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Gilson Dipp
A DELAO OU COLABORAO PREMIADA
Uma anlise do instituto pela interpretao da lei.
Instituto Brasiliense de Direito Pblico IDP Braslia 2015
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Conselho Editorial:
Presidente: Gilmar Ferreira Mendes (IDP) Secretrio Geral: Jairo Gilberto Schfer (IDP) Coordenador-Geral: Walter Costa Porto (Instituto Federal da Bahia) 1. Adriana da Fontoura Alves (IDP) 2. Alberto Oehling de Los Reyes (Madrid) 3. Alexandre Zavaglia Pereira Coelho (PUC-SP) 4. Arnoldo Wald (Universidade de Paris) 5. Atal Correia (IDP) 6. Carlos Blanco de Morais (Faculdade de Direito de Lisboa) 7. Carlos Maurcio Lociks de Arajo (IDP) 8. Everardo Maciel (IDP) 9. Felix Fischer (UERJ) 10. Fernando Rezende 11. Francisco Balaguer Callejn (Universidade de Granada) 12. Francisco Fernndez Segado (Universidad Complutense de Madrid) 13. Ingo Wolfgang Sarlet (PUC-RS) 14. Jorge Miranda (Universidade de Lisboa) 15. Jos Levi Mello do Amaral Jnior (USP)
16. Jos Roberto Afonso (USP) 17. Julia Maurmann Ximenes (UCDAVIS) 18. Katrin Mltgen (Faculdade de Polticas Pblicas NRW - Dep. de Colnia/Alemanha) 19. Lenio Luiz Streck (UNISINOS) 20. Ludger Schrapper (Universidade de Administrao Pblica do Estado de Nordrhein-Westfalen) 21. Marcelo Neves (UnB) 22. Maria Alicia Lima Peralta (PUC-RJ) 23. Michael Bertrams (Universidade de Munster) 24. Miguel Carbonell Snchez (Universidad Nacional Autnoma de Mxico) 25. Paulo Gustavo Gonet Branco (IDP) 26. Pier Domenico Logroscino (Universidade de Bari, Italia) 27. Rainer Frey (Universitt St. Gallen) 28. Rodrigo de Bittencourt Mudrovitsch (USP) 29. Rodrigo de Oliveira Kaufmann (IDP) 30. Rui Stoco (SP) 31. Ruy Rosado de Aguiar (UFRGS) 32. Sergio Bermudes (USP) 33. Srgio Prado (SP) 34. Teori Albino Zavascki(UFRGS)
_______________________________________________________________
Uma publicao Editora IDP
Reviso e Editorao: Ana Carolina Figueir Longo
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DIPP, Gilson. A delao ou colaborao premiada: uma anlise do instituto pela interpretao da lei. Braslia : IDP, 2015. Disponvel no http://www.idp.edu.br/publicacoes/portal-de-ebooks 80 p. ISBN 978-85-65604-57-4 DOI 10.11117/9788565604574 1. Jurisdio Constitucional Brasil. 2. Norma Jurdica I. Ttulo.
CDD 341.2
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PREFCIO
Desde muito tempo as expresses crime organizado, organizaes
criminosas e, enfim, delao premiada deixaram de ser unicamente parte do
vocabulrio dos juristas, tornando-se elementos-chave em manchetes dos
principais meios de comunicao em nosso pas.
De fato, e infelizmente, em especial a partir de operaes policiais
de sugestivos nomes, cada vez mais comum vermos holofotes apontados
sobre formas indevidas de obteno vantagens que acabaram (e acabam)
interligando os sistemas da poltica e da economia em esquemas bem pouco
republicanos.
Nesta toada, a presente obra que nos entrega o Ministro Gilson Dipp
no poderia ter chegado em melhor hora pois, para alm do sentido e razo de
cunho jurdico que, como si acontecer, carrega, traz consigo o condo de
lanar luzes em diversos pontos ainda carentes de esclarecimento sobre um
dos institutos mais registrados pelos meios jornalsticos nos ltimos meses: a
delao premiada.
Incorporado ao ordenamento ptrio desde os anos noventa o
instituto da delao premiada (ou colaborao premiada, como agora passa a
ser conhecida) nasceu com o fito de propiciar tanto o descobrimento de
infraes penais, quanto a identificao da autoria e participao de agentes
em situaes singularmente complexas que, no mais das vezes, envolvem
organizaes criminosas cujas estruturas de comando e modus operandi
dificultam a persecuo penal.
Em uma viso panormica de nossa ordem jurdica na esfera penal
e processual penal, percebe-se que seja na j revogada Lei 9.034/95, que
dispunha sobre a utilizao de meios operacionais para a preveno e
represso de aes praticadas por organizaes criminosas; seja,
exemplificativamente, na alterao da Lei 7.492/86, que define os crimes contra
o sistema financeiro nacional; ou, ainda, na Lei 8.137/90 que, por seu turno,
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prev os crimes contra a ordem tributria, econmica e contra as relaes de
consumo, benefcios aos delatores foram sendo internalizados em diferentes
tipos normativos.
Todas previses legislativas essas que, se de um lado demonstram
a preocupao poltico-criminal em aparelhar a investigao e o processo
penal, de outro provocam intensas reflexes quanto acomodao do instituto
na prxis policial, ministerial e judiciria.
Turbulncias parte, em especial no que diz respeito crtica
doutrinria que busca fulminar a prpria existncia da delao sob um
fundamento tico, o fato que a colaborao persiste em nosso ordenamento,
tendo recebido novo trato a partir da Lei 12.850, de 02 de agosto de 2013.
Tendo como especial foco, como muito bem esclarece o autor, a
organizao criminosa, o crime organizado, a colaborao premiada
caracteriza-se como um evento de natureza processual incidental ao
procedimento investigatrio ou ao processo criminal, seja antes da instaurao
da ao penal ou ainda na fase de inqurito, e at mesmo aps a sentena ou
em fase de execuo.
Em linhas gerais, dispondo sobre direito material e direito
processual, a lei, no que toca colaborao, estabelece que o juiz poder, em
benefcio daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a
investigao e com o processo criminal, a requerimento das partes, conceder
perdo judicial, reduzir em at 2/3 (dois teros) a pena privativa de liberdade ou
substitu-la por restritiva de direitos.
Com a lei pretende-se reforar a tutela a bens jurdicos pelo auxlio
prestado por um agente conhecedor intrnseco do engendre criminoso a partir
de sua deciso voluntria de colaborar. Ou seja, trata-se de um
comportamento que parte de uma deciso do prprio agente, que pode no ser
espontnea, mas que sempre livre. Sendo, neste diapaso, importante e
fundamental para o acordo, portanto, que haja: um, a renncia ao silncio pelo
colaborador, e seu consequente compromisso de dizer a verdade; e, dois, por
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bvio, a assistncia de seu defensor em todos os momentos, inclusive para
renunciar defesa pessoal negativa.
Vale ressaltar que, como aponta o autor, a lei no cogitou de relato
crtico ou juzo de valor da colaborao, o que, entretanto, como o mesmo
tambm assevera, parece ser intuitivo, vez que desse relato decorrer a
valorizao objetiva da colaborao.
Por sinal, e como tambm aponta o autor em seus comentrios,
pelo relato da colaborao, e seus resultados, que ser possvel desde logo
apurar a efetividade da mesma, a qual ficar sujeita ao juzo do Ministrio
Pblico e da autoridade policial e, claro, da reavaliao pelo magistrado por
ocasio da homologao.
Importante que se diga que a colaborao dever resultar, separada
ou conjuntamente, na identificao dos demais coautores e partcipes da
organizao criminosa e das infraes penais por eles praticadas; na revelao
da estrutura hierrquica e da diviso de tarefas da organizao criminosa; na
preveno de infraes penais decorrentes das atividades da organizao
criminosa; na recuperao total ou parcial do produto ou do proveito das
infraes penais praticadas pela organizao criminosa; ou, ainda, na
localizao de eventual vtima com a sua integridade fsica preservada.
Como observa-se a lei 12.850 aumentou os benefcios concedidos
ao colaborador, prevendo, no apenas reduo de pena, como tambm perdo
judicial e substituio da pena corprea por pena restritiva de direitos. Ampliou
significativamente o rol de resultados para a concesso de possveis
benefcios. E, alm disso, tanto estabeleceu direitos ao colaborador, como
instituiu requisitos de validade do termo de acordo da colaborao.
Em sntese, e como encerramento deste prefcio cujo convite me
honrou mais do que o merecido, alentador doutrina brasileira receber as
aclaradoras linhas preenchidas pela pena do eminente Ministro Gilson Dipp
sobre esse instituto que, como bem ele prprio esclarece, a prxis judiciria
acabou por construir, mas que, logicamente, dever ser harmonizado no
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conjunto dos propsitos e limites legais que disciplinam e orientam a
instaurao da ao penal correspondente ou os da investigao quando
existentes.
Braslia, dezembro de 2014.
Profa. Dra. Soraia da Rosa Mendes
Professora Titular do Programa
Mestrado em Direito do Instituto
de Direito Pblico IDP.
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A DELAO OU COLABORAO PREMIADA
Uma anlise do instituto pela interpretao da lei.
A delao premiada, denominao popular da chamada
colaborao premiada instituda pela Lei n 12.8501, de 2 de agosto de 2013, e
fruto de progressiva formalizao pelos magistrados de competncia criminal
ao longo de vrios anos no trato da criminalidade organizada, tanto na rea
federal quanto na justia estadual com inspirao no direito comparado. Para
esse efeito, os juzes foram elaborando conceitos e procedimentos a partir das
necessidades da prtica processual que permitissem a adoo de colaborao
negociada entre acusao e defesa a respeito de condutas criminosas ou
ilcitos penais de acentuada gravidade, praticados por organizao criminosa
ou atravs dela. Essa colaborao, como meio de obteno de elementos de
prova, tem por propsito promover a rpida apurao dos ilcitos e de modo
clere a aplicao das punies correspondentes em face de condutas de
difcil comprovao. Nesse aspecto, vale conferir recente julgado do Supremo
Tribunal Federal no HC 90.688-PR (Rel. Lewandowski, 1 T, DJe 25.04.2008,
maioria, II Sigilo do acordo de delao que, por definio, no pode ser
quebrado) a respeito do pretendido direito a acesso ao teor do acordo de
delao premiada. Nessa ocasio a Corte fixou entendimento de no constituir
esse documento meio de prova mas meio de obteno dela assim no se
submetendo necessariamente ao contraditrio ou ampla defesa, podendo
manter-se sobre ele o sigilo s demais partes (no envolvidas no acordo) ou
interessados, enquanto conveniente para a instruo ou at que a lei o
dispense.
1 Define organizao criminosa e dispe sobre a investigao criminal, os meios de obteno
da prova, infraes penais correlatas e o procedimento criminal; altera o Decreto-Lei no 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 (Cdigo Penal); revoga a Lei no 9.034, de 3 de maio de 1995; e d
outras providncias
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Na lei, a disciplina da colaborao premiada est includa em um
capitulo (Seo I Capitulo II), sujeita assim, pela tcnica legislativa, aos
princpios gerais dessa normativa os quais estabelecem conceitos-base de
natureza material como organizao criminosa, investigao criminal, condutas
tpicas e penalizao correspondentes, e disposies de ordem processual
importantes a serem respeitadas na interpretao respectiva.
Tais balizas so relevantes pois elas indicam os limites da aplicao
dos institutos da lei que so excepcionais cuja disciplina, por essa razo, tem
contornos claramente restritos e restritivos, especialmente na perspectiva
intertemporal.
No artigo 1, obediente aos cnones de elaborao legislativa (LC
95, de 26 de fevereiro de 1998), a lei define o mbito de atuao de seus
preceitos, isto , d a definio de organizao criminosa para seus fins e
subsequente aplicao; dispe sobre a investigao criminal, meios de prova e
identificao de infraes penais prprias; e estabelece regras especiais de
procedimento criminal a serem observadas. Em outras palavras a lei, com foco
na organizao criminosa (e, portanto, no crime organizado) que o ndice
principal de interpretao, dispe sobre direito material e direito processual.
Veja-se passo a passo.
Art. 1o Esta Lei define organizao criminosa e dispe sobre a investigao criminal, os meios de obteno da prova, infraes penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.
1o Considera-se organizao criminosa a associao de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela diviso de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prtica de infraes penais cujas penas mximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de carter transnacional.
A cabea do art. 1 identifica os limites de aplicao da lei nova, a
definio de organizao criminosa cujo conceito servir de referencia para a
interpretao dos demais. A lei tambm versa sobre a investigao criminal
correspondente a dizer que, apesar das regras gerais existentes na legislao
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ordinria para o processo relacionado com as organizaes criminosas, h
peculiaridades quanto aos elementos de obteno de prova, quanto s
infraes penais correlatas e ao procedimento criminal a ser aplicado. Nessa
linha, o processo penal dos crimes praticados por organizao criminosa
observar as regras gerais de processo penal e os procedimentos especiais
ora disciplinados na lei nova sem prejuzo daquelas, mas obedientes ao seu
propsito especifico.
No pargrafo 1 do art. 1 ficou legalmente assentado que
organizao criminosa a associao de 4 (quatro) ou mais pessoas,
estruturalmente ordenada e caracterizada pela diviso de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de
qualquer natureza, mediante a prtica de infraes penais cujas penas
mximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de carter
transnacional.
Essa noo fundamental e precisa a todo tempo ser integral e
integradamente compreendida de modo sistemtico em beneficio da clareza e
preciso da aplicao da lei em toda sua amplitude.
Uma organizao criminosa de modo geral se revela por dotar-se de
aparato operacional, o que significa ser uma instituio orgnica com atuao
desviada, podendo ser informal e at formal mas clandestina e ilcita nos
objetivos e identificvel como tal pelas marcas correspondentes. A organizao
criminosa pode tambm, eventualmente ou ordinariamente, exercer atividades
lcitas com finalidade ilcita, apesar de revestir-se de forma e atuao
formalmente regulares. Um estabelecimento bancrio que realiza operaes
legais e lcitas em deliberado obsequio de atividades ilcitas de terceiro, o
exemplo que recomenda cuidado e ateno na compreenso de suas
caractersticas.
A principal delas ser produto de uma associao, expresso que
indica a afectio entre pessoas com propsitos comuns ou assemelhados em
finalidade e objeto. essencial que haja afinidade associativa entre as pessoas
(usualmente pessoas fsicas, mas no impossvel a contribuio de pessoas
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jurdicas) ainda que cada uma tenha para si uma pretenso com motivao e
objetivos distintos das demais e justificativas individuais, todavia logicamente
reunidas por inteno e vontade comum nos resultados.
A associao para assumir o carter de organizao criminosa ter
de reunir 4 ou mais pessoas com idnticas intenes mesmo que tenham
desempenhos diversos, mais ou menos importantes no interior da estrutura e
operaes da mesma. O pressuposto necessrio que a associao seja una
nos propsitos.
A estrutura ordenada da associao pela diviso de tarefas constitui
elemento importante para a identificao da organizao criminosa,
independente de estar ou no formalmente estabelecida, podendo ser atravs
de tarefas distribudas de modo direto ou indireto, tanto horizontal como
verticalmente, ainda que de feitio assimtrico em poder de concepo, de
direo ou de execuo, e desde que revele funcionalidade e racionalidade
prprias.
Importa, sobretudo, tenha a distribuio de tarefas dentro da
organizao a finalidade de obter vantagens de qualquer natureza, que pode
ser pecuniria ou material, em benefcios ou crditos, oportunidades ou
facilidades, embora todas, em principio, possivelmente conversveis em valor
monetrio ou em espcie.
As tarefas so propriamente as infraes penais ou atividades
tendentes realizao de crimes pelos quais seja promovida a consumao
dos resultados ilcitos da organizao criminosa. Mas no qualquer infrao
penal seno aquelas punidas com pena mxima superior a 4 anos, ou que
constituam crime de carter transnacional. A definio das penas, para o efeito
mencionado, pode suscitar dificuldades em caso de concurso formal ou
material em que se somam ou acrescem para outros fins, com reflexos lgicos
na concepo do regime de criminalidade organizada. Alm disso, pela nova lei
foram institudas agravantes e qualificadoras pelas quais a pena pode se
elevada a patamares muito mais significativos. Por essa razo, parece evidente
a compreenso de que se cuida de delitos insuscetveis de substituio da
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pena, seja pela quantidade seja pela natureza da realizao do crime. A
observao pertinente e oportuna, pois at ento era comum nos casos mais
complexos e demorados no prevalecerem as imputaes de quadrilha ou
bando (o exemplo por todos o da AP 470 STF caso mensalo, organizao
criminosa com vrios rus, alguns, porm, sem condenao ou imposio de
pena), pela dificuldade de prova ou pela prescrio ante a reduzida pena
imponvel, frustrando sobremaneira a condenao e assim com manifesto
reflexo na demonstrao da criminalidade organizada. Se no tecnicamente, ao
menos na opinio pblica ou no imaginrio popular essa ilao se impe pela
negativa, pois no havendo condenao ou ocorrendo a extino da
punibilidade do crime de quadrilha pode no haver evidncia de crime
organizado (o art. 24 da lei, talvez com essa preocupao, d nova redao ao
pargrafo nico do art. 288 Cdigo Penal crime de quadrilha ou bando
aumentando a pena em metade se armado e dele participa criana ou
adolescente).
A lei incluiu nesse regime tambm o crime de carter transnacional,
independente da pena imponvel, fazendo-o suscetvel de caracterizao como
daqueles que so abrangidos pelo conceito de organizao criminosa, de tal
modo que esta poder ser identificada penalmente quando se dedica a essa
modalidade de crime. A lei no o define, mas resulta logico de sua designao
e compreenso que seja realizado ou consumado em mais de um pas, ou
valendo-se l fora de modo licito ou ilcito de facilidades oferecidas por
diferentes sistemas financeiros ou polticos, em prejuzo dos interesses
nacionais do Brasil ou com resultados no pas.
De outra parte, o Brasil subscreveu diversos instrumentos
internacionais a esse respeito, servindo de subsidio para a referida noo,
como a seguir elencado:
1. Conveno das Naes Unidas contra a Corrupo, promulgada pelo Decreto n 5.687, de 31 de janeiro de 2006; 2. Conveno das Naes Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto n 5.015, de 12/03/2004; 3. Protocolo Adicional Conveno das Naes Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo Preveno,
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Represso e Punio do Trfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianas, promulgado pelo Decreto n 5.017, de 12/03/2004; 4. Protocolo Adicional Conveno das Naes Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, relativo ao combate ao Trfico de Migrantes por via terrestre, martima e area, promulgado pelo Decreto n 5.016, de 12/03/2004; 5. Protocolo contra a Fabricao e o Trfico Ilcito de Armas de Fogo, suas Peas e Componentes e Munies, complementando a Conveno das Naes Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgado pelo Decreto n 5.941, de 26/10/2006; 6. Conveno para a Supresso do Financiamento do Terrorismo; promulgado pelo Decreto n 5.640, de 26/12/2005; 7. Protocolo Facultativo Conveno sobre os Direitos da Criana referente venda de crianas, prostituio infantil e pornografia Infantil, promulgado pelo Decreto n 5.007, de 08/03/2004 e depositado na Secretaria Geral da ONU; 8. Conveno contra o Trfico Ilcito de Entorpecentes e Substncias Psicotrpicas, Decreto n 154, de 26 /07/1991; 9. Conveno sobre a Preveno e Punio de Crimes contra Pessoas que Gozam de Proteo Internacional, inclusive Agentes Diplomticos, Decreto n 3.167, de 14/09/1999; 10. Conveno Internacional contra a Tomada de Refns, Decreto n 3.517, de 20/06/2000; 11. Conveno sobre a Proteo Fsica de Materiais Nucleares, Decreto n 95, de 16/04/1991; 12. Conveno para a Represso aos Atos Ilcitos contra a Segurana da Aviao Civil, Decreto n 2.611, de 02/06/1998; 13. Conveno para a Supresso de Atentados Terroristas com Bombas, Decreto n 4.394, de 26/09/20024.
Do exame de todas as discusses respectivas resulta uma frmula
que pode resumir em boa parte o que seja modernamente crime transnacional:
... [] a atividade ou o conjunto de atividades, isoladas ou reiteradas,
cometidas por grupo criminoso organizado, que, em transterritorialidade,
envolva a prtica de infraes penais graves (com pena privativa de liberdade
igual ou superior a quatro anos) ou, qualquer que seja a pena, diga respeito
aos crimes mencionados na Conveno de Palermo e seus Anexos....
No conceito de Criminalidade Transnacional, contudo, ficaram sem
previso as modalidades ilcitas transterritoriais como o terrorismo de Estado,
as polticas capitalistas predatrias praticadas sob o manto da legalidade, o
genocdio dos sistemas prisionais, os crimes ambientais, crimes contra as
relaes de consumo etc. (Santo. Davi do E.,
www.univali.br/direitoepolitica-ISSN1980-7791).
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Ou, como est na Conveno das Naes Unidas contra o Crime
Organizado Transnacional (Dec. 5.015, 12.03.2004) ...a infrao ser de
carter transnacional se for cometida em mais de um Estado; for cometida em
um s Estado, mas uma parte substancial de sua preparao, planejamento,
direo e controle tenha lugar em outro Estado; for cometida num s Estado,
mas envolva a participao de um grupo criminoso organizado que pratique
atividades criminosas em mais de um Estado; ou for cometida num s Estado,
mas produza efeitos substanciais noutro Estado..
No que respeita colaborao premiada, diversas disposies
legais a seguir mencionadas, anteriores a esta lei nova e relacionadas com o
tema, em maior ou menor grau disciplinaram modalidades de colaborao por
parte do ru ou acusado ao longo dos ltimos anos.
A Lei n. 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro) foi a que por
primeiro disciplinou o tema no art. 25 e 2 (...nos crimes previstos nesta lei,
cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou participe que atravs de
confisso espontnea revelar autoridade policial ou judicial toda a trama
delituosa ter a sua pena reduzida de um a dois teros).
A Lei n. 8.072/90 (crimes hediondos) disps no art. 8 e nico (o
participante e o associado que denunciar a autoridade o bando ou quadrilha,
possibilitando seu desmantelamento, ter a pena reduzida de um a dois
teros).
A Lei n. 8.137/90 (crimes tributrios) estabeleceu no art. 16, nico
(nos crimes previstos nesta lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o
coautor ou partcipe que atravs de confisso espontnea revelar autoridade
policial ou judicial toda a trama delituosa ter a sua pena reduzida de um a
dois teros).
A Lei n. 9.034/95 que trata das organizaes criminosas, hoje
revogada pela Lei n. 12.850/2013, disse no art. 6 (nos crimes praticados em
organizao criminosa, a pena ser reduzida de um a dois teros, quando a
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colaborao espontnea do agente levar ao esclarecimento de infraes
penais e sua autoria).
A lei de proteo s testemunhas a Lei n 9.807/99 -- disps mais
longamente nos arts. 13 a 15 (Art. 13. Poder o juiz, de ofcio ou a
requerimento das partes, conceder o perdo judicial e a consequente extino
da punibilidade ao acusado que, sendo primrio, tenha colaborado efetiva e
voluntariamente com a investigao e o processo criminal, desde que dessa
colaborao tenha resultado: I - a identificao dos demais coautores ou
partcipes da ao criminosa; II - a localizao da vtima com a sua integridade
fsica preservada; III - a recuperao total ou parcial do produto do crime.
Pargrafo nico. A concesso do perdo judicial levar em conta a
personalidade do beneficiado e a natureza, circunstncias, gravidade e
repercusso social do fato criminoso. Art. 14. O indiciado ou acusado que
colaborar voluntariamente com a investigao policial e o processo criminal na
identificao dos demais coautores ou partcipes do crime, na localizao da
vtima com vida e na recuperao total ou parcial do produto do crime, no caso
de condenao, ter pena reduzida de um a dois teros. Art. 15. Sero
aplicadas em benefcio do colaborador, na priso ou fora dela, medidas
especiais de segurana e proteo a sua integridade fsica, considerando
ameaa ou coao eventual ou efetiva. 1o Estando sob priso temporria,
preventiva ou em decorrncia de flagrante delito, o colaborador ser custodiado
em dependncia separada dos demais presos. 2o Durante a instruo
criminal, poder o juiz competente determinar em favor do colaborador
qualquer das medidas previstas no art. 8o desta Lei. 3o No caso de
cumprimento da pena em regime fechado, poder o juiz criminal determinar
medidas especiais que proporcionem a segurana do colaborador em relao
aos demais apenados.).
Por fim, a Lei n 11.343 de 2006, a lei de txicos, garantiu no art. 41
(o indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigao
policial e o processo criminal na identificao dos demais coautores ou
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partcipes do crime e na recuperao total ou parcial do produto do crime, no
caso de condenao, ter a pena reduzida de um tero a dois teros.).
Como se pode observar, a preocupao do legislador evoluiu de
modo progressivo no tratamento dessa forma de colaborao com o processo
penal, e culminou com a disciplina bem mais elaborada e sistematizada na lei
de proteo testemunha cuja disciplina muito se assemelha e agora na lei em
exame.
A principal marca da disciplina legal relativa a essa forma de
colaborao nos diferentes regramentos que ela se refere sempre a crimes
praticados por mais de um agente em forma de coautoria ou coparticipao, ou
de organizao criminosa ou quadrilha ou bando, de modo a deixar assente
que a delao ou colaborao no se aplica aos casos de crimes individuais ou
sem a caracterstica de grupo, bando, quadrilha ou organizao voltada para o
crime.
Na presente Lei n 12.850/2013, que manteve de modo geral a
normativa especifica a qual, por isso, pode servir como paradigma
hermenutico para a aplicao de outras regras assemelhadas levou em
conta especialmente a organizao criminosa como pressuposto imprescindvel
de aplicao desse regime de delao.
Em todas as hipteses legais antes enumeradas de criminalidade
organizada, por tal razo, dever ser observada a oportunidade e alcance da
colaborao e seus efeitos relativamente a cada qual dos delitos nelas
previstos, mas, no que respeita ao procedimento de colaborao premiada
dever ser observado o rito prprio da lei nova, respectivamente os arts. 4 a 8
da Lei n 12.850/2013 com incidncia imediata no que respeita aos aspectos
processuais e nos de carter material para os delitos praticados sob sua
vigncia (i.. de 19.09.2013 em diante).
Vale sublinhar essa circunstncia, decisiva para a boa aplicao da
lei nova. As normas de natureza processual ou procedimental incidem de
imediato e aos processos em andamento, em qualquer estgio que se
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encontrem, da por diante disciplinando-os. As regras que de qualquer forma
impliquem em restrio ou supresso de direito, todavia, no podem retroagir
sobre qualquer deles quando j realizado ou constitudo, seja de ordem
material ou processual uma vez completos e gerando seus efeitos regulares.
o que ressai do disposto no art. 5, XXXVI e XL (este, por extenso, no que
respeita penalidades se mais graves).
De tudo pode ser extrada a concluso preliminar geral de que a
delao ou colaborao premiada, agora disciplinada pela lei nova, pode ser
aplicada em todas as situaes das leis anteriores, observados os seus
respectivos pressupostos, para cada qual delito e regime de colaborao, mas
tendo presente a disciplina da lei atual quando mais benfica e mais compatvel
com os princpios constitucionais de ampla defesa, contraditrio e devido
processo legal.
Nessa linha de compreenso, a delao ou colaborao constitui
incidente processual especial (prvio ou propriamente incidental) com regime e
objeto prprios de cujo sistema, como se ver, podem surgir igualmente
decorrncias especiais e relevantes em particular pelo momento de exerccio e
contedo das revelaes.
A observao relativa autonomia do incidente de delao premiada
tem sua razo de ser pelas consequncias importantes. Como a lei permite a
colaborao premiada em qualquer fase da persecuo penal, admite
logicamente todas as suas decorrncias processuais e de direito material
penal, algumas de modo excepcional mas outras particularmente subversivas
da tcnica processual e dos princpios que a regulam.
Para se ter uma ideia, a delao premiada pode dar-se aps a
sentena de mrito (antes ou depois do trnsito em julgado, mas sobretudo
depois) e pode acarretar, por exemplo, o perdo judicial, a reduo da pena
imposta, ou a substituio dela, mesmo em face de deliberaes processuais
consolidadas ou de precluso ou contra ato judicial coberto por garantias
constitucionais e legais. No parece invencvel esse obstculo formal tanto em
respeito ao principio da verdade real quanto da possvel flexibilizao de
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padres de interpretao em favor do ru ou investigado, o que igualmente no
ofende a essncia da Constituio, mas provoca uma extrema relativizao da
coisa julgada.
Por tais razes, revela-se compatvel com o sistema processual
penal e de direito penal admitir-se, por via da delao premiada (observados
todos os rigores da lei, obviamente), a alterao da coisa julgada, do ato
jurdico perfeito, da situao jurdica constituda em beneficio do ru inobstante
prestando reverncia verdade formal com a qual se compromete. certo que
essa novidade, em termos de processo penal, constitui um fenmeno
excepcional e, como tal, deve receber interpretao restritiva, mas no se deve
recus-lo s por suposta coliso com os padres tradicionais. Cabe aqui, ao
contrrio, a compreenso abrangente dos valores constitucionais mais caros ao
avano civilizatrio e dignidade da pessoa humana, um e outro marcos de
uma modalidade at ento imprevista de justia verdadeira e socialmente
eficiente, em que o dever legal de penalizar o ru pode ceder ante os
interesses da sociedade e do bem pblico.
Art. 1o ..................................................................................... 2o Esta Lei se aplica tambm: I - s infraes penais previstas em tratado ou conveno internacional quando, iniciada a execuo no Pas, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; II - s organizaes terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faa parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatrios ou de execuo de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em territrio nacional.
No art.1, 2 da lei ora comentada, ficou estabelecido que seus
preceitos, inclusive a delao premiada aplicam-se tambm s infraes penais
previstas em tratado ou conveno internacional quando, iniciada a execuo
no pas, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou
reciprocamente (inciso I); e s organizaes terroristas internacionais,
20
reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o
Brasil faa parte, cujos atos terroristas de suporte, bem como os atos
preparatrios ou de execuo, ocorram ou possam ocorrer no territrio nacional
(inciso II).
Trata-se da explicitao de uma categoria transnacional de delitos
sujeitos lei que, assim, submetem-se ao regime dela. bem de ver que a lei
interna tem abrangncia menor que a da Conveno, deixando de lado
algumas hipteses cuja aplicao, quando se oferecer a ocasio, poder ser
objeto de discusso. Assim, a) os atos delituosos praticados no Brasil com
execuo iniciada ou realizada no exterior e os ali fora praticados mas com
execuo no pas, independente de serem prprios de organizao criminosa
(inciso I), assim como b) quando relativos s organizaes terroristas (inciso II)
reconhecidas pela lei brasileira para os atos que de qualquer forma ocorram ou
possam ocorrer no Brasil (Conveno de Palermo e Conveno de Mrida)
sujeitam-se ao controle judicial brasileiro e, para os efeitos desta lei, ao regime
de delao premiada.
Por fora desses atos internacionais, conforme antecipado acima,
inobstante a legislao interna de menor alcance, incidem as diretivas
convencionais acolhidas pelo ordenamento brasileiro (Decreto n 5.015, de 12
de maro de 2004, que promulga a Conveno das Naes Unidas contra ao
Crime Organizado Transnacional especialmente art.26 c/c art. 24; e o Decreto
n 5.687, de 31 de janeiro de 2006 que promulga a Conveno das Naes
Unidas contra a Corrupo, art. 37 c/c art. 32), sendo tais comandos, para o
caso, compatveis com o regime de direitos e garantias da Constituio de
1988.
Cabe anotar que a previso legal de aplicao do regime desta lei
aos crimes previstos em tratado ou conveno internacional sem distino,
implica admiti-la em casos bem diversos das hipteses desta lei pois no se
exige sejam praticados por organizao criminosa de tal modo que simples
crimes singulares podero vir a se sujeitar a ela contra a razo logica da lei e
sim apenas por se definirem como crimes previstos em tratado ou conveno
21
internacional. A proposio natural ser reconhecer essa aplicao to s aos
crimes previstos em tratado ou conveno internacional que se realizem por
meio de organizao criminosa, observados os demais requisitos indicados no
inciso I do pargrafo examinado.
Art. 2o Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organizao criminosa: Pena - recluso, de 3 (trs) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuzo das penas correspondentes s demais infraes penais praticadas.
1o Nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraa a investigao de infrao penal que envolva organizao criminosa.
2o As penas aumentam-se at a metade se na atuao da organizao criminosa houver emprego de arma de fogo.
3o A pena agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organizao criminosa, ainda que no pratique pessoalmente atos de execuo.
4o A pena aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois teros): I - se h participao de criana ou adolescente; II - se h concurso de funcionrio pblico, valendo-se a organizao criminosa dessa condio para a prtica de infrao penal; III - se o produto ou proveito da infrao penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior; IV - se a organizao criminosa mantm conexo com outras organizaes criminosas independentes; V - se as circunstncias do fato evidenciarem a transnacionalidade da organizao.
5o Se houver indcios suficientes de que o funcionrio pblico integra organizao criminosa, poder o juiz determinar seu afastamento cautelar do cargo, emprego ou funo, sem prejuzo da remunerao, quando a medida se fizer necessria investigao ou instruo processual.
6o A condenao com trnsito em julgado acarretar ao funcionrio pblico a perda do cargo, funo, emprego ou mandato eletivo e a interdio para o exerccio de funo ou cargo pblico pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao cumprimento da pena.
7o Se houver indcios de participao de policial nos crimes de que trata esta Lei, a Corregedoria de Polcia instaurar inqurito policial e comunicar ao Ministrio Pblico, que designar membro para acompanhar o feito at a sua concluso.
22
Nesse quadro, a lei, no art. 2 e pargrafos, estabelece penas,
institui e tipifica crimes na ao de promover, constituir, financiar ou integrar,
pessoalmente ou por interposta pessoa, organizao criminosa (pena de 3 a 8
anos de recluso, mais qualificadoras e agravantes) aos quais se reporta
expressamente ento o regime de colaborao premiada. No mbito da lei
apenas a essas condutas que se dirige a disciplina respectiva e aos crimes
praticados por organizao criminosa; aos previstos em tratado ou convenes,
quando iniciada a execuo tenha ou devesse ter ocorrido no exterior ou vice-
versa; ou os praticados por organizaes terroristas internacionais, e, por
extenso legal, os crimes de impedir ou embaraar a investigao de infrao
penal que envolva organizao criminosa (art. 2, 1), sujeitando-se todos s
mesmas penas de 3 a 8 anos de recluso, mais qualificadoras e agravantes.
Desse modo, o regime de delao ou colaborao premiada refere-
se a esse universo definido, no sendo extensvel a situaes fora dos limites
do citado conjunto legislativo, tendo em conta expressamente os limites de
cada qual lei e o padro da lei nova, quando e se aplicvel s demais
disciplinas. Por essa razo, as diferentes figuras legais, que tm seu regime
prprio, no que for compatvel podem, ou no, ter subsdio na lei nova cabendo
analisar cada caso.
Este instituto de direito processual penal consolidou-se e
sistematizou seu processamento tambm base de precedentes
jurisprudenciais em casos concretos nas instncias ordinrias, a maioria
experimentados no mbito federal nas varas federais de lavagem de dinheiro
onde foram elaborados e aperfeioados procedimentos, clusulas e os termos
de acordo, ainda antes da lei nova alguns dos quais foram por ela
incorporados.
Art. 3o Em qualquer fase da persecuo penal, sero permitidos, sem prejuzo de outros j previstos em lei, os seguintes meios de obteno da prova: I - colaborao premiada;
A lei permite (art. 3, I) a instaurao desse incidente de delao
premiada em qualquer momento do processo ou antes dele (em qualquer fase
23
da persecuo penal), como meio de obteno de prova. Isto , a colaborao
premiada no constitui meio de prova e sim ferramenta processual orientada
para a produo de prova em juzo, submetendo-se dessa forma, e somente de
modo secundrio, ao regime geral de produo de prova regulado pela lei
processual e sujeito s garantias constitucionais correspondentes. Esse dado
relevante pois dele decorrem algumas consequncias como se vai adiante
relembrar.
A lei permite a delao premiada em qualquer fase da persecuo
penal. Para a exata compreenso do alcance dessa expresso necessrio
definir o que constitui persecuo penal. No h dvida de que a fase de
inqurito policial -- e at antes dele por extenso (sindicncias preliminares,
investigao policial preliminar, averiguaes administrativas) -- pode ser
compreendida na noo de persecuo penal que inclui a instruo processual
e a fase dos recursos ordinrios e excepcionais at a formao da coisa
julgada formal e material. Quanto a isso no parece subsistir dvida. A questo
saber se a execuo da pena pode ser compreendida na noo de
persecuo penal. Aparentemente, a resposta positiva dado que mesmo
nessa fase so inmeras as possibilidades de reexame da condenao, seja
por reviso criminal (art. 621 CPP) em sentido estrito; seja por unificao de
penas; seja por incidentes de execuo para apreciao de regime, de favores
ou reprimendas decorrentes da prpria condenao (art. 66, I, II e III Lei n
7210/84); ou pela possibilidade sempre presente de anlise de toda matria de
fato e de direito por meio de habeas-corpus que a jurisprudncia admite nas
mais variadas circunstncias, inclusive depois do trnsito em julgado da
sentena condenatria. Seria incongruente permitir toda sorte de reexames
desse teor depois de encerrada a instruo e ao mesmo tempo considerar
esgotada a persecuo penal quando ainda pode ser largamente discutida e
desfeita por variados motivos de fato e de direito. Nessa linha, a delao
premiada no ontologicamente incompatvel com a execuo da pena, nem
seus pressupostos ou objeto conflitantes com as finalidades do prprio instituto.
Alis, a lei permite expressamente a colaborao premiada depois da sentena
( 5 do art. 4) sem definir at que momento aps esse ato processual ela
24
admissvel, parecendo, com razo, que ser possvel admiti-la at a extino
(cumprimento) ou exaurimento da pena quando finalmente no haver mais
espao para considerao da oportunidade da delao que coincide com a
razo lgica de tambm no mais caber HC aps a extino da pena (smula
695 STF). De acordo com a lei, a delao premiada, assim, mantm com a
pena uma relao logica necessria, sobrevivendo aquela apenas enquanto
esta tiver oportunidade real. Acaso extinta ou cumpria a pena, a delao no
tem mais sentido lgico ou tcnico.
Art. 4o O juiz poder, a requerimento das partes, conceder o perdo judicial, reduzir em at 2/3 (dois teros) a pena privativa de liberdade ou substitu-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigao e com o processo criminal, desde que dessa colaborao advenha um ou mais dos seguintes resultados: I - a identificao dos demais coautores e partcipes da organizao criminosa e das infraes penais por eles praticadas; II - a revelao da estrutura hierrquica e da diviso de tarefas da organizao criminosa; III - a preveno de infraes penais decorrentes das atividades da organizao criminosa; IV - a recuperao total ou parcial do produto ou do proveito das infraes penais praticadas pela organizao criminosa; V - a localizao de eventual vtima com a sua integridade fsica preservada.
Art. 6o O termo de acordo da colaborao premiada dever ser feito por escrito e conter: I - o relato da colaborao e seus possveis resultados; II - as condies da proposta do Ministrio Pblico ou do delegado de polcia; III - a declarao de aceitao do colaborador e de seu defensor; IV - as assinaturas do representante do Ministrio Pblico ou do delegado de polcia, do colaborador e de seu defensor; V - a especificao das medidas de proteo ao colaborador e sua famlia, quando necessrio.
Destinada a propiciar instruo criminal elementos consistentes
para a produo da prova da materialidade e autoria dos crimes praticados por
organizao criminosa, a delao premiada constitui um acordo (art. 4, 7)
25
entre acusao e defesa pelo qual o colaborador investigado se compromete a
revelar, de modo voluntario e efetivo (art. 4, caput), a identificao dos demais
autores ou partcipes; os crimes respectivos; a estrutura hierrquica da
organizao; a recuperao do produto ou proveito das infraes; quando for o
caso, a localizao de eventual vitima e a preveno de novos crimes. Em
outras palavras, instituto essencialmente direcionado ao juzo penal e aos
seus propsitos, nos limites do especifico universo das condutas ilcitas das
organizaes criminosas por isso qualificado pela lei como colaborao com a
investigao e com o processo criminal.
O termo de acordo (art. 6) dever ser elaborado por escrito (a lei
no indica nenhuma forma especial, usualmente escrevendo-se como um
contrato) e ter de mencionar e conter, obrigatoriamente, o relato da
colaborao oferecida pelo acusado, observados e demonstrados os requisitos
legais essenciais de voluntariedade e efetividade com os resultados
correspondentes (inciso I). Esse relato, igualmente no tem forma
predeterminada, mas inegvel que ser detalhado e preciso de modo a
mostrar no s o atendimento das exigncias da lei como as circunstancias e
condies em que se deu a colaborao. No h padro de avaliao da
voluntariedade e efetividade que poder portanto ser construdo e revelado
luz dos resultados relacionados (assim, no valendo para todos os casos), na
razo direta dos fatos expostos e esses vinculados ao conjunto dos fatos
delituosos objeto da investigao ou da prpria delao. A lei no cogita de
relato critico ou juzo de valor da colaborao, mas parece intuitivo que desse
relato decorrer a valorizao objetiva da colaborao. Alis, pelo relato da
colaborao e seus resultados possvel desde logo apurar a efetividade da
colaborao, os quais ficam, depois, ao juzo do Ministrio Pblico e da
Autoridade Policial sem embargo da reavaliao pela autoridade judicial por
ocasio da homologao que se dar por critrios do Juiz (surge, j aqui,
espao para imaginar, por exemplo, eventual ou possvel divergncia entre o
ministrio pblico e o magistrado). O relato da colaborao no poder omitir
informaes ou reservar para outro momento a revelao de dados existentes
pois o cumprimento da proposta e a aplicao das penas, sua reduo,
26
substituio, perdo judicial ou no aplicao, tm como pressuposto o acordo
homologado. Cabe mencionar, todavia, que esse termo de acordo, ante o
silencio da lei, aparentemente no se confunde com a proposta do Ministrio
Pblico (inciso II) que d incio ao incidente de colaborao premiada e em que
se firmam os compromissos de parte a parte para definir os limites bsicos da
delao. Pela redao da lei o relato e a proposta so elementos distintos do
termo (incisos I e II) indicando a existncia de contedo e funo diversos e a
dizer que a homologao do termo abrange todo o desempenho das partes no
procedimento de delao compreendendo o inteiro teor das declaraes e
documentos oferecidos e recolhidos. Em outras palavras, pela lgica da lei a
proposta constitui o primeiro momento da produo do acordo e o termo sua
consolidao e concluso, acompanhadas de anexos e adendos, como fica
evidenciado por ocasio do seu encaminhamento a juzo para homologao
que ser pessoal ao magistrado ficando no protocolo judicial apenas a petio
ou oficio de entrega sem indicao alguma do colaborador ou investigaes.
Ou seja, consoante o disposto nesse artigo 6 o termo de acordo contem todos
os seus componentes formais e os resultados com as declaraes e
documentos recolhidos.
Os resultados (art. 6, I) da colaborao tem estipulao legal
devendo constar no termo e serem alcanados os seguintes, conforme
indicados no art. 4 caput: I - a identificao dos demais coautores e partcipes
da organizao criminosa e das infraes penais por eles praticadas; II - a
revelao da estrutura hierrquica e da diviso de tarefas da organizao
criminosa; III - a preveno de infraes penais decorrentes das atividades da
organizao criminosa; IV - a recuperao total ou parcial do produto ou do
proveito das infraes penais praticadas pela organizao criminosa; V - a
localizao de eventual vtima com a sua integridade fsica preservada.
Da colaborao premiada ter de resultar necessariamente a
identificao dos demais autores, coautores, participes e das infraes por eles
praticadas (art. 4 inciso I). Ainda que no se possa exigir a delao de todos
os participes, seja por inviabilidade seja por desconhecimento, a colaborao
ter de ser objetivamente suficiente quanto a isso, cabendo ao MP e Policia,
27
e eventualmente ao magistrado, a avaliao da suficincia da realidade dessa
identificao e das infraes, pois o colaborador poder, deliberadamente ou
no, omitir ou suprimir nomes ou delitos no universo da delao. Ficar por
conta da habilidade ou aptido das autoridades proporem as condies que
impliquem na delao completa evitando que seja parcial ou que busque
esconder ou excluir algum coautor ou partcipe. A identificao ser a mais
completa e clara possvel, mesmo que no indique nome ou qualificao,
podendo constituir-se de indicaes fsicas, tnicas e antropolgicas ou por
qualquer outro meio descritivo ou indicativo pelo qual se possa chegar
inequivocamente identidade correspondente. De qualquer modo, parece uma
tarefa difcil cercar o colaborador de exigncias que propiciem a exata
identificao e impeam a omisso de nomes ou aes, mas poder constar do
acordo clausula que preveja a futura incluso de novos elementos em
hipteses definidas e compreensveis, que no desnaturem o acordo e
preservem sua abrangncia ou sanes pela omisso. Nesse ponto cabe
pequeno comentrio sobre a alegada inconstitucionalidade da delao
premiada em face de terceiros, isto , daqueles terceiros que o colaborador
dever identificar. Argui-se violao de garantias constitucionais ao entregar o
delator informaes sobre outras pessoas propondo prova sem o devido
processo legal, sem contraditrio e ampla defesa. A tese insustentvel. que
a delao premiada no produz esse efeito sendo ferramenta processual
destinada apenas produo de elementos para a produo da prova e no
ela mesma. Alm disso, os elementos apurados na delao premiada -- em
face de terceiros -- podero eles prprios ser discutidos e apreciados no juzo
respectivo luz das garantias constitucionais. Com respeito s infraes,
obviamente no se exigir capitulao exata ou precisa seno a descrio das
condutas relacionadas com os participes ou coautores, principalmente com
relao a datas e locais para permitir a definio de competncia e prescrio,
por exemplo. A descrio da relao entre o agente e a conduta de extrema
importncia e deve ser claramente relatada, no s entre autores mas tambm
entre coautores, de modo a definir tanto a prpria condio fundamental de
organizao, quadrilha ou bando, quanto para evidenciar, se for o caso, a
necessidade de unidade de processo e julgamento, particularmente se
28
existirem coautores detentores de foro especial, podendo resultar da concurso
de jurisdio entre as infraes praticadas. De tal sorte, o relato observar na
medida do possvel os detalhes que auxiliem a equao dessa relevante e
decisiva circunstncia de natureza processual.
A revelao da estrutura hierrquica e a diviso de tarefas da
organizao criminosa (art. 4 inciso II) so clausulas fundamentais e resultado
essencial da proposta e do termo do acordo de delao premiada, pois falta
da demonstrao da existncia de uma organizao criminosa, alm de
desaparecer a razo lgica da delao, desaparece a causa legal da delao.
Assim, o colaborador ter de produzir elementos consistentes e inquestionveis
da existncia da organizao; do seu proposito criminoso com todas as
referencias respectivas; de sua estrutura e seu funcionamento. Se o
colaborador no estiver apto a descrever de modo convincente a diviso de
tarefas dos coautores e partcipes, que constitui a caracterstica natural de uma
organizao, no haver delao premiada no sentido legal suscetvel de
homologao. Tambm a podem surgir duvidas quanto omisso ou
supresso de informaes que deturpem o sentido e finalidade da delao,
cabendo aos membros da acusao a argucia e perspiccia para evita-las
ainda que no exista formula absoluta para preveni-la. A descrio mais
detalhada possvel da correlao de identidades, infraes e estrutura ou
distribuio de tarefas contribui para a reduo do risco de omisso, e
condio para a admissibilidade e homologao do acordo, mas sempre
poder persistir ocasio de falha ou engodo, sobretudo porque o colaborador
poder procurar ressalvar sua situao pessoal ou de outrem para o que nem
sempre precisar revelar todo o esquema ou organizao. Cuida-se a de
habilidade do MP e da Policia a quem cabe a produo da prova de suas
acusaes. Pode ocorrer que o delator no tenha conhecimento de toda a
organizao ou alegue no t-lo e ento a colaborao poder ser parcial, mas
nem por essa razo invivel ou no homologvel. Trata-se de hiptese em que
s o caso concreto dir se a colaborao compatvel com a vantagem ou
no, e sujeitarem-se as partes ao dilema.
29
De modo geral, a recuperao total ou parcial do produto ou do
proveito das infraes penais praticadas (art. 4 inciso IV) um dos objetivos
principais do acordo de delao premiada e nessa perspectiva a colaborao
deve ser precisa e efetiva na identificao dos valores, localizao e posse dos
bens correspondentes, particularmente quando em moeda, sua situao de
conversibilidade e depsito ou origem e destinao, etc. Nem sempre a
recuperao estar ao alcance do colaborador, mas o que se espera que
suas informaes e iniciativas sejam suficientes para a promoo de medidas
compatveis com a recuperao determinada pela lei. A recuperao cogitada
deve ter relao com as infraes delatadas e o produto pode ser, inclusive, a
resultante de outras condutas indiretamente relacionadas com as infraes
praticadas pela organizao criminosa e seus partcipes ou coautores.
A preveno de crimes da organizao criminosa (art. 4 inciso III)
resultar da denuncia pelo colaborador dos mtodos ou tcnicas de infrao
no sendo propriamente uma condio de colaborao, pois o delator nem
sempre poder responsabilizar pela cessao da atividade da organizao
criminosa embora de sua colaborao possam advir medidas e proposies
para prevenir no futuro aes dessa natureza, ou quando nada inibi-las.
Por igual, a localizao da vitima (art. 4 inciso V), hiptese mais
comum nos crimes de organizaes criminosas com objeto nos delitos contra a
pessoa ou contra a liberdade pessoal, ser importante auxilio tanto na
recuperao da liberdade da vitima quanto da cessao da atividade criminosa.
Essa cogitao, nada obstante, no comum nos crimes de organizao
criminosa especializadas em crimes contra administrao, de corrupo,
crimes fiscais ou financeiros-econmicos.
O termo de acordo haver de conter tambm as condies da
proposta do Ministrio Pblico ou da autoridade policial (art. 6, inciso II),
minuciosamente descritas, sendo, portanto, condies relacionadas aos limites
da colaborao e da voluntariedade e efetividade, isto , da extenso e
profundidade das declaraes em relao s vantagens oferecidas o que
constitui importante fator de avaliao dos resultados e da prpria colaborao.
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Tambm aqui a descrio no pode omitir condies, circunstncias ou
elementos considerados, ou porque os dados omitidos ou no indicados
perdero valor judicial ou porque no podero ser revelados posteriormente
homologao, ao menos como revelao oriunda da delao. Alm disso, as
condies propostas devem ser claras e objetivas de modo a evitar
incompreenses ou dvidas que, existindo, repercutiro no juzo de
homologao uma vez que vinculam todos os membros do MP que venham a
atuar no caso. Recorde-se tambm que o ato de homologao, conquanto em
principio meramente formal, como todo ato judicial que de alguma forma produz
efeitos jurdicos poder ser submetido a discusso em recurso cabvel tanto
nas instancias ordinrias quanto na via excepcional, e, embora no se sujeite,
nesta ltima via, apreciao do contedo, pode ser examinada pela
racionalidade e relao logica entre relato e resultados, entre condies e
colaborao, pois todos esses aspectos podem refletir-se na fixao da pena
e, assim, submeter-se ao exame via de habeas-corpus a qualquer tempo e em
qualquer grau de jurisdio. A esse respeito, cabe ressaltar que o tema ainda
est aberto enquanto persiste discusso a respeito da natureza do termo de
delao premiada, tido por alguns como meio de obteno de prova e por
outros como meio de prova e, assim, dependendo da opo adotada (na
doutrina ou na jurisprudncia) poder submeter-se, ou no, disciplina do
controle judicial da prova.
A declarao de aceitao pelo colaborador e seu defensor (art. 6,
inciso III) constitui outro elemento fundamental para a validade da colaborao
premiada. Essa declarao de aceitao deve ser exatamente descrita, se
possvel nos detalhes, que devem relacionar-se logicamente com as condies
oferecidas pelo MP ou pela Policia tanto quanto relacionar-se logicamente com
o relato e seus resultados, evitando se obtenha ou disponha de elementos no
claramente aceitos pelo colaborador ou por este deixado de revelar clara e
objetivamente o que efetivamente aceitou. A declarao de aceitao que deve
ser expressa e clara diz respeito s condies propostas pelo MP e pela
Policia, mas tambm aos termos do prprio acordo, para que no venham os
seus resultados ou relatos a ser futuramente objetados ou questionados pelo
31
colaborador. Por essa razo, alis, o defensor tambm deve manifestar
expressamente declarao de aceitao das condies propostas pelo MP ou
pela Policia, sem ressalvas ou reservas, ficando vedado posteriormente
rediscuti-las, pelo menos no mbito do acordo de delao devido precluso
integral das formas e do contedo nos limites respectivos das condies e da
aceitao. Se no cotejo do teor do relato, das condies, dos resultados e da
aceitao da proposta surgirem divergncias entre as partes, devem ser
resolvidas antes da homologao ou esta ser inviabilizada no podendo, aps
a homologao do acordo, suscitarem-se divergncias. Eventuais
desentendimentos s podem ser objeto dos recursos adequados nos
respectivos limites, se cabveis.
A assinatura das partes e seus representantes (art. 6, IV) requisito
essencial para a validade do acordo assim como para a firmeza do
compromisso e legalidade do avenado. Da porque devem ser os prprios
interessados a subscreverem o termo, observando-se em caso de foro especial
os agentes do MP ou policiais com competncia especifica do mesmo modo
que eventual defensor pblico. No se cogita de assinatura do colaborador por
procurao ou pelo defensor, pois o ato personalssimo no havendo
hiptese de recusa (pois assim no h delao premiada) nem impossibilidade
(salvo a fsica e temporria, caso em que assinar a rogo o terceiro assim
escolhido e identificado que pode ser o prprio defensor). Se o defensor
renunciar ao patrocnio aps a assinatura do termo ainda assim valer podendo
o novo defensor da por diante mudar a estratgia de defesa, mas o fato da
delao estar consumado e o incidente encerrado. Tambm as medidas de
proteo do colaborador e sua famlia (art. 6, V), quando for o caso, estaro
descritas e substanciadas no acordo, embora, nesse tema, porque as
condies so naturalmente variveis e mutantes, possam a todo tempo ser
ulteriormente alteradas, modificadas ou ampiadas sem precluso.
Art. 5o So direitos do colaborador: I - usufruir das medidas de proteo previstas na legislao especfica; II - ter nome, qualificao, imagem e demais informaes pessoais preservados;
32
III - ser conduzido, em juzo, separadamente dos demais coautores e partcipes; IV - participar das audincias sem contato visual com os outros acusados; V - no ter sua identidade revelada pelos meios de comunicao, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prvia autorizao por escrito; VI - cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corrus ou condenados.
O colaborador tem assegurado pela lei alguns direitos
procedimentais que podem ser objeto de negociao antes da pactuao das
regras do acordo, sem prejuzo de outras que decorram das circunstncias ou
at depois da homologao dele. Essas garantias devem ser acertadas
logicamente antes do inicio das declaraes e depoimentos (por ocasio da
avaliao da proposta do MP/Policia), pois constituem o prprio ncleo da
contrapartida a ser oferecida pela acusao alm das que depois podero ser
deferidas no julgamento final. Assim, pode o colaborador pleitear medidas de
proteo semelhantes s que a lei defere a testemunhas ameaadas (Lei n
9.807/99) e que constituem verdadeiro regime de vida e deslocamento
inteiramente controlado. Poder ter o seu nome, qualificao, endereo,
emprego, dados sociais ou funcionais (e fiscais) e demais informaes relativas
ao seu patrimnio pessoal, inteiramente preservados no sentido de que ficam a
salvo de consulta, sindicncia ou cadastramento. Alias, possveis demandas
judiciais ou administrativas em que seja interessado o colaborador devero ser
objeto de cuidadosa apreciao tal qual no trato de prestaes de natureza
previdenciria, assistencial para que no sejam perdidas ou frustradas ante a
necessidade de preservao fsica do colaborador. Tambm ser ele
conduzido, quando preso, em separado dos demais coautores e participes e
mesmo de outros presos, do mesmo modo que em audincia no tenha
contato visual com outros autores ou coautores. particularmente relevante a
proteo do colaborador em face da imprensa para que seu nome, identidade,
ou modo de conhec-la, no seja liberado, nem filmado ou fotografado sem sua
autorizao escrita e prvia. Alis, se a preservao do sigilo do contedo da
delao se encerra em certo momento, no cessa com relao proteo da
33
pessoa do colaborador cuja preservao pode estender-se para alm do
processo. naturalmente intuitiva essa cautela apesar de todas as
salvaguardas processuais, dado que no so desconhecidas as vicissitudes
prprias da participao em organizao criminosa onde os mtodos, a
disciplina e as regras internas nem sempre observam os direitos individuais.
Cabe, portanto, ao Estado evitar que o colaborador venha a ser molestado,
prejudicado ou sujeitado a gravames pessoais ou materiais em razo da
colaborao. Quando condenado, ter direito de conservar-se em
estabelecimento penal diverso dos demais corrus condenados, ou, ao menos
em ala, pavilho, seo ou alojamento diverso e distante, se no mesmo
complexo penitencirio. Em suma, o colaborador premiado -- quando assim
considerado pela homologao do acordo e s ento -- tem direito absoluta
reserva sobre sua pessoa no que se refere ao teor e contedo das declaraes
que prestar, podendo, por elas, exigir as garantias mencionadas, as quais
naturalmente se incluem tanto na proposta do MP/Policia quanto na declarao
de aceitao do acordo independente do futuro levantamento do sigilo das
declaraes. Alguma perplexidade pode oferecer o fato de a delao premiada
no vir a ser homologada. Nesse caso, as declaraes anteriores e as
cautelas, sigilo e restries previa e cautelarmente conferidas at a
homologao prevalecem, seja porque acaso no admitidas como tal perdem
sua relevncia processual e desaparecem como fato processual seja porque se
acolhido e homologado o termo ficam aquelas resguardadas at o recebimento
da denuncia se houver. Os casos omissos devero ser resolvidos por aplicao
subsidiria da lei de proteo s testemunhas ameaadas.
Art. 4o . .................................................................................... 6o O juiz no participar das negociaes realizadas entre as partes para a formalizao do acordo de colaborao, que ocorrer entre o delegado de polcia, o investigado e o defensor, com a manifestao do Ministrio Pblico, ou, conforme o caso, entre o Ministrio Pblico e o investigado ou acusado e seu defensor.
7o Realizado o acordo na forma do 6o, o respectivo termo, acompanhado das declaraes do colaborador e de cpia da investigao, ser remetido ao juiz para homologao, o qual dever verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade,
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podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presena de seu defensor.
8o O juiz poder recusar homologao proposta que no atender aos requisitos legais, ou adequ-la ao caso concreto. ...........................................................................................
Art. 7o O pedido de homologao do acordo ser sigilosamente distribudo, contendo apenas informaes que no possam identificar o colaborador e o seu objeto.
1o As informaes pormenorizadas da colaborao sero dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuio, que decidir no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.
A lei d a entender que esse acordo dever ser concertado pelas
partes, isto , por ambas as partes, circunstncia que se acomoda com a
disposio que tambm exige oportunamente o requerimento ao Juiz por
ambas as partes para sua homologao e demais vantagens processuais,
tanto que concludo o acordo. Essa disposio evidencia novamente ser a
colaborao premiada um evento de natureza processual incidental ao
procedimento investigatrio ou ao processo criminal -- seja antes da
instaurao da ao penal ou ainda na fase de inqurito, e at mesmo aps a
sentena ou em fase de execuo -- e logicamente deve ser harmonizado no
conjunto dos propsitos e limites legais que disciplinam e orientam a
instaurao da ao penal correspondente ou os da investigao quando
existentes.
O termo de acordo como visto dever conter: I - o relato da
colaborao (portanto estar esgotada a colaborao); II - as condies da
proposta do MP e da Policia; III - a declarao de aceitao do colaborador e
seu defensor; e IV e V - as assinaturas e as medidas de proteo. Por isso, o
acordo que oficializa a colaborao e que se submeter homologao judicial
s ser formulado e conhecido quando concluda, o que de certa forma expe
o colaborador a incertezas antes da formalizao e homologao j que fica
merc das autoridades antes de terem-na acolhida legalmente, estas e o juiz,
ainda que em caso de recusa da homologao, assim como na retratao, se
lhe garanta a imprestabilidade dessas informaes (mas exclusivamente)
quando em seu desfavor. que o colaborador tem por si apenas a proposta do
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MP e a sua aceitao alm de renunciar ao direito constitucional ao silencio
(art. 4, 14). A lei no cogita da resciso do acordo, em tese possvel
enquanto ato bilateral de convergncia de vontades. Cabe, entretanto, alguma
reflexo. inegvel que a homologao pressupe a realizao dos atos
correspondentes com as declaraes, documentos, depoimentos, apuraes
(anexos) que a lei exige para reconhecer como vlida e legitimada a delao
premiada, fora do que no haver espao para a homologao e menos ainda
para os efeitos da delao regularmente completada. Para a homologao,
pois, necessrio ter reunida a robusta demonstrao dos resultados que a lei
elenca e, ento, o ato judicial de homologao -- sem cogitar de juzo sobre o
contedo -- dir que o acordo observou os termos formais da lei para os
efeitos processuais designados.
Para esse efeito o pedido ser distribudo a um juiz (ou Relator) com
reserva de sigilo para no identificar o colaborador e o objeto da delao. Esse
ato administrativo processual por tal razo no revelar qualquer informao
que possa redundar na violao do sigilo recomendado pela lei, por isso
mesmo reduzindo-se distribuio do pedido sem os anexos ou documentos
os quais sero entregues com os anexos direta e pessoalmente ao magistrado
escolhido pela distribuio. O art. 4, caput, diz que as partes em conjunto
apresentam o pedido de vantagens processuais e penais derivadas do acordo,
o que implica reconhecer que a homologao dele ter de ser requerida
igualmente pelas partes para a homologao pelo Juiz competente, ao qual
ser distribudo se ainda o no tiver sido, ou encaminhado ao juiz da causa se
j existir ao penal ou inqurito distribudo e relacionado. A lei no esclarece
se possvel delao premiada de mais de um colaborador
concomitantemente. Como os fatos eventualmente imbricados podem suscitar
essa anomalia, mostra-se inconveniente o processamento conjunto de duas
colaboraes em vista das peculiaridades, alcance, extenso do incidente, de
modo que a cada colaborao ou colaborador cabe um procedimento prprio,
na medida do possvel inclusive individuado e sigiloso entre si. Essas
informaes pormenorizadas que integram o termo de acordo so as que j
esto recolhidas, mas no se impede que prossigam as diligencias ou
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depoimentos e posteriormente sejam juntadas s demais pois tanto a lei como
a realidade permitem que novos fatos ou detalhes novos possam vir a ser
desvendados na sequencia. Nesse caso, da mesma forma sero
encaminhados diretamente ao juiz prevento sem intermdio da distribuio ou
protocolo de secretaria. Cuida-se de evitar, por via travessa, a divulgao
desses eventos e seus participantes, embora na prtica judiciaria se saiba que
virtualmente impossvel ocultar dos servidores ou agentes pblicos
envolvidos a existncia de uma colaborao premiada. Restringir o contedo j
ser uma razovel sucesso, at porque magistrados, promotores ou policiais
no atuam sozinhos e, ao contrrio, na maioria dos casos so auxiliados por
assessores ou contam com a assessoria de outros profissionais ou agentes e
at terceirizados. Cabe por isso a quem dela tenha conhecimento, ocasional ou
por fora do oficio, manter rigorosamente o sigilo a que tenha tido acesso por
um ou outro modo sob as cominaes da lei penal. A cautela fundamental deve
enderear-se identidade do colaborador, pois quanto a esse h ou pode
haver risco de ofensa fsica ou de morte. Se a instancia judicial ou a
administrativa do inqurito j se tenham instalado ser impossvel evitar a
existncia do acordo e o processo de sua homologao sendo nesse caso
muito mais rigorosa a observncia das restries indicadas pela lei (se a
denuncia j estiver recebida h entendimento jurisprudencial de que o sigilo
no mais prevalece). Antes do inqurito, como medida cautelar ou preparatria
ser trazida ao juzo nessa qualidade preservando-se com mais facilidade o
sigilo. A lei estabelece que as informaes da colaborao sero entregues
pessoalmente ao juiz indicado pela distribuio entre os competentes ou o que
detiver a competncia especifica quando especializada a jurisdio. Por esse
modo, ainda que algum venha a reconhecer a existncia da colaborao
premiada na secretaria ou no cartrio judicial s o magistrado ter acesso ao
seu contedo, dispondo de 48 horas para proceder ao exame e deliberao. O
magistrado tem de decidir sobre a homologao do termo de acordo, o que,
na prtica, vai se resumir a declarao de que o instrumento est obediente s
formalidades da lei. Esse ato judicial, ademais, independe de manifestao
prvia das partes eis que so as que subscrevem o termo, bem assim pelas
mesmas razes a deciso judicial fica dispensada de publicao ou intimao
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que no seja para as mesmas partes envolvidas no dito acordo. A
homologao judicial, integral ou parcial, no entanto, pode ser objeto de
recurso pelos interessados participantes firmatrios do termo, bastando
demonstrar no que foram vulnerados seus interesses ou direitos, dado que h
prvio acordo e renncia jurisdio.
Ao receber o acordo para homologao o magistrado deve apreciar
necessariamente a sua competncia. O Juiz competente (seja juiz de primeiro
grau, desembargador ou ministro, conforme detenha o acusado ou um dos
corrus foro especial ou no, ou at mais de um juzo -- resolvendo-se por
concurso de jurisdio quando em processo nico -- se a delao premiada
indicar envolvimento de vrios investigados com foro prprio), inobstante, no
participa das negociaes e o termo de acordo com as declaraes do
colaborador e a cpia da investigao lhe sero submetidos apenas para
verificar a regularidade, a legalidade e a voluntariedade (art. 4, 6).
Poder, no entanto, ouvir o colaborador sigilosamente na presena
do defensor (art. 4, 7). A particularidade que essa diligencia ser
realizada nas 48 horas de que dispe o juiz para a homologao. Tratando-se
de fase ainda sigilosa e cercada de grandes restries o juiz poder, ao invs
de faz-lo apresentar no frum ou no tribunal competente, ir ao local onde se
encontra o colaborador com as garantias de acompanhamento pela defesa.
Ante as peculiaridades do processo judicial eletrnico essa audincia pessoal
tambm pode ser realizada com o colaborador via Internet ou por
videoconferncia, no podendo porm ser delegada ou deprecada pela prpria
natureza do ato.
O Juiz competente exercer a jurisdio em processo nico quando
prorrogada pela conexo ou continncia, assim abrangendo o universo dos
acusados mediante unidade de instruo e julgamento, ou ento a
competncia ser repartida entre os vrios juzes competentes, se diversas e
independentes as aes, caso em que a homologao da colaborao cabe a
cada um deles na medida de sua respectiva competncia. bem de ver que
situaes especiais podem ocorrer. Se o colaborador tiver prestado
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declaraes em face de fatos que se referem a dois casos ou dois processos
distintos ou que venham a ser separados com competncias diversas, caber a
homologao a juzes diversos sobre as mesmas declaraes ou delao.
Nesses casos haver risco de impasse se divergirem os juzes, agravando-se
se um for juiz de primeiro grau e outro de foro colegiado especial. De qualquer
sorte, parece certo que a homologao do acordo caber sempre ao juiz
efetivamente competente, sempre se aplicando as regras de concurso de
jurisdio quando diversos. Cabe referir precedente do STF segundo o qual a
competncia daquela Corte se estabelece de direito estrito quando envolvida
pessoa ou autoridade que a ela se sujeite, no se podendo, considerada a
conexo ou continncia, estende-la a ponto de alcanar inqurito ou ao
penal relativos a cidado comum (Ag.Rg. no Inq. 3.515 SP, Rel. Marco Aurlio,
Plenrio, 13.02.2014). A despeito da ementa expressa, no corpo do julgado
ficou assente que a regra o desmembramento, deixando implcito que, como
na Ao Penal originaria n 470 caso Mensalo pode ocorrer hiptese de
necessria unidade de processo e julgamento da excepcionando-se a regra de
direito estrito. Ora, nos casos de crime organizado em que participe pessoa ou
autoridade com foro especial, pela prpria unidade de atuao criminosa e
justo por essa razo, parece ser a regra a unidade de processo e julgamento a
indicar a competncia do Juzo ou da Corte definida pela de maior hierarquia
para todos os participes. Caso contrrio, se separados os processos e os atos
da instruo, tanto poder vir a afrontar-se tecnicamente a noo de quadrilha,
bando ou organizao criminosa quanto a ser prejudicada gravemente a
prpria apurao dos fatos e a aplicao da lei penal.
Cabe ao Juiz competente a homologao do acordo sem apreciao
do contedo embora possa tambm recus-la ou adequ-la se no atender aos
requisitos legais. Nada obstante, parece manifesta e irresistvel a necessidade
de delibao mnima acerca de possveis elementos constantes da
colaborao uma vez que praticamente invivel, por exemplo, a aferio da
regularidade e da voluntariedade da delao sem um mnimo envolvimento
com o contedo das declaraes ou documentos revelados. Em particular
porque, em tese, o Juiz poder no homologar o acordo, hiptese s
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compreensvel se vier a valer-se de juzos acerca da voluntariedade ou
regularidade das declaraes ou afirmaes. A ateno com os limites
mencionados recomenda reiterado cuidado contra possveis avaliaes de
mrito, at porque somente na sentena final (art. 4, 11) o julgador apreciar
pelo contedo os termos do acordo homologado.
De outra parte, o Juiz poder recusar a homologao se entender
estar ela desatenta aos requisitos legais. Como se viu acima e pelo texto da
prpria lei, existem inmeras dificuldades de interpretao as quais podem
contribuir para tornar o ato de homologao um juzo complexo a despeito de
literalmente preso formalidade. A lei, no entanto, abre espao para uma
conjuntura que em parte ameniza essa restrio literal pois autoriza a
adequao ao caso concreto. Ora, o juzo de adequao passa
necessariamente pela apreciao dos termos da delao premiada e mesmo
sendo o magistrado criterioso ao mximo ter de acomod-lo aos contornos da
delao por meio de razes no estritamente formais, exceto se a essa
clausula legal se emprestar a noo limitativa da estrita legalidade, isto , da
adequao do acordo apenas aos estritos limites da forma legal sem qualquer
cogitao de interpretao ou avaliao, o que, a despeito de possvel, na
prtica dificilmente acontece.
Alis, essa homologao precisa ser obediente aos limites legais,
pois exorbitando deles poder ser objeto de ataque judicial pelas partes,
mesmo sigiloso o pacto, uma vez que essa restrio em princpio no afasta o
controle judicial de ndole constitucional, ainda que para evitar o controle
judicial se negue ao acordo o carter de elemento ou meio de prova. A esse
respeito, em impetrao por parte de terceiro interessado que se pretendia
legitimado para acessar o teor do acordo (HC 195.797-PR, Rel. Laurita, 5T,
22.05.2012) e conhecer a delao do ru ao MP ao fundamento de que sua
situao processual que poderia alterar-se, o veredicto assentou ser invivel
essa pretenso face o sigilo legal e o contrato entre partes, podendo o corru,
quando de sua prpria defesa, impugna-la conforme lhe parea. No HC
282.252-MS (Rel. Sebastio Reis, 6T, 25.03.2014) a questo suscitada,
tambm relacionada com o acesso aos termos da delao pretendido por
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terceiros j no curso da ao penal, tinha um diferencial: os atos ilcitos teriam
sido praticados antes da Lei 12.850, de 2.8.2013 (em vigor em 19.09.2013).
Nessa ocasio o Superior Tribunal de Justia assentou que as normas de
natureza processual se aplicavam de imediato no estagio em que estivesse o
processo de delao e as normas de natureza material ficavam insuscetveis
de aplicao retroativa. Alm disso, o STJ entendeu que, aps o recebimento
da denncia, no prevaleceria mais o sigilo da delao premiada pois essa
disposio processual j havia incidido imediatamente afastando-o a partir da.
Tais precedentes acabaram revelando aspectos que a lei no cogita mas que
so de capital importncia. Primeiro, que a regra do sigilo fica relacionada com
a data limite do recebimento da denncia de tal maneira que a delao
acertada depois do recebimento dela no se prevalece do sigilo, exceto se
relativa a correu no denunciado ou em hiptese de aditamento para incluir
novo correu. Depois, ao admitir questionamento ou conflito de competncia
com outros juzos a respeito dos termos do acordo, o sigilo imposto pela lei
perante o juzo de primeiro grau acaba cedendo pela necessidade de
discusso dele por outro Tribunal que no o destinatrio da delao. Ainda que
se transferisse para outro rgo judicial, o sigilo da delao passaria a ser
partilhado com outros juzes ou partes que no os estritamente vinculados ao
acordo. E assim sucessivamente por todos os tribunais quantos forem
acionados para defesa do interesse do corru ou de terceiros. Nessa linha, o
sigilo, a despeito de fundamental, pode vir a ser reduzido, compartilhado ou
afastado indiretamente mesmo antes do recebimento da denncia. A anotao
de certo significativa e as proposies afirmativas da lei de certa forma
tornam-se suscetveis de flexibilizao. Com efeito, em linha de princpio, o
acordo de delao estabelecido depois do recebimento da denuncia nem por
isso ontologicamente dispensa o sigilo pelas mesmas razes daquele acertado
antes dela, e assim, de toda convenincia e oportunidade a compreenso de
que tambm nesse caso o sigilo prevalece at o recebimento do aditamento da
denncia, ou, sem ele, at a homologao judicial do termo de acordo seja ele
estabelecido com ru j denunciado seja como novo correu.
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Sobre esse ato de homologao judicial interessante referir um
exemplo recente. Em 27 de setembro de 2014, foi firmado termo de acordo
(alis, divulgado pela imprensa) entre o MPF e um colaborador no caso
conhecido como Operao Lavajato contendo diferentes clausulas fixando o
compromisso de futuras declaraes com diversas cautelas e vrios outros por
parte do colaborador, mas o ato judicial de homologao (parcial, pois a
clausula de renncia jurisdio deixou de ser homologada por
inconstitucional), datado de 29 de setembro de 2014 (tambm divulgado pela
imprensa), refere ter a copia das declaraes e depoimentos acompanhado o
requerimento. No que interessa, parece haver um descompasso, deliberado ou
no, entre os atos em exame, pois a proposta de acordo denominada de termo
de acordo (clausula 5), sugere providencias a adotar no futuro enquanto no
caso mencionado (48 horas depois) a homologao indica j terem sido
recolhidas as informaes que a lei recomenda sejam a base da delao
premiada. A despeito da ambiguidade, o ato de homologao est correto pois
na suposta competncia originaria do STF -- foi requerido pelo Procurador-
Geral da Repblica e pelo colaborador e apreciado pelo Ministro Relator no
STF (Petio 5.209) nos limites legais em que se afirma a existncia das
informaes obtidas e faz meno a autoridades com foro especial, o que ao
revs confirma a realizao antes da homologao das condies insertas na
proposta do MPF e a avaliao da competncia. Chama ateno a proposta e
o termo terem sido firmados pela Procuradoria da Repblica no Estado e
subscritos por Procuradores da Repblica que atuam junto Justia Federal
local de primeiro grau.
Art. 4. ....................................................................................
9o Depois de homologado o acordo, o colaborador poder, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministrio Pblico ou pelo delegado de polcia responsvel pelas investigaes. 10. As partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatorias produzidas pelo colaborador no podero ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor. ...................................................................................
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12. Ainda que beneficiado por perdo judicial ou no denunciado, o colaborador poder ser ouvido em juzo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial. .................................................................................. 13. Sempre que possvel, o registro dos atos de colaborao ser feito pelos meios ou recursos de gravao magntica, estenotipia, digital ou tcnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informaes. 14. Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciar, na presena de seu defensor, ao direito ao silncio e estar sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade. 15. Em todos os atos de negociao, confirmao e execuo da colaborao, o colaborador dever estar assistido por defensor.
A lei diz que o colaborador depois de homologado o acordo poder
ser ouvido pelo MP ou pelo Delegado de Policia encarregado das
investigaes. No parece compreensvel essa regra se o colaborador vem de
prestar sucessivas declaraes que constam do acordo e se incluem nos
elementos essenciais da prova referida. Que o MP e a autoridade possam ouvi-
lo novamente no constitui dificuldade, mas diligencia discutvel salvo se fato
novo apresentar-se ou o magistrado entender de adequar os termos do acordo
com alterao dos limites ou qui do contedo. Essa ressalva, porm,
aparentemente encontra justificativa no fato de, homologado o acordo pelo juiz,
presumir-se a inviabilidade de reabertura da colaborao. Malgrado esse
possvel entendimento, que, todavia, no se revela fundado e desse modo
torna intil a ressalva, pela prpria natureza das atividades de investigao a
todo tempo poder o MP ou a autoridade policial ouvir o colaborador com ou
sem a anuncia do Juiz, conforme acontea antes da instaurao da ao
penal ou aps sua instaurao ou mesmo aps seu encerramento. De qualquer
sorte, no haver impedimento para essa providencia uma vez que a lei admite
a qualquer tempo a manifestao do MP pela concesso do perdo judicial
ainda quando no proposto no acordo. O que implicitamente indica ser possvel
obter novas informaes aps o acordo homologado, desse modo justificando
indiretamente a continuidade das diligencias (ast. 4, 2) e, nessa linha, a
oportunidade de novas inquiries inclusive a ouvida do colaborador sem
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necessidade de disposio legal especfica. De outra parte, a lei admite a
retratao da proposta. No fica claro se isso compreende a proposta aceita e
homologada aps o cumprimento das clausulas ou apenas enquanto no
homologada. A retratao depois da homologao revela-se, no entanto,
impraticvel e logicamente incompatvel porque se fosse possvel a retratao
as partes passariam a ter mais poder que o juiz sobre o estado da causa,
contrariando o principio geral de que o juiz sempre e no poderia deixar de
ser pena de destruir-se a logica do sistema -- o condutor do processo cujos
atos s se desfazem por via de recurso regular. A proposta (art. 6, II) sempre
do MP ou da Policia e a atitude do colaborador aceita-la ou no. Portanto, a
nica hiptese de retratao da proposta ser de iniciativa da acusao e,
embora tambm tenha o colaborador interesse em
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