ZÍLIO, Rodrigo Lopes. Direito eleitoral. 4. ed. Porto Alegre

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Rodrigo López Zilio DIREITO ELEITORAL Noções Preliminares Elegibilidade e Inelegibilidade Processo Eleitoral (da convenção à diplomação) Ações Eleitorais 4 a Edição (revista e atualizada) BIBLIOTECA TRE - RS Verbo Jurídico editora

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Rodrigo López Zilio

DIREITOELEITORAL

Noções Preliminares

Elegibilidade e Inelegibilidade

Processo Eleitoral (da convenção à diplomação)

Ações Eleitorais

4a Edição

(revista e atualizada)

B I B L I O T E C ATRE - RS

Verbo Jurídicoeditora

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DIREITO ELEITORAL Rodrigo López Zilio

O desiderato do legislador constituinte derivado não restou, de modoalgum, afetado ou relativizado pelo teor da Súmula 13 do TSE135, a qual visou,apenas, afastar a possibilidade de fundamentar a causa de pedir da impugna-ção de registro de candidato com base em alegações sobre a vida pregressa docandidato ou ausência de moralidade para o exercício do mandato. O TSE refe-rendou que "o art 14, §9B, da CF não é auto-aplicável" e "na ausência de lei com-plementar estabelecendo os casos em que a vida pregressa do candidato implica-rá inelegibilidade, não pode o julgador, sem se substituir ao legislador, defini-los"(Recurso Ordinário nQ 1.069 - j. 20.9.2006 - Rei. Marcelo Ribeiro). Então, foiajuizada arguição de descumprimento de preceito fundamental, sustentando aauto-aplicabilidade do art. 14, §9S, da CF, por força da redação dada pela EC n2

04 e, por conseqüência, a inviabilidade de candidatura de quem ostente vidapregressa incompatível com a moralidade e a probidade administrativa. O STF,porém, julgou improcedente o pedido formulado, porque "desautorizado tantopelo postulado da reserva constitucional de lei complementar quanto por cláusu-las instituídas pela própria Constituição da República e que consagram, em favorda pessoa, o direito fundamental à presunção de inocência [CF, art. 5g, LVH), eque lhe asseguram, nas hipóteses de imposição de medidas restritivas de quais-quer direitos, a garantia essencial do devido processo" (ADPF ns 144 - Rei. Celsode Mello-j. 06.08.2008).

Em junho de 2010, veio à lume a LC nQ 135/10 que, em síntese, estabe-leceu hipóteses de inelegibilidade com base na vida pregressa incompatívelpara o exercício do mandato, notadamente através da restrição à capacidadeeleitoral passiva a partir de condenação proferida por órgão colegiado.

4.3.6.1 Na Constituição Federal

A Constituição Federal, embora de modo assistemático, previu deter-minadas hipóteses de inelegibilidade, entendida tal expressão na acepção maisampla possível - de modo a englobar a ausência dos pressupostos de elegibili-dade ou a incidência de uma causa de inelegibilidade. Tal proceder do legisla-dor constitucional criou embaraços e impropriedades interpretativas severasque acarretam, ainda, discussões e polêmicas em relação à matéria.

São as seguintes as hipóteses de inelegibilidades arroladas pelo legis-lador constituinte:

Art. 14. (...) §4°. São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos

135 Súmula 13 do TSE. "Não é auto-aplicável o §9? do art. 14 da Constituição, com a redação da Emenda Constitucio-nal de Revisão n? 04/94"

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Consagrada a distinção conceituai entre condições de elegibilidade ehipóteses de inelegibilidade, parece claro que a norma sob análise não trata deinelegibilidade (em sentido estrito) como sugere uma interpretação estrita-mente literal; ao revés, a previsão estabelecida pela norma constitucional, emverdade, refere-se à ausência de condição de elegibilidade.

É voz corrente, inclusive na jurisprudência136, uma análise crítica daredação dada ao §4° do art. 14 da CF, já que a inalistabilidade não se caracteri-za como uma inelegibilidade, porquanto o alistamento é condição de elegibili-dade (art. 14, §3Q III, da CF). Sendo a alistabilidade um requisito de condição deelegibilidade, evidente negar-se a capacidade eleitoral passiva de quem sequerostenta a condição de eleitor. Enquadram-se na categoria de inalistáveis: aque-les que tem os seus direitos políticos suspensos (art. 15 CF), enquanto duraresta situação; os menores de 16 anos; os estrangeiros e os conscritos durante oserviço militar obrigatório (art. 14, §2°, CF).

O comando normativo constitucional nega capacidade eleitoral passivaaos analfabetos. Inexiste, no direito brasileiro, uma clara identificação e concei-tuação do que seja urna pessoa analfabeta. Tratando-se de norma que visa aassegurar a participação política e adotado o regime da democracia represen-tativa, deve-se considerar que, apenas, o totalmente analfabeto - ou seja, aque-le que não consegue exprimir um sentido mínimo às palavras escritas ou lidase não possui capacidade alguma de compreender o teor de um texto simplório- deve ter sua capacidade eleitoral passiva restringida. Neste passo, necessita-se de uma correta distinção entre o analfabeto e o semi-alfabetizado; àquele,nega-se a capacidade eleitoral passiva, que é permitida a este último. Consoan-te TÁVORA NIESS, "assim como o alfabetizado é aquele que sabe ler e escrever,analfabeto é a pessoa totalmente desprovida desses conhecimentos. Consequen-temente, quem tem tímidas noções de escrita e/ou da leitura, quem lê, emboracom dificuldade, mas quem consegue apreender o sentido de um texto simples,quem escreve mal, com muitos erros de grafia, conseguindo, entretanto, expres-sar um sentimento lógico, não é analfabeto e, portanto, tem direitos políticosplenos" (p. 110). Nesta quadra, tem sido admitida a elegibilidade do analfabetofuncional - que, embora com capacidade de leitura de palavras simples e frasescurtas, não possui habilidade mínima na interpretação de textos e, pois, nãoconsegue um desejável desenvolvimento profissional ou pessoal.

De regra, quando do registro da candidatura, o requerente já acostarádocumentação comprobatória de sua condição de escolaridade e, assim, espan-cará qualquer dúvida sobre a satisfação do requisito exigido pela norma consti-

136 O Ministro Sepúlveda Pertence, nos autos da ADIN 1063, observou a "impropriedade terminológica, no art. 14,§4°, de chamar de 'inelegibilidade' a alistabilidade e alfabetização do eleitor, quando a alfabetizoção, à luz dadistinção conceituai, seria claramente uma condição de elegibilidade, e a alistabilidade é menos que isso: é um pré-requisito de uma condição de elegibilidade, que é o alistamento".

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tucional. Nesta senda, aliás, as resoluções expendidas pelo TSE, para regula-mentar as eleições, têm exigido a apresentação do comprovante de escolarida-de ou, alternativamente, declaração de próprio punho (art. 27, inciso IV, e §49,da Resolução nQ 23.405/14 do TSE), como forma de suprir o estabelecido pelaCarta Republicana. É prevista, ainda, subsidiariamente, a possibilidade de afe-rição, por outros meios, da condição de alfabetizado, o que importa no reco-nhecimento da aplicação dos denominados "testes de alfabetizacão". Portanto,a mens legis é que a aferição da alfabetizacão através do teste a ser aplicadopela Justiça Eleitoral é subsidiária à exigência da comprovação por outros mei-os documentais - seja através de certificado escolar ou da declaração escritapor próprio punho pelo candidato. Porém, este último procedimento podelevar à situações limítrofes de dúvida acerca do implemento do requisito daalfabetizacão; em hipóteses tais, razoável a submissão do candidato ao teste dealfabetizacão.

De fato, havendo dúvida razoável na implementação do requisito exi-gido, é facultado, ao Juiz Eleitoral, a aplicação de teste de alfabetizacão, o qualdeve consistir em proposições simples, de trato do cotidiano dos cidadãos co-muns, evitando situações complexas ou subjetivas. O desiderato do teste dealfabetizacão, diversamente de um concurso público, não é a seleção dos maisaptos; ao revés, o objetivo é, apenas, afastar do processo de participação popu-lar aquele que seja considerado analfabeto. Não se trata, portanto, de processode seleção qualificativo, com a finalidade de escolher os mais aptos, e sim demeio de afastamento daqueles que se enquadrem como analfabetos, eis quedespidos da apreensão mínima da escrita e da leitura. Incumbe ao eleitor,quando do pleito, manifestar sua opinião sobre as qualidades de determinadocandidato, para o fim de representação popular. Deste modo, embora reco-mendável que os exercentes de mandatos eletivos tenham noções consolidadasde escrita e leitura - até mesmo porque, no caso do Poder Legislativo, uma dasincumbências é o processo legislativo - não é tarefa da Justiça Eleitoral efetuareste juízo de valor quando dos testes de alfabetizacão. É do eleitor, repita-se, atarefa de, através do voto, revelar sua opção àquele candidato que julgue maisqualificado. Não é possível à Justiça Eleitoral, quando da realização do teste dealfabetizacão, antecipar esta avaliação, ainda mais quando o juízo técnico domagistrado é completamente diverso da íntima convicção pessoal do eleitor.Se, do resultado do teste, importar o reconhecimento de noção básica - emboraprecária - da escrita, leitura e da compreensão de um texto por parte do pre-tenso candidato, não é possível negar-lhe a capacidade eleitoral passiva, já quebasta a condição de semi-alfabetizado para o implemento deste requisito. Alegalidade dos testes de alfabetizacão é largamente reconhecida pela jurispru-

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dência, a qual tem vedado a aplicação de testes públicos, coletivos e que, dealgum modo, violem o princípio da dignidade da pessoa humana137.

O exercício anterior de mandato eletivo torna dispensável a submissãodo candidato ao teste de alfabetização ? A comprovação da alfabetização, porse caracterizar como pressuposto de elegibilidade, não pode ser dispensadapor mera presunção, ainda que calcada no exercício anterior de mandato eleti-vo. Ou seja, não há como cogitar de direito adquirido à implementação da alfa-betização, porquanto a noção de direito adquirido está adstrita ao exame dalegalidade da norma. Ademais, o exercício anterior de mandato eletivo nãosupre a comprovação da alfabetização pela simples razão que tal requisitopode não ter sido aferido com as cautelas necessárias por ocasião do deferi-mento do registro anterior. No mesmo norte, o reconhecimento de eventualdireito adquirido no implemento do requisito da elegibilidade referente à alfa-betização importa em violação do princípio da igualdade em relação aos de-mais candidatos que, necessariamente, devem fazer prova suficiente da exis-tência de sua plena capacidade eleitoral passiva. Neste sentido, o TSE decidiuque "o fato de o registro de candidatura ter sido deferido em eleições anterioresnão significa que o candidato deva ser necessariamente considerado alfabetizadoou que deva ser ele dispensado de comprovar tal condição" (Embargos de Decla-ração em Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nQ 31.937 - Rei.Joaquim Barbosa - j. 30.06.2009).

Art. 14. (...) §5°. O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Fe-deral, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos po-derão ser reeleitos para um único período subsequente.

O legislador constituinte, originariamente, seguindo a tradição do di-reito eleitoral brasileiro, previu138 a impossibilidade dos exercentes de manda-to no Poder Executivo concorrerem, para o mesmo cargo, em período subse-quente. As razões do constituinte originário se lastreiam, mais do que em mo-tivação história, no conhecimento dos costumes dos mandatários locais que,sistematicamente, se usufruem de parcela do poder para perpetuação - pró-pria ou de seus apaniguados - à testa das esferas públicas.

137 "(...) Quando o teste de alfabetização, apesar de não ser coletivo, traz constrangimento ao candidato, não podeser considerado legítimo. (,,.)" (TSE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n^ 24.343 - Ac. - Rei. GilmarMendes - j. 11.10.2004). Neste caso foi considerado ilegal o teste de alfabetização pela simples presença do juizeleitoral, do promotor eleitoral, de oficial de justiça, do chefe de cartório, do candidato que apresentou a impugna-ção ao registro e seu advogado. Porém, não se vislumbra ilegalidade no teste apenas pela presença das pessoasreferidas. O comparecimento dos primeiros decorre do próprio compromisso dessas autoridades e servidores emrelação ao pleito eleitoral, ao passo que a presença de representantes dos partidos políticos, inclusive de outroscandidatos, é perfectibilização da transparência na fiscalização do processo eleitoral. O TSE tem, efetivamente,concluído admissível "aplicar teste de alfabetização, desde que seja reservado, sem trazer constrangimento aocandidato" (Recurso Especial Eleitoral n° 21.762 - Rei. Gilmar Mendes -j. 31.08.2004).138 A redação originária do §52 do art. 14 da CF, assim dispunha: "São inelegíveis para os mesmos cargos, no períodosubsequente, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem oshouver sucedido, ou substituído, nos seis meses anteriores ao pleito"

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