FRANCINE DE CAMARGO PROCÓPIO
PARTICIPAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NA
ALIMENTAÇÃO ESCOLAR DO MUNICÍPIO DE ITAPEVA-SP:
CONTRIBUIÇÕES AO APRIMORAMENTO DO PNAE
CAMPINAS
2015
II
III
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA
FRANCINE DE CAMARGO PROCÓPIO
PARTICIPAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NA
ALIMENTAÇÃO ESCOLAR DO MUNICÍPIO DE ITAPEVA-SP:
CONTRIBUIÇÕES AO APRIMORAMENTO DO PNAE
Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia
Agrícola da Universidade de Campinas como parte dos
requisitos exigidos para obtenção do título de Mestra em
Engenharia Agrícola, na área de concentração de Gestão de
Sistemas na Agricultura e Desenvolvimento Rural.
Orientadora: Profa. Dra. JULIETA TERESA AIER DE OLIVEIRA
Co – Orientador: Prof. Dr. RICARDO SERRA BORSATTO
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA FRANCINE DE CAMARGO PROCOPIO, E ORIENTADA PELA PROFA DRA. JULIETA TERESA AIER DE OLIVEIRA.
CAMPINAS
2015
IV
Informações para Biblioteca Digital Título em outro idioma: Family farm's participation in the school food Itapeva-SP county :
contributions to the improvement of Pnae Palavras-chave em inglês:
Public policy Farmers School feeding Área de concentração: Planejamento e Desenvolvimento Rural Sustentável Titulação: Mestra em Engenharia Agrícola Banca examinadora: Julieta Teresa Aier de Oliveira [Orientador] Regina Aparecida Leite de Camargo Vanilde Ferreira de Souza Esquerdo Data de defesa: 20-02-2015
Programa de Pós-Graduação: Engenharia Agrícola
V
VI
VII
RESUMO
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) está regulamentado por meio da
Lei nº 11.947/2009, com vigência a partir de 2009, a qual estabelece que no mínimo
30% dos recursos financeiros repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE) aos municípios para alimentação escolar devem ser para adquirir
alimentos oriundos diretamente da agricultura familiar. Essa medida garante um
mercado estável e regular para a produção familiar. No entanto, muitos municípios e
agricultores familiares até o momento não aderiram ao Programa e os que aderiram
enfrentam dificuldades para cumprir as exigências operacionais do Pnae. Nesse
sentido, esta dissertação teve por objetivo principal analisar esses entraves
operacionais no município de Itapeva, situado na região sudoeste do estado de São
Paulo, Brasil. Para tal, coletou-se, com o uso de entrevistas semiestruturadas e
aplicação de questionários, junto às organizações formais de agricultores familiares que
participavam do Programa na época da pesquisa e aos funcionários municipais
responsáveis pela implantação e execução da Lei, informações sistematizadas sobre as
dificuldades enfrentadas. Trabalhou-se também com pesquisa documental. Foi possível
compreender os principais entraves para execução do Pnae no município selecionado e
com isso propor medidas para a superação dos obstáculos enfrentados pelos
agricultores familiares para participarem desse programa governamental.
Palavras-chave: agricultores; políticas públicas; alimentação escolar.
VIII
IX
ABSTRACT
The National School Feeding Programme (NSFP) is regulated by Law No. 11,947/ 2009,
effective from 2010, which states that at least 30 % of the funds transferred by the
National Fund for Education Development (NFED) to municipalities for school feeding
should be to get food from directly from family farmers. This will ensure a stable and
regular market for family production. However, many municipalities and farmers so far
not joined the program and those who joined struggling to meet the operational
requirements Pnae. Thus, this project is meant to examine these operational barriers in
the municipality of Itapeva, located in São Paulo, Brazil. To this end, we intend to collect,
together with formal organizations of farmers participating in the Program and municipal
officials responsible for implementation and execution of Law systematic information
about the difficulties faced by documentary research, semi-structured interviews and
questionnaires. Expected to understand the main obstacles for the implementation of
Pnae in the selected region and thus propose measures to overcome the obstacles
faced by family farmers to participate in this public policy.
Key Words: farmers; policy; school feeding
X
XI
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... ....1
1.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................. 4
1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................... 4
2 ITAPEVA, AGRICULTURA FAMILIAR E POLÍTICAS PÚBLICAS .......................... 5
2.1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ITAPEVA ............................................... 5
2.2 AGRICULTURA FAMILIAR E POLÍTICAS PÚBLICAS ......................................... 13
3 PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR ................................... 21
3.1 HISTÓRICO DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NO BRASIL .................................... 21
3.2 AQUISIÇÃO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS DA AGRICULTURA FAMILIAR PELO
PNAE...............................................................................................................................31
3.2.1 RESOLUÇÃO/CD/FNDE Nº 38/2009 ................................................................... 33
3.2.2 RESOLUÇÃO/CD/FNDE Nº 25/ 2012 .................................................................. 36
3.2.3 RESOLUÇÃO/CD/FNDE Nº26/2013 .................................................................... 36
3.2.4 EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS .................................................................... 41
4 METODOLOGIA ................................................................................................... 44
4.1 ANÁLISE DOCUMENTAL ..................................................................................... 46
4.2 ENTREVISTAS SEMIESTRUTURADAS .............................................................. 47
5 RESULTADOS ..................................................................................................... 52
5.1 OS ATORES INSTITUCIONAIS DO PNAE EM ITAPEVA: ESTRUTURA
MUNICIPAL E ORGANIZAÇÕES DE AGRICULTORES.................................................53
5.2 OS AGRICULTORES FAMILIARES DO PNAE DE ITAPEVA................................60
5.3 A EXECUÇÃO DO PNAE EM ITAPEVA: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL............63
5.4 AS VOZES DOS RESPONSÁVEIS DAS NSTITUIÇÕES MUNICIPAIS E DAS
ORGANIZAÇÕES DE AGRICULTORES FAMILIARES..................................................75
5.4.1 RETROSPECTIVA DA IMPLANTAÇÃO DA LEI 11.947/2009 EM
ITAPEVA........75
5.4.2 ASPECTOS JURÍDICOS DA EXECUÇÃO DO
PNAE...........................................76
XII
5.4.3 RELAÇÕES COMERCIAIS NA EXECUÇÃO DO
PNAE........................................80
5.4.4 CARDÁPIO DA MERENDA ESCOLAR.................................................................85
5.4.5
LOGÍSTICA............................................................................................................88
5.5 DIFICULDADES E AVANÇOS DO PNAE EM
ITAPEVA........................................91
6 CONSIDERAÇÕES
FINAIS....................................................................................100
7 REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS......................................................................104
APÊNDICE A ................................................................................................................110
ANEXO 1 ......................................................................................................................118
XIII
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela vida e por todos os momentos vividos desde o momento
da divulgação do processo seletivo de Mestrado. Não foram poucos, e nem tão fáceis.
Mas como ele nunca nos desampara sou muito agradecida pelos anjos que colocou em
minha vida.
Obrigada Professora Julieta por toda dedicação, paciência e orientação,
aproveito para agradecer ao Professor Ricardo, por me colocar no chão, por não me
permitir flutuar e sair do objetivo da pesquisa.
Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) pelo auxílio financeiro. E pela liberação do projeto " Para além dos efeitos
primários das políticas públicas: a autonomia de agricultores familiares" para o Edital
Chamada Universal - MCTI/CNPq nº 14/2013, aprovado no CNPq. Sobre coordenação
da pós-graduanda da Feagri Dra. Vanilde Ferreira de Souza Esquerdo, sendo que nele
estava previsto apoio financeiro para a realização do trabalho de campo desta
dissertação.
Como também a Faculdade de Engenharia Agrícola que me acolheu e
possibilitou estar concluindo mais essa fase em minha vida. E a todos da nossa equipe
do Laboratório de Extensão Rural.
Quanto aos amigos, não vou citar nomes, mas agradeço a todos que estiveram
ao meu lado me apoiando, em companhia no bar, puxando minha orelha e me
distraindo dos momentos tensos.
E agradeço a minha família, que acompanhou todos os momentos desse
trabalho, tanto os bons quanto os de desespero por faltar as palavras, obrigada Mãe por
todos os beijos de bochecha... foram dois anos, mas a Senhora aprendeu a beijar,
risos.
XIV
XV
O dia mais belo? Hoje
A coisa mais fácil? Equivocar-se
O obstáculo maior? O medo
O erro maior? Abandonar-se
A raiz de todos os males? O egoísmo
A distração mais bela? O trabalho
A pior derrota? O desalento
Os melhores professores? As crianças
A primeira necessidade? Comunicar-se
O que mais faz feliz? Ser útil aos demais
O mistério maior? A morte
O pior defeito? O mau humor
A coisa mais perigosa? A mentira
O sentimento pior? O rancor
O presente mais belo? O perdão
O mais imprescindível? O lar
A estrada mais rápida? O caminho correto
A sensação mais grata? A paz interior
O resguardo mais eficaz? O sorriso
O melhor remédio? O otimismo
A maior satisfação? O dever cumprido
A força mais potente do mundo? A fé
As pessoas mais necessárias? Os pais
A coisa mais bela de todas? O amor
(Madre Teresa de Calcutá)
XVI
XVII
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 LOCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ITAPEVA NO ESTADO DE SÃO
PAULO ..................................................................................................................... 5
FIGURA 2 FLUXOGRAMA ILUSTRATIVO DA GESTÃO DO QALI WARMA. ....... 42
FIGURA 3 FLUXOGRAMA DO PNAE EM ITAPEVA ............................................. 54
FIGURA 4 RECURSOS DISPONIBILIZADOS PELO FNDE PARA O MUNICÍPIO
DE ITAPEVA/SP, PARCELA DESTINADA À AGRICULTURA FAMILIAR E
VALORES DAS CHAMADAS PÚBLICAS, 2010 A 2014. ....................................... 68
FIGURA 5 QUANTIDADE DE ITENS ADQUIRIDOS NAS CHAMADAS PÚBLICAS
DO PNAE NO MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2010 A
2014.....................................70
FIGURA 6 COMPARATIVO DE PREÇOS PRATICADOS NOS EDITAIS DE
CHAMADAS PÚBLICAS PARA O PNAE NO MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2010 A
2013.........................................................................................................................73
XVIII
XIX
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 A ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NO BRASIL................................................ 23
QUADRO 2 RESUMO DAS NORMAS DA RESOLUÇÃO Nº 38/2009 DO PNAE. ........ 35
QUADRO 3 SÍNTESE DE MODIFICAÇÕES DA RESOLUÇÃO Nº 26/2013 DO PNAE.38
QUADRO 4 FLUXOGRAMA DE OPERACIONALIZAÇÃO DO PNAE: DO REPASSE
FINANCEIRO DO FNDE ATÉ A AQUISIÇÃO DOS GÊNEROS ALIMENTÍCIOS DA
AGRICULTURA FAMILIAR. .......................................................................................... 40
QUADRO 5 RELAÇÃO DE ENTREVISTADOS DA PESQUISA. .................................. 48
QUADRO 6 NÚMERO DE QUESTIONÁRIOS APLICADOS SEGUNDO A
ORGANIZAÇÃO DE AGRICULTORES SELECIONADA PELA PESQUISA............... .. 51
QUADRO 7 SÍNTESE DAS CHAMADAS PÚBLICAS PARA O PNAE NO MUNICÍPIO
DE ITAPEVA/SP, 2010 A 2014. .................................................................................... 66
QUADRO 8 PONTOS DE ENTREGA DOS PRODUTOS ADQUIRIDOS PELA PNAE DO
MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP. 2010 A 2013. ................................................................ 75
QUADRO 9 SAZONALIDADE DE PRODUTOS DA AGRICULTURA FAMILIAR
COMERCIALIZADOS NOS MERCADOS INSTITUCIONAIS PAA E PNAE, MUNICÍPIO
DE ITAPEVA/SP EM 2010, 2011, 2012, 2013 E 2014. ................................................. 76
XX
XXI
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 PRODUÇÃO E ÁREA DAS PRINCIPAIS LAVOURAS PERMANENTES DO
MUNICÍPIO DE ITAPEVA, SP, EM 2012. ....................................................................... 8
TABELA 2 PRODUÇÃO E ÁREA DAS PRINCIPAIS LAVOURAS TEMPORÁRIAS DO
MUNICÍPIO DE ITAPEVA, SP, EM 2012. ....................................................................... 9
TABELA 3 PRODUÇÃO E EFETIVO DA PRODUÇÃO ANIMAL DO MUNICÍPIO DE
ITAPEVA, SP, EM 2012. ............................................................................................... 10
TABELA 4 PRODUÇÃO ORIUNDA DA SILVICULTURA NO MUNICÍPIO DE ITAPEVA,
SP, EM 2006. ................................................................................................................ 11
TABELA 5 EVOLUÇÃO DOS VALORES DOS REPASSES DO FNDE PARA O PNAE.
1995 A 2014. ................................................................................................................. 29
TABELA 6 TAMANHO DAS PROPRIEDADES DOS AGRICULTORES FAMILIARES
PESQUISADOS NO MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP. ..................................................... 60
TABELA 7 ACESSO DOS AGRICULTORES AO PNAE NO MUNICÍPIO DE
ITAPEVA/SP, 2014. ...................................................................................................... 61
TABELA 8 QUALIDADES DO PNAE MANIFESTADAS PELOS AGRICULTORES
FAMILIARES PESQUISADOS, MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2014. .......................... 61
TABELA 9 DIFICULDADES ENCONTRADAS PELOS AGRICULTORES FAMILIARES
PESQUISADOS PARA COMERCIALIZAR NO PNAE, MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP,
2014. ............................................................................................................................. 62
TABELA 10 BENEFICIAMENTO DOS PRODUTOS ENTREGUES AO PNAE PELOS
AGRICULTORES FAMILIARES, MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2014. ........................ 63
TABELA 11 ORIGEM E TIPO DE EMBALAGENS DOS PRODUTOS ENTREGUES AO
PNAE PELOS AGRICULTORES FAMILIARES, MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2014...63
TABELA 12 TRANSPORTE DOS PRODUTOS ENTREGUES AO PNAE PELOS
AGRICULTORES FAMILIARES, MUNICÍPIO DE ITAPEVA/SP, 2014. ........................ 64
XXII
XXIII
LISTA DE SIGLAS
AEE - Atendimento Educacional Especializado
CAE – Conselho de Alimentação Escolar
CD – Conselho Deliberativo
Cepal – Comissão Econômica para América Latina e Caribe
CME - Campanha de Merenda Escolar
CNA – Comissão Nacional de Alimentação
CNAE - Campanha Nacional de Alimentação Escolar
CNME - Campanha Nacional de Merenda Escolar
Coapri – Cooperativa dos Assentados de Reforma Agrária e Pequenos Produtores da
Região de Itapeva
Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar
Cooperorgânica – Cooperativa de Produtores Orgânicos
Coopeva – Cooperativa dos Produtores de Itapeva e Região
DAP – Declaração de Aptidão ao Pronaf
EJA – Ensino de Jovens e Adultos
Emater – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Embrater – Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura
FCO – Fundo Constitucional do Centro-Oeste
Fetaeg - Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Goiás
FNDE- Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
GSFP – Ghana School Feeding Programme
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
Incaper - Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural
Itesp – Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”
MDS – Ministério de Desenvolvimento Social
MEC – Ministério de Educação
XXIV
Mesa – Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e Combate à Fome
ONU - Organização das Nações Unidas
Oscip - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PAA – Programa de Aquisição de Alimentos
PAE - Programa de Alimentación Escolar
Pnae – Programa Nacional de Alimentação Escolar
PAPP - Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural
PCPR - Programa de Combate a Pobreza Rural
PMA - Programa Mundial de Alimentos
PNAN - Programa Nacional de Alimentação e Nutrição
Pronaf – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
Pronaa - Programa Nacional de Asistencia Alimentaria
Pronan – Programa Nacional de Alimentação e Nutrição
SAN – Segurança Alimentar e Nutricional
Sibrater – Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural
SIM – Sistema de Inspeção Municipal
Sintraf - Sindicato de Trabalhadores Rurais e de Trabalhadores da Agricultura Familiar
SIT- Sistema de Informação Territorial
SNCR – Sistema Nacional de Crédito Rural
Stan - Serviço Técnico de Alimentação Nacional
Usaid - Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional
1
1 INTRODUÇÃO
Em 2001 foi lançado, no Brasil, o Programa Fome Zero, que era composto por
eixos de trabalho que deveriam ser tratados de forma integrada entre os diversos
Ministérios, com a finalidade de garantir a Segurança Alimentar e Nutricional a todos os
cidadãos brasileiros que estivessem em situação de vulnerabilidade. A partir deste
momento, foram implementadas diversos programas de políticas públicas, alguns
desses com foco em incentivar a comercialização de produtos oriundos da agricultura
familiar.
O primeiro programa de política a ser realizado, nesse contexto, foi o Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA), em 2003. Era composto por três modalidades:
doação simultânea; formação de estoque e compra direta. Essas três modalidades
focavam em seu escopo a aquisição de alimentos produzidos por agricultores
organizados em cooperativas ou associações, com intuito de incentivar os agricultores
familiares a se organizarem e assim se inserirem no mercado.
A modalidade mais acessada tem sido a de doação simultânea, a qual permite
que o agricultor possa entregar os produtos oriundos do seu pomar e da horta, sem que
tenha necessidade de produção em escala. Portanto, se o agricultor produziu um saco
de laranja, ele pode entregar esse saco para sua organização e ela direcionará essa
produção para alguma instituição consumidora beneficiada pelo programa.
Outro programa dentro desse mesmo conceito surge como resultado da parceria
entre o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e o Conselho
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) que encaminharam proposta
de Lei sobre a alimentação escolar no País, a qual foi sancionada em 2008 e foi
denominado de Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). O FNDE, que é
responsável por repassar os recursos do Pnae aos municípios, definiu a
obrigatoriedade da utilização de parte desses recursos para a compra de gêneros
alimentícios diretamente de agricultores familiares, visando o abastecimento das
merendas escolares municipais. Essa medida foi regulamentada pela
Resolução/CD/FNDE 38/2009 (BRASIL, 2009).
2
Observa-se que na prática, tanto prefeituras, como organizações de agricultores
familiares estão enfrentando dificuldades para atender a esta Resolução, o que
demanda estudos aprofundados sobre a operacionalização desse programa de política
pública em nível municipal, em especial quanto às chamadas públicas voltadas aos
agricultores familiares para adesão ao programa, bem como, que auxiliem na
compreensão das dificuldades desses agricultores em atender satisfatoriamente às
necessidades operacionais para o sucesso do Programa, tais como, qualidade e
periodicidade da oferta de produtos e operação logística adequada ao transporte dos
alimentos.
As Chamadas Públicas para aquisição dos alimentos passaram a ser realizadas
a partir de 2009, pois até aquele ano os processos de aquisições públicas para o Pnae
eram realizados exclusivamente através da Lei 8.666/1993 que institui normas para
licitações e contratos da Administração Pública. A partir da nova Resolução deixa de
haver essa obrigatoriedade e passa a ser dispensado o processo licitatório quando o
fornecedor for caracterizado como agricultor familiar; ademais, a resolução versa que os
preços pagos pelos produtos devem ser compatíveis com os vigentes no mercado local.
Porém, após a implementação da Resolução /CD/FNDE 38/2009 algumas
observações empíricas detectaram indicativos de falta de beneficiamento e seleção de
alguns produtos e o baixo nível de organização associativa entre os agricultores
participantes do Pnae.
Nesse sentido, a presente pesquisa buscou analisar os entraves à participação
da agricultura familiar na alimentação escolar do município de Itapeva/ SP, com vistas a
compreender melhor essas dificuldades e assim poder contribuir para a melhoria do
Pnae.
Escolheu-se o município de Itapeva pelo fato de integrar o Território da
Cidadania do Sudoeste Paulista que apresenta uns dos menores Índices de
Desenvolvimento Humano do estado de São Paulo; além de ser um município mais
produtor do que consumidor de sua produção, com vários pequenos estabelecimentos
rurais e com oportunidade de desenvolver a região através de seus mercados.
As perguntas norteadoras da pesquisa foram: Por que organizações de
agricultores familiares não estão aderindo às Chamadas Públicas efetuadas pela
3
prefeitura de Itapeva para participarem como fornecedores de alimentos para
alimentação escolar? Quais os problemas enfrentados pela prefeitura para aplicação da
Resolução/CD/FNDE 38/2009 em nível municipal?
Tais respostas podem contribuir para discussão de novos direcionamentos e
aprimoramentos na aplicação do Pnae, tanto para a prefeitura municipal de Itapeva
quanto para os agricultores familiares e suas organizações. Espera-se ainda, que esse
estudo possa contribuir para o aprimoramento do Pnae em outros municípios brasileiros
de pequeno e médio portes.
Assim, a hipótese geral desta pesquisa foi que entraves operacionais na
implantação municipal do Programa Nacional de Alimentação Escolar limitam a
participação de agricultores familiares nas Chamadas Públicas, dificultando o alcance
dos resultados pretendidos pelo Programa.
Para tanto, esta dissertação foi dividida em capítulos, de maneira a facilitar a
leitura e a compreensão sobre os temas abordados, sendo que:
No Capítulo 1 estão inclusos, além desta introdução, os objetivos gerais e
específicos do trabalho.
O Capítulo 2 retrata a história do município de Itapeva, seguido da
contextualização sobre a agricultura familiar e políticas públicas.
Já no Capítulo 3, o leitor se depara com a trajetória do Pnae, que tem
proporcionado o acesso aos alimentos para os educandos deste País. Também, se
verá como se dá a sistemática do repasse dos recursos do FNDE aos municípios, como
os agricultores familiares fazem para aderir ao Pnae, e por fim, algumas experiências
internacionais.
O Capítulo 4 trata da metodologia utilizada na pesquisa empírica realizada no
município de Itapeva/SP.
O Capítulo 5 traz os resultados decorrentes da metodologia empregada na
pesquisa.
E, por último, o Capítulo 6, apresenta as conclusões da pesquisa realizada,
estabelece considerações sobre o Pnae a partir do que foi observado em campo e
contribuições para sua melhoria.
4
1.1 OBJETIVO GERAL
O objetivo geral da pesquisa foi analisar os entraves operacionais da implantação
e execução da Resolução/CD/FNDE 38/2009, do Programa Nacional de Alimentação
Escolar (Pnae), no município de Itapeva, localizado no Território da Cidadania Sudoeste
Paulista.
1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Buscando alcançar o objetivo geral proposto elegeram-se os seguintes objetivos
específicos:
- identificar e analisar as dificuldades das organizações de agricultores familiares
quanto à sua periodicidade de entrega de produtos e logística de transporte para
participarem do Programa Nacional de Alimentação Escolar, como estipulado na
Resolução/CD/FNDE 38/2009;
- analisar as dificuldades quanto à elaboração de Chamadas Públicas, auxílio na
logística de transporte e adequação de cardápios da Prefeitura de Itapeva/SP para
implantar da citada Resolução; e,
- propor medidas que possam contribuir para a superação dos obstáculos
enfrentados pelos agricultores familiares, suas organizações associativas e pela
prefeitura de Itapeva para participação no Pnae.
5
2 ITAPEVA, AGRICULTURA FAMILIAR E POLÍTICAS PÚBLICAS
2.1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ITAPEVA
O município de Itapeva surgiu no início do século XVIII, quando deixou de ser um
bairro rural do município de Sorocaba. Sua fundação ocorreu no dia 20 de setembro de
1779 pelo Juiz ordinário da Vila de Sorocaba Cláudio de Madureira Calheiros
(ITAPEVA, 2013). O município está localizado no sudoeste do estado de São Paulo, a
70 km da fronteira paulista com o estado do Paraná, como é possível ver na Figura 1.
Figura 1 Localização do município de Itapeva no Estado de São Paulo
Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre, 2006.
Na época de sua fundação predominava na região a agricultura de subsistência,
mas com a formalização da nova vila, novas famílias lá se instalaram promovendo uma
concentração populacional que deram início a diversas atividades produtivas visando o
abastecimento alimentar (ITAPEVA, 2013).
Os campos da região de Itapeva também eram favoráveis ao desenvolvimento
da pecuária e com isso atraíram viajantes e remanescentes das Bandeiras, que se
fixaram em extensas “fazendas de criar” (CARMO, 1997).
No entanto, Carmo (1997) cita que a agricultura permaneceu marginal até por
volta de 1860, sendo realizada em pequenas áreas. Sua produção se limitava às roças
6
de milho, arroz, mandioca e feijão e alguma criação, cujos excedentes eram vendidos
para os tropeiros ou em Sorocaba, em razão da feira de mulas1 que criava demanda de
alimentos.
Esta foi a origem de diversos ciclos econômicos que se sucederam e que
deixaram Itapeva conhecida em todo estado de São Paulo. O primeiro deles foi o do
algodão, cultivado por pequenos agricultores e comprado por tecelões, visando atender
o mercado interno, em particular do Sul do Brasil, que ficou desabastecido devido à
guerra de Secessão que privou a indústria têxtil inglesa do algodão americano, levando
o preço da arroba subir significativamente em curto período de tempo (SAINT-HILAIRE,
1976, p.186). Concomitante, ocorre a decadência da Feira de Sorocaba, em razão da
rápida expansão das estradas de ferro, que chega a Campinas em 1872 e em 1909 a
Itapeva. Isso permitiu o deslocamento dos capitais e da mão-de-obra disponíveis para a
cotonicultura e também resultou no crescimento da população e no desenvolvimento
das tradicionais culturas de subsistência como o arroz, a mandioca e o feijão plantados
de acordo com as necessidades familiares. Além disso, a criação de porcos,
sustentados pelas roças de milho, disseminou-se na região (CARMO, 1997).
A busca de novas terras para a cultura algodoeira foi fator determinante no
desmatamento e na queima de florestas da região, bem como para impulsionar o
comércio de grãos, principalmente arroz, que vai crescer em virtude do
desenvolvimento das estradas e pelo surgimento dos primeiros caminhões para
transporte de cargas. Mas o milho para a criação de porcos continuou sendo a
produção dominante.
Todavia, a produção era realizada de modo a levar ao esgotamento do solo, pois
não havia reposição de nutrientes e o plantio era realizado com arado, que, mal
utilizado, provocou fortes erosões. Com a diminuição da fertilidade do solo e o aumento
da área para compensar a baixa produtividade do milho, se reduziu o tempo de
descanso das terras, que resultou na degradação do agroecossistema. Ao mesmo
tempo registra-se uma importante mudança na alimentação da população com a
substituição da banha de porco por óleo vegetal, especialmente milho e soja e os
1A feira de mulas de Sorocaba, entre o século XVII e o início do século XX, foi uma espécie de polo
articulador da região centro-sul do Brasil (MOTA, 2003)
7
agricultores tradicionais entram em crise (GRAZIANO DA SILVA, 1982, p.226 apud
CARMO, 1997).
Nesse mesmo período, final dos anos 1960, o País vive quedas na produção de
feijão que provocam a escassez do produto no mercado interno e a alta de seu preço,
resultado da baixa produtividade e da diminuição do ritmo de expansão agrícola, além
das adversidades climáticas ocorridas em 1973, 1976, 1979 e 1980 levando a crises de
abastecimento para a população em geral (GRAZIANO DA SILVA, 1982, p.38 apud
CARMO, 1997).
Com este cenário econômico favorável para aos agricultores, o cultivo de feijão
se expande rapidamente na região, substituindo pastos e outras culturas. Além disso,
muitos agricultores da região também destinam áreas de suas propriedades para
reflorestamentos graças aos incentivos governamentais presentes até o final dos anos
1970.
A conjuntura dos altos preços do feijão e do acesso facilitado ao crédito rural no
final dos anos 1960 resultou numa diferenciação socioeconômica entre os produtores
familiares marcada não mais pela diversificação de produtos e sim pela capacidade de
acumulação.
Entre os anos 1989 e 1996, ocorre o fim do apoio público maciço à agricultura,
prevalecendo a ideia de que a agricultura já era um setor bastante capitalizado e
maduro, não mais necessitando de apoio estatal e, portanto, deveria ser regido pelo
mercado (CARMO, 1997).
Contudo, como relata Carmo (1997), a queda do preço do feijão e a falta de
crédito prejudicaram fortemente os agricultores de Itapeva, principalmente os menos
capitalizados cuja renda dependia fortemente deste produto, a área cultivada com a
cultura caiu bastante desde 1985. Muitos agricultores saíram do campo a partir de
1989, e o movimento acentuou-se em 1994. Outros substituíram suas áreas de feijão
com outras culturas com condições de propiciar uma boa renda em pequenas áreas,
como hortaliças e culturas envaradas, especialmente o tomate.
Atualmente, segundo o IBGE (2013), Itapeva conta com uma população
aproximada de 91.807 mil habitantes num espaço geográfico de 1.826.258 km², sendo
que seu perímetro urbano ocupa apenas 10% desse total, ou seja, Itapeva é um
8
município predominantemente rural. A cidade é considerada um dos polos comerciais
do Sudoeste Paulista, que é formado por 15 municípios e uma população estimada em
308.552 habitantes (SIT, 2013)2.
Sua área agrícola é composta por lavouras permanentes, lavouras temporárias,
produção de animais e silvicultura, distribuídos nos diversos segmentos que compõem
a agricultura itapevense, como: Agricultura Empresarial, Agricultura Familiar,
Quilombolas e Assentamentos Rurais.
No ano de 2012 a cultura agrícola que mais se destacou entre as permanentes
foi a de laranja, com produção de 11.016 toneladas, em 270 hectares e a de tangerina
com 1.795 toneladas em 88 hectares, conforme mostra a Tabela 1.
Tabela 1 Produção e Área das Principais Lavouras Permanentes do Município de Itapeva, SP, em 2012.
Fonte: IBGE, 2012.
Referente às lavouras temporárias, Tabela 2, o município de Itapeva, como
apresenta os dados do IBGE (2012), não possui muita variedade, no entanto,
demonstra grande aptidão para a produção de monoculturas de grãos, como o milho, a
2Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social (BRASIL, 2012), no estado de São Paulo estão situados três
Territórios da Cidadania: um no Pontal do Paranapanema, com 32 municípios, outro no Sudoeste Paulista com 15
municípios e o terceiro no Vale do Ribeira, com 25 municípios. Compõe o Território da Cidadania do Sudoeste
Paulista os municípios de Taquarituba, Bom Sucesso de Itararé, Capão Bonito, Coronel Macedo, Guapiara, Itaberá,
Nova Campina, Ribeirão Grande, Riversul, Taquarivaí, Barão de Antonina, Buri, Itapeva, Itaporanga e Itararé.
Segundo o Sistema de Informações Territoriais (SIT) do IBGE, a região, em 2010, tinha 312.073 habitantes, dos
quais 67.415 viviam na área rural, o que corresponde a 21,60% do total. Possuía 6.605 agricultores, 415 famílias
assentadas, 1 comunidade quilombola e 2 territórios indígenas (SIT, 2013).
Lavoura Permanente Quantidade Produzida (tonelada)
Área de produção (hectare)
Laranja 11.016 270
Tangerina 1.795 88
Limão 1.700 85
Banana (cacho) 800 40
Caqui 1.110 37
Uva 95 5
9
soja, e o feijão (em grão), entre outros. Além dos grãos há também uma expressiva
concentração de terra nas produções de cana-de-açúcar, além da batata-inglesa e
algodão herbáceo.
Tabela 2 Produção e Área das Principais Lavouras Temporárias do Município de Itapeva, SP, em 2012.
Lavoura Temporária Quantidade Produzida –(tonelada)
Área Produção –(hectare)
Cana-de-açúcar 495.000 5500
Milho (em grão) 298.800 34250
Soja (em grão) 140.050 40000
Batata - inglesa 73.600 2.600
Tomate 44.000 800
Feijão (em grão) 13.800 8400
Trigo (em grão) 11.000 5500
Algodão herbáceo (em caroço) 9.600 4000
Arroz (em casca) 9.412 2.400
Sorgo (em grão) 6.300 2100
Cebola 6.000 300
Melancia 3.000 200
Triticale (em grão) 3.000 1000
Fonte: IBGE, 2012.
Já a produção pecuária, Tabela 3, é pouco diversificada, com ênfase para os
bovinos e para galinhas, galos, frangos e pintos. A região é composta de grande
número de estabelecimentos com granja de aves e com fazendas de gado de corte, o
que hoje mobiliza os municípios a se adequarem ao Sistema Municipal de Inspeção
Sanitária3 (SIM).
3Sistema Municipal de Inspeção (SIM) é o sistema de fiscalização municipal que tem a finalidade de
averiguar se as indústrias alimentícias do município oferecem condições adequadas de manuseio dos alimentos in natura. Está vinculado ao poder local, cabendo ao Executivo e Legislativo institui-lo, caso o município não tenha. Nenhum produto processado pode cruzar a fronteira do mesmo, pois não há órgão que assegure a origem e o seu processo industrial.
10
Tabela 3 Produção e Efetivo da Produção Animal do Município de Itapeva, SP, em 2012.
Tipo de Criação Quantidade Unidade
Ovos de galinha – produção 150 Mil dúzias
Galinha, Galos, frangos e pintos 77.000 Cabeças
Bovinos 68.000 Cabeças
Suínos 6.100 Cabeças
Vacas ordenhadas 5.500 Cabeças
Leite de vaca - produção 5.000 Mil litros
Ovinos 2.350 Cabeças
Equinos 2.000 Cabeças
Casulos do bicho-da-seda – produção 1.800 Kg
Mel de abelha - produção 850 Kg
Caprinos 480 Cabeças
Codornas 470 Cabeças
Bubalinos 252 Cabeças
Muares 250 Cabeças
Ovinos tosquiados 80 Cabeças
Fonte: IBGE, 2012.
No que diz respeito à silvicultura, o município tem dedicado grandes áreas para a
produção de lenha, madeira em tora, madeira para papel e celulose e madeira para
outra finalidade. Segundo o Censo Agropecuário de 2006 (IBGE, 2006), Itapeva tinha
41 propriedades que utilizava a terra para matas e/ ou florestas - florestas plantadas
com essências florestais, sendo expressivo a quantidade de propriedades entre 200 a
menos de 500 ha, que totalizam 13. Na faixa de áreas maiores, existiam 9 propriedades
entre 500 a menos de 1000 ha, seguido de 3 propriedades entre 1.000 ha e menos de
2.500 ha, finalizando com 2 propriedades acima de 2.500 ha. Mas havia também 14
propriedades com menos de 200 ha com atividade silvícola. Essa grande quantidade de
terras utilizadas para a silvicultura, ocupadas com matas e/ ou florestas - florestas
plantadas com essências florestais - equivalem, aproximadamente, a 13% do território
do município.
Na tabela 4 é possível verificar o quanto é produzido nessas áreas, e concluí-se
que a produção de madeira em tora é a mais realizada, visto que em 2006 produziu
11
426.000 m³, seguido da madeira em tora para papel e celulose, e em terceiro lugar para
lenha. Por conta dessa expansão da silvicultura, hoje, Itapeva conta com uma
Universidade Estadual4 para dar suporte à esta atividade econômica.
Tabela 4 Produção Oriunda da Silvicultura no Município de Itapeva, SP, em 2006.
Silvicultura Quantidade Produzida
Unidade
Carvão vegetal 13.000 Tonelada
Lenha 235.000 Metros cúbicos
Madeira em tora 426.000 Metros cúbicos
Madeira em tora para papel e celulose 340.000 Metros cúbicos
Madeira em tora para outras finalidades 86.000 Metros cúbicos
Outros produtos 6.200 Toneladas
Acácia negra (casca) - Toneladas
Eucalipto (folha) - Toneladas
Resina 6.200 Toneladas
Fonte: Censo Agropecuário, 2006.
Segundo diálogos informais com extensionistas rurais e agricultores de Itapeva,
a produção de grãos e de animais vem perdendo espaço para a produção de eucalipto,
em razão de demandar menos mão de obra, oferecer menos risco com as intempéries e
ser melhor remunerada.
Outra característica do município é a diversidade de organizações de agricultores
familiares: atualmente existem 5 Associações e 3 Cooperativas, a seguir descritas:
a) Cooperativa de Produtores Orgânicos (Cooperorgânica), com sede no centro
do município e com 679 membros distribuídos por diversos municípios no entorno de
Itapeva. Sua produção é de hortifrutigranjeiros;
b) Cooperativa dos Assentados de Reforma Agrária e Pequenos Produtores da
Região de Itapeva (Coapri), oriunda do Assentamento Pirituba, tem sua sede na
4O Campus Experimental de Itapeva intitulado “Unidade Diferenciada de Itapeva”, foi inaugurado
em 18/08/2003, como parte do plano de expansão da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (Unesp). Diferente das outras unidades da Unesp, a operacionalização do campus de Itapeva foi realizado no formato de parceria coletiva entre a Universidade, Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura Municipal de Itapeva (UNESP, 2013).
12
Agrovila V deste assentamento, incentiva práticas agroecológicas e possui várias linhas
de produção, como: leite e derivados lácteos; grãos – feijão, milho, soja, arroz e trigo; e
hortifrutigranjeiros. Ela abrange todo o Assentamento Pirituba;
c) Associação de Produtores Rurais do Bairro do Avencal do Município de
Itapeva, situada na divisa com o município de Taquarivaí, o bairro é próximo a uma área
de preservação permanente, sendo uma das razões para eles produzirem apenas
alimentos orgânicos. A produção é basicamente de hortifrutigranjeiros. Ela conta com
90 membros;
d) Associação dos Apicultores do Município de Itapeva, situada no município,
mas abrange a região, conta com 35 sócios, sendo 29 agricultores familiares. Sua
produção é de mel, entre eles, o silvestre e o de eucalipto.
e) Associação dos Produtores Rurais Quilombos do Jaó, situada no Quilombo
Jaó, tendo como sócios apenas as pessoas do Quilombo, totalizando 25 membros. Sua
produção é baseada em grãos, como o feijão, soja, milho e também em hortaliças;
f) Associação de Produtores do Taquari Mirim, localizada em um bairro rural de
Itapeva e é composta por 21 agricultores familiares produtores de leite. Ela surgiu da
necessidade de se adquirir um resfriador para armazenamento do leite produzido;
g) Associação Agropecuária Nova Esperança, localizada no Assentamento
Pirituba, na Agrovila IV. Ela é composta por 16 agricultores familiares. Sua produção se
concentra em leite – tipo A, milho (em grãos) e feijão;
h) Cooperativa dos Produtores de Itapeva e Região (Coopeva), também situada
no centro do município, tem box do Mercado do Agricultor e conta com 40 membros.
Sua produção é de hortifrutigranjeiros, tendo destaque as frutas.
13
2.2 AGRICULTURA FAMILIAR E POLÍTICAS PÚBLICAS
Há mais de 50 anos o modo de fazer política agrícola no Brasil mudou, um dos
fatores determinante para a modernização da agricultura foi à constituição do Sistema
Nacional de Crédito Rural (SNCR) em 1964, que possibilitou a integração, cada vez
mais, das atividades rurais às dinâmicas colocadas pela indústria e pelo setor de
serviços.
O crédito rural, que ofertava taxas de juros subsidiadas, orquestrou uma difusão
tecnológica, em caráter da modernização da agricultura, que foi denominada
“Revolução Verde”.
Esse processo de transformação recebeu críticas referentes às suas implicações
para a sociedade, e como ponto positivo Wanderley (2011, p.30) refere-se à
consolidação do mercado de produtos agrícolas orientados para o consumo urbano e
de insumos industriais destinados a empresas agropecuárias que levou a modernização
a ser referenciada em todos os estabelecimentos agrícolas. Mas, como ponto negativo,
o processo se apresentou seletivo, por atingir apenas alguns tipos de produtores, que
realizavam determinadas culturas ou criações, em regiões especificas do País, levando
a uma transformação desigual das diversas fases do processo produtivo. Para Graziano
(apud WANDERLEY, 2011, p.31):
A acumulação de capital necessita não da “racionalização” da agricultura, mas da submissão da agricultura à racionalidade do setor industrial, o que pode, eventualmente, ser combinado com certo grau de “irracionalidade” relativa da produção agrícola.
Graziano chama a atenção para a real lógica econômica empregada na
agricultura, onde o “antes da porteira” é formado pela indústria, o dentro da “porteira”
por produtores e o “depois da porteira”, novamente a indústria, levando o agricultor a
ser tomador de preços de ambos os lados, tornando-o refém do mercado, sem
autonomia para ditar qualquer regra. Ainda pior foram os impactos desse processo para
os agricultores familiares, que não se beneficiaram da modernização.
Nesse período da modernização da agricultura brasileira ocorre, também, a
criação da Embrater (Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural), que
14
tinha como objetivo central a difusão da tecnologia para os agricultores, mas concentrou
o atendimento nos produtores de média e alta renda para se obter aumentos de
produtividade e produção (SIQUEIRA, 2002).
Siqueira (2002) cita ainda que menos de 15% do crédito rural era recebido por
agricultores familiares, e que através dos dados do Sistema Brasileiro de Assistência
Técnica e Extensão Rural (Sibrater), ao qual era integrado, as Empresas de Assistência
Técnica e Extensão Rural (Emater’s), os escritórios privados de Ater credenciados,
atendiam apenas 16% dos produtores rurais brasileiros, em 1979.
Entretanto, no País ocorreram algumas ações pontuais que visavam o
desenvolvimento da agricultura familiar e que merecem destaque. Uma dessas ações
ocorreu no município de Silvânia que, segundo Xavier e Zoby (2007, p. 166), após
constatar que o modelo difusionista não beneficiava os agricultores familiares, a
Embrater solicitou a participação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa) para apoiar um programa voltado às comunidades de pequenos produtores
denominado Convivência do Cerrado, no qual foram escolhidos cinco municípios em
cada estado da região Centro-Oeste, sendo o município de Silvânia selecionado no
estado de Goiás e iniciado os trabalhos em 1987.
Nesse município foi desenvolvido o projeto de P&D5 (Pesquisa e
Desenvolvimento) e fortalecimento da organização dos agricultores familiares que deu
origem à formação de grupos organizados, onde as instituições tiveram como papel
fundamental facilitar as relações entre os agricultores e os órgãos públicos. A partir daí,
criaram o Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO), mantido com recursos da
União. Também foi criado um Conselho de Desenvolvimento Estadual que era
responsável por estabelecer as prioridades na operação do FCO. E posteriormente
articularam para a fundação da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado
de Góias (Fetaeg) (XAVIER e ZOBY, 2007).
Já no semi-árido, foi criado o Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural
(PAPP), em decorrência de uma das fortes secas que assolaram a região, como uma
5 Projeto desenvolvido por instituições de pesquisa e extensão rural com foco na agricultura
familiar, seu objetivo principal era “promover o desenvolvimento rural por meio da criação de um dispositivo de intervenção no meio rural, que favorecesse a utilização de inovações tecnológicas e sociais pelos pequenos e médios produtores” (ZOBY et al., 2003, p. 12)
15
iniciativa do Projeto Nordeste6 em meados de 1983. O PAPP era financiando com
recursos do Banco Mundial e pelo Orçamento da União, sendo a execução realizada
pelo estado participante. A partir de 1992 o Programa passa a ser financiado pelo
Banco Mundial, União e estado envolvido.
Segundo Vasconcelos e Monteiro (2005), o PAPP teve como atividades
principais: a geração e difusão de tecnologia; assistência técnica e extensão rural;
comercialização da produção; crédito; apoio às pequenas comunidades rurais (APCR);
fundos de terras (legalização de terras); sistema de informação do mercado agrícola e
organização de associações.
No entanto, em 1996 o PAPP se transformou em Programa de Combate a
Pobreza Rural (PCPR), que se constituiu num Programa de desenvolvimento rural,
estimulando através de financiamentos não reembolsáveis, investimentos e
empreendimentos de interesse das comunidades rurais mais pobres.
Destaque-se que essas ações foram importantes, mas, como já citado,
realizadas de formas pontuais, abrangendo poucos agricultores familiares e não lhes
inserindo ao processo de modernização da agricultura que o País estava envolvido.
Observa-se, então, que no Brasil os pequenos agricultores familiares nem
sempre foram beneficiados pelo crédito rural, e esta situação foi grave visto ter sido
esse foi o principal instrumento de política agrícola do País durante várias décadas.
Segundo Peraci e Bittencourt (2010: p.191):
O crédito rural sempre foi seletivo e concentrador de renda, pois imperava no governo brasileiro a postura de que a agricultura e os agricultores deveriam ser beneficiados com políticas agrícolas, independentemente de seu porte, ou seja, os agricultores eram tratados da mesma forma, sem considerar suas diferenças econômicas e sociais. Com isso, os agricultores de médio e grande porte acabavam sendo os maiores beneficiados, pois detinham melhores condições para acessar os recursos do crédito rural e das políticas de garantias de preços mínimos.
6O Projeto Nordeste, é um projeto que compreendia o desempenhar de uma programação
integrada das ações necessárias para elevar os níveis de produção, produtividade e renda, com o envolvimento de infraestruturas sociais e produtivas (KHAN et al, 2005).
16
Em um contexto de elevada concentração de terra e mercados imperfeitos, até
mesmo inexistentes, a marginalização de pequenos agricultores era frequente, e esses
produtores ficavam muitas vezes expostos a uma competição não mediada com
produtos gerados em larga escala. A falta de incentivo para ampliar sua produção e as
dificuldades para comercializar seus produtos a preços compatíveis com seus custos os
colocavam como reféns de atravessadores (PERACI e BITTENCOURT, 2010).
Na tentativa de resolver esses problemas, em 1992, o Ministério da Agricultura e
do Abastecimento criou o Programa de Valorização da Pequena Produção Rural
(Provap), que serviu de base para a criação do Programa Nacional de Fortalecimento
da Agricultura Familiar (Pronaf) em 1995 (BONNAL e MALUF, 2011).
Todavia, quando foram avaliados os grupos de agricultores familiares que
receberam crédito de custeio do Pronaf, verificou-se que muitos agricultores não
conseguiam acessá-lo, pois para Abramovay e Veiga (1999), o crédito tende a
concentrar-se em apenas dois segmentos, aqueles cujos contratos com a agroindústria
lhes fornecem garantias de comercialização e nos que possuem patrimônios para
assegurar os empréstimos bancários, ou seja, ou são agricultores inseridos nas cadeias
de complexos agroindustriais ou são agricultores de médio ou grande infraestrutura de
produção.
Nota-se que a comercialização é um importante instrumento de política pública,
por fornecer garantias de renda aos agricultores. Só que muitos agricultores familiares
são excluídos de circuitos longos de comercialização, seja por estarem distantes dos
médios e grandes centros de consumo, seja pela heterogeneidade de produtos que têm
para ofertar, os quais individualmente somam relativamente pequenas quantidades, não
compensa o deslocamento para outros locais mais distantes a não ser no seu próprio
município ou entorno.
Guanziroli, Buainain e Di Sabbato (2012), alegam que o Pronaf consolidou
grupos já existentes de agricultores, pois afirmam, que para os grupos vulneráveis não
serão as políticas de crédito que resolverão os problemas da pobreza, mas sim políticas
específicas de apoio a esses grupos, portanto recomendam a realização de políticas
agrárias e sociais ao invés de políticas agrícolas.
Nesse mesmo sentido, Van der Ploeg, (2014, p.14) ressalta no texto a seguir:
17
As políticas públicas, por sua vez, podem fazer com que sejam garantidos os direitos dos agricultores familiares e que sejam realizados investimentos suficientes em infraestrutura, pesquisa e extensão, educação, abertura de canais de mercado, seguridade social, saúde, entre outras áreas. Isso proporciona aos agricultores familiares a segurança para investir em seus próprios futuros.
O problema de alguns agricultores não é produzir, mas sim a falta de mercados
locais ou a dificuldade em transportar o alimento que podem desmotivar a produção.
Para Fornazier (2014) o acesso aos mercados pode ser uma oportunidade de incentivar
a produção. Como, nem sempre os agricultores conseguem atender as condições de
acessarem os grandes mercados e a demanda local pode ser pequena, surgem
propostas de utilizar a demanda dos equipamentos públicos para adquirir alimentos dos
agricultores.
Os alimentos adquiridos pelos equipamentos públicos são chamados de
mercados institucionais ou compras governamentais, onde Maluf (1999, p.9)
argumenta:
O manejo do chamado mercado institucional (alimentação escolar, fornecimento a hospitais e presídios etc), com o propósito de favorecer os pequenos e médios empreendimentos, constitui-se em instrumento valioso que está presente em várias experiências analisadas, mas que é pouco explorado em nosso País. Finalmente, deve ser dado destaque especial ao importante papel que as administrações municipais podem desempenhar nas negociações com os agentes econômicos participantes dos circuitos regionais (como o comércio atacadista e, sobretudo, varejista), parte integrante da indispensável regulação pública dos mercados agroalimentares, no caso, em âmbito local-regional.
A entrada de produtos da agricultura familiar para abastecer os equipamentos
públicos, o então mercado institucional, surgiu como um dos objetivos do Programa
Fome Zero, lançado em 2001, pelo Instituto de Cidadania, que segundo o documento-
síntese focaria a seguinte parcela da população brasileira:
A maioria das famílias muito pobres brasileiras vive em pequenas e médias cidades do interior (4,3 milhões de famílias ou 20 milhões de
18
pessoas) e nas regiões metropolitanas (2 milhões de famílias ou 9 milhões de pessoas). A pobreza atinge ainda quase 3 milhões de famílias rurais (15 milhões de pessoas) (BRASIL, 2013).
Tal ação ocorreu afim do Estado tentar garantir o acesso à alimentação pela
população, através de uma política permanente de segurança alimentar e nutricional.
Entre o conjunto de políticas públicas concebidas pelo Programa Fome Zero encontra-
se o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), que segundo Mattei (2007:33) “... visa
implementar ações no âmbito das políticas agrícolas e de segurança alimentar com o
objetivo de fortalecer a política global de combate à fome”.
Nesse período, também foi promulgada a Lei nº 11.326, de 2006 que definiu
como agricultor familiar e empreendedor familiar
“indivíduos que praticam atividades no meio rural; não detenham mais que quatro módulos fiscais, ou seja pequenos proprietários; utilizem mão de obra da própria família e tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo”
(BRASIL,2013).
O Brasil tinha, segundo o Censo Agropecuário de 2006 (BRASIL, 2009)
4.367.902 estabelecimentos de agricultura familiar, que representam 84,4% dos
estabelecimentos rurais brasileiros e, esses estabelecimentos ocupavam uma área de
80,25 milhões de hectares, ou seja, 24,3% da área total dos estabelecimentos
agropecuários, com área média de 18,37 hectares. Já a população ocupada nesses
estabelecimentos era de 12,3 milhões de pessoas, enquanto os estabelecimentos não
familiares ocupavam um terço deste valor, 4,2 milhões de pessoas.
Apesar de ocupar uma área menor, a Companhia Nacional de Abastecimento
(Conab) destaca que a agricultura familiar gera mais de 80% das ocupações no setor
rural, favorecendo o emprego de práticas agrícolas ecologicamente mais equilibradas,
como a diversificação de cultivos e o menor uso de insumos industriais. Por isso, em
2009, cerca de 60% dos alimentos que compuseram a cesta básica dos brasileiros
foram oriundos da agricultura familiar (CONAB, 2013).
Assim, o apoio a estes agricultores na forma de incentivos à produção de
alimentos sustentáveis é essencial, não apenas por sua capacidade de gerar ocupação
19
e renda, como também pela diversidade e oferta de alimentos de qualidade, menor
custo de transporte, preservação do hábito regional e da produção artesanal,
promovendo uma conexão eficaz entre o campo e a cidade (TRICHES e SCHNEIDER,
2010).
Avila et al. (2013) em sua análise afirmam que as experiências do PAA e
posteriormente as do Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar) foram uma
maneira de garantir a oferta de produtos e manter o estímulo para a produção pois
passavam pela constituição de acesso para os agricultores familiares a mercados
considerados certos e seguros.
O Pnae é um programa público que pode ser considerado como promotor de
segurança alimentar e nutricional (SAN) para parte da população brasileira, visto que a
Lei 11.947/2009 que o constituiu, conseguiu reunir educação alimentar e segurança
alimentar e nutricional para os estudantes da rede pública do ensino fundamental e
médio e a inclusão produtiva de agricultores familiares pelas compras governamentais.
Portanto, ela pode promover o desenvolvimento sustentável das localidades em que
está inserida.
Corroborando tal afirmação, Belik e Souza (2009) realizaram estudos a partir de
levantamentos em municípios participantes do Prêmio Gestor Eficiente da Merenda
Escolar, organizado pela Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip)
Ação Fome Zero, observaram que nos municípios onde houve a promoção da compra
de alimentos da agricultura familiar ocorreram vantagens em termos de renda e
emprego, além de estimular a manutenção dos hábitos alimentares regionais. Porém,
para privilegiar os fornecedores locais é necessário grande esforço, tanto nos trâmites
administrativos, quanto na reorientação das decisões políticas.
Além dos esforços é necessário haver articulação entre as diversas áreas das
prefeituras, como, por exemplo, entre as secretarias de agricultura e de educação, que
são importantes para promover o desenvolvimento local inserindo os agricultores
familiares e melhorando a alimentação escolar com a oferta de alimentos in natura.
Para tanto, Saraiva et al. (2013, p. 933) argumentam:
20
Nesse sentido, do desenvolvimento local, é de fundamental importância o reconhecimento do papel interdependente das várias secretarias do poder executivo (tanto municipal quanto estadual) relacionados ao tema, como agricultura, educação, fazenda, ou administração, entre outras. O desenvolvimento local será potencializado na medida em que o gestor público, ou EE7, consiga implementar a compra da agricultura familiar como uma ação verdadeiramente transversal dentro de políticas setoriais prevendo desafios pendentes como o tema de assessoria técnica para agricultores, infraestrutura de logística e armazenagem, diagnóstico e interação com a realidade agrícola local/ regional e, fundamentalmente, a criação de espaços ou fóruns participativos de debate e planejamento, envolvendo agricultores, gestores e escolas.
Além da articulação e da vontade política existe um conjunto de problemas que
surgem na operacionalização como Pnae, como a corrupção. Fornazieri e Belik (2012,
p.36) destacam que “...o maior problema está em romper um circuito que se mantém há
vários anos e que envolve licitações, propinas e procedimentos burocráticos incrustados
na máquina administrativa”.
Mesmo assim o relatório do IPC-IG8 (2013), realizado em parceria com o
Programa Mundial de Alimentos (PMA) da Organização das Nações Unidas (ONU),
descreve que o Pnae é um entre os poucos programas de proteção social que tem
potencial de fornecer muitos benefícios sociais, a partir de seus objetivos. Pois, além
dos impactos gerados pelo lado das crianças ao se beneficiarem da alimentação
escolar adequada, tem um grande potencial de aumentar a participação dos
agricultores familiares, se cumprido a legislação (idem).
Todavia, não é apenas a estância municipal que tem problemas a serem
superados, o agricultor familiar também tem, como apontam Avila et al. (2013: p. 105):
“A comercialização e os instrumentos a ela relacionados foram por muito tempo (e ainda são) obstáculos para uma inserção mais efetiva dos agricultores (sobretudo os familiares) no mercado. Seja pela falta de conhecimento das técnicas e estratégias de mercado, seja pela opção de ser agricultor e não comerciante que adotam muitos agricultores familiares, associadas às características intrínsecas da produção agropecuária (sazonalidade, perecibilidade, dependência climática, etc.). O “depois da porteira” sempre foi considerado um vilão para os produtores.”
7 Entidade Executora.
8 Internacional Policy Centre for Inclusive Growth (IPC –IG).
21
3 PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
3.1 HISTÓRICO DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NO BRASIL
Para dar início ao histórico da alimentação escolar no Brasil, antes é necessário
contextualizar como se iniciou a discussão a respeito do tema, em razão, da
alimentação escolar fazer parte de um tema muito mais abrangente que é o de
Segurança Alimentar e Nutricional.
Isso ocorre porque a alimentação é um direito fundamental, como dos direitos
econômicos, sociais e culturais que juntamente com os direitos civis e políticos, formam
o quadro dos Direitos Humanos, conforme a Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948. Neste mesmo ano ocorreu a criação da Organização Mundial de
Saúde, três anos após a FAO – sigla na língua inglesa da Organização das Nações
Unidas para Alimentação e Agricultura, ambas dedicadas indireta ou diretamente à
questão alimentar.
A criação desses mecanismos organizacionais em nível mundial foi para
assegurar que todo Ser Humano tenha direito à alimentação adequada, portanto “o
direito humano à alimentação” está assegurado em âmbito mundial através do conjunto
dos direitos dos povos promovidos pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais, do Alto Comissariado de Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas (ONU, 1966), sendo reforçado através de diversas outras ações da ONU, como
ocorreu na Cumbre Mundial sobre la Alimentación (1996), a qual assegurou que os
direitos são universais e indivisíveis por alcançarem todas as pessoas indistintamente e
por considerar que nenhum desses direitos pode ser alcançado de maneira
desconectada dos demais, fazendo com que sejam também interdependentes.
As políticas públicas começaram a fazer uso explícito dessa noção a partir de
1950 (MALUF e REIS, 2013). A denominação “segurança alimentar” acrescida do
adjetivo nutricional (SAN) fica reservado ao Brasil (idem). A SAN se refere ao direito de
todo cidadão estar protegido contra a fome e desnutrição, prevenido de males
decorrentes à alimentação e preservação da cultura alimentar.
22
No Brasil o grande pioneiro da questão da SAN foi Josué de Castro, ressalvando
que na sua época não se tinha esse conceito como se tem hoje. Josué de Castro atuou
frente a diversos órgãos públicos a partir de 1940, como profissional da Fundação dos
Arquivos Brasileiros de Nutrição (1941) e posteriormente como diretor do Serviço
Técnico de Alimentação Nacional (Stan) assumiu o objetivo de desenvolver a área de
tecnologia alimentar. Em termos de organismos estatais, em 1945 o Stan é substituído
pela Comissão Nacional de Alimentação - CNA (CAISAN, 2011).
Através das campanhas realizadas por Josué de Castro em 1955, a Comissão
Nacional de Alimentação regulamenta a Campanha de Merenda Escolar (CME), sob a
coordenação do Ministério da Saúde (CASTRO, 2014).
Assim, a alimentação escolar iniciou-se como uma política pública inserida num
contexto de ações de combate à fome representado pelo Programa Nacional de
Alimentação e Nutrição - PNAN (LAMARE, 1968). Pode-se dizer que esse programa
possibilitou a criação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) em 1954,
sob responsabilidade do Ministério da Saúde e sendo transferido logo em seguida, em
1955, para o Ministério da Educação e Cultura.
A criação do Pnae representou um marco importante na história brasileira devido
ao fato de passar a ser um programa federal oficial voltado para a alimentação e
nutrição de crianças e jovens escolares (ROSENBURG, 1978). No Quadro 1 há uma
linha do tempo sobre a evolução da alimentação escolar no Brasil.
23
Quadro 1 A Alimentação Escolar no Brasil.
1954 • Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), programa
de combate a fome.
1955 • Transferência do Ministério da Saúde para o Ministério da
Educação e Cultura
1956 • Instituído a Campanha de Merenda Escolar (CME)
1957 • Muda o nome de CME para Campanha Nacional de Merenda
Escolar (CNME)
1965
• Alterada a nomenclatura de CNME para Campanha Nacional de Alimentação Escolar (CNAE)
• Campanhas Internacionais (Norte-americanas) de combate a fome
1970 • Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (Pronan),
responsável pela articulação de programas de desenvolvimento local;
1976 • Alimentação escolar passa a integrar o Pronan
1979 • Mudança de nomenclatura de CNAE para Pnae
1988 • Todos os alunos do ensino fundamental passam a ter direito à
alimentação escolar
1972 à 1994 • Administração centralizada
• Fortalecimento da indústria alimentícia com distribuição de em latados
24
Fonte: Elaborado pela autora, 2014.
Sob a subordinação do Ministério da Educação foi instituída em 1956 a
Campanha de Merenda Escolar (CME), que depois de um ano passou a ser
denominada de Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME). Essa nomenclatura
foi alterada novamente em 1965 para Campanha Nacional de Alimentação Escolar
(CNAE), quando surgiu uma série de programas de ajuda norte-americana ao Brasil,
tendo como destaques o Alimento para a Paz, financiado pela Agência dos Estados
Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid); o Programa de Alimentos para o
Desenvolvimento, voltado para o atendimento das populações carentes e à alimentação
de crianças em idade escolar; e o Programa Mundial de Alimentos (PMA) da
25
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO/ONU) (BRASIL,
2013).
Destacam-se também nesse sentido as ações do Ministério da Saúde,
principalmente entre as décadas de 1970 e 1980, com a criação do Programa Nacional
de Alimentação e Nutrição (Pronan), que objetivava não só a melhoria da alimentação e
nutrição da população, mas também a articulação de programas no sentido de
promover o desenvolvimento local por meio de apoio aos agricultores familiares (SILVA,
1995; LAVINAS, 1998). Com isso a Alimentação Escolar, mesmo financiada pelo
Ministério da Educação e gerenciada pela CNAE, passou a integrar o Pronan em 1976.
Somente em 1979 passou a ser denominado Programa Nacional de Alimentação
Escolar (Pnae) (BRASIL, 2013).
Em 1988 foi promulgada uma nova Constituição Federal, no qual era assegurado
o direito à alimentação escolar a todos os alunos do ensino fundamental do Brasil por
meio de programas governamentais.
É interessante destacar o período de 1972 até 2002 na história da alimentação
escolar no Brasil porque ele foi caracterizado por duas fases antagônicas. Na primeira,
de 1972 a 1994, a União administrava de forma centralizada o Pnae, e se pretendia o
fortalecimento da indústria alimentícia nacional, o que levou à adoção nas merendas de
alimentos formulados, sem respeito aos hábitos alimentares regionais (SILVA, 1995). A
segunda fase, de 1994 a 2002, foi marcada pela promulgação da lei de
descentralização do Pnae a Lei nº. 8.913, de 12/07/1994, com o objetivo central de
melhorar a qualidade da alimentação e nutrição, bem como do rendimento escolar, e na
qual se promoveu a participação social por meio da efetivação dos Conselhos de
Alimentação Escolar (CAEs) (TAKAGI, 2006). Os CAEs passaram a ser responsáveis
pelo acompanhamento e fiscalização do cumprimento das diretrizes do Programa e
aplicação dos recursos, por garantir a qualidade dos alimentos, aceitabilidade dos
cardápios, receber o relatório anual de gestão do Programa e emitir parecer, aprovando
ou não a execução do Pnae (VIEIRA, 2013). A partir dessa fase o Pnae deixou de ser
um programa apenas de entrega de alimentos do Governo Federal aos estados e
municípios para transformar-se em uma ação coordenada de alimentação e nutrição,
com planejamento e diretrizes.
26
Magalhães et al. (2013) citam que devido à trajetória de expansão da cobertura
da rede básica de ensino, ocorrida entre 1980 e 2000, o acesso à alimentação escolar
foi ampliado significativamente. Mesmo assim, o acesso permaneceu dificultado até o
final da década de 1990 em comunidades onde as escolas eram mais precárias e
distantes dos locais de moradia (idem). Mudanças significativas no Programa no sentido
de ampliação da cobertura e do valor financeiro per capita repassado aos municípios
deveu-se às negociações mediadas pelo Consea (BURLANDY, 2009).
Quanto à descentralização, ocorreu efetivamente em 1998 quando a
transferência dos recursos passa a ser feita automaticamente, sem que seja necessário
firmar convênio ou qualquer outro meio, dando maior agilidade ao processo (FNDE,
2007). Nessa época (1998), o valor diário per capita da merenda era de R$ 0,13, valor
que foi mantido até 2003, apesar da inflação.
Com a descentralização, o município passa a ser o responsável pela alimentação
escolar, podendo deslumbrar diversas estratégias de melhoramento como: redução do
custo de logística, promoção do desenvolvimento local, elaboração de cardápios
baseados nos hábitos alimentares das comunidades e suas diferentes formas de
preparo e maior participação da sociedade civil, por meio do CAE.
Cabe citar que em 2001, a Medida Provisória nº 2.1789, de 28/06/2001 fez
menção pela primeira vez ao desenvolvimento da economia local, como se pode ver
abaixo nos seus artigos 6º e parágrafo único e 7º:
Art. 6° Os cardápios do programa de alimentação escolar, sob a responsabilidade dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, serão elaborados por nutricionistas capacitados, com a participação do CAE e respeitando os hábitos alimentares de cada localidade, sua vocação agrícola e preferência por produtos básicos, dando prioridade, dentre esses, aos semi-elaborados e aos in natura. Parágrafo único. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios utilizarão, no mínimo, setenta por cento dos recursos do PNAE na aquisição dos produtos básicos. Art. 7° Na aquisição dos gêneros alimentícios terão prioridade os produtos da região, visando a redução dos custos.
9 Dispõe sobre o repasse de recursos financeiros do Pnae, institui o Programa Dinheiro Direto na
escola e da outras providências.
27
Mas, foi a partir de 2003 que se sucedeu na alimentação escolar uma série de
mudanças no sentido de incorporá-la a uma nova política de SAN coordenada pelo
Programa Fome Zero, vinculado ao Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e
Combate à Fome (Mesa) (TAKAGI, 2006), como consta na Resolução nº 15 de 16 de
junho de 2003:
Art. 2º. O PNAE tem como objetivo suprir parcialmente as necessidades nutricionais dos alunos, com vistas a garantir a implantação da política de Segurança Alimentar e contribuir para a formação de bons hábitos alimentares.
Mesmo com a extinção do Mesa em 2004 e a transferência da administração do
Fome Zero para o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e sua transformação em
uma estratégia de governo, o Pnae manteve inserido no escopo da política do Fome
Zero até os dias atuais e conseguiu realizar as metas propostas no projeto inicial do
Programa (BELIK, 2013).
Do ponto de vista da atuação técnica, foi estabelecida a exigência de um
nutricionista responsável técnico pelo Pnae no município e fortaleceu-se sua atuação no
planejamento dos cardápios e processos de compra de alimentos, bem como no
acompanhamento técnico das creches e escolas.
Dentro dessa linha, em 2006 foi implementada uma das ações mais importantes
em termos de metas alimentares e nutricionais por meio da Resolução FNDE nº. 32, de
10/08/2006 (BRASIL, 2006). Essa Resolução definiu, pela primeira vez em mais de 50
anos de Programa, que não só os valores de energia e proteína, mas também os de
vitaminas e minerais, deveriam ser fornecidos em cada refeição (MEC, 2013).
Essa fase também se caracterizou pela evolução normativa do Pnae no sentido
de incentivar a diversificação das refeições com base em uma alimentação saudável,
alicerçando os fundamentos de uma das funções mais importantes do Programa, a de
promover ações de educação alimentar. Reforçaram-se as diretrizes de respeito à
vocação agrícola regional e aos hábitos alimentares típicos da localidade e da etnia,
nos casos das creches e escolas das comunidades indígenas e quilombolas (BELIK,
2013).
28
Em 2007, juntamente com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (Consea), o FNDE encaminhou proposta de projeto de lei sobre a
alimentação escolar que foi sancionada pelo Presidente da República e apresentada ao
Congresso Nacional, na qual previa, entre outras ações, o apoio explícito à agricultura
familiar por meio da compra de seus produtos, bem como a ampliação do Programa
para o ensino médio. Essa legislação representou um marco histórico na associação da
alimentação escolar com a agricultura familiar (BELIK, 2013).
Com a promulgação da Lei Federal nº 11.947/09 (BRASIL, 2009) novos avanços
ocorreram no Pnae, como sua extensão para toda a rede pública de educação básica,
incluindo os alunos do Programa Mais Educação, e de jovens e adultos, e a garantia de
que, no mínimo, 30% dos repasses do FNDE sejam investidos na aquisição de produtos
da agricultura familiar. Em 2013 houve a inclusão dos alunos que frequentam o
Atendimento Educacional Especializado (AEE), a Educação de Jovens e Adultos (EJA)
semipresencial e para aqueles matriculados em escolas de tempo integral (BRASIL,
2013).
A partir de 2003 o valor per capita foi reajustado sucessivamente, saindo do R$
0,13 para R$ 0,22 em 2006, que além das crianças já beneficiadas passou também a
atender as creches (0 a 3 anos de idade). Esse valor sofre novos reajustes em 2013,
quando as creches passaram a receber R$ 1,00 e as pré-escolas R$ 0,50. Referente
aos alunos do ensino médio e ensino de jovens e adultos (EJA) das redes públicas e
filantrópicas, esses passaram a receber cobertura em 2009. Os valores destinados a
esses alunos e também aos do ensino fundamental chega em 2013 à R$ 0,30. Quanto
aos escolares indígenas e quilombolas, também houve reajuste que passou de R$ 0,44
em 2004 para R$ 0,60 em 2010 e se mantém até os dias atuais. Além de alguns
reajustes, em 2013, também há o anúncio de mais uma cobertura por parte do governo
federal, que é a dos alunos de ensino integral (Mais Educação), tendo repasse de R$
0,90. Todos os valores citados acima são repassados por aluno/dia (FNDE, 2013).
A Tabela 5 apresenta a evolução dos valores repassados pelo FNDE para o
Pnae a partir de 1995 a 2012, dos quais, desde 2009, no mínimo 30% dos recursos
financeiros são destinados à aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar.
29
Tabela 5 Evolução dos Valores dos Repasses do Fnde para o Pnae. 1995 a 2014.
Ano Recursos Financeiros (Em milhões de R$)
Alunos atendidos (Em milhões)
Valor correspondente a
30% de Aquisição da Agricultura Familiar (Em milhões de R$)
1995 590,1 33,2 -- 1996 454,1 30,5 -- 1997 672,8 35,1 -- 1998 785,3 35,3 -- 1999 871,7 36,9 -- 2000 901,7 37,1 -- 2001 920,2 37,1 -- 2002 848,6 36,9 -- 2003 954,2 37,3 -- 2004 1.025 37,8 -- 2005 1.266 36,4 -- 2006 1.500 36,3 -- 2007 1.520 35,7 -- 2008 1.490 34,6 -- 2009 2.013 47,0 603,9 2010 3.034 45,6 910,2 2011 3.051 44,4 915,3 2012 3.306 43,1 991,8 2013 3.500 43 1.050
Fonte: FNDE (2014).
Schneider et al. (2010) afirmam que essa Lei 11.947/09 foi um marco nas
políticas públicas relacionadas à Segurança Alimentar, porque ampara, explicitamente,
o agricultor familiar quando obriga as entidades executoras a utilizar no mínimo 30% do
valor remetido pelo FNDE na aquisição de gêneros alimentícios destes fornecedores,
além de inovar no que diz respeito à legislação das aquisições públicas brasileiras, que
dispensa o processo licitatório quando o fornecedor for caracterizado como agricultor
familiar (SCHNEIDER et al., 2010). Tal dispensa encontra-se no art. 14 da referida Lei:
Art. 14. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas
30
organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas. § 1º A aquisição de que trata este artigo poderá ser realizada dispensando-se o procedimento licitatório, desde que os preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local, observando-se os princípios inscritos no art. 37 da Constituição Federal, e os alimentos atendam às exigências do controle de qualidade estabelecidas pelas normas que regulamentam a matéria.
A aquisição de gêneros para a alimentação escolar com recursos do próprio
Programa pode ser viabilizada de três formas: 1) Lei de Licitações – 8.666/ 1993; 2) Lei
11.947/2009 e Resolução nº 38/ 2009 e; 3) por meio do PAA (Programa de Aquisição
de Alimentos) – Decreto 6959/2009 (Compra Direta).
O Consea (2010), em seu resumo executivo de 2010, apontou um desafio para
Pnae que é a importância dele consolidar e disseminar o seu sistema de monitoramento
e avaliação, para fazer do Programa um espaço efetivo para a promoção da
alimentação saudável e para a formação de sujeitos de direitos.
31
3.2 AQUISIÇÃO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS DA AGRICULTURA FAMILIAR
PELO PNAE
Com a finalidade de regulamentar e desburocratizar o acesso de produtos
advindos da agricultura familiar, o Presidente do Conselho Deliberativo do FNDE, no
uso de suas atribuições legais, estabeleceu as primeiras normas para a execução
técnica e administrativa do Pnae e para a transferência de recursos financeiros da
União aos municípios através de Resolução Normativa.
Para melhor entendimento do conteúdo desse aparato legal, a seguir são
apresentadas definições de diversos termos:
- Entidade Executora: órgão público autorizado a receber, administrar e utilizar o
recurso repassado pelo FNDE, que são as Secretarias de Educação, sejam Estadual,
Municipal, do Distrito Federal ou das escolas federais (BRASIL, 2009).
- Entidade Articuladora: entidades representativas da agricultura familiar,
cadastrada(s) no Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural (Sibrater),
Sindicato de Trabalhadores Rurais e de Trabalhadores da Agricultura Familiar (Sintraf)
e entidades credenciadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para
emissão da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP). As entidades articuladoras
devem assessorar e articular os agricultores familiares detentores de DAP Física10 para
a elaboração do Projeto de Venda11 (BRASIL, 2013).
- Grupos Formais: empreendedores familiares rurais constituídos em
Cooperativas e Associações, que devem ter DAP Jurídica12 (BRASIL, 2009).
- Grupos Informais: agricultores familiares e empreendedores familiares que não
estão constituídos em Cooperativas e Associações (BRASIL, 2009). Conforme o art. 22
(Resolução nº 38/2009),
§ 1º Os Grupos Informais deverão ser cadastrados junto à Entidade Executora por uma Entidade Articuladora, responsável técnica pela elaboração do Projeto de Venda de Gêneros Alimentícios da Agricultura Familiar para a Alimentação Escolar conforme.
10
Documento utilizado como instrumento de identificação do agricultor familiar para acessar as políticas públicas.
11 Ver Anexo 1.
12 Documento utilizado como instrumento de identificação de organizações de agricultor familiares
para poderem acessar as políticas públicas.
32
- Licitação: a Lei nº 8.666, de 1993, ao regulamentar o artigo 37, inciso XXI, da
Constituição Federal, estabeleceu normas gerais sobre licitações e contratos administrativos
pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no
âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (BRASIL,
2013)
Licitação é o procedimento administrativo formal em que a Administração Pública convoca, mediante condições estabelecidas em ato próprio (edital ou convite), empresas interessadas na apresentação de propostas para o oferecimento de bens e serviços. A licitação objetiva garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração, de maneira a assegurar oportunidade igual a todos os interessados e possibilitar o comparecimento ao certame do maior número possível de concorrentes (idem).
- Chamada pública:
Considera-se chamada pública o procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para aquisição de gêneros alimentícios provenientes da Agricultura Familiar e/ou Empreendedores Familiares Rurais ou suas organizações. (BRASIL, 2013).
Dando continuidade à apresentação das normas técnicas que regulamentaram
ou regulamentam o Pnae, destaca-se que a primeira resolução publicada referente ao
tema foi a Resolução/CD/FNDE nº 38/2009 (BRASIL, 2009); posteriormente veio a
Resolução/CD/FNDE nº 25/2012 com a finalidade de alterar parte da redação da
resolução anterior; e, por último, foi publicada a Resolução/CD/FNDE nº 26/2013, a qual
revogou as resoluções anteriores.
Portanto, na Resolução Normativa constam as normas técnicas que
regulamentam determinada Lei, de maneira a determinar quais são os procedimentos
para se enquadrar em tal Lei. No caso do Pnae, a resolução busca regulamentar as
ações dos Nutricionistas, Secretários de Educação e como devem ser reali
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