81
4 O Acesso e a Permanência no Ensino Superior: A visão dos alunos bolsistas do ProUni do Curso de Padagogia
Neste capitulo, apresentar-se-á o ProUni a partir da visão dos estudantes do
Curso de Pedagogia, curso de licenciatura com maior número de alunos bolsistas
do Programa64
no UNINORTE.
A construção desse olhar foi embasada nas entrevistas semiestruturadas,
feitas com alunos voluntários do supracitado curso, que correspondem aos
critérios definidos para a pesquisa: a) alunos (as) do Curso de Pedagogia do turno
noturno que já cursaram mais de 50% do curso; b) ser trabalhador (a); c) estar na
faixa etária entre 20 a 30 anos e; d) ser primeiro membro familiar a ingressar no
ensino superior.
As informações obtidas junto ao Departamento de Registro Acadêmico
(DRA)65
, via setor responsável pelos convênios e bolsas, agregadas as
informações preliminares do Setor Responsável pela Computação e
Processamentos de Dados (CPD), foram fundamentais para o levantamento das
informações.
Segundo tais informações, o Curso e Pedagogia possui 104 bolsistas
ProUni, no turno noturno. Para contato inicial com esses alunos, enviou-se via e-
mail convite para que estes participassem dessa pesquisa, no e-mail foi
esclarecido: o objetivo da pesquisa; seu caráter voluntário; a liberdade para
desistir da entrevista em qualquer uma de suas etapas. Foram indicados
inicialmente apenas três dos critérios estabelecidos: ser trabalhador, ter idade na
faixa de 20 a 30 anos, e ser aluno regular do turno noturno66
(teor do e-mail em
apêndice).
64
O Curso de Pedagogia é um dos cursos da Instituição com maior número de alunos (estão a sua
frente os cursos de Administração, Seviço Socila, Psicologia e Contabilidade). 65
O DRA é o órgão responsável pelos processos individuais dos estudantes, registros acadêmicos,
guarda e expedição dos documentos escolares e todos os procedimentos pertinentes a secretária
geral do UNINORTE. Pela reorganização do UNINORTE/Laureate, no início de 2011, o DRA
passa a condição de Secretaria de Registro Acadêmico (SRA). 66
Quando falamos em “aluno regular do turno noturno” queremos afastar a possibilidade de
incluir alunos que cursam disciplinas isoladas (cursam disciplinas para fins de adaptação
curricular) naquele turno.
82
Sendo a participação dos estudantes uma ação voluntária e também em
função dos critérios estabelecidos para seleção dos entrevistados, respondeu ao
convite, feito via e-mail, reforçado pela Professora Responsável pelo Núcleo de
Atendimento Psicopedagógico aos Estudantes (NAPE) do Curso de Pedagogia,
um grupo de 34 (trinta e quatro) alunos. Sendo esse um número estava acima da
possibilidade de execução do estudo, sendo assim, aplicou-se o último critério
estabelecido, “primeiro membro da família a cursar a educação superior”. Com a
utilização deste último critério diminuiu-se o universo a ser pesquisado para 10
(dez) estudantes.
Dada a limitação de tempo dos estudantes, 8 das entrevistas foram
realizadas na sala de Atendimento aos Estagiários (as), situada no prédio em
frente ao Campus, na qual funciona o Curso de Pedagogia. As duas restantes
foram realizadas, uma (1) na residência do estudante e a outra, no local de
trabalho, no intervalo entre os turnos, na sala de atendimento do RH (setor onde a
aluna faz estágio não obrigatório).
Considerando que essa pesquisa foi realizada a partir das muitas
inquietações motivadas pelos atendimentos aos alunos do Curso de Pedagogia do
UNINORTE67
, entende-se ser importante contextualizar a região e Instituição
lócus dos dados levantados.
4.1 O UNINORTE no contexto do ensino superior no Amazonas
O Estado do Amazonas possui uma área territorial de 1.564.455 Km², sendo
considerado o Estado com maior área territorial na federação brasileira. A
concentração populacional do Estado, em maior número de habitantes, está
localizada na capital, Manaus68
. A cidade conta com uma população de 1.738.641
67
Instituição na qual trabalhamos no período de 1982 a 2010, que cresceu significativamente nos
dez últimos anos, conforme pode ser constatado nos gráfico institucional disponível em
www.uninorte.com.br. 68
Apenas seis municípios contam com mais de 50.000 habitantes. Parintins – 107.250, Coari –
66.991, Manacapuru – 86.472, Itacoatiara – 89.440, Tefé – 64.671, segundo dados do IBGE
divulgados em 2009.
83
habitantes69
(IBGE, 2011), segundo o Censo da Educação Superior de 2007, é
sede de 3 instituições públicas de Ensino Superior (Universidade Federal do
Amazonas, Universidade Estadual do Amazonas e o Instituto Federal de
Educação, Ciências e Tecnologia do Amazonas) e 16 privadas70
. E de acordo com
o Sistema de Cadastro da Educação Superior – Sistema e-MEC, existem 35
Instituições de ensino superior cadastradas para atuarem em Manaus em cursos
presenciais (21) e a distância (15)71
.
O grande número de instituições particulares na capital do Estado reflete a
tendência do restante do país, o predomínio das IES privadas. Esse crescimento
pode ser atribuído à falta de políticas públicas para a ampliação de vagas no
sistema público de ensino e ao panorama econômico e político, fortemente
influenciado pelo projeto neoliberal que caracterizou os anos de 1990, quando o
ensino superior se expande com forte predomínio da iniciativa privada. Segundo
Ney, (2008) o ideário ideológico neoliberal é a disseminada adequação dos
Estados a serem Estados Mínimos e, com isso aparecem três expressões que
caracterizam bem essa formação: desregulamentação, descentralização/autonomia
e privatização.
[...] desregulamentação destaca-se a necessidade do Estado diminuir a
normalização, a regulamentação e as interferências sobre as diversas atividades,
deixando o mercado livre para agir. A justificativa apresentada para gerar mais
emprego e tornar competitivas as empresas brasileiras [...]. A
descentralização/autonomia é decorrente em parte do primeiro termo. Quando os
países entram no processo de se tornarem Estados Mínimos, realizando as devidas
desregulamentações. A desregulamentação é voltada para tirar os encargos
financeiros dos Estados em virtude dos credores internacionais e da utilização dos
fundos públicos pelo setor privado. A privatização é caracterizada pela
transferência de empresas e serviços públicos para a iniciativa privada. (Ney, 2008,
p. 54-55)
Nesta linha de raciocínio do neoliberalismo, pode-se afirmar que a educação
se tornou um nicho mercadológico, disputado e lucrativo para as empresas
privadas. A questão que se põe em pauta, no que diz respeito ao ProUni, é que o
governo paga as instituições privadas com recursos públicos. A educação torna-se
69
Segundo o Censo do IBGE 2010, a população do Amazonas é de 3.350.773 e a população de
Manaus 1.802.525 habitantes, disponível em http://www.censo2010.ibge.gov.br, acesso em
09.04.2011, as 14h44. 70
Dados extraídos do Censo 2007,no seguinte endereço eletrônico:
http://download.inep.gov.br/download/superior/censo/2007/Resumo_tecnico_2007.pdf via site
www.mec.gov.br (Acesso em 20/04/2010). Observa-se que o próximo Censo será em 2011. 71
Informações obtidas na busca interativa, no seguinte endereço: http://emec.mec.gov.br/
84
um serviço à venda, um serviço comercial não implicando barreiras para o seu
livre comércio. Para Sguissardi (2006, p. 365):
Serão os ventos e a avalanche neoliberais na economia, na reforma do Estado e na
concepção do conhecimento e do ensino superior como bem privado, quase-
mercadoria, serviço educacional regulamentável no âmbito da organização
Mundial do Comércio, que irão condicionar nos últimos anos a nova configuração
da universidade em nosso país e no exterior, também sob o ponto de vista dos
modelos universitários.
Certamente os programas de bolsas é um investimento no setor privado, por
outro lado observa-se o sucateamento pelos governos das Universidades Públicas,
que, por causa disso, não conseguem ampliar suas vagas, não conseguem
estruturar seus espaços, aumentar seu quadro profissional, nem reclamar para si os
investimentos destinados à educação pública.
Novamente, há uma questão política que se coloca como determinante dessa
questão. Para as políticas públicas educacionais, investir no setor privado significa
apenas fazer um investimento que equivale a uma mensalidade do aluno. Não há
responsabilidade com a estrutura física da Universidade pública, com o corpo
docente, com investimentos em programas de extensão e pesquisa. Se essa
demanda fosse destinada à Universidade pública, o governo arcaria com custos
bem maiores como: contratar profissionais, investir no espaço físico, possibilitar
programas de ensino, pesquisa e extensão, o que aumentaria sua responsabilidade.
O estado do Amazonas não fugiu desse processo de privatização,
principalmente com o desenvolvimento econômico da região e a criação do
Distrito Industrial desde 1968, que ampliou a necessidade de mão de obra
especializada. Manaus, a capital do Amazonas, concentra 55% da população e é
responsável por 96% dos tributos do Estado. É facilmente perceptível a influência
econômica do modelo Zona Franca de Manaus, em especial na formação da sua
renda per capita, que se equipara hoje às mais altas entre as capitais brasileiras
(IBGE, 2010). Estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
mostraram que Manaus, em 2010, tinha o sexto maior PIB do país - R$
34.403.671.
A Zona Franca de Manaus contribuiu para este PIB com a industrialização
desejada pela elite local e nacional, com finalidades totalmente econômicas, que,
no entanto, trouxeram fortes consequências de impacto para educação do Estado.
Segundo Ribeiro (1987), a Zona Franca de Manaus obteve a mão de obra
85
necessária à produção e foi tão eficiente a formação ofertada pelo Estado que, em
pouco tempo, pôde aumentar o exército de reserva, impondo critérios de
seletividade desnecessários à produção do chão de fábrica. Nesse sentido, Silva
(2009)72
percebe como significativas as mudanças advindas da implementação do
“livre mercado em Manaus”, visto que:
O vigoroso crescimento econômico chamou a atenção de migrantes,
principalmente, dos estados do Ceará, Maranhão e Pará, além dos ribeirinhos do
próprio Amazonas. Este movimento populacional tem pressionado as ofertas de
serviços de saúde, educação, saneamento básico, transporte etc. E assim,
acumulou-se um passivo social enorme que resultou na criação de uma sociedade
dualista em que exclusão e riqueza convivem lado a lado. A dicotomia econômico-
social é péssima para a cidade. Mesmo com o Pólo Industrial de Manaus (PIM)
proporcionando bilhões de reais aos cofres públicos, essa situação social é
calamitosa, exigindo imediata definição de políticas públicas que melhorem a
qualidade de vida da população e elevem a competitividade da economia.
Nesse cenário, há necessidades de ampliação de mão de obra especializada,
antes vinda de outros estados, adicionada à forte demanda reprimida da população
com ensino médio concluído e enorme concorrência para o ensino público versus
reduzido número de vagas nas IES públicas, influenciou os empresários
educacionais para que investissem na criação de instituições de Ensino Superior
na cidade de Manaus, ocasionando grande expansão nesse segmento de ensino
(Souza, 2009), conforme se pode observar na Tabela abaixo:
Tabela 5- Expansão de IES por setor público e privado, no Brasil e no estado do
Amazonas, no período 1991-2007 Brasil Amazonas
Ano Público Público Privado Público Privado
1991 222 671 2 3
1996 211 711 2 8
2004 224 1.789 3 14
2005 231 1.934 3 16
2006 248 2.022 3 16
2007 249 2.032 3 17
Fonte: Censo da Educação Superior 2008, MEC/Inep/Deaes.
Com base na tabela, verifica-se que no período entre 1991 a 2007, no
Amazonas, o crescimento das Instituições públicas foi insignificante. Apenas uma
72
SILVA, Juçara Lobato da, História da Educação no Amazonas: Intelectuais, Educação e
Desenvolvimento no do Governo Artur Reis – 1964 A 1967. Unicamp/HISTEDBR. disponível
em: www.histedbr.fae.unicamp.br/acer_histedbr, acesso em 19.04.2010
86
instituição, a Universidade Estadual do Amazonas que foi fundada em 2001
aumenta para três as IES públicas no estado. Por outro lado, o setor privado
expandiu significativamente, passando de 8 IES (1996) para 17 (2007). Com base
nos dados do INEP e conforme o histórico do ensino superior no Brasil e no
Amazonas nos é permitido inferir três aspectos desta questão que relacionaremos
a seguir:
Primeiro, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9.394/96), instrumento legal,
importante pelas significativas modificações que introduziu na política
educacional do País, reuniu as condições favoráveis para o crescimento do setor
privado, quando no artigo 45 afirma que: “A educação superior será ministrada
em instituições de ensino superior: públicas ou privadas, com variados graus de
abrangência ou especialização”. Ao mesmo tempo, possibilitou às IES privadas a
legitimidade para desenvolver ações de expansão, seja concentrando sua oferta de
vagas nos cursos noturnos, notadamente horário em que se concentrava maior
demanda reprimida, seja oferecendo possibilidade de bolsas de estudos;
Segundo, as IES privadas criadas no Estado se organizaram seguindo o
mesmo caminho, de certa forma, todas procuraram oferecer o maior número de
vagas no turno noturno, por ser o horário mais procurado pela classe trabalhadora
e os cursos oferecidos foram aqueles com maior demanda local, como
Administração, Direito, Psicologia, Pedagogia, Letras, Processamento de Dados.
Por último, as instituições de ensino, na área metropolitana de Manaus,
organizaram suas estruturas e ações numa tentativa de aumentar as chances de
sobrevivência e ganhar mercado. As IES privadas viram no ensino superior uma
oportunidade para ampliar e garantir resultados financeiros positivos. Havia uma
demanda muito grande de pessoas com o ensino médio concluído sem conseguir
ter acesso ao ensino superior, criando um nicho mercadológico que estava a
espera de oportunidades. As IES privadas, incentivadas pelas políticas
educacionais, se integram neste campo da educação e também do comércio.
Este é o cenário da educação superior no Estado do Amazonas, onde está
inserido o UNINORTE, espaço empírico da nossa investigação e que
continuaremos a abordar na seqüência.
O UNINORTE é um Centro Universitário, mantido pelo setor de ensino
privado. É oriundo do Instituto Cultural de Ensino do Amazonas – ICESAM,
cujas atividades iniciaram em 1998 com a implantação dos cursos de Serviço
87
Social e Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda. O
UNINORTE recebeu, ainda, por absorção, os cursos de Tecnologia em
Processamento de Dados e Turismo ministrados pelo Instituto Manauara de
Ensino Superior e o curso de Administração com ênfase em Análise de Sistemas,
ministrado pelo Instituto Amazonense de Ensino Superior, que tiveram início em
1994.
O Centro Universitário, UNINORTE, tem uma estrutura administrativa
composta pelos mantenedores (SODECAM/Laureate) e uma estrutura acadêmica
composta por: Diretor Executivo; Reitora; Pro – Reitor Acadêmico; Pro – Reitor
Administrativo; Diretor Financeiro; Diretor de Marketing e Relacionamento;
Diretora de Ensino de Graduação; Diretor de Pós – Graduação e Diretora de
Extensão.
Conforme sua política institucional vem implantando seus cursos de forma
gradativa, desenvolvendo atividades de pesquisa e de iniciação científica, assim
como cursos de Pós – Graduação Lato Sensu em todas as suas áreas de formação e
Stricto Sensu com os seguintes Mestrados Interinstitucionais: Administração em
parceria com a Universidade Federal de Pernambuco (curso concluído); Serviço
Social em parceria com a PUC Rio de Janeiro (curso em fase de conclusão);
Contabilidade e Controladoria em parceria com a Universidade Federal do
Amazonas – UFAM; Ciências Jurídicas em parceria com a Universidade do Vale
do Itajaí - UNIVALI – SC; Administração e Turismo em parceria com a
Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI - SC (em andamento), conforme sua
política institucional.
Segundo o Relatório Geral da Presidência, apresentado ao corpo docente em
2010, as atividades de extensão têm priorizado como população alvo, segmentos
excluídos que não têm acesso aos conhecimentos científicos e técnicos
necessários para equacionar problemas que dizem respeito às necessidades básicas
para a sobrevivência humana, assim como as necessidades na esfera da cultura
que se mostrem relevantes para a autonomia e organização desses segmentos.
Desenvolve essas atividades por intermédio de:
a) Núcleos Permanentes de Extensão, que são atividades exercidas pela
comunidade acadêmica de forma localizada e contínua, junto a diversos
segmentos da sociedade, com o objetivo de refletir e construir, conjuntamente,
propostas de solução para as questões advindas da realidade social, priorizando os
88
segmentos mais carentes da sociedade; estão ligados aos cursos de graduação e
são realizados em forma de projetos que atendam à comunidade própria de cada
curso. No caso do Curso de Pedagogia, as atividades de extensão priorizam o
atendimento às escolas, à comunidade próxima ao UNINORTE, à comunidade
acadêmica auxiliando-a na sua formação através de cursos, oficinas, palestras.
b) Alfabetização Solidária, programa criado em 1997 pelo Conselho da
Comunidade Solidária sendo gerenciado por uma organização não governamental
– AAPAS (Associação de Apoio ao Programa de Alfabetização Solidária),
entidade privada sem fins lucrativos. No 2º semestre de 1999 foi firmado
convênio com municípios parceiros do UNINORTE (Santo Antônio do Içá e
Amaturá). Posteriormente, foram capacitados os alfabetizadores dos municípios
de Atalaia do Norte, Benjamin Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença e
Anorí.
c) Projeto de Educação Ambiental, em parceria com o curso de Serviço
Social atuando na comunidade do Igarapé de Manaus, realiza palestras, mini-
cursos, oficinas com a comunidade do entorno do igarapé. Faz um trabalho de
sensibilização e educação ambiental, proporcionando aos alunos do curso de
Serviço social oportunidade de atuar junto à comunidade.
d) Projeto Inglês para Todos, em parceria com o curso de Letras atendendo
tanto a comunidade interna quanto externa, através de aulas semanais de inglês
para iniciantes, tendo como monitores alunos do curso de Letras com habilitação
em Língua Inglesa;
e) Eventos de Extensão, atividades realizadas no cumprimento de programas
específicos, oferecidos com o objetivo de produzir, sistematizar e divulgar
conhecimentos, tecnologias e bens culturais podendo desenvolver-se em nível
universitário ou não. Os eventos de extensão compreendem: Ciclos de
Conferência; Seminários; Fóruns, Ciclo de Palestras; Reuniões Técnicas;
Concertos; Festivais; Manifestações artísticas e culturais; Espetáculos; Oficinas; e
outros de natureza semelhante. O critério de frequência mínima para cursos e
eventos de extensão está estabelecido em seus respectivos projetos, não podendo
ser inferior a 75%;
f) Cursos de Extensão, atividades programadas pelos departamentos e
colegiados de cursos, visando socializar os conhecimentos produzidos na
Instituição, através da execução de calendário próprio. Os cursos de extensão
89
articulam a comunidade acadêmica com as necessidades concretas da sociedade,
num confronto permanente entre a teoria e a prática, como pré-requisito e
consequência dos diversos programas de extensão.
g) Projeto UNINORTE Orienta: trabalho desenvolvido junto às escolas
públicas com o objetivo de orientar os alunos finalistas do Ensino Médio quanto à
escolha profissional. Atualmente, a Instituição oferece 68 (sessenta e oito)
cursos/habilitações/modalidades em nível de graduação e atua nas seguintes áreas:
Ciências Exatas e da Terra e Engenharia – Ciências Biológicas e da Saúde – e -
Ciências Sociais e Humanas. É prevista ainda, a atuação, também, na área de
Ciências Agrárias.
4.2 O Centro Universitário do Norte e seu sistema de bolsas
No que diz respeito ao sistema de bolsas o UNINORTE, aderiu as seguinte
modalidades: Bolsa Social, Bolsa Universitária, FIES73
, ProUni.
A Bolsa Social foi instituída pelo UNINORTE para os alunos de baixa renda
que não foram selecionados pelas demais bolsas e que fazem opção por estudar no
turno matutino ou vespertino, é uma bolsa parcial de 50% do valor das parcelas
semestrais para a maioria dos cursos e de 70% para os cursos de Direito,
Odontologia e Fisioterapia.
A Bolsa Universitária foi criada em 2009 pelo governo municipal local
através de convênio com o UNINORTE que realizou processo seletivo específico
para tal, e que se volta para população de baixa renda e professores do Sistema
Público de Ensino.
Em 2010 o Programa Bolsa Universitária74
, integrou-se ao Programa de
Gestão da Prefeitura de Manaus. Segundo o edital75
as bolsas de estudos são
concedidas aos estudantes interessados em cursar o ensino superior e que não têm
73
FIES – Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior, é um Programa de
Financiamento Estudantil. 74
Mais informações pelo endereço eletrônico: http://bolsasuniversidade.manaus.am.gov.br 75
Disponível no portal da Prefeitura de Manaus: www.manaus.am.gov.br
90
“condições” de custear seus estudos. Em contrapartida serão concedida
compensações fiscais pactuada com as IES credenciadas, que aderem ao Programa
voluntariamente “sem ônus para Prefeitura” (item 1.1 do Edital –Processo
Seletivo para o Programa Bolsa Universitária.
O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) é
destinado à concessão de financiamento a estudantes regularmente matriculados
em cursos superiores não gratuitos e com avaliação positiva nos processos
conduzidos pelo Ministério da Educação. Depois de formado, há um período de
carência de dezoito meses antes do início do pagamento das prestações. A carência
permite que o aluno possa recompor seu orçamento após a graduação. Durante
esses dezoito meses, o aluno continua pagando trimestralmente, os juros do
financiamento, limitados a uma parcela máxima de R$50,00. Após o período de
carência, o financiamento começa a ser amortizado. Nos doze primeiros meses
(Fase I) a prestação será igual a parte da mensalidade que era paga pelo estudante
à instituição, com base no último semestre financiado. Terminado esse período, o
saldo devedor é dividido em prestações iguais, pelo prazo de três vezes o período
de utilização do financiamento (Fase II). (http://www.mec.gov.br, 2010).
Considerando o período de absorção, a Instituição oferece, há 16 (dezesseis)
anos, o ensino superior na cidade de Manaus, capital do Estado do Amazonas.
Atendeu em 2010 mais de 24.000 estudantes distribuídos nos turnos matutino,
vespertino e noturno76
. Sendo que destes 24 mil, 42% de alunos são bolsistas,
distribuídos de acordo com o gráfico abaixo:
76
Dados referentes ao ano letivo de 2010 (semestre 2) fornecidos pelo CPD/UNINORTE em
23.09.2010
91
Gráfico 3- Distribuição dos alunos bolsistas do UNINORTE, segundo o tipo de bolsa,
no ano base de 2010 (segundo semestre). N= informe o número total de bolsistas
Fonte: Dados obtidos junto ao Centro de Processamento de Dados do Centro Universitário do
Norte.
Conforme o gráfico, o Bolsa universitária apresentava o maior número de
bolsistas, seguido pelo ProUni e depois pelo Fies.
Apesar de não ter dados quantitativos da Bolsa Social e do crédito
universitário, o UniNorte oferece, ainda, bolsas parciais ou integrais para os
dependentes do seu Corpo Docente. Embora com critérios de seleção
diferenciados, essas bolsas assumem finalidades sociais e abrem a possibilidade
de acesso ao Ensino Superior aos funcionários e seus dependentes.
O UNINORTE foi aderindo ao sistema de bolsas gradativamente. Os alunos
que não tinham condições de arcar com os custos de sua formação podiam
solicitar ajuda financeira através do Fundo de Financiamento ao Estudante do
Ensino Superior – FIES, programa do Governo Federal que se apresenta como
uma possibilidade de democratizar o acesso à educação de qualidade a fim de
propiciar ao maior número possível de estudantes a permanência e a conclusão do
ensino superior. Em 2010, esses alunos totalizavam 5,1% dos acadêmicos
matriculados. Alunos bolsistas do ProUni totalizavam 12% dos alunos
matriculados e do Bolsa Universitária representam 25% dos alunos matriculados.
Desde a implementação do ProUni no UNINORTE, em 2005, somando-se
o primeiro e o segundo semestre de cada ano, a referida instituição já recebeu
quantidade dos alunos; ProUni;
2.856; 28%
quantidade dos alunos; Bolsa Universitária;
6.000; 60%
quantidade dos alunos; FIES; 1.217; 12%
Alunos bolsistas do UNINORTE
ProUni Bolsa Universitária FIES
92
cerca de 11.642 alunos bolsistas. Segundo informações disponibilizadas pelo
Centro de Processamento de Dados do Centro Universitário do Norte, o número
de estudante que entra na Instituição pelo ProUni vem crescendo
consideravelmente. O quadro 1 apresenta este crescimento ao longo dos anos,
dando um salto de 364 do ano de 2005 para 1.074 no ano de 2010. Importante
ressaltar que o número de alunos pré-selecionados, ou seja, aquele que a
instituição se propõe a receber é maior que o número daqueles que efetivamente
fazem a matrícula e iniciam o curso de graduação.
Quadro 1- total de alunos pré-selecionados e aprovados no ProUni, no UNINORTE,
no período de 2005 a 2010
Ano Total de Candidatos
Pré-selecionados Total de Candidatos Aprovados
(matricula inicial) 2005 Primeiro ano de ProUni
no UNINORTE 364
2006 698 483 2007 1.303 977 2008 1.606 950 2009 1.245 696 2010 1.782 1.074
Fonte: Dados coletados junto ao Centro de Processamento de Dados do UNINORTE, em
novembro de 2010.
Este quadro apresenta um crescimento de bolsas no decorrer dos anos. Da
sua implementação até o ano de 2010, houve um significativo aumento, com
queda no ano de 2009, mas retomando a linha crescente em 2010. Utilizando os
dados dos diversos cursos, nos diferentes turnos, podemos visualizar no quadro 2
como estes alunos estão distribuídos por graduação:
93
Quadro 2- Distribuição dos alunos bolsistas ProUni, por curso de graduação com
três turnos do UNINORTE, no ano de 2010 CURSO TURNO TOTAL
BOLSISTA
S
TURN
O
TOTAL
BOLSISTA
S
TURNO TOTAL
BOLSISTAS
ADMINISTRAÇÃ
O
M 43 T 39 N 651
BIOLOGIA (LIC) M 8 T 3 N 44
EDUCAÇÃO
FÍSICA
M 4 T 1 N 50
ENFERMAGEM M 52 T 25 N 94
FISIOTERAPIA M 57 T 2 N 56
FONOAUDIOLO
GIA
M 4 T 3 N 34
LL - L.INGLESA M 8 T 3 N 26
NUTRIÇÃO M 22 T 1 N 33
PEDAGOGIA
LIC.
M 23 T 13 N 104
PSICOLOGIA M 5 T 15 N 77
SERVIÇO
SOCIAL
M 21 T 36 N 139
Fonte: Dados coletados junto ao Centro de Processamento de Dados do UNINORTE, em
novembro de 2010.
No UNINORTE, alguns cursos são oferecidos nos três turnos, isso faz com
que o número de alunos bolsistas do ProUni seja dividido de acordo com essa
organização. 11 cursos são oferecidos nos três turnos, como observado no quadro
2. Desses, os que mais recebem alunos bolsistas são: administração, com 733
bolsas; serviço social, com 196 bolsas e pedagogia, com 140 bolsas. Os cursos
com menos bolsistas são os de fonoaudiologia, letras – língua inglesa e nutrição.
Já os alunos bolsistas que fazem o curso à tarde e à noite, apresentados no
quadro 3, estão em maior número nos cursos de direito e petróleo e gás.
Importante ressaltar que o curso de petróleo e gás foi criado a partir de uma
demanda que surge com a criação do gasoduto de Coari e, como demonstrado,
tem uma procura elevada por bolsas do ProUni.
94
Quadro 3- Distribuição dos alunos bolsistas ProUni, por curso de graduação com
dois turnos do UNINORTE, no ano de 2010 CURSO TURNO TOTAL
BOLSISTAS
TURNO TOTAL
BOLSISTAS
ARQUITETURA T 7 N 73
C. COMPUTAÇÃO T 8 N 54
DIREITO T 25 N 83
ENG.CIVIL T 3 N 45
ODONTOLOGIA T 7 N 25
PETRÓLEO E GÁS T 21 N 50
TURISMO T 9 N 20
Fonte: Dados coletados junto ao Centro de Processamento de Dados do UNINORTE, em
novembro de 2010.
Como se pode observar, seja no turno matutino, vespertino, seja no noturno,
os alunos bolsistas do ProUni estão presentes no UNINORTE de forma
significativa. No curso de pedagogia, campo desta pesquisa, no ano de 2010/1
havia 1.345 alunos matriculados e destes 134 eram bolsistas do ProUni. No turno
noturno 104 estudantes participam do programa.
Nos últimos anos, houve um crescimento significativo de estudantes que
ingressaram no ensino superior. Os números apresentados pelo governo parecem
mesmo ser animadores, porém, segundo Ristoff (2006), os 9 milhões de
estudantes que poderão chegar às universidades no ano de 2011 não atendem à
meta do Plano Nacional de Educação (30% dos jovens de 18 a 24 anos
matriculados na educação superior, com 40% da matrículas em instituições
públicas).
4.3 Percepções dos alunos sobre o ensino superior e o ProUni
Esta etapa da pesquisa tem por objetivo analisar a percepção do aluno do
curso de Pedagogia Noturno do UNINORTE, bolsista ProUni, em relação ao
acesso e à permanência no ensino superior privado. Para isso, será apresentado o
resultado e a análise das entrevistas que compõem a percepção dos alunos sobre o
ProUni como política pública de ação afirmativa, que garante o acesso ao ensino
95
superior, bem como nos apresenta as principais dificuldades que esses estudantes
encontram para garantir a permanência no Ensino Superior. Proporciona, ainda,
conhecer as possíveis estratégias que esses bolsistas utilizam para lidar com as
dificuldades no cotidiano do Curso.
Foram selecionados 10 alunos como sujeitos desta pesquisa, obedecendo
aos seguintes critérios de escolha: alunos(as) do Curso de Pedagogia, noturno que
já cursaram mais de 50% do curso; trabalhador(a); na faixa etária de 20 a 30 anos
e; primeiro membro familiar a ingressar no ensino superior. As entrevistas foram
realizadas no mês de outubro e novembro de 2010.
O contato inicial foi feito através de um convite via e-mail, o qual esclarecia
o objetivo da pesquisa, seu caráter voluntário e a liberdade para desistir da
entrevista em qualquer uma de suas etapas. A partir dos critérios apontados
chegou-se a um universo de 10 alunos Destes 10 alunos entrevistados, 2 eram
homens, 8 eram mulheres e estavam no 6º e 7º períodos.
As entrevistas realizadas foram semiestruturadas, pois seguiam um roteiro
pré-estabelecido, mas deixavam oportunidade para o pesquisador coletar mais
informações, caso fosse necessário.
A análise do trabalho foi organizada em quatro eixos fundamentais, a saber:
O perfil dos entrevistados; Significado do ensino superior e razões para aderir ao
ProUni; Avaliação do ProUni pelos bolsistas – UNINORTE e suas estratégias
para permanecer no ensino superior e Acesso, permanência e democratização do
ensino superior: o que dizem os bolsistas. Tais eixos foram estruturados com base
nos objetivos propostos nesta pesquisa, quais sejam: Geral: conhecer a percepção
do aluno bolsista ProUni do curso de Pedagogia noturno do UNINORTE em
relação ao acesso e à permanência no ensino superior privado. Específicos:
conhecer as razões que os levaram a aderir ao ProUni; conhecer as principais
dificuldades que esses estudantes encontram para se manter no curso com
aproveitamento acadêmico; e conhecer as possíveis estratégias que os mesmos
utilizam para lidar com as dificuldades no cotidiano do curso de Pedagogia.
A escolha dos pesquisados obedeceu aos seguintes critérios de escolha:
alunos(as) do Curso de Pedagogia, noturno que já cursaram mais de 50% do
curso; trabalhador(a); na faixa etária de 20 a 30 anos e primeiro membro familiar
a ingressar no ensino superior. As entrevistas foram realizadas no mês de outubro
e novembro de 2010.
96
O contato inicial foi feito através de um convite via e-mail, o qual esclarecia
o objetivo da pesquisa, seu caráter voluntário e a liberdade para desistir da
entrevista em qualquer uma de suas etapas. A partir dos critérios apontados
chegou-se a um universo de 10 alunos Destes 10 alunos entrevistados, 02 eram
homens, 08 eram mulheres e estavam cursando os 6º e 7º períodos. Dos 10
estudantes apenas 01(um) tem casa própria que compartilha com a sua família e a
sogra, 02 vivem de aluguel, 04 moram com pessoas de suas famílias (irmã ou
irmão, ou tio, ou tia ou avós) e 03 dos entrevistados moram com pessoas estranhas
a suas famílias, sendo que, desses, 02 moram com seus patrões. Dos dez
entrevistados apenas 04 (quatro) trabalhavam com contrato registrado em Carteira
Profissional (CLT) sendo 03 em fábricas do Polo Industrial de Manaus77
e 01
(um) no Comércio de Manaus, 0278
são empregadas domésticas e apresentaram
um relato bem interessante que transcrevemos abaixo:
P1- Trabalho na casa de uma família há muitos ano minha mãe criou a gente
trabalhando na casa dos outro, arranjei filho, que deixei com minha tia no interior
e vim trabalhar na casa dessa família que era conhecida da pessoa que minha mãe
trabalha, pra mim79
estudar e melhorar de minha vida e pode dar uma vida
melhor pra minha filha. A minha patroa é ipresária e como eu tenho segundo grau
pede pra mim ajudar os mininos dela a fazer tarefa, ela ficou dizendo que era bom
que eu fosse professora e ajudar melhor, que tenho jeitinho pra ensinar, mim falou
que agora só não estuda quem não quer. Ai conversando com uma colega que
trabalha na casa da vizinha e que estuda numa faculdade de Pedagogia, ela me
falou do ProUni, fique pensando e tentei a prova do emem, bem e me candidatei
pro UNINORTE que todo mundo diz que é bom e recebe muitos alunos. Eu
consegui, eu quero mudar de vida, preciso trabalhar e ter uma vida melhor...
P2 - Eu trabalho com um casal muito bom que tem uma filha e um filho, eu cuido
deles, da casa e da mãe do senhor que é meu patrão. Eles são professores lá do
curso de Biologia, daqui do UNINORTE, ai eu falei que queria muito estudar uma
faculdade, eles me disseram que tinha um incentivo que o Governo dava pra que
queria fazer faculdade superior, o ProUni, mim disseram que Pedagogia era uma
boa profissão, que professor sempre tem emprego, que todo dia nasce criança que
tem que estudar é muita criança que nasce, principalmente no povo pobre, que
precisa estudar na escola pública e o Estado está sempre chamando professor
para trabalhar e eu fiquei logo interessada pois meu sonho é ter uma vida melhor
para mim ajudar minha família, tirar mim minha mãe dessa vida dura de
empregada, poder ter credito ....
77
O PIM (Polo Industrial de Manaus) utiliza jornada de trabalho por turno estabelecido de forma
rotativa de acordo com a necessidade da produção de acordo com informação dos entrevistados. 78
Nesse relato identificaremos as entrevistadas com: PTD1(sendo P de Pedagogia T de
Trabalhadora, D de Domestica) e PTD2 (idem a definição anterior). 79
As palavras em itálicos são fieis aos erros gramaticais ou de concordância transcritos da fala dos
entrevistados.
97
Outro relato significativo ligados a atividade profissional é de um estudante
que pertence a economia informal, pois retrata bem as dificuldades que precisam
enfrentar os alunos de baixa renda para estudar nesse mundo capitalista:
PI ... já trabalhei de todo jeito, no Distrito, no Comercio, dirigindo Taxi, o último
foi numa fábrica de roupa cuidando da limpeza do salão de moldagem. Ai num dia
eu saia 5 horas, outro dia 6 ou 7 horas80
, ai no dia que eu vinha fazer o provão e
que a professora Lenize avisou que quem chegasse depois não entrava. Falei com
o encarregado que tinha que sair no horário da saída, às 5 horas porque tinha
prova. Ele disse pra mim: “o que tenho com isso”! O salão só pode ser limpo às 7
horas. Eu disse então manda outro limpar que eu já vou. Peguei a conta. Resolvi
vender mingau na porta da escola .... Pronto, é pouco mas dá pra viver ...
Tomando por foco a fala dos alunos reproduzida acima e com base na nossa
experiência enquanto coordenadora do curso de Pedagogia do UNINORTE, turno
noturno, podemos dizer que os alunos por nós entrevistados apresentam
características representativas dos alunos que aderem ao ProUni e estudam no
Curso de Pedagogia no UNINORTE, no turno noturno.
4.3.1 Significado do ensino superior e razões para aderir ao ProUni
Quando se perguntou aos alunos bolsistas do ProUni o que significava para
eles o ensino superior, as respostas foram:
P1 - O ensino superior pra mim significa mais uma porta que está
começando a se abrir pra mim na minha questão profissional e não é tudo,
mas é o início da minha formação. A formação não vai parar somente aí.
Meus planos é continuar e prosseguir até chegar o mestrado, quem sabe até
o doutorado.
P2 – [...] pra mim agora, na situação em que eu me encontro no ensino
superior ele abre portas, ele propicia no caso achar um emprego melhor,
melhorar de vida que é o que todo mundo busca, né.
P3 - Bom, o ensino superior para mim significa muitas coisas. Primeiro,
condições, status social, ter uma profissão e depois com essa profissão com
certeza ascender na vida social ne, financeiramente, a oportunidade de
entrar no mercado de trabalho.
80
O aluno se refere a 17 horas, 18h e 19 horas.
98
P4 - Para mim, o ensino superior é a oportunidade. Então com a bolsa eu
consegui realizar essa parte da minha vida.
P7 - Significa a oportunidade da realização de um sonho que tava muito
distante. Eu queria, mas era impossível porque não podia pagar. E o
ProUni abriu essa possibilidade. Ensino superior é uma grande conquista
na minha vida. Tenho certeza que sou o orgulho da minha família. Espero
poder incentivar meus irmãos a seguir esse caminho.
P9 - Pra mim, tem sido muito crescimento. Me sinto mais respeitada no
meu meio. As pessoas te olham diferente, até se admiram quando falo que
faço faculdade na UNINORTE. Parece que é algo impossível.
Nessas falas, percebe-se que o ensino superior, para esses alunos, é a porta
que se abre para a profissionalização, para um emprego melhor, para a ascensão
social e econômica e para a realização do sonho. Na perspectiva dos alunos, o
ensino superior é a oportunidade para reconstruir a vida social, econômica e
pessoal. Apesar disso, as falas dos alunos indicam que chegar ao ensino superior é
apenas o começo, há, hoje, maiores exigências no mercado de trabalho para que se
consigam melhores resultados profissionais.
Na visão dos alunos entrevistados, o ensino superior está relacionado ao
aumento da empregabilidade, termo que no contexto neoliberal significa a
capacidade técnica e profissional do capital humano para se manter em condição
de se empregar. O homem deve continuamente adquirir novas competências e
habilidades para continuar em condições de se empregar. Volta a ideia tecnocrata,
assumida no tempo do militarismo pelas ideias expostas na teoria do capital
humano. (Frigotto, 1989)
Para compreender a Teoria do Capital Humano é preciso não só apreender
o seu processo de construção. É importante, antes, entender como esta se articula
com o desenvolvimento do sistema capitalista. Dizendo de outra forma, não é
possível apreender o seu conteúdo se não se buscar uma articulação entre o que se
dá no âmbito da infra-estrutura (economia), com o que se dá no campo da
superestrutura. (Frigotto, 1989)
A teoria do capital humano é formulada para justificar as contradições do
sistema capitalista, tendo como objetivo a manutenção das relações de força e de
desigualdade existentes.
Nesse sentido, o capitalismo considera os fatores isoladamente e leva o
indivíduo a pensar por esse mesmo prisma, ou seja, um ser dotado de uma
racionalidade tal, que é capaz de escolher, livre das pressões externas, quais
99
devem ser os melhores caminhos traçados para assim alcançar o seu sucesso
econômico. No interior dessas relações, os indivíduos não percebem que são sim
as pressões externas que determinam as suas escolhas. Retomando as falas dos
alunos entrevistados, quando se perguntou o que significa o ensino superior para
eles, isto se torna visível quando afirmam:
P1 - Meus planos é continuar e prosseguir até chegar o mestrado, quem
sabe até o doutorado.
P3 - [...] ter uma profissão e depois com essa profissão com certeza
ascender na vida social né, financeiramente.
P7 - E o ProUni abriu essa possibilidade. Ensino superior é uma grande
conquista na minha vida.
Como contraponto a essas percepções, o acesso ao emprego não decorre só
e nem primordialmente do aumento da qualificação, mas principalmente da
automatização do processo produtivo do mercado. Para Frigotto (1989), o sistema
capitalista retira, cada vez mais, do trabalhador o controle do seu processo de
trabalho. Em consequência disso, o sistema capitalista determina maior
qualificação do trabalhador, sem que o aluno perceba que está entrando no ensino
superior para cumprir este objetivo.
A escolarização, na concepção do aluno, contribuirá diretamente para a
melhoria de sua qualidade de vida, proporcionando um aumento de renda que
acontecerá em função da sua melhor qualificação.
4.3.2 Significado do ensino superior e razões para aderir ao ProUni (A)
O ProUni é um Programa de Governo, iniciado em 2005, que intervém
diretamente nas Instituições de Ensino Superior (IES) privadas e filantrópicas a
partir do acesso ao ensino superior de estudantes do ensino com bolsas integral ou
parcial que comprovem estar incluídos nos critérios indicados pelo Programa.
Considerando essa condição, perguntou-se como os entrevistados avaliavam essa
ação Governamental. As respostas, na maioria, avaliaram o ProUni de forma
bastante positiva:
100
P1 – [...] eu acho que essa ação é uma ação boa, uma ação muito eficaz,
muito eficiente. Apesar de ter seus prós e contra, mas é uma ação muito
eficiente para os estudantes [...].
P2 - Pra mim é uma ação governamental é maravilhosa que propiciou no
caso pra mim e pra outras pessoas também poder estar na faculdade.
Porque eu iniciei pagando, mas quando eu passei no ProUni me ajudou
bastante.
P3 – [...] se dependesse de mim, da minha família eu não teria condições de
cursar uma faculdade, mas devido a oportunidade que o governo federal
está dando de estudar numa faculdade privada, reconhecida é eu to
agarrado a essa oportunidade, eu to tendo essa chance, essa oportunidade,
mas caso contrário, tudo isso eu não taria aqui nesse momento.
P6 - Bom, eu avalio como muito bom. Eu sempre tive vontade de fazer o
ensino superior, mas pelas minhas condições financeira eu nunca pude,
[...].
Os alunos entrevistados fazem uma leitura mais social que política do
acesso ao nível superior via ProUni. Eles se percebem como vítimas do sistema e
o governo lhes dá a chance de realizar seu sonho. O que não percebem é que este
mesmo governo é quem não faz investimento qualitativo desde o ensino
fundamental até o ensino superior público. A lógica de concessão de bolsas está
atrelada à construção de assistencialismo e não como ação de políticas públicas
comprometidas com os desfavorecidos, os pobres, não assegurando, de fato, um
direito constitucional. Segundo Pereira (2008, p. 221): “concretizar direitos
sociais significa prestar a população, como dever do Estado, um conjunto de
benefícios e serviços que lhes é devido, em resposta às suas necessidades sociais
[...] àquilo que lhes é essencial para garantir sua participação cidadã”.
Chama atenção nas respostas que os aspectos individuais se destacam nas
falas, pois é recorrente o uso da 1ª. Pessoa: “Eu sempre tive vontade de fazer o
ensino superior”; “se dependesse de mim, da minha família eu não teria
condições de cursar uma faculdade” ; em detrimento ao coletivo. Visualiza-se o
direito ao estudo que se conquista individualmente. Os aspectos individuais se
apresentam como ter vontade de cursar o ensino superior, de realizar um sonho,
de ser exemplo para a família.
É preciso alertar para o fato de que esse fenômeno da expansão do ensino
superior pela iniciativa privada sustenta-se através da possibilidade lucrativa da
educação. Forster e Fagundes (2006, p.61) nos alertam que este fato se dá:
101
[...] explorando nichos e demandas reprimidas da população que poderiam
garantir retorno financeiro aos investidores. Na maioria das vezes, essa
expansão se deu por meio de instituições que centram suas atividades
somente no ensino, em que a qualidade do trabalho acadêmico, muitas
vezes, não se coloca como condição fundamental de funcionamento.
O aluno, enquanto objeto principal desse processo, por conta de sua pobreza
se vê dentro dessa demanda reprimida e cita suas situações individuais como
aspecto subjetivo para adentrar e permanecer no ensino superior. Utilizam sua
situação econômica como mérito pessoal e encaram-na como passaporte para
entrar no curso e garantir a conquista do diploma. Quando estes perdem a bolsa
por não conseguirem acompanhar o curso, por conta de sua defasagem ensino-
aprendizagem, sentem-se injustiçados.
Na maioria dos casos, esses alunos que estão no UniNorte chegam ao ensino
superior com uma defasagem nos segmentos básicos do ensino, principalmente,
leitura, escrita, interpretação. Como coordenadora do Curso de Pedagogia, várias
vezes tive oportunidade de ouvir alunos, que sem conseguir acompanhar os
estudos por falta dessa bagagem de ensino, eram reprovados em uma ou mais
disciplinas e acusavam diretamente os professores de terem destruído seus sonhos.
Fica clara a lógica da concessão de bolsa como dádiva do governo e que as
instituições, na percepção dos alunos, deve acolhê-los como se fossem
“coitadinhos”, sem exigir desses um aprofundamento acadêmico. Dessas falas,
uma evidencia a questão política que se esconde sob a máscara de democratização
do ProUni:
P9 – [...] O ProUni está oportunizando muita gente a alcançar algo que era
muito difícil, fazer uma faculdade, ainda mais uma particular. A faculdade
pública é muito difícil o vestibular. Entra mais o pessoal que faz cursinho.
[...] Então parece que hoje os que podem pagar estudam na faculdade
pública e os que não podem pagar estudam na particular por causa do
ProUni. Bem, pelo menos tem essa chance pra nós.
Está claro para o entrevistado que a universidade pública, na conjuntura
atual, é para aqueles que tiveram acesso à educação de qualidade nos segmento
fundamental e médio. Resta para aqueles que não “fazem cursinho” e “que não
podem pagar” o sistema de bolsas oferecido pelo ProUni. A universidade pública,
na concepção do aluno, que deveria ser acessível a todos, fica restrita à classe
média e alta.
102
Duas observações parecem relevantes neste contexto: a primeira refere-se à
constatação pelo aluno de que a universidade pública é um direito restrito a
poucos; a segunda diz respeito à universidade particular como sendo aquela que
acolhe os “que não podem pagar”81
. A crítica a esse modelo imposto pelo
neoliberalismo pelas universidades públicas nem sempre tem encontrado energia
capaz de fazer vigorar uma perspectiva emancipatória, uma resistência que
recupere a ideia do compromisso social da universidade, que para Geroge
...significa o exercício da crítica, da oposição e da resistência, tendo o contexto
social mais amplo que envolve tanto a instituição de uma sociedade mais justa e
igualitária, quanto à realização do ser humano como indivíduo e cidadão. (Geroge,
2006, p. 68)
O que percebemos na realidade atual é uma educação superior privada
atrelada aos interesses socioeconômicos do sistema vigente, seja para suprir suas
incompetências, seja para otimizar seus procedimentos quando esses visam apenas
seus interesses mercadológicos. O Brasil tem enfrentado dificuldades para a
implementação da democracia, acompanhadas de constantes desafios político-
econômicos. Sem dúvida, a entrada e permanência dos jovens no ensino superior é
uma delas.
Diante desses desafios, os bolsistas precisam criar estratégias para se manter
no ensino superior e concluir o curso, pois há que se superar as questões
econômicas que se põem como fator decisivo nas entrevistas. Os bolsistas
afirmam que, para suprir suas necessidades acadêmicas (compra de livros,
apostilas, lanche, transporte etc), usam recursos próprios e contam com a ajuda de
seus familiares, como podemos observar nos trechos abaixo:
P1- Bom, com relação a lanche quase não se lancha, mas apostilas, livros,
a maioria são nós mesmo, infelizmente temos que assumir isso. Esse é um
lado bem negativo. Passar três anos e pouco com poucos livros, porque não
tem condições de você pagar muitos livros, então você meio que seleciona
os livros e questão financeira ajuda de família ajuda de esposo, marido
trabalha, tira daqui, tira dali pra poder comprar os livros, as apostilas que
são muitas. [...]
81
Um dado para reflexão: Segundo a Pró-Reitora Acadêmica da Universidade Estadual do
Amazonas-UEA, em 2010/1 haviam 25.000 alunos matriculados e de acordo com o Relatório
Acadêmico do UNINORTE em 2010/2 a Instituição matriculou 27.000 alunos.
103
P2- Passar três anos e pouco com livros emprestados, porque não tem
condições de você ter muitos livros, então você só compra uns livros com
ajuda de família, as vezes ajuda marido, quando tá trabalhando. [...]
P3- E eu posso dizer pra senhora que eu já tive que mudar de emprego uma
três, quatro vezes devido ao meu estudo, primeiro porque você já estuda a
noite aí você tem uma carga obrigatória de estágio, aí você tem que
cumprir um estágio pela manhã ou pela tarde aí são no mínimo duas
semana a três semana [...]
Alguns alunos da bolsa ProUni que permanecem no Curso de Pedagogia –
como já informado - são trabalhadores do distrito industrial ou do comércio, e
usam do seu ganho para manter os gastos provenientes do estudo. Outro dado
importante é que, a partir do 4º. Período, um número considerável de alunos
começa a realizar o estágio supervisionado, obrigatório para a sua formação e,
com isso, têm que reorganizar seus horários de trabalho, aumentando também os
gastos com alimentação e condução. Registre-se que são eles próprios que
precisam custear os gastos provenientes do estágio.
Como já discutido anteriormente, a desigualdade econômica exerce forte
influência na educação, a ponto de apresentar números bem diferentes de acesso
ao ensino superior dos mais pobres e dos mais ricos. Esses resultados demonstram
a fragilidade social e estão ligados, diretamente, com as injustiças e a
desigualdade social, inclusive a desigualdade de oportunidades. Por isso, o
ProUni, apesar de dar acesso à universidade aos mais carentes, mascara o
sucateamento do setor público, o descaso com o ensino fundamental e médio.
Amplia o número de alunos cursando o nível superior, sem, efetivamente, investir
na reforma do ensino superior e na democratização e universalização do mesmo.
Como Afirma Gentilli (2007, p 21) “Não há grandes surpresas na pesquisa
entre pobreza e educação e não há portas secretas que levem à solução. Se há um
mistério, é do tipo que Sartre denominou „mistério à plena luz do dia‟, um
desconhecimento criado pelo modo como estruturamos e utilizamos nosso
conhecimento”. [destaque do autor].
104
4.3.3 Acesso, Permanência e Democratização do Ensino Superior: O que dizem os Bolsistas?
O acesso ao ensino superior tem sido incentivado e oportunizado,
principalmente pela criação de bolsas, no entanto, tal medida não se apresenta
como um processo democratizador do sistema de ensino, pois, para que a
democratização aconteça de fato é preciso que os direitos dos excluídos, histórica
e socialmente, sejam firmados e respeitados; que o acesso e permanência dos que
buscam a educação superior seja garantido.
Convém repetir: se a palavra de ordem da década passada foi expandir, a desta
década precisa ser democratizar. E isso significa criar oportunidades para que os
milhares de jovens de classe baixa, pobres, filhos da classe trabalhadora e
estudantes das escolas públicas tenham acesso à educação superior. Não basta mais
expandir o setor privado – as vagas continuarão ociosas; não basta aumentar as
vagas no setor público – elas apenas facilitarão o acesso e a transferência dos mais
aquinhoados. (Ristoff, 2006, p. 45)
Parece que há uma confusão entre estes dois termos – expandir e
democratizar - por parte da sociedade, pois esta analisa a expansão, o fato de
muitos terem a oportunidade de ingressar no ensino superior como sendo um ato
de democratização, sem conseguir perceber que o acesso ao ensino superior por si
só é apenas uma medida paliativa.
O programa de bolsas, tanto aqueles oferecidos pelo governo como o
ProUni e o Crédito Universitário, quanto os demais, na visão desses alunos, têm
sido significativo para o ingresso no ensino superior, embora essas políticas de
programas educacionais mascarem a democratização e a universalização do
ensino, pois nem todos terão acesso e não há garantia de que estes que entraram
concluam o curso.
Na realidade, há um “fetiche” quando se justifica que o programa de bolsa
democratiza o ensino, pois conforme sinalizado por autores que se dedicam a
estudar o acesso ao ensino superior (Frigtto, Savini, Boa Ventura, entre outros), a
opção do governo foi a mercadorização da universidade, fato que não é percebido
também pelos alunos entrevistados da Bolsa ProUni, do Curso de Pedagogia, que
foram por nós entrevistados e cujas respostas serão mais aprofundadas no
próximo item.
105
Para ilustrar a questão da democratização do acesso ao ensino superior na
perspectiva do sistema de bolsas do ProUni, apresentamos a seguir algumas das
respostas que nos foram dadas pelo grupo de bolsistas entrevistados que, como
poderá ser observado, à exceção do entrevistado P3, os alunos foram unânimes em
dizer que o ProUni democratiza o ensino, dá oportunidades para os mais carentes
cursarem o ensino superior. Como as respostas se repetiam selecionamos apenas
algumas para exemplificar.
P1 - Democratização é o ProUni em si. Onde você busca através de
programas pessoas que não tinham condições financeiras nenhuma de
chegar ate lá. Então democratizar o ensino superior é buscar essas pessoas
através de doar, para aquelas pessoas que core atrás. Eu estudei, eu lutei
pra chegar até onde eu estou hoje. Nada me foi dado.
P2 - Pra mim o significado seria a liberdade pra todo mundo ter. Seria esse
céu aberto pras pessoas, como nós, necessitadas de ensino superior que não
temos dinheiro pra pagar a faculdade de agora poder está aqui no auge da
nossa vida [...]
P3 - - [...] Então essa democratização pelo ProUni, pra mim significa que
estou fazendo parte de um grupo que na verdade está sendo privilegiado, é
um projeto limitado, e os outros?
P4 - Vamos dizer que seja assim, uma oportunidade maior, de conseguir o
que eu não podia porque com o salário que eu ganhava, eu não conseguia
pagar as mensalidades, então o ProUni abriu um leque pra eu conseguir e
suprir essa necessidade que eu tinha de ingressar na faculdade.
P7 - Democratização é a democracia. O governo está buscando essa
democratização através do ProUni dando essa chance pra muita gente
cursar o ensino superior sem pagar. Isso é a verdadeira democratização.
P8 - - Democratização é uma forma de dar uma oportunidade pra todos.
Pena que as vagas sejam poucas. O governo está demonstrando a
democratização através do ProUni porque aí as pessoas podem ter a
chance de cursar o ensino superior sem pagar ou pagando só a metade.
Claro que o ideal é não pagar porque aqui na faculdade a gente tem
algumas despesas extras e pesa no orçamento. Mas essa democratização é
muito válida.
Nos fragmentos acima, o entrevistado P3 percebe que somente a bolsa não é
garantia de continuar no estudo, pois segundo ele “não é fácil se manter em uma
universidade privada”. O aluno precisa custear a sua permanência no ensino
superior garantindo, entre outras, a aquisição de livros, apostilas, transporte,
execução de trabalhos, fundamentais no processo de desempenho acadêmico.
A maioria dos relatos aponta como percepção de democratização o fato de
eles, os alunos carentes, terem finalmente oportunidade de adentrar ao ensino
superior, uma vez que apenas com o salário que recebiam por seus trabalhos não
106
era possível pagar uma universidade, e, através do ProUni, eles têm essa
oportunidade. A pergunta que nos fazemos é: então isso é democratização?
A democracia, para Cortela (2005, p 146) “não é um fim em sim mesma; é
uma poderosa e indispensável ferramenta para a construção contínua da cidadania,
da justiça social e da liberdade compartilhada. Ela é a garantia do princípio da
igualdade irrestrita entre todas e todos [...]”. Nesse sentido, Freire (2003, p. 11) já
nos alertava de que como seres políticos, os homens não podem deixar de ter
consciência do seu ser ou do que está sendo, e “é preciso que se envolvam
permanentemente no domínio político, refazendo sempre as estruturas sociais,
econômicas, em que se dão as relações de poder e se geram as ideologias”. A
vocação do ser humano não é de ser dominado, massacrado, modelado ou
dirigido, mas, de “ser mais”, fazer e refazer a sua história, intervindo no seu meio.
Sendo assim, percebe-se no discurso do aluno a falta de consciência política
do sistema do qual está envolvido, que as políticas de acesso ao ensino superior,
estão inseridas num projeto que nega o direito a políticas sociais através de
políticas universais. O entrevistado P3 nos pareceu ter sido o único a ter essa
concepção quando afirmou “pra mim o ProUni significa que estou fazendo parte
de um grupo que na verdade está sendo privilegiado, é um projeto limitado, e os
outros?” Depreende-se de seu discurso que a crítica ao acesso ao ensino superior
no que se refere a uma visão mais sistêmica do assunto.
Cabe ratificar que a política do ProUni não atende a todos, mas apenas a
uma pequena parcela da população. É necessário romper com a lógica do capital
se quisermos criar de fato a democratização do ensino e, para tanto, a
multiplicação de instituições públicas e gratuitas, bem como de escolas públicas
de ensino fundamental e médio de qualidade, são necessidades prioritárias.
Na maioria das faculdades e centros universitários, privados ou não, tem-se
o ensino por excelência, não há investimento em pesquisa e extensão, sem contar
que a formação do estudante fica dependente, cada vez mais, do seu esforço
próprio.
Apesar das declarações dos alunos entrevistados, percebe-se, com base na
literatura que nos serviu de apoio, a falta de consciência da responsabilidade do
governo com políticas sociais e a força do ideário neoliberal no campo da
educação superior de que a universidade pública é irreformável porque a única
alternativa está na criação do mercado universitário, como se fosse a indústria do
107
diploma. O aluno acaba assumindo o discurso do privado e do individual, como
pode ser ilustrado no seguinte fragmento: “Vamos dizer que seja assim, uma
oportunidade maior, de conseguir o que eu não podia porque com o salário que
eu ganhava, eu não conseguia pagar as mensalidades, então o ProUni abriu um
leque pra eu conseguir e suprir essa necessidade que eu tinha de ingressar na
faculdade”. Nessa fala, evidencia-se que o setor privado é o que traz benefícios e
estes estão restritos apenas a um eu, como pode ser visto nos destaques da citação
acima.
Não se percebe o reconhecimento, por parte dos alunos bolsistas
entrevistados, da descapitalização e desestruturação da universidade pública a
favor do emergente mercado universitário, com transferência de recursos para o
setor privado às custas do setor público. Na fala dos alunos, a universidade
pública é a frustração do sonho.
Ainda quanto à democratização do acesso ao ensino superior, outra questão
política que fica velada na fala dos alunos, diz respeito à gratuidade do ensino na
universidade particular, pois os bolsistas do curso de pedagogia entrevistados
evidenciaram como positivo o fato de estar na universidade privada sem pagar.
P1 – Sim, o ProUni deixa o aluno que não consegue entrar na UFAM, UEA
estudar numa faculdade boa de graça. [...] então isso é um ponto positivo e
negativo ao mesmo tempo e isso acaba limitando isso aí aos alunos.
P4- Pra mim os positivos é que eles possam continuar com essas bolsas
oferecendo a oportunidade pra outras pessoas e de negativos, tipo assim,
eles criem mais oportunidades pra mais pessoas que ainda não acessaram,
porque hoje ainda tem poucas oportunidades.
P5- Pontos positivos é você não precisar pagar. É uma coisa muito boa. A
gente precisa cursar uma faculdade, mas não tem como pagar. [...] Pontos
negativos é muita burocracia é demais. Quase que eu não consigo por
causa dos documentos. Horrível. Muita comprovação. Bastante.
O aluno não consegue perceber que o sistema de bolsas tira os recursos
públicos para investir no setor privado. Os alunos não compreendem que seus
estudos estão sendo financiados pelos encargos públicos. Diante do sentido da
educação proposto pelo neoliberalismo e de suas teorias quantitativas, reduzida a
um valor de uso, constrói-se um aluno alienado, coisificado, preso a ideologia
dominante, que esvazia o humano em confronto com os interesses de mercado. Na
fala de Paulo Freire (1996), isto é uma imoralidade que sobrepõe os interesses
radicalmente humanos aos do mercado.
108
O referido autor nos adverte, ainda, que o sistema nos faz cair nas
armadilhas das ideologias que diretamente ocultam a verdade dos fatos para
penumbrar ou opacizar a realidade ao mesmo tempo em que nos torna
míopes.(Freire, 1996)
As utopias geradas a partir da possibilidade de cursar o ensino superior
através dos programas de bolsas oferecidas pelo governo, e do funcionamento de
uma sociedade pautada no mercado contém um forte componente subjetivo de
negação da realidade, isto é, não permitem aos beneficiários dos programas
enxergar o falseamento da democratização do ensino, em que a maioria da
população pobre fica excluída do processo.
Entendemos que a medida escolhida pelo Brasil foi o de se tornar Estado
Mínimo nessa questão, investindo no setor privado e diminuindo sua
responsabilidade quanto aos resultados da educação, embora este se coloque como
fiscalizador e controlador, quando cria o sistema de avaliação do ensino em todos
os seus segmentos. Nessa perspectiva, convém lembrar que o Brasil é uma forma
marcada pela apropriação da escola pública em função dos interesses particulares
de grupos poderosos, com uma tradição autoritária e excludente, condensada no
autoritarismo social. A criação do ProUni não está fora desse contexto, pois, ao
mesmo tempo que inclui, é excludente, já que nem todos podem permanecer e dar
continuidade aos estudos devido às questões socioeconômicas.
Tanto que, quando se perguntou aos alunos bolsistas a respeito do acesso e
permanência no ensino superior, um dos alunos deu a seguinte resposta:
P 3 – [...] Agora com relação a permanência, eu acho assim que o governo
poderia é criar outros tipo de método que o aluno ganhasse uma bolsa pra
permanecer nos estudo, você sabe que na faculdade o problema não é só
entrar, mas tem a passagem de ônibus, materiais didáticos, os livros,
sucessivamente, então acho que a parte de acesso ta boa, mas a parte de
permanência o governo poderia criar algo diferente pra tentar ajudar esses
alunos a permanecer na faculdade.
Para esse aluno, a permanência no ensino superior deveria ser também
responsabilidade do governo, pois as condições financeiras de cursar uma
graduação estão para além da mensalidade, envolvem outros gastos e também a
determinação pessoal para enfrentar as diversas situações relativas para cursar e
manter o estudo.
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Outras falas evidenciam que a permanência no ensino superior está atrelada
ao rendimento do estudante, ao desafio de estudar, de obter boas notas para assim
concluir o curso.
P 8 – O acesso é muito difícil principalmente pra gente que sempre estudou
em escola pública, a senhora vê o estado degradante do ensino público.
[...]. Agora, permanecer é difícil, tem que ter muita força de vontade e
disciplina. Tem que estudar pra garantir a permanência. Não pode
reprovar senão perde a bolsa. Eu me esforço muito, estudo de madrugada,
final de semana porque não quero perder essa oportunidade. [...]
P 9 – [...] E como já falei a escola pública não prepara tão bem. [...] Então
o acesso não é tão fácil assim, é muita gente concorrendo. [...] Aí a
permanência é outra dificuldade que temos que superar, e muito maior.
Temos que ter disciplina e força de vontade. É muita exigência de estudar.
Os professores cobram muito. Está certo, eles tem que ensinar bem. [...]
P 10 – [...] Difícil é a permanência. Você conciliar família, trabalho e
estudo não é fácil. Garantir essa permanência exige muita dedicação e
esforço. Estudo de madrugada, nos finais de semana, nos intervalos de uma
coisa e outra. Os professores são bons, mas exigem muita leitura. Nosso
curso é a base de textos e leituras. Uma loucura. Cada professor acha que a
gente só tem a matéria dele. Então você precisa se esforçar muito, se
dedicar e ter muita disciplina senão você se perde e não acompanha. Acho
que é por isso que alguns desistem porque é puxado.
Nas falas dos alunos, o professor é visto como aquele que cobra, que exige
leitura, trabalhos. Importante ressaltar que os entrevistados entendem essa atitude
do professor como correta, como algo que deve ser feito. Entre os motivos para
permanência no ensino superior, os alunos alegam as dificuldades de manter a
família, trabalhar e estudar. Rodrigues, citando Zago (2006) enfatiza que o acesso
ao ensino superior é uma vitória, mas sua permanência implica apoio familiar e
algum tipo de atividade remunerada.
Outro fator marcante na fala dos alunos para sua permanência no curso é
cumprir as tarefas acadêmicas, pois esse aspecto evidenciou-se como o mais
complexo porque exige autonomia nos estudos, representada em suas falas pela
“disciplina”, tempo para se dedicar às leituras e realizações de trabalhos. E
precisa, em especial, superar suas dificuldades trazidas dos segmentos anteriores.
A aprendizagem é, sem dúvida, uma questão de caráter autônomo e quando
essa construção ainda não se efetivou, o aluno se sente pressionado a dar conta
das exigências postas por essa nova fase de sua vida. Alguns trechos das falas
revelam bem esta realidade: “Estudo de madrugada, nos finais de semana, nos
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intervalos de uma coisa e outra”, “Então você precisa se esforçar muito, se
dedicar e ter muita disciplina senão você se perde e não acompanha. Acho que é
por isso que alguns desistem porque é puxado”.
A exigência nos aspectos cognitivo-intelectuais está posta e obriga o aluno a
buscar aspectos que propiciem e possibilitem a construção de sujeitos aprendizes,
em que estes se tornam, também, responsáveis por sua formação acadêmica,
porém, a aprendizagem é reduzida a um saber dado, dissociado do
desenvolvimento humano e passa a representar uma nota a ser alcançada no final
do semestre.
Debater a questão da democratização do ensino esbarra nos direitos sociais
dos cidadãos, que no processo histórico do povo brasileiro tem sido dificultado de
várias formas, dentre elas, a desvantagem na formação escolar básica entre os
ricos e os pobres. Os pobres não conseguem acesso às instituições públicas de
ensino superior em função de seus estudos na escola primária e secundária inferior
e com falta de recursos. Resolver os problemas da educação parece não ser a
proposta de um governo neoliberal, que faz uma pseudoinclusão, quando deveria
priorizar investimentos na expansão da educação pública, gratuita e de qualidade,
já que este é um direito pleno da cidadania.
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