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apontam para números impressionantes, da ordem das5x1010 t/ano de várias substâncias geológicas, o quesignifica que a interferência do Homem no geossiste-ma global corresponde já a valores superiores aos dageração de novo material crustal nas cristas de expan-são oceânica ou aos da formação de montanhas e ero-são. Das consequências de tal facto ninguém podeainda adiantar resposta credível, ignorância que é, nomínimo, motivo de séria apreensão.

Graças ao progresso científicodas últimas décadas, em particularnos ramos das Geociências, sabe-seque os recursos minerais, ou, deforma mais abrangente, recursosgeológicos, mesmo aqueles queocorrem em quantidades diminu-tas, devem ser entendidos comoprodutos normais de processos dociclo geológico e não particularida-des ou “caprichos” da Natureza, deocorrência aleatória. Sempre quedeterminados factores se conjugam,o fenómeno mineralizante aconte-ce. A intensidade do mesmo é quevaria de caso para caso, podendo,em consequência, formar-se desdea simples ocorrência mineral até aodepósito de enormes dimensões.Assim, muito embora haja impor-tantes lacunas de conhecimento noscomplexos sistemas metalogenéti-cos que ocorrem no interior dacrusta terrestre, a verdade é que es-tão já relativamente bem definidose caracterizados os ambientes físi-cos onde a generalidade dos dife-rentes tipos de jazigos minerais seencontram.

om a escalada das mudanças que vêm revolucio-nando a civilização actual, decorrentes, em gran-de medida, das novas tecnologias da informação,

da biotecnologia, dos novos materiais e da maior e me-lhor percepção da vulnerabilidade do ambiente natu-ral, muitos parecem esquecer-se de que praticamentetodas as substâncias necessárias à saúde e prosperida-de provêm da Terra. Tais substâncias, genericamenteapelidadas de recursos não renováveis, estão, sempreestiveram, directa ou indirectamen-te envolvidas nos processos produ-tivos, desde a mais rudimentarindústria do homem pré-histórico,até ao fabrico de vestuário, do pa-pel, dos modernos materiais com-pósitos e cerâmicas ou da ultra-so-fisticada optoelectrónica. Por para-doxal que pareça, até a mera pro-dução de bens alimentares, típicosrecursos renováveis, é hoje, cadavez mais, dependente do consumode recursos não renováveis, tradu-zido em equipamento, energia, fer-til izantes e outros produtosquímicos. A indispensabilidade dosrecursos para a vida é bem patentenas mais diversas estatísticas. De1900 a 1970 a população mundialcresceu cerca de 2,3 vezes, mas, emcontrapartida, o consumo de mine-rais aumentou 12 vezes. Por outrolado, os números actuais indicamque estão a ser extraídas, por anoe por pessoa, cerca de 10 toneladasde material da crusta terrestre, doqual 30% é rejeitado e depositadoalgures como estéril. Tais valoresquando computados à escala global,

O conhecimento que tivermos da Base de Recursos que a Geologia e a História noslegaram e o modo como a soubermos explorar e aproveitar serão, como sempre foram,

factores determinantes de progresso e bem estar social.

PASSADO E FUTURO DOS RECURSOSMINERAIS EM PORTUGAL

DELFIM DE CARVALHO

C

Licenciado em Ciências Geológicas (FCUL), Delfimde Carvalho obteve formação pós-graduada em Geologia Económica na Universidade do Arizona, participou em vários projectos de prospecção mi- neira e teve contribuição activa na descoberta de depósitos minerais. Formulou e desenvolveu mo- delos metalogénicos orientadores da prospecção e pesquisa de jazigos de sulfuretos polimetálicos. É autor ou co-autor de várias dezenas de trabalhos em livros e revistas, publicados no país e no es- trangeiro. Conferencista convidado em Portugal, Espanha, Bélgica, Japão e EUA, delegado nacionalno Programa “Matérias-Primas” da CEE, é perito avaliador de programas internacionais de inves- tigação. Investigador-Coordenador (IGM) e Profes- sor Convidado de Geologia Económica na Universidade Nova de Lisboa, foi Director dos Ser- viços Geológicos de Portugal de 1978 a 1992.

Os recursos são como o ar, sem grande importânciaaté se sentir a sua falta

(anónimo)

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O progresso na compreensão da tectónica global,essencialmente derivado da teoria da tectónica de pla-cas a partir da década de 60, conjugado com os inú-meros dados sobre a tipologia e distribuiçãoespaço-temporal dos diferentes jazigos minerais, emparticular nas cadeias orogénicas de formação recen-te, e com os resultados do estudo de sistemas minera-lizantes activos nos limites de placas oceânicas, levouà conclusão de que a cada ambiente geotectónico es-tão associados determinados tipos de recursos geoló-gicos. Por outro lado, tudo leva a crer que osmecanismos da tectónica global, consequência da li-bertação da energia do interior da Terra, terão, no es-sencial, sempre actuado de forma semelhante, vindotais ambientes a ser, pelo menos desde o Proterozói-co (2500 Ma), ciclicamente gerados ao longo dos tem-pos geológicos.

A definição tipológica e a sistematização dos jazi-gos à escala global, bem como o conhecimento dos res-pectivos enquadramentos geológicos, fazem com que,uma vez conhecida a geologia de determinada região,caracterizados os materiais que nela ocorrem, defini-dos que sejam o respectivo ambiente geotectónico eo nível de erosão actual, ou seja, em síntese, a históriageológica dessa região, fácil se torna aplicar as técni-cas de análise predictiva e estimar a sua potencialida-de em recursos. É, assim, possível obter, com elevadasegurança, dados fundamentais quanto à previsibilida-de sobre quais as substâncias possíveis, tipo de jazidas,e, até mesmo, as gamas de teores mais prováveis e ograu de dificuldade na descoberta de eventuais jazigosminerais que em tal região possam existir.

Assim, se, por exemplo, se pretender saber porquerazão um granito formado numa cadeia de montanhascomo a dos Andes tem um cortejo de mineralizaçõesassociadas bem distinto dum outro granito gerado nu-ma cadeia do tipo Himalaias, muita teoria e grande so-ma de dados de petrogeoquímica, de geologiaisotópica, ou de metalogenia poderiam ser adiantadospara tentar explicar tal facto. Mas, se a resposta plena-mente convincente ainda não é, para alguns autores,possível de obter, o mesmo não aconteceria, porém,se a questão fosse a de prever o potencial duma áreagranítica, representada num mapa geológico da qualse conhece com adequado rigor a história geológicae, eventualmente, a história mineira. É a aplicação dateoria e da análise global dos dados a funcionar comoeficaz instrumento prático de inestimável valor. Comefeito, o conhecimento da evolução geotectónica du-ma região resulta da integração de múltipla informa-ção de diferentes domínios das geociências, podendoalguma dela ser, só por si, determinante e secundari-zar a relevância de outra, conhecida ou desconheci-da. É o que vem já, por sistema, a ser praticado nosgabinetes de planeamento de prospecção e pesquisa derecursos geológicos das empresas e organismos moder-nos, com recursos às tecnologias da informação, à mo-delação matemática e simulação. Porém, se tais dados

de base não existirem tudo ficará bloqueado à partida.Todavia, a história geológica da maioria dos terre-

nos antigos pode ser complexa e difícil de desvendarpor terem sido submetidos a profundas transformaçõesem diferentes ciclos orogénicos. Curiosamente, casoshá em que são, inclusive, as próprias mineralizaçõesque ajudam a inferir os ambientes geotectónicos, talé a especificidade da sua formação e modo de ocor-rência.

Processos geradores de recursos minerais

No âmbito destas genéricas considerações introdu-tórias, parece ajustado lembrar, em traços muito ge-rais, os principais processos de formação de recursosminerais. Resumidamente, pode dizer-se que os depó-sitos minerais resultam da concentração de um ou maisminerais por uma das seguintes vias:

1. Concentração devida à diferenciação por cristaliza-ção fraccionada de um magma. Tal diferenciação, apartir de magma basáltico de baixa viscosidade, podeacontecer quando os primeiros minerais formadosconstituem fases mais densas, as quais se afundam ra-pidamente no líquido e acumulam na parte inferior dacâmara magmática. São os casos da cromite, platina eplatinóides, por exemplo. Em contrapartida, a crista-lização fraccionada de um magma granítico pode ge-rar uma fracção residual, fundida, progressivamenteenriquecida em elementos químicos não integrados nosminerais que se foram formando. A separação e pos-terior cristalização dessa fracção vai originar rochas ri-cas nesses elementos. Estão neste caso, os pegmatitosque podem conter berilo, nióbio, césio, tântalo, urâ-nio, lítio e outros elementos menores muito raros. Es-tes grupos de mineralizações associam-se,respectivamente, às fases “proto” e “tardi” da evolu-ção magmática propriamente dita e tomam a designa-ção de depósitos minerais magmáticos.

2. Concentração por precipitação a partir de fluidosaquosos quentes que percorrem fracturas ou espaçosintergranulares das rochas, dando enorme variedadede elementos metálicos, designadamente: cobre, zin-co, chumbo, prata, ouro, estanho, volfrâmio, molib-dénio, etc. A água dos fluidos pode ter, conforme oscasos, uma ou mais proveniências (magmática, meta-mórfica, fóssil, meteórica ou água do mar) e atingir sa-linidades relativamente elevadas. Tais fluidosconstituem soluções hidrotermais, as quais se compor-tam como que salmouras quentes e ricas em metais.A precipitação pode ocorrer devida à queda da tem-peratura ou da pressão, à ocorrência de ebulição dofluido ou a reacções de equilíbrio entre este e a rochaencaixante por onde passa. Ocorrem predominante-mente em filões, filonetes ou em massas lenticularese tomam a designação genérica de depósitos hidro-termais.

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3. Concentração por precipitação dos elementos trans-portados em solução nas águas de lagos ou na água ma-rinha em bacias circunscritas, dando origem aosdepósitos sedimentares, tais como: gesso, evapori-tos (ClNa, ClK, Co3Na2) e vários jazigos de ferro. Es-tas concentrações formam-se concomitantemente comos processos de sedimentação em camadas concordan-tes com os estratos.

4. Concentração hidrogravítica de minerais densos oude metais a partir de águas em movimento de rios eriachos formando “placers”; são bem conhecidos oscasos do ouro, diamantes, cassiterite, zircão, terras--raras, etc.

5. Concentração por alteração meteórica provocadapelas águas das chuvas, dando origem aos depósitosresiduais. Caso das bauxites donde se extrai o alumí-nio, as laterites niquelíferas, etc. A alteração meteóri-ca pode também destruir jazigos, como foi o caso deChança, a norte de S. Domingos, ou transformar mine-ralizações sub-económicas em jazigos rentáveis devi-do à formação de minerais supergénicos, muito maisricos em metal do que os minerais primários de quederivaram. Tal aconteceu em vários depósitos de co-bre noutros países, e em Portugal no pequeno jazigode zinco calaminar de Vila Ruiva (Moura) já explorado.

6. Formação de combustíveis fósseis por:– Concentração de matéria orgânica (fito e zooplanc-ton) em sedimentos e em rochas sedimentares mari-nhas que, por decomposição química, pode gerarhidrocarbonetos (óleo e gás) em “rochas-mãe”, osquais podem migrar e ser retidos em armadilhas natu-rais “rochas-reservatório”.– Acumulação de restos de plantas em pântanos e ba-cias sedimentares continentais que por incarbonização,devida à evolução diagenética ou a metamorfismo, dãocarvão, ou seja, uma rocha composta por mais de 50%,em peso, de matéria orgânica.

Os depósitos ou jazidas minerais assim formadospodem, quando economicamente exploráveis, cons-tituir jazigos e dar lugar a minas de lavra subterrâneaou a céu aberto para exploração do minério, normal-mente constituído por minerais úteis e ganga. O mi-nério é geralmente concentrado nas instalações damina (operações mineralúrgicas) e ganha valor comer-cial, mas do concentrado ao metal praticamente puropode haver um longo caminho a percorrer, passandopor processos metalúrgicos, mais ou menos comple-xos, casos do cobre, do tungsténio e de tantos outros.

Para os minerais não metálicos as etapas do pro-cesso produtivo desde a mina à utilização final são,quase sempre, mais simples e em menor número, e ca-sos há em que o produto tal qual extraído pode ser di-rectamente aplicado na indústria transformadora, porexemplo o sal-gema, enxofre, carvão, etc.

A exploração dos hidrocarbonetos faz-se por po-ços de produção, com ou sem bombagem, e a extrac-

ção de sal-gema pode, para além dos tradicionais mé-todos de lavra, ser obtida por dissolução com água eformação de salmoura que é “bombeada” para a su-perfície. Processos envolvendo lixiviação são tambémutilizados na exploração de alguns metais (p.e. Cu, Au,U, Ni), normalmente a partir de minérios de baixo teor.Por outro lado, o enxofre pode ser explorado após fu-são “in situ” provocada pela injecção de água quente(método Frash).

Classificação de Recursos

Toda a substância de natureza geológica (sólida, lí-quida, gasosa) ou o calor geotérmico, podem dar lu-gar a um recurso sempre que, em função da sua formae concentração na crusta terrestre, é, ou poderá vir aser, economicamente viável a extracção de um bemútil e comercializável.

O conjunto dos depósitos, ou seja, das concentra-ções de recursos conhecidas e desconhecidas existen-tes na parte acessível da crusta terrestre constitui aBase de Recursos Geológicos.

A necessidade de conhecer as disponibilidades derecursos à escala global, em boa medida na sequênciado sinal de alarme dado nos anos 60 pelo Club de Ro-ma, despertou a atenção para a conveniência de se vira utilizar uma linguagem comum nesta matéria. Por talfacto, surgiram diferentes modelos de classificação derecursos, designadamente o proposto conjuntamentepelo USGS (United States Geological Survey) e USBM(United States Bureau of Mines) em 1976 com os rea-justamentos posteriores, e o da ONU em 1979, pare-cendo ser aquele o preferencialmente seguido nasempresas e serviços (Fig. l). Tais classificações podemser aplicadas a várias escalas, desde a global até à dodistrito mineiro ou à do simples depósito mineral. Sen-do a figura suficientemente explícita, e estando forade causa entrar aqui na definição de todos os termos,interessará apenas destacar o significado de Reservas,ou seja, a parte dos recursos conhecidos que podem,no momento, ser legal e economicamente explorados.

Fig. 1 – Classificação de Recursos Minerais (USGS-USBM, 1976,1986).

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Trata-se, pois, de um conceito dinâmico. Quer isto di-zer que, para além das propriedades intrínsecas da mi-neralização e das características da jazida, há quecontar com vários outros factores de natureza tecno-lógica, económica e política para que um depósito, oujazida, possa ser considerado um jazigo com reservassuficientes para dar lugar a uma exploração mineira.De salientar que, mesmo um depósito mineral muitogrande à escala mundial, pode, num dado momento,não conter reservas mas apenas recursos. Este é o ca-so do depósito de ferro de Moncorvo, por exemplo.A conjugação daqueles factores faz, assim, variar os li-mites inferiores das Reservas e da Base de Reservas.A Base de Reservas (conjunto sombreado na figura) in-clui não só as reservas propriamente ditas, mas tam-bém os recursos que oferecem um potencial razoávelde poderem vir a ser economicamente explorados emhorizonte temporal para além do que entrou em con-ta apenas com a tecnologia dominante e a envolventeeconómica corrente.

Recursos minerais e matriz geológica

É na área correspondente à parte portuguesa do de-signado Maciço Hespérico que se localizam a quasetotalidade das ocorrências metálicas e os principais de-pósitos minerais do País (Fig. 2). Aquele maciço cons-titui a fracção mais contínua do soco hercínico docontinente europeu e as formações geológicas que oconstituem compreendem variada gama de rochas se-dimentares metamorfizadas e rochas ígneas (vulcâni-cas e plutónicas) com idades que vão do Precâmbricosuperior até ao Paleozóico superior (aprox. de 700 a250 Ma). Foi neste período de tempo que decorreramos processos geológicos do ciclo hercínico, envolven-do erosão, transporte e sedimentação, magmatismo,metamorfismo e deformação tectónica, culminando naorogenia a que se associou intensa actividade ígnea gra-nítica e consolidação dos terrenos, gerando-se a cadeiade montanhas hercínica ou varisca. Mais tarde, a ero-são começou a actuar aplanando-a, reiniciando-se

Fig. 2 – Grandes unidades geológicas e distribuição dos principaisdepósitos minerais.

Fig. 3 – Mineralizações na coluna estratigráfica em Portugal.

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assim um novo ciclo geológico (ciclo alpino) com a de-posição de sedimentos em bacias de plataforma está-vel, dando origem às Orlas Meso-Cenozóicas Ocidental eAlgarvia (Fig. 2).

As diversas mineralizações do Maciço Hespéricoforam condicionadas pelos ambientes geotectónicos dociclo hercínico (Fig. 3) e podem enquadrar-se em doisgrandes grupos:– jazigos singenéticos, ou seja, os que se formaram du-rante a fase deposicional concomitantemente com asrochas que os acompanham, como resultado da inte-racção de factores de natureza vulcânica, sedimento-lógica e paleogeográfica. Ocorrem geralmente emcamadas, leitos ou lentículas interestratificadas.Destaca-se nesta fase a formação do depósito de Mon-corvo e a dos importantes jazigos de sulfuretos poli-metálicos da Faixa Piritosa, em especial Neves-Corvo(Cu, Sn, Zn, Pb, Ag, S) e Aljustrel (Cu, Zn, Pb, Ag, S).O primeiro da classe 2 (grande) e os dois últimos daclasse 3 (muito grande), segundo a classificação, combase na tonelagem de metal ou de substância útil, adop-tada no Atlas Mineiro Mundial, a qual prevê ainda umaclasse 4 (excepcional) para englobar jazigos de gigan-tesca dimensão. Na Península, só Rio Tinto, em Espa-nha, (que também se inclui neste grupo de jazigos), seconsiderado na sua forma original, poderia, porven-tura, ser incluído nessa classe. Para dar ideia da rari-dade bastará dizer que se contam pelos dedos osdepósitos minerais do globo que ultrapassam a barrei-ra da classe 3 para a 4. Ligados ao vulcanismo há ain-da a referir pequenos depósitos e ocorrências de Mnna Faixa Piritosa (Lagoas do Paço, Ferragudo, Balan-ça), os de Zn-Pb (Ag) -Cu (Algares, Balsa-Portel ePreguiça-Ficalho), e os de Fe (Orada-Serpa e Vale dePães-Vidigueira);– jazigos epigenéticos - ocorrem geralmente em fi-lões ou em massas irregulares; resultaram essencial-mente da actividade magmática, predominantementegranítica, que teve lugar durante e depois das fases oro-génicas principais (Carbónico, 300-270 Ma). É vastís-sima a gama de mineralizações que então se formaramconforme se pode depreender da figura 3, sendo maisimportantes as de W, Sn, Au. É neste grupo que se in-clui o jazigo de volframite da Panasqueira (Fundão),mundialmente famoso por ser o primeiro produtor detungsténio da Europa desde 1934 e também pela rarabeleza e espectacularidade dos cristais. Juntamentecom o W a Panasqueira produz também Sn e Cu comosub-produtos. Além deste há a referir, entre outras: asjazidas de ouro e prata de Jales (Vila Pouca de Aguiar),de tungsténio (volframite e scheelite) da Borralha(Montalegre) - durante muito tempo o segundo pro-dutor em Portugal - e ainda as de Argozelo (Sn-W),Montesinho (Sn), Vale das Gatas (W-Sn), todos em Trás--os-Montes, e a do Cercal (Fe-Mn-Ba), no Alentejo.

Muito embora as concentrações que deram lugaraos depósitos minerais de urânio tenham ocorrido pos-teriormente (Jurássico, Cretácico e, inclusive, no Qua-ternário), a origem primária do urânio prende-se comos granitos que resultaram da actividade magmática atrásreferida. Igualmente dependente dos granitos

hercínicos há que salientar os jazigos de caulino quese formaram por alteração de minerais primários des-tas rochas, devida a actividade hidrotermal, bem co-mo a processos supergénicos de meteorizaçãoassociados à evolução paleogeográfica.

Dos depósitos minerais não formados no ciclo her-cínico há, como está indicado na figura 3, que referir:os pequenos depósitos de antracite da bacia carboní-fera do Douro (Pejão, S. Pedro da Cova), os conside- ráveis jazigos de evaporitos (sal-gema e gesso) queocorrem na base do Jurássico em estruturas diapíricas(os quais, para além do sal, podem proporcionar va-liosas cavernas para armazenamento de variados pro-dutos), pequenos depósitos sedimentares de manganês(Anadia) e ocorrências de ferro na base do Mesozóico,pequenos depósitos de lignitos do Cabo Mondego (Ju-rássico) e Rio Maior (Pliocénico), de diatomite, e ain-da pequenos depósitos aluvionares de Sn, Ti, Nb - Tae de Au (Gaia-Maçainhas, Nave de Haver). Na base doMesozóico são conhecidas algumas ocorrências de Cu(Fateota - Santiago do Cacém) sem interesse econó-mico, e, no Quartenário, pequenos depósitos de turfa.

São igualmente conhecidas, desde o fim do segun-do quartel do século passado, diversas manifestaçõespetrolíferas nas orlas meso-cenozóicas. Incluem-se fun-damentalmente no Jurássico (Lias e Oxfordiano) as“rochas-mãe” do petróleo, o qual migrou para“rochas-armazém” de diferentes idades (Jurássico, Cre-tácico e outras) donde se obteve já a inequívoca pro-va da existência de petróleo, no “onshore” e no“offshore”, mas, até à data, sem dimensão económica.

Para além destes recursos importa destacar a rele-vante importância económica das rochas ornamentaisque advém das enormes reservas e boa qualidade de már-mores (2.o exportador europeu), granitos e calcá-rios (Fig. 4), bem como a riqueza e variedade de águasminerais (38 termas) e de águas de nascente (24 ofici-nas de engarrafamento).

Fig. 4 – Localização dos centros produtores dos principais tiposde rochas ornamentais. Adaptado do Catálogo de Rochas Ornamen-tais, DGGM, 1983.

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A análise genérica da dotação de recursos geológi-cos conhecidos na Base de Recursos do território na-cional permite, desde logo, apurar os seguintes factosprincipais:

– Apesar da exiguidade da expressão geográfica, acomplexa evolução geológica do território criou gran-de variedade de ocorrências e de jazidas minerais,destacando-se a formação de três depósitos da classe3 mundial (“muito grande”): Neves-Corvo, Aljustrel(mais de 10 000 000 de ton. de Cu + Pb + Zn) e Panas-queira (mais de 50 000 ton. de W) e cinco depó-sitos da classe 2 (“grande”): Moncorvo (mais de100 000 000 ton. de Fe), Borralha (mais de 10 000t de W), Loulé, Matacães e Carriço (mais de 100 000000 ton. de ClNa, jazigos estes apenas parcialmente co-nhecidos).

– Nos recursos energéticos sobressaem os depósitosde minerais radioactivos que, embora de pequena di-mensão, detêm no conjunto importantes quantidadesde urânio (Nisa e outros) no quadro europeu e, atémesmo, mundial. Em relação aos combustíveis fósseisdestacam-se a exiguidade dos depósitos e a fraca qua-lidade dos carvões, não podendo tal cenário vir amodificar-se. No referente ao petróleo e gás, o que sepode com segurança dizer, é que constitui bom sinalhaver a certeza de que as condições geológicas propi-ciaram a sua formação. O que é conhecido até agorapouco mais representa que meros, embora bons, in-dícios.

Existe um considerável potencial geotérmico debaixa-média entalpia (bacias sedimentares, áreas de vul-canismo recente e zonas termais), bem como de altaentalpia, para produção de electricidade, que começaa ser realidade nos Açores e se poderá, no futuro, de-senvolver noutras regiões de gradiente geotérmicoanómalo, do continente e ilhas, logo que a tecnologiae a competitividade económica do processo conheci-do por HDR (“Hot Dry Rock”) o permitam.

– O País é particularmente rico em alguns recursosdo sector “não metálico”, em particular, de mármo-res, granitos e calcários, e em recursos hidromi-nerais.

Recursos minerais em Portugal- uma síntese retrospectiva

Do passado longínquo

Da simples leitura da distribuição geográfica das es-tações arqueológicas conhecidas e do contexto geo-lógico em que se situam, fácil se torna concluir queterão sido factores geológicos, em particular os recur-sos, que mais determinaram a escolha de locais parapovoamentos primitivos. A existência de água, de ca-vernas ou grutas, de rochas siliciosas, e, mais tarde,já no Neolítico e nas épocas seguintes da Antiguidade,os bons solos, argilas e metais, foram condimentos

decisivos para a fixação e objectivos de conquista emsucessivas fases de colonização do território (Fig. 5).Muito embora haja a tendência, compreensível, aliás,para ao se tratar destes períodos valorizar sobretudoos metais, será interessante lembrar que a obtenção deuma ponta de seta de silex em determinada região po-dia ser tão ou mais difícil do que uma pepita de ouro;e o agora desprezado silex era, porventura, bem maisútil ao possuidor.

Fig. 5 – Exemplos de aproveitamento de recursos minerais em in-dústrias pré-históricas em Portugal. Da esquerda para a direita, res-pectivamente: biface – Juncal, Alpiarça; ponta de lança – Montiraz,Santarém; punhal de bronze – Montelavar (pedreira Pêra Gorda).Museu dos Serviços Geológicos de Portugal.

A riqueza da Península Ibérica em recursos mine-rais e as condições naturais muito favoráveis à sua des-coberta permitiram que fossem explorados desdetempos remotos, como se conclui dos vestígios encon-trados em diversas minas e estações metalúrgicas atri-buídas a povos pré-Romanos. Fenícios, Tartessos eCartagineses terão sido os mais activos nesse períododa exploração, seguidos depois pela impressionante ac-tividade mineira romana. Os metais extraídos foramo ouro, cobre, estanho, prata e chumbo. As aluviõesauríferas e os metais nativos (cobre, ouro, prata) quelocalmente ocorrem nas zonas de oxidação dos jazi-gos de sulfuretos, terão sido os primeiros a serem des-cobertos. Tais zonas de oxidação, que formam os“gossans” ou chapéus de ferro, constituem quase sem-pre pontos conspícuos na paisagem, não só pela mor-fologia do terreno mas, também, pela variedade decores observáveis, predominantemente vermelhas, cas-tanhas e amarelas dos óxidos e hidróxidos de ferro oudos verdes e azuis dos carbonatos de cobre, dando ní-tido contraste com as rochas comuns. A figura 6 mos-tra um belo exemplar proveniente de um “gossan”,tirado do livro de Blanchard (Interpretation of Lea-ched Outcrops, 1968), autor que dedicou a sua vidaao estudo dos minerais oxidados. Amostras semelhan-

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tes eram utilizadas para ensinar os primeiros prospec-tores e serviam de referência para as pesquisas. Os Ro-manos foram tão eficazes que se pode afirmar teremdescoberto praticamente todos os chapéus de ferroexistentes na Península Ibérica. Os frutos da experiên-cia milenária de várias civilizações foram sendo com-pilados em textos da época helenístico-romana,contendo princípios de pesquisa geológico-mineira, dotipo acabado de referir.

Apesar de muita incógnita persistir, podeconsiderar-se que a actividade mineira e metalúrgicana antiguidade em Portugal está relativamente bem co-nhecida, conforme se pode concluir dos trabalhos maiscompletos sobre o assunto, Allen, J.C. (A mineraçãoem Portugal na Antiguidade, Bol. Minas, 1965) e Do-mergue, C. (Les mines de la péninsule ibérique dansl’antiquité romaine, Coll. École Française de Rome,n.o 127, 1990), dos quais se extraíram, no essencial,muitos dos dados e ideias aqui apresentadas.

Não restam dúvidas de que a exploração dos me-tais ocorrera já nas épocas pré-romanas desde o Eneo-lítico (3 300-2 300 a.C.). Da época pré-Campaniforme(Zambujal - 3 145 a 2 405 a.C.), são conhecidos frag-mentos de cobre fundido e diversos objectos em co-bre, atestando a actividade metalúrgica para este metaladmitindo-se, até, que tanto o cobre como a prata te-riam sido explorados, muito provavelmente nos jazi-gos da Faixa Piritosa, e exportados da Península porvolta dos 3 000 anos a.C. É consensual a ideia de queo cobre terá sido introduzido na Península pelos pros-pectores do Mediterrâneo Oriental desembarcados nacosta sul de Espanha, dando origem à conhecida cul-tura de Almeria. Alguns autores salientam mesmo a es-treita ligação da colonização megalítica das zonascosteiras atlânticas com o comércio e a prospecção eexploração metalífera. Da célebre cultura do vaso

campaniforme (2 100 - 1 900 a.C.), com os notáveistestemunhos de Vila Nova de S. Pedro e do Zambujal,típicos vasos de cerâmica são acompanhados de pu-nhais e cabeças de setas.

A Idade do Bronze na Península Ibérica ficou assi-nalada por vasta actividade extractiva em minas de co-bre. Nem na época romana foram trabalhadas tantasjazidas de cobre, daí resultando a utilização, na Penín-sula, de cobres arsenicais, ou bronzes primitivos, atéà introdução do verdadeiro bronze com estanho. Denotar, porém, que se sabe hoje haver também estanhoem quantidades apreciáveis nalguns chapéus de ferroda Faixa Piritosa, o que terá facilitado, sem o saberem,a obtenção de bronzes impuros. Por outro lado, os es-tudos arqueológicos das minas de chumbo do SE daPenínsula veio a revelar que a extracção da prata a par-tir do sulfureto de chumbo (galena) era já praticada pe-los povos argáricos na Idade do Bronze. Técnicas essasque, um pouco mais tarde, vieram a ser aplicadas nosjazigos da Faixa Piritosa.

Com a chegada dos Fenícios à Península (fundado-res de Gades em 1 100 a.C., hoje Cádis) a pesquisa ea indústria minero-metalúrgica sofreram grande impul-so, em particular o estanho e a prata, mais pela acçãoindirecta decorrente do comércio por eles incremen-tado do que pelo seu labor como exploradores acti-vos. Mais tarde também os Tartessos (900/800-500a.C.) exploraram os jazigos da Faixa Piritosa, essencial-mente para a prata. Seguiram-se-lhe os Cartagineses queigualmente procuraram e exploraram a prata, para fi-nanciar as duas primeiras guerras púnicas com Roma,mas actuaram principalmente na região de Cartago No-va (hoje Cartagena), de que foram fundadores. Graçasa Estrabão (58 a.C. - 25 d.C.), ao transcrever parte dosescritos de Políbio (200 a.C.) que visitara a Penínsulae acompanhara os Romanos aquando da queda de Nu-mância em 133 a.C., foi possível colher conhecimen-tos sobre a actividade mineira e metalúrgica naPenínsula, região que, de acordo com as descrições,mais ou menos fantasiosas dos historiadores gregos eromanos, seria imensamente fértil em riquezas mine-rais. Riquezas essas que iriam ser objecto de intensaprocura e exploração no período de mais de seis sécu-los de ocupação romana, desde o fim da Segunda Guer-ra Púnica até meados do séc. V. Muito do que se sabeda sua actividade ficou a dever-se ao historiador Plí-neo o Velho (23 a.C. - 79 d.C.), que durante noveanos foi procurador-geral para toda a Península, e aoestudo das várias peças arqueológicas encontradas jun-to das explorações. É curiosa a preocupação de rigorpor Plíneo ao distinguir nos seus escritos o minério (ue-na) da ganga ou estéril (lápis, terra ou arena). Porexemplo, ao referir-se à pirite não utilizava o termouena, como fazia para os minerais de cobre.

A actividade mineira desenvolvida pelos Romanosna Península, extraindo ouro, prata, cobre, ferro, es-tanho, chumbo e zinco foi, a todos os títulos, verda-deiramente impressionante. Os alvos mais importantes

Fig. 6 – Amostra de minerais oxidados de um chapéu de ferro. Ti-rado de Interpretation of Leached Outcrops, Blanchard. Nevada Bu-reau of Mines Bull. 66 , 1968.

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foram os metais das jazidas de sulfuretos da Faixa Pi-ritosa no Alentejo, a exploração do ouro aluvionar (ar-rugia) e do ouro em filões (canalicium). Contam-sepor dezenas as minas que em Portugal foram trabalha-das pelos romanos, destacando-se pela importância daquantidade dos materiais removidos, as lavras em TrêsMinas e Jales (Vila Pouca de Aguiar) para ouro e prata,e Aljustrel, Caveira-Lousal e S. Domingos no Alente-jo, para cobre, ouro, prata e, talvez, ferro. Os exten-sos escoriais encontrados, os poços e galerias,ferramentas, cerâmica, vestuário e moedas, dão teste-munho de tão importante actividade. Em Três Minasonde restam duas importantes cortas (480 x 60 x 80 me 350 x 100 x 100 m) da exploração a céu aberto, e al-gumas galerias e poços, os escoriais encontrados fo-ram estimados entre 16 a 20 milhões de toneladas ecerca de 3 milhões de toneladas em Aljustrel. A explo-ração foi feita em regime de concessão em Aljustrel en-quanto que em Três Minas era pertença do estadoromano e a magnitude dos desmontes da lavra ali rea-lizados implica 2 000 homens x 200 anos de traba-lho. A exploração de Aljustrel, bem como deS. Domingos, Jales e várias outras, envolveu lavra sub-terrânea. Em Aljustrel, jazigo de Algares, os trabalhossubterrâneos atingiam 118 metros de profundidade eem Jales localizaram-se ao longo de mais de 4 Km , che-gando a tingir mais de l 200 m de extensão e 120 mde profundidade.

Os Romanos levaram as explorações das jazidas deouro até ao limite das suas possibilidades. Jales foi umcaso singular por ter permitido, nos tempos moder-nos, retomar a exploração com sucesso. O minério ex-plorado não se cingia apenas às zonas de oxidação, elesexploravam também a zona dos sulfuretos auríferosdos filões que submetiam a tratamento metalúrgico,muito favorecido no caso de Jales e Três Minas dadoque a paragénese do minério incluía minerais de chum-

bo e arsénio. A recuperação do ouro dos sulfuretos poramalgamação era já conhecida, mas em Jales não fo-ram encontrados indícios de aplicação desta técnica.

Os estudos das escórias encontradas nas minas daFaixa Piritosa, tanto em Espanha como Portugal, de-monstram bem a evolução dos conhecimentos meta-lúrgicos conseguida pelos romanos. As escórias antigas, decor castanha, pré-romanas, continham teores de co-bre da ordem dos 3,5 % , enquanto que as que se lhesobrepunham, atribuídas aos romanos (nelas foram en-contrados diversos achados dessa época) tinham cornegra e deram teores à volta dos 0,5 % Cu.

Dos inúmeros achados romanos nas minas portu-guesas há a referir dois lingotes, um de cobre, com99,5% Cu, e outro de chumbo, com 99,47% Pb, quesão testemunho da sua técnica e eficácia para obten-ção do máximo valor acrescentado (Fig. 7 ). É de crer,porém, que o lingote de chumbo não corresponda ametal extraído do minério de Aljustrel, mas sim a pro-duto trazido de outra proveniência, destinado à extrac-ção da prata. Todavia, os mais importantes achadosarqueológicos correspondem às duas célebres tábulasde bronze, também encontradas nos escoriais de Al-justrel. A primeira (fig.8) que está datada do século Ia.C., está gravada nas duas faces, encontra-se actual-mente no Museu dos Serviços Geológicos de Portugal,foi encontrada em 1876 e logo dada a conhecer nomesmo ano por Augusto Soromenho em relatóriodirigido ao Ministro do Interior (La Table de Bronzed’Aljustrel, Imprensa Nacional, Lisboa, 1877). Este do-cumento romano foi estudado por Estácio da Veiga,dele vindo a publicar a sua interpretação em 1880.

Fig. 7 – Lingotes de cobre e de chumbo da época romana. Minasde Algares, Aljustrel, Museu dos Serviços Geológicos de Portugal

Fig. 8 – Tábula de Bronze, Lei Mineira Romana, sec. I. Minas deAljustrel, Museu dos Serviços Geológicos de Portugal.

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A segunda tábula de bronze foi descoberta em1906, está gravada numa face, menciona o imperadorAdriano (117 - 136 a.C.) e encontra-se no Museu Na-cional de Arqueologia Doutor Leite Vasconcelos. Es-tes notáveis documentos, ímpares no mundo, contêmdecretos e regulamentos para aplicação à exploraçãomineira, fundição de cobre e prata, bem como a todaa actividade civil do Vicus Vipascencis, que era o no-me dado, na época, à região mineira de Aljustrel.

A clara percepção dos romanos sobre a vital im-portância da actividade mineira, a sua especificidadee as dificuldades que impunha, é bem patente na sualegislação que chegava ao ponto de prever incentivosà iniciativa individual, como demonstra a introdução,em período de declínio da actividade, da lei damna-tio ad metalla, promulgada em 1 de Outubro de 326d.C., visando estimular o interesse na exploração. Es-ta legislação destinava-se a desenvolver qualquer jazi-da susceptível de ser explorada por pequenos gruposautónomos e não para os trabalhos de grande dimen-são. Verifica-se assim a preocupação de introduzir re-gulamentos flexíveis adaptáveis à realidade. Afiscalidade variava em função da dimensão da explo-ração. Preocupações que, nos traços gerais, têm plenaactualidade.

A intensa actividade mineira dos romanos levou aoesgotamento dos recursos que na época podiam ser ex-plorados com benefício em muitos dos jazigos, impli-cando declínio acentuado na produção de ouro desdeo séc. III d.C. até ao abandono da lavra a partir do fimdo séc. IV d.C. Não há registos de actividade mineiradurante a ocupação pelos “povos bárbaros” desde ocomeço do séc. V d.C. até à ocupação árabe. Os ára-bes não tinham grande tradição mineira e durante asua permanência, até ao séc. XIII, muito poucos recur-sos minerais terão sido explorados, porventura, ape-nas o ouro aluvionar na Adiça (Almada) e algumminério das minas de Aljustrel.

Do passado recente aos nossos dias

O ressurgimento do verdadeiro interesse pelos re-cursos minerais só vem a ter eco por meados do séc.XIX como consequência da revolução industrial. Noentanto, em meados do séc.XVI nascia na Saxónia--Boémia (Erzebirge) a ciência da Geologia Mineira e em1556 Georgius AGRICOLA, físico de Chemnitz (Sa-xónia), publica o magnífico volume De Re Mettali-ca , primeiro tratado sobre jazigos minerais, ondevaloriza sobretudo a observação de campo, cita a va-rinha mágica dos vedores mas descrê dela, trata comgrande imaginação criativa os problemas da génese eda pesquisa, e revela técnicas para a exploração mi-neira e tratamento metalúrgico (Fig. 9). Trata-se de umdos primeiros livros a ser publicado, surgindo apenas40 anos após o primeiro livro impresso de Gutenberg.É curioso verificar que já naquela época Agricola fo-cava problemas do impacte ambiental da exploração

mineira, alguns deles com acuidade não muito diferen-te da actual. Os seus trabalhos científicos induziramenorme estímulo ao desenvolvimento de ideias e seurefinamento em Universidades e Academias. Com oséc. XVIII surge a corrente defensora do pragmatismopara testar as Ciências Naturais, até então mais filosó-ficas do que aplicadas, passando-se à acção de “verifi-car na prática”. O progresso é enorme e em 1756 épublicado em Paris o Mapa Geológico do Este do Ca-nadá, o qual já incluía simbologia dos depósitos mine-rais. Na Rússia, é grande o interesse pelos depósitosminerais e organizam-se expedições à Sibéria para des-cobrir jazigos e colher dados para “confirmação de cer-tas teorias científicas”. Em Portugal, porém, havia queesperar pela Revolução Industrial para desencadear oestudo com base científica da Geologia e dos recursosminerais do País. A Academia Real das Ciências de Lis-boa, ao reconhecer, em 1848, o adiantamento da Geo-logia e dos conhecimentos geológicos no estrangeiro,quando comparados com os de Portugal, e da sua“transcendência incalculável para muitos assuntos ad-ministrativos” decidira recomendar ao Governo a cria-ção de uma Comissão Geológica, presidida porCharles Bonnet, especialista francês que estava emPortugal a expensas do Conde de Farrobo para dirigiras suas explorações mineiras. Tal proposta foi aceite,ficando reunidas as condições para a criação do Servi-ço Geológico Nacional com a missão de proceder ao“exame e exploração geológica e mineralógica das pro-víncias do continente do reino”. Carlos Ribeiro(Fig. l0), primeiro Director dos Serviços Geológicos(1857-1882), foi um grande dinamizador da Geologiaem geral e pioneiro da Geologia Económica, desenvol-vendo obra notável e determinante na recuperação degrande parte do atraso em que o País se encontravaneste domínio. A prospecção e estudo dos recursos mi-nerais passaram a ser progressivamente mais facilita-

Fig. 9 – Prospecção e pesquisa no séc. XVI. De Re Metallica, Geor-gius Agricola.

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dos, à medida que avançavam a cartografia geológicasistemática do País e a investigação na Geologia, Mi-neralogia e Ciências da Engenharia, tendo como pro-tagonistas os organismos públicos, universidades eempresas.

A segunda metade do século passado ficou marca-da por notável actividade de pesquisa e exploração derecursos minerais, em particular do carvão, ferro, man-ganês e metais básicos. Datam deste período as atri-buições dos primeiros alvarás de concessão paraexploração de vários jazigos, com destaque para Al-justrel, S. Domingos e Panasqueira. A preocupação emincrementar a produção e maximizar o valor acrescen-tado, através do tratamento metalúrgico, era já notadominante como consta das recomendações do notá-vel relatório da Comissão presidida por Carlos Ribei-ro para analisar a situação das Minas de Aljustrel,datado de 1873. Surgiram também várias exploraçõesde pequenos depósitos de cobre, chumbo-zinco, anti-mónio, estanho, tungsténio, ouro e prata. Data igual-mente deste período a primeira concessão (1848) paraexploração de produtos betuminosos, em Canto doAzeche (Pataias), que terá laborado irregularmente atécerca de 1861, produzindo o betume com que, entreoutras obras, foram asfaltadas todas as estações de ca-minho de ferro de Lisboa até Elvas e desde o Entron-camento até ao Porto. É ainda nesta época que severificam as principais produções de antimónio dopaís, proveniente das jazidas de antimónio e ouro daregião Valongo-Gondomar. Os minérios eram de boaqualidade e o auge da produção ocorreu entre 1880

e 1890, data em que, por excesso de oferta no merca-do devido à produção chinesa, as minas tiveram de fe-char. Pelo que consta, a produção portuguesa chegounaquele período a afectar a cotação do metal no mer-cado londrino.

Ao entrar no século actual Portugal debatia-se comuma preocupante dependência de carvão importado,dado que a produção nacional raramente ultrapassa-va as 20 000 toneladas anuais. Com a deflagração da1.a Guerra Mundial esta situação agravou-se, devidoà suspensão de fornecimentos do estrangeiro e dificul-dades de transportes marítimos, obrigando toda a in-dústria a aproveitar ao máximo os carvões nacionais,muito deles de fraca qualidade. Meios consideráveis fo-ram então mobilizados para aumentar as reservas e in-crementar a produção, proveniente das minas deantracite da Bacia Carbonífera do Douro (S. Pedroda Cova, Passal de Baixo e Pejão) e de lignitos do ca-bo Mondego. Assim, de uma produção de pouco maisde 29 000 toneladas em 1914 passou-se para 151 000em l916 e mais de 200 000 em 1917. A importânciados carvões levou a que em 1921 fosse nomeada umaComissão para o estudo sobre as possibilidades de exis-tência de carvões no país e seu aproveitamento, de quefoi relator o engenheiro António Viana, estudo esseque foi complementado com um trabalho do mesmoautor sobre a situação geral da indústria mineira do car-vão em Portugal. Tais trabalhos foram apresentadosem 1924 e constituíram referência orientadora das ac-ções de política sectorial durante muitos anos. Paraalém do carvão, também o ferro, manganês, tungsté-nio e outros metais foram alvo de vários trabalhos deprospecção e pesquisa os quais atingiram particular in-tensidade durante e após a Segunda Guerra Mundial,com destaque para os jazigos de volframite do Centroe Norte do País. Surgiram então muitas minas para ex-plorar os jazigos revelados, quase todos de pequenadimensão. No que ao tungsténio se refere, pode dizer--se que, por ser facilmente identificável, praticamen-te todas as jazidas aflorantes de volframite(WO4 Fe Mn) terão sido descobertas, restando apenaspara o futuro investigar as não aflorantes e aquelas on-de este metal ocorre sob a forma de scheelite(WO4 Ca), mineral que, embora bastante denso, tem,ao contrário daquele, cores e brilho que o tornam fa-cilmente confundível com outros minerais comuns.Portugal passou a ser um dos mais importantes pro-dutores de tungsténio e de estanho do Mundo, sendoa Panasqueira e a Borralha as principais minas. Os“records” de produção do país estão ligados aos pe-ríodos da 2.a Grande Guerra e ao da Guerra da Coreia(5 700 ton. de concentrados em 1942 e 4 900 ton. em1952; com o valor médio de 2 912 ton. entre 1939-70).A mesma evolução se poderia apontar para a produ-ção de estanho, companheiro íntimo do tungsténio emvárias jazidas (4 400 ton. de concentrados em 1942 e2 300 ton. em 1952; valor médio de 1 615 ton. entre1939-70 e de 974 ton. entre 1959-70). Os jazigos

Fig. 10 – Carlos Ribeiro (1813-1882). Pioneiro da Geologia Eco-nómica e primeiro Director dos Serviços Geológicos de Portugal.

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filonianos da Ribeira, Argozelo, Montesinho (Bra-gança), Panasqueira e as aluviões de Gaia (Belmon-te) incluem-se entre os que mais estanho produziram.

Quanto aos recursos uraníferos, a primeira desco-berta data de 1907 (Rosmaneira) e em 1913 arrancoua exploração de rádio na Urgeiriça. Até 1940, devemter sido produzidos apenas 50g de rádio e desperdiça-das mais de 500 toneladas de urânio, o qual só a partirde 1944 começou a ser objecto de interesse. De 1951a 1991 foram produzidas 4 174 toneladas de U3 O8,das quais cerca de 83% foram vendidas. A actividadeprivada neste domínio cessou em 1962.

Ciente da relevância dos recursos geológicos co-mo suporte de importantes sectores da indústria trans-formadora o Estado passou a ter um papel mais activono estudo e avaliação das potencialidades mineiras doPaís, assumindo o ónus da responsabilidade nas eta-pas de maior risco e, ao mesmo tempo, prestar o apoiotécnico e lançar incentivos às empresas de modo a di-namizar o sector, desde a prospecção até à explora-ção e valorização. Dentro desta linha foram, então,criados o Serviço de Fomento Mineiro (SFM) na Direc-ção Geral de Minas e Serviços Geológicos em 1939 e,para a prospecção e exploração de recursos de urânio,em regime de exclusividade, a Junta de Energia Nuclear(JEN), em 1954. Surgem assim projectos de prospec-ção sistemática de áreas potenciais, de pesquisa, reco-nhecimento e preparação para lavra de jazigos deantigas minas, algumas das quais deram novas explo-rações. Nesta fase verifica-se também o desenvolvimen-to nas universidades de equipas dedicadas ao estudode depósitos minerais, das tecnologias de exploraçãoe do tratamento de minérios, e assiste-se à grande evo-lução das teorias metalogenéticas, um pouco por to-do o mundo, permitindo o refinamento dos modelosconceptuais orientadores da prospecção. Tais factos,juntamente com o enorme progresso concomitante-mente ocorrido na geologia estrutural, geoquímica egeofísica, conduziram a que da aplicação prática re-sultassem importantes descobertas de vários depósi-tos minerais, em especial no referente aos jazigos desulfuretos polimetálicos da Faixa Piritosa, cujas des-cobertas, juntamente com as de Espanha, transforma-ram esta província metalogenética no maior “stock”de metais básicos da Europa Ocidental. Outros êxitossurgiram igualmente no domínio dos recursos uraní-feros, com a descoberta de várias jazidas nas Beiras,Alto Alentejo e Trás-os-Montes, colocando Portugal emlugar de destaque, quer em recursos conhecidos quercomo produtor de concentrados de urânio.

A prospecção de petróleo no “onshore” teve sig-nificativo desenvolvimento nas três décadas posterio-res a 1938, seguindo-se, na década de 70, actividaderelativamente intensa na prospecção do “offshore”(plataforma continental), por algumas das mais impor-tantes empresas petrolíferas mundiais. Foram realiza-das várias sondagens, tendo algumas delas encontrado,efectivamente, petróleo (Abadia-Torres Vedras no

“onshore”; Moreia e 14-A1 na plataforma continen-tal) mas, até ao presente, sem dimensão económica.

Os anos de 1950 a l980 correspondem, sem dúvi-da, a um período áureo da prospecção mineira em Por-tugal, graças ao relevante papel dos organismos estataisatrás referidos, protagonistas de quase todas as desco-bertas, e também de empresas mineiras nacionais e es-trangeiras. Dos vários casos de sucesso há a destacarcomo mais importante a descoberta em 1977 deNeves-Corvo, jazigo de classe mundial, fabulosamenterico de Cu-Sn, a que se juntam enormes recursos deZn, Pb, (Ag, Au) e de vários outros elementos meno-res, sendo hoje o principal produtor de cobre e esta-nho da Europa Ocidental (Figs. 11, 12 e 13). Neves--Corvo foi descoberto por uma associação luso--francesa (Sociedade Mineira de Santiago, SociedadeMineira Metalúrgica Peñarroya Portuguesa e Sociétéd’Études et Recherches Minières) num alvo gravimé-trico (Fig. 14) previamente evidenciado e selecciona-do pelo SFM (Direcção Geral de Minas e ServiçosGeológicos).

Como sempre acontece quando surge uma desco-berta sensacional, verificou-se uma corrida das empre-sas mineiras nacionais e estrangeiras, algumas dasmaiores do mundo mineiro, para prospectarem emPortugal, mas, tal como os mais atentos e informadospreviam, a prática veio demonstrar que os êxitos fá-ceis não surgiram. Porém, as potencialidades existeme as perspectivas para algumas áreas continuam aconsiderar-se favoráveis. Muitas das razões de tantosinsucessos são conhecidas e da ponderada reflexão so-bre as mesmas poderão, certamente, surgir novas li-nhas de rumo para acções futuras.

A generalizada depressão dos mercados da maio-ria dos metais verificada na última década veio criarsérios problemas de sobrevivência a várias minas e àdiminuição conjuntural do interesse pela prospecção

Fig. 11 – Tonelagem e teores de diferentes tipos de jazigos de co-bre (adaptado de Jensen and Bateman, Economic mineral deposits,3rd ed., John Wiley & Sons, 1981).

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dos metais básicos, Sn, e W, surgindo, em contrapar-tida, uma corrida à procura de metais preciosos, ourofundamentalmente, como consequência de novasideias metalogenéticas, da evolução tecnológica nosdomínios da exploração e do tratamento mineralúrgi-co de minérios de baixo teor e das condições favorá-veis de mercado. Novos alvos que pudessem conterjazidas de ouro de baixo teor (1,5 a 4 p.p.m. de Au)mas de grande tonelagem passaram a despertar inte-resse. São os primeiros passos de longa caminhada,muito havendo ainda para investigar antes que se che-gue a algum êxito de relevo neste domínio.

Traços gerais da situação actual

Fruto da dedicação e do intenso trabalho de tantasgerações que, no campo, serviços, universidades e em-presas, desenvolveram em prol do sector geológico--mineiro, as riquezas do subsolo foram sendoregularmente reveladas e exploradas em função daspossibilidades tecnológicas, financeiras e de mercado.

Muito embora não seja directamente traduzido nosindicadores macroeconómicos (mesmo no Canadá, 3.o

produtor mineiro mundial, não atinge os 5% do PIB),a importância dos recursos minerais produzidos pelaindústria extractiva (exploração e tratamento primá-rio de matérias-primas) para ser avaliada terá que seter em conta o seu papel como suporte de importan-tes sectores da indústria transformadora com grandecontribuição no PIB e no emprego (cimento, materiaisde construção, cerâmica, vidro, pasta de papel, pro-dutos químicos, produção de energia, etc.). Além dis-so, contribui para melhorar a balança comercial,chegando a atingir mais de 3% do valor das exporta-ções, e é fonte de emprego em regiões do país econo-micamente deprimidas.

Como se pode ver das figuras 15 e 16, apesar doPaís ser fortemente dependente da importação, em al-guns casos a 100%, a taxa de cobertura das importa-ções pelas exportações, excluindo o petróleo, passoua ser francamente positiva, após a entrada em produ-ção de Neves-Corvo em 1989, que, como se deduz dafigura 17, nos tirou da cauda da Europa no referenteao valor da produção de metais.

O projecto da mina de Neves-Corvo levou, desdea descoberta do jazigo até ao arranque da produçãono final de 1988, onze anos a concretizar. Período de

Fig. 14 – Anomalia gravimétrica Bouguer na área de Neves-Corvo(adaptado de dados da SOMINCOR e SFM).

Fig. 12 – Contacto do minério maciço (18% Cu) com estéril (embaixo). Mina de Neves-Corvo (massa Corvo).

Fig. 13 - Minério de estanho e cobre de Neves-Corvo (massa Cor-vo) ao microscópio (cas-cassiterite, cp-calcopirite, st-estanite, py--pirite). Tirado de Mitsuno et al. 1988.

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Fig. 15 – Grau de dependência externa de recursos minerais.

tempo relativamente curto, atendendo à envergadurada obra e à profundidade do jazigo (de 250 a mais de1 000 m). O impacte da produção de Neves-Corvo(1.600.000 ton. de minério, que deram 600 000 deconcentrados de Cu e 6 500 ton. de concentrados deSn, em 1992), veio revolucionar as estatísticas minei-ras conforme consta do Quadro I, onde se destaca ocrescimento do valor da produção total anual e o sal-to do contributo dos recursos do sub-sector “Metáli-cos”, o qual se deve, exclusivamente, àquela mina.

Quadro I

Fontes: INE e DGGM(*) inclui alguns valores provisórios

Deste quadro ressalta, também, a relevante impor-tância do sub-sector dos recursos “não metálicos”no contexto da indústria mineira. Com efeito, na es-trutura da exportação das dez principais substâncias(99% do total de 73 milhões de contos em 1991) apa-recem logo a seguir ao minério de cobre, em primeirolugar com cerca de 46%, os mármores e calcários or-namentais com 29% e os granitos com 16%. O esta-

Fig. 16 – Valor das importações e exportações das 10 principais substâncias minerais e do total referente a 1991, excepto petróleo (milharesde contos).

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nho e o tungsténio contribuem com cerca de 2%, aardósia 1 % e o ouro, prata, urânio e sal com menosde 1 % cada.

A comprovação, de facto, do real valor de Neves--Corvo, preciosa riqueza da nossa Base de Recursoshoje reflectida na economia do País, veio despertar asatenções e o interesse pelo sector geológico-mineiro,factor da maior importância para prosseguir com per-severança no caminho do futuro. Todavia, não podedeixar de causar apreensão a distorcida imagem que,por vezes, transparece como se Portugal fosse um “ElDorado” e estivesse a viver uma época de grande di-namismo e expansão na indústria extractiva. Tal fac-to desfoca a verdadeira e dura realidade que se traduz,porventura, por uma das maiores crises que o sectorjá enfrentou. Com efeito, o número de minas em efec-tiva laboração tem vindo, em boa parte por razões deordem externa, a diminuir drasticamente nos últimosanos, sendo grande a vulnerabilidade do sector, quan-do perspectivado a médio-longo prazo.

O ciclo de vida de uma mina diz-nos que ela nas-ce, cresce e morre, mas a morte absoluta só se podeaceitar com o esgotamento dos seus recursos e não dasreservas. A crise do mercado de metais decorrente doexcesso de oferta, tem várias causas, nomeadamente,das novas fontes de abastecimento a partir dos paísesda Europa Leste, do aumento da reciclagem e substi-tuição de produtos, e de distorções anormais do mer-cado (“dumping”). Estes são alguns dos factores que,de uma maneira ou de outra, mais determinaram a ine-xistência de reservas mineiras que assegurassem a con-tinuação da laboração de praticamente todas as nossasminas de estanho, tungsténio, ouro e urânio.

Pensar o Futuro

Não será arriscado afirmar haver consenso quantoà relativa riqueza e variedade de recursos geológicosno território nacional. A relevante contribuição dosmesmos para a economia desde tempos recuados, emespecial a partir dos metais básicos, W, Sn, Au, U,carvão, mármores e granitos, e o bom conhecimen-to que já se possui da geologia do País, dão fundamentoa tal ideia. Mais reforçada, ainda, quando se toma porreferência o quadro europeu, em particular o conjun-to da CE, a qual tem uma dependência global em me-tais importados superior a 70%. Somos, inclusiva-mente, ricos de vários recursos geológicos, que, ape-sar disso, temos de importar; ou porque de tais recur-sos não é possível constituir reservas, devido a baixosteores, à complexidade intrínseca dos minérios e ina-dequação tecnológica para o seu tratamento, ou porrazões de mercado, ou, noutros casos (cobre e esta-nho, p.e.) devido à inexistência de metalurgias no País.

Do conhecimento existente sobre o nosso Geossis-tema não é difícil, por razões de ordem geológica, eli-minar uma série de possibilidades quanto à existênciade várias substâncias, das quais somos e seremos for-

tes importadores. Em relação a todas as indicadas comdependência a 100 % na figura 15, não há fundamen-to credível para que a situação se possa alterar no fu-turo, pelo menos a partir da área emersa do territórionacional. Dados novos surgiram, porém, em especialnas duas últimas décadas, que obrigam a cuidados es-peciais nos diagnósticos e cenários evolutivos para osector. Sem procurar ser exaustivo salientarei os se-guintes:

– O progresso no melhor aproveitamento dasmatérias-primas e da energia por unidade de produto,conhecido pela expressão “fazer mais com menos”(doing more with less), a crescente taxa de reciclagemde metais, o desenvolvimento de novos materiais e denovas tecnologias.– Alargamento das fontes de fornecimento dematérias-primas a partir de países do leste europeu edo oriente, com crescente descontrolo de mercadose maior imprevisibilidade na evolução dos mesmos.– Mais exigentes padrões de qualidade e rigorosos me-canismos de controlo na preservação do meio ambien-te natural.– Descoberta de Neves-Corvo e demonstração da exis-tência de jazigos anomalamente ricos e de grande di-mensão, justificando-se, por isso, a prospecção dezonas mais profundas das áreas de maior favorabi-lidade.– Enorme progresso no conhecimento da tectónica,da geologia económica e das técnicas geoquímicas egeofísicas e de teledetecção, bem como na tecnologiamineira, no tratamento de minérios, na modelação ma-temática e simulação.– Descobertas revolucionárias sobre a génese de de-pósitos polimetálicos em formação activa junto dasgrandes fracturas dos fundos oceânicos, bem como natecnologia de investigação e exploração dos recursosdo solo e subsolo marinho.– Considerável progresso no conhecimento da geo-logia do País em geral e do contexto geológico ondeocorrem importantes jazigos, bem como sobre as res-

Fig. 17 – Valor da produção de minerais metálicos em países daEuropa Ocidental em 1988 (adaptado de Lumsden, G.I., ed., Geo-logy and the Environment in Western Europe, Oxford, 1992).

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postas geoquímica e geofísica dos mesmos, facilitan-do a selecção de áreas potenciais e a sua prospecçãoe pesquisa.– Começar a ganhar credibilidade a possibilidade de,dentro de algumas décadas, poder vir a ser controla-do o complexo processo de produção de energia porfusão nuclear.

Estes grupos de dados, em particular os três primei-ros e o último, traduzem-se em factores que, conjun-tamente ou de per si, podem vir a introduzirprofundas e imprevisíveis mutações capazes de invia-bilizarem o aproveitamento de recursos hoje econó-micos ou, em contrapartida, despertar o interesse pornovos outros que até aí não o eram. Torna-se, assim,difícil admitir que a generalidade das pequenas minasde Sn, W, Au-Ag, Pb-Zn, Cu, entre outras, que dantestrabalhavam com teores médios a fracos, e que só per-mitam a exploração pelos métodos de lavra subterrâ-nea tradicionais, possam voltar, em condições normaisda conjuntura internacional, a operar economicamen-te, salvo se, porventura, contiverem nos seus minériosmetais menores susceptíveis de importante valoriza-ção por necessários à aplicação em novos materiais ounovas tecnologias. Há vários casos conhecidos da li-teratura, como p.e. minas de zinco que só são rentá-veis graças ao germânio obtido das blendas, ou comoa antiga pequena mina de cobre Apex (Utah, EUA) quevoltou a ser reactivada graças à extracção de germâ-nio e do gálio.

A tendência para “fazer mais com menos” tem ti-do repercussões extremamente positivas na economiade recursos, ajudando a minorar o impacte da tremen-da procura que o crescimento populacional do globoirá impor. Por outro lado, a substituição de metais po-de causar forte perturbação no mercado, como vemjá acontecendo com o W, Cu, Al , que têm sido substi-tuídos por novos produtos, tais como, respectivamen-te: cerâmicas, fibra óptica e materiais compósitos.Sintomático disso é o que se irá passar com a indústriaaeronáutica em que os principais construtores pre-vêem, em valores médios globais, passar, no consumode alumínio dos 80% de 1980 para 56% no ano 2000,enquanto que a aplicação de materiais compósitos pas-sará de 2,7% para 25% no mesmo período.

Muito embora para estes novos materiais se tenhade recorrer a maior variedade de recursos geológicose a mais avançada tecnologia, as quantidades requeri-das são incomparavelmente menores (Fig. 18). Em con-trapartida, tais recursos existem em zonas maislocalizadas e em quantidades globais muito pequenaso que impõe novos desafios para a sua descoberta eaprovisionamento. Mas isso não contrariará, porém,tal tendência, que certamente irá prosseguir, sendo deadmitir como provável que quando se avizinhar o es-gotamento efectivo de determinado metal, a respostaserá encontrar-se substituto, em vez de induzir aumen-tos substanciais e duradouros nas cotações que permi-

tam a retoma da exploração de depósitos pequenos epobres. Por outro lado, mesmo que venha a ser possí-vel dispor de energia inesgotável a custos competiti-vos, também não é de supor que, devido ao impacteambiental, pelo menos nos países mais evoluídos sepasse à produção de metais a partir das rochas comuns,ou seja, descer os teores de corte (teores pagantes doscustos operatórios) para valores da ordem do “clar-ke” (teor médio de cada elemento geoquímico na crus-ta terrestre), como adiante se verá.

Em Portugal, excluindo a pequena produção de mi-nérios de ferro e manganês do Cercal, sem expressãoeconómica, todos os restantes metais produzidos per-tencem ao grupo dos elementos geoquímicos escassos,teor médio na crusta inferior a 1 000 p.p.m.. As curvasde Skinner (Fig. 19) revelam que a relação metal nacrusta/teor se traduz por uma distribuição bimodal paraestes elementos. Neste caso, os dois ramos da curvasão separados pela zona de fronteira correspondenteà barreira mineralógica, ou seja, a ocorrência do me-tal nos respectivos minerais próprios (exploração eco-nómica actual), da que corresponde ao mesmoelemento na rede cristalina de outros minerais das ro-chas comuns, p.e., o níquel na olivina, ou o cobre nabiotite. Há correntes optimistas que crêem ser possí-vel, em caso de esgotamento de reservas, passar essabarreira. Porém, para estes elementos mesmo dispon-do de energia “inesgotável” e barata, primeira condi-ção para encarar tal hipótese (dado o enorme salto noconsumo de energia para produzir a mesma quantida-de de metal a partir de materiais dum ou doutro ladoda curva, contrariamente ao caso dos elementos escas-sos em que esse consumo cresce progressivamente),mesmo nessa hipotética situação, não é de prever quetal possa vir a acontecer. Na verdade, os danos causa-dos ao meio ambiente seriam sempre de proporçõesgigantescas, certamente inaceitáveis. Veja-se o caso o dasactuais explorações dos famosos jazigos de cobre de

Fig. 18 – Relação entre quantidade de recursos e a informação cien-tífica no fabrico de produtos.

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baixo teor e grande tonelagem (porphyry copper*) al-guns dos quais já chegaram, na década de 70, a baixaro teor de corte para valores da ordem dos 3 500 p.p.m.(mas a partir de minérios de minerais de cobre), figura20. É tanto assim que, a cratera de subsidência da mi-na de exploração subterrânea (“block caving”) do“porphyry copper” de San Manuel (Arizona) e a imensacorta da exploração a céu aberto de Bingham Canyon(Utah) onde chegaram, num só dia, a movimentar maisde meio milhão de toneladas de minério e estéril ,incluem-se já nos pontos conspícuos do nosso plane-ta quando visto da Lua! Por outro lado, certa corrente

optimista chegou mesmo a admitir estar o problemados recursos resolvido, dado que, pela relação deLasky, à diminuição aritmética do teor de corte cor-responderia crescimento geométrico das reservas. Ce-do se demonstrou ser isso apenas parcialmente válidoquase só naquele tipo de jazigos e para determinadagama de valores.

Considerando o factor de concentração em relaçãoao “clarke”, para os elementos abundantes (Si, Al, Fe,Mn, Mg, Ti) e para os elementos escassos, necessáriopara se atingirem os mais baixos teores de corte dasexplorações actuais no mundo, verifica-se que, p.e.,enquanto que tal factor é da ordem dos 4,5 no Fe, 16no Ti e 2,5 no Al, ele passa para 2 100 no Pb, 1 500 noSn, 4 000 no Au, 15 000 no W e é de 100 000 parao Hg. Estes valores dão, em certa medida, ideia sobrea raridade e o refinamento dos processos exigido parase atingirem tais concentrações em quantidade e vo-lume que formem jazigos. Os recursos minerais terão,pois, de ser sempre considerados como bens escassos.

Tendo presentes tais dados e as características dageologia e das mineralizações do nosso território, épossível delinear caminhos a seguir para encarar o fu-turo, mais precisamente, para ampliar, valorizar e apro-veitar, a Base de Recursos, devendo ter-se bempresente que a prospecção mineira será cada vez maisuma actividade de investigação aplicada. Apontam-seseguidamente algumas considerações e linhas de acçãoque parecem pertinentes em tão delicado assunto:

– Sendo um jazigo mineral o resultado de processosgeológicos, óbvio se torna concluir que quanto melhor

Fig. 19 – Relação metal na crusta versus teor dos elementos abun-dantes (a) e elementos escassos (b). Adaptado de Skinner, Amer. Scien-tist, 64, 1976.

Fig. 20 – Exploração a céu aberto de um “porphyry copper”. Mina de Ajo, Arizona

* Os principais jazigos “porphyry copper” ocorrem no designado círculo de fogo do Pacífico. Estão associados aos ambientes geotectónicos (zonasde subducção) que, desde o Mesozóico, geraram magmatismo dos arcos insulares e das cadeias de montanhas à volta daquele oceano. Esta actividadeígnea, que à superfície se manifesta hoje por vários vulcões activos, produz, a profundidades de l a 3 km, rochas porfiríticas (pórfiros monzoníticos,tonalíticos, quartzo-dioríticos, etc.) com as quais se associam o cobre, ouro, molibdénio e, nalguns casos, estanho e tungsténio. É nestes jazigos queexistem as principais reservas e recursos de cobre do planeta, com destaque para o Chile, EUA, Canadá, Perú, México e Filipinas.

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conhecimento houver da geologia do território tantomais fácil será apurar o que possuímos ou não pode-mos possuir. O uso das novas tecnologias de informa-ção permitiu revolucionar métodos de trabalhos e oapuramento de resultados, mas importa ter presenteque continua, e, certamente, continuará sempre, a serimprescindível, a colheita directa de dados na fonte,melhor dizendo, no terreno. A discriminação cartográ-fica, a caracterização geológico-estrutural detalhadadas diferentes formações e dos ambientes geotectóni-cos onde se formaram são fundamentais para qualquersalto qualitativo na criação de novas perspectivas e de-finição de novos horizontes para a prospecção de re-cursos; petróleo, gás e geotermia (HDR) incluídos. Oapoio da geofísica e geoquímica na fase do estudo geo-lógico regional, bem como o recurso a sondagens re-lativamente profundas em áreas criteriosamenteseleccionadas são cruciais para tal objectivo. Sem taissondagens arrastar-se-ão, ad aeternum, importantesquestões de natureza geotectónica e do conhecimen-to crustal por esclarecer;

– Em Portugal justifica-se, apesar do elevado risco, de-senvolver esforços no sentido de descobrir jazigos deteores elevados, de média e grande dimensão, paraalém das profundidades já hoje praticadas na explora-ção. O simples facto da existência de Neves-Corvo aisso obriga. Parece pertinente questionar se será estejazigo excepção à regra ou haverá mais? Nada do quese conhece sugere que se deva optar pela negativa. Tu-do indica, porém, que tendo em conta os dados da geo-logia, da prospecção geofísica e sondagens, apossibilidade de eventuais descobertas de jazigos dotipo Neves-Corvo a baixas profundidades (menos de300 m) é muito pequena. De todas as áreas potenciaisressalta, para o autor destas linhas, como alvo prefe-rencial a indicada na figura 21; mas a tarefa não vaiser fácil;– Os progressos na investigação dos processos geo-lógicos geradores de recursos, do controlo estrutural,da geoquímica das terras-raras, dos isótopos e das in-clusões fluídas, bem como dos diferentes domínios dageofísica, conjugados com a crescente tendência para

Fig. 21 – Mineralizações da Faixa Piritosa Portuguesa e área potencial para prospecção de jazigos tipo Neves-Corvo no lineamento Estaçãode Ourique-Neves-Foupana.

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a quantificação das observações e uso das tecnologiasda informação, da modelização matemática e simula-ção, irão proporcionar melhores e mais eficazes meiospara a descoberta de jazigos minerais. Do mesmo mo-do, a biogeoquímica multielementar, utilizando não sóplantas mas, inclusive, microorganismos, poderá vira revelar-se, em alguns casos, de grande utilidade. Comefeito, ensaios recentes num projecto de investigaçãosobre o jazigo de Neves-Corvo (desenvolvido pelos Ser-viços Geológicos dos Estados Unidos da América e osServiços Geológicos de Portugal, financiado pelaFLAD), revelaram que as folhas da Quercus ilex (vul-go, azinheira) acusam com facilidade anomalias metá-licas existentes no solo e subsolo que podem sercorrelacionáveis com a presença de jazigos minerais,e servir para ajudar a detectar jazigos ocultos (Fig. 22);– Como novos domínios para a prospecção deverá,para além do já referido, ter-se em conta que ao longoda coluna geológica das formações que ocorrem noPaís são conhecidos vários episódios vulcânicos, mui-tos deles ainda insuficientemente estudados, em par-ticular as fácies de rochas vulcânicas distais(depositadas longe dos centros vulcânicos) ou as exa-lativas - sedimentares (exhalitos, ou seja, sedimentosquímicos derivados de fluidos vulcânicos). Da inves-tigação do vulcanismo actual e antigo tem-se concluí-do que a tais rochas, quando em condições estruturaisfavoráveis, podem estar associadas mineralizações, emparticular, de ouro. Igualmente para o ouro há que in-tensificar a investigação de possíveis ocorrências de ja-zidas associadas a zonas de fraqueza crustal antigas que

possam ter rejogado ao longo dos tempos geológicos(zonas de cisalhamento e zonas de sutura);– A procura de metais para os novos materiais e no-vas tecnologias vai despertar o interesse em minérioscorrentes que possam conter tais elementos em con-centrações susceptíveis de recuperação como sub--produtos de grande valia, como é o caso, entre outros,do Ge, In, Nb, Ta, Ga, Se, Cd. Do mesmo modo, ha-verá que fazer o estudo das rochas ígneas alcalinas eperalcalinas que ocorrem no País, tendo em vista o co-nhecimento da sua potencialidade em terras-raras, nió-bio e outros elementos raros. Das formações aplito--pegmatíticas é igualmente de esperar poderemdetectar-se zonas de relativo enriquecimento em me-tais raros susceptíveis de interesse actual e futuro;– Muito há ainda a realizar para melhorar o conheci-mento estrutural e mineralógico e para mais rigorosa-mente fazer a caracterização de recursos já conhecidos,metálicos e não metálicos, tendo em vista a sua valo-rização e aproveitamento. Importa reforçar a articu-lação e aumentar o grau de integração vertical com aindústria transformadora, ainda bastante débeis, à ex-cepção dos casos do sal-gema para a indústria quími-ca, as argilas para a cerâmica e os materiais deconstrução. Além disso, a modernização de estruturasprodutivas e a racionalização de explorações, em par-ticular no sub-sector dos “não-metálicos”, são indis-pensáveis para assegurar a competitividadeinternacional.

Uma fronteira para vastos horizontesA Zona Económica Exclusiva

Pela sua extensão e grande importância, pelo pou-co conhecimento que, apesar dos notáveis trabalhosrealizados, dela se tem e pelo muito que importa fa-zer, julgou-se adequado destacar este tema. É facto co-nhecido que o território imerso sob jurisdiçãoportuguesa corresponde a uma área cerca de dezoitovezes superior à superfície da zona emersa, ou seja, amaior da CE e a terceira da Europa (Fig. 23). A tremen-da responsabilidade que advém da posse de tão impor-tante património territorial terá de ser assumida emtoda a sua plenitude, sob pena de virmos a ser “colo-nizados” neste domínio.

Tradicionalmente, quando se aborda o tema dos re-cursos não vivos do mar, associa-se logo a ideia do pe-tróleo e gás. Sem dúvida que estes são os maisimportantes recursos geológicos explorados nas áreasmarinhas do globo, mas outros há que, no futuro, po-derão desempenhar relevante papel na economia dasnações.

As primeiras indicações concretas da formação demetais sob os oceanos foram obtidas pela expediçãoChallenger em 1870, quando recolheram os célebresnódulos de manganês e ferro, contendo também algumníquel, cobalto e cobre. Evidência indirecta de que im-portantes jazigos de sulfuretos polimetálicos maciços,

Fig. 22 – Teores de Cu, As, Sn, Bi, Sb, e In nas cinzas das folhasde Quercus ilex, um perfil sobre jazigo de Neves-Corvo. Adaptadode Grimes, D. et al., USGS Bull., in press.

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Fig. 23 - A Zona Económica Exclusiva (ZEE) portuguesa.

como os de Chipre, do Kuroko no Japão, ou os da Fai-xa Piritosa foi sendo obtida de diversos estudos em ter-renos antigos, um pouco por todo o mundo, vindo aser proposta e genericamente aceite, a partir do fimda década de 50, a teoria vulcano-sedimentar para ex-plicar a formação de tais jazigos no fundo marinho.Por outro lado, no início da década de 60, no SaltonSea (Golfo da Califórnia) e no Mar Vermelho detectava--se a presença de focos mineralizadores activos, for-mando salmouras metalíferas quentes, das quaisresultam lamas ou sedimentos polimetálicos muito fi-nos junto das áreas de descarga. Em 1962, uma son-dagem para a prospecção de petróleo e gás no ImperialValley, a SE do Salton Sea, encontrou, inesperadamen-te, à profundidade de 1 500 m, uma salmoura com320° de temperatura que, ao arrefecer à superfície pre-cipitou, durante três meses, cerca de 8 toneladas dematerial silicioso contendo 20% de Cu e 8% de Ag,em peso. Tais sistemas activos têm sido fonte de enor-me quantidade de dados científicos de extraordináriaimportância sobre os processos mineralizantes. Paraas lamas do Mar Vermelho, que atingem centenas demilhões de toneladas, existem já ensaios tecnológicospara a sua exploração, tratamento mineralúrgico e ex-tracção de metais Zn, Cu, e Ag. Mas, porventura, asmais sensacionais descobertas foram na East PacificRise, pela equipa do projecto RISE (Fractura 21N),quando em missão no submersível ALVIN (1978), amais de 2 500 m de profundidade, puderam observarao vivo a descarga dos “black smokers” (Fig. 24),

Fig. 24 – “Black smoker”. Solução hidrotermal a cerca de 320o C formando um depósito mineral no fundo marinho a 2 500 m de profundi-dade na Fractura 21 N da East Pacific Rise. A cor negra é devida às finas partículas de sulfuretos polimetálicos precipitados em contacto coma água do mar. Ao lado, uma camada de sulfuretos formados ã volta dos canais de exalação na 21N. Tirado de The Dynamic Earth, an Intro-duction to Physical Geology, 2nd. ed., 1992, por Skinner, B.J. e Porter, S.C. Copyright© 1992, by John Wiley & Sons, Inc. Reprodução autori-zada por John Wiley & Sons, Inc..

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i.é. chaminés, com três ou mais metros de altura, bro-tando fumos negros compostos de líquido e vapor su-persaturado em elementos metálicos, Fe, Cu, Zn, Mne metais preciosos a temperaturas que podem atingiros 400° C. Ficou assim demonstrada a deposição di-recta de mineralizações no fundo do mar a partir desistemas hidrotermais, fenómeno que muitos autoresjulgavam dantes ser inviável.

Para a formação e preservação de um depósito desulfuretos vulcanogénicos marinhos é necessária a con-jugação favorável de, fundamentalmente, cinco facto-res determinantes: a) – a existência de um fluidocapaz de transportar vários p.p.m. de metais, e enxo-fre reduzido em solução; b) – uma fonte de energiatérmica (intrusão magmática) capaz de gerar circula-ção convectiva através de vários quilómetros de rochasdo fundo oceânico; c) – existência de um sistema defracturas que proporcionem espaços abertos para a cir-culação do fluido; d) – mecanismos que levem à pre-cipitação dos metais. Normalmente a pressão da coluna deágua impede que o fluido entre em ebulição antesde atingir o fundo marinho e daí ele brotar sob a for-ma de “black smoker”; a precipitação resulta da sim-ples mistura do fluido hidrotermal com a água do marfria. Precipitam assim os sulfuretos metálicos e os sul-fatos de cálcio e de bário. O ferro e manganês formamóxidos e hidróxidos que permanecem em solução ouformam colóides e arrastam consigo metais nobres, emespecial o ouro, podendo vir a dispersar-se e irem pre-cipitar distalmente em relação aos focos donde bro-tam os fluidos de profundidade. Caso não hajasulfuretos metálicos no fluido geram-se os designados“white smokers”; e) – acumulação de material se-dimentar ou vulcânico para cobrir e preservar da ero-são as mineralizações depositadas.

Se o fluido na sua ascensão para a superfície sofrerebulição, os sulfuretos podem precipitar ainda no seiodas rochas do subsolo marinho dando filonetes, vénu-las e veios ou formar uma lama que se extravasa e afun-da na bacia de sedimentação.

Estas impressionantes descobertas geraram novosparadigmas e vieram reforçar o potencial de recursos dosolo e subsolo marinhos, muito em particular nasvizinhanças das zonas de fraqueza estrutural associa-das às cristas médias e falhas transformantes das pla-cas oceânicas. Portugal com a sua vasta ZEE, na qualse incluem extensas zonas vizinhas da Crista Médiado Atlântico e de falhas transformantes, em particu-lar nas regiões dos Açores e Madeira, dispõe, desde lo-go, de condições particularmente favoráveis.

Para além dos sulfuretos polimetálicos, vários sãoos recursos que podem existir nos diferentes ambien-tes geológicos marinhos (Fig. 25). Na área portuguesaconhecem-se indícios de óleo e de gás e admitem-seboas perspectivas para estes recursos nas bacias sedi-mentares do “deep-offshore”. Por outro lado, nela jáforam definidos alguns depósitos de areias e cascalhosjunto à costa e descobertos nódulos fosfatados e nó-dulos metálicos (Fig. 26). Ocorrências de sulfuretos fo-ram também já reveladas na crusta oceânica atlântica.

Parece, assim, razoável admitir ser desta imensaárea sob jurisdição portuguesa que, no próximo sécu-lo, poderão surgir importantes contributos para a am-pliação da Base de Recursos. O desafio é enorme ea tarefa gigantesca. Alguns dirão que isso vai levar mui-to tempo e há que trabalhar para o presente. Outroscontestarão que, por isso mesmo, há que começar ce-do para não se correr o risco de perder a corrida. Ape-sar dos escassos meios, muito já foi feito e de boaqualidade, o que é, só por si, um bom ponto de parti-

Fig 25 – Tipo de recursos minerais em ambientes geológicos marinhos. Adaptado de Monteiro, H., Bol. Minas, vol. 22, n.o 1, 1985.

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Fig. 26 – Nódulos de manganês e fosforites da ZEE portuguesa.

da. A cooperação internacional, fundamental neste do-mínio, face aos custos envolvidos, tem sido exemplare muito frutuosa. Importará prosseguir com determi-nação e alargar, desde já, o conhecimento geológicoa toda a ZEE, incluindo as planícies abissais e os ar-quipélagos dos Açores e Madeira, e desenvolver estu-dos de detalhe de áreas potenciais em recursos, bemcomo acompanhar de perto a evolução científica nosdiversos domínios da oceanografia e da tecnologia daexploração mineira submarina.

O progresso dos povos sempre foi e, apesar das pre-visíveis mutações, por certo continuará a ser fortemen-te dependente da utilização dos recursos geológicos.Portugal reúne condições naturais relativamente favo-ráveis para encarar o futuro com tranquilidade e es-perança, desde que se verifique criteriosa e racionalexploração e valorização dos recursos conhecidos, ese criem os meios e envidem os esforços necessáriospara traduzir a real potencialidade de ampliação daBase de Recursos em efectivas descobertas em terrae no mar.

AGRADECIMENTOS

Ao Eng. Moitinho de Almeida e ao Dr. Hipólito Monteiro, pela ajuda na obtenção de algumas fotografias; à Dra Maria de Jesus Sousa peloprocessamento e composição gráfica do texto e ao desenhador José de Almeida pela elaboração das peças desenhadas.Ao Professor Martim Portugal Ferreira pela cuidada revisão do texto.

SUGESTÕES DE LEITURA

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