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Uma arma contra bactéria resistente a antibióticos Por Clara Barata SEXTA-FEIRA 22/01/2010 Faz lembrar a medicina mágica do Star Trek, mas é bem real: uma equipa internacional, com cientistas portugueses, desenvolveu um método para fazer o retrato genético completo das bactérias Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (as temidas bactérias resistentes a múltiplos antibióticos, contraídas em meio hospitalar, conhecidas pela sigla MRSA). Consegue-se identificar não só a história da epidemia, os saltos que as bactérias deram entre continentes, como a viagem que fazem de pessoa para pessoa, de enfermaria para enfermaria. O trabalho é relatado hoje, na revista Science, e tem na verdade duas partes. Uma tem por base a biblioteca de amostras de MRSA do Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ITQB), em Oeiras, explicam Hermínia de Lencastre e Susana Gardete, co-autoras do estudo, a partir de Nova Iorque, da Universidade Rockefeller, a sua outra filiação. Estas amostras "foram recolhidas em diferentes países, como Portugal, Brasil, China, Argentina, República Checa, Turquia, EUA e Dinamarca, durante 20 anos (1982-2003). Caracterizámos molecularmente as estirpes, determinámos a sua resistência a diferentes classes de antibióticos, reunimos toda a informação clínica e demográfica dos doentes e preparámos o ADN a sequenciar pelo Instituto Sanger", no Reino Unido, explicam as cientistas por e- mail. Este material permitiu estabelecer uma árvore evolutiva da bactéria - de uma das suas estirpes, denominada ST239 ou clone Brasileiro, hoje responsável por 90 por cento das infecções na China e provavelmente na Ásia continental, escrevem os investigadores. Em Portugal, foi dominante de meados dos anos 90 até 2000, mas hoje já não é. "Uma das conclusões é que o clone terá tido origem na Europa, migrando para a América do Sul e Ásia, evoluindo depois

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Uma arma contra bactéria resistente a antibióticosPor Clara Barata

SEXTA-FEIRA 22/01/2010

Faz lembrar a medicina mágica do Star Trek, mas é bem real: uma equipa internacional, com cientistas portugueses, desenvolveu um método para fazer o retrato genético completo das bactérias Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (as temidas bactérias resistentes a múltiplos antibióticos, contraídas em meio hospitalar, conhecidas pela sigla MRSA). Consegue-se identificar não só a história da epidemia, os saltos que as bactérias deram entre continentes, como a viagem que fazem de pessoa para pessoa, de enfermaria para enfermaria.

O trabalho é relatado hoje, na revista Science, e tem na verdade duas partes. Uma tem por base a biblioteca de amostras de MRSA do Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ITQB), em Oeiras, explicam Hermínia de Lencastre e Susana Gardete, co-autoras do estudo, a partir de Nova Iorque, da Universidade Rockefeller, a sua outra filiação.

Estas amostras "foram recolhidas em diferentes países, como Portugal, Brasil, China, Argentina, República Checa, Turquia, EUA e Dinamarca, durante 20 anos (1982-2003). Caracterizámos molecularmente as estirpes,

determinámos a sua resistência a diferentes classes de antibióticos, reunimos toda a informação clínica e demográfica dos doentes e preparámos o ADN a sequenciar pelo Instituto

Sanger", no Reino Unido, explicam as cientistas por e-mail.

Este material permitiu estabelecer uma árvore evolutiva da bactéria - de uma

das suas estirpes, denominada ST239 ou clone Brasileiro, hoje responsável por 90 por cento das infecções na China e provavelmente na Ásia continental, escrevem os investigadores. Em Portugal, foi dominante de meados dos anos 90 até 2000, mas hoje já não é. "Uma das conclusões é que o clone terá tido origem na Europa, migrando para a América do Sul e Ásia, evoluindo depois independentemente na Europa, América do Sul e Ásia", dizem as cientistas.

A segunda parte do estudo baseia-se nos avanços da tecnologia, que permite sequenciar rapidamente todo o genoma da bactéria, e não apenas alguns pedaços, como até agora, por um preço razoável (cerca de 320 dólares). Com o que aprenderam sobre a taxa evolutiva da MRSA, graças à base de dados portuguesa, será possível refazer o trilho de uma infecção, tirando lições para evitar futuros surtos.