INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS - IBET
ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO TRIBUTÁRIO
RICARDO PELEGRINI
IMUNIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PELAS ENTIDADES
BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A LEI CONDICIONANTE DO
ARTIGO 195, §7ª DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
SÃO PAULO/SP
Julho - 2012
2
INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS - IBET
ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO TRIBUTÁRIO
RICARDO PELEGRINI
IMUNIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PELAS ENTIDADES
BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A LEI CONDICIONANTE DO
ARTIGO 195, §7ª DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Monografia apresentada ao Instituto Brasileiro
de Estudos Tributários - IBET, como requisito
parcial para obtenção do título de
Especialização em Direito Tributário.
SÃO PAULO
Julho – 2012
3
INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS - IBET
ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO TRIBUTÁRIO
RICARDO PELEGRINI
IMUNIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PELAS ENTIDADES
BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A LEI CONDICIONANTE DO
ARTIGO 195, §7ª DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Banca Examinadora:
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
4
RESUMO
Este trabalho científico tem por finalidade o estudo dos documentos normativos e a
diagnose dos enunciados prescritivos, das proposições e normas jurídicas que definem a
imunidade das contribuições sociais pelas entidades beneficentes de assistência social.
Nele duas correntes resistem no entendimento, parte da doutrina e jurisprudência
diverge suas teses entre qual deve ser a norma condicionante apta a regular a imunidade do
artigo 195, §7º da Constituição Federal - que ocupa um lugar de alta relevância nesta análise -
se a legislação ordinária ou a legislação complementar.
Como esta demanda, ainda não está definida, o presente grafito se dedica a uma
construção científica baseada nos consentâneos normativos jurídicos relacionados ao tema,
bem como uma análise mais aprofundada das divergências entre doutrina e jurisprudência, e
com base nos comandos constitucionais e princípios jurídicos que sustentam o Estado
Democrático de Direito o autor busca a extração de um juízo de valor que aflui para a
conclusão do presente estudo.
5
ABSTRACT
This scientific work takes as finality the study of the prescriptive documents and the
diagnosis of the expressed ones prescriptive, of the propositions and legal standards that
define the immunity of the social contributions for the charitable entities of social work.
In him two currents hold in the understanding, part of the doctrine and jurisprudence
diverges his theories between which the standard must be a suitable restriction regulating the
immunity of the article 195, §7º of the Federal Constitution - that occupies a place of high
relevance in this analysis - if the ordinary legislation or the complementary legislation.
Since this demand, it is still not defined, the present graffito is dedicated to a
scientific construction when we were based consentaneous prescriptive legal when they were
made a list to the subject, as well as an analysis more deepened of the divergences between
doctrine and jurisprudence, and on basis of the constitutional commands and legal beginnings
that support the Democratic State of Right the author looks for the extraction of a valuable
judgment that flows for the conclusion of the present study.
6
SUMÁRIO
1. Introdução ........................................................................................................... 7
2. Imunidade Tributária .......................................................................................... 9
2.1. Definição de Imunidade ................................................................................. 9
2.2. Conciso Paralelo e as Principais Diferenças entre Imunidade e Isenção ....... 10
3. Imunidade das Contribuições para a Seguridade Social pelas Entidades
Beneficentes de Assistência Social e a Lei Condicionante do Artigo 195, §7º
da Constituição Federal ......................................................................................
14
3.1. Contribuições Sociais ..................................................................................... 14
3.2. A Imunidade do Artigo 195, §7º da Constituição Federal de 1988 ............... 16
3.3. Imunidades Incondicionais e Condicionais ................................................... 19
3.4. A Legislação Condicionante Hábil a Regulação dos Requisitos ao Gozo da
Imunidade do Artigo 195, §7º da Constituição Federal de 1988 ..................
20
4. Conclusão ......................................................................................................... 28
7
1. INTRODUÇÃO
De acordo com o conceito dado ao artigo 1º da Lei Orgânica da Assistência Social
(Lei nº 8.742 de 07 de dezembro de 1.993), a assistência social é um dever do Estado e um
direito do cidadão que visa a prestação de auxílio às necessidades básicas dos carecidos, sob o
ponto de vista familiar, educacional, saúde, econômico, higiene, etc., através de um conjunto
de ações de iniciativa pública com a sociedade.
Do ponto de vista constitucional, precisamente na disposição do artigo 203 da CF/88,
a assistência social deve ser prestada a quem dela necessitar independente de contribuição
social.
Contudo, o Estado por si só não possui todas as condições necessárias para prestar o
atendimento social de acordo com o comando constitucional, daí a necessidade de unir forças
com a iniciativa privada, outorgando seus deveres às associações conhecidas como “entidade
beneficente de assistência social”, pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos,
que se dedicam a prestar gratuitamente serviços de atendimento e assessoramento destinados
ao suprimento das necessidades básicas das pessoas carentes, por meio de ações que visam a
proteção social, a vigilância socioassistencial e a defesa e garantia de direitos básicos, nos
termos que determinam os artigos 203 da CF/88; e 3º da LOAS.
Por esta razão, o legislador constituinte - visando a necessidade da colaboração da
sociedade na iniciativa pública para assegurar o exercício dos direitos sociais a fim de
proporcionar aos mais carentes o atendimento de suas necessidades básicas - limitou a atuação
impositiva do Estado, dando às entidades beneficentes de assistência social imunidade
tributária: (i) dos impostos (art. 150, VI, c) e (ii) das contribuições sociais (art. 195, §7º),
ambos da Constituição Federal de 1988.
Para evitar eventuais abusos contra a ordem fiscal, ao final de cada um dos artigos
constitucionais, o constituinte condicionou o gozo das imunidades propostas ao atendimento
de leis condicionantes por parte das entidades beneficentes de assistência social, no entanto,
não especificou se a norma atendida deve ser lei ordinária ou lei complementar, expressando
nos textos da Constituição apenas “lei” em sentido genérico.
8
Quanto à imunidade de impostos do artigo 150, VI, c, da CF/88, já há entendimento
pacificado, sobre qual o instrumento normativo condicionante apto à regulação dos
procedimentos para que a entidade beneficente possa valer-se da norma imunizadora.
Entretanto, a omissão quanto a norma condicionante à imunidade das contribuições
sociais do artigo 195, §7º da CF/88 gerou um dissidente jurídico entre doutrinas e
jurisprudências, em primeiro lugar porque o legislador constitucional cometeu um erro
técnico de linguística e utilizou no texto maioral a nomenclatura “isentas” quando deveria ter
utilizado a palavra “imune”, e em segundo plano por não haver uma expressa ordem
subordinando a regulação do gozo do beneficio à uma lei ordinária, assim nasceram, portanto
duas correntes doutrinárias:
i. A que defende a tese de que a norma condicionante a ser
observada para a concessão da imunidade das contribuições
sociais deve ser a lei ordinária; e
ii. A que defende a tese de que a norma apta a regular o gozo da
imunidade do artigo 195, §7º da CF/88 é a lei complementar.
Contudo, o presente estudo tem por objetivo buscar juridicamente, dentro de uma
análise científica baseada no conhecimento da melhor doutrina a correta interpretação da
vontade do legislador constituinte, para entender qual é a legislação condicionante hábil para
a regulação dos requisitos ao gozo da imunidade das contribuições sociais pelas entidades
beneficentes de assistência social na forma prevista pelo §7ª do artigo 195, da Constituição
Federal.
Por esta razão neste trabalho serão abordadas as principais questões que envolvem o
tema, convergindo ao final numa conclusão lógica pautada nos mais elevados princípios do
Direto Tributário.
9
2. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
2.1. Definição de Imunidade
Nos termos da Constituição Federal de 1988, imunidade é a restrição imposta ao
poder impositivo do Estado, cujo desígnio constitucional veda a exigência, a instituição e a
cobrança de tributos em determinadas situações, a exemplo do que regem os artigos 150, VI,
c; e 195,§7º do Texto Constitucional, entre outros.
Neste mesmo sentido Marcus Claudio Acquaviva1 é enfático ao definir imunidade
fiscal como sendo uma “Vedação constitucional da imposição de tributos sobre coisa,
negócio, fato ou pessoa”.
Em assonância a este entendimento, José Souto Maior Borges2 ensina que a
Constituição Federal, ao repartir a competência tributária, retirou do campo de tributação
pelos entes federados, determinados bens, pessoas e serviços, in verbis:
Ao proceder à repartição do poder impositivo, pelo mecanismo da
competência tributária, a Constituição Federal coloca fora do campo
tributável reservado à União, Estados-membros, Distrito Federal e
Municípios certos bens, pessoas e serviços, obstando, assim – com o limitar
o âmbito de incidência da tributação – o exercício das atividades legislativas
do ente tributante. [...] Ao imunizar, a Constituição proíbe que se estenda o
âmbito de validez da própria lei tributária sobre pessoas ou bens imune.
Aliomar Baleeiro3, harmonicamente, manifesta seu apoio a esta tese dizendo que as
imunidades são “limitações constitucionais ao poder de tributar” e vai um pouco mais além
destacando quatro pontos relativos à vedação constitucional ao poder tributante dos entes
federados afirmando que do ponto de vista jurídico há concordância geral de que a imunidade:
1. É regra jurídica com sede constitucional;
2. É delimitativa (no sentido negativo) da competência dos entes políticos
da Federação, ou regra de incompetência;
1 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva: De acordo com o novo Código
Civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004, p.725 2 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. 2º tiragem,
p.217 3 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI, Misabel Abreu
Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.372
10
3. Obsta o exercício da atividade legislativa do ente estatal, pois nega
competência para criar imposição em relação a certos fatos especiais e
determinados;
4. Distingue-se da isenção, que se dá no plano infraconstitucional da lei
ordinária ou complementar [...]
Baleeiro4 ainda sintetiza sua ideia dizendo que: “A imunidade é, portanto regra de
exceção e de delimitação de competência, que atua, não de forma sucessiva no tempo, mas
concomitantemente”.
Na visão de Paulo de Barros Carvalho5, que segue a mesma orientação bussolar, o
Ilustre Professor propõe uma definição, com maior sentido semântico e mais abrangente, ao
conceito de imunidade tributária, exibindo-a com grande eloquência como sendo:
[...] a classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas,
contidas no texto da Constituição Federal, e que estabelecem, de modo
expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional
interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações
específicas e suficientemente caracterizadas.
Portanto, em sintonia com os consentâneos ensinamentos doutrinários em exposição
é conclusivo que imunidade é, em epítome, a norma constitucional que tolhe a competência
impositiva das pessoas políticas, negando-lhes o poder de instituírem, cobrarem e/ou exigirem
tributos sobre fatos, coisas, pessoas e/ou serviços acobertados pelas proposições
constitucionalmente qualificadas.
2.2. Conciso Paralelo e as Principais Diferenças entre Imunidade e Isenção
Em se tratando do instituto jurídico da imunidade não podemos ignorar, ainda que de
forma pouco profunda, a isenção como outra espécie jurídica de não incidência tributária,
embora não seja este o foco deste estudo, concordamos com a posição de Paulo de Barros
Carvalho6 que trata imunidade e isenção como categorias jurídicas dessemelhantes, que não se
permeiam, tampouco mantém, “qualquer tipo de relacionamento no processo de derivação ou
de fundamentação, a não ser em termos muito oblíquos e indiretos”.
4 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI, Misabel Abreu
Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.374 5 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.234
6 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 237
11
Ainda o Ilustre professor Paulo de Barros Carvalho7 ressalva que a doutrina tributária
brasileira tem, por tradição, o costume de tratar os institutos da imunidade e isenção
conjuntamente, sempre ressaltando pontos que aproximam as duas instituições, em um
paralelismo que tem por finalidade demonstrar similaridade entre as duas realidades
normativas, “Anunciam que, no final das contas, seja no caso de imunidade ou na hipótese de
isenção, inexiste o dever prestacional tributário, aspecto que justifica o paralelismo entre as
instituições”.
Contudo, por não serem as diferenças entre imunidade e isenção objetos
protagonistas deste grafito acadêmico, compendia-se que os paralelos entre os institutos não
se justificam, conforme Paulo de Barros Carvalho8 há entre eles apenas três sinais comuns: “a
circunstância de serem normas jurídicas válidas no sistema; integrarem a classe das regras
de estrutura; e tratarem de matéria tributária”. Em nada mais se assemelham.
Neste sentido para dar seguimento à análise da imunidade das contribuições sociais
pelas entidades beneficentes de assistência social, nos basta entender que imunidade e isenção
são institutos jurídicos completamente diferentes e que não guardam entre si qualquer tipo de
relação seja no processo de derivação ou no processo de fundamentação.
Luiz Fernando Maia9 ao discorrer sobre o instituto da imunidade deixa claro que este
fenômeno jurídico não se confunde com qualquer outro elemento de desoneração tributária,
nas palavras do autor:
Sendo a imunidade tributária uma forma de não-incidência por força de
mandamento constitucional, que sufoca o poder tributante do Estado, não
chega a ocorrer o fato gerador, inexiste relação jurídico-tributária, a
obrigação tributária não se instaura e o tributo nunca poderá ser devido, pois
nunca poderá existir.
Assim, a imunidade não se confunde com outros fenômenos de desoneração
de tributo determinados pelo legislador infra-constitucional, como por
exemplo, a isenção, porque nessa há a incidência do tributo, ocorre o fato
gerador, instaura-se a relação jurídico-tributária, nasce a obrigação tributária,
sendo por conseguinte, devido o tributo. Mas, por disposição de lei infra-
constitucional (CTN, art. 176), o contribuinte, por razões econômicas,
7 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.236/237
8 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.237
9 MAIA, Luiz Fernando. Compêndio de Direito Tributário: Doutrina, legislação e prática processual no âmbito
administrativo, fiscal e judicial. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2009, p. 186
12
políticas ou sociais, é dispensado de seu pagamento. Tanto é assim que
isenção é considerada pelo Código tributário Nacional como causa de
exclusão do crédito tributário porque, embora exista a obrigação tributária, a
isenção impede que se constitua o crédito tributário pelo lançamento. A
imunidade, assim, decorre da Constituição e a isenção se origina da lei.
(negrito nosso)
Apenas ao dizer que as normas de imunidade são aquelas “contempladas na
Constituição Federal” já se faz distinção desta com a isenção, já que esta última decorre de
norma infraconstitucional e a primeira, como dito, de texto constitucional.
No mesmo paralelo Marcus Claudio Acquaviva10
faz a seguinte análise dos dois
institutos:
Isenção Fiscal
Dispensa legal do pagamento de tributo. Pode ser extinta mediante lei
ordinária, ao contrário da imunidade, somente atingida por alteração
constitucional. Não se confunde, também, com a não-incidência, pois se a
isenção é a dispensa legal do pagamento de um tributo, a não-incidência
implica a própria inexistência da obrigação fiscal, não havendo, portanto,
fato gerador.
Por fim, Paulo de Barros Carvalho11
ensina que imunidade e isenção não guardam
paralelo entre si, em suas palavras, “São proposições normativas de tal modo diferentes na
composição do ordenamento positivo que pouquíssimas são as regiões de contato”. Quanto
às diferenças entre imunidade e isenção, assevera que:
O preceito de imunidade exerce a função de colaborador, de uma forma
especial, no desenho das competências impositivas. São normas
constitucionais. Não cuidam da problemática da incidência, atuando em
instante que antecede, na lógica do sistema, ao momento da percussão
tributária. Já a isenção se dá no plano da legislação ordinária. Sua
dinâmica pressupõe um encontro normativo, em que ela, regra de isenção,
opera como expediente redutor do campo de abrangência dos critérios da
hipótese ou da consequência da regra-matriz do tributo[...].
(negrito nosso)
Assim sendo, pelo breve traçado entre os dois institutos jurídicos é notória a
diferença existente entre ambos, sendo irretorquível que a principal diferença e também a
10
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva: De acordo com o novo Código
Civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004, p.781 11
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.237
13
mais evidente se delineia justamente pelo fato de que a “IMUNIDADE” é norma
constitucional e tem a função precípua de colaborar no contorno das competências
impositivas dos Entes políticos da República, já a “ISENÇÃO” é norma que se da no âmbito
da legislação infraconstitucional e não se trata apenas de uma mera desobrigação de
pagamento de tributo, pois possui um sentido muito mais abrangente, e tem como desígnio
não uma dispensa fiscal, mas a redução do campo de abrangência tributária por meio da
mutilação de um ou mais critérios hipotético-consequentes da regra matriz de incidência
tributária, o que por consequência impede a incidência do tributo.
Por esta razão, adotamos como definição de imunidade - em concordância
com a acepção introduzida pelos renomados autores - a expressão de Clélio Chiesa12
como
sendo a imunidade: “um conjunto de normas jurídicas contempladas na Constituição Federal
que estabelecem a incompetência das pessoas politicas de direito constitucional interno para
instituírem tributos sobre certas situações nela especificadas”.
Outra diferente característica entre os dois institutos jurídicos se demonstra pelo fato
de que na imunidade não há sequer o nascimento do tributo ao passo que nas hipóteses de
isenção o ente tributante exerce uma faculdade legal, abrindo mão da receita fiscal em favor
de um benefício concedido ao contribuinte. Ora, se na isenção há uma renúncia fiscal por
parte do Estado, na imunidade não existe tal possibilidade, pois por consequência lógica é
impraticável renunciar a receita fiscal de um tributo que jamais poderá instituir tendo em vista
a expressa vedação constitucional.
Não vamos enumerar todas as diferenças entre imunidade e isenção, pois não são o
foco deste estudo, por esta razão ficamos apenas com as diferenças principais que importam à
conclusão desta obra, ou seja, em síntese imunidade é norma constitucional que obsta a
competência impositiva do ente tributante, e isenção é uma norma infraconstitucional que se
dá no plano da legislação ordinária facultando ao Estado abrir mão de determinada receita
fiscal.
12
CHIESA, Clélio. Imunidades e Normas Gerais de Direito Tributário. In: Curso de Especialização em Direito
Tributário: Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho. coord. SANTI, Eurico Marcos
Diniz de. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.932
14
3. IMUNIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURIDADE SOCIAL PELAS
ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A LEI
CONDICIONANTE DO ARTIGO 195, §7º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
3.1. Contribuições Sociais
As contribuições sociais são tributos, constitucionalmente vinculados com a atuação
estatal, com destinação especificada em lei, sem nenhuma semelhança com os impostos, já
que a criação destes independe de qualquer tipo de atuação do ente político tributante.
A Constituição Federal de 1988 solidificou esta espécie jurídico-tributária
destacando a importância de seu papel no custeio das finalidades sociais a que se destina.
Por esta razão, os textos constitucionais dos artigos 149 e 195 consagraram a
nominação das contribuições sociais, disciplinando sua criação e exigência como podemos
confirmar nas redações que seguem:
Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de
intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias
profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas
respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem
prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que
alude o dispositivo.
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e
das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da
lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de
1998)
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados,
a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20,
de 1998)
c) o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não
incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime
geral de previdência social de que trata o art. 201; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
15
III - sobre a receita de concursos de prognósticos.
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele
equiparar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
[...]
§ 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser
exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as
houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art.
150, III, "b".
Com relação a esta espécie jurídica em análise, é evidente que o disposto no artigo
149 da Constituição Federal, da à União a possibilidade de se utilizar das contribuições
sociais como ferramentas de atuação e intervenção nas esferas sociais, econômicas e
profissionais do Estado.
Neste sentido é o entendimento de Paulo de Barros Carvalho13
, ipsis verbis:
O art. 149, caput, do texto constitucional prescreve a possibilidade da União
instituir contribuições como instrumento de sua atuação do âmbito Social, na
intervenção do domínio econômico e no interesse das categorias
profissionais ou econômicas.
Igualmente, Luiz Fernando Maia14
faz uma importante ressalva, quanto à instituição
das contribuições pelos entes políticos:
Assim, as contribuições sociais são distintas dos impostos, por isso que a
atuação estatal é ato necessitado e não contingente, e distintas das taxas e das
contribuições de melhoria, porque nem sempre concorre, na hipótese, o
requisito da referibilidade ao contribuinte.
Entretanto, isto não implica dizer que há para o legislador plana liberalidade para
propor as situações que irão compor a hipótese de incidência desses tributos, pois de uma
análise mais acurada do texto da Carta Magna, se observa o dever que os legisladores
ordinários dos entes Federados têm de respeitar as competências, a eles atribuídas, conforme a
imposição constitucional.
13
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.76 14
MAIA, Luiz Fernando. Compêndio de Direito Tributário: Doutrina, legislação e prática processual no âmbito
administrativo, fiscal e judicial. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2009, p.45
16
3.2. A Imunidade do Artigo 195, §7º da Constituição Federal de 1988
O artigo 150 da Constituição Federal de 1988 estabelece um rol de garantias
imunizadoras de impostos conferidas a determinados contribuintes, as quais visam protege-los
contra ocasionais excessos ou abusos do poder tributante dos entes políticos da República. O
mesmo artigo elenca ainda as hipóteses de imunidade tributária, que como visto é deferente
das isenções, precisamente por ser aquela prevista no texto constitucional e esta em legislação
infraconstitucional.
Entre as já mencionadas hipóteses de imunidades tributárias indiscutivelmente
previstas, em especial, as elencadas no artigo 150, VI da Carta Primaveril, que trata dos
impostos, a própria Constituição Federal visando à realização dos objetivos sociais do Estado,
prevê algumas hipóteses de desoneração tributária também no âmbito das contribuições
sociais, a fim de:
[...] assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e
internacional15
[...].
Estas desobrigações tributárias são também imunidades, que protegem, em certas
hipóteses, determinados contribuintes da capacidade impositiva dos entes tributantes.
Neste espeque, segundo Paulo de Barros Carvalho16
as imunidades transcendem os
impostos previstos no artigo 150, inciso VI, do texto constitucional, atingindo também taxas e
contribuições dentre as quais se destacam as contribuições sociais das entidades beneficentes
de assistência social, conforme reza o artigo 195, §7º da Constituição Federal de 1988, in
verbis:
Art. 195 A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
15
BRASI. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Brasília, 5 de outubro
de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm#adct>.
Acesso em: 19 set. 2012. 16
CARVALHO, Paulo de Barros, Direito Tributário Linguagem e Método. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2009.
p.374
17
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e
das seguintes contribuições sociais:
[...]
§7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades
beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas
em lei.
Não obstante o legislador constituinte haja empregado de maneira inapropriada o
termo “isenção” para desobrigar as entidades beneficentes de assistência social do
recolhimento das contribuições sociais, vale ressalvar que por versar sobre desoneração
tributária difundida pela própria Constituição Federal, tal proposição possui natureza jurídica
de imunidade.
Paulo de Barros Carvalho17
esclarece que a terminologia “isenção” utilizada no
artigo 195, §7º da Constituição Federal deve ser entendida como “imunidade”, pois é norma
constitucional, assim sendo não pode ser considerada isenção uma norma contida na Lei
Maior ainda que expressa desta forma, já que “isenção” se origina apenas no campo da
legislação infraconstitucional, a saber:
Conquanto o legislador constitucional mencione a palavra “isentas”, há
imunidade à contribuição para a seguridade social por parte das entidades
beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas
em lei, consoante dispõe o art. 195, III, §7º, da CR.
Neste sentido, é pacífico o entendimento jurisprudencial, especialmente
considerando que a matéria já foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, no MS
22.192-DF, publicado no DJ de 19/12/96, no qual se destaca um trecho do voto vencedor do
Excelentíssimo Ministro Celso de Mello18
que em consonância com a doutrina tributária
esclarece que a norma esculpida no artigo 195, §7º, da Constituição é definida como “típica
hipótese de imunidade”, in verbis:
Impende enfatizar, neste ponto, um aspecto de mais alta relevância. Mais
importante do que a própria discussão sobre o alcance da norma inscrita em
simples ato de caráter infraconstitucional editado pelo Poder Público (DL nº
1.572/77, art. 1º, §1º), revela-se a análise da cláusula inscrita no art. 195, §7º,
17
CARVALHO, Paulo de Barros, Direito Tributário Linguagem e Método. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2009.
p.377 18
BRASIL. Superior Tribunal Federal. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. RMS nº 22.192 2ª Turma.
Relator: Ministro Celso de Melo. Brasília, DF, Acórdão, DJ Nr. 246 do dia 19/12/1996: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1608853>. Acesso em: 04 jul.2012
18
da Carta da República, que outorga a entidades beneficentes de assistência
social – desde que atendam as exigências estabelecidas em lei – o benefício
extraordinário da imunidade subjetiva referente às contribuições pertinentes
à seguridade social.
Com a superveniência da Constituição Federal de 1988, outorgou-se às
entidades beneficentes de assistência social, em norma definidora de típicas
hipóteses de imunidade, uma expressiva garantia de índole tributária em
favor dessas instituições civis.
A cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Carta Política – não obstante
referir-se impropriamente à isenção de contribuição para a seguridade social
-, contemplou as entidades beneficentes de assistência social com o favor
constitucional da imunidade tributária, desde que por elas preenchidos os
requisitos fixados em lei (ROQUE ANTONIO CARRAZA, “curso de
Direito Constitucional Tributário”, p. 349, nota de rodapé nº 144, 5º ed.,
1993, Malheiros; JOSÉ EDUAURDO SOARES DE MELO, “Contribuições
Sociais no Sistema Tributário”, p. 171-175, 1995, Malheiros; SACHA
CALMON NAVARRO COÊLHO, “Comentários à Constituição de 1988 –
Sistema Tributário”, p. 41-42, item nº 22, 4º ed., 1992, Forense; WAGNER
BALERA, “Seguridade Social na Constituição de 1988”, p. 71, 1989 RT,
v.g.).
Convém salientar que este magistério doutrinário reflete-se na própria
jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, que já
identificou na cláusula inscrita no art. 195, §7º, da Carta Política, a
existência de uma típica garantia de imunidade estabelecida em favor das
entidades beneficentes de assistência social (RTJ 137/965, Rel. Min. Moreira
Alves).
Ainda na ADIn. nº 2.545-7, o voto da Relatora Ministra Ellen Grace
19, referendado
por seus pares no Supremo Tribunal Federal ressaltou a impropriedade técnica da palavra
“isentas” utilizada no artigo 195, §7º da Constituição Federal:
Esta Corte já teve oportunidade de reconhecer, quando do citado referendo à
liminar concedida na ADIn. n. 2.028, que o benefício de que cogita o art.
195, §7º, é o de imunidade.[...]
Destarte, a vedação de cobrança das contribuições para a seguridade social das
entidades beneficentes de assistência social de que trata o texto constitucional, é sem dúvidas
uma consagrada norma de imunidade e, por ser constitucionalmente qualificada como norma
19
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI 2545
Tribunal Pleno. Relatora: Ministra Ellen Grace. Brasília, DF, DJ do dia 07/02/2003: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E+E+2545
%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+2545%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos>.
Acesso em: 05 jul.2012
19
de limitação ao poder de tributar esta não pode ser modificada, extinta ou ter reduzidos seus
efeitos por lei infraconstitucional.
Este entendimento se consagra ainda nas palavras dos Professores Ives Gandra
Martins e Marilena Talarico Martins Rodrigues20
O constituinte cria hipóteses fora do campo de abrangência do poder público
tributante, motivo pelo qual sempre que a Constituição retira do poder
tributante o poder de tributar o faz por meio de imunidade e nunca de
isenção. Aquela é forma desonerativa de exclusiva utilização pelos
legisladores ordinários.
Por esta razão, as imunidades constitucionais em matéria tributária, estão
centradas no art. 150, VI que elenca diversas hipóteses de imunidade de
impostos e no §7º do art. 195, que menciona a imunidade para as
contribuições sociais, atendidos os requisitos da lei.
Para Aliomar Baleeiro21
: a “isenção” a que se refere o art. 195, é erro técnico do
enunciado linguístico do dispositivo, que consagra uma imunidade e verdadeira limitação ao
poder de tributar.
Por todas estas exposições, embora seja flagrante a falha técnica empregada pelo
legislador constitucional ao grafar a nomenclatura “isentas” na Lei Maior, não há dúvidas
que a norma contida no artigo 195, §7º da Constituição é de fato e direito imunidade das
contribuições sociais.
3.3. Imunidades Incondicionais e Condicionais
Antes de abordar o tema sobre a norma condicionante competente para
regularização dos procedimentos para a concessão de imunidade das contribuições sociais
pelas entidades beneficentes de assistência social, é importante destacar para o relevo deste
estudo que entre as várias classificações de imunidade estabelecidas por nossos melhores
doutrinadores que lecionam no ramo do direito tributário, as mais importantes referem-se às:
20
MARTINS, Ives Gandra; RODRIGUES, Marilena Talarico Martins. A imunidade tributária das entidades de
educação e de assistência social sem fins lucrativos à luz da CF/88. In Aspectos Jurídicos do Terceiro Setor. 1.
ed. São Paulo: IOB Thomson, 2005, p.102 21
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI, Misabel Abreu
Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.516
20
i. Imunidades “INCONDICIONAIS”
(aquelas que independem de lei infraconstitucional); e,
ii. Imunidades “CONDICIONAIS”
(aquelas que requerem lei infraconstitucional para a produção de
seus efeitos).
Neste mesmo sentido Luiz Fernando Maia22
faz a seguinte diferenciação entre as
duas espécies jurídicas:
i. Imunidades incondicionais ou autoexecutáveis são aquelas
consubstanciadas em normas constitucionais e eficácia plena, que
produzem efeitos de imediato (CF, art. 150. VI, a, b e d), não dependendo
sua eficácia de lei complementar que estabeleça requisitos para a sua
aplicação.
ii. As imunidades condicionais são consagradas em normas constitucionais
que reclamam lei complementar para que possa produzir seus efeitos e
fixe as condições que devem ser observadas pelas entidades para gozarem
a proteção constitucional. (ex.: CF, arts. 150, VI, c, e 195,§7º).
Neste último caso, a norma infraconstitucional condicionante aplicada às normas
imunizadoras de eficácia contida não possui o condão de modifica-la, extingui-la ou reduzir
seus efeitos, antes se presta a constituir apenas um pressuposto formal que deve ser observado
pelo destinatário, para que efetuada a comprovação de seu atendimento esteja protegido em
face da competência impositiva do ente tributante.
3.4. A Legislação Condicionante Hábil a Regulação dos Requisitos ao Gozo da
Imunidade do Artigo 195, §7º da Constituição Federal de 1988
Superadas as questões conflitantes das diferenças que orbitam as imunidades e
isenções - para deixar claro que a regra constitucional expressa no artigo 195, §7º trata-se de
típica hipótese de imunidade condicional - é imprescindível, portanto, que o presente estudo
passe a dedicar-se a um exame mais profundo sobre o normativo hábil a regularizar os
procedimentos necessários para a concessão do benefício da imunidade das contribuições
sociais pelas entidades beneficentes de assistência social previsto na Constituição, se lei
ordinária ou lei complementar.
22
MAIA, Luiz Fernando. Compêndio de Direito Tributário: Doutrina, legislação e prática processual no âmbito
administrativo, fiscal e judicial. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2009, p.187
21
A este respeito o Ilustre Ministro Moreira Alves23
ao proferir seu voto na ADIn n.
2028, que aguarda julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, fez algumas considerações
acerca do tema destacando a principio que de acordo com o entendimento da Corte
Constitucional, a exigência de lei complementar, para determinada matéria, deve ser aludida
pela própria Constituição o que por consequência leva ao entendimento de que se o texto
constitucional menciona apenas a “lei” de forma universal, esta expressão abrange tanto a
legislação ordinária quanto à legislação complementar, como é o caso do artigo 195, §7º da
Carta Magna, assim por este entendimento aplicar-se-ia como norma condicionante a este
dispositivo constitucional a legislação ordinária, senão vejamos parte do mencionado voto, in
verbis:
[...] De há muito se firmou a jurisprudência desta Corte no sentido de que só
é exigível lei complementar quando a Constituição expressamente a ela faz
alusão com referência a determinada matéria, o que implica dizer que
quando a Carta Magna alude genericamente a "lei" para estabelecer princípio
de reserva legal, essa expressão compreende tanto a legislação ordinária, nas
suas diferentes modalidades, quanto a legislação complementar. - No caso, o
artigo 195, § 7º, da Carta Magna, com relação a matéria específica (as
exigências a que devem atender as entidades beneficentes de assistência
social para gozarem da imunidade aí prevista), determina apenas que essas
exigências sejam estabelecidas em lei. Portanto, em face da referida
jurisprudência desta Corte, em lei ordinária. – [...]
Entretanto, na continuação do mesmo voto (ADIn n. 2028) o Meritíssimo Ministro
Moreira Alves, dedicou notória importância à outra parte da corrente doutrinária, a qual em
sua posição defende que sendo a imunidade uma limitação constitucional ao poder de tributar,
aplica-se como norma condicionante a lei complementar, justamente por eficácia do comando
esculpido no artigo 146, II da Lei Máxima, ipsis litteris:
[...] É certo, porém, que há forte corrente doutrinária que entende que, sendo
a imunidade uma limitação constitucional ao poder de tributar, embora o § 7º
do artigo 195 só se refira a "lei" sem qualificá-la como complementar - e o
mesmo ocorre quanto ao artigo 150, VI, "c", da Carta Magna -, essa
expressão, ao invés de ser entendida como exceção ao princípio geral que se
encontra no artigo 146, II ("Cabe à lei complementar: .... II - regular as
limitações constitucionais ao poder de tributar"), deve ser interpretada em
23
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI 2028 Tribunal Pleno.
Relatora: Ministro Moreira Alves. Brasília, DF, DJ do dia 16/06/2000: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E+E+2028
%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+2028%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos>.
Acesso em: 20 out.2012
22
conjugação com esse princípio para se exigir lei complementar para o
estabelecimento dos requisitos a ser observados pelas entidades em
causa.[...]
Tendo em vista a relevância das duas teses opostas sobre o tema, Aliomar Baleeiro24
em sua primorosa obra doutrinária “Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar” faz
algumas considerações com relação à posição da Corte Suprema, mencionando que esta ainda
não se posicionou definitivamente a respeito de qual é a norma apta à regulação dos
pressupostos ao disfrute da imunidade das contribuições sociais pelas entidades beneficentes
de assistência social, permeando seus votos entre as duas posições resistidas:
Como se pode observar, o Supremo Tribunal Federal não se posicionou
sobre a necessidade da edição de lei complementar para a regulação dos
requisitos ao gozo da imunidade do art. 195, §7º, reconhecendo, não
obstante, relevância nas duas teses opostas sobre o tema (aquela que exige a
edição de lei complementar e aquela que a dispensa).
Acerca do tema, é certo que não há um consenso jurisprudencial somente dentro do
Supremo Tribunal Federal, mas também entre este e demais órgãos julgadores do judiciário e
da Administração Pública, por esta razão para ratificar a análise da matéria em debate cabe
destacar algumas divergências entre o a Corte Suprema – RE 42881525
(pela tese da lei
ordinária), o Superior Tribunal e Justiça - REsp 49597526
(tese da lei complementar) e o
Conselho de Contribuintes – Processo n. 10830.003364/2001-1127
(tese da lei complementar),
senão vejamos:
(STF – RE 428815)
DECISÃO: RE, a, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal
da 1a Região, assim ementado: "CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO.
IMUNIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ENTIDADE
24
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI, Misabel Abreu
Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.520 25
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário. RE 428815 / AM. Relator: Ministro Sepúlveda
Pertence. Brasília, DF, DJ do dia 14/09/2004: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+428815
%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas>. Acesso em: 20 out.2012
26
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. REsp 495975 / RS (2002/0156711-0) T1. Relator:
Ministro José Delgado. Brasília, DF, DJ do dia 20/10/2003: Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/pagina_lista.asp>. Acesso em 20 out 2012 27
BRASIL. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Processo n. 10830.003364/2001-11. Relator: Jorge
Freire. Brasília, DF, Sessão do dia 20/10/2005: Disponível em:
<http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf>.
Acesso em: 21 out.2012
23
FILANTRÓPICA. ENTIDADE DECLARADA DE FINS
FILANTRÓPICOS E DE UTILIDADE PÚBLICA. CERTIFICADO DE
ENTIDADE DE FINS FILANTRÓPICOS NÃO RENOVADO ENTRE
20.04.98 E 22.06.1999. ART. 146-II E ART. 150-VI-'C' DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. 'São isentas de contribuição para a
seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendem
às exigências estabelecidas em lei'. (art. 195-§7o da CF). 2. A previsão
constitucional, em questão, trata, na verdade, de imunidade, pois toda
restrição ou limitação ao poder de tributar prevista na Constituição
Federal traduz imunidade e não isenção. 3. As condições que definem
instituição filantrópica estão previstas no art. 14 do Código Tributário
Nacional e a interpretação harmônica dos artigos 146-II, 150-VI, 195-
§7o permite concluir que os requisitos para constituição e
funcionamento das entidades imunes é efetivamente matéria de lei
ordinária. Ocorre que a comprovação de que a Impetrante é entidade
filantrópica, mesmo que ela tenha sido reconhecida entidade de utilidade
pública desde 11.07.1983 (fls. 18) depende de demonstração periódica de
atendimento às condições previstas em lei, que se dá por meio do Certificado
de Entidade de Fins Filantrópicos. 4. O pedido de renovação do Certificado
da Impetrante foi realmente indeferido com efeitos a partir de 20.04.1998 e
só em 22.06.1999 novo Certificado válido foi emitido. Portanto, durante este
período, a Impetrante não estava sob o abrigo da imunidade tributária
prevista pela Constituição Federal'(do Opinativo Ministerial, fls. 169). 5.
Apelo improvido." A recorrente alega violação dos artigos 195, § 7o, e 146,
II, da Constituição Federal. Sustenta que, por se tratar de imunidade
tributária, a lei a que se refere o § 7o do art. 195 da Constituição é lei
complementar, portanto, os requisitos a serem atendidos para o
reconhecimento da imunidade são os constantes no art. 14 do CTN e não os
do art. 55 da Lei 8.212/91, dispositivo legal que exige o Certificado de
Entidade de Fins Filantrópicos. O Supremo Tribunal Federal firmou, no
julgamento do MI 616, Nelson Jobim, DJ 25.10.2002, entendimento nos
termos da ementa que segue: "CONSTITUCIONAL. ENTIDADE CIVIL,
SEM FINS LUCRATIVOS. PRETENDE QUE LEI COMPLEMENTAR
DISPONHA SOBRE A IMUNIDADE À TRIBUTAÇÃO DE IMPOSTOS E
CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURIDADE SOCIAL, COMO
REGULAMENTAÇÃO DO ART. 195, § 7º DA CF. A HIPÓTESE É DE
ISENÇÃO. A MATÉRIA JÁ FOI REGULAMENTADA PELO ART. 55
DA LEI Nº 8.212/91, COM AS ALTERAÇÕES DA LEI 9.732/98.
PRECEDENTE. IMPETRANTE JULGADA CARECEDORA DA AÇÃO."
Na linha do precedente, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 557,
caput, C.Pr.Civil). Brasília, 18 de agosto de 2004. Ministro SEPÚLVEDA
PERTENCE - Relator
(RE 428815, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, julgado em
18/08/2004, publicado em DJ 14/09/2004 PP-00037)
(negrito e grifo nosso)
24
(STJ - REsp 495975)
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. INSS. IMUNIDADE.
ENTIDADE BENEFICENTE DECLARADA DE UTILIDADE PÚBLICA.
CTN ART. 14. CONSTITUIÇÃO FEDERAL ART. 195, § 7º.
1. Sendo a Entidade Beneficente declarada de utilidade pública, não se
submete à obrigação de recolher quota patronal de contribuição social
ao INSS, em face da imunidade tributária que lhe é conferida pelo art.
195, § 7º, da Constituição Federal, em consonância com o art. 14 do
Código Tributário Nacional.
2. Na espécie, o Tribunal recorrido, mediante exame do substrato
probatório, verificou o suprimento, pela Instituição Beneficente, de todos os
requisitos legitimadores à concessão da imunidade tributária referenciada,
sendo certo que o reconhecimento de tal condição deve operar efeito "ex
tunc", uma vez que se limita a declarar situação anteriormente existente.
3. Recurso especial conhecido e desprovido
(STJ - T1 - PRIMEIRA TURMA - REsp 495975 RS 2002/0156711-0;
Relator Ministro JOSÉ DELGADO; julgado em 03/09/2003; publicado em
DJ 20.10.2003; pg. 00198
(negrito e grifo nosso)
(CARF)
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS
204-00646 Acórdão
Número do Processo: 10830.003364/2001-11
Data da Sessão: 20/10/2005
Órgão Julgador: Quarta Câmara/Segundo Conselho de Contribuintes
Contribuinte: ASSOC EDUC SAGRADO CORACAO DE JESUS
Relator(a): Jorge Freire
Ementa: COFINS. ENTIDADE EDUCACIONAL. IMUNIDADE.
CF/1988, ARTIGO 195, § 7°. A imunidade do parágrafo 7° do artigo
195 da Constituição Federal é norma de eficácia contida, só podendo a
lei complementar veicular suas restrições. Precedentes STF na ADIN
2028-5. Aplicação do Decreto nº 2.346/97 e do artigo 14 do CTN,
recepcionado como lei complementar. [...]
(negrito e grifo nosso)
Com base nas discordâncias observadas é claro que a questão continua sendo ainda
debatida em todas as esferas jurisdicionais do país, porque mesmo havendo, na prática, uma
obrigação imposta às entidades beneficentes de assistência social ao cumprimento de leis
ordinárias para o gozo da imunidade das contribuições sociais, permanece a cizânia de ideias
contrapostas na busca de uma resposta, coerente com a ciência do direito, sobre qual o
normativo apto a regular as regras da imunidade prevista na parte final do §7º do artigo 195
da Constituição: Se a legislação ordinária ou a legislação complementar?
25
Por esta razão, em busca de uma direção, para identificar qual é a legislação
condicionante capaz de regular os requisitos para o gozo da imunidade constitucional de
eficácia contida (art. 195, §7º da CF/88), se lei ordinária ou lei complementar, é admissível
buscar a resposta dentro da própria Constituição Federal, o que, data vênia, nos leva a
endossar a tese mais coerente com o desejo do constituinte e os princípios constitucionais do
Estado Democrático de Direito, a qual tem plana convicção de que a norma considerada apta
deve ser a legislação complementar, seguindo a fiel redação do artigo 146, II da CF/88, a qual
aponta um caminho lógico para a solução do conflito ao determinar que:
Art. 146. Cabe à lei complementar:
[...]
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
Assim sendo, por ser a norma do artigo 195, §7º da Constituição “imunidade”,
portanto, “limitação constitucional ao poder de tributar”, a lei condicionante a que se refere o
final do parágrafo não pode ser outra senão a lei complementar por força do que determina a
redação do artigo 146, II do mesmo diploma legislativo.
Nesta linha de raciocínio, a assertiva constitucional guarda pleno respaldo da melhor
doutrina, a exemplo da lição dos Ilustres Professores Ives Gandra Martins e Marilena Talarico
Martins Rodrigues28
:
Compreende-se a exigência da Lei complementar como veiculo legislativo
para disciplinar a matéria. É que se fosse deixar a critério do poder tributante
a fixação de requisitos necessários para o gozo da imunidade, à evidência,
poderia ele criar tal nível de obstáculos, que viria a frustrar a finalidade para
a qual a imunidade foi inserida na Lei Maior.
Aliomar Baleeiro29
também compartilha deste entendimento, deixando claro que lei
ordinária não possui aptidão de dispor sobre a imunidade, já que esta é por natureza uma
limitação constitucional ao poder de tributar:
Parece-nos que também o art. 195, §7º, da Constituição, como limitação do
poder de tributar, somente poderá ser regulado por meio de lei
28
MARTINS, Ives Gandra; RODRIGUES, Marilena Talarico Martins. A imunidade tributária das entidades de
educação e de assistência social sem fins lucrativos à luz da CF/88. In Aspectos Jurídicos do Terceiro Setor. 1.
ed. São Paulo: IOB Thomson, 2005, p.103 29
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI, Misabel Abreu
Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.517
26
complementar. A observância das “exigências de lei”, a que nos remete o
art. 195, §7º, restringe-se ao conceito e requisitos exigíveis na criação das
instituições beneficentes de assistência social, mas não pode lei ordinária
dispor sobre a imunidade, como limitação ao poder de tributar.
Apesar do silêncio da Corte Constitucional sobre a matéria, jamais se
conheceu um julgado em que lei ordinária fosse considerada apta a modificar
o teor do art. 14 do Código Tributário Nacional. Em resumo, para a
imunidade, relativa a impostos, do art. 150, VI, c, da Constituição, a Corte
Suprema somente reconhece validade ao art. 14 do CTN.
Noutro momento, a Suprema Corte, por ocasião do julgamento do Recurso Ordinário
em Mandado de Segurança – RMS 22.192-9/DF30
, publicado no DJ de 19/12/1996, também já
reconheceu que, presentes os requisitos da lei complementar, precisamente os do artigo 14 do
CTN, seria suficiente para legitimar o gozo da imunidade dos artigos 150, VI, c; e 195, §7º,
da CF/88.
Por corolário lógico, nesta esteira racional, é dedutivo que compete, portanto, ao
Código Tributário Nacional como lei complementar – devidamente recepcionado pela
Constituição Federal de 1988 – regular por meio de seus artigos 9º e 14, os requisitos ao gozo
da imunidade das contribuições sociais pelas entidades beneficentes de assistência social
previstas no artigo 195, §7º do Texto Constitucional Pátrio.
Para melhor reflexão, assim dispõem os artigos 9º, IV, c, e 14 da Lei n. 5.172/66 –
Código Tributário Nacional:
Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
IV - cobrar imposto sobre:
[...]
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas
fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de
educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os
requisitos fixados na Seção II deste Capítulo; (Redação dada pela Lei
Complementar nº 104, de 10.1.2001)
30
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário. RMS 22.192-9/DF. Relator: Ministro Celso de
Mello. Brasília, DF, DJ do dia 19/12/1996: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RMS%24%2ESCLA%2E+E+2219
2%2ENUME%2E%29+OU+%28RMS%2EACMS%2E+ADJ2+22192%2EACMS%2E%29&base=baseAcordao
>. Acesso em: 20 out.2012
27
Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à
observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a
qualquer título; (Redação dada pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos
seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos
de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo
9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são
exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais
das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou
atos constitutivos.
No entendimento de Hugo de Brito Machado31
, qualquer exigência que se faça para a
concessão da imunidade das contribuições sociais pelas entidades beneficentes por meio de lei
ordinária pode ser considerada inconstitucional, pois pelo fato de o artigo 195, §7º da CF/88
veicular uma típica hipótese de imunidade a referência legislativa nela expressa se reporta à
lei complementar.
Em face do Código Tributário Nacional, o tratamento das instituições de
assistência social e das instituições de educação, no que diz respeito à
imunidade tributária, deve ser rigorosamente o mesmo. E qualquer exigência
a mais, feita por lei ordinária às instituições de assistência social, com
suposto fundamento no art. 195, §7º, da Constituição Federal, pode ser
considerado inconstitucional, porque embora se refira a isenção esse
dispositivo na verdade institui uma limitação ao poder de tributar, devendo a
referência nele feita à lei ser entendida como relativa à lei complementar.
Embora, ainda não haja um consenso entre doutrinas e jurisprudências acerca do tema,
não há como negar a vigência e a eficácia do artigo 146, II da Constituição, que estabelece de
forma enfática caber à lei complementar a regulação das limitações constitucionais ao poder
de tributar, assim, por lógica consequência a lei ordinária não tem aptidão jurídica para
disciplinar sobre imunidade, pois a matéria está adstrita exclusivamente à competência de lei
complementar.
31
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional.. 2. ed. v. 1 São Paulo: Atlas, 2007,
p.203
28
Assim sendo, as entidades beneficentes de assistência social são imunes às
contribuições sociais outorgadas pelo legislador constituinte no §7º do artigo 195 da CF/88,
desde que atendam às exigências estabelecidas em lei, que neste caso não poderia ser outra a
não ser a “Lei Complementar” ou o Código Tributário Nacional como foi recepcionado pela
Constituição Federal de 1988.
4. CONCLUSÃO
Os princípios constitucionais alcatifam todos os atos normativos, pois como base
inicial para a elaboração de qualquer preceito jurídico sua inobservância dará ao contexto
legislativo uma significação diversa do que se espera, e isto pode fazer com que a norma
jurídica ao ingressar no ordenamento produza efeitos contrários ao esperado pelo legislador e
desfavoráveis à sociedade, bem como contribua para a concepção de vários conflitos e
dissidências jurídicas.
Por esta razão, este trabalho buscou em primeiro lugar, uma compreensão a respeito da
definição de imunidade tributária como sendo o instituto jurídico de limitação constitucional
ao poder de tributar, ou ainda, norma constitucional de vedação ao poder impositivo das
pessoas politicas da federação.
Na diagnose foram verificados alguns pontos comuns entre imunidade e isenção
como: (i) a circunstância de serem normas jurídicas válidas no sistema; (ii) integrarem a
classe das regras de estrutura; e (iii) tratarem de matéria tributária. Entretanto, em nada mais
se assemelham, restando como principais diferenças o fato de que a imunidade é norma
constitucional e a isenção norma infraconstitucional, bem como a primeira não permite sequer
o nascimento do tributo, enquanto esta última da ao ente tributante a faculdade de abrir mão
do recebimento de uma receita fiscal.
Ao examinar o instituto da imunidade das contribuições para a seguridade social
conferida às entidades beneficentes assistenciais pelo artigo 195, §7º da Constituição Federal
de 1988, nos deparamos com duas questões polêmicas uma já pacificada e outra ainda sem
definição pela complexidade dos entendimentos emanados entre doutrinas e jurisprudências.
29
Apenas para aclarar, a questão já pacificada refere-se à falha técnica empregada pelo
legislador constitucional ao grafar a palavra “isentas” no §7º do art. 195 da Lei Maior, que
segundo Aliomar Beleeiro trata-se de erro técnico do enunciado linguístico do dispositivo,
que consagra uma imunidade e verdadeira limitação ao poder de tributar, ou seja, por ser
veiculada pela própria Constituição Federal a norma mencionada não é de isenção, mas de
típica imunidade tributária, mas isto já está pacificado na doutrina e jurisprudência.
Na outra ponta, a questão ainda resistida entre parte da doutrina e jurisprudência se
digladia no campo da legislação condicionante, entre qual deve ser a norma apta a regular a
imunidade do artigo 195, §7º da Constituição Federal, se a legislação ordinária ou a legislação
complementar.
Esta demanda, todavia não foi definida, embora haja na atual realidade prática uma
obrigação de obediência à legislação ordinária imposta às entidades beneficentes para que
gozem da imunidade das contribuições sociais, a tese doutrinária que tem ganhado
entendimento de alguns julgadores, espelhada nos escritos constitucionais do artigo 146, II, e
que é perfeitamente sustentável considerando os cabeçalhos jurídicos da ciência do direito,
defende que a norma condicionante à que se refere a parte final do §7º, do art. 195 da CF/88 é
a lei complementar, por ser característica norma de imunidade e, portanto, verdadeira
limitação constitucional ao poder de tributar, não se subordina em nenhuma hipótese à
legislação ordinária, antes está designada à regulação exclusiva de lei complementar, que no
caso nos remete ao Código Tributário Nacional, em especial seus artigos 9º e 14.
Como visto, as entidades beneficentes de assistência social são imunes às
contribuições para a seguridade social (art. 195, §7º da CF/88) desde que atendam às
exigências estabelecidas em lei, que não poderia ser outra a não ser o Código Tributário
Nacional recepcionado como Lei Complementar pela Constituição de 1988, pois uma
interpretação contrária se desvia do principio da razoabilidade jurídica, distorce o verdadeiro
sentido atribuído pelo constituinte ao artigo 146, II da Constituição e põe em risco a
segurança jurídica e o principio da legalidade que são colunas de sustentação do sistema
jurídico tributário e, sobretudo do Estado Democrático de Direito.
30
REFERÊNCIAS:
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva: De acordo
com o novo Código Civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atual. DERZI,
Misabel Abreu Machado. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010
BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2007. 2º tiragem, p.217
BRASIL. Brasília. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Processo
n.10830.003364/2001-11. Relator: Jorge Freire. Brasília, DF, Sessão do dia 20/10/2005:
Disponível em:
<http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudeci
aCarf.jsf>. Acesso em: 21 out.2012
_______. _______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponìvel
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso
em: 13.03.2012, 09h30
_______. _______. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema
Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e
Municípios. DOU de 31.10.1966. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm> Acesso em 13.03.2012, 10h31
_______. _______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. REsp 495975 / RS
(2002/0156711-0) T1. Relator: Ministro José Delgado. Brasília, DF, DJ do dia 20/10/2003:
Disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/pagina_lista.asp>. Acesso em
20 out 2012
_______. _______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI
2028 Tribunal Pleno. Relatora: Ministro Moreira Alves. Brasília, DF, DJ do dia 16/06/2000:
Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESC
LA%2E+E+2028%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+2028%2EAC
MS%2E%29&base=baseAcordaos>. Acesso em: 20 out.2012
_______. _______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário. RE 428815 / AM.
Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Brasília, DF, DJ do dia 14/09/2004: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCL
A%2E+E+428815%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas>. Acesso em: 20 out.2012
31
_______. _______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário. RMS 22.192-9/DF.
Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília, DF, DJ do dia 19/12/1996: Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RMS%24%2ES
CLA%2E+E+22192%2ENUME%2E%29+OU+%28RMS%2EACMS%2E+ADJ2+22192%2
EACMS%2E%29&base=baseAcordao>. Acesso em: 20 out.2012
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva,
2010
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional.. 2. ed. v. 1 São
Paulo: Atlas, 2007
MAIA, Luiz Fernando. Compêndio de Direito Tributário: Doutrina, legislação e prática
processual no âmbito administrativo, fiscal e judicial. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2009
MARTINS, Ives Gandra; RODRIGUES, Marilena Talarico Martins. A imunidade tributária
das entidades de educação e de assistência social sem fins lucrativos à luz da CF/88. In
Aspectos Jurídicos do Terceiro Setor. 1. ed. São Paulo: IOB Thomson, 2005
Top Related