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O Fim da Incompetncia

O Fim da Incompetncia

Casar com a filha do dono da empresa, arrumar emprego pblico, ter padrinho poltico ou obedecer piamente s ordens do chefe eram, em linhas gerais, os caminhos para o sucesso no Brasil. QI era sinnimo de "quem indica".Ter mestrado no exterior, falar cinco idiomas, desenvolver nova tecnologia, caminhos certos para o sucesso no Primeiro Mundo, em nada adiantavam. As empresasbrasileiras mamando nas tetas do governo, com crditos subsidiados, numa economia protegida, eram obviamente super-rentveis, mesmo sem muita sofisticao administrativa. At um perfeito imbecil tocava uma empresa brasileira naquelas condies, fato que irritava sobremaneira a esquerda e os acadmicos, que na poca dirigiam a economia. Est a uma das razes menos percebidas da onda de estatizao a que assistimos no Brasil.Contratar pessoas competentes, alm de no ser necessrio, era desperdcio de dinheiro. Num pas em que se vendiam carroas a preo de carro importado, engenheiros especializados em airbags morriam de fome. Competncia num ambiente daqueles no tinha razo para ser valorizada. Os jovens naquela poca no viam necessidade de adquirir conhecimentos, s precisavam passar de ano. Alunos desmotivados geraram professores desmotivados, instalando um perverso crculo vicioso que tomou conta das nossas escolas.

Tudo isso, felizmente, j est mudando. Empresrios incompetentes esto quebrando ou vendendo o que sobrou de suas empresas para multinacionais. Por muitos anos, quem no Brasil tivesse um olho era rei. Daqui para a frente, sero necessrios dois olhos, e bem abertos. Sai o sbio e eruditosobre o passado e entra o perspicaz previsor do futuro. Sai o improvisador e o esperto, entra o conhecedor do assunto.

A regra bsica daqui para a frente a competncia. Competncia profissional, experincia prtica e no terica, habilidades de todos os tipos. De agora em diante, seu sucesso ser garantido no por quem o conhece, mas por quem confia em voc. Estamos entrando numa nova era no Brasil, a era da meritocracia. Aqueles bnus milionrios que um famoso banco de So Paulo vive distribuindo no so para os filhos do dono, mas para os funcionrios que demonstraram mrito.

Felizmente, para os jovens que querem subir na vida, o mrito ser remunerado, e no desprezado. J se foi a poca em que o melhor aluno da classe era ridicularizado e chamado de CDF. Se seu filho de classe mdia no est levando o 1 e o 2 grau a srio, ele ser rudemente surpreendido pelos filhos de classes mais pobres, que esto estudando como nunca. As classes de baixa renda foram as primeiras a perceber que a era do status quo acabou. Hoje, at filho de rico precisa estudar, e muito.Vinte anos atrs, eram poucas as empresas brasileiras que tinham programas de recrutamento nas faculdades. Hoje, as empresas possuem ativos programas de recrutamento nas faculdades, no somente aqui, mas tambm no exterior. Os 200 brasileiros que esto atualmente cursando mestrado em administrao l fora esto sendo disputados a peso de ouro.Infelizmente, os milhares de jovens competentes de geraes passadas acabaram no desenvolvendo e tiveram seu talento tolhido pelas circunstncias. Talvez eles no tenham mais pique para desfrutar essa nova era, e na minha opinio essa a razo da profunda insatisfao atual da velha classe mdia. Mas, os jovens de hoje, especialmente aqueles que desenvolveram um talento, os estudiosos e competentes, podero finalmente dormir tranqilos. No tero mais de casar com a filha do dono, arrumar um padrinho, aceitar desaforo de um patro imbecil.O talento voltou a ser valorizado e remunerado no Brasil como mundo afora. Talvez ainda mais assustador reconhecer que o Brasil no ser mais dividido entre ricos e pobres, mas sim entre competentes e incompetentes. Os incompetentes que se cuidem.

Publicado na Revista Veja edio 1536 de 18 de abril de 2001