UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA
FACULDADE DE ENGENHARIAS, ARQUITETURA E
URBANISMO
ENGENHARIA QUÍMICA
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
ESTUDO DA INFLUÊNCIA DOS ÁCIDOS CÍTRICO
E METANOSSULFÔNICO NO PROCESSO DE
PURIFICAÇÃO DA GLICERINA – SUBPRODUTO
DA PRODUÇÃO DE BIODIESEL
Alunos: Guilherme Bueno Costa – 01210110
Janine Eberle Schmidt Sales – 01211179
Orientadora: Dra. Vanesa Claudia Gisela Mitchell Ferrari
São José dos Campos
Junho de 2016
RESUMO
A busca por substituição de combustíveis de origem fóssil por combustíveis provenientes de
biomassa cresce ao longo dos anos, devido aos problemas de esgotamento do petróleo e a
poluição ambiental. Dentro deste cenário, o mercado de biodiesel apresenta grande destaque,
pois provém de uma fonte renovável. A produção de biodiesel é feita através de um processo
químico denominado transesterificação, uma reação que ocorre entre um triglicerídeo e um
álcool de cadeia curta resultando em éster (biodiesel) e o subproduto glicerol, uma matéria
prima com aplicação em diversos setores da indústria. O glicerol proveniente do processo de
transesterificação contém impurezas e necessita passar por uma etapa de purificação. Um dos
processos de purificação mais utilizado é a destilação, onde a glicerina passa por um pré-
tratamento denominado acidulação, no qual são retirados os sabões e o catalisador através da
adição de ácidos, originando sais e ácidos graxos livres. Neste trabalho, avaliam-se dois tipos
de ácidos diferentes, o ácido metanossulfônico e o cítrico como alternativas para o processo
de pré-tratamento da glicerina. Após a etapa de acidulação, a glicerina é submetida à
destilação para sua purificação e são realizadas análises para caracterização do material obtido
no processo. Mediante a observação dos testes realizados, o ácido metanossulfônico mostrou-
se mais vantajoso, apesar de ser mais caro do que o ácido cítrico, pois resulta em glicerina
mais pura, com melhor aparência, maior rendimento e menor quantidade de resíduo gerado, se
comparado aos testes com o ácido cítrico.
Palavras-chave: Biodiesel. Glicerina. Destilação. Ácido Metanossulfônico. Ácido Cítrico.
ABSTRACT
The search for replacement of fossil fuels from biomass fuel increases over the years due to
oil depletion and environmental pollution problems. Within this scenario, the biodiesel market
has great importance because it comes from a renewable source. The production of biodiesel
is made through a chemical process called transesterification, a reaction that occurs between a
triglyceride and a short chain alcohol resulting in ester (biodiesel) and by-product glycerol, a
raw material for application in various sectors of industry, also called crude glycerin. The
glycerol from the transesterification process contains impurities and need to undergo a
purification step to be used. One of the most commonly used purification methods are
distillation, where glycerin undergoes a pretreatment called acidulation, which are removed
soaps and catalyst present by adding acids, yielding salts and free fatty acids. In this work, we
evaluate methanesulfonic and citric acids as alternatives to the process of pretreating glycerin.
After the acidifying step, glycerol is subjected to distillation for its purification, and analyzes
are performed to characterize the material obtained in the process. Upon observation of the
tests, methanesulfonic acid proved to be more advantageous, although it is more expensive
than citric acid as it results purestglycerin with better appearance, greater efficiency and lower
quantities of waste generated as compared to tests with citric acid.
Keywords: Biodiesel. Glycerin. Treatment. Methanesulfonic Acid. Citric Acid.
SUMÁRIO
I. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 5
I.1.Glicerol .................................................................................................................... 7
I.2. Processo de tratamento da glicerina bruta –Acidulação ....................................... 11
II. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................. 13
II.1- Processo de Purificação da Glicerina Bruta ........................................................ 13
II.2. pH ........................................................................................................................ 18
II.3. Determinação do teor de glicerina ....................................................................... 18
II.4. Teor de cinzas sulfatadas ..................................................................................... 19
II.5. Cor Pt-Co ou APHA ou HAZEN ........................................................................ 20
II.6. Teor de água ........................................................................................................ 20
II.7. Espectroscopia por infravermelho ....................................................................... 21
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................... 22
III.1. Tratamento com ácido e separação do material graxo e glicerina ................. 22
III.2. Destilação ....................................................................................................... 24
III.3. Resultados analíticos e cálculos de rendimento ............................................. 27
IV. CONCLUSÃO .................................................................................................... 33
CITAÇÕES E REFERÊNCIAS ...................................................................................... 34
5
I. INTRODUÇÃO
A necessidade de formas mais eficientes e econômicas de se produzir energia tem
apresentado crescimento exponencial. Com o advento das novas tecnologias, a busca por
substituição de combustíveis de origem fóssil por combustível proveniente de biomassa
apresenta grande importância para o desenvolvimento industrial. Cabe destacar que o uso
excessivo de combustíveis fósseis apresenta dois grandes problemas: o esgotamento, já que o
petróleo não é um recurso renovável, e a poluição ambiental, que vem sendo a maior
preocupação das metrópoles. [1]
O aumento da concentração de gases como o dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4),
causadores do efeito estufa, ocasiona sérias mudanças climáticas, como o aumento da
temperatura média global, elevação do nível dos oceanos e poderão trazer consequências
catastróficas frente à tendência de aumento da população. [2] Um dos maiores responsáveis
pela emissão de poluentes atmosféricos é o transporte, devido à combustão de derivados do
petróleo, por exemplo, a gasolina e o óleo diesel. No ano de 2003, aproximadamente 50% da
energia consumida no país foi proveniente de fontes fósseis e o transporte representou
praticamente metade deste total. [3]
Os biocombustíveis são uma alternativa para minimizar estes problemas. O Brasil é um
dos pioneiros no uso deste tipo de combustível, devido à utilização do etanol proveniente da
fermentação de cana. [3] Dentro deste cenário, o mercado de biodiesel cresce cada dia mais,
pois provém de uma fonte renovável, contribui para a redução de emissões gasosas que
provoca as variações climáticas por todo o planeta, além de ser biodegradável e não-tóxico.
[4]
A produção de biodiesel é feita por um processo químico denominado
transesterificação. A reação de transesterificação ocorre entre um triglicerídeo (óleos e
gorduras) e um álcool de cadeia curta, geralmente metanol, em presença de um catalisador
alcalino. O glicerol contido no triglicerídeo é substituído pelo álcool formando o biodiesel
(éster) e o subproduto glicerol. [2] A Figura 1 ilustra a reação de transesterificação, onde R é
uma mistura de diversas cadeias de ácidos graxos e R’ simboliza a cadeia carbônica do álcool,
no caso do metanol, CH3. [5]
Em geral, os catalisadores utilizados são hidróxido de sódio (NaOH), hidróxido de
potássio (KOH) ou metilato de sódio (NaCH3O) – o mais eficiente entre os três. [5,6]
6
FIGURA 1 – Reação de transesterificação
Fonte: Knothe. [5]
O mecanismo desta reação encontra-se descrito na Figura 2. Este mecanismo é parcial,
demonstrando apenas a formação de um monoglicerídeo.
FIGURA 2 – Mecanismo de reação de transesterificação via catálise básica
Fonte: Valle. [7]
7
O álcool reage com os grupos de ácidos graxos presentes no triglicerídeo, formando os
ésteres (o biodiesel) e o glicerol. [7]
Após o término da reação de transesterificação, o produto resultante constitui-se de duas
fases: a fase menos densa pelo éster e a mais densa pelo glicerol, onde tem-se a glicerina
bruta. [8] Esta separação de fases, em geral, ocorre rapidamente, devido à baixa solubilidade
do glicerol na fase éster, e pode ser feita através de centrífugas ou de decantadores. [5]
O éster metílico segue para um processo de neutralização e remoção do metanol,
lavagem aquosa para remoção de qualquer quantidade residual de catalisador, sabões, sais,
metanol ou glicerina livre, e por fim, secagem, onde tem-se o biodiesel terminado. A fase da
glicerina segue para outros processos de purificação. [5]
I.1.Glicerol
O glicerol, também chamado de glicerina, ou 1,2,3 – propano–triol, é um álcool
trihidroxilado. O termo glicerol é aplicado ao componente puro, enquanto o termo glicerina é
utilizado para produtos comerciais purificados contendo mais do que 95% de glicerol. [5]
É um liquido claro, viscoso, uma molécula polar, higroscópio e possui um gosto doce.
Seu ponto de fusão é, aproximadamente, 17,8ºC e tem ponto de ebulição com a decomposição
por volta de 290ºC. [4,9] Sua descoberta foi feita por Scheele, em 1779, durante o
aquecimento de uma mistura de letargo e azeite de oliva. [5] O Quadro 1 apresenta algumas
propriedades físico-químicas do glicerol.
QUADRO 1 – Propriedades físico-químicas do glicerol
MASSA MOLAR 92,09 kg/kmol
DENSIDADE (25ºC) 1,262 kg/m3
ÍNDICE DE REFRAÇÃO (20ºC) 1,4723
pH (sol. 10%) 6,5 – 7,5
TENSÃO SUPERFICIAL (20ºC) 63,4 x 10-3 N/m
VISCOSIDADE (20ºC) 1499 mPa.s
CONDUTIVIDADE TÉRMICA 0,28 W/(m.K)
Fonte: Adaptado de Knothe e Santos. [5,9]
8
Na natureza, o glicerol é encontrado como glicerídeo em todos os óleos graxos animais
e vegetais. Além do processo de transesterificação de óleo com um álcool, é obtido como
subproduto na indústria de sabão e detergente, durante a saponificação dos óleos. O glicerol
também é formado como um subproduto na síntese de propileno, sendo este responsável pela
geração de 25% de todo o glicerol produzido nos EUA. A Figura 3 apresenta as fontes
globais de produção de glicerol. [5]
FIGURA 3 – Produção mundial de glicerol
Fonte: Adaptado de Knothe. [5]
É mais encontrado em óleos com maiores porcentagens de ácidos graxos C6-C14 (70-
80%) como óleos de coco e de semente de palma e possui diversas aplicações dentre os quais
se destacam as indústrias de medicamentos e cosméticos, alimentos, tabacos, usos em uretano,
etc., como exibe a Figura 4. [5]
O glicerol possui diversas propriedades: é um produto natural, não tóxico, considerado
seguro para o consumo humano, excelente umectante, emulsificante, plastificante, compatível
com diversos tipos de materiais, o que o faz ser amplamente utilizado industrialmente. [10]
Na área de cosméticos, o glicerol se encontra presente em loções e cremes corporais,
xampus, condicionadores, sabões e detergentes. É utilizado como emoliente, umectante,
41%
21%
14%
11%
9%4%
Produção global de glicerol
Ácidos graxos Produção de sabão
Ésteres metílicos para álcoois e detergentes Ésteres metílicos como biodiesel
Síntese química Outros
9
lubrificante e solvente. Em cremes dentais é empregado como umectante, veículo para
corantes e aromas e dispersante. A indústria de produtos alimentícios e bebidas o utiliza como
solvente, emulsificante, anticongelante, condicionador, entre outras aplicações. [9] Na
produção de tabaco é empregado na composição dos filtros de cigarros e como veículo de
aromas. É utilizado na fabricação de dinamite e em explosivos a base de nitroglicerina,
composto explosivo obtido a partir da reação de nitração da glicerina. [11]
FIGURA 4 – Usos da glicerina
Fonte: Adaptado de Schroeder. [10]
A glicerina proveniente do processo de transesterificação (glicerina bruta) que, em
geral, representa 10% em massa do produto da reação, contém impurezas e necessita passar
por um processo de purificação e concentração. Pode conter um teor de 50 a 90% de glicerol.
Apresenta uma coloração escura e se solidifica a temperatura ambiente, devido à presença dos
subprodutos incorporados ao mesmo tais como sabão, álcool, catalisador alcalino, entre
outros. [8,12,13]
A purificação é um processo importante visto que o glicerol proveniente da separação
glicerina/éster do processo de fabricação de biodiesel tem baixo valor de mercado e sua
disposição pode ser relativamente difícil, pois seu uso depende do seu grau de pureza que, em
geral, deve estar acima de 95%. O glicerol com teor de 99% é uma matéria prima de alto valor
devido à possibilidade de ser aplicada em diversos setores da indústria. [5,14]
Existem dois métodos utilizados comercialmente para a purificação da glicerina:
processo por destilação (método convencional) e por troca iônica, sendo este a passagem do
material por uma resina. [6,15] Antes de passar por estes processos, ocorre um pré-tratamento
da glicerina bruta, onde os sabões e o catalisador presentes podem ser removidos utilizando-se
10
acidulação, originando sais, água e ácidos graxos livres. [10] A glicerina proveniente desta
etapa é denominada glicerina loira. [3]
O processo de troca iônica vem ganhando espaço atualmente devido ao seu baixo
consumo de energia e simplicidade de operação. [6] Consiste na passagem da glicerina loira
por sucessivos leitos de resina catiônica forte, resina aniônica fraca e resinas mistas de cátion
e ânion fortes, onde ocorre a eliminação de traços de ácidos graxos livres, cor, odor e demais
impurezas presentes. Após este processo, segue para uma evaporação, onde obtém-se
glicerina com pureza de mais de 99%. A glicerina pode ainda passar por um leito de carvão
ativado para melhorar sua aparência. [8]
O método convencional é o mais utilizado pelas indústrias. Após a etapa de acidulação,
a glicerina loira passa por evaporação à vácuo onde o metanol utilizado em excesso na reação
de transesterificação pode ser retirado juntamente com a água, e segue para uma destilação a
vácuo ou adsorção contínua, onde pode atingir 99,5% de pureza. Para eliminação de odores e
clarificação, pode passar por desodorização e tratamento com carvão ativado, seguido de
filtração para sua eliminação. [6,8]
A temperatura na destilação deve ser controlada de forma rígida, uma vez que se houver
uma variação muito grande, pode ocorrer a destilação de subprodutos escuros presentes no
resíduo. Para prevenir a polimerização do glicerol e a formação de outros compostos, como a
acroleína, a temperatura não deve ultrapassar 200ºC e o pH do meio não pode estar baixo,
devendo-se fazer ajuste caso seja necessário. [7,14] A acroleína é um aldeído insaturado,
incolor e tóxico, causa irritação nos olhos e nas membranas mucosas do trato respiratório.
[16,17]
FIGURA 5 – Fórmula estrutural da acroleína
Fonte: Osório. [17]
11
I.2. Processo de tratamento da glicerina bruta –Acidulação
O processo de acidulação, também chamado de neutralização, [8] é conhecido como
hidrólise ácida. A hidrólise consiste em uma reação de decomposição de uma substância pela
água. É aplicável na saponificação de ácidos graxos e demais ésteres, quebra de proteínas,
entre outros processos. Considera-se hidrólise as reações onde são colocados ácidos minerais
em água e a reação onde um álcali é utilizado no lugar da água, originando um sal alcalino de
um ácido. [18]
Este tratamento com ácidos é feito para neutralização do catalisador e remoção dos
ácidos graxos presentes na glicerina bruta. [3] Alguns dos ácidos utilizados no processo de
acidulação são: ácido fosfórico (H3PO4), ácido sulfúrico (H2SO4) e ácido clorídrico (HCl).
[19,20,21] Algumas empresas utilizam ácido cítrico (C6H8O7) na etapa de purificação, como
uma alternativa barata e de menos prejuízos para os equipamentos, devido ao ataque do ácido.
Outra alternativa seria a utilização do ácido metanossulfônico (NaCH3O) devido à
propriedade de ser um ácido forte, do seu baixo índice de ataque à equipamentos metálicos e
boa solubilidade dos sais formados. [22,23,24]
Os ácidos graxos formados após a adição do ácido são insolúveis no glicerol,
promovendo uma separação de fases, permitindo que seja feita a separação do ácido graxo e
da glicerina. [10]
A reação de neutralização com o ácido metanossulfônico em uma glicerina proveniente
de um processo de transesterificação utilizando metilato de sódio como catalisador gera a
seguinte reação: [5,25]
CH3SO3H + NaCH3O → NaCH3SO3 + CH3OH
E no tratamento de acidificação com ácido cítrico, tem-se:
C6H8O7 + 3 NaCH3O → Na3C6H5O7 + 3 CH3OH
Após as reações que ocorrem com o catalisador, o ácido começa a reagir com o sabão
presente na glicerina bruta, tendo a seguinte reação característica para o processo de
tratamento com o ácido metanossulfônico: [5,25]
R − COONa + CH3SO3H → R − COOH + NaCH3SO3
12
E no processo com ácido cítrico, tem-se:
3 R − COONa + C6H8O7 → 3 R − COOH + Na3C6H5O7
Onde R é uma mistura de cadeias carbônicas. Nestas reações é possível observar a
formação dos sais metanossulfonato de sódio (NaCH3SO3) e citrato de sódio (Na3C6H5O7),
respectivamente, com fórmulas estruturais ilustradas na Figura 6. [5,25]
Após a acidificação, a glicerina loira segue para os processos de purificação
convencional ou troca iônica. [8]
FIGURA 6 – Fórmulas estruturais dos sais formados na acidulação.
Fonte: O autor.
Este trabalho propõe a utilização do ácido metanossulfônico como uma alternativa dos
ácidos utilizados usualmente neste tipo de aplicação. O objetivo é realizar uma comparação
com o ácido cítrico no processo de tratamento da glicerina bruta, proveniente de uma reação
de transesterificação entre óleo de soja e metanol catalisada por metilato de sódio, utilizando a
destilação no processo de purificação, e verificar qual apresenta os melhores resultados
durante o processo e no produto final.
13
II. MATERIAIS E MÉTODOS
Os equipamentos utilizados nas análises e no processo de tratamento da glicerina
encontram-se detalhados a seguir:
Agitador mecânico IkaLabortechnik – modelo RW 20;
Manta aquecedora Fisatom modelo 202;
Controlador de temperatura Fisatom modelo 409;
Balança analítica Mettler Toledo modelo PB3002-S;
Bomba de vácuo Edwards – modelo nXDS10iC;
Vacuômetro Willy 760mmHg - Classe A1;
pHmetro Thermo Scientific - modelo Orion Star A211
Espectrofotômetro FT-IR Spectrum 400 PerkinElmer
Titulador Karl Fischer 870 KF Titrino plus – Metrohm Herisau
Estufa Fanem mod. 502;
II.1- Processo de Purificação da Glicerina Bruta
A glicerina bruta foi obtida a partir de uma reação de transesterificação entre óleo de
soja e metanol, utilizando metilato de sódio como catalisador. Após o término da reação, a
separação do éster e da glicerina foi realizada por diferença de densidade, e a glicerina foi
encaminhada para testes, apresentando teor de 84,34%.
Ácido metanossulfônico
O ácido metanossulfônico (Figura 7), também chamado de MSA (methanesulfonic
acid), é um ácido orgânico forte, inodoro, não apresenta propriedades oxidantes e muito
estável termicamente se comparado com alguns ácidos aromáticos sulfonados. É vendido
comercialmente a uma concentração de 70% ou também pode ser encontrado com
concentração de aproximadamente 100% (>99,5%). Os sais formados possuem ótima
solubilidade como, por exemplo, o metanossulfonato de sódio com solubilidade em água de
716 g/L (a 23ºC). Pode ser manuseado na sua forma líquida, uma vez que seu ponto de fusão
é -54ºC. Possui grande biodegradabilidade, propriedades higroscópicas e densidade
14
aproximada de 1,35 g/cm3. Os ácidos clorídrico, sulfúrico e metanossulfônico são mais fortes
se comparados aos ácidos fosfórico e cítrico. [22,23,24,26].
FIGURA 7 – Fórmula estrutural do ácido metanossulfônico.
Fonte: Sigma-Aldrich. [26]
Ácido cítrico
O ácido cítrico (C6H8O7) é um ácido tricarboxílico e, de acordo com a nomenclatura da
IUPAC, é denominado ácido 1,2,3-tricarboxílico 2-hidroxipropano, de fórmula estrutural
conforme Figura 8. Em frutas cítricas pode ser encontrado em grandes quantidades (de 5 a 9%
de suco). É incolor, inodoro e possui agradável sabor ácido. Sua densidade relativa é de 1,542
e possui ponto de fusão a 100ºC. [27] Além disso, o sal citrato de sódio, o mais comum
formado em uma neutralização, possui solubilidade (em água a 23ºC) de 425 g/L. [28] Ácido
cítrico forma complexos estáveis com muitos metais, alguns como citrato de ferroamônio. O
ácido cítrico e seus sais são muito utilizados na produção alimentícia, incluindo bebidas,
sucos de frutas, geléias, etc. São importantes na produção de óleos vegetais, na preservação da
cor, sabor, entre outros, de vegetais e frutas frescas ou congeladas. [27]
FIGURA 8 – Fórmula estrutural do ácido cítrico.
Fonte: Adaptado de Ullmann’s. [27]
O processo utilizado para o tratamento da glicerina neste trabalho pode ser observado
através do fluxograma ilustrado na Figura 9.
15
FIGURA 9 – Fluxograma do processo de tratamento da glicerina
Fonte: O autor.
Aquece-se a glicerina em temperatura de aproximadamente 65ºC, pois a mesma se
encontra em estado sólido à temperatura ambiente devido a presença de impurezas. O
aquecimento garante a homogeneidade na amostra a ser testada e facilidade no manuseio do
material.
Diluição da glicerina
Tratamento com MSA
Separação das Fases
Análise de pH
Material Graxo Destilação
Destilado
Resíduo
Água
Tratamento com ácido cítrico
Separação das fases
Análise de pH
Material Graxo Destilação
Destilado
Resíduo
Água
Análises físico
químicas
16
Dilui-se a glicerina recuperada para aproximadamente 70%, onde adiciona-se 204,26g
de água destilada em 1100g de glicerina sob agitação constante, de aproximadamente 2000
rpm. Esta diluição é feita para facilitar o manuseio do produto. Após esta etapa, adiciona-se
91,72g de ácido metanossulfônico, mantendo-se o pH entre 3,00 e 4,00.
O ácido metanossulfônico utilizado se encontra em uma solução com concentração
70%, portanto a quantidade do produto tal qual utilizada na neutralização foi de 64,20g,
conforme a conta a seguir:
Massa ácido × 0,70 = 91,72 × 0,70 = 64,20g
Os testes com ácido cítrico foram feitos em paralelo aos testes com o ácido
metanossulfônico, seguindo os mesmos parâmetros de diluição, neutralização e destilação. A
massa de ácido cítrico utilizada foi de 50,29g.
Observa-se que a quantidade de ácido cítrico aplicada no processo foi menor do que a
quantidade de ácido metanossulfônico para realizar a neutralização e atingir o pH ideal para
que ocorressem as reações de quebra de sabão.
A razão molar entre o ácido metanossulfônico e o metilato de sódio a ser neutralizado e
a molécula de sabão a ser quebrada é de 1:1, enquanto que, no caso do ácido cítrico, esta
razão é de 1:3, conforme reações supracitadas, o que pode explicar a diferença de massa de
ácido utilizada, além da força dos ácidos, já que o MSA é um ácido mais forte que o ácido
cítrico.
Em seguida, transfere-se a glicerina neutralizada para um funil de separação de 2L e
coloca-se em estufa a 60ºC por um período de 24 horas. Após este período, ocorre a separação
de fases, onde a fase superior é composta de material graxo e a fase inferior, de glicerina.
Ambas as fases são separadas e pesadas. Mede-se o pH e mantém-se o valor em uma faixa
entre 5,0 e 6,0. Se necessário, adiciona-se NaOH para acerto do pH.
Em seguida, transfere-se a glicerina para um reator de vidro de 2L acoplado a um
condensador e uma manta aquecedora, conforme demonstrado na Figura 10.
Realiza-se a destilação a vácuo de aproximadamente 700 mmHg, utilizando a bomba de
vácuo e fazendo a leitura através de um vacuômetro, com agitação constante de 400 rpm. A
destilação da água ocorre entre 60 e 100ºC. Após a retirada da água, ajusta-se a temperatura
para 120ºC e, após 20 minutos, para 150°C, garantindo que toda a água seja retirada.
17
Em seguida, ajusta-se a temperatura para 185°C para destilação da glicerina. Após um
período de cerca de 4 horas, obtém-se três derivados: a glicerina, a água e um resíduo que
permanece no reator.
FIGURA 10 – Sistema para destilação da glicerina
Fonte: O autor.
Para simplificar as identificações das amostras em cada fase do processo de tratamento
das glicerinas e nos resultados das análises, foram criadas siglas, apresentadas no Quadro 2.
QUADRO 2 – Nomenclatura das amostras.
Sigla Descrição
GMD Glicerina destilada – tratamento com ácido metanossulfônico
GMR Resíduo da destilação – tratamento com ácido metanossulfônico
GMA Glicerina antes da destilação – tratamento com ácido metanossulfônico
GCD Glicerina destilada – tratamento com ácido cítrico
GCR Resíduo da destilação – tratamento com ácido cítrico
GCA Glicerina antes da destilação – tratamento com ácido cítrico
GBD Glicerina bidestilada
GB Glicerina bruta
MSA Methanesulfonic acid (Ácido metanossulfônico)
Fonte: O autor.
18
II.2. pH
O pH (potencial hidrogeniônico) das amostras foi medido utilizando um pHmetro
previamente calibrado com soluções tampão de pH 4,01 e 7,00. Nesta análise, insere-se o
eletrodo na amostra de interesse, e o equipamento faz a leitura do pH, indicando o resultado
no visor.
II.3. Determinação do teor de glicerina
Esta análise baseia-se no Método Henkel KGaA nos 113/114/115, onde tem-se a
oxidação da glicerina em meio acético com ácido periódico, o qual só reage com produtos de
OH vicinais. O excesso deste ácido é titulado por iodometria.
Pesa-se em um aproximadamente 0,35 g da amostra em balança analítica. Transfere-se
quantitativamente, para um balão volumétrico de 1000 mL. Completa-se o balão até o
menisco com água destilada, com auxílio de uma pisseta. Para a reação de oxidação da
glicerina, tem-se:
C3H8O3 + 2HIO4 → 2CH2O + HCOOH + H2O + 2HIO3
Por meio da pipeta de 50 mL, retira-se uma alíquota e transfere-se para o erlenmeyer.
Em paralelo, faz-se o branco pipetando 50 mL de água destilada. Deixa-se em repouso por
meia hora, no escuro. A reação abaixo exemplifica o teste branco e o teste com a glicerina
após a oxidação, respectivamente.
HIO4 + 7I− + 7H+ → 4I2 + 5H2O
HIO3 + 5I− + 5H+ → 3I2 + 3H2O
Após este período, adiciona-se 30 mL de solução de iodeto de potássio a 10% com o
auxílio de uma proveta. Agita-se e espera-se de 1 a 5 minutos. Faz-se, então, a titulação com
solução de tiossulfato de sódio 0,1N, até a solução ficar clara. Segue reação:
I2 + 2S2O3−2 → 2I− + S4O6
−2
Adiciona-se de 0,5 a 1,0mL da solução de amido, neste momento, haverá alteração da
cor da solução, assumindo então uma coloração azulada. Continua-se a titulação até o
desaparecimento da cor azul.
19
O teor de glicerol presente na amostra, determina-se através do cálculo:
%𝑔𝑙𝑖𝑐𝑒𝑟𝑜𝑙 =(𝐵 − 𝐴) × 𝑓 × 230
𝑃𝐴 × 50
Onde:
B = volume da solução de tiossulfato de sódio 0,1N gasto na prova em branco (mL)
A = volume da solução de tiossulfato de sódio 0,1N gasto na amostra (mL)
f = fator de correção da solução de tiossulfato de sódio 0,1N.
PA = peso da amostra (g)
50 = alíquota pipetada
II.4. Teor de cinzas sulfatadas
Esta análise tem o intuito de determinar a concentração de contaminantes inorgânicos
com base no teor de cinzas sulfatadas. Baseada em British Pharmacopeia 1988 – Method II,
consiste no princípio de queima e volatização do material orgânico a 800°C em meio ácido
sulfúrico a fim de converter as impurezas metálicas em seus sulfatos correspondentes,
reduzindo a perda de material por volatilização. Os materiais inorgânicos, sendo fixados na
forma de sulfato, são pesados. Este processo envolve duas reações químicas, que são descritas
da seguinte forma:
C3H8O3 + 5O2 → 3CO2 + 4H2O
Metal + H2SO4 → Metal SO4 + H2
Coloca-se um cadinho, por 30 minutos, em mufla a 600°C. Retira-se, espera-se esfriar
por 20 minutos em dessecador e pesa-se (T). São pesadas cerca de 10 g da amostra no cadinho
e queima-se até quase a secura no triângulo de porcelana e no tripé de ferro. Adiciona-se 0,5
mL de H2SO4 P.A e retorna-se ao triângulo e tripé de ferro. Aquece-se lentamente e
gradativamente com o bico de Bunsen até a queima total do material, que, então, é colocado
em mufla 600°C e calcina-se por 1 hora ou até peso constante. Adiciona-se algumas gotas de
H2SO4 1M e é feito aquecimento, como anteriormente. O material é deixado para esfriar.
Adicionam-se algumas gotas de Carbonato de Amônia a 16% e evapora-se até secura. Passa-
se para a mufla a 800ºC e calcina-se por 60 minutos. O material é deixado em resfriamento
em dessecador por 20 min e pesado (P).
20
%cinzas sulfatadas =P − T
PA× 100
Onde:
P = peso do cadinho + cinzas (g)
T = tara do cadinho
PA = peso da amostra (g)
II.5. Cor Pt-Co ou APHA ou HAZEN
Nesta análise, baseada na norma ASTM D-1209, a cor da amostra é comparada com
cores contidas em discos padrões de cores, em um colorímetro (Nesslerizador). O resultado é
expresso em número igual à cor padrão ou mais próxima desta. São colocados 2 tubos de
Nessler, um contendo a amostra e outro contendo água destilada. Seleciona-se o disco padrão
com escala de cores compatível com a amostra a ser analisada e coloca-se no aparelho
Nesslerizador. O tubo com a água destilada é colocado no lado esquerdo do aparelho e o tubo
contendo a amostra de interesse, do lado direito. Liga-se a luz e gira-se o disco padrão de
cores, até que as janelas observadas tenham a mesma intensidade de coloração. Faz-se a
leitura indicada no aparelho.
II.6. Teor de água
O reagente de Karl Fischer é um composto de iodo, piridina, anidrido sulfuroso e éter
metílico do monoetileno glicol. A presença de água na amostra ocasiona redução do Iodo pelo
anidrido sulfuroso. No momento em que não há mais água na solução, tem-se iodo livre. Na
titulação Karl Fischer, o ponto final ocorre quando é percebida, visualmente a cor marrom do
reagente, ou podem ser utilizados equipamentos automáticos baseados na detecção
eletromagnética do ponto final. [29]
Esta análise, baseada na norma ABNT NBR 5758, é realizada através de um titulador
Karl Fischer (KF). Coloca-se metanol no copo do KF até cobrir as platinas do eletrodo. O
equipamento é acionado para iniciar a titulação da água contida no copo, que ocorre até a
neutralização, indicado pelo aparelho. Com o auxílio de uma seringa, injeta-se uma
quantidade de 8 a 10g da amostra no copo. Inicia-se novamente a titulação, indicando no
21
aparelho a quantidade de amostra pesada, até ser indicado o término da análise. É feita a
leitura do resultado no visor do titulador.
II.7. Espectroscopia por infravermelho
A espectroscopia por infravermelho é uma técnica que se baseia na radiação
infravermelha, sendo esta situada na região entre a região visível e a região de microondas.
[30].
As moléculas absorvem a radiação infravermelha e excitam-se até um estado de energia.
A frequência absorvida é específica para cada tipo de molécula e, uma vez absorvida, essa
energia promoverá uma vibração molecular, que é definida pelos movimentos de estiramento
e deformação das ligações da molécula. Essas vibrações moleculares dão origem a bandas que
ocorrem aproximadamente na mesma frequência. [31]
Nesta análise foi utilizado o espectrofotômetro FT-IR Spectrum 400 da Perkin Elmer,
sendo o número de scans de 10 e realizando o background a cada 2 amostras medidas. É
depositado sobre o cristal do módulo 1 mL de amostra e realizada a análise. Os resultados são
indicados em um computador conectado ao equipamento.
22
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO
III.1. Tratamento com ácido e separação do material graxo e glicerina
O aspecto da glicerina recuperada após a etapa de acidificação com o ácido
metanossulfônico (A) e com o ácido cítrico (B) pode ser observado na Figura 11.
FIGURA 11 – Glicerina recuperada neutralizada com ácido metanossulfônico (A) e com ácido
cítrico (B)
Fonte: O autor.
É possível observar que a glicerina acidificada com ácido cítrico apresentou uma
formação de um sobrenadante de aparência espumosa, enquanto a glicerina acidificada com o
ácido metanossulfônico não apresentou formação de segunda fase.
Nesta etapa, observa-se que, ao ser realizada a adição do ácido, no caso
metanossulfônico e cítrico, inicialmente tem-se a reação entre o ácido e o catalisador residual
(metilato de sódio) presente na glicerina bruta. Desta reação originam-se os sais
metanossulfonato de sódio e o citrato de sódio. Quando o catalisador residual é totalmente
23
reagido, o ácido (MSA ou cítrico) sobressalente faz com que o pH do meio diminua,
tornando-se ácido. Neste momento, ocorre a quebra dos sabões formados durante a reação de
transesterificação, conforme as reações descritas na Figura 12, onde R é uma mistura de
diversas cadeias carbônicas.
FIGURA 12 – Reações de quebra de sabão com ácido MSA (A) e cítrico (B).
Fonte: Adaptado de Knothe e Pelisson. [5,25]
Após o período de repouso na estufa (24h a 60ºC), observou-se a ocorrência de
separação de fase em ambas as amostras. Baseado nos resultados obtidos e nos valores de
solubilidade de sais formados, supõe-se que o ácido metanossulfônico solubilize, até certo
ponto, o material graxo formado pela quebra do sabão, impossibilitando a formação da
segunda fase antes do aquecimento. A Figura 13 mostra a separação das fases após a
acidulação e o período de repouso na estufa. Sendo A (esquerda) a glicerina acidificada com o
ácido metanossulfônico e B (direita) a glicerina acidificada com o ácido cítrico.
A fase superior, de cor marrom, contém o material graxo formado pela quebra do sabão
após a adição do ácido, conforme demonstrado na Figura 12, e a fase inferior, de cor amarela,
contém a glicerina. Isto ocorre pois, através da reação de quebra dos sabões, os ácidos graxos
livres resultantes, não sendo solúveis no glicerol, se deslocam para a superfície onde podem
ser retirados e reciclados.
24
FIGURA 13 – Separação de fases: glicerina + ácido metanossulfônico (A) e glicerina + ácido
cítrico (B)
Fonte: O autor.
III.2. Destilação
Durante o processo de destilação obteve-se, primeiramente, a destilação da água, sendo
esta com a presença de possíveis compostos voláteis (como metanol) e material graxo
residual; seguido pela destilação da glicerina propriamente dita.
A glicerina tratada com metanossulfônico foi destilada a 181ºC, visto que acima disso
ocorre a destilação dos subprodutos. Já para a glicerina tratada com ácido cítrico a destilação
ocorre por volta de 185ºC. Apenas ao atingir essa temperatura foi possível observar a
destilação da glicerina, porém, ela apresentou uma coloração amarelada, indicando possíveis
subprodutos do resíduo.
No primeiro teste realizado, deixou-se a destilação ocorrer por um tempo muito longo, o
que acarretou na destilação do resíduo e foi observado aumento da temperatura no material
que estava no reator. Sendo assim, foi observado que o tempo da destilação também deve ser
controlado rigorosamente, pois acima das 4 horas pode ocorrer a contaminação do destilado
25
pelos subprodutos presentes no resíduo, uma vez que este começa a destilar. O teste onde
ocorreu tal situação necessitou ser descartado.
Nos demais testes foi realizado controle do tempo de reação, de modo que não ocorresse
a contaminação da glicerina destilada.
A Figura 14 apresenta uma comparação dos produtos da destilação com o ácido
metanossulfônico (A) e com ácido cítrico (B).
FIGURA 14 – Comparação entre a glicerina destilada, o resíduo e a glicerina antes da
destilação
Fonte: O autor.
É possível observar que a glicerina proveniente do tratamento com o ácido
metanossulfônico apresentou aparência mais límpida, e mais próxima à do glicerol, se
26
comparada com a glicerina proveniente da acidificação com o ácido cítrico que resultou em
uma cor amarelada, indicando que o tratamento com o MSA aparentemente resulta em uma
glicerina com menor quantidade de impurezas do que o realizado pelo processo de acidulação
com o ácido cítrico.
As massas dos materiais utilizados durante o processo, assim como as dos produtos
obtidos durante a etapa de acidulação e destilação encontram-se detalhados no Quadro 3.
QUADRO 3 – Massas (g) de glicerina, água e ácidos utilizados e obtidos no processo.
MSA Cítrico
Massa utilizada na destilação 965,88 960,86
Material graxo 22,93 26,74
Água + metanol destilados 208,96 192,22
Glicerol destilado 584,26 305,86
Resíduo da destilação 170,66 461,82
Fonte: O autor.
A menor solubilidade dos sais do ácido cítrico pode ter proporcionado a presença de
certa quantidade de sais do mesmo no meio graxo, ocasionando aumento da massa resultante,
o que não ocorre com o meio graxo do tratamento com MSA, pois este apresenta maior
solubilidade de seus sais.
O resíduo do destilado do tratamento com ácido cítrico reflete a insolubilidade dos sais
do mesmo, o que resultou em maior dificuldade de destilação e quantidade de resíduo
formado consideravelmente maior em relação ao tratamento com o metanossulfônico.
Percebe-se que com o tratamento utilizando MSA obteve-se maior quantidade de
glicerina destilada, se comparado ao tratamento com ácido cítrico, tendo-se maior rendimento
no processo.
27
III.3. Resultados analíticos e cálculos de rendimento
Adotou-se uma amostra padrão de glicerina comercial (bidestilada) para que fossem
realizadas comparações dos resultados obtidos nos testes de tratamento da glicerina com os
ácidos cítrico e o ácido metanossulfônico.
O Quadro 4 apresenta os resultados das análises obtidas.
QUADRO 4 – Resultados analíticos das amostras padrão e das glicerinas obtidas após a
destilação
GMD
Glicerina
Destilada
(MSA)
GMR
Resíduo da
Destilação
(MSA)
GCD
Glicerina
Destilada
(AC)
GCR
Resíduo da
Destilação
(AC)
GBD
Glicerina
Bidestilada
(padrão)
Cor APHA 74 -1 >500 -1 20
Teor de Cinzas sulfatadas 0,007% 21,39% 0,01% 5,7% 0,01%
Teor de Glicerina 99,62% 25,33% 97,52% 20,85 99,5%
Teor de Água (KF) 0,29% 0,57% 1,18% 0,55 0,5%
pH 6,3 5,6 5,9 5,2 7,0
1 – Material muito escuro
Fonte: O autor.
Na análise de cor APHA, não foi possível verificar a cor real da amostra GCD, visto que
a leitura do equipamento era realizada somente até 500. Portanto, sabe-se que o resultado da
análise para esta amostra é maior do que 500. A cor APHA da GMD apresentou valores mais
próximos da GBD (20) se comparado com a GCD.
O teor de cinzas sulfatadas de ambas as glicerinas destiladas (GMD e GCD)
apresentaram valores bem próximos do padrão (0,01) sendo esta análise a responsável por
identificar o “teor de impurezas” na amostra. A GMD apresentou teor de glicerol superior ao
padrão e relativamente melhor do que o GCD (97,52).
A seguir tem-se os cálculos de rendimento da glicerina destilada para o tratamento com
o ácido metanossulfônico e com o ácido cítrico respectivamente.
28
Ácido metanossulfônico
Primeiramente calcula-se o teor (%) de glicerol após a diluição e adição do ácido. O teor
da glicerina bruta (C1) foi analisado antes do início do tratamento com o ácido, segundo
método supracitado.
C1 × V1 = C2 × V2
0,8434 × 1100 = C2 × 1395,98
C2 = 0,6646
Em seguida calcula-se o teor de glicerol após a retirada do material graxo.
C2 × V2 = C3 × V3
0,6646 × 1395,98 = C3 × 1350,12
C3 = 0,6872
Por fim, calcula-se o rendimento com base na quantidade (teor versus massa) de
glicerina destilada e na quantidade total de glicerina utilizada na destilação.
R =VD × TD
VI × TI
R =584,26 × 0,9962
965,88 × 0,6872× 100
R = 87,69%
Ácido cítrico
Os mesmos cálculos de rendimento de glicerol foram feitos para os testes com ácido
cítrico.
C1 × V1 = C2 × V2
0,8434 × 1100 = C2 × 1354,55
C2 = 0,6849
C2 × V2 = C3 × V3
0,6849 × 1354,55 = C3 × 1327,81
C3 = 0,6987
29
R =VD × TD
VI × TI
R =305,86 × 0,9752
960,86 × 0,6987× 100
R = 44,43%
Sendo,
C1 = Teor da glicerina bruta (%);
C2 = Teor da glicerina diluída (%);
C3 = Teor da glicerina sem o material graxo (%);
V1 = Massa da glicerina bruta utilizada no teste (g);
V2 = Soma das massas de glicerina bruta, água e ácido (g);
V3 = Massa da glicerina após a retirada do material graxo (g);
VI = Massa de glicerina utilizada na destilação (g);
TI = Teor de glicerol inicial (%);
VD = Massa do glicerol destilado (g);
TD = Teor de glicerol no destilado (%);
R = Rendimento (%).
Observa-se que, de acordo com a análise de teor de glicerol, a glicerina resultante do
tratamento com MSA possui um teor de glicerol maior se comparado com a glicerina tratada
com ácido cítrico e, de acordo com os cálculos baseados nas massas de glicerina obtidas na
destilação, apresenta maior rendimento do que a proveniente do tratamento com ácido cítrico.
O teor de cinzas sulfatadas em GMD foi levemente menor se comparado ao GCD.
Para caracterizar e comparar as amostras de glicerina obtidas com a comercial, realizou-
se análises de infravermelho.
A Figura 15 mostra uma comparação da média dos espectros de infravermelho das
glicerinas após serem tratadas com os respectivos ácidos.
30
FIGURA 15 – Infravermelho da glicerina após tratamento com ácidos.
Fonte: O autor.
Observa-se uma diferença significativa nas bandas entre 1750 e 1130 cm-1. As
diferenças nas bandas compreendidas entre 1750 e 1480 cm-1 se deve a forte presença de
ligações duplas carbono/oxigênio presentes no ácido cítrico, enquanto a região de 1450 a
1270 cm-1 apresenta duas bandas, sendo a primeira uma deformação angular do grupo OH,
muito forte em ácidos cítricos e um estiramento do grupo C-O de álcoois, muito comum na
molécula de glicerol (álcool tri hidroxilado).
A Figura 16 apresenta os espectros médios de infravermelho da glicerina tratada com o
ácido metanossulfônico e destilada (GMD), da glicerina tratada com ácido cítrico e destilada
(GCD) e da glicerina comercial (bidestilada):
3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
100
150
200
250
300
350
400
450
R-S
O2
(def. a
ng.)
O-H
(est
.) C
-O d
e á
lcool
(est
.) C
=O
Tra
nsb
itâ
ncia
(%
)
Comprimento de onda (cm-1)
GMA
GCA
31
FIGURA 16 – Infravermelho da glicerina destilada
Fonte: O autor.
Percebe-se que os resultados obtidos com a glicerina padrão e as glicerinas provenientes
dos testes realizados, foram semelhantes. Porém, pode-se observar que houve a formação de
uma banda em 1723 cm-1 característica de estiramento C=O na amostra de GCD,
possivelmente devido a ligações duplas do carbono/oxigênio indicando a presença de sais
provenientes do ácido cítrico, que foram destilados junto com a glicerina.
A Figura 17 apresenta a média dos espectros de infravermelho do resíduo formado na
destilação.
3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
50
100
150
200
250
300
350
400
450
(def. a
ng.)
CH
2
(def. a
ng.)
RH
C=C
H2
(est.)
C-O
de á
lcool
(def. a
ng.)
O-H
Fin
gerp
rint
(est.)
C-H
de C
H2
(est.)
O-H
(est.)
C=O
T
ran
sb
itâ
ncia
(%
)
Comprimento de onda (cm-1)
Comercial
GCD
GMD
32
FIGURA 17 – Infravermelho do resíduo
Fonte: O autor.
É possível observar uma banda mais intensa no espectro da GMR na região de 1250-
1130 cm-1, sendo este um modo vibracional característico do grupo SO2 presente no sal
metanossulfonato (NaCH3SO2). A amostra GCR apresentou um pico intenso na região de
entre 1400 cm-1 pertencente ao grupo OH, isso se deve ao fato da presença de grupos hidroxila
do sal citrato.
3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
50
100
150
200
250
300
350
400
450
(def. a
ng.)
CH
3
R-S
O2
(def. a
ng.)
CH
2
(def. a
ng.)
O-H
(est.)
C=O
(est.)
C=O
Fin
gerp
rint
(est.)
C-H
de C
H2
(est.)
O-H
Tra
nsb
itâ
ncia
(%
)
Comprimento de onda (cm-1)
GCR
GMR
33
IV. CONCLUSÃO
A utilização de ácidos no processo de purificação da glicerina mostra-se de grande
importância, pois o uso destes para a neutralização do catalisador e quebra dos sabões para
retirada dos materiais graxos, mostra-se de grande eficiência para tornar a glicerina aplicável
nos diversos setores da indústria, que requerem alto grau de pureza. Porém, muitas vezes o
processo de neutralização ocorre em tanques metálicos, o que propicia o ataque do ácido à
superfície metálica. Tais ataques podem causar grandes prejuízos para as empresas, visto que
há uma grande demanda por manutenção. A busca por ácido de melhor performance e baixo
custo é constante.
O ácido cítrico tem sido uma opção por ser um ácido orgânico fraco. O ácido
metanossulfônico foi proposto como uma alternativa eficiente levando-se em conta também
seu potencial de neutralização e a solubilidade dos sais formados, além de apresentar a
característica de ser um ácido forte que resulta em baixo ataque aos materiais metálicos, se
contrastado aos demais ácidos fortes, como ácido sulfúrico e clorídrico.
Ao se comparar os resultados obtidos nos testes, pode-se observar uma diferença
notável tanto no quesito rendimento do destilado quanto na cor propriamente dita, onde o
ácido metanossulfônico mostrou-se melhor do que o ácido cítrico, e também na quantidade de
resíduo gerada, que no caso da acidulação com o ácido cítrico, resultou em maior valor do que
com o metanossulfônico.
O ácido cítrico possui valor comercial menor do que o ácido metanossulfônico, porém
mediante observação dos resultados obtidos nos testes realizados e das vantagens
apresentadas, conclui-se que o ácido metanossulfônico é o mais indicado para este tipo de
processo.
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