DOI: 10.4025/4cih.pphuem.428
CIDADES PIONEIRAS: HISTÓRIA E IMAGEM
Gustavo Bruski de Vasconcelos Arquiteto e Urbanista. Prof. Esp. Colaborador, Universidade Estadual de Maringá-UEM,
Departamento de Engenharia Civil-DEC. Mestrando do Programa de Pós-graduação em Engenharia Urbana-PEU, [email protected]
História e Imagem
A construção de uma urbe numa região inóspita já seria suficiente para evidenciar os
efeitos da civilização. Portanto aqui, através da observação de algumas fotografias de época,
alguns aspectos da cidade, retratando cenas de um difícil dia a dia, faz com que este artigo
abra o leque das discussões sobre as fotografias do cotidiano dos pioneiros da cidade de
Londrina e Maringá, Paraná, Esta linguagem visual pode evidenciar as formas de representar
os cenários urbanos, e dar visibilidade aos seus primeiros moradores, moradias e instalações,
que foram enquadradas pelas câmeras fotográficas que tinha por objetivo propalar uma cidade
moderna, próspera e atrativa, revelando a intensidade e a rapidez com que aquela sociedade,
desejava alcançar a modernidade, ao mesmo tempo em que foca também uma outra cidade
que nos remete a espaços de convivência de diferentes realidades.
A fotografia não foi necessariamente concebida, produzida ou percebida como fonte
de documentação. Mas ao longo de sua trajetória, em todas as partes do mundo, foi se
caracterizando como importante fonte de pesquisa para a recuperação e compreensão
histórica. Do ponto de vista da história sócio-urbana de uma cidade, é possível a partir de uma
análise das fotografias, construir uma imagem realística do cenário da época. Nesse contexto,
segundo Burke (2004) a fotografia, enquanto registro expressivo de um cenário urbano,
arquitetônico e social em processo de transformação, registra os anseios de modernidade e
progresso daquela sociedade. A fotografia permite apreciar a peculiaridade ótica com a qual a
imagem da cidade se forma e é ligada ao mundo mental do autor que a produziu.
O uso da imagem fotográfica é um importante objeto para uma ampla investigação
histórica. Portanto, a contribuição deste estudo se ancora no uso da fotografia como principal
documento de análise para produção historiográfica, entendendo que esta representa um
testemunho que “fala” do passado na intensidade em que o pesquisador a questiona e a
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compreende. Isto é aqui demonstrado na análise da relação entre fotografia e cidade a partir
da narrativa visual de fotos de Londrina e Maringá que foram produzidos nas primeiras
décadas de sua colonização e ocupação. Este interpretação, enquanto narrativa que visualiza
uma cidade moderna, constituí-se em uma das estratégias metodológicas que validam a
abordagem do uso da fotografia como documento para o historiador, considerando que nesse
tipo de documentação pode mostrar dados dispersos ou mesmo silenciados por outras fontes
de pesquisas.
Segundo Kossoy, (2001), toda fotografia traz uma história, pois tem a capacidade de
resgatar hábitos e o dia-a-dia dos moradores do passado. Inicialmente, houve a intenção de
alguém para que a fotografia existisse. Em seguida, houve um cenário que deu origem à sua
materialização. E por fim, o seu conteúdo foi guardado, e nele, o seu tempo.
As fotografias são valiosas, como evidência da cultura material do passado, pois as
imagens revelam ou implicam a respeito de idéias, atitudes e mentalidades em diferentes
períodos. Essas imagens são, principalmente, preciosas na reconstrução da cultura cotidiana
de pessoas comuns e sua forma de habitação, além disso, é importante para visualizar as
paisagens de cidades, pois desaparecidos os cenários, personagens e vestígios da cultura
material, sobrevivem. Nesse sentido passam a representar um testemunho que caracteriza o
espírito da época (BURKE, 2004).
Ao se explorar a iconografia fotográfica pelas múltiplas possibilidades de investigação
que ela oferece ao pesquisador, são inúmeras as leituras e interpretações que essas imagens
proporcionam. Trata-se de observar tudo o que se possa retirar dessa imagem perpetuada. E
vale lembrar, que é possível ir além do que a imagem pode mostrar, apresentando elementos
que possam contribuir com as discussões do contexto histórico da fotografia enquanto fonte
para o historiador e sua pesquisa (PEREIRA, 2006).
Neste contexto, pensar na possibilidade de descoberta e interpretação da história por
meio de uma cena fotografada pode nos trazer uma noção precisa do espaço, tempo e
costumes representados, estimulando a mente à lembrança, à reconstituição e a imaginação.
Uma pesquisa depende de variadas fontes, mas Burke (2004) afirma que os aspectos
culturais abordados em determinadas imagens são detentoras de sentidos e significados que
evidenciam história. Por isso, vários historiadores têm se interessado pelo estudo das imagens
pelo fato de poderem encontrar nelas, uma forma de transmitir informações que abordam
temas políticos, econômicos e sociais e, também, do cotidiano das pessoas e da própria
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história cultural. Aborda ainda a dificuldade que temos para analisar as imagens uma vez que
estamos habituados a investigar fontes escritas.
Daí a importância de estudar as mensagens visuais e a vantagem do testemunho de
imagens é a de que elas comunicam rápida e claramente os detalhes de um processo
complexo, como o da impressão, por exemplo, o que um texto leva muito mais tempo para
descrever de forma mais vaga.
O testemunho das imagens necessita ser colocado no devido contexto e deve, quando
possível, analisar uma série de imagens. Essas imagens dão acesso não ao mundo social
diretamente, mas sim visões contemporâneas daquele mundo.
Entretanto, os retratos registram, não tanto a realidade social, mas ilusões sociais, não
a vida comum, mas perfomances especiais; eles fornecem evidência inestimável a qualquer
um que se interesse pela história de esperanças, valores e mentalidades sempre em mutação.
Independente de sua qualidade estética, qualquer imagem pode servir como evidência
histórica.
Historiadores contemporâneos têm se valido de imagens, ou seja, fotografias, para
decifrar e compreender épocas anteriores. Ao se referir a paisagens extintas, varias correntes
de historiadores têm-se baseado intensamente no testemunho de imagens para reconstruir uma
paisagem, agora, inexistente.
A análise
Cidades Pioneiras
Aqui, convido ao leitor a participar da análise de algumas imagens da Maringá
Pioneira, suas paisagens e seus personagens, os pioneiros daquela época.
As frentes pioneiras têm por característica a destruição sistemática da natureza, com a
derrubada da mata nativa para a massiva exploração agrícola. Essa materialidade ganhou
forma e fixou-se sobre um espaço até então in natura, ocupado apenas por matas ou fazendas,
sob a liderança de empreendedores da Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná
(CMNP) de origem britânica.
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Vista das terras, ainda “vazias” da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, 1951.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
A natureza sendo exibida em sua exuberância e vigor. No entanto, para que acidade
brotasse daquele solo, a natureza deveria ser sucumbida e extirpada no machado.
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Operário da Cia. derrubando a mata a base do machado, década de 40.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
Limpar totalmente o solo, queimar os vestígios da derrubada, deixar o solo
higienizado e “purificado” para se esquadrinhar os lotes, ruas, praças, e construir as primeiras
moradias faziam das queimadas, o fogo e a fumaça no ar, uma paisagem rotineira.
Queimada em sítio, década de 50.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
Medir, registrar e esquadrinhar o chão, faziam parte do trabalho diário dos topógrafos
e engenheiros para a exploração e desbragamento do território. Com isso, a garantia de títulos
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seguros das terras adquiridas, demarcadas matematicamente, sobre a responsabilidade de
pessoas habilitadas e o testemunho de homens simples e honrados.
Topógrafo da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, 1945
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
Os primeiros acampamentos dos engenheiros e topógrafos da Cia. Melhoramentos. O
acesso à água farta e de boa qualidade para consumo humano e abastecimento da futura
propriedade rural.
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Acampamento da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná próximo a uma nascente d’
água, 1946. Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
As primeiras construções eram em madeira roliça (palmito) e depois tábuas, num
processo a natureza foi construída com a natureza disponível. O rancho de madeira predomina
na paisagem inicial de Maringá.
Rancho de palmito e madeira roliça, início de Maringá, 1945.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
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Dar nome aos lugares. Identificá-los, reconhecê-los na terra escolhida para se fixar
eviver.
Primeiro Hotel de Maringá, cujo nome era o da nova cidade “Maringá”, 1942.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
A urgência e rapidez ao se levantar as primeiras construções em tábuas na paisagem recém
queimada, 1946. Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
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O núcleo urbano em consolidação e rápido crescimento e a “luta constante contra a mata”,
1946. Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
A paisagem da mata dá lugar à geometria cartesiana das ruas dos primeiros cafezais, década
de 60. Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
Logo nos primeiros anos de sua implantação, a cidade mostra necessidades e
preocupações em se firmar uma pólis que pode ser observada na tentativa de ordenação da
paisagem urbana segundo princípios estéticos e funcionais.
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A cidade com sua vitalidade e prosperidade, década de 70.
Fonte: Museu da Bacia do Paraná, Maringá.
Conclusão
As paisagens, congeladas pela subjetividade dos “fotógrafos”, não deve ser
interpretada somente na sua verdade, mas também na forma de como é construída em sua
fantasia. Torna-se evidente, assim, a necessidade de confrontação das fontes iconográficas
com outras fontes e informações que forneçam suporte para as interpretações.
A fonte imagética amplia a pesquisa do historiador, colabora nas incursões
metodológicas e didáticas para a compreensão de um contexto histórico.
O desafio a qualquer pesquisa nesta linha de raciocínio, é organizar os dados
pesquisados, conferir-lhes uma lógica e uma ordem necessária para obter mais subsídios para
a observação das fontes iconográficas, e para interpretar sua mensagem, é necessário
familiarizar-se com os códigos culturais de cada época.
Referências
BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. EDUSC, Bauru, 2004.
KOSSOY, Boris. Fotografia e História. Ateliê Editorial, 2ª Ed. São Paulo, 2001.
PEREIRA, Rosa Claudia Cerqueira. Paisagens Urbanas: Fotografia e Modernidade na Cidade de Belém (1846-1908). Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Pará, 2006.
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Bibliografia consultada
CIAVATTA, Maria. O mundo do Trabalho em Imagens: A fotografia como Fonte Histórica ( Rio de janeiro 1900 – 1930). Editora, DP&A. Rio de Janeiro, 2002.
FELDMAN, Bela; LEITE, Miriam Moreira. Desafios da Imagem. Fotografias, Iconografias e Vídeo nas Ciências Sociais. Editora Papirus. Campinas-SP, 1998.
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