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9Campinas, 7 a 13 de setembro de 2009 JORNAL DA UNICAMP

CARMO GALLO NETTO

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Émuito grande a diversidadede pesquisas realizadasnas universidades brasi-leiras. Há docentes que sededicam essencialmente

à pesquisa básica com o objetivo deoferecer contribuições teóricas ao de-senvolvimento de sua área de atuação;

há os que esperam que elas possamde alguma forma vir a alavancar signicativos incrementos no desen-volvimento cientíco e até contribuir 

 para avanços tecnológicos; há os quetrabalham com vistas a descobertasque possam ser implementadas em

 produtos oferecidos no mercado; háos que esperam de alguma forma dar retorno mais imediato à sociedadeque arca com o custo da pesquisa e doensino universitário ocial no Brasil.É neste último grupo que se situa deli-

 berada e preferencialmente o professor Armando Lopes Moreno Junior, doDepartamento de Estruturas da Facul-dade de Engenharia Civil, Arquiteturae Urbanismo (FEC) da Unicamp, umdos responsáveis pelos estudos desen-volvidos no Laboratório de Estruturas

e Construção Civil da Faculdade.Com efeito, o pesquisador mantémuma linha de pesquisa envolvendo oemprego de materiais alternativos naconstrução civil com o objetivo deoferecer para as comunidades carentes

 processos construtivos mais bara-tos e utilizáveis pelos seus própriosmembros. Com essa preocupação, ele

 procura desenvolver alternativas para afabricação de tijolos ecológicos, estudaa construção de lajes, vigas e colunascom a utilização de tiras de bambu emsubstituições às tradicionais armadu-ras de aço, e pesquisa a utilização dacola de PVA (cola branca comum) noassentamento de tijolos em lugar daargamassa convencional constituídade areia, cal e cimento.

Moreno faz questão de esclarecer 

que sua linha de pesquisa caminha por duas vertentes distintas. Uma pro- priamente acadêmica em que estudao comportamento de estruturas emsituação de incêndio, que constituiuma pesquisa de ponta porque não hánenhum grupo que faz isso no Brasil elhe garante projeção e prestígio acadê-micos e publicações em revistas inter-nacionais, o que talvez não conseguiriase desenvolvesse trabalhos voltadosapenas para a comunidade.

Em outra vertente, se preocupaem oferecer tecnologias construtivasexequíveis para comunidades carentes

 para que possam, por exemplo, utilizá-las em construções em mutirões. Eesclarece: “Por opção, trabalho coma preocupação de prestar serviços àcomunidade, adotando a pesquisa demateriais alternativos para a construçãocivil que, embora repercuta apenas emrevistas regionais, geralmente de arqui-tetura, garantem uma transferência detecnologia bem mais rápida que os tra-

 balhos que realizo em minha outra atu-ação na Universidade, envolvendo es-tudos de ponta sobre o comportamentode estruturas submetidas ao fogo, cujosresultados vão ser absorvidos pelo mer-cado somente daqui a oito, dez anos”.

A fabricação do tijolo ecológico seinsere nesse projeto a que dedica maior urgência. Ele conta que tem conse-guido, por meio do desenvolvimentodesse tijolo, oferecer cursos para a

  população de baixa renda, interme-diados por associações de moradorese grupos religiosos, possibilitando queessas comunidades fabriquem os tijolosque irão aplicar na construção de suas

residências. As comunidades selecio-nam as pessoas que têm determinadasaptidões e disposição para o curso.

 Nas férias, o serviço é oferecidotambém para estudantes de nível médio

que terão depois condições de repassar o que aprenderam. Atualmente, umasua aluna do curso de engenharia ci-vil está realizando esse trabalho comegressos de presídios. A ideia é conse-guir dar uma prossão para esse pes-soal. O docente acrescenta, entusias-mado: “Originalmente, essa linha de

 pesquisa foi montada para dar retornoe atender as comunidades, o que consi-dero muito importante. Conseguir esseretorno social é muito graticante”.

Os participantes dos cursos ofereci-dos aprendem em cerca de 30 horas afazer a mistura com a umidade adequa-da, prensagem e cura recomendadas

 para obtenção de tijolos de boa quali-dade. São alertados para a adequaçãodo material à construção civil e por isso aprendem os conceitos básicos

de resistência mecânica, absorção deágua etc. Recebem também noções  básicas da construção civil: como preparar a argamassa de revestimento,de reboco, como erguer uma paredeno prumo, a importância da fundação.“Estamos trabalhando para que essesalunos recebam um certicado nessescursos para que consigam um empregomelhor e uma inserção social maior”,diz o professor.

O curso é ministrado por alunos deengenharia civil o que considera im-

 portante porque os despertam para asnoções de responsabilidade social, poiscomo diz, “eles estão aqui estudandogratuitamente e de alguma maneiradevem retribuir para a sociedade oque estão recebendo”. Estão envolvi-dos nesse trabalho também alunos deiniciação cientíca.

Mistura

É considerado ecológico o tijolo

que não precisa de queima, dife-rentemente dos feitos de argila que,

depois de moldados, são queimadosem grandes fornos, que além de con-sumirem madeira poluem o ambiente.Além disso, a argila encontra-se emgeral próxima aos cursos d’água e suaretirada provoca erosão e assoreamentode rios. Os tijolos ecológicos são feitosde uma mistura de solo-cimento, na

 proporção de 10:1, devidamente ume-decida e submetida à prensa manual, decusto baixo, uma vez que se destina aatender uma comunidade.

Uma pessoa consegue produzir por dia 500 tijolos. Em geral é utilizada aterra do local, selecionando solos cons-tituídos naturalmente de areia, argila esilte, na proporção de 60, 20 e 20 por cento, respectivamente. O engenheiroexplica que a maioria dos solos daregião de Campinas tem essa composi-

ção, excluída a camada supercial, ricaem matéria orgânica. Para garantir queo tijolo a ser produzido pelas comuni-dades esteja dentro das normas esta-

 belecidas, o grupo de pesquisa vai aolocal, procede à seleção do solo, faz os

 primeiros tijolos e executa os ensaios  padrões recomendados. O professor garante que o tijolo obtido, além da ex-celente qualidade, é mais barato do queo convencional oferecido no mercado.

Ele vem pesquisando a fabricaçãoe emprego do tijolo ecológico há cercade dez anos. Nesse tempo fabricoutijolos com a adição de resíduos várioscomo o lodo oriundo das estações detratamento de esgoto, entulho devida-mente processado, borracha de pneususados, ou seja, todo tipo de resíduoque normalmente seria descartado nomeio ambiente.

Resultam daí materiais interessan-tes, cuja utilização depende da dispo-nibilidade na região em que serão em-

O professor 

 ArmandoLopes

Moreno

 Junior e os

tijolos feitos

com mistura

de solo e

cimento:

produto de

excelente

qualidade e

mais barato

do que o

convencional

Construindo com tijolos ecológicosProfessorda FECcoordena

pesquisasfocadas emmateriaisalternativos

 pregados. O pesquisador conta que háempresas que o procuram para vericar 

a possibilidade de emprego de seus re-síduos, o que o faz estudar sua utiliza-ções na fabricação de tijolos, de telhas,de placas de concreto etc. Constituemvertentes da sua pesquisa de materiaisalternativos para construção civil.

  Nesses estudos, ele testa os ma-teriais obtidos com base nos padrõesnormatizados nacionais ou, na ausênciadeles, dos internacionais americanosou europeus, com vistas à produção detijolos, telhas, placas. De acordo com autilização a que se destina, o materialdeve atender padrões de comportamen-to estabelecidos pelas normas, comoresistência à compressão, permeabi-lidade em relação à absorção de água,

 para que se possa comparar seu com- portamento em relação aos respectivosmateriais convencionais. E para isso

existem ensaios padronizados.A técnica da fabricação com solo-cimento e o tijolo ecológico começa-ram a ser utilizados no país nos anos50, mas, somente na última décadavem tendo a importância merecida,face ao seu apelo de sustentabilidade.Primeiro, em construções envolvendomutirões em que as comunidades fa-

 bricavam seus elementos de alvenariae, depois, por razões ligadas à causaecológica, acabou sendo encampado

 pelas classes mais abastadas, tornando-se protagonista destes dois apelos.

Cola O caso particular da utilização da

cola à base de PVA para assentar ostijolos na construção de paredes emsubstituição à argamassa convencionalconstituída de areia, cal e cimento, seinsere nessa linha de pesquisa e suautilização visa dar rapidez, limpeza

 – porque a padronização do bico de

aplicação garante a sua distribuiçãouniforme, e economia à construção,

 pois o assentamento com argamassaé demorado e o desperdício grande,chegando a 30%. Moreno constataque a resistência da cola em relaçãoà aderência é maior do que quando seutiliza a argamassa. Ele enfatiza que,nos cursos ministrados, o uso da cola éapresentado como opção, mesmo por-que neles se mostra também a técnicausual de assentamento.

Em relação à cola à base de PVA, odocente constata que pouco se estudoua respeito do seu emprego no assenta-mento de elementos de alvenaria desolo-cimento e que, mesmo em uma

  busca rápida no mercado, podem ser encontradas empresas nacionais quese propõem a utilizá-la na união detijolos. Para isso precisam que os ele-mentos colados apresentem-se secos,

 pouco porosos e tenham uniformidadena superfície de aplicação da cola,características que o tijolo maciço desolo-cimento apresenta . A avaliação da

 possibilidade desse assentamento temsido objeto da pesquisa desenvolvido

 por Moreno e os resultados, emboraainda parciais, indicam que a cola podesubstituir com vantagens a argamassausual no assentamento de tijolos ma-ciços de solo-cimento.

Ele entende que os resultados já ob-tidos podem respaldar cienticamenteuma técnica de execução de alvenariarápida, econômica e que não leva adesperdício de material. Entretanto,considera primordial a continuidadedos estudos, pois muitas outras ava-liações de desempenho das alvenariasde solo-cimento, em ambientes inter-nos e externos, devem ser executadasantes que esta técnica seja corrente ecorretamente empregada no setor daconstrução civil nacional.

 Aluna do ensino médio durante ofcina e uma das prensas usadas no processo de produção: repassando os conhecimentos para a comunidade

Fotos: Antoninho Perri

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