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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ RENATO CESAR DE ARAUJO PORTO A ÉTICA NA GARANTIA DE PROTEÇÃO DA VULNERABILIDADE AGRAVADA DO CONSUMIDOR VIRTUAL Rio de Janeiro 2016

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

RENATO CESAR DE ARAUJO PORTO

A ÉTICA NA GARANTIA DE PROTEÇÃO DA VULNERABILIDADE AGRAVADA DO CONSUMIDOR VIRTUAL

Rio de Janeiro2016

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RENATO CESAR DE ARAUJO PORTO

A ÉTICA NA GARANTIA DE PROTEÇÃO DA VULNERABILIDADE AGRAVADA DO CONSUMIDOR VIRTUAL

Tese apresentada ao Curso de Doutorado

em Direito Público e Evolução Social, da

Universidade Estácio de Sá, como requisito

parcial à obtenção do título de Doutor.

Orientador: Prof. Dr. Nilton Cesar Flores.

Rio de Janeiro

2016

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AGRADECIMENTOS

A todo(a)s que tornaram possível o enfrentamento da vigorosa

maré alta... Em paralelo ao apoio afetivo e acadêmico e de

parcerias diversas, indispensáveis ao cumprimento da missão de

doutorando, cada um(a) a seu “jeito” fortaleceu minha convicção

de que, não obstante a desigualdade nas relações de consumo

virtual, há robusta fundamentação para equilibrar tal interação,

ainda que na contramão da maré...

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“Para ser grande, sê inteiro: exagera ou exclui; sê

todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo

que fazes. Assim, em cada lago, a lua toda brilha,

porque alta vive”. Ricardo Reis

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RESUMONesta Tese, defende-se que a ética é requisito fundamental na garantia

dos direitos do usuário da internet, cuja vulnerabilidade é indiscutível e agravada sob quaisquer aspectos que se queira examinar. Com essa premissa, perseguem-se os seguintes objetivos: a) Examinar o contexto e as dimensões mais evidentes da vulnerabilidade que caracteriza a sociedade da informação, com evidentes reflexos ao usuário da internet. b) Analisar, em perspectiva multidisciplinar, requisitos éticos e sócio-político culturais norteadores da sociedade da informação, tendo em vista delinear nos novos desdobramentos e regulamentação à função ético-social do contrato; c) Discutir a proteção de direitos do cidadão/consumidor, principalmente na rede internacional de computadores. d) Apresentar um conjunto de propostas para resolução de conflitos virtuais informacionais, sob a égide da ética nas relações entre pessoas, grupos e empresas. Do ponto de vista metodológico, trata-se de pesquisa descritiva, orientada pelo modelo indutivo, cujas fontes de consulta principais são constituídas por legislação nacional e estrangeira, da doutrina pátria e alienígena sobre os temas dominantes na investigação, mormente a ética e proteção do usuário da rede de computadores e jurisprudência nacional. Ao final, expõem-se conclusões que indicam um conjunto de propostas de consideração da vulnerabilidade do usuário digital, tendo como fio condutor os princípios e requisitos da ética nas relações virtuais.

Palavras-chave: Vulnerabilidade; Ética; Relações de consumo; Internet; Proteção do consumidor virtual.

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ABSTRACT

In this Thesis it is argued that ethics is a fundamental prerequisite in ensuring the internet user's rights, whose vulnerability is indisputable under any aspect one wants to examine. This premise considered, the following objectives are then chased: a) To examine the context and the most obvious dimensions of vulnerability that characterize the information society, with obvious consequences to the internet user) To review, in a multidisciplinary perspective, the gaps, the ethical and the cultural socio-political information society requirements regarding the new developments and regulations on the ethical and social functions of the contracts) To discuss the citizen / consumer rights, given such knowledge, principles and procedures as the foundations to the analysis of the practice of relationships developed in the setting of international computer network. d) To present a set of informational virtual conflict solving proposals under the ethics in relations between individuals, groups and businesses. From a methodological point of view, it is descriptive research, whose main sources are comprised of domestic and foreign, Brazilian and foreign doctrine of this research´s dominant themes, especially ethics and protection of the user of the computer network. At last, findings that indicate a set of proposals for consideration of the digital user vulnerability are exposed, being principles and ethics requirements in virtual relationships the guideline.

Keywords: Vulnerability; ethics; Consumer relations; the Internet; social function of the contract.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANATEL Agência Nacional de Telecomunicação ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária atual. BA Estado da Bahia CDC Código de Defesa do Consumidor Caput expressão latina que significa “cabeça" CE Comunidade Europeia CEE Comunidade Económica Europeia CF Constituição Federal Cfr. Conferir Cit. abreviatura de expressão latina citatum, citato, que significa “citada”. com. ComissãoCoord. Coordenação DL (ou D.L.) Decreto-lei ECA estatuto da criança e do adolescente Ed. Edição ES Estado do Espírito Santo et al. expressão latina que significa “e outros”. GO Estado de Goiás Ibidem palavra de origem latina que significa “no mesmo lugar”, “na mesma passagem” Idem palavra de ordem latina que significa “o mesmo”, “igual” i.e., abreviatura de expressão em latim exempli gratia, que significa “isto é” LTDA sociedade limitada MG Estado de Minas Gerais n. º Número ONU Organização das Nações Unidas org. organizador p. página PE Estado de Pernambuco pp. páginas prof. professor RAPEX Community Rapid Information System (sistema de informação de rápida comunição) RDPC Revista Portuguesa de Direito do Consumidor rev. revista RJ Estado do Rio de Janeiro RS Estado do Rio Grande do Sul RT Revista dos Tribunais S.A. sociedade anônima SC Estado de Santa Catarina ss. seguintes SP Estado de São Paulo

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STJ. Superior Tribunal de Justiça TCE Tratado da Comunidade Europeia TFUE Tratado de Fundação da União Europeia TUE Tratado da União Europeia TJCE Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia UE União Europeia Vide expressão latina que significa “veja” v.g. verbi gratia, palavra latina que significa "pela graça da palavra”, ou "por exemplo". Vol. Volume

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................10Capítulo 1 – A VULNERABILIDADE NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO.....131.1- A comunicação na sociedade de informação.......................................................131.2 A Influência das Tecnologias no Comportamento Coletivo.................................171.3 A Vulnerabilidade do Consumidor...................................................................24

Capitulo 2 - REQUISITOS ÉTICO E SOCIO-POLITICOS CULTURAIS DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO.............................................................................53

2.1 Fundamentos sócio-filosóficos constitucionais.................................................532.2 Fundamentos jurídicos...........................................................................................68

Capítulo 3 – A ÉTICA E A PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR VULNERÁVEL. .833.1 Ética e Liberdade Responsável de Informação nas relações de consumo........833.2 A ética na Tutela de Direitos Individuais e Coletivos.......................................933.3 A Ética nas Comunicações e a Tutela do Consumidor........................................1003.3 A dinâmica do mercado e o interesse do consumidor.........................................1043.4 A Isonomia no Acesso à informação e a Vulnerabilidade Agravada..............107

Capítulo 4 – O Fortalecimento da tutela do consumidor virtual...................................1124.1 O Apoio do Marco Civil da Internet....................................................................1124.2 Previsão Legal.....................................................................................................1184.3 Os Códigos de Ética............................................................................................1244.4 A compatibilidade entre a boa-fé objetiva e o Marco Civil da Internet..............1294.5 Marco Civil: Responsabilidade conforme atividade do fornecedor....................1354.6 Medidas educativas.............................................................................................1374.7 A adequação do Marco Civil...............................................................................1424.8 A identificação da publicidade............................................................................1464.9 A reinterpretação do direito privado....................................................................1464.10 A aplicação do conjunto de propostas...............................................................151

CONCLUSÃO...............................................................................................................158REFERÊNCIAS............................................................................................................162

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INTRODUÇÃO

Nesta tese, enfrenta-se o problema da vulnerabilidade agravada do

consumidor que celebra contratos por meios virtuais, defendendo que a ética é

requisito inelutável às relações interpessoais e contratuais em geral e, em

particular num cenário globalizado e informatizado, que tende a aprofundar

desigualdade de “armas” entre as partes.

A opção pelo tema se justifica quando se constata que a força de

disseminação de dados, informações, notícias e propagandas modificou o

modo de interação social e os meios de informação, aos poucos, se tornaram

grandes empresas e conglomerados de disseminação de ideias e

conhecimentos. Ainda nesse contexto, é forçoso sublinhar a velocidade,

diversidade e possibilidades de exploração propiciadas pela internet, o que

acarreta consequências que reverberam em todas as áreas da vida individual e

coletiva, espraiando-se, portanto ao campo do direito público e privado.

Foge aos propósitos da investigação discutir a inegável relevância da

imprensa livre e da liberdade de expressão do cidadão. Todavia, essa premissa

exige que se considere, em paralelo a possibilidade de que a desinformação

dos cidadãos/usuários da rede na “sociedade da informação” resulte em

inegáveis reflexos.

Não obstante tal problemática, a produção científica jurídica apresenta

lacunas no que se refere à proteção do cidadão, precipuamente considerando

a ética que precisa nortear as relações de toda natureza empreendidas na

virtualização da vida, que marca a sociedade contemporânea.

No cenário de evidente vulnerabilidade do cidadão/usuário, devido à

reduzida familiaridade com os recursos tecnológicos, que evoluem em

velocidade impossível de acompanhar pelo homem comum, defende-se que as

relações virtuais precisam ser protegidas por alicerces calcados em requisitos

éticos e sócio-político-culturais, mormente na principiologia garantida pela

Constituição vigente no país.

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Essa é pedra de toque da presente pesquisa, cujos objetivos são os

seguintes:

Examinar o contexto e as dimensões mais evidentes da vulnerabilidade

que caracteriza a sociedade da informação, com evidentes reflexos aos

usuários da internet.

Analisar, em perspectiva multidisciplinar, as lacunas e os requisitos

éticos e sócio-político culturais da sociedade da informação, tendo em vista

delinear nos novos desdobramentos e regulamentação à função ético-social do

contrato;

Discutir fundamentos éticos e constitucionais, princípios e definidos

como compromisso de proteção das relações de consumo na rede

internacional de computadores.

Apresentar um conjunto de propostas para resolução de conflitos

virtuais informacionais, sob a égide da ética nas relações entre pessoas,

grupos e empresas.

O trabalho está organizado em quatro capítulos, cuja estrutura se

resume a seguir.

No primeiro capítulo, aborda-se a vulnerabilidade e disparidade de

recursos na sociedade da informação, expondo brevemente diferentes

dimensões dessa fragilidade na vida contemporânea.

No segundo capítulo, assumindo perspectiva multidisciplinar, examinam-

se alguns requisitos éticos e sócio-político-culturais na sociedade da

informação, com destaque à liberdade de expressão, isonomia numa

sociedade desigual, precipuamente no que se refere à dominante lógica dos

mercados, além de aspectos vinculados à igualdade de acesso à informação e

dignidade da pessoa.

No terceiro capítulo, trata-se dos fundamentos éticos e sócio-jurídicos à

proteção do cidadão/consumidor, no contexto da virtualização da vida, que

envolve experiências de toda sorte, incluindo drogas e medicamentos

proibidos, TV digital, redes de relacionamento, mecanismos de monitoramento

do perfil do usuário. Nessa linha de pensamento, sublinha-se a emergência de

grupos hipervulneráveis nas relações de consumo e informação, cuja proteção

encontra robustos suportes nos ordenamentos jurídicos e na ética norteada

pela dignidade humana, com todos os seus desdobramentos.

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No quarto capítulo, a ênfase recai na apresentação de propostas para

solução de conflitos no ambiente virtual, ressaltando a teoria do diálogo das

fontes, seus princípios, todos pautados na ética e função social do contrato.

Do ponto de vista metodológico, trata-se de pesquisa descritiva,

baseada no modelo indutivo, cujas fontes principais são constituídas por

legislação nacional e estrangeira, da doutrina pátria e alienígena, bem como na

jurisprudência sobre os temas dominantes na investigação, mormente a ética e

proteção do usuário da rede de computadores.

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Capítulo 1 – A VULNERABILIDADE NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

“O mais importante na comunicação

é ouvir o que não foi dito”

Peter Drucker

1.1- A comunicação na sociedade de informação.

A exteriorização de sentimentos e a comunicação que propiciam

a construção e evolução da cultura em sociedade são requisitos inerentes à

condição humana (ALVIS, 2013, p. 27). Os gregos assinalaram que tal

característica está umbilicalmente ligada à fundação da polis, fora da qual só

haveria lugar para escravos e bárbaros (ARENDT, 1981).

A ausência deste pressuposto comunicacional pode desigualar as

classes (MARX & ENGELS, 2011) já que cidadãos pertencentes ao

mencionado microssistema possuem característica peculiar e funcional, ligada

às necessidades do organismo humano (PARRY, 2012, p. 340).

A comunicação e expressão emocional se desenvolve mediante

quatro ferramentas principais: discurso, música, imagens e escrita (PARRY,

2012, p. 343). Por seu turno, as funções básicas da comunicação interpessoal

são: informar, divertir, ensinar e persuadir (BAVARESCO & KONZEN, 2009, p.

69). Nesse cenário, os diversos formatos de mídia (livros, jornais televisão,

internet, entre outros) são usados para difundir o conteúdo de maneira mais

ampla. Como consequência, imagens e música dispensam a linguagem verbal,

pois são diretas e viscerais (PARRY, 2012, p. 343).

O propósito de interação entre emissor e receptor depende da

maximização do emprego das ferramentas referidas, tendo em vista a

efetividade da informação, diversão, ensino e persuasão, ou outras finalidades.

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Diversas áreas da ciência, como a psicologia, a matemática, a

neurociência, a sociologia, o marketing, entre outras (GORLISH, 2014, p. 194)

interagem com os meios de comunicação, recorrendo ainda às novas

tecnologias da informação. A neurociência, a matemática e o marketing são

responsáveis pela construção métrica do pensamento, à medida que estudam

os processos cerebrais que explicam o comportamento humano e o processo

de tomada de decisões, no intento de suplantar erros decorrentes de

desentendimentos interpretativos em processos internos metaconscientes

oriundos do pensamento hegemônico na coletividade (GORLISH, 2014, p.

198).

O raciocínio humano é preponderante para a boa transmissão do

discurso construído, que pode ser captado por vias, racionais ou emocionais.

Nesse embate, os fatores emocionais são mais intensos do que aqueles de

natureza racional, tidos como mais poderosos e eficientes.

Na maioria das pessoas, o cérebro não é usado de forma ativa e

refletida, eis que se trata de espécie de máquina que não pode ser desligada a

qualquer momento e, se algo não for lhe dado a fazer, continuará em atividade,

até cansar (BANDLER, 1987, p. 19).

Dada a característica de funcionamento ininterrupto, o processo

comunicativo deve ser interpretado de maneira ampla, pois não se trata apenas

de pequena fonte formal de inter-relação entre semelhantes, mas de

característica fisiológica humana (MCLUHAM, 2007, p. 108).

O criador da Programação Neurolinguística RICHARD BANDLER

exemplifica a dinâmica:

“Você já se pegou pensando na vida, ou então profundamente adormecido, quando de repente o seu cérebro lança lhe uma ideia que quase lhe mata de susto? Quantas vezes alguém já acordou no meio da noite por ter tido uma sensação de êxtase profundo? Se o seu dia foi ruim, mais tarde o seu cérebro irá repassar imagens vividas dos acontecimentos, de forma incessante. Não terá sido suficiente a má experiência que sofreu durante o dia, é provável que a sua noite vai ficar prejudicada e talvez até a sua semana também. A maioria das pessoas não para, no entanto, por aí. Quantos de vocês ficam remoendo fatos desagradáveis que já aconteceram há muito tempo? É como se o cérebro dissesse”. Vamos reviver esse fato! ” (BANDLER, 1987, p. 19)

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A compreensão vincula-se às experiências subjetivas dos

processos através dos quais as pessoas aprendem (BANDLER, 1987, p. 130),

e, nesse contexto, as vivências emocionais perduram mais do que as

experiências racionais na mente humana.

Além disso, a transformação das técnicas de formação do

pensamento em mecanismos de transmissão emocional mediante a utilização

das vias digitais institui novo paradigma comunicacional. Nessa senda, a

convergência adequada da comunicação produzida pela mídia eletrônica pode

trazer os benefícios profetizados por MCLUHAM, ou sério perigo, sobretudo

quando se trata da evolução da espécie impactada pelos aspectos sociológicos

e culturais. Essa dinâmica tende a ser muito eficiente ao interferir na formação

de novas identidades coletivas (PINOCHET, 2014, p. 449).

Outro aspecto importante é o da construção do meio em que a

comunicação se desenvolve. Sinapse é a atividade cerebral modulada por

estímulos gerados internamente de natureza excitatória ou inibitória, mediados

por contato. A plasticidade ou neuroplasticidade é a capacidade de o sistema

nervoso responder a flutuações da atividade neural (por estímulos internos e/ou

externos), ligado a alterações sinápticas e a conexões neurais. A interação

entre estímulos internos (genes) e os estímulos externos (ambiente) foi objeto

de estudo que concluiu pela influência ambiental na formação sináptica e na

organização cortical (PASQUALOTTO, et al., 2014, pp. 20-21).

Assim, animais que se desenvolvem em meio estimulante

apresentam maior atividade sináptica em determinadas áreas do cérebro,

quando comparados com animais cuja evolução ocorreu no cenário de meios

não enriquecidos. Em outras palavras: a experiência desempenha papel

preponderante na seleção e estabelecimento de sinapses ativas e, quando um

grupo neuronal é selecionado numa área mapeada, a exposição ao mesmo

estímulo (ou similar) provavelmente ativará o grupo neural anteriormente

selecionado (PASQUALOTTO, et al., 2014, p. 45).

Um dos principais estímulos neurais na vida contemporânea

encontram esteio na mídia, a qual, como qualquer veículo de socialização,

precisa ser analisada em relação ao todo. Suas consequências para o

desenvolvimento das pessoas, sobretudo no que diz respeito às crianças e

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adolescentes, dependem da interação com o contexto social (SANTOS A. M.,

2014, p. 40).

Os significados atribuídos aos objetos, baseados em anúncios

publicitários, onde, usualmente dois objetos se relacionam – por exemplo,

beleza e vestuário – desencadeiam um conjunto de signos, na medida em que

um objeto complementa outro, numa relação de dependência (BAUDRILLARD,

2010, pp. 95-103).

Nesse passo, a publicidade realiza o prodígio de elevado valor,

com o único fim, não de acrescentar, mas de tirar o valor de um dos objetos, de

diminuir o seu valor/tempo, sujeitando-se ao valor/moda e à renovação

acelerada (BAUDRILLARD, 2010, p. 45). Daí resulta a obsolescência

programada, por meio da qual se transforma mentalmente determinado produto

em bem obsoleto, para induzir o consumidor a consumir produto recém

lançado, ainda que desnecessário.

Voltando ao aspecto orgânico, as modificações sinápticas são

rápidas, operando na forma e funcionalidade dos contatos entre os neurônios.

O contraponto da neuroplasticidade é a vulnerabilidade. Essas observações,

têm implicações importantes à compreensão da vulnerabilidade, eis que o

cérebro pode ser “moldado” pelo ambiente, pelas experiências positivas ou

negativas (PASQUALOTTO, et al., 2014, pp. 21-22).

Em resumo, o pensamento pode desenvolver-se de maneira

involuntária e sem controle sobre a atividade cerebral. Ele se encontra ligado à

inviabilidade de privação dos sentidos em relação a qualquer fato externo, em

especial ao processo comunicacional. O pensamento ininterrupto e

permanentemente exposto a estímulos é sujeito à neuroplasticidade e a

vulnerabilidade.

Partindo do exposto, é legítimo supor que o conteúdo

informacional midiático produzido pela via eletrônica (ou outra) é construído em

interação multidisciplinar com a evolução científica, onde uma análise métrica

do pensamento produz no interlocutor um aforisma que se equipara a reflexo,

nem sempre compatível com um processo de meditação norteado pela razão.

Como consequência, cogita-se a possibilidade de um estado de vulnerabilidade

específico, ligado ao campo da informação tradicional, ou absorvida pela via

tecnológica.

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1.2 A Influência das Tecnologias no Comportamento Coletivo

Nietzsche, citando FOUCAULT (2011, p. 22-23) afirma que o

filósofo mais facilmente se engana sobre a natureza do conhecimento, por

pensá-lo na forma da adequação, do amor, da unidade, da pacificação. Nessa

linha de argumentação, a definição do conhecimento não resulta apenas da

forma de vida, da existência, de ascetismo, própria do filósofo, pois se faz

necessário investigar igualmente o conhecimento sob a perspectiva de

aspectos como luta e poder. Entre as características de poder manifestas na

sociedade capitalista pós-moderna, uma das mais expressivas está alicerçada

na valorização da iniciativa privada, que se retroalimenta pela via do consumo,

outro polo da relação. Pela natureza do sistema, o capital e seus interesses

exercem influência na comunicação, que não se restringe ao meio verbal, de

forma explícita e intencional. Trata-se de processo cuja complexidade abarca

as diferentes formas e recursos, por meio das quais as pessoas e instituições

interagem com seus semelhantes. Na circunstancia em exame, parte-se da

premissa de que todas as ações ou eventos têm aspectos comunicativos,

sempre que provocam efeitos em outrem. (BAVARESCO & KONZEN, 2009, p.

68).

Outro ponto a ressaltar é que o processo de comunicação

repercute diferentemente nas pessoas, eis que guarda relação com elementos

internos, como a identidade e experiências anteriores, pré concepções, visão

de mundo e similares (PIAGET, 1977, p. 522). O conjunto de informações

absorvidas pelas mais variadas fontes do conhecimento encontra ponto de

convergência na via eletrônica, que requer mudança comportamental em face

da moderna tecnologia. Na contemporaneidade, a forma de produzir, adquirir e

utilizar conhecimento expressa transformações que representam ruptura com

os mecanismos tradicionais, impondo a adoção e familiaridade com novo

modelo, entre outras consequências (LIMA, 2000, p. 2).

Trata-se de momento ímpar, em que o homem tecnológico

encontra um de seus principais conflitos, resumidos por BAUMAN (1998, p. 30)

nos seguintes termos: Como ajustar o avanço tecnológico que constitui o ser

humano pós-moderno ao exercício da liberdade de expressão e de atualização

pela via eletrônica, sem a imposição de riscos, ou até mesmo, de danos?

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Por certo, a tecnologia e a revolução digital estão presentes nos

diversos espaços do cotidiano: lares, transporte, trabalho e estudo. Por um

lado, a finalidade da tecnologia é servir o homem, propiciando-lhe vida mais

fácil e agradável e simplificação do cotidiano (PINOCHET, 2014, p. 473).

Do ponto de vista conceitual, tecnologias da informação ou Tic’s

baseiam-se no estudo, no desenvolvimento e na prática de sistemas de

computador, especialmente no que diz respeito à união de software, hardware

e peopleware, de maneira a definir sua atividade na evolução da computação

apoiada em redes de comunicação. Esse processo fomenta o intercâmbio de

informações que propicia grandes descobertas cientificas (PINOCHET, 2014, p.

438).

O uso cotidiano dos aparatos e meios tecnológicos de difusão em

larga escala produz uma espécie de responsabilidade recíproca, onde viver em

comunidade não pode ser considerado como o simples desfrute de benefícios

de serviços prestados por outros: mas. Acima de tudo, criar condições sob as

quais o serviço mútuo faça parte da vida em comunidade. Em outras palavras,

a orientação ética humana não se restringe à convivência em comunidade, eis

que abarca igualmente a participação ativa na construção dessa comunidade

(ALVIS, 2013, p. 27).

A base fortalecedora do impulso da palavra, conforme ALVIS

(ALVIS, 2013), desenvolve-se nos seguintes termos:

“Lo más profundo, y así hermoso de todo esto, es saber que cada uno de nosotros y desde nuestra forma de ser, a nuestro modo y nuestras capacidades estamos llamados a construir comunidad, y lo podemos hacergracias a la palabra. Palabra no sólo debemos entenderla como el recurso verbal, sino más bien entender que palabra es todo lo que comunica, así todo nuestro ser comunica. Se comunica de modo integral tanto desde lo que hablamos, como desde nuestras manos y gestos, desde nuestra mirada o los ojos, desde nuestro mismo cuerpo y desde cualquier recurso que nos permita exteriorizar nuestra alma, cosa que nunca estará al alcance de los medioso aparatos. Somos nosotros los que hacemos y podemos explotar la comunicación construyendo comunidad porque somos seres humanos, Los medios de difusión y los informadores son importantísimos como especialistas de la difusión masiva de mensajes, pero la comunicación la podemos realizar todos y cada uno de nosotros a nuestro modo y desde nuestras necesidades. Por otro lado, la ética vista desde los medios de difusión y el papel de los informadores comienza

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con una clara comprensión de que el objetivo principal de ellos será el servicio a la sociedadad e más de ser garantes de un crédito o confianza social que hemos puesto e nellos los que más bien deben respondernos garantizando aquella cualidad natural de todas y todos que es el derecho a la comunicación.”

Na vida moderna, a tecnologia é tão necessária quanto a difusão

da informação, a qual, segundo (BAUMAN, 2008, p. 9), dirige os anseios do

homem moderno e tecnológico aos requisitos da nova sociedade do consumo.

Seria razoável supor que a exibição pública do “eu interior” da maior parte das

pessoas através dos aparatos tecnológicos poderia ser convencionada como

fator meramente transitório e geracional?

Como o problema é complexo, o homem que vive na era

tecnológica necessita de recursos capazes de contrapor-se aos interesses das

partes dominantes no processo. A esse respeito, é oportuno refletir sobre as

características da vida digital sob a perspectiva da psicologia das massas, com

o fito de compreender melhor a vulnerabilidade dos consumidores que

contratam pela via virtual.

De pronto, cumpre recordar que a revolução digital transpôs

barreiras que separavam as três fontes formais de informação: o som, a escrita

e a imagem, favorecendo a emergência de uma quarta forma de comunicação,

que abriga as demais em um só lugar: a INTERNET (LUIZA NETO, 2014, p.

178).

Aos poucos, novo processo comunicacional passou a operar,

trazendo a lume o homem digital, cujo modus vivendi incorporou a tecnologia

às características tradicionais. ZYGMUNT BAUMAM (2008, p. 8-9) esclarece

que “ a vida social já se transformou em vida eletrônica ou cibervida, e a maior

parte dela se passa na companhia de um computador, um ipod ou um celular, e

apenas secundariamente ao lado de seres de carne e osso.

Como se ressaltou, a velocidade da evolução dos meios

tecnológicos, do tráfego de informação e, por consequência, da interação entre

as pessoas constitui fenômeno que interferiu decisivamente na relação entre

empresas, conglomerados de comunicação e consumidores.

Essa dinâmica aproximou a publicidade, o marketing, a

informação e o estudo das massas, que tradicionalmente funcionavam como

esferas autônomas. A cultura das massas, obedecendo à coerência

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empresarial, ao apelo popular e a objetivos estruturalmente mercantis; a

comunicação ao intento publicitário, o marketing à propaganda, à retórica de

persuasão; e por último, a informação, com as agências de notícias, boletins de

radiodifusão ou de televisão, a imprensa, as redes de informação contínua,

dentre outras. Aos poucos, essas instâncias foram convergindo, até se

transmutarem em uma só coisa, ciclópica, tornando difícil distinguir as

atividades pertencentes à cultura de massa, à comunicação e à informação

(LUIZA NETO, 2014, p. 178).

O pensamento coletivo, característico da psicologia das massas

também sofre influência de fatores políticos que vulneram ainda mais o

consumidor. NOAM CHOMSKY (2014, p. 66) elucida essa problemática nos

seguintes termos:

“Numa democracia que funciona adequadamente existem classes de cidadãos. Em primeiro lugar, existe a classe de cidadãos que tem de assumir um papel ativo na gestão dos assuntos de interesse público. Essa é a classe especializada. São pessoas que analisam, executam, tomam decisões e administram as coisas nos sistemas político, econômico e ideológico. Trata-se de um percentual pequeno da população. Naturalmente qualquer um que avance essas ideias é sempre parte desse pequeno grupo, e eles estão discutindo sobre o que fazer com aqueles outros. Aqueles que estão fora do pequeno grupo, a grande maioria da população, são o que Lippman chamava de “rebanho desorientado”. Temos que proteger do “tropel e do ronco de um rebanho desorientado”. Ora, existem duas funções numa democracia: a classe especializada, os homens responsáveis, assume a função executiva, o que significa que eles pensam, planejam e compreendem os interesses de todos. Depois, o rebanho desorientado, e ele também tem função na democracia. Sua função na democracia é a de espectador, e não de participante da ação. ”

Por seu turno, ESTEVES (2010, p.10) advoga que, apesar do

déficit entre a população e os propagadores de informação, sobretudo no que

pertine à internet, não se verifica alienação total das massas em relação à

tecnologia. Tratando do tema, o referido autor leciona que:

“Um desses juízos preconcebidos refere-se aos utilizadores da Internet: os céticos das tecnologias encaram estes, assumidamente ou de uma forma implícita, como sujeitos diminuídos em termos mentais e cívicos. Na média em geral,

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como na própria conversação, existe um potencial de alienação. Mas daí não podemos fazer generalizações do tipo: os utilizadores da Internet são seres incapazes de estabelecer uma relação criativa com as novas tecnologias, de avaliar reflexivamente as suas consequências sociais, ou de desenvolver aptidões consistentes com uma consecução bem-sucedida destes mesmos objetivos. ”

Nesse sentido, vale considerar e a exclusão digital, como ocorre

em diversos níveis da vida social e econômica. Nesse cenário, um ser abstrato,

designado como “o mercado” passa a ser definido como o vilão, quando

sujeitos econômicos não querem se apresentar como responsáveis pelo

agravamento da miséria mundial. “O mercado está nervoso! Costumamos

ouvir, enquanto se tenta legitimar uma ação econômica com graves efeitos no

mundo jurídico” (FLORES, 2008, p. 211).

Nessa perspectiva, é fundamental o cuidado de perceber que,

caso determinados padrões não sejam absorvidos pelo consumidor, este

automaticamente estará excluído de algum grupo e tornar-se “presa” mais fácil

dos fomentadores da dinâmica simbiótica que envolve pessoas e recursos

tecnológicos.

Além disso, diante do poder de compra, maior ou menor, levando-

se em consideração uma série de aspectos socioeconômicos, as pessoas

passam a ser bombardeadas no intuito de sentir necessidades consumeristas.

O consumo passa a ser mecanismo de satisfação de desejos e supostas

demandas indispensáveis, cientificamente estudadas por profissionais

(marketing, psicólogos, economistas, juristas, administradores, dentre outros)

para fazer com que as pessoas consumam mais e mais (FLORES, 2008, p.

211).

NILTON CESAR FLORES traz importantes esclarecimentos sobre

o problema e afirma:

“O consumo de massa é construído para atender uma necessidade social e comercial, cuja base e referência estratégica passa pelo reconhecimento de símbolos, marcas, de status social e de qualidade; que podem ser identificadas independentemente da nacionalidade, religião, cultura ou poder econômico do indivíduo. O símbolo atinge todos e nos deixa fascinado pelo que representa. O produto deixa de ser produto para ser uma emoção, o indivíduo não tem um relógio, ele tem um Rolex; não tem uma bolsa, tem uma Louis Vuitton; não tem

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um celular, tem um iphone; não tem um tênis, tem um Nike. Em todos esses casos o símbolo da marca transcende o produto em si e expressa uma emoção”.

Sob a vertente do consumo emocional, a psicologia das massas é

relevante, quando se trata de delinear as perspectivas sociais inerentes às

características de consumo do homem pós-moderno e a capacidade de

influência das empresas ligadas às tecnologias da informação na sociedade de

consumo.

A psicologia das massas emergiu no cenário europeu no final do

século XIX e contribui para que se compreenda o impacto dos meios de

comunicação no campo social, em especial quando se trata das

transformações oriundas das tecnologias da informação. Sob o viés

psicológico, o estudo constitui ferramenta para identificar estado anímico capaz

de provocar na massa a adesão ao que se difunde.

É oportuno recordar que esse afeto foi estudado por FREUD

(2013), na obra “Psicologia das massas e análise do eu” quando verifica que a

compulsão massiva pode tornar-se ainda mais intensa, conforme o número de

pessoas que percebam esse sentimento no mesmo momento. “Essa dinâmica

mental, desperta no indivíduo a sensação de ser possuidor de um poder

irrestrito, e sob a sua ótica, aos quem tentam enfrentá-lo, a existência de um

perigo invencível” (FREUD, 2013, pp. 511-519).

A reflexão sobre o tema traz a lume a vulnerabilidade dos

indivíduos e grupos em face da influência dos incentivos ao consumo na vida

moderna. Gustav Le Bon (BON, 2005), Karl Marx, Friedrich Engels (MARX &

ENGELS, 2011) e Alexis de Tocqueville (TOCQUEVILLE, 1987) também

desenvolveram relevantes estudos pertinentes ao tema.

Para LE BON (2005, p. 72), emoção das massas representa

elemento irracional que, com potencial explosivo, está prestes a subverter os

vínculos que tornam possível a coesão social. Por seu turno, MARX e ENGELS

(2011) imaginavam que as multidões empreenderiam revolta de classe,

orientada para nova ordem social, antagônica ao capitalismo. Em sentido

antagônico, TOCQUEVILLE (1987) se interroga sobre o risco de uniformizar o

pensamento coletivo, em uma “era democrática” (MATTELART, 2001, p. 80).

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A noção de pensamento coletivo toma como fundamento

associações aparentes, que se encadeiam, como na hipótese de um esquimó

que, sabendo por experiência que o gelo, corpo transparente, se derrete na

boca, conclui que o vidro, corpo igualmente transparente, tende a derreter na

boca; ou como as de um selvagem que pensa que, ao comer o coração de um

inimigo corajoso, adquire bravura; ou ainda como as de um empregado,

explorado pelo patrão, que conclui que todos os patrões são exploradores

(BON, 2005, pp. 73-74). Dizendo de outra forma: tal estrutura de pensamento

não é dotada de critérios objetivos, mas de associações díspares, que só

mantêm ligações aparentes, provenientes de generalização a partir de casos

particulares. Tais conclusões carecem de espírito crítico e, portanto, se

mostram incapazes de discernir o certo do errado: são juízos previamente

aceitos e nunca discutidos. Sua gênese está na incapacidade da maior parte

de os homens formarem opinião, baseada nos próprios raciocínios (BON, 2005,

p. 74).

Como a evolução do pensamento é alimentada por estímulos

diários de natureza comunicativa, cumpre atentar a qualquer tipo de tratamento

da informação, sobretudo no que diz respeito à forma, instrumentos e eficácia

do sistema comunicacional. Através desses estímulos, pode-se aferir o estágio

civilizatório de determinada população (BELTRÃO & QUIRINO, 1986, p. 21).

Assumindo que o tema é polêmico, sublinha-se que a psicologia

social já se ocupou mais dessa problemática, sobretudo em momentos

conturbados, em que determinadas ideologias comandaram nações levando-as

a cometer, ou silenciar diante de atitudes que violavam a dignidade da pessoa

humana (ALVARO & GARRIDO, 2006). No entanto, o debate volta à tona, em

função da possibilidade de revitalizar tais atrocidades, porém por outra via, qual

seja, a informacional-digital.

Em sintonia com esses estímulos, os meios de comunicação tiram

proveito da carga emocional que integra o processo de informação. A esse

respeito, são esclarecedoras as seguintes observações de BAVARESCO &

KONZEN, 2009:

“ou seja, tais meios, muitas vezes, foram e ainda são usados para cunhar, intermediar e reforçar o consenso ou o arremedo

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da opinião pública, através do poder da propaganda, a qual é uma tentativa de influenciar a conduta dos indivíduos, pois, afinal, o escopo do propagandista é o de convencer ou de direcionar a opinião alheia. ” (BAVARESCO & KONZEN, 2009,).

A problemática em tela se agiganta no contexto de sociedade

interconectada, em que aspectos macroestruturais relativos à estratégia de

expansão das empresas se organizam para além das fronteiras nacionais

(Williamson & O'Rourke, 1999, p. 25) com maior agilidade e ampliação

quantitativa de participantes (MELUCCI, 1989) e em que os movimentos

sociais seguem rumo a uma liderança determinada. O assunto chama a

atenção dos meios de comunicação (JESUS, 2013) e o interesse no que diz

respeito à estrutura da difusão das manifestações de pensamento aumenta por

parte do capital.

KONZEN em trabalho sobre os cenários da liberdade de

imprensa (BAVARESCO & KONZEN, 2009) é explícito:

“Constata-se uma mudança em nível da tecnologia da informação, desencadeando novos cenários na liberdade de imprensa e na formação da opinião pública. Em que medida a nova tecnologia da informação associada ao papel da imprensa incide na formação da opinião pública? Como esses novos cenários da comunicação, na era da internet, relacionam-se com o fenômeno da opinião pública? Ou ainda, a impaciência da opinião, regida pela rapidez instantânea dos fluxos on-line, pode suportar a paciência da mediação da opinião numa sociedade globalizada? Apresentam-se, inicialmente, os novos cenários da comunicação, a fim de situar a relevância do problema. Depois, descreve-se o desenvolvimento histórico da imprensa no Ocidente e, especificamente, no Brasil, expondo a institucionalização do direito à liberdade de expressão e a formação da opinião pública, contrapondo-se à censura. ”

Talvez o termo “impaciência da opinião” defina bem o cenário ao

qual o novo consumidor está submetido, qual seja, o de um ser cada vez mais

conectado e menos paciente, devido à enorme carga informacional. Sob essa

perspectiva, a qualidade do conteúdo pouco importa, pois o que vale é a regra

de transmitir/receber o máximo de informação em curto espaço de tempo. Daí

decorrem decisões irrefletidas, dotadas de pouco senso de razoabilidade, em

face de informações muitas vezes inverídicas.

Seria essa a base para o surgimento de nova espécie de

vulnerabilidade? É disso que se tratará a seguir.

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1.3 A Vulnerabilidade do Consumidor

Uma vez verificada a possibilidade de o pensamento humano ser

influenciado por fatores alheios à vontade, é importante examinar a

possibilidade da decisão irrefletida, sob efeito dos meios de comunicação

tradicionais, ou ligados à via digital responsáveis pela criação, estruturação e

difusão da informação. Grande parte dos ordenamentos jurídicos

vigentes assegura direitos fundamentais ligados à comunicação, com destaque

ao direito à informação e à liberdade de expressão. Por certo, o

reconhecimento dos aludidos direitos não assegura a faculdade de comunicar

livremente, nem impede que se concentre na esfera de uma casta privilegiada

os meios próprios para isto. A distribuição do controle dos meios comunicativos

da sociedade moderna é irregular e merece ser observada de perto pela

sociedade civil, na medida em que tais fatos trazem consigo novo modus

operandi que, por sua vez, culmina no redesenho do tecido e das formas de

relacionamento social (BRITTOS & COLLAR, 2008, p. 71). Sob essa vertente,

merece ser observada e respeitada a confiabilidade da mensagem produzida.

Na circunstância em exame, a pressão econômica se faz presente

na mensagem da mídia, não sendo ocioso afirmar que o conteúdo das

comunicações é determinado pelas pessoas que a enunciam, pelos

anunciantes que pagam a publicidade, pelo Estado que dá subvenções

(BOURDIEU, 1997, pp. 19-20).

PIERRE BOURDIEU indica claramente a dinâmica subjacente á

sua argumentação:

A NBC é de propriedade da General Eletric (o que significa dizer que, caso ela se aventure a fazer entrevistas com os vizinhos de uma usina nuclear, é provável que...aliás, isso não passaria pela cabeça de ninguém...), que a CBS é de propriedade da Westinghouse, que a ABC é proprietária da Disney, que a TF1 é propriedade de Bouygues, o que tem consequências, através de toda uma série de mediações. É evidente que há coisas que um governo não fará a Bouyegues sabendo que Bouyegues está por trás da TF1. Essas são coisas tão grossas e grosseiras que a crítica mais elementar percebe, mas ocultam os mecanismos anônimos, invisíveis,

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através dos quais se exercem as censuras de toda ordem que fazem da televisão um formidável instrumento de manutenção da ordem simbólica.

Além dessa fisionomia óbvia da corrupção da informação, existe

outra menos perceptível, mas igualmente intensa: a influência dos profissionais

do jornalismo. A denúncia de escândalos, as ações e faltas deste ou daquele

apresentador, ou os salários exorbitantes de certos produtores, entre outros

fatores que podem prejudicar a análise da informação, submetendo a

“audiência” à máscara dessa espécie de falha estrutural (BOURDIEU, 1997, p.

21).

A velocidade, característica dos tempos modernos, também

contribui para essa dinâmica, fazendo com que a informação seja “consumida”,

sem exame detalhado dos acontecimentos e dos contextos em que estão

inseridos. Por sua vez, a cobertura jornalística, em muitas oportunidades, não

ultrapassa critérios de superficialidade e incompletude (SILVA, 2016, p. 3).

Com tal orientação, conglomerados de mídia selecionam

informações de interesse do grande público, como no caso de notícias sobre

variedades em que predominam o sangue, o sexo, o drama e o crime. Ora, se

o tempo é raro na televisão e se minutos preciosos são empregados para tratar

de temas fúteis, é porque os mesmos servem para ocultar coisas preciosas

(BOURDIEU, 1997, p. 23).

SILVA sublinha a necessidade de examinar cuidadosamente a

forma pela qual se aborda a informação, e esclarece que:

“O jornal muitas vezes é considerado como o espelho da realidade, mas seu reflexo é subjetivo e depende dos diversos pontos de vista. Esse reflexo é apenas uma dimensão na construção e percepção da realidade que ocorre de forma discursiva. Esse é o referencial que circula entre leitores e jornalistas. Ocorre um recorte da realidade, através de um viés do próprio jornalista ou do agente social que ele tem em mente quando pauta determinados acontecimentos e outros não. Existem diversas abordagens na construção dessa realidade dentro do trabalho jornalístico que são chamados de enquadramentos midiáticos. A área jornalística está intimamente ligada à aprovação do mercado através de da opinião do público e da audiência” (SILVA, 2016, p. 5)

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As fontes midiáticas, sobretudo os jornais e revistas, podem ser

consideradas como forma confessional de um grupo que induz de maneira

espelhada a participação comunitária. Em geral, os jornalistas tendem a dar

“coloração” aos acontecimentos, veiculando-os ou passando ao largo dos

mesmos. Mas o espelhamento comunitário diário de múltiplos itens proporciona

a esses veículos sua complexa dimensão de interesse humano (MCLUHAM,

2007, p. 231). O espelhamento produzido aproxima o interlocutor do meio

midiático, sem restrições às mensagens veiculadas, formando o que se

designa como opinião pública.

Diante disso, não se pode admitir a existência de informação

produzida com isenção. Levando em conta os inúmeros recursos, meios e

modos de difusão da informação, parece razoável supor que subjaz algo

imperceptível, não tátil, capaz de ocultar certo ruído nas mensagens

propagadas, na sociedade da informação.

A esse respeito, a partir do século XX, com a sociedade de massa

e os avanços tecnológicos, a informação sofreu forte tendência mercantil,

avalizada pelo paradigma e interesses empresariais e, no afã de sobrepujar a

concorrência, impôs a desinformação na sociedade da informação. Por mais

paradoxal que isso possa parecer, a premissa encontra suporte no

desenvolvimento de técnicas de informação voltadas à persuasão e à

veiculação ideológica, contrariando a característica fundante de um processo

informacional orientado segundo princípios éticos.

O foco do anúncio não é ser visualizado e, muito menos, fazer ler

ou ouvir. Seu propósito é difundir informações e criar comportamentos de

adesão aos produtos, no intuito de direcionar o consumidor à compra

(SANT'ANA, 2007, p. 122).

Na informação tendenciosa não há espaço para a propalada

neutralidade; “ela é sempre sugestiva para produzir a necessidade da compra,

o que, na sociedade moderna, nos leva a reconhecer uma sobreposição da

função persuasiva à informativa, natural dessa técnica de mercado” (DIAS,

2013, p. 28).

É o que GUI DEBORD identifica na sociedade do espetáculo,

quando assinala que “nenhuma ideia deve levar além do espetáculo existente,

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mas apenas além das ideias existentes sobre o espetáculo”. O mesmo autor

(DEBORD, 1997, p. 133) acrescenta que:

“A falsa escolha em meio à abundância espetacular, escolha que reside na justaposição de espetáculos concorrentes e solidários e na justaposição de papéis (principalmente expressos e incorporados por objetos que são ao mesmo tempo exclusivos e imbricados, desenvolve-se como luta de qualidade fantasmáticas destinadas a açular a adesão à banalidade quantitativa. Renascem assim falsas oposições arcaicas, regionalismos ou racismos encarregados de transfigurar em superioridade ontológica fantástica a vulgaridade dos lugares hierárquicos do consumo”. (DEBORD, 1997, p. 41)

No contexto da sociedade do “espetáculo” informativo, predito por

DEBORD, as intenções do capitalismo se personificam, incutindo hábitos e

valores no cotidiano do cidadão comum.

O hábito condiciona o pensamento: quando ligado ao consumo, é

fator chave para compreender as classes sociais nas sociedades industriais

modernas, urbanas e móveis. O impulso à mobilidade na pirâmide social é uma

das explicações ao consumo de ostentação. Sob a perspectiva econômica, as

instituições não constituem sistema fechado, eis que fazem parte da dinâmica

da cultura (DESJEUX, 2011, p. 27).

Na vida contemporânea, a prática do consumo está mais

arraigada no imaginário coletivo do que se pode supor; ela aparenta definir a

essência da sociedade, e não experiência fugaz, meramente produzida com o

intuito de vender produtos ou fomentar a revenda de serviços. Assim

concebida, faz parte dos elementos estruturantes do arcabouço social e

alimenta a busca da distinção social que DESJEUX exemplifica com maestria:

“Durante o período de cultura predatória, a sociedade era composta de duas classes: uma superior, feita de homens robustos e uma inferior, feita de mulheres trabalhadoras, crianças e alguns homens: “ a função dos homens é a de consumir o que as mulheres produzem. Para as mulheres, o consumo é um fenômeno acessório. O ponto importante é que a diferença de modo de consumo tem um caráter cerimonial e, logo, uma dimensão sagrada. As práticas de consumo se apoiam sobre tabus, isto é, sobre interditos coletivos. Consumir em resumo é o signo do estatuto superior dos homens. ”

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Talvez, seja essa seja resposta à influência da publicidade no

imaginário coletivo. Em uma sociedade em que o consumo corresponde às

“expectativas” da sociedade, independentemente de gênero, ou de outra

característica qualquer, não se pode negar a exploração e a perda da

autonomia da vontade do público, tratado como potencial consumidor.

Com novas matizes, sobretudo após o desenvolvimento da

sociedade da informação, a publicidade se afasta dos anseios meramente

informativos dos consumidores que intentavam adquirir produtos ou serviços.

Essa tendência decorre basicamente do aumento da competição entre as

empresas produtoras de bens e serviços, num movimento em que a

publicidade desempenha a função de importante instrumento concorrencial.

Trata-se de ferramenta fundamental na conquista de novos clientes, mediante

simbiose entre o caráter supostamente informativo e os mecanismos voltados à

persuasão do consumidor final (DIAS, 2013, p. 27).

Nesse passo, é espinhoso distinguir o que determina qual

informação impregna a mente das pessoas e o que simplesmente é

descartado, em meio ao bombardeio de mensagens consumistas e de outras

situações similares, igualmente pouco memoráveis. (LINDSTROM, 2009, p.

10).

Como se expôs, assim produzida e veiculada, a informação,

ocorre na sociedade um déficit informacional peculiar, raiz de vulnerabilidade

inconsciente.A lacuna exposta em forma de “aparente informação”

desencadeia quadro de diferença social e de vulnerabilidade. Que possui

várias dimensões: fática, econômica, informacional, processual, psicológica ou

até mesmo biológica, como se depreende na hipótese de crianças, idosos e/ou

pessoas pouco informadas.

A esse respeito, é interessante registrar que o termo

vulnerabilidade implica a qualidade ou o estado de vulnerável que, por sua vez,

remete à noção do que pode ser vulnerado, magoado, prejudicado e ofendido.

Nas relações de consumo, o sujeito que ostenta tais

características é, inequivocamente, o consumidor que, não sendo o detentor

dos mecanismos de controle do processo de produção, distribuição e

comercialização, participa, tão somente da última etapa, qual seja, o consumo,

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onde pode ser ofendido, ferido e lesado, em seus aspectos econômicos,

físicos, psicológicos ou de ordem moral (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 47).

O reconhecimento da condição de vulnerabilidade é fundamental

para que se consubstanciem os objetivos da Política Nacional das Relações de

Consumo, tendo em vista o atendimento das necessidades dos consumidores;

o respeito à sua dignidade, saúde e segurança; a proteção dos seus interesses

econômicos; a melhoria da sua qualidade de vida e a transparência e harmonia

das relações de consumo (DENSA, 2007, p. 21).

Trata-se de conceito jurídico complexo, que abrange diversos

enfoques, eis que, potencialmente, o “ataque” pode advir de diferentes

mecanismos, particularmente quando a manipulação psíquica e de outra

natureza pode induzir ao convencimento e à compulsão da vontade (MORAES,

1999, p. 43).

A verificação da vulnerabilidade do consumidor, parte mais frágil

da relação de consumo, é essencial para que o mesmo possa ser tutelado, nos

termos da legislação brasileira vigente, com destaque ao Código de Defesa do

Consumidor (CDC) (GARCIA, 2007, p. 28). A fragilidade é concreta, real e

decorre de dois aspectos: o primeiro, ligado aos meios de produção da

informação, monopólio do fornecedor, que inclui a escolha da maneira de

produzir ou de fornecer determinado bem ou serviço. (NUNES, 2011).

Admitir a vulnerabilidade é requisito de efetividade do comando

constitucional que sustenta a política nacional das relações de consumo. A

fragilidade advém do desconhecimento tecnológico do produto ou serviço, bem

como a capacidade econômico-financeira das partes envolvidas. Nesse

sentido, o consumidor pode até ser mais abastado do que o fornecedor e,

ainda assim, estar em posição frágil em relação ao fornecedor de produtos e

serviços (MELO, 2010, pp. 54-55).

A vulnerabilidade é da essência do sistema de consumo, o que

deu origem à iniciativa de criação do Código de Proteção e Defesa do

Consumidor, no intento de equilibrar a relação desigual entre o consumidor

(standard ou por equiparação) e o fornecedor de produtos e serviços (NETTO,

2008, p. 43; DENSA, 2007, p. 22).

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No art.4, I do Código de Defesa do Consumidor, está expressa a

presunção de desigualdade material, formal, econômica e informativa entre os

sujeitos integrantes da relação de consumo (KLEE, 2014, pp. 247-248).

Como se comentou, o consumidor pode ser atingido das mais

variadas formas, sofrendo pressões de engenhosas campanhas publicitárias,

destinadas a criar necessidades de consumo, além de iniciativas invasivas a

sua privacidade, (BONATTO & Moraes, 2009, p. 43).

Dessa forma, estabelece-se evidente desproporção entre o poder

de barganha do consumidor frente aos fornecedores, o que traz a lume a

necessidade de ações do poder público e de tratamento desigual para os

desiguais na medida de suas desigualdades (FILOMENO, 2005, p. 11).

Como consequência, sobressai o princípio da isonomia, que

reconhecendo a debilidade do consumidor, indica que toda e qualquer

intervenção legislativa, administrativa e judiciária em sede de relações de

consumo, deve ser aparelhada de modo a suprir tal desvantagem (MATTOS

JUNIOR R. F., 2009, p. 59).

Sua gênese encontra esteio no desequilíbrio, no estado fático de

submissão do sujeito passivo da relação, que pouco ou nada pode fazer, frente

à superioridade técnica, jurídica, informacional ou relativa à dinâmica do evento

de consumo. Para satisfazer suas necessidades objetivas ou imaginárias, é

inevitável que se submeta às condições impostas pelo fornecedor. Atualmente

existe consenso doutrinário acerca da vulnerabilidade do consumidor.

A Organização das Nações Unidas, na Resolução 39/248, de 10

de abril de 1985, reconhece que os consumidores se deparam com

desequilíbrio em termos econômicos, nível educacional e poder aquisitivo

(ALMEIDA J. B., 2008, pp. 24-25). Como se depreende, o desequilíbrio é

reconhecido internacionalmente, como traço marcante da relação,

independente da condição dos consumidores, sejam ricos ou pobres, educados

ou ignorantes, crédulos ou espertos (GRINOVER, 2000, p. 313).

Diante do exposto, a vulnerabilidade é elemento fundamental no

mosaico jurídico do que se designa como Direito do Consumidor. Trata-se do

ponto de partida dessa teoria jurídica (MORAES, 1999, p. 10). Esse processo

prima pela isonomia constitucional, quando pressupõe tratamento distinto para

pessoas diferentes (JÚNIOR, 2002, p. 320), respeitando-se o comando do

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art.5º da Constituição Federal a fim de se atingir a igualdade real (ALMEIDA J.

B., 2003, p. 17).

As desigualdades podem adquirir dimensão coletiva, quando se

traduzem entre categorias econômicas. Na hipótese do consumidor, porém,

isso se amplifica em uma sociedade pautada pela onipresença do consumo.

Em outras palavras, não parece constitucionalmente consistente tratar todos os

consumidores de forma igual. Afinal, isso representaria, sob argumento de

promoção da justiça, um verdadeiro retrocesso na teoria contratual, pois seria

verdadeiro retorno à mística das categorias abstratas e redutoras. Hoje, ao

contrário, avulta a importância da criação de “padrões de diferenciação”

(NEGREIROS, 2002, p. 199).

A democracia não é exatamente um regime político que se

caracteriza pela plena igualdade de todos perante a lei; mas pelo tratamento

desigual para os desiguais. (FILOMENO, GRINOVER, FINK, JUNIOR, &

DENARI, 2011, pp. 73-74).

Um dos problemas a esse respeito pode ser verificado nos

contratos de adesão, previamente redigidos por decisão unilateral, que por

óbvio favorece a parte mais forte da relação. Eles são revestidos de uma

percepção que não se coaduna com qualquer critério de razoabilidade, eis que

se verifica flagrante discrepância, na situação concreta. Eis porque o legislador

presumiu a fragilidade do destinatário final; admitindo, portanto, tratamento

privilegiado, para proporcionar o equilíbrio entre as partes (MELO, 2010, p. 56).

Com a mesma orientação, o direito do consumidor estabeleceu

que a vulnerabilidade do consumidor independe do potencial econômico. A

vulnerabilidade é presumida de forma absoluta; na sociedade da informação,

sem sombra de dúvida, identificam-se características típicas de sujeição ao

conhecimento da técnica, da arte, ou engenho de que é detentora a outra parte

(LISBOA, 2012, pp. 175-178).

O art.5º XXXII da Constituição Federal determina ao Estado a

Defesa do Consumidor em seu título II, quando trata dos Direitos e Garantias

Fundamentais. O tema também está presente no art.170, V ao tratar da Ordem

Econômica Nacional, sob a premissa de que só se defende aquele que se

encontra em posição de desvantagem.

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Além disso, no art.4º, I do Código de Defesa do Consumidor está

positivada a vulnerabilidade como princípio geral de direito do consumidor.

Ressalte-se que o tratamento desigual surge, não para conferir

privilégios ou vantagens indevidas, mas, para reconhecer determinadas

prerrogativas legais – materiais e instrumentais – no intento de levar à

efetividade o desiderato constitucional de igualdade real. A igualdade

aristotélica, na visão de Rui Barbosa, importa o dever de tratar desigualmente

os desiguais, na medida de suas desigualdades. Assim procedendo, não se

vulnera o sagrado princípio constitucional de isonomia dispensado ao

consumidor, o que se legitima pela discrepante e insustentável relação de

forças e pelo propósito de se garantir equilíbrio e harmonia na interação

consumidor-fornecedor (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 48).

A igualdade é uma das metanarrativas da modernidade, mas a

pós-modernidade tende a destacar o “diferente” e “privilegiado” na senda dos

novos direitos humanos, permitindo a desigualdade formal a fim de atingir a

igualdade material. Na hipótese do Código de Defesa do Consumidor,

garantem-se os direitos dos consumidores, com ênfase na escolha, reflexão,

informação, transparência e liberdade dos consumidores nos contratos

(MARQUES & MIRAGEM, 2012, p. 125).

A vulnerabilidade divide-se em cinco espécies: técnica,

jurídica/científica, fática, econômica e informacional. A vulnerabilidade técnica

consiste na fragilidade do consumidor no tocante à discrepância de

conhecimentos relativos às características estruturais dos produtos ou dos

serviços: trata-se da falta de expertise, de proficiência técnica intrínseca ao

bem de consumo. Nessa espécie de vulnerabilidade, o consumidor não se

encontra em pé de igualdade para discutir sobre a essência do objeto da

relação jurídica de consumo. Ela é determinada pela ausência de

conhecimento especializado do consumidor acerca dos produtos e serviços

que está contratando (CANTO, 2015, p. 66). A mesma se dá em face da

hipótese na qual o consumidor ignora conhecimentos especializados sobre o

produto ou o serviço que adquire, ou utiliza em determinada relação de

consumo. O fornecedor, por sua vez, como se presume, tem conhecimento

aprofundado sobre o produto ou o serviço que ofereça. É dele a expertise de

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conhecimento mais exato das características essenciais do objeto (MIRAGEM,

2008, p. 63).

O dirigismo contratual pressupõe a proteção da norma para a

“defensa de los debiles”. Tal orientação visa a equilibrar as relações

contratuais, admitindo, se necessária, a intervenção estatal. O CDC resulta

desse reconhecimento e, como sublinhado por KHOURI (2013, p. 17), o

consumidor é vulnerável sob o prisma técnico, pois lhe falta acesso ao sistema

produtivo, além de não ter condições de conhecer o funcionamento do bem

jurídico. (NUNES, 2011, p. 674).

Trazendo interessante conclusão a respeito da vulnerabilidade

técnica, insta colacionar decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,

exposta nos seguintes termos:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. VÍCIO DO PRODUTO. DECISÃO QUE INDEFERIU A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REFORMA DA DECISÃO. Cuida-se, na origem, de ação de obrigação de fazer c/c indenizatória por danos materiais e morais proposta por adquirente de veículo zero quilômetro, em razão de diversos vícios apresentados, os quais não foram sanados. A inversão do ônus da prova, direito básico do consumidor consagrado no artigo 6º, inciso VIII da Lei 8.078/90, é uma regra de natureza processual que, a critério do Juiz, permite-lhe equilibrar a posição das partes no processo, ante a verossimilhança das alegações do consumidor ou a verificação de sua hipossuficiência. Vulnerabilidade técnica que decorre da ignorância, do conhecimento deficiente ou da dificuldade do consumidor em compreender as propriedades e o funcionamento do produto em questão. Patente a hipossuficiência técnica do autor frente às rés, pessoas jurídicas de grande porte, que têm maior condição técnica e financeira de produzir as provas que entendem cabíveis para demonstrar a não ocorrência do defeito do produto. Verossimilhança das alegações do autor exsurge das provas acostadas aos autos, quais sejam, a nota fiscal, as fichas de seguimento do veículo e as ordens de serviço que foram emitidas em decorrência dos defeitos apontados. Inversão probatória é medida que se impõe. Precedentes do STJ e desta Corte. RECURSO PROVIDO. ‘ (Agravo de Instrumento 0057707-96.2015.8.19.0000, Rio de Janeiro, Vigésima Sétima Camara Cível Consumidor, TJRJ, j. 20/04/2016, unânime, Rel. Des. Maria Luiza de Freitas Carvalho) ”.

A vulnerabilidade jurídica/científica trabalha com a hipótese de

ausência de familiaridade do consumidor quanto aos seus direitos e deveres,

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aos jargões próprios da comunidade jurídica, às características ínsitas à

critérios contábeis, tecnológicos e imanentes do arcabouço técnico-jurídico

próprio da área.

Ela se dá na circunstancia da falta de conhecimentos, pelo

consumidor, dos direitos e deveres inerentes à relação de consumo que

estabelece, assim como de limitações quanto à identificação das

consequências jurídicas dos contratos que celebra (MIRAGEM, 2008, p. 63).

Tais limites situam-se na esteira do conhecimento de assuntos de natureza

jurídica ou pertinentes a outros campos, como economia, contabilidade,

informática, entre outros (ALMEIDA F. B., 2013, pp. 198-200) (MARQUES,

2004, p. 324).

Em outra decisão emblemática, o TJRJ consubstanciou a

vulnerabilidade em tela:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS AO PATAMAR DE 30% DOS VENCIMENTOS DO AUTOR. SERVIDOR MILITAR DA MARINHA DO BRASIL. DECISÃO DE INDEFERIMENTO QUE SE REFORMA. 1. O agravante celebrou inúmeros contratos, cujos descontos mensais ultrapassam o percentual de 30% de seu vencimento. 2. Nessa ótica, se, por um lado, o agravante teve pleno conhecimento dos encargos e condições ao contratar, por outro, este entendimento é mitigado pela jurisprudência deste E. Tribunal e do STJ, pois os vencimentos têm natureza alimentar, não sendo possível que o cumprimento do contrato se realize em detrimento da subsistência do autor, em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1º da CRFB). 3. Ademais, trata-se de relação de consumo, sujeita, portanto, às normas da Lei nº 8.078 de 1990, motivo pelo qual deve ser levada em conta a vulnerabilidade do consumidor na relação jurídica ora analisada, o que enseja a mitigação do princípio da pacta sunt servanda, evitando, dessa forma, que recaia sobre o demandante a excessiva onerosidade aqui demonstrada. 4. Sobre o tema específico, esta eg. Câmara já se pronunciou em idênticas hipóteses, e até o momento nenhuma modificação no cenário fático ou jurisprudencial ocorreu de forma que pudesse implicar na mudança de entendimento. Assim, consoante pacífica jurisprudência desta Câmara sobre o tema, a limitação de 30% é a que melhor se coaduna com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como com a interpretação legal mais favorável a parte mais fraca da relação consumerista. 5. Ressalte-se que a limitação do desconto objetiva garantir o mínimo existencial necessário para a subsistência do devedor, em observância ao princípio da

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dignidade da pessoa humana, que possui sede constitucional. 6. Nesse cenário, vislumbro que a verossimilhança das alegações do agravante resta demonstrada pelo contexto fático narrado na exordial, que revela a onerosidade excessiva sobre os proventos percebidos. 7. O periculum in mora, por sua vez, decorre inequivocamente do caráter alimentar da verba. Ademais, tal requisito resta caracterizado também pelo fato de dever ser preservado um mínimo de recursos que possibilite a sobrevivência do devedor, em prestígio aos princípios do mínimo existencial, e da dignidade da pessoa humana, consoante já mencionado. 8. Dessa forma, ponderando-se os interesses envolvidos, bem como o comando legal e a farta jurisprudência sobre o assunto, entendo que a prudência recomenda a reforma da decisão ora vergastada 9. Recurso provido. ‘ (Agravo de Instrumento 007848-31.2015.8.19.0000, Rio de Janeiro, Vigésima Sétima Camara Cível Consumidor, TJRJ, j. 04/04/2016, unânime, Rel. Des. Tereza C. S. Bittencourt Sampaio) ”.

A vulnerabilidade fática resulta da dificuldade de o consumidor

demonstrar os fatos em detalhes (promessa de desconto, de ausência da

cobrança de juros, promoção) do que foi dito (eventual humilhação sofrida pelo

consumidor, entre outros) e de como a relação jurídica se desenvolveu, em que

só estavam presentes o consumidor e o preposto do fornecedor.

Como assinalado, o fornecedor detém o controle do serviço ou

produto ofertado (CAVALIERI FILHO, 2011, pp. 48-49). Em um mundo

impessoal, anônimo e estandardizado, a decisão de um único agente

econômico afeta centenas de milhares de pessoas de uma só vez,

demonstrando a flagrante disparidade de forças entre as partes na relação de

consumo (CANTO, 2015, p. 69).

A vulnerabilidade fática também abrange situações específicas

relativas a alguns consumidores; por exemplo, é vulnerável fático, ou

duplamente vulnerável o consumidor criança, ou idoso, os quais podem ser

mais suscetíveis ao apelo dos fornecedores (MIRAGEM, 2008, pp. 63-64).

Seus traços também restaram demonstrados em diversos

entendimentos jurisprudenciais. Para ilustrar, transcreve-se o que segue:

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO ANULATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM A COBRANÇA DENOMINADA "TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO". CONTRATO DE ADESÃO. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE NÃO FOI DEVIDAMENTE INFORMADA

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AO CONSUMIDOR. IN CASU, CONSTATA-SE QUE SE TRATA DE PESSOA HUMILDE, SENDO NOTÓRIA A SUA VULNERABILIDADE FÁTICA E DIFICULDADE DE ENTENDIMENTO ACERCA DO TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO CONTRATADO. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO E DA BOA-FÉ OBJETIVA POR PARTE DO FORNECEDOR DO SERVIÇO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO COMPROVOU O CONHECIMENTO PRÉVIO DO ALUDIDO TÍTULO POR PARTE DO CONSUMIDOR. CARTÃO DE CRÉDITO QUE SEQUER FOI ENTREGUE AO RECORRIDO. PODENDO SE FALAR, INCLUSIVE, NO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA POR PARTE DO RECORRENTE. NEGÓCIO JURÍDICO DEVIDAMENTE ANULADO PELO JUÍZO DE ORIGEM PELO VÍCIO DE CONSENTIMENTO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA. APLICABILIDADE DA TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. VERBA COMPENSATÓRIA FIXADA PELO JUÍZO A QUO, QUE OBSERVOU OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE, BEM COMO OS PRECEDENTES DESTA CORTE. ADEMAIS, APLICA-SE A INTELIGÊNCIA DO ENUNCIADO 116 (AVISO TJ 55/12). HONORÁRIOS BEM FIXADOS NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 20, § 3º DO CPC. SENTENÇA IRRETOCÁVEL. RECURSO QUE SE NEGA PROVIMENTO, COM FULCRO NO ART. 557, CAPUT, DO CPC.” ‘ (Apelação 007200-39.2014.8.19.0042, Rio de Janeiro, Vigésima Sétima Camara Cível Consumidor, TJRJ, j. 15/03/2016, unânime, Rel. Des. Antonio Carlos Bitencourt) ” .

A vulnerabilidade econômica decorre da insuficiência de recursos

do consumidor, quando pretende fazer valer seus direitos frente ao fornecedor

de produtos ou serviços (PORTO, 2014). Na circunstancia em tela, a pedra de

toque repousa no parceiro negocial, o fornecedor que, por seu poder

econômico ou em razão da essencialidade do serviço, desfruta de

superioridade contratual (MARQUES, 2004, p. 331).

Trata-se de enfoque diverso em relação à pessoa do consumidor,

haja vista que o reconhecimento social, a imagem do sucesso tende a ser

visualizada como dependente da aptidão de ter; consumir. (CAVALIERI FILHO,

2011, p. 49).

Em decisão emblemática, apoiada na discrepância entre

consumidores e fornecedores, o Desembargador Marcus da Costa Ferreira,

pronunciou-se como segue:

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AGRAVO REGIMENTAL EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS. VEDADA. ÍNDICE DE CORREÇÃO PELO INPC. PARCIAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I - A despeito de ser admissível a capitalização de juros em periodicidade inferior a um ano, quando expressamente pactuada, a capitalização diária deve ser afastada, por caracterizar a prática de anatocismo. II - Na hipótese, deve prevalecer o INPC, como fator de correção monetária, por estar de acordo com os ditames legais e por ser o índice menos gravoso ao consumidor. III - (…) ’ (TJGO, APELACAO CIVEL 92807-45.2009.8.09.0051, Rel. DR (A). MARCUS DA COSTA FERREIRA, 4A CAMARA CIVEL, julgado em 18/09/2014, DJe 1637 de 26/09/2014, g.) ”

Por sua vez, a vulnerabilidade informacional decorre da ausência

ou insuficiência de informação, para apoiar a decisão de consumir. Aqui se

destaca o déficit informacional de uma das partes da relação jurídica de

consumo. Em posição passiva e sem condições de atestar a veracidade dos

dados, e suscetível aos apelos do marketing dos fornecedores de produtos ou

serviços situa-se o consumidor (MIRAGEM, 2008, p. 64).

Essa espécie de vulnerabilidade repousa basicamente nas

informações relativas aos bens de consumo e na influência do poder de

persuadir e convencer o consumidor no momento da escolha (ALMEIDA F. B.,

2013, p. 200).

A esse respeito, cumpre recordar que, em determinadas

situações, a mensagem publicitária é travestida de matéria de edição de cunho

jornalístico e, portanto, presume-se isenta de qualquer caráter persuasivo,

possuindo maior credibilidade, ou ainda, quando se encontra presente na

reportagem: nesse caso, o veículo de comunicação intencionalmente dissimula

a publicidade, na modalidade redacional (PASQUALOTTO, et al., 2014, p.

168).

O Superior Tribunal de Justiça, no emblemático caso do

Cogumelo do Sol, manifestou-se especificamente sobre a vulnerabilidade

informacional, explicitando que:

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PROPAGANDA ENGANOSA. COGUMELO DO SOL. CURA DO CÂNCER. ABUSO DE DIREITO. ART. 39, INCISO IV, DO CDC. HIPERVULNERABILIDADE.

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RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO DEVIDA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL COMPROVADO.1. Cuida-se de ação por danos morais proposta por consumidor ludibriado por propaganda enganosa, em ofensa a direito subjetivo do consumidor de obter informações claras e precisas acerca de produto medicinal vendido pela recorrida e destinado à cura de doenças malignas, dentre outras funções.2. O Código de Defesa do Consumidor assegura que a oferta e apresentação de produtos ou serviços propiciem informações corretas, claras, precisas e ostensivas a respeito de características, qualidades, garantia, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, além de vedar a publicidade enganosa e abusiva, que dispensa a demonstração do elemento subjetivo (dolo ou culpa) para sua configuração.3. A propaganda enganosa, como atestado pelas instâncias ordinárias, tinha aptidão a induzir em erro o consumidor fragilizado, cuja conduta subsume-se à hipótese de estado de perigo (art. 156 do Código Civil).4. A vulnerabilidade informacional agravada ou potencializada, denominada hipervulnerabilidade do consumidor, prevista no art. 39, IV, do CDC, deriva do manifesto desequilíbrio entre as partes.5. O dano moral prescinde de prova e a responsabilidade de seu causador opera-se in re ipsa em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo consumidor.6. Em virtude das especificidades fáticas da demanda, afigura-se razoável a fixação da verba indenizatória por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).7. Recurso especial provido. ‘ (Res 1.329.556/SP, Terceira Turma, TJRJ, j. 25/11/2014, Rel. Min. Ricardo Villas Boas Cuevas) ”.

Essas espécies de vulnerabilidade, quando aliadas ás

características gerais do tratamento conferido à informação, despertam

elementos de índole sociológica, que ensejam debate no meio jurídico, acerca

das premissas dogmáticas dispensadas aos meios de comunicação. Tal

discussão, no entanto, serve de ponto de partida para a identificação de uma

espécie peculiar de vulnerabilidade produzida pela informação precipuamente

conduzida pela via digital.

A vulnerabilidade informacional pode resultar então de vários

fatores: um deles se reveste da ausência da informação nos rótulos e

condições gerais dos contratos, conforme exposto acima. Outros são forjados

pelo tratamento à informação desde sua origem, abrangendo sua concepção,

elaboração, aplicação midiática e difusão ao público.

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A comunicação evidencia face mais pública em relação à de

ordem privada. A ação política brota de interesses privados (associações,

categorias profissionais ou partidos que são agremiações privadas com o

objetivo de atuar publicamente). Os interesses privados se esgueiram pela

fonte pública para fazer valer suas causas, reivindicações e propostas (BUCCI,

2015, p. 551).

Nessa linha de raciocínio, a sociedade em rede, ou tecnológica

deve estar em permanente estado de solidariedade em relação aos conteúdos

produzidos, aos valores contidos na informação, à cultura da dignidade

humana, seja pela via pública ou pela via privada. Seguramente, boa parte

deste processo reside na atividade política, que pode resgatar sua face nobre,

pelos ideais e pelos conteúdos que realiza. A ela compete a elaboração de

normas justas, livres e desapegadas de fatores materiais, fazendo com que a

justiça e a legalidade tendam a se confundir, condicionadas pelas histórias e

pelas contingências, mas inspiradas nas convicções acerca do caráter sacro

dos valores do ser humano (PERLINGIERI, 2008, p. 514).

Trata-se de fatores intrínsecos, que independem do conteúdo

dado à informação, posto que, guardam relação direta com o meio responsável

pela elaboração e difusão da informação. Este meio é competente para

viabilizar a liberdade de expressão, mas também pelo processo decisório dos

consumidores, influenciados pelos recursos midiáticos que despertam emoções

mediante a utilização de um grande número de aparatos tecnológicos. Esses

por sua vez, se fazem valer da utilização de cores, sons, aromas e arte. Tais

fatores, lançam mão de estratégias para interferir na escolha do consumidor,

de onde resulta espécie peculiar vulnerabilidade.

Nessa ambiência, a doutrina e jurisprudência tem admitido que

determinados grupos de consumidores, em razão do alto nível de fragilidade,

merecem maiores cuidados em relação aos fornecedores de bens e serviços

ou a outros grupos de consumidores. É o caso da gestante, dos portadores de

necessidades especiais, da criança e do adolescente, do idoso e de enfermos

(ALMEIDA F. B., 2013, p. 201), os quais, por se encontrarem em estado de

inferioridade frente à média, merecem atenção especial.

O prefixo hiper deriva do grego hypér, que designa alto grau, ou

aquilo que excede a medida normal. O prefixo, acrescentado à palavra

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vulnerabilidade, sugere intensa fragilidade, que supera os limites do que seria

uma situação de fraqueza (SCHMITT, 2014, pp. 217-218).

O levantamento de grupos hipervulneráveis implica o

reconhecimento da insuficiência do princípio jurídico da vulnerabilidade como

presunção jurídica formal. O tratamento a esses grupos deve ocorrer mediante

tratamento diferenciado, pois os mesmos necessitam de proteção qualificada

pelas normas do CDC e por outras fontes normativas, inclusive internacionais

(AZEVEDO, 2016, p. 16).

A noção de hipervulnerabilidade já encontrava previsão legal nos

arts. 37, § 2º (crianças) e 39, IV, agora sob a denominação única de

hipervulnerabilidade, consolidada na jurisprudência do STJ, conforme

MARQUES & MIRAGEM, 2012, p. 188:

“ os hipervulneráveis (...) são esses que, exatamente por serem minoritários e amiúde discriminados ou ignorados, mais sofrem com a massificação do consumo e a pasteurização das diferenças que caracterizam e enriquecem a sociedade moderna ( ... ) ser diferente ou minoria, por doença ou por qualquer outra razão, não é ser menos consumidor, nem menos cidadão, tampouco merecer direitos de segunda classe ou proteção apenas retórica do legislador”.

Por sua vez, MIRAGEM citando MARQUES & MIRAGEM (2012,

pp. 188-189), ao tratar do novo direito privado e a proteção dos vulneráveis,

esclarece que:

“A hipervulnerabilidade seria a situação social, fática e objetiva de agravamento de vulnerabilidade da pessoa física consumidora, por circunstâncias pessoais, aparentes ou conhecidas do fornecedor, como sua idade reduzida (assim, o caso da comida para bebês ou da publicidade para crianças) ou idade alentada (assim, os cuidados especiais com os idosos, tanto no código em diálogo com o Estatuto do Idoso e da publicidade de crédito para idosos ou sua situação de doente ( assim caso do Glúten e sobre informações de bula em remédios ).”

Em outras palavras, enquanto a vulnerabilidade “geral” do art.4º, I

é inerente a todos os consumidores, a hipervulnerabilidade se aplica à

condição “especial”, circunstancial de um consumidor, seja permanente, como

na hipótese de pródigos, incapazes, ou temporária, como no caso da criança.

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A doutrina alusiva à hipervulnerabilidade encontra respaldo na

Constituição, atingindo em especial os vulneráveis mencionados na Carta

Política (portadores de deficiência, idosos e crianças). No entanto, parece

melhor asseverar que a hipervulnerabilidade parte de um caráter subjetivo,

multiforme e pluridimensional, escudado na igualdade e na equidade que

possibilita o tratamento de “outros” fracos, tais como os doentes (MARQUES &

MIRAGEM, 2012, p. 189).

Nessa perspectiva, a jurisprudência desenvolveu a ideia de

vulnerabilidade como corolário positivo da proibição do texto constitucional, e

discriminação derivada do princípio da igualdade (dever-ser) e do pleno

desenvolvimento da personalidade, umbilicalmente ligadas. Em ambos os

casos, versa-se sobre a máxima proteção da dignidade da pessoa humana

(MARQUES & MIRAGEM, 2012, p. 191).

Em resumo, hipervulnerabilidade remete à noção de grau

excepcional da vulnerabilidade geral dos consumidores e a tratamento especial

(idosos, crianças, doentes, deficientes físicos e mentais), para que a nova

igualdade se efetive com “calma e com alma”, permitindo superar os padrões

mecânicos e formalistas do direito de igualdade no direito privado. Assim

sendo, igualdade não deve mais ser tratada como recurso de hierarquia ou

incapacidade permanente, pois, acima de tudo, está embasada em papéis

fluidos e momentâneos, de estilos de vida e de ser (MARQUES & MIRAGEM,

2012, pp. 193-195).

A Constituição da República outorga várias ações nesse sentido,

como previsto no art.5º, XXXII, que estabelece: “ O Estado promoverá, na

forma da lei, a defesa do Consumidor”. Ora, se todos são iguais perante a lei,

como compreender que a Lei Maior estabeleça tratamento diferente para o

consumidor? Em realidade, não existe tecnicamente diferenciação de

tratamento, ou se existe, gravita apenas no campo formal, pois a Constituição

Federal somente afirmou que o consumidor não é igual ao fornecedor e que,

por isso, merece tratamento diferente, no intuito de equilibrá-lo ao fornecedor,

tendo-se limitado a tratar desigualmente, o desigual na proporção de sua

desigualdade (ANDRADE, 2006, p. 6).

A conjugação dos fatores indicados propicia a consolidação do

tratamento diferente ao consumidor virtual. No entanto, não parece adequado

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inserir o consumidor no rol dos hipervulneráveis, por eventual debilidade no

mercado de consumo por razões corporais; ou seja, em face da condição

fisiológica. O consumidor virtual, por estar comprometido apenas

psiquicamente, localiza-se em uma zona híbrida, entre a vulnerabilidade fática

evidenciada entre todo e qualquer consumidor e a figura dos hipervulneráveis,

que não têm possibilidade de alterar suas condições corpóreas, ao menos,

momentaneamente.

O consumidor virtual se encontra imerso em um emaranhado de

recursos tecnológicos capazes de influenciar, direta ou indiretamente, suas

escolhas. Sua vulnerabilidade resulta de critérios naturais (Art.4º, I) e

tecnológicos, não percebidos naturalmente, mas que foram e serão

demonstrados com mais vagar ao longo do presente trabalho.

O princípio da igualdade deve observar diferenças reais e efetivas

vislumbradas entre as pessoas (ANDRADE, 2006, p. 6) e o consumidor, na

sociedade da informação, está fragilizado tacitamente, frente aos fornecedores

de produtos ou serviços virtuais.

Mediante análise dos aspectos sociológicos e técnicos desse

mecanismo informacional, pode-se identificar uma espécie de vulnerabilidade

especial do consumidor virtual.

O Código de Defesa do Consumidor consolida a possibilidade de

tratamento mais cuidadoso, no que diz respeito à vulnerabilidade dos

consumidores, como se depreende da leitura dos arts. 37, § 2º e 39, IV, agora

sob a denominação única de hipervulnerabilidade (MARQUES & MIRAGEM,

2012, p. 187), a seguir transcritos:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

        § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

 Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

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        IV - Prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

A hipervulnerabilidade evidente na norma, encontra suporte na

jurisprudência do STJ (Informativo 524), como demonstrado em continuidade:

DIREITO DO CONSUMIDOR. VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO PELO FORNECEDOR.

No caso em que consumidor tenha apresentado reação alérgica ocasionada pela utilização de sabão em pó, não apenas para a lavagem de roupas, mas também para a limpeza doméstica, o fornecedor do produto responderá pelos danos causados ao consumidor na hipótese em que conste, na embalagem do produto, apenas pequena e discreta anotação de que deve ser evitado o "contato prolongado com a pele" e que, "depois de utilizar" o produto, o usuário deve lavar e secar as mãos. Isso porque, embora não se possa falar na ocorrência de defeito intrínseco do produto - haja vista que a hipersensibilidade ao produto é condição inerente e individual do consumidor -, tem-se por configurado defeito extrínseco do produto, qual seja, a inadequada informação na embalagem do produto, o que implica configuração de fato do produto (CDC, art. 12) e, por efeito, responsabilização civil do fornecedor. Esse entendimento deve prevalecer, porquanto a informação deve ser prestada de forma inequívoca, ostensiva e de fácil compreensão, principalmente no tocante às situações de perigo, haja vista que se trata de direito básico do consumidor (art. 6°, III, do CDC) que se baseia no princípio da boa-fé objetiva. Nesse contexto, além do dever de informar, por meio de instruções, a forma correta de utilização do produto, todo fornecedor deve, também, advertir os usuários acerca de cuidados e precauções a serem adotados, alertando sobre os riscos correspondentes, principalmente na hipótese em que se trate de um grupo de hipervulneráveis (como aqueles que têm hipersensibilidade ou problemas imunológicos ao produto). Ademais, o art. 31 do CDC estabelece que a "oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores". Por fim, ainda que o consumidor utilize o produto para a limpeza do chão dos cômodos da sua casa - e não apenas para a lavagem do seu vestuário -, não há como isentar a responsabilidade do fornecedor por culpa exclusiva do consumidor (CDC, art. 12, § 3º, III) em razão de uso inadequado do produto. Isso porque a utilização do sabão em pó para limpeza doméstica não representa, por si só, conduta descuidada apta a colocar a

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consumidora em risco, haja vista que não se trata de uso negligente ou anormal do produto, sendo, inclusive, um comportamento de praxe nos ambientes residenciais. REsp, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/5/2013.

Consagrada a hipervulnerabilidade de determinados grupos de

consumidores (crianças, idosos, portadores de necessidades especiais, entre

outros) na lei, na doutrina e na jurisprudência, resta identificar traços comuns

de fragilidade, para que sirvam de ponto de referencia a outras relações

jurídicas que também se afastem da média, e, por conseguinte, mereçam

tratamento diferente.

O art.37, §2º realça três pontos específicos: 1 – O estímulo ao

medo, à violência e à superstição. 2 – O aproveitamento da incapacidade de

julgamento da criança. 3 – A indução ao comportamento prejudicial do

consumidor, como na hipótese de lesão ao meio ambiente e desrespeito à

saúde e a segurança dos mesmos. Por sua vez, o art. 39, §4º realça dois

pontos: 1 - a fragilidade e 2- a ignorância dos consumidores, tomando-se por

base a idade, saúde, condição social ou conhecimento.

O primeiro está presente no art.37§, 2º, quando contempla a

fragilidade pautada no medo, sentimento característico dos humanos, capaz de

afetar as escolhas do consumidor. É interessante assinalar que essa

experiência parece atingir outros grupos: estudiosos do comportamento animal

descrevem em detalhes o variado repertório de reações animais, no intuito de

repelir presença de ameaça que ponha em risco suas vidas (BAUMAN, 2008,

p. 9).

Conforme análise de BAUMAN, “Medo” é o nome que damos a

nossa incerteza; nossa ignorância da ameaça e do que deve ser feito – do que

pode e do que não pode – para fazê-la parar ou enfrenta-la, se cessá-la estiver

além do nosso alcance”. O pensador citado acrescenta espécie peculiar de

medo, exclusiva dos humanos: Trata-se de um medo em segundo grau, um

medo, por assim dizer, social, um medo derivado que orienta seu

comportamento, quer haja ou não uma ameaça imediatamente presente

(BAUMAN, 2008, p. 9).

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O medo secundário pode ser visto como rastro de experiência de

enfrentamento de ameaça direta; trata-se de resquício, de reminiscência que

sobrevive ao encontro e se torna fator importante de modelagem da conduta

humana, mesmo que não haja mais ameaça direta à vida ou à integridade.

Esse medo derivado é uma estrutura mental estável que leva a um estado de

vulnerabilidade que tem como pressuposto a falta de confiança nas defesas

disponíveis em face do volume ou da natureza das ameaças reais (BAUMAN,

2008, p. 9).

Nessa linha de entendimento, o medo encontra-se mais vinculado

a fatores emocionais do que à razão. Não é exagero supor que fatores

emocionais constituem o suporte à previsão do legislador à

hipervulnerabilidade, tal como definida no texto do art.37§, 2º.

Em continuidade, confere-se relevo à deficiência de julgamento da

criança, indução à violência e desrespeito ao meio ambiente. A proteção da

criança encontra fundamento no art.227 da Constituição da República, assim

formulado:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”

No ECA, prevê-se explicitamente que “ Art. 17. O direito ao

respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da

criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da

identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos

pessoais.

Estudos recentes demonstram a importância de crianças e

adolescentes nos hábitos de consumo de suas famílias. O “poder” dos filhos

(entre outras relações familiares) contrasta com sua vulnerabilidade na relação

negocial com fornecedores no mercado, os quais lançam mão de técnicas de

marketing. No cenário aqui subentendido, os apelos, em geral, sedutores aos

consumidores em geral, adquirem maior vigor em relação às crianças e

adolescentes, que se encontram em estágio de vida mais susceptível ao

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convencimento, em função de formação intelectual incompleta (MIRAGEM,

2008, p. 65).

A esse respeito, cumpre recordar que a televisão interfere na

visão de mundo, valores, práticas sociais e de consumo das pessoas, expostas

a 40 mil publicidades em um ano (PASQUALOTTO, et al., 2014, p. 40). A

exposição midiática também é responsável pelo agravamento da indução à

violência. Ela estimula tanto as crianças, quanto qualquer integrante da

sociedade ao consumo (LINN, 2010). Neste contexto, a internet serve de fio

condutor da mídia e de outros meios globalizados, facilitando a padronização

dos modos de vida (PASQUALOTTO, et al., 2014, p. 41).

Além disso, é conveniente registrar a falta de consciência em

relação à proteção e preservação ambiental, mediante indução ao consumo

desenfreado. Como alertou, VIGOTSKI (2007, p. 55) “é importante a percepção

de que o controle da natureza e o controle do comportamento estão

mutuamente ligados, assim como a alteração provocada pelo homem sobre a

natureza altera a própria natureza do homem”.

O art.39, IV do CDC dá respaldo ao respeito ao mais frágil, seja

sob o aspecto fático, como ocorre na hipótese de crianças, idosos e

necessitados de cuidados especiais, mas também de todo e qualquer

consumidor que se encontre na posição de ignorância.

A falta de informações suficientes sobre determinado bem ou

serviço amplia o espectro de aplicação do tratamento diferenciado para todos

os consumidores. Além de questões alusivas à idade, a lei remete à hipótese

de portadores de necessidades especiais e à potencial debilidade que aflige

qualquer consumidor.

GILLES LIPOVETSKY, em discurso emblemático proferido ao

receber o título de doutor honoris causa na Universidade de Sherbrooke, no

Canadá, afirmou que o “indivíduo pós-moderno é excessivamente caricaturado

como uma mônada fechada sobre si própria”. Tal assertiva partiu da

compreensão de que os novos consumidores desconhecem aspectos

existenciais, pelo simples fato de não serem detentores das informações

adequadas acerca do que consomem (LIPOVETSKY, 2004, p. 21).

A essência do tratamento diferente entre os consumidores

articulados no art.37, §2º é pautada por dois determinantes: a discrepância de

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ordem emocional, que pode levar à decisão de consumo, sem critérios

racionais; a possibilidade de redução do poder de ingerência do consumidor

sobre a sua vontade, tendo em vista a desinformação na sociedade da

informação. Os fatores elencados convergem para a análise da vulnerabilidade

das pessoas na sociedade de consumo que interage via internet.

Dimensões humanas, como emoção/vontade (art.37, §2º), e

ausência de informação (art. 39, IV) são articuladas e, quando o debate

converge para o campo da relação de consumo virtual, onde a vulnerabilidade

informacional está presente, sustentam uma espécie autônoma de

vulnerabilidade agravada.

O Binômio emoção/vontade foi objeto de reflexão de vários

autores, dentre eles JEAN BAUDRILLARD, (2010), para quem, entre outras

formas de indução emocional que reverberam na vontade, merece relevo o

volume e diversidade de produtos, que tende a impulsionar o consumo:

“ O amontoamento, a profusão revela-se evidentemente como o traço descritivo mais evidente. Os grandes armazéns, com a exuberância de conservas, vestidos, bens alimentares e confecção constituem como que a paisagem primária e o lugar geométrico da abundância. Mas todas as ruas, com as montras repletas, cintilantes (se a luz não fosse o bem menos raro, a mercadoria não seria o que é), com as ostentações de charcutaria, toda a festa alimentar que põe em cena, tudo estimula a salivação fantástica. No amontoamento, há algo mais que a soma dos produtos: a evidência do excedente, a negação mágica e definitiva da rareza, a presunção materna e luxuosa da terra da promissão. Os nossos mercados, artérias comerciais, Superprisunic, imitam assim a natureza reencontrada, prodigiosamente fecunda: são os nossos vales de Canaã onde correm, em vez de leite e do mel, as ondas de néon sobre o ketchup e o plástico. ” (BAUDRILLARD, 2010, pp. 14-15)

Em consonância com a interpretação de BAUDRILLARD, verifica-

se que nenhum outro ambiente consegue reunir quantitativo tão elevado de

bens de consumo, luzes e sons do que a internet. Por sua vez, MARTINS

(2014, p. 43) afirma que a concentração empresarial no campo da informação

também contribui para o impulso sem precedentes em toda a história de

existência humana. Como exemplo, vale lembrar que, com apenas 15 anos de

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existência, a América On-Line absorveu o grupo Time Warner, em uma das

maiores operações financeiras de todo o período do capitalismo (184 bilhões

de dólares) e mais complexas, ante a desmaterialização da riqueza (MARTINS,

Responsabilidade Civil por Acidente de Consumo na Internet, 2014, p. 43).

A maior empresa de hotéis do mundo (Airbnb) não é proprietária

de nenhum hotel; a maior empresa de mídia (Facebook) não produz qualquer

conteúdo; a maior empresa de transporte do mundo (Uber) não possui sequer

um veículo e a maior empresa de vendas do mundo (Alibaba) não tem produtos

ou sequer estoque. Fenômenos desse tipo de fizeram com que autores como

CANTO (2015, p. 19), acentuasse que a transposição das relações de

consumo para o mundo on-line, ou a virtualização do real alterou o

comportamento do consumidor, aumentando ainda mais a debilidade existente

entre os fornecedores que se utilizam dos meios virtuais e seus destinatários

finais de produtos e/ou serviços.

O estado emocional do consumidor na web é constantemente

impulsionado pela conjugação dos fatores aqui trazidos, quais sejam: a oferta

presente nos canais web, o capital investido decorrente do crescimento das

empresas virtuais e o controle dos grandes conglomerados de mídia, que são

capazes de influir no pensamento do cidadão comum, produzindo

necessidades que se conjugam com seus interesses econômicos.

Além disso, fatores orgânicos também se fazem presentes, o que

agrava ainda mais a vulnerabilidade, ARISTÓTELES (2009) em Ética a

Nicômaco contribui para a compreensão do fenômeno em tela, quando alude à

necessidade de aceitação do ser em relação aos semelhantes. Com base

nessa premissa, é difícil imaginar um homem feliz, sendo solitário; raras

pessoas aceitariam a posse do mundo inteiro, sob a condição de viverem na

solidão. O homem é um ser político e está em sua natureza viver em sociedade

(ARISTÓTELES, 2009).

Na visão aristotélica a plenitude da condição

humana depende de seus vínculos sociais: sozinho, não pode satisfazer as

próprias necessidades, nem realizar as próprias aspirações. Por natureza, o

indivíduo associa-se com outros indivíduos e se organiza em sociedade

(TRANSFERETTI, 2001, p. 77). Atualmente, quando não se possui telefone

celular da marca X, um aplicativo Y ou Z, a roupa de marca W, não é

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surpreendente a sensação de exclusão de determinado grupo. Em toda parte,

o capitalismo de consumo se faz empreendedor artístico, empresário de

inovação cultural destinada à distração das massas. Arte, bens de consumo,

animação e lazer, tudo se interpenetra permanentemente, conferindo novo

significado à noção de cultura e de arte, pois não são mais o território

patrimonial da cultura clássica, mas de uma hipercultura de objetivo mercantil,

baseada nos recursos do espetáculo e do divertimento generalizados

(SERROY & LIPOVETSKY, 2013, p. 3971).

Nessa linha de interpretação, consumir é requisito para ser aceito,

na vida moderna... A autonomia da vontade do homem pós-moderno é

influenciada por fatores emocionais de ordem primitiva que se apresentam sob

nova roupagem, onde a necessidade de aceitação encontra abrigo no

consumo. As escolhas, por sua vez, tornam-se relativizadas, particularmente,

quando se considera que os grandes conglomerados de mídia se irmanam com

as maiores empresas dos respectivos setores, no intuito de promover seus

novos produtos/serviços, pelos modernos meios de propagação de

mensagens.

Caso o consumidor ouse se rebelar contra o sistema “imposto”,

talvez ele seja posto à parte da nova ordem social, e, por consequência, à

margem de seus semelhantes. GUI DEBORD (1997, p. 43) demonstra com

precisão essa dinâmica quando afirma “Se cada chinês tem que aprender a ser

Mao, é porque não há outra coisa para ser”.

Após essa ilustração da possível ausência de controle sobre os

atos praticados, pautada no binômio emoção/vontade, que conduz o

consumidor a uma aparente informação, parece evidente a convergência dos

elementos responsáveis pela consagração da vulnerabilidade agravada no

CDC; ou seja, um conjunto de fatores complementares que estabelecem

relação de causa e efeito entre pessoas que atualmente possuem tratamento

diferenciado, e outras, que merecem se aproximar do

mesmo.Consequentemente, a vulnerabilidade informacional digital se amolda á

vulnerabilidade agravada do consumidor, que se situa em zona híbrida entre a

vulnerabilidade tradicional insculpida no art.4º, I do Código de Proteção e

Defesa do Consumidor e 5º, XXXII da Constituição Federal e a

hipervulnerabilidade própria de pessoas específicas, tais como, de idosos,

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crianças e pessoas possuidoras de necessidades especiais. Assim, parece

adequado afirmar a vulnerabilidade agravada do consumidor virtual.

Nesse passo, vem a lume a vulnerabilidade (Art.4º, I, CDC)

agravada na hipótese do consumidor virtual, reprisada pelos fatores de

mercado. Exatamente por isso, critérios éticos parecem razoáveis para produzir

uma base que sustente o tratamento do tema.

MICHAEL SANDEL chama atenção para os limites morais do

mercado quando afirma:

“Vivemos numa época em que quase tudo pode ser comprado e vendido. Nas três últimas décadas, os mercados – e os valores de mercado – passaram a governar nossa vida como nunca. Não chegamos a essa situação por escolha deliberada. É como se a coisa tivesse se abatido sobre nós. Quando a guerra fria acabou, os mercados e o pensamento pautado no mercado passaram a desfrutar de um prestígio sem igual, e muito compreensivelmente. Nenhum outro mecanismo de organização da produção e distribuição de bens tinha se revelado tão bem-sucedido na geração de afluência e prosperidade. Mas, enquanto um número cada vez maior de países em todo mundo adotava mecanismos de mercado na gestão da economia, algo mais também acontecia. Os valores de mercado passavam a desempenhar um papel cada vez maior na vida social. A economia tornava-se um domínio imperial. Hoje, a lógica da compra e venda não se aplica mais apenas a bens materiais: governa crescentemente a vida como um todo. Está na hora de perguntarmos se queremos viver assim. ” (SANDEL, 2012, p. 11)

Essa interpretação aplica-se como luva para análise de problemas

presentes na Sociedade da Informação e nas correspondentes relações de

consumo. Sustenta-se a premência de encontrar caminhos legais e filosófico-

sociais para estruturar o tratamento jurídico a ser conferido ao consumidor.

Nessa senda, a dignidade da pessoa humana (Art.1º, III, CF), quando

conjugada com objetivos constitucionais (liberdade (Art.3º, I, CF), igualdade

(Art.3º, IV, CF) e fraternidade/solidariedade (Art.3º, I, CF)), e os direitos

fundamentais (Liberdade de Expressão (Art.5º, I, CF) e os Direito do

Consumidor (Art.5º, XXXII, CF) em consonância com os princípios (Art.1, CF e

Art.4º CDC) e os aspectos éticos relativos à livre iniciativa (Art.1º, IV, CF), pode

se apresentar como elemento pavimentador do tratamento jurídico às relações

de consumo virtual, sempre à luz da dignidade da pessoa.Como se discutirá,

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tal vulnerabilidade encontra previsão no texto consumerista, sob efeito da

velocidade das relações eletrônicas que impõe profunda reflexão e atualização.

Para TOMAS PIKETTY (2014, p. 52), o “capital não é um conceito

imutável: ele reflete o estado de desenvolvimento e as relações sociais que

regem uma sociedade”. Em outra obra, (PIKETTY 2015, p. 66) acrescenta que

“mesmo que o mercado de crédito seja perfeito, a pessoa ou o país que faz

empréstimos para investir deverá quitá-los e, logo, não poderá, com sua

poupança, alcançar de pronto o nível patrimonial do seu credor. ”

É usual o desequilíbrio nas relações, mesmo porque a poupança,

aos poucos, tende a se dilapidar para compor o crédito. Como se sabe, numa

sociedade consumista, não raro, o crédito antecipa a felicidade e compromete

a aposentadoria. Sob esse ângulo de interpretação, dessa forma, invertem-se

os fatores pois, ao invés de estimular a privação para posterior desfrute, ele

estimula o desfrute agora e o pague depois. Para o consumidor administrar

suas satisfações com antecedência, absorve o crédito (BAUMAN, 2010, p. 28-

29).

O autor mencionado afirma que a finalidade do consumo em si é

evitar que as necessidades sejam satisfeitas, posto que a filosofia empresarial

evoca, induz, conjura e amplia as necessidades que clamam por satisfação e

novos clientes, induzidos à ação justamente por estas necessidades: em suma,

difunde-se um filosofia de afirmar que a função da oferta é criar demanda,

porém quando o assunto chega ao crédito, a finalidade da oferta é produzir a

necessidade ampliada de empréstimos e o endividamento das famílias

(BAUMAN, 2010, p. 28).

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Capitulo 2 - REQUISITOS ÉTICO E SOCIO-POLITICOS CULTURAIS DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

“O sábio pode mudar de opinião. O

ignorante, nunca. ” Immanuel Kant

2.1 Fundamentos sócio-filosóficos constitucionais

Para os romanos, o conceito de dignidade era associado ao

status social de determinado indivíduo ou instituições. Ela derivava da

titularidade ou, do exercício de determinadas funções públicas. Em linhas

gerais, a dignidade derivava do dever geral de respeito, honra e deferência,

devido àqueles indivíduos que, por diversos motivos, eram merecedores de tais

distinções (BARROSO, 2014, pp. 110-120).

À época, o conceito de pessoa não se identificava com a

compreensão atual. Para os antigos, sobretudo no cenário da filosofia grega, o

homem era um animal político ou social, pois se tratava de elemento

constitutivo de algo maior, como em Aristóteles, que resumia na cidadania a

figura do ser (ARISTÓTELES, 2009, p. 38).

Em Ética a Nicômaco, o filósofo referido acentuou:

“O bem humano tem que ser a ciência política, pois ainda que seja o caso de o bem ser idêntico para o indivíduo e para o Estado, o bem do Estado é visivelmente um bem maior e mais perfeito, tanto para ser alcançado como para ser preservado. Assegurar o bem de um indivíduo é apenas melhor do que nada; porém, assegurar o bem de uma nação ou de um Estado é a realização mais nobre e mais divina...”

O Estado estava intimamente ligado ao cosmos, à natureza; o

homem era parte integrante de sistema complexo, em que sua existência tinha

importância secundária; logo, não poderia ser titular de direitos.

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Na filosofia grega, inexistia termo próprio para exprimir

personalidade (MONDIM, 1980, p. 285); o termo “persona é derivado do latim

(SANTOS F. F., p. 1). Segundo o autor mencionado, o conceito de pessoa

“Como categoria espiritual, como subjetividade, que possui valor em si mesmo, como ser de fins absolutos, e que, em consequência, é possuidor de direitos subjetivos ou direitos fundamentais e possui dignidade, surge com o Cristianismo, com a chamada filosofia patrística, sendo depois desenvolvida pelos escolásticos” (SANTOS F. F., p. 1).

A valoração da pessoa humana resultou na afirmação de direitos

específicos de cada homem, os quais se sobrepõem à supremacia do Estado

frente ás vidas de seus integrantes. Desloca-se então o Direito do plano do

Estado, para o do Indivíduo, em busca do o equilíbrio entre a liberdade e a

autoridade (REALE, 1996, p. 4).

O pensamento Kantiano contribui significativamente para o estudo

da ética, em correspondência com o respeito à dignidade da pessoa humana.

Além disso, seus estudos propiciaram avanços à filosofia moral e jurídica

ocidental moderna. Sua concepção de ética abrange a capacidade de o

indivíduo dominar suas paixões e interesses, num processo de descoberta da

lei moral, capaz de orientar sua conduta (BARROSO, 2014, p. 1092).

Seu projeto filosófico teve início em uma investigação que visava

determinar um padrão epistemológico comum do conhecimento humano, tanto

para as matemáticas e as ciências exatas, quanto para a filosofia moral e

estética. Kant definia sua ciência filosófica fundamental como transcendental.

Atualmente a filosofia kantiana é reconhecida como vertente crítica

transcendental, que funciona como critério racional de todas as formas de

conhecimento humano (BARRETO, 2013, p. 43).

Tratando do assunto, vale recordar que moral e ética são

conceitos usualmente empregados como sinônimos, ambos no sentido de um

conjunto de regras de conduta, consideradas como obrigatórias. Porém, os

dois vocábulos têm origem diversa: um do latim (moral) e outro do grego

(ética); duas culturas antigas que assim designavam o campo das reflexões

sobre os costumes dos homens, sua validade, legitimidade e exigibilidade.

Essa sinonímia clássica se dissocia da visão moderna, na medida em que a

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ética passou a ser concebida como um campo de reflexão prenhe de riquezas,

uma referência a atitudes nobres, qualidades de que a “pobre” e “seca” moral

careceria inapelavelmente (TAILLE, 2006, pp. 25-26).

Convencionou-se então que a moral seria mais adequada para

definir o fenômeno social, ao passo que a ética remetia à reflexão filosófica ou

científica. Nas comunidades humanas, há um conjunto de regras cuja

transgressão acarreta sanções socialmente organizadas: sob esse ângulo, toda

organização social humana tem uma moral. Mas, invariavelmente, como todo

fenômeno social, a moral suscita indagações. Por tratar de normas de conduta,

uma primeira questão incide sobre suas origens, fundamentos e legitimidade. A

filosofia dedica-se a desvendar tais perguntas.

No entanto, a moral pode figurar como cerne de um debate

científico: pode-se procurar traçar a história dos sistemas morais (história), a

compreensão das condições sociais (sociologia), desvendar os processos

mentais (psicologia), e assim por diante... A esse trabalho de reflexão filosófica

e científica costuma-se designar como ética (TAILLE, 2006, p. 26).

A aceitação do termo “ética” deve-se à rejeição de seu

correspondente etimológico: “moral”, que remete a “moralismo”, “moralista”,

lembrando, normatização incessante, dogmática, de abrangência excessiva,

vigiando e disciplinando a vida alheia. Outra constatação interessante é a

interferência de ambas na esfera pública e privada. A moral reserva-se ao

campo das relações privadas, como ocorre na hipótese do comportamento de

um bom pai, ou de uma boa mãe, já a ética interfere nas questões que ocupam

o espaço público. Daí as referências aos “códigos de ética” de variadas

profissões, ou da presença de expressões como a “ética na política”, e os

“comitês de ética para a pesquisa de seres humanos”. Dessa percepção

depreende-se que não faria o menor sentido o termo “ética na família” (TAILLE,

2006, p. 27).

A observância da ética na sociedade da informação é de suma

importância, pois seu desrespeito pode ter efeitos gravíssimos quanto à

dignidade da pessoa humana. A ética está ligada a ideia básica de liberdade e

à formação do indivíduo para a vida em comunidade e para condução de uma

vida coletiva (CORTELLA, 2015, p. 15).

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Enquanto os indivíduos não virem respeitadas rigorosamente as

exigências morais, culturais e espirituais, fundadas na dignidade da pessoa e

na identidade peculiar de cada comunidade, a começar pela família, a

abundância material e as vantagens da tecnologia, resultarão insatisfatórias e,

com o andar do tempo, desprezíveis. Os publicitários, bem como todos os

profissionais dos mass media, têm o dever intransigente de exprimir e de

promover uma visão autêntica de progresso humano nas suas dimensões

materiais, culturais e espirituais.

Nessa linha de análise, a comunicação que corresponde a este

princípio é verdadeira expressão de solidariedade. Na realidade, as duas

dimensões, a comunicação e a solidariedade, são inseparáveis (FOLEY, 1997).

Em que pesem as críticas relativas à filosofia política e jurídica

externada por diversos autores, dentre eles Hanna Arendt e Shopenhauer que

afirmaram que sua obra jurídica não estaria no mesmo patamar de suas

grandes obras filosóficas (BARRETO, 2013, pp. 44-45), não se pode negar o

aporte kantiano ao debate sobre a possibilidade de o ser humano pós-moderno

ser capaz de discernir adequadamente acerca de suas escolhas.

Em 1762, nas Lições sobre a Ética, Kant desenvolveu longa

argumentação sobre a natureza da obrigação, demonstrando a obrigação em

relação a si mesmo e ao outro. Esse fundamento respalda todos os sistemas

normativos e a distinção entre a moral e o direito. Em síntese, sua teoria

constituiu o cerne da primeira sistematização da filosofia moral, por ele

designada como filosofia prática universal (BARRETO, 2013, p. 45).

Análise percuciente de BARRETO favorece a compreensão da

arquitetura do pensamento kantiano:

“A arquitetônica da teoria do conhecimento de Kant baseia-se em um conjunto de elementos constitutivos de qualquer forma de pensamento, os chamados a priori, ou seja, aquilo que é determinado a partir de puros conceitos, independentes da própria experiência. Os elementos a priori do conhecimento (intuições, categorias e princípios) revelem-se como tais pelo seu caráter de necessidade rigorosa e de validade universal. As três críticas da razão escritas por Kant – Crítica da razão pura, 1781, 2ª Ed. modificada em 1787; Crítica da razão prática, 1788; Crítica da faculdade de julgar, 1790 – estabelecem esse edifício arquitetônico, procurando cada uma delas responder às perguntas clássicas kantianas. A primeira

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delas reflete sobre os limites do conhecimento humano argumentando como na ordem do conhecimento, as leis a priori da razão impõem-se ao conhecimento. A crítica da razão prática estabelece que, na ordem da razão humana, a razão pura prática, dirigindo de modo incondicional e formal a ação humana, determina o imperativo categórico do dever de modo apodítico. A crítica da faculdade de julgar, por sua vez, estabelece como princípios puros a priori regem, através do julgamento estético, o que podemos chamar de comunicação intersubjetiva. Em todas as críticas consideram-se os a priori racionais que irão sedimentar o supere aude do homem moderno. ” (BARRETO, 2013, p. 45)

Kant divisava a filosofia em três partes: Lógica, que é a dimensão

formal, aplicada a todo pensamento; física, que trabalha com as leis da

natureza, e ética, cujo pressuposto é a vontade humana. A ética é formada no

campo da lei moral, por mandamentos que regem à vontade, segundo a razão.

Esses comandos espelham uma espécie de “dever ser”, um

imperativo que pode ser hipotético ou categórico. O imperativo hipotético

identifica a ação boa, ligada a determinado fim. Já o imperativo categórico

apresenta uma ação que é boa na gênese, independente da pretensão de

alcançar algum fim (BARROSO, 2014, p. 1105).

Ao invés de determinar um rol de ações positivas ou negativas,

Kant concebeu uma fórmula capaz de determinar que tipo de ação pode ser

considerada como ética.

Outros conceitos fundamentais no sistema ético-kantiano são a

autonomia da vontade e a dignidade. Autonomia é a qualidade de uma vontade

livre e permite identificar a capacidade de autodeterminação do indivíduo,

conforme a representação de certas leis. Trata-se de uma razão que se

autogoverna. A ideia central do debate consiste na afirmação de que os

indivíduos estão sujeitos a leis que determinam a si próprios: em outras

palavras: um indivíduo autônomo é orientado pela própria vontade e não por

outrem; é governado pela razão, consistente na representação correta das leis

morais. O princípio máximo da moralidade supõe que cada indivíduo dá a si

mesmo uma lei que poderia tornar-se universal; uma lei objetiva da razão, sem

qualquer concessão ou motivação subjetiva (BARROSO, 2014, p. 1135).

Por outro lado, a dignidade, na visão kantiana, tem por

fundamento a autonomia. Trata-se de um mundo pautado pelo imperativo

categórico, como que, em uma espécie de “reino dos fins”. Nesse cenário, tudo

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tem um preço ou uma dignidade: as coisas que têm preço podem ser

substituídas por equivalentes. Todavia, quando algo está acima de qualquer

preço, sem a possibilidade de substituição por equivalente, ela tem dignidade.

Assim está constituída a natureza única do ser humano: somente

as pessoas são detentoras de valor interno absoluto, chamado dignidade.

Como consequência, cada ser racional e cada pessoa existe como fim em si

mesma, jamais podendo ser tratada como meio para uso direcional de vontade

externa, na formulação do imperativo categórico kantiano (BARROSO, 2014, p.

1149).

A dinâmica do imperativo categórico é fecunda à análise do “reino

da sociedade da informação”, cujos integrantes nem sempre têm noção do real

conteúdo, ou poder de controle sobre a forma e a fonte das informações

propaladas.

Nos estudos ligados à gênese da teoria do conhecimento, Kant

elevou o sujeito à condição de núcleo da elaboração teórica. Nessa ordem de

raciocínio, como se aludiu, o homem se torna o centro gravitacional da ciência.

Propondo mudança no ato de conhecer, o filósofo em tela definiu o movimento

como “revolução copernicana”, em que o ser deixa de gravitar ao redor de

objetos: não é o conhecimento humano que deve girar em torno dos objetos,

mas os objetos que devem adequar-se ao conhecimento humano (SANTOS F.

F., p. 1).

O sujeito pensado por Kant é um sujeito transcendental, em que a

razão universal é uma “estrutura vazia”, que, separada da sensibilidade, nada

pode conhecer; mediante a práxis, a razão se libertará do auto alienação na

teoria, porquanto, no domínio da prática, a razão está a serviço de si mesma.

Depreende-se daí não ser apropriado procurar as normas do agir humano

apenas na experiência, pois isso significaria submeter o homem a outro

homem. Como se expôs, o que caracteriza o ser humano, e o faz dotado de

dignidade especial, é que ele constitui fim em si mesmo (SANTOS F. F., p. 1).

Conforme lição de SARLET (2009, p. 2368), a dignidade da

pessoa humana tem como origem o pensamento kantiano, alicerce da ordem

jurídica, onde o reconhecimento da identidade pessoal (no sentido de

autonomia e integridade psíquica e intelectual), concretiza-se em outras

dimensões – como na hipótese do respeito à privacidade, intimidade, honra,

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imagem. Na mesma seara, situam-se todas as dimensões umbilicalmente

vinculadas à dignidade da pessoa, não apenas como direito geral ao livre

desenvolvimento da personalidade, mas em todas as suas complexas

dimensões (SARLET, 2009, p. 2368).

No entendimento de BARROSO, a dignidade da pessoa humana

identifica (1) o valor intrínseco de todos os seres humanos, assim como (2) a

autonomia de cada indivíduo, (3) limitada por algumas restrições legítimas

impostas a elas em razão de valores sociais ou até mesmo interesses do

estado (BARROSO, 2014, p. 1159).

O valor intrínseco constitui elemento ontológico da dignidade

humana, vinculado à natureza do ser, pois corresponde ao conjunto de

características inerentes a todos os seres humanos, trata-se de um valor que

não tem preço porque é bom. A autonomia é o elemento ético da dignidade da

pessoa humana. Cuida do fundamento do livre arbítrio dos indivíduos que

permite buscar a forma de viver bem e ter uma vida boa. No caso em exame, a

noção central é a autodeterminação.

Ainda na esteira da dignidade da pessoa humana, destaca-se o

valor comunitário, também convencionado como heterônomo. Por essa

vertente, os contornos da dignidade são modelados pelas relações dos

indivíduos com os demais e com seu contexto. (BARROSO, 2014, pp. 1216-

1402).

No fundo, o conceito extraído da dignidade da pessoa humana

constitui – tal como o de ser humano, para o qual remete diretamente – uma

expressão abstrata e genérica, cujo conteúdo é sedimentado através do

amadurecimento das relações humanas que se manifestam através de

decisões judiciais proferidas em casos concretos. (CANOTILHO & Alessandra

SILVEIRA, 2013, p. 665).

É oportuno sublinhar que a dignidade humana não se refere a

uma noção abstrata de pessoa, mas é o apanágio de cada pessoa humana, na

sua vida pessoal e social (MIRANDA & MEDEIROS, 2010, p. 80). Como

assinalado, dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais se

relacionam de forma íntima, como as duas faces da mesma moeda. Em uma

delas, constam os valores morais que singularizam todas as pessoas,

tornando-as merecedoras de igual respeito e apreço; na outra, encontra-se o

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direito, com os valores fundamentais, uma função de perspectiva moral capaz

de replicar sanções no campo do direito (BARROSO, 2014, p. 1199).

Tal interação exige que a dignidade da pessoa humana sirva de

fio condutor da reflexão sobre as relações virtuais, que, além de protegidas

pelo texto consumerista, contam com a força normativa do texto constitucional,

cuja principiologia é instrumento vital para enfrentar conflitos, para os quais

nem sempre o direito positivo oferece respostas. A dignidade, no entanto, por

tratar-se de um valor ínsito ao ser humano guarda relação com os direitos

humanos, dada a existência de um verdadeiro “fetiche dos direitos humanos”

(BARRETO, 2013).

As constituições e declarações de direitos do estado liberal

fundamentavam-se mais nas noções de liberdade e igualdade do que de

dignidade. Os direitos fundamentais eram vislumbrados como o espaço jurídico

dentro do qual se conferia ênfase à garantia da propriedade, espinha dorsal da

sociedade liberal. Enquanto estes declaravam os direitos considerados básicos

em determinado Estado, os Direitos Humanos apontavam para a dimensão

propriamente dita do cidadão, não adstrito ao direito positivo nacional.

Talvez por este motivo, para alguns autores, a dignidade era

considerada como a matriz da filosofia dos direitos humanos (BARRETO, 2013,

p. 64), além de ser simultaneamente, elemento que confere unidade de sentido

e legitimidade à ordem constitucional (SARLET, 2009, p. 2168).

No intuito de distinguir os conceitos de dignidade da pessoa

humana e direitos humanos, é basilar o entendimento de que ambos ocupam o

mesmo plano, pois se referem à pessoa humana. Todavia, a dignidade situa-se

em nível mais profundo na essência do homem, de modo que a liberdade lhe

será subsumida. A noção de que no substrato dos direitos humanos, encontra-

se um valor moral, apareceu em função de dois fenômenos ocorridos no século

XX: a barbárie nazista e a biomedicina. Ambas suscitaram o temor de que o

exercício do poder e a aplicação do conhecimento científico poderiam destruir a

vida humana. Ao mesmo tempo, possibilitariam a explicitação de uma defesa –

a proteção do homem através do reconhecimento da sua dignidade. Em outras

palavras, a dignidade humana designaria não o ser humano, o indivíduo, mas

toda a humanidade.

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Enquanto os direitos humanos representaram a defesa da

liberdade diante do despotismo, a dignidade humana significou a marca da

humanidade diante da barbárie (BARRETO, 2013, p. 65).

Como se assinalou, os direitos humanos relacionam-se com a

defesa do indivíduo contra as arbitrariedades do exercício do poder,

principalmente do poder do Estado. O sistema jurídico, por sua vez, tem como

objeto a preservação da liberdade das pessoas, em todas as suas

manifestações e dimensões, incluindo aquelas que assegurem ao homem o

pleno exercício da vida política (BARRETO, 2013, p. 66).

A análise dos direitos humanos sob a perspectiva da sociedade

também pressupõe o exercício da liberdade. Isso porque a igualdade entre os

homens somente poderá ser efetiva, se for realizada em liberdade (BARRETO,

2013, p. 66). Como sugerido, o homem livre é capaz de se autodeterminar e

orientar sua vida, com base em critérios racionais.

O conceito de liberdade não constitui objeto de mero

conhecimento teórico e não pode valer como princípio constitutivo, mas como

elemento regulador e não apenas como princípio meramente negativo da razão

especulativa (KANT, 1973, p. 366).

Nas sociedades modernas, a liberdade pavimenta a igualdade e

vice-versa. Para BARRETO, igualdade representa condição para a

concretização da liberdade. “Logo os direitos humanos representam a garantia

de que a sociedade constituída de iguais, que permitem as relações entre si, e

também do “ego” do indivíduo, possibilita a junção desses dois espaços

jurídicos” (BARRETO, 2013, p. 66).

Por este viés, os processos metaconscientes de criação de

convicções e a forma de estruturação de pensamento da coletividade deixam

transparente, que para a preservação da dignidade da pessoa humana, deve-

se conceder um tratamento jurídico mais atento à debilidade do cidadão,

quando é instado a refletir e posicionar-se acerca das informações captadas

nos meios de comunicação.

Em sua vertente prática, a liberdade se operacionaliza mediante aplicação de

princípios práticos, que demonstram, como leis, uma causalidade da razão

pura para determinar o arbítrio independente de condições empíricas, trazem a

lume uma vontade pura, na qual os conceitos e leis morais têm sua origem.

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Nessa dimensão do conceito positivo de liberdade, fundamentam-se leis

praticas incondicionais que se denominam morais. Verifica-se um arbítrio que é

afetado sensivelmente e, portanto, não se adequa por si mesmo à vontade

pura, mas com frequência lhe é resistente. Essas leis são comandos ou

proibições e, na verdade, imperativos categóricos (KANT, 1973, p. 377).

Sob o ângulo da moral, a ação é reafirmada por HEGEL (in:

WEBER, 2013, p. 1804), quando ressalta que. A “exteriorização da vontade

como vontade subjetiva ou moral é a ação”. Esta deve ser: a) reconhecida

como minha; b) estar relacionada ao conceito na forma de dever ser; c) estar

relacionada à vontade dos demais. Do ponto de vista subjetivo, satisfeitas

essas condições, pode-se afirmar que a ação atende às exigências de ação

moral e pode ser imputada responsabilidade de ordem moral.

A ideia básica é da autonomia, pois a liberdade exige escolha

autônoma. Nessa linha, a ética encontra campo fértil para atuar na sociedade

da informação.

A autonomia da vontade é princípio supremo da moralidade, que

abriga leis universais. Somos autônomos, quando obedecemos à lei: como

legisladores do reino dos fins, uma comunidade moral (WEBER, 2013, p. 338).

A liberdade é conceito chave para compreensão da autonomia:

uma vontade livre equivale a uma vontade autônoma: ou seja, uma vontade

sujeita em aos valores e regras socialmente reconhecidos e chancelados.

Nas palavras de (BARRETO, 2013, p. 66):

“A dignidade da pessoa humana encontra-se no cerne da luta contra o risco da desumanização, consequência do envolvimento desmesurado da tecnociência e do mercado. O inimigo não é mais única e exclusivamente o poder do Estado, mas também o próprio produto do conhecimento humano e do sistema produtivo. ”

O homem está acima de qualquer preço, porque impregnado da

dignidade A personalidade moral, com capacidade de exercício da vontade,

determina a condição de sermos membros de um “reino dos fins”. Como tais,

temos a capacidade de agir fora de forma eticamente correta; isto é, em

conformidade com princípios (WEBER, 2013, p. 349).

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Para VICENTE DE PAULA BARRETO (BARRETO, 2013, p. 66), a

questão da dignidade é relativa ao indivíduo:

“Verifica-se então como a dignidade da pessoa humana se encontra referida à questão do indivíduo, mas da humanidade. O homem dos direitos humanos representa, juridicamente, o indivíduo universal no exercício de sua liberdade também universal. A humanidade por sua vez, é a reunião simbólica de todos os homens enquanto seres humanos. Reconhece-se a pessoa como pertencente a um mesmo gênero: “o gênero humano”. A dignidade se apresenta como qualificativo do gênero humano, que torna possível identificar todos homens como pertencentes a um mesmo gênero. A identificação que faz com que todos os homens façam parte da humanidade reside no fato de que todos têm uma mesma qualidade de dignidade no quadro da humanidade. Os humanos são assim considerados porque todos são dotados de uma mesma dignidade, que é o último critério de reconhecimento. ”

De plano, a liberdade pode ser considerada a essência dos

direitos humanos, enquanto a dignidade pode configurar-se como a essência

da humanidade (BARRETO, 2013, p. 66). Nessa perspectiva, é evidente a

exigência de posicionamento ético por parte dos grandes conglomerados de

mídia, sem o que restará desestruturado um dos pilares dignidade humana.

O exercício da liberdade só pode ser pleno, se o agente possuir

integral conhecimento das características dos negócios jurídicos a serem

celebrados, e antes de mais nada, o efetivo controle sobre os seus atos.

Partindo-se desse requisito, as informações provenientes da via digital nem

sempre são capazes de objetivar as premissas ora ressaltadas, senão o ser

humano não seria livre conforme definiu Kant.

ROUSSEAU fez referencia ao critério libertário, quando tratou do

direito do mais forte:

“Nunca o mais forte o é tanto para ser sempre senhor, se não converte a força em direito, e em dever a obediência; eis donde vem o direito do mais forte, direito que irônica e aparentemente se tomou, e na realidade se estabeleceu em princípios: mas nunca nos explicarem essa palavra? A força é um poder físico, não imagino que moralidade possa resultar de seus efeitos. Ceder à força é um ato de necessidade, não de vontade; é, quando muito, um ato de prudência. Em que sentido poderá ser um dever? ” (ROUSSEAU, Do Contrato Social, 2005, p. 19).

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A teoria rousseauniana sugere que com a migração do interesse

comum para o interesse particular, a sociedade é impulsionada para um

sistema de dominação e subordinação. O senhor da propriedade empregava a

força para impor o domínio, nascendo daí o poder individual, fundado em um

interesse privado. Nessa perspectiva, construiu-se nova narrativa que

fundamenta a escravidão, agora calcada na aquisição de bens (MATTOS

JUNIOR R. F., 2009, pp. 18-19).

A propriedade interferiu na formação do Estado, assegura a

dominação, estabelecendo uma espécie de pacto de opressão social e política.

Diante do problema, o homem é levado a lutar pela liberdade suprimida pelo

Estado e pela camada social dominante que realizou, com êxito, a moralização

da força, por meio do direito (JUNIOR R. F., 2009, p. 19).

Como ressaltou Norberto BOBBIO (1992, p. 5):

“Do ponto de vista teórico, sempre defendi – e continuo a defender, fortalecido por novos argumentos – que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todos”

A dominação do Estado que, entre outros meios, utiliza a

necessidade de consumo, impõe às pessoas maior e mais intensa dedicação

ao trabalho, para atender às necessidades da vida moderna. A “informação”

obtida durante esse processo, ou no trânsito dos consumidores até o seu

trabalho, mantém ativa a falsa percepção de absorção de informação. Trata-se

de um processo de transmutação do entretenimento em informação, ou do que

Zygmunt Bauman designa como vida para consumo.

“É uma sociedade notória por eliminar a fronteira que antes separava o privado e o público, por transformar o ato de expor publicamente o privado numa virtude e num dever públicos, e por afastar da comunicação pública qualquer coisa que resista a ser reduzida a confidências privadas assim como aqueles que se recusam a confidencia-las (BAUMAN, 2008, p. 10).

A ausência ou insuficiência de informação obnubila as reais

necessidades dos consumidores, na medida em que cria constante estado de

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atenção, originado em “uma espécie de medo de “segundo grau”, um medo,

por assim dizer, social e culturalmente reciclado, ou um “medo derivado” que

orienta seu comportamento, havendo ou não uma ameaça imediatamente

presente” (BAUMAN, Medo Líquido, 2008, p. 9). O autor em tela identifica a

presença de um medo forjado na necessidade de permanente dominação do

Estado, mas nesse momento representada pelo acesso a bens de

consumo/informação e pela dominação do Estado em relação às grandes

corporações.

Como resposta jurídica à dinâmica que retira do ser humano o

exercício da liberdade, desenvolveram-se movimentos históricos, com a

finalidade de devolver às pessoas a capacidade de comando sobre os próprios

atos, sem os quais, a dignidade da pessoa é letra morta.

O embate relativo à dominação do Estado e das classes sociais

dominantes e detentoras da propriedade privada. Ruy Ferreira Mato Junior

(JUNIOR R. F., 2009, p. 19) presta relevantes esclarecimentos sobre o tema:

“Daí por diante, houve a preocupação crescente em se limitar o poder como forma de se assegurar uma sociedade livre de arbitrariedades, cujo reflexo teve repercussão no movimento denominado de humanismo. Por sua vez, a consequente renovação trazida no período Renascentista, coloca o homem como centro do debate, afastando a opressão religiosa disfarçada em poder divino, ratificadora do poder absoluto e perpetrado na Idade Média. Com a transição para a Idade Moderna, iniciou o predomínio do antropocentrismo e da exacerbação do racionalismo. Com o desenvolvimento do intelecto humano, o acesso à informação e a possibilidade de se questionar aquelas verdades consideradas absolutas, oportunizou-se que as formas de dominação, até então fundadas no paradigma teocêntrico, começassem a ruir pelas suas próprias fragilidades conceituais. Nascem os pactos, inúmeros, que vieram a garantir a proteção de direitos de determinados grupos, a princípio, reflexamente individuais e políticos”.

Dessa dinâmica, ao longo do tempo emergiram iniciativas que

visam a propiciar resposta jurídica às preocupações da vida pós-moderna. A

referência da sociedade que se pauta pela dificuldade da inter-relação entre o

avanço das novas tecnologias ligadas ao campo da informação e a

necessidade de respeito às mínimas garantias sociais, produz inúmeras

respostas. Porém, somente através da estrita observância dos direitos

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fundamentais, será viável o efetivo enfrentamento dos problemas, os quais

“apresentam sua gênese na concepção humana de que a liberdade é o bem

mais precioso à existência digna da vida” (MATTOS JUNIOR R. F., 2009, p.

20).

A partir da natureza racional do ser humano, Kant ressalta que a

autonomia da vontade merece ser observada como a faculdade de o ser

humano determinar a si mesmo e agir em conformidade com a significação de

determinadas leis, por tratar-se de dádiva conferida somente aos seres

racionais, fundada na dignidade da pessoa humana (SARLET, A eficácia dos

direitos fundamentais, 2009, p. 35).

Como se demonstrou, a dignidade constitui característica

imanente dos homens e não concessão do estado. Sua origem é anterior ao

surgimento do ente estatal e superior a qualquer valor material, não se

admitindo qualquer substituição.

O respeito à dignidade da pessoa humana é nodal para dirimir

questões ligadas à informação, haja vista suas relações com a solidariedade

que perfaz a ética humana. Pela solidariedade, o homem reconhece o outro

como semelhante e compreende que seu comportamento (bom ou mau) pode

afetar o outro. Por este viés, o que for avaliado como digno para uma pessoa,

também o será para os demais. Tratando do tema, (ANDRADE, 2006, p. 4)

leciona que:

“Em verdade o comportamento ético delineado pela solidariedade humana deve ser obtido pela supressão, por parte do homem, da visão dualista e obnubilada que impede de enxergar a humanidade como um todo, sem divisão de qualquer espécie, certamente o homem agirá sempre de forma ética, pois, fazendo parte do todo, jamais praticará ato que vilipendie o direito de seu semelhante, uma vez que este ato também o prejudicará. Assim, o respeito à dignidade da pessoa humana atingirá o grau de pureza que ensinamos quando o homem for capaz de eliminar a dualidade do “meu” e do “seu” e enxergar somente o nosso”

Por óbvio, que a ideia guarda vínculos com o pensamento

kantiano, concernente à premissa de que a pessoa é subjetivamente livre para

agir em conformidade com sua consciência e valores; mas, acima de tudo,

deve observar e respeitar o imperativo categórico de natureza ética, para que

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sua conduta segundo critérios de solidariedade. Sob esse enfoque, a dignidade

da pessoa humana deve ser compreendida como valores éticos-sociais, em

que se inclui a vida, a integridade física e a liberdade, entre outros (ANDRADE,

2006, p. 4).

Nessa linha de raciocínio, a garantia de preservação da dignidade

da pessoa compreende o direito de controlar sua vida e, no contexto da

sociedade da informação, um tratamento equilibrado em face dos criadores e

difusores da informação. Trata-se de relação única, alicerçada pelo imperativo

categórico de respeito e equilíbrio entre as partes. A análise da informação

deve ser feita sob o prisma do direito fraterno, onde o material difundido será

submetido ao crivo de padrões éticos, revestidos de boa-fé, transparência,

isonomia e equidade.

Para atingir tal objetivo, é necessário resgatar a riqueza

multifacetada dos sentidos dos conceitos jurídicos. Na tradição jurídica da

modernidade, o direito vencedor apagou o sentido mais essencial da

solidariedade — o dever de todos, da comunidade de garantir o direito do

próximo — superando uma cidadania calcada em bases individualistas

(MARRAFON, 2014).

O autor supramencionado, discorrendo sobre o pensamento de Elígio Resta jusfilosofo italiano, explica que

“Esse sentido, ora apagado, estava presente no artigo 23 da Carta francesa de 1793, no qual se encontra a noção de que a luta pelo direito é um problema de cultura da comunidade, manifestada na previsão de que é dever de todos zelar pelo reconhecimento, manutenção e efetivação do direito de cada um” (MARRAFON, 2014).

Bebendo na fonte indicada, (ELÍGIO RESTA), pode-se entender que:

"Os direitos, entendidos como ‘plural absoluto’, deveriam se realizar como um problema comunitário e de reciprocidade positiva, pelo qual os direitos dos outros seriam reconhecidos apenas sob a condição de reconhecimento simétrico e em função da redução da violência recíproca, dentro de um pacto que não poderia exigir [admitir] uma soberania” (RESTA, 2004, pp. 90-91)

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O zelo que impregna o princípio da fraternidade rompe a

perspectiva dominante na sociedade da informação e serve de referencia para

a estruturação de uma sociedade que pensa no outro e afasta o egoísmo. Com

essa orientação, torna-se viável o reposicionamento do cidadão comum em

relação aos provedores de informação e sua relação com os consumires da

internet. Considerando a infinita gama de possibilidades determinada pelas

novas relações de consumo que vulnerabilizam o consumidor, a regência dos

princípios jurídicos constitui elemento fundante na aplicação do direito, quando

se pretende produzir respostas a novos problemas.

2.2 Fundamentos jurídicos

Como esclarece amplamente a doutrina, regras e princípios

detêm funções distintas no ordenamento jurídico. Enquanto as regras tomam

por base o estabelecimento da conduta adequada a hipóteses pontuais,

devidamente caracterizadas, sob a forma de resposta do tipo o tudo ou nada,

os princípios têm o papel de dar unidade e harmonia ao sistema jurídico. Outra

função relevante dos princípios é de condicionar a atividade do intérprete.

Operando como bússolas que apontam para o norte do sistema jurídico, os

princípios constituem o fio condutor do intérprete, lente de exame de toda e

qualquer questão submetida ao julgador. (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 34).

As normas jurídicas dividem-se em duas categorias: regras e

princípios. As primeiras contêm previsão objetiva, descritiva de

determinadas condutas, aplicáveis a hipóteses definidas. Elas partem da

perspectiva de incidência pré-determinada que, uma vez preenchida, demanda

a devida consequência normativa. Trata-se de um comando objetivo que não

dá margens a elaborações mais sofisticadas acerca de sua aplicação.

(CAVALIERI FILHO, 2011, p. 32).

Em “Levando os direitos a sério”, RONALD DWORKIN exemplifica

a referida regra do tudo ou nada de maneira pontual:

“Esse tudo ou nada fica mais evidente se examinarmos o modo de funcionamento das regras, não no direito, mas em algum empreendimento que elas regem – um jogo, por exemplo. No beisebol, uma regra estipula que, se o batedor errar três bolas, está fora do jogo. Um juiz não pode de modo coerente,

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reconhecer que este é um enunciado preciso de uma regra do beisebol e decidir que um batedor que errou três bolas não está eliminado. Sem dúvida, uma regra pode ter exceções (o batedor que errou três bolas não será eliminado se o pegador deixar cair a bola no terceiro lance). Contudo um enunciado correto da regra levaria em conta essa exceção; se não o fizesse seria incompleto. Se a lista de exceções fosse muito longa, seria desajeitado demais repeti-la cada vez que a regra fosse citada; contudo em teoria não há razão que nos proíba de incluí-las e quanto mais o forem, mais exato será o enunciado da regra” (DWORKIN, 2010, pp. 39-40)

Sob a vertente etimológica, a gênese do termo Princípio remete à

noção de início, ponto de partida. Sob a ótica jurídica, a análise do

ordenamento jurídico se desencadeia e é orientada pelos princípios. Os valores

éticos e morais situam-se na base da ordem jurídica e são compartilhados pela

comunidade. Nessa esteira, destaca-se a liberdade, a igualdade, a

solidariedade, a dignidade da pessoa humana, a boa-fé entre outros.

A noção de valor está no alicerce moral do direito; sua essência

ética. É importante sublinhar que toda sociedade tem como elemento de

ligação uma escala de valores, ligada à ideia de poder, importância,

necessidade material ou moral, acerca de condutas, posições, entendimentos e

coisas. A escala axiológica se forma e evolui aos poucos, de acordo com

correntes ideológicas – pensamentos teorias, opiniões – dominantes em

determinada sociedade (CAVALIERI FILHO, 2011, pp. 32-33).

Regras veiculam mandados de definição, ao passo que os

princípios são mandados de otimização e devem ser realizados com a maior

amplitude possível, reconhecendo-se uma dimensão de peso e importância. A

generalidade é comum tanto para princípios como para regras; no entanto, a

generalidade das regras é mais pontual do que a dos princípios. Em breve

síntese: enquanto a regra detém conteúdo específico que define precisamente

os pressupostos fáticos de incidência, os princípios tipificam-se por seu

conteúdo genérico e enunciado aberto, cujos pressupostos de aplicação não

são definidos com precisão, espraiando-se por um número indeterminado de

situações concretas (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 33).

A prevalência de um princípio em relação ao outro pode ocorrer

em diferentes circunstâncias. O direito respeita o pressuposto segundo o qual

nenhum homem pode beneficiar-se dos erros que comete; no entanto, é

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comum que pessoas obtenham vantagem, de modo legal, dos atos ilícitos que

praticam. Um excelente exemplo é a hipótese da usucapião – se alguém

atravessar terras sem autorização durante muito tempo, algum dia surgirá o

direito de cruza-las quando desejar. Outro exemplo aparece quando um

homem foge do sistema prisional quando está sob fiança para fazer um

investimento milionário, ele poderá ser remetido de volta para a prisão, mas

manterá os lucros (DWORKIN, 2010, p. 40).

A dimensão atribuída aos princípios não é de validade ou

invalidade como na hipótese das regras, mas tão somente de peso e

importância. Quando as regras conflitam, não é viável afirmar que uma

prevalece sobre a outra. A solução deste tipo de conflito (antinomia) terá como

base a hierarquia, a especialidade, a temporalidade ou a aplicação da teoria do

diálogo das fontes. Os princípios serão avaliados segundo sua importância em

relação ao caso concreto. Em que pese o dilema quanto ao melhor

ajustamento de um princípio em relação ao outro, há um critério de valoração,

estabelecido através da ponderação de valores (CAVALIERI FILHO, 2011, p.

33).

Ao lado de Dworkin, ALEXY (2005) auxilia na compreensão dos

princípios, especialmente no que tange a sua ponderação, processo mediante

o qual se confrontam as razões em jogo, no caso concreto. Em seus estudos,

Alexy observou que as decisões do tribunal alemão não seguiam um padrão de

racionalidade nas decisões norteadas por princípios jurídicos. Nesse cenário,

ele se dedicou a encontrar uma técnica capaz de reduzir a discricionariedade

do julgador e propiciar certo grau de racionalidade ao processo decisório.

Nesse passo, confere-se relevo à técnica de ponderação de

princípios, mediante a qual se identifica o peso de cada princípio em face do

caso concreto. No desenvolvimento dessa ponderação, deflagram-se as

máximas jurídicas ligadas à proporcionalidade em sentido estrito, adequação e

necessidade.

Os fundamentos desse processo repousam em uma teoria

argumentativa proposta pelo autor, no intuito de revelar as intenções do

intérprete, ao definir o peso de cada princípio (MAIA & Carneiro, 2013, pp. 205-

206).

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“A ponderação, como poderemos notar, subdivide-se nos campos da justificação interna e justificação externa. A justificação interna, em poucas linhas, seria a própria ponderação. Já a justificação externa seria responsável, através de uma teoria da argumentação, por sustentar aquela resposta que foi encontrada através de um procedimento racional. Já de antemão é possível percebermos que a principal preocupação de Alexy era propor uma teoria mais analítica, preocupada com a racionalidade do discurso e a validade do procedimento” (MAIA & Carneiro, 2013, p. 211)

Como se comentou, Alexy produziu teoria analítica que intentou

garantir o padrão de racionalidade para decisões judiciais, combatendo a ideia

do julgador solipcista: cujas decisões são calcadas em experiências pessoais

(MAIA & Carneiro, 2013, p. 214).

A proteção à pessoa humana alberga a instituição dos direitos e

garantias fundamentais, no intuito de concretizar a dignidade da pessoa

humana. Por conseguinte, não é a pessoa que existe em favor do Estado, mas

o oposto. Sendo assim, torna-se evidente a vinculação da dignidade da pessoa

humana no rol dos direitos fundamentais, já que a essência de tal princípio

fundamenta a instituição dessas garantias (DOBARRO, 2015, p. 3).

Quando se reflete sobre essas exigências, é conveniente advertir

para a circunstancia de que o tempo dos problemas da vida cotidiana (como

aqueles inerentes aos contratos celebrados pela via digital) é diverso daquele

da produção legislativa, cuja trajetória passa pelo processo social, para depois

tramitar nas instâncias próprias, até ser incorporada ao ordenamento jurídico,

até entrar em vigor. Ademais, a análise desses dilemas precisa pautar-se por

valores, conceitos, preceitos, princípios e normas pactuados socialmente.

Nesse intento, merece relevo a consideração de princípios

norteadores de toda reflexão. Do ponto de vista histórico, um marco desse

alicerce teórico radica nos postulados da revolução francesa: liberdade,

igualdade e fraternidade, que constituem os pilares sobre os quais repousam

as três primeiras gerações dos direitos do homem. Outro fio condutor situa-se

na Carta Magna, que consagra valores e direitos, de aceitação geral e de

indiscutível aplicação, tendo em vista harmonizar e dar efetividade vida

cotidiana. Sob o aspecto constitucional, a Lei Maior vigente prevê

expressamente a possibilidade de interação e vários dispositivos indicam a

relação entre a dignidade da pessoa humana, igualdade e liberdade. No artigo

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1º, inciso III a Constituição Federal impõe, como um dos pilares da República

Federativa, a dignidade da pessoa humana, a qual também pode ser

considerada como fundamento da liberdade, da igualdade e dos demais

direitos fundamentais. Tal inferência torna-se evidente nos seguintes

dispositivos constitucionais: Artigo 5º, caput e inciso I, onde se contempla a

igualdade; no artigo 3º, III, quando se expressa o compromisso com a redução

das desigualdades e com repulsa à discriminação; no mesmo artigo 3º, IV;

além da literal vinculação do Estado brasileiro com a busca pelo bem-estar

social e justiça social, como se identifica nos artigos 170 e 193 (SIQUEIRA &

RIBEIRO, 2016, p. 18).

A partir desses alicerces, o direito se configura como ciência e

prática social capaz de incorporar perspectivas mais integradoras e solidárias;

principalmente se estiver conectado com outros saberes científicos, numa

vertente transdisciplinar, escudado em decisões baseadas não somente na

razão. Vislumbra-se assim uma perspectiva solidária de empatia aos

sentimentos das partes e, a partir do envolvimento mais efetivo e próximo dos

operadores com os reflexos da causa na vida das partes e da sociedade.

Dessa forma, encontra-se espaço para investigar a aplicação da disciplina legal

sob a perspectiva da justiça em concreto, recorrendo igualmente à mediação e

à conciliação para a solução de conflitos, de maneira que não existam

perdedores, ganhadores, amigos ou inimigos, mas parceiros, nascidos do

pacto original jurado conjuntamente (FERREIRA R. F., 2008, pp. 98-99).

Essa percepção exige a superação do paradigma tradicional do

direito, enquanto ciência autônoma e apartada das demais, pautada em

decisões jurídicas escudadas na racionalidade e na letra fria da lei. Nesta visão

tradicional, questões jurídicas eram (ainda são?), tratadas como uma espécie

de jogo de perde e ganha, onde a impessoalidade dos operadores alinhavada

com o drama processual, as partes e a causa são de menor importância

(SIQUEIRA & RIBEIRO, 2016).

A nova orientação do direito assume a premissa de que a

exploração de um ser humano pelo outro, por qualquer via, viola a dignidade da

pessoa, bem como os requisitos inelutáveis de igualdade e de liberdade.

Tratando do assunto, SIQUEIRA & RIBEIRO (2016, p. 17) faz a seguinte

exemplificação:

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“o fato de alguém que, subjugado pelo outro, tornar-se atrelado aos interesses deste e ser utilizado como meio para obtenção de fins que não os seus próprios, encontrar-se-á privado de sua liberdade e não poderá ser considerado em condição de igualdade com relação a aquele que o subjugou. Haverá, nesse caso, uma violação frontal ao princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que sem direito à sua autodeterminação e privado de seu direito à igualdade formal e material, aquele homem deixará sua condição de ser humano e identificar-se-á com o conceito de instrumento, objeto utilizado para obtenção de determinado fim”.

O direito à dignidade é próprio da história da filosofia ocidental.

Antes mesmo do texto clássico de Picco de Mirandola, intitulado de “Discurso

sobre a dignidade do homem (1486) ”, a questão encontrava-se na obra de

Aristóteles, Santo Agostinho, Boécio, Alcuino e Santo Tomás, indicando como

através dos tempos se agregaram valores à ideia de pessoa, que terminaram

por objetivar a ideia de dignidade humana (BARRETO, 2013, pp. 63-64). Ela é

caracterizada “como uma qualidade intrínseca e indissociável de todo e

qualquer ser humano” (SOARES, 2016, p. 3).

No âmbito da teoria do direito, a dignidade humana é conceito

relativamente novo e, apesar de figurar em inúmeros textos internacionais

(Declaração Universal dos Direitos do Homem, 1949, art.22; Convenção

relativa aos direitos da criança, 1959, art.39, entre outras), sempre esteve

presente como princípio, referência moral obrigatória quando, ainda no século

XIX, a escravidão era combatida por ser um atentado contra a dignidade dos

seres humanos (BARRETO, 2013, p. 64). Ela deve ser guardada com todo zelo

e carinho, pois este coração deve ser livre de todas as moléstias e agressões

(SARLET, 2009, p. 4548).

Com a Constituição de 1988, a dignidade passou a fazer parte da

cultura jurídica brasileira como referência obrigatória na cultura cívica e nas

lides judiciais. Apesar disso, a dignidade da pessoa humana não se restringe

aos campos contemplados pelo direito positivo, eis que sua materialização

jurídica pressupõe perspectivas mais amplas do que permite o espaço jurídico

positivado (BARRETO, 2013, p. 64).

Ao seu lado, a liberdade de expressão (5º, IX) e os direitos do

consumidor (5º, XXXII e 170, V) foram consagrados como direitos e garantias

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fundamentais de todo e qualquer cidadão brasileiro. A importância conferida ao

postulado produz a necessidade de interpretá-lo como cláusula geral voltada à

efetivação dos direitos fundamentais, sendo capaz de guiar a unidade material

da Carta Magna. Por este prisma, os direitos fundamentais estão impregnados

de características indeléveis que os caracterizam sob diversos ângulos, tais

como a historicidade, a universalidade, a irrenunciabilidade, a

imprescritibilidade, a indivisibilidade e interdependência entre si.

Sua evolução encontra-se doutrinariamente dividida em

dimensões de direitos fundamentais que possuem eficácia vertical e horizontal,

pois sua vinculam o Estado e os particulares a sua observância (SOARES,

2016, p. 4).

Nessa linha de raciocínio, justifica-se o tratamento do consumidor

virtual, com respaldo na proteção à dignidade da pessoa humana, na seara dos

princípios de liberdade, igualdade e fraternidade/solidariedade.

A dignidade da pessoa humana é cláusula geral dos direitos

fundamentais (BARRETO, 2013, p. 64), tal como prevista no art.1º da

Constituição Federal. No entendimento de FLAVIA BAHIA (2009), constitui o

valor axiológico dos direitos fundamentais, como um dos fundamentos da

República (art.1º, III), eles são princípios implícitos (art.5º, III), tidos como

cláusula pétrea (art.60, §4º, IV) por sua força irradiante (BAHIA, 2009).

O liame entre a dignidade da pessoa humana com os preceitos de

liberdade (art.3º, I), igualdade (art.3º, IV), e fraternidade/solidariedade (art.3º, I)

é inelutável, não ao porque constituem objetivos fundantes da República

Federativa do Brasil (art.3º), cuja força normativa dialoga com os Direitos

Fundamentais previstos no art.5º da Constituição. Neste rol, se espelham a

liberdade de expressão (art.5º, IX) e a defesa do consumidor (art.5º, XXXII); ou

seja, os direitos ligados à sociedade da informação no mercado de consumo.

Ademais, os princípios podem operar como rede de proteção do

sistema normativo. Aplicados ao caso concreto, como se reflete no presente

estudo, se entrelaçados enriquecem o discernimento e análise de conflitos

pertinentes aos interesses do consumidor virtual.

Conforme alerta de DWORKIN (2010, p. 29), o sistema positivo

não pode antecipar todas as contingências; decorre daí a relevância dos

princípios.

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Além disso, a dinâmica da economia também influencia na

sociedade do consumo. Nesse contexto, a livre iniciativa descrita no art.1º, IV

da CF também deve ser observada, em conjunto com o art.1º III relativo à

dignidade e o art., 170, V, onde resta configurada a importância da defesa do

consumidor para a ordem econômica.

A dignidade humana compreende o princípio da igualdade que,

por sua vez, abarca a solidariedade. Já se ressaltou que a noção de igualdade

não significa tratar a todos igualmente em qualquer âmbito, pois as pessoas

não são iguais, sendo que a igualdade apresentada nos textos legais, como,

por exemplo, o art. 5º da CF (“Todos são iguais perante a lei [...]”), é tão

somente formal e não real (ANDRADE, 2006, p. 5).

Considerando-se essa característica, a igualdade a ser

perseguida é aquela voltada a tratar desigualmente os cidadãos, na proporção

em que se desigualam. Trata-se das chamadas ações afirmativas, por meio

das quais se busca restaurar o equilíbrio entre todos (ANDRADE, 2006, p. 5).

Na visão tridimensional, proposta por Reale, são incindíveis as

dimensões do fato, do valor e da norma na identificação do direito. Por essa

vertente, o direito é sensível a qualquer interferência de discrepância ao

universo de valores jurídicos e à proteção de tais valores primordiais (BITTAR,

2009, p. 113).

Se o direito pressupõe estabilidade dos valores majoritários

consensuais, para que a norma seja aplicada, no dinamismo da vida

contemporânea, pergunta-se: Quais os consensos possíveis em um mundo em

transformação? (BITTAR, 2009, p. 113).

Trata-se de um conjunto harmônico em que um não sobrevive

sem o outro. As violações da dignidade no contexto abordado, derivam da

desproporção fática entre os participantes de uma relação jurídica de consumo.

Aristóteles em “Ética a Nicômaco” (ARISTÓTELES, 2009, pp. 157-

176) auxilia na compreensão do dilema e, tela, ao sublinhar que:

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“Num sentido metafórico e analógico há certa justiça não dirigida contra si mesmo mas entre distintas partes da própria natureza de alguém, não, em verdade, justiça no sentido pleno do termo, mas àquela justiça que subsiste entre o senhor e o escravo, ou entre o chefe de sua casa e esposa e filhos; isso porque nos discursos em torno dessa questão, é estabelecida uma distinção entre as partes racional e irracional da alma, que é o que leva as pessoas a supor que exista algo...”

Nessa perspectiva, verifica-se a possibilidade de o sujeito saber e

reconhecer só o que tem origem na sua vontade. Essa característica deve

nortear a sua vida eis que querer e saber são condições essenciais à

constituição da livre vontade, sob o ponto de vista moral. A vontade subjetiva é

livre moralmente, na medida em que as determinações são postas

integralmente como aquelas realmente desejadas. Conforme assinalado,

autonomia da vontade é o critério de moralidade e de responsabilidade, pois só

um ato livre pode ser responsabilizado. A moralidade, portanto, trata das

condições constitutivas da responsabilidade subjetiva. (WEBER, 2013, p.

1784).

Admitida a hipótese de vulnerabilidade do consumidor, sustenta-

se o respeito ao princípio da igualdade e da isonomia, sem que se ignore a

exigência de fraternidade como possível fonte de solução dos dilemas de

cunho informacional-virtual. As teses de cunho libertário, identificadas na

readaptação do direito privado, se amoldam ao tratamento das complexas

estruturas insculpidas no bojo da sociedade da informação.

A tríade que guiou a revolução francesa, quando irmanada à

dignidade da pessoa humana, por certo traz a lume soluções indispensáveis

aos problemas característicos da sociedade midiática.

Comentando que liberdade e igualdade são valores intimamente

ligados ao Estado Democrático de Direito, o Ministro Gilmar Mendes, (in:

GOMES, 2009) em discurso proferido na Universidade de Münster assinalou:

“as decisões de fato dos tribunais constitucionais dão a esses valores uma

dimensão real, diante das peculiaridades históricas e culturais das diversas

sociedades”.

Em prosseguimento, citando Häberle, o então presidente do STF

(in: GOMES, 2009) chamou atenção à importância desses valores: “No início

deste Século XXI, o conceito de liberdade e igualdade deve ser reavaliado,

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reposicionando-se o da fraternidade". "Quero com isso dizer que a fraternidade

pode colocar em nossas mãos a chave com que poderemos abrir diversas

portas no sentido da solução das mais importantes questões da liberdade e da

igualdade com que se debate, hoje, a humanidade".

O respeito à tríade insculpida pela revolução francesa, aos pactos

internacionais relativos ao tratamento da matéria e a observância aos direitos

fundamentais estabelecidos na Carta Política vigente se apresentam como

disciplina às relações em que os direitos do cidadão possam ser

desconsiderados, seja por intermédio do Estado ou subliminarmente pela mão

das grandes corporações, ou outro qualquer ator social. Como se expôs, a

dignidade da pessoa humana é absoluta, e prevalecer sobre qualquer outro

valor ou princípio

A vulnerabilidade informacional agravada, situada no do contexto

de uma sociedade ávida por conhecimento, ou por obter o máximo de dados,

no menor espaço de tempo possível, precisa dos alicerces dos princípios

gerais de direito. Dessa forma, torna-se possível produzir soluções

principiológicas, de ordem constitucional e de aceitação geral, capazes de

impor respostas adequadas ao tempo e ao espaço. Esses elementos são

imprescindíveis, quando se consideram as velozes variações produzidas pelas

novas relações jurídicas travadas pelos meios virtuais.

Essa modalidade de vulnerabilidade precisa dos fundamentos da

fraternidade, eis que se trata de relações de interesses recíprocos na mesma

senda do caráter intersubjetivo dos direitos fundamentais. Sendo assim, o

indivíduo precisa superar o egoísmo e orientar sua conduta no sentido do bem

comum: quando se causa dano à comunidade, ofende-se o tecido de

solidariedade do qual emana a seiva vital. O exercício de uma liberdade não

comunitária é suicida, pois destrói o mecanismo reprodutivo humano

(PIZZOLATO, 2008, p. 120).

Com esse pressuposto, toda informação produzida e veiculada

deve observar os critérios éticos que pautarão o percurso informacional-

tecnológico. Sem isso, produz-se falsa sensação de liberdade.

Por sua vez, a liberdade tem como contrapartida a

responsabilidade pelas decisões e atitudes, cuja finalidade é chegar a uma

vontade boa (PAGOTTO-EUZEBIO, 2016, p. 2), tal como se propõe Kant:

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"Portanto, se a razão não é apta bastante para guiar com segurança à vontade no que respeita aos seus objetos e à satisfação de todas as nossas  necessidades  (que ela mesma  a razão em parte multiplica),  visto que um instinto natural inato levaria com muita maior certeza a este fim, e se, no entanto, a razão nos  foi dada como faculdade prática,  isto é,  como faculdade que deve exercer influência  sobre a vontade, então o seu verdadeiro destino deverá ser produzir uma vontade, não só boa quiçá como meio para outra intenção, mas uma vontade boa em si mesma, para o que a razão é absolutamente necessária, uma vez que a natureza de resto agiu em tudo com acerto na repartição de suas  faculdades  e talentos. Essa vontade não será na verdade o único bem nem o total, mas terá de ser contudo o bem supremo e a condição de tudo o mais, mesmo de toda aspiração de felicidade." (KANT, 1973, p. 205)

Kant argumenta que a liberdade é requisito à tomada de decisões:

quando o cidadão não detém controle sobre as informações que pré-

constituem sua base intelectiva, ele não pode ser considerado como um

homem livre. Aplicando esse pressuposto à sociedade da informação e aos

meios de consumo de massa, tornam-se ainda mais relevantes os

fundamentos da fraternidade, da ética, da solidariedade e da boa-fé.

O direito fraterno encontra respaldo no princípio da dignidade da

pessoa humana, tal como previsão no art.1º, III da Constituição Federal. Este

princípio independe de qualquer circunstância, eis que é inerente aos seres

humanos (DOBARRO, 2015, p. 2).

Como alertou SARLET (2009, p. 65), onde não houver respeito

pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde não existir o

respeito a garantias mínimas de existência digna, onde não houver limitação de

poder; enfim onde a liberdade e a autonomia, a igualdade e os direitos

fundamentais não forem respeitados, inexistirá lugar para a dignidade da

pessoa humana.

O debate entre justiça, direito e lei tem-se intensificado, trazendo

a lume um conjunto de valores justos, éticos, civis e a lei imposta pelo Estado

encontra suporte nas constituições modernas e em documentos internacionais.

No Brasil, como se apontou, o Preâmbulo da Carta Maior de 1988 consagra o

Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício de direitos

fundamentais “como valores sociais de uma sociedade fraterna”, proclamando

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inúmeros dispositivos, entre os quais se destaca a dignidade da pessoa

humana, a erradicação da pobreza e da marginalidade e a redução das

desigualdades sociais e regionais, bem como a prevalência dos direitos

humanos (CURY, 2016, p. 9).

Ao lado das constituições que trazem em seu bojo a preocupação

com a fraternidade, importantes atos e convenções internacionais vinculam

esse compromisso a serem observados pelos estados signatários. A

Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 reafirma o lema de

liberdade, igualdade e fraternidade e determina em seu art.1º “ todos os seres

humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão

e consciência e devem agir reciprocamente com espírito de fraternidade”

(CURY, 2016, p. 9).

Para CURY, a solidariedade, uma das vertentes da fraternidade,

dá novo sentido à distribuição de justiça, posto que se, de um lado tem, como

base a aplicação da lei, de outro, avalia os conflitos que conferem prioridade ao

direito à vida, reconhecendo o respeito e a dignidade das partes no processo,

interpretando-a segundo o preceito básico de “fazer ao outro aquilo que

gostaria que fosse feito a si próprio (CURY, 2016, p. 11).

Como cediço, a fonte de inspiração da ordem jurídica repousa em

valores sociais capazes de harmonizar o cotidiano dos integrantes de cada

sistema; sublinhando valores aptos a promover a convivência social, o bem

comum, o interesse público, a segurança e a justiça. Nessa perspectiva, o bem

comum congrega o ideal norteador da boa convivência entre homens e as

condições de realizar suas potencialidades, com alicerce no princípio da

fraternidade, entre outros.

Com esse avanço, a hipótese do pensamento fraterno passou a

servir de embasamento teórico à análise de conflitos e até a implantação de

formas alternativas nas relações eletrônicas, entre outros. Essa premissa é

particularmente verdadeira, quando se pretende ampliar a prevalência do justo

sobre o bom, oportunizando (GHISLENI & SPENGLER, 2011, p. 24) “alimentar

de paixões quentes o clima rígido das relações” (RESTA, 2004, pp. 9-12).

Além disso, a fraternidade mantém vínculos com a amizade, na

medida em que prevê (GHISLENI & SPENGLER, 2011, p. 24) a “comunhão de

destinos derivada do nascimento e independente das diferenças”. (RESTA,

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2004, pp. 9-12). Como exposto, o Direito Fraterno pode servir de elemento

catalisador dos direitos humanos, com fundamento na solidariedade (MAIA M.

I., 2010).

O termo solidariedade advém da origem etimológica latina

“solidarium”, que é proveniente de “solidum” ou soldum (inteiro, compacto,

sólido). Tendo em vista dar a cada um o que é seu, em Direito, o conceito mais

difundido de solidariedade é a condição mediante a qual uma pessoa tem a

mesma obrigação legal que outra. Nas circunstâncias criadas pela globalização

internetizada, emerge a noção de solidariedade objetiva. Trata-se de conceito

que diz com a previsão de mútua ajuda, em interação pragmática com o ideal

de fraternidade. O pragmatismo da fraternidade refere-se ao discurso jurídico

vinculado ao sócio-direito, o direito em ação (MAIA M. I., 2010).

O Direito Fraterno também se sustenta na esteira dos direitos

humanos, que se estabeleceram ao longo da história da humanidade e

possuem caráter de universalidade, aplicando-se a todos os cidadãos.

Como aludido, os direitos humanos resultaram de vários processos históricos

e, em seu dinamismo, ainda hoje manifestam avanços. ELIGIO RESTA (2004,

p. 13) ressalta que o Direito Fraterno “coincide com o espaço de reflexão ligado

ao tema dos Direitos Humanos, com uma consciência a mais: a de que a

humanidade é apenas um lugar ‘comum’, somente em cujo interior pode-se

pensar o reconhecimento e a tutela”.

O autor em tela chama atenção para a diferença entre “ser

homem” e “ter humanidade” (GHISLENI & SPENGLER, 2011, p. 25): ser

homem não garante o sentimento singular de humanidade. A linguagem, com

as muitas sedimentações de sentido que encerra, é um infinito observatório dos

paradoxos com os quais convivemos. (RESTA, 2004, p. 12)

Em importante lição, MARIA IZABEL MARTINS MAIA sustenta

que:

“É o que faltava para integrar o Direito, e é nesse pensamento de tornar inteiro, total, que arriscamos uma sugestão para nomeá-lo, como o Direito Integrador, holístico, que surge como paradigma para integrar o Direito, dando-lhe uma releitura pós-moderna, onde se começa a especular uma noção de Direito, mais adequada e saudável, pelo ângulo pluralista, sanando-lhe, por conseguinte, a psicose instaurada com o positivismo jurídico, cuja psicopatologia só permitia uma visão estigmatizada, dogmática, monista. É, provavelmente, pela

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visão holística amplificada, que poderemos aperceber a inter-relação saudável, adequada e necessária ao Direito para interagir com as outras epistemi, proporcionando realmente uma justiça social, igualdade justa, liberdade ética, enfim, o Direito Fraterno/Holístico é o direito da inter-relação, do interpessoal, abrangendo, primordialmente, com essa finalidade e com esse modo-de-ser, a interdisciplinaridade” (MAIA M. I., 2010).

O direito fraterno contribui para fortalecer o pensamento jurídico

de vanguarda, no sentido do resgate dos aspectos finalísticos do direito. Daí

emana a qualificação de metateoria do direito fraterno; melhor dizendo, teoria

metapositiva, baseada na força universal dos direitos humanos (FERREIRA R.

F., 2008, p. 98).

Decorre daí que atos praticados pela via digital, sem observância

dos critérios de ética, equidade e isonomia, na prestação das informações

completas sobre o produto ou serviço podem ter sua validade questionada. O

vício formal, nessa circunstancia, pode estar ligado à vulnerabilidade do

consumidor, em decorrência de falta de elementos que subsidiem a tomada de

decisão e exercício de vontade no momento da contratação.

Não se pode ignorar que, na realização da vontade, cada pessoa

o faz com “subjetividade imediata” individual e personalíssima, ao passo que a

subjetividade exterior “é a vontade dos demais”! O reconhecimento do querer e

saber inclui a subjetividade exterior. Por esse motivo, a concretização de

objetivos depende do reconhecimento da vontade dos outros; requer o

reconhecimento da liberdade como princípio universal (WEBER, 2013, p.

1804).

A ausência de percepção do ser humano sobre as condições que

o cercam já foi identificada por Rousseau, no discurso sobre a origem e os

fundamentos da desigualdade entre os homens, através da afirmação de que a

desigualdade se exteriorizava de duas formas: uma natural ou física,

decorrente da natureza do ser humano, como se verifica na diferença de idade,

saúde e demais características individuais; a outra, denominada como moral ou

política, dependente de uma espécie de convenção estabelecida ou, ao menos,

autorizada, pelo consentimento dos homens. Essa consiste nos diferentes

privilégios que alguns usufruem, como o de serem mais ricos, mais honrados,

mais poderosos, ou até de se fazerem obedecer pelos demais (ROUSSEAU,

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Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre homens.,

2013, p. 574).

A segunda modalidade identificada por Rousseau favorece a

compreensão da vulnerabilidade informacional, resultante dos privilégios de

ordem técnica e econômica de empresas e fornecedores, quando fazem

prevalecer seu interesse em relação aos consumidores.

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Capítulo 3 – A ÉTICA E A PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR VULNERÁVEL

“Somos metade vítimas, metade

cúmplices...” Simone de Beauvoir

3.1 Ética e Liberdade Responsável de Informação nas relações de consumo

As desigualdades produzidas pela ausência de tratamento

isonômico entre os integrantes da relação jurídica de consumo informacional

virtual acentuam o quadro vulnerabilidade do consumidor web. A organização

proveniente das regras de mercado e dos avanços produzidos pelas novas

tecnologias pode agravar esse quadro. Por este motivo, a utilização de pautas

éticas e morais devem permear as novas e antigas relações de direito privado.

Além dos fundamentos abordados em capítulos anteriores, seja

pela identificação de espécie peculiar de vulnerabilidade, ou da interpretação

segundo princípios, elementos relativos à ética tem função imperativa na busca

de resposta aos conflitos presentes no cotidiano das pessoas e instituições.

O estudo relativo à ética desenvolveu-se, conforme CHAUÍ

(1995), na esteira dos textos de Platão e Aristóteles, em que o tema foi

introduzido por Sócrates no campo da filosofia. Nessa linha de entendimento,

o corpo seria a prisão da alma e, por conseguinte, existiria um “bom em si”

próprio da sabedoria da alma, podendo ser lembrado através do aprendizado

(ARICÓ, 2001, p. 83).

Posteriormente, ARISTÓTELES em Ética a Nicômaco, esclareceu

que a reflexão moral adapta seu pensamento às necessidades políticas da

época, quando o homem deveria ser adaptado à realidade, sempre com a

necessária interferência da família no processo de educação, no intuito de

conter as paixões (CAMPOS, GREIK, & Tacyane do VALE, 2002).

Em análise mais contemporânea, Kant afirmou inexistir bondade

natural, concentrando a atenção nos critérios éticos, em que o homem passa a

ser o centro gravitacional (BARROSO, 2014).

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Conforme lição de COMPARATO (2006, p. 18), o conceito de

ética “é bem largo: ela abrange o conjunto dos sistemas de dever-ser que

formam, hoje, os campos distintos — e, na maioria das vezes, largamente

contraditórios — da religião, da moral e do direito”. Pode igualmente ser

definida como um conjunto de regras, princípios ou maneiras de pensar que

norteiam a autoridade para guiar as ações de determinado grupo, ou ainda,

como estudo argumentativo no melhor estilo, passo a passo, sobre como o ser

humano deve proceder em sociedade (CAMPOS, GREIK, & Tacyane do VALE,

2002, p. 1).

Reitera-se a contribuição kantiana à reflexão analítica sobre o

Estado Democrático de Direito, quanto à ênfase na complementaridade entre a

moral e o direito, também no que pertine à institucionalização do referido

regime político. Do diálogo entre os dois institutos, resulta o argumento

legitimador do sistema democrático (BARRETO, 2013, p. 41).

Nas constituições, sublinha-se fonte de ordem moral, raiz do

sistema político-institucional e jurídico. Nessa linha de pensamento, a

Constituição vigente é fruto da manifestação da vontade de agentes morais

autônomos, estabelecendo limites ao arbítrio e às desigualdades. Nesse

contexto, o regime democrático extrapola a simples manifestação de vontade

de maioria, eis que é dotado de valores morais fundamentadores e justificativos

do ordenamento jurídico e de sua aplicação (BARRETO, 2013, p. 41).

Além disso, recuperar a tradição kantiana favorece a superação

da perspectiva positivista, no contexto da cultura tecnocientífica moderna, que

exige a instauração de novo paradigma teórico sedimentado na teoria do

direito, capaz de responder às exigências de legitimidade da ordem jurídica do

Estado Democrático de Direito (BARRETO, 2013, pp. 41-42).

As relações de consumo celebradas no seio da sociedade da

informação trazem a lume alguns conflitos e dilemas de difícil solução, seja

pelo avanço tecnológico, ou pela potencial interferência da mensagem

propagada pela via eletrônica no comportamento da outra parte, ou pelo

ineditismo das situações. Parece, pois fecundo dispor de parâmetros que

possam delinear o tratamento da informação de consumo virtual.

Eis porque as correntes contemporâneas de pensamento pugnam

pela ética e efetividade do sistema mundial de direitos humanos, entre outras

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saídas para a crise atual da humanidade. Tal orientação reforça o esforço de

aprofundamento dos estudos sobre ética, sobretudo no campo do direito,

(PIROTTA, 2008).

Entretanto, é interessante assinalar que ética é daquelas coisas

que todo mundo intui o que seja, mas encontra dificuldade de explicar ou

definir. Tradicionalmente, o termo remete à noção de estudo ou reflexão

científica ou filosófica e eventualmente teológica, sobre os costumes ou sobre

as ações humanas” (VALLS, 1994, p. 7).

Na lição de VASQUEZ (1995, p. 5), Ética “é a teoria ou ciência do

comportamento moral dos homens em sociedade. Ou seja, é ciência de uma

forma específica de comportamento humano”. Por sua vez, SPINOZA (1985)

refere que “o homem que vive pela razão, não é guiado pelo medo, e, por este

motivo, faz o que é melhor para todos e através até mesmo das leis do Estado,

pode conseguir viver livremente”.

No seio da doutrina, encontram-se inúmeras definições, onde

“muitos chamam de ética, a própria vida, quando em conformidade com os

costumes considerados corretos. A ética pode ser o estudo das ações ou dos

costumes, e pode ser a própria realização de um tipo de comportamento”

(VALLS, 1994, p. 7).

VALLS ilustra as diversas características da ética moderna,

exemplificando:

“Vejamos um exemplo. Subornar um funcionário, é um problema apenas ético, apenas econômico, ou tem os dois aspectos? As questões da ética nos aparecem a cada dia. A partir do exemplo acima, logo poderíamos nos perguntar se, num país capitalista, o princípio do lucro poderia ou deveria situar-se acima ou abaixo das leis da ética. E em épocas mais difíceis, muitas vezes nos perguntamos se uma lei injusta de um Estado autoritário precisa ou não ser obedecida. E quando nós temos um "problema de consciência", quando estamos com um "sentimento de culpa", coisa que ocorre a todos, não se torna importante saber se este sentimento corresponde de fato a uma culpa real? Cabe à reflexão ética perguntar se o homem pode realmente ser culpado, ou se o que existe é apenas um sentimento de um mal-estar sem fundamento. E as artes também levantam problemas para a ética. Por exemplo: o poder de sedução, de encantamento, da música, pode (ou deve) ser usado para condicionar o comportamento das pessoas? E o mandamento evangélico do amor aos inimigos é válido como uma obrigação ética para todos? E quando, lendo

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um romance de Dostoievski, encontramos um personagem como Ivan, de Os Irmãos Karamazov, afirmando que "se Deus não existe tudo é permitido", devemos então concluir que isso é uma proposta de abolição da ética? Os problemas que acabamos de mencionar implicam todos alguma relação com outras disciplinas teóricas e práticas, mas são todos problemas específicos da ética”

Inexiste ética individual; o princípio radica na condição de

sociabilidade humana. De maneira hipotética, se poderia até tomar a natureza

como o outro, mas tal percepção é recente: começou a ganhar forma a partir

do século XX. O período do industrialismo e do maquinismo (XVIII e XIX)

foram, em essência, baseados na anulação da natureza como o outro. À

época, a natureza era tida como objeto e, portanto, passível de posse.

Modernamente, a ecologia constitui questão ética, porque deixamos de

considerar a natureza como simples objeto (CORTELLA, 2015, pp. 15-16).

Inobstante a premissa, seguindo perspectiva obsoleta, algumas

pessoas visualizam o outro como objeto – do seu interesse, do seu desejo, do

seu mando (CORTELLA, 2015, p. 16). Por essa perspectiva, a sociedade de

consumo, não raro, despreza a perspectiva do próximo, em detrimento de

interesses particulares, o que se contrapõe à visão ética de Kant. Esse

argumento encontra respaldo em DEBORD, quando afirma que “ sob as

oposições espetaculares esconde-se a unidade da miséria” (DEBORD, 1997, p.

42). A pseudonecessidade imposta pelo consumo moderno não pode ser

contrastada a qualquer outra necessidade, ou desejo autêntico que não seja,

ele mesmo, produzido pela sociedade em perspectiva história. Trata-se do

desenvolvimento orgânico de vontades sociais (DEBORD, 1997, p. 45) que

retiram do ser humano o direito à escolha, através da imposição de nova ordem

premida pelo interesse de incutir falsos desejos e consequentes necessidades

nos desavisados.

Um dos argumentos legitimadores dessa distorção é o do preceito

constitucional de liberdade de expressão, ou liberdade de informação previsto

no próprio texto constitucional.

Tomando como referencia a diferença entre liberdade de

expressão e liberdade de informação, cumpre esclarecer que essa última “diz

respeito ao direito individual de comunicar fatos e ao direito difuso de ser deles

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informado”, guardando relação com a divulgação de fatos, ou de determinados

dados apurados (BARROSO L. R., 2004).

Em paralelo, encontra-se a liberdade de expressão que, apesar

de possuir caráter informativo, sobressalta algumas características ínsitas ao

autor, pois ela implica o direito de expor o pensamento, o espírito, a vontade,

ou as convicções do emissor da mensagem.

Sua proteção tem por base a Constituição de 1988, que a

consagra como direito fundamental e alicerces do Estado Democrático de

Direito. Dentre outros, o Direito à Liberdade merece lugar de destaque, como

garantia suprema, inserida no rol de direitos indeclináveis e irrevogáveis.

Adicionalmente, liberdades individuais do cidadão, tais como, ir e vir,

manifestação do pensamento, de crença religiosa e de expressão, entre outras

foram garantidas pelo texto legal. (LURCONVITE, 2016). A esse respeito, é

ilustrativo o que se transcreve a seguir:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; [...]

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”

Do texto constitucional, extrai-se o direito inelutável de o cidadão

informar (Art.5º, IX) e ser informado livremente (Art.5º, XIV). No entanto, esse

direito não é absoluto, conforme lição de LUÍS ROBERTO BARROSO (2004):

“A informação que goza de proteção constitucional é a informação verdadeira. A divulgação deliberada de uma notícia falsa, em detrimento do direito de personalidade de outrem, não constitui direito fundamental do emissor. Os veículos de comunicação têm o dever de apurar, com boa fé e dentro dos critérios da razoabilidade, a correção do fato a qual darão publicidade. É bem de ver, no entanto, que não se trata de uma verdade objetiva, mas subjetiva, subordinada a um juízo de plausibilidade e ao ponto de observação de quem a divulga” (BARROSO L. R., 2004).

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Como se depreende do exposto, as garantias relativas à liberdade

de informar encontram limites na comprovação da veracidade e plausibilidade

das informações e na proteção do direito à personalidade, intimidade e honra

das pessoas, na esteira co mencionado direito à dignidade.

O art. 220 da Constituição contempla a liberdade de atuação dos

meios de informação. Porém, o STF, conforme advertência do Ministro Ayres

Britto:

“a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não sejam as figurantes dela própria, Constituição. (...) O art. 220 é de instantânea observância quanto ao desfrute das liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma forma, se veiculem pelos órgãos de comunicação social. Isto sem prejuízo da aplicabilidade dos seguintes incisos do art. 5º da mesma CF: vedação do anonimato (parte final do inciso IV); do direito de resposta (inciso V); direito a indenização por dano material ou moral à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas (inciso X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV). Lógica diretamente constitucional de calibração temporal ou cronológica na empírica incidência desses dois blocos de dispositivos constitucionais (o art. 220 e os mencionados incisos do art. 5º). " (ADPF 130, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 30-4-2009, Plenário, DJE de 6-11-2009.)Vide: ADI 4.451-MC-REF, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 2-9-2010, Plenário,DJE de 24-8-2012.

Ampliando a abrangência do olhar, o Estado Democrático de

Direito deve garantir a livre informação sob a dimensão participativa e

pluralista, com o objetivo de aperfeiçoar a democracia, fundada na liberdade,

em articulação com os princípios da igualdade e da dignidade. Sob essa

conformação, o componente social orienta o comportamento do emissor, a

quem compete pesquisar a veracidade dos dados referentes aos particulares e

também ao poder público, a quem compete prestar informações. Nessa

vertente, é dever do poder público permitir que a sociedade tenha acesso a

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dados e informações, para acompanhar o andamento de políticas públicas e

outras atividades, mormente aquelas atinentes à aplicação e destino de

recursos públicos. (CARVALHO L. G., 2003, p. 82).

Como demonstrado, a liberdade de expressão encontra limites em

risco de violações à intimidade, à imagem, à honra, à proteção à infância e a

juventude, valores éticos e sociais, consagrados constitucionalmente.

Além disso, a liberdade de expressão e de pensamento encontra

limites no que tange à violação de direitos humanos, em termos gerais e

específicos, como se demonstrará ao longo do capítulo. Em obra emblemática

relativa à publicidade abusiva, SUZANA MARIA PIMENTA CATTA PRETA

FEDERIGHI, expõe subsídios à reflexão segundo princípios da ética:

“O que sobrevive aos momentos sociais conturbados e, porque não dizer, às oscilações de valores que uma determinada sociedade sofre, faz parte dos balizamentos éticos. As estruturas conceituais sofrem também suas alterações, conforme o grau de permissividade reinante, mas é certo também que, mesmo nos momentos mais críticos, uma sociedade ética pode ser a utopia máxima. As crises políticas que verteram desde a década de sessenta de nosso século tiveram sempre o condão de desencadear não somente o debate sobre a ética, mas também a autocrítica sobre a viabilidade da defesa dos valores. (FEDERIGUI, 1999)”

A responsabilidade decorrente de lacunas éticas na sociedade da

informação encontra previsão no texto constitucional, onde resta demonstrada

a importância da coerência ligada aos valores éticos para o bom

desenvolvimento social e garantia à preservação da família: Art. 221 - A

produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos

seguintes princípios: IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da

família.

Nessa ordem de reflexão, é premente trazer a lume a diferença

entre liberdade de expressão e liberdade de comercialização/exploração da

expressão, tendo em vista que fornecedores de produtos ou serviços

comercializados pela via digital, frequentemente realizam esse tipo de

manobra, no intuito de angariar mais clientes.

Receptores de informação virtual não se restringem a captar

informações, pois também fazem uso de recursos de mercancia ou de

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entretenimento, que VARGAS LLOSA configura como a civilização propensa

ao espetáculo da informação moderna, nos seguintes termos:

“ O que não dizer da civilização do espetáculo? É a civilização de um mundo onde o primeiro lugar na tabela de valores vigente é ocupado pelo entretenimento, onde divertir-se, escapar do tédio, é a paixão universal. Esse ideal de vida é perfeitamente legítimo, sem dúvida. Só um puritano fanático poderia reprovar os membros de uma sociedade que quisessem dar descontração, relaxamento e humor e diversão a vidas geralmente enquadradas em rotinas deprimentes e às vezes imbecilizantes. Mas transformar em valor supremo essa propensão natural a divertir-se tem consequências inesperadas: Banalização da cultura, generalização da frivolidade e, no campo da informação, a proliferação do jornalismo irresponsável da bisbilhotice e do escândalo... (Llosa, 2012) ”

A comercialização/exploração da informação reveste-se de direito

à informação, embora esteja voltada ao entretenimento e ao consumo, sendo

relevante ao debate ligado à sociedade da informação e seus critérios éticos.

Esse critério sugere preliminarmente medidas urgentes para que

o receptor seja devidamente informado, sem que figure como sujeito passivo

do processo de informação, imitido na massificação dos órgãos de

comunicação.

A contrario sensu, o que se espera é seja tratado como sujeito

ativo, titular do direito de informar e de ser informado adequadamente acerca

de toda e qualquer informação propagada pela sociedade moderna

(CARVALHO L. G., 2003, p. 83).

Em contrapartida, na prática, o momento do consumo pode ser

entendido como o substrato da atividade comercial em que somente uma das

partes tem o direito de se manifestar, e por isso, merece uma adequação.

Decorre daí que, caso critérios éticos não sejam considerados no cenário das

relações empreendidas na web, a adesão a um produto ou serviço nada mais

representará do que a corporificação da dinâmica desenvolvida nos contratos

de adesão; ou seja, àqueles que se encontram premidos da ausência de

participação, ou mais importante, devida informação do consumidor.

Além da discriminação inicial, é pertinente estabelecer a existência de

possível ilegalidade, decorrente da falha da interpretação do direito à liberdade

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de expressão, em contraponto à defesa dos direitos do consumidor. Para tanto,

é importante divisar liberdade de expressão, de direito de comercialização da

expressão. Em breve leitura do texto constitucional, a diferença é facilmente

percebida:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

IX - É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Analisando esses fundamentos, em momento algum se evidencia

a liberdade de comercialização da informação, pois a liberdade de pensamento

relativa ao intento do autor, que, conforme sublinhado, deve ser guiado pelo

componente social. Para atingir tal objetivo, antes de mais nada, é importante a

percepção da bilateralidade da informação, oriunda do direito de emitir e de

direito de se captar a informação, em via de duas mãos.

Nessa linha de raciocínio, o direito de informação se desmembra

em duas vertentes, a capacidade de emitir e o direito de receber informações.

Sendo assim, a concepção que não observe o caráter recíproco da informação

deve ser observada com ressalvas, já que inexistente a bilateralidade

(COLOMA, 1987, p. 43).

Na circunstância em tela, trata-se primordialmenda da

possibilidade da eleição do que se deseja receber, decorrente do pluralismo

inerente ao Estado democrático de direito. A faculdade de captação da

informação encontra-se entrelaçada com o mesmo pensamento do direito à

proteção do monopólio (art.220, §5º da CF), que alberga aquele em que se

tenta proteger a sociedade dos efeitos maléficos de versão única (CARVALHO

L. G., 2003, p. 88).

A discrepância parte da unilateralidade, que envolve uma

sociedade plural, que não admite que uma das partes tenha o direito de se

manifestar livremente, eis que a manifestação recíproca baseia toda e qualquer

relação jurídica que tenha por fundamento a informação. É o que JOSAPHAT

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ensina “sem uma boa informação sobre os graves problemas humanos, nada

funciona com justeza e justiça no país e no mundo (JOSAPHAT F. C., 2006, p.

17) ”.

Evidenciada a ausência da bilateralidade, aventa-se a

possibilidade de tratamento diferenciado, derivado do déficit informacional

produzido pela ausência de informação de consumo adequada, na sociedade

da informação. Aqui se preza a esperada isonomia contratual relacional, que,

em muitas hipóteses, não se apresenta no campo das relações de consumo.

Quando tal capacidade relativa às escolhas do cidadão encontra-

se esvaziada, resulta a necessidade de impor limites a eventuais abusos,

quanto à informação de consumo obtida pela via virtual, que reúne o

espetáculo ventilado por Vargas Llosa (Llosa, 2012), Lipovetsky

(LIPOVETSKY, 2004) e Debord (DEBORD, 1997) relativo ao entretenimento,

quanto à ferocidade imposta pela publicidade proveniente das novas mídias

alertada por BAUMAN 2008), Macluham (MCLUHAM, 2007), Lindstrom

(LINDSTROM, 2009), Bourdieu (BOURDIEU, 1997) e Baudrillard

(BAUDRILLARD, 2010), entre outros.

Assim, o preceito constitucional relativo às garantias do

consumidor pode representar argumento relevante à informação de consumo

obtida pela esfera digital, como demonstrado a seguir:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

O exposto permite inferir que inexiste embate entre o direito de

liberdade de expressão e os direitos do consumidor. Vale notar que o texto

constitucional não aborda, em momento algum, a garantia da “liberdade de

comercialização de expressão”.

FRANCISCO JOSÉ CASTILHOS KARAM lembra que, na

hipótese é relevante o reconhecimento do outro, “onde a palavra relação está

ligada a algo fora de si mesmo, pois o indivíduo deixa de ser um apêndice

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natural agregado à vida para ser uma ponte que vai da individualidade para a

totalidade e desta para a singularidade” (KARAM, 1997).

Para razoável entendimento do tema, é primordial compreender

que, em momento algum, se pretende desrespeitar liberdades de mercado e de

livre concorrência, necessárias à devida circulação de bens de consumo,

considerando ser fator decisivo à economia nacional. É o que, nas palavras de

ADAM SMITH “promove uma receita farta para a subsistência das pessoas” e

ainda “supre o Estado ou a comunidade nacional com receita suficiente para

seus serviços públicos”, finalmente “ela enriquece tanto o povo, quanto o

soberano” (SMITH, 2015, p. 262).

Apesar disso, impõe-se a necessidade de justa adequação da

informação de consumo obtida por meios virtuais, quando não atender à

preceitos mínimos de informação, que resguardem isonomia, especificamente,

no que diz respeito ao aspecto bilateral da informação. A bilateralidade tende a

ser diminuída, dada a sofisticação dos meios de comunicação de massa e

congregação da informação no domínio de poucos, que monopolizam o

“mercado da informação”, que podem filtrar, selecionar e distorcer a informação

para atender aos interesses particulares do emissor da mensagem.

Diante do exposto, parece adequado admitir que a garantia da

defesa do consumidor impõe-se em relação à liberdade de comercialização da

informação, não por ser mais ou menos “forte”, sob a ótica de direitos

fundamentais, mas pela inexistência de tratamento específico que dê guarida à

mensagem unilateral abusiva de consumo virtual.

3.2 A ética na Tutela de Direitos Individuais e Coletivos

A publicidade, entre outras finalidades, está voltada ao grande

público, eis que realizada determinada campanha, não há como identificar o

número de atingidos. LUCIA ANCONA, define publicidade “como o meio de

divulgação de produtos e serviços com a finalidade de incentivar o consumo”. A

autora acrescenta que a publicidade pode ser considerada como o “duto par

excellence através do qual se leva ao conhecimento dos consumidores em

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geral a existência de bens e serviços à serem examinados e eventualmente

adquiridos” (DIAS, 2013, p. 21).

Não raro, o termo publicidade é confundido com propaganda: no

entanto ambas se distinguem. Publicidade, no âmbito do direito do consumidor,

guarda relação direta com a difusão da intenção de lucro, mediante a

mercancia de produtos ou serviços; ou seja, no caso, existe clara intenção de

lucro. Exemplificando, quando se trata do lançamento de veículo pela indústria

automotiva, se está em face de publicidade, pois o que pretende é o lucro

obtido com a venda do automóvel.

Por sua vez, a propaganda, visa à veiculação de mensagem que

não guarda relação direta com obtenção de lucro. É o que ocorre na

propaganda política ou em campanhas para erradicação de doenças (Ex.

Febre amarela, gripe suína, combate ao mosquito da dengue). Propaganda,

apesar de recorrer à técnica de persuasão, não possui qualquer intuito

econômico a priori; visa explicitamente propagar, difundir, alastrar, disseminar

uma ideia que pode ser política, cívica, religiosa, ou de outra natureza.

Sua origem veio do Vaticano, através da Congregatio de

Propaganda Fide, ou Congregação para a propagação da fé, fundada em 1597

pelo papa clemente VIII e organizada por Gregório XV, em 1622, com o

objetivo de propagar a fé cristã pelo mundo, em contraponto ao exponencial

crescimento da ordem de Lutero (DIAS, 2013, p. 22).

Em texto publicado pelo Vaticano, o Pontifício Conselho das

Relações Sociais, recomenda a observância, antes de mais nada, da Ética

quando da propagação de campanha publicitária, justamente por seu caráter

de direito difuso. Exemplarmente, enumera fatores essenciais à boa difusão de

uma mensagem:

“ A importância da publicidade « na sociedade moderna é cada vez maior.

1. Esta observação, feita há 25 anos por este Pontifício Conselho, por ocasião dum balanço acerca da comunicação mediática daquela época, ainda hoje é incontestável. Se os mass media adquirem em toda a parte importância, a publicidade, veiculada pela mídia, atualmente é uma poderosa força de persuasão que modela as atitudes e os comportamentos no mundo contemporâneo. A Igreja

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interessou-se com frequência pelo papel e responsabilidades dos mass media, sobretudo depois do Concílio Vaticano II.

2. Ela procurou fazê-lo dum modo fundamentalmente positivo, encarando os mass media como « dons de Deus » que, segundo a intenção providencial, aproximam os povos, « pondo-se assim ao serviço da Sua vontade salvífica ».

3. A Igreja recorda também a responsabilidade que os mass media têm de promover o progresso autêntico e integral dos homens e de servir o bem da sociedade. « A informação mediática está ao serviço do bem comum. A sociedade tem direito a uma informação fundada na verdade, na liberdade, na justiça e na solidariedade ».

4. É neste espírito que ela dialoga com os comunicadores. De igual modo, ela chama a atenção sobre os princípios e normas morais que dizem respeito à comunicação social, bem como a outras formas de empenho humano, e critica os procedimentos e as práticas que se contrapõem a tais valores. O tema da publicidade foi tratado várias vezes nas numerosas publicações, frutos do profundo interesse da Igreja pelos meios de comunicação.

5. Examinamos aqui novamente este tema, solicitados pela importância crescente da publicidade e pelo pedido dum estudo mais amplo deste fenómeno.

Queremos chamar a atenção para as contribuições positivas que a publicidade pode oferecer e que, por outro lado, não deixa de fornecer. Desejamos também recordar os problemas éticos e morais que a publicidade apresenta. (FOLEY, 1997)”

Ao admitir que a Ética deve permear todas as relações

informativas provenientes dos meios de comunicação de massa, o órgão

criador da publicidade respalda a tese de respeito aos princípios éticos

relativos à informação difundida o âmbito da sociedade da informação.

Ademais, o Pontifício Conselho para as Relações Sociais aponta

para significativos caminhos para alcançar tal missão, quando ressalta que a

liberdade de expressão e de comunicação requer dos publicitários suão

exercício responsável da profissão. O Conselho eclesiástico indica inclusive

uma série de atos que, sob o ponto de vista ético, minimizariam eventuais

prejuízos: por exemplo, publicação de avisos corretivos, indenização das partes

lesadas, incremento da publicidade de utilidade pública (FOLEY, 1997).

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A ausência de ética da informação, proveniente da “coisificação”

das pessoas, implica distorção, configurada por privilégio próprio da sociedade

das relações privadas, onde o capital se sobrepõe ao interesse público.

A temática em tela instiga a reflexão sobre os direitos relativos à

liberdade de expressão, indiscutivelmente garantidos pela Constituição da

República e igualmente contemplados pelo Código de Defesa do Consumidor,

garantindo seus interesses, na forma individual e coletiva. A esse respeito,

merece relevo o art. 81 do CDC, entre outros regramentos que dão suporte aos

direitos coletivos e à ética no mercado virtual de consumo:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

        Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

        I - Interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

        II - Interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

        III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

A defesa coletiva dos interesses do consumidor representa

avanço no que concerne à defesa do segmento, tratado pelo fornecedor como

grupo, ou como pessoa. Tradicionalmente, quando buscava seus direitos, o

consumidor era considerado na perspectiva singular. Com significativo avanço,

o CDC incluiu a defesa coletiva dos interesses do consumidor (ANDRADE,

2006, p. 506).

Os interesses e direitos coletivos, em sentido amplo, têm por

fundamento a indeterminação dos titulares e a indivisibilidade do objeto, como

ocorre exemplarmente nos danos produzidos ao meio ambiente, à saúde e à

educação. Esse rol de direitos integra a casta dos direitos de terceira geração,

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que assistem, de modo subjetivamente indeterminado, ao gênero humano

(CAVALIERI FILHO S. 2011, p. 368).

Para exata compreensão do tema, é imprescindível determinar o

significado de tutela jurisdicional, aqui entendida como a proteção conferida

pelo Estado quando provocado por meio de um processo, decorrente da lesão

ou ameaça de lesão a um direito material. Daí entender-se como correta a

utilização precisa do tema “Tutela Jurisdicional Coletiva” (TARTUCE & NEVES,

2012, p. 536).

Sendo assim, a Tutela Jurisdicional Coletiva situa-se entre o

interesse público e privado. O interesse público está ligado às prerrogativas da

coletividade, uma vez que tem por objeto o bem geral, ao passo que o

interesse privado diz respeito ao interesse individual, particular. Para preencher

o espaço entre o direito individual e o interesse público criou-se categoria

híbrida, que compreende interesses coletivos, referentes a uma categoria ou

grupo de pessoas que têm algo em comum (CAVALIERI FILHO S., 2011, p.

368).

Tais direitos dividem-se em três espécies: Difusos, Coletivos em

sentido estrito e Individuais Homogêneos, sendo sua diferenciação importante

para melhor compreensão da matéria.

Para SUZANA GASTALDI, (2016) existe sensível diferença entre

os institutos que se apresentam

“Pela transindividualidade, que pode ser real ou artificial, ampla ou restrita; pelos sujeitos titulares, determinados ou indeterminados; pela indivisibilidade ou divisibilidade do objeto; pela disponibilidade ou indisponibilidade do bem jurídico tutelado; e pelo vínculo a ensejar a demanda coletiva, jurídico ou de fato”

Direitos difusos são transindividuais, metaindividuais ou

supraindividuais que não têm como titular um indivíduo. Para TEORI ALBINO

ZAVASCKI (2006, p. 42), “é um direito que não pertence à administração

Pública e nem aos indivíduos particularmente determinados. Pertence, sim, a

um grupo de pessoas, a uma classe, a uma categoria, ou à própria sociedade,

considerada em sentido amplo”.

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A interpretação de HERMES ZANETI JUNIOR é esclarecedora

quanto aos direitos difusos, ao lecionar que:

“Assim, tem-se por direitos difusos (art. 81, § único, I, do CDC e art. 1°, I, do CM) aqueles transindividuais (metaindividuais, supraindividuais, pertencentes a vários indivíduos), de natureza indivisível (só podem ser considerados como um todo), e cujos www.abdpc.org.br titulares sejam pessoas indeterminadas (ou seja, indeterminabilidade dos sujeitos, não há individuação) ligadas por circunstâncias de fato, não existe um vínculo comum de natureza jurídica, v.g., a publicidade enganosa ou abusiva, veiculada através de imprensa falada, escrita ou televisionada, a afetar uma multidão incalculável de pessoas, sem que entre elas exista uma relação jurídica-base (JUNIOR H. Z., 2016)”.

Direitos Coletivos, em sentido estrito, como na hipótese dos

direitos difusos, são compostos por quatro elementos cumulativos, que dizem

respeito a direito transindividual, eis que seu titular não é um indivíduo; os

direitos difusos e coletivos são considerados essencialmente coletivos. Há,

entretanto, marcante diferença: enquanto no direito difuso, o titular é a

coletividade em geral, no direito coletivo, é a comunidade, determinada por um

grupo, classe ou categoria de pessoas (TARTUCE & NEVES, 2012, p. 548).

Os direitos coletivos stricto sensu (art. 81, § único, II

do CDC, e art. 1°, II do CM) foram classificados como direitos transindividuais,

de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de

pessoas (indeterminadas, mas determináveis, enquanto grupo, categoria ou

classe) ligadas entre si, ou com a parte contrária, por relação jurídica base.

Segundo esclarecimento de HERMES ZANETI JUNIOR:

“Nesse particular cabe salientar que essa relação jurídica base pode-se dar entre os membros do grupo “affectio societatis” ou pela sua ligação com a “parte contrária”. No primeiro caso, temos os advogados inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (ou qualquer associação de profissionais); no segundo, os contribuintes de determinado imposto (JUNIOR H. Z., 2016). ”

Trata-se, pois, de direitos que não dizem respeito a uma só

pessoa, indivisíveis, mas há entre elas (ou com a parte contrária) um laço

jurídico e não meramente fático, como na hipótese anterior. Conquanto sejam

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transindividuais e indivisíveis, os titulares desses direitos são determináveis

(ALVIM, 2016).

Por sua vez, Direitos Individuais Homogêneos decorrem de

origem comum. Nessa linha, KAZUO WATANABE (2011, p. 76) indica que a

origem comum pode ser de fato e de direito e a expressão não significa,

necessariamente uma unidade factual e temporal. As vítimas de publicidade

enganosa, veiculada e repetida em órgãos de imprensa de um produto nocivo à

saúde adquirido por vários consumidores num largo espaço de tempo e em

várias regiões têm, como causa dos danos, fatos de uma homogeneidade tal

que os tornam a origem comum de todos eles.

Diferentemente dos direitos difusos e coletivos, o direito individual

homogêneo não constitui direito transindividual, pois seu titular não é a

coletividade, nem determinada comunidade, mas os indivíduos (TARTUCE &

NEVES, 2012, p. 555). Na interpretação de TEORI ALBINO ZAVASCKI (2004,

p. 42-43), os direitos individuais homogêneos, são, simplesmente direitos

subjetivos individuais. A qualificação de homogêneos não altera nem pode

desvirtuar essa natureza. É qualificativo utilizado para identificar um conjunto

de direitos subjetivos individuais ligados entre si por uma relação de afinidade,

de semelhança, de homogeneidade, o que permite a defesa de todos eles

Justamente por ser divisível, o direito individual homogêneo corre

contra o direito difuso e coletivo,

“Sendo divisível e decomponível entre cada um dos indivíduos. Como não existe a incindibilidade natural dos direitos transindividuais, o direito individual homogêneo é apenas a soma dos direitos individuais, que, fundados numa tese geral, podem ser tratados conjuntamente como se fossem um só no processo coletivo” (TARTUCE & NEVES, 2012, p. 555).

A importância do tema é também exemplificada por PEDRO

LENZA (LENZA, 2003), quando afirma que

“ a) o direito de todos não serem expostos à propaganda enganosa e abusiva veiculada pela televisão, rádio, jornais, revistas, painéis publicitários; e) o dano difuso gerado pela falsificação de produtos farmacêuticos por laboratórios químicos inescrupulosos; f) a destruição, pela famigerada indústria edilícia, do patrimônio artístico, estético, histórico

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turístico e paisagístico; j) o dano nefasto e incalculável de cláusulas abusivas inseridas em contratos padrões de massa; k) produtos com vícios de qualidade ou quantidade ou defeitos colocados no mercado de consumo;” (LENZA, 2003)

Referindo-se à sociedade da informação, PIROTTA (2008)

acentua que

“Os conflitos entre interesses individuais e coletivos, entre autonomia privada e normas de ordem pública, as antinomias recorrentes nas diversas abordagens do Direito em relação às mais variadas áreas, trazem de forma contínua para o centro da discussão a dimensão ética presente em cada uma das situações específicas”.

Como óbvio, os direitos coletivos também podem ser aplicados no

âmbito de uma sociedade cujos membros celebram contratos por meio

eletrônico, envolvendo bens de consumo, não raro sob influencia de

campanhas publicitárias.

3.3 A Ética nas Comunicações e a Tutela do Consumidor

Quando se denuncia a coisificação das pessoas no mercado de

consumo, sobretudo no que diz respeito ao campo virtual, emerge cristalina a

exigência de informação adequada quanto às características gerais de

produtos e/ou serviços comercializados presencialmente e por meio virtual.

Essas iniciativas favorecem a escolha consciente, calcada em um conjunto de

informações que libertem os consumidores do tratamento dispensado a coisas.

A visão global de sociedade, como o sistema em que as ciências

e as técnicas da decisão dos negócios parecem um matagal cerrado que não

permite identificar bases para decisões responsáveis e conscientes. Como

assinalou JOSAPHAT C. (2010, p. 466), não se discutem os avanços da

sociedade moderna, mas uma imensa encruzilhada incita o despertar de

consciências que viabilizem o triunfo de uma ética autêntica e ajustada.

Essa reflexão torna-se mais oportuna, particularmente, quando se

leva em consideração dados da UNESCO, segundo os quais alguns

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conglomerados de informação detêm o monopólio da informação mundial,

levando a efeito a “manipulação da notícia” (FILHO & NUZZI, 1998, p. 39).

Segundo pesquisa da agência Zenith Optmedia, as empresas 1 -

Google, 2 - Walt Disney Company, 3 - Comcast, 4 - 21Th Century Fox, 5 - CBS

Corporation, 6 - Bertelsmann, 7 - Viacom, 8 - Time Warner, 9 - News Corp, 10 -

Facebook, 11 - Advance Publications, 12 - IHeartmedia, 13 - Discovery, 14 -

Baidu, 15 - Gannet, 16 - Asahi Shimbun Company, 17 - Grupo Globo, 18 -

Yahoo, 19 - Fuji Media Holdings, 20 - CCTV e 21 – Microsoft, constituem os 21

maiores conglomerados de mídia do mundo (BARNARD, 2015).

Conforme matéria veiculada em seu sitio eletrônico, em pesquisa

de Rosa, o Grupo Globo,

“Está entre as empresas com crescimento mais rápido em receitas ligadas à mídia no mundo, de 15%. Ficou atrás apenas de Facebook, que aparece na décima posição, com avanço de 63% nas receitas e Baidu, uma espécie de Google da China, com alta de 43% nos negócios, na 14ª colocação. O Grupo Globo é o único latino-americano entre os 20 maiores. De acordo com o relatório, o Grupo Globo aproveitou sua presença em um mercado emergente, com rápido crescimento em anúncios publicitários, economia que agora enfrenta uma crise”. (ROSA, 2016)

Entre muitos outros, vem à evidencia a necessidade de

autenticidade e ética relativa à informação, que exigem compreensão sistêmica

da organização e funcionamento de uma sociedade complexa, em seus

projetos de maior racionalidade e eficiência tecnológica.

Encarar a sociedade como sistema tecido por um feixe de

sistemas requer o reconhecimento da realidade, sem qualquer vezo pessimista;

bem ao contrário, implica atitude de respeito pelo trunfo de uma ordem racional

a que a informática veio acrescentar formalização mais ajustada. O problema,

no entanto, é que maior acuidade técnica não necessariamente coincide com

maior justiça, liberdade e solidariedade (JOSAPHAT C., 2010, p. 466).

A ausência de ética pode levar a um revés indesejado, pois, na

condição de oprimidos, ainda que pela via da ignorância, cedo ou tarde, as

pessoas tendem a lutar contra os opressores (FREIRE, 2005, p. 33).

Aprofundar a análise do tema é vital, tanto para as ciências

jurídicas, quanto para ciências da comunicação e educação, ao menos no

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intuito de evitar que se recomece sempre do ponto zero e de ultrapassar a

esterilidade que vem marcando as discussões (FADUL, 1986, pp. 67-68).

A informação ou ausência de informação na sociedade e, ao seu

lado, a ética, impregnada do princípio da dignidade da pessoa humana

reproduzirá o atributo mínimo esperado da maior teia de relações sociais. O

desafio imaginado por ZYGMUNT BAUMAN resume-se nos seguintes termos:

“ Uma vez lançados num cenário como este e obrigado a nele agir, não se torna mais fácil pelas “redes conceituais” que herdamos ou aprendemos a usar para aprender a fugaz realidade, nem pelos vocabulários a que em geral recorremos para relatar nossas descobertas”, nem ao menos perceber dentro de tantos conceitos e tantas palavras metricamente pensadas para transmitir a nós mesmos e aos outros os significados que depreendemos hoje se mostram inadequados para seus propósitos. Precisamos desesperadamente de um novo quadro que acomode e organize nossas experiências, permitindo perceber sua lógica e ler sua mensagem, até agora ocultas, ilegíveis ou suscetíveis de leituras errôneas” (BAUMAN, 2011, p. 8).

Numa relação dialética, o mercado consumidor pressiona

crescentemente as empresas em termos de custo e qualidade dos produtos e

serviços ofertados. De sua parte as organizações buscam continuamente o

desenvolvimento de produtos com conteúdo tecnológico agregado que lhes

permitam vantagens em relação à concorrência e correspondência às

demandas, explícitas ou implícitas do mercado. Não raro, segundo a lógica do

capitalismo concorrencial, adianta-se a ele, oferecendo alternativas não

vislumbradas pelo consumidor (PINOCHET, 2014, p. 508).

As empresas que marcam presença online investem cada vez

mais na web como ferramenta de comunicação de seus empreendimentos. As

técnicas de marketing lançam mão de técnicas e recursos que permitem

investigar o consumidor virtual, para desenvolver estratégias mais adequadas

aos propósitos do seu negócio, em ambiente supostamente seguro e livre de

qualquer interferência externa (SENDIN, 2011, p. 4058).

Tais necessidades podem ser relativas ao campo da informação

(notícias, formação e etc.), de transações (compras), de entretenimento (jogos,

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música e artes), ou de comunicação (redes sociais, mail), e assim

sucessivamente (RICART & GUAL, 2001).

O avanço é evidente pela criação de agências específicas de

comunicação focadas em novos produtos de mídia que se ocupam de

estratégias para fidelizar e manter em rede a geração digital. Elas definem

novos sites e preocupam-se com o retorno do investimento, aparecendo

conceitos como e-mail marketing, redes sociais e criação de comunidades de

consumidores online, marketing e parcerias estratégicas (SENDIN, 2011, p.

4063).

Diante do exposto e espancando qualquer análise ingênua, é

óbvio que a informação deixou de ser mero instrumento de expressão e

transmissão de ideias e notícias, como no passado. O impacto da informação e

a mídia na sociedade moderna é inconteste (KUNSCH, 2007, p. 41).

WOLTON (2004, p. 27) ressalta o poder da nova informação,

afirmando: “A comunicação é um dos mais brilhantes símbolos do século XX;

seu ideal de aproximar os homens, os valores e as culturas compensa os

horrores e as barbaridades de nossa época”.

O mesmo autor em outro estudo (WOLTON, 2006, p. 9), reafirma

sua tese, afirmando:

“Em menos de cem anos foram inventados e democratizados o telefone, o rádio, a imprensa de grande público, o cinema, a televisão, o computador, as redes, transformando definitivamente as condições de troca e de relação, reduzindo as distâncias e realizando a tão desejada aldeia global”.

No universo digital, acentua-se a participação dos mecanismos de

busca no momento do acesso à informação. Como consequência, aproximam-

se as empresas de tecnologia da informação das empresas de mídia que

sobrevivem essencialmente de seu conteúdo. Por essa dinâmica, intensificam-

se os movimentos de integração empresarial e parcerias estratégicas, fusões e

aquisições, no intento de lançar projetos cada vez mais audaciosos (SENDIN,

2011, p. 4071).

Em concreto, verifica-se a transformação de inúmeras atividades

econômicas relacionadas com as tecnologias digitais. Elas permitem acesso

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mais rápido e barato ao tratamento e armazenamento de informação e

constituem peça chave deste novo cenário econômico. O processo é fruto da

capacidade da internet de promover acesso sem precedentes a vasto volume

de informação, cuja exploração favorece adaptação dos mercados e

reestruturação das empresas, além de proporcionar novas oportunidades de

fomento de riquezas (JONSSON & OLMEDO, 2002).

O networking produz lógica organizacional sobre a qual se

sustentam as estruturas emergentes de criação, difusão e compartilhamento de

conhecimento (SUAREZ & SALINAS, 2009, p. 44).

A internet transforma a maneira tradicional de relação entre

compradores e fornecedores seja pela interferência irrestrita na esfera

administrativa, no processo produtivo, na cooperação com outras firmas, no

financiamento ou avaliação de ações em mercados financeiros em uma

economia globalizada (CASTELLS, 2003, p. 56).

A empresa em rede evoluiu a partir de várias estratégias de

interconexão. Basicamente, três movimentos propiciaram a referida revolução:

1 – Descentralização interna das grandes corporações.

2 – Cooperação entre pequenas e médias empresas.

3 – Alianças e parcerias estratégicas.

Esse modelo empresarial não pode ser considerado como

agência enxuta de atividades econômicas, nem organização em rede

intrafirma. Trata-se de empresa construída em torno de projetos empresariais

específicos, levados a cabo por redes de composição e origem variada: a rede

é a empresa. É dotada de flexibilidade e adaptabilidade requeridas por uma

economia global sujeita às constantes inovações tecnológicas e estimulada por

uma demanda em rápida modificação (CASTELLS, p. 58-59).

3.3 A dinâmica do mercado e o interesse do consumidor

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Traço marcante da dinâmica empresarial, a adaptabilidade das

empresas aos anseios da sociedade de consumo. Atualmente quem dita as

regras são os anseios da audiência.

O público se tornou a entidade nuclear sobre quem se

compartilham conhecimentos, como nas comunidades virtuais e redes sociais.

(SUAREZ & SALINAS, 2009, p. 59).

Tratando das necessidades, aspirações e desejos do público

PETER DRUCKER, assinalava que “ essa fórmula é tão complicada que só os

clientes podem respondê-la”, mas como primeira regra “ não existem clientes

irracionais! ”. Por este motivo, as empresas não devem tentar adivinhar as

respostas, mas sempre procurar os consumidores, em uma busca sistemática

por respostas (DRUCKER, et al., 2011, p. 280).

Steve Jobs afirmava categoricamente “ Venda sonhos ao invés de

produtos, as pessoas que compram produtos apple não são “consumidores”

são pessoas com sonhos, esperanças e ambições ” (GALLO, 2010, p. 423),

além dele Bill Gates quando tratou do conteúdo de sites criados pelos próprios

consumidores também ressaltou, “ Uma das partes interessantes da internet é

que qualquer pessoa com um computador e um modem de internet pode

publicar qualquer conteúdo que criarem. De certo modo, a internet é a

multimídia equivalente a fotocopiadora: ela permite que o material seja

duplicado por um preço baixo, não importa o tamanho da audiência” (MIOZZO,

2016).

A experiência sensorial proveniente da mídia se enriquece

quando dois ou mais se seus elementos básicos são combinados. Existem

pessoas que experimentam um incomum cruzamento de estímulos que fornece

algumas pistas sobre o porquê de essas combinações terem um efeito tão

profundo e avassalador. Imaginemos uma espécie de linguagem que derive da

associação de sons, cores e olfato. Essa junção tem a possibilidade de

deflagrar respostas multissensoriais e que poderiam explicar o que torna

determinadas obras de arte ou músicas tão populares e evocativas, ou como

na hipótese de apresentações ao vivo como teatro, filmes e shows de rock, em

que o discurso, a música, as imagens e o texto combinam-se ao tato, ao

paladar, ao olfato e, ás vezes, a histeria coletiva (PARRY, 2012, p. 624).

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Para se exemplificar podemos extrair o exemplo de um anúncio

feito poucos dias antes do dia dos pais na cidade de Buenos aires:

“Os outdoors da cidade de Buenos Aires apareceram tomados por um cartaz em que se via uma espécie de super-herói patético (ombros estreitos, barriga grande, capa, máscara). Ao lado dele havia um reluzente computador com todos os acessórios. E uma criança, que sentada de costas para o espectador, o observava. Na parte superior, o cartaz exibia o logotipo de uma rede de lojas de venda de produtos eletrônicos. Na parte inferior, uma legenda: Volte a contar com a admiração de seu filho”

Qual o motivo para a perda da admiração do filho? A partir de que

momento o afeto, o carinho, a admiração e o respeito que um filho sente pelo

pai são gerados a partir do que este compra? O que importa é o computador, o

brinquedo, o bem material, a isca eletrônica ou qualquer que seja o nome

atribuído a ela (SINAY, 2012, pp. 73-74) além da intensidade e da capacidade

de despertar sentimentos da mensagem.

Os mecanismos de convencimento e manipulação psíquica, são

variados nos meios de comunicação de massa, os quais criam representações

ideais de situações de vida que induzem o comportamento e expectativas do

consumidor (MORAES, 1999, p. 43).

Em muitas situações, o pressuposto é de que quanto maior o

valor do bem de consumo, maior a manifestação de afeto.

No afã de impor bens de consumo, as fontes subliminares de

informação nem sempre tem seus propósitos explicitados e decodificados pela

audiência. Com o tempo e pela reiteração, passam a integrar o subconsciente

do indivíduo, impondo visão de mundo e conduta irrefletida, porém

minuciosamente planejada (MORAES, 1999, p. 43).

Por seu turno, fornecedores de produtos e serviços, quando

sabedores de tal dinâmica, massificam a determinada forma de comunicação e

informação, ao ponto de se produzir falsa sensação de liberdade de escolha no

mercado de consumo. É a liberdade em cuja gênese existe um ruído produzido

pela ausência de percepção do todo. Segundo ARENT (1967, p. 89) “ em

nossa época, parece-me, nada é mais dúbio do que nossa atitude em relação

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ao mundo, nada é menos assente que a concordância com o que aparece em

público...”.

Diante dessa problemática característica da sociedade de

consumo de massas e da nova forma de produção capitalista, é clara a

necessidade de aceitação de condições de desigualdade, pois consumidores

podem ocupar posições de disparidade no curso das relações econômicas

(MIRAGEM, 2008, p. 27).

Como exposto, trata-se de uma espécie de vulnerabilidade que

decorre da forma pela qual a comunicação é difundida, vez que as experiências

sensoriais provocadas pelas técnicas de mídia tendem a potencializar os

efeitos da informação.

Nesse processo, consagra-se a possibilidade de que o

consumidor seja afetado na livre manifestação de vontade, relativamente à

escolha de suas prioridades e necessidades. Antes de tudo, fazendo valer o

princípio da igualdade, cumpre prever e aplicar medidas dirigidas a defesa de

seus interesses. (MORAES, 1999, p. 43)

Não é ocioso alertar que o conteúdo produzido por este ambiente,

toma por base a vida do consumidor, que “percebe” nova dimensão de

consumo. Aí reside um aspecto fundamental da discussão, qual seja, a

autonomia da vontade que se encontra em cheque.

Tal consideração inspira a recuperação do direito à noção de

igualdade, derivada do pensamento de Aristóteles, conhecida como igualdade

material, em que se reconhecem as diferenças, imperativo de tratamento

desigual aos desiguais. (MIRAGEM, 2008, p. 28).

A preservação dos critérios isonômicos encontra-se articulada

com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que impõe o mais absoluto

zelo pelos direitos de terceira geração, como se demonstra a seguir:

“Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identifica com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem

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um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade.” (MS 22.164, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 30-10-1995, Plenário, DJ de 17-11-1995.)

De certa forma, a resposta pode estar nos anseios do público, na

força do novo consumidor, capaz de ditar o modus operandi da atividade

empresarial, como ocorre nas hipóteses de consumo sustentável, crédito

responsável e similares. No entanto, o direito deve se adaptar ao dinamismo

das circunstâncias.

É forçoso zelar pela informação, pela aplicação de critérios éticos,

morais, livres, pautados em princípios capazes de equilibrar as relações

humanas, em confronto com as características notadamente desequilibradas

do mercado de consumo.

3.4 A Isonomia no Acesso à informação e a Vulnerabilidade Agravada

A complexa dinâmica das relações empresariais na sociedade da

informação sugere refletir sobre mecanismos jurídicos capazes de equilibrar

relações, injustamente desiguais.

Nessa perspectiva, a utilização de meios legais e filosóficos pode

servir como fundamento à proteção dos interesses do consumidor virtual.

Como destacou MORAES A. (2003, p.65), a “Constituição Federal vigente

adotou o princípio da isonomia ou igualdade de direitos, antecipando a

igualdade de aptidão, uma igualdade de tratamento idêntico pela lei, de acordo

com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico”.

No entendimento de ALEXANDRE MORAES, (2003. p.65), é

nodal a demonstração da tríplice finalidade limitadora do princípio da igualdade,

que é a limitação ao legislador, ao intérprete e ao particular.

“O legislador, no exercício de sua função constitucional de edição normativa, não pode negar o princípio da igualdade já que configura inconstitucionalidade. Logo, as normas que criem

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diferenciações abusivas que não tenham nenhuma finalidade lícita, serão incompatíveis com a Constituição Federal”.

Por sua vez, PAESANI (2006, p.21) defende com ênfase que:

“A liberdade de informação tem sido definida como a mãe de dois direitos: de informar e de ser informado. A informação deve ser observada sob o aspecto ativo e passivo. No primeiro caso, aborda-se a possibilidade de acesso aos meios de informação em igualdade de condições, possibilitando o direito de expressar o pensamento e informar; o aspecto passivo salvaguarda o direito de assimilar e receber as notícias e as opiniões expressas por alguém. Neste último caso, tem-se a liberdade de se informar”.

O duplo aspecto da dinâmica informacional justifica-se o

reconhecimento da vulnerabilidade agravada do consumidor virtual, que

OLIVEIRA (2016) define como “A informação é parâmetro primordial no mundo

globalizado de grande difusão de conhecimento”. Em paralelo ao acesso á

informação, questionam-se os critérios de eticidade que devem permear todas

as relações jurídicas em geral, e mais do que isso, a postura adotada pelo

Estado em relação aos fornecedores que estabeleçam relação de consumo

virtual.

Esse dever do Estado é repisado pelo pensamento de VALLE

(2005, p.27) quando aborda as estruturas formais do Estado moderno, em que

o monopólio da força convive com as estruturas de um Estado-Rede, numa

espécie de soberania compartilhada que requer efetividade de princípios em

prol do respeito aos direitos humanos.

O assunto em tela tem sido objeto de decisões das cortes

superiores:

“O princípio da isonomia, que se reveste de auto aplicabilidade, não é – enquanto postulado fundamental de nossa ordem político-jurídica – suscetível de regulamentação ou de complementação normativa. Esse princípio – cuja observância vincula, incondicionalmente, todas as manifestações do Poder Público – deve ser considerado, em sua precípua função de obstar discriminações e de extinguir privilégios (RDA 55/114), sob duplo aspecto: (a) o da igualdade na lei; e (b) o da igualdade perante a lei. A igualdade na lei – que opera numa fase de generalidade puramente abstrata – constitui exigência destinada ao legislador que, no processo de sua formação,

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nela não poderá incluir fatores de discriminação, responsáveis pela ruptura da ordem isonômica. A igualdade perante a lei, contudo, pressupondo lei já elaborada, traduz imposição destinada aos demais poderes estatais, que, na aplicação da norma legal, não poderão subordiná-la a critérios que ensejem tratamento seletivo ou discriminatório. A eventual inobservância desse postulado pelo legislador imporá ao ato estatal por ele elaborado e produzido a eiva de inconstitucionalidade. ” (MI 58, rel. p/ o ac. min. Celso de Mello, julgamento em 14-12-1990, Plenário, DJ de 19-4-1991.)

Sem sombra de dúvidas, o julgamento supramencionado respalda

os parâmetros éticos relativo à dignidade da pessoa humana, inclusive no que

se relaciona com a isonomia perante a lei.

Exige-se, pois esforço no sentido de estabelecer parâmetros de

igualdade e isonomia, capazes de nortear qualquer relação de consumo que

tenha como origem o ambiente on line, para que se possa enfrentar a

vulnerabilidade agravada do consumidor, própria da sociedade da informação.

A igualdade é “uma qualidade ou estado de igual; um estado de

paridade, equidade e justiça”. AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA,

além de definir o termo, ainda indica a existência de três espécies de

igualdade: Igualdade formal, material e moral. Igualdade formal existe entre

indivíduos ou grupos sociais, que se estabelece por categorias abstratas

(dignidade, cidadania) e que geralmente são definidas por normas. Igualdade

material situa-se no campo das condições concretas, das que atendem às

necessidades reais das pessoas, como o acesso à saúde, educação e

segurança. Finalmente a igualdade moral, diz respeito à garantia de direitos

fundamentais, que provêm da humanidade e definem a dignidade da pessoa

humana (FERREIRA A. B., 2009, p.1069).

A igualdade também reconhecida como isonomia é um dos pilares

do Estado democrático de Direito, que pugna pelo tratamento justo a todos,

impondo o objetivo universal a uma vida digna. É elemento fundante à

proibição aos privilégios e distinções injustificadas. (D’Oliveira, 2016)

No campo da igualdade moral, o discurso ético indica caminho

mínimo a ser observado por todos e, no caso em tela no presente estudo, pelos

difusores da informação de consumo da sociedade da informação. Ausente

esse cuidado, estarão cometendo violações à dignidade da pessoa humana.

Page 112: portal.estacio.br · Web viewOutro ponto a ressaltar é que o processo de comunicação repercute diferentemente nas pessoas, eis que guarda relação com elementos internos, como

112

O princípio em exame tem previsão constitucional no art.3º da

Constituição Federal, ao garantir a erradicação da pobreza e da

marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção

do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e

quaisquer outras formas de discriminação. Essa determinação dá sustentação

à busca da igualdade nas diferentes esferas do direito, seja de ordem

processual, social, ou qualquer outra, sempre no intuito de que tornar o país

mais justo (MIRANDA D. C., 2014).

Não obstante, na prática, verifica-se embate entre o interesse das

instituições, ou grandes conglomerados de mídia, que representam o lugar das

antigas classes abastadas, fazendo repetir a dinâmica de opressão secular,

que, nas palavras de D’Oliveira, “conferem uma interpretação destoante da que

realmente deve ser aplicada” ao texto constitucional (D’Oliveira, 2016).

Para leitura adequada do diploma constitucional ao consignar

tratamento isonômico a todos, indistintamente, é imprescindível examinar a

dinâmica das relações empresariais, particularmente num cenário em que a

internet detém recursos que permitem identificar, entre outros aspectos, os

anseios de seu público consumidor.

Mergulhando mais fundo na reflexão, vale lembrar que o termo

“tecnologia” deriva da junção de duas palavras gregas: “Tekne”, que significa

“Técnica”, e “logos” que significa “conjunto de saberes”. Isso posto, sublinha-se

que, na prática da vida contemporânea, a tecnologia permeia todas as áreas do

conhecimento, permitindo construir e transformar o meio ambiente, com o fito

de satisfazer as necessidades humanas.

Por seu turno, as tecnologias da informação constituem a fusão

da arte com a ciência. a tal ponto que, atualmente abarca conjunto de

conhecimentos científicos encomendados, por meio do qual você pode projetar

e criar bens e serviços (PINOCHET, 2014, p. 427).

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113

Capítulo 4 – O Fortalecimento da tutela do consumidor virtual

“Viver no mundo da ignorância, é aceitar

viver em um mundo sem o real sentido das

coisas” Itamar Firmino Lima

Considerando o até aqui exposto, quanto ao direito material e à

regulamentação processual, sem dúvida, há ferramentas jurídicas para

proteção ao direito do consumidor virtual. Nessa linha de raciocínio, assume-

se a premissa de que a legislação é condição necessária, mas não suficiente

quando se procura resolver algum problema, pois o de que se precisa é

efetividade substancial do direito positivo.

Tendo em vista os propósitos maiores desta Tese, no presente

capítulo, busca-se expor algumas propostas, que podem favorecer a

efetividade da proteção ao consumidor virtual. As recomendações estão

alicerçadas no Marco Civil da Internet, no Sistema Universal de Direitos

Humanos e nos princípios estabelecidos em âmbito internacional.

De pronto, enfrentam-se questões como as seguintes: Diante das

inúmeras possibilidades conferidas pela internet, seria razoável supor que

todos os problemas abarcados encontram soluções efetivas? Como se

proteger de compra impulsionada por fatores emocionais, subjacentes a

julgamento deficiente seja por falta de informações adequadas, ou por

limitações quanto ao domínio técnico e aos cuidados necessários à tomada de

decisão no ambiente virtual?

4.1 O Apoio do Marco Civil da Internet

A lei 12.965, de abril de 2014, também conhecida como Marco

Civil da Internet estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para uso da

internet no Brasil e determina diretrizes para atuação da União, do Distrito

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114

Federal e dos municípios em relação à matéria. Em seu art.2º destaca a

liberdade de expressão, como fundamento do ambiente em rede. Em

contrapartida, contêm seis incisos (três deles especificamente vinculados ao

objeto da presente investigação), cuja importância repousa no regramento do

uso dos meios eletrônicos. A esse respeito, é essencial refletir sobre o que se

transcreve a seguir:

“Art. 2o A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:

I - O reconhecimento da escala mundial da rede;

II - Os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;

III - a pluralidade e a diversidade;

IV - A abertura e a colaboração;

V - A livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e

VI - a finalidade social da rede. ” Grifos nossos.

Sob essa perspectiva de análise, é pertinente sublinhar que

fundamentos são características basilares do ordenamento jurídico, eis que

alicerçam a formulação e aplicação da norma em cotejo com a realidade fática.

O Marco Civil é reconhecido por alguns, como “A Constituição da Internet”, eis

que, como não poderia deixar de ser, está subsumida à Carta Magna, e, por

isso também faz referência explícita “ aos fundamentos do Estado Democrático

de Direito”, e os “seus objetivos” (BRANT, 2014, p.582).

Fundamentos como exposto, dão respaldo à estrutura e

funcionamento do sistema. Ademais, princípios são as diretrizes norteadoras

da interpretação e desenvolvimento prático do ordenamento jurídico, inclusive,

para elucidar eventuais hipóteses de antinomias ou conflitos para a aplicação

de determinada regra. Por sua vez, objetivos indicam com precisão o que se

pretende alcançar; logo, sua concretização depende da execução de um

conjunto de projetos, planos, programas e atividades de rotina.

No Marco Civil da Internet, o legislador optou por um rol

exemplificativo, o que permite lançar mão de princípios não explicitados no

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115

diploma os quais favorecem a compreensão do conteúdo e abrangência da

norma (BRANT, 2014, p.582).

Quando examinados os fundamentos do Marco Civil, destacam-se

quatro aplicáveis diretamente às circunstâncias relativas ao consumidor virtual:

1 – A Liberdade de Expressão (art.2º caput).2 - Os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais (art.2º, II).3- A livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor (art.2º, V).4 - A finalidade social da rede (art.2º, VI).

As propostas apresentadas a seguir baseiam-se nesses

fundamentos, conferindo-se inicialmente ênfase à Liberdade de Expressão, tal

como contemplada no Marco Civil da Internet e no Sistema Universal de

Proteção dos Direitos Humanos, consagrada tanto na Declaração Universal

dos Direitos Humanos, quanto no Pacto Internacional dos Direitos Civis e

Políticos, que preveem o seguinte:

“Artigo 19 (Declaração Universal)

Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o

que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o

de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras,

informações e ideias por qualquer meio de expressão.

Artigo 19 (Pacto Internacional)

1. Ninguém poderá ser molestado por suas opiniões.

2. Toda pessoa terá o direito à liberdade de expressão; esse

direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir

informações e ideias de qualquer natureza, independentemente

de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, de

forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua

escolha.

3. O exercício do direito previsto no § 2 do presente artigo

implicará deveres e responsabilidades especiais.

Consequentemente, poderá estar sujeito a certas restrições,

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116

que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei e

que se façam necessárias para:

a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais

pessoas;

b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral

pública. ” (OEA, 2016)

A previsão legal em tela sublinha a importância e os limites da

Liberdade de Expressão para o debate relativo ao consumidor virtual, no

contexto internacional, acrescentando-se que mecanismos internacionais

(ONU, OEA, OSCE e CADHP) inclusive, desde 2011, ratificam o destaque da

“Liberdade de Expressão dentro do contexto web”, particularmente, quando

firmaram declaração conjunta sobre liberdade de expressão e internet. É

interessante lembrar que o Relator Especial das Nações Unidas (ONU) sobre a

Liberdade de Opinião e Expressão, a Representante da Organização para a

Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) para a Liberdade dos Meios de

Comunicação, a Relatora Especial da Organização dos Estados Americanos

(OEA) para a Liberdade de Expressão e a Relatora Especial da Comissão

Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) para Liberdade de

Expressão e Acesso à Informação, após analisarem as questões

conjuntamente com a colaboração da organização ARTIGO 19, Campanha

Mundial pela Liberdade de Expressão (ARTICLE 19, Global Campaign for Free

Expression) e do Centro para o Direito e a Democracia (Centre for Law and

Democracy) resolveram adotar os seguintes princípios (MARINO, 2013):

“1. Princípios gerais 

a. A liberdade de expressão se aplica à internet do mesmo modo que a todos os meios de comunicação. As restrições à liberdade de expressão na internet só são aceitáveis quando cumprem os padrões internacionais, que dispõem, entre outras coisas, que elas devem estar previstas pela lei, buscar uma finalidade legítima reconhecida pelo direito internacional e ser necessárias para alcançar essa finalidade (o teste "tripartite").  

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117

b. Ao avaliar a proporcionalidade de uma restrição à liberdade de expressão na internet, deve-se ponderar o impacto que a restrição poderia ter na capacidade da internet para garantir e promover a liberdade de expressão em relação aos benefícios que a restrição geraria para a proteção de outros interesses. 

c. As abordagens de regulamentação desenvolvidas para outros meios de comunicação – como telefonia ou rádio e televisão – não podem ser simplesmente transpostas para a internet, mas devem ser desenhadas especificamente para este meio, atendendo as suas particularidades. 

d. Para responder a conteúdos ilícitos, deve-se atribuir uma maior relevância ao desenvolvimento de abordagens alternativas e específicas que se adaptem às características singulares da internet, e que por sua vez reconheçam que não se devem estabelecer restrições especiais ao conteúdo dos materiais que são difundidos por meio da internet. 

e. A autorregulação pode ser uma ferramenta efetiva para abordar as expressões injuriosas, e, por isso, deve ser promovida. 

f. Devem-se fomentar medidas educativas e de conscientização destinadas a promover a capacidade de todas as pessoas de fazer um uso autônomo, independente e responsável da internet ("alfabetização digital"). ” (MARINO, 2013) Grifos nossos

Expostos os direitos e princípios, justifica-se o intento de examinar

o Sistema Universal de Direitos Humanos, a Declaração Mundial sobre

Liberdade de Expressão e Internet e os fundamentos do Marco Civil da

Internet, obedecendo à seguinte simetria:

1 - Apresentação dos princípios gerais que guardam relação com a

problemática do consumo virtual.

2 – Ponderação dos princípios mundiais, como base para o Sistema Universal

de Direitos Humanos e o Marco Civil da Internet.

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QUADRO 1 Sistema Universal de Direitos Humanos e o Marco Civil da Internet

segundo Princípios Norteadores

Princípios Sistema

Universal

Marco Civil

1-A liberdade de expressão se aplica à internet do mesmo modo que a todos os meios de comunicação. As restrições à liberdade de expressão na internet só são aceitáveis quando cumprem os padrões internacionais, que dispõem, entre outras coisas, que elas devem estar previstas pela lei, buscar uma finalidade legítima reconhecida pelo direito internacional e ser necessárias para alcançar essa finalidade (o teste "tripartite").

Artigo-19

Declaração

Universal

Artigo-19

Pacto

Internacional

arts. 2º, II, V, VI

3º, I, VI, VIII

4º, II, VII

7º, I, VI, XI, XIII

8º,9º, 10º, 12º, 13º, 18º,

19º, 20º, 21º, 22º, 24º,

III, VI, VIII, X

27º, II, 28º e 30º

2-A autorregulação pode ser uma ferramenta efetiva para abordar as expressões injuriosas, e, por isso, deve ser promovida.

Artigo-19

Declaração

Universal

Artigo-19

Pacto

Internacional

arts. 2º, II, V, VI

3º, I, VI, VIII

4º, II, VII

7º, I, VI, XI, XIII

8º,9º, 10º, 12º, 13º, 18º,

19º, 20º, 21º, 22º, 24º,

III, VI, VIII, X

27º, II, 28º e 30º

3-Devem-se fomentar medidas educativas e de conscientização destinadas a promover a capacidade de todas as pessoas de fazer um uso autônomo, independente e responsável da internet ("alfabetização digital")

Artigo-19

Declaração

Universal

Artigo-19

Pacto

Internacional

arts. 2º, II, V, VI

3º, I, VI, VIII

4º, II, VII

7º, I, VI, XI, XIII

8º,9º, 10º, 12º, 13º, 18º,

19º, 20º, 21º, 22º, 24º,

III, VI, VIII, X

27º, II, 28º e 30º

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4.2 Previsão Legal

1. A liberdade de expressão se aplica à internet do mesmo modo que a todos os meios de comunicação. As restrições à liberdade de expressão na internet só são aceitáveis quando cumprem os padrões internacionais, que dispõem, entre outras coisas, que elas devem estar previstas pela lei, buscar uma finalidade legítima reconhecida pelo direito internacional e ser necessárias para alcançar essa finalidade (o teste "tripartite").  

O primeiro princípio indica a possibilidade da criação de leis

restritivas à Liberdade de Expressão, cuja aplicação deve ser compatível com

padrões internacionais e impregnados de finalidade legítima.

Sob esse ângulo de análise, e, em tese, parece inócua a criação de

novas normas sobre o assunto. Vale notar que o excesso de instrumentos

normativos tende a tornar caótica a legislação, além de ferir o princípio da

segurança jurídica, trazendo à baila intermináveis discussões acerca da

vigência e aplicação da lei no tempo. A criação de novas normas para resolver

os problemas resultantes da inaplicação de preceitos legais existentes não é

razoável.

No caso em exame, é premente a aplicação da legislação existente

em conformidade com os fundamentos e princípios constitucionais, a todos e

contra todos, com o afastamento liminar do que for desconforme (HARADA,

2010).

O ordenamento jurídico pátrio é suficiente para cuidar desse tipo de

demanda (Constituição Federal, arts.1º, 3º, 5º - Código de Defesa do

Consumidor, arts.6, III, IV e VI, 37 § 2°, 39, IV e pelo Marco Civil da Internet,

arts. 2º, II, V, VI, 3º, I, VI, VIII, 4º, II, VII, 7º, I, VI, XI, XIII, 8º,9º, 10º, 12º, 13º,

18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 24º, III, VI, VIII, X, 27º, II, 28º e 30º).

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Auto-regulamentação

1. A autorregulação pode ser uma ferramenta efetiva para abordar as expressões injuriosas, e, por isso, deve ser promovida. 

Nesse aspecto, o Brasil, através do Ministério da Ciência e

Tecnologia (MCT) empreendeu significativo esforço de discussão, abarcando

os quatro setores da sociedade governamental, privado, acadêmico e o terceiro

setor, além de pessoas vinculadas a outros países e organizações

internacionais. Os debates se dirigiram ao magno desafio de estabelecer o

conteúdo e reforçar a necessidade de envolvimento de toda a sociedade

brasileira na construção de diretrizes voltadas a esse mister (SILVA,

JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016, p.32-33).

O esforço resultou na publicação, em 2000, do Livro Verde da

sociedade da informação (Tadao TAKAHASHI, 2000). O documento trouxe

claramente a proposta de universalização de serviços e a necessidade de

conceber soluções e promover ações que envolvam, desde a ampliação e

melhoria da infraestrutura de acesso, até a formação do cidadão, que,

informado e consciente, possa utilizar os serviços disponíveis na rede (SILVA,

JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016).

A regulação da mídia e seus reflexos na liberdade de expressão,

ocupa lugar de destaque nas discussões alusivas ao setor de

telecomunicações e respectiva influência no seio do estado democrático de

direito.

Como se demonstrou, na atualidade enfrenta-se a possibilidade

concreta de lesão aos consumidores virtuais, o que justifica a premência de

preservar garantias mínimas relativas ao ambiente web. Nessa perspectiva,

ressalta-se que, no Livro Verde da Sociedade da Informação, suscitou-se a

regulamentação para o comércio eletrônico, entre outras modalidades de

serviços web, tais como, assinatura digital, proteção à privacidade, liberdade de

expressão, regulamentação de arrecadação e taxação de transações

eletrônicas.

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121

A medida merece realce, pois o comércio eletrônico requer

segurança, confiabilidade e velocidade na transmissão de informações pela

rede, bem como logística de entrega eficiente. Quando se trata de B2C

(business to consumer): relação entre empresa e consumidor, há exigências

adicionais de proteção aos compradores virtuais, como interatividade e

facilidade de uso (TAKAHASHI, 2000).

Além disso, é o próprio ente estatal brasileiro que, desde 2000 (data

da edição do livro verde), preconiza atenção específica à padronização do

comércio eletrônico, como se ilustra a seguir:

“Um fator essencial para a difusão do comércio eletrônico diz respeito à regulamentação dessa atividade, em especial quanto aos seguintes aspectos, alguns dos quais ainda polêmicos: • validação das transações eletrônicas, particularmente quanto à certificação de assinaturas e documentos; • proteção da privacidade de pessoas e instituições; • adoção de padrões para os serviços de comércio eletrônico; • taxação de transações eletrônicas e de bens e serviços; • regulamentação do modelo de arrecadação das transações eletrônicas” (TAKAHASHI, 2000, p.19).

A auto regulação, definida como “uma combinação de padrões e

códigos de práticas adequadas, que são necessários para apoiar a liberdade

de expressão e balizam o monitoramento, a análise criteriosa e a

responsabilização dos veículos de comunicação” (PUDDEPHATT, 2011, p.12),

é fundamental para início de diálogo sobre o tema.

Outro ponto a considerar diz respeito ao dado de realidade de que o

comércio eletrônico é complexo: muitos produtos e serviços (como, por

exemplo, software, serviços de consultoria, prestação de serviços em geral

(cursos, palestras e aulas), música etc.) podem ser entregues na forma

digitalizada. Trata-se de bens intangíveis, que podem cruzar fronteiras entre

países eletronicamente, sem passar por alfândegas. (TAKAHASHI, 2000, p.19)

No ambiente global, amplia-se a complexidade do problema e da

jurisdição, o que dá respaldo à auto-regulamentação, por diversos argumentos.

Em primeiro plano, trata-se de economia de recursos públicos, vez que a

própria indústria assume os custos de adaptação, podendo seguir regras mais

flexíveis do que as estabelecidas na regulação estatal. Além disso, a pressão

das empresas sobre seus pares é fator positivo, pois pode funcionar como

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incentivo às boas práticas, com respeito aos padrões e regras – embora haja

evidências de que a regulação externa, ou a ameaça de aplicá-la, seja mais

efetiva para assegurar a conformidade com padrões e regras. A auto-

regulamentação pode ainda, incentivar a melhora dos padrões profissionais,

pois sua implementação requer que as organizações desenvolvam e apliquem

seus códigos de conduta. (PUDDEPHATT, 2011, p.13)

Experiências exitosas nesse sentido já se desenvolvem na Suécia e

no Reino Unido, onde o sistema de auto-regulamentação da mídia é formado

por 32 integrantes. Sua composição obedece à seguinte ordem: além dos

quatro juízes da Suprema Corte que se revezam na presidência, a composição

do órgão é equilibrada entre 16 representantes das organizações de mídia e 12

membros do público em geral. Os representantes públicos – atualmente

composto, entre outros, por médicos e professores – são nomeados pelo

Ombudsman do Parlamento, e pelo presidente da Associação Nacional de

Magistrados da Suécia. No Reino Unido, o IPSO é presidido por um ex-juiz da

Alta Corte, e tem doze integrantes: sete independentes e cinco ligados à

indústria de jornais e revistas. O IPSO tem poder legal para impor o direito de

resposta e outras providências em defesa de leitores e leitoras.  (WALLIN,

2015).

Como exposto, é evidente que não se trata apenas de autorregular,

cumpre dispor de organização plural, séria, comprometida, necessariamente

composta de elementos chave do processo social.

Em consonância com a proposta ora defendida, passamos a relatar

práticas exitosas realizadas por alguns países:

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Quadro 2Diretrizes para Práticas no Comércio Virtual em diferentes países

Tipo Instituição1

Certificado-ID geral com chave privada em cartão-ID eletrônico

Diretrizes para Propaganda na Internet

Regras de Best-Practices para comércio de bens intangíveis

Repositório de E-Termos para Contratos

Contrato-modelo para Fluxo de Dados Transfronteiras

Serviços de Certificação PKI

Contrato-modelo para vendas eletrônicas (business-to-business)

Código-modelo para proteção de Informações Pessoais (no Canadá)

BBBOnline Privacidade (apoio a Programas de empresas)

Auto-regulamentação de Propaganda na Internet

Modelo de Avaliação de Tecnologias de Implementação de Shopping Malls

Diretrizes para o uso de Smart Cards

Diretrizes para Autoridades de Certificação

Hotlines contra Conteúdos IlegaisDiretrizes para transações entre comerciantes e consumidores virtuais

Código de conduta para Comércio Eletrônico

SEIS (Suécia)

ICC

ICC

ICC

ICC

ICC/IBCC

ICC

CSA (Canadá)

BBBOnline (EUA)

CAP (GB)

ECOM (Japão)

ECOM (Japão)

ECOM (Japão)

NLIP (Holanda)

ECOM (Japão)

ECP.NIP (Holanda)

Fonte: Livro Verde da Sociedade da Informação no Brasil (TAKAHASHI, 2000, p.20)

1 Siglas:•BBBOnline (EUA): Serviço do Council for Best Business Practices dos EUA (Associação Privada)•CAP (Reino Unido): Community for Advertising Practices•CSA (Canadá): Canadian Standards Association•ECOM (Japão): Electronic Commerce Promotion Council of Japan•ECP.NIP (Holanda): Internet Service Providers Association Netherlands•IBCC (Internacional): International Bureau of Chambers of Commerce•ICC (Internacional): International Chamber of Commerce•SEIS (Suécia): Secured Electronic Information in Society (organização não-governamental)

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Nesse tipo de sistema, prevalece a ética, posto que a mesma “pode

ser muito mais rigorosa do que a própria lei” (WALLIN, 2015). Em resumo, é

importante reconhecer o caráter dual da mídia e suas implicações.

Primeiramente, ela constitui ambiente de livre troca de ideias e opiniões,

requisito fundamental em uma democracia e, portanto, merece proteção, sem

interferências políticas governamentais ou de grupos específicos. Em segundo

lugar, trata-se de ator social em defesa de seus direitos e interesses; suas

decisões sobre quais fatos cobrir e de que forma fazê-los, assim como suas

posições editoriais. Tais circunstâncias podem interferir nos acontecimentos, o

que requer comportamento socialmente responsável. O caráter duplo torna

essencial a construção de um sistema efetivo de autor regulação

(PUDDEPHATT, 2011, p.13).

PERRENOUD (1999, p.96) conceitua a auto regulação como as

“capacidades do sujeito para gerir ele próprio seus projetos, seus progressos,

suas estratégias diante das tarefas e obstáculos. ” Na realidade todas as

pessoas possuem certo grau de auto regulação, mas importa o mesmo seja

elevado, tendo em mente a autonomia progressiva no aprender e, por

extensão, na organização da vida em todas as suas dimensões (FREIRE,

2009, p.278).

Nas palavras de PERRENOUD (1999, p.96):

“Para aprender, o indivíduo não deixa de operar regulações intelectuais. Na mente humana, toda regulação em última instância, só pode ser uma auto regulação, pelo menos se admitirmos as teses básicas do construtivismo: nenhuma intervenção externa age se não for percebida, interpretada, assimilada por um sujeito. Nessa perspectiva, toda ação educativa só pode estimular o autodesenvolvimento, a autoaprendizagem, a auto regulação de um sujeito, modificando seu meio, entrando em interação com ele. Não se pode apostar, afinal de contas, senão na auto regulação. ” (PERRENOUD, 1999, p.96)

A possibilidade de o ser humano desenvolver a auto-

regulamentação em termos gerais se espraia para que se proteja contra riscos

presentes no consumo virtual e exerça a liberdade de expressão, entre outros

importantes direitos fundamentais.

Deve-se, portanto, “esperar que um amplo conjunto de aspectos seja

objeto de ação do setor privado, em busca de auto-regulamentação:

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125

propaganda na Internet, idoneidade de lojas virtuais, modelos de contratos

comerciais etc” (TAKAHASHI, 2000, p.20).

4.3 Os Códigos de Ética

No cenário da pós-modernidade, o individualismo está vinculado à

desumanização e coisificação do indivíduo, o que requer juízo crítico e

resistência aos apelos do mercado. Decorre daí a premência de definição e

respeito a princípios éticos voltados à informação do consumidor virtual, como

bússola à atuação do fornecedor de produtos e serviços comercializados pela

web, inclusive no que tange às estratégias e técnicas de marketing.

A sociedade da informação tem como característica o forte poder

da mídia principalmente quando atende à curiosidade inerente à condição

humana. Por mais óbvio que isso possa parecer, ainda não se atribui a

importância adequada às consequências da interação entre homem e máquina,

seja por falta de conhecimentos adequados, ou pela negação da dependência,

que para alguns consumidores pode representar apelo irresistível, como vício.

Em face da ausência de senso crítico, por inadvertência, o

homem pós-moderno tende a passar ao largo da hipótese de risco subjacente

à informação obtida pelos meios digitais. Não raro, ouve-se que se trata de

elemento próprio da vida moderna e capaz de facilitar as relações sociais.

Como consequência, o problema relativo à utilização de critérios éticos torna-

se cada vez mais presente nas relações de ordem informacional-digital.

Ao assistir televisão, conscientemente ou não, absorve-se a

mensagem de que o valor primordial na vida é possuir mais bens materiais.

Isso se torna decisivo para as escolhas. As pessoas assistem aos jogos de

futebol, às séries cômicas ou aos filmes e não pensam; apenas consomem

(CHOMSKY, 2014, p. 170).

O mesmo autor (CHOMSKY, 2014, p. 170) denuncia que, vez ou

outra, as informações transmitidas (como doenças e violência) estimulam o

medo, incutindo sensação de perigo iminente, interno ou externo, que mantém

a audiência sob controle, na medida em que, sem reflexão, passa a agir

simplesmente em conformidade com a programação. Agregada às novas

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126

tecnologias, a mídia passou a ser utilizada como aparato social de controle, o

que não se ajusta aos princípios da ética (MARLETTI, 2004, p. 6).

Em face da magnitude dessa problemática, em alguns países,

reconhece-se a suma relevância da ética, a tal ponto que se criou a profissão

de eticista, para fazer referencia ao profissional que atesta especificamente se

a ação é ou não ética (DALLARI, 2003, p. 9).

Da carência de reconhecimento da vulnerabilidade agravada pelo

consumidor, sobressai a necessidade da criação de mecanismos internos

(auto-regulamentação), submetida ao crivo do Estado.

Nessa esteira, considera-se que a autorregulamentação requer

instrumentos eficazes para sua efetividade. Entre os meios de

instrumentalização de direitos de consumidores virtuais, confere-se relevo à

criação e aplicação de códigos de ética, requisito primeiro no equilíbrio de

interesses entre pares nas relações de consumo.

Essa proposta adquire maior relevo, quando se considera a crise

de valores e modelos capazes de sustentar a coexistência entre os cidadãos.

Na atualidade, o consumo virtual, entre outros espaços de interação social,

demanda formação adequada desde cedo, com respaldo em princípios éticos

que balizem a formulação de princípios informacionais capazes de propiciar ao

consumidor a liberdade almejada na tomada de decisão.

A criação e aplicação de códigos de ética empresarial no contexto

da sociedade da informação proporciona respaldo ao arcabouço jurídico da

Auto-regulamentação. Desse modo, a participação plural e efetiva da

sociedade, guardando semelhança com modelos adotados em outros países,

sustentará a concretização de princípios éticos no tratamento ao consumidor

virtual brasileiro.

Nessa esteira, é pertinente assinalar pontos de convergência e de

distinção entre moral e ética, a fim de se atribuir força coercitiva ao

pensamento hipoteticamente aventado.

Como se ressaltou, ética e moral são institutos que despertam

certa dificuldade de compreensão pelo homem comum, embora a moral seja

ponto de partida para princípios éticos (VASQUEZ, 2007, p.22). Sem intenção

de aprofundar a reflexão, pode-se admitir que a ética propicia a compreensão e

sistematização de postulados morais, fundamento de tudo o que promova o

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bem-estar do homem. A partir dessa premissa, a moral abarca um conjunto de

normas e princípios que influenciam o comportamento humano, tendo em vista

seu bem-estar (GONÇALVES, 2015).

A Moral, prática e imediata, impõe sanção (não no mesmo sentido

do Direito, mas enquanto reprovação social). Ética, por sua vez, tem natureza

teórica, eis que se trata de reflexão filosófica sobre a moral, justificando-a e

traçando parâmetros para a vida humana. “Ética é a ciência da Moral”

(VASQUEZ, 2007, p. 23).

Ética e Direito também não se confundem, conquanto a lei possa,

em muitas situações, ter fundamentos éticos. Do ponto de vista científico, a lei

não mantém necessariamente vínculo com a ética, sobretudo porque esta

tende a variar mais que a lei, dependendo de uma série de fatores, tais como:

momento histórico, contexto social, profissão e similares. (GONÇALVES,

2015).

O autor em tela acrescenta que a sanção própria do Direito dá

maior efetividade ao debate, visto que a ética nem sempre atinge seus

objetivos:

“Diferença básica reside no quesito sanção, isto é, enquanto o Direito impõe sanção por sua desobediência, Ética não tem a característica de compelir o indivíduo, pelo Estado, ou mesmo pela sociedade, a cumprir diretrizes éticas. Pretendendo-se cumprimento de postulados éticos é necessário normatizá-los, sempre considerando, de um modo ou de outro, o âmbito do Direito. (...) É justamente a força coercitiva, exteriorizada por meio de sanções – o dever-ser –, que dá maior efetividade ao Direito, nem sempre alcançada pela Ética ou pela Moral, notadamente porque a humanidade ainda não atingiu o estágio em que os próprios cidadãos cumpram obrigações sem coerção. É verdade que a coerção do Direito está condicionada às forças políticas que o originam e, também, aos interesses sociais que determinam a efetividade da lei. Forças que são influenciadas por fatores morais e éticos. ” (GONÇALVES, 2015) 

A turbulência do presente momento social instiga ao debate e à

busca de novas soluções para a resolução de antigos problemas. Somente

através do resgate de determinados valores estruturantes e inseparáveis do

homem moderno, é possível encontrar respostas adequadas ao campo social,

no que diz respeito ao tratamento da informação propagada pela mídia e

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contribuir para o bem-estar social e, segundo BOBBIO ainda que o poder

político esteja influenciado por postulados éticos, a força do Direito se dá pelo

ordenamento jurídico, sentido amplo, que organiza respectivas sanções e,

portanto, torna efetivas normas de conduta que a sociedade, politicamente,

estabeleceu (BOBBIO, 1999, pp. 69-70).

Neste sentido, a ética emerge da consciência do imperativo de

ruptura com a mentalidade geral alienante. O despertar da responsabilidade, o

discernimento e a incorporação da justa cota de corresponsabilidade, quanto à

ética comunicacional exigem senso crítico, pois a comunicação moderna se

encontra bem alicerçada, abarcando e envolvendo cada vez mais o universo

das coisas e dos homens, o mundo das ideias, de interesses, de imagens e

paixões, que seduzem e conduzem todos os seres humanos (JOSAPHAT,

2006, pp. 13-14).

A conjugação da ética informacional com a ciência do direito pode

fortalecer o exercício do senso crítico e interferir no imaginário social quanto ao

mercado de consumo, o que se reflete no exercício da liberdade nas escolhas

e decisões. Trata-se da concretização da ética, do ponto de vista dos

consumidores, e dos fornecedores.

Interessante exemplo para observar a efetividade que o Direito

proporciona em homenagem à Ética e à Moral é a responsabilidade social das

empresas. Baseada em postulados éticos e morais, que devem orientar a

atividade empresarial, para que haja respeito ao meio ambiente, cidadania,

igualdade e inclusão social, a responsabilidade social ainda não encontrou

plena efetividade em nosso país, porque as empresas têm a liberdade de

cumprir, ou não, essa diretriz. (GONÇALVES, 2015)

A ética individual não é desligada da ética social, exatamente

porque ninguém vive sozinho; todos vivem necessariamente em associação.

Nesse passo, como se ressaltou, o ser humano é influenciado por uma série de

fatores, de tal forma que, não raro, a capacidade racional é utilizada para

satisfazer o egoísmo essencial, mencionado por Kant. “Tenho consciência que

isto é injusto; mas isto é que vai me trazer proveito, então é isso que vou fazer.

” Pior ainda, “vou influir para que os outros façam aquilo que considero

conveniente para mim, vou vender como justo aquilo que me é conveniente”

(DALLARI, 2003, p. 110).

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A diferença fundamental entre Direito e Moral, o que, por

consequência, estende-se à Ética, é, de fato, a sanção: enquanto as leis

impõem sanção por sua desobediência, a moral, quando muito, induz à

reprovação social, sem reflexos na responsabilidade patrimonial ou na restrição

de liberdade. (GONÇALVES, 2015)

A comercialização de produtos na modalidade virtual é lícita, útil e

necessária ao bom desenvolvimento do sistema capitalista. No entanto, o que

se impõe é um critério de readaptação da antiga publicidade, ou da prática de

mercado, agora assentada em atributos éticos, capazes de produzir no

consumidor o senso crítico necessário à escolha e decisão responsável.

Algumas dificuldades desse intento são expressas na linguagem

utilizada pela mídia, quando embriaga o ser humano. Através do estímulo à sua

afetividade, aos sentidos, à inteligência, à imaginação e, sobretudo, à

capacidade de sonhar, torna-se difícil (se não impossível) fugir dos influxos

moderadores de imagem, das ondas luminosas ou sonoras da comunicação. O

mais grave é que a sociedade engendrada pelo processo de comunicação

avança sem o controle ou consciência da realidade, da amplidão ou da

profundeza dessa evolução (JOSAPHAT, 2006, p. 15).

Na atualidade, mais do que nunca os elementos éticos e a criação

de códigos de ética empresarial para a sociedade da informação devem pautar

as relações web, onde o pensamento do emissor da informação deve ser

revestido de olhar respeitoso e empático à figura do outro.

Por óbvio, os fatores relativos ao campo da mídia, ou os temas

sociais são importantes, mas é nodal a hipótese de que ambos são

complementares e não um sistema de alforria recíproca. CARLOS JOSAPHAT

(2006, p. 12) traduziu bem o pensamento de Jean Paul Sartre e Simone de

Beauvoir, quando sublinhou: “somos metade vítimas, metade cúmplices”.

Na sociedade moderna, muitas profissões possuem Código de

Ética, como é o caso, por exemplo, do Estatuto e Código de Ética da Ordem

dos Advogados do Brasil e o Código de Ética Médica, entre outros. Ética

profissional é o conjunto de normas de cumprimento obrigatório, derivadas de

condutas definidas pelos próprios profissionais. No entanto, a sanção não

decorre da “norma ética”, mas da lei instituída pelo Estado, ou pela categoria,

caso o poder público tenha delegado tal possibilidade. A desobediência de

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postulados éticos resulta em sanções derivadas do conteúdo legal, incluindo

até a proibição de exercer a profissão (GONÇALVES, 2015).

No campo do consumo virtual, são inúmeros os casos de

ausência de ética, seja quando, existe o monitoramento da navegação do

usuário, ou quando fornecedores se beneficiam da fraqueza, ou ignorância do

navegante virtual, como nas hipóteses da venda por impulso, indução ao medo,

rastreamento da posição geográfica do consumidor, apropriação não

autorizada de cookies, publicidade voltada ao público infantil, empréstimo por

impulso a aposentados entre outros.

Na hipótese de consumidores idosos inclusive, a ausência de

ética se aproveita da fragilidade decorrente de eventuais problemas quanto à

administração de relações corriqueiras e frustrações da vida que, na terceira

idade, podem assumir maior vulto. Além disso, em alguns casos, verifica-se o

receio de conviver com a probabilidade de morte iminente e o somatório de

perdas afetivas ao longo da vida (BARLETTA, 2010, p. 27).

4.4 A compatibilidade entre a boa-fé objetiva e o Marco Civil da Internet

Pelo exposto, levando-se em consideração que os postulados

éticos possuem características deontológicas, calcados nos fundamentos e

sistemas morais, a criação de códigos de ética empresarial na sociedade da

informação configura-se como normatização interna do princípio da boa-fé

objetiva relativa aos contratos. Esse respaldo pode ser aplicado à defesa do

consumidor virtual, no intento de apresentar soluções concretas para

problemas eventualmente não especificados no ordenamento jurídico.

A boa fé objetiva dirige-se à personalização das relações

obrigacionais. As cláusulas contratuais previamente elaboradas regulam as

relações da coletividade e a manutenção de dogmas contratuais clássicos,

marcados pela autonomia da vontade não se viabiliza da mesma forma

(LISBOA, 2012, p. 145).

Revestidos de formalidades legais, os contratos se modernizaram;

no entanto, há princípios a serem respeitados, independentemente das

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mudanças. Por exemplo, é óbvio não se admitir a validade de contrato de

adesão, firmado via web, que não se encontre em conformidade com os

princípios de eticidade, boa fé e função social (PORTO, 2014, p.29).

Do exposto, extrai-se importante alicerce no rol exemplificativo

(mas não exaustivo) de princípios do Marco Civil da Internet (Art.3º):

Art. 3o A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:

I - Garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;

II - Proteção da privacidade;

III - Proteção dos dados pessoais, na forma da lei;

IV - Preservação e garantia da neutralidade de rede;

V - Preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas;

VI - Responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;

VII - Preservação da natureza participativa da rede;

VIII - Liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta Lei.

Parágrafo único. Os princípios expressos nesta Lei não excluem outros previstos no ordenamento jurídico pátrio relacionados à matéria ou nos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. (Grifos nossos)

Como se assinalou, princípios operam como ditames superiores,

fundantes e informadores do conjunto de regras do Direito Positivo. Com essa

característica, pairam sobre toda a legislação, conferindo-lhe significado

legitimador e validade jurídica (PORTO, 2014, p.29).

Dentre todos os presentes no Marco Civil da Internet, o art.3º

inciso VIII, guarda relação direta com o a boa-fé objetiva, precipuamente,

quando afirma categoricamente que a “liberdade dos modelos de negócios

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promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios

estabelecidos nesta Lei” será respeitada. Além disso, em seu parágrafo único

ressalta que “os princípios expressos nesta Lei não excluem outros previstos

no ordenamento jurídico pátrio relacionados à matéria ou nos tratados

internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. ”

Não restam dúvidas de que o princípio da boa-fé encontra ampla

aplicação no Marco Civil, inclusive sobre o ponto de vista principiológico.

Assim, à medida que a hermenêutica se despe da tradicional tendência

patrimonial, subjacente à adjetiva civil clássica, passa a reconhecer justa

prevalência dos valores inerentes à dignidade da pessoa humana sobre os

bens materiais. Nessa linha de interpretação, é compreensível que os

princípios formadores do direito contratual instem a sensível mudança na

análise e julgamento dos conflitos de interesse, promovendo releitura do

instituto dos contratos (RELVAS, 2008, p.81). É o que se depreende do

transcrito a seguir:

Marco Civil: Da inclusão de princípios constitucionais, civis e consumeristas (art.3, VIII).

VIII - Liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta Lei.

Parágrafo único. Os princípios expressos nesta Lei não excluem outros previstos no ordenamento jurídico pátrio relacionados à matéria ou nos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. (Grifos nossos)

Não se trata de mera transposição dos princípios básicos, mas de

revolução no paradigma do direito, que alcança todas as áreas. A Lei Maior

encontra-se no ápice do ordenamento jurídico; seus princípios, por

conseguinte, são alicerces também para a reconstrução do modelo de Direito

Privado (MORAES, 2009, p. 68).

Resta evidente que a análise do Marco Civil da Internet deve

necessariamente perpassar pelo respaldo do texto constitucional, e neste

tocante, o art.3º, VIII, é de clareza solar, cabendo à boa fé objetiva, interagir

com os códigos de ética a fim de propiciar a efetividade do direito. Além disso,

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a aplicação da boa-fé objetiva, em conjunto com a lei consumerista, pode

garantir ainda mais a efetividade, mesmo porque há intrínseca relação

contratual do texto legal, baseada na relação contratual estabelecida por meios

eletrônicos.

O uso do universo virtual é repleto de aceitações tácitas; ou seja,

a mera navegação na rede de computadores pode descortinar determinado tipo

de contrato ou declaração positiva ou negativa (MARQUES, 2004, p.99-100).

Explicitando melhor, a abertura de um link web pode indicar um contrato, e

todas as janelas e provenientes de aplicações de internet constituem

subcontratos, como se depreende da interpretação conjunta dos arts.29 e 30

do Código de Defesa do Consumidor.

O art. 29 permite identificar a figura do sujeito ativo da relação de

consumo, quando indica que “equiparam-se aos consumidores todas as

pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas”; ou seja, a

mera exposição da mensagem enseja vínculo jurídico. Em seguida, o art.30

indica que

“Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.”

Esses fundamentos sugerem que, se o art.29 estabelece a

relação jurídica pela mera exposição do consumidor à oferta e o art.30 garante

a vinculação entre publicidade/oferta, pode-se intuitivamente interpretar que

todo conteúdo ofertado pela via midiática constitui uma oferta, e como tal,

torna-se parte integrante pela via direta do instituto dos contratos. A

consequência é, pois seu tratamento garantido pelo princípio da boa-fé

objetiva.

Esse princípio resguarda amplamente direitos do cidadão pelo

simples fato de existir, contrariando a visão retrógrada e meramente econômica

do ter (MULHOLLAND, 2006, p.88).

Tratando do tema, Caitlin Mulholland ressalta:

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“ Junta-se a estes elementos a inegável influência dos fatos sociais, tais como a consolidação de uma sociedade de massa, com produção e o consumo de bens e serviços em grandes proporções, que gerou uma necessária reformulação da teoria contratual, base tradicional de um sistema individualista de direito privado. A percepção de que o sistema jurídico, por ser unitário e, portanto, sistemática e hierarquicamente estabelecido, não poderia mais ser analisado e interpretado em blocos estanques e separados, levou a conclusão de que quando diante de um sistema jurídico fundado em uma norma superior – a Constituição – há que se respeitar os princípios e valores que dela emanam, sob pena de se ver descaracterizado o sentido do sistema do ordenamento. ”

Dessa forma, ocorre agilidade nos negócios jurídicos, como na

hipótese de contrato de adesão que exige intervenção do Estado. Na mesma

linha de raciocínio, vêm a lume as normas jurídicas de ordem pública,

desvelando a proteção dos interesses sociais, difusos, coletivos e individuais

homogêneos. Outro ponto a sublinhar é o deslinde da polêmica sobre o

conteúdo e alcance da função social do contrato (LISBOA, 2012, p. 146).

O art.3º, VIII, quando indica o mais absoluto respeito ao princípio

da boa-fé objetiva interage com a harmonização dos interesses. Tal inferência

encontra substrato nos termos do art.4º, mais especificamente em seu inciso

III, quando garante a

“Harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e a compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios na qual se funda a ordem econômica (art.170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”.

Quando se reflete sobre o exposto, pode-se acrescentar que boa

fé objetiva nada mais é do que evolução do conceito de boa-fé, cujas raízes

estão fincadas no plano psicológico ou intencional (boa-fé subjetiva), para o

plano concreto da atuação humana (boa-fé objetiva). Essa segunda espécie

recebeu influencia católica e cristã na perspectiva do jus naturalismo e se

reveste de nova roupagem, relacionada com a conduta dos negociantes,

denominada de boa-fé objetiva. Por este princípio, exige-se no contrato de

consumo o máximo respeito e colaboração entre as partes. Na circunstância

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de desrespeito à adjetiva consumerista, o ofensor será penalizado com

interpretação contrária (art.47), ou por sanções ligadas à nulidade das

cláusulas ou até do negócio jurídico (TARTUCE & NEVES, 2012, pp. 33-35).

A boa fé objetiva desvincula-se das intenções íntimas do sujeito,

indicando o comportamento adequado aos padrões de ética, lealdade,

honestidade e colaboração desejáveis em qualquer relação jurídica de

consumo. Trata-se de um dos pilares da sociedade civil organizada em termos

de sistematização da ordem jurídica, além do qual não se pode avançar, sem

incorrer em ilicitude (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 39).

Trata-se de nova concepção do contrato, em sua vertente social,

para a qual não só a manifestação da vontade importa, mas sobretudo que os

efeitos do contrato sejam estritamente observados. O ideal do equilíbrio

contratual precisa pautar as relações de consumo e o direito positivo, iluminado

pelos princípios constitucionais, detém força limitadora e legitimadora da

autonomia da vontade. Essa lei protegerá interesses sociais, prezando pela

confiança mútua entre as partes, as expectativas e a boa-fé dos contratantes

(MARQUES, Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 2004, p. 175).

Tratando-se de conceito marcado por valores culturais

tradicionais, por certo, a transformação não será automática. Todavia, o

espaço reservado para que os particulares autorregulem será reduzido por

normas imperativas, atinentes à nova concepção do contrato no Estado Social,

em que a vontade deixa de ser o elemento nuclear, eis que se submete ao

interesse social e à dignidade da pessoa.

Não é ocioso sublinhar que a norma consumerista prevê

intervenção estatal nas relações contratuais que relativiza o antigo dogma da

autonomia da vontade através de novas intervenções de ordem social, com a

imposição de novo paradigma, estimulado pelo princípio da boa-fé objetiva.

Assim concebido, trata-se do contrato, instrumento à disposição dos

integrantes da sociedade de consumo, o qual, como no direito de propriedade,

encontra limites para dar eficácia à sua função social (MARQUES, Contratos

no Código de Defesa do Consumidor, 2004, p. 176).

No que pertine às relações contratuais estabelecidas pela via

digital, esse dever social é ainda mais intenso, pois a autonomia do contratante

virtual é mais sensível, por dois fatores fundamentais: a) ausência de contato

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direto com o bem de consumo, produz incerteza no momento da concretização

do negócio. Esse dilema justifica o direito de arrependimento, tal como previsto

no art.49 da norma consumerista. A ausência de contato interfere em um dos

elementos mais sensíveis para a manifestação da vontade dos contratantes,

qual seja, a exata noção do que se consome; b) com a contratação à distância,

surge a possibilidade de produção de ruído na autonomia da vontade, derivado

da forma e circunstancias pelas quais ocorreu a contratação (contratação

noturna, compra por impulso, utilização de cookies, monitoramento de

navegação, entre outros), ou pela intensidade em que as campanhas de

marketing se apresentam (Black friday, publicidade enganosa por omissão,

sites de compras coletivas, traição virtual, e similares).

4.5 Marco Civil: Responsabilidade conforme atividade do fornecedor

Admitida a perspectiva de novo paradigma de tratamento jurídico,

em que o consumidor virtual é reconhecido como alguém que padece de

vulnerabilidade agravada, o art.3º, VI indica expressamente “a

responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da

lei”.

Diferente das modalidades clássicas de contratação à distância,

como aquelas veiculadas mediante televisão, rádio, correio, entre outros, o

contrato eletrônico propicia ao fornecedor estratégias de marketing agressivo,

com imagens, links e sons, com acentuado poder de persuasão durante 24

horas ininterruptas, a custo extremamente reduzido, com um simples clique no

mouse. Sob essa influência, o consumidor pode encontrar-se diante da

possibilidade de adquirir uma gama de produtos ou serviços das mais variadas

formas, independentemente da localização e do horário, utilizando-se ainda

das mais diversas formas de pagamento (MARQUES, 2004, p.99-100).

O termo “de acordo com as suas atividades”, amplia a aplicação

da norma, eis que “carrega uma dimensão semântica ou axiológica maior do

que a generalidade das disposições normativas” (ABREU, 2009); ou seja, o

inciso trabalha com a hipótese de cláusula aberta, flexível, capaz de adaptar-se

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ao caso concreto, parecendo razoável afirmar que o referido termo se encaixa

perfeitamente na relação de consumo virtual, em que uma atividade específica,

e notadamente discrepante da normalidade das demais relações jurídicas,

merece tratamento mais cuidadoso.

Resta claro que o comércio eletrônico constitui modalidade

peculiar de negócio jurídico e, portanto, merecedora de atenção específica “de

acordo com a atividade”. Trata-se de realidade cada vez mais vibrante, o que

faz sublinhar a importância do estudo e propostas de meios próprios de

contratação.

GONÇALVES (2001, p.224-356) Gonçalves tece considerações

emblemáticas sobre as condições de validade dos contratos eletrônicos e

leciona:

“Não há lei qualquer óbice à utilização, aceitação, validade ou mesmo a obrigatoriedade da proposta efetuada em contratos eletrônicos, os também chamados contratos virtuais, exceto para os casos onde haja formalidade expressa ao meio de realização do ato. (...) a lei brasileira aceita até mesmo a existência de um contrato verbal tácito no qual nem mesmo os registros eletrônicos que podem comprovar a manifestação da vontade na web estão presentes” (GONÇALVES S. R., 2001, p.224-356).

Trata-se de novo dado de realidade, que merece tratamento

especial; o Código de Defesa do Consumidor assegura direitos para alcançar a

igualdade material dos desiguais, garantindo a escolha, reflexão, informação e

transparência para proteger a abalada liberdade ou autonomia de vontade dos

consumidores nos contratos (MARQUES & MIRAGEM, 2012, p.125)

Se o princípio da vulnerabilidade preza por tratamento desigual

aos desiguais, os consumidores virtuais, por terem vulnerabilidade agravada,

são merecedores de maior cautela.

Num esforço de síntese do exposto entende-se que o

encadeamento dos seguintes elementos constitui fonte imprescindível de

resolução de conflitos virtuais: 1 – Auto-regulamentação, 2 – Criação de

Códigos de Ética, 3 – Observância do princípio da boa-fé objetiva em conjunto

com o Marco Civil, os preceitos constitucionais, além do reconhecimento de

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tratamento diferenciado à categoria de consumidores que necessita de atenção

especial devido à vulnerabilidade agravada.

4.6 Medidas educativas

A segunda proposta guarda relação com a criação de medidas

educativas, voltadas à pessoa do consumidor, para que o mesmo possa fazer

escolhas conscientes, ao enfrentar as armadilhas eventualmente presentes no

mercado de consumo virtual. De pronto, expõe-se o que segue, derivado dos

princípios do Pacto Mundial: Devem-se fomentar medidas educativas e de

conscientização destinadas a promover a capacidade de todas as pessoas de

fazer um uso autônomo, independente e responsável da internet

("alfabetização digital").

Antes de qualquer ponderação, é imperioso deixar claro que o

termo inclusão digital, especificamente no que pertine à educação em rede,

deve expressar conceito que encerre consideração humanista. Isso porque o

mundo contemporâneo está imerso em ágeis transformações e tendências de

deterioração das relações humanas, a tal ponto que o resgate de valores “meio

adormecidos”, no afã do desenvolvimento puramente tecnológico e econômico,

precisa ser considerado (SILVA, JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016, p.29).

No livro Verde da Sociedade da Informação no Brasil, organizado

por TAKAHASHI, foi ressaltada a importância da educação, para o bom

desenvolvimento de uma sociedade assentada, entre outras formas, no

convívio virtual:

“A educação é o elemento-chave na construção de uma sociedade baseada na informação, no conhecimento e no aprendizado. Parte considerável do desnível entre indivíduos, organizações, regiões e países deve-se à desigualdade de oportunidades relativas ao desenvolvimento da capacidade de aprender e concretizar inovações. Por outro lado, educar em uma sociedade da informação significa muito mais que treinar as pessoas para o uso das tecnologias de informação e comunicação: trata-se de investir na criação de competências suficientemente amplas que lhes permitam ter uma atuação efetiva na produção de bens e serviços, tomar decisões

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fundamentadas no conhecimento, operar com fluência os novos meios e ferramentas em seu trabalho, bem como aplicar criativamente as novas mídias, seja em usos simples e rotineiros, seja em aplicações mais sofisticadas. Trata-se também de formar os indiví- duos para “aprender a aprender”, de modo a serem capazes de lidar positivamente com a contínua e acelerada transformação da base tecnológica”

Nesse sentido, a proposta de universalização de serviços, constante

do Livro Verde, traz como inerente ao conceito de inclusão digital não só a

aquisição de habilidades básicas para o uso de computadores e da Internet,

mas também a capacitação para utilização dessas mídias, em favor dos

interesses e necessidades individuais e comunitários, com responsabilidade e

senso de cidadania. Essa ação é designada de alfabetização digital pelo

Programa Socinfo (SILVA, JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016).

Pensar a educação na sociedade da informação parte da

consideração de um leque de aspectos relativos às tecnologias de informação

e comunicação, a começar pelo papel que desempenham na construção de

uma sociedade que tenha em pauta a prioridade à inclusão e a justiça social.

Inclusão social prepara o integrante da sociedade para o livre exercício da

cidadania, o que significa que as tecnologias de informação e comunicação

devem ser precipuamente utilizadas para a democratização dos processos

sociais, para fomentar a transparência de políticas e ações de governo e para

incentivar a mobilização dos cidadãos e sua participação ativa nas instâncias

cabíveis (Tadao TAKAHASHI, 2000, p. 45).

As tecnologias de informação e comunicação devem ser utilizadas

em primeiro plano, para integrar a escola e a comunidade, de tal sorte que a

educação mobilize a sociedade e a clivagem entre o formal e o informal seja

vencida. Formar o cidadão não significa tão somente “preparar o consumidor”

para o mercado de consumo: importa promover a capacitação das pessoas

para a tomada de decisões e para a escolha informada acerca de todos os

aspectos na vida em sociedade que as afetam, o que exige o acesso à

informação e ao conhecimento e capacidade de processá-los judiciosamente,

sem se deixar levar cegamente pelo poder econômico ou político (Tadao

TAKAHASHI, 2000).

Desde 2005, o Estado admite que a inclusão digital é fundamental

para o pleno exercício da de cidadania, chegando a criar o Programa de

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Inclusão Digital, através de parceria entre os ministérios das Comunicações,

Educação, Ciência e Tecnologia e Planejamento, Orçamento e Gestão, e

também em empresas públicas e privadas e organizações não

governamentais. As ações governamentais têm o intuito de baratear

equipamentos, criação de locais para acesso gratuito à internet e capacitação

de profissionais atuantes nas escolas públicas, com laboratórios de informática

para promover acesso à internet pela banda larga e capacitação de

professores (ALMENDROS & STRASSER, 2015, p.270).

O Marco Civil da Internet consolida os direitos e deveres de usuários

e de provedores de internet no país, ao mesmo tempo em que ratifica a

essencialidade desse meio de comunicação ao exercício da cidadania. A esse

respeito, destaca-se o que segue:

“Art.2º A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:

II - Os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;

(...)

Art. 4o A disciplina do uso da internet no Brasil tem por objetivo a promoção:

I - Do direito de acesso à internet a todos;

II - Do acesso à informação, ao conhecimento e à participação na vida cultural e na condução dos assuntos públicos;

III - da inovação e do fomento à ampla difusão de novas tecnologias e modelos de uso e acesso; e

IV - da adesão a padrões tecnológicos abertos que permitam a comunicação, a acessibilidade e a interoperabilidade entre aplicações e bases de dados. ”

Reconhecendo essa importância, desde 2005, o Estado tem

atuado, por meio dos Ministérios das Comunicações, Educação, Ciência e

Tecnologia e Planejamento, Orçamento e Gestão, para que esse acesso possa

ocorrer e até regulamentou lei federal para esse fim (ALMENDROS &

STRASSER, 2015, p.271).

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Ao pensar sobre o assunto, ressalta-se não serem raras as

discussões sobre os problemas que envolvem a educação escolar brasileira.

São recorrentes os comentários sobre as deficiências do sistema de ensino

pátrio e dos problemas sociais resultantes dessa realidade (RODRIGUES,

2016).

O impacto de tecnologias de informação e comunicação coloca a

necessidade de se pôr em marcha permanente vigilância quanto aos

resultados da educação, considerando o propósito de equilíbrio dinâmico,

revisão curricular em todos os níveis e áreas. Entre muitos, a análise dos

Parâmetros Curriculares Nacionais (em formulação no momento em que se

conclui esta Tese) deve ser considerada (Tadao TAKAHASHI, 2000, p.49).

FOLEY (1997) indica que a educação por parte das instituições civis

também constitui fonte de amenização dos problemas, pois a formação

midiática deve integrar o planejamento de programas sociais e educativos

empreendidos pelas instituições civis, dentre elas a própria igreja,

compreendidas as escolas católicas. Segundo o autor em tela, o ensino deveria

abranger formação a respeito do papel da publicidade no mundo atual. com

visão alargada o processo deveria incluir a preparação das pessoas para que

se encontrem informadas e vigilantes, tanto perante a publicidade, como outras

formas de comunicação (FOLEY, 1997).

Como admitido em uníssono pelos especialistas no assunto, a

Internet é um ambiente de informação extremamente complexo para quem não

tem familiaridade ou preparo adequado para a busca e recuperação da

informação. Por isso, para haver inclusão digital, é necessária a habilitação ao

acesso à informação na Internet, o que, conforme se observou, é denominado,

pelos programas governamentais, alfabetização digital (SILVA, JAMBEIRO,

LIMA, & BRANDÂO, 2016, p.33).

No livro VII da República 5, PLATÃO (2011, p.279) compara o

mundo sensível a uma caverna em que homens se encontravam acorrentados

e obrigados a contemplar as sombras como se fossem realidade. As sombras

projetadas na parede da caverna representavam a experiência sensível, o

mundo das aparências e do vir a ser. Os objetos verdadeiros, situados no

exterior da caverna, iluminados pelo sol, simbolizavam o mundo das verdades

eternas; isto é, o mundo das ideias governadas pelas ideias do bem. O homem

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no interior da caverna simboliza o estado de ignorância. No entanto, se um

deles se esquivar e atingir a realidade, a educação, que consiste em aplicar os

meios possíveis para dar boa direção à alma do homem, tem o dever de

regressar, para instruir os antigos companheiros sobre a existência de um

mundo superior àquela realidade. O prisioneiro libertado da caverna é

conduzido à luz do sol, através da Filosofia e representa a dialética

transcendente, onde o mesmo tem a responsabilidade de organizar a pólis,

com base no verdadeiro conhecimento. No entanto, ao retornar à caverna,

ofuscado pela luz do sol, os ‘antigos amigos’ consideraram-no desvairado

(LASCH, SANTOS, & SOMAVILLA, 2016, P.2).

Para Platão, entre outros que o seguiram, a educação é pressuposto

essencial na construção de um Estado ético-político (LASCH, SANTOS, &

SOMAVILLA, 2016, p.3). Todavia, garantir acesso universal à educação,

embora necessário, não é o bastante, pois a qualidade de ensino também deve

ser levada em consideração (RODRIGUES, 2016).

Nas sociedades modernas, o fenômeno da caverna não é tão

distante, eis que em um cenário real, pessoas ocupam seus dias inseridos em

realidades virtuais, por meio de recursos tecnológicos, que espelham a sombra

produzida pela caverna de Platão. No entanto, o reflexo é produzido pelas telas

dos telefones celulares que passam a figurar como fonte maior de absorção de

conhecimento e de contato com o mundo exterior.

Ocorre que os problemas estão enraizados na estrutura e

funcionamento da formação em nosso país, que abarcam a precária educação

e desigualdade na distribuição de renda, entre outras mazelas. Se grande

número de pessoas não tem acesso à educação de qualidade, ou são

analfabetas, como poderão usar a internet para autopromoção, inclusive no

mercado de trabalho? Ademais, se no videocurrículo as empresas avaliam o

modo de vestir da pessoa, sua fala, postura, qual será o critério de exigência

em relação às pessoas com alguma característica diferente da média ou do

padrão aceito pela cultura hegemônica? (ALMENDROS & STRASSER, 2015,

p.272)

Quando se fala de educação digital, tem-se em mente um processo

integrado que alcança a sociedade por inteiro, em todas as dimensões, para

orientar-se desse patamar para avançar no sentido de preparar o cidadão para

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lutar por garantir seus direitos, e usufruir deles com responsabilidade

(SANDES, 2012).

Obrigação do Estado, prevista constitucionalmente, (SANDES,

2012), trata-se de compromisso permanente não vinculada a determinada

corrente ideológica ou posição política, mas direito universal conquistado ao

longo da história (SILVA, 2013).

Apesar de “amplamente aceita”, o uso dos meios virtuais ainda

constitui fenômeno recente, se comparado com outras práticas e áreas do

conhecimento humano, requerendo por isso mais ampla e cuidadosa

veiculação e esclarecimentos, seja mediante orientações sistemáticas e

responsáveis, principalmente aos usuários mais novos. Incluem-se nessa

categoria as crianças, que devem ser educadas e conscientizadas para acesso

cauteloso ao ambiente Internet, bem como quaisquer usuários que se disponha

a adquirir bens de consumo, ou fazer outros usos dos meios eletrônicos

(CAMPOS & PRADO, 2016, p.1).

Para estar apto a viver no mundo globalizado atual, com os novos

parâmetros e paradigmas, o navegante deve conhecer a forma de utilização

dos recursos da informática, principalmente o acesso à Internet, para que se

situe em hipotético estado de igualdade, perante os demais integrantes da

sociedade. Apesar de idealmente alcançável, a realidade da população se

distancia do desejável e seu enaltecimento faz parte da criação de uma cultura

transformadora, marcada por incrível velocidade das informações, sem que os

usuários possam assimilá-la (CAMPOS & PRADO, 2016, p.2).

A inclusão digital encerra complexo inter-relacionamento de

conceitos e tem como ponto central a educação para a informação ou

information literacy education” (SILVA, JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016,

p.35).

Nesse sentido, a relação entre inclusão digital e educação para a

informação constitui fator preponderante para a ciência da informação. Como

ciência social aplicada, em consonância com as mudanças na sociedade

contemporânea, a ciência da informação tem enorme papel econômico e

social. Situada no seio de novo projeto de sociedade, ancorado em modelo de

educação que envolve novas e ousadas abordagens também no que se refere

ao acesso à informação (SILVA, JAMBEIRO, LIMA, & BRANDÂO, 2016, p.35).

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Por certo, a educação é requisito de equalização das relações web,

medidas educativas voltadas à população em geral podem cooperar para o

equilíbrio das relações virtuais.

4.7 A adequação do Marco Civil

Outra proposta está voltada à adequação do Marco Civil da Internet,

no que diz respeito ao art.5º, relativo às definições estabelecidas pela norma.

O legislador formulou o texto legal como se transcreve a seguir:

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, considera-se:

I - Internet: o sistema constituído do conjunto de protocolos lógicos, estruturado em escala mundial para uso público e irrestrito, com a finalidade de possibilitar a comunicação de dados entre terminais por meio de diferentes redes;

II - Terminal: o computador ou qualquer dispositivo que se conecte à internet;

III - endereço de protocolo de internet (endereço IP): o código atribuído a um terminal de uma rede para permitir sua identificação, definido segundo parâmetros internacionais;

IV - Administrador de sistema autônomo: a pessoa física ou jurídica que administra blocos de endereço IP específicos e o respectivo sistema autônomo de roteamento, devidamente cadastrada no ente nacional responsável pelo registro e distribuição de endereços IP geograficamente referentes ao País;

V - Conexão à internet: a habilitação de um terminal para envio e recebimento de pacotes de dados pela internet, mediante a atribuição ou autenticação de um endereço IP;

VI - Registro de conexão: o conjunto de informações referentes à data e hora de início e término de uma conexão à internet, sua duração e o endereço IP utilizado pelo terminal para o envio e recebimento de pacotes de dados;

VII - Aplicações de internet: o conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet; e

VIII - Registros de acesso a aplicações de internet: o conjunto de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP.

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O teor do diploma legal em comento permite identificar um conjunto

de definições de termos técnicos, para dirimir eventuais controvérsias futuras

relativas à sociedade da informação. Neste turno, acredita-se necessária a

implementação de mais um inciso na lei, haja vista, a importância e

possibilidade de desvirtuamento do termo Liberdade de Expressão para o

contexto digital. Para os que imaginam não existir a necessidade de tal

definição, esclarece-se que não se pretende definir o termo Liberdade de

Expressão, mas trazer esclarecimentos de forma a distingui-lo de outros como:

Liberdade de Informação, Liberdade de Imprensa e Liberdade de

Comercialização da Expressão.

Esse entendimento é fundamental, quando se contemplam abusos

praticados nas relações de web-consumo. Sendo assim, o Termo

Comercialização da Expressão seria o mais adequado a ser combatido, ante a

possibilidade de ausência de controle da publicidade digital, o que, por

consequência, pode ser fonte de desrespeito aos direitos do web-consumidor.

A doutrina brasileira distingue a liberdade de informação e de

expressão (CARVALHO, 2003). A primeira diz respeito ao direito de comunicar

livremente fatos e ao direito difuso de ser deles informado. A liberdade de

expressão, por seu turno, destina-se a tutelar o direito de externar ideias,

opiniões, juízos de valor, em suma, qualquer manifestação do pensamento

humano. (BARROS0, 2004, p.18)

Além das expressões liberdade de informação e de expressão, há

ainda uma terceira locução que se tornou tradicional no estudo do tema e que

igualmente tem assento constitucional: a liberdade de imprensa. A expressão

designa a liberdade reconhecida aos meios de comunicação em geral de

comunicarem fatos e ideias, envolvendo, desse modo, tanto a liberdade de

informação, como a de expressão. (BARROS0, 2004, p.19)

Partindo de tal perspectiva, LUIS ROBERTO BARROSO assinala

que:

Se de um lado, portanto, as liberdades de informação e expressão manifestam um caráter individual, e nesse sentido funcionam como meios para o desenvolvimento da personalidade, essas mesmas liberdades atendem ao inegável interesse público da livre circulação de ideias, corolário e base de funcionamento do regime democrático, tendo, portanto, uma dimensão eminentemente coletiva, sobretudo

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quando se esteja diante de um meio de comunicação social ou de massa. A divulgação de fatos relacionados com a atuação do Poder Público ganha ainda importância especial em um regime republicano, no qual os agentes públicos praticam atos em nome do povo e a ele devem satisfações (BARROS0, 2004, p.19).

Por sua vez, Liberdade de Comercialização da Expressão se

apresenta como fruto da imensa gama de possibilidades provenientes da oferta

(Artº 30 CDC), seja pela via tradicional, ou pelo exponencial crescimento do

comércio eletrônico. Esse quarto elemento, potencializado pela arquitetura

web, encontra-se situado em um campo híbrido (art.37 CDC), pois, tanto pode

abarcar publicidade enganosa por omissão, bem como certa modalidade de

publicidade abusiva, se admitirmos a hipótese da vulnerabilidade agravada do

web-consumidor.

Movidos pelo cuidado de afastar qualquer possibilidade de confusão

com mecanismo de censura, os legisladores do Marco Civil afirmaram em

vários momentos o direito à liberdade de expressão. De pronto, o art.2º, caput,

disciplinou o uso da internet no Brasil fundamentado pelo respeito à liberdade

de expressão: depois no art.19 declarou que "com o intuito de assegurar a

liberdade de expressão e impedir a censura [...]", e, pela terceira vez o art.3º, I,

previu que um dos princípios do uso da internet no Brasil é a "garantia da

liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento, nos

termos da Constituição Federal" (FLORÊNCIO FILHO, 2016).

Não restam dúvidas quanto a importância do tema por muitos

motivos. Além disso, a má interpretação da liberdade de manifestação de

pensamento não pode servir de anteparo ao desrespeito aos direitos nas

relações de consumo. O uso da “expressão” ou a “comercialização da

expressão” não se confunde com liberdade de expressão, pois os primeiros

trazem consigo carga semântica que tem como pilar a indução comportamental

proveniente de pensamento negocial previamente articulado. Sua natureza é

de ordem negocial.

A distinção é relevante para a preservação da Liberdade de

Expressão, haja vista a possibilidade de que confusão conceitual poderia

enfraquecer o instituto, abrindo margem aos desmandos; aí sim, provenientes

da censura.

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Todo o cidadão tem o direito de se manifestar livremente; no

entanto, de longa data esse direito se faz acompanhar da correspondente

responsabilidade. Caso alguma forma de manifestação produza lesões, o

emissor será alvo de sanções.

Por isso, não se admitem limites à manifestação de pensamento, ou

de imprensa livre, que constituem direitos inerentes à pessoa humana e ao

Estado Democrático de Direito. O esclarecimento legal da divergência entre os

mesmos e a liberdade de comercialização da expressão serve de reforço e

preservação da liberdade de expressão.

Esse argumento repisa a hipótese da existência de publicidade

enganosa por omissão, ressaltando sanções já existentes nos “arts.6º, IV, 30,

36 a 38 do CDC” (DIAS, 2013, p.42), para o tratamento do tema, e, por via de

consequência, resguarda direitos sociais de informação, quando deixa clara a

diferença concreta.

4.8 A identificação da publicidade

Essa regulamentação possui como fundamento a necessária

identificação da publicidade, presente no art.36 do Código de Defesa do

Consumidor, que indica que “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que

o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal. ”. Como se

depreende, trata-se de direito do consumidor a ser observado pelos

fornecedores no momento da comercialização de seus bens de consumo e

resguardados pelo Estado no momento da criação das regras.

Os arts. 9º, caput e §1º, 10, 29 caput e parágrafo único, e 30 do

Código Brasileiro de Auto-regulamentação publicitária, também consagra a

identificação da mensagem publicitária e, especificamente o art.28º acentua

que “o anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua

forma ou meio de veiculação”.

A identificação da publicidade decorre do dever de transparência e

lealdade nas relações de consumo, eis que o ocultamento do caráter

publicitário pode induzir o consumidor a erro quanto à natureza da mensagem,

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na hipótese de fins comerciais, não meramente informativa e desinteressada

(DIAS, 2013, p.65).

4.9 A reinterpretação do direito privado

A presente proposta, antes de mais nada, exige clara e completa

releitura do direito privado, agora mais complexo pela existência do ambiente

virtual. A tensão entre os interesses econômicos dos fornecedores de produtos

e serviços e seus consumidores constitui objeto de regulação do direito do

consumidor virtual. O reconhecimento da desigualdade entre as partes justifica

o estabelecimento de normas protetivas, requerendo a intervenção do Estado

em setores que até então se encontravam confiados à livre iniciativa dos

particulares. (MIRAGEM, 2008, p. 28).

No estado da natureza, tal como definido por Locke, os homens

são todos iguais: por igualdade, entende-se que são iguais no gozo da

liberdade. Tal universalidade não se aplica aos direitos sociais e aos direitos

políticos, diante dos quais os indivíduos são iguais genericamente, mas não

especificamente (BOBBIO, 1992, pp. 70-71). O autor mencionado acrescenta:

“Com relação aos direitos políticos e aos direitos sociais, existem diferenças de indivíduo para indivíduo, ou melhor, de grupos de indivíduos para grupos de indivíduos, diferenças que até agora (e o são intrinsecamente) relevantes. Durante séculos, somente os homens do sexo masculino – e nem todos – tiveram o direito de votar; ainda hoje não tem esse direito os menores, e não é razoável pensar que o obtenham em um futuro próximo. Isso quer dizer que, na afirmação e no reconhecimento dos direitos políticos, não se podem deixar de levar em conta determinadas diferenças, que justificam um tratamento não igual. Do mesmo modo, e com maior evidência, isso ocorre no campo dos direitos sociais. Só de modo genérico e retórico se pode afirmar que todos são iguais com relação aos três direitos sociais fundamentais (ao trabalho, à instrução e à saúde); ao contrário, é possível dizer, realisticamente, que todos são iguais no gozo das liberdades negativas. E não é possível afirmar aquela primeira igualdade porque, na atribuição dos direitos sociais, não se pode deixar de levar em conta as diferenças específicas, que são relevantes para distinguir um indivíduo de outro, ou melhor, um grupo de indivíduos de outro grupo. ”

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Quando o debate aporta ao campo das relações eletrônicas,

acentua-se a discrepância o que justifica tratamento especial ao microssistema

do consumidor regulado pela lei 8078/90.

Suas disposições se aplicam às relações de consumo, excluídas

outras que contrariem seus dispositivos, por tratar-se de um microssistema

multidisciplinar, adernando para questões relativas ao direito civil, penal,

administrativo e processual. Em essência, o Código de Defesa do Consumidor

foi criado para regular por completo as relações jurídicas de consumo

(ANDRADE, 2006, p. 13).

A atenção legal aos diferentes é essencial e, como se registrou,

nas relações de cunho informacional a desigualdade se amplia. SUZANA

CATA PRETA exemplifica com a força da publicidade frente aos meios

jornalísticos. Ela indica que, em 1953, a Standard Oil retirou suas cotas

publicitárias do Diário de Notícias, haja vista denúncia do periódico, envolvendo

personalidade de interesse da empresa. Em outro episódio, também relatado

pela autora mencionada, as empresas Thompson e McCann-Erickson que

dominavam o mercado nos idos de 1950 e 1960, pressionaram o Conselho

Editorial do jornal para seguir a linha que lhes convinha e, dada a negativa,

retiraram as cotas de anúncios, o que levou o periódico à bancarrota

(FEDERIGUI, 1999, p. 13).

A informação ligada à futilidade, à competição, à impotência e à

agressão contida pode ser vetor de compulsão para o sujeito; associada aos

meios de comunicação. Mas, alguns negam os referidos efeitos, sob o

argumento de que se trata de meros fomentadores do diálogo. O que não se

pode descurar é o quanto cada um deles influi na sociedade de massa, com a

qual o argumento psicanalítico coincide, ao sublinhar o quanto tais estímulos

são ingredientes do consumo em si. Enfim, a resposta é mais nebulosa do que

se pode imaginar (FEDERIGUI, 1999, p. 22).

Aliado ao exposto, forma-se uma liturgia em torno do objeto, pois

a transformação do consumidor em relação ao objeto simplesmente mudou. O

objeto não se refere apenas à utilidade específica, eis que alcança o conjunto

de objetos na sua abrangência total. O anúncio publicitário, a firma produtora e

a marca que desempenha papel substantivo impõem uma visão coerente,

coletiva, de uma espécie de totalidade quase que indissociável. É uma cadeia

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que deixa aparecer série organizada de objetos simples e se manifesta com a

aglutinação de objetos significantes, que fazem parte de um subprojeto

integrado, pois a inércia do consumidor pode levá-lo ao constrangimento

(BAUDRILLARD, 2010, p. 16).

É o que acontece exemplarmente no lançamento de novo

aplicativo: se o consumidor não possuir o instrumento digital, parece afastado

de determinado grupo de usuários, os quais privilegiam esse mecanismo de

comunicação. Ao alijar-se dessa dinâmica, o consumidor torna-se alheio do

grupo. Articulado mediante a sociedade digital de consumo.

Eis porque se faz necessária a releitura do direito privado, que

conferia ênfase a indivíduos e grupos específicos (civis), privilegiava outros

(comerciantes, falidos), deixando a maioria excluída da igualdade material

(Crianças, mulheres, escravos e mais recentemente trabalhadores,

consumidores, idosos etc.) MARQUES & MIRAGEM (2012, p. 127). O novo

direito privado e a proteção dos vulneráveis

Diante dessa problemática no âmbito do tradicional direito

privado, admitiu-se a premência de intervenção do Estado, típica do Direito

Público, da hierarquia de suas normas (ordem pública) e da força equalizadora

dos direitos humanos (MARQUES & MIRAGEM; 2012, pp. 127-128). A atuação

do ente estatal se orienta para a efetiva proteção dos direitos de liberdade,

mediante reorganização dos serviços públicos, que deu origem ao Estado

Social (BOBBIO, 1992, p. 72).

Inaugurou-se então o direito privado constitucionalizado. Sua raiz,

por força de imperativo categórico, do direito internacional e do direito

constitucional, espraia-se para todos os ramos do direito. A Declaração dos

Direitos do Homem de 1789, na França, que afirmou pela primeira vez que os

homens nascem livres e iguais em direitos. Consequentemente, a igualdade

pode ser sintetizada por intermédio do ideal do Justo, representado pelos

direitos humanos ou fundamentais (MARQUES & MIRAGEM, 2012, p. 128) O

novo direito privado e a proteção dos vulneráveis.

Por conseguinte, se as bases da sociedade e das instituições

jurídicas são fundadas na liberdade e os critérios libertários encontram-se

mitigados pelas características estruturantes da sociedade da informação, seria

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razoável admitir que os processos de profusão dos novos meios de informação

podem colidir com as instituições jurídicas da sociedade civil.

Segundo GUILHERME MAGALHÂES MARTINS (2014, pp. 4-5) “a

sociedade da informação alterna e dita comportamentos, regendo as formas de

comunicação, os relacionamentos interpessoais, o consumo e a própria vida

em sociedade. ” Ele identifica nova fase na especificação dos direitos humanos

fundamentais, bem como a releitura do direito privado internacional, voltada ao

desenvolvimento das relações que tenham por base a interação das

comunicações, a telemática e as informações em tempo real, com transmissão

on line e assimilação simultânea (MARTINS, Direito Privado e Internet.

A possível colisão entre os meios de informação e os direitos

fundamentais faz com que autores como SOFIA CASIMIRO (2000, p. 19)

assinalem dificuldade no trato de problemas virtuais, que instigam a reflexão de

juristas e exigem a atualização do ordenamento jurídico.

A posição ontológica sustenta a evidência de um mundo “virtual”

diferente do mundo físico, que se sustenta em “paradigmas digitais”,

preenchido por atores sociais denominados de “netcitzens”, os quais lançam

mão de nova linguagem, em espaço e tempo diferentes. No âmbito jurídico, há

quem sustente a evidencia de uma constituição digital, que oportunizará um

direito constituído preponderantemente por normas técnicas que não

careceriam de interpretação, porquanto serão guiadas pela lógica formal.

Nessa perspectiva, haveria juízes virtuais, atuantes na rede, aplicando o direito

de forma automática (LORENZETTI, 2004, pp. 68-69).

Sobre essa perspectiva, ainda pouco discutida, sustenta-se o

Direito que conhecemos. Dado seu caráter inovador, seria forçosa a iniciativa

de muitas adaptações do ordenamento jurídico, para que o mesmo se encontre

apto para dirimir conflitos emanados de contratos de ordem virtual. Nesse

sentido, é clara a analogia entre terra e mar: O direito do “mundo real” emana

dos Estados nacionais, territoriais dentro do qual exercem seus limites. Esse

mesmo direito admite um espaço liberado, que é o mar, sobre o qual não existe

o poder de controle além das áreas próximas da terra firme. Essa analogia abre

espaço à possibilidade de um direito diferenciado, ligado especificamente a

situações dessa natureza (LORENZETTI, 2004, p. 69).

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A adaptação do direito privado é fruto da desdogmatização,

fenômeno da constitucionalização do direito e do paradigma do ser igual

mesmo na diferença (MARQUES & MIRAGEM 2012, pp. 126-127).

Trata-se de condição processante de amadurecimento social,

político, econômico e cultural que haverá de alargar-se por muitas décadas até

a sua mais completa consolidação sob o ponto de vista social (TARTUCE &

NEVES, 2012, p. 4). Trata-se também de um momento de ressignificação da

figura do indivíduo, em que o novo sujeito multiplicou-se entre os muitos

sujeitos individuais, homogêneos, coletivos e difusos, em novo pluralismo que

não impede que recebam e exerçam seus direitos. Ou seja, o sujeito passa a

qualificar-se como tal, quando recebe direitos fundamentais e acaba por

modificar as instituições em que está (MARQUES & MIRAGEM, 2012, p. 126).

No Brasil, ainda subsiste o desafio de concretizar algumas

garantias do consumidor, pois as lesões são perpetradas em larga escala,

sendo insuficiente a efetividade da legislação consumerista. De qualquer forma,

no que toca à defesa de determinados indivíduos, busca-se proteção concreta

e eficaz tomando-se por base as consequências das distorções ao Direito

Privado Contratual (SCHMITT, 2014, p. 43).

4.10 A aplicação do conjunto de propostas

Tendo em vista demonstrar a viabilidade do conjunto de propostas

apresentadas, neste momento da pesquisa, trata-se de tecer alguns

comentários sobre sua aplicação.

Nesse intuito, entre muitos casos presentes no cotidiano do

usuário dos meios eletrônicos, imagine-se o hipotético caso de um consumidor,

que, confiando no sistema de informação do banco, acredita possuir

determinada quantia de dinheiro, quando na realidade, a informação inclui o

valor remanescente do cheque especial. Imaginemos agora, ele tomou um

empréstimo, descontado em folha de pagamento, e isso tudo ocorreu pela via

virtual, seja através de uma confirmação por SMS, e-mail de aceite ou

parcelamento proposto por atendente virtual.

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Agregue-se à dinâmica corriqueira na vida dos clientes das

instituições, as campanhas publicitárias veiculadas pelo banco, nos intervalos

de jogos de futebol ou das novelas, isso quando não estão contidas no interior

das programações, com jogadores de alta popularidade, atores e atrizes

veiculando esse tipo de funcionalidade.

Finalmente, reflita-se sobre situações corriqueiras, em que o meio

de informação em que o consumidor absorve conhecimento, seja ele virtual

(Internet, WhatsApp, SMS) ou físico (jornais de papel), afiançam, mediante

dados supostamente confiáveis, fornecidos por especialistas, os quais

comentam que o momento econômico é propício à tomada de crédito.

Todas essas hipotéticas situações aqui trazidas a guisa de

exemplo são habituais no cotidiano dos consumidores virtuais, e constituem

problemas concretos que merecem atenção cuidadosa, tendo em vista a

proteção dos direitos do consumidor cuja vulnerabilidade é agravada.

O deslinde de alguns casos já encontra respaldo jurisprudencial,

como se demonstra em decisão do STJ transcrita a seguir:

“APELAÇÃO. AGRAVO INTERNO. Relação de consumo.

Superendividamento. Limitação da margem de consignação em 30%

dos rendimentos do autor. Princípio constitucional da dignidade

humana. Preservação do mínimo existencial. A Medida Provisória nº

2.215/01 em seu artigo 14, não autoriza os descontos facultativos

acima de 30% e sim, assegura ao servidor militar o recebimento de

quantia mínima que garanta a sua sobrevivência. ”

(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão. Recurso Especial

nº1.598.124/RJ. 1ª Turma. Relator Min. Sergio Kukina. DJU, Brasília,

24 mai. 2016.)

No entanto, em que pese o respeito relativo ao mínimo

existencial, parece que a resposta é restrita, ou seja, embora exista um fator

objetivo (percentual de 30%), o referido julgado não leva em consideração

elementos subjetivos, capazes de produzir resultado indesejado para o

consumidor. Isso representa acreditar na razão teórica que, nas palavras de

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154

LENIO STRECK “é o mesmo que acreditar na possibilidade de respostas antes

mesmo das perguntas” (Streck, 2013, p.1429).

Levando em consideração que “não há como definir aplicações da

lei em abstrato” (Streck, 2013, p.1429), destacam-se os fatores subjetivos

responsáveis pela constatação da vulnerabilidade agravada, e, logo em

seguida, as propostas concretas para a resolução de problemas advindos da

ausência de informação na sociedade da informação.

4.11 Critérios de convergência da vulnerabilidade agravada

Analisando os dispositivos legais que consagram a

vulnerabilidade agravada (37 §2º e 39 §4º), o informativo 524 do STJ e o art.31

do CDC, mais especificamente no que tocante à necessidade de informações

claras no momento da oferta, depreende-se que qualquer tipo de descuido no

que diz respeito à prestação da informação, pode ser capaz de produzir um

ruído no ato jurídico, e, se assim ocorre, faz-se necessária a identificação dos

elementos responsáveis pelo tratamento diferenciado.

O art.37 trata da peculiaridade da publicidade abusiva, indicando

os traços marcantes da abusividade relativa ao marketing, capazes de produzir

a referida vulnerabilidade agravada:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

Referindo-se ao conceito de debilidade, BENJAMIM et al. (2011,

p.348) esclarecem que a categoria dos mais frágeis compreende “os doentes,

as crianças, os idosos, os crédulos, os ignorantes ou os de pouca instrução”.

O pensador mencionado respalda a fragilidade da figura do consumidor virtual,

quando exemplifica: “Os consumidores de uma região recém-afetada por

incêndio são mais vulneráveis a exageros publicitários de produtos contra tal

fenômeno”, deixando clara a inexistência de exclusividade da aplicação da

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vulnerabilidade agravada, seja ela para idosos, crianças ou até mesmo doentes

(BENJAMIM, et al., 2011, p.348).

Por suas palavras, verifica-se a existência de elementos

subjetivos capazes de deflagrar a sutil modalidade de vulnerabilidade, onde

“não se exige que a “maioria” dos consumidores seja atingida pela capacidade

de induzir em erro”. Para uma perfeita compreensão, é necessário

fundamentar a avaliação em dois critérios: o primeiro é de natureza objetiva,

relacionado ao modus operandi da publicidade, ao passo que segundo, de

ordem subjetiva, pois se relaciona-se com o tipo do consumidor atingido, ou

atingível. Consequentemente, “uma mensagem pode não ser enganosa para

um grupo, mas perfeitamente identificável em função das características do

outro grupo” (BENJAMIM, et al., 2011, p.348).

Ressalte-se que para a caracterização da publicidade enganosa,

não existe sequer a necessidade da intenção de enganar, portanto dispensado

o argumento da boa ou má-fé, mais adequado ao direito penal. Em se tratando

de relação de consumo, sempre que o anúncio for capaz de induzir o

consumidor ao erro, estará caracterizada a publicidade enganosa (BENJAMIM,

et al., 2011, p.345).

É evidente a possibilidade de aplicação do conceito de

vulnerabilidade agravada a consumidores unidos por um elemento subjetivo

deflagrador da vulnerabilidade.

Ademais, o art.39 indica os elementos objetivos que dão

fundamento para a vedação da prática comercial:

 Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

       IV - Prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

Como fica claro, o legislador confere ênfase aos potenciais

atingidos pela prática da publicidade; ou seja, crianças, idosos, doentes,

pessoas movidas por sua condição social e finalmente os que não possuem um

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conhecimento adequado do objeto da relação. Sem sombra de dúvidas, os

critérios arrolados aplicam-se perfeitamente ao consumidor virtual.

Aprofundando a reflexão, é interessante assinalar como o

problema é tratado no direito comparado. Para ilustrar, refere-se que a

Suprema Corte Americana indicou objetivamente o âmbito da publicidade

abusiva, quando afirmou que “abusivo seria aquilo que ofende a ordem pública,

o que não é ético, bem como, o que causa dano aos consumidores. ”

(BENJAMIM, et al., 2011, p.354)

Note-se que a definição, de conteúdo mais abrangente do que se

expôs anteriormente, proporciona alicerce ao tratamento que se sugeriu em

relaçao ao consumidor virtual, tanto no que toca à ordem pública, em função do

disposto no art.1º do CDC, pois “o mesmo é uma norma de ordem pública e

principiológica” (TARTUCE, 2012, p.9), quanto à ética.

A esse respeito, reitera-se a importância da ética como

substrato,ao adequado desenvolvimento das relações de consumo virtual.

Outro ponto objetivo a examinar é a ausência de conhecimento,

ou falha de informação.

Nessa perspectiva, o Código de Defesa do Consumidor no art.31

e o Superior Tribunal de Justiça em seu informativo de nº 524 se

complementam:

“Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores. ”

Como se demonstrou, o art.31 traz um rol meramente

exemplificativo, pois indica que a omissão de qualquer tipo de dados prejudica

a viabilidade da oferta. Com base nessa premissa, é pertinente trazer à colação

o que segue:

É direito básico do consumidor a “informação adequada e clara sobre

os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de

quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem

como sobre os riscos que apresentem” (art. 6º, III, do CDC). Assim, o

direito à informação confere ao consumidor uma escolha consciente,

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permitindo que suas expectativas em relação ao produto ou serviço

sejam de fato atingidas, manifestando o que vem sendo denominado

de consentimento informado ou vontade qualificada. Diante disso, o

comando legal somente será efetivamente cumprido quando a

informação for prestada de maneira adequada, assim entendida

aquela que se apresenta simultaneamente completa, gratuita e útil,

vedada, no último caso, a diluição da comunicação relevante pelo uso

de informações soltas, redundantes ou destituídas de qualquer

serventia. Além do mais, o dever de informar é considerado um modo

de cooperação, uma necessidade social que se tornou um autêntico

ônus pró-ativo incumbido aos fornecedores (parceiros comerciais, ou

não, do consumidor), pondo fim à antiga e injusta obrigação que o

consumidor tinha de se acautelar (caveat emptor). Além disso, o art.

31 do CDC, que cuida da oferta publicitária, tem sua origem no

princípio da transparência (art. 4º, caput) e é decorrência do princípio

da boa-fé objetiva. Não obstante o amparo legal à informação e à

prevenção de danos ao consumidor, as infrações à relação de

consumo são constantes, porque, para o fornecedor, o lucro gerado

pelo dano poderá ser maior do que o custo com a reparação do

prejuízo causado ao consumidor. Assim, observe-se que o dever de

informar não é tratado como mera obrigação anexa, e sim como

dever básico, essencial e intrínseco às relações de consumo, não

podendo afastar a índole enganosa da informação que seja

parcialmente falsa ou omissa a ponto de induzir o consumidor a erro,

uma vez que não é válida a “meia informação” ou a “informação

incompleta”. Com efeito, é do vício que advém a responsabilidade

objetiva do fornecedor. Ademais, informação e confiança entrelaçam-

se, pois o consumidor possui conhecimento escasso dos produtos e

serviços oferecidos no mercado. Ainda, ressalte-se que as leis

imperativas protegem a confiança que o consumidor depositou na

prestação contratual, na adequação ao fim que razoavelmente dela

se espera e na confiança depositada na segurança do produto ou do

serviço colocado no mercado. Precedentes citados: REsp 586.316-

MG, Segunda Turma, DJe 19⁄3⁄2009; e REsp 1.144.840-SP, Terceira

Turma, DJe 11⁄4⁄2012. REsp 1.364.915-MG, Rel. Min.

Humberto Martins, julgado em 14/5/2013.

Depreende-se da leitura que o informativo 524, além de espelhar

a essência dos dispositivos supra, indica que elementos subjetivos

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intrinsecamente ligados ao meio em que o consumo se desenvolve, e que,

fogem ao critério já aceito de vulnerabilidade agravada (crianças, idosos e

doentes), são capazes de permitir aplicação diferenciada da norma para outros

grupos, os quais, devido à ausência de informação, devem ser considerados

como mais vulneráveis do que a média.

Demonstrada a existência da vulnerabilidade agravada bem como

os instrumentos jurídicos disponíveis para tratamento do tema, quais sejam:

Implementação da auto-regulamentação, efetividade dos códigos de ética pela

aplicação do princípio da boa-fé objetiva e adequação da norma à exigência da

identificação da publicidade, situações que aparentemente até então

encontravam dificuldade de resolução, poderiam amplamente receber o

amparo dos novos meios.

Assim, por analogia, merecem particular cuidado casos como

Cookies (MARQUES R. D., 2015), Publicidade subliminar (VERAS & BRITO,

2015), Superendividamento (ALMEIDA, 2015), Manipulação de preferências

(CARVALHO M. M., 2015), Reveng porn (UNSER & SOBRINHO, 2015), honra

e internet (COSTA, 2015), papel social do internauta (construção de vínculos

em redes) (BARROS & RICHTER, 2015), nano tecnologia (FUMAGALI &

OLIVEIRA, 2015), postagem de conteúdos ilícitos (LEAL & ANSELMO, 2015),

analfabetismo digital (ALMENDROS & STRASSER, 2015), pessoas

monitoradas por sensores (ALMENDROS & STRASSER, 2015).

Por fim, parece evidente que a problemática é complexa, de

magna amplitude e, considerando o dinamismo da evolução dos meios

eletrônicos, da publicidade e do aumento da abrangência de consumidores

virtuais, é premente a aplicação de princípios na análise dos casos concretos,

na circunstancia de aparentes lacunas na legislação. O primordial é que em

todos os casos, o consumidor virtual tenha seus direitos protegidos, na esteira

da constitucionalização do direito.

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CONCLUSÃO

A construção de tese doutoral pressupõe elementos

indispensáveis, tais como, originalidade, viabilidade e relevância social e

acadêmica. No desenvolvimento da investigação, fatores relacionados com a

essência da pesquisa propiciam novos rumos ao pensamento inicial,

identificação de fontes até então desconhecidas, entre outros desafios

pertinentes à investigação científica jurídica e de outras áreas. No presente

trabalho não foi diferente...

Entre outros pontos a destacar no momento de formular a

conclusão (sempre provisória, devido ao dinamismo do objeto da pesquisa),

ressalta-se a premência de expor em breves linhas os achados primordiais,

respeitando o fio condutor do raciocínio, pois, ao contrário do que se

imaginava, um número razoável de respostas passou a figurar como elemento

tangível de propostas ao tratamento do problema norteador.

De pronto, cumpre mencionar que são múltiplas as possibilidades

de enfrentamento da gama de desafios produzidos pelo consumo virtual e uso

da internet.

Em homenagem à coerência indispensável na aplicação do

direito, encontrou-se robusto alicerce na doutrina que fortalece a dimensão

principiológica e a constitucionalização do direito, que se mostram competentes

para o fim a que se destina a ética na proteção do consumidor virtual.

Com esse fundamento, entre outros de natureza doutrinária e

jurisprudencial, perseguiram-se os objetivos específicos reitores dos diferentes

capítulos da tese.

No que se relaciona com a vulnerabilidade na sociedade da

informação, as fontes consultadas indicam que o desenvolvimento do processo

comunicacional e das novas tecnologias, mormente a publicidade e marketing

exercem influência no comportamento individual e no imaginário coletivo no

seio de uma sociedade que se torna cada vez mais consumista.

Na esteira do consumo desenfreado, sob efeito da publicidade,

elemento chave do capitalismo contemporâneo, encontra-se a raiz da

vulnerabilidade fática dos consumidores. Contudo, é forçoso acrescentar que o

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estudo desvelou modalidade peculiar de vulnerabilidade no âmbito da

sociedade da informação, propiciando azo a uma relação jurídica

particularmente frágil. Trata-se de interação situada em região diferenciada,

híbrida, que pode ser designada como vulnerabilidade agravada do consumidor

virtual.

Com respaldo nessa problemática, conferiu-se relevo aos

requisitos éticos e sócio-políticos culturais da sociedade da informação,

considerando que, desde os pensadores clássicos, há fundamentos sócio-

filosóficos e políticos como requisitos norteadores das interações entre

indivíduos e grupos.

Não obstante o vigoroso embasamento teórico disponível,

verificou-se que a sociedade contemporânea enfrenta crise de valores, num

processo transitório cuja evolução ainda desconhecida motiva justificada

preocupação. Diante de tão elevado dilema, assumiu-se a perspectiva

multidisciplinar pautada nos requisitos éticos e sócio-político-culturais que

precisam nortear o convívio entre as pessoas e grupos, inclusive quando se

relacionam através de meios eletrônicos.

Na análise das relações de consumo virtual, atribuiu-se relevo à

liberdade de expressão, ao tratamento isonômico, o qual exige tratamento

diferente aos desiguais, que operam perante a lógica dos mercados. Nesse

passo, também se sublinhou a garantia de igualdade no acesso à informação.

No que tange à proteção ao consumidor vulnerável, evidenciou-se

igualmente o imperativo categórico da ética e dos princípios de liberdade

responsável, igualdade e fraternidade/solidariedade nas relações de consumo.

Sendo assim, defendeu-se a tutela dos direitos individuais e coletivos dos

consumidores virtuais, particularmente de grupos considerados

hipervulneráveis nas relações de consumo. Com esse intuito, recorreu-se a

sólidos argumentos pautados nos ordenamentos jurídicos e na ética norteada

pela dignidade da pessoa humana.

Do conjunto de achados da investigação, derivou-se um conjunto

de propostas para a solução de conflitos suscitados em contratos estabelecidos

ou induzidos no ambiente virtual. Em síntese, as conclusões e propostas são

as seguintes:

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1) De todo o conjunto de normas jurídicas nacionais e internacionais,

inexiste tratamento explícito reconhecendo direitos específicos aos

consumidores de produtos ou serviços ofertados pela internet.

2) Que existe uma espécie de vulnerabilidade agravada do web-

consumidor resultante do avanço tecnológico e das regras gerais de

mercado.

3) O Sistema Universal de Direitos Humanos, através da Declaração

Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional dos Direitos

Civis e Políticos, indica como um de seus preceitos a Liberdade de

Expressão, e por via de consequência, todas as construções jurídicas

imanentes ao tema, oscilam ao redor dogmático do referido instituto

previsto pelo sistema.

4) Que o Livro Verde da Sociedade da Informação do Brasil se coaduna

com o sistema universal de proteção aos Direitos Humanos.

5) Que os princípios elencados na declaração conjunta sobre liberdade de

expressão e internet emitidos pela Organização das Nações Unidas

(ONU), pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa

(OSCE), pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e ainda pela

Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) em

conjunto com o teor do Livro Verde, dão respaldo às principais respostas

relativas à proteção dos direitos do consumidor virtual.

6) Que o Marco Civil da Internet, em seus fundamentos, princípios e

objetivos, ao dialogar com o Código de Proteção e Defesa do

Consumidor e a Constituição da República, apresenta meios de

dissociação da Liberdade de Expressão da Liberdade de

Comercialização da Expressão, além de produzir respostas

principiológicas capazes de dar maior efetividade ao consumo na

internet.

Diante das conclusões parciais, apresentam-se as seguintes propostas:

1) A primeira defende a auto-regulamentação, mediante a implementação

de códigos de ética. A conjugação desses elementos leva em

consideração que os postulados éticos possuem características

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deontológicas, balizadas pelos fundamentos e sistemas morais. Nesse

passo, a criação de códigos de ética empresarial para a sociedade da

informação pode operar como normatização interna do princípio da boa-

fé objetiva peculiar aos contratos.

2) A segunda proposta preconiza a adoção de medidas educativas,

capazes de formar o senso crítico e o exercício da cidadania consciente

no mercado de consumo virtual. Tal proposta reveste-se de concepção

humanista e inclusiva.

A terceira e proposta ampara-se na defesa da implementação normativa

de mais um inciso no art.5º do Marco Civil da Internet, no intuito de

esclarecer eventuais divergências entre os termos Liberdade de

Expressão e Liberdade de Comercialização da Expressão, além de

solucionar controvérsias em relação ao tratamento do web-consumidor.

Isso posto, acredita-se ter cumprido o objetivo de propor a

incorporação conceitual dos direitos dos consumidores de produtos e serviços

ofertados pela internet, de forma explícita, além de indicar meios alternativos

de resolução de conflitos, como pilares para ampliar a eficácia do direito

fundamental à Defesa do Consumidores, relacionada à sua proteção no

mercado de consumo virtual.

Em livre adaptação de fragmento da obra de Fernando Pessoa,

cumpre anotar: “[...] Há metafísica bastante em não pensar em nada [...]”, que

do vazio paradigmático metafísico do não pensar, já pensando em algo,

venham respostas puras, livres, capazes de devolver ao cidadão seu estado

natural, um estado de consciência que seja capaz de nortear sua existência

enquanto consumidor, que liberte o mesmo de suas paixões de consumo,

ampliando sua consciência sobretudo no que diz respeito às suas escolhas. –

Audácia!

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