico e institucional dentro do qual ela est ocorrendo. Alm disso, existe toda a probabilidade de que haja efeitos adicionais atravs de outros canais de transmisso. A descrio que se segue dos canais de transmisso resume as questes-chave dos cinco canais existentes no Guia do Usurio para AISP e desenvolve o sexto, com base na discusso anterior. (1) Emprego. Na medida em que uma mudana de poltica afetar a estrutura do mercado de trabalho ou a demanda de mo-de-obra, especialmente em setores que empregam os pobres (como trabalhadores no-qualificados, bias-frias, agricultores), o nvel de vida das famlias de baixa renda ser afetado. Essas mudanas podem incluir muitos outros fatores tais como mudanas de status, na auto-estima ou no acesso a redes sociais que, por sua vez, tm impacto sobre a excluso social e a vulnerabilidade. A transmisso do impacto pode ser direta (p.ex., atravs de cortes de gastos no setor pblico, ou via novas oportunidades de emprego) ou indireta (p.ex., atravs do crescimento macroeconmico, da depreciao da taxa de cmbio, da liberalizao do comrcio ou do mercado). Tambm pode ser que os impactos sobre os setores formal e informal, inclusive sobre o auto-emprego, sejam diferenciados. (2) Preos (produo, consumo e salrios). Os preos determinam a renda real de uma famlia ou domiclio. Preo inclui o preo monetrio real pago e tambm os custos de oportunidade (p.ex, ter de ficar em filas) e custos incorridos na busca de renda improdutiva (rent seeking, ou gastos que no agregam produo de bens e servicos na economia). Mudanas de preos afetaro tanto o consumo quanto as decises sobre a alocao de recursos. Do lado do consumo, as polticas que causam um aumento nos preos de bens ou servios consumidos pelas famlias tais como a elevao das tarifas de importao ou uma poltica monetria inflacionria tero um efeito negativo direto sobre seu nvel de vida. Os produtores tambm sero afetados por polticas que causam mudanas relativas nos preos de seus produtos ou insumos. Mudanas de salrios afetaro de maneiras diferentes os compradores e vendedores de mo-de-obra, e as polticas que alteram preos relativos induziro mudanas tanto na demanda quanto na oferta. (3) Acesso. O bem-estar ser afetado pelo acesso a bens e servios, seja atravs do acesso a mercados e pontos de prestao de servios ou atravs de melhorias na qualidade e na resposta dos fornecedores de servios pblicos ou privados. As polticas podem afetar o acesso diretamente, quando melhoram a proviso de infra-estrutura ou dos servios em questo, ou indiretamente, ao remover limitaes ao acesso de famlias ou grupos especficos. Normas ou regras estruturais ou culturais (como as restries mobilidade feminina e aos direitos de propriedade das mulheres)

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tambm podem impor custos de transao mais elevados ou criar barreiras ao acesso, algumas das quais so mais suscetveis de responder a aes de polticas que outras. Esses tipos de reformas tero o canal de autoridade como o principal, e o canal de acesso como canal de apoio. (4) Ativos. Mudanas no valor de ativos afetaro os aspectos de renda e no-renda do bem-estar. Essas mudanas podem ser devidas a mudanas nos nveis ou nos retornos dos ativos. O patrimnio de ativos inclui capital fsico (tal como a habitao), natural (como terra, gua), humano (como educao, habilidades), financeiro (por exemplo, uma conta de poupana) e social (como a associao a redes sociais que aumentam o acesso informao ou a recursos). Mudanas em determinadas polticas tais como reforma agrria, realocaes da despesa pblica, poltica macroeconmica podem ter impacto direto ou indireto sobre a habilidade das pessoas de investir em seus ativos ou desinvestir, ou de manter os rendimentos que eles propiciam. (5) Transferncias e taxas. O bem-estar afetado por transferncias que podem ter a forma de fluxos privados (tais como presentes e remessas) ou pblicos (como subsdios e taxas). As finanas pblicas tm um impacto direto sobre o nvel de vida de grupos especficos atravs de transferncias inclusive subsdios, transferncias de renda direcionadas e medidas de proteo social e de polticas tributrias cujo impacto distributivo pode ter maior ou menor progressividade. A poltica tributria tem efeitos distributivos diretos na medida em que os recursos ou a renda de uma famlia sejam taxados. Regimes tributrios regressivos oneram desproporcionalmente as famlias mais pobres, e os subsdios podem s vezes simplesmente ser mal direcionados ou capturados pelos no-pobres. Transferncias privadas e remessas de trabalhadores empregados no exterior tambm desempenham um papel importante na diferenciao entre reas urbanas e rurais. Transferncias ilegtimas ou ilegais, tais como dinheiro cobrado para proteo, tambm podem ter efeitos distributivos significativos. (6) Autoridade. Aqui se incluem mudanas no poder, estruturas e processos que governam as funes formais e informais de instituies pblicas. Este canal pode operar no nvel macro (p.ex., reforma do servio pblico), no intermedirio (p.ex., descentralizao da autoridade administrativa), e mesmo no nvel micro (p.ex., redirecionamento dos pagamentos de benefcios, que passam a ser feitos s mulheres e no mais aos homens). O canal encoraja a anlise de como mudanas em comportamentos e interaes relacionados ao processo decisrio podero impactar os atores estatais e os cidados mudanas essas que resultaram de novos agrupamentos de direitos, obrigaes, incentivos e sanes. Atravs deste canal, a anlise de impactos indiretos pode tambm explorar, por exemplo, as situaes em que indivduos e grupos reagem expandindo ou diversificando suas estratgias de subsistncia, ou mudando seu comportamento ao compreender que o sistema tornou-se mais responsivo e mais responsabilizvel. Essas mudanas de comportamento iro, por sua vez, afetar mudanas absolutas e relativas de poder e influncia. Alguns grupos podem tentar minar as novas estruturas decisrias ou conjuntos de direitos, limitando sua implementao ou usando influncias para impedir que outros faam uso dos novos entitlements. medida que se ganha mais experincia na compreenso de como funcionam os canais de transmisso, inevitavelmente haver novos refinamentos. Por enquanto, no entanto, pode-se afirmar que esse canal adicional tanto ajuda a preencher uma lacuna terica quanto responde a uma necessidade prtica enfrentada por inmeras reformas. importante notar que a adio deste sexto canal de transmisso no elimina a necessidade de uma anlise institucional, poltica e social de impactos indiretos que abranja todos os seis canais de transmisso. Uma discusso mais detalhada est feita abaixo.

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2.2.3. Como identificar impactos diretos e indiretos Como mencionado na descrio dos seis canais de transmisso, mudanas em polticas podem ter impactos direitos iniciais e impactos secundrios e subseqentes atravs desses canais e sobre o resultado final. Os impactos diretos so os efeitos imediatos de uma poltica: por exemplo, o aumento de preo reduzindo o poder de compra ou limitando a expanso na cobertura de um novo servio. Esses impactos tendem a ser fceis de medir. No se presumem mudanas comportamentais, e h como conhecer os dados requeridos, mesmo que nem sempre estejam disponveis. No entanto, esses impactos diretos podem alterar os benefcios concedidos atravs de impactos indiretos adicionais. A perda de um emprego em conseqncia da reforma do setor pblico, por exemplo, pode ter considerveis impactos sociais indiretos. Isso ocorre naqueles contextos nos quais benefcios associados ao emprego funcionam como uma forma de segurana social, dada a ausncia de uma proviso significativa de benefcios sociais estatais e de um mercado privado de seguros. A perda de status pode aumentar ainda mais a pobreza dos afetados. A perda de empregos no setor pblico, especialmente em cidades monoindustriais, pode tambm levar contrao da economia local, criando efeitos secundrios adicionais. Alm de mudanas no conjunto de entitlements, a maior parte das mudanas em polticas tambm resultar em mudanas comportamentais que so, com freqncia, exatamente o objetivo da mudana na poltica. Essas mudanas resultaro em impactos indiretos, ou secundrios, que so mais difceis de estimar. O aumento no preo de um bem, por exemplo, pode levar consumidores a consumir menos ou a buscar substitutos. Aumentos de preos podem levar os consumidores de renda mdia a reduzir o consumo de bens e servios menos essenciais produzidos por grupos pobres, que dependem deles para sua subsistncia. Da mesma forma, os produtores podem usar menos de um insumo ou tentar e conseguir passar os custos aos consumidores, aumentando preos. Alternativamente, eles podem reduzir o nvel de produo e afetar seus empregados e fornecedores, e assim por diante. Esses elos so muitssimo mais difceis de estimar e requerem dados e modelagens mais detalhados. At agora, a experincia com a AISP ilustra que reas de reforma especficas, tais como descentralizao e alguns tipos de reforma institucional, tm impactos direitos e imediatos atravs do canal de transmisso da autoridade. A AISP da descentralizao e privatizao do setor de gua na Albnia, por exemplo, ilustra que mudanas de regras relativas descentralizao da regulao e do gerenciamento de servios de utilidade pblica ajustam-se a um canal de transmisso direta e imediata, ocorrendo mudanas na autoridade tanto nas relaes dentro do governo quanto naquelas entre o governo local e os cidados. O impacto secundrio visto na resposta daqueles que foram afetados, tanto em seus comportamentos individuais quanto nas relaes com outros. Os quadros conceituais e as ferramentas apresentados neste Livro-guia destinam-se a colaborar na anlise institucional, poltica e social desses impactos secundrios. Esta anlise freqentemente abrange todos os canais de transmisso, demonstrando a necessidade de examinar a interao de diferentes efeitos diretos imediatos. A Tabela 2.1 faz a correspondncia entre canais de transmisso com impactos diretos e imediatos e alguns tipos de polticas (uma listagem indicativa, no exaustiva), e a Tabela 2.2 relaciona as ferramentas descritas neste Livro-guia adequadas para cada canal de transmisso. Foi enfatizado nesta seo que a incluso de um sexto canal de transmisso relativo autoridade no substitui a necessidade de uma anlise institucional das reformas onde outros canais de transmisso podem estar gerando efeitos diretos com possvel impacto sobre instituies e prticas, inclusive normas scio-culturais. Uma combinao de mtodos qualitativos e quantitativos empregados em diversas disciplinas pode ser utilizada para ajudar a compreenso desses mltiplos impactos indiretos. Este Livro-guia visa a expandir o entendimento do processo da AISP e a diversidade de mtodos que podem ser empregados. As sees seguintes examinaro em maior detalhe os vrios mtodos disponveis para tais anlises.

http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/TOPICS/EXTSOCIALDEVELOPMENT/EXTTOPPSISOU/0,,contentMDK:20588762~menuPK:1441948~pagePK:64168445~piPK:64168309~theSitePK:1424003,00.html#Table_2_1#Table_2_1http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/TOPICS/EXTSOCIALDEVELOPMENT/EXTTOPPSISOU/0,,contentMDK:20588762~menuPK:1441948~pagePK:64168445~piPK:64168309~theSitePK:1424003,00.html#Table2_2#Table2_2

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Tabela 2.1. Exemplos de Canais de Transmisso Relevantes para Reformas de Polticas especficas Reforma

Reforma de polticas monetrias i.e., reformas que influenciam inflao e taxas de juro.

1 Reforma macroeconmica e fiscal

Amplas reformas de polticas fiscais para tratar o dficit fiscal (tipicamente, o ajuste envolve reduo de despesas e aumento de impostos). Reforma das despesas, p.ex., mudanas nos nveis/na alocao de gastos setoriais

2 Finanas pblicas

Polticas de renda nveis, composio, melhorias na administrao de impostos, recuperao de custos nos servios pblicos Reformas de barreiras tarifrias e no-tarifrias

3 Reforma comercial e da taxa de cmbio

Reformas da taxa de cmbio Eliminao de preos administrados (i.e., faixas de preos, preos mnimos e mximos); fim de programas de estoques reguladores (usados para manter os preos). Mudanas em subsdios e impostos sobre as famlias

4 Reforma agrcola

Eliminao de cmaras setoriais de comercializao

5 Reforma agrria

Distribuio de terra aos sem-terra ou adoo de leis que regulem o direito de possuir, trocar ou herdar terra

6 Reforma do setor financeiro

Liberalizao financeira (taxas de juros, alocao de crdito, grau de regulamentao, propriedade de instituies financeiras)

7 Reforma do mercado de trabalho Legislao sobre salrio mnimo, segurana no emprego, liberalizao do mercado de trabalho

8 Reforma dos servios bsicos Reestruturao das empresas estatais de servios; aumento da participao privada nessas empresas at atingir a plena privatizao

9 Reforma do servio pblico Reforma gerencial, reestruturao dos quadros de funes e salrios

10 Descentralizao Descentralizao fiscal, desconcentrao da autoridade

11 Redes de segurana social

Transferncias em dinheiro/em espcie direcionadas para categorias especficas (AIDS, rfos, deficientes, idosos), mudana nos arranjos de financiamento

12 Reforma previdenciria Mudanas em esquemas de financiamento, taxas de contribuio, idade de aposentadoria, concesses de aposentadoria, inclusive introduo de planos privados e esquemas no-contributivos de aposentadoria

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Tabela 2.2. Ferramentas (FIPS) relevantes para os Canais de Transmisso [Nota: A tabela seguinte ilustra o uso das ferramentas para anlise de impactos mais adequadas para diferentes canais de transmisso.1 A escolha exata dos quadros de referncia analticos e das ferramentas depender do contexto do pas, da natureza da reforma, da relao do setor com a economia, da disponibilidade de dados e recursos, e da capacidade do cliente.] Canais de transmisso Quadros de Referncia Analticos & Ferramentas

1. Emprego Anlise de Vulnerabilidade

Anlise de Gnero Anlise de Meios de Subsistncia Anlise de Redes Mtodos Participativos

2. Preos (produo, consumo e salrios)

Anlise de Vulnerabilidade Anlise de Gnero Mtodos No-contextuais

3. Acesso Anlise de Vulnerabilidade Mtodos Contextuais Mapeamento Esttico e Dinmico Anlise dos Custos de Transao Mtodos Participativos

4. Ativos Anlise de Meios de Subsistncia Anlise de Gnero Anlise de Empowerment Mtodos Participativos

5. Transferncias e Taxas Anlise de Vulnerabilidade Anlise de Custos de Transao

6. Autoridade Anlise Poltica (Anlise Social do Pas, Anlise de Poder) Mapeamento Esttico e Dinmico Anlise de Custos de Transao Anlise de Empowerment Mtodos Participativos

1 medida que ganhamos experincia, a anlise pode produzir orientaes mais especficas que capturem como a combinao de quadros de referncia e ferramentas funciona melhor para conjuntos especficos de reformas.

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3. Como compreender os contextos do pas e da reforma Existe uma compreenso crescente entre as agncias doadoras internacionais e os parceiros no governo e na sociedade civil de que a reforma de polticas deve basear-se numa melhor compreenso dos contextos do pas e da reforma. No nvel macro do contexto do pas e da reforma, uma ampla anlise das condies iniciais e gerais do pas, examinando o cenrio poltico, pode ser complementada por anlise mais especfica do contexto relativo a um tipo particular de reforma. Aqui sero introduzidas abordagens adotadas para a anlise de pas (Seo 3.1) e descritas diversas ferramentas que podem ser empregadas para a) definir os interessados e determinar seus interesses no nvel macro (Seo 3.2) e b) examinar as instituies que governam o contexto da reforma (Seo 3.3).

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3.1. Anlise do contexto do pas: Anlise de Pas Compreender melhor o contexto do pas significa investigar a composio herdada e em transformao de variveis polticas, econmicas e sociais que influenciam as agendas polticas e as respectivas mudanas. Os doadores, em particular, reconhecem atualmente que: Embora as experincias e lies de histria de outros pases nas reas de desenvolvimento e

reduo da pobreza possam fornecer insights e ensinamentos para o desenvolvimento internacional atual, essas duas reas podem ser vistas e compreendidas atravs da situao atual particular em que se encontre determinado pas.

Os governos de muitos pases continuam no-responsivos s necessidades dos pobres e no

mostram interesse em alcanar metas tais como as Metas de Desenvolvimento do Milnio. Conceitos como falta de vontade poltica, freqentemente usados para descrever essas situaes, so inadequados porque, embora identifiquem um problema, deixam de explicar a razo desses fracassos e no facilitam a identificao de solues viveis.

A condicionalidade, associada assistncia ao desenvolvimento e destinada a mudar o

comportamento dos governos recebedores, um instrumento grosseiro; e a eficcia da ajuda aumenta quando a ajuda apia esforos nacionais, tomando como ponto de partida a situao local, e no polticas pr-concebidas. Isso significa dar maior ateno anlise do contexto do pas e s maneiras como ele est mudando.

Doadores e pases parceiros esto agora conduzindo e contratando formas de anlise de pas para compreender o contexto histrico e sua implicao para futuras mudanas. Exemplos recentes incluem um estudo sobre aspectos da economia poltica na Ucrnia ps-independncia (Mueller, 2002) e no Gabo (Mueller, 1999) que esto influenciando os esforos de reformar polticas. Anlises de pas como essas podem ser conduzidas usando a literatura secundria, com talvez alguma anlise adicional baseada em entrevistas com informantes-chave e seguida da anlise de dados de pesquisas existentes. Nesta seo sero apresentadas e ilustradas quatro abordagens s anlises de pas sendo adotadas e financiadas pela comunidade de doadores. Essas incluem quatro ferramentas: 1) a Anlise Social do Pas (Country Social Analysis) do Banco Mundial, 2) os Indutores de Mudana (Drivers of Change) do Departamento de Desenvolvimento Internacional da Gr-Bretanha (DFID, na sigla em ingls), 3), a Anlise de Poder (Power Analysis) da Agncia Sueca de Desenvolvimento Internacional (SIDA, na sigla em ingls) e 4) o Questionrio de Governana (Governance Questionnaire) da Cooperao Tcnica Alem (GTZ, na sigla em alemo).

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3.1.1. Anlise Social do Pas - ASP (Banco Mundial) A Anlise Social do Pas (ASP) uma ferramenta de diagnstico adotada pelo Banco Mundial. Ela integra a anlise social, econmica, poltica e institucional para melhorar a compreenso das ligaes entre as dinmicas do desenvolvimento socioeconmico e as estruturas sociais e polticas que moldam os resultados do desenvolvimento nos nveis local e nacional. A ASP baseia-se principalmente em dados qualitativos e quantitativos existentes, suplementados com a coleta de novos dados primrios sobre questes de interesse particular em cada caso. A ASP d ateno particular: (i). distribuio entre diferentes grupos sociais de ativos, direitos (entitlements), atividades de

mercado e acesso a mercados, (ii). avaliao de como instituies locais e sistemas polticos afetam a formulao e implementao

de polticas, ou identificao de instituies que esto impedindo os pobres de participar e ter acesso a ativos e servios que promoveriam sua mobilidade social e econmica, e

(iii). s oportunidades e limitaes ao desenvolvimento do pas resultantes de seu atual contexto

social. A Anlise Social do Pas faz uso de bases de dados comparativos existentes, tais como as Estatsticas de Desenvolvimento Social (SD Stats) do Banco Mundial. Elas contm 50 macroindicadores indiretos de desenvolvimento social, designados como Indicadores de Desenvolvimento Social e distribudos em quatro dimenses: (i). o contexto do pas, a fim de identificar e monitorizar as principais estruturas socioeconmicas com

probabilidade de serem afetadas pela reforma (ii). a incluso social, a fim de identificar e monitorizar as regras formais e informais que limitam as

capacidades dos desprovidos de poder (disempowered) e desencorajam a participao de diversos indivduos e grupos na implementao da reforma

(iii). a coeso social, a fim de identificar e monitorizar em que medida as sociedades tm disposio e

capacidade para lidar com necessidades comuns, superar limitaes, considerar interesses diferentes e resolver diferenas com civilidade, de uma forma no-confrontacional

(iv). a responsabilizao social (social accountability), a fim de identificar e monitorizar instituies que

sejam transparentes, responsivas e que atendam ao interesse pblico de uma forma eficaz, eficiente e justa.

Quando possvel, a anlise inclui comparaes longitudinais e entre pases, baseadas em dados disponveis, a fim de permitir uma melhor compreenso das questes e dos processos nacionais que se enquadram nessas quatro dimenses. Anlises Sociais do Pas esto sendo realizadas em aproximadamente 10 pases. A metodologia e as ferramentas aplicadas nas ASP do Equador e do Imen esto discutidas no Volume 2. A cobertura temtica das ASP do Banco Mundial inclui: (i). pobreza e meios de subsistncia entre famlias e grupos sociais (ii). governana, poder, e a eficincia e eqidade do ambiente institucional quanto a diferentes grupos

sociais, e (iii). riscos sociais, polticos e institucionais que afetam o desenvolvimento.

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Cada componente abrange um conjunto de dimenses padro para a anlise emprica. Dentro desse quadro de referncia, so selecionadas questes especficas de cada pas para uma anlise aprofundada, conforme determinado por tendncias sociais e polticas identificadas, e tambm pela assistncia do Banco.

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3.1.2. Indutores de Mudana (DFID) O Departamento para o Desenvolvimento Internacional da Gr-Bretanha (DFID, na sigla em ingls) encomendou uma srie de estudos similares de paises no mbito de sua iniciativa chamada Indutores de Mudana. A Anlise de Indutores de Mudana visa a melhorar a compreenso das foras polticas, econmicas, sociais e culturais que informam a mudana num contexto regional e nacional, e a associar tal compreenso identificao de polticas-chave e indutores institucionais de mudana que afetam o contexto da reduo da pobreza. O DFID decompe a metodologia dos Indutores de Mudana em seis tipos de anlise. Cada um tem um ttulo breve e uma pergunta correspondente destinada a estabelecer se, e em que medida, a sua delegao naquele pas tem uma boa e compartilhada compreenso de um conjunto de questes. Os seis tipos esto resumidos no Quadro 3.1. O primeiro passo fazer uma anlise bsica do pas implica olhar, sem preconceitos induzidos pela postura de ajuda, em que ponto est aquela sociedade e em que direo esto indo suas principais instituies polticas, econmicas, sociais e culturais no longo prazo. Isso envolve ter em mente tudo o que sabemos (em termos amplos) sobre como os pases se desenvolvem, e como as possibilidades de mudana evoluem medida que muda o mundo (Hendrie et al, 2003). O DFID emprega a lista de pontos a serem checados, elaborada por Moore (2001), para fazer a anlise bsica do pas em trs dimenses: Fatores de origem: Existe uma comunidade poltica? O governo controla o territrio? De que

forma a histria da formao do estado, a geografia poltica, a posio geoestratgica e as estruturas sociais e econmicas implantadas moldaram as caractersticas bsicas do sistema poltico? Em que medida o governo depende dos contribuintes para obter receitas?

Fatores de mdio prazo, institucionais: Quo institucionalizados so a burocracia, os

mecanismos de polticas, partidos polticos, organizaes da sociedade civil? Existe uma constituio? Em caso positivo, quo implantada est ela? Qual a base da competio poltica, e a composio da elite poltica? A mobilizao poltica est baseada em questes, ou gira em torno de redes personalizadas de patronagem? Quo importante a etnia? Existem meios pacficos para lidar com a transferncia do poder poltico? Como partilhado o poder entre o Executivo, o Legislativo, o Judicirio, os militares, outros nveis de governo, o setor privado, organizaes religiosas?

Fatores de curto prazo: Qual a capacidade burocrtica e financeira do governo? Os mecanismos-

chave para a responsabilizao vertical e horizontal? Recursos polticos (inclundo o momento no ciclo eleitoral).

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3.1.3. Anlise de Poder (SIDA) A Agncia Sueca para o Desenvolvimento Internacional (SIDA, na sigla em ingls) encomendou a elaborao do que descrito como Anlise de Poder a partir da compreenso de que a reduo sustentada da pobreza requer que as pessoas pobres tenham acesso ao poder e aos recursos polticos. At o momento, as anlises de poder da SIDA tm buscado alcanar dois objetivos: (i) introduzir uma forma alternativa de analisar o cenrio poltico uma que focalize os aspectos

formais e informais das relaes e estruturas de poder, e (ii) compreender como esses fatores afetam a cooperao para o desenvolvimento e como so

afetados por ela. A anlise de atores, grupos de interesse e estruturas tenta descobrir onde est o poder real numa sociedade e qual a sua distribuio em termos geogrficos, institucionais e sociais. A anlise tambm pode indicar que tipo de poder est sendo exercido e como, alm de mostrar como isso compreendido ou subentendido, e por quem. Para uma primeira tentativa utilizando esta abordagem (fase piloto), a SIDA encomendou uma rondadada de anlises de poder em quatro paises: Etipia, Qunia, Burkina Faso e Mali. O objetivo do estudo na Etipia (Vaughan e Tronvoli, 2003, resumido no Volume 2) era fornecer uma compreenso mais profunda das estruturas de poder e das relaes de poder formais e informais, de natureza poltica, econmica e social, na sociedade etope, bem como suas implicaes para a reduo da pobreza no pas. A encomenda da Anlise de Poder tem tido impactos analticos e institucionais interessantes. O conceito de poder embora controverso parecia produzir uma ponte nos debates internos entre os economistas, antroplogos e cientistas polticos da SIDA, muito mais que, por exemplo, o conceito de democracia. Alm disso, ao contratar especialistas locais e organizar seminrios durante os processos do estudo-piloto, a SIDA identificou novos parceiros para o dilogo e novas relaes, e tem feito grande esforo para mant-los.

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3.1.4. Questionrio de Governana (GTZ) O Questionrio de Governana (QG) desenvolvido pela GTZ destina-se a capacitar especialistas em desenvolvimento e tomadores de deciso para que possam analisar de forma sistematica o quadro poltico e institucional de um pas, bem como os atores e processos de um sistema de governana. O QG est baseado num questionrio que pode ser usado para obter de entrevistados qualificados uma avaliao da realidade poltica em sua sociedade. Os entrevistados podem fornecer razes para suas respostas no final de cada questo. Essas explicaes adicionais podem fornecer uma imagem detalhada de uma situao especfica e ser usadas para uma anlise mais aprofundada. As perguntas cobrem seis arenas polticas: 1) Relao entre estado e sociedade 2) Sistema poltico 3) Cultura poltica, agentes de mudana e paradigmas de desenvolvimento 4) Poltica e gnero 5) Poltica econmica e o quadro de referncia poltico de mercados 6) Integrao internacional Quando integralmente aplicado, o QG pode ser usado para situar polticas no contexto poltico e institucional mais amplo. Pode ajudar a analisar o desempenho do sistema poltico e suas relaes internas, bem como aquelas entre o estado e a sociedade civil. Assim, o QG pode dar aos contratantes e facilitadores de uma AISP indicaes a respeito de atores e processos que devem ser considerados durante o processo de consulta da Anlise, e tambm produzir feedback para fundamentar as decises seguintes. Os especialistas podem selecionar perguntas especficas e adapt-las para identificar e avaliar o contexto da economia poltica de reformas especficas. O QG tambm pode ajudar a identificar pontos de entrada para novas anlises institucionais e de grupos interessados. O potencial do QG baseia-se em trs caractersticas centrais: 1) Vai alm de um estudo de instituies formais, incluindo tambm as informais como valores,

normas, atitudes e costumes. 2) Sua abordagem multidisciplinar combina as perspectivas de diversas reas: cincia poltica, direito,

economia, antropologia legal e pesquisa social emprica. 3) A introduo de arenas polticas facilita o exame de estruturas sociais complexas sem perder de

vista as inter-relaes importantes. A abordagem sistmica do Questionrio de Governana s questes relativas governana d apenas uma primeira imagem de tendncias e obstculos. necessrio, portanto, realizar tambm uma anlise mais profunda que d o contexto da reforma de cada poltica especfica.

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3.2. Anlise do contexto da reforma: Anlise dos grupos interessados no nvel macro

A anlise dos grupos interessados baseia-se no reconhecimento de que os resultados do processo decisrio decorrem dos interesses poltico-econmicos e ideolgicos dos principais participantes interessados numa determinada poltica. O objetivo da Anlise de Interessados identificar caractersticas dos interessados, seus interesses e a natureza e o grau da influncia que exercem sobre atuais ou futuras polticas, reformas ou intervenes. O alvo da Anlise Institucional descobrir as organizaes e instituies formais e informais que moldam o contexto no qual essas polticas, reformas, ou intervenes tm lugar. O grande desafio quando se tenta mapear o cenrio da reforma de polticas que existe, com freqncia, muitos atores diferentes, ou participantes interessados, com interesses e interaes que mudam e evoluem ao longo do tempo (Brinkerhoff e Crosby, 2002, 164). Um participante interessado (stakeholder) definido como um indivduo, uma comunidade, um grupo ou uma organizao interessados no resultado de uma interveno, seja por serem afetados por ela positiva ou negativamente, ou por serem capazes de influenciar a interveno de uma maneira positiva ou negativa (DFID, 2003, 2.1). H trs tipos principais de participantes interessados, embora a distino possa no ser totalmente bvia na realidade: Interessados-chave. Aqueles que podem influenciar significativamente uma interveno ou so

importantes para seu sucesso Interessados primrios. Aqueles indivduos e grupos que, em ltima instncia, so afetados por

uma interveno, seja como beneficirios (positivamente afetados) ou prejudicados (negativamente afetados)

interessados secundrios. Todos os outros indivduos ou grupos com algum envolvimento,

interesse ou papel intermedirio na atividade. Os interessados diferem em termos de nveis de interesse, motivaes e nveis de poder e influncia. Eles sero encontrados no governo, na sociedade civil e no setor privado. A anlise de interessados no nvel macro enfoca especialmente os interessados-chave, aqueles capazes de influenciar significativamente a elaborao, a implementao e os resultados de reformas de polticas.

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3.2.1. Matrizes de Anlise de Interessados O contexto da anlise de interessados neste nvel , em geral, uma combinao de uma reviso da literatura secundria (ver acima a discusso sobre anlise de pas) e sesses adicionais de brainstorm ou workshops com um pequeno nmero de informantes-chave com conhecimento de causa. Os analistas podem usar matrizes de anlise de interessados para listar e mapear os interessados e sua relao com o processo da poltica em questo. Essa matriz pode ser usada para situar num mapa duas ou mais das seguintes variveis (DFID, 2003; World Bank, 2003b; Brinkerhoff e Crosby, 2002): o grau de impacto da reforma da poltica sobre os interessados seu nvel de interesse numa determinada reforma de poltica o grau de importncia que atribuem satisfao das necessidades e dos interesses de cada

interessado o nvel de influncia que o interessado tem para facilitar ou impedir a formulao de uma poltica e

sua implementao o grau de poder coercivo do interessado para obrigar o cumprimento de decises no processo da

poltica o nvel de recursos que possuem os interessados e o quanto so capazes de agreg-los ao

processo da poltica o grau de legitimidade do interesse de cada interessado, ou seja, o grau em que as demandas do

um so vistas como apropriadas pelos outros a urgncia que deve ser dada s demandas concorrentes de cada interessado.

Existem muitas verses dessa ferramenta. A Matriz de Anlise de Interessados, por exemplo, identifica categorias de interessados dentro do governo, no setor privado e na sociedade civil, lista sua relevncia para a rea da reforma, suas caractersticas, seu interesse na reforma de polticas (se comprometidos com o status quo ou com a mudana) e o grau de influncia que tm sobre o processo (alto, mdio ou baixo). A Matriz de Importncia/Influncia tambm lista tipos de interessados e a natureza de seus interesses na reforma de polticas (se positivos ou negativos) e ento situa sua importncia para a reforma e a influncia que tm sobre ela em quatro quadrantes. A Matriz de Interesse na Poltica focaliza mais especificamente, com relao a determinada poltica, os objetivos de atores-chave dentro do governo, os provveis benefcios e limitaes que percebem e o grau de influncia que exercem. Esta ferramenta foi usada na Anlise dos Impactos Sociais e na Pobreza relativos criao de uma taxa sobre o arroz na Indonsia (descrita no Volume 2). As matrizes de anlise de interessados so ferramentas teis para organizar a anlise, mas vm acompanhadas de alertas (DFID, 2003, 2.8): O jargo pode ser ameaador para muitos A qualidade da anlise depende da qualidade das informaes coletadas e usadas Matrizes podem simplificar excessivamente situaes complexas Os julgamentos utilizados para situar interessados numa matriz so freqentemente subjetivos.

Diversas opinies, de fontes diferentes, sero freqentemente necessrias para confirmar ou negar estes julgamentos

O trabalho de equipe pode ser prejudicado se for dada nfase excessiva s diferenas entre os grupos que participam de uma atividade, em detrimento do que tm em comum

Tentar descrever ganhadores e perdedores, bem como predizer conflitos e interesses ocultos, pode alienar grupos poderosos.

http://web.worldbank.org/servlets/ECR?contentMDK=20590303&contTypePK=217180&folderPK=1452657&sitePK=1423945#Using_anhttp://web.worldbank.org/servlets/ECR?contentMDK=20590303&contTypePK=217180&folderPK=1452657&sitePK=1423945#Table_1

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3.2.2. Mapeamento Poltico As matrizes de anlise de interessados focalizam o poder, a influncia e a maior ou menor proximidade de indivduos e grupos de interesse reforma de uma poltica em particular. O mapeamento poltico, por sua vez, tem um enfoque mais direto no cenrio poltico da reforma de polticas, identificando a fora e a natureza das opinies poltico-ideolgicas sobre determinada reforma. Esse mapeamento identifica os atores polticos mais importantes e expressa espacialmente suas relaes uns com os outros com respeito elaborao de uma poltica e a sua implementao. Ao fazer isso, poder servir diversos propsitos (Brinkerhoff e Crosby, 2002, 164): Fornecer uma representao grfica da viabilidade poltica de um regime

Oferecer pistas sobre as vulnerabilidades do regime

Detectar a existncia de alianas entre opositores e potenciais coligaes de apoio

Dar uma indicao do nvel de autoridade que possui o regime

Ajudar a indicar a capacidade de implementao de vrios atores

Detectar novas direes nas polticas analisadas

A fim de tornar compreensvel um cenrio poltico complexo, um mapa poltico simplifica o mundo real em duas dimenses: horizontal e vertical. O governo sempre colocado no centro do mapa, uma vez que o principal foco decisrio na distribuio dos benefcios para a sociedade. O principal foco da atividade poltica, e aquilo que ela busca alcanar, influenciar o governo e suas decises sobre polticas. Ao longo do eixo vertical, encontramos os diferentes tipos de atores polticos organizados em quatro setores: atores externos (incluindo doadores e ONGs internacionais), setores sociais (incluindo grupos de interesse baseados em classes ou em indstrias), partidos polticos (que buscam influenciar diretamente as polticas pblicas atravs de instrumentos de poder) e grupos de presso (grupos de influncia formados em torno de questes especficas). O propsito do eixo horizontal estimar o grau em que cada grupo apia o governo. O apoio ao governo vai desde um apoio nuclear ou central at o apoio ideolgico ou suave, enquanto a oposio est segmentada em oposio legal (a que apia firmemente as regras do sistema poltico) ou anti-sistema (que se ope no apenas poltica em questo, mas tambm forma como as decises so tomadas). Os grupos so localizados no mapa de acordo com duas dimenses: 1) apoio ao regime ou oposio a ele, e 2) a relao entre suas respectivas agendas polticas e a do regime no poder (colocando-se no lado esquerdo do mapa os grupos mais progressistas, intervencionistas e/ou esquerdistas). O objetivo da segunda dimenso reconhecidamente muito subjetiva e contextual separar visualmente os grupos que ideologicamente tm pouco em comum e no tm probabilidade de formar alianas ou atuar em conjunto. O mapa lido considerando-se: (i) o grau de apoio ao regime; o grau de coeso de tal apoio e os padres de concentrao de apoio; e (ii) a oposio ao regime, seu tamanho e configurao, seu nvel de intensidade e compromisso, e quaisquer alianas importantes em formao. Quanto mais os atores estiverem concentrados no meio do mapa e em torno do governo com respeito a uma determinada reforma, mais poder e estabilidade teria o governo para implementar a reforma. Estando os atores dispersos em cada lado do governo, haver maior probabilidade de se produzir um ambiente poltico instvel e antagnico para a implementao da reforma, que dependeria do compromisso e da cooperao da oposio. Um problema com o mapeamento poltico a falta de dinamismo, sendo que um nico mapa poltico se assemelha a uma foto instantnea. Ao combinar uma srie de mapas ao longo do tempo, os analistas de processos podem comear a compreender as dinmicas polticas (Brinkerhoff e Crosby, 2003, 165).

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3.3. Anlise do contexto da reforma: Anlise institucional no nvel macro As instituies so as regras do jogo concebidas pelos seres humanos vivendo em sociedade, e elas moldam e limitam a interao humana e as escolhas individuais (North, 1990, 3).1 As instituies podem ser um conjunto de regras como aquelas encontradas numa Constituio, num regime regulatrio ou comercial, num regime poltico, nas relaes Executivo-Judicirio, em eleies, num sistema partidrio, num sistema de servio pblico, numa comunidade social ou geogrfica. Essas regras institucionais esto contidas no sexto canal de transmisso para a AISP proposto neste Livro-guia, e tambm podem revelar-se nas maneiras comuns ou habituais de fazer as coisas. Esses tipos de instituies informais representam prticas culturais que delimitam o comportamento e a interao social e abrangem hierarquias sociais, relaes patro-cliente e varias formas de rent seeking. As instituies reduzem a incerteza provendo uma estrutura para a vida diria poltica, econmica e social. Em outras palavras, os seres humanos, consciente ou inconscientemente, impem limitaes a si mesmos a fim de tornar a vida mais administrvel. Assim sendo, crucial compreender como as instituies so criadas e se transformam, e como influenciam o comportamento humano para que se possa tambm entender como e por que razo a reforma de polticas concebida e implementada. Uma anlise institucional baseada no poder sustenta que as regras tendem a surgir para apoiar a ideologia ou a viso de mundo dominantes em qualquer contexto. O poder pode ser usado por aqueles que controlam recursos, informao e poder decisrio para compelir as pessoas a fazerem o que no escolheriam fazer. s vezes isso se d atravs de coero ou violncia, mas, mais freqentemente, de modo mais sutil, atravs da criao de consenso sobre regras do jogo que distorcem aquelas regras a favor dos poderosos, e impedem as pessoas de fazerem escolhas crticas e bem fundamentadas. A anlise institucional no nvel macro examina as regras que governam a identificao de temas e setores de reforma poltica e as negociaes respectivas. Ela nos permite compreender a motivao para a reforma e a arquitetura institucional que delimitar a formulao da reforma de uma poltica. Uma anlise institucional desse tipo essencialmente uma forma narrativa de anlise. Quando se aplicam mtodos para avaliar instituies polticas, o desafio est em como organizar a informao de modo a torn-la um fundamento til da anlise narrativa. Vrios mtodos podem ser aplicados anlise dos contextos institucionais de uma reforma de poltica. Dois desses mtodos esto apresentados abaixo: anlise de rede e anlise de custos de transao.

1 H aqui uma distino importante a ser feita entre 1) instituies, das quais se originam as regras, e 2) organizaes - sociais, polticas ou econmicas - que funcionam em conjunto para alcanar objetivos comuns dentro das limitaes institucionais (North, 1990, 5).

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3.3.1. Anlise de redes A anlise de redes uma ferramenta para se pensar estrategicamente sobre a fora e a natureza das conexes institucionais existentes no cenrio poltico. um mtodo visual de mapear e medir as relaes e interaes entre um conjunto de atores/entidades (pessoas, grupos, organizaes, etc.) numa comunidade, setor, indstria, etc. Est centrada na estrutura de relaes entre atores/entidades, em vez de nos atributos de cada um. A ferramenta permite uma compreenso da estrutura organizacional e funcional de sistemas, do comportamento organizacional, das relaes interorganizacionais e do fluxo de informao, conhecimento e recursos. Essas so as relaes que delimitam o processo decisrio e as negociaes a respeito da reforma de polticas. Uma rede formada de ns e elos (ver estudos de caso descritos no Volume 2). Os ns numa rede podem ser pessoas, grupos ou organizaes. Os elos so as relaes ou fluxos entre os ns tais como contatos sociais, informao e conhecimento, influncia, dinheiro, associao a organizaes, participao em eventos especficos, ou muitos outros aspectos das relaes humanas. Os atores (os ns) no se comportam nem tomam decises como indivduos fora de um contexto social. Seus comportamentos, suas decises e aes esto imersas em sistemas correntes de relaes sociais. As intervenes para o desenvolvimento esto inseridas em redes sociais formais e informais constitudas de indivduos e organizaes, e seu objetivo produzir um efeito sobre as vidas de pessoas, tanto das que se encontram dentro dessas redes quantodas que so marginais a elas. Uma representao de rede de um programa de desenvolvimento permite uma viso imediata de quem est sendo influenciado por quem (direta e indiretamente), e a qualquer nvel de complexidade requerido. Representaes de redes so muito flexveis e ajustveis, podendo ir desde o desenvolvimento muito local at o mais global, e podem incluir estruturas tanto formais quanto informais.

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3.3.2. Anlise dos custos de transao A Anlise dos Custos de Transao uma ferramenta para anlise da economia poltica centrada na distribuio desigual da informao. A ferramenta mais relevante para reformas do setor pblico ou de reformas de privatizao, podendo ajudar a identificar potenciais limitaes nas fases de elaborao e implementao das reformas com base nos custos de transao. Enquanto as ferramentas existentes de Avaliao Institucional e Mapeamento Organizacional concentram-se em como as relaes de poder moldam a agenda poltica e a luta por recursos e influncia, a Anlise de Custos de Transao parte da premissa de que a incerteza e a informao encontram-se desigualmente distribudas entre agentes/atores. A estrutura de incentivos subjacente a todos os processos de tomada de deciso (em empresas privadas, governos, ONGs, etc.) determinada por essa distribuio de incerteza e informao. Assim, as relaes de poder no so um dado constante nesta abordagem, mas so explicadas em termos dos custos de transao causados por uma distribuio desigual de informaes incorridos para se estabelecerem relaes contratuais. Algumas perguntas fundamentais com as quais lida a Anlise dos Custos de Transao incluem: (i) O problema contratante-agente, em que o contratante principal (freqentemente o governo)

contrata o agente (uma empresa privada) para realizar uma tarefa especfica (proviso de um servio de utilidade pblica), mas onde o acesso desigual informao pode mudar a relao de poder existente e, assim, minar a reforma. O conhecimento especializado na prestao desse tipo de servio, por exemplo, est na empresa privada, e o governo defronta-se com significativos custos de transao quando tenta avaliar o trabalho feito pelo contratante privado; e

(ii) O problema da seleo adversa, em que o ator (o governo) com informao inferior forado a

dar o primeiro passo para estabelecer uma relao contratual. Empresas de seguros enfrentam custos de transao substanciais quando tentam definir prmios para segurados individuais, devido ao desequilbrio no acesso informao: o segurado tem mais informao sobre ele mesmo que a companhia. No contexto de uma reforma, a seleo adversa pode ocorrer quando empresas privadas apresentam propostas para contratos a preos que no podero ser sustentados.

Os fortes vnculos desta abordagem com a economia institucional significam que as relaes sociais so compreendidas no mbito da racionalidade limitada, quando as pessoas agem racionalmente num ambiente imperfeito de informao assimtrica.. Assim, embora a anlise dos custos de transao seja uma ferramenta til para identificar certos pontos problemticos em relaes contratuais antes da implementao da reforma, a ferramenta no pode funcionar isoladamente como uma anlise de economia poltica. O peso dado informao assimtrica, embora relevante, excessivamente dominante para lidar efetivamente, por si s, com questes sociais tradicionais. Os custos de transao so um fator importante para determinar relaes de poder existentes, mas so apenas um fator dentre muitos.

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4. Como entender o processo de implementao de polticas

O segundo nvel de aplicao das FIPS o nvel intermedirio de implementao de polticas. A anlise do processo de implementao permite que se explore como, por que e sob que condies uma interveno numa poltica pode funcionar ou deixar de funcionar, e faz isso atravs de uma melhor compreenso dos fatores contextuais, dos mecanismos e processos subjacentes ao sucesso ou fracasso de uma poltica. A anlise da implementao de polticas inclui a expanso de nosso entendimento de como as polticas impactam o mundo real. Isso significa entender as instituies do nvel intermedirio e o papel dos custos de transao e a fora relativa de negociao que governa as transaes e a tomada de decises no contexto institucional da implementao de polticas. A anlise do processo poltico fortemente contextual porque no busca generalizar alm do contexto no qual a pessoa est trabalhando. por essa razo que mtodos qualitativos so particularmente importantes, porque permitem ao pesquisador estudar com mais profundidade e detalhes as questes selecionadas. Aqui so discutidas ferramentas para a compreenso do processo de implementao de polticas. Tais ferramentas permitem testar pressupostos sobre os participantes interessados e as instituies envolvidas na implementao de polticas: Anlise de nvel intermedirio dos interessados (seo 4.1) para testar pressupostos sobre os

interesses de atores sociais; e Anlise institucional de nvel intermedirio (seo 4.2) para testar pressupostos sobre as regras

sociais que governam a implementao de polticas.

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4.1. Anlise de nvel intermedirio dos interessados Enquanto a anlise de interessados no nvel macro (acima) concentra-se nos interessados-chave, aqueles mais capazes de influenciar o resultado de uma interveno, a anlise de interessados no nvel intermedirio leva em conta, adicionalmente, os interessados secundrios, significando isso todos os outros indivduos ou grupos com algum tipo de investmento, interesse ou papel intermedirio na atividade sendo considerada. Neste nvel, a anlise de interessados ajuda a criar a compreenso da importncia e influncia relativas de diferentes grupos de interesse e atores, bem como o papel que cada um pode desempenhar no processo de implementao.

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4.1.1. Matrizes de anlise de interessados As Matrizes de anlise de interessados seguem uma srie de passos (ver Quadro 4.1) e podem ser feitas em contextos individuais ou de grupos. Uma anlise adicional de interessados feita em grupo pode introduzir um vis estratgico devido dinmica do grupo. No entanto, tal anlise pode ser triangulada com entrevistas individuais e funcionar como um ponto de encontro de atores envolvidos num processo de formulao de polticas, alm de tambm fortalecer o dilogo e o senso de propriedade (ownership) com relao s polticas. Dessa forma, o workshop de interessados serve para gerar informao sobre a influncia de interessados na implementao da poltica, e tambm como um passo na negociao do melhor caminho para a reforma de uma poltica. A anlise de interessados feita no mbito da AISP da reforma agrria na Zmbia identificou os interessados no governo, no setor privado, na comunidade de doadores e na sociedade civil, e examinou o interesse, a influncia e o impacto provvel de cada um sobre a implementao da poltica. Isso foi integrado anlise de quais grupos seriam negativamente afetados em termos sociais e de pobreza, e de se a reforma teria a probabilidade de contribuir para a reduo da pobreza em termos prticos e, em caso afirmativo, como isso seria feito.

http://web.worldbank.org/servlets/ECR?contentMDK=20590303&contTypePK=217180&folderPK=1452988&sitePK=1423945#Stakeholder

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4.1.2. Mapeamento poltico micro O Mapeamento poltico micro pode ser usado para esclarecer a distribuio do apoio a questes especficas, indica como certos setores reagiro a polticas especficas, e esclarece as posies de diferentes organizaes dentro de um mesmo setor. No mapeamento poltico, tal como discutido acima, os atores so representados como unidades homogneas no nvel macro, mas o governo, por exemplo, consiste em mltiplas fraes em muitos nveis diferentes. O mapeamento poltico micro necessrio para se ter uma compreenso das dinmicas de nvel mais baixo com impacto potencial sobre a elaborao ou implementao da reforma. Os atores num mapa poltico micro so desagregados a fim de se identificar as diferentes fraes que existem dentro de um governo, ministrios com agendas conflitivas, fortes laos de sangue/parentesco (kinship) em conflito dentro do governo, e o apoio de outras agncias pblicas (instituies militares, tribunais, cmaras de comrcio, etc.). As duas dimenses no grfico mostram, com freqncia (mas nem sempre), diferentes nveis de apoio reforma e de poder sobre ela. O mapeamento poltico micro particularmente relevante quando uma reforma contm diversas polticas com diferentes nveis de apoio, e que poderiam ser implementadas por diferentes setores do governo. Embora um mapeamento macro possa mostrar o governo como o ator mais poderoso na implementao de uma reforma, estudos adicionais baseados num mapa poltico micro poderiam revelar um alto grau de heterogeneidade e conflito interno dentro do governo, com implicaes importantes para o processo de reforma. O Ministrio das Finanas poderia dar forte apoio a uma substancial reduo nos subsdios a certas indstrias, enquanto o Ministrio do Trabalho pode desejar proceder com cautela para evitar cortes concentrados e de grande porte. As relaes de poder relativo entre os atores podem ser descritas qualitativamente, mas no facilmente representveis no mapa. O mapeamento politico micro pode, portanto, ser eficazmente suplementado com uma anlise de campo de fora.

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4.1.3. Anlise de campo de fora A Anlise de campo de fora um mtodo ilustrativo para apresentar um quadro geral do apoio e da oposio de interessados-chave a uma reforma em particular. capaz de fornecer uma indicao das presses a favor da mudana e contra ela. O mtodo de situar os interessados num continuum de acordo com sua opinio sobre a reforma fornece uma rpida viso geral do clima poltico em torno da reforma. Esse pode ser usado como uma primeira ferramenta numa anlise mais abrangente da economia poltica, atravs da identificao de interessados-chave e da estimativa do efeito potencial de cada um sobre a elaborao e implementao da reforma, Baseada principalmente na anlise de interessados, a anlise de campo de fora identifica interessados-chave e mapeia a posio de cada um em relao reforma. Alm disso, a anlise de campo de fora tipicamente tambm inclui uma quantificao da intensidade com que os interessados se opem reforma ou a apiam. Deve-se notar que Brinkerhoff & Crosby (2002) no incluem esse segundo passo como um componente necessrio da anlise de campo de fora. A nosso ver, no entanto, esse passo essencial para se ter uma idia das foras e dos poderes que afetam a implementao, para que no se termine apenas com um mapa de atores polticos. Sem incluir as foras, no pode haver nenhum campo de fora; necessrio realizar, portanto, identificar os poderes que puxam a reforma em diferentes direes. Tal fora pode ser uma funo do poder relativo de interessados individuais perante os outros atores, ou indicar o quanto o interessado est a favor da reforma ou contra ela. Um interessado poderoso, mas bastante neutro com relao reforma, pode exercer menos presso sobre a implementao que um outro menos influente cuja existncia dependa crucialmente de como seja elaborada a reforma. Devido ao fato de que se trata de uma anlise, e no de um mapeamento, as variveis fora e grau de oposio no precisam ser exibidas num diagrama de dois eixos (veja descrio do caso), mas podem tambm ser expressas em valores. Na forma mais simples, o poder e o grau de oposio ou apoio podem ser padronizados (entre 1 e 5, por exemplo) e multiplicados um pelo outro para se obter uma medida de fora que vai de 1 (fraca) at 25 (forte). No entanto, uma anlise de campo de fora no oferece informao sobre por que os diferentes grupos interessados se distribuem de certa maneira num campo de fora. Os interessados podem se opor s reformas com base em incontveis e diferentes razes que no esto descritas na anlise de campo de fora. A perspectiva unidimensional da posio de cada interessado (ao longo do contnuo de oposio/apoio reforma) tambm exclui opinies mais detalhadas que os interessados possam ter. Eles podem se opor a certas partes da reforma e apoiar outras, suas escolhas podem depender de outras polticas (e no apenas da reforma), etc.

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4.2. Anlise institucional no nvel intermedirio Como visto acima, as instituies podem ser definidas como conjuntos de regras que governam o comportamento individual e coletivo. As instituies podem ser formais sistemas legais, direitos de propriedade, mecanismos de fazer cumprir normas; ou informais, ligadas a prticas culturais e normas sociais. As instituies operam e influenciam comportamentos em diferentes domnios da vida diria (Alsop e Heinsohn, 2005): o domnio do estado (que governa a justia, processos polticos e prestaes de servios), o domnio do mercado (que governa crdito, mo-de-obra e bens) e o domnio social (que governa a comunidade e o comportamento da famlia). No nvel intermedirio da implementao de polticas, as instituies mediam e distorcem os impactos antecipados das reformas sobre o contexto social e a pobreza. A fim de compreender os impactos distributivos da reforma de uma poltica, no podemos presumir a existncia de um modelo de mercados completos (Rajan, 2004) no qual todos atuam segundo um conjunto de regras eqitativas e transparentes cuidadosamente elaboradas no nvel macro. Existem inmeras situaes importantes nas quais arranjos institucionais no nvel intermedirio alteraro ou distorcero a transmisso pretendida de uma reforma de poltica, mais significativamente: Quando no h um mecanismo efetivo para fazer cumprir os contratos. Quando a reforma de

polticas cria novos conjuntos de direitos (entitlements), surgem incentivos que encorajam os interessados mais poderosos a ignorar ou contornar a obrigao de cumprir as exigncias legais que garantem tais capacidades e direitos. A reforma agrria, por exemplo, freqentemente concebida para dar aos pobres a posse segura da terra, que vem acompanhada de eqidade, bem-estar e acesso a recursos para investimentos. Em alguns casos, no entanto, a perspectiva de garantia da posse pode criar incentivos para a expropriao da terra por grupos de interesse mais poderosos, resultando em conseqncias regressivas para os pobres (Deininger, 2005);

Quando os contratos realmente no existem. Quando a reforma de polticas baseia-se em

pressupostos no testados sobre a eficcia institucional, ela pode ter efeitos distorcivos durante a implementao. A reforma do mercado de trabalho, por exemplo, baseia-se num pressuposto a respeito da inflexibilidade dos contratos de trabalho que impede as empresas de reagirem prontamente s condies dos negcios, visto que so refns de sindicatos excessivamente poderosos. No entanto, se a justia for lenta e corrupta, no concedendo nenhuma reparao legal a um trabalhador demitido, a proibio de demitir pode, de fato, ser a nica forma de proteger os trabalhadores de decises arbitrrias dos empregadores (Rajan, 2004);

Quando a distribuio da informao assimtrica. O pressuposto de que todos os

interessados tm as informaes necessrias pode ser testado atravs da anlise institucional de nvel intermedirio. A reforma de polticas que cria novos conjuntos de transferncias ou subsdios, por exemplo, pode criar custos de transao mais elevados para aqueles beneficirios que carecem de informao para ter acesso a tais benefcios.

O propsito da anlise institucional de nvel intermedirio compreender essas regras do jogo que intermedeiam a implementao de reforma de polticas. Abaixo, so apresentadas ferramentas que podem ser usadas para apoiar a anlise institucional da implementao de polticas. O mapeamento organizacional envolve trs passos analticos a serem usados em seqncia ou independentemente: mapeamento esttico (institucional), acompanhamento de processo, e mapeamento de processo (ver Grfico 4.1).

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4.2.1. Mapeamento esttico (Institucional) O Mapeamento esttico uma ferramenta para documentar as regras que governam a implementao de polticas, a fim de testar pressupostos sobre a forma como instituies mediaro a reforma de polticas. Isso feito mapeando-se os recursos e as responsabilidades das agencias e organizaes responsveis pela implementao de mudanas em polticas. Atravs da anlise de estudos de caso existentes e de entrevistas com informantes-chave, podem ser identificados os incentivos em operao e a informao disponvel aos atores envolvidos. O mapeamento institucional realizado como parte da AISP da titulao de terras na Zmbia, por exemplo, revelou ineficincias institucionais e situaes que geravam comportamentos de rent seeking, dada a ausncia de mecanismos para fazer cumprir os contratos e a inexistncia de um sistema legal eficiente. Tudo isso representava um srio risco para os propsitos progressistas da poltica. O mapeamento institucional conduzido para a AISP da reforma da Tanzania Crop Board (Comisso Agrcola da Tanznia) examinou prticas e incentivos institucionais. A equipe de pesquisa mapeou as atividades das comisses regionais at o nvel do produtor, observando arranjos institucionais do setor em diversas regies produtivas. A equipe foi ento progredindo em sentido inverso, at o nvel das comisses agrcolas e de outros agentes no topo da cadeia, descrevendo as etapas desses dois arranjos. O estudo