Maria da Penha Brandim de Lima
O TEXTO NO CONTEXTO ESCOLAR: Limites e Possibilidades para a Produção de Texto no Ensino Médio
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Língua Portuguesa, sob a orientação da Profª. Drª. Sueli Cristina Marquesi.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 2007
BANCA EXAMINADORA
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(Assinatura)
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(Assinatura)
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(Assinatura)
Dedico este trabalho à minha família. Para meus pais, Inês (in memorian) e José, que, conscientes do sentido da humanidade, ensinara-me o valor do conhecimento. Aos meus irmãos, George, Gerson, José (in memorian) e Guilherme, por atuarem, carinhosamente, como meus primeiros alfabetizadores.
_____________________________________________________________AGRADECIMENTOS
À Secretaria de Estado da Educação, pela concessão da Bolsa Mestrado.
À Diretoria de Ensino da Região de Jundiaí, pela colaboração e pelo apoio à pesquisa
realizada.
Às Escolas Estaduais da Região de Jundiaí que, gentilmente, abriram suas portas e
contribuíram, sem receios, para a realização da pesquisa.
À Profª Drª Sueli Cristina Marquesi, pelas orientações precisas e valiosas no decorrer do
processo de elaboração do trabalho.
Aos Profs. Drs.João Hilton Siqueira Sayeg e Amélia Maria Jarmendia, pelas valiosas
contribuições realizadas na elaboração desta dissertação.
À Profª Karlene Campos, pela colaboração na revisão do trabalho.
À toda equipe da EE Odilon Leite Ferraz pela compreensão e apoio durante o processo de
elaboração desse trabalho.
Aos amigos Roseli Naressi, pelo apoio e respaldo profissional em meus momentos de ausência,
Maria do Carmo Delalana e Márcio Rogério Cano, pelo carinho e pela interlocução no processo
de escrita deste texto e Marlete Paranhos, pela atenção e colaboração prestadas.
À Celina e Eurides, minhas professoras de primeira série, representando os demais professores
da Rede Pública Estadual de Ensino, que, em sua simplicidade, dedicam-se com carinho,
atenção, respeito e compromisso aos estudantes do Estado de São Paulo, promovendo o amor
ao conhecimento e a inserção no mundo da escrita.
À Maria Cecília Freire, pelo carinho e pela amizade incondicional.
Ao Jesse Felipe, incentivador, amigo e companheiro, sempre.
RESUMO
Este trabalho insere-se na linha de pesquisa Leitura, Escrita e Ensino de Língua
Portuguesa e consiste no estudo dos limites da produção textual escrita no contexto
escolar, no intuito de sugerir alguns procedimentos didáticos para o tratamento da
produção de textos dissertativos, os quais podem auxiliar o professor a aprimorar sua
prática pedagógica.
Para tanto, realizamos uma pesquisa-piloto com seis professores e sessenta
alunos, em seis escolas de ensino médio da rede pública estadual, situadas na região
de Jundiaí, São Paulo, considerando os resultados obtidos na avaliação SARESP,
edição 2004, com o objetivo de retratar o quadro atual das aulas de produção de texto.
A dissertação fundamenta-se em aportes teóricos da Lingüística Textual,
especificamente nos princípios de textualidade propostos por Beaugrande e Dressler
(1994) e Beaugrande (1997), bem como nas orientações dos Parâmetros Curriculares
Nacionais, dada nossa preocupação com uma prática de produção textual orientada
pela concepção sociointeracional de texto.
Os resultados obtidos na pesquisa-piloto apontam para a necessidade de se
considerar procedimentos que propiciem a produção de textos em situações efetivas de
comunicação, observando-se, entre outros fatores, os objetivos da produção e os
interlocutores possíveis, bem como os aspectos de organização textual. Diante de tais
resultados, apresentamos, no final do trabalho, alguns procedimentos de produção de
texto dissertativo, que podem ser utilizados por professores em salas de aula de língua
portuguesa.
ABTRACT
The present work is related to the field research of the reading, writing and
teaching Portuguese language and has as objective to study the limits of the writing
textual producing in the school context. It intends to suggest some didactic procedures
related to producing dissertative texts, which could help teachers to improve their
pedagogical practice.
For in such a way, we carry through a research-pilot with six teachers and sixty
pupils, in six secondary grade schools of the state public net, situated in the region of
Jundiaí, São Paulo. These schools were chosen due their results of the SARESP, 2004
edition and we had as a objective to draw a now existing picture of the producing text
classes.
The dissertation is based upon of the Textual Linguistic Theory, specifically in the
principles of textuality considered by Beaugrande and Dressler (1994) and Beaugrande
(1997), as well as in the guidance of the National Curriculum Parameters, given our
concern with a textual production guided by the sociointeracional conception of text.
The results gotten in the research-pilot point out to the necessity of considering
procedures that propitiate the production of texts in effective communication situations,
taking in to sideration, among others factors, the objectives of the production and
interlocutors, as well as the aspects of textual organization. Bearing in mind such
results, we present, in the end of the work, some procedures of dissertative text
production, that could be used by the teachers in classrooms of Portuguese language.
SUMÁRIO
Introdução 01
Capítulo I Limites da escola no ensino da produção textual 07
1.1 Produção textual em contexto escolar: resultados de uma observação 08 1.2 Universo da pesquisa e coleta de dados 09 1.3 Apresentação do corpus 11
1.3.1 Pesquisa com professores 11 1.3.2 Pesquisa com alunos 20
1.4 Observações sobre os dados obtidos 25
Capítulo II Texto e construção da textualidade 27
2.1 Texto, textualidade e textualização 29 2.2. Princípios de textualidade 34
2.2.1 Coesão textual 36 2.2.2 Coerência textual 38 2.2.3 Intencionalidade 40 2.2.4 Aceitabilidade 41 2.2.5 Situacionalidade 42 2.2.6 Intertextualidade 43 2.2.7 Informatividade 44
2.3 Texto como evento comunicativo 46 2.4 Produção textual - as orientações da Lingüística Textual e os PCN 48
2.4.1 Conceito de texto 53 2.4.2 Implicações do contexto e princípios de textualidade 55 2.4.3 Visão pragmática em relação aos recursos lingüísticos 56
Capítulo III Limites e possibilidades para o tratamento da produção textual no contexto escolar
58
3.1 Análise dos dados obtidos 59 3.1.1 Características da produção de texto em sala de aula 62
Preparação para a escrita 62 Orientações no momento da produção textual 64 Intervenções no momento da escrita 66 Periodicidade para a produção textual 69
3.1.2 Concepções teóricas dos professores 72
Conceito de texto para os professores 72 Principais dificuldades dos alunos na produção de textos 73 Perfil dos profissionais e fundamentação teórica dos professores 74 Atividades com resultados positivos 75
3.2 Possibilidades para a produção textual no ensino médio- alguns procedimentos
77
3.2.1 Organização dos procedimentos 78 Procedimentos relativos à definição da situação comunicativa 78 Procedimentos relativos ao estudo do tema 81 Procedimentos para a produção do texto coletivo 84 Procedimentos para a organização e realização do debate 87 Procedimentos para a produção do texto individual 90 Divulgação dos textos produzidos 92 Cronograma de atividades 93
Considerações Finais 99
Referências Bibliográficas 103
Anexos 106
Anexo I Questões para professores 107
Anexo II Questões para alunos 111
Anexo III Quadro de competências e habilidades PCN 113
Anexo IV Quadro de competências e habilidades PCN+ 114
Anexo V Critérios para correção das redações Manual SARESP 117
INTRODUÇÃO
Indiscutivelmente, escrever constitui, ainda, uma tarefa difícil para boa parcela de
estudantes brasileiros. A redação de um simples bilhete, o preenchimento de um
formulário, a elaboração de um texto dissertativo na sala de aula tornam-se, para eles,
um momento de angústia. As dificuldades variam: alguns não utilizam adequadamente
os recursos lingüísticos, outros não levam em conta a estrutura textual solicitada, ou
não encadeiam corretamente as seqüências textuais, entre outros aspectos.
Nesse contexto, temos de reconhecer que o ensino de Língua Portuguesa na
Educação Básica, em que pesem as diversas mudanças pelas quais foi submetido ao
longo da história, não tem conseguido desenvolver uma competência escritora1, uma
vez que os alunos, de modo geral, nem sempre são capazes de se expressar
adequadamente diante de situações sociais diversas.
No Estado de São Paulo, o Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do
Estado - SARESP2, edição 2004, que avalia as escolas públicas da rede estadual,
apresentou resultados gerais, considerados, paradoxalmente, satisfatórios na prova de
escrita para as terceiras séries do Ensino Médio, em torno de 20,9 a 35,7%. Nossa
experiência com o Ensino Médio, entretanto, demonstra que a escola não tem
desenvolvido, eficientemente, um trabalho voltado para o desenvolvimento da
competência escritora, tendo em vista sua função social.
Nesse sentido, afirma Pécora (1988):
De modo geral, o que o conjunto dos problemas mais freqüentes de argumentação deixa entrever é o fato de que o processo escolar tende fortemente a uma falsificação das condições de aprendizado da escrita, desvinculando-a de todo empenho pessoal de atuação sobre diferentes
1 Por competência, compreendemos como Perrenoud (1999), a capacidade de mobilizar um conjunto de saberes para solucionar, com eficácia, uma série de situações. O autor diferencia competências de habilidades; as habilidades são ações que fazem parte do saber-fazer de nosso dia-a-dia, fazem parte das competências e são esquemas de certo modo complexos que foram adquiridos, a partir de um treinamento intensivo, cujos gestos se transformaram em hábitos rotinizados. 2 O SARESP foi instituído no Estado de São Paulo a partir de 1996; seu objetivo é obter indicadores educacionais que possam subsidiar a elaboração de propostas de intervenção técnico-pedagógica no sistema de ensino, visando a melhorar a sua qualidade e a corrigir eventuais distorções detectadas. Cabe ao SARESP monitorar a qualidade do sistema de ensino e subsidiar a tomada de decisão nos vários níveis do sistema de ensino (SÃO PAULO, 2003).
interlocutores. Há aí uma espécie de esvaziamento do sentido da prática da escrita, que ao mesmo tempo, é supostamente preenchido por determinados modelos e estereótipos do mundo admitido pela instituição.
Assim, além das dificuldades referentes à estrutura física e material das escolas,
os professores, de modo geral, enfrentam dificuldades de ordem didática, já que não
conseguem desenvolver em seus alunos as habilidades necessárias para uma
adequada produção de texto.
Considerando nossa atuação como professora do 3º ano do Ensino Médio,
compreendemos que o desenvolvimento de estudos que levem ao desvelamento das
dificuldades enfrentadas pelos professores no ensino da produção textual é
fundamental para a organização de procedimentos didáticos, que concorram para o
desenvolvimento da competência escritora dos alunos.
Em nossa experiência profissional, percebemos que a produção em sala de aula
assume, muitas vezes, um caráter avaliativo de aspectos gramaticais, enquanto os
alunos apresentam dificuldades mais complexas, como, por exemplo, inabilidade para
articular idéias de modo coeso e coerente.
Preocupados com essa situação, consideramos que o tratamento do texto com
base nos princípios de textualidade pode auxiliar o professor em atividades de
produção textual em sala de aula, uma vez que ele pode se valer de tais princípios para
aperfeiçoar procedimentos metodológicos que auxiliem o aluno a desenvolver sua
competência escritora.
Sabemos, contudo, que muitos professores nem sempre dominam as teorias
necessárias para proporem procedimentos metodológicos dessa natureza. Desse
modo, na elaboração deste trabalho, partimos de uma pesquisa-piloto, realizada com
seis escolas públicas, estaduais, da Diretoria de Ensino da Região de Jundiaí, para
verificar o desenvolvimento metodológico da aula de produção textual, observando,
inclusive, as teorias de texto que a sustentam.
Os resultados decorrentes da pesquisa-piloto, sustentados pelo estudo dos
princípios teóricos da Lingüística Textual que tratam, especificamente, dos princípios de
textualidade, servirão de base para, no final da dissertação, apresentarmos a
organização de procedimentos didáticos para melhorar o desempenho de professores e
alunos no tratamento da produção textual. Para tanto, norteamo-nos pelas seguintes
perguntas de pesquisa:
1. Como os professores trabalham a produção de texto em sala de aula?
2. Os professores da rede pública estadual embasam suas aulas de
produção de texto em teorias atuais como a Lingüística Textual?
3. Que procedimentos didáticos, voltados para a produção textual, podem
ser desenvolvidos no ensino médio, com base em concepções da
Lingüística Textual, especificamente nos princípios de textualidade?
O objetivo principal desta dissertação é refletir sobre os limites da produção
textual em sala de aula e associá-los a conceitos da Lingüística Textual, a fim de
vislumbrarmos procedimentos didáticos possíveis para a produção de textos
dissertativos, fundamentados teoricamente nos princípios de textualidade e nas
orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN3.
No trabalho, buscamos, primeiramente, desvelar as práticas docentes exercidas
em sala de aula, relacionando-as aos referenciais teóricos de professores de terceiras
séries do ensino médio para, em seguida, organizar procedimentos de ensino a serem
3 Documento institucional, elaborado pelo MEC
Ministério da Educação e Cultura - cujas bases legais se encontram na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira
Lei Federal 9394/96, no Parecer nº 15/98 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e na Resolução nº 03/98 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Os PCN têm como metas difundir os princípios da reforma curricular e orientar os professores na busca de novas abordagens e metodologias e pretendem readequar o currículo, num redirecionamento para um ensino voltado para o jovem. São suas diretrizes o trabalho interdisciplinar e contextualizado e o desenvolvimento da capacidade de aprender a aprender. Seu objetivo principal é sistematizar discussões, reflexões e práticas de educadores de diferentes regiões do país. Os PCN devem orientar a seleção e organização de conteúdos, as práticas didáticas e o significado da avaliação, constituindo-se em referências para que estados, municípios e escolas elaborem seus currículos.
desenvolvidos em sala de aula para o tratamento da produção textual e que,
oportunamente, serão aplicados em nossa unidade escolar com alunos das terceiras
séries do ensino médio.
Para a realização do trabalho, empreendemos os seguintes procedimentos
metodológicos:
a) Realização de pesquisa-piloto, considerando as seguintes etapas:
seleção de seis escolas com base nos resultados obtidos na avaliação de
escrita do SARESP: duas escolas com resultados acima da média do
Estado, duas com resultados na mesma média do Estado e duas com
resultados abaixo da média do Estado;
coleta de dados que demonstrem como ocorrem atividades de produção
textual em salas de aula do terceiro ano do ensino médio. A coleta realiza-
se por meio de aplicação de questionário a seis professores, um de cada
escola escolhida, e a sessenta alunos, dez de cada professor;
análise de dados, com a qual procuramos verificar como são elaboradas
as atividades de produção textual em salas de aula do terceiro ano do
ensino médio, observando, inclusive, se conceitos teóricos da Lingüística
Textual servem de fundamento para os procedimentos metodológicos
adotados pelo professor.
b) Revisão de literatura acerca dos conceitos de texto e dos princípios
constitutivos da textualidade.
c) Elaboração da organização de procedimentos para a produção de texto em
sala de aula, fundamentada nos conceitos da Lingüística Textual e nos PCN.
Quanto à organização estrutural, esta dissertação apresenta, além da introdução
e das considerações finais, três capítulos.
No primeiro capítulo, apresentamos a pesquisa-piloto realizada com professores
e alunos do terceiro ano do ensino médio, a fim de delimitar os limites da escola no que
se refere às atividades de produção textual, caracterizando algumas das condições
atuais do ensino de redação.
No segundo capítulo, apresentamos as contribuições de Beaugrande e Dressler
(1994) e de Beaugrande (1997), em relação aos princípios constitutivos da textualidade,
aos processos de textualização e à natureza comunicativa do texto; as contribuições de
Fávero (2004), Koch (1990), Fávero e Koch (2005) e Koch e Travaglia (2005), acerca
da coesão e coerência textual e as contribuições de Maingueneau (2004) em relação
aos aspectos relativos ao contexto de produção textual. Ainda neste capítulo,
realizamos a releitura dos PCN, a fim de indicarmos os pontos de convergência entre
suas diretrizes e seus objetivos com os conceitos preconizados pela Lingüística Textual.
No terceiro capítulo, discutimos os resultados obtidos na pesquisa-piloto e
apresentamos a organização de alguns procedimentos de ensino, teoricamente
orientados pela Lingüística Textual e pelos PCN, a fim de oferecer subsídios didáticos
aos professores para as aulas de produção textual.
CAPÍTULO I - Limites da escola no ensino da produção textual
1.1 Produção textual em contexto escolar: resultados de uma observação.
O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) 4, realizado em 2003,
indica que o desempenho dos estudantes brasileiros de ensino fundamental e médio
encontra
se entre os dezenove países com desempenho abaixo da média da
avaliação proposta pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). Por sua vez, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 5 de
2004, em sua sétima edição, demonstra que a média da avaliação da redação obtida
pelos alunos ficou em torno de 48,95, numa escala de 0 a 100 pontos. Já o Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP), edição 2004,
apresenta índices gerais de 20,9 a 35,7% de resultados considerados satisfatórios na
prova de escrita para as terceiras séries do ensino médio.
Todos esses resultados apontam para o fato de que é necessário rever algumas
práticas pedagógicas, para que se possa compreender melhor os problemas e os
desafios que permeiam o contexto escolar. Assim, neste capítulo, pretendemos
apresentar os resultados da pesquisa realizada no ano de 2005, com professores do 3º
ano do ensino médio de escolas públicas estaduais, no intuito de estabelecer as
limitações vivenciadas no ensino de produção textual.
Trata-se de uma pesquisa empírica, embasada nas experiências que temos no
cotidiano escolar, de natureza interpretativa, pois visa a compreender alguns
procedimentos docentes, e que apresenta apenas um dos múltiplos pontos de vista. Na
seqüência, apresentamos o universo da pesquisa, a coleta de dados e os resultados
obtidos.
4 O PISA envolve 41 países e visa a verificar o desempenho de estudantes de 15 anos de idade de escolas públicas e privadas. A finalidade desse programa é detectar os conhecimentos adquiridos pelos jovens e a sua capacidade de analisar, raciocinar e comunicar idéias. A avaliação, que é realizada a cada três anos, é uma iniciativa da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e no Brasil tem como responsável o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC). 5 O Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM - foi implantado em 1998 e destina-se aos alunos que estão concluindo ou que já terminaram o ensino médio. O exame avalia as competências desenvolvidas no decorrer da educação básica.
1. 2 Universo da pesquisa e coleta de dados
Empreendemos nossa pesquisa motivados por nossa experiência como
educadora de Educação Básica diante da observação das dificuldades relativas ao
ensino da produção textual na sala de aula. Nesse sentido, iniciamos a pesquisa de
campo, que visa a compreender algumas das práticas pedagógicas realizadas no
ensino da produção textual, especificamente, para alunos das terceiras séries do ensino
médio, etapa final da Educação Básica.
Na investigação, partimos dos resultados da prova de redação do Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo, edição 2004, que permitiu o
levantamento de seis escolas estaduais de ensino médio, com realidade
socioeconômica e cultural semelhantes e cujos resultados na avaliação se
enquadravam nas seguintes classificações adotadas: duas escolas com resultados
acima da média do Estado, duas escolas com resultados na mesma média do Estado e
duas escolas com resultados abaixo da média do Estado.
As seis escolas selecionadas pertencem ao município de Jundiaí, interior do
Estado de São Paulo, e estão localizadas em zonas urbanas, próximas ao centro da
cidade. De modo geral, todas possuem boa infra-estrutura física e material, contando
com bibliotecas, salas de recursos audiovisuais, boas condições de limpeza e
conservação do prédio escolar, além de acesso à informática.
Para a escolha das escolas, recorremos à Diretoria de Ensino
Região de
Jundiaí e, junto à supervisão de ensino e à Dirigente Regional de Ensino, pudemos
localizar os índices globais obtidos pelas escolas de ensino médio na prova de Escrita.
Selecionadas as escolas, todas com classes de 3ª série do Ensino Médio no
período da manhã e da noite, contatamos os Diretores das Escolas para que
autorizassem a realização de nossa pesquisa em suas unidades escolares, indicando-
nos os professores de 3ª série do ensino médio.
Nosso primeiro passo foi identificar o grupo de professores indicados e verificar
os dados que se referiam à sua experiência profissional. Assim, no que se refere ao
tempo de magistério, ao período em que lecionam e à classificação da escola onde
trabalham, obtivemos as seguintes informações:
Professor Tempo de atuação no magistério
Período em que leciona
Classificação da Escola na avaliação SARESP 2004
Prof.1 13 anos Diurno Noturno
Acima da média do Estado
Prof.2 13 anos Diurno Noturno
Acima da média do Estado
Prof.3 08 anos Diurno Noturno
Média do Estado
Prof.4 13 anos Diurno Noturno
Média do Estado
Prof.5 20 anos Diurno Noturno
Abaixo da média do Estado
Prof.6 26 anos Diurno Noturno
Abaixo da média do Estado
Em um segundo momento, aplicamos, para os seis professores, um questionário
anexo I
composto de nove questões, sendo quatro de múltiplas alternativas e cinco
dissertativas, todas relativas à prática docente e à rotina de sala de aula.
Tendo em vista que os indivíduos, naturalmente, têm uma leitura própria do
mundo que os cerca, aplicamos também um questionário para sessenta alunos, dez
alunos de cada professor, com quatro questões de múltipla escolha
anexo II. Esse
procedimento teve como objetivo confrontar as respostas de docentes e discentes no
que se refere às aulas de produção textual e, desse modo, retratar um quadro mais
próximo do real. Em outras palavras, os questionários tinham o intuito de identificar e
relacionar o tratamento metodológico utilizado pelos educadores, suas estratégias de
ensino e as concepções teóricas que consubstanciariam o trabalho de produção de
textos dos estudantes.
Assumimos uma postura interpretativa acerca dos pólos de convergência e
divergência caracterizados pelas respostas obtidas entre professores e alunos e
retratamos a rotina de sala de aula em relação às atividades de preparação e produção
de texto escrito, tendo em vista:
o conceito de texto;
as bases teóricas subjacentes à prática docente;
os elementos importantes para a preparação da produção de texto do
aluno: atividades, condições de realização e tempo a ela destinados;
as situações do momento da proposta de atividade de produção de texto;
as intervenções realizadas no processo de produção textual do aluno pelo
professor;
a periodicidade na realização de produções textuais em sala de aula;
as razões que dificultam a produção de texto em sala de aula.
Para a aplicação dos questionários, estivemos presentes nas escolas, no horário
das aulas de Língua Portuguesa, por acreditarmos na importância da interação entre
pesquisador e pesquisados na perspectiva de uma apuração mais clara das respostas
obtidas.
Dessa maneira, os participantes da pesquisa puderam nos interpelar e
manifestar impressões ou dúvidas sobre o questionário recebido. Os professores e os
alunos participantes responderam seus questionários ao mesmo tempo, porém
individualmente, sem trocas de impressões entre os grupos. Suas considerações foram
registradas e posteriormente transcritas, compondo conjuntamente nosso corpus de
análise.
1.3 Apresentação do corpus
1.3.1 Pesquisa com professores
O primeiro bloco de questões consistia em questões de múltiplas alternativas e
buscou respostas para as seguintes perguntas de pesquisa:
1. Como os professores trabalham a produção de texto em sala de aula?
2. Os professores da rede pública estadual embasam suas aulas de
produção de texto em teorias atuais como a Lingüística Textual?
Solicitamos aos professores que relacionassem, em ordem de prioridades, as
atividades realizadas em sala de aula para preparar seus alunos para o
desenvolvimento de um texto. Os professores deveriam numerar, de um a cinco, as
opções de atividades por nós apresentadas, considerando um, o menor grau de
realização e cinco, o maior grau de realização.
Na aplicação da pesquisa com o grupo de professores, no intuito de analisar as
estratégias de contextualização dos temas a serem trabalhados para a produção de
texto do aluno, propusemos a seguinte questão:
1- Em sua atuação como professor (a) de Língua Portuguesa, considere as indicações
abaixo para caracterizar os aspectos mais importantes para a preparação das aulas de
produção de texto. Para as questões a seguir, utilize a escala de 1 a 5 pontos, sendo 1
o grau mais alto e 5, o grau mais baixo:
possibilitar aos alunos momentos de discussão a partir da realização de
debates, trocas de informações/ experiências;
possibilitar momentos de leitura individual por meio de atividades de
leitura com questões para interpretação de texto a serem respondidas de
forma escrita;
propor temas para reflexão por meio de vídeos, leituras de jornais, revistas
e outros;
estabelecer um vínculo interdisciplinar a partir do conteúdo programático
das diversas áreas do conhecimento ou de projetos da escola;
relacionar o conteúdo trabalhado a outras leituras a fim de trabalhar o
programa da disciplina de forma contextualizada.
Diante dessa questão, obtivemos as seguintes respostas:
Ordem de Prioridades
Professores
1º lugar Relacionar conteúdo trabalhado a outras leituras
2º lugar Estabelecer um vínculo interdisciplinar
3º lugar Possibilitar leituras individuais
4º lugar Propor temas para reflexão
5º lugar Possibilitar momentos de discussões
A segunda questão foi realizada com o objetivo de compreender como os
professores acreditam proporcionar condições para a produção de texto de seus
alunos:
2 - Ao propor uma atividade de produção de texto, você:
procura relacionar o tema ao cotidiano do aluno, a partir das questões
locais;
segue as orientações de livros didáticos para uma seqüência adequada
dos conteúdos;
segue as orientações de livros didáticos por se tratar de um recurso
disponível para os alunos;
procura abordar temas políticos, econômicos e sociais, por exemplo,
relacionados ao meio ambiente, às questões políticas, à pena de morte
etc., relacionando-os a leituras propostas e debates;
apresenta o tema, expõe os critérios de realização e solicita que a
atividade seja realizada em casa.
As respostas dos professores foram:
Ordem de
Prioridades
Professores
1º lugar Segue orientações do Livro Didático como recurso do aluno.
2º lugar Segue orientações do Livro Didático como seqüência de conteúdos.
3º lugar Apresenta tema, expõe critérios de realização e solicita a atividade de
produção para ser realizada em casa.
4º lugar Procura abordar temas políticos, econômicos e sociais, relacionando-os
a leituras e debates.
5º lugar Procura relacionar o tema ao cotidiano do aluno.
A terceira questão procurou identificar duas situações, sendo a primeira
relativa à existência de intervenções (correções, apontamentos, sugestões etc.) por
parte do professor nos textos dos alunos durante o processo de produção escrita, e a
segunda relativa à modalidade de intervenção realizada. Tal questão se subdividiu em
duas (3a e 3b), explicitadas a seguir:
3.a -Durante o processo de produção textual de seus alunos, você:
costuma intervir na produção, no momento da escrita do aluno;
não costuma intervir na produção, no momento da escrita do aluno;
As respostas obtidas foram:
Interferem Não interferem
Professores 02 04
3.b - Ao propor intervenções nas produções de texto em sala de aula, você:
sugere modificações no texto no que se refere à adequação ao tema;
sugere modificações no texto no que se refere à adequação ortográfica, à
pontuação, à paragrafação e a outros aspectos gramaticais;
indica as modificações necessárias no que se refere à tipologia textual.
Como respostas, obtivemos:
Nossa última questão fechada dividiu-se em duas etapas (4a e 4b): a primeira
remetia à freqüência de realização de atividades de produção de texto e a segunda
visava a verificar os motivos da periodicidade apontada:
4.a- Você costuma solicitar que seus alunos realizem produções textuais
periodicamente?
sim, diariamente;
sim, semanalmente;
sim, quinzenalmente;
sim, mensalmente;
sim, bimestralmente;
não costuma solicitar redações em sala de aula.
Em ordem hierárquica, obtivemos as seguintes respostas:
Ordem de prioridades Professores
1º lugar Quinzenalmente
2º lugar Mensalmente
3º lugar Semanalmente
Nenhuma resposta Diariamente
Nenhuma resposta Bimestralmente
Nenhuma resposta Não costuma solicitar redações
Ordem de
prioridade
Professores
1º lugar Sugere adequação gramatical
2º lugar Sugere adequação ao tema
3º lugar Indica modificações no que se refere à tipologia
4.b Você não solicita produções de texto periodicamente porque6:
existe a disciplina de Técnica de Redação, específica para esse trabalho;
a classe é numerosa e essa atividade fica difícil para o momento da
avaliação;
os alunos têm muitas dificuldades gramaticais e o trabalho toma muito
tempo;
você é professor substituto;
você trabalha em muitas escolas e a atividade de correção torna-se difícil
devido à sobrecarga de trabalho;
outros motivos/ especificar.
As respostas obtidas foram:
Ordem
de prioridades
Professores Periodicidade
apontada
1º lugar Sem respostas
utilização, pelo professor, de sistema de correção
mais detalhado, como os critérios estabelecidos na
avaliação SARESP e de alguns vestibulares;
Mensal
2º lugar
Outros
motivos maior importância dada à preparação do aluno
para produzir, motivando, proporcionando debates
e discussões;
Mensal
3º lugar classes numerosas. Quinzenal
O segundo bloco de questões agrupava questões abertas, que procuravam
averiguar as concepções teóricas dos professores. A primeira das questões abertas
pretendia verificar suas concepções de texto:
5- Em sua concepção, o que é um texto?
6 Essa questão tinha caráter facultativo, três professores responderam a pergunta.
Obtivemos as seguintes respostas:
Professor Definição de texto
Prof. 1 Um texto tem que ser coerente, coeso, ter uma estética favorável.
Prof. 2 Texto é a sua idéia. É comunicação, é a linguagem, seja ela verbal ou
não - verbal. Num texto dissertativo, temos que colocar a opinião, mas
antes a estrutura do texto dissertativo, que é um texto de opinião, mas
que não tem que deixar isso tão claro dentro do texto, não tem que dizer
eu acho ou eu penso , a minha opinião .
Prof. 3 Não respondeu.
Prof. 4 Um bom texto é aquele que atende exatamente àquilo que foi proposto
a ele.
Prof. 5 Um texto tem que atender a uma determinada estrutura, à proposta do
tema, ser coerente e ter uma boa adequação em relação à
morfossintaxe.
Prof. 6 Um texto deve ser coeso e coerente e demonstrar, com clareza, seus
conhecimentos e ponto de vista. No caso de dissertação, que apresente
argumentação capaz de sustentar a tese.
Na seqüência, solicitamos que os professores indicassem as principais
dificuldades encontradas na elaboração de textos pelos alunos, por meio da seguinte
pergunta:
6- Quais são as principais dificuldades que seus alunos apresentam na produção
de texto?
As respostas obtidas foram:
Professor Dificuldades dos alunos
Prof.1 A organização das idéias.
Prof.2 A argumentação.
Prof.3 Os alunos acham que a redação não tem um fim para o professor,
que ela é apenas mais uma atividade que o professor dá quando não
tem o que fazer, e muitos não dão nota.
Prof. 4 Excluindo a estruturação do texto dissertativo, é o fato de o aluno
não conseguir passar para o papel aquilo que está pensando. Lendo
as redações, você percebe que não há um segmento de idéias, eles
cortam uma idéia no meio ou aquilo se estende muito além do que se
espera. Além dos erros de ortografia e concordância, bastante
cometidos porque eles se estendem muito no período e começam a
perder um pouquinho a noção do sujeito da frase, então não
conseguem fazer concordância.
Prof. 5 O pior é a organização, as idéias acabam se tornando colchas de
retalhos.
Prof. 6 Coesão, coerência, pontuação e ortografia.
A seguir, perguntamos aos professores participantes quais foram os
últimos cursos ou orientações que freqüentaram com o objetivo de atualização
profissional:
7 Você tem realizado cursos de atualização em sua área de atuação?
Sim/ Não. Quais?
As respostas obtidas foram:
Professor Cursos de atualização
Prof. 1 Ultimamente tenho feito apenas o Tecendo Leituras7 porque tenho dois
filhos pequenos, mas pretendo fazer outros cursos.
Prof. 2 Faço Teia do Saber8 e Letra e Vida9.
7 Tecendo Leituras
Programa da SEE/SP para o Ensino Fundamental que tem como proposta de trabalho enfatizar a leitura e suas práticas cotidianas, formando alunos e professores leitores dentro e fora das salas de aula. 8 Teia do Saber _ Consiste na contratação de Instituições de Ensino Superior, Públicas ou Privadas, pelas próprias Diretorias de Ensino para ministrarem cursos destinados a professores das escolas estaduais de Ensino Fundamental e Médio. Suas finalidades são: aliar o trabalho de fundamentação teórica com as vivências efetivas dos educadores que atuam nas escolas públicas estaduais; manter os professores atualizados sobre novas metodologias de ensino,
Prof. 3 Nenhum
Prof. 4 Orientador da Teia do Saber
Prof. 5 Já faz anos que não participo porque trabalho em escola particular também,
então meu tempo é escasso. O último estudo de que participei foi há anos,
nós estudamos os Parâmetros, discutindo cada área de trabalho,
trabalhamos a história, o porquê de trabalharmos com os Parâmetros
Curriculares, mas o autor10 não foi trabalhado.
Prof. 6 Nenhum.
Na questão seguinte, solicitamos aos professores que citassem algum autor ou
teoria da linguagem, no intuito de verificar se estavam embasando suas aulas de
produção de texto em teorias atuais da Lingüística Textual:
8- Indique pelo menos um autor ou teoria que estuda a linguagem (leitura,
escrita, gramática, etc). As respostas obtidas foram:
Professor Autores / teorias da linguagem
Prof. 1 O Faraco11, que é o autor do livro que usamos aqui na escola.
Prof. 2 Bakhtin. Não recordo outros nomes porque são todos nomes estrangeiros, os
orientadores dos cursos trazem muitos textos.
Prof. 3 Bakhtin, se não me engano, Koch e um autor que não me recordo o nome no
momento e que estava na bibliografia do concurso.
Prof. 4 Ezequiel Theodoro da Silva.
Não dá pra definir uma linha teórica a ser adotada na rede pública. O
professor não tem acesso a essa linha. Não adianta falar de Bakhtin.
Prof. 5 Não citou.
Prof. 6 Douglas Tufano.
voltadas para práticas inovadoras; tornar os professores aptos a utilizar novas tecnologias a serviço do ensino, a organizar situações de aprendizagem e a enfrentar as inúmeras contradições vividas nas salas de aula. 9 Letra e Vida - Programa de formação continuada, destinado aos professores que trabalham com a leitura e escrita nas séries iniciais do Ensino Fundamental. (CENP/SEE-SP, 2005). 10 A professora referiu-se a autoria dos PCN. 11 O professor referiu-se a Carlos Emílio Faraco, autor de livros didáticos de Língua Portuguesa.
Nossa última questão tinha como objetivo identificar atividades desenvolvidas em
sala de aula e que, na visão dos professores, foram desempenhadas com sucesso,
obtendo bons resultados:
9- Indique pelo menos uma atividade para produção de texto em sala de aula
com a qual você considera ter conseguido os melhores resultados.
As respostas obtidas foram:
Prof. 1 Na preparação para o SARESP, usamos os cadernos de prova e discutimos
a questão da obesidade. Eles prestaram muita atenção porque estavam se
preparando para a prova.
Prof. 2 Na preparação para o SARESP, nas atividades de avaliação simulada que a
escola realiza bimestralmente.
Prof. 3 Trabalhar com projetos, com temáticas, temas do momento.
Prof. 4 A partir do momento que eu comecei a usar a coletânea mesmo.12
Prof. 5 Antes do debate, antecipo a leitura de um texto, depois nós fazemos um
debate e, após este debate, a produção de texto. Eu gosto muito de ouvir.
Prof. 6 Elaboração de um texto dissertativo baseado no poema O bicho, de Manuel
Bandeira.
1.3.2 Pesquisa com alunos
Para realizarmos a pesquisa com os alunos, comparecemos às salas de aula de
3ª série do ensino médio, juntamente com os professores das escolas, e explicamos o
motivo da pesquisa e sua posterior utilização, deixando clara a necessidade de
responder com seriedade o questionário elaborado.
Depois das explicações, solicitamos que dez voluntários nos acompanhassem
para, em outro espaço, responder às questões. Como houve mais voluntários do que
nossa necessidade, acabamos recorrendo a um sorteio para contemplar apenas o
12 O professor referiu-se a um conjunto de textos, previamente estudados em atividades de interpretação textual.
número estabelecido. Com esse procedimento, obtivemos um grupo bastante
heterogêneo e de perfil diversificado.
Os questionários dos alunos não foram compostos de questões abertas, mas de
questões de múltiplas alternativas seguidas de espaço para comentários que julgassem
interessantes. Todas as questões foram semelhantes àquelas aplicadas a seus
professores e foram assim realizadas:
Na primeira questão, solicitamos aos alunos que relacionassem quais são, em
ordem de prioridades, as atividades mais realizadas em sala de aula. Tal como a
questão proposta aos professores, esperamos determinar quais são as estratégias de
contextualização dos temas a serem trabalhados para a produção de texto do aluno.
Realizamos a seguinte pergunta:
1
Nas aulas de Língua Portuguesa, em sua classe você percebe que o
professor propicia, prioritariamente:
momentos de discussão, debate, troca de informações/ experiências entre
alunos;
momentos de leitura individual, com questões para interpretação de texto
a serem respondidas de forma escrita;
reflexão de temas por meio de vídeos, leituras de jornais, revistas e
outros;
estabelecimento de vínculo interdisciplinar com base em conteúdo
programático de diversas áreas do conhecimento ou de projetos da
escola;
relação entre conteúdo trabalhado pela disciplina e leituras realizadas.
As respostas obtidas, em ordem de incidência, foram:
Ordem de
Prioridades
Alunos
1º lugar Momentos de leituras individuais
2º lugar Discussão, debate, troca de experiências
3º lugar Estabelecimento de vínculo interdisciplinar
4º lugar Reflexão a partir de vídeos e outros
5º lugar Relacionamento de conteúdo da disciplina a outras leituras
A segunda questão foi realizada com o objetivo de compreender como os alunos
são orientados pelo professor no momento da produção do texto:
2 - Antes de realizar uma redação, você:
relaciona o tema ao cotidiano local: seu bairro e sua cidade;
segue as orientações de livros didáticos;
segue as orientações do (a) professor (a), após uma explicação geral do
tema e de seu ponto de vista;
aborda temas do cotidiano social, a partir de leituras propostas pelo (a)
professor (a) e debates realizados anteriormente;
procura não cometer muitos erros de ortografia e gramática para que
tenha uma boa nota.
Diante dessa questão, as respostas obtidas foram:
Ordem de
Prioridades
Alunos
1º lugar Segue as orientações do professor.
2º lugar Relaciona tema / cotidiano social e discutem em sala de
aula.
3º lugar Relaciona tema /cotidiano do aluno e discutem em sala
de aula.
4º lugar Segue as orientações do Livro Didático.
5º lugar Preocupa-se com a correção gramatical.
Na seqüência, perguntamos aos alunos quais os principais objetos de suas
preocupações no momento da produção escrita:
3- Ao ser solicitada uma redação, sua maior preocupação é:
a adequação ao tema;
a adequação gramática: ortografia, pontuação, paragrafação e outros;
a adequação à tipologia textual:narração/descrição/dissertação;
a avaliação (nota, conceito ou desempenho).
As respostas dadas pelos alunos foram:
Ordem de
Prioridades
Alunos
1º lugar Adequação ao tema
2º lugar Adequação à tipologia.
3º lugar Adequação gramatical.
4º lugar Avaliação.
A próxima questão objetivou verificar a freqüência de atividades de produção de
texto realizadas pelos alunos:
4
Você costuma realizar produções de textos periodicamente nas aulas de
Língua Portuguesa?
sim, diariamente;
sim, semanalmente;
sim, quinzenalmente;
sim, mensalmente;
sim, bimestralmente;
não realizo produções de texto na sala de aula.
As respostas dadas foram assim classificadas:
Ordem de prioridades
Alunos
1º lugar Bimestralmente.
2º lugar Mensalmente.
3º lugar Quinzenalmente.
4º lugar Semanalmente.
5º lugar Não realiza produções de textos na
sala de aula.
A quinta questão tinha como objetivo verificar, com os alunos que não produziam
textos em sala de aula, o motivo que os levava a não realizar a atividade:
5
Se você não produz textos em sala de aula nas aulas de Língua Portuguesa,
quais são os motivos?13
Existem aulas de Técnicas de Redação.
A classe é numerosa e essa tarefa fica prejudicada devido ao barulho
constante.
As aulas de Literatura ou Gramática tomam todo o tempo da aula.
Não gosto ou não consigo escrever.
As redações devem ser feitas em casa ou em dias de provas, conforme
orientação do professor.
Outros motivos? Quais?
13 Esta pergunta foi direcionada apenas a alunos que responderam que não realizam produções de texto em sala de aula.
Os principais motivos indicados pelos alunos foram:
1º lugar Aulas de Literatura e Gramática ocupam muito tempo.
2º lugar Excesso de alunos na sala, com muito barulho, dificultando a
concentração dos alunos para o desenvolvimento do texto.
1.4 Observações sobre os dados obtidos
Com os dados obtidos, pudemos organizar respostas que nos levaram a
responder as duas primeiras questões de nossa pesquisa:
como os professores trabalham a produção de texto em sala de aula? e
existe um embasamento teórico dessas aulas de produção de texto em
teorias atuais como a Lingüística Textual?
Pudemos aferir da pesquisa que professores e alunos divergem em relação à
maioria das respostas obtidas. O levantamento indica que existem diferenças na visão
de ambos os segmentos em relação à priorização das atividades em sala de aula.
Enquanto para o professor são prioritárias as atividades de:
relacionar o conteúdo da disciplina a outras leituras;
seguir as orientações do livro didático como principal recurso do aluno;
intervir no texto do aluno com propostas de adequação gramatical;
realizar atividades de produção de texto de forma quinzenal.
As respostas dos alunos indicam que são prioridades da aula:
realizar leituras individuais, com questões para interpretação;
orientar-se pelos direcionamentos do professor no momento da produção
do texto;
enfatizar a adequação ao tema proposto;
produzir textos com periodicidade bimestral.
Observamos ainda que:
existe uma priorização de momentos de assimilação de conteúdos e de
modelos textuais, ou seja, uma preocupação com o aspecto informativo e
o formal do texto a ser produzido;
o texto na sala de aula apresenta-se como fonte de avaliação para o
professor, sendo a avaliação um fator de motivação para sua realização;
os professores não apresentam uniformidade no que se refere ao conceito
de texto e apontam característica e aspectos de como deve ser um texto;
os professores apresentam conhecimento superficial no que se refere a
aspectos teóricos da produção de texto.
Das atividades apresentadas pelos professores como aquelas em que obtiveram
sucesso, não pudemos perceber a realização de um trabalho com atividades que
oportunizassem o desenvolvimento de estratégias argumentativas que o aluno pudesse
recuperar no momento da escrita, nem de atividades em que, na elaboração do texto
escrito, a organização da coesão e da coerência fosse relacionada a objetivos
comunicativos, diante de um contexto de interação no espaço escolar.
Ao concluirmos este capítulo, enfatizamos que a análise dos dados aqui
apresentados será realizada com profundidade no terceiro capítulo desta dissertação,
em que discorremos sobre os limites do professor em relação à preparação de aulas
sobre produção textual e propomos alguns procedimentos que poderão contribuir para
o trabalho docente em sala de aula de Língua Portuguesa.
CAPÍTULO II Texto e construção da textualidade
Por sua relevância social, o texto tem sido foco de diversos estudos, sob
diferentes abordagens metodológicas. No entanto, conforme mencionamos no primeiro
capítulo, o professor de Língua Portuguesa parece não ter ainda encontrado caminhos
que resultem numa melhora da produção textual dos alunos, a fim de levá-los a uma
escrita competente e reflexiva.
Entendemos que as concepções de texto trazidas pelo advento da Lingüística
Textual podem fundamentar o ensino de produção de texto, notadamente a visão de
texto em sua totalidade, construído sob uma trama de relações que possibilitam a
constituição de sentidos. Tal concepção certamente auxiliará o professor a elaborar
aulas cujos objetivos sejam mais claros e cujos resultados sejam mais produtivos.
Nessa perspectiva, devem ser consideradas, além dos elementos lingüísticos, as
relações extralingüísticas do contexto de produção, leitura e circulação dos textos, dada
sua característica de atividade humana e social e as intrínsecas relações presentes e
permanentes entre discurso e os fatores histórico-sociais, que possibilitam a
caracterização da linguagem como manifestação dos sujeitos em suas formas de
pensar e realizar o mundo e a sociedade em que se inserem.
Desse modo, neste capítulo, apresentamos alguns conceitos de texto, bem como
de alguns elementos fundamentais para a construção da textualidade no processo de
produção escrita dos textos, como, por exemplo, os princípios de textualidade e a
questão da textualização, com base nos estudos de Beaugrande e Dressler (1994),
Beaugrande (1997), Maingueneau (2004), Fávero (2004) e Fávero e Koch (2005), entre
outros. Acreditamos que tais conceitos poderão ser relevantes para uma perspectiva de
trabalho com textos, no processo de produção textual.
Em seguida, discutimos alguns pontos dos PCN, a fim de verificarmos as
convergências existentes entre suas diretrizes e conceitos da Lingüística Textual. Essa
discussão poderá estabelecer um aprofundamento teórico mais consistente às diretrizes
que se encontram institucionalizadas nas escolas públicas de ensino fundamental e
médio por meio dos PCN que têm caráter nacional e se propõem como suporte ao
trabalho dos docentes há cerca de dez anos.
2. 1 Texto, textualidade e textualização.
Como manifestação humana, é condição do texto construir sentidos que possam
afetar, convencer, sensibilizar, ou informar os interlocutores envolvidos numa
determinada situação. Sendo assim, todo texto constitui fonte e forma de expressão, de
registros de pensamentos, manifestações, compromissos, sentimentos humanos e
possibilidade de interferência num determinado contexto social.
Desse modo, os textos são caracterizados, de forma geral, por sua capacidade
de conduzir os usuários a envolverem-se com a trama textual no estabelecimento de
sentidos; isso ocorre desde que sejam desenvolvidos de forma coerente e mediante
uma determinada completude. Corroborando essa idéia, Bronckart (1999, p.75) explica
que um texto deve ser compreendido como:
Toda unidade de produção de linguagem situada, acabada e auto-suficiente (do ponto de vista da ação ou da comunicação)... A noção de texto designa toda unidade de produção de linguagem, que veicula uma mensagem lingüisticamente organizada e que tende a produzir um efeito de coerência sobre o destinatário (...).
Fávero e Koch (2005, p.26), por sua vez, apresentam a compreensão de texto
como qualquer manifestação da capacidade textual do ser humano (quer se trate de um
poema, quer de uma música, uma pintura, um filme, uma escultura etc.).
Ainda para as autoras (op. cit.), um texto consiste em qualquer passagem, falada
ou escrita, que forma um todo significativo, independente de sua extensão.
As diversas possibilidades de realização do texto são reiteradas por
Maingueneau (2004, p.57):
(...) A diversificação das técnicas de gravação e de reprodução da imagem e do som vem modificando consideravelmente a representação tradicional do texto: este não se apresenta mais unicamente como um conjunto de signos sobre uma página, mas pode ser um filme, uma gravação em fita cassete, um programa em disquete, uma mistura de signos verbais, musicais e de imagens em um CD-ROM... .
Tais concepções indicam um conceito de texto que vai além da elaboração de
seqüências gramaticais bem estruturadas, mas que consideram a importância de uma
necessária unidade, podendo ser apresentado por diversos portadores, de acordo com
as condições em que é produzido, o que caracteriza seus intrínsecos aspectos
contextuais.
No que se refere à produção de texto escrito, o sujeito escritor precisa recuperar
aspectos de sua formação lingüística e mobilizá-las de acordo com situações
contextuais. Esses aspectos são de natureza dinâmica, portanto, constantemente
modificáveis e condicionam as estruturas textuais produzidas.
Para Bronckart (1999, p.91), o produtor de texto realiza operações lingüísticas e
textuais na dependência constante da situação em que se encontra. Re-conhecer essa
característica implica a compreensão dos motivos de produção de um texto com
determinadas estruturas.
Para Beaugrande (1997, p.13):
O texto pode estar relacionado a contextos sociais plausíveis e a papéis em que as pessoas se comunicam e interagem. A validade de nossos resultados assenta-se não tanto em replicar os processos comportamentais e mentais específicos dos participantes àquele tempo e lugar, como a descreverem-se as práticas discursivas características de participantes semelhantes naquele tipo de situação.
Assim, ao contexto estão relacionadas as condições de produção na adequação
do texto às diversas situações de comunicação. O sucesso da relação entre os
interlocutores é determinado pelas trocas cognitivas possíveis, seu conhecimento de
mundo, o conhecimento enciclopédico, regras da comunicação, entre outros aspectos,
e pela mobilização pertinente de recursos lingüísticos na produção do texto.
Como contexto, referimo-nos, como Maingueneau (2004), a não só àquilo que se
encontra ao redor do texto, o cotexto14, mas também aos elementos que estão além
desse redor, contribuindo para a construção de seu sentido e que é produzido por seus
interlocutores, numa determinada relação espaço temporal. Para Maingueneau,
podemos encontrar três tipos de contextos:
1. O contexto situacional, que configura tanto o espaço físico-temporal como os
agentes de interlocução. No texto, esses elementos aparecem, por exemplo, nas
pessoas do discurso e nas articulações verbais.
2. O contexto cognitivo, os saberes anteriores, ou seja, os conhecimentos prévios
dos interlocutores, necessariamente partilhados para a efetiva constituição de
sentidos.
3. O contexto lingüístico ou o cotexto, em que se dá a progressão temática. Para
Maingueneau, o recurso ao cotexto mobiliza a memória do intérprete, que vai
colocar uma dada unidade em relação a uma outra no mesmo texto (Cf.
MAINGUENEAU, 2004, p.27).
Consideramos o contexto lingüístico, ou o cotexto, como o momento em que o
escritor deve articular com competência os processos de progressão e retroação
textuais, para os quais precisará utilizar elementos coesivos que garantam a
14 Em Maingueneau (2004, p.27) encontramos o conceito de cotexto como seqüências verbais encontradas antes ou depois da unidade a interpretar.
seqüencialização do texto, como a recorrência a aspectos léxico-gramaticais
específicos.
A relação texto contexto traduz-se nas marcas impressas na superfície textual,
revela modelos e estruturas previamente assimiladas pelo produtor e as condições a
que se submeteu a produção textual.
O contexto de produção textual, de maneira física, subjetiva, cognitiva e
semântica, tem por objetivo adaptar um texto às intenções do escritor e contribuir para
as possibilidades de compreensão do leitor, numa ação interacional e comunicativa.
Nesse sentido, concordamos mais uma vez com Maingueneau (2004, p.54):
Não diremos que o discurso intervém em um contexto, como se o contexto fosse somente uma moldura, um cenário; na realidade, não existe discurso senão contextualizado. Sabemos que não se pode verdadeiramente atribuir um sentido a um enunciado fora do contexto; o mesmo enunciado em dois lugares distintos corresponde a dois discursos distintos.
Em outras palavras, o contexto pode compor-se do portador do texto, seus
aspectos gráficos, os conhecimentos prévios e compartilháveis entre os interlocutores,
a situação de produção, as marcas lingüísticas: tempos verbais, pessoas do discurso e
condições interdiscursivas, próprias do meio em que o texto está sendo construído.
Ainda de acordo com Maingueneau (2004, p.25):
Existem muitos enunciados que ocorrem fora de qualquer contexto: os exemplos de gramática, precisamente (...). Mas é uma ilusão acreditar que esses enunciados se interpretam sem contexto. Na verdade, os exemplos de gramática aparentemente descontextualizados são inseparáveis de um contexto muito específico que é o livro de gramática.
Dessa maneira, compreendemos o contexto como condição precípua para o
desenvolvimento do texto; o contexto não exerce apenas um papel secundário, mas
estabelece condições de produção e processamento textual, uma vez que essas
funções apresentam uma relação intrínseca, embora se realizem em movimentos
diferenciados.
Do ponto de vista de sua unidade, um texto compõe-se de estruturas lingüísticas
e aspectos contextuais concebidos por meio de um conjunto de procedimentos
lingüísticos e extralingüísticos desenvolvidos por seus usuários e que são denominados
de textualidade. Para Schmidt (1978, p.164), a textualidade consiste em:
Uma dupla estrutura, isto é, uma estrutura a ser abordada tanto sob o aspecto lingüístico como sob o aspecto social. Esta hipótese refere-se ao fato já amplamente observado de que todo enunciado, efetivado por parceiros de comunicação mediante uma língua-objeto (isto é, não metalingüístico) e com função comunicativa, necessariamente apresenta a característica de textualidade ou conformidade textual. Desde que ela exista, a comunicação se dá de forma textual.
A textualidade é a qualidade presente na trama de relações que possibilitam a
constituição de sentidos no processo de produção de texto. No entanto, só é possível
textualizar o material lingüístico que, na sua elaboração, considere o contexto em que
se desenvolve, ou seja, o ato comunicativo em que se efetiva.
Para caracterizarmos um artefato como texto, buscamos a sua unidade e sua
completude, características que se realizam na ação dos interlocutores, em atos
comunicativos diversos, de acordo com o contexto em que se inserem. A esse processo
conjunto de construção de sentidos pelos usuários Beaugrande (1997, p.18) denomina
textualização e argumenta que:
A textualidade é não só a qualidade essencial a todos os textos, mas é também uma realização humana sempre que um texto é textualizado, isto é, sempre que um artefato de marcas sonoras ou escritas é produzido ou que recebe o nome de texto. Contudo, o ato de textualizar ocorre tão rápida e habilmente que nós não acreditamos que estamos realizando algo e assume-se o artefato em si mesmo como sendo um texto completo . Essa crença reifica o texto numa entidade autônoma que diz apenas o que significa e contém sua própria verdade ou autoridade, testemunha alguns dizeres consensuais como isto é o que se diz aqui , está bem aqui na página , ou essas são as palavras exatas .
A cada textualização realizada, existe uma co-responsabilidade entre os
interlocutores em relação à construção e à organização de sentidos gerados, a partir da
conectividade que se instaura por meio dos princípios de textualidade, dos quais
trataremos na próxima seção deste capítulo.
Diante dessa perspectiva, os usuários dos textos passam a ser incluídos como
sujeitos participantes na construção de sentidos, tornam-se agentes de constituição
textual em que uma trama de relações vai sendo desenvolvida por meio da
textualidade, para possibilitar que os sentidos desejados possam se tornar perceptíveis.
Dessa forma, consideramos com Beaugrande (1997, p.18) que nosso mote pragmático
deveria ser: um texto não existe, como texto, a não ser que alguém o esteja
processando.
Assim, o contexto da produção textual pode vir a definir a eficácia do texto,
qualificando-o ou desqualificando-o como unidade. Para Bronckart (1999, p.73), cada
texto está em relação de interdependência com as propriedades do contexto em que é
produzido.
2. 2 - Princípios de textualidade
Ao tratarmos das questões relativas à produção textual, tendo em vista uma
concepção de texto em sua completude, consideramos importante analisar os princípios
que garantem sua unidade de sentido.
Na fala, alguns elementos extralingüísticos, tais como a retomada de turnos, as
antecipações, as expressões corporais e faciais, entre outros aspectos próprios da
linguagem oral, podem auxiliar no estabelecimento da comunicação; a linguagem falada
permite a interlocução direta, numa co-autoria constante. Na escrita, porém, a
competência lingüística, consolidada na microestrutura textual, precisa conferir ao texto
condições de desenvolvimento da comunicação, garantindo a constituição de sentidos.
Por conseguinte, o texto escrito deve contar com um planejamento anterior, que
se define a partir dos interesses de seu produtor e das condições contextuais de seu
desenvolvimento, asseguradas pelas escolhas e pelos registros dos recursos
lingüísticos. O planejamento deve levar em conta as relações pragmáticas entre
espaço, tempo e pessoa, que se configuram como pressuposições para a composição
textual, definindo relações que se realizam por meio de fatores como:
o direcionamento do autor;
as expectativas e os resultados obtidos pelo interlocutor;
as situações sociais, as características grupais, o universo cultural e
cognitivo dos sujeitos;
o conteúdo desenvolvido e suas relações com os conhecimentos do
interlocutor;
os recursos gramaticais utilizados como forma de garantia da unidade de
sentido;
a relação com outros textos;
uma organização consistente, em que se garanta a completude do texto.
Em outros termos, o planejamento textual deve levar em conta os princípios de
textualidade explicitados por Beaugrande e Dressler (1994) e retomados por
Beaugrande (1997). Os autores explicam que tais princípios, centrados no texto e em
seus usuários, garantem a realização do processo comunicativo e os organizam em
sete: coesão, coerência, intencionalidade, aceitabilidade, informatividade,
situacionalidade e intertextualidade.
Beaugrande (1997) esclarece que os princípios de textualidade não são
características inerentes e estáticas pertencentes ao texto como produto, mas
constituídos nos processos de interação entre os usuários do texto. Embora não se
efetivem isoladamente, nem apresentem uma hierarquia de importância, ao contrário,
cada um deles mantém um elo visceral com os outros, realizaremos a discussão de
cada um deles de forma separada, por simples questão de organização deste trabalho.
2. 2.1 Coesão textual
Para Koch (1996, p.19), o conceito de coesão textual15 diz respeito a todos os
processos de seqüencialização que asseguram ou tornam recuperável uma ligação
lingüística significativa entre os elementos que ocorrem na superfície do texto. Como
material lingüístico, o texto precisa compor uma estrutura relativamente homogênea de
forma a assegurar sua unidade. Nesse sentido, os elementos de coesão apresentam-se
como recursos responsáveis pelo encadeamento linear de idéias. Eles manifestam-se,
de acordo com Koch (2004, p.36), de forma remissiva ou referencial e seqüencial.
Em relação à forma remissiva ou referencial, a manifestação pode dar-se por
realização de anáfora ou catáfora, as quais estão vinculadas a uma interpretação
semântica e a determinados pressupostos que acompanham a trama textual. São
mecanismos de formas referenciais: nominalizações, expressões sinônimas,
expressões quase sinônimas, nomes genéricos, hiperônimos ou indicadores de classe
e elipse. Na anáfora, o termo pressuposto aparece explicitamente e precede o recurso
coesivo, enquanto que na catáfora, o termo pressuposto aparece depois do recurso
coesivo. Koch (2004) organizou as formas referenciais em:
a) referencial endofórica, em que a coesão se dá pela conexão entre estruturas
ou elementos do texto;
b- referencial exofórica, em que a garantia da coesão acontece por meio de
elementos do texto com elementos do conhecimento compartilhado ou prévio.
A autora também faz menção a formas não-referenciais presas, compostas por
recursos que fornecem instruções de sentido, e livres, apenas indicadoras da conexão.
15 A coesão, inicialmente reconhecida como os modos com os quais os componentes da superfície textual se conectam, passa a ter seu conceito direcionado, de acordo com Halliday e Hassan, para a conceituação de coesão referencial e coesão seqüencial. O conceito de coesão abrangeria as relações de referência, substituição, elipse, conjunção e coesão lexicais, posteriormente subdivididas pelos pesquisadores em dois grandes grupos: a coesão seqüencial, que diz respeito à continuidade de sentido e a coesão referencial ou remissiva, que se relaciona à atuação lingüística de recursos em suas relações entre os enunciados.
Como formas não-referenciais, encontramos, por exemplo: artigos, pronomes adjetivos,
numerais cardinais e ordinais, advérbios pronominais e expressões adverbiais.
O quadro a seguir fornece um resumo dessa classificação, na qual identificamos
os dois grupos: formas referenciais e não referenciais.
Quadro I Formas referenciais e formas não referenciais
Formas referenciais
Formas não-referenciais
Presas Livres
Nominalizações Expressões sinônimas Expressões quase sinônimas Nomes genéricos, hiperônimos ou indicadores de classe, elipse.
Artigos definido e indefinido; Pronomes adjetivos, demonstrativos, possessivos, indefinidos, relativos; Numerais cardinais e ordinais.
Pronomes pessoais de 3ª pessoa, pronomes substantivos: demonstrativos, possessivos, indefinidos, interrogativos, relativos; Numerais: cardinais, ordinais, multiplicativos, fracionários; Advérbios pronominais; Expressões adverbiais.
Em relação à forma seqüencial, essa está constituída nos segmentos dos textos:
em enunciados, parágrafos e seqüências textuais, na articulação da progressão textual
em face de relações semânticas e pragmáticas, podendo ou não apresentar elementos
recorrentes. Desse modo, teremos:
a) a seqüenciação parafrástica, em que ocorrem recorrências na retomada de
enunciados;
b) a seqüência frástica, que marca a inter-relação entre enunciados por meio de
sucessivos encadeamentos definidos por recursos e procedimentos lingüísticos
específicos.
No caso da seqüencialização parafrástica, podemos ressaltar:
a recorrência de termos de mesmo item lexical;
a recorrência de estruturas como paralelismo sintático, de conteúdos
semânticos, de recursos fonológicos segmentais e/ou supra-segmentais, de
tempo e aspecto verbal.
Quanto à seqüência frástica, estão evidentes os procedimentos de manutenção
temática por meio do campo lexical, da progressão temática na organização tema e
rema e nos encadeamentos articulados das relações semânticas.
De acordo com Beaugrande e Dressler (1994, p.22), a análise das condições de
coesão implica a definição de um estudo do texto voltado para sua constituição como
processo e como produto. Se considerarmos a coesão como resultado da articulação
de elementos que indicam relações entre outros elementos na superfície textual,
definiremos que ela se constrói e, necessariamente, deverá ser processada pelos
interlocutores, o que implica em ações centradas nos usuários.
Como princípios relacionados ao usuário, a coesão e a coerência16 são
construídas a partir de relações entre os componentes da superfície textual que
deverão ser processadas pelo interlocutor. No que se refere à coesão, o
desenvolvimento textual assume um caráter auto-realizável, desde que ele esteja
imbuído de intencionalidade, na garantia de uma coerência muito além da seqüência de
fatos, assertivas, exemplos e conceitos reproduzidos.
2. 2.2 Coerência textual
De maneira geral, o entendimento sobre coerência reside na capacidade de um
texto apresentar-se dentro de certa linearidade, logicidade, organização e consistência.
Porém, devemos assumir que é possível atribuir sentidos a textos cuja organização e
linearidade não sejam as ideais. De acordo com Costa Val (2004):
Se assumimos que a textualidade dos artefatos lingüísticos com os quais interagimos é produzida à medida que aplicamos a eles princípios de textualização, não podemos supor textos que tenham coerência e coesão e não-textos que não tenham. Cada vez que um usuário interpreta um artefato
como texto é porque conseguiu aplicar a ele, com sucesso, os princípios de textualização, construindo sua coesão, sua coerência e tudo mais.
16 Em relação à coerência, sua construção caracteriza-se por operações de inferência; um texto não tem sentido em si mesmo, mas faz sentido pela interação entre os conhecimentos que apresenta e o conhecimento de mundo de seus usuários.
É possível, então, indicar que a coerência pode ser constituída ou resgatada
pelos interlocutores em razão de seu caráter macrotextual. Mais do que um princípio de
textualidade, a coerência é assegurada por meio dos outros princípios e é constituída
pelos usuários numa situação comunicativa. De acordo com Fávero (2004, p.61),
enquanto a coesão se dá em nível microtextual
conexão da superfície do texto, a
coerência caracteriza-se como o nível de conexão conceitual e estruturação do sentido,
manifestado, em grande parte, macrotextualmente.
Para a realização da coerência, são fundamentais as relações de conhecimento
compartilhado entre os interlocutores. Além disso, é necessário compreender que ela se
efetiva a partir de procedimentos cognitivos, portanto, ações centradas nos usuários.
Ainda em Fávero (2004, p.62), encontramos que:
O texto contém mais do que o sentido das expressões na superfície textual, pois deve incorporar conhecimentos e experiência cotidiana, atitudes e intenções, isto é, fatores não lingüísticos. Desse modo, um texto não é em si coerente ou incoerente; ele o é para um leitor/alocutário, numa determinada situação.
Em outros termos, um texto pode não ser incoerente, mas ser incoerente para
alguém que não está a par do tema tratado, que não possui um conhecimento prévio,
ou que não dispõe de recursos lingüísticos para a compreensão, por exemplo, de
implícitos e subentendidos ou de outros fatores extralingüísticos que permitam realizar o
processamento textual. Nesse caso, não há dialogia, muito menos interação.
Diferentemente da coesão, a coerência não possui caráter linear e não se
encontra aparente apenas na superfície textual, por se realizar num plano global e
incluir a articulação com elementos extralingüísticos. Desse modo, ao compreendermos
o texto como uma ação comunicativa, estamos atribuindo à produção textual uma
necessária característica de interação. Ao discutirmos a produção textual escrita,
entendemos que a coerência será arquitetada com base no contexto da produção e
talhada, passo a passo, durante o processo de escrita.
2. 2.3 Intencionalidade
A escrita, tanto quanto a fala, é uma ação para alguém o outro. Na constituição
do processo dialógico, buscamos com nosso texto atingir um objetivo, convencer,
seduzir, ou compartilhar com o outro aquilo em que acreditamos. Portanto, construir
sentidos no texto depende parcialmente das intenções daquele que o produz,
normalmente imbuído de argumentos que deseja ver aceitos por seu interlocutor.
Pensando na constituição de textos coesos e coerentes como base para uma
construção argumentativa efetiva, encontramos outro princípio de consolidação da
textualidade, a intencionalidade. De acordo com Schmidt (apud KOCK, 2004, p.13):
É somente na medida em que o locutor realiza intencionalmente uma função ilocutória (sociocomunicativa) identificável por parte dos parceiros envolvidos na comunicação que o conjunto de enunciados lingüísticos vem a constituir um processo textual coerente, de funcionamento sociocomunicativo eficaz e normalizado, conforme as regras constitutivas (uma manifestação da textualidade).
Como prática social, imbuída da necessidade e do desejo de uma ação sobre o
outro, o texto, é naturalmente intencional. Nesse sentido, compreendemos o princípio
da intencionalidade como o plano articulador da trama textual, que garante o
estabelecimento de sentidos por meio dos objetivos propostos. Koch e Travaglia (2005,
p.79-80), explicam:
Em sentido restrito, a intencionalidade trata da intenção do emissor de produzir uma manifestação lingüística coesiva e coerente, ainda que essa intenção nem sempre se realize integralmente, podendo mesmo ocorrer casos em que o emissor afrouxa deliberadamente a coerência com o intuito de produzir efeitos específicos (...) Em sentido amplo, a intencionalidade abrange todas as maneiras como os emissores usam textos para perseguir e realizar suas intenções comunicativas.
Na produção de um texto, o sujeito escritor precisa planejar, intencionalmente, os
recursos lingüísticos de que lançará mão para consolidar seus objetivos. Nesse
momento, deve dispor-se a operá-los de maneira que proporcionem a constituição dos
sentidos desejados, ou seja, escolher e mobilizar recursos lingüísticos que o interlocutor
poderá recuperar mo momento da interação com o texto, numa reação desencadeada
pela própria trama textual.
Dessa maneira, os atos comunicativos realizados na superfície textual devem
articular-se a estratégias cognitivas que promovam a contextualização; esses atos
podem ser originados de uma subjetividade intuitiva: sentimentos, desejos ou
necessidades do produtor, mas precisam ser desenvolvidas a partir de um plano
intencional, com vistas à consolidação da unidade do texto.
O princípio da intencionalidade marca o ponto de partida para que o sujeito
escritor componha a organização de seu texto. Apoiado num plano de unidade, ele
lança mão, desde a escolha lexical, até a organização sintática, na mobilização de
estratégias cognitivas complexas para a constituição de sentidos do texto.
Koch e Travaglia (2005, p.80) discutem a intencionalidade associada à
aceitabilidade, definindo que, em sentido amplo, essas duas noções têm a ver com o
que se vem chamando, na literatura lingüística, de argumentatividade.
2. 2.4 Aceitabilidade
Ter seu texto aceito é objetivo primeiro de qualquer escritor; no nível do
convencimento ou no nível da compreensão, o sujeito escritor pensa e constrói o texto
na perspectiva do outro, sempre que essa escrita é realizada tendo em vista um
objetivo.
De acordo com Fiorin (1998, p.130), é necessário não perder de vista que uma
argumentação bem feita dá consistência ao texto, produz uma sensação de realidade e
uma impressão de verdade. Leva o leitor a crer que o texto fala de coisas reais e
verdadeiras, leva-o a aceitá-lo.
A aceitação de um texto constitui princípio de toda situação comunicativa, e as
conseqüências dessa atitude - seja refutar, discordar, acolher, delimitar ou expandir
sentidos - dependem tanto das condições de produção quanto dos processos de
interação, nos quais esse texto venha a ser apresentado, portanto, condições também
relacionadas ao contexto. Para Beaugrande (1997, p.20), o princípio da aceitabilidade
assume o que os recebedores de texto se dispõem a fazer ao aceitar um texto, por
exemplo, compreender, considerar, reagir etc.
Diante de um texto, os interlocutores inserem-se em determinados aspectos
contextuais, espaciais, temporais, sociais e culturais e procuram interagir com a
diversidade textual, compreendendo tais eventos como portadores potenciais de
sentidos.
Para Koch e Travaglia (2005, p.80), a aceitabilidade inclui a aceitação como
disposição ativa de participar de um discurso e compartilhar um propósito comunicativo.
Podemos considerar, portanto, que o próprio fato de existir um interlocutor possa vir a
cooperar para que a produção de texto seja realizada dentro de um plano de aceitação
pelo sujeito escritor.
Costa Val (1999, p.11) esclarece que a aceitabilidade:
Concerne à expectativa do recebedor de que o conjunto de ocorrências com que se defronta seja um texto coerente, coeso, útil e relevante, capaz de levá-lo a adquirir conhecimentos ou a cooperar com os objetivos do produtor.
Dessa maneira, entendemos que seja comum a existência de uma pré-
disposição entre os interlocutores em estabelecer sentidos aos textos. O desafio a ser
enfrentado pelo produtor é fortalecer o sentido que espera ser constituído.
2. 2.5 Situacionalidade
De acordo com Beaugrande (1997, p.20) aplicamos o princípio da
situacionalidade ao conectarmos o texto-evento à situação em que ele ocorre; o
produtor percorre, portanto, uma linha demarcada por fatores internos e externos ao
texto, em que precisa realizar uma necessária articulação espaço-temporal no
desenvolvimento da organização dos recursos lingüísticos e estruturas formais,
inerentes à produção textual escrita.
O princípio da situacionalidade trata da tomada de posição que os interlocutores
adotam numa circunstância determinada de situação comunicativa; ela é motivada
pelas crenças, pelos valores, por aspectos culturais diversos, pelas necessidades e
interesses, relativizados no processo de interação. Segundo van Dijk (1984, p.273),
uma primeira propriedade do contexto a ser ressaltada é seu caráter dinâmico. Um
contexto não é só um mundo-estado possível, mas uma seqüência de mundos-estados.
O princípio da situacionalidade envolve as disponibilidades e capacidades dos
interlocutores em situações reais de comunicação. A interação entre os sujeitos, no
texto compreendido como evento comunicativo, é de fundamental importância para as
atitudes de monitoramento do processo de produção textual a fim de adaptar,
adequadamente, o texto produzido à situação de uso, tornando-o relevante. Como
essas condições são dinâmicas, é necessária uma competência na articulação textual
no sentido de garantir a construção de sentidos. Esse princípio refere-se, portanto, ao
contexto de produção.
2. 2.6 Intertextualidade
O repertório sociocultural e cognitivo dos sujeitos é desenvolvido com base em
diversos textos, sejam esses falados ou escritos. Tal repertório é construído nos
diversos segmentos sociais, da família à escola, da mídia à igreja, por meio de leituras
diversas e na interação entre os sujeitos.
Para Beaugrande (1997, p.21):
Nós podemos aplicar o princípio da intertextualidade ao conectarmos a situação atual de produção e recepção do texto à nossa experiência prévia
com outros textos, especialmente aqueles do mesmo tipo de texto e domínios de discurso.
Há, assim, uma seqüência contínua de retomadas de textos que, por sua vez,
são modificados, ampliados, complementados ou simplesmente repetidos em forma de
citações, de forma consciente ou inconscientemente, num processo discursivo circular.
Vigner (2002, p.32) explica que:
Só é legível o já lido, o que pode inscrever-se numa estrutura de entendimento elaborada a partir de uma prática e de um reconhecimento de funcionamentos textuais adquiridos pelo contato com longas séries de textos. (...) Afirma-se aqui a importância do fenômeno da intertextualidade como fator essencial da legibilidade do texto literário e, a nosso ver, de todos os outros textos. O texto não é mais considerado só nas suas relações com um referente extratextual, mas primeiro na relação estabelecida com outros textos.
Em outras palavras, na elaboração de novos textos, recorremos a recursos
assimilados em outros textos, desde a superestrutura até os recursos estilísticos. Para
os procedimentos de produção textual, a realocação de procedimentos de
intertextualidade é de suma importância na composição de gênero e tipo textual, tanto
no que se refere à seleção lexical quanto aos demais componentes de progressão.
Nesse sentido, há que se levar em conta formas de intertextualidade, que podem se
dar:
por conteúdo - as ligadas às questões de conhecimento de mundo;
por aspectos formais dos textos - evidentes na materialidade lingüística
dado seu caráter de reprodução de uma determinada forma de escrever;
por fatores tipológicos - configuradas tanto de forma intuitiva quanto de
forma dirigida, na assimilação de aspectos lingüísticos próprios de cada
tipo de texto. (Cf. KOCH e TRAVAGLIA, 2005).
2. 2.7 Informatividade
O princípio da informatividade relaciona-se ao grau de inovação apresentado
pelo texto. Assim, um texto será tanto menos informativo, quanto maior a
previsibilidade; e tanto mais informativo, quanto menor a previsibilidade (KOCH;
TRAVAGLIA, 2005, p.81).
Todas as vezes que nos deparamos com um texto, temos o desejo, a
necessidade ou a incumbência de encontrar um determinado conteúdo; o texto será
tanto mais produtivo quanto maior o grau de novidade que possa vir a expressar. No
entanto, o sujeito escritor não pode firmar seu texto apenas em aspectos de inovação,
sem oferecer como ponto de partida algo já conhecido.
De maneira geral, a motivação para a aceitabilidade de um texto está
relacionada à articulação entre o dado e o novo, ou seja, a ampliação de
conhecimentos ou informações já adquiridas que podem ser expandidas com base em
novas informações ou conhecimentos. Isso significa que um mesmo texto pode ser
altamente informativo ou absolutamente inútil para determinado segmento de
interlocutores, ou ainda para os mesmos interlocutores, de acordo com o momento em
que se realiza.
Beaugrande (1997, p.20) argumenta que a informação não é apenas o conteúdo
da mensagem por si mesma, mas o bom ajustamento entre o conteúdo da mensagem
versus aquilo que nós já sabemos. Esse ajustamento determina o efeito de sentido
possível e é garantia de interação entre os interlocutores.
No ajustamento do conteúdo da mensagem, os recursos lingüísticos a serem
acionados nesse movimento de retroação e progressão encontram suporte na
superfície textual, mediante o uso criterioso de determinados aspectos gramaticais e
também na articulação de elementos contidos em nossa memória discursiva, que são
necessariamente ativados pelos interlocutores na construção dos sentidos.
2.3 Texto como evento comunicativo
Acreditamos que os princípios de textualidade convergem conjuntamente para a
unidade do texto e contemplam o desenvolvimento da competência sociocomunicativa
na produção textual, pois relacionam os interlocutores a seus contextos. Assim,
concordando com Beaugrande (1997 p. 21-22):
Como qualquer outro conjunto de princípios numa ciência, a textualidade deve ser justificada pelos insights que ela fornece. (...) Não deve ser abrangente a ponto de nivelar diferenças relevantes (...). Deve ser capaz de enriquecimento para acomodar nossos próprios objetivos cognitivos e pessoais (...). Nossos princípios de textualidade devem nos ajudar a fazer múltiplas conexões não só dentro de um texto, mas também entre o texto e os contextos humanos nos quais ele ocorre e a determinar que conexões são relevantes.
Nessa perspectiva, para a organização do texto como unidade de sentido, os
participantes do discurso valem-se de mecanismos específicos para a garantia de uma
ordem progressiva das ações, planos e objetivos dentro de seus contextos particulares.
A esse processo Beaugrande (1997) denomina de agenda do texto. A agenda do texto
prevê a organização de um plano, em que alguns elementos determinam a
argumentatividade textual e têm papel decisivo no convencimento do outro.
Para a realização da agenda do texto são articulados elementos de estratégia e
de foco, evidenciados pelos recursos da linguagem, os quais são selecionados entre as
possíveis escolhas discursivas, para os quais utilizaremos a mesma nomenclatura de
Beaugrande (1997), que os denomina como economia do texto. Para o autor (1997, p.
7- 8), o termo economia reflete o status do texto enquanto sistema
a língua é um
sistema virtual que estipula as escolhas potenciais; o texto é um sistema real que
manifesta as escolhas reais. A economia do texto refere-se, então, às possibilidades do
produtor, no manuseio de recursos que compõem a superfície textual.
Beaugrande estabelece ainda, subgrupos de organização de economias
contribuintes, relacionadas ao uso de recursos chave para a consolidação de uma
situação comunicativa: a economia prosódica, estabelecida por recursos que definem o
ritmo textual; a economia léxico gramatical, dada pelas escolhas lexicais e pelo
tratamento gramatical no texto, e a economia gráfica, marcada por aspectos de forma
do texto.
A seguir, organizamos um quadro síntese dessas economias:
Quadro II A economia do texto
Economia Prosódica Léxico-gramatical Gráfica
Definida pelo ritmo
textual
Definida pelas escolhas
lexicais e tratamento
gramatical.
Definida pela disposição do
texto e seus referenciais.
Marcas Fluxo, entonação,
aliterações, seqüências
melódicas.
Formas e padrões da
língua: colocações
pronominais, escolhas
verbais.
Imagens, ilustrações,
disposição do texto e
relações possíveis com o
sentido desejado.
As escolhas realizadas na economia do texto devem proporcionar uma
construção de sentido eficiente e eficaz no desenvolvimento da produção textual, que
se constitui do processamento e da mobilização de recursos lingüísticos capazes de
compor uma superfície homogênea de produção de sentidos, relativos a um
determinado contexto situacional.
Vale ressaltar, porém, que, apesar de o desempenho na escrita depender da
capacidade de o sujeito realizar, na superfície textual, o uso de recursos lingüísticos
que sejam capazes de apresentar os efeitos de sentido desejados, não acreditamos
que isso dependa do domínio absoluto de conceitos ou nomenclaturas gramaticais, mas
da apropriação dos mecanismos da linguagem escrita, da compreensão dos recursos
discursivos e da articulação de elementos constitutivos da textualidade realizada pelas
relações de interação com e nos processos cognitivos entre os interlocutores.
Diante do exposto, consideramos que o texto deve ser compreendido como
evento comunicativo, dada sua característica interativa e sua natureza social. Trata-se,
em outras palavras, de um evento marcadamente dialógico, concebido por necessários
princípios de textualidade que garantem a produção de sentidos, mediante um
determinado contexto.
2.4 Produção textual - as orientações da Lingüística Textual e os PCN
Cabe à Lingüística Textual LT o estudo da organização textual, dos processos
e estratégias de que os usuários lançam mão para a construção da textualidade, dada
uma situação de produção de texto. A prática docente, em Língua Portuguesa, encontra
diretrizes pedagógicas nos Parâmetros Curriculares Nacionais
PCN, cujos
fundamentos apresentam co-relações com as orientações mais amplas da LT. Nesta
seção, trataremos de demonstrar as convergências entre os conceitos da Lingüística
Textual e as diretrizes dos PCN, no intuito de colaborar com o professor da rede pública
estadual para a apropriação de um aporte teórico que consubstancie as atividades de
produção de texto desenvolvidas em sala de aula de Língua Portuguesa no ensino
médio.
Em relação aos PCN, podemos encontrar uma grande variedade de estudos,
entre os quais, aqueles que apontam falhas, incongruências, lacunas e outros aspectos
determinantes de possíveis imperfeições que o documento possa apresentar. Nossa
perspectiva, no entanto, reside na utilização de um documento oficial, de caráter
nacional que, por sua natureza prescritiva, oferece ao professor pistas de ações
didático-pedagógicas a serem encaminhadas em salas de aula do ensino médio, mas
para os quais observamos a necessidade de um aprofundamento teórico, a fim de
tornar sua prática mais produtiva.
No que se refere ao trabalho a ser desenvolvido em sala de aula, os PCN
relacionam competências e habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos até o fim
do ensino médio nas diferentes áreas de conhecimento. Essas competências e
habilidades encontram-se apresentadas pelo documento por meio de um quadro único
anexo III. Nele encontram-se divididas três unidades temáticas: representação e
comunicação, investigação e compreensão e contextualização sócio cultural, para as
quais estão previstas as seguintes competências e habilidades a serem desenvolvidas
em Língua Portuguesa:
Competências e habilidades a serem desenvolvidas em Língua Portuguesa
(BRASIL, 1999, p.145).
Representação e comunicação:
Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes manifestações da
linguagem verbal.
Compreender e usar a Língua Portuguesa como língua materna, geradora de
significação e integradora da organização do mundo e da própria identidade.
Aplicar as tecnologias de comunicação e da informação na escola, no trabalho e
em outros contextos relevantes da vida.
Investigação e compreensão
Analisar os recursos expressivos da linguagem verbal, relacionando
textos/contextos, mediante a natureza, função, organização, estrutura, de acordo
com as condições de produção, recepção (intenção, época, local, interlocutores
participantes da criação e propagação das idéias e escolhas, tecnologias
disponíveis).
Recuperar, pelo estudo do texto literário, as formas instituídas de construção do
imaginário coletivo, o patrimônio representativo da cultura e as classificações
preservadas e divulgadas, no eixo temporal e espacial.
Articular as redes de diferenças e semelhanças entre a língua oral e escrita e
seus códigos sociais, contextuais e lingüísticos.
Contextualização sócio cultural:
Considerar a Língua Portuguesa como fonte de legitimação de acordos e
condutas sociais e como representação simbólica de experiências humanas
manifestas nas formas de sentir, pensar e agir na vida social.
Entender os impactos das tecnologias da comunicação, em especial da língua
escrita, na vida, nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
No que se refere a esse quadro de competências e habilidades, encontramos
uma das marcas dos PCN relativa ao papel da interlocução. As habilidades e
competências previstas implicam a articulação de atividades somente possíveis em
situações de interação: argumentação, trocas de experiências etc, e da apropriação da
língua para a realização de objetivos previamente estabelecidos, adaptando o texto às
situações em que se encontra.
É possível observar que essas indicações encontram-se relacionadas às
orientações da Lingüística Textual, uma vez que o trabalho proposto está vinculado à:
compreensão do texto como unidade;
realização de atividades interlocutivas para o desenvolvimento de estratégias
argumentativas;
apropriação de mecanismos lingüísticos capazes de veicular o texto por meio de
diversos portadores, inclusive os que envolvem o uso de tecnologias;
adaptação de textos aos contextos situacionais;
compreensão da escrita como uma modalidade de interação social, portanto, de
caráter comunicativo.
A partir de 2002, os PCN foram complementados pelos PCN +: Orientações
Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais; as
conceituações apresentadas no documento original foram retomadas e expandidas,
apresentando mais pontos de convergência com as orientações da LT, como, por
exemplo, a visão pragmática em relação aos recursos lingüísticos. Os PCN+
apresentam um novo quadro de competências e habilidades - anexo IV - e detalham
essas características.
O documento subdivide o quadro original, separando as competências em gerais
e específicas. As unidades temáticas encontram-se apresentadas sob três novos
aspectos: usos da língua, diálogo entre textos, ensino de gramática e o texto como
representação do imaginário e a construção do patrimônio cultural.
Em relação às competências gerais, não existem alterações significativas, à
exceção da unidade Ensino de Gramática. Essa unidade compreende a necessidade de
articular as redes de diferenças entre a linguagem oral e escrita e seus códigos sociais,
contextuais e lingüísticos. Nesse sentido, o documento vem contemplar a relação entre
estudo
uso dos recursos lingüísticos, a ser realizado de forma contextualizada,
reiterando como Koch (s/d) 17 a necessidade de:
(...) Uma revitalização do estudo da gramática: não, é claro, como um fim em si mesma, mas com o objetivo de evidenciar de que modo o trabalho de seleção e combinação dos elementos lingüísticos, dentro das variadas possibilidades que a gramática da língua nos põe à disposição, nos textos que lemos ou produzimos, constitui um conjunto de decisões que vão funcionar como instruções ou sinalizações a orientar nossa busca pelo sentido.
No que se refere às competências específicas, compreendem tópicos de
competências os seguintes aspectos, relacionados pelos PCN+ (BRASIL, 2002, p.72-
74) no quadro de competências e habilidades a serem desenvolvidas em Língua
Portuguesa:
Usos da língua
1- Língua falada e língua escrita; gramática natural; automatização e estranhamento.
2- Linguagem; tipologia textual.
3- Tipologia textual; interlocução.
17 Disponível em: http:// www.unb.br/abralin. (Acesso em 20/11/2006).
4- Gíria e contexto.
5- Língua e contexto.
Ensino de gramática: algumas reflexões
1- Gramática, lingüística; gramaticalidade.
2- Gramática normativa; erro.
3-Gramática normativa; ciência versus achismo.
Diálogo entre textos: um exercício de leitura
1- Função e natureza da intertextualidade
2- Protagonista do discurso; intertextualidade.
Em relação às competências específicas, de um modo geral, configuram-se as
seguintes recomendações do documento:
Usos da língua:
Reconhecer os níveis e as possibilidades de uso da linguagem em sua
diversidade, adequando-a de forma contextual, mediante intenções dos usuários.
Ensino de gramática: algumas reflexões
Diferenciar gramáticas normativa e descritiva, reconhecer e considerar as
diferenças entre oralidade e escrita e compreender a gramática em sua cientificidade,
bem como em seu caráter dinâmico.
Diálogo entre textos: um exercício de leitura
Esse segmento do quadro de habilidades e competências constitui-se como um
dos mais restritos. Nele, a intertextualidade encontra-se prevista, mas não descrita,
embora no decorrer do documento, seu papel encontre-se claramente como fonte de
produção textual.
O documento prevê a análise de recursos expressivos, de forma contextualizada
e o protagonismo como estratégia para o desenvolvimento da argumentação.
Com a breve análise do documento original (BRASIL, 1999) e de seu
complementador (PCN+, 2002), podemos observar, a seguir, suas identificações com
conceitos básicos encontrados na LT, quais sejam: o conceito de texto, as implicações
do contexto, os princípios de textualidade e a visão pragmática em relação aos recursos
lingüísticos como instrumentos para consolidação da unidade textual.
2. 4.1 Conceito de texto
Como prática social, o texto constitui-se como instrumento de manifestação
humana, capaz de inserir os mais diversos pensamentos num determinado momento. A
compreensão de aluno como um produtor de textos implica a aceitação de um sujeito
capaz de manifestar se socialmente, portanto, imbuído de intenções. A
intencionalidade, como princípio de textualidade, pressupõe um plano textual com
vistas a um interlocutor, aquele que pode vir a discutir, aceitar ou refutar um texto
produzido, de acordo com suas possibilidades contextuais cognitivas, lingüísticas e
espaço temporais.
Para os PCN (BRASIL, 1999) o aprendizado deve ser organizado por áreas de
conhecimento; os estudos em Língua estão reunidos sob a nomenclatura de
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias18, e, de acordo com o documento, devem
destacar o respeito à diversidade lingüística. O documento propõe também o re-
conhecimento do processo histórico de construção dos conteúdos estudados. Assim,
dizem os PCN:
(...) O aluno deve ser considerado como produtor de textos, aquele que pode ser entendido pelos textos que produz e que o constituem como ser humano. O texto só existe na sociedade e é produto de uma história social e cultural, único em cada contexto, porque marca o diálogo entre os interlocutores que o produzem e entre os outros textos que o compõem. O homem visto como um texto que constrói textos. (BRASIL, 1999, p.139)
18 Compreende as disciplinas de Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e Língua Estrangeira,
As orientações da LT, identificadas em Bronckart (1999), Koch (2005),
Beaugrande & Dressler e (1994) Beaugrande (1997) nos levaram a compreender o
conceito de texto por sua unidade e completude, sua natureza comunicativa,
marcadamente dialógica, concebido por necessários critérios para produção de
sentidos. Na linha desses pressupostos, dizem os PCN:
(...) A unidade básica da linguagem verbal é o texto, compreendido como a fala e o discurso que se produz, e a função comunicativa, o principal eixo de sua atualização e a razão do ato lingüístico. (...) A interação é o que faz com que a linguagem seja comunicativa. Esse princípio anula qualquer pressuposto que tenta referendar o estudo de uma língua isolada do ato interlocutivo (BRASIL, 1999, p.139).
A definição de texto nos PCN+ caminha na mesma direção. O documento
apresenta, de forma sucinta, que texto é um todo significativo e articulado, verbal ou
não-verbal (BRASIL, 2002, p.60).
Em relação à produção de texto, encontramos nos PCN+ (BRASIL, 2002, p.80)
um reconhecimento de que existe uma priorização no indicativo de ações voltadas para
a leitura:
Se priorizamos até agora procedimentos voltados para a leitura, isso se deve certamente à intenção de valorizar a formação do leitor competente nos múltiplos textos a que tem acesso. Entretanto, os procedimentos indicados especialmente quanto à recepção dos textos devem contribuir também para os processos de produção textual.
Essa priorização às atividades voltadas para a leitura conduzem, certamente, a
resultados significativos no que se refere ao desenvolvimento da escrita. No entanto,
compreendemos que as atividades de ler e compreender textos não resolvem os
problemas específicos da escrita. Na produção do texto escrito, a movimentação do
autor no uso dos recursos lingüísticos e contextuais acontece em direção diferente
daquela realizada pelo leitor.
Como se vê, as propostas para produção de texto em sala de aula, de acordo
com os PCN+, levam em conta o aluno como protagonista na produção e recepção de
textos e aponta para atividades possíveis. Assim, recomendam os PCN+ (2002, p.61):
Ser produtor de textos, falados ou escritos, e atuar como interlocutor e leitor requer o desenvolvimento progressivo de diversas habilidades e competências. Entre tantas, a correspondência com os colegas e com membros da comunidade
por fax e correio eletrônico (e-mail, Chat), por exemplo
é uma atividade que desenvolve essa competência.
Nesse sentido, os PCN reforçam a importância da relação entre a interação e
contexto de produção textual, considerando as situações comunicativas reais com
vistas a uma produção de texto que integre, com consistência, os princípios de
textualidade.
2.4.2 Implicações do contexto e princípios de textualidade
Ao discutirmos a organização do texto pela LT, compreendemos como as
condições contextuais, mais do que participantes, são formadoras da organização do
texto. Na mesma direção, indicam os PCN+ (2002, p.80):
Diante de uma dada proposta de produção, o aluno deve ter clareza sobre: - o que tem a dizer sobre o tema proposto, de acordo com suas intencionalidades; - o lugar social de que ele fala; - para quem seu texto se dirige; - de quais mecanismos composicionais lançará mão; - de que forma esse texto se tornará público.
Ao referendar o contexto como constituinte do processo de produção textual, o
documento compõe ponto de convergência de fundamental importância com os
pressupostos da LT. Observamos, por exemplo, a indicação da necessidade de
interlocução e a visão do produtor, no caso, o aluno, como protagonista do texto, numa
valoração da produção do estudante de ensino médio; além disso, o documento orienta
também para as formas de intertextualidade inerentes à produção textual.
Ainda vislumbrando os princípios de textualidade, encontramos no documento
uma preocupação com um trabalho que considere o uso dos recursos expressivos em
seus contextos de produção.
De acordo com Maingueneau, um texto garante seu sentido em relação a um
determinado contexto e não podemos atribuir o mesmo sentido de um texto para dois
contextos diferenciados (Cf. MAINGUENEAU, 2004, p.55). Encontramos ressonância
nos PCN (BRASIL, 1999, p.142):
A língua dispõe dos recursos, mas a organização deles encontra no social sua matéria-prima. Mesmas estruturas lingüísticas assumem significados diferentes, dependendo das intenções dos interlocutores. Há uma diversidade de vozes em um mesmo texto.
Dessa forma, o documento detém-se numa clara alusão aos princípios de
textualidade: intencionalidade, situacionalidade, aceitabilidade e intertextualidade,
enfatizando o papel da intencionalidade na elaboração da constituição de sentidos, a
preocupação com a recepção dos textos e sua aceitação, seu contexto situacional e a
circulação dos textos, reiterando uma visão de texto como evento comunicativo.
Ainda em relação à manifestação pela linguagem verbal, os PCN retomam a
indicação das atividades escolares como fundamentais para praticar a capacidade de
fazer-se sujeito a partir do texto, enfatizando a capacidade de reflexão e argumentação
(op.cit., p.143).
Compreender a língua é saber avaliar e interpretar o ato interlocutivo, julgar, tomar uma posição consciente e responsável pelo que se fala/escreve. Toda fala/escrita é histórica e socialmente situada, sua atualização demanda uma ética. Onde se aprende isso? A experiência escolar é necessária e, mais, deve ser uma necessidade sentida pelo próprio aluno.
2.4.3 - Visão pragmática em relação aos recursos lingüísticos:
Em relação à competência lingüística do aluno, de acordo com as orientações
dos PCN (BRASIL, 1999, p.131), o ensino médio:
Não está pautado na exclusividade do domínio técnico de uso da língua legitimada pela norma padrão, mas, principalmente, no saber utilizar a língua, em situações subjetivas e/ou objetivas que sejam graus de distanciamento e reflexão sobre contextos e estatutos de interlocutores
a competência
comunicativa vista pelo prisma da referência do valor social e simbólico da atividade lingüística e dos inúmeros discursos concorrentes.
Utilizando-se de uma abordagem pragmática, o documento confere, ao ensino
de Língua Portuguesa, a tarefa de capacitar o aluno para o uso da linguagem como
instrumento de sua manifestação, como expressividade prevista na capacidade de
manusear os recursos lingüísticos de forma apropriada, não no sentido das convenções
gramaticais estritas, mas no sentido da realização comunicativa mais eficaz, atributo
que se consolida na efetiva apropriação e no uso da linguagem escrita.
Pressupondo que os estatutos básicos relativos ao funcionamento da língua portuguesa foram aprendidos ao longo do ensino fundamental, cabe ao ensino médio oferecer aos estudantes oportunidades de uma compreensão mais aguçada dos mecanismos que regulam nossa língua, tendo como ponto de apoio alguns dos produtos mais caros às culturas letradas: textos escritos, especialmente os literários.
Essas orientações visam ao emprego de recursos expressivos que desenvolvam
o processo de argumentação e, portanto, contemplam os princípios de textualidade,
com vistas à produção de um texto coeso e coerente. Todavia, contrapõem-se aos
procedimentos de aceitação passiva dos conteúdos impressos nos livros didáticos,
dando ênfase à produção do aluno.
O documento avança ainda para outras questões de relevância para o ensino da
língua, mas que não serão objetos de nossa reflexão, pois estamos atentos aos
aspectos indicativos da constituição do sujeito escritor em sua relação com o outro e a
intencionalidade como fonte de construção coesa e coerente da argumentatividade.
De forma geral, acreditamos que pudemos realizar, neste capítulo uma
explicitação de conceitos que podem iniciar o suporte de uma proposta para o ensino
da produção textual em sala de aula de Língua Portuguesa, tarefa que realizaremos no
próximo capítulo.
CAPÍTULO III Limites e possibilidades para o tratamento da
produção textual no contexto escolar
Neste capítulo, analisamos os dados obtidos na pesquisa-piloto e apresentamos
alguns procedimentos didáticos para o tratamento da produção de textos dissertativos,
os quais podem auxiliar o professor a aprimorar sua prática pedagógica. As sugestões
apresentadas fundamentam-se nos resultados obtidos na pesquisa-piloto, explicitada
no capítulo 1; em teorias da Lingüística Textual, mais especificamente as que se
referem aos princípios de textualidade, de Beaugrande e Dressler (1994) e Beaugrande
(1997), e nas diretrizes dos PCN (BRASIL, 1999; 2002) que visam a orientar a produção
textual.
3. 1 Análise dos dados obtidos
Na pesquisa-piloto, explicitada no primeiro capítulo, procuramos observar como
os professores trabalhavam com a produção de texto em sala de aula e, ainda, verificar
se esse trabalho estava embasado em teorias de texto atuais.
Para a realização da análise de dados, selecionamos as principais prioridades
apontadas por docentes e alunos, as quais caracterizavam as atividades mais
praticadas nas aulas de produção textual. Organizamos os dados obtidos em dois
quadros-síntese apresentados a seguir. O quadro III refere-se às respostas dadas por
ambos às questões objetivas, mediante as quais pudemos comparar as afirmações de
professores e alunos. Por sua vez, o quadro IV diz respeito às respostas dadas pelos
professores às questões dissertativas, relativas aos conceitos teóricos que
fundamentam sua prática didático-pedagógica no ensino da produção textual.
Os dados apresentados nesses quadros permitem-nos responder,
respectivamente, duas de nossas perguntas de pesquisa, a saber:
1- Como os professores trabalham a produção de texto em sala de aula?
2- Os professores da rede pública estadual embasam suas aulas de
produção de texto em teorias atuais como a Lingüística Textual?
A terceira e última pergunta de pesquisa será respondida mais adiante,
quando apresentarmos alguns procedimentos que podem nortear o trabalho com
produção textual em sala de aula:
3- Que procedimentos didáticos podem ser adotados por professores do
terceiro ano do ensino médio em aulas de produção textual?
Quadro III Prioridades apontadas por professores e alunos
Principais Prioridades
Professores Alunos
Atividades de preparação
1º lugar Relação leituras- cotidiano social
Realização de leituras individuais com questões para interpretação
Proposta/realização de produção textual:
1º lugar Orientação do Livro Didático como recurso do aluno
Orientações do professor
Intervenções no momento da escrita
1º lugar Adequação gramatical Adequação ao tema
Periodicidade apontada
1º lugar Quinzenal Bimestral
Razões para a periodicidade apontada Utilização, pelo professor, de sistema de correção mais detalhado, como os critérios estabelecidos na avaliação SARESP e em alguns vestibulares.
Aulas de Literatura Gramática ocupam muito tempo
Maior importância dada à preparação do aluno para produzir, motivando, proporcionando debates e discussões;
Excesso de alunos por classe, dificultando o trabalho de correção.
Excesso de alunos na sala, com muito barulho, dificultando a concentração para o desenvolvimento do texto.
Como podemos observar, as respostas indicam uma desarticulação em relação à
compreensão da aula de produção textual por professores e alunos e levam-nos a
afirmar que:
- em atividades de preparação, a prática de leitura, seguida de questões para
interpretação textual, caracteriza-se como fonte de produção do texto pelo aluno;
- a reflexão e a discussão sobre as leituras realizadas não se caracterizam como
prioridade principal para os professores;
- o livro didático é usado como orientador da prática docente;
- os textos são produzidos num período de cerca de quinze a trinta dias;
Os dados obtidos conduzem-nos a inferir, então, que o contexto atual do ensino
de produção de texto não contribui para a melhoria da qualidade do texto do aluno, uma
vez que aspectos importantes para a constituição de uma escrita mais coerente não
são priorizados, como discussões sobre as leituras realizadas, que propiciariam a
interação entre estudantes, tão importante na construção do conhecimento. Além disso,
não constituem prioridade da aula, a realização de procedimentos para a produção
textual, os quais poderiam auxiliar os alunos a compreenderem melhor o processo de
comunicação por meio da escrita.
Em outros termos, os dados revelam que as condições para a produção textual
não propiciam adequadamente o desenvolvimento da competência textual dos alunos,
conforme demonstramos a seguir:
1- local de produção: as salas de aula apresentam número elevado de alunos, fato que
dificulta a concentração;
2- momento da produção: em atividades preparatórias de produção textual, são
priorizadas leituras individuais, que, de acordo com os professores, relacionam-se ao
cotidiano social, ou seja, a questões sociais mais abrangentes, como, por exemplo,
meio ambiente, questões políticas nacionais, pena de morte etc. Além disso, em oitenta
por cento dos casos, o professor não realiza orientações ou intervenções no texto do
aluno no momento da produção textual e, nos casos em que essas intervenções
acontecem, os comentários são, prioritariamente, de ordem gramatical. Por fim, ele
demora um período de quinze a trinta dias para corrigir os textos dos alunos, fato que
pode prejudicar o desenvolvimento da produção pelo aluno, que perde a oportunidade
de diálogo com o próprio texto.
3- produtor: o aluno, após um período de preparação para a escrita, recebe a
incumbência de dissertar sobre um determinado tema trabalhado. Para a realização da
tarefa, apóia-se, principalmente, em dois suportes: o livro didático e as orientações do
professor;
4- interlocutor: no contexto escolar, o único leitor do texto do aluno é o professor, fato
que constitui a produção textual em tarefa a ser cumprida sem maiores objetivos
interacionais.
Com a finalidade de delinear melhor como os professores trabalham a produção
textual, respondendo, assim, à nossa primeira pergunta de pesquisa, discutimos a
seguir algumas características que envolvem esse trabalho em sala de aula do ensino
médio.
3.1.1 Características da produção de texto em sala de aula
Preparação para a escrita
De acordo com nossa pesquisa, os professores consideram que a leitura e a
interpretação de textos apresentam-se como atividades prioritárias na preparação para
a produção textual. Contudo, isso não é, de fato, priorizado no momento da produção,
conforme mencionamos anteriormente.
Não são raros os estudos que consideram a leitura como atividade fundamental
para a melhoria da escrita. Como já observamos, as diretrizes dos PCN orientam e
priorizam tais atividades, bem como a diversificação de textos a serem trabalhados em
sala de aula. Entretanto, esse documento alerta para o fato de que os textos devem ser
produtos de um processo histórico, social e cultural, em razão da ação dialógica entre
os interlocutores, que se manifestam em seus textos e por seus textos são
caracterizados socialmente. Nessa ótica, o aluno do ensino médio deve ser
considerado no papel de produtor de textos, manifestando-se e inserindo-se
socialmente. Compreendemos que, para que isso ocorra, os processos de interação
compõem-se como atividade fundamental
fator que também não foi privilegiado pelo
professor no momento da produção textual de forma que a produção realizada não se
constitua apenas em uma reprodução.
Dessa maneira, as leituras de textos diversos auxiliam na composição de novos
textos, tanto no que se refere a seus aspectos formais quanto no que se refere ao
desenvolvimento argumentativo, em conseqüência do princípio da intertextualidade,
estudado no capítulo 2. O professor do ensino médio deve então considerar que, ao
produzir seu próprio texto, o aluno escritor precisa lançar mão de uma série de
estratégias cognitivas para que possa recuperar, transformar e ajustar o conteúdo das
leituras realizadas às características do novo contexto para o qual se volta sua
produção, ou seja, ele precisa dialogar com o texto, retomando-o em discussões nas
quais possa analisar diferentes pontos de vista, estabelecer comparações, questionar
conceitos apresentados, elaborar seu próprio ponto de vista e produzir seu texto.
O docente também deve considerar que nem sempre uma produção escrita é
decorrente de uma leitura, mas de situações específicas que requerem um texto escrito
em situações de comunicação reais, como, por exemplo, a elaboração de textos
informativos e de propaganda e a divulgação de pesquisas realizadas. Assim, para a
realização da produção textual, deve ser levado em conta que o produtor precisa
organizar um planejamento de escrita que preveja os interlocutores e as características
contextuais, o que significa que deve superar modelos adquiridos e adequar seu texto
ao contexto comunicativo em questão.
Orientações no momento da produção textual
Nossa pesquisa revelou que, para os professores, é mais importante garantir a
seqüência de conteúdos escolares presente nos livros didáticos do que propor
atividades de interação em sala de aula e que, para os alunos, os apontamentos
realizados pelos docentes, com base em tais conteúdos, são considerados indicadores
para a constituição de seus textos. Esses dados permitem-nos observar as relações de
autoridade presentes nas situações de ensino e aprendizagem, pois, para professores e
alunos, existe a noção de que algumas condições e informações devem,
obrigatoriamente, ser localizadas no texto produzido, pois são aquelas encontradas nas
orientações do livro didático.
Nesse sentido, entendemos que essa noção condiciona uma postura de trabalho
voltada para a assimilação de conhecimentos consagrados como saberes social e
historicamente reconhecidos e encontra lugar de destaque nas atividades
desenvolvidas, preterindo as que incentivem o questionamento, a pesquisa e a
produção. Tal postura contribui para a passividade como característica da
aprendizagem e não auxilia no desenvolvimento de uma argumentatividade esperada
para o nível de ensino médio, o que implica, em parte, as dificuldades para a produção
da coerência textual. Assim, a artificialidade das situações de produção e a falta de
objetivos para a produção de um texto tendem a reforçar as situações de reprodução e
a dificuldade de encadeamento de idéias, conforme apontado pelos professores
entrevistados em nossa pesquisa.
Por conseguinte, o momento da produção de texto deve corresponder ao
momento em que o aluno possa articular seus conhecimentos às situações de
produção, tendo em vista um interlocutor possível. Dessa forma, quanto mais reais
forem os motivos para a produção textual
sejam as relações com a comunidade, a
interferência em situações do cotidiano, as necessidades e os gostos pessoais ou de
um grupo cultural
menos artificial será o trabalho em sala de aula e mais significativa
será a realização da produção de texto do aluno.
Nesse sentido, compreendemos que um ponto de partida para o professor, no
desenvolvimento da produção textual de seus alunos, deve ser a promoção de uma
situação de comunicação efetiva, na qual os estudantes possam fazer uso de estudos,
análises, comparações e reflexões diversas, como meio para aprimorar sua capacidade
argumentativa e fortalecer a constituição de seus textos.
Observamos que a participação do aluno em debates acerca de temas de seu
cotidiano, de questões locais relacionadas a seu bairro, sua cidade, sua escola podem
vir a compor uma fonte mais significativa para a construção da coerência textual do que
assuntos ou temas mais complexos, para os quais seu contexto cognitivo e situacional
não estejam preparados. Nossa experiência demonstra que o ambiente escolar, como
qualquer espaço social, é rico em situações de contraposição de idéias. Conflitos entre
alunos, problemas relacionados à convivência entre os diversos grupos, aspectos
relacionados à conservação do prédio são questões éticas que podem ser discutidas
nesse espaço. O debate de aspectos como esses pode gerar textos de relevância para
seus usuários, que encontram, no próprio espaço de produção, um vasto campo para a
circulação de suas opiniões.
Além disso, temas mais abrangentes, inseridos em contextos sociais mais
amplos, poderão ser discutidos no bojo das questões locais. Por exemplo, ao tratarem
de problemas de saneamento básico do bairro ou da poluição de um rio da cidade, os
alunos certamente poderão avançar para questões mais amplas relativas ao meio
ambiente.
Em relação aos aspectos formais do texto, entendemos que o trabalho com o
maior leque possível de textos na sala de aula pode ser intensificado, objetivando
oferecer ao aluno visões diferenciadas acerca dos mais diversos temas e das formas de
concebê-los na escrita. Desse modo, do panfleto entregue na rua aos periódicos de
renome, existem várias maneiras de se estudar a organização textual. Logo, a presença
do livro didático como recurso do aluno ou como norteador de seqüências do conteúdo
a ser desenvolvido não pode se constituir em um limite para a prática docente.
No que se refere especificamente ao texto dissertativo, que foi privilegiado na
pesquisa, ressaltamos que a seqüência esperada para esse tipo textual precisa ser
desenvolvida em razão de objetivos delineados anteriormente. Cabe, assim, ao
professor explorar as várias possibilidades de apresentação e organização textual e
estudá-las com seus alunos, a fim de efetivar, de acordo com Koch e Travaglia (2005),
a apropriação de superestruturas, a compreensão dos elementos coesivos e a
aquisição das bases informativas dos textos a serem produzidos.
Quanto ao uso do livro didático, reconhecemos seu papel no contexto da escola
pública, por se apresentar como um o recurso didático mais acessível a alunos e
professores. Mas entendemos que essa ferramenta deve ser conduzida pelo professor
e não o contrário.
Intervenções no momento da escrita
Nossa pesquisa revelou que a maioria dos professores entrevistados não realiza
intervenções nos textos de seus alunos no momento da produção em sala de aula,
deixando para tratar de possíveis problemas numa correção final. Esse dado leva-nos a
discutir dois aspectos: a importância da intervenção do professor no processo de
elaboração do texto e o tipo de intervenção relevante.
Entendemos que as intervenções do professor no momento da produção textual
do aluno são necessárias e contribuem para demonstrar caminhos possíveis para a
constituição da coesão e da coerência na retomada do texto produzido e no
questionamento de aspectos da argumentação e das demais estratégias que garantam
sua textualidade.
A cada fase de produção de um texto, o professor pode discutir com os alunos o
desenvolvimento da progressão textual, apontando, por exemplo, para formas e
elementos em que se possam efetivar relações referenciais, discutindo seu
funcionamento no texto que está sendo construído.
Tendo em vista que a coerência pode ser determinada, em parte, pela
linearidade, logicidade, organização e consistência do texto e que se consolida em
momentos de interação, a perspectiva do outro no planejamento do texto deve levar em
conta seu contexto cognitivo, situacional e lingüístico e constitui fator a ser analisado
ainda no processo de produção textual considerado como ação comunicativa.
Alguns professores afirmaram em nossa pesquisa que o processo de correção
do texto é demorado devido às condições de trabalho em que se encontram ou devido
às estratégias de correção que utilizam. Verificamos que eles adotam estratégias de
correção pautadas nas técnicas de correção de provas seletivas, revelando a
preocupação em assimilar essas fórmulas à sua prática docente, como as encontradas
na avaliação institucional SARESP e nos vestibulares.
Entendemos que a redação como atividade seletiva, classificatória, ou mesmo
diagnóstica tende a enquadrar-se em padrões, modelos e formas que podem levar o
aluno a transformar-se num reprodutor de idéias, conceitos e padrões, e o professor,
em um corretor de textos padronizados.
Nossa pesquisa indica, ainda, que os docentes que utilizam o momento da
produção escrita para intervir nos textos dos estudantes preocupam-se principalmente
com a adequação gramatical: correções ortográficas, pontuação, concordância verbal e
nominal etc. Esse dado encontra contradição em relação às respostas dos alunos, os
quais não apontam para uma preocupação com o desenvolvimento dos aspectos
gramaticais de forma específica no desenvolvimento de seus textos.
Além disso, os dados obtidos revelam que as atividades de ensino que
privilegiam o desenvolvimento do texto em sua unidade e completude como as práticas
voltadas para a reflexão e argumentação ocupam um segundo plano no contexto
pesquisado.
Tais dados refletem, certamente, o dilema dos professores em resolver as
dificuldades de competência lingüística que seus alunos apresentam e que, em parte,
resultam na conseqüente deficiência na constituição da coesão, pois, conforme Koch e
Travaglia (2005, p.37) o mau uso de elementos lingüísticos e estruturais pode criar
incoerência, normalmente em nível local.
Ressaltamos que, embora a utilização adequada de recursos coesivos garanta a
articulação do conteúdo do texto, esses recursos podem ser organizados de acordo
com sua função, como vimos no quadro I (p. 35). Dessa forma, entendemos que o
estudo de aspectos gramaticais de forma contextualizada propicia o uso dos recursos
lingüísticos com o objetivo de garantir a unidade do texto.
A reflexão sobre o ensino da gramática descontextualizada tem sido uma das
questões mais debatidas nas últimas décadas na rede pública de ensino e, em relação
a isso, vale ressaltar com Coste (2002, p.13) que:
Devemos considerar que a competência comunicativa abrange a competência lingüística, ou pelo menos, controla o seu uso, não deixando de reconhecer que a gramática tem suas próprias leis e que a competência comunicativa só pode realizá-la e assumi-la com fins pragmáticos, respeitando o seu alcance e as suas tolerâncias.
Nessa perspectiva, entendemos serem necessárias atividades em que os alunos
possam escolher, experimentar e revisar os elementos léxico-gramaticais usados em
seus textos, uma vez que o dilema relativo ao trabalho com aspectos gramaticais se
justifica ainda devido ao histórico processo exclusivo em que um ensino tradicional
privilegiou a correção gramatical em detrimento aos demais aspectos da linguagem. De
acordo com Beaugrande (1997, p.28):
O privilégio da gramática em detrimento da retórica na educação escolar, fato que se estende até os tempos modernos, reflete a política de se garantir mais preferencialmente o acesso ao conhecimento, gratificando o alto letramento e o dialeto padrão do que as habilidades de comunicação popular.
Para o privilégio da situação comunicativa, acreditamos que, no momento da
produção textual, a correção gramatical não deveria se constituir como uma prioridade
de intervenção, mas transformar-se numa atividade a ser realizada na revisão e
reescrita do texto. Essa atividade pode acontecer na correção coletiva de um dos
textos, escolhidos pelo professor a fim de que sejam estudados aspectos relevantes
para o momento, tendo em vista a maior necessidade da classe. Acreditamos também
que esse trabalho constitui uma abordagem mais significativa para o estudo dos
aspectos gramaticais em sala de aula, de forma contextualizada, com objetivos claros e
mais interessantes para o aluno.
Diante disso, consideramos que o dilema relativo ao ensino de gramática no
ensino médio pode ser superado, tendo em vista que, nesse nível de ensino, o
amadurecimento dos alunos permite uma abordagem pragmática e conceitual mais
incisiva em relação aos recursos lingüísticos, desde que relacionada aos aspectos de
produção textual como atividade intencional, com finalidades predeterminadas por seus
usuários. Dessa maneira, diferenciamos o estudo sobre os recursos lingüísticos de um
estudo para o uso dos recursos lingüísticos.
Periodicidade para a produção textual
Dos problemas apontados pelos professores em relação à preocupação com o
tempo despendido nas atividades das aulas, percebemos a existência de prioridades
diferenciadas para os dois segmentos: atividades gramaticais, para os professores,
Literatura e Gramática, para os alunos. Além disso, a pesquisa aponta para um
desacordo em relação à periodicidade com que os alunos produzem textos
de
quinzenal a bimestralmente.
Na seção anterior, acreditamos ter explicitado nossa visão acerca do papel do
ensino relativo aos aspectos gramaticais. Em relação à Literatura, entendemos que os
textos literários devem compor o acervo de pesquisa e a análise da sala de aula,
constituindo fonte de intertextualidade, discussão e produção de textos para consultas,
como, por exemplo, a elaboração de resenhas a serem depositadas na biblioteca da
escola.
Em relação à periodicidade da produção de texto em sala de aula apontada na
pesquisa-piloto, os dados obtidos remetem-nos rapidamente para uma reflexão sobre o
conceito de texto subjacente à prática docente, a ser discutido a seguir, com base nas
respostas dos professores para as questões dissertativas, conforme o quadro IV, cujos
dados permitem observar que a prática docente desvelada em nossa pesquisa-piloto
assinala a fragilidade dos docentes no que se refere aos aspectos teóricos da
linguagem. Na seqüência realizamos a análise das respostas dos professores.
Quadro IV Resumo das respostas dos professores às questões abertas:
Prof. Texto Dificuldades dos alunos
Autores indicados
Cursos
1 Tem que ser coerente, coeso e apresentar uma estética favorável.
Organização das idéias
Faraco Tecendo Leituras
2 Texto é idéia, é comunicação, é a linguagem verbal ou não-verbal. O texto dissertativo é opinativo. A estrutura do texto dissertativo é a de um texto de opinião.
Argumentação Bakhtin Teia do Saber Letra e Vida
3 Sem resposta Visão da escrita com fim em si mesma
Bakhtin Koch
Nenhum
4 Um bom texto é aquele que atende exatamente aquilo que foi proposto.
Organização das idéias Erros de ortografia Erros de concordância Extensão nos períodos Perda da noção do sujeito da frase
Ezequiel Theodoro da Silva.
Teia do Saber
5 Um texto tem que atender a uma
determinada estrutura, à proposta do tema, ser coerente e ter uma boa adequação em relação à morfossintaxe.
Organização das idéias
Não citou Nenhum
6 Um texto coeso e coerente que demonstre com clareza seus conhecimentos e ponto de vista. No caso de dissertação, que apresente argumentação capaz de sustentar a tese.
Coesão Coerência Pontuação Ortografia
Douglas Tufano
Nenhum
Verificamos que as respostas acima apresentadas, com exceção da resposta do
Prof. 2, não indicam um conceito sobre texto, mas apontam para características gerais
a serem encontradas num texto: aspectos relativos à coesão e coerência textual, o
desenvolvimento argumentativo, o atendimento ao tema proposto e aspectos
gramaticais diversos, o que nos leva a afirmar que existe, para as aulas de produção
textual, uma preocupação incisiva em relação à forma em detrimento aos seus
objetivos. Ressaltamos que o conceito de texto como manifestação humana a partir de
sua noção de unidade significativa e de sua natureza comunicativa não se apresenta
contemplado.
Além disso, os professores não relacionam nenhuma teoria da linguagem em
que baseiam suas aulas, tendo indicado autores variados, sendo que das seis
respostas, Bakthin aparece por duas vezes e dois autores de livros didáticos também
aparecem duas vezes. Diante desse quadro, não pudemos definir uma linha teórica da
linguagem a ser seguida pelo professor; em especial, não pudemos estabelecer uma
fundamentação teórica para o ensino da produção textual, voltada para os princípios de
textualidade ou para uma função social da escrita.
Conseqüentemente, em relação às dificuldades apresentadas pelos alunos,
observamos que os principais problemas se referem à progressão textual: organização
de idéias e argumentação, conforme relatado pelos professores, além daqueles
relacionados ao uso adequado dos recursos lingüísticos e da dificuldade em garantir a
coesão e a coerência.
A fim de relacionarmos esse perfil teórico à prática docente e, objetivando
responder à nossa segunda pergunta de pesquisa, aprofundaremos, a seguir, a
discussão dos aspectos apontados em nossa pesquisa, relativos à conceituação teórica
dos professores e a produção textual em sala de aula.
3.1.2
Concepções teóricas dos professores
Nessa categoria, analisamos os dados relativos à conceituações teóricas dos
professores e estabelecemos relações com a prática apresentada na seção anterior.
Conceito de texto para os professores
Sobre o conceito de texto, observamos que os professores se preocuparam em
definir como deve ser um texto. Nenhuma das respostas relacionou o texto às suas
especificidades de unidade e completude, mas apontaram para uma valorização de
aspectos formais e gramaticais, como podemos constatar nas seguintes respostas:
Num texto dissertativo temos que colocar a opinião, mas antes a estrutura do texto dissertativo, que é um texto de opinião. (Prof. 2, grifo nosso)
Um texto tem que atender a uma determinada estrutura,
à proposta do tema, ser coerente e ter uma boa adequação em relação à morfossintaxe.
(Prof. 5, grifo nosso)
Observamos, ainda, a relação entre as conceituações definidas pelos
professores e os critérios de correção19 do SARESP
anexo IV - para as provas de
redação, cujos aspectos definidos são: atendimento ao tema solicitado, atendimento à
estrutura do texto dissertativo, conhecimento dos mecanismos lingüísticos da
dissertação, domínio da norma padrão e elaboração de proposta de intervenção em
relação ao tema trabalhado.
19 Manual de redação SARESP 2004. Documento elaborado pela Secretaria de Estado da Educação em convênio com a Fundação Carlos Chagas e a Fundação para o Desenvolvimento da Educação de São Paulo, enviado anualmente para as escolas, no período de aplicação da prova.
Conforme já mencionamos, a questão do conceito de texto dos professores
precisa ser analisada em relação à questão anterior, em que professores e alunos
indicam a produção textual como atividade realizada num período variável de quinze a
trinta dias, desconsiderando a possibilidade de outras atividades de escrita,
possivelmente realizadas durante as aulas como também sendo produções textuais.
Compreendemos que a prática de produção textual em sala de aula precisa ser
constante e pode ser efetivada por meio de diversas maneiras, desde os registros do
aluno relativo às pesquisas, explicações e impressões sobre temas estudados até a
produção de um texto específico para divulgação.
Vale lembrar que os PCN valorizam o protagonismo do aluno na produção
textual e apontam para atividades de produção textual em que haja o contato com
textos de colegas, como a realização de correspondências constituindo formas de
interação entre os interlocutores. Desse modo, a produção de texto de forma pontual,
para treino ou avaliação, pode implicar a reprodução de modelos e repetição de
jargões, frases feitas e de efeito que, em muitos dos casos, comprometem a coerência
global.
Principais dificuldades dos alunos na produção de textos
Em relação às dificuldades mais presentes na produção textual dos alunos,
destacam-se, de acordo com as respostas dos professores, a progressão textual, o
desenvolvimento da idéia central, a coerência e a argumentação.
O contexto de produção analisado em nossa pesquisa-piloto explicita que, em
sala de aula, não se tem realizado atividades que promovam o desenvolvimento da
argumentatividade em contextos de interação, visando a uma situação de comunicação
real. Considerando com Koch e Travaglia (2005, p.37) que:
(...) Não existe o texto incoerente em si, mas que o texto pode ser incoerente em/para determinada situação comunicativa, objetivos, destinatário, outros elementos da situação de comunicação em que é produzido, uso dos recursos lingüísticos, etc. Por tudo isso, ao dizer que um texto é incoerente, temos de
especificar as condições de incoerência, porque sempre alguém poderá projetar um uso em que ele não seja incoerente,
podemos afirmar que o sujeito escritor tende a articular seu texto no sentido de garantir
a realização de suas expectativas, ou seja, realizar uma ação sobre o outro, que, por
sua vez, poderá encontrar no texto suas próprias expectativas, em razão do contexto
em que se encontra.
Tendo em vista que o princípio da situacionalidade envolve as relações dos
interlocutores em situações reais de comunicação, é a interação entre os sujeitos do
texto, compreendido como evento comunicativo, que o torna relevante. Assim,
entendemos que a produção de uma esperada coerência se torna mais complexa para
o produtor se estiver desvinculada de um objetivo final, portanto situações de
comunicação autêntica tendem a resultar em produções intencionais, com vistas à
construção de sentidos.
Perfil profissional e fundamentação teórica dos professores
Em nossa pesquisa, pudemos observar o perfil profissional de um quadro de seis
professores, um grupo com, em média, quinze anos de magistério: nenhum dos
entrevistados possui formação em nível de pós-graduação ou realiza qualquer outra
atividade de estudo fora de seu horário de trabalho que não esteja vinculada às
propostas de formação continuada da Secretaria de Estado da Educação e três
professores participam de cursos de capacitação oferecidos por esse órgão.
Dos cursos apontados, o Teia do Saber apresenta-se como uma das versões
mais atuais dessa modalidade de capacitação em serviço e conta com a participação
de várias universidades na gestão e execução dos módulos de estudo, apresentando
versões diferenciadas em cada região. Tal modalidade, que desenvolve estudos
relativos aos ensinos fundamental e médio, é realizada aos sábados e tem retorno no
quadro de evolução profissional.
Em relação ao curso Letra e Vida, esse se encontra relacionado aos problemas
de alfabetização; a modalidade Tecendo Leituras vincula-se ao Programa Nacional do
Livro Didático20 e tem como ênfase o trabalho com leituras no Projeto Hora da Leitura21,
ambas voltadas para o ensino fundamental. Cinqüenta por cento dos entrevistados não
participam de nenhuma forma de atualização acadêmica ou profissional.
O resultado apresentado indica que as discussões mais atuais sobre questões
pedagógicas ou específicas da área de linguagem não são acompanhadas por metade
do grupo entrevistado em forma de estudo regular, indicando, possivelmente, a
ausência de referenciais teóricos. Quando perguntamos sobre autores ou teorias da
linguagem, recebemos como respostas dois autores de livros didáticos e três autores de
referência em cursos e concursos promovidos pela Secretaria de Estado da Educação
de São Paulo.
A referência a autores de livros didáticos vem confirmar esse instrumento como
recurso relevante das aulas de Língua Portuguesa e relaciona a prática docente à
perspectiva da reprodução de atividades propostas nos livros didáticos e a ausência de
atividades diferenciadas, elaboradas pelo professor em torno de uma fundamentação
teórica estudada ou mesmo indicada pelos PCN.
Atividades com resultados positivos
Em relação às atividades que os professores pudessem apontar como atividades
em que obtiveram sucesso, foram relacionadas: a performance na avaliação
institucional SARESP, a contextualização de temas, a intertextualidade e estratégias
para a construção da argumentatividade.
Identificamos, por meio dessas respostas, que, embora os alunos tenham
definido a avaliação como a última de suas preocupações, no discurso do professor,
20 O PNLD
Programa nacional do livro didático, consiste na distribuição gratuita de obras didáticas para alunos da rede pública de ensino fundamental e médio, adquiridas por meio das verbas oriundas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. 21 O projeto incluiu, desde 2005, uma hora semanal, na carga horária do Ensino Fundamental, para atividades relativas a leitura.
está presente a preocupação com a nota ou com o desempenho do aluno como motivo
para a execução da tarefa de produção escrita. Em relação a esse aspecto, reiteramos
nossa visão de que o texto do aluno, nessa perspectiva, tende a se tornar reprodução
de modelos padronizados, em vez de constituir fonte de aprendizado.
Verificamos, ainda, que a avaliação SARESP aparece como motivação para a
realização de produções textuais, conforme observamos nos relatos de professores que
atuam em escolas cujos resultados alcançados nessa avaliação, encontram-se acima
da média do Estado. Ao serem solicitados a indicar pelo menos uma atividade para
produção de texto em sala de aula que considerassem ter obtido bons resultados, os
professores responderam:
Na preparação para o SARESP, usamos os cadernos de prova e discutimos a questão da obesidade. Eles prestaram muita atenção porque estavam se preparando para a prova. (Prof. 1, grifo nosso)
Na preparação para o SARESP, nas atividades de avaliação simulada que a escola realiza bimestralmente. (Prof. 2, grifo nosso)
A avaliação SARESP é citada como modelo de correção dos textos dos
estudantes pelos professores. Essa indicação reforça nossa preocupação relativa ao
texto como instrumento de avaliação e de realização de produções textuais como treino
para uma esperada competência a ser atestada por uma prova pontual.
Ainda quanto à indicação dos professores das atividades de sucesso, foram
apontados o trabalho com temas atuais e o uso de leituras como ponto de partida para
a escrita. Somente um professor abordou o desenvolvimento de debates:
Antes do debate, antecipo a leitura de um texto, depois nós fazemos um debate e, após este debate, a produção de texto. (Prof. 5, grifo nosso)
Como vimos, as respostas obtidas demonstram a ausência de atividades
voltadas para a interação, a interlocução para a produção de texto e a retomada dos
textos produzidos na efetivação de uma situação comunicativa completa. Não se
apresenta como hábito escolar, por exemplo, a divulgação dos textos produzidos pelos
alunos, aspecto que consideramos ser necessário na organização de procedimentos
para uma produção de texto produtiva.
Diante da análise realizada, pudemos perceber um indicativo das necessidades
do trabalho na sala de aula, que vai além da aquisição de modelos textuais.
Observamos que a produção escrita no contexto escolar precisa ser revista,
especialmente no que se refere à finalidade dos textos produzidos, ao uso e estudo dos
recursos lingüísticos e à concretização do texto como unidade de sentido.
Acreditamos que a escrita com fim em si mesma ou com finalidade apenas
avaliativa, acaba por descartar possibilidades de interação entre os alunos, e entre o
texto e os alunos, uma vez que a imagem de um leitor possível ou real se resume
apenas na figura do professor.
Nesse sentido, acreditamos que seja necessária a organização de
procedimentos de ensino voltados para a produção textual, tendo em vista o resgate da
natureza comunicativa do texto no contexto da sala de aula como forma de lhe atribuir
um caráter de prática social, em atividades voltadas para um objetivo real, no qual
estejam previstas a produção e a circulação de textos.
3. 2
Possibilidades para o tratamento da produção textual no ensino médio
alguns procedimentos.
Não é nossa intenção apresentar um novo modelo de ensino de produção
textual, nem tampouco pouco apresentar a criação de propostas metodológicas
inéditas. Nossa perspectiva é organizar, diante da pesquisa-piloto e do estudo teórico
realizados, alguns procedimentos para o tratamento da produção textual no ensino
médio, respondendo, dessa forma, nossa terceira pergunta de pesquisa.
3.2.1 Organização dos procedimentos
Procedimentos relativos à definição da situação comunicativa:
No que se refere aos procedimentos para a produção textual que passamos a
apresentar, partimos do pressuposto de que, realizada uma exposição inicial pelo
professor, os alunos se encontram motivados a realizar a atividade sugerida. A respeito
disso, o professor precisa estimular a classe para a produção de um texto do tipo
dissertativo-argumentativo, objetivando atender um determinado público. Para tanto, o
texto a ser produzido deve tratar de um tema relevante, de interesse coletivo e que
esteja relacionado o mais próximo possível da realidade cotidiana do aluno.
Além disso, deve ser considerado na produção textual o princípio da
intencionalidade (BEAUGRANDE,1997), que consiste nos objetivos da produção
textual, mediante um plano que o produtor espera ver cumprido. Considerando, como
Bernárdez (apud KOCH e TRAVAGLIA, 2005, p. 36), que no processo de um texto
coerente:
O falante tem uma intenção comunicativa; O falante desenvolve um plano global que lhe possibilita, tendo em conta os fatores situacionais etc., conseguir que seu texto tenha êxito, quer dizer, que cumpra sua intenção comunicativa; O falante realiza as operações necessárias para expressar verbalmente esse plano global, de maneira que, através das estruturas superficiais, o ouvinte seja capaz de reconstituir ou identificar a intenção comunicativa inicial.
é necessário que se estabeleçam os objetivos do texto a ser produzido, como, por
exemplo, a produção de um texto que discuta uma questão de destaque para o meio
em que se produz, a fim de que os interlocutores previamente definidos possam se
interessar pela leitura. O texto a ser produzido também precisa levar em conta os
veículos pelos quais será divulgado e as conseqüências de sua leitura.
Tendo em vista o princípio da situacionalidade (BEAUGRANDE, 1997), que
consiste, fundamentalmente, nos aspectos relativos ao contexto, ou seja, às relações
espaço-temporais, e, considerando, como Bronckart (1999, p.93), que
todo texto resulta de um comportamento verbal concreto, desenvolvido por um agente situado nas coordenadas do espaço e do tempo; portanto, todo texto resulta de um ato realizado em um conjunto físico, que pode ser definido por quatro parâmetros precisos: o lugar de produção: o lugar físico onde o texto é produzido; o momento de produção, a extensão do tempo durante o qual o texto é produzido; o emissor (produtor ou locutor): a pessoa (ou a máquina) que produz fisicamente o texto, podendo essa produção ser efetuada na modalidade oral ou escrita; o receptor: ou a(s) pessoa(s) que pode(m) perceber (ou receber) concretamente o texto.
acreditamos que os procedimentos apresentados a seguir contemplam a necessidade
de processos de interação na produção textual, bem como proporcionam o
desenvolvimento de um texto cuja coerência seja construída em uma situação de
comunicação efetiva em que se levam em conta os aspectos contextuais e os sujeitos
envolvidos. Propomos as seguintes atividades:
- os alunos podem realizar uma primeira produção de um texto dissertativo, elaborado
em grupo, a ser apresentado para duas classes, a classe de origem e uma classe
convidada, sendo ambas do 3º ano do ensino médio;
- as produções textuais de cada grupo podem ser realizadas em sala de aula e
entregues para o professor, que realizará uma leitura prévia a fim de observar e
relacionar os aspectos gerais a serem trabalhados;
- as produções textuais podem ser apresentadas, primeiramente, para a classe de
origem e, depois, para as duas classes juntas, em forma de leitura, para posterior
debate acerca dos temas pesquisados. As produções podem ser analisadas mediante
roteiro previamente trabalhado com o professor;
- as discussões decorrentes do debate podem ser registradas por todos os alunos, ou
por representantes dos grupos, em forma de relatório, a fim de que componham
material de consulta para a elaboração de um segundo texto, individual, dissertativo-
argumentativo. Para facilitar esse trabalho, o professor pode organizar um painel, com a
síntese das discussões realizadas;
- a apresentação dos textos coletivos e o encerramento do debate podem ser seguidos
de uma correção coletiva realizada pelo professor; a seguir, os textos dos grupos serão
revisados pelos alunos e organizados graficamente, passando novamente pela revisão
final do professor, para, posteriormente, serem afixados em local visível e de fácil
acesso para a leitura de um público maior;
- a produção do segundo texto deve ser caracterizada como a escrita de um texto final,
individual, que poderá tratar tanto das considerações do próprio grupo do aluno quanto
de outro grupo que ele julgue conveniente ou mais interessante;
- a produção do texto individual pode percorrer o mesmo caminho do texto coletivo, mas
o aluno pode escolher com quem realizará a troca; após essa etapa, ele entregará o
texto ao professor, que tecerá comentários gerais em relação aos aspectos positivos e
indicará as revisões necessárias a serem realizadas pelo autor, visando a publicação;
- as produções finais podem ser encaminhadas pelos alunos, de forma voluntária, para
publicação, a fim de que se garanta o respeito à sua vontade quanto à divulgação de
seu texto;
- as publicações dos textos podem se realizar em jornal mural, jornal da escola ou
periódico local, conforme as condições da escola; os textos devem permanecer
arquivados em pasta apropriada para que, ao final do ano, seja escolhido um deles, que
comporá o livro da classe e, posteriormente, o acervo da biblioteca da escola.
Procedimentos relativos ao estudo do tema
Na perspectiva da interação em sala de aula, a realização da pesquisa, da leitura
voltada para a aquisição de conhecimentos e a troca de informações tendem a ser mais
produtivas diante de uma situação problematizadora ou de um questionamento. Para
que isso ocorra, é necessário que o tema a ser estudado esteja relacionado a aspectos
do cotidiano do aluno, para o qual ele seja capaz de levantar hipóteses.
A título de exemplo, em nossa exposição, utilizaremos como mote o Carnaval,
tendo em vista que se trata de um evento de grandes proporções em nosso País e que
o ano letivo se inicia antes desse período. Além disso, consideramos que em torno do
tema existem situações polêmicas, tais como a euforia gerada pelo evento e suas
conseqüências, as mudanças da rotina da cidade, a priorização do assunto pela mídia,
entre outros.
O tema central, portanto, hipoteticamente eleito com os alunos, é: Brasil, o País
do Carnaval. Esse tema pretende trazer à tona diversas questões e não somente
retratar o período de festa, como também tratá-lo de forma crítica, pois inerente à
expressão País do Carnaval encontram-se, como dissemos, questões relacionadas a
polêmicas de várias ordens.
Objetivando contemplar o princípio da informatividade (BEAUGRANDE, 1997) e,
na perspectiva da interlocução, entendemos que, num primeiro momento, o professor
deve verificar os conhecimentos prévios dos alunos e estimulá-los para a pesquisa.
Nesse sentido, o professor pode realizar questionamentos relacionados aos assuntos
da pesquisa a ser empreendida pelos grupos por meio de questões como:
como surgiu a comemoração do Carnaval?
Vocês observam alterações nas vidas das pessoas nesse período?
O que acontece com os meios de comunicação durante o período?
O questionamento conduzido pelo professor pode tratar do levantamento de
questões relativas às vantagens e desvantagens do período de Carnaval para o País,
como as conseqüências sociais, econômicas, a erotização, o papel da mídia, entre
outros. Essa etapa objetiva atender ao princípio da informatividade, cujo conceito geral
consiste na apresentação das informações contidas no texto e que consolida o nível de
interesse do leitor.
Os conhecimentos prévios dos alunos sobre o assunto em questão podem ser
organizados e registrados pelo professor no quadro-negro e em folhas à parte, por
representantes dos grupos
cerca de oito alunos
cujo produto, constituindo uma
produção de texto preliminar, passa a compor o acervo da classe. Nesse momento, o
professor pode orientar a classe sobre o uso dos conhecimentos prévios como suporte
para a introdução do texto e como requisito na apresentação de uma nova informação,
aspecto importante na organização dissertativa.
Os apontamentos realizados com base nas questões iniciais devem ser
retomados em etapa posterior, para que se possa comparar aos levantamentos
realizados após a realização das pesquisas dos grupos. Ainda nessa etapa, o professor
pode sugerir e indicar material de pesquisa: leitura de livros, textos, músicas etc, que
contribuam para a produção dos grupos. Nessa etapa do trabalho, o professor,
provavelmente, estará promovendo o desenvolvimento de habilidades de leitura como
fonte de construção de conhecimento.
Com base no questionamento levantado, a classe pode ser dividida em grupos
de cerca de cinco alunos, compondo oito grupos, no caso de uma classe com a média
de quarenta alunos por turma. Para cada grupo, pode-se definir um subtema a ser
pesquisado, por exemplo:
Grupo 1 O processo histórico do Carnaval origens, tradições e a atualidade.
Grupo 2 Das marchas carnavalescas às canções de hoje.
Grupo 3
Carnaval e Mídia
o papel da televisão e dos demais meios de
comunicação.
Grupo 4 O Carnaval e a AIDS a euforia e a prevenção.
Grupo 5
A mulher no Carnaval
a erotização, a banalização do sexo e a exploração
do sexo feminino.
Grupo 6
Polêmicas do Carnaval
o financiamento das escolas de samba e fatos de
relevância social desenrolados no período.
Grupo 7
Turismo e Carnaval
a economia, a falta de segurança pública e a imagem
do Brasil como País do Carnaval.
Grupo 8 - O Carnaval em nossa cidade
principais acontecimentos: eventos,
mudanças na rotina e na movimentação da comunidade.
Ainda nesse momento, o professor pode introduzir uma leitura conjunta sobre o
tema, para a qual pode acontecer um momento de discussão coletiva com vistas à
realização de interpretação textual e, ainda, indicar outras fontes de pesquisa para a
classe. Cabe também ao professor apresentar aos alunos os possíveis métodos de
pesquisa, como a realização de entrevistas, enquetes, visita a instituições, bem como a
orientação geral para esse trabalho: o agendamento, a preparação das questões, as
formas de abordagem aos entrevistados etc., no desenvolvimento das formas de
linguagem em geral.
Nesse contexto, o professor deve visar ao atendimento do princípio da
intertextualidade na composição do novo texto, com base na consulta bibliográfica a ser
realizada, mas de maneira que não haja uma simples reprodução de textos originais,
nem a aceitação passiva de um único ponto de vista. Trata-se, também, do momento de
apresentar aos alunos as maneiras adequadas de uso de textos alheios, como as
formas de citação.
Procedimentos para a produção do texto coletivo
Após a realização do período de pesquisa, os grupos devem passar ao processo
de elaboração do texto em sala de aula. Antes do início do texto escrito, é necessário
definir com os alunos questões relativas à organização do trabalho,como:
- a distribuição de funções a cada componente do grupo, como, por exemplo,
organização dos dados obtidos e suas fontes, o redator responsável pela escrita do
texto no momento de seu desenvolvimento, o plano gráfico para apresentação do texto
final, o relator para a seção de apresentação e o revisor do texto produzido;
- a operacionalização das trocas por exemplo, o grupo um realiza a troca com o grupo
dois, o grupo três com o grupo quatro e assim sucessivamente;
- as normas gerais para a apresentação do texto e realização do debate, bem como as
normas éticas no trabalho a ser desenvolvido.
Durante o processo de escrita, o professor deve realizar intervenções relativas à
seqüencialidade, progressão temática e adaptação ao contexto dos interlocutores, ou
outros aspectos previamente definidos. A seguir, o professor pode apresentar um
roteiro de análise para os textos, cujo conteúdo deve se relacionar aos objetivos
traçados. Por exemplo, para o trabalho em sala de aula, voltado ao desenvolvimento e
à melhoria da progressão referencial, objetivando o aperfeiçoamento da
seqüencialidade do texto, a análise dos textos pode pautar-se no seguinte roteiro:
Quadro V Roteiro de análise para produção textual
Tema_______________________________________________________________________
Subtema_____________________________________________________________________
Título do texto________________________________________________________________
Identificação do(s) autor(es)_____________________________________________________
1-Em relação ao texto lido, os elementos abaixo são encontrados?
Sim Não Exemplo
-informações de conhecimento comum
-informações novas
-comprovação das informações por meio de citações,
exemplos, dados estatísticos, outros
2-Em relação ao encaminhamento para a conclusão: -o encaminhamento para a conclusão indica um
posicionamento claro, em relação a um ponto de vista?
- o encaminhamento para a conclusão apresenta-se
como uma constatação de fatos expostos?
3-Dos elementos a seguir, quais foram utilizados para o encadeamento da seqüência textual: -retomada de nomes/ expressões em diferentes
parágrafos com substituição por sinônimos
-uso de resumos que determinam termos/ expressões ou
idéias já expostas
Outras observações
Sugestões
Análise realizada por:
Data____/____/_____
A primeira versão do texto produzido deve ser entregue a outro grupo da classe,
que realizará um parecer sobre o texto lido, de forma escrita e por meio do roteiro
anteriormente apresentado. Terminada a atividade, os grupos devem devolver os textos
aos grupos de origem e cada grupo observará as indicações que recebeu para realizar
as mudanças que julgarem pertinentes.
Nesse momento, a presença do professor é fundamental para verificar,
acompanhar e orientar as alterações propostas, intervindo nas questões mais
complexas e, inclusive, observando as questões relativas aos aspectos de organização
do texto dissertativo.
Ao professor cabe, ainda, observar desvios relativos à elaboração da introdução
do texto, analisando de que maneira ela é elaborada, verificar a construção
argumentativa, sugerindo alterações, esclarecendo o uso adequado de conectivos, a
relação entre os parágrafos, a pertinência do conteúdo com o tema, entre outros.
Assim, realizada a produção de texto e após a entrega final para o professor,
este seleciona uma ou mais produções para realizar uma correção coletiva. Vale dizer
que, durante todo o processo de escrita dos alunos, o professor precisa acompanhar e
realizar observações para si próprio, as quais são organizadas por tópicos de
discussão, estudo e análise realizados com os alunos.
Ressaltamos que as intervenções gramaticais podem ser realizadas durante todo
o processo, desde que não se constituam em entrave para o desenvolvimento do texto.
No caso de produções em que o desenvolvimento do tema apresente uma dificuldade
para o grupo, a correção gramatical deve ser deixada para a última fase, antes da
apresentação final.
Na realização da correção coletiva, uma questão importante é abordar em
primeira instância os aspectos pertinentes ao tema trabalhado e sua relação com o
público para o qual é destinado, tendo em vista a clareza dos enunciados e sua relação
com o contexto de circulação do texto produzido. Em relação aos recursos lingüísticos,
o professor pode eleger, por exemplo, para um dos textos selecionados, o estudo de
concordância verbal e nominal; para outro, aspectos de pontuação; em outro, o uso de
conectivos e assim por diante.
O uso de textos diferentes pode tornar a atividade menos cansativa para os
alunos e o professor não corre o risco de rotular um texto como ruim, pode ainda
demonstrar que todos os textos podem ser melhorados. Além disso, ele não precisa,
necessariamente, explorar apenas os aspectos de falhas desses textos, mas,
principalmente, destacar construções bem elaboradas.
Realizado dessa maneira, de forma consciente e intencional, de acordo com o
contexto de produção, o estudo de aspectos gramaticais não se encontra realizado por
ele mesmo, mas remete às possibilidades de escolha de recursos léxico gramaticais
para uma melhor adequação do texto, diante do sentido desejado. Nesse sentido,
podem ser explorados, por exemplo, o emprego de artigos, a colocação dos tempos
verbais e sua manutenção no decorrer do texto, a manutenção da pessoa do discurso,
a articulação coesiva do texto, como no uso de nominalizações, expressões sinônimas,
nomes genéricos, hiperônimos ou indicadores de classe e elipse que contribuem para a
progressão textual.
Quanto ao modo de realização desse estudo, uma das alternativas é a
apresentação de um texto no qual o professor realiza as alterações possíveis, enquanto
explica aos alunos os conceitos pertinentes, sistematizando o conteúdo trabalhado no
quadro-negro para registros dos estudantes ou até utilizando-se do livro didático como
material ilustrativo.
Entendemos que essa etapa inicial, que denominamos etapa I, pode ser
realizada em, aproximadamente, seis aulas e corresponde a atividades de elaboração
da proposta, levantamento de conhecimentos prévios, eleição do tema, divisão dos
grupos e de subtemas, leitura e pesquisa, discussão dos grupos, troca de textos,
revisão e reescritas.
Procedimentos para a organização e realização do debate
Antes de iniciar essa nova etapa, que denominamos etapa II, os alunos devem
ser orientados a realizar o registro de observações acerca dos textos apresentados
pelos demais colegas, em relação aos quais desejam se manifestar na hora do debate,
que se inicia somente após a sessão de leitura dos textos. De acordo com as
possibilidades da escola, o texto pode ser projetado em tela para um melhor
acompanhamento do público.
As orientações para análise dos textos devem constar em um roteiro
previamente elaborado pelo professor de acordo com o momento e o objetivo do
trabalho, considerando-se que é o professor quem sabe quais são os aspectos
necessários a serem trabalhados com seus alunos.
No momento do debate, os alunos podem discutir o conteúdo, a forma e os
aspectos lingüísticos, manifestando, por exemplo, incompreensão de determinado
trecho lido; discordância em relação às informações que o constituem, questionamento
sobre a construção de um parágrafo que cause um efeito de contradição ou duplo
sentido; sugestões que contribuam para a coerência textual.
No momento da discussão, é importante o registro das principais teses
levantadas pelos grupos em cada subtema. Esse registro pode ser realizado
individualmente pelos alunos ou por representantes dos alunos. O material de registro
organizado pode vir a compor uma fonte de consulta para a elaboração do texto
individual, constituindo-se de um acervo de textos que o professor organiza na sala de
aula, em conjunto com periódicos, editoriais, reportagens, obras literárias e outros.
Terminada essa etapa, o professor realiza uma correção coletiva dos textos,
apontando de forma geral ou específica, para os aspectos positivos e os problemas
apresentados.
Para realizar a correção coletiva, o professor deve utilizar seus próprios registros,
organizados com base nos objetivos estabelecidos para o trabalho e por meio de
observações coletadas ao longo do processo de produção. Dessa maneira, a leitura
prévia dos textos dos alunos, bem como as observações realizadas no processo de
escrita dos textos pelos grupos e dos comentários e registros realizados no debate,
constituem fonte de indicações fundamental para o trabalho do professor.
Assim, consideramos importante que a seqüência de observações realizadas
seja sempre seguida de acordo com o roteiro oferecido aos alunos. Com o objetivo de
melhorar a escrita de forma a garantir o desenvolvimento de uma seqüência de idéias
de forma clara, o professor pode observar, por exemplo, os seguintes aspectos:
Aspectos relativos à coesão
A composição do parágrafo:
existe segmentação adequada?
- existe uma seqüência linear?
- existem inversões de frases constantes, que comprometem o sentido do texto
de forma global ou em nível local?
- como estão organizados os períodos?
- os alunos utilizam apenas orações coordenadas?
O uso adequado de conectivos:
- quais são os conectivos usados?
- existem conjunções usadas em sentido impróprio?
- há diversidade no uso dos conectivos ou os alunos incorrem em repetição do
mesmo termo?
Aspectos relativos a informatividade:
- que informações podem ser localizadas no texto?
- quais são os dados de pesquisa usados?
- como esses dados aparecem no texto
existem citações, referências,
exemplificação, etc?
Aspectos relativos à intencionalidade, aceitabilidade e situacionalidade
Em relação ao ponto de vista dos autores:
- trata-se de um texto opinativo?
- é possível verificar um ponto de vista defendido pelo grupo?
- que argumentos podem ser encontrados na elaboração da tese?
- existem argumentos relevantes?
- os argumentos utilizados são de fácil acesso e entendimento para os leitores
previstos?
- quais são os exemplos dados, as informações e opiniões encontradas?
- o texto apresenta uma conclusão?
Consideramos importante também esclarecer que, embora o professor esteja
atento para esses aspectos, cada um deles deve ser trabalhado de maneira específica.
Os conceitos de cada aspecto precisam ser trabalhados por meio de exemplos,
modificações no texto propostas pelos próprios alunos e comparações com a
construção original.
Ao final das discussões, torna-se ainda importante o momento de sistematização
dos conhecimentos. Os alunos devem registrar os conceitos aprendidos durante a aula.
Procedimentos para a produção do texto individual
Encerrada a etapa do debate e da devolutiva do texto coletivo com as últimas
observações do professor, passamos à elaboração do texto individual, cujo tema a ser
desenvolvido pelo aluno pode ter como foco o subtema de seu grupo, de outro grupo,
ou, ainda, apresentar uma abrangência mais ampla, de acordo com as condições do
aluno-produtor. A essa etapa do trabalho denominamos etapa III.
De acordo com os PCN (BRASIL, 1999), a interferência em produções textuais
próprias e alheias constituem objeto de estudo do texto. Ao propormos a troca de textos
entre os colegas para leitura e emissão de considerações escritas que registrem os
aspectos positivos, estamos proporcionando a realização conjunta de vários aspectos
do trabalho com a linguagem. À semelhança do que se realizou com o texto coletivo,
esse procedimento pode promover a divulgação dos textos, no experimento do princípio
da aceitabilidade (BEAUGRANDE, 1997); promover a avaliação como forma de
aprimorar o texto produzido, dada uma situação de interlocução e promover práticas de
leitura, compreensão, interpretação e análise textuais, empreendendo a seguir, um
estudo dos recursos lingüístico de forma contextualizada.
Para a realização da atividade, os textos produzidos devem ser entregues ao
professor, que realizará uma leitura prévia e anotará os pontos positivos e os pontos
críticos, com base nos objetivos traçados. Antes da troca de textos entre os alunos, o
professor deve apresentar e discutir com a classe o roteiro de análise22 a ser seguido
na leitura dos textos dos colegas. Dessa maneira, para a organização, orientação e
preparação da classe, o professor precisa:
- definir os aspectos a serem analisados nos textos;
- realizar uma orientação geral para toda a classe, de forma detalhada, em relação aos
aspectos a serem analisados, de acordo com o objetivo que espera atingir;
- orientar sobre as formas de registro da análise realizada: impresso padrão elaborado
para esse fim, verso da folha original, folha de caderno do aluno etc.;
- definir a operacionalização das trocas.
No decorrer das leituras dos textos trocados, cabe ao professor a mediação da
atividade, ou seja, ele necessita acompanhar a realização da análise com os alunos,
tirando dúvidas, questionando, estimulando a análise, observando se não há dispersão
para outras questões irrelevantes no momento. Cabe também a ele, mediante a entrega
dos textos produzidos, a revisão final, verificando, inclusive, se os aspectos de análise
foram realmente observados e se estão corretos.
Após essa fase, o professor deve realizar a última correção e devolver o texto ao
aluno com observações sobre os aspectos positivos e com os apontamentos para as
22 Consideramos que o roteiro em questão possa seguir o mesmo padrão do roteiro apresentado quando discutimos a produção de texto coletivo.
adequações necessárias. Em posse da correção do professor, o aluno deve realizar a
reescrita do texto. Consideramos importante que essa atividade seja realizada em sala
de aula para que os alunos possam esclarecer possíveis dúvidas durante o processo de
reescrita.
Divulgação dos textos produzidos
Retomando Beaugrande (1997), a textualidade se efetiva por princípios
dinâmicos que se constituem em processos de interação entre usuários. Nesse sentido,
consideramos como mais significativas as atividades de produção de texto escrito que
sejam realizadas com o objetivo de divulgação, uma vez que, sempre que produzimos
um texto, produzimo-lo para alguém, com uma finalidade. Assim, a produção de texto,
após a realização do debate, pode cumprir uma função social, em detrimento da prática
de responder questões de interpretação.
Os textos individuais dos alunos podem ser afixados em murais da escola ou da
classe, desde que seus autores se sintam à vontade para isso. A partir daí, os alunos
podem opinar e participar da escolha do texto ou textos que desejam remeter para
publicação. O professor pode ainda criar um espaço para comentários dos leitores dos
textos divulgados, os quais também podem ser afixados, durante um período de tempo,
no mesmo local onde se encontram os textos publicados.
Os textos produzidos podem, ainda, contemplar atividades mais diversificadas,
como o roteiro do locutor da rádio da escola, caso exista esse projeto; a representação
teatral de programas de televisão, a participação em seminários de outras classes e
várias outras atividades em que o aluno necessite organizar seu texto para uma
situação de comunicação efetiva.
De acordo com a relevância, o aprofundamento do tema trabalhado e mediante
as necessidades da classe, existem outras possibilidades para o desenvolvimento dos
textos, tendo-se em vista os princípios de textualidade e as situações de comunicação
efetiva, como, por exemplo, a possibilidade de criação de fóruns de discussão ou
grupos de pesquisa para o estudo e debate de temas sugeridos ou escolhidos a partir
de uma determinada relação, proposta pelo professor de Língua Portuguesa ou por
professores de outras áreas de conhecimentos. As atividades interdisciplinares
contribuem para o grau de informatividade e intertextualidade dos textos produzidos.
Entre as inúmeras possibilidades, consideramos as atividades de
correspondência, a partir da divisão dos alunos em grupos, de acordo com suas
preferências em torno de temas propostos pelos professores das diversas áreas. As
formas como essas correspondências podem se concretizar são muito diferentes, dada
a multiplicidade de situações pertinentes a cada unidade escolar. Sabemos que
algumas escolas contam com equipamento de informática e outras não, mas
compreendemos esse instrumental como um veículo dos textos, não como condição
para sua produção.
Para a realização de fóruns de discussão, torna-se necessária uma organização
específica dos grupos de alunos em torno de um grupo de pesquisa que venha a
compartilhar seus estudos, leituras e pesquisas e que troque impressões, opiniões,
informações e comentários acerca do objeto de estudo. Nesse caso, o
acompanhamento do professor em relação às discussões propostas e apresentadas é
fundamental para que se evitem dispersões, violações de normas de convivência ou
mudanças em torno dos objetivos estabelecidos. Para o acompanhamento das
discussões, o professor precisa ter livre acesso ao material produzido.
Cronograma de atividades
Etapa I Elaboração do texto coletivo
Aula nº
Atividade Procedimentos Responsáveis23
23 A divisão de responsabilidades implica a intensificação do papel de protagonista para o aluno, embora sejam da competência e responsabilidade geral do professor o acompanhamento e a intervenção em todas as fases do trabalho.
1 Definição de objetivos
Definição de intelocutores Levantamento dos conhecimentos prévios Levantamento de subtemas
Organização de grupos
Explicitação da proposta Definição da classe convidada Questionamentos acerca do tema
Discussão acerca das implicações do tema Orientação e organização de material para consulta
Professor Professor e alunos Professor
Professor e alunos
Professor e alunos
2 Leitura de textos diversos, pesquisas, entrevistas, compilação de dados
Início da atividade de construção coletiva do texto
Consulta ao acervo da classe e em situações extra classe Definição do ponto de vista Elaboração do plano geral do texto Registro e organização dos dados obtidos
Alunos
3 Divisão de tarefas Redator Relator Plano gráfico Revisão do texto preliminar após devolutiva do professor Reescrita do texto após a revisão final
Aluno 1 Aluno 2 Aluno 3 Aluno 4
Aluno 5
4 Interação Orientação para a análise com base em roteiro apresentado Trocas de textos entre os grupos Leitura, discussão e registro da análise
Professor
Professor Alunos
5 Revisão final do texto Correção coletiva Reescrita
Professor Alunos
6 Retomada do texto Leitura do texto pelo grupo e preparação para a apresentação aos demais alunos
Alunos
Etapa II Atividades de interação
Aula nº
Atividade Procedimentos Responsáveis
7 Realização do debate Orientação geral para a realização da atividade Apresentação dos textos em forma de leitura em voz alta para os colegas Discussão sobre os subtemas Registros acerca das teses apresentadas
Professor
Aluno Relator
Alunos Alunos
8 Análise de textos Trocas de textos entre os grupos Análise de textos por meio de roteiro apresentado pelo professor
Professor Alunos
9 Retomada dos textos pelos
grupos. Correção do professor. Revisão Final/Entrega.
Devolução dos textos para os grupos de origem Revisão Correção final
Professor
Revisor Professor
Etapa III Produção de texto individual
Aula nº
Atividade Procedimentos Responsáveis
10 Produção de texto dissertativo-argumentativo
Produção de texto em sala - Tema: Brasil: País do Carnaval Objetivo- discutir as questões relativas à tradição brasileira no período de carnaval e suas implicações no âmbito social
Alunos
11 Troca de textos/ análise Leitura e análise dos textos produzidos, com base em roteiro fornecido pelo professor
Alunos
12 Revisão
Correção do texto Reescrita
Revisão do texto com base em indicações do colega Correção final Reescrita do texto com base nas indicações do professor
Alunos
Professor Alunos
Etapa Final A divulgação dos textos
Procedimentos Responsáveis Entrega dos textos finais
Publicação em mural
Publicação em periódicos locais
Aluno Professor Professor
O quadro a seguir resume os procedimentos apresentados.
Quadro V - Resumo dos procedimentos para produção textual
Princípios de
textualidade
Atividade Nível estrutural
Macroestrutura
Microestrutura
Agenda do texto
Economia do texto
Intencionalidade -Definição do tipo de texto-
aspectos formais a serem
atendidos. Exposição pelo
-Proposta de apresentação de
um texto com posicionamento
acerca de tema polêmico,
Economia Prosódica
- Debate organizado com
base em pesquisas realizadas
e em textos elaborados pelos
alunos
Economia léxico-
gramatical
-Registro escrito acerca das
discussões realizadas
-Atividades de revisão do
texto apresentado
-Intervenções do professor
no momento das produções
pelos alunos
Economia gráfica:
-Trocas de textos entre os
alunos
-Exposição de texto coletivo
e individual em painel, mural
ou periódicos
Economia léxico -
gramatical
Informatividade -Pesquisa em periódicos,
biblioteca da escola,
entrevistas, Internet, acervo
da classe vistas etc.
-Uso dos registros obtidos a
partir dos debates realizados
-Registro do levantamento de
dados, conceitos e opiniões
acerca do tema trabalhado
-Elaboração de texto com
base em dados levantados
-Troca de textos entre alunos,
com realização de
observações
-Revisão do texto
verificando-se possíveis
problemas
-Correção final do professor
Devolutiva do professor com
correção coletiva
Aceitabilidade -Apresentação da leitura do
texto produzido para os
colegas
-Apresentação dos textos
escritos aos colegas por meio
de divulgação em painéis,
murais etc.
-Registros dos comentários
acerca dos textos dos colegas
-Pesquisa sobre o
conhecimento do tema em
relação ao público escolhido
para a divulgação do texto a
ser publicado com base em
enquetes, entrevistas e
pesquisas
-Preocupação com o
conhecimento partilhado
(referenciais exofóricos)
-Realização de atividades de
escrita para a retomada de
dados nos textos; verificação
da incidência de anáfora e
catáfora para garantir a
linearidade textual
Situacionalidade -Definição do tipo de texto a
ser apresentado, do público a
quem será apresentado,
vinculado ao portador do
texto final produzido
-Articulação da escrita, tendo-
se em vista:
-Definição do momento e
local de divulgação do texto
-Definição do portador do
texto
-Adequação da organização
textual de acordo com o
público e o meio de
comunicação
Intertextualidade Fichamento dos textos de
pesquisa, dos textos lidos em
sala de aula e de dados
relativos a seus autores
-Verificação da influência de
outras leituras na elaboração
do texto, procurando-se
identificar determinadas
linhas de pensamento
-Uso de citações, referências
e dados recuperados por
meio de outras leituras
Coesão -Redação do texto final, constituído das etapas já realizadas
-Revisão, adequação lingüística, discursiva e tipológica do texto: verificação de referenciais
(endofóricos e exofóricos); verificação das estruturas que garantem a seqüencialização do texto
(características verbais e recorrências lexicais)
Coerência -Circulação do texto: devolutivas dos colegas, correspondências entre os alunos (seja pela
mídia eletrônica, seja por murais das classes)
Consideramos que em atividades como essas, embora demandem cerca de 12
aulas, as atividades planejadas podem contemplar várias necessidades da aula de
Língua Portuguesa, como a leitura
inclusive de obras literárias consagradas, que
podem ser indicadas pelo professor como fonte de pesquisa, para os alunos, e a
gramática, cujos aspectos podem ser observados na elaboração do texto e em seu
processo de revisão.
Assim como elegemos o Carnaval como tema para essa atividade, no decorrer
do ano, outros eventos que marcam atividades sociais ou acontecimentos de conjuntura
municipal, estadual, nacional ou internacional podem vir a compor uma nova proposta
de trabalho, com outra organização, mas que se componha de dois aspectos
fundamentais
momentos de interação e produção textual realizada com objetivos
específicos.
Neste capítulo, procuramos apresentar ao professor de Língua Portuguesa
algumas possibilidades para o tratamento da produção textual escrita em sala de aula.
Acreditamos que os procedimentos apresentados poderão contribuir para o
aprimoramento de sua prática pedagógica e, ainda, para o desenvolvimento, nos
alunos, de habilidades relativas a uma produção textual mais significativa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Refletir sobre os limites da produção textual em sala de aula a fim de vislumbrar
procedimentos didáticos possíveis para a produção de textos dissertativos, com base
nos princípios de textualidade e nas orientações dos Parâmetros Curriculares
Nacionais, foi o nosso objetivo precípuo nesta dissertação, na intenção de contribuir
para o aprimoramento da prática pedagógica do professor e para a melhoria do texto
produzido pelos alunos em sala de aula.
Para isso, empreendemos uma pesquisa-piloto com seis professores e sessenta
alunos, em seis escolas de ensino médio da rede pública estadual da Região de
Jundiaí, escolhidas mediante os resultados obtidos na avaliação SARESP, edição de
2004.
Na realização de nossa pesquisa, solicitamos aos entrevistados que
relacionassem, em ordem de prioridades, as atividades praticadas em sala de aula na
preparação e no desenvolvimento de seus textos; explicitassem aspectos relativos às
suas concepções teóricas; relacionassem os principais problemas apresentados na
produção textual de seus alunos e indicassem as atividades cujos resultados
apresentaram maior sucesso.
Os resultados decorrentes dessa pesquisa demonstraram divergências nas
respostas fornecidas por professores e alunos em relação à prática desenvolvida em
sala de aula. O levantamento indicou, de maneira geral, que existiam diferenças no
apontamento das prioridades de atividades em sala de aula, entre outros aspectos. Os
dados obtidos permitiram observar também que a aula de produção de texto se
caracterizava por:
priorização de momentos de assimilação de conteúdos e de modelos
textuais, numa preocupação com os aspectos informativo e formal do
texto a ser produzido;
uso do texto como fonte de avaliação para o professor, sendo a avaliação
um fator de motivação para a realização da produção textual;
ausência de uniformidade no que se refere ao conceito de texto pelos
professores e à indicação de característica e aspectos textuais;
conhecimento superficial dos professores no que se refere a aspectos
teóricos da produção textual;
realização de atividades desassociadas de um trabalho para o
desenvolvimento da argumentatividade, da organização dissertativa e dos
aspectos relativos à consolidação da coesão e coerência textual;
ausência de objetivos comunicativos para a produção textual, na
perspectiva de um contexto de interação no espaço escolar.
Tendo em vista a organização de procedimentos de ensino voltados para o
aprimoramento da prática pedagógica do professor e para a melhoria da produção
textual no ensino médio, apresentamos um estudo acerca do conceito de texto,
fundamentadas em autores da Lingüística Textual, especificamente os que trataram dos
princípios de textualidade (BEAUGRANDE e DRESSLER, 1994; BEAUGRANDE, 1997,
entre outros) relacionando-os às diretrizes pedagógicas dos PCN, cujos fundamentos
apresentam co-relações com as orientações mais amplas da Lingüística Textual.
Para a organização dos procedimentos, apresentamos alguns critérios
fundamentais, que levaram em conta a definição de uma situação comunicativa real e
possível e o planejamento do texto, visando: aos objetivos da produção textual, aos
interlocutores possíveis, ao conteúdo do texto e aos seus aspectos organizativos e às
formas de apresentação e divulgação dos textos produzidos. Tal organização
considerou os seguintes aspectos:
- problematização, definição e estudo do tema a ser tratado;
- organização do material de pesquisa e das formas de registros dos obtidos com
base na realização de um texto coletivo a ser apresentado em forma de leitura;
- debate acerca dos textos apresentados;
- análise dos textos produzidos;
- revisão, adequação lingüística, discursiva e formal do texto, em dois momentos
de produção coletiva e individual;
- divulgação dos textos finais: devolutivas, correspondências entre os alunos,
publicações em periódicos etc.
Preocupamos-nos com a prática escolar da produção textual, mediante uma
concepção de texto em sua unidade, completude, função sociocomunicativa e a visão
do aluno como produtor de textos. Nesse sentido, entendemos que o professor deve
admitir a superação de alguns dogmas históricos do processo de ensino e
aprendizagem e repensar nas relações escolares, refletindo sobre a necessidade de
atividades que priorizem a interação, a investigação, o questionamento e a
possibilidade de realização de escolhas, numa reformulação da dinâmica das aulas de
Língua Portuguesa.
Temos clareza de que não é o professor o início e o fim de todos os conflitos
inerentes aos processos de ensino e aprendizagem, mas entendemos que, como
profissional do ensino, é ele o fio condutor da quebra de paradigmas ultrapassados. Ao
professor cabe a reflexão sobre as atividades propostas no cotidiano de sua prática e o
questionamento de modelos e formas de realização da aula, cristalizadas durante
décadas. É necessário repensar a prática pedagógica do ponto de vista de sua função
social, desmistificando-se, inclusive, tudo o que foi padronizado, da gramática ao
modelo canônico de produção textual, das classificações às regras e organizações dos
textos, cujos manuais didáticos insistem em determinar.
Referências bibliográficas
BEAUGRANDE, Robert & Dressler, Wolfgang U. E. Introduzione alla lingüística testuale. Bologna: Mulino, 1994.
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ANEXOS
Anexo I - Questões para professores
Escola...........................................................Professor...............................................
Formação: Tempo de magistério.................anos
Séries em que leciona.................................Período em que leciona.........................
Em sua atuação como professor (a) de Língua Portuguesa considere as
indicações abaixo para caracterizar os aspectos mais importantes de suas aulas. Para
as questões a seguir, utilize a escala de 1 a 5 pontos, sendo 1 o grau mais alto e 5, o
grau mais baixo:
I Na preparação de suas aulas para produção textual, você pretende:
1. ( ) possibilitar os alunos momentos de discussão, a partir da realização de debate,
troca de informações/ experiências;
2. ( ) possibilitar momentos de leitura individual, por meio de atividades de leitura com
questões para interpretação de texto a serem respondidas de forma escrita;
3. ( ) propor temas para reflexão por meio de vídeos, leituras de jornais, revistas e
outros;
4. ( ) estabelecer um vínculo interdisciplinar com base no conteúdo programático das
diversas áreas do conhecimento ou de projetos da escola;
5. ( ) relacionar o conteúdo trabalhado a outras leituras, a fim de trabalhar o conteúdo
da disciplina de forma contextualizada.
II - Ao propor uma atividade de produção de texto, você:
1. ( ) procura relacionar o tema ao cotidiano do aluno, a partir de questões locais;
2. ( ) segue as orientações de livros didáticos para uma adequada seqüência dos
conteúdos;
3. ( ) segue as orientações de livros didáticos por se tratar de um recurso disponível
para os alunos;
4. ( ) procura abordar temas do cotidiano social (políticos, econômicos e sociais, por
exemplo, relacionados ao meio ambiente, a questões políticas de nível nacional, a pena
de morte etc) relacionando-os a leituras propostas e debates realizados anteriormente;
5. ( ) apresenta o tema, expõe os critérios de realização e solicita que a atividade seja
realizada em casa.
III Durante o processo de produção textual de seus alunos, você:
3.a Costuma intervir na produção de texto, no momento da escrita do aluno ( )
Não costuma intervir na produção de texto, no momento da escrita do aluno ( )
3.b Ao propor intervenções na produção de texto em sala de aula, você:
1. ( ) sugere modificações do texto no que se refere à adequação ao tema;
2. ( ) sugere modificações no texto no que se refere à adequação ortográfica,
pontuação, paragrafação e outros aspectos gramaticais;
3. ( ) indica modificações necessárias no que se refere à tipologia textual.
IV - Você costuma solicitar que seus alunos realizem produções textuais
periodicamente:
4.a
1. ( ) diariamente.
2. ( ) semanalmente.
3. ( ) quinzenalmente.
4. ( ) mensalmente.
5. ( ) bimestralmente.
6. ( ) não costuma solicitar redações em sala de aula.
4.b Você solicita produções de texto na periodicidade apontada porque:
1. ( ) existe uma disciplina específica para esse trabalho (Técnicas de Redação);
2. ( ) a classe é numerosa e essa atividade fica difícil no momento da avaliação;
3. ( ) os alunos têm muitas dificuldades gramaticais e isso toma muito seu tempo;
4. ( ) você é professor substituto;
5. ( ) você trabalha em muitas escolas e a atividade de correção torna-se difícil devido
à sobrecarga de trabalho.
Outros motivos. Especificar___________________________________________
V- Em sua concepção, o que é um texto?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
VI
Quais são as principais dificuldades que seus alunos apresentam na produção de
texto?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
VII Você tem realizado cursos de atualização em sua área de atuação?
Sim( ) Não ( ) Quais?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
VIII- Indique pelo menos um autor ou teoria que estuda a linguagem (leitura, escrita,
gramática,etc)
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
IX
Indique pelo menos uma atividade para produção de texto em sala de aula com a
qual você considera ter conseguido os melhores resultados.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
Utilize o espaço para quaisquer comentários que julgar pertinentes.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Anexo II - Questões para alunos
Escola..............................................................Série.......................Período...............
I - Nas aulas de Língua Portuguesa, em sua classe você percebe que o professor
propicia, prioritariamente, numa escala de 1 a 5, sendo 1 para o grau mais alto e 5, para
o grau mais baixo:
1. ( ) momentos de discussão, debate, troca de informações/ experiências entre
os alunos;
2. ( ) momentos de leitura individual, com questões para interpretação de texto a
serem respondidas de forma escrita;
3. ( ) reflexão de temas por meio de vídeos, leituras de jornais, revistas e outros;
4. ( ) estabelecimento de um vínculo interdisciplinar com base em conteúdo
programático de diversas áreas do conhecimento ou de projetos da escola;
5. ( ) relação entre o conteúdo trabalhado pela disciplina e leituras realizadas.
II - Antes de realizar uma redação, você:
1. ( ) relaciona o tema ao cotidiano local: seu bairro e sua cidade;
2. ( ) segue as orientações de livros didáticos ;
3. ( ) segue as orientações do(a) professor(a), após uma explicação geral do tema
e de seu ponto de vista;
4. ( ) aborda temas do cotidiano social, a partir de leituras propostas pelo(a)
professor(a) e debates realizados anteriormente;
5. ( ) procura não cometer muitos erros de ortografia e gramática para que tenha
uma boa nota.
III - Ao ser solicitada uma redação, sua maior preocupações é:
1. ( ) a adequação ao tema
2. ( ) a adequação gramatical: ortografia, pontuação, paragrafação e outros
aspectos;
3. ( ) a adequação à tipologia textual: narração/descrição/dissertação;
4. ( ) a avaliação (nota).
IV - Você costuma realizar produções de texto periodicamente, nas aulas de Língua
Portuguesa:
1. ( ) sim, diariamente;
2. ( ) sim, semanalmente;
3. ( ) sim, quinzenalmente;
4. ( ) sim, mensalmente;
5. ( ) sim, bimestralmente.
6. ( ) não realiza produções de textos na sala de aula.
V
Se você não costuma realizar produções de texto nas aulas de Língua Portuguesa
quais são os motivos?
1. ( ) existem aulas de Técnicas de Redação;
2. ( ) a classe é numerosa e essa tarefa fica prejudicada devido ao barulho
constante;
3. ( ) as aulas de Literatura ou Gramática tomam todo o tempo da aula;
4. ( ) não gosto ou não consigo escrever;
5. ( ) as redações devem ser feitas em casa ou em dias de provas, conforme
orientação do professor.
Outros motivos:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Utilize o espaço para quaisquer comentários que julgar pertinentes.
Anexo III - Quadro de competências e habilidades PCN
Anexo IV - Quadro de competências e habilidades PCN+
Anexo IV - Quadro de competências e habilidades PCN+
Anexo IV - Quadro de competências e habilidades PCN+
Anexo V Critérios para correção das redações Manual SARESP
Anexo V Critérios para correção das redações Manual SARESP
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