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PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO PROCESSO PGT/CCR/ 1554/2011 1 Folha _______ Origem: PRT da 4ª Região – Sede Órgão Oficiante: Drª Tayse de Alencar Macario da Silva Interessado: Sigiloso Interessado: Sindilíquida VOTO VISTA - DIVERGÊNCIA ANULAÇÃO DE TAC. DESVINCULAÇÃO DA ATIVIDADE MINISTERIAL À JURISPRUDÊNCIA SUMULADA DOS TRIBUNAIS. A atuação do MPT não está vinculada à jurisprudência sumulada do TST. A desobediência pontual do PN 119/TST não constitui fundamento para anular termo de compromisso de ajustamento de conduta. A eleição da estratégia de atuação do MPT em matéria de contribuições assistenciais é questão controvertida no seio da instituição. Somente a violação objetiva do princípio da legalidade (requisito de validade do ato administrativo de tomada de compromisso para a tutela de interesse metaindividual) pode alicerçar a pretensão de anulação de TAC. I – RELATÓRIO Adoto o bem lançado relatório da Exma. Relatora Drª Adriana Silveira Machado. II – ADMISSIBILIDADE Mantendo o mesmo entendimento da Relatora, conheço do Pedido. III - MÉRITO Desde a edição da Lei 7.347/85, amplos debates doutrinários se travaram em torno da natureza jurídica do termo de ajustamento de conduta, disciplinado no § 6º, do art. 5º, do referido Diploma Legal. Após calorosas discussões, a doutrina

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PROCESSO PGT/CCR/1554/2011

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Folha _______

Origem: PRT da 4ª Região – Sede Órgão Oficiante: Drª Tayse de Alencar Macario da Silva Interessado: Sigiloso Interessado: Sindilíquida

VOTO VISTA - DIVERGÊNCIA

ANULAÇÃO DE TAC. DESVINCULAÇÃO DA ATIVIDADE MINISTERIAL À JURISPRUDÊNCIA SUMULADA DOS TRIBUNAIS. A atuação do MPT não está vinculada à jurisprudência sumulada do TST. A desobediência pontual do PN 119/TST não constitui fundamento para anular termo de compromisso de ajustamento de conduta. A eleição da estratégia de atuação do MPT em matéria de contribuições assistenciais é questão controvertida no seio da instituição. Somente a violação objetiva do princípio da legalidade (requisito de validade do ato administrativo de tomada de compromisso para a tutela de interesse metaindividual) pode alicerçar a pretensão de anulação de TAC.

I – RELATÓRIO

Adoto o bem lançado relatório da Exma. Relatora Drª Adriana Silveira Machado. II – ADMISSIBILIDADE

Mantendo o mesmo entendimento da Relatora, conheço do Pedido. III - MÉRITO

Desde a edição da Lei 7.347/85, amplos debates doutrinários se travaram em torno da natureza jurídica do termo de ajustamento de conduta, disciplinado no § 6º, do art. 5º, do referido Diploma Legal. Após calorosas discussões, a doutrina

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majoritária sufragou entendimento segundo o qual o TAC ostenta natureza jurídica de ato administrativo em sentido estrito. Nesse sentido é Magistério de José dos Santos Carvalho Filho1:

“A um primeiro exame, poder-se-ia considerar o compromisso de ajustamento de conduta como um acordo firmado entre o órgão público legitimado para a ação civil pública e aquele que está vulnerando o interesse difuso ou coletivo protegido pela lei. Não obstante, a figura não se compadece com os negócios bilaterais de natureza contratual, razão por que entendemos que não se configura propriamente como um acordo. Como a lei alude ao ajustamento de conduta às exigências legais, está claro que a conduta não vinha sendo tida como legal, senão nada haveria para ajustar. Por outro lado, ao empregar o termo tomar o compromisso, o legislador deu certo cunho de impositividade ao órgão público legitimado para tanto. Ora, ante esses elementos o compromisso muito mais se configura como reconhecimento implícito da ilegalidade da conduta e promessa de que esta se adequará à lei. [...] Podemos, pois, conceituar o dito compromisso como sendo o ato jurídico pelo qual a pessoa, reconhecendo implicitamente que sua conduta ofende a interesse difuso ou coletivo, assume o compromisso de eliminar a ofensa através da adequação de seu comportamento às exigências legais. [...] A natureza jurídica do instituto é, pois, a de ato jurídico unilateral quanto à manifestação volitiva, e bilateral somente quanto à formalização, eis que nele intervêm o órgão público e o promitente. (CARVALHO FILHO, 2001, p. 201).”

1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2001.

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Não existe, portanto, transação em sede de ajustamento de conduta, uma vez que o Ministério Público não faz concessões recíprocas com o compromissário, tendo em vista os princípios da indisponibilidade da tutela coletiva e da supremacia do interesse público sobre o privado, não havendo nenhuma natureza sinalagmática no TAC.

Sendo ato administrativo, está o termo de compromisso sujeito a todos os requisitos de validade dos atos oriundos da administração pública, a fim de que possam fluir seus efeitos jurídicos. Seguindo essa linha de raciocínio, a Administração Pública se deparando com um ato administrativo manifestamente ilegal tem a prerrogativa de anular o ato viciado, como base no seu poder de autotutela administrativa, sem ter a necessidade de recorrer ao Poder Judiciário. A administração pública tem ainda a faculdade de revogar o ato por razões de conveniência e oportunidade.

Tratando-se de termo de compromisso firmado pelo Ministério Público, o Membro que celebra o ajuste, o faz com base num juízo de conveniência e oportunidade que tem lastro na sua prerrogativa de atuar com independência funcional. Entendo, portanto, que não se pode admitir a ideia de que o Órgão revisional tenha o poder discricionário de desfazer o ajuste administrativo, apenas invocando outras razões de conveniência e oportunidade, porque nessa hipótese estar-se-ia violentando a independência funcional do Órgão de execução que tomou o compromisso.

Tal enfoque, a meu ver, foi acolhido pelo Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho, a editar o art. 14-A, da Resolução 69/2007/CSMPT que disciplina apenas a

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possibilidade de anulação do TAC, quando inviável a sua repactuação, verbis:

“Art. 14-A. Quando o Órgão oficiante reputar ineficaz para restaurar a ordem jurídica o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta por ele celebrado ou por membro diverso, ou quando surgirem fatos novos modificando significativamente as situações fática ou jurídica, deverá indicar em despacho fundamentado os defeitos imputados ao instrumento, as medidas que considera necessárias para saná-los, bem como a proposta retificadora do TAC, ou para sua anulação, remetendo os autos à Câmara de Coordenação e Revisão que decidirá a matéria, homologando a retificação ou ratificando o instrumento primevo.” (grifo nosso) Portanto, em sede de termo de ajustamento de conduto,

só resta possível a anulação da avença, não havendo falar-se em revogação do ato, por questão de conveniência a oportunidade.

No caso concreto, não vislumbro nenhum vício de competência administrativa (atribuição funcional) ou de forma, que pudesse dar suporte à anulação do presente termo de compromisso de ajustamento de conduta. Poder-se-ia redarguir, entretanto, e me parece ser essa a linha de argumentação do Órgão requerente, que há um vício de conteúdo no ajuste, uma vez que as suas disposições contrastam com o entendimento jurisprudencial consubstanciado no PN 119/ TST.

Contudo, e data vênia da bem lançada argumentação do Membro requerente não vislumbro atuação administrativa ofensiva do princípio da legalidade, que possa alicerçar um pedido de anulação do TAC. Como já me manifestei em outras oportunidades, entendo que a necessidade de intervenção ministerial para exigir a aplicação do PN 119/ TST, no que tange aos descontos

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das contribuições assistenciais incidentes sobre os não filiados às agremiações sindicais, é matéria absolutamente tormentosa no âmbito do MPT, não tendo a CONALIS – Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical pacificado a questão até a presente data. A manifestação da Coordenadoria Temática (fls. 473/480) evidencia de forma cabal tal aspecto.

O MPT está dividido, destarte, em duas correntes. Uma, entende ser imperativa a atuação do MPT para coibir todo e qualquer desconto de contribuição sindical em desarmonia com o citado verbete sumular do TST, a outra preconiza a não obrigatoriedade da atuação ministerial pelo só fato da contribuição ter sido instituída em desacordo com a jurisprudência sumulada do TST.

Com todas as vênias àqueles Colegas que perfilham a primeira corrente. Filio-me ao segundo entendimento, pois advogo a tese que a análise do caso concreto é que determinará a necessidade de intervenção ou não do MPT nos casos de contribuição assistencial, devendo o Órgão de execução sopesar a origem da denúncia, a dimensão dos valores a serem descontados e a necessidade/capacidade dos trabalhadores interessados defenderem seus próprios interesses dada a natureza preponderantemente patrimonial e privada dos direitos e interesses em questão, para eleger a melhor estratégia de atuação na hipótese concreta.

No caso dos autos, penso que esses aspectos foram devidamente analisados pelo membro signatário do TAC, não podendo, data vênia, a CCR opor outras razões de conveniência

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e oportunidade para desautorizar a manifestação do Órgão que tomou o compromisso num contexto fático e temporal que não podem ser reavaliados pelo Órgão de revisão. Repito que a revogação de TAC não tem previsão normativa na Resolução 69/2007/CSMPT.

Sob tal enfoque e, dentro dos estreitos limites impostos à anulação de atos administrativos pelo Órgão de revisão, não vislumbro ilegalidade que possa conduzir à conclusão da nulidade absoluta do TAC. Nesse sentido, não enxergo vinculação irrestrita da atividade ministerial ao rol de verbetes sumulares do TST. Observo ainda, que a jurisprudência da Corte superior já oscilou em relação à matéria, já que o antigo PN 74/TST, admitia a licitude dos descontos em análise, desde que garantido o exercício do direito de oposição. É de conhecimento geral, também, que o TST está num processo de revisão de todos os seus precedentes, inclusive do PN 119, que deve ser modificado à curto prazo.

O fato do TST adotar determinado posicionamento jurisprudencial não constitui fundamento para a anulação de ato administrativo produzido com base na independência funcional do membro firmatário do ajuste. Reitero que a questão de aplicar-se o PN 119/TST, para nortear a atuação do MPT na matéria, não é de legalidade estrita, mas meramente interpretativa, e controvertida, como acima observado.

Nesse contexto, e com todas as vênias à bem lançada fundamentação pelo Membro de origem, não acolho a proposição de anulação do TAC.

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IV - CONCLUSÃO À vista do exposto, divirjo da Eminente Relatora

e proponho a redação da orientação, nos termos da fundamentação do voto vista.

Brasília, 11 de setembro de 2014.

Fábio Leal Cardoso Membro da CCR