7/23/2019 Sit Socio Hist Mus s XVIII
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SITUAÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA
DA MÚSICA NO SÉCULO XVIII
O impulso tomado pela evolução social e cultural na Europa no século XVIII fez-se sentir mais
cedo nas regiões ocidentais do continente e no meio urano! onde a moilidade social e as
atividades culturais se desenvolveram mais amplamente" #s cidades de comércio e os grandes
portos mar$timos! por um lado! os centros administrativos e as cidades universit%rias! por outro!
desempen&aram nesse processo papéis de maior ou menor import'ncia! conforme o caso" # arte
mon%r(uica! &erdada do século XVII! permaneceu) a m*sica de corte rodeava e glorificava os
soeranos" #s festas e as cerim+nias tamém cumpriam função de relevo na vida da sociedade!
soretudo nos c$rculos em (ue se moviam os pr$ncipes e a noreza! tendo sempre a acompan&%-la
a m*sica apropriada ,s ocasiões mais diversas! como noivados! casamentos! funerais e recepções
solenes" Emora alguns dos maiores compositores! como aendel! na Inglaterra! e! durante certo
tempo! .ac&! na #leman&a! ten&am conferido prest$gio , m*sica de corte! sua decad/ncia começou
a manifestar-se no correr do século" 0om o fim do arroco! por volta dos anos 123! a arte
mon%r(uica entrou em decl$nio" 4as uma arte aristocr%tica continuou a e5istir no dom$nio musical!
e uma oa parte da produção de m*sica ainda foi criada nesse c$rculo social 6 na It%lia! por
e5emplo! e soretudo na #leman&a 6 até (ue! finalmente! o advento da m*sica nos meios
urgueses irrompeu com uma import'ncia (ue até então 7amais l&e fora recon&ecida"
8o século XVIII! paralelamente , vida musical da corte e dos salões aristocr%ticos!
desenvolveu-se aos poucos uma vida musical nova! a da urguesia" ozando
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de co n s id e r áv e l prosperidade e c o n ô m i c a , a burguesia em parte retomou elemen
tos da
vida
musical da corte e dos
sa lões
da aristocracia, e em parte
c r i o u ,
já em
meados do s é c u l o , os elementos de uma cultura musical a u t ô n o m a , sobretudo nas
grandes
cidades e u r o p é i a s , como Londres, Paris, Leipzig,
Hamburgo, Viena, ene-
za e N á p o l e s . Há nisso uma t r a n s f o r m a ç ã o profunda e importante para a vida
musical
do futuro, e, em particular, para a do concerto p ú b l i c o . Passara-se da exe
c u ç ã o em c í r cu lo s privados à e x e c u ç ã o em p ú b l i c o , e da opera seria à ó p e r a c ô m i c a
na Alemanha, t a m b é m ao
Singspiel
e ao novo Lied : em suma, da d o m i n a ç ã o de
uma cultura musical de corte à de uma cultura musical mais complexa, mais
aber
ta e mais adaptada à classe m é d i a .
Se a
classe
burguesa
ascendente,
mais ou menos consciente da vantagem cu l t u -
ra l que sobre ela guardava a classe r ival , terminou imitando-a em certos d o m í n i o s ,
o fez segundo a mentalidade e o estilo de
vida
que lhe eram p r ó p r i o s , de modo a
afirmar
a p r ó p r i a personalidade e o p r ó p r i o p r e s t í g i o .
Nesse
contexto, a m ú s i c a
assumia, por vezes, a f u n ção de signo ou de s í m b o l o de um estatuto social. Mas se,
em
sua conquista da
m ú s i c a ,
os
burgueses
não escapavam de
imitar
a aristocracia
e mesmo a corte real, esta ú lt im a t a m b é m era imitada pelos aristocratas. Já no
reinado de Luís X I V , os divertissements por exemplo, tinham a f u n ção de comemo
rar algum evento importante e podiam ser oferecidos pelo rei em homenagem a
uma personalidade, ou em recompensa por seus m é r i t o s . O fato de serem criadas
pelos mais
destacados
compositores, como
Philidor
e Delalande e, no s écu lo X V I I ,
p o r Lul ly e Boesset),
assegurava
o p r es t í g io dessas p e ç a s . A aristocracia, p o r é m ,
logo
apropriou-se do g ê n e r o , que deixou de ser uma exclusividade da corte. Com
p o s i çõ es feitas para um dia, para um sarau noturno, não estavam destinadas a
sobreviver à q u e l e s a quem adulavam. Entretanto, cumpriam muito bem sua f u n -
ç ã o social do momento. Os divertissements constituem um exemplo de
obras
que
se assinalam por carac ter í s t icas apropriadas a sua f u n ção social, mas cujo valor
a r t í s t i co é, o mais das vezes, menor ou inferior.
Longe de ser tão i n s t r u í d o e refinado quanto o p ú b l i c o a r i s t o c r á t i c o , o p ú b l i co
b u r g u ê s
estava
igualmente longe de possuir uma cultura musical c o m p a r á v e l à
daquele. Apesar do seu interesse pela m ú s i c a , era f r eq ü en t e que esse novo p ú b l i co
manifestasse um gosto bem m e d í o c r e ou mesmo
bastante
vulgar. Era ca r ac t e r í s t i -
ca da mentalidade
desse
p ú b l i c o
a
o p i n i ã o
— corrente na Alemanha, por exemplo
— segundo a qual a m ú s i c a tinha o poder de al iviar o
peso
dos es forços e do
c a n s a ç o
de um dia dedicado pelo
b u r g u ê s
a tratar de
n e g ó c i o s ,
a
ocupar-se
com
n ú m e r o s e contas. T a m b é m com f r e q ü ê n c i a , as m o t i v a ç õ e s do p ú b l i c o musical
parisiense da primeira metade do s é c u l o X V I I I eram de natureza mais social que
ar t í s t i ca : por essa é p o c a , era comum apreciar-se a m ú s i c a mais pelo que ela podia
acrescentar à
vida
mundana e à moda, assim como a uma e d u c a ç ã o de elite —
objetivo
que a burguesia se
esforçava
por
a l c a n ç a r — ,
do que por seu valor
es té t ico
p r ó p r i o .
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Nu ié i u lo x v i i i , «• pú bl ic o pai l i ienie favorei Io co m pc t l çô ei entre vlr tuc •
vlolinistai o
Gulgnon
c
A n e l m a i s
tarde,
l
lu ignon e M o i u l o n v i l l c
cantoras t o m o Todi e Mara. Nessa época , o in té rp re te
procurava
surpreendi I
1
causar pasmo pelo car á ter or ig inal c
engenhoso
de seu desempenho, en<
OI
iljddl
1 1
tanto
p o r u m p ú b l i c o à s
vezes
superficial e f r e q ü e n t e m e n t e pouco i n s t r u í d o
1
prática foi
levada
ao
extremo
sobretudo
na Itália. Na
Alemanha, compositor
> orno Reinhard Keiser e outros chegaram a ultrapassar as exigem ias ilo publ
c o m p o s i ç ã o d e suas óp er as . Em seu esforço de
seduzir
as platéias, (lampia 1
I
>«in
chet,
po r sua vez, introduziram
numerosas
m o d i f i c a ç õ e s e m suas
obras
1
1 >
sabor
da acolhida de
cada
r e p r e s e n t a ç ã o .
Para satisfazer
u m p ú b l i c o novo
1
niiii
o prazer dos ouvintes,
organizadores
e compositores foram
levados
a fazei I I
c o n c e s s õ e s , aceitando so luções de compromisso. Cortar era um
procedimento
dl
uso
muito corrente.
Havia o gosto p o r costurar fragmentos diversos (que s i ipn
sentavam
sob o
nome,
e n t ã o
muito
apreciado,
de
pots-pourris
e por in t ro dl l t i l
cortes nas
obras
menos acess íveis ,
recompondo-as
pela escolha do que tivessem
I
mais
leve,
com o objetivo de to rná- las de mais fácil aceitação pelo púb li i n l 'oi
meio de tais concessões , a s p la té ias eram levadas a adm i t i r um
pomo
mai di
m ú s i c a erudita". N o s é c u l o X V I I I , as peças curtas,
ligeiras,
estiveram em grfindl
moda, o que in f luenc iou sua pub l ica ção : Ba l la rd im pr im iu , em
Paris, volumo
I
c o l e t â n e a s .
A m ú s i c a n ã o e r a objeto apenas d e
concertos
pú bl ic os ; com ela se
faziam
Iam
b é m
saraus
a do m ic í l io , que re fo rçav am a d i s t in ção social. A m ús ica , aos
poili
foi
se tornando parte da vida
social,
no c í rcu lo fam il iar e de amizades da
t
a
1
burguesa, como outrora do sa lão ar is tocrá t ico , nos espetáculos e nas
festas
Sob
1
forma de f reqüen tação dos concertos,
saraus
musicais a do m icí l io ou a t iv ldndl
musical de amadores, a m ú s i c a
passou
a ser, pouco a pouco, um a exigem ia • il
e u m
marco
dis t in t iv o da fam íl ia
burguesa.
O piano,
esse
s í m b o l o d a prospei « Ia. ll
burguesa, faria sua entrada u m pouco mais tarde nas casas da burguesia, 0 0 1 tu
do de
piano, principalmente
pelas
moças , f icou
sendo
u m
"imperativo
soi ia l .
signo
de boa e du ca çã o. A í es tá um a das ra ízes sociais de um outro f e n ô m e
portante, que haveria de se expandir nos meios
burgueses,
sobretudo na Alem
1
nha: o
amadorismo musical,
o r i g i n á r i o e m
parte
do
amadorismo
dos
arislo
O s diversos convivia musica e collegia musica surgidos
desde
o fim do sei ulo
eram no in íc io , de modo geral, corais de m ú s i c a sacra. N o s é c u l o seguinte, fo i I R
cultivados pelos instrumentistas
amadores.
N o s é c u l o
X V I II , tais conjuntos
1 hega
ram a dar, pode-se dizer, um a fisionomia particular à burguesia a l e m ã :
de
amadores
d e c o n d i ç ã o burguesa ajudou essa classe a tomar con sciém ia l
1
mesma,
funcionando
a m ú s i c a
como
u m v í n c u l o social de reun ião ede
unif l i
1
Essa s i t u a ç ã o persistiu ao longo de todo o século, e , em parte, no sécu lo XIX .
Juntamente com as
bandas
municipais, essas i n s t i t u i ç õ e s musicais de
amadoit
c o n s t i t u í a m , d e certa forma, uma répl ica da burguesia às ins t i tu içõ es musicais prlfl
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414
Quarta
parte
a primeira
metade
do
século
XV
cipescas e a r i s toc r á t ic a s às capelas com orquestras das cortes e dos pa lác ios . E o que
é mais importante: os p r ó p r i o s compositores, que a t é e n tã o se voltavam com maior
f reqüênc ia
para a corte e para o
p a lá c io c o m e ç a m
a aproximar-se
desses
Kenner
und
Liebhaber
[conhecedores e admiradores], aos quais até mesmo um p e r i ó d i c o Der
Mnsikalische Dilettante [O diletante
musical],
foi consagrado a partir de 1769.
O nascimento da cr í t ica musical foi um acontecimento de imensa i m p o r t â n c i a
para a
vida
musical do s é c u lo X V I I I . Essa atividade não cessaria de
existir,
de e n t ã o
p o r diante, até os nossos dias, assumindo um papel cada vez mais relevante. Até
aproximadamente a metade do s é c u lo
X V I I I
prevaleciam nos escritos sobre m ú s i c a
c o m p a r a ç õ e s e paralelos, p o l ê m i c a s e querelas em torno de
assuntos
de ca rá te r
preferentemente geral, como as q u e s t õ e s de melodia e de harmonia, ou de m ú s i c a
francesa e italiana. A q u i e a l i no entanto, c o m e ç a r a m a manifestar-se julgamentos
sobre uma obra musical particular ou sobre a arte de determinado compositor.
Podem-se
ler as primeiras
cr í t icas
musicais propriamente ditas, em Londres, nos
jornais The Spectator e The Guardian e, em Paris, no Mercure Galant ou seja, em
p u b l i c a ç õ e s não profissionais. Em parte sob inf luênc ia dos ó r g ã o s desse g ê n e r o
J. Mattheson c o m e ç o u a publicar, em Hamburgo, em 1713, seu p e r i ó d i c o Der
Vernünftler [O argumentador], cujo objetivo era a edif icação cultural das
classes
m é d i a s . Um pouco mais tarde, sua revista ritica M usica acolheria cr í t icas musi
cais das obras e de suas o r i e n ta ç õe s e s t é ti c a s o que foi retomado t a m b é m pela
revista
dirigida por J. A . Scheibe, Der CritischeMusicus [O mú s ic o c r í t i c o ] c é l e b re
p or ter publicado uma a p r e c ia ç ã o negativa sobre as c o m p o s i ç õ e s de Bach em 1737.
Essas
duas revistas musicais deram l ivre curso às novas idéias iluministas francesas,
que enfatizavam a primazia, nas artes, da natureza e da r a z ã o . Outras pub l i c a ç õe s
p e r i ó d i c a s como a
Musikalische
Bibliothek [Biblioteca musical], dirigida por
L . Miz le r um aluno de Bach em
Leipzig,
tinham antes um ca rá te r c ient í f ico . Na
segunda
metade do
s é c u lo
X V I I I
Be r l im
tornou-se o mais importante centro de
cr í t ica e de teoria musical na Alemanha, graças sobretudo aos trabalhos e aos pe
r i ó d i c o s publicados por F.W. Marpurg, que, amigo de d Alembert, de
Voltaire
e de
outros enciclopedistas franceses, levava ao p ú b l i c o a l e m ã o as idé ias destes sobre
m ú s i c a . A cr í t ica musical era particularmente prolíf ica nos p a í s es g e r m â n i c o s tan
to mais que lá se publicavam, no s é c u lo
X V I I I
muitas centenas de revistas e jornais.
No século
X V I I
a m ú s i c a era tratada nos escritos dos t e ó r i c os e dos filósofos
sobretudo como parte integrante de um todo mais vasto, ou como uma arte
infe-
r i o r subordinada à poesia ou às m a t e m á t i c a s . Com os filósofos das Luzes, no en
tanto, ela passou a ser concebida cada vez mais como uma arte distinta, em sua
autonomia e sua especificidade. Uma abordagem mais e m p í r i ca da m ú s i c a come
ç o u a impor-se, e progressivamente foi sendo reconhecido o seu valor p r ó p r i o
es té t ico e cultural. Até mais ou menos a metade do s é c u lo X V I II praticamente não
existia uma clara e n í t i da c onsc iê nc ia da historicidade da m ú s i c a que c o m e ç o u a
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Situação sócio histórica
d
música
no
século XVIII
415
partir de e n t ã o , a manifestar-se. As primeiras h i s tó r i a s da m ú s i c a propriamente
ditas foram escritas na Inglaterra, na F r a n ç a e na Alemanha, tais como as p u b l i
cadas
por Hawkins, Burney e Bourdelot-Bonnet. Os
filósofos
deram-se
conta de
que a m ú s i c a é um f e n ô m e n o de i m p o r t â n c i a social e que, ao mesmo tempo, é
dif ici lmente expl icável
nos quadros do racionalismo corrente: este a subordinava à
poesia por causa do elemento racional que, presente na lingagem verbal, faltava
justamente à mú s i ca . A té en t ão , as ú n i c a s formas de m ú s i c a verdadeiramente apre
ciadas
pelos t eó r i co s e os filósofos eram a m ú s i c a vocal e a ó p e r a , ou seja, a m ú s i c a
que está ligada à palavra. Doravante, a m ú s i c a instrumental, em pleno desenvolvi
mento, levantava um problema t e ó r i c o : o do valor p r ó p r i o da m ú s i c a enquanto tal.
E m meados do sécu lo , a p r ó p r i a palavra es té t ica é aplicada por A . G . Baumgarten,
em seu l i v r o Aesthetica ao belo e à arte.
Embora nenhum dos enciclopedistas fosse m ú s i c o profissional — com exce
ção,
até certo ponto, do autodidata
Rousseau
—, a m ú s i c a mereceu um esp aço
importante na Encyclopédie o que decerto contribuiu para re t i r á- la do isolamento
em que se achava até e n t ã o . O nascimento e o desenvolvimento da ó p e r a , g ên e r o
que obteve o maior sucesso junto ao p ú b l i c o , c o n t r i b u í r a m , por sua vez, para con
tatos mais seguidos entre
m ú s i c o s
e
poetas,
assim como para uma
c o n c e p ç ã o
mais
h u m a n í s t i c a da m ú s i c a . O m ú s i c o passou a ser tratado cada vez menos como um
a r t e s ã o ,
o que
t a m b é m
determinou a
m u d a n ç a
e a
e l ev ação
de sua
s i t u ação
social
e da c o n s i d e r a ç ã o de que era objeto. Por outro lado, aumentavam os
ganhos
dos
m ú s i c o s , e suas c o n d i ç õ e s gerais de vida tornavam-se aproximadamente as mes
mas em diversos países europeus.
E m suma: grosso
modo
a m ú s i c a passa de uma p o s i ç ã o de ornamento s e c u n d á
r i o na
vida
da elite social e de instrumento do culto
religioso,
da festa e do cerimo
nia l , ao estatuto de importante i tem da vida cu l tu ra l . As p o l ê m i c a s entre m ú s i c o s
e filósofos, como a que se travou entre Rameau e Rousseau, que sustentavam res
pectivamente a primazia da harmonia ou da melodia na m ú s i c a , c o n t r i b u í r a m
para incrementar o
interesse
pela
m ú s i c a
nos
c í r cu lo s
intelectuais, como, de resto,
as querelas entre as diferentes t e n d ê n c i a s e
escolas
concernentes à ó p e r a . Mas tam
pouco devem ser esquecidas, como fator determinante para a i n s e r ç ã o da m ú s i c a
na cultura, as f u n çõ es reais que ela exercia na sociedade. A f u n ção social da ó p e r a
mostra-se, no caso, mais uma vez, de singular i m p o r t â n c ia : a ó p e r a não era apenas
u m divertimento para as classes superiores; t a m b é m era o c e n á r i o de uma luta
entre diversas idéias f ilosóficas e es té t icas , entre diversos gostos, a l ém de solicitar
toda uma sér ie de outras atividades, como a dos pintores, dos d a n ç a r i n o s , dos
co r eó g r a f o s ,
etc.
Assim,
as
c o n s i d e r a ç õ e s
sobre a
m ú s i c a v i r i a m
a ocupar um
espa
ço cada vez maior na obra de filósofos como Diderot, d'Alembert e
Rousseau.
O sécu lo X V I I I assistiu, sobretudo na F r a n ç a , à f o r m a ç ã o de verdadeiros par
tidos
musicais, que às
vezes
se tornaram partidos
p o l í t i co s ;
inversamente,
m o t i -
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416
Quarta parte a primeira
metade
do século
XV
vos po l í t i co s estiveram na origem de a p r e c i a ç õ e s sobre as obras e os compositores.
Criaram-se, igualmente,
d iv i sões
em diferentes
clãs ,
em que argumentos de gosto
e de
es té t i ca
misturavam-se, por vezes, a atitudes
po l í t i cas ,
como foi o
caso
das
disputas entre m ú s i c a francesa e
italiana,
entre
lullistas
e ramistas, gluckistas e
piccinistas, por exemplo. No p r i n c í p i o do sécu l o X V I I I , o debate entre a m ú s i c a
francesa e a m ú s i c a italiana ganhara novo impulso. A m ú s i c a italiana tinha a pre
ferência
da nobreza, e os
primeiros
compositores franceses de sonatas dedicavam,
em
geral, suas obras ao duque de
O r l é a n s ,
um
p a r t i d á r i o
declarado da
t e n d ê n c i a
italianizante. Talvez se deva ver
nesse
entusiasmo do regente da F r a n ç a um modo
de opor-se às t e n d ê n c i a s até e n t ã o prevalecentes na corte. A Querela dos B ufões
serviu,
por outro lado, para desviar a
a t e n ç ã o
das disputas do parlamento e do
clero, até
e n t ã o
o objeto fundamental da curiosidade
púb l i ca .
Durante a R e v o l u ç ã o na F r a n ç a , a o r g a n i z a ç ã o das festas nacionais, em que a
m ú s i c a teve p a r t i c i p a ç ã o importante, foi uma das p r e o c u p a ç õ e s constantes das
autoridades
po l í t i cas .
Conseguiu-se levar as massas a um engajamento musical,
pedindo
aos compositores que, com
esse
objetivo, escrevessem corais. As compo
s ições
de
c i r c u n s t â n c i a ,
vocais e instrumentais, surgiram em quantidade, e o que
caracterizou o gosto musical r e v o l u c i o n á r i o foi sobretudo o emprego de grandes
massas sonoras. Em o b e d i ê n c i a à p res são popular, o gosto musical voltou-se para
os vastos conjuntos e para as imponentes
d e m o n s t r a ç õ e s
de sonoridade, acostu-
mando-se a efeitos demasiado pesados e mesmo brutais que bem se ajustavam à
exp res são
do clã
p a t r i ó t i c o
e ao poderio
m i l i t a r :
a
m ú s i c a serve-se
de fanfarras e
a té mesmo de c a n h õ e s , com resultados os mais barulhentos, marcados por um
entusiasmo pelo pomposo e pelo g r a n d i l o q ü e n t e . Muitos anos mais tarde,
Reichardt ainda
p ô d e
observar, nas
i n t e r p r e t a ç õ e s
do Concert des Amateurs em
Paris, exageros de
n u a n ç a s d i n â m i c a s
na
e x e c u ç ã o
da
m ús i ca s é r i a
e
s i n fôn i ca ,
o
que é pouco p r o v á v e l não tivesse a ver com o e s t a r d a l h a ç o pomposo das festas
nacionais a que o p ú b l i c o se havia acostumado.
No sécu l o X V I I I , a especificidade social da ó p e r a c ô m i c a prende-se ao advento
das classes m é d i a s . A ó p e r a c ô m i c a apareceu mais ou menos na mesma é p o c a em
diferentes
paí ses :
na
I t á l i a ,
na Inglaterra, em Hamburgo, e no
c o m e ç o
do
século
era representada sobretudo nos teatros das feiras, recebendo em seguida, em Paris,
u m a
forma
mais desenvolvida. Refletindo o gosto do p ú b l i c o b u r g u ê s e pequeno-
b u r g u ê s ,
assinala um
significativo
contraste em
re l ação
à
ó p e r a
de corte, com
seus
temas
h e r ó i c o s e x t r a í d o s
da
h i s t ó r i a
ou da mitologia, tanto por seu
c a r á t e r
musical
como
pelo de seu texto. Os recursos musicais e
t é c n i c o s
da
ó p e r a c ô m i c a ,
muito
singelos de
i n í c i o ,
cresceram progressivamente em
i m p o r t â n c ia . Seus
temas esta
vam ligados principalmente às
classes
m é d i a s , às quais se d i r ig ia de modo especial;
às vezes, abordava até mesmo o que estava acontecendo no momento. Era fre-
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Situação sócio histórica
d
música
no
século XVIII
4 1 7
quente, nas ó p e r a s c ô m i c a s , ridicularizar a nobreza e parodiar a
opera
seria. Ao
passo que
esta
ú l t i m a se apresentava com um c a r á t e r
internacional,
a ó p e r a c ô m i
ca era nacional; nela fazia-se uso até de dialetos locais. Era um e s p e t á c u l o com
ingressos à venda, aberto a todos sem
ex ceção ,
ao
c o n t r á r i o
da
ó p e r a
principesca,
à
qual
só se podia assistir sendo convidado. A ó p e r a c ô m i c a , sob suas diferentes
formas
e
d e n o m i n a ç õ e s ,
que variavam de um
país
para outro, era um
g ê n e r o
ca
paz de satisfazer perfeitamente as ex igências de um p ú b l i c o novo e em e x p a n s ã o ,
que não cessou de ap r ec i á - l o cada vez mais ao longo de todo o sécu lo .
O crescimento do p ú b l i c o b u r g u ê s amante da m ú s i c a no s é c u l o X V I I I teve uma
c o n s e q ü ê n c i a importante para a vida
musical:
multiplicaram-se as a p r e s e n t a ç õ e s
p ú b l i c a s
de
m ú s i c a ,
asseguradas
pelos diversos
concerts
(sociedades de concerto ou
academias). Na F r a n ç a , academias organizadas como sociedades de concerto, so
bretudo de amadores, mas com a p a r t i c i p a ç ã o cada vez
maior
de profissionais,
existiram
desde a primeira metade do sécu lo , em Paris, Marselha, Bordeaux, N i -
mes, L y o n , Lille e noutros pontos. Em
Amiens,
os
principais
burgueses da cidade,
e m n ú m e r o de quarenta, mantinham uma sociedade desse t i p o . Os estatutos da
academia de Marselha esclarecem que ela fo i fundada para d iver t i r uma
juventu
de por demais ociosa e para ter, ela p r ó p r i a , uma o c u p a ç ã o . As academias de
p r o v í n c i a ,
da mesma forma que as parisienses — a mais importante das quais era
o
oncert
SpiritueL fundado em 1725 —, c o n t r i b u í r a m de maneira co n s id e r áv e l
para a e x t e n s ã o da cultura musical na F r a n ç a , sobretudo nos meios burgueses.
Entretanto, por conta da atmosfera social do A n t ig o Regime, quando uma acade
m i a n ã o era fundada por nobres, seus fundadores burgueses quase sempre pediam
a p r o t e ç ã o de a l g u é m que o fosse. Nos concertos oferecidos por essas academias,
burgueses e nobres sentavam-se lado a lado. Na busca de alegria e d i s t r a ç ã o na
m ú s i c a , as duas classes finalmente se reuniam. Encontravam pontos de contato e
de solidariedade na a p r e c i a ç ã o geral da arte dos sons até que afinal. . . compuse
ram-se, em termos de
m ú s i c a ,
de tal modo que a
vida
musical,
sobretudo na se
gunda metade do sécu lo , já não era puramente a r i s t o c r á t i ca , nem puramente
burguesa tampouco. Antes mesmo do desenvolvimento das academias e dos
con
certos p ú b l i c o s na F r a n ç a , os sa lões ar i s tocrá t icos foram-se abrindo pouco a
pou
co para uma certa
elite
da burguesia, e os membros das duas classes lá se reuniam
para apurar juntos os ouvidos. O p ú b l i c o que f r eq ü en t av a o sa lão do mecenas La
P o u p l i n i è r e compunha-se tanto de nobres como de burgueses. Na aristocracia,
numerosos eram aqueles que organizavam concertos em suas r e s id ên c i a s , onde
era p o s s ív e l às vezes ouvir m ú s i c o s n o t á v e i s — um Mozart, por
exemplo.
T r i a l e,
posteriormente, Gossec d i r i g i r a m os concertos do p r í n c i p e de C o n t i , onde se
apresentaram t a m b é m Schobert, Rodolphe, Janson e outros mais. O b a r ã o de
Bagge, o conde
d'Albaret
e o duque d ' A i g u i l lo n foram mecenas. Mas a alta bur
guesia t a m b é m queria desempenhar o papel
lisonjeiro
de protetora das artes. Um
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418
Quarta parte a primeira metade do século XV
financista como La
P o u p l i n i è r e
em cujos
sa lões
apresentaram-se entre outros
Rameau Stamitz e Gossec
a l c a n ç o u
grandes
m é r i to s
em seu papel de
mecenas
de
p r i m e i r í s s i m a i m p o r t â n c i a
na
F r a n ç a
a ponto de poder ser comparado
nessa
c o n d i ç ã o a p r í n c i p e s e aristocratas da Alemanha que
faziam
de suas cortes e pa
l ác ios
verdadeiros centros da vida musical.
M as
as academias ofereciam uma
o r g a n i z a ç ã o
de concertos que custavam
m u i -
to
menos que a
m a n u t e n ç ã o
de uma orquestra
particular
permanente.
A
participa
ç ã o gratuita dos amadores em muito c o n t r i b u í a para isso. Ademais as academias
e os concertos p ú b l i c o s vendiam os ingressos em geral por um sistema de assina
tura obtendo dessa maneira uma renda com os
e spe t ácu l os
— o que era proibido
e m p r i n c í p i o
aos
sa lões
particulares.
A
d e t e r i o r a ç ã o da s i t u a ç ã o e c o n ô m i c a geral na F r a n ç a que se acentua com o
correr do s é c u l o a atitude oficial para com a m ú s i c a por parte de um poder que
já
não a favorece como antes e não concede cartas patentes reais às academias e
finalmente as guerras como a Guerra dos Sete Anos determinaram o
d ec l í n i o
progressivo
e por fim com a
R evo l ução
o desaparecimento das academias por
sinal
excessivamente associadas ao An t i go Regime. As d é c a d a s de 1770 e de 1780
trouxeram m u d a n ç a s profundas para a vida musical provocadas pelas modifica
ç õ e s
radicais da
vida
e c o n ô m i c a
e social.
Esses anos foram assinalados por muitas
i n o v a ç õ e s
importantes na vida mu
sical
e u r o p é i a
decorrentes em parte da
e d i ç ã o
musical. Como escreveu Barry
S.
Brook esse p e r í o d o
marcou o ponto culminante de um longo processo durante
o qual a m ú s i c a evoluiu da c o n d i ç ã o de of ício semifeudal a s e rv i ço da Igreja da
cidade e da corte à de p rof i ssão de l ivre iniciat iva voltada predominantemente
para o mercado
b u r g u ê s .
Nessa
é p o c a
a classe
m é d i a
forjava para si uma nova si
t u a ç ã o
social e a
p rof i ssão
musical seguia o movimento que se expandiu em ou
tras
esferas
sociais cada vez mais penetradas pela
l ivre iniciat iva
que abastecia o
mercado crescente em conformidade com as leis sempre mais ativas da oferta e da
procura leis que
c o m e ç a r a m
a atuar
t a m b é m
mas de um modo
especí f i co
no
setor
cultural.
N o ú l t i m o
quartel do
s écu l o
o papel e a
f u n ç ã o
do mecenato
c o m e ç a r a m
a
declinar e as
m u d a n ç a s
na
p o s i ç ã o e c o n ô m i c a
do
m ú s i c o
desenharam-se em
l -
nhas
marcantes. Os compositores já não recorriam sistematicamente à
d e d i c a t ó r i a
para obter alguns s u b s í d i o s da parte de um mecenas o que
significava
a l é m do
mais
e n d e r e ç a r
suas
c o m p o s i ç õ e s
a um
p ú b l i c o
restrito.
O destino do
m ú s i c o
e de
sua obra decide-se cada vez mais diretamente nos concertos
p ú b l i c o s
no interior
de uma vida musical sempre mais comercializada e organizada para um
púb l i co
novo de
classe m é d i a
na qual entretanto o
púb l i co a r i s t oc rá t i co
ainda ocupa um
lugar de destaque. Os compositores escrevem cada vez menos exclusivamente para
as r e s i dênc i as dos p r í n c i p e s e dos aristocratas onde até e n t ã o o m ú s i c o não pas-
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Situação sócio histórica d música no século XVIII
4 9
sava, ou quase, de um criado, como era ainda o caso de Haydn a
serv iço
do
p r í n
cipe Esterhazy, ou de Mozart em Salzburg. Os compositores dependem cada vez
menos de nobres
p a t r õ e s .
Em
Leipzig
por exemplo, J.A.
Hi l le r feito
Kantor da
igreja
de Santo
Tom ás e s fo rçava - se
por tornar
acessíveis
suas
c o m p o s i ç õ e s
procu
rando — sobretudo em
seus Singspiels
que se tornaram muito populares na
A l e
manha — a simplicidade de
exp res são
e a
c o m p r e e n s ã o
de um
p ú b l i c o
mais am
p lo
de diletantes e profissionais.
A
f r eqüênc i a
aos concertos e às
r e p r e s e n t a ç õ e s
de
ó p e r a s
aumentava com o
crescimento das empresas comerciais de
d i fusão
musical, que se iam tornando
menos dependentes da
c ó p i a
manuscrita e cada vez mais
associadas
à jovem in
d ú s t r i a
da gravura e da
i m p r e s s ã o .
Depois de ter
c o m e ç a d o
dando
p r e j u í zo
a
edi
çã o
musical gravada ou impressa se fez
lucrativa.
Não é de surpreender, por exem
plo
que Bach tenha publicado em vida tão pouco de suas obras. A venda de A arte
da fuga publicada quando de sua morte, não deu para cobrir sequer os gastos com
a
g r avação
sobre cobre. Mais tarde, pelo
c o n t r á r i o
esse novo fator, representado
pelo editor na vida musical, haveria de proporcionar ao compositor uma
s i tuação
e c o n ô m i c a
de maior
i n d e p e n d ê n c i a
do que a que lhe garantia o
s e rv i ço
da aristo
cracia, embora, por outro lado, pudesse
p r e n d ê - l o
a outros
v í ncu l os
de ordem
e c o n ô m i c a
e comercial. Os compositores deviam
f r e q ü e n t e m e n t e
levar em conta
o mercado visado por seus editores e escrever suas obras de modo a que estes
ficassem satisfeitos. Nessa
é p o c a
entretanto, os compositores por vezes encarrega
vam-se de ser
seus p r ó p r i o s
editores, ocupando-se da
i m p r e s s ã o
de
suas obras
por
tipografia ou gravura.
O
abandono da
p r o t e ç ã o
do mecenato
a r i s t oc rá t i co
tradicional
fo i
acompanha
do pela
evo l ução
de possibilidades, até
e n t ã o
desconhecidas, de liberdade de
esco
lh a
em toda uma
sér ie
de atividades musicais profissionais. E
essas
possibilidades
eram exploradas por um
n ú m e r o
cada vez maior de
m ú s i c o s .
A mobilidade da
prof i ssão
de
m ú s i c o
tornou-se mais generalizada, não sendo o estatuto social dessa
categoria definido tão rigidamente como no
passado.
Na
F rança
um decreto de
Turgot pôs
f i m
em 1776, à
h i s t ó r i a
das
c o r p o r a ç õ e s :
todas as artes e
ofícios
torna
ram-se
doravante
livres.
A mobilidade da
p r ó p r i a m ú s i c a
aumentou em propor
ções
até
e n t ã o
nunca vistas. A
in f luência
da
i m p r e s s ã o
e da
ed i ção
estreitamente
ligadas entre si, foi sentida não apenas na
d i fusão
da
m ú s i c a
permitindo-lhe ser
conhecida numa
á rea
social e
geográfica
mais extensa: com a
m o v i m e n t a ç ã o
mais
f r eqüen t e
dos
m ú s i c o s
de um
p a í s
para outro e a
c o n s e q ü e n t e v a l o r i z a ç ã o
de
seus
contatos pessoais, a
ed i ção
musical de grandes tiragens
contribuiu
para uma in
f luência rec íproca
crescente
entre os estilos musicais e os compositores
individuais,
n ã o
somente no
interior
dos diferentes
países
mas
t a m b é m
para
a l ém
de
suas f ron
teiras. A
in f luência
italiana, dominante sobretudo na esfera da
ó p e r a
como
atesta
a
p r e sença
de companhias de
ó p e r a
italianas em Londres quase desde o
p r i n c í p i o
do
sécu lo
na Alemanha a partir de 1730 aproximadamente, e em Paris depois de
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Quarta parte a primeira
metade
do século XV
1750), foi desaparecendo aos poucos na segunda metade do
s écu l o ,
a não ser nos
cí rcu los
da corte, onde a
opera seri
e o
o r a t ó r i o
italiano conservaram sua ascen
d ên c i a .
No
d o m í n i o
instrumental da
m ú s i c a
far-se-ia sentir
dal i
por diante a in
fluência
do que se fazia na
Áu s t r i a ,
na
B o ê m i a
e na Alemanha do Norte. De qual
quer modo, a
ed i ção
musical teve
c o n s e q ü ê n c i a s
importantes
t a m b é m
no plano
ar t í s t i co .
Num
primeiro
momento, o papel
principal
coube à
F r a n ç a ,
à Inglaterra
e aos
Países
Baixos. Antes que muitos editores de outros centros europeus — como
Viena,
Ber l im
e
M i lã o
— se
l an ças s em
em uma atividade de maior
vu l to ,
mais ou
menos na
ú l t i ma t e r ça
parte do
s écu l o , foram
principalmente os editores de mú
sica de Paris
Boivins ,
Le Clercs), de Londres (Walsh) e de
A m s t e r d ã
(Roger, Le
C è n e )
que publicaram o grosso da
p r o d u ç ã o
musical gravada ou impressa do sé
culo
X V I I I .
Muitos
mú s i co s a l emãe s , au s t r í aco s
e
italianos, inclusive
os mais famo
sos
(Mozart, Haydn), tiveram
as primeiras
ed i çõ es
de
suas
obras publicadas em
Paris, cuja grande atividade
nesse d o m í n i o
ultrapassou em muito, por um certo
tempo,
a atividade somada desses
países
todos.
Certos editores abusavam, entretanto, dos compositores, publicando
suas
obras sem
a u t o r i z a ç ã o
e não lhes pagando qualquer
r e m u n e r a ç ã o .
A pirataria na
ed i ção
musical chegava ao ponto de atribuir-se o nome de um compositor
cé lebre
a
c o m p o s i ç õ e s
que não eram de sua autoria, com o
objetivo
de
v e n d ê - l a s
mais
facilmente.
Ou seja, os direitos autorais ainda
n ã o
estavam garantidos. Só perto do
final do
s écu l o
foram dados os primeiros passos nesse sentido — na Alemanha,
sobretudo,
g raças
à atividade de J.G.I.
Breitkopf.
Mas a
p r o d u ç ã o
musical da
ép o ca
era tão volumosa, que somente uma pequena parte das obras compostas podia ser
publicada. Tanto mais que uma parte
co n s i d e ráv e l
dessa
p r o d u ç ã o ,
sobretudo no
tocante a
ó p e r a s ,
era destinada a uma
vida muito
curta no
r e p e r t ó r i o , motivo
pelo
qual sua
ed i ção
impressa ou gravada não oferecia
rentabilidade. A vida
musical do
s écu l o
X V I I I passou por este paradoxo: de um lado, o
ca rá t e r e f êmero
de uma certa
arte de temporada ; de outro, a repetitividade, que visava, apoiada na
ed i ção ,
a
manter por mais tempo
certas
obras no
r e p e r t ó r i o .
Este, por sua vez, comportava
obras de alta qualidade lado a lado com
aquelas
que simplesmente estavam na
moda, destinadas aos amadores e a um
p ú b l i c o
cada vez mais numeroso.
A grande
in f luência
exercida pela
ed i ção
musical teve, no
ú l t i m o t e r ç o
do sé
culo,
causas diversas, ligadas todas elas a
f e n ô m e n o s e c o n ô m i c o s
e sociais mais
vastos que tinham curso nos
pa í ses
de maior desenvolvimento da Europa. O
s écu
lo
X V I I I , em
seus ú l t i m o s
anos, inaugurou um
f e n ô m e n o
que dominaria a
h i s tó r ia
da
mú s i ca d a l i
por diante, cada vez mais: a repetitividade Desapareceu o
cará ter
ú n i c o
e estritamemte circunstancial, associado a uma só
o cas i ão ,
ou quando
m u i
to
a algumas
ocas iões
bem pouco numerosas, do acontecimento musical:
suas
l i
m i t a ç õ e s
em
f re q ü ên c ia d i m i n u í r a m ,
e sua
r e s t r i ção
a uma
c i r c u n s t â n c ia
especial
o u ú n i ca
rarefez-se. O
p r i n c í p i o
de
r ep e t i ção ,
favorecido e encorajado pela
ed ição ,
7/23/2019 Sit Socio Hist Mus s XVIII
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Situação sócio histórica d música no sécião XVIII
levou à possibilidade de a u d i ç õ e s m ú l t i p l a s de uma p e ç a musical numa sér ie de
ex ecu çõ es que escapavam ao controle do compositor e à sua d i r e ç ã o imediata ou
direta, assim como lhe escapavam os conhecimentos dos locais e dos c í r cu l o s , dos
i n t é r p r e t e s
e das
c i r c u n s t â n c i a s
precisas em que
suas
obras poderiam ser tocadas.
Bach
compunha
suas cantatas
para o cas i õ es determinadas, e em geral uma cantata
para cada vez; Haydn queixava-se, em 1768, de que lhe era difícil compor uma
cantata para um mosteiro na Á u s t r ia sem conhecer nem as pessoas nem o local .
Enquanto as
cantatas
de Bach eram regidas por ele p r ó p r i o , Haydn já se encontra
va no momento da m u d a n ç a , em que a e x e c u ç ã o de boa parte de suas obras come
çava a escapar-lhe.
Se, por um lado, o crescimento quantitativo da m ú s i c a e sua d i s s e m i n a ç ã o t i
veram
causas s o c i o l ó g i cas — maior liberdade para o m ú s i c o , p ú b l ic o mais vasto,
e s t í m u l o e c o n ô m i c o à e d i ç ã o —, por outro, t a m b é m
tiveram
c o n s e q ü ê n c i a s bem
determinadas: a ulterior ou suplementar demanda e a m p l i a ç ã o do p ú b l i c o , a re
ceptividade para a m ú s i c a que aumentava com cada a p r e s e n t a ç ã o , o maior
encorajamento ao amadorismo, e finalmente o e s t í m u l o mais forte para as p r ó
prias atividades comerciais ligadas à m ú s i c a e à vida
musical.
Aos poucos, a repeti
tividade
levou à o r g a n i z a ç ã o de toda uma rede comercial envolvendo o conjunto
de fatores que tiveram papel ativo em sua a f i r m a ç ã o posterior no s écu l o XIX: os
gravadores, os impressores, os editores, os vendedores de partituras, os fabricantes
de instrumentos, os organizadores da
vida
musical, etc.
Quem quiser situar as primeiras aberturas em d i r e ç ã o à d e m o c r a t iz a ç ã o da
vida musical e da m ú s i c a , tornada acess ível no sécu lo XX a um p ú b l i c o mais amplo
do que jamais o foi no passado, pode e n c o n t r á - l a s em todos esses f e n ô m e n o s que
se produziram perto do fim do s écu l o X V I I I e não exatamente no sécu lo XIX,
como se chegou por
vezes
a imaginar.
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